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Universidade Potiguar - UnP
Programa de Pós-Graduação em Administração - PPGA
Mestrado Profissional em Administração
EDINELZA MACEDO RIBEIRO
DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E O FENÔMENO CULTURAL DOS
BOIS-BUMBÁS DE PARINTINS: UM ESTUDO DE CASO
NATAL
2008
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1
EDINELZA MACEDO RIBEIRO
DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E O FENÔMENO CULTURAL DOS
BOIS-BUMBÁS DE PARINTINS: UM ESTUDO DE CASO
Dissertação apresentada ao programa de
Pós-graduação Strictu Sensu em
Administração da Universidade Potiguar
como requisito para a obtenção do título
de Mestre.
Linha de Pesquisa e Temática: Gestão
Estratégica de Pessoas.
ORIENTADORA: Prof.ª Lydia Maria
Pinto Brito. Dr.ª
NATAL
2008
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2
R484d Ribeiro, Edinelza Macedo.
Desenvolvimento local sustentável e o fenômeno
cultural dos bois-bumbás de Parintins: um estudo de
caso / Edinelza Macedo Ribeiro. – Natal, 2008.
143f.
Dissertação (Mestrado em Administração)
Universidade Potiguar. Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-
Graduação.
Bibliografia f. 134-142.
1. Administração – Dissertação. 2. Desenvolvimento
Local Sustentável – Dissertação. 3. Bois - Bumbás –
Parintins – Dissertação. I. Título.
RN/UNP/BCFP CDU:658(043.3)
3
EDINELZA MACEDO RIBEIRO
DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E O FENÔMENO CULTURAL DOS
BOIS-BUMBÁS DE PARINTINS: UM ESTUDO DE CASO
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Administração da
Universidade Potiguar, como requisito
parcial para a obtenção do Título de
Mestre, na área de concentração Gestão
Estratégica de Pessoas.
Data da aprovação: ____/_____/_____
BANCA EXAMINADORA
________________________________________
Profª. Dr ª. Lydia Maria Pinto Brito
Orientadora
Universidade Potiguar
______________________________________
Prof ª. Dr ª. Tereza de Souza
Coordenadora do Curso de Mestrado
Universidade Potiguar
________________________________________
Prof°. Dr. Fernando Dias Lopes
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à comunidade parintinense como forma
de compartilhar saberes necessários sobre as possibilidades
concretas de desenvolvimento através da cultura de seu povo.
5
AGRADECIMENTOS
A Deus, a quem devo minha existência.
Aos meus pais e familiares pelo apoio na realização desse estudo.
Em especial, aos acadêmicos do curso de Letras e Pedagogia da Universidade do
Estado do Amazonas – CESP.
À professora orientadora Lydia Maria Pinto Brito pelo exemplo, estímulo e
contribuição dedicada à comunidade acadêmico-científica.
A Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
Ao Programa de Apoio à Formação de Recursos Humanos Pós-Graduados para o
Interior do Estado do Amazonas – RH-Interiorização.
Aos professores e colegas do curso de Mestrado Profissional em Administração. O
impossível aconteceu!
Às professoras Maria das Graças Soares, Georgina Vasconcelos e professores
Valdson Soares e Valteir Martins pelas substituições em sala de aula.
Ao pessoal da secretaria da UEA - Vilcélia, Jacklane, Vandineth Pires e Solemara.
Às minhas amigas, Darlene Pereira e Maria do Carmo Silva, pelo brilhante
desempenho na realização das tarefas.
Aos dirigentes e apoio técnico das organizações dos bumbás “Garantido” e
“Caprichoso”.
À comunidade parintinense pela receptividade na realização da presente pesquisa.
Aos órgãos públicos e privados, pela colaboração e apoio no estudo.
6
É necessário perder o hábito e deixar de conceber a cultura
como saber enciclopédico, no qual o homem é visto sob forma
de recipiente para encher e amontoar com dados empíricos,
com fatos brutos e desconexos, que ele depois deverá arrumar
no seu cérebro como nas colunas de um dicionário para poder
então, em qualquer ocasião, responder aos vários estímulos do
mundo externo. Esta forma de cultura é verdadeiramente
nociva, especialmente para o proletariado.
Gramsci
7
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Sinalizações de Traços da Cultura Brasileira
Quadro 2 Demonstrativo das etapas do tratamento dos dados da pesquisa
Quadro 3 Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a própria emergência
como atores sociais
Quadro 4 Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a criação de redes de
cooperação
Quadro 5 Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a elaboração de
projetos coletivos
Quadro 6 Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre Instituições
8
LISTA DE SIGLAS
AO Aprendizagem Organizacional
AABB Associação Atlética Banco do Brasil
AAPP Associação dos Artistas Plásticos de Parintins
AFBBC Associação Folclórica Boi Bumbá Caprichoso
AFBBG Associação Folclórica Boi Bumbá Garantido
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
CEPAL Comissão Econômica para América Latina
CIEAM Centro das Indústrias do Estado do Amazonas
DLS Desenvolvimento Local Sustentável
DST’S Doenças Sexualmente Transmissíveis
ECO 92 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento
EXPOPIN Exposição da feira Agropecuária do Interior do Norte
FAB Força Azul e Branca
FAO Organização de Alimentação e Agricultura das Nações Unidas
FBC & VB Fórum Brasileiro de Conventions & Visitor’s Bureua
FIEAM Federação das Indústrias do Estado do Amazonas
FMI Fundo Monetário Internacional
FUNAI Fundação Nacional do Índio
HIV Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IPASEA Instituto de Previdência e Assistência Social do Estado do Amazonas
JAC Juventude Alegre Católica
ONG’S Organizações Não Governamentais
ONU Organização das Nações Unidas
PDEL Programa de Desenvolvimento Econômico Local
PETI Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
QG’S Quartéis Generais
SUDENE Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
9
SEBRAE Serviço Brasileiro de Assistência Gerencial às Pequenas e Médias
Empresas
SUFRAMA Superintendência da Zona Franca de Manaus
UFAM Universidade Federal do Amazonas
10
RESUMO
A temática do Desenvolvimento Local Sustentável (DLS) passou a fazer parte dos
debates sobre desenvolvimento, como categoria inovadora introduzindo fatores que
contrapõem o modelo tradicional adotado pelos Governos de planejar o
desenvolvimento. Arraigado na desconstrução do viés econômico, os pressupostos
do DLS partem da reformulação das forças existentes no local para a efetiva
definição de um processo de desenvolvimento participativo e auto-sustentável,
apostando na melhoria integral da qualidade de vida da população. Nesse contexto
de análise, a presente pesquisa se propôs a identificar a percepção dos atores
sociais internos e externos sobre a influência do fenômeno cultural dos bois-bumbás
para o desenvolvimento local sustentável (DLS) da cidade de Parintins. Ela se
justifica pelo valor que esse fenômeno representa para a comunidade local, nos
aspectos culturais, econômicos e sociais, além de criar um espaço onde os
integrantes do contexto local possam refletir, falar e produzir conhecimento sobre
sua realidade. A metodologia utilizada foi de natureza qualitativa, pautada na ótica
descritiva e explicativa, pois se pretendeu não somente privilegiar a concepção dos
indicadores de sustentabilidade, bem como resgatar, de forma detalhada, a evolução
histórica do fenômeno cultural dos bois-bumbás com base nos depoimentos e
significados presentes nos discursos das pessoas envolvidas. Enfim, verificou-se
pelo discurso dos atores sociais envolvidos, a ausência da internalização do
conceito do DLS, estando o fenômeno cultural dos bois-bumbás com características
da forte influência da lógica do capital. Enquanto condições potencializáveis para o
município, o evento cultural em estudo poderá se efetivar somente quando emergir
da essência de um projeto coletivo idealizado nas necessidades globais da
comunidade e mediado através de uma política conjuntural de desenvolvimento
entre os Governos: Federal, Estadual, Municipal e principalmente com a participação
da sociedade local. Isso tudo, como forma de minimizar antagonismos, a partir da
criação de um ambiente favorável à cooperação e consolidação das vantagens
territoriais existentes.
Palavras-chave: Desenvolvimento Local Sustentável. Fenômeno Cultural dos bois-
bumbás de Parintins. Cultura
11
ABSTRACT
The Sustainable Development Theme (DLS) has become part of discussions on
development, introducing innovative category as factors that counter the traditional
model adopted by the governments of the development plan. Attached to the
deconstruction of the economic bias, the assumptions of the DLS come from the
reformulation of existing local forces to the effective establishment of a process of
participatory development and self–sustaining, fully focusing on improving the quality
of life. In this context analysis, this research aims to identify the influence of
perception of social internal and external actors on the cultural phenomenon of
horse-bumbás for sustainable local development (DLS) Parintins City. This city was
chosen because of the value that this phenomenon represents for the local
community in cultural, economic and social aspects, and also because it creates a
space where members of the local context can reflect, talk and produce knowledge
about their reality. The methodology used was based on a qualitative nature
descriptive and explanatory optics as it sought to focus not only on the design of the
indicators of sustainability, but also on the rescue of detailed historical development
of the cultural phenomenon of horse-bumbás based on testimony and meanings
present in the speeches of those involved. Finally, it was veryfied, by the speech of
social actors involved, the absence of internalization of the concept of DLS, the
cultural phenomenon bumbás with characteristics of the strong influence of the logic
of capital. While strong conditions to the council, cultural event in the study could
emerge become effective only when the essence of a collective project idealized in
the global needs of the community and mediated through a policy of economic
development between the Governments: Federal, State, Municipal and above with
the participation of local society. All this as a way to minimize conflicts, from the
creation of an environment conducive to cooperation and consolidation of existing
territorial advantages.
Keywords: Local Sustainable Development. Cultural Phenomenon of horse-bumbás
in Parintins. Culture
12
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................
13
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO
.................................................................................
13
1.2 PROBLEMA
....................................................................................................
18
1.3 OBJETIVOS
....................................................................................................
20
1.3.1 Geral.............
..................................................................................................
20
1.3.2 Específicos....................................................................................................
20
1.4 JUSTIFICATIVA.....
.........................................................................................
20
2. REFERENCIAL TEÓRICO.............................................................................
24
2.1 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO...............
.............................................
24
2.2 DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL
............................................
34
2.3 INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL
............
45
2.3.1 Atores Sociais................
...............................................................................
46
2.3.2 Redes
.............................................................................................................
50
2.3.3 Projeto Coletivo...................
.........................................................................
55
2.3.4 Instituições
....................................................................................................
59
2.4 CULTURA...................................
....................................................................
62
2.4.1 CULTURA BRASILEIRA
.................................................................................
66
2.4.2 CULTURA ORGANIZACIONAL.......................................
...............................
68
3 METODOLOGIA.............................................................................................
78
3.1 TIPO DE PESQUISA..........................................................................
............
78
3.2 ÁREA DE ABRANGÊNCIA DA PESQUISA
....................................................
81
3.3 VARIÁVEIS DE ESTUDO
...............................................................................
81
3.4 PLANO DE COLETA DE DADOS
...................................................................
82
3.5 TRATAMENTO DOS DADOS
.........................................................................
84
4 RESULTADOS DA PESQUISA.....................................
................................
86
4.1 PARINTINS: ASPECTOS HISTÓRICOS
........................................................
86
4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS BOIS-BUMBÁS
.............................................
87
4.2.1 História do Boi
Caprichoso..........................................................................
94
4.2.2 História do Boi Garantido............................................................................
95
4.3 ATORES INTERNOS..........................
..........................................................
98
4.4 ATORES EXTERNOS
...................................................................................
105
13
4.4.1 Síntese do Discurso - Emergência como Atores Sociais................
.......
105
4.4.2 Síntese do Discurso –
Criação de Redes de Cooperação.......................
112
4.4.3 Síntese do Discurso –
Elaboração de Projetos Coletivos.......................
116
4.4.4 Síntese do Discurso – Modelo de Instituição........
....................................
122
5 CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÃO............................................................
128
REFERÊNCIAS..........................................................................................
...
134
APÊNDICES...................................................................................................
143
13
1 INTRODUÇÃO
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO
A literatura sobre Desenvolvimento Local Sustentável (DLS) cresceu
sensivelmente nos últimos anos. Na realidade, o que se observa no contexto das
abordagens desse novo modelo de desenvolvimento é uma tentativa de articulação
entre os circuitos globais da economia com a dinâmica local, em que os embates
dualistas do significado “desenvolvimento econômico” e “desenvolvimento” são alvos
de questionamentos quanto aos objetivos sociais, ecológicos e econômicos. São
discussões que não ficaram limitadas apenas no contexto internacional, pois no
Brasil a semente da “nova ordem mundial” começa a florescer e ganhar
especificidades, como é o caso de alguns municípios que ao vivenciarem essa
desafiante experiência, conseguiram, através do Governo Federal, montar um
sistema nacional de apoio a programas com capacidade de articular crescimento
econômico com geração de emprego e renda, melhorando a qualidade de vida das
pessoas.
Essas reivindicações foram registradas nos últimos acontecimentos políticos
do Leste Europeu que têm salientado as contradições nas sociedades capitalistas
dependentes e contribuído para desmoronar os “princípios”, “fundamentos” e
“estruturas” que, durante as últimas décadas, vêm impondo o agir político-econômico
de todos. A busca de novos paradigmas e novos pontos referenciais volta-se para a
valorização de espaços, teorias e relações que há muito se havia relegado. Um
desses espaços, que deve ocupar um lugar privilegiado nesse novo modelo é o
espaço sócio-geográfico, denominado “comunidade”, “poder locais”, grupos de base,
entre outros (GUTIÉRREZ, 2001).
Para Martins (1999), os vexatórios indicadores sociais, econômicos e
ambientais do país e suas conseqüências são por demais conhecidos. Ao buscar
dados do último informe sobre o Desenvolvimento Humano, publicado pela ONU
(PNU, 1999), o autor comenta que o Brasil está classificado como pertencente ao
conjunto dos países de Índice de Desenvolvimento Humano Médio, ocupando o 79°
lugar no total de 174 nações, atrás de vários países ibero-americanos (Venezuela,
14
Panamá, México, Colômbia, Cuba, Equador, Suriname) e, especialmente, de seus
parceiros de MERCOSUL que, com exceção do Paraguai, são considerados como
de índice de Desenvolvimento Humano Alto. O mesmo documento mostra que,
apesar de integrar o conjunto de 10 países com maior Produto Interno Bruto do
planeta, o Brasil é um dos mais injustos quanto à concentração de renda e exclusão
social. Assim, pode-se entender que este triste fato reflete um modelo de
desenvolvimento que pode perfeitamente ser caracterizado, no mínimo, como
“insustentável”.
Em decorrência dos impactos ambientais das atividades econômicas e
sociais, novos estudos precisam ser estimulados como forma de garantir a
sustentação de um modelo no longo prazo. O movimento ecológico aponta fortes
relações entre ambiente e atividades econômicas, entendendo esta última como um
sistema com fortes relações com o “ambiente” e o crescimento da economia como
um fator que está absorvendo sempre mais da produção biosférica primária (DALBY,
1997; SANTOS; HAMILTON, 2001; ACSELRAD, 1999).
Fruto desta crise econômica, social e ambiental, vários movimentos têm
surgido principalmente nos últimos 30 anos, tendo como marco referencial uma
consciência planetária ambiental, a Conferência de Estocolmo em 1972 e a ECO-92
realizada no Rio de Janeiro (MARTINS, 1999). Foi nesse contexto de discussão que
surgiu o chamado Desenvolvimento Sustentável. Este conceito abrange a
preocupação da sociedade com a oferta futura de bens e serviços indispensáveis à
sobrevivência da humanidade. Desde então, as nações passaram a se preocupar,
finalmente, com os impactos do processo de crescimento na qualidade de vida. Essa
concepção de desenvolvimento vai de encontro ao “projeto desenvolvimentista”, cuja
ideologia econômica apostava na industrialização integral como forma de superação
do atraso e da pobreza brasileiros.
A política do Desenvolvimento Local Sustentável (DSL), segundo Brito (2006)
é um processo que busca articular, coordenar e inserir os empreendimentos
empresariais, associativos e individuais, comunitários, urbanos e rurais, a uma nova
dinâmica de integração sócio-econômica de reconstrução do tecido social de
geração de emprego e renda.
Iniciativa desse tipo foi constatada no Município de Vivência/PE, em estudo
realizado por Ferreira (2003). Com a temática “Inovações Educacionais no Âmbito
do Poder Local: os impactos do programa de erradicação do trabalho infantil (PETI)”
15
a autora consegue implementar o programa do DLS, cujo objetivo voltava-se para
critérios de mediação preventiva no combate ao trabalho infantil, que em situação de
exploração compunha a força de trabalho no meio rural. Nesse sentido, discute
teoricamente as posições acerca das possibilidades de configuração do poder local
frente ao processo de descentralização, definido no molde do governo federal e dos
interesses internacionais, a partir de elementos direcionados aos aspectos do
processo de municipalização da educação, na perspectiva do desenvolvimento local
sustentável. Expõe, entre outras questões, a importância da descentralização
política do poder local, administrativo - no e pelo município, fomentando a ação
participativa da sociedade. São alternativas que, segundo a autora, resolvem
problemas centrais das cidades, com destaque principalmente para as áreas de
educação e saúde. Apesar dos obstáculos que enfrentou diante da efetivação dos
objetivos propostos no estudo, a pesquisadora, por fim, consegue um resultado
positivo, pois, a partir de um simples programa emergencial, passa a reverter-se em
política pública, consolidada através da proposta “Escolas rurais, construindo o
desenvolvimento local”, proposta esta atrelada à política de DLS, provido pela
Prefeitura Municipal de Vivência/PE.
A indústria de eventos é também um instrumento de desenvolvimento para
as cidades de médio porte e seu efeito multiplicador sobre estes municípios é muito
grande. De acordo com Guimarães; Ferreira (2006), a realização de eventos é um
facilitador de intercâmbios e da troca de idéias e informações entre as pessoas. Na
sociedade atual, é um recurso cada vez mais adotado, quer por associações de
classe, quer por empresas, quer por localidades turísticas que servem para a difusão
de conhecimentos e técnicas, para a preservação da cultura ou acomo forma de
decidir sobre questões de interesse destas organizações. Desse modo, pode ser
considerado um gerador de demanda para o núcleo, pois: gera fluxos amplia as
taxas de permanência dos turistas nas localidades receptoras, atua como atrativo
turístico, permite a diminuição da sazonalidade, resgata e valoriza conteúdos
culturais e naturais, aumenta o número de empregos diretos e indiretos, fomenta
negócios e investimentos, possibilitando a distribuição de renda e absorção de
divisas, entre outros desdobramentos.
A iniciativa mais vigorosa de avaliação do setor de eventos partiu de uma
parceria do rum Brasileiro de Conventions & Visitors’Bureua (FBC&VB) e o
Serviço Brasileiro de Assistência Gerencial às Pequenas e dias Empresas
16
( SEBRAE) com vistas ao Dimensionamento Econômico do Setor de Eventos no
Brasil. Os dados foram levantados entre janeiro e novembro de 2001 e seus
resultados apresentados em janeiro de 2002. Até a presente data, este é o estudo
mais abrangente realizado no setor conforme assegura (MOLETTA, 2000 apud
GUIMARÃES; FERREIRA, 2006, p. 20),
[...] pela primeira vez é realizada uma pesquisa que relata a realidade desse
mercado em nosso país, até aqui carente de números que servissem de
base para dar maior visibilidade à participação do segmento na nossa
economia, seja para nortear políticas de desenvolvimento da indústria de
eventos, seja para estudos de investimentos públicos ou privados.
O evento tem uma lógica permanente, na qual se reproduz e produz através
de valores sociais espacialmente estabelecidos. Desse modo, não pode
simplesmente desfrutar de uma localidade ou de uma cidade como um apêndice,
mas sim fazer parte da política turística de cada localidade. Os agentes devem
participar e inserir a participação da sociedade como forma de torná-la valor turístico
e assim, reproduzir-se de forma sustentável (GUIMARÃES; FERREIRA, 2006).
A indústria de eventos no Brasil responde por grande parte dos fluxos
turísticos para uma infinidade de destinações. Multidões viajam para eventos como o
Círio de Nazaré, em Belém, ou a Paixão de Cristo, em Nova Jerusalém ou para
eventos culturais como a Festa do Boi-Bumbá, em Parintins, no Amazonas ou para
eventos agropecuários, como a Festa do Vinho em Caxias, Rio Grande do Sul ou
para a Festa do Peão Boiadeiro em Barretos, São Paulo ou ainda para eventos
técnicos e científicos que ocorrem em todo o Brasil. É importante destacar que os
benefícios estruturais gerados pela promoção de eventos permanecem na cidade
para serem usufruídos pela população local.
Ainda segundo Guimarães; Ferreira (2006) existem muitos casos de sucesso
em todo o país, de festividades, comemorações, eventos culturais ou esportivos, que
se tornaram verdadeiros dínamos econômicos das cidades onde acontecem,
ocupando hotéis, aumentando o consumo em bares e restaurantes, o comércio e a
utilização de diversos meios de transportes, entre outros. A realização de eventos
tem efeito multiplicador sobre vasta gama de atividades, podendo se refletir direta e
17
indiretamente no aumento de postos de trabalho e na arrecadação de impostos para
o governo.
O evento cultural em estudo tem uma importância ímpar para a comunidade
local. Importância essa que não se limita apenas a fatores que caracterizam os
aspectos evolutivos das etapas da realização do evento, em que a pesquisa da
própria biodiversidade cultural é consolidada como sinônimo de valorização da
essência cultural da região amazônica, visível nas diversas alegorias criadas por
artistas plásticos, as quais simbolizam diversas coreografias fantásticas das etnias
indígenas, como por exemplo, o modo de ser e viver do ribeirinho e do cabloco
amazonense. Como também pelo conjunto cultural e folclórico que se difundiu essa
brincadeira, a qual foi alimentada pela rivalidade existente entre os dois bumbás que
se autodenominam de “Boi Garantido” o boi que defende a cor vermelha e o “Boi
Caprichoso” a cor azul. Estes festejos permitem grande fluxo de turistas na cidade
nesse período, contribuindo na mobilização de toda a sociedade com venda de
produtos artesanais e maior movimento no comércio, entre outros. Nos anos
recentes, essa brincadeira do boi foi eleita como bandeira de uma identidade cultural
regional.
Além dos benefícios culturais propiciados pela promoção do evento, existem
também os impactos negativos causados pelo festival, entre eles: a emigração de
famílias compostas de jovens que abandonam a área rural para a área urbana do
município, evasão escolar infanto-juvenil devido à oferta dos chamados “bicos” ou
seja, trabalhos temporários que surgem nos galpões ou “Quartéis Generais (Qgs)”
(locais onde são confeccionadas as alegorias do evento), grande incidência de
Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs), tornando-se uma das grandes
preocupações dos técnicos que atuam, principalmente no atendimento às vítimas
infectadas com o vírus da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (HIV) e a falta de
reconhecimento profissional dos próprios trabalhadores envolvidos na promoção do
evento, entre eles, os artistas plásticos. Sabe-se que após a realização do festival
alguns profissionais entram em batalha judicial com os presidentes das organizações,
como forma de reivindicarem seus direitos trabalhistas. Inclusive, questiona-se se
esse fator não está relacionado a um dos motivos que levam muitos artistas, por
falta de opção, a deixar seu lugar de origem, para acordarem contratados com
outras instituições promotoras de evento em outras regiões, como por exemplo, o
carnaval do Rio de Janeiro, São Paulo e outros eventos na própria região. As
18
iniciativas são louváveis, porém nem sempre promissoras para todos os profissionais
locais. Pode-se afirmar que após o término do festival alguns artistas ficam sem
atividades no município de Parintins.
Apesar dos esforços do governo estadual e municipal no sentido de
fortalecer a economia em conjunto com os grandes patrocinadores, o que se
observa de um lado é o surgimento de pequenas associações e cooperativas
enfraquecidas por falta de organização e capacitação. De outro, os benefícios da
promoção do evento centrado nas mãos dos grandes empresários que investem na
divulgação e marketing de seus produtos.
Diante do exposto, espera-se que esse estudo contribua no aprimoramento
de novos subsídios teóricos para que possa conferir à pesquisa sua verdadeira
função acadêmica e social. É um tema que pela importância que tem, precisa ser
debatido nas escolas, nas universidades e na própria comunidade local. Sabe-se
que a implementação do projeto do DLS não é fácil. Mas, não é difícil também
questionar o tipo de desenvolvimento que se deseja no Brasil atualmente. Enquanto
os métodos tradicionais podem levar a sérios problemas sociais e ambientais, o DLS
pode fornecer uma estrutura através da qual as comunidades possam usar recursos
de forma mais eficiente, criar infra-estruturas eficazes, proteger e melhorar a
qualidade de vida, além de criar novos negócios para fortalecer a economia local.
Tudo isso é claro, sem deteriorar e prejudicar a base de recursos que lhe
sustentação.
1.2 PROBLEMA
Muito se tem discutido sobre as políticas que norteiam o “Desenvolvimento
Local Sustentável” atualmente. Essa “nova ordem mundial” vem ganhando espaço e
tornando-se uma alternativa de fonte econômica concreta de renda, visível
principalmente em países em desenvolvimento afetados pelo clima desfavorável da
economia internacional. Esses impasses foram alvos de muitas reflexões que
resultaram nas premissas da resolução 44/228 da Assembléia Geral de 22 de
dezembro de 1989, adotada quando as nações do mundo convocaram a
19
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (SANTOS;
HAMILTON, 2001).
Do resultado desses diversos encontros, surgiu o compromisso registrado na
Agenda 21 (1989) que se dispôs, entre outros objetivos, a voltar-se para os
problemas urgentes de hoje, como também, a preparar o mundo para os desafios do
próximo século. Assim, o êxito de sua execução é responsabilidade, antes de tudo,
dos Governos e, para concretizá-la são cruciais as estratégias, os planos, as
políticas e os processos nacionais.
Alimentado no âmbito das Organizações Não Governamentais (ONG’S),
governos, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco Mundial, Fundo
Monetário Internacional (FMI), Organização das Nações Unidas (ONU), Organização
de Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO) e instituições de pesquisa, o
DLS não é um consenso. Sabe-se que, na maioria das vezes, os termos
desenvolvimento e crescimento são utilizados como sinônimos, porém o crescimento
é condição indispensável para o desenvolvimento, mas não condição suficiente.
Para Resende (2000), enquanto o crescimento refere-se a incrementos quantitativos,
o desenvolvimento implica melhorias qualitativas. Se o princípio do desenvolvimento
está relacionado a palavras intuídas como positivas e favoráveis como “progresso e
crescimento”, então como explicar o freqüente uso da palavra desenvolvimento em
conotações desfavoráveis, como, por exemplo, “desenvolvimento predatório” e
“desenvolvimento desordenado”?.
Diante do exposto, a presente pesquisa se propôs a investigar o seguinte
problema: como os atores sociais internos e externos percebem a influência do
fenômeno cultural dos bois-bumbás para o Desenvolvimento Local Sustentável da
cidade de Parintins.
Acredita-se que os pressupostos teóricos do DLS possam fornecer
conhecimentos sobre um desenvolvimento sabidamente marcado pela cultura do
contexto em que se situa. Ou seja, refletido em uma prática coerente, pois, o DLS é
um processo interno de uma determinada localidade capaz de proporcionar a
melhoria das condições de vida da sociedade, respeitando os limites e as
possibilidades dos seus recursos naturais (BUARQUE, 1999).
20
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 Geral
Identificar a percepção dos atores sociais internos e externos sobre a
influência do fenômeno cultural dos bois-bumbás para o Desenvolvimento
Local Sustentável da cidade de Parintins.
1.3. 2 Específicos
Investigar se o fenômeno cultural dos bois-bumbás mobiliza e contribui na
formação de atores sociais em Parintins.
Verificar se existe no contexto do evento a formação de redes de atores
sociais e parcerias entre a sociedade civil, poder público e patrocinadores.
Identificar se existe um projeto coletivo no contexto das organizações que
realizam o evento cultural em estudo.
Identificar o modelo do sistema institucional utilizado na promoção do
evento.
1.4 JUSTIFICATIVA
O interesse maior da pesquisa justifica-se no fato da emergência da reflexão
do tema no contexto socioeconômico, cultural e educacional na cidade de Parintins,
quanto aos benefícios que a política do Desenvolvimento Local Sustentável possa
contribuir no contexto do fenômeno cultura dos Bois-Bumbás.
Parintins, município do Estado do Amazonas, está situada na ilha
Tupinambarana à margem direita do Rio Amazonas na divisa com o Pará. O
21
município encontra-se a 420 km a leste de Manaus por via fluvial e 325 Km em linha
reta, com área de 7mil Km2. Tem uma população com aproximadamente 101.908
mil habitantes (Censo 2007). Deste total, 66.481 mil vivem na área urbana e 35.427
mil vivem na área rural do município. A população economicamente ativa do local
sobrevive do extrativismo, pesca e pecuária. Esta última atividade, inclusive, vem
preocupando os ambientalistas, dada a grande derrubada e queimada de florestas
que a cada ano sofrem com o processo de transformação de campos, para criação
de gado de corte.
Outro fator preocupante na região, diz respeito à produção agrícola
(inexistente). Esse fato contribui com a baixa qualidade da alimentação do povo da
região. A maioria da produção agrícola consumida vem de outras regiões. Isso
reflete no custo elevado dos preços da alimentação básica e conseqüentemente a
dificuldade de acesso desses alimentos às populações mais necessitadas, que ficam
apenas se alimentando do básico da região, como por exemplo, o peixe e a farinha,
como é o caso dos “ribeirinhos”, denominação aplicada à população que habita as
margens dos rios amazonenses.
Diante do exposto, acredita-se que os pressupostos teóricos do
“Desenvolvimento Local Sustentável” estabelecido pela Comissão Mundial Sobre o
Meio Ambiente e Desenvolvimento possam sensibilizar todos os responsáveis na
promoção do evento como forma de reconhecer o sentido maior do
“desenvolvimento” voltado para o bem-estar social da coletividade local.
A temática sobre o Desenvolvimento Local Sustentável (DLS) vem ganhando
amplo espaço de discussão atualmente e está presente nos discursos e declarações
de princípios e estratégias de governo, partidos, empresas, organizações não
governamentais (ONGs), fundações, instituições financeiras e dos principais
organismos mundiais. Entretanto, é preciso ficar alerta com as propostas de “auto-
ajuda” enfatizada pelas ações do Estado e de suas instituições. Há fragilidade
econômica, principalmente “nos aspectos ‘produtivistas’, por não conter elementos
suficientes para desenvolver a identidade comunitária e preparar uma transição
cultural” (GUTIERREZ, 2001, p. 24). Segundo o autor, outro foco de atenção se volta
para os modelos de produção” (comunidade, grupal, familiar...), apesar de se
projetarem como forte impulsionadores mediante as contribuições econômicas e
democráticas de geração de emprego, quando o emergem dos próprios grupos
populares, mas que resultam de interesses externos, causam problemas diversos.
22
Essas questões comumente são visíveis e surgem em formas de apaziguamento
político, de geração de emprego a baixo custo, de ocupação de mão-de-obra ociosa
em terras de baixa produtividade, de transferência de custo de infra-estrutura e
manutenção, bem como de liberação de custos das cargas sociais (GUTIERREZ,
2001).
Para Buarque (1998), o DLS objetiva fortalecer os empreendimentos
empresariais associativos e os micro empresários para que gerem empregos
sustentáveis. Ele é uma resultante direta da capacidade dos atores e das
sociedades locais se estruturarem e se mobilizarem, com base nas suas
potencialidades e sua matriz cultural, para definir e explorar suas potencialidades e
especificidades, buscando competitividade num contexto de rápidas e profundas
transformações. No novo paradigma de desenvolvimento, isto significa, antes de
tudo, a capacidade de ampliação da massa crítica dos recursos humanos, domínio
do conhecimento e da informação, elementos centrais da competitividade.
A proximidade dos problemas, necessidades, recursos e atores sociais
locais permitem formular políticas mais realistas e, sobretudo, baseadas no
consenso com tais atores, capazes de “introduzir modalidades de ação nas quais os
agentes tenham maiores margens de autonomia nas decisões” (CEPAL, 1990, p.
917).
É nesse contexto de reflexão que a presente pesquisa se propôs a investigar
como os sujeitos sociais internos e externos percebem a influência do fenômeno
cultural dos bois-bumbás para o Desenvolvimento Local Sustentável da cidade de
Parintins. Acredita-se que a implementação do projeto do DLS pode trazer
benefícios significativos para a cidade, como forma de emergir novos atores
comprometidos em resignificar a identidade cultural local. Nesse sentido, essa
conquista será possível através da criação negociada de parcerias com
instituições de fomento produtivo empresarial com amplos e contínuos investimentos
em longo prazo e a participação da sociedade civil, comprometidos com a efetivação
de políticas que promovam o desenvolvimento local (FERREIRA, 2003).
Desse modo, justifica-se a importância da realização da pesquisa justamente
por reconhecer o valor que esse fenômeno cultural representa para a comunidade
local, bem como pela própria dimensão que o evento vem alcançando nos últimos
anos. O sucesso do projeto do DLS dependerá da criação de uma cultura coletiva
23
inscrita dentro de uma memória coletiva e de uma rede associativa levada pela
vontade de se afirmar uma identidade regional.
Para melhor atender aos anseios dos objetivos propostos, o presente
trabalho encontra-se estruturado em capítulos: No primeiro capítulo, discutem-se
temas relacionados ao desenvolvimento econômico e desenvolvimento local
sustentável. O entendimento desses dois eixos de argumentação é essencial, pois
justifica o aporte teórico-metodológico assumido no estudo. Permite ao leitor
estabelecer pontes de esclarecimento com algumas concepções básicas dos
elementos indicadores das iniciativas locais de desenvolvimento, que além de
servirem como mecanismo de sustentação da proposta, servem também de
parâmetros de avaliação da principal questão desta pesquisa. No segundo capítulo,
elucidam-se aspectos conceituais da cultura, traços característicos cultura brasileira
e cultura organizacional. No terceiro capítulo, apresentam-se os métodos de coleta
de dados que viabilizaram a realização do trabalho e como os mesmos foram
tratados. No quarto capítulo, apresentam-se os resultados da pesquisa com
abordagem inicial sobre os aspectos históricos da cidade de Parintins. E no quinto, a
conclusão e recomendação.
24
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
Entender o processo histórico que resulta nas atuais discussões sobre
Desenvolvimento Local Sustentável é antes de tudo resgatar um pouco da história
do pensamento econômico brasileiro, caracterizado necessariamente, entre os
períodos de 1945 a 1964, para que se possa compreender as controvérsias
existentes nas abordagens do termo “desenvolvimento”, muito utilizado enquanto
sinônimo de crescimento econômico.
A noção de “desenvolvimento”, atrelada ao crescimento econômico originou-
se com a implantação do Projeto da Modernidade. Influenciado pelo pensamento
iluminista, este projeto associou a idéia de progresso ao avanço e consolidação das
formas de produção capitalista, baseada na industrialização. Assim, será
considerada mais “desenvolvida aquela formação social onde o capitalismo for mais
avançado, pois é ai que encontramos, segundo os elementos analíticos modernos,
maior racionalidade e progresso” (HARVEY, 2001).
