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UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ
RAIMUNDO ALBERTO TAVARES AMPUERO
O GRAFISMO CORPORAL DOS ASURINI DO KOATINEMO:
preservação cultural de um povo indígena
TAUBATÉ – SP
2007
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UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ
RAIMUNDO ALBERTO TAVARES AMPUERO
O GRAFISMO CORPORAL DOS ASURINI DO KOATINEMO:
preservação cultural de um povo indígena
Dissertação apresentada para a obtenção do
Título de Mestre pelo Curso de Gestão e
Desenvolvimento Regional do Departamento
de Economia, Contabilidade e Administração
da Universidade de Taubaté.
Área de Concentração: Planejamento e
Desenvolvimento Regional.
Orientador: Prof. Dr. Edson Aparecida de
Araújo Querido.
Orientadora: Profª. Drª. Mônica Franchi
Carniello.
TAUBATÉ – SP
2007
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RAIMUNDO ALBERTO TAVARES AMPUERO
O GRAFISMO CORPORAL DOS ASURINI DO KOATINEMO:
preservação cultural de um povo indígena
Dissertação apresentada para a obtenção do
título de Mestre pelo Curso de Gestão e
Desenvolvimento Regional do Departamento
de Economia, Contabilidade e Administração
da Universidade de Taubaté.
DATA: --------------------------------------
RESULTADO: ----------------------------
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Edson Aparecida de Araújo Querido Oliveira Universidade de Taubaté
Assinatura:
____________________________________________________________________
Profa. Dra. Mônica Franchi Corniello Universidade de Taubaté
Assinatura:
____________________________________________________________________
Prof. Dr. Robson Bastos da Silva Universidade de Taubaté
Assinatura:
____________________________________________________________________
Prof. Dr.Ariberto Venturini Universidade Federal do Pará
Assinatura:
____________________________________________________________________
4
Aos meus pais (in memorian),
pela coragem de me
direcionarem ao mundo dos
estudos para que eu pudesse
ter a chance de chegar aqui.
5
AGRADECIMENTOS
Ao povo indígena Asurini do Xingu (Koatinemo), pela boa vontade em participar
deste trabalho e por ter permitido minha participação no seu cotidiano da aldeia.
A minha família e amigos, que me apoiaram sempre, dando-me condições para
continuar minha trajetória, dividindo momentos de estudo, estimulando e torcendo
pelo meu sucesso.
Aos professores deste mestrado, em especial meus orientadores, Prof. Dr. Edson
Aparecida de Araújo Querido e Profª. Dra. Mônica Franchi Carniello, que, com
sabedoria e dedicação, contribuíram de maneira fundamental para a minha vida
profissional, despertando em mim a vontade de aprender e socializar o
conhecimento.
Ao Administrador da Funai Altamira e amigo, Benigno Pessoa, e à Arruda, pelo
apoio para a realização deste trabalho.
6
“Ninguém passa incólume pela
experiência de ver o mundo
pelos olhos de um índio. Nunca
mais se é a mesma pessoa”.
Darcy Ribeiro
7
RESUMO
Esta pesquisa objetiva apreender o significado da cultura do grafismo corporal da
etnia Asurini do Koatinemo. Tratou-se de identificar, caracterizar e compreender a
prática da pintura corporal desenvolvida pelas mulheres índias Asurini do Koatinemo,
verificando a representatividade dessa prática na manutenção e consolidação da
cultura desse povo. Observou-se o processo de aprendizagem da pintura corporal
desenvolvido pelas mulheres. As questões norteadoras da presente pesquisa foram:
a prática do grafismo corporal desenvolvido pelas mulheres Asurini do Koatinemo
representa a consolidação e o resgate simbólico dessa etnia indígena? O processo
de aprendizagem da pintura corporal, nos dias de hoje, é considerado importante
pelo grupo étnico Asurini como forma de preservação de sua cultura? Quando e
como ocorre a aprendizagem e significado do grafismo corporal entre as mulheres
no grupo? Os processos metodológicos obedeceram ao tipo de pesquisa de Campo,
Participante e Descritiva, com a abordagem Qualitativa por meio de observação.
Foram quinze os sujeitos deste estudo, tendo como critério de escolha as faixas
etárias de oito a doze, de treze a dezessete, de dezoito a trinta e nove, e acima de
quarenta anos de idade. Os sujeitos corresponderam a 35% de um universo de 46
índios. Os resultados da pesquisa mostram que o reconhecimento do significado do
grafismo corporal praticado pelas índias da etnia Asurini do Koatinemo é
compreendido dentro da comunidade indígena apenas pelas mulheres que estão
nas faixas etárias de dezoito a trinta e nove anos e das mulheres que estão com a
idade acima de quarenta anos. As mulheres do grupo demonstram ser responsáveis
pela manutenção de tal prática para a consolidação da cultura do povo. O processo
de aprendizagem da pintura corporal acontece durante toda a infância, adolescência
e fase adulta das mulheres do grupo. A aprendizagem ocorre observação das
mulheres pela mais novas, como filhas e netas, sobre as mais maduras. A pesquisa
serviu para fomentar a prática da pintura corporal dentro da comunidade,
contribuindo para incentivar a preservação e manutenção desta prática como
elemento fundamental da identidade cultura dos Asurini. Constatou-se ainda que o
grafismo corporal do povo Asurini está sendo pouco a pouco praticado também na
pintura de utensílios domésticos, como cerâmicas, e em tecidos, como forma de
divulgação da cultura do povo, trazendo perspectivas para uma fonte de renda e
auto-sustentação para o grupo. Acredita-se que mais estudos relacionados às
culturas dos povos indígenas devam ser incentivados, para dar continuidade a novas
descobertas sobre as diversidades culturais dos povos brasileiros, sobretudo dos
povos indígenas da Região Amazônica.
Palavras–chave: Cultura. Cultura indígena. Grafismo Corporal. Desenvolvimento
Regional. Preservação.
8
ABSTRACT
This research has the object to study the meaning of the Asurini´s body-graphs of
Koatinemo. It was identified and characterized to understand the body-painting
developed by the Asurini´s women Indians of Koatinemo, observing it´s meaning for
the maintenance and consolidation of the Asurini´s culture. This process of painting
involves a learning developed by the Asurini´s women Indians. The important
questions were: The body-graphs practice developed by the Asurini´s women Indians
means the consolidation and the symbol’s rescue of this ethane? The learning
process of the body-painting, nowadays, is considered important for the ethnic group
Asurini to preserve their culture? When and how this learning and meaning happens
with these women Indians? The methodology’s process were agreeing with the
camp-research’s type, participative and descriptive, with the qualitative broaching by
observation. There were fifteen subjects of this study, in the ages of eight to 12,
thirteen to seventeen, eighteen to thirty-nine and up to forty years old; involving 35%
of 46 indians.The results of this research showed that the recognizing of the body-
graphs´s meaning is comprehended, inside of the Asurini´s community, just for the
women in the ages of eighteen to thirty-nine and up to forty years old. These women
show responsibility to preserve that practice to consoled the Asurini´s culture. The
learning process happens during the childhood, teenager and adult fases of the
women, through observation from the youngers for the olders. This research
contributes to foment and incentive the body-graphs practice in this community to
preserve and maintain this Asurini´s culture like a fundamental element of the
Asurini´s identity. It was proved that the Asurini´s body-graphs is being used in
domestic utensils, like ceramic and tissues, to divulgate their culture and bring
expectances to a new income source for this group. It´s believed that more studies of
indians´s cultures may be incentive, to give continuity for new information about the
cultural diversities of the Brazilian people, and principally in the Amazonic Region.
Key-words: Culture. Indians Culture. Body-graphs. Regional Developing.
Preservetion.
9
LISTA DE IMAGENS
FIGURA 1 - Fruto do urucuzeiro usado na pintura corporal...................................... 36
FIGURA 2 - Índios Asurini do Koatinemo (tocando turé)............................................43
FIGURA 3 - Habitação Asurini................................................................................... 44
FIGURA 4 - Índio Asurini com diversos adornos........................................................47
FIGURA 5 - Tavyve (Casa grande)............................................................................48
FIGURA 6 - Tavyve (Casa grande por dentro)..........................................................49
FIGURA 7 - Casal do grupo étnico Asurini.................................................................51
FIGURA 8 - Pintura do corpo masculino e da boca...................................................52
FIGURA 9 - Pintura do corpo feminino e da boca (Menina Asurini de12 anos).........53
FIGURA 10 - Primeiro grupo de grafismo corporal....................................................54
FIGURA 11 - Segundo grupo de grafismo corporal...................................................55
FIGURA 12 - Terceiro grupo de grafismo corporal....................................................55
FIGURA 13 - Homem Asurini com tatuagem permanente.........................................59
FIGURA 14 - Mãos femininas com tatuagem permanente........................................60
FIGURA 15 - Merirynha. Instrumento de escarificação da tatuagem definitiva.........60
FIGURA 16 - Índio Asurini tocando turé. (Pajé da aldeia atualmente)......................61
FIGURA 17 - Meninas do povo Asurini brincando com a pintura corporal................70
FIGURA 18 - Avó Asurini pintando sua neta.............................................................71
FIGURA 19 - Mulheres do grupo Asurini...................................................................72
FIGURA 20 - Mãe e filhas do grupo Asurini pintando tecido.....................................75
FIGURA 21 - Criança Asurini brincando de se pintar.................................................80
FIGURA 22 - Criança Asurini.....................................................................................81
FIGURA 23 - Mãe Asurini pintando seu filho............................................................ 83
10
FIGURA 24 - Mulher Asurini pintando o marido.........................................................84
FIGURA 25 - Homem Asurini pintado........................................................................85
FIGURA 26 - Índia ralando o jenipapo na raiz da árvore que se chama paxiúba, para
extrair o sumo a fim de fazer a tinta da pintura corporal......................87
11
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................ 12
1.1 Problema .................................................................................................
15
1.2 Objetivo Geral ........................................................................................
15
1.2.1 Objetivos Específicos ........................................................................
15
1.3 Delimitação do Estudo ............................................................................
16
1.4 Relevância do Estudo .............................................................................
16
1.5 Organização do Trabalho........................................................................
17
2 REVISÃO DA LITERATURA.....................................................................
19
2.1 O HOMEM, A CULTURA E A SOCIEDADE ...........................................
19
2.1.2 O processo de aculturação ..................................................................
23
2.2 A CULTURA DOS POVOS INDÍGENAS ................................................
25
2.2.1 O grafismo e a arte: uma relação histórica e cultural nos
diversos grupos humanos .........................................................................
31
2.2.2 O grafismo corporal dos povos indígenas ......................................
34
2.2.2.1 Os Índios Xavante ...........................................................................
35
2.2.2.2 Os Índios Xinguano.........................................................................
36
2.2.2.3 Os Índios Kadiwéu ..........................................................................
38
2.2.2.4 Os Índios Xikrin ...............................................................................
39
2.2.2.5 Os Índios Asurini do Troca.........................................................
40
3. A ETNIA ASURINI DO KOATINEMO .......................................................
42
3.1 O grafismo corporal dos Asurini do Koatinemo........................................
50
4 MÉTODO ....................................................................................................
63
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ...............................................................
68
5.1 Resultados ...............................................................................................
68
5.2 Discussões ..............................................................................................
79
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................
92
REFERÊNCIAS .............................................................................................
94
APÊNDICE......................................................................................................
98
12
I INTRODUÇÃO
Esta pesquisa apresenta, após longo período de convivência com o povo
asurini, as preocupações quanto à capacidade e à competência desse povo em
consolidar seu conhecimento e suas práticas de grafismo corporal, garantindo a
manutenção desse importante traço identitário.
Segundo LARAIA (2001), as realizações humanas são justificadas pela
sua cultura, muito mais do que a herança genética, pois ela determina seus
comportamentos, sua maneira de pensar, agir e fazer na sociedade. Segundo o
autor, os instintos do homem foram transformados com o passar dos tempos, uma
vez que ao longo da história, seguindo os padrões culturais dos grupos em que
estão inseridos, constantemente são levados a adaptar-se naturalmente aos
diversos ambientes. Assim, pessoas compartilham predisposições, comportamentos,
que podem ser seus, como também podem ser de outros.
A essa relação de compartilhamento, dentro de um mesmo “espaço”,
demarcado pelo sentido de fronteira, chama-se de “contexto cultural”, que aos
poucos se torna imperceptível quando a fronteira permite a interculturalidade, ou
seja, o deslocamento da cultura.
A cultura abrange os jogos, canções e danças; os modos de construir um
abrigo, de cultivar o milho e de governar um barco; a estrutura e o
funcionamento das famílias, dos governos e dos sistemas educacionais; a
divisão da autoridade, a atribuição de papéis e o estabelecimento de
normas dentro desses sistemas; a língua e todos os demais códigos, bem
como os conceitos e codificados; e em um complexo de modos de viver, de
adaptar-se ao ambiente em mutação e de garantir, por pressão social e por
recompensas, a realização de seus imperativos (BERLO, 2003, p.173).
O conceito de cultura é aqui entendido como produto da sociedade, da
coletividade à qual os indivíduos pertencem, antecedendo-os e transcendendo-os,
como conjunto de códigos simbólicos reconhecíveis pelo mesmo grupo. Neles, os
13
indivíduos são formados desde o momento da sua concepção, seguindo os mesmos
códigos na infância, quando aprendem os valores do grupo e, mais tarde, quando
são introduzidos nas obrigações da vida adulta, apreendendo a maneira como cada
grupo social os concebe.
Como afirmam vários autores, o conceito de cultura vem relacionado à
aculturação e, para melhor compreender o que é esse processo, destaca-se aqui o
o
conceito segundo Oliveira (2007), para quem a aculturação em um
sentido mais amplo pode ser entendida como o contato entre culturas diferentes e o
resultado dessa influência para cada tipo de cultura.
O processo de aculturação é mais fácil de ser percebido quando se
estabelece a comparação entre as ditas sociedades tradicionais e os povos
indígenas. Pesquisadores como Ermel (1988) discutem que a cultura destes povos é
construída por meio da utilização de símbolos, de objetos, de utensílios do seu dia-a-
dia. Segundo ela, é por meio do objeto material que os povos indígenas remetem
sua cultura à fala do grupo e seu relacionamento, em que tudo tem um significado.
A cultura oral, por exemplo, passa de geração a geração, dando
significado ao saber construído no cotidiano. É por meio desta que o conhecimento
informal é transmitido oralmente pelos mais velhos, reconhecido entre os demais
pelas suas experiências acumuladas, resultantes de um passado que está muito
mais distante da memória de povos recentes. É neste contexto que se deve
enquadrar a cultura dos índios que é transmitida, oralmente, da geração antiga a
gerações mais recentes.
14
Diante dessa discussão, é possível refletir sobre as questões que
envolvem a preservação da pintura corporal praticada pelos grupos indígenas,
caracterizada como um costume de grupos étnicos. É nesta perspectiva que pode
ser analisada especialmente o grafismo corporal praticado pelo grupo étnico Asurini
do Koatinemo, objeto de nossa pesquisa.
Dessa forma, entende-se que mostrar a importância da preservação e
manutenção e de uma possível consolidação do grafismo presente na cultura do
povo Asurini será de fundamental importância para o fortalecimento da cultura desse
povo, assim como para a preservação do patrimônio cultural regional da Amazônia,
muitas vezes violentado pelo desaparecimento de idiomas e culturas inteiras de
várias etnias dessa região.
Para De Paula (2000), não é por acaso que, nas últimas décadas, por
exemplo, grupos indígenas organizados tiveram reconhecimento como povos
culturalmente diferenciados. Este fato garantiu aos povos indígenas o direito de se
organizarem e desenvolverem suas próprias reivindicações e lutarem pela
preservação e manutenção de seus traços culturais.
Não se pode deixar de relacionar a preservação e manutenção cultural do
povo indígena com a preocupação do desenvolvimento regional, uma vez que a
região amazônica faz parte de uma das maiores preocupações nacionais sobre o
desenvolvimento. As atenções ambientalistas carregam também a questão indígena
como a marca da presença cultural do indígena, devastada ao longo de toda sua
história.
