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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGRONEGÓCIOS
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL,
HISTÓRIA, CULTURA E TRADIÇÃO: OS CAMINHOS
DO CAFÉ EM ALTO PARAÍSO (GO)
JUREMA IARA CAMPOS
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM AGRONEGÓCIOS
BRASÍLIA/DF
FEVEREIRO/2008
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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGRONEGÓCIOS
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL, HISTÓRIA, CULTURA E
TRADIÇÃO: OS CAMINHOS DO CAFÉ EM ALTO PARAÍSO (GO)
JUREMA IARA CAMPOS
ORIENTADORA: ANA LÚCIA EDUARDO FARAH VALENTE
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM AGRONEGÓCIOS
PUBLICAÇÃO: 14/2008
BRASÍLIA/DF
FEVEREIRO/2008
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA E CATALOGAÇÃO
CAMPOS, J. I. Desenvolvimento territorial, história, cultura e tradição: os caminhos do
café em Alto Paraíso (GO). Brasília: Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária,
Universidade de Brasília, 2008, 000 p. Dissertação de Mestrado.
Documento formal, autorizando reprodução
desta dissertação de mestrado para empréstimo
ou comercialização, exclusivamente para fins
acadêmicos, foi passado pela autora à
Universidade de Brasília e acha-se arquivado na
Secretaria do Programa. A autora reserva para
si os outros direitos autorais de publicação.
Nenhuma parte desta dissertação de mestrado
pode ser reproduzida sem a autorização por
escrito da autora. Citações são estimuladas,
desde que citada a fonte.
FICHA CATALOGRÁFICA
Campos, Jurema Iara
Desenvolvimento territorial, história, cultura e tradição: os
caminhos do café em Alto Paraíso (GO). / Jurema Iara
Campos; orientação de Ana Lúcia E. F. Valente - Brasília,
2008.
167 f: il.; 30 cm.
Dissertação (Mestrado) - Universidade de Brasília,
Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, 2008.
1. Agricultura Familiar. 2. Café. 3. Abordagem territorial. 4.
Agronegócio. 5. Estratégia de Marketing.
CDU 63:339.13(817.3)
ii
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGRONEGÓCIOS
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL, HISTÓRIA, CULTURA E
TRADIÇÃO: OS CAMINHOS DO CAFÉ EM ALTO PARAÍSO (GO)
JUREMA IARA CAMPOS
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
SUBMETIDA AO PROGRAMA DE PÓS-
GRADUAÇÃO EM AGRONEGÓCIOS,
COMO PARTE DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS À OBTENÇÃO DO GRAU DE
MESTRE EM AGRONEGÓCIOS
APROVADA POR:
________________________________________________
ANA LÚCIA EDUARDO FARAH VALENTE
(ORIENTADORA)
________________________________________________
NEWTON NARCISO GOMES JUNIOR
(EXAMINADOR INTERNO)
_________________________________________________
ARILSON FAVARETO
(EXAMINADOR EXTERNO)
BRASÍLIA/DF, 20 DE FEVEREIRO DE 2008.
iii
Dedico este trabalho aos meus pais, Múcio e Neiva,
e aos meus filhos, Francisco e Bruno, com carinho.
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeço o carinho e a orientação da professora Ana Lúcia Eduardo Farah Valente, cujas
experiências e conselhos me conduziram a um caminho de pesquisa de riquezas inestimáveis,
que é o de olhar nos olhos das pessoas, enfocar o ser humano, entrar na emoção e no que o
indivíduo tem de mais precioso: a cultura de seu povo.
À equipe de professores do Programa de Pós-Graduação em Agronegócios,
especialmente ao professor Josemar Xavier de Medeiros, que me mostrou a importância e o
fascínio do estudo e da pesquisa.
Aos professores Newton Narciso Gomes Júnior e Arilson Favareto, por suas valiosas
contribuições para a conclusão desse trabalho.
Aos meus familiares, pais, irmãos e filhos, que, com paciência e carinho, aguardaram o
fim dessa jornada de ansiedade e tensão. Agradeço-lhes pela confiança, apoio e compreensão.
Aos meus amigos, especialmente Elsa, Ricardo e Mirian, que, com carinho e dedicação,
contribuíram na elaboração do texto.
À prefeitura de Alto Paraíso de Goiás, especialmente ao prefeito Uíter Gomes de Araújo,
pelo auxílio durante a realização da pesquisa de campo.
Aos habitantes do município de Alto Paraíso de Goiás, que tão gentilmente me
receberam em suas casas, e que, com a mesma amabilidade, responderam às minhas perguntas
e curiosidades.
E especialmente a Deus, pelo prazer de estar viva e pelas oportunidades por Ele dadas a
mim de crescimento e evolução.
v
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL, HISTÓRIA, CULTURA E
TRADIÇÃO: OS CAMINHOS DO CAFÉ EM ALTO PARAÍSO (GO)
RESUMO
O presente estudo tem por objetivo analisar a forma como os habitantes de Alto Paraíso de
Goiás estão buscando alternativas para a geração de renda e o desenvolvimento sustentável do
município. Para isso, efetua a análise a partir da implantação, pela Embrapa, de um projeto
específico, relativo ao resgate da cultura agrícola tradicional do café. O município faz parte da
região da Chapada dos Veadeiros e possui trajetória de busca de atividades produtivas que
agreguem renda para sua população. A partir da colonização no século XVIII, a mineração e
as atividades agrícola e pecuária foram as que mais se desenvolveram na região até que sua
vocação produtiva foi transformada, no início dos anos 1960, com a criação do parque
Nacional da Chapada dos Veadeiros e a inauguração de Brasília, iniciando-se a exploração do
turismo. A partir do ano 2000, o fluxo de turistas decaiu devido a problemas relativos à saúde
pública, acarretando na região estagnação da economia local e escassez de recursos
financeiros. A partir da conjuntura de diversificação do mercado, produtores familiares do
município despertaram para a existência, em suas terras, de um café que pode ser
comercializado em nichos de mercado de cafés especiais, tais como de orgânicos e de origem
definida. E buscaram, na Embrapa, o desenvolvimento de projeto relativo à implantação de
cafeicultura orgânica para a agricultura familiar. Essa pesquisa se apoiou na perspectiva
técnico-metodológica da Antropologia, que tem como linhas condutoras a exigência do
trabalho de campo e o estudo de caso. Os resultados revelaram que a partir do desvelamento
de valores, representados pela história, cultura e as tradições da região, é possível estabelecer
uma estratégia mais eficiente de busca de mercado para o café, a partir da experiência
revelada no próprio trabalho concreto e na cultura dos produtores. E que o desenvolvimento
rural da região deve ser buscado a partir do desenvolvimento de atividades da nova ruralidade
e da aplicação de uma abordagem territorial de desenvolvimento, de forma a potencializar as
habilidades locais por meio da integração dos municípios que compõem o território.
Palavras-chave: agricultura familiar, café, abordagem territorial, agronegócio, estratégia de
comercialização.
vi
TERRITORIAL DEVELOPMENT, HISTORY, CULTURE AND
TRADITION: THE PATHS OF COFFEE IN ALTO PARAÍSO (GO)
ABSTRACT
This study aims to examine how the inhabitants of Alto Paraíso de Goias are seeking
alternatives to generate income and sustainable development of the municipality. To do so, it
makes the analysis from the deployment, by Embrapa, of a specific project on the rescue of
traditional agricultural culture of coffee. The municipality is part of the region of the Chapada
dos Veadeiros and has trajectory of searching for productive activities that add income to
itspopulation. From colonization in the eighteenth century, the mining and agricultural and
livestock activities were the ones that most developed in the region until its productive
vocation was transformed in the early 1960, with the creation of the National Park of the
Chapada dos Veadeiros and the inauguration of Brasilia, starting up the exploitation of
tourism. Begining in 2000, the flow of tourists dropped due to problems related to public
health, resulting in the stagnation of the local economy and shortage of financial resources.
From the juncture of diversification of the market, family producers woken up to the
existence, in their land, of a coffee that can be sold in niche markets for specialty coffees,
such as organic and of definite origin. And sought, in Embrapa, the development of project on
the deployment of organic coffee for family farming. This research was supported in view of
the technic and methodology of Anthropology, which has the lines conducting the
requirement of the fieldwork and analysis of the case. The results revealed that from the
unveil of values, represented by the history, culture and traditions of the region, it is possible
to establish a more efficient strategy for picking up market for coffee from the experience
revealed in their own specific job and the culture of the producers. And that rural
development in the region must be sought from the development of activities of the new
rurality and the implementation of a territorial approach of development in order to enhance
local skills through the integration of the municipalities that make up the territory.
Keywords: Family farming, coffee, territorial approach, agribusiness, marketing strategy.
vii
LISTA DE TABELAS
Tabela 3.1 Dados demográficos do nordeste goiano 74
Tabela 3.2 - Índice de Desenvolvimento Social (IDS) e Índice de Desenvolvimento
Econômico (IDE), por regiões de planejamento do Estado de Goiás – 2000 75
Tabela 5.1 - Áreas destinadas à colheita e colhida, quantidade produzida, rendimento
médio e valor da produção de café (beneficiado), segundo as Unidades da Federação,
mesorregiões, microrregiões e os municípios produtores do Brasil – 2005 101
Tabela 5.2 - Áreas destinadas à colheita e colhida, quantidade produzida, rendimento
médio e valor da produção do café beneficiado, segundo os Estados produtores do
Brasil – 2005 101
Tabela 5.3 - Principal renda das famílias, por região estudada 102
Tabela 5.4 - Tamanho das propriedades por área de pesquisa 102
Tabela 5.5 - Número de empregados por propriedade, por região estudada 103
Tabela 5.6 - Idade do entrevistado por região estudada 103
Tabela 5.7 - Características das atividades desenvolvidas nas propriedades da região,
por região estudada 108
viii
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABIC - Associação Brasileira da Indústria de Café
ABICS - Associação Brasileira da Indústria do Café Solúvel
ACVCV - Associação dos Condutores de Visitantes da Chapada dos Veadeiros
AGENCIAAMBIENTAL - Agência Goiana de Meio Ambiente
AGENCIARURAL - Agência Goiana de Desenvolvimento Rural e Fundiário
AMORC - Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis
AMORMOINHO - Associação dos Moradores do Moinho
APA - Área de Preservação Ambiental
ASFLO - Associação dos Catadores de Flores do Cerrado
CBP&D/Café - Consórcio Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café
CE - Comunidade Européia
CECAFÉ - Conselho dos Exportadores de Café Verde do Brasil
CERTICAFÉ - Programa Mineiro de Incentivo à Certificação do Café
CNC -Conselho Nacional do Café
EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
FNMA - Fundo Nacional do Meio Ambiente
IDE - Índice de Desenvolvimento Econômico
IDS - Índice de Desenvolvimento Social
IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IICA - Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura
IPTR - Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural
OIC - Organização Internacional do Café
ONGs - Organizações Não Governamentais
ORNAs - Ocupações Rurais Não Agrícolas
PNVC - Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros
PNP&D/Café - Programa Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento do Café
RPPN - Reserva Particular do Patrimônio Natural
SEPIN - Superintendência de Estatística, Pesquisa e Informação da SEPLAN/GO
SEPLAN/GO - Secretaria do Planejamento e Desenvolvimento do Estado de Goiás
SNUC - Sistema Nacional de Unidade de Conservação
UNESCO - Organização das Nações Unidas Para a Educação, a Ciência e a Cultura
VBP - Valor Bruto da Produção
ix
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 1
2. REFERENCIAL TEÓRICO E MÉTODO 7
2.1. AGRICULTURA FAMILIAR COMO VANTAGEM ESTRATÉGICA 9
2.1.1. Os valores e a competitividade na agricultura familiar 14
2.1.2. A competitividade da agricultura familiar como fator de desenvolvimento
rural 16
2.2. MEMÓRIA COLETIVA E TRADIÇÃO 22
2.2.1. Tradições e qualificação de produtos 27
2.3. A TERRITORIALIDADE 30
2.3.1. Espaço rural revalorizado 31
2.3.2. Exemplos estrangeiros 35
2.3.3. O papel das instituições 39
2.4. A UNIÃO COMO ESTRATÉGIA 41
2.4.1. A formação de associações para benefícios coletivos 43
2.5. O AGRONEGÓCIO CAFÉ NO BRASIL E A AGRICULTURA FAMILIAR 45
2.5.1. Segmentação de mercado 48
2.5.2. A produção de orgânicos 50
2.5.3. Certificação de origem 53
2.6. MÉTODO 56
3. A HISTÓRIA DO NORDESTE GOIANO 61
3.1. As bandeiras e a colonização de Goiás 61
3.2. A ocupação com a abertura da fronteira agrícola para o Norte 68
3.3. A vocação para o turismo ecológico 71
x
4. ALTO PARAÍSO: OS DESAFIOS DA MEMÓRIA 78
4.1. Sertão: Fama, misticismo e tragédia 79
4.2. Vila São Jorge: turismo e ecologia 85
4.3. Misticismo, agricultura e pecuária 86
4.4. O cultivo tradicional de café 87
4.5. Em busca de uma estratégia de desenvolvimento 89
5. A REDENÇÃO PELO CAFÉ? 99
5.1. Proximidade do Parque Nacional favorece o turismo 109
5.2. Grandes fazendas e produções extensivas 112
5.3. Beleza exuberante dos vales produtivos 116
6. A BUSCA POR UM PROJETO DE DESENVOLVIMENTO 119
7. CONCLUSÃO 128
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 136
9. APÊNDICES 145
10. ANEXOS 163
xi
1. INTRODUÇÃO
O Brasil é o maior produtor e exportador mundial de café verde. E é, também, o segundo
maior consumidor dessa bebida, ficando atrás, apenas, dos Estados Unidos. Em 2006, 16,33
milhões de sacas do produto foram demandadas no mercado brasileiro, e o consumo per
capita ficou em 4,27 kg de café torrado - ou quase 70 litros por pessoa - por ano (REETZ et
al., 2007). Pesquisas apontam que hoje 91% dos brasileiros tomam café e a bebida é a
segunda mais consumida no país, depois da água (ABIC, 2008). Além disso, a taxa de
aumento do consumo do brasileiro foi uma das maiores nos últimos anos, se comparada às
outras nações. O consumo interno do produto chegou a uma taxa de crescimento de 19,2%
entre os anos de 2003 e 2006 (REETZ et al., 2007). Com esse aumento, o setor acredita que
até o ano de 2010 o país passará a ser o maior consumidor de café do mundo, chegando a
consumir 21 milhões de sacas do produto por ano.
Para o produtor, o mercado de café é promissor. Em 2007, a procura do produto no Brasil
foi maior do que a oferta. Para abastecer o mercado, que está em franca expansão em todo o
mundo, a necessidade de aumentar a produção em 10% até 2010. Uma das alternativas
apontadas pelo setor para melhorar o abastecimento é a abertura de novas áreas de produção
(REETZ et al., 2007).
Esse mercado se mostra muito favorável à agricultura familiar. O segmento responde
hoje por até 25% da produção brasileira de café, gerando, direta e indiretamente, cerca de 8,4
milhões de empregos. A cafeicultura é relativamente intensiva no uso de mão-de-obra quando
comparada com outras culturas desenvolvidas por agricultores familiares. Estudos
demonstram que na Guatemala, por exemplo, o café requer o trabalho de 73 pessoas por dia,
1
por hectare, enquanto que o milho utiliza 58 pessoas na sua produção, e o feijão, 61
(BLISKA; PEREIRA; GIOMO, 2007 apud RICE; WARD, 1996).
A mudança de hábitos dos consumidores nos últimos anos, especialmente no mercado
norte-americano, devido, principalmente às mudanças demográficas e maiores exigências
quanto à sanidade do produto, causou a redução no consumo per capita de café e a
conseqüente busca de novos produtos para atender a esse mercado. Isso resultou na
diversificação do produto e na produção dos cafés gourmet, orgânico, com diferentes sabores,
com origem definida, espressos e descafeinados. Essa mudança despertou, ainda, a
consciência ecológica e a responsabilidade social dos produtores. O mercado ficou cada vez
mais favorável aos agricultores familiares, que o café produzido de forma artesanal ficou
mais valorizado, possibilitando a inserção desses produtores em nichos de mercado de cafés
especiais, tais como o orgânico, o de origem definida, bem como nos mercados de produtos à
base de café, como cappuccinos, sorvetes, drinks, e outros. E o mercado dos cafés especiais
está ainda em expansão. Enquanto que o consumo de café commoditie no mundo vem
crescendo a uma taxa de 1,38% ao ano (LEITE, 2005), a demanda para o produto especial,
como o café orgânico, por exemplo, cresce anualmente a uma taxa de 10% (RICCI;
ARAÚJO; FRANCH, 2002).
Com esse aumento na demanda do café orgânico e de origem definida, os produtores do
município de Alto Paraíso de Goiás despertaram para a existência, em suas terras, de um café
que se enquadra nesse tipo de mercado, tendo características de sabor, aroma e textura
próprios da região. O café é produzido, tradicionalmente, de forma orgânica ou agroecológica
e demonstra ser de uma variedade muito antiga, própria para a produção de café especial.
Além de ecológico, o café também é produzido com responsabilidade social, pois se encontra
especialmente cultivado em propriedades de agricultores familiares, sendo colhido e
2
preparado de forma artesanal e com os cuidados de quem produz para o consumo de sua
própria família.
O município de Alto Paraíso localiza-se na região nordeste do estado de Goiás, a cerca de
250 quilômetros de Brasília, inserido no Bioma Cerrado. É local de beleza natural exuberante,
sendo considerado por muitos como um éden terrestre. É, ainda, local que reúne misticismo e
esoterismo atraindo, para a região, participantes de várias seitas e religiões.
No início de sua ocupação, no século XVIII, Alto Paraíso teve como atividade produtiva
principal a mineração, realizada em conjunto com as atividades agrícola e pecuária. Porém, a
região transformou sua vocação produtiva quando sua população passou a desenvolver
atividades vinculadas ao turismo no lugar daquelas exploratórias e de produção de gêneros
alimentícios. Esse marco em sua história ocorreu a partir da década de 1960, com a criação do
Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, ali localizado, e a interiorização da Capital
Federal brasileira. Desde então, houve mudança significativa na forma de explorar o território.
Entretanto, a trajetória de exploração do turismo foi interrompida a partir do ano 2000,
quando os visitantes, até então atraídos principalmente pelo caráter ecológico e místico da
região, foram afastados, principalmente por problemas relativos à saúde pública. O principal
motivo foi a constatação de que pessoas contaminadas por febre amarela tinham estado na
região. A partir de então, a ausência de visitantes acarretou, em Alto Paraíso e nos municípios
vizinhos, a estagnação da economia local e a escassez de recursos financeiros, intensificadas
pela carência de políticas públicas. Hoje todo o território convive com o título de corredor da
miséria.
alguns anos, motivados pela diminuição do fluxo de turistas a partir do ano 2000,
lideranças locais buscaram incitar a geração de renda no município por meio do
desenvolvimento de projetos voltados para a área rural, de forma a promover a união de sua
população em torno de um produto tradicional e característico. Viram, no café e no trigo
3
veadeiro
1
, os produtos agrícolas que estão estampados no brasão do município de Alto Paraíso
de Goiás, datado do ano de 1953, as opções para o resgate da produção agrícola, anos
perdida pelos agricultores locais.
O trigo veadeiro proporcionou muita riqueza ao município durante vários anos de sua
história, desde a chegada à região, porém teve a produção abandonada cerca de quarenta
anos, quando enfrentou dificuldades na sua comercialização. Na época, houve rejeição ao
produto regional por ser de coloração mais escura do que o trigo comum. Atualmente, a partir
da conjuntura de diversificação do mercado, o trigo veadeiro passou a ser novamente
produzido com as sementes que haviam sido conservadas nas câmaras frias da Embrapa
Recursos Genéticos e Biotecnologia e que foram devolvidas aos produtores locais em 2005.
o café é um produto que chegou à região ainda no século XVIII, juntamente com os
colonizadores, sempre foi cultivado e consumido no local, porém nunca teve uma produção
significativa que possibilitasse sua inserção no mercado. Em 2007, um projeto denominado
Implementação de Cafeicultura Orgânica para a Agricultura Familiar de Alto Paraíso de
Goiás foi iniciado na Embrapa Café, que passou a estudar o produto tradicional ali existente e
a implantação da cafeicultura orgânica para agricultores familiares. A importância do projeto
desenvolvido pela Embrapa na região é inegável, porém, as conseqüências ainda são
imprevisíveis, já que sua execução está sendo iniciada.
Porém, acredita-se que apenas o desenvolvimento de um projeto setorial, voltado para a
produção do café no campo, não é garantia para que a região alcance mercado. O café
produzido naquele município, que não tem tradição de produção cafeeira comercial, precisa
encontrar fatores que agreguem valor ao seu produto, a fim de que seu café tenha maior
chance de competir em algum nicho de mercado. Isso, para que o café de Alto Paraíso possa
concorrer com aqueles que são produzidos em outros estados brasileiros, como Minas Gerais,
1
Variedade crioula de trigo trazida para o Brasil por imigrantes egípcios no século XVIII. De nome científico
Triticum aestivum L. Thell, a variedade leva o nome popular de trigo veadeiro por ser adaptada às condições
climáticas e ambientais da região.
4
Paraná e São Paulo, que têm maior facilidade de colocação do produto no mercado,
considerando que são regiões tradicionalmente produtoras de café do país.
Além da exuberância oferecida pela natureza, a região nordeste do estado de Goiás
possui história e passado tradicionais tão interessantes que podem vir a agregar valor aos seus
produtos. A tradição e a história do território estabelecem um valor intrínseco ao processo de
produção e identidade ao produto final. É essa busca de identidade que passou a formar o
comportamento dos agentes da região ao procurar resgatar o café ali existente centenas de
anos e cujo valor é percebido pelo mercado internacional. Isso nos levou a estabelecer a
seguinte pergunta de pesquisa: porque os agricultores familiares de Alto Paraíso de Goiás
demandaram a ajuda da Embrapa para o resgate do café que é produzido tradicionalmente em
suas propriedades?
Para responder a essa pergunta, este estudo tem por hipótese: os agricultores familiares
de Alto Paraíso de Goiás buscam dar sentido operacional à expressão simbólica percebida no
brasão municipal - no qual um ramo de café e outro de trigo estão entrelaçados -, como base
de projeto de desenvolvimento que se vale de um produto que tem identidade com a história e
a tradição dos habitantes da região. É essa a razão que os motiva, para além do apoio e da
competência técnica nacional e internacionalmente reconhecida da Embrapa.
O presente estudo tem por objetivo analisar a forma como os habitantes de Alto Paraíso
de Goiás estão buscando alternativas para a geração de renda e o desenvolvimento sustentável
do município. Para isso, efetuou-se a análise a partir da implantação, pela Embrapa, de projeto
específico relativo ao resgate da cultura agrícola tradicional do café na região.
Optou-se por adotar, como ponto de corte para a realização do presente trabalho, os
agricultores do município de Alto Paraíso de Goiás, pelo fato de o projeto de pesquisa da
Embrapa ter como público alvo esses produtores. Acredita-se, porém, que os resultados
obtidos são aplicáveis em realidades semelhantes que possam ocorrer em outros municípios
5
da região nordeste do estado de Goiás que possuam características, história e cultura similares
à do município pesquisado.
Este trabalho está dividido em seis capítulos. O primeiro refere-se à Introdução, na qual
são apresentados: o problema, a relevância de seu estudo, o objetivo a ser alcançado com o
trabalho e a hipótese. No Capítulo 2, apresentamos o referencial teórico e conceitual no qual
nos apoiamos, por meio de revisão de literatura, para a realização da análise. Ainda, no
segundo Capítulo, está descrito o Método utilizado para o desenvolvimento da pesquisa. O
Capítulo 3 traz um levantamento histórico da região, de forma a mostrar como as relações
produtivas foram se formando e a relação entre o desenvolvimento dessas formas com a
transformação do espaço a partir da ação do homem. O Capítulo 4 apresenta informações
sobre como são divididas as regiões do município e os costumes e tradições do território,
estabelecidos a partir do relato de seus habitantes. No Capítulo 5, fazemos uma exposição
sobre a produção local de café e os antecedentes do desenvolvimento do projeto de pesquisa
para o produto. No Capítulo 6, discute-se, à luz do referencial teórico, a forma como a região
está buscando construir seu projeto de desenvolvimento. No Capítulo 7, apresentamos as
conclusões e contribuições do estudo, algumas proposições e as sugestões para estudos
futuros.
6
2. REFERENCIAL TEÓRICO E MÉTODO
A experiência global da modernidade está interligada - e influencia, sendo
por ela influenciada - à penetração das instituições modernas nos
acontecimentos da vida cotidiana. Não apenas a comunidade local, mas as
características íntimas da vida pessoal e do eu tornam-se interligadas a
relações de indefinida extensão no tempo e espaço (GIDDENS, 1997, p.77).
Anthony Giddens (1997), ao estudar o processo de globalização, demonstra como os
acontecimentos locais interferem e influenciam o que acontece em todo o mundo, do mesmo
modo em que os acontecimentos globais também influenciam no local. Para ele, “poucas
pessoas, em qualquer lugar do mundo, podem continuar sem consciência do fato de que suas
atividades locais são influenciadas, e às vezes até determinadas, por acontecimentos ou
organismos distantes” (GIDDENS, 1997, p.74).
As experiências do cotidiano refletem o que foi repassado pela tradição que, porém, es
em constante mutação. Cabe à tecnologia, no significado geral da técnica, desempenhar
importante papel nessa mudança, tanto na forma de tecnologia material quanto pela
transformação social
2
. Conforme Santos (2002, 45-46), “a técnica é um elemento importante
de explicação da sociedade e dos lugares, mas, sozinha a técnica não explica nada”. Ainda
segundo o geógrafo, “a ordem global busca impor, a todos os lugares, uma única
racionalidade. E os lugares respondem ao Mundo segundo os diversos modos de sua própria
racionalidade” (SANTOS, 2002. p.338).
A forma como a partir da experiência pessoal e local, ou seja, da singularidade, pode-se
compreender a dimensão universal do capitalismo (VALENTE, 2005), é mostrada, também,
2
Giddens (1997) um exemplo simples, retirado do romance The Mezzanine (1990), de Nicholson Baker. O
livro mostra como o desenvolvimento da tecnologia fôrma de fazer gelo forneceu não apenas uma nova
tecnologia, mas processos mais profundos de reforma da vida cotidiana, ao longo de sua transformação em
pouco tempo: saindo de formas de alumínio com uma grade de lâminas ligadas a uma alavanca, que passava sob
água morna para que o gelo se desprendesse do metal e transformando-se em bandejas de plástico, como moldes,
que produzem cubos pequenos.
7
por Alves (2003, p. 28), quando afirma que “o singular é sempre uma forma de realização do
universal”. Para o autor, ao adotar uma escala, mostrando uma determinada realidade humana,
seja uma cidade, uma região ou um país, o pesquisador gera o conhecimento que evidencia a
cultura predominante entre os povos que vivem sob a égide do modo de produção capitalista,
ao mesmo tempo em que mostra as especificidades das diferentes regiões ou nações.
Para Bourdieu (1989, p. 150),
[...] o trabalho científico tem em vista estabelecer um conhecimento
adequado o do espaço das relações objectivas entre as diferentes
posições constitutivas do campo mas também das relações necessárias
estabelecidas, pela mediação dos habitus dos seus ocupantes, entre essas
posições e as tomadas de posição correspondentes, quer dizer, entre os
pontos ocupados neste espaço e os pontos de vista sobre este mesmo espaço,
que participam na realidade e no devir deste espaço.
Ou seja, a delimitação do espaço construído permite compreender o princípio e a eficácia
da estratégia dos agentes para conservar ou modificar esse espaço.
na opinião de Marx, citado por Adelman (1972), o mundo deve ser compreendido
como um complexo de processos, ao invés de um complexo de coisas feitas. Esses processos
sofrem uma série de transformações, a partir das quais acontece o desenvolvimento
progressivo. Na opinião de Marx, “o trabalho é, em primeiro lugar, um processo no qual [...] o
homem inicia, regula e controla, mediante sua própria ação, seu intercâmbio material com a
natureza” (ADELMAN, 1972, p. 60).
Porém é preciso levar em consideração que, para Marx (1986), a produção de idéias e da
consciência pelo homem está diretamente entrelaçada com a atividade material desenvolvida
por este homem, ou seja a produção dos meios de vida pelo homem depende dos meios de
vida encontrados por este mesmo homem e que ele terá que reproduzir. Com isso, a
estrutura social e do Estado es diretamente relacionada com o processo de vida de
indivíduos determinados, ou seja, que, como produtores atuam de modo determinado,
8
estabelecendo entre si relações sociais e políticas determinadas. Não do que imaginam ou
representam esses homens, mas do que eles realmente são, bem como da forma como atuam e
produzem materialmente. “[...] os homens, ao desenvolverem sua produção material e seu
intercâmbio material, transformam também, com esta sua realidade, seu pensar e os produtos
de seu pensar. Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a
consciência” (MARX, 1986, p. 37).
O presente estudo buscou analisar um caso de inserção da agricultura familiar no
agronegócio, mais particularmente, na produção voltada para o mercado de café. Para orientar
a leitura da pesquisa realizada junto a agricultores familiares de uma região com tradição para
o turismo ecológico e místico no município de Alto Paraíso de Goiás, faz-se necessário
esclarecer a abordagem escolhida. Assim é que no desenvolvimento do tema são utilizadas
referências da literatura sociológica, antropológica, histórica, além da mais recente literatura
acerca do desenvolvimento da ruralidade, da territorialidade e do agronegócio.
Para o resgate histórico, das tradições e dos costumes buscou-se, na literatura e na
memória de seus habitantes, especialmente os mais antigos, as informações sobre a região,
suas festividades e comemorações religiosas e regionais, além das formas de relação desses
habitantes com a terra, a propriedade e o trabalho.
2.1. AGRICULTURA FAMILIAR COMO VANTAGEM ESTRATÉGICA
A agricultura familiar sempre despertou interesse de pesquisadores de diversas áreas do
conhecimento devido ao seu “papel fundamental na estruturação de economias mais
dinâmicas e de sociedades mais democráticas e eqüitativas” de países capitalistas que hoje
ostentam os melhores indicadores de desenvolvimento humano em todo o mundo
9
(GUANZIROLI et al, 2001, p. 15). No Brasil, essa categoria social, segundo o Censo
Agropecuário 1995/96 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (IBGE, 2006),
é composta por 13,78 milhões de pessoas, num total de 77% dos agricultores, que detém 85%
dos estabelecimentos agrícolas do País. Porém, a agricultura familiar no Brasil, conforme
Buainain et al. (2005), é extremamente diversificada, incluindo tanto famílias que exploram
minifúndios e produzem apenas para seu sustento, em condições de extrema pobreza, quanto
produtores inseridos no moderno agronegócio, que conseguem gerar renda várias vezes
superior àquela que define a linha de pobreza.
De forma geral, pode-se considerar que a agricultura familiar está relacionada ao modo
de produção que tem como base a família e aspectos ligados ao trabalho, à terra e ao
ambiente. Para Wanderley (1999, p.3), a agricultura familiar é “aquela em que a família, ao
mesmo tempo em que é proprietária dos meios de produção, assume o trabalho no
estabelecimento produtivo”. Buainain et al. (2005), consideram como estabelecimentos
familiares aqueles cuja direção dos trabalhos é feita pelo produtor rural e onde a mão-de-obra
familiar utilizada é superior à contratada.
Em meados dos anos 1990, com a efervescência de movimentos sociais do campo, à
noção de agricultura familiar também foram incorporadas várias categorias sociais. Conforme
Schneider (2003a), tais categorias envolvem assentados, arrendatários, parceiros, integrados
às agroindústrias, entre outros, que não mais podiam ser identificados como pequenos
produtores ou, simplesmente, como trabalhadores rurais. Além disso, após um grande
investimento político e acadêmico, o termo pequena produção transformou-se em agricultura
familiar, principalmente para legitimar a revalorização da reforma agrária, alavancar linhas
especiais de crédito e, finalmente, levar à criação de um novo Ministério (GUANZIROLI et
al., 2001).
10
Analisando o uso histórico do termo pequena produção, Abramovay (1998) acredita que
ele escamoteia o abismo social existente entre os camponeses, desestruturados pelo
desenvolvimento capitalista e os agricultores profissionais, capazes não só de sobreviver, mas
de formar a base fundamental do desenvolvimento do capitalismo na agricultura
contemporânea. E ambos são produtores que operam com a família e fornecem trabalho
excedente para o capital. Para ele, por trabalhar em função da família, o agricultor renuncia à
renda presente para a obtenção de uma renda futura, que geralmente vem pela valorização do
patrimônio fundiário
3
. Além disso, o autor afirma que o agricultor rebaixa o custo de
reprodução da sua força de trabalho, proporcionando a transferência de renda da agricultura
para outros setores, fazendo com que toda a sociedade se beneficie de sua atividade, pelo
aumento na oferta e pela redução nos preços médios dos produtos. Para o autor, isso faz com
que exista uma ligação direta entre o caráter familiar da agricultura e o regime de produção
fordista, que caracterizou o capitalismo após a Segunda Guerra Mundial, e é por isso que a
agricultura nos países capitalistas avançados se estruturou socialmente em torno do
estabelecimento familiar.
Na análise de Guanziroli et al (2001), os agricultores familiares são sensíveis aos
estímulos do mercado, absorvem tecnologia moderna e produzem com eficiência, podendo
produzir alimentos e matérias-primas em quantidade e com a qualidade requeridas pela
expansão do setor urbano-industrial. Isso porque, com técnicas modernas mais intensivas no
uso do fator abundante (o trabalho), a agricultura familiar é capaz de gerar renda líquida
superior ao custo de oportunidade de seu trabalho.
Além de geração de renda, a agricultura familiar precisa estabelecer estratégias para que
seu produto participe de forma competitiva no mercado. Este é um desafio, principalmente,
quando a produção agroalimentar é realizada em pequena escala. Porém, para Wilkinson
3
Esta opinião também é compartilhada por Ploeg (2006, p.28), quando diz que “o consumo pode agora ser
suprimido para ampliar ganhos e benefícios no futuro”.
11
(2004), a escala tende a expulsar a agricultura familiar de posições conquistadas nos
modernos mercados de commodities nas cadeias onde ela manteve forte participação e até
onde ela chegou a ser âncora, como na cadeia do leite. Isso porque, após o período inicial
da modernização do agronegócio, em que os desafios de escala eram enfrentados mediante a
agregação em cooperativas, hoje, a mudança no sistema de distribuição, com a hegemonia dos
supermercados e hipermercados passou a exigir dos fornecedores um sistema de logística com
capacidade de suprir as grandes redes de distribuição com uma cesta mínima de produtos de
forma planejada e contínua.
Mesmo assim, os aspectos tradicionais da pequena produção passaram a serem
considerados valores de mercado, já que a produção de commodities exclui a agricultura
familiar em um ambiente onde as vantagens dos fatores tradicionais pouco representam face
aos novos conhecimentos e capacidades organizativas e gerenciais exigidas pela grande
distribuição. Para Wilkinson (2004, p. 57):
se a agricultura familiar, novamente, torna-se pequena produção, frente as
transformações nas grandes cadeias, esta mesma pequenez é vista cada vez
mais como vantagem estratégica, à medida que for associada à tradição, à
natureza, ao artesanal, ao local - um conjunto de valores agora premiado
pelo mercado.
Espírito Santo et al. (2003) acreditam que os agricultores que produzem commodities
precisam conquistar aumento de produtividade e redução de custos por meio da incorporação
de tecnologias, porém eles defrontam-se com baixos preços e a concentração de mercados
tanto à montante quanto à jusante e precisam de capital para atingir escalas que viabilizem
este tipo de produção. Por isso, esses agricultores buscam a diversificação da produção,
combinando culturas tradicionais, novas culturas comerciais e a pecuária e, para superarem o
problema da escala, empregam o trabalho coletivo. Os autores apontam dois caminhos que
podem ser tomados pelos agricultores familiares para agregarem valor e renda em sua
12
atividade: a verticalização da produção, por meio da agroindustrialização, e a diferenciação de
produtos - a partir do desenvolvimento de produtos de qualidade superior - ou pela
combinação de ambos. Porém, a diferenciação de produtos pela busca do desenvolvimento da
qualidade superior enfrenta dificuldades no que se refere à padronização, o escalonamento, o
custo, a distribuição em canais especializados. Por isso, deve haver um reconhecimento do
valor intrínseco por parte do consumidor, o que implica na necessidade de certificação do
produto e criação de novas marcas.