Quando se busca entender o estabelecimento das bases do chamado
“pensamento econômico”, constata-se haver correlação do fato, mais precisamente
nas décadas de 30, 40 e 50. Esses períodos serviram de alicerce para a
implementação do sistema industrial brasileiro. Para Bielschowsky (1988), nessa
época, ocorreu uma rápida e profunda divisão do trabalho nacional, através de um
processo que programou e difundiu significativamente o sistema produtivo em
transformação, “o progresso técnico mundial, aentão praticamente confinado aos
limites do comércio exterior do país” (BIELSCHOWSKY, 1988, p. 5). São esses
conhecimentos preliminares que implicam na possibilidade do entendimento da
complexa sociedade brasileira de fins do século XX e que também vem sendo,
atualmente, alvo de estudos e pesquisas por diversos historiadores que buscam
entender os variados aspectos da formação econômica, política e social do Brasil.
Ao discutir o conceito de “desenvolvimentismo” na obra “Pensamento
Econômico Brasileiro” (BIELSCHOWSKY, 1988), além de pressupô-lo enquanto
25
proposta ideológica de transformação da sociedade brasileira definida pelo projeto
econômico discute alguns aspectos sicos que fundamenta essa corrente. Entre
eles, a idéia de que a industrialização seria a via de superação da pobreza e do
desenvolvimentismo brasileiro. A noção de que não haveria meios de alcançar uma
industrialização eficiente e racional no Brasil através de espontaneidade das forças
de mercado. A idéia de que o Estado é quem seria o responsável por todo esse
planejamento e que conseqüentemente viabilizaria a expansão almejada dos setores
econômicos e os instrumentos de promoção dessa. Por fim, a idéia de que o Estado
imporia a execução da expansão, captando e orientando recursos financeiros e
promovendo investimentos diretos nos setores em que a iniciativa privada fosse
insuficiente.
Desvencilhando-se de alguma maneira diante das abordagens que propõe a
discutir sobre o pensamento econômico, o autor procura estabelecer algumas
características básicas do quadro analítico subjacente ao debate desenvolvimentista
brasileiro. Enfatiza que a discussão em sua obra apresenta uma abordagem
direcionada aos argumentos empregados na teoria do subdesenvolvimento contra
as teorias e políticas liberais. Nesse sentido, salienta que apesar das controvérsias
políticas existirem, tanto as propostas da Comissão Econômica para a América
Latina e o Caribe (Cepal) como as teorias Liberais defendiam a mesma proposição
política para países subdesenvolvidos. Ou seja, a de industrializar, como “meio de
superar a pobreza ou de reduzir a diferença entre eles e os países ricos, atingindo
independência política e econômica através de um crescimento econômico auto-
sustentado” (BIELSCHOWSKY, 1988, p.11).
O conflituoso embate das disputas teóricas e políticas concernentes ao
futuro dos países desenvolvidos foi nos anos 40 e 50, resultado da conveniência da
intervenção do Estado para estabelecer um novo padrão de crescimento. Assim, o
principal alvo de ataque contra a doutrina dominante direcionava-se para os
“princípios do livre comércio”. Ou seja, da eficiência no que diz respeito ao destino
de recursos a nível interno e externo, por meio dos mecanismos de mercado. Entre
outras questões, o referido ataque visava sustentar medidas governamentais,
especificamente ao planejamento e ao protecionismo, vistos como estratégias para
alcançar a industrialização rápida e eficiente e, conseqüentemente, de desviar o
curso da história dos países subdesenvolvidos. “No caso específico do debate latino-
americano, também se encontra no segundo conjunto de discordância, dirigida às
26
políticas do Fundo Monetário Internacional” (BIELSCHOWSKY 1988, p. 12). As
abordagens estruturalistas consistiram em explicações não convencionais sobre as
causas da inflação e dos problemas de balanço de pagamentos. Também objetivava
dar suporte a medidas de política heterodoxas destinadas à aceleração do processo
de industrialização.
Ainda é possível identificar na obra do autor, as principais correntes do
pensamento econômico, as quais sustentam as opiniões dos economistas da época,
entre elas: a corrente neoliberal que tinha como pressuposto básico, a defesa do
sistema de mercado como fórmula básica de eficiência econômica; a corrente
desenvolvimentista, cujo planejamento da economia visava a intervenção estatal e a
socialista, cujos integrantes, pretendiam defender os investimentos estatais em
setores básicos da economia e o controle de capital estrangeiro como etapa histórica
de transição para o socialismo.
No momento, o que interessa para a proposta em estudo é o significado de
“Desenvolvimentismo”, pois segundo (BIELSCHOWSKY 1988, p. 91) “foi a ideologia
econômica de sustentação do projeto de industrialização integral como forma de
superação do atraso e da pobreza brasileiros”. Nesse sentido, é possível distinguir
dentro dessa abordagem, três correntes que completam o eixo norteador dessa
ideologia, a qual objetivava em seu projeto formar um capitalismo industrial moderno
no país.
Três são as correntes que subdividem a proposta Desenvolvimentista, tanto
no setor privado como no setor público, estando assim, compreendido em duas
vertentes: os “não-nacionalistas” e os “nacionalistas”. Na seqüência, comentam-se,
em linhas gerais, as principais idéias e características de cada corrente no contexto
político da época.
Ao caracterizar as especificidades relacionadas aos “não-nacionalistas” do
setor privado, observa-se a existência de um grupo de economistas que defendiam
uma posição antiliberal e desenvolvimentista. Estes acreditavam que o setor
industrial teria um papel central a cumprir no futuro da economia nacional. Nesta
perspectiva, apoiavam o Estado diante da acumulação privada e apresentavam
diversas opiniões quanto ao grau de participação estatal que convinha ao processo.
No que diz respeito à participação do capital estrangeiro, não é possível distinguir
uma posição única e homogênea nessa corrente. Dentre os principais defensores
intelectuais, destacou-se Roberto Simonsen, empresário e líder industrial que
27
ocupou vários cargos de destaque na época, sendo que todos estavam ligados às
questões da indústria. As principais idéias defendidas nesta corrente eram:
confiança a favor dos investimentos na industrialização, pois acreditava que esta
poderia superar a pobreza brasileira; convicção diante das mudanças estruturais das
economias latino-americanas; defesa do protecionismo e do planejamento como
instrumentos de intervenção estatal, onde esta deveria incluir investimentos diretos
nos setores básicos em que a iniciativa privada não se fizesse presente
(BIELSCHOWSK, 1988).
No setor público, os que seguiam a linhagem dos desenvolvimentistas “Não-
Nacionalistas” combatiam a proliferação dos investimentos estatais alegando que o
Estado não deveria ocupar o espaço em que a iniciativa privada pudesse atuar com
maior eficiência. Assim, demonstravam interesse pelo capital estrangeiro, com
preferência ao capital estatal. Entre outras questões ainda davam ênfase à
necessidade de controle da inflação e apoio às medidas de estabilização monetária.
Como principal mentor dessa proposta econômica encontra-se Roberto Campos,
diplomata, graduado em economia pela Universidade de Columbia, onde se
destacou nos anos 50 como um pensador certeiro. Pertencia à “ala direita” da
posição desenvolvimentista. Trabalhou no projeto de industrialização do país e
empenhou-se pelo planejamento do desenvolvimento econômico. Além de defender
a atração de capitais estrangeiros, como a mineração e energia, propôs solução
estatal para investimentos com solução privada. Dentre as principais teses constata-
se: “a defesa da industrialização; defesa do planejamento; planejamento seccional,
ponto de germinação e pontos de estrangulamento” (BIELSCHOWSKY 1988, p.125).
A posição defendida pelo grupo pertencente ao setor público,
especificamente, os desenvolvimentistas “Nacionalistas” defendiam a constituição de
um capitalismo moderno no país. Dentre as principais características que marcaram
esta iniciativa encontravam-se: inclinação pela ampliação da intervenção do Estado
na economia através de políticas de apoio à industrialização, integradas num
sistema de planejamento abrangente, incluindo investimentos estatais em setores
básicos; sistemática defesa da subordinação da política monetária à política de
desenvolvimento; inclinação política por medidas econômicas de cunho social e
preocupação com desemprego, pobreza, atraso cultural da população brasileira e
arcaísmo das instituições vigentes no país.
28
Merece destaque neste processo o economista Celso Furtado, considerado
como símbolo da esperança desenvolvimentista dos anos 50. Formado em Direito,
com doutorado em Economia, cursado em Paris. Trabalhou na CEPAL, Santiago do
Chile, na elaboração de teses cepalinas. Suas obras de abordagens estruturalistas
voltam-se para defender pressupostos como: defesa da liderança do estado na
promoção do desenvolvimentalismo, através de investimentos em setores
estratégicos e do planejamento econômico. Defesa estruturalista da submissão da
política monetária e cambial à política de desenvolvimento, base da argumentação
nacionalista em oposição aos programas de estabilização preconizados pelo FMI.
Reformas de cunho social, iniciando-se pela defesa da tributação progressiva,
passando pelo projeto de desconcentração regional de renda Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), atingindo, também, o apoio à reforma
agrária.
O desenvolvimento, como é hoje compreendido, é um mito imposto pelos
países considerados mais desenvolvidos aos paises que são por eles considerados
subdesenvolvidos. Este mito consiste na exigência de que todos devem manter os
mesmos padrões de consumo e a mesma base industrial. Desse modo, é mais cil
a dominação econômica, instalando empresas estrangeiras e impondo hábitos
alienígenas sem que se considere as necessidades locais, como afirma (FURTADO,
1974, p. 16),
[...] pretende-se os economistas liberais que os standards de consumo da
minoria da humanidade, que atualmente vive nos países altamente
industrializados, é acessível à grande massa de população em rápida
expansão que foram o chamado terceiro mundo. Essa idéia constitui,
seguramente, uma prolongação do mito do progresso, elemento essencial
na ideologia diretora da revolução burguesa dentro da qual se criou a atual
sociedade industrial.
Esta lógica foi largamente adotada em algumas regiões do Brasil. Esse fato
ocorre dado às facilidades oferecidas pelos países dependentes para as indústrias
estrangeiras. Os ditos países dominantes continuam instalando suas indústrias, pois
não encontram retaliações ambientais severas como em suas pátrias, pois naqueles
países a degradação ambiental tornou severas as multas aplicáveis. É preciso,
então, partir para nações onde seja possível manter a mesma industrialização por
29
meios não renováveis, pois o capital extraído da produção seria reduzido
significativamente se fosse necessário adaptar a indústria às necessidades do meio
ambiente ecologicamente equilibrado. A exploração da mão-de-obra tão barata
quanto os danos ambientais torna os países periféricos mais atraentes, pois se
possível às empresas multinacionais instalarem-se em práticas que nada lucraram
com a presença estrangeira. Mas mesmo assim, aceitaram a presença
economicamente dominante (FURTADO, 1974).
Ainda segundo Furtado (1974, p. 60):
As novas formas que está assumindo o capitalismo nos países periféricos
não são independentes da evolução global do sistema. Contudo, parece
inegável que a periferia terá crescente importância nessa evolução, não só
porque ntricos serão cada vez mais dependentes de recursos naturais
não reprodutíveis por ela fornecidos, mas também porque as grandes
empresas encontrarão na exploração de sua mão-de-obra barata, um dos
principais pontos de apoio para firmar-se no conjunto do sistema.
Deste modo, a produção possível diante da fragilidade do meio ambiente
não pode ter como padrões de desenvolvimento espaços estrangeiros. Enquanto a
economia humana tem admitido a degradação ambiental desde que os indivíduos
possam adquirir bens e rendimentos com a produção negligente quanto à natureza a
degradação, às demais formas de vida não-humanas e o correspondente espaço
físico não serão relevantes aos estudiosos ambientalistas que tratam das
indenizações pelo princípio poluidor-pagador. O desenvolvimento será considerado
sustentável de acordo com a compensação, mesmo que parcial, do dano realizado,
pois mais importará que a empresa poluente sinta o peso da multa do que o quanto
o ambiente foi abalado devido à dificuldade de cálculo das proporções do dano
ambiental (FURTADO, 1974).
A designação do termo “nacionalista” justifica-se, dada a fragilidade da
estrutura do capital nacional que, na época, sofria forte influência de investimentos
estrangeiros (BIELSCHOWSK, 1988). Vale salientar que os nacionalistas, de um
modo geral, eram opositores de política de estabilização, por receio do baixo
crescimento econômico.
Ao discutir sobre a temática Montibeller-Filho (2004) reconhece que a teoria
chamada “desenvolvimentista”, às quais se podem denominar teorias clássicas do
30
desenvolvimento econômico, foram elaboradas principalmente nas cadas de 1950
e 1960, em suas diversas formas. Na obra O mito do desenvolvimento sustentável:
meio ambiente e custos sociais no moderno sistema produtor de mercadorias,
publicado pela editora da Universidade Federal de Santa Catarina, 2004, examina
três das principais teorias do pensamento econômico, a saber: a teoria ricardiana do
desenvolvimento; a teoria do desenvolvimento econômico de Schumpeter e a
análise marxista do desenvolvimento capitalista.
Antes de abordar as teorias relativas ao pensamento econômico
(MONTIBELLER-FILHO, 2004), lembra que é preciso ter um cuidado inicial quando
se busca o entendimento do funcionamento da economia capitalista. Ou seja, o fato
de se levar em conta que a principal característica desse processo econômico é a
exigência ou imperativo sistêmico da obtenção de lucro. Nesse contexto de
discussão, o processo de valorização do capital acontece mediante investimentos
que devem retornar em forma de lucros líquidos ao capitalista. Desta forma, as
teorias que tratam do assunto buscam examinar como o processo ocorre, para, em
seguida questionar as causas básicas acerca da tendência de continuidade ou o
do mesmo, em longo prazo.
As estratégias para obtenção do lucro são muito bem explicitadas na obra do
autor. De certa forma, se tornam parâmetros de análise diante das duas
concepções que se busca evidenciar no momento, ou seja, “Desenvolvimentismo”
contrapondo os ideais do Desenvolvimento Local Sustentável (DLS). Na seqüência,
apresenta-se uma síntese das três teorias econômicas, a saber: teoria ricardiana do
desenvolvimento; teoria do desenvolvimento econômico de Schumpeter e teoria da
análise marxista do desenvolvimento capitalista.
A) A crítica ecológica à teoria ricardiana foi elaborada a partir dos conceitos e
das teorias parciais (da renda diferencial da terra; dos salários; dos lucros)
de David Ricardo. De acordo com esta teoria os investimentos líquidos
causam como efeito imediato, a ampliação da demanda por mão-de-obra,
o que, em economias de pleno emprego estrutural - como considera que
são as de capitalismo avançado, conduziria ao aumento dos níveis
salariais (MONTIBELLER-FILHO, 2004, p. 58).
B) A essência da teoria do desenvolvimento econômico de Schumpeter trata
de uma perspectiva teórica de longo prazo. Portanto, a lógica do processo
31
abarcaria a valorização do capital em seu circuito produtivo priorizando a
condição de fluxo circular, em que a taxa de lucro é igual à taxa de juros.
A economia no fluxo circular avança seguindo, porém, uma evolução
linear, tendendo sempre a uma posição de equilíbrio (o que seria a
evolução ideal da economia, na visão da escola neoclássica). Após uma
análise mais contundente sobre sua teoria, Schumpeter chega à
conclusão que esta trajetória do crescimento econômico limita-se apenas
a mudanças quantitativas. Isto é, quando, por exemplo, o investimento
líquido absorve mão-de-obra desempregada (ou trabalho excedente, no
conceito neoclássico, existente em uma situação de desequilíbrio da
economia) e conduz assim, novamente, ao equilíbrio de mercado. O fluxo
circular e o crescimento econômico são as formas como a teoria
neoclássica percebe a evolução do capitalismo.
A evolução do capitalismo em sua tendência de muito longo prazo (ou
tendência secular), na visão schumpeteriana, -se através de recorrentes e fortes
rompimentos das situações passageiras de equilíbrio. Através destes poderosos
desequilíbrios e a propagação de seus efeitos sobre o sistema econômico, ocorre o
processo que o autor denomina desenvolvimento econômico (distinguindo-o do
simples crescimento econômico).
Nas palavras do autor, desenvolvimento significa (MONTIBELLER-FILHO,
2004, p. 65):
O desenvolvimento, no sentido em que o tomamos, é um fenômeno distinto,
inteiramente estranho ao que pode ser observado no fluxo circular ou na
tendência para o equilíbrio. É uma mudança espontânea e descontínua nos
canais do fluxo, perturbação do equilíbrio, que altera e desloca para sempre
o estado de equilíbrio previamente existente.
Na realidade, o que se observa diante dos argumentos acima, é que ao
invés de a economia apresentar longos períodos de equilíbrio brevemente
perturbados e voltar a um novo longo período de equilíbrio (como ocorre no conceito
de fluxo circular), ela de fato passa por breves e instáveis equilíbrios, os quais são
rompidos por fortes perturbações que mantêm a economia desequilibrada por longo
32
tempo, para depois outra vez se equilibrar momentaneamente num patamar mais
elevado, e assim, sucessivamente. Na visão schumpeteriana, tais instabilidades são
provocadas por inovações de grande impacto, que periódica e recorrentemente
aparecem no sistema econômico, em forma de ondas de inovações. Inovações
essas introduzidas pelos empresários e caracterizam-se pelo grande poder de
impacto e de disseminação sobre o conjunto da economia.
C) Ao analisar a teoria marxista, Montibeller-Filho (2004) faz alusão quanto à
diferença que esta teoria apresenta diante das demais abordadas. De
acordo com o autor, a teoria marxista se contrapõe às demais por tecer
críticas ao sistema que interpreta e por buscar formas de superá-lo. Assim,
as transformações estruturais pelas quais a economia avança, com
implicações sociais e políticas devem-se, em última instância, a evolução
tecnológica. O grau tecnológico define a composição técnica do capital e
tem influência na composição orgânica do capital.
O ajuste técnico do capital está atrelado à produtividade física da força do
trabalho que é obtida, mediante determinado estágio tecnológico. Quando as
diferentes produtividades são reduzidas a uma base comum de valor, estas
proporções são expressas em termos da proporção entre capital constante que se
emprega num período de produção determinado. Com efeito, diz a teoria,
impulsionado a buscar uma diferenciação em face da média social para permitir-lhe,
aumento do lucro na forma de lucro extraordinário, ou sob a pressão de aumento
salarial, ou ainda na busca da mais-valia relativa mediante aumento da
produtividade da força de trabalho, e outras formas de garantir competitividade (ser
mais eficiente do que a media social) o capitalista individual é levado a introduzir
novas tecnologias (MONTIBELLER-FILHO, 2005).
De fato, Montibeller-Filho (2004, p. 72) assegura:
No capitalismo contemporâneo [...] a exploração do tempo de trabalho
continua a ser a fonte primordial da mais-valia absoluta, mas dentro dos
limites crescentes que decorrem da redução na duração do dia de trabalho,
dos níveis mínimos de salário e dos acordos salariais, e de outras
conquistas da organização da classe trabalhadora e dos movimentos sociais
urbanos [...], o capitalismo foi forçado a deslocar uma ênfase cada vez
maior para a extração da mais-valia relativa, através das mudanças
tecnológicas, das modificações na composição orgânica do capital [...].
33
Outro fator influenciador na taxa de lucro, conforme acima, é a taxa de mais-
valia. O comportamento desta, enquanto tendência a muito longo prazo mantém-se
constante no movimento cíclico. Por seu lado, a taxa de mais-valia pode sofrer
variações. A constância em longo prazo da taxa de exploração ou de mais-valia
ocorre por esta refletir basicamente a correlação de forças entre a classe proprietária
dos meios de produção e a classe trabalhadora na determinação da participação
relativa dos salários e dos lucros no produto social. Tal correlação em condições
sociopolíticas normais, e consideradas em longo prazo, não se altera
substancialmente, pois os avanços da conscientização da classe trabalhadora
quanto a seus interesses são contrabalançados pelo progresso tecnológico, que
retira dela parte de seu poder de barganha (MANDEL, 1985 apud MONTIBELLER-
FILHO, 2004).
Ainda é possível perceber na obra, os fracassos, as contradições e as
críticas direcionadas aos aspectos ecológicos sob a teoria marxista da evolução
secular do modo capitalista de produção e consumo. Os pressupostos marxistas não
levam em consideração a variável ambiental, a não ser tomando a natureza como
fonte de matérias-primas e recursos exploratórios (portanto, elementos passivos,
não participante ativo, na teoria (MONTIBELLER-FILHO, 2004).
Neste sentido, a teoria marxista do desenvolvimento capitalista, na versão
corrente da teoria do desenvolvimento, procura compreender como tem agido o
capital na busca incessante do maior e mais imediato lucro. Nesta direção, de fato, o
capital não tem apresentado preocupação com os danos ambientais que possa
causar, tais como exaustão de fontes de recursos naturais ou degradação do meio
natural ou humano. O que persegue como forma de manter e ampliar o lucro é o
aumento da produção de mercadorias (sistema produtor de mercadorias) e
produtividade.
Enfim, expor as características da concepção de desenvolvimento
econômico no contexto de um processo histórico foi essencial, pois possibilitou um
entendimento mais adequado diante das contradições e controvérsias remetidas
pelo próprio termo. Ao contrário dos ideais de um desenvolvimento atrelado a
crescimento, progresso, sistema produtivo e renda per capta, surge atualmente,
outra abordagem de desenvolvimento. Entender a emergência da difusão, dos
aspectos históricos, da concepção e das condições favoráveis da implementação do
34
programa de desenvolvimento local sustentável é propósito de análise do próximo
item.
2.2 DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL
A Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio-Ambiente,
Estocolmo (1972), trouxe oficialmente à cena o tema da sobrevivência da
humanidade. Relatórios têm também sido apresentados desde então pelo Clube de
Roma. Em 1983, a Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU)
criou a Comissão Mundial para o Meio-Ambiente e Desenvolvimento por Gro Harlem
Brundtland, que preparou o “Relatório Brundtland” e cunhou as expressões
“desenvolvimento sustentado” e “nova ordem mundial”. Em 1992, a Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio-Ambiente e Desenvolvimento (Eco-92, Rio de Janeiro)
produziu o protocolo conhecido como Agenda 21. Em 1993, foi a vez da Declaração
de Kyoto, internacionalmente ainda não validada, sobretudo pela recusa do Governo
Bush (EUA) em subscrevê-la. Anunciam-se as próximas adesões da Rússia e do
Canadá, o que legitimaria este protocolo. Em 2002, teve lugar em Johannesburgo,
África do Sul, a “Conferência Rio+10” (SANTOS; HAMILTON, 2001).
De acordo com Santos; Hamilton (2001), a Agenda 21, da qual são
signatários o Brasil e outros 176 países, preconiza a implementação de políticas
públicas compatíveis com os princípios do desenvolvimento sustentável, através de
projetos adaptados nacionalmente e financiados pelo Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento (PNUD). O autor enfatiza que o Brasil criou um Ministério
do Meio Ambiente e selecionou seis áreas temáticas para a ação sócio-ambiental, a
saber: Infra-Estrutura e Integração Regional; Cidades Sustentáveis; Agricultura
Sustentável; Gestão dos Recursos Nacionais; Redução das Desigualdades Sociais;
Ciência e Tecnologia e Desenvolvimento Sustentável.
Para melhor compreensão dos principais aspectos que subsidiam o tema em
estudo, faz-se necessário voltar um pouco à história da civilização. Admite-se que o
ser humano enfrentou, num passado remoto, dificuldades para produzir seu sustento
e proteção, dispondo de poucas e rudimentares armas e instrumentos. Tais
carências foram substituídas pela via do progresso técnico que permitiu o
35
aperfeiçoamento das armas, instrumentos e práticas, facilitando a produção da
subsistência e da produção, e o aumento do tamanho da complexidade dos grupos.
Tendo “vencido” os obstáculos e “inimigos” que a “Natureza” lhe opunha, o Homem
pôde divisar o advento de uma vida “civilizada” e feliz. Não foi o que aconteceu.
Prevaleceu o princípio e a prática do homo hominis lupus, do que resultou e resulta
para o homem “mais fraco” as variadas formas de exploração e de violência
impostas pelo “mais forte”. A organização social e os estilos de vida advindos da
“civilização” produziram e produzem um caudal de problemas. O modo capitalista de
produção engendrado pela civilização cristã ocidental européia conduziu e ainda
conduz, ao agravamento da pobreza, da poluição ambiental, da corrupção e da
guerra (SANTOS; HAMILTON, 2001).
Na visão dos autores, o pensamento moderno alicerçou o modelo técnico-
industrial que sustenta a separação homem-natureza e considera a natureza como
uma fonte inesgotável de recursos para dar suporte à acumulação de riqueza da
sociedade. Desse modo, a Revolução Industrial agravou a hegemonia da produção
em detrimento da conservação e a hegemonia humana sobre a natureza. O mito do
desenvolvimento fortaleceu a certeza de sucesso irrestrito da capacidade humana
de produzir e ocultou a barbárie do progresso (SANTOS; HAMILTON, 2001).
A partir dos anos setenta e oitenta, a crise do modelo de desenvolvimento
fordista acabou estimulando um maior interesse na reflexão sobre as iniciativas de
desenvolvimento econômico local, ao questionar a visão do processo de
desenvolvimento econômico que serviu de base de educação por longas décadas, a
qual tende a simplificá-lo como se desenvolvesse unicamente pela via do modelo
concentrador, baseado na grande indústria e nos grandes núcleos urbanos
(ACSELRAD, 1999). Foram constatadas, igualmente, as limitações das políticas
macroeconômicas formuladas a partir das instâncias centrais, quando se trata de
conseguir um crescimento mais equilibrado territorialmente, mais eqüitativo do ponto
de vista da distribuição da renda, mais ambientalmente sustentável e, em suma, com
capacidade para impulsionar o desenvolvimento humano e elevar a qualidade de
vida das pessoas. O que inclui a qualidade de vida da população de regiões mais
pobres do Brasil.
Em face dos problemas surge um novo sentido para a palavra
desenvolvimento. A nova estratégia denomina-se “desenvolvimento local
sustentável”. A aplicação dos conceitos de desenvolvimento sustentável no nível
36
territorial local constitui o “desenvolvimento local sustentável” (DLS), cuja
especificidade consiste na ampliação de iniciativas inovadoras e mobilizadoras da
coletividade, articulando as potencialidades locais.
No Brasil, o desenvolvimento econômico local surgiu como produto de
posicionamentos impulsionados a partir dos governos centrais, e o como
conseqüência de iniciativas territoriais geradas “desde baixo”, capaz de impulsionar
atividades de fomento produtivo e empresarial no momento em que as condições
econômicas e institucionais estavam experimentando uma mudança radical. As
discussões em torno desta temática travavam-se entre uma corrente que defendia o
liberalismo econômico, preocupada em “garantir a ‘vocação agrária’ do Brasil, e uma
corrente desenvolvimentista, que pregava a intervenção do Estado na economia
para implementar a industrialização no país” (MANTEGA, 1987, p.12).
Para Camargo (2002), na expressão desenvolvimento sustentável, a palavra
sustentável costuma adquirir um sentido mais específico, remontando aos conceitos
da ecologia, referindo-se, de modo geral, à natureza homeostática dos ecossistemas
naturais e a autoperpetuação. “Sustentável”, nesse contexto, englobaria ainda a
idéia de capacidade de suporte, a qual se refere ao binômio recursos-população. O
DLS pode ser definido através (CAMARGO, 2002, p. 23) da seguinte forma:
O desenvolvimento sustentável busca simultaneamente a eficiência
econômica, a justiça social e a harmonia ambiental. Mais do que um novo
conceito é um processo de mudança onde a exploração de recursos, a
orientação dos investimentos, os rumos do desenvolvimento ecológico e a
mudança institucional devem levar em conta as necessidades das gerações
futuras.
Seguramente, essa é uma discussão que impõe uma gama enorme de
desdobramentos e explicações citadas em vários trabalhos científicos, e que merece
atenção especial no presente estudo, principalmente quando se busca entender a
essência da concepção de desenvolvimento, como se observa no estudo de
Barbosa; Mioto (2004) intitulado, “O desenvolvimento local em perspectiva:
explorando alguns ângulos do debate”. Ao revelarem dois aspectos importantes na
evolução da compreensão do conceito, eles verificam, inicialmente, que o
desenvolvimento foi a reboque do crescimento econômico, por emergir no contexto
37
das discussões do pós-guerra, estando assim, inseparável da Organização das
Nações Unidas (ONU), com Carta do Atlântico (1941) e a Carta das Nações Unidas
(1945). Fato este observado nos indicadores que mediam o desenvolvimento como o
PIB e o PIB per capta (BARBOSA; MIOTO, 2004). Para ilustrar o assunto, os autores
citam Seers como o primeiro a buscar uma subjetivação do conceito, o qual adotou
não fatores ligados à esfera material, como também juízo de valor. Ao abraçar a
idéia, a ONU cria o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o qual abarca três
componentes, a saber: qualidade de vida, longevidade e nível de conhecimento.
Enfim, reconhecem que o mérito não se limita apenas a ONU, mas a autores
como, (Boisier, Marx-Neef, Elizalde, Hopernhayn) os quais contribuíram para o
progresso do conceito de desenvolvimento, “visando sua complexidade e
multidimensionalidade, confrontando-o ao paradigma anterior que, para eles, era
reducionista, mecanicista e linear” (BARBOSA; MIOTO 2004, p. 1-2).
Buarque (1999) entende o desenvolvimento local sustentável (DLS)
enquanto processo endógeno registrado em pequenas unidades territoriais e
agrupamentos humanos, capaz de promover o dinamismo econômico e a melhoria
da qualidade de vida da população. Por emergir de um movimento construído na
base coletiva da comunidade, e por interagir com as complexas e conflitantes
condições contemporâneas da globalização e o acirrado processo de transformação,
o DLS, também interage economicamente com o contexto regional e nacional. Essas
idéias na visão de Harvey (2001, p. 13) podem contribuir com forte influência e
pressões positivas e negativas, justamente por entender que:
O desenvolvimento local está associado, normalmente, a iniciativas
inovadoras e mobilizadoras da coletividade, articulando as potencialidades
locais nas condições dadas pelo contexto. Como diz Arto Haveri, “as
comunidades procuram utilizar suas características específicas e suas
qualidades superiores e se especializar nos campos em que têm uma
vantagem comparativa com relação às outras regiões.
Dentre as várias preocupações referidas pelo autor, a que mais se destaca
se refere às decisões coletivas. Ora, se não houver a vontade conjunta da sociedade
em viabilizar uma política de sustentabilidade real para o local através de um projeto
coletivo, logicamente que as pressões externas falarão mais alto. Nesse caso, os
38
esforços pensados nesses ideais de mudança continuarão revestidos de interesses
mascarados induzidos pelas pressões políticas externas.
Ao fazer referência sobre os aspectos da globalização e o desenvolvimento
local (BUARQUE, 1999, p. 15) aponta diversas contradições, mas admite que possa
haver vantagens, pois:
O desenvolvimento local dentro da globalização é uma resultante direta da
capacidade dos atores e das sociedades locais se estruturarem e se
mobilizarem, com base nas suas potencialidades e sua matriz cultural, para
definir e explorar suas prioridades e especificidades, buscando a
competitividade num contexto de rápidas e profundas transformações. No
novo paradigma de desenvolvimento, isto significa, antes de tudo, a
capacidade de ampliação da massa crítica de recursos humanos, domínio
do conhecimento e da informação, elementos centrais da competitividade
sistêmica.
Como base nos argumentos, entende-se que um pré-requisito para a
obtenção das vantagens na dinâmica dessa “nova ordem mundial”. A primeira
condição está atrelada à capacitação e ampliação da massa crítica. Como as
intenções do processo de globalidade implicam em jogos de interesses,
necessariamente, a condição resultante da criação de alianças, articulada com
grandes centros mercadológicos através de redes, não é o suficiente. Acredita-se
que o grande mentor do DLS é o conhecimento adquirido pelos próprios atores
sociais. o eles que farão o diferencial de um desenvolvimento pensado na
sustentabilidade local. Dotados de conhecimento, evidentemente que poderão
participar do jogo da globalidade, sem necessariamente desvalorizarem o produto de
seu trabalho. Para isso, deverão ter competência e habilidades para construírem
vantagens competitivas locais e municipais, com base nas potencialidades em infra-
estrutura econômica, logística, recursos humanos especialmente educação e
capacitação educacional, além do desenvolvimento tecnológico.
Para Mello (1988) as crescentes exigências no tocante à produtividade e
competitividade que devem atender às empresas, assim como os maiores níveis de
exposição externa que enfrentam as economias, como resultado do processo de
globalização, são desafios do qual a educação é a chave principal. Em face desse
estado de coisas, é preciso negociar entre o setor privado, a administração pública e
39
o restante dos atores sociais regionais e locais, a criação de um “ambiente inovador”,
sócio-institucional, que assegure a qualificação da educação global (CEPAL, 1990).
Enfim, a globalização tem um efeito dialético sobre a organização do espaço
social. De um lado, demanda e provoca um movimento de uniformização e
padronização dos mercados e produtos como forma de integrar os mercados. Por
outro lado, também provoca a diversificação e a flexibilização das economias e dos
mercados locais, cria e produz diversidades, integrando os valores globais com os
padrões locais, articulando o local ao global. Assim, nesse jogo, entende-se que o
global se alimenta do local.
Para Rattner (1999) é preciso ficar alerta para as intenções do discurso
disseminado muitas vezes nas intenções do programa, pois, enquanto as práticas
dominantes na sociedade (econômica, política, cultural) são determinadas pelas
elites de poder, essas mesmas elites são também as principais referências para a
produção e disseminação de idéias, valores e representações coletivas. Assim, cada
teoria, doutrina ou paradigma sobre sustentabilidade terá diferentes implicações
para a implementação e o planejamento da ação social.
Críticas refletidas nesta ótica estão registradas em produções que se
completam no X Colóquio Internacional sobre o Poder Local realizado em Salvador-
BA (2006). Uma visão ampliada do tema encontra-se presente nos estudos de Brito;
Vieira (2006). Em artigo intitulado “Mundialização do capital e desenvolvimento local:
uma luta entre Davi e Golias”, os autores além de apontarem as contradições da
implementação do programa dentro do capitalismo, apontam vantagens da iniciativa,
a partir da apresentação da proposta política do DLS, do paradoxo existente da
implementação do processo, e das experiências internacionais. Nesse sentido,
entendem que o processo de desenvolvimento local surge como (BRITO; VIEIRA,
2006, p. 3):
[...] um fenômeno que coloca em evidência: os atores sociais, as redes de
cooperação, o sistema institucional e os projetos coletivos. Objetiva
fortalecer os empreendimentos empresarias associativos e os
microempresários para que gerem empregos sustentáveis. [...] é uma
resultante direta da capacidade dos atores e das sociedades locais se
estruturarem e se mobilizarem, com base nas suas potencialidades e sua
matriz cultural, para definir e explorar suas potencialidades e
especificidades, buscando competitividade num contexto de rápidas e
profundas transformações.
40
Esse processo decorre do compromisso pressuposto no programa do DLS e
das bases da consolidação da essência do desenvolvimento que se almeja. Existe
uma parceria efetiva resultado do acordo de “uma parte significativa da sociedade
local e de mudanças básicas em suas atitudes e comportamentos, o que permite
substituir a concepção tradicional de “espaço” (simples espaço físico) pela de um
contexto social de cooperação ativa (um território)”
(
ALBUQUERQUE, 1998, p. 36).