Sabe-se que o desenvolvimento regional surge como um aporte
necessário ao desenvolvimento econômico, o dito “desenvolvimento sustentável”,
que carrega a necessidade de auto-suficiência, orientado para as necessidades das
15
populações locais, salientando a urgência de maior harmonia com o meio ambiente,
o que se torna possível, pelo menos, legalmente, com a garantia de direitos aos
povos indígenas.
Nessa particular temática, lembramos o pensamento de Santos, que
afirma: “o estudo da cultura contribui no combate a preconceitos, oferecendo uma
plataforma firme para o respeito e a dignidade nas relações humanas”. (SANTOS,
2004, p. 8-9).
1.1 PROBLEMA
Diante dessa discussão, questiona-se como a prática do grafismo
corporal, realizado pelas mulheres Asurini do Koatinemo, pode contribuir para a
preservação e manutenção da cultura indígena desse grupo.
1.2 OBJETIVO GERAL
Esta pesquisa objetivou identificar a prática da pintura corporal
desenvolvida pelas mulheres índias Asurini do Koatinemo como preservação e
consolidação da cultura desse povo.
1.2.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Investigar a prática do grafismo corporal desenvolvido pelas mulheres
Asurini do Koatinemo e compreender o significado do grafismo para a
etnia;
16
Compreender, por meio da observação da prática da pintura corporal
realizada pelas mulheres Asurini, o processo de aprendizagem dessa
pintura corporal pelo grupo;
Identificar se após a aprendizagem o grafismo sobrevive, de forma
sustentável, à aculturação.
1.3 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO
O povo indígena Asurini do Koatinemo tem no grafismo um instrumento
visual para representar suas crenças, costumes e tradições, usando da arte gráfica
para compor a ornamentação do corpo, não em ocasiões de cerimônias
especiais, mas também no seu cotidiano.
Por essa razão, este trabalho mostra a importância da manutenção da
prática do grafismo para a consolidação e preservação da cultura e identidade
cultural desse povo, a fim de que essa prática possa ser repassada para novas
gerações.
1.4 RELEVÂNCIA DO ESTUDO
A proposta desta pesquisa é contribuir, por meio das reflexões trazidas,
para a consolidação e preservação da cultura indígena por meio da prática da
pintura corporal, enquanto símbolo da identidade dessa etnia.
Nesse sentido, entende-se que o presente estudo poder ser um
instrumento de referência para a identificação das formas de transmissão e
construção dos saberes culturais por meio do grafismo corporal, garantindo a
17
continuidade simbólica desse elemento cultural para o fortalecimento da cultura
desse povo, assim como o patrimônio cultural regional da Amazônia, uma vez que
culturas inteiras dessa região têm desaparecido. Destaca-se também, como
contribuição desta pesquisa, a disponibilização catalogada do grafismo corporal dos
Asurini para acervo cultural.
1.5 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
Este estudo desenvolveu-se em seis capítulos. No primeiro, abordou-se o
homem, cultura e cultura indígena, relacionando tais temas com a aculturação. Nele,
foram tratados o problema em estudo, o objetivo geral e específicos, a delimitação
do estudo, sua relevância e a organização do trabalho.
No segundo capítulo, traz-se o conceito de homem, cultura e sociedade,
tentando compreender o significado de seus símbolos, além de tratar da
conceituação de aculturação e do grafismo corporal dos povos indígenas, fazendo
uma abordagem histórica dos índios brasileiros em seus aspectos de vida, idioma,
crença, família, interesses e talentos.
No terceiro capítulo, investiga-se, a cultura, os usos e costumes do povo
Asurini, por meio de sua história de contato, localização, confrontos com outros
grupos indígenas e, ainda, busca-se elementos para a compreensão do significado
do grafismo.
O quarto capítulo pautou-se na reflexão metodológica utilizada na
pesquisa, no contexto em que se encontrava a aldeia, lidando com o povo indígena
Asurini, no âmago de seu habitat. Desta forma, foi possível, utilizando a abordagem
18
qualitativa, realizar uma pesquisa de campo, com observação participativa, efetivada
no período de junho de 2006 a agosto de 2007.
O quinto capítulo aborda todo o conhecimento básico conquistado,
coletado e interpretado ao longo das visitas à aldeia e contém ainda a
sistematização de todos os conteúdos pesquisados nas fontes bibliográficas
utilizadas.
O sexto capítulo caracteriza-se pelo conjunto de respostas à indagação
proposta na pesquisa, por isso representa o importante elo entre o estudado, o
conhecido e o percebido ao longo do estudo, servindo ainda como resultado e
conclusão deste trabalho.
19
2 REVISÃO DA LITERATURA
Este capítulo trata do conceito de homem e sua relação com a cultura e a
sociedade, compreendendo que, por se tratar de um estudo voltado à questão
indígena, falar sobre cultura implica falar sobre o homem e os contextos os quais
convive.
2.1 O HOMEM, A CULTURA E A SOCIEDADE.
Falar sobre o homem implica compreender a história humana e assim o
significado de seus mbolos, ou seja, é compreender a cultura humana e como
acontece a apropriação dos símbolos utilizados por um grupo de pessoas como
forma de sua expressão, sua comunicação e seu desenvolvimento.
De acordo com Santos (2004, p. 4), “o desenvolvimento da humanidade
está marcado por contatos e conflitos marcantes entre modos diferentes de
organizar as vidas sociais, de se apropriar dos recursos naturais e de transformá-los,
e de conceber a realidade e expressá-la”, isto implicaria, ainda, que
A história do homem é marcada pela coexistência de múltiplas culturas.
Essa variedade é muito importante, pois, observando as práticas e tradições
de outros povos, somos levados a refletir sobre a coletividade à qual
pertencemos. Afinal, será que são gratuitas as diferentes formas de
organizar a vida social, de conceber e expressar a realidade? (SANTOS,
2004, p. 4).
Assim, entende-se que o homem não pode dissociar-se do contexto
cultural, pois está permanentemente em comunicação com o outro, e isso exige uma
aprendizagem e uma organização social. Berlo (2003) afirma que a vida humana é
um processo e percorre um constante aprendizado de comunicação, no qual todas
as variáveis estão interligadas. Portanto tudo se aprende, utilizando-se do
20
conhecimento adquirido para ajudar na compreensão de quem são as outras
pessoas e em que estas estão se transformando. Dessa forma, é por meio da
consolidação da cultura que o homem se torna humano.
Marvin Harris, antropólogo americano, por volta de 1969, expressou com
bastante clareza as implicações da obra de John Locke, de 1890, o “Ensaio acerca
do entendimento humano”, e demonstrou que ao nascer o homem nada traz em sua
mente. Porém compreende que o homem é rico em signos, com uma capacidade
imensa de multiplicar infinitamente suas crenças e ideais eruditos, comunicá-los e
transmiti-los aos seus descendentes (BERLO, 2003).
Marconi e Presotto (2001) destacam quatro fases remetentes à trajetória
histórica da cultura do homem; são elas: fase evolutiva, fase de desenvolvimento
biológico, fase de desenvolvimento cultural e fase da cultura do passado.
A fase evolutiva mostra os processos adaptativos pelos quais o homem
passou; desde que era um primata até a fase do homem moderno. Esse caminho
percorrido subdivide-se em dois períodos.
O primeiro retrata as transformações da humanidade, obedecendo aos
estágios pelos quais o homem evoluiu tanto física como culturalmente. O segundo
mostra o ser humano adaptável culturalmente, e se refere ao ser diferente dos
demais seres pela sua capacidade de produzir cultura, ao desenvolver o mecanismo
de adaptação ambiental:
Mesmo os antepassados mais longínquos do homem possuíam rudimentos
de linguagem articulada, indispensável à transmissão da cultura através da
comunicação simbólica. Suas primeiras manifestações culturais foram os
instrumentos intencionalmente confeccionados, primeiramente de pedra,
depois de osso e madeira, tendo sua função utilitária ou bélica (MARCONI e
PRESOTTO, 2001, p. 91).
21
O desenvolvimento biológico do homem é compreendido como uma fase
que se a partir de transformações psicossomáticas básicas, a chamada evolução
hominídea (homem macaco), que foi contínua e gradativa. Nesta fase ocorreram as
modificações necessárias para que o gênero humano fosse aperfeiçoado, é a fase
do Homo em relação ao meio. O resultado dessa seqüência evolutiva de
sobrevivência é denominado sapiens, da qual o homem moderno é o representante.
Na verdade, o desenvolvimento cultural do homem está intrinsecamente
ligado à evolução psicobiológica, que o torna um ser capaz de produzir, criar
experiências e, principalmente, de repassá-las às outras sociedades, tornando-se
então um ser cultural. Ainda nessa fase, são destacados, as influências trazidas pelo
tempo, evidências fósseis, manifestações culturais e estágios da evolução. “O
composto psicobiológico do homem se desenvolveu paralelamente ao componente
cultural e tais aspectos devem ser considerados para a compreensão de tal
fenômeno” (MARCONI e PRESOTTO, 2001, p. 92).
Dentro do processo de desenvolvimento cultural do homem, citados pelo
autor, encontram-se as fases das manifestações culturais, percebidas desde a
época pleistocênica, 2.000000 a 10.000 anos, que testemunhou a evolução física e
cultural do homem.
A época paleolítica inferior (500.000 a 150.000 anos) e do Paleolítico
médio entre 150.000 a 40.000 anos atrás, durante as quais foram construídos
utensílios de pedra encontrados em cavernas ou em leitos de rios. O Paleolítico
superior, 40.000 a 12.000 anos, durante a qual houve a comprovação da presença
humana, acompanhada por manifestações artísticas como modelagem, esculturas e
pinturas. O período Mesolítico, 12.000 a 10.000 anos, cujas evidências estão nos
arcos geométricos e não geométricos e arpões. O período Neolítico ou da Pedra
22
polida, em torno de 10.000 a.C, é marcado pelos aglomerados humanos e
domesticação de animais e plantas. E finalmente, o último período, conhecido como
Calcolítico, de 4.500 a 3.000 a.C, que se distingue pela metalurgia do Cobre e,
posteriormente, do bronze e ferro. Para Marconi e Presotto (2001), as informações
destas fases demonstram a compreensão da cultura humana em seus diferentes
níveis culturais: pré-paleolítico ou eolítico, paleolítico, mesolítico e neolítico.
Laraia (2001) relata que toda história de vida de uma geração, toda
experiência de uma comunidade está acumulada em sua cultura e esta pode ser
considerada como fundamental nesse processo acumulativo.
Considerando-se essas diferentes óticas sobre a cultura, torna-se
imprescindível contextualizá-la e conceituá-la. Na França, por exemplo, o conceito
continua marcado pela unidade de gênero humano e que, no sentido coletivo, é
primordialmente conhecido como a “cultura da humanidade”. No século XIX, a
palavra “Cultura” passou a representar um conjunto de especificidades próprias de
uma certa comunidade, deixando a dimensão do desenvolvimento intelectual
individualista e passando ao reconhecimento do conjunto (CUCHE, 2002).
Para Santella (2003), o termo cultura pode se associar a qualquer
atributo, pois é bastante vasta e complexa sua conceituação. Como exemplo de
alguns está a cultura nacional, a cultura universal, as culturas greco-romanas, a
cultura agrícola, a cultura muito ou pouco desenvolvida, a cultura política, a cultura
dos séculos e, por a cultura das mídias.
Segundo Berlo (2003), a cultura influencia a personalidade, as
necessidades biológicas influenciam a organização social, o conhecimento influencia
o pensamento, o pensamento influencia a crença, a crença influencia os sistemas
23
sociais e estes influenciam o biológico. Todos esses fatores, não podem ser
analisados individualmente, quando se fala de cultura (p. 174).
A história registra com abundância as transformações nas diversas
culturas, movidas por forças internas ou externas, em conseqüência de contatos e
conflitos étnicos. Por isso, ao discutir-se cultura é necessário ter sempre em mente a
humanidade e toda a sua riqueza e multiplicidade de forma de existência.
Santos (2004) afirma que reconhecer o papel fundamental e estratégico
das expressões culturais no mundo contemporâneo está cada vez mais interligado à
diversidade da cultura. Por isso é necessário relacionar a variedade de
procedimentos culturais aos contextos em que são produzidos. Para isto, faz-se
necessário considerar as diferenças na estrutura familiar, os modos habitacionais, as
formas de se vestir ou de distribuir o produto do trabalho.
Finalmente, discutiu-se que a relação homem e cultura são marcadas pelo
mesmo princípio. E a cultura passa por adaptações no processo de aculturação.
2.1.1 O processo de aculturação
Em qualquer trabalho sobre cultura é necessário abordar também a
aculturação. Segundo Oliveira (1976), é possível conceituar aculturação num sentido
mais geral como o contato entre culturas diferentes e o resultado que essa influência
tem para tais culturas.
O termo aculturação, por várias razões, costuma ser usado com
preconceito, com o sentido explícito ou implícito de que os índios que experimentam
mudanças culturais deixam de ser índios e, portanto, perdem seus direitos enquanto
povos (OLIVEIRA, 1976). A palavra o se resume a um tipo de aculturação. O
24
prefixo “a” também não significa privação; esse termo vem do latim e significa um
movimento de aproximação.
Na verdade, a discussão gira em torno da crença de que não culturas
estáticas, imutáveis, permanentes ou fechadas em si mesmas. É preciso reconhecer
que as influências sobre esse conjunto, bem como seus componentes, são múltiplas,
por isso estão em contínua mudança, sofrendo o impacto de sociedades e de
sistemas de valores variados (MIDLIN, 2006).
De acordo com Cuche (2002), frente aos inúmeros dados empíricos
existentes sobre o termo aculturação, o Conselho de Pesquisa em Ciências Sociais
dos Estados Unidos criou, em 1936, um comitê responsável para organizar a
pesquisa sobre os fatos de aculturação.
Referendado por Cuche (2002), o “Memorando para o Estudo da
Aculturação”, escrito por Robert Redfield, Ralph Linton e Melville Herskovits em
1963, fazia um esclarecimento semântico e anunciava o conceito a partir de então
como: a aculturação seria um conjunto de fenômenos que resultam de um contato
contínuo e direto entre grupos de indivíduos de culturas diferentes e que provocam
mudanças nos modelos “patterns” culturais iniciais de um ou dos dois grupos.
Segundo o documento, deve ser distinguido o sentido da palavra
“aculturação” e “mudança cultural”. A expressão é utilizada por antropólogos
britânicos, que, segundo eles, na realidade a mudança cultural pode resultar tanto
de causas internas como externas. Aprofundando o debate, Herskovits (apud
CUCHE, 2002) propõe um conceito de reinterpretação de aculturação que seria o
processo pelo qual antigas significações atribuídas a elementos novos ou pelo qual
novos valores mudam a significação cultural de formas antigas.
25
Sabe-se que o termo aculturação aplica-se, em uma visão antropológica,
a todo resultado de contato entre culturas diferentes, em que ambos os envolvidos
passam por trocas de culturas diversas. Este fato é freqüente e comum em todos os
contextos de cultura, inclusive por se tratar de uma cultura tradicional de povos
antigos, nos grupos indígenas, nos quais as diferenças culturais são mais
perceptíveis e, por outro lado, mais vulneráveis.
2.2 A CULTURA DOS POVOS INDÍGENAS
Sobre a cultura dos povos indígenas, Baniwa (2005) aponta cinco
pressupostos básicos para a compreensão da dimensão dessa cultura e a criação
de políticas próprias para sua preservação.
O primeiro está na capacidade de situar-se historicamente na perspectiva
das políticas existentes. No ano de 1500, quando os portugueses chegaram ao
Brasil, existia uma população de, no mínimo, 6 milhões de índios. A FUNAI registra
em dados oficiais, no início da década de 1980, 250 mil índios. Dados mais recentes
do IBGE apontam número em torno de 700 mil. Contudo a FUNAI ainda trabalha
com a média de 350 mil índios no território brasileiro. “A redução populacional
drástica é resultado de séculos de uma política colonial de limpeza étnica”. Povos
indígenas inteiros foram literalmente dizimados física e culturalmente (BANIWA
2005).
