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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Eloisa Marques Damasco Penna
Processamento simbólico arquetípico:
uma proposta de método de pesquisa em
psicologia analítica
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM PSICOLOGIA CLÍNICA
NÚCLEO DE ESTUDOS JUNGUIANOS
SÃO PAULO
2009
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Eloisa Marques Damasco Penna
Processamento simbólico arquetípico:
uma proposta de método de pesquisa em
psicologia analítica
Tese apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial
para a obtenção do título de Doutor em Psicologia Clínica, pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação
da Profª Doutora - Denise Gimenez Ramos.
SÃO PAULO
2009
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BANCA EXAMINADORA
Orientadora:________________________________________
Profa. Dra. Denise Gimenez Ramos
Examinadores:______________________________________
Examinador:_______________________________________
Examinador:_______________________________________
Examinador:_______________________________________
Agradecimentos
Ao fundo de apoio à Pesquisa do Conselho de Ensino e Pesquisa da PUC-
SP, o subsídio recebido.
À PUC-SP, a oportunidade de ter feito essa pesquisa
À Drª Denise Gimenez Ramos, orientadora, colega e amiga, o apoio irrestrito
ao meu projeto de pesquisa, a escuta atenciosa e as preciosas sugestões.
Aos professores, colegas e amigos da Faculdade de Psicologia da PUC-SP
com os quais compartilhei dúvidas e desabafei, e dos quais recebi apoio e incentivo.
Aos alunos da Faculdade de Psicologia da PUC-SP e aos trainees da SBPA,
sobretudo aos meus orientandos, que com seus dilemas metodológicos instigaram
este trabalho.
Aos pesquisadores que generosamente cederam seus trabalhos e àqueles
que, com sua produção científica, forneceram o material para essa pesquisa.
A Susan Carol Albert, aluna, colega e amiga, a versão dos resumos e sua
disponibilidade irrestrita sempre.
A Milena Guarnieri, a dedicação nas buscas da primeira etapa de coleta de
material e muitas outras solicitudes e gentilezas.
A Felicia Araújo, a incansável disposição nas buscas da segunda etapa de
coleta de material e seu espírito curioso e inteligente que ensejou tantas conversas
produtivas e agradáveis.
A Luisa de Oliveira, a preparação e organização eletrônica dos originais. Mas
principalmente tudo mais que as palavras não expressam.
Aos meus filhos recém-adquiridos Fabio Bento e Silvio
Ao Kiko meu ‘puer-trickster-aeternus’.
Às minhas filhas, Ana Carolina e Adriana, que são o meu grande incentivo e a
mais valiosa recompensa de todas as minhas realizações.
Ao João Baptista, companheiro de sempre, para tudo e para sempre.
Resumo
Penna, Eloisa Marques Damasco. Processamento Simbólico Arquetípico: Uma
proposta de método de pesquisa em psicologia analítica, São Paulo, 2009.
Com o objetivo de fazer uma proposta de método de pesquisa em psicologia
analítica, foi feito um levantamento da produção acadêmica nesta abordagem –
teses de doutorado e dissertações de mestrado – em duas universidades brasileiras
– PUC-SP e USP – no período de 2002 a 2007. O material coletado foi analisado, a
partir das diretrizes metodológicas do paradigma junguiano. A análise das pesquisas
destacou os principais procedimentos metodológicos utilizados pelos pesquisadores,
tanto na coleta como na interpretação dos dados. A articulação entre o fenômeno
eleito com o objeto de pesquisa, o objetivo e os procedimentos metodológicos de
coleta e análise do material propiciou a identificação das modalidades de pesquisa
mais frequentes e as principais dificuldades dos pesquisadores. Com base na
análise do material coletado, foi feita uma proposta de método de investigação em
psicologia analítica.
O processo de pesquisa, no paradigma junguiano, abarca as etapas de
apreensão e compreensão dos fenômenos, nas quais são empregados recursos e
procedimentos metodológicos compatíveis com as diretrizes básicas do paradigma.
Dentre eles, destaca-se a amplificação simbólica. A participação do pesquisador,
sua função, sua formação e, sobretudo, o aprimoramento da atitude simbólica na
condução do processo e na relação ‘pesquisador-pesquisado’ foram ressaltados.
São, também, apontados os principais riscos que a atividade de pesquisa oferece ao
pesquisador junguiano contemporâneo e com isso, os cuidados a serem observados
durante o processo. Por fim, são discutidas as implicações éticas da atividade
científica, em geral, e do trabalho do pesquisador junguiano, em especial. O método
de pesquisa em psicologia analítica, por suas características, epistemológicas e
metodológicas, é denominado processamento simbólico arquetípico.
Palavras-chave: epistemologia, método; símbolo; processo de pesquisa;
paradigma junguiano; processamento simbólico arquetípico.
Abstract
Penna, Eloisa Marques Damasco. Archetypal Symbolic Process: a proposal
for a research method for analytical psychology. São Paulo, 2009.
The objective of this study was to propose a research method for analytical
psychology and for such an investigation was undertaken into the academic
production in analytical psychology – doctorate thesis and masters’ dissertations – at
two Brazilian universities – PUC-SP and USP – from 2002 through 2007. The
material collected was analyzed based on the methodological guidelines for the
Jungian paradigm. The analysis of the research projects identified the main
methodological procedures adopted by the researchers, both for collecting and for
interpreting the data, and the articulation between the objective of the research, the
phenomenon selected as the object of research and the methodological procedures
used to collect and analyze the material; the most frequent research modules were
identified together with the main difficulties faced by the researchers in undertaking
their research. Based on an analysis of the material collected, a research method for
investigation into analytical psychology was proposed.
The research process, within the Jungian paradigm, includes stages for
apprehending and comprehending phenomena, during which methodological
procedures and resources are used that are compatible with the basic guidelines for
the paradigm, which include symbolic amplification. Special attention was given to
the researcher’s participation in the process, considering his/her function and
academic background and more importantly, the development of a symbolic attitude
to approach the work and within the relationship ‘researcher-researched’. This
research also identifies the main risk that the research activity presents to the
contemporary Jungian researcher, and consequently, the care that needs to be taken
during the research process. Finally, the ethical implications of scientific activity in
general are discussed, and particularly in the work of Jungian researchers. The
research method in analytical psychology, given its characteristics, epistemology and
methodologies, is referred to as an archetypical symbolic procedure.
Key words: epistemology, method; symbol; research process; Jungian
paradigm; archetypal symbolic process.
Resumée
Penna, Eloisa Marques Damasco: Processus Symbolique Archétype: une
proposition de méthode de recherche en psychologie analytique, São Paulo, 2009.
Dans le but de proposer une méthode de recherche en psychologie analytique
une étude a été réalisée sur la production académique psychologie analytique –
thèses de doctorat et dissertations de Master – dans deux universités brésiliennes –
PUC-SP et USP – entre 2002 et 2007. Le matériau recueilli a été analysé à partir
des orientations méthodologiques du paradigme junguien. L’analyse des recherches
a mis en relief les principales procédures méthodologiques employées par les
chercheurs si bien pour le recueil comme pour l’interprétation des données; à partir
de l’articulation entre but de la recherche, phénomène choisi comme but de
recherche et des procédures méthodologiques employées pour le recueil et l’analyse
du matériel de la recherche ont été identifiées les modalités de recherche les plus
fréquentes et encore les principales difficultés des chercheurs dans la conduite de
leurs recherches ont été observées. À partir de l’analyse du matériau recueilli, une
proposition de méthode d’investigation en psychologie analytique a été faite.
Le processus de recherche, dans le paradigme junguien, comprend les étapes
de saisie et compréhension des phénomènes, où sont employées des ressources et
procédures méthodologiques compatibles avec les orientations de base du
paradigme. Parmi elles nous retenons l’amplification symbolique. La participation du
chercheur dans le processus mérite une reconnaissance spéciale, étant donné sa
fonction, sa formation et surtout, le perfectionnement de l’attitude symbolique dans la
conduite du processus et dans le rapport “chercheur-recherché”. Nous soulignons
aussi les principaux risques que l’activité de recherche comporte au chercheur
junguien contemporain et ainsi, l’attention à être observée pendant le processus de
la recherche. Enfin, les implications éthiques de l’activité scientifique en général et
notamment du travail du chercheur junguien seront discutées. La méthode de
recherche en psychologie analytique par ses caractéristiques épistémologiques et
méthodologiques est dénominée procédure symbolique archétype.
Mots-clés: épistémologie, méthode; symbole; procédure de recherche; paradigme
junguien; processus symbolique archétype.
Sumário
1 Introdução......................................................................................................12
1.1 O tema: contexto, justificativa e relevância............................................................... 13
2 Objetivo..........................................................................................................17
3 Método...........................................................................................................18
3.1 Procedimentos.......................................................................................................... 18
4 Formas de produção de conhecimento .........................................................30
4.1 Mito - religião - arte e filosofia................................................................................... 31
4.2 Ciência - concepções e objetivos.............................................................................. 34
4.2.1 A vertente romântica do conhecimento na arte e na ciência ....................... 40
4.3 Transição para uma concepção de ciência e método pós-moderno ........................ 42
5 Meios de produção de conhecimento: método..............................................45
5.1 Método científico....................................................................................................... 46
5.2 Sobre Paradigma...................................................................................................... 51
5.3 Pesquisa científica - a forma de produção do conhecimento científico.................... 56
5.4 Enfoques metodológicos de pesquisa ...................................................................... 57
5.4.1 Enfoque metodológico quantitativo......................................................... 58
5.4.2 Enfoque metodológico qualitativo........................................................... 61
5.4.3 Enfoque metodológico misto.................................................................. 66
5.5 Método de investigação em psicologia..................................................................... 68
6 Diretrizes metodológicas básicas para a pesquisa em psicologia analítica...77
6.1 Perspectiva ontológica.............................................................................................. 77
6.2 Perspectiva Epistemológica...................................................................................... 80
6.2.1 Origem e limites da consciência conhecedora........................................... 81
6.2.2 Possibilidades e limites do conhecimento................................................. 82
6.2.3 Relação sujeito e objeto – objetividade e subjetividade ............................. 84
6.3 Perspectiva metodológica: apreensão e compreensão dos fenômenos................... 87
6.3.1 Apreensão do fenômeno / símbolo - coleta de material.............................. 88
6.3.2 Delimitação do contexto de apreensão.................................................... 88
6.3.3 Recursos de apreensão do fenômeno - coleta de material.......................... 89
6.3.4 Relação pesquisador-pesquisado............................................................ 93
6.3.5 Compreensão do fenômeno - análise do material...................................... 95
7 Análise e compreensão do material...............................................................99
7.1 Análise descritiva.................................................................................................... 100
7.1.1 Amostra geral ....................................................................................100
7.1.2 Amostra atual ....................................................................................103
7.2 Análise compreensiva............................................................................................. 105
7.2.1 Método declarado ...............................................................................106
7.2.2 Tema de pesquisa...............................................................................110
7.2.3 Objeto / fenômeno: alvo de investigação................................................111
7.2.4 Contexto da pesquisa..........................................................................112
7.2.5 Procedimentos de coleta – apreensão do fenômeno .................................115
7.2.6 Procedimentos de análise.....................................................................119
7.2.7 Modalidade de pesquisa.......................................................................122
7.3 Comentários a título de propor uma discussão sobre método de pesquisa em
psicologia analítica........................................................................................................... 126
8 Processo de pesquisa - processo de individuação - processo analítico......138
8.1 Características gerais do processo......................................................................... 138
8.2 Plano de pesquisa e projeto de pesquisa............................................................... 143
8.3 Etapas do processo de pesquisa............................................................................ 146
8.3.1 Primeira etapa - Escolha do tema..........................................................147
8.3.1.1. Estabelecimento e delimitação do objetivo da pesquisa.................................................... 151
8.3.2 Etapa intermediária: pausa para reflexão sobre o andamento do processo ..153
8.3.2.1. Uma dinâmica intrincada: pesquisador – pesquisado........................................................155
8.3.3 Segunda etapa – apreensão do fenômeno – coleta de material..................162
8.3.3.1. Recursos metodológicos....................................................................................................162
8.3.3.2. Observação e auto-observação .........................................................................................162
8.3.3.3. Procedimentos metodológicos para a apreensão dos fenômenos.....................................166
8.3.3.4. Procedimentos em Pesquisas com seres humanos...........................................................166
8.3.3.5. Entrevistas .........................................................................................................................168
8.3.3.6. Recursos projetivos............................................................................................................170
8.3.3.7. Material não-verbal ............................................................................................................171
8.3.3.8. Considerações sobre pesquisa e Intervenção psicoterapêutica ........................................ 171
8.3.3.9. Procedimentos em Pesquisas de fenômenos culturais......................................................172
8.3.3.10. Procedimentos em Pesquisas de conceitos ou temas teóricos..........................................174
8.3.4 Terceira etapa: Processamento simbólico arquetípico...............................175
8.3.4.1. Organização do material para fins de análise....................................................................177
8.3.4.2. Parâmetros de interpretação.............................................................................................. 180
8.3.4.3. Atitude simbólica do pesquisador.......................................................................................180
8.3.4.4. Amplificação simbólica.......................................................................................................183
8.3.5 Quarta e última etapa – produção do relato da pesquisa...........................185
8.3.6 Riscos e possibilidades na pesquisa contemporânea.................................188
8.3.7 Questões éticas ..................................................................................193
9 Considerações finais ...................................................................................196
10 Postscriptum ...............................................................................................198
Referências............................................................................................................200
Anexos ...................................................................................................................208
11
Lista de Tabelas e Figuras
Quadro 1: Descrição das etapas de coleta de material 24
Tabela 1: Amostra geral 101
Tabela 2: Amostra geral: área de concentração 102
Tabela 3: Amostra geral psicologia x outras áreas de concentração 103
Tabela 4: Pesquisas em psicologia: sub-áreas 103
Tabela 5: Amostra atual 104
Tabela 6: Método declarado 106
Tabela 7: Objeto de pesquisa 112
Tabela 8: Contexto de apreensão 115
Tabela 9: Procedimentos de coleta de material 116
Tabela 10: Material verbal e não-verbal 118
Tabela 11: Procedimentos de análise 120
Tabela 12: Procedimentos de análise: fundamentação teórica 122
Tabela 13: Modalidade de pesquisa 124
Figura 1: Relação pesquisador-pesquisado 160
12
1 Introdução
O principal objetivo desta tese de doutorado é propor um método de
investigação dos fenômenos psíquicos aplicável à pesquisa em psicologia analítica.
Para atingir esse objetivo decidiu-se realizar um levantamento da produção
científica da comunidade junguiana no contexto acadêmico atual em duas
instituições brasileiras de ensino superior (PUC–SP e USP). Tal opção fundamenta-
se nas ideias de Thomas Kuhn ([1970] 2001), que considera relevante a avaliação
do estatuto da produção científica realizada na própria comunidade à qual o
pesquisador pertence.
Para tanto, inicialmente, foi feita uma retrospectiva histórica com o intuito de
posicionar a psicologia analítica e seu método de investigação no contexto da
ciência e da metodologia científica atuais, assim como no campo da psicologia. Essa
retrospectiva, primeiramente, situa a ciência como uma forma de produção de
conhecimento entre outras formas de conhecimento, tais como: mito, religião, arte e
filosofia. Destaca, também, a ciência como forma de conhecimento – sua concepção
na modernidade – assim como a transição para a concepção pós-moderna
(capítulo 4).
Em seguida, apresenta a evolução do método cartesiano para a metodologia
positivista e discute as epistemologias que contestaram a hegemonia do método
experimental, com a finalidade de, por um lado, localizar as bases filosóficas e
epistemológicas da psicologia analítica e, por outro lado, observar o surgimento dos
métodos qualitativos de pesquisa no panorama científico contemporâneo. Nesse
contexto foi destacado o conceito de paradigma e o estatuto do modelo junguiano
como um paradigma científico. São apresentados, ainda, os enfoques metodológicos
por meio dos quais o conhecimento científico é produzido atualmente. No paradigma
junguiano, o conhecimento é produzido predominantemente pelo enfoque
metodológico qualitativo (capítulo 5).
Com base nos estudos realizados sobre o método de investigação da psique
proposto por C.G. Jung (PENNA, 2003, 2005, 2007), são explicitadas as diretrizes
metodológicas básicas para a pesquisa em psicologia analítica, com a finalidade de
13
subsidiar a análise e discussão do material coletado no levantamento da produção
acadêmica junguiana atual (capítulo 6).
O referido levantamento é apresentado de modo a traçar um perfil da
produção científica atual em psicologia analítica e, em seguida, é analisado e
discutido com base nas diretrizes metodológicas do paradigma junguiano. Foram
destacados os principais procedimentos metodológicos empregados na condução
das pesquisas e as modalidades de pesquisa mais frequentes na amostra
(capítulos 7).
Com base na avaliação do material coletado foi encaminhada a proposta do
método junguiano de investigação científica. No processo de pesquisa no paradigma
junguiano são destacadas as etapas de apreensão e compreensão dos fenômenos,
suas características e procedimentos compatíveis com as diretrizes básicas do
paradigma. É dada ênfase especial à participação do pesquisador no processo, com
destaque para sua função, sua formação e, sobretudo, o aprimoramento de uma
atitude simbólica na condução do processo de pesquisa e diante do fenômeno
pesquisado. São apontados os principais riscos que a atividade de pesquisa oferece
ao pesquisador contemporâneo e, com isso, os cuidados a serem observados,
especialmente pelo pesquisador junguiano durante o processo de pesquisa. Por fim,
são discutidas as implicações éticas da atividade científica em geral e do trabalho do
pesquisador junguiano em especial (capítulo 8).
1.1 O tema: contexto, justificativa e relevância
O modelo teórico proposto pela psicologia analítica se mostra mais afinado
com a concepção de ciência atual do que com a concepção de ciência do início do
século (PENNA, 2003), o que, de certa forma, justifica a grande resistência e a
ampla gama de incompreensões que o pensamento de C.G.Jung suscitou na
comunidade científica, sobretudo na primeira metade do século 20 (TACEY, 1997)
1
,
quando ainda prevaleciam os padrões positivistas de cientificidade e seus métodos
de investigação.
1
Os textos consultados em outros idiomas foram traduzidos pela autora.
14
No entanto, a psicologia analítica tem alcançado grande repercussão no
panorama científico contemporâneo, principalmente, nas duas últimas décadas. É
notável a crescente inserção do pensamento junguiano nas universidades, não
apenas no Brasil, destacando-se a PUC-SP onde o ensino da psicologia analítica
está presente nos curso de graduação desde a década de 1970, mas também na
Europa e na América do Norte.
O paradigma junguiano apresenta diversos pontos de aproximação com a
ciência pós-moderna e seu método de investigação psicológica e sintonia com os
princípios básicos da metodologia qualitativa de pesquisa.
O modelo junguiano desenvolveu-se, predominantemente, na direção da
formação de analistas, privilegiando a aplicação da teoria à psicoterapia. No
entanto, tem sido observada a aplicação deste modelo teórico a vários campos de
trabalho e um crescente interesse por parte da comunidade acadêmica em conduzir
pesquisas baseadas nos pressupostos teóricos da psicologia analítica.
Cumpre salientar, no entanto que o valor e reconhecimento da psicologia
junguiana permanecem ainda fortemente associados ao método psicoterapêutico
como área de maior concentração de estudos e pesquisas até hoje. Entretanto,
para que sua aplicabilidade realmente se estenda para além do âmbito clínico é
necessária a formulação de uma metodologia de pesquisa própria deste paradigma.
Quando se fala de método junguiano, geralmente, entende-se método
psicoterapêutico. Jung, no entanto, além de exímio psicoterapêuta, foi antes um
grande pensador que construiu um modelo teórico consistente tanto em termos
ontológicos quanto epistemológicos e metodológicos, o que permite se falar de um
novo paradigma científico (PENNA, 2003).
A produção de conhecimento na área da psicologia analítica tem
contemplado temas associados à clínica, com destaque para a psicoterapia, mas
também temas relacionados à cultura, às artes, à mitologia, à sociologia, assim
como desdobramentos teóricos e reflexões importantes por partes dos pós-
junguianos de questões contemporâneas.
A aplicação da psicologia analítica à pesquisa científica abre possibilidades
15
de atuação profissional que vão além da prática clínica e constitui um desafio da
prática junguiana a ser enfrentado. A perspectiva simbólica arquetípica como forma
de compreensão da realidade nos habilita a investigar os fenômenos nos contextos
individual e coletivo. É nesse contexto que se insere o presente estudo com a
finalidade de fornecer suporte teórico e prático para os pesquisadores junguianos e
incentivar a pesquisa nesta área.
Em se tratando de analisar e discutir a produção de conhecimento na
psicologia analítica e suas diretrizes básicas de pesquisa é recomendável a
contextualização do tema no panorama da ciência contemporânea, e os enfoques
metodológicos que esta propõe aos pesquisadores. Além de explicitar os motivos
pessoais que subjazem este estudo.
Foi no contexto acadêmico que este interesse se forjou, resultante da
experiência de orientar monografias de conclusão de curso e pesquisas de iniciação
científica na Faculdade de Psicologia da PUC-SP e no curso de formação de
analista junguianos da SBPA. Nesse contexto foram se evidenciando as
dificuldades e as controvérsias teórico-metodológicas que a pesquisa em psicologia
analítica envolviam. As inquietações quanto a este tema, primeiramente, motivou
entre 2000 e 2003 a realização de minha dissertação de mestrado "Um estudo
sobre o método de investigação da psique na obra de C.G.Jung", onde foi feita uma
sistematização dos fundamentos epistemológicos e dos pressupostos
metodológicos do modelo proposto por Jung. O texto resultante dessa pesquisa
mostrou-se bastante útil para alunos e professores da graduação e da pós-
graduação cujo interesse está voltado para a utilização da psicologia analítica em
suas pesquisas. No entanto, acredito que ainda há uma lacuna quanto a diretrizes
metodológicas mais específicas que orientem na condução de pesquisas nessa
área. O estudo atual, por um lado é uma conseqüência natural do trabalho realizado
anteriormente e por outro lado constitui-se, a meu ver, na consecução de uma nova
etapa no desenvolvimento do modelo junguiano, qual seja, uma proposta
metodológica aplicável à pesquisa científica. Etapa esta que outras abordagens
teóricas da psicologia já efetivaram e que na psicologia analítica está apenas
começando. Com isso espero contribuir para a ampliação e o aprofundamento das
possibilidades de aplicação da psicologia analítica no campo da pesquisa
acadêmico-científica e evitar tanto o desgaste do pesquisador que precisa fazer
16
constantemente adaptações metodológicas, quanto as inevitáveis inadequações
metodológicas que tais adaptações acarretam nos projetos de pesquisa em
psicologia analítica. Humberto Eco em seu livro ‘Como se faz uma tese’ define como
tese de doutorado
um trabalho original de pesquisa, com o qual o candidato deve demonstrar
ser um estudioso capaz de fazer avançar a disciplina a que se dedica [...]
em qualquer caso, o estudioso deve produzir um trabalho que,
teoricamente, os outros estudiosos do ramo não deveriam ignorar,
porquanto diz algo de novo sobre o assunto. (ECO, 1998, p. 2)
Desse modo espero que este trabalho atenda às exigências de uma tese de
doutorado e seja útil à comunidade junguiana para dar prosseguimento aos estudos
e pesquisas nesta área. Com respeito à realização de teses de doutorado esse
autor faz ainda um comentário que particularmente me confortou, ele diz:
E, com efeito, ela não é elaborada, como entre nós, aos vinte e dois anos,
mas bem mais tarde, às vezes mesmo aos quarenta ou cinqüenta anos
(embora é claro, existam PhDs bastante jovens). (ECO, 1998, p. 2)
17
2 Objetivo
O estudo realizado sobre o método de investigação da psique na obra de
C.G.Jung (PENNA, 2003) levou à conclusão de que o modelo proposto por Jung
pode ser considerado um paradigma no sentido atual do termo, uma vez que
apresenta uma base ontológica e pressupostos epistemológicos coerentes e
consistentes entre si e com sua proposta metodológica. A presente pesquisa tem
como objetivo avançar nesses estudos no sentido de propor um método de pesquisa
em psicologia analítica.
O objetivo principal deste estudo é a sistematização de uma proposta de
método de pesquisa condizente com o paradigma junguiano para atender a uma
demanda por parte de pesquisadores. É frequente os pesquisadores lançarem mão
de métodos de investigação de outras abordagens numa tentativa de articulação
entre suas necessidades e o referencial teórico. Esse cenário acarreta desgaste ao
pesquisador, que necessita realizar adaptações metodológicas que, por vezes,
geram inadequações e incongruências nos processos de pesquisa em psicologia
analítica.
A presente pesquisa reflete sobre os procedimentos metodológicos e
instrumentos adequados à proposta epistemológica da psicologia analítica para
fornecer indicadores sobre as possibilidades e limites da investigação junguiana
18
3 Método
Esta pesquisa foi realizada sob o enfoque metodológico qualitativo seguiu as
diretrizes metodológicas básicas do paradigma junguiano. O estudo foi conduzido
em quatro níveis principais:
Levantamento bibliográfico
Enquadre teórico
Levantamento e análise da produção científica acadêmica
Proposta de método de pesquisa em psicologia analítica
O enfoque qualitativo caracteriza-se como um processo de pesquisa
constituído por várias etapas, não previamente estabelecidas. A cada etapa, o
processo pode e deve ser revisto em função dos achados das etapas anteriores. Os
procedimentos para a consecução desta pesquisa seguiram um plano básico,
inicialmente delineado no projeto, mas este sofreu alterações ao longo do processo
de realização da pesquisa.
O detalhamento dos procedimentos de coleta de material, assim como as
alterações ocorridas ao longo do processo de pesquisa são apresentadas da forma
mais fiel possível, embora alguns detalhes possam ter escapado ao registro.
3.1 Procedimentos
3.1.1 Revisão bibliográfica, cuja finalidade principal é a contextualização do
tema no panorama da ciência contemporânea e no campo específico da psicologia.
Nesta etapa, primeiramente, foi feita uma pesquisa bibliográfica sobre formas de
produção de conhecimento, com destaque ao contexto histórico que faz surgir uma
concepção de ciência, que passa a ser considerada como a produção de
conhecimento por excelência, e seu condizente método de investigação,
caracterizado como enfoque metodológico quantitativo de pesquisa ou pesquisa
experimental (CHIZZOTTI, 2003). Em seguida, a pesquisa bibliográfica focalizou os
questionamentos que levaram a uma nova concepção de ciência e o surgimento,
19
principalmente na área das ciências humanas, do enfoque metodológico qualitativo
de pesquisa. O levantamento bibliográfico revelou a presença de um terceiro
enfoque metodológico, na atualidade, que busca a conciliação dos dois enfoques
anteriores (quantitativo e qualitativo). Em razão da ênfase qualitativa do método
junguiano, a pesquisa bibliográfica em metodologia qualitativa de pesquisa foi mais
extensa.
3.1.2 Enquadre teórico da pesquisa com a finalidade de localizar
epistemologicamente o estudo atual, fornecendo subsídios para a consecução do
objetivo mais abrangente sobre método de pesquisa em psicologia analítica. Com
base no levantamento bibliográfico foi feita a articulação entre os pressupostos dos
enfoques metodológicos de pesquisa vigentes e o método junguiano de investigação
da psique (PENNA, 2003, 2005, 2007). Foram abordadas as articulações possíveis
entre a pesquisa quantitativa e qualitativa e apresentadas as diretrizes
metodológicas básicas do paradigma junguiano que serviram de suporte teórico para
a análise e discussão do material.
3.1.3 Levantamento da produção acadêmica na área da psicologia analítica
para a obtenção de subsídios para atingir a meta principal deste estudo – análise do
método praticado nas pesquisas acadêmicas e proposição de uma metodologia de
pesquisa em psicologia analítica. A opção pelo levantamento e análise da produção
realizada pela comunidade junguiana inserida no contexto acadêmico fundamenta-
se nas ideias de Thomas Kuhn e outros autores da filosofia da ciência que julgam
relevante a consideração do estatuto da ciência dentro da própria comunidade à qual
o pesquisador pertence. Assim, para melhor analisar, discutir e mesmo fazer alguma
proposta sobre método de pesquisa em psicologia analítica nada melhor do que
“olhar” e “ver” como esta comunidade tem conduzido suas pesquisas. Esse
levantamento de pesquisas consta de:
3.1.3.1 Objeto de estudo e contexto
Pesquisas acadêmicas realizadas em psicologia analítica. Foram definidas
como produção acadêmica científica: dissertações de mestrado e teses de
doutorado.
Foram escolhidas duas instituições de ensino superior da cidade de São
20
Paulo – PUC-SP e USP – em função de sua reconhecida importância e relevância
no panorama científico brasileiro atual, sobretudo no que tange ao ensino e à
pesquisa em psicologia analítica. Foi inicialmente estabelecido o período de 2002-
2007 como alvo do estudo com a finalidade de circunscrever a produção atual
(últimos 5 anos).
3.1.3.2 Coleta de Material
A coleta do material foi feita em várias etapas intercaladas por etapas de
análises preliminares. As análises preliminares sugeriram a necessidade de novas
buscas a fim de que a coleta de material fosse concluída de forma satisfatória para o
objetivo do estudo. Dessa forma, o procedimento de coleta de dados e a preparação
do material para fins de organização e análise serão apresentados
consecutivamente para proporcionar uma visão mais clara do processo de coleta de
material.
Primeiramente, destacam-se as fontes por meio das quais foi realizada a
apreensão dos fenômenos em cada etapa:
Fontes da 1ª etapa de coleta
Arquivos eletrônicos das duas instituições.
Resumos disponíveis nos meios eletrônicos das duas instituições.
Cópias xerográficas das pesquisas obtidas nas bibliotecas das duas
instituições.
Cópias xerográficas dos capítulos ‘objetivo e método’ obtidas nas bibliotecas
das duas instituições.
Cópia xerográfica dos sumários de algumas dissertações obtidas nas
bibliotecas das duas instituições.
Cópia xerográfica da Introdução e/ou capítulos considerados relevantes e/ou
necessários, para os objetivos da pesquisa, das dissertações e teses obtidas
nas bibliotecas das duas instituições.
21
Fontes da 2ª etapa de coleta
Refinamento dos procedimentos de busca em relação à 1ª etapa de coleta e
ampliação dos meios de acesso ao material:
Solicitação de informação sobre teses e dissertações via e-mail aos alunos e
ex-alunos da pós-graduação da PUC-SP.
Seleção de novas palavras-chave para busca nos meios eletrônicos das duas
instituições.
Contato direto – via e-mail ou telefone – com pesquisadores.
Cópias xerográficas do material cedido pelos pesquisadores.
Procedimentos de coleta de material: 1ª etapa
1. A primeira busca de material foi realizada nos arquivos eletrônicos das
duas instituições com as palavras-chave: psicologia analítica; Jung; arquétipo e
símbolo. Tais termos foram selecionados por constituírem palavras que permitem a
identificação da abordagem da psicologia analítica. Com esta primeira busca visava-
se obter um panorama amplo das pesquisas em psicologia analítica nas duas
instituições escolhidas. Desta primeira busca resultaram 80 pesquisas num período
que se estendia de 1990 a 2007.
2. Foram então selecionadas, do montante de 80 pesquisas, as pesquisas do
período de 2002 a 2007, com a finalidade de se circunscrever um panorama mais
atual e significativo da produção científica. Desta etapa resultaram 58 pesquisas.
3. O material selecionado (58 pesquisas) – resumos apresentados pelos
autores e disponíveis nos meios eletrônicos das duas instituições de ensino superior
(PUC-SP e USP) – foi lido e analisado quanto a sua adequação ao objetivo deste
estudo, qual seja, análise do método utilizado em pesquisas que tivessem como
enquadre teórico a psicologia analítica.
4. Da leitura e análise dos resumos obtidos pelos meios eletrônicos, verificou-
se que:
22
Em algumas pesquisas o referencial junguiano não parecia ter sido utilizado
como abordagem principal.
Em algumas pesquisas o resumo não fornecia informação sobre abordagem
metodológica da pesquisa.
5. Foram então eliminadas 11 pesquisas, resultando 47 pesquisas que foram
consideradas ‘pesquisa em psicologia analítica’.
6. Esse material foi novamente lido e analisado com o objetivo de orientar a
eleição de categorias que auxiliassem na organização do material e sua posterior
análise. Desta análise preliminar do material emergiram 4 categorias norteadoras da
primeira e mais ampla organização do material:
a) Tema da pesquisa
b) Fenômeno/objeto de estudo
c) Instrumentos de coleta de material
d) Recursos metodológicos de análise
Tais categorias visavam verificar a presença de algum padrão fenômeno-
instrumento-análise em cada modalidade.
7. Com base na leitura e análise dos resumos xerográficos das 47 pesquisas,
verificou-se que estes não forneciam dados suficientes para a visualização
adequada dos tópicos selecionados para organização do material, principalmente,
no que se refere a procedimentos de coleta e recursos metodológicos de análise.
8. Procedeu-se, então, à coleta de cópias xerográficas dos capítulos ‘objetivo
e método’ das pesquisas obtidos nas bibliotecas das duas instituições. Nesta busca
verificou-se que algumas dissertações não continham capítulos intitulados ‘objetivo’
e/ou ‘método’.
9. Foram então coletados os sumários destas pesquisas e realizada sua
leitura crítica com o objetivo de selecionar os trechos que fornecessem o material
adequado para análise. A seleção desses trechos deu-se a partir da suposição, pelo
23
título do capítulo aliado ao contexto do estudo todo, de que estes apresentassem as
informações necessárias para a composição de um quadro geral das pesquisas.
10. Procedeu-se, assim, à coleta de cópia xerográfica dos trechos
considerados relevantes e necessários das dissertações em que o capítulo ‘Objetivo’
e/ou ‘Método’ estava ausente.
11. Leitura e análise dos capítulos selecionados (objetivo, método, introdução
e outros).
A organização preliminar feita do material recolhido nesta 1ª etapa levantou
algumas questões e reflexões quanto à representatividade do material, em função da
suspeita de que algumas teses e dissertações poderiam não ter sido coletadas.
Passou-se, então, a uma 2ª etapa de coleta de material.
Procedimentos de coleta de material: 2ª etapa
Refinamento dos procedimentos de busca e ampliação dos meios de acesso
ao material:
Solicitação de informação sobre teses e dissertações via e-mail aos alunos e
ex-alunos da pós-graduação em Psicologia Clínica da PUC-SP.
Seleção de outras palavras-chave que foram adicionadas às anteriormente
citadas: junguiana/o e inconsciente coletivo, utilizadas em:
Novas buscas nos meios eletrônicos das duas instituições
Novas buscas nas bibliotecas das duas instituições.
Levantamento dos professores orientadores da pós-graduação nas duas
instituições (em abordagem junguiana).
Busca eletrônica de teses e dissertações, pelo nome de professores
orientadores nas duas instituições.
Consulta direta a pesquisadores das duas instituições e a pessoas que
supostamente poderiam fornecer informações sobre o material pretendido.
24
Dessas novas buscas resultou um total de 133 teses de doutorado e
dissertações de mestrado, incluindo as 80 recolhidas na 1ª etapa de coleta. Em
razão das dificuldades encontradas na 1ª etapa e mesmo com os esforços e
aperfeiçoamento das buscas na 2ª etapa, cumpre salientar que o levantamento
realizado pode ainda não revelar a totalidade das pesquisas feitas no período, no
entanto, supõe-se que a amostra recolhida seja representativa da produção de
pesquisas acadêmicas em psicologia analítica e passível de análise.
Quadro 1 – descrição das etapas de coleta de material
Total de pesquisas coletadas 80 Total de pesquisas coletadas 133*
Critério de Exclusão
Data de realização
1990-2001
22
Critério de Exclusão:
Abordagem não junguiana 7
Total parcial 58 Total parcial:
Amostra Geral
126
Critério de Exclusão:
Abordagem não junguiana 11
Critérios de Exclusão:
Data de realização e área do
conhecimento
89
Total final:
2002-2007
Abordagem junguiana
47
Total final:
Amostra Atual
2002-2007
Abordagem junguiana
Área do conhecimento:
Psicologia
37
Primeira Etapa da Coleta de Material
1990-2007
Segunda Etapa da Coleta de Material
1990-2007
* Esse total de 133 pesquisas inclui as 80 coletadas na Primeira Etapa da
Coleta de Material
Da análise preliminar do material colhido nesta 2ª etapa resultaram algumas
alterações no projeto inicial, as quais estão registradas a seguir.
3.1.3.3 Alterações no projeto inicial – diante desse novo conjunto de dados
foram feitas algumas modificações no projeto original. Os 80 trabalhos constantes da
1ª coleta foram retomados e revistos quanto a sua abordagem teórica.
A partir do quadro geral das pesquisas coletadas, pretendia-se, inicialmente,
chegar ao agrupamento das pesquisas com um perfil semelhante em relação a
modos de coleta e de análise, que permitissem a classificação das pesquisas quanto
25
aos recursos metodológicos empregados. Com base nesse agrupamento, selecionar
uma pesquisa de cada modalidade para análise em profundidade, as quais seriam
avaliadas e discutidas com base nas ‘diretrizes metodológicas básicas do modelo
junguiano’. Constava do plano inicial que ‘os critérios de seleção destas pesquisas
dependiam da configuração do quadro geral das pesquisas e previa a eventual
reformulação das categorias em decorrência da análise em profundidade das
pesquisas selecionadas’.
Entretanto, diante do novo quadro das pesquisas coletadas na 2ª etapa foi
abandonada a intenção inicial de escolha de apenas algumas pesquisas para a
análise em profundidade e optou-se por trabalhar com a totalidade do material, que
foi organizado e analisado em dois níveis.
1. Amostra geral – 1990 - 2008
2. Amostra atual – 2002 - 2007
Foram então fixados critérios de inclusão e exclusão para estabelecimento
das duas amostras.
Na amostra geral incluem-se todas as dissertações e teses encontradas no
período 1990 – 2008 em que o referencial junguiano, de alguma forma, tivesse sido
utilizado. Foram excluídas aquelas que apenas mencionavam Jung ou autores
junguianos, mas não utilizavam a psicologia analítica como forma de abordagem.
Desta amostra foram excluídos sete trabalhos que mostraram não utilizar o
referencial da psicologia analítica como abordagem principal, resultando um total de
126 pesquisas.
Na amostra atual incluem-se as teses e dissertações encontradas no período
de 2002-2007, realizadas na área da Psicologia e que utilizam o referencial
junguiano como abordagem principal mesmo que aliada a outras abordagens. Foram
excluídas as teses e dissertações oriundas de outras áreas do conhecimento. Foram
excluídas as teses e dissertações de 2008 em função da exiguidade de tempo para
sua análise, uma vez que estas foram obtidas no fim de 2008. A amostra atual
consiste, portanto, de 37 pesquisas.
A decisão de dividir o material em dois grupos para análise justifica-se pela
oportunidade que o material ofereceu de avaliar a aplicação da psicologia a outras
26
áreas de conhecimento e a possibilidade de observar o crescimento da produção de
conhecimento em psicologia analítica.
3.1.3.4 Organização do material para fins de análise e interpretação
Amostra geral (anexo 1):
A organização do material foi orientada pelas informações constantes da ficha
catalográfica disponível nos meios digitais, sendo considerados os seguintes dados:
Data de apresentação da pesquisa
Tipo: mestrado ou doutorado
Área de concentração: foi definida como área de concentração o curso de
pós-graduação em que a pesquisa foi realizada.
O quadro do levantamento geral do material (anexo 1) apresenta a amostra
geral de 126 pesquisas encontradas a partir dos critérios de inclusão e exclusão
estabelecidos. A numeração das pesquisas neste quadro apresenta-se pela ordem
em que elas foram encontradas ao longo das diversas buscas realizadas (que
inicialmente perfazia um total de 133 pesquisas). Essa numeração tinha como
objetivo a identificação das pesquisas da amostra geral. A amostra atual foi re-
numerada conforme se apresenta no anexo 2.
Amostra atual
(anexo 2):
1. A organização do material foi orientada pelas informações constantes:
1º nos resumos disponíveis em meios eletrônicos ou por cópia xerográfica do
material original encontrado nas bibliotecas ou cedido pelos autores.
2º nos capítulos selecionados e xerografados do material original encontrado
nas bibliotecas ou cedido pelos autores.
3º nos textos integrais das teses e dissertações, em formato PDF, obtidos nos
arquivos eletrônicos das duas instituições ou cedidos pelos autores.
As leituras do material advindo destas fontes foram realizadas
27
progressivamente em função da necessidade de obter informações fiéis e
suficientemente aprofundadas para a análise que se pretendia.
2. A organização da amostra atual para fins de análise foi feita segundo duas
diretrizes básicas:
Informações explicitamente fornecidas pelos autores nos textos consultados.
Avaliação depreendida da leitura do material, mas não necessariamente
explicitada pelos autores.
3. Processo de organização do material para fins de análise:
Todo material foi submetido a leituras sucessivas ao longo de todo o processo
de organização e análise, resultando em uma nova seleção de categorias de análise,
as quais foram baseadas no material coletado e nas diretrizes metodológicas
básicas do paradigma junguiano. Foram definidas as seguintes categorias de
análise:
Método declarado – refere-se ao método de pesquisa utilizado pelo
pesquisador. A fonte de informação para esta categoria é exclusivamente o
texto da pesquisa, seja no capítulo que informa sobre o método, seja em
especificações ou comentários complementares encontrados ao longo do
texto sobre o método empregado na pesquisa.
Objeto / fenômeno alvo da investigação – refere-se ao objeto de estudo
escolhido pelo pesquisador, ou seja, é o fenômeno que se apresenta para o
pesquisador como a melhor via de acesso ao tema da pesquisa. Dessa forma,
o objeto da pesquisa é a expressão simbólica por meio da qual o pesquisador
buscará as informações necessárias para a compreensão da incógnita do
símbolo a ser investigado. As informações referentes a essa categoria foram
obtidas pela articulação entre o material encontrado nos textos e a leitura
analítica do material.
Contexto em que a pesquisa foi realizada - refere-se ao campo delimitado nas
pesquisas para a coleta do material, que informa sobre o recorte e os limites
em que os dados foram coletados, configurando a abrangência dos
28
resultados e a amplitude de sua análise e interpretação. As informações
referentes a essa categoria foram obtidas pela articulação entre as
especificações encontradas nos textos e a leitura analítica do material.
Procedimentos de coleta – são os recursos metodológicos utilizados na
investigação para captar o fenômeno a ser investigado. Consistem nos
instrumentos e/ou estratégias utilizadas para a apreensão do fenômeno e/ou
os meios pelos quais as facetas que o objeto de estudo oferece sobre o
símbolo a ser investigado podem ser melhor capturadas. As informações
referentes a essa categoria foram obtidas pela articulação entre as
especificações encontradas nos textos e a leitura analítica do material.
Procedimento de análise – refere-se ao conjunto de instrumentos e
estratégias (técnicas) e ao tratamento a que são submetidos os dados
recolhidos para fins de compreensão e interpretação do material
disponibilizado pelos procedimentos de coleta. As informações referentes a
essa categoria foram obtidas, sobretudo, pela leitura analítica do material,
mas também a partir de referências encontradas nos textos.
Modalidade de pesquisa – por modalidade de pesquisa entende-se uma
categorização ampla da pesquisa que engloba vários aspectos: o tema, os
objetivos, o fenômeno alvo da investigação, o contexto em que o fenômeno é
investigado e a finalidade da discussão empreendida na pesquisa pelo
pesquisador. As informações referentes a essa categoria foram obtidas
exclusivamente pela leitura analítica do material.
Estabelecidas as categorias de análise procedeu-se à elaboração de uma
ficha de análise (anexo 5) onde os dados foram registrados, de modo a distinguir o
texto original dos pesquisadores e as informações depreendidas da leitura crítica do
material. Dessa forma, foi possível organizar e analisar os registros. Os registros da
ficha de análise foram transpostos para um quadro geral descritivo em que foi
possível, mais uma vez, proceder a uma reorganização do material com base em
novos elementos observados, que foram agrupados em categorias de análise
(anexo 3).
29
3.1.4 Análise do material coletado
A análise do material foi conduzida no sentido de se observar e selecionar:
As regularidades ou semelhanças encontradas nas categorias de análise
relativas a tema, objeto de estudo, procedimentos de coleta e procedimentos
de análise, e outras que se mostraram relevantes ao longo da análise.
As discrepâncias relevantes em relação aos itens acima destacados.
Situar as dificuldades mais frequentes enfrentadas pelos pesquisadores.
3.1.5 Discussão e considerações finais
Articulação entre a análise do material obtido pelo levantamento da produção
acadêmica com as diretrizes metodológicas básicas do modelo junguiano.
Proposta de um método de pesquisa em Psicologia Analítica.
3.1.6 Cuidados éticos
O material coletado foi tratado dentro dos parâmetros éticos recomendáveis,
ou seja, a preservação da identidade dos autores das teses e dissertações de
mestrado recolhidas neste levantamento, embora o material coletado seja de cunho
público e tenha sido coletado em meios públicos ou com a anuência dos autores. O
objetivo desta tese não é fazer uma crítica ao material ou ao pesquisador, mas, sim,
uma análise do conjunto da produção científica no contexto e período selecionados.
Cabe aqui uma última observação a título de esclarecimento aos leitores. No
texto deste estudo são usados os termos ‘pesquisador’, ‘leitor’, ‘orientador’ etc., no
gênero gramatical masculino, que tradicionalmente indica o uso genérico do termo,
visto que na língua portuguesa são raros os substantivos neutros. Conforme Eco
(1998) adverte “não vai nesse uso gramatical qualquer discriminação de sexo”
(p. XV).
30
4 Formas de produção de conhecimento
O conhecimento é a marca característica do ser humano e define sua
trajetória. Ser e conhecer são indissociáveis para o ser humano. Buscar o
conhecimento do mundo e de si-mesmo foi o moto inicial da humanidade, e
continua a movê-la em todas as suas atividades.
"A vida é um processo de conhecimento; assim se o objetivo é compreendê-
la, é necessário entender como os seres vivos conhecem o mundo" (MARIOTTI,
2001). Esse conhecimento se produz de diversas formas. Dificilmente somos
capazes de discriminar completamente todas as vertentes pelas quais o
conhecimento vem se operacionalizando ao longo da história da humanidade.
Dentre as diversas formas de produção de conhecimento, atualmente, a ciência
representa uma vertente do conhecimento humano de grande repercussão e
credibilidade, constituindo um dos melhores instrumentos para explorar os aspectos
desconhecidos da realidade. Cassirer (1997) aponta a ciência como a última etapa
do desenvolvimento mental do homem – a mais alta e mais característica façanha
da cultura humana.
O ocidente, desde a antiguidade grega, segue uma tradição de produção de
conhecimento calcada nas funções cognitivas que privilegiam o pensamento
racional. Entretanto o pensamento não foi a forma original do ser humano de se
relacionar com a vida e a natureza e construir conhecimento. Na história da
humanidade, outras formas de conhecimento antecederam o pensamento filosófico
e científico. A percepção, a intuição e a emoção precedem o pensamento como
meio de aquisição de conhecimento tanto no desenvolvimento individual como na
história da humanidade. A criança é movida por funções perceptivas, intuitivas e
afetivas antes de se orientar pela função cognitiva ou intelectiva.
Não é pretensão deste estudo esmiuçar a história do conhecimento humano,
nem as teorias do conhecimento, mas apenas destacar alguns pontos importantes
para o objetivo atual.
31
4.1 Mito - religião - arte e filosofia
Mitologia e Religião desde tempos imemoriais lidam com o conhecimento e o
autoconhecimento do ser humano. Os mitos e as doutrinas religiosas consideram
uma obrigação fundamental do homem – conhecer suas origens e a origem do
universo. Estas questões, atualmente, estão a cargo da ciência, que talvez possa
ser considerada um mito contemporâneo.
Os mitos forneciam aos seres humanos um corpo de conhecimentos e
métodos para lidar com a natureza e construir modos comunitários de vida
produtivos e criativos. Os mitos são resultantes da compilação do conhecimento
acumulado sobre a constituição do mundo e dos seres vivos, seu funcionamento e
integração. A mitologia é uma produção coletiva anônima e espontânea de
conhecimento que brota do inconsciente coletivo e constrói consciência coletiva.
Podemos indiscutivelmente considerar os mitos como uma forma de conhecimento
produzido e acumulado pela humanidade desde seus primórdios. Assim sendo, a
mitologia constitui uma das primeiras formas de produção de conhecimento
registrado e compilado.
Mito e religião são formas de conhecimento que mantêm estreita correlação
tanto em sua origem como em sua estrutura e finalidade. Ambos têm origem nos
mesmos fenômenos fundamentais da vida humana. No desenvolvimento da cultura
humana, não é possível fixar claramente um ponto em que o mito acaba ou começa
a religião. Em todo o curso de sua história, a religião permanece ligada a elementos
míticos, e impregnada deles. O mito, mesmo em suas formas mais grosseiras e
rudimentares, traz em si alguns motivos que antecipam os ideais religiosos
superiores que surgiram posteriormente. Desde o início, o mito é religião em
potencial. Segundo Eliade (1986) o mito conta uma história sagrada. Gilbert Murray
(1930) afirma que é comum considerarmos o mito como o começo normal de toda
religião, ou quase como a matéria bruta de que é feita a religião.
Tanto Cassirer (1997) como Eliade (1986) comentam que antropólogos e
etnólogos em suas pesquisas com material religioso e mitológico se surpreenderam
ao encontrar os mesmos pensamentos básicos dispersos por todo o mundo, embora
em condições culturais e sociais diferentes. Parece que algumas formas de elaborar
conhecimento emergiram simultaneamente em vários pontos do planeta, indicando
32
um modo de formular conhecimento típico de uma época.
À medida que o pensamento religioso vai se separando do mito surge um
corpo de conhecimento religioso que vai se aproximando do pensamento filosófico.
Do conhecimento mítico para o conhecimento filosófico Goldfarb (2001) insere um
tipo de agente do conhecimento, que ela denomina o sábio. Goldfarb (2001) aponta
a 'sabedoria' como um corpo de doutrina que tem um autor – o sábio – e traz
consigo a marca da individualidade e das circunstâncias culturais desse autor, o que
não está presente na produção mítica. A 'sabedoria' indica o início de uma
sistematização do conhecimento adquirido sob uma autoria individual precedente à
formulação de uma teoria. O que distingue o mito do "saber", no sentido que
Goldfarb (2001) propõe, seria o caráter coletivo do conhecimento mítico e o caráter
individual de uma 'sabedoria', além da maior especificidade da sabedoria versus a
generalidade do mito. O mito é um conhecimento universal, genérico e abrangente;
a sabedoria é específica, relativa a um aspecto particular da vida e da natureza.
Na Grécia, a filosofia é um sucedâneo natural da mitologia. O pensamento
filosófico, desde a escola de Mileto, é a expressão do desejo de conhecimento do
homem na antiguidade. Trata-se de uma forma mais sistematizada e individualizada
de produzir conhecimento.
Na história da cultura grega encontramos um período em que os deuses
antigos, os deuses de Homero e de Hesíodo começam a declinar. Surge um
novo ideal religioso formado por homens individuais. A humanização dos
deuses foi um passo indispensável na evolução do pensamento religioso
(CASSIRER, 1997, p. 150).
Há um período, na Grécia, em que mitologia e filosofia coexistiram e,
gradativamente, a mitologia foi cedendo espaço à filosofia. Na filosofia pré-
socrática já se observa uma crítica contundente à tradição mítica. Segundo
Gorresio (1999, p. 49) foi na escola de Mileto "que o logos teria se diferenciado
do mito”. De acordo com Cornford (apud GORRESIO,1999), na filosofia, o mito
foi racionalizado, isto é, os elementos primordiais antropomorfizados na narrativa
mítica transformam-se em princípios abstratos (conceitos ou ideias). Nessa
época observa-se também uma discriminação entre religião e filosofia, sendo
que esta passa a ser considerada uma forma de conhecimento mais confiável.
Hoje não temos dúvidas quanto às diferenças entre mitologia e filosofia como
33
formas de conhecimento distintas, entretanto em suas origens há parentescos e
observa-se que uma sucedeu à outra.
A obra de Heródoto apresenta uma verdadeira mestiçagem entre
mitologia e história. Os fatos relatados por Heródoto são simultaneamente
ocasionados pelos deuses e pelos homens. A realidade mítica e a realidade
empírica se sobrepõem. Personagens históricos convivem com entidades
sobrenaturais. Segundo Azevedo (1964, p. XX):
Heródoto, vendo em todas as coisas humanas o efeito e a influência do
'demonium', revela tendências inteiramente diversas das de um historiador
moderno, que coloque os acontecimentos sob a dependência de fatores
naturais e econômicos. Coexistem em sua personalidade, juntamente com o
cronista atento e minucioso, um teólogo e um poeta.
Algumas características dos mitos tais como sua dramaticidade, plasticidade
e emocionalidade nos permitem considerá-los, hoje, mais aparentados da arte,
enquanto a religião, por seu aspecto mais regrado e sistematizado se aproxima da
filosofia.
A arte também pode ser considerada uma forma de conhecimento que
detém modos de estruturação, realização e métodos bastante particulares. As
expressões artísticas desde a pré-história são formas de manifestação da visão
de mundo e das preocupações, sentimentos e emoções mais poderosas do ser
humano. A expressão pictórica cumpria também uma função ritualística de
propiciação e preparação para as atividades de caça ou enfrentamento do
mundo natural.
A filosofia é herdeira da mitologia e da religião, no entanto seu caráter de
autoria individual distingue a produção filosófica do conhecimento mítico e religioso.
O atributo da individualidade está, necessariamente, associado à ideia de opinião e
pontos de vista. Julgamentos baseados no livre arbítrio darão origem às
concepções filosóficas como uma nova forma de produzir e instituir conhecimento.
As bases epistemológicas da mitologia e da religião não são de todo
dessemelhantes, mas o fundamento epistemológico da ciência ocidental é
totalmente diferente destas formas de conhecimento, principalmente a partir da
modernidade.
34
A mentalidade ocidental foi forjada pelo entrelaçamento do pensamento
filosófico grego e a tradição judaico-cristã, com seu mito monoteísta que dá origem a
uma nova forma de conhecimento mesclando religião e filosofia na proposição de
princípios morais e de convivência social, a mentalidade romana também exerce
grande influência na formação do cânone cultural do ocidente. O cristianismo entra
no império romano e passa de mito a religião institucionalizada e em seguida dá
origem a todo um corpo filosófico que dominará a Europa durante séculos. A
associação duradoura e intensa entre filosofia e religião sintetizada na mentalidade
cristã medieval vai desencadear um movimento de suma importância em todas as
áreas do conhecimento europeu - a renascença. Deste renascimento, tanto na arte
como na filosofia nascerá a ciência moderna.