Para Brito; Vieira (2006) “local” é entendido como espaço favorável para a
população adquirir um auto-reconhecimento de suas características, de modo a
exercerem certa influência sobre as mudanças socioeconômicas em favor das
formas de intervenção oferecidas pelas instituições governamentais e associativas.
Nesse sentido, todas as idéias e características do processo se integram, a
partir da: coordenação dos diversos agentes públicos e privados que atuam no
território, o acesso aos serviços estratégicos para incorporação de inovações
tecnológicas e empresariais no tecido produtivo territorial, a criação de “incubadoras
de empresas” para multiplicação das iniciativas empresariais, a concentração dos
serviços elementares (administrativos, contábeis, telecomunicações, formação
básica de gestão empresarial) em local cedido pelo próprio município, pela câmara
de comércio local ou associação de empresários e fundamentalmente o estímulo às
lideranças emergentes, bem como a capacitação do novo empresário (BRITO;
VIEIRA, 2006).
Na seqüência, os autores ainda corroboram quanto à capacidade e
funcionamento da iniciativa, focados na mudança de concepção e da importância da
implementação do programa econômico, com base nos seguintes pontos: a) de
natureza econômica alternativa de reação à crise econômica dos países
industrializados e em processos de decomposição e de recomposição dos sistemas
produtivos. Enquanto escala de desenvolvimento local, surge como o lugar
privilegiado de regulação de disfunções propiciando uma interação forte entre os
sistemas tecnológicos e os sistemas econômico-culturais. Sob essa ótica, “território”
passa a ser reconhecido como laboratório de experimentação social capaz de
absorver as novas tecnologias e criar novas unidades de produção mais adaptadas
a sua melhor utilização. o critério “conhecimento” é o responsável de absorver e
integrar o território ao mercado; b) de natureza institucional resultado das
mudanças institucionais induzidas pelas políticas de descentralização do Estado; c)
41
razões decorrentes dos processos sociais na medida em que o modelo privilegia
as condições sociais, econômicas, culturais e políticas de desenvolvimento e
reconhece os fatores invisíveis que permitem a adequação de políticas de
desenvolvimento local. Entendem que ao conjunto composto de todos os recursos
materiais e imateriais, dominados por uma cultura historicamente construída,
relacionada em torno de um sistema do tipo cooperação e concorrência, permitirá a
adequação de políticas de desenvolvimento local.
Associada a essas questões importa ainda conhecer como se constituem as
etapas da transição do processo que caracterizam a passagem de um estado
“cultural” existente para outro (BRITO; VIEIRA, 2006).
1) Caracterização das localidades que tem como objetivo estabelecer o
diagnóstico de um território de maneira a analisar as condições de ação
da política de desenvolvimento e avaliar seus efeitos;
2) Caracterização das políticas e das escolhas estratégicas visando
identificar a estreita ligação entre a vontade de mudança e a capacidade
de iniciativa dos líderes locais para encarar os desafios socioeconômicos
diagnosticados;
3) Apreensão do momento da emergência e criação dos atores do
desenvolvimento, dos serviços de administração do Estado e dos serviços
territoriais envolvidos nas políticas de desenvolvimento;
4) Mobilização que se organiza à medida da ocorrência dos acontecimentos
no território ou a partir dos projetos iniciados pelos responsáveis locais.
A partir de uma análise mais detalhada, se consegue entender a essência
que caracteriza a política do DLS, conectadas às seguintes ações: raízes atreladas a
uma criação cultural inscrita e consolidadas na memória coletiva e de uma rede
associativa, levada pela vontade de se afirmar uma identidade regional. Mobilização
de uma população que se descobre através de sua própria apresentação,
desenvolvimento das iniciativas no campo cultural e no campo econômico,
emergência de uma parceria que atinge progressivamente o meio associativo, o
mundo político, os sócio-profissionais A valorização dos produtos locais e iniciativas
locais de qualidade que tem como efeito a valorização do território e seus produtos;
a apropriação dos eventos de fortalecimento das identidades culturais pelos
parceiros políticos e os sócio-profissionais sem prejudicar a dinâmica original. O
42
exercício do processo de aprendizagem coletiva pela população local que aceita
inscrever-se no processo, reforçando a mobilização. A emergência de cidadãos,
novos atores, reivindicando uma fixação local. A dinâmica local desencadeada
difundindo-se geograficamente para outros espaços sociais A busca de um equilíbrio
frágil entre uma promoção não seletiva de produtos locais, que encoraja a maioria
dos atores locais (artesãos, comerciantes, agricultores, pecuaristas, profissionais
liberais); uma preocupação de marketing, marcada pelo pensamento de distinção de
produtos de qualidade dirigidos a públicos aos quais deseja atingir (TEISSERENC,
1994).
Como se pode observar essa seria a forma ideal de se pensar e estabelecer
política do DLS. Mas, necessariamente não é tão fácil a implementação das idéias,
devido à própria contradição do processo, como se observa nos exemplos citados
nos estudos de (BRITO; VIEIRA, 2006) em países que experimentaram a
metodologia (BRITO; VIEIRA, 2006), entre eles:
a) França o desenvolvimento local não pôde funcionar sem a intervenção
exterior, da mesma forma ele não pôde arrancar e prosseguir sem
vontade e iniciativas locais. O desenvolvimento local é uma resposta
conjuntural à crise econômica e administrativa, ao mesmo tempo em que
é a invenção de um modelo social que valoriza as identidades culturais
locais ( BRITO; VIEIRA, 2006).
b) Itália - as novas instituições ficam mais perto do povo, como previam os
idealizadores. Entretanto, a eficiência administrativa propalada pelos
reformadores regionalistas não se propagou As regiões mais atrasadas se
livraram do paralisante domínio das regiões mais adiantadas, no entanto
a histórica disparidade entre o Norte e Sul permanece (BRITO; VIEIRA,
2006).
c) Canadá ocorreu a criação de pequenas empresas em regiões distantes,
diminuindo custos de infra-estrutura, equipamentos coletivos,
hospedagens, entre outras. Aumentou a valorização do patrimônio e da
identidade dos ambientes. Entretanto, permanece a insuficiência de
emprego para responder às necessidades da população (BRITO; VIEIRA,
2006).
43
Enfim, os autores reconhecem existir no Brasil experiências de
implementação do DLS em fase embrionária, apresentando-se com diferentes
dimensões: de reflexões mais amplas sobre sustentabilidade e meio ambiente, até
experiências urbanas como os micro-espaços de poder e segregação como os
condomínios urbanos horizontais fechados.
As contribuições de Pereira (2006), no artigo “O local e o território nos
programas de desenvolvimento econômico local: um ensaio sobre as possibilidades
e limites do caso brasileiro” põe em xeque o conceito de desenvolvimento,
reportando-se ao contexto histórico do Brasil, uma vez que, o crescimento
econômico e modernização das estruturas cio-produtivas não foram capazes de
promover, a reboque, melhorias de qualidade de vida para a população. Torna-se
imprescindível buscar uma noção de desenvolvimento capaz de equacionar os
problemas sociais graves os quais se perpetuam e ampliam neste país. Lembra que
se tornou comum falar em desenvolvimento sustentável, desenvolvimento social e
desenvolvimento local. Para a autora, tais adjetivações apóiam a ampla gama de
significados que o termo adquiriu, dado às conseqüências agravantes do projeto
moderno. Nesse sentido, os países periféricos não podem continuar alimentando-se
de concepções puramente econômicas, que lhes conferiram um caráter
eminentemente macro, norteado pelo próprio avanço do sistema capitalista.
No item referente às possibilidades e limites do Programa de
Desenvolvimento Econômico Local (PDEL), a autora cita quatro fatores impactantes
da ação dinâmica do processo: o primeiro refere-se à falta de uma estrutura nacional
que desse conta de um sistema de apoio. O segundo resulta na superação da
cultura política, onde se destacam dois problemas: i) a prática do clientelismo e do
assistencialismo, ii) a questão da continuidade dos programas de governo. O terceiro
fator, relaciona-se à escassez de recursos O quarto fator direciona-se à capacitação
dos administradores municipais. Embora todos esses fatores sejam limitantes, sob o
ponto de vista da autora, a ausência de participação social/cidadã é um dos maiores
limitadores da ação social. Concorda, apesar das dificuldades, haver um grande
avanço na implementação de programas de DLS no Brasil. Porém, a busca por
políticas públicas para a promoção de um desenvolvimento mais humano pode ser
feita através da integração dos circuitos da economia, do mapeamento das
potencialidades do território, da valorização da cultura (das identidades locais) e de
um crescimento econômico setorial. Enfim, entende que o compromisso não fica sob
44
responsabilidade apenas do município: “é antes de tudo, uma tarefa de
Planejamento que passa necessariamente pela capacitação técnica, mas também
pela vontade política” (PEREIRA, 2006, p. 15).
Exemplo disso evidencia-se na experiência vivenciada no município de
Pintadas (Bahia, Brasil), cujo movimento social resultou de caráter popular
organizado com bases nas necessidades dos produtores rurais, iniciada desde a
década de 1960, sob a liderança da Igreja Católica em parceria com agentes da
cooperação internacional. Ao discorrer o sucesso da iniciativa no contexto da teoria
do capital social e desenvolvimento local, (MILANI, 2003), reafirma que a política do
DLS envolve fatores sociais, culturais e políticos que não se regulam exclusivamente
pelo sistema de mercado. O crescimento econômico é uma variável essencial,
porém não suficiente para ensejar o desenvolvimento local. Considerado como
projeto para Perroux (apud MILANI, 2003), caminho histórico para Sachs (apud
MILANI, 2003), e ação plurudimensional para Bártoli (apud MILANI, 2003), o
desenvolvimento local é marcado pela cultura do contexto onde está situado.
Nesse sentido, pode ser considerado como um conjunto de atividades
culturais, econômicas, políticas e sociais - vista sob a óptica intersetorial e trans-
escalar - que participam de um projeto de transformação consciente da realidade
local. Nesse desafio, significativo grau de interdependência dos diversos
segmentos que compõem a sociedade (âmbito cultural, político, legal, educacional,
econômico, ambiental e tecnológico) e os agentes presentes em diferentes escalas
econômicas e políticas (do local ao global) (MILANI, 2003, p. 6 apud GIANNELA,
2006, p. 8), pois:
É assim que, no atual contexto da globalização econômica, o
desenvolvimento local é considerado por muitos como a ‘resposta
mágica’ou a única resposta possível às crises do desenvolvimento em geral.
Ou seja, mesmo em países com alto grau de desigualdade estrutural como
o Brasil, a ‘solução’ para os problemas de acesso à educação, saúde,
emprego ou renda adviria das ‘estratégias de desenvolvimento local’. O
desenvolvimento local é assim politicamente reinvestido e socialmente
redefinido, sofrendo profunda alteração semântica, uma vez que passa a
ser visto, por muitos analistas, como estratégia de adaptação e não mais de
transformação social.
45
Ao refutar sobre os ideais de um DLS considerado por muitos como a
resposta para todos os problemas de desenvolvimento do país, os autores se
preocupam com as intenções propaladas por um grupo elitizado. De um lado
reconhecem que a estrutura global não pode ser construída sem a inteligência local
e a cooperação dos atores. De outro, “não admite contestar o piloto e o rumo que ele
impõe ao veículo”
(GIANNELLA, 2006, p. 8).
Enfim, o desenvolvimento local sustentável pode ser entendido como aquele
processo reativador da economia e dinamizador da sociedade local que, mediante o
aproveitamento eficiente dos recursos internos disponíveis em uma zona
determinada, é capaz de estimular seu crescimento econômico, criar emprego e
melhorar a qualidade de vida da comunidade local. É esse potencial interno quando
realizado, que favorece um dos fatores que define o desenvolvimento local. Da
mesma forma, um projeto desse tipo deve ser assegurado mediante a mobilização
da população local, sua participação na formulação e na implementação das
iniciativas de desenvolvimento (BUARQUE, 1999).
2.3 INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL
Ao valorizar a mobilidade de grupos de apoio na busca de uma
transparência social observa-se que no contexto de análise do DLS, a construção do
Estado é acompanhada pela constituição de uma espécie de transcendental
histórico comum, imanente a todos os ‘sujeitos’. Através do ajuste que impõe às
práticas, o Estado tenta incultar formas e categorias de percepção e de pensamento
comuns, quadros sociais da percepção, do entendimento ou da memória, estruturas
mentais, formas estatais de classificação. Deste modo, cria as condições de
consenso sobre o conjunto de evidências partilhadas constitutivas do senso comum
(BOURDIEU, 1994 apud BRITO; VIEIRA, 2006). Para tanto, o êxito dos instrumentos
viabilizadores da dinâmica iniciada pelo tecido associativo decorre da eficácia dos
seguintes indicadores de desenvolvimento local: emergência de atores sociais,
criação de sistema institucional, formação de redes de cooperação e
desenvolvimento de projetos coletivos. A fim de apreender o que, de certa forma,
alimenta e sustenta essa “nova ordem mundial”, a seguir, apresenta-se o conceito de
46
cada mecanismo de sustentação do processo, os quais funcionam como variáveis
do presente estudo.
2.3.1 Atores Sociais
Uma das principais preocupações de consolidação da política de
desenvolvimento local sustentável encontra-se refletida na concepção de atores
sociais. No contexto semântico da iniciativa do DLS, os atores sociais estão
representados por “lideranças políticas, organizações comunitárias, secretários
municipais, conselhos municipais, extensionistas, conselhos regionais, sindicatos,
professores”, em cujo rol, não se pode deixar de incluir os empreendedores e as
suas variadas maneiras de se organizarem (FILHO, 2005).
Assim, Brito (2006, p. 9) reconhece que:
Atores sociais consistem na existência de uma situação favorável ao
surgimento de sujeitos (lideranças comunitárias; diretores de serviços
ou de agências de desenvolvimento; representantes institucionais;
encarregados de funções; gerentes de projetos; empresários;
operadores e representantes eleitos que sejam incentivadores ou
não das políticas de desenvolvimento) cujo perfil de competência, em
termos de conhecimentos, habilidades e atitudes, os predestinam a
representar um papel particular na realização das políticas de
desenvolvimento.
Como se pode observar na discussão acima, os atores sociais representam
na realidade, “blocos de poder” que colocados em sinergia de interesses pela
qualidade do meio ambiente e de vida, podem aprender e ensinar uns aos outros.
Ao reconhecer a diversidade de modelos de participação social no planejamento e
na gestão pública do desenvolvimento local há a necessidade de se distinguir,
conceitualmente, atores sociais e Estado como forma de entender a lógica e
funcionamento e cada instância, a saber (ROSA, 2002).
a) Atores sociais - são os grupos e segmentos sociais diferenciados na
sociedade que constituem conjuntos relativamente homogêneos segundo
sua posição na vida econômica e na vida sócio-cultural e que, por sua
47
prática coletiva, constroem identidades e espaços de influência dos seus
interesses e suas visões de mundo. Os atores sociais organizam-se e
manifestam-se por intermédio de entidades, organizações, associações,
lobbies e grupos de pressão política, expressando sempre interesses e
visões de mundo diferenciado segundo o corte temático ou espacial,
compreendido em três conjuntos: cooperativos, comunitários e temáticos
(BUARQUE, 1999).
b) Estado - é a instância jurídico-política que sintetiza o jogo de interesses e
poderes dos atores sociais em conflito e cooperação, consolidando e
expressando uma estrutura de poder na sociedade. Dessa forma, “não é
um ator, mas uma expressão dos seus interesses e poderes diferenciados
e representação do projeto e vontade dominante na sociedade em cada
momento” (BUARQUE, 1999, p.27).
c) Conselhos e Fóruns de Participação - são os espaços de participação dos
atores sociais e de negociação de interesses diferenciados da sociedade
entre si e de influenciação sobre o Estado e as instituições blicas. É a
instância de participação por excelência, “constituindo-se num dos
campos de disputa política e jogo de interesses dos atores. Pode ser
limitado à representação desses, ou juntar para negociação os atores e
as representações dos órgãos públicos” (BUARQUE, 1999, p.28).
Em artigo denominado “Temas para reflexão em desenvolvimento local
sustentável”, a socióloga e consultora do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) em DLS, Rosa (2002) utiliza o termo empreendedor social
para designar aquele ator que tem uma missão social. Tais empreendedores,
contudo, têm um papel fundamental como agentes de mudança no setor social. Sua
atuação sempre traz benefícios em cadeia para um território ou localidade. Agem
sempre no sentido de: gerar e manter valor social (não apenas valor privado);
reconhecer e buscar novas oportunidades; engajar-se num processo de inovação,
adaptado e aprendizado contínuo; agir arrojadamente sem se limitar aos recursos
disponíveis; exibir um elevado senso de transparência para com seus parceiros e
público pelos resultados gerados.
Em sua análise, a socióloga conclui que essa inovação comportamental do
ator social representa, em essência, a diferença que o distingue dos
48
empreendedores de negócios. Mesmo os de negócios socialmente responsáveis.
Assim, as metas desafiadoras designadas ao ator social, compreendem ações de
melhorias sociais que não podem ser diminuídas para se criar benefícios privados
(retornos financeiro ou benefícios de consumo) para indivíduos. Gerar lucro, criar
riquezas ou servir aos desejos de consumidores pode ser parte do modelo, mas são
apenas meios para um fim social, não os fins propriamente ditos (ROSA, 2002).
Outra abordagem põe em discussão que os líderes genuínos e os bons
políticos são empreendedores sociais. Seu papel é de ajudar a tecer a rede da
solidariedade a partir das oportunidades locais. Nesse sentido, constroem o social a
partir das suas bases, identificando as oportunidades e abrindo novos caminhos.
Não abandonam o desenvolvimento econômico, mas procuram agregar a ele novos
valores de desenvolvimento. Sob esta ótica conclui que líder significa aquela pessoa
a quem foi atribuída, formal ou informalmente, uma posição de responsabilidade
para dirigir e coordenar as atividades de um grupo. Sua preocupação prende-se,
portanto, à realização de algum objetivo específico no grupo (ROSA, 2002, p. 7).
Ao destacar o novo papel do líder, Senge (2006) apresenta dois pontos de
vistas: o primeiro, sob a ótica tradicionalista e o segundo embasado na perspectiva
das organizações que aprendem. O perfil da primeira característica encontra-se
enraizada, principalmente no Ocidente, onde líderes representam heróis. Ou seja,
grandes homens (e ocasionalmente mulheres) que se tornam importantes em
épocas de crise. Enquanto predominarem tais mitos, eles reforçarão o foco em
eventos de curto prazo e heróis carismáticos. Não, necessariamente, nas forças
sistêmicas e no aprendizado coletivo. Na perspectiva funcionalista da organização
que aprende, os papéis dos líderes diferem substancialmente daquele do
carismático tomador de decisões. Os líderes são projetistas, professores e regentes.
Nesse sentido, precisarão de novas habilidades, como: a capacidade de construir
uma visão compartilhada, de trazer à superfície e questionar os modelos mentais
vigentes e de incentivar padrões mais sistêmicos de pensamentos. Em suma, nas
organizações que aprendem, os líderes são responsáveis para construir
organizações nas quais as pessoas possam estar continuamente expandindo sua
capacidade de criar seu futuro. Isto é, os líderes são responsáveis pelo aprendizado.
A propósito dessa discussão, Wagner III; Hollenbeck (2000) reconhecem
haver um conceito mais apropriado para liderança voltado para o uso de influência
simbólica e não coercitiva. Essa assertiva serve para coordenar e dirigir metas das
49
atividades estabelecidas pelos membros na busca de objetivos comuns. Nesse
aspecto, aprende-se a ser líder e liderados, ao mesmo tempo, na construção de
relações democráticas de influência mútua entre todos, no desempenho da
construção da cidadania, exercida em um pequeno grupo de trabalho, na
organização e na comunidade. Após mostrar as plausíveis causas que constituem
um líder, os autores chegam à conclusão de que, necessariamente, o líder não
nasce líder e muito menos herda fatores genéticos. Na verdade, essas
características são “adquiridas” como sugerem os pensadores comportamentalistas.
As idéias refletidas acima se complementam nas discussões do tema
“Atores Sociais que interferem na qualidade do meio ambiente e qualidade de vida”.
Em nota introdutória, Viezzer (2005, p. 10), consultora de Educação Socioambiental,
tece uma critica e diz que:
Nenhuma pessoa e nenhuma instituição, ao ocupar um destes
espaços de poder, pode dar conta da complexidade das questões
que se colocam nos níveis econômicos, sociais, ambientais, culturais
e políticos. Donde a necessidade de trabalhar com todos os Atores
Sociais na perspectiva ética do cuidado, desenvolvendo a ação
educativa continuada nos diversos espaços e níveis de atuação dos
mesmos e trabalhando para sua articulação permanente com os
métodos e técnicas de negociações necessárias, particularmente em
casos de conflitos socioambientais.
Para a consultora ambiental os atores sociais que interferem na qualidade
de vida da região dividem-se nos seguintes “blocos de poder”:
O poder público que se exerce a partir dos órgãos do legislativo, executivo,
judiciário. Estes, por sua vez, situam-se em diversos níveis: local,
estadual e nacional. Em muitos casos a estes se agregam organismos
internacionais.
O poder econômico que se exerce a partir de empresas e instituições da
indústria, a agroindústria, os bancos, o comércio.
O poder do saber e da informação que se concentra nos centros de
pesquisa, nas universidades, na rede formal de ensino e nos meios de
comunicação.
50
O poder da organização da sociedade civil que se expressa
particularmente nas organizações chamadas do Terceiro Setor:
Organizações Não Governamentais (ONGs) e Movimentos Sociais com
suas diferentes representações (sindicatos, cooperativas, associações,
comunidades de igrejas, entre outras).
Cada um destes atores sociais tem funções específicas que exercem a partir
de seu tipo de interferência na qualidade de vida de uma população. Evidentemente,
esta categorização não é estanque. Muitas vezes, estas variáveis se misturam. Um
centro de pesquisa pode ser público ou privado, assim como as universidades, as
escolas e as empresas. O assim chamado “Terceiro Setor” não é uma grande
congregação: nele se encontram grupos diferentes, diferenciados e, por vezes, até
antagônicos.
O importante é considerar que as formas de participação e de representação
no processo decisório dependem da ação dos atores sociais internos e externos, em
condição de contribuir na consecução e no sucesso das estratégias negociadas
através de parceria. Na verdade, a parceria constitui elemento chave dos processos
de inovação no desenvolvimento local sustentável. E uma das formas de se
trabalhar a constituição de parcerias acontece através das redes sociais, assunto
este, discutido no próximo item.
2.3.2 Redes
Ao fazerem referência sobre a vantagem dessa iniciativa Pike; Selby,1999, p.
57) asseguram dizendo que,
[...] ela incentiva a plena utilização de inovações individuais ou de
pequenos grupos e minimiza as conseqüências de um fracasso; ela
promove a máxima penetração de idéias através das barreiras
socioeconômicas e culturais, enquanto preserva a diversidade cultural e
subcultural; ela é suficientemente flexível para adaptar-se com rapidez às
condições cambiantes; e coloca uma vantagem estrutural nas habilidades
individuais igualitárias, em contraste com os modos impessoais de
integração que são a característica do paradigma burocrático.
51
Com base nesses argumentos evidencia-se a compreensão de um novo
paradigma com ênfase no potencial humano. Um potencial pensado nos ideais de
integração de grupos que investem na transformação pessoal e na participação do
cidadão comum. Tais ações podem produzir novos níveis e formas de cultura e
comunidade, dentro e através do sistema global, seguido de uma diminuição
daqueles aspectos das interdependências atuais que são destrutivas e injustas.
Uma importante contribuição da compreensão do processo da formação de
redes nas organizações está presente na obra de Castells (1999). Para o autor, as
ações do processo estão atreladas às mudanças ocorridas nas bases sociais,
causadas, principalmente, pela revolução tecnológica concentrada nas tecnologias
da informação.
Conseqüências dessas mudanças são evidentes no próprio capitalismo que
passa por um processo de profunda reestruturação caracterizado por maior
flexibilidade de gerenciamento; descentralização das empresas e sua organização
em redes tanto internamente quanto em suas relações com outras empresas;
considerável fortalecimento do papel do capital vis-à-vis o trabalho, com o declínio
concomitante da influência dos movimentos de trabalhadores; individualização e
diversificação cada vez maior das relações de trabalho; incorporação maciça das
mulheres na força de trabalho remunerada, geralmente em condições
discriminatórias; intervenção estatal para desregular os mercados de forma seletiva
e desfazer o estado do bem-estar-social com diferentes intensidades e orientações,
dependendo da natureza das forças e instituições políticas de cada sociedade;
aumento da concorrência econômica global em um contexto de progressiva
diferenciação dos cenários geográficos e culturais para a acumulação e a gestão de
capital (CASTELLS, 1999).
Os processos dominantes da sociedade moderna estão estruturalmente
organizados em redes. Enquanto formadoras da nova morfologia social, a
propagação da lógica de redes modifica de maneira substancial a operação e os
resultados dos processos produtivos da experiência, poder e cultura. Assim, “elas
tomaram uma nova forma, nos tempos atuais, ao se transformar em redes
informacionais, revigoradas pela internet”, como afirma (CASTELLS, 1999, p. 190):
52
As redes são criadas não apenas para comunicar, mas para ganhar
posições, para melhorar a comunicação. Portanto, é essencial
manter uma distância entre a avaliação do surgimento de novas
formas e processos sociais, induzidos e facilitados por novas
tecnologias, e a extrapolação das conseqüências potenciais desses
avanços para a sociedade e as pessoas: análises específicas e
observação empírica conseguirão determinar as conseqüências da
interação entre as novas tecnologias e as formas sociais emergentes.
Mas também é essencial identificar a lógica embutida no novo
paradigma tecnológico.
O autor considera que o paradigma da tecnologia da informação o evolui
para seu fechamento como um sistema, mas rumo à abertura como uma rede de
acesso ltiplo. De certa forma são considerados modelos distintos que
desempenharam papel considerável no crescimento econômico de vários países,
nas duas últimas décadas, a saber: “o modelo de redes multidirecionais postas em
prática por empresas de pequeno e médio porte e o modelo de licenciamento e
subcontratação de produção sob o controle de uma grande empresa” (CASTELLS,
1999, p. 181).
Nos pressupostos que discutem sobre a teoria do "espaço de fluxos", o autor
salienta não apenas as dimensões econômicas e políticas, mas também as
dimensões culturais desses processos de segmentação, baseados em estruturas
sócio-técnicas. Sua interpretação da dinâmica social da sociedade em redes revela
interessantes percepções sobre transformações sociais induzidas pelas Tecnologias
de Informação e Comunicação (TICs). Como resultado, pode-se chegar a um melhor
entendimento das perspectivas de redes comunitárias e as possibilidades do uso
das TICs em prol do desenvolvimento sustentável de comunidades locais.
As deduções inferidas pelo autor sobre a sociedade em rede e as
estratégias e mecanismos utilizados pela elite empresarial da nova economia
informacional são bastante reveladoras, especialmente se vistas em contraste com
os processos de fragmentação e segmentação observadas no âmbito da sociedade
civil, sobretudo em nível comunitário. Segundo ele, segue uma esquizofrenia
estrutural entre duas lógicas espaciais que ameaça romper os canais de
comunicação da sociedade. A tendência predominante é para um ambiente de rede
que impõe uma gica nos lugares segmentados e espalhados, cada vez menos
53
relacionados uns com os outros, cada vez menos “capazes de compartilhar códigos
culturais" (CASTELLS, 1999, p. 451).
Nesse sentido, as redes sociais podem ser compreendidas como formas
independentes de coordenação de interações. A marca central da rede é a
cooperação, baseada em confiança entre atores autônomos e interdependentes.
Nesse sentido, todos estes trabalham em conjunto por um período limitado de tempo
e levam em consideração os interesses dos parceiros envolvidos, que estão
conscientes de que essa forma de coordenação é o melhor caminho de alcançar
seus objetivos particulares. É em função dessa capacidade de agregação que as
redes têm um grande potencial para instigar processos de aprendizagem e são
defendidas para a implementação de projetos de inovação, nos casos em que os
riscos envolvidos apresentarem-se altos demais para cada um dos parceiros
individualmente (CASTELLS, 1999).
Essas qualidades da estrutura de rede é que tornam a opção comunitária tão
atraente para a política local. No entanto, resultados positivos podem ser
esperados se as comunidades locais conseguirem colocar em prática o modelo de
interação social da colaboração em rede. Infelizmente, as condições gerais o são
muito favoráveis para os processos de inovação social impulsionados de baixo para
cima.
Ao apoiar-se nas experiências de Ken’ichi Imai; analista organizacional que
mais se aprofundou na proposta e documentação da tese da transformação de
empresas em redes (CASTELLS, 1999), se baseia nos estudos das multinacionais
japonesas e norte-americanas, enfatizando três estratégias de implantação de
diferentes redes. A primeira e mais tradicional refere-se a uma estratégia de
múltiplos mercados domésticos para as empresas que investem no exterior a partir
de suas plataformas nacionais. A segunda visa o mercado global e organiza
diferentes funções da empresa em lugares diferentes, integrados em uma estratégia
global articulada. A terceira estratégia, característica do estágio econômico e
tecnológico mais avançado baseia-se em redes internacionais. Essa estrutura
internacional permite que pequenas e médias empresas se unam a empresas
maiores, formando redes capazes de inovar e adaptar-se constantemente. Assim, a
unidade operacional real torna-se o projeto empresarial, possibilitado por uma rede
em vez de empresas individuais ou agrupamentos formais de empresas. Nesse
sentido, as informações adequadas são cruciais para o desempenho das empresas,
54
as quais circulam pelas seguintes redes: redes entre empresas, redes dentro de
empresas, redes pessoais e redes de computadores (CASTELLS, 1999).
Mance (1999) corrobora com orientações mais didáticas sobre o assunto,
afirmando que o termo rede tem sido empregado, com sentidos diversos, por muitos
movimentos sociais, ONGs e intelectuais atuantes nesse tipo de organização.
Alguns estudiosos consideram como redes de movimentos sociais um amplo
conjunto de fóruns e articulações variadas que conectam organizações e entidades
populares.
Nesse quadro social, um princípio básico da noção de rede é que ela
funciona como um sistema aberto que se auto-reproduz. Isto é, como um sistema
autopoiético
1
. A idéia de rede que conecta grupos de um determinado movimento
social, por exemplo, do movimento de mulheres, é a de que a articulação entre todos
os movimentos deste tipo fortaleça cada movimento em particular pelos intercâmbios
que passem a ocorrer entre eles e que tal fortalecimento venha a contribuir no
surgimento de novos movimentos de mulheres em outras cidades, a fim de ampliar o
combate ao machismo e a defesa dos direitos da mulher em uma área maior do que
a atingida pelo conjunto dos movimentos já organizados ( MANCE, 1999).
Contudo, é oportuno discutir duas características de rede numa perspectiva
de análise que a tornam revolucionária, a saber: o princípio de intensividade e
extensividade. O critério da difusão da intensividade reside no fato que cada unidade
da rede venha a atingir e envolver um maior número de pessoas no local onde
aquela unidade atua. O resultado desta iniciativa encontra-se no aparecimento de
outros pequenos nódulos na referida região articulados entre si e conectados à rede
em geral. Ampliar a extensividade, por sua vez, significa expandir a rede para outros
territórios colaborando no surgimento de novas unidades suas e no desenvolvimento
destas, ampliando a abrangência da rede e fortalecendo o seu conjunto (MANCE,
1999).
Na verdade, o crescimento fecundo das redes ainda depende e se fixa em
três importantes conjuntos que se completam, entre eles: diversidade, integralidade
e realimentação. Uma rede apta a conectar diversidade secapaz de integrar, de
maneira fecunda e criativa, as ações realizadas na esfera pública não-estatal que
envolve todas as ONGs, organizações populares, associações, movimentos, entre
1
Autopoiese: do grego auto-poien, significa autofazer-se, ou auto-organização.
55
outros. Esses movimentos praticam a colaboração solidária, articulando seus
recursos e consolidando a implementação de seus projetos, fortalecendo cada nó na
medida em que ele mantém um fluxo constante com os demais. A integralidade
reside no fato de que todos os objetivos da colaboração solidária defendidos pelos
diversos nódulos da rede em particular sejam assumidos pelo conjunto dos nódulos
da rede. Finalmente, a idéia de realimentação se constitui em ações desenvolvidas
pela rede, através de seus nódulos e suas articulações, no agenciamento de novas
ações da própria rede, ampliando-a enquanto tal e expandindo o conjunto de suas
ações em um círculo virtuoso capaz de envolver cada vez mais pessoas,
possibilitando novas transformações de cada nódulo em particular e da rede como
um todo (MANCE, 1999).
Dentre os vários conceitos que se veiculam no reconhecimento da rede,
enquanto conceitualmente complexa e de caráter revolucionário, constata-se ainda
na visão do autor uma análise crítica contundente que reflete cada concepção Entre
elas: o consumo como mediação do bem-viver, o consumo solidário, a revolução das
redes e a globalização solidária internacional como alternativa à globalização
capitalista (MANCE, 1999).
As justificativas decorrentes em face das mudanças que primam para a
promoção do desenvolvimento a nível local, geralmente são atribuídas à eficácia das
ações governamentais. E a falta de participação da comunidade é apontada, na
literatura produzida pelas principais instituições internacionais da área de fomento do
desenvolvimento, como uma das principais causas do fracasso de políticas,
programas e projetos de diferentes tipos (BANDEIRA, 1999). Na tentativa de reverter
esse quadro, busca-se, nesse contexto de análise, conhecer as propostas de
desenvolvimento sustentável pensadas e articuladas através do projeto coletivo.
2.3.3 Projeto Coletivo
Não é de hoje que os “projetos” parecem ser uma excelente dinâmica de
trabalho. Segundo Barbosa (2005, p. 146) o projeto de trabalho supera sua origem,
“não é um método, nem uma técnica. Antes de tudo, é uma atitude que revela uma
visão de ensinar/aprender que permite a articulação de conhecimento, tão
56
necessária em tempos globais”. Historicamente os projetos aparecem como prática
educativa desde que Kilpatrick, em 1919, levou à sala de aula algumas das
contribuições de Dewey (HERNANDÉZ, 1988 apud BARBOSA, 2005). Porém, nos
dias de hoje, eles ressurgem como propostas da prática para a mediação do
desenvolvimento das habilidades e competências. Mesmo reconhecendo as diversas
vantagens de um projeto, pode-se dizer que as bases que solidificam essa nova
estratégia estão atreladas a um “plano previamente concebido para a realização de
uma medida qualquer” (MAIA JR; PASTOR, 1997, p. 726). Mas qual seria então, a
concepção de “projetos coletivos?”
Os projetos coletivos representam a capacidade de formulação de
referências conceituais formais e informais, visando orientar e inspirar o alcance dos
objetivos em função de acordos previamente estabelecidos e selecionados,
concedendo significados pessoais e coletivos aos processos de mudança, impondo
sentido à imaginação, à vontade, aos valores e à identidade cultural local
(TEISSERENC, 1994).