O segundo pressuposto aborda a consideração sobre as diversas culturas
indígenas existentes. Trata-se de 220 povos, com aproximadamente 180 nguas,
com distintas histórias, em diversos ecossistemas encontrados em contextos
econômicos e políticos diferentes, em um país que possui dimensões continentais. O
26
povo indígena ocupa 1% do território brasileiro. Na região amazônica, esse
percentual sobe para 21% da região inteira. Existe uma grande importância sobre a
qualidade dessa diversidade de cultura, também há o valor quantitativo de seus
territórios para as políticas públicas do país:
[...] A maioria dessas terras está preservada: em muitos casos, as terras
indígenas formam ilhas de florestas rodeadas de pastos, monoculturas de
soja, arroz e outras formas de destruição de recursos naturais de valores
incalculáveis do ponto de vista ambiental e econômico (BANIWA, 2005, p.
180).
No terceiro pressuposto está a noção de identidade. “A identidade
pessoal e de grupo é de natureza multifacetada e cambiante” (BANIWA, 2005, p.
182). Os comportamentos de ser ou ter, nas questões de valores e conhecimentos
materiais e não materiais para si ou em relação a outros grupos, estão relacionados
à identidade do grupo social, isto é, não é a posse, mas o grupo que define quem é.
A terra é do índio, pois ele precisa dela. A exemplo disto estão as expressões
culturais e artísticas dos povos indígenas, que são canais de confirmação de
identidade.
A memória coletiva construída por meio de representações das coisas e
da natureza também é reforço do pertencer a um determinado grupo. Neste sentido
a história, o sentido de pertença, a identidade pessoal ou coletiva, a cultura, as
relações interétnicas devem ser levados em conta para a concepção, formulação e
implementação das políticas do Estado (BANIWA, 2005, p. 182).
No quarto pressuposto, encontra-se o direito a terra. Ter terra e identidade
são fundamentais para a obtenção da sobrevivência física e cultural do povo
indígena. Como grupos étnicos, os indígenas preservam a identidade e o território
constituídos em pilares indispensáveis para a preservação histórica dos mitos, dos
27
rituais e para a identificação de lugares sagrados que significam referências para o
grupo, enfim, elementos que dão sustentação para a confirmação da identidade.
Para Baniwa (2005), o que fundamentalmente afeta os índios é a
necessidade de se conhecer e aprender a cada dia mais sobre o grupo, produzir e
criar conhecimentos capazes de desenvolver fontes que fortaleçam sua identidade
cultural. Exemplos disso podem ser os trabalhos produzidos no meio acadêmico a
cultura.
Como quinto e último pressuposto, esse autor fala sobre a necessidade
de uma “educação adequada e de qualidade para formar intelectuais e profissionais
indígenas, capazes de organizar e sistematizar, segundo conceitos e metodologias
privilegiadas da sociedade dominante, experiências e conhecimentos de seus
povos”.
Assegurar a promoção, a divulgação e a sobrevivência de valores
culturais e identidades indígenas tornam-se fundamental. Diante desse contexto,
entende-se que a cultura é geradora de parâmetros educacionais, uma vez que
promove e dissemina a diversidade, o auto-reconhecimento e a auto-estima dos
diferentes povos.
Nas últimas décadas, houve o reconhecimento dos índios como povos
culturalmente diferenciados com competências para desenvolverem sua própria
organização e desenvolvimento social (DE PAULA, 2000).
Em relação ao desenvolvimento social dos povos indígenas, a
manutenção da cultura própria de cada etnia parece ser de fundamental importância;
Essa manutenção perpassa também pela sua auto-sustentação. Loureiro (2004)
afirma que a “auto-sustentação” é uma necessidade que se impõe para a
28
sobrevivência cultural dos povos indígenas. Difícil, no entanto, é realizá-la sem ferir
de alguma maneira valores tradicionais e modos de viver dos grupos indígenas.
De acordo com Gruspioni (1998) as dificuldades se devem a vários
fatores dentre os quais destacam-se dificuldades de comunicação cultural entre
brancos e índios no Brasil. Sem os acessos aos canais políticos no cenário nacional,
os índios estão distantes do processo de exercício da cidadania.
De Paula (2000) afirma que na Região Amazônica estão localizados
muitos grupos étnicos indígenas. A região pode ser caracterizada como de fronteira,
como uma área em formação, onde o tradicional e o moderno convivem no mesmo
espaço. É uma área de diversos conflitos, de grandes empreendimentos:
agrominerais, agroflorestais, agroindustriais e de exploração de outros recursos
naturais.
As tecnologias modernas na Amazônia implicam novas dinâmicas de
apropriação de terra, movidas por incentivos governamentais e que impõem a
expropriação das sociedades tradicionais (indígenas) que historicamente habitam
estes espaços e que precisam migrar para outras áreas.
Sabe-se que as sociedades indígenas precisam de terras para viver e
tradicionalmente vivem do que pescam, caçam, plantam e colhem. Essas atividades,
que são resultado da produção material indígena, proporcionam acúmulos de
conhecimentos a respeito da fauna e da flora, o que lhes permite proporcionam
índio, ao longo dos anos, a evolução das técnicas de trabalho, de novas formas e
regras de convívio social e das teorias de origem do mundo, vinculando-se sempre
ao território em que vivem (VALADÃO, 2001).
29
O autor comenta também não limites precisos sobre a ocupação
tradicional dos territórios indígenas. Os índios abriam suas casas, seus caminhos de
caça e as trilhas para visitar outras aldeias. Quando a caça ou a pesca se
esgotavam, abriam novos caminhos em outra direção, mas conservavam de alguma
forma os lugares das antigas moradas e os cemitérios em que enterravam os
mortos.
De Paula (2000) comenta que no início de suas atividades o antropólogo
Lévi-Strauss foi à busca do selvagem e encontrou o homem. O autor, ainda
esclarece que o povo indígena marca de várias formas sua identidade, pois cada
povo possui uma explicação mítica sobre a origem do mundo, sua própria língua,
tradições, seus rituais de nascimento e de morte fúnebre, seus rituais de passagens
durante várias fases da vida. Assim, cada etnia tem sua maneira própria de construir
suas casas, de fabricar seus utensílios de uso pessoal e da cultura material.
[...] Índio é todo indivíduo que assim se identifica pelos membros de sua
comunidade, com seus elementos e que mantém vínculos históricos com
populações de origem pré-colombiana. Assim se define um índio pelo
critério de autodefinição étnica, adotado pela maioria dos antropólogos e
outros estudiosos dos povos indígenas (De PAULA, 2000, p. 47).
Dos povos indígenas que Cabral encontrou aqui durante o descobrimento,
muitos deles ainda habitam esse território, conservando suas línguas maternas, suas
culturas próprias e vasto conhecimento sobre o seu ambiente, sensibilidade artística
e um senso estético demonstrado até hoje no grafismo de vários povos
representados na pintura corporal.
Novaes (2005) comenta que, para se entender a cultura indígena ou de
um índio, deve-se despojar de nossa civilização, porque o encontro com o índio ou
com sua cultura representa um mergulho em outros espaços, coloridos e
prodigiosos, povoados por espíritos, animais, vegetais e minerais. É penetrar em
30
outro mundo, que não seja aquele em que se vive. Essa vivência se torna primordial,
possibilita a compreensão do próprio mundo vivido como um complexo cultural. Com
essa experiência, pode-se ver o mundo do outro e com ele, refletir e compreender a
complexidade da cultura.
Ermel (1988) diz que, para entender o tempo e o espaço da cultura
indígena, que se entender sua história, seu desenvolvimento. É preciso vivenciar
com ele esse momento. Cada gesto da etnia indígena está fundamentado no tempo
percorrido da sua tradição, com isso tendo sua própria forma de viver, de sentir e de
valorizar seu tempo e espaço; esse tempo é uma dimensão do vivido intensamente
determinado pela sua própria natureza.
Tradicionalmente, os povos indígenas se organizam em grupos
pequenos, dispersos em seus respectivos territórios. Sua mobilidade nesse território
é determinada pelas técnicas produtivas, que conjugam muitas atividades, como a
agricultura, a caça, a pesca, a coleta de frutos e outros recursos necessários ano-a-
ano para sua sobrevivência (CARELLI, 2001).
A organização das atividades obedece a um calendário anual que
acompanha o ciclo das estações, estipulando a época das expedições na mata,
acompanhando a maturação das frutas e reprodução de animais. O ciclo da
agricultura também estabelece tarefas distintas no verão, quando ocorre a
derrubada, e no inverno, quando o começo das chuvas marca o tempo de iniciar a
plantação (CARELLI, 2001).
Na aldeia Asurini do Koatinemo, ainda se obedece a estes ciclos. Todas
as famílias asseguram sua própria subsistência. Assim, todos os membros do grupo
têm acesso à produção e ao consumo, resultados que dependem do trabalho de
cada um. Não existe na aldeia indivíduo que controla o acesso e a distribuição dos
31
recursos necessários para o sustento, uma vez que o objetivo do trabalho é de
subsistência e tudo o que produzem em família os indígenas usam para seu próprio
consumo, ou seja, não é objetivo do índio produzir em abundância, porque a
tecnologia tradicional usada com base nos próprios recursos extraídos da natureza
raramente poderia permitir a estocagem ou acumulação de qualquer produto.
Para os Asurini do Koatinemo, o conceito de desenvolvimento vincula-se
à satisfação das necessidades pessoais e do grupo. Os indígenas não possuem a
intenção comercial do que é produzido nas aldeias; logo se elimina a possibilidade
de produção de excedentes.
Para finalizar este capítulo, é necessário relembrar a conceituação
universalista e etnológica de cultura elaborada pelo antropólogo britânico Edward
Burnett Tylor (1832 – 1917), para quem “Cultura inclui o conhecimento, as crenças, a
arte, a moral, o direito, os costumes e as outras capacidades ou hábitos adquiridos
pelo homem enquanto membro da sociedade”. Cuche (2002) afirma que esse autor
foi o primeiro etnógrafo a abordar efetivamente os fatos culturais sob uma ótica geral
e sistemática, foi também o primeiro a se dedicar ao estudo da cultura em todos os
tipos de sociedade e sob todos os aspectos, materiais, simbólicos e até corporais
(CUCHE, 2002). Aspecto que muito interessa a este estudo.
2.2.1 O grafismo e a arte: uma relação histórica e cultural nos diversos grupos
humanos
Segundo Freire (2007), a relação entre o homem e a arte ocorre a partir
do emprego da sensibilidade humana sobre o mundo, assim como de seus
fenômenos por meio da percepção cognitiva mais complexa da mente humana. Por
32
isso é indiscutível que historicamente a arte se constitui em uma forma do homem se
expressar ao longo de sua existência.
Esse autor aborda que a percepção como instrumento da sensibilidade
favorece a concretização das várias formas de expressão da arte que se desvela no
experimento do ato de ler, na decodificação da gramática visual, corporal e sonora,
na transposição do mundo real e imagético a uma compreensão dos signos do
mundo presente. Neste sentido, a arte é um canal de aprendizagem, de
conhecimento de coisas que não se consegue articular na vida concreta.
A arte acontece como um meio de vida, para que as sociedades saibam o
que pensam, para divulgarem suas crenças ou as de outros grupos, para
estimularem e distrair a si mesmo e aos outros, para explorar novas formas de olhar
e interpretar objetos e cenas. A arte para Manzatti (2006) é criação humana com
valores estéticos, equilíbrio, harmonia e a mesmo de revolta, que resume
emoções, histórias, sentimentos e cultura, apresentando-se sob variadas formas: a
plástica, a música, a escultura, o cinema, o teatro, a dança, a arquitetura e pode ser
vista ou percebida pelo homem de três maneiras: visualizada, ouvida ou mista
audiovisual.
O grafismo é uma dessas formas de expressão, pois, na história da arte,
este se faz presente desde a pré-história, nas pinturas rupestres, como as primeiras
impressões do homem sobre o mundo que o cercava. Hoje, constitui uma técnica
usada para criar imagens abstratas e de composições geométricas.
Há de se observar que o grafismo no sentido a que este estudo se propôs
a investigar é norteado pelas práticas e saberes culturais dos povos que utilizam
essa forma de expressão, visto que se trata de um código de comunicação
complexo, o qual exprime a concepção que os Asurini do Koatinemo têm do mundo
33
e de suas relações com os outros, concebendo-os como iguais ou diferentes, e
ainda da relação com os seres sobrenaturais e com o ambiente onde vivem.
Os indígenas brasileiros, incluindo-se o povo Asurini do Koatinemo,
praticam a pintura corporal com uma gama de significados diferentes, adequados a
cada etnia. A esse respeito Manzatti (2006, p. 01) esclarece:
O grafismo dos grupos indígenas sempre chamou a atenção de cronistas e
viajantes, desde a chegada dos primeiros europeus ao Brasil. Além da
beleza dos desenhos, o que surpreendia os não-índios era a insistência da
presença desses grafismos.
Os indígenas de qualquer etnia podem opor sua opção cultural à
realidade da natureza, pois quando se questiona o que torna o homem diferente dos
outros animais, a resposta sempre envolverá a arte. Somente os serem humanos
criam obras artísticas; sejam pinturas, músicas, histórias, mitos e ritos. Estes são
fatores humanos, criados pelos homens para conviver e comunicar-se entre si.
O grafismo em forma de arte sempre esteve presente nos muitos
momentos da história humana. A fase modernista até os dias atuais, o grafismo
ganhou força por se caracterizar como arte abstrata. Entretanto tem-se que
considerar que os grafismos quando expostos na cultura indígena ultrapassam a
dimensão artística, pois quando o índio pinta seu próprio corpo, ele demarca seu
lugar no mundo, afirma sua identidade. (MANZATTI, 2006).
Freire (2007) ressalta que o olhar curioso do homem civilizado sobre a
arte indígena, sobretudo o grafismo, é algo que vem de longa data, pois
efetivamente, desde o século XVI, os cronistas europeus vêm registrando os
desenhos utilizados pelos índios na própria pintura corporal ou ainda a utilizam em
decorações de cerâmicas, em tecidos, em máscaras, em cestarias, nas esculturas,
em madeira, e em uma série de artefatos e ornamentos.
34
O grafismo no contexto da arte constitui um saber cultural, pois depende
da intencionalidade dos contextos sociais onde estão inseridos. Para Freire (2007), a
arte gráfica indígena impressiona pela força, pela autenticidade e qualidade estética,
mas ainda é vista de forma preconceituosa.
Na concepção do autor, a arte indígena é considerada estranha e
contraditória, mesmo quando reconhecida como produto sofisticado e refinado. Os
usuários dos produtos classificam o produtor como selvagem e rbaro e a
sociedade que os produziu como atrasada, concebendo a arte de forma isolada,
independente do artista, e do conjunto de valores e tradições culturais que a
mantém.
2.2.2 O grafismo corporal dos povos indígenas
Nas sociedades indígenas, o aprendizado da arte da pintura começa
desde criança. Esta habilidade é elemento culturalmente transmitido, ainda assim
não é considerada uma produção de conhecimento que confira ao índio uma
especialidade. A classificação da pintura facial na sociedade ocidental é de suma
importância, pois serve para identificação estética. Mas essa pintura é classificada
de acordo com a posição social apresentada pelas pessoas, distinguindo-as uma
das outras por classe, idade e meio social, ao passo que a pintura nos grupos
indígenas tem funções culturais diferenciadas.
Em alguns povos, a pintura significa preparação para a luta, batalha; para
outros, serve para ornamentar, como é o caso das imagens. A pintura corporal pode
ser considerada e é, para alguns povos, obras de arte. Ela é transmitida por meio da
memória cultural herdada de seus antepassados e pela mitologia que explica sua
35
existência; além disso, as pinturas são verificadas em toda a história da
humanidade. Desvendar as diferentes formas de pinturas e seus significados nas
diversas culturas indígenas torna-se relevante quando se considera que é neste ato
que as diversas etnias enfrentam o fenômeno da aculturação.
2.2.2.1 Os índios Xavante
Müller (1992) relata que esse povo, residente no Estado de Mato Grosso,
utiliza em suas pinturas as cores vermelhas, que é extraída do urucum e que a
coloração na tinta. Do jenipapo, assim como da fuligem das panelas, é extraída a cor
preta. A associação desta cor a (urucum) e ao sol (budü), é a mais utilizada por
sua praticidade.