4.2 Ciência - concepções e objetivos
Cassirer (1997) coloca a ciência como a última etapa do desenvolvimento
mental do homem – sendo a mais alta e mais característica forma de conhecimento
da cultura humana atual. O conhecimento científico moderno e seus métodos de
pesquisa subsidiaram um desenvolvimento tecnológico nunca antes observado na
humanidade. Embora os princípios básicos da modalidade científica do
conhecimento tenham suas origens nos grandes pensadores gregos e seus
modelos filosóficos, o conhecimento em sua vertente científico-tecnológica moderna
é um produto recente e requintado da humanidade.
Para Platão, a ciência é uma introdução, ou pressuposto da filosofia; é ela
(ciência) que permite o discurso verdadeiro. No modelo filosófico platônico, a
ciência é a ponte entre o sensível e o discurso absolutamente verdadeiro, que é o
da filosofia. Com Descartes a filosofia deixa de ser o acabamento para tornar-se o
pressuposto da ciência. Sua imagem sobre o conhecimento é famosa: o saber é
como uma árvore, cujas raízes são a metafísica, o tronco, a ciência física, e os
ramos, as ciências aplicadas. Segundo Davy (1983), para Platão a 'ciência das
ideias' era a única e verdadeira ciência, e o único meio de salvação para o homem
e a cidade; na sociologia positiva de Augusto Comte (séc.19), a 'ciência dos fatos' é
a salvação para a sociedade.
Ainda segundo Davy (1983, p. XV), tanto Platão como Augusto Comte
35
devotam uma fé absoluta na ciência como encarregada de "inspirar, dirigir e
executar as reconstruções necessárias" para que se realizem as transformações
reclamadas pelos homens, para Platão, e pela sociedade, para Comte.
A ciência como promotora de conhecimento vai se instalando lenta e
gradualmente na mentalidade ocidental, convivendo com a filosofia e, mais
recentemente, substituindo-a. Santos (2000, p. 28) afirma que, de meados do séc.
19 até hoje, a ciência adquiriu total hegemonia no pensamento ocidental, tomando-
se a produção de conhecimento por excelência. O paradigma moderno "pressupõe
uma única forma de conhecimento válido, o conhecimento científico".
Cumpre salientar que o conhecimento humano continua se realizando por
meio da filosofia, da arte e da religião, embora haja preconceitos quanto á validade e
seriedade, principalmente, desta última.
Do ponto de vista epistemológico, a marca fundamental da transição entre a
filosofia medieval e a moderna é o caráter construtivo do conhecimento, que tem
como autor principal a razão humana e não mais uma entidade divina exterior. Em
Descartes o conhecimento é construído por uma razão lógica, e em Kant, pelas
relações dialéticas entre a razão pura e a razão prática.
Dentre as diversas formas de produção de conhecimento, a ciência moderna
passa a ocupar lugar de destaque. Em todas as formas de produção de
conhecimento - mito, religião, filosofia, arte e ciência – o ser humano tem como
objetivo "entender e interpretar, articular, organizar, sintetizar e universalizar sua
experiência humana" (CASSIRER, 1997, p. 359) com a finalidade última de
apreender e compreender seu mundo e a si-mesmo.
O objetivo principal da ciência, portanto, coincide com as metas das outras
formas de conhecimento, ou seja, conhecimento do mundo e dos seres; e se
distingue delas por sua ênfase, e quase exclusividade, no aspecto cognitivo
intelectual como meio pelo qual o conhecimento se produz. Nesse percurso o ser
humano é sempre o sujeito e o alvo mais importante do conhecimento.
A ciência moderna privilegia um tipo de conhecimento produzido por meio de
um pensamento racional e lógico identificado como uma atividade estritamente
36
intelectual. No entanto, já na filosofia grega observa-se a presença de uma forma de
produção de conhecimento baseada no logos.
O vocábulo grego logos, frequentemente traduzido por estudo, ciência,
disciplina, discurso e investigação sistemática (PAPADOPOULOS, 2006), surge
entre o séc. VIII e VII a.c. para designar um novo tipo de palavra, marcando o
declínio da 'palavra mágico-religiosa' (fase mitológica) e a ascensão da 'palavra
argumento' (fase filosófica). Usada nas discussões e nos debates, esta palavra
argumento dá origem aos diálogos e, nesse sentido, adquire o significado de
discurso e de instrumento do conhecimento. "Na retórica sofista, pelo logos (discurso
ou debate) é delimitado um plano de pensamento mais secularizado, em que a
Alétheia (verdade suprema) é excluída" (GORRESIO,1999, p.67). Logos é a palavra
instrumental pela qual o homem pode se exercer no mundo de modo mais ativo e
prático - um instrumento de conhecimento e controle no plano cotidiano da palavra
prática e coloquial distinto do conhecimento verdadeiro associado a Alétheia
(verdade). Segundo Vernant (apud GORRESIO,1999), o pensamento do tipo logos
surge quando o homem alcança certa autonomia em relação às forças divinas; o
controle e o domínio da vontade, do pensamento e da ação denotam uma
consciência do eu separada do mundo. O conhecimento que se produz por meio do
logos é um conhecimento associado à razão - um pensamento emancipado das
forças divinas. Segundo Gorresio (1999, p. 84), "para a razão nascer, houve
necessidade de diferenciar-se dos deuses". O conhecimento que se produz via logos
é um tipo de conhecimento derivado de competências essencialmente humanas que
se discrimina do conhecimento oriundo de potências divinas. Essa discriminação e
emancipação, no entanto, não anula o plano divino, pois o conhecimento 'verdadeiro'
ainda pertence ao âmbito divino.
A ciência moderna também surge de uma profunda crise filosófico-religiosa
que se instala no período medieval e dá origem à mentalidade renascentista, que
por sua vez, conduz a civilização ocidental aos ideais da modernidade. Na
Renascença, aos poucos, vai se instalando a secularização do conhecimento tanto
na vertente filosófica quanto na arte. As manifestações humanas vão se
desvinculando do sentido religioso que até então carregavam. A arte religiosa dá
lugar a expressões artísticas laicas; temas da natureza e da vida cotidiana passam a
37
prevalecer sobre os temas religiosos. Aos poucos esta desvinculação entre religião e
ciência passa a conferir supremacia a esta que será a detentora do conhecimento
'verdadeiro' e promove a desvalorização daquela.
Para Jung (vol. 5)
2
, o logos está associado ao pensamento conceitual,
distinto do pensamento mítico, e radica-se principalmente na extensão e
intensidade da consciência sendo característico do dinamismo patriarcal
operante na consciência.
Do latim, scientia é sinônimo de conhecimento de onde deriva o termo
consciência, que se refere, do ponto de vista psicológico, àquilo de que se tem
conhecimento, abarcando também o autoconhecimento. Em grego conhecimento é
episteme. Poderia se pensar, então, que ciência, como concebida hoje, refere-se a
um tipo de conhecimento associado ao logos. No entanto, para Papadopoulos
(2006), o correlato latino – scientia – do termo grego episteme não traduz sua
profundidade e riqueza. Etimologicamente, episteme relaciona-se com o verbo
epistemi e epistamai que significam respectivamente 'estabelecer ou localizar' e
'saber como', sugerindo que episteme poderia ser entendida como o ato de marcar
um território para ser observado ou compreendido. Donde epistemologia seria a
demarcação de um campo a ser conhecido ou para fins de conhecimento ou
compreensão.
Com esta exposição sobre os significados originais dos termos logos,
episteme e scientia, talvez seja possível esclarecer os sentidos e funções que estes
termos compreendem no campo do conhecimento científico hoje. Logos refere-se a
uma forma de abordar a realidade por meio da 'palavra argumento', sob o domínio
da razão humana diferenciada da razão divina; Episteme é o conhecimento
demarcado ou localizado, isto é, caracteriza um campo de conhecimento; e scientia
é conhecimento no sentido de um saber adquirido. Assim, entende-se por ciência um
tipo de conhecimento produzido por uma forma de abordagem – racional – de um
campo demarcado da realidade. A atividade científica, a partir da modernidade, deve
ser totalmente isenta de crenças religiosas. Os limites do conhecimento científico
2
As referências e citações retiradas das obras completas de C.G.Jung são feitas pela indicação do
volume seguida do parágrafo.
38
estão demarcados, assim como seus métodos, posto que a ciência moderna
pretende um conhecimento operacionalizado pela razão humana.
Na Idade Moderna, a separação entre Ciência e Religião caminha no sentido
de estabelecer duas formas de conhecimento independentes, cujos campos de
conhecimento não se cruzam. Primeiro Descartes, depois Pascal, Montaigne,
Copérnico e Galileu e depois Newton vão modelando as bases da filosofia e da
epistemologia modernas nas quais o poder da razão humana é estabelecido e
confirmado. Apesar de conflitos e tensões profundos e intensos, o homem ocidental
entra numa época em que o conhecimento estará centrado na razão. Com Darwin,
definitivamente, o ser racional supera o ser religioso.
A partir do século 17 implanta-se a solução racionalista para o conhecimento
em geral. A razão matemática e a física mecanicista são o elo entre o ser humano e
o universo. Filosofia e Ciência começam a trilhar caminhos paralelos, entretanto
separados, a partir da modernidade.
No século 18 ciência e religião estão completamente separadas, espírito e
razão são polaridades não apenas discriminadas, mas dissociadas. A ciência
moderna afasta o polo subjetivo da observação científica, pois este não somente
"atrapalha" como compromete a produção de conhecimento fidedigno e confiável.
De acordo com Byington (1986), o preconceito contra a subjetividade, que se
instaura no paradigma cartesiano, vai acarretar um desvio na epistemologia
altamente prejudicial para todo o caminho da humanidade em direção ao
autoconhecimento. A unilateralidade que passa a vigorar promove um grande vazio
que culmina com um sentimento profundo de perda do sentido individual da vida
como aponta Bauman (1998) em seu livro O mal estar da pós-modemidade.
O Racionalismo e o Iluminismo, que deram origem à ciência e tecnologia
modernas, foram uma contra revolução à Inquisição medieval, que professava a
supremacia da religião sobre outras formas de conhecimento. O polo anteriormente
oprimido (razão, lógica, secularidade) foi trazido à luz, entretanto, neste movimento,
mais uma vez houve a hipertrofia de uma das partes da totalidade. Desta vez a
polaridade racional exclui o polo irracional e espiritual antes exacerbado, assim
como as funções cognitivas e perceptivas eclipsam as funções sentimento e
39
intuição.
No século 19 a ciência passou a ser socialmente reconhecida pelas
virtualidades instrumentais da sua racionalidade, ou seja, pelo desenvolvimento
tecnológico por ela mesma impulsionado. Segundo Japiassu e Marcondes (2001),
modernamente, a ciência é a modalidade de saber constituída por um conjunto de
aquisições intelectuais que tem por finalidade propor uma explicação racional e
objetiva da realidade.
Neste panorama os objetivos da ciência como produtora exclusiva de
conhecimento sério, confiável e verdadeiro, de acordo com Mazzotti e
Gewandsznajder (1998), chegaram à ambição máxima de conseguir alcançar um
conhecimento empírico certo, comprovado e com o maior número possível de
enunciados verdadeiros acerca do mundo. Já o racionalismo crítico pretendia
conseguir enunciados verdadeiros, embora admitindo que não fosse possível
conseguir um conhecimento absolutamente certo, ou seja, mesmo que se
consiguisse descobrir uma teoria verdadeira, nunca se poderia ter certeza absoluta.
Mas o conhecimento científico mantinha também como um de seus objetivos básicos
a previsibilidade e capacidade de generalização, segundo Mazzotti e
Gewandsznajder (1998), buscando teorias mais amplas, precisas ou exatas, que
alcançassem um maior número de fenômenos.
Observa-se que a produção de conhecimento científico, por um lado, apóia-
se em teorias que são validadas por meio do método científico e, inversamente, o
conhecimento produzido com base no rigor metodológico do paradigma produz
teorias precisas, exatas e verdadeiras, formando um círculo vicioso entre teoria e
método, em que um valida e referenda o outro sucessivamente. Segundo Santos
(2000, p. 28), a partir de então, o conhecimento científico opera uma verdadeira
inversão de valores, pois pode dispensar a investigação das suas causas como meio
de justificação, passando a "justificar-se não pelas suas causas, mas pelas suas
consequências". Assim também "a tecnologia da ciência e a tecnologia produtiva
progridem juntas, amparando-se e incentivando-se reciprocamente" (FIGUEIREDO,
1989, p. 15), posto que ambas compartilham objetivos e modos de abordagem.
Resumindo, a ciência moderna alicerçada na filosofia iluminista e racionalista
40
é orientada por uma mentalidade, essencialmente do tipo pensamento-sensação
extrovertida. A produção do conhecimento científico é nitidamente associada ao
pensamento e à percepção de um modo extrovertido. Intuição e sentimento foram
aspectos bastante negligenciados pela consciência coletiva na construção do
conhecimento científico assim como a abordagem introvertida dos fenômenos. Por
isso sempre nos referimos a um 'pensamento científico' ou a uma 'percepção
científica' da realidade ou dos fenômenos. Não há menção a um ‘sentimento
científico’ ou a uma ‘intuição científica’. O aspecto extrovertido desse conhecimento
qualifica como fenômeno real os fatos da realidade externa, daí a grande ênfase na
objetividade. O aspecto perceptivo destaca o dado observável – perceptível – como
o fenômeno passível de investigação científica, elegendo o método empírico que
enfatiza a observação perceptiva dos fatos e sua sofisticação crescente, que está
expressa na tecnologia cada vez mais avançada de instrumentos de observação e
mensuração. O pensamento dá o tom principal à produção científica moderna
fortemente associada à racionalidade e à lógica e define o método científico
baseado no determinismo lógico e na causalidade.
O processo científico leva a um equilíbrio estável, a uma estabilização e
consolidação do mundo, de nossas percepções e pensamentos (...) o fator
material é dado por nossa percepção sensorial; o formal é representado por
nossos conceitos científicos. (CASSIRER, 1997, p.338)
A era moderna marcou a época em que o conceito de ciência se configurou
como a melhor forma de produzir conhecimento.
4.2.1 A vertente romântica do conhecimento na arte e na ciência
A vertente romântica do conhecimento está relacionada aos filósofos alemães
(BORNHEIM, 1993), que, partindo de Kant, formulam um conjunto de sistemas
idealistas, incluindo a teologia sentimental de Schleiermacher e o realismo mágico
de Novalis, e excluindo o idealismo de Hegel (GUINSBURB,1993), que será mais
absorvido pela dialética materialista de Engels e Marx e pela fenomenologia
existencial de Heidegger.
Tarnas (2001) situa o início do Romantismo em paralelo ao lIuminismo, tendo
ambos surgido da complexa matriz do Renascimento. Para Nunes (1993), o
Romantismo, propriamente dito, surge como uma reação ao lIuminismo, sendo o
41
ponto nascente da filosofia romântica, a tentativa de Fichte de discutir as antinomias
de Kant. No século 19 há um renascimento dos ideais românticos que será
denominado neo-romantismo. Os filósofos neo-românticos operam uma pequena
revolução no andamento da filosofia em geral, retomando algumas questões
esquecidas pela filosofia racionalista herdeira do iluminismo. Dentre elas destacam-
se as questões relativas à espiritualidade e à individualidade.
A filosofia romântica foi uma reação ao Iluminismo, este, porém, vai
sobreviver através do positivismo, do pragmatismo e da ciência tecnológica dos dias
atuais.
O discurso romântico é essencialmente interpretativo e formativo. As fontes
propulsoras do romantismo estão no indivíduo. O ser humano é fantasioso,
imprevisível, de alta complexidade psicológica, dotado de um mundo interno rico e
exuberante e por isso centrado na sua imaginação, sensibilidade e intuição; o ser
humano do romantismo é um organismo dotado de corpo e alma, sendo o espírito
seu centro nevrálgico (PENNA, 2003). Sua principal distinção em relação ao
pensamento cartesiano e à filosofia positivista reside na visão pluralista da filosofia
romântica que contempla o objeto de vários pontos de vista e a preferência por uma
abordagem circular em lugar do pensamento lógico linear da perspectiva positivista.
No panorama filosófico do fim do século 19, paralelamente à filosofia
positivista associada ao empirismo lógico inglês, destacam-se a filosofia de Kant em
seus desdobramentos neo-kantianos, e o neo-romantismo, que revive e resgata o
romantismo dos séculos anteriores.
A concepção de ciência prevalecente até meados do século 20 identificou-se
com a vertente filosófica racionalista e positivista, sendo que a filosofia alemã
romântica foi mais assimilada pela arte. Outras áreas do conhecimento que foram
influenciadas pela filosofia romântica, como por exemplo, a psiquiatria dinâmica e a
psicologia profunda, foram duramente criticadas pela ciência tradicional em função
de sua recusa em se adequar aos padrões metodológicos de cientificidade
propostos pela concepção racionalista positivista.
42
4.3 Transição para uma concepção de ciência e método pós-
moderno
A partir da segunda metade do século 20 movimentos importantes foram
surgindo no sentido de questionar a hegemonia do paradigma positivista na ciência.
Ao longo do século 20, de acordo com Tarnas (2001), observa-se uma crise
epistemológica e metodológica na ciência ocidental, que questiona o pensamento
científico moderno Prigogine (1996) avalia que, neste período, estamos no ponto de
partida de uma nova racionalidade, em que a ciência não mais se identifica com a
busca de certezas absolutas.
Karl Popper (1902-1994) e Thomas Kuhn (1922-1996) são considerados os
principais articuladores da concepção pós-moderna de ciência. Popper foi o primeiro
a questionar a relação estrita estabelecida entre hipótese, comprovação e previsão
(JAPIASSU; MARCONDES, 2001) do método dedutivo, e criticou também o método
indutivo ao discutir os limites do observador e sua interferência na experimentação.
Para Popper as hipóteses de caráter geral jamais podem ser comprovadas ou
verificadas de modo definitivo, a verdade é colocada por ele como essencialmente
transitória, isto é, algo pode ser considerado verdadeiro até que seja verificada
evidência contrária. Dessa forma o objetivo da ciência não é mais a comprovação,
mas a possibilidade de refutação, reafirmando o caráter dinâmico do conhecimento
científico. Thomas Kuhn critica a 'ciência normal' (positivismo e empirismo) em
virtude da estreiteza de seus limites e da exigência de uma objetividade impossível
de ser mantida ou mesmo alcançada.
As críticas da Escola de Frankfurt à "ciência tradicional" também afetaram
profundamente, segundo Mazzotti e Gewandsznajder (1998), tanto a concepção de
ciência como seu método, contribuindo para o esgotamento do empirismo lógico. É
neste contexto que surge a concepção de método qualitativo aplicado principalmente
às ciências humanas.
A visão de ciência apresentada por Thomas Kuhn ([1970] 2001) foi duramente
criticada pela comunidade científica, por defender uma visão considerada
excessivamente relativista ao negar a existência de critérios objetivos para a
avaliação de teorias e, sobretudo, por ressaltar a forte influência de fatores
43
psicológicos e sociais em qualquer tipo de investigação e avaliação científicas que
se queira fazer.
As premissas da Física de Heisemberg e Eistein, quanto à interferência do
observador no objeto observado, nesta época, ainda não haviam abalado a crença
na objetividade científica. Vale também lembrar Nietzsche, que já havia levantado
essa questão em relação aos modelos filosóficos no fim do século 19, para quem
não era possível separar assepticamente a obra e a pessoa dos filósofos, "toda
grande filosofia" é a "confissão pessoal de seu autor” (NIETZSCHE,1978). Sem falar
na psicologia profunda que desde o início do século 20 apresentava uma noção de
conhecimento e método bastante discrepante da tradição lógico - empírica da
ciência moderna, mais afinada com a filosofia romântica e com a dialética kantiana
do que com os princípios filosóficos cartesianos e positivistas.
No panorama contemporâneo da ciência observa-se, porém, que a tradição
do positivismo lógico, herdeiro do Iluminismo, e ambos radicados no "grande
paradigma do ocidente" (MORIN, 2000) formulado por Descartes, ainda prevalece
como método promotor do conhecimento científico sério e confiável, privilegiando o
enfoque metodológico quantitativo de investigação científica.
No entanto, as críticas à 'ciência normal' proferidas por Thomas Kuhn e suas
proposições a respeito das revoluções científicas repercutiram na comunidade
científica a partir da década de 1970, fazendo despontar uma concepção de ciência
menos idealizada e mais realizável, que admite a incerteza, a diversidade e a
complexidade do mundo e do ser humano. Para Prigogine (1996), trata-se de uma
ciência que permite a criatividade como expressão singular de um traço humano
comum e fundamental a todos os níveis de conhecimento. Kuhn ([1970] 2001)
discute ciência como uma produção de conhecimento realizada por cientistas e dá
destaque aos cientistas como seres humanos e à comunidade científica como
integrante da comunidade humana, discutindo as intrincadas relações entre
indivíduo e cultura, ressaltando a importância do contexto histórico social em que as
teorias científicas são produzidas. Sua ênfase na pessoa do cientista e na
comunidade desloca o eixo de discussão da natureza e das teorias para o ser
humano (cientista no caso) produtor de conhecimento, destacando os aspectos
psicológicos e sociais de todas as formas de produção de conhecimento,
44
especialmente o conhecimento científico.
Santos (2000) aponta a ‘desdogmatização’ como a característica principal da
concepção de ciência na pós-modernidade. A partir do interesse crescente por parte
de alguns filósofos da ciência em questionar as bases do pensamento científico
moderno, o movimento de ‘desdogmatizaçao’ da ciência intensificou-se na segunda
metade do século.
A relativização do rigor metodológico observado na atualidade, sobretudo nas
ciências humanas, está vinculada também à proposição epistemológica de
substituição da busca da verdade pela tentativa de aumentar o poder explicativo das
teorias (LUNA, 1996), e enfatizando a função compreensiva mais do que descritiva
do conhecimento, além de seu caráter provisório e relativo na pós-modernidade.
Os horizontes da cientificidade foram ampliados em relação aos limites
estritos propostos pela filosofia iluminista e pelo rigor metodológico do positivismo
lógico. Estes têm se mostrado não apenas insuficientes e insatisfatórios, mas
sobretudo impeditivos para o desenvolvimento do conhecimento.
As revoluções dos paradigmas científicos, cujos princípios fundamentais
foram questionados e avaliados criticamente, são a marca do pensamento científico
do século 20. Não apenas a concepção de ciência se diversifica a partir de então,
como também os métodos pelos quais esse conhecimento vai ser produzido.
45
5 Meios de produção de conhecimento:
método
O termo método tem sua origem no grego clássico e comporta sentidos
relativos a percurso (espaço) e duração (tempo). Diz respeito ao caminho a ser
seguido ou percorrido durante a caminhada em direção a uma meta; ou a estrada a
ser trilhada para se chegar ao destino; ou ainda, o caminho que está de acordo com
a viagem a ser empreendida e aonde se quer chegar. O método está associado ao
viajante e à viagem a ser empreendida. Daí se destacam as particularidades dos
métodos, em função das características específicas tanto da meta que se tem
quanto dos pressupostos de que se parte.
Junto aos antigos, principalmente, Platão e Aristóteles, método aparece com
o sentido de investigação e pesquisa (ABBAGANO,1999), ligado à busca de
conhecimento. Alude assim ao caminho tortuoso e árduo a ser trilhado em direção
ao conhecimento.
Dentre as acepções modernas do termo, o dicionário Larousse Universal
(1923) indica o verbete método como:
o andar racional que se segue para chegar a um fim [...] andamento racional
do espírito para chegar ao conhecimento ou à demonstração da verdade;
conjunto de procedimentos destinados a conduzir o espírito ao
conhecimento da verdade. Cada ciência tem seus procedimentos
particulares, apropriados ao seu objeto próprio.
Foulquié e Saint-Jean (1969) assinalam, no sentido abstrato – "caráter de
uma atividade que se desdobra seguindo um plano refletido e determinado
anteriormente" e um sentido concreto – "um conjunto de procedimentos destinados a
assegurar um resultado determinado". Abbagano (1999) considera que, na medida
em que toda doutrina filosófica ou teoria científica possui uma ordem de
procedimentos que visam à aquisição de conhecimento, estes podem então ser
chamados de método. De acordo com Mazzotti e Gewandsznajder (1998), método
pode ser definido como uma série de regras para tentar resolver um problema.
Japiassu e Marcondes (2001) definem método como um conjunto de procedimentos
racionais baseados em regras, que visam atingir um objetivo determinado. Como
conjunto de regras ou procedimentos, esta definição diz mais respeito a técnicas ou
46
recursos metodológicos do que propriamente o método.
Observa-se que o termo método comporta um sentido abstrato (teórico) e um
aspecto concreto (prático). O significado concreto refere-se a técnicas –
procedimentos, recursos, estratégias e instrumentos – utilizados para se alcançar
uma meta. O sentido abstrato do termo indica modo de pensar – forma de conduzir o
pensamento – para aquisição de conhecimento associado a teorias científicas ou
doutrinas filosóficas e, nesse sentido, compreende o processo através do qual se
efetiva o conhecimento. O método implica sempre sentido prático relativo à
aplicabilidade e viabilidade da teoria sobre a qual este se assenta.
Por método, entende-se o modo de produção de conhecimento; o caminho a
ser seguido para aquisição de conhecimento. Deste ponto de vista, mais filosófico do
que prático, método associa-se à busca de conhecimento de forma ampla e geral,
indicando os meios de produção do conhecimento a partir da concepção de
conhecimento e da área de conhecimento a que se propõe. Mais uma vez, vale
lembrar a estreita relação entre epistemologia e método no conhecimento científico.
5.1 Método científico
As características mais marcantes do conhecimento científico moderno, como
foi visto, residem na busca de ordem, universalidade, constância e veracidade. Tais
atributos conferem à ciência o estatuto de conhecimento sério e confiável. A garantia
de alcance destas qualidades se dá pelos meios através dos quais o conhecimento
é adquirido e produzido, isto é, pelo método científico.
Método em ciência é um indicador de como as pesquisas científicas devem
e/ou podem ser conduzidas e, consequentemente, sugere os recursos técnicos mais
adequados para a condução do processo de produção de conhecimento científico.
Tais recursos são também denominados recursos metodológicos e incluem,
estratégias, ferramentas ou instrumentos (técnicas). Ao conjunto de recursos
metodológicos empregados em uma pesquisa e seu modo de articulação e manejo
dá-se o nome de procedimentos metodológicos. Denzin e Lincoln (1998a)
consideram o método, no contexto da concepção contemporânea de paradigma,
parte integrante do corpo do paradigma (ontologia, epistemologia e metodologia) e
47
destina às técnicas funções denominadas ‘procedimentos de investigação’;
estratégias empíricas’ ou ‘ferramentas de pesquisa’.
De acordo com Mazzotti e Gewandsznajder (1998), atualmente não há uma
concordância completa entre os filósofos da ciência acerca das características do
método científico. Uma das características básicas do método científico moderno é a
tentativa de resolver problemas por meio de hipóteses que possam ser testadas
através de observações ou experiências.
No entanto, a partir da segunda metade do século 20, a comunidade científica
começou a questionar as bases e fundamentos vigentes do conhecimento científico.
Considerando-se a ciência como uma forma de produção de conhecimento,
ela necessariamente implica uma epistemologia (demarcação de um campo ou
território a ser compreendido) e um método decorrente dessa epistemologia.
Com Descartes (1596 - 1650), a concepção de ciência caracteriza-se por seu
aspecto racional, e o método privilegia o raciocínio lógico formal baseado na Física e
na Matemática. Contudo é na obra de Francis Bacon (1561- 1626) que a abordagem
empirista se afigura como um novo modo de articulação entre teoria e prática, ao
enfatizar, pela primeira vez, "o caráter operante das relações entre o homem e o
mundo, bem como a legitimidade dessa forma de relacionamento." (FIGUEIREDO,
1989). O racionalismo de Descartes e o empirismo de Bacon marcam a transição
entre a Renascença e a Idade Moderna no que diz respeito ao método científico. A
tônica de Bacon reside na produção de conhecimento objetivo e no método
instrumental, pois sua ênfase no caráter operante e dominador da mente humana,
no processo de conhecimento, faz com que uma preocupação metodológica se
imponha, colocando 'a disciplina do espírito' como o objetivo das "regras
metodológicas que definirão a própria especificidade da prática científica: cientista
não é quem alcança a verdade, mas quem se submete conscienciosamente à
disciplina do método" (FIGUEIREDO, 1989, p.15). Para Descartes o aspecto racional
precede e predomina sobre o empirismo de Bacon, mas o método também tem
papel preponderante e definidor de sua concepção de ciência. A dúvida metódica de
Descartes é o procedimento fundamental para a produção de conhecimento
científico. Para ele o caráter verdadeiramente científico do conhecimento reside em
48
descartar como inteiramente falso tudo aquilo que possa supor a menor dúvida.
Ressalta, sobre os fatos que
não basta observá-los com cuidado, descrevê-los e classificá-los, mas, e
isso é muito mais difícil, cumpre ainda, segundo a palavra de Descartes,
encontrar o aspecto pelo qual são científicos, isto é, descobrir neles algum
elemento objetivo suscetível de determinação exata e, se possível, de
medida (DURKEIM, 1983, p. XIX).
O racionalismo de Descartes e o empirismo de Bacon vão constituir a base do
paradigma científico da modernidade – concepção de ciência e método científico.
Kant (1724 - 1804) instaura um novo conceito de conhecimento (dialético) ao
discutir as relações entre a razão pura (transcendente) e a razão prática (sensível) e,
de acordo com Denzin e Lincoln, (1998), rompe com a tradição cartesiana que
inaugurou o método quantitativo de pesquisa, ao instaurar o limite fenomenológico
ao conhecimento científico. Kant abala a busca de uma verdade absoluta e definitiva
como meta do conhecimento possível.
No entanto, apesar da grande questão da dúvida lançada por Descartes, o
caráter incerto do conhecimento humano não foi, e ainda não é, facilmente aceito
pela comunidade científica. Apesar dos dilemas e questionamentos apresentados
tanto por Descartes quanto pela dialética kantiana, a busca por certezas e verdades,
previsibilidade e confiabilidade, generalidade e universalidade são ideais muito
arraigados no ocidente, e permaneceram na base do método científico moderno. O
século 19 e a primeira metade do século 20 são pautados por uma concepção de
ciência mais cartesiana do que kantiana, pois buscava certezas por meio da razão
lógica. De Kant, permanecem as noções de fenômeno e experiência; esta, porém,
tomada no sentido geral de Bacon e não no sentido particular da filosofia
fenomenológica existencial, herdeira de Kant; e a objetividade prevalece sobre a
subjetividade nos métodos científicos.
Segundo Chizzotti (2003), o século 20 se caracterizou por duas tendências
conflitantes quanto a métodos de pesquisa, uma que se "caracteriza pela adoção de
uma estratégia de pesquisa modelada pelas ciências naturais e baseada em
observações empíricas para explicar fatos e fazer previsões, e outra, que advoga
uma lógica própria para o estudo dos fenômenos humanos e sociais, procurando as
significações dos fatos no contexto concreto em que ocorrem" (p.12).
49
A tendência modelada originalmente pelas ciências naturais estendeu-se às
ciências humanas e constituiu-se no grande paradigma científico da modernidade,
denominado por Kuhn 'ciência normal' ou 'paradigma cartesiano', segundo Morin
(2008), que centralizou toda a produção de conhecimento e determinou um método
de produção de conhecimento – enfoque metodológico quantitativo – que perdurou
como o único paradigma aceitável nos meios acadêmicos até meados do século 20.
A partir de Bacon e Descartes, passando por Galileo (1564-1642) e pela física
de Newton (1642-1727), forma-se a corrente teórico-metodológica do empirismo
lógico, derivado da combinação de ideias empiristas com o uso da lógica
racionalista, realizada pelos pesquisadores da escola anglo-americana, que,
segundo Mazzotti e Gewandsznajder (1998), privilegia o método dedutivo. As
vertentes metodológicas racionalista e empirista, aplicadas às ciências naturais,
invadem as ciências humanas por meio do positivismo de Augusto Comte (1786-
1873), para quem a ciência é o parâmetro de todo o conhecimento. Segundo Santos
(2000, p. 28) o paradigma moderno "pressupõe uma única forma de conhecimento
válido, o conhecimento científico", validade esta que se assenta na primazia da
objetividade e prescreve métodos que garantam essa objetividade pelo rigor de suas
normas metodológicas, priorizando dados mensuráveis que são analisados por uma
lógica matemática que exclui o pesquisador como sujeito do conhecimento e
despreza os aspectos qualitativos dos fatos.
Para o positivismo, a lógica e a matemática seriam válidas porque
estabelecem as regras da linguagem, constituindo-se em um conhecimento a priori,
ou seja, independente da experiência. Para a vertente empirista, o conhecimento
factual ou empírico deveria ser obtido a partir da observação. O positivismo lógico
recuperou alguns aspectos do pensamento cartesiano, imprimindo à ciência um
caráter essencialmente racionalista e lógico que dominou o método científico
moderno a partir do século 17. A ciência, como uma forma de conhecimento que
"não somente pretende apropriar-se do real para explicá-lo de modo racional e
objetivo, mas procura estabelecer entre os fenômenos observados relações
universais e necessárias" (JAPIASSU; MARCONDES, 2001, p. 43) de causa e efeito
com a finalidade principal de previsão de resultados, adota um método baseado em
procedimentos experimentais que permitem pelos efeitos (resultados), deduzir as
causas.
50
Nessa concepção de ciência, o método experimental é o legado da síntese
entre Descartes, Bacon e Kant (PENNA, 2005), cujas características principais são:
objetividade, previsibilidade, fidedignidade e validade alcançadas pelo pensamento
dedutivo. Trata-se, por um lado, de aceitar a proposta kantiana de um conhecimento
resultante da experiência, mas, por outro lado, de manter a tônica cartesiana de um
conhecimento produzido racionalmente, baseado no pensamento lógico em que o
rigor é alcançado pela máxima objetividade do pesquisador. O empirismo lógico
enfatiza o método experimental, em que a observação e a distinção ascética entre
sujeito e objeto é primordial para que o método científico cumpra seu papel de
promotor de conhecimento sério e confiável. Segundo (JAPIASSU; MARCONDES,
2001), o método hipotético-dedutivo é considerado científico na medida em que
constrói uma teoria a partir de hipóteses das quais os resultados podem ser
deduzidos. Este método contempla os requisitos de previsibilidade e generalidade,
pois, além de fidedigno, fornece garantia de alcançar um conhecimento seguro e
verdadeiro.
O método indutivo, segundo o qual uma lei geral é estabelecida a partir da
observação e pela regularidade das repetições, na concepção moderna de ciência,
pode ser aplicado em casos particulares, uma vez que não garante o
estabelecimento de verdades, mas apenas de probabilidades. A observação e a
experimentação são seus aspectos mais importantes para o alcance de níveis
maiores de confiabilidade e previsibilidade em termos de probabilidade. Tanto o
método dedutivo como o método indutivo são criticados por Popper, que propõe a
refutação como principal objetivo da ciência, o que não altera significativamente o
método científico em si, mas abre espaço para as discussões sobre método, que
ganham grande impulso no século 20 e resultam na formulação dos métodos
qualitativos de pesquisa científica.
Morin (2008) reconhece que são inquestionáveis os progressos
extraordinários que a ciência realizou a partir do século 17 até o século 20, os quais
são evidentes na vida cotidiana contemporânea, mas critica o método experimental
fundamento da ciência durante muito tempo ao avaliar que mesmo este, ao mesmo
tempo que
serviu para alimentar os progressos do conhecimento, provocou o
desenvolvimento da manipulação, ou seja, das disposições destinadas à
51
experimentação, e essa manipulação, de subproduto da Ciência, pôde
tornar-se o produto principal no universo das aplicações técnicas, onde,
finalmente se experimenta para manipular (em vez de manipular para
experimentar) (p. 101).
O autor conclui que o conhecimento científico é tragicamente ambivalente,
pois na busca de certezas alcança incertezas. O progresso da ciência revela assim o
progresso da incerteza num movimento progressivo e regressivo incessante.
Segundo França, Vasconcellos e Borges (1992), atualmente, é importante
distinguir metodologia de método. Método é a justificativa para o tipo de
procedimento (quantitativo ou qualitativo) empregado na pesquisa, a teoria do
método; ao passo que metodologia é o conjunto de procedimentos empregado na
realização do estudo. A distinção entre os termos método e metodologia, apesar de
se mostrar relevante, tem se apresentado de forma bastante ambígua e ambivalente,
levando a um uso, às vezes, indiscriminado dos termos e, outras vezes,
considerados sinônimos. Sinteticamente é útil e didático assumir que metodologia
refere-se ao estudo do método (científico). Discussões e avaliações sobre método
em ciência (metodologia científica), embora sempre tenham sido feitas, intensificam-
se durante o século 20, quando a concepção de ciência, vigente na modernidade
(paradigma positivista ou empírico-Iógico), e seu método (experimental-dedutivo)
passam a ser mais insistentemente questionados, principalmente pelas ciências
humanas. Deste questionamento resulta uma diversidade de metodologias, ou seja,
estudos e propostas de métodos científicos, uma vez que a acepção do termo
ciência também se diversifica, passando a admitir várias concepções de produção
de conhecimento, o que dá origem a 'epistemologias' e 'métodos' diversos.
Para que se tenha um entendimento mais amplo e profundo das
transformações operadas na concepção de ciência na atualidade e suas implicações
no método científico, faz-se necessária a compreensão do conceito de paradigma
proposto por Thomas Kuhn ([1970] 2001).
5.2 Sobre Paradigma
Paradigma, originalmente, significa modelo ou exemplo (ABBAGANO, 1999).
52
Esse termo foi usado por Platão no primeiro sentido, e por Aristóteles, no segundo.
Para Platão as formas ou ideias são paradigmas, ou seja, "arquétipos, modelos
perfeitos, eternos e imutáveis dos objetos existentes no mundo natural que são
cópias desses modelos" (JAPIASSU; MARCONDES, 2001).
O termo paradigma começa a ser divulgado na ciência contemporânea a
partir do livro de Thomas Kuhn (2001), A Estrutura das Revoluções Científicas,
publicado em 1962 e revisto pelo autor em 1970, quando passa a ser utilizado por
diversos autores, ganhando crescente penetração na filosofia das ciências.
Atualmente o uso deste termo cobre uma grande variedade de sentidos, às vezes
contraditórios, mas também resultantes da reflexão crítica de autores
contemporâneos.
Torna-se, portanto, oportuna uma retrospectiva sobre o termo e o
esclarecimento sobre o sentido com que o conceito de paradigma será utilizado no
presente estudo.
Para Kuhn ([1970] 2001), "um paradigma é aquilo que os membros de uma
comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em
indivíduos que partilham um paradigma" (p. 219). Embora esta definição, à primeira
vista, pareça circular, ela expressa com propriedade a proposta do autor, que
ressalta a relação de reciprocidade entre conhecimento científico e comunidade
científica.
Segundo Mazzotti e Gewadsznajder (1998), a proposta de Thomas Kuhn
considera que a "pesquisa científica é orientada não apenas por teorias, no sentido
tradicional deste termo (conjunto de leis e conceitos), mas por algo mais amplo, o
paradigma, que constituiria uma 'teoria ampliada'" (p. 24). A noção de 'teoria
ampliada', na definição kuhniana de paradigma envolve vários elementos: uma
matriz disciplinar que compreende 'generalizações simbólicas' que constituem leis e
definições conceituais; compromissos coletivos com crenças e valores; coerência
interna e exemplos compartilhados (exemplares), que são as soluções concretas dos
problemas. Tais fatores resultam num corpo de conhecimento amplo – paradigma –
que norteia o cientista em suas investigações (Kuhn, [1970] 2001).
Devido às violentas críticas que o termo paradigma recebeu por parte da
53
comunidade científica, em 1969, Kuhn retoma o texto de 1962 e acrescenta um
pósfacio com o objetivo de elucidar as dúvidas e polêmicas que o termo suscitara.
Inicialmente Kuhn havia proposto o conceito de matriz disciplinar, cujos
componentes eram: generalizações simbólicas (leis ou definições), compromisso
coletivo (modelo), valores e exemplares (exemplos partilhados). Em seguida ele
enfatiza o papel dos exemplares e amplia seu significado, afirmando que "alguns
exemplos (exemplares) que incluem, ao mesmo tempo, lei, teoria, aplicação e
instrumentação, proporcionam modelos dos quais surgem as tradições coerentes e
específicas de pesquisa científica" (KUHN [1970] 2001, p. 30). Em sua revisão, no
entanto, Kuhn propõe duas acepções distintas para a noção de paradigma: 'matriz
disciplinar' como sinônimo aproximado de teoria ampliada, e 'exemplares', como as
"soluções concretas de problemas que os estudantes encontram desde o início de
sua educação e formação" e que funcionam como visão de mundo, praticada e
vivida, determinando que tipo de ideias são válidas; que tipo de questões são
pertinentes; que tipo de procedimentos devem ser aplicados para a solução de
problemas; e chega a propor que o termo paradigma seja substituído pelo termo
'exemplares'. Curiosamente a noção de "exemplares" foi praticamente abolida da
literatura da Filosofia das Ciências, e a noção de paradigma, apesar de criticada no
início, foi adotada e discutida, sendo amplamente aceita atualmente.
A ideia básica de paradigma, para Thomas Kuhn ([1970] 2001), é de um
conjunto de crenças, valores e concepções que, como um todo, rege e orienta uma
dada comunidade e é aceito tacitamente em suas ações e intervenções no mundo. A
noção de compartilhamento e compromisso é central na ideia kuhniana de
paradigma. Ao compartilhar concepções, valores e modos de resolver problemas, a
comunidade forma um paradigma, e automaticamente está sob a égide de um
paradigma que determinaria até mesmo a forma como um fenômeno é percebido
pelos cientistas.
Os períodos de revolução científica são caracterizados por mudanças de
paradigmas, quando novos fenômenos são descobertos, conhecimentos antigos
são abandonados e há uma mudança radical na prática científica e na 'visão de
mundo' do cientista. Embora o mundo não mude com a mudança de paradigma,
depois dela "os cientistas passam a trabalhar em um mundo diferente" (KUHN,
54
[1970] 2001, p. 171).
Segundo Japiassu e Marcondes (2001), atualmente, o termo paradigma é
utilizado no sentido de modelo teórico, abarcando um corpo de conhecimentos, ao
mesmo tempo abrangente e consistente, que envolve "lei, teoria, aplicação e
instrumentação" (p. 206), coincidindo com Denzin e Lincoln (1998), para quem a
noção de paradigma envolve três elementos fundamentais – ontologia,
epistemologia e metodologia – que devem estar articulados e entrelaçados de forma
consistente e coerente.
Bateson (1972) define paradigma como "uma rede de premissas
epistemológicas e ontológicas que – a despeito de sua veracidade ou falsidade
última – tornam-se auto-validadas" (p.314) e configuram procedimentos
metodológicos compatíveis.
Vasconcellos (2005, p. 34), citando Morin, "considera que os paradigmas são
princípios 'supralógicos' de organização do pensamento, princípios ocultos que
governam nossa visão de mundo, que controlam a lógica de nossos discursos, que
comandam nossa seleção de dados significativos e nossa recusa dos não -
significativos, sem que tenhamos consciência disso".
Figueiredo (1989) utiliza a expressão 'matrizes do pensamento psicológico'
para discutir "os modelos de inteligibilidade e os interesses expressos nas várias
posições teóricas e metodológicas geradores [...] de escolas e 'seitas' psicológicas"
(p.11), cada uma delas representando um conjunto cultural de caráter científico ou
não, que, de alguma forma, originaram-se de um cânone científico ou cultural,
legitimando-o, ou que influenciaram a formação de um novo cânone cultural ou
científico.
Nesse sentido, a noção de paradigma, às vezes, equivale a um modelo
teórico amplo, incluindo metodologia e aplicação prática, outras vezes, refere-se a
uma mentalidade, cânone cultural ou, ainda, 'espírito de época', sendo utilizado tanto
no âmbito da ciência como em sentido laico. Seu compartilhamento pode abranger
desde grandes comunidades até pequenos grupos, e também se refere a
concepções e formas de agir, mais ou menos conscientes, embora uma certa porção
de consciência seja indispensável para que o paradigma se estabeleça. Suas raízes,
55
no entanto, de acordo com Kuhn ([1970] 2001), não são necessariamente racionais.
A efetividade de um paradigma se revela na capacidade desse corpo de
conhecimentos se mostrar útil ou apropriado para a solução de problemas.
Para Tarnas (2001), o conceito kuhniano de paradigma representa uma das
características principais do pensamento pós-moderno, "refletindo uma consciência
crítica da natureza essencialmente interpretativa da cultura" (p. 424) contemporânea,
que não se satisfaz mais com a simples constatação dos fatos, mas deseja
compreendê-los e interpretá-los criticamente.
Considerando-se que as mudanças de paradigma são raras e se processam
lentamente (KUHN, [1970] 2001), pode-se supor que as descobertas científicas e
novas epistemologias que eclodem no início do século 20 têm suas raízes nos
séculos precedentes. Dentre elas, o surgimento da Psicologia Profunda, que deu
origem à psicanálise em 1900 e à psicologia analítica em 1914, pode representar um
período de 'revolução científica' que implicou numa mudança de paradigma.
Os paradigmas científicos traduzem uma 'mentalidade científica', que inclui
aspectos ontológicos e epistemológicos, os quais encaminham métodos e
estratégias de investigação científica. A comunidade que o compartilha, em primeira
instância, é uma comunidade de cientistas, no entanto, a efetividade deste
paradigma tende a transpor as fronteiras do mundo científico e impregnar a cultura.
De acordo com (PIERI, 2002), na psicologia junguiana, o paradigma centrista
e determinista cede lugar ao paradigma da complexidade e diversidade dinâmica. O
paradigma junguiano faz parte dos, assim chamados, ‘paradigmas qualitativos’, por
sua ênfase no aspecto compreensivo e interpretativo dos fenômenos. Sua
característica mais distintiva é, no entanto, seu caráter simbólico arquetípico, como
discutido em Penna (2003). Por paradigma junguiano entende-se o corpo de
conhecimentos propostos por C.G. Jung, ampliado e atualizado pelos pós-
junguianos, e sua aplicação prática (clínica e pesquisa). Esse corpo consiste em
concepções ontológicas, pressupostos epistemológicos e propostas metodológicas
articuladas num todo consistente e coerente que configura uma atitude perante o
mundo e o ser humano.
56
5.3 Pesquisa científica - a forma de produção do
conhecimento científico
Além de ser a mais recente aquisição humana, a ciência é, atualmente,
considerada a mais sofisticada e confiável forma de produção de conhecimento. A
produção de conhecimento científico se realiza por meio da pesquisa científica, cujos
fins subjacentes, de acordo com Chizzotti (2003), são: transformar o mundo, criar
objetos e concepções, encontrar explicações e avançar previsões, trabalhar a
natureza e elaborar as suas ações e ideias.
De acordo com Sampieri, Collado e Lucio (2006), o que distingue uma
pesquisa científica de qualquer outro tipo de pesquisa é o método pelo qual ela é
conduzida. Assim sendo o que vai definir um conhecimento como científico é o seu
método de produção, em geral mais organizado e cuidadosamente delineado além
de bem explicitado do que nas investigações não científicas. Como salienta Kerlinger
(2002), isso se aplica tanto aos estudos quantitativos, qualitativos como mistos.
Sampieri, Collado e Lucio (2006), afirmam que a pesquisa científica é
sistemática, empírica e crítica. O aspecto sistemático implica disciplina, organização
dos fatos que assim "não são deixados à casualidade" (p. XX). Quanto ao ser
empírica, Sampieri, Collado e Lucio (p. XX) falam de "dados coletados e analisados",
e ser crítica significa que está sendo avaliada e melhorada constantemente,
podendo ser mais ou menos controlada, mais ou menos flexível ou aberta, mais ou
menos estruturada, mas nunca caótica e sem método.
Para Chizzotti (2003), a pesquisa investiga o mundo em que o homem vive e
o próprio homem transformando os horizontes de sua vida. Nesta atividade, o
investigador recorre à observação e à reflexão que faz sobre problemas que
enfrenta e à experiência passada e atual dos homens na solução destes problemas,
munindo-se dos instrumentos e técnicas mais adequados à sua ação, a fim de
intervir no seu mundo com a intenção de construí-lo adequadamente à sua vida.
Para Kuhn ([1970] 2001), a 'ciência normal' é constituída pelas realizações
"reconhecidas durante algum tempo por alguma comunidade científica" (p. 29), as
quais servem como indicadores tanto dos problemas de pesquisa como dos
"métodos legítimos de um campo de pesquisa" (p. 30). Dessa forma a 'ciência
57
normal', equivalente à concepção de ciência vigente desde Descartes até meados
do século 20, elabora uma teoria a partir da estruturação de preceitos, noções
fundamentais que funcionam como postulados básicos, que prescrevem os
procedimentos de pesquisa dominantes em uma comunidade científica, isto é,
formula um método de pesquisa condizente. Da mesma forma Chizzotti (2003)
comenta que o paradigma dominante numa dada comunidade científica condiciona o
modo como as pesquisas são conduzidas, envolvendo uma concepção de ciência
que estabelece os critérios de definição e de formulação de um problema a ser
pesquisado, implicando numa abordagem metodológica condizente que indica ou
mesmo determina também a forma de apreensão dos dados e sua compreensão.
Ainda com o propósito de contextualizar o tema deste estudo, é importante
ressaltar que os debates e questionamentos em relação ao método científico de
pesquisa, tradicionalmente utilizado pela ciência moderna, foram encabeçados por
pensadores ligados às ciências humanas, embora alguns cientistas filiados às assim
chamadas ciências naturais tenham contribuído com críticas e reflexões importantes
como foi o caso de Heisenberg e Bohr, quanto à relatividade e incerteza do
conhecimento (PENNA, 2005) na física quântica. Estes questionamentos resultaram
numa nova concepção de ciência o que, por sua vez, levou à formulação dos assim
chamados métodos qualitativos de pesquisa. De acordo com Sampieri, Collado e
Lucio (2006), atualmente a pesquisa científica pode ser conduzida baseada em três
principais enfoques metodológicos, a saber: o enfoque quantitativo, o enfoque
qualitativo e o enfoque integrado, 'multimodal' ou misto.
5.4 Enfoques metodológicos de pesquisa
Para Sampieri, Collado e Lucio (2006), o enfoque metodológico de uma
pesquisa modula a maior ou menor flexibilidade do método, o nível de controle sobre
as condições de apreensão e análise do material e o grau de estruturação do projeto
de pesquisa como um todo. No entanto em qualquer modalidade de pesquisa o
método é importante e deve ser claramente explicitado pelo pesquisador.
Desde a segunda metade do século 20 as correntes teórico-metodológicas
foram polarizadas em dois enfoques metodológicos principais: enfoque quantitativo e
enfoque qualitativo da pesquisa.
58
Mais relevante do que discutir a maior ou menor validade de uma forma de
abordagem ou de outra é analisar em que contexto emerge a metodologia qualitativa
de pesquisa e com isso compreender seu significado e sua aplicabilidade no modelo
de pesquisa junguiana, assunto sobre o qual este estudo pretende se debruçar.
5.4.1 Enfoque metodológico quantitativo
O enfoque metodológico quantitativo está alinhado com a concepção
moderna de ciência alicerçada no modelo cartesiano e positivista, que pretende
produzir um conhecimento verdadeiro, confiável, generalizável e preditivo, livre de
erro e objetivo.
O método experimental constitui-se o 'método-padrão' das pesquisas
científicas na modernidade e vigorou de forma praticamente absoluta até a segunda
metade do século 20 (CHIZZOTTI, 2003). As pesquisas conduzidas pelo método
experimental são designadas 'científicas', reafirmando a posição positivista que só
reconhece como válido o conhecimento resultante de experimentações
comprovadas por padrões mensuráveis de aferição, tanto em relação à coleta
quanto à análise dos dados, que são avaliados por dedução matemática. O modelo
de pesquisa experimental privilegia a verificação e controle das variáveis implicadas
por meio do uso de técnicas sofisticadas de medida dos dados, fatos ou fenômenos,
e alcançou grande prestígio na comunidade científica, tornando-se o modelo
dominante de pesquisa científica. A sofisticação dos instrumentos de coleta e análise
de dados utilizados no enfoque quantitativo de pesquisa é justificada pelos seus
objetivos e é condizente com uma concepção de ciência definida como promotora de
um conhecimento verdadeiro e definitivo.
Originário nas ciências naturais, o enfoque metodológico quantitativo foi
adotado nas ciências humanas a partir do século 18 por Augusto Comte (1798-
1854), e Émile Durkheim (1858-1917) que propõem a aplicação do mesmo método
científico (experimental), utilizado com considerável êxito nas ciências naturais, ao
estudo dos fenômenos sociais, por considerarem que todas as coisas ou fenômenos
podem ser medidos (SAMPIERI; COLLADO; LUCIO, 2006). O positivismo lógico
também denominado empirismo lógico, como foi visto anteriormente, constitui-se
num enfoque metodológico adotado pela ciência moderna, sendo caracterizado
59
pelos assim chamados métodos quantitativos de pesquisa.
Segundo Sampieri, Collado e Lucio (2006), o enfoque quantitativo
fundamenta- se no método hipotético-dedutivo, do qual, a partir das teorias, são
derivadas hipóteses, que são submetidas a prova pela utilização de modelos de
pesquisa apropriados. Se os resultados obtidos forem condizentes com as hipóteses
inicialmente colocadas, estas são confirmadas pelas evidencias em seu favor. Se,
por outro lado, os resultados refutarem tais hipóteses, tanto os resultados como as
hipóteses podem ser descartados, para que se busquem melhores explicações ou
reavaliação das hipóteses. Como se pode observar, este procedimento é condizente
com as diretrizes do método experimental, e aceita a utilização do método hipotético-
dedutivo e do método indutivo, além de ter incorporado a proposta de refutabilidade
de Popper.
De acordo com Chizzotti (2003), no método experimental os fatos são
captados em condições experimentais rigorosamente controladas, e sua análise
consiste em medidas de frequência e constância de incidência coerentes com as
regras lógicas aplicadas tanto na coleta como na análise dos dados, sendo
considerados científicos, neste enfoque, "somente os conhecimentos passíveis de
apreensão em condições de controle legitimados pela experimentação e
comprovados pela mensuração" (p. 25). Com isso são alcançadas as metas de
confiabilidade, validade e generalização, aspectos fundamentais dessa concepção
de ciência e consequentemente objetivo desse enfoque metodológico.
No enfoque quantitativo há regras claramente colocadas tanto em relação à
coleta como à análise do material, as quais se apoiam nas leis determinadas pela
teoria. De acordo com Sampieri, Collado e Lucio (2006), "se essas regras são
seguidas cuidadosamente os dados gerados possuem os padrões de validade e
confiabilidade, e as conclusões obtidas serão válidas, ou seja, há possibilidade de
serem contestadas ou replicadas com a finalidade de construir conhecimento"
(p. 10).