O modelo de desenvolvimento agrícola para o Terceiro Mundo denominado Revolução
Verde, que foi desenhado nos últimos trinta anos tendo como parâmetro o desenvolvimento
técnico-econômico dos países do Primeiro Mundo, trouxe conseqüências desastrosas seja em
termos sociais, especialmente da exclusão dos pequenos produtores, seja em termos
ambientais (DUARTE, 1998). Porém, após ter esse parâmetro satisfeito no mercado
globalizado, a partir do abastecimento mundial de grande quantidade de alimentos produzidos
com o cultivo intensivo de commodities; os países produtores tiveram que se adaptar às novas
exigências dos consumidores, que passaram a valorizar outras características do produto,
como suas qualidades, tanto intrínsecas quanto extrínsecas. Alimentos mais saudáveis - com
menos gorduras saturadas, açúcares e sal - e com maior poder de atração, que ressaltem sua
característica de sabor, aroma ou visual, enfim, o que o distingue dos demais, passaram a ter
lugar de destaque na mesa dos consumidores em todo o mundo. Com isso, o diferente
adquiriu uma conotação primitiva, natural e, portanto, passível de dominação, mudança e
instrumentalização, no sentido da transformação para melhor (DUARTE, 1998, p. 14, grifo
da autora).
2.1.1. Os valores e a competitividade na agricultura familiar
13
Na última década do século XX, o incremento tecnológico acarretou mudança nos
processos de produção existentes e criação de novos bens e serviços de consumo, que
propiciaram o surgimento de novos ramos de produção. Essas transformações fizeram com
que caminhos alternativos fossem vislumbrados pelas famílias rurais na busca de sua inserção
e da competitividade no mercado consumidor, tanto interno quanto externo (VALENTE,
2005). A busca desses caminhos, porém, tornou-se impositiva devido aos novos desafios que
a agricultura brasileira passou a enfrentar com o paradigma técnico-econômico estabelecido
no país a partir da década de 1980 (MEDEIROS et al., 2002). No que se refere ao processo de
desenvolvimento da agricultura brasileira, se por um lado, “a contribuição da ciência e da
tecnologia foi fundamental para sua modernização, por outro, a natureza desse processo
trouxe, como conseqüência indesejável, um elevado nível de exclusão social” (MEDEIROS et
al., 2002, p.23). Num primeiro nível, essa exclusão social foi promovida pela substituição de
mão-de-obra por máquinas, e mais recentemente com a exclusão dos produtores rurais que
não conseguem acompanhar o nível da inovação e da padronização tecnológica exigidos pelas
novas formas de organização dos processos produtivos estruturados no âmbito do moderno
agronegócio.
Por isso, Valente (2005) acredita que, que a agregação de valor aos produtos é
compatível com as atividades dos agricultores que têm acesso à inovação técnica e capacidade
de mobilizar recursos e conhecimento para isso, no caso dos agricultores pouco capitalizados,
antes de tudo é preciso valorizar o trabalho concreto, aquele que tem como resultados valores
de uso. Para a autora, “neste caso, não se trata de acrescentar valor, como indicam aquelas
expressões de uso corrente no agronegócio. Trata-se de desvelar valor: revelar o trabalho e a
cultura, a ação e reflexão humana no processo de produção de sua existência” (VALENTE,
2005, p.67).
14
Para a autora, desvelar valor é “tirar o véu e dar a conhecer a história e a cultura daqueles
que os produziram, em sua dimensão singular e universal” (VALENTE, 2005, p.67). Isso
porque o processo cultural é inseparável da condição social humana; por se transformar ao
longo do tempo, é histórico; e também, por ser comum a todos, é universal. Além disso, a
cultura constitui um processo no qual os homens orientam e dão significado às suas ações por
meio da manipulação simbólica: “Desse modo, a análise de fenômenos culturais é a análise do
processo de reorganização desses significados, ao mesmo tempo condição e produto da
prática social” (VALENTE, 2005, p. 67).
A autora propõe que, tendo por referência a importância que atividades preservadas pela
tradição cultural vêm assumindo como atividades econômicas, é preciso promover o
desvelamento de valor dos produtos resultantes das atividades agrícolas, não-agrícolas e das
“novas” atividades agropecuárias, localizadas em nichos específicos de mercado, produzidos
por este segmento. É, portanto, o desvelamento de valor que poderá conferir aos agricultores
familiares o diferencial em relação aos produtores empresariais.
Desse modo, as atividades não agrícolas e as novas atividades agropecuárias podem ser
pensadas a partir de outros pressupostos. Este conceito incorpora o potencial de geração de
ocupação e renda das atividades não agrícolas existentes, principalmente em pequenas
propriedades e na agricultura familiar. Estas atividades são ligadas à moradia, ao lazer e a
várias atividades industriais e de prestação de serviços.
A combinação permanente de atividades agrícolas e não agrícolas em uma mesma
família caracteriza o fenômeno da pluriatividade. Schneider (2005, p.26) acredita que a
pluriatividade, ou seja, “a combinação das múltiplas inserções ocupacionais das pessoas que
pertencem a uma mesma família”, é uma característica intrínseca ao modo de funcionamento
de unidades de trabalho da agricultura familiar. O autor afirma que a pluriatividade pressupõe
que duas ou mais atividades, sendo uma delas a agricultura, são combinadas, como uma
15
estratégia familiar, de forma a garantir a reprodução social do grupo, como também como
uma estratégia individual, dos membros ou parte dos membros que constituem a unidade
doméstica. Essa interação será mais intensa à medida que mais complexas e diversificadas
forem as relações de agricultores e ambientes social e econômico em que estiverem situados.
2.1.2. A competitividade da agricultura familiar como fator de desenvolvimento
rural
A família rural brasileira passa por desafios que vão além daqueles ligados à produção e
à busca de mercado para seus produtos. Um desses desafios é o que se forma a partir do uso e
da valorização da terra, que se impõe na medida em que novas utilidades para a área rural são
estabelecidas por habitantes tanto rurais quanto urbanos.
Uma das principais conclusões das pesquisas realizadas no âmbito do Projeto Rurbano
(GRAZIANO DA SILVA, 2001) entre os anos de 1981 e 1995, e que derruba antigos mitos
existentes sobre o mundo rural brasileiro, mostra que as áreas rurais estão sendo utilizadas
atualmente no país mais como residência do que como estabelecimento produtivo. Ou seja, o
meio rural brasileiro passou a ter novas funções, tais como propiciar lazer às famílias urbanas
nos finais de semana (por meio de chácaras, pesque-pagues, hotéis-fazenda) e moradia a um
segmento crescente da classe média e alta, bem como favorecer o desenvolvimento de
atividades de conservação da natureza e abrigar um conjunto de profissões tipicamente
urbanas, tais como a de motorista de ônibus para transporte de trabalhadores rurais,
mecânicos, contadores, secretárias, digitadores, trabalhadores domésticos e outros.
Outras conclusões do projeto são extremamente importantes e mostram a realidade de um
país cujo traço comum entre o novo e o velho rural é sua heterogeneidade, o que impede a
generalização de situações locais específicas. Dentre elas destaca-se que o novo rural
brasileiro é atualmente composto tanto pelo agronegócio, como por novos sujeitos sociais, tais
16
como: neo-rurais, que exploram novas atividades agrícolas para nichos de mercado (criação
de escargots, plantas e animais exóticos); moradores de condomínios rurais de alto padrão;
loteamentos para empregados domésticos e aposentados que não conseguem sobreviver na
cidade com os salários que recebem; agricultores familiares pluriativos e ainda milhões de
excluídos (denominados pelo autor como sem-sem), que não têm terra, nem emprego, nem
casa, nem saúde, nem educação. Um número crescente desses novos e antigos residentes nas
áreas rurais hoje es ocupado em atividades não-agrícolas, as chamadas ORNAs (ocupações
rurais não agrícolas), que inclui as atividades domésticas, como as de motoristas, serventes de
pedreiro, caseiros, prestadores de serviços diversos, e outras.
A pesquisa também verificou que as famílias agrícolas e pluriativas brasileiras ficaram
mais pobres a partir da segunda metade dos anos 1990 e a queda de sua renda per capita só
não foi maior devido aos benefícios sociais recebidos, como aposentadorias e pensões. Nas
propriedades agropecuárias pequenas e médias, a gestão está se individualizando, ficando
apenas um membro da família, geralmente o pai ou o avô, encarregado das atividades,
enquanto os demais, os filhos e netos, procuram outras formas de inserção produtiva,
geralmente fora da propriedade. Quando as atividades agropecuárias necessitam de mão-de-
obra, o trabalho é contratado fora da propriedade, mediante serviços de terceiros. Além disso,
a gestão familiar inclui agora outros negócios não agrícolas como parte de sua estratégia de
sobrevivência.
A família rural deixou de ser essencialmente agrícola. Porém, as atividades agrícolas
continuam sendo a única alternativa para parte significativa da população rural, especialmente
para aquela parcela da força de trabalho mais pobre que se torna excedente pelo progresso
tecnológico e pela reestruturação produtiva - principalmente os mais velhos - sem
qualificação profissional e sem escolaridade formal, que não encontra ocupações não
agrícolas nas quais possa se encaixar e tem, na atividade agrícola, sua única função.
17
Mas a propriedade de famílias tradicionalmente rurais é vista, ainda, como um refúgio,
quando os membros da família que trabalham em outras atividades perdem o emprego e
também como uma espécie de base territorial, acolhendo os filhos para ocasiões festivas, bem
como os parentes próximos em períodos de crises.
Nas regiões mais atrasadas do país não emprego agrícola e muito menos ocupações
não agrícolas, não havendo alternativa para suas populações além de políticas compensatórias
de renda mínima, como, por exemplo, a previdência social. Nessas regiões, também uma
“retomada da produção de subsistência”, financiada principalmente pelas transferências
sociais de rendas, principalmente a aposentadoria rural e pelo trabalho das mulheres dos
agricultores como empregadas domésticas nas cidades (GRAZIANO DA SILVA, 2001).
O autor afirma que o enfoque do desenvolvimento local pressupõe que haja um mínimo
de organização social e a falta desse tipo de organização, especialmente da sociedade civil,
tem se caracterizado como uma barreira tão ou mais forte que a miséria das populações rurais.
Além disso, para ele, as restrições quanto às formas de participação e representação têm seu
princípio não na pouca mobilização, mas também nos impedimentos e vieses operacionais
vinculados às estruturas institucionais vigentes em nível local e à dominação das decisões
pelos grupos mais fortes. O autor acredita que os trabalhos realizados no âmbito do Projeto
Rurbano mostram que a busca do desenvolvimento da agricultura mediante uma abordagem
eminentemente setorial não é suficiente para levar ao desenvolvimento de uma região.
O novo enfoque do desenvolvimento local sustentável tem o inegável mérito
de permitir a superação das arcaicas dicotomias urbano/rural e
agrícola/não agrícola. Como sabemos hoje, o rural, longe de ser apenas um
espaço diferenciado pela relação com a terra - e mais amplamente com a
natureza e o meio ambiente - está profundamente relacionado ao urbano que
lhe é contíguo (GRAZIANO DA SILVA, 2001, p.46)
A baixa capacidade de mobilização social e a escassa tradição associativista são, também
para Navarro (2001), condições para a falta de preparo dos atores locais para o desempenho
18
de ações comunitárias. O autor explica que, por esse motivo, pertence ao campo da ideologia
a proposição que insiste na necessidade da organização social como exigência,
principalmente política, para que sejam possíveis tais mudanças. Acredita que existem, no
Brasil, limites e entraves que, “se secundarizados, provavelmente condenariam ex-ante
qualquer iniciativa no sentido do desenvolvimento rural” (NAVARRO, 2001, p.91). Para ele,
a abertura comercial e o acirramento concorrencial derivado da globalização têm significado o
encurralamento das opções para o mundo rural, tendo, como resultado, a redução da
autonomia dos Estados nacionais para erigir programas de desenvolvimento rural. O autor cita
a extrema heterogeneidade das atividades agrícolas e rurais que existe no Brasil como o
primeiro desses limites. As regiões brasileiras que sofreram forte intensificação econômica e
dinamismo tecnológico fazem oposição a outras que parecem, ainda, “dormitar em contextos
do passado”, pela falta de integração econômica ou pela natureza das relações sociais e
políticas, que permanecem distantes dos padrões de institucionalidade satisfatórios
(NAVARRO, 2001, p. 91).
Conforme o autor, a solução para tais limites poderia ser a formação de uma coalizão
entre forças sociais e distintas orientações políticas em uma aliança pelo desenvolvimento
rural que inclua, não apenas os setores populares, mas também a maioria do empresariado
agrícola e certamente a totalidade de seu setor mais modernizado. Portanto, para ele, o alcance
do desenvolvimento rural no Brasil não se restringe apenas às famílias rurais. Nele são
envolvidos todos os atores comunitários, políticos, institucionais, municipais, e outros capazes
de promover as transformações necessárias às mudanças nas diversas esferas da vida social
que têm por limite mais imediato a realização do município.
Esse conceito de desenvolvimento rural, conforme o autor, altera-se ao longo do tempo,
influenciado pelos condicionantes que o desenvolvimento geral da economia e da vida social
impõem às famílias e às atividades rurais. Outras preocupações são impostas a esse conceito,
19
como a relativa ao componente sustentável (política, social, institucional), principalmente à
sustentabilidade ambiental, que inclui ao conceito de desenvolvimento a preocupação com as
gerações futuras e a preservação do meio ambiente. Ancorado numa estratégia assentada na
prioridade ambiental e nas crescentes inovações da gestão pública, onde os municípios têm
participação importante, o processo de desenvolvimento rural no Brasil será conduzido por
um processo de mudanças que deverá ser múltiplo, interdependente, cumulativo e
diversificado, em planos territoriais e sociais variados.
Para Singer (2004), como conseqüência do nível de exclusão em que se encontram
algumas comunidades pobres que vivem em economia de subsistência, o desenvolvimento
comunitário tem que ser financiado com juros subsidiados e longos períodos de carência.
Além disso, o custo da assistência ao crédito deve ser coberto por recursos públicos, a fundo
perdido, pelo menos nas etapas iniciais do desenvolvimento. O autor define desenvolvimento
comunitário como aquele em que todos os membros de uma comunidade desenvolvem-se
conjuntamente, unidos pela ajuda mútua e pela posse coletiva de certos meios essenciais de
produção ou distribuição (SINGER, 2004). Afirma, ainda, que o desenvolvimento exige que a
comunidade encontre uma brecha de mercado que permita que seus membros produzam algo
que lhes proporcione boa remuneração. Para o autor, essa brecha pode ser criada mediante:
1. acentuada melhora da qualidade de produtos tradicionais, 2. invenção de
produtos novos ou seminovos, 3. detecção de demanda nova ou em forte
expansão por algo que a comunidade pode vir a produzir ou ainda 4. a
aplicação de processos de produtividade mais elevada em atividades antigas
(para poder vender os seus produtos mais barato) (SINGER, 2004, p. 3).
O autor, porém, acredita que o processo de desenvolvimento requer um relacionamento
simbiótico da comunidade com o que ele denominou os agentes de desenvolvimento,
representados por bancos e serviços públicos, agências solidárias de fomento da economia,
que podem estar ligadas às igrejas, aos sindicatos, às universidades ou aos movimentos
sociais. A missão desses agentes é levar à parte da comunidade mais esclarecida ou mais
20
inconformada com a situação - que irá levar ao conjunto da comunidade - a consciência de
que o desenvolvimento é possível a partir do esforço conjunto da comunidade e se amparado
por crédito assistido e acompanhamento sistemático.
A participação do agente de desenvolvimento pode ser essencial na busca da brecha de
mercado, a partir do momento em que ele possua ou faça o levantamento das informações
relevantes sobre os mercados - locais, regionais, nacionais ou internacionais - possíveis de
inserção pela comunidade. Isso porque, segundo Singer (2004), o pequeno tamanho da
comunidade pobre e seu relativo isolamento fragilizam suas possibilidades de se desenvolver
por meio próprio. Por isso, defende que, para que as comunidades tenham maior autonomia, o
desenvolvimento comunitário deve ser deixado para a iniciativa das autoridades municipais e
estaduais, com menor apoio dos órgãos da União.
Para Wilkinson (2000), por razões diferentes, todas as correntes convergem para a
necessidade de estratégias e políticas que visam o desenvolvimento do espaço rural com a
diversificação e a densificação dos mercados de trabalho e de produtos resultantes do meio
rural. Porém, para ele, é possível que o modelo produtivista dominante seja reversível. Por
exemplo, quando as famílias tradicionais rurais contestam os novos mercados de nicho ou
quando a agricultura familiar se torna revalorizada por meio da incorporação de novas
funções ligadas ao meio ambiente, lazer e o consumo cultural do espaço rural.
O autor levanta três questões relacionadas às análises e propostas políticas desenvolvidas
nos estudos sobre o rural não-agrícola e a pluriatividade no Brasil a partir dos estudos
realizados no âmbito do Projeto Rurbano. Em primeiro lugar, a separação da agricultura e
agroindústria em distintos tipos de ocupação muitas vezes não corresponde à realidade no
país. As atividades agroindustriais rurais, onde o produtor processa seu próprio produto
agrícola, é uma estratégia de agregação de valor que abre novas oportunidades por meio do
fortalecimento da agroindustrialização integrada à atividade agrícola. Além disso, a
21
valorização de produtos estabelecidos nas embalagens como naturais age também no mesmo
sentido, promovendo uma agroindustrialização light (preparação e embalagem de produtos)
que é integrada à atividade agrícola.
Em segundo lugar, o autor acredita que os novos mercados de nicho não precisam ser
ocupados prioritariamente pelos neo-rurais. Para ele, nesses novos mercados, a barreira
mercadológica parece mais forte que a tecnológica, o que favorece os neo-ruralistas. Para que
os produtores tradicionais que agora estão excluídos dos mercados de commodities possam
ocupar esses novos espaços de mercado é preciso que haja recursos dirigidos à reconversão
desses atores. Além disso, é preciso que eles sejam acompanhados por programas de
capacitação, nas áreas críticas de mercados, tecnologia e gestão.
Em terceiro lugar, o autor cita a nova valorização do mercado por aqueles produtos que
usam menos insumos químicos, produtos orgânicos e não transgênicos, que colocam em
questão o futuro do modelo produtivista. Essas tendências criam um ambiente propício à
revalorização da agricultura familiar, sobretudo se acrescentarmos as preocupações em torno
do meio ambiente. No setor agroindustrial, muitas oportunidades são abertas para a inserção
dos produtos coloniais ou sertanejos nos novos mercados onde a qualidade é fortemente
associada à produção em forma artesanal e à atividade familiar. Uma conjunção de fatores que
aponta para o potencial de promover a multifuncionalidade da propriedade agrícola, que
complementa a pluriatividade do produtor rural e cujo eixo natural é a agricultura familiar
(WILKINSON, 2000).
2.2. MEMÓRIA COLETIVA E TRADIÇÃO
No momento em que o mercado volta a valorizar a produção agrícola tradicional, com
reduzida aplicação de insumos, bem como o consumo in natura dos alimentos, ou seja,
22
produtos menos processados e industrializados, resgatam-se informações que durante várias
gerações ficaram guardadas. As informações do saber fazer podem estar contidas no trato da
planta e dos animais, no cultivo de ervas medicinais, no manuseio de produtos naturais, na
elaboração de artesanatos e de todo conhecimento tradicional tão comum no interior do país.
Essas informações haviam sido descartadas pelos paradigmas da Revolução Verde, que eram
alicerçados no uso intensivo de tecnologias e defensivos agrícolas.
Conforme Coutinho (2005), a compreensão da cultura como tradição viva, no Brasil, é
uma tendência marginal e minoritária, predominando a concepção metafísica da tradição, que
tem como objetivo conservar as relações sociais vigentes. Ou seja, na concepção cultural
brasileira, “a cultura é pensada como um objeto, uma peça de coleção ou uma mercadoria,
desconsiderando o processo pelo qual o homem por meio de sua praxis
4
criadora transforma
ativamente a realidade cultural” (COUTINHO, 2005, p. 88).
A própria palavra tradição, conforme Coutinho (2005), deriva do latim traditio, do verbo
tradere, que significa a ação de transmitir, entregar. Para Giddens (1997), a tradição, é a
repetição de informações, atos e atitudes e pressupõe uma verdade que é a antítese da
indagação racional. Tomando-se como pressuposto de que a sociedade moderna,
especialmente a chamada sociedade ocidental, tornou-se destradicionalizada, o autor afirma
que a forma de saber se isso aconteceu é olhar para formas específicas de rituais e símbolos e
considerar até que ponto eles compõem tradições. Para o autor, em muitos aspectos de nossas
vidas ocorrem transições importantes na vida cotidiana, tanto individual quanto coletiva,
devido à preocupação de se construir, regularmente, futuros potenciais, mesmo sabendo que
essa construção pode, na verdade, impedir que eles venham a acontecer.
4
A teoria da práxis, para Gramsci, resulta da tese segundo a qual o desenvolvimento histórico se caracterizará,
em determinado ponto, pela passagem do reino da necessidade ao reino da liberdade. É uma filosofia que busca
liberar-se de qualquer elemento ideológico unilateral e fanático. É uma expressão das contradições históricas a
partir da consciência plena dessas contradições (GRAMSCI, 2001).
23
De qualquer maneira, as tradições podem ser inventadas (HOBSBAWM, 2006) e se
transformam ao longo do tempo (VALENTE, 1999). A tradição inventada tenta, sempre que
possível, estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado (HOBSBAWM,
2006), e pode ser entendida como um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras
de natureza ritual ou simbólica, aceitas pelo grupo, que visam sugerir certos valores e normas
de comportamento a partir da repetição, implicando uma continuidade em relação ao passado.
Isso explica a utilização do recurso da invenção das tradições pelos países da Europa entre os
anos de 1870 e 1914 para assegurar aos Estados a continuidade entre o passado e o presente
da sociedade, no momento em que o mundo moderno estava destruindo os velhos padrões
sociais (COUTINHO, 2005).
Hobsbawm (2006) afirma que, na medida em que as práticas passam a ser um hábito, a
partir da repetição, resgata-se um passado histórico ao qual tais práticas fazem referência. O
autor acredita que a invenção das tradições é importante:
[...] quando uma transformação rápida da sociedade debilita ou destrói os
padrões sociais para os quais as velhas tradições foram feitas, produzindo
novos padrões com os quais essas tradições são incompatíveis; quando as
velhas tradições, juntamente com seus promotores e divulgadores
institucionais, dão mostras de haver perdido grande parte da capacidade de
adaptação e flexibilidade; ou quando são eliminadas de outras formas
(HOBSBAWM, 2006, p.12).
Coutinho (2005), ao afirmar que podemos falar em tradições hegemônicas - que
reafirmam a visão de mundo das camadas dominantes - e em tradições contra-hegemônicas -
que reconstroem a história pela perspectiva das classes subalternas; afirma que a tarefa das
massas, em sua luta pela hegemonia política e ideológica, é a de combater o mosaico de
tradições conservadoras presentes no senso comum e definir sua própria filosofia. E completa
que, cabe aos intelectuais a formação intelectual e moral do povo, desenvolvendo, com base
na própria tradição, a concepção de mundo das classes subalternas.
24
Com isso, o autor acredita que será possível elaborar uma visão crítica do mundo com
base no conhecimento das massas. E é na tradição que se encontra esse processo de superação
dialética do patrimônio histórico-cultural, processo de desenvolvimento que elimina, conserva
e eleva a sabedoria popular a um nível superior. Porém, para ele, existe uma diferença
fundamental entre a cultura popular, que constitui a concepção do mundo e da vida de
determinados estratos da sociedade, e a cultura dominante no que diz respeito à elaboração e à
sistematização do conhecimento. “Esta última tende à unidade, à organização e à coerência,
ao passo que aquela é desagregada, contraditória, anacrônica, ideologicamente servil e
caoticamente estratificada” (COUTINHO, 2005, p. 96).
Tais enunciações vão ao encontro do habitus, de Bourdieu (1987), que é o que predispõe
os indivíduos a fazerem determinadas escolhas (SEYMOUR, 2005) que, conforme as
definições de Bourdieu, o habitus seria
[...] um conjunto de esquemas implantados desde a primeira educação
familiar, e constantemente repostos e reatualizados ao longo da trajetória
social restante, que demarcam os limites à consciência possível de ser
mobilizada pelos grupos e/ou classes, sendo assim responsáveis, em última
instância, pelo campo de sentido em que operam as relações de força
(MICELI, 1987, p. XLII).
A memória e a tradição dizem respeito à organização do passado em relação ao presente.
Mas não um passado preservado, e sim continuamente reconstruído, tendo como base o
presente. Para Giddens (1997), a modernidade, durante a maior parte da sua história,
reconstruiu a tradição enquanto a dissolvia. E a tradição está ligada ao que Maurice
Halbwachs denomina memória coletiva, que envolve ritual, possui guardiões e, ao contrário
do costume, tem força de união que combina conteúdo moral e emocional. A tradição é um
meio organizador da memória coletiva. “Desse modo, a memória é um processo ativo, social,
que não pode ser apenas identificado com a lembrança” (GIDDENS, 1997, p. 81).
25
Essa memória, para Halbwachs (1990), não se confunde com a história, que para a
compilação dos fatos históricos os acontecimentos passados são escolhidos entre os fatos que
ocupam maior espaço na memória dos homens. “É porque geralmente a história começa
somente no ponto onde acaba a tradição, momento em que se apaga ou se decompõe a
memória social” (HALBWACHS, 1990, p. 80). A história relata períodos e sociedades
muito distantes no passado, no momento em que não se encontram mais muitas testemunhas
que conservem alguma lembrança e quando a memória não tem mais por suporte um grupo,
que a ela esteve engajada, e, portanto, capaz de dar um relato vivo sobre os acontecimentos. A
história é, com isso, o único meio de salvar as lembranças dispersas em alguns “espíritos
individuais”, fixando-as por escrito, uma vez que as palavras e os pensamentos morrem, mas
os escritos permanecem.
A memória coletiva, conforme Halbwachs (1990), distingue-se da história por ser uma
corrente de pensamento contínuo, que retém do passado somente aquilo que ainda está vivo,
ou que é capaz de viver na consciência do grupo que a mantém. E é difícil dizer em que
momento uma lembrança coletiva desapareceu, e se, realmente ela em algum momento
deixou a consciência do grupo, que basta que uma parte do corpo social conserve essa
lembrança, para ela estar sempre presente ali.
Outra característica que distingue a memória coletiva da história é que apenas uma
história e existem muitas memórias coletivas. A história dispõe os acontecimentos em ordem
cronológica e espacial, em quadros que permanecem exteriores aos grupos. A memória
coletiva, ao contrário, é o grupo visto de dentro, durante um período que não ultrapassa a
duração média de uma vida humana, em um determinado espaço e onde o indivíduo se
reconhece sempre dentro dessas imagens sucessivas. As memórias coletivas são os centros
das tradições (HALBWACHS, 1990).
26
Os rituais, conforme Giddens (1997), conectam o passado com as ações do presente e é
pela continuidade da prática, organizada nos rituais, que os povos percebem a diferença entre
realidade cotidiana e fantasia, ou os devaneios. Os rituais são guardados e reconstituídos pelos
guardiães, que geralmente são pessoas mais idosas e que assim o são não apenas porque
participaram de muitas das formulações dessas tradições, mas também porque têm tempo
disponível para identificar os detalhes contidos.
Os guardiães, sejam eles idosos, curandeiros, mágicos ou funcionários
religiosos têm muita importância dentro da tradição, porque se acredita que
eles são os agentes, ou os mediadores essenciais, de seus poderes causais.
Lidam com os mistérios, mas suas habilidades de arcanos provêm mais do
seu envolvimento com o poder causal da tradição que do seu domínio de
qualquer segredo ou conhecimento esotérico (GIDDENS, 1997, p.83).
2.2.1. Tradições e qualificação de produtos
A emergência do tema qualidade no contexto da competitividade do mercado globalizado
tem levado estudiosos das ciências sociais, entre eles economistas, a debater sobre novos
padrões, modelos, regras e conceitos que possam contribuir para a explicação desse
fenômeno. A economia da qualidade agroalimentar busca utilizar conceitos da economia e das
ciências sociais para a compreensão desse processo. Porém, a qualidade é subjetiva e está
sujeita a mudanças no tempo (SATO; BRITO, 2007) e no julgamento de valor dos
consumidores. Por isso, a economia neoclássica torna-se limitada para considerar a qualidade
do produto, bem como a crescente assimetria da informação existente no mercado globalizado
que enfraquece o papel dos consumidores
5
.
5
Como exemplo da assimetria de informação no mercado agroalimentar podemos citar o fato ocorrido no início
de novembro de 2007, no mercado brasileiro, quando os industriais de leite longa vida foram flagrados
adicionando produtos químicos, como soda cáustica e água oxigenada, ao leite destinado ao mercado interno. O
produto foi, por muito tempo, repassado aos consumidores - e, portanto, consumido por eles - que se sentiram
reféns dessa manobra, realizada para prolongar o período em que o produto seria próprio para o consumo e,
portanto, aumentar a permanência do leite no mercado.
27
Conforme os autores, na economia da qualidade, a abordagem neoclássica não pode mais
ser a única considerada, ao se realizar a análise do mercado, baseando-se unicamente no
mecanismo de preço, que o preço baixo pode ser considerado como baixa qualidade.
Apesar de as inovações tecnológicas e a produção em escala terem contribuído para a redução
do preço dos produtos agroalimentares, os consumidores estão mais preocupados com a
sanidade dos produtos, a produção com proteção do meio ambiente e com o compromisso
social, estando, inclusive, dispostos a pagar mais por isso.
A Escola Francesa da Economia da Qualidade substituiu a abordagem econômico-
tecnológica por uma perspectiva mais ampla, que considera a qualidade como uma construção
social (SATO; BRITO, 2007). Nessa perspectiva, a qualidade é considerada uma construção
social que precisa de cooperação e coordenação, refletindo os objetivos de todos os atores,
sociais, políticos ou econômicos, que participam do processo. A informação sobre todo o
processo de produção do produto agropecuário passa a ser importante na construção de uma
marca, desde o trabalho de construção da própria marca até os atributos do produto que será
lançado no mercado.
Thévenot (1995) faz uma avaliação sobre a importância da informação para a
coordenação das atividades quando se busca a qualidade de bens e serviços. Para ele, ao se
determinar as regras e normas relativas a uma forma de avaliação, os indicadores utilizados
para discriminar a informação referem-se a um julgamento de valor. Nem todos os
indicadores perceptíveis se inscrevem numa avaliação. Porém, o autor afirma que “é
impossível não ver, no estudo das marcas, normas ou marcas especiais (labels), todo o
trabalho anterior à constituição de referências comuns que autorizarão a falar de
informação (THÉVENOT, 1995, p.35, tradução nossa). Entre essas referências pode-se
considerar a origem, a forma de produção e os autores sociais que participam desse processo.
Com isso, a característica da produção tradicional pode ser considerada um atributo de
28
qualidade do produto, por meio da construção social do mercado. Para o autor, a pertinência
das informações e o caráter avaliativo de um processo de avaliação dependem da coordenação
das ações que participam desse processo, a partir do valor que é dado a cada informação. A
informação relativa ao preço é uma evidência, porém outros valores são buscados em termos
de notoriedade da opinião, como a confiabilidade técnica ou de reputação. Informações como,
por exemplo, produto manufaturado ou produto natural estampadas nas embalagens dos
produtos podem transmitir ao consumidor uma relação de proximidade com o produto.
A questão da posse das informações é também tratada por Valceschini e Nicolas (1995),
quando afirmam que o controle da qualidade é um problema de cooperação entre os
intervenientes, no qual cada um possui apenas uma parte das informações das competências
ou das capacidades de ações necessárias. Para eles, não se trata apenas de garantir um nível de
segurança, nem de criar os conhecimentos científicos e técnicos necessários à elaboração
dessa informação e de comunicá-la aos consumidores, mas de elaborar e de comunicar uma
informação completa sobre o estado do produto a fim de colocar o consumidor em posição de
escolher individualmente em função de suas representações pessoais, da natureza, da saúde e
de seus gostos.
Para promover a divulgação do produto, como estratégia de marketing, conforme
Thévenot (1995), a diferenciação é um modo de contornar a coordenação pelo preço, evitando
a pressão sobre os preços exercidos pela concorrência de produtos de qualidades idênticas.
Com isso, o que se estabelece não é um processo de divulgação que privilegia a concorrência
pelo mercado, mas é a opinião que está em jogo, na qual o valor é uma notoriedade e cujo
suporte não é um bem apropriável mas um signo reconhecível. É verdade que, em vista de
uma coordenação pela opinião e o exame de notoriedade que a caracteriza, todas as outras
grandezas podem ser utilizadas estrategicamente, como quando os especialistas de marketing
recobrem seu produto de aparência de tradição.
29
2.3. A TERRITORIALIDADE
A ruralidade é condição e característica associada a territórios, que tem em
essência uma construção de ordem histórica e social, como processos
prolongados de formação de sociedades e organizações territoriais. Nesses
territórios, arraigam-se a história, a tradição e a cultura da maior parte dos
povoadores da América Latina e do Caribe e é nessa história e nesse
processo onde se encontram os elementos constitutivos da concepção de
ruralidade associada a território (PERICO; RIBEIRO, 2005, p.31).
Com essa perspectiva territorial, descrita em publicação elaborada pelo Instituto
Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) no Brasil
6
, os autores acreditam que
o território emerge como categoria privilegiada para sintetizar muitos dos elementos que
constituem as novas estratégias de desenvolvimento rural, sendo, por isso, necessário redobrar
os esforços para incorporar o critério espacial na definição de políticas públicas.
Porém, o espaço físico se torna território quando é modificado, na perspectiva de
Lefebvre (2000), ou seja, ao ser transformado pelas redes, circuitos e fluxos que nele se
instalam, como por exemplo as malhas viárias, os circuitos comerciais e bancários, os canais,
as rotas aéreas (RAFESTIN, 1993). A partir dessa idéia, o território pode ser considerado um
espaço onde se projetou um trabalho, seja energia e informação e que, por conseqüência,
revela relações marcadas pelo poder. A territorialidade, para o autor, reflete:
[...] a multidimensionalidade do vivido territorial pelos membros de uma
coletividade, pelas sociedades em geral. Os homens “vivem”, ao mesmo
tempo, o processo territorial e o produto territorial por intermédio de um
sistema de relações existenciais e/ou produtivistas. Quer se trate de relações
existenciais ou produtivistas, todas são relações de poder, visto que
interação entre os atores que procuram modificar tanto as relações com a
natureza como as relações sociais (RAFESTIN, 1993, p. 158).
6
A publicação, lançada em 2005 pelo IICA no Brasil, visa, por meio de propostas metodológicas, dar às
instâncias locais e regionais dos países da América Latina e do Caribe, instrumentos para o planejamento
estratégico de processos de desenvolvimento local sustentável, buscando a revalorização do rural ao lançar
estratégias interventivas de combate à pobreza, bem como às conseqüências oriundas da exclusão social
generalizada.
30
Nesse pressuposto, qualquer estudo realizado a partir de uma perspectiva territorial
coloca as relações de poder territorial como conseqüência das relações de produção. Rafestin
(1993, p. 152) demonstra que “do Estado ao indivíduo, passando por todas as organizações
pequenas ou grandes, encontram-se atores sintagmáticos que produzem o território” (grifo do
autor).
Abramovay (2002) acrescenta que novas formas de relação entre o homem e o território
vão surgindo, aumentando a dimensão do espaço rural e interferindo diretamente nos seus
modos de uso. Hoje, as necessidades da produção agrícola são apenas um componente, e cada
vez menos importante, na utilização do espaço. Com isso, as unidades produtivas
multifuncionais e polivalentes, que até cerca de vinte anos atrás eram consideradas marginais,
passam a ter um papel cada vez mais importante nesse processo.
2.3.1. Espaço rural revalorizado
O Brasil passou, a partir dos anos 1980, por grandes transformações nas relações
rural/urbano. O êxodo rural ocasionado pela Revolução Verde impulsionou uma massa de
trabalhadores para as grandes cidades, acarretando, também, mudanças nas relações de
produção no meio rural. A crise do modelo vigente ocorreu, conforme Vilela (2002),
paralelamente a um processo de desestruturação/reestruturação do meio rural, onde as
atividades rurais mais tradicionais têm sua importância econômica reduzida, dando lugar a
outras atividades, que são criadas ou recriadas com um vigor socioeconômico expressivo em
relação, inclusive, às atividades não-agrícolas.
Para o autor, o atendimento à demanda urbana passa a reestruturar o meio rural em
contextos sóciopolíticos particulares, produzindo oportunidades de mercado altamente
diferenciadas para vários grupos de renda. Esses mercados incluem uma ampla extensão de
bens localizados - residência, atividades de lazer, áreas de conservação, entre outras - para
31
atender, em grande parte, à classe média sufocada com o modo de vida urbano
contemporâneo. Com isso, uma grande diversidade de atores novos e velhos passa a competir
por recursos nesse ambiente rural,
[...] no qual a agricultura poderá tornar-se crescentemente residual, ainda que
os agricultores mantenham uma presença social e ideológica representativas
do rural e de seu caráter territorial. O espaço rural passa, assim, a ser palco
do surgimento de novas categorias socioprofissionais, dotadas de
experiências as mais diversas, em busca de um lugar em um velho/novo
espaço revalorizado (VILELA, 2002, p. 99).