Para Buarque (1995), o planejamento representa uma forma de a sociedade
exercer o poder sobre o seu futuro. Nesse sentido, torna-se uma ferramenta
importantíssima, pois caberá a ele, mediar e orientar os atores na tomada de
decisão coletiva. Embora viabilize um “espaço de construção da liberdade da
sociedade dentro das circunstancias, delimitando o terreno do possível para
implementar as mudanças capazes de moldar a realidade futura” (BUARQUE, 1999,
p. 36) comenta:
De um modo geral, o planejamento governamental é o processo de
construção de um projeto coletivo capaz de implementar as transformações
necessárias na realidade que levem ao futuro desejado. Portanto, tem uma
forte conotação política. E no que se refere ao desenvolvimento local e
municipal, o planejamento é um instrumento para a construção de uma
proposta convergente dos atores que organizam as ações na perspectiva do
desenvolvimento sustentável.
Como se pode perceber, planejar no âmbito das políticas de
desenvolvimento local pressupõe a primeira condição para a criação de um projeto
coletivo. As ações refletidas no processo envolvem decisões e escolhas de
alternativas em torno de objetivos coletivos. O cálculo que precede e preside a ação
57
passa por negociação e formulação política. De interesses controversos, os objetivos
e interesses sociais são muito distintos, e, muitas vezes, conflitantes na sociedade.
Assim, “as decisões tomadas no processo de planejamento resultam de uma disputa
política dos atores, cada um procurando influenciar no projeto coletivo com suas
próprias expectativas em relação ao futuro e com os meios e instrumentos de poder”
(BUARQUE, 1999, p. 2).
Por outro lado, enquanto parte do processo político, o projeto coletivo
constitui um espaço privilegiado de negociação entre os atores sociais, confrontando
e articulando seus interesses e suas alternativas para a sociedade. Nesse sentido,
torna-se um processo ordenado e sistemático de decisão, o que lhe confere uma
conotação técnica e racional de formulação e suporte para as escolhas da
sociedade. Desta forma, o plano incorpora e combina uma dimensão técnico-política
(BUARQUE, 1999).
Na opinião de Rosa (2002), o desenvolvimento local sustentável é o
resultado de um processo cooperativo dos atores sociais locais. Para construir um
ambiente social cooperativo deve-se garantir a participação da sociedade civil no
processo de DLS. Isto significa construir um tecido social (e econômico) voltado para
fortalecer a coletividade em torno de um projeto de desenvolvimento comum.
Por “projeto comum”, a autora o define como “um conjunto de ações
consensuadas localmente. Voltadas para se garantir um futuro compartilhado em um
determinado local ou território, a partir de projetos concretos e específicos para o
local” (ROSA, 2002. p. 2). Assim, é preciso recuperar o passado e o presente do
território, por meio de colóquios e debates, de forma a construir um ciclo de
solidariedade, ao qual cada ator social local subordina seus interesses particulares
em função dos interesses comuns. Em síntese, o projeto comum constitui um
indicador de que uma determinada localidade está disposta a construir o seu
desenvolvimento local (ROSA, 2002, p. 2).
Enfim, é importante atentar para as diferentes dimensões de trabalho que
compõem o projeto comum de um território. Entre elas: a dimensão da identidade do
território; a dimensão da endogenia e a dimensão da organicidade. Para ilustrar
cada função designada às modalidades citadas anteriormente, expõem-se a seguir,
as principais idéias de cada processo.
A- A dimensão da identidade do território - se preocupa com a identificação
de valores e recursos locais, percebidos endógena e exogenamente como
58
características peculiares de um determinado território, como: paisagem,
cultura, música, arquitetura, patrimônio histórico, folclore, entre outros.
Somam-se a essas particularidades, outras características: uma
identidade construída historicamente. Presença de símbolos e interesses
da população local. Valores simbólicos e produtos têm significativa
repercussão na economia do território e podem contribuir para o seu
desenvolvimento, se já não o fizeram em outras épocas (ROSA, 2002).
B- A dimensão da endogenia - constitui-se de um “conjunto de forças que se
originam no interior de um território ou localidade, que podem reforçar o
seu processo de desenvolvimento” (ROSA, 2002, p. 2) Além dos valores
da identidade definida, a referida dimensão enfatiza outros fatores, como:
vocacionais e potenciais locais que podem ser estimulados no sentido de
construção do projeto comum e o aprendizado coletivo dos atores sociais.
C- A dimensão da organicidade se apóia nas dimensões anteriores,
constituindo-se das necessidades, expectativas e formas organizativas
com o propósito de articular a sociedade civil e o Estado na busca da
consolidação do projeto coletivo. O fator chave da construção deste
processo se ajusta no seguinte entendimento: compromisso e
representatividade dos atores sociais locais diante da flexibilidade de
ações focadas na diversidade cultural local. Como resultado, prima pela
“construção de uma institucionalidade local, capaz de levar à frente o
projeto coletivo, tendo como base os princípios da cooperação, do
pluralismo político e social e da solidariedade” (ROSA, 2002, p. 3).
Merece destaque, nesse contexto de análise, os níveis (pode haver dois, ou
mais) que funcionam como mediadores da articulação da cooperação. Entre eles: o
nível formal acontece, por exemplo, diante da criação de um conselho, comitê, fórum
ou ponto de encontro para o emprego e o desenvolvimento. O vel informal:
compreende diversos canais que além de “articular”, auxilia outros canais menos
institucionais, mas não menos importante, como: ciclos de conferências e debates,
campanhas nos meios de comunicação, reuniões informais de líderes locais, entre
outros (ROSA, 2002).
Na seção seguinte, discutem-se alguns aspectos teóricos que corroboram
com as principais idéias que fundamentam a concepção de “instituição” em seus
59
diferentes enfoques. Designada como um dos mais fortes indicadores de política de
desenvolvimento local, a perspectiva institucional pode criar estruturas empenhadas
não apenas na “manutenção”, mas também no “desenho” e na “renovação” das
instituições sociopolíticas.
2.3.4 Instituições
Reconhecer os aspectos conceituais e a relevância do desenho institucional
se torna importante, o apenas para a ampliação da participação política, como
também para o fortalecimento da sociedade civil local e, conseqüentemente,
implementação do projeto de desenvolvimento local sustentável.
Numa abordagem sociológica, o conceito de instituição significa “complexo
de idéias, padrões de comportamento e de outras formas sociais conservadas por
tradição” (MAIO JR; PASTOR, 1997, p. 511).
Alguns aspectos teóricos que caracterizaram as contribuições da perspectiva
institucional, no antigo modelo, são registrados mais especificamente, a partir da
década de 50 e relançadas na metade dos anos 70. Estudos de Carvalho; Lopes;
Vieira (1999), em artigo intitulado Contribuições da perspectiva institucional para
análise das organizações”- ANPAD, analisam a partir das contribuições de Selznick
(1957), que processo designado como “processo de institucionalização” pode ser
resumido apenas em um aspecto: os valores substituem os fatores cnicos na
determinação das tarefas organizativas.
No embate teórico, os autores deixam clara, a diferença existente entre a
“concepção racionalista” defendida por Hodgson (1994), e a concepção da
“racionalidade limitada” proposta por Simon (1987). A primeira, afirma que a ação
está subordinada à razão e que, portanto, todas as ações são racionais e dirigidas a
lograr objetivos definidos. A segunda defende a ponderação da capacidade
computacional limitada da mente humana. Tais tendências focalizam a compreensão
de três orientações responsáveis no desenvolvimento do enfoque institucional,
distintas: uma econômica, outra política e uma terceira sociológica. É na vertente
sociológica onde se constatam diferenças significativas entre os conceitos de
“instituição” e “processos de institucionalização”. O texto em estudo conta de
60
apontar as mais freqüentes divergências atribuídas aos elementos institucionais que
dividem a perspectiva em três pilares: regulador, normativo e cognitivo.
A versão reguladora da perspectiva institucional dá prioridade a um processo
estrito de regulamentação da ação nas organizações, por ser mais “convencional” no
sentido de ser moderada e se aproximar de uma visão clássica da teoria das
organizações, a qual defende a seguinte idéia: “os atores têm interesses
‘naturais’que perseguem racionalmente” (CARVALHO; LOPES; VIEIRA, 1999). Sob
esta versão volta-se a idéia do indivíduo motivado para atender a seus próprios
interesses numa lógica utilitarista de custo-benefício.
O pilar normativo evidencia os valores e as normas como elementos
institucionais nos quais se apóiam uma grande parte dos primeiros investigadores
institucionalistas como Parsons, Durkheim e Selznick. A proposição normativa tenta
desvendar em quê as opções estruturais assumidas pelas organizações são
derivadas da pressão exercida pelas normas e os valores. Para esta versão, o
desejo preferido do sujeito fica no primeiro plano, o qual corresponde ao conceito de
valores juntamente com a construção de princípios, estruturas e comportamentos
existentes, podendo ser comprovados e avaliados. As normas, por outro lado,
especificam como deveriam ser realizadas as coisas. Definem os meios legítimos
para perseguir os fins desejados (SCOTT, 1995 apud CARVALHO; LOPES; VIEIRA,
1999).
A última visão da perspectiva institucional põe em evidência o “novo
institucionalismo”/cognitivo e os elementos das instituições. Os elementos ficam
centralizados nas normas que compõem a natureza da realidade e o arcabouço
através do qual os significados são construídos. Considera os indivíduos e as
organizações como realidades socialmente construídas, com distintas capacidades e
meios para a ação, e objetivos que variam de acordo com seu contexto institucional.
Assim, o estímulo do ambiente deve ser cognitivamente processado pelos atores,
interpretado pelos indivíduos, empregando sistemas simbólicos socialmente
construídos, antes de reagirem (SCOTT, 1995 apud CARVALHO; LOPES; VIEIRA,
1999).
O presente trabalho prioriza as pressuposições relativas à orientação
sociológica da perspectiva institucional, pois o ideais refletidos na proposta de
desenvolvimento local sustentável. Nesse contexto de análise, Durkheim aparece
como principal influenciador do caráter variável das bases da ordem social. Em
61
trabalhos posteriores o sociólogo se aproxima das proposições básicas do
institucionalismo, destacando o papel exercido pelos sistemas simbólicos, os
sistemas de conhecimento, de crença e a autoridade moral, identificados como
instituições sociais, produtos da interação humana. Contudo, deve-se relevar que o
conceito de “instituição” evoluiu bastante, o que o reitera o valor à contribuição de
Durkheim (SCOTT, 1995 apud CARVALHO; LOPES; VIEIRA, 1999).
Ainda segundo os autores, outra contribuição vem da sociologia do
conhecimento de Berger; Luckmann (1991). A preocupação desses autores,
segundo a análise, se volta para a investigação da natureza e origem da ordem
social. A base de seus argumentos justifica-se no fato da ordem social estar
fundamentada na “construção social da realidade” gerada pela interação com a
natureza. Nessa ótica, surge o novo institucionalismo a partir dos trabalhos de Meyer
(1997), Meyer; Rowan (1992) e de Zucker (1977), apoiados no conceito de
instituição desenvolvidos por Berger; Luckmann, sublinhando o papel das normas
culturais e dos elementos do amplo contexto institucional, como as normas
profissionais e os organismos do estado no processo de institucionalização. Porém,
é bom enfatizar que esta nova orientação não é uma mera maquilagem do velho
institucionalismo senão que contém divergências em vários aspectos. (CARVALHO;
LOPES; VIEIRA, 1999).
O neo-institucionalismo mantém a rejeição do institucionalismo referente às
abordagens de escolha racional, pois reconhece ser imprescindível levar em conta,
para além dos interesses pessoais, as instituições e identidades que influenciam o
comportamento e as atitudes dos atores políticos nos processos de tomada de
decisão. Na prática, os atores políticos estão buscando estratégias apropriadas na
base de regras, obrigações, direitos e papéis institucionalizados. Para os neo-
institucionalistas é preciso discutir uma visão mais ampla do conceito de instituição,
pois a vida é organizada por conjuntos de práticas e significados compartilhados que
são considerados dados por um longo tempo. Ações intencionais e calculadas de
indivíduos e coletividades são inseridas nessas práticas e significados
compartilhados, os quais podem ser chamados de identidades e instituições
(CARVALHO; LOPES; VIEIRA, 1999).
Enfim, o sistema institucional pretendido no estudo tem como objetivo criar
e/ou fortalecer as estruturas encarregadas de promover as políticas de DLS tais
como agências de desenvolvimento, serviços de economia de uma coletividade e
62
estruturas intermunicipais, promovendo, também, a transformação dos serviços
existentes: serviços técnicos das coletividades, serviços do Estado e estruturas
municipais e outros organismos de caráter privado ou não governamental. A
empresa em desenvolvimento social, enquanto sistema social aberto, para promover
mudanças duráveis, integrar os atores do desenvolvimento e implantar projetos
coletivos precisa criar as condições de aprendizagem e difundir uma cultura
democrática. Desse modo, tem o propósito de substituir um sistema que concede
pouco lugar à mobilização social e que possui um alto grau de institucionalização da
representação e da consulta que confere aos eleitos uma excepcional legitimidade e
um alto grau de participação dos cidadãos no sistema político (BRITO; VIEIRA,
2006).
2.4 CULTURA
Ao iniciar discussões sobre a concepção de cultura numa perspectiva
antropológica Laraia (1993) mostra haver controvérsias de opiniões entre a
conciliação biológica e a grande diversidade cultural da espécie. Porém, reconhece
que o conceito de Cultura como é utilizado atualmente foi definido pela primeira vez
por Edward Tylor (1832-1917), que conseguiu resumir apenas no vocábulo inglês
Culture o termo germânico Kultur e o termo francês Civilization. O significado
etnográfico de Culture é todo complexo e inclui conhecimentos, crenças, arte, moral,
leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem
como membro de uma sociedade. Ao estabelecer essa concepção Taylor reuniu em
uma só palavra todas as possibilidades de realização humana, além de marcar
fortemente o caráter de aprendizado da cultura em oposição à idéia de aquisição
inata, transmitida por mecanismos biológicos (LARAIA, 1993).
Santos (1994) apresenta duas concepções básicas de cultura. A primeira,
remete a todos os aspectos de uma realidade social. Assim, cultura nesse sentido,
diz respeito a tudo aquilo que caracteriza a existência social de um povo ou nação,
ou então de grupos no interior de uma sociedade. Pode-se falar na cultura francesa
ou na cultura xavante, cultura camponesa ou então na cultura dos astecas. Nesses
casos, cultura refere-se a realidades sociais bem distintas. A segunda refere-se mais
63
especificamente ao conhecimento, às idéias e crenças de um povo. Nessa
compreensão uma ênfase maior ao conhecimento e dimensões associadas.
Nesse caso, a cultura diz respeito a uma esfera, a um domínio da vida social.
Enquanto construção histórica, a cultura é um produto coletivo da vida
humana. Isso se aplica não apenas à sua percepção, mas também à sua relevância,
à importância que passa a ter. É um território bem atual das lutas sociais por um
destino melhor. É uma realidade e uma concepção que precisam ser apropriadas em
favor do progresso social e da liberdade, em favor da luta contra a exploração de
uma parte da sociedade por outra. Em favor da superação da opressão e da
desigualdade (SANTOS, 1994).
Para Geertz (1989, p. 52) cultura significa:
Um sistema de concepções herdadas, expressas em formas simbólicas,
através das quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem os
seus conhecimentos e suas atividades em relação à vida. Cultura é a
representação intelectual, artística e moral de um povo ou, mais
amplamente, de uma civilização. Ela pode ser compreendida no processo
de seu desenvolvimento histórico ou num período delimitado de sua história.
Reconhecer a importância do processo de simbolização no estudo da cultura
é fundamental. A ela é delegado o direito de permitir que o conhecimento seja
conciso, que as informações sejam processadas, que a experiência acumulada seja
transmitida e transformada. No entanto, Santos (1994) tece críticas quanto ao fato
de não haver muito entusiasmo diante das oportunidades oferecidas pela
simbolização, “a ponto de saírem por localizando significados ocultos em cada
prática cultural, em cada elemento da cultura, em cada produto cultural” (SANTOS,
1994, p. 42). São questões que podem atrapalhar, ao invés de contribuir com uma
análise mais profunda de uma sociedade.
A compreensão dos elementos que implicam no processo do significado de
cultura, muito contribui quando se entende, principalmente, os enigmas culturais da
Amazônia. Os significados, os segredos guardados em cada narrativa do indígena,
do caboclo, do ribeirinho, dos rios, florestas, aldeias, vilas e cidades ribeirinhas
caracterizam uma cultura profundamente identificada com a natureza. Esta, ao
mesmo tempo em que oportuniza ao habitante da região explicar e justificar o mundo
64
criado pelo seu imaginário privilegia a criação de dois grandes espaços sociais
tradicionais com características definidas, porém unidos através de forte articulação
mútua. A urbana, onde existem trocas simbólicas intensas, com outras culturas
diversas e a rural, especialmente a do ribeirinho. Nessa, a cultura se mantém e
permanece mais apoiada às tradições e conservação dos valores decorrentes de
sua história (SILVA, 2005).
Silva (2005, p. 17) ao abordar a temática “Boi-Bumbá de Parintins: arte e
significação” reconhece a essência de uma cultura que luta para se preservar,
quando:
Rica de plasticidade e inocente magia, a natureza amazônica se revela
como pertencente a uma idade mítica, plena de liberdade e energia telúrica.
Situa-se em um tempo cósmico no qual tudo brota como nas fontes
primevas da criação: a mata, os rios, as aves, os peixes, os animais, o
homem, o mito, os deuses. Entendemos que a cultura nascida em tal
contexto, no plano imaginal, apresente uma atmosfera que a aproxima das
chamadas culturas míticas ou de origens.
Essa maneira de caracterizar a região Amazônica muito impressionou e
continua impressionando civilizações distantes. A presença da mitologia contribui no
desvelamento de um mundo encantado, propiciando uma linguagem própria da
fábula que “flui como produto de uma faculdade natural, levada pelos sentidos,
imaginação e descoberta” (SILVA, 2005 p. 48). Conhecer alguns personagens que
povoam esse mundo imaginário e sobrenatural é propósito da autora, pois:
A Boúna ou cobra grande, surge das trevas, atrai pessoas, que fascinadas
tentando se aproximar dela podem morrer afogadas. As Anhangás, almas
demoníacas, povoam as águas. Aqui vive Poromina-minari, um herói
transgressor, sem princípios morais, que tem como objetivo de vida, a
satisfação dos instintos primários humanos: comer, satisfazer os instintos
sexuais, etc. A mãe d’água metade peixe, metade mulher, cabelos longos,
rosto lindíssimo, voz maravilhosa, atrai, irresistivelmente, aqueles que a
ouvem, para o fundo dos rios. O jurupari, herói do Alto Rio Negro para os
indígenas e demônio para os missionários católicos, à época do Brasil
Colônia.
65
Um momento oportuno para entender o significado dessas figuras lendárias
com seus respectivos rituais se faz presente no evento do boi-bumbá da Parintins.
Todo ano observam-se inovações propiciadas por pesquisas que buscam valorizar
as raízes indígenas e caboclas nos mitos, nas expressões artísticas e na visualidade
que caracteriza suas produções. É nessa realidade e nesse contexto que o habitante
da região recorre para explicar o mundo criado pelo seu imaginário (SILVA, 2005).
A cultura pode ser reconhecida como doadora aos grupos e as nações de
um referencial que permite aos homens atribuir um sentido ao mundo no qual vivem
e às suas próprias ações. Assim, designa, classifica, corrige, liga e coloca em ordem.
Enquanto sistema de símbolos e significados compartilhados, serve como
mecanismo de controle. Nessa perspectiva as ações simbólicas necessitam ser
interpretadas, lidas ou decifradas para que sejam entendidas (MOTTA; CALDAS,
1997).
Numa abordagem antropológica cultural constata-se em Sathe (apud
FREITAS, 1991) duas correntes principais: a Adaptacionista, que defende a cultura
como algo que é diretamente observável nos membros de uma comunidade. Isto é,
seus padrões de comportamento, discurso e uso de objetos materiais. E os
defensores da escola Ideational os quais, definem a cultura como algo que é
compartilhado na mente dos membros da comunidade, tal como crenças, valores e
idéias que as pessoas sustentam em comum.
As contribuições de Freitas (1991), se tornam importantes por ampliar
diversos conceitos em diferentes abordagens apresentadas com os respectivos
fundamentos de atuação. Entre elas estão: a Antropologia Cognitivista voltada para
os conhecimentos compartilhados; a Antropologia Simbólica voltada para os
significados compartilhados; a Antropologia Estrutural, baseada nos processos
psicológicos inconscientes.
Mesmo reconhecendo o valor das diversas abordagens presentes no estudo
sobre cultura, constata-se na visão de Freitas (1991); Motta (1997); Morgan (1996, p.
117) a concisão das idéias discutidas, pois,
[...] cultura refere-se tipicamente ao padrão de desenvolvimento refletido nos
sistemas sociais de conhecimento, ideologia, valores, leis e rituais
quotidianos, podendo a palavra também ser usada para fazer referência a
um grau de refinamento evidente em tais sistemas de crenças e práticas.
66
Por entender que os fatos sociais não podem ser entendidos isoladamente,
principalmente quando se busca entender a percepção de um grupo de pessoas
sobre determinado fenômeno cultural, a riqueza das diversas concepções discutidas
por autores selecionados permitiu identificar melhor a realidade que se propôs
analisar.
2.5 CULTURA BRASILEIRA
Muitas as são obras de autores brasileiros, que resgatam os valores
remanescentes da cultura brasileira. Enquanto alguns se empenham em evidenciar
conteúdos do modo de ser e viver da população brasileira, outros buscam estilos
diferentes e começam a inferir conotações interessantes, principalmente nas
observadas no contexto das literaturas administrativas. É o que se pode observar no
artigo de Carvalho; Leitão (1999), intitulado “Organizações de aprendizagem:
resistências culturais”.
Os argumentos presentes no referido artigo partem de uma análise da
natureza fenomenológica das características comuns ao conceito de Aprendizagem
Organizacional (AO) somando-se a essa discussão, um modelo de categorias
culturais de caráter genérico e metafórico, desenvolvido por Handy (1994), e de um
modelo de ação cultural brasileiro, proposto por Prates; Barros (1997 apud
CARVALHO; LEITÃO, 1999).
Após várias pesquisas, os autores reconhecem que os principais traços
culturais presentes nas empresas brasileiras segundo Prates; Barros são:
“concentração de poder, flexibilidade, paternalismo, lealdade às pessoas,
personalismo, impunidade, tendências a evitar conflito, postura de espectador e
formalismo” (PRATES; BARROS, 1997 apud CARVALHO; LEITÃO, 1999, p.26).
Na análise que Hofstede (apud MOTTA, 1997) faz das diferenças entre
culturas nacionais nos valores relacionados ao trabalho, o Brasil se apresenta com
grande distância de poder, traço relacionado à hierarquização social. As origens
patriarcais brasileiras geraram o hábito da obediência irrestrita a uma minoria social,
67
a aceitação da estratificação por cor, dinheiro ou nome de família. Concentração e
estratificação têm, certamente, implicações na geração e posse do conhecimento e
se contrapõem a um ambiente de valores democráticos e liberais que não restrinjam
a informação, a pesquisa e a criatividade. Nesse contexto, indivíduos das camadas
inferiores da organização tendem a não se sentirem estimulados a produzir novos
conhecimentos, reproduzindo o estabelecido. Hofstede considera o país com grande
necessidade de evitar incertezas, traço relacionado ao formalismo, e novo
conhecimento gera situação de ambigüidade, frente ao conhecimento estabelecido.
(CARVALHO; LEITÃO, 1999).
A análise cultural que aborda as principais características de uma
organização de aprendizagem são as seguintes: geração de conhecimento;
transferência eficiente de conhecimento através da organização; transformação do
conhecimento em resultados práticos; comprometimento das lideranças; existência
de objetivos verdadeiramente coletivos; avaliação e refino constantes dos modelos
mentais; posicionamento positivo frente aos fracassos e erros; coexistência
harmoniosa e produtiva de opiniões distintas; clima de abertura e valorização da
verdade; padronização e homogeneização dos meios de comunicação; consistência
objetiva das premissas; autocrítica e humildade; busca de visões alternativas;
aprendizado em grupo.
O presente trabalho entende que a cultura é um conjunto complexo e
dinâmico de elementos materiais e simbólicos compartilhados, do ponto de vista
intelectual e psicológico, e que orientam a ação humana num contexto histórico e
geográfico.
No Brasil, vários estudos clássicos (CUNHA, 1995; FREIRE, 1995;
HOLANDA, 1994; FAORO, 1989; FERNANDES, 1987; PRADO JÚNIOR, 1987)
foram elaborados no sentido de mapear traços da cultura brasileira.
Na realidade, esse conjunto de fatores ilustra um dos fascinantes lugares de
tensa e intensa troca cultural, tão característicos da cultura brasileira. Enquanto
frutos da constituição histórica podem ou não emergir nas diversas especificidades
locais do país. É importante também registrar que no século XX a cultura deixa de
ser uma área de desenvolvimento espontâneo de enriquecimento do espírito, para
se tornar mais um setor que tem que "se sustentar", como "negócios privados" (WU,
2006). Nesse sentido, reconhecer cada característica do processo é importante
68
principalmente quando se pretende analisar com base nesses pressupostos, os
principais elementos identificadores de sustentação da proposta do DLS.
Traço Características-chave
1.Hierarquia
Autoritarismo. Tendência à centralização do p
oder dentro dos grupos
sociais. Distanciamento nas relações entre diferentes grupos sociais
(FAORO, 1989).
2.Personalismo
Sociedade baseada em relações afetivas. Paternalismo: domínio moral e
econômico. Mistura do público com o privado
(HOLANDA, 1994).
3.Malandragem
Flexibilidade e adaptabilidade como meio de navegação social. “Jeitinho”
(HOLANDA, 1994).
4.Sensualismo
Gosto pelo exótico e sensual nas relações (FREIRE, 1995).
5.Conservador
Elite burguesa promove mudança para não mudar a situação e o
cons
eqüente processo de acumulação (FERNANDES, 1987; PRADO
JÚNIOR, 1987).
6.Religiosidade
Indivíduo busca solução para o problema amparado por uma entidade
metafísica e religiosa. Sincretismo religioso. Mistura entre o profano e o
sagrado (
CUNHA, 1995).
Quadro 1 - Sinalizações de Traços da Cultura Brasileira.
Fonte: Adaptado de Freitas In Motta e Caldas, 1997, p.44.
2.6 CULTURA ORGANIZACIONAL
Quando se discute o conceito de Cultura Organizacional reflete-se de
imediato na mudança de paradigma difundido praticamente na década de 80 e
adaptado no contexto das empresas que buscam sobreviver no complexo mercado
global. As justificativas são várias, mas pontos relevantes se repetem em várias
abordagens, como os evidentes em estudos empíricos que detectam que as
organizações são possuidoras de uma cultura singular “que a faz única e lhes
uma identidade diferencial” (DIAS, 2003 p. 37).
Na opinião de Freitas (1991), a Cultura Organizacional representa um
poderoso mecanismo que visa conformar condutas, homogeneizar maneira de
pensar e viver a organização. Introjetar uma imagem positiva da mesma, onde todos
são iguais, escamoteando as diferenças e anulando a reflexão. Para a autora o
constante interesse pelo estudo da cultura organizacional surgiu com o súbito
declínio da produtividade americana e o ganho de competitividade dos japoneses.
Aparecendo assim a cultura japonesa como mais homogênea e possuidora de
69
valores bem cultivados que enfoca a obediência, o trabalho em equipe, o
compartilhar, dentre outros.
Nesse sentido, Nonaka;Takeuchi (1997) buscam uma definição de cultura
decorrente de uma visão compartilhada das relações humanas subsidiadas na
compreensão orgânica e coletiva. É justamente dentro dessa visão orgânica de
mundo que os japoneses enfatizam o conhecimento subjetivo e a inteligência
intuitiva. Essa lógica se completa diante do estudo da cultura organizacional. De
abordagem humanista, a cultura japonesa promove o compartilhamento de valores
entre os colaboradores, determinando, assim, “a cultura empresarial”, que é
responsável por determinar sua forma de pensar, compreendida no seguinte fator
comportamental: “ter experiências compartilhadas suficientes”. A cultura nesse
contexto é um produto aprendido e uma experiência coletiva.
Schein (apud FREITAS, 1991) vislumbra a cultura como um aprendizado
coletivo ou compartilhado, que uma unidade social ou qualquer grupo desenvolve
enquanto sua capacidade para fazer face ao ambiente externo e lidar com suas
questões internas. O autor aponta dois mecanismos interativos que a cultura é
aprendida: a redução da dor e ansiedade e o reforço/ recompensa positivos. O
primeiro mecanismo diz respeito à ansiedade derivada da incerteza que uma pessoa
tem ao encontrar um grupo novo, a respeito de sua capacidade de sobreviver e ser
produtivo ou se os membros irão trabalhar bem uns com os outros. A incerteza
social e cognitiva é traumática, tornando assim suas vidas mais previsíveis. O
problema com este mecanismo de aprendizagem reside no fato dos indivíduos
aprenderem a evitar situações penosas, e continuarem a perseguir este curso sem
testar se o perigo realmente existe. No segundo mecanismo, as pessoas repetem o
que funciona e abandonam o que não funciona. Nesse tipo de mecanismo as
respostas produzidas estão sendo testadas continuamente no ambiente, o que
permite maior rapidez de adaptação. No entanto, pode originar um comportamento
resistente à mudança se o ambiente for inconsciente, produzindo sucesso em um
momento e fracasso em outro.
Essa compreensão se resume nos argumentos de Schein (apud FLEURY
1996, p. 24) quando reconhecem que:
70
A cultura é formada pelo conjunto de pressupostos básicos que um grupo
inventou, descobriu ou desenvolveu, ao aprender a lidar com os problemas
de adaptação externa e integração interna e que funcionaram bem o
suficiente para serem considerados válidos e ensinados a novos membros
como a forma correta de perceber, pensar sentir com relação a esses
problemas.
De acordo com esse pressuposto três fatores que completam essa
concepção, a saber: o problema da socialização, o do comportamento e do
questionamento do autor em saber se uma grande organização pode ter uma cultura.
Todos esses fatores trazem informações precisas do modo de ser e entender os
pressupostos da cultura organizacional. Evidenciam-se vantagens para grupos que
conseguem compartilhar e interagir conhecimentos dos seus novos membros com
os antigos. O que ocorre nesse jogo é a construção de uma cultura solidificada na
criatividade, fator chave de sucesso e competitividade no mercado. Por outro lado, a
cultura nesse contexto pode ser analisada também, “como um mecanismo de
controle social e pode ser base de manipulação explícita dos membros de um grupo
para perceberem, pensarem e sentirem de certa maneira” (DIAS, 2003, p.46).
Ao discutir a temática Cook e Yanow (1996 apud BITENCOURT, 1995)
destacam que as organizações vistas como culturas devem ser entendidas como
aprendendo através de atividades que envolvem traços culturais. Associa-se,
portanto, cultura a aprendizado, implicando aquisição, preservação ou mudança das
habilidades da empresa para fazer o que faz. “Cabe, então, examinar a fase dialética
do aprendizado cultural em que podem surgir as resistências às conjeturas” (SENGE,
2006, p. 168).
O conceito emergente lançado por Senge (2006) abre espaço para
importantes transformações nos indivíduos e empresas, estimulando o
autoconhecimento, a verdade, o desprendimento e a humildade, traços raros no
mundo dos negócios, que sofre hoje de graves problemas éticos (CARVALHO;
LEITÃO, 1999). Para os autores, o conceito de cultura organizacional, mais bem
estabelecido na administração, “é por sua vez, central nos processos de mudança,
constituindo, quase sempre, fonte de resistência às estratégias que alterem
comportamentos” (CARVALHO; LEITÃO, 1999, p. 26).
Nesse sentido, existem os elementos da cultura organizacional que
funcionam como fortes instrumentos de apoio na interpretação, tanto na resolução
71
dos problemas, como, no desenrolar das atividades cotidianas dos membros de uma
organização, de acordo com seus pressupostos básicos e valores fundamentais
aceitos. Para o autor, os principais elementos configuradores da cultura
organizacional são os seguintes: a) Valores, b) Crenças e pressupostos, c) Ritos,
rituais e cerimônias, d) Estórias e mitos, e) Tabus, e) Heróis, f) Normas e
Comunicação. A seguir, apresenta-se uma síntese de cada concepção de acordo
com a ordem dos elementos especificados neste parágrafo.
a) Valores - representam a essência da filosofia de ação da organização
para alcance do sucesso, eles fornecem um senso de direção comum
para todos os empregados. Assim, os valores tornam-se pontos-chave de
tomada de decisão, por fazer referências às pessoas, em que uma tarefa
desempenha não se limita apenas no significado, mas também no valor.
O que ela está fazendo não somente é possível, mas também correto,
certo e importante (DIAS, 2003).
b) Crenças e pressupostos - se relacionam sobre a “verdade” na
organização e atendem a uma necessidade humana de consistência e
ordem. Tornam estável a vida do grupo como uma defesa contra a
ansiedade derivada da incerteza e confusão. Sendo assim, reconhece a
importância dos impactos e das vantagens causados pela crença, pois
além de permitir desenvolver a consciência de pertença no interior da
organização, fornecendo ao empregado o convencimento de fazer parte
do desenvolvimento da visão da empresa, aproveita-se desse
comportamento como sinônimo de vantagens para ela. No que diz
respeito às categorias de pressupostos, estão assim classificados:
natureza dos relacionamentos, natureza humana, natureza da ‘verdade’,
ambiente e universalismo/particularismo (DIAS, 2003).
c) Os ritos, rituais e cerimônias - estão compreendidos da seguinte forma:
ritos é o conjunto de atividades planejadas que consolidam várias
formas de expressões culturais num só evento executado através de
interações sociais, geralmente dramáticos, para benefício de uma
audiência; ritual entende-se como conjunto detalhado e padronizado de
técnicas e comportamentos que lida com as ansiedades, mas que
freqüentemente produz conseqüências intencionais de maneira prática.
Cerimônias designadas como momentos especiais nos quais se
72
reforçam valores específicos, criam possibilidades entre as pessoas para
compartilhar entendimentos importantes e podem celebrar heróis e
heroínas que simbolizam admiráveis crenças e atividades organizacionais
(DIAS, 2003).
Dentre os tipos de ritos mais comuns, encontram-se: 1) Passagem –
facilitar mudança de status; 2) Degradação dissolver identidades sociais
e retirar seu poder; 3) Reforço celebração pública de resultados
positivos; 4) Renovação renovar as estruturas sociais e aperfeiçoar seu
funcionamento; 5) Redução de conflitos restaurar equilíbrio em relações
sociais perturbadas; e 6) Integração encorajar sentimentos comuns e
manter as pessoas comprometidas com o sistema social.
d) Estórias e Mitos “estórias” são narrativas baseadas em eventos
ocorridos, que informam sobre a organização, reforçam comportamento
existente e enfatizam como este se ajusta ao ambiente organizacional.
Nas estórias presença de algumas funções designadas para funcionar
como mapas para auxiliar os indivíduos a saberem como as coisas são
feitas por determinado grupo; como símbolos obter coesão para
assegurar que os diversos indivíduos cooperem para o bem de todos;
como scripts dizer quais os comportamentos e atitudes são aceitáveis.