Tanto Sampieri, Collado e Lucio (2006) como Chizzotti (2003) ressaltam o
controle como uma característica que permeia e enfoque quantitativo e seu método
experimental. São controladas as condições de seleção e coleta de dados, a análise
60
dos fatos, as deduções possíveis e também a atividade do pesquisador. A coleta é
conduzida com observação de critérios rigorosos de assepsia para evitar vieses que
possam acarretar a interferência de variáveis estranhas ao objetivo da pesquisa,
dentre as quais destaca-se a influência de possíveis aspectos subjetivos do
pesquisador. Dessa forma, no enfoque quantitativo há menor flexibilidade ou
autonomia do pesquisador. A análise do material coletado consiste na mensuração
dos dados a partir da organização das variáveis em categorias de análise; as
medições obtidas são analisadas frequentemente por métodos estatísticos, e é
estabelecida uma série de conclusões a respeito das hipóteses inicialmente
levantadas. No caso das ciências sociais e do comportamento humano, de acordo
com Sampieril, Collado e Lucio (2006), seguindo essas diretrizes metodológicas é
possível estabelecer com exatidão os padrões de comportamento de uma
população.
Denzin e Lincoln (1998) afirmam que no modelo positivista o plano de
pesquisa consiste de uma proposta de etapas e fases previamente definida, em que
uma questão é colocada e um conjunto de hipóteses é levantado, sendo
estabelecidas, a partir disso, estratégias de coleta, em geral por amostragem, e
procedimentos de análise que são previamente especificados. "Os projetos
positivistas tentam antecipar todos os problemas que possam surgir num estudo
qualitativo" (p. XII). Embora esse autor admita a aplicação do modelo positivista à
pesquisa qualitativa, ele foi originalmente pensado e aplicado à pesquisa
quantitativa, pois o paradigma científico positivista reconhecia como ciência o
conhecimento produzido, exclusivamente, por meio do método quantitativo. No
entanto observa-se a utilização do paradigma positivista em pesquisas de tipo
qualitativo, na verdade, essas tentativas faziam uso tanto da mensuração ou
quantificação dos dados e na análise era feita uma avaliação qualitativa, buscando
com isso alcançar uma compreensão dos fenômenos para além da simples
quantificação descritiva.
Em função de sua ênfase na quantificação, constatação e mensuração dos
fenômenos, de acordo com Sampieri, Collado e Lucio (2006), na análise do material,
no enfoque quantitativo, observa-se uma humildade por parte do pesquisador, que
deixa tudo sem conclusão para evitar a interpretação e incentivar novas pesquisas, a
fim de que o conhecimento possa prosseguir rumo a melhores e mais amplas e/ou
61
confiáveis informações, para tal todos os métodos e os procedimentos são
colocados à disposição de outros pesquisadores.
Há um certo consenso entre os autores sobre a maior adequação do enfoque
metodológico quantitativo para as ciências chamadas 'exatas' ou naturais
3
. Nas
ciências humanas os pesquisadores que adotaram esse enfoque metodológico
pretendiam expandir os estudos sociais para além do que se consideravam
abordagens meramente especulativas.
As pesquisas conduzidas pelo enfoque quantitativo permitem uma descrição
acurada dos fenômenos assim como sua classificação em categorias de acordo com
sua incidência na população pesquisada. São, portanto, bons meios para fazer
levantamentos e mapeamentos de fenômenos em uma dada população. Nas
ciências da saúde, por exemplo, as pesquisas quantitativas são bastante úteis para
estudos epidemiológicos; nas ciências sociais, este enfoque é produtivo para
levantamento de níveis de incidência de determinado fenômeno num dado contexto.
Sua aplicação à Psicologia será analisada e discutida mais adiante.
5.4.2 Enfoque metodológico qualitativo
O enfoque qualitativo, comumente denominado metodologia qualitativa de
pesquisa ou apenas pesquisa qualitativa, de acordo com Chizzotti (2003), abriga
diversas tendências oriundas de pressupostos filosóficos distintos. A principal
característica do método qualitativo é o fato de associar-se à tradição compreensiva
e interpretativa. Este é também o traço principal da Psiquiatria Dinâmica que está na
origem da Psicologia Profunda.
No início do século 20, controvérsias metodológicas entre adeptos dos
modelos explicativos das ciências naturais aplicados às ciências humanas e uma
vertente que buscava novas possibilidades de compreensão dos fenômenos mais
adequada às ciências humanas dão origem às primeiras propostas do que viria a se
constituir nos métodos qualitativos em ciência. Dilthey (1833-1911) e Weber (1864-
1920) advogam em favor da apreensão e 'compreensão' ou 'entendimento',
3
Para maiores informações sobre o tema, ver: Chizzotti (2003), Denzin & Lincoln (1998), Figueiredo
(1989), Sampieri, Collado e Lucio (2006).
62
versteben, dos significados, reconhecendo que, além da descrição e da medição de
variáveis, devem ser considerados também seus significados subjetivos e o contexto
no qual o fenômeno ocorre. Weber propõe um método híbrido, em que os estudos
não devem ser compostos unicamente de variáveis macrossociais, mas também de
instâncias individuais. Bérgson (1859-1941) defende a intuição como meio de se
conhecer a realidade vivida. Uma ponte nova começa a ser construída no caminho
do conhecimento entre o enfoque quantitativo e o enfoque qualitativo, tentando
amenizar e flexibilizar os procedimentos metodológicos tradicionais exclusivamente
quantitativos a fim de abarcar também a dimensão compreensiva na produção
científica de conhecimento. Na medida em que a compreensão dos significados e
circunstâncias dos fenômenos implica sua avaliação e não apenas sua descrição,
isso necessariamente envolve questões de subjetividade que geraram grandes
controvérsias em relação aos métodos qualitativos de pesquisa.
As primeiras tentativas nessa direção datam do século 18, quando Kant
propõe uma epistemologia com base nas relações dialéticas, rompendo com a
tradição cartesiana baseada na razão lógica. Em Kant encontram-se as primeiras
tentativas de relativização dos métodos científicos de caráter racional, empírico e
lógico. Vários movimentos filosóficos se sucedem nesta direção, desde Kant até os
dias atuais. No entanto a ciência ocidental permaneceu fiel à tradição cartesiana,
positivista e tecnicista enquanto a filosofia e a arte aderiram às vertentes
epistemológicas neokantianas e românticas.
A fenomenologia e a tradição dialética estão na base de diversas teorias nas
ciências humanas e exerceram forte influência na formulação de métodos
qualitativos de pesquisa.
Os métodos qualitativos de pesquisa propõem uma abordagem compreensiva
e interpretativa dos fenômenos, buscando seus significados e finalidades. A maioria
dos autores dessa abordagem considera que toda pesquisa é interpretativa, guiada
por um conjunto de crenças e sentimentos sobre o mundo que norteia o modo como
os fenômenos devem ser investigados e compreendidos na ciência. (GUBA, 1990,
LINCOLN; GUGA, 1985, DENZIN; LINCOLN, 1998a).
A partir da segunda metade do século 20, em consequência do
63
questionamento dos padrões tradicionais de produção de conhecimento científico e
da própria concepção de ciência, começam a se delinear propostas metodológicas
essencialmente qualitativas. Nesse panorama científico observa-se, então, uma
espécie de dois mundos separados e isolados quanto aos métodos de pesquisa –
quantitativos e qualitativos – sem que seja possível diálogo entre ambos.
A articulação dessas transformações, nos paradigmas científicos, surge
principalmente nas ciências humanas, pois segundo Denzin e Lincoln (1998), "o
comportamento humano, diferentemente dos objetos físicos, não pode ser
compreendido sem referência aos significados e propósitos atribuídos pelos
humanos às suas atividades" (p. 107).
Se o pressuposto do paradigma experimental defende um padrão único de
pesquisa para todas as ciências, na abordagem qualitativa, por outro lado, o método
deve estar alinhado às especificidades de cada área de conhecimento, portanto, o
enfoque qualitativo abriga diversas tendências e pressupostos com raízes filosóficas
distintas. Dessa forma, cada paradigma interpretativo faz exigências particulares ao
pesquisador, desde as questões que são formuladas até as interpretações que são
feitas a partir delas. Portanto é essencial a consistência entre a metodologia e as
premissas ontológicas e epistemológicas do paradigma.
Somente a partir da década de 1970 a pesquisa qualitativa começa a ser
definida e realmente praticada, devendo aqui ser ressaltada a contribuição
importante da publicação da 2ª edição do livro de Thomas Kuhn A estrutura das
revoluções científicas. Segundo Denzin e Lincoln (1998), por mais de duas décadas
uma revolução metodológica foi se dando nas ciências sociais em direção a uma
abordagem interpretativa e qualitativa dos fenômenos.
A palavra qualitativa implica uma ênfase em processos e significados que
não são rigorosamente examinados ou medidos (se medidos), em termos
de quantidade, intensidade ou freqüência. Pesquisadores qualitativos
enfatizam a relação íntima entre o pesquisador e o que é estudado, e os
limites situacionais da investigação. Eles buscam respostas para questões
que enfatizam como a experiência é criada e significada. Em contraste,
estudos quantitativos enfatizam a medida e análise de relações causais
entre variáveis e não os processos. (DENZIN; LINCOLN, 1998a, p.8).
Esta metodologia baseia-se numa perspectiva epistemológica em que o
conhecimento resulta de processos dinâmicos que fluem dialeticamente. Do princípio
64
da relatividade, da complementaridade e da incerteza deriva uma concepção de
verdade relativa e temporária. Do ponto de vista metodológico, os fenômenos são
considerados em função do contexto em que são investigados, do seu significado e
valor tanto individual como social; tanto a objetividade quanto a subjetividade são
consideradas, sendo que a intersubjetividade se configura como a melhor posição
possível do pesquisador diante do conhecimento e de seu objeto de investigação.
A abordagem qualitativa, em geral, opõe-se ao modelo experimental que
defende um método unificado de pesquisa, independente do objeto de pesquisa e de
seus objetivos, assim como a área do conhecimento envolvida. O enfoque qualitativo
com frequência está baseado em métodos de coleta de dados sem medição
numérica, privilegiando a observação como modo básico de apreensão dos
fenômenos.
O processo de pesquisa baseado no enfoque qualitativo, segundo Sampieri,
Collado e Lucio (2006), é mais flexível e se move entre os eventos e sua
interpretação, entre as respostas e o desenvolvimento da teoria com a finalidade de
'reconstruir' a realidade. Muitas vezes é chamado 'holístico', porque considera o
todo, sem reduzi-lo ao estudo das partes.
Em razão do intenso e recente desenvolvimento da pesquisa qualitativa,
observa-se uma proliferação de propostas metodológicas nesse campo. Guba
(1990) adverte que algumas dessas podem ser assumidas em princípio; outras são
altamente problemáticas e controvertidas. Denzin e Lincoln (1998b) comenta sobre o
researher-as-bricoleur-teorist’’
4
que trabalha em meio a paradigmas ou perspectivas
rivais justapostas, para quem as teorias tem um papel secundário ou até irrelevante.
Sob o título de pesquisa qualitativa, uma imensa variedade de procedimentos e
instrumentos pode ser articulada, às vezes, de uma forma precipitada ou grosseira,
quase aleatória, sem que seja necessária uma justificativa teórica ou metodológica
mais acurada. Assim, é importante que o pesquisador esteja ciente de que cada
paradigma interpretativo faz exigências particulares ao pesquisador, incluindo as
4
A tradução aproximada para esse neologismo poderia ser ‘pesquisador-teorizador itinerante’ ou
‘pesquisador-teórico de improviso’. O termo ‘Bricolage’ admite a tradução em português para ‘colagem’ ou
‘colcha de retalhos’.
65
questões que são formuladas e as interpretações que são feitas a partir delas.
Portanto é essencial a consistência entre a metodologia e as premissas ontológicas
e epistemológicas.
De acordo com o acima exposto, torna-se bastante arriscado conduzir
pesquisas sem uma base teórica definida, principalmente na psicologia, área em que
toda atuação pressupõe uma concepção de mundo e de homem; um contexto em
que o fenômeno acontece; e exige fundamentos epistemológicos sobre construção e
aquisição de conhecimento. Figueiredo (1989, p. 20) sustenta que a psicologia "que
nasce no bojo das tentativas de fundamentação de outras ciências" é caracterizada
desde seus primórdios pela diversidade expressa na variedade de suas posições
teóricas e metodológicas.
Diante do amplo e variado panorama que se descortina para a pesquisa
qualitativa e para a psicologia, a opção pelo enfoque metodológico qualitativo exige
do pesquisador coerência e consistência epistemológicas, envolvimento pessoal
com a investigação e, sobretudo, uma atitude crítica e ética perante o conhecimento
e às comunidades social e científica a que pertence. A produção de conhecimento
científico, no contexto da pesquisa qualitativa, busca não apenas a descrição dos
fenômenos, mas principalmente, a compreensão e interpretação da realidade
pesquisada.
Ao abranger tendências teóricas e práticas diversas e pressupostos filosóficos
distintos a pesquisa qualitativa requer rigorosa fundamentação teórica, explicitação
clara dos objetivos e delimitação do contexto de coleta e análise do material, pois a
falta de uma fundamentação consistente pode resultar em oposição gratuita e
infundada à mensuração e levar a uma rejeição elementar dos fundamentos e
métodos de validação dos conhecimentos sob uma alegação ingênua de maior
flexibilidade que permite uma produção mais criativa ou até crítica.
Os métodos de pesquisa qualitativa vêm alcançando crescente penetração
nos meios universitários, sobretudo nas ciências humanas. Contribuíram, para isso,
os questionamentos e discussões sobre a concepção de ciência e sua adequação
aos diferentes campos de conhecimento, além das inovações trazidas à pesquisa
pelas ciências sociais, em geral, e também o fato de alguns pesquisadores, com
66
longa tradição em pesquisa naturalista, terem transigido em seus modelos
tradicionais em favor de uma abordagem mais ampla de pesquisa.
Ambos os enfoques podem ser considerados bastante valiosos tendo
fornecido contribuições notáveis ao avanço do conhecimento. Nenhum é
intrinsecamente melhor que o outro, são apenas diferentes em relação ao estudo de
um fenômeno. Na opinião de Sampieri, Collado e Lucio (2006), a controvérsia entre
as duas visões tem sido desnecessária e não está isenta de dogmatismo.
São enfoques complementares e podem enriquecer a pesquisa quando
utilizados em conjunto, ou seja, cada um exerce uma função específica para o
conhecimento de um fenômeno e o alcance de solução dos diversos problemas e
questionamentos colocados pela pesquisa.
O pesquisador deve ser metodologicamente plural guiar-se pelo contexto,
pela situação, pelos recursos de que dispõe, por seus objetivos e pelo problema de
estudo em questão.
5.4.3 Enfoque metodológico misto
Os métodos de pesquisa qualitativa conseguiram ampla difusão nos meios
universitários. Contribuíram para isso os questionamentos e discussões sobre a
concepção de ciência e sua adequação aos diferentes campos de conhecimento
além das inovações trazidas à pesquisa pelas ciências sociais, em geral, e também
o fato de alguns pesquisadores, com longa tradição em pesquisa naturalista, terem
transigido em seus modelos tradicionais em favor de uma abordagem mais ampla de
pesquisa.
Desde o surgimento das metodologias qualitativas até recentemente os
enfoques de pesquisa quantitativo e qualitativo foram considerados modos opostos e
inconciliáveis de se conduzir uma investigação. Hoje, no entanto é possível perceber
tentativas de aproximação e convergência entre os dois enfoques, denominada
como 'triangulação' por Denzin e Lincoln (1998a), quali-quanti por outros autores,
dentre eles Fernando Lefévre (2003), ou ainda enfoque integrado "multimodal",
segundo Sampieri, Collado e Lucio (2006), que ressalta que o pesquisador deve ser
metodologicamente plural e guiar-se pelo contexto, pela situação, pelos recursos de
67
que dispõe, por seus objetivos e pelo problema de estudo em questão. Desde já é
preciso ressaltar que a alternativa deste enfoque integrado é muito recente e os
resultados de pesquisas conduzidas dessa forma precisam ser mais avaliadas.
Embora Sampieri, Collado e Lucio (2006) denominem como 'puristas' aqueles
que defendem a assepsia entre os enfoques quantitativos e qualitativos, não se trata
propriamente de purismo, mas de discussão e avaliação crítica sobre os limites e
possibilidades de integração entre os enfoques, assim como de possíveis riscos a
serem considerados. Não se deve esquecer a premissa principal de que o método é
antes de tudo uma decorrência do modelo teórico adotado pelo pesquisador.
Sampieri, Collado e Lucio (2006) apresentam algumas formas de integração
dos dois enfoques, a saber: modelo de duas etapas; modelo de enfoque dominante
e modelo misto. No primeiro caso, em uma mesma pesquisa são aplicados ambos
os enfoques em fases distintas do processo. Em um dos exemplos citados pelo
autor, em uma primeira etapa foi realizado um estudo quantitativo e, em uma
segunda etapa, um estudo qualitativo baseado nos dados coletados por meio de
instrumentos apropriados para o enfoque quantitativo. Esses dados foram
devidamente analisados por meio de cálculos estatísticos e em uma segunda etapa,
com base no material da primeira etapa, foram selecionados aqueles a serem
investigados qualitativamente, por meio de instrumentos e procedimentos de análise
compatíveis. Em outro exemplo, a partir de entrevistas não estruturadas com um
número reduzido de participantes, foi elaborada uma escala aplicada à totalidade da
população em questão e os dados coletados foram tratados quantitativamente.
No modelo de enfoque dominante, o estudo é realizado dentro de um dos
enfoques, o qual prevalece, mas são utilizados elementos do outro enfoque. Por
exemplo, ao enfoque qualitativo inclui-se a aplicação de uma escala ou teste
padronizado para medir determinada variável. Ou inversamente, num estudo
basicamente quantitativo podem ser incluídas entrevistas abertas. O modelo misto,
segundo Sampieri, Collado e Lucio (2006), "representa o mais alto grau de
integração ou combinação entre os enfoques qualitativo e quantitativo" (p. 18),
envolvendo coleta de dados qualitativos e quantitativos que se sucedem e
reorientam as fases subsequentes de coleta e análise. Este modelo exige por parte
dos pesquisadores domínio completo sobre os dois enfoques e capacidade de
68
"pensamento dedutivo e indutivo" para a melhor condução do processo todo. Uma
outra forma de integração entre os dois enfoques é a realização de um estudo
qualitativo decorrente de outro estudo realizado pelo enfoque quantitativo, ou seja, a
partir dos resultados obtidos por uma pesquisa quantitativa pode ser feita uma
análise qualitativa desse material. Esta pode ser considerada uma variante do
modelo de duas etapas, as quais seriam realizadas por pesquisadores diferentes e
constituiriam duas pesquisas complementares.
No caso da pesquisa em psicologia analítica, a abordagem qualitativa é
predominante, uma vez que os pressupostos epistemológicos desta abordagem são
essencialmente de cunho compreensivo e interpretativo, desta forma o modelo de
enfoque dominante poderia ser utilizado desde que se procedesse a uma reflexão
cuidadosa por parte do pesquisador sobre os objetivos gerais e específicos da
pesquisa e as circunstâncias em que os instrumentos quantitativos, tanto de coleta
como de análise, são aplicáveis. É possível também a aplicação da abordagem
junguiana a dados previamente coletados e analisados quantitativamente.
Em qualquer um dos modelos de integração quali-quanti há que se ter claro
que o uso de elementos quantitativos não tem por finalidade conferir maior
confiabilidade ou veracidade aos dados, pois essa crença por si só elimina o uso do
enfoque qualitativo, uma vez que esta concepção de ciência é prerrogativa do
enfoque quantitativo. A integração dos dois enfoques deve ter como finalidade
básica a busca de maior abrangência e profundidade da pesquisa.
5.5 Método de investigação em psicologia
A partir da segunda metade do século 19, observa-se na Europa Central o
surgimento de uma preocupação crescente com os aspectos psicológicos em várias
áreas. Na medicina essa tendência vai se manifestar na psiquiatria dinâmica
(PENNA, 2003). Na fisiologia aparecem estudos que integram o aspecto psicológico
e o fisiológico, resultando na psicofisiologia. Na Filosofia o movimento romântico
enfatiza o aspecto psicológico do ser humano; o liberalismo ressalta a noção de
individualidade, e o positivismo, herdeiro do iluminismo, destaca a disciplina e o
racionalismo como determinantes do comportamento. Wertheimer (1972) afirma que
a Psicologia surgiu da confluência de dois grandes rios – da ciência e da filosofia.
69
Por não estar afinada com o método positivista, a psicologia, até meados do século
19, não era considerada ciência, mas um tipo de saber filosófico. Quando "os
psicólogos se convenceram de que também eles precisavam seguir o caminho
tomado pelos físicos, químicos e fisiólogos e transformar a psicologia em ciência
experimental" (WOODWORTH, 1965, p. 6), esta passa a adotar o método
experimental e adquire o estatuto de ciência.
A dupla filiação da Psicologia remonta também de acordo com Figueiredo
(1992), às 'duas revoluções individualistas' que surgem na Renascença e são a
gênese da modernidade: o movimento iluminista e o movimento romântico. O
primeiro enfatiza a igualdade de direitos e a supremacia da racionalidade como meio
de se exercer a liberdade individual e se volta para o estudo dos processos
cognitivos; seus objetos de estudo são reificados; metodologicamente observa-se
uma tentativa constante de assepsia entre sujeito e objeto e a decorrente
valorização da objetividade típica da pesquisa experimental. O movimento
romântico, por outro lado, enfatiza as diferenças qualitativas num individualismo
baseado nas singularidades, valorizando a experiência interior (afetos, sentimentos,
imaginação), em que sujeito e objeto se mesclam ou mesmo se confundem com
uma valorização inevitável da subjetividade. Os dois movimentos são representantes
das polaridades divididas na modernidade: corpo e espírito; razão e paixão; ciência
e religião. No iluminismo o caráter sublime e elevado do ser humano está sediado na
razão, e para os românticos sua sede é o coração.
Conforme Hilgard e Atkinson (1976), antes do aparecimento da psicologia
experimental havia duas teorias da mente: a teoria das faculdades inatas
(pensamento, sentimento e vontade) e a teoria associacionista, para a qual o
conteúdo mental resultava das associações realizadas pelos sentidos; ambas
influenciaram o desenvolvimento das diversas correntes posteriores da psicologia.
As pesquisas da psicologia experimental se concentram em descrever e
compreender, assim como discriminar e classificar os elementos e características
psíquicas humanas em geral, que se desdobram em extensos estudos sobre a
inteligência humana e pesquisas acerca de capacidades como memória, atenção e
percepção; dos processos mentais, a associação de idéias, os atos reflexos; sobre
aprendizagem, desenvolvimento e, principalmente, sobre os comportamentos
70
humanos.
Conforme Garrett (1969), a partir do método pavloviano de reflexos
condicionados, dos estudos de Franz e Lashley sobre o papel do cérebro na
aprendizagem; passando por Torndike e seus experimentos sobre aprendizagem
animal e seus correlatos na aprendizagem humana; pelos estudos experimentais
sobre o desenvolvimento sensório-motor, mental e social da criança de Watson;
pelas pesquisas pioneiras de Galton sobre hereditariedade, fazendo uso da
estatística aplicada aos problemas mentais; por Fechner (1801-1887) e sua
abordagem psicofísica até chegar ao primeiro laboratório de psicologia fundado por
Wundt em 1879, sob cuja influência Cattell desenvolveu seus estudos sobre o tempo
de reação e os primeiros 'testes mentais'; destacando-se, ainda, os testes de
inteligência de Binet e Simon, cuja escala publicada em 1905 "marca o verdadeiro
início da medida da inteligência" (GARRET, 1969, p. 298), tem-se um breve
panorama da psicologia sob o enfoque quantitativo de pesquisa denominada
psicologia experimental. Embora Anastasi (1965) situe os testes de associação na
categoria de testes projetivos, seus métodos e procedimentos são derivados da
psicologia experimental, como é o caso do teste de associação livre descrito e
sistematizado por Galton em 1879, adaptado e ampliado por Wundt, cuja finalidade
era detectar ritmo, atenção e memória associativa. Kraepelin adaptou o experimento
à clínica e, em 1904, Jung faz uma nova adaptação da versão de Wundt com função
de diagnóstico psiquiátrico, cuja finalidade principal era detectar a interferência de
conteúdos inconscientes no funcionamento da consciência. Baseado nos
experimentos de Wundt, Jung organiza, em 1904, o laboratório experimental de
psicopatologia no Bürgholzli e realiza seu experimento de associação de palavras,
que constitui a primeira pesquisa do inconsciente nos moldes experimentais.
Além dos testes de inteligência, o enfoque metodológico quantitativo na
psicologia também predomina nos teste de capacidades, de aptidão e de
aproveitamento para crianças e adultos, desde a escala de inteligência Binet-Simon;
o quociente de inteligência (QI) de Terman e suas diversas revisões, incluindo a
escala Wechsler-Bellevue para adultos, de 1939, e suas revisões; estendendo-se a
testes de personalidade, tais como os inventários de personalidade como o MMPI,
escalas de preferência e escalas de fatores de personalidade, como o 16 PF de
Cattell, e nessa categoria se incluem também os testes de tipos psicológicos
71
elaborados a partir da concepção de Jung sobre os tipos psicológicos de abordagem
da realidade, como o MBTI e o QUATI, nos quais não há propriamente mensuração
de capacidades, mas apenas descrição de características que são agrupadas em
torno de tipos de personalidade. Embora estes testes não façam uso de uma
quantificação estatística no sentido de medir a incidência dos sujeitos dentro de uma
população, seus instrumentos de coleta de dados são questionários fechados cujas
respostas são tabuladas quantitativamente. Dessa forma podem ser considerados
procedimentos de cunho mais quantitativo do que qualitativo em termos de método
de pesquisa, ainda que não associados aos padrões epistemológicos da psicologia
experimental.
Embora o termo 'método projetivo' tenha sido utilizado pela primeira vez por
Frank, em artigo publicado em 1939, esses métodos já eram usados desde o início
do século 19. Segundo Anastasi (1965), a principal característica das técnicas
projetivas reside na apresentação de uma tarefa relativamente não-estruturada que
permite uma variedade quase ilimitada de respostas possíveis. Outro elemento
característico dos testes projetivos é a natureza de seu material, que consiste em
estímulos, suficientemente ambíguos ou vagos, que permitam a expressão de
conteúdos internos, subjetivos e/ou inconscientes, donde se aplica o termo
'projetivo', ou seja, estímulos que favorecem a projeção por meio da qual é possível
avaliar o funcionamento psíquico do indivíduo tanto na vertente extrapsíquica como
no âmbito intrapsíquico. A grande maioria dos testes projetivos baseia-se numa
concepção psicodinâmica da personalidade e fundamenta-se em pressupostos
ontológicos e epistemológicos da psicologia profunda e da fenomenologia, cujas
concepções de realidade e ser não se identificam com a ciência positivista. Com isso
está claro seu caráter metodológico mais qualitativo do que quantitativo não alinhado
com a psicologia experimental.
Figueiredo (1989) situa a psicologia experimental nas 'matrizes cientificistas'
do pensamento psicológico, que abarcam todas as tentativas de identificar a
psicologia com as ciências naturais. Fazem parte da matriz cientificista três
submatrizes: nomotética e quantificadora; atomicista e mecanicista; e funcionalista e
organicista. A matriz nomotética quantificadora "orienta o pesquisador para a busca
da ordem natural dos fenômenos psicológicos e comportamentais na forma de
classificações e leis gerais com caráter preditivo" (p. 27), em que a mensuração em
72
condições experimentais rigorosamente controladas define o procedimento
experimental e garante "um movimento incessante de autocorreção das expectativas
acerca dos resultados" do experimento (p. 28). A matriz atomicista e mecanicista
"orienta o pesquisador para a procura de relações deterministas ou probabilísticas"
(p. 28), fazendo uso de um raciocínio linear e causalista típico da lógica formal
empregada no paradigma cartesiano e no positivismo lógico. A matriz funcionalista e
organicista "caracteriza-se por uma noção de causalidade funcional" (p. 30.) que
privilegia um modelo funcional de explicação com tendência a eleger uma causa
determinável para os fenômenos. A psicologia norte-americana foi fortemente
influenciada e apoiada nos princípios de Wundt, os quais foram criticados por
William James (1842-1910), o pioneiro da ciência do comportamento na América do
Norte, que priorizava a observação como método para compreender o
funcionamento da consciência, sendo considerado o fundador do funcionalismo
(DAVIDOFF, 2001). O funcionalismo organicista, originário da biologia, influenciou e
exerceu (ainda exerce) papel importante na psicologia, principalmente quando esta
pretende alçar-se ao estatuto científico equivalente ao da medicina. Seu método de
pesquisa segue os ditames do paradigma positivista racional e pragmático, utilizando
o enfoque metodológico quantitativo de investigação, embora de certo modo, em
maior ou menor grau, o aspecto qualitativo sempre se insinue nas pesquisas, uma
vez que o objeto de estudo da psicologia é essencialmente voltado para as
qualidades psicológicas humanas.
As pesquisas em psicologia experimental com seres humanos a partir da
década de 1970 já apresentavam uma tentativa de articulação entre os enfoques
metodológicos quantitativo e qualitativo. Os procedimentos de coleta de material
eram bastante controlados e orientados pelo empirismo lógico, mas a análise dos
dados utilizava o método indutivo e fazia avaliações compreensivas do
comportamento. A flexibilização do determinismo biológico-ambiental pode ser
observada na obra de B.F. Skinner.
Benkö (1961) avalia que "até a segunda guerra mundial a psicologia, para
alguns devia ser unicamente de laboratório – uma ciência acadêmica – para outros
não devia se preocupar com 'elucubrações teóricas'", com isso "corria-se o risco de
uma psicologia afastada da realidade concreta cheia de suposições ou
especulações infundadas, ou aderida a um empirismo extremo" (p. 630)
73
De modo geral até meados do século 20, a base da concepção ontológica da
psicologia assentava-se no binômio biológico-ambiental e seus métodos visavam
comprovar e/ou discutir a medida de interferência deste no comportamento humano.
A proposta do inconsciente como uma variável importante na vida psíquica, embora
atraente e interessante, ainda não consegue ser inserida na mentalidade científica
da época.
A filosofia romântica, que surge como uma reação ao iluminismo e se afirma
em oposição ao positivismo, não exerceu, praticamente, nenhuma influência na
epistemologia e método das ciências naturais, mas, ao contrário, ela está no cerne
das ciências humanas; sua influência também é notável na psiquiatria dinâmica,
ramo da psiquiatria que se distingue da psiquiatria organicista por seu método de
investigação mais compreensivo do que descritivo. Da psiquiatria dinâmica emerge o
conceito de inconsciente que dá origem à psicologia profunda com Freud e Jung. É
interessante notar que a psiquiatria dinâmica se manteve quase como um saber
marginal na perspectiva da ciência moderna, fortemente influenciada pelo
positivismo de Augusto Comte e pelo racionalismo cartesiano, que adota o método
experimental de pesquisa.
Segundo Figueiredo (1989), a psicanálise freudiana situa-se na matriz
funcionalista e organicista, embora o autor admita que a obra de Freud seja
"tributária de diversas tradições" com aproximações à filosofia, à filologia –
hermenêutica e linguística, e à ciência – fisiologia mecanicista e biologia
funcionalista. O mesmo autor reputa à psicanálise de Freud o que denomina
'interacionismo', no qual a vida é resultante da interdependência entre o organismo e
o ambiente. Figueiredo (1989) reconhece ainda traços estruturalistas na psicanálise,
notadamente em sua versão lacaniana, em função de sua ênfase no rigor
metodológico, cujos procedimentos analíticos devem ser cuidadosamente
formalizados. De qualquer modo, o método psicanalítico foi extensiva e
exaustivamente exposto e revisto pelos psicanalistas, discutido e comentado dentro
e fora da psicanálise, e em todas as circunstâncias deve ser considerado um método
interpretativo que privilegia a subjetividade, embora recomende a neutralidade do
analista e a observação rigorosa do método e da técnica.
Dentre as correntes filosóficas não positivistas que rejeitam o modelo de
74
pesquisa quantitativa, além da filosofia romântica que deu origem à psiquiatria
dinâmica e à psicologia profunda, destacam-se, de acordo com Chizzotti (2003), a
fenomenologia e a dialética cujos métodos exerceram grande influência nas ciências
humanas em geral e na psicologia em particular.
Da tradição filosófica neo-kantiana, a partir de Husserl e Heiddeger, deriva
uma importante vertente da psicologia contemporânea, a fenomenologia existencial
situada, de acordo com Figueiredo (1989), nas matrizes compreensivas pós-
românticas, cuja concepção de ser não pressupõe uma essência pré-definida; a
existência é o modo de ser e ressalta mais o rigor epistemológico e menos os
aspectos metodológicos. Augras (1978) destaca a análise da intersubjetividade
como uma característica importante do método fenomenológico, assim como a
hermenêutica é seu centro como modelo para a compreensão. Quando Chizzotti
(2003) afirma que a abordagem qualitativa fundamenta-se na relação dinâmica entre
o mundo real e a pessoa, formando-se um vínculo indissociável entre o mundo
objetivo e a subjetividade do indivíduo, é indiscutível a afinidade da fenomenologia
com os enfoques metodológicos essencialmente e exclusivamente qualitativos.
Concluindo, pode-se dizer que o modelo contemporâneo de método
qualitativo de produção de conhecimento com o objetivo de alcançar compreensão
dos fenômenos parece ser o mais adequado às ciências humanas, em geral, e para
a psicologia em particular. Mesmo quando se lança mão de dados quantitativos, os
métodos de produção de conhecimento em psicologia são predominantemente
qualitativos, em função de sua finalidade compreensiva e interpretativa dos
fenômenos numa perspectiva psicológica. A produção de conhecimento em
psicologia decorre essencialmente das tentativas de compreensão do ser e do
mundo em seus aspectos psicológicos.
A metodologia qualitativa de pesquisa alcançou destaque e repercussão no
panorama científico a partir da segunda metade do século 20, por ocasião da
eclosão de uma crise epistemológica e metodológica que passou a questionar o
paradigma vigente – materialista-racional-pragmático – e propôs um método
científico mais adequado às ciências humanas. Na psicologia, no entanto, desde o
início do século 20, já se observam modelos teóricos cujas epistemologias
contrastam com o paradigma vigente e cujos métodos não se adequam aos padrões
75
de cientificidade da época, como é o caso da psicanálise e da psicologia analítica;
essas abordagens são consideradas não-científicas ou anti-científicas. Freud, e a
psicanálise em geral, ao reconhecer e sublinhar a especificidade de seu objeto de
estudo – atos e vivências de um sujeito, dotados de valor e significado subjetivos –
reivindica para o modelo psicanalítico total independência diante da psicologia e das
demais ciências (FIGUEIREDO, 1989).
Já Jung (vol.A), desde o final do século 19, critica o modelo materialista
positivista e propõe uma concepção de ciência baseada nos postulados de Kant e
da filosofia romântica, mais adequada ao estudo do homem em sua vertente
espiritual, e defendeu seu método como científico.
Com o teste de associação de palavras, em 1904, Jung comprovou,
experimentalmente, a atuação de conteúdos inconscientes sobre o funcionamento
da consciência. Esse instrumento foi testado e validado dentro de todo o rigor
científico da época – o método experimental. Já nessa época, porém, declara sua
insatisfação em relação ao método experimental para a investigação psicológica,
principalmente no que diz respeito à análise do material que exige uma abordagem
interpretativa de caráter simbólico e não apenas descritiva, que vise tão somente a
constatação e mensuração dos fenômenos.
Com este experimento, embora, aparentemente tão simples, há uma grande
dificuldade - a interpretação dos distúrbios; ou para expressar de outra
forma (n.) sugerimos que a interpretação no presente é antes arte do que
ciência. No futuro, talvez, leis serão descobertas para o método de
interpretação. (voI. 2, §1024)
[...] muitas vezes não era clara à primeira vista [a relação entre
estímulo/distúrbio], mas tinha um caráter mais ‘simbólico’ eram ‘alusões’.
(vol. 2, § 1350)
Em 1912 ele definitivamente considera o método experimental não apenas
insuficiente, mas também inadequado para as pesquisas em psicologia profunda.
A psicologia experimental hodierna está longe, porém, de poder comunicar
uma visão articulada daquilo que constitui, praticamente, os processos mais
importantes da psique [...] Portanto, quem quiser conhecer a psique humana
infelizmente pouco receberá da psicologia experimental. (voI.7/1, p.112)
Numa época em que o paradigma científico vigente ainda era o positivismo
lógico racional, a psicologia do inconsciente não era considerada científica por não
76
seguir o método experimental tradicional. Em 1920 Jung reivindica à psicologia o
estatuto de ciência fora do campo das ciências naturais e adverte que o método
experimental não atende aos seus fundamentos ontológicos e epistemológicos.
Quem houver penetrado mais fundo na essência da psicologia e exigido que
seja considerada ciência, sem depender, em sua existência, dos limites
impostos pela metodologia das ciências naturais, terá percebido que jamais
haverá um 'método experimental' que satisfaça à essência da alma humana
ou que trace uma imagem bastante fiel dos complicados fenômenos
anímicos. (VoI. 6, §741)
77
6 Diretrizes metodológicas básicas para a
pesquisa em psicologia analítica
A pesquisa em psicologia analítica situa-se no contexto da pesquisa
qualitativa que se caracteriza por uma abordagem interpretativa e compreensiva dos
fenômenos, buscando seus significados e finalidades, cujo método é resultante da
articulação das perspectivas ontológica e epistemológica do paradigma junguiano. É
importante que o pesquisador adote um paradigma científico a partir do qual seu
projeto de pesquisa é construído.
A noção de paradigma envolve três elementos fundamentais - ontologia,
epistemologia e metodologia - que devem estar articulados e entrelaçados de forma
consistente e coerente. Esses três elementos constituem seus aspectos principais e
serão aqui denominados: perspectiva ontológica, perspectiva epistemológica e
perspectiva metodológica do paradigma.
Formalmente, as premissas ontológicas localizam-se na base do paradigma e
sobre estas se apóiam as proposições epistemológicas e o método, formando um
todo. No entanto, esta relação linear e causal entre os elementos que compõem um
paradigma é impossível de ser alcançada na formação de um paradigma, visto que
eles mantêm uma relação dinâmica e interdependente, o que torna o paradigma um
corpo de conhecimento vivo, sendo constantemente atualizado em função de novas
descobertas. Deve-se sublinhar que essa linha de raciocínio tem apenas, e tão
somente, a função de organizar e sistematizar a análise do paradigma, correndo-se
inevitavelmente o risco de limitar sua amplitude e esvaziar sua dinâmica. (PENNA,
2003)
6.1 Perspectiva ontológica
A perspectiva ontológica de um paradigma refere-se à natureza da realidade
considerando as concepções básicas de mundo e ser humano sobre as quais se
assentam sua epistemologia e método. As bases ontológicas do paradigma
junguiano compreendem a concepção de mundo, realidade psíquica, ser humano e
psique. A noção de totalidade - unidade e diversidade - constitui o pilar básico da
78
perspectiva ontológica do paradigma junguiano permeando sua visão de mundo e
ser. Trata-se de uma totalidade dinâmica que contém diversos elementos. O mundo
para Jung é concebido em seus aspectos subjacente e manifesto - inconsciente e
consciente respectivamente. A noção de unus mundus, emprestada da filosofia
medieval, é utilizada por Jung como um paralelo metafísico de seu conceito de
totalidade. Duas características da concepção de mundo junguiana associada à
noção de ununs mundus devem ser destacadas: em primeiro lugar, cada aspecto da
totalidade "está intimamente ligado a todos os outros" (SAMUELS; SHORTER;
PLAUT, 1988) conferindo dinamismo ao todo e integrando microcosmo e
macrocosmo; em segundo lugar, a dinâmica do sistema se assenta em relações
causais e não causais. Disto decorre um pressuposto epistemológico altamente
relevante do paradigma, qual seja: a totalidade consiste numa cosmovisão que não
se limita à explicação de causas, mas ressalta as relações de significado na
compreensão da psique. A totalidade se define mais por um sistema de ralações do
que como um campo embora não descarte esta acepção também. Como campo, a
totalidade tem caráter 'todo abrangente' incluindo consciente e inconsciente, psique
e corpo, indivíduo, natureza e cultura. Como sistema de relações implica uma
dinâmica multi-vetorial de interações e entrelaçamentos constantes entre todos os
elementos que compõem a totalidade num processo de diferenciação e integração
das partes rumo a uma complexidade crescente. Esta dinâmica opera tanto no plano
individual como cultural e histórico.
O ser humano é considerado uma totalidade eco-bio-psíquica-social incluindo
consciente e inconsciente (PENNA, 2003); como microcosmo, o ser humano é parte
integrante do macrocosmo, o qual compreende as esferas do inconsciente coletivo e
da consciência coletiva. Do ponto de vista psicológico Jung distingue o plano
coletivo e individual da psique humana.
De modo geral esta totalidade contém aspectos herdados, inatos e adquiridos
pela experiência vivenciada na relação com o mundo. O plano coletivo da psique
refere-se a conteúdos herdados e inatos que constituem o humano em sua acepção
mais ampla e universal, daquilo que lhe é típico.
O homem não nasceu tábula rasa, apenas nasceu inconsciente. Traz
consigo sistemas organizados e que estão prontos a funcionar numa forma
especificamente humana. (...) denominei este modelo instintivo, congênito e
79
preexistente (...) de arquétipo. Esta é a imagem, carregada com o
dinamismo, que não podemos atribuir a um ser humano individual (voI. 4,
§ 728-9)
No plano individual o ser humano é concebido como uma totalidade única
(indivíduo) resultante de um potencial arquetípico que se atualiza num corpo
biológico inserido num ambiente natural e num contexto histórico e social (cultura) -
um microcosmo dentro de um macrocosmo.
A noção de realidade psíquica formulada por Jung, de acordo com Tarnas
(2001), confere estatuto empírico ao psiquismo dando substância à experiência
interior. O mundo e o ser humano são definidos por sua qualidade simbólica. Desta
forma o ser humano é um ser simbólico, que vive numa dimensão simbólica.
Segundo Cassirer (1944), o homem é um animal 'symbolicum', que não vive mais
num universo meramente físico; o universo humano é simbólico e isto o insere numa
nova dimensão de realidade: a dimensão simbólica que abarca os aspectos
biológicos, ambientais, culturais (sócio-históricos) e espirituais, integrando-os num
todo único e típico.
A concepção romântica de uma realidade subjacente interferindo na realidade
manifesta e a noção de uma totalidade abrangente movida por padrões
organizadores (BOHM, 2001), isto é, arquétipos fora do controle da consciência,
constituem a base da ontologia junguiana, que hoje começa a ser aceita por outros
paradigmas.
A psique constitui uma dimensão do humano que inclui tanto o âmbito
inconsciente, relacionado aos fenômenos do mundo subjacente, como o âmbito
consciente, relativo aos fenômenos do mundo manifesto. Na realidade psíquica
distinguem-se dois planos principais: coletivo e pessoal ou individual. O plano
coletivo refere-se ao inconsciente coletivo e à consciência coletiva, denominada por
Jung psique objetiva de caráter impessoal. O âmbito inconsciente da psique objetiva
(inconsciente coletivo e arquétipos) consiste num macro sistema de caráter originário
postulado como a priori e, portanto, um fator primário no sistema. O plano individual
da psique, denominado por Jung psique subjetiva, tem caráter histórico, constitui um
fator secundário do sistema e refere-se ao ego e à consciência, no que diz respeito
ao âmbito consciente, e ao inconsciente pessoal e os complexos, no âmbito
80
inconsciente. Disto decorre que a concepção de inconsciente (coletivo e pessoal)
constitui uma das noções mais básicas da ontologia deste paradigma,
principalmente no que se refere ao inconsciente coletivo e aos arquétipos. Segundo
Rauhala (1991) o conceito de arquétipo está essencialmente associado à concepção
de homem, determinando o estatuto ontológico do modelo junguiano em termos
mais filosóficos do que propriamente psicológicos. Ao distinguir o 'arquétipo em si' da
manifestação arquetípica ou 'experiência arquetípica', Jung delimitou o campo
epistemológico de sua psicologia, pois como Rauhala (1991, p. 233) aponta, "o
'arquétipo em si' claramente não é um conceito psicológico. A experiência
arquetípica, por outro lado, é um assunto de psicologia".
6.2 Perspectiva Epistemológica
Retomando o sentido original grego do termo episteme como o ato de marcar
um território para ser observado ou compreendido (Papadopoulos, 2006),
epistemologia refere-se à demarcação de um campo para fins de conhecimento.
A perspectiva epistemológica de um paradigma refere-se às questões
relativas ao valor, possibilidades e limites do conhecimento e à relação entre o
pesquisador e o objeto a ser conhecido. A produção de conhecimento científico se
dá por meio de pesquisas científicas. O processo de produção de conhecimento está
diretamente associado às concepções ontológicas assumidas pelo paradigma e
encaminha os meios pelos quais o conhecimento pode ser produzido - método.
A perspectiva epistemológica começa pela definição de conhecimento para
em seguida, avaliar como esse conhecimento é viável em termos de suas
possibilidades e limites. Na psicologia analítica, conhecimento equivale a
consciência. É importante assinalar que conhecimento e autoconhecimento são
inseparáveis. O processo de aquisição e construção de conhecimento é um
processo de ampliação da consciência que se estende por toda a existência do ser
humano e permeia toda a história da humanidade, denominado por Jung processo
de individuação. Trata-se de um processo gradual e constante de integração de
aspectos do inconsciente e do mundo na consciência, que visa integração à
comunidade humana e a si mesmo, num movimento de crescente complexidade e
diversidade. A capacidade de conhecer do ser humano não se esgota enquanto
81
houver uma consciência viva.
“A individuação é o tornar-se um consigo mesmo, e ao mesmo tempo com a
humanidade toda, em que também nos incluímos” (JUNG, vol 16, § 227).
Atualmente as teorias de conhecimento consideram relevante o conhecimento
buscado e alcançado pelas teorias científicas, conforme foi apresentado no capítulo
sobre as formas de produção de conhecimento. A validade do conhecimento está
associada àquilo que faz sentido num determinado contexto. Assim, o conhecimento
válido para a psicologia analítica é aquele que tem um valor simbólico para o
indivíduo ou para uma dada comunidade humana.
O estudo da psicologia, e especialmente a psicologia do inconsciente
iniciada por Freud e Jung coincidiu com desenvolvimentos extraordinários
na Física do século 20 que desafiaram as hipóteses da física clássica dos
500 anos precedentes. (HAUKE, 2000, p. 238)
A epistemologia junguiana aborda o conhecimento em termos psicológicos e
seu maior desafio se concentra na possibilidade da consciência conhecer o
inconsciente.
6.2.1 Origem e limites da consciência conhecedora
A consciência como sede do conhecimento é limitada, de um lado, pelo
inconsciente e, por outro, pelo mundo. A aquisição de conhecimento promove
ampliação da consciência que se dá pela integração de conteúdos inconscientes
simultaneamente à incorporação de elementos do mundo externo na consciência
individual e coletiva.
Ego e consciência são fatores secundários oriundos de um fator primário - o
inconsciente coletivo. Como um subsistema o complexo ego-consciência está
contido num sistema mais abrangente de caráter coletivo (inconsciente coletivo e
consciência coletiva) e faz parte de um sistema de caráter individual que abrange o
inconsciente pessoal.
A origem da consciência é arquetípica, ou seja, postula-se uma aptidão inata
ou um potencial que é inerente ao ser humano para formar ego e consolidar
consciência. Por um lado, este potencial tende a se realizar independentemente do
82
fator tempo ou local, visto que em todas as épocas e lugares o ser humano
apresenta algum tipo de consciência e produção de conhecimento. Por outro lado, o
conhecimento está intimamente associado às circunstâncias históricas e ambientais.
Verifica-se, portanto, um intrincado entrelaçamento dinâmico de vários aspectos.
A consciência do eu parece depender de dois fatores: primeiramente
depende das condições da consciência coletiva, isto é, social e, em
segundo lugar, depende dos arquétipos do inconsciente coletivo. (JUNG,
voI. 8, §154)
Esses fatores constituem os limites deste subsistema e são eles também que
o desafiam e são desafiados pelo sistema a ir além de seus próprios limites. O
processo pelo qual esta dinâmica se traduz em aquisição de conhecimento e
ampliação da consciência é o processo de individuação.
6.2.2 Possibilidades e limites do conhecimento
A epistemologia junguiana concentra-se, principalmente, na possibilidade e
nos limites de acesso ao inconsciente. A possibilidade de acessar o mundo
subjacente (inconsciente) repousa na hipótese de que este se expressa na realidade
manifesta (consciente) (PENNA, 2003).
De acordo com Cassirer (1997), a única forma de conhecer o ser humano é
através de suas manifestações, que são "os fios que tecem a rede simbólica da
experiência humana" (p. 48).
Para Jung, o inconsciente não é passível de um contato direto, ele se dá a
conhecer apenas por meio da consciência, que constitui o ponto de partida de todo
conhecimento em psicologia.
A psicologia como ciência relaciona-se, em primeiro lugar, com a
consciência; a seguir, ela trata dos produtos do que chamamos psique
inconsciente que não pode ser diretamente explorada por estar a um nível
desconhecido, ao qual não temos acesso. O único meio de que dispomos,
neste caso, é tratar os produtos conscientes de uma realidade, que
supomos originários do campo inconsciente, esse campo de
'representações obscuras' ao qual Kant, em sua Antropologia, se refere
como sendo um mundo pela metade. Tudo que conhecemos a respeito do
inconsciente foi-nos transmitido pelo próprio consciente. A psique
inconsciente (coletivo), cuja natureza é completamente desconhecida,
sempre se exprime através de elementos conscientes. Não se pode ir além
desse ponto. (JUNG, vol.18, §8).
83
A distinção que Jung faz entre a noção de arquétipo em si e de manifestação
arquetípica é fundamental para a discriminação entre os conceitos de arquétipo e
símbolo. O construto teórico limite (arquétipo) de natureza psicóide e impossível de
ser representado (voI. 8), e portanto, fora dos limites do campo de conhecimento
(consciência), as manifestações dessa entidade teórica que são acessíveis à
consciência e, por isso, passíveis de observação e conhecimento são os símbolos
(PENNA, 2003). De acordo com Jaffé (1989), a distinção entre o conteúdo
arquetípico na consciência e o arquétipo em si "caracteriza o fundamento
epistemológico da obra de Jung desde os seus primórdios" (p. 42). Essa distinção
tem papel fundamental na epistemologia e acarreta implicações metodológicas
altamente relevantes no paradigma junguiano. Com isso é definida a fronteira entre
psíquico e não psíquico, e delimitado o campo de investigação psicológica. A
fronteira psicóide delimita aquilo que é potencialmente cognoscível daquilo que é
totalmente incognoscível (STEIN, 2000).
As representações desse construto teórico (arquétipo) são acessíveis à
consciência por intermédio de suas expressões simbólicas e, dessa forma, passíveis
de observação e compreensão. O estudo da psique se efetiva através da pesquisa
dessas manifestações na esfera consciente tanto no âmbito pessoal como no
coletivo. Como fenômeno psíquico passível de investigação, o símbolo, constitui a
chave possível para o conhecimento, pois "sempre exprimimos através de símbolos
as coisas que não conhecemos" (JUNG, vol.8, §.366)
Segundo Jung (vol.6), o símbolo pressupõe uma função psíquica que cria
símbolos e uma função que os compreende, a qual denominou de "pensamento
simbólico ou entendimento simbólico" (§171). Esta é coordenada pelo ego e realiza
a transformação de material inconsciente em material consciente.
Segundo Jacobi (1986), a capacidade da psique de formar símbolos,
chamada função transcendente, é uma função complexa operada pela psique por
meio do mecanismo de auto-regulação, que une os pares de opostos numa síntese
e cria uma comunicação entre consciente e inconsciente.
Quando o arquétipo aparece no aqui e agora do espaço e do tempo,
podendo ser, de algum modo percebido pelo consciente, falamos então de
símbolo. Dessa forma, cada símbolo é também um arquétipo, mas isso não
quer dizer que um arquétipo é idêntico a um símbolo. Quando existe uma
84
constelação psíquica geral ou uma posição adequada do consciente, ele
(arquétipo) está sempre pronto a aparecer como símbolo. (JACOBI, 1986,
p.72)
O símbolo como manifestação do arquétipo situa-se no limiar da possibilidade
de conhecimento, pois o arquétipo em si está fora dos limites do conhecimento, ou
seja, o símbolo constitui a possibilidade e o limite do conhecimento.
Do ponto de vista individual, o conhecimento do ser humano se dá através de
suas manifestações subjetivas, como sonhos, fantasias, sintomas e
comportamentos. Do ponto de vista coletivo, o conhecimento se dá pelas
manifestações humanas coletivas, ou seja, culturais, tais como na mitologia, no
folclore, na arte, nos eventos históricos e sociais e também na produção científica.
6.2.3 Relação sujeito e objeto – objetividade e subjetividade
A metodologia de pesquisa qualitativa afirma que a relação estabelecida entre
o pesquisador e o pesquisado decorre dos pressupostos epistemológicos que
definem a relação entre o conhecedor e o conhecido (DENZIN, 1998a).
Do ponto de vista epistemológico, o fato de a psique ser tanto sujeito como
objeto de conhecimento na psicologia é o ponto crucial desta ciência. Jung
considerava este o maior desafio na busca de métodos em psicologia (PENNA,
2004).
No paradigma da totalidade/diversidade, segundo Papadopoulos (2002), o
outro está contido no todo do qual faz parte o eu, e nesse sentido o outro é o
restante do eu, que falta ou sobra ao eu e, portanto, lhe é desconhecido. A noção de
inconsciente, embora não coincida exatamente com o desconhecido, o inclui. Do
ponto de vista egoico, o mundo externo e o inconsciente são experimentados pelo
ego como 'outro', isto acarreta diversos tipos de conexões entre o eu e o outro, as
quais podem ser colocadas em termos de diferença e similaridade ou união e
separação, ou ainda, oposição e complementaridade.
Hauke (2000) salienta que na concepção de inconsciente de Jung, o ego e
sua subjetividade são colocados frente a um “inconsciente que é experimentado pelo
sujeito como profundamente outro” (p. 150, grifo do autor); dessa forma é possível
85
falar de um outro ‘interno’, além do outro ‘externo’ ao eu.
No entanto, ainda que o outro esteja contido no mesmo todo do qual o ego faz
parte, não se trata, em momento algum, de anular as diferenças entre o eu e o outro,
uma vez que, segundo Jung (vol.6) "a identidade sujeito-objeto torna impossível
qualquer conhecimento" (§ 449). Trata-se de perceber as características dessa
relação dinâmica que se estabelece entre sujeito e objeto, suas especificidades e
limites, posto que nela está implícita a presença do conhecedor - sujeito - e do
desconhecido a ser conhecido – objeto.