Esse novo espaço revalorizado, que são os territórios brasileiros, segundo Sabourin;
Teixeira (2002), desponta como o elemento central do desenvolvimento rural, por terem como
principal especificidade a sua diversidade, resultante de construções e evoluções históricas,
econômicas, culturais e sociais. Definido o território como “um espaço geográfico construído
socialmente, marcado culturalmente e delimitado institucionalmente” (SABOURIN;
TEIXEIRA, 2002, p. 23), as ações voltadas para seu planejamento e desenvolvimento devem
traduzir as aspirações das populações locais. Ao mesmo tempo, resultam de um processo
desejado, partilhado, produtor de riquezas e redistributivo, a partir do estabelecimento de
parcerias entre os atores públicos, privados, nacionais, regionais ou locais envolvidos. Por
essa razão, “o planejamento e o desenvolvimento dos territórios rurais passam a exprimir as
dimensões de fenômenos local, regional, nacional e internacional” (SABOURIN; TEIXEIRA,
2002, p. 8). Nesse processo, porém, a mediação entre os interesses individuais e coletivos é
dificultada pela globalização das atividades econômicas, bem como a definição de objetivos,
o estabelecimento de metas de curto e longo prazos e a valorização da especificidade local.
As relações territoriais hoje estão marcadas, conforme explicado por Vilela (2002), pela
influência que a globalização exerce no local, bem como a importância do local diante da
globalização. Essa influência da globalização no local também é lembrada por Schneider
(2003b, p.90), quando afirma que “o quadro atual é profundamente marcado por um processo
32
de ampliação da interdependência nas relações sociais e econômicas em escala internacional”,
e cita Castells (1999) que indica a influência exercida pela globalização como característica
da excepcional capacidade que a economia capitalista tem de ajustar, em escala planetária, a
interdependência entre as condições de tempo e espaço no processo global de produção de
mercadorias.
Nesse contexto, Perico; Ribeiro (2005) propõem a existência de uma nova ruralidade,
que contém nela inserida a redefinição do rural, e convidam a reconsiderar a visão de que o
rural é população dispersa, baseada apenas na produção agropecuária, para passar à
reconstrução do objeto de trabalho e de política, ao definir o âmbito rural como “território
construído a partir do uso e da apropriação dos recursos naturais, de onde são gerados
processos produtivos, culturais, sociais e políticos” (PERICO; RIBEIRO, 2005, p.19). Desta
forma, por sua potencialidade como território, o setor rural passa a ser estratégico no
desenvolvimento integral e harmônico da região. Além disso, a formação de capital social, de
institucionalidade e de capital político encontra, nos territórios rurais, oportunidade favorável,
a partir do fortalecimento das culturas tradicionais, de suas comunidades e de suas próprias
formas de organização.
Veiga (2006, p. 334) propõe o reconhecimento de uma ruralidade que “não está
renascendo, e sim nascendo”. Para ele, a valorização dos espaços rurais que está ocorrendo
nos dias atuais, especialmente nos países desenvolvidos, é um fenômeno novo, que muito
pouco tem a ver com “as relações que essas sociedades mantiveram no passado com tais
territórios”, que nunca houve sociedades tão opulentas e nem tanta valorização da sua
relação com a natureza.
Essa valorização, segundo o autor, resulta do reconhecimento da importância das áreas
rurais para a qualidade de vida e o bem-estar da humanidade globalizada, por conter nelas três
vetores: a conservação do patrimônio natural e da biodiversidade; o aproveitamento
33
econômico das amenidades naturais pelo turismo; e a exploração de fontes alternativas e
renováveis de energia. Isso faz com que o rural remoto ou profundo, ou seja, aquele que ainda
não foi modificado ou destruído pela “milenar agressão das atividades humanas” (VEIGA,
2006, p. 337) deva ser cada vez mais conservado, mesmo admitindo-se a existência, no
território, de atividades econômicas de baixo impacto. Por outro lado, faz com que ocorram
inéditas combinações socioeconômicas no território rural que está mais próximo ou acessível.
O autor faz uma análise da situação italiana, que afirma que na Itália são fartas as
evidências de como esses vetores se manifestam em progressos na direção da diversidade
biológica e cultural, do aproveitamento econômico das amenidades e das fontes renováveis de
energia. E cita autores italianos, como Umberto Bonapace (2001), que, propôs a permanência
de duas grandes heranças para o presente e para o futuro na ruralidade do país: a primeira de
ordem física, o espaço, e a segunda de ordem cultural, o patrimônio das tradições.
Corrado Barberis (2001), outro autor italiano citado por Veiga (2006), afirma que essa
nova ruralidade tem sua expressão mais colorida nas festividades ligadas à figura do(a)
santo(a) padroeiro(a) e na “divindade gastronômica do lugar” (il raviolo o la bruschetta, il
pecorino o il cinghiale). Veiga (2006, p. 336) acrescenta que tais manifestações
são marcadas por forte sentido de pertencimento, destinado a sustentar os
pequenos mercados locais que se apóiam nesse ou naquele produto típico.
Uma consideração de muita importância, tanto para o turismo quanto para a
agricultura.
Porém, para Veiga, esse fenômeno da nova ruralidade, exemplificada pela experiência
italiana, pode existir em situações específicas, onde haja grande prosperidade
socioeconômica - capaz de aflorar as qualidades singulares dessa ruralidade - tornando
possível impulsionar simultaneamente os três vetores: da conservação da biodiversidade, do
aproveitamento econômico das belezas naturais, por meio do turismo, e a alteração da matriz
34
energética, mediante o aumento de suas fontes renováveis. “Por isso, ela deve ser considerada
nova, em vez de renascente” (VEIGA, 2006, p. 348).
Considerando-se, como Favareto (2007, p.103), “a diferença entre o rural e o urbano nos
países do capitalismo avançado e nos países da América Latina, Ásia e África”, nos quais a
urbanização se deu como fator de subdesenvolvimento, seria possível pensar que a ruralidade
se expressará de maneira específica. Entretanto, com relação ao caso brasileiro, Veiga (2003)
acredita que ainda falta ao país a elaboração de um plano estratégico de desenvolvimento
sustentável do Brasil rural que contenha diretrizes, objetivos e metas que favoreçam as
sinergias entre a agricultura e os outros setores das economias locais, de forma a explorar as
vantagens comparativas e competitivas desses territórios. Enfim, o autor acredita que o
desenvolvimento regional passa pelo equilíbrio entre o fortalecimento da capacidade
concorrencial do território e a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes, o que é
alcançado a partir da criação de novas formas de parceria entre os atores envolvidos, sejam
eles públicos, privados, nacionais, regionais ou locais (VEIGA, 2003, p.285).
Espírito Santo et al. (2003), acreditam que a valorização do território é importante
estratégia para diferenciar a produção familiar e agregar renda à atividade. Para os autores,
[...] os produtos típicos da agricultura familiar são o resultado de um saber-
fazer tradicional, transmitido de geração em geração. A qualidade desses
produtos típicos resulta de uma estreita relação entre o saber-fazer (o
homem) e as características das distintas zonas agroclimáticas existentes no
território nacional (o território), que proporcionam sabores, cores e aromas
únicos (ESPÍRITO SANTO et al., 2003).
2.3.2. Exemplos estrangeiros
A valorização do território ou da região de produção e o uso de organizações de ensino e
pesquisa para consultoria e treinamento dos produtores são estratégias utilizadas em países
35
europeus para o desenvolvimento da agricultura familiar que devem ser seguidas no Brasil
(DINIZ, 2004).
Entre os exemplos extraídos de países da Comunidade Européia (CE) e, em especial, a
França, país que possui um número muito grande de pequenos produtores, bem como uma
demanda dos consumidores por produtos que atendam às preferências e os recursos locais, as
estratégias que mais se destacaram foram:
o estabelecimento de um grupo, por meio de associação de produtores,
cooperativa, ou outra forma de organização., é importante para garantir o
fortalecimento e a permanência dos produtores no mercado;
a cooperação entre os produtores é uma solução para enfrentar grandes
concorrentes, normalmente mais produtivos e competitivos;
criar uma estratégia de melhoria nos níveis de qualidade, custos e serviços aos
clientes;
definir regras coletivas e padrões de qualidade de produtos e serviços para
serem seguidos por todos os produtores participantes do grupo, bem como o
monitoramento e controle desses produtos e serviços, mediante indicadores de
desempenho e sanções a serem exigidas àqueles que se desviarem dos padrões
definidos;
agrupar os produtores não apenas para reunir em uma estratégia de
comercialização, mas também buscando agrupar diferentes padrões de
qualidade, valorizando, assim, sua origem;
o empreendorismo de certos membros de uma cooperativa ou associação de
produtores é um dos pontos fundamentais para o sucesso do grupo;
36
não basta apenas utilizar os conhecimentos locais para permanecer no
mercado, buscando competências que possam ‘reciclar’ técnicas e estratégias
já utilizadas em outras experiências;
partir dos produtores a continuidade dos incentivos para o desenvolvimento
da agricultura familiar, buscando a sustentabilidade da atividade por meio da
autogestão eficiente do grupo.
A autora cita, porém, a facilidade com que os países desenvolvidos investem em pesquisa
para solucionar problemas da sociedade, o que não ocorre na realidade brasileira. Além disso,
um dos desafios, para ela, ao se promover a agricultura familiar, “é o de ensinar aos
produtores não somente as técnicas de produção e de comercialização, como também a
influência das suas atividades no seu meio, com conseqüências sociais, econômicas e
ambientais” (DINIZ, 2004, p.93).
Outro desafio a ser enfrentado é que o Estado e as sociedades, conforme Favareto (2007),
têm dificuldade em operar com a mudança de paradigma contida na nova ruralidade. Por isso,
as regras do jogo continuam fortemente orientadas pelo viés setorial, na formulação de
políticas, e na mobilização dos atores. Isso acontece embora o discurso sobre
desenvolvimento territorial tenha, nos últimos anos, entrado definitivamente para o discurso
acadêmico e governamental de vários países. Porém, até o momento, essa incorporação dos
novos temas es sendo feita, conforme o autor, por adição, sem a devida mudança
institucional capaz de sustentar a inovação que ela deveria significar. Neste caso, “sob nova
roupagem, velhos valores e práticas continuam a dar os parâmetros para a atuação dos agentes
sociais, coletivos e individuais” (FAVARETO; SCHRODER, 2007, p. 28). Os autores
explicam que essa prática não é mais possível, já que os processos sociais subjacentes ao que
a literatura convencionou chamar nova ruralidade trouxeram a erosão das bases empíricas que
37
estavam na raiz do paradigma clássico de explicação do desenvolvimento rural, antes reduzida
à dimensão setorial dos seus aspectos agrícolas e agrários.
Martins (2005) acredita que não padrões ou modelos próprios para o desenvolvimento
local, ou seja, ele deve ser construído com base nas demandas e características locais. Com
relação aos programas agroambientais implantados na União Européia, as estratégias que
visam a sustentabilidade da produção agrícola devem levar em consideração o novo conceito
de ruralidade, que, segundo o autor, compreende estruturas complexas de composição de
atividades distintas de produção de valor, problematizando o desenvolvimento territorial das
áreas rurais em detrimento das estratégias setoriais (MARTINS, 2005).
O autor afirma que, no caso brasileiro, a gestão dos recursos territoriais demandaria a
criação de instrumentos locais capazes de promover novas oportunidades e institucionalidades
que tomassem como princípio o novo rural brasileiro, a partir de instâncias institucionais
descentralizadas, que possibilitassem a participação de comunidades locais no planejamento e
na gestão dos recursos humanos, econômicos e ambientais dos territórios.
No campo das novas institucionalidades, Martins (2005, apud GRAZIANO DA SILVA,
2001) ressalta o vácuo existente no Brasil em termos de regulação pública, talvez por não
possuir tradição na condução de políticas públicas voltadas às áreas rurais. Os instrumentos de
intervenção do Estado, em forma de políticas agrícolas e agrárias, sempre estiveram,
conforme ele, atreladas a um corte eminentemente setorial, fazendo com que, tanto a
agricultura, quanto as atividades não-agrícolas se desenvolvessem sem marcos regulatórios
bem definidos. E as questões institucionais, a regulação ambiental e a participação do Estado
na gestão pública do território, são, para o autor, questões que podem ter influência decisiva
nos rumos da localidade.
Porém, para ele, qualquer que seja o viés de análise sobre estratégias de desenvolvimento
rural, a transformação dos atuais padrões de uso agrícola ocupa posição central de reflexão. E,
38
mesmo a despeito do crescimento do emprego não-agrícola, a agricultura continua sendo a
principal usuária dos recursos naturais nas áreas rurais do país.
Em razão disso, as possibilidades de fixação de novas frentes de produção de
valor nestes espaços também dependerão do vel de adequação sócio-
ambiental da agricultura, visto que a expansão de tais frentes associa-se,
dentre outros, à própria paisagem característica das áreas rurais. Assim,
atividades direcionadas aos "nichos de mercado" como aquelas associadas
ao turismo esportivo e ao lazer dependerão diretamente dos esforços do
setor agrícola para a preservação e/ou recuperação das paisagens rurais
(MARTINS, 2005, p. 264).
2.3.3. O papel das instituições
Para North (1993), é muito comum os atores trabalharem com a informação incompleta
que dispõem, processando-a mediante elementos racionais, podendo, com isso, chegar a
resultados ineficientes. O autor afirma que para amenizar esses efeitos, é que são utilizadas as
instituições. A função principal das instituições na sociedade, segundo ele, é reduzir a
incredulidade, estabelecendo uma estrutura estável, mesmo que não seja eficiente, de
interação humana.
Porém, o conceito de instituição, para o autor, vai além da concepção formal
estabelecida, mais próxima de organizações, definindo-a como a regra do jogo, que inclui
todo tipo de limitação que é criada para dar forma à interação humana. Mas que, por outro
lado, estrutura os incentivos para o intercâmbio humano, seja na área política, social ou
econômica.
O autor explica que as normas, formais e informais, bem como a eficácia da sua
obrigatoriedade, é que determinam a índole do jogo. Porém, as normas formais podem mudar
da noite para o dia, como resultado de decisões políticas ou judiciais, fazendo com que as
limitações informais, inseridas nos costumes, tradições e códigos de conduta, sejam muito
mais resistentes a mudanças. Sobretudo pelo fato de serem mais difusas do que as primeiras e
39
formadas a partir da sedimentação de vários processos sociais, envolvendo, muitas vezes,
muito tempo e várias gerações. “Essas limitações culturais não somente conectam o passado
com o presente e o futuro, como também nos proporcionam uma chave para explicar a senda
da mudança histórica” (NORTH, 1993, p. 17).
A fonte de mudança incremental das instituições, conforme North (1993), é a
aprendizagem. Para compreender como essa mudança acontece, o autor lança mão do
conceito de parth dependence, ou seja, a dependência de caminho, que faz com que o
aprendizado individual se transforme em aprendizado coletivo, e como isso se relaciona com
a emergência das instituições.
Favareto (2007), apoiado nas idéias de North (1993), mostra que as instituições são, elas
mesmas, expressões de conflitos e compromissos, ou seja, resultado das interações
propiciadas por estruturas sociais determinadas. Para ele, o problema que envolve a mudança
institucional repousa, principalmente, nas instituições informais e nos conflitos entre
instituições e organizações.
Granovetter (1990), ao definir sua proposição sobre a sociologia econômica, cujos
trabalhos publicados a partir do final dos anos 1970 estão associados ao ressurgimento desse
campo de conhecimento, afirma que as instituições são construídas socialmente, e não brotam
automaticamente, tomando uma forma incontornável.
Uma das contribuições da sociologia econômica é o entendimento dos arranjos que
atuam quando o problema a resolver é a questão da avaliação da qualidade dos produtos. Essa
avaliação, conforme Steiner (2006), pode se dar por procedimentos de certificação; por
decisões quanto aos investimentos em modelos, quando as empresas definem padrões de
produção; pode se tratar de redes de relações pessoais que possibilitam a difusão e a
verificação de informações relevantes a respeito da qualidade do produto; e pode ser a
combinação entre organizações em torno de objetos e espaços.
40
2.4. A UNIÃO COMO ESTRATÉGIA
Machado; Silva (2005) afirmam que existem dificuldades para que a agricultura familiar
coloque em prática as estratégias relacionadas à comercialização do seu produto. Segundo
eles,
[...] parte das dificuldades está associada à cultura dos produtores, que são,
muitas vezes, individualistas e imediatistas na comercialização dos produtos.
São pouco dispostos a formar associações e cooperativas, o que tem
demonstrado ser uma das principais alternativas para o fortalecimento dos
produtores (MACHADO; SILVA, 2005, p. 128).
Esse tipo de visão individualista vai mais além, para Gaiger (2005), da cultura dos
produtores. Isso porque, segundo ele, está ocorrendo, ao longo das últimas décadas, a
exacerbação do individualismo, uma atitude que, conjugada ao definhamento dos valores e
das estruturas sociais de suporte na família, no trabalho, no civismo e nas sociedades
tradicionais, tem deixado os indivíduos “em suspenso, sem chão e sem estrela-guia, relutantes
e carentes de vínculos” (GAIGER, 2005). E essa atitude tem como princípio histórico,
segundo o autor, o sistema mundial produtor de mercadorias, de onde as sociedades
conheceram a produção capitalista, que tem a peculiaridade de gerar diretrizes a partir do
próprio terreno econômico, estabelecendo uma racionalidade própria, que passa a digladiar-se
com os demais princípios da organização social, deixando a impressão de que eles inexistem
ou são dispensáveis (GAIGER, 2005).
O capitalismo, segundo o autor, alterou as regras do jogo das sociedades desde o seu
surgimento. Isso porque a produção capitalista toma como importante apenas a rentabilidade e
a produção de riquezas, retirando como princípios de valor as relações sociais. O capitalismo,
para dominar as consciências, acaba por ocultar todas as estruturas sociais diferentes das que
são contra os interesses que levam ao seu desenvolvimento, como: a existência de outras
41
possibilidades modernas de organização das sociedades, fora do capitalismo, capazes de gerar
bem estar e mantendo a economia baseada em sistemas de regulação politicamente
instituídos; a existência de outros princípios de organização econômica que não aqueles do
mercado; e a existência de outras iniciativas econômicas, distintas da empresa privada
capitalista.
Para o autor, apesar de o capitalismo proporcionar o nascimento da exacerbação do
individualismo e a produção e distribuição de riquezas, a inédita freqüência com que se fala
de solidariedade e com que se observa sua presença nos sentimentos e gestos cotidianos
mostra que é possível resgatar a economia solidária, a partir de empreendimentos cujo elo
mais importante seja o interesse pela coletividade (GAIGER, 2005).
Conforme Barth (1998), o aumento dos contatos possibilitado pela modernização, que
foi considerado fator de uniformização e de assimilação, hoje é tomado como um fator que
facilita a emergência de identidades particularistas. Ou seja, a globalização, que poderia ser
entendida como uma forma de uniformizar culturas, pode mostrar as diferenças culturais entre
as nações. Considerando-se a cultura como um processo de contínua transformação, ela deixa
de ser um “elemento de definição de grupos para ser considerada uma conseqüência ou
implicação no estabelecimento de fronteiras étnicas que são sociais, simbólicas e
mutáveis” (VALENTE, 2006, p. 103).
Barth (1998) afirma que é comum a todos os sistemas sociais poliétnicos adotar o
princípio de que a identidade étnica pressupõe uma série de restrições sobre os tipos de papéis
que cada indivíduo pode desempenhar, e sobre os parceiros que ele pode escolher para os
diferentes tipos de transações. Com isso, ele rompe a perspectiva de se pensar a etnicidade em
termos de grupos humanos diferentes, caracterizados por uma história e cultura próprias, e
sugere que antes é preciso interrogar-se sobre as razões que levam à emergência de distinções
étnicas em uma dada situação, sendo secundário o substrato cultural da etnicidade em relação
42
ao estabelecimento de fronteiras étnicas entre grupos (VALENTE, 2006). As fronteiras a
serem consideradas, então, são as fronteiras sociais.
Além disso, Barth (1998) afirma que na medida em que atores, com o objetivo de
interagir com outros, usam identidades étnicas para categorizar a si mesmos e aos outros, eles
formam grupos étnicos nesse sentido organizacional. Porém, “as características que são
levadas em consideração não são a soma das diferenças objetivas, mas somente aquelas que
os próprios atores consideram significativas” (BARTH, 1998, p.194).
2.4.1. A formação de associações para benefícios coletivos
Como as ações a serem adotadas por agricultores familiares precisam de investimento,
principalmente em tecnologia de produto, processo ou serviço, a cooperação entre os
produtores pode ser uma alternativa para superar problemas como a imposição de preços,
exigências de bonificações, pequena escala produtiva, inconstância na entrega de produtos.
Por meio das ações coletivas, os produtores também podem trocar
informações e compartilhar conhecimentos e experiências. É possível
aumentar o poder de barganha, melhorando as negociações com os membros
do canal. O nível de renda poderá aumentar, uma vez que é possível agregar
valor, facilitar o relacionamento dos produtores com as estruturas de
mercado a montante e a jusante de seu estágio de produção e trazer lucros
por meio da escala de negociação (MACHADO; SILVA, 2005, p. 129).
Os grupos, ou associações, são formados para oferecer benefícios coletivos, ou seja, que
sejam comuns a todos os seus membros, onde nenhum dos seus participantes está excluído
dos benefícios proporcionados pelas ações advindas do grupo (GARCIAS, 1999). E, ao tratar
da formação de grupos é importante entender o que levam os indivíduos, ou as organizações,
a formar grupos, bem como conhecer o comportamento desses indivíduos ou organizações ao
participar de um grupo.
43
Garcias (1999, apud Best, 1990), estabelece alguns fundamentos básicos no processo de
formação de grupos. Segundo ele, em primeiro lugar, os grupos devem, além de atingir
objetivos que resultem em benefícios para o grupo como um todo, atender os interesses
individuais que sejam comuns aos participantes do grupo. Um segundo elemento motivador
para a criação do grupo é que, por meio dele, é possível atingir objetivos que não poderiam
ser alcançados pela iniciativa individual. O terceiro fundamento é que a ação coletiva aumenta
o poder de barganha do grupo, o que traz muita vantagem para grupos de pequenos
produtores, que não têm produção suficiente para alcançar a escala desejada pelas grandes
indústrias e distribuidores, por exemplo.
Outro fator apontado por Garcias (1999), que motiva a formação dos grupos, é a
especialização das atividades, que podem ser divididas por cada membro do grupo, com a
qual é possível aumentar a eficiência do grupo e promover a permanente troca de
conhecimentos e experiências. Um quinto fator é a possibilidade de aproveitamento, de todos
os participantes do grupo, dos benefícios dos bens inclusivos, ou seja, aqueles que não têm
relação mercadológica, como treinamento, pesquisa, marketing e propaganda, distribuição.
Como exemplos de itens que favorecem a formação dos grupos estratégicos, Garcias
(1999) cita:
[...] a capacidade de auto-regulação do grupo; garantia de legitimidade de
uma ação coletiva; estímulo ao autodesenvolvimento; aumento da eficiência
individual e coletiva das firmas pela especialização e troca de conhecimento
e experiência; possibilidade de obter economias de escala e escopo através
de atuação integrada; aumento do poder de negociação e redução da
incerteza pela ação coletiva; agilidade e flexibilidade de adaptação; inovação
e melhoria contínua, entre outros (GARCIAS, 1999, p.78).
Porém, existem assimetrias dentro dos grupos, que podem ser de ganho no mercado, de
distribuição dos custos e de informações. Um dos pressupostos para a formação de grupos é a
redução da assimetria da informação. Conforme Garcias (1999, p. 85), “a informação é um
44
bem coletivo fundamental numa aliança estratégica”. E a flexibilidade e a agilidade na
divulgação e na resolução dos problemas no interior do grupo são as armas contra a assimetria
da informação. A democratização da informação entre os participantes do grupo é uma das
ferramentas fundamentais para reduzir a incerteza e o comportamento oportunista.
Assume-se que os indivíduos são oportunistas e que limites em sua
capacidade cognitiva para processar a informação disponível (racionalidade
limitada). Por oportunismo entende-se que os indivíduos são considerados
fortemente auto-interessados; podendo, se for de seu interesse, mentir,
trapacear ou quebrar promessas (AZEVEDO, 2000, p. 36).
Garcias (1999) identifica alguns fatores restritivos na formação de grupos, tais como: a
racionalidade limitada e o comportamento oportunista dos agentes; a lentidão no processo de
decisão; a dificuldade de harmonizar competitividade e cooperação na produção de bens
coletivos exclusivos
7
e de estabelecer mecanismos adequados de incentivo e controle; a
possibilidade de formação de subgrupos de interesse; a tendência de diminuir o tamanho do
grupo para a produção dos bens exclusivos; o problema do free-rider
8
no caso da oferta de
bens e serviços inclusivos; a complexidade do arranjo organizacional e do sistema de
contratos; as limitações de um sistema de comando que é disperso; e as dificuldades de
desmembramento de investimentos fixos de grande monta (GARCIAS, 1999).
2.5. O AGRONEGÓCIO CAFÉ NO BRASIL E A AGRICULTURA FAMILIAR
A história do Brasil está muito proximamente interligada com a história do café no país.
Em toda a história brasileira, o café sempre foi o maior gerador de riquezas e o produto mais
importante no seu desenvolvimento. Desde sua chegada ao Brasil, em 1727, o café foi bem
7
Conforme Garcias (1999, apud Olson, 1990), bens coletivos exclusivos são aqueles que possuem um valor de
demanda total fixo.
8
O fenômeno free-rider acontece “quando o indivíduo procura receber os benefícios da ação coletiva mas não
atende aos princípios e às regras de participação que sustentam a ação coletiva” (Garcias, 1999, p.70)
45
adaptado aos diversos tipos de climas e solos brasileiros, desde seu primeiro plantio, no Pará,
sua posterior adaptação aos estados do Maranhão, Ceará, Pernambuco e Bahia, até se fixar
definitivamente, a partir de 1773, na região Sudeste, principalmente em Minas Gerais e São
Paulo.
Os primeiros cafezais brasileiros foram descendentes de uma única espécie, Coffea
arabica cv. Arábica, conhecida também por Typica. Aos poucos, as plantações do país,
principalmente concentradas no estado de São Paulo, foram se diversificando, quando em
1852, chegaram ao Brasil as sementes do café bourbon vermelho (C. arabica cv. Bourbon
Vermelho), que o governo brasileiro mandara trazer da ilha de Reunião, no continente
africano, por ser uma variedade mais produtiva e de melhor qualidade.
No ano de 1830, o café era o principal produto da exportação brasileira, ultrapassando
o algodão e o açúcar. Em 1845, o Brasil já era responsável por 45% das exportações mundiais
desse produto. Com a grande expansão do cultivo, algumas variedades surgiram no país,
devido às raras mutações, que naturalmente ocorrem, ou às recombinações de fatores
genéticos, a partir de cruzamentos naturais entre cultivares existentes. Assim, no ano de 1871,
na região de Botucatu, São Paulo, foi encontrado, pela primeira vez, um cafeeiro com frutos
amarelos.
A expansão do produto pelo Brasil foi rápida e com grande amplitude. Durante muitos
anos, o principal estado produtor foi São Paulo, período em que o produto enriqueceu muitos
fazendeiros, que passaram a se chamar Barões do Café. No ano de 1906, quando a produção
brasileira superou os 22 milhões de sacas, foi celebrado o Acordo de Taubaté, que proibia
novos plantios em São Paulo, fazendo com que a cultura se expandisse para o Paraná.
A ocorrência de geadas, na década de 1960, no Paraná, que era, então, o maior produtor
do país, fez com que o produto se instalasse no estado de Minas Gerais, que é hoje o principal
46
produtor brasileiro, sendo responsável por mais de 50% da produção nacional (EMBRAPA,
2004).
Hoje, a espécie arábica é cultivada principalmente em Minas Gerais, São Paulo, Paraná,
sul do Espírito Santo e Bahia. A espécie robusta, como é adaptada às zonas quentes e úmidas,
própria das florestas tropicais de baixa altitude, é plantada, principalmente, no norte do
Espírito Santo, sul da Bahia e em Rondônia.
Os agricultores familiares correspondem a 75% dos produtores de café, sendo que, desse
total, cerca de 60% referem-se àqueles que produzem em áreas de até cinco hectares. Esse
segmento responde por 25% da produção brasileira de café, empregando em torno de 1,8
milhão de pessoas/ano, priorizando os sistemas agroecológicos de produção (NAPOLEÃO,
2005).
Para Coelho (2005) a preocupação social e ambiental da cafeicultura familiar pode ser
explicada por uma das diferenças que existem entre as relações de trabalho da produção
familiar e da patronal. Ele explica que quando, na agricultura familiar, ocorre uma doença,
por exemplo, por intoxicação por agroquímicos, isso não é tratado apenas como uma simples
reposição de um fator de produção (mão-de-obra), como acontece na agricultura patronal.
“Outros valores circulam nesse contexto”, fazendo com que a saúde do trabalhador e de sua
família, as questões de sanidade das plantas e de animais e a perpetuação da qualidade do solo
façam parte de “uma outra contabilidade” (COELHO, 2005, p.10).
Para mostrar a importância do segmento familiar na produção de café no país, o autor
realizou um estudo comparativo entre as produções familiares e patronais. A partir da
comparação do Valor Bruto da Produção (VBP) agropecuária entre esses produtores, o autor
concluiu que existe uma superioridade produtiva das unidades patronais de produção que não
é um dado absoluto, mas relativo aos financiamentos públicos. Isso porque, utilizando os
dados do Censo Agropecuário 1995-1996, percebeu que os agricultores familiares, que eram
47
85,2% das unidades produtivas no Brasil e que ocupavam 30,5% da área, receberam apenas
25,3% dos R$ 3,7 bilhões do financiamento do governo federal, enquanto a agricultura
patronal, que ocupara, naquele período, 67,9% da área e que representava 11,4% dos
estabelecimentos agropecuários, recebeu 75% dos mesmos financiamentos e produziu 61% do
VBP. Além disso, Coelho (2005, p.11) dividiu o VBP dos produtores patronais pela área
ocupada pelos mesmos, concluindo que o rendimento por área, entre os familiares, é mais
intenso.
2.5.1. Segmentação de mercado
O Brasil ocupa ainda hoje a posição de maior produtor e exportador de café, porém, vem
perdendo sua participação no mercado mundial, passando dos 80% de participação nas
exportações do início do século, para os atuais 25% (VEGRO, 2007). Esse declínio tem como
causas, conforme o autor, os preços elevados mantidos artificialmente pelo país no mercado
durante anos, o que beneficiou a expansão da área cultivada de outros países; a falta de
qualidade do produto nacional; e as estratégias de marketing mais eficientes dos países
concorrentes ao Brasil, que conquistou com maior rapidez a preferência dos consumidores.
Apesar de ter, ainda hoje, como principal produto de exportação o café tipo commoditie,
os agentes do sistema produtivo do café têm procurado se ajustar à essa nova realidade do
mercado, já que novos países têm entrado no rol de produtores mundiais e aumentado sua
produção a taxas geométricas, como os países da Ásia, que tiveram um incremento anual de
produção de 3,84% de 1961 a 2003, enquanto que o Brasil teve incremento de 2,3% ao ano no
período 1974/2004. Conforme Vegro (2007), uma estratégia empresarial para a busca de
mercado é a de diferenciar o café, segmentando o mercado e procurando abastecê-lo com um
produto de qualidade. Em contraposição ao mercado de massa, onde o vendedor busca
produzir, distribuir e promover seu produto para todos os compradores, a segmentação de
48
mercado busca direcionar o esforço de venda para consumidores previamente identificados a
partir de suas preferências, poder de compra, localização geográfica, atitudes e hábitos de
compra similares.
O termo nicho de mercado é utilizado, por profissionais de marketing, para definir uma
forma mais segmentada de comercializar o produto. Segundo Kotler (2000, p. 279), um nicho
“é um grupo definido mais estritamente, um mercado pequeno cujas necessidades não estão
sendo totalmente satisfeitas”. Ele explica que os empresários que participam desses mercados
conhecem muito bem as necessidades de seus clientes, que, por seu lado, conhecendo as
vantagens e os benefícios dos produtos, concordam em pagar um preço maior por ele.
Esse mercado é buscado especialmente por pequenas empresas que desejam ampliar sua
participação, evitando competição direta com grandes concorrentes. Como alternativa, essas
empresas identificam e atendem a um segmento específico, ou um nicho, de um mercado
maior. Kotler (2000, p. 280, apud LINNEMAN; STANTON, 1991) acredita que “as
oportunidades estão nos nichos e que as empresas terão que encontrá-los ou se arriscarão a
ficar fora do mercado”.
No caso do mercado de café, novos hábitos dos consumidores de todo o mundo vêm
trazendo mudanças importantes (LEITE, 2005). Os impactos trazidos com as exigências pela
qualidade do consumidor dos Estados Unidos, a partir dos anos 1980, resultaram nos cafés
gourmet, orgânico, com diferentes flavors (sabores), com origem definida, espressos ou
descafeinados e despertou a consciência ecológica e a responsabilidade social dos produtores.
Apesar de ainda pouco aproveitadas pelos produtores, o Brasil possui, para Caixeta
(2001), grandes perspectivas de produção de cafés especiais, pois nenhum país concorrente
tem o acervo tecnológico do Brasil. Além disso, hoje não se fala mais do café do Brasil, mas
dos cafés do Brasil, porque o país produz diversas texturas, sabores e aromas em seu café. Por
isso, Caixeta (2001) acredita que o país tem grande potencial junto a esse mercado em
49
crescimento, conquistando nichos de mercado, desde que o país mostre, divulgue e ofereça o
produto brasileiro de maneira que as pessoas o conheçam.
Para a autora, a forma de acelerar o processo de mudanças é definindo melhor os canais
de comercialização, dando ênfase à qualidade e segmentando o mercado. Além disso, o
marketing deve ser um processo de constituição sólida e não apenas promocional, que é
apenas uma das vertentes da estratégia de marketing. Precisamos agregar ao nosso produto
valores relativos à tecnologia, à pesquisa e promover ações de marketing para mostrar ao
mundo que temos condições de oferecer os melhores cafés. Este ganho de motivação para
qualidade é fundamental” (CAIXETA, 2001, p. 17).
Para Mello (2001), o Brasil possui várias regiões com condições favoráveis à produção
de cafés de boa qualidade, mesmo quando esses cafés são preparados em terreiros e nos
modos mais usuais de cuidado da cultura. Dessas regiões, as mais conhecidas são as de cafés
do Cerrado, abrangendo as regiões de Minas Gerais, Goiás, Bahia e São Paulo. O autor
também cita como exemplos de cafés de qualidade os cultivados em regiões de montanha, que
são colhidos em época correta e com secagem cuidadosa; e os produzidos em regiões de
umidade elevada, que pode ser uma boa opção para o preparo do café conhecido como cereja
descascado.
Mello (2001, p. 567) cita ainda que “para os produtores de cafés especiais existem ainda
outras nuances, como o uso de variedades próprias, tidas como bouquets característicos, como
é o caso do Bourbon, a produção de cafés orgânicos e outros”.
2.5.2. A produção de orgânicos
Um nicho muito peculiar de cafés especiais é o dos cafés orgânicos. É esse o segmento
de mercado que mais cresce no mundo, chegando a uma taxa anual de crescimento de 500%
(LEITE; SILVA, 2000). No Brasil, embora ainda pequeno, o mercado cresce anualmente
50
cerca de 10%. Muito apreciado por consumidores de países como Estados Unidos, Alemanha,
Países Baixos, Suíça, França, Austrália e Japão, o café orgânico é produzido principalmente
por: Brasil, Costa Rica, Peru, México, Guatemala, Nicarágua, El Salvador e Colômbia
(RICCI; ARAÚJO; FRANCH, 2002).
O mercado de café orgânico é predominantemente constituído por consumidores
preocupados com questões ligadas à saúde e tem, nos últimos anos, tido adesão de um público
preocupado também com as questões social e ambiental. Nos países desenvolvidos, a imagem
do chamado comércio ético (fair trade) vem sendo cada vez mais associada a uma agricultura
sustentável e ecológica.
A definição de agricultura orgânica é complexa. Em princípio, ela é considerada um tipo
de agricultura não-convencional, ou seja, uma agricultura alternativa, como também o são a
agricultura biológica, a ecológica, a natural, a regenerativa, a sustentável e a biodinâmica.
