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que ela num saía. Aí, um dos nêgo, coitado, chegou lá e pediu o senhor: “Ô senhor, será que
com ocês ela num quis sair, será que o senhor deixa nós ir lá, ver se ela sai com nós?” A
resposta que ele teve foi: “Ah, cambada de preguiçoso! Cês tá é com preguiça! Se ela não saiu
com nós, com isso, essa catinga de nêgo, é que ela vai sair?” Ele deu as costa por resposta e foi
saindo devagarzinho. Aí o senhor pegou e chamou ele e falou: “Oh, então vai lá, vamo vê se
ela sai com cês, vamo vê?”
Aí eles foram chamar. Chegou lá, juntaram o Candombe, o Moçambique e o Congo, e
desceram e vieram pra beira do mar. Chegaram. O Congo chegou na frente, dançava e fazia
aquela meia lua chamando o Moçambique, que ela tava caminhando, falando com o
Moçambique que ela tava caminhando. O Congo foi ficando aflito, ficando aflito...
Evém do mar, evém do mar
Lá evém Nossa Senhora
Virgem Santa, mãe de Deus
Ela é a mãe dos nêgo
É a santa que todo mundo adora
E o Moçambique num podia andar depressa, porque estava os preto velho com os tambor, não
agüentavam caminhar com os pé tudo cheio de bicho, não tinha como caminhar, e os tambor
sem jeito, não tinha corda pra segurar nem nada.
Aí, quando chegaram na beira do mar, os três, que foi o Congo, o Moçambique e o Candombe;
aí quando chegaram, a Nossa Senhora já tava pertinho, quase do lado de fora. Aí que ela rancô
de lá e pulô. Mas não chegou, assim, pegou os bastãos que a gente, os capitão, tava usando,
eles fizeram uma parede com os bastão e levantaram ela e sentou ela no tambor que chama
Santana. Daí os tambor já num bateu mais. O Moçambique é que veio conduzindo a nossa
Senhora em cima do Santana. Aí apareceu tudo quanto é santo, para que nada atingisse aquela
coroa que Nossa Senhora usava na cabeça.
Evém do mar
Evém do mar
A coroa do rosário (eu vou levar)
Evém do mar
Quem viesse de longe num sabia de tanta coroa que tava ao redor. Aí veio. Aí, quando chegou
na igreja dos branco eles tomaram a santa. Tomaram ela, levaram lá pra dentro e mandou os
nêgo sumir outra vez porque eles num precisava dos nêgo. Mas só que ela fugiu. Ela fugiu e foi
embora na madrugada. Quando foi no outro dia eles chegou lá caçando a santa, que deixou ela
muito bem trancada, muito bem arrumada. Saiu, aí viu o rastinho dela, que ela tinha voltado
pro mar. Foi atrás do negro outra vez, chamar os nêgo para que os nêgo isse lá na beira do mar
vê se tirava a santa. Aí então os nêgo foi, arrumou os seus tambor, arrumou suas caixa e tudo.
Aí foi lá, formaram, foi, e bateram ela tornou a sair com os nêgo. Aí os nêgo já não parou na
igreja dos branco. Cortou pro mato afora, pos trio e foi lá pra tipóia. Na tipóia deles é que eles
deixou a santa lá, sem... sem trancar, sem nada. Aí Nossa Senhora lá com eles ficou. Ficou a
noite toda.
Então, de manhã, eles assustou, que o senhor tava esperando de dá neles um coro porque sabia
que eles tava suado, que eles tava dançando. “Ah, eu vou mostrar eles. Amanhã nós vamos
tudo.” E prepararam. Mas só quando eles chegou lá, que eles viram a santa, eles assustaram.
Assustaram e vieram pros seus cavalos e correram. Vieram embora. E falando: “Ela tá lá, ela
amanheceu lá com eles, ela amanheceu lá com eles.”
Nisso os nêgo assustou né, quando eles viu os cavalo e os piraí, eles assustaram e levantaram.
Mas os branco já lá ia correndo, lá ia correndo. Aí eles levantaram afobado e a Nossa Senhora
tava lá, olhando eles. E eles chegou e falou. Perguntou a Nossa Senhora o quê que eles ia dá ela
a troco dela ter ficado lá e eles num ter apanhado. Ela respondeu pra eles: “Não, é só ocês falar
assim: Benção!” E ensinou eles: “Cês só tomam ‘a benção mamãe’. E ocês num tem que pagá
nada.” Aí foi ela cuns nêgo. A história é essa. (LUCAS, 2006, p. 40-42).
Os negros também contam, com a história da retirada da santa das águas, que esta,
ao acompanhar os escravos, deixou cair lágrimas, que deram origem à planta, cujas
sementes são utilizadas para a confecção do rosário. Por tal motivo as contas são