O mundo não existe apenas em si mesmo, mas também é o que representa
para mim. No fundo, não teríamos qualquer critério para julgar um mundo
que não fosse assimilável pelo sujeito [...] descambaríamos para o caminho
do vazio e crasso positivismo que estragou a virada de nosso século e
também para uma arrogância intelectual precursora da rudeza de
sentimentos e de uma violência igualmente estúpida e pretensiosa. Pela
supervalorização da capacidade objetiva de conhecer, reprimimos a
importância do fator subjetivo, a importância do próprio sujeito. Seria doentio
ignorar que o conhecer tem um sujeito e que não existe conhecer algum,
portanto mundo algum para nós, em que alguém não diga ‘eu conheço’,
fórmula pela qual exprime a limitação subjetiva de todo conhecer. (JUNG,
vol.6, § 692)
Pode-se, assim, concluir que o conhecimento é limitado tanto pela
subjetividade do sujeito conhecedor quanto pela objetividade do outro (interno ou
externo) a ser conhecido.
A questão da objetividade nos paradigmas científicos foi amplamente
discutida e debatida por Kant, depois pelos filósofos românticos e por Nietzsche que
afirma a impossibilidade de objetividade, uma vez que o conhecimento produzido por
um pensador está inevitavelmente impregnado de sua personalidade. A
subjetividade, originalmente colocada num campo marginal à ciência, passa para
uma posição central nos debates sobre critérios de cientificidade e na formulação de
métodos qualitativos de pesquisa. No século 20, Nietzsche e Thomas Kuhn são duas
referências pioneiras no questionamento e na crítica aos ideais cartesianos e
positivistas quanto à objetividade na produção de conhecimento. Do ponto de vista
filosófico, a posição nietzschiana é destacada, e do ponto de vista da epistemologia
científica, Kuhn é uma referência. É interessante notar que na literatura pós-
junguiana Nietzsche é constantemente citado, provavelmente por ter sido uma
referência para o próprio Jung, mas Kuhn raramente é mencionado.
86
Para Jung, o conhecimento é influenciado pela psique do sujeito conhecedor,
mas diferentemente de Nietzsche, ele considera o conhecimento, assim como as
ações humanas, condicionados tanto pelo objeto como pelo sujeito (vol.7/1),
podendo haver oscilações numa ou noutra direção, de acordo com as características
do sujeito conhecedor. Uma abordagem mais calcada no objeto (outro) externo
tende a uma observação mais objetiva; por outro lado, uma abordagem
condicionada, preferencialmente, pelas disposições do eu, tende a uma visão mais
subjetiva.
Fica assim patente que Jung (vol.9/1) considera o conhecimento fruto
inevitável da personalidade do pesquisador, que necessariamente interfere no
fenômeno observado. Assim como uma partícula atômica sofre a interferência do
observador, também "o arquétipo se altera ao se tornar consciente e ser percebido,
e toma as cores da consciência individual na qual ele aparece". (§ 6)
Em qualquer circunstância o observador necessariamente interfere no
fenômeno observado, sobretudo quando se trata da percepção de elementos
psíquicos inconscientes.
A relação entre sujeito e objeto - pesquisador e fenômeno - é uma relação
dialética e significativa, em que sujeito e objeto participam ativamente do
conhecimento. Essa dialética deve ser balanceada de tal forma que sejam evitadas
posições unilaterais. Se a subjetividade for desconsiderada, ela permanecerá
inconsciente no processo de conhecimento e, como tal, tenderá a se projetar de
forma automática e primitiva. Entre a objetividade e a subjetividade, o máximo que
se pode almejar é uma intersubjetividade, evitando-se tanto o 'subjetivismo' como o
'objetivismo'.
Em parte alguma, como no campo da psicologia, é exigência absolutamente
básica que o observador e pesquisador sejam adequados a seu objeto, no
sentido de serem capazes de ver uma e outra coisa. Exigir que só se olhe
objetivamente nem entra em cogitação, pois isto é impossível. Já deveria
bastar que não se olhasse subjetivamente demais. (JUNG, vol.6, § 8)
A objetividade na investigação científica hoje é discutida não mais em termos
de sua manutenção rigorosa, mas, de acordo com Hauke (2000), na perspectiva de
que uma posição objetiva é impossível de ser alcançada, pois "qualquer exame
humano de um fenômeno deve sempre envolver a intervenção humana neste
87
fenômeno" (p. 237). Esta, por um lado, inevitavelmente altera permanentemente o
fenômeno, e, por outro lado, a percepção ou abordagem do fenômeno é impregnada
pelas características subjetivas do pesquisador.
6.3 Perspectiva metodológica: apreensão e compreensão dos
fenômenos
A perspectiva metodológica diz respeito ao modo como o conhecimento é
adquirido e acumulado; os meios pelos quais o conhecimento é efetivado. Os
métodos de investigação compreendem duas grandes etapas, quais sejam: coleta
de material ou apreensão dos fenômenos a serem investigados e análise do material
ou compreensão dos dados coletados.
Ellenberger (1970) aponta Jung como precursor do método interpretativo na
psiquiatria dinâmica no início do século 20. Von Franz ([1975] 1992) afirma que a
compreensão do inconsciente, formulada e praticada por Jung, marca o fim do
racionalismo científico do século 19.
O símbolo como ponte epistemológica entre consciente e inconsciente é o
fenômeno psíquico passível de investigação. Ele congrega o âmbito pessoal e o
âmbito coletivo, a dimensão histórica e a dimensão universal dos eventos psíquicos,
e coloca-se como o elemento a ser apreendido pela consciência, podendo ser
compreendido e assimilado quando elaborado. A emergência de um símbolo conta
com a anuência da consciência no sentido de que, em razão do mecanismo de auto-
regulação da psique, o ego "deseja e precisa" da mensagem contida no símbolo,
embora isto não seja garantia de sua compreensão. O aspecto consciente do
símbolo consiste na forma reconhecível de que o símbolo se reveste e pela qual é
captado pela consciência que o reconhece. Seu aspecto desconhecido representa o
enigma a ser decifrado, que constitui, justamente, aquilo de que a consciência se
ressente no momento. O símbolo é sempre algo intrigante e instigante para a
consciência que o vivencia; seu caráter ambivalente e paradoxal produz uma
sensação simultânea de plenitude e vazio (PENNA, 2003). A manifestação de um
símbolo é invariavelmente acompanhada pela experiência numinosa que ele
provoca e o define como experiência arquetípica.
88
A investigação psicológica na psicologia analítica considera os fenômenos em
seu âmbito individual (sonhos, fantasias, experiências pessoais) e coletivo (mitos,
contos de fadas, obras de arte, acontecimentos sociais e políticos), desde que
revestidos de valor simbólico, seja para o indivíduo ou a coletividade que os produz
e os vivencia psicologicamente.
6.3.1 Apreensão do fenômeno / símbolo - coleta de material
Em função de seu valor significativo o símbolo não passa despercebido pelo
ego. Assim, será considerado símbolo qualquer evento que provoque ou mobilize a
atenção, seja de um indivíduo, no caso de símbolos individuais, seja de um grupo,
no caso de símbolos coletivos. A presença de um símbolo é percebida pela
consciência como instigante, surpreendente ou intrigante, provocando
estranhamento, curiosidade, inquietação, atração ou repulsa, admiração ou
reprovação. Dessa forma, os fenômenos I símbolos são aqueles que têm grande
repercussão no contexto em que eles ocorrem em razão de seu alto valor de
significado e sentido.
6.3.2 Delimitação do contexto de apreensão
Kuhn ([1970] 2001), ao discutir as intrincadas relações entre indivíduo e
cultura, ressalta a importância do contexto histórico e social em que as teorias
científicas são produzidas e as pesquisas são conduzidas. Para Jung, todo
conhecimento é contingente, isto é, ocorre dentro de um contexto determinado. O
símbolo emerge “no aqui agora do espaço e do tempo, podendo ser, de algum modo
percebido pelo consciente” (JACOBI, 1986), fruto da constelação atual da energia
psíquica no sistema como um todo, decorre, portanto, da situação – do contexto –
em que surge (PENNA, 2003).
O contexto em que o fenômeno ocorre e é captado deve ser considerado na
investigação psicológica e cuidadosamente explicitado, a fim de circunscrever o
campo da pesquisa, o que constitui fator importante na compreensão (análise) do
material coletado. O contexto mais amplo e geral de um fenômeno psicológico
qualquer é o âmbito arquetípico, e o contexto mais estrito e específico do fenômeno
é o âmbito individual. Entre esses dois polos há gradações que devem ser
89
observadas e explicitadas de acordo com a situação e o objetivo da investigação em
curso.
Neste sentido, a metodologia junguiana propõe um método de investigação
dos fenômenos que inclui tanto um contexto subjetivo quanto um contexto objetivo
da realidade e permite que sejam conduzidas pesquisas no âmbito pessoal e no
âmbito coletivo dos fenômenos culturais. O método junguiano aplicado à
psicoterapia tem como ênfase principal o aspecto subjetivo e visa compreender a
dinâmica psíquica com base nas manifestações individuais. A aplicação do método
junguiano a outros contextos condicionará o grau de prioridade com que os aspectos
subjetivos e objetivos serão enfatizados e quais as manifestações que serão alvo de
investigação.
6.3.3 Recursos de apreensão do fenômeno - coleta de material
Cabe aqui retomar e novamente esclarecer a distinção entre método e
técnica. Por técnica, geralmente, são entendidos os instrumentos, estratégias ou
ferramentas que são utilizados como subsídios metodológicos no processo de
pesquisa e atualmente têm sido denominados procedimentos de investigação,
estratégias ou ferramentas de pesquisa (DENZIN; LINCOLN, 1998a). Entende-se
por recursos metodológicos os meios disponíveis para o pesquisador captar e
compreender os fenômenos investigados que incluem as estratégias e/ou
instrumentos, mas também, às vezes, vão além do emprego de técnicas, como por
exemplo, no caso da observação como meio de apreensão de material de pesquisa.
Os procedimentos, por sua vez, dizem respeito ao modo como são manejados e
aplicados pelo pesquisador os recursos metodológicos de que dispõe o pesquisador
e não têm um fim em si mesmos, estão sempre a serviço do método.
A apreensão do fenômeno psíquico – símbolo – é alcançada primordialmente
pela observação; tanto pela 'observação natural' como pela 'observação
instrumental' (PIERI, 2002), em ambos os casos, a apreensão ou captação do
símbolo envolve a articulação entre um sistema observador e um sistema
observado.
Observação e auto-observação têm importante papel no método de pesquisa,
uma vez que constituem o meio pelo qual é possível acessar o fenômeno psíquico
90
(símbolo) a ser investigado. Assim, o pesquisador deve ser capaz de conduzir a
observação de modo adequado para a apreensão do material inconsciente contido
no símbolo. Quanto à auto-observação, o pesquisador deve manter-se atento e fiel a
suas metas e objetivos de pesquisa, refletindo constantemente sobre suas decisões
e ações, avaliando-as.
Cumpre lembrar que a capacidade de observação é um traço característico
dos seres humanos, sendo operada pelas suas funções perceptivas. A percepção
como função da consciência foi denominada por Jung de ‘função sensação’, “a
função dos sentidos que os psicólogos franceses chamam ‘la fonction du réel’, a
soma total de minhas percepções de fatos externos, vindas até mim por meio dos
sentidos [...] A sensação me diz que alguma coisa é (JUNG, vol.18/1, §21). A
sensação como função perceptiva da consciência foi considerada por Jung (vol.6 e
8) uma função irracional por seu caráter imediato em relação aos objetos, isto é, a
percepção não é mediada por nenhum tipo de julgamento. Segundo Jung, ela
simplesmente constata o que o objeto é, nesse sentido é uma função puramente
apreensiva; juntamente com a intuição estas funções captam os fenômenos. A
sensação, de uma forma perceptiva sensorial, capta os fenômenos de modo
detalhado e minucioso, e a intuição os capta de modo global e abrangente,
percebendo-os como parte de um todo mais amplo – visão de contexto. As funções
de julgamento – racionais – como o pensamento e o sentimento atribuem significado
e valor ao fato percebido, o pensamento define e conceitua, dizendo o que a coisa é
(JUNG, vol.18/1), e o sentimento agrega valor ao objeto, fazendo uma avaliação
sobre os fatos percebidos. A articulação entre as funções perceptivas e as funções
de julgamento resulta numa observação perceptiva e compreensiva dos fenômenos.
Quanto à articulação entre o observador e o objeto observado e suas
implicações quanto à subjetividade e objetividade da observação, Jaffé (1989)
comenta que, assim como Heisenberg afirmou que “não é mais possível falar do
comportamento de uma partícula atômica independentemente do processo de
observação”, não podemos também “falar do comportamento do inconsciente
independentemente do processo de observação e da consciência que observa;
como na física nuclear a observação altera o comportamento das partículas, o
mesmo ocorre na psicologia” (JAFFÉ, 1989, p. 41). Da mesma forma que o átomo
sofre a interferência do observador, Jung (vol.9/1) afirma que “o arquétipo se altera
91
ao se tornar consciente e ser percebido, e toma as cores da consciência individual
na qual ele aparece” (vol.9/1,§6). A forma alterada pela qual o arquétipo se expressa
é o símbolo que se constitui no fenômeno psíquico a ser investigado.
Considerando que o sistema observado não é apenas perturbado pelo
sistema observador, mas também é produto deste sistema (PIERI, 2002), de acordo
com Hauke (2000), o efeito da observação sobre o fenômeno a ser conhecido é
absolutamente fundamental e não pode ser reduzido ou mesmo neutralizado. A
relação entre esses dois sistemas é bastante complexa no período de apreensão do
fenômeno pesquisado e envolve diversos níveis de inter-relação.
Devem ser considerados três aspectos importantes no que diz respeito à
observação e auto-observação:
1. As particularidades do objeto de investigação – símbolo – que inclui
aspectos conscientes e inconscientes, ou seja, conteúdos conhecidos e
desconhecidos para o observador. A natureza da expressão simbólica
alvo de investigação deve ser analisada para que o melhor modo de
apreensão seja escolhido. (escolha de instrumentos e modos de
observação adequados ao objeto).
2. A equação pessoal do sistema observador também contém aspectos
conscientes e inconscientes compreendidos no âmbito coletivo e pessoal.
3. A dinâmica entre esses dois sistemas envolve um inter-jogo entre todos
esses aspectos – coletivo e pessoal, consciente e inconsciente.
Apesar de Jung afirmar que "em psicologia o observador é o observado, a
psique é não apenas o objeto, mas também o sujeito de nossa ciência" (JUNG,
Vol.18/1, §277). Na verdade, um vínculo estreito e uma dinâmica complexa se
estabelecem entre sujeito e objeto, mas não propriamente uma identidade entre
eles. Epistemologicamente, conhecimento e autoconhecimento são inseparáveis, e
metodologicamente, observação e auto-observação são indispensáveis.
No processo de pesquisa, à semelhança do processo de individuação, a
forma e o grau de interação entre elementos conscientes e inconscientes depende,
em última instância, do ego do pesquisador. A esse respeito, contudo, cumpre
92
salientar a posição do ego na totalidade do sistema psíquico, lembrando que:
A consciência do ego parece depender de dois fatores: primeiramente, das
condições do consciente coletivo, isto é, consciência social; e por outro lado,
dos arquétipos, ou dominantes, do inconsciente coletivo. (JUNG, voI. 8,
§ 423)
É importante ressaltar também a dinâmica própria do sistema psíquico que
opera pela função compensatória, cujo produto é o símbolo que representa a síntese
necessária para o equilíbrio do sistema todo. Todavia somente o processamento
desse símbolo, realizado pelo ego, efetiva a integração dos conteúdos inconscientes
na consciência, resultando em ampliação da consciência, ou seja, produzindo
conhecimento.
No processo de pesquisa, a tarefa do ego do pesquisador é manejar a
captação e o processamento dos símbolos investigados desde sua apreensão
(coleta) até sua compreensão (análise).
Os recursos metodológicos utilizados são aqueles que favorecem a
observação e a captação dos símbolos produzidos pela psique, ou seja, os meios
que fornecem a melhor forma possível de detectar e recolher o material simbólico e
que facilitam sua compreensão. Dessa forma, são empregadas as técnicas
projetivas e expressivas que se mostrem mais favoráveis à elaboração simbólica no
contexto da investigação (PENNA, 2003).
Uma vez que o símbolo é composto de material consciente e inconsciente e a
meta epistemológica da psicológica analítica é captar além da face consciente
também os aspectos inconscientes do símbolo, os instrumentos de apreensão do
fenômeno psíquico/símbolo devem ser escolhidos a partir desse critério –
capacidade de captar material consciente e inconsciente. Os instrumentos de
pesquisa utilizados são, sobretudo, recursos de caráter projetivos em geral, visto que
o pesquisador deve lançar mão de recursos capazes de apreender os aspectos
conscientes e inconscientes do símbolo. Assim como a observação do fenômeno
pode se dar tanto por meio da 'observação natural' como da 'observação
instrumental', a apreensão também pode ser feita por meio direto ou indireto.
A seleção dos recursos metodológicos para apreensão do fenômeno a ser
pesquisado é condicionada pela articulação de diversos aspectos: tema da
93
pesquisa, seus objetivos, a delimitação do contexto e o objeto de estudo, ou seja, o
tipo de manifestação simbólica a ser captada e observada. O objeto de estudo se
configura como o recorte da ampla variedade de formas de expressão que um
símbolo pode ter, sendo que esse recorte define a representação deste símbolo
como sendo a forma como ele é apresentado à consciência (coletiva ou individual).
As técnicas expressivas de caráter projetivo favorecem a apreensão dos
símbolos. Sonhos, fantasias dirigidas, imaginação ativa, relaxamento, meditação,
desenho, pintura, expressão corporal, dramatização e Sandplay são alguns dos
recursos utilizados para acessar material inconsciente. Jung foi um dos pioneiros no
uso de recursos expressivos em psicoterapia como um meio de trabalhar com os
produtos do inconsciente.
[...] eu aproveitava uma imagem onírica ou uma associação do paciente
para lhe dar como tarefa elaborar ou desenvolver estas imagens, deixando
a fantasia trabalhar livremente. De conformidade com o gosto ou os dotes
pessoais, cada um poderia fazê-lo de forma dramática, dialética, visual,
acústica, ou em forma de dança, de pintura, de desenho ou de modelagem.
(JUNG, vol.8, §400)
As técnicas expressivas são instrumentos que visam também amplificar os
conteúdos inconscientes contidos no símbolo e lançar luz sobre seus motivos
arquetípicos. Tais técnicas demonstram-se úteis no levantamento de temas
arquetípicos análogos, em diferentes manifestações simbólicas dentro de um mesmo
contexto (a psique atual do indivíduo) (PENNA, 2003).
Pode-se ainda lançar mão de questionários e entrevistas abertas ou
semidirigidas desde que formulados de modo a captar conteúdos conscientes e
inconscientes.
6.3.4 Relação pesquisador-pesquisado
Interação Eu – outro; sujeito – objeto; conhecido – desconhecido
A metodologia de pesquisa qualitativa afirma que a relação estabelecida entre
o pesquisador e o pesquisado deriva dos pressupostos epistemológicos que definem
a relação entre o conhecedor e o conhecido (DENZIN, 1998)
94
Do ponto de vista epistemológico, o fato de, na psicologia, a psique ser tanto
sujeito como objeto de conhecimento é o ponto crucial desta ciência, que se
distingue das outras, exatas ou naturais (PENNA, 2004). Jung considerava este o
maior desafio na busca de métodos em psicologia.
No paradigma junguiano, o mundo externo e o inconsciente são vivenciados
pelo ego como 'outro', isto acarreta diversos tipos de conexões entre o eu e o outro,
tais como: diferença e similaridade; união e separação; oposição e
complementaridade. Embora o outro esteja contido no mesmo todo do qual o ego
faz parte, não se trata de extinguir as diferenças entre eu e outro, uma vez que,
segundo Jung, "a identidade sujeito-objeto torna impossível qualquer conhecimento".
(voI. 6; § 402)
Do ponto de vista metodológico, é importante analisar as particularidades
dessa relação para assegurar que um conhecimento científico seja produzido. A
relação pesquisador-pesquisado envolve a articulação dinâmica de elementos
conhecidos e desconhecidos, tanto no plano interno como no plano externo ao
pesquisador.
Na abordagem simbólico-arquetípica do paradigma junguiano, pesquisador e
pesquisado formam um par de opostos complementares em que se estabelece uma
relação dialética mutuamente transformadora, sendo que a distinção entre as duas
entidades é sempre indispensável. O outro é algo ou alguém (objeto do
conhecimento) que não sou eu ou nós (pesquisador) sujeito do conhecimento
(PAPADOPOULOS, 2002). Deste modo a relação sujeito-objeto diferencia eu e
outro, mas não prioriza um em detrimento do outro. Embora a produção de
conhecimento seja, primordialmente, conduzida pelo pesquisador, a este não é
dado, em princípio, o controle egoico da situação de coleta de material, uma vez que
o inconsciente – pessoal e coletivo – participa e interfere constantemente no
processo. A manutenção de uma atitude simbólica em relação ao pesquisado
(outro), buscando integrar as polaridades em questão numa relação dialética de
trocas mútuas, favorece o andamento satisfatório do processo de apreensão dos
símbolos em questão.
O processo de pesquisa, na etapa de apreensão do fenômeno, compreende
95
dois sistemas em constante e intensa interação: o sistema pesquisador com seus
aspectos conscientes e inconscientes, e o sistema pesquisado – fenômeno psíquico
a ser conhecido – símbolo – com seus aspectos conhecidos e desconhecidos,
manifestos e subjacentes. Ambos, pesquisador e pesquisado fazem parte e
compartilham a dimensão coletiva consciente e inconsciente.
6.3.5 Compreensão do fenômeno - análise do material
Segundo Jung (vol.6), a função que entende o símbolo, utilizada na análise do
material coletado, é conduzida pelo 'pensamento simbólico' que opera por
associações, comparações e analogias entre diversas áreas do conhecimento e
entre as diversas funções da consciência. A compreensão dos fenômenos, ou seja,
a análise do material coletado é realizada por meio da elaboração dos símbolos.
A compreensão do fenômeno / símbolo, segundo Jung (vol.8), abrange as
etapas de tradução, interpretação, elaboração e integração do desconhecido à
consciência conhecedora. Estas etapas têm por objetivo auxiliar o pesquisador no
processo de compreensão da mensagem desconhecida contida no símbolo e
correspondem ao que Jung chamou sucessivamente de: método associativo –
comparativo; método hermenêutico; método hermenêutico-construtivo; método
sintético-hermenêutico e, por fim, método de amplificação simbólica dos fenômenos
psíquicos.
É importante ressaltar que, tanto na obra de Jung como para muitos pós-
junguianos, a distinção entre método e procedimentos metodológicos não é clara.
Frequentemente, estratégias (técnicas) empregadas para captar e compreender
material inconsciente são chamadas método. Imaginação ativa, sandplay e mesmo
desenho, visualização e meditação são denominados métodos na literatura
junguiana. Chodorow (2006), por exemplo, ao discutir imaginação ativa reconhece a
dificuldade para defini-la “porque Jung usou muitos nomes diferentes para descrever
o método” (p. 228). Posteriormente a autora se refere à imaginação ativa como uma
função da psique e, portanto, mais abrangente do que um método, o que de certa
forma é adequado, dependendo do entendimento que se tem do significado e do uso
da imaginação ativa. O mesmo se passa com relação à amplificação proposta por
Jung como método.
96
Assim sendo é oportuno esclarecer o estatuto de método e seu emprego
como procedimento metodológico no paradigma junguiano.
Pieri (2002) distingue a característica instrumental e a característica
modeladora da amplificação psicológica do material inconsciente. Segundo o autor,
o caráter instrumental designa um instrumento da prática e, dessa forma, uma
técnica; e o caráter modelador está associado à própria forma de argumentação da
teoria, principalmente a teoria dos arquétipos, que pressupõe a emergência de
símbolos com características análogas universalmente perceptíveis.
Em resumo, como discutido em Penna (2003), por um lado, a amplificação
simbólica é considerada um recurso metodológico que facilita e favorece a tradução
e posterior interpretação do material simbólico. Por outro lado, a amplificação pode
ser considerada o próprio método de investigação psicológica de C.G.Jung. Neste
caso, amplificação refere-se a um modo de pensar, constituindo a perspectiva pela
qual o conhecimento psicológico é produzido no paradigma junguiano.
O pensamento simbólico definido por Jung (vol.6) como a função que
compreende os símbolos é, em si, uma forma amplificatória de pensar que flui por
imagens, por comparações e por analogias em torno de um tema central. Esta forma
de pensar congrega todas as funções da consciência para rodear o símbolo num
movimento circum-ambulatório, em busca do sentido e do significado mais essencial
deste. A atuação integrada das funções da consciência nesse processo promove
uma produção de conhecimento de ordem intelectiva, perceptiva, valorativa e
intuitiva. Dessa forma, mais do que um pensamento simbólico, como foi proposto por
Jung, o processo de compreensão e assimilação dos símbolos é, na realidade, um
processamento simbólico arquetípico
5
do material.
Com o processamento simbólico arquetípico o potencial transformador do
símbolo se realiza e a transformação necessária, exigida pela totalidade e ensejada
pela auto-regulação, é alcançada, resultando na produção de um conhecimento
novo e significativo. Este conhecimento se realiza na medida em que aspectos do
5
Esse termo foi sugerido pela Drª Ceres Araújo por ocasião da apresentação da dissertação de
mestrado da autora, em 2003, “Um estudo sobre o método de investigação da psique na obra de C.G.Jung”, a
quem agradeço e aceito a sugestão.
97
inconsciente ou do mundo, antes desconhecidos, passam a fazer parte do sistema
consciente, operando uma ampliação da consciência, o que, em termos científicos
significa produção de conhecimento e, no plano individual, remete ao processo de
individuação.
O termo hermenêutica foi utilizado por Jung, à semelhança do linguista ou
arqueólogo que procura traduzir um fenômeno desconhecido a partir do conhecido
em busca da compreensão por analogias e comparações. Isso fica claro em sua
afirmação de que “qualquer interpretação é uma hipótese, apenas uma tentativa de
ler um texto desconhecido” (vol.16/1, § 322). No desenvolvimento de seu método, as
raízes de sua concepção de hermenêutica situam-se na conceituação das duas
formas de pensar do ser humano, quais sejam, o pensamento dirigido e o
pensamento não dirigido ou ‘pensamento-fantasia’. Este é associativo, analógico,
imagético e se aproxima mais do inconsciente (PENNA, 2003). A associação entre
essas duas formas de pensar resulta no pensamento simbólico.
O aspecto hermenêutico do método junguiano decorre do pressuposto
epistemológico de que o inconsciente só é acessível à consciência por meio dos
símbolos. Estes por sua vez, por sua natureza híbrida (consciente e inconsciente),
são percebidos pelo ego como uma mensagem cifrada, e como tal precisa ser
traduzida para a linguagem da consciência. Dessa forma, pela hermenêutica, os
símbolos são traduzidos em termos compreensíveis para a consciência.
Romanyshyn (2007) situa a origem da hermenêutica da psicologia analítica
mais na alquimia do que na filosofia moderna. Já Kluger (1993) considera a
hermenêutica junguiana um modo de pensar mais pós-moderno, do que a
hermenêutica filosófica moderna.
Ao caráter hermenêutico do método junguiano se acrescenta o caráter
construtivo e sintético que foi chamado por Jung de amplificação simbólica. Alguns
autores usam a denominação método hermenêutico construtivo para a amplificação
simbólica (CLARKE, 1993; MARONI,1998).
Em primeiro lugar, tive que me convencer profundamente de que a
"análise", na medida em que se restringe à decomposição, deve ser
necessariamente seguida por uma síntese. Em segundo lugar, tive que me
convencer da existência de um material psíquico praticamente desprovido
98
de significado quando simplesmente decomposto, mas que encerra uma
plenitude de sentido ao ser confirmado e ampliado por todos os meios
conscientes (é a chamada amplificação). Os valores das imagens ou
símbolos do inconsciente coletivo só aparecem quando submetidos a um
tratamento sintético. Como a análise decompõe o material simbólico da
fantasia em seus componentes, o processo sintético integra-o numa
expressão conjunta e coerente. (JUNG, voI. 7/1, §122)
De acordo com Chodorow (2006), o método de amplificação simbólica de
Jung é construído sobre o processo natural de associações paralelas extraídas de
diversas áreas do conhecimento, ou seja, em decorrência do método comparativo e
hermenêutico.
A compreensão do material de pesquisa considera os fenômenos tanto na
sua perspectiva causal como teleológica. Por um lado, as possíveis causas ou
antecedentes do evento psicológico informam sobre a dimensão histórica do símbolo
e localiza-o no contexto tanto pessoal como cultural em que ele ocorre. Isto está
associado ao que Jung denominou de método redutivo causal. E, por outro lado, a
perspectiva teleológica informa sobre a finalidade do símbolo no processo de
individuação, situando a atualidade do evento na perspectiva futura, em termos de
seu sentido e significado num contexto mais amplo e está associada ao que Jung
denominou método energético final. A perspectiva causal está ligada a perguntas do
tipo – por quê? A perspectiva final está associada a perguntas do tipo – para quê?
Estas duas perspectivas devem necessariamente ser abordadas na análise do
material para que uma compreensão junguiana dos fenômenos seja alcançada. A
perspectiva da sincronicidade deve ser cogitada como uma possibilidade de
compreensão, embora ela não esteja necessariamente presente, podendo, por
conseguinte, ser ou não um parâmetro de análise utilizável.
Um aspecto importante que ainda deve ser ressaltado no que diz respeito à
compreensão do material é a integração da perspectiva arquetípica dos eventos
(símbolo) com sua perspectiva pessoal.
No processamento simbólico arquetípico do material de pesquisa, alguns
parâmetros devem ser observados, tanto na apreensão como na compreensão dos
fenômenos: a causalidade, a finalidade e a eventual sincronicidade presentes nos
eventos simbólicos.
99
7 Análise e compreensão do material
De acordo com Pieri (2002), o termo análise indica um procedimento que visa
“à descrição, interpretação ou compreensão de um objeto qualquer segundo seus
componentes mais simples, e das diferentes relações entre os próprios
componentes” (p. 32).
O objeto desta pesquisa é a produção acadêmica (teses e dissertações) em
psicologia analítica, no contexto de duas universidades da cidade de São Paulo, que
têm tradição no ensino e na pesquisa em psicologia analítica.
Todo processo de pesquisa resulta em um texto, essa é a forma como
tradicionalmente as pesquisas acadêmicas são formatadas, pelo menos até hoje. É
possível que outras formas surjam com o avanço da tecnologia, mas por enquanto o
produto final das pesquisas é um texto, que pode ser considerado um documento
científico. Na análise das teses de mestrado e dissertações de doutorado recolhidas
para este estudo, o material para fins de análise ora é chamado de ‘pesquisa’, ora
‘texto’, ora ‘documento’, ou simplesmente material ou dados.
Cabe, assim, esclarecer que a análise do objeto de estudo desta pesquisa
pretende descrever as características gerais do objeto, destacar seus componentes,
observados e considerados mais relevantes, sugerindo relações entre alguns
aspectos significativos para fins de compreensão do fenômeno – produção
acadêmica em psicologia analítica – dentro de um contexto específico.
O objeto por meio do qual foram colhidas as informações para esta pesquisa
consiste no texto das teses de doutorado e dissertações de mestrado. E o meio pelo
qual esta pesquisa se produz é também um texto. Portanto a compreensão desses
textos é formada pela articulação entre o texto explícito e o texto compreendido.
A análise das pesquisas foi conduzida em duas etapas. Na primeira etapa é
feita uma apresentação do levantamento das teses de doutorado e das dissertações
de mestrado em duas amostras – geral e atual. Em ambas, o material coletado foi
organizado de modo a destacar os aspectos que se mostraram mais relevantes para
a compreensão do fenômeno investigado – produção acadêmica em psicologia
100
analítica. Na segunda etapa, o material foi organizado e analisado em diferentes
níveis de profundidade em cada uma das amostras, conforme o objetivo desta
pesquisa (análise da produção acadêmica atual em psicologia analítica). A etapa de
apresentação e organização do material faz uma análise descritiva das duas
amostras. Na segunda etapa, a organização do material foi feita com base no
registro do material coletado e nas categorias de análise selecionadas com o
objetivo de promover uma análise compreensiva do material, que posteriormente é
discutido articulando-se os dados levantados e a pesquisa bibliográfica realizada.
Considerando que qualquer análise consiste em descrição, compreensão e
interpretação e o processo dinâmico pelo qual as pesquisas são realizadas, o
material desta pesquisa será apresentado tendo em mente a ressalva que Jung
(vol.7/1) faz, de que toda análise deve ser “necessariamente seguida por uma
síntese” (§ 122) e, assim, descrição, análise, compreensão e discussão formam um
todo que evolui para uma visão integrada do processo de pesquisa.
7.1 Análise descritiva
A descrição dos dados desse levantamento foi feita sob dois ângulos:
1. em relação ao que foi denominado ‘amostra geral’, que inclui pesquisas em
psicologia analítica encontradas no período de 1990 a 2008.
2. Para efeito de análise foi feito um recorte na amostra geral denominada
‘amostra atual’ que se refere às pesquisas realizadas na área da Psicologia sob a
abordagem da psicologia analítica no período de 2002 a 2007 (conforme
especificado no capítulo 3).
7.1.1 Amostra geral
A amostra geral coletada, de acordo com os procedimentos descritos no
capítulo 5, consta de dissertações e teses realizadas no período de 1990 – 2008 nas
duas instituições (PUC-SP e USP), utilizando como abordagem a Psicologia
Analítica. Primeiramente cumpre salientar que esse levantamento pode não revelar a
totalidade das pesquisas efetivamente realizadas no período, em função de
possíveis falhas na coleta, como foi apontado no capítulo 5. No entanto supõe-se
101
que a amostra recolhida seja representativa do universo que se pretende investigar
e passível de análise e compreensão da situação atual da produção de pesquisas
acadêmicas em psicologia analítica no que diz respeito ao método.
A amostra ampla compõe-se de 126 pesquisas, sendo 98 dissertações de
mestrado e 28 teses de doutorado.
Tabela 1- amostra geral
Ano Doutorado Mestrado Total Porcentagem
1990 1 1 2 1,6%
1993 1 - 1 0,8%
1994 2 1 3 2,4%
1995 2 1 3 2,4%
1996 - 2 2 1,6%
1997 2 3 5 4,0%
1998 - 4 4 3,2%
1999 2 4 6 4,8%
2000 1 3 4 3,2%
2001 5 6 11 8,7%
2002 - 6 6 4,8%
2003 - 9 9 7,1%
2004 1 3 4 3,2%
2005 6 17 23 18,3%
2006 3 19 22 17,5%
2007 1 8 9 7,1%
2008 1 11 12 9,5%
Total 28 98 126 100,0%
Observa-se, durante os últimos 18 anos, um aumento gradual e constante na
produção acadêmica das duas instituições, com aumento significativo a partir de
2001. Na década de 1990 a 1999 temos 26 pesquisas ao passo que no período de
2000 a 2008 há um total de 100 pesquisas, o que demonstra um relevante
crescimento no interesse da comunidade acadêmica em conduzir pesquisas com
base na abordagem junguiana, o que também justifica o presente estudo.
Foi observada acentuada predominância de pesquisas de mestrado em
relação a pesquisas de doutorado, 78% das pesquisas encontradas são
dissertações de mestrado e 22% são teses de doutorado.
102
Nas duas instituições de ensino superior em que essas teses e dissertações
foram realizadas, observa-se uma distribuição em 7 áreas de conhecimento, sendo
que a grande maioria das pesquisas encontradas (75%) situa-se na área da
psicologia e 25% delas são oriundas de áreas de conhecimento fora da psicologia,
mas com acentuada predominância nas ciências humanas. Esse dado ilustra a
abrangência de aplicação da psicologia analítica.
Tabela 2 – amostra geral: área de concentração
Área de concentração Total Porcentagem
Ciências Contábeis 1 0,79%
Direito 1 0,79%
Gerontologia 1 0,79%
Medicina 1 0,79%
Educação 4 3,17%
Psicologia Social 3 2,38%
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
75,56%
Ciências da Religião 16 12,70%
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
16 12,70%
Psicologia Clínica 76 60,32%
Total geral 126 100,00%
De acordo com Freitas (2007), em levantamento realizado na USP, no
período de 1979 – 2006 foram encontrados “21 trabalhos de pós-graduação fora do
Instituto de Psicologia da USP que se valeram da psicologia analítica” (p. 62),
distribuídos em oito áreas de conhecimento. Esse dado, embora referente a um
período diferente do presente estudo, reafirma o panorama encontrado no contexto
do levantamento desta análise, quanto ao alcance da psicologia analítica na
academia atual.
103
Tabela 3 – amostra geral psicologia x outras áreas de concentração
Trabalhos acadêmicos no campo da
psicologia X outras áreas
Total Porcentagem
Psicologia 95 75,40%
Outras áreas do conhecimento 31 24,60%
Total Geral 126 100,00%
Na área da psicologia as teses e dissertações estão distribuídas em três sub-
áreas (departamentos ou programas de pós-graduação), sendo que 79% das
pesquisas encontradas pertencem à sub-área da psicologia clínica, o que demonstra
a aplicação do modelo junguiano preferencialmente neste campo clínico, pelo menos
aparentemente.
Tabela 4 – pesquisas em psicologia: sub-áreas
Pesquisas em psicologia: sub-áreas Total Porcentagem
Psicologia Social 3 3,2%
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
16 16,8%
Psicologia Clínica 76 80,0%
Total geral 95 100,0%
7.1.2 Amostra atual
O levantamento da produção acadêmica que constitui a amostra atual é
composto exclusivamente por pesquisas na área da psicologia no período de 2002-
2007, realizadas na abordagem da psicologia analítica conforme critérios de inclusão
e exclusão definidos no capítulo 5. Esta amostra é apresentada e analisada com
base em categorias de análise selecionadas em função de sua significância e
interesse para uma compreensão ampla e profunda da produção científica em
psicologia analítica no que diz respeito ao método por meio do qual a pesquisa foi
conduzida.
104
Essa amostra compreende 37 pesquisas, sendo 5 (14%) teses de doutorado
e 32 (86%) dissertações de mestrado. Mais uma vez é notável a maior incidência de
dissertações de mestrado na produção acadêmica em psicologia analítica.
Tabela 5 – amostra atual
Ano Doutorado Mestrado Total Porcentagem
2002 5 5 13,5%
2003 6 6 16,2%
2004 1 1 2,7%
2005 2 5 7 18,9%
2006 1 10 11 29,7%
2007 1 6 7 18,9%
Total 5 32 37 100,0%
Neste período o crescimento da produção se mantém num ritmo ascendente
constante, observando-se, porém, um aumento significativo da produção em 2005 e
2006. É bastante provável que esse aumento da produção científica de pesquisas
em psicologia analítica, nas duas instituições, esteja relacionado à criação do
‘Núcleo de Estudos Junguianos’ no programa de pós-graduação em Psicologia
Clinica da PUC-SP, em 2003, e também à inclusão da disciplina ‘Psicologia Analítica
de Jung e Grupos Vivenciais: Subsídios para a Pesquisa em Saúde e Educação’ no
elenco de disciplinas do IPUSP, em 2001, o que, segundo Freitas (2007), significa
que “na pós-graduação, a Psicologia de Jung encontra-se, portanto, oficialmente
abrigada atualmente na linha de pesquisa Saúde e Desenvolvimento Humano” (p.
62). Esses dados confirmam a hipótese geral de crescente interesse da comunidade
acadêmica em conduzir pesquisas na abordagem junguiana.
Quanto à predominância de dissertações sobre teses, esta se expressa de
forma até mais acentuada neste período do que na amostra geral. É possível supor
que num futuro próximo essa proporção possa se alterar um pouco, uma vez que
alguns dos novos pesquisadores que realizaram suas dissertações recentemente
podem vir a produzir pesquisas de doutorado. Mas a expectativa é que a
predominância de dissertações de mestrado se mantenha, seguindo a tendência
105
observada nos últimos 18 anos. Vale ressaltar que esse panorama (mais
dissertações do que teses) caracteriza a produção acadêmica em geral, segundo
dados do Dedalus, sistema integrado de bibliotecas da USP, e do Lúmen, sistema
de bibliotecas da PUC-SP.
7.2 Análise compreensiva
A amostra de pesquisas na área da psicologia encontradas no período de
2002-2007 que foram realizadas sob o enfoque da psicologia analítica foi organizada
a partir de sete vértices, selecionados como categorias de análise, com a finalidade
de fornecer subsídios para uma análise compreensiva do método pelo qual essas
pesquisas foram conduzidas e, com isso, viabilizar a discussão crítica do método de
pesquisa em psicologia analítica com o objetivo de sistematizar uma metodologia de
pesquisa em psicologia analítica.
Os vértices pelos quais essas pesquisas foram organizadas para fins de
análise foram selecionados com o objetivo de serem abordados os principais
aspectos componentes do método de pesquisa em psicologia analítica, conforme
discutido por Penna (2003). São eles: 1. método declarado pelo pesquisador, 2.
tema da pesquisa, 3. objeto / fenômeno alvo de investigação, 4. contexto da
pesquisa, 5. procedimentos de coleta de material – apreensão do fenômeno, 6.
procedimentos de análise – compreensão do fenômeno e 7. modalidades de
pesquisa. Foram feitas também associações entre alguns desses aspectos que se
mostraram relevantes ao longo do processo de análise.
A análise das pesquisas encontradas e recolhidas no levantamento realizado
neste estudo considera, em primeiro lugar, o relato dos pesquisadores, ou seja, tem
como fonte de informação o texto / documento consultado. Em segundo lugar foi
feita uma análise crítica das pesquisas pela leitura apurada e compreensiva dos
textos, conforme descrito no capítulo 5, portanto os vértices foram selecionados e
analisados a partir desta leitura crítica mais apurada dos textos consultados e não
mais exclusivamente baseado naquilo que o pesquisador declara ter feito, mas
também naquilo que se observou que ele fez.
106
7.2.1 Método declarado
O método pelo qual uma pesquisa é conduzida resulta da opção metodológica
do pesquisador e esta deriva da articulação de diversos fatores. Em geral, o fator
principal na determinação do método de pesquisa é o paradigma adotado pelo
pesquisador.
Entende-se por ‘método declarado’ aquilo que está explicitamente colocado
pelo pesquisador a respeito do método de pesquisa, isto é, a fonte de informação
para esta categoria é exclusivamente o texto sobre o método e as especificações
complementares sobre o método empregado na pesquisa especificado no texto da
pesquisa.
Na maioria das pesquisas analisadas, a justificativa para a opção
metodológica é feita prioritariamente em função do paradigma adotado pelo
pesquisador, no entanto, para alguns pesquisadores, percebe-se que o tema foi o
ponto de partida da investigação, e a opção metodológica é justificada em
decorrência do tema. Um exemplo desse processo é quando o pesquisador
primeiramente discorre sobre o tema, abordando-o sob diversas perspectivas
teóricas e, em seguida, justifica a opção pela abordagem junguiana como sendo a
mais adequada para os objetivos de sua pesquisa ou para o objeto de estudo em
questão.
Tabela 6 – método declarado
Método declarado Total Porcentagem
Qualitativo 8 22%
Não explicitado 7 19%
Explicitação das etapas da pesquisa 3 8%
Teórico 3 8%
Pesquisa de campo 2 5%
Quali/Quanti; Estudo exploratório 2 5%
Abordagem social e histórica 1 3%
Amplificação; Método simbólico construtivo 1 3%
Análise interpretativa 1 3%
Comparação entre grupos 1 3%
Empírico; Estudo de caso 1 3%
Método construtivo de Jung, fenomenológico 1 3%
Método junguiano 1 3%
Metodologia própria em caráter de ensaio 1 3%
Pesquisa descritiva Quali-Quanti 1 3%
Qualitativa; Estudo de caso 1 3%
Qualitativo e comparativo 1 3%
Qualitativo; Compreensão simbólica 1 3%
Total Geral 37
100%
107
Quanto ao método declarado pelo pesquisador, verificou-se uma ampla
variedade de denominações e especificações para o método escolhido e definido
para as pesquisas, o que resultou, na organização do material, num agrupamento de
18 tipos de denominações. Verificou-se que em 27% das pesquisas analisadas não
há menção, ou definição explícita sobre o método utilizado nas pesquisas. Vale
destacar, no entanto, que neste grupo incluem-se dois sub-grupos nos quais podem
ser observados tratamentos diferentes dispensados pelo pesquisador em relação ao
método.
Em 19% dos documentos não há nenhuma referência ao método empregado
nas pesquisas. Incluem-se aqui as pesquisas nas quais não se encontra destacado
um capítulo dedicado ao método e também não há explicitação da metodologia em
outros trechos do texto consultado. Essas pesquisas foram classificadas quanto ao
método declarado na categoria ‘método não explicitado’. Em 8% das pesquisas não
há definição explícita do método utilizado, mas observa-se menção e descrição do
método. Incluem-se aqui as pesquisas em que é destacado um capítulo para o
método, em que as etapas do processo de pesquisa e seus procedimentos
metodológicos são descritos, mas não é nomeado ou especificado o enfoque
metodológico da pesquisa. Estas foram classificadas na categoria ‘explicitação de
etapas’. Esta discriminação é importante, pois se percebe, em cada um desses dois
grupos, um tratamento diferenciado dispensado ao método da pesquisa. No primeiro
grupo, ‘método não explicitado’, pode-se supor que não haja nenhuma preocupação
por parte do pesquisador quanto à importância de ser destacado e explicitado o
método por meio do qual a pesquisa foi conduzida, embora, sem dúvida, o estudo
tenha sido feito com algum método. O segundo grupo, ‘explicitação de etapas’,
revela preocupação com relação à descrição do método de pesquisa ao destacar um
capítulo especialmente para esse assunto e ao explicitar como as pesquisas foram
conduzidas por meio da descrição das etapas do processo e dos procedimentos
utilizados, no entanto, não há definição ou especificação da opção metodológica.
Quanto a esse grupo pode-se supor que, embora seja evidente o valor atribuído ao
assunto método, talvez tenha havido alguma dificuldade quanto à definição ou à
especificação metodológica em função da ausência de literatura que oriente o
pesquisador no campo da psicologia analítica. Esta é apenas uma hipótese que
merece ser discutida.
108
Em 22% das pesquisas o método foi declarado como ‘qualitativo’ sem
nenhuma especificação; incluem-se nesta categoria denominações do tipo:
‘pesquisa qualitativa’, ‘método qualitativo de pesquisa’, ‘metodologia qualitativa’ ou
‘estudo qualitativo’, sem outras especificações.
Em 9% das pesquisas a declaração do método ‘qualitativo’ é complementada
por alguma especificação; incluem-se nesta categoria denominações tais como:
‘pesquisa qualitativa – estudo de caso’, método qualitativo e comparativo’, ‘método
qualitativo com ênfase na compreensão simbólica’.
Há ainda pesquisas (8%) em que método é definido como qualitativo e
quantitativo, sendo que duas delas recebem a especificação de estudo exploratório
e outra é definida como pesquisa descritiva com a especificação ‘quali-quanti’.
Dessa forma, no quadro geral, 38% das pesquisas podem ser avaliadas como
‘qualitativo + especificação’, no método declarado pelo pesquisador.
A definição ‘método teórico’ aparece em 8 % das pesquisas, embora desde já
se possa dizer que algumas pesquisas são nitidamente conduzidas pelo método
teórico sem que sejam definidas metodologicamente como tais.
Somente três pesquisas (8%) são definidas metodologicamente pelo
referencial junguiano; nestas o método declarado aparece como: ‘amplificação –
método simbólico construtivo’, ‘método junguiano’ e ‘método construtivo de Jung’.
Nota-se, no entanto, que muitos pesquisadores fazem uso da amplificação na
análise do material. (Esse tema será analisado em relação aos procedimentos de
análise). Nestes casos o uso da amplificação é feito como recurso metodológico e
não como método principal da pesquisa.
Além dessas especificações atribuídas ao método, que foram descritas na
tabela 6: método declarado, foram encontradas outras especificações que podem
ser consideradas secundárias por não constarem da definição principal do método,
mas que merecem destaque para fins de discussão sobre o assunto.
Em 5 pesquisas (13%) encontra-se menção à denominação ‘estudo
exploratório’, em 2 pesquisas esta denominação é a especificação principal do
método, em 3 pesquisas a denominação aparece como uma particularidade
109
secundária.
Em 10 pesquisas (27%) foi verificada menção a ‘estudo de campo’ ou
‘pesquisa de campo’. Em 2 pesquisas essa denominação consta como definição
principal do método, nas outras 8 a referência a pesquisa ou estudo de campo diz
respeito a uma particularidade da coleta de dados, não sendo considerada
característica definidora do método.
Vale ressaltar ainda a presença de uma pesquisa em que o método declarado
foi classificado como ‘metodologia própria em caráter de ensaio’ com base na
explicitação feita pelo pesquisador no capítulo intitulado ‘objeto da pesquisa e
metodologia’, nos seguintes termos: ‘[...] formam um conjunto de materiais
fundamentais para a compreensão do fenômeno, e consequentemente da visão que
desenvolvi da mesma a partir de minha metodologia’, mais adiante se encontra: ‘a
dissertação tem um caráter de ensaio, feito a partir dos materiais acima descritos’.
Merece destaque também uma pesquisa cujo método declarado foi ‘pesquisa
de campo’, em que o pesquisador declara: ‘esta dissertação possui algumas
pretensões, muitas das quais serão apenas esboçadas neste trabalho: propor uma
metodologia específica de pesquisa qualitativa em psicologia analítica, [...]’.
Essas duas pesquisas, ainda que representem uma minoria no contexto da
coleta realizada, podem ser ilustrativas da dificuldade encontrada pelo pesquisador
em definir o método de pesquisa em psicologia analítica. Concorre para essa
hipótese a amplitude de denominações dadas ao método de pesquisa – 18 tipos de
denominação – fazendo supor que, por vezes, os pesquisadores são levados a fazer
articulações metodológicas quase impossíveis de definição, ou a fazer uso de
nomenclatura emprestada de outras abordagens.
A análise mais acurada do material coletado, no que diz respeito ao método
declarado, demonstrou que em 95% das pesquisas é nítido o enfoque metodológico
qualitativo da pesquisa. Mesmo quando são utilizados recursos quantitativos, estes
servem como subsídios à análise qualitativa, não podendo ser considerado um
enfoque propriamente misto nos termos descritos anteriormente (cap.5), no entanto,
esse dado pode indicar uma possibilidade na pesquisa junguiana, ou seja, o uso de
dados que recebem um tratamento quantitativo para ampliar e/ou aprofundar a
110
análise simbólica e a discussão do material da pesquisa na perspectiva da psicologia
analítica.
Verificou-se em 5% das pesquisas a predominância de uma abordagem
quantitativa descritiva do material. Um dos pesquisadores declarou sua opção
metodológica como ‘pesquisa descritiva quantitativa e qualitativa’. Na análise mais
aprofundada do texto desta pesquisa, constata-se que o paradigma junguiano foi
utilizado apenas na discussão do material, não constando da apreensão e
compreensão dos dados. Em outra pesquisa em que não há explicitação da opção
metodológica, observa-se, porém, que o encaminhamento preferencial se deu pelo
enfoque metodológico quantitativo tanto na seleção dos objetos de estudo como na
escolha dos instrumentos de coleta e análise do material que priorizou as descrições
quantitativas, sem utilização do paradigma junguiano. Apenas na revisão preliminar
da literatura e nas considerações finais são feitas alusões a conceitos da psicologia
analítica. Essas duas pesquisas podem ser consideradas ‘pouco junguianas’ quanto
ao método. Talvez seja possível levantar uma hipótese de que, quando o enfoque
quantitativo é predominante, o produto final da pesquisa não pode ser considerado
um estudo junguiano, pois esse tipo de abordagem do fenômeno não contempla
uma análise de dados baseada na psicologia analítica.
7.2.2 Tema de pesquisa
Não foi possível classificar as pesquisas quanto ao tema. A ampla variedade
de temas e a interpenetração de assuntos não permitiram uma análise das
pesquisas por temas. Essa impossibilidade de classificação pode ser entendida
como uma característica da pós-modernidade pela maior flexibilidade e plasticidade
nas concepções científicas e pela diversidade e complexidade da própria vida
contemporânea que resultaram numa acentuada pulverização de necessidades e
interesses tanto no campo individual como cultural, proporcionando uma ampliação
dos horizontes do conhecimento assim como das oportunidades de pesquisa
científica.
Merece destaque quanto à análise do tema da pesquisa sua relação com os
objetivos da pesquisa e o objeto de estudo selecionado, assim como os
procedimentos de coleta embora esta articulação dificilmente seja passível de
111
expressão em termos de classificação ou categorização.
O tema da pesquisa constitui o símbolo que captura o pesquisador e é o
‘motivador básico’ da investigação; ele contém a incógnita a ser explorada. Há uma
estreita relação entre o tema e o objeto de pesquisa.
7.2.3 Objeto / fenômeno: alvo de investigação
O objeto da pesquisa é definido como a expressão ou manifestação por meio
da qual o símbolo contido no tema pode ser apreendido. O objeto de estudo
escolhido pelo pesquisador como alvo de sua investigação constitui-se então como o
fenômeno que se apresenta para o pesquisador como a melhor via de acesso ao
tema da pesquisa. Nesse sentido o objeto da pesquisa, parafraseando Jung (vol.6),
“constitui a melhor designação ou a melhor fórmula possível” para a investigação de
algo relativamente desconhecido, sendo portanto considerado a manifestão
simbólica escolhida, entre outras, pelo pesquisador, como o fenômeno a ser
investigado.
O objeto da pesquisa é, então, a expressão do símbolo por meio da qual o
pesquisador buscará, com seus procedimentos de apreensão, as informações
necessárias para que a incógnita do símbolo possa vir a ser compreendida. No
campo metodológico da pesquisa, o fenômeno investigado constitui-se pela síntese
entre o tema da pesquisa e as expressões pela quais esse fenômeno se manifesta
(objeto da pesquisa).
Em algumas pesquisas verificou-se a articulação de mais de um objeto de
estudo, ou seja, foram escolhidas mais de uma forma de expressão do fenômeno a
partir das quais o tema da pesquisa foi investigado. Para efeito de análise foram
destacados como objeto de estudo para compor as categorias de análise o objeto
predominante na apreensão dos dados. Os objetos de pesquisa foram, assim,
agrupados em três categorias de análise:
Seres humanos – quando o material pesquisado foi obtido diretamente por
pessoas, isto é a fonte de apreensão dos fenômenos foi o ser humano.
Fenômenos da cultura – quando o material de pesquisa foi obtido por meio da
112
apreensão de fenômenos culturais, tais como personagens de filmes, obras de arte,
atividades culturais ou outros elementos da cultura.
Conceitos teórico-científicos – esta categoria inclui pesquisas em que o
material pesquisado diz respeito a conceitos teóricos investigados no âmbito da
ciência. Embora conceitos científicos também possam ser considerados fenômenos
culturais, uma vez que a produção científica é parte integrante da cultura, decidiu-se
destacar essa categoria em função de suas especificidades quanto a uma
modalidade de pesquisa.
