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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Tânia Soares da Silva
Paula Souza, “arauto da modernidade”. Um estudo
da elite paulista (1843-1917)
Tese apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, como exigência parcial para a
obtenção do título de DOUTORA em
História, sob a orientação da Profa. Dra.
Maria Izilda Santos de Matos.
São Paulo
2009
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BANCA EXAMINADORA
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Para Antonio.
Aos meus pais, Luiz e Odete.
E em memória de José Augusto, meu “papito”.
4
AGRADECIMENTOS
Quero começar a agradecer, antes de tudo, à minha orientadora,
Prof.ª Dr.ª Maria Izilda Santos de Matos, que mais uma vez, pacientemente,
se dispôs a me ajudar a trilhar o árduo caminho de minha formação.
Desfrutar o seu convívio por todos esses anos me deu o privilégio de poder
chamá-la de amiga e contar sempre com sua pronta disposição para
orientar-me, como profissional brilhante que muito admiro. Espero que,
após a superação de mais essa etapa, possamos continuar essa relação.
Ao Professor Alexandre Hecker, pela gentileza em aceitar participar
do exame de qualificação, pelas críticas, sugestões, abrindo o horizonte de
possibilidades dessa pesquisa, ainda que eu não tenha tido o tempo e a
competência para fazê-lo.
À Yvone Dias Avelino, mais que uma professora, pesquisadora e
intelectual, agradeço imensamente por todos os comentários acerca do texto
apresentado por ocasião da qualificação, e também em outras oportunidades
nas quais pude contar com sua colaboração. Suas aulas também foram
essenciais no amadurecimento e encaminhamento deste estudo.
A todos os professores do Departamento de Estudos Pós-Graduados
em História da PUC/SP.
À “minha turma”, Zilmar, Agenor, Josberto, Henri, pelos bons
momentos que pudemos compartilhar. À Angela especialmente, a quem
agradeço a boa vontade em ser minha amiga, ainda que eu não expresse e
não retribua toda a atenção que me dispensa. Sua presença em todo o
processo de estudo e na minha vida fora marcante, em todos os sentidos
possíveis. As palavras de estímulo e confiança, sempre me fazendo ir
adiante, mesmo quando tudo parecia desmoronar, e ainda, como não
bastasse, se dispôs a fazer leituras e outras coisas mais que não cabem
neste espaço.
À CAPES agradeço pela concessão da Bolsa de Estudos, que permitiu
que esse trabalho se concretizasse.
5
A todos os funcionários dos arquivos e bibliotecas em que estive. À
amável Poli, responsável pelo acervo do Instituto de Engenharia, que
demonstrou tanto interesse e disposição para ajudar, tanto na localização
dos documentos como na viabilidade de sua digitalização. E também aos
engenheiros com quem lá pude conversar e ouvir sugestões.
Foram muitos percalços a serem vencidos. A biblioteca Mário de
Andrade, principal arquivo em que pesquisei, estava na iminência de ser
fechado para reforma, cujo prazo previsto de término seria dois anos. Nesse
entremeio, também foi descoberto o roubo de obras, que resultou no
fechamento do setor em que pesquisava. Todas essas dificuldades puderam
ser contornadas com a imensa gentileza das meninas do setor de Obras
Raras, Marilza e Cleide, que me avisavam a tempo dos acontecimentos, para
que pudesse concluir a pesquisa. A elas agradeço a simpatia e gentileza que
amainaram a relação por vezes tensa com o curador responsável pelo setor.
À simpatia e competência com que fui recebida pela Anicleide
Zequini, do Arquivo do Museu Republicano “Convenção de Itu”.
Aos funcionários das Bibliotecas da Escola Politécnica, da FAU,
UNICAMP, PUC/SP, IEB, Faculdade de Direito/USP, IPT, com quem pude
contar na localização de obras.
Na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, tive um excelente
atendimento e incentivo dos funcionários que cuidam do setor,
especialmente Priscila, Carlos e Helga, que criaram condições favoráveis
para que pudesse terminar o trabalho de pesquisa em tempo hábil.
Ao querido amigo Esteban, pela aula de espanhol, permitindo que eu
fizesse parte de seu seleto grupo de 100% de aprovação.
Ao Zé, pela imensa boa vontade em fazer uma leitura minuciosa
acrescida de sugestões, críticas e elogios. Agradeço também à sua família,
Ieda, Gabriel e a Lulu, pelo carinho com que sempre me receberam.
Ao João, amigo novo, mas não menos querido, pela pronta aceitação
em ajudar a solucionar problemas de ordem técnica na construção dos
gráficos e pela imensa paciência.
6
Aos amigos Maria Inês Nocite e Claudinho, pelo convívio,
descontração, divertimento e ainda pelo aprendizado com a experiência de
quem viveu muitas histórias.
Às minhas queridas amigas Lourdes, Eliana, Gislayne, Nilda, que,
cada uma de um jeito, me ajudaram, incentivaram, se interessaram por mim
e pela minha pesquisa. À Nanci um especial agradecimento pelos
empréstimos dos livros, pela chateação em levar e trazer documentos, além
das visitas às vezes inconvenientes à sua casa, mas sempre recebida com
simpatia pelas “meninas” Clarissa e Marina. Jamais esquecerei o que
fizeram por mim.
Aos meus amigos vizinhos, Suzana, Luiz, Renata, Amauri, Paulo e
Vanessa, obrigada pelos momentos divertidos e pelo apoio nos momentos
difíceis.
Ao Mingo, Céia, Vinícius, Cida, Carol, Bira, Dayene, Amanda, Izaíno,
Luíz, Solange, Tamiris, Gabriel, Elza, Paulinho, Gustavo, Marquinhos,
Mariane, Simone, Lázaro, D. Josina e Rodrigo, pelo carinho com que me
receberam e tornaram-me parte da família. Ao Paulo, Ester e Teça, sou
eternamente grata pela incomensurável ajuda, orientando-me, pegando-me
pela mão quando me vi perdida.
À Dra. Ana Cristina Walter e ao Dr. Giordano Estevão, responsáveis
pela minha saúde, meu equilíbrio e força necessários para me tornar uma
pessoa melhor.
À minha mãe, Odete, e ao meu pai, Luís, que muito me ajudam e
participam da minha vida. Aos meus irmãos, Carlinhos, Jaja, Tati e Stela,
fundamentais na minha existência e responsáveis pelos amores da minha
vida, meus sobrinhos, Sofia, Ariane, Ester, Arielle e João Pedro (que acabou
de chegar), que me fazem lembrar muitas vezes, em momentos difíceis, que a
vida “é gostosa, tem a noite tem o dia, a poesia e tem a prosa...”. Ao querido
Allan, somado a todo carinho e amor, um especial agradecimento pela
disponibilidade em viabilizar a digitalização do material.
Ao Tonho, com “todo amor que houver nessa vida”, tenho que
agradecer muito pelas leituras, críticas, sugestões e pela resolução de
problemas de ordem burocrática e também cotidiana. Pela compreensão dos
7
“sonhos com o Paula Souza” e do “amor pela genealogia”, sem contar as
conversas inconvenientes na hora do futebol. Pela companhia nas viagens à
Itu, Campinas, USP, em visitas a bibliotecas, que, apesar de serem
motivadas pela pesquisa e trabalho, para mim não deixaram de ser
prazerosas. Sua companhia e ajuda o fundamentais em todos os aspectos
da minha vida. “dimidium animae mea”.
8
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...
Fernando Pessoa
9
RESUMO
O objetivo deste trabalho é, a partir da trajetória do engenheiro Antonio
Francisco de Paula Souza (1843-1917), questionar as experiências e
estratégias de que as elites brasileiras, em especial a paulista, lançaram mão
para a manutenção de sua influência nos mais diversos setores da vida,
abordando-se suas relações familiares, que resultaram em sua herança
política e nortearam suas ações em diversos campos. O período
compreendido é entre o Segundo Reinado e os primeiros anos dos tempos
republicanos, época agitada por questões como as que envolviam a mão-de-
obra para a lavoura cafeeira, o abolicionismo e os projetos de imigração,
além do questionamento do centralismo monárquico.
Paula Souza teve seu nome inscrito na história de São Paulo por sua
atuação política, mas principalmente pela sua vinculação à fundação da
Escola Politécnica de São Paulo e à defesa do ensino técnico
profissionalizante, que podem ser entendidas como a expressão e a
culminância de um projeto político específico que entendia que o
desenvolvimento do país adviria da industrialização e do domínio da
tecnologia, projeto este conduzido pelo engenheiro, que era
reconhecidamente o intelectual privilegiado para encaminhá-lo.
Segundo Paula Souza, a busca pelo “progresso”, “civilização” e
“modernidade”, as palavras de ordem na época, exigia capacitação dos
indivíduos para o seu exercício, que, segundo a sua ótica, seria obtida por
intermédio da educação profissionalizante, com a divulgação de
conhecimentos “científicos” que seriam “úteis a si” e ao “engrandecimento da
pátria”.
Palavras-chave: história paulista, elite, Paula Souza.
10
ABSTRACT
Starting with the trajectory of the engineer Antonio Francisco de Paula
Souza (1843-1917), the objective of this work is to examine the experiences
and strategies used by the Brazilian elites, especially the Paulista elite, to
maintain their influence in the most diverse sectors of life. It also deals with
their family relations which resulted in their political heritage and guided
their actions in different areas. The period covered is between the Second
Reign and the first years of the Republican era, a time stirred by matters
such as those involving labor for the coffee plantations, abolitionism and the
immigration projects, in addition to the questioning of monarchic centralism.
Paula Souza had his name inscribed in the history of São Paulo for his
political career, but even more so for his connection to the founding of the
Escola Politécnica de São Paulo and the defense of vocational and technical
education. This can be understood as the expression and culmination of a
specific political project which held that the country’s development resulted
from industrialization and control over technology, a project led by the
engineer, who was recognized as being the intellectual best equipped to
direct it.
According to Paula Souza, the search for “progress”, “civilization” and
“modernity”, the buzz words of the time, required enabling individuals to live
these concepts in practice; something that, from his standpoint, would be
achieved by means of vocational education, spreading “scientific” knowledge
that would be “useful to oneself” and to “making the homeland great”.
Keywords: Paulista history, elite, Paula Souza.
11
SUMÁRIO
LISTA DE IMAGENS E GRÁFICOS GENEALÓGICOS................................12
APRESENTAÇÃO.......................................................................................13
CAPÍTULO I - GÊNESE DA ELITE PAULISTA............................................24
1.1 - GENEALOGIA E PODER.............................................................26
1.2 - ORIGENS DA RIQUEZA..............................................................44
1.3 - ORIGENS DO PODER.................................................................61
CAPÍTULO II - TRADIÇÃO E MODERNIDADE...........................................69
2.1 - JOVEM PAULA SOUZA...............................................................70
2.2 - ENGENHARIA: O CAMPO...........................................................78
2.3 - FERROVIAS: ESPECIALIZAÇÃO:.................................................86
2.4 - MUDANÇA DE HABITUS..........................................................103
CAPÍTULO III - “MALES DO PRESENTE E ESPERANÇAS
DO FUTURO”................................................................118
3.1 - RAÍZES POLÍTICAS...................................................................120
3.2 - ESPERANÇA E CIVILIZAÇÃO....................................................134
3.3 - REPÚBLICA FEDERATIVA PARA O BRASIL..............................157
CAPITULO 4 - DESERÇÃO OU RECONVERSÃO......................................171
4.1 - ENFIM, A REPÚBLICA!.............................................................172
4.2 - TECNOLOGIA E IDEOLOGIA....................................................181
4.3 - ENSINO TÉCNICO E SALVAÇÃO DA POBREZA.........................190
4.4 - ATUANDO NA CIDADE.............................................................207
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................220
BIBLIOGRAFIA........................................................................................226
FONTES..................................................................................................254
ANEXOS..................................................................................................279
12
LISTA DE IMAGENS E GRÁFICOS GENEALÓGICOS
IMAGEM 1 - Barão de Piracicaba I..........................................................................27
IMAGEM 2 - Dr. Antonio Francisco de Paula Souza...............................................35
IMAGEM 3 - Família Paula Souza...........................................................................44
IMAGEM 4 - O jovem estudante Paula Souza.........................................................71
IMAGEM 5 - Jovem estudante Paula Souza, ao centro..........................................73
IMAGEM 6 - Fábrica de Diogo Paes de Barros (litografia de Jules Martin)............84
IMAGEM 7 - Rafael Tobias de Barros, Barão de Piracicaba II................................92
IMAGEM 8 - Trilho Decauville................................................................................99
IMAGEM 9 - Portador Decauville..........................................................................100
IMAGEM 10 - Interior da casa de Antonio Paes de Barros.....................................109
IMAGEM 11 - Residência que pertenceu a D. Maria Raphaela, mãe de
AFPS, e, com a morte desta, passou para a filha Maria
Raphaela, casada com o primo Fernando Paes de Barros...............111
IMAGEM 12 - Rua Florêncio de Abreu - em primeiro plano, a residência
em que residiu o engenheiro AFPS; ao fundo, a residência
de Maria Raphaela; à direita, o gradil que circundava a casa
do Barão de Tatuí.............................................................................112
IMAGEM 13 - Francisco de Paula Souza e Mello....................................................125
IMAGEM 14 - Antonio Francisco de Paula Souza, o médico e Conselheiro...........135
IMAGEM 15 - Imigrantes Americanos: Foto da residência da família
Bookwalter........................................................................................153
IMAGEM 16 - Imigrantes Americanos: Foto de pessoas no trole em frente
à casa de Luiz Pyles (1919)..............................................................156
IMAGEM 17 - Engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza...............................158
IMAGEM 18 - Publicação de AFPS, 1869................................................................159
IMAGEM 19 - Publicação de Paula Souza, 1879.....................................................188
IMAGEM 20 - Solar do Marquês de Três Rios, primeira locação da POLI..............203
IMAGEM 21 - Paula Souza em pé, ao lado de Prudente de Moraes
(governo provisório 1889-1890).......................................................211
IMAGEM 22 - Edifício Paula Souza - prédio novo da Escola Politécnica...............216
IMAGEM 23 - Paula Souza, em 1916......................................................................219
GRÁFICO GENEALÓGICO 1 - Núcleo familiar principal...........................................37
GRÁFICO GENEALÓGICO 2 - Núcleo familiar estendido........................................280
13
APRESENTAÇÃO
Antonio Francisco de Paula Souza
viveu para a pátria,
para a família
e para sua Escola Polytechnica.
Os seus actos
o imortalizaram..
1
O objetivo deste estudo é discutir aspectos sobre a elite paulista a
partir de um dos seus expoentes, Antonio Francisco de Paula Souza, no
período de 1843 a 1917. Não se trata de um trabalho biográfico no sentido
restrito do termo, embora também se aborde a trajetória de vida de uma
personalidade que se destacou na história de São Paulo e na instituição do
ensino tecnológico. Em outras palavras, adota-se a trajetória de uma
individualidade como ponto de partida para responder a questões mais
amplas concernentes à compreensão do caráter da elite paulista.
O interesse pelos Paula Souza veio como desdobramento da
Dissertação apresentada, em 2004, ao Programa de Estudos Pós-Graduados
em História da PUC-SP, intitulada “Da Panacéa para Hygéa”:
Representações, diagnósticos e ações sobre a infância, mulheres e famílias
pobres no discurso médico-higienista (São Paulo, 1920-1930), na qual
buscava-se analisar o discurso e as práticas médico-higienistas, destacando-
se a figura do médico Geraldo Horácio de Paula Souza
2
.
Em face da percepção do destaque que o referido médico teve na
constituição da medicina higienista e sua institucionalização com a criação
do Instituto de Higiene de São Paulo (atual Faculdade de Saúde Pública de
São Paulo, USP), produto do convênio do governo paulista com a Fundação
Rockefeller, investigaram-se as razões para essa proeminência, chamando
atenção o seu histórico familiar e suas conexões políticas e sociais,
sinalizando uma longa trajetória de poder que ultrapassou os regimes
políticos brasileiros.
1
Revista Polytechnica. São Paulo, 1918.
2
Geraldo Horácio de Paula Souza (1889-1951) destacou-se na história paulista por sua
atuação na saúde pública em o Paulo, lançando uma série de renovações de inspiração
norte-americana, a “Reforma Paula Souza”.
14
Seguindo esses indícios, foi localizada uma farta documentação no
Arquivo de Obras Raras da Biblioteca Mário de Andrade, composta, em sua
maioria, de manuscritos, sobretudo correspondências com conteúdos os
mais diversos, desde assuntos políticos, da economia do país e mundial, até
questões de foro íntimo, como conselhos do pai aos filhos desobedientes.
A princípio, foi renegada a possibilidade de este trabalho tratar-se de
uma pesquisa biográfica, optando-se unicamente por um viés analítico e,
nesse processo, entendendo-se os Paula Souza como possibilidade para
apreender a trajetória e as questões de um grupo de identidade e de uma
época. Todavia, no percurso de investigação, buscou-se entender o porquê
da rejeição à biografia incorporada por muitos historiadores.
Tomada a biografia como marcada pelo positivismo, pelas
tradições de genealogias do Instituto Histórico e Geográfico e pelo
enaltecimento de personalidades e mitos históricos, o repúdio a esse gênero
de escrita histórica e o questionamento à sua cientificidade são explicados,
por vezes, pela herança do modelo materialista de pensar a História e sua
epistemologia, marcada pelo estruturalismo, que permeou a produção
historiográfica por muito tempo. Bem como pela herança da história da
“longa duração”, dada à análise das conjunturas e estruturas mais
abrangentes do social.
3
O espaço e o interesse que a biografia tomou na atualidade, não
para os que se ocupam da pesquisa em História, mas para um público mais
amplo basta olhar as estantes das livrarias para observar o sucesso
editorial das histórias individuais –, explicam-se pela sua retomada entre os
historiadores interligada à lógica da organização social capitalista liberal,
que, a partir da década de 1980, recuperou o fôlego com as práticas
neoliberais, construindo uma ideologia que atribui ao indivíduo a
responsabilidade de sucesso ou fracasso pessoal. Daí o interesse por
experiências singulares e vidas exemplares. A biografia, supostamente,
“oferece a seus leitores um rumo na estrada de suas próprias vidas”.
4
3
BORGES, Vavy Pacheco. “Grandezas e Misérias da Biografia”. In: PINSKY, Carla
Bassanezi.(Org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2005.
4
BURKE, Peter. “A Invenção da Biografia e o Individualismo Renascentista”. Estudos
Históricos. n
o
19. Rio de Janeiro, 1997.
15
Em sua grande maioria, esses textos o são produções que partem
de estudos de historiadores, mas de jornalistas sem compromisso com o
rigor acadêmico ou com a metodologia científica de trabalho
5
– que permeia e
inquieta o ofício do historiador –, os quais souberam aproveitar o filão que se
abriu no mercado editorial, seduzindo leitores com textos menos densos,
mais fluídos. O resultado disso é uma narrativa mais leve, de fácil leitura e,
por vezes, muito mais próxima da ficção.
A crítica ao gênero biográfico recai justamente na sua fragilidade
quanto ao método no que diz respeito à produção de sentido duma vida,
uma vez que esta não obedece a uma lógica linear. Destarte, perde-se
muitas vezes o parâmetro de que as personalidades não são estáticas:
[...] real é descontínuo, formado de elementos justapostos
sem razão, todos eles únicos e tanto mais difíceis de
serem apreendidos porque surgem de modo
incessantemente imprevisto, fora de propósito, aleatório.
6
A História, por outro lado, nos últimos tempos também se aproximou
da narrativa, utilizando elementos inventivos e ficcionais, porém sem abrir
mão da análise das fontes e da documentação, sempre demarcando
claramente os argumentos construídos em caráter hipotético. Seu campo
não é irrestrito, suas ações são determinadas pelo “real”, ou melhor, pelo
que ficou desse real, não abrindo mão do método e da teoria peculiares aos
trabalhos de História.
7
O que se pode apreender das lições dos experientes historiadores é
que as narrativas de histórias individuais somente têm sentido se inseridas
em questões mais amplas, não sendo consideradas histórias de vidas com
um fim em si mesmas, abordadas, em geral, para satisfazer a curiosidade
daqueles que cultuam personalidades que se destacam no meio social pelos
mais variados motivos. Assim, o biografado deve ser entendido pelo
5
de se considerar que muitos trabalhos biográficos de cunho jornalístico são produto de
sérias pesquisas, cujos resultados são primorosos.
6
ROBBE-GRILLET, A. “Le Mirole qui revient”. Paris: Minuit, 1984. p.208. Apud:
BOURDIEU, Pierre. “A ilusão biográfica”. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO,
Janaína (Orgs.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2000.
7
SCHMIDT, Benito Bisso. “Construindo Biografia... Historiadores e Jornalistas:
Aproximações e afastamentos”. Estudos Históricos. n
o
19. Rio de Janeiro, 1997.
16
historiador como um instrumento para se chegar ao entendimento das
questões históricas, ultrapassando-se os limites do culto às “celebridades” e
da “curiosidade de seres humanos a respeito de outros seres humanos”
8
.
A farta documentação exemplarmente conservada e doada pela
família Paula Souza levou a algumas reflexões, a saber: Existiria uma
intenção de “arquivar a própria vida”? Na conservação de alguns
documentos e supressão de outros, haveria o propósito de se criar uma
autobiografia? Afinal, selecionar a documentação a ser preservada já é um
indício da intenção de construir uma imagem de si, ou seja, já é uma
escolha do que se pretende perpetuar.
Correntemente os pesquisadores de Arquivos Pessoais indagam: Por
que indivíduos cuja posição social (política, econômica, cultural, entre
outras) os inscreveria necessariamente na História entesourariam e
organizariam seu acervo material e pessoal?
9
Poder-se-ia questionar se esse
era o caso dos Paula Souza.
A coleção Paula Souza está subdividida entre a documentação do
Conselheiro e médico Dr. Antonio Francisco de Paula Souza (1819-1866) e a
do seu filho homônimo, o engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza
(1843-1917), compostas por recortes de jornais e revistas, boletins,
documentos pessoais, produção intelectual manuscrita, dados biográficos,
discursos, anotações de viagem e um grande número de correspondências.
10
Pode-se até especular qual a razão da seleção de determinado material, mas
sem perder de vista que nem tudo se consegue conservar ou guardar:
geralmente o que remete a lembranças mais caras preserva-se.
Não se sabe se realmente houve uma seleção para a preservação de
uma memória dos Paula Souza, mas é certo que havia o costume na
família de guardar documentos. Como decorrência, é possível pesquisar três
8
HOBSBAWN, Eric. Tempos Interessantes: Uma vida no século XX. Tradução de S. Duarte.
São Paulo: Companhia das Letras, 2002. Ver também: HOBSBAWN, Eric. “A volta da
narrativa”. In: Sobre História. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p.201-6.
9
A Revista Estudos Históricos, da FGV, tem um número dedicado ao tema dos Arquivos
Pessoais, que contempla essa discussão da “dimensão autobiográfica” dos arquivos
pessoais. Estudos Históricos. Vol. 11. n
o
21. Rio de Janeiro, 1998.
10
Segundo a documentação do Setor de Obras Raras da Biblioteca Mário de Andrade, toda
essa documentação fora doada em dois lotes pela Sra. Evangelina de Paula Souza, esposa
de Geraldo Horácio de Paula Souza, e por sua filha Ada Celina Anhaia Mello.
17
gerações da família o que pode ser interpretado como uma consciência do
papel de seus entes como partícipes de uma história que ainda estava por
ser escrita.
A preservação pessoal e seletiva da memória de um indivíduo ou
grupo por meio de seus arquivos não invalida um estudo crítico sobre eles,
haja vista que cabe ao historiador se posicionar analiticamente e
criticamente ante suas fontes, independentemente da sua procedência. O
que deve prevalecer é a potencialidade delas na reconstituição crítica de uma
época, de um pensamento, entre outros.
Partícipes ativos na vida política de São Paulo, os Paula Souza faziam
parte de uma elite, numa época em que a correspondência tinha um
significado prático, pois era o meio de comunicação mais comum e usual.
Suas cartas assumiram relevo nesta pesquisa, não somente pela quantidade,
mas em especial pela riqueza dos relatos que revelam para a compreensão
da dinâmica social de seu tempo. Elas também apresentam uma rede de
relações que induzem à percepção de sua posição no campo intelectual e
político da época em questão.
Sendo fundamental a análise da formação pessoal para a
compreensão de posicionamentos, idéias e ações, as cartas se apresentam
como fonte em potencial, tendo em vista que elas podem ser registros
significativos sobre a pessoa estudada, sobretudo a correspondência pessoal,
quando num diálogo mais aberto revelam-se idéias, projetos, opiniões,
interesses e sentimentos.
Mediante as incursões no mundo das cartas dos Paula Souza, pôde-
se compreender o risco que corre o pesquisador que manuseia este tipo de
material de tomá-lo imediatamente como verdadeiro, ou seja, de cair no
“feitiço” das narrativas. Isso porque esse tipo de documentação aproxima o
investigador do sujeito histórico investigado, estabelecendo uma espécie de
intimidade que pode confundir e induzir à ilusão da verdade
11
se não
tomadas as devidas precauções.
11
GOMES, Ângela de Castro. “Nas malhas do feitiço: o historiador e os encantos dos
arquivos privados”. Estudos históricos. Vol. 11. n
o
21. Rio de Janeiro, 1998.
18
Por essa razão, para não se cair no canto da sereia”, no estudo
apoiado nesse tipo de fonte há de se atentar para o fato de que
[...] o trabalho de crítica exigido por essa documentação
não é maior ou menor do que o necessário com qualquer
outra, mas precisa levar em conta suas propriedades,
para que o exercício de análise seja efetivamente
produtivo.
12
Com a devida cautela, no presente estudo privilegia-se esse tipo de
arquivo para se apreender um dado pensamento entendido como o que mais
possibilita cumprir o objetivo de entender aspectos da elite paulista que
viveu no período estudado (1843-1917). Concomitantemente, privilegia-se
ainda a interface com outros tipos de fontes, como Revistas Institucionais,
Jornais, Anais da Câmara dos Deputados, enfim, fontes capazes de permitir
a compreensão de uma vida específica como expressão de um grupo que é
produto de uma época. Foi dessa premissa que se partiu para aguçar o olhar
sobre essa documentação, entendendo-se que as fontes devem ser
analisadas em sua auto-significação e em consonância ou interação com os
procedimentos teóricos.
Notabiliza-se que os Paula Souza estão inscritos na história de São
Paulo pela participação ativa na vida política da cidade e do país, mas entre
eles dois nomes mantêm seu lugar de memória encravado na cidade:
Geraldo Horácio de Paula Souza (1889-1951), idealizador do Instituto de
Hygiene de São Paulo, hoje Faculdade de Saúde Pública da Universidade de
São Paulo; e Antônio Francisco de Paula Souza (1843-1917), idealizador do
Instituto Polytechico, hoje Escola Politécnica, também integrada à USP
13
,
12
GOMES, Ângela de Castro. “Escrita de si, escrita da História: a título de prólogo”. In:
GOMES, Ângela de Castro (Org.). Escrita de si, escrita da História. Rio de Janeiro: Ed. FGV,
2004. p.15.
13
A Politécnica foi integrada à USP em 1934, por ocasião de sua criação; antes a Escola
Politécnica funcionava no casarão que pertenceu ao Marquês de Três Rios, Joaquim Egídio
de Souza Aranha (1821-1893), adaptado para abrigar a Escola. Embora tenha abrigado
laboratórios e biblioteca até 1924, o casarão foi demolido por volta de 1930. Nesta época já
havia sido construído novo prédio na mesma região, onde hoje é a praça Fernando Prestes,
na região da Luz. A construção passou por uma série de modificações, mas ainda hoje
existem alguns vestígios de seu passado nas instalações da Faculdade de Tecnologia de São
Paulo e no Departamento de Patrimônio Histórico da cidade de São Paulo (DPH). A partir de
1973 todas as instalações passaram a funcionar no campus da Cidade Universitária.
19
além das Faculdades de Tecnologia (FATEC) e Escolas Estaduais de Ensino
Técnico (ETEC).
14
A análise do sujeito histórico em pauta, Paula Souza, em suas
ligações familiares e seus laços de sociabilidade, apresentou-se como “caso
exemplar” para discutir o comportamento das elites brasileiras,
especificamente uma parte da elite em São Paulo, com sua capacidade de
adequar-se às demandas sociais, fazendo uso de todo um arcabouço teórico
para justificar suas ações, postulando-se “modernos”. No entanto, as
práticas, em todas as instâncias dessa pretensa configuração de grupo,
evidenciam seu caráter de elite tacanha, característica de uma camada
social marcada pela memória de um passado colonial que impossibilitava
qualquer ação independente e nacional em essência, buscando sempre
referências exógenas, numa lógica contraditória para empreender o
desenvolvimento e progresso nacional.
Observa-se que a definição do conceito de elite é problemática e
controversa. O que caracterizaria um grupo ou indivíduo como parte dela ou
não? Qual seria a sua origem? Qual a nomenclatura correta, elite ou elites?
15
Mas, ainda que carregado de imprecisões, o termo “elite” aparece aqui como
válido para designar um determinado grupo social composto por indivíduos
que se sobressaem de algum modo sobre os demais que compõe o todo
social. Grupo este que desfruta privilégios, poderes e influências muitas
vezes inacessíveis ao grande número de indivíduos membros da sociedade.
16
Ainda que se tenha adotado a utilização de tal conceito (entendido
por muitos como contraposto a classes sociais, portanto, destituídos de
contradições e chão material), este foi tomado numa acepção ampla, sem
perder a estreita ligação entre o poder econômico e as outras instâncias de
poder na sociedade.
14
Seu nome foi dado a um Centro Estadual voltado para a educação tecnológica, Centro
Paula Souza”, que administra 157 Escolas Técnicas (ETECs) e 46 Faculdades de Tecnologia
(FATECs). Paula Souza não participou da fundação destas instituições espalhadas pelo
estado de São Paulo, mas elas são vistas como desdobramento de suas iniciativas voltadas
para o ensino técnico.
15
Sobre a discussão a respeito, ver texto introdutório “O historiador e as elites”. In: HEINZ,
Flávio M. (Org.). Por outra história das elites. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2006.
16
SCOTT, John. “Les elites dans la sociologie anglo-saxonne”. Apud: HEINZ, Flávio M. Op.
cit., 2006. p.7.
20
Dessa forma, o que se propõe aqui é a íntima vinculação entre o
poder econômico e outras instâncias de poder institucionalizado ou não na
sociedade brasileira do final do século XIX e princípio do século XX,
momento importante na demarcação dos espaços de atuação deste segmento
social, especificamente em São Paulo, cujo apogeu da cultura cafeeira
permitiu um maior enriquecimento desse grupo e, por conseguinte, a
ampliação de seu grau de influência na condução dos destinos do país.
17
Percebe-se que os grupos que tiveram destaque na vida pública em
São Paulo eram oriundos dos extratos sociais que detinham o poder
econômico, ligados, em sua maioria, a uma sociedade rural tradicional que,
a partir da cultura cafeeira, passou também a desenvolver atividades nas
cidades.
18
Cabe ressaltar que alguns membros da elite mencionada haviam
diversificado sua área de atuação: não eram mais fazendeiros, embora a
elite tradicional derivasse em sua maioria dessa atividade, mas “poderiam
ser, e muitas vezes o eram, simultaneamente, capitalistas, negociantes,
políticos, fazendeiros, intelectuais”.
19
17
Ver: LOVE, Joseph L.; BARICKMAN, Bert J. “Elites regionais”. In: HEINZ, Flávio M.
(Org.). Op. cit., 2006. p.77-97; LOVE, Joseph L. A Locomotiva: São Paulo na federação
brasileira 1889-1937. Tradução de Vera Alice Cardoso da Silva. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1982.
18
Estudos foram realizados no intuito de retratar as elites, sobretudo a elite política, e
encontrar a sua fisionomia, lançando o de informações estatísticas e método
prosopográfico, considerando dados e critérios a partir de origens e relações familiares,
escolaridade, raça, participação política. O método da prosopografia, cunhado originalmente
pelos ingleses “prosopography”, é um gênero de estudo de história que tem por objetivo
estudar questões ligadas à construção de biografias coletivas. Segundo Stone,
“prosopografia é a investigação das características básicas comuns de um grupo de atores
na história por meio do estudo coletivo de suas vidas. O método empregado é o de
estabelecer o universo a ser estudado e formular um conjunto uniforme de questões sobre
nascimento e morte, casamento e família, origens sociais e posição econômica herdade,
lugar de residência, educação, tamanho e origens das fortunas pessoais, ocupação, religião,
experiência profissional, etc. os vários tipos de informação sobre indivíduos de um dado
universo são justapostos e combinados e, em seguida, examinados por meio de variáveis
significativas. Essas são testadas a partir de suas correlações internas e correlacionadas
com outras formas de comportamento e ão.” STONE, Lawrence. “Prosopography”.
Daedalus: Winter, 1971. Apud: DE DECCA, Edgard S. “Apresentação”. In: BURKE, Peter.
Veneza e Amsterdã: Um estudo das elites do século XVIII. São Paulo: Brasiliense, 1991. p.7-
8.
19
FRAGOSO, João; MARTINS, Maria F. “Grandes negociantes e elite política nas ultimas
décadas da escravidão (1850-1880)”. In: FLORENTINO, Manolo; MACHADO, Cacilda (Orgs.).
Ensaios sobre a escravidão. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2003. p. 160.
21
No geral, era uma elite branca, declarando-se seguidora da religião
católica. Eram possuidores de títulos universitários ou incentivavam seus
filhos a tê-los, pois um diploma poderia significar o passaporte para adentrar
no universo da política, ainda que nem todos os políticos tradicionais o
possuíssem.
20
Tomando-o como pré-requisito para a ocupação de altos cargos, o
Conselheiro Dr. Paula Souza (1819-1866), sintonizado com o seu tempo,
escrevia e orientava o filho a se dedicar ao estudo da Engenharia, atividade
profissional prática que estava em ascensão:
Tenho escrito por mais de uma vez acerca do valor dos
estudos, principalmente estudos complementares. [...]
meditais a respeito, aproveita-vos do tempo, que o maior
e mais precioso, que possuímos e cuja separação não se
obtém jamais. Se tiveres sólidos conhecimentos que de
uma forma nos aproveitamos deles; e estes não se
assimilam sem uma individualidade e sem a prática
inteligente, esta adquireis com esforço e relação que
devereis travar de modo a não perder tempo quando
sahirdes da escola para viajar e explorar [...].
21
Em outra carta, também comentava:
[...] continua em vossos estudos com esperança de obter
um diploma da escola onde estais. Bem sei que um
diploma por si não nem tira conhecimentos e
habilitações, vosso avô não o possuía, todavia foi sempre
altamente acatado como autoridade em Direito,
Economia, Política, outros o possuem sem, entretanto
gerassem reputação alguma. Sem dúvida, mas se o
20
O avô do engenheiro Paula Souza, Francisco de Paula Souza e Mello (1791-1852), por
exemplo, teve participação bastante ativa na vida política, no entanto, não possuía diploma
universitário de Coimbra, como era costume, e talvez lamentasse o fato de o tê-lo. A falta
de um documento comprobatório de sua formação, entretanto, não o impediu de exercer o
direito, nem de participar ativamente da política, como também não lhe poupou das
provocações de seus críticos e adversários políticos, que tentavam desqualificar suas
proposições e posicionamentos por o ser diplomado: "Vossa Excelência é formado nas
areias de Itú", dizia-lhe ironicamente Miguel Calmon do Pin e Almeida (1796-1865), o futuro
Marquês de Abrantes, que era formado por Coimbra, como a maioria daqueles que
participavam dos círculos do poder na época. BRASIL. Câmara dos Deputados. Disponível
em: <www2.camara.gov.br/conheça/historia/ presidentes/francisco_melo.html>
. Acesso
em: 20/02/2008.
21
Carta do Conselheiro Paula Souza ao filho. São Paulo, 19/04/1863. Arquivo Paula Souza
- PS.863.04.19, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
22
Diploma que he uma prova prévia e argumento da
habilitação, mas nem sempre garante [...].
22
Por esses dois excertos de correspondências do pai para o filho
percebe-se como o primeiro tentava transmitir seus valores, resultados
também da educação que recebera de seu pai, bem como de seu senso de
oportunismo. Também é possível perceber duas características consideradas
fundamentais para a compreensão do caráter do engenheiro em formação: a
valorização do ensino prático, quando o pai afirmava que o diploma não
necessariamente conferia competência; e outra quando afirmava a
importância, além dos estudos, da prática inteligente e do estabelecimento
de relações, revelando a técnica elitista do clientelismo.
Outra característica que sobressai dessas elites eram os fortes laços
familiares, numa extensa rede de relações, cuja importância merecerá uma
análise mais acurada à frente. Acrescenta-se ainda a essas características de
identificação da elite o predomínio sobre os bens culturais, forjando-os como
parte do capital adquirido, conferindo-lhes direitos de apropriação.
23
A partir
de tais caracteres evidencia-se o pertencimento dos Paula Souza a um grupo
privilegiado da elite paulista, objeto de estudo deste trabalho.
Isto posto, cabe apresentar a estrutura da presente tese, definida com
vistas a contemplar todas as temáticas que emergiram a partir do diálogo
com as fontes.
No primeiro capítulo, intitulado “Gênese da Elite Paulista”, expõe-se o
processo de constituição do capital econômico, social, político e cultural que
originou a elite paulista e a projetou nacionalmente a partir do ápice da
produção agroexportadora.
22
Carta do Conselheiro Paula Souza ao filho. São Paulo, 19/12/1864. Arquivo Paula Souza
- PS. 864.12.19 c/h, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
23
Em Itu, por exemplo, à medida que se conformava a colonização do território, fez-se
questão de se demarcar a distinção entre o poder econômico e o religioso por meio da
construção de igrejas e conventos, expressando a delimitação de posições e lugares que
refletissem a separação cultural: “A religião talvez fosse além da devoção, uma técnica de
poder ou classificação social.” Pertencer a uma ordem ou irmandade era uma forma de
classificar-se na hierarquia social. Como era costume entre os membros da elite, Dona
Gertrudes Celidonêa de Cerqueira, bisavó do engenheiro Paula Souza, por exemplo, assim
como outros membros da família de elite, deixou em inventário, constante no Arquivo do
Museu Republicano, Convenção de Itu, a recomendação para ser sepultada entre os seus
“irmãos” da ordem do Carmo de Itu, irmandade à qual pertencia e fizera questão de deixar
mencionado.
23
No segundo capítulo, “Tradição e Modernidade”, explicita-se a
trajetória do jovem Antonio Francisco de Paula Souza, cuja formação foi
fortemente marcada pela influência paterna. O capítulo trata também da
constituição da Engenharia como um “campo”, no sentido forjado por Pierre
Bourdieu, e seu desdobramento na política de aprimoramento das vias de
comunicação, principalmente das ferrovias, como parte de uma estrutura
para atender às necessidades do desenvolvimento capitalista. Aborda-se
ainda como essa elite lançou mão de estratégias de distinção, marcadas pela
ocupação dos espaços da cidade, na formação de um habitus de classe que
acabou por contribuir para a cristalização da idéia de “progresso”,
“modernidade” e cosmopolitismo entre o povo paulista.
No terceiro capítulo, “Males do presente e esperanças do futuro”,
apresenta-se, por meio de um recorte geracional, como a herança do
engenheiro Paula Souza balizou seu pensamento político interligado às
idéias que circulavam no século XIX, como o positivismo, o cientificismo,
entre outras doutrinas. Destaca-se a participação efetiva de seus familiares
na política imperial e como lidaram com as grandes questões da época, a
exemplo da problemática da mão-de-obra e da imigração. Deslindam-se as
reflexões de cunho político que o levaram a questionar o centralismo
monárquico e a defender o federalismo e a democracia como vias de
progresso e civilização do país.
No quarto capítulo, “Deserção ou Reconversão”, analisa-se a
participação de Paula Souza nas instâncias político-administrativas, sua
atuação na “Convenção de Itu”, no Governo Republicano e a sua relação com
a fundação e direção da Escola Politécnica com vistas à formação de
intelectuais que expressassem os “novos tempos”. Com a Proclamação da
República, adotou os ideais de “democracia” e “cidadania”, admitidos como
possíveis apenas mediante a educação, o ensino prático, técnico e
profissionalizante.
24
CAPÍTULO I -
GÊNESE DA ELITE PAULISTA
25
Analisando-se a documentação desta pesquisa, constituída em
grande parte de correspondências do Conselheiro Antonio Francisco de
Paula Souza e de seu filho, engenheiro, seu homônimo, foi possível notar a
participação política de certos grupos e a proeminência de alguns nomes no
período da Colonização do Brasil, permitindo a reflexão de como alcançaram
o direito de participar dos embates políticos e puderam desfrutar posição de
comando e de destaque social.
Tentar perscrutar e analisar como funcionava a dinâmica dessa elite
que exerceu grande influência na organização da sociedade brasileira,
conhecer seus mecanismos de aquisição e manutenção de poder, seu
comportamento, relacionando-a com o todo social, remeteu à necessidade de
entender como se deu a sua constituição, sua fonte de acumulação de
riqueza, que se estende ao domínio político, pois a análise que se
empreendeu dessas elites reafirma e aponta a freqüente ligação entre o
político, o econômico e também o cultural.