Porém, cada qual possui suas particularidades que a diferem das demais. O termo agricultura
alternativa é utilizado para diferenciar da agricultura convencional, também conhecida como
tradicional, moderna, contemporânea, química ou industrial, denominação dada ao tipo de
agricultura utilizada predominantemente em todo o mundo a partir da Revolução Verde. Neste
modelo, o uso intensivo de insumos agrícolas, máquinas, equipamentos e tecnologias são
incentivados na busca de uma agricultura com níveis de produção e produtividade altíssimos,
porém com raríssima preocupação com o meio ambiente e a sanidade dos consumidores e dos
trabalhadores rurais. Nesse contexto, os diferentes aspectos da produção são vistos de forma
isolada. Por exemplo, o surgimento de uma determinada praga é sanado pelo seu extermínio
por completo, via aplicação de agrotóxicos (RICCI; ARAÚJO; FRANCH, 2002).
as várias correntes da agricultura alternativa, como a orgânica, priorizam o “enfoque
sistêmico, no qual cada unidade rural produtiva é entendida como um sistema complexo,
dinâmico e integrado. Trata-se, portanto, de uma abordagem holística, que considera as
51
múltiplas interações da natureza para a racionalização dos métodos de produção
agropecuária” (RICCI; ARAÚJO; FRANCH, 2002, p. 8). Nesse tipo de agricultura, que é
fundamentada em princípios ecológicos e na conservação dos recursos naturais, a
diversificação de espécies é maior, verificando-se uma nítida redução da incidência de
fitoparasitas, quando comparada a sistemas monoculturais, devido à maior abundância e
diversidade de inimigos naturais.
Análise da agricultura orgânica realizada pela Organização Internacional do Café conclui
que existem três níveis de definição: científico-filosófico, técnico-agronômico e econômico
9
.
A base científico-filosófica da agricultura orgânica teve início nos anos 1930, a partir da
difusão do conhecimento das ciências naturais e também pela reação à tendência mecanicista
e industrial de produção agropecuária. Ela teve como princípios os seguintes pontos:
a) o solo não é um substrato inerte, mas o habitat de múltiplos organismos e
microorganismos, que funcionam como agentes transformadores dos nutrientes,
tornando-os solúveis e disponíveis às plantas;
b) o desequilíbrio nutricional das plantas reduz suas defesas, propiciando o
aparecimento de pragas e doenças;
c) fertilizantes de origem mineral devem ser evitados, por sua natureza inerte;
d) as plantações devem formar um todo orgânico, alcançando, assim, auto-
suficiência.
A partir da definição técnico-agronômica, busca-se analisar os métodos utilizados na
seleção de sementes, germinação, preparo e manutenção dos solos, plantio, proteção
fitossanitária, fertilização e, no caso do café, processamento e armazenamento” (ANÁLISE...,
2002, p.8).
9
Texto adaptado de “Análise agroeconômica do café cultivado organicamente ou café orgânico”, da OIC,
Londres, 1997, 19p.
52
No nível econômico, procuram-se estratégias de produção e de comercialização orgânica
que se adaptem às várias regiões e países. Como, por exemplo, nos países de tradição anglo-
saxônica, o termo orgânico refere-se a uma visão holística, mas mecanicista do mundo, já os
países de língua francesa preferem enfatizar o caráter vivo dos fenômenos agronômicos.
Quanto à comercialização, os países da Europa Ocidental e América do Norte procuram
“reduzir o excesso de intermediários, para que haja uma relação direta, mais sociável e
humana, entre produtores e consumidores” (ANÁLISE..., 2002, p.8).
2.5.3. Certificação de origem
Para Leite; Silva (2000, p. 62), “os cafés especiais são aqueles que apresentam origem
definida, não só de país mas de local de produção, a fazenda ou a região”. Essa regionalização
também associa o produto ao material genético tradicionalmente utilizado na região, ao clima
e ao ecossistema, ao solo e à topografia, aos tratos culturais e às práticas de beneficiamento e
de armazenamento locais. A qualidade da bebida é altamente influenciada, ainda, pelo manejo
de pós-colheita.
Um dos critérios utilizado mundialmente na busca de diferenciação de produtos
agroindustriais é, segundo Luna (2001), aquele baseado nas características geográficas das
regiões produtoras.
A utilização da denominação de origem pode estabelecer diferenciais para
produções aparentemente iguais, pois padroniza a produção, considerando
aspectos relacionados às características ambientais da região. Verifica-se que
os produtos passam a ter uma característica única e inimitável,
completamente diferenciada de outras regiões produtoras da mesma cultura.
A concessão de uma denominação de origem pode amparar o grupo de
produtores, requerendo uma rígida disciplina na produção e comercialização
dos produtos e dando mais uma garantia aos consumidores (LUNA, 2001, p.
2).
53
No mercado internacional as regras para o estabelecimento da origem das mercadorias
seguem a Convenção Internacional para a Simplificação e a Harmonização dos Regimes
Aduaneiros, mais conhecida como convenção de Kyoto, adotada em 18 de maio de 1973 e
que entrou em vigor em 25 de setembro de 1974 a fim de diminuir as divergências existentes
entre os procedimentos aduaneiros adotados por diferentes países que pudessem dificultar o
comércio internacional. Com isso, as normas contidas no acordo estão orientadas a alcançar
alto grau de simplificação e harmonização dos regimes aduaneiros em nível mundial.
A partir de revisão realizada na Convenção em 1999, esta passou a conter anexos
específicos, entre os quais o anexo K, que contém disposições relacionadas à origem das
mercadorias e está dividido em três capítulos (BRASIL, 2004):
1) regras de origem: que estabelecem quais as práticas recomendadas para mercadorias
totalmente obtidas, transformação substancial, país de origem das mercadorias, regras
de transporte direto;
2) prova documental de origem: que estabelece as regras para Certificado de Origem,
certificado de denominação regional, declaração certificada de origem, declaração de
origem, autoridades ou organismos habilitados para emitir certificados e sanções;
3) controle das provas documentais de origem: que estabelece as práticas recomendadas
para estabelecimento da autenticidade e exatidão das provas documentais de origem,
solicitação de informações pelas autoridades aduaneiras, desembaraço de mercadorias
sujeitas ao controle de origem.
O Certificado de Origem estabelecido para o café foi criado pela Organização
Internacional do Café (OIC), “a principal entidade internacional para a promoção do café,
congrega países produtores e consumidores a fim de enfrentar os desafios do setor cafeeiro
mundial através da cooperação internacional” (BRASIL, 2004, p. 117).
54
Entre os principais objetivos da OIC, estão: habilitar representantes governamentais a
compartilhar visões e coordenar políticas e prioridades; aprimorar a qualidade do café em
todo o mundo; incrementar o consumo mundial de café; encorajar a economia cafeeira
sustentável e ambiental; e prover informação objetiva e compreensiva do mercado mundial do
café.
O Brasil é membro da OIC e assinou a Convenção Internacional do Café de 2001. No
país, as entidades autorizadas a emitir a Certificação de Origem autorizada pela Organização
Internacional do Café (OIC) são:
a) Conselho dos Exportadores de Café Verde do Brasil (CECAFÉ) e Conselho Nacional
do Café (CNC), para amparar as exportações brasileiras de café em grão;
b) Associação Brasileira da Indústria do Café Solúvel (ABICS), que ampara as
exportações brasileiras de café solúvel;
c) Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), para amparar as exportações
brasileiras de café torrado e moído;
d) As entidades de classe regionais, como: Associação Comercial de Santos e Centros do
Comércio de Café do Rio de Janeiro, de Vitória (ES), de Minas Gerais, de Paranaguá
(PR), da Bahia e do Norte do Paraná.
A Certificação de Origem da OIC deve ser emitida para amparar toda exportação ou re-
exportação de café, por entidades autorizadas pelos membros, segundo as normas do
Regulamento de Estatística, Regulamento para Aplicação de um Sistema de Certificação de
Origem.
Apenas o estado de Minas Gerais, que é o líder mundial na produção cafeeira,
respondendo por cerca de 50% da safra brasileira (LUNA, 2001) possui legislação para
certificação da origem do café. Para isso, o governo de Minas Gerais criou o Programa
Mineiro de Incentivo à Certificação do Café (CERTICAFÉ). Para estabelecer as regiões, o
55
Estado foi dividido em quatro regiões produtoras: Cerrado de Minas, Jequitinhonha de Minas,
Montanhas de Minas e Sul de Minas.
2.6. MÉTODO
As metodologias utilizadas nos estudos em agronegócios são as mais diversas e resultam
dos diferentes objetivos pretendidos (SILVA; BATALHA, 1999). Esses estudos envolvem
uma multiplicidade de questões relacionadas aos recursos físicos, financeiros e humanos,
fazendo com que adquiram um caráter próprio, o que impede uma recomendação universal de
opção metodológica para a busca de informações.
A presente pesquisa, a partir da perspectiva teórica adotada, apresentada neste
Capítulo, buscou apoiar-se no ferramental metodológico existente nos campos do
conhecimento da Sociologia, Antropologia e Agronegócio.
De Favareto (2007, p.16), depreende-se o que está na base de toda a tradição da
sociologia da ciência, que é que
[...] a validade das idéias científicas não resulta somente do movimento
cumulativo derivado de seu teste e aperfeiçoamento lógico e prático, mas
também, e talvez sobretudo, das visões que presidem o olhar dos
pesquisadores e dos processos sociais, internos e externos aos domínios do
campo científico. Visões que condicionam os lugares estabelecidos das
idéias e também de seus portadores ou a totalidade na qual elas se inserem
[...] Pôr em marcha o exame de categorias específicas do pensamento
científico não deveria ser, portanto, somente uma tarefa
epistemológica, mas também histórica e sociológica.
Com isso, a presente pesquisa traz a nossa visão com relação ao objeto estudado, a partir
dos dados objetivos da realidade e tendo como base a visão dos atores dos acontecimentos
vividos por eles, estando envolvidos em um cenário social específico.
56
Este estudo se apoiou, ainda, nas linhas condutoras estabelecidas pela pesquisa
antropológica a partir do início do século XX: a exigência do trabalho de campo e o estudo de
caso (VALENTE, 2003). Sendo assim, é caracterizada pelo estudo de caso único como
recurso metodológico. Lazzarini (1997) sugere o uso de estudos de caso para pesquisas de
fenômenos sociais complexos, nas quais se pressupõe maior nível de detalhamento das
relações entre os indivíduos e dentro das organizações e entre elas, bem como suas interações
com o ambiente externo.
Este trabalho de pesquisa foi realizado no período de março de 2006 a dezembro de
2007. Alguns dados coletados na região pesquisada no período de realização dessa pesquisa
fazem parte de um dos planos de ação que compõem o projeto Implementação de cafeicultura
orgânica para agricultura familiar de Alto Paraíso de Goiás, que está sendo desenvolvido
por pesquisadores do Consórcio Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café
(CBP&D/Café). Esse projeto está incluído no Programa Nacional de Pesquisa e
Desenvolvimento do Café (PNP&D/Café), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(Embrapa), e começou a ser executado em janeiro de 2007.
O estudo foi iniciado pelo levantamento histórico da região nordeste do estado de Goiás,
por meio da revisão da literatura em livros, documentos diversos, páginas oficiais de órgãos
governamentais na Internet, estudos e pesquisas realizadas sobre o tema e a região. Esse
levantamento foi feito levando-se em consideração que a história, conforme Halbwachs
(1990), é a compilação dos fatos que ocuparam o maior espaço na memória dos homens e
que, ao serem lidos em livros e ensinados nas escolas, esses acontecimentos passados são
escolhidos e classificados conforme as necessidades ou regras.
Considerando-se que a história começa somente no ponto onde acaba a tradição
(HALBWACHS, 1990), a presente pesquisa buscou resgatar os hábitos, costumes e tradições
existentes no município, e que estão contidas na memória de seus habitantes. Essa pesquisa
57
foi feita por meio de entrevistas individuais, realizadas durante visitas às propriedades de cada
agricultor. Isso porque, conforme Giddens (1997, p. 8), no contexto mundial atual, em que a
globalização tomou conta das relações econômicas, políticas e sociais, as tradições precisam
se defender, pois estão sempre sendo contestadas”.
As principais técnicas de coleta de informações adotadas foram a observação, as
conversas informais e as entrevistas semi-estruturadas. A estratégia de ação inicial foi, a partir
da observação, conhecer o cotidiano da comunidade, os problemas enfrentados na área
estudada e os interesses demonstrados por seus habitantes para a resolução de seus problemas.
Com isso, a pesquisa transcorreu durante o ano de 2006, tendo como complementação às
visitas às propriedades, a realização de reuniões entre os membros da comunidade e
representantes de órgãos públicos, entre eles a Embrapa.
Durante esse período, foram promovidos encontros com representantes da prefeitura,
câmara legislativa e secretarias municipais, organismos públicos, além de empresários,
comerciantes e líderes comunitários locais. Esses encontros possibilitaram conhecer melhor as
microregiões nas quais se subdividem, informalmente, o município e estabelecer o número de
produtores a serem entrevistados em cada uma delas.
A coleta de dados relativos à região e seus habitantes também contou com a colaboração
de alunos da disciplina de Extensão Rural do primeiro semestre de 2006, do curso de
graduação da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília.
Os alunos permaneceram na comunidade durante 3 (três) dias observando o local e colhendo
informações, que nos foram repassadas por meio de relatórios, que expressaram suas
percepções acerca da região.
A partir das informações coletadas, foi elaborado o questionário, contendo perguntas que
permitiam respostas fechadas e abertas, para levantamento de dados quantitativos e
qualitativos. Isso porque, segundo Valente (2003, apud Malinowski, 1976), o pesquisador,
58
mesmo no relacionamento natural, deve aplicar métodos de coleta, manipulação e registro da
evidência. Para Mendonça (2003), os estudos qualitativos compreendem a pesquisa
exploratória, que visa, basicamente, a formulação e/ou sistematização de objetos
desconhecidos, e a pesquisa descritiva, que busca elucidar e/ou detalhar e ampliar o
conhecimento sobre objetos parcialmente conhecidos.
A revisão da literatura disponível e os relatos dos moradores permitiram reunir
informações suficientes para montar um histórico passado remoto e recente do município,
especialmente os relativos à origem da região e da cultura do café. Esses relatos foram
colhidos por meio de entrevistas com 28 (vinte e oito) famílias, sendo 7 (sete) da região do
Sertão, 13 (treze) do vale do rio São Miguel e 8 (oito) da região entre a cidade de Alto Paraíso
e a de São João D’Aliança.
As entrevistas semi-estruturadas são definidas por Triviños (1990, p.146) como “aquela
que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses que interessam à
pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas
hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas dos informantes”. Ela se
caracteriza, segundo Duarte (2004, p.116) “por apresentar um certo grau de estruturação
inicial, mas ser flexível e adaptável à seqüência de respostas do entrevistado, garantindo que a
fonte, e não o entrevistador, conduza a questão tratada para seus aspectos mais relevantes”.
Os questionários foram elaborados para serem utilizados como um roteiro, como forma
de orientar as entrevistas informais. As entrevistas foram gravadas por nós em gravador, nos
formatos cassete e MP3, sob autorização dos entrevistados. Para a aplicação dos
questionários, permanecemos no município durante duas semanas, período em que visitamos
cada propriedade onde era possível a passagem do veículo de passeio utilizado. A cada dia
foram percorridos cerca de 70 a 90 quilômetros, sempre de carro ou à pé. Quando necessário,
o carro era deixado na estrada, e o restante da trajetória era percorrida a pé, de forma a que
59
fossem alcançadas as propriedades cujo acesso ao carro era impossibilitado, devido a
precariedade das estradas.
As visitas às propriedades e a participação nos encontros foram registrados por
fotografias, algumas das quais ilustrarão o final deste trabalho.
Para garantir o anonimato das famílias e dos entrevistados, citamos os nomes apenas das
pessoas cujas referências foram feitas em textos de outros autores ou das pessoas cuja
indicação no texto revela sua identidade.
60
3. A HISTÓRIA DO NORDESTE GOIANO
O singular refere-se à escala adotada pelo pesquisador para realizar a
abordagem da realidade humana: uma cidade, uma região, um país, um
continente, etc. O singular é manifestação, no espaço convencionado, de
como leis gerais universais operam dando-lhe uma configuração específica
(ALVES, 2003, p. 28).
A abordagem da realidade de um território, a partir da escala adotada pelo pesquisador,
parte da análise de quais circunstâncias levaram a essa realidade atual e das relações
existentes, desde os seus primórdios, entre o homem e a natureza, bem como da
transformação do espaço que ocorreu com essa ação (LEFEBVRE, 2000). Segundo Rafestin
(1993) ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente, o ator territorializa o
espaço
10
. E nessa perspectiva, para o estudo da territorialização do espaço na região que
abrange as áreas limítrofes ao Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, é preciso buscar na
história a evolução das relações do homem com o seu espaço, com a produção desenvolvida
nesse espaço e com a organização social dominante.
3.1 As bandeiras e a colonização de Goiás
O processo sócio-cultural que resultou no estabelecimento da capitania de
Goiás integra a história de ocupação do interior do Brasil, quando, nos
séculos XVI e XVII, jesuítas, viajantes e bandeirantes contataram os grupos
indígenas locais. Enquanto os jesuítas tinham o suposto objetivo de
catequização dos indígenas, os bandeirantes buscavam capturar índios para
trabalhos forçados e para indicação da presença de riquezas como pedras e
metais preciosos (ATTUCH, 2006, p.15).
10
Cruz (2005), Tibúrcio (2006) e Silva (2007), sob a mesma orientação, partem de igual perspectiva.
61
Quatro foram as etapas de intervenção e ocupação dos cerrados, cada uma delas
associada à exploração econômica dos recursos ambientais: a captura e escravização indígena;
a lavra de minerais preciosos, a partir do emprego da mão-de-obra de escravos africanos; a
fazenda policultural pecuarista ultra-extensiva; e a agricultura de áreas de cerrado
(ALBUQUERQUE, 1998). Porém, na região da Chapada dos Veadeiros, em virtude de sua
excepcionalidade ambiental, uma outra forma de intervenção foi desenvolvida nos últimos
anos, a do ecoturismo.
A região de Goiás foi desbravada pelos bandeirantes desde o início da colonização
brasileira, mas seu povoamento se deu com a descoberta das minas de ouro no século
XVIII. As bandeiras, como foram chamados os deslocamentos de desbravadores pelo interior
do país, saíam de São Paulo em busca de índios, cada vez mais escassos e, com freqüência,
chegavam ao extremo norte de Goiás, na região do Estreito. De início, as expedições seguiam
em canoas o curso dos rios: Paranaíba-Tocantins-Araguaia, até voltar pelo Tietê a São Paulo.
A viagem podia durar anos (PALACÍN; MORAES, 1989).
O desbravador de Goiás foi Bartolomeu Bueno da Silva, mais conhecido por
Anhangüera, cuja bandeira saiu de São Paulo em 3 de julho de 1722, retornando dessa
primeira viagem em 1725, após ter descoberto várias minas de ouro, em regiões com ótimo
clima e de fácil acesso. O povoamento de Goiás iniciou-se nesse período. Nos vinte primeiros
anos da mineração, quase todo o território foi percorrido e vasculhado pelas bandeiras à busca
de novas jazidas, porém as populações só se fixaram onde foi achado ouro (PALACÍN;
MORAES, 1989).
Três zonas foram povoadas de forma irregular e instável durante o século XVIII com
relativa densidade: uma zona no centro-sul - Santa Cruz, Santa Luzia (Luziânia), Meia Ponte
(Pirenópolis) principal centro de comunicações, Jaraguá, Vila Boa, entre outros arriais. A
segunda zona era na Região do Tocantins, no alto do rio Tocantins ou Maranhão - Traíras,
62
Água Quente, São José (Niquelândia), Santa Rita, Muquem e outros. Entre o Tocantins e os
chapadões encontravam algumas povoações dispersas - Arraias, São Félix, Cavalcante,
Natividade, Porto Real (Porto Nacional), que era o arraial mais setentrional.
A ilustração constante no Anexo A mostra a divisão da capitania em julgados e arraiais.
A área do Julgado de Cavalcanti corresponde à região em que hoje se encontra o município de
Alto Paraíso de Goiás.
Durante os primeiros cinqüenta anos, todos os esforços de capital e de mão-de-obra,
inclusive de escravos, se concentraram na mineração, o que explica o pouco desenvolvimento
da lavoura e da pecuária em Goiás naqueles anos.
Com relação à mineração, Palacín; Moraes (1989) explica que dois tipos de jazidas
auríferas foram explorados no Brasil:
1) A mineração de morro, praticada por meio de túneis e galerias (mineração de mina),
ou cortando a montanha perpendicularmente (talho aberto).
2) As jazidas sedimentares eram exploradas pela chamada mineração de cascalho, onde
o ouro, levado pelas chuvas, fica depositado no cascalho, no fundo das correntes de água,
como córregos e rios. O trabalho do mineiro é o de retirar o cascalho e peneirá-lo, para
que o ouro, mais pesado que a areia, fique depositado no fundo. Esse tipo de mineração,
mais simples, foi quase a única que foi praticada em Goiás. Por isso, os arraiais eram
instalados sempre próximos aos rios.
Goiás foi o segundo produtor de ouro do Brasil no século XVIII. No auge de sua
produção, na década de 1750, a média de ouro extraída na jazidas de Goiás era de 25.000
quilos por ano (ATTUCH, 2006). Nos primeiros anos da mineração, foi grande o número de
mineiros que foram para levando seus escravos. As distâncias dos centros consumidores,
como Rio de Janeiro, Bahia e São Paulo, eram muito grandes e, portanto, o preço das
mercadorias importadas dessas regiões, muito alto. O período de exploração do ouro em
63
Goiás foi curto, “a mineração foi um negócio próspero até 1750, um empreendimento
arriscado, mas ainda rendoso entre 1750 e 1770, e um negócio ruinoso depois dessa
data” (PALACÍN; MORAES, 1989, p. 22).
Os negros estiveram presentes na história de Goiás desde seus primórdios, colaborando
na formação étnica e na evolução sócio-econômica e cultural do estado (BAIOCCHI, 1983).
Durante as incursões das bandeiras, foi o negro que possibilitou a colonização do vasto
território goiano. Enquanto os bandeirantes seguiam sozinhos, sem suas famílias, os negros
eram levados nas expedições, com mulheres e filhos, e eram utilizados como exploradores de
minérios, lavradores, militares (para perseguição de índios fugidos e no combate aos índios
selvagens). Mas, de acordo com Baiocchi (1983, p.18), “a tarefa principal do negro nas
bandeiras foi sua ação que possibilitou a fixação no solo. Assegurada a conquista de novas
terras, competia ao negro trabalhá-la, plantar e colher o alimento necessário à manutenção de
todos”. A inexistência de mulheres brancas no Planalto Central incentivou, nos séculos XVIII
e XIX, a intensa miscigenação, que os proprietários das minas, homens brancos, uniam-se
às índias e negras.
O fim da atividade mineradora em Goiás fez com que os ricos senhores migrassem para
outras regiões do Brasil onde a extração do ouro era mais viável. Os que permaneceram na
região passaram a se dedicar à pecuária, que requeria menor número de escravos, e à lavoura,
utilizada, no início, apenas para a subsistência. Os escravos da região passaram a ter menor
valor no comércio, que os senhores não tinham mais como pagar os altos preços antes
cobrados. Essa diminuição no preço possibilitou a muitos escravos comprar as suas próprias
cartas de alforria, bem como para seus parentes, a partir do trabalho que já era feito na lavoura
em forma de parcerias que, conforme Attuch (apud BAIOCCHI, 1983), era o sistema mais
comum no estado de Goiás,
[...] de acordo com o qual o trabalhador explora ouro, semeia a terra e colhe
os frutos, cuida do gado ou processa a cana colhida nos engenhos, tendo uma
64
porcentagem do produto obtido dada ao dono da mina, da terra ou do gado.
Este trabalhador não recebe remuneração por sua mão-de-obra e de sua
produção sempre é subtraída uma determinada quantia destinada ao
proprietário dos meios de produção (ATTUCH, 2006, p.16).
A agricultura foi se desenvolvendo em Goiás e as lavouras plantadas passaram a ser
produto de exportação no início do século XIX, principalmente com o algodão e o café
extrapolando as fronteiras do país. A primeira referência ao cultivo do café no Estado,
conforme Baiocchi (1983), data de 1804, quando D. Francisco de Assis Mascarenhas, então
governador de Goiás, passou a incentivar o cultivo agrícola em grande escala, deixando para
trás a febre do ouro. No plantio diversificado empregavam-se técnicas rudimentares: “na
lavoura adotavam o sistema de coivara, herdado do índio. As florestas eram queimadas, e
semeava-se sob as cinzas. Plantavam milho, mandioca, cana, algodão, café, tabaco, feijão e
legumes” (BAIOCCHI, 1983, p.35).
Ao sair do período da mineração, a região tentou se desenvolver com a agricultura e,
principalmente, a pecuária extensiva. Documento escrito em 1836, pelo então Governador das
Armas do estado de Goiás, Raimundo José da Cunha Matos faz relatos sobre a região e a
agricultura desenvolvida ali. Naquela época, o primeiro mapa da Capitania de Goiás,
elaborado por Tossi Colombiana, em 1750, dava o nome de Chapada de Cavalcante à região
hoje denominada Chapada dos Veadeiros (ALBUQUERQUE, 1998):
[...] Logo que se chega ao alto da serra continua a estrada pelo meio de
elevadíssimas montanhas, que aqui formão hum desfiladeiro em zig-zag, até
subir ao Chapadão de Cavalcante. Este território em que vou entrando parece
outro Mundo; o ar he muito mais frio, e a atmosphera muito mais clara. Os
moradores deste lugar cultivão vários gêneros de alimentos [...] (CUNHA
MATOS, 1836, p. 204, 207).
Nesse relato, feito no ano de 1824, em que foi realizada a expedição, o autor demonstra o
miserável estado em que se encontrava a Província de Goiás que em outro tempo foi muito
mais rica em ouro, e em edificios, e mais povoada de escravos, e talvez de homens livres,
65
principalmente os de cor branca [...]” (CUNHA MATOS, 1836, p. 206). Sua narrativa mostra a
existência de vários “sítios”
11
ao longo da passagem da expedição, porém afirma que a
agricultura achava-se em abandono.
Cunha Matos também faz referência ao povo da região:
He tão grande a repugnância que a gente destes lugares mostra à agricultura,
que apenas cultivão quanto julgão necessário para não morrerem de fome.
As vistas de todo o povo estão postas na mineração; e apesar da experiência
lhes mostrar que a extracção do ouro he de difficuldade insuperável aos
fracos meios dos habitantes, assim mesmo esperão descobrir tesouros
encantados. O Padre Vigário de Trahiras, homem instruído e muito abastado,
disse-me centos de vezes diante dos seus patrícios e paroquianos, que se os
habitantes de seu districto tivessem tanto trabalho na criação de galinhas,
porcos e bois, como na cultura do milho, feijão e mandioca, não haveria
huma ave ou huma rez para vender e comprar. A preguiça he extremamente
grande; a falta de provisões he enorme, e muita gente ha que vende alguns
gêneros comestíveis para acudir a outras maiores necessidades, ficando
muitas vezes sem terem hum grão de milho ou de farinha para se
alimentarem. O povo espera da providência, e muitos indivíduos existem que
durante a maior parte da sua vida alimentão-se de fructos silvestres, palmitos
e guarirobas, e alguma caça que apanhão em armadilhas, ou matão a
espingarda [sic] (CUNHA MATOS, 1836, p. 207/208).
Goiás experimentou um longo período de estagnação e até mesmo de regressão
econômica. Não muitas informações disponíveis a esse respeito (VALENTE, 2007), o que
levaria a crer que as iniciativas governamentais de estímulo à produção agrícola não
resultaram em maior impacto no Estado. Entretanto, por ser uma população de tradição
agrícola, no final do século XIX, quando a mineração deixou de ser um negócio rentável,
passou-se a cultivar alimentos.
No fim do século XVIII e início do século XIX, com o declínio da
exploração de ouro, os fazendeiros que haviam se enriquecido com a fase
econômica aurífera e que permaneceram, passaram a investir com mais
11
Conforme o Dicionário Aurélio, um sítio é um estabelecimento agrícola de pequena lavoura (AURÉLIO,
2008).
66
intensidade nas atividades pecuárias e agrícolas. O gado fornecia carne,
couro, leite e meio de transporte, enquanto a agricultura focava seus esforços
no cultivo de algodão e café (ATTUCH, 2006, p.26).
Nesse momento, a produção do trigo e do café em Alto Paraíso percorreram trajetórias
diferentes. A produção de trigo foi uma das mais importantes para a economia local durante
um período de tempo e depois foi interrompida de forma radical. A produção de café, apesar
de ter sido importante, já que era usada para troca por mercadorias de valor pelos agricultores,
nunca foi significativa. Mas o produto continua a ser utilizado ainda hoje para o consumo dos
seus habitantes e dos visitantes, do mesmo modo como era feito por seus antepassados.
Udry (2007) registra a existência do trigo veadeiro na região desde 1862, ano em que o
trigo, conforme a autora, atingiu uma safra recorde, mandando para o porto do Rio de Janeiro
vinte toneladas para exportação. E essa produtividade mantinha-se expressiva, mesmo com
alguns fatores negativos, como variações climáticas e de mercado.
O botânico Ernesto Ule, participante da Missão Cruls, que foi enviada ao Planalto
Central no ano de 1892 para delimitar a área da Capital Federal, e que percorreu a região
durante sete meses, registrou assim o que viu:
Entre o vale do Paranã e do Tocantinzinho existe uma chapada designada
nos mapas de Chapada dos Veadeiros [...] a viagem foi boa e transpusemos
chapadões extensos, às vezes de altitudes superiores a 1.300 metros. No
quinto dia avistamos alguns cumes [...] atravessamos [...] o Rio Tocantins,
900 metros do nível do mar. [...] descemos outro vale, e chegamos a uma
localidade denominada ‘Paraíso’ onde passamos o dia seguinte [...] cada vez
alargava-se mais adiante de nós a soberba paisagem, imponente pelo seu
caráter grandioso [...] partindo destes, em direção ao norte, se estende uma
cadeia chamada ‘Chapada dos Veadeiros’, até a vista ser interrompida por
uma paragem montanhosa. [...] depois de algumas horas de viagem,
chegamos à entrada de um vale, onde uns estabelecimentos rurais e nos
foi oferecido um rancho para nossas acomodações. Neste vale corre o Passa-
Tempo pertencente do sistema fluvial do Paranã. O vale penetra
profundamente na serra que por se estende. Conquanto que sua altitude de
67
1.200 metros acima do mar modere o clima, todas plantas tropicais
prosperam sobretudo bananas, canas, mandioca, café, etc., porém considero
o fato da cultura de trigo que na região superior do Tocantins medra
otimamente. Se, infelizmente, é diminuto, atribuído isto é à dificuldade da
venda, ao estado um tanto primitivo dos aparelhos de moenda e à
conseqüente cor escura da respectiva farinha (UDRY, 2007, p. 176).
3.2 A ocupação com a abertura da fronteira agrícola para o Norte
Após a depressão de 1930, o processo de ocupação de Goiás seguiu os interesses do
governo federal de voltar a economia do país para dentro, em locais onde existiam terras
férteis, florestas ainda preservadas e grande extensão de pastagens naturais. Para isso, o
governo lançou o programa Marcha para o Oeste, que tinha por objetivo estimular a
produção econômica no interior do país, devido à crise de abastecimento alimentar nos
grandes centros urbanos ocorrida no período pós-guerra, agravada pelas crises do café, e pelo
interesse de diminuir as importações e substituir os produtos importados pela produção
nacional (CRUZ, 2005). Para isso, era preciso que houvesse a melhoria da infra-estrutura de
transportes em estados como Mato Grosso e Goiás, até aquele momento esquecidos pelo
governo federal, com a ampliação das malhas viárias tanto terrestre quanto aérea.
Nesse período, o Major-Brigadeiro-do-Ar Lysias Augusto Rodrigues comandou
expedição, iniciada em 1935, que percorreu, por terra, do Rio de Janeiro até Belém,
desbravando o interior do país a fim de implantar campos de pouso para aviões do Correio
Aéreo Nacional (CAN) (CAMBESES Jr, 2007). Sobre a região da Chapada dos Veadeiros,
que depois veio a tornar-se reserva ecológica, o autor afirma:
do outro lado do rio, começamos a subir os planaltos escalonados da
Chapada dos Veadeiros. Depois de cansativa subida por três quilômetros,
nosso esforço foi amplamente compensado ao chegarmos ao alto, pois, com
o sol alto e o céu azul, a vista era deslumbrante. Via-se todo o horizonte ao
redor, a mais de cem quilômetros, todo o relevo do solo, planaltos
emntremeados de morros, várzeas verdes, e aqui e ali uma arvore de cor
68
viva. Uma maravilha! Extasiados, permanecemos ali bem uma meia hora
contemplando a paisagem (RODRIGUES, 1943, p. 43).
Com a grande migração para o interior do país, vários vilarejos foram se formando na
década de 1940, dando origem a novas cidades e municípios. Um deles foi Veadeiros, que até
a década de 1950 ficou pertencente a Cavalcante, e em torno do qual predominavam fazendas
e sítios.
Para atingirmos Cavalcante, que fica em um enorme buracão, tínhamos que
descer da chapada dos Veadeiros. Essa descida é simplesmente terrível.
Basta dizer que tivemos que fazê-la a pé, puxando os animais, e com o
máximo cuidado de não falsear o pé. Rampas abruptas, pedregal solto,
margeando pontos perigosos, foi isso o que encontramos durante uma hora
de descida (RODRIGUES, 1943, p. 54).
Em 1953, o município de Veadeiros emancipa-se de Cavalcante, tornando-se um novo
município. Seu nome lembra a atividade predatória de veados, animal bastante abundante na
região, e cuja pele tinha elevado valor econômico no meio rural.
A origem de Veadeiros, como de S. João da Aliança, foi uma fazenda; em
Veadeiros, o dono da fazenda, Sr. Moisés Bandeira, compreendendo que
teria os elementos necessários ao serviço da fazenda quando conseguisse ali
fixá-los, começou a construir uns ranchos, nos quais facilitava a moradia a
quantos quisessem trabalhar na fazenda. Assim começou a povoação. Em S.
João da Aliança a fazenda pertencia ao Sr. Néri, nosso guia e dono da
comitiva que utilizávamos (RODRIGUES, 1943, p. 47).
O militar impressiona-se com o abandono em que se encontravam os habitantes do lugar.
Numa mesma região, a expedição se deparou com imensas fazendas improdutivas e aldeias
quilombolas, nas quais habitavam uma população que vivia em estado de penúria:
Cerca de uma legua do local onde foi S. Felix, existe uma aldeia de negros
descendentes de escravos, doentes, degenerados, sujos, verdadeiros farrapos
humanos, que não se sabe como ainda existem (RODRIGUES, 1943, p. 66).
Curioso é observar-se um contraste aqui: junto a um grande número de
proprietários de vastidões territoriais, que raramente os donos conhecem
69
integralmente, vastidões que encerram riquezas das mil e uma noites, há uma
massa da população pobre, miserável, curtindo fome, devorada pelas
doenças, sobretudo pelo impaludismo. Quando liquidaremos o latifúndio no
Brasil?!... (RODRIGUES, 1943, p. 70).
A partir de 1960, a inauguração de Brasília fez crescer a procura pelo desenvolvimento
do interior do país, inaugurando também uma nova fase na ocupação do território goiano.
Nesse período, a integração do Sul e do Sudeste do País com o Norte e o Nordeste estimulou
a abertura de novas fronteiras agrícolas, especialmente na região dos cerrados.
É nesse processo de interiorização e de promoção da melhoria de infra-
estrutura urbana no centro do país que Alto Paraíso ganha importância, por
estar, no sentido Sul-Norte, a meio caminho de Formosa (Goiás) e Palmas
(atual estado de Tocantins), bem como ligar, no sentido Leste-Oeste o vale
do rio Tocantins ao vale do rio Paraná (ATTUCH, 2006, p.19).
E o norte de Goiás descobre, finalmente, sua vocação. A região possui belezas naturais
que favorecem a exploração do turismo ecológico. Além disso, é muito favorecida pela
grande quantidade de rios, córregos e lagos, destacando-se o Rio Preto, das Pedras e
Tocantinzinho. Do Rio Tocantins, a abundância de água proporcionou a construção de uma
imensa barragem da Hidrelétrica de Serra da Mesa, com um lago de cerca de 1.780
quilômetros quadrados.
Com isso, pela lei estadual número 4.685, de 15 de outubro de 1963, o município de
Veadeiros passou a denominar-se Alto Paraíso de Goiás (ver Anexo B). O proprietário da
Fazenda Vereda, Dimas de Almeida Sobrinho, que foi o primeiro vereador eleito no
município, afirma que foi por sua sugestão que o município passou a se chamar Alto Paraíso
de Goiás. Segundo ele, este nome foi escolhido entre os cinco propostos pelos vereadores do
município para a cidade: Planalto Rico, Montevidil, Monte Sinai e Alto Tocantins, esse
último também sugerido pelo então vereador Dimas.