Tabela 7 – objeto de pesquisa
Objeto Total Porcentagem
Seres Humanos 23 62%
Fenômenos da cultura 8 22%
Conceitos teórico-científicos 6 16%
Total Geral 37 100%
Quanto ao objeto ou o fenômeno alvo de investigação, a grande maioria das
pesquisas tem como objeto de suas investigações o ser humano (62%), seja no
contexto clínico como sociocultural, seja no âmbito individual como grupal ou coletivo
mais amplo. Os fenômenos culturais aparecem como objeto de pesquisa em 22%
dos documentos, e a investigação sobre conceitos teóricos aparecem como objeto
de investigação em 16% das pesquisas.
7.2.4 Contexto da pesquisa
O contexto da pesquisa foi destacado neste estudo em função da importância
de sua delimitação na apreensão dos fenômenos na pesquisa. Assim como o
conhecimento humano é sempre contingente, isto é, ocorre dentro de um contexto
determinado que circunscreve suas possibilidades e limites; também as descobertas
resultantes de uma pesquisa – produção de conhecimento – principalmente sob o
enfoque qualitativo, são delimitadas pelo contexto em que os fenômenos são
coletados.
113
Em todas as pesquisas analisadas o contexto de apreensão do fenômeno é
claramente especificado, embora nem sempre sua delimitação seja justificada. O
contexto em que a compreensão do material foi realizada, isto é, o ângulo ou
perspectiva pela qual o material foi analisado raramente é explicitado. Às vezes, é
possível depreender a ênfase dada à análise pela leitura dos textos, mas optou-se
por não destacar esse vértice de análise em função da escassez de informações. Na
organização do material foi então destacado o contexto em que o fenômeno foi
colhido, denominado contexto de apreensão do fenômeno.
Contexto de apreensão – refere-se ao campo delimitado nas pesquisas para a
coleta do material. A delimitação deste contexto informa sobre o recorte e os limites
em que os dados foram coletados, configurando a abrangência dos resultados e a
amplitude de sua análise e interpretação. A validade do conhecimento nos estudos
qualitativos está associada àquilo que faz sentido num determinado contexto. A
importância da explicitação do contexto reside na descrição das condições em que
os dados foram coletados, ou seja, a situação em que o fenômeno foi observado e
registrado. Para a compreensão de um dado fenômeno é indispensável determinar o
contexto em que este fenômeno foi captado.
O contexto do fenômeno deve ser considerado, primeiramente, em relação à
dimensão espaço-temporal em que ele ocorre, isto é, as contingências culturais e
históricas em que ele surge (PENNA, 2003). Este, porém, não é o único critério para
a definição do contexto, além do espaço e do tempo deve-se considerar a situação e
as condições em que coleta foi feita, pois do contexto decorre o viés pelo qual o
fenômeno pode ser analisado e compreendido.
Kuhn ([1970] 2001) discute ciência como uma produção de conhecimento
realizada por cientistas e dá destaque aos cientistas como seres humanos e à
comunidade científica como integrante da comunidade humana, discutindo as
intrincadas relações entre indivíduo e cultura, ressaltando a importância do contexto
histórico e social em que as teorias científicas são produzidas.
A opção por um procedimento de investigação deve ser sintônica com o
método, sendo que a decisão sobre as estratégias e os instrumentos utilizados é da
competência do pesquisador e decorre do paradigma adotado por ele. Um mesmo
114
método admite vários recursos técnicos, dependendo do contexto da investigação.
No caso da psicologia analítica, o contexto psicoterapêutico admite procedimentos
que podem não ser procedentes em outros contextos.
Quanto ao contexto de apreensão, o material da presente pesquisa foi
agrupado e resultou em 6 tipos de contexto:
Contexto clínico: refere-se às pesquisas em que o material foi coletado no
âmbito clínico – consultório particular, instituição clínica pública ou privada – e a
perspectiva de compreensão do material é clínica.
Contexto institucional: refere-se às pesquisas em que o material foi coletado
no âmbito de instituições públicas ou privadas, tais como: universidades, hospitais,
ambulatórios ou escolas, e o objetivo da pesquisa era uma compreensão do
fenômeno no âmbito grupal, cultural ou histórico.
Contexto social: refere-se a pesquisas em que a delimitação da coleta de
material foi feita pela circunscrição de um grupo social específico determinado por
diversos critérios, tais como: faixa etária, gênero, pertencimento a grupos sociais
específicos.
Contexto cultural: refere-se às pesquisas em que o material foi coletado num
contexto amplo, abrangendo suas expressões na cultura em geral.
Contexto científico: refere-se às pesquisas cuja coleta foi circunscrita ao
âmbito científico, ou seja, textos científicos específicos.
Contexto histórico: refere-se às pesquisas cujo material foi coletado sob a
delimitação histórica do fenômeno, tais como documentos e textos de caráter
histórico.
115
Tabela 8 – contexto de apreensão
Contexto de Apreensão
Total Porcentagem
Clínico 9 24%
Institucional 8 22%
Social 8 22%
Cultural 6 16%
Científico 5 14%
Histórico 1 3%
Total Geral 37 100%
Em 24% das pesquisas, o material foi apreendido no contexto clínico quando
a coleta de dados se deu no ambiente clínico e sob a perspectiva clínica. Em todas
as pesquisas cujo contexto de apreensão é clínico o objeto de pesquisa foi o ser
humano. O contexto institucional de apreensão foi observado em 22% das
pesquisas, e o contexto social aparece em 22% das pesquisas. Em ambos o objeto
de estudo é predominantemente o ser humano, sendo que quanto às pesquisas cujo
contexto é institucional, em todas, exceto uma, o objeto de estudo é o ser humano, o
mesmo se observa nas pesquisas de contexto social. O contexto cultural foi aplicado
em 16% das pesquisas nas quais o objeto de estudo é predominantemente
fenômenos culturais (66%), com a presença de 22% de seres humanos como objeto
de estudo. O contexto científico e o contexto histórico perfazem 17% do total das
pesquisas analisadas, e o objeto de estudo neste caso são textos e documentos.
7.2.5 Procedimentos de coleta – apreensão do fenômeno
A escolha dos procedimentos de investigação é condicionada em larga escala
pela articulação do objeto de estudo, ou seja, o tipo de manifestação pela qual o
fenômeno é investigado, com os objetivos da pesquisa (DENZIN; LINCOLN, 1998).
Foi observada uma grande diversidade de procedimentos empregados na
apreensão dos fenômenos, que resultou na detecção de 84 procedimentos utilizados
116
pelos pesquisadores nas 37 pesquisas analisadas, que foram agrupados em
categorias de análise conforme descrição no capítulo 3.
As pesquisas são conduzidas com utilização de, em média, dois a três
instrumentos para apreensão dos fenômenos. Considerando-se que as pesquisas
teóricas fazem uso exclusivamente do recurso de pesquisa bibliográfica em sua
coleta de material, é bem provável que a média de utilização de outros recursos
metodológicos para apreensão de dados em cada pesquisa fique em torno de três a
quatro instrumentos de coleta utilizados pelos pesquisadores.
No quadro ‘procedimentos de coleta de dados por pesquisa’, anexo 4, pode-
se observar uma variação de um a sete instrumentos utilizados pelo pesquisador
para a coleta de material. Um dos pesquisadores, ao justificar seus procedimentos,
comenta que ‘a diversidade de métodos (procedimentos) reflete o esforço dos
pesquisadores para encontrar e elaborar recursos que contemplem o material de
pesquisa e o referencial teórico’.
Tabela 9 – procedimentos de coleta de material
Procedimentos de coleta Total Porcentagem
Entrevistas 17 18,1%
Pesquisa bibliográfica 12 12,8%
Observação 10 10,6%
Intervenção terapêutica 9 9,6%
Recursos Expressivos 9 9,6%
Registros escritos 6 6,4%
Registro de imagem e/ou som 6 6,4%
Questionário estruturado 5 5,3%
Testes psicológicos 5 5,3%
Testes projetivos 4 4,3%
Relato de sonhos 4 4,3%
Documentos 3 3,2%
Pesquisa literária 2 2,1%
Experiência do pesquisador 1 1,1%
Recursos Audio-Visuais 1 1,1%
Total Geral 94
100%
117
Em 32% das pesquisas é mencionado o uso da pesquisa bibliográfica como
meio de coletar material. No entanto, numa análise mais acurada das pesquisas
verifica-se que em todas é feito algum tipo de pesquisa bibliográfica com a finalidade
de colher informações sobre o fenômeno pesquisado.
Em 21% das pesquisas encontra-se referência ao uso da observação (direta
ou indireta) como recurso de apreensão do fenômeno. No entanto supõe-se que
alguma forma de observação esteja presente em todas as pesquisas, mesmo que
não tenha sido explicitada pelo pesquisador em seu método de apreensão do
fenômeno.
Entrevista é o procedimento mais frequentemente utilizado para apreensão
dos fenômenos; 46% das pesquisas usam entrevistas como instrumento de coleta
de material, com predominância da entrevista semi-dirigida, embora tenha sido
verificado o uso de entrevistas abertas e estruturadas também.
Recursos expressivos foram empregados na coleta de material em 24% das
pesquisas, e 10% fizeram uso de testes projetivos. Em algumas pesquisas há uma
articulação de dois ou mais instrumentos de caráter expressivo e/ou projetivo
(desenho e visualização, ou desenho e modelagem ou CAT e desenho) para
apreensão dos dados. Dentre os recursos expressivos, o mais comumente usado foi
o desenho.
Outro procedimento bastante usado refere-se às formas de intervenção
terapêutica que totalizam 22%. Dentre estas, o tipo de intervenção mais freqüente é
o Sandplay (37%).
O uso de instrumentos de registro de imagem e som foi utilizado por 16% dos
pesquisadores como forma de coleta, equipamentos tais como gravador e máquina
fotográfica ou vídeo foram usados, demonstrando a possibilidade de integração da
tecnologia com a observação e o registro pessoal do pesquisador, embora estes
ainda prevaleçam, evidenciando a pessoa do pesquisador como, em última análise,
o principal instrumento de apreensão dos fenômenos pesquisados.
A análise dos procedimentos de captação dos fenômenos possibilitou também
a classificação destes em termos de coleta de material escrito ou verbal (entrevistas
118
gravadas ou registradas, registros escritos pelos participantes e/ou pelos
pesquisadores, depoimentos gravados ou registrados, documentos, textos) e de
material não-verbal (desenhos, modelagem, imagens fotográficas, cinematográficas
ou mentais), o que do ponto de vista junguiano é altamente relevante, uma vez que
a expressão imagética do símbolo tem especial destaque tanto para Jung como para
os pós-junguianos. Em 35% das pesquisas são utilizados pelo menos um tipo de
procedimento para a coleta de material não-verbal.
Tabela 10 – material verbal e não-verbal
Material: verbal/não-verbal
Total Porcentagem
Material verbal 15 40,5%
Material verbal e não-verbal 9 24,3%
Material não-verbal 4 10,8%
Não se aplica 9 24,3%
Total Geral 37 100%
No entanto, apenas 20% dos pesquisadores referem-se à imagem como um
elemento destacado na análise e compreensão do material. Mesmo quando não há
referência a um procedimento específico para coleta de imagens, na análise do
material notam-se procedimentos em que as imagens são privilegiadas e analisadas.
Quanto aos instrumentos de coleta de material, é interessante destacar a
diversidade de procedimentos empregados nas pesquisas e a articulação criativa
destes, a fim de que sejam captadas as diversas faces do objeto de pesquisa e os
objetivos aos quais a investigação se propõe sejam mais amplamente alcançados. A
articulação entre procedimentos para captação de material verbal e material não-
verbal é especialmente interessante no sentido de revelar a intenção de apreender
aspectos dos símbolos investigados em sua vertente verbal e imagética, o que é
bastante sintônico com o paradigma junguiano. Outras articulações de instrumentos
também se mostraram muito criativas. Nota-se, por exemplo, que o emprego de
entrevistas – o mais usado nas pesquisas – como recurso metodológico para
119
apreensão do fenômeno, a maioria das vezes (73%), é articulado com algum outro
procedimento – testes projetivos, desenhos, modelagem, relato de sonhos ou
visualização de imagens.
A forma de elaborar o roteiro das entrevistas também denota a finalidade de
captar nuances do objeto, o que demonstra não apenas a perspicácia, sensibilidade
e criatividade do pesquisador como também a percepção das particularidades do
fenômeno que o objeto pode oferecer se for explorado por ângulos diversos. Um dos
pesquisadores faz uma descrição detalhada de seu roteiro de entrevista semi-
estruturada, que permite observar a forma como o instrumento congrega perguntas
objetivas que informam sobre alguns aspectos do tema em questão; perguntas que
evocam lembranças significativas na forma de histórias sobre o assunto – ‘conte-me
um caso ou uma situação de conflito ocorrida no departamento’; perguntas que
solicitam associação imagética na forma de imagens metafóricas sobre os temas
abordados – ‘se você tivesse que escolher um instrumento musical, um animal ou
uma canção para representar o departamento qual você escolheria’. Dependendo da
forma como uma entrevista é elaborada, ela é praticamente um recurso expressivo e
projetivo de captação de material consciente e inconsciente. Um dos pesquisadores
destaca a importância de se prestar atenção ao tom e ritmo de voz e aos gestos do
participante durante a entrevista. O uso do gravador para registro de entrevistas ou
depoimentos é bastante favorecedor para essa captação de nuances e ênfases
significativas para a análise.
7.2.6 Procedimentos de análise
Os procedimentos de análise estão diretamente associados aos
procedimentos de apreensão na medida em que o material é analisado em função
da forma como foi coletado, ainda que vários tratamentos possam ser dados do
ponto de vista compreensivo e interpretativo ao material obtido pelos procedimentos
de coleta. Nota-se, em geral, maior detalhamento dos procedimentos de coleta do
que dos procedimentos de análise nas pesquisas deste estudo. Em 10% das
pesquisas não foi encontrada menção aos procedimentos de análise do material,
mas todos os pesquisadores de alguma forma mencionam como seus dados foram
coletados. É possível supor que para estes pesquisadores não seja relevante a
discriminação de procedimentos de análise, embora os de coleta, sim; supõe-se
120
também que algum tipo de procedimento foi aplicado ao material para se proceder à
análise. Por vezes esse procedimento é feito de forma intuitiva e escapa ao crivo
analítico do pesquisador.
Observa-se também a utilização de procedimentos de análise combinados, ou
seja, em várias pesquisas são empregados mais de um procedimento de análise na
compreensão do material. A amplitude de procedimentos de análise é menor do que
a de procedimentos de coleta.
Os recursos metodológicos empregados na compreensão do material
pesquisado foram agrupados em torno de seis categorias (tabela 11) as quais tem
por objetivo apresentar os tipos de procedimentos utilizados e sua frequência de uso
diante da diversidade de procedimentos observada. Na tabela 12, os procedimentos
foram reagrupados em face da perspectiva teórica, ou seja, nessa tabela os
procedimentos: categorias de análise, quantitativos e elaborados pelo pesquisador
foram analisados quanto ao seu embasamento teórico.
Tabela 11 – procedimentos de análise
Procedimentos de Análise Total Porcentagem
Procedimentos
exclusivamente junguianos
20 34%
Procedimentos específicos de
outras abordagens
15 25%
Categorias de análise 9 15%
Procedimentos Quantitativos 6 10%
Análise conceitual 2 3%
Procedimentos elaborados
pelo pesquisador
12%
Não consta 6 10%
Total Geral 59 100%
Foram considerados procedimentos exclusivamente junguianos aqueles
característicos do paradigma junguiano. A determinação de procedimentos de
caráter junguiano considerou o procedimento explicitamente apresentado no texto
das dissertações e teses analisadas (amplificação, leitura simbólica, análise de
121
desenhos, análise de contos de fadas, análise de mitos) e a referência a autores
junguianos citados no texto.
Foram considerados procedimentos específicos de outras abordagens
aqueles que são explicitamente apontados no texto das pesquisas analisadas como
baseados em outros autores. Por exemplo ‘ análise de conteúdo proposta por
Bardin’, ‘descrição densa de Geertz’ ou ‘método de leitura baseado em Cervo e
Bervian’.
O procedimento ‘categorias de análise’, na tabela 11, evidencia o uso deste
tipo de procedimento na análise do material e a frequência com que ele aparece.
Categorias de análise como recurso metodológico empregado para a compreensão
dos fenômenos, associado ou não a procedimentos exclusivamente junguianos, são
bastante utilizadas se considerarmos que, em relação ao número de pesquisas
analisadas, 24% delas faz uso de categorias de análise para compreensão dos
fenômenos. O uso de categorias de análise, muitas vezes, aponta para uma visão
junguiana na organização e seleção de categorias de análise, principalmente no
caso de ‘categorias temáticas’, ou ‘categorias em torno de um eixo temático’. Na
tabela 12, este procedimento foi analisado em razão da fundamentação teórica na
qual se baseou o pesquisador para a formulação das categorias de análise, sendo
então incluído em uma das categorias dessa tabela.
A tabela ‘procedimentos de análise – fundamentação teórica’ expressa a
articulação entre os procedimentos selecionados e a base teórica na qual estes se
apoiam pela relevância que esse dado tem para o presente estudo. Para a
elaboração desta tabela foram consideradas, em primeiro lugar, as informações
colhidas para a tabela 11 e, em segundo lugar, a leitura analítica do material,
quando se buscou apreender a ênfase ou perspectiva pela qual o material foi
analisado, nos casos em que o texto consultado não foi suficientemente claro quanto
ao referencial teórico subjacente aos procedimentos de análise.
122
Tabela 12 – procedimentos de análise: fundamentação teórica
Procedimentos de Análise e
Fundamentação Teórica
Total Porcentagem
Procedimentos articulados (junguianos
e não-junguianos)
12 32%
Procedimentos não-junguianos 10 27%
Procedimentos exclusivamente
junguianos
8 22%
Procedimentos elaborados pelo
pesquisador
13%
Não consta 6 16%
Total Geral 37 100%
Em 27% das pesquisas são utilizados procedimentos de análise específicos
de outras abordagens teóricas. Em 32% das pesquisas há articulação de
procedimentos de análise junguianos e não junguianos, e 22% das pesquisas fazem
uso de procedimentos exclusivamente junguianos. Pode-se então perceber que 54%
das pesquisas empregam algum tipo de procedimento junguiano na análise de seu
material. Apenas uma pesquisa explicitamente utiliza a amplificação como recurso
metodológico único na compreensão dos fenômenos, mas em várias pesquisas
percebe-se o uso da amplificação simbólica como recurso básico e principal na
análise, embora isto não esteja especificado no texto sobre método da pesquisa.
7.2.7 Modalidade de pesquisa
A categoria de análise ‘modalidade de pesquisa’ foi selecionada na
expectativa da possibilidade de classificação do material coletado, a exemplo das
propostas encontradas na literatura sobre metodologia de pesquisa qualitativa,
adaptando-as ao paradigma junguiano. A nomenclatura sobre modalidades de
pesquisa varia muito entre os autores. Para Cozby (2003), as pesquisas podem ser
divididas em: básica e aplicada, sendo que esta divide-se em experimental e de
campo. Eco (1998) discrimina três tipos de pesquisa acadêmica: teórica, histórica e
experimental. Chizzotti (2003) faz duas grandes distinções nas pesquisas em
123
ciências humanas: experimental e qualitativa; e faz uma classificação extensa e
detalhada dessas pesquisas sob vários ângulos. Quanto à denotação que se quer
dar, elas podem ser do tipo: teórica ou fundamental, aplicada, descritiva, analítica,
descritiva, quantitativa, qualitativa ou nomotética. Quanto ao método de abordagem
analítica, elas podem ser: comparativas, históricas, funcionais, estruturais,
sistêmicas ou dialéticas. Em relação aos objetivos específicos a que se propõem
podem ser pesquisa clínica ou pesquisa-intervenção. Sampieri; Collado; Lucio
(2006) Mazzotti; Gewandsznajder (1998) e Severino (2002) preferem uma divisão
ampla: experimental, teórica e de campo.
Por modalidade de pesquisa entende-se uma categorização abrangente das
pesquisas, que engloba vários aspectos: o tema, os objetivos, o fenômeno alvo da
investigação, o contexto em que o fenômeno é investigado e a finalidade da
discussão empreendida na pesquisa pelo pesquisador.
Dessa articulação foram selecionadas as seguintes classificações, resultantes
da análise do material: cultural, clínica, teórica, análise institucional e mistas –
teórica-clínica e teórica-cultural.
Foram consideradas pesquisas culturais aquelas em que a tônica básica da
investigação é o plano cultural, ou seja, tratam de temas relativos à consciência
coletiva, os fenômenos escolhidos são enfocados pelo ângulo coletivo/cultural e não
pelo viés da individualidade; mesmo quando o objeto de estudo é o ser humano,
este é tratado como representante de um grupo social ou no âmbito mais amplo do
humano universal. O contexto da pesquisa é social, institucional, histórico ou cultural
e a compreensão do fenômeno tem como finalidade fazer articulações com o plano
arquetípico, visando a uma interpretação em termos coletivos. Nessas pesquisas
não há ênfase no aspecto subjetivo/individual do tema e dos fenômenos.
As pesquisas clínicas, por outro lado, têm a ênfase colocada no plano
subjetivo/individual. Os temas são relativos à prática clínica, os fenômenos
investigados são destacados pela sua expressão no ser humano como
individualidade e o contexto da pesquisa é principalmente clínico, mas também pode
ser institucional ou social.
As pesquisas teóricas são aquelas em que o tema refere-se a conceitos ou
124
aspectos científicos específicos de uma ou várias abordagens teóricas, os objetivos
são a ampliação, discussão ou aprofundamento de conceitos das teorias abordadas,
e os fenômenos destacados são, via de regra, textos ou documentos de cunho
científico. Esse tipo de pesquisa é denominado na literatura tradicional também
como pesquisa básica, fundamental ou pura.
As modalidades mistas são articulações entre modalidades. As pesquisas
consideradas teórico-clínicas são principalmente do tipo teórica, ou seja, trata-se de
um tema conceitual abordado no plano teórico, que faz uso de ilustração clínica para
aprofundar ou enriquecer a compreensão do material, e as pesquisas consideradas
teórico-culturais fazem uso de ilustrações ou amplificações culturais com o intuito de
compreender o fenômeno em sua articulação com o plano cultural.
A modalidade de pesquisa análise institucional foi destacada por sua
especificidade quanto ao tema, quanto ao objeto de estudo e quanto ao enfoque da
análise. Nestas pesquisas a instituição é tratada como uma ‘individualidade’ em suas
características e idiossincrasias e, por isso, não se encaixa na categoria cultural.
Tabela 13 – modalidade de pesquisa
Modalidade Total Porcentagem
Cultural 13 35%
Clínica 12 32%
Teórica 5 14%
Mista: teórica/clínica 3 8%
Análise instituicional 2 5%
Mista: teórica/cultural 2 5%
Total Geral 37 100,00%
A mais frequente modalidade de pesquisa encontrada refere-se à
investigação de fenômenos culturais no âmbito coletivo, que foi classificada como
pesquisa cultural e perfaz 35% do total. Em seguida há os estudos clínicos
observados em 32% da amostra. As pesquisas teóricas somam 14%. Foram
encontrados também estudos classificados como mistos (clínico-teóricos e teórico-
125
culturais) num total de 13%, e 5% das pesquisas foram definidas como análise
institucional.
Quanto às pesquisas clínicas, cabe salientar algumas diferenças no projeto
da pesquisa e no processo pelo qual ela é realizada, que podem parecer sutis, mas
envolvem escolhas e decisões particularmente diferentes por parte do pesquisador.
Em algumas pesquisas a intenção de investigar o material clínico foi posterior à
realização do processo terapêutico, em outras, o movimento foi inverso, ou seja, a
partir do propósito de fazer uma pesquisa decorre a intervenção terapêutica. No
primeiro caso, o pesquisador lança mão de registros arquivados e faz o trabalho de
análise e compreensão dos dados à semelhança das outras modalidades de
pesquisa. No segundo caso, o pesquisador escolhe como contexto e como
procedimento de coleta de dados o setting terapêutico; neste caso o papel e a
função de pesquisador e psicoterapeuta são acumulados e a investigação se
sobrepõe à intervenção. Essas duas formas de encaminhar o processo de
investigação acarretam implicações bastante distintas no que se refere ao vínculo
estabelecido entre o pesquisador e o participante, as quais merecem reflexão e
discussão.
A presença significativa de pesquisas cuja modalidade foi considerada cultural
aponta para uma característica do paradigma junguiano no campo da pesquisa, ou
seja, o campo da compreensão de fenômenos culturais na perspectiva simbólica
arquetípica. A concepção de inconsciente coletivo e da consciência coletiva como
âmbitos psíquicos de natureza universal leva à conceituação de símbolos culturais
(coletivos) e símbolos individuais. Nesse sentido a investigação psicológica de
material de ordem cultural é tão possível quanto apropriada para o paradigma e tem
se mostrado uma tendência significativa na produção de conhecimento em
psicologia analítica. A proporção entre pesquisas clínicas e culturais mostra também
que o paradigma junguiano, originalmente formulado por Jung para o campo clínico,
hoje divide o interesse dos pesquisadores com o campo cultural. Vale lembrar que o
próprio Jung apontou essa possibilidade em suas obras, ao discutir a perspectiva
simbólica arquetípica dos fenômenos culturais, mas a tradição junguiana de
aplicação da psicologia analítica até recentemente situava-se predominantemente
no campo clínico.
126
7.3 Comentários a título de propor uma discussão sobre
método de pesquisa em psicologia analítica
Em primeiro lugar deve ser salientado que a amostra de 37 pesquisas
analisadas quanto ao método apresenta trabalhos cujo método é bastante
sofisticado, articulando vários procedimentos para a apreensão dos fenômenos, e
faz uso de procedimentos combinados de análise para uma compreensão mais
profunda do material.
A utilização de ampla variedade de procedimentos metodológicos, seja na
coleta de dados, seja na análise do material de pesquisa, é uma marca do enfoque
qualitativo de pesquisa. Conforme comentam Mazzotti e Gewandsznajder (1998), “as
pesquisas qualitativas são caracteristicamente multi-metodológicas, isto é, usam
grande variedade de procedimentos e instrumentos de coleta de dados” (p. 163). A
articulação desses recursos visa atender da forma mais adequada possível às
necessidades que se impõem ao pesquisador no processo de pesquisa. Tais
recursos têm por finalidade a sintonia entre o tema da pesquisa, seus objetivos e as
características do objeto de pesquisa. Um dos pesquisadores expressa bem essa
questão: ‘a diversidade de métodos reflete o esforço dos pesquisadores para
encontrar e elaborar recursos que contemplem o material de pesquisa e o referencial
teórico’.
Concordando com Mazzotti e Gewandsznajder (1998), a variedade de
recursos metodológicos empregados na coleta de material é, não apenas
necessária, como também aconselhável nas pesquisas qualitativas e, sobretudo, na
pesquisa junguiana, pois os procedimentos metodológicos, conforme Oliveira (2007)
‘devem contemplar os objetivos e os fenômenos que a pesquisa pretende investigar’.
Foi observada também uma certa medida de criatividade na articulação de recursos
metodológicos para a coleta de material. Um pesquisador lança mão do recurso de
‘observador auxiliar com a função de complementar a coleta de dados feita pelo
pesquisador’.
Quanto à compreensão dos fenômenos, constatou-se menor variedade de
recursos metodológicos empregados, embora se verifique o uso de mais de um
procedimento nas pesquisas para a compreensão do material. O detalhamento dos
procedimentos é feito predominantemente na etapa de apreensão dos fenômenos.
127
Na etapa de compreensão do material, os procedimentos, quando explicitados, são
mencionados de forma mais genérica. Isto pode ser entendido como um viés
contaminador do enfoque metodológico quantitativo em que a análise, muitas vezes,
se resume ao tratamento estatístico dos dados e sua descrição é mais apresentativa
do que interpretativa. Este viés, por vezes, é observado também no enfoque
metodológico qualitativo. Mazzotti (1998); Sampieri, Collado e Lucio (2006); Chizzotti
(2003) são autores que, ao discutir metodologia qualitativa de pesquisa, se
estendem e detalham muito mais as questões relativas à escolha de objeto de
estudo e instrumentos de coleta do que aos procedimentos de compreensão do
material. Há, sem dúvida, autores como Bardin (1991); Rey (2001); e Lefèvre;
Lefévre (2003), que se dedicam à orientação no que diz respeito à organização e
análise dos dados. No entanto, o valor do relato minucioso dos recursos
metodológicos empregados na compreensão do material ainda parece não mobilizar
a maioria dos pesquisadores.
Considerando-se que as metodologias de pesquisa qualitativa exigem uma
articulação consistente entre epistemologia e método, é principalmente na etapa de
análise e interpretação que essa associação do método com os pressupostos
epistemológicos se faz mais imprescindível. Dessa forma, no que tange à pesquisa
em psicologia analítica, os procedimentos de compreensão dos fenômenos devem
ser preferencialmente buscados na literatura junguiana, podendo ser, obviamente,
articulados com outros procedimentos. É bastante compreensível o fato de 27% dos
pesquisadores terem buscado recursos metodológicos em outras abordagens em
função de uma suposta lacuna na bibliografia da psicologia analítica quanto a esse
assunto, no entanto, isso não foi apontado como uma dificuldade encontrada pelo
pesquisador na condução das pesquisas.
Vale ressaltar, ainda, que poucos pesquisadores relatam dificuldades
metodológicas encontradas no processo de pesquisa. Dois pesquisadores referem
dificuldade no acesso aos participantes da pesquisa e relatam mudança no plano
inicial da pesquisa em função das dificuldades encontradas durante o processo.
Poucos pesquisadores referem-se a modificações feitas em seus objetivos durante o
processo, entretanto, isso é bastante possível, uma vez que os objetivos gerais
iniciais podem se revelar parcialmente impossíveis de serem alcançados depois de
uma revisão de literatura mais aprofundada sobre o assunto, ou diante dos dados
128
coletados, requisitando reformulações nos objetivos da pesquisa. Um dos
pesquisadores assinala mudança nos objetivos e nos procedimentos da pesquisa,
‘no início da pesquisa pensávamos [que] para responder a tais questões seria
necessário um trabalho de campo ou uma pesquisa clínica [...] assim mudamos o
curso do trabalho [...] nossa pesquisa será construída a partir de um estudo teórico
bibliográfico’. Esse relato é muito interessante e cumpre um dos papéis da pesquisa
científica, qual seja, sua função de contribuir para a produção de conhecimento,
entretanto, não foi encontrada referência a dificuldades que tenham motivado tal
mudança.
A análise mais apurada das pesquisas, no entanto, faz supor a ocorrência de
dificuldades, seja na etapa de coleta de material, seja na etapa de análise e
interpretação do material. Uma dificuldade não declarada, mas observada na análise
das pesquisas diz respeito à explicitação e definição do método usado nas
pesquisas. A nomenclatura utilizada para definir o método, por vezes, é um tanto
ambivalente.
É muito interessante notar que em uma das pesquisas, em que o método
encontra-se muito bem apresentado e detalhado, este é denominado inicialmente
como ‘pesquisa empírica’ e, em seguida, como ‘estudo de caso’. Sob o título
Método, a pesquisa é definida como estudo de caso – ‘o estudo de caso foi
escolhido como método válido para ser utilizado no presente estudo’. Por outro lado,
verifica-se que o título Método faz parte de um capítulo intitulado Pesquisa Empírica,
em que são explicitadas as estratégias de coleta de dados e suas finalidades
perante os objetivos da pesquisa, onde se lê: ‘para se chegar ao objeto necessário à
presente investigação, será preciso colher os relatos das pessoas, para identificar os
símbolos presentes nesses relatos será preciso não apenas recolher ‘imagens’, mas
submetê-las a um processo de análise que confirme o seu enquadramento na
categoria símbolo dentro da perspectiva adotada por C.G. Jung e seus seguidores.
E somente após esse trabalho, tratar os dados colhidos com o objetivo de apreender
os diferentes sentidos [...] coletados esses dados é necessário arranjá-los de forma
a enfatizar os aspectos centrais que, organizados permitem uma análise segundo a
hermenêutica junguiana’. No capítulo sobre a organização do material em categorias
de análise, o método é denominado como ‘método empírico, estudo de caso’. Essa
pesquisa foi classificada quanto à categoria ‘método declarado’ como ‘pesquisa
129
empírica, estudo de caso’. No entanto, parece evidente que se trata de uma
pesquisa eminentemente junguiana desde seus objetivos, procedimentos de coleta e
procedimentos de análise. Entretanto, o método pelo qual ela é definida não faz
nenhuma referência ao paradigma junguiano. Essa é uma questão que merece
reflexão.
Este é um exemplo, dentre outros, em que a nomenclatura não coincide
plenamente com o método efetivamente utilizado. A denominação ‘pesquisa
qualitativa’, encontrada em 22% das pesquisas, é invariavelmente acertada para um
estudo sob o enfoque da psicologia analítica, mas ela, via de regra, requer uma
qualificação mais específica, uma vez que os métodos qualitativos de pesquisa
abrangem uma ampla gama de procedimentos e enfoques teórico-metodológicos
que, muitas vezes, não expressam claramente o método pelo qual a pesquisa foi
conduzida.
Algumas especificações foram explicitadas no capítulo sobre método e
constam da tabela 6; outras foram encontradas ao longo do texto da pesquisa e,
portanto, não constam da tabela. Alguns trabalhos, 13%, fazem menção adicional ao
caráter exploratório da pesquisa, por exemplo, ‘ trata-se de um estudo exploratório’
ou ‘estudo exploratório teórico-clínico’. A referência ao caráter exploratório da
pesquisa como qualificação adicional não é explicada ou justificada. Segundo Quivy
e Van Campenhoudt (1992), os estudos exploratórios são definidos como aqueles
que têm por finalidade esclarecer e/ou modificar conceitos e ideias com o objetivo de
uma formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para
estudos posteriores. Para Sampieri, Collado e Lucio (2006), “os estudos
exploratórios [são realizados], normalmente quando o objetivo é examinar um tema
ou problema de pesquisa pouco estudado, do qual se tem muitas dúvidas ou não foi
abordado antes”. (p. 99). Há referências também ao caráter descritivo – ‘estudo
descritivo’ – das pesquisas, entretanto, não foi encontrada justificação para o uso
desse qualificativo no texto das pesquisas. Uma suposição que pode ser levantada é
que, em se tratando de nomenclatura usual em metodologia de pesquisa, isto
dispense esclarecimentos, o que não se justifica, uma vez que é aconselhável que o
método em pesquisa qualitativa seja detalhadamente explicitado em função de sua
diversidade de possibilidades tanto em termos de recursos metodológicos com de
aportes epistemológicos. De acordo com Sampieri, Collado e Lucio (2006), os
130
estudos descritivos, muitas vezes, dispensam a especificação de procedimentos de
análise, uma vez que a análise se resume à descrição, quantitativa ou não, do
material coletado. Para Chizzotti (2003), a pesquisa descritiva restringe-se à
descrição dos fatos ao passo que a pesquisa analítica faz análises interpretativas
das quais se podem extrair conclusões. A pesquisa qualitativa, porém, busca
principalmente a compreensão aprofundada do material e, por isso, dispensa uma
coleta extensa e abrangente, como é o caso da pesquisa quantitativa, mas, por outro
lado, requer aprofundamento analítico. Dessa forma os procedimentos de análise
tornam-se altamente relevantes, pois as descobertas e a discussão do material
dependem em larga escala da compreensão qualitativa do material. Compreensão
esta que é, em larga escala, limitada pelo contexto em que o fenômeno é captado e
pelos meios pelos quais o material é tratado, analisado e discutido.
O método empregado pelos pesquisadores em suas pesquisas demonstra a
diversidade e complexidade que a metodologia qualitativa de pesquisa oferece, o
que a um só tempo pode ser considerado um fator enriquecedor e problemático. Por
um lado, o pesquisador precisa tomar muitas decisões e fazer diversas escolhas,
num amplo leque de possibilidades, em todas as etapas do processo de pesquisa,
buscando a melhor forma de investigação conforme seus objetivos e tema de
pesquisa. Nesse percurso uma ampla gama de procedimentos lhe é oferecida,
sendo o produto final – método – de certa forma uma composição particular em cada
pesquisa, o que poderia justificar a denominação ‘minha metodologia’, como foi
observado em uma das pesquisas analisadas. Por outro lado, a produção científica
de conhecimento busca sempre uma organização e sistematização do conhecimento
produzido com a finalidade de se alcançar um corpo de conhecimentos acumulados,
seja para embasar ou orientar profissionais e pesquisadores, seja para ser avaliado,
criticado e contestado pela comunidade científica e/ou pelo público em geral, de tal
modo que o processo de conhecimento humano siga seu processo de ampliação e
complexificação da consciência coletiva – cultura. Portanto é aconselhável e
necessário que sejam procurados e encontrados termos, definições e explicações
para todo tipo de recurso metodológico utilizado em pesquisa com o objetivo de se
formar uma linguagem compreensível e comunicável.
Quanto à explicitação dos objetivos, é interessante analisar os termos com
que estes são formulados. Em alguns textos, os objetivos estão expressos em
131
termos de: ‘verificar de que forma determinadas características’, ‘verificar a
importância de’, ‘verificar se’, ‘verificar o nível de satisfação’, ‘verificar a expressão
de’, ‘demonstrar a viabilidade de’, ‘definir e rastrear’, ’investigar as causas
determinantes de’.
Depreende-se no texto das pesquisas analisadas, uma certa preocupação
ambivalente do pesquisador, que oscila entre conferir um caráter científico as suas
pesquisas, pelo uso de uma linguagem emprestada das pesquisas experimentais
tradicionais. Por outro lado, ao afirmar o caráter qualitativo de sua pesquisa, nota-se
uma tentativa de minimizar o valor do trabalho.
Ao tentar ‘demonstrar’ ou ‘evidenciar’ algo, supõe-se que o pesquisador partiu
de uma hipótese que pretende demonstrar ou evidenciar em sua pesquisa. Muitas
vezes, no entanto, esta hipótese inicial não é apresentada. Este tipo de formulação
que enfatiza a verificação, comprovação, demonstração e definição do fenômeno,
deixa transparecer o uso de uma linguagem que parece derivada das ciências
exatas e da pesquisa experimental lógico-empírica. Deve-se evitar o uso burocrático
da nomenclatura.
Por outro lado, algumas pesquisas apresentam os objetivos como: ‘ampliar a
compreensão’, ‘aprofundar questões’, ‘compreender a temática’, ‘investigar o
significado simbólico’, ‘explorar’, ‘ampliar o conhecimento e auxiliar na prática
clínica’, ‘abordar o simbolismo e os fundamentos arquetípicos de’, ‘explorar a
contribuição’, ‘análise simbólica’, ‘observação e análise dos resultados terapêuticos’
ou ‘propor, aplicar e avaliar’. Este tipo de formulação salienta a compreensão,
discussão, exploração e avaliação do fenômeno em termos de uma linguagem que
se aproxima mais do enfoque qualitativo das ciências humanas. O caráter
eminentemente compreensivo e interpretativo do enfoque qualitativo de pesquisas
tende a encaminhar a investigação no sentido da compreensão, análise,
interpretação ou exploração de significados.
Há ainda um grupo em que os objetivos são postos de forma apresentativa,
sugerindo uma intenção mais descritiva do que analítica ou dinâmica do fenômeno:
tratar, estudar, apresentar, abordar, observar.
Quanto aos meios de apreensão do fenômeno em psicologia analítica, estes
132
devem ser eleitos entre aqueles que possibilitem o acesso a aspectos inconscientes,
para tanto, muitas vezes, é necessária a associação de instrumentos cuja
articulação torna acessível material inconsciente e material consciente, isto favorece
a revelação de aspectos inconscientes do símbolo e a constatação de seus aspectos
manifestos.
Apenas 16% dos pesquisadores fazem menção ao uso de instrumentos de
coleta capazes de captar material inconsciente, embora numa análise mais
aprofundada das pesquisas observe-se que muitos instrumentos de coleta
escolhidos se prestam nitidamente à captação de material inconsciente, tais como
recursos expressivos de caráter projetivo (desenhos, técnica de visualização,
técnicas de mobilização, sandplay, sonhos) e testes projetivos (CAP, HTP, teste de
associação de palavras). Na análise do material, fica mais evidente a preocupação
com a compreensão e avaliação dos aspectos inconscientes do material, entretanto,
sobretudo na análise, raramente é destacada a particularidade do procedimento
escolhido em função da consideração das facetas inconscientes captadas. Este fato
pode levar à suposição de que, na verdade, o pesquisador junguiano não considera
necessário explicitar sua intenção de coletar material inconsciente ou mencionar
esse critério na escolha de seus procedimentos metodológicos, talvez por considerar
que esse critério seja óbvio. Cumpre salientar, entretanto, que o inconsciente está na
base ontológica do paradigma junguiano, sendo determinante na epistemologia e
condicionante do método de investigação da psique, não podendo, portanto, ser
negligenciado ou esquecido, tanto na etapa de apreensão dos fenômenos como na
etapa de compreensão destes.
O paradigma junguiano destaca como parâmetros de análise a causa e a
finalidade dos fenômenos, as quais estão intrinsecamente articuladas na forja do
fenômeno e, portanto, devem ser consideradas em sua compreensão. Na amostra
coletada há raríssimas referências à intenção de compreensão da finalidade dos
fenômenos investigados. Apenas uma pesquisa explicita nos objetivos a intenção de
investigar a finalidade do fenômeno – ‘abordar os fundamentos arquetípicos,
compreender sua finalidade e seus significados para a psique subjetiva’, e apenas
um pesquisador destaca em seu método a finalidade do fenômeno como um dos
parâmetros para sua análise – ‘levando em conta a finalidade e o significado, não
somente a causalidade e a origem’ do fenômeno a ser investigado. Nota-se, ainda,
133
que alguns, poucos, pesquisadores demonstram preocupação em ressaltar os
aspectos prospectivos dos achados de sua pesquisa. Assim, é possível concluir que
a ênfase no aspecto prospectivo, ou mesmo o destaque da análise da finalidade dos
fenômenos, não constitui uma marca distintiva das pesquisas analisadas neste
estudo.
Sobre a apreensão e compreensão dos fenômenos investigados, parece ser
uma marca das pesquisas a articulação de diferentes procedimentos. O uso da
amplificação simbólica como recurso metodológico foi observado em algumas
pesquisas. Alguns pesquisadores referem-se à amplificação como método. Cumpre
lembrar que, de fato, Jung utiliza essa nomenclatura – método construtivo sintético
ou método hermenêutico construtivo – para se referir à amplificação, no entanto,
nestes casos, trata-se, mais de um procedimento para compreensão (análise e
interpretação) dos fenômenos do que de método de pesquisa. Com a análise em
profundidade das pesquisas, por outro lado, foi possível perceber em duas delas a
aplicação da amplificação como método no processo de pesquisa como um todo,
desde a colocação dos objetivos, passando pelos procedimentos de coleta até os
recursos empregados na análise do material. Apenas um desses pesquisadores
nomeia, acertadamente, o método da pesquisa como ‘simbólico construtivo –
amplificação’.
O emprego de diversos recursos metodológicos para a compreensão dos
fenômenos deve ser cuidadosamente avaliado, a fim de evitar um produto de
análises que se revelem contraditórias ou inadequadas para o paradigma adotado
pelo pesquisador.
Foi observada também, em algumas pesquisas, a articulação de vários
objetos de pesquisa como meio de captar diversas formas de expressão do
fenômeno / símbolo. Essa articulação, às vezes, mostrou-se enriquecedora, mas,
outras vezes, revelou-se problemática. A título de ilustração, adiciona-se ao objeto
principal do estudo um objeto secundário com a intenção de ampliar e enriquecer a
compreensão do fenômeno, no entanto, a suposta ampliação pode acarretar a
captação de material difuso e de difícil articulação na etapa de análise, sem
promover uma discussão mais profunda do fenômeno, mas apenas resultando numa
discussão superficial. Por outro lado, há situações em que a adição de um novo
134
objeto de pesquisa a título de ilustração, de fato, promove ampliação e
aprofundamento na compreensão do tema da pesquisa.
Todos os tipos de articulação, quer seja de procedimentos, ou de objetos de
estudo, tornam mais complexo o manejo da diversidade de material disponível e
consequentemente de material a ser analisado e discutido. Ao optar por essas
articulações o pesquisador deve atentar para as exigências que essa opção
acarreta.
Não foi possível avaliar a relação entre o pesquisador e o pesquisado em
profundidade por falta de material apropriado para tanto. No caso das pesquisas em
que o objeto de estudo – o pesquisado – eram seres humanos, a maioria dos
pesquisadores descreveu detalhadamente a escolha dos participantes e o contato
com eles, e atentou para os cuidados éticos necessários e indispensáveis para a
realização da pesquisa. Alguns, pesquisadores mencionaram o cuidado quanto à
escolha de local seguro e reservado para a coleta de material, denotando
preocupação com o bem-estar do participante, assegurando também melhores
condições para uma boa captação do material. Em alguns casos foi possível
perceber uma atenção dispensada à forma de solicitar as informações, de modo a
favorecer a coleta e/ou proporcionar conforto ao participante, garantindo
naturalidade e espontaneidade às informações oferecidas pelo participante da
pesquisa. No caso de pesquisas em que o pesquisado consistiu em fenômenos
culturais, documentos ou textos, há referências aos critérios de escolha e acesso ao
material. Não se observa, no entanto, referência a dificuldades no contato com o
pesquisado / participante ou menção a questões relativas a contratransferência.
A ausência de comentários nem sempre pode ser tomada como sinônimo de
falta de preocupação ou consideração sobre alguns assuntos. Na verdade parece
que na cultura não há o hábito de se tecer considerações sobre as dificuldades
enfrentadas no trabalho científico, em geral, e nos trabalhos acadêmicos, em
particular. As dificuldades devem ser contornadas, solucionadas, mas não
evidenciadas. Há pouquíssima literatura sobre falhas ou erros. Em congressos e
encontros científicos raramente são apresentados trabalhos que proponham reflexão
sobre erros ou dificuldades próprias, em geral, isso fica a cargo de críticas externas.
135
Convém assinalar a total ausência de referência ao fator sincronicidade nas
pesquisas analisadas, embora a sincronicidade esteja presente, no paradigma
junguiano, como um dos parâmetros de explicação dos fenômenos, da mesma forma
que a causalidade e a finalidade. É, no entanto, bastante compreensível essa
ausência por dois motivos. Primeiro, porque o fator sincronicidade não é uma
ocorrência necessária como a causalidade e a finalidade, mas, sim, esporádica.
Segundo, porque a inclusão da sincronicidade como uma característica possível ou
mesmo viável na configuração dos fenômenos não faz parte do cotidiano dos
pesquisadores, aliás, não só dos pesquisadores como da população em geral. Na
literatura sobre pesquisa científica, recentemente, algumas referências esparsas ao
fator acaso têm sido observadas. Um tipo de ‘acaso significativo’ são as descobertas
acidentais, também conhecidas no ambiente científico como serendipity. “Só é
possível fazer descobertas acidentais quando se vê o mundo com olhos curiosos”
(COZBY, 2003, p.33).
Da mesma forma, os pesquisadores não fazem nenhuma alusão ao uso da
intuição como função da consciência, como recurso para a captação dos fenômenos.
Como mencionado anteriormente, a concepção de ciência e método ainda
predominante na academia privilegia o ‘pensamento científico’, a ‘percepção
científica’, e mais recentemente, valoriza a avaliação ou julgamento na ciência, mas
devota muito pouca atenção para a intuição como uma faculdade utilizável na
atividade de pesquisa científica.
Cozby (2003) menciona a abordagem intuitiva como frequente, mas
problemática. De acordo com o autor, “a intuição é usada para explicar eventos
integrantes observados” (p. 18). No entanto ao exemplificar situações em que isso
acontece, percebe-se que, inicialmente, sua noção de intuição está relacionada com
fantasia, imaginação e projeção. Ao alertar sobre os problemas em relação à
intuição, o autor menciona os vieses cognitivos e motivacionais (‘correlações
ilusórias’) que afetam a percepção e acarretam conclusões errôneas sobre a relação
causa e efeito dos eventos, e nesse momento sua definição de intuição confunde-se
com a noção de sincronicidade, quando afirma “o viés cognitivo chamado correlação
ilusória acontece quando focalizamos dois eventos que se sobressaem e ocorrem
juntos” (p. 18).
136
Por fim, é oportuno salientar que os relatos de pesquisa são sempre redutivos
e dificilmente conseguem expressar tudo que se passa num processo de pesquisa,
visto que seu objetivo principal consiste em comunicar os achados da pesquisa e
fazer uma contribuição à produção de conhecimento mais do tipo pontual do que
processual. Outro aspecto que merece destaque diz respeito ao imperativo do
cumprimento de formalidades nos relatos de pesquisa, lembrando que atualmente os
indicadores de produção científica, tanto no plano nacional como internacional,
privilegiam quantidade, muitas vezes, em detrimento da qualidade. Particularmente
no campo da produção acadêmica, segundo Waters (2006), atualmente, o número
de publicações é mais importante para os órgãos científicos do que sua utilidade
para a ciência. Nesse contexto, o cumprimento de formalidades supera a
criatividade, e o aspecto burocrático se impõe na produção acadêmica em
detrimento de um trabalho de cunho mais artesanal reflexivo e crítico. Waters (2006)
aponta, nesse sentido, uma situação paradoxal que interessa particularmente aos
pesquisadores das ciências humanas que se dedicam à pesquisa qualitativa. De
acordo com o autor, ao mesmo tempo em que nos últimos vinte anos as publicações
científicas, em algumas universidades norte-americanas, chegaram a se multiplicar
por seis, “vimos diminuir, acentuadamente em alguns casos, o número de
publicações na área de humanidades” (p. 9) em instituições acadêmicas altamente
conceituadas dos EUA.
Essa informação pode contribuir para reflexões e conjecturas no contexto
deste estudo. Será que a queda na produção em ‘humanidades’ tem relação com o
fato de que o processo de pesquisa no enfoque qualitativo demanda mais tempo e
mais investimento pessoal do pesquisador? Ou será que a concepção de ciência e,
portanto, de método e produção científica, privilegia pesquisas quantitativas de
caráter descritivo mais abrangentes e menos onerosas para o pesquisador, uma vez
que podem ser conduzidas por técnicos de pesquisa e auxiliadas em grande escala
pela tecnologia, tanto na coleta como na análise dos dados? Ou será que a
compreensão qualitativa e crítica da realidade desperta menos interesse e mobiliza
menos a consciência coletiva contemporânea?
Com o intuito de ampliar tais reflexões cabe aqui ressaltar Tarnas (2001), que
aponta como uma das características principais do pensamento pós-moderno, “uma
consciência crítica da natureza essencialmente interpretativa da cultura” (p. 424)
137
contemporânea que não se satisfaz mais com a simples constatação dos fatos, mas
deseja compreendê-los e interpretá-los criticamente. Vale lembrar também Prigogine
(1996), para quem a concepção de ciência contemporânea permite a criatividade
como expressão singular de um traço humano comum e fundamental a todos os
níveis de conhecimento, e ainda Kuhn ([1970] 2001), que discute ciência como uma
produção de conhecimento realizada por cientistas, e dá destaque aos cientistas
como seres humanos e à comunidade científica como integrante da comunidade
humana.
No próximo capítulo será abordado o Processo de pesquisa em psicologia
analítica, suas características e demandas para o pesquisador que pretende
conduzir pesquisas sob o enfoque da psicologia analítica. A discussão do processo
de pesquisa pretende articular a análise da produção acadêmica recente em
psicologia analítica com a literatura disponível sobre o tema, com o objetivo de dar
subsídios aos pesquisadores da área.
138
8 Processo de pesquisa - processo de
individuação - processo analítico
Na pesquisa em psicologia analítica, devem ser destacados dois aspectos
principais. Em primeiro lugar, a pesquisa é considerada um processo dinâmico de
produção de conhecimento científico e, em segundo lugar, o pesquisador como parte
integrante do processo é um pesquisador participativo (PENNA, 2007). Dessa forma,
a discussão do processo de pesquisa em psicologia analítica, por um lado,
contextualiza seus diversos aspectos perante a pesquisa qualitativa contemporânea
num todo orgânico e dinâmico. E, por outro lado, destaca a pessoa do pesquisador
como o ator – autor principal dessa aventura que é realizar uma pesquisa científica.
Para a discussão do processo de pesquisa em psicologia analítica, faz-se
necessário em primeiríssimo lugar ressaltar que o caráter dinâmico deste processo
exige uma postura dialética constante em relação às polaridades consciente e
inconsciente do pesquisador e do pesquisado. Esta postura se assenta na atitude
simbólica do pesquisador perante o processo (PENNA, 2007), e isso significa pôr em
ação todos os recursos psíquicos de que dispõe para que o conhecimento se
processe.
8.1 Características gerais do processo
Vários autores (SAMPIERI. COLLADO e LUCIO, 2006; DENZIN; LINCOLN,
1998; ALLONES, 2004; ROMANYSHYN, 2007) consideram a pesquisa qualitativa
como resultante de um processo dinâmico.
Considerando-se ciência como uma produção de conhecimento realizada por
cientistas, enfatiza-se a pessoa do pesquisador como produtor de conhecimento;
com isso o centro da discussão científica se desloca da natureza e das teorias para
o ser humano como ponto de partida e como alvo desta produção.
O processo de pesquisa guarda analogias com o processo analítico e com o
processo de individuação proposto por Jung, mas também se distingue destes em
alguns aspectos relevantes, os quais serão abordados ao longo deste capítulo. Em
139
toda e qualquer pesquisa, em qualquer área do conhecimento, a partir de qualquer
orientação paradigmática e sob qualquer enfoque metodológico há uma constante
inegável, na realização de uma pesquisa, que é a pessoa do pesquisador, um ser
humano que, não importa quais recursos teóricos, metodológicos ou tecnológicos
utilize, conduzirá a pesquisa.
A psique do pesquisador é sua mais importante ferramenta de trabalho, por
esse motivo será debatida, mais adiante, a formação do pesquisador, a exemplo da
formação do analista junguiano, ou a exemplo da formação pessoal, educacional e
profissional pela qual todos os seres humanos passam para exercer seu papel na
vida e se realizar o mais plenamente possível (processo de individuação).
Fazer pesquisa científica significa ingressar numa ‘aventura heroica’ que, de
acordo com Eco (1998), “é longa, fatigante e absorvente” (p. 3) e requer a ativação
de um verdadeiro exército de potenciais arquetípicos (herói, sábio, puer, senex...). A
disposição e o entusiasmo com que o ego do pesquisador se entrega a um processo
de pesquisa estão diretamente associados ao sentido e à necessidade que o movem
para a realização da pesquisa, particularmente no caso de pesquisas acadêmicas.