Mitos - são estórias consistentes com os valores da organização, porém
não sustentados pelos fatos.
e) Tabus - orientam comportamento e demarcam áreas de proibições.
Trata-se de temas delicados para a organização, pois não podem ser
citados. Lugares que não podem ser freqüentados por algum grupo social,
por exemplo; nomes de pessoas que não podem ser ditos, entre outros.
Assim, assumem um papel de demarcar limites culturais, apontando
determinadas ações ou temas não utilizados como argumentos ou
modelos para a resolução de problemas (DIAS, 2003).
f) Heróis personificam os valores e condensam a força da organização.
Têm coragem e persistência de fazer aquilo que todos almejam, porém
não o tentam por medo. São pessoas intuitivas, têm visão, fazem seu
próprio tempo, apreciam cerimônias, são experimentadores. Apresentam
as seguintes funções: tornam o sucesso atingível e humano; fornecem
modelos; simbolizam a organização para o mundo exterior; preservam o
73
que a organização tem de especial e estabelecem padrões de
desempenho, motivam os funcionários fornecendo influência duradoura
(DIAS, 2003).
g) Normas - é o comportamento sancionado, através do qual as pessoas são
recompensadas ou punidas, confrontadas ou encorajadas, ou ainda
isoladas quando violam as regras estabelecidas (DIAS, 2003).
h) Comunicação - interação social mediante a troca de mensagens -
transações simbólicas significativas através de verbalizações,
vocalizações e comportamentos não-verbais que possibilitam a criação,
sustentação, transmissão e mudança da cultura organizacional. O sistema
de comunicação possui agentes da rede de comunicação, assim
representados: contadores de estórias - interpretam o que ocorre na
organização ajustando os fatos à sua própria percepção; padres -
guardiões dos valores culturais, falam por analogias; confidentes
detentores de poder por construir um vasto sistema de contatos;
fofoqueiros promovem entretenimentos; espiões mantêm os chefes
informados; e os conspiradores grupos que se reúnem secretamente
com o objetivo de promoção (DIAS, 2003).
Para Morgan (1996 p 117):
O sucesso das organizações esta intimamente ligado ao contexto cultural no
qual elas evoluíram. Que as organizações são um conjunto de miniculturas
podendo ela atuar em conjunto como uma família ou individualmente,
devido a um sistema de valores que competem entre si criando um mosaico
de realidades organizacionais ao invés de uma cultura corporativa uniforme.
As pressuposições de Aktouf (2007) divergem de algumas concepções
discutidas acima por duas razões que se completam: a primeira, pela própria
ousadia de se pretender esgotar o conceito de cultura, pois não existe uma
unanimidade de opiniões nem mesmo nas disciplinas seriamente ligadas a temática,
como: a etnologia, a antropologia e a sociologia. A segunda, pelo fato das distorções
presente no conceito de “cultura de empresa” quando analisada a partir da influência
da “corrente predominante”. Nesse contexto “cultura de empresa” emerge de
74
intenções e imposições arraigadas a “valores e identidades teleguiados, talvez pré-
fabricados, ou [...] receitas para ensinar a (pré) fabricar uma “boa” ou “forte” cultura
de empresa” (AKTOUF, 2007, p. 46).
À luz dos pressupostos da concepção antropológica de cultura (AKTOUF,
2007, p. 49) assim a entende:
A cultura é um conjunto complexo e multidimensional de praticamente tudo
o que constitui a vida em comum nos grupos sociais. [...] nesse sentido, a
cultura implica uma interdependência entre história, estrutura social,
condições de vida e experiências subjetivas das pessoas.
Nesse contexto de análise, as implicações perpassadas no conceito de
cultura são indissociáveis das idéias que tratam da estrutura social, ou seja,
(sistemas de posicionamento na sociedade, regulamentos que disciplinam as
interações). O que é sua história, seu desenvolvimento, seu futuro (inscritos na
memória e na evolução das pessoas e de suas relações em si), do que constitui a
experiência vivida dos membros dessa sociedade (sendo que esta experiência vivida
influencia, por vez, as condutas e as relações sociais) (GODELIER, 1969, 1973;
VALLÉE, 1985; CONDOMINAS, 1980, 1985 apud AKTOUF, 2007).
Essa compreensão fica mais evidente na contribuição de (GOLDELIER,
1969, 1973 apud AKTOUF, 2007, p. 51) quando entendem, a partir da visão de Marx
e Engels:
Toda comunidade humana é submetida, na sua constituição como
sociedade, a uma dialética fundamental que se estabelece entre três veis
ou sistemas: o sistema de produção de bens materiais (economia, trocas,
bens e mercadorias, técnicas, ciências etc.), o sistema de produção e bens
sociais (regulamentos, leis, costumes, normas etc.) e o sistema de produção
de bens imateriais (magia, religiões, símbolos, crenças etc).
Entendida nesse contexto complexo que a constitui enquanto saberes, a
crença, a arte, fica impossível separar o conceito de cultura das idéias e das
representações daquilo que compõe a vida social, articulada em torno da maneira
como estão distribuídos os status, os papéis relativos às diversas situações sociais e
75
as relações de produção estabelecidas em torno das atividades econômicas. “Por
este processo infra-estrutura e superestrutura se intercomunicam” (AKTOUF, 2007,
p.51).
Sendo assim, é preciso esclarecer como ocorre a articulação entre vida
concreta e vida representativa, como forma de minimizar as dificuldades no
estabelecimento da ligação entre materialidade e imaterialidade, pois na visão de
(GOLDELIER, 1969, 1973 apud AKTOUF, 2007, p. 51):
A única concepção do existencial inteligível ao homem é a sua própria
concepção; assim, não é de admirar que, para dar um significado, talvez
mesmo uma explicação ao universo (natural e social) do desconhecido e do
complexo, ele proceda por analogias com sua própria realidade concreta.
Mesmo admitindo que a cultura seja construída por meio de interação, e que
os gerentes têm um papel no estabelecimento das condições dessa interação, existe
um viés de manipulação nessa situação que faz crer que a cultura possa ser alguma
coisa diferente da realidade vivida, espontânea, subjetiva dos indivíduos. Que ela
possa ser alguma coisa diferente da relação deles com suas condições de existência,
para ser alguma coisa que possa ser decretada e mudada a vontade (AKTOUF
,
2007)
.
Para Malinowski (apud AKTOUF, 2007, p. 52):
Quer se considere uma cultura muito simples ou muito primitiva, ou, pelo
contrário, uma cultura complexa, muito evoluída, estamos tratando com um
vasto aparelho que é, em parte, material e, em parte, humano, e, ainda por
uma outra parte espiritual; esse aparelho permite ao homem enfrentar os
problemas precisos e concretos com que ele se defronta (...); a cooperação
faz parte da própria essência de qualquer obra cultural (...); o substrato
material da cultura deve-se renovar, ele deve ser conservado em estado de
bom funcionamento.
Os ideais presentes no modo de conceber a “cultura de empresa” na visão
de (AKTOUF, 2007), não se limitada a interesses repentinos como, valorização do
produto, da imagem e, sobretudo, do esforço contínuo em direção da “qualidade”. Ao
mesmo tempo em que reconhece os fatores críticos e históricos da adoção do novo
76
modelo, questiona os seguintes impactos: A) fracasso do modelo das relações
humanas e das motivações que, como fica aprovado através do sucesso do
enriquecimento das tarefas e dos círculos de qualidade, mostraram sua capacidade
intrínseca de resolver o problema fundamental: fazer com que dirigentes e dirigidos
se tornem realmente parceiros. B) fracasso do “modelo racional” e do
comportamento “científico” das organizações, notadamente em virtude da inibição do
potencial humano devido ao seu “fechamento” em especializações/divisões de
trabalho praticamente paralisantes, da pilhagem dos recursos de Planeta, da
poluição e do desperdício. C) enfim, o desejo, como quer a fórmula de Peters e
Waterman, de fazer emergir “campeões” e “embaixadores” de todos os lados da
empresa, para suscitar em cada um a procura de um ideal de si mesmo, na
organização e através da organização, isto é, na sua “qualidade”.
Com base nas discussões de Aktouf (1996), a “cultura de empresa” está
relacionada a cumprimento de princípios para se atingir determinado resultado. É
uma concepção idealizada pelos japoneses, cuja estratégia se propunha transformar
a empresa num lugar de cumplicidade ativa, onde cada empregado se sentiria como
um “embaixador”. Acreditou-se que este processo poderia se converter em
ferramentas de gestão, por meio das quais seria possível construir uma “gestão
simbólica” ou uma “gestão cultural da empresa”.
Contudo, para que se chegue a uma situação de compartilhamento, isto é, a
uma situação que reine uma “cultura” de comunhão de objetivos, de convergência,
de solidariedade e de cumplicidade ativa, é preciso bem mais do que hábeis
cerimônias, belos discursos e repetições de rituais de credo e valores escolhidos
pelos altos dirigentes. É inevitável que haja condições concretas de comunhão, de
transparência, de solidariedade e cumplicidade na vida cotidiana do trabalho. Nesse
processo, cabe aos dirigentes tomarem decisões favoráveis a sua instauração. “Os
valores, as atitudes, comportamentos, crenças, símbolos e outros elementos
correspondentes da “cultura” virão depois, se construindo e se consolidando em
torno de fatos e de atos materiais “comunitários”, cotidianamente vividos” (AKTOUF,
1996, p. 135).
Enfim, as questões discutidas ao longo deste capítulo não se propõem a
esgotar a temática em evidência. Ao contrário, foram cuidadosamente selecionadas
com o propósito de evidenciar os impactos verificados no decurso da história do
pensamento econômico brasileiro como parâmetro de compreensão do novo modelo
77
de gestão contemporâneo. O paradigma de desenvolvimento local sustentável.
Desse modo, as mesmas influências que desviaram o sentido de “desenvolvimento”
do seu curso maior; para um modelo racionalista consolidado no capitalismo
industrial, a concepção de cultura também sofreu esses impactos. Acredita-se que
assim procedendo perceber-se-á que a visão do desenvolvimento pensado na
sustentabilidade mantém um perfeito diálogo com a cultura, em que ‘faz agir’, no
sentido de que ela mobiliza e cria solidariedade, ‘dirige’, pois canaliza os
comportamentos. Esta seria, em resumo a resposta ao desempenho econômico
sustentado” (AKTOUF,2007, p. 49).
78
3 METODOLOGIA
A metodologia é uma das fases mais importantes, notadamente quando Gil
(2002); Vieira; Zouain (2006); Triviños (1995), a reconhecem como parte integrante
de um projeto de pesquisa por configurar os passos em que o pesquisador deve
caminhar para orientar a condução da investigação científica. Na visão de Thiollent
(2000, p. 25), a metodologia se preocupa com a “avaliação de técnicas de pesquisa
e com a geração ou a experimentação de novos métodos que remetem aos modos
efetivos de captar e processar informações e resolver diversas categorias de
problemas teóricos e práticas de investigação”. Desse modo, entende-se que são os
métodos enquanto esclarecedores dos procedimentos lógicos, que nortearão o
processo de investigação científica dos fatos da natureza e da sociedade.
Por sua vez, são essas características que tornarão o conhecimento
científico distinto dos demais, sobretudo, por deixar claros os tópicos gerais de
cientificidade. A seguir, se apresentam os principais métodos e procedimentos que
foram utilizados no presente estudo.
3.1 TIPO DE PESQUISA
A presente pesquisa foi desenvolvida a partir de uma abordagem de
natureza qualitativa, pautada na ótica interpretativa e indutiva, pois se pretendeu
privilegiar a concepção dos sujeitos da investigação que atuavam direta e
indiretamente na organização do evento, objetivando identificar a percepção dos
atores sociais internos e externos sobre a influência do fenômeno cultural dos bois-
bumbás para o DLS da cidade de Parintins. Ao discutirem sobre a importância do
método qualitativo Dezeni; Licoln (2006, p. 19) afirmam que:
É uma atividade situada que localiza o observador no mundo. Consiste em
um conjunto de práticas materiais e interpretativas que dão visibilidade ao
mundo. Essas práticas transformam o mundo em uma série de
representações, incluindo as notas de campo, as entrevistas, as conversas,
as fotografias, as gravações e os lembretes.
79
Para Triviños (1995 p. 128):
A pesquisa qualitativa [...] é essencialmente descritiva. E como as
descrições dos fenômenos estão impregnadas dos significados que o
ambiente lhes outorga, e como aquelas são produto de uma visão subjetiva,
rejeita toda expressão quantitativa, numérica, toda medida. Desta maneira,
a interpretação dos resultados surge como a totalidade de uma especulação
que tem como base a percepção de um fenômeno num contexto. Por isso
não é vazia, mas coerente, lógica e consistente.
Esse tipo de análise garantiu a riqueza dos dados, pois corroborou na
interpretação da investigação em sua totalidade, o que facilitou a exploração das
contradições e paradoxos presente nos discursos. Para Vieira; Zouain (2006 p. 19),
esse método tem uma importância fundamental à descrição detalhada dos
fenômenos e dos elementos que o envolvem aos depoimentos dos atores sociais
envolvidos, aos discursos, aos significados e aos contextos.
Uma vez que se buscou fazer um levantamento/diagnóstico das condições
socioculturais de dois grupos, aqui denominados de parceiros internos (dirigentes e
apoio técnico das Associações Folclóricas) e os parceiros externos (patrocinadores e
alguns representantes da comunidade local), a pesquisa se caracterizou também
como descritiva visando a identificar a percepção dos sujeitos acerca do fenômeno
cultural em estudo.
Para Roesch (2006, p. 137) “esse tipo de pesquisa busca informações
necessárias para a ação ou predição. [...] não respondem bem ao por que, embora
possam associar certos resultados a grupos de respondentes”. Somam-se a esses
fatores algumas vantagens já que descrevem as características de determinada
população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis (GIL,
1999). Nessa perspectiva elegeu-se a pesquisa explicativa para dar suporte ao
referido estudo quando da percepção dos atores sociais em um fenômeno cultural.
Raupp; Beuren (2003), ao abordarem sobre esse tipo de pesquisa, afirmam que ela
possui um grau de maturidade e detalhamento ao responder à questão-problema, o
que não ocorre na pesquisa exploratória. Esse quadro favoreceu a viabilidade da
investigação e a seleção, entre outros, de recursos de entrevista como: filmadora,
DVD, máquina fotográfica e gravador.
80
Quanto aos métodos de procedimentos de coleta de dados foram priorizados
o método observacional e o estudo de caso. O primeiro foi empregado em todos os
estágios da pesquisa, desde os primeiros contatos com o universo a ser investigado,
incluindo as fases das coletas de dados e as aplicações dos instrumentos de
pesquisa. Por ser um todo que apresenta um alto grau de precisão, geralmente é
utilizado nas ciências sociais, o que possibilita Gil (1999, p. 34) “ao pesquisador
observar de forma coerente o desencadeamento dos fatos no campo de análise”.
o segundo, justifica-se dado ao foco da investigação voltar-se especificamente para
identificar a percepção dos atores sociais internos e externos sobre a influência do
fenômeno cultural dos bois-bumbás para o DLS da cidade de Parintins.
O estudo de caso permitiu o apenas resgatar os valores da cultura da
comunidade, como também o contato com as pessoas envolvidas, viabilizando uma
coerente interação com o objeto de estudo. Na opinião de Roesch (2006, p.155),
essa “estratégia de pesquisa busca examinar um fenômeno contemporâneo dentro
de seu contexto”. Para Gil (1999, p. 72) o estudo de caso “caracteriza-se dado ao
exaustivo e profundo estudo de um, ou de poucos objetos, de maneira a permitir o
seu conhecimento amplo e detalhado, tarefa praticamente impossível mediante a
outros tipos de delineamentos considerados”.
Como pré-requisito básico de investigação de apoio à descrição da história
da evolução dos Bumbás, dos aspectos socioeconômicos dos agentes sociais
envolvidos no evento e da própria característica administrativa das Organizações
dos Bumbás, priorizou-se a análise documental existente nas associações
responsáveis pelo evento na cidade, na Coordenadoria do Turismo da Prefeitura e
nas bibliotecas. Nesse aspecto Gil (2002) enfatiza que na pesquisa documental
podem-se verificar fatos passados que sejam úteis, não apenas como registro de
memórias, mas também para visualizar tendências futuras.
A pesquisa adotou um levantamento de fontes de referências ao longo da
execução das investigações e coleta de dados. Ao discutir sobre esse tipo de
pesquisa (GIL, 1999) entende ser a investigação bibliográfica aquela desenvolvida a
partir de material elaborado, constituído principalmente de livros e artigos
científicos. São critérios apontados como vantagens, fato de permitir ao investigador
maior acesso e apoio a uma diversidade de fenômenos além do que poderia
pesquisar diretamente. Isso implica em maior flexibilidade e alternativa na busca de
fontes para atender aos objetivos da pesquisa (GIL, 1999).
81
3.2 ÁREA DE ABRANGÊNCIA DA PESQUISA
De acordo com Vieira; Zouain (2006), o universo e amostra da pesquisa são
fatores importantes que precisam de um cuidado especial. Por se tratar de uma
pesquisa social com abordagem qualitativa, a área de abrangência do presente
estudo limitou-se na organização do evento, visto que houve a preocupação em
selecionar apenas um grupo de pessoas visando obter amostras representativas dos
envolvidos diretos (parceiros internos: dirigentes e apoio técnico) da Associação
Folclórica Boi-Bumbá Caprichoso (AFBBC) e Associação Folclórica Boi-Bumbá
Garantido (AFBBG) e dos envolvidos indiretamente (parceiros externos:
patrocinadores e representantes da comunidade local).
Dentre os entrevistados (parceiros internos) encontram-se: 02 presidentes
da AFBBC e AFBBG, 02 diretores de Teatro (Boi de Arena), 02
apresentadores/animadores, 02 responsáveis pela marujada/batucada, 02
levantadores de toadas. No que diz respeito aos responsáveis pela promoção do
evento (parceiros externos) que participam indiretamente foram entrevistados os
seguintes atores sociais: 02 instituições blicas e 03 privadas. Quanto aos
representantes da comunidade local, foram entrevistadas 06 pessoas, entre elas 01
representante de movimentos sociais, 01 educador, 01 comerciante, 01 vendedor
ambulante, 01 agente de viagem e 01 jornalista, somando-se um total de 21 atores
sociais entrevistados.
3.3 VARIÁVEIS DO ESTUDO
Com o propósito de identificar a percepção dos atores sociais internos e
externos sobre a influência do fenômeno cultural dos bois-bumbás para o DLS da
cidade de Parintins, o estudo estabeleceu variáveis norteadoras da pesquisa, as
quais se resumem nos elementos da sustentação do processo, a saber:
a) Mobilização e contribuição na formação de atores sociais em Parintins.
82
b) A formação de redes de atores sociais e parcerias entre a sociedade civil,
poder público e patrocinadores.
c) Se existe um projeto coletivo no contexto das organizações que realizam
o evento cultural em estudo.
d) Modelo de sistema institucional utilizado na promoção do evento.
Contudo, é oportuno ressaltar que os pressupostos teóricos da cultura, em
especial da cultura brasileira, permeou o contexto de análise de todas as variáveis,
como parâmetro de entendimento das contradições que se estabeleceram no
discurso dos atores sociais envolvidos.
3.4 PLANOS DA COLETA DE DADOS
A coleta de dados foi viabilizada através da técnica de observação em que o
pesquisador se propôs apenas a coletar dados concernentes ao objeto de estudo.
Segundo Gil (1999 p. 111):
A observação apresenta como principal vantagem, em relação a outras
técnicas, a de que os fatos são percebidos diretamente, sem qualquer
intermediação. Desse modo, a subjetividade, que permeia todo o processo
de investigação social tende a ser reduzida.
A vantagem dessa técnica de pesquisa se efetiva, sobretudo, através da
credibilidade e seriedade do pesquisador com a qualidade das informações que se
deseja coletar no processo da investigação. Além de proporcionar um contato mais
presente diante da realidade investigada.
Como técnica de investigação adotou-se entrevistas semi-estruturadas, pois
se pretendeu organizar um roteiro pré-estabelecido constando itens que
justificassem a percepção dos sujeitos envolvidos direta e indiretamente no evento
cultural, priorizando no contexto, os elementos básicos das iniciativas de
desenvolvimento local. Os roteiros das entrevistas encontram-se nos apêndices A, B,
C e D do presente estudo, estruturados da seguinte forma: 40 perguntas dirigidas
83
aos presidentes dos bumbás, envolvendo questões de identificação pessoal e
profissional e questões sobre a própria organização (Associações Folclóricas). Para
o apoio técnico foram dirigidas 09 perguntas envolvendo questões de identificação
pessoal e atuação profissionais enquanto integrantes do evento. As questões
dirigidas aos parceiros externos (patrocinadores) foram compostas por 13 itens que
também envolveram assuntos de ordem sociocultural e econômica. Finalmente, para
os representantes da comunidade local, dirigiu-se 08 perguntas apenas.
De modo geral, a entrevista semi-estruturada se torna um dos principais
meios que tem o investigador para realizar a coleta de dados. É uma estratégia de
dupla face, pois, além de valorizar a presença do investigador, oferece todas as
perspectivas prováveis para que o informante adquira a liberdade e a
espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação (VIEIRA; ZOUAIN, 2006).
Quanto à operacionalização do plano de coleta de dados priorizou-se a
revisão da literatura e a elaboração de um esquema constituído por um conjunto de
questões orientadoras da pesquisa. A partir desse planejamento iniciou-se o
trabalho do estudo de caso, o qual obedeceu a três etapas distintas que seguem:
a) Primeiro houve visitas e contatos com: Associações Folclóricas dos
Bumbás Garantido, Caprichoso e representantes da comunidade
local. Em seguida, com órgãos públicos e empresas selecionadas
promotoras de patrocínio, objetivando contato direto para inteirar os
responsáveis das instituições sobre o assunto da pesquisa. Nesse
primeiro momento houve agendamento e realização da primeira fase
da entrevista com parceiros internos (dirigentes e apoio técnico das
duas agremiações folclóricas). Essa etapa de entrevista aconteceu
em Parintins.
Os trabalhos de coleta de dados referentes a essa fase foram
realizados nos meses de dezembro de 2006 e janeiro de 2007.
b) A segunda fase do plano foi reservada para seleção e análise de
documentos na cidade, com visitas à Coordenadoria de Turismo da
Prefeitura e bibliotecas, onde se coletou revistas, jornais, periódicos e
biografias de autores parintinenses, os quais faziam referência aos
aspectos históricos da cidade e do festival. Nesse período houve
realização das entrevistas com os parceiros externos. As entrevistas
foram realizadas em Manaus.
84
Os trabalhos de coleta de dados referentes a essa fase foram
realizados nos meses de junho, dezembro de 2007 e janeiro de 2008.
c) A terceira fase foi reservada para registrar o evento através de
filmagem, fotografias, como também realizar entrevistas com os
representantes da comunidade local selecionados. Iniciou-se o
tratamento dos dados priorizando-se as fases da codificação,
categorização e análise e interpretação do conteúdo. E, finalmente, a
elaboração da dissertação.
Os trabalhos de coleta de dados relacionados a essa fase do
plano foram realizados nos meses de fevereiro a junho de 2008.
3.5 TRATAMENTO DOS DADOS
Para Barros (1990) é nesta importante fase que o pesquisador mostra o
planejamento das operações para estabelecer o confronto dos dados obtidos com os
objetivos e questões propostas no estudo. Nesse sentido, priorizar cada fase que
antecede a execução da análise e da interpretação se torna essencial. Por “análise”
entende-se propor o sentido mais explicativo dos resultados da pesquisa.
“interpretação”, remete a capacidade de se voltar à síntese sobre os dados,
entendendo-os em relação a um todo maior, e em relação a outros estudos
realizados na mesma área. Análise e interpretação são processos que se
complementam e acontecem como sínteses, numa totalidade (BARROS, 1990, p.
87).
Conforme indicado anteriormente, esta pesquisa foi desenvolvida numa
perspectiva qualitativa e explicativa visando conhecer a percepção dos atores
sociais envolvidos direta e indiretamente no fenômeno cultural em estudo, de modo
que a técnica selecionada foi a Análise de Conteúdo (AC). Na visão de Bardin (1979)
esse critério “se presta para estudo das motivações, atitudes, valores, crenças,
tendências”. O objeto de estudo dessa técnica se resume ao estudo da linguagem
muito utilizada para estudar e analisar material qualitativo, buscando-se eficiência na
compreensão de uma comunicação ou discurso (BARROS, 1990).
85
Para Bakhtin (1929, p. 415) é no transcurso da interação verbal que a
palavra se “transforma e ganha diferentes significados, de acordo com o contexto em
que surge. Sua realização como signo ideológico está no próprio caráter dinâmico
da realidade dialógica das interações sociais”. Essa possibilidade de interação
dialógica do texto foi propiciada em pesquisa qualitativa através da técnica da
análise de conteúdo. Isso se explica devido ao uso de diferentes procedimentos para
levantar inferências válidas a partir de um texto. Nesse sentido, busca classificar
palavras, frases, ou mesmo parágrafos em categorias de conteúdo (ROESCH, 2006).
Em razão disso, os dados obtidos na investigação do estudo priorizou a
seguinte seqüência de análise: entrevista semi-estruturada com a utilização do
gravador; transcrição e tabulação qualitativa das falas, pré-análise (contato inicial
com a mensagem). Os conteúdos obtidos passaram pelo processo da codificação
temática, assim representado:
ANÁLISE DO CONTEÚDO
A) Pré-Análise: transcrição; tabulação qualitativa das falas.
B) Codificação.
Etapa I: divisão de 03 grupos representados pelos parceiros internos/função desempenhada nas
agremiações: gerência superior, intermediária e técnica.
C) Codificação
Etapa II: divisão de 03 grupos representados pelos parceiros externos (patrocinadores: Instituições
públicas, empresas privadas e comunidade local.
D) Categorização temática: subdivido em 04 subgrupos, com os itens:
Atores Sociais; • Redes de Cooperação; • Projetos Coletivos; • Modelo de Instituição
Quadro 2 – Demonstrativo das etapas do tratamento de dados da pesquisa – Jan/08.
Com base nas classificações estabelecidas houve o confronto dos dados
coletados com os objetivos e interesses da pesquisa, através da análise textual e
semântica. Este procedimento é apoiado em (BARDIN, 1979).
86
4 RESULTADOS DA PESQUISA
4.1 PARINTINS: ASPECTOS HISTÓRICOS
A cidade de Parintins foi fundada em 1669? Registros históricos apontam
controvérsias a respeito de sua fundação. Esses fatos ficam evidentes na obra do
historiador parintinense Saunier (2003), o qual convencido dos argumentos do
professor historiador amazonense Arthur Cezar Ferreira Reis concorda ser o
verdadeiro fundador da cidade de Parintins o padre João Felipe Bettendorff e não o
Capitão de Milícias José Pedro Cordovil, como registra a história propriamente dita.
Ao esclarecer essas divergências, Saunier (2003) explica que, na realidade,
José Pedro Cordovil encontrou uma povoação desorganizada fundada pelo padre
João Felipe Bettendorff. Aproveitando-se dessa desorganização, Cordovil faz dessa
povoação um sítio particular, o qual deu o nome de Tupinambarana. Em 1803,
elevou à categoria de Missão, com a denominação de Vila Nova da Rainha. Para o
cônego Francisco Bernardino de Souza, em 1804 “era fazenda agrícola, tendo
Cordovil oferecido à rainha Maria I de Portugal, a Louca” (BITTENCOUT, 1924 apud
SAUNIER, 2003, p. 55)
Bittencout (1924 apud SAUNIER, 2003, p. 55) reconhece que Cordovil foi o
fundador de Parintins. Entretanto, contra-argumenta:
Os habitantes de Tupinambarana, afeitos à liberdade, uniram-se aos
habitantes de Silves, em 1755, para exigir de Portugal a
independência de São José do Rio Negro do Grão-Pará, à qual era
subordinada. Isso vem provar que, em 1755, 41 anos antes da
chegada de Cordovil à nossa ilha, em 1796, cujos dias e mês não
foram registrados, existia um povo que sabia o que queria,
faltava se organizar.
As crônicas jesuíticas comprovam que no ano de 1669, aqui aportou o padre
alemão João Felipe Bettendorff, acompanhado do padre italiano Pier Luigi Consalvi
e do irmão Domingos da Costa, em visita autorizada pelo padre Antônio Vieira às
missões da região. Nessa ocasião, o reverendo Bettendorff era fundador de missões
87
e vilas, e havia fundado a missão dos Tupaiu, hoje Santarém, a 22 de junho de 1661.
Posteriormente, a 29 de setembro de 1669, Bettendorff viria dedicar uma capela em
honra a São Miguel, na aldeia dos Tupinambaranas. Somente após várias conversas
e consultas a vários livros científicos é que o escritor chega a conclusão de que: “É,
sem dúvida alguma, o dia 29 de setembro de 1669 a data da fundação de Parintins,
com o nome de ‘São Miguel dos Tupinambaranas’” (SAUNIER, 2003, p. 56).
A cidade passou por vários períodos antes de ser elevada à categoria de
cidade. Quando missão, em 1803, recebe o nome de “Vila Nova da Rainha”. Em
1837, quando elevada à Freguesia, recebeu outra vez o nome Tupinambarana.
Elevada à categoria de vila e município, seu nome foi mudado para “Vila Bela da
Imperatriz”, em 1852, e quando elevada à categoria de cidade. Em 1880, recebeu
definitivamente o nome de “Parintins”, em homenagem aos Parintim, indígenas que
habitavam a Serra de Parintins (SAUNIER, 2003, p. 55).
Parintins, conhecida como “Ilha Tupinambarana” está localizada à margem
direita do rio Amazonas. Compõe o que se conhece como Médio Amazonas, o
coração geográfico da Amazônia. O município encontra-se a 420 km a leste de
Manaus por via fluvial (15 horas descendo e 27 horas subindo o Amazonas). Por via
aérea esse percurso acontece em 1 hora. Compõe uma área de 7.069 quilômetros
de superfície, com florestas de várzeas e de terra firme, com lagos, ilhas e uma serra
de 152 metros cercada de verde, entre o Pará e o Amazonas. Possui um grande
rebanho de bois sendo o maior centro da pecuária amazonense. A ilha é
entrecortada de rios e igarapés. Clima ameno e vegetação exuberante, paisagem
exótica (CUNHA; VALENTIN, 1998). De acordo com o último Censo/2007 a cidade
conta com uma população aproximada de 101.908 mil habitantes, com 66.481 mil
habitando a área urbana e 35.427 mil vivendo na área rural.
4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS BOIS-BUMBÁS
É possível entender a evolução histórica da brincadeira dos bois-bumbás
limitando-a apenas sob influências do universo indígena dabakuri (encontro festivo
de tribos)? Essa compreensão vai muito além. É preciso valorizar e ouvir também,
outras versões para quem de fato conviveu com essa história na ilha Tupinambarana.
88
Nesse sentido, resgatar a rede de etnias que passaram pela ilha se torna de
fundamental importância quando se deseja entender melhor os traços que
caracterizam os povos da região, as raízes culturais do Médio Amazonas e as
transformações sofridas na brincadeira do boi. São, no total, dez as etnias que
passaram pela ilha, entre elas: Parintintins, Sapuapé, Uapixaa, Crixanã, Patuarana,
Mundurucu, Permeiana, Mura, Escariano e Tupinambá (SANTOS, 2000).
Para muitos pesquisadores a história dos bois-bumbás começou mesmo foi
com os pescadores e estivadores. Ou seja, os homens do “trapiche”; nome dado ao
antigo porto da cidade. É nesse contexto que entram em cena alguns nomes
conhecidos do povo parintinense, como: Emídio Vaz, Boboí, Lindolfo Monteverde,
Luís Gonzaga, Roque, Antônio Cid e José Furtado Belém. Furtado Belém foi quem
propôs à base eleitoral formada por pescadores e estivadores repetir o Boi-Bumbá
que apadrinhava na Praça 14 de Janeiro, em Manaus. Para Andrade (apud CUNHA;
VALENTIN, 1998), o Caprichoso nasceu em Manaus e brincou na capital
amazonense a 1974. Porém, outro boi com o mesmo nome de Caprichoso foi
criado em Parintins a 20 de outubro de 1913 por José Furtado Belém. Assim,
acredita-se que o boi Galante que antecedeu o Caprichoso terminaria absorvido pelo
azul e branco.
outras manifestações folclóricas culturais que cultuam o boi. Histórias
estas presentes, principalmente, no Mundo Antigo. As fortes influências são
marcantes e estão atreladas, principalmente, à cadência e ao ritmo que ocorreu com
a participação dos negros na história. É por isso que o ritmo do Boi-Bumbá emerge
da mesma família do caturité, do maxixe, baião, carimbó, sirimbó, do samba e do
próprio reggae. Essas manifestações folclóricas, ao difundirem-se em Belém/PA e
em Manaus/AM, sofrem reformulações no ritmo quando chegam a Parintins. O ritmo
deixa de ser ligeiro para adequar-se a um “ritmo mais dançante, mais lento e
cadenciado recebendo inclusive, uma nova denominação, a de Boi-Bumbá”
(SANTOS, 2000, p. 66).
O início da festa do Boi-Bumbá em Parintins foi marcado pela rivalidade
entre as famílias. De um lado, Lindolfo Monteverde, fundava seu próprio bumbá, o
Garantido em decorrência de numa promessa feita a São João para recuperar a
saúde. Era um homem do tipo “peito-de-aço”, que se fazia ouvir a quarteirões sem a
necessidade de amplificadores. Já pelo Caprichoso respondia “seu” Nascimento, voz
igualmente forte. Não tinha essa história de preparar a toada com antecedência.
89
Ambos compunham versos desafiadores e provocativos. Isso resultava muitas
vezes em duelos entre os brincantes (SANTOS, 2000).
Em meados da década de 1950, a rivalidade se tornou questão-chave na
disputa entre barões da juta; fibra oriental que entrou no Brasil por Parintins na
bainha da camisa do japonês Ryota Oyama e fez fortunas na cidade. Pelo Garantido
respondia Antônio Maia, irmão de um dos líderes políticos mais conhecidos da
história amazonense, o ex-senador e governador Álvaro Maia. Pelo Caprichoso,
Elias Assayag, pai do diretor do Caprichoso, Simão Assayag e Raimundo Dejard
Vieira, o “Didi Vieira” (SANTOS, 2000).
Nessa época, “rico” era chamado de “branco”. E os pescadores passavam o
ano inteiro “ajeitando” os brancos para que fornecessem a “fazenda” de veludo para
cobrir o Boi. Conta-se que quando um surubim corria dentro da tarrafa de Luiz
Gonzaga, num dos campos inundados nos arredores de Parintins, ele gritava de
felicidade: “Taí o peixe dos brancos!”. Atualmente essa disputa familiar permanece,
com um peso menor, mas ainda significante.