Assim, este capítulo expõe como se deu o processo de constituição do
capital, inclusive o cultural, que deu à elite paulista projeção nacional no
auge da produção agroexportadora do café e que, ao mesmo tempo,
forneceu-lhe mecanismos de ampliação de poder, tomando lugar privilegiado
entre as oligarquias regionais, confirmando sua condição de elite, arrogando
a si o direito de encaminhar os destinos e as questões envolvendo a
coletividade.
Uma discussão em torno da formação social da sociedade paulista
também se fez necessária, afinal, sua organização estruturada na instituição
familiar criou condições para o surgimento e o fortalecimento desse grupo,
que, com sua política interna, criou mecanismos de distinção em todos os
aspectos da vida, de maneira que acabou se legitimando com prerrogativas
que lhe conferiam direitos e meios para participar de diferentes instâncias de
poder.
26
1.1 - GENEALOGIA E PODER
A família burguesa é um
instrumento para a reunião e
preservação do capital.
Friedrich Engels
Para a compreensão da elite e suas ações como grupo social
privilegiado e detentor do poder representado nas mais diversas esferas,
institucionais ou não, tornou-se necessário relacioná-la com “uma série de
ambientes menores”, entre os quais o mais “óbvio” pareceu ser a organização
familiar dos grupos entendidos como “classe superior”.
24
Desse modo,
entende-se que questionando e estudando as ações e os pensamentos de
personalidades como o engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza pode-
se compreender a coerência histórica do comportamento de pelo menos uma
parte dessa elite
25
.
Assim, partindo-se do “óbvio”, acrescido do “vício do historiador” pela
busca das origens, realizou-se uma análise da proveniência de seu grupo
familiar. Os estudos iniciais impuseram um verdadeiro desafio, que um
emaranhado de nomes se apresenta ao se tentar desvendar a origem social
do supracitado engenheiro.
Sua descendência estava entre aqueles cujo tronco familiar deu
origem às famílias mais proeminentes de São Paulo: os Paes de Barros,
Aguiar Barros, Souza Queirós, Souza Barros e outros ramos dos Rezende,
Vergueiro, Costa Aguiar, entre outros. Tais nomes tinham uma ascendência
comum do casamento entre Antonio de Barros Penteado, filho de Fernão
24
MILLS, C. Wright. A elite do poder. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1968. p.25.
25
Alguns membros da família Paula Souza podem causar uma pequena confusão. Os nomes
mais recorrentes ao longo do trabalho são de três gerações: do Conselheiro Francisco de
Paula Souza e Mello (1791-1851); Antonio Francisco de Paula Souza (1819-1866), seu filho,
também foi Conselheiro formado em Medicina; Antonio Francisco de Paula Souza (1843-
1917), homônimo, filho do dico, o engenheiro. No decorrer deste estudo, procura-se
deixar claro quando se trata de um ou de outro. Por vezes, o médico é chamado de Dr. Paula
Souza, o engenheiro de AFPS, ou simplesmente engenheiro Paula Souza, ou Paula Souza,
mais recorrente no último capítulo, quando se falará unicamente dele.
27
Paes de Barros e Angela Ribeiro Leite, e Maria Paula Machado, filha do
capitão-mor Salvador Jorge Velho e Genebra Maria Machado.
IMAGEM 1 - Barão de Piracicaba I.
26
A constatação não surpreende, uma vez que esse imbricado de nomes
da sua linhagem familiar revela uma característica marcante das elites: sua
origem remonta ao período de conquista e colonização do território
brasileiro, cuja direção fora resultado de um longo processo de expansão de
famílias. Destarte, evidencia-se a dimensão que esta organização teve na
empresa colonial, convertida na base da sociedade que se estruturava,
ditando normas de conduta e relações sociais, num processo de socialização
e integração.
27
Esse modo de organização da instituição familiar no Brasil Colonial
tem suas raízes no modelo português, com famílias compostas por pais e
filhos co-residentes, e acompanhadas por uma parentela mais extensa,
constituída por laços de sangue e de afinidade. Tais características
predominavam entre as classes privilegiadas, marcadas por agrupamentos
ainda mais amplos. Cabe notar ainda que em tais classes o casamento era
26
Fonte: RIBEIRO, Jacintho. Chronologia Paulista: Relação histórica dos acontecimentos
mais importantes ocorridos em S.Paulo desde a chegada de Martim Afonso de Souza á S.
Vicente até 1898. Vol. 1, 1899. Cabe esclarecer que as imagens apresentadas ao longo do
trabalho, embora tenham sido fruto de pesquisa e servido de apoio na construção dos
textos, não foram utilizadas num sentido analítico, mas meramente ilustrativo.
27
SAMARA, Eni de Mesquita. Família, Mulheres e Povoamento: São Paulo, Século XVII.
Bauru, SP: EDUSC, 2004. p.15.
28
utilizado como instrumento para a realização de alianças políticas ou mesmo
para se ver aumentado o patrimônio por meio de uniões conjugais.
28
As terras coloniais eram pertencentes à Coroa e deveriam ser
concedidas “a todos os que desejassem nelas se estabelecer, segundo seus
méritos”. No entanto, certos grupos faziam uso de uma política de
aforamento
29
que estabelecia como condição para a obtenção de terras o fato
de o candidato “ter família constituída, [prestar] serviços à sua custa à S.
Majestade” ou ser homem de qualidades, o que resultava na sua
inacessibilidade a um grande número de colonos, convertidos na “ralé
colonial”.
30
Por conseguinte, grande parte das terras se concentrou nas mãos
de um pequeno grupo, que comporia a elite colonial. Tal política acabou por
favorecer a instituição familiar, sendo aperfeiçoada mediante a utilização do
casamento como dispositivo de defesa de interesses.
Neste ponto, considera-se conveniente fazer uma digressão para
tratar da “família brasileira”, vista quase como sinônimo do modelo
patriarcal nordestino.
31
Diversos agrupamentos e configurações familiares
coexistiram num mesmo período. Alguns estudos mais recentes dedicados à
temática têm relativizado a preponderância desse modelo consagrado para
todo o país, apontando a confusão comumente feita entre os conceitos de
“família brasileira”, “família patriarcal” e ainda “família extensa”, conceitos
estes aos quais equivocadamente são atribuídas semelhantes significações.
32
28
CAMPOS, Alzira Lobo de Arruda. Casamento e Família em São Paulo Colonial: caminhos e
descaminhos. São Paulo: Paz e Terra, 2003. p.46-7.
29
Tratava-se da política da Coroa no intuito de organizar e regulamentar a ocupação das
terras conquistadas.
30
VIANNA, Oliveira. VIANNA, Oliveira. Populações Meridionais do Brasil: história,
organização, psicologia. Belo Horizonte: Itatiaia; Niterói: Editora da Universidade Federal
Fluminense, 1987. Vol. 1, pp. 122-3.
31
De modo bastante resumido, o modelo de família patriarcal nordestina apresentaria as
seguintes características: “a proeminência absoluta e incontestada do poder do patriarca
(chefe de importante família) sobre um amplo conjunto de dependentes que englobava desde
a família nuclear (esposa, filhos, genros, noras e netos), passando pela família extensa (uma
série de parentes de variados graus muitas vezes morando junto à família do patriarca), até
uma ampla rede de dependentes, agregados, escravos, entre outros. Ao mesmo tempo esse
patriarca, junto com outros patriarcas semelhantes, reunia em suas mãos o controle da
grande propriedade rural e da vida política local, constituindo-se numa espécie de pequeno
régulo [...]”. PESSOA, Ângelo Emílio da Silva. As Ruínas da Tradição: A Casa da Torre de
Garcia D’Ávila família e propriedade no nordeste colonial. Tese (Doutorado em História
Social), FFLCH, USP, São Paulo, 2003. p.17.
32
A sedimentação dessa percepção de família teria se dado a partir da apropriação dos
estudos de Gilberto Freire e Oliveira Vianna, utilizados como exemplo válido para toda
29
Esses estudos têm chamado atenção para essa confusão, procurando
demonstrar a complexidade da organização social brasileira, em particular
da intricada sociedade paulista, contrapondo-se à fórmula simplista da
família patriarcal, que não era a única forma de organização, mesmo nos
tempos mais remotos da colonização.
33
Neste estudo, o tipo de organização social que se sobressai é aquele
pertencente aos quadros da elite, ou seja, a típica família tradicional
paulista, caracterizada como extensa, cuja tradição e origem tinham como
base a solidariedade entre seus membros.
Num meio geográfico adverso, o isolamento imposto pela Coroa
Portuguesa, as investidas das populações indígenas e a limitada base
demográfica obrigavam, de certa forma, a convivência em grupo e, portanto,
familiar. Assim, pelo menos nos primeiros tempos de colonização, o
casamento ganhou uma importância fundamental e utilitária, pois
representava a possibilidade de constituição de uma família que
proporcionaria uma sobrevivência mais tranqüila às partes envolvidas e lhes
garantiria respeitabilidade em relação aos demais membros da sociedade.
Em tempos de tantas adversidades, o pertencimento a uma rede
familiar significava melhores possibilidades de ocupação das terras, de
sucesso nas investidas pelos sertões e, conseqüentemente, de ascensão
econômica, social e política. Por essas razões, a família alcançou tal
importância no projeto colonizador que para entendê-lo de se
compreender seu significado, suas formas de sociabilidade, suas estratégias
de articulação, aquisição e manutenção de poder.
34
Foi a partir desses primeiros grupos colonizadores, de suas
estratégias de sobrevivência e de suas ambições que se deu a formação dos
sociedade brasileira. SAMARA, Eni de Mesquita. A família brasileira. São Paulo: Brasiliense,
1998. p.12-3.
33
A título de exemplo sobre as diversas configurações familiares, podem ser citados diversos
trabalhos, entre os quais se destacam: SAMARA, Eni de Mesquita. O papel do agregado na
região de I (1780-1830). Dissertação (Mestrado em História Social), FFLCH, USP, São
Paulo, 1975; CORRÊA, Mariza. “Repensando a família patriarcal brasileira”. In: ARANTES,
Antonio Augusto [et. al.]. Colcha de Retalhos: estudos sobre a família no Brasil. Campinas,
SP: Editora da UNICAMP, 1994; LONDOÑO, Fernando Torres. A Outra Família:
Concubinato, Igreja e Escândalo na Colônia. São Paulo: Loyola, 1999.
34
LEVI, Darrell E. A Família Prado. São Paulo: Cultura 70 - Livraria e Editora, 1977.
30
grupos detentores do poder econômico sendo que ser detentor de poder
econômico significava, naquela época, ser senhor de terras e escravos.
As organizações familiares extensas não foram exclusividade paulista,
mas não se pode desprezar que nessa região ganharam maior notoriedade.
Isto porque São Paulo, no período colonial, não despertava interesse da
administração colonial, cuja atenção estava voltada, inicialmente, para a
cultura açucareira nordestina e, mais tarde, para o ouro das Minas Gerais.
Assim, distante da capital da Colônia e mais ainda da Metrópole, São
Paulo pôde desenvolver certa autonomia, pois seus habitantes, ao contrário
daqueles que viviam no restante da Colônia, pouco fizeram para limitar o
poder desses grupos familiares. Isso lhe proporcionou a possibilidade de
desfrutar alguma independência, que contribuiu para a constituição e o
fortalecimento de um poder local estruturado na associação familiar.
35
Marcadamente corporativista, a família paulista acabou por se
constituir na estrutura do governo. Arranjos de alianças familiares eram
freqüentes.
36
O estreitamento e a ampliação de laços de parentesco se davam
por meio de casamentos arranjados, endogâmicos e, mesmo,
consangüíneos.
37
Somado à posse de grandes extensões de terra, o casamento
apresentava-se como estratégia e mecanismo de acumulação de poder, a
princípio local, e nos anos subseqüentes, acompanhando o crescimento
econômico, que conheceu seu apogeu na cultura cafeeira, essa prática
procurou extrapolar o âmbito do regional, ambicionando também as
instâncias de poder nacional.
A constituição dessa “nobreza da terra”
38
senhores de engenho (no
caso nordestino) e proprietários de terras e escravos (no caso paulista, o
35
NAZZARI, Muriel. O desaparecimento do dote: mulheres, famílias e mudança social em
São Paulo, 1600-1900. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. p.27.
36
Essa prática de casamentos não era comum somente entre os paulistas; podia-se verificá-
la também nas famílias extensas tradicionais da elite nordestina, nas quais tios e sobrinhas,
primos e primas casavam-se como estratégia para evitar a dispersão de bens e estreitar
laços de solidariedade de família e afiliações políticas. FREYRE, Gilberto. Casa-Grande e
Senzala. 39
a
ed. Rio de Janeiro: Record, 2000. p.395-7.
37
NAZZARI, Muriel. Op. cit., 2001. p.30.
38
Uma discussão em torno do termo “nobreza da terra” afirma que o termo cabe ao
referir-se à lógica social da cultura pernambucana, pois somente os documentos relativos a
Pernambuco apresentam essa designação. Neste estudo partilha-se da opinião de que, em
31
apresamento do índio) representava, de algum modo, a influência e
adequação da cultura do Antigo Regime português na organização da
sociedade colonial no Brasil.
39
Favores, atos de dar, receber e retribuir
baseados em critérios de amizade, parentesco, fidelidade, honra e serviço
eram valores e práticas estruturantes dessa sociedade do Antigo Regime,
marcada pela relação rei/vassalo, na qual o rei podia conceder aos seus
súditos não apenas benefícios materiais, mas principalmente as tão
cobiçadas honras e distinções, como a outorga de senhorios, de hábitos de
comendas militares, de postos e ofícios da administração central e na
própria casa real, em troca de serviços prestados e de vassalagem.
40
Essa relação entre o rei e seus súditos alcançou dimensão tal que a
própria coesão e existência do Império Colonial Português dependiam desse
vínculo, materializado por intermédio da política de mercês, que incentivava
a ocupação, defesa e conquista das terras e ainda incursões pelos sertões em
busca de riquezas minerais:
Aquele que reduzisse a cultura a uma certa extensão de
terreno e à sua custa o fizesse povoar por um
determinado número de fogos; o outro que introduzisse e
promovesse no Brasil, ou nas Colônias de África, os
gêneros de primeira necessidade, como trigo e linho
exceção do Rio Grande) ali se não cultivam. Estes digo
eu, e outros muitos que por meio dos seus
descobrimentos e aplicação poupassem ao Estado a
extração de imensas somas que cada dia o empobrecem,
detrimento da discussão da legitimidade do conceito na documentação, torna-se mais
profícuo analisar sua construção e utilização a partir de certos atributos das elites coloniais.
BICALHO, Maria Fernanda Baptista. “Conquista, Mercês e Poder Local: ‘a nobreza da terra’
na América portuguesa e a cultura política do Antigo Regime”. Almanack Brasiliense.
Revista de História. n
o
2. São Paulo: USP, novembro de 2005. p.24.
39
Essa relação entre rei e vassalos mediada por um sistema de “mercês” era uma velha
prática portuguesa, que teve suas origens nas guerras de Reconquista da Península Ibérica
contra os mouros. O rei dava recompensas, privilégios aos que tivessem prestado serviços à
Coroa, e a conseqüência seria o surgimento de uma nobreza constituída por esses benefícios
dados pelo rei, “ou melhor, por aqueles cujas rendas eram dadas pela coroa”. Ver:
FRAGOSO, João. “A formação da economia colonial no Rio de Janeiro e de sua primeira elite
senhorial (séculos XVI e XVIII)”. In: FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda Baptista;
GOUVÊA, Maria de Fátima Silva (Orgs.). O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial
portuguesa (séculos XVI e XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p.43-50.
40
MONTEIRO, Nuno Gonçalo. “O ‘Ethos’ Nobiliárquico no final do Antigo Regime: poder
simbólico, império e imaginário social”. Almanack Brasiliense. Revista de História. n
o
2. São
Paulo: USP, novembro de 2005. p. 6.
32
deveriam ser beneficiados com um grau de nobreza
pessoal.
41
No Ultramar, os súditos tentavam amoldar-se à cultura do Antigo
Regime, disputando sua inclusão nos cargos e funções da governança local,
ou ainda ofícios periféricos da Monarquia, como a Provedoria da Fazenda
Real, a administração religiosa conezia vacante ou a capitania de uma
fortaleza. A ânsia por ocupar esses cargos justificava-se por apresentar-se
como meio que tinha como pré-requisitos, além de posição econômica com
a posse de terras e escravos, a posição ocupada na conquista e defesa do
território colonial e a ascendência familiar (ser descendente dos primeiros
colonizadores) para alcançar prestígio e status, e também por representar
um canal de ligação e negociação com o governo metropolitano
42
, o que
facilitaria a consolidação, reafirmação e reconhecimento como “principal” ou
“nobre da terra” e todas as prerrogativas reais ou simbólicas intrínsecas a tal
distinção.
“Quem quisesse desfrutar do nome e dos privilégios de nobre devia
fazer certa a sua qualidade e viver conforme a mesma.”
43
Numa sociedade
ainda marcada pela rusticidade, a elite em formação procurava marcas de
distinção que suscitassem inveja e representassem autoridade e respeito.
44
Dessa forma, seguia um código de honra herdado dos costumes portugueses
e que consistia, por exemplo, na forma de tratamento diferenciada, como o
uso do “Dom” antes do nome, no uso de vestimentas com tecidos caros, na
posse de objetos inacessíveis à maioria a bengala de Henrique da Cunha,
os chapéus de Francisco de Proença, as luvas enfeitadas de Antonio Leite, o
óculo-de-alcance de Cornélio de Arzão, o lampião de Jerônimo Bueno, jóias
41
Dom Rodrigo de Sousa Coutinho. Apud: SILVA, Maria Beatriz Nizza. Ser Nobre na Colônia.
São Paulo: Editora da UNESP, 2005. p.24.
42
BICALHO, Maria Fernanda Baptista. Op. cit., 2005. p.29.
43
SILVA, Maria Beatriz Nizza. Op. cit., 2005. p.21.
44
A inspiração para a afirmação acerca do que significava ser nobre na Colônia veio da
afirmação de Antonil: “O SER SENHOR DE ENGENHO é titulo a que muitos aspiram,
porque traz consigo o ser servido, obedecido e respeitado por muitos. E se for, qual deve ser,
homem de cabedal e governo, bem se pode estimar no Brasil o ser senhor de engenho,
quanto proporcionadamente se estimam os títulos entre os fidalgos do Reino.” (destaque do
autor) ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. 3
a
ed. Belo Horizonte: Itatiaia;
São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1982. p.75.
33
como o colar de ouro e pérolas de Maria de Araújo, entre outras raridades
45
e na ocupação de lugares especiais nas procissões e cerimônias religiosas,
maneiras de deixar claramente visível sua condição.
Fazia parte do imaginário criado a respeito do caráter do paulista o
seu desinteresse em relação às políticas de compensação da Coroa. Em
estudos acerca dos pedidos de mercês remetidos à Colônia, os paulistas
aparecem como os que menos solicitavam honras e distinções, ainda que
tivessem uma grande lista de serviços prestados à Coroa.
46
Mas, ainda
assim, a vaidade dos paulistas era estimulada, no intuito de incentivá-los à
conquista dos sertões e do ouro:
Foram-lhes prometidas mercês várias e, uma vez
descobertas as minas, não na região das Gerais como
em Cuiabá, o governador de São Paulo, Rodrigo César de
Meneses, aconselhou em 1721 o rei: lhes deve conceder
algumas mercês, principalmente do bito de Cristo, que
esta gente é tão vaidosa que se lembra de honra e
despreza toda a conveniência”.
47
Aqueles que recebiam mercês faziam questão de ostentá-las, como a
família de Antonio Francisco de Aguiar
48
, administrador do Registro de
Sorocaba, Cavaleiro da Ordem de Cristo e Coronel das ordenanças, “de
grande zelo no serviço real e na Lei da Nobreza, podendo ter cavalos de
estrebaria e pajem para acompanhá-lo”. Por seu turno, a Fernão Dias Pais
teria sido ofertado o título de Marquês das Minas e outras regalias caso
empreendesse buscas por ouro “às suas custas”
49
.
Com raízes ainda no período colonial, a família Paula Souza esteve
entre as que deram origem à elite paulista. Seu nome consta entre aqueles
45
BELMONTE. No tempo dos bandeirantes. São Paulo: Melhoramentos, s/d. p.121-2.
46
SILVA, Maria Beatriz Nizza. Op. cit., 2005. p.94.
47
Ibidem. p.111.
48
Antonio Francisco de Aguiar e sua esposa, Gertrudes Eufrosina Ayres, eram os pais de D.
Gertrudes Eufrosina de Aguiar, que, casando-se com Antonio Paes de Barros, marcou a
união de interesses entre as duas famílias. D. Gertrudes Aguiar era a mãe de D. Maria
Raphaela, mãe do engenheiro AFPS. Ver gráfico genealógico nos anexos.
49
MESGRAVIS, Laima. “De bandeirante a fazendeiro: aspectos da vida social e econômica
em São Paulo colonial”. In: PORTA, Paula. História da Cidade de São Paulo: A cidade
colonial. São Paulo: Paz e Terra, 2004. p.122.
34
que detiveram poder econômico e participaram ativamente da vida política
por várias gerações.
Antonio Francisco de Paula Souza
50
, engenheiro citado
anteriormente, filho de D. Maria Raphaela de Aguiar Barros, nasceu em Itu,
no ano de 1843, na chácara de seus avós maternos, Antonio Paes de Barros
(1791-1876), o primeiro Barão de Piracicaba, e Gertrudes Eufrosina de
Aguiar, filha do Coronel Francisco de Aguiar e de Gertrudes Eufrosina Ayres,
irmã do Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar (1794-1857)
51
.
Do lado paterno, Paula Souza descendeu do Senador Francisco de
Paula Souza e Mello (1791-1851), seu avô, que teria originado o sobrenome
“Paula Souza”. Recebeu o nome “Francisco de Paula” em razão de uma
promessa que seus pais fizeram ao Santo homônimo, episódio assim
relatado em uma biografia do senador:
No fim do século passado vivia na Villa de Itu uma
respeitável família que na prática de severas virtudes
fazia consistir a sua felicidade.
Eram o bacharel em cânones Antonio José de Souza,
natural do Porto, e sua mulher D. Gertrudes Solidonea de
Serqueira. Mas essa união roborada por laços tão
sagrados, rodeiada de tantos encantos, o céu não a
queria abençoar com o nascimento de um filho, que fosse
no futuro o legatário de suas tradições. No seio da paz
doméstica os dous virtuosos esposos viam sua felicidade
incompleta...
N’esse anciar de um dezejo casto, volveram seus olhos á
Deos, e dirigiram uma supplica fervorosa á S. Francisco
de Paula, para que o nascimento de um ente caro a seus
corações viesse enlaçar sua existência.
50
Fez-se um levantamento do histórico familiar de Paula Souza, a fim de se comprovar a
hipótese de sua origem entre a elite paulista. Muitos nomes mais emergiram desse
levantamento. Para se ter uma idéia mais profunda da configuração familiar dos Souza e
suas ramificações, vale consultar: SILVA LEME, Luiz Gonzaga da Silva. Genealogia
paulistana. São Paulo: Duprat, 1903. E também: PAES LEME, Pedro Taques de Almeida.
Nobiliarquia paulistana, histórica e genealógica. São Paulo: Martins, 1953.
51
O brigadeiro Tobias, casado com D. Domitila de Castro, a marquesa de Santos, foi der
da Revolta Liberal de 1842 em Sorocaba, movimento que contou com a adesão do Padre
Diogo Antônio Feijó e também dos Vergueiro, dos Andradas, de Antonio Francisco de Paula
Souza e Mello, entre outros das cidades e vilas circunvizinhas, Itu, Campinas, Capivari,
Porto Feliz, Pirapora, Itapetininga, chegando até Curitiba e Minas Gerais na figura de Teófilo
Otoni.
35
A benção celeste desceo nas azas da oração, e, no dia 5
de junho de 1791, d’esse hymineo ungido pela religião do
cruxificado nasceu um menino que, em honra do Sancto
invocado em suas preces, ficou-se chamando Francisco
de Paula.
É o conselheiro Francisco de Paula Souza e Mello.
52
O Senador Imperial da Província Francisco de Paula Souza e Mello
era casado com Maria de Barros Leite, sua prima, última dos nove filhos do
casamento de Antonio de Barros Penteado e Maria Paula Machado. O pai do
engenheiro, seu homônimo, era o primogênito do referido casal Francisco
de Paula Souza e Mello e Maria de Barros Leite
53
.
IMAGEM 2 - Dr. Antonio Francisco de Paula Souza.
54
O Dr. Antonio Francisco de Paula Souza (1819-1866) estudou
Medicina na Bélgica e destacou-se também, talvez principalmente, como
político. Foi deputado provincial, deputado geral e ministro da Agricultura
no ministério Olinda, de 1864 a 1866. Casado com Dona Maria Raphaela
52
HOMEM DE MELLO, Francisco Ignacio Marcondes, Barão Homem de Mello. Esboços
biographicos por Homem de Mello. Rio de Janeiro: Typ. do Diário do Rio de Janeiro, 1862.
53
Tiveram também outros filhos que se destacaram. Os filhos homens eram todos formados,
em Medicina ou Direito, e também seguiram carreira política, merecendo destaque João
Francisco, que foi Senador, e Bento Francisco, como deputado e ministro da marinha. Entre
as filhas merece destaque Francisca de Paula Souza, que, casando-se com Vicente de Souza
Queirós, tornou-se a Baronesa de Limeira, mãe de Luiz Vicente de Souza Queirós,
reconhecido como idealizador da “Escola Superior Agrícola Prática de Piracicaba”, fundada
em 1901, atualmente denominada “Escola Superior de Agricultura Luiz de Queirós”, a
ESALQ, também parte do complexo da USP. Biografia Manuscrita do Engenheiro Antonio
Francisco de Paula Souza. Arquivo Paula Souza - PS. Ca.18/1, Biblioteca Mário de Andrade,
São Paulo.
54
Fonte: RIBEIRO, Jacintho. Op. cit., 1899.
36
Paes de Barros, tiveram, além do engenheiro Antonio Francisco de Paula
Souza, mais nove filhos
55
.
Também numerosa foi a família formada por seu filho mais velho, o
engenheiro Paula Souza, que se casou, na Europa, com Ada Herweg, com
quem teve sete filhos: Maria Raphaela, Virgínia de Paula Souza, Ada de
Paula Souza, Antonio de Paula Souza, Elza de Paula Souza, Gertrudes de
Paula Souza e Geraldo Horácio de Paula Souza (1889-1951) este último
casou-se com Evangelina Fonseca Rodrigues
56
, pais de Ada Celina
57
.
O gráfico exibido a seguir apresenta de maneira mais didática os
principais nomes da ascendência do engenheiro Paula Souza.
58
55
Eram também filhos do casal: Francisco de Barros Paula Souza, José Bento de Paula
Souza, Cesina de Paula Souza, Francisca de Paula Souza, Geraldo de Paula Souza,
Gertrudes de Paula Souza, Maria Raphaela de Paula Souza, Calixto de Paula Souza e
Raphael de Paula Souza. Notas de Genealogia. Arquivo Paula Souza - PS. Ca.18/1,BMA.
56
O filho caçula do casal, Geraldo Horácio de Paula Souza, pode-se dizer, foi legítimo
herdeiro das idéias de seu pai. Sua biografia demonstra tal coerência: formou-se em
Farmácia (1908) e Medicina (1913); e, em 1918, partiu para Baltimore, nos Estados Unidos,
para doutorar-se em Higiene e Saúde Pública na John Hopkins University, acompanhado
pelo amigo Francisco Borges Vieira. A ida de ambos a Baltimore era parte do acordo firmado
entre o governo paulista e a Fundação Rockefeller. De volta ao Brasil, assumiu a Cadeira de
Higiene na Faculdade de Medicina, foi Diretor do Serviço Sanitário de São Paulo, quando
empreendeu, em 1925, a “Reforma Paula Souza”, na qual constavam suas principais
idealizações marcadas pela influência norte-americana: os Centros de Saúde e o Curso de
Educadoras e Visitadoras Sanitárias. Foi Diretor do Instituto de Higiene desde a sua
fundação, também parte do acordo do governo com a Fundação Rockefeller. Participou da
Fundação da Organização Mundial de Saúde, do SESI, foi sócio-fundador em 1931 do
IDORT (Organização Racional do Trabalho) juntamente com Armando Salles Oliveira,
Gaspar Ricardo Jr., Aldo Mario de Azevedo, Lourenço Filho, Roberto Mange, entre outros.
De 1940 a 1942, em colaboração com industriais paulistas, dedicou-se à criação de um
serviço capaz de proporcionar a preparação de operários qualificados para a indústria,
dando origem ao SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial.
57
Evangelina Fonseca Rodrigues e Ada Celina foram as responsáveis pela doação do acervo
que compõe o Arquivo Paula Souza, na Biblioteca Mário de Andrade.
58
O gráfico foi construído de maneira simples, sem grandes preocupações com normas
genealógicas. Para sua leitura basta observar as ligações com um traço, indicando a
descendência e ascendência, e quando tratar-se de união de casamento encontra-se um
traço duplo. A cor tem um significado meramente ilustrativo para indicar o sexo. Um gráfico
com um maior grau de elaboração, com informações mais completas, encontra-se nos
anexos.
37
38
Os nomes representantes das últimas gerações da família parecem
ser indicativos da preservação dos valores e relações familiares. Ada Celina
casou-se com José Luiz Anhaia Mello, descendente do Coronel Luiz Antonio
Anhaia, que, juntamente com Antonio Paes de Barros (Barão de Piracicaba,
pai de sua tataravó, Maria de Barros Leite), Ângelo Custódio de Moraes, José
Manuel de Mesquita e Antonio Carlos de Camargo Teixeira, fundou a
primeira fábrica de tecidos de São Paulo, em 1869, a Fábrica São Luiz, em
Itu.
59
Ada Celina e José Luiz Anhaia Mello tiveram quatro filhos, sendo a
mais velha, Maria Celina Paula Souza Anhaia Mello , casada com Antonio de
Arruda Botelho, descendente do Conde do Pinhal, Antonio Carlos de Arruda
Botelho (1827-1901), proprietário da Fazenda do Pinhal, donde se originou a
cidade de São Carlos, cuja estrada de ferro principal foi projeto do
engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza.
Essa última geração representa simbolicamente o resultado da
confluência das “grandes famílias paulistas”, carregando consigo os nomes
Paes de Barros, Paula Souza, Anhaia Mello, Arruda Botelho, Velho, Penteado
e suas transmutações.
Desviando o foco da análise do núcleo Paula Souza para a formação e
o perfil da família da elite paulista, utilizando ainda como exemplo as
ligações familiares que partiram do casal Antonio de Barros Penteado,
descendente de Fernão Paes de Barros sertanista, filho de Luzia Leme e do
Capitão-mor Pedro Vaz de Barros –, e Maria Paula Machado – filha de
Genebra Maria Machado e Salvador Jorge Velho –, se pode observar a
importância do fortalecimento familiar como estratégia para a ampliação de
seu poder econômico e, por conseguinte, político. Tal fortalecimento se dava
59
A cultura do algodão em Itu e Sorocaba, a partir de 1860, teria oferecido a matéria-prima
necessária para a fabricação de panos, o que possibilitou o pioneirismo ituano com a
criação da Fábrica de tecidos o Luiz. “Esta fábrica produzia ‘algodão grosso da terra’
destinado principalmente às roupas de escravos, trabalhadores na agricultura e para o
ensacamento do sal, em Santos. Projetada também para que futuramente fossem
produzidos tecidos finos, a fábrica empregava inicialmente mulheres e crianças para
trabalharem nos 24 teares que possuía [...].” ZEQUINI, Anicleide. O Quintal da Fábrica.
Dissertação (Mestrado em História), IFCH, UNICAMP, 1992.
Sobre a fábrica o Luiz, ver também: NARDY FILHO, Francisco. A fábrica de tecidos São
Luiz de Itu: primeira fábrica de tecidos a vapor fundada em São Paulo. São Paulo, 1949.
p.32-7; DEAN, Warren. “A fábrica São Luiz de Itu: um estudo de arqueologia industrial”. In:
USP. Anais de História. Ano VIII. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Assis, 1976. p.15.
39
mediante as próprias famílias da elite, ao consorciarem-se por meio do
casamento de seus filhos, dos quais originaram-se outros núcleos, que
também deram continuidade à mesma política de casamentos, talvez não
mais por questões diretas de poder, mas por laços de sociabilidade e força do
habitus.
60
A união entre as famílias era extremamente vantajosa para as partes
envolvidas, pois significava fortalecer o domínio sobre a propriedade da terra
e trazia a possibilidade de diversificação econômica. Ademais, criava e
reforçava um vínculo de solidariedade e lealdade interna que lhes daria
sustentação política nos embates contra seus adversários nos negócios
envolvendo o governo.
61
Nesse sentido, torna-se exemplar o caso do consórcio entre os Aguiar
e os Paes de Barros.
62
Os primeiros tinham negócios no comércio de animais
e serviços de tropas, enquanto os Paes de Barros vinculavam-se à
propriedade da terra e à produção do açúcar. Numa época em que os
transportes e as vias de comunicação eram problemáticos, a união das
famílias faria com que o açúcar produzido pelos Paes de Barros tivesse a
garantia do transporte seguro até o seu destino.
Os Aguiar enfrentavam problemas com os Prado, também da região
de Sorocaba, na época em que Antonio da Silva Prado, futuro Barão de
Iguape, administrava o Registro de Animais, alvo de disputa pelo seu
controle, gerando freqüentes atritos entre as duas famílias, levados ao
extremo no campo político-partidário. Assim, ligados por relações de
parentesco, os Aguiar e os Paes de Barros, unidos, formavam “um poderoso
sistema no tocante à dominação econômica e política”
63
.
60
No próximo capítulo trabalhar-se-á mais detidamente o habitus desse grupo social e seu
capital cultural.
61
CAMPOS, Eudes. “Os Pais de Barros e a Imperial Cidade de São Paulo”. Informativo
Arquivo Histórico Municipal. Ano 3. n
o
16. São Paulo, janeiro/fevereiro de 2008. Disponível
em: <http://www.fotoplus.com/dph/info16/i-estudos.htm>. Acessado em: 12/01/2008.
62
Bento Paes de Barros casou-se com Leonarda de Aguiar, Antonio Paes de Barros com
Gertrudes Eufrosina de Aguiar, Francisco Xavier de Barros com Rosa Cândida de Aguiar e,
depois da viuvez, com a cunhada Anna de Aguiar, e Anna Joaquina de Barros casou-se com
João da Costa Aguiar.
63
CANDIDO, Antonio. “The Brazilian Family”. In: SMITH, T. Lynn. Brazil, portrait of half a
continent. New York: The Dryden Press, 1951. p.297-8.
40
Além do consórcio com os Aguiar, Antônio de Barros Penteado,
tirando vantagens do sentido utilitário do casamento, viu sua riqueza
aumentar ainda mais com a união entre sua filha Genebra de Barros Leite e
o futuro Brigadeiro Luiz Antônio de Souza
64
, cuja riqueza teria sido originada
nos tempos da mineração, por meio do comércio com a região do Mato
Grosso, investindo posteriormente também nos engenhos de açúcar em São
Paulo. Desse casamento originou-se o núcleo dos Souza Barros e ainda dos
Souza Queirós.
A concentração de propriedade e riqueza se estendeu, a partir do
casamento entre os Souza Queirós e a filha de Nicolau Pereira de Campos
Vergueiro (1778-1859), ganhando reforço nas gerações seguintes, que
também se casaram entre si, além de outras ligações externas, como com os
Gavião Peixoto, Mesquita, Whitaker e Gordo, por exemplo.
Entre os Paula Souza, do lado paterno, a ascendência mais antiga no
Brasil vem de Antônio José de Souza, português natural do Porto, Doutor em
cânones, que se casou, no Brasil, com Gertrudes Celidônia de Cerqueira
Leite, com quem teve um único filho, Francisco de Paula Souza e Mello.
65
Antonio José de Souza era filho de um comerciante português, João de
Souza Rodrigues, que viera para o Brasil tentar ampliar seus negócios.
As anotações encontradas na documentação a respeito desse
comerciante português
66
induzem a pensar que se tratava de um rico e
próspero comerciante. No entanto, estudos apontam que comerciantes ricos
não tinham interesse em sair de Portugal, que por mesmo existiam
64
Em segunda núpcias, Genebra de Barros Leite casou-se com José da Costa Carvalho, o
Marquês de Monte Alegre, que teve destaque por ocasião de Revolução de 1842, liderada
pelos liberais, em que esteve à frente entre outros Rafael Tobias de Aguiar e o padre Diogo
Feijó. A Revolução contou ainda com a participação de Francisco de Paula Souza e Mello. O
Marquês de Monte Alegre, que na época governava a província de São Paulo, tomou parte na
repressão ao movimento.
65
SISSON, S. A. Galeria dos brasileiros ilustres. Vol.2. Brasília: Senado Federal, 1999.
p.367-76.
66
Tais referências acerca do comerciante português fazem parte de uma série de
manuscritos, anotações, esboços de notas de genealogia, o que faz pensar no interesse em
tentar reconstituir suas origens. O mais provável é que estivessem tentando, assim como o
fez grande número de famílias da elite, buscar um passado heróico, procurando uma
ascendência ilustre, inclusive entre importantes caciques indígenas e bandeirantes,
reivindicando a legitimação de sua parte mais idealizada do que real entre os mais
“nobres” paulistas de “400 anos”. CAMPOS, Alzira Lobo de Arruda. “População e sociedade
em São Paulo no século XIX”. In: PORTA, Paula (Org.). História da cidade de São Paulo: a
cidade no Império. Vol.2. São Paulo: Paz e Terra, 2004. p.18.
41
oportunidades de negócios, tornando desnecessário os riscos assumirem
empreendimentos no ultramar.
67
Segundo os valores da Metrópole transplantados para o além-mar,
não eram vistos com bons olhos aqueles que se dedicavam à prática
comercial. Era-lhes restrita a possibilidade de ascensão social e participação
política, assim como aos negros e mulatos, judeus e cristãos-novos, ainda
que se soubesse a importância de tal atividade para a economia colonial.
68
Mas, numa sociedade que se organizava nos moldes capitalistas, a
aquisição de fortuna figurava um caminho de aceitação da classe dos
“principais da terra”. Assim, aos poucos, a riqueza se tornou mais um
critério para alcançar a nobreza e respeitabilidade social, revelando a
conveniente flexibilidade do rigoroso código de princípios ante os interesses
econômicos, políticos e sociais.
Se a medida do prestígio social era a aquisição de propriedades, o
casamento de um forasteiro com alguma filha de proprietário, desde que o
primeiro tivesse algum título, fosse ele formado em leis ou funcionário
graduado, também poderia resolver a questão.
69
Assim, pode-se analisar o
caso de D. Antonio José de Souza.
Formado em Coimbra, Antonio José de Souza veio para o Brasil na
condição de ouvidor e casou-se com Gertrudes Celidonia de Cerqueira Leite,
filha de Calixto de Melo e Maria de Cerqueira Paes de Barros, proprietários
de terras já estabelecidos e considerados de “linhagem”, cuja riqueza e
prestígio teriam advindo dos negócios da mineração. Conscientes do status e
do poder que a propriedade da terra conferia, passaram a investir seu capital
também na aquisição de propriedades e na instalação de engenhos de
açúcar.
70
67
MESGRAVIS, Laima. “Os Aspectos Estamentais da Estrutura Social do Brasil Colônia”.
Estudos Econômicos. Vol.13. N
o
Especial. São Paulo: Instituto de Pesquisas Econômicas,
1983. p.803.
68
Os comerciantes eram sempre relegados, devido ao seu passado étnico incerto e pela
possibilidade de desenvolverem algum tipo de atividade manual, totalmente repudiada entre
os que possuíam nobreza. KUZNESOF, Elisabeth Anne. “A Família na Sociedade Brasileira:
Parentesco, Clientelismo e Estrutura Social (São Paulo, 1700-1980)”. Revista Brasileira de
História. Vol. 9. n
o
17. São Paulo: ANPUH/Marco Zero, set.-88/fev.-89. p.37-63.
69
MESGRAVIS, Laima. Op. cit., 1983. p.811.
70
O casamento entre comerciantes e membros da elite agrária funcionava como mecanismo
de ascensão social e meio de viabilizar o acesso a postos políticos e militares para os
42
Para a família da noiva, neste caso específico, o casamento também
se fazia conveniente, pois, se alguma dúvida pairasse sobre sua condição de
“nobreza da terra”, o seu consórcio com algum “fidalgo português” a
eliminaria por completo, e ainda estreitaria o seu vínculo com a “nobreza
real”, trazendo-lhe mais prestígio e distinção. Em outros casos, associar-se
com comerciantes, absorvê-los no meio da família, ainda que desprovidos de
ilustre cepa, ou de diplomas capazes de lhes conferir alguma ilustração,
nobreza ou fidalguia, poderia significar a ampliação de capital, de negócios e,
por conseguinte, poder e prestígio.