A produção de conhecimento científico se realiza por meio da pesquisa
científica. No século 20, o questionamento da concepção de ciência, vigente na
modernidade (paradigma positivista ou empírico-lógico), e seu método
(experimental-dedutivo) resulta numa diversidade de propostas metodológicas de
cunho qualitativo. Tal diversidade decorre da ampliação da concepção de ciência
que passa a admitir várias concepções de produção de conhecimento, o que dá
origem a 'epistemologias' e 'métodos' diversos.
Embora alguns autores considerem que “não importa que tipo de paradigma
fundamenta nosso estudo nem o enfoque que seguiremos” (SAMPIERI; COLLADO;
LUCIO, 2006, p. 24), a articulação entre epistemologia e método é essencial
considerando-se que “sem o suporte de uma epistemologia, o ‘metodólogo’ cai
fatalmente num tipo de atividade mecânica pouco inteligente, porque acrítica”
(JAPIASSU; MARCONDES, 2001. p. 24). Chizzotti (2003) comenta que o paradigma
dominante numa dada comunidade científica condiciona o modo como as pesquisas
são conduzidas e envolvem uma concepção de ciência que implica numa
140
abordagem metodológica condizente. Papadopoulos (2006) destaca que
“metodologia refere-se à aplicação das premissas epistemológicas que uma pessoa
adota” (p.11). Janesick (1998) afirma que a pesquisa qualitativa é sempre
ideologicamente conduzida e, por isso, a ideologia do pesquisador deve ser
explicitada. Para Allones (2004), as especificidades e limites da psicologia e seus
procedimentos exigem do pesquisador uma posição metodológica e epistemológica
clara (p. 21).
Figueiredo (1989) ressalta que “o ecletismo é a maneira predominante da
comunidade profissional enfrentar as contradições do projeto de psicologia como
ciência independente. Sua principal desvantagem é que nesse enfrentamento as
contradições ficam camufladas, travestidas de complementaridade e a própria
natureza do projeto é subtraída do plano de reflexão e da crítica”.(p. 40)
A busca de conhecimento é sempre conduzida de modo compatível com a
concepção de mundo (ontologia) e de conhecimento (epistemologia) de que se
parte. Isso pode ser observado pelos diferentes métodos utilizados em diferentes
épocas na história do conhecimento e em diferentes modelos teóricos (PENNA,
2003). A exigência indispensável, atualmente, da explicitação do paradigma adotado
pelo pesquisador deve-se a grande diversidade de paradigmas científicos
disponíveis. Como visto anteriormente, a concepção atual de paradigma envolve,
segundo Denzin e Lincoln (1998), a articulação consistente e coerente entre
ontologia, epistemologia e método. Observa-se, no entanto, que a noção de
paradigma como um todo articulado ainda não parece ser uma concepção
suficientemente difundida na metodologia científica contemporânea, o que torna
ainda necessário sublinhar, repetidamente, a associação consistente entre
epistemologia e método e a necessidade de explicitação da opção epistemológica
adotada nas pesquisas científicas.
Dessa forma, o primeiro passo num processo de pesquisa refere-se à opção
paradigmática que naturalmente encaminha o método pelo qual a pesquisa será
conduzida, ainda que as estratégias e procedimentos metodológicos possam ir se
delineando e se especificando à medida que o processo se dá. Assim, a perspectiva
epistemológica do paradigma deve ser apresentada e discutida perante a opção
metodológica feita pelo pesquisador, a fim de que sejam esclarecidos os
141
fundamentos que sustentam o método. Entende-se por opção metodológica o
conjunto de escolhas e decisões metodológicas feitas ao longo do processo de
pesquisa: o enfoque metodológico, o objeto de estudo, os procedimentos
empregados na apreensão e na compreensão do fenômeno.
As concepções de ciência e produção de conhecimento científico contidas no
paradigma junguiano coincidem mais com a concepção pós-moderna de ciência,
mais abrangente e diversificada do que com a concepção moderna de ciência
calcada no paradigma cartesiano-positivista.
Rey (2001) assinala que a produção de conhecimento na ‘epistemologia
qualitativa’ “não segue as fórmulas tradicionais da indução, nem da dedução, mas
segue um processo muito mais irregular, construtivo e contraditório, que definimos
como lógica configuracional” (p. 124); no paradigma simbólico arquetípico o
processo pelo qual o conhecimento (coletivo ou individual) se produz vai além do
plano de qualquer lógica. A noção de conhecimento nesse paradigma não é apenas
intelectual; sua criatividade e produtividade se efetivam somente à medida que incluir
todas as funções psíquicas intelectivas, emocionais, intuitivas, perceptivas e
imaginativas (PENNA, 2003).
A opção pelo paradigma junguiano é uma opção que vai além também da
simples escolha de uma epistemologia ou mesmo de um modelo teórico e implica
algumas atitudes do pesquisador diante do processo de pesquisa.
Entende-se, aqui, por processo de pesquisa todas as vicissitudes que
abrangem a realização de uma pesquisa científica desde a motivação inicial do
pesquisador, que inclui a idealização de um plano de pesquisa, passando pela
elaboração de um projeto, até a realização da investigação propriamente dita,
chegando ao produto final que geralmente se efetiva num texto público acessível à
comunidade científica a que pertence o pesquisador. Para tanto
é preciso, ao menos, que o pesquisador individual se esforce em dar aos
seus conceitos solidez e precisão, o que pode ser feito discutindo o sentido
em que emprega o conceito, de modo que todos estejam em condições de
entender o que pretende exprimir. (JUNG, vol.5, §743)
[...] não há dúvida de que qualquer pesquisador deve documentar, tanto
quanto possível, os resultados a que chegou e suas opiniões; mas pode
aventurar-se ocasionalmente a emitir alguma hipótese, mesmo com o risco
142
de errar. Afinal de contas, são os erros que nos proporcionam os
fundamentos da verdade... (JUNG, vol.9/2; §429)
É no relato das pesquisas que a produção de conhecimento realmente se
efetiva e o seu caráter científico se cumpre ao promover debate crítico, favorecendo
a continuidade do processo de conhecimento tanto pelos erros como pelos acertos.
Isso acarreta uma atitude do pesquisador diante da pesquisa que considera
todo conhecimento um autoconhecimento, considerando, assim, a produção de
conhecimento como um processo gradual e constante de transformação de aspectos
inconscientes em consciência tanto no âmbito individual como coletivo muito
semelhante ao conceito de processo de individuação, mas que se circunscreve no
âmbito da pesquisa em curso. O pesquisador, ao iniciar um projeto de pesquisa,
assume um compromisso científico e social perante a comunidade a que pertence,
que condiciona eticamente suas atitudes.
Discorrer sobre as características do processo de pesquisa em psicologia
analítica é um desafio, posto que, por seu caráter dinâmico, o processo se desenrola
de modo ‘circum-ambulatório’ em torno de um eixo, que é a pesquisa em si, em
constantes idas e vindas, para cima, para baixo, para a frente e para trás, para a
direita e para a esquerda, tecendo uma rede de conexões, cuja linguagem verbal,
muitas vezes, não consegue expressar tão satisfatoriamente quanto se desejaria. No
entanto, esta é a forma pela qual este estudo pretende apresentar o processo de
pesquisa em psicologia analítica, convidando o leitor a manter-se atento a esse
movimento circum-ambulatório que permeia todo este processo altamente dinâmico.
Assim sendo, ao discutir as etapas do processo, não se pretende fixá-lo ou
estratificá-lo, mas apenas lançar mão de uma estratégia didática em nome da melhor
compreensão possível do assunto. Nem se pretende, aqui, fornecer um manual de
instruções ou receituário sobre como fazer pesquisa, mas, sim, propor uma visão
abrangente das etapas e elementos constituintes do processo de pesquisa, que
oriente o pesquisador e favoreça a reflexão sobre os principais aspectos desse
processo.
Toda pesquisa tem como ponto de partida uma motivação do pesquisador
para conhecer algo, para descobrir algo novo. Como destaca Romanyshyn (2007),
fazendo um trocadilho bastante criativo, pesquisar (research) , no idioma inglês, é re-
143
procurar (re-search) algo, ir em busca de algo para ser re-conhecido.
Esta motivação fundante da pesquisa tem o valor e a função de um símbolo
para o pesquisador, uma vez que mobiliza, instiga e fomenta a criatividade do
pesquisador em busca de algo tão desconhecido quanto necessário para si e para a
cultura.
8.2 Plano de pesquisa e projeto de pesquisa
A partir do desejo e da intenção de realizar uma pesquisa, inicialmente, é
formulado um plano de pesquisa que evolui para um projeto que orienta e conduz o
pesquisador na execução da pesquisa. O processo engloba todas as etapas desde o
plano de pesquisa, passando pela elaboração de um projeto, até a realização da
investigação.
Um plano de pesquisa é um roteiro orientador para o trabalho do pesquisador
e deve ser abrangente e flexível. Do ponto de vista psicológico, geralmente, um
plano evolui a partir de fantasias, sonhos e ideais que, quando considerados,
criteriosamente, conduzem o indivíduo a um comprometimento com esses sonhos,
fantasias e ideais num esforço de articulação entre os níveis consciente e
inconsciente que transforma ideais e planos, sonhos e fantasias em um projeto
factível.
Cozby (2003), embora não aborde a questão em ternos de plano ou projeto
de pesquisa, também ressalta que “a motivação para realizar pesquisas científicas
deriva de uma curiosidade natural a respeito do mundo”, sendo que uma pesquisa
pode ser iniciada quando esta curiosidade conduz a perguntas, “seguida de uma
tentativa de responder às perguntas”. (p. 30)
Sampieri (2006) coloca na base de um projeto de pesquisa ‘ideias de
pesquisa’ que representam a primeira aproximação daquilo que se pretende
pesquisar. Para o autor, “as ideias em sua maioria são vagas e requerem análise
cuidadosa para que venham a se transformar em projetos mais precisos e
estruturados” (p. 25).
De certa forma, o plano de pesquisa já é resultante de um processo de
144
elaboração com intenção de efetivação de um ‘sonho’. O pesquisador deve estar
aberto, durante todo o processo, às modificações que se fizerem necessárias à
medida que for interagindo com o tema, com a colocação do problema e,
posteriormente, com os dados coletados, estando assim sintonizado com a realidade
pesquisada e com a sua criatividade.
Para Eco (1998), o plano de pesquisa é comparável a um roteiro de viagem
cujo trajeto pode ser modificado, mas não se trata de um trajeto qualquer, pois de
alguma forma está colocado um ponto de partida e esboçado um ponto de chegada.
Luna (1996) sugere que nem mesmo o tema deve ser fixado de antemão. No
entanto, o tema, de forma ampla, já contém o símbolo que mobiliza o pesquisador
em direção à investigação e, portanto, de alguma forma ele já está presente no
plano de pesquisa. Ele poderá ser, com certeza, reformulado, redimensionado, às
vezes, até transfigurado, mas o cerne do tema está lá, pois ele está na base da
motivação inicial do pesquisador.
Do plano, por meio de reflexões e leituras (pesquisa bibliográfica preliminar)
chega-se à elaboração de um projeto de pesquisa. Para Kude (1995), um projeto de
pesquisa é um plano de envolvimento em investigação sistemática para obter
compreensão de um fenômeno.
Entende-se por projeto de pesquisa, no enfoque qualitativo, um esboço inicial
que funciona como uma ‘carta de intenções’ do pesquisador, no qual suas
motivações e inquietações paulatinamente vão sendo exploradas e consideradas. O
fato de ser considerado como um esboço não significa que o projeto seja visto como
um ‘rascunho’ descomprometido, desprovido de seriedade. Trata-se de um esboço
porque ele estará, inevitavelmente, sujeito a alterações, que serão impostas pelas
circunstâncias com as quais o pesquisador irá, necessariamente, se deparar ao
longo do processo de pesquisa.
Do projeto de pesquisa constam necessariamente o tema que o pesquisador
pretende investigar, o motivo pelo qual considera relevante sua pesquisa, tanto do
ponto de vista pessoal quanto do ponto de vista científico e/ou social. Para tanto,
deve ser feita uma extensa revisão de literatura sobre o assunto, o que, além de
fundamentar a justificativa e relevância do tema, ajuda o pesquisador a encaminhar
145
os objetivos gerais da pesquisa, os quais poderão ser especificados e/ou alterados
no processo. Nesse momento, o pesquisador começa a se deparar com as
possibilidades e limites (impossibilidades) de seu ‘sonho’ de pesquisa.
Antes, porém, de adentrar as etapas do processo de pesquisa, mais uma vez,
é importante ressaltar que pesquisar em psicologia analítica significa participar de
um processo de produção de conhecimento científico no qual a meta principal é a
aquisição de um conhecimento novo e relevante (LUNA, 1996), tanto em relação ao
conhecimento coletivo como no que se refere ao autoconhecimento do pesquisador,
uma vez que, conforme já ressaltado, conhecimento e autoconhecimento são
indissociáveis.
O levantamento das pesquisas realizado neste estudo, mais uma vez,
reafirmou a importância de se atentar para o caráter dinâmico da pesquisa
qualitativa como um processo de produção de conhecimento altamente complexo,
que pode ser comparado a uma saga heroica nos termos descritos por Joseph
Campbell ,ou ao processo de individuação descrito por Jung e pelos pós-junguianos.
Ao se dispor a realizar uma pesquisa em psicologia analítica, o pesquisador
inevitavelmente ingressa numa aventura cheia de imprevistos, alguns agradáveis,
outros nem tanto. Os imprevistos desagradáveis geralmente são ocorrências que
contrariam o plano previsto, que se interpõem no projeto de pesquisa originalmente
idealizado e planejado pelo pesquisador, e que são vivenciadas como problemas ou
complicações. Raramente o pesquisador é capaz de se deixar levar, ou pelo menos,
refletir sobre o significado desses imprevistos no processo. A esse respeito será
feita, mais adiante, uma reflexão sobre o papel da sincronicidade na epistemologia e
no método junguiano.
Qual pesquisador não passou pela angústia de, diante de um tema, não saber
como investigá-lo; ao coletar dados não saber a melhor forma de registrá-los!
Quantas dúvidas permeiam a aventura de realizar uma pesquisa! Que dados são
relevantes para a pesquisa? Ou, ainda, diante dos dados coletados não saber para
onde eles apontam. Afinal, quem conduz a pesquisa? O pesquisador ou o material
pesquisado? Mas, também, há que se lembrar o momento em que o pesquisador se
vê totalmente absorvido pelo processo, tomado por um entusiasmo que chega a pôr
146
em risco sua capacidade crítica. Esse arrebatamento também ameaça tornar o
processo de pesquisa algo interminável, quase um processo de vida. Uma pesquisa
não pode durar para sempre, e quanto a esse tópico são interessantes as
colocações de Morse (1998) sobre a ‘etapa de retirada’. A autora se refere
especificamente à retirada do campo de coleta de dados, mas isso vale para o
processo todo.
Muitas escolhas e decisões são feitas de modo intuitivo e apenas
posteriormente são pensadas e analisadas racionalmente. Se o processo for
conduzido exclusivamente pelo pensamento dirigido racional e consciente, isto pode
tolher a criatividade e novidades podem escapar do processo, por outro lado, se o
processo for conduzido exclusivamente pela intuição e emoção do pesquisador, o
resultado, embora, agradavelmente criativo, talvez não possa ser considerado uma
produção científica, mas apenas uma produção artística ou pessoal. O equilíbrio
entre esses aspectos precisa ser encontrado e mantido durante o processo de
pesquisa.
Vale destacar aqui, ainda, que o pesquisador participa ativamente do
processo de pesquisa, interagindo com os aspectos conscientes e inconscientes do
fenômeno pesquisado. Os aspectos conscientes e inconscientes do pesquisador e
os elementos conscientes e inconscientes do pesquisado estão constantemente
interagindo durante todo o processo. Portanto, a personalidade do pesquisador atua
em todas as etapas do processo, o que, sem dúvida, exige, por parte do
pesquisador, uma atitude compatível com a proposta epistemológica e metodológica
do paradigma junguiano, para que a pesquisa seja conduzida de modo apropriado e
resulte na produção de conhecimento científico. Dessa forma, a atitude do
pesquisador, particularmente em relação à participação do inconsciente durante o
processo de pesquisa deve ser alvo de constante atenção e o pesquisador precisa
atentar para as demandas inconscientes que permeiam suas escolhas e decisões.
8.3 Etapas do processo de pesquisa
No processo de pesquisa destacam-se três grandes etapas: 1. escolha do
tema; 2. apreensão do fenômeno – coleta de dados e 3. compreensão do fenômeno
– análise de material, as quais se sucedem e se desdobram, entrelaçadas e
147
interligadas, formando um todo coeso em que os primeiros estágios preparam e
determinam os seguintes (PENNA, 2007). É necessário esclarecer que a dinâmica
do processo de pesquisa é bastante complexa e seu desenvolvimento está sujeito a
constantes revisões e reformulações em função das ponderações e descobertas
feitas pelo pesquisador durante todo o processo. Janesick (1998) faz uma
interessante analogia entre os estágios pelos quais o pesquisador passa para
elaborar um projeto de pesquisa e as etapas percorridas pelo dançarino na
preparação de sua coreografia – aquecimento – exercícios e relaxamento. Pode-se
dizer que, no processo de pesquisa, há vários momentos de aquecimento –
exercício e relaxamento que se sucedem.
8.3.1 Primeira etapa - Escolha do tema
Esta etapa do processo de pesquisa começa pela mobilização do pesquisador
para a realização de um trabalho de pesquisa, tal mobilização pode estar assentada
em diversos motivos. As pesquisas acadêmicas, por exemplo, têm como motivação
basilar o desejo e/ou a necessidade de capacitação e/ou aperfeiçoamento
profissional. Um motivo mobilizador, necessário para disparar um processo de
pesquisa científica, é o desejo de conhecer e dar a conhecer algo. Esse algo inicial a
ser conhecido é o germe de um tema de pesquisa.
A 1ª etapa do processo de pesquisa – escolha de um tema de pesquisa –
implica na consideração de vários aspectos e elementos que irão fazer parte do
plano de pesquisa e, posteriormente, do projeto de pesquisa que será realizado. Do
tema inicial, ainda vago e amplo, passa-se ao levantamento de perguntas sobre o
tema, que conduz à formulação de um problema de pesquisa e enseja a pesquisa
bibliográfica, que, por sua vez, dá contornos mais nítidos ao tema, com base no qual
se delineiam os objetivos gerais, uma nova revisão de literatura que levam à
configuração dos objetivos específicos do projeto de pesquisa.
Do ponto de vista epistemológico, no paradigma junguiano, a produção de
conhecimento compreende o acesso a aspectos inconscientes relativos à psique
coletiva e pessoal. O conhecimento do inconsciente é possível apenas
indiretamente, por meio de suas manifestações na consciência. A ponte
epistemológica entre consciente e inconsciente é feita pelos símbolos. O fenômeno
148
psíquico passível de ser investigado na psicologia analítica é o símbolo (PENNA,
2003), assim, o tema da pesquisa, e por decorrência seu objeto, é considerado um
símbolo importante para o pesquisador e provavelmente para sua comunidade
científica.
Para Jung (vol.6), o símbolo depende de uma atitude favorável da consciência
para se manifestar. A emergência de um símbolo, por um lado, depende do
consentimento da consciência e, por outro lado, o inconsciente, pelo mecanismo da
auto-regulação, mobiliza a consciência em direção a algo que lhe falta (algo
desconhecido), promovendo uma aproximação entre as duas esferas (consciente e
inconsciente), que foi chamada por Jung de função transcendente. Desta, por sua
vez, resulta o símbolo, produto da cooperação entre consciente e inconsciente. Uma
vez formulado o símbolo, com a vivência numinosa que ele produz, o ego ‘deseja e
precisa’ capturar a mensagem contida no símbolo (PENNA, 2004). “Onde há um
símbolo há uma necessidade de interpretação” (ROMANYSHYN, 2007, p.87). O
objeto de pesquisa – fenômeno a ser pesquisado –, considerado um símbolo,
constela a necessidade de conhecimento do pesquisador. As forças numinosas do
símbolo instigam e capturam a consciência do pesquisador, mobilizando-o em
direção ao desconhecido, esta é a motivação básica da investigação. Assim sendo,
o pesquisador deve, sobretudo, estar disponível para a experiência numinosa que o
símbolo propicia. O caráter inédito e relevante do conhecimento científico, a ser
produzido no processo de pesquisa, reside nos aspectos inconscientes contidos no
símbolo a ser investigado.
Do ponto de vista metodológico, o processo de pesquisa é desencadeado por
um interesse do pesquisador em algo, que o conduz a uma pergunta ou questões
em torno de um problema. Sampieri, Collado e Lucio (2006) fala de uma ‘motivação
intrínseca’ com relação ao trabalho de pesquisa; no paradigma junguiano isto remete
à vivência numinosa que tem o símbolo como raiz.
Morse (1998) chama de ‘etapa de reflexão’ aquela em que o pesquisador
identifica um tema e passa a considerá-lo passível de investigação. A eleição de um
tema, ou a elaboração de uma pergunta de pesquisa, de acordo com Morse (1998),
requer um esforço considerável por parte do pesquisador, e a chave mestra da
escolha do tema é identificar algo que capture seu interesse por um longo tempo,
149
pois o processo de pesquisa é uma empreitada de longo prazo.
A seleção e configuração de um tema de pesquisa já estabelecem um vínculo
entre o pesquisador e o pesquisado, em que o tema vai se constelando como um
símbolo importante para o pesquisador. A relação entre o pesquisador e seu objeto
de investigação – o símbolo – desde o princípio é permeada por fatores conscientes
e inconscientes, tais como intenções, expectativas e fantasias em relação ao objeto,
assim como uma certa fascinação pela incógnita que o símbolo produz.
De acordo com Romanyshyn (2007), “um tema escolhe o pesquisador através
de seus complexos, tanto quanto, ou talvez mais do que ele ou ela conscientemente
o escolhe” (p.135). A proposição de que o tema de pesquisa (e posteriormente o
objeto da pesquisa) seja entendido como um símbolo importante para o pesquisador
considera que este contém em seu bojo aspectos conscientes e inconscientes
(complexos e arquétipos) que capturam e movem o processo de pesquisa rumo à
elaboração do(s) símbolo(s) aí contido(s).
A etapa de escolha do tema requer do pesquisador sensibilidade e paciência.
Mais do que escolher de forma exclusivamente egoica um tema, trata-se também de
se deixar ser mobilizado e escolhido pelo tema. Faz parte desta etapa a formulação
de um problema de pesquisa, que leva ao levantamento de perguntas e à definição
dos objetivos da pesquisa; para tal a pesquisa bibliográfica, tão importante quanto
necessária, é de grande ajuda.
O símbolo é sempre algo mobilizante para a consciência que o experimenta;
seu caráter ambivalente e paradoxal produz uma sensação de conhecimento e
desconhecimento (PENNA, 2003). Ao refletir sobre seu interesse pelo tema, tanto
sua motivação pessoal quanto sua relevância científica devem ser explicitadas e
justificadas no projeto de pesquisa. A relevância do tema reside no valor simbólico
deste para o pesquisador, assim como para a comunidade social e científica à qual
ele pertence. A discriminação desta relevância no plano individual é fornecida pela
observação e reflexão sobre seu valor subjetivo, no plano coletivo a relevância do
tema é verificada pelo valor e repercussão que o tema tem para o contexto científico,
social e histórico em que a pesquisa será realizada, o que é buscado, mais uma vez
por meio de pesquisa bibliográfica.
150
Nesta etapa, é importante que o pesquisador examine os motivos conscientes
e inconscientes envolvidos no problema de pesquisa, explorando as fantasias e
expectativas sobre seu projeto, e trate seu tema como um símbolo. Em analogia à
recomendação feita por Jung em relação aos sonhos:
[...] quase sempre dá bons resultados fazer uma meditação verdadeira e
profunda sobre o sonho (símbolo), isto é, se o carregarmos dentro de nós
por algum tempo [...] (JUNG, vol 16, § 86)
É recomendável que o pesquisador carregue consigo o tema eleito, refletindo
sobre ele e se deixando mobilizar por tudo quanto o tema evoque, pois o símbolo é
sempre algo intrigante e instigante para a consciência que o vivencia (PENNA,
2007). Este procedimento permite explorar e tornar conscientes, na medida do
possível, aspectos inconscientes do pesquisador, que, do contrário, podem ser
projetados no objeto de pesquisa e acarretar interferências sombrias no processo.
Quanto à interferência de aspectos sombrios no processo de pesquisa, na revisão
bibliográfica do presente estudo, foram encontrados pouquíssimos autores que
alertam para essa questão. Cumpre citar, no entanto, Janesick (1998), que não se
refere explicitamente a fatores inconscientes, mas ressalta a importância de serem
explicitadas “as experiências pessoais (do pesquisador) como um ímpeto para a
pesquisa, o que não é errado, mas é melhor que o pesquisador esteja consciente de
seus possíveis motivos para conduzir o estudo, pois tais experiências podem dar um
viés particular ao estudo”. (p. 58) (grifos da autora)
Faz parte do procedimento circum-ambulatório desta etapa imaginar as
respostas às quais se deseja chegar para as perguntas levantadas; isso ajuda a
trazer à luz possíveis preconceitos e ilusões do pesquisador em relação ao assunto
pesquisado. Lembrando que, segundo Von Franz (1992b), as ilusões são formadas
pelos véus de projeção que se interpõem entre o eu e o outro. Esse trabalho de
meditação e reflexão em busca do esclarecimento de possíveis e prováveis aspectos
sombrios concernentes ao tema (e objeto) de pesquisa tem por finalidade a
especulação sobre os complexos, aos quais Romanyshyn (2007) se refere,
envolvidos no símbolo em questão. Ainda que nem tudo possa ser esclarecido, no
trabalho de pesquisa, em relação aos aspectos inconscientes tanto do pesquisador
como do pesquisado. Esse assunto será novamente abordado no que tange às
vicissitudes da relação entre o pesquisador e o pesquisado.
151
8.3.1.1. Estabelecimento e delimitação do objetivo da pesquisa
O objetivo da pesquisa é refinado na 1ª etapa e pode ser reformulado até a 3ª
etapa (compreensão dos dados). Em geral, os objetivos têm uma primeira
formulação em larga escala com base na motivação inicial para a pesquisa e são
fortemente impregnados pela fascinação que a incógnita simbólica exerce sobre o
pesquisador. Desta primeira formulação resultam ‘perguntas’, e o refinamento destas
leva a uma delimitação dos objetivos, fruto da confrontação das expectativas e
fantasias sobre o tema com as perguntas formuladas e com os dados de realidade
que a revisão da literatura fornece.
Morse (1998) fala de ‘perguntas pesquisáveis’, que são encontradas por meio
de consultas a fontes bibliográficas ou a especialistas da área. Recorrer à
bibliografia é um recurso que permeia todo o processo de pesquisa e funciona como
um modelador das escolhas e decisões a serem tomadas, norteando as alterações
no curso da pesquisa.
Tanto as perguntas pesquisáveis quanto os objetivos formulados numa
pesquisa resultam da articulação entre vários elementos da pesquisa, tais como:
objeto de estudo, área do conhecimento em que a pesquisa é conduzida e,
sobretudo, o paradigma adotado pelo pesquisador, que condiciona a opção
metodológica da pesquisa.
Considerando-se as características da pesquisa qualitativa em geral, e do
paradigma junguiano em particular, os objetivos de uma pesquisa em psicologia
analítica, frequentemente dizem respeito à compreensão simbólica dos fenômenos
investigados e pretendem abranger seus sentidos e significados tanto numa
perspectiva causal como final, isto é, a investigação dos fenômenos deve buscar
compreendê-los não apenas em sua perspectiva atual, mas também em relação a
suas causas e finalidades. De acordo com Jung, “todo produto psíquico, encarado
do ponto de vista causal, é a resultante de conteúdos psíquicos que o precederam
[...], além disso, esse mesmo produto psíquico, considerado sob o ponto de vista de
sua finalidade, tem um sentido e um alcance que lhe são próprios dentro do
processo psíquico” (vol.8, §451). Dessa forma, “todo evento psíquico é forjado numa
relação causal e final, ou seja, ao mesmo tempo em que o símbolo é causado por
152
uma situação de tensão energética, ele é também fruto de uma relação de
finalidade, isto é, tem um propósito teleológico de conduzir a psique a níveis mais
complexos de desenvolvimento. Os fenômenos psíquicos, no paradigma junguiano,
não podem ser compreendidos apenas com base em suas causas” (PENNA, 2003,
p.166). Por conseguinte, tanto a apreensão como compreensão dos fenômenos
psíquicos devem abarcar o ponto de vista da causa e da finalidade a que eles se
referem, o que já deve estar presente para o pesquisador na formulação do tema e
na definição de seus objetivos.
Em qualquer circunstância, é possível perguntar-se "por quê?" e "para
quê?", pois toda estrutura orgânica é constituída de um complexo sistema
de funções com finalidade bem definida e cada uma delas pode decompor-
se numa série de fatos individuais, orientados para uma finalidade precisa.
(JUNG,8, §462)
É recomendável que as perguntas que norteiam o pesquisador na formulação
do problema de pesquisa – ‘perguntas pesquisáveis’ – sigam essa orientação a fim
de que o estabelecimento de seus objetivos de pesquisa sejam compatíveis com o
paradigma adotado. A pergunta ‘por quê’ aponta para as origens e causas do
fenômeno. A pergunta ‘para quê’ se dirige para a finalidade do fenômeno.
O estabelecimento dos objetivos da pesquisa resulta da avaliação e
verificação dos interesses e motivações do pesquisador diante da amplitude do tema
e do levantamento de perguntas para as quais o pesquisador deseja buscar
respostas, o que conduz à delimitação do tema. Desse percurso resulta a
circunscrição de um contexto no qual o tema será investigado e, naturalmente,
algumas hipóteses são levantadas.
Por um lado, as hipóteses são apresentadas com base nos pressupostos
teóricos; como propõem Mazzotti e Gewandsznajder (1998), “uma teoria é formada
por uma reunião de leis, hipóteses, conceitos e definições interligadas e coerentes”
(p. 8). Nesse sentido, algumas hipóteses fundamentais são colocadas no projeto de
pesquisa com base nos fundamentos epistemológicos do paradigma adotado pelo
pesquisador. Estas hipóteses orientam a formulação dos objetivos e a definição de
perguntas de pesquisa.
Tais hipóteses, na pesquisa qualitativa, não têm a função nem o objetivo de
serem verificadas, testadas ou comprovadas, mas têm o papel de orientar
153
epistemologicamente a pesquisa, no sentido de suposições fundamentadas pela
teoria e pela revisão bibliográfica (outras pesquisas) sobre o assunto. Por outro lado,
as hipóteses são “conjecturas, palpites, soluções provisórias, que (supostamente)
tentam resolver um problema ou explicar um fato” (MAZZOTTI;
GEWANDSZNAJDER, 1998, p. 5), e neste caso, associam-se às fantasias,
expectativas e mesmo pré-conceitos mais ou menos conscientes que permeiam o
símbolo a ser investigado, as quais, como visto anteriormente, devem ser outrossim
consideradas.
Em ambos os casos as hipóteses têm a função de promover e incentivar a
investigação quando criteriosamente avaliadas pelo pesquisador, seja para confirmá-
las, seja para descartá-las ou reformulá-las durante o processo de pesquisa.
8.3.2 Etapa intermediária: pausa para reflexão sobre o andamento
do processo
Antes de entrar propriamente na 2ª etapa do processo, que diz respeito à
apreensão do fenômeno, faz-se necessário introduzir algumas reflexões sobre a
intrincada relação que se estabelece entre o pesquisador e seu objeto de pesquisa e
suas implicações quanto à polêmica questão do papel da subjetividade na atividade
de pesquisa e suas associações com a objetividade. Essas questões mantêm
estreita relação com a observação dos fenômenos, sobretudo na etapa de coleta do
material.
Na pesquisa qualitativa em geral, e na psicologia analítica em particular, em
que o símbolo é considerado o fenômeno psíquico passível de investigação, a
atitude simbólica do pesquisador é um recurso metodológico. A consciência do
pesquisador é o instrumento básico e principal na apreensão dos fenômenos, e o
procedimento principal para esta apreensão é a observação.
Do ponto de vista da Psicologia, o sistema observado consistiria não de
objetos físicos, como também incluiria o inconsciente, ao passo que à
consciência caberia o papel de instrumento de observação. (PAULI. in:
Vol.8, §439, nota 129)
Janesick (1998) diz que a pesquisa qualitativa exige que o pesquisador se
torne o principal instrumento de pesquisa. Isto significa que “o pesquisador deve ter
a capacidade de observar comportamento e deve afiar as habilidades necessárias
154
para observação e entrevista face a face”. (p. 42). Segundo Patton (2004),
observação e escuta são os principais instrumentos de pesquisa nas ciências
humanas.
Nas ciências humanas, em geral, e na psicologia em particular, a relação
dinâmica entre sujeito e objeto, com suas tensões e controvérsias, é uma realidade
intrínseca a esse campo do conhecimento, que deve ser tratada com todas as
implicações e dificuldades que dela decorrem.
Chizzotti (2003) afirma que a abordagem qualitativa fundamenta-se na
relação dinâmica entre o mundo real e a pessoa, formando-se um vínculo
indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do indivíduo. Allones (2004)
destaca “a tensão particular que mantém o sujeito e o objeto na intervenção e na
pesquisa” (p. 20) como um fator preponderante nesta atividade, que encaminha
posições epistemológicas e metodológicas que possam viabilizar a pesquisa numa
tentativa constante de encontrar os melhores meios de lidar com essa ‘tensão
específica entre sujeito e objeto’. Figueiredo (1989) aponta “a interpenetração do
sujeito e do objeto do conhecimento psicológico” (p. 20) e suas implicações como
alvo frequente de discussão em vários aspectos da pesquisa em psicologia.
Esta situação (tensão entre sujeito e objeto) própria às ciências sociais,
aliás inevitável, e seus efeitos podem constituir um freio, um obstáculo, um
”barulho” parasitante, paralisando o trabalho daquele que intervém ou do
pesquisador, se seu modelo de referência é o das ciências exatas, cujas
exigências de cientificidade visam justamente a reduzi-las ou eliminá-las
(ALLONES, 2004, p.21).
A implicação do pesquisador no processo de pesquisa é notória e já está
posta desde o início do processo de pesquisa – motivação para iniciar um processo
de pesquisa – e permeia toda a discussão sobre o assunto. No entanto, é na etapa
de coleta de dados que as idiossincrasias da relação entre pesquisador e
pesquisado ficam mais evidentes. Em cada um dos itens destacados nesta
discussão serão abordadas as especificidades da participação do pesquisador no
processo de pesquisa e sua função como instrumento principal de coleta e análise
do material pesquisado.
É importante sublinhar que a relação pesquisador-pesquisado está fortemente
entrelaçada à observação como procedimento metodológico de apreensão, e disto
155
decorrem as idiossincrasias da presença inevitável da subjetividade do pesquisador
no processo e a necessária objetividade que o trabalho científico requer.
8.3.2.1. Uma dinâmica intrincada: pesquisador – pesquisado
Os fundamentos epistemológicos que sustentam a proposta metodológica do
paradigma junguiano foram amplamente apresentados e discutidos no capítulo sobre
as diretrizes metodológicas básicas para a pesquisa em psicologia analítica. A
ênfase, neste momento, será colocada nos aspectos metodológicos concernentes ao
processo de pesquisa. Entretanto torna-se necessário retomar algumas premissas
epistemológicas com o objetivo de esclarecer a perspectiva metodológica referente
às características da relação dinâmica que se estabelece entre o pesquisador e o
pesquisado, suas especificidades e limites. Do ponto de vista metodológico, é
importante analisar as particularidades dessa relação para assegurar que um
conhecimento científico seja produzido.
No paradigma junguiano, do ponto de vista epistemológico, a psique é tanto
sujeito como objeto do conhecimento, o que, para Jung, constituiu um grande
desafio na busca de métodos em psicologia (PENNA, 2004).
No entanto, ainda que o outro (pesquisado) esteja contido no mesmo todo do
qual o eu (pesquisador) faz parte (PAPADOPOULOS, 2002), não se trata, em
momento algum, de anular as diferenças entre ambos, uma vez que "a identidade
sujeito-objeto torna impossível qualquer conhecimento" (Jung, vol.6, §231).
Do ponto de vista metodológico, o outro é algo ou alguém (objeto do
conhecimento) que não sou eu ou nós (pesquisador) sujeito do conhecimento
(PAPADOPOULOS, 2002). Ambos formam um par de opostos complementares,
sendo que a distinção entre as duas entidades, como já assinalado, é sempre
indispensável. Para o pesquisador, como sujeito do conhecimento, seu objeto alvo
de conhecimento se constitui num outro, entretanto, em psicologia analítica, o outro
é considerado a partir de uma dupla perspectiva. Por um lado, há um outro assim
chamado ‘interno’, constituído pelos aspectos inconscientes do pesquisador,
relativamente desconhecido para o ego, e há um outro ‘externo’ que é representado
pelo fenômeno / objeto de investigação, parcialmente desconhecido do pesquisador.
Esta intrincada relação será abordada em maior profundidade mais adiante neste
156
estudo.
A física quântica demonstrou que o observador (pesquisador) interfere no
fenômeno observado e, com isso, a noção de objetividade preconizada pelo
positivismo lógico foi bastante abalada desde então. No entanto, o paradigma
científico que preconiza a assepsia entre sujeito e objeto, notadamente nas, assim
chamadas, pesquisas experimentais no enfoque metodológico quantitativo, ainda
desfruta de alto prestígio na comunidade científica contemporânea. Nas ciências
humanas os métodos qualitativos de pesquisa discutem e propõem meios para
operar uma produção de conhecimento em que a relação entre sujeito e objeto é
necessariamente distinta das ciências naturais ou exatas.
No paradigma simbólico-arquetípico esse tema é abordado a partir de dois
ângulos, quais sejam: a personalidade do pesquisador e sua inevitável subjetividade;
e os limites e articulações possíveis e necessários entre objetividade e subjetividade
na produção científica.
Papadopoulos (2006) diz que Jung, desde suas mais precoces formulações
epistemológicas, “estava ciente de que as ‘premissas científicas’ não estão
dissociadas da história pessoal (educação), assim como dos contextos coletivos
mais amplos (meio ambiente cultural)” (p. 26) do cientista. Kotsch (2000) discute os
limites e articulações entre objetivismo e relativismo, sugerindo que a epistemologia
de Jung seja considerada um ‘realismo psíquico’ que supera a dicotomia entre
objetivismo e relativismo.
Em 1920 Jung (vol.6) abordou a questão da personalidade do pesquisador
como determinante para o ponto de vista pelos quais as teorias científicas são
construídas, assim como para a relação estabelecida com seu objeto de estudo e a
perspectiva a partir da qual os fenômenos são pesquisados e analisados. A
personalidade do autor ou do pesquisador inegavelmente influencia sua abordagem
dos fenômenos e a forma como estes são pesquisados. A produção científica para
Jung é “um produto da constelação psicológica subjetiva do pesquisador. Na
elaboração de teorias e conceitos científicos há muita coisa de sorte pessoal”. (vol.6,
§ 8)
Romanyshyn (2007) discute a vulnerabilidade do observador, ressaltando que
157
“a inclusão do sujeito conhecedor no objeto a ser conhecido é uma exigência
inescapável para qualquer corpo de conhecimento que pretenda ser
verdadeiramente objetivo” (p. 107).
Entre a inescapável subjetividade do pesquisador e a necessidade de uma
comunicação objetiva da produção de conhecimento com a finalidade de promover
compreensão científica, coloca-se uma tensão entre polaridades, que constitui um
grande desafio para todo pesquisador.
Todos os autores consultados na revisão de literatura deste estudo, de algum
modo, mais detalhado ou menos aprofundado, abordam o tema da subjetividade
como fator inegavelmente implicado na produção de conhecimento atual. Não se
trata aqui de propor uma receita ou um modelo para se lidar com o binômio ou
mesmo antinomia – objetividade-subjetividade, mas, talvez, de recomendar ao
pesquisador uma atitude consciente e crítica quanto a esse assunto, pois se trata
mais de um problema a ser considerado do que a ser resolvido.
A aceitação do fator subjetivo, por um lado, já configura uma posição
adequada do pesquisador, pois “se, por ventura, a subjetividade for desconsiderada,
ela permanecerá inconsciente no processo de conhecimento; e, como se sabe, uma
polaridade inconsciente tende a se manifestar de forma, muitas vezes, primitiva”
(PENNA, 2003, p.172). Para Maroni (1998), a subjetividade, quando inconsciente,
corre o risco de se expressar indevidamente com feições de universalidade e
generalidade, o que sem dúvida acarreta uma atitude arrogante e pretensiosa do
pesquisador. De acordo com Romanyshyn (2007), a objetividade não é assegurada
pela negação da presença do pesquisador no processo, nem pela “ficção do
observador neutro” (p.106). Por outro lado, não basta a aceitação da influência do
fator subjetivo na atividade de pesquisa. Cabe ao pesquisador treinar e desenvolver
sua objetividade ao ponto em que ambas polaridades possam se equilibrar dentro
dos limites do humanamente possível, com a finalidade de evitar uma posição
excessivamente subjetiva, viabilizando assim uma posição o menos unilateral
possível para que seja alcançada uma síntese na intersubjetividade. Conforme foi
salientado por Jung (vol.6, §8), “exigir que só se olhe objetivamente nem entra em
cogitação, pois isto é impossível. Já deveria bastar que não se olhasse
subjetivamente demais".
158
Evitar que a subjetividade atue excessivamente, como já foi mencionado,
inclui atenção às fantasias e pré-conceitos em relação ao objeto, pois enquanto
estas permanecerem inconscientes atuarão por meio de projeções e, na vigência da
projeção, há uma fusão entre o sujeito e o objeto (Jung, vol.6) que inviabiliza o
conhecimento do objeto.
Romanyshyn (2007) discute longamente a problemática da subjetividade e
sugere que o pesquisador ferido está para o processo de pesquisa, da mesma forma
que o curador ferido está para o processo analítico. E nesse aspecto há que se
atentar para as semelhanças e diferenças entre os dois processos. É inegável que a
relação do pesquisador com seu objeto de pesquisa se estabelece em bases
transferenciais semelhantes às do processo analítico, sobretudo quando o objeto de
pesquisa são seres humanos. Como enfatiza Jung (vol.16/2), toda relação humana
constela um vínculo transferencial. Entretanto o papel e a função do pesquisador se
distinguem do papel e da função do psicoterapeuta.
A pesquisa se distingue da prática clínica em seus objetivos e procedimentos,
e quanto a isso Allones (2004) e Romanyshyn (2007) concordam, assim como em
relação à instauração de um campo transferencial, tanto no processo de pesquisa
como no processo analítico. Entretanto, há que se frisar também as particularidades
distintas das duas atividades do psicólogo. Uma distinção importante sublinhada por
Allones (2004) diz respeito à demanda; na pesquisa a demanda é do pesquisador ou
de um grupo de pesquisa, e, nesse sentido os pontos de partida estão invertidos se
comparados ao processo psicoterapêutico. Romanyshyn (2007) salienta que o
envolvimento do pesquisador é tão complexo e intenso quanto o envolvimento do
psicoterapeuta (p. 139), mas ressalta que “isto não significa que pesquisa seja
terapia, ou que devesse ser” (p. 136). No processo de pesquisa, o envolvimento e o
compromisso do pesquisador está focalizado em seu trabalho e é neste vínculo que
se estabelece o campo transferencial.
Allones (2004) ressalta a contratransferência como mais importante na
discussão de procedimentos clínicos em pesquisa do que a transferência. Em
verdade trata-se apenas e tão somente de transferência, ou melhor, de um vínculo
transferencial que se estabelece entre o pesquisador e o pesquisado, que perpassa
esferas racionais e irracionais, cognitivas e emocionais, conscientes e inconscientes.
159
Por vínculo transferencial entende-se um canal que une de modo recíproco os
participantes da relação (PENNA, 2005b). No caso do processo de pesquisa, os
conteúdos dessa transferência interessam e devem ser analisados pelo pesquisador
em benefício de seu trabalho e não em favor do paciente, como acontece no
processo analítico.
Além do esforço pessoal e da atenção do pesquisador quanto à tensão entre
objetividade e subjetividade, presente no processo de pesquisa, as diretrizes
metodológicas do paradigma funcionam como parâmetros para o manejo de sua
relação com o objeto de pesquisa e orientam na seleção de instrumentos de
apreensão e procedimentos para a compreensão do símbolo investigado.
Considerando-se, como visto, que a relação ‘pesquisador–pesquisado’
envolve a articulação dinâmica de elementos conhecidos e desconhecidos, tanto no
plano interno como no plano externo ao pesquisador, o processo de pesquisa
compreende dois sistemas em interação: o sistema pesquisador com seus aspectos
conscientes e inconscientes e o sistema pesquisado – fenômeno psíquico a ser
conhecido – com seus aspectos conhecidos e desconhecidos – manifestos e
subjacentes. Ambos, pesquisador e pesquisado fazem parte da dimensão coletiva e
a compartilham, tanto no plano consciente como no plano inconsciente. A interação
entre esses dois sistemas produz, pelo menos, quatro conjuntos de conexões
possíveis que se estabelecem entre o pesquisador e seu objeto/símbolo de
pesquisa, as quais se articulam de modo dinâmico e devem ser consideradas ao
longo de todo o processo de pesquisa.
A título de ilustração, para a melhor visualização dos componentes implicados
nesta intrincada relação, propõe-se uma representação gráfica da interação
pesquisador–pesquisado no processo de pesquisa, com a finalidade de contribuir
para a compreensão e reflexão sobre o assunto, pois, por mais que seja desejável
que o pesquisador se envolva de corpo e alma no processo e considere seus
aspectos conscientes e inconscientes na pesquisa e se deixe levar por suas
fantasias e pelo fascínio que o símbolo produz, o comando do processo está mais a
cargo da consciência do pesquisador do que do objeto pesquisado.
160
Figura 1: Relação pesquisador-pesquisado
Como é possível observar (fig. 1), a dinâmica estabelecida entre os dois
sistemas – pesquisador e pesquisado – apresenta formas de interpenetração em
vários níveis que devem ser observados pelo pesquisador durante o processo de
pesquisa:
1. neste plano observa-se a relação entre o ego do pesquisador com a face
manifesta do símbolo. Este é o plano de relação que se pode chamar de face a face.
Refere-se àquilo que o pesquisador sabe de si e àquilo que ele percebe
explicitamente em seu objeto de pesquisa. É um plano de constatações. Neste plano
o pesquisador registra e recolhe as informações que o objeto lhe oferece, por meio
dos procedimentos de apreensão.
2. neste plano se dá a relação entre o ego do pesquisador com a face
desconhecida – inconsciente – do símbolo. Aqui é onde o pesquisador faz suas
descobertas. Em contato com o fenômeno, especialmente por meio dos
procedimentos de análise, o pesquisador vai descobrindo facetas, que antes lhe
eram desconhecidas.
161
3. neste plano ocorre a relação do inconsciente do pesquisador com a face
manifesta do símbolo, que geralmente se dá via projeção. O pesquisador dever estar
atento para elucidar os vieses que a projeção de conteúdos inconscientes pode
exercer ao promover distorções na percepção e compreensão dos fenômenos e,
fazer o recolhimento dessas projeções. Para tanto, o primeiro passo é reconhecer a
natureza da relação que se estabelece entre o pesquisador e a pesquisa e fazer uso
de procedimentos que funcionem como ‘filtro’ para a elucidação das projeções. A
despeito de qualquer recurso técnico que possa ser empregado para minimizar os
efeitos da projeção, o melhor recurso a ser utilizado nesse campo ainda é a atitude
reflexiva do pesquisador, consciente de que este plano da relação está
constantemente ativado. É neste plano também que, com o recolhimento das
projeções, o pesquisador pode descobrir que o seu objeto de estudo não era
exatamente aquilo que ele imaginava e então se surpreender com as novidades que
a investigação propõe.
4. o plano de relação entre o inconsciente do pesquisador e os aspectos
inconscientes – desconhecidos – do símbolo é uma suposição plausível decorrente
dos pressupostos epistemológicos do paradigma, mas do qual pouco, ou mesmo
nada, se pode dizer a não ser aceitar sua existência. Neste campo se insere a
discussão sobre verdade que será abordada mais adiante.
Em resumo, a perspectiva simbólica arquetípica aplicada no campo da
pesquisa configura uma relação sujeito-objeto dialética que diferencia o eu e o outro,
mas não prioriza um em detrimento do outro. Embora a produção de conhecimento
seja primordialmente conduzida pelo pesquisador, a este não é dado, em princípio,
um controle egoico absoluto da situação, uma vez que o inconsciente – pessoal e
coletivo – participa e interfere constantemente no processo. Apenas a manutenção
de uma atitude simbólica em relação ao pesquisado pode favorecer o andamento do
processo, que busca integrar as polaridades em questão, sem menosprezar ou
supervalorizar uma ou outra. Dessa forma a atitude do pesquisador, particularmente
em relação à participação do inconsciente no processo, é alvo de constante atenção.
Desde o início do processo de pesquisa, o pesquisador deve estar atento às
demandas inconscientes que permeiam suas escolhas e decisões.
162
8.3.3 Segunda etapa – apreensão do fenômeno – coleta de material
Retomando as diretrizes metodológicas do paradigma junguiano, que indica a
consciência do pesquisador como o instrumento primordial na apreensão dos
fenômenos e a observação o procedimento principal para esta apreensão, deve-se
enfatizar também que, da apreensão do fenômeno depende diretamente sua
compreensão, ou seja, a etapa de coleta de dados delimita e condiciona, em larga
escala, os limites e possibilidades de análise e interpretação que o material permite.
Outro aspecto importante a ser considerado na apreensão dos símbolos no
paradigma junguiano é o contexto do fenômeno, ou seja, a situação e a condição em
que o símbolo emerge (PENNA, 2003) e como sua expressão simbólica é captada
pelo pesquisador. Considerações a respeito do contexto do fenômeno, quer na sua
apreensão, como em sua compreensão, serão feitas ao longo de toda a discussão
sobre o processo de pesquisa.
8.3.3.1. Recursos metodológicos
Cumpre salientar que a atitude simbólica do pesquisador consiste em recurso
metodológico indispensável na condução de um processo de pesquisa coerente com
as demandas ontológicas e epistemológicas do paradigma junguiano. A atitude do
pesquisador diante de seu objeto de pesquisa, assim como diante de todo o
processo de pesquisa, confere um caráter amplificatório à sua forma de captar o
material. A função instrumental da consciência do pesquisador tem sido alvo de
atenção ao longo de toda a discussão do processo de pesquisa e, por isso, não
requer nem comporta um destaque isolado neste momento. Por outro lado, quanto à
observação, esta, sim, merece destaque como parte dos procedimentos
metodológicos de apreensão dos fenômenos.
8.3.3.2. Observação e auto-observação
Com base nas considerações feitas sobre as características e implicações da
dinâmica ‘pesquisador–pesquisado’, é possível discutir agora a observação como
procedimento metodológico básico na apreensão dos fenômenos investigados. O
enfoque qualitativo de pesquisa, com frequência, está baseado em métodos de
coleta de dados sem medição numérica, privilegiando a observação como modo
primordial de apreensão dos fenômenos.
163
Pieri (2002) distingue dois tipos de observação: a observação ‘natural’ e a
observação ‘experimental’. Pode-se falar também de observação instrumental, ou
seja, mediada por um instrumento. Nas ciências naturais fala-se de observação a
‘olho nu’ ou por instrumentos (microscópios ou telescópios). Embora, a rigor, toda
observação seja mediada pelo observador, essa distinção é válida quando se trata
de avaliar procedimentos de coleta de material.
Há que se lembrar também a distinção entre observação direta e indireta, pois
“o inconsciente, por definição, não é acessível à observação direta” (vol.8, §356,
nota 12). Assim, a apreensão dos fenômenos psíquicos é sempre feita por meio de
procedimentos de observações diretas e indiretas.
A psicologia como ciência relaciona-se, em primeiro lugar, com a
consciência; a seguir, ela trata dos produtos do que chamamos psique
inconsciente que não pode ser diretamente explorada por estar a um nível
desconhecido, ao qual não temos acesso. (JUNG, vol.18/1, §8)
A distinção que Jung faz do arquétipo em si e da manifestação arquetípica é
fundamental para se discriminar entre constructo teórico limite (arquétipo), que fica
fora da experiência observável e, portanto, fora dos limites do conhecimento
(consciência), e as manifestações dessa entidade teórica que são acessíveis à
consciência e, por isso, passíveis de observação e conhecimento. De acordo com
Jaffé (1989), a distinção entre o conteúdo arquetípico na consciência e o arquétipo
em si “caracteriza o fundamento epistemológico da obra de Jung desde os seus
primórdios” (p. 42) e encaminha diretrizes para o método de pesquisa em psicologia
analítica. Jung afirma que o inconsciente, apesar de não ser acessível à observação
direta, pode ser observado, de modo indireto, por suas manifestações na
consciência (símbolos). Nesse sentido, de certa forma, toda observação psicológica
que vise acessar material inconsciente pode ser considerada uma observação
indireta.
As representações simbólicas desse constructo teórico (arquétipo) são
acessíveis à consciência por intermédio de suas expressões simbólicas e, dessa
forma, passíveis de observação e compreensão. A produção de conhecimento neste
paradigma se efetiva através da pesquisa dessas manifestações na esfera
consciente, tanto no âmbito pessoal como no coletivo. No processo de pesquisa, a
tarefa do pesquisador é manejar a captação e o processamento dos símbolos
164
investigados desde sua apreensão (coleta) até sua compreensão (análise).
A capacidade e a habilidade de observação estão diretamente relacionadas
às funções perceptivas da consciência conhecedora. O treinamento dessa
capacidade inata do ser humano leva ao refinamento da observação, que se traduz
em acuidade, sensibilidade e perspicácia perceptivas que habilitam o pesquisador a
observar os fenômenos em suas sutilezas e nuances. Todavia o conhecimento
humano é sempre resultante da articulação de, pelo menos duas funções – uma
perceptiva (irracional) e uma de julgamento (racional). A sensação e a intuição,
como funções perceptivas da consciência, foram consideradas por Jung (vol.6 e
18/1) funções irracionais, pelo modo imediato com que abordam os objetos. A
sensação simplesmente constata ‘que o objeto é’. Pela percepção sensorial, ela
capta os fenômenos de modo detalhado e minucioso; a intuição os capta de modo
global e abrangente, percebendo-os como parte de um todo mais amplo – visão de
contexto, e, nesse sentido, são funções puramente apreensivas. O pensamento e o
sentimento são funções de julgamento, o primeiro define e conceitua o objeto, e o
segundo atribui significado e avalia o fato percebido. A articulação entre as funções
perceptivas e as funções de julgamento resulta numa observação perceptiva e
compreensiva dos fenômenos, assim, toda observação é simultaneamente
perceptiva e interpretativa. Vale, mais uma vez, sublinhar que ao ser humano não é
possível perceber sem simultaneamente interpretar, por conseguinte, é admissível a
distinção entre procedimentos de apreensão e de compreensão, mas sua separação
no processo de realização da pesquisa, até certo ponto, tem uma função didática
para facilitar a transmissão do conhecimento.
