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Convém ressaltar que os três grandes objetivos dessa medicina
eram: primeiro, analisar no espaço urbano, a fonte de doenças e os lugares de
formação e difusão de fenômenos epidêmicos ou endêmicos, os cemitérios -
nesta época, surge a organização das sepulturas reservadas às famílias, com a
individualização do caixão; segundo, controlar a circulação e a qualidade, não
dos indivíduos, mas dos elementos, essencialmente, a água e o ar, porque
estes eram considerados fatores patogênicos e necessitavam ser mantidos sob
vigilância – o que significava o controle da condição do ar e dos corredores de
água em uma cidade; e, terceiro, distribuir a sequência dos elementos
necessários à vida comum, tais como fontes, esgotos ou barcos bombeadores.
Desta forma, os espaços comuns, os lugares de circulação, os
cemitérios e os matadouros foram sujeitados por um controle médico-sanitário.
Para cada situação relativa à higienização, os peritos médicos eram
consultados. Cabe admitir, na perspectiva apontada por Foucault, que a
medicalização da cidade, a partir do século XVIII, não era uma medicina dos
homens, corpos ou organismos, mas uma medicina das coisas, tais como o ar,
a água, as decomposições e os fermentos – medicina esta voltada ao controle
das condições de vida e do meio de existência.
A evolução dessa medicalização urbana teve como alvo final, no século
XIX, segundo Foucault (1995) o "controle dos pobres" agora identificados como
elementos perigosos. Tal controle motivou o surgimento, na Inglaterra, da "Lei
dos Pobres”
2
. Convém apontar, de acordo com Foucault (1995: 95), que: vê-se
claramente a política da transposição, na legislação médica, do grande
problema da burguesia nessa época: a que preço, em que condições e como
assegurar sua segurança política.
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Em 19 de dezembro de 1601, foi promulgada, pela Rainha Isabel I, a Lei dos Pobres, com o seu
surgimento, a medicina inglesa começa a tornar-se social. Essa legislação comportava um controle
médico do pobre. A partir do momento em que o pobre se beneficia do sistema de assistência, deve, por
isso mesmo, submeter-se a vários controles médicos (Foucault, 1995). A Lei dos Pobres assentava em
quatro princípios: 1- a obrigação do socorro aos necessitados; 2 - a assistência pelo trabalho; 3 - a taxa
cobrada para o socorro aos pobres; 4 – a responsabilidade das paróquias pela assistência de socorros e
de trabalho (Guedes, 1942).