3.3 A vocação para o turismo ecológico
70
Na década de 1960, ao final de seu mandato, o então presidente da República, Juscelino
Kubitscheck, criou doze parques nacionais, dentre os quais, três localizados na região do
cerrado: o Parque Nacional das Emas, o Parque Nacional de Brasília e o Parque Nacional de
Tocantins. Este último, criado a partir do decreto número 49.875, de 11 de janeiro de 1961,
abrangia uma área de 625.000 hectares. Os limites do parque começavam na
[...] margem direita do Rio Tocantins, na confluência do Rio Tocantinzinho,
seguindo por este até a sua nascente; daí através das vertentes contornando a
cidade de Veadeiros até a nascente do Rio Preto; daí seguindo pela mesma
vertente, até a nascente do Córrego Santa Rita; daí pelo referido córrego até
a confluência com o Ribeirão São Félix; daí, pelo referido ribeirão São Félix
até a sua confluência com o Rio Tocantins; daí, rio acima, até o ponto de
partida (BRASIL, 2007).
A grande extensão inicial do parque trouxe conseqüências devastadoras para a população
rural local, colocando em risco a sobrevivência econômica do município devido a diminuição
das atividades agropecuárias e mineiras. Outros problemas foram identificados na
implantação da Unidade de Conservação e relatados em estudo feito pelo Ministério da
Agricultura no ano de 1966, como a falta de recursos financeiros para a compra de terras
escolhidas e a falta de recursos humanos qualificados (ALBUQUERQUE, 1998). Com isso,
nos anos subseqüentes à sua criação, os limites do Parque foram sucessivamente alterados em
1972, por meio do Decreto n. 70.492 - de 11 de maio de 1972 (BRASIL, 2008a), em 1981 por
duas vezes, pelos Decretos n. 86.173, de 02 de julho de 1981 (BRASIL, 2008b), e Decreto n.°
86.596, de 17 de novembro de 1981 (BRASIL 2008c), em 1990, pelo Decreto n.° 99.274, de
06 de junho de 1990 (BRASIL, 2008d), e em 2001, pelo Decreto n.° 3.942, de 27 de setembro
de 2001 (BRASIL, 2008e), sendo drasticamente reduzido aos atuais 65.514 hectares, e seu
nome alterado para Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.
A região nordeste de Goiás é uma das que guardam as maiores riquezas naturais do
estado, tendo sido, por isso, reconhecida pela UNESCO, no ano 2.000, como Reserva da
71
Biosfera do Cerrado Goyaz. Em 2001, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros foi
declarado Sítio do Patrimônio Natural Mundial, pelo mesmo organismo. O objetivo de sua
criação foi preservar o cerrado de altitude e a fauna local, a interpretação ambiental, o
ecoturismo, a pesquisa científica e a educação ambiental (IBAMA, 2006).
Para preservar a área limítrofe ao Parque, em 2001 foi criada a Área de Proteção
Ambiental - APA de Pouso Alto, estabelecida a partir do decreto do estado de Goiás de
5.419, de 07 de maio de 2001 e na qual está inserido o município de Alto Paraíso de Goiás. A
APA de Pouso Alto é “destinada a fomentar o desenvolvimento sustentável e a preservar a
flora, a fauna, os mananciais, a geologia e o paisagismo da região de Pouso Alto, localizada
na Chapada dos Veadeiros, neste Estado” (GOIÁS, 2007). A APA possui 872.000 hectares e
abrange as áreas rurais dos municípios de Alto Paraíso de Goiás, Cavalcante, Teresina de
Goiás, Colinas do Sul, São João D’Aliança e Nova Roma. Segundo o artigo 4° desse decreto,
[...] para resguardar e proteger a integridade da APA de Pouso Alto todos os
empreendimentos susceptíveis de provocar modificações e/ou impactos
ambientais dentro e num raio de 10 km dos limites desta Unidade de
Conservação, deverão ser submetidos à anuência da Agência Goiana de
Meio Ambiente (GOIÁS, 2007).
Mesmo decadente, em comparação ao apogeu atingido no século XIX, a mineração em
Goiás continuou a ser atividade promovida por seus habitantes. Até o final da década de 1930,
o cristal de rocha, outro importante produto da mineração na região, obtinha um valor muito
grande para a venda porque, devido suas propriedades, a pedra tornou-se matéria prima da
indústria elétrica. Porém, o final daquele ciclo fez com que desaparecessem alguns vilarejos
surgidos na região por causa da mineração, como os do Silêncio e do Segredo, que ficavam
próximos a Vila São Jorge. O vilarejo Silêncio foi completamente abandonado em 1971
(SILVEIRA, 1997).
72
Entretanto, a partir da criação do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, em 1961, a
relação do garimpo com o Parque passou a ser conflituosa e foco de embates. O parque atraiu
ecologistas e ecólogos para a região, que consideravam os garimpeiros os verdadeiros vilões
da preservação, depredadores e exploradores inconscientes do meio ambiente. Porém, antes
de depredadores do meio ambiente, os garimpeiros eram mais voltados para a produção de
alimentos do que para a exploração. Sobre os garimpeiros radicados na região, Silveira (1997,
p. 6) explica que eles
[...] estão mais ligados à terra, porque são também agricultores. O quartzo
hialino ou cristal de rocha, por ter um valor oscilante e limitado, divide com
a roça e a criação o espaço produtivo. A exploração do mineral é realizada
com técnicas artesanais, mobilizando poucas pessoas (principalmente velhos,
mulheres e crianças) e contribuindo para a exígua economia familiar.
Hoje Goiás, além das dotações naturais do estado que favorecem a exploração do turismo
de natureza, tem sua economia baseada na produção agrícola e pecuária, no comércio e nas
indústrias de mineração, alimentícia, de confecção, mobiliária, metalúrgica e madeireira. Na
agricultura, destaca-se na produção de arroz, café, algodão herbáceo, feijão, milho, soja,
sorgo, trigo, cana-de-açúcar e tomate (CRUZ, 2005).
Entretanto, para Campos (2002), por ter problemas semelhantes aos da região nordeste
brasileira, devido ao nível de pobreza da população, à escassez de água e a dificuldade de
manejo do solo, e outros, a região nordeste de Goiás é tratada de forma injusta. Segundo ele,
diferentemente dali, no nordeste brasileiro, existe o apoio à produção na agricultura por meio
de incentivos fiscais, que possibilitam o crescimento e o desenvolvimento. Hoje, a região
nordeste goiana guarda os maiores problemas socioeconômicos de Goiás, é conhecida como a
mais pobre do estado - o que lhe reservou o clichê de corredor da miséria (CARVALHO,
2004) - e sofre principalmente com a falta de definição de políticas públicas voltadas para o
desenvolvimento local. É, portanto, uma região muito carente e necessitada de apoio
73
governamental e empresarial. O quadro abaixo mostra a parcela de participação da região na
economia de Goiás em anos anteriores, conforme levantamento da Secretaria do Planejamento
e Desenvolvimento do Estado de Goiás (SEPLAN/GO).
Tabela 3.1 - Dados demográficos do nordeste goiano
INDICADORES DADOS
% em Relação a
Goiás
ÁREA TOTAL 38.726,3 km
2
11,39
POPULAÇÃO (2005) 155.886 2,77
ARRECADAÇÃO DE ICMS (2005) R$ 30.057.000 0,71
N.º DE ESTABELECIMENTOS INDUSTRIAIS (2005) 102 0,85
TAXA DE MORTALIDADE INFANTIL (por 1000
nascidos vivos) % 1998
39,36 -
TAXA DE ANALFABETISMO (% 2005) 22,35 -
N° DE SALAS DE AULA (2005) 1.351 3,99
N.º DE LEITOS EM HOSPITAL (2005) 381 2,01
N.º DE MÉDICOS (2002) 72 0,97
N.º DE ELEITORES (2006) 115.556 3,19
SISTEMA DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA (2005)
População Urbana Atendida
89,48 % -
SISTEMA DE ESGOTAMENTO SANITÁRIO (2005)
População Urbana Atendida
8,39 % -
Fonte: SEPLAN/GO (2007).
Para ilustrar a situação que desvela a dura realidade local, vejamos abaixo a tabela que
compara as diversas regiões do estado, elaborada por Carvalho (2004), utilizando-se de dados
da SEPLAN-GO (2000), e baseando-se nos indicadores municipais que compõem o IDE
(Índice de Desenvolvimento Econômico) e o IDS (Índice de Desenvolvimento Social). A
partir dessa comparação, o nordeste goiano (região de planejamento) é classificado em 10°
lugar, ocupando a última posição no estado. Conforme a autora, esses dados foram
construídos a partir de análise de elementos tais como: a infra-estrutura dos municípios, a
qualificação da mão-de-obra formal e a renda municipal per capita, além de considerar o
desempenho dos setores da saúde, da educação, da oferta de serviços básicos e da renda da
mão de obra formal, respectivamente (Tabela 3.2).
74
Tabela 3.2 - Índice de Desenvolvimento Social (IDS) e Índice de Desenvolvimento
Econômico (IDE), por regiões de planejamento do Estado de Goiás – 2000.
Regiões de Planejamento IDS Classificação IDE Classificação
1. Sudoeste Goiano 5031,2 5091,4
2. Sul goiano 5029,0 5047,0
3. Região Metropolitana de
Goiânia
5028,5 5018,7
4. Sudoeste Goiano 5019,1 5028,9
5. Oeste Goiano 5003,1 4995,0
6. Noroeste Goiano 4996,0 4973,3
7. Centro Goiano 4989,0 4971,9
8. Norte Goiano 4977,2 4973,2
9. Entorno do Distrito Federal 4965,7 4955,3
10. Nordeste Goiano 4951,8 10º 4926,3 10º
Fonte: SEPLAN-GO/SEPIN – Gerência de Estudos Especiais. Dados de 2000 (CARVALHO, 2004).
A autora afirma que, com base nessa tabela, muitos moradores dos municípios do
nordeste goiano têm discutido as políticas aplicadas na região que se voltam muito para o
caráter assistencialista, alegando a ineficácia em desenvolver os municípios e dar autonomia à
população residente, deixando-a mais dependente dos governos municipal, estadual e federal
(CARVALHO, 2004).
O município de Alto Paraíso de Goiás está situado numa região caracterizada pelo bioma
Cerrado
12
. Possui 2.593 Km² de área e abriga um total de 6.182 habitantes, sendo 2.003 na
área rural. O Produto Interno Bruto (PIB) do município em 2003, conforme o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2006), foi de 24.572.000 reais, com um PIB per
capita naquele ano de 3.521 reais.
12
O cerrado é um ecossistema que ocorre em dezesseis estados brasileiros, ocupando entre 20 a 25% da área
total do país, ou mais de um milhão de quilômetros quadrados, mas que se concentra em: Minas Gerais (37,35 de
sua superfície), Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (35,4%) e 73% em Goiás/Tocantins (UDRY, 2001). É
considerada a savana mais rica do mundo em biodiversidade (IBAMA, 2007a).
75
Hoje, Alto Paraíso de Goiás possui 100 produtores rurais registrados no Sindicato Rural,
dos quais cerca de 70% são de agricultores familiares. A produção agrícola na região é
dificultada por vários motivos, que serão listados ao longo deste trabalho. Porém, dois
motivos são citados por todos os produtores entrevistados:
1) o impedimento da abertura de novas áreas de plantio e do uso de máquinas,
equipamentos e produtos químicos nas áreas pertencentes à Área de Preservação
Ambiental - APA de Pouso Alto, que abrange grande parte do território do município.
Qualquer atitude que acarrete em mudanças na cobertura vegetal existente na região a
partir da criação da APA de Pouso Alto deve ter a anuência, conforme citado acima, da
Agência Goiana de Meio Ambiente. Essa permissão, segundo todos os moradores das regiões
visitadas, é demorada e difícil, que para que haja a aprovação de um novo projeto, técnicos
dos organismos responsáveis pela anuência precisam comparecer à propriedade para analisar
tal possibilidade.
2) a dificuldade em contratar trabalhadores rurais atualmente na região, devido a dois
motivos: o alto preço cobrado pela mão-de-obra local e a legislação trabalhista.
O início da exploração da região para o ecoturismo, com a criação do Parque Nacional da
Chapada dos Veadeiros, elevou o custo da mão-de-obra rural, pois grande parte dos
trabalhadores nas atividades agrícolas passou a trabalhar como guias de turismo, já que
conheciam muito bem a região. Segundo os proprietários, cada trabalhador cobra cerca de R$
20,00 (vinte reais) a tarefa agrícola por cada dia trabalhado, sendo que, uma tarefa é a unidade
de medida de uma área e todo o trabalho de manejo do solo e da produção realizado no
interior daquela área. Problemas, também, com as exigências burocráticas trabalhistas,
limitam a contratação de trabalhadores para o serviço rural.
Mesmo aos proprietários que concordam em pagar o valor cobrado pelos trabalhadores
rurais, é difícil encontrar trabalhadores dispostos a aceitar o trabalho. A concorrência vem,
76
também, do valor da diária pago pelo Ibama para a atividade de prevfogo, cujo objetivo é a
prevenção, o controle e o combate aos incêndios florestais e às queimadas que ocorrem na
área do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros (AMBIENTEBRASIL, 2007)
Outro grande problema existente na região, principalmente para a busca de
financiamento da produção, é que a maioria das terras não é demarcada. Muitos antigos
proprietários receberam suas terras em doação. Donos de grandes extensões de terras
costumavam doar parte delas aos seus mais fiéis empregados. A grande maioria desses
empregados era formada por negros, antigos escravos ou descendentes de escravos, que
habitavam a região em grande quantidade. Albuquerque (1998 apud FUNES, 1986) afirma
que a concentração de africanos e seus descendentes na região era tão grande que dados
estatísticos de 1822 apontam a existência de 2.067 habitantes na região, dos quais 456 eram
escravos, 1.448 eram homens livres de cor e 163 eram homens brancos, sendo esse o mais
alto índice de população branca do norte de Goiás. Hoje, regiões do município como Moinho
e Bonsucesso são caracterizadas por uma população predominantemente negra e mestiça
(UDRY, 2001).
Os proprietários das terras, por sua vez, herdaram suas propriedades de seus antecessores
sesmeiros, que as terras privadas existentes na região foram distribuídas pelo sistema de
sesmarias. Este sistema foi utilizado no Brasil a partir dos colonizadores portugueses ainda no
ano de 1530, para a distribuição de terras destinadas à produção, principalmente da cana-de-
açúcar. Além da concentração fundiária proporcionada pelas sesmarias, cujos grandes
proprietários chegavam a possuir 20 léguas quadradas ou mais, existiam os sitiantes, donos de
pequenas glebas e os posseiros, que iam ficando aonde chegavam para trabalhar a terra
(BAIOCCHI, 1983).
77
4. ALTO PARAÍSO: OS DESAFIOS DA MEMÓRIA
Torna-se necessário dar voz ao camponês tradicional e ao indígena,
convertendo-os em partícipes do destino da região que ocupam; reconhecer
neles os guardiões não apenas das plantas e animais, mas também do ar puro,
da água não poluída, dos alimentos não contaminados, do silêncio e,
sobretudo, de uma diversidade cultural alternativa a ser resguardada.
Ao comercializar os bens naturais, antes isentos de valor mercantil, como
forma de exploração futura ou garantia de qualidade de vida presente, será
possível obter um ressarcimento por sua conservação.
Nesse contexto, surge a questão da biodiversidade que, no cerrado e na
Amazônia, apresenta um número muito elevado de espécies biológicas. Mas
ela o é fruto apenas das forças da natureza, e sim das atividades
econômicas e agrícolas das sociedades tradicionais de pequena escala. A
biodiversidade é, na verdade, um fenômeno biocultural, representando, em
grande parte, milhares de anos de interpretação das sociedades indígenas e
depois rurais com seus ambientes imediatos (RIBEIRO, 1993).
Considerando-se que a memória organiza o passado em relação ao presente
(HALBWACHS, 1990), neste capítulo pretende-se mostrar como os habitantes de Alto
Paraíso e seus guardiães (GIDDENS, 1997), construíram, para além das fronteiras,
demarcações territoriais (PERICO; RIBEIRO, 2005; RAFESTIN, 1993; ABRAMOVAY,
2002) a partir da localização das regiões e de suas similaridades topográficas.
Dados relativos à produção rural do município situado na região nordeste de Goiás são
também apresentados, que incluem a memória de seus habitantes sobre as atividades
produtivas ali desenvolvidas ao longo dos anos. Isso porque é fundamental, nesse caso, olhar
para o passado para entender o desenvolvimento das formas produtivas, bem como a sua
relação com a transformação do espaço a partir da ação do homem (LEVEBVRE, 2000).
78
Alguns relatos expressam os desafios que devem ser enfrentados na construção de um projeto
de desenvolvimento.
A área rural do município é hoje dividida, conforme sua localização no mesmo, em três
regiões, recebendo muitas vezes a denominação das antigas fazendas que ali existiam e que
foram dividias ao longo do tempo:
A região do Sertão é localizada a nordeste do município e composta por vales produtivos,
entre eles o Bonsucesso, o Moinho, e o de Serra, área de mais difícil acesso devido a
precariedade das estradas.
A região do vale do rio São Miguel, onde se encontra a Vila São Jorge, é onde se localiza
o acesso mais conhecido ao Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.
A outra região é a que fica ao Sul do município, cujo acesso se ao longo da estrada
que liga a cidade de Alto Paraíso de Goiás à de São João D’Aliança. É uma região com solo
mais plano, onde estão as produções mais extensivas, principalmente de milho, soja e cana, e
as fazendas de criação de gado e onde se encontram as áreas produtivas conhecidas como
Posse, Piçarrão, Bandeira e a Cidade da Fraternidade.
4.1 Sertão: Fama, misticismo, tragédia
O Moinho é uma das regiões mais conhecidas nas proximidades da cidade de Alto
Paraíso de Goiás. O ponto alto de sua fama foi no final dos anos 1980, quando ocorreu mais
intensamente a exploração turística de suas mais conhecidas cachoeiras (Anjos e Arcanjos) e
por suas histórias místicas.
O Moinho está localizado a doze (12) quilômetros da cidade de Alto Paraíso, em uma
região chamada Sertão, que também abriga as microrregiões do de Serra e de Bonsucesso,
e onde estão os vales produtivos. Banhada por três rios, São Bartolomeu, Santo Antônio e Rio
Preto, e por um córrego, Manhana, a região deveria ser favorecida pela existência de muita
79
água e pelo solo rico devido à matéria orgânica depositada nos vales. Hoje, porém, os
agricultores do Moinho reclamam a falta de água suficiente para a implantação de um projeto
agrícola. Poucas áreas possuem fartura de água, tão necessária em toda a região, devido ao
período de estiagem ser muito grande, estendendo-se, às vezes, de fevereiro a novembro.
A produção agrícola, segundo os moradores da região, é muito dificultada pela falta de
água para irrigação, pois, além da seca, o solo é muito cheio de cascalho. Um morador lembra
que em sua propriedade, antigamente, cerca de setenta (70) anos atrás, existia um grande
cafezal e muitas árvores de marmelo. Porém, naquela época, segundo ele, “o rego
13
corria
dentro da propriedade como se fosse um rio”. Para outra moradora, o rio sumiu “por causa da
água encanada”.
Cerca de noventa por cento (90%) da comunidade é participante da Comunidade
Evangélica Projeto de Deus, que chegou à região pouco tempo depois que o último padre
católico abandonou o lugar sem motivos aparentes (ATTUCH, 2006). Predominantemente
católica, com a chegada do pastor a comunidade passou a integrar a igreja evangélica.
Duas grandes propriedades privadas da região, o Solarión e a Flor de Ouro, surgiram na
década de 1980 a partir de movimentos migratórios alternativos e esotéricos, nas quais se
trabalhava com as idéias de comunicação extraterrestre (ATTUCH, 2006). Durante muitos
anos o Solarión, onde se encontram as conhecidas cachoeiras Anjos e Arcanjos, explorou o
turismo e a vida alternativa, porém suas atividades foram bruscamente interrompidas com o
trágico assassinato da proprietária e de sua filha por um trabalhador da propriedade.
A existência de pessoas que vivem a chamada vida alternativa no povoado também hoje
é percebida pelos habitantes do Moinho. Em uma das extremidades da estrada que atravessa o
povoado, existe uma propriedade onde moram antigos participantes da comunidade hippie,
cuja população raramente é vista e que não participa das atividades desenvolvidas no local.
13
Conforme definição de Aurélio (2008), um “sulco natural ou artificial que conduz água, ou sulco deixado pelo
arado, ou ainda valeta num campo cultivado”.
80
Segundo os moradores do Moinho, esses habitantes produzem seu próprio alimento, usam
roupas que eles mesmos confeccionam e vivem com o que têm na propriedade. Eles não
interferem na nossa vida nem nós na deles”, afirma um morador.
Algumas associações foram iniciadas no passado para tentar agregar os agricultores do
Moinho em torno de um projeto comunitário, porém nenhuma persiste até hoje. As principais
iniciativas foram a Amormoinho - Associação dos Moradores do Moinho, e a ASFLO -
Associação dos Catadores de Flores do Cerrado.
A Associação Amormoinho foi criada especialmente para a realização de um projeto para
a montagem de viveiro de ervas medicinais e árvores frutíferas iniciado em 1997, e que
cerca de dois anos (2005) foi finalizado. O projeto foi iniciado com a instalação das mudas e a
compra de material. Após dez anos, porém, não se sabe o que foi feito do material comprado e
as terras que haviam sido disponibilizadas para o projeto tiveram que ser devolvidas, que
não havia mudas ou plantas para serem comercializadas. As ervas medicinais, agora, estão
plantadas na propriedade de Dona Flor, uma das líderes do projeto, que as utiliza na produção
de xaropes, sabão, óleo e todo o tipo de produto a partir das ervas medicinais.
Dona Flor - raizeira, parteira, agricultora e líder comunitária - também possui em sua
casa um tear para fiar algodão, e vários trabalhos de tecelagem estão expostos para quem se
interessar em adquirir. Esses trabalhos fazem parte de outro projeto liderado por ela. O
trabalho feito por Dona Flor vai desde a fiação do algodão, produzidomesmo na região, até
a confecção do trabalho manual. Junto com ela, participam desse projeto mulheres da região,
que fabricam as peças de vestuário, enfeites para casas, etc. e os expõem na feira da cidade,
que acontece todo sábado pela manhã. Alguns empresários também expõem os trabalhos em
estabelecimentos turísticos da cidade.
Uma foto que a agricultora expõe com orgulho em sua sala, retratando seu esposo, em
uma mata repleta de flores do Cerrado, é um registro do outro projeto iniciado na região. O
81
desenvolvido pela ASFLO - Associação dos Catadores de Flores do Cerrado. Esse projeto
tinha como objetivo o extrativismo de flores e produtos da região para a produção de arranjos
florais, doces e biscoitos. Ela explica que os arranjos e os produtos do cerrado produzidos
eram vendidos na comunidade do Moinho, em Brasília, Goiânia, em outras cidades de Goiás e
na cidade de Alto Paraíso, para turistas que visitavam o Parque Nacional da Chapada dos
Veadeiros. Esse projeto deu lucro nos primeiros anos, porém acabou com prejuízo para todos
os que trabalharam no seu desenvolvimento.
Segundo Dona Flor, ninguém sabe exatamente porque os vários projetos realizados na
região fracassaram. Porém, para ela, ambos levaram a um aprendizado, que a seu ver: “no
projeto não pode entrar muito dinheiro. Tem que ser que nem esse projeto da tecelagem. Entra
com as ferramentas, um pouco de produto, pra o povo aprender a trabalhar. O dinheiro tem
que sair do produto que você vende”.
O Povoado do Moinho, bem como a região que o circunda, teria sido formado, conforme
relatos dos entrevistados, provavelmente a partir de duas fazendas, Bonsucesso e Moinho, que
no século XIX produziam prioritariamente o trigo. Os donos dessas fazendas teriam doado
lotes a seus escravos mais próximos, cujas famílias passaram a residir ali. Por esse motivo, os
moradores do local são, predominantemente, negros (ATTUCH, 2006).
A região ficou denominada Moinho, devido a um grande moinho de trigo que existia na
fazenda, herdada pela família do Capitão Mor e que passou a pertencer, por casamento, a João
Bernardes Rabelo, figura muito conhecida da região, fazendeiro que foi deputado e prefeito
do município, e que começou a plantar trigo em 1940. A produção de trigo, muito grande, era
vendida para várias cidades de Goiás, como Formosa e Anápolis, e para outros estados, como
Bahia. O cultivo do trigo foi introduzido na região da Chapada dos Veadeiros no século
XVIII, por imigrantes egípcios. O clima temperado, graças à altitude e à sazonalidade das
chuvas, próprio da ecorregião, permitiu que a cultura se tornasse um sucesso, resultando na
82
construção de moinhos movidos a água. A adaptação secular do produto gerou uma variedade
chamada veadeiros, que chegou a participar da Exposição Internacional na Filadélfia, Estados
Unidos, em 1876 (EMBRAPA, 2008).
As fazendas localizadas no Julgado de Cavalcante, que até então praticavam
agricultura diversificada, voltada principalmente para subsistência e
comércio local, passaram a se dedicar ao cultivo de trigo e se tem o registro
de que, ainda no século XVIII, três engenhos teriam sido fundados neste
Julgado. As terras férteis da bacia do rio São Bartolomeu mostraram-se
excepcionais para o investimento em tal cereal, cujas primeiras sementes, de
acordo com a literatura sobre a região, foram trazidas por egípcios, via
Bahia. Em meados do século XIX, a farinha de trigo era até mesmo
exportada, chegando o produto a participar de exposições internacionais
(ATTUCH, 2006, p. 26).
O trigo era produzido na fazenda por dezenas de trabalhadores contratados por João
Bernardes, e por agricultores que possuíam terras nas vizinhanças que trabalhavam em regime
de meia. Entre esses trabalhadores, o pai da Dona Leonia, mulher forte e alegre que herdou a
fazenda, quando casou com o então viúvo João Bernardes, em 1963. Porém, muito antes,
quando ela ainda tinha 11 anos, relata um dos acontecimentos mais representativos para o
futuro da produção agrícola da região.
O fazendeiro João Bernardes, ainda casado com sua primeira esposa, quando saia para
vender o trigo, principalmente em Goiânia, aproveitava para comprar as sementes para as
novas plantações. Em sua última plantação de trigo, as sementes compradas estavam com
veneno muito forte. E era uma imensa plantação, que na época o mercado estava em franca
expansão e a produção já tinha mercado certo, em Goiânia.
Todos os anos, logo que saía a produção de trigo, havia uma grande festa na região em
homenagem a Nossa Senhora da Conceição. A festa durava nove dias, quando eram servidas
quitandas, ou seja, as iguarias em forma de bolos, biscoitos, broas, feitas com trigo plantado e
moído na região. A própria esposa de João Bernardes fazia questão de elaborar várias fôrmas
83
de roscas, bolachas, e pães com a farinha de trigo que eles mesmos moíam. que o trigo
estava envenenado, e as pessoas que comeram daquelas guloseimas quase morreram de
desarranjo estomacal e intestinal. Grande maioria da população da região passou mal, uma
vez que mesmo os que não foram à festa, receberam em casa, por oferecimento do rico
fazendeiro, os quitutes elaborados por sua esposa.
Ao tentar comercializar o trigo em Goiânia, os compradores, alegando excesso do
produto comprado de outras regiões, recusaram todo o lote, fazendo com que o fazendeiro
tivesse que transportar de volta todo o carregamento. Por não saber o que fazer com tanto
trigo, João Bernardes colocou fogo em tudo, pois ficou com medo de utilizá-lo para novo
plantio ou para o preparo de alimentos. Dona Leonia lembra que esse trigo ficou “queimando
durante meses”.
Depois desse episódio, Bernardes nunca mais plantou trigo. O moinho foi desmontado
em 1975, dois anos após a morte do fazendeiro. Segundo a agricultora, ele foi desmontado
porque, na época, ela estava viúva com crianças pequenas, que gostavam de brincar no galpão
onde ficava a pedra do moinho e onde, devido ao pouco uso, passou a habitar muitos ratos do
mato e cobras. Além disso ela não sabia que essa pedra ia ficar tão famosa como agora, que
vem gente de todo lugar querendo fotografar e filmar a pedra”.
Dona Leonia explica que esse antigo moinho de trigo era formado por duas grandes
pedras redondas que giravam uma por cima da outra, de forma a triturar os grãos que por ali
passavam, transformando-os em farinha. Por ser uma construção rústica e muito antiga, hoje
turistas que visitam a região, gostam de conhecer a construção devido ao resgate histórico,
principalmente, por ter sido utilizado no período escravista e por ter sido parte de um período
de grande importância econômica para a região no passado.
Alguns anos após a morte de Bernardes, certo dia passou pela fazenda de Dona Leonia,
que continuava na lida da roça, como ela mesma diz, um guia de turismo que lhe propôs
84
utilizar sua fazenda como ponto de parada para turistas que, na época, faziam uma trilha da
cidade de Alto Paraíso até a Cachoeira dos Cristais. Para isso, ela precisava oferecer duas
refeições (o jantar e o café-da-manhã) para os integrantes do grupo, além de camas para
dormir durante uma noite. Hoje, além da agricultura e dos doces e queijos que produz, Dona
Leonia - que teve cinco filhos naturais e quatro adotivos, e que cria atualmente outros três
filhos adotivos e um neto - vive da renda proporcionada pelos turistas que comem e dormem
no chalé construído por ela para abrigá-los. Mas raramente passam por desde a diminuição
do turismo na região a partir do ano 2.000.
4.2 Vila São Jorge: turismo e ecologia
A Vila São Jorge é de onde se o acesso de turistas aos principais pontos de visitação
do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. A simplicidade de suas casas e a rusticidade
das fachadas das pousadas e restaurantes transmitem aos visitantes a imagem de um lugar
onde a paz e a tranqüilidade reina por meio da harmonia entre o homem e o meio ambiente.
Por esse motivo, é o lugar mais procurado pelos turistas que buscam maior contato com a
Natureza e as forças místicas que asseguram existirem no local. Porém, ao contrário do que se
imagina, a Vila São Jorge não surgiu como ponto turístico. Ela nasceu muito antes da criação
do Parque. Era um dos aglomerados, as chamadas currutelas, pequenas vilas formadas por
garimpeiros e suas famílias em pontos estratégicos para facilitar a exploração do quartzo
hialino, ou cristal de rocha, a partir do ano de 1912 (SILVEIRA, 1997).
Antes de ser batizada como Vila São Jorge - a partir da iniciativa de Severiano da Silva
Pires, por causa de uma imagem de São Jorge levada para pelos garimpeiros - a localidade
era chamada simplesmente por Baixa. A mudança do nome encontra-se no livro de registros
da paróquia da Vila como tendo acontecido no ano de 1954 (SILVEIRA, 1997).
85
Por estarem muito próximos ao Parque Nacional, os habitantes acreditam que, para quem
possui um pedaço de terra na região, a propriedade é mais valorizada quando não está
produzindo, ou seja, quando é utilizada para o turismo ou para a conservação do meio
ambiente, do que para a produção agrícola.
A tradição de cultivo da terra, que existia nos antigos moradores da área rural próxima à
Vila São Jorge, conforme seus moradores, foi sendo perdida ao longo dos tempos, a partir da
criação do Parque, nos anos 1960. Naquela época, todos os moradores passaram a integrar a
massa de mão-de-obra utilizada para acompanhar os turistas para visitação do parque
ecológico, já que a região era tão conhecida por seus antigos moradores.
4.3 Misticismo, agricultura e pecuária
Em 1956, Lúcio Costa apresentou seu relatório à Comissão que escolheria o
projeto para a construção da nova Capital brasileira, inaugurada em 1960.
Em 1959, grupos espíritas kardecistas começaram a receber orientações
espirituais no sentido de se deslocarem para o Planalto Central, para se
instalarem e desenvolverem um projeto de amparo a crianças órfãs e
abandonadas. Em 1963, um grupo inicia a construção da Cidade da
Fraternidade, a poucos quilômetros da sede do município Alto Paraíso. O
local foi identificado, graças à existência de uma árvore incomum na região
(SIQUEIRA; BANDEIRA, 1998, p 269/270).
Inicialmente foram doados para a Cidade da Fraternidade cerca de 2.544 hectares de
terra, sendo que atualmente contam 2.000 hectares, em regime de comodato com o Ministério
da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
A Cidade da Fraternidade é uma das áreas de produção agrícola da região, que hoje
cultiva principalmente o trigo, arroz, milho e cana. Na Cidade, cerca de 160 crianças estudam
na escola do ensino fundamental, sendo que em torno de 400 jovens são alimentados por dia
no restaurante da Cidade. Além da escola, a Cidade da Fraternidade possui um alojamento
onde abriga os jovens que ali residem. A área da Cidade foi dividida em terrenos de 40 a 100
86
hectares, onde são plantados os alimentos. Dez por cento de tudo o alimento que é produzido
é doado para a Cidade, para alimentar as crianças e os jovens que ali vivem.
Na região que se estende da cidade de Alto Paraíso até São João D’Aliança existem os
produtores que chegaram ao município após a construção de Brasília, mas também moram
muitas famílias de agricultores tradicionais que ali produzem com mão de obra familiar os
alimentos e os produtos para o sustento dos filhos que, geralmente, estudam ou trabalham nas
cidades próximas. Os produtores estão localizados em áreas tais como Piçarrão, Bandeira,
Posse e Cidade da Fraternidade, algumas denominações, provavelmente surgidas a partir dos
nomes das grandes fazendas existentes ali no passado e que foram, com o tempo, divididas.
4.4 O cultivo tradicional de café
Diferentemente do trigo veadeiro, cujo período de prosperidade econômica e a abrupta
interrupção da produção são largamente lembrados por seus habitantes, o café é uma cultura
cuja chegada seus moradores não sabem precisar, embora existam vagas referências aos
escravos negros como cultivadores no período colonial. se lembram que desde que eram
crianças o café existia nos quintais. E sua produção nunca deixou de ser mantida, fazendo
com que cada propriedade da região tenha pelo menos um ou dois pés de café ainda em
produção. Por isso, o café, juntamente com o trigo veadeiro, é um dos produtos agrícolas que
ilustra o brasão do município.
O café na região é tão tradicional e antigo, que moradores destacam algumas localidades
onde eles afirmam que existe um café nativo. Uma dessas localidades é as margens do Rio
São Miguel, onde está a Vila São Jorge, entre as cidades de Alto Paraíso e Colinas do Sul.
Próximo a esta região, entre os anos de 1968 e 1970, aconteceu uma grande chacina de índios
da tribo Avá-Canoeiro por jagunços contratados por fazendeiros da região, que reclamavam
que os índios estariam matando seu gado.
87
Conforme Albuquerque (1998), as expedições chamadas bandeiras foram iniciadas no
século XVII com o objetivo de capturar no interior do território indígenas que seriam usados
como força de trabalho nas plantações, após o esgotamento das reservas próximas ao núcleo
paulista. Os povos que viviam na região limítrofe dos territórios que hoje são os estados de
Goiás e Tocantins eram os índios: Caiapó, Crixás, Acroá, Xacriabá, Xavante, Xerente, Carajá,
Tapirapé, Timbira, Avá-Canoeiro, além de outras etnias que ali viviam há séculos (ATTUCH,
2006).
Estudos históricos demonstram que os Avá-Canoeiro são descendentes dos índios Carijó,
originais do estado de São Paulo, e que teriam sido levados para Goiás em 1724 ou 1726, pela
bandeira de Bartolomeu Bueno, filho do Anhanguera, para auxiliarem na defesa contra os
índios habitantes do território e trabalharem na mineração (INSTITUTO..., 2006). Com o
final da bandeira, os índios foram abandonados à sua sorte, em uma região que eles não
conheciam. Ao ficarem livres, eles recuperaram sua existência como grupo autônomo e
permaneceram em Goiás, porém não tinham muita área disponível para seu sustento,
precisando buscar o alimento nas fazendas vizinhas. O massacre dos índios Avá-Canoeiro
ocorreu em um local denominado “Mata do Café”.
Máila, o encantado, espírito capaz de criar e destruir o mundo dos Avá-
Canoeiro. Para eles, o nome de Máila também designa o homem branco. A
figura mitológica confunde-se hoje com a ira de jagunços contratados para
dar fim à vida dos índios que habitavam o cerrado ao norte de Goiás, num
morro de terras ricas chamado Mata do Café. Para os sobreviventes de um
dos mais violentos massacres vistos no Brasil, matadores que traziam em
punho armas de fogo eram também chamados pelo nome desse poderoso
espírito indígena. Em 1968, um grupo de cerca de 150 pessoas foi vítima da
brutalidade de homens que, enraivecidos, cobiçavam suas terras e
abominavam sua existência. Da grande aldeia, plenamente constituída,
restaram apenas quatro pessoas - um homem, duas mulheres e uma criança.
“Meu papai e minha mamãe morreu. Máila matou”, conta Iawi, que na
época, tinha apenas cinco anos de idade (BRASIL INDÍGENA, 2006, p.8).