À observação também se acrescenta a auto-observação, que consiste na
constante reflexão do pesquisador sobre sua conexão com as metas da pesquisa,
avaliando constantemente suas decisões e ações, considerando seu vínculo com o
objeto de pesquisa, tentando, na medida do possível, atentar para os aspectos
inconscientes envolvidos no processo, como já foi discutido no que diz respeito à
relação ‘pesquisador – pesquisado’. Da mesma forma que conhecimento e
autoconhecimento são indissociáveis, também a observação e a auto-observação
são inseparáveis.(PENNA, 2003)
As alterações operadas no fenômeno (símbolo) por ocasião de sua
165
observação pelo pesquisador estão presentes ao longo do processo de pesquisa e
são decorrentes, tanto dos procedimentos de apreensão como dos procedimentos
de análise. Elas se sucedem nas etapas do processo e seus efeitos são cumulativos.
Ainda que tais interferências sejam, em grande medida, inevitáveis e mesmo
inerentes à pesquisa qualitativa, é importante considerá-las. Por este motivo é
necessário que o pesquisador explicite detalhadamente suas escolhas e decisões,
definindo o contexto de apreensão e o contexto de compreensão dos fenômenos
pesquisados, alertando para os vieses naturais da investigação. Dessa forma, suas
descobertas se traduzem numa produção de conhecimento que contribui para a
comunidade científica e cultural.
A observação como instrumento fundamental de apreensão dos símbolos
está intimamente associada à relação ‘pesquisador–pesquisado’, anteriormente
abordada. As implicações discutidas quanto à relação epistemológica eu – outro
(sujeito-objeto) estão diretamente relacionadas à questão metodológica da
observação, embora não se trate exatamente do mesmo tipo de relação.
A relação que se estabelece entre o sistema observante e o sistema
observado vai além da relação direta sujeito-objeto, visto que entre os dois sistemas
pode se interpor um instrumento (relato, foto, filme, teste psicológico, técnica
expressiva), como equipamento técnico favorecedor e facilitador da observação do
símbolo. A equação pessoal de ambos os sistemas também se interpõe tanto na
emissão da imagem a ser observada como na sua captação. O campo de
observação psicológica é um campo simbólico que preenche de significados o
processo de observação, o que, mais uma vez, reafirma o caráter interpretativo da
observação.
O ideal e o objetivo da ciência não consistem em dar uma descrição, a mais
exata possível, dos fatos – a ciência não pode competir com a câmera
fotográfica ou com o gravador de som – mas em estabelecer a lei que nada
mais é do que a expressão abreviada de processos múltiplos que, no
entanto, mantêm certa unidade. Este objetivo se sobrepõe, por intermédio
da concepção, ao puramente empírico, mas será sempre, apesar de sua
validade geral e comprovada, um produto da constelação psicológica
subjetiva do pesquisador. (vol.6, §8)
166
8.3.3.3. Procedimentos metodológicos para a apreensão dos
fenômenos
A opção por um procedimento de investigação é da competência exclusiva do
pesquisador e decorre, em primeiro lugar, do paradigma adotado por ele. Um
mesmo método admite vários recursos metodológicos, a articulação de diversos
procedimentos tende a enriquecer e aprofundar a coleta de material. Conforme
apontado por Oliveira (2007), ‘a diversidade de estratégias [utilizadas] reflete o
esforço dos pesquisadores para encontrar e elaborar recursos que contemplem o
material de pesquisa e o referencial teórico’. A escolha dos recursos metodológicos
– instrumentos ou estratégias – para a apreensão dos fenômenos é derivada, em
segundo lugar, da articulação entre o tema da pesquisa, seus objetivos, o contexto
em que a pesquisa é conduzida e o objeto de estudo selecionado pelo pesquisador
como a manifestação simbólica por meio da qual o símbolo será captado.
Optou-se por discutir os procedimentos metodológicos para apreensão dos
fenômenos em sua interface com o objeto da pesquisa como fonte de informação
selecionada pelo pesquisador para captar o símbolo a ser investigado. A escolha do
objeto de pesquisa condiciona, em larga medida, os recursos metodológicos para a
captação das manifestações simbólicas pretendidas na pesquisa. Há pesquisas em
que são eleitas mais de uma fonte de informação sobre o fenômeno, nestes casos é
frequente a associação com o ser humano como fonte de informação, por exemplo,
quando são usados documentos e seres humanos; ou obras literárias e seres
humanos. Mesmo quando o fenômeno alvo de investigação é de cunho cultural
(social ou histórico), percebe-se que, na pesquisa em psicologia em geral, há uma
preferência pelo ser humano como fonte de informação. Por esse motivo, a
discussão dos procedimentos de apreensão é encaminhada, primeiramente, pelas
pesquisas com seres humanos.
8.3.3.4. Procedimentos em Pesquisas com seres humanos
Quanto à articulação entre os procedimentos de coleta, o objeto de estudo e
sua fonte de informação, destacam-se as pesquisas em que a apreensão é feita com
seres humanos. Primeiramente porque isso se aplica a uma grande parcela das
pesquisas realizadas, como foi observado na análise da produção acadêmica atual
167
em psicologia analítica em que 62% das pesquisas tinham seres humanos como
fonte de informação para a investigação do fenômeno e, em segundo lugar, porque
essa articulação requer procedimentos e providências específicas.
Quando os dados são coletados pela observação ou intervenção com seres
humanos, o primeiro ponto a ser esclarecido é quanto à nomenclatura utilizada.
Tradicionalmente as pesquisas com seres humanos usavam o termo ‘sujeito’ ou
‘sujeito de pesquisa’ para nomear as pessoas que forneciam os dados num processo
de pesquisa. Com o advento das pesquisas qualitativas, sobretudo nas ciências
humanas, essa nomenclatura passou por várias revisões, que propuseram os termos
‘informante’ ou ‘participante’ para designar os ‘sujeitos’. Chizzotti (2003) refere-se a
‘pessoas-fonte’ como os indivíduos que são considerados adequados para fornecer
informações ao pesquisador sobre o tema da pesquisa. No presente estudo será
adotado, preferencialmente, o termo participante, com a advertência de que o
participante equivale ao objeto de pesquisa, ou seja, o ser humano é para o
pesquisador, o objeto/fenômeno por meio do qual o material de pesquisa é
apreendido. Em outras modalidades de pesquisa, os objetos / fenômenos podem ser
documentos, textos, filmes ou quaisquer outros tipos de evento cultural, artístico ou
científico. Outro ponto importante, a ser aqui destacado, diz respeito ao vínculo
transferencial que necessariamente se estabelece entre o pesquisador e o
participante e que deve ser cuidadosamente observado especialmente na etapa de
apreensão do material, embora também deva ser considerado na etapa de
compreensão do fenômeno. As pesquisas com seres humanos exigem também
cuidados éticos específicos, alguns dos quais previstos nas regulamentações de
instituições de ensino e saúde onde as pesquisas são realizadas, e outros
recomendáveis pela ética profissional e pessoal que devem ser explicitados no relato
da pesquisa.
Nas pesquisas com seres humanos, o procedimento mais frequentemente
utilizado é a entrevista, podendo ser também usados outros instrumentos de coleta
tais como: depoimentos, questionários, registros ou relatos verbais escritos ou
gravados, testes ou recursos expressivos. A observação, tanto natural como
instrumental, cumpre papel importante em todas essas circunstâncias.
168
8.3.3.5. Entrevistas
Bleger (2007) considera a entrevista um instrumento psicológico fundamental,
tanto no método clínico como na investigação científica.
Entrevista é o procedimento mais frequentemente utilizado para apreensão
dos fenômenos nas pesquisas com seres humanos. Em 46% das pesquisas
acadêmicas atuais, analisadas neste estudo, o procedimento de entrevista foi
selecionado como instrumento de coleta de material.
Como procedimento preferencial na pesquisa em psicologia analítica, as
entrevistas devem ser subsidiadas, de acordo com Blanchet (2004), por uma teoria e
pela experiência do pesquisador. Diante dos fundamentos epistemológicos do
paradigma junguiano, a elaboração das entrevistas deve ter por objetivo colher
material consciente e inconsciente, assim as modalidades de entrevista
semidirigidas, semi-estruturadas, abertas ou em profundidade são as mais
adequadas. O que distingue essas modalidades de entrevista é o crescente grau de
liberdade por elas permitido, tanto ao entrevistador como ao entrevistado no seu
transcurso. Estes tipos de entrevistas são orientados por um roteiro previamente
estabelecido que lhes confere flexibilidade, favorecendo a espontaneidade do
participante e a criatividade do pesquisador. Entretanto, essas modalidades de
entrevista exigem do entrevistador conhecimento aprofundado do assunto
pesquisado, além de sensibilidade psicológica para os conteúdos projetados na
relação transferencial que necessariamente se estabelece entre entrevistador e
entrevistado, conforme discutido anteriormente.
Dessa forma, a elaboração e aplicação das entrevistas devem privilegiar a
relação interpessoal dinâmica entre o entrevistador e o entrevistado (vide relação
‘pesquisador – pesquisado’). De acordo com Bleger (2007), “a entrevista psicológica
é uma relação, com características particulares, que se estabelece entre duas ou
mais pessoas” (p. 6). Ao pesquisador entrevistador compete eleger modos e formas
de conduzir a entrevista a fim de que seja captado o material necessário e
condizente com seu tema de pesquisa.
Quanto à dinâmica relacional, Bleger (2007) salienta como habilidades
importantes do entrevistador não apenas a escuta, mas também a observação do
169
comportamento do outro, ou seja, deve-se conseguir, pela entrevista, captar a
personalidade do entrevistado. Quanto ao entrevistador “é importante ressaltar o
esforço para estimular os sujeitos a se tornarem generosos ao assumirem a tarefa
de informante, ponto central para o sucesso da coleta” (PAULA, 2005, p. 135), pois,
conforme aponta Allones (2004), o procedimento de entrevista pode deixar muitos
conteúdos implícitos e, quanto a isso, é importante, não apenas a promoção de um
ambiente favorável para a realização da entrevista, mas também a formulação de
um roteiro que permita a emergência do material a que se destina a entrevista, ou
seja, atentar para a sintonia com os objetivos da pesquisa e do procedimento.
É imprescindível que a entrevista seja elaborada de tal modo que permita o
acesso ao material consciente e inconsciente. É desejável que o caráter projetivo da
entrevista seja articulado com seu aspecto expositivo, favorecendo a naturalidade e
espontaneidade do entrevistado.
Quanto à captação de material consciente, é recomendável que seja
solicitado ao entrevistado o uso das várias funções da consciência (pensamento,
sentimento, sensação e intuição) em suas respostas. Para tanto, o roteiro da
entrevista deve contemplar questões que incentivem o participante a exprimir-se
tanto do ponto de vista cognitivo e perceptivo, como também valorativo e intuitivo
quanto ao tema investigado. Dessa forma é assegurada a apreensão de múltiplas
facetas conscientes do símbolo investigado. Ainda em relação à obtenção de
informação no plano consciente, pode ser conveniente para o tema da pesquisa
proceder à investigação dos dinamismos arquetípicos por meio dos quais o indivíduo
se relaciona com o ambiente, neste caso o roteiro de entrevista deve abranger
perguntas que atentem para tais dinamismos. Por exemplo, questões relativas a
gosto, prazer ou aspectos da natureza tendem a revelar um funcionamento de tipo
matriarcal. Por outro lado, questões referentes a dever, trabalho, leis e regras, assim
como disciplina e ordem, suscitam o desempenho patriarcal da consciência. Com
isso fica evidente a necessidade de domínio das bases epistemológicas do
paradigma por parte do pesquisador (entrevistador) para o uso eficiente dos
instrumentos de coleta de dados em geral.
Quanto às estratégias para a apreensão de material inconsciente, podem ser
utilizadas perguntas ou propostas que solicitem a projeção de conteúdos
170
inconscientes que remetam o indivíduo à imaginação e à fantasia. A formulação de
perguntas, tais como ‘se você fosse...’, ou, ‘o que você imagina que...’, ou ainda,
como seria se...’, incentiva a fantasia e, com isso, a entrevista se torna um recurso
metodológico projetivo.
A modulação do ritmo, a duração da entrevista bem como a sequência de
temas abordados e a intensidade de envolvimento solicitado ao entrevistado
também contribuem para a consecução dos objetivos almejados na apreensão dos
fenômenos. O roteiro da entrevista deve ser cuidadosamente preparado, testado e,
se necessário, reformulado. A avaliação da pertinência e eficiência do roteiro de
entrevista pode ser feita por meio de entrevistas piloto ou pela ‘auto-aplicação’ do
roteiro. A experiência de uso da ‘auto-aplicação’ de recursos metodológicos em
grupos de alunos da graduação tem se mostrado muito interessante. Ao se submeter
a seu próprio instrumento, o pesquisador experimenta de modo prático, e não
apenas teórico, a ressonância provocada por seu instrumento de coleta de material,
sobretudo no que diz respeito aos aspectos transferenciais envolvidos na aplicação
de estratégias de pesquisa.
Os registros (escritos ou gravados e transcritos) devem ser feitos “com a
maior fidelidade possível, buscando preservar o dinamismo e vivacidade originais de
forma a reconstituir o diálogo registrado” (PAULA, 2005, p.144). Nesse sentido a
competência do pesquisador como observador atento e sensível a sutilezas e
minúcias é essencial.
Muitas das considerações feitas quanto à elaboração e aplicação de
entrevistas também se aplicam ao uso de outros procedimentos metodológicos em
pesquisas com seres humanos.
8.3.3.6. Recursos projetivos
A utilização de recursos projetivos também é bastante frequente nas
pesquisas em psicologia analítica. São considerados recursos projetivos tanto os
testes projetivos como as técnicas expressivas, amplamente utilizadas nos
processos de psicodiagnóstico e no processo analítico. Os recursos projetivos, por
sua natureza, favorecem a emergência de conteúdos inconscientes via projeção e
são, portanto, estratégias muito adequadas aos objetivos da pesquisa junguiana
171
para a captação de material. O uso de testes projetivos na coleta de material
dispensa comentários mais detalhados, uma vez que a literatura específica dos
testes informa e orienta sua aplicação.
Quanto ao emprego de recursos expressivos, estes podem ser de cunho
gráfico, plástico, dramático, corporal e imaginativo, tais como desenho, modelagem,
dramatização, técnicas de relaxamento e expressão corporal, visualização de
imagens, fantasia dirigida, material onírico e cenários em caixa de areia. Esses
recursos evocam material simbólico que se expressa por vias não-verbais, ainda que
em alguns casos seu registro seja verbal (ou escrito).
8.3.3.7. Material não-verbal
De acordo com a conceituação de símbolo e considerando-se que o
conhecimento é fruto da articulação das diversas funções da consciência, na
pesquisa em psicologia analítica é não apenas viável como também desejável,
dependendo dos objetivos e do contexto em que a pesquisa é feita, a obtenção de
material não-verbal. Estes podem ser associados à coleta de material verbal. Os
desenhos, por exemplo, são estratégias de apreensão de dados muito utilizadas em
razão de sua capacidade expressiva que articula material projetivo (inconsciente e
consciente) com uma forma de expressão não verbal. A articulação entre
procedimentos de apreensão de material verbal e material imagético enriquece e
aprofunda o espectro de facetas do símbolo em pauta na investigação.
8.3.3.8. Considerações sobre pesquisa e Intervenção
psicoterapêutica
Com respeito à pesquisa com seres humanos, cumpre salientar também as
investigações clínicas, cujo foco principal situa-se na avaliação de intervenções
psicoterapêuticas. Esta modalidade de pesquisa foi amplamente discutida por
Allones (2004) e algumas de suas implicações foram abordadas quando se discutiu
a relação ‘pesquisador – pesquisado’. Entretanto algumas considerações ainda
devem ser feitas quanto às pesquisas que fazem uso de intervenções terapêuticas
como procedimento de apreensão do fenômeno. Herrmann (2006) e Neder (1993)
172
argumentam em favor da não discriminação entre a atividade clínica e de pesquisa e
sustentam que o trabalho clínico é em si um trabalho de investigação, porém o papel
e a função do pesquisador e do psicoterapeuta são bastante distintos, assim como o
são seus objetivos. Não se trata de invalidar a produção de conhecimento no campo
da psicoterapia, ao contrário, seu valor é inegável. Trata-se, porém de escolher
cuidadosamente a forma de realizar tais pesquisas, visto que o acúmulo de papéis e
funções advindo da sobreposição das atividades de pesquisa e de intervenção
torna-se especialmente delicado e até mesmo arriscado, tanto para o pesquisador
como para os indivíduos que dela participam. O processo de pesquisa em psicologia
analítica por si só já envolve uma grande diversidade de fatores a serem
considerados, assim como um alto grau de complexidade no manejo e articulação de
elementos conscientes e inconscientes tanto no plano individual quanto arquetípico.
Portanto é mais aconselhável, na medida do possível, manter a discriminação entre
as funções de pesquisador e psicoterapeuta e as atividades de pesquisa e
intervenção. Se o profissional tem o hábito de registrar e arquivar o material de seus
pacientes, ele não terá dificuldade em realizar uma investigação científica de cunho
clínico utilizando esse material previamente coletado, o que é prática bastante
frequente entre os psicólogos clínicos. Essas recomendações são válidas também
para outros tipos de intervenções clínicas em instituições de saúde em geral. Vale
ressaltar o caso das clínicas-escola e os hospitais-escola, em que todo material é
registrado e arquivado com o consentimento prévio de seus usuários com a
possibilidade de eventual uso como material de pesquisa.
Nas pesquisas teórico-clínicas, o material clínico geralmente é utilizado como
uma ilustração a serviço de uma compreensão ampliada e aprofundada do tema ou
conceito teórico alvo da investigação. Essa é, outrossim, uma alternativa
interessante para a produção de conhecimento no campo clínico.
8.3.3.9. Procedimentos em Pesquisas de fenômenos culturais
Muitos dos aspectos abordados sob a rubrica de pesquisa com seres
humanos são da mesma forma aplicáveis às pesquisas de fenômenos culturais e às
pesquisas teóricas. Nas pesquisas cujo objeto de estudo são fenômenos culturais,
muitas vezes são utilizados seres humanos como fonte de informação. Cumpre, no
entanto, salientar as situações em que o objeto exclusivo da pesquisa são eventos
173
culturais, tais como obras de arte, personagens ou fatos de ordem histórica ou
ficcional, cujas fontes de informação podem ser documentos; produções literárias ou
cinematográficas; mídia escrita ou televisiva, entre outros.
Oliveira (2007), em sua pesquisa sobre a personagem Buffy, de um seriado
de televisão, afirma, em relação à abordagem de produções culturais nas pesquisas
em psicologia analítica, que “a intensidade da fascinação ou das emoções geradas
pelas imagens cinematográficas é fator suficiente para justificar o trabalho de
análise” assim como sua eleição como objeto de pesquisa (p. 17).
Os procedimentos de coleta nestes casos fazem amplo uso da observação
natural ou instrumental e da coleta de material via registro das observações. Aqui
também são utilizados recursos para obtenção de material não-verbal, tais como
fotos e vídeos a partir dos quais o pesquisador recolhe seu material de pesquisa
para análise e compreensão do fenômeno.
Alguns critérios devem ser estabelecidos para proceder à coleta desse tipo de
material. A delimitação do contexto de coleta cumpre papel relevante para
circunscrever as características da amostra, orientar e organizar a seleção de
material apropriado aos objetivos da pesquisa. As fontes consultadas devem ser
minuciosamente registradas. Algumas opções quanto ao tipo de material a ser
selecionado para análise, muitas vezes, precisam ser feitas de antemão, por
exemplo, no caso de filmes é preciso decidir se a unidade de análise serão as
imagens ou as cenas do filme, se será constituída pelos diálogos dos personagens,
ou ainda por ambos, visto que, dependendo da escolha feita pelo pesquisador, as
perspectivas de observação e o registro do material são diferentes.
A relação que se estabelece entre o pesquisador e o pesquisado neste tipo de
pesquisa, apesar de distinta daquela em vigor nas pesquisas com seres humanos,
ainda assim envolve alguma espécie de vínculo transferencial, em função da
hipótese de que o tema da pesquisa e seu correlato no fenômeno (objeto de
pesquisa) são, respectivamente um símbolo e uma expressão ou manifestação
desse símbolo. O caráter numinoso do símbolo tanto captura como fascina o
pesquisador, mobilizando forte carga energética de emoções e curiosidade
intelectual, que são, inevitavelmente fonte de fantasias projetivas sobre o objeto.
174
Com isso é essencial que o pesquisador fique atento a suas expectativas, crenças e
valores consensuais assim como pré-conceitos com relação ao objeto sob
investigação, que, de certa forma, podem configurar complexos culturais do
pesquisador. Tais projeções podem nublar a observação e ainda enviesar a coleta
de material. Mesmo admitindo-se que algum tipo de viés (subjetividade) estará
sempre presente, o registro minucioso tanto dos dados como das fontes utilizadas,
neste caso, são muito importantes.
Finalmente, com relação às pesquisas cujo objeto de estudo são fenômenos
culturais, é preciso ressaltar que, em função de seus pressupostos epistemológicos,
o paradigma junguiano oferece recursos metodológicos para a “compreensão e
análise de fenômenos socioculturais” (OLIVEIRA, 2007, p. 24), o que tem sido
observado na produção de vários autores pós-junguianos
6
, e também foi constatado
pela presença de 35% de pesquisas de cunho cultural na produção acadêmica atual
brasileira.
8.3.3.10. Procedimentos em pesquisas de conceitos ou temas
teóricos
Nas pesquisas em que o objeto alvo da investigação consiste em questões
relativas a conceitos teóricos ou autores da psicologia analítica, os procedimentos de
coleta de material empregados são, geralmente, revisão bibliográfica: levantamento
de textos de cunho histórico ou de documentos considerados relevantes para o
assunto pesquisado. Aqui se aplicam as mesmas recomendações feitas a respeito
dos fenômenos culturais, tanto em relação aos procedimentos de coleta como
referentes ao vínculo transferencial com o material. A variedade de fontes
consultadas pode auxiliar na redução de vieses. O rastreamento histórico do
conceito ou do tema pesquisado confere maior amplitude de possibilidades na
análise e colabora para o estabelecimento do contexto de apreensão e, nesse
sentido, encaminha o contexto de análise do material. O progresso da ciência
depende da sinergia entre pesquisa básica e pesquisa aplicada (COZBY, 2003).
6
Para informações a esse respeito, ver, dentre outros: Gambini (1988); Neumann (1990); Stein (2001);
Singer (2002); Ramos (2004); Zoja (2005).
175
8.3.4 Terceira etapa: Processamento simbólico arquetípico
Os fenômenos investigados na pesquisa junguiana são parcialmente
conhecidos (conscientes) e parcialmente desconhecidos (inconsciente) e portanto
analisáveis e compreensíveis. Os aspectos conhecidos do fenômeno são as facetas
evidentes do objeto pelas quais ele se apresenta e é captado e registrado. Seus
aspectos desconhecidos são as incógnitas a serem respondidas pela investigação,
as quais estão delineadas ou sugeridas no objetivo da pesquisa e serviram de
orientação para a apreensão do fenômeno na fase de coleta de dados.
Tais fenômenos têm valor simbólico para o pesquisador e para a comunidade
científica e cultural e estão referidos a um determinado contexto, no qual foram
apreendidos (contexto de coleta de dados). A etapa de análise compreensiva do
material tem por finalidade decifrar e assimilar a face desconhecida do símbolo,
tornando-a, até certo ponto, conhecida. Cumpre-se, assim, a meta do processo de
pesquisa: produção de um conhecimento novo e significativo. Nesta fase do
processo, os principais recursos metodológicos utilizados concentram-se nos
recursos internos do pesquisador: suas capacidades e habilidades, seus
conhecimentos específicos sobre o tema investigado, e o trabalho realizado nas
etapas anteriores.
Dessa forma, a condução do processamento simbólico arquetípico do material
coletado exige a participação integral da personalidade do pesquisador. Mesmo que,
desde o início do processo de pesquisa, seus recursos internos estejam atuantes e
se articulem com a atividade de apreensão, neste momento, eles se fazem mais
proeminentes e exigem também introspecção e reflexão, uma vez que os rumos do
trabalho podem ser alterados pelo processamento simbólico arquetípico que começa
a revelar as incógnitas do símbolo investigado.
O processamento simbólico arquetípico requer, em primeiro lugar, a
articulação das funções da consciência, favorecendo a compreensão psicológica dos
fenômenos a partir da perspectiva simbólica arquetípica do paradigma junguiano
(PENNA, 2003). Em segundo lugar, esse processamento tem caráter dinâmico, que
inclui, conforme proposto por Jung (vol.8), as etapas de tradução, interpretação
(hermenêutica) e elaboração do material, as quais transcorrem dialeticamente em
176
sequências de análises e sínteses e demandam uma atitude compatível por parte do
pesquisador.
Para Jung (vol.6), a psicologia é uma espécie de ciência intermediária capaz
de unir ideia e coisa. A realidade psíquica é uma “realidade viva”, realidade esta que
“não é dada exclusivamente pelo produto do comportamento real objetivo das
coisas, nem pela fórmula ideal, mas pela combinação de ambos no processo
psicológico vivo” (§ 73). Nesse âmbito, a experiência sensível da coisa e a força da
ideia se integram, pois, se por um lado, “ao esse in intelectu falta a realidade
tangível, ao esse in re falta espírito” (§ 73), pelo esse in anima o paradigma
junguiano supera a dissociação, tradicional da filosofia das ciências, entre a
perspectiva materialista e a perspectiva idealista.
Ideia e coisa confluem na psique humana que mantém o equilíbrio entre
elas. Afinal o que seria da idéia se a psique não lhe concedesse um valor
vivo? E o que seria da coisa objetiva se a psique lhe tirasse a força
determinante da impressão sensível? O que é a realidade se não for uma
realidade em nós, um esse in anima? (JUNG, vol.6, §73).
Do ponto de vista prático, para que a 3ª etapa do processo tenha início, o
pesquisador precisa fazer uma revisão geral de todo material coletado e avaliar a
necessidade de complementação ou descarte de dados, para então encerrar
definitivamente a etapa de apreensão; retirar-se do campo de coleta e se dedicar à
compreensão do material.
As suas funções da consciência (pensamento, sentimento, sensação e
intuição) são os recursos internos de que dispõe o pesquisador para observar e
compreender os símbolos. Como foi discutido anteriormente, a observação é o
recurso metodológico primordial para a apreensão dos fenômenos, sua articulação
com as funções de julgamento resulta em uma percepção interpretativa. Tais
recursos no processo de pesquisa constituem recursos metodológicos tanto de
apreensão como compreensão.
Segundo Von Franz (1992), “uma interpretação meramente intelectual jamais
é satisfatória, pois o valor emocional do conteúdo arquetípico é tão importante
quanto sua compreensão [racional]” (p. 108). Dessa forma, os processos cognitivos
devem ser flexibilizados, por um lado, pela participação de outras funções
perceptivas e avaliativas, e por outro lado, permitindo que, ao pensamento racional
177
dirigido seja acrescentado o pensamento irracional não dirigido (Jung, vol.5), donde
resulta o pensamento simbólico (Jung, vol.6). A leitura simbólica do material
promove uma compreensão que não é literal ou simplesmente descritiva do
fenômeno. A atitude simbólica do pesquisador diante da pesquisa é peça
fundamental nesta etapa do trabalho.
O trabalho realizado na 2ª etapa resultou num material que agora deve ser
analisado. O material a ser analisado precisa ser considerado quanto ao contexto;
quanto a suas causas e finalidades e quanto aos seus aspectos arquetípicos e
particulares ou individuais. Esses três aspectos encontram-se fortemente
entrelaçados nos fenômenos.
Por um lado, os eventos psicológicos – manifestações simbólicas – emergem
tanto no contexto individual como no contexto cultural – símbolos individuais e
símbolos culturais – e, por outro lado, todo conhecimento é forjado e faz sentido num
determinado contexto. A perspectiva simbólica arquetípica do paradigma requer que
os fenômenos sejam analisados dentro de um amplo espectro de possibilidades, no
que diz respeito ao contexto em que a compreensão do material será conduzida. A
investigação na psicologia analítica abarca a esfera dos fenômenos individuais e dos
fenômenos coletivos, desde que configurados por seu valor simbólico, seja para o
indivíduo ou para a coletividade que os produz e os vivencia.
O contexto mais amplo e geral de qualquer fenômeno psicológico é o contexto
arquetípico, e seu contexto mais estrito e específico é o contexto particular ou
individual. Entre esses dois polos há gradações que devem ser consideradas, de
acordo com a situação (contexto) em que o fenômeno foi observado e os objetivos
da pesquisa.
Na perspectiva simbólica-arquetípica, o evento simbólico é compreendido
com base nas causas, na teleologia (finalidade) e na sincronicidade; é analisado e
interpretado no entrelaçamento de seus aspectos atuais, históricos e arquetípicos,
buscando-se sempre situar seu sentido na totalidade de que faz parte.
8.3.4.1. Organização do material para fins de análise
Esta é uma etapa preliminar da análise compreensiva essencial para a
178
preparação do material para sua leitura simbólica, que já invoca as capacidades
analíticas e amplificatórias do pesquisador para traduzir o material recolhido num
texto legível, a fim de ser interpretado.
Meu modo de proceder não difere daquele usado para decifrar um texto
difícil de ler. O resultado obtido com este método nem sempre é um texto
imediatamente compreensível, mas muitas vezes não passa de uma
primeira, mas preciosa indicação que comporta numerosas possibilidades.
(Jung, vol.8, §542)
Reconstituição do contexto de coleta:
A ‘reconstituição do contexto’ (Jung, vol.8) do fenômeno é feita pela retomada
das condições de apreensão do fenômeno e informa sobre sua situação atual e as
condições gerais em que esse símbolo se expressa, tanto na perspectiva espaço
temporal (cultural) no contexto da consciência coletiva, como na perspectiva da
consciência individual e, também, quanto à situação psíquica que enseja a
manifestação do símbolo, qual seja, a dinâmica compensatória entre a consciência
(coletiva e individual) e o inconsciente (coletivo e pessoal). Lembrando que todo
evento psicológico “é uma auto-representação, em forma espontânea e simbólica, da
situação atual do inconsciente” (Jung, vol.8, §505) e tem uma função compensatória
para a situação atual da psique (individual ou coletiva) na qual ele emerge.
A avaliação do contexto do fenômeno aliada aos objetivos pretendidos pela
pesquisa encaminham o contexto da análise e definem o âmbito em que o fenômeno
será analisado e compreendido; com isso, delimitam em que grau e com que ênfase
os aspectos arquetípicos e individuais do símbolo serão considerados em sua
interpretação.
Algumas perguntas, a título de reflexão, podem ser levantadas pelo
pesquisador com o intuito de esclarecer e preparar a análise do material:
Que circunstâncias forjaram a emergência deste símbolo / fenômeno?
Que situação psíquica este símbolo vem compensar?
Qual o tema arquetípico subjacente neste símbolo?
Tradução do material num texto legível
Com a reconstituição do contexto de apreensão, que considera “um trabalho
simples, quase mecânico, que tem um valor meramente preparatório” (vol.8, §542), é
179
feita a tradução do material em um ‘texto legível’ para sua interpretação e
compreensão subsequentes. A tradução equivale à etapa de organização e
preparação do material para fins de análise.
Na preparação do material o pesquisador tenta encontrar padrões de
semelhança e/ou discrepâncias relevantes, com a finalidade de descobrir e definir
que tipo de análise o material permite e selecionar os ângulos pelos quais a
compreensão dos fenômenos será encaminhada. Essa organização do material, por
vezes, se assemelha à montagem de um quebra-cabeça cuja figura final ainda não
está definida, visto que no enfoque qualitativo de pesquisa a análise e a
interpretação do material não estão predeterminadas, ao contrário, elas vão se
delineando ao longo da etapa de coleta e se estabelecendo à medida que o material
é organizado. O modo mais frequente e adequado de preparar o material para fins
de análise é por meio de leituras e re-leituras analíticas que conduzem à seleção das
categorias de análise. O parâmetro básico para a seleção das categorias são as
unidades de significado observadas pelo pesquisador na organização e
mapeamento do material por eixos temáticos. Os núcleos temáticos que subjazem a
seleção de categorias são discriminados pelo procedimento circum-ambulatório que
consiste em circular em torno do material, procurando e se deixando surpreender
pelos padrões arquetípicos constelados no material. É recomendável, mais uma vez,
lembrar que “dá bons resultados fazer uma meditação verdadeira e profunda sobre o
[material], isto é, se o carregarmos dentro de nós por algum tempo”. (JUNG,
vol.16/1, §86)
Em síntese, esta etapa de tradução do material num texto legível situa o
material recolhido (contexto de apreensão) e destaca os elementos mais
significativos e relevantes disponíveis para a análise a partir das categorias
selecionadas. Com isso o contexto de interpretação é delimitado e a perspectiva
pela qual será conduzida a análise é delineada; são retomados ou reformulados os
objetivos em função das disponibilidades e possibilidades oferecidas pelo material,
lembrando que sempre há “diversas possibilidades de interpretação para os
conteúdos simbólicos”. (JUNG, vol.16/1, §9).
Assim, o campo está razoavelmente preparado para a etapa de interpretação.
Diante deste panorama, algumas questões devem ser levantadas pelo pesquisador
180
com o objetivo de orientá-lo na leitura simbólica do ‘texto legível’ produzido pela
tradução de seus dados.
Neste momento, visando à avaliação dos parâmetros de causa e finalidade,
fornecem boas pistas ao pesquisador, perguntas do tipo:
De onde surge este fenômeno? Qual a sua origem?
Por que isso se apresenta neste momento?
Qual a finalidade deste evento? A que serve este símbolo?
Para onde isto aponta ou se encaminha?
8.3.4.2. Parâmetros de interpretação
Conforme delineado até este momento, o processamento simbólico
arquetípico, com o objetivo de compreender o material, coletado envolve vários
aspectos que se articulam em vários níveis de análise e interpretação: construção de
uma rede de associações entre características explícitas e implícitas do fenômeno,
estabelecimento de conexões entre o material de pesquisa e as hipóteses
(ontológicas e epistemológicas) do paradigma adotado pelo pesquisador e
articulação entre o plano arquetípico e o plano individual dos fenômenos. Trata-se de
um processo cuja dinâmica e complexidade em muito escapa à tentativa de
descrevê-lo, ao preço e ao risco de ser reduzido e imobilizado artificialmente. Assim
sendo, a descrição e discussão desta etapa do processo de pesquisa é apresentada
de tal forma que a dinâmica seja preservada e a compreensão não seja
comprometida.
Os principais parâmetros de análise são: causalidade, finalidade, eventual
sincronicidade, padrões arquetípicos proeminentes e função compensatória do
símbolo em relação ao inconsciente coletivo e individual (fator desconhecido).
Parâmetros esses que já vêem sendo considerados e empregados no
processamento simbólico arquetípico desde a reconstituição do contexto e estão
especificados nas diretrizes metodológicas da pesquisa em psicologia analítica.
8.3.4.3. Atitude simbólica do pesquisador
A atitude do pesquisador junguiano consiste em considerar as polaridades
psíquicas, sem menosprezar ou sobrevalorizar uma em detrimento da outra,
181
evitando uma posição unilateral em relação aos fenômenos. Assim, o pesquisador
deve empregar todos os recursos de sua personalidade para que o conhecimento se
processe, o que exige uma abertura para o desconhecido (inconsciente), tanto em si
mesmo como no outro. Essa atitude diante dos fenômenos psíquicos baseia-se na
concepção de inconsciente coletivo, na hipótese de um princípio organizador da
psique e no conceito de símbolo (PENNA, 2003). Trata-se de uma atitude simbólica
do pesquisador, indispensável para a condução do processo de pesquisa e para a
produção de um conhecimento científico condizente com as diretrizes do paradigma
junguiano (PENNA, 2007). Tal atitude é, como já foi apontado anteriormente,
fundamental no processo de pesquisa em todas as suas etapas.
Kluger (1993) considera o método junguiano de interpretação dos fenômenos
uma hermenêutica reflexiva, uma vez que esta se propõe a manter a tensão entre o
nível objetivo da interpretação e seu nível subjetivo, posto que o conceito de imago
sintetiza as percepções externas com as imagens internas e assim re-une sujeito e
objeto.
Romanyshyn (2007) propõe a manutenção da tensão entre pensar e imaginar
como o modo de se situar entre o objetivismo e o subjetivismo e configura uma
posição do pesquisador diante dos fenômenos. Kotsch (2000) diz que Jung “forjou
um caminho que levou a uma posição meta-psicológica similar ao realismo interno
[...] e a uma psicologia teórica que deu lugar tanto à estrutura cognitiva inconsciente
como à imaginação. Longe de ser meramente uma preocupação acadêmica, esta
perspectiva conduz a uma atitude inconfundivelmente junguiana” (p. 219). O autor
propõe que essa perspectiva da psicologia analítica seja denominada ‘realismo
psíquico’, para superar a oposição entre subjetivismo e objetivismo.
A perspectiva simbólica arquetípica da psicologia analítica supera várias
dicotomias típicas da mentalidade moderna com sua acentuada predominância do
dinamismo patriarcal. Tanto epistemológica como metodologicamente, o paradigma
junguiano tende a uma posição de síntese das polaridades consciente e
inconsciente, espírito e matéria, sujeito e objeto, individual e coletivo e causa e
finalidade. Essa perspectiva acarreta uma atitude diante da vida, da realidade e dos
fenômenos que pode ser chamada atitude simbólica. Tal atitude precisa ser adotada
pelo pesquisador, mas nem sempre coincide com a educação e formação
182
acadêmica a que ele esteve exposto e pela qual foi treinado para lidar com os
problemas e desafios da vida. Nesse sentido, é importante destacar a necessidade
da comunidade junguiana de se dedicar à formação de pesquisadores da mesma
forma que vem se dedicando à formação de analistas há mais de 50 anos.
Ao considerar a atitude do pesquisador, cabe ressaltar a sincronicidade como
um fator relevante no processamento simbólico arquetípico dos fenômenos. Mais do
que um conceito ou apenas um parâmetro para a compreensão da realidade, a
sincronicidade implica uma atitude diante dos fatos, visto que o reconhecimento de
sua ocorrência requer, mais do que uma capacidade perceptiva, uma cosmovisão
que dê acolhida à sincronicidade.
Definida por Jung (vol.8) como um princípio de conexões acausais cuja
relação se estabelece pelo significado, a sincronicidade permanece uma noção
altamente polêmica, mesmo com as descobertas da física quântica sobre a não
localidade do átomo e dos campos interativos. A física quântica aborda o campo dos
fenômenos microfísicos relativos a uma espécie de realidade subjacente, assim
como a realidade inconsciente, ao passo que, o campo dos fenômenos da física
clássica refere-se à realidade cotidiana manifesta, assim como a realidade
consciente. A sincronicidade refere-se a eventos relacionados pela via do significado
e não pela via da causalidade. A noção de unus mundus originária da filosofia
medieval; o conceito de realidade unitária de Jung (vol.8) subjacente à dualidade
psique e matéria e a ordem implicada proposta por Bohm (2001) apontam para a
conexão entre psique e matéria, conexão esta que escapa aos tão arraigados
parâmetros racionais visíveis de causa e efeito.
Hauke (2000) situa a sincronicidade como a manifestação de algo para além
da esfera material e, portanto, fora do alcance da percepção sensorial. Aufranc
(2006) sugere que “quando os arquétipos operam simultaneamente em ambas as
esferas, a da psique e a da matéria, dão origem ao fenômeno da sincronicidade”
(p. 11).
“A causalidade não explica uma determinada classe de acontecimentos, e
que, neste caso, é preciso levar em conta um fator formal, isto é, a sincronicidade,
como princípio de explicação”. (JUNG, vol.8, §934)
183
A sincronicidade como mais um fator de explicação para fenômenos psíquicos
amplia o âmbito de análise e compreensão. Causa e finalidade implicam relações
temporais, a sincronicidade envolve relações de significado. Dessa forma, aos
parâmetros de causa e finalidade acrescenta-se o parâmetro da sincronicidade na
compreensão dos fenômenos investigados.
Não há como orientar o pesquisador, nesta etapa do processo, sem contar
com seus conhecimentos claros e abalizados sobre os pressupostos ontológicos e
epistemológicos do paradigma junguiano, assim como invocar sua acuidade
simbólica e sua sensibilidade e experiência pessoais com relação à perspectiva
arquetípica da vida e dos fenômenos, ou seja, sua atitude simbólica.
E quanto a isso é necessário considerar a formação do pesquisador à
semelhança da formação do analista junguiano, posto que, no enfoque qualitativo de
pesquisa, o pesquisador é o primeiro e principal recurso metodológico empregado na
apreensão e na compreensão do material. Soma-se a isso a exigência básica da
metodologia qualitativa de consistência e coerência entre epistemologia e método.
Destarte a habilitação do pesquisador não é de ordem técnica, ao contrário trata-se
de uma formação que envolve conhecimentos específicos sobre o paradigma
adotado, experiência profissional e formação pessoal do pesquisador.
8.3.4.4. Amplificação simbólica
Quanto aos procedimentos empregados no processamento simbólico
arquetípico do material, destaca-se a pesquisa bibliográfica, que já foi feita em
etapas anteriores, mas que agora se aplica ao processamento do material em
decorrência dos achados da fase de tradução do material, e é feita em duas
direções: literatura específica sobre o tema central da pesquisa em associação ao
material coletado e relativa aos conceitos da psicologia analítica que se mostraram
relevantes para a análise e literatura ampla e variada sobre os temas encontrados
no material a partir das categorias temáticas.
Com isso pretende-se estabelecer conexões e fazer associações que
forneçam informações sobre o assunto pesquisado e permitam a ampliação e o
aprofundamento do conhecimento sobre os temas em pauta.
184
Conforme destaca Oliveira (2007), “a incursão por estudos culturais advindos
de outros campos da ciência, como a antropologia, folclore, história, linguística e
ciências da religião, concorre para a delimitação do campo de estudo [...] além de
demonstrar que diferentes ciências, pautadas por diferentes intenções, criam
demarcações relativas aos resultados” a serem analisados e interpretados (p. 17).
A pesquisa bibliográfica inter-áreas (artes, mitologia, história, religião,
antropologia etc.) pretende estabelecer conexões com outras áreas do
conhecimento e ampliar as possibilidades de compreensão do fenômeno e, para
tanto, deve abranger diversos campos da cultura em diferentes épocas com a
finalidade de avaliar a qualidade arquetípica do símbolo e as transformações a que
foram submetidas suas manifestações tanto no plano individual como coletivo. O
tratamento dispensado ao material bibliográfico deve ser do tipo hermenêutico
amplificatório, tendo como centro o núcleo temático do fenômeno, buscando
associações e analogias entre os achados bibliográficos e o núcleo temático do
material pesquisado.
A pesquisa bibliográfica específica tem como objetivo dar sustentação
epistemológica e articulação consistente às várias possibilidades vislumbradas pela
pesquisa bibliográfica amplificatória realizada no plano cultural.
A hermenêutica junguiana, também chamada amplificação simbólica, é aqui
proposta como um procedimento metodológico a serviço do processamento
simbólico arquetípico, seu caráter amplificatório estabelece uma rede de
associações em torno do tema nuclear do fenômeno, visando amplificar seus
significados em vários níveis de interpretação. A rede de associações por analogias
e comparações entre diversas áreas do conhecimento favorece a articulação entre o
nível arquetípico (coletivo) e o nível particular (individual) do fenômeno,
simultaneamente sintetiza as perspectivas objetiva e subjetiva e, assim, restabelece
o vínculo entre indivíduo e cultura. A circum-ambulação, como a estratégia de rodear
o símbolo em busca de semelhanças de sentido e significado, visa também
encontrar correspondências entre o âmbito atual de expressão do símbolo e seu
âmbito causal (histórico), assim como perscrutar sua finalidade – perspectiva
teleológica (prospectiva) –, estabelecendo uma conexão entre o passado, o presente
e o futuro do fenômeno pesquisado. Nesse sentido, o processamento dos símbolos
185
por meio da amplificação, ao observar o presente, olha também para o passado e
nessa intersecção vislumbra o futuro, resgatando as encruzilhadas do lembrado e do
esquecido, do universal e do particular. “O tratamento hermenêutico [dos símbolos]
conduz teoricamente ao longo da análise à síntese do indivíduo com a psique
coletiva [arquetípica ou cultural]”. (JUNG, vol.7/2, p.146).
A amplificação simbólica aplica-se a qualquer tipo de mensagem simbólica e
não está exclusivamente associada à mensagem verbal. A transdução (RAMOS,
2005) de um canal (corporal) de expressão do símbolo para outro canal (pictórico)
diversifica e amplia as possibilidades de compreensão do símbolo.
A perspectiva teleológica pesquisada por meio do parâmetro da finalidade do
símbolo no panorama atual da psique cumpre também um dos objetivos da pesquisa
científica, que é o encaminhamento de novas questões para futuras pesquisas, o
que, no paradigma cartesiano positivista foi chamado de poder preditivo, mas que,
no paradigma junguiano, refere-se a suas finalidades e o sentido para onde aponta o
conhecimento então produzido, ampliando o sentido e o significado dos fenômenos
analisados. Com esse procedimento pretende-se obter um amplo leque de
possibilidades para a compreensão dos dados.
De qualquer forma, é necessário ressaltar, mais uma vez, que a interpretação
dos fenômenos psíquicos, visando sua compreensão, realizada pelo processamento
simbólico arquetípico, “é geralmente uma tarefa exigente. Ela pressupõe empatia
psicológica, capacidade de combinação, penetração intuitiva, conhecimento do
mundo e dos homens e, sobretudo, um saber específico que se apoia ao mesmo
tempo em conhecimentos extensos e numa certa intelligence du coeur”. (JUNG,
vol.8, §543).
8.3.5 Quarta e última etapa – produção do relato da pesquisa
Com a finalização da etapa de análise e compreensão do material
pesquisado, o processamento simbólico arquetípico está quase concluído. As
incógnitas do símbolo investigado, passíveis de compreensão, foram assimiladas e
integradas à consciência (do pesquisador) e, assim, um conhecimento – novo e
relevante – científico, foi produzido.
186
Contudo a conclusão do trabalho de pesquisa não encerra o processo, uma
vez que, no campo científico, de nada vale um conhecimento se este não for
comunicado e, com isso, alcance o âmbito público.
A confecção do relato de pesquisa não é uma etapa simples, nem tampouco
rápida. Embora o texto venha sendo redigido ao longo de todo processo de
pesquisa, agora, sua redação concentra todas as atenções do pesquisador. Na
produção final do relato da pesquisa, o processamento do material da investigação
prossegue e, frequentemente, as ‘conclusões’ se corporificam e, até mesmo,
algumas revelações ainda acontecem. A confecção do produto final – texto – deve
tentar retratar o mais fielmente possível o processo de pesquisa tal como foi
idealizado, pensado, planejado, vivido, e realizado pelo pesquisador.
O trabalho de construir um texto claro e coerente; fiel e comunicável, convoca,
mais uma vez, as funções da consciência do pesquisador. Desta feita todas as
funções perceptivas, cognitivas e avaliadoras concorrem para um tipo de transdução
da experiência de pesquisa e suas particularidades, para um canal de expressão
específico que é a linguagem escrita. São invocadas, novamente, as habilidades
analíticas e sintéticas do pesquisador, assim como, e sobretudo, sua memória. Muita
paciência e dedicação são necessárias para que sejam feitos os últimos retoques no
quebra-cabeça e a imagem final se revele tão interessante quanto compreensível
para os ‘outros’.
E então, outra vez, é ativado o tema da relação eu – outro, não mais sob o
enfoque da interação pesquisador – pesquisado, mas sob o ângulo do pesquisador
com sua comunidade científica. As características dessa interação têm estreita
conexão com os objetivos da pesquisa e, principalmente, com a finalidade a que ela
se destina, o que configura os interlocutores, isto é, a que ‘outro’ é endereçado o
produto final da pesquisa, o que condiciona a forma e o estilo de comunicação a ser
feita.
Não serão abordadas aqui as regras específicas a serem seguidas na
organização e elaboração do texto final da pesquisa. Embora tais regras sejam muito
úteis para o autor. Quanto aos aspectos técnicos da elaboração de um texto
científico, há bastante bibliografia disponível, por exemplo, Humberto Eco (1998),
187
que escreve especificamente sobre teses acadêmicas, e Köche (2001), que fala
sobre relatórios de pesquisa e artigos científicos. Ambos dão informações
detalhadas sobre estilos de redação, organização e formatação do texto (capítulos,
sumário, referências bibliográficas); Goldenberg (2005), Mazzotti e Gewandsznajder
(1998), Severino (2002) e Cozby (2003) dão dicas interessantes para a redação e os
tipos de textos a serem elaborados dependendo de sua finalidade. Por outro lado, há
pouca literatura que discute a função e finalidade do texto público, por meio do qual
um processo de pesquisa se apresenta. A produção de conhecimento, lentamente
forjada ao longo do processo de pesquisa, se efetiva no relato final desta e nele se
cumpre seu caráter científico.
É apropriado retomar, neste momento, alguns cuidados, já discutidos
anteriormente com relação à condução do processo de pesquisa e que o
pesquisador deve dispensar agora, na confecção de seu texto. Primeiro ele deve
esforçar-se para dar solidez e precisão aos seus conceitos, discutindo-os de tal
modo que seu texto expresse aquilo que o autor pretende comunicar (JUNG, vol.5).
Em segundo lugar, “qualquer pesquisador deve documentar, tanto quanto possível,
os resultados a que chegou” (JUNG, vol.9/2, §429), assim como expressar suas
opiniões e avaliações sobre o tema pesquisado, levantar hipóteses, se for o caso, e
fazer propostas, correndo o risco de errar, pois “afinal de contas, são os erros que
nos proporcionam os fundamentos da verdade [e a continuidade do processo de
conhecimento]” (vol.9/2, §429). E, por fim, o pesquisador deve estar ciente de que,
com o produto de seu trabalho, ele afirma sua autoria e assume um compromisso
com a comunidade científica.
Uma das funções básicas do relato de pesquisa é promover um debate crítico
que ofereça a oportunidade de transformação constante ao conhecimento científico,
tanto pelos erros quanto pelos acertos. Vale lembrar, ainda, que a concepção atual
de ciência é bastante sintônica com a posição de Jung no que diz respeito à
transitoriedade da verdade, quando ele afirma que não temos condições de fazer
“afirmações verdadeiras ou corretas [...] o melhor que conseguimos são ‘expressões
verdadeiras’” (vol.4, §771), na realidade, mais do que expressões verdadeiras’, o
máximo que se pode fazer, num trabalho científico, é fornecer, no relato de
pesquisa, expressões honestas sobre o que foi estudado.
188
O pesquisador, como uma psique individual, com seu trabalho, penetra e
interfere na psique coletiva (cultural), dessa forma cumprindo seu papel. Conforme
discute Zoja (2005), “a psique individual é o produto de uma cansativa diferenciação
da psique coletiva” (p. 21), mas indivíduo e cultura se influenciam mutuamente num
movimento circular e esta relação configura, segundo Jung (vol.18/2, §1095), uma
relação de ‘culpa trágica’ do indivíduo com a cultura, uma vez que “a individuação
retira a pessoa da conformidade pessoal e, com isso, da coletividade. Esta é a culpa
que o individualizado deixa para o mundo e precisa tentar resgatar [...], precisa
pagar um resgate, isto é, precisa apresentar valores que sejam o equivalente de sua
ausência na esfera coletiva”. Sem a produção de valores para a cultura, a
individuação torna-se imoral. Ao oferecer seu produto individual à comunidade
científica, o pesquisador devolve ao coletivo o que dele retirou ou recebeu, acrescido
de sua contribuição pessoal e criativa para a cultura.
O produto final de um processo de pesquisa ao ser entregue à comunidade
científica sobrevive ao seu autor e, assim, cumpre sua função científica cultural.
Com isso, o propósito da transformação do trabalho num texto público tem
forte ligação com as questões éticas implicadas na atividade científica. Antes,
porém, de refletir sobre essas implicações éticas, outra questão importante se
interpõe e concorre para a referida reflexão. Trata-se dos riscos e das possibilidades
que a pós-modernidade oferece aos pesquisadores junguianos contemporâneos.
8.3.6 Riscos e possibilidades na pesquisa contemporânea
A pós-modernidade como uma época de crise em que os limites se borram,
os valores se diluem, o velho e o novo se alternam numa dinâmica de pluralidade e
plasticidade, apresenta características da modernidade ainda fortemente arraigadas
na cultura, assim como questiona e critica aspectos dessa mesma modernidade, faz
propostas novas, instala novos hábitos e valores numa dinâmica ambivalente tão
instigante e fascinante quanto angustiante e assustadora.
No contexto deste trabalho interessa discutir os riscos e as possibilidades que
a pós-modernidade oferece ao pesquisador junguiano, e nesse sentido a discussão
situa-se no âmbito da ciência e da pesquisa científica.
189
No cenário contemporâneo em que os horizontes da cientificidade foram
significativamente ampliados, instala-se, principalmente nas ciências humanas, uma
concepção de ciência menos idealizada e mais realizável, que admite a incerteza, a
diversidade e a complexidade do mundo e do ser humano. Uma concepção de
ciência que não apenas permite, mas incentiva a criatividade do pesquisador e
navega por diversas epistemologias que, por sua vez, encaminham diferentes
propostas metodológicas essencialmente no campo da pesquisa qualitativa.
O enfoque qualitativo da pesquisa científica abarca diversas epistemologias
que, em geral, destacam-se pela plasticidade e pela ênfase da experiência sobre os
princípios abstratos e axiomáticos fortemente influenciadas pela mentalidade pós-
moderna. Samuels (1995) aponta como características da pós-modernidade a
presença penetrante da dúvida e da relativização da noção de verdade, assim como
a interpretação e re-interpretação constantes dos fenômenos, o que define a época
atual como uma ‘era de incertezas’. “A relatividade e a diversidade multifacetadas, a
imprecisão e a paradoxalidade são características tão marcantes do que é chamado
de pós-modernidade que a indefinição passa a ser sua definição” (PENNA, 2006,
p. 16). Desses diversos pressupostos epistemológicos decorrem os “paradigmas
qualitativos”, com métodos de pesquisa altamente flexíveis que admitem
procedimentos e arranjos metodológicos tão criativos quanto caóticos. Observa-se
até uma certa displicência com o rigor metodológico (GUBA, 1990; DENZIN;
LINCOLN, 1998b), o que requer alguns cuidados na condução das pesquisas. Há,
no entanto, setores do conhecimento científico que ainda se pautam pelos princípios
do paradigma cartesiano positivista moderno.
De acordo com Figueiredo (1992), no século 16 muitas transformações foram
produzidas, percebidas e tolerantemente acolhidas, apesar do medo que as
diluições de fronteiras, a mistura de costumes, a desagregação das crenças
religiosas e a vertiginosa mobilidade social causavam.