No que diz respeito à promoção e organização do I Festival Folclórico de
Parintins estão presentes os nomes de Raimundo Muniz, Jansen Godinho e Lucinor
Barros. Tudo iniciou no ano de 1966 quando, “a pretexto de arrecadar dinheiro extra
para a Festa de Nossa Senhora do Carmo (6 a 16 de julho), padroeira da cidade, um
grupo de dirigentes da Juventude Alegre Católica (JAC) organizou o I Festival
Folclórico de Parintins” (SANTOS, 2002, p. 66). Nesse ano apresentaram-se apenas
quadrilhas, os bumbás apareceram no ano seguinte. Aos primeiros fundadores
juntaram-se posteriormente Xisto Pereira de Souza e Irineu Teixeira.
Inicialmente, a pequena quadra da JAC que serviu de local às primeiras
apresentações da festa teve que ser substituída por outra. Dessa vez, foi adaptada
num terreno mais amplo, pertencente ao Instituto de Previdência e Assistência
Social do Estado do Amazonas (IPASEA). Bem antes de receber o lugar definitivo
das apresentações folclóricas, serviram de palco ainda para o evento, os seguintes
locais: Parque das Castanholeiras e o estádio de futebol municipal Tupy Catanhede.
Posteriormente ganhou bumbódromo de madeira construído pelo prefeito Gláucio
Gonçalves e, finalmente, em 1988, o governador Amazonino Mendes inaugurou o
Centro Desportivo e Cultural - o Bumbódromo, como é conhecido atualmente o lugar
das apresentações da festa do Boi-Bumbá (SANTOS, 2000).
90
Cunha; Valentin (1999, p. 102) revelam algumas características e
curiosidades sobre o local principal de apresentação dos bumbás:
O Festival Folclórico de Parintins se realiza no Centro Cultural de Parintins.
Óbvio? Sim, mas se o visitante pedir ao motorista de táxi que o leve ao
Centro Cultural de Parintins é provável que receba como resposta um ar de
profunda interrogação. Agora, se disser simplesmente que quer ir ao
Bumbódromo, é fácil, todo mundo sabe onde fica o grande ginásio
inaugurado pelo Governador Amazonino Mendes em 1988 que recebe de
40 a 45 mil visitantes por noite. O Bumbódromo é utilizado durante todo o
ano para a realização de eventos sócio-culturais como a apresentação da
Orquestra Filarmônica do Amazonas, com um repertório que inclui peças
clássicas e arranjos eruditos das toadas que dão alma e ritmo ao Festival
Folclórico. Dotado de salas de aula, posto médico e quadras poliesportivas,
funciona também como escola pública.
Além das características expostas acima, vale ressaltar que estruturalmente,
o Bumbódromo é uma construção circular em forma de uma cabeça de boi estilizada.
Divide-se em duas arquibancadas principais, uma revestida na cor azul, do
Caprichoso e a outra na cor vermelha, do Garantido. É composto ainda de arena,
tribuna de honra, cadeiras numeradas, arquibancadas especiais e camarotes
(GARCIA, 2000).
Em 1975, o Festival começaria uma virada que iria abrir as mentes dos
artistas para a espetacularização propriamente dita da festa. Pelo Garantido a
experiência criativa de Jair Mendes com o Boi Biônico e a primeira versão animada
da Cobra Grande foi um sucesso estrondoso. Para dar resposta a altura, Odinéia
Andrade, Milka Maya, Gadelha e Nazaré de Jesus buscam nos livros referências
teóricas de lendas e mitos da região que pudessem servir de instrumento para os
artistas do Caprichoso em suas alegorias. Estavam assim, introduzindo a pesquisa
no contexto do evento. Item este indispensável e que serve de disputa entre os dois
bumbás. Atualmente, os artistas fazem uma releitura das lendas para serem
encenadas na arena do Bumbódromo, conforme relato abaixo:
O Boi Bumbá é uma variação do Bumba-meu-Boi do Maranhão e aqui
incorporou fundamentalmente o lendário indígena. A mitologia indígena que
hoje chega a ser o ápice das apresentações, tanto de um quanto de outro -
chamado ritual indígena, que realmente é um negócio muito bonito, onde
os artistas após fazerem uma leitura das lendas, ou da criação, ou da
91
gênese, ou do extermínio de uma nação, que todas as nações, que todas
as etnias têm como elas foram criadas e pós-morte o que acontece com
eles. Todos eles têm essa história, essa questão mitológica, essas lendas e
o artista pode fazer uma leitura daquela e ele viaja naquilo e vai
desenhando, criando. Primeiramente o desenho, pra depois executar aquilo
nos moldes alegóricos e resulta no que acontece no Bumbódromo.
Fonte: Entrevista – Parceiros Internos.
A festa do Boi-bumbá de Parintins surgiu a partir da fusão entre a cultura do
Bumba-meu-boi do Maranhão e cultura indígena do povo do Amazonas. No decorrer
dos anos aquela brincadeira de rua que nasceu em Parintins no início do século XX
transformou-se em um instrumento de comunicação e expansão da cultura local e
regional. Além de sensibilizar a população local sobre a preservação do meio
ambiente, os rituais indígenas resgatam os valores cultuados por diversas etnias que
habitaram e ainda habitam a região Amazônica.
A brincadeira do boi inicialmente ocorria nas ruas, casas e bairros, iluminada
pela luz das lamparinas. A festa geralmente acontecia no interior das casas. O dono
da casa, seus familiares e convidados faziam um círculo no terreiro para o
observarem a evolução da dança do boi e do amo (repentista). Depois de certo
tempo, as brincadeiras evoluíram e necessitaram de gerenciamento. O Boi
Caprichoso instalou sua sede administrativa no Curral, conhecido por Zeca Xibelão,
localizado no centro da cidade. O Boi-Bumbá Garantido, na Cidade Garantido, que
fica na estrada Odovaldo Novo. Os espaços denominados de “Currais” são
complexos utilizados para confecção das alegorias, fantasias e adereços
empregados na festa. O local também se destina a ensaios das coreografias e das
letras das toadas. Contam com participação da torcida organizada chamada de
“Força Azul e Branca” (FAB) do boi Caprichoso e “Galera Vermelha e Branca” do boi
Garantido (VALENTIN, 2001, p. 160) relata:
Na festa do boi de Parintins as galeras têm papel fundamental. As pessoas
que estão no bumbódromo não apenas formam uma torcida, mas participam
diretamente do espetáculo. Estão dentro da festa, têm responsabilidade
sobre o desempenho de seu boi, fazem parte dos quesitos dos jurados.
Tanto que são convocadas previamente para ensaiar o que farão durante a
apresentação, a partir de um planejamento cuidadosamente elaborado
pelas direções dos dois bois. Enfeitam-se. Levam fitas, chapéus, bandeiras
e o que for necessário para demonstrar e aumentar a empolgação. Com um
detalhe essencial: quando um boi está se apresentando, a galera do
“contrário” tem que permanecer em silêncio absoluto, senão seu boi perde
92
pontos. Um lado incendeia. O outro observa, calado. Uma galera está
intensamente iluminada. A outra, no escuro. Uma galera festeja, brinca,
dança. A outra, contrita e séria, acompanha. Nada de vaias, apupos.
aplausos. E esta é uma das mais curiosas, interessantes e civilizadas
características da festa parintinense.
As apresentações dos bumbás envolvem prioritariamente o conjunto de vinte
e um itens, que são representados em três noites de festa, sendo reservado para
cada boi, duas horas e meia de espetáculo. Nesse espaço de tempo, em que os
personagens vão surgir, a chamada galera (torcida organizada) começa a executar
movimentos que irão evoluir até o último dia de festival. Daí surge o apresentador,
cuja função é conduzir o andamento do espetáculo e de apreciar cada item que
surge por ordem de apresentação. Em seguida, o levantador de toadas realiza toda
parte musical da festa, que são as toadas (representações musicais das
características de cada item e também das temáticas específicas exploradas
naquele momento da festa). Este vem acompanhado com o grupo instrumental e
rítmico. No caso do Caprichoso, é a chamada “Marujada de Guerra”, e no Garantido
é a Batucada. É válido ressaltar que este grupo musical estará presente até o
término da apresentação. A partir deste momento, surgem os personagens do Amo
do Boi (tirador de versos), o boi-bumbá evolução, a sinhazinha da fazenda, porta-
estandarte, rainha do folclore, cunhã-poranga, tribos indígenas, e pajé.
Essas categorias geralmente estão agregadas aos itens de: ritual indígena,
lenda amazônica, celebração folclórica, figura típica regional e as alegorias.
Ressalta-se, ainda, que um dos momentos mais admirados do festival, é o ritual
indígena. Estes são abordados e conduzidos pelo personagem do pajé, que encena
seus poderes mágicos e trava grandes batalhas com seres mitológicos que tentam
destituir determinada nação indígena, ou causar malefícios à floresta e aos
amazônidas.
Esta estrutura evolutiva de apresentação dos bumbás segue o mesmo
caráter, uma vez que, itens individuais estão associados a imensas alegorias, fazem
parte do enredo, como afirma um dos membros da comissão de arte do Garantido
(GARCIA, 2004, p. 17):
93
Caprichoso e Garantido seguem um padrão, apresentando todas as noites
momentos: ritual, lenda amazônica e momento folclórico, que é onde
surgem figura típica regional e bum propriamente ditos. Essas três
estruturas podem ser desdobradas em até cinco, se a figura típica vier numa
grande alegoria e o boi participar do que chamamos de “apoteose”, o
momento culminante da apresentação.
As organizações dos itens que compõem os dois bumbás de Parintins
dividem-se em itens individuais, artísticos e coletivos. Nos itens individuais estão:
apresentador, levantador de toadas, amo do boi, sinhazinha da fazenda, rainha do
folclore, cunhã-poranga, porta estandarte, pajé e o boi com sua evolução. Nos
coletivos estão Batucada, tribos indígenas, tuxauas, vaqueirada, galera, organização
do conjunto folclórico e coreografia. No item estruturas artísticas concorrem, ritual
indígena, lenda amazônica, figura típica regional e alegorias; e o abstrato é a toada
e letra da música (GARCIA, 2005).
Estes itens são avaliados por um grupo de nove jurados, selecionados por
uma empresa de consultoria os quais terão que, criteriosamente, julgar as
apresentações dos bois, de acordo com o regulamento do Festival Folclórico. As
notas atribuídas a cada item pelos jurados podem variar entre 8 a 10, podendo ser
fracionadas (RODRIGUES, 2007). Não se pode deixar de fazer referência ao item
“Pai Francisco e Mãe Catirina”. Estes personagens fundamentais na tradição do auto
do boi são obrigatoriamente apresentados. Contudo, não lhes são atribuídas notas.
No caso de um dos bumbás não apresentar esses dois itens, haverá penalização,
com perda de pontos na avaliação geral pelos jurados da festa.
As temáticas que transitam no contexto das apresentações do evento são de
responsabilidade das comissões de arte dos bois. Esta comissão é composta por
pessoas ligadas ao meio ambiente, folclore, coreografias, indigenismo e à história da
região. Esse trabalho envolve os artistas dos bumbás, numa trajetória que inicia logo
após o término do festival anterior, no qual novas pesquisas, vídeos das
apresentações e discussões sobre o que funcionou bem ou não, definirão os
caminhos para a festa no ano seguinte (BRITO, 2007).
94
4.2.1 História do Boi Caprichoso
A história de origem do Boi-Bumbá Caprichoso está relaconada a uma
família, mais precisamente aos irmãos Raimundo, Pedro e Félix Cid. Os três
migraram da cidade de Crato, no Ceará, passaram pelos estados do Maranhão e
Pará, até chegarem a Parintins, onde fizeram uma promessa a São João Batista
para obterem prosperidade no novo município. Ao conhecerem vários folguedos
juninos sofrem influências culturais de duas manifestações folclóricas marcantes: o
bumba-meu-boi maranhense e a marujada paraense (WIKIPÉDIA, 2007). A
assimilação desses dois folguedos favoreceu a adoção das cores oficiais do Boi
Caprichoso, o azul e o branco, usadas nos trajes dos marujos. Ou seja, na Marujada
de Guerra, nome designado ao grupo responsável pela marcação do ritmo na
apresentação do boi (ANDRADE, 2001).
No decorrer dos anos, a organização do Boi Caprichoso teve vários
presidentes como: Acinelcio Vieira, Waldemar Queiroz, João Andrade, Irineu
Teixeira, Rubens dos Santos, Ray Viana, Geraldo Medeiros, Joito Azedo e
Dodozinho Carvalho (ANDRADE, 2001). Atualmente, a Associação Folclórica é
administrada pelo presidente Carmona de Oliveira que está no seu segundo
mandato.
A Associação Folclórica Boi-bumbá Caprichoso congrega atualmente 717
associados e possui dois projetos sociais: “Resgate cultural e cidadania” e
“Associação Atlética Banco do Brasil (AABB) Comunidade” desenvolvido através da
Escola de Arte Irmão Miguel de Pascalle.
Com base nas pesquisas, a Escola de Arte Irmão Miguel de Pascalle
funciona desde 1997, sendo o projeto “AABB Comunidade” somente inserido no
contexto da instituição no ano de 2000. A escola em referência, objetiva
prioritariamente educar e profissionalizar para as artes crianças e jovens na faixa
etária de oito a dezoito anos. Essa meta tem sido alcançada, uma vez que a
“escolinha” (modo como é chamada pelos alunos) revelou vários talentos para o
Caprichoso. São aproximadamente quinhentos alunos atendidos. Na escola são
oferecidas mais de quinze oficinas pedagógicas, voltadas principalmente para a área
cultural, como dança, desenho, flauta, teclado, violão, cavaquinho, cartonagem,
95
artesanato, serigrafia, macramé, pintura em tela e em tecido, jogos e filosofia, inglês
e informática (ALCÂNTRA, 2007).
A perspectiva dada aos estudantes da escola é, sem dúvida, de grande valor
socioeconômico, pois estes acreditam que conseguirão se profissionalizar e de certa
forma garantir possibilidades futuras de trabalhar como artistas no próprio festival de
Parintins ou em outros eventos do país, a exemplo de muitos parintinenses que
realizaram essa trajetória vitoriosa de trabalho muitas vezes.
A Escola de Arte cumpre duas funções principais: primeiro explora a
criatividade e desenvolve o talento de crianças e jovens parintinenses, pois elas
aprendem as coreografias características de cada item do boi e aperfeiçoam a
prática do desenho e da pintura. Segundo, de modo mais primordial, conseguem
manter vivos o amor e a tradição pelo boi Caprichoso e pelo Festival Folclórico de
Parintins (ALCÂNTRA, 2007).
As especificidades tratadas nas temáticas do Boi Caprichoso retratam, de
modo geral, tanto os aspectos históricos culturais da Amazônia, com propriamente o
cotidiano dos amazônidas. Em virtude dessas características, itens com: lendas do
Jurupari, da Cobra Grande, do Boto, do Mapinguari e outros, se transformam em
espetáculo no Bumbódromo.
As temáticas mais evidenciadas e cantadas no Boi Caprichoso são: a Terra
é azul (2000), Caprichoso: Amor e paixão (2001), Amazonas: fonte de folclore, fonte
de vida (2004), Caprichoso: A estrela do Brasil (2005), O Eldorado é aqui (2007). No
ano de 2008, a temática eleita foi: “O futuro é agora”. A mensagem difundida evoca
a responsabilidade de todos em busca da preservação do ambiente natural. O agora
representa o futuro imediato. Ou seja, o momento de melhorar as atitudes do homem
com relação à preservação do planeta (FREITAS, 2008).
4.2.2 História do Boi Garantido
O Garantido nasceu de uma promessa feita a São João, no dia 12 de junho
de 1913. Foi fundado por Lindolfo Monteverde, um morador da Baixa do São José
22
.
2
Bairro da cidade de Parintins, localizado na parte baixa do município.
96
Esse personagem real nasceu em 1895 e morreu em 1979. Tudo que se sabe sobre
ele está cercado por certa áurea lendária ou pelo fanatismo dos torcedores do boi
vermelho e branco. Contudo, a cidade é unânime em apontá-lo como um grande
improvisador, ou seja, um bom “tirador de versos” e dono de um vozeirão capaz de
atravessar quarteirões, num tempo em que não havia microfones e nem
amplificadores para as apresentações da brincadeira do Boi (GARCIA, 2000).
Dessa maneira, o Garantido surgiu na antiga estrada Terra Santa, hoje
Avenida Lindolfo Monteverde, na tradicional Baixa do São José. Atualmente, o
bumbá em referência, possui suas instalações administrativas em um complexo
arquitetônico de uma antiga fábrica da cidade, denominada de Fabriljuta, localizado
na Rodovia Odovaldo Novo. Essa estrutura denominada de Cidade Garantido abriga
os galpões, a diretoria e demais coordenadorias que fazem parte da administração
do boi.
Historicamente, foram atribuídos vários slogans ao Boi Garantido. Destes,
vale ressaltar os seguintes: “Boi da Promessa”, “Boi do Coração”, “Brinquedo de São
João”, “Boi do Povão” e outros. O mais popular é “Brinquedo de São João”, de
autoria de Lindolfo Monteverde para homenagear o santo a quem se apegou para
curar uma doença que o ameaçava quando serviu ao exército. Os dirigentes do
bumbá preservam até os dias atuais este slogan como forma de reconhecimento a
Lindolfo, o poeta maior da nação vermelha e branca (WIKIPÉDIA, 2007).
No decorrer dos anos, o Festival Folclórico se desenvolveu, e com este, o
Boi Garantido e o Boi contrário
33
. A necessidade de uma Associação e lideranças foi
imprescindível. Assim apareceram nomes como: José Walmir, Raul Góes, Antônio
Andrade e outros que gerenciaram o bumbá, contribuindo de maneira significativa
para o alicerce da festa e da agremiação folclórica.
Atualmente, a Associação Boi-bumbá Garantido é administrada por Vicente
Matos. Para o presidente da Organização, as tarefas administrativas são bastante
trabalhosas. Principalmente quando se priorizam também, objetivos sociais visando
o benefício da comunidade parintinense.
As temáticas fundamentais apresentadas pelo Boi-bumbá Garantido na
arena do Bumbódromo nos últimos dez anos são exemplos de idéias atuais de
3
Boi Contrário é a maneira que tanto o Caprichoso, quanto o Garantido tem de se expressar um com
relação ao outro, a fim de não utilizar o nome do rival. Expressão idiomática pica dos falantes de
Parintins.
97
proteção ao ambiente natural. Entre elas, cumpre citar: “Amazônia santuário
Esmeralda”, “Amazônia Viva” “Amazônia Pátria Verde”, “Garantido: o boi da
Amazônia” e “Guardiões da Amazônia” (RODRIGUES, 2007). A temática da
preservação mostrou-se uma estratégia bem sucedida para o Boi vermelho e branco,
tendo rendido ao grupo sete títulos, sendo um tetracampeonato (1999 a 2002) e um
tricampeonato (2004 a 2006)
4
. Para o coordenador da Comissão de Arte do
Garantido
5
, tratar dessa temática no ano de 2007 revelou uma necessidade de
conclamar a humanidade para o apelo ambiental de conservação da natureza. Desta
forma (GÓES, 2007, p. 8) relata:
O Garantido prepara os seus espetáculos, para as três noites do 42º
Festival Folclórico de Parintins, tendo como foco o tema: Guardiões da
Amazônia”. O objetivo é muito claro: alertar definitivamente para os riscos,
mais do que evidentes, de que se continuarmos depredando o meio em que
vivemos, estaremos decretando a nossa própria morte que, embora
aparentemente lenta, já está batendo em nossa porta. É preciso a
conscientização imediata de que é irreversível o problema do aquecimento
global. Não se trata mais de um mero apelo ambientalista, mas, sobretudo,
de uma constatação realista da comunidade científica de que é chegado o
momento de olharmos para o nosso meio e vermos o grande mal que temos
causado a nós mesmos, quando derrubamos as nossas florestas, poluímos
os nossos rios e submetemos à extinção os nossos animais.
Decorrente disso, a Comissão de Arte do Garantido foi buscar nas lendas
amazônicas o exemplo a ser seguido pelos guardiões da Amazônia. A figura
lendária selecionada foi o Curupira, protetor da mata e de seus habitantes
(RODRIGUES, 2007). O discurso idealizado nos últimos anos pelo Garantido, em
favor da preservação da natureza, continuou em 2008 e a temática central foi
“Garantido: o Boi da preservação”. Sob este prisma aconteceu mais um belo
espetáculo de cultura, folclore, senso ambientalista e uma festa de grande emoção
para os artistas, os parintinenses e os visitantes.
4
DIÁRIO DO AMAZONAS op. cit., p. 06
5
O coordenador da comissão de Arte dirige o espetáculo do Boi como um todo na parte artística, ou seja, desde a
parte de definição de temas, à definição do eixo de cada momento do espetáculo.
98
4.3 ATORES INTERNOS
Os atores internos do processo exercem as funções que viabilizam o
funcionamento das organizações promotoras do evento dos “Bois-Bumbás”, ou seja,
gerência superior, gerência intermediária e atividades técnicas. A função de gerência
superior, não remunerada, é exercida pelos presidentes das organizações. A função
de gerência intermediária, de remuneração episódica, é exercida pelos diretores de
teatro e arena e pelo diretor de arte, que coordenam os núcleos de artistas
responsáveis pelos elementos de formatação estética do Boi-Bumbá teatralizado na
arena: cenografia, indumentária, desempenho dos dançarinos e dos atores, dentre
outros.
As funções técnicas são remuneradas e exercidas: pelo apresentador/
animador, que é o mestre-de-cerimônias do espetáculo artístico, dentro da arena do
bumbódromo, o qual atua comentando, informando e divulgando para os jurados o
espetáculo teatral. Pelo responsável da batucada, que tem como papel preparar e
ensaiar com os instrumentistas todas as toadas e criar várias situações de toque
para serem apresentadas na arena. Pelo levantador de toadas, cuja incumbência é
cantar toadas e produzir os CDs com as músicas de cada evento.
99
Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a própria emergência como Atores Sociais
Desenvolvimento
Local Integrado
Gerência Superior Gerência Intermediária Técnicos
Garantido
“Tô com 47 anos. Tenho curso de
Administração pela UFAM (...) Passei treze
anos fora e quando cheguei aqui, eu fui
convidado a ingressar no Garantido. Eu sou
presidente do Garantido dois anos, mas
exerci a função de diretor financeiro(...) o que
me deu a possibilidade de chegar a
presidência(...). Eu penso que [cheguei a
presidência] através das atitudes, do meu
discurso, dos meus posicionamentos diante
dos fatos(...) fazendo uma leitura e levando as
pessoas [a refletir sobre] a importância desta
associação para o município de Parintins”.
A minha formação, é uma formação
acadêmica no sentido de ter feito curso
de Arte e Educação, mas eu tenho
uma formação empírica, que pra mim é
até mais importante porque foi a área
que eu pude mergulhar com mais
profundidade, de forma autodidata,
que é o teatro e a dança. Então vindo
pra Parintins, eu sou convidado pra
participar da Comissão de Arte”.
“Eu na Associação 22
anos(...)desde que voltei de o Paulo
[onde] passei 20 anos, retornei e me
engajei no Boi.(...)Sou jornalista de
formação e fiz comunicação Social em
São Paulo [onde trabalhei] 10 anos
como músico profissional e fiz contatos
como grandes profissionais do teatro”.
“Entrei em 2002, agora completo na
verdade meu sexto ano como
apresentador e, graças a Deus, nesses
6 anos venci 4, perdi a minha segunda
vez, a agora muito mais vitórias do
que derrotas. Eu sou bacharel em
Direito e o Boi nos profissionalizou, nós
temos uma remuneração pra fazermos
apresentações, até pro Boi
profissionalizar todos os seus itens,
seus atores, suas atrizes.(...)O Boi
Bumbá hoje é um teatro a céu aberto,
mas é fora a remuneração, o mais
importante mesmo de tudo é o amor
que temos pelo Boi Garantido”.
Emergência
de
Atores Sociais
Caprichoso
Tenho 47 anos de idade, sou natural de
Parintins-Amazonas, possuo o Ensino Médio
Completo, ingressei no projeto da Associação
mais de 20 anos, como brincante, torcedor,
Vice-presidente, diretor, administrador e de
Marujada. Sou Presidente (02) dois anos
sem remuneração. Tenho a profissão de
Empresário. A presidência representa um
serviço, uma missão com grandes desafios e
enorme responsabilidade”.
{“Meu nome é (...) [x}, mas o nome
artístico é (...) [ y], tenho 43 anos,(...)
mais de 28 anos dedicados ao teatro.
Sou formado em Artes Visuais pela
UFAM e experiência em cinema, (...) e
teatro com deficiente auditivo. (...).
Damos suporte nas pesquisas
folclóricas e mitológicas amazônicas
dentro do tema desenvolvido pelo Boi.
Na Associação, eu acho que estou
uns 10 anos, mas são 18 anos
trabalhando diretamente ligado à
questão do Conselho de Arte desde
quando o Conselho de Arte do Boi-
bumbá Caprichoso foi desenvolvido”.
Eu já estou 11 anos. Comecei em
96 com oito anos de idade e aí comecei
a carreira até o ano de 2005, eu fazia
ainda aquela animação, pré-animação
até mesmo infantil e depois
passando para o público em geral. E
quando foi em 2005 eu me tornei
apresentador oficial com 17 anos de
idade”.
Quadro 3. Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a própria emergência como Atores Sociais
Fonte – Pesquisa direta.
100
Conforme relato no Quadro 3 - Síntese do Discurso dos Atores Internos
sobre a própria emergência como Atores Sociais, a emergência dos atores
sociais internos ocorre através de duas formas, no caso da escolha da presidência:
no Garantido, pelo convite para pessoas que, embora sejam oriundos de Parintins,
possuam qualificações gerenciais e técnicas. No Caprichoso, de modo mais
espontâneo, com a valorização de pessoas da própria comunidade. As gerências
intermediárias e os técnicos são escolhidos nas duas fundações pela competência
técnica. É importante observar que alguns agentes do processo são pessoas da
comunidade que foram estudar em centros mais avançados e que depois
retornaram a sua cidade de origem.
Com relação à presença de possíveis traços da cultura brasileira, verifica-
se a hierarquia, quando a estrutura da organização é piramidal, e a centralização
do poder formal pelos homens, pelo fato de que todas as funções de comando
formais importantes da associação são exercidas por elementos do sexo
masculino. A maioria dos contratados também é de homens. Existe um número
pequeno de mulheres em atividades subalternas e “femininas” na parte
operacional da costura, adereços e chapéus.
A cultura amazônica dá sentido ao ritual, quando as mulheres aparecem
dentre os participantes do espetáculo para o blico, exibindo beleza e
sensualidade. Resgatando, por exemplo, o grande mito do folclore amazonense:
Cunhã Poranga. Ou seja, a da mais bela moça da tribo que irradia beleza nativa,
olhar selvagem e um lindo corpo emoldurado de penas para seduzir a platéia.
A primeira grande contradição observada reside no fato de que o boi
Garantido, talvez por suas origens, considerado o boi do “povão” e que a partir dos
anos 1990 passou a ser comandado por um grupo de grandes empresários, é
administrado de acordo com os preceitos da Administração moderna, que valoriza
a competência formal. Este fato sinaliza para apropriação, pelo capital, de um
evento cultural, e remete a Fernandes (1987), quando constata como
características da revolução burguesa no Brasil, as mudanças promovidas pela
elite para que não seja mudado o status quo e o conseqüente processo de
acumulação do capital.
Por outro lado, o Caprichoso, percebido como o boi de elite, tem como
presidente uma pessoa, com escolaridade média e surgida da própria comunidade.
101
Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a criação de redes de cooperação
Desenvolvimento Local
Integrado
Gerência Superior Gerência Intermediária Técnicos
Garantido
“Nós nos sentimos honrados hoje de termos
parceiros poderosíssimos, empresas
transnacionais como a Coca-Cola, a maior
empresa do país que é a Petrobrás, a Kaiser,
que é Fisa, que é uma transnacional também.
Temos os Correios, a Nestlé, a maior
empresa de alimentos do mundo, nós temos a
TIM, nós temos o Bradesco, o maior banco
privado da América Latina. Esse pessoal
apóia tão-somente a questão do Boi de Arena,
o espetáculo em si. Ninguém, a exceção do
Governo do Estado, apóia os nossos projetos
sociais. Nós queremos trazer essas
organizações poderosíssimas pra dentro dos
projetos sociais por que Parintins precisa
fundamentalmente disso também. A diocese
não colabora financeiramente falando. A
Amazonastur nos ajuda esporadicamente com
orientações voltadas ao turismo, mas investir
financeiramente no Boi não”.
“Minha função é conseguir formatar um
corpo de coreógrafos, para que estes
coreógrafos possam enfim trabalhar com
esse contingente que chega a
aproximadamente 1500 pessoas por noite,
e daí extrair o espetáculo, e daí extrair o
resultado, então essa é a minha função”.
“Nós temos uma equipe
chamada Comissão de Arte que
quando é necessário fazer algo,
ou refazer, ou aproveitar, a
gente senta e coloca na mesa
algumas coisas pra discutir a
respeito disso. Não é eu que
faço essa parte, mas o
Garantido tem uma equipe toda
que faz essa parte. dez anos
é a mesma equipe trabalhando
no mesmo sentido”.
Criação de redes de cooperação
Caprichoso
“Nossos parceiros são a Associação Atlética
do Banco do Brasil -AABB, Comunidades e
Conselho de Desenvolvimento Humano -
CDH. Temos o Patrocínio da Universidade do
Norte - UNINORTE”.
O Conselho de Arte tem um presidente e
membros diretivos, alguns membros são
convidados, outros membros, por serem
artistas, são pagos, a questão do
desenvolvimento financeiro do Conselho de
Arte, ele é direcionado ao presidente, então
nenhum conselheiro sabe quanto cada um
custa, ou se ele vai receber pagamento ou
não, não existe assim um contrato para ser
conselheiro, o conselheiro não sabe se o
outro recebe ou não, quanto recebe, é uma
atribuição dada ao presidente do Boi, que
faz essa negociação entre artistas”.
“A gente tem toda uma estrutura,
um embasamento, que o nosso
Conselho de Arte nos dá”.
Quadro 4 - Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a criação de redes de cooperação
Fonte – Pesquisa direta.
102
Com relação às redes de cooperação - Quadro 4, observa-se que, na
percepção dos presidentes, ela envolve os atores externos da comunidade. na
percepção dos gerentes intermediários e técnicos, ela se refere às equipes
internas simbolizadas no Conselho de Arte. A primeira visão tem como foco a
captação de recursos financeiros. A segunda, a qualidade do desempenho dos
bois. Em nenhuma das visões, verifica-se pelo discurso dos atores a internalização
do conceito de redes de cooperação mútua, de acordo com a concepção do DLS.
Neste item, mais uma vez, são reforçadas nas falas dos respondentes as
questões da hierarquia, autoritarismo, tendência à centralização do poder dentro
dos grupos sociais e distanciamento nas relações entre diferentes grupos sociais,
traços da cultura brasileira.
A ideologia burguesa dominante é manifestada na fala do presidente do
Garantido, quando ele exalta as empresas internacionais representantes do capital
estrangeiro colaboradoras do evento, considerando apenas o status e os aspectos
financeiros. Em nenhum depoimento, é percebida a valorização dos sujeitos da
história dos bois, de outras contribuições da comunidade, das lideranças locais,
culturais ou sociais.
Para as gerências intermediárias e técnicos, o Conselho ou Comissão de
Arte seria o grande articulador da rede de cooperação interna ao procurar nos
elementos da cultura indígena os argumentos que façam sentido e mobilizem os
atores internos e a comunidade permitindo a construção e o desenvolvimento do
espetáculo.
Pelo que se pode observar no Quadro 5 - Síntese do Discurso dos
Atores Internos sobre a elaboração de projetos coletivos - os respondentes
têm dificuldade de falar sobre este tema. O presidente do Garantido declara que
projeto coletivo significa remuneração dos componentes associados dos Bois,
cerca de 2.500 indivíduos, o que revela a lógica capitalista dominante, cujo foco é
sempre o resultado econômico. Existem alguns ensaios de projetos coletivos como
a idealização de uma escolinha de arte Aldeia da Arte, cujo nome remete à
cultura indígena. Tais conclusões podem ser confirmadas abaixo:
103
Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a elaboração de projetos coletivos
Desenvolvimento
Local Integrado
Presidentes Diretores de arte Técnicos
Garantido
“Olha, o projeto coletivo que ela possui,
coletivo seria a contemplação[financeira] dos
sócios, e que não consegue fazê-la até por
falta de receita pra isso, mas nós temos hoje
no Garantido um trabalho social voltado para
atender a comunidade ou parte dessa
comunidade que não chega lá a contemplar
todas as pessoas interessadas em particular
dos projetos sociais, mas é no coletivo seria
dos seus sócios, para atender também
Parintins enquanto projeto turístico, isso faz
parte perseguir essa meta aí”.
“Existe essa preocupação, agora uma
parceria com o Governo do Estado foi
aberta uma escola que ainda não es
em funcionamento, mas a partir do ano
que vem, ela começa a funcionar, que
é a escolinha de arte, aldeia da arte,
que vai ensinar música, teatro, dança
para crianças que são filhos de sócios
e também são Garantido desde
pequenininho”.
“A produção procura os melhores
músicos pra fazer um trabalho bom,
trabalho digno diante do que é o
Festival hoje”.
Elaboração
de
Projetos Coletivos
Caprichoso
“O aprendizado é feito com as viagens
que os artistas fazem por conta
própria. Na realidade o Boi contrata
o artista pra desenvolver aquele
trabalho, naquele período. Não existe
uma sistematização para dar
continuidade ao estudo do artista,
então o artista sai depois desse
período e viaja pra outros estados, faz
contato com essa nova cultura,
vivencia outras experimentações
artísticas. Essa vivência com outras
experimentações artísticas é que
esse crescimento, quando ele chega
aqui, ele pega essas experimentações,
essas vivências artísticas e transforma,
remodela e que essa nova cara a
cada ano no festival”.
Quadro 5 - Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre a elaboração de projetos coletivos
Fonte – Pesquisa direta
104
A fala do diretor de arte do Caprichoso, ao se referir ao seu
desenvolvimento pessoal sem o apoio da Associação ou do Governo, revela traço
característico do personalismo.
Desenvolvimento
Local Integrado
Presidentes
Garantido
O Garantido surgiu em 1913 (...), a Associação (...) existe 25 anos para
apresentar a Amazônia, a cultura amazônica e a cultura do Boi Bumbá. Possui
cerca de 1900 sócios e mobiliza cerca de 2.500 pessoas.
“O Boi Bumba é uma variação do Bumba-meu-Boi do Maranhão e aqui
incorporou fundamentalmente o lendário indígena. A mitologia indígena, que
realmente é um negócio muito bonito, onde os artistas, após fazerem uma
leitura das lendas, ou da criação ou da gênese, ou do extermínio de uma
nação. Todas as nações e etnias[indígenas] têm como elas foram criadas e pós
morte o que acontece com eles. Todos eles têm essa história, essa questão
mitológica, essas lendas e aí o artista pode fazer uma leitura daquela e ele viaja
naquilo e vai desenhando, criando. Primeiramente o desenho, pra depois
executar aquilo nos moldes alegóricos e resulta no que acontece no
Bumbódromo”.
“A Amazônia, mesmo para as pessoas que não a conhecem, quando é falada
em qualquer lugar do mundo suscita uma curiosidade, suscita um interesse.