O grupo dos Xavante procura utilizar predominantemente as tintas
simples ou naturais na pintura corporal; já as pinturas faciais são feitas com tintas de
breu; para a pintura de objetos é utilizado sumo de cascas. O urucum é utilizado por
homens e mulheres para pintura corporal. Os Xavante não fazem o uso deste para
desenhos, mas procuram esfregá-lo e espalhá-lo no corpo inteiro.
Nessa comunidade indígena, a índia é quem prepara a tinta a ser
utilizada. O urucum além de planta medicinal (protege contra queimadura solar),
serve de proteção para o corpo contra picada de insetos. A cor vermelha extraída do
urucum serve de base ou fundo para os posteriores desenhos feitos com a tinta
preta extraída do fruto do jenipapo. A Figura 1 mostra o fruto do Urucum.
36
Durante os rituais de pintura corporal Xavante, as crianças e os homens
são pintados, respectivamente, por suas mães, irmãs ou esposas. A índia, por
exemplo, tem o privilégio de pintar o índio, mas este nunca passa urucum no corpo
dela. A arte de pintar é feminina neste grupo. Os mais velhos acreditam que, quando
a mulher pinta, o homem traz sorte na caça, no amor e na vida.
De acordo com o costume, festividade, ritual ou cerimônias que cada índio
queira participar é feito um tipo de pintura. No uso diário são feitos traços e pontos
de pequeno porte, pintados com tinta preta extraída do jenipapo, principalmente
utilizados para pintura facial (aplicam na testa, face e no nariz), não devendo pintar a
boca e o queixo; nos dias de grandes rituais são feitos desenhos altamente
trabalhados e preparados para aquele momento especial.
2.2.2.2 Os índios Xinguano
Os Xinguano são povos com costumes e línguas diferenciadas. Podem
ser encontrados no Parque Indígena do Xingu, onde vivem divididos em dezoito
sociedades distintas, num total de 2.300 índios (MÜLLER, 1992).
Figura 1: Fruto do urucuzeiro usado na pintura corporal.
37
Os grupos vivem juntos no Parque e estão divididos por nome: Trumai,
Kuikuro, Txicão, Kalápalo, Kamaiurá, Yawalapití, Waurá, Mehinãku. Procuram
realizar encontros regularmente para formalizarem reuniões políticas e festas.
De acordo com Franchetto (2001), os Xinguano fazem trocas de objetos,
de costumes, de símbolos quando fazem encontros ou casamentos entre os
participantes dos grupos distintos.
A pintura corporal faz parte do cotidiano dos povos Xinguano. É feita com
urucum e com óleo de pequi na cor vermelha; do jenipapo e da tabatinga, eles
extraem, respectivamente, a cor preta e a cor branca. As tatuagens representam
partes do corpo (pêlo ou pele), reverenciando animais de sua região e o seu jeito de
se movimentar. Todos sabem se pintar desde criança, porém não possuem
especialização, ou seja, não dominam nenhuma técnica, uma vez que o
conhecimento é desenvolvido de forma empírica, não sistematizado.
Entre os povos do Xingu estão os Kuikúro, que em festas exibem enfeites,
cintos de caramujos, braçadeiras com penas, cocares com cores variadas e o corpo
com pinturas vermelhas feitas de urucum e passadas no corpo inteiro. Existem
muitos e deferentes padrões de pintura corporal, de desenhos que cobrem os
cabelos, as costas, os quadris e as pernas. Cada desenho possui um nome que
algumas vezes lembra o animal cuja forma, carapaça ou pele inspira os traços
simétricos: jabuti, onça, borboleta ou piranha, entre outros (FRANCHETTO, 2001).
Os desenhos são diferentes entre mulheres e homens. Para o índio dessa
etnia, pessoas bonitas o pessoas pintadas. A pintura tem o sentido de vestimenta
para o corpo que, sem pintura, está nu.
38
2.2.2.3 Os índios Kadiwéu
De acordo com Siqueira (1992), este povo, também chamado de índios
cavaleiros, de língua Guaicuru, pertencem ao grupo étnico Mbayá. Esses povos
apresentam uma população aproximada de 350 pessoas, vivendo em duas aldeias
Bodoquene e São João, em latifúndios reservados pelo Governo Federal. Eles
praticam a caça do veado e do cervo e cultivam coco e palmito. Anualmente sofrem
com o fluxo e refluxo do rio Paraguai, que inunda o Pantanal durante cinco meses no
ano.
A cultura rígida apresentada pelo povo Kadiwéu é orientada por
expressões culturais, embora atravessem um período de revisão de valores em
vistas das várias mudanças ocorridas ou processadas nessa sociedade. O trabalho
artesanal realizado com palha, couro e barro, encontrado nas técnicas de
manipulação do metal, dá conta de obras magníficas, de alta perfeição e técnica.
Para Siqueira (1992), a pintura corporal se apresenta nessa sociedade
sem virtuosismos e cores. Na pintura são utilizados desenhos e tatuagens com
poucos detalhes, geralmente simétricos, alguns detalhes sobre o nariz, bios e
faces, sendo que os mais complexos cobrem toda a face, quase impossíveis de
descrever.
A pintura corporal indígena é o elo de transmissão das informações, ricas
em significados. É um sistema de comunicação visual, em que a maioria dos povos
pinta seu corpo com significado da fauna, da flora, do rio, da floresta ou de objetos
de uso cotidiano.
39
A convivência conflitante com os brancos esbarra de maneira dramática
nas situações atuais da cultura desse grupo, que continua enfrentando resistência
por parte da sociedade branca.
2.2.2.4 Os índios Xikrin
Segundo Vidal (1992), os Xikrin são originários do grupo indígena Kayapó
e vive às margens do rio Catete, entre os rios Araguaia e Xingu no Estado do Pará,
com uma população estimada em 170 índios. Sua língua de origem pertence ao
tronco Macro-jê.
Quanto à pintura corporal, eles são bastante evoluídos. A aparência
corporal é bem definida e de grande importância, porque toda e qualquer pintura tem
seu significado e serve para a comunicação e para a beleza física.
Por ocasião de doença e de luto, a pintura corporal preta não é utilizada,
nesses momentos as cores utilizadas são a vermelha, feita com urucum, e brancas,
originadas do ovo do pássaro Azulão.
Na cultura Xikrin, as pinturas são vistas como poderosas, mágicas, de
grande importância, usadas em cerimônias, rituais, e vistas apenas nas crianças e
mulheres da aldeia. Homens, mulheres e crianças utilizam adornos diariamente e a
cada oito dias as mulheres casadas e seus filhos se reúnem para uma sessão de
pintura coletiva.
Como a sociedade é bastante numerosa, procuram dividir-se em grupos
de idade, pintando-se umas às outras no corpo e posteriormente no rosto. O índio
Xikrin ao nascer é pintado com seu próprio cordão umbilical.
40
O material utilizado para pintar é a lasca da palmeira, utilizada para
confecção de desenhos geométricos que imitam movimentos ou lembram corpos de
animais, ou ainda desenhados conforme a criatividade do pintor.
2.2.2.5 Os Asurini do Trocará
Esse povo é conhecido como Asurini do Tocantins, constituído por índios
pertencentes à família lingüística Tupi-Guarani, que vive na reserva do Trocará,
localizada na margem esquerda do rio Tocantins, ao norte do município de Tucuruí,
no Estado do Pará, no Brasil (ANDRADE, 1992).
Essa etnia usa, para a pintura corporal, o fruto do jenipapo e do urucum
no preparo das tintas. Essa matéria-prima é aplicada no corpo com as mãos ou com
o auxílio de um pedaço de madeira, quando é necessário maiores detalhe na
pintura. Esse povo utiliza, durante a pintura corporal, carimbos feitos do caroço da
fruta inajá, partido ao meio. Esse carimbo é mergulhado na tinta do fruto jenipapo e
seguidamente aplicado sobre a pele do corpo.
O urucum é cultivado nas proximidades das casas da aldeia e o jenipapo
é coletado nas matas, em locais mais distantes da aldeia. A colheita do fruto do
jenipapo é especialmente feita por homens, enquanto que o preparo da tinta do fruto
é tarefa feminina.
Andrade (1992) relata que a pintura dessa etnia pode ser feita tanto por
homens, como por mulheres. Apesar de estas serem predominantes, alguns homens
também são considerados bons pintores.
Existe uma ordem familiar a que se obedece na família. Nela as irmãs
pintam-se umas às outras; as esposas, seus maridos; as mães pintam seus filhos;
41
as avós pintam seus netos, aque todos adquiram a prática da pintura. Existem
dois métodos de aprendizagem da pintura corporal dos Asurini do Trocará: a
observação e o treino no corpo das crianças.
A pintura corporal desse povo marca suas etapas de vida e seus
diferentes eventos. É possível observar a pintura que o indivíduo ostenta, identificar
se este está, por exemplo, indo a um ritual xamanístico ou a um ataque guerreiro.
Pode-se também saber se o mesmo é solteiro, casado ou possui filhos. Assim, o tipo
de pintura desse povo pode fornecer uma espécie de cartão de identidade daquele
que a usa:
Por intermédio de tal ornamentação, a aldeia fica dividida em diferentes
grupos: as pessoas maduras (casadas e com filhos) e imaturas (crianças,
solteiras e casados sem filhos); homens e mulheres; os guerreiros e os
homens comuns; visitantes (membro de outro grupo local) e os habitantes
da aldeia. A pintura também mostra os indivíduos que estejam em
momentos especiais da vida: mulheres menstruadas (que não podem se
pintar) das outras mulheres; os mortos dos vivos; os dançarinos
(personagens centrais dos rituais xamanísticos) dos outros homens
(ANDRADE, 1992, p.172).
A pintura dos índios Asurini do Trocará pode demonstrar o status das
pessoas, do nascimento a sua morte. O morto é pintado com o urucum e o recém-
nascido com a tinta do jenipapo, que pode, segundo as crenças, acelerar seu
crescimento físico (ANDRADE, 1992).
Retratou-se neste capítulo o sentido do grafismo para algumas etnias.
Para cada uma delas o grafismo tem significados específicos, que vão desde
revestimentos (Xinguano), até as marcas identitárias dentro do próprio grupo (Asurini
do Trocará), conferindo-lhes um lugar na estrutura social da aldeia. Nota-se que o
grafismo possui um significado especial e está relacionado à cultura de cada grupo.
Em seguida serão abordados tópicos que apresentam as características,
os costumes e os grafismos do povo Asurini, enfoque desta pesquisa.
42
3 A ETNIA ASURINI DO KOATINEMO
O povo Asurini vive em aldeia localizada à margem direita do rio Xingu, na
terra indígena Koatinemo, homologada em 1986. Antes este povo, desde 1972 até o
ano de 1985, habitava outra aldeia localizada à margem do igarapé Ipiaçava,
afluente da margem direita do Xingu, ocupando uma superfície de 388.304 m, com
428 km de perímetro, pertencente ao município paraense Senador José Porfírio,
estando mais ligado ao município de Altamira, por proximidade geográfica e por
decisão política das lideranças desse grupo.
Os Asurini vivem dependentes política, econômica e socialmente do
município de Altamira. Mas, originalmente, esse povo habitava às margens do rio
Pacajá, e de 1940 a 1950 os índios foram migrando em direção ao rio Xingu,
pressionados pelos índios Kayapó e Araweté. Os Asurini escolheram a nova morada
à margem direita do rio Xingu, que ficou conhecida como a “Terra Asurini”.
Na década de 1970, com o início da construção da Transamazônica, o
contingente da chamada Frente Nacional de Desenvolvimento instalou grandes
projetos agropecuários, de mineração e de hidrelétricas na região, e, sobrevoando a
região do Xingu localizaram os Asurini. Essas mesmas companhias financiaram o
primeiro contato com os Asurini em 1971, por intermédio dos padres Anton e Karl
Lukesch, da Prelazia do Xingu. Após o primeiro contato, o sertanista Antônio Cotrin,
da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), ficou responsável pela aproximação e
contato.
Os Asurini do Xingu ou Asurini do Koatinemo tiveram sua denominação
pelas frentes de atração. Sua manifestação cultural, por meio de extensos ritos e
práticas de “xamanismo”, com complexa arte gráfica, faz desse povo uma etnia de
43
tamanha vitalidade cultural capaz de sobreviver às constantes ameaças físicas. A
Figura 2 apresenta os homens da aldeia tocando turé (instrumento musical).
Ao contatar os índios do igarapé Ipiaçava, o missionário católico e
etimólogo Antonio Lukesch denominou-os ASURINI, por serem Tupi e “ÍNDIOS
VERMELHOS”, devido ao uso abundante do urucum. Esse grupo se autodenomina
AWAETÉ, que significa “GENTE DE VERDADE” (AWA = GENTE, ETÉ = sufixo que
dá ênfase como “VERDADEIRO”, “MUITO”).
Segundo Müller (1993), o grupo Asurini contava com 150 índios por volta
de 1930. De 1930 até 1971, ano do contato, muitos morreram em choques com os
Kayapó e com os Araweté, além do registro de seqüestro de mulheres e crianças.
Após o contato com os brancos, em função de doenças por eles transmitidas, a
população decresceu 50%, chegando quase à extinção, com 53 índios em 1982.
Atualmente, a população Asurini está com aproximadamente 137 índios.
Este crescimento populacional se deve às mudanças de padrão etário para a
maternidade, levando em conta que no século passado as jovens tinham filhos entre
20 e 25 anos de idade.
Figura 2: Índios Asurini do Koatinemo tocando turé.
44
A tradição xamanística exigia intensa participação das jovens nos rituais,
e os filhos pequenos impediam sua participação mais efetiva. Atualmente, a
maternidade atropela a adolescência e as jovens Asurini se tornam mães a partir de
12 anos de idade e em conseqüência se tornam responsáveis muito cedo por proles
numerosas.
Na aldeia Asurini, encontram-se vários tipos de habitações, sendo que as
mais comuns são do tipo regional, com paredes de barro, estrutura de madeira e
cobertura de palha, conforme a Figura 3.
Atualmente, a subsistência do grupo está baseada em pequenas roças,
coleta e caças. O artesanato equivale a uma parcela considerável dessa
subsistência, pois sua comercialização permite a aquisição de gêneros de primeira
necessidade, como sal, sforo, munição e sabão. O povo Asurini é agricultor e, no
passado, plantou e comercializou cacau, jaborandi, arroz, castanha-do-pará, mas,
na verdade, são poucas suas perspectivas de autonomia econômica.
As pesquisas acadêmicas, principalmente a de Müller (1993), mostram
que os Asurini enfrentaram situações de crise, notadamente demográficas, ameaças
Figura
3: Habitação Asurini.
45
à integridade de seus territórios e a intensificação de relações conflituosas com
brancos e outros índios. Atualmente, lutam pela subsistência e melhoria mínima da
qualidade de vida, reelaborando sua relação com o branco, com o outro na própria
aldeia e com o mundo.
Antropólogos e pesquisadores como Franchetto (1987), Arnoud (1983) e
Müller (1993) ilustram essa pesquisa com registros de costumes e tradições dessa
etnia.
O etnógrafo Curt Nimuendajú (1963) afirma que os índios conhecidos hoje
como Araweté, Arara e Parakadominavam a região compreendida entre os rios
Xingu e Bacajá, desde o século XIX. Esses recebiam o nome de Asurini, que
significa “vermelho” na ngua Juruna, eram moradores da margem direita do baixo
rio Xingu, região onde sempre se chamou “Terra dos Asurini”. A localização da atual
aldeia ainda é a margem direita do Baixo Xingu, que desde 1986, quando foi
homologada, chama-se Terra Indígena do Koatinemo. A língua falada desse grupo
indígena pertence à família lingüística Tupi-Guarani.
Monserrat em 1998, com o auxílio das Irmãzinhas de Jesus e apoio do
(Conselho Indígenista Missionário) CIMI conseguiram publicar a gramática dos
Asurini do Xingu, que se diferencia da gramática dos Asurini do Tocantins em regras
morfológicas. Assim, a gramática vem sendo utilizada pelos professores da escola
da aldeia do Koatinemo e todos os Asurini falam a sua ngua. Inclusive a grande
maioria dos índios dessa etnia são bilíngües, com exceção dos mais idosos.
(MÜLLER, 1993).