Paulatinamente, a admissão de comerciantes entre os estratos e as
atividades antes limitadas àqueles provenientes dos grupos de tradicionais
proprietários de terra passou a ser cada vez mais comum, e a riqueza
tornou-se fator de integração e aceitação nos quadros da elite. Mas, decerto,
a revisão na legislação de Pombal, ajustando-a às transformações sociais e
aos novos valores impostos pela crise do Antigo Regime, e a valorização, ou
melhor, a não-depreciação da atividade comercial, aliada ao processo de
mercantilização da Colônia, contribuíram para estimular casamentos deste
tipo, uma vez que passavam a ser vantajosos para as partes envolvidas, sem
incorrer no risco de manchar o nome da família nobre
71
, unindo num mesmo
movimento riqueza, status, prestígio social e poder político.
Dessa maneira, confirma-se o caráter pragmático da política de
casamentos entre os membros da elite, haja vista que o centro de suas
preocupações era garantir a sua hegemonia na sociedade. Por isso, mesmo
suas estratégias de matrimônio alteravam-se de acordo com as
circunstâncias. Assim, conforme o interesse do momento, poderiam ocorrer
primeiros. Contudo, era comum também o casamento de comerciantes entre seus pares,
como forma de ampliar negócios, dar coesão e, conseqüentemente, promover o
fortalecimento do grupo. Ver o capítulo “O comércio e retalhos de vida”, da tese: BORREGO,
Maria Aparecida de Menezes. A Teia Mercantil: Negócios e Poderes em São Paulo Colonial
(1711-1765). Tese (Doutorado em História Social), FFLCH, USP, 2006. p.242.
71
Até pelo menos a primeira metade do século XVIII, a condição de negociante era bastante
desprestigiada. Vale lembrar que essa desvalorização não valia para os comerciantes “de
porta aberta”, ou seja, àqueles que se dedicavam ao comércio em lojas ou abastecimento e
também quem praticasse ofícios manuais.
43
uniões entre membros das “melhores famílias” e forasteiros que possuíssem
cabedal ou tivessem posição estratégica na administração.
72
Ao final do século XVIII, grande parte das propriedades rurais, pelas
quais era medida a riqueza e o prestígio das famílias, estava nas mãos de um
pequeno grupo, cujos membros eram aparentados entre si e, por isso
mesmo, detentores do controle dos cargos, contratos e monopólios na
Colônia.
73
Pode-se observar que essas características edificadoras da
sociedade paulista, em especial das elites, avançaram e permaneceram ainda
por muito tempo em cena, alcançando seu apogeu com a cultura cafeeira,
que lhe conferiu projeção nacional.
Contudo, de se considerar a incrível capacidade de “reconversão”
destes grupos detentores do poder. Seu potencial de integrar aspectos lhes
permitiu um ajustamento diante de novas circunstâncias, lançando mão de
“estratégias” de manutenção do “capital social”, numa dimensão reprodutora
das condições que geraram o “habitus” do grupo social ao qual pertenciam.
74
O campo político consistiu em espaço privilegiado para a elite
demonstrar essa sua capacidade de amoldar-se às novas condições que
constantemente se apresentavam. Por intermédio da política, conseguiu
conciliar e adaptar poderes e interesses essencialmente privados com os
regimes políticos que advieram.
75
72
FRAGOSO, João. Op. cit., 2001. p.53-6.
73
BLAJ, Ilana. Na trama das tensões: o processo de mercantilização de São Paulo colonial.
São Paulo: Humanitas /FFLCH/USP: Fapesp, 2002, p. 291.
74
“Estratégias”, “capital social”, “campo” e “habitus” são premissas epistemológicas que
orientam o trabalho de Bourdieu na reflexão indivíduo/sociedade. Bourdieu recuperou a
idéia “escolástica” de “habitus”, que enfatiza a dimensão de um aprendizado do passado. O
corpo, por exemplo, é o substrato do habitus. Nele se inscrevem as relações de poder que
reproduzem ao nível corpóreo o sistema de dominação que impera na sociedade global. Os
demais conceitos são desenvolvidos para a compreensão das questões que envolvem a
formação e o papel do habitus. ORTIZ, Renato (Org.). Pierre Bourdieu. São Paulo: Ática,
1983.
75
QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. “O coronelismo numa interpretação sociológica”. In:
CARDOSO, Fernando Henrique [et. al.]. O Brasil Republicano, v. 1: estrutura de poder e
economia. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. p.157.
44
IMAGEM 3 - Família Paula Souza.
76
1.2 - ORIGENS DA RIQUEZA
O tropeiro é o sucessor direto do
sertanista e o precursor, em
muitos pontos, do grande
fazendeiro.
Sérgio Buarque de Holanda
Não se pode negar que a riqueza paulista foi em grande medida
proporcionada pelo café, responsável pela projeção da antiga Capitania de
São Vicente num cenário econômico e político mais amplo. A instauração do
Regime Republicano, resultado, em parte, das ações dos cafeicultores
paulistas, permitiu que estes desfrutassem efetivamente uma influência
política que ultrapassou os limites do poder local ao qual estavam
acostumados. Dessa maneira, foi com o desdobramento da economia
cafeeira que as oligarquias rurais, lideradas pelos paulistas, assumiram
posto privilegiado no “novo regime”.
76
Fonte: CAMPOS, Cristina. São Paulo pela Lente da Higiene: as propostas de Geraldo
Horácio de Paula Souza para a Cidade (1925-1945). São Carlos: Rima, 2002.
45
Assim, pode-se afirmar sem reservas que a elite de São Paulo foi
projetada pelo café. Todavia, muito antes de sua cultura, ainda nos remotos
tempos coloniais, uma classe se forjou e se constituiu como grupo
privilegiado, produzindo características de distinção sobre os demais grupos
que participaram da formação da sociedade colonial paulista.
Diz-se com freqüência que a Capitania de Martim Afonso era pobre,
isolada, sem atrativos que a fizessem despertar interesses, ao contrário das
capitanias do Nordeste, especificamente da capitania de Pernambuco e sua
cultura canavieira. Responsabilizada pela sua miséria, isolamento e pobreza,
a geografia paulista acabou por dar os contornos de sua ocupação e também
sua posição no quadro do Antigo Sistema Colonial.
77
São Paulo, tomando-se como referência a opulenta região do açúcar
no Nordeste, ocupava uma posição periférica no empreendimento
colonizador. Tal fator, no entanto, não impediu a formação de grupos
enriquecidos e privilegiados que viriam a compor a elite paulista.
Foi nos sertões que os primeiros colonos angariaram recursos para a
sua subsistência material, como também foi dos sertões que vieram as
primeiras formas de acumulação de riqueza, tanto pela monopolização dos
recursos naturais e pelo apossamento da terra, como pelo apresamento e
comercialização do índio, convertido, pelo menos nos primeiros tempos, no
aspecto dominante da economia, lançando as bases para a formação de uma
sociedade hierarquizada, contrariando a imagem construída de liberdade e
independência nas origens da sociedade paulista:
Assim aos poucos foi se delineando nas terras vicentinas
uma organização social na qual as linhas de separação
foram se definindo tendo no índio a camada mais
humilde da sociedade, mamelucos, brancos pobres e
àqueles “cujas razões de domínio e liderança decorriam
da posse de muita terra e notadamente da posse de
muito índio”.
78
77
PRADO JR., Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. o Paulo: Brasiliense; Publifolha,
2000. p.58-9.
78
Muitos paulistas se opulentaram de escravos arrolando em seus espólios. No de Antonio
Paes de Barros havia cerca de quinhentos. Eram assim propriedade mais preciosa da
terra”. BRUNO, Ernani Silva. Viagem ao país dos paulistas: Ensaio sobre a ocupação da
área vicentina e a formação de sua economia e de sua sociedade nos tempos coloniais. Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio, 1966. p.50-1.
46
Em São Paulo, mais do que em qualquer outra parte da Colônia,
ocorrera uma disposição dos colonos para adequarem-se ao meio,
absorvendo e habituando-se aos conhecimentos dos nativos da terra.
79
No
desbravamento dos caminhos que levavam aos sertões, por exemplo, foi de
grande valia a colaboração daqueles que, familiarizados com o ambiente,
conheciam o território e, por isso mesmo, eram donos de uma destreza e de
um sentido de orientação nas matas, passagens e locais para pouso e
descanso.
80
A apropriação do saber indígena sua dieta alimentar adaptada ao
meio, sua habilidade de caça e pesca, seus conhecimentos das plantas para
tratar as doenças, entre outros permitiu o estabelecimento de uma relação
entre os colonizadores e os nativos da terra em tamanha proporção que se
chega a afirmar que sem tal conexão talvez não houvesse se concretizado a
grande empresa bandeirante, ainda que isso significasse para os primeiros
um “retrocesso a condições mais primitivas” de sobrevivência.
81
Contudo,
de se considerar que essas particularidades sobretudo a questão da
mobilidade paulista da ocupação do território voltadas para atender aos
aspectos da vida material do colonizador não o desvinculam do projeto mais
amplo controlado pela Metrópole:
A mobilidade dos paulistas estava condicionada, em
grande parte, a certa insuficiência do meio em que
viviam; insuficiência para nutrir os mesmo ideais de vida
estável, que nas terras da marinha puderam realizar-se,
ao primeiro contato entre o europeu e o Novo Mundo.
Distanciados dos centros de consumo, incapacitados, por
isso, de importar em apreciável escala os negros
africanos, eles deverão contentar-se com o braço indígena
os “negros” da terra; para obtê-lo é que são forçados a
correr sertões inóspitos e ignorados. Em toda parte é
idêntico o objetivo dos colonos portugueses. Diverge
79
Os paulistas levaram ao extremo essa relação com os costumes nativos, de tal maneira
que ficaram conhecidos pelos seus modos no restante da Colônia, chegando inclusive a
serem convidados para auxiliar nas contendas entre colonos e valentes índios guerreiros na
conhecida “guerra dos bárbaros”: “Sua eficiência era tanta que só os bandeirantes paulistas,
considerados tão selvagens quanto eles, poderiam enfrentá-los, e daí os convites com
promessas de posse dos capturados e sesmarias nas áreas conquistadas.” MESGRAVIS,
Laima. Op. cit., 2004. p.121.
80
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Caminhos e Fronteiras. Rio de Janeiro: José Olympio,
1956. p.19.
81
Ibidem. p.21.
47
unicamente, ditado por circunstâncias locais, o compasso
que, num e noutro caso, dirige a marcha para esse
objetivo.
82
Os aspectos levantados acerca da colonização de São Paulo apontam
sempre a idéia, que se tornou hegemônica, de que a sociedade que por aqui
se formou era pobre, sem dinamismo, voltada para a subsistência, com
lavouras rudimentares, marcada pela falta de produtos exportáveis e com
um ritmo lento de acumulação de capital, sempre comparada às prósperas
capitanias da Bahia, de Pernambuco e da região mineradora.
83
Numa época
em que a riqueza estava sempre vinculada aos negócios de exportação-
importação, São Paulo, considerada pouco afeita às relações de mercado,
não se enquadrava nessa lógica.
84
Muitos estudos sugerem uma prudente análise dessa idéia
cristalizada. Entende-se que não se pode defender a idéia de pobreza
paulista, tampouco ignorá-la, mas sim relativizá-la.
Nos inventários analisados para a elaboração do presente estudo
encontram-se alguns indícios da riqueza paulista. No cabedal de Dona
Gertrudes Celidônea de Cerqueira, casada com D. Antonio José de Souza,
com raízes remotas na família Paula Souza, consta como principais bens a
propriedade de escravos e terras, os quais deixou para seu único filho,
“único e universal herdeiro”.
85
Cabe considerar que seu inventário foi
elaborado em época um tanto distante do período dos primeiros tempos da
colonização paulista, mas trabalha-se com a hipótese de que só foi possível a
acumulação de tal cabedal em virtude das atividades desenvolvidas a partir
da colonização dessa região.
A reflexão estabelecida nesse sentido, portanto, deve levar em conta
as atividades econômicas desenvolvidas como indicativo do dinamismo e da
riqueza da região paulista. Na agricultura, por exemplo, verificou-se não
82
Idem. Monções. São Paulo: Brasiliense, 2000. p.16. (destaque nosso)
83
MORSE, Richard. Formação Histórica de São Paulo: de comunidade a metrópole. o
Paulo: DIFEL, 1970. p.30-3.
84
RABELLO, Elisabeth Darwiche. As elites na sociedade paulista da segunda metade do
século XVIII. o Paulo: Safady, 1980. p.17-8.
85
Autos de conta do testamento de Dona Gertrudes Celidônea de Cerqueira. Anno de 1862.
Maço 80, Acervo Arquivístico e Biblioteca do Museu Republicano, “Convenção de Itu”
MP/USP.
48
meramente uma atividade de subsistência
86
, no sentido restrito da palavra,
mas uma cultura com objetivo de suprir o abastecimento interno da
capitania, secundária sim à grande empresa açucareira, mas não com menor
importância no processo de acumulação de capital. De sua concentração nas
mãos de um grupo limitado se originaram os quadros da elite em São Paulo.
Existia em São Paulo, ainda no primeiro século de colonização, uma
intensa produção local diversificada, o que corrobora o questionamento da
tese da agricultura de subsistência. se fazia presente toda uma produção
agrícola, artesanal e comercializada. Produziam-se gêneros alimentícios
como feijão, trigo, milho e outros legumes, além de mandioca e farinhas, que
atendiam às necessidades não da capitania paulista, como também das
demais partes da Colônia, evidenciando a existência de uma rede organizada
de distribuição. Guilherme Pompeu de Almeida (1656-1713), por exemplo,
financiador de expedições sertanistas, foi grande abastecedor de gêneros
alimentícios, em grande parte colhidos ou manufaturados em território
paulista e em pequena porção importados de outras regiões para as zonas do
ouro.
87
O algodão, também cultivado em São Paulo, servia para a indústria
artesanal caseira de tecidos e panos grosseiros. Quase todos os sítios tinham
o seu algodoal para suprir as necessidades de seus proprietários – servindo o
algodão para a confecção de calças, ceroulas, camisas ou ainda surtuns de
baeta, para serem usados nos dias de muito frio e para vestir “a gente de
serviço”.
88
A produção de algodão atingiu proporções tão grandes que
permitiu a formação de verdadeiros “magnatas do algodão”, entre eles
Domingos Fernandes, o fundador de Itu.
89
Esses senhores teriam também se dedicado à criação de ovelhas,
para a produção de tecidos de para consumo próprio, complementando
86
Caio Prado explica a conveniência do termo “subsistência” para diferenciar as atividades
que não fossem destinadas ao grande mercado exportador e para tornar claro os aspectos
que diferenciam e diversificam as atividades no setor da agricultura colonial. PRADO JR.,
Caio. Op. cit., 2000. p.157.
87
BRUNO, Ernani da Silva. Op. cit., 1966. p.74-5.
88
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Caminhos e Fronteiras. São Paulo: Companhia das Letras,
1994, p.214 e 221.
89
Como nem todos possuíam teares, alguns proprietários prestavam o serviço. Sobre o
processo de acumulação de capital no setor algodoeiro, ver: Ibidem. p.214 e 221.
49
suas vestimentas, que, em grande parte, eram feitas com tecidos
importados. Posteriormente, passaram a investir na criação de porcos, bois e
cavalos, principalmente nas regiões distantes do litoral, desenvolvendo a
produção de carne salgada, o aproveitamento do couro e ainda o cultivo de
frutas para a fabricação de marmeladas e vinhos.
Também merece ser relativizada a dispersão dos paulistas, idéia
consolidada por conta de seu “espírito” de aventura, em conseqüência das
suas investidas pelos sertões. Indícios revelam que, a partir do século XVII,
ocorreu uma maior fixação, ao mesmo tempo em que as atividades
econômicas, principalmente a agricultura, iam sendo constituídas. Mesmo
no período da “corrida do ouro”, conhecido pelo despovoamento da capitania
e por vezes acusado de acarretar crise em São Paulo, verificou-se que
aconteceu justamente o contrário, ou seja, houve um crescimento
populacional na província.
90
Aproveitados de todas as formas possíveis, os índios, integrados à
economia paulista, “tornaram-se o principal ativo de proprietários de São
Paulo”.
91
Constituindo parte significativa dos bens e patrimônios das
famílias dos “principais da terra”, os índios eram convertidos em mercadoria
e fonte de acumulação de capital.
92
Sua presença tornou-se fundamental na Colônia, em todos os
sentidos de seu desenvolvimento: na atividade agrícola comercial ou de
subsistência, nas incursões pelos sertões, na aculturação e sobrevivência do
colono, nas atividades criatórias, na mineração, no transporte de cargas e na
satisfação de pessoas, na ânsia de viverem “à lei da nobreza”,
proporcionando ao seu senhor prestígio e riqueza. Transformaram-se nas
90
Ver o trabalho de Marcílio, no qual realiza primorosa pesquisa analisando dados que
revelam um forte crescimento demográfico no período em questão: “Mesmo que
consideremos que o ritmo de crescimento foi desigual durante todo o século, sendo muito
mais rápido na sua segunda metade, ainda assim fica difícil admitir, demograficamente,
uma possível emigração maciça de paulistas para as minas, de acordo com as teses
generalizadas [...]. Ao contrário, a mineração foi quem influiu e refletiu num avanço
inusitado da demografia paulista em todo o século.” MARCÍLIO, Maria Luiza. Crescimento
demográfico e evolução agrária paulista: 1700-1836. Tese (Livre Docência em História),
FFLCH, USP, 1974. p.271-2.
91
NAZZARI, Muriel. Op. cit., 2001. p.38.
92
de se destacar que a atividade de apresamento e apropriação do trabalho indígena não
teve a dimensão que alcançou o tráfico negreiro, mas também contribuiu na constituição de
uma sociedade escravista. MONTEIRO, John Manuel. Negros da terra. Índios e bandeirantes
nas origens de São Paulo. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. p.98.
50
“mãos e pés” não somente daqueles considerados “nobres”, mas até mesmo
dos mais pobres, que faziam questão de possuí-los, a fim de garantir a sua
subsistência mediante a pequena agricultura e singelas criações.
Essa nobreza da terra”, formada por grandes clãs parentais, foi,
então, o germe da formação da elite paulista. O estudo dessas “grandes”
famílias aponta que sua origem estava concentrada no interior paulista, local
privilegiado para a acumulação de riqueza. Vários fatores concorrem para
explicar esse movimento de interiorização: a formação geográfica de São
Paulo, que impelia “naturalmente para os sertões”
93
, o papel que
desempenhou no contexto da colonização portuguesa, o comércio monçoeiro,
a busca de metais preciosos, a conquista e o povoamento do território, entre
outros.
94
Com o aumento da produção e do comércio, foram se formando
bairros e núcleos de povoamento nas áreas que seriam futuramente Santana
do Parnaíba, Mogi das Cruzes, Jundiaí, Sorocaba e Itu.
95
Junto com esse movimento rumo ao interior, formou-se um grupo
privilegiado cujo capital acumulado teria se originado a partir das atividades
descritas. Como exemplo de acumulação de capital pode-se citar o típico
caso da família Prado, cujo fundador, Antonio da Silva Prado, o barão de
Iguape (1788-1875), teve um processo de enriquecimento a partir do
comércio de mulas entre São Paulo, Goiás e Bahia de maneira
extraordinária.
96
A trajetória dos Prado também é exemplar no sentido de revelar a
existência de uma diversificação dos negócios. Antonio da Silva Prado
93
Para uma maior compreensão do “fator geográfico na formação e desenvolvimento de o
Paulo”, vale consultar o trabalho de Caio Prado Jr., que, embora trate especificamente da
“cidade”, nos fornece subsídios para compreender como o planalto paulista impelia para os
sertões. PRADO JR., Caio. A cidade de São Paulo: geografia e história. o Paulo:
Brasiliense, 1998.
94
Idem. Op. cit., 2000. p.58-9.
95
MONTEIRO, John Manuel. Op. cit., 1994. p.104.
96
Antonio da Silva Prado tornou-se presidente da primeira sucursal do Banco do Brasil
aberta em São Paulo e vice-presidente da Província. Seus descendentes assumiram a tarefa
de completar a acumulação do capital da família, destacando-se a atuação de Martinho
Prado Junior (1722-1770), o Martinico, que, associado ao pai e ao irmão, montou uma
fazenda de 12.000 alqueires com 3.400.000 pés de café. Martinico Prado tornou-se
conhecido também por seu papel na organização de uma sociedade de imigração, foi
comissário dos negócios do café e deputado da assembléia provincial. Por sua vez, seu irmão
Antônio foi banqueiro, ministro da agricultura e prefeito de São Paulo. MONBEIG, Pierre.
Pioneiros e Fazendeiros de São Paulo. São Paulo: HUCITEC, 1984. p.140-1.
51
dedicava-se ao comércio de animais, ao açúcar, ao algodão (pelo menos no
início de sua carreira capitalista, em Caitité, na Bahia), fazia empréstimos e
arrecadava contratos de cobrança de rendas públicas, mesmo nos tempos
áureos do café. Essa diversidade de investimentos funcionava também como
meio para solidificação de poder; ainda com esse objetivo, procurava-se
atuar nas mais diversas instâncias, de ordem tanto econômica quanto
política.
97
O importante comércio de muares e gado vacum, voltado
principalmente ao mercado consumidor da região do Rio de Janeiro ou do
Vale do Paraíba, também teria originado o capital dos Aguiar, concorrentes
de Antonio da Silva Prado na disputa pelo domínio do principal mercado de
animais, localizado em Sorocaba, onde funcionava a famosa “feira de
tropas”.
98
Antonio Francisco de Aguiar, pai do citado Rafael Tobias de
Aguiar, irmão de D. Gertrudes, avó do engenheiro Paula Souza, dedicou-se
também ao comércio de tropas e ainda era proprietário de “fazenda seca”,
lavoura e engenhos de açúcar.
99
À atividade comerciante também teria se dedicado o mais antigo
ascendente dos Paula Souza, o português João de Souza Rodrigues, que veio
para o Brasil e estabeleceu-se na região de Itu com grande casa de comércio
por atacado, negociando principalmente ferragens pelo Mato Grosso.
Ademais, administrava muitas tropas que lhe traziam de Santos objetos,
utensílios, produtos e mercadorias diversas importadas de Portugal em
embarcações próprias.
100
Foi graças à “indústria de tropas” cujo engrandecimento deveu-se à
interiorização das atividades econômicas que se deu a valorização e
integração do Centro-Sul à economia da Colônia, com a circulação de
97
Sobre a família Prado, ver: LEVI, Darrell E. Op. cit., 1977. E também: D’AVILA, Luiz
Felipe. Dona Veridiana: trajetória de uma dinastia paulista. o Paulo: A Girafa Editora,
2004.
98
Sorocaba teria alcançado importância nesse ramo de atividade em função de sua
privilegiada posição. Era caminho de circulação das tropas, o que a tornou local de parada
obrigatória para descanso e “estação de invernada”, que teria dado origem à feira e ao
Registro para a cobrança de impostos sobre os animais. PETRONE, Maria Thereza Schorer.
O Barão de Iguape. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1976. p.14-5.
99
IRMÃO, José Aleixo. Rafael Tobias de Aguiar, o Homem, o Político. Sorocaba, SP: Fundação
Ubaldino do Amaral, 1992.
100
Notas de Genealogia. Anotações Manuscritas. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de
Andrade, São Paulo.
52
animais, homens e capitais. Entretanto, tal “indústria” entrou em declínio
com o desenvolvimento das comunicações e a construção ou extensão de
redes ferroviárias ligando os pólos econômicos do país, principalmente São
Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, regiões em crescente desenvolvimento
e de significativa importância para a economia brasileira.
A existência de um mercado consumidor interno apresentou-se com
possibilidades e perspectivas de ganho. A prática comercial interna
funcionava como mecanismo de acumulação de riqueza e tomou tamanha
proporção que foi alvo freqüente de disputas e hostilidades entre negociantes
e autoridades régias.
101
A presença desse segmento econômico indica a existência de uma
dinâmica social. Uma variedade de negócios movimentava o comércio interno
da região paulista e o articulava a outras áreas. Comerciava-se inclusive
produtos importados considerados de luxo, permitindo perceber a existência,
se não da riqueza paulista, ao menos de um pequeno grupo que tinha poder
de consumo elevado, podendo comprar baetas, cobertores, chamalotes,
tafetás, meias de seda portuguesa, fitas de seda, chapéus, botões, pólvora,
panos diversos, ferro, sabão, entre outros produtos.
102
No final do século XVII, as atividades comerciais apresentavam-se
cada vez mais integradas a uma economia de mercado. Essa crescente
mercantilização ganhou importância tal que se pode dizer que também
contribuiu para a “fixação do paulista, por seu enriquecimento e pela
estruturação e consolidação de uma elite que iria exercer o seu papel por
meio da Câmara Municipal”
103
.
Somadas a essa ampliação das atividades mercantis, as atividades
agropecuárias também tiveram papel importante no desenvolvimento da
economia paulista, no acúmulo de capitais e na formação de um grupo de
poder. Parte da dieta básica do português, o trigo teve seu espaço entre as
101
MOURA, Denise A. Soares de. “Poder Local e o funcionamento do comércio vicinal na
cidade de São Paulo (1765-1822)”. Revista História. Vol.24. n
o
2. Franca, SP: Faculdade de
História, Direito e Serviço Social, 2005. p.261-90.
102
BLAJ, Ilana. Op. cit., 2002. p.109.
103
Ibidem. p. 89 e 116.
53
atividades econômicas mais importantes.
104
Sua produção era destinada ao
consumo da “população européia das vilas e cidades do litoral e às frotas
portuguesas, sendo produto requisitado pelo governo colonial em diversas
ocasiões ao longo do século”
105
. Os demais habitantes de São Paulo
adequaram sua dieta à do nativo da terra, empregando o produto produzido
a partir da mandioca, a chamada “farinha de guerra”, para substituir o pão
de trigo
106
, além da incorporação da importante cultura do milho.
no período seiscentista mais para o final do século encontra-se
alusão à significativa produção do trigo entre as posses dos “principais da
terra”.
107
Os primeiros moinhos teriam sido instalados a partir de 1609, sob
o incentivo dado na administração de D. Francisco de Sousa,
108
cujo
propósito era criar um modelo de produtividade que integrasse as atividades
econômicas, como a mineração, a agricultura e a manufatura, desenvolvidas
nas diferentes regiões da Colônia. São Paulo, nos seus projetos, deveria
converter-se no “celeiro do Brasil”, partindo pela produção do trigo. Mas foi
entre os anos de 1630 e 1680 que se assistiu à sua disseminação, graças à
abundante mão-de-obra indígena neste período.
109
A produção do trigo visava a atender um mercado interno colonial,
embora inventários indiquem a existência de um pequeno mercado de
104
Monteiro revela que é pouco conhecida a cultura do trigo na o Paulo Colonial, devido à
sua rápida ascensão e curta duração; muito embora alguns indivíduos houvessem
acumulado muito capital, poucos conseguiram realmente fazer fortuna duradoura somente
por meio do desenvolvimento da triticultura. MONTEIRO, John Manuel. Op. cit., 1994.
p.127.
Belmonte expressa o grau de importância da cultura do trigo afirmando que esta chegou a
“constituir verdadeira força econômica do planalto”, o que demonstra com informações
colhidas em inventários, como os números da produção, cujo preço variava entre 100 e 200
réis por alqueire. Afirma ainda que o trigo desempenhou papel tão importante que “na terra
não há dinheiro senão as ditas farinhas”. BELMONTE. Op. cit., s/d. p.36 e 41.
105
MONTEIRO, John Manuel. Op. cit., 1994. p.114.
106
MARANHO, Milena Fernandes. O Moinho e o Engenho: São Paulo e Pernambuco em
diferentes contextos e atribuições no Império Colonial Português, 1580-1720. Tese
(Doutorado em História Social), FFLCH, USP, 2006. p.82-3.
107
Aqui se faz alusão ao estudo de Sérgio Buarque acerca dos inventários donde
sobressaem referências às propriedades rurais com produção do trigo e a moinhos.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Op. cit., 1994. p.177-8.
108
Para maiores detalhamentos da atuação de D. Francisco de Souza como Governador-
Geral do Brasil, a partir de 1590, ver capítulo XVII do trabalho de: LUÍS, Washington. “Na
Capitania de São Vicente”. Edições do Senado Federal. Vol.24. Brasília: Senado Federal,
Conselho Editorial, 2004. p.271-88.
109
Os índios foram os primeiros produtores de trigo em São Paulo e também deram origem
às grandes famílias paulistas, entre as quais a Taques e a Pedroso de Barros. MONTEIRO,
John Manuel. Op. cit., 1994. p.102-3 e 113.
54
exportação. O maior consumidor do trigo produzido em São Paulo era o Rio
de Janeiro.
110
Entre as atividades de acumulação de riqueza também merece
destaque a mineração, por ter ampliado sobremaneira as oportunidades de
negócios, tanto para os que desertaram São Paulo para fazer incursões pelos
sertões na busca do “eldorado”, como para os que ficaram em seus
territórios e vilas de origem desfrutando indiretamente o desenvolvimento e
progresso de tal atividade. Caso exemplar de riqueza propiciada pela
mineração é a trajetória de Francisco Penteado, um típico “paulista feliz”,
“nobre e venerado cidadão de o Paulo”, que, logo nos primeiros anos da
descoberta do ouro, transferiu-se para a região de Minas Gerais e acumulou
grande cabedal. Ao retornar, investiu na criação de opulenta fazenda na
região de Araçariguana, “na qual reinava em todos os dias a profusão e o
bom gosto”. teria construído uma capela forrada de ouro para Nossa
Senhora da Piedade, que deu nome à sua propriedade, onde recebia com
freqüência notórias personalidades e autoridades.
111
Costuma-se dizer que eram raros casos como este de capital advindo
diretamente das explorações mineradoras, pois, em geral, a riqueza da
mineração chegava a São Paulo principalmente de modo indireto, por meio
da atividade mercantil com a região de Minas Gerais. Todavia, outros nomes
de personalidades que viviam em São Paulo e enriqueceram diretamente em
razão dos negócios das minas podem ser citados, como Baltazar de Godoy
Moreira, Manuel Borba Gato, Garcia Rodrigues Pais, Amador Bueno da
Veiga e José Góis de Morais
112
, que ficara conhecido como o paulista que
quase comprou São Paulo”.
113
Casos como estes indicam que o
enriquecimento direto da exploração mineradora não era tão raro assim.
110
Ibidem. p.115.
111
“Mineradores felizes e infelizes: A miragem do ouro e seus desenganos cruéis”. Informes
da Nobiliarchia Paulistana. Annaes do Museu Paulista. Tomo quinto. São Paulo: Imprensa
Oficial, 1931.
112
Ver o capítulo “Cultura e Opulência do Brasil pelas minas de ouro”, em: ANTONIL, André
João. Op. cit., 1982. p.163-95.
113
“Primogênito do ilustre Pedro Taques de Almeida”, José Góis e Morais teria acumulado
tamanha fortuna que ofereceu ao donatário de São Vicente, o Marquês de Cascais, a
quantia de 40 mil cruzados pela Capitania de São Vicente. Ver: QUEIROZ, Suely Robles Reis
de. “José de Góis e Morais: o paulista que quase comprou São Paulo”. Revista de História. n
o
86. Vol.XLII. Ano XXII. São Paulo: USP, abr.-jun. de 1971. p.373-87.
55
Esse acúmulo de riqueza em decorrência das descobertas auríferas
provocou uma dinamização e diversificação das atividades econômicas em
São Paulo, mas de modo algum se deve atribuir o desenvolvimento paulista
unicamente à mineração. Esta atividade proporcionou uma intensificação
dos processos, em curso, de mercantilização, de expansão econômica e de
concentração do poder nas mãos de um grupo privilegiado. Desse modo,
entende-se que a articulação de São Paulo com a região mineradora veio
reforçar uma tendência iniciada anteriormente.
Nesse sentido, cabe
ratificar os estudos que desfazem essa idéia de que São Paulo, até o período
da mineração, não tinha expressão econômica alguma: “A articulação com o
núcleo mineratório dinamizará esse quadro, mas não será, de forma alguma,
responsável por sua existência.”
114
Sem dúvida, houve uma dinamização da economia paulista com a
mineração, o que não somente resultou no enriquecimento dos grupos que
dominavam essa atividade, como também trouxe uma série de problemas
para a população local, como a alta dos preços. Isto porque muitos
produtores preferiam ter suas mercadorias enviadas para as zonas
mineratórias, onde alcançariam melhores preços, provocando a falta de
diversos produtos básicos de consumo e gêneros alimentícios como a carne,
alguns tipos de farinha e sal, e ainda a escassez de mão-de-obra. Tais fatores
geraram tensões e obrigaram as Câmaras e a Metrópole a fazer intervenções
governamentais, como a taxação dos víveres, a proibição da venda fora da
área e a limitação da ida dos indígenas para as minas.
Um grande afluxo de comerciantes portugueses para São Paulo,
principalmente a partir de 1730, também resultou dessa efervescência da
economia paulista, estimulado pelas possibilidades de lucro ante o
promissor mercado de abastecimento voltado às zonas auríferas. Fixando-se
em São Paulo, tais comerciantes, uma vez enriquecidos, buscavam também
ascender socialmente, mas esbarravam numa elite estabelecida
convertida, depois das aventuras sertanistas, em criadores de gado para o
114
BLAJ, Ilana. Op. cit., 2002. p.125.
56
mercado interno, comerciantes audazes e fazendeiros bem situados.
115
Então, buscavam a solução para sua promoção social na já citada política de
casamentos, na conquista de bens simbólicos significativos de distinção,
como a participação em instituições prestigiadas entre as quais a Santa
Casa de Misericórdia, as Irmandades, o Juizado de Órfãos e as Companhias
Militares –, ou ainda na reversão de seus capitais em fazendas. Assim, uma
vez convertidos em senhores de terras e escravos, alcançariam a desejada
posição na hierarquia social paulista.
116
Também tomando parte desse processo de dinamização das
atividades mercantis, a agricultura fora estimulada e intensificada por efeito
da demanda de abastecimento proporcionada pelas zonas mineradoras,
fornecendo gêneros e víveres como carne de porco defumada e salgada,
cereais, marmelada,
117
trigo, algodão, além de produtos importados, como o
sal, armas, azeite, vinagre, vinho, entre outros, primeiramente para Minas
Gerais e depois para Cuiabá e Goiás, o que contribuiu para a formação de
algumas fortunas entre os que controlavam esse comércio.
Ainda antes do café, a atividade açucareira foi responsável por
profunda transformação operada na agricultura paulista e, de certa forma,
preparou o terreno para o ápice da lavoura na região com a implantação da
indústria cafeeira. A produção do açúcar, na segunda metade dos
setecentos
118
, em pouco tempo, diante das condições favoráveis para o
comércio internacional, levou à dinamização do porto de Santos e à
expansão dos engenhos, tornando a grande lavoura açucareira o motor da
economia paulista, ainda que fosse controlada por empresas pequenas se
comparadas aos vultosos e opulentos engenhos do Nordeste.
119
115
Idem. “Agricultores e comerciantes em São Paulo nos inícios do culo XVIII: o processo
de sedimentação da elite paulistana”. Revista Brasileira de História. Vol.18. n
o
36. São
Paulo: ANPUH/Marco Zero, 1998. p.2-3.
116
BORREGO, Maria Aparecida de Menezes. Op. cit., 2006. p.1 e 200.
117
ABUD, Kátia Maria. Autoridade e riqueza: Contribuição para o estudo da sociedade
paulistana na segunda metade do século XVIII. Dissertação (Mestrado em História Social),
FFLCH, USP, 1978. p.21-2.
118
Não se pode esquecer que a atividade ucareira em São Paulo não era novidade. No
período quinhentista, mais precisamente nos tempos do donatário Martim Afonso de Souza,
a cana-de-açúcar apresentou-se como atividade promissora, mas acabou sendo suplantada
pela produção nordestina.
119
CANABRAVA, Alice Piffer. “História Econômica de São Paulo”. In: CANABRAVA, Alice
Piffer. História Econômica: Estudos e Pesquisas. São Paulo: Hucitec, UNESP, 2005. p.207.
57
A cana-de-açúcar promoveu a prosperidade econômica da região, em
suas vilas produtoras, Campinas, Mogi Mirim e Itu (o mais velho centro da
lavoura comercial), acelerando o crescimento demográfico, o florescimento de
núcleos urbanos e o aumento da mão-de-obra escrava, elemento
fundamental para o avanço da indústria açucareira. Na vila de Itu, por
exemplo, entre os anos de 1766 e 1769, havia 1230 escravos para uma
população de 2758 habitantes.
120
Dessa forma, pode-se reafirmar a
correlação entre a lavoura do açúcar e a escravidão africana, pois, até
meados do século XVIII, era raríssima a presença de escravos negros em São
Paulo, onde todas as atividades eram realizadas essencialmente com a
exploração da mão-de-obra indígena.
A então província de Itu destacou-se como principal e maior
produtora de açúcar paulista. Sua produção chegou ao número de 50.000
arrobas anuais e seu número de engenhos crescia vertiginosamente. Em
conjunto com outras zonas produtoras, como Porto Feliz, Piracicaba,
Sorocaba, Campinas, São Carlos, Jundiaí, além das regiões litorâneas de
São Sebastião e Ubatuba
121
, tornou a produção açucareira digna de
consideração entre os produtos exportáveis da Colônia. Em 1799, o
montante produzido pela capitania era de cerca de 200.000 arrobas.
Assim, o açúcar exerceu significativa influência no cabedal de
homens como o Brigadeiro Luiz Antonio de Souza
122
e seu irmão, o Coronel
Francisco Antonio de Souza, principal proprietário de Campinas, produzindo
também na região de Piracicaba. Eram igualmente figuras de destaque no
mundo açucareiro Floriano de Camargo Penteado e o Capitão Teodoro Ferraz
Leite, além dos já mencionados Antonio Francisco Tobias de Aguiar e
Coronel Antonio da Silva Prado, produzindo, estes últimos, em proporções
bem menores, em virtude da diversificação de seus negócios. Sem contar a
considerável produção oriunda da associação entre o citado Brigadeiro
120
IANNI, Octavio. Uma cidade antiga. Campinas: CMU/Unicamp, 1996. p.29.
121
HOLANDA, Sérgio Buarque de [et. al.]. “O Brasil Monárquico, tomo II: dispersão e
unidade”. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de [et. al.]. História Geral da Civilização Brasileira.
Vol.2. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p.419.
122
O Brigadeiro Luiz Antonio de Souza era casado com Genebra Maria Machado, uma das
filhas do casal Antonio de Barros Penteado e Maria Paula Machado. Era, portanto, tio-avô
do engenheiro Paula Souza. Ver gráfico genealógico nos anexos.
58
Luiz Antonio e Nicolau Pereira de Campos Vergueiro. Também proprietários
de engenho ituanos foram o padre Diogo Antonio Feijó, Antonio de Barros
Penteado, João de Almeida Prado e Vicente Taques Góes e Aranha.
Enfim, os negócios do açúcar fizeram emergir um grupo de
“engenheiros” detentores de prestígio econômico e social. O interior paulista
ganhou importância e a vila de Itu posicionou-se na dianteira da lavoura
comercial
123
, o que conferiu às suas elites papel de destaque na vida política
do país, sobressaindo-se principalmente por seu posicionamento liberal.
Isto exposto, torna-se mais claro que São Paulo e seus grupos de
poder, com a riqueza, o prestígio e a posição que ganharam no período da
cultura cafeeira e antes dele, passaram por, pode-se dizer, uma espécie de
“acumulação primitiva”, que permitiu a inserção de São Paulo
primeiramente nos quadros do “Antigo Sistema Colonial”
124
e posteriormente
no quadro mais amplo do capitalismo mundial. Dessa forma, tomou parte na
“Divisão Internacional do Trabalho”, o que implicou toda uma conformação
política interna de maneira que se garantisse a adequação e estabilidade do
sistema sócio-econômico.
Então, pode-se afirmar que o café significou para os paulistas seu
amadurecimento capitalista, que se deu, portanto, por meio da agricultura
comercial. Na região oeste, particularmente em Campinas e proximidades,
antes de 1800 se notava uma produção pouco expressiva, e pouco tempo
depois, em meados do mesmo século, a região se tornou o grande centro
produtor do país, substituindo a já decadente produção fluminense e do Vale
do Paraíba.
Em síntese, durante todo o período colonial, essas foram as
principais atividades econômicas desenvolvidas em São Paulo e que
permitiram a acumulação de capitais, dando origem a riquezas, criando e
123
Foi extremamente significativo o aumento da produção açucareira na região ituana, que
assim viveu em constante crescimento até o final do período colonial. Em Itu, foram
produzidas 50.000 arrobas de açúcar em 1797, número que em 1822 subiu para 96.496, o
que fez a sua população também dar um salto de aproximadamente 50%, como também a
sua escravaria, signo da riqueza e prosperidade. QUEIROZ, Suely Robles Reis. “Algumas
notas sobre a lavoura do açúcar em São Paulo no período colonial”. Anais do Museu
Paulista. t.21. São Paulo, 1967. p.248-9.
124
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808).
São Paulo: HUCITEC, 2001.