Então é uma grande marca, é uma grande grife, resta-nos saber vendê-la
fora, usufruir do potencial dela em benefício da comunidade que aqui vive, dos
habitantes da Amazônia”.
Instituições
Caprichoso
Além da tradicional história do grupo que vem desde 1913. Este passou a ser
associação legal em 1996”. O Caprichoso conta com a participação de 717
sócios fundadores”.
“O Boi-bumbá explicita as figuras típicas regionais mais importantes e que
expressam concretamente a vida e a realidade amazônica”.
Quadro 6 - Síntese do Discurso dos Atores Internos sobre Instituições
Fonte – Pesquisa direta.
Com relação ao Quadro 6 - Síntese do Discurso dos Atores Internos
sobre Instituições observa-se mais uma vez traços da cultura brasileira
representados na hierarquia e no personalismo, quando apenas os presidentes
falam sobre a Associação como instituição. Os relatos também expressam o
resgate dos elementos da cultura indígena para dar significado ao ritual do boi.
Pelo tempo de criação das associações, pode-se concluir que o grande
projeto coletivo do Município de Parintins é o fenômeno dos bois, existente 95
anos. Entretanto, sua formalização, mediante a criação das associações somente
acontece há 25 anos.
Pelo discurso do presidente do Garantido, contudo, esta iniciativa
comunitária se insere na lógica do capital e se torna uma mercadoria para ser
105
vendida, com a justificativa de que a venda traria benefícios para os habitantes da
Amazônia.
4.4 ATORES EXTERNOS
O grupo denominado “Atores Externos” do processo está representado por
órgãos públicos e empresas privadas, patrocinadores do evento, como também
alguns representantes da comunidade local. O propósito maior dessa investigação
foi identificar a percepção desses atores sobre a influência do fenômeno cultural
dos bois-bumbás para o desenvolvimento local da cidade de Parintins, através das
variáveis do estudo que nortearam a pesquisa, resumindo-se nos indicadores das
iniciativas locais de desenvolvimento. Entre eles, a emergência de atores sociais,
criação de redes de cooperação, desenvolvimento de projetos coletivos e a criação
de sistema institucional.
4.4.1 Síntese do Discurso dos Atores Externos sobre a Emergência como
Atores Sociais.
Na perspectiva dos pressupostos do DLS atores sociais estão
representados por sujeitos, cuja atuação sempre traz benefícios em cadeia para
um território ou localidade, como por exemplo: líderes comunitários, representantes
institucionais, gerentes de projetos, diretores de serviços ou de agências de
desenvolvimento. Nesse sentido, manifestam-se por intermédio de entidades,
organizações, associações ou grupos de pressão política, cujo perfil de
competência, em termos de conhecimentos, habilidades e atitudes, os predestinam
a representar um papel particular na realização das políticas de desenvolvimento.
De acordo com os resultados da pesquisa, o evento contribui com a
emergência de atores sociais. No entanto, tais atores ainda não possuem um perfil
que os caracterize enquanto fomentadores de políticas de desenvolvimento, como
pressuposto pelo DLS. A falta de interação das parcerias, do engajamento na
106
busca de novas oportunidades para a dinâmica local e a falta de transparência nos
convênios e contratos, mostra a fragilidade com que são tratadas as decisões que
envolvem os atores sociais, tanto no que diz respeito aos parceiros internos, como
externos. De acordo com depoimentos obtidos, a emergência da escolha da
parceria entre patrocinadores e dirigentes das Associações Folclóricas dos Bois-
Bumbás ocorre de diferentes formas. Ora por convênios, ora por encaminhamento
do projeto do festival às empresas para análise e seleção de patrocínio, ou contato
dos próprios dirigentes das organizações dos bumbás em busca de apoio a
projetos sociais para a comunidade. No entanto, percebe-se claramente nos
depoimentos que as pessoas contatadas das empresas patrocinadoras não são de
Parintins. Fica evidente, porém, que as relações estabelecidas em busca de
patrocínio acontecem de maneira mais formal que informal, como mostra o
fragmento (01),
[...] assina um convênio com as Associações Folclóricas Boi-bumbá
Garantido e Boi-bumCaprichoso. [...] o compromisso é com o Festival,
é com o município de Parintins. [...] O patrocínio [...] ele é direto [...]
patrocina o festival, patrocina os Bois. Tem um convênio que repassa
esse recurso de apoio financeiro para os bumbás. Por exemplo, a
empresa [...] tem sido nos últimos anos um grande parceiro, parceiro que
conquistou a empresa [...] como patrocinadora do Boi-bumbá. Agora o Boi
tem parceiros diretos. E o patrocínio é mensurado de acordo com o
alcance do Festival, o volume de renda que ele gera, o número de
pessoas envolvidas, qual a importância que ele tem para o município e o
Festival Folclórico de Parintins é um dos maiores produtos culturais e
artísticos do Estado do Amazonas.
Fonte: Atores Externos – Instituição Pública.
Conforme se observa, existe, por parte das instituições públicas, iniciativas
na busca de parcerias para promoção do evento. Entretanto, fica evidente na
exposição do entrevistado o compromisso do investimento cultural ficar
condicionado “com o alcance do Festival” ou com “o volume de renda que ele gera”
[...]. Isso implica considerar que a negociação dos interesses demonstra haver
contraste do evento cultural para apropriação pelo capital.
Pela forma como é viabilizado o repasse dos recursos para as
organizações dos bumbás, evidenciam-se traços característicos da cultura
brasileira focada no modelo de gestão hierárquica, com tendência à centralização
do poder dentro dos grupos promotores do evento. Apesar dos esforços
107
articulados entre as instituições públicas traços característicos, tipo de iniciativa
da adoção de projetos de caráter público local, os quais, de acordo com Rosa
(2002), ao priorizarem uma lógica do interesse comum, buscam fortalecer as
iniciativas locais insuficientes ou ineficientes. Esta parceria emerge geralmente de
uma vontade substitutiva de reagir a uma situação econômica e social
desfavorável. Essas ações paliativas ficam claras no fragmento (02),
[...] depois de 5 ou 6 anos, a partir dos anos 90, é que vimos que os
moradores de Parintins tomaram justamente iniciativa, e com isso também
uma grande ajuda por parte de Governo aqui no interior, promovendo por
exemplo, o projeto “café da manhã”o que alivia essa falta muito grande de
atendimento ao fluxo de turista.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local
Após referir-se a todos os trâmites burocráticos por que passa a aprovação
de um projeto, o entrevistado no trecho (03) deixa clara a falta de integração das
parcerias, pois “[...] ninguém pertence a Parintins. Na verdade eles nos procuraram,
nós fizemos as visitas, apoiamos, e surgiu a proposta”. Como se pode observar
a iniciativa fica na responsabilidade dos dirigentes dos bumbás. Nesse sentido,
não há engajamento por parte das parcerias na promoção de valores de
desenvolvimento local, principalmente quando se analisa na expressão “pediram
apoio para estruturar o lado social que estava muito abandonado”. Mais uma
vez constatam-se contradições subjacentes no discurso quanto ao tratamento
dado à concepção de cultura, como se os benefícios econômicos independessem
da essência maior do significado de cultura, pois:
(03) Bem, não é bem patrocinadores, nós fizemos um convênio de
cooperação técnico-financeira que foi pra estruturar a escolinha de Artes
de lá, pra dar um incentivo na área social. [...] na verdade, é o seguinte,
hoje além do lado cultural que ocorre na cidade que todo mundo conhece,
tem o lado social para atender a comunidade carente do município fora do
período do Festival, eles pediram apoio para estruturar o lado social
que estava muito tempo abandonado. Então a instituição [...] apoiou
os dois para que mantivesse essa estrutura, começasse alguma coisa no
caso do Garantido, e no Caprichoso alavancar o que já tinha.
Fonte: Parceiros Externos – Instituição Pública.
108
O sistema de parcerias que constitui a promoção do evento está ligado às
instituições públicas, algumas subsidiadas por ONG’S e empresas privadas. Dados
da pesquisa apontam que os apoios de patrocínio advindo de algumas instituições
duram mais de 13 anos. Estando na 43° apresentação os benefícios do apoio
chegam para suprir alguns problemas emergenciais da infra-estrutura da cidade,
às vésperas do evento. Mas está longe de ser suficiente, pois os acordos dos
investimentos não se realizam com todas as partes envolvidas, principalmente, a
comunidade local. Isso remete a Pereira (2006, p. 14), quando reconhece ser “a
ausência de participação social/cidadã... [...] um dos maiores limitadores da ação
social”. E esse fator impactante fica refletido nas falas observadas nos trechos (04)
e (05) em que:
Os representantes dos bois são de Parintins e Manaus, normalmente. São
assinados contratos formais de patrocínio, com cláusulas a serem
cumpridas pelas partes envolvidas. [...] a empresa y é a maior
patrocinador do Festival de Parintins e foi a primeira grande empresa a
apoiar a manifestação cultural. A cada ano são negociados valores e
compromissos com as agremiações.
Fonte: Parceiros Externos – Empresa Privada.
O projeto do Festival é apresentado a Cia e passa por uma seleção,
concorrendo com projetos de todo o país. Não existe relação informal
entre patrocinador e patrocinada. A empresa x é a que mais investe na
cultura brasileira e conseqüentemente na cultura amazonense. A política
de patrocínio cultural de empresa se alinha ao planejamento estratégico
da companhia, que ao lado da rentabilidade, ressalta seu compromisso
com a responsabilidade social e com o crescimento do país.
Fonte: Parceiros Externos – Empresa Privada.
Claramente percebe-se nos discursos acima haver por parte das parcerias
um compromisso em apoiar manifestações culturais. No entanto, a ausência de
precisão nos objetivos comuns, aliada à falta de transparência das estratégias
negociadas através das parcerias reflete uma conotação de desenvolvimento que
contraria os pressupostos do DLS principalmente por entender que parceria refere-
se às ações conjuntas assumidas entre instituições blicas e privadas em torno
de objetivos comuns. É um processo institucional articulado que visa somar
esforços de coordenar ações, gerando sinergia e potencializando os resultados
para o desenvolvimento local (ROSA, 2002).
109
Em momento algum são mencionados pelos parceiros/empresa privada
estratégias de patrocínio que possam ser revestidos em políticas públicas em nível
local, com interesses de aproveitamento dos recursos humanos, naturais e
financeiros locais. Mais uma vez a ênfase no discurso fica restrita a interesses
econômicos da lógica de know-how apenas na promoção do evento em si. A
ineficácia dessas ações começa a ser refletida na comunidade local, é o que
evidencia o trecho (06):
Boi-bumbá, na realidade, ele contribui através de reflexos, quais seriam
esses reflexos? Se nós nos concentrarmos apenas na realização do
Festival Folclórico em si, nós diríamos que o Boi não contribui em nada,
por quê? Porque a realização do Festival enquanto evento grandioso,
reconhecido internacionalmente, ele, os recursos que circulam em torno
desse evento, ele praticamente não fica em Parintins, ele não fica na
cidade, ele não fica com o parintinense. Agora, os reflexos deste evento
geram alguns benefícios, quais benefícios? Benefícios que o desde a
infra-estrutura que a cidade necessita, benefícios que atingem, por
exemplo, projetos socioculturais. E muitas vezes, outras cidades teriam
muita dificuldade em conseguir recursos de ministérios, recursos de
embaixadas, recursos de Ongs, então esses recursos vêm para Parintins
por quê? Por causa do nome do Boi, ele estabelece para Parintins,
enquanto cidade turística, cidade cultural. Bom, isso seria, o meu ponto de
vista em relação aos reflexos do Boi-bumbá. Agora, se você me perguntar
os recursos que são investidos no Boi-bumbá ficam em Parintins?
Praticamente é mínima a quantidade que fica, por quê? Porque o volume
de negócios em torno do Festival, ele beneficia muito mais as grandes
empresas, muito mais os grandes comerciantes, o firmas de São
Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Rio Grande do Sul, agora até na
China vai se adquirir material do Boi-bumbá. Então, fica o
questionamento, enquanto evento, o evento em si, ele não deixa muitas
divisas para Parintins, ele cria um envolvimento grandioso para pequenos
vendedores, ambulantes, pessoas que vendem refrigerante, pessoas que
alugam casa, mas é o mínimo em relação ao volume que se investe, é o
mínimo que fica na cidade.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local
Quer se trate de iniciativa de indivíduos, de empresas privadas ou
iniciativas públicas, pode-se identificar dois tipos de lógica de parceria: 1) Parceria
para cobertura de interesses definidos: este tipo de parceria nasce da
oportunidade conjuntural (programas, financiamento excepcional, etc.). Limita-se
no tempo. Segue uma lógica de projeto (encontrar e associar os fornecedores de
meios e de know-how em torno da montagem concreta de uma operação). 2)
Parceria para o desenvolvimento ou identidade do território: este tipo visa à
construção de um projeto de sociedade. Baseia-se numa abordagem pedagógica e
110
moralizadora que demora tempo. A sua finalidade é, pois, uma tomada de
consciência de cidadania, uma modificação dos comportamentos e um empenho
responsável do maior número de indivíduos possível (ROSA, 2002).
Quando se analisa a cultura na visão dos atores externos, constata-se uma
visão antagônica entre os patrocinadores e a comunidade local. Essas
divergências de opiniões se justificam nos traços característicos da cultura
brasileira (FREITAS apud MOTTA; CALDAS, 1997) entre eles, a hierarquia se
constata nos trechos (07) e (08):
(07) [...] Toda vez que se repassa algum recurso, que faz qualquer
atividade, qualquer projeto, a primeira coisa que se é a questão da
sustentabilidade, a questão do custo-benefício, a questão do que vai ficar.
Por exemplo, como a gente costuma fazer o apoio a festas populares nos
municípios, o que fica pra comunidade? Porque a festa vem, cumpre o
seu papel, atrai o turista, aumenta a renda, mas é importante que sempre
deixe alguma coisa em contrapartida, é uma biblioteca, é uma banda de
música, é a capacitação, é alguma coisa que tenha a permanência, que
seja nos 365 dias no ano, tenha um benefício trazido por esse
investimento do governo.
Parceiros Externos: Instituição Pública.
(08) [...] os Bois estão dentro de uma lógica de mercado do sistema
capitalista, e é uma estrutura totalmente verticalizada e que pouca
contribuição traz em nível de desenvolvimento econômico. É admissível
que haja sim um crescimento econômico, pra quem? Para os grupos que
administram a festa, que administram os Bois e para empresários que
também tiram proveito da situação. Agora pensando em desenvolvimento
econômico, que é a eqüidade na distribuição de riquezas, de distribuição
de benefícios pro social, isso deixa muito a desejar, então em termos
de desenvolvimento econômico, desenvolvimento social, a nossa análise
perpassa primeiro pela visão de que o Boi está dentro de uma estrutura
capitalista, dentro de uma lógica de mercado, em que dentro dessa lógica
o que prevalece é o lucro, não o humano.
Parceiros Externos: Comunidade Local.
Os paradoxos sobre o termo “sustentabilidade” são visíveis no trecho (07).
A preocupação do entrevistado visa melhoria de investimentos apenas de caráter
quantitativo. Estando o critério “capacitação” das pessoas enquanto contrapartida
de interesses. É bom registrar que o interesse sobre essa capacitação partiu da
iniciativa dos profissionais envolvidos diretamente no evento, ao avaliar diversos
problemas como a falta de segurança, de equipamentos, questões trabalhistas,
entre outros. Esses problemas são divulgados pelos jornais de circulação na
111
comunidade local cotidianamente. E, foi nesse contexto de luta que lançaram
neste ano (2008) “um pacote” de parcerias entre a Prefeitura Municipal,
Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA), Força Sindical,
Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (FIEAM), Centro das Indústrias
do Estado do Amazonas (CIEAM), Coca-Cola e os bumbás Garantido e
Caprichoso (FREITAS, 2008).
No trecho (08) o respondente admite reconhecer que a festa dos bumbás
está “dentro de uma estrutura capitalista [...] o que prevalece é o lucro, não o
humano”. São implicações visíveis nos discursos das empresas parceiras, quanto
esclarecem sobre o objetivo do patrocínio, depoimentos (09) e (10),
(09) [...] fortalecer uma manifestação cultural e popular legítima e que
merece ser conhecida internacionalmente, como temos conseguido fazer
em todos esses anos, através de convidados de renome nacional e
internacional.
Fonte: Parceiros Externos - Empresa privada.
(10) Ainda [...] se empenha em defender e valorizar a cultura brasileira por
meio de uma política de patrocínios de alcance social, articulada com as
políticas públicas para o setor e focada na afirmação da identidade
brasileira.
Fonte: Parceiros Externos – Empresa privada.
Como se percebe o “ganho” do apoio do patrocínio está em tirar a cidade
do anonimato e torná-la conhecida internacionalmente. As metas subjacentes à
concepção de cultura o valorizam ações políticas articuladas na promoção do
desenvolvimento participativo e auto-sustentável. Acredita-se ser esse campo
complexo e rico em diversidade, prova de êxito para os líderes e demais atores
sociais mostrarem competência, criatividade e inovação no desenvolvimento de
idéias e soluções. São características mínimas e necessárias para o
estabelecimento de redes de cooperação pensada na política do DLS.
112
4.4.2 Síntese do Discurso dos Atores Externos Sobre a Criação de Redes de
Cooperação
A percepção usual sobre redes de cooperação presente na visão dos
atores externos apresenta paradoxos diante dos conceitos discutidos nos
pressupostos do DLS. Em uma primeira análise a concepção de redes na
percepção dos atores/empresas privadas fica limitada na negociação de valores do
patrocínio. Na segunda, a compreensão do processo remete sentido para as
dinâmicas da comunicação dos atores como reuniões, conferência e seminários.
Embora não se rejeite esses dois importantes mecanismos viabilizadores da
política do DLS, as questões debatidas neste item ficam mais claras quando
entendidas no contexto dos discursos dos atores envolvidos. Como mostram os
trechos (11) e (12):
(11) [...] através de reunião, através de documentos informais. O [...] tem
trabalhado de uma forma participativa não com os Bumbás, mas
também com a comunidade parintinense. Nós realizamos quatro
seminários de avaliação crítica do Festival Folclórico de Parintins, dos
quais participou a comunidade de Parintins, a comunidade formal e
informal, o poder público municipal, estadual e federal, porque a
participação do governo no Festival não é patrocínio para os bumbás,
é a estrutura toda do Festival, não dentro do Bumbódromo como da
própria cidade, porque durante o Festival o governo mobiliza toda sua
força de trabalho na área de saúde, na área de segurança, então tudo é
mobilizado para o festival.
Fonte: Parceiros Externos – Instituição Pública.
(12) Não [...] Até porque o nosso objetivo não é formar uma rede de ação,
talvez até seja uma rede de assistência social no Estado como um todo,
mas cada uma trabalhando no seu nível, não uma situação coordenada
pelo [...] Estado, mas o nosso papel é apoiar, dar suporte para que as
organizações não governamentais do Estado desenvolvam suas ações
por meio de convênio, cada uma tem a sua especificidade, faz o seu
trabalho, a gente apóia naquele momento, depois ela vai caminhando
com as próprias pernas.
Fonte: Parceiros Externos – Instituição Pública.
A percepção de rede, porém, se manifesta de forma contestatória quando
se busca o conceito dessa iniciativa, na comunidade local. Conforme se observa
no fragmento (13),
113
(13) [...] pra que nós chegássemos a isso, é necessário que os Bois
repensem o modelo de administração, o modelo social, o modelo de
Estado em que o Boi está inserido. Começa por aí, o desafio seria
desconstruir para poder, a partir de ouvir os interesses, as intenções, as
manifestações dos grupos da sociedade e construir um grande projeto,
mas enquanto não se repensar esse modelo de Estado e a inserção do Boi
dentro desse modelo, é difícil construir alguma coisa que venha realmente
representar uma manifestação popular.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local
Nessa ótica cabe aqui esclarecer a visão de Buarque (1999), sob o papel
do Estado. Enquanto instância jurídico-política, ele visa sintetizar o jogo de
interesses e poderes dos atores sociais, em conflito e cooperação, consolidando e
expressando uma estrutura de poder na sociedade. Deste ponto de vista o Estado
não é um ator, nem ente autônomo desvinculado da sociedade, nem tem vontade
própria, sendo expressão dos atores, seus interesses diferenciados e suas
relações de poder.
Sob esse prisma, os entrevistados entendem ser viável a formação de rede
de cooperação para consolidar a participação da comunidade na construção
democrática das parcerias. De acordo com os trechos (14) e (15):
(14) Existe [...] dois, três anos, existiram seminários para os quais foi
solicitada a presença da sociedade civil organizada, dos segmentos
sociais. Então houve um ensaio de discussão, mas nós ainda estamos
muito longe de democratizar, de democratizar essa realização, de
democratizar essa discussão, por quê? Por que se realizam seminários,
mas depois o produto final sempre está centralizado com o Estado,
sempre está centralizada com as empresas que investem, os
patrocinadores. A comunidade praticamente não tem nenhuma voz ativa
pra dizer como deveria ser o Festival ou opinar como ela gostaria que
fosse.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
(15) Agora nestes últimos anos é que aconteceu algum tipo de
conferência para a sociedade ser convidada, mas o que geralmente são
convidados são os segmentos que são envolvidos com o Boi-bumbá, a
própria sociedade, o povão enfim, eles não participam, não têm acesso a
essa situação, mas as entidades que são envolvidas, que ganham
dinheiro; eles são convidados, mas o povão não.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
114
A ausência da participação da comunidade local e as evidências da
centralização de poder nas decisões se repetem nas opiniões dos demais
entrevistados representantes da comunidade parintinense. Seguramente, essa é
uma discussão que impõe uma gama enorme de desdobramentos e explicações
consideradas significativas, pois implica em apelo à falta de atuação da
constituição de redes nas parcerias, principalmente pelo caráter imediatista e
descontínuo e sem monitoramento que vêm sendo tratadas as questões da cultura
local, discutidas no trecho (16):
(16) Eu poderia dizer que o Festival em Parintins, ele tem contribuído
muito e é lógico, embora isso aconteça só apenas em 3 dias em cada ano
do mês de junho. O que eu gostaria de ver que esta sociedade movida
através dos seus dirigentes de Boi-bumbá, agremiações, as outras
entidades de direito que tem que incentivar a cultura local pudesse não
ficar somente no Festival Folclórico, porque depois do Boi, na verdade,
Parintins fica sem opções. Eu acho que deveriam ser trabalhados aqui
outros eventos que pudéssemos aproveitar, principalmente agora que nós
estamos tendo um fluxo de turistas gradativo, quem vêm buscar Parintins
através dessa grande divulgação desse evento formidável, maravilhoso. É
uma das maravilhas contidas aqui no Norte do Brasil e que a gente
poderia tratar isso com mais seriedade e não deixar apenas no Boi-bum
[...].
Fonte: Parceiros Externos - Comunidade Local.
Não obstante, se analisa no trecho (17) os reflexos da fragmentação dos
interesses das parcerias dentro da própria Organização dos Bois-Bumbás, quando:
(17) Bom, é preciso que a sociedade entenda uma coisa, que a
Associação Folclórica Boi-bumbá Caprichoso que é o lado boi de arena. E
tem a Fundação Boi-bumCaprichoso, que é o lado social, no caso é
onde está inserida a Escola de Artes Irmão Miguel de Pascalle. Então,
esta é a separação, os parceiros. Tem parceiros da Associação, no caso
é a Coca-cola, o Governo Federal, o Governo Estadual que são da
Associação do Boi de arena. Tem parceiros da Fundação, que é o
Governo do Estado, através da Secretaria de Cultura, da Secretaria de
Educação, e temos também a Caixa Econômica e Fundação Banco do
Brasil, são os parceiros da Fundação. O Boi-bumbá tem a sua
contribuição dentro da própria Escola Irmão Miguel de Pascalle, mas o Boi
não, os parceiros do Boi é o próprio Boi que coopera também, conosco.
[...] em Manaus funciona o Movimento Marujada, que é um dos grandes
parceiros da Escola de Arte. Então quando uma necessidade, quando
uma dificuldade nossa, o primeiro a levantar é o Movimento Marujada,
que nos ajuda muito, isso dentro do contexto do Boi-bumbá. Graças a
Deus até agora não temos tido dificuldade, o que o Governo prometeu,
115
cumpriu e está cumprindo, a Caixa Econômica, o que prometeu cumpriu e
continua cumprindo, a Fundação Banco do Brasil, cumpriu e está
cumprindo. Nós recebemos os materiais didáticos, amesmo móveis e
utensílios desses parceiros.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
Importa ainda destacar na expressão “Graças a Deus” proferida pelo
depoente, um pressuposto implícito, característico dos traços da cultura brasileira,
conhecido como religiosidade, ou seja, indivíduo busca solução para o problema
amparado por uma entidade metafísica e religiosa. Não obstante, se analisa ainda
no discurso dos demais atores a presença da hierarquia e do personalismo
(FREITAS apud MOTTA; CALDAS, 1997).
Quando se buscou conhecer as percepções dos atores responsáveis pela
Coordenadoria de Turismo Municipal, do agente de viagem e vendedores de
produtos artesanais, mais uma vez detectou-se haver desconhecimento sobre o
significado mais amplo de redes. O trato da ausência dessas ações podem ser
refletidas no discurso do representante das etnias Sateré Mawé (Andirá), Vai-Vai
(Oriximiná/Pará) e Ticuna (Alto Solimões), conforme trecho (18) que a convite da
Fundação Nacional do Índio (FUNAI) aproveitaram o período para venderem
produtos artesanais, mas:
(18) O Prefeito deveria ter parceria com as etnias indígenas para
instalarem malocas. Tudo o que usa no festival é coisa de índio, a dança,
os rituais, então os índios deveriam ser mais respeitados. O turista que
vem aqui vem para ver índio e não outra coisa.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
Mais uma vez a presença do autoritarismo, tendência à centralização do
poder dentro dos grupos sociais e distanciamento nas relações entre diferentes
grupos sociais se fazem presentes, caracterizando os traços da cultura brasileira.
Iniciativa de pertença ao grupo e cooperação mútua entre os atores sociais
locais não acontece, de acordo com os entrevistados. Em momento algum se
observam nos discursos dos atores envolvidos, reconhecimento da comunidade,
das lideranças antigas dos bumbás, aspectos culturais ou sociais. Inclusive, um
desses fatores começa a apresentar insatisfação na comunidade, como
observado em matéria jornalística que reporta o seguinte: “Os desprezados ‘donos’
116
dos bois: Figuras que ajudaram a fazer a fama e a história dos bumbás de
Parintins reclamam da falta de consideração”. De acordo com um dos sócios
fundadores “A evolução no boi devia ser acompanhada com a preservação da
memória dos veteranos” (CESAR, 2008). Segundo os pressupostos do DLS esses
conflitos podem ser revestidos através da construção de um projeto coletivo.
4.4.3 Síntese do Discurso dos Atores Externos Sobre a Elaboração de
Projetos Coletivos.
De acordo com resultado da pesquisa, tanto as parcerias públicas como as
empresas privadas não dispõem de projetos coletivos pensado nos pressupostos
do DLS. Enquanto uns cogitam a possibilidade da construção do programa, outras
admitem possuir, quando acionam estratégias práticas de solução social na
comunidade local através de seleção de projetos direcionados a diversos
segmentos, como: artes cênicas, artes visuais, cinema, cultura, literatura, música,
patrimônio edificado, entre outros.
Nos fragmentos (19) e (20) evidencia-se nas falas dos entrevistados a
concepção que têm sobre projetos coletivos:
(19) Na verdade, a coordenação de todo o Festival está a cargo da
instituição, é ela que congrega todos os Órgãos, é ela que realiza
reuniões com todos os Órgãos, com a Polícia Militar, a Aeronáutica, com
a Secretaria de Saúde, de Estrutura, ela que organiza todo o projeto do
Festival Folclórico. [...] A diretoria de eventos, os funcionários dos vários
setores da Secretaria. O departamento de eventos é que coordena, mas
precisa do jurídico pra fazer o convênio, precisa do financeiro pra fazer
todos os trâmites, do administrativo pra fazer... Né?! Então são vários
setores da [...] que trabalham, isso internamente, porque externamente
nós temos todos os Órgãos do governo do Estado, do poder municipal e
do poder federal, como eu falei: Aeronáutica, Marinha, porque para ir para
Parintins tem que ter a Marinha tomando conta dos barcos, para verificar
lotação, itens de segurança, precisa da Aeronáutica pra poder... pra poder
tomar conta do aeroporto, precisa da Infraero pra sinalizar o aeroporto.
Então a Secretaria coordena todos esses Órgãos, a atividade de todos
esses Órgãos. No último Festival Folclórico de Parintins, a equipe médica
que trabalha em Parintins recebe um suporte para a Saúde, então vai
uma equipe, vai anestesista, cirurgião, especialistas em todas as áreas,
ortopedistas, vão uma equipe pra reforçar a estrutura. Aí vai Polícia Militar
são 700 homens da Polícia Militar daqui de Manaus que vão pra
Parintins para reforçar o policiamento, vai uma equipe de Bombeiros, vão
117
120 homens do Corpo de Bombeiros para reforçar a equipe de bombeiros
que existe em Parintins. Então todo esse trabalho requer essa
organização de cada Secretaria, cada Órgão, cuida da sua atividade, do
seu trabalho. A [...] tem a obrigação de coordenar todos para que tudo
funcione. Então é esse que é o papel da Instituição.
Fonte: Parceiros Externos – Instituição Pública.
(20) Na verdade, cada Órgão tem o seu foco de atuação, o nosso, por
exemplo, é atender aquela necessidade imediata da ONG, no caso do
Caprichoso melhorar a estrutura para o ensino de arte, pintura, essas
coisas todas, depois se uma outra Secretaria do Estado achar que deve
apoiar o custeio de uma outra coisa depende dela, mas não existe uma
rede dentro do Estado, não existe um projeto coletivo, por exemplo, o [...]
e a [...] trabalhando juntos pra apoiar uma atividade, não existe nesse
nível, mas cada uma atuando na sua especificidade.
Fonte: Parceiros Externos – Instituição Pública (grifo nosso).
Obviamente, sabe-se do potencial das ações de todos os órgãos
envolvidos com relação à responsabilidade e mobilização do pessoal às vésperas
da realização do festival promovido pelo Estado. Constata-se nesse período que a
cidade sofre total transformação. Os equipamentos e o pessoal de apoio vêm da
capital. Todo o investimento na época se destina ao bom funcionamento do evento.
Mas quando passa esse período, a cidade fica sem opção. A consolidação do
projeto coletivo na perspectiva do DLS não se efetiva em ações fragmentadas. No
trecho (19) na fala “[...] tem obrigação de coordenar todos, para que tudo funcione”.
E no trecho (20) “não existe um projeto coletivo, por exemplo. [...] trabalhando
juntos pra apoiar uma atividade, não existe nesse nível, mas cada uma atuando na
sua especificidade”. Marcam traços da cultura brasileira como a hierarquia,
estrutura piramidal com centralização de poder formal. Mais do que um simples
programa, os projetos coletivos priorizam objetivos a alcançar em função de
acordos previamente instituídos que dão sentidos pessoais e coletivos aos
processos de mudança. Nesse sentido, torna-se global, pois envolve todos os
componentes da vida local e procura levar em conta as numerosas interações
entre esses componentes, e a explorá-los como recursos a serviço do
desenvolvimento (TEISSERENC, 1994). É oportuno ainda considerar as reflexões
percebidas pela comunidade local quando questionada sobre a elaboração do
projeto coletivo, como mostra o trecho (21),
118
(21) [...] a gente sabe que têm alguns projetos, as escolas de formação de
artistas, existe tanto em um quanto no outro, mas um projeto de
democratização da cultura, a democratização do Boi-bumbá, isso não
existe, porque as coisas já vêm pré-determinadas de acordo com os
interesses do grupo, dos interesses do lucro, quem dera se realmente os
Bois desenvolvessem um projeto que pudesse abrir para a coletivização
da arte, coletivização da cultura, a gente poderia realmente acreditar
que a festa é popular, que a festa era uma manifestação da cultura desse
povo.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
É nítido no discurso (21) perceber as contradições que se estabelecem
entre as relações intersubjetivas, característica do sistema capitalista com um
desejo latente observado na fala do entrevistado quando anseia, em seu discurso,
por uma manifestação cultural realizada em projeto pensado no e pelo povo. “[...]
as coisas vêm pré-determinadas de acordo com os interesses do grupo, dos
interesses do lucro”. Nessa expressão características da influência do modelo
de produção baseado no mercado e na sociedade de classes: o estrato capitalista,
que detém o capital, a propriedade, os objetos de trabalho, os meios de produção
que exploram o trabalho para obter mais-valia e a camada trabalhadora, que
vende sua força de trabalho. A força de trabalho é, assim, como tudo no
capitalismo, transformada também em “mercadoria que tem o dom de criar valor
maior do que nela está contido” (TEIXEIRA, 1995, p.132).
Para Marx (1985, p. 154), os fenômenos peculiares do processo de
trabalho capitalista são:
a) o trabalhador trabalha sob o controle do capitalista a quem pertence
seu trabalho. O capitalista cuida de que o trabalho se realize em ordem e
os meios de produção sejam empregados conforme seus fins, portanto,
que não seja desperdiçada matéria-prima e que o instrumento de trabalho
seja preservado; e b) o produto do trabalho é propriedade do capitalista, e
não do produtor direto.
Esta forma da divisão do trabalho fornece a lógica do modelo que se
instala no contexto das organizações e das parceiras patrocinadoras do festival,
pois conforme resultado desta pesquisa, a infra-estrutura vem toda de fora. Esse
resultado é impactante, pois de acordo com os entrevistados “ficamos com as
119
‘migalha’ [...] os artistas fazem contratos, porém são mal pagos. [...] não levam a
sério os trabalhos dos artistas”. Além das influências da lógica (MARX, 1985) do
acúmulo do capital nas mãos da classe burguesa verifica-se a alienação também
do trabalhador (artistas plásticos) quando da existência desse traço dentro da
própria categoria refletido na figura do “artista de ponta”, ou seja, o “chefe” que
“recebem para mandar”. Essa lógica fica clara no trecho (22):
(22) Existem os artistas de ponta” esse nome inclusive passa a ter um
certo preconceito. Quem recebe o dinheiro do trabalho são eles. Como
também são eles que firmam contratos com os artistas que realmente vão
construir o trabalho. [...] Recebem para mandar. Geralmente fazem um
contrato por três meses, mas não amparam. É um contrato “quase
escravo” sem proteção e de péssimo ambiente. No entanto, nota-se um
diferencial diante dessa má assistência. Tem organização que quando
falta recurso, como materiais e adereços, pára de funcionar. Outra, não,
prosseguem com os trabalhos, reciclando, emendando, soldando e
adaptando material.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
Esse afastamento nas relações de produção caracteriza formas históricas
advindas das primeiras relações sociais influenciadas na força do trabalho escravo,
“ordenado, reprimido, e calado, gerando uma estratificação social e rígida
hierarquização de seus atores, estabelecendo uma distância quase infinita entre
senhores e escravos” (FREITAS, In MOTTA; CALDAS, 1997, p. 46).