Arnoud (1989) relata que, após o contato com brancos, as dificuldades
aumentaram em função da contaminação por moléstias como gripe, malária,
catapora, até então desconhecidas, resultando em declínio da população, falta de
46
alimentos e longa fase de desequilíbrio sociopolítico em função da morte de vários
líderes.
A população Asurini, sempre pequena durante décadas, foi resultado de
forte controle da natalidade, inclusive por meio da prática do aborto, como reação à
gravidez e à procriação indesejada. A partir das grandes perdas de homens jovens
nos combates com outras etnias, as jovens não desejavam filhos com maridos
velhos, além da grande dificuldade de fuga durante os ataques se tivessem crianças
para proteger.
Esse povo vive sob a égide e proteção da FUNAI, que mantém na aldeia
um chefe de posto que organiza, coordena e articula as ações do grupo e da
FUNASA, que apóia a questão da saúde e da prevenção (ARNOUD, 1989).
É um povo agricultor por vocação, subsiste pela manutenção das
pequenas roças, da coleta vegetal, da caça e da pesca. Cabe aos homens da aldeia
construírem suas casas, providenciarem a alimentação e todas as tarefas que estão
relacionadas com a floresta. Fabricam suas armas, seus utensílios, como bancos,
pilões e outros objetos; são exímios caçadores e nadadores.
A divisão do trabalho obedece a regras próprias do grupo regido por mitos
ou ritos que organizam o fazer cotidiano. O homem Asurini caça, pesca, produz
artefato de madeira, constrói as habitações, faz a derrubada e a queimada do
roçado; as mulheres, além de fazer cerâmica, fiação, tecelagem de algodão, colheita
e preparação da comida, fazem a pintura corporal de todos os integrantes da aldeia.
Estão incumbidas, também, das atividades domésticas, como preparar a
comida, e cuidar do marido e dos filhos. As mulheres se tornam mãe entre 12 e 13
47
anos de idade e são especialistas na arte artesanal, na confecção de rede, de
cerâmica, de colares, pulseiras. (RIBEIRO apud ARNOUD, 1989).
Considera-se relevante realçar a vocação e o talento concreto do povo
Asurini e, em especial, das mulheres para a expressão artística de sua cultura,
tradicionalmente por meio da reprodução do grafismo utilizado na pintura corporal e
na cerâmica, fator que contribui hoje economicamente para a sobrevivência do
grupo.
Ribeiro (apud ARNOUD, 1989) comenta que, com respeito aos costumes
e às tradições na maneira de vestir, andar e se enfeitar desta etnia, os Asurini
normalmente usam os cabelos cortados de forma circular, sempre à altura das
orelhas. Os homens amarram o pênis com fio de cordão. Mulheres e homens usam
brincos, adornos nas pernas, como tornozeleiras, e também tipóias tecidas em
algodão. Na cabeça, usam uma espécie de capacete em forma de coroa radial. A
Figura 4 mostra um índio utilizando os diferentes adornos próprios da cultura Asurini.
Figura 4: Índio Asurini com diversos adornos.
48
Arnoud (1989) comenta que este povo usa redes de fio de algodão para
dormir ou descansar. Elas são feitas de tucuia de trama trançada espaçada, sem
punhos, com contrastes nas extremidades, usando as cores marrons e brancas e
desenhos lineares.
Quanto à moradia, Müller (1993) relata que, dentre as casas da aldeia,
destaca-se a tavyve. Essa casa possui dimensões e formas que as distingue das
demais. Apresentam-se com 30 m de comprimento, 10 m de largura e 12 m de
altura. Müller diz que a tavyve pode ser comparada a um casulo, por apresentar
forma redonda do teto ao chão e por não haver distinções entre o teto e a parede.
Possui quatro entradas, duas nas extremidades e duas nas laterais, conforme
ilustrada na Figura 5.
Além da moradia e centro de atividades rituais, a tavyve é também o
cemitério da aldeia. Para os Asurini a construção de uma tavyve significa o
nascimento de novos membros do grupo e tem uma conotação mágica relacionada
ao seu simbolismo.
Figura 5: Tavyve (Casa grande)
49
A tavyve representa a fortaleza do povo e sua construção coletiva com
participação de homens e das mulheres reverencia o simbolismo dessa etnia, que,
no trabalho conjunto, exercitam a tomada de decisão desde a escolha dos materiais,
madeiras, palhas enviras até o acabamento final. O final da construção da tavyve
culmina com um grande ritual em que se busca também a cura e a saúde das
crianças.
A Figura 6 ilustra a tavyve por dentro, onde se visualiza uma grande
panela utilizada nos rituais de passagens dos meninos Asurini. Ao fundo, encontram-
se enterrados os mortos da aldeia.
Os móveis da moradia são feitos em madeiras esculpidos em uma
peça, com assento circular escavado ao centro. Os utensílios domésticos são
cabaça com recipiente e cuias, contendo desenhos decorativos e cestarias de
traçados sobrepostos. Utilizam esteiras, abanos, peneiras, cestos com aplicação das
palhas de babaçu, tucumã e arumã. Produzem cerâmicas, como panelas, potes,
vasos e costumam fazer arcos e flechas para a realização de cerimônias. Constroem
Figura 6: Tavyve: ( Casa grande por dentro).
50
instrumentos musicais, como buzinas de tabocas. Todos usam como transporte as
canoas ou barcos. (RIBEIRO apud ARNOUD, 1989).
Segundo Müller (1993), a subsistência é obtida por meio da caça, pesca,
coleta e agricultura. A caça é mais praticada pelo sistema de “tocaia (espera).
Caçam jabutis e colhem castanhas-do-pará. Cultivam mandioca, macaxeira, milho,
algodão e banana, com maior predominância da mandioca, para a fabricação de
beju e de farinha de mandioca, com a utilização da massa puba (massa da
mandioca que fica de molho e serve para fazer mingau, beju e farinha d’água). As
atividades cotidianas na aldeia começam ao nascer do sol, quando a família se
reúne na cozinha (fora de casa) para comer (peixe, beju, caça) e em seguida vai
para os afazeres diários. Dentre essas atividades, também a pintura corporal.
3.1 O grafismo corporal dos Asurini do Koatinemo
Uma característica desse povo é a pintura corporal. Utilizam a tinta
extraídas de frutos como o “urucum” e ou “jenipapo” para a coloração da pele. O tipo
de pintura mostra desenhos simétricos e com aplicação de tatuagem.
Para representar esse sistema de arte gráfica, o povo utiliza elementos da
natureza, como cipó entremeado na mata, feijão grande, pata do jabuti, favo de mel
e pescoço da onça pintada.
Segundo Müller (1992), os significados da pintura praticada pelos Asurini
estão relacionados à cosmologia e às noções fundamentais do olhar sobre o mundo
frente ao povo, conforme ilustrada na Figura 7, onde somente as mulheres pintam,
isto é, os homens e elas próprias são pintados por mulheres.
51
Figura 7: Casal do grupo étnico Asurini.
De acordo com dados da FUNAI (2005), a pintura corporal utilizada pelo
povo Asurini é feita em forma de desenhos geométricos, também usada na
decoração das cerâmicas, das cabaças, dos bancos e demais objetos da sua cultura
material, significando um sistema próprio de arte gráfica.
Segundo Müller (1993), existem desenhos próprios que são específicos a
cada região do corpo, como a pintura da perna, o desenho na cabeça, a pintura da
boca. Todos são diferentes entre si e são únicos de cada parte do corpo, existindo
ainda uma diferença entre a pintura feita nos homens e a pintura feita nas mulheres.
No sexo masculino, a divisão se dá no sentido horizontal com um
desenho oval em cada ombro, três linhas anteriores e três linhas posteriores ligando
ombro a ombro. A pintura corporal no homem determina sua participação nas
atividades guerreiras. no sexo feminino, a divisão do corpo é feita verticalmente,
dividindo-o em duas partes à altura do ventre, conforme ilustra a Figura 8.
52
O significado da pintura no homem tem como objetivo mostrar sua
participação como guerreiro.
No sexo masculino o espaço formado pelo círculo ovalado jesiivapava sobre
a articulação braço tronco (ombro) é prenchido com desenhos dos padrões
pirinyna, taynagva e kuiapeí. Na linha entre a linha divisória e as linhas
verticais e horizontais, à altura dos mamilos, pode ser tatuada uma faixa
preenchida pelo padrão já’éakynga. Esta linha corresponde à divisão
horizontal na pintura corporal, marcada pelas linhas que unem os desenhos
dos ombros. A decoração desta parte do corpo masculino enfatiza seu
significado social, a importância do papel de guerreiro literalmente, através
do desenho geométrico (
M
Ü
LLER
, 1993, p. 228).
Entre os desenhos femininos estão evidenciadas as partes do ventre,
sendo dividida em duas partes verticalmente. Já nos homens, a divisão é feita
horizontalmente, obedecendo à mesma divisão da tatuagem.
Pela observação das partes tatuadas do corpo da mulher, é possível
inferir a qual faixa etária pertence. Os traços feitos nas crianças são largos e, à
medida que estas crescem, esses traços vão se afinando. A Figura 9 apresenta uma
pintura feminina (menina Asurini de 12 anos).
Figura 8: Pintura do corpo masculino e da boca.
53
De acordo com ller (1992), os desenhos geométricos do grafismo
Asurini cobrem, em diferentes formas, a superfície do corpo, todos com significados
distintos. Na arte gráfica, as formas geométricas, chamadas também de Ikwasiat, é
muito utilizada na pintura corporal dos Asurini, assim como é utilizada na pintura de
seus materiais.
O corpo humano se constitui na maior manifestação do grafismo dos
Asurini. A divisão do corpo em áreas para a decoração obedece às regras formais
do desenho. Tratam-se de critérios como sexo, idade e atividades que determinam
categorias sociais marcadas no corpo por tais signos visuais (CC, 1992).
Os desenhos não determinam grupos (clãs) na aldeia, por isso podem ser
usados por diferentes famílias. Eles são feitos através do uso de um pequeno talo de
árvore (Jupuywa), usado pelos índios como pincel. Alguns grafismos podem ser
usados em ambos os sexos, outros não, como é o caso do grafismo específico de
rituais relacionados à função do espírito, por meio do qual prepara para o ritual.
O grafismo corporal do povo Asurini e seus significados estão divididos
em três grupos (M
Ü
LLER, 1993). O primeiro é conhecido como grupo ecológico ou
Figura 9: Pintura do corpo feminino e da boca (Menina
Asurini de 12 anos).
54
domínio da natureza. São os traços que mostram as influências que o ambiente
exerce sobre a vida diária do povo Asurini, representados pelos desenhos na figura
10.
AJUAWUIAKI – ramos de árvore
EIREMA’YWA – favo de mel
AWATIPUTYRA – espiga de milho
KUMANA – feijão
JAWARAJURYNA – pescoço do jaguar
YWRYWAAKA – pintura da lagarta
;
O segundo grupo, denominado cosmológico ou domínio do sobrenatural,
são traços usados nos rituais e representam a figura humana. Estes são
reconhecidos pelos desenhos representados na Figura 11.
Figura10: Primeiro grupo de grafismo corporal.
55
TAYNGAVA boneco antropomórfico-
imagem
TAYNGAVAJUWAJARAKA pintura
sem bunda e KAPUYWA pintura de
galho de arvore
TAYNGAJUPUPE pintura da figura de
dentro do espinho.
TAYNGAJUVAPYKA pintura de ombro
muakara
TAYNGAJUWA’AWA – pintura frente a
frente
O terceiro grupo é o domínio da cultura material, representado pelos
desenhos na Figura 12:
TAMAKYJUAKA – pintura da perna
JUAKETÉ – pintura de verdade
JÁ’EAKYNGA pintura de já’e (especial
de panela)
Figura 11: Segundo grupo de grafismo corporal.
Figura 12: Terceiro grupo de grafismo corporal.
56
De acordo com Lo curto (1993), a cor utilizada na pintura corporal
atualmente é a preta, feita do sumo do jenipapo com carvão vegetal. Os desenhos
corporais do povo Asurini também podem ser utilizados na aplicação sobre a
cerâmica. A cor utilizada no corpo é exclusivamente a preta, com a única exceção do
AJEMUKATI, que é todo vermelho.
A cor preta utilizada na cultura da pintura corporal do povo Asurini, de
acordo com Sagardoy (2006), significa a ausência de luz. Pode transmitir um
sentimento de autoritarismo e dominância, pois atua também no psicológico, por isso
favorece a introspecção e meditação, podendo transmitir a sensação de renúncia e
entrega, de abandono e ainda auto-análise:
[...] O preto mostra que tem conhecimento do mundo, educação e nobreza.
Você é uma pessoa determinada e sabe o que quer da vida. Não dá
importância para o que os outros dizem sobre suas idéias e atitudes.
Investem nos seus sonhos. Tem dignidade e se mantém fiel a seus desejos
(SAGARDOY, 2006, p. 24).
Os tipos de técnicas e estilos de desenhos podem ser bastante
diversificados. Segundo Müller (1992, 240)
Para se definir as características formais no desenho Asurini é importante,
antes de tudo, perceber princípios de ordenamento do espaço. Esses
podem ser entendidos por meio da relação entre percepção visual e
processo cognitivo.
De acordo com Müller (1992), a utilização dos desenhos que existem
abstratamente em uma superfície supostamente infinita e imaginária sob formas
determinadas e restritas ocorre por meio de técnicas que contemplam quesitos
formais e de estilos para as pinturas.
As técnicas representam a ampliação que permite o aumento dos
tamanhos dos desenhos, em especial no padrão tamakyjuak (losangular); o
comprimento realizado pela repetição permanente varia de uma unidade elementar
57
do padrão para outra. Esta, geralmente, é utilizada também no padrão tayngava
(grega); a repetição simétrica dos módulos geométricos e o recorte, operação que
apresenta uma região do desenho infinito, como ocorre no tipo kumandã (curvilíneo)
e no kuiapeí. Essa técnica representa um paradigma da relação entre a técnica e o
desenho: o princípio de percepção visual que enquadra o desenho em uma forma
tridimensional recortando-o em determinado espaço, na forma do objeto.
O desenho juaketé é usado exclusivamente no corpo. Este motivo, por
sua vez, se realiza na forma do corpo humano. O círculo passa pelas linhas e
losângulos que cobrem o tronco e as coxas e é aplicado sobre a articulação das
pernas ao tronco. O padrão juaketé é essencialmente a pintura das mulheres e
significa “pintura de verdade”.
Segundo Müller (1993), a impressão que se tem ao observar os desenhos
do grafismo Asurini, em suas três funções, é que a primeira mostra a ligação do
homem com a natureza pelos desenhos e traduz uma transfiguração do real para o
modo abstrato; a segunda expõe as tradições espirituais da vida no povo Asurini; e a
terceira faz com que o desenho seja apreciado pela beleza intrínseca na cultura
material desse povo.
O grafismo corporal do povo Asurini adquire um significado distinto para a
população urbana, mas, para os índios, é um signo icônico, ou seja, é uma
representação que possui semelhança formal com o objeto representado. Müller
(1993) acredita que o grafismo corporal do povo Asurini pode ser aprimorado a partir
do resgate da origem e significados dos símbolos existentes que são repassados de
uma geração para outra.
Na pintura utilizada no dia-a-dia do povo, a identificação de quadrados,
retângulos e outras formas de figuras geométricas e formas orgânicas têm como
58
elemento visual mais presente na composição a linha, com predominância da reta.
Os desenhos-figuras, que adquirem formas abstratas, são criados a partir da
observação do meio natural, no domínio cosmológico, no processo da criação, se
dão pela interpretação de um universo abstrato representado também de forma
abstrata (M
Ü
LLER, 1993).
Quando usa a pintura jumuunawa (se fazer ficar preto) e encobre todo
corpo de tinta preta, o índio Asurini apaga o desenho anterior, durante o rito, e
renuncia de sua dimensão humana para entrar em contato com o sobrenatural (LO
CURTO, 1993).
Na visão de Müller (1993), a pintura em preto com penugem de gavião é a
negação do ser social, diferenciado. É a aproximação física dos espíritos. É a
passagem de um estado para outro, de uma categoria para outra, de uma esfera
cósmica para outra.
Apesar de terem outras opções de cores, como o vermelho e o cinza,
existe uma predileção pela cor preta.
