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Em nossa penúltima edição falamos do barulho infernal e do desmedido
número e choque de horários das dezenas de auto-falantes (sic) que infestam
Teresina de um certo tempo pra cá. Parece, entretanto, que com a nossa nota
e apelo a quem de direito, equivaleu “malhar em ferro frio”, e as autoridades
a quem compete reprimir o abuso, continuam de braços cruzados[...]
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Tão logo nasceram os anos 50, Teresina se preparava para comemorar o primeiro
centenário.
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A cidade queria crescer, mas os discursos presentes nas páginas de jornais
revelavam o desejo de que o processo de modernização
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avançasse silencioso e calmo, sem
traumas, sem ruídos. Durante o horário comercial, no entanto, as ruas do centro, ofereciam os
sons estridentes que advinham no mesmo ritmo do “progresso”.
O barulho do trânsito de carros, caminhões, ônibus, ciclistas, motociclistas... O
grito dos vendedores ambulantes, o zunzunzum das rodas de conversa sobre a política e a
expectativa em torno da festa de aniversário da capital... As várias bocas de alto-falantes
utilizadas por casas comerciais para propaganda, além das amplificadoras maiores que
funcionavam como “estações de rádio” improvisadas desde o final da década de 30... Tudo
isso fazia parte da “paisagem sonora”
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da cidade, no nascimento dos anos 50.
Era necessário que tudo parecesse perfeito na festa do centenário, em 1952. Os
bares, cafés, hotéis, pensões e prostíbulos deveriam ter o asseio impecável para receber os
visitantes, alguns deles ilustres figuras do cenário político nacional, intelectuais e artistas
consagrados do rádio nacional que iriam animar as festividades.
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ALTO-FALANTES. O Dia, Teresina, p.1, 25 fev 1951.
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Para se estudar a memória, também é necessário visualizar o espaço onde ela – ou parte dela – foi construída.
Por isso também analisamos um possível cenário do centenário de Teresina. “[...]Não há memória coletiva que
não se desenvolva num quadro espacial. [...] É sobre o espaço, o nosso espaço – aqueles que ocupamos, ao qual
sempre temos acesso, e que em todo o caso, nossa imaginação ou nosso pensamento é a cada momento capaz de
reconstruir – que devemos voltar nossa atenção; é sobre ele que nosso pensamento deve se fixar, para que
reapareça esta ou aquela categoria de lembranças”, Cf. HALBWACHS, 1990, Op. Cit.
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Para Nascimento, “é possível afirmar que existia um processo de modernização em Teresina desde a primeira
década do século XX”. Em seus estudos sobre o período do Estado Novo, concluiu que o incêndio de casas de
palha em Teresina serviram para empurrar a população pobre da capital para a periferia, contribuindo com o
poder público no projeto de “embelezamento urbano”. Ver: NASCIMENTO, Francisco Alcides do. A cidade sob
o fogo: modernização e violência policial em Teresina (1937-1945). Teresina, Fundação Monsenhor Chaves,
2002. Trabalha-se aqui com a hipótese de que o processo de modernização da capital piauiense tenha avançado
com a implantação da primeira estação de rádio, advento de novas tecnologias, com o fortalecimento do
comércio e com o discurso (e efetivação) de mudanças de comportamento da população. Outros autores sugerem
que o processo se consolida com a melhoria de serviços como iluminação pública (com a inauguração da Usina
de Boa Esperança), com programas de integração e desenvolvimento promovidos pelo governo federal, dentre
outros, a partir do final da década de 60, Cf. BRANDÂO, Wilson de Andrade. Formação Social. In:
SANTANA, R. N. Monteiro (org). Piauí: Formação, Desenvolvimento, Perspectivas. Teresina, Halley, 1995.
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BOSI, Ecléa, 1994, p. 445