88
Segundo os moradores, o local tinha essa denominação devido à grande quantidade de
plantas de café que existiam na região, principalmente no morro de terras ricas. Nos últimos
anos, porém, muitos pés foram cobertos pelas águas da barragem da usina hidrelétrica de
Serra da Mesa, cujas obras de construção foram iniciadas em 1986, inundando uma área de
1.784 km², e atingindo oito municípios do estado de Goiás: Minaçu, Campinorte, Campinaçu,
Colinas do Sul, Uruaçu, Niquelândia, Barro Alto e São Luiz Norte (ANDRADE, 2002).
É em algumas propriedades às margens do Rio São Miguel onde está, segundo os
habitantes, em maior quantidade, o café mais antigo da região. Provavelmente esses são os
cafés brotados a partir dos que foram levados para a região pelos bandeirantes no século XIX.
Árvores muito antigas foram encontradas na propriedade Volta da Serra, que fica a cerca de
doze quilômetros da Vila de São Jorge.
O agricultor e pecuarista de 82 anos diz que sabe como o café chegou à região. Ele
afirma que, proveniente de São Paulo, foi seu bisavô quem levou tanto o café quanto o trigo,
quando chegou à região pelo ano de 1820, onde a família se estabeleceu e vive até hoje.
Segundo o pecuarista, ele é o único morador antigo que, na região, continua com sua
propriedade. Os outros proprietários, segundo ele, foram vendendo suas fazendas e aplicando
o dinheiro em Brasília, logo após sua construção. Ao ser sugerida sua transferência, também,
para a nova capital, o pecuarista afirmou aos entusiastas: “vocês vão indo que eu vou ficar por
último”. Com isso, foi comprando algumas das melhores terras que estavam à venda,
chegando a ter até três mil alqueires goianos de terras, ou 14.400 hectares. Grande parte
dessas terras foi doada para cada um dos seus cinco filhos.
4.5 Em busca de uma estratégia de desenvolvimento
Além dos problemas antigos enfrentados pela região nordeste de Goiás, alguns fatos
ocorreram nos últimos anos, fazendo com que, a partir do ano 2000, Alto Paraíso de Goiás
89
passasse a buscar novas fontes de recursos que pudessem levar mais emprego e renda para o
município, bem como a melhoria da qualidade de vida da população local. Devido à tradição
do turismo ecológico na região, representantes dos diversos setores: público, empresarial,
agrícola, e outros, buscaram restaurar, principalmente, as atividades que pudessem ser
complementares ao turismo, ou que diminuíssem a grande dependência do município com
relação a ele.
Segundo relatos dos moradores entrevistados, dois fatos, ocorridos no ano 2.000, tiveram
reflexos nos anos que se seguiram, acarretando grande diminuição do fluxo de turistas para a
região, trazendo, como conseqüência para o município, o desemprego, o desestímulo e o
empobrecimento de seus habitantes, especialmente aqueles que até então trabalhavam com o
turismo ecológico e místico:
1. O primeiro acontecimento foi a divulgação, pelos veículos de comunicação de massa
em nível nacional, do falecimento de um adolescente, em Brasília, por febre amarela.
Esse jovem havia sido contaminado, supostamente, após passar alguns dias em Alto
Paraíso de Goiás. Mesmo sem a confirmação do local da contaminação, esse
acontecimento trouxe medo aos turistas que pretendiam visitar o município, fazendo
com que muitos deles desmarcassem inclusive viagens programadas à região, e
tirando o município da rota do turismo ecológico brasileiro durante vários anos.
2. O outro acontecimento diz respeito ao caráter místico do turismo em Alto Paraíso de
Goiás, que fez com que vários religiosos, místicos e esotéricos
14
se deslocassem para a
região em busca do éden terrestre durante vários anos, desde meados dos anos 1980.
14
Os conceitos de misticismo e esoterismo são bastante polêmicos, sendo usadas, para os mesmos, várias
definições, dependendo da visão religiosa, filosófica, etc. do autor. Utilizamos aqui as definições escritas por
Siqueira; Bandeira (1998), que tomaram como fonte o Dicionário de Ciências Sociais, 1986.
Misticismo: palavra que se origina do verbo grego myo, que pode ser traduzido por fechar a boca, ou seja, algo
que se percebe íntima e profundamente, mas que não se pode falar. O misticismo nasce do esforço que a pessoa
faz para alcançar a visão única, uma realidade divina e absoluta. Envolve um conjunto de disposições (afetivas,
intelectuais e morais), cuja meta final é a comunhão com o Todo-Poderoso.
Esoterismo: A palavra liga-se à idéia de secreto, no sentido de oculto. Ensinamentos secretos de caráter
imemorial, verdades fundamentais que se transmitem em cadeias de mestres e discípulos. A maçonaria é a maior
sociedade secreta atual e a sociedade Rosa-Cruz (AMORC) é considerada a mais importante na forma
contemporânea.
90
Várias teorias tentam explicar a natureza mística da região. Campos (2002) afirma que o
primeiro indicador vem com o sonho de Dom Bosco, cujos relatos históricos datam de 30 de
agosto de 1883: “Quando se vierem cavar as minas escondidas em meio a estes montes,
aparecerá aqui a terra prometida, que jorra leite e mel. Será uma riqueza incontestável. Isso
acontecerá antes que passe a segunda geração. ...Um lago largo e comprido” (CAMPOS,
2002, p. 23).
Apesar de alguns autores atribuírem essa terra prometida à cidade de Brasília
(WIKIPÉDIA, 2007a), Campos (2002) acredita que o lago largo e comprido, ao qual faz
referência o texto, seria o da Usina de Serra da Mesa, próximo ao município de Alto Paraíso
de Goiás, e o término da segunda geração seria no ano de 2010.
Segundo o autor, outras duas profecias complementariam a de Dom Bosco: a de um autor
francês, A. Cassert, falecido em 1945, denominada Profecia do Plenilúnio; e a atribuída a
André Luiz, tendo sido psicografada por Francisco Cândido Xavier em 1952 (CAMPOS,
2002). O autor também complementa com outras teorias, como a de que na região da Chapada
dos Veadeiros estaria o chacra cardíaco do planeta, o coração da mãe Terra
15
. Outra seria a
afirmação de um jovem físico nuclear de que um canal iluminado por cristais liga a região de
Alto Paraíso a Machu Picchu e às pirâmides do Egito; as afirmações da ocorrência, ali, em
outras dimensões, de cidades e civilizações subterrâneas; e a existência, ainda, de canais ou
portais dimensionais, ou seja, pontes entre o mundo físico e o espiritual; além de muitas
outras evidências citadas pelo autor.
Siqueira; Bandeira (1998) afirmam que o misticismo que envolve todo o Planalto
Central, inclusive a cidade de Brasília, vem da crença de que existe um Paraíso Perdido pela
humanidade, mas que poderá ser reencontrado no terceiro milênio. E a América do Sul seria o
berço desse terceiro milênio, sendo o Brasil, especialmente o Planalto Central, e, mais
15
Essa referência, segundo o autor encontra-se na página 219 do livro Águias Terrestres Uma Missão
Planetária, de Ergom (CAMPOS, 2002, p. 39).
91
especificamente a região de Alto Paraíso, os privilegiados na passagem. E esta seria
interpretada como o encontro dos indivíduos consigo mesmos, para a ocorrência do novo
homem para o novo tempo, por meio de cantos, meditações, retiros, até a eliminação do ego-
humano.
A reunião das teorias místicas e espiritualistas culminou com crença de que, com a
passagem para o ano 2000, o mundo entraria em colapso, quando restariam apenas poucos
lugares possíveis de se viver na Terra, entre eles a região da Chapada dos Veadeiros. Esta
crença fez com que vários religiosos, místicos, espiritualistas, e outros crédulos na teoria se
dirigissem à região nos anos que antecederam àquele de 2000.
Porém, o mundo não acabou naquele ano, mas o caráter místico, esotérico e espiritualista
do turismo da região foi, em grande parte, perdido, fazendo com que diminuísse em muito o
fluxo de pessoas para o município de Alto Paraíso de Goiás. Para um habitante da região,
realmente, a partir daquele ano, o mundo que existia até então acabou, e se transformou em
um outro mundo, muito melhor, onde
[...] as crianças que hoje têm até 7 anos de idade já vieram ao mundo com
um entendimento aprimorado, tanto as que moram num palácio como num
casebre. São crianças mais dóceis. O mundo se transformou para o bem. Não
existe regressão. caminhada. Sempre evoluindo. Nós estamos sempre
melhorando. Pode às vezes ficar parado. Porque uns adiantam mais no
entendimento. Mas sempre melhorando
De qualquer modo, crendo ou não nas teorias místicas, o certo é que houve o grande
deslocamento do turismo de Alto Paraíso de Goiás para outras regiões do Centro Oeste com
características similares do ecossistema Cerrado. A partir dos acontecimentos relatados
anteriormente, o município passou a buscar fontes de recursos alternativas capazes de trazer
melhor qualidade de vida para o município e seus habitantes, da área rural e urbana.
Nesse momento, a tradição agrícola da região foi lembrada. E, ao perceber que existia na
região a possibilidade de atender a um mercado que hoje valoriza o produto tradicional e
92
diferenciado, a tradição foi sendo inventada (HOBSBAWM, 2006) a fim de encontrar os
produtos que pudessem se inserir nesse mercado.
O trigo veadeiro foi o primeiro a ser remido por produtores da região. Ao saberem que,
nas câmaras frias dos laboratórios da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em
Brasília-DF, sementes do trigo veadeiro estavam sendo conservadas a 20° C abaixo de zero,
agricultores da Cidade da Fraternidade foram em busca das sementes. Eles já não as possuíam
mais, mas haviam sido resgatadas pela empresa, vinculada ao Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento. Essas sementes foram multiplicadas e, no dia 12 de maio de 2005,
cem (100) unidades foram entregues a produtores da região para multiplicação e cultivo
(PENTEADO et. al, 2006). Hoje, as sementes resgatadas estão no seu terceiro ano de
plantio na região, ocupando quatro (4) hectares, isso apenas nas terras de um dos produtores.
A expectativa desse produtor, que produz açúcar mascavo e arroz integral, é, com o
resultado da produção deste ano, vender sementes e mudas do trigo para os produtores
interessados no plantio do trigo e também fazer a sua plantação, para fabricação de pães e
produtos à base de trigo integral, de forma a abastecer o mercado regional, onde o produto
tem boa aceitação. Além disso, o trigo, a exemplo do queé feito com o açúcar mascavo e o
arroz integral, será usado na alimentação das crianças carentes amparadas pela comunidade.
Tendo conseguido com sucesso o resgate da cultura tradicional do trigo veadeiro,
produtores e empresários de Alto Paraíso de Goiás passaram a buscar as formas de
comercializar o café, produto agrícola que, juntamente com o trigo, encontra-se estampado no
brasão do município, sendo considerado, portanto, um dos de maior tradição de cultivo na
região. Uma das primeiras iniciativas de representantes de produtores, comerciantes e poder
público local foi a de procurar, ao final do ano de 2005, a Embrapa Café, em Brasília, a fim de
verificar a qualidade do café tradicional existente no nordeste goiano e pesquisar suas
características e origens.
93
Essa iniciativa resultou no Encontro do Café de Alto Paraíso de Goiás, realizado nos
dias 9 e 10 de maio de 2006 e que teve como objetivo principal orientar agricultores da região
para a produção racional do café orgânico, além dos benefícios e o retorno econômico que
podem advir com a valorização do produto certificado. O evento teve a participação de
pesquisadores do Consórcio Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café
(CBP&D/Café), coordenado pela Embrapa, que apresentaram aos produtores locais as
tecnologias existentes na empresa voltadas para a produção orgânica, desde a preparação das
mudas até o desenvolvimento equilibrado das plantas, com a manutenção da qualidade no
período pós-colheita. Contou também com a presença de uma engenheira agrônoma do
Distrito Federal, especialista em certificação de produtos orgânicos e agroecológicos do
Distrito Federal, que mostrou aos produtores quais as exigências das empresas certificadoras
para conferirem esse diferencial.
No dia 6 de agosto de 2006, a partir de uma parceria entre a prefeitura de Alto Paraíso, a
Embrapa Café e empresários e produtores do setor, foi realizado evento em um shopping de
Brasília que marcou o Lançamento do Café Histórico de Alto Paraíso de Goiás. Esse evento
foi o início da comercialização do produto no mercado de Brasília, que se mostra com grande
potencial de absorção do café orgânico. Brasília possui grande número de consumidores
capitalizados e com alto nível intelectual, além de se localizar a apenas 230 quilômetros de
distância da cidade de Alto Paraíso de Goiás. O mercado de Brasília, era importante para o
turismo do município, que, conforme empresários locais, cerca de 90% dos turistas da
região habitam a capital federal.
Conforme Orsi; Melo (2004), os consumidores que estão localizados somente no DF -
excetuando-se, portanto, as cidades do entorno, no estado de Goiás - contam com uma renda
per capta muito superior à média nacional o que, conseqüentemente, influi diretamente na
94
demanda de produtos agropecuários. Outro dado interessante sobre o mercado da capital
federal citado pelos autores é que o Distrito Federal possui especificidades que potencializam
a criação de espaços favoráveis a certos tipos de experiências que requerem
responsabilidade para a divulgação de qualquer proposta de modelo de
dinamização comunitária e de desenvolvimento local/regional/territorial,
quando trabalhados pelo enfoque da comercialização, principal “gargalo” de
todo processo de produção rural de economia familiar (ORSI; MELO, 2004,
p. 108).
A iniciativa resultou, ainda, no projeto de pesquisa Implementação de cafeicultura
orgânica para agricultura familiar de Alto Paraíso de Goiás, aprovado no âmbito do
Programa Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento do Café (PNP&D/Café), do
CBP&D/Café, para realização a partir do ano de 2007 e que tem por objetivo o
desenvolvimento de tecnologias para a sustentabilidade da produção de café em sistemas
agroecológicos e orgânicos para a agricultura familiar da região.
Esse projeto tem o período de duração de vinte e quatro meses e uma equipe composta
por quinze profissionais, sendo desses, doze doutores, ligados às áreas da agronomia,
biologia, socioeconomia, fitotecnia, agroclimatologia e bioquímica. Uma importante
contribuição do projeto é a condução do mesmo a partir da investigação participativa, ou seja,
a elaboração de tecnologias no campo da agroecologia será feita a partir do conhecimento dos
próprios agricultores. Para isso, os agricultores serão tão importantes nesse processo quanto
os pesquisadores. Essa participação acontecerá, entre outras formas, pelo estabelecimento de
unidades experimentais de produção nas propriedades da região, de acordo com a realidade
local, onde serão testados sistemas integrados de produção orgânica de café, de forma a
formar modelos passíveis de difusão da tecnologia gerada para a região. Durante o período de
realização do projeto, serão desenvolvidos os planos de ação relativos a:
1) Caracterização socioeconômica do município de Alto Paraíso de Goiás: esse trabalho
será realizado por meio de pesquisa de campo em que será aplicado um questionário a
95
grande parte dos produtores do município. Esses dados possibilitarão aos participantes
do projeto conhecer a estrutura existente na região antes do início da realização do
mesmo;
2) Estudo do meio físico regional e local, desenho e estabelecimento de um sistema
padrão de produção de café orgânico: esse plano de ação tem por objetivo desenvolver
um método rápido para avaliação da sustentabilidade de cafezais agroecológicos, a fim
de propor e estabelecer modelos de produção orgânica adequados à agricultura familiar
da região;
3) Avaliação, com a participação direta dos agricultores familiares, do comportamento de
cultivares antigos e melhorados de café arábica no sistema orgânico de produção em
diferentes ambientes da região. Com isso, pretende-se identificar a variabilidade
genética para rias características agronômicas cujos dados serão, no futuro,
exploradas em programas de melhoramento genético do cafeeiro; e selecionar
cultivares de café promissores para o cultivo orgânico na região.
4) Seleção dos materiais orgânicos que são produzidos nas próprias propriedades da
região, bem como as introduzidas, que tenham potencial para adubação dos cafeeiros e
levantamento das plantas espontâneas da região para adubação verde;
5) Caracterização química e molecular dos cultivares de café antigos existentes na região
por meio de técnicas químicas e moleculares com o uso de marcadores. Após análise,
serão comparados os parâmetros nos sistemas convencional e orgânico.
No dia 18 de junho de 2007, a Embrapa Café e a prefeitura municipal de Alto Paraíso de
Goiás assinaram um contrato de cooperação entre os dois órgãos para viabilizar o
desenvolvimento do projeto. O contrato contempla, ainda, o desenvolvimento de estudos
destinados ao aprofundamento do conhecimento técnico-científico no âmbito da agricultura,
pecuária, silvicultura e demais áreas afins da região, além de outras áreas, como as de
96
desenvolvimento institucional, monitoramento ambiental, informática, instrumentação
agrícola, zoneamento agroecológico e tecnologia dos alimentos. A assinatura foi realizada
durante visita ao município do governador do estado, Alcides Rodrigues Filho, além de vários
políticos de Goiás.
Além do projeto da Embrapa em execução, outros estudos estão sendo feitos pelo
órgão para o desenvolvimento de novos projetos de pesquisa, que contemplem atividades de
grande importância para a produção de café com qualidade, como o processamento da pós-
colheita. A preocupação com a qualidade do produto em todas as fases da produção é uma das
grandes exigências do mercado consumidor mundial. Por isso, grande investimento está sendo
feito pela pesquisa, governo e empresários brasileiros para que o setor produtivo enfatize a
qualidade como fator essencial na ampliação da demanda do produto (SILVA; LEITE, 2000).
A busca do desenvolvimento de pesquisas com o café da região faz parte das ações que
foram iniciadas para o desenvolvimento local. Prefeitura, Câmara Municipal e órgãos do
governo vêm buscando a união da comunidade a fim de encontrarem soluções para seus
problemas. Para isso, foi realizado o Fórum para o Desenvolvimento Sustentável de Alto
Paraíso de Goiás, no dia 24 de fevereiro de 2007, na Câmara Municipal, que reuniu
empresários, produtores rurais e lideranças locais com o objetivo de debater as alternativas
para a região. O evento contou com a presença de representantes e líderes políticos locais,
como o atual prefeito municipal, dois ex-prefeitos, além de outros políticos locais. O principal
objetivo da reunião foi realizar levantamento dos produtos regionais que poderiam ter sua
produção incentivada, de forma a se tornar mais uma fonte de renda para o município,
agregando sua comercialização ao turismo local. Produtos tais como artesanato local, cristais
de rocha e plantas do Cerrado são comercializadas para os turistas. Discutiu-se, então, a
viabilidade do aumento e divulgação da produção orgânica já tradicionalmente feita na região,
97
de produtos tais como frutas, frango, hortaliças e café, para comercialização ao turista, além
do trigo veadeiro.
98
5. A REDENÇÃO PELO CAFÉ?
Como explicamos na Introdução, nossa proposta de investigação, em que pese possuir
um referencial teórico-metodológico mais amplo, passou a integrar o processo desencadeado
pela Embrapa Café e produtores do município de Alto Paraíso de Goiás. Por essa razão, o
questionário elaborado e muitos direcionamentos nos procedimentos técnicos adotados
visaram atender demandas do projeto de pesquisa daquela instituição e teve foco
especialmente nessa cultura. Porém percebeu-se que, devido à estrutura de produção dos
pequenos produtores do município, muito ainda é preciso fazer para que a produção
agropecuária da região seja considerada comercial.
Para se ter uma idéia dos desafios para o futuro, conforme especificada na Tabela 5.1, a
quantidade produzida de café de toda a região norte e nordeste de Goiás, conforme o IBGE,
analisada no ano de 2005, não ultrapassa as 250 toneladas do produto. As áreas destinadas à
colheita e colhida, a quantidade produzida, o rendimento médio e o valor da produção do café
beneficiado, segundo as Unidades da Federação, as mesorregiões, microrregiões e os
municípios produtores Brasil no ano de 2005 estão na Tabela 5.1.
99
Tabela 5.1 - Áreas destinadas à colheita e colhida, quantidade produzida, rendimento
médio e valor da produção de café (beneficiado), segundo as Unidades da Federação,
mesorregiões, microrregiões e os municípios produtores do Brasil – 2005
Unidades da Federação,
Mesorregiões, Microrregiões e
os Municípios
Área
destinada a
colheita
(ha)
Área
colhida
(ha)
Quantidade
produzida
(t)
Rendimento
médio
(kg/ha)
Valor
(1 000 R$)
Café (beneficiado)
Goiás 7 548 7 548 16 022 2 122 62 086
Norte Goiano 248 248 250 1 008 672
Porangatu 120 120 66 550 132
Niquelândia 120 120 66 550 132
Chapada dos Veadeiros 128 128 184 1 437 540
Alto Paraíso de Goiás 40 40 24 600 62
Cavalcante 8 8 4 500 10
São João d'Aliança 80 80 156 1 950 468
Fonte: IBGE (2007).
Pode-se verificar nessa tabela que a produção de café no município de Alto Paraíso de
Goiás foi de apenas 24 toneladas, em uma área plantada de 40 hectares. Uma produção e
produtividade por árvore muito baixas, principalmente se comparada à produção dos
principais estados produtores no Brasil naquele ano. As áreas destinadas à colheita e colhida,
a quantidade produzida, o rendimento médio e o valor da produção do café beneficiado,
segundo os estados produtores Brasil, no ano de 2005, estão na Tabela 5.2:
100
Tabela 5.2 - Áreas destinadas à colheita e colhida, quantidade produzida, rendimento
médio e valor da produção do café beneficiado, segundo os estados produtores do Brasil
– 2005
Unidades da Federação,
Mesorregiões, Microrregiões e
os Municípios
Área
destinada a
colheita
(ha)
Área
colhida
(ha)
Quantidade
produzida
(t)
Rendimento
médio
(kg/ha)
Valor
(1 000 R$)
Café (beneficiado)
Minas Gerais 1 043 308 1 043 308 1 002 672 961 3 674 138
Espírito Santo 545 289 545 289 532 435 976 1 300 241
São Paulo 221 700 221 700 201 130 907 729 516
Bahia 151 019 150 610 128 511 853 399 165
Rondônia 167 738 167 738 107 083 638 204 152
Paraná 106 219 106 219 85 977 809 297 297
Mato Grosso 29 448 29 448 15 902 540 28 775
Pará 22 263 16 626 18 021 1 083 16 340
Rio de Janeiro 13 772 13 772 15 734 1 142 38 571
Outros 24.999 23.662 16.682 5.037 38.531
Fonte: IBGE (2007).
Em 67,85% das propriedades visitadas no município a produção agropecuária era
utilizada apenas para o autoconsumo. São agricultores sem grandes perspectivas de aumento
de produção e de área plantada, sem acesso ao serviço de assistência técnica e extensão rural e
sem acesso a financiamento rural. A renda dessas famílias provém, principalmente, dos
salários de um ou mais membros da família que tem um emprego na cidade, na Vila de São
Jorge ou mesmo na própria comunidade. Esses empregados trabalham para a prefeitura,
outros órgãos do governo municipal ou para os estabelecimentos que exploram o turismo:
restaurantes, bares, hotéis e pousadas. Dos habitantes entrevistados, 42,85% trabalham com
alguma atividade relativa ao turismo.
As tabelas 5.3, 5.4, 5.5, 5.6 e 5.7, que apresentaremos a seguir, são resultados dos
questionários aplicados a agricultores do município de Alto Paraíso de Goiás. Elas
apresentam o número de famílias existentes em cada item estabelecido por coluna. A principal
renda de cada família, por região estudada, está na Tabela 5.3.
101
Tabela 5.3 - Número de famílias por principais atividades desenvolvidas das quais
obtêm renda, por região estudada
Atividades Recebem
renda
governo
Região
Trabalho na
cidade/comunidade
Turismo Agricultura/
pecuária
Outras
Vila São Jorge 5 4 3 1 4
Estrada S. João
D’Aliança
1 - 6 1 2
Serra 2 - 4 1 2
Total 8 4 13 3 8
Fonte: pesquisa de campo
Das famílias entrevistadas, 28,57% recebem qualquer tipo de benefício do governo, que
pode proceder de qualquer programa social de iniciativa dos governos estadual ou federal. A
principal renda citada foi a aposentadoria, que é mencionada como uma das principais fontes
de renda. Porém, em duas famílias, percebeu-se que essa passa a ser a principal renda de
sustentação da família, utilizada para a compra de gêneros de primeira necessidade, no
momento da ausência de outras rendas.
Tabela 5.4 - Número de famílias por tamanho das propriedades, por região estudada
Região Até 20 ha 21 a 50 ha 51 a 200 ha 201 a 999 ha Acima de
1000 ha
Vila São Jorge - 1 8 2 2
Estrada São João
D’Aliança
1 2 2 1 2
Serra 6 - - 1 -
Total 7 4 8 4 5
Fonte: pesquisa de campo
Apesar de grande quantidade dos produtores, 75% do total de entrevistados, terem
propriedades com mais de 20 hectares (Tabela 5.4), apenas uma propriedade entre as visitadas
102
possui mais de três empregados (Tabela 5.5). Em todas as outras, o trabalho da terra é feito
apenas por membros da família, na maioria dos casos em período parcial. Apenas um membro
da família tem dedicação integral à propriedade e à produção agropecuária que é realizada na
mesma. Por esse motivo, em quase todas, foi possível entrevistar um membro da família
para aplicação do questionário, que os outros membros ou estavam em seus empregos na
cidade ou na comunidade, ou não moravam na propriedade (moram em outras cidades). Das
pessoas entrevistadas, 46,42% tinham idade acima de 60 anos, e eram elas que cuidavam,
sozinhas, durante todo o dia, das atividades relativas à propriedade, ou seja, relativas ao
cultivo das plantas e trato dos animais. As idades dos entrevistados, por área pesquisada estão
na Tabela 5.6.
Tabela 5.5 - Número de propriedades que não possuem empregados, com um ou dois
empregados e com mais de dois empregados, por região estudada
Região Zero Até dois Acima de dois
Vila São Jorge 9 4 -
Estrada São João
D’Aliança
3 4 1
Serra 6 1 -
Total 18 9 1
Fonte: pesquisa de campo
Tabela 5.6 - Número de entrevistados por faixa de idade, por região estudada
Região Até 29 Entre 30 e 39 Entre 40 e 49 Entre 50 e 59 Acima de
60
Vila São Jorge - 1 7 1 4
Estrada São João
D’Aliança
- 1 1 1 5
Serra - 2 - 1 4
Total - 4 8 3 13
Fonte: pesquisa de campo
103
O tamanho das propriedades relatado pelos entrevistados nem sempre é exato, que não
existe demarcação de terras na região. Apenas onze pessoas entrevistadas afirmaram que as
propriedades eram próprias, porém não foi possível confirmar se essas propriedades possuíam
escritura registrada. Dos entrevistados, 42,85%, afirmam ter direito de posse às propriedades,
por habitarem na terra mais de 40 anos. Essas terras, bem como as que foram doadas pelos
antigos proprietários, são as áreas que não estão devidamente demarcadas, conforme citamos
anteriormente.
A produção agrícola em todas as propriedades visitadas é diversificada. São produzidos,
principalmente, os alimentos mais consumidos pelas famílias, como: vários tipos de hortaliças
e frutas, feijão, arroz, milho e mandioca - para fazer a farinha - além da cana, que é utilizada
para fazer a rapadura. O gado, os porcos e as aves, como galinhas e patos, estão, geralmente,
soltos na propriedade, utilizados para o consumo de carnes e de seus subprodutos pela família.
Algumas ervas do cerrado bastante conhecidas para uso medicinal foram encontradas,
também, em todas as propriedades visitadas para a pesquisa. Podiam ser encontradas em
viveiros plantados e cercados, usados para protegê-las das galinhas e de outros animais, ou
nas margens das nascentes. Foram encontradas a carqueja, o boldo, a erva cidreira, o
assapeixe, a hortelã, o poejo, a arruda, o bálsamo, a babosa, a quebra-pedra, o manjericão, o
barbatimão, além de várias outras. Todas as famílias da região afirmam usar largamente essas
ervas, bem como declaram acreditar no seu poder de cura.
Poucos são os produtos comercializados pelos agricultores, geralmente na feira que
acontece na cidade de Alto Paraíso todo sábado logo no início da manhã. Para ir até a feira,
carros dos moradores da área rural ou da cidade são fretados pelos produtores para levar os
produtos até a cidade. Os carros nem sempre são suficientes para transportar todos os
produtores, por isso alguns vão para a cidade à pé, andando 10 e às vezes até 20 quilômetros
104
para chegar à feira. Para isso, geralmente saem de casa ainda no escuro, quando o dia ainda
não amanheceu.
Apenas poucos pequenos produtores da região participam da feira, que comercializa
tanto pequenos animais quanto produtos agrícolas e alimentos elaborados a partir deles, como
hortaliças, frutas do cerrado (cajá-manga, pequi, jabuticaba), doces e vinhos preparados com
frutas nativas, mandioca e farinha, rapadura, açúcar mascavo e café. Também são
comercializados produtos alimentícios utilizados na cozinha alternativa (macrobiótica,
vegetariana), como queijo de soja (tofu), broto de feijão e seitan
16
. A feira, que possui um
espaço próprio e reservado na cidade ao lado da prefeitura, comercializa, ainda, produtos
medicinais: sabonetes de pequi, de tigui-do-cerrado e de abacate, além das garrafadas
preparadas por Dona Flor. Produtos artesanais, como brincos, pulseiras e outros também são
comercializados pelos artesãos da cidade para os turistas que eventualmente visitam a feira.
Dos entrevistados na região, 10,78% afirmaram ter acesso regular aos técnicos da
assistência técnica e extensão rural públicos, que no estado de Goiás são realizadas pela
AGÊNCIARURAL
17
, para obter alguma informação sobre as plantações. Esse acesso é
assegurado, apenas para os agricultores que podem se deslocar até a sede da instituição na
cidade de Alto Paraíso. 35,78% afirmaram, porém, que duas vezes por ano, geralmente nos
meses de maio e novembro, algum veterinário da instituição realiza a aplicação de vacinas nos
animais. A pesquisa foi realizada apenas com os produtores do município. Não temos,
portanto, informações sobre a atuação da instituição na região.
16
O seitan ou glúten, como por vezes também é designado, devido ao nome da proteína do cereal, é um
substituto da carne derivado de uma proteína de trigo chamada glúten. É utilizado como substituto da carne, não
só devido sua qualidade protéica como também pela forma de preparação culinária. O seitan é produzido a partir
da produção da farinha de trigo (WIKIPÉDIA,2007b).
17
A Agência Goiana de Desenvolvimento Rural e Fundiário – AGENCIARURAL, foi criada pela Lei 13.550,
de 11/11/1999, e seu objetivo é desenvolver atividades de assistência técnica, social e gerencial aos produtores
rurais; é responsável, entre outras atividades, pelos feitos direcionados ao desenvolvimento sustentável da Bacia
do Rio Araguaia Caiapó; está inserida nas ações do Programa Nacional de Agricultura Familiar; desenvolve
pesquisa agropecuária e, ainda, trabalha com a regularização fundiária, assentamentos e reforma agrária. Em
parcerias com outros organismos, a AGENCIARURAL está atuando, ainda, em ações relacionadas com o Sítio
Histórico Kalunga (AGÊNCIARURAL, 2007)
105
Com relação a financiamentos rurais, os pequenos produtores da região preferem não
procurá-los. Os que se aventuraram em buscar algum financiamento em anos anteriores,
dizem se arrependerem, devido às grandes angústias que tiveram que enfrentar no momento
de pagar pelo financiamento. Afirmam que o banco geralmente começa a cobrar o pagamento
da dívida meses antes de a produção começar a ser negociada, o que inviabiliza a tomada de
financiamentos, principalmente para aqueles que não possuem renda regular com a produção.
Em todas as propriedades onde o café ainda permanece produzindo existem pelo menos
um membro da família que conhece como cuidar da plantação, colher, descascar, limpar,
torrar e moer o produto. Um conhecimento que passou, na maioria dos casos, de pai para
filho, ou de mãe para filha, durante muitos anos. Alguns produtores torram e moem o grão
ainda com a casca, pois acreditam que, dessa forma, o café conserva melhor a sua doçura
natural.
O modo de preparo do café colhido pelas famílias na região segue o que tradicionalmente
se faz em todo o interior do Brasil: o torrado é passado em coador de pano; o açúcar - ou
em grande parte dos lares, a rapadura - é acrescida à água fervente, antes mesmo de passá-
la pelo pó; o café é ralo, feito com pouco e muito doce. Esse modo de preparo, apesar de
muito utilizado no interior do Brasil, contraria todas as recomendações para o preparo de um
café de qualidade
18
.
Como, no momento da colheita do produto, as famílias colhem apenas os grãos que estão
no ponto de colher e que serão consumidos nos próximos meses, o produto conserva seu
18
Conforme Pozza et al (2000), essas recomendações são:a bebida preparada deve ser consumida em no máximo
uma hora, pois o café pronto perde suas características após esse período; lavar o coador de pano apenas com
água, nunca com sabão; usar preferencialmente água filtrada para preparar o café; aquecer o bule e as xícaras que
serão utilizadas para a bebida; o tempo de contato entre a água e o café no momento do preparo deve, variando
conforme o equipamento e a preferência pessoal, ser: para moagem fina até 4 minutos, para moagem média de 4
a 6 minutos, para moagem grossa de 6 a 9 minutos; deve-se usar a proporção de 8 a 10 litros de água para cada
500 gramas de pó, ou 5 a 8 g/100 cc; não se deve adoçar o café antes de seu preparo, pois ele deve ser adoçado
na xícara; o pó deve ser acondicionado em lugar fresco e com a embalagem bem fechada, sem que haja o contato
com outros alimentos, para que ele não absorva outros odores; a água não deve ser fervida, sua temperatura deve
ser entre 90 e 100°C; deve-se passar pelo apenas água quente, nunca a bebida; o e a bebida pronta
devem sempre ser descartados, e nunca reutilizados; as garrafas térmicas devem ser muito limpas e de uso
exclusivo do café; nunca deve-se armazenar na garrafa térmica a bebida adoçada, pois isso fará com que se
forme uma crosta de caramelo de mau sabor nas paredes do recipiente.
106
aroma e sabor, tornando-o mais aprazível do que muitos cafés comercializados no mercado
brasileiro. O café utilizado é o chamado seco natural, ou seja, aquele que é seco no pé e com a
casca, que o diferencia dos cafés cerejas descascado e despolpado, muito utilizado em outros
países. O café seco natural, conforme Mello (2001), tem 2% a mais de açúcares do que o café
lavado e fermentado.
Outros fatores fazem do café da região um produto de qualidade superior. Conforme
Mello (2001), no Brasil existem regiões que, naturalmente, possuem condições favoráveis à
produção de cafés de boa qualidade, mesmo os cafés preparados em terreiros, com os
cuidados usuais. E as regiões que são mais conhecidas que têm essas condições favoráveis são
as do café do Cerrado, abrangendo as dos estados de Minas Gerais, Goiás, Bahia e São Paulo.
Além disso, outras características da região tornam seu café favorável a um produto de
boa qualidade. Entre elas, Mello (2001) cita:
a) temperaturas mais baixas, presentes em regiões de altitudes mais elevadas
19
, que
condicionam uma frutificação e, principalmente a maturação dos frutos em período mais
longo, além de reduzir a atividade microbiana, responsável por fermentações indesejáveis nos
frutos;
b) chuvas bem definidas, com um período seco coincidente com a época de colheita do
café, o que facilita a secagem do produto e reduz as fermentações, além de proporcionar uma
florada mais uniforme na retomada das chuvas;
c) umidade baixa do ar, que condições para que não haja fermentações indesejáveis
nos frutos.
Todas essas condições para a produção de um café de qualidade existem na região.
O café é visto, pela maioria dos agricultores, como um produto para consumo da família
e de seus amigos e visitantes, não para comercialização. Dos dezessete (17) produtores
19
A microegião da Chapada dos Veadeiros é composta pelos municípios que se localizam nas terras mais altas
do Brasil Central: São João d´Aliança (sul), Colinas (oeste), Cavalcante e Santa Terezinha (norte), Nova Roma
(leste) e Alto Paraíso de Goiás (centro) (UDRY, 2001).
107
entrevistados que possuem na sua propriedade alguns pés de café, apenas 17,64% estão
comercializando seu produto por meio de cafeterias, restaurantes e bares, na cidade de Alto
Paraíso e em Brasília. E, desses produtores, apenas um procura adquirir mais conhecimentos
acerca do cultivo, do produto e do mercado de café, a fim de aumentar sua produção e a
comercialização do produto. Cinqüenta por cento dos produtores não têm consciência ou
conhecimento sobre a importância da produção do café da região, nem sobre o mercado
cafeeiro. A grande maioria não pensa em tornar sua produção comercial. Porém, todos eles
(100%) se mostraram interessados em atingir um cultivo comercial caso a produção seja
estimulada, por meio de financiamento próprio e auxílio técnico.
As principais características das atividades desenvolvidas nas propriedades da região
estão na Tabela 5.7. Nela, são apresentados, ainda, os números relativos à produção de café.