A pintura ajeukati (ficar vermelho) tem a finalidade de proteger o corpo
contra as picadas dos insetos. Mesmo assim, ela é rara de se ver. A prática mais
comum é a tinta vermelha nos cabelos, que vem a ser ajeakymyti cabeça
vermelha.
Para Sagardoy (2006), a pintura corporal é uma espécie de ornamentação
do corpo e está entre as manifestações significativas adotadas pelo povo Asurini. O
grafismo do corpo é dotado de um conteúdo próprio, e se refere aos processos
ocorridos com os indivíduos, assim como o uso de objetos com significado simbólico
e a ação ritual. A Figura 13 apresenta um índio com grafismo corporal permanente.
59
Além da pintura, ornamentação efêmera, os Asurini marcam a divisão do
corpo relacionada, portanto, mais fundamentalmente à categorização social dos
indivíduos. Diferentemente da pintura corporal praticada no cotidiano, existe a
tatuagem permanente.
Nos homens, a tatuagem é feita de ombro a ombro e corpo completo.
Além do desenho do ombro é escarificado todo o corpo masculino, troncos, pernas,
braços e coxas, com linhas verticais aa altura dos mamilos. Dessa região até a
altura dos ombros, são traçadas linhas horizontais. E na mulher, em certas partes:
ventre, braço, rosto e mãos (MÜLLER, 1993)
Segundo Müller (1993, p.228)
As mãos são tatuadas primeiro, (geralmente com motivo pirinyna (linhas
verticais). Em segundo lugar, ao que tudo indica, é tatuado o ventre com
uma faixa vertical que se estende dos seios até a púbis. Empregam, neste
caso, os motivos: um: pirinyna (linhas verticais), e dois: linhas verticais e
horizontais e diagonais cruzadas, motivo corrente apenas da tatuagem da
mulher madura é provável que, ao longo de sua existência, a mulher
possa completar tatuagem vertical do ventre com linhas horizontais ou
diagonais, alterando o motivo original, conforme ilustrado na Figura 14.
Figura 13: Homem Asurini com tatuagem permanente.
60
Müller (1993) identifica, nessa modalidade de expressão da arte gráfica
Asurini, que a tatuagem é expressão tanto masculina como feminina. Para
impressão da tatuagem, o corpo é escarificado com o instrumento chamado
merirynha, que é uma peça em madeira em forma de pássaro, feita com o dente de
cotia, como mostra a Figura 15.
Figura 14: Mãos femininas com tatuagem permanente.
Figura15: Merirynha, instrumento de escarificação da tatuagem
definitiva.
61
Figura 16: índio Asurini tocando o turé (Pajé da aldeia
atualmente).
Durante a escarificação, o sangramento é contido com uma mistura da
folha do urucum em fusão aplicada na pele, sendo esfregada até que o sangue
estanque. A escarificação torna-se futuramente indelével ao ser coberta com a tinta
de jenipapo, misturado ao de carvão e resina vegetal. A pele tatuada deve ser
mantida seca por aproximadamente uma semana.
A ornamentação corporal assim como a cultura material está no campo da
arte gráfica do povo Asurini, pois a pintura corporal é o exercício da arte no contexto
cultural e social mais amplo desta sociedade. Sendo a arte gráfica uma atividade
comum a todos os membros da sociedade, seu conteúdo e significado são
repassados entre todos, homens, mulheres e crianças.
Embora a pintura corporal tenha sido uma prática essencialmente
masculina, nos dias atuais esta atividade tornou-se uma ação feminina, porém com a
participação dos homens em dois momentos: na ocasião da pintura do turé
(instrumento musical), realizando a pintura na forma triangular com as cores branca
e vermelha, e na ocasião das tatuagens permanentes, que configuram a identidade
do povo Asurini (M
Ü
LLER, 1993).
62
Este capítulo apresentou os dados da pesquisa, demonstrando a
importância do grafismo para a consolidação da cultura Asurini, por meio da
transferência do conhecimento entre as gerações da população feminina. Tratou-se
também dos significados do grafismo e de sua utilização na aldeia Asurini. No
próximo capítulo será apresentado o método utilizado na pesquisa.
63
4 MÉTODO
A pesquisa foi realizada na aldeia do povo Asurini, na terra indígena
denominada Koatinemo, localizada no baixo Xingu, município de Senador José
Porfírio, no Estado do Pará. O acesso à aldeia se através do rio Xingu, rio de
difícil navegabilidade pela existência de inúmeras regiões de pedras e corredeiras. È
necessário um piloteiro de barco que tenha bastante experiência e que conheça
perfeitamente a dinâmica dos rios da região. O bom piloto deve conhecer os locais
de pedras e corredeiras, os diferentes acessos devido aos vários furos dos rios e
igarapés que tornam o caminho um verdadeiro labirinto até chegar à aldeia do
Koatinemo.
No verão, quando o volume d’água está baixo (seca), a viagem
acontece em embarcação pequena ou em pequena lancha, muito veloz, conhecida
na região como voadeira. A viagem da cidade de Altamira até a aldeia neste período
tem a duração de oito horas aproximadamente. No período do inverno esta
embarcação fará o mesmo percurso em apenas quatro horas aproximadamente. No
inverno, quando o rio se encontra com maior volume d’água (cheia), fica menos
perigoso e podem ser usadas embarcações maiores, mais lentas, realizando o
mesmo percurso em doze horas de viagem.
Antes que se possa aqui detalhar os passos da pesquisa, é preciso que
se diga que o pesquisador, desde 1995, quando assumiu a Coordenação de
Educação Escolar Indígena, pela Secretaria de Educação do Estado do Pará
SEDUC, estabeleceu contato com vários grupos étnicos do Estado, chamando sua
atenção o grupo indígena Asurini por sua cultura diversa. Então, com a identificação
com este povo, por meio de vários contatos, passou a desenvolver projetos de
educação escolar naquela região.
64
Como membro da Fundação Ipiranga, uma organização não
governamental sem fins lucrativos, passou a apoiar a comunidade indígena Asurini.
A marca da aproximação cultural veio literalmente quando foi tatuado em 2004 pelo
PaJé Asurini, em um ritual indígena com o “dente da cotia”. O pesquisador foi
“escarificado” (tatuagem definitiva) e passou a ser reconhecido como pertencente ao
grupo, por meio da marca feita em seu corpo, passando a ser reconhecido pelos
índios como IVAKA’EYMA (aquele que não é do céu).
O contato tão próximo levou à opção de estudar os índios Asurini do
Koatinemo, mais especificamente sua cultura, no caso, a pintura corporal ou o
grafismo usado por este grupo. Mas levantou a preocupação da neutralidade
científica, defendida por Emile Durkheim (2001), quando se refere à necessidade de
se manter neutro frente ao objeto. Como afirma Chamon (2007, p. 236), “o fazer
científico supõe um conhecimento a priori daquilo que se deseja estudar”. Desta
forma, como pesquisador, a inquietação foi constante. E deu-se inÍcio ao trabalho
descrito a seguir.
A decisão de estudar o grafismo corporal praticado pelas mulheres do
grupo Asurini surgiu por se entender que esta prática é substancial para a
preservação cultural desse grupo. A experiência com os indígenas do grupo, quando
se fizeram as observações dentro da comunidade, revelou a necessidade de se
saber mais sobre essa prática tão importante para os indígenas Asurini.
A relevância da pintura corporal é expressiva em toda produção de
objetos criados pela comunidade, daí a preocupação em desvendar e entender
esses significados. Por isso as questões norteadoras deste estudo são:
65
A prática do grafismo corporal desenvolvido pelas mulheres Asurini do
Koatinemo poderá representar a consolidação e o resgate simbólico desta etnia
indígena?
O processo de aprendizagem da pintura corporal, praticado atualmente, é
considerado importante pelo grupo étnico Asurini, como modo de preservação de
sua cultura?
Quando e como ocorre a aprendizagem e o reconhecimento do
significado do grafismo corporal praticado entre as mulheres no grupo Asurini?
A população estudada conta com 132 índios, considerando que neste
universo estão incluídos os idosos e as crianças e que cinqüenta por cento delas
são menores de quinze anos.
As índias Asurini, na faixa etária entre oito e sessenta anos, foram os
sujeitos escolhidos para a pesquisa,que são elas que fazem as pinturas e, em um
primeiro contato, quando se falou da pesquisa, estas aceitaram participar de livre e
espontânea vontade. Elas foram observadas em sua forma de pintar nas mais
diversas ocasiões em que utilizam sua arte, como será descrito nessa pesquisa.
A metodologia dessa pesquisa está baseada nos referenciais teóricos de
Marconi & Lakatos (2005) e Trivinõs (1987). Utilizando-se uma pesquisa de Campo,
com Abordagem de Observação, Qualitativa, Exploratória e Descritiva, buscou-se
compreender o significado e a caracterização das formas de transmissão da pintura
corporal praticada pelas mulheres da aldeia, identificando e registrando as formas de
sua aprendizagem.
Vale ressaltar que, diferentemente do que imaginávamos, a participação
nas atividades cotidianas da comunidade contribuiu para uma maior integração entre
66
o pesquisador e o grupo, além de ter fortalecido um laço de confiança para ambos, o
que facilitou bastante o trabalho de campo como técnica especifica de investigação.
Quanto à coleta e análise dos dados, foi feito um recorte da realidade
existente na aldeia do povo Assurini do Koatinemo, no segundo período de 2007.
Utilizou-se de registros fotográficos, registros das observações de costumes,
diálogos e conversas entre as participantes do estudo e o pesquisador e ainda
observação dos diferentes tipos de pintura corporal praticados pelas mulheres do
povo Asurini.
As respostas coletadas durante as entrevistas realizadas nos quatro
grupos de índias, respectivamente das faixas etárias oito a doze anos,
representando a infância; treze a dezoito anos, a adolescência; de dezenove a
quarenta anos e acima de 40 anos, a vida adulta foi transcrita literalmente. Feito
isso, foram selecionadas somente as respostas que estavam de acordo com as
questões. A essas respostas, foram dados os nomes de “categorias”. Assim, cada
uma das categorias estará de acordo com o que diz respeito à primeira, à segunda e
à terceira questão.
As categorias foram formadas por meio da exclusão de respostas iguais
ou repetitivas; de respostas que não estivessem diretamente relacionadas às
questões; e de acordo com as respostas mais exatas relativas à questão do
momento.
Considerou-se também nesta análise o aspecto das diferentes faixas
etárias. Nesse sentido, foi possível observar que nos quadros de categorias haverá
algumas lacunas nas respostas de determinadas questões por parte de uma ou mais
das faixas etárias presentes na pesquisa.
67
Durante a análise, a técnica de construir códigos foi utilizada para
categorizar os dados que se relacionam, pois estes contribuíram para decodificar os
símbolos e significados atribuídos pelos sujeitos da pesquisa aos seus atos. E,
finalmente, a descrição das entrevistas se deu por meio de tabelas, completando a
pesquisa de acordo com as etapas descritas abaixo:
Primeira Etapa: abordou-se a cultura indígena fazendo um levantamento
histórico dos índios brasileiros em seus aspectos de vida, idioma, crença, família,
interesses e talentos.
Segunda Etapa: fez-se um processo de observação da cultura, dos usos
e costumes do povo Asurini, por meio de sua história de contato, localização,
confrontos com outros grupos indígenas e, ainda, buscar os caminhos para a
compreensão do significado do grafismo;
Terceira Etapa: reflexão metodológica utilizada na pesquisa. No contexto
em que encontravam, lidando com o povo indígena Asurini, no âmago de seu
habitat;
Quarta Etapa: representou todo o conhecimento básico conquistado,
coletado e interpretado ao longo das visitas na aldeia e a sistematização de todos os
conteúdos pesquisados nas fontes bibliográficas disponíveis;
Quinta Etapa: caracterizou todas as respostas à indagação,
representaram o importante elo entre o estudado, o conhecido e o percebido como
resultado, discussões e considerações finais deste trabalho, o que poderá ser
observado no capítulo seguinte.
68
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Este capítulo apresenta os resultados e as discussões da pesquisa. Nos
resultados é apresentado o dado consolidado sobre as três questões centrais da
pesquisa de campo realizada na aldeia Asurini do Koatinemo.
Nas discussões são apresentadas as principais análises decorrentes dos
dados obtidos na pesquisa de campo com as amostras selecionadas, que nortearão
as conclusões finais deste trabalho.
5.1 RESULTADOS
A pesquisa de campo teve por finalidade responder às três questões
básicas colocadas como proposições deste trabalho.
Na primeira questão foi abordada a perspectiva de consolidação simbólica
da cultura da etnia Asurini pelo grafismo corporal. Observa-se que as primeiras
faixas etárias, de 8 a 12 anos e de 13 a 18 anos de idades, evidenciam não haver
conhecimento, preocupação ou interesse pelo resgate e consolidação cultural dessa
etnia. Apenas as duas faixas etárias maiores responderam a esta questão. O quadro
1 ilustra este caso.
69
A PRÁTICA DO GRAFISMO CORPORAL DESENVOLVIDO PELAS MULHERES
ASURINI DO KOATINEMO PODE REPRESENTAR FUTURAMENTE A
CONSOLIDAÇÃO E O RESGATE SIMBÓLICO
DESTA ETNIA INDÍGENA?
De 08 a 12
anos de idade
De 13 a 18
anos
de idade
De 19 a 40 anos
de idade
Acima de 40 anos
de idade
-
-
Tem que escutar os mais
velhos e os que eles
falam.
A cultura Asurini fica fo
rte
quando pinta.
-
-
Tem que respeitar mais
os velhos porque eles
sabem.
Pinta para a pessoa não
ficar velha.
- -
Pintar faz parte da
cultura.
Pinta para ficar bonita.
- -
Se acabar a cultura não
tem índio.
Fica muito melhor do que
cultura de branco.
-
-
Quando alguém se pinta,
todo mundo diz que é
índio.
A pintura é como se fosse
as nossas roupas.
-
-
Sem pintura vão dizer
que deixaram de ser
índios e que perderam
a cultura.
Quando se pinta não se
perde a cultura.
-
-
Temos que continuar
com a nossa cultura.
Estavam perdendo o
costume de pintar o corpo.
Mas agora voltou.
-
-
Nós pensamos nos mais
novos que não querem
mais pintar.
Agora a pintura ainda é
forte. Mais antes, era mais.
-
-
A pintura é enfeite para
nós. Igual ao perfume e
o sabonete para os
brancos
Era mais forte a pintura na
aldeia, antigamente. Agora
é mais fraca.
Quadro 1 – Resultados obtidos in loco na aldeia Asurini do Koatinemo.
Não foi possível identificar qual o motivo da ausência de respostas por
parte das faixas etárias de oito a doze anos e de treze a dezoito anos. Infere-se que
a falta de respostas pode ser em decorrência da imaturidade das índias que, sendo
crianças e jovens, ainda não se interessam ou não percebem o significado da prática
do grafismo dentro do grupo. Elas sabem que é uma prática eminentemente de
mulheres e que deverão aprendê-las. A Figura 17 apresenta meninas Asurini
brincando com a pintura corporal.
70
Observa-se que as índias que se encontram nas faixas etárias de
dezenove a quarenta anos e acima de quarenta anos compreendem que a pintura
corporal feita pelo grupo é importante. Acham-na bonita e que ela serve como
enfeite ou roupa para as índias; além disso, também entendem que a pintura
representa para a etnia Asurini sua cultura e, com clareza, falam que a cultura da
pintura corporal dos índios Asurini é para elas mais bonita do que a cultura dos
brancos.
Uma outra análise, feita sob as respostas dos dois grupos de faixas
etárias maiores, foi a importância dada aos saberes culturais dos mais velhos, pois,
para as índias Asurini, os mais velhos é que são os verdadeiros detentores do
conhecimento. Sua sabedoria deve ser continuada e mantida com muito respeito e
todos têm o dever de aprender os costumes dos mais velhos para a manutenção e a
preservação de sua cultura. A Figura 18 apresenta uma índia (avó) pintando sua
neta.
Figura 17: Meninas do povo Asurini brincando com a
pintura corporal.
71
Figura 18: Avó Asurini pintando sua neta.