59
reforçando o poder e a distinção dos grupos originados dos “principais da
terra”.
Essa explanação acerca das atividades econômicas também revela
que, fundamentalmente, a riqueza e a projeção proporcionadas pelo café
foram possíveis graças ao terreno fértil que vinha sendo preparado pelos
grupos sociais dominantes, cuja formação foi bem anterior ao “boom”
cafeeiro. No geral, foram os antigos agricultores, mineradores, negociantes,
investidores ou “engenheiros” de açúcar que investiram na produção do café.
Isto é, foram os mesmos considerando sua descendência, que, favorecida
pelo processo de estruturação social baseado na família, pôde dar
continuidade ao processo de enriquecimento do grupo.
São Paulo tinha a sua parte no Antigo Sistema Colonial. Era
“instrumento e produto de colonização”
125
, exercendo papel importante,
constituindo-se como zona voltada principalmente para uma economia de
abastecimento, estruturada na exploração da mão-de-obra indígena e depois
africana, que possibilitou sua articulação com as demais regiões com
economia atrelada ao mercado externo.
Foi no interior paulista que se constituiu a riqueza e se formou uma
“aristocracia”, que aos poucos perdeu a rusticidade necessária à
sobrevivência nos tempos das bandeiras. Assim, aqueles considerados
nobres buscaram expressar sua distinção em relação aos demais extratos da
população
126
das mais diversas formas, quer mediante a dominação dos
125
SILVA, Janice Theodoro da. São Paulo 1554-1880: discurso ideológico e organização
espacial. São Paulo: Moderna, 1984. p.20.
126
Por demais extratos sociais entende-se o grande contingente que vivia fora das grandes
fazendas e fora dos crescentes centros urbanos. Eram, no geral, uma população rural
remanescente das antigas tribos indígenas ou de antigos aldeamentos, mestiça e dispersa
pelos campos, “os caipiras”, vivendo da agricultura de subsistência, no seu sentido mais
restrito. Os que buscaram adequar-se espontaneamente ou de maneira compulsória àquela
estrutura social, integrando-se, conseguiram ganhar certas garantias de sobrevivência, mas
foram condenados à dependência. Eram integrados no sentido de manterem ligações com o
sistema de produção e de organização social, contribuindo para a sua constituição e
manutenção. Eram os “agregados”, que, incorporados à proteção de uma determinada
família, também contribuíam para a projeção de poder, numa época em que o prestígio de
um indivíduo era medido pela quantidade de “arcos” que o seguia. Sobre o “caipira”, ver:
CANDIDO, Antonio. Os parceiros do Rio Bonito: Estudo sobre o caipira e a transformação
dos seus meios de vida. Rio de Janeiro: Livraria Duas Cidades, 1971. p.35. Sobre o
“agregado”: SAMARA, Eni de Mesquita. Lavoura Canavieira, Trabalho Livre e Cotidiano: Itu,
1780-1830. São Paulo: EDUSP, 2005.
60
meios de produção, quer mediante a dominação dos bens imateriais ou
simbólicos.
Enfim, não se teve aqui a intenção de escrutinar todos os processos
econômicos vivenciados por São Paulo desde a sua colonização. Contudo, a
idéia de dar um panorama das atividades econômicas desenvolvidas
apresentou-se conveniente para compreender como se deu a origem da
riqueza das elites paulistas e, por conseqüência, o “direito” atribuído a estas
de atuar nas instâncias culturais e políticas.
Em todo o período colonial, o que se assistiu foi um processo de
estruturação econômica e social controlado por clãs parentais que
dominavam o poder e, constituindo-se como elite, criavam mecanismos de
dominação, sobretudo por meio da rede de solidariedade formada a partir
das relações de parentesco, sedimentando a estratificação social em São
Paulo e reforçando sua própria estrutura de dominação interna, que
atingiriam sua plenitude nos séculos seguintes.
Entendendo-se que as relações econômicas foram fundamentais
nesse processo, essa plenitude esteve vinculada à grande produção cafeeira,
“marca na evolução econômica do Brasil”, assim sintetizada:
O café deu origem, cronologicamente, à última das três
aristocracias do país, depois dos senhores de engenho e
dos grandes mineradores, os fazendeiros de café se
tornam a elite social brasileira. E em conseqüência na
política também. O grande papel que São Paulo foi
conquistando no cenário político do Brasil, até chegar à
sua liderança efetiva, se fez à custa do café; e na
vanguarda deste movimento de ascensão, e
impulsionando-o, marcham os fazendeiros e seus
interesses [...].
127
Em meados do século XIX, esta elite paulista cafeeira encontrava-se
consolidada. Cabe salientar que se entende “elite cafeeira” num sentido
ampliado, abrangendo outros setores da economia, muitas vezes
interligados. Afinal, essa elite caracterizava-se também pela diversificação
nos negócios, controlando desde a aquisição de terras para a produção até a
127
PRADO JR., Caio. História Econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1986. p.167.
61
mão-de-obra, o transporte e a comercialização, e interferindo ainda na
política econômica e financeira.
128
Com características distintas dos grupos hegemônicos – ligados à
cultura econômica do Nordeste que a antecederam, a elite paulista,
projetada nacionalmente pela principal atividade econômica do país e
reintegrando este no comércio internacional em expansão, lançou-se
também na disputa pelos centros de decisões do poder político, cujo ápice,
em conjunto com a outra oligarquia poderosa no país, a mineira, deu-se com
a aliança do “café-com-leite”.
1.3 - ORIGENS DO PODER
Em função da atividade de apresamento do índio, a busca por metais
preciosos acabou proporcionando uma movimentação na Colônia que
resultou na expansão e ocupação de territórios mais distantes do litoral,
ensejando a fundação de vilas como as de Itu (1656-8), Parnaíba (1697),
Sorocaba (1661), Curitiba (1693), Taubaté (1643), Guaratinguetá (1651),
Jacareí (1653) e Jundiaí (1655), cada qual com uma função no
empreendimento sertanista. Localizadas à “boca do sertão”, Itu e Sorocaba,
por exemplo, também serviam como zona de abastecimento de gêneros
produzidos a partir de uma agricultura com base no trabalho indígena.
129
Além dos negócios do apresamento do “negro da terra”, também
contribuíram para o surgimento de bairros rurais, vilas e povoados outras
atividades produtivas. Era comum bairros surgirem a partir de grandes
unidades de produção, comandadas pelos moradores mais ricos, que nessas
localidades construíam capelas, atraindo assim uma população para a
realização de suas atividades religiosas.
130
Aliás, a construção de capelas era
estratégia para a apropriação de terras e fundação de povoados:
128
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora
Nacional; Publifolha, 2000. p.119-121.
129
MONTEIRO, John Manuel. Op. cit., 1994. p.109.
130
Idem. “Distribuição da Riqueza e as Origens da Pobreza Rural em São Paulo (Século
XVIII)”. Estudos Econômicos. Vol.19. n
o
1. São Paulo: Instituto de Pesquisas Econômicas da
FEA - USP, jan./abr. de 1989.
62
[...] ergue-se a capella na terra que lhe foi doada. Esta
atrahe os devotos, cujas pequenas habitações se lhe
agrupam em torno; nasce o povoado, e este vae aos
poucos exigindo novas fundações, dando origem em
seguida á Villa e finalmente á Cidade.
É esse, nas linhas geraes, o modo por que se fundaram
as cidades do Oeste de São Paulo.
131
Itu, por exemplo, fora fundada em território do município de Parnaíba
pelo capitão Domingos Fernandes e seu genro Cristóvão Diniz, quando, por
volta do ano de 1610, erigiram uma capela sob a invocação de Nossa
Senhora da Candelária.
Avançando nos séculos, a necessidade de novas terras cultiváveis
para a expansão da cultura cafeeira também contribuiu para a fundação de
novas vilas e cidades, assim como para dinamizar as já existentes, sobretudo
no oeste paulista. Eram as bandeiras e monções do século XIX que
desbravavam as regiões, não mais em busca de índios, conquistas da terra e
cata do ouro, mas para “pedir à terra o fructo do seu labor, que querem
exploral-a cultivando-a”.
Esse novo movimento de interiorização, não mais ditado em função
das atividades sertanistas, representava a nova fase da economia paulista,
inserida mais diretamente no movimento do capitalismo internacional. Os
sertões, aos poucos ocupados, se transformaram em vilas e povoados,
fazendo emergir a necessidade de formalizar a estruturação de sua
administração, uma vez que os “mandões do local” marcavam sua
presença.
A materialização dessa estruturação dos espaços do poder se deu
com a organização das Câmaras Municipais, também produtos do modo
como fora constituída a colonização. Ou seja, inspirada na instituição
portuguesa, segundo as Ordenações Manuelinas, tal estruturação fora
adaptada levando em conta a posse por alguns de grandes propriedades de
terra e a organização familiar.
132
131
FORJAZ, Djalma. O Senador Vergueiro, sua vida e sua época (1778-1859). o Paulo:
Officinas do “Diário Official”, 1924. p.82-3.
132
Seguindo a tradição do modelo administrativo português, a Câmara era acessível
àquele que fosse proprietário de terras, que não se dedicasse ao comércio de porta aberta”,
não exercesse ofício manual e não tivesse mistura de sangue até a quinta geração,
63
O poder local era representado pelas Câmaras Municipais, que
funcionavam como espaços de dominação do poder político por esses
senhores de “família”, proprietários. Sua função era representar os
interesses dos habitantes, sendo porta-voz das queixas e súplicas dos
moradores. As Câmaras constituíam um espaço privilegiado de diálogo e
negociação direta com a Coroa, muitas vezes contestando normas
governamentais e metropolitanas.
Participar dos ofícios camarários significava gozar de privilégios,
como ter imunidade judicial e poder corresponder-se diretamente com o rei.
O que significava, de certo modo, nobilitar-se com as “honras e privilégios
dispensados à gente da governança”.
133
Durante muito tempo, a composição camarária de São Paulo se
restringiu aos proprietários rurais, às irmandades e às ordens militares,
caracterizando-se, portanto, como espaço privilegiado de atuação e controle
por excelência da elite senhorial. Mas, a partir da terceira década do século
XVIII, houve uma crescente participação dos comerciantes, que
ambicionavam participar da vida social e administrativa, ampliar
sociabilidades por meio do ingresso em instituições locais e desfrutar o
status e os privilégios de “nobilitação” proporcionados pela participação nas
referidas instituições.
134
Exercer influência na Câmara significava a possibilidade de intervir
na organização administrativa, mas também podia ser mecanismo de
ampliação de riqueza mediante a apropriação de recursos oriundos e
destinados a toda a sociedade. Ou seja, fazia-se uso da administração e dos
domínios da Câmara como método de acumulação de riqueza, e não somente
como instância de poder, ainda que se saiba que riqueza e poder estão
geralmente imbricados.
requisitos também necessários para qualquer cargo de comando e posições de poder e
prestígio. Enfim, tinha de ser “homem bom”. MESGRAVIS, Laima. Op. cit., 2004. p.126.
133
BICALHO, Maria Fernanda Baptista. A cidade e o império: Rio de Janeiro no século XVIII.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p.324.
134
A promoção da atividade mercantil provocou àqueles que a ela se dedicavam ambições de
também participar mais diretamente da vida política e administrativa da Colônia, o que por
muitas vezes acabou gerando conflitos com a classe estabelecida no poder. O exemplo
clássico é a luta entre Recife e Olinda na “Guerra dos Mascates”, entre os anos 1710-1711.
64
A acumulação se dava pela chamada apropriação da “economia do
bem comum”, que consistia em bens e serviços públicos, cujas despesas
ficavam a cargo de todos os colonos, embora fossem administrados por
poucos, resultado dos costumes administrativos do Antigo Regime
português, pautados numa política de privilégios e concessões. Tal política
dera origem a uma nobreza que detinha o monopólio dos principais cargos e
postos de prestígio, cujos mecanismos jurídicos e administrativos se
estenderam para o ultramar no processo de organização do governo
metropolitano nos domínios coloniais. Isto acabou por gerar um grupo
privilegiado que recebia, por fidelidade à Coroa e pelos serviços prestados à
conquista, privilégios mercantis, como a isenção de tarifas alfandegárias ou
monopólios de determinada rota comercial, além de cargos administrativos e
militares.
135
Os altos cargos remunerados pelo erário real não eram confiados aos
“conquistadores”, restando-lhes o espaço das Câmaras Municipais como
mecanismo de nobilitação e conquista de privilégios, o que, ao mesmo
tempo, reforçava o vínculo essencial de controle entre os “vassalos
ultramarinos” e o “soberano português”:
A economia política de privilégios deve ser, portanto,
pensada no âmbito não do concelhio, mas,
sobretudo, de interlocução entre poder local e poder
central enquanto cadeias de negociação e redes
pessoais e institucionais de poder que, interligadas,
viabilizavam o acesso dos “descendentes dos primeiros
conquistadores”, dos “homens principais”, e da “nobreza
da terra”, a cargos administrativos e a um estatuto
político como o ser cidadão –, hierarquizando tanto os
homens quanto os serviços dos colonos em espirais de
poder que garantiam a partir das câmaras e, portanto,
das diferentes localidades espalhadas pelos quatro
continentes e ilhas a coesão política e o governo do
Império.
136
135
FRAGOSO, João. Op. cit., 2001. p.43-4.
136
BICALHO, Maria Fernanda Baptista. “As câmaras ultramarinas e o governo do Império”.
In: FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda Baptista; GOUVÊA, Maria de Fátima Silva
(Orgs.). O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI e XVIII).
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p.220-1.
65
Mesmo cargos não muito prestigiados, como o de almotacé
funcionário subordinado da Câmara cujas funções eram impor os valores
das taxas, fiscalizar o abastecimento de víveres nas vilas e cidades, fazer
cumprir o pagamento de impostos dos moradores à mara e cuidar da
aplicação exata de pesos e medidas sobre os produtos –, também eram
ambicionados, pois figuravam a porta de entrada para uma participação
mais ativa na vida política da vila. O próprio Nicolau Campos Vergueiro
(primo dos Paula Souza), por volta de 1814, teria desempenhado a função de
almotacé.
137
Assim, os cargos administrativos eram extremamente
disputados, pois ocupá-los significava auferir prestígio, poder e riqueza.
As Câmaras concentraram tal grau de autonomia com relação à
Metrópole que, ao substituírem as Ordenações Manuelinas pelas Ordenações
Filipinas, em 1603, tentaram impor limites e regras ao seu funcionamento,
restringindo suas obrigações a questões de ordem econômica, administrativa
e, em determinados assuntos, meramente consultiva. Nem mesmo a
implantação de legislação reguladora significou mudança, que
“continuaram exercendo, com ‘direito ou sem ele’, as atribuições que
julgavam de sua competência”
138
, o que resultou na criação de um poder que
dificilmente seria controlado pela Coroa. As Câmaras exerciam pleno poder
em seus domínios, passando a refletir totalmente os interesses daqueles que
a compunham e representavam.
Essa autonomia e poder que desfrutavam as Câmaras e a tolerância
da Coroa para com elas teriam se originado da própria colonização
portuguesa, ao “apelar” à iniciativa privada para pôr em execução sua obra
colonizadora, o que permitiu aos colonizadores/empreendedores uma
participação na administração desde o início.
Também a própria estrutura da organização colonial, com base
familiar, colaborou para esse fortalecimento do poder local, uma vez que era
composta por verdadeiras redes de solidariedade, de forma que todos os
137
Atas da Câmara. Vol.21, 1814. p.459. Apud: MOURA, Denise A. Soares de. Op. cit.,
2005. p.261-290.
138
QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. O mandonismo local na vida política brasileira e
outros ensaios. São Paulo: Alfa-Omega, 1976. p.41-3.
66
esforços empreendidos para controlá-las eram neutralizados, obrigando
muitas vezes o próprio governador-geral a “dobrar-se” às suas exigências.
Mesmo os juízes de fora onde eles existiram –, instituídos para
controlar as funções jurídicas e policiais dominadas pelos “mandões” do
lugar, pouco puderam fazer valer sua autoridade.
139
Exemplo dessa
desobediência e do prevalecimento dos interesses da classe dos colonos foi o
caso da proibição da escravização do indígena, que ocasionou verdadeiras
revoltas, obrigando a administração real a suspender o decreto ou mesmo
ignorar a desobediência daqueles que continuavam a escravizar os gentios,
sem imputar-lhes punição alguma.
No entanto, cabe notar que a Coroa agia passivamente porque lhe
convinha, afinal, eram os colonos que desbravavam o território, efetivando a
sua posse, como também eram eles que buscavam os desejados metais
preciosos. Ademais, nos primeiros tempos da colonização, quando a Coroa
tentou estreitar seu controle, já havia se consolidado uma classe proprietária
acostumada com o poder e tomada de um sentimento de superioridade ante
os demais excluídos do processo político. No que diz respeito aos cargos
administrativos das Câmaras, vale observar que eram os “homens bons”
que, em detrimento do poder da Coroa, os exerciam de fato:
O poder das câmaras é, pois o dos proprietários. E seu
raio de ação é grande, muito maior que o estabelecido
nas leis. Vemos as câmaras fixarem salários e o preço das
mercadorias; regularem o curso e valor das moedas;
proporem e recusarem tributos reais, organizarem
expedições contra o gentio, e com ele celebrarem pazes;
tratarem da ereção de arraiais e povoações; proverem
sobre o comércio, a indústria e a administração blica
em geral; chegam a suspender governadores e capitães,
nomeando-lhes substitutos, e prender e pôr a ferro
funcionários e delegados régios. Algumas câmaras
mantinham até representantes efetivos em Lisboa,
tratando assim diretamente com o governo metropolitano,
por cima da autoridade dos seus delegados no Brasil.
140
139
Ibidem. p.38, 43-5.
140
PRADO JR., Caio. Evolução Política do Brasil: Colônia e Império. São Paulo: Brasiliense,
1999. p.30-1.
67
Tal estrutura de organização do poder político-administrativo teve
forte influência na condução da vida política paulista e brasileira nos anos
subseqüentes ao período colonial. À medida que esses grupos fortaleciam-se,
dominando os espaços econômico, político e cultural, procuravam também
ampliar sua influência em sua província, buscando meios de consolidar e
garantir sua autonomia na gestão de seus redutos. Além disso, também
ambicionavam extrapolar seu raio de atuação, desejosos de efetiva
participação na condução da política do Estado brasileiro em formação,
transformando os espaços da política em “lugares privilegiados de
conciliação entre as diferentes oligarquias regionais”, ou seja, lugares
“profundamente elitistas”.
141
O que se assistiu no período de formação do Estado Nacional
brasileiro as disputas e embates políticos –, pode-se afirmar, fora em certa
medida produto dessa transformação dos espaços da política em espaços de
conflito de interesses de grupos. Fenômeno exemplar foi a Revolução Liberal
de 1842, em São Paulo, expressando bem a visão dos liberais e os embates
pela hegemonia do poder, assim como o entendimento do sentido da política
e do uso da máquina burocrática.
142
Com o avançar do século XIX, novas condições sociais acrescentaram
a esse grupo novos atores políticos, como os jovens bacharéis e os
imigrantes de “boa estrela”. Contudo, suas ações não se desvinculavam da
tradicional elite, uma vez que eram de seu interior que saíam os jovens que
iam estudar Direito, como também era em seu seio que os imigrantes
buscavam reconhecimento social mediante alianças de casamento.
141
ALENCASTRO, Luis Felipe de. “O Fardo dos Bacharéis”. Novos Estudos CEBRAP. n
o
19.
São Paulo, dez. de 1987.
142
Entre os ideais que nortearam o movimento de 42 estão a recusa do governo do Marquês
de Monte Alegre, José da Costa Carvalho, e a ameaça da perda da autonomia político-
administrativa, que foram impostas pelas medidas da Lei de Interpretação do Ato Adicional,
colocando em xeque toda uma manobra dos liberais iniciada com a Maioridade e com as
“eleições do cacete”. A Lei de Interpretação do Ato Adicional foi significativo passo no
caminho da centralização monárquica empreendida no governo imperial do Segundo
Reinado, liderado pelos conservadores, contrariando o domínio local, tradicionalmente nas
mãos dos liberais. Sobre o Ato Adicional e sua nova interpretação, ver o capítulo Arranjo
Institucional” da obra de: DOLHNIKOFF, Míriam. O Pacto Imperial: origens do federalismo
no Brasil do século XIX. São Paulo: Globo, 2005. p.81-125.
Para ver a lei na íntegra, basta consultar o site: <www.cliohistoria.hpg.ig.com.br>.
68
Dando continuidade às suas estratégias de adequação aos tempos do
café, essa elite, ainda mais enriquecida, procurou atuar de maneira mais
significativa na organização do país, extrapolando os limites do poder local.
Enriquecidos e ansiosos pelo seu reconhecimento, os “nobres” procuraram
signos que traduzissem a sua riqueza e poder, forjando novos hábitos,
procurando distanciar-se cada vez mais do passado rústico dos seus
antecedentes e aproximar-se dos valores da modernidade.
69
CAPÍTULO II -
TRADIÇÃO E MODERNIDADE
70
No Brasil, os últimos decênios do século XIX foram marcados pelo
reconhecimento da necessidade de “modernização” do país por parte de
alguns grupos sociais dominantes. Essa “modernização” era entendida
prioritariamente como meio de expansão do capital, acompanhada de
mudanças políticas que criassem facilidades para tal expansão e também de
novos códigos culturais que distinguissem o grupo que se julgava
competente no seu encaminhamento.
Antonio Francisco de Paula Souza descendia de uma família que
tomava parte num grupo específico que se posicionava como portador
especial dos interesses gerais da sociedade. No primeiro capítulo, verificou-
se como se constituiu esse grupo, bem como que o fator econômico foi
determinante para sua promoção aos quadros da elite, permitindo que
dominasse também outros aspectos da vida social, como o político e o
cultural.
O presente capítulo busca dar conta dos aspectos da estratégia desse
grupo para a manutenção de seu capital e a atualização de seu habitus
143
ante as condicionantes sociais emergentes, partindo da análise da formação
de AFPS, influenciada significativamente pelas orientações paternas,
seguindo os princípios gerais do seu grupo social. Busca-se, depois,
entender a eleição da Engenharia como campo capaz de assegurar posição
de poder. Pretende-se compreender ainda como esse grupo forjou novos
hábitos de sociabilidade, criando modelos hegemônicos e códigos de valores
inacessíveis para a maioria, no intuito de marcá-lo e preservá-lo como grupo
distinto.
2.1 - JOVEM PAULA SOUZA
Antonio Francisco de Paula Souza passou os primeiros anos de sua
infância na cidade de Itu, onde nascera, depois foi morar em Capivari e, em
seguida, em Campinas, onde seu pai exercia a Medicina.
143
“Habitus”, “Campo”, “estratégia”, “capital social” são premissas epistemológicas que
orientam o trabalho de Pierre Bourdieu na reflexão indivíduo/sociedade. O principal
conceito o Habitus - donde surge os outros para a compreensão das questões que envolvem
a formação e o papel daquele - pode ser entendido como uma “segunda natureza”, uma
natureza socialmente constituída e internalizada pelos determinismos sociais.
71
IMAGEM 4 - O jovem estudante Paula Souza.
144
O mais velho entre os dez filhos do casal Antonio Francisco de Paula
Souza, Conselheiro, e Dona Maria Raphaela Paes de Barros, iniciou seus
estudos em sua cidade natal, no colégio do Sr. Braz Carneiro Leão, onde
aprendeu o latim e um pouco do francês, entre outras matérias, passando
mais tarde para o colégio Galvão, em São Paulo, de onde se transferiu, junto
com seu irmão Francisco, para o colégio Calógeras, em Petrópolis, no Rio de
Janeiro.
Em 1857, em companhia de seu irmão e de seus tios maternos
Antonio
145
e Diogo Paes de Barros
146
, seguiu viagem rumo à Alemanha. ,
encaminharam-se para o colégio Krause e Wagner, em Dresden, então
afamada instituição de ensino, onde Antonio e seu irmão passaram a
estudar, enquanto seus tios dirigiram-se a Hamburgo.
Em 1860, no entanto, os dois irmãos retornaram ao Brasil, a pedido
do diretor do colégio, que, depois da morte de um colega em conseqüência de
forte resfriado que também acometera o jovem AFPS, passou a temer pela
saúde dos rapazes.
147
Contudo, permaneceram pouco no Brasil, tornando os
144
Fonte: POLI/USP. Disponível em: <www.poli.usp.br>.
145
O Coronel Antonio Paes de Barros (1840-1909) casou-se com Maria de Souza Barros,
filha do segundo casamento de Luiz Antonio de Souza Barros. Com o nome de casada,
Maria Paes de Barros, tornou-se conhecida por suas memórias. BARROS, Maria Paes. No
tempo de dantes. São Paulo: Paz e Terra, 1998. Ver imagem nos anexos.
146
Diogo Paes de Barros (1844-1888), em sociedade com seu pai, foi responsável pela
fundação da primeira fábrica de tecidos de algodão movida a vapor na cidade de o Paulo,
situada na atual Rua Florêncio de Abreu. Posteriormente, assim como seu pai, que foi sócio
do Coronel Luís Antonio Anhaia na fábrica São Luis, de Itu, Diogo de Barros associou-se
também a este na instalação da fábrica do Bom Retiro, em 1885. Participou da Guerra do
Paraguai como capitão do 7
o
Batalhão de voluntários paulistas. Ver imagem nos anexos.
147
Segundo biografia escrita por Ramos de Azevedo, o jovem que falecera era filho único de
Ospina, então presidente da Venezuela. REVISTA POLYTECHNICA. Revista da Escola
72
dois jovens a embarcarem para a Europa, chegando, em julho de 1861, a
Zurique, na Suíça, onde o mais velho matriculou-se na Escola Polytechnica,
depois de passar por três meses de aulas particulares e prestar os exames de
admissão.
148
Por essa ocasião, a Eidgenössische Technische Hochschule Zürich
(ETH Zürich), também conhecida como Escola Politécnica de Zurique, havia
reunido em seu corpo docente um verdadeiro conjunto de celebridades.
Eram profissionais das áreas de Arquitetura e Engenharia, como Rosenhaur,
Clausius, Wolff, Cullman, Semper, Vischer Chalhemel-Lacour, Dufraisse, de
Sanctis, entre outros nomes de destaque no meio acadêmico e científico.
149
Na Europa, pouco depois de sua chegada, AFPS passou a fazer parte
de uma Sociedade de estudantes, a “Rhenania”, na qual fez muitas amizades
e participou de diversos duelos, pelo menos 25.
150
Nessa oportunidade, como
muitos jovens da época, entusiasmou-se pelas idéias do general Garibaldi,
procurando ingressar em sua milícia por volta de agosto de 1862. Mas, antes
de chegar a Milão, soube da prisão do general e regressou a Zurique.
Durante todo o tempo em que esteve fora do país, manteve com o pai
uma ampla correspondência, o que permitiu reconstituir um pouco de sua
vida, de suas relações familiares, de seu posicionamento político e de suas
idéias, ao mesmo tempo em que possibilitou recuperar a fisionomia de um
período histórico específico. Considerando que o indivíduo existe na rede de
relações com o coletivo, sendo assim produtor e produto de sua época,
entende-se que as vidas e as ações desse sujeito histórico e seu grupo de
relações podem ser vistas como ponto de intersecção entre a história
individual e a sociedade.
Politécnica de São Paulo. Número Extraordinário. São Paulo: Casa Vanorden, 13 de abril de
1918. p.2.
148
Carta ao pai. Zurich, 19/08/1861. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade,
São Paulo.
149
A ETH de Zurique, fundada em 1855, por ocasião da estada de AFPS, era uma
reconhecida instituição de ensino e pesquisa científica da Europa. Por passaram muitos
ganhadores do Prêmio Nobel, como Einstein, que fez parte do seu corpo de alunos em 1896.
150
Em sua documentação não foi encontrado nenhum comentário de AFPS acerca dos
duelos de que teria participado, o que dificulta entender o que significava duelar naquela
época. O número de duelos de que porventura tenha participado é bastante alto, o que
permite cogitar que não se tratava do sentido “clássico” do duelo. Como esteve ligado a
associações estudantis, pode-se sugerir que se duelava sem a utilização de armas de fogo,
ou armas brancas, mas na forma de luta livre, ou brigas entre grupos de estudantes rivais.
73
IMAGEM 5 - Jovem estudante Paula Souza, ao centro.
151
Paula Souza pretendia concluir seus estudos na Suíça, o que, no
entanto, não foi possível, em decorrência do surgimento de problemas com o
diretor da instituição em que estudava. Em suas biografias o fato é relatado
de maneira superficial, permitindo perceber somente que AFPS considerava
que o diretor Dr. Bolley cometia injustiças com os alunos. Ao que parece, a
contenda teria ocorrido devido ao envolvimento de Paula Souza e outros
jovens em alguma espécie de “movimento estudantil”. Os estudantes diziam
rejeitar qualquer tipo de censura e, conforme documento de abaixo-assinado
em que constam 350 assinaturas, reivindicavam a demissão do Diretor e a
revogação das expulsões impostas arbitrariamente.
152
Mediante carta de seu irmão Francisco se pode ter uma idéia do
ocorrido:
151
Fonte: SAMARA, Eni de Mesquita. Diretores da Escola Politécnica da Universidade de São
Paulo: vidas dedicadas a uma instituição. São Paulo: EPUSP, 2003.
152
Arquivo Paula Souza - PS. CA863, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
74
Meu pai eu lhe digo esta verdade meu mano foi sempre
um dos mais aplicados daqui de Zurich, e num belo dia
que elle vem das aulas elle acha sobre a mesa uma carta
para elle do Director na qual dizia a elle continuasse aqui
elle sairia expulso de Zurich, e quando se recebe uma
dessas cartas, quando menos se pensa estas expulso e
para não passar por essa vergonha elle saiu da
Polythecnica e entrou na Universidade para esperar
tempo de entrar na Escola de Carlsruhe. Como elle não
queria esperar perder esse precioso tempo que faltava elle
ia duas classes da universidade e de algumas da
Polytechnica, o Director da Polythecnica fica zangado
com elle por isso e da lhe o dinheiro que meu mano tinha
pago para todo anno, meu mano ficou indignado e
perguntou ao director da Universidade o que elle devia
fazer.
O Director então tomou o negócio sobre si e comesou um
processo contra o Diretor da Polythecnica.
O processo ainda não acabou muitos professores da
Polythecnica estão a favor de meu manno. Depois de lhe
ter dito isto V. M. de ver que o diretor da Polythecnica
não pode nos gostar. Por isso eu lhe pesso que me de a
licença de estudar na Allemanha a Engenharia eu lhe
prometo que V. M. ide ficar contente com meu
adiantamento, hei de fazer o mais que poder.
153
Em sua narrativa, Francisco não relata os detalhes da desavença,
mas defende a inocência do irmão, que mais adiante parece ser confirmada,
quando comenta, em outra missiva, a substituição do Diretor e a
transferência de diversos colegas de Zurique.
154
De qualquer modo, a
questão entre os estudantes e o Diretor Bolley foi intensa, pois resultou no
deslocamento do jovem Paula Souza para Karlsruhe para onde também
deveria seguir seu irmão Francisco, depois dos cursos preparatórios –, na
Alemanha, em 1863, onde permaneceu até 1867, ano em que se formou.
Este episódio da transferência de Paula Souza não agradou muito ao
seu pai, que ficou preocupado em saber o que realmente havia acontecido e
153
Arquivo Paula Souza - PS. 863.12.20, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
154
“[...] Por causa da História com o Director nomearão um outro para Zurich como
Pestalozi que é um bom professor [...].” Carta de Francisco. Carlsruhe, 04/03/1865. Arquivo
Paula Souza - PS. 865.03.04, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
Anteriormente, em outra carta, Paula Souza comentara com o pai: “No fim d’esta comesão
as aulas de novo; e então teremos o prazer de ver chegar de repente os 250 Polytechnicos de
Zurique, que confirmão os seus estudos aqui.” Carta de Antonio para o pai. Carlsruhe,
06/09/1864. Arquivo Paula Souza - PS. 864. 09.06, Biblioteca Mário de Andrade, o
Paulo.
75
com a inconveniência da mudança de Zurique, temendo que essa
“peregrinação” acabasse resultando em atrasos nos estudos do filho.
155
Francisco, na carta remetida ao pai supracitada, além de defender
seu “mano”, revelava também sua obediência à orientação paterna quanto ao
estudo da Engenharia, contrariando seu próprio desejo de estudar
Agricultura, expresso em várias missivas:
Eu não pretendo ser engenheiro, antes quero ser
agricultor do que ser “Doutor em leis” que eu não tenho
propensão alguma.
Eu estou estudando bastante para não dar ocasião a
alguém de me chamar pelo nome que V. Me. me deu
na carta de 26 de julho.
156
Nesse embate, a vontade do pai prevaleceu, ainda que Francisco
tenha cogitado também a possibilidade de atuar na atividade comercial.
Talvez o Dr. Paula Souza tenha percebido a diferença de personalidade dos
filhos e aventado a possível falta de vocação de Francisco para os estudos:
[...] eu espero ainda ser um Ingenheiro, por isso meu pai
eu lhe pesso a licença de experimentar ainda um anno a
carreira de Ingenheiro e com boa vontade sendo
Ingenheiro eu ganho muito, e não podendo ser
Ingenheiro e ser presizo que eu siga a carreira de
comerciante eu não perderei nada em ter conhecimentos
Mathemáticos, creio eu.
Meu querido pay por isso eu lhe pesso tenha paciência
ainda com esse [?] filho e deixe ele ainda experimentar
um anno de Ingenharia eu hei de estudar com vontade
como já lhe disse nas cartas passadas mais se eu ver que
não sirvo [?] mesmo para essa dita carreira lhe peço
licença de ir para minha casa Patria seguir o anno que
estudarei a Ingenharia hei de largar de estudar nguas
[...] hei de ser um comerciante.
Eu creio que um comerciante pode servir muito para
a pátria.
157
155
Arquivo Paula Souza - PS. 863.08.18 c/h, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
156
Arquivo Paula Souza - PS. 861?/3, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (destaque
nosso)
157
Carta de Francisco ao pai. Zurich, 03/04/1864. Arquivo Paula Souza - PS. 864.04.03,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (destaques nossos)
76
Dr. Paula Souza escreveu a esse respeito ao filho Antonio, esperando
que este, por ser mais velho e “adiantado”, pudesse orientar o irmão mais
novo, sempre alvo de preocupações dos pais
158
, o que não significa que o
velho Dr. Souza não tenha sido também rigoroso e preocupado com seu filho
primogênito:
Causou-me lastima vossa carta de dezembro, pois com
19 annos de idade ainda não tendes madureza e reflexão
para distinguirdes justas obervações de seu pae, e as
tomardes como offensa aos brios do homem? Se commigo
assim vos comportais o que devo esperar com outros?
Auguro-vos triste vida e misero fim, quando vejo
abafardes os sentimentos de família...
159
Sua preocupação com o filho justificava-se pelos prejuízos que
suas escolhas poderiam provocar nas relações que estabeleceria na
sociedade, que esta era marcada pelo clientelismo. Na tentativa de
compreender o comportamento do filho, pensou que a distância da família e,
por conseguinte, o excesso de liberdade que desfrutava talvez o tivessem
afastado dos princípios e obrigações religiosas:
A irascibilidade que revelou vossa carta passada, que
respondi transpassado de dor e sentimentos, he ainda
vosso defeito pois o que vos alienará muita relação
boa e aproveitável, tenho pensado n’isso e presumo,
que a causa d’ella outra não pode ser senão a tibieza ou
quem sabe se a falta de princípios religiosos, que são os
únicos guias e conselheiros seguros da vida. Lembrai-vos,
que sois cristão e catholico, que esses princípios forão os
que derão a liberdade ao mundo actual, e o levarão a ser
maior, a pleno desenvolvimento quando aplicados com
puresa e sem embargos na governação do Estado: a falta
d’ellas aballa [?] nações, governos e indivíduos, a estes
principalmente he indispensavel ou qualquer época, e
fase da existência, he um consolo na desgraça, conselho
na ventura e esperança no passamento. Praticai pois
158
Em diversas missivas, os pais revelavam preocupação com Francisco, que, conforme se
pode inferir de seus escritos, tinha personalidade e caráter mais livre e descompromissado
que o irmão. Em suas narrativas, revelava sua afeição pelos familiares e também
demonstrava ter um espírito sensível ao descrever lugares que conhecia, o interesse pela
literatura e pela música. Arquivo Paula Souza - PS. 861.12.20/2, PS. 861?/4, PS.
862.04.04/1 e PS. 861.09.29, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
159
Carta para o filho Antonio. Itu, 14/07/1863. Arquivo Paula Souza - PS. 863.07.14,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
77
vossos deveres de catholico, estudai-vos a vos mesmo,
corrigir-vos e preparaivos a apresentar-vos em qualquer
momento perante o Juiz Supremo a que podereis ao
menos alegar do esforços que empregasteis em tão
louvavel empenho. Vede vos nesse espelho de vossa alma,
e consciência, vos envergonhareis de vos mesmo como a
mim me teacontecido; [...] Que Deus se compadeça de
nos, e nos não abandone.
160
Dessa maneira, percebe-se como transcorreu a relação entre pai e
filhos que estudavam fora do país, marcada por repreensões e conselhos do
patriarca, às vezes transmitidos de maneira carinhosa, às vezes de modo
ríspido.
As atitudes do pai, o Dr. Souza, com relação à formação dos filhos
refletem seu pensamento enquanto partícipe de um grupo que se pretendia
hegemônico. Nesse sentido, a formação dos filhos era tida como fundamental
para a perpetuação da família nos círculos do poder.
Contudo, seus interesses particulares eram apresentados como
interesses comuns a toda a sociedade, o que se pode constatar quando
afirma, por exemplo, que seguir a carreira de engenheiro seria a chance de
estar a serviço do país. O mesmo se pode notar quando o jovem Francisco,
ante a possibilidade de não conseguir formar-se engenheiro, tenta se
convencer de que seguir a carreira de comerciante também poderia ser uma
maneira de servir à pátria.
Desse modo, seguindo o fluxo mundial e as transformações impostas
pelo desenvolvimento da industrialização, estudar Engenharia significava
manter-se na vanguarda e influenciando os rumos do país. Portanto, torna-
se necessário compreender o ideal que a Engenharia trazia naquele
momento.
160
Carta ao filho Antonio. Rio de Janeiro, 07/06/1864. Arquivo Paula Souza - PS.
864.06.07, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (destaques nossos)
78
2.2 - ENGENHARIA: O CAMPO
Meditai sabiamente, e fazei-
vos engenheiro, que a fortuna
he vossa.
161
A posição social e política, a formação intelectual e também as
heranças familiares e de grupo do Conselheiro Dr. Paula Souza, pai dos
jovens Antonio e Francisco, deram a ele condições de vislumbrar o futuro de
seus filhos e fazer projetos acerca de suas carreiras profissionais com uma
visão, pode-se dizer, já “modernizante”. Ele conseguiu perceber as mudanças
que estavam ocorrendo em seu tempo cujo ápice se daria muito mais
adiante, precisamente no final do século XIX – e a emergência da Engenharia
nesse processo. Dizia ele: “[...] entramos [?] em época que tais
conhecimentos serão [?] muito procurados, e reclamados...”
162
Todavia, cabe perguntar: Que mudanças eram essas que reclamavam
esse tipo de conhecimento proporcionado pela Engenharia e pelas ciências
voltadas para o aperfeiçoamento tecnológico?
A partir do final do século XVIII, inúmeras mudanças ocorreram no
mundo, em conseqüência das transformações do capitalismo, bem como da
difusão de novas fontes de energia, novas técnicas produtivas, de
comunicação e de transporte, mudando de maneira radical a fisionomia dos
lugares por elas atingidos. Nesse processo, os engenheiros quase sempre
protagonizaram as iniciativas das intervenções.
163
Os engenheiros atuavam no Brasil desde os primeiros tempos da
colonização.
164
Os problemas enfrentados no início do século XIX, ante a
economia agroexportadora, principalmente em razão do produto em
161
Carta para o filho Antonio. Rio de Janeiro, 24/04/1864. Arquivo Paula Souza - PS.
864.04.24, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
162
Carta ao filho Antonio. Itu, 29/12/1862. Arquivo Paula Souza - PS. 862.12.29, Biblioteca
Mário de Andrade, São Paulo.
163
CAMPOS, Candido Malta. Os Rumos da Cidade: Urbanismo e modernização em São
Paulo. São Paulo: Editora SENAC, 2002. p.39.
164
Na época colonial, os trabalhos de engenharia estavam ligados à construção de
fortificações e edifícios públicos, à abertura de estradas e à realização de levantamentos
cartográficos e topográficos. NAGAMINI, Marilda. “Engenharia e técnicas de construções
ferroviárias e portuárias no Império”. In: VARGAS, Milton (Org.). História da Técnica e da
Tecnologia no Brasil. São Paulo: Editora da UNESP, Centro Estadual de Educação
Tecnológica Paula Souza, 1994. p.131-61.
79
ascensão, o café, eram atinentes, entre outras questões, às vias de
comunicação e ao transporte, alçando a Engenharia à condição de ciência
capaz de administrá-los e solucioná-los.