Tabela 5.7 - Características das atividades desenvolvidas nas propriedades da região,
por região estudada
Características das atividades Propriedades com café
Região Produção
autoconsumo
Trabalha
com
ecoturismo
Café na
propriedade
Comercializa
o café
Vila São Jorge 9 9 6 2
Estrada São João
D’Aliança
4 1 7 1
Serra 6 2 4 -
Total 19 12 17 3
Fonte: pesquisa de campo
Apresentamos, a seguir, as informações conseguidas por meio dos questionários
aplicados, por cada uma das regiões de produção do município.
5.1 Proximidade do Parque Nacional favorece o turismo
108
Na região às margens do Rio São Miguel, próxima à Vila São Jorge, foram visitadas
treze famílias, onde foram aplicados os questionários. Onze deles foram respondidos por
homens e dois por mulheres.
Nessa região, foi encontrado o maior número de pessoas que trabalham, de alguma
forma, com o turismo. Nove famílias entrevistadas afirmaram que exploram o turismo da
seguinte forma: quatro chefes de família são guias turísticos, principalmente procurados por
turistas para visitação do Parque Nacional; três realizam alguma atividade relacionada ao
turismo em estabelecimentos comerciais, como bares, restaurantes ou pousadas existentes na
Vila São Jorge e duas famílias exploram suas terras para a visitação turística, com a cobrança
de cerca de R$ 5,00 por pessoa para a visitação de suas propriedades, onde podem ser feitos
banhos nas cachoeiras, passeios nas trilhas, e outras atividades.
Quatro famílias entrevistadas têm auxílio da aposentadoria de pelo menos uma das
pessoas da família e nenhuma recebe outros auxílios do governo, como bolsa família.
Oito moradores entrevistados utilizam suas propriedades apenas para produção de
alimentos, principalmente frutas e hortaliças, para o autoconsumo. Sete pessoas responderam
que moram na Vila São Jorge, mantendo a propriedade como fonte de lazer para a família e
como forma de manter um patrimônio. Um morador afirmou: “é a forma de apreciarmos a
natureza e a beleza daqui, pelo menos nos finais de semana”.
Das propriedades da região, apenas uma tem menos de trinta hectares, nove possuem
entre 150 e 250 hectares e três possuem mais de 500 hectares.
Uma moradora entrevistada, que tem uma área próxima à Via São Jorge, cercou sua
propriedade e instalou na entrada uma portaria, onde podem passar os carros com turistas para
visitação do rio que passa logo abaixo. Pagando a entrada, ao preço de cinco reais por pessoa,
os visitantes podem ficar o dia todo na propriedade, cuja mata está ainda preservada. Além da
exploração do turismo, vive-se também com recursos da aposentadoria, recebida por dois
109
membros da família. Para ela, com a produção agrícola é muito difícil garantir renda, pois
além da terra ser de difícil trato, por ter muito cascalho, a burocracia para alcançar a licença
de produção, pelo Ibama, é muito difícil, além de não termos terra bastante para aumentar a
produção já existente”.
A propriedade possui cerca de 35 pés de café, conforme afirmou a moradora, que estão
localizados bem em frente da varanda da casa, sede da propriedade. Além disso, ali é
produzida a mandioca, que é usada para fazer a farinha, apenas para o consumo da família.
Existem, ainda, algumas galinhas e duas vacas. Árvores frutíferas também estão espalhadas
no quintal, como laranjeiras, pitangueiras, cajueiros, jabuticabeiras, mamoeiros, jambeiros,
tamarineiros e outras. A família cultiva as hortaliças que consome. A agricultora afirma que já
tentou produzir milho para comercialização na propriedade, mas teve que parar a produção
por exigência do Ibama, que via no cultivo uma ameaça à preservação da mata existente na
margem do rio.
A Vila São Jorge fica a 36 quilômetros de Alto Paraíso e possui hoje cerca de 300
moradores fixos. Na Vila existem uma escola de ensino fundamental e um posto de saúde que
funciona duas vezes por semana. Porém, segundo seus moradores, o posto de saúde não
consegue atender às necessidades da população da Vila, que se utiliza, para isso, do trabalho
dos agentes de saúde. Hospital e, inclusive, as farmácias, quando necessários, devem ser
procurados na cidade de Alto Paraíso. Na Vila, uma associação reúne as atividades dos guias,
a Associação dos Condutores de Visitantes da Chapada dos Veadeiros (ACVCV).
Naquela região existe pelo menos uma das propriedades que possui uma área preservada,
com registro como Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). São 110 hectares de
área protegida. A legislação para o estabelecimento de áreas particulares protegidas no Brasil
existe desde o Código Florestal de 1934. Naquela época, essas áreas eram chamadas
florestas protetoras. As reservas existentes atualmente são regidas pela lei do Sistema
110
Nacional de Unidade de Conservação (SNUC), estabelecida em 2000 e que concede, aos
proprietários, benefícios como: direito de propriedade preservado; isenção do Imposto sobre a
Propriedade Territorial Rural referente à área estabelecida como RPPN; prioridade na análise
dos projetos pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA); preferência na análise de
pedidos de concessão de crédito agrícola para projetos a serem implementados na
propriedade; e possibilidades de cooperação com entidades privadas e públicas na proteção,
gestão e manejo da RPPN (IBAMA, 2007b).
Seu proprietário é, segundo ele, um engenheiro agrônomo que se estabeleceu na região
nos anos 1980, quando para se dirigiu, juntamente com outras pessoas, para criar uma
comunidade onde todos pudessem viver em harmonia com a Natureza, tirando da terra o seu
sustento. Porém, sua família foi a única que permaneceu na terra até hoje. Para ele,
o que atrapalhou a produção aqui foi o turismo. Quando veio o turismo,
ninguém mais quis produzir e todo mundo saiu da terra. Esse foi o grande
impacto aqui no campo. O abandono do campo. Foram saindo da terra para
trabalhar com o turismo. Mas, agora tem alguns voltando, aos poucos.
Entre esses produtores que estão retornando à produção agrícola, estão principalmente os
interessados na produção de café orgânico.
Um outro agricultor daquela região produziu mais de três mil mudas de café cujas
sementes foram retiradas das árvores antigas existentes na sua propriedade. Esse produtor,
que mora em Brasília, é proprietário de uma área com mais de mil hectares de extensão,
herdada pela família de sua esposa. Porém, grande parte da propriedade está preservada com
vegetação nativa. Nela, segundo ele, existem pés de café, ao longo do rio, muito antigos,
provavelmente descendentes daqueles plantados pelos bandeirantes. A área onde os pés estão
localizados é de muito difícil acesso e com mata muito fechada. Para os moradores da região,
essa fazenda é uma das que possui os pés de café levados para a região ainda no século XVIII.
111
O proprietário, preocupado com a preservação do patrimônio que possui na região,
também pretende transformar parte de sua propriedade em RPPN. É bastante interessado,
também, na produção orgânica do café. Por isso, participou de vários cursos e eventos, em
Brasília, relativos à produção, beneficiamento e até à industrialização do café. Ele pretende
fazer, de sua pequena lavoura, uma produção comercial. Seus pés de café, obtidos a partir das
sementes do café retiradas das árvores próximas ao rio, estão plantados, agora, próximo à sede
da propriedade, juntamente com árvores frutíferas e outras plantas do cerrado, obtendo uma
produção agroecológica ou, como o produtor diz, produzido organicamente. A partir do café
colhido das árvores antigas, esse produtor levou o produto, torrado e moído, a feiras e
cafeterias, além de eventos específicos de exposição e comercialização de produtos orgânicos,
em Brasília, onde o café passou, então, a ser testado e aprovado por consumidores, tanto
conhecedores quanto leigos. Na sua opinião,
[...] o café é um produto chave pra desenvolver Alto Paraíso. tentaram
tantas outras coisas, mas que não deram certo, especialmente porque é uma
região turística. Mas, precisamos procurar o que a região tem para oferecer
para o turista, além da sua beleza cênica. O café vem dar identidade à região.
5.2 Grandes fazendas e produções extensivas
O agricultor da Cidade da Fraternidade, porém, acredita que outros fatores estão
envolvidos para o café conseguir se estabelecer na região. Descendente de negros, o agricultor
mora mais de 25 anos na Cidade da Fraternidade, comunidade espírita localizada a cerca
de 30 quilômetros de Alto Paraíso, desde que se estabeleceu ali, vindo de Minas Gerais. Ele
acredita que o fator místico deve ser levado em consideração quando se busca o
desenvolvimento da região. Segundo ele, “tudo o que for feito na região que resgate o que foi
trazido pelos negros vai prosperar. Fora isso, o que não é resgate dos negros, não vai prá
frente”.
112
O agricultor mostra, ali perto, o vale do Sapucaí, que é ladeado por um paredão de pedra,
por onde os negros passavam carregando os senhores que iam a caminho de Niquelândia
(GO) em busca de ouro e diamantes. E lembra que por aquela região também passou a rainha
Maria Vitória, carregada por seus escravos, quando ia de São João D’Aliança para o norte do
país.
Onde eles faziam parada, às vezes de seis meses no local, eles cultivavam.
Eles traziam a semente e iam plantando. E foram ficando, pois têm os
kalungas na região. Assim como ficaram os kalungas, a mandioca que eles
traziam ficou. A cana não ficou porque ela é doce e o cupim acabou com ela.
Eu achei aqui o anis verde, que tem mentol, num local onde eles fizeram
parada. E o café que eles trouxeram foi aquele que um grão e que é o
melhor café que tem. [sic]
Além da Cidade da Fraternidade, na região cujo acesso é ao longo da estrada que liga
Alto Paraíso a São João D’Aliança existem antigas fazendas, onde se encontram agricultores
estabelecidos na região vários anos e os novos moradores, chegados após a construção
de Brasília. É nessa região que se encontra a antiga fazenda Bandeira, provavelmente uma das
primeiras a serem estabelecidas no território, ainda pelo sistema de sesmarias, no início da
ocupação da região nordeste de Goiás. Ali se encontra o maior número de produtores
patronais locais verificados pela presente pesquisa. Ali, pode-se perceber a existência de
produções agropecuárias extensivas, principalmente de milho, soja, eucalipto e gado. Isso,
provavelmente, por ser essa região de solo mais plano, possibilitando o uso de tratores,
colheitadeiras e máquinas de grande porte. Além disso, existem ali as propriedades que estão
fora da jurisdição da APA de Pouso Alto. Nos últimos anos, a produção de cana-de-açúcar
está sendo iniciada em várias fazendas, pelo estímulo de culturas destinadas à produção de
biodiesel.
Dos oito questionários aplicados na região, cinco foram respondidos por homens, um por
mulher e dois pelo casal de proprietários. A maioria das propriedades, cinco delas ou 62,5%, é
113
própria, sendo que, das outras, duas (25%) são utilizadas por regime de comodato, dentro da
Cidade da Fraternidade, e uma (12,5%) é arrendada do proprietário para a produção comercial
de eucalipto. Três propriedades (37,5%) têm até 30 hectares, duas (25%) entre 30 e 100
hectares e três (37,5%) acima de 500 hectares, sendo duas (25%) acima de 1000.
O acesso às propriedades é pela estrada que liga Alto Paraíso à cidade de São João
D’Aliança. Uma das propriedades onde o questionário foi aplicado, que não está inserida na
APA de Pouso Alto, teve que ser dividida ao meio quando da construção da estrada, o que
dificultou a produção agropecuária. Ali, a produção é feita apenas para o autoconsumo.
Quatro propriedades produzem alimentos apenas para o autoconsumo. As outras quatro
produzem comercialmente: duas produzem eucalipto - que é vendido para a produção de
carvão e para a produção de estacas para escoramento e para a construção de cercas - uma é
de criação de gado e uma produz arroz, cana e trigo.
Duas famílias têm auxílio da aposentadoria e nenhuma recebe outros auxílios do
governo. Duas pessoas entrevistadas afirmaram ter emprego na cidade, porém, a grande
maioria dos moradores afirma que seus filhos trabalham empregados tanto em Alto Paraíso,
quanto em outras cidades.
A Fazenda Bandeira, que era de 50 alqueires goianos, ou 240 hectares, foi dividida entre
os oito filhos do Sr. Sérgio, agricultor que morreu em 2007, após viver mais de 90 anos. Os
oito irmãos moram no mesmo local com suas famílias. As propriedades, de cerca de 25
hectares cada uma, produzem alimentos para o autoconsumo das famílias, tais como frutas,
mandioca e café, além do gado, porcos e galinhas. O excedente da farinha de mandioca e da
rapadura produzida são vendidos na própria fazenda, para os turistas que por ali passam, a
caminho da cachoeira do Macaquinho.
A região fica a cerca de 30 quilômetros de Alto Paraíso, e o deslocamento para a cidade é
muito difícil. Hospitais, comércio e segurança pública só existem na cidade, porém uma
114
escola rural de nível fundamental atende os alunos a cerca de quatro quilômetros da
comunidade.
O café para o consumo das oito famílias é produzido por apenas uma das irmãs, nas
horas de folga, no momento em que a agricultora não está trabalhando em seu emprego na
cidade de Alto Paraíso. A fazenda Bandeira é uma das referências para o resgate do café
antigo. Acredita-se que os pés ainda existentes na propriedade sejam descendentes de pés que
datavam dos anos de 1850. Atualmente, esses pés têm cerca de 25/30 anos e não dão muitos
frutos. São árvores sem adubação e irrigação e que, mesmo após tantos anos sem o tratamento
adequado, ainda continuam produzindo, mesmo que apenas poucos frutos. Novos pés foram
plantados, de onde são retirados os frutos para o consumo da família. O excedente do café da
propriedade está sendo fornecido para comerciantes da cidade de Alto Paraíso. Todo o
trabalho de preparação do café para o consumo é feito na propriedade. Os grãos são retirados
dos cerca de 50 pés existentes na fazenda pelos membros da família, a secagem é realizada em
plástico preto, o descascamento em pilões, e a torra do café em tachos de cobre.
Apenas uma das oito propriedades pesquisadas nessa região não possui algum pé de café,
porém, segundo seu proprietário, ela teve uma grande produção cafeeira. Das sete
propriedades onde o café é produzido, apenas uma vende seu produto para um restaurante em
Alto Paraíso. Isso porque o proprietário do restaurante busca o café na fazenda com seu carro,
já que, segundo seus moradores, é muito difícil transportar grande quantidade de produto até a
cidade. Para os habitantes de menor renda da região, o transporte até a cidade é feito apenas
por meio de ônibus, carros fretados, quando é necessário transportar algum objeto, ou cavalo.
Um pecuarista da região lida praticamente sozinho, auxiliado apenas por um vaqueiro
contratado e por um neto, com a criação das 500 cabeças de gado existentes na sua
propriedade, de mil hectares. Segundo ele, antigamente os moradores da região tinham muito
dinheiro, “porém, ao venderem suas terras e se mudarem para Brasília, os patrimônios e as
115
riquezas foram perdidos. Como o conhecimento dessas pessoas era o de lidar com a terra, a
vida na cidade não lhes trouxe prosperidade, e perderam quase tudo que tinham”. Para ele, os
proprietários que venderam suas terras no município e foram para Brasília, hoje não
conseguem comprar nem um lote na cidade de Alto Paraíso.
Sua esposa, de 67 anos, lembra que, na chácara que era de seu avô, o café “é nativo na
mata”. E recorda-se de quando era criança, que havia tanto café na propriedade do avô, que
era preciso fazer escala de trabalhadores para colheita do produto, devido a grande quantidade
de catadores que eram contratados, incluindo duas ou três famílias inteiras. Para ela, foram as
doenças trazidas com as novas mudas que acabaram com os cafezais locais.
A fazenda continua sendo o local para onde os filhos e suas famílias sempre retornam,
seja nas férias escolares, nos feriados ou mesmo nos finais de semana. O gosto pela terra e
pelo sustento que ela proporciona à família, é uma herança que os pais buscam valorizar no
contato com os filhos e netos. Para o casal de antigos agricultores, é importante que
mostremos para os filhos e os netos o nosso gosto pela terra. Depois, se eles quiserem vender,
que vendam, mas nossa obrigação foi feita”.
5.3 Beleza exuberante dos vales produtivos
A região da Serra, composta pelos vales produtivos Moinho, Bonsucesso e Pé de Serra, é
uma das regiões mais bucólicas e bonitas que encontramos quando da realização da pesquisa
na região. Os vales são de uma beleza exuberante e as montanhas, cobertas pela vegetação
nativa do cerrado, possuem uma variedade de espécies animais e vegetais desse rico
ecossistema. No Moinho, onde moram cerca de sessenta famílias, encontramos as áreas de
menor extensão de todo o município, o que dificulta em muito a produção agrícola. São áreas
de no máximo três hectares onde são produzidos vários gêneros alimentícios, tais como frutas,
hortaliças e grãos. Além disso, a área ainda comporta pequenos animais, como aves, patos e
116
porcos. Três das cinco pessoas entrevistadas no Moinho (60%) afirmaram ainda ter café do
antigo em suas propriedades, porém são poucos pés e que produzem pouca quantidade de
grãos. A pessoa entrevistada no Bonsucesso produz café para o consumo da família e a da
região do Pé de Serra não tem mais café em sua propriedade.
A principal fonte de renda para os produtores rurais do Moinho é a horta comunitária
instalada em 2006 pela prefeitura de Alto Paraíso de Goiás, da qual participam 26 famílias. A
horta foi preparada em um terreno cedido, por comodato à prefeitura, pelo proprietário da
área. Na horta, a água para irrigação das plantas é levada por meio de uma bomba d’água
doada à região pela Secretaria de Agricultura do Estado de Goiás. Cada família tem sua área
de produção no espaço da horta, onde são plantadas várias hortaliças, verduras e tubérculos.
Desde sua instalação, a prefeitura fornece as sementes e o adubo orgânico utilizados na horta,
além do técnico agrícola que orienta os participantes sobre a produção.
Além disso, a prefeitura busca as formas de escoar a produção no comércio local. A
ajuda da prefeitura deverá durar até 2008, quando cada uma das famílias participantes deverá
passar a arcar com todas as despesas de produção e com a comercialização. As primeiras
hortaliças colhidas estão sendo consumidas pelas próprias famílias, doadas para escolas na
comunidade, ou vendidas nas residências, comércios e na feira da cidade de Alto Paraíso.
A produção agropecuária de seis das sete famílias visitadas é apenas para o autoconsumo.
Porém, por ser uma região que tem grande fluxo de turistas, peças artesanais, bijuterias,
compotas de doces, geléias e rapadura são comercializados na própria região para os
visitantes.
Dentro da comunidade do Moinho existe uma escola que atende a todas as crianças que
cursam o ensino fundamental da região. Possui, também, um posto de saúde, que funciona um
dia a cada mês. Segundo os moradores locais, o posto de saúde atende satisfatoriamente a
comunidade para a realização de consultas médicas, aplicação de vacinas e o atendimento de
117
outras necessidades. Além disso, os agentes de saúde e as parteiras que habitam na região
atendem sempre que os moradores precisam de atendimento de urgência. São geralmente
mulheres que fazem o acompanhamento pré-natal das gestantes e ministram ervas medicinais
sempre que necessário. Conforme Udry (2001), que realizou pesquisa sobre a manutenção da
saúde na região, o trabalho dos agentes de saúde é fundamental para a população local. Sobre
o trabalho de uma das agentes de saúde ela afirma: “Como agente de saúde, ela atende, às
vezes de bicicleta, toda a região: Moinho, Pé de Serra, Bom Sucesso, Gamelera, Guarda Mor
e Boqueirão. Devido às distâncias, às vezes é necessário pernoitar no local para continuar o
trabalho no dia seguinte” (UDRY, 2001, p.206).
Nenhuma das pessoas entrevistadas afirmou receber qualquer auxílio do governo, nem
aposentadoria nem bolsa família. Um dos sete entrevistados trabalha em emprego na cidade
de Alto Paraíso e dois trabalham em emprego na comunidade do Moinho. Para essas famílias,
o trabalho na terra é feito nos finais de semana ou nas horas vagas.
118
6. A BUSCA POR UM PROJETO DE DESENVOLVIMENTO
A valorização dos ecossistemas preservados é uma realidade recente em todo o mundo. A
exasperação ante os desastres ambientais, causados pelo desenvolvimento dos países
capitalistas durante os anos 1950 e 60, fez surgir uma nova visão da economia que levou
Veiga (2003), a questionar quanto vale um ecossistema? Para mostrar o valor dos benefícios
proporcionados aos seres humanos pelos dezesseis grandes ecossistemas terrestres, que são
usufruídos gratuitamente milhões de anos pela humanidade, o autor cita os resultados de
um estudo publicado pela revista Nature. As funções desempenhadas pelos ecossistemas ao
serem preservados durante um ano, segundo esses estudos, valem quase duas vezes a riqueza
produzida no mundo no mesmo período, ou seja, cerca de 33 trilhões de dólares anuais. Veiga
(2003) conclui, a partir dessa afirmação, que um preço a pagar pela utilização da natureza
para a produção agrícola.
A preservação do meio ambiente e da biodiversidade podem proporcionar retorno
econômico para aquelas populações que sabem usufruir os recursos de forma racional.
Segundo Favareto (2007, p. 196/197), essa forma de utilizar a natureza pode ser mais
vantajosa do que a agricultura, que, nos últimos anos, o uso social dos recursos naturais
passaram:
do privilégio à produção de bens primários a uma multiplicidade de
possibilidades, onde se destacam aquelas relativas à valorização e
aproveitamento das amenidades naturais, à conservação da biodiversidade, e
à utilização de fontes renováveis de energia.
As informações apresentadas nos capítulos anteriores indicam que os habitantes da
região da Chapada dos Veadeiros sabem quanto vale a preservação de seu ecossistema
20
.
20
O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) está realizando projeto
que tem por objetivo estimar o valor de existência do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros atribuído pela
população de Brasília, a cidade mais próxima (250 km) e que maior número de turistas envia para a região. A
119
Durante pelo menos quarenta anos, eles aprenderam a conservar, valorizar e cuidar do
material genético existente na área preservada do cerrado. Nem sempre essa valorização foi
espontânea, tendo que ser imposta, muitas vezes, por determinação dos órgãos responsáveis
pela fiscalização ambiental, com base nos instrumentos legais em vigor.
Hoje, ao adquirirem nova visão do espaço rural, seus habitantes descobriram que o
ecossistema preservado tem valor (PERICO; RIBEIRO, 2005; VEIGA, 2006; FAVARETO,
2007). Eles descobriram que, com o turismo, podem tirar vantagens econômicas de suas
propriedades quando conservam o ambiente natural, intocado. Essas vantagens não advêm
apenas da exploração do turismo. Uma das alternativas existente é a extração dos produtos
nativos que o ecossistema oferece, tais como os frutos do cerrado, que hoje estão sendo muito
valorizados tanto no mercado interno quanto no externo. Vale lembrar que a estratégia de
utilização de um produto típico do território (no caso, o fruto do cerrado) aliado à agricultura
familiar, agrega valor à atividade (ESPÍRITO SANTO et al., 2003). Outra estratégia é pelo
aproveitamento das plantas medicinais do cerrado. Isso porque em todo esse ecossistema
existem diversas espécies de plantas que podem ser utilizadas para fins medicinais (UDRY,
2001).
A produção agrícola comercial também é possível. E, para que ela atinja os
consumidores, é preciso que o mercado seja socialmente construído, por meio de produtos
diferenciados que sejam característicos da região. E é isso que o município de Alto Paraíso de
Goiás está buscando ao inventar a tradição (HOBSBAWM, 2006) da produção agrícola do
trigo veadeiro e do café tradicional. Ou seja, ao tentar restabelecer continuidade de seu
passado histórico, buscam resgatar o que está ligado ao habitus (BOURDIEU, 1987) da
região. Não apenas o passado histórico propriamente dito, mas, principalmente o que está
contido nos costumes e na memória coletiva (HALBWACHS, 1990) de seus habitantes no
pesquisa está sendo realizada a partir do método Avaliação Contingente (AC), que procura, por meio de
inquéritos, estimar o valor monetário de determinado bem ambiental (IBAMA, 2007c).
120
presente. Dessa forma, reconstroem, com base no presente, as informações transmitidas de
geração em geração, preservando-as permanentemente (GIDDENS, 1997).
Foi essa busca por resgatar a produção agrícola comercial dos produtos tradicionais da
região que havia sido esquecida pela maioria dos habitantes após a descoberta da sua vocação
para o turismo, que nos impeliu à elaboração do presente estudo. É difícil prever, no
momento, o resultado da iniciativa das lideranças regionais e dos organismos que estão
estimulando a produção comercial do café, porém, com os resultados preliminares obtidos
nesse trabalho, bem como com as primeiras percepções dos pesquisadores envolvidos no
projeto em desenvolvimento pela Embrapa, podemos destacar alguns aspectos que indicam
que a região pode se transformar numa região produtora de café.
No que concerne à produção no campo, sabe-se que a região possui microclima e
altitudes compatíveis com a produção regular de um café de boa qualidade (MELLO, 2001).
Além disso, pesquisadores da área da cafeicultura que estiveram na região afirmaram que,
devido às suas características visuais e de paladar, o café existente ali deve ser de um material
genético muito antigo, talvez o Typica ou Bourbon, que produzem uma bebida de boa
qualidade. No tocante à sanidade da produção, grande parte das árvores demonstra estar,
talvez devido à proximidade do Parque Nacional, em harmonia com o ambiente que as
circunda o que faz com que o local seja compatível com uma produção agroecológica e
orgânica (RICCI; ARAÚJO; FRANCH, 2002).
Para se estabelecer, na região, uma produção que possa ser inserida no mercado de cafés
commoditie, ou seja, para que o produto oferecido ao mercado tenha regularidade de
fornecimento e volume, é preciso que haja aumento da produção e da produtividade em
relação às hoje existentes. Para isso, a necessidade do aumento da área plantada. Na
maioria das propriedades visitadas para a realização da presente pesquisa essa ampliação é
dificultada por dois motivos. Primeiro, devido ao tamanho das propriedades, já que em
121
regiões como a do Moinho, por exemplo, as propriedades não chegam a possuir cinco
hectares de área. Mas, o principal fator que limita a expansão da produção é o fato de grande
parte das propriedades estar inserida em área de proteção ambiental (APA). A abertura de
novas áreas para plantio, por meio da derrubada de mata nativa é negada ou dificultada pelos
órgãos responsáveis pela fiscalização, especialmente o Ibama, na maioria das vezes.
A produção em pequena escala aliada à agricultura familiar torna-se, então, uma
vantagem estratégica, na perspectiva de Wilkinson (2004). O modo de produção agrícola das
propriedades existentes na região estudada neste projeto tem as características típicas da
agricultura familiar estabelecidas por Wanderley (1999) e Buainain et al. (2005), como a
propriedade dos meios de produção e a utilização de mão-de-obra familiar. Percebe-se, ainda,
a presença de famílias com características muito semelhantes àquelas mencionadas no Projeto
Rurbano (GRAZIANO DA SILVA, 2001). São famílias pluriativas (SCHNEIDER, 2005),
cuja ocupação principal está em atividades não-agrícolas, tais como o emprego em
estabelecimentos comerciais e domésticos nas áreas urbanas e a exploração da propriedade
para o turismo e a conservação da natureza. Nas propriedades, a atividade agrícola é exercida
por apenas um membro da família, em geral mais velho, que produz para o autoconsumo.
Esse membro mais velho, geralmente o pai ou o avô, não possui qualificação profissional nem
escolaridade formal, mas sustenta, com a força de seu trabalho e com o apoio da
aposentadoria que recebe, os estudos dos filhos na cidade. Como também cita o estudo de
Graziano da Silva (2001), na região estudada a propriedade continua sendo um refúgio, um
sustentáculo, acolhendo os membros da família nos casos de perdas de emprego ou para
reuni-los em festividades e nos períodos de crises.
A questão da qualidade na produção do café ainda precisa ser resolvida na região. A
produção é realizada da mesma forma como faziam os antigos produtores que ali se
estabeleceram. A secagem do produto é feita em sacos plásticos, em terrenos onde circulam
122
pequenos animais, tais como galinhas, cachorros e porcos. Com isso, a qualidade do produto
fica comprometida. Porém, os produtores familiares são sensíveis aos estímulos de mercado e
absorvem tecnologia para a produção com mais eficiência (GUANZIROLI et al., 2001). Por
isso, acredita-se que a falta de conhecimento dos agricultores das técnicas para a produção de
café com qualidade poderá ser resolvida com assistência técnica mais efetiva. Além disso,
obter um produto com melhor qualidade é um dos objetivos do projeto que está sendo
desenvolvido pela Embrapa na região. A partir da realização desse projeto, a produção
regional poderá obter melhor qualidade do produto, agregando ao seu café os valores relativos
à aplicação da tecnologia. Isso possibilitará aos produtores elaborar um produto com as
características de um café especial, alcançando classificação de café gourmet, ecológico ou
orgânico; e que tenha textura, aroma e sabor próprios. Com uma produção de melhor
qualidade será possível aos produtores buscarem, com a ajuda de outros parceiros, o
planejamento de estratégias de marketing que promovam o seu produto (CAIXETA, 2001).
A produção tradicional é uma característica que também pode ser considerada atributo de
qualidade do produto, a partir de uma construção social do mercado (THÉVENOT, 1995).
Isso é possível pelo fato de a qualidade ser uma característica subjetiva e sujeita a mudanças
no tempo (SATO; BRITO, 2007) e no julgamento de valor dos consumidores. É ela que,
juntamente com a diferenciação do produto, deve ser perseguida pelos produtores que querem
participar do mercado cafeeiro (VEGRO, 2007). E na região da Chapada dos Veadeiros
encontram-se valores que podem ser usados como estratégia de diferenciação dos produtos
agrícolas, se associados à agricultura familiar (ESPÍRITO SANTO et al., 2003;
WILKINSON, 2004; COELHO, 2005). No caso do café, a história da chegada do produto à
região, conforme mostramos nos capítulos anteriores, é uma característica que pode ser
valorizada. Destaca-se, nessa perspectiva, o fator histórico ligado às Bandeiras e à escravidão
e a tradição de cultivo, características que podem ser consideradas valor de mercado. Além
123
disso, o café tradicional pode ser divulgado a partir da perspectiva de uma produção agrícola
que abastece um nicho de mercado cada vez mais valorizado em todo o mundo, o de café
orgânico, agroecológico, biológico ou natural (RICCI; ARAÚJO; FRANCH, 2002). Esse tipo
de café, valorizado tanto devido à proteção do meio ambiente e à sanidade do produto quanto
por seu compromisso social, abastece um consumidor disposto a pagar mais por essas
características (SATO; BRITO, 2007).
Devemos considerar a região escolhida para o estudo como exemplo ilustrativo para
confirmar a perspectiva de Sabourin; Teixeira (2002), segundo a qual os territórios brasileiros
são o elemento central do desenvolvimento rural por terem como principal especificidade a
sua diversidade, resultante de construções e evoluções históricas, econômicas, culturais e
sociais. A partir dessa perspectiva, o levantamento das tradições sociais e culturais da região,
conforme foi registrado anteriormente, pode se tornar uma estratégia para a inserção no
agronegócio de produtos agrícolas tradicionais, como o café. Neste caso, as estratégias de
marketing e divulgação do produto podem ser direcionadas para uma construção social do
mercado que leve em consideração o desvelamento dos valores locais (VALENTE, 2005), ou
seja, tirar o véu que atualmente esconde as tradições, o cultivo ecológico e tradicional desse
produto e a cultura mística e esotérica da região. Essa inserção é possível a partir do momento
em que se considera o mercado como uma estrutura social (STEINER, 2006), formado a
partir da relação e confiança entre os atores que dele participam, além da história e da
coordenação social existentes no próprio mercado, com suas estruturas, conflitos e
dependências (ABRAMOVAY, 2007).
A criação desse mercado deverá vir como resultado de um trabalho de coordenação da
própria comunidade sobre si mesma, não sendo, portanto, um resultado espontâneo
(STEINER, 2006). E deverá levar em consideração os fatores relacionais, políticos, culturais e
outros que intervêm na sua formação, paralelamente aos fatores econômicos. Nessa
124
construção, um estudo importante é o relativo ao levantamento das referências comuns, tais
como a origem do café no território, a forma de produção e os atributos do produto, e os
atores sociais que participam do processo (THÉVENOT, 1995) e que farão parte do trabalho
de construção da própria marca que será lançada no mercado (SATO; BRITO, 2007).
A construção social do mercado de café é recomendável por não ser aquela uma região
tradicional de produção cafeeira, mesmo estando em um ambiente propício para uma
produção de café com qualidade (MELLO, 2001). Por isso, e pelo fato de a agricultura
familiar ser a que predomina na região, acreditamos que o desvelamento dos valores do
território (VALENTE, 2005) é a estratégia que melhor se aplica para inserir o produto no
mercado, por meio de uma construção social.
Essa construção social do mercado, além de ser coordenada pela comunidade local, deve
ser feita a partir do envolvimento de grande parte dos produtores, a fim de que sejam
estabelecidas as estratégias de desenvolvimento. Hoje esse envolvimento é baixo, devido à
resistência dos habitantes locais em unirem-se em torno de projetos comuns, por meio de
associações ou cooperativas. Acredita-se que isso decorra das experiências frustradas vividas
anteriormente, conforme mostramos nos capítulos anteriores, por razões diversas, que
acabaram por pulverizar os esforços e os recursos despendidos. E é essa resistência à
participação em associações, conforme foi citado por Singer (2004), que traz como
conseqüência a exclusão dos pequenos produtores do agronegócio. Problemas relacionados à
política partidária local, tanto entre representantes de partidos antagonistas de um mesmo
município, quanto entre os municípios componentes da região observada, é outro fator que
dificulta o estabelecimento de um planejamento integrado de desenvolvimento local. Esses
problemas, ligados à baixa capacidade de mobilização social e a escassa tradição
associativista colocam-se como grandes entraves para o desenvolvimento rural da região
(NAVARRO, 2001).
125
O processo de construção do território a partir do vivido pela coletividade ao longo dos
anos (LEFEBVRE, 2000; RAFESTIN, 1993) é importante para o desenvolvimento rural que
se quer obter ao se considerar a abordagem de desenvolvimento territorial defendida por
Veiga (2003). E, para que esse desenvolvimento seja realmente efetivado, é preciso uma visão
não setorial do que seja rural e por arranjos institucionais que promovam, estimulem e ajudem
as articulações intermunicipais de desenvolvimento. Dessa maneira, os municípios rurais que
compõem a região nordeste de Goiás devem buscar realizar o planejamento integrado de seu
desenvolvimento, diagnosticando seus principais problemas rurais, planejando ações e
captando os recursos necessários à sua execução. Isso para que não se corra o risco “de que
propostas muito bem intencionadas sirvam para perpetuar e reforçar o viés setorial dos
programas existentes, em vez de ajudarem a promover a referida transição” (VEIGA, 2003, p.
49).
Neste sentido, projetos como o que está sendo desenvolvido pela Embrapa, de cunho
setorial, não devem ser dissociados daqueles que tratem dos outros elos da cadeia, tais como o
beneficiamento e a industrialização do produto, a comercialização, o armazenamento.
Resultados ineficientes podem ter por influência o uso racional, pelos atores, da
informação incompleta de que dispõem (NORTH, 1993). Para que isso não aconteça na
região é preciso, conforme Favareto; Schroder (2007), que as articulações para o
desenvolvimento rural considerem a coerência entre as instituições para o desenvolvimento
territorial e as estruturas sociais existentes nos espaços em que são formadas. São elas que
respondem pela configuração da política e da economia local. É preciso considerar, também, a
complementaridade das instituições que orientam a conduta dos agentes individuais e
coletivos nesses espaços, capazes de influenciar substantivamente as regras do jogo social
local.
126
Devido às características comuns - físicas, climáticas, históricas, de tradições e de cultura
- a região nordeste de Goiás deve buscar seu desenvolvimento rural a partir do
desenvolvimento de projetos de abordagem territorial. Para isso, a fonte de mudança
incremental das instituições, na perspectiva de North (1993), é a aprendizagem. Nesse
sentido, as organizações que participam do desenvolvimento rural na região, como a
Embrapa, devem incorporar os conceitos constantes no paradigma em construção da nova
ruralidade. Com isso, o desenvolvimento rural deverá vir por meio de programas e projetos
que tenham dimensão territorial. Esses projetos devem ser construídos a partir da coerência
entre essas instituições com as estruturas sociais existentes e a complementaridade com as
atividades de outras organizações, tais como as entidades públicas federais, estaduais e dos
municípios, ONGs e outras.
Além disso, após a desestruturação e reestruturação do meio rural ocorrida nos últimos
anos, é preciso prestar atenção nas atividades que terão maior vigor socioeconômico
(VILELA, 2002) naquele meio. No tocante à região estudada, deduz-se que a atividade
econômica mais expressiva é, ainda, a relativa ao turismo ecológico ou místico. Assim, a
atividade agrícola deverá trabalhar em estreita relação tanto com o turismo quanto com as
outras atividades relacionadas ao território, tais como a conservação, o lazer, a residência.