As índias Asurini têm consciência de que a pintura corporal, feita por seu
povo, em tempos atrás era mais praticada. Relatam que por algum tempo ela foi
pouco realizada no grupo, quase perdendo sua importância para a etnia. Os mais
novos do grupo não demonstravam mais interesses em se pintar; isso trouxe grande
preocupação para os mais velhos. Porém, hoje, a pintura corporal é considerada
novamente importante e está bastante presente, sendo muito praticada pelas índias
de todas as idades no cotidiano da aldeia.
Considerando esses relatos: Santos (2004), comenta sobre o quanto a
compreensão do significado dos símbolos como expressão de cultura dos povos é
importante para sua manutenção. Para o Asurini do Koatinemo, a pintura corporal é
reconhecida como um costume e um símbolo de sua cultura e sua manutenção
significa respeito e preservação da identidade cultural do povo ou grupo indígena.
As mulheres mais jovens do grupo indígena Asurini voltaram à prática do
grafismo corporal por necessidade de manutenção de tal arte e de tal costume.
Antes disso, somente índias mais velhas do grupo preservam essa tradição. As
índias mais novas relatam que, ao observar que suas avós não deixavam de pintar
72
seus corpos, começaram a perceber a importância de repetir a prática para
tornarem-se iguais.
É interessante comentar que sociedades que possuem um passado
cultural diferente tendem a diferentemente se comunicar, sendo que os índios dessa
etnia possuem um passado cultural igual ou com pequenas mudanças. E, assim,
“todas as coisas influenciam no comportamento humano daqueles que convivem
juntos”. (BERLO, 2003)
Está correta a afirmação de Berlo sobre ser imprescindível o
conhecimento do contexto cultural no qual está havendo a comunicação de crenças
e de valores. A manutenção de uma cultura acaba sendo estimulada mesmo que
seja “exigida ou não exigida”, pois a mesma faz parte da cultura do grupo. A Figura
19 apresenta grupo de mulheres Asurini (novas) em atividades ritualísticas (danças).
Ao finalizar a análise e discussão sobre o primeiro questionamento deste
estudo, constata-se que as pinturas corporais, praticadas pelas mulheres Asurini do
Koatinemo, é uma forma de expressão cultural das mais preservadas, senão pelo
Figura 19: Mulheres do grupo Asurini.
73
conhecimento dos significados, pela simples prática cotidiana, o que representa o
fortalecimento da identidade e contribui para a consolidação e preservação da
cultura desse povo.
A segunda questão norteadora desta pesquisa foi contemplada com
respostas dos três grupos etários. O Quadro 2 descreve as categorias retiradas das
falas dos sujeitos para esta questão.
O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DA PINTURA CORPORAL, NOS DIAS
ATUAIS, É CONSIDERADO IMPORTANTE PELO GRUPO ÉTNICO ASURINI
COMO MODO DE PRESERVAÇÃO DE SUA CULTURA?
De 08 a 12 anos de
idade.
De 13 a 18 anos de
idade.
De 19 a 40 anos
de idade.
Acima de 40 anos
de idade.
-
Não sabe a
importância
Está ensinando a filha,
porque a mãe contava
a história igual para
ela.
Mesmo sabendo
pintar, tem que ficar
olhando para saber
mais.
-
Manda a filha aprender
com a avó
Toda vez que se pinta
mostra para a filha
como faz.
Quando pinta seu
corpo e está errado, a
avó manda pintar
novamente.
-
Ensina a filha da
mesma maneira que a
mãe lhe ensinou.
Temos que prender
todas as pintura que
os mais velhos sabem.
Se os Asurini
continuarem se
pintando, fica mais
forte a cultura.
-
A mãe oferece partes
do seu corpo para a
filha ir treinando a
aprender.
As pinturas com
nomes mais difíceis
são as mais bonitas.
Se acabar pintura,
acaba Asurini.
Quadro 2 – Respostas obtidas in loco na aldeia Asurini do Koatinemo no período em que convivemos
com os indígenas por conta da investigação.
Ao analisar as respostas retiradas das falas, é bastante evidente a forte
presença da figura feminina (mãe e avó materna) no processo de aprendizagem da
pintura corporal.
74
A mãe ensina a filha da mesma maneira que sua mãe lhe ensinou.
Quando vão pintar seus corpos, chamam as filhas ou para que observem a maneira
de pintar ou para que as próprias filhas pintem as partes de seus corpos. Assim,
acreditam que vão treinando umas nas outras ou em si próprias. Influenciam na
aprendizagem também as avós e as primeiras esposas do marido.
As mulheres mais velhas da etnia o as detentoras do conhecimento.
São reconhecidas por isso e são elas que sabem as melhores, as mais bonitas e as
mais difíceis pinturas. Para as índias Asurini, as pinturas mais difíceis são as mais
valiosas, porque são as mais bonitas; quanto mais elaborados os desenhos, mais
sabedoria e delicadezas nos traços.
As índias Asurini acreditam que, ao se pintarem, estão mantendo a cultura
de seu povo. Expõem suas preocupações sobre a manutenção do costume e
consideram que o desaparecimento da prática do grafismo corporal no grupo irá
representar a perda da identidade Asurini e o fim da cultura do povo.
As três faixas etárias estão bastante atentas para a continuidade do
ensino e da perpetuação da cultura do grafismo como cultura de sua etnia. Sobre
essa atitude de preservação e a instintiva relação entre manutenção e necessidade
de preservação cultural, pode-se citar o comentário de Loureiro (2005): “O
desenvolvimento social dos povos indígenas, a cultura própria de cada etnia parece
ser fundamental”.
O autor afirma ainda que, para isto ocorrer, a preservação da cultura está
ligada também à auto-sustentação, a qual é necessária para a sobrevivência cultural
dos povos indígenas. Os Asurini começaram a sentir essa necessidade. A pintura
que antes somente era praticada nos seus corpos agora passa a ser mostrada em
tecidos e utensílios que passaram a ser vendido aos brancos.
75
A perspectiva de aumentar as condições de auto-sustentação do povo
Asurini pela continuidade de uma prática cotidiana pode representar o aumento do
sustento de sua própria cultura. Portanto acredita-se que o incentivo à produção de
utensílios, roupas e outros artefatos com a marca do grafismo praticado pela etnia
Asurini, por parte de instituições governamentais e não-governamentais, poderá
proporcionar o fortalecimento da cultura deste grupo.
A Figura 20 ilustra a pintura em tecido pelas índias da aldeia Asurini do
Koatinemo, cuja prática foi introduzida pela fundação Ipiranga e tem como objetivo o
registro do grafismo, além de se tornar fonte de renda para o povo.
As respostas obtidas em campo para esta segunda questão confirmam a
importância dos saberes e costumes praticados pelas mulheres mais velhas do
grupo, como sinônimo de manutenção cultural por meio da prática do grafismo
corporal. E ainda apontam para a perspectiva de que a aprendizagem e o
reconhecimento do significado do grafismo estejam sendo considerados importantes
Figura 20: Mãe e filhas do grupo Asurini pintando tecidos.
76
para a comunidade de índias, sendo elas as responsáveis pela pintura corporal
como forma de preservação cultural da referida etnia.
Sobre a terceira questão, relacionada ao momento e a forma em que
ocorre a aprendizagem e o reconhecimento do significado do grafismo corporal,
todas as faixas etárias responderam significativamente a questão. Observa-se no
Quadro 3 as categorias retiradas das entrevistas com os quatro grupos de mulheres
índias do grupo Asurini.
QUANDO E COMO OCORRE A APRENDIZAGEM E O RECONHECIMENTO DO
SIGNIFICADO DO GRAFISMO CORPORAL PRATICADO ENTRE AS MULHERES NO
GRUPO ASURINI?
De 08 a 12 anos
De idade
De 13 a 18 anos de
de idade
De 19 a 40 anos
de idade
Acima de 40 anos
de idade.
Primeiramente
só pintava as
pernas.
A mãe ensina a
pintar
Não acerta de primeira
vez. Depois vai
fazendo.
Acha bonito, mas
não sebe falar a
respeito.
Aprende ao
observar a mãe
pintar
Quando está
pintando chama à
filha pra ficar
observando.
Quando se é pequena
não se sabe.
Ficava vendo e mãe
pintar e faz do
mesmo jeito.
Às vezes brincam
de pintar na mãe.
Pintam a boca, as
pernas e as costas.
Só sabe o
significado das
pinturas que faz.
Às vezes pintava o
irmão, ou as próprias
pernas e as mãos.
Chamava a mãe pra
ensinar.
Acha que está
pintando melhor.
Porque antes não
fazia nadinha.
Acha que a pintura
antiga é mais
bonita.
Acha que significa que
é a cultura do povo
Asurini mesmo.
Quando era criança
a mãe mandava
brincar de desenho.
Quadro 3 – Resultados obtidos in loco na aldeia Asurini do Koatinemo – terceira questão da pesquisa.
Fica evidente que a aprendizagem do grafismo corporal ocorre durante
todo o processo de crescimento da mulher indígena. Tal processo acontece sob o
olhar das meninas da faixa etária de oito a doze anos de idade e não se com o
reconhecimento de significados, e sim por repetição de um costume praticado pelas
mulheres mais velhas da aldeia e especialmente porque é praticado por suas mães.
77
As meninas da faixa etária de oito a doze anos relatam que treinam a
prática da pintura primeiramente em suas pernas. Acrescentam que no início era um
pouco mais difícil, mas com o tempo elas superam as dificuldades pelo treino
executado em seguidos momentos de aprendizagem ao lado da mãe, e têm a
percepção de que ainda estão aprimorando seu grafismo corporal a cada dia que
passa.
As mulheres que se encontram na faixa etária de treze a dezoito anos de
idade relatam que o processo de aprendizagem se inicia ainda na infância e também
pela observação e repetição da pintura praticada pelas mães. Também não sabem
exatamente o significado do grafismo para o grupo; sabem, apenas, o que significam
alguns tipos de pintura e o que mais gostam de pintar, e o fazem com freqüência,
não se interessando em aprender outros tipos.
Nota-se nas respostas das faixas etárias maiores que a figura da avó
também está muito viva quando se referem ao aprendizado da pintura. As mães
chamam suas filhas para as observarem pintar. As avós também são observadas
pelas netas; e as mães ainda na fase adulta são orientadas por suas mães (avós)
nos momentos de pintura. É possível perceber que tal sucessão ocorre de maneira
bastante natural.
Constata-se ainda que não existe ciência para a aprendizagem do
grafismo corporal praticado pelas mulheres da etnia Asurini do Koatinemo, porém o
reconhecimento do significado desta prática para a preservação da cultura de tal
povo torna-se evidente em quase todas as faixas etárias.
A análise das categorias da pesquisa mostra que a preocupação com a
maneira como a aprendizagem está ocorrendo não é levada em consideração pelas
mulheres do grupo; tampouco existe a preocupação com o momento em que ocorre
78
a aprendizagem significativa dessa prática. A maioria das mulheres do grupo pinta
seu corpo sem conhecer o significado do grafismo para a preservação da cultura de
seu povo. Pintam porque acham bonito e somente as mulheres mais velhas
demonstraram um pouco de preocupação com o fato de que essa prática é peculiar
ao grupo Asurini. Sabem que é uma cultura dos Asurini e reconhecem que sua
extinção seria o fim do grupo; entretanto desconhecem outra forma de mantê-la viva
a o ser pelos ensinamentos aos mais novos, e estes estão a cada dia mais
distantes dos costumes praticados pelos mais velhos (segundo depoimento dos mais
velhos).
Para Müller (1993), a pintura corporal praticada pelos índios parece ser o
elo entre as informações e é cheia de significados. Percebeu-se que a pintura das
mulheres Asurini funciona de fato como sistema de comunicação visual, sendo que a
maioria das mulheres do grupo faz as pinturas em seus corpos com traçados retos,
como losângulos, diagonais, entre outros, representando a fauna e a flora do seu
cotidiano.
Pode-se dizer que existem dois tipos de significados relativos ao grafismo
corporal dos Asurini. O significado da prática do grafismo seja de que desenho for
desponta como sendo a identidade cultural do povo Asurini e o significado de cada
grafismo feito nos corpos. Este segundo acredita-se que pode ser aprimorado a
partir do resgate da origem e significados dos símbolos que o repassados de uma
geração para outra, como diz Müller (1993).
Contudo o reconhecimento do primeiro significado é mais complexo para
a compreensão das mulheres que praticam o grafismo. As mais moças o fazem pela
beleza ou por pura repetição; as mulheres mais idosas compreendem que o
grafismo faz parte de sua cultura. Apenas elas reconhecem que um modo peculiar
79
de pintar o corpo deve ser considerado identidade do grupo, sendo assim de
fundamental importância sua preservação.
5.2 DISCUSSÕES
Assim, destaca-se nesta pesquisa a importância de estudar a etnia Asurini
em seu habitat. Foi possível identificar que a cultura do grafismo corporal desse
povo pode estar em início de extinção, se não for dada a ela o valor necessário e o
devido incentivo a sua preservação.
Em relação ao habitat dos índios, aprendeu-se que é preciso despojar-se
da civilização que se conhece além dos limites da aldeia, para se ter a compreensão
do que é ser índio e o que é a sua cultura, porque ter um “encontro” com o índio é
“mergulhar” em outro espaço existente entre o céu e a terra, entre a água e o fogo;
um espaço colorido e prodigioso, povoado de espíritos, animais, vegetais e minerais.
Agora é possível dizer certamente que a cultura indígena existe pelos
saberes que provêm do seu cotidiano, tendo uma implicação de cumplicidade entre
os índios. O conhecimento é informal, transmitido oralmente, baseando-se nas
experiências acumulativas de seus ancestrais e anciãs. E está a pintura corporal
como um dos conhecimentos repassados de geração a geração, entre os Asurini.
Em seu habitat, após compreender o dia-a-dia da aldeia Asurini do
koatinemo, foi possível perceber a distribuição das atividades no grupo e ainda
acompanhar a rotina de costumes desse povo. O ambiente onde é compartilhada a
atividade é o “espaço” demarcado pelo sentido de fronteira. Pode ser entre uma
casa e outra. Berlo (2003) chama a tudo isso de “contexto cultural”.
80
Foi possível perceber o significado dos costumes indígenas nas
atividades desenvolvidas pelo grupo, principalmente no que se refere à pintura
corporal que, nesse caso, representa a identidade cultural dos Asurini.
Na cultura dos povos Asurini, desde o seu nascimento, a criança jamais
se separa da mãe. Ela vem agarrada ora atrás, atada em suas costas, ora na lateral,
em uma tira feita de algodão bem macio (tipóia), carregada nos braços.
A mãe é transformada em uma espécie de berço ambulante. Esta trás o
filho junto ao corpo, de forma que a criança possa facilmente alcançar o seu seio.
Isso permite que a mãe possa continuar fazendo seus afazeres diários. É por meio
do relacionamento da mãe com o filho que a criança desenvolve as características
indígenas vigentes no grupo.
No decorrer de sua vida, as crianças crescem brincando e imitando os
pais, os mais velhos, ouvindo as histórias, participando dos rituais e das atividades
do seu dia-dia; é assim que se tornam adultas. Na Figura 21, a criança Asurini brinca
com o talo da planta usada para se pintar.
Figura 21: Criança Asurini brincando de se pintar.
81
A criança índia tem sempre seu corpinho pintado pela mãe, onde estão
representadas, da mesma maneira, as figuras do corpo do adulto. Quando crescem
um pouco, por volta dos quatro ou cinco anos, as crianças da aldeia Asurini
primeiramente começam a riscar com tinta de jenipapo, borrando suas próprias
pernas. Isto foi relatado pelas índias entrevistadas na pesquisa.
Observou-se que um grupo de meninas que estavam se pintando
iniciavam a pintura corporal de baixo para cima do seu corpo e do centro para os
lados, tendo um ponto, feito na parte inferior da perna e no centro, como princípio de
partida.
A infância é à base da aprendizagem, é o momento em que as crianças
são totalmente integradas à vida comunitária da aldeia. Todos os conhecimentos
são transmitidos oralmente dos mais velhos para os mais novos. Na Figura 22, uma
criança com ornamentos.
Figura 22: Criança Asurini./ Foto: J. Ramid (.2007)
82
A arte de pintar o corpo é feita com maestria pelas mais idosas.