Conhecia de perto esse contexto o Conselheiro Dr. Paula Souza, em
função de sua intensa participação política, mas principalmente pela visão
que seu cargo no ministério lhe proporcionava, fazendo-o perceber a real
emergência da Engenharia no país e as possibilidades que esta ofereceria
aos seus filhos:
Francisco resolveo definitivamente continuar, ou antes,
encetar deveras seos estudos de engenharia; irá pois para
la também e matricular-se n’essa mesma eschola para
obter também idêntico titulo.
[...]
Mando-vos agora pelo correio o jornal do commercio em
que apareceu de uma comissão da camara desenvolva os
destinos futuros da nossa viação férrea e fluvial; he
apenas uma ponta da voz do futuro, que se levanta e
por ella vereis o magnífico horisonte, que se abre [...]
vossa profissão; vide, meditas, estudas e vinde com
documento e auctoridade.
165
Nesse período, cabia aos engenheiros principalmente atender às
exigências da economia agroexportadora cafeeira, e o setor mais promissor
era o de transportes, centrado na construção e ampliação de uma malha
férrea eficiente, sendo que também se fazia necessário o aperfeiçoamento do
transporte fluvial, além de construções portuárias.
Muitos outros campos se abriam aos engenheiros, em decorrência da
industrialização do país e do conseqüente crescimento da vida urbana. No
entanto, nos primeiros momentos da cafeicultura, não se considerava o
engenheiro um intelectual tão prestigiado quanto os bacharéis, médicos,
sobretudo os primeiros. Ainda assim, o Dr. Paula Souza sabia que se tratava
de um campo em ascensão, bem como que este poderia garantir uma
“colocação” aos seus filhos. Ademais, a profissão apresentava consonância
com suas idéias liberais, que projetava que o progresso do país
aconteceria por meio do aperfeiçoamento tecnológico e prático.
165
Carta para o filho Antonio. Rio de Janeiro, 09/05/1864. Arquivo Paula Souza - PS.
864.05.09, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (destaques nossos)
80
A Engenharia no Brasil desenvolveu-se primordialmente no último
quartel do século XIX, refletindo a conjuntura da progressão do capitalismo
mundial, quando as elites dirigentes passaram a depender das práticas de
categorias sociais especificamente ligadas às tecnologias. Por isso mesmo, o
engenheiro, enquanto detentor de um saber tecnológico, passou a ter função
de destaque no processo produtivo e na estrutura capitalista.
Assim, o Dr. Paula Souza, ao insistir que seus filhos seguissem a
carreira de engenheiro, parecia entender o papel de prestígio e poder que
esse profissional teria na nova sociedade, que em seu tempo ainda estava se
configurando. Essa fase de criação de uma infra-estrutura para atender à
cultura agroexportadora do café trouxe a especialização no setor de
ferrovias, dando origem a um crescente número de engenheiros
ferroviários.
166
A promoção do engenheiro a profissional privilegiado nessa nova
ordem” acabou por estimular a criação de cursos de formação e escolas
especializadas. O mais antigo estabelecimento de ensino da Engenharia do
país teve suas origens ainda no século XVIII, com a fundação da Real
Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho, em 1792, no Rio de Janeiro,
considerada berço da Academia Real Militar, criada pelo príncipe D. João,
em 1810, depois transformada em Escola Militar e posteriormente
subdividida em duas: a Escola Central, para formação de engenheiros, e a
Escola Militar. Da Escola Central originou-se então a Escola Polytechnica,
depois “Escola Politécnica do Rio de Janeiro”, em 1874.
167
Essa desvinculação da formação de engenheiros e militares assinalou
a mudança da visão acerca da Engenharia, que, antes vista como uma
166
REVISTA ENGENHARIA. Vol.64. São Paulo: Engenho Editora Técnica, set./out. 2006.
167
MENDES, Marcel. Mackenzie no Espelho: uma história documentada da cassação ao
reconhecimento dos cursos de engenharia (1932-1938). São Paulo: Editora Mackenzie,
2000. p.15.
A Escola de Minas, em Ouro Preto, foi a segunda escola de engenharia do país, fundada por
Claude Henri Gorceix, em 1876. Sua marca se deu na pesquisa científica, destinada a
formar geólogos e engenheiros de minas. Sobre a Escola, ver: CARVALHO, José Murilo de. A
Escola de Minas de Ouro Preto: o peso da glória. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.
81
tecnologia a serviço do Estado
168
, passava a ser associada a preocupações
econômicas, a técnicas produtivas e a atividades ligadas à urbanização.
O Dr. Paula Souza, atento que era, percebia as exigências do que
estava por vir, e não permitiu que o filho Antonio buscasse o curso de
Engenharia Militar:
vos dice alguma cousa acerca de vossa pretensão em
missiva [sic] passada; agora repito declarando, que não
vejo vantagem alguma nesse modo de engenharia
militar, e que isso não tem meo consentimento; pelo
contrário julgo indispensável, que continuais mesmo
em Carlsruhe vossos estudos ate o ponto de tirar d’esse
curso vossa carta de bacharel, ou Dr. em engenharia; he
elle um dos mais bem reputados na Alemanha, e aqui
muito bem conceituado pelos nossos homens da sciencia,
que me assegurarão, que se trouxéreis um título dessa
academia vos abriria elle as portas a [...] pretensão vossa.
Assim continueis ahi por um ou mais annos até
obtiverdes esse titulo, [...] que vos abra [?] na Europa as
portas de muitos estabelecimentos, onde encontrareis
saber, pratica e reputação. Um dos nossos mais bem
reputados engenheiros Viriato de Medeiros que [?] em
Inglaterra pertenceu ao collegio dos engenheiros civis
apesar de estrangeiro, insisto em que continue ahi; bem
assim Christiano Ottoni, ambos impregados na estrada de
ferro D. Pedro 2.º, e d’elle, espero obter emprego para vos
logo, que voltardes; mas para isso he preciso não so
habilitar suas, como ainda traser o documento legal, e
serio dessa habilitação.
169
Nomes de engenheiros despontavam com destaque, como os
citados pelo Dr. Souza, Viriato de Medeiros (1823-1900) e Christiano Ottoni
(1811-1906) cujo nome está inscrito na história da Engenharia de
Transportes –, dos quais pretendia obter, com o seu prestígio político, o favor
168
Explica-se que o vínculo que a engenharia teve nos primeiros tempos com a área Militar
devia-se à sua função social numa época em que a preocupação era principalmente a
expansão e proteção de fronteiras. Por isso era conduzida conforme “[...] As necessidades da
consolidação da posição internacional do Brasil no continente sul-americano e da
manutenção da unidade da pátria, ameaçada por sucessivos movimentos revolucionários.”
SIMONSEN, Roberto C. “Objetivos da Engenharia Nacional”. Separata do “Boletim do
Instituto de Engenharia”. n
o
148. Conferência proferida no Instituto de Engenharia de o
Paulo. São Paulo, set. 1939. p.3.
169
Carta para o filho Antonio. Rio de Janeiro, 09/03/1864. Arquivo Paula Sousa - PS.
864.03.09, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (destaques nossos)
82
de arranjar colocação para o filho, prática, aliás, muito comum naquela
época.
170
O interesse pela Engenharia também estava ligado ao desejo de
“modernização”, acompanhando o movimento e a conjuntura internacional.
Seguindo essa tendência, Rafael Tobias de Aguiar, em sua primeira gestão
como presidente da província de São Paulo (1831-1835), no Período
Regencial, criou, em 1835, o Gabinete Topográfico, no intuito de formar
técnicos especializados na abertura de estradas, para possibilitar uma maior
integração da região com outros territórios e centros produtivos. Contudo, o
conflito de interesses de ordem política, sobretudo a oposição partidária, fez
com que o Gabinete fosse fechado três anos depois de sua fundação, com a
subida ao poder dos conservadores.
171
Concretamente, o Gabinete Topográfico pouco realizou, como indica o
discurso do Brigadeiro Tobias, por ocasião de sua nova gestão como
presidente da província (1840-1841), oportunidade em que tentou
restabelecê-lo. Todavia, com dificuldades para o seu pleno funcionamento, o
Gabinete tornou-se alvo das contendas entre liberais e conservadores.
172
A experiência do Gabinete Topográfico, visto como precursor do
ensino técnico de Engenharia, foi assim relatado por AFPS, quando da
inauguração da Escola Politécnica, em 1894:
Instituição tão necessária para o real desenvolvimento do
paiz não podia medrar n’aquelle regimem de ficções e
de enfezada centralização. Por isso, apesar da grande
falta que então se experimentava, de homens práticos,
capazes de bem delinear e executar as estradas,
n’aquella épocha reputadas indispensáveis para a
prosperidade de São Paulo, após extincção daquella
modesta tentativa, que alias já ia produzindo excellentes
fructos, nada mais se ensaiou entre nós d’aquele
gênero.
173
170
o foram poucos os documentos encontrados em que se observaram muitos pedidos e
favores de toda sorte direcionados ao Dr. Paula Souza em sua época de ministério.
171
CAMPOS, Candido Malta. Op. cit., 2002. p.40-1.
172
SÃO PAULO (Província). Discurso Recitado pelo Exmo. Presidente Raphael Tobias de
Aguiar no dia 7 de janeiro de 1841 por occasião da abertura da Assembléia Legislativa da
província de São Paulo. São Paulo: Typographia de Costa Silveira, 1842.
173
PAULA SOUZA, Antonio Francisco. “Sessão de instalação da Escola Polytechnica em 15
de fevereiro de 1894”. In: ESCOLA POLITÉCNICA. Annuario da Escola Polytechnica para o
anno de 1900. Lisboa: Imprensa Nacional, 1900. p.403. (destaques nossos)
83
A modernidade estava, então, à mercê de disputas de grupos de
interesses, posicionamentos e incompatibilidades de propostas. Os liberais
se mostravam os mais entusiasmados em acompanhar e tentar praticar as
tendências mundiais. Isto pode ser explicado pelo seu franco interesse de
descentralização do poder, o que favoreceria o fortalecimento e a autonomia
do poder local, o qual desfrutavam. Os conservadores, por sua vez, temiam a
ampliação dos poderes desse grupo e barravam qualquer tentativa que
representasse ameaça aos seus interesses. Era a política de “enfezada
centralização”, à qual se referiu Paula Souza, vinculado que era, inclusive
historicamente, aos liberais.
O anseio de modernidade perpassava também pelo encaminhamento
de políticas de melhoramentos e saneamento da cidade, em virtude da
crescente urbanização, reclamando um tipo de conhecimento que era
dominado pelos engenheiros.
Foi no tempo de João Teodoro como presidente da Província (1872-
1875) que em São Paulo as questões de habitação, saneamento, transporte,
meios de comunicação, de circulação, obtenção e distribuição de energia e
abastecimento de água, entre outras, ganharam importância.
174
Entre suas
realizações podem-se citar a abertura e o alargamento de ruas e calçadas; a
“substituição de terrenos paludosos e miasmáticos, em frente ao mercado,
por passeios mais aprazíveis e saudáveis”
175
; o embelezamento e recuperação
da segurança do antes “medonho” morro do Carmo; a facilitação da
comunicação entre as regiões da cidade com a regularização do Largo dos
Curros; a arborização de diversas áreas; a construção de pontes, pontilhões
e bueiros; e a regularização do abastecimento de água para algumas regiões,
como o Brás.
174
SÃO PAULO (Província). Relatório apresentado à Assembléia Legislativa Provincial de São
Paulo pelo exmo. sr. dr. João Teodoro Xavier de Matos, presidente da província, no dia 5 de
fevereiro de 1873; Relatório apresentado à Assembléia Legislativa Provincial de o Paulo
pelo presidente da província, o exmo. sr. dr. João Teodoro Xavier de Matos, em 5 de
fevereiro de 1874; Relatório da passagem da presidência ao ilmo. e exmo. sr. monsenhor
Joaquim Manuel Gonçalves de Andrade, digníssimo 5
o
vice-presidente da província de São
Paulo, em 30 de maio de 1875.
175
SÃO PAULO (Província). Relatório apresentado à Assembléia Legislativa Provincial de São
Paulo pelo exmo. sr. dr. João Teodoro Xavier de Matos, presidente da província, no dia 14 de
fevereiro de 1875. São Paulo: Typographia do “Diário”, 1875. p.37.
84
“Dia a dia, para norte, para sul, para leste, para oeste, está
crescendo, está-se alastrando, é o que mais é, está-se aformoseando...”
176
Tal política de modernização dos espaços urbanos justificava-se também por
razões de ordem econômica, afinal, a cidade engrandecida seria atrativa para
proprietários e capitalistas, cujos investimentos produziriam riquezas e
estas, por sua vez, viriam a beneficiar a sociedade como um todo. Iniciativas
como a do “tio Diogo” eram louvadas (imagem 6):
Os homens ricos e abastados procurão comprar casas de
elevado preço na Capital para effectuarem suas
mudanças, ou gozarem por algum tempo das
commodidades que offerece.
Mais que tudo o grande e edificante exemplo da família
Barros (vinda de Itu), em fundar uma importantíssima
fábrica de tecidos (a vapor), prenuncia o desenvolvimento
da industria fabril nesta Cidade; única em que poderá
primar, e com a qual atingirá alto grao de prosperidade
[...].
177
IMAGEM 6 - Fábrica de Diogo Paes de Barros (litografia de Jules Martin).
178
Contudo, o processo de urbanização não trouxe para a cidade
somente os endinheirados barões do café, mas também muitos
comerciantes, imigrantes, trabalhadores de origem rural, em busca de
176
RIBEIRO, Júlio. A Carne. São Paulo: Martin Claret, 2006. p.134.
177
SÃO PAULO (Província). Relatório apresentado à Assembléia Legislativa Provincial de São
Paulo pelo exmo. sr. dr. João Teodoro Xavier de Matos, presidente da província, no dia 14 de
fevereiro de 1875. São Paulo: Typographia do “Diário”, 1875. p.38-9.
178
Fonte: Mappa da Capital da Província de S. Paulo, 1877. Museu Paulista, São Paulo.
85
melhores oportunidades para garantir sua sobrevivência. Por conseguinte,
verificou-se a concentração de grande contingente humano, gerando novos e
agravando antigos problemas sociais, colocando em pauta questões de
intervenção urbanística
179
e de normatização.
Esperava-se, então, que essas intervenções urbanísticas e de
organização dos espaços tivessem também um efeito moralizante:
[...] as vantagens conquistadas em favor da salubridade,
do gozo social, e até da ordem pública e da amenidade
dos costumes, com os melhoramentos e distracções
innocentes, que afastão os homens dos jogos, da
embriaguez, das associações de maledicência para o gozo
de mais suaves interesses [...].
180
Em síntese, a função primordial do engenheiro, naqueles tempos
desejosos de modernidade, resumiu-se ao aprimoramento dos transportes e
vias de comunicação e à preocupação com as questões urbanas. Muitas
vezes, o cumprimento do seu papel significava a participação direta na
política, mas a “boa política”, pois, como se afirmava, sua imposição à
sociedade tinha por base demonstrar a exatidão das soluções científicas:
“Nossa disciplina assenta-se na convicção da justeza das leis científicas que
rege serenamente toda atividade pacífica.”
181
Por isso mesmo, deveriam ser respeitados, pois sua formação lhes
permitia, mais do que qualquer outra, saber qual o meio eficaz para
encaminhar as questões ligadas ao progresso e à modernidade. Sua
participação política era encarada como parte de sua missão, e a omissão
nesse sentido deixava para os inaptos a decisão e o encaminhamento de
questões que seriam de sua alçada, daí a desarmonia da política com as
questões que a sociedade reclamava e necessitava. O engenheiro, então,
imbuído do conhecimento tecnológico, não deveria descuidar dos
179
AZEVEDO, Ricardo Marques. “Uma idéia de metrópole no século XIX”. Revista Brasileira
de História. Vol.18. n
o
35. São Paulo: ANPUH/Marco Zero, 1998.
180
SÃO PAULO (Província). Relatório apresentado à Assembléia Legislativa Provincial de São
Paulo pelo exmo. sr. dr. João Teodoro Xavier de Matos, presidente da província, no dia 14 de
fevereiro de 1875. São Paulo: Typographia do “Diário”, 1875. p.38-9.
181
MARTINS, Egydio. “O papel do engenheiro na sociedade moderna”. Boletim do Instituto de
Engenharia. Vol.XXIX. n
o
142. São Paulo, fev. 1939.
86
compromissos sociais, inteirando-se e atuando no desenvolvimento de
soluções.
Assim, não faltava oportunidade de trabalho para os engenheiros
182
,
que, ao se auto-atribuírem a responsabilidade pela modernização a qual
perpassava também pela reordenação dos espaços e, por conseguinte, pela
reordenação social –, com a devida anuência dos grupos emergentes na
estrutura produtiva, a elite cafeeira, passaram a buscar legitimação também
política
183
desqualificando os intelectuais detentores de outro tipo de
conhecimento, especificamente os bacharéis, que dominavam a vida política
do país desde os tempos da independência.
2.3 - FERROVIAS: ESPECIALIZAÇÃO
Ganham, ganham muito dinheiro, ganham riquezas de
Creso os ingleses e merecem-nas. O progresso
assombroso de São Paulo, a iniciativa industrial paulista
moderno; a rede de vias férreas, que leva vida, o
comércio, a civilização a Botucatu, a São Miguel, a Jau, a
Jaguera, tudo se deve à Saint Paul Road, á Estrada de
Ferro de Santos a Jundiaí. Rule, Bribnnial Hurrah for the
English Rule Brittania! que o nosso governo não
presta para nada!
184
Referindo-se à São Paulo Railway, primeira ferrovia a fazer a ligação
entre o interior do estado e o litoral, o excerto extraído do romance “A carne”,
de Júlio Ribeiro, publicado em 1882, passados aproximadamente 15 anos
da instalação daquela estrada de ferro, expressa o impacto do fenômeno
ferroviário em São Paulo. Síntese da modernidade desejada, as estradas de
ferro, elemento de suma importância no complexo cafeeiro, significavam
antes de tudo progresso econômico.
182
SIMONSEN, Roberto C. Op. cit., 1939.
183
KROPF, Simone Petraglia. “O saber prever, a fim de prover a engenharia de um Brasil
moderno”. In: HERSCHMANN, Micael M.; PEREIRA, Carlos Alberto Messeder (Orgs.). A
invenção do Brasil Moderno: medicina, educação e engenharia nos anos 20-30. Rio de
Janeiro: Rocco, 1994. p.202-23.
184
RIBEIRO, Julio. A Carne. São Paulo: Martin Claret, 2006. p.134.
87
O aperfeiçoamento de caminhos, estradas, portos, enfim, a criação de
vias de comunicação mais eficientes era condição básica para o crescimento
da economia. O processo de escoamento da produção cafeeira, que deveria
partir do interior paulista para o porto de Santos, e de seguir para os
países importadores, era um tanto problemático. Gastava-se muito tempo e
dinheiro, e muitas vezes perdia-se parte da produção no caminho, o que não
estimulava o interesse em ampliar a produção, ainda que o mercado
internacional do café estivesse em ascensão.
O problema com os transportes era velho conhecido; não foi
privilégio unicamente dos tempos do café, nem seus produtores os únicos
prejudicados. O Conselheiro Paula Souza chamava atenção para o problema,
assinalando o prejuízo ao desenvolvimento capitalista:
A abertura de estrada e canais, a canalização dos rios, os
melhoramentos de portos, isto é, a promoção de fácil,
segura e rápida circulação de pessoas e produtos [...] são
deveres cujo cumprimento os agricultores, bem como a
nação, tem direito de exigir de seu governo [...]
Entre nós, porém, quantas vezes se não derranca no
seleiro a maior parte da laboriosa produção de um ano
por falta de consumidores? Vi, nos confins de
Araraquara, em São Paulo, mais de 3.000 alqueires de
milho perdidos porque não havia quem os quizesse nem a
240 rs. o alqueire! Em Piracicaba, alguém vendeu já vinte
e cinco arrobas de açúcar por 800 rs. tal era a falta de
consumo e extração do gênero. O transporte era tão difícil
e caro que matou todo o espírito de especulação
mercantil, fazendo chegar ao mercado por tal preço que a
concorrência era impossível.
185
As estradas de ferro em São Paulo deveriam atender primordialmente
às necessidades da produção cafeeira, sendo parte do complexo de
acumulação de capital no setor. Sem elas, dificilmente poder-se-ia ter
ampliado a produção para o abastecimento dos mercados europeus e norte-
americanos, por ausência de condições de transporte, principalmente
quando seu cultivo passou para a região do “Oeste Paulista”, mais distante
dos portos. Foram as estradas de ferro a alternativa encontrada para a
185
BRASIL. Relatório do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Ministro Dr.
Antonio Francisco de Paula Souza. Rio de Janeiro: Typographia Perseverança, 1866. p.7-21.
88
antiga forma de transporte utilizada até então, as velhas tropas de mulas,
responsáveis pelo comércio e abastecimento da região paulista por muitos
decênios.
Como se diz, o desenvolvimento da economia cafeeira não teria se
dado sem as estradas de ferro.
186
Elas continham em si elementos
fundamentais que proporcionaram o seu crescimento, como a “função
desbravadora” de buscar novos espaços produtivos cada vez mais para o
interior e, portanto, mais distantes dos portos, demandando uma rede
eficiente e econômica de transporte, inviável pelos meios tradicionais o
transporte de muares. Problema prontamente resolvido com a expansão das
redes de trilhos, resultando também num aumento significativo da
produção, pois, com o encurtamento das distâncias, as perdas ao longo do
transporte também diminuíram.
187
Portanto, quando se faz referência à economia cafeeira, deve-se
entendê-la num sentido ampliado, compreendendo, além da produção
agrícola em si, toda a rede de investimentos de capital do setor, envolvendo
empresas associativas nacionais e estrangeiras de exploração de estradas de
ferro, na nascente industrialização, e do setor de serviços oriundos da
urbanização, bem como a dinamização do comércio interno e do sistema
bancário.
Alguns esforços anteriores foram canalizados para o empreendimento
ferroviário; porém, até 1850, os planos ferroviários nunca avançaram ou
concretizaram-se efetivamente. Era a fase ferroviária de “tentativas e
erros”
188
, quando, em 1835, Feijó tentou constituir um plano ferroviário que
ligaria o país de norte a sul, e também quando, em 1836, a Assembléia
Provincial de o Paulo estudou um plano ferroviário combinando canais
fluviais, rodovias e estradas de ferro, chegando a conceder, em 1838, o
186
SILVA, Sérgio. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. São Paulo: Alfa -
Omega, 1985. p.56.
187
CANO, Wilson. Raízes da Concentração Industrial no Brasil. Rio de Janeiro/ São Paulo:
Difel, 1977. p.33-4. Segundo o mesmo autor, os gastos com transporte do café no período
depois das ferrovias diminuíram cerca de 20%.
188
PINTO, Adolpho Augusto. História da viação pública de São Paulo. São Paulo: Governo do
Estado, 1977.
89
privilégio de realizar esse complexo à firma Aguiar, Viúva, Filhos & Cia. e à
Platt e Reid.
189
Em 1839, o inglês Thomas Cockrane solicitou, com base na lei de
1835, a “Lei Feijó”, o direito para a construção de uma estrada de ferro
ligando o Rio de Janeiro até o Vale do Paraíba, mas tal iniciativa também
fracassou. Contudo, essa fase inicial de insucessos nas iniciativas serviu
para se compreender que seria necessário muito mais que angariar apenas
capitais para a concretização dos projetos ferroviários.
190
Mais precisamente em 1852, com a lei n
o
641, teve início a fase na
qual efetivamente foram postos em prática projetos de criação de uma rede
ferroviária. A primeira estrada de ferro do Brasil foi inaugurada no ano de
1854, construída por Irineu Evangelista de Souza, o Visconde de Mauá
(1813-1889). Todavia, a prioridade na construção das estradas de ferro era
atender ao setor cafeeiro, e foi o engenheiro Christiano Benedito Ottoni,
nomeado presidente da recém-criada Companhia Estradas de Ferro D. Pedro
II, quem esboçou as premissas para a organização de uma política de
transporte, premissas estas que seriam levadas a efeito nos anos
subseqüentes.
191
A D. Pedro II atendia à produção do café no Vale do
Paraíba, estendendo-se até o norte de São Paulo e chegando a partes do
sudeste de Minas Gerais e do Rio de Janeiro.
Por sua vez, a Santos-Jundiaí, inaugurada em 1867, fruto do
investimento de capital inglês, marcou o início da febre das ferrovias em São
Paulo, convertendo-se em marco no desbravamento do oeste paulista.
192
A
São Paulo Railway, ou “a inglesa”, como ficara conhecida, foi uma das mais
189
VEIGA, Tânia Gerbi. Trem, Terra e Trabalho: a São Paulo Railway. Dissertação (Mestrado
em História), PUC/SP, 1991. p.16-8.
190
“Vias de Comunicação”. In: ELLIS, Myriam [et. al.]. O Brasil Monárquico, tomo II: declínio
e queda do Império. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p.42-57.
191
KATINSKY, Júlio Roberto. “Ferrovias Nacionais”. In: MOTOYAMA, Shozo (Org.).
Tecnologia e industrialização no Brasil: uma perspectiva histórica. São Paulo: Editora da
UNESP, Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, 1994. p.39.
192
Foi concedida em 1856 a autorização ao Marquês de Monte Alegre, ao Conselheiro
Pimenta Bueno e ao Barão de Mauá; no exterior, uma companhia estava disposta a assumir
todos os encargos para a construção de uma estrada de ferro que transpusesse a grande
muralha que separava o planalto do litoral, o que favoreceu a organização em Londres da
São Paulo Railway, começando em 1860 sua efetiva concretização. Sabia-se que tal percurso
seria altamente lucrativo, uma vez que esta barreira era velha conhecida dos paulistas e
representava a grande dificuldade de comunicação e transporte. “Vias de Comunicação”. In:
ELLIS, Myriam [et.al.]. Op. cit., 1997. p.42-57.
90
rentáveis companhias de estradas de ferro do Brasil, isto porque durante
muito tempo deteve o monopólio do caminho que chegava a Santos, o que
significava que praticamente toda a produção cafeeira do interior, ou mesmo
produtos de abastecimento, tinha de percorrer os seus trilhos.
Em pouco tempo, as vias férreas avançaram por quase todo o
território paulista e Jundiaí tornou-se importante zona de entroncamento
ferroviário no interior da província. Em 1872, saíam de Jundiaí três grandes
ferrovias, a Paulista, a Ituana e a Mogiana. No final do Império, São Paulo
contava com 2.425 quilômetros de vias férreas instaladas, o que
representava aproximadamente 24,3% das ferrovias existentes no Brasil.
193
Assim, em pouco tempo, o grande problema para a expansão da
cafeicultura, os transportes, parecia estar solucionado é claro que o lombo
das mulas não foi prontamente inutilizado, que ainda era útil ao
transporte da produção até as estações das estradas de ferro –, e ainda os
custos e o tempo para escoar a produção foram reduzidos drasticamente.
194
Para além da questão utilitária das estradas de ferro, elas também
tinham um significado simbólico na representação das elites, uma vez que,
com exceção da Companhia Railway, todas as companhias de estradas de
ferro paulistas foram financiadas pelo capital dos produtores de café.
Exemplar é o caso da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, a Paulista,
fundada, em 1868, sob os esforços de Saldanha Marinho, então presidente
da Província de São Paulo e entusiasta das ferrovias.
A Paulista foi a primeira companhia ferroviária de São Paulo que
nasceu sob os auspícios do capital regional, ou seja, sob os auspícios da
nascente elite do café, nela figurando personalidades como os Barões de
Itapetininga, de Limeira, de Piracicaba, de Cascalho, de Tietê, de Atibaia, de
Souza Queiroz, de São João do Rio Claro, de Antonina e de Itatiba; os
Viscondes de Vergueiro e de Indaiatuba; e ainda Martinho Prado, Luiz
193
SAES, F. A. M. de. As ferrovias de São Paulo - 1870-1940: expansão e declínio do
transporte ferroviário em São Paulo. São Paulo: Hucitec; Brasília: INL, 1981. p.24.
194
LOVE, Joseph. A Locomotiva: São Paulo na federação brasileira - 1889-1937. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1982. p.23-4.
91
Antonio de Souza Barros, os irmãos Souza Aranha, Antonio Pompeu
de Camargo, Floriano de Camargo Penteado, entre outros.
195
Os principais acionistas das Companhias de Estradas de Ferro foram
reconhecidos por seu caráter arrojado e empreendedor, demonstrado ao
fazerem da construção das vias férreas mais um mecanismo de ampliação de
seus capitais. Desapegados dos valores tradicionais, tornaram-se símbolo da
prosperidade, civilização e modernidade.
A viabilização dos projetos das estradas requeria mão-de-obra
especializada e, nos primeiros anos, ficou a cargo de profissionais
estrangeiros. Também a técnica para tal viabilização fora importada,
especificamente da Inglaterra, Estados Unidos, França e Alemanha.
196
Os
nacionais ficaram incumbidos somente de uma parte do processo,
cumprindo etapas como o reconhecimento do terreno e o levantamento dos
possíveis traçados. Contudo, quando do retorno do agora engenheiro Paula
Souza ao Brasil, a participação de brasileiros nas obras de Engenharia era
mais recorrente.
Pouco tempo antes de completarem seus estudos, antes do regresso
às terras brasileiras, os jovens irmãos Antonio e Francisco foram
surpreendidos pela notícia da morte do pai. D. Maria Raphaela escreveu ao
filho mais velho prescrevendo orientações e relatando como encaminharia
sua vida até o retorno dos filhos:
No maior pesar escrevo esta contando-vos da morte de
vosso sempre honrado [sic] Pay: Nosso Senhor Deus
tirou-me no dia 18 as 10 ½ da noite, quando mais vosso
Pay fazia falta no mundo, primeiro por mim e vossos
todos e depois para nossa província porque vosso Pay já
valia alguma coiza.
[?] o que me resta agora, se não vossos que já estão
grandes, conclui todos vossos estudos assim como era o
desejo de vosso Pay. Para virdes cuidar em vossa May e
irmãos pequenos...
197
195
MATOS, Odilon Nogueira de. Café e ferrovias: a evolução ferroviária de São Paulo e o
desenvolvimento da cultura cafeeira. São Paulo: Arquivo do Estado, 1981. p.78-81.
196
NAGAMINI, Marilda. Op. cit., 1994. p.131-61.
197
Carta de D. Maria Raphaela Paula Souza para o filho Antonio. Arquivo Paula Souza - PS.
866.11, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
92
As orientações eram permanecer na Europa e terminar os estudos.
Enquanto isso, a família amparar-se-ia junto ao tio Raphael
198
, na espera do
retorno dos dois jovens, principalmente do mais velho, que haveria de tomar
a responsabilidade paterna de dirigir a família.
IMAGEM 7 - Rafael Tobias de Barros, Barão de Piracicaba II.
199
O refúgio de Dona Maria Raphaela junto ao irmão revela antes a
necessidade de amparo afetivo, mas também a precisão de auxílio para a
resolução de questões de ordem prática, como a permanência dos filhos
estudando fora e os cuidados com o inventário do marido falecido. Mas a
matriarca também não deixou de receber ajuda financeira do pai para
custear o término dos estudos e o retorno dos filhos da Europa; dele também
198
Raphael Tobias Paes de Barros (1830-1898), irmão de D. Maria Raphaela, fora o segundo
Barão de Piracicaba. Recebeu este nome em homenagem ao seu tio e padrinho Raphael
Tobias de Aguiar. Raphael casou-se em primeiras núpcias com a prima Leonarda de Aguiar
Barros, filha do tio Bento Paes de Barros, o Barão de Itu. Em segundas núpcias casou-se
com Joaquina de Melo Oliveira, filha de Estanislau de Oliveira (1803-1884), antes Barão de
Araraquara e depois Visconde do Rio Claro. Sua filha Sophia Paes de Barros casou-se com
Washington Luís Pereira de Souza, o futuro presidente nos tempos republicanos.
O sítio de sua propriedade a que Dona Maria Raphaela se refere era provavelmente a
“Fazenda Santo Antonio”, em Rio Claro, onde sua casa até hoje encontra-se preservada e faz
parte do roteiro turístico da cidade, sendo conhecida como “Solar Edmundo Navarro de
Andrade”. Desde a sua venda, em 1916, para a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, o
lugar tornou-se residência de Edmundo Navarro de Andrade (1881-1941), cientista
contratado pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro do Estado de São Paulo, em
1904, para encontrar a espécie florestal que melhor se prestaria ao fornecimento de carvão
para as locomotivas e de madeira para os dormentes das ferrovias. Sobre Edmundo Navarro
de Andrade, ver: MARTINI, Augusto Jerônimo. O plantador de eucaliptos: a questão da
preservação florestal no Brasil e o resgate documental do legado de Edmundo Navarro de
Andrade. Dissertação (Mestrado em História Social), FFLCH, USP, 2004.
199
Fonte: MOTTA, Heloísa Alves de Lima. Uma menina paulista. o Paulo: Totalidade
Editora, 1992.
93
recebeu as terras de Rio Claro, para onde, posteriormente, foi viver com os
filhos.
O irmão do Dr. Paula Souza, o tio João Francisco de Paula Souza,
escreveu aos sobrinhos relatando mais detalhadamente a doença que
vitimara o Conselheiro:
Hes homem de [?] tempera e estirpe, por isso não julgo
necessário preparar-te com vulgares preâmbulos por dar-
te uma muito triste e mal novas, cuja comissão assumi
[sic] [...]
dois dias falleceu teu pae, victima de uma curta mas
terrível enfermidade, que durou uns nove dias:
inflammação central agudíssima ou meningo
encephalite.
200
Ao que tudo indica, a doença que vitimou o Dr. Paula Souza foi
meningite, que, segundo o relato de D. Maria Raphaela, teria causado a
morte de muitas pessoas na época. Mas, segundo o tio, também teriam
exaurido as forças do Conselheiro os aborrecimentos, o sentimento de
impotência e as decepções decorrentes do cargo político que ocupava:
Extenuado pelas longas fadigas e insanos trabalhos que
uma organização administrativa ás partes
ministeriais; desgostoso, desiludido dos homens, dos
amigos políticos; fatigado de lutar com inimigos e amigos
ambiciosos e sem patriotismo; enojado de avistar-se com
as chagas quase incuráveis [sic] de nossa sociedade,
recolheu-se aos lares a procurar um repouso de que
tanto carecia. Era tarde. As forças destruidoras,
apenas contidas por uma vontade de ferro, tomarão conta
daquelle corpo e o precipitou ao seu tumulo.
201
Na mesma carta, o tio relatava ainda os acontecimentos que
cercaram os últimos dias do Conselheiro e as condições em que se
encontrava D. Maria Raphaela fragilizada também pelo parto do último
filho. Por fim, orientava os jovens a terminarem os estudos para depois
retornarem ao Brasil.
200
Carta de João Francisco de Paula Souza ao sobrinho Antonio. Itu, 20/11/1866. Arquivo
Paula Souza - PS. 866.11.20, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
201
Carta de João Francisco de Paula Souza ao sobrinho Antonio. Itu, 20/11/1866. Arquivo
Paula Souza - PS. 866.11.20, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
94
Tua mai está prostrada, mas cônscia de seus deveres.
Sabe que tem filhos menores, por quem é indispensável
[...] A vontade decisiva de tua Mai é que fiques ahi até
completares teus estudos, por isso se receberes esta
antes da sua, não dês um passo, sem estares prevenido
de sua resolução. Isto é positivo: toda acção em contrario
lhe seria penosa.
Adeus. Abraço-te com verdadeira affeição e cheio de
magoa. Sabe que tens em nós teus tios paternos
verdadeiros amigos. Mais tarde terás mais detalhes por
que todos te escreverão. Adeus ainda uma vez e fica certo
do amor cordial de
Teu tio e amigo
João de Paula
PS Teu mano igualmente não deve tomar resolução
alguma
sem nova ordem.
202
Os planos traçados pelo pai para depois que Antonio concluísse seu
curso previam viagem para a Europa e os Estados Unidos, a fim de exercer a
profissão e adquirir experiência:
Quando pretendeis fazer vossos exames? Que titulo vos
vos darão elles. Quando sejais aprovado? Tenho prazer
que saihais, e tenhais documento d’isso; mas não tenho
por que voutais; aprendis mais. Estimaria entretanto
poder collocar-vos aqui como praticante (sem vencimento)
em qualquer das obras, que tenho em mãos para
adquirirdes pratica e depois d’ella poder aproveitar
uma viagem de instrução pelos Estados Unidos e
Europa. Sahir da eschola e viajar sem ter passado
pelas sendas [?] da pratica me parece, ser cousa sem
vantagem. Tenho aqui impregados moços [?], que tem
títulos, saber, mas que olhão para os instrumentos e o
campo, e não sabem como lavrar-se [sic], estão chucros
que he uma desgraça: um d’elles esteve alias 3 annos na
Inglaterra com um engenheiro de nota; e pratico em
differentes trabalhos. Mas sem titulo legal e legalisado
[...].
203
O título sem a prática, ou a prática sem o título, não tinha muita
serventia, segundo o Dr. Souza. Por isso, em suas missivas ao filho, sempre
insistia na obtenção do título, mas enfatizava também a importância dos
202
Carta de João Francisco de Paula Souza ao sobrinho Antonio. Itu, 20/11/1866. Arquivo
Paula Souza - PS. 866.11.20, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
203
Carta ao filho Antonio. 24/05/1866. Arquivo Paula Souza - PS. 05.24/1, Biblioteca
Mário de Andrade, São Paulo.
95
exercícios práticos. Ademais, demonstrava satisfação quando o filho relatava
as atividades práticas da escola de Engenharia ou quando contava sobre as
viagens e observações que costumava fazer nos tempos de descanso dos
estudos. As viagens, estimuladas pelo pai, eram entendidas para além do
exercício da engenharia prática, figurando elemento útil de ilustração,
modelação e amadurecimento do caráter.
Todavia, os últimos acontecimentos abortaram seus planos, mas,
seguindo as orientações da mãe e do tio, Antonio terminou os estudos.
Quanto ao seu irmão Francisco, tudo indica que não se formou.
Em 1867, então formado, AFPS retornou à terra pátria, na
companhia de um amigo, membro do “Corpo Rhenania”, o engenheiro suíço
Sr. Richmann, que desejava trabalhar no Brasil. Richmann achou logo uma
boa colocação na Estrada de Ferro Paulista, mas faleceu poucos anos
depois, em Campinas, vítima de febre amarela.
No Brasil, Paula Souza foi viver com sua família, que estava residindo
na fazenda Santa Gertrudes
204
cedida pelo avô, o Barão de Piracicaba, para
a filha Maria Raphaela –, em Rio Claro, onde sua mãe, com a ajuda do irmão
Raphael, do primo Bento e sempre amparada pelo pai, tocava os negócios do
café.
205
Em 1868, foi convidado pelo então presidente da província, o liberal
Saldanha Marinho (1867-8), a ocupar o cargo de inspetor da recém-criada
Repartição de Obras Públicas da Província, que, no entanto, logo foi
dissolvida, em decorrência da volta dos conservadores ao poder.
204
A referência à ida da família para Rio Claro, na fazenda Santa Gertrudes, encontra-se
nas biografias de Paula Souza; contudo, algumas dúvidas pairam sobre a referida fazenda. A
fazenda Santa Gertrudes existe ainda hoje e preservada, tomando parte no rol das antigas
fazendas de café de o Paulo, famosa por seus espaços serem freqüentemente utilizados
como cenários em novelas de época. Em seu histórico não foram encontrados nomes ligados
à família Paula Souza ou Paes de Barros. Ver: FAZENDA SANTA GERTRUDES. Disponível
em: <www.fazendasantagertrudes. com.br>. Acesso em: 10/08/08.
No entanto, o nome dos Paes de Barros está vinculado à história da cidade de Rio Claro. O
barão de Piracicaba, Antonio Paes de Barros, fazia parte do grupo dos “homens bons” do
lugar, entre eles o Capitão Manoel Paes D’Arruda, o Capitão-mor Estevam Cardoso de
Negreiros, Joaquim José de Andrade e Nicolau Pereira Campos Vergueiro. Esse grupo
organizou-se numa “Sociedade do Bem Comum”, a fim de tratar dos interesses da região,
então chamada São João Batista do Rio Claro, pertencente à Vila de Constituição (depois
Piracicaba), por volta de 1832. Foi a partir das ações de tal grupo que a estrutura de poder e
política da localidade foi assentada.
SANTOS, Fábio Alexandre dos. Rio Claro: uma cidade em transformação. o Paulo:
Annablume, 2000. p.26-7.
205
Carta de D. Maria Raphaela. Arquivo Paula Souza - PS. 868.07.03, Biblioteca Mário de
Andrade, São Paulo.