Como as ações voltadas para o planejamento e desenvolvimento do território devem traduzir
as aspirações das populações locais é preciso verificar, junto aos habitantes da região, que
projetos eles estão dispostos a realizar. assim, partilhadas entre atores públicos e privados,
nacionais, regionais, ou locais, ligados por meio de parcerias, essas ações serão produtoras e
redistributivas de riquezas para todo o território (SABOURIN; TEIXEIRA, 2002).
127
7. CONCLUSÃO
A presente pesquisa foi iniciada com o objetivo de estudar a melhor forma de inserir os
agricultores familiares de Alto Paraíso de Goiás no agronegócio do café. A hipótese levantada
foi comprovada: os agricultores familiares do município, ao procurarem a ajuda da Embrapa
para resgatar o café que é produzido tradicionalmente em suas propriedades, têm como
intenção dar sentido operacional à expressão simbólica do brasão municipal, como base de
projeto de desenvolvimento, por meio de um produto que tem identidade com a história e a
tradição dos habitantes da região. Embora a direção a ser adotada ainda não esteja plenamente
definida para eles, essa investigação permite sinalizar alguns caminhos.
O presente estudo possibilitou pensar a noção de construção social do mercado a partir de
um café que está sendo, mais de duzentos anos, tradicionalmente produzido seguindo os
compromissos ecológico e social. Compromisso ecológico por ser produzido em uma área de
proteção ambiental (APA), já que se encontra plantado em uma região que faz fronteira com o
Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, subordinada à legislação brasileira relativa ao
uso da terra em regiões estabelecidas como APA. Essa legislação limita a derrubada de matas
nativas bem como o uso indiscriminado de produtos químicos e máquinas agrícolas. O
compromisso social decorre do fato de o café ser produzido por agricultores familiares, que
utilizam basicamente a mão-de-obra da família em benefício de todos os seus membros.
É recomendável que a construção social do mercado, neste caso, seja feita de forma a
inserir o produto no mercado de cafés especiais, no qual é valorizado por consumidores com
consciência ecológica e social, e que estão dispostos a pagar mais por ele. Acredita-se que
esse café pode abastecer o nicho de mercado de produtos com certificação de origem
21
, que
21
A certificação de origem estabelece a diferenciação do produto a partir das características geográficas da
região produtora e do material genético tradicionalmente utilizado, bem como aos tratos culturais e às práticas de
beneficiamento, tratamento de pós-colheita e ao armazenamento locais. Os produtos da região certificada devem
128
valoriza o produto que é elaborado de forma tradicional em uma determinada região. A
certificação de origem é uma das estratégias possíveis para a inserção, no mercado, do café da
região. Porém, ela poderá ser estabelecida no futuro que, para isso, é necessário, ainda,
que os produtores se organizem de forma a que os processos de melhoria da qualidade do
produto final sejam aplicados na produção local.
Por se perceber a possibilidade de construção social desse mercado é que se buscou na
história, nas tradições e nos costumes da região, os valores que podem ser considerados para a
construção. Ao ‘inventar’ a tradição da região, ou seja, ao estabelecer a continuidade com o
passado histórico apropriado (HOBSBAWM, 2006), resgata-se o que está ligado ao habitus
(BOURDIEU, 1987) e à memória coletiva de seus habitantes (HALBWACHS, 1990). Esse
resgate da memória coletiva é possível a partir do desvelamento dos valores existentes no
território estudado (VALENTE, 2005). Valores que são revelados no próprio trabalho
concreto dos produtores familiares e na sua cultura, isto é, na ação e reflexão humana que
fazem conhecer o processo de produção de sua existência.
Esse processo faz ressurgir informações que foram passadas de geração em geração e que
ainda estão preservadas por sua população. Dessa forma, essas informações são
permanentemente reconstruídas com base no presente (GIDDENS, 1997).
O café da região da Chapada dos Veadeiros pode abastecer, ainda, um outro nicho de
mercado de cafés especiais: o de cafés orgânicos
22
, o segmento de mercado que mais cresce
atualmente em todo o mundo (LEITE; SILVA, 2000). Porém, para participar desse nicho, é
necessário que os produtores locais passem a adaptar sua produção aos métodos estabelecidos
pelos órgãos de certificação do produto orgânico, conforme foi explicitado anteriormente por
ser padronizados e ter característica única, inimitável, completamente diferenciada de outras regiões produtoras
da mesma cultura. Porém, a certificação de origem requer uma rígida disciplina na produção e comercialização
dos produtos, o que concede, por outro lado, mais garantia aos consumidores (LUNA, 2001).
22
Tipo de agricultura que prioriza o enfoque sistêmico e a abordagem holística da produção. Fundamentada em
princípios ecológicos, na conservação de recursos naturais, na diversificação de espécies e na eliminação do uso
de produtos químicos e máquinas para o cultivo. Hoje os consumidores desse tipo de produto estão também
preocupados com as questões sociais e ambientais de produção (RICCI; ARAÚJO; FRANCH, 2002).
129
Ricci; Araújo; Franch (2002). Isso deverá tornar possível após a realização de projeto de
pesquisa que está sendo desenvolvido pela Embrapa e que estabelecerá a produção orgânica
de café para a região.
O incentivo para a realização do presente estudo partiu da realização desse projeto
desenvolvido pela Embrapa, denominado Implementação de Cafeicultura Orgânica para a
Agricultura Familiar de Alto Paraíso de Goiás - e que tem como principal objetivo o
desenvolvimento de tecnologias para a sustentabilidade da produção de café em sistemas
agroecológicos e orgânicos para os agricultores familiares do município de Alto Paraíso de
Goiás. Esse projeto é de extrema importância na busca estratégica de mercado, que, a partir
dele, será possível estabelecer a produção do café com qualidade e sanidade na região.
Entretanto, acredita-se que a realização de um projeto setorial, ou seja, voltado apenas
para a produção cafeeira, não seja o bastante para que os produtores conquistem o mercado.
Os resultados deste estudo sinalizam que a competência institucional da Embrapa, já
reconhecida nacional e internacionalmente, deve ser alargada no sentido de incorporar às suas
pesquisas as dimensões histórica, cultural e do saber-fazer ligado à tradição. No caso em
questão, o estudo mostrou que não basta uma intervenção meramente operacional, restrita à
produção no campo, que padroniza a participação no mercado e os projetos desenvolvidos.
Devem-se considerar os significados presentes na dimensão simbólica, na qual o brasão de
Alto Paraíso de Goiás é apenas uma expressão, que evocam sentidos sobre a identidade de
quem produz o território e que os diferencia. Por esse motivo, espera-se que o presente
trabalho possa ser utilizado na construção de novos projetos de pesquisa que levem em
consideração a construção social do mercado do café e na busca das estratégias mais
eficientes de divulgação do produto final. Um dos aspectos a serem considerados ao se
perseguir a construção do mercado é o planejamento de projetos que visualizem toda a cadeia,
130
de maneira a que o desenvolvimento do produto seja feito de forma eficiente, desde a
produção no campo até sua chegada ao consumidor.
A valorização de cada ator que participa do processo de construção do desenvolvimento
local é outro aspecto importante para a busca eficiente do mercado. Para que a produção da
região da Chapada dos Veadeiros seja sustentável, acredita-se ser importante o envolvimento
dos produtores de café de todo território, de forma integral, nos projetos de desenvolvimento.
Hoje, conforme foi verificado na presente pesquisa, a grande maioria dos produtores ainda
não conseguiu estabelecer a relação que existe entre o café cultivado em suas propriedades e o
passado histórico da região. A partir do envolvimento integral desses habitantes, espera-se
que eles passem a ser os principais atores na construção desse mercado.
Tem-se a consciência de ser um erro tentar estabelecer, para o território em questão, as
diretrizes de um modelo de desenvolvimento que sejam similares às dos países de capitalismo
avançado (FAVARETO, 2007), que tiveram formas de ocupação de seu território diversas às
ocorridas no Brasil. Porém, acredita-se que algumas experiências vividas por agricultores
familiares de países europeus, relatadas em textos citados no presente trabalho, que foram
estabelecidas por Veiga (2006) e Diniz (2004), podem ser consideradas, com as devidas
adaptações. Abaixo, são sugeridos alguns caminhos que podem ser seguidos pela comunidade
local para o desenvolvimento rural da região. Para isso, acredita-se ser preciso que os
produtores da região da Chapada dos Veadeiros:
Estabeleçam o desenvolvimento da ruralidade por meio da sinergia entre a
agricultura e os outros setores da economia local, sejam eles o turismo, o
artesanato ou mesmo a conservação sustentável do meio ambiente, de forma a
explorar as vantagens comparativas do território como um todo.
131
Estabeleçam um grupo, que poderá ser formado por meio de uma associação de
produtores, uma cooperativa, ou outra forma de união, que promova o
fortalecimento dos agricultores familiares na busca de estratégias coletivas.
Cooperem entre si, de forma a enfrentar os grandes concorrentes do agronegócio
brasileiro e de outros países produtores, para conseguir estabelecer mercado tanto
para o café quanto para outro produto agrícola a ser explorado na região.
Criem uma estratégia para que a qualidade do café que produzem seja melhorada
em todo o processo de produção, podendo estabelecer uma forma de
beneficiamento e industrialização do produto por meio de uma cooperativa de
produtores, como já é praticado em outras regiões produtoras de café no país.
Definam regras coletivas de padrão de qualidade do produto e dos serviços que são
prestados na região. Ao estabelecerem esse padrão de qualidade, todos os
participantes do grupo devem seguí-las, de forma que, ao comercializar seu
produto ou prestar um serviço, o grupo seja monitorado, mediante indicadores de
desempenho e que sanções sejam aplicadas àqueles que se desviarem dos padrões
definidos.
Apontem os líderes empreendedores que estejam dispostos a unir esforços e buscar
as competências e técnicas que possam ser utilizadas pelo grupo, além das
experiências externas que serão aplicadas ao mesmo;
Estabeleçam os incentivos que irão perpetuar o processo de produção e
comercialização do produto bem como a prestação dos serviços. Devem partir do
grupo de produtores as propostas de continuidade dos incentivos que busquem a
sustentabilidade das atividades desenvolvidas por meio da autogestão eficiente, e
não de uma organização externa ao grupo.
132
Percebe-se, ainda, que, além de o objetivo ter sido atingido de maneira satisfatória, e
comprovada a hipótese levantada, o presente estudo possibilitou estabelecer algumas
sugestões relativas à região nordeste do estado de Goiás, hoje ainda conhecida como corredor
da miséria. Ao se resgatar as características comuns a todo o território, acredita-se que são
elas que devem ser consideradas quando se quer buscar o desenvolvimento sustentável da
região. E, um dos desafios no campo do agronegócio atual, é a incorporação dos aspectos
territoriais aos produtos, transformando atributos culturais em valor econômico.
Além de um ambiente de beleza exuberante e rico em recursos naturais, os municípios
que compõem a região da Chapada dos Veadeiros também compartilham um passado comum
de valor histórico, tradicional e cultural. Por esse motivo, os projetos a serem desenvolvidos
na região devem incorporar a abordagem territorial de desenvolvimento (VEIGA, 2003).
Esses projetos devem ser elaborados de forma a potencializar as habilidades locais por meio
da integração dos municípios que compõem o território, buscando envolver tanto as
comunidades que habitam os municípios quanto as organizações que atuam na região. Essa
articulação envolve entidades públicas federais, estaduais e municipais, ONGs, associações de
produtores e empresários, além das lideranças locais. Por meio dessa articulação é possível
buscar o planejamento de ações de desenvolvimento integrado da região e o desenvolvimento
de projetos sociais, de forma a que juntos todos os atores possam captar os recursos e os
meios necessários à sua execução.
Acredita-se, ainda, que na região objeto da presente pesquisa o estudo do agronegócio
não deve se limitar a visualizar apenas a cadeia produtiva em questão, mas indicar caminhos
para que sejam possíveis novos enfoques e estratégias para a construção do mercado que se
propõe, que levem em consideração as estruturas sociais existentes. No território estudado,
observou-se a existência de uma comunidade rural que foi, ao longo dos anos, perdendo sua
tradição de produção agrícola para o mercado, devido, além de outros motivos, à perda dos
133
membros mais jovens das famílias rurais, que foram trabalhar nas cidades ou no turismo, e a
falta de apoio dos órgãos públicos. Evidencia-se, ainda, um elevado grau de debilidade
econômica das pequenas famílias rurais da comunidade, que utilizam suas propriedades
apenas para a produção de alimentos para o autoconsumo.
Por outro lado, percebe-se, na região, um potencial para a exploração de atividades
pertencentes ao que os estudiosos do moderno agronegócio convencionaram chamar de nova
ruralidade (PERICO; RIBEIRO, 2005; VEIGA, 2006; FAVARETO, 2007). Nos últimos
anos, após o advento da Revolução Verde, cujo modelo de desenvolvimento tem acarretado
severas críticas devido às conseqüências deixadas, tanto em termos sociais quanto em relação
ao meio ambiente, em todo o mundo, estudiosos estão analisando as mudanças ocorridas na
relação rural/urbano, bem como na redefinição dos espaços rurais. A área rural passou de
simples espaço destinado à produção de alimentos para uma multiplicidade de possibilidades
de exploração econômica, em especial o aproveitamento econômico das amenidades naturais
por meio do turismo e a exploração de fontes alternativas e renováveis de energia, além da
conservação da biodiversidade. O estudo dessa nova ruralidade traz, também, à tona, a
impor-tância de se explorar a capacidade concorrencial do território como fator de
desenvolvimento regional e de melhoria da qualidade de vida de seus habitantes. O Estado e a
sociedade, porém, têm dificuldade em operar com a mudança de paradigma contida na
construção dessa nova ruralidade. Isso faz com que o discurso, as políticas e os programas
que buscam o desenvolvimento rural nem sempre incorporem os novos temas e, muitas vezes,
acabam por colocar apenas nova roupagem nos velhos valores e práticas adotados anterior-
mente, reduzidos à dimensão setorial dos seus aspectos agrícola e agrário (FAVARETO,
2007).
Para que esta visão seja vencida, é necessário que as lideranças do agronegócio superem
o discurso setorial e comecem a exercer seu papel no desenvolvimento territorial. Isso inclui a
134
capacidade de ajudar e de ser beneficiado pelo desenvolvimento sustentável das localidades
sob sua influência e das quais dependerá a manutenção de sua própria competitividade
23
.
Por esse motivo é que se buscou, a partir da análise de um projeto específico, estudar a
forma como as organizações e a comunidade local participam do processo de construção de
um novo mercado, o do café, produto antes negligenciado na região, mas que está presente em
grande parte das propriedades privadas. Por outro lado constatou-se que, após vários anos de
trabalho voltado para a exploração do turismo, os projetos de desenvolvimento rural a serem
desenvolvidos na região devem considerar essa vocação local para o turismo ecológico e
místico. Essa é a razão pela qual, a atividade agrícola para a produção do café deverá
trabalhar em estreita relação tanto com o turismo quanto com as outras atividades
relacionadas ao território que podem agregar valor ao produto, como a história e o misticismo
da região, além do absoluto respeito à legislação ambiental e à ecologia.
Acredita-se que, ao se resgatar, a partir de documentos e da memória dos habitantes da
região, o passado histórico do produto, estritamente ligado à história do Brasil, reveste-se o
café de um valor antes não percebido nem por seus próprios produtores. Esse valor, alicerçado
na tradição, nos costumes e no conhecimento transmitido de geração em geração, pode ser
utilizado para a divulgação do café a um consumidor que valoriza esse tipo de produto. Mas
deve, principalmente, revestir-se de um conceito que revele a ligação desse povo com o seu
próprio passado vinculado à terra e àquela região, levando-o a reconhecer o valor que a
tradição e o produto de seu trabalho concreto podem alcançar no mercado. E, com isso, traçar
um novo destino que possa trazer de volta os filhos da terra para que, unidos, construam e
reconstruam o seu território em busca de mais dignidade e qualidade de vida, num processo
constante e ininterrupto.
23
Veiga defende a idéia de que, além da dimensão ligada à eficiência produtiva e comercial, esta ligada ao cerne da
própria noção de competitividade, passa a ser fundamental que o agronegócio também se preocupe com os aspectos
relativos à sua eficiência distributiva, à sua eficiência ecológica e à sua eficiência mesoeconômica. Esta última refere-
se à sua capacidade tanto de ajudar como de ser beneficiado pelo desenvolvimento sustentável das localidades que
mais influencia e das quais dependerá a manutenção de sua própria competitividade (VEIGA, 2003).
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WANDELEY, M. de N. B. Raízes históricas do campesinato brasileiro. In: TEDESCO, J. C.
(org.). Agricultura familiar. Realidades e perspectivas. 2ª ed. Passo Fundo: EDIUPF, 1999.
WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/João_Bosco>
Acesso em: 25 out 2007a.
________. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Seitan>. Acesso em: 27 out de
2007b.
WILKINSON, J. Distintos enfoques e debates sobre a produção familiar no meio rural.
Revista Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável, n° 3 julho/set, 2000.
________. A pequena produção e sua relação com os sistemas de distribuição. In:
FIGUEIREDO, A.; PRESCOTT E.; MELO, M. F. (orgs.) Integração entre a produção
familiar e o mercado varejista - uma proposta. Brasília: Universa, 2004.
144
9. APÊNDICES
145
Apêndice A
Questionário
1. PERGUNTAS SOBRE O ENTREVISTADO E SUA FAMÍLIA:
1.1) Nome do entrevistado:
1.2) Sexo:
( ) masculino ( ) feminino
1.3) Idade:
( ) até 19 anos ( ) de 20 a 29 anos ( ) de 30 a 39 anos
( ) de 40 a 49 anos ( ) de 50 a 59 anos ( ) acima de 60
anos.
1.4) Cor/descendência:
( ) branca ( ) negra ( ) parda
( ) amarela ( ) indígena ( )
1.5) Como é composta a família?
( ) pai
( ) mãe
( ) filhos. Quantos? ......................................................
( ) outros parentes Que tipo e quantos? .........................
( ) agregados. Que tipo e quantos? .................................
1.6) Qual o nível de escolaridade do chefe da família?
( ) fundamental incompleto ( ) fundamental completo ( ) médio incompleto
( ) médio completo ( ) superior incompleto ( ) superior completo
( ) nunca foi à escola
1.7) É o chefe da família?
( ) Sim ( ) Não
1.7.1 Se não, qual o nome do chefe da
família?...............................................................................
1.8) A principal renda da família vem de:
( ) agricultura ( ) pecuária ( ) artesanato
( ) aposentadoria/pensão ( ) emprego na cidade ( ) ecoturismo
( ) programas sociais ( ) extrativismo ( ) garimpo
( ) outros: ......................................................................................
146
1.9) Quantas pessoas da família trabalham na terra?
( ) em tempo integral ( ) meio período do dia ( ) nas horas vagas
( ) nos fins de semana ( ) outro período: ...............................
1.10) Quantas pessoas da família têm outras atividades? Quais?
( ) artesanato ( ) emprego na cidade ( ) com o ecoturismo
( ) extrativismo ( ) garimpo
( ) outros: ............................................................................
1.11) Nasceu em Alto Paraíso de Goiás?
( ) Sim ( ) Não
1.11.1 Se não, onde nasceu? (cidade e estado)..................................
1.12) Caso não tenha nascido em Alto Paraíso de Goiás, como chegou à região? Porquê?
Quando?
1.13) Pertence a algum sindicato ou associação de produtores?
( ) Sindicato ( ) Associação de produtores ( ) Não pertence a nenhum
1.14) Quais os meios de transporte mais utilizados pela família:
( ) carro ( ) caminhão ( ) cavalo
( ) a pé ( ) bicicleta ( ) motocicleta
( ) ônibus ( ) outros: ........................................................
1.15) Que aparelhos domésticos existem na propriedade? (colocar quantidade)
( ) televisão ( ) rádio ( ) geladeira
( ) máquina de lavar roupa ( ) computador ( ) freezer
2. PERGUNTAS SOBRE A COMUNIDADE:
2.1) Na comunidade existe: (pode marcar mais de uma resposta)
( ) centro comunitário ( ) escola ( ) hospital/centro de saúde
( ) posto telefônico ( ) posto policial
2.2) Quais os tipos de associação/grupos que você conhece na comunidade? (marcar
quantos forem necessários)
( ) jovens ( ) mulheres ( ) educação
( ) saúde ( ) produtores agrícolas ( ) artesanato
( ) político ( ) outros: ..................................
2.3) Quantos membros da família participam ativamente desses grupos? (marcar a
quantidade)
( ) jovens ( ) mulheres ( ) educação
( ) saúde ( ) produtores agrícolas ( ) artesanato
( ) político ( ) outros: .........................................................
2.4) A família recebe algum auxílio do governo?
147
( ) Sim ( ) Não
2.4.1 Se sim, que tipo?
( ) federal ( ) estadual ( ) municipal
2.4.2 Qual? ..............................................................
2.5) Quais festas tradicionais você conhece que existem na região?
2.6) De que forma a família participa das festas tradicionais locais?
( ) não participa
( ) participa ajudando a preparar
( ) participa ajudando com dinheiro
( ) apenas vê
( ) participa da realização da festa. Como? (exemplo: canta no coro, toca algum instrumento,
vende produtos em barracas) ...........................................................................
2.7) Algum membro da família é adepto de alguma religião?
( ) Sim ( ) Não
2.7.1 Se sim, qual?.............................................................................
3. SOBRE EDUCAÇÃO:
3.1) Quantas pessoas da família estudam? (colocar o número de pessoas)
( ) de 0 (zero) a 6 (seis) anos ( ) de 7 (sete) a 14 (quatorze) anos
( ) 15 (quinze) anos para cima
3.2) Onde fica a escola mais próxima?
( ) na comunidade ( ) na cidade. Qual? .......................................
( ) não existe escola próxima
3.3) Qual a escola mais próxima da comunidade? Qual a distância da comunidade até a
escola?
( ) Km OU ( ) Léguas
3.4) Como os alunos vão para a escola?
( ) ônibus ( ) carro ( ) à pé
( ) cavalo ( ) bicicleta ( ) motocicleta
( ) outro: .................................................................................
3.5) Qual o tipo do prédio escolar:
( ) alvenaria ( ) adobe ( ) madeira
( ) outros: ..................................................................................
3.6) A escola é mantida por:
( ) governo estadual ( ) governo municipal ( ) comunidade
( ) iniciativa privada ( ) é escola particular
( ) outros: ................................
148
3.7) A escola da comunidade é suficiente para atender todos os alunos?
( ) Sim ( ) Não
3.8) Que tipo de ensino é dado nas escolas na região? (pode marcar mais de uma resposta)
( ) fundamental ( ) médio ( ) profissionalizante
( ) superior ( ) outros:.........................................................
3.9) Existe na comunidade escola para adultos?
( ) Sim ( ) Não
4. SOBRE SAÚDE:
4.1) Existe posto de saúde na comunidade?
( ) sim, funciona normalmente ( ) sim, mas não funciona todos os dias
( ) sim, mas não funciona
( ) não existe ( ) outra situação. Qual? ..........................................
4.2) Existem na comunidade agentes de saúde comunitários/voluntários?
( ) parteiras ( ) enfermeiros ( ) curandeiros
( ) médicos/estudantes de medicina ( ) outros: .......................................................
4.3) Qual a distância da comunidade ao posto de saúde mais próximo?
( ) Km OU ( ) Léguas
4.4) Qual a distância da comunidade ao hospital mais próximo?
( ) Km OU ( ) Léguas
4.5) No posto de saúde/hospital tem tratamento de dente?
( ) Sim OU ( ) Não
4.6) A família faz/já fez tratamento de dente?
( ) Sim ( ) Não
4.7) A família se utiliza de plantas medicinais?
( ) Sim. Produzo na minha propriedade ( ) Sim. Compro de quem produz ( ) Não
4.8) Quais plantas já usou e para que?
5. PERGUNTAS SOBRE A PROPRIEDADE:
5.1) Nome da propriedade
5.2) Localização (Nome da região, da área, localidade, ou endereço)
5.3) Qual a área da propriedade?
( ) até 9 hectares ( ) de 10 a 19 hectares ( ) de 20 a 39 hectares
( ) de 40 a 49 hectares ( ) de 50 a 99 hectares ( ) de 100 a 499 hectares
149
( ) de 500 a 999 hectares ( ) acima de 1000 hectares
5.3.1 Se souber, colocar o tamanho: ............................................................................
5.4) A propriedade está inserida na área protegida, como por exemplo proteção
ambiental (APA)?
( ) Sim ( ) Não
5.5) Qual o tamanho da área que está sendo usada para a agricultura?
( ) até 4 hectares ( ) de 5 a 9 hectares ( ) de 10 a 19 hectares
( ) de 20 a 39 hectares ( ) de 40 a 49 hectares ( ) de 50 a 99 hectares
( ) de 100 a 499 hectares ( ) de 500 a 999 hectares ( ) acima de 1000 hectares
5.5.1 Colocar o tamanho: ....................................................................
5.6) Qual a distância da propriedade da cidade mais próxima?
( ) Km ( ) Léguas
5.6.1 Qual é a cidade? ..............................................................
5.7) Qual o tipo da casa onde mora:
( ) alvenaria ( ) adobe ( ) madeira
( ) outros: .............................................................................
5.8) A água utilizada na casa vem de:
( ) rede pública ( ) rio, córrego ou riacho ( ) poço artesiano
( ) outro. Qual? ...................................................................................
5.9) Existe energia elétrica na propriedade? É obtida por:
( ) rede ( ) placa solar ( ) gerador
( ) não tem energia elétrica ( ) outros: ............................................................
5.10) Existe esgoto sanitário na propriedade? Que tipo?
( ) rede pública ( ) fossa ( ) não existe
5.11) Qual a topografia predominante na propriedade?
( ) plana ( ) ondulada ( ) montanhosa
( ) outro. Qual? ........................................................................................
5.12) A propriedade é
( ) própria ( ) arrendada ( ) posse
( ) explorada sob o regime de meeiro (planta em terra alheia e divide os resultados com o
dono)
( ) parceiro (compartilha a terra com outro agricultor)
( ) outros: ......................................................................................
6. PERGUNTAS SOBRE A PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA:
6.1) O que produz? (preencher com o que o entrevistado sabe)
150
Produto Quantidade (Kg) Porcentagem
(%)
Tamanho da área (m²)
mandioca
feijão
arroz
milho
café
Frutas (especificar)
Hortaliças
(especificar)
Animais (especificar)
6.2) Com qual produto a propriedade tira mais renda na venda?
( ) mandioca ( ) feijão ( ) arroz
( ) milho ( ) café ( ) banana
( ) frango ( ) porco
( ) outro. Qual?.....................................................................................
6.3) Qual o destino da produção? (marcar todos os mercados usados)
Destino da
Produção
mandioca feijão arroz milho café banana frango porco outro
produto
Feira na
comunidade
Feira na cidade
Comércio local
Comércio na
cidade
Distribuidor
Hotéis/pousadas
Restaurantes/bares
Na propriedade
Consumo da
família
Outro
6.4) Quando vende os produtos agropecuários produzidos?
( ) todo dia ( ) toda semana ( ) todo mês
( ) de vez em quando
6.5) Como recebe o pagamento?
( ) dinheiro ( ) mercadoria
( ) outra forma. Qual?..........................................................................
151
6.6) Irriga a terra?
( ) Sim ( ) Não
6.7) Tem água para irrigação o ano todo?
( ) Sim ( ) Não
6.8) Utiliza água para irrigação de onde?
( ) encanada ( ) rio ( ) córrego
( ) lagoa ( ) outro. Qual? .......................................................
6.9) A terra que você trabalha é boa?
( ) Sim ( ) Não
6.10) A terra já recebeu calcário?
( ) Sim ( ) Não
6.11) Você protege o solo da erosão?
( ) Sim ( ) Não
6.11.1 Como? .......................................................................................................
6.12) Utiliza produtos orgânicos (palhas, folhas, restos de cultivos, etc.) para aumentar a
fertilidade do solo?
( ) Sim ( ) Não
6.12.1 Quais? .................................................................................
6.13) Utiliza adubo químico?
( ) Sim ( ) Não
6.13.1 Se sim, com que freqüência? .................................................................
6.13.2 Em que cultivos? ..................................................................................
6.13.3 Qual produto utiliza?...............................................................................
6.14) Utiliza produtos naturais (controle biológico, fumo, pimenta, armadilha, etc) para
combater as pragas e doenças?
( ) Sim ( ) Não
6.14.1 Quais produtos? ..........................................................................
6.15) Utiliza produtos químicos (inseticida, herbicida ou fungicida) para combater as
pragas e doenças ou controlar o mato?
( ) Sim ( ) Não
6.15.1 Se sim, com que freqüência? ..................................................................
6.15.2 Em que cultivos? ..................................................................................
6.15.3 Quais produtos? ..............................................................................
6.16) Já recebeu ajuda de alguma instituição de assistência técnica ou de extensionistas,
como Emater, etc?
( ) Sim ( ) Não
6.16.1 Quais? .........................................................................................
6.16.2 Qual a periodicidade? .............................................................
152
6.17) Tem acesso a veterinário para vacinação/tratamento dos animais?
( ) Sim ( ) Não
6.17.1 Qual a periodicidade? .......................................................................
6.18) Utiliza trator?
( ) Sim ( ) Não
6.19) A quem o trator pertence?
( ) prefeitura ( ) é próprio ( ) da comunidade
( ) é alugado ( ) emprestado ( ) da agroindústria
( ) outros. Qual? ....................................................................
6.20) Qual a periodicidade em que tem acesso a financiamento?
( ) todo ano ( ) raramente ( ) nunca
6.20.1 Se sim, de que financiadora? .........................................................
6.21) Existe alguma estratégia para a venda conjunta dos produtos da região? Como
cooperativa, feira, etc.
( ) Sim ( ) Não
6.21.1 Se sim, quais? ................................................................................
6.22) Faz ou já fez alguma parceria/contrato com alguma indústria ou comércio?
( ) Sim ( ) Não
6.22.1 Se sim, com quem? .............................................................................
6.22.2 Para quê (venda, distribuição)? .........................................................
6.23) Este tipo de parceria/contrato melhorou sua venda?
( ) Sim ( ) Não
6.24) Qual a renda mensal (ou anual) da família? (colocar se é mensal ou anual)
6.25) Possui na propriedade empregados que não sejam da família?
( ) Sim ( ) Não
6.26) Se sim, quantos?
( ) Um ( ) Dois
( ) Três ( ) Mais de três
6.27) Para que tipo de serviço?
( ) plantio ( ) colheita ( ) todo o serviço
( ) outro. Qual? ............................................................................................
6.28) Como é feito o pagamento?
( ) dinheiro ( ) mercadoria
( ) outro. Qual? .................................................................................
6.29) Qual a periodicidade do pagamento?
( ) mensal ( ) semanal ( ) diária
( ) por empreitada ( ) por serviço realizado ( ) outro. Qual? ................
153
7. SOBRE A PRODUÇÃO DE CAFÉ
7.1) Sabe quantos pés de café possui?
( ) menos de 19 ( ) de 20 a 49 ( ) de 50 a 99
( ) de 100 a 499 ( ) de 500 a 999 ( ) mais de 1000
7.1.1 Se souber, colocar a quantidade:..................................................
7.2) De onde vieram as mudas?
( ) já pegou a propriedade com o café
( ) comprou as mudas na região
( ) comprou as mudas em outra região
7.3) Já comprou sementes de café?
( ) Sim ( ) Não
7.3.1 Se sim onde? ..............................................................................
7.4) Sabe qual a idade dos pés?
( ) Sim ( ) Não
7.4.1 Se sim, qual é, aproximadamente.........................................................
7.5) A produção é consorciada?
( ) Sim ( ) Não
7.5.1 Se sim, com que cultura?
( ) banana ( ) feijão ( ) milho
( ) outra. Qual? ................................................................................................
7.6) É sombreada?
( ) Sim ( ) Não.
7.6.1 Se sim, por que cultura? ..................................................................
7.7) Que tipo de operação é feita na propriedade com o café após a colheita?
Operação Sim Não
Lavagem
Secagem
Descascamento
Torrefação
Moagem
Embalagem
Armazenamento
154
7.8) As operações que não são feitas na propriedade, onde são realizadas?
Operação Realizada
Lavagem
Secagem
Descascamento
Torrefação
Moagem
Embalagem
Armazenamento
7.9) Existem indústrias de torrefação e moagem de café na região?
( ) Sim ( ) Não
7.10) A propriedade possui quais equipamentos/infra-estrutura abaixo?
Equipamentos Sim Não
Terreiro secador
Lavador de café
Equipamento de irrigação
Galpão para armazenagem
Máquina de torrar
Máquina de moer
7.11) De que forma é vendido o café?
Venda do café Marcar as opções existentes na fazenda
Frutos sem secar ou lavar
Em coco (com a casca)
Verde (sem torrar) descascado
Seco sem a casca
Torrado em grão
Torrado e moído
Embalado
7.12) Tem alguma idéia do custo de produção do café?
( ) Sim ( ) Não
7.12.1 Se sim, qual é? .......................................................................
7.13) Faz alguma anotação sobre custo de produção?
( ) Sim ( ) Não
7.14) Como é feito o transporte do café para beneficiamento/industrialização?
( ) ônibus ( ) carro ( ) à pé
( ) cavalo ( ) bicicleta ( ) motocicleta
( ) outro: ...........................................................................
155
7.15) Quanto rende, em reais, o cafezal? (responder qual o entrevistado souber)
( ) por saca .............................................................
( ) por hectare .............................................................
( ) por semana ........................................................
( ). por mês .............................................................
( ) por ano ...............................................................
7.16) Usa mão de obra externa à propriedade para a produção de café?
( ) Sim ( ) Não
7.17) Para que tipo de serviço?
( ) plantio ( ) colheita ( ) todo o serviço
( ) outro. Qual? .................................................................................
7.18) Como é feito o pagamento?
( ) dinheiro ( ) mercadoria
( ) outro. Qual? ..............................................................................
7.19) Qual a periodicidade do pagamento?
( ) mensal ( ) semanal ( ) diária
( ) por empreitada ( ) por serviço realizado
( ) outro. Qual? ..............................................................................
7.20) Você considera que os preços obtidos por seu café nos últimos dois anos foram
compensadores?
( ) Sim ( ) Não
7.21) Pretende ampliar o cafezal? ( ) Sim ( ) Não
156
Apêndice B
Mapa da região adaptado de Attuch (2006) por André Souza/2007.
157
Apêndice C
A secagem do café é feita em plásticos pretos
Pés de café antigos, de porte alto
158
Antigo fiador de algodão
Café secando no terreiro
159
Horta comunitária do Moinho
Sistema de irrigação da horta comunitária
160
O café e o produto do artesanato feito com plantas do Cerrado
Pé de café antigo
161
Sementes caídas dos pés antigos brotam com facilidade em meio às folhas no chão
Pés de café da Chapada dos Veadeiros (GO)
162
10. ANEXOS
163
Anexo A
164
Fonte: Palacín, 1989, p. 13
A) CORREIÇÃO DE VILA BOA B) CORREIÇÃO DO NORTE
I - Julgado de Vila Boa
01. Arraial da Barra
02. Arraial de Anta
03. Arraial de Santa Rita
04. Arraial de Tesouras
05. Arraial do Ferreiro
06. Arraial do Ouro Fino
07. Arraial do Curralinho
08. Arraial de Pilões
09. Arraial de Anicuns
VIII - Julgado de Traíras
18. Arraial de Água Quente
19. Arraial do Cocal
20. Arraial do Maranhão
21. Arraial de São José do Tocantins
22. Arraial de Cachoeira
23. Arraial de Santa Rita
24. Arraial de Muquém
25. Arraial de Piedade
26. Arraial de Amaro Leite
II - Julgado de Meia Ponte
10. Arraial do Córrego do Jaraguá
11. Arraial de Corumbá
IX - Julgado de Cavalcante
27. Arraial das Flores
28. Arraial de Santa Rosa
29. Arraial de Mato Grosso
III - Julgado de Santa Luzia
12. Arraial de Montes Claros
13. Arraial de Couros
X - Julgado de São Félix
30. Arraial do Carmo
31. Arraial Chapada de São Félix
IV - Julgado de Santa Cruz
14. Arraial de Bonfim
XI - Julgado de Arraias
32. Arraial do Morro do Chapéu
33. Arraial de São Domingos
V - Julgado do Desemboque
15. Arraial do Araxá
XII - Julgado da Barra do Palma
34. Arraial de Conceição
35. Arraial do Príncipe
VI - Julgado do Pilar
16. Arraial das Lavrinhas
17. Arraial de Goarinhos
XIII - Julgado da Natividade
36. Arraial da Chapada da Natividade
37. Arraial do Duro
VII - Julgado de Crixá XIV - Julgado de Porto Real
38. Arraial de São João das Duas Barras
39. Arraial do Carmo
40. Arraial do Pontal
165
Anexo B
166
Anexo C
Brasão de Alto Paraíso de Goiás
167
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
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