Sob essa ótica, o trecho (23) explicita como vêm ocorrendo as ações via
projeto no contexto das organizações dos bumbás, pois:
(23) Tem projetos, assim, bem acanhados, agora que começaram a
aparecer mais entidades, como por exemplo, a Força Sindical, a
Confederação Nacional dos Transportes, alguns outros órgãos federais,
começaram a aparecer alguns investimentos, aquela resposta social que
os Bumbás deveriam dar à comunidade. No Caprichoso, nós temos o
conhecimento da Escola de Artes Irmão Miguel de Pascalle, essa escola
de artes atende centenas de crianças com várias oficinas o ano todo, que
é um projeto financiado pelo Governo do Estado e parte dele também com
a AABB Comunidade, a Fundação Banco do Brasil, né? Bom, no
Garantido, agora que começaram cursos como também no Caprichoso
em parceria com a Força Sindical e as entidades citadas anteriormente,
dentre elas a SUFRAMA, a Prefeitura de Parintins. Então, este ano
apareceram estes cursos, são cursos de qualificação profissional, agora
dentro da área que o Bum tem necessidade. Um curso muito
importante está acontecendo agora, que é o Cálculo Estrutural, para os
120
artistas que montam aquelas alegorias, mas o meu pensamento é que a
resposta que o Boi está dando para comunidade, para sociedade em
relação ao montante de recursos que chega para a “brincadeira”, é muito
acanhada.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
A idéia das ações via projeto com as parcerias citadas anteriormente
atendeu a essa demanda recentemente. Anterior a essas reivindicações constata-
se um projeto idealizado pela Associação dos Artistas Plásticos de Parintins
(AAPP). Com metas voltadas para a inclusão social, e, em especial, para atender
as necessidades dos artistas plásticos foi viabilizado pelas entidades locais um
curso de “Expressão Visual” realizado nas dependências da Universidade Federal
do Amazonas (UFAM). No entanto, o curso o teve continuidade gerando certo
desestímulo.
Nessa ótica, a concepção de cultural implícita nos trâmites dessas ações
vai de encontro aos pressupostos de Motta; Caldas (1997, p. 34), quando
entendem que a cultura:
[...] designa, classifica, corrige, liga e coloca em ordem. [...] A cultura é um
sistema de símbolos e significados compartilhados, que serve como
mecanismo de controle. A ação simbólica necessita ser interpretada, lida
ou decifrada para que seja entendida. [...] Toda cultura é caracterizada
por algum nível de continuidade.
Na tentativa de respaldar esse raciocínio Rosa (2002) contribui com duas
formas do processo de concertação
66
de parcerias: deveriam ser definidas por
estruturas permanentes ou permanecer de forma latente? As duas formas
apresentam prós e contra, pois a institucionalização do processo pode produzir
uma excessiva burocratização e perda de entusiasmo por parte dos primeiros
promotores e estimuladores do processo, ou seja, a maioria dos atores sociais
locais. Entretanto, a ausência de uma estrutura pode permitir que os acordos não
cheguem a ser implementados. Isso fica evidenciado no trecho (24),
6
Concertação: considerada como uma das atividades mais importantes no DLS significa o
compartilhamento das decisões, na medida em que busca envolver os diversos atores sociais
locais, dando-lhes oportunidade de participarem das decisões de mudança, associadas ao bem
estar local e à mobilização de todos os recursos disponíveis localmente (Rosa, 2002).
121
(24) [...] o que acontece é que quando chega o mês de abril, começa o
movimento nos QGs, quando chega no mês de junho estrangulou todas
as economias dos trabalhadores, então por isso que a gente que cada
Boi tem o seu projeto, né? Mas voltado para aqueles poucos meses: abril,
maio, junho. Então nesses três meses de atividade nós diríamos assim,
“quem não comeu um pedaço da fatia desse bolo, não comerá mais”, por
quê? Por que quando termina o Festival, os Bois estão sem recursos e o
que é pior, endividados.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
Na seqüência, apresentam-se, de forma sucinta, os projetos elaborados no
contexto das Organizações dos bumbás. Trecho (25) Boi Caprichoso e (26) Boi
Garantido:
(25) A escola desenvolve dois projetos: “Resgate Cultural” e “AABB
Comunidade” que envolve 500 alunos distribuídos em várias oficinas
dentro da Escola de Artes Irmão Miguel de Pascalle . O principal objetivo
das escolas de artes é colaborar, contribuir com as escolas de ensino
regular, tanto que o primeiro critério para matricular um aluno é que ele
esteja na escola regular. Se caso ele não estiver na escola regular, nós
temos a obrigação de matricular esse aluno para que este possa
participar da escola de artes, também nas oficinas de artes Irmão Miguel
de Pascalle. [...] nós temos um percentual, por exemplo, 50% desses
alunos são pessoas de periferia, assim de bairro que precisam de ajuda,
porque Parintins não tem meninos de rua, tem meninos na rua. Então, nós
colaboramos com as famílias, fazemos uma parceria de escola-
comunidade para que nós possamos inserir esses garotos em algum
programa social, no caso, aqui na Escola. Nós atendemos de oito a
dezoito anos. Eles passam primeiro por uma oficina-base, às vezes a
gente recebe de sete anos também. A cartonagem que é uma oficina que
distribui os alunos para outras oficinas, porque ele tem manejo de mão,
manejo de cortar, manejo de fazer, manejo de mexer com qualquer coisa,
até mesmo de desenhar. Então, dessa oficina é que é a base, de que
sai para música, sai para desenho, sai para pintura, sai para capoeira, sai
para dança. [...] na Escola nós tivemos essa preocupação com o projeto
“Resgate Cultural” justamente para fazer com que o aluno saiba a história
do Boi-bumbá, como surgiu o Boi-bumbá? Como ele é hoje? E a escola
faz esse trabalho, responde.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
Na parte (26) se conhece a realidade de alguns projetos implementados
pela AFBBG. Mesmo não tendo ainda os parâmetros que atendem a formalidade
do funcionamento de um projeto social como o encontrado em outra organização,
o atual presidente prioriza importante meta em sua administração, uma vez que
visa colocar em prática projetos na área social que beneficiem tanto os mais de
1900 associados do boi, quanto à comunidade parintinense, até por que,
122
(
26) [...] quando eu vejo uma companhia de dança que nós criamos, onde
se paga uma bolsa de R$ 150,00 pra quem dança lá, é nada, mas era
muito menos, era muito mais nada lá, quando não tinham noções técnicas
de dança, e hoje se tem. Quando você começa a organizar um segmento
de crianças pra que não deixe aquilo morrer, pra ver se perpetuar aquela
situação, quando você cria uma Batucada Mirim, quando cria um
Garantido Show Mirim, quando você coloca uma Escola de Arte, de
música pra 250 crianças, e sem receber além do patrocínio pra fazer isso.
Eu penso que agente fazendo alguma coisa e talvez tenha sido esse
meu discurso que hoje eu tento de todas as formas implementar, realizar
dentro do Garantido, e que me propiciou chegar à função de presidente
do Boi.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
Também se cogita a possibilidade do projeto “Revitalização do Curral da
Baixa”. O objetivo desse, é propor ações que resgatem valores histórico-culturais
do local onde ocorreram os primeiros ensaios do Boi Garantido (RUFFINO, 2006, p.
7).
4.4.4 Síntese do Discurso dos Atores Externos Sobre Instituições
Ao analisar a percepção das organizações parcerias sobre o modelo de
instituição adotado, apenas uma admitiu possuir sistema institucional aberto. Ou
seja, caracterizam-se nesse processo, empresas em desenvolvimento social que
buscam promover mudanças duráveis, integrar os atores do desenvolvimento e
implantar projetos coletivos, criando condições de aprendizagem e difundindo uma
cultura democrática.
Nessa ótica, procurou-se avaliar a coerência existente entre as ações
desenvolvidas pelas instituições, com o modelo proposto no contexto local, pois o
modelo de gestão do DLS deve ajustar-se com a visão geral e com “os princípios
do planejamento, com o estilo de desenvolvimento sugerido (desenvolvimento
sustentável) e as opções estratégicas, ressaltando a democratização e
participação da sociedade e a descentralização do processo decisório e da
execução das ações” (BUARQUE, 1999, p. 60).
Ao analisar as ações desenvolvidas pela empresa que afirmou adotar um
sistema institucional aberto, verificou-se contradição e incoerência no discurso,
123
quando se constata que os investimentos do patrocínio aplicado à cultura
acontecem de forma descontínua visando atender o evento em si. Muito embora
não se descarte o compromisso pretendido de algumas empresas em defender e
valorizar a cultura brasileira por meio de uma política de patrocínios de alcance
social, com vistas a afirmar a identidade brasileira, as intenções desse tipo de
estratégia contradizem a possibilidade dessa organização possuir um sistema
institucional aberto.
Sem pretender sair dessa linha de raciocínio, no trecho (27) outra empresa
reconhece o fato de ter sido,
(27) [...] a maior patrocinadora do Festival Folclórico e a primeira grande
empresa a apoiar a manifestação cultura. [...] individualmente. [...] visa
uma cooperação voltada exclusivamente para prepararem seus
espetáculos, mas prioriza um compromisso em diversas ações de
responsabilidade social e ambiental. Temos importantes projetos no
Estado ligados à cultura, ao esporte e ao bem-estar da população em
geral, buscando sempre devolver à comunidade onde atuamos o
reconhecimento pela nossa atuação na região.
Fonte: Parceiros Externos – Empresa Privada.
A expressão “individualmente” e “cooperação voltada exclusivamente para
prepararem seus espetáculos”, evidencia uma forma de organização fragmentada
com ausência de práticas que vise uma articulação de equipe técnica com
instâncias e formas de participação dos atores sociais locais (BUARQUE, 1999).
Quando se busca saber da percepção das empresas parceiras, trecho (28)
e da comunidade (29) sobre os benefícios do evento para a comunidade local,
constata-se que:
(28) O evento é a principal fonte de recursos e de divulgação da região de
Parintins, tornando a cidade conhecida internacionalmente, o que a faz
receber turistas durante todo o ano. Portanto, ajuda a gerar recursos e
renda para o município e para a população local. [...] Com certeza, é uma
das maiores fontes de renda do município e que conseguiu nome. Hoje
nós temos artistas dos Bois em todos os lugares do Brasil e que fazem o
carnaval do Rio, de São Paulo, do Pará, que fazem a Festa da Uva em
Santa Catarina, do Rio Grande do Sul, é que fazem o carnaval daqui de
Manaus, é que trabalham muito nos municípios do Amazonas, trabalham
na Ciranda em Manacapuru, trabalham no Peixe Ornamental em Barcelos
e assim vai, essa é realmente a geração de renda.
Fonte: Parceiros Externos – Instituição Pública.
124
(29) [...] acredito que deveria [...] a própria Câmara Municipal uma lei que
tirasse uma porcentagem dos recursos que o Bum recebe todos os
anos, que são muitos recursos, recursos de multinacionais para que
pudesse dar uma oportunidade de informação pros jovens, de um
aprendizado, de uma formação profissional para que ele pudesse ter seu
primeiro emprego.
Fonte: Parceiros externos: Comunidade Local.
De acordo com os entrevistados, o evento contribuiu com fatores como:
melhoria na infra-estrutura da cidade, geração de emprego e renda, arrecadação e
movimentação de recursos financeiros e divulgação da cultura local. Ou seja, os
investimentos de apoio ao evento contribuem com um desenvolvimento
insustentável, quando os investimentos não contribuem com a qualidade de vida
da população local, limitando-se ao desejo da oportunidade de emprego e na
divulgação do evento no contexto internacional. Observa-se que cobrança por
ações mais significativas direcionadas “À Câmara Municipal”. O que comprova
mais uma vez a fragilidade das estruturas organizacionais que operam no evento.
Não um critério explícito que procure influenciar a coordenação de estratégias
de rede e projetos coletivos que privilegiem a mobilização do grupo e a
transparência social na operacionalização do evento.
As contribuições de Matos Macedo (1995) conseguem esclarecer o
impasse instalado, pois, o processo de formulação de políticas não é estruturado
exclusivamente por meio de acordos institucionais formais; como se observa na
forma com que o estabelecidos os patrocínios do evento. A seguir, apresenta-se
um relato do resumo sobre os aspectos estruturais das organizações dos bumbás
atualmente. Trecho (30):
(
30) Eu penso que primeiro nós estamos vivendo uma fase do Boi, que o
Boi começou como brincadeira, uma manifestação popular, uma
expressão cultural popular mesmo, depois veio e foi açambarcado pela
indústria cultural, e hoje nós estamos vivendo a fase de profissionalização,
nós temos um ensaio de profissionalização dos Bois, até chegar a
transformar-se em empresas, porque o volume que o evento apresenta,
ele tem necessidade de uma organização, de uma superorganização, de
uma superestrutura para que ele seja auto-sustentável. O que acontece
nos dias de hoje é que os Bois “andam de pires na mão”, pedindo dinheiro
de político para todo lado. Um Boi que chega a movimentar em três
meses milhões de reais, milhões de recursos públicos e depois esse
recurso público investido, é como se estrangulasse todo o processo,
fica aquele vácuo de junho a fevereiro, março do próximo ano, é como se
125
a cidade não tivesse nenhum investimento daqueles. Então, o que eu
penso, é que a principal contribuição seria os Bumbás se
profissionalizarem, que eles aderiram às malhas da indústria cultural,
então que se profissionalizem, que se organizem como empresas para
começar a gerir os seus próprios recursos, e quando essa empresa
começar a funcionar como empresa, ela vai gerar emprego e renda e vai
estar sobrevivendo de seus recursos próprios sem estar de “pires na mão”.
Fonte: Parceiros Externos – Comunidade Local.
Pelas declarações do entrevistado, é possível identificar uma crítica
contundente à falta de maior mobilização dos grupos organizadores dos bumbás.
Na sua 43° apresentação ainda é possível inferir que os “Bois andam de pires na
mão”. A expressão é análoga à ação de mendicância, que segundo (MAIA JR;
PASTOR, 1997) significa uma maneira de sobreviver através de dificuldade. De
acordo com resultado da pesquisa o evento conta aproximadamente com 13 anos
de apoio de patrocínio. Mas os recursos oriundos das parcerias o atendem às
necessidades da comunidade local. circulação de grande fluxo financeiro, mas
não fica na cidade. Todos esses fatores, juntos, acirram os conflitos e tensões,
tanto no contexto interno das agremiações, como na própria comunidade local. E o
resultado se resume no argumento de um dos entrevistados de uma das empresas
que concorreram recentemente à licitação pública do direito da venda dos
ingressos do evento, quando diz o seguinte: “dado a problemas internos nas
organizações dos bumbás [...] o Governo do Estado tomou a responsabilidade da
comercialização do evento”. Esse direito foi acordado através de carta de intenção
entre os dirigentes dos bumbás. Essa informação inclusive foi divulgada no jornal
“Parintins Em Tempo” no dia 10 de junho de 2008 tornando público para a
comunidade parintinense quais direitos ficariam sob a responsabilidade do poder
público estadual, entre eles: a transmissão, negociação de publicidade e venda de
ingressos alegando, pois, necessidade de “profissionalizar e aumentar a renda
dos bois” (NORONHA, 2007, p. 5).
Com relação à presença de possíveis traços da cultura brasileira, verifica-
se no contexto das organizações envolvidas no evento, grande distância de poder,
traço relacionado à hierarquização social. Principalmente pelo fato das intenções
subjacentes do apoio do patrocínio se restringir quase que exclusivamente na
realização do espetáculo em si, com interesse econômico de venda e troca de
serviços prestados efetivados através de projetos, contratos e convênios.
126
Há, ainda, a presença do personalismo diante da dependência que existe
entre as lideranças dos bumbás com a forma de buscar patrocínio. Essas
características contribuem para a manutenção do sistema restritivo de
disseminação do conhecimento. E isso se torna fato, diante das ações dos
dirigentes líderes locais quando aceitam transferir, através de “carta de intenção”,
um importante evento cultural da cidade sem consultar a própria sociedade
interessada. Essa total passividade marca traços culturais típicos, os quais a
lealdade valoriza mais a visão e as necessidades da liderança do que as da
organização como um todo.
Concentração e estratificação têm certamente suas implicações nessa
análise, principalmente quando se verifica a cobrança feita no trecho (30) aos
líderes das agremiações da necessidade urgente do “Boi se tornar empresa” ou
em “superestrutura” e se “profissionalizarem”. Esses traços tendem a coibir e
restringir estímulos e, conseqüentemente produzir novos conhecimentos, os quais
apenas se produz o estabelecido. Pelo fato do evento estar na sua 43°
apresentação e com 13 anos aproximadamente de apoio de patrocínio, conforme
resultado da pesquisa, a transformação do conhecimento em resultados práticos
ainda não se concretizou no contexto das organizações envolvidas.
Esse modelo de gestão é analisado na visão de (CARVALHO; LEITÃO,
1999) como aparente contradição entre os traços de postura de espectador e de
flexibilidade. O primeiro, identificado em sua falta de consciência crítica, baixa
iniciativa e pouca vontade própria, comuns em países com grande distância de
poder, pode impor dificuldade para transferir o novo conhecimento para a prática.
Mas, por outro lado, a flexibilidade, identificada na criatividade e no pragmatismo,
traria capacidade de ajustamento a novas tecnologias (CARVALHO; LEITÃO,
1999). Para Hofstede, “somos um país com grande necessidade de evitar
incertezas, traço relacionado ao formalismo e novo conhecimento gera situação de
ambigüidade, frente ao conhecimento estabelecido(CARVALHO; LEITÃO, 1999,
p. 29).
Pode-se perceber, ao longo da análise, ausência de estrutura institucional
que vislumbre o DLS da cidade de Parintins. Os planos e as metas de ação não
são coerentes quando deixam de traduzir as vontades, valores e interesses
coletivos como processo de construção de seu desenvolvimento. Essa interação
exige montagem de um sistema de participação da sociedade, acompanhamento,
127
avaliação e controle permanente da implementação do plano, que permita os
ajustes e retificações necessárias à realização dos seus objetivos gerais, contendo
indicadores de processo e resultados (BUARQUE, 1999).
128
5 CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÃO
Os resultados alcançados por este estudo permitiram identificar a
percepção dos atores internos e externos sobre a influência do fenômeno cultural
dos bois bumbás para o DLS da cidade de Parintins. Considerando os
sinalizadores de sucesso do processo, tais como a emergência de atores sociais, a
formação de redes de cooperação, o desenvolvimento de projetos coletivos e a
criação de sistema institucional, pode-se inferir que os pressupostos da pesquisa
foram confirmados. A seguir discute-se o resultado da pesquisa com base nas
questões orientadoras do estudo.
Com relação à mobilização e contribuição na formação de atores sociais,
observou-se pelo discurso dos atores internos e externos que, embora o
evento favoreça a emergência de atores sociais, não há integração
entre as parcerias. Os investimentos advindos do patrocínio ficam
limitados aos benefícios do evento em si. Falta transparência nas
decisões firmadas nos contratos e convênios entre os parceiros internos
e externos promotores de patrocínio, entre os sócio-profissionais
envolvidos diretamente na promoção do evento, como também,
ausência de propostas/projetos nas negociações que contemplem as
necessidades do cidadão parintinense. Esse resultado reflete uma
concepção que contraria o sentido do ator social promotor da política do
DLS. O ator social nesse contexto deve tomar parte da sociedade e
reconhecer-se em sua história e em seu sistema de normas e valores.
Sendo assim, são fomentadores de políticas de desenvolvimento com
base nas potencialidades locais.
Observou-se nos discursos dos atores sociais que as ações
realizadas pelas organizações envolvidas apresentam influência da
hierarquia e do personalismo, traços característicos da cultura brasileira
em que a sociedade se baseia em relações pessoais, herança de uma
ideologia do “nosso desenvolvimento econômico capitalista ou (pseudo-
revolução burguesa) e das raízes históricas do passado
129
colonial”(FERNANDES, 1974; HOLANDA, 1984 ; FERNANDES, 1978, p.
30).
Com relação à formação de redes de atores sociais e parcerias entre a
sociedade civil, poder público e patrocinadores, constatou-se paradoxos
na compreensão do processo. Em primeira análise o sentido de rede foi
relacionado à negociação de valores de patrocínio. Na segunda, a
percepção restringiu-se à qualidade do desempenho dos bois e a
algumas ferramentas da comunicação do processo, como: seminários,
conferências e reuniões. Em nenhuma das visões, verificou-se pelo
discurso dos atores sociais envolvidos a internalização do conceito de
redes de cooperação mútua, como sugerido nos pressupostos do DLS.
Com relação à existência de projeto coletivo no contexto das
organizações que realizam o evento, as percepções evidenciam a não
existência de um projeto coletivo pensado nos ideais e nas metas do
DLS. Dados da pesquisa inferem que as ações idealizadas, a partir de
projetos dentro do contexto das organizações atendem às necessidades
específicas de cada agremiação. Constatou-se recentemente na
comunidade, uma espécie de “lançamento do pacote de cursos [...]
parceria dos bumbás com prefeitura e centrais sindicais” (FREITAS,
2008, p. 8). Tais pacotes emergenciais surgiram a partir das
reivindicações dos sócio-profissionais dos bumbás, devido à falta de
segurança e problemas trabalhistas.
Com relação ao modelo de sistema utilizado nas organizações
promotoras do evento, apenas uma empresa admitiu adotar um sistema
institucional aberto. No entanto, verificou-se no discurso dos sujeitos,
visão antagônica entre as ações desenvolvidas, com o modelo de
gestão adotado pela empresa. De um modo geral, as instituições
apresentam características de estrutura hierárquica, com traços do
personalismo, o que contraria a concepção de uma estrutura promotora
de políticas do DLS.
De acordo com o resultado da pesquisa, apesar de o evento contar com
apoio das instituições públicas, municipais e empresas privadas, as ações
130
desenvolvidas no segmento do evento são imediatistas e visam atender a
realização do evento em si. As políticas voltadas à promoção do evento são
calcadas em pacotes pré-formatados que favorecem apenas as empresas privadas.
Este modelo leva a concentração de renda, cujos impactos sociais, econômicos e
ambientais, avaliados pelo custo total, terminam sendo negativos. Verificou-se nos
discursos dos entrevistados da comunidade local, que a renda gerada no evento é
apropriada pelos grandes centros que exportam seus produtos e serviços para os
destinos turísticos. É nestes destinos que os principais impactos ocorrem. Essa
relação na visão de Guimarães; Ferreira (2006) tem um “caráter predatório”. Ou
seja, o empreendimento turístico beneficia-se do patrimônio local deixando muito
pouco em troca e termina esgotando ou transformando os recursos naturais ou
culturais do destino, inviabilizando sua continuidade.
Estes resultados ajudam a explicar o porquê da falta de políticas públicas
clamadas nos discursos dos representantes da comunidade local, como, por
exemplo, falta de emprego para os jovens e opção de trabalho para os artistas
plásticos. Tais fatores, inclusive, são refletidos no Atlas de Desenvolvimento
Humano, (ver site www.pnud.org.br) do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)
em Parintins. O referido site mostra que nos últimos 10 anos houve uma melhora
nos indicadores de análises educacionais e de longevidade da população, porém,
uma queda na renda. Verificou-se que, num período de 10 anos, os proventos
originados de rendimentos com o trabalho diminuíram, havendo um aumento de
rendas provenientes de transferências governamentais. A renda per capita média,
considerando R$2.000,00, caiu de 102,7% para 91,7%, o que pode significar o
empobrecimento da população.
As evidências resultantes dos procedimentos adotados entre as
organizações envolvidas propõem sugestões significativas quando da revisão do
modelo de gestão. O paradigma indicado pelo estudo do desenvolvimento local
sustentável propõe correção dessa forma exploratória, de maneira que a festa dos
bois-bumbás possa perpetuar-se indissociável de seus valores tradicionais e das
raízes históricas e socioculturais de seu destino.
Desse modo, essa interação pode ser consolidada pela própria política do
DLS, cuja metodologia busca a articulação, coordenação e inserção dos
empreendimentos empresariais, associativos e individuais, comunitários, urbanos e
rurais, a uma nova dinâmica de integração socioeconômica de reconstrução do
131
tecido social de geração de emprego e renda (BUARQUE, 1998). Isso implica
diferentes padrões nas relações sociais dentro das organizações e um perfil de
liderança distinto, caracterizado pelo envolvimento e a participação das pessoas
nos diversos programas e projetos. Um objetivo central desses líderes será a
consecução de uma participação efetiva dos diferentes grupos de interesses e
comunidades nas decisões. Isso requer uma contextualização cultural do processo
de maneira que, além da abertura para a participação democrática dos diversos
atores, esse processo possibilite um fluxo de informação em todos os sentidos,
permitindo que os diferentes setores recebam informações e participem da
elaboração dos planos de ação a serem implementados (RATTNER, 1992).
Uma das questões fundamentais verificadas ao longo das abordagens do
DLS diz respeito, a ausência de participação social/cidadã como um dos maiores
limitadores da ação local. Na realidade quando se analisa, de um modo geral, os
indicadores da sustentabilidade, as intenções subjacentes primam por um
desenvolvimento pensado nos anseios da coletividade, uma vez que as
representações coletivas (DURKHEIM, 1978, p. 238),
[...] gozam de propriedades maravilhosas. Por elas os homens se
compreendem, as inteligências penetram uma nas outras. Elas têm
em si um tipo de força, de ascendência moral em virtude da qual se
impõem aos espíritos particulares. Desde então o indivíduo se
conta, pelo menos obscuramente, que acima de suas
representações privadas existe um mundo de noções-tipo,
segundo as quais ele é obrigado a regular suas idéias; entrevê
todo um reino intelectual de que ele participa, mas que o ultrapasse.
Evidentemente, a ausência da participação popular não pode ser
justificada fora do contexto das representações, pressupostos e valores culturais
de organizações tão influenciadas pelos traços da cultura brasileira. No entanto, as
ações propostas pelo DLS são desafiadoras, as quais buscam demonstrar a força
que têm os cidadãos organizados.
Nessa perspectiva, recomenda-se que novas pesquisas sejam
desenvolvidas, como por exemplo, “Planejamento de Políticas de Desenvolvimento
pela Atividade do Turismo” e “Educação Ambiental” a fim de propiciar à
132
comunidade local, alternativas possíveis de um desenvolvimento como fator de
inclusão social.
O turismo é uma atividade econômica que mais cresce em nível mundial.
No Brasil, segundo o IBGE, citado pela EMBRATUR (2002), o turismo repercute
em 52 segmentos diferentes da economia, empregando desde mão-de-obra mais
qualificada à menor qualificação, tanto no emprego formal quanto no informal. De
acordo com a Organização Mundial do Turismo (1999), as possibilidades de
crescimento no setor, para os próximos anos são enormes principalmente pelo
apelo do marketing turístico voltado cada vez mais, para o contato com a natureza
e com o patrimônio histórico-cultural. E nesses aspectos, o Brasil, em especial o
Estado do Amazonas é privilegiado por ser um dos poucos lugares considerados
como possuidores de grande diversidade biológica. É nesse sentido que a
Educação Ambiental se torna fundamentalmente importante, pois pode servir de
apoio à conservação da biodiversidade para a auto-realização individual e
comunitária e para a gestão política e econômica através de processos educativos
que promovam a melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida
(SORRENTINO, 1995).
Assim, pode-se dizer que o evento pode criar condições potencializáveis
para o município quando emergir da essência de um projeto coletivo pensado na
desconstrução do viés econômico, partindo da reformulação das forças existentes
no local para a efetiva definição de um processo de desenvolvimento participativo
e auto-sustentável. E as ações da dinâmica desse processo devem acionar
recursos para que se dinamizem atividades turísticas contínuas e não limitada
apenas em três dias por decorrência da festa do boi-bumbá. Com base nas
pesquisas verificou-se que o Plano Diretor e o Calendário de Eventos do Município
de Parintins (2008) dispõem de uma oferta de recursos do próprio local que
poderiam ser discutidos a partir da dinâmica do DLS, entre elas: Soltura de
Quelônios, Paixão de Cristo, Feira do Artesanato, Boi Miniatura, Festival de
Quadrilhas, Danças e Bois Mirins, Festival Folclórico de Parintins, Festa da
Padroeira “Nossa Senhora do Carmo, Festa do Peixe Liso, Festival de Verão,
aniversário da Cidade, Festival de Toadas, Exposição da Feira Agropecuária do
Interior do Norte (EXPOPIN), Festival das Pastorinhas, Réveillon na Orla.
Enfim, a oportunidade de realização do estudo propiciou uma visão mais
abrangente dos pressupostos do DLS, a partir das relações estabelecidas com as
133
concepções da cultura. As teorias em evidência estão consolidadas no
compromisso da interdependência entre história, estrutura social, condições de
vida e experiências subjetivas das pessoas. Essa reflexão baseou-se,
principalmente, nos conceitos de Desenvolvimento Local Sustentável DLS
(ALBUQUERQUE, 1998), Cepal (1990), Agenda 21 (1992), Buarque (1999),
Mantega (1978), Brito (2005) e Teisserenc (1994); Cultura - Aktouf (2007),
(CARVALHO; LEITÃO, 1999), (MOTTA; CALDAS, 1997) e SANTOS (1994).
Entretanto, os aspectos metodológicos selecionados ajudaram a atingir os
objetivos pretendidos no presente estudo.
Acredita-se que a implementação do programa do DLS possa funcionar
como alternativa viável no atendimento das especificidades do município,
intimamente articulado com os poderes públicos estadual, municipal e com as
associações comunitárias, bem como agilizar estratégias entre as parcerias que
fomentem a instalação de pequenos negócios, através da criação de redes de
cooperação e elaboração de projetos coletivos, coerentes com os padrões
culturais do lugar e capazes de geração de renda.
5.1 LIMITAÇÕES DO ESTUDO
Por se tratar de um estudo de caso, as interpretações contidas na análise
do resultado da proposta do Desenvolvimento Local Sustentável em estudo, não
pode inferir generalizações.
134
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143
APÊNDICES
144
APÊNDICE A Roteiro da entrevista aplicada aos presidentes das Associações
Folclóricas dos bumbás.
Parte I – Identificação do pesquisado
1 Nome:
2 Idade:
3 Escolaridade:
4 Naturalidade
5 Função que representa na Associação.
6 Há quanto tempo?
7 É remunerado?
8 Tempo de trabalho é dedicado a Associação
9 Profissão:
10 Quais as atividades que executa na função?
11 Você executa outras atividades remuneradas?
12 Pessoalmente, o que representa o cargo/função para você no evento?
13 Como você ingressou no projeto da Associação?
14 Período de funcionamento das associações / Horários:
PARTE II – Desenvolvimento de competência.
15 Relacione 10 itens correspondentes ao desenvolvimento de sua competência
no que diz respeito à aquisição de:
Conhecimento/ Habilidades/Atitudes/Valores
16 Como você desenvolve a aprendizagem criativa para adquirir e disseminar
(passar para outros) as competências?
17 E da retenção das competências e talentos?
PARTE III Sistema Institucional/ dados sobre a AFBBC e AFBBG do projeto dos
bumbás.
18 História dos grupos.
19 Números de membros que integram o grupo. São remunerados?
20 Sexo: Masculino/quantidade / Feminino / quantidade.
21 Como estão constituídas as associações/número de pessoas envolvidas na
função?
22 Há quanto tempo a associação existe?
23 Como está estruturalmente organizada a AFBBC e AFBBG?
24 Qual a filosofia das associações?
145
25 Do significado das simbologias presentes no evento
26 Bumbódromo; Figura do boi; Figuras típicas regionais mais importantes. Mitos/
lendas - representatividade?
27 Alegorias mais representativas / Figuras regionais
28 Se possui um projeto coletivo? Número de integrantes no evento do bumbá.
29 Se as associações criaram alguma instituição? Qual finalidade?
30 Em sua opinião, o evento contribui com melhoria socioeconômica do município?
Como?
31Que valores culturais as associações apresentam como identidade
organizacional?
PARTE IV – Rede de agentes sociais – dados do projeto boi-bumbá
32 Líder fundador ; Parcerias (redes de agentes sociais) ; Patrocínios
33 Quais são os critérios exigidos pelas parcerias - patrocínio?
34 Existe uma rede de comunicação entre os patrocinadores e a sociedade civil
quando da organização do evento?
35 Valor repassado para a Associação/Evento
36 Procedência dos turistas: quem vem; como; onde ficam; o que é oferecido.
37 Como são fornecidas as informações aos turistas?
38 As associações dispõem de cronograma para funcionamento?
39 Como as associações desenvolvem estratégias e procedimentos para
disseminação do conhecimento?
40 O evento contribui com melhoria socioeconômica do município? Como?
146
APÊNDICE B Roteiro da entrevista aplicada ao apoio técnico das organizações
dos bumbás.
1 Nome:
2 Cargo: / Função / atribuições / Tempo de atuação
3 É remunerado?
4 Você executa outras atividades remuneradas?
5 Profissão
6 Como você desenvolve a aprendizagem criativa e como faz para passar o
conhecimento a outras pessoas?
7 Quais são os principais elementos priorizados no processo de aprendizagem?
8 Simbologia do “Boi de Arena”
9 Como a Associações desenvolvem estratégias e procedimentos para
disseminação do conhecimento com os demais membros?
147
APÊNDICE C Roteiro da entrevista aplicada aos parceiros externos
(patrocinadores do evento)
PARTE I – Identificação do pesquisado/ Pessoa Jurídica
1 Nome da empresa/ instituição.
2 Tempo de atuação da empresa no evento (patrocínio).
3 Como se deu a emergência das parcerias.
4 As pessoas, contatos das empresas patrocinadoras são de Parintins?
5 Que modelo (aspectos administrativos) e sistema institucional a empresa
mantém?
6 Qual a relação formal e informal entre as duas instituições - patrocinadores X
Organização dos bumbás?
7 Se existem, como ocorrem as redes de cooperação mútua entre patrocinadores
e organizadores dos bumbás.
8 Existem reuniões entre todos os envolvidos?
9 Compromissos da empresa com a cultura local e como são efetivados os
critérios de distribuição dos patrocínios.
10 Quais os verdadeiros interesses subjacentes ao patrocínio?
11 Do montante que a empresa aplica a eventos culturais, que percentual é
repassado para os bumbás de Parintins?
12 Em sua opinião, o evento contribui para a melhoria socioeconômica do
município de Parintins? Como?
13 Existe um projeto coletivo no contexto da empresa destinado à promoção de
eventos culturais? Se existe, quais são e como se desenvolvem os projetos
coletivos?
148
APÊNDICE D – Roteiro da entrevista aplicada aos parceiros externos (comunidade
local).
1 Nome do (a ) entrevistado(a) / Profissão: / Função:
2 Preferência do boi-bumbá
3 Proveniente de qual bairro?
4 Em sua opinião o evento contribui para a melhoria socioeconômica do município
de Parintins? Como?
5 Em sua opinião, quais são os benefícios promovidos pela festa dos bois-bumbás
para o desenvolvimento local?
6 Como a festa dos bumbás e a própria Organização/Associação pode contribuir
para o desenvolvimento na melhoria da qualidade de vida do povo e na
conservação dos recursos naturais?
7 Existe uma rede de cooperação mútua entre a sociedade civil organizada e
organizadores dos bumbas? Se existe como acontece?
8 Existe um projeto coletivo entre a sociedade civil, as associações dos bumbás e
as parcerias de patrocínio?
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