96
Durante o período em que a Repartição sobreviveu, Paula Souza
empreendeu viagem percorrendo as principais estradas do território paulista
e traçando planos de melhoramentos, os quais não pôde levar a efeito em
razão da queda do governo liberal. Diz-se que chegou a abrir mão de seus
honorários para prover de recursos a Repartição, então desprovida:
206
Mas em que desordem achou elle esta repartição! Não
podia obter dados sobre as obras feitas e á fazer; não
existia quota para a compra dos instrumentos mais
indispensáveis. Como não era possível trabalhar assim,
elle propôz desistir da sua gratificação de 1:000$000 para
empregar esta quantia na compra dos instrumentos mais
necessários. Foi aceita esta dádiva pelo Sr. Vice-
Presidente. Antonio F. de Paula Souza iniciou então uma
longa e penosa viagem, sahindo do Rio de Janeiro,
passando em todas as cidades do Norte, Lorena,
Pindamonhangaba até chegar a S. Paulo, vindo assim a
conhecer o estado das estradas, pontes até d’aquella
zona, luctando com difficuldades de toda espécie, mas
com esperança de poder melhorar este estado de cousas
na província.
Mas antes de ter estado 4 mezes n’esta repartição,
tendo cahido o governo liberal, despedio-se tendo tido
prejuízos materiais e desgostos pelas difficuldades que
surgiam de toda parte, como falta de pessoal,
vontade, etc.
207
Experimentadas as primeiras vicissitudes da política, pôde sentir o
que seu pai antes relatava em seus escritos. Decidiu então retomar o projeto
adiado de viajar para os Estados Unidos e embarcou no vapor Mississipi, em
20 de abril de 1869, com destino aos Estados Unidos. Dos Estados Unidos
partiu, em abril de 1870, para a Europa, seguindo para a Suíça e depois
para Baden-Baden, onde retomou o namoro com Ada Virginie Herwegh
(1849-1921), nascida em Paris, onde estavam exilados seus pais, os
revolucionários Georg Herwegh (1817-1875), poeta suíço, e Ema Siegmund
Herwegh.
208
206
AZEVEDO, Ramos de (Coord.). “Notas Biográficas”. Revista Polytechnica. São Paulo:
Seção de Obras do Estado de São Paulo, N. extraordinário, 13 de abril de 1918, p.5.
207
Biografia Manuscrita do Engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza. Arquivo Paula
Souza - PS. Ca.18/1, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
208
George Herwegh e Ema Siegmund tiveram participação ativa nos acontecimentos de
1848 na Europa. Sua forma de pensar e viver os obrigou a viver a maior parte de suas vidas
no exílio. Foram amigos de Mikail Bakunin (testemunha de casamento do casal, em 1843),
97
Paula Souza havia conhecido a família Herwegh ainda nos tempos de
estudante, na Europa, por intermédio de Horace Herwegh também
estudante de Engenharia em Carlsruhe e membro da Rhenania –, que o teria
levado para conhecer sua família em Baden-Baden.
209
Depois de dois meses de noivado, em 22 de junho de 1870, Paula
Souza casou-se com Ada Virginie, na Suíça, numa cerimônia “pura, simples
e romântica” realizada por um padre “bem liberal”.
210
Após uma pequena
viagem de núpcias por algumas cidades da Europa, os noivos decidiram
voltar ao Brasil, mas a declaração da Guerra Franco-Prussiana (1870-1871)
os surpreendeu quando se encontravam em Veneza, interrompendo sua
viagem e obrigando-os a voltar com muita dificuldade a Baden-Baden, onde
tiveram de permanecer até o fim do ano, para esperar os recursos do Brasil
necessários ao retorno. Partiram, então, no vapor “Laplace”, chegando no
final de janeiro de 1871 ao Rio de Janeiro e em fevereiro à fazenda de D.
Maria Raphaela, em Rio Claro.
211
Com seu retorno para o Brasil, teve início uma nova fase de sua vida
pessoal e profissional. Paula Souza ingressou efetivamente na carreira de
engenheiro, certamente favorecido por suas ligações familiares, dedicando-se
ao setor ferroviário, conforme as previsões de seu pai. Após um curto período
de refazimento, em julho do mesmo ano de seu retorno da Europa, seu avô
materno, Antonio Paes de Barros, o I Barão de Piracicaba, o encarregou da
Bruno Bauer, Ludwig Feuerbach, Henrique Heine, Victor Hugo, Ferdinand Lassalle, Franz
Lizt, Felice Orsini, Francesco De Sanctis, Iwan Turgenjew, Richard Wagner, Friedrich Engels
e Karl Marx, de quem George fora amigo próximo e com quem mantivera ativa
correspondência. Ver: PADILHA, Ângelo Fernando; PADILHA, Rodrigo Bastos. Antonio
Francisco de Paula Souza (1843-1917): o mais antigo estudante brasileiro em Karlsruhe.
Disponível em: <www.aaa.uni-karlsruhe.de/ download/PaulaSouzaoriginaltex.doc>. Acesso
em: 25/01/2005.
Sobre a correspondência entre o poeta e Marx, ver exemplo em: MARXISTS INTERNET
ARCHIVE. Disponível em: <www.marxistsfr.org/archive/marx/works/1847/letters/
47_08_08.htm>. Acesso em 03/08/2008.
209
“[...] Chegamos hoje de Baden-Baden, para onde fomos hontem a tarde para as carreiras.
[...] Baden-Baden é muito bonito: é cercada de montanhas bem altas que prestão a passeios
bem agradáveis [...].Carta de Antonio para o pai. Carlsruhe, 06/09/1864. Arquivo Paula
Souza - PS. 864.09.06, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
“[...] Agora esta meu mano fazendo viagem na Suissa, porque elle tem dois mesez de férias
[...]. Carta de Francisco aos pais. 19/08/1862. Arquivo Paula Souza - PS. 862 08.19,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
210
Diário pessoal de Antonio Francisco de Paula Souza. Arquivo Paula Souza - PS. 868,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
211
Biografia Manuscrita do Engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza. Arquivo Paula
Souza - PS. Ca.18/1, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
98
exploração de território para a construção de uma linha férrea que,
passando por Porto Feliz, ligaria Itu a Piracicaba.
Poucos meses depois, foi convidado com muita insistência para ser
engenheiro-chefe da estrada de ferro Ituana, então em construção, cargo que
deixou pouco antes de a obra ser concluída. Em 1872, mudou-se para o
Paulo, onde fixou residência na Rua Boa Vista – local onde ocorreram muitas
reuniões de republicanos ilustres e abolicionistas, merecendo destaque Luiz
Gama, entre outros –, e imediatamente foi nomeado árbitro da Companhia
Paulista, função em que deveria mediar as relações entre a empresa e os
empreiteiros desta linha, encarregando-se também das medições finais do
trecho de Jundiaí até Campinas.
No ano de 1873, foi designado engenheiro da secção da Estrada de
Ferro de Campinas, em Rio Claro, cujo chefe era Antonio Rebouças. Teve,
então, de se mudar para aquela cidade, onde permaneceu até a conclusão e
inauguração da linha.
Ao assistir à Exposição Universal de Paris, no ano de 1878, cujo tema
foi “Agricultura, Artes e Indústria”
212
, empolgou-se com o Decauville, sistema
de caminho de ferro de via estreita (bitola de 40 a 60 centímetros), novidade
útil para o transporte dos produtos das fazendas brasileiras. Paula Souza
tornou-se representante desse sistema no Brasil, trazendo para a
inovação em 1878. Nesse mesmo ano, estabeleceu-se em Campinas, onde
abriu escritório em sociedade com o engenheiro Bernardo Morelli, a fim de
comercializar os tais trilhos. Neste ínterim, contatou o escritório de Bento
Tomás Viana, em Santos, para viabilizar a entrada dos materiais por
intermédio do porto daquela cidade.
213
212
FRANCE. Ministère de l'agriculture et du commerce. Exposition universelle de 1878 a
Paris. Paris: Imprimerie nationale, 1880-1884. Disponível em: <http:// cnum.cnam.fr>.
Acesso em: 12/10/2008. Nesse site encontram-se relatórios do júri internacional sobre os
trabalhos expostos.
213
No arquivo do engenheiro Paula Souza, existe uma farta correspondência de Bento
Tomás Viana, o que contribuiu para entender o funcionamento do negócio, a demanda das
mercadorias importadas e ainda projetar a lucratividade, mas também os prejuízos, como
indica a carta transcrita a seguir:
“Ao seu favor de 21 do corrente esperando conhecimento por 176 volumes de s/c vindos do
(?) por vapor ‘Rivadavia’, respondo, devolvendo-lhe dito conhecimento e nota para o
despacho dos referidos volumes, por que infelizmente, o vapor que os conduzia, naufragou
em (?) perdendo-se toda a carga e sobrando-se apenas a tripulação. Deste naufrágio, há
99
Nesse período, fizeram medições em muitas fazendas, e em diversas
Paula Souza e seu sócio introduziram os trilhos Decauville. Entre outros
serviços de engenharia oferecidos pelo seu escritório, a venda dos
“Portadores Decauville” talvez tenha sido o mais significativo.
Estrategicamente estabelecido em Campinas, uma espécie de “centro
catalisador” do Oeste Paulista, o escritório alcançou êxito, pois os
fazendeiros daquela região tornaram-se grandes compradores do seu
produto, haja vista que a novidade tornava mais eficiente o transporte de
gêneros agrícolas, principalmente do café:
Estimaria muito que me viessem logo os trilhos para
começar a usá-los e fazer vir as [?] sua grande vantagem
para que esta não as ponha de lado e continua a fazer
todo o serviço de café no terreiro, na cabeça como
geralmente se usa [...].
214
Tratava-se de uma espécie de trilho portátil, criado por Paul
Decauville (1846-1922), formado por componentes pré-fabricados e que
podiam ser deslocados e encaixados facilmente. Portanto, trabalhadores sem
qualificações especiais poderiam executar sua montagem.
IMAGEM 8 - Trilho Decauville.
215
dias, se teve conhecimento por telegramas, restando apenas saber-se dos pormenores. Sou
com estima.”
Santos, 25 de setembro de 1880. Arquivo Paula Souza - PS. 880.09.25, Biblioteca Mário de
Andrade, São Paulo.
214
Carta do tio Antonio Paes de Barros, o segundo Barão de Piracicaba. Pirassununga,
24/07/1881. Arquivo Paula Souza - PS. 881.07.24, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
215
Fonte: DECAUVILLE MUSEUM. Disponível em: <www.decauville.nl>.
100
Reduzindo os custos da implantação de caminhos de ferro, pela
facilidade da sua instalação, os trilhos Decauville popularizaram-se entre os
produtores agrícolas, mas também foram úteis aos setores minerador e
industrial, como também no transporte de passageiros. A imagem exibida a
seguir oferece uma idéia do seu funcionamento no transporte de produtos:
IMAGEM 9 - Portador Decauville.
216
Nesse período, a lucratividade de seu negócio, pelo menos enquanto o
Decauville fora novidade, não deve ter sido pequena. Pressupõe-se que tenha
vendido o inusitado produto para sua vasta parentela que, conforme indica
a documentação analisada, foi grande, se não única, apreciadora da
novidade –, o que já permite imaginar que teve um ganho razoável.
Conforme revelam as anotações de AFPS, estavam entre seus clientes
o Dr. Antonio Francisco de Aguiar Barros, João Tobias de Aguiar, João de
Paula Souza, Comendador Luiz Antonio Souza Barros
217
, além de Antonio
Paes de Barros e da Baronesa de Limeira, Dona Francisca de Paula Souza.
218
Nessa época, o referido engenheiro se correspondia freqüentemente com seu
216
Fonte: DECAUVILLE MUSEUM. Disponível em: <www.decauville.nl>.
217
Arquivo Paula Souza - PS. 881.09.18, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
218
Carta do primo Antonio Francisco de Aguiar Barros. São Paulo, 14/03/1881. Arquivo
Paula Souza - PS. 881.03.14/2, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
Lembrança das encomendas feitas por João Tobias. Arquivo Paula Souza - PS. 881.06.16/1,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
Carta enviada pelo engenheiro para Dr. Luiz de Souza Barros. Rio Claro, 29/07/1881.
Arquivo Paula Souza - PS. 881.07.29/2, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
Carta do tio Antonio Paes de Barros. Arquivo Paula Souza - PS. 881.04.09, Biblioteca Mário
de Andrade, São Paulo.
Arquivo Paula Souza - PS. 881.04.13, PS. 881.06.16/2, PS. 881.07.24, PS. 881.08.22 e PS.
881.10.29/2, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
101
primo Rafael Tobias de Aguiar, que parecia participar de seus negócios,
fazendo remessas de encomendas, de dinheiro recebido e pagamentos.
219
Essa nova fase da vida de Paula Souza foi de muito trabalho. Além de
vender os trilhos Decauville, também desenvolvia, ainda em Campinas,
estudos sobre a implantação de bondes, tendo sido contratado por Francisco
Bueno de Miranda para planejar a disposição dos trilhos que passariam por
sua propriedade.
220
Também era chamado para atuar como agrimensor, ou
seja, para fazer medições e demarcações de propriedades agrícolas, trabalho
que teve de dispensar muitas vezes, em razão do seu elevado número de
afazeres, ou indicar a outro colega, como seu sócio, Bernardo Morelli:
[...] agora estou além de outros trabalhos, muito ocupado
com a construção da Estrada de Ferro do Rio Claro à S.
Carlos do Pinhal e não me é portanto possível ir
satisfazer seus desejos. No entanto posso participar à V.
S. que meo ex-socio d’escriptório o Dr. Morelli é muito
apto para semelhantes trabalhos e que sem duvida elle
irá fazer esse serviço com toda a rapidez e presteza como
se eu fizer, V.S. o convidar [...].
221
Na supracitada missiva, Paula Souza referia-se ainda ao trabalho que
assumira na construção da Estrada de Ferro de Rio Claro a São Carlos do
Pinhal, obra em que ocupava o cargo de engenheiro-chefe, atendendo ao
convite do Barão do Pinhal, Antonio Carlos de Arruda Botelho (1827-1901).
Participou da construção desta estrada e ficou até a inauguração, mas não
aceitou o convite de continuar depois como Inspetor Geral, deixando a
indicação de Andrew Schmidt, chefe do escritório desta linha.
Em seguida, voltou por pouco tempo a Campinas. Em 1886, foi para
Itu cuidar do abastecimento de água da cidade, trabalho que concluiu em
1888. Assumiu então o cargo de Inspetor da Ituana, que reorganizou
completamente.
219
Arquivo Paula Souza - PS. 881.09.18, PS. 881.03.14/2, PS. 881.06.25, Biblioteca Mário
de Andrade, São Paulo.
220
Carta de Paula Souza para Francisco Bueno de Miranda. Arquivo Paula Souza - PS.
881.08.28, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
221
Carta de Francisco Godoy Moreira. Campinas, 08/06/1881. Resposta de AFPS. Rio
Claro, 09/06/1881. Arquivo Paula Souza - PS. 881.06.08, Biblioteca Mário de Andrade, São
Paulo.
102
Nessa temporada que passou em Campinas, Paula Souza estabeleceu
amizade com Francisco de Paula Ramos de Azevedo (1851-1928), com quem
manteve uma ampla correspondência, mesmo depois da mudança de ambos
para São Paulo.
222
Desenvolveram alguns projetos juntos, entre os quais a
reforma da Igreja Matriz de Itu.
quem afirme que o projeto do prédio da Escola Normal de São
Paulo teria saído do punho de AFPS. Mas, ao que se sabe, o projeto inclui-se
entre as principais obras de Ramos de Azevedo. Contudo, supõe-se também
que este arquiteto tenha trabalhado em conjunto com o engenheiro, ou
mesmo que ambos tenham discutido sobre alguns aspectos do projeto, como
ocorrera em outros trabalhos, mas a sua execução e formalização teriam
ficado a cargo de Ramos de Azevedo
223
:
Visões convergentes, Paula Souza e Ramos de Azevedo
teriam oportunidade de complementar o trabalho um do
outro não apenas neste projeto arquitetônico, como em
outros que fazem confundir e entrecruzar suas vidas e a
história da engenharia e arquitetura em São Paulo.
224
Polêmicas à parte, foi desta maneira, no setor ferroviário inicialmente,
depois na área de construção, que Antonio Francisco de Paula Souza
inseriu-se no mercado de trabalho e passou a construir sua experiência na
engenharia paulista. Com projeção nacional, ganhou notoriedade.
Assim, o reconhecimento de sua competência profissional, associado
à tradição familiar, lhe deu condições para ingressar também na vida
política.
222
No arquivo do engenheiro encontra-se um razoável mero de cartas remetidas pelo
referido arquiteto entre os anos de 1885 e 1895.
223
Ver: LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. Ramos de Azevedo e seu escritório técnico. São
Paulo: Editora PINI, 1998. Vale a pena conferir também a exposição virtual sobre Ramos de
Azevedo no site da Escola Politécnica: <http://www.poli.usp.br/
Organizacao/Historia/ramosazevedo/index.html>.
224
CARVALHO, Maria Cristina Wolff de Carvalho. A arquitetura de Ramos de Azevedo. Tese
(Doutorado em História da Arquitetura), São Paulo, FAUUSP, 1996. p.162.
103
2.4 - MUDANÇA DE HABITUS
[...] compraria um terreno grande em um bairro
aristocrático, na Rua Alegre, em Santa Efigênia, no Chá,
construiria um palacete elegante, gracioso, rendilhado, à
oriental, que sobressaísse que levasse de vencida esses
barracões de tijolos, esses monstrengos impossíveis que
por aí avultam, chatos, extravagantes, à fazendeira, à
cosmopolita, sem higiene, sem arquitetura, sem gosto.
Fá-lo-ia sob a direção de Ramos de Azevedo, tomaria para
decoradores e ornamentistas Aurélio de Figueiredo e
Almeida Júnior. [...] Mirar-se-ia em espelhos de Veneza,
guardaria perfumes em frasquinhos facetados de cristal
da Boêmia. [...] Teria cavalos de preço [...].
Viajaria pela Europa toda [...]. Havia de voltar, de oferecer
banquetes; havia de chocar paladares, habituados ao
picadinho e ao lombo de porco [...].
225
À tarde, por exemplo, tomava-se chá. Era horrível, suava-
se, mas muito chique. [...] visitavam senhoras que,
supervestidas, os recebiam entre amigas no salão de
visitas, toda atravancado de bibelôs, reposteiros, jarrões,
mesinhas, cadeiras estofadas estilo Luís isto, Luís aquilo,
com banquetinhas para se pôr o pé, vãos de plantas pelos
cantos e piano de cauda com retratos. E tomavam chá.
Tudo como se fazia lá na Europa.
226
As epígrafes, marcadas pela ironia literária, revelam e ilustram os
hábitos aburguesados e, ao mesmo tempo, aristocráticos que a elite paulista
passou a adotar, tentando livrar-se do provincianismo que marcara o viver
em São Paulo. Uma São Paulo não muito diferente das outras vilas do país,
onde a fronteira entre campo e cidade ainda não era nítida. A maior
movimentação cultural que existia era proporcionada pelos estudantes da
Academia de Direito, que vinham de diversas partes do país. Cafés, livrarias,
hospedarias, alojamentos e restaurantes foram criados para atender essa
ruidosa clientela.
O curso jurídico trouxera para São Paulo também a função cultural,
antes praticamente inexistente, limitando-se às idas ao centro urbano para
as missas, quermesses, procissões e compromissos políticos.
227
Mas, ainda
225
RIBEIRO, Julio. Op. cit., 2006.
226
TRAVASSOS, Nelson Palma. Minhas memórias dos Monteiros Lobatos. São Paulo: Clube
do livro, 1974.
227
QUEIROZ, Suely Robles Reis de. São Paulo. Madri: Editorial Mapfre, 1992. p.149.
104
assim, as atividades culturais se restringiam ao universo dos estudantes,
professores e seus entusiasmados encontros, nos quais travavam discussões
e articulavam idéias que resultavam, muitas vezes, na organização de folhas,
revistas acadêmicas, periódicos de cunho político, científico e literário. Tais
professores e estudantes são considerados precursores da formação de uma
cultura letrada em o Paulo. Não foram poucos os intelectuais, políticos e
literatos que saíram dos bancos da Academia de Direito do Largo São
Francisco.
228
A promoção do café no mercado internacional inseriu São Paulo na
nova ordem capitalista mundial. Tentando ampliar os limites das terras
na região do Vale do Paraíba, a produção cafeeira viu-se obrigada a partir em
busca de lugares onde a terra fosse mais interessante do ponto de vista da
oferta. A região escolhida foi o “Oeste Paulista”, onde a terra se apresentou
favorável também em outros quesitos, como condições climáticas, fertilidade,
topografia.
229
Com a melhora da qualidade da produção cafeeira, possibilitada,
entre outros fatores, pelo surgimento de novas técnicas de cultivo e pela
introdução de máquinas e equipamentos, em pouco tempo a região alcançou
altos índices de produtividade. O advento das ferrovias, por sua vez, fez os
lucros aumentarem ainda mais.
O fenômeno café-ferrovias trouxe conseqüências muito além do
desenvolvimento econômico, como a projeção de São Paulo e sua afirmação
ante as demais regiões do Império. Tal fenômeno deu origem a um grupo de
famílias muito enriquecidas – cuja acumulação de capital, como já fora
abordado no capítulo anterior, iniciou-se muito antes do aparecimento do
café – e também a um crescente processo de urbanização.
Uma importante característica dessas famílias enriquecidas era a
diversificação de seus bens e das atividades que desenvolviam a fim de
aumentarem seus ganhos. Em torno do “produto nuclear”, emergiram “as
mais avançadas e dinâmicas relações capitalistas”, incluindo atividades
essencialmente urbanas como a industrial, a bancária, além do surgimento
228
CRUZ, Heloísa de Faria. São Paulo em papel e tinta: periodismo e vida urbana, 1890-
1915. São Paulo: EDUC, 2000. p.53.
229
CANO, Wilson. Op. cit., 1977. p.31.
105
de escritórios, armazéns, oficinas de estradas de ferro, comércios
atacadistas, comércios de exportação e importação, etc. Outros negócios
surgiram ainda em decorrência do crescimento dos supracitados
empreendimentos, numa rede interdependente de atividades econômicas,
financeiras e de serviços.
230
O antigo senhor de terras e escravos tornou-se também um homem
de negócios, passando a transitar entre o mundo rural e o urbano, o que o
levou, mais uma vez por questões práticas, a manter uma casa também na
cidade. Foi esse viver na cidade que trouxe as mudanças na fisionomia do
antigo “Burgo dos Estudantes”.
Com as estradas de ferro funcionando a pleno vapor, o trânsito da
fazenda, onde funcionava a atividade principal e de onde irradiavam todas as
outras, para a cidade, e vice-versa, foi um tanto facilitado. As idas para o
campo tornaram-se ocasionais e a permanência na cidade uma constante, o
que requeria o aprendizado de um novo modo de vida, que não se poderia
simplesmente transplantar os valores rurais para a cidade.
Assim, os nobres passaram a desejar e a produzir novos valores que
os fizessem reconhecidos com “distinção”, sempre inspirados pelo modo de
viver da burguesia européia, especialmente a francesa, sem, no entanto,
abandonar os valores aristocráticos, como os títulos de nobreza, que desde
tempos mais remotos atraíam o interesse das classes que dominavam o
processo produtivo e das quais se originaram as tradicionais famílias
paulistas – processo já explicado no primeiro capítulo deste trabalho.
A tônica da época era a modernidade
231
, entendida segundo a visão
européia. Aliás, os membros das famílias ilustres viajavam para a Europa
com freqüência para observarem, aprenderem e exercitarem a “civilização” a
ser importada para o Brasil. O excesso de “francesismo” levou muitos deles a
230
Ibidem. p.42 e 69.
231
O paradigma da modernidade na época vinculava-se à idéia de “civilização”, o que
significava “ficar em de igualdade com a Europa no que se referia ao cotidiano,
instituições, economia, idéias liberais, etc. [...] moderno, modernidade, modernismo ou
mesmo modernização, tornaram-se palavras de ordem com peso significativo, expressavam
estar em sintonia com os povos ‘adiantados’”. HERSCHMANN, Micael; PEREIRA, Carlos
Alberto Messeder. “O Imaginário Moderno no Brasil”. In: HERSCHMANN, Micael; PEREIRA,
Carlos Alberto Messeder (Orgs.). A invenção do Brasil Moderno: medicina, educação e
engenharia nos anos 20-30. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. p.12 e 15.
106
manter residência também em Paris, para passar longas temporadas
visitando teatros, modistas, museus, antiquários, estudando, fazendo
negócios e também observando o universo francês e sentindo-se parte dele.
Não bastavam o poder econômico, político e os títulos; era necessário
também ser civilizado, o que significava ser educado, vestir-se corretamente,
ter boas maneiras, saber etiqueta, ser culto. Passar uns tempos na Europa
servia como uma espécie de estágio nesse sentido.
O fenômeno urbano e o novo gosto da elite elegeram a casa como
símbolo dessa nova mentalidade, com base na “estética erudita ou civilizada
que a Europa se dignava enviar”.
232
A casa podia revelar o grau de poder
econômico de seu proprietário, representando também a libertação do “jugo
caipira”. Decorar a nova moradia passou a ser parte das ocupações da elite.
O bairro escolhido, a arquitetura, entre outros, eram elementos
fundamentais nesse novo modo de viver. “O local em que residiam era a um
tempo forma de expressão de suas posições na cidade e legitimação dessa
mesma posição.”
233
A ocupação de determinados espaços na cidade acabou por expressar
o domínio de um poder simbólico adquirido pelo controle dos capitais nas
suas mais variadas formas (capital econômico, cultural, social), o que
garantiu aos nobres, além dos sinais de distinção, um distanciamento dos
elementos indesejáveis, ou seja, daquelas pessoas que não partilhavam de
qualquer tipo de capital dominado pelo grupo da elite, mais precisamente do
povo.
O espaço é um dos lugares onde o poder se afirma e se
exerce [...] os espaços arquitetônicos, cujas injunções
mudas dirigem-se diretamente ao corpo, obtendo dele,
com a mesma segurança que a etiqueta das sociedades
de corte, a reverência, o respeito, que nasce do
distanciamento ou, melhor, do estar longe, à distância
respeitosa, são sem vida, os componentes mais
importantes, em razão de sua invisibilidade, da simbólica
232
LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. Casa Paulista: história das moradias anteriores ao
ecletismo trazido pelo café. São Paulo: EDUSP, 1999. p.251.
233
TRIGO, Maria Helena Bueno. Os paulistas de quatrocentos anos: ser e parecer. o
Paulo: Annablume, 2001. p.44-6.
107
do poder e dos efeitos completamente reais do poder
simbólico.
234
Em 1879, o alemão Frederico Glete realizou o loteamento de vasta
área de uma chácara em Campos Elísios, como também o fizera Victor
Nothmann, local que se tornou, junto com Higienópolis, o bairro preferido da
elite.
235
A escolha por essas regiões da cidade justificava-se pelo paradigma
da Medicina e higiene da época antes das descobertas da microbiologia –,
já que, segundo a teoria miasmática, as regiões mais altas, com maior
circulação do ar, estariam afastadas das doenças epidêmicas e infecciosas
emanadas. A posse do capital lhes permitia manter à distância pessoas e
coisas indesejáveis e, ao mesmo tempo, aproximar-se de pessoas e coisas
desejáveis
236
, e assim foram constituindo os bairros que se tornaram
“redutos da elite”.
Despendia-se muito tempo e dinheiro na construção de casas
imponentes. Em Campos Elíseos foi construído o palacete de Elias Chaves,
tão belo e suntuoso que se tornou o “Palácio dos Campos Elíseos”, sede do
governo paulista. No mesmo bairro também se instalou Antônio Carlos da
Silva Telles, o casal Ignácio e Olivia Guedes Penteado e o Conselheiro
Antonio Prado, filho de D. Veridiana, que havia construído seu palacete no
bairro de Higienópolis.
Assim, esse universo da moradia, os espaços em que viviam e
transitavam, contribuiu para delinear a sua fisionomia, anseios, desejos,
como eram e como queriam ser vistos. A inovação no novo jeito de morar da
elite também poderia ser observada “porta adentro”, tanto em uma nova
distribuição espacial dos cômodos, cada qual com sua função, respeitando a
234
BOURDIEU, Pierre. “Efeitos do lugar”. In: BOURDIEU, Pierre (Org.). A miséria do mundo.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1999. p.163.
235
LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. Cozinhas, etc.: um estudo sobre as zonas de serviço
da casa paulista. São Paulo: Perspectiva, 1978. p.125-8.
236
BOURDIEU, Pierre. Op. cit., 1999. p.164.
108
privacidade dos que neles habitavam e impondo um limite aos visitantes,
que, em geral, não acessavam a área privada da residência, como também
no novo comportamento de seus moradores. Os limites entre o público e o
privado ficavam mais nítidos.
As visitas eram recebidas em espaços criados para esse fim, como
também eram específicos os espaços de trabalho e as acomodações dos
empregados da casa. A residência da elite, com a normatização e
organização dos espaços tal qual a sua função, parecia um prenúncio da
definição dos espaços que efetivamente se pretendeu fazer na cidade com as
reformas urbanísticas iniciadas na gestão do prefeito Antonio da Silva Prado
e levadas a cabo pelo seu sucessor, o Barão de Duprat.
237
Investiam-se grandes somas na importação de móveis e objetos de
decoração vindos da Europa:
Móveis ingleses ou franceses, paredes cobertas com
artísticos lambris nas bibliotecas, cortinas de ricos
brocados, tapetes persas, espelhos venezianos, lustres de
cristal da Boêmia, castiçais de prata, porcelanas de
Sèvres [...].
238
Outros objetos também passaram a ser utilizados, como fogões de
ferro, geladeiras, luminárias a gás, instalações sanitárias de porcelana
inglesa, ladrilhos ornamentados, entre outros, também importados,
fabricados conforme novas técnicas para atender às novas exigências do
gosto da elite.
239
237
MARINS, Paulo César Garcez. Habitação e Vizinhança: limites da privacidade no
surgimento das metrópoles brasileiras”. In: SEVCENKO, Nicolau (Org.). História da Vida
Privada no Brasil. Vol.3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p.177-8.
238
GRIEG, Maria Dilecta. Café: histórico, negócios e elite. São Paulo: Olho d’Água, 2000.
p.132-3.
239
LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. Op. cit., 1999. p.252-3.
109
IMAGEM 10 - Interior da casa de Antonio Paes de Barros.
240
Em meio a esse “delírio ornamental”, também se precisava modelar
um novo jeito de comportar-se, com refinamento e etiqueta. Para dar conta
desse requinte e dos cuidados com a nova casa, fazia-se necessário um
contingente razoável de empregados e escravos, ou seja, nesse quesito a
modernidade, pelo menos a princípio, não trouxe novidades, pois desde os
tempos dos engenhos coloniais “[...] o negro era o esgoto, água corrente e
fria; era interruptor de luz e botão de campainha; o negro tapava goteira e
subia vidraça pesada; era lavador automático, abanava que nem ventilador
[...]”
241
.
240
Fonte: Álbum de construcções - Ramos de Azevedo. FAU/USP, São Paulo.
241
COSTA, Lúcio. Apud: LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. Op. cit., 1978. p.111.
110
A adesão ao novo gosto também chegara aos Paes de Barros e
descendentes. Rafael Tobias de Aguiar Paes Barros (1830-1898), sobrinho e
afilhado de Rafael Tobias de Aguiar, filho de Antonio Paes de Barros, irmão
de D. Maria Raphaela (mãe de AFPS) e futuro segundo Barão de Piracicaba,
construiu, por volta de 1875, seu palacete, situado na Rua Brigadeiro
Tobias, sendo um dos mais belos exemplares de residência da elite, com
características ainda de uma arquitetura luso-brasileira. Seu suntuoso
palacete seria desbancado pela construção “afrancesada” da “Vila Maria”
de Dona Veridiana Prado.
242
Além da Rua Brigadeiro Tobias, também a Rua Florêncio de Abreu foi
lugar que atraiu a construção de residências de luxo. Naquela região, houve
grande concentração dos membros da família Paula Souza. construíram
suas casas e residiram Diogo de Barros, o “amante do progresso”
243
, que na
mesma localidade também estabeleceu sua fábrica de tecidos; Raphaela Paes
de Barros e depois sua filha e o marido, o primo Fernando Paes de Barros; o
engenheiro AFPS; sua tia Antonia de Aguiar Barros, a marquesa de Itu, cuja
residência destacou-se pelo fausto, entre outros. O Barão de Tatuí,
Francisco Xavier Paes de Barros (1831-1914), casado com Gertrudes Aguiar
Paes de Barros, filha do Barão de Itu, Bento Paes de Barros, também
possuía residência na Florêncio de Abreu (Imagens 11 e 12), onde fora
construído ainda, por volta de 1889, o palacete luxuoso e austero de Antonio
Paes de Barros (Imagem 10).
244
242
Fonte: MOTTA, Heloísa Alves de Lima. Op. cit., 1992.
243
CAMPOS, Eudes. “São Paulo: desenvolvimento urbano e arquitetura sob o Império”. In:
PORTA, Paula (Org.). História da cidade de São Paulo: a cidade no Império. Vol.2. São Paulo:
Paz e Terra, 2004. p.239.
244
Idem. “Nos caminhos da Luz, antigos palacetes da elite paulistana”. Anais do Museu
paulista. Vol.13. n
o
1. São Paulo: Museu Paulista, Universidade de São Paulo, jan.-jun.
2005. p.11-57.
111
IMAGEM 11 - Residência que pertenceu a D. Maria Raphaela, mãe de AFPS, e,
com a morte desta, passou para a filha Maria Raphaela, casada com o primo
Fernando Paes de Barros.
245
A região da Florêncio de Abreu era parte das propriedades que
haviam pertencido ao primeiro Barão de Piracicaba, o patriarca da família,
que, ao falecer, transferiu o patrimônio aos seus herdeiros, o que explica a
grande concentração de sua parentela naquela região.
245
Fonte: Álbum de construcções - Ramos de Azevedo. FAU/USP, São Paulo.
112
IMAGEM 12 - Rua Florêncio de Abreu - em primeiro plano, a residência em que
residiu o engenheiro AFPS; ao fundo, a residência de Maria Raphaela; à direita,
o gradil que circundava a casa do Barão de Tatuí.
246
Veridiana Valéria da Silva Prado foi a síntese exemplar desse novo
comportamento da elite. Filha do Barão de Iguape, Antonio da Silva Prado, e
casada com o meio-irmão de seu pai, seu meio-tio Martinho da Silva Prado,
D. Veridiana foi a responsável por lançar a moda de morar em villas na
cidade.
247
Seu palacete, projetado na França, exprimia todo o luxo e
cosmopolitismo desejado pela elite oriunda da riqueza do café.
O próprio engenheiro Paula Souza o resistiu à curiosidade de
visitar a sua propriedade:
São Paulo, 07 de janeiro de 1902
Exmo. Dr. Paula Souza,
Para completar a obra convido-o! visitar o vinhedo de D.
Veridiana Rua Sta. Ephygenia, 87. He uma obra d’arte,
na qual caprichei por aproximar-me da perfeição ideal.
Não vi na Europa nada superior no gênero.
246
Fonte: KOSSOY, Boris. São Paulo, 1900: imagens de Guilherme Gaensly. São Paulo:
Kosmos, 1988.
247
D’AVILA, Luiz Felipe. Dona Veridiana. São Paulo: A Girafa Editora, 2004. p.235.
113
Convem que a visita seja feita de manhã. Se não lhe for
inconveniente, amanhã, às 7 h., lá o esperarei.
Convido igualmente o Dr. Silva Telles [...]
248
Além da curiosidade pela obra, por sua suntuosidade, o engenheiro
também se mostrou interessado em visitar o palacete de D. Veridiana para
conhecer o cultivo de vinhas que era desenvolvido naquela propriedade pelo
italiano Benedito Marengo, que iniciara uma produção de uvas niágara,
cujos pés trouxera dos Estados Unidos.
249
A “Vila Maria” de D. Veridiana, além da beleza e das novidades em
termos arquitetônicos e artísticos, tornou-se conhecida como o palacete da
intelectualidade. Era a expressão dos novos tempos de incremento do viver
urbano. Nos seus saraus e bailes, sempre imponentes, podia-se exercitar a
erudição com os artistas e intelectuais da época, como também pôr em
prática o novo jeito de portar-se.
Nos salões
250
fechavam-se negócios, discutiam-se e arquitetavam-se
lances políticos, faziam-se audições de música erudita, recitavam-se poesias,
muitas vezes em francês, moças casadoiras conheciam pretendentes. Para os
artistas sem recursos, estas festas representavam oportunidades de conviver
num espaço e estabelecer relações que sua posição social não permitia, mas
que eram de fundamental importância, pois poderiam significar amparo
financeiro no exercício de sua arte. Enfim, era o espaço onde, entre ricas
tapeçarias, cristais Baccarat, pratarias, bronzes e espelhos bisotados, se
realizava a sociabilidade da elite.
248
Carta de Luis Pereira Barreto ao engenheiro, então ministro AFPS. São Paulo,
07/01/1902. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
249
As uvas de Benedito Marengo ficaram famosas na região do Tatuapé, onde adquirira uma
propriedade que produzia, além das uvas, pêssegos, ameixas, entre outras frutas.
250
Também famoso foi o salão de Freitas Valle, a Villa Kyrial. José de Freitas Valle era poeta
simbolista, professor de francês, advogado, perfumista, gourmet, mecenas, deputado e
senador. A Villa Kyrial estava localizada na Rua Domingos de Morais, número 10, na atual
Vila Mariana, local que durante aproximadamente 20 anos foi encontro de artistas, literatos,
políticos e personalidades de destaque no cenário nacional e internacional. Nomes como
Lasar Segall, Guilherme de Almeida, Blaise Cendrars, Oswald de Andrade e Mário de
Andrade freqüentavam seus banquetes, saraus literários, audições musicais e ciclos de
conferências. Anita Malfati, Victor Brecheret, Leonor Aguiar, João de Sousa Lima e
Francisco Mignone figuravam entre aqueles protegidos e financiados pelo mecenato de
Freitas Valle.
Sobre Freitas Valle e a Villa Kyrial, ver o belíssimo trabalho de: CAMARGOS, Márcia. Villa
Kyrial: crônica da Belle Époque paulistana. São Paulo: Editora SENAC, 2001.
114
A instituição dos salões era fruto da ânsia por “civilização” da elite,
numa época em que a educação inclusive a feminina, embora os objetivos
da educação masculina e da feminina fossem distintos tornou-se quesito
importante na formulação do novo habitus. As mulheres deviam cuidar de
sua formação moral e religiosa, conhecer artes, músicas, línguas
(principalmente o francês), aprender a se comportar em sociedade e
assimilar a arte de bem receber:
As festas [...] eram a oportunidade para a dona da casa
brilhar, mostrando-se perfeita hostess, recebendo seus
inúmeros convidados, escolhendo uma bonita decoração,
organizando o cardápio e supervisionando a cozinha,
preparando hospedagem para os que deveriam pernoitar,
aposentos para a toilette e descanso das damas.
Fundamental era a escolha de vestidos e jóias adequados
para cada ocasião.
251
A educação, então, tomou parte na aquisição desse novo tipo de
capital simbólico. Desde cedo, as crianças eram estimuladas a apreciar os
valores europeus. Para isso, tornou-se comum entre os mais abastados a
contratação de preceptoras francesas e governantas alemãs ou inglesas. As
meninas podiam ser matriculadas em colégios como o Sacré Coeur, o Sion,
ambos no Rio de Janeiro, e o Des Oiseaux, em São Paulo, pelos quais
passaram muitas jovens da elite.
252
Nestas instituições todas as matérias
eram ensinadas em francês.
Assim, as meninas aprendiam os valores considerados paradigmas de
cultura superior, valores estes que, no entanto, não coincidiam com a
história e a realidade nacional. Aprendiam também, além das matérias
regulares, a portar-se com delicadeza e mesura, a dominar os códigos de
etiqueta, a apresentar desenvoltura na arte da conversação e a mostrar-se
com toaletes impecáveis. Em contrapartida, aos rapazes era conveniente
possuir titulação, aliando o desejo de erudição que o novo habitus impunha
251
GRIEG, Maria Dilecta. Op. cit., 2000. p.119.
252
Os detalhes do tipo de educação no Des Oiseaux foram relatados por Yolanda Penteado
em sua autobiografia “Tudo em cor de rosa”, com prefácio de Gilberto Freire e Sérgio
Buarque de Holanda. Ver também: BIVAR, Antonio. Yolanda. São Paulo: A Girafa Editora,
2004.
115
com a promessa de vantagens sociais e políticas oferecida pelos títulos
universitários.
Durante um bom tempo, seguindo a tradição portuguesa, as atenções
estiveram voltadas para a formação de bacharéis. Até o período que precedeu
a independência, os membros da elite encaminhavam seus filhos para
estudarem Direito em Coimbra. Posteriormente, com a ascensão da nova
elite e o aparecimento do desejo de afastar-se de tudo que remetesse ao
domínio e às tradições portugueses, passou-se a enviar os jovens para a
Academia de Direito de São Paulo.
A Faculdade de Direito de São Paulo, fundada em 1827, poucos anos
depois da independência do Brasil, passou a ser o organismo representante
da intelligentsia brasileira, junto com a Faculdade de Olinda. Destas
instituições deveriam sair homens diplomados e com capacidade para
conduzir o país recém-emancipado. Assim, começou o culto ao
“bacharelismo”, e seus representantes se fizeram presentes em todas as
instâncias da vida pública nacional.
