204
Se você for fazer uma matéria sobre árvore, por exemplo... Lembro-me de uma matéria do
jequitibá, que eu fiz com o Zé Hamilton. Como você faz para o telespectador se prender
numa imagem de árvore, que é um ser parado que está ali? Você precisa criar situações
com movimento de câmera, com detalhes da árvore... O cinegrafista do Globo Rural
precisa ser muito observador. Ele tem que estar atento ao que pode chamar a atenção numa
coisa parada que é uma árvore. Então, a gente fica imaginando o que vamos fazer com
essa árvore. Apesar do tamanho dela, a grossura dela, a explosão que ela é como ser, como
vamos transformar isso em termos de televisão? Nós vamos ter que buscar alternativas. A
primeira foi construir uma plataforma ao lado dela e falar: “Nós vamos escalar essa
árvore, nós vamos entrar no íntimo da copa dela”. Criamos uma plataforma e levamos o
Zé Hamilton, que é um cara que escreveu muito sobre jequitibá. Então, quando o Zé
Hamilton chegou à copa da árvore, que eu já estava com a câmera lá em cima... Já no meu
íntimo, eu falei: “Vai haver uma explosão emotiva do Zé muito grande, porque ele falou
da árvore com tanta intimidade durante muito tempo e ele não entrou na intimidade da
árvore. Ele vai entrar agora!” E quando ele chegou, ele se emocionou, ele chorou.
Aí, eu fiquei uma semana naquela copa, mostrando o que acontecia ali, e o que se passava
em volta da árvore, o que a árvore estava vendo... Eu passei a ser a árvore. Então, era um
passarinho com uma cor diferente, era um bando de macacos que vinha de manhã para
comer uma frutinha. Era um cara que passava com uma foice nas costas, porque ele ia
cortar uma cana lá na frente e aí ele passava e olhava para a árvore. Então, a câmera
passou a ser a árvore, a ter uma vida, e aí nós transportamos o telespectador para uma
realidade. Então, nossa câmera é muito aberta, muito aberta. Mas, eu volto a dizer, o
Globo Rural é muito rico em personagens.
E como é esse personagem em termos de imagem?
Bem, a câmera precisa ir no rosto desse personagem, com plano fechado. A gente abusa
do close, vai para os olhos, vamos em busca de planos-seqüência do cinema de arte. O
olhar do homem do campo é um olhar puro, honesto, verdadeiro. Então, não tem por que
você esconder esse olhar. A câmera pode se aproximar dele, e pode se aproximar muito.
Mas a câmera não causa uma certa inibição?
O engraçado é que, num primeiro momento, eles ficam meio que ariscos com nossa
presença, não só pela câmera mas também pelo microfone, às vezes já desce tripé, a gente
monta luz, outras vezes não precisamos nem de iluminação... A gente evita usar luz,
porque utilizamos muito a luz natural. As câmeras que temos hoje, as beta digitais,
gravando em disco, são muito mais sensíveis. É um equipamento excelente, de última
geração, que utiliza um mínimo de luz. Para nós, do Globo Rural, foi muito bom, porque
trabalhamos com a luz verdadeira, do dia-a-dia da casa. A gente trabalha com aquele feixe
de luz, ali, brilhando, um raio, na cozinha. A gente consegue pegar a luz natural. A
parafernália assusta um pouco, mas, normalmente, a gente começa a entrar num clima de
brincadeira que ajuda a descontrair. Passamos às vezes dois ou três dias na propriedade,
com muitas horas de gravação, e isso ajuda o cidadão a se soltar, entrar no nosso clima.
Em Rio Capibaribe, por exemplo, há variados planos de imagem da arquitetura,
especialmente do centro histórico do Recife. Dá para explicar essa linguagem?
É o cinema. Assisto muitos filmes. Eu viajo muito e vou comprando filmes que assisto em
meu laptop durante minhas viagens. Quando eu estou em São Paulo, eu pego a minha filha