Assim como a renascença, a pós-modernidade parece ser um tempo de
passagem para um novo cânone cultural. Nesse contexto, as consciências
individuais e a consciência coletiva, ainda fortemente arraigadas ao projeto
cartesiano positivista se angustiam diante da incerteza causada pela plasticidade
escorregadia dos tempos atuais. Parece natural que diante dessa angústia
190
mecanismos de defesa sejam ativados, e nestes se situam alguns dos riscos que
correm os pesquisadores contemporâneos.
A crise atual do dinamismo patriarcal indica seu esgotamento e, ao mesmo
tempo, anuncia a emergência de um novo padrão arquetípico. Nesta crise observa-
se a alternância de várias dinâmicas arquetípicas, ora ressurgem aspectos
matriarcais, ora se acirram aspectos patriarcais, ora brotam novas possibilidades.
Em tempos de crise as transformações são iminentes, e correr riscos,
enfrentar desafios, aceitar ou rejeitar possibilidades é inevitável. Hoje a pós-
modernidade se apresenta, não mais como uma nova e auspiciosa perspectiva, mas
como uma realidade cujos aspectos criativos e destrutivos são evidentes.
O paradigma junguiano demonstra acentuada tendência pós-moderna, suas
perspectivas, epistemológica e metodológica, mostram-se mais afinadas com os
parâmetros científicos da pós-modernidade do que com aqueles da modernidade.
Diante disso os principais riscos que se apresentam aos pesquisadores
junguianos situam-se nas próprias possibilidades que a pós-modernidade traz. A
seguir são destacados quatro pontos em que possibilidade e risco se entrelaçam e,
por isso, merecem reflexão.
O primeiro ponto a ser destacado refere-se à flexibilidade metodológica da
ciência pós-moderna e a amplitude e complexidade do paradigma junguiano. A
diversidade de recursos metodológicos à disposição dos pesquisadores, aliada à
maior liberdade que o método científico permite, apresenta tanto possibilidades
quanto riscos na atividade de pesquisa. Quanto à flexibilidade metodológica, o
principal risco é a perda de consistência e coerência do conhecimento produzido
com relação aos atributos que caracterizam e distinguem a produção científica de
outras formas de conhecimento.
Vale lembrar que flexibilidade não equivale a falta de rigor, qualquer pesquisa
científica deve ser conduzida rigorosamente, observando-se as exigências
específicas de uma produção científica, quais sejam: um conhecimento público a
serviço da coletividade, passível de crítica e eticamente responsável.
A pesquisa qualitativa, ao contemplar variadas possibilidades metodológicas
191
requer rigorosa consistência epistemológica do pesquisador, assim como
explicitação clara dos objetivos e delimitação do contexto de coleta e de análise do
material. Ou seja, o rigor metodológico é traçado pelo paradigma adotado pelo
pesquisador e orienta suas escolhas e decisões. Cada paradigma interpretativo faz
exigências particulares ao pesquisador, sendo, assim, essencial que o pesquisador
esteja atento à consistência entre os pressupostos epistemológicos e as diretrizes
metodológicas do paradigma adotado.
O segundo ponto a ser sublinhado, como possibilidade e risco simultâneos,
diz respeito à transitoriedade e relatividade do conhecimento e, por conseguinte, à
noção de verdade. Tais pressupostos epistemológicos oferecem como
possibilidades a ampliação dos horizontes da pesquisa e maior dinamismo à
produção científica, mas também oferecem riscos, quando transitoriedade e
relatividade significam autorização para uma atitude descomprometida do
pesquisador que prioriza suas motivações subjetivas em detrimento da coletividade.
O compromisso com a coletividade, mais uma vez, é ressaltado e reporta ao papel
da ciência como promotora de conhecimento e à atitude ética do cientista.
O terceiro ponto que merece destaque tem estreita conexão com os
anteriores e refere-se à subjetividade do pesquisador, assunto já extensamente
discutido neste estudo, mas que merece ainda reflexão. Convém reexaminar
algumas advertências feitas por Jung quanto à articulação entre subjetividade e
objetividade no método científico. Ao criticar veementemente o paradigma positivista
materialista da ciência moderna, Jung defende a subjetividade e critica a exigência
rigorosa da objetividade, mas aconselha uma posição intermediária de síntese entre
ambas polaridades. A defesa da subjetividade hoje deve ser cuidadosamente
observada e considerada no sentido inverso à intenção de Jung em sua época. A
atenção atualmente deve se concentrar em “não [se] olhar subjetivamente demais”
(vol.6, §10), pois a mentalidade pós-moderna tende a incentivar uma produção do
conhecimento excessivamente subjetivista. Numa época em que a subjetividade do
cientista era completamente banida, é compreensível a preocupação de Jung em
resgatá-la, a fim de evitar a unilateralidade tão condenada na psicologia analítica.
Hoje, entretanto, quando a subjetividade é altamente valorizada, tanto na ciência
como na vida diária, deve-se prestar atenção ao seu oposto – objetividade – para
que, da mesma forma, se evite a unilateralidade. O equilíbrio entre objetivismo e
192
relativismo é a meta e o desafio do pesquisador contemporâneo. Na busca de maior
criatividade, ensejada pela liberdade metodológica, corre-se o risco de cair na
liquidez escorregadia de uma flexibilidade subjetivista que diluiria o conhecimento
científico no senso comum. Isto representaria um mergulho no dinamismo matriarcal
em que a ciência talvez não faça mais nenhum sentido.
Há também que se observar o risco oposto. Diante de possibilidades quase
infinitas que atordoam e desorientam, e simultaneamente fazem exigências, por
vezes, tão complexas ao pesquisador, é tentador buscar refúgio no projeto
cartesiano-positivista que, além de conhecido, promete certezas e verdades
seguras. Aqui reside o quarto risco iminente na vida pós-moderna em geral, e na
pesquisa acadêmica em particular, o retorno ao ‘paraíso patriarcal’ ou a insistência
em permanecer aderido a leis e regras confiáveis e seguras assentadas numa lógica
racional, ainda muito presentes e atuantes na academia. O domínio da razão
associado ao livre arbítrio são aquisições irreversíveis que ampliaram os horizontes
da consciência coletiva e individual ao ponto de hoje se traduzir numa liberdade tão
fascinante quanto assustadora. Bauman (1998) adverte que no panorama pós-
moderno não é mais possível uma liberdade sem medo, como se pretendia, no
entanto, o combate ao medo combate também a liberdade alcançada.
Assim, parece que a alternativa seja o caminho da liberdade individual
responsável e comprometida com o coletivo.
Todos os riscos aqui apontados configuram cuidados a serem observados
para que os pesquisadores cumpram seu papel no panorama científico atual que se
nos descortina.
O quarto risco apontado, no entanto, é o mais preocupante, especialmente
para os pesquisadores junguianos. Afinado com o espírito pós-moderno, Jung
criticou o materialismo científico do século 19, reafirmou o paradoxo e a contradição
do ser humano, assim como sua complexidade; destacou a diversidade e a incerteza
como inevitáveis no conhecimento do inconsciente e propôs uma epistemologia e
um método consistentes, assentados na perspectiva simbólica arquetípica do
conhecimento (PENNA, 2003). O método de pesquisa da psicologia analítica se
propõe a articular objetividade e subjetividade, integrar causa e finalidade, além de
193
trabalhar com a hipótese da sincronicidade e preconizar a busca do sentido e do
significado da vida individual e coletiva.
8.3.7 Questões éticas
Da consideração sobre os riscos e possibilidades, na pesquisa
contemporânea, advindos da cosmovisão pós-moderna, segue-se necessariamente
a reflexão sobre a ética do pesquisador junguiano.
Não serão abordados aqui os preceitos éticos específicos da profissão e da
especialidade profissional do pesquisador, pois estes, supõe-se que lhes sejam
plenamente conhecidos. A estes preceitos acrescentam-se as recomendações éticas
do paradigma junguiano.
No panorama científico atual, o maior desafio é lidar com as polaridades
oscilantes e conflitantes na atividade científica. Por um lado, observa-se um cenário
em que a ciência tem a reputação de detentora da verdade e concentra o poder
hegemônico da razão responsável por todo conhecimento sério e confiável. Por
outro lado, percebe-se um movimento de ‘desdogmatização’ dos métodos de
produção de conhecimento, que promove a relativização dos parâmetros de
cientificidade, confere plasticidade aos procedimentos metodológicos e admite a
transitoriedade da verdade.
Permanece, entretanto, a concentração de poder na racionalidade humana
que confere uma certa idolatria à ciência. A maior ambivalência reside na tensão
entre as polaridades ‘quantidade e qualidade’, subjetividade e objetividade’, rigidez e
fluidez.
Waters (2006) faz um desabafo e um alerta sobre os riscos que ameaçam a
ciência contemporânea. Segundo ele, os parâmetros excessivamente quantitativos
de avaliação da produção científica se assentam em técnicas administrativas com
vistas a “lutar por dinheiro”, denominada pelo autor “a crise da contabilidade
acadêmica”.
Dessa forma a metodologia qualitativa de pesquisa com sua concepção de
ciência e método deve fazer exigências claras quanto à ética do pesquisador, pois,
194
de acordo com Waters (2006), “entramos na região sombria da pesquisa acadêmica,
e agora as exigências de produtividade estão levando à produção de um número
muito maior de coisas sem sentido”. (p.28).
Em épocas como esta, em que a concepção de ciência se amplia e, com isso,
apresenta uma flexibilidade metodológica que coloca à disposição do pesquisador
um amplo leque de possibilidades, fica a cargo do cientista fazer escolhas e tomar
decisões sobre o seu trabalho, visto que hoje não lhe é exigido, simplesmente
obedecer ou acatar regras ou preceitos externos. Mais do que um compromisso com
a verdade, impõe-se o comprometimento primeiro consigo mesmo e com a
comunidade científica a que pertence e, em seguida, com a coletividade. Seu
trabalho deve ser colocado a serviço do coletivo.
No paradigma junguiano em particular, em primeiro lugar destaca-se a atitude
ética diante do inconsciente, respeitando as possibilidades e os limites com que o
material de pesquisa se oferece para o conhecimento e se responsabilizando pelo
conhecimento produzido perante a situação atual da consciência individual e
coletiva, lembrando que
Não existe nenhuma razão para querer conhecer mais do inconsciente
coletivo do que se consegue por meio de sonhos e intuições [símbolos].
Quanto mais se sabe sobre ele, maior e mais pesada a responsabilidade
moral, porque os conteúdos do inconsciente se transformam em tarefas e
responsabilidades individuais tão logo começam a se tornar conscientes.
(JUNG, Letters 2).
Em segundo lugar parece evidente que não é possível encontrar a verdade
sobre a psique. O máximo que se consegue são expressões verdadeiras na
apresentação das observações e experiências subjetivas que se tem sobre a
realidade psíquica objetiva e subjetiva.
“No tocante à psicologia, acho melhor renunciar à ideia de que estejamos hoje
em condições de fazer afirmações ‘verdadeiras’ ou ‘corretas’ sobre a essência da
psique. O melhor que conseguimos são ‘expressões verdadeiras’” (vol.4, §771). A
verdade revela-se na maior aproximação possível que a consciência humana pode
atingir do desconhecido. A verdade na ciência só pode ser considerada uma
“hipótese, momentaneamente, satisfatória, mas não um artigo de fé eternamente
válido” (Jung, 1981, p. 143). A aproximação entre consciente e inconsciente se
195
realiza pela função transcendente que produz os símbolos, e a compreensão destes
conduz a consciência ao que há de mais verdadeiro e necessário para ela no
contexto atual.
Em terceiro lugar, vale destacar que um dos problemas cruciais da crise
patriarcal contemporânea é o sentimento de vazio, a perda do sentido e do
significado da vida e sua consequente banalização. A busca e a compreensão do
sentido e do significado dos símbolos é a meta do processo de individuação, assim
como do processo de pesquisa. Nesse aspecto, o paradigma junguiano exige uma
atitude íntegra do indivíduo perante o mundo e consigo mesmo. Sua integridade é
definida pela atitude responsável e comprometida perante o mundo externo e seu
autoconhecimento.
196
9 Considerações finais
Diante das discussões e reflexões feitas ao longo desta tese, propõe-se que o
método de investigação científica dos fenômenos psíquicos pelo qual as pesquisas
neste paradigma são conduzidas seja chamado de processamento simbólico
arquetípico.
Simbólico porque o eixo central da pesquisa junguiana situa-se no símbolo
como fenômeno psíquico a ser investigado. O símbolo como único meio pelo qual o
inconsciente se torna acessível à observação é o elemento que congrega aspectos
conhecidos e desconhecidos sintetizados pela função transcendente da psique,
desta forma, representando e apresentando à consciência aquilo que é relevante e
significativo para uma dada consciência (coletiva ou individual) num dado momento
(contexto do símbolo). Nestas circunstâncias o símbolo se configura como o material
psíquico a ser pesquisado pelo paradigma junguiano. O caráter simbólico deste
método de pesquisa tem seu fundamento na perspectiva epistemológica do
paradigma.
Arquetípico porque a concepção de arquétipo e a qualificação que este atribui
à realidade psíquica e à condição do ser humano neste paradigma é seu fator
distintivo em relação às outras abordagens psicológicas. O caráter arquetípico do
método de pesquisa junguiano assenta-se na perspectiva ontológica do paradigma.
A atitude simbólica do pesquisador, norteada pelas premissas ontológicas e
pelos pressupostos epistemológicos do paradigma, está presente desde o início do
processo de pesquisa. Esta atitude condiciona a escolha do tema; orienta a definição
dos objetivos que a pesquisa pretende atingir; direciona a pesquisa bibliográfica
amplificatória na 1ª, 2ª e 3ª etapas; encaminha os procedimentos de apreensão e
compreensão do material e, sobretudo, sustenta e permeia a relação que se
estabelece entre o pesquisador e o pesquisado durante todo o processo.
Na base ontológica do paradigma situa-se seu fundamento arquetípico, do
qual decorre o pressuposto epistemológico do símbolo, que condiciona a atitude
simbólica do pesquisador e encaminha a perspectiva metodológica do paradigma
com suas recomendações específicas quanto aos procedimentos metodológicos a
197
serem empregados no processo de pesquisa em psicologia analítica. Conformr
anteriormente proposto, o conjunto destes procedimentos aplicados à investigação
científica por um pesquisador que adote uma atitude simbólica no processo de
pesquisa configura o método de investigação condizente com o paradigma junguiano
– simbólico arquetípico – que consiste no processamento simbólico arquetípico.
À semelhança do processo de individuação que visa à integração gradual e
constante de elementos do inconsciente e do mundo na consciência, promovendo a
ampliação e complexificação da consciência; e em conformidade com o processo
analítico cuja meta principal é ajudar o paciente a seguir seu caminho de
individuação para ser capaz de suportar e elaborar os conflitos e tensões inevitáveis
da vida por meio da compreensão e integração de suas vivências simbólicas; assim
também o processo de pesquisa atinge seu objetivo final ao tornar conhecidos os
aspectos desconhecidos dos símbolos investigados pelo processamento simbólico
arquetípico do material pesquisado.
O símbolo processado deixa de ser um símbolo e passa a ser um conteúdo
assimilado e integrado na consciência e, desse modo, dá lugar à emergência de
novos símbolos. A finalização de um processo de pesquisa favorece o surgimento de
novas incógnitas que ensejam novas pesquisas.
Com isso se cumpre a finalidade da pesquisa científica, dando
prosseguimento ao processo de produção de conhecimento e promovendo a
ampliação da consciência coletiva.
198
10 Post-scriptum
Várias metáforas são adequadas para retratar o processo de pesquisa, desde
uma saga heróica, à semelhança de Hércules e seus trabalhos, até uma penosa
jornada como a de Psique e suas tarefas impossíveis impostas pela poderosa
Afrodite.
A jornada heroica de realizar uma pesquisa tem por meta a materialização do
processo num produto apresentável. Se, por um lado, letras
7
enfileiradas, página
após página, são sempre uma redução drástica das vicissitudes do trabalho, por
outro lado, letras, parágrafos, gráficos, tabelas, em uma longa sucessão de páginas,
acondicionados em capa e contracapa sóbrias e elegantes, devem guardar também
o espírito que habita o texto.
Com e por tudo isso, a motivação primordial para que uma pesquisa aconteça
é que ela seja um símbolo importante para o pesquisador. O sentido e o significado
que a pesquisa tem para o pesquisador é sua maior fonte de energia e criatividade.
Sem paixão não há razão que consiga ensejar e sustentar a jornada heroica. Em
tempos tão esvaziados de sentido, a tendência à burocratização ou banalização das
atividades é quase uma tentação, tanto para o pesquisador junguiano em seu
processo de pesquisa, como para o analista junguiano no processo analítico e
também para o indivíduo em seu processo de individuação.
Algumas, últimas recomendações aos pesquisadores junguianos.
Durante o processo de pesquisa é recomendável dormir bem – os sonhos
podem ajudar! Já que outros prazeres têm que ser, na melhor das hipóteses,
sacrificados, e, na pior, reprimidos, algumas reverências à Grande Mãe devem ser
concedidas: comer alimentos nutritivos e saborosos! Dieta, sobretudo as de cunho
estético, não combina com processo de pesquisa.
No campo da alteridade, invocando anima e animus, os pesquisadores devem
7
Há uma passagem do clássico de Shakespeare em que Hamlet está na biblioteca do falecido pai procurando
indícios sobre o seu assassinato e um de seus supostos inimigos lhe pergunta: – O que há de tão interessante nesses livros. E
ele responde: – Letras, esses livros estão cheios de letrinhas... letrinhas enfileiradas.
199
pedir e receber ajuda de amigos, colegas, parceiros, professores, orientador e
divindades afins, pois a eles serão dirigidos os agradecimentos que figuram nas
primeiras páginas do produto final e, além disso, a sabedoria compartilhada é mais
nobre e prazerosa do que a erudição solitária. No campo da totalidade, é
recomendável que o pesquisador possa ser dirigido por todos os pontos cardeais, de
tal forma que conte com uma gama mais ampla de direções a seguir, podendo ser
não apenas orientado e norteado, mas também ‘ocidentado’ e ‘suleado’.
Para melhor encaminhamento do processo, algumas condições são
necessárias:
1. Paciência e disposição com perseverança e entusiasmo
2. Criatividade com crítica e coerência
3. Fé, esperança com senso de realidade
4. Capacidade de análise e síntese
5. Disciplina e flexibilidade
6. Senso de responsabilidade e espírito de aventura
7. Seriedade e senso de humor
8. Ativação do arquétipo do herói e da Soror Mystica
9. Senex e Puer tutelados pelo Trickster e por Sophia
10. A função superior assessorada pela função inferior (ou vice-versa)
E, finalmente, não se deixar abater pelo desânimo (perda de anima ou
animus), nem se deixar inflar com o entusiasmo prematuro de um insight delirante.
A título de finalização, cabe destacar os inevitáveis acidentes eletrônicos que
caracterizam a inexorável realidade do ser humano pós-moderno agraciado e
escravizado pela tecnologia; outros tipos de imprevistos são também
paradoxalmente previstos, os quais podem ser compreendidos sob a ótica da
sincronicidade.
200
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_________ vol. 2 Estudos experimentais
_________ vol. 4 Freud e a psicanálise
_________ vol. 5 Símbolos de transformação
_________ vol. 6 Tipos psicológicos
_________ vol. 7/1 Psicologia do inconsciente
_________ vol. 7/2 O eu e o inconsciente
_________ vol. 8/1 A natureza da psique
_________ vol. 9/1 Arquétipos do inconsciente coletivo
_________ vol. 9/2 Aion – estudos sobre o simbolismo do si-mesmo
_________ vol. 16/1 A prática da psicoterapia
_________ vol. 16/2 Ab-reação, análise dos sonhos, transferência
_________ vol. 18/1 A vida simbólica
_________ vol. 18/2 A vida simbólica
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208
Anexos
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
1 Alexandre Schmitt 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP O limite como potência: um estudo das relações entre a vergonha e a criatividade”.
2 Ligia Maria Bonini 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Logomarca e seu simbolismo: um estudo sob a perspectiva junguiana
3 Ana Carolina Falcone Garcia 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Da relação pai-filha à profissional mulher: um estudo qualitativo com mulheres adultas
jovens, numa abordagem junguiana
4 Marcia Loureiro Baptista 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP A teoria Junguiana dos Tipos Psicológicos: a possibilidade do uso clínico na infância".
5 Reinalda Melo da Matta 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
A utilização da terapia do Sandplay no tratamento de crianças com Transtorno Obsessivo-
Compulsivo".
6 Mônica Perri Kohl Greghi 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
"O uso do sandplay na psicoterapia de pacientes com sintomas orgânicos: uma análise
compreensivo-simbólica
7 Mara Lucia Salla 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Desfeminilização Cultural e Saúde - Um Estudo em Mulheres Executivas na Ótica da
Psicologia Analítica
8 Lilian Harumy Shibata 2006 Dissertação Educação PUC-SP
Em Busca de um Novo Caminho - O Pós Carreira como Oportunidade de Realização de
Potencialidades
9 Solange Lopes de Souza 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Expressão Psicossomática da Infertilidade Conjugal: Investigação dos Processos de
Enfrentamento Durante Diagnóstico
10 Marília Aparecida F. 2001 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP No limiar da transcendência - a alquimia e o sagrado em Jung: reflexos na atualidade
12 M. Mercedes Samudio Santos 2005 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
Convivendo Com Adolescentes: Esboçando Um Modelo De Intervenção Clinica Em
Adolescentes Em Uma Instituição Escolar
13 Cristiane Curi Abud 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Dores e Odores - Distúrbios e Destinos do Olfato
14 Aydil da Fonseca Prudente 2006 Dissertação Direito PUC-SP A Ressocialização do Adolescente Infrator: Uma Leitura Interdisciplinar
15 Cláudia G. Gonçalves Freitas 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Psicossomática e Tecnologia: Stress em Jogadores de Lan House
16 Ana Luiza Nogueira Vessoni 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP A Experiência Expressiva Na Clínica Da Psicose
Anexo I - Quadro do Levantamente Geral do Material
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
17
Carlos Eduardo A. de L.
Salem
2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Uma Leitura Simbólica do Espírito Empreendedor
18 Fernanda da Silva Pimentel 2005 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Quando o psiquê liberta o demônio: um estudo sobre a reação entre exorcismo e cura
psíquica em mulheres na igreja universal do reino de Deus
19 Arnaldo Alves da Motta 2005 Dissertação Psicologia Social PUC-SP Psicologia Analítica no Brasil Contribuições para a sua história
20 Ricardo Alvarenga Hirata 2005 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
O Rio da Alma - Contribuições do simbolismo religioso e da psicologia analítica para uma
reflexão sobre a crise ecológica no rio Tietê
21 Patricia Maria Martins 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Mapeamento Integrado de Saúde - Uma Contribuição da Psicologia
22 Lia Monteiro Bogdanowicz 2001 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Psicossomática: A Busca Do Elo Perdido
23 Juliano Maluf Amui 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Vinho: uma imagem arquétipa
24
Maria Lygia de C. Alli
Molineiro
2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Vocação: Uma perspectiva junguiana - A orientação vocacional na clínica junguiana
25 Cintia Roberta R. Hoffmann 2006 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Unus Mundus: os graus da Coniunctio do alquimista Gerardus Dorneus, as fases
alquímicas e suas relações com o ritmo ternário dos processos psíquicos em busca da
totalidade
q
uaternária
,
se
g
undo C. G. Jun
g
26 João Bezinelli 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Imago Dei: Da proto-imagem ao conceito Um estudo da formação do conceito da Imago
Dei nas Obras de C. G. Jung
27 Luísa de Oliveira 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Coisas de menina: análise simbólica da personagem Buffy A Caça Vampiros
28 Luciana Carnial 2005 Dissertação
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
PUC-SP A Narrativa Mítica Na Literatura Infantil Contemporânea: Uma Visão
29 Mônica Amaral Melo Poyares 2006 Tese Ciências da Religião PUC-SP
Abra a Roda Tin dô Lê Lê - Dimensão Religiosa nas Brincadeiras de Roda entre Crianças
de 4 a 6 anos
30 Cecilia Lourenço Maeda 2005 Tese Psicologia Clínica PUC-SP Eutonia E Qualidade De Vida Em Pacientes Com Fibromialgia (mulher)
31 Maria Cherubina de L. Alves 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Apropriação de espaço: vivências dos pacientes hospitalizados
32 Neide Maria Rocha Giordano 2005 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP Contar histórias: um caminho para o sagrado
33
Maria de Fatima de J. A.
Ferreira
2004 Dissertação Gerontologia PUC-SP O Idoso E A Criança: O Significado Da Relação Ao Contar Histórias
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
34 Claudete Sargo 2000 Tese Educação PUC-SP
O processo de aprendizagem e sua articulação com a dinâmica relacional entre pais e
filhos: um estudo a partir da psicologia analítica
35 Edson Fernandes 2005 Tese
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
PUC-SP
Imaginário da cibercultura e territórios mitológicos da grande mãe web: uma leitura crítica
dos mithos, símbolos e ritos do espaço telemáticos e da estética na web art.
36 Vânia Medeiros Gasparello 2005 Tese Educação PUC-SP
Expandindo a consciência pelo caminho simbólico: uma perspectiva interdisciplinar em
educação
37 Regina Bruhns R. Andrade 2005 Dissertação Educação PUC-SP
Professor Formador & Professor Discente: uma relação a ser construída com consciência
da sincronicidade
38 Jorgson K. Smith Moraes Jr 2005 Dissertação
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
PUC-SP Heroi decadente - A emergência histórica do anti-heroi na literatura, no cinema e na tv
39 Maria Cristina M. Guarnieri 2001 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP Morte no corpo, vida no espírito: o processo de luto na prática espírita da psicografia
40 Waldemar Magaldi Filho 1999 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP A crise e o sagrado: um estudo em Carl Gustav Jung e René Girard
41 Kleber Maia Marinho 2006 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
In The President We Trust: uma análise da concepção religiosa na esfera política dos EUA
presente nos discursos de George W. Bush.
42 Judith Vero 2006 Tese Psicologia Clínica PUC-SP Paixões Estrangeiras: A Vingança
43 Valeria Sanchez Silva 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Devir Cigano - O Encontro Cigano-não Cigano (Rom-Gadjé) como Elemento Facilitador do
Processo de Individuação
44
Maria de Fátima C. Dias
Ferreira
2006 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
Da expressão que espanta ao toque que encanta: a Calatonia e a Shantala como
instrumentos de intervenção no re-significar das relações entre mães e filhos
45 Claudia L. Passalacqua 2007 Dissertação
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
PUC-SP
Estudo sobre um instrumento de escrita designado auto-retrato para a expressão do
indivíduo
46 Felipe Alberto de Q. Lalinde 2006 Dissertação
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
PUC-SP Paixões, Pecados, Picardia e Poesia na Publicidade (Radiofônica)
47 Tânia Maria Dias Fernandes 2006 Dissertação
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
PUC-SP Personagens e imaginário em Lygia Bojunga Nunes
48 Eric Richter 2004 Dissertação Ciências Contábeis PUC-SP Carater organizacional e o processo de planejamento financeiro
50 Eloisa Penna 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Um estudo sobre o metodo de investigacao da psique na obra de C. G. Jung
52 Estela Noronha ok 2005 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Tenha fe, tenha confianca, Iemanja e uma esperanca! : um estudo a luz da socio-
antropologia e da psicologia analitica do fenomeno ’iemanjismo’ entre os nao devotos das
reli
g
ioes afro-brasileiras
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
53 Anna Patricia ChagasBogado 2003 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Maria Madalena: da pecadora a iniciada : um estudo psicologico sobre o feminino a partir
dos evangelhos
54 Brigida Carla Malandrino 2003 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Umbanda - mudar para permanecer : a influencia dos simbolos na mudanca religiosa e
permanencia na umbanda segundo a psicologia analitica
55 Angela Maria Carcassoli Kato 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Um estudo sobre a relacao entre feminilidade e esterilidade primaria feminina sob o enfoque
da psicologia analitica
56 Margareth Lury Yoshikawa 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Cenarios femininos : um estudo psicossomatico de mulheres com sindrome do ovario
policistico atraves da terapia do Sandplay
57 Marcia Rodrigues Sapata 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP O mioma uterino e a mulher na metanoia : uma lelitura simbolica da doenca.
59 Maria Ruth Gonçalves Pereira 1990 Tese Psicologia Clínica USP Espaço para a individuação: o masculino e o feminino como pontes a unidade
60 Regina Celia F. Amaro Giora 1994 Tese Psicologia Social USP Um estudo sobre a liderança carismática de Getúlio Vargas
61 Laura Villares de Freitas 1995 Tese Psicologia Clínica USP Mascara e palavra: exploração da persona em grupos vivenciais
62 Paulo Afranio Sant'Anna 1996 Dissertação Psicologia Clínica USP Estudo dos arquétipos nos sonhos de portadores de HIV
63 Angela M.R.Cavalcanti Brasil 1996 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Voar é viajar, viajar é migrar, é sair da terra: migração como processo finito e processo
infinito - estudo junguiano dos símbolos presentes na trajetória heróica migrante
64 Sandra M.G. Tavares Duran 1997 Tese Psicologia Clínica USP
O atendimento psicoterapeutico em grupo aos usuários de uma unidade básica de saúde
pelo método corporal Petho Sandor: uma interpretação na perspectiva da psicologia
analítica de C.G.Jun
g
65 Patrícia Diaz Gimenez 1998 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP Orientação profissional numa abordagem clínica junguiana: da técnica ao ritual
66 Luciana Puglisi de P. Souza 1998 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP Da adolescência à fase adulta: um ritual de passagem e transformação
67 Elvira Maria Leme 1998 Dissertação Psicologia Clínica USP O corpo - sentido no processo educativo: uma abordagem fenomenológica
68 Walter José Martins Migliorini 1999 Tese Psicologia Clínica USP Imaginário e envelhecimento
69 Márcia Marques Portazio 2000 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Construção de um instrumento de medida para identificação de determinados padrões
arquetípicos no comportamento feminino
70 Mariana Halpern-Chalom 2001 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Contar histórias e expressar-se: aprendizagem significativa e plantão psicológico abrindo
possibilidades para a clínica
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
71 Patrícia Pinna Bernardo 2001 Tese
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
A "Doce Medicina": trabalhando com a sabedoria da psique na criação de um conhecimento
integrado ao auto-conhecimento
72 Antonio Carlos Farjani 2002 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Freud x Jung no caso do Homem dos Lobos: como um trabalho científico pode ser
contaminado pela paixão
73 Iara Lopes Patarra 2003 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Do papel das imagens às imagens no papel: o conceito de imagem na psicologia genética
piagetiana e analítica de Jung
74 André Mendes 2005 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
A identidade migrante: reflexões sobre o processo de individuação em sua relação com o
espaço, a migração e a comunidade
75 José Edmundo Heráclito Silva 2005 Tese
Literatura, Crítica Literária,
Comunicação, Semiótica
USP
As habilidades de comunicação no trabalho jornalístico: uma proposta de compreensão e
desenvolvimento com base na teoria dos arquétipos de Carl Gustav Jung
76 Guilherme Scandiucci 2005 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Juventude negro-descendente e a cultura hip hop na periferia de São Paulo: possibilidades
de desenvolvimento humano sob a ótica da psicologia analítica
77 Cláudio Paixão A. de Paula 2005 Tese
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
O símbolo como mediador da comunicação nas organizações: uma abordagem junguiana
das relações entre a dimensão afetiva e a produção de sentido nas comunicações
entre
p
rofessores do de
p
artamento de
p
sicolo
g
ia de uma institui
ç
ão de ensino su
p
erior
78 Rinaldo Miorim 2006 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Aprender com o corpo: estabelecendo relações entre a psicologia analítica e as técnicas
corporais taoístas
79 Jose Jorge de M. Zacharias 1994 Tese Psicologia Social USP
Tipos psicológicos junguianos e escolha profissional: uma investigação com policiais
militares da cidade de São Paulo
80
Angelita Viana Corrêa
Scárdua
2003 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Felicidade e individuação: um estudo exploratório do desenvolvimento adulto baseado na
psicologia positiva e na teoria de Jung
81 Durval Luiz de Faria 2001 Tese Psicologia Social PUC-SP O pai possivel : um estudo dos conflitos da paternidade em um grupo de homens.
83 Liliana Liviano Wahba 2001 Tese Psicologia Clínica PUC-SP Relacao medico-paciente : subsidios da psicologia para a educacao medica.
84 Monalisa Dibo 2007 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Prabha - Mandala : os efeitos da aplicacao do desenho da mandala no comportamento da
atencao conc
85 Giuseppe Mario Sabella 2004 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Os efeitos da danca circular e de tecnicas expressivas corporais no stress e na qualidade
de vida
86 Geni Garcia Santiago 2003 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP Um estudo sobre a religiosidade em mulheres acima de oitenta anos de idade.
87 Maria Lucia Tavares Ferreira 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP A psique do paciente com cancer na fase terminal
88 Heloisa Dias da Silva Galan 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Um estudo psicologico sobre o infarto do miocardio em mulheres.
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
89 Miguel Glikin 2001 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
As imagens mentais como recurso em psicoterapia : uma pesquisa de quatro abordagens:
Gerald Epste
90 Marisa Campio Muller 2001 Tese Psicologia Clínica PUC-SP Um estudo psicossomatico de pacientes com vitiligo numa abordagem analitica.
91 Maria Raymunda Ribeiro 2000 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Proposta de intervencao terapeutica para adultos hipertensos.
92
Marcia Iole Sanchez Turrini
Coutinho
1999 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
"Levanta-te e anda" - invalidez e reabilitacao como caminhos para o significado da
vida : dos lim
93 Alberto Pereira Lima Filho 1999 Tese Psicologia Clínica PUC-SP O significado do pai para a psique : da interdicao estruturante a construcao da autonomia.
94
Mara de Sa Martins da Costa
Passos
1999 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP Exu pede passagem.
95
Susana de Albuquerque Lins
Serino
1999 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Diagnostico compreensivo simbolico : uma proposta de ressignificacao da doenca organica
para a pr
96 Marcus Cezar Donha 1998 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
O arquetipo do pai na cultura patriarcal : um estudo sobre a relacao pai-filho e seus reflexos
na
97
Luiz Antonio de Oliveira e
Araujo
1997 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Crime e hierofania : um estudo sobre algumas manifestacoes do sagrado em criancas e
adolescentes
98
Joao Baptista Soares de Faria
Lago
1997 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP O embruxamento e a psique masculina na obra de Franklin Joaquim Cascaes.
99 Paulo Sergio Ruby 1997 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Tipologia junguiana - correlacoes entre a funcao inferior e o sintoma corporeo : um estudo
sobre
100 Elisabete Sofia Lepera 1995 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP O desenvolvimento da abordagem sistemico simbolica
101 Denise Gimenez Ramos 1993 Tese Psicologia Clínica PUC-SP O modelo analitico no tratamento de doencas organicas
102 Pedro Otavio Barretto Prado 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Estudo exploratório da dimensão psicobiológica do método Rolfing de integração estrutural:
criação, desenvolvimento e avaliação de questionários
103 Regina Alvares Biscaro 2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP O treino em psicoterapia na residência de psiquiatria: uma visão da psicologia analítica
104
Elizabeth do Rocio Dipp
Azevedo Gimael
2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Conflitos conjugais: uma leitura a partir da psicologia analítica, tomando como base os tipos
psicológicos
105 Susan Carol Albert 2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Infertilidade na relação conjugal: uma pesquisa na abordagem junguiana utilizando a terapia
breve com Sandplay
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
106 Valeria Centeville 2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Ciúme patológico masculino: reflexões sob a ótica junguiana
107 Daniela Borba 2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Individuação e expatriação: resiliência da esposa acompanhante
108 Marilena Dreyfuss Armando 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Calatonia e religiosidade: uma abordagem junguiana
109 Flávia Cristina Amaro da Silva 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Ameaças à Infância: do Trauma Psíquico ao Transtorno de Estresse Pós-Traumático
110 Maria Aparecida Mello 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Endometriose: percepção da doença e estratégias de enfrentamento
111 Lisete Moreira Del Bianco 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Alegria em uma perspectiva de saúde
112
Manuela Silva Ferreira de
Sousa
2007 Tese Psicologia Clínica PUC-SP A busca pela cirurgia plástica estética: um sintoma da sociedade contemporânea?
113 Maria Teresa Nappi Moreno 2004 Tese Psicologia Clínica PUC-SP Raiva: uma das emoções ligadas à gastrite e à esofagite
114
Cristina Martins Torres
Masiero
2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
A resiliência em pessoas com lesão medular que estão no mercado de trabalho: uma
abordagem psicossomática
115 Eliana Lemos Pommé 2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP O vínculo mãe–bebê: primeiros contatos e a importância do holding
116
Guilherme Tavares de
Siqueira
2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Hostilidade: uma revisão de literatura no referencial teórico junguiano
117 Neusa Maria Lopes Sauaia 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Psicoterapia de orientação junguiana com foco corporal para grupos de crianças vítimas de
violência: promovendo habilidades da resiliência
118 Renata Soifer 2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Relação mãe-filho e o sono do bebê: uso de técnica para modificação de hábitos de sono
119
Maria Claudina Mendes
Vasconcelos de Oliveira
2001 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Câncer de mama e resiliência: uma abordagem psicossomática
120
Maria Beatriz Vidigal Barbosa
de almeida
2007 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Paternidade e subjetividade masculina em transformação : crise, crescimento e
individuação. Uma abordagem junguiana
121 Santina Rodrigues de Oliveira 2006 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Reflexões sobre a materialidade numa abordagem imagético-apresentativa : narrativa de
um percurso teórico e prático à luz da psicologia analítica
122 Luís Gustavo Vechi 2008 Tese
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
A psicologia analítica de Carl Gustav Jung no estudo de instituição : uma proposta teórico-
metodológica
Autor Ano Tipo Área de concentração Instituição
Título
123 Paulo Afranio Sant'ana 2001 Tese Psicologia Clínica USP
As imagens no contexto clínico de abordagem junguiana: uma interlocução entre teoria e
prática
125
Rita de Cassia Ferrer da Rosa
Mootoka
2008 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Aspectos emocionais investigados na infertilidade através do método de Rorschach
126 Cecilia Lourenço Maeda 2000 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Eutonia e o processo de individuação: uma abordagem psicossomática
127 Julia Signer e Cruz 2008 Dissertação Ciências da Religião PUC-SP
Do eu ao não-eu: um estudo sobre os relatos dos efeitos da experiência do estado de rigpa
(clara luz) segundo a tradição budista tibetana
128 Maria Rosa Spinelli 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Um estudo psicoterápico de uma paciente com lúpus eritematoso sistêmico
130 Nairo de Souza Vargas 1995 Tese Medicina USP Psicoterapia de casais - uma visão simbólico-arquetípica da conjugalidade
131 Marion Gallbach 1990 Dissertação Psicologia Clínica USP O arquétipo materno na gravidez: um estudo de temas oníricos na abordagem junguiana
132 Marion Gallbach 1997 Tese Psicologia Clínica USP Grupo de vivência de sonhos: uma investigação sobre formas de trabalho com sonhos
133 Patrícia Pinna Bernardo 1994 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
O processo criativo como veículo de transmutação do arco-íris em ponte mandala (a
utilização de recursos artísticos no trabalho terapêutico)
Anexo 2 - Quadro das pesquisas realizadas entre 2002 - 2007
Ano Tipo Área de concentração Instituição
1 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
2 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
3 2002 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
4 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
5 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
6 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
7 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
8 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
9 2003 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
10 2003 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
11 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
12 2004 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
13 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
14 2005 Dissertação Psicologia Social PUC-SP
Ano Tipo Área de concentração Instituição
15 2005 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
16 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
17 2005 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
18 2005 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
19 2005 Tese
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
20 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
21 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
22 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
23 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
24 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
25 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
26 2006 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
27 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
28 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
29 2006 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Ano Tipo Área de concentração Instituição
30 2006 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
31 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
32 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
33 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
34 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
35 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
36 2007 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
37 2007 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento Humano
USP
Anexo 3 - Quadro descritivo com categorias de análise - pesquisas realizadas entre 2002 - 2007
Ano Tipo
Área de
concentração Instituição título tema
Método
declarado Objeto
Contexto de
apreensão
Análise
verbal/imagética Modalidade
1 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Um estudo sobre a relacao entre feminilidade e
esterilidade primária feminina sob o enfoque da
psicologia analitica
Feminilidade e
esterilidade
Comparação
entre grupos
Seres Humanos Social
Análise de material
verbal
Clínica
2 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Cenarios femininos : um estudo psicossomatico de
mulheres com sindrome do ovario policistico atraves da
terapia do Sandplay
Síndrome do Ovário
Policístico
Qualitativo e
comparativo
Seres Humanos Clínico
Análise verbal e
imagética
Clínica
3 2002 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
Freud x Jung no caso do Homem dos Lobos: como um
trabalho científico pode ser contaminado pela paixão
Freud x Jung Não explicitado
Fenômenos da
cultura
Científico Não se aplica Teórica
4 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP A psique do paciente com cancer na fase terminal Câncer Terminal
Explicitação das
etapas da
pesquisa
Seres Humanos Clínico Análise de imagens Clínica
5 2002 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Um estudo psicologico sobre o infarto do miocardio em
mulheres.
Infarto em mulheres Qualitativo Seres Humanos Institucional
Análise de material
verbal
Clínica
6 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
O uso do sandplay na psicoterapia de pacientes com
sintomas orgânicos: uma análise compreensivo-
simbólica
Pacientes
orgânicos/avaliação
terap.
Qualitativo Seres Humanos Clínico Análise de imagens Clínica
7 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Um estudo sobre o metodo de investigacao da psique na
obra de C. G. Jung
Método
Explicitação das
etapas da
pesquisa
Conceitos teórico
-
científicos
Científico Não se aplica Teórica
8 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
O mioma uterino e a mulher na metanoia : uma lelitura
simbolica da doenca.
Mioma uterino Qualitativo Seres Humanos Clínico
Análise verbal e
imagética
Clínica
9 2003 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
Do papel das imagens às imagens no papel: o conceito
de imagem na psicologia genética piagetiana e analítica
de Jung
Conceito de imagem
Piaget e Jung
Não explicitado
Conceitos teórico
-
científicos
Científico Análise de imagens
Mista:
teórica/clínica
10 2003 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
Felicidade e individuação: um estudo exploratório do
desenvolvimento adulto baseado na psicologia positiva e
na teoria de Jung
Desenvolvimento
adulto
Pesquisa de
campo
Seres Humanos Social
Análise de material
verbal
Mista:
teórica/cultural
Ano Tipo
Área de
concentração Instituição título tema
Método
declarado Objeto
Contexto de
apreensão
Análise
verbal/imagética Modalidade
11 2003 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Psicoterapia de orientação junguiana com foco corporal
para grupos de crianças vítimas de violência:
promovendo habilidades da resiliência
Violência: crianças e
terapia corporaal
Qualitativo Seres Humanos Institucional
Análise verbal e
imagética
Clínica
12 2004 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
Raiva: uma das emoções ligadas à gastrite e à esofagite
pouco junguiana
Raiva
Explicitação das
etapas da
pesquisa
Seres Humanos Institucional
Análise de material
verbal
Cultural
13 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Desfeminilização Cultural e Saúde - Um Estudo em
Mulheres Executivas na Ótica da Psicologia Analítica
Desfeminilização Qualitativo Seres Humanos Institucional
Análise de material
verbal
Cultural
14 2005 Dissertação Psicologia Social PUC-SP
Psicologia Analítica no Brasil Contribuições para a sua
história
Psicologia analítica no
Brasil
Abordagem
social e histórica
Fenômenos da
cultura
Histórico Não se aplica Cultural
15 2005 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
Eutonia E Qualidade De Vida Em Pacientes Com
Fibromialgia (mulher)
Eutonia Não explicitado Seres Humanos Clínico
Análise de material
verbal
Clínica
16 2005 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Apropriação de espaço: vivências dos pacientes
hospitalizados
Apropriação de
espaço
Quali/Quanti;
Estudo
exploratório
Seres Humanos Institucional
Análise verbal e
imagética
Análise
instituicional
17 2005 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
A identidade migrante: reflexões sobre o processo de
individuação em sua relação com o espaço, a migração e
a comunidade
Migração
Pesquisa de
campo
Seres Humanos Social
Análise de material
verbal
Cultural
18 2005 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
Juventude negro-descendente e a cultura hip hop na
periferia de São Paulo: possibilidades de
desenvolvimento humano sob a ótica da psicologia
analítica
Cultura Hip hop
Metodologia
própria em
caráter de
ensaio
Seres Humanos Social
Análise de material
verbal
Cultural
19 2005 Tese
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
O símbolo como mediador da comunicação nas org.:
abordagem junguiana das rel.entre a dim. afetiva e a
prod.de sentido nas comunic.entre prof. do depto. de
psic. de 1 inst. de ensino sup.bras.
Comunicação entre
professores
Empírico; Estudo
de caso
Seres Humanos Institucional
Análise de material
verbal
Análise
instituicional
20 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
O limite como potência: um estudo das relações entre a
vergonha e a criatividade”.
Vergonha e
criatividade
Não explicitado
Conceitos teórico
-
científicos
Cultural Não se aplica
Mista:
teórica/cultural
21 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Logomarca e seu simbolismo: um estudo sob a
perspectiva junguiana
Logomarcas Qualitativo
Fenômenos da
cultura
Institucional
Análise verbal e
imagética
Cultural
Ano Tipo
Área de
concentração Instituição título tema
Método
declarado Objeto
Contexto de
apreensão
Análise
verbal/imagética Modalidade
22 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Da relação pai-filha à profissional mulher: um estudo
qualitativo com mulheres adultas jovens, numa
abordagem junguiana
Relação pai-filha
Qualitativo;
Compreensão
simbólica
Seres Humanos Social
Análise de material
verbal
Cultural
23 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
A teoria Junguiana dos Tipos Psicológicos: a
possibilidade do uso clínico na infância".
Tipologia e
psicodiagnóstico
Análise
interpretativa
Seres Humanos Clínico
Análise de material
verbal
Clínica
24 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
A utilização da terapia do Sandplay no tratamento de
crianças com Transtorno Obsessivo-Compulsivo
Criança/
TOC/avaliação terapia
Quali/Quanti;
Estudo
exploratório
Seres Humanos Clínico
Análise verbal e
imagética
Clínica
25 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Uma Leitura Simbólica do Espírito Empreendedor
Espírito
empreendedor
Não explicitado
Fenômenos da
cultura
Cultural Não se aplica Cultural
26 2006 Tese Psicologia Clínica PUC-SP Paixões Estrangeiras: A Vingança Vingança Não explicitado
Fenômenos da
cultura
Cultural
Análise de material
verbal
Cultural
27 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Devir Cigano - O Encontro Cigano-não Cigano (Rom-
Gadjé) como Elemento Facilitador do Processo de
Individuação
Processo de
individuação
Não explicitado
Fenômenos da
cultura
Social Não se aplica Cultural
28 2006 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Da expressão que espanta ao toque que encanta: a
Calatonia e a Shantala como instrumentos de
intervenção no re-significar das relações entre mães e
filhos
Relações entre mãe e
filho
Qualitativa;
Estudo de caso
Seres Humanos Social
Análise de material
verbal
Clínica
29 2006 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
Aprender com o corpo: estabelecendo relações entre a
psicologia analítica e as técnicas corporais taoístas
Técnicas corporais Teórico
Conceitos teórico
-
científicos
Científico Não se aplica Teórica
30 2006 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
Reflexões sobre a materialidade numa abordagem
imagético-apresentativa : narrativa de um percurso
teórico e prático à luz da psicologia analítica
Materialidade
Método
junguiano
Seres Humanos Clínico
Análise verbal e
imagética
Teórica
31 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Vinho: uma imagem arquétipa Vinho
Amplificação;
Método
simbólico
construtivo
Fenômenos da
cultura
Cultural Não se aplica Cultural
32 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Vocação: Uma perspectiva junguiana - A orientação
vocacional na clínica junguiana
Orientação vocacional Teórico
Conceitos teórico
-
científicos
Clínico
Análise verbal e
imagética
Mista:
teórica/clínica
Ano Tipo
Área de
concentração Instituição título tema
Método
declarado Objeto
Contexto de
apreensão
Análise
verbal/imagética Modalidade
33 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Imago Dei: Da proto-imagem ao conceito Um estudo da
formação do conceito da Imago Dei nas Obras de C. G.
Jung
Imago dei Teórico
Conceitos teórico
-
científicos
Científico Não se aplica Teórica
34 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP
Coisas de menina: análise simbólica da personagem
Buffy A Caça Vampiros
Buffy personagem Qualitativo
Fenômenos da
cultura
Cultural Análise de imagens Cultural
35 2007 Dissertação Psicologia Clínica PUC-SP Calatonia e religiosidade: uma abordagem junguiana
Calatonia e
religiosidade
Método
construtivo de
Jung,
fenomenológico
Seres Humanos Institucional
Análise verbal e
imagética
Clínica
36 2007 Tese Psicologia Clínica PUC-SP
A busca pela cirurgia plástica estética: um sintoma da
sociedade contemporânea? Pouco junguiana
Cirurgia Plástica
Pesquisa
descritiva Quali-
Quanti
Seres Humanos Social
Análise de material
verbal
Cultural
37 2007 Dissertação
Psicologia Escolar e do
Desenvolvimento
Humano
USP
Paternidade e subjetividade masculina em transformação
: crise, crescimento e individuação. Uma abordagem
junguiana
Paternidade Qualitativo Seres Humanos Cultural
Análise de material
verbal
Mista:
teórica/clínica
Anexo 4 - Quadro dos Procedimentos de Coleta de Dados
Ano
Tipo Procedimentos de coleta
1 2002 Dissertação Questionário estruturado
1 2002 Dissertação Testes psicológicos
2 2002 Dissertação Intervenção terapêutica
2 2002 Dissertação Relato de sonhos
3 2002 Dissertação Pesquisa bibliográfica
4 2002 Dissertação Entrevistas
4 2002 Dissertação Relato de sonhos
4 2002 Dissertação Recursos Expressivos
5 2002 Dissertação Entrevistas
6 2003 Dissertação Intervenção terapêutica
6 2003 Dissertação Registro de imagem e/ou som
7 2003 Dissertação Pesquisa bibliográfica
8 2003 Dissertação Intervenção terapêutica
8 2003 Dissertação Recursos Expressivos
8 2003 Dissertação Recursos Expressivos
8 2003 Dissertação Relato de sonhos
8 2003 Dissertação Observação
9 2003 Dissertação Pesquisa bibliográfica
10 2003 Dissertação Entrevistas
10 2003 Dissertação Pesquisa bibliográfica
11 2003 Dissertação Recursos Expressivos
11 2003 Dissertação Recursos Expressivos
11 2003 Dissertação Intervenção terapêutica
11 2003 Dissertação Recursos Expressivos
12 2004 Tese Documentos
12 2004 Tese Testes psicológicos
12 2004 Tese Entrevistas
13 2005 Dissertação Entrevistas
Ano
Tipo Procedimentos de coleta
13 2005 Dissertação Questionário estruturado
13 2005 Dissertação Registro de imagem e/ou som
14 2005 Dissertação Documentos
14 2005 Dissertação Pesquisa bibliográfica
15 2005 Tese Entrevistas
15 2005 Tese Intervenção terapêutica
15 2005 Tese Questionário estruturado
15 2005 Tese Testes psicológicos
16 2005 Dissertação Documentos
16 2005 Dissertação Entrevistas
16 2005 Dissertação Observação
16 2005 Dissertação Observação
16 2005 Dissertação Recursos Expressivos
16 2005 Dissertação Registro de imagem e/ou som
17 2005 Dissertação Observação
17 2005 Dissertação Registros escritos
18 2005 Dissertação Entrevistas
18 2005 Dissertação Entrevistas
18 2005 Dissertação Observação
18 2005 Dissertação Registros escritos
19 2005 Tese Entrevistas
19 2005 Tese Testes projetivos
20 2006 Dissertação Pesquisa bibliográfica
21 2006 Dissertação Recursos Expressivos
22 2006 Dissertação Entrevistas
23 2006 Dissertação Entrevistas
23 2006 Dissertação Observação
23 2006 Dissertação Testes psicológicos
23 2006 Dissertação Testes projetivos
Ano
Tipo Procedimentos de coleta
24 2006 Dissertação Entrevistas
24 2006 Dissertação Intervenção terapêutica
24 2006 Dissertação Questionário estruturado
24 2006 Dissertação Registro de imagem e/ou som
24 2006 Dissertação Testes projetivos
24 2006 Dissertação Testes psicológicos
25 2006 Dissertação Pesquisa bibliográfica
25 2006 Dissertação Pesquisa literária
26 2006 Tese Entrevistas
26 2006 Tese Pesquisa literária
27 2006 Dissertação Experiência do pesquisador
28 2006 Dissertação Entrevistas
28 2006 Dissertação Intervenção terapêutica
28 2006 Dissertação Intervenção terapêutica
28 2006 Dissertação Observação
29 2006 Dissertação Pesquisa bibliográfica
30 2006 Dissertação Registro de imagem e/ou som
30 2006 Dissertação Registros escritos
30 2006 Dissertação Registros escritos
30 2006 Dissertação Relato de sonhos
31 2007 Dissertação Pesquisa bibliográfica
32 2007 Dissertação Intervenção terapêutica
32 2007 Dissertação Pesquisa bibliográfica
33 2007 Dissertação Pesquisa bibliográfica
34 2007 Dissertação Observação
34 2007 Dissertação Recursos Audio-Visuais
35 2007 Dissertação Entrevistas
35 2007 Dissertação Observação
35 2007 Dissertação Recursos Expressivos
Ano
Tipo Procedimentos de coleta
35 2007 Dissertação Registros escritos
36 2007 Tese Questionário estruturado
36 2007 Tese Testes projetivos
37 2007 Dissertação Entrevistas
37 2007 Dissertação Observação
37 2007 Dissertação Pesquisa bibliográfica
37 2007 Dissertação Registro de imagem e/ou som
37 2007 Dissertação Registros escritos
ANEXO 5
MODELO DE FICHA DE ANÁLISE
IDENTIFICAÇÃO DA PESQUISA
- N.
- TÍTULO
OBJETIVO:
- PROBLEMA
- OBJETIVO GERAL
- OBJETIVOS ESPECÍFICOS
MÉTODO:
PROCEDIMENTOS DE APREENSÃO:
- MÉTODO DE COLETA:
- CONTEXTO
- OBJETO DE PESQUISA (PARTICIPANTES)
- INSTRUMENTOSA DE COLETA DE DADOS
- TRATAMENTO DOS DADOS
- CUIDADOS ÉTICOS
- OBSERVAÇÕES
PROCEDIMENTOS DE COMPREENSÃO:
- MÉTODO DE ANÁLISE
- INSTRUMENTOS
- TRATAMENTO DOS DADOS
- OBSERVAÇÕES
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