Seguir a carreira de bacharel estava mais vinculado ao prestígio e à
aquisição de capital cultural do que propriamente à busca por uma
profissão. O curso de Direito significava também a porta de entrada para a
carreira política, possibilitando ainda qualificação para adentrar nos
quadros do funcionalismo público. Em estudo das gerações acadêmicas que
se sucederam, no período compreendido entre 1828 e 1883, foram
identificados pelo menos 73 acadêmicos que ganharam notoriedade na
política, como também nas artes e na carreira jornalística.
253
Não era por acaso que o Conselheiro Dr. Paula Souza tanto insistia
nos estudos dos filhos. Ele esperava que sua participação no governo
imperial facilitasse a admissão deles nos quadros da governança, numa
época em que prestar serviço ao Estado, pertencer ao funcionalismo público,
significava poder desfrutar status e privilégios. Como os cargos eram
nomeados, ninguém melhor do que o próprio grupo para indicar os que
253
Nesse importante estudo do bacharelismo no Brasil, especificamente na Faculdade de
Direito de São Paulo, estão elencados nominalmente aqueles que tiveram destaque, numa
tabela, e os respectivos períodos acadêmicos. ADORNO, Sérgio. Os aprendizes do poder:
bacharelismo liberal na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. p.135-45.
116
também fariam parte dele. Daí a importância de ser bem relacionado,
freqüentar as “altas rodas”, além de possuir o capital cultural necessário.
Nascido no seio de uma família tradicional, poderosa e conhecida por
seus membros ocuparem cargos públicos, o Dr. Paula Souza queria ver
garantida a participação dos filhos nos círculos do poder, significando
também a garantia de futuro e conforto, e por isso mesmo lhes chamava a
atenção:
Não comprehendo bem as vantagens, que colhereis em
adquirides um posto militar na Suissa, para que nada
vos servirá, apenas vejo alguma vantagem na obtenção de
alguns conhecimentos práticos. O que vos convem, e he
indispensável, nem que consiguais um titulo com o que
possais ser admittido no Império a exames e
aquisição de um lugar importante honroso, e que vos
dará pão o que presumo poder conseguir assim
trabalhai nesse sentido que não virdes como os
outros, que hão dado em água de barrada. Talvez va
Francisco para la; mas a costumar o estado agitado da
Alemanha, julgo prudente sahirdes de la e hirdes para a
Belgica, onde igualmente se ensina bem essas matérias;
vosso irmão deverá então acompanhar-vos para
matricular-se em um curso, que possa seguir e
aproveitar.
254
Além do interesse em ver seus filhos alcançarem colocações em
cargos públicos, mais uma vez o autor da missiva deixava transparecer a
sua rejeição à Engenharia Militar, pela qual Antonio havia manifestado
simpatia, justificando e reafirmando sua visão do sentido utilitário e
promissor do estudo da Engenharia, principalmente a voltada para
melhoramentos nas vias de comunicação.
A emergência da Engenharia e, antes dela, a formação de bacharéis
mediante a fundação da Faculdade de Direito de São Paulo tiveram ligações
com a formação e consolidação do Estado Nacional Brasileiro, que buscava
formar seus próprios dirigentes e intelectuais, procurando distanciar-se dos
moldes portugueses de administração.
254
Carta ao filho Antonio. Rio de Janeiro, 24/02/1864. Arquivo Paula Souza - PS.
684.02.24, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (destaques nossos)
117
A Engenharia também ganhou status, quando a corrente
internacional da revolução industrial chegou ao Brasil, época em que o
conhecimento prático e científico se mostrou mais útil para o
desenvolvimento e progresso do país do que o excesso de teoria do
bacharelismo. Nessa mesma ocasião, também as teorias liberais e
democráticas ganharam novo fôlego e novos adeptos no país, que passaram
a criticar o modelo europeu, buscando a aproximação do modelo dos
Estados Unidos, então em ascensão.
AFPS tomou parte nesse grupo, que se posicionou contrário ao
pedantismo desse arremedo de civilização européia que a elite paulista
representava. Demonstrou desapego aos valores tradicionais e buscou
conhecer melhor a cultura norte-americana, iniciando com as leituras de
Tocqueville e Chevallier e depois partindo para uma experiência “in loco”,
quando, após um pequeno período como inspetor da Repartição de Obras
Públicas da Província, partiu para a América do Norte.
Contudo, embora fosse contrário ao habitus da elite, AFPS também
era produtor e produto dela ainda que se tenha de considerar a
possibilidade de subversão dentro de um grupo social ou casos individuais
que contrariem a propensão geral, forjando trajetórias bem singulares. Suas
idéias podem ser vistas como distintas daquelas ensaiadas pelo grupo dito
“tradicional” e “dono do poder”. Entretanto, do ponto de vista teórico, as
idéias que influenciaram sua formação e nortearam suas ações no campo
político e intelectual iam ao encontro dos interesses daqueles que foram
responsáveis por sua formação moral, ou seja, sua família. Em outras
palavras, suas idéias apresentavam consonância com aquelas dos detentores
do capital econômico, político, cultural e intelectual, materializados na elite
paulista.
118
CAPÍTULO III -
“MALES DO PRESENTE E ESPERANÇAS DO FUTURO
” *
119
Analisando-se as condicionantes históricas que nortearam a vida do
engenheiro Paula Souza em seu aspecto político, depara-se com uma
tradição familiar de posicionamento liberal, o que torna necessário entender
o significado do “ser liberal” no período imperial brasileiro. Impõe-se ainda a
necessidade de compreender a participação efetiva de seu pai como ministro
da Agricultura, Comércio e Obras Públicas no governo de D. Pedro II, bem
como de seu avô, eleito para as Cortes de Lisboa e também para participar
da Assembléia Constituinte no período pós-independência no governo de D.
Pedro I.
Sem contrariar a tese de que a origem é o maior tributo para a
formação dos indivíduos, pode-se verificar o quanto o engenheiro Antonio
Francisco de Paula Souza esteve cercado pelas suas heranças, ou seja, pelos
alicerces políticos e sociais construídos por seus antepassados. Assim,
pressupondo ser significativa a compreensão de algumas das idéias que
circulavam no século XIX, este capítulo tem como propósito apresentar, por
meio de um recorte geracional, como sua herança norteou sua formação e
seu pensamento político.
Nesse sentido, busca-se apresentar também o significado que tiveram
as idéias liberais na região paulista, a participação efetiva de seus familiares
na política imperial e como lidaram com as grandes questões da época, como
o problema da mão-de-obra, num período em que a escravidão era
internacionalmente questionada e a imigração com formação de colônias
apresentada como solução para a situação.
Dessa forma, a influência do capitalismo internacional e a
necessidade de adequação do país, tornando-o partícipe daquele, exigiram
também reflexões de cunho político, levando ao questionamento do
centralismo monárquico e à apresentação do federalismo e da democracia
como caminhos mais viáveis para o crescimento e a civilização do Brasil.
Frase emprestada da obra de Aureliano Cândido Tavares Bastos (1839-1875), publicada
em 1861, na qual reúne uma série de textos acerca dos problemas que inquietavam sua
geração, da qual também era partícipe o médico e Conselheiro Paula Souza. TAVARES
BASTOS, Aureliano Cândido. Os males do presente e as esperanças do futuro: estudos
brasileiros. São Paulo: Ed. Nacional; Brasília: INL, 1976.
120
3.1 - RAÍZES POLÍTICAS
Não sou muito affeiçoado do Carrão como político, porque
o tenho sempre muito propenso aos conservadores como
V. Excia. não desconhece ahi atrás as suas estreitas
ligações [...] para confirmar meo juízo. [...]
Entretanto conheço que lhe prestado serviços
relevantes aos liberais, porque tem o seu melhor princípio
na família Barros e outros caracteres paulistas como
expus. Em summa o nosso amigo Carrão se processe
encontrar na província melhor apoio do lado conservador,
do que tem no liberal, talvez o perdêssemos. Desculpe
estes rasgos de franqueza.
255
O texto acima, trecho de uma carta endereçada ao Conselheiro Paula
Souza, revela uma forma de recepção e adesão às idéias liberais no Brasil,
permitindo entrever significados que lhes eram conferidos. Os “rasgos de
franqueza” do autor da missiva expõem seu ponto de vista acerca de João da
Silva Carrão (1810-1888)
256
, notório político da época, correligionário do
Conselheiro Paula Souza, apesar da sua possível fraqueza de ideais liberais.
Assim, a mensagem desvela o quanto a política e o liberalismo no
Brasil estavam sujeitos a interesses paroquiais. Eram antes as heranças
familiares e os interesses de grupo que definiam a afiliação a um
posicionamento político ou outro. Praticamente até os últimos decênios do
período imperial brasileiro, a luta política consistia em pouco mais que uma
ambição pelo poder por parte de grupos liderados pelas famílias mais
prestigiosas.
257
Entre estas estava a família Barros, da qual descendiam os
Paula Souza, como citado no excerto acima, que tinha sólido passado e longa
tradição liberal.
“Desenvolvimento do trabalho”, “consciência de igualdade” e
“convicção na prosperidade do homem”
258
eram expressões correntes nos
255
Carta de Santos Lopes ao Conselheiro Paula Souza. Arêias, 26/04/1865. Arquivo Paula
Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
256
Reconhecidamente adepto de um liberalismo moderado, o Conselheiro Carrão foi
deputado provincial em diversas legislaturas, como também deputado geral. Foi Presidente
da Província de São Paulo por duas vezes (1857-1858 e 1865-1888). Foi também Ministro
da Fazenda no ano de 1866.
257
COSTA, Emília Viotti da. Da monarquia à república: momentos decisivos. São Paulo:
Editora da UNESP, 1999. p.161.
258
Carta de AFPS ao pai. Carlsruhe, 20/04/1866. Arquivo Paula Souza - PS. 866.04.20,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
121
escritos do jovem Paula Souza, denotando que os princípios liberais faziam
parte das suas idéias desde os tempos em que estudava na Europa.
Os liberais paulistas eram oriundos da elite senhorial, proprietária de
terras e escravos. Dedicaram-se a diversas formas de acumulação de
riqueza, que depois reverteram na produção cafeeira (ver primeiro capítulo).
Eram políticos que, apesar da pouca importância política de São Paulo antes
do advento do café, exerciam forte influência sobre os principais
acontecimentos do país, em particular sobre o processo de formação do
Estado Nacional Brasileiro.
Nesta época, a compreensão de liberalismo destes políticos vinculava-
se à compreensão da natureza da monarquia constitucional, pois, assim
como os demais grupos das elites do país, olhavam com desconfiança a
grande população negra e escrava. Para eles, esta representava uma real
ameaça, pois poderia deflagrar uma convulsão social nos moldes da que
ocorrera no Haiti, sendo que também os preocupava a iminência da
“anarquia” republicana, que se espalhara pela América espanhola.
“O Brasil teme, como teme Portugal, a divisão de seus territórios [...]”,
afirmava o padre Diogo Feijó (1784-1843), em seu discurso às Cortes de
Lisboa. Esse temor das elites representado no discurso de Feijó tornou-se
ilustrativo do tipo de liberalismo que se pensou no Brasil por essa ocasião.
259
Numa definição restrita, o liberalismo “é a tradição do pensamento
que situa no centro de suas preocupações a liberdade do indivíduo”.
260
Tal
pensamento, com raízes nos escritos filósofos iluministas
261
, chegou ao
259
RICCI, Magda. Assombrações de um padre regente: Diogo Antônio Fei (1784-1843).
Campinas, SP: Editora da UNICAMP, CECULT-IFCH, 2001.
Para um aprofundamento nas idéias e na figura de Feijó, ver também: CALDEIRA, Jorge
(Org.). Diogo Antônio Feijó. São Paulo: Editora 34, 1999; CARVALHO, Roberto Machado.
“Feijó e os Padres do Patrocínio de Itu”. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de o
Paulo. Vol.84. São Paulo, 1989; AMARAL, Antonio Barreto do. “Um grande paulista”. Revista
do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. Vol.84. o Paulo, 1989; ELLIS JÚNIOR,
Alfredo. Diogo Antonio Feijó e a primeira metade do século XIX. São Paulo: Brasiliana, 1980.
260
LOSURDO, Domenico. Contra-História do Liberalismo. Aparecida, SP: Idéias & Letras,
2006. p.13. Esse pressuposto filosófico do liberalismo foi elaborado pelo “jusnaturalismo
escola do direito natural –, segundo o qual todos os homens, indistintamente, têm direitos
fundamentais, independentemente de sua ou de qualquer vontade. Direito que deve ser
respeitado e o Estado prestar garantias para evitar qualquer transgressão. BOBBIO,
Norberto. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Editora Brasiliense, 1988. p.11. Ver
também: LASKI, Harold J. O liberalismo Europeu. São Paulo: Mestre Jou, 1973.
261
John Locke (1632-1704), insurgindo-se contra as teses legitimadoras do poder
absolutista na Inglaterra, postulou as premissas básicas da teoria que ficaria conhecida
122
Brasil por meio dos estudantes nacionais formados na Universidade de
Coimbra e outros centros europeus, uma vez que o liberalismo era parte da
nova cultura política que se formava na Europa.
262
Contudo, no Brasil, as idéias liberais, ainda que inspiradas nas
idéias, premissas e fórmulas políticas européias, foram adequadas à
realidade e aos interesses dos grupos que procuravam encaminhar os
destinos do país após a independência.
263
As idéias liberais na Europa:
[...] surgiram das lutas da burguesia contra os abusos da
autoridade real, os privilégios do clero e da nobreza, os
monopólios que inibiam a produção, a circulação, o
comércio e o trabalho livre. Na luta contra o absolutismo,
os liberais defenderam a teoria do contrato social,
afirmando a soberania do povo e a supremacia da lei, e
lutaram pela divisão de poderes e pelas formas
representativas de governo. Para destruir privilégios
corporativos, converteram em direitos universais a
liberdade, a igualdade perante a lei e o direito de
propriedade. Aos regulamentos que inibiam o comércio e
a produção opuseram a liberdade de comércio e de
trabalho.
264
Assim, evidenciam-se as peculiaridades de tal doutrina no Brasil,
haja vista que as condições sociais, econômicas e políticas brasileiras
divergiam das européias. Isto, no entanto, não significa que o liberalismo da
Europa tenha conseguido aliar teoria e prática, afinal, as idéias liberais
adotadas naquele continente também foram utilizadas para atender aos
mais diversos propósitos e interesses.
265
“Ou seja, como qualquer doutrina, o
liberalismo foi impelido pelas circunstâncias históricas dos diferentes países
como Liberalismo. Ao lado das idéias de cunho político de Locke, o escocês Adam Smith
(1723-1790) elaborou os preceitos no sentido econômico.
262
Estudar em Coimbra ou em outra universidade européia teve papel fundamental na
formação intelectual da elite brasileira, delineando seu perfil e posicionamento político:
“homogeneidade de sua formação e treinamento”. O resultado disso era a visão política
semelhante, formados que eram na tradição jurídica do despotismo ilustrado. Tal
característica teria contribuído para a construção do Estado centralizado. CARVALHO, José
Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial. Teatro de sombras: a política
imperial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p.65.
263
COSTA, Emília Viotti da. “Liberalismo: teoria e prática”. In: COSTA, Emília Viotti da. Op.
cit., 1999. p.132.
264
Ibidem. p.132-3.
265
Ibidem. p.133.
123
e redefinições [...].
266
Desse modo, o liberalismo no Brasil, como em
qualquer lugar, tomou feições segundo sua própria realidade.
267
Nesses tempos da conformação do Estado Nacional Brasileiro, a
questão subjacente nos debates dos liberais era a mão-de-obra escrava,
causa de grandes desentendimentos.
268
De um lado, políticos liberais
paulistas, oriundos da elite proprietária, entendiam que a escravidão deveria
acabar de maneira lenta e gradual, de modo que se garantisse um fluxo de
trabalhadores. Discussões foram travadas por ocasião da lei que punha fim
ao tráfico de escravos, lei que não impediu a continuidade da prática e
acabou servindo de argumento aos próprios liberais para defender sua
revogação, que não era respeitada e, segundo seu entendimento,
contrariava os princípios liberais, o que justificavam afirmando que o Estado
deveria funcionar como um regulador dos direitos, e as leis como mecanismo
de controle para garantir o respeito a esses direitos, o que não se aplicava à
norma em questão.
De outro lado, burocratas liberais ilustrados, entre os quais se
destacava José Bonifácio (1763-1838), defendiam a libertação dos escravos,
a fim de se pôr em prática o princípio básico e fundamental do liberalismo
a liberdade –, de tal maneira que estes indivíduos pudessem, no exercício de
266
REGO, Walquíria Domingues Leão. “Tavares Bastos: um liberalismo descompassado”.
Revista USP. n
o
17. São Paulo, mar./abr. 1993. p.76.
267
GUIMARÃES, Lucia Maria Paschoal. “Liberalismo Moderado: Postulados Ideológicos e
Práticas Políticas no Período Regencial (1831-1837)”. In: GUIMARÃES, Lucia Maria
Paschoal; PRADO, Maria Emília (Orgs.). O liberalismo no Brasil Imperial: origens, conceitos e
prática. Rio de Janeiro: Revan, UERJ, 2001. p.104.
268
Formalmente discordante, muito se propalou a respeito da contradição
escravidão/liberalismo no Brasil. Contudo, reconhece-se um falso impasse, uma vez que
“o seu consórcio se poria como contradição real se se atribuísse ao segundo termo,
liberalismo, um conteúdo pleno e concreto, equivalente à ideologia burguesa do trabalho
livre que se afirmou ao longo da revolução burguesa industrial européia”. BOSI, Alfredo. A
escravidão entre dois liberalismos”. Estudos Avançados. Vol.2. n
o
3. São Paulo, set./dez.
1988. p.4-5.
Cabe lembrar que o próprio Adam Smitho era contra a escravidão nas colônias. “Ou seja,
o próprio liberalismo europeu nasceu sob essa contradição; mesmo a Revolução Francesa
decretou a libertação dos escravos nas colônias francesas em 1794, mas Napoleão
restabeleceu a escravidão oito anos depois.” Assim, entende-se que o liberalismo brasileiro
não era o dissonante assim do liberalismo inglês ou francês, que também padeceu dessa
contradição. “Trabalho livre na Europa, escravidão nas colônias americanas tal a
ordenação segmentada, estabelecida pela teoria liberal.” GORENDER, Jacob. “Liberalismo e
escravidão”. Estudos Avançados. Vol. 16. n
o
46. São Paulo, set./dez. 2002. p.211. Ver
também: REGO, Walquíria Domingues Leão. “Liberalismo e escravidão: um dilema?”
Primeira Versão. Vol.43. Campinas: IFCH, 1992. p.1-30.
124
suas potencialidades, se transformar em geradores de riqueza para si e,
conseqüentemente, para o país. Segundo sua visão, não poderia:
[...] haver indústria segura e verdadeira, nem agricultura
florescente e grande com braços de escravos viciosos e
boçais. Mostra a experiência e a razão que a riqueza
reina onde impera a liberdade e a justiça, e não onde
mora o cativeiro e a corrupção.
269
Desse modo, os burocratas liberais entendiam ser fundamental o
empreendimento de reformas que incluíssem os mais diversos setores
sociais, com o propósito de realizar o ideal de nação e civilização.
Defensor da primeira perspectiva, Francisco de Paula Souza e Mello
(1791-1851), avô do engenheiro Paula Souza, foi liderança de destaque entre
os liberais paulistas. Seu projeto afinava-se com o ideal de que a nação
brasileira se dava por meio do Estado e, portanto, era a sua organização
institucional que importava.
270
Por esse motivo, sua corrente trabalhava
politicamente no sentido de conseguir a inserção do maior número possível
de seus correligionários nas instituições do governo, a fim de organizá-lo
conforme os interesses do grupo da elite do qual faziam parte.
Resumidamente, pode-se dizer que tais interesses estavam centrados na
garantia da autonomia provincial, de modo que tais partidários pudessem
dar continuidade aos seus negócios sem a interferência do governo central,
bem como na participação dos liberais dessa tendência nos centros de
poder.
271
269
ANDRADA E SILVA, José Bonifácio de. Representação à Assembléia Geral, Constituinte e
Legislativa do Império do Brasil sobre a escravatura. 1825. Santos: Typographia a vapor do
Diário de Santos, 1886. p.27. Disponível em: <www.obrabonifacio.com.br>. Acesso em:
01/02/2009.
Para aprofundamento nas idéias de Jo Bonifácio, ver também: CALDEIRA, Jorge (Org.).
José Bonifácio de Andrada e Silva. São Paulo: Editora 34, 2002.
270
DOLHNIKOFF, Miriam. “São Paulo na Independência”. In: JANCSÓ, István (Org.).
Independência: História e Historiografia. São Paulo: Hucitec, 2005(a). p.567.
271
Ibidem. p.568.
125
IMAGEM 13 - Francisco de Paula Souza e Mello.
272
Francisco de Paula Souza e Mello nasceu na Vila de Itu, “numa
respeitável família”
273
. Autodidata, não estudou em Coimbra, mas na
biblioteca herdada de seu pai, o bacharel em cânones Antonio José de
Souza, falecido quando tinha apenas dois anos.
274
Sua saúde frágil não
permitiu que freqüentasse escolas regulares; assim, suas primeiras letras
foram ensinadas por seu tio, capitão-mor de Itu, Vicente da Costa Taques
Góis e Aranha. Num outro estágio, seus estudos passaram a ser conduzidos
por um parente ex-jesuíta atingido pela extinção da Companhia de Jesus, o
padre José de Campos Lara, com quem se aperfeiçoou no estudo de línguas
como o francês, inglês, latim, italiano e obteve conhecimentos de história,
geografia, filosofia, economia, finanças e retórica.
275
Por sua fraca compleição física, não pôde, depois desta etapa,
estudar as ciências jurídicas, costume da elite na época. Mesmo sem
272
Fonte: RIBEIRO, Jacintho. Chronologia Paulista: Relação histórica dos acontecimentos
mais importantes ocorridos em S. Paulo desde a chegada de Martim Afonso de Souza a
Vicente até 1898. Vol. 1. São Paulo, 1899.
273
HOMEM DE MELLO, Francisco Ignácio Marcondes, Barão Homem de Mello. Esboços
biographicos por Homem de Mello. Rio de Janeiro: Typ. do Diário do Rio de Janeiro, 1862.
274
TAUNAY, Affonso de. Grandes Vultos da Independência Brasileira: publicação
commemorativa do primeiro centenário da independência nacional. São Paulo: Companhia
Editora Melhoramentos de S. Paulo, 1922. p.133-8.
275
CARVALHO, Roberto Machado. “Conselheiro Paula Souza, um liberal do Império”.
Revista da ASBRAP. Vol.14. São Paulo, 2008. p.53.
126
diploma de Coimbra, atuou como conhecedor das leis, dominando assuntos
de direito constitucional, administrativo e internacional e ainda relacionados
a finanças.
Reconhecido como intelectual e estudioso, não se privou de aderir ao
pensamento político liberal que chegava de Portugal, por ocasião da
Revolução Liberal do Porto de 1820.
276
Foi eleito deputado às Cortes de
Lisboa, mas não chegou a ocupar o cargo em virtude de seus problemas de
saúde, que não lhe permitiram empreender viagem tão longa. Foi então
substituído por Antonio Manoel da Silva Bueno, que embarcou rumo a
Portugal, junto com Antonio Carlos Andrada e Silva, o padre Diogo Antonio
Feijó e Nicolau Campos Vergueiro, deputados eleitos representantes da
Província de São Paulo.
Seu nome é freqüentemente lembrado quando se fala dos “magnos
patriotas” que estiveram envolvidos no movimento de independência do
Brasil:
Coube-lhe a glória de ter sido dos primeiros a aventar a
idéia da separação lusa brasileira, mal estava ela
esboçada, quando propôs aos deputados brasileiros se
concedessem poderes para negociar esta cisão.
277
Todavia, seu destaque deve ser relativizado, pois, como se sabe,
muitas vezes os fatos e personagens da história da independência do Brasil
foram criados pelas paixões dos envolvidos, “sempre prontos a superestimar
a ação dos indivíduos e a conceder valor demasiado a episódios meramente
circunstanciais”.
278
276
Movimento fomentado por idéias liberais, associadas à crise portuguesa depois da
transferência da família real para o Brasil. A exigência dos revoltosos centravam-se na
convocação de uma assembléia constituinte, com a finalidade de pôr fim ao regime
absolutista português. Suas reivindicações foram bem recebidas no Brasil e desejavam,
entre outras coisas, restringir o poder real. Vários liberais brasileiros aderiram ao
movimento, mas, no decorrer da Assembléia das Cortes, os interesses entre ambos os lados
tornaram-se patentes. MONTEIRO, Hamilton de Matos. “Da independência à vitória da
ordem”. In: LINHARES, Maria Yedda (Org.). História geral do Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier,
1990. p.130-1.
277
TAUNAY, Affonso de. Op. cit., 1922. p.133-8.
278
COSTA, Emília Viotti da. “Introdução ao Estudo da Emancipação Política do Brasil”. In:
MOTA, Carlos Guilherme. Brasil em Perspectiva. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.
p.65.
127
As idéias emancipacionistas não eram unanimidade entre os
membros do grupo dominante da elite, que antes entendiam o Brasil como
parte do Império português, que deveria livrar-se do centralismo
monárquico.
O liberalismo de Paula Souza e Mello era voltado sobretudo para
questões de ordem econômica. O recurso do separatismo efetivamente
ocorreu quando houve rompimento com as Cortes de Lisboa e a “idéia de
monarquia dual”
279
apresentou-se inviável. No decorrer das Assembléias,
ficou claro que as Cortes não tinham interesses em comum com o Brasil,
que, ao contrário, suas intenções apresentaram-se um tanto antiliberais,
pois pretendiam restringir e limitar as disposições liberalizantes de D. João
VI.
Assim, meio a “contragosto”, as idéias de emancipação política do
Brasil ganharam corpo. Contudo, os menos radicais ainda procuraram
contemporizar com a monarquia portuguesa, mas, diante da
impossibilidade, a figura do Príncipe Regente D. Pedro apresentou-se como a
solução para encaminhar a independência sem grandes transtornos e
agitações populares.
Sua figura representava a saída mais viável, atendendo aos interesses
e aspirações dos diversos grupos, por mais contraditórios que fossem entre
si. Havia aqueles que viam nele a possibilidade de independência sem
rompimento com Portugal, defendendo a perpetuação do sistema
monárquico ou sua manutenção por meio de uma monarquia dual; aqueles
que almejavam a autonomia, mas sem uma separação efetiva; e ainda
aqueles que queriam o rompimento definitivo e total com Portugal, mas sem
que tal ruptura fosse conduzida pelas massas. Ou seja, estes sustentavam
que a independência deveria se dar sem alterar a ordem social, adotando-se
um sistema de monarquia constitucional
280
, seguindo o caminho das
revoltas liberais que sacudiram a Europa, mas também os interesses das
279
COSTA, Emília Viotti da. Op. cit., 1999. p.47.
280
Ibidem. p.46-7 e 67.
128
elites, que tiveram papel dominante no processo de formação do Estado
Nacional Brasileiro.
281
Paula Souza e Mello, “campeão ituano de constitucionalismo”
282
, teve
atuação política marcada pelo seu entusiasmo pela propaganda
constitucional:
Devemos reconhecer que os princípios dominantes no
país, desde que começou a nossa revolução, são dois:
monarquia e liberdade. Monarquia sem liberdade é
escravidão para nós, não se pode merecer os respeitos e
simpatias da nação. A nação tem ligado estas duas
idéias; é o que ela deseja; é por isso que se tem
sacrificado tantos anos; é pelo predomínio destas
duas entidades. É, pois, nosso dever trabalhar pelo
triunfo destas duas idéias.
283
Eleito deputado à Assembléia Geral, Constituinte e Legislativa do
Império do Brasil (3 de maio a 12 de novembro de 1823), não pôde ver suas
idéias colocadas em prática, devido à dissolução da Assembléia pelo
Imperador D. Pedro I. Foi também deputado às duas primeiras legislaturas
ordinárias, de 8 de maio de 1826 a 3 de setembro de 1829 e de 3 de maio de
1830 a 5 de outubro de 1833; presidente da Câmara dos Deputados, de 4 de
maio a 2 de junho de 1827; e senador pela Província de São Paulo a partir de
17 de agosto de 1833. Foi ainda secretário e ministro de Estado dos Negócios
do Império (7
o
Gabinete do 2
o
Império), de 20 de julho a 28 de agosto de
1847; e presidente do Conselho de Ministros (9
o
Gabinete do 2
o
Império), de
31 de maio a 29 de setembro de 1848, acumulando no mesmo período a
Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda.
284
281
MARTINS, Maria Fernanda Vieira. A velha arte de governar: um estudo sobre política e
elites a partir do Conselho de Estado (1842-1889). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2007.
p.45-52.
282
HOLLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil monárquico, tomo II, v.2: dispersão e unidade. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p.471-2.
283
Discurso de Francisco de Paula Souza e Melo no Senado, na sessão de 15 de setembro de
1841. Anais do Senado, 1841, livro 5, p.329. Apud: MARTINS, Maria Fernanda Vieira. Op.
cit., 2007. p.44.
284
BRASIL. Senado Federal. Dados biográficos dos senadores de São Paulo: 1826-1998.
Brasília: Secretaria de Informação e Documentação, 1998. p.133-4; LEITE NETO, Leonardo
(Org.). Catálogo Biográfico dos Senadores Brasileiros, de 1826 a 1986. Brasília: Senado
Federal, Centro Gráfico, 1986. p.899-901; CARMO, J. A. Pinto. Ministros da Fazenda. Rio de
Janeiro, 1944. p.119-20; MACEDO, Joaquim Manoel de. Brazilian Biographical annual.
Vol.II. Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia do Imperial Instituto artístico, 1876.
129
Paula Souza e Mello, considerado “o liberal mais sincero e mais puro
de nossa história”
285
, defendia um governo representativo e, assim como
aqueles de seu grupo de origem, temia as convulsões sociais promovidas
pelas classes subalternas, daí o posicionamento conservador quanto às
questões ligadas à abolição da escravidão. Afinal, como afirmara Cavour,
arquiteto da unificação da Itália unida:
Se a ordem social chegar a ser genuinamente ameaçada,
se os grandes princípios sobre os quais ela repousa
vierem a estar de um sério risco, então muitos dos mais
decididos oposicionistas, os mais entusiásticos
republicanos, serão, temos certeza, os primeiros a
aliarem-se aos flancos do partido conservador.
286
Mesmo porque, no Brasil, as designações “liberal” e “conservador”
287
não tinham tanta distinção ideológica; significavam antes a posição na
disputa por clientelas opostas em busca das vantagens do poder.
288
As lutas e conquistas deveriam ficar limitadas ao campo político. As
mudanças pertinentes a toda a sociedade deveriam ser orquestradas pelas
lideranças políticas; qualquer disposição contrária era entendida como o
caminho da desordem.
Então chefe do gabinete liberal, Paula Souza e Mello, no poder desde
1844, assim como Tocqueville na França
289
, demonstrava preocupação e
chamava atenção para os perigos da revolução social em 1848 e o “fermento
socialista”:
p.471-7. BRASIL. Câmara dos Deputados. Francisco de Paula Souza e Mello (SP). Disponível
em: <http://www2.camara.gov.br/conheca/historia/presidentes/francisco_melo.html>.
Acesso em: 24/04/2007; BRASIL. Senado Federal. Disponível em: <www.senado.gov>.
Acesso em: 24/04/2007; BRASIL. Ministério da Fazenda. Disponível em:
<www.fazenda.gov.br/portugues/institucional/ ministros/>. Acesso em: 24/04/2007.
285
NABUCO, Joaquim. Apud: HOLLANDA, Sérgio Buarque. Op. cit., 1997. p.237.
286
Camilo Benso, Conde de Cavour. Apud: HOBSBAWM, Eric J. A Era do Capital (1848-
1875). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. p.35.
287
Sobre liberais e conservadores, ver: MATTOS, Ilmar R. O tempo saquarema: a formação
do Estado Imperial. São Paulo: HUCITEC, 2004.
289
O pensador político discursou na Câmara dos Deputados: “Dormimos sobre um vulcão...
Os senhores não percebem que a terra treme mais uma vez? Sopra o vento das
revoluções...” Alexis Tocqueville. Apud: HOBSBAWM, Eric J. Op. cit., 1979. p.29. Sobre as
revoluções de 1848, ver também: TOCQUEVILLE, Alexis. Lembranças de 1848: as jornadas
revolucionárias em Paris. São Paulo: Companhia das Letras, 1991; MARX, Karl. As lutas de
classes na França. São Paulo: Global, 1986.
1
30
Pede-se que se note que a posição atual da Europa tem
dois caracteres político e social; e não poderemos nós
temer a repercussão com caráter social? Estes boatos,
que dias aparecem no Brasil, não devem despertar
nossos receios?
290
O eminente ministro referia-se à onda revolucionária que abalou a
Europa em 1848. A política complicava-se ainda mais com a influência
socialista e a possibilidade de convulsão social, que Paula Souza e Mello e
seu grupo queriam evitar a todo custo. Defendiam uma concepção liberal
que temia a democracia, conforme evidenciava Theóphilo Ottoni (1807-
1869), que dizia sonhar com uma “democracia pacífica, da democracia da
classe média, a democracia da gravata lavada, a democracia que com o
mesmo asco repele o despotismo das turbas ou a tirania de um só”.
291
Assim, o liberalismo brasileiro, e em especial desse grupo paulista,
tinha suas especificidades. No que diz respeito ao setor econômico, a
interferência do Estado na economia só teria sentido se impulsionasse o
desenvolvimento econômico e prerrogativas políticas que atendessem aos
seus interesses. “Daí o caráter funcional e tópico do seu liberalismo.”
292
Suas discussões giravam em torno de questões dessa ordem,
deixando de lado aquelas ligadas ao necessário reordenamento social.
293
Em
resumo, nessa época, o termo liberal tinha os seguintes significados para a
elite proprietária:
1) Liberal, para a nossa classe dominante aos meados
do século XIX, pôde significar conservador das
liberdades, conquistadas em 1808, de produzir, vender e
comprar.
2) Liberal pôde, então, significar conservador da
liberdade, alcançada em 1822, de representar-se
politicamente: ou em outros termos, ter o direito de eleger
e de ser eleito na categoria de cidadão qualificado.
3) Liberal pôde, então significar conservador da liberdade
(recebida como instituto colonial e relançada pela
expansão agrícola) de submeter o trabalhador escravo
mediante coação jurídica.
290
Francisco de Paula Souza e Mello. Apud: REZENDE, Antonio Paulo. A Revolução Praieira.
São Paulo: Ática, 1995.
291
Theóphilo Ottoni. Apud: REGO, Walquíria Domingues Leão. Op. cit., 1993. p.76.
292
BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p.198.
293
DOLHNIKOFF, Miriam. Op. cit., 2005(a). p.561.
131
4) Liberal pôde, enfim, significar capaz de adquirir novas
terras em regime de livre concorrência, ajustando assim o
estatuto fundiário da Colônia ao espírito da Lei de Terras
de 1850.
294
Propunham-se mudanças dentro da ordem, a criação de leis que
garantissem a soberania nacional e resguardassem a autonomia provincial,
bem como a adoção de medidas que acelerassem o crescimento econômico,
mas desde que este fosse restrito e orquestrado pelo grupo economicamente
dominante: “São estes homens que, no Brasil, foram os cabeças da
Revolução: não cuidavam senão em diminuir o poder do Rei, aumentando o
próprio. Não pensavam de modo algum, nas classes inferiores.”
295
A crítica liberal nesse período era direcionada primordialmente às
instituições políticas do Império. Defensor contumaz do constitucionalismo,
o senador Paula Souza e Mello questionava: “Mas como o conseguiremos?”
Respondendo em seguida:
Eu o direi: seguindo a marcha da justiça formulada pela
constituição que nos rege [...] ela tem em si mesma o
gérmen das reformas e melhoramentos, sem os perigos
que tais reformas e melhoramentos costumam trazer
consigo [...].
296
Segundo sua visão, uma “Monarquia Constitucional Federalista”
parecia ser o caminho mais viável para resolver a questão.
A idéia de federalismo ganhou corpo no Brasil à época da construção
do Estado Nacional Brasileiro, expressando a vontade das elites
comprometidas com os seus interesses locais e materiais –, cujo papel
desempenhado nesse processo garantiu a definição de sua natureza.
297
As
discussões e os debates que se seguiram, principalmente aqueles realizados
na Assembléia Constituinte de 1823, deixam entrever o que entendiam por
federalismo nessa época que o seu entendimento sofreu mudanças ao
294
BOSI, Alfredo. Op. cit., 1992. p.200.
295
SAINT-HILAIRE. “A segunda viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a São Paulo”.
Apud: Ibidem. p.203.
296
Francisco de Paula Souza e Mello. Anais do Senado de 1832, sessão de 28 de maio, p.
146. Apud: DOLHNIKOFF, Miriam. Op. cit., 2005(a). p.573.
297
Idem. O Pacto Imperial: origens do federalismo no Brasil no século XIX. São Paulo: Globo,
2005(b). p.11-2.
132
longo dos acontecimentos do século XIX –, “a reunião de Estados soberanos
em torno de um centro comum”, ou seja, tinha o mesmo sentido de
confederação.
298
Líderes políticos de renome, como Diogo Antonio Feijó e Nicolau
Campos Vergueiro, eram partidários da idéia de federalismo, ainda que
comprometidos com a monarquia
299
, pois, segundo o entendimento que
tinham dessa maneira de organizar o Estado, não residia nenhuma
incompatibilidade. A defesa do federalismo tinha como pressuposto a
garantia da autonomia das províncias; por isso, desejavam uma organização
que conciliasse o governo central e o provincial, de modo que as atribuições
de cada um seriam definidas por uma constituição. Daí a defesa do
constitucionalismo promovida por esses liberais federalistas, entre os quais
Paula Souza e Mello.
Os federalistas brasileiros do século XIX lutavam pela adoção de um
modelo institucional que lhes desse autonomia nas províncias e
representação no governo central. Alguns, declaradamente republicanos e,
portanto, mais radicais, como Frei Caneca (1779-1825)
300
, até aceitavam a
monarquia caso ela seguisse o modelo federalista.
301
A discussão sobre a
forma de governo era secundária; o mais importante era que a província
dispusesse de liberdade para administrar seus interesses. Estes sendo
atendidos, não havia mal algum em admitir a monarquia como forma de
governo.
302
O modelo de federação que estes federalistas pretendiam implantar
era declaradamente inspirado nas instituições norte-americanas; contudo,
nesta geração, esquivavam-se da discussão da democracia e da república.
303
298
COSER, Ivo. “O conceito de Federalismo e a Idéia de Interesse no Brasil do século XIX.
Dados - Revista de Ciências Sociais. Vol.51. n
o
4. Rio de Janeiro, 2008(a). p.941.
299
DOLHNIKOFF, Miriam. Op. cit., 2005(b). p.15.
300
Ver: MELLO, Evaldo Cabral de (Org.). Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. o Paulo:
Editora 34, 2001.
301
DOLHNIKOFF, Miriam. Op. cit., 2005(b). p.15.
302
COSER, Ivo. Op. cit., 2008(a). p.948.
303
No período da Constituição, em 1823, ainda não haviam sido assimiladas no Brasil as
inovações da Convenção da Filadélfia, em 1787, na qual se discutiu a implementação de
alterações na organização dos Estados norte-americanos. Os Estados deveriam permanecer
autônomos, contudo, deveriam estar subordinados ao poder central, ou seja, os Estados não
seriam mais entidades soberanas, pois só assim o governo da União teria poder para, em
dadas circunstâncias, chegar até o cidadão sem passar pelos Estados. Sobre a organização
133
Segundo eles, os ideais que moveram a constituição da nação norte-
americana cabiam somente à sua própria realidade, que as tradições
políticas e religiosas dos Estados Unidos tinham consumado a experiência
do self governement e uma série de outras circunstâncias favoreciam o surto
do capitalismo.
304
No Brasil, as elites ajustavam os contornos de tal modelo conforme os
seus interesses e a realidade brasileira. As instituições norte-americanas
serviam como justificativa para a sua oposição à centralização e para a
defesa da ampliação de sua própria participação política.
305
Privilégio não
estendido a toda a sociedade, o que não significava incoerência, pois não se
distanciava muito dos modelos que seguiam, sendo relativizados os
significados de representatividade e cidadania política na época.
306
Em suma, o federalismo pelo menos neste período de conformação
do Estado Nacional Brasileiro pode ser compreendido como “conjugação
entre autonomia provincial e participação das elites provinciais no governo
central, a fim de ampliar o papel político das elites tanto nas suas províncias
como na Corte”.
307
A solução federalista parece também ter empolgado gerações
posteriores, como a do jovem engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza –
neto de Paula Souza e Mello –, que, em 1869, escreveu um texto expondo as
vantagens do federalismo no Brasil.