Sobretudo, independente da etnia, a pintura corporal configura-se em uma maneira
de posicionar-se dentro da comunidade. O tipo de pintura mostra a crença, indica o
sexo e forma as características do povo indígena.
Foi possível identificar nas falas das índias, sujeitas do estudo, o quão é
importante a figura materna dentro da aldeia e para o processo de aprendizagem da
pintura corporal. As filhas aprendem as tarefas atribuídas às mulheres por meio da
convivência com a mãe, estabelecendo uma relação muito próxima e repetem tudo o
que a mãe faz sem, no entanto, ser necessário que a mãe mande. Vale ressaltar a
grande importância de essa relação mãe, filha, avó e neta ser orientada diretamente
de forma sistemática ou no acompanhamento de cada processo, ou de cada fase.
A figura da avó é muito importante por sua experiência e sabedoria e
quando a mãe e a avó não orientam, por qualquer razão, a criança escolhe ou é
escolhida por parente ou por uma pessoa boa pintora, que fasua orientação nos
caminhos do grafismo.
Se a mãe e a avó são eximias pintoras, facilitará, para a filha, o
desenvolvimento da habilidade, pela facilidade de observação, de imitação e de
orientação direta. A observação e a consciência de aprender a conquistar seu
espaço dentro da comunidade faz a aprendizagem acontecer. A Figura 23 ilustra
esta relação de uma mãe índia Asurini pintando seu filho.
83
Figura 23: Mãe Asurini pintando seu filho.
A mulher é a personagem mais significativa da aldeia, representando o
verdadeiro elo entre as relações sociais, afetivas e a fonte de aprendizagem dos
mais novos, tanto para homens quanto para elas próprias. Nos rituais, são elas que
se preocupam com o ritmo, com os passos, com a harmonia das danças daqueles
jovens que ainda estão aprendendo.
Assim a figura da mulher é essencial para a transmissão da
aprendizagem. Se a criança não possui mãe, avó ou parentes mais velhos, uma
outra mulher independentemente de parentesco deve transmitir-lhe a cultura da
pintura corporal, a sua cultura material, ritos e mitos de sua etnia.
Os locais que as mulheres ocupam na aldeia, a casa, a roça, o rio, os
arredores, são os espaços plenos que constituem o seu território. Elas são
incumbidas das atividades domésticas como: preparar a comida, buscar água no rio,
catar lenha para o fogo no lar, cuidar do marido e dos filhos, tendo ainda aos seus
cuidados a plantação junto do seu marido no roçado, a colheita dos tubérculos e a
pintura corporal.
84
Figura 24: Mulher Asurini pintando o marido.
Loureiro (2004) afirma que “A auto-sustentação é uma necessidade que
se impõe para a sobrevivência cultural dos povos indígenas”, é fundamental que
estas práticas do cotidiano do homem e da mulher Asurini se mantenham, pois elas
representam a continuidade da cultura desse povo, uma vez que também as ações
masculinas sempre serão executadas em função da mulher. Por exemplo, para ser
um bom caçador, ou pescador o homem precisa de m sua mulher. É ela quem
conhece e vive sua cultura. A mulher mantém uma espécie de relação íntima com o
fogo, o qual mantém aceso o dia todo à espera do marido que trará o alimento.
Quando as mulheres estão em casa, passam horas fiando algodão,
fazendo pulseiras ou redes, cerâmica e panelas, e se destacam pela criatividade na
confecção de sua cultura material, dedicando grande parte do seu tempo a essas
tarefas solitárias, apenas na companhia de seus filhos pequenos.
Quanto ao espaço onde o grupo étnico Asurini do Koatinemo habita, é
possível dizer que a aldeia significa para o povo um território tradicional e sagrado. O
85
Figura 25: Homem Asurini pintado.
espaço onde viveram seus antepassados, o lugar onde está e se desenvolve sua
cultura de subsistência, onde desenvolvem sua roça, as caçadas, as colheitas. É o
espaço conhecido como Mãe Terra.
Arnoud (1989) comenta sobre a divisão do trabalho na aldeia. É regra os
homens dedicarem-se à caça, à pesca, à produção artefatos de madeira, à
construção de casas e também à derrubada e à queimada da roça.
Às mulheres cabe a responsabilidade pelos cuidados com os filhos, casa,
roça, transformação dos alimentos, além da exclusiva produção da cerâmica e do
grafismo corporal.
A manutenção dessas práticas e divisão de tarefas são fatores
preponderantes para a consolidação da cultura Asurini.
Uma questão relevante a ser analisada é a divisão do trabalho na aldeia
entre os sexos, considerando a convivência mais intensa como povo não-índio e a
possibilidade de alteração das práticas culturais tradicionais. A Figura 25 apresenta
um homem Asurini pintado para execução de um ritual.
86
Na aldeia Asurini do Koatinemo, para que fossem possíveis as
aproximações com as mulheres para a entrevista, foi necessário inicialmente seguir
os passos destas, dentro da aldeia, em seu dia-a–dia. Logo após o café da manhã,
observou-se uma índia que foi colher jenipapo.
Uma aproximação foi necessária para que fosse feita alguma pergunta
sobre o que ela pretendia fazer. Ela respondeu: - Vou pintar! E logo pegou uma
panela onde colocou o jenipapo que colheu e começou a ralá-lo. Depois, adicionou
ao sumo que ficou na panela de barro um pedaço de carvão. Essa é então a tinta
que servirá para a pintura corporal.
O trabalho da índia estava sendo observado por duas de suas filhas, uma
de apenas oito anos e outra de dez anos de idade, que se sentaram em um
banquinho e também iniciaram a pintura corporal em seus corpos, começando pelas
pernas, sempre sob o olhar de sua mãe, que vai orientando quanto à largura dos
traços. Essa pintura fica no corpo em média 15 dias.
Também se observou que, enquanto a mãe realizava a pintura no corpo
do marido, as filhas meninas e moças ficavam sempre observando os movimentos
da mãe, inclusive as crianças de cinco anos de idade, que acompanham sempre a
mãe em todas as atividades do dia-a-dia.
Nessa questão, é relevante destacar a importância da observação para a
aprendizagem em todas manifestações culturais e em todas as etapas de cada uma
delas seja a cerâmica, a pintura corporal ou os afazeres domésticos.
O ambiente indígena é um cenário contínuo de aprendizagem e
ensinamento de várias pessoas, onde o espaço social ou o ritual surgem e
sustentam-se com as pessoas, tendo uma consciência da sua natureza e ficando
87
“encravada” nos seus corpos para sustentar e manter de forma perene a sua
sobrevivência, tanto física como espiritual. A Figura 26 ilustra este caso.
que se considerar a importância de se garantir o respeito por esses
povos, por suas culturas, suas tradições presentes no dia-a-dia e na memória dos
seus antepassados.
Acredita-se que a prática do grafismo corporal do povo Asurini do
Koatinemo pode ser compreendida tanto como representação cultural desse grupo
indígena, como também uma arte decorativa, cheia de significados e expressões,
principalmente a da identidade étnica do grupo.
De tudo que é repassado como conteúdo cultural de geração a geração
desse povo, o grafismo é o elemento de maior importância e significação para o
grupo. Deve ser priorizado como elemento fundamental para a manutenção do
repertório cultural da etnia e ainda deve ser reconhecido enquanto saber cultural
praticado pelos mais velhos, atores principais, quando se fala em manutenção e
preservação da identidade cultural do povo Asurini.
Figura 26: Índia Asurini ralando o jenipapo na raiz da paxiúba e
extraindo o.sumo a fim de fazer a tinta da pintura
corporal.
88
A produção do grafismo Asurini é representação da realidade que é
apresentada pela imaginação do povo por meio da pintura nos corpos.
É possível afirmar que a pintura corporal do povo Asurini é uma referência
étnica desse povo, constituindo-se em um trabalho de arte por sua originalidade e
beleza. São nos detalhes da pintura corporal que o povo Asurini demonstra toda sua
habilidade manual e manifesta o estilo da cultura de seu grupo.
A prática do grafismo corporal dos Asurini contribui para a revitalização
étnica dos povos indígenas. Reflete um conjunto de valores e tradições de um povo
indígena e ainda significa a preservação da identidade regional dos grupos
indígenas, contribuindo para o não desaparecimento das culturas milenares.
Como disse Ermel (1988), a cultura das sociedades indígenas é
construída por meio da utilização de símbolos, objetos, utensílios utilizados no dia-a-
dia. Os objetos expressam a fala do grupo relacionando tudo a um significado. Foi
possível reconhecer na aldeia dos Asurini a fala a que Ermel se refere, ou seja, a
fala que é passada de geração a geração, possibilitando o significado do saber
construído no cotidiano.
Outro tema bastante discutido na cultura Asurini é a estreita ligação do
grafismo corporal com os mitos que sustentam as tradições da cultura desse povo.
O grafismo da pintura corporal dos Asurini está diretamente ligado aos
mitos dessa etnia. Sobre o surgimento da prática do grafismo existe um mito que
está relacionado aos desenhos das raízes, que é um ser conhecido por Ajykwasara
que tinha o corpo todo pintado, onde cada parte apresentava uma pintura diferente.
Apenas algumas pessoas podiam ver esse ser. Diz o mito que, alguém ao ver esse
89
ser e para não esquecer os desenhos que estavam em seu corpo, decorou com
estes, a ponta de sua flecha e seu arco. Isso foi repassado de geração a geração.
Outro mito relacionado à pintura dos Asurini está nos tipos de pintura
masculina (guerreiro), que são interligados por linhas horizontalmente de ombro a
ombro à altura do peito. Este tipo de pintura é feito nas mulheres quando elas
começam a crescer muito, ultrapassando a estatura mediana padrão para as
mulheres dessa etnia.
Existe ainda o desenho que está em desuso, que é um tipo de pintura
conhecido como Apity (linhas entrelaçadas ou amarradinhas). Essa pintura era
utilizada livremente, até o dia em que um homem que estava pintado com esse tipo
de pintura morreu. Desde então prevaleceu o mito de que a pessoa que utilizar esse
tipo de pintura morrerá, ou morrerá alguém de sua família, fato que contribui para o
desaparecimento da técnica da aprendizagem do Apity.
É na cultura dos Asurini que se empregam conhecimento para a formação
e educação dos mais novos. São conhecimentos empíricos, porém verdadeiros,
preciosos para a sobrevivência da sua cultura.
Com o processo de aculturação, o povo Asurini corre o risco de perda de
sua identidade étnica ameaçada pela destruição do patrimônio cultural desse povo.
As próprias índias da aldeia relataram durante a pesquisa que tiveram medo do
desaparecimento da pintura corporal praticada pelo grupo. Os mais jovens tendem a
se interessar pela cultura dos brancos, que é conhecida com as visitas destes à
aldeia, despertando a necessidade de aquisição material.
O povo Asurini tenta superar isso com o grafismo corporal, fortalecendo o
valor étnico cultural dessa comunidade, quando se aproxima da realidade e
90
consegue manter sua prática, mesmo nos momentos em que se aproximam de
adversidade defendendo seu patrimônio étnico-cultural. É um povo que armazena no
conhecimento, historicamente construído, uma cultura rica e marcante em que a
realidade vigente impõe inúmeros desafios, sobretudo marcados pelo fortalecimento
da identidade do povo com o grafismo corporal.
O grafismo Asurini possui uma linguagem que expressa o mundo indígena
Asurini. Um mundo de desejos, emoções, saudades, como qualquer outro ambiente
civilizado nos molde da cultura branca. Os Asurini, tendo no grafismo sua marca
personalizada, expressam nele seus sentimentos, como poder, amor, paixões,
desejo do outro.
Na aldeia Asurini, ainda que seja atributo do homem o domínio da família,
é a mulher que tem o poder e o conhecimento da pintura corporal. É ela quem faz a
pintura no seu marido, ocupando o espaço do corpo do homem com traços, linhas,
curvas e retas, criando e repassando mensagens que ficam marcadas no corpo.
Na pintura do corpo do homem e da mulher Asurini, fica expresso o
estado de espírito do mundo em que vivem e, assim, a sua cultura. Deste modo,
pode-se afirmar que o grafismo é a maior marca identitária dessa etnia, que
consolida seu carisma a partir do idioma falado e do corpo pintado.
Como demonstram os dados da pesquisa, é relevante a preservação
desse grafismo, a partir do fazer, do fazer mais, como diz o Asurini, para “fazer mais
bonito”, dentro do aprimorado senso estético das mulheres Asurini. A prática do
grafismo ultrapassa o corpo como espaço privilegiado e extrapola para os objetos de
sua cultura material, numa tessitura que parece caminhar sempre para o infinito.
91
A forma de consolidar este fazer, este fazer bonito”, é fazendo, é
pintando, oferecendo oportunidades para que os Asurini possam pintar cada vez
mais e oferecer estes objetos para o mercado de arte de outras civilizações,
colocando-os no circuito mundial de arte indígena.
92
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fazer uma pesquisa em qualquer situação sempre é muito difícil; neste
caso, por se tratar de um campo de estudo em área indígena, é mais difícil ainda. De
um lado, fatores como o acesso perigoso e traiçoeiro pelos rios e floresta
amazônicos; o atendimento e a comunicação com a etnia indígena e, por fim, o
atendimento e compreensão de sua cultura parecem dificuldades intransponíveis.
Por outro lado, o encantamento pela cultura, pelo símbolo e o significado
do indígena favorecem uma relação jamais experimentada antes, tornando a
pesquisa uma gratificação ao pesquisador.
Como os resultados da pesquisa comprovam, a pintura indígena, ou o
que se denomina grafismo corporal, é o elemento da cultura mais expressivo para os
índios Asurini do Koatinemo.
Dados da pesquisa mostraram que as mulheres índias o responsáveis
pela preservação da prática da pintura corporal e contribuem para a consolidação da
identidade cultural do grupo.
As mulheres, ao praticarem a pintura corporal, consolidam a cultura do
seu povo, promovendo o processo de aprendizagem do grafismo corporal desde a
infância, embora o reconhecimento do seu significado ocorra apenas na fase adulta
das índias. A prática do grafismo corporal é repassada pelas mulheres a outras
índias desde pequenas. Essa constatação e a preocupação quanto à continuidade
do processo de transmissão do conhecimento do grafismo corporal representam o
eixo principal deste trabalho
A pesquisa serviu para promover e estimular a prática da pintura corporal
dentro da comunidade indígena estudada, indo além da perspectiva levantada, pois,
93
durante a pesquisa de campo, as índias faziam constantes momentos de pintura,
registrados em fotos.
Assim os objetivos deste estudo foram alcançados, constatando-se que o
grafismo corporal do povo Asurini está sendo praticado mais intensivamente, no
cotidiano da aldeia, e, principalmente, por ocasião das festas e rituais. Nesse
particular, acreditamos que uma das formas mais consistentes de proteger a cultura
Asurini da descaracterização é a prática sistemática do grafismo corporal e sua
aplicação em todos os produtos de sua cultura material.
No decorrer da pesquisa, preocupou-nos sobremaneira a crescente
influência do não-índio nos costumes e nas atividades do cotidiano da aldeia.
Considerando as discussões aqui apresentadas que se perceber que
falar sobre a cultura indígena significa adentrar em um campo distinto, diferenciado,
por isso é difícil que esta dissertação se encerre aqui, que muitas discussões
agora se apresentam. Podemos destacar o estudo sobre o gênero para
consolidação de sua cultura; entendimento da formação do grupo indígena familiar,
que, entre outras, ficam aqui como sugestão para uma continuidade desta pesquisa.
Finalmente, compreende-se que a cultura, principalmente na região
Amazônica, é um elemento precioso que precisa ser preservado para que junto com
ela se preserve a nação indígena.
94
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98
APÊNDICE
99
Ficha catalográfica elaborada pelo
SIBi – Sistema Integrado de Bibliotecas / UNITAU
A527g Ampuero, Raimundo Alberto Tavares
O grafismo corporal dos Asurini do Koatinemo: preservação
cultural de um povo indígena / Raimundo Alberto Tavares
Ampuero. - 2008.
131f. : il.
Dissertação (mestrado) - Universidade de Taubaté,
Departamento de Economia, Contabilidade e Administração, 2008.
Orientação: Prof. Dr. Edson Aparecida de Araújo Querido; Co-
orientação: Profa. Dra. Mônica Franche Carniello, Departamento
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