308
Diferente de seu avô, sua proposta
defendia a implantação de uma República e considerava a monarquia
ultrapassada, algo exótico entre os países mais adiantados. Pelo que se pode
perceber, sua proposição tinha como modelo os Estados Unidos, que
do Estado Federal, sob o qual se estruturou os Estados Unidos e os princípios que o
nortearam, ver o conjunto de textos publicados originalmente na imprensa de Nova York em
1788 com o objetivo de contribuir para a ratificação da Constituição pelos Estados:
HAMILTON, Alexander. [et. al.] O Federalista. Campinas: Russell Editores, 2005.
304
DIAS, Maria Odila Leite da Silva. A interiorização da metrópole e outros estudos. o
Paulo: Alameda, 2005. p.131-2.
305
Ibidem. p.142.
306
Ver: CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2001. p.29-32; CARVALHO, José Murilo de (Org.). Nação e cidadania
no Império: novos horizontes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007; SAES, Décio
Azevedo Marques de. “A questão da evolução da cidadania política no Brasil”. Estudos
Avançados. Vol.15. n
o
42. São Paulo, mai./ago. 2001. p.379-410.
307
DOLHNIKOFF, Miriam. Op. cit., 2005(b). p.27.
308
Ainda neste capítulo, esta obra em específico será abordada em sua particularidade.
134
também ofereceram ao Brasil a possibilidade de reforma moral, econômica e
política mediante a imigração.
3.2 - ESPERANÇA E CIVILIZAÇÃO
[...] nada me allegra tanto como que V. Mce. Tem
trabalhado para reformar nosso país, e me allegro tanto
mais que apesar de V. Mce. ter tido tantos antecessores,
excellentes e estes não conseguir o que conseguiu
actualmente.
O meu maior desejo jovem he ver o seu nome a partir
daquelles que tem conseguido por em prática as teorias
magníficas do trabalho livre. [...]
Pois então de-se a esses coitados a liberdade [...] muito
ricasso virá a ser pobre homem com a liberdade dos
escravos, mas nós ganharíamos muito mais o Brazil,
adquiriria mais energia, pois lhe se veria obrigado a
ganhar o pão com o suor do seu rosto: e essa intensidade
de preguissossos e ignorantes ver se hião obrigados a
trabalhar e aprender alguma cousa senão quer morrer de
fome, e no Brazil não se pode morrer de fome quando se
trabalha [...].
309
Seguindo trajetória semelhante à trilhada por seu pai, figura
reconhecida entre os políticos mais ilustres e que encetaram o movimento
pela independência, Antonio Francisco de Paula Souza (1819-1866), o
médico, também se enveredou pelos caminhos da política.
Formado em Medicina pela Faculdade Médica da Universidade de
Louvain, na Bélgica, no ano de 1842, teve seu reconhecimento mais pela
presença política em São Paulo e no país. Foi deputado provincial, deputado
geral e ministro da agricultura no ministério Olinda (1864-66)
310
,
destacando-se principalmente pela apresentação de um plano de abolição da
escravidão, com base num projeto específico de imigração.
309
Carta de Antônio Francisco de Paula Souza ao pai, o Conselheiro. Karlsruhe,
07/11/1868. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
310
PADILHA, Rodrigo Bastos; PADILHA, Angelo Fernando. Antonio Francisco de Paula Souza
(1843-1917) o mais antigo estudante brasileiro em Karlsruhe. Disponível em: <www.aaa.Uni-
karlsruhe.de/dowload/PaulaSouza_origonaltex.doc>. Acesso em: 22/03/2005.
135
IMAGEM 14 - Antonio Francisco de Paula Souza, o médico e Conselheiro.
311
A escravidão, então sustentáculo do sistema social e econômico
brasileiro, ao avançar o século XIX, começou a ser questionada. Com o
advento do capitalismo, passou a denotar um entrave para a sua expansão.
Nesse sentido, argumentos eram construídos para apontar a
incompatibilidade da escravatura com a moral cristã, com a ordem
econômica e ainda, conforme defendiam os liberais, com as leis da natureza.
O surto imigrantista no Brasil
312
, principalmente em São Paulo, se
deu por essa ocasião, quando se percebeu que o fim do escravismo era
líquido e certo. A lei que proibia o tráfico negreiro, embora fosse
freqüentemente desobedecida, fez com que a oferta de escravos rareasse,
gerando um comércio interno, cujos preços tornaram-se exorbitantes. Além
disso, as pressões abolicionistas se faziam sentir; o mundo já havia se
311
Fonte: O Cabrião. São Paulo: UNESP, Imprensa Oficial, 2000. p.65.
312
A temática da imigração, sobretudo no período da “grande imigração”, é recorrente na
historiografia brasileira, dada a sua relação com a transição do trabalho escravo para o
trabalho livre, tornando-se tema central para se compreender a histórica de o Paulo na
sua especificidade. Muitos trabalhos abordaram as questões de ordem econômica
preferencialmente, no entanto, longe de esgotar o tema, os novos paradigmas de abordagem
histórica permitem a inserção de outras questões de ordem social, cultural, entre outras.
FAUSTO, Boris. Historiografia da imigração para São Paulo. o Paulo: Editora Sumaré,
FAPESP, 1991.
136
rendido à extinção do trabalho escravo, não restando assim outra opção aos
defensores da escravidão senão reconhecer o seu fim e buscar alternativas.
Os fazendeiros do oeste paulista encontraram na imigração européia
a solução para a questão. O alto custo da manutenção do trabalho escravo
os convenceu da conveniência da mão-de-obra livre. Assim, a convergência
de interesses entre os representantes da administração da província paulista
e os fazendeiros fez com que se elaborasse a vinda desses imigrantes – numa
época favorável a ela, afinal, a Itália vivia um alto grau de empobrecimento
das populações camponesas
313
por meio da imigração subvencionada e se
criassem organismos facilitadores, como a Associação Auxiliadora da
Imigração, em 1871, e posteriormente, em 1886, a Sociedade Promotora da
Imigração
314
, com o objetivo de “difundir, propagandear, atrair e recrutar
trabalhadores na Europa, estabelecendo contratos e racionalizando os
custos de tal empreitada”.
315
O resultado de tais ações foi a chegada, entre os anos de 1871 e
1886, de aproximadamente 40 mil estrangeiros, em sua maioria italianos.
Nos dois anos seguintes, ingressaram no Brasil mais cerca de 122 mil
imigrantes.
316
Levando-se em conta todo o período em que esteve na ativa, a
313
Os italianos predominaram de tal modo na lavoura cafeeira paulista que comumente a
imigração para São Paulo tem sido identificada com italianos. Eles chegaram a representar
cerca de 70% de todas as chegadas entre os anos de 1887-1900. A grande depressão
econômica por que passou a Itália entre os anos de 1880 e 1896 atingiu particularmente o
setor agrícola, e os pequenos proprietários agrícolas e trabalhadores rurais se viram
estimulados a emigrar, também influenciados pela propaganda e divulgação do programa
paulista para imigração. A Espanha representava 11%, Portugal 10% e demais países 6% de
todo o contingente imigrante para São Paulo no mesmo período. HOLLOWAY, Thomas H.
Imigrantes para o café: café e sociedade em São Paulo, 1886-1934. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1984. p.71-3.
Sobre os italianos em São Paulo, ver também, entre outras obras: HECKER, Alexandre. Um
socialismo possível: a atuação de Antonio Piccarolo em São Paulo. São Paulo: T. A. Queiroz,
1988; CARELLI, Mário. Carcamanos & comendadores: os italianos de São Paulo da realidade
à ficção, 1919-1930. São Paulo: Ática, 1985.
314
A fundação da Sociedade Promotora da Imigração reflete o grau de interesse dos
proprietários/empresários paulistas no projeto imigrantista. Fundada em 02/07/1886,
contava com a participação de Martinho Prado Junior, Nicolau de Souza Queirós e Rafael
Aguiar Paes de Barros, 2
o
Barão de Piracicaba, o “tio Rafael”.
315
MATOS, Maria Izilda Santos de. “Imigração Portuguesa em São Paulo: Perspectivas e
possibilidades de investigação”. In: SOUZA, Fernando de; MARTINS, Ismênia (Orgs.). A
Emigração Portuguesa para o Brasil. Porto, Portugal: CEPESE, Edições Afrontamento, 2007.
p.291-304.
316
“Da Escravidão ao trabalho livre”. In: IGLÉSIAS, Francisco. [et. al] O Brasil monárquico, v.
3: reações e transações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. p.178.
137
Sociedade Promotora da Imigração introduziu cerca de 255 mil imigrantes
em São Paulo.
317
Paralelamente à inserção do trabalho livre, a mão-de-obra escrava
ainda era bastante utilizada. Mesmo com a proibição do tráfico negreiro,
uma nova modalidade de comércio de negros surgiu, o tráfico
interprovincial, também criticado pelos cafeicultores paulistas, que se
opuseram à prática, que eram os que mais necessitavam de mão-de-obra
e apoiavam a solução imigrantista, que, afinal, acabou prevalecendo, criando
condições objetivas para a vitória do abolicionismo.
318
Antes da efetiva imigração com esse sentido de oferecer mão-de-obra
para a lavoura cafeeira, configuração que ela ganhou nas últimas décadas
do século XIX, algumas experiências foram postas em prática. Entre elas, a
que alcançou maior projeção foi a experiência do regime de parceria,
realizada a princípio pelo senador Nicolau Pereira Campos Vergueiro (1778-
1859) em sua propriedade, a fazenda Ibicaba, na região de Limeira, em
1847, antevendo a lei Eusébio de Queiroz, que suspenderia em definitivo o
tráfico negreiro.
319
Vergueiro recebeu um empréstimo do governo Imperial,
que pagaria durante três anos, livre de juros, para efetivar seu projeto de
imigração, cobrindo os gastos com a transferência, numa primeira leva, de
64 famílias.
O acordo entre parceiros consistia no financiamento pelos
proprietários da viagem e das despesas iniciais do imigrante para
estabelecer-se, e os trabalhadores, cuidando de determinado número de pés
de café e tendo direito a um pedaço de terra para cultivo de gêneros para sua
subsistência, deveriam reembolsar as dívidas contraídas inicialmente num
prazo de dois anos; caso não conseguissem cumprir esse prazo, estariam
sujeitos ao pagamento de juros. Os trabalhadores eram responsabilizados
317
SANTOS, Ivison Poleto dos. A Sociedade Promotora da Imigração e o financiamento público
do serviço de imigração. Dissertação (Mestrado em História Social), USP, São Paulo, 2005.
318
BEIGUELMAN, Paula. A crise do escravismo e a grande imigração. São Paulo: Brasiliense,
1981. p.12-9.
319
Para um maior e melhor detalhamento acerca do sistema de parceria, seu funcionamento
e fracasso, ver, entre outras obras: WITTER, José Sebastião. A Revolta dos Parceiros. o
Paulo: Brasiliense, 1986; Idem. Ibicaba, uma experiência pioneira. São Paulo: Arquivo do
Estado, 1982; DAVATZ, Thomaz. Memórias de um colono no Brasil. São Paulo: Martins,
1972.
138
por todos os gastos dos fazendeiros em seu favor
320
, de modo que todas as
despesas na implantação do novo sistema ficavam a cargo do próprio
trabalhador imigrante, que, portanto, iniciava sua jornada num novo país
endividado.
321
O aparente sucesso do empreendimento de Vergueiro suscitou o
interesse de outros fazendeiros, que também adotaram o sistema, fazendo
algumas adaptações e aperfeiçoamentos, que, no entanto, nunca traziam
vantagens aos trabalhadores. Por volta de 1855, havia na Província de São
Paulo aproximadamente 3500 trabalhadores em trinta fazendas.
322
A escolha do sistema de parceria como solução para o problema da
mão-de-obra no país pode ser explicada por sua própria lógica. Os
proprietários entendiam que esse sistema seria muito vantajoso para eles,
uma vez que os trabalhadores, sem saber ao certo o seu rendimento, se viam
estimulados a dedicarem-se mais ao trabalho a fim de receberem mais,
afinal, sua renda dependia do montante produzido. Conseqüentemente,
entendia-se que, além de aumentar a produção, esse procedimento
demandaria menos trabalhadores, e o investimento inicial necessário ao
empreendimento seria muito menor.
Cabe notar que o referido sistema ainda apresentava outra vantagem:
os parceiros deveriam ter acesso a uma pequena roça para sua subsistência,
o que fazia com que as despesas com o empreendimento fossem ainda
menores, que os proprietários não precisariam custear a alimentação dos
trabalhadores.
323
Por fim, entendia-se que com a parceria corriam-se menos
riscos que com o trabalho assalariado, pois, em face das incertezas do
mercado cafeeiro e suas oscilações, afastava o perigo de os proprietários
terem de gastar com o pagamento de mão-de-obra independentemente da
lucratividade que tivessem.
320
STOLCKE, Verena; HALL, Michael. A introdução do trabalho livre nas fazendas de café
de São Paulo”. À Luta Trabalhadores. Revista Brasileira de História. n
o
6. São Paulo: Marco
Zero, 1984. p.83.
321
STOLKE, Verena. Cafeicultura: homens, mulheres e capital (1850-1980). São Paulo:
Brasiliense, 1986. p.20.
322
Ver quadro nos anexos sobre o número e a origem dos colonos na Província Paulista
entre os anos de 1850 e 1860, os municípios das fazendas que adotaram o sistema e seus
respectivos proprietários.
323
STOLKE, Verena. Op. cit., 1986. p.24-6.
139
Contudo, tal ensaio da utilização da mão-de-obra livre, composta
nesse primeiro momento por colonos alemães e suíços
324
, não teve o êxito
esperado, por diversas razões, sobretudo o conflito de interesses entre
colonos e proprietários. Muitos indicaram a qualidade do trabalhador
como fator principal do fracasso
325
, mas, como se sabe, o insucesso da
experiência se deveu a uma série de questões, envolvendo o desagrado das
duas partes envolvidas, colonos e proprietários.
326
Ademais, a própria
estrutura exigida pela produção cafeeira inviabilizava o funcionamento do
projeto.
327
As dificuldades do sistema adotado por Vergueiro acabaram por
fortalecer a resistência à iniciativa por parte daqueles proprietários que
entendiam a instituição escravista como única saída para a questão do
trabalho. O projeto imigrantista enfraqueceu também devido à fama que
o Brasil ganhou na Europa, dificultando o recrutamento de pessoas
dispostas a emigrar. Aqueles que se encontravam aqui tentavam buscar
outras paragens fora do Brasil, inclusive nos Estados Unidos. O governo era
alertado a conter tal movimento, tomando as devidas providências para
evitar que os imigrantes fossem para lugares que pudessem lhes oferecer
melhores condições:
Por informações, mesmo a que colhi de vários colonos
alemães de Petrópolis, vai se operando [...] a fazer
324
Estudos apontam que na época, por volta de 1850, a Europa e, em especial, as regiões de
onde vieram esses “imigrantes parceiros” eram de extrema precariedade. Emigrar tinha o
significado, para eles, de sobrevivência. Na Suíça teria havido um crescimento populacional
tal que os pequenos proprietários não tinham mais condições de subdividir as terras. Assim,
emigrar para um lugar onde a terra abundava parecia ser a solução mais viável. DEAN,
Warren. Rio Claro: um sistema brasileiro de grande lavoura, 1820-1920. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1977. p.113.
325
Na defesa das melhores intenções dos proprietários, dizia-se que as municipalidades das
quais partiam os colonos livravam-se de seus “condenados, vagabundos, enfermos, velhos,
atirando-os para o Brasil”. Mas também havia quem condenasse as atitudes “bárbaras” e
“avarentas” de alguns proprietários do interior, que não sabiam lidar com homens livres.
TAVARES BASTOS, Aureliano Cândido. “Memória sobre a Imigração (relatório apresentado
pela diretoria à Sociedade Internacional da Imigração)”. In: TAVARES BASTOS, Aureliano
Cândido. Os males do presente e as esperanças do futuro: estudos brasileiros. São Paulo:
Ed. Nacional; Brasília: INL, 1976. p.86.
326
Os colonos, desiludidos com a América, acusavam os proprietários de adotarem medidas
fraudulentas, cálculo desonesto, além das péssimas condições de vida e de trabalho.
327
COSTA, Emília Viotti da. Da Senzala `a Colônia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP,
1998. p.139.
140
emigrar para os Estados Unidos pelo menos a maior
parte dos colonos alemães que habitam o Brasil.
Importando urgente que o nosso governo se ponha ao
alcance desta manobra em todas as nossas colônias para
acudir com providências; e que em Petrópolis deve
proteger-se e criar se diversas industrias para esta gente
poder achar meios devido não oferecer melhores terras
em outras partes.
Os que estão embarcados [...] Muitos outros tratão de
arranjos pois devem vir segundo colhi 2 navios
americanos.
A 2 meses pouco mais ou menos veio dos Estados Unidos
um português que se dizia capitão do Exército Norte
Americano, chamando-se Antonio Joaquim; este foi o
primeiro aliciador.
2
o
Manoel, que foi e ainda é criado do Dr. Kelly a mais de
20 anos e é também catequista protestante.
Disseram-me que fornecerá passagem aqueles a quem
faltar meios [...].
328
Outros achavam que o governo deveria criar mecanismos, utilizando
inclusive a lei, para obrigar a população nacional a superar a “aversão” ao
trabalho, como se acreditava. Entendiam que o Brasil possuía naturalmente
tudo o que era necessário para o seu progresso e riqueza, mas o que o
atravancava era a sua população sem interesse pelo trabalho.
Todavia, aqueles que acreditavam na solução imigrantista não
esmoreceram com o malogro daquela experiência. Para o Conselheiro Paula
Souza, a imigração resolveria uma série de questões, como o necessário
povoamento do território brasileiro, então caracterizado por uma
distribuição do contingente populacional. Idéia que não era nova, pois desde
os tempos da vinda da família real para o Brasil, sob a administração de D.
João VI
329
, estimulava-se a imigração, acreditando-se que poderia resolver
algumas questões econômicas, mas principalmente de ordem demográfica,
moral e militar, na defesa do território e suas fronteiras.
330
328
Carta ao Conselheiro Paula Souza, enviada por J. Durão Annaes. s/d. Arquivo Paula
Souza - PSca.865/2, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
329
“A Colonização baseada no regime de pequena propriedade agrícola”. In: IGLÉSIAS,
Francisco. [et. al.] Op. cit., 2004. p.223.
330
quem afirme que também se encontrava na política joanina de colonização e
imigração a idéia do branqueamento da sociedade brasileira. AZEVEDO, Salvio de Almeira.
“Imigração e Colonização no Estado de São Paulo”. Revista do Arquivo Municipal. Vol.75. São
Paulo, 1941. p.105-56.
141
Desse modo, o Conselheiro Dr. Paula Souza pretendia, em seu projeto
de imigração, estimular a vinda de estrangeiros que se tornassem pequenos
proprietários. Sua intenção era trazer um povo industrioso, que valorizasse o
trabalho e, mediante essas qualidades, características do ideal liberal,
garantisse não o seu próprio enriquecimento, mas também o do país que
o teria acolhido e lhe dado a chance de crescer.
Assim, o Conselheiro entendia que, para que isso efetivamente fosse
alcançado, a imigração deveria ser espontânea, pois assim se garantiria a
chegada de estrangeiros interessados em desenvolver o lugar em que iriam
morar e aplicar seu pecúlio nesse sentido, cumprindo, dessa maneira, os
ideais do liberalismo econômico.
331
O sucesso desses pequenos
empreendedores poderia atrair outros que, sem capital, trabalhariam nas
fazendas de café, substituindo a mão-de-obra escrava, até conseguirem
acumular um montante suficiente que lhes permitisse adquirir suas próprias
terras.
Por isso, o agente do ministro Paula Souza, imbuído dos preceitos
liberais, do individualismo e da livre iniciativa, dizia ser fundamental para o
sucesso do projeto que a imigração acontecesse espontaneamente:
Aquillo que deve fazer o governo em minha fraca opinião
é proporcionarmos ocupação aos emigrantes, pois isso
bastará para fazel-os affluir para o Brazil.
Mas os meios de empregar para esse fim devem ser muito
indirectos e direi mesmo sistematicamente indirectos.
Pois se o colono se persuadir que o governo toma-o
no collo, adeos iniciativa individual, único meio
seguro de sucesso na vida do homem.
332
Assim, o povo que mais se enquadrava nesses princípios era o norte-
americano, cujo feito, supunha-se, havia proporcionado o caminho do
crescimento dos Estados Unidos. Dessa maneira, ele idealizou
preferencialmente a vinda do imigrante norte-americano
333
:
331
DEAN, Warren. Op. cit., 1977. p.96.
332
Carta de Luiz Werneck. Genebra, 05/10/1865. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de
Andrade, São Paulo. (destaques nossos)
333
Havia também interesse em abrir uma corrente imigratória da Europa, especialmente da
Suíça, como demonstra a correspondência do Conselheiro. No entanto, seus esforços
142
[...] povo de que mais nos convém, visto que elle muito e
muito industrioso como prova o rápido augmento da
Norte-América [...] amante do trabalho, ella produzirá
preciza e necessariamente muito bons fructos; estará
acima de qualquer outra que tenhamos tido em geral em
todo o Brazil.
334
A realização do projeto iniciou-se com o estabelecimento de uma
relação entre emissários brasileiros e norte-americanos, também
interessados nos assuntos da imigração. Da parte de lá, foram criadas
sociedades como a Southern Colonization Society e a Florida Emigration
Society, com o intuito de coordenar as emigrações e o estabelecimento de
comunidades em seus destinos. Com essa intenção, enviavam agentes a fim
de verificarem as reais condições do estabelecimento de colônias, a partir de
dados econômicos, agrícolas, culturais, e a possibilidade de negociação com
os líderes políticos de incentivos para a emigração.
Do lado brasileiro, também foram criadas associações imigrantistas e
enviados representantes aos Estados Unidos, principalmente, e à Suíça,
tendo como escopo estimular o interesse pela mudança de terra,
apresentando as vantagens da política imperial para os emigrados. Tais
associações elaboravam panfletos, cartilhas, livros e guias com a finalidade
de divulgar informações sobre o Brasil.
Conhecido como “padrinho” da imigração, o Conselheiro Paula Souza
era solicitado para, por meio de sua administração, ajudar na edição desses
concentraram-se na imigração americana. Carta de C. José Hormeyer. Arquivo Paula Souza,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
A impopularidade do Brasil na Europa dificultava as tentativas nesse sentido. O Brasil o
oferecia incentivos suficientes para atrair os suíços: “[...] confesso à Vossa Excelência que
não tenho animo de escrever o que quer que seja sobre colonização. [...] Para melhor me
reprimir e com a liberdade [...], eu direi a V. S. que a imigração não segue o caminho do
Brasil porque não enxerga ahi fáceis recursos para estabelecer-se com vantagens. A
constituição e o regimem da nossa propriedade territorial monopolisada pelos fazendeiros e
as dificuldades de transporte e locomoção dos terrenos devolutos ou terras públicas
expellen o colono do exercício da agricultura onde o regimen da parceria ou o do salário não
offerecem atractivos. Que, pois, fazer o colono? Indústria manufatureira? Essa não existe.
Comércio? Com agricultura insipiente e sem indústria, as exigências do comércio não
podem comportar [...].” Carta de Luiz Werneck. Genebra, 05/10/1865. Arquivo Paula Souza
- PSca.865/2, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
334
Carta ao Conselheiro Paula Souza, remetida por Antonio JoMaria Pego Junior. Vapor
Magé, 26/12/1865. Arquivo Paula Souza - PS 865.12.26/3, Biblioteca Mário de Andrade,
São Paulo.
143
livros, como o fez Guilherme Scully (editor de um jornal de língua inglesa na
Corte, o Anglo Brazilian Times, e também diretor estrangeiro por um tempo
da Sociedade Internacional de Imigração) para o seu “Guia do Brazil”, que
seria distribuído na Inglaterra, Irlanda, Escócia e Estados Unidos. O
conteúdo tratava da descrição de cada Província, detalhamento do clima,
terreno, agricultura, vias de comunicação, por terra, mar e rios, exportação,
importação, costumes, educação, enfim, “um perfeito guia que se de
tornar indispensável para atrair quem tiver algum interesse no país”.
335
A divulgação desses dados da terra, do povo e do governo
336
tinha o
propósito de atingir os interessados de tal modo que viessem
espontaneamente, maneira entendida fundamental para que os objetivos em
prol do desenvolvimento e enriquecimento econômico e moral do país fossem
realmente alcançados.
337
Em suma, financiava-se o transporte, alimentação, guias, intérpretes
e determinadas somas eram oferecidas para que os agentes pudessem viajar
pelas terras brasileiras, a fim de verificar onde e como poderiam estabelecer-
se:
O Wood ao chegar aqui hoje [...] resolveu fixar-se
definitivamente aqui e marcou a olho o território que
os americanos querem ocupar, inclusive o lugar para os
assuntos da cidade que pretende seja fundada.
338
São diversas as missivas que tratam das explorações do território
brasileiro, em especial o paulista pelo general Wood, como a do primo do
Conselheiro, Bernardo Avelino Gavião Peixoto:
335
Carta ao Conselheiro Paula Souza, enviada por Guilherme Scully. Rio de Janeiro,
17/10/1865. Arquivo Paula Souza - PS.865.10.17/7, Biblioteca Mário de Andrade, São
Paulo.
336
Sobre o assunto da divulgação do Brasil no exterior, outras missivas do Arquivo Paula
Souza fazem referência: Carta de João Guilherme d’Aguiar Witaker, PSca865.05/2; Carta de
Ignácio da Cunha Galvão, PS865.11/07 (fala de sua publicação sobre a imigração contendo
legislação brasileira referente aos imigrantes e que, com a ajuda do Conselheiro, gostaria de
vê-la publicada em português, francês, inglês e alemão). Rio de Janeiro, 07/10/1865;
17/10/1865. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
337
Carta ao Conselheiro, enviada por João da Silva Carrão. Arquivo Paula Souza -
PS865?09?/2, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
338
Carta de João da Silva Carrão, enviada ao Conselheiro Paula Souza. s/d. Arquivo Paula
Souza - PS865?08?, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
144
Primo Paula Souza [...]. As notícias que me vem do
interior á respeito do Wood são excellentes!! O homem
vae contentíssimo e ao que parece no firme propósito de
não sair de São Paulo. [...] também reconhece a
superioridade de nossa Província e encontra-se aqui
todas as condições que precisam para os seus patrícios.
Deus os traga á todos e muito logo. È opinião geral que
com sua consignação no ministério S. Paulo te
immigração importante. E por ainda com sacrifício, não
nos prive d’este immenso e incalculável benefício.
339
Explorador das benesses que o Governo Imperial oferecia e do
potencial das suas terras, o General William Wallace Wood, no ano de 1865,
buscou introduzir em território brasileiro mais de 600 fazendeiros dos
estados de Mississippi e Louisiana. Afirma-se que sua presença no Brasil
deixou a desejar, bem como que, após aproveitar-se do interesse brasileiro
nos negócios da imigração, nunca mais retornou ao país, nem o Brasil ouviu
mais notícias suas.
340
A viagem teria servido apenas para seus
divertimentos.
341
Em carta enviado por um norte-americano que vivia no
Brasil, o Conselheiro Paula Souza foi alertado:
Tem aparecido ultimamente muitos artigos nos jornaes
da Côrte sobre a Emigração “Norte Americana” e hoje se
encontra muitos “representantes” por si constituídos de
hum número de gente que é realmente fabuloso e
absurdo, que Emigrão para o Brazil.
Snr. Ministro, tenho razão bem fundada de supor que
toda essa fanfosarrada [sic] não passa de especulação de
alguns interessados que queirão especular sobre a
credulidade dos brasileiros e desejo que V. Excia. fica
prevenida de antemão.
Sou americano residente neste paiz 20 annos, tenho
sido muito feliz em granjear a simpatia de todos e sou
muito grato.
Desejo que as relações entre Brazil e América do Norte
sejão das mais intimas porem não quero que o povo
339
Carta de Bernardo Avelino Gavião Peixoto. São Paulo, 04/04/1865. Arquivo Paula Souza,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
340
Ao que parece, também nos Estados Unidos o general Wood teria se aproveitado da
viagem ao Brasil. Após seu retorno, em janeiro de 1866, sua principal atividade teria sido
viajar para palestrar sua experiência e visão acerca da imigração para o Brasil, chegando
inclusive a publicar um livro, Ho! For Brazil!. Depois dessa fase, passou a atuar como
promotor no Mississipi e as “aventuras” pelo Brasil ficaram esquecidas.
341
“Aspectos das migrações norte-americanas após a guerra civil”. In: IGLÉSIAS, Francisco.
[et al.] Op. cit., 2004. p.263.
145
americano sejão mal juizado por imprudência dos
“Especuladores”.
Tomo a liberdade de recomendar a V. Excia. que exigir
desses estrangeiros Documentos Certificados e
Verificações. Essa precaução não custa nada e para o
futuro V. Excia há de agradecer [...].
342
Também investigou a região paulista na mesma época o Dr. James
MacFadden Gaston (médico aristocrata de Colúmbia), representando
famílias da região da Carolina do Sul. Munido de carta de recomendação do
ministro, seguiu rumo ao interior de São Paulo e também a outras regiões do
país.
343
Os familiares do ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas,
Paula Souza, privilegiados pela relação com o governo mediante seu parente,
organizavam incursões dos agentes imigrantistas norte-americanos na
Província paulista, em terras de seu interesse, geralmente suas propriedades
e de seus apaniguados, dando a impressão de que a gestão do ministro
canalizava para a sua região seu projeto de civilização:
Não posso escusar-me de fazer-te minhas queixas por
ter-se esquecido da Bahia em se tratando da colonização
americana.
Não seja bairrista, veja que nós aqui também oferecemos
aos colonos americanos magníficos terrenos em lugares
apropriados e já tem navegação a vapor.
Mande-me para algum desses americanos, que
facilitaria sem o menor dispêndio para ele, o
conhecimento dos melhores lugares da província, dar-
lhes-hei vantagens quem também nos atraia para nós
[...].
344
Em outra missiva, seu primo também alertava: “Não sejas Caipira
Paulista nesta questão de imigração.” Dessa forma, advertia Paula Souza da
342
Carta ao Conselheiro Paula Souza, enviada por D. W. Clinton Van Trempl. Rio de
Janeiro, 11/10/1865. Arquivo Paula Souza - PS.865.10.11/3, Biblioteca Mário de Andrade,
São Paulo. (grifos originais)
343
Carta ao Conselheiro, enviada por Pedro de Araujo Lima, o Marquês de Olinda.
10/07/1865. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
344
Carta ao Conselheiro, enviada por Manuel Pinto de Souza Dantas, do Gabinete da
presidência da Bahia. 3/11/1865. Arquivo Paula Souza - PS.865?11.03, Biblioteca Mário
de Andrade, São Paulo. (grifo original)
146
existência de outras regiões além de São Paulo com terras tão boas como as
de Campinas.
345
Segundo narrativa dos próprios agentes, disputava-se no Brasil o
privilégio de recebê-los: “Bailes, festas, serenatas eram nossos companheiros
de todas as noites. Estivéssemos no campo ou na cidade havia sempre, e
invariavelmente, uma grande cena de vida, amor e amizade, sedutoras”,
contou o general Wood.
346
Todavia, não foi somente em São Paulo que se deu o empreendimento
colonizador. Comunidades imigrantes se estabeleceram também no Paraná,
no Amazonas, no Rio de Janeiro, conforme relatos das correspondências do
ministro avisando sobre o envio de recursos para essas regiões.
Muitas são as cartas enviadas ao ministro por Tavares Bastos, um
dos diretores da Sociedade Internacional de Imigração, fundada em janeiro
de 1866, no intuito de conseguir os auxílios prometidos pelo Governo do
Império para a execução do projeto de imigração norte-americana. Nessas
missivas, Tavares Bastos faz referência às regiões acima citadas, e não
somente a São Paulo:
Em nome dos meos collegas, membros da Sociedade
Internacional de Immigração venho rogar a V. Excia. para
os immigrantes norte-americanos, mencionados na lista
inclusa, os seguintes obséquios:
1.º Passagem do governo nos vapores da comp.ª
intermediária para os que vão indicados na lista junta
2.º Recomendação de V. Excia. para o pres. do Paraná,
ou antes para as autoridades de Paranaguá, e as de
Santa Catarina.
3.º Passagem na estrada de ferro e na “União e Indústria”
para os que queiram ir ver Minas.
Esses homens o recomendados pelo Snr. e
Albuquerque, dos quaes foram companheiros de viagem
pelo último paquete americano.
Esperando de V. Excia a sua costumada benevolência,
assigno-me com muito respeito.
[...]
345
Carta de Calazans ao Conselheiro. São Paulo, 03/10/1865. Arquivo Paula Souza -
PS.865.10.03/1, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
346
BLANCHE, Henry Clark Weaver. “Confederate Emigration to Brazil”. Journal of
Souththern History. Vol.27. S.l., feb. 1961. p.37-8. Apud: HARTER, Eugene C. A Colônia
Perdida da Confederação: A imigração norte-americana para o Brasil após a Guerra de
Secessão. Rio de Janeiro: Nórdica, 1985. p.52.
147
PS. Esses homens são precursores; outros virão atraz;
não são proletários; foram proprietários.
347
Aliás, o liberal Aureliano Candido Tavares Bastos (1839-1875)
348
,
representante da Província de Alagoas, era um dos mais fervorosos e
entusiastas do movimento imigrantista e “americanista”, defendendo a
subvenção do governo nesse sentido. Foi ele quem propôs a criação de uma
linha de paquetes para realizar o serviço de correio transatlântico entre o
Brasil e os Estados Unidos, sugestão que o Conselheiro Paula Souza
prontamente atendeu.
349
Tavares Bastos chamava a atenção para outras regiões do país, no
Nordeste sobretudo em Pernambuco e na sua Província, Alagoas e no
Amazonas, com potencial para a recepção de imigrantes. Segundo ele, o
Amazonas tratava-se de região que, além de salubre, “é no Brazil o
verdadeiro país do algodão”, produzido com base no trabalho livre e
assalariado.
350
Organizou inclusive um tratado a fim de promover a
imigração para aquela região, chegando a publicar uma obra específica
351
,
resultante de viagem de pesquisa que empreendera. Um trecho de uma carta
que enviou ao Conselheiro Paula Souza oferece uma idéia da dimensão de
seu pensamento e projetos
352
:
347
Carta de Tavares Bastos ao Conselheiro. 03/03/1866. Arquivo Paula Souza -
PS.866.03.03, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (grifo original)
348
Tavares Bastos foi eleito deputado geral por Alagoas em três legislaturas, 1861-1863,
1864-1866 e 1867-1870, sendo que na primeira vez tinha 22 anos de idade, era o mais
jovem deputado no Parlamento, eleito juntamente com José de Alencar, João Alfredo, José
Bonifácio, o Moço, entre outros. Publicou diversas obras, nas quais expressava seu
pensamento acerca de questões como a escravidão, a imigração, a livre navegação do
amazonas, a educação e o polêmico assunto da separação entre Estado e Igreja: Cartas do
Solitário (1862); O vale do Amazonas (1866); Reflexões sobre a imigração (1867); A província
(1870); Reforma eleitoral e parlamentar e Constituição da magistratura (1873).
Tavares Bastos era patrono da cadeira 35 da Academia Brasileira de Letras. ACADEMIA DE
LETRAS. Disponível em: <http://www.academia.org.br>. Acesso em: 12/01/09.
349
Carta de Tavares Bastos ao Conselheiro. 15/12/1865. Arquivo Paula Souza -
PS.865.12.05, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
350
Carta de Tavares Bastos ao Conselheiro. 15/12/1865. Arquivo Paula Souza -
PS.865.12.05, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
351
TAVARES BASTOS, Aureliano Cândido. O Vale do Amazonas: a livre navegação do
Amazonas, estatística, produções, comércio, questões fiscais do vale do Amazonas. São
Paulo: Companhia Editora Nacional; Brasília: INL, 1975(a).
352
Essa carta foi também transcrita por Tavares Bastos no livro “O Vale do Amazonas”, ao
abordar o desperdício de riquezas que havia na Amazônia, atribuindo-o à “indolência
natural” de sua população. No seu entender, havendo um povo interessado como os norte-
148
Si auguma parte do Brazil merecesse preferência na
emigração norte-americana, seria indubitavalmente o
Amazonas.
A falsidade das informações derramadas no mundo sobre
a salubridade d’aquelle paiz o prejudica-o extremamente
no interesse de attrahir emigrantes da raça saxônica.
[...]
A rapidez de communicações directas a vapor com o paiz
de sua procedência e a vantagem especial da navegação a
vela no rio para barcas de qualquer dimensões,
constituem vantagens consideráveis para o emigrante
norte-americano no Amazonas.
Cumpre, porém, abandonar qualquer tentativa de
emigração isolada; o que convém é que muitas famílias,
um número de 100 pessoas pelo menos, emigrem
simultaneamente e se estabeleçam em um desses
magníficos pontos do Amazonas, na intenção resoluta de
cultivarem a terra.
Um estabelecimento nessas condições, com um sacerdote
e um professor, prosperará necessariamente.
353
Contudo, efetivamente, as mais importantes e significativas levas de
imigrantes se destinaram mesmo para São Paulo, talvez não em razão da
produção cafeeira, mas também pelo grande empenho do ministro, de seus
conterrâneos políticos, de seus parentes, dos proprietários de terras e dos
membros da Associação Auxiliadora da Imigração para São Paulo, fundada
em novembro de 1865 como Antonio da Silva Prado (Barão de Iguape),
Bernardo Avelino Gavião Peixoto, João da Silva Carrão, Fidencio
Nepomuceno Prates, Joaquim José dos Santos Silva (Barão de Itapetininga),
Antonio Manoel de Freitas (Barão do Rio Claro), Francisco Antonio de Souza
Queiroz (Barão de Souza Queiroz), João Manuel da Silva (Barão do Tietê),
João da Silva Machado (Barão de Antonina), Martinho da Silva Prado, Luiz
Antonio de Souza Barros, entre outros.
354
Os lucros que se pretendia obter com a venda de propriedades aos
imigrantes eram exorbitantes, o que significa que a imigração também era
americanos, a região haveria de tornar-se próspera e integrada às demais regiões do país.
Ibidem. p.212-6.
353
Carta enviada ao Conselheiro por Tavares Bastos. 15/121865 (a bordo do transporte
“Oyapochi”). Arquivo Paula Souza - PS.865.12.15/1, Biblioteca Mário de Andrade, São
Paulo.
354
ZORZETTO, Alessandra Ferreira. Propostas imigrantistas em meados da década de 1860:
a organização de associações de apoio à imigração de pequenos proprietários norte-
americanos – análise de uma colônia. Dissertação (Mestrado em História Social), Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP, Campinas - SP, 2000. p.64.
149
um negócio. Ademais, envolvia ainda a possibilidade da abertura de um
canal de comunicação com aqueles interessados na exportação de
mercadorias, sobretudo do algodão, produto considerado privilegiado entre
os americanos, acostumados a produzi-los na sua terra de origem. Assim,
donos de casas de exportação em Santos, entre as quais Souza Queiroz &
Vergueiro e Martinho Prado & Wright, apoiavam a imigração por anteverem
os negócios que poderiam estabelecer com os estrangeiros, entre outros
fatores.
355
Quanto à produção de algodão, se chegou a estabelecer uma
verdadeira campanha para estimulá-la, que se entendia a referida cultura
como um meio para se tomar parte no mercado capitalista internacional. A
matéria-prima era fornecida à indústria têxtil da Inglaterra e dos Estados
Unidos, preenchendo parte da lacuna deixada pelos produtores sulistas
daquele país, destroçado depois da guerra. O inglês John James Albertin,
superintendente da São Paulo Railway entre os anos de 1861 e 1869,
escrevia ao Conselheiro explicando as vantagens de se incentivar a cultura
algodoeira no Brasil
356
, indicando inclusive a possibilidade de se aproveitar a
mão-de-obra especializada norte-americana que estava chegando ao país,
especialmente à província paulista.
357
O interesse pela cultura do algodão também abriria um canal para a
revenda de maquinário e instrumentos de agricultura
358
e incentivaria a
ampliação da rede ferroviária, objeto de interesse de investidores ingleses.
359
Aliás, tal ampliação também importava a J. J. Albertin, que empreendeu
viagem ao interior a fim de mapear as condições para encaminhar imigrantes
355
Ibidem. p.77.
356
A produção açucareira também era incentivada, tendo sempre em vista a cultura a que
os norte-americanos estavam habituados: “O Senhor Burns [...] é um fazendeiro
experimentado de assucar, que pode introduzir no país importantes melhoramentos na
cultura e fabrico da cana [...].” Carta ao Conselheiro, de Francisco Ignácio da Cunha Galvão.
Arquivo Paula Souza - PSca.865/13, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
357
Carta ao Conselheiro, enviada por John James Albertin. São Paulo, 04/09/1865.
Arquivo Paula Souza - PS.865.09.04/2, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
358
Carta ao Conselheiro, enviada por H. M. Lane. Rio de Janeiro, 06/04/1866. Arquivo
Paula Souza - PS.866.04.06, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
359
OLIVEIRA, Maria Costa de. O Destino (não) Manifesto: Os imigrantes norte-americanos no
Brasil. São Paulo: União Cultural Brasil-Estados Unidos, 1995. p.26-7.
150
e, por essa ocasião, reafirmou a necessidade do estabelecimento de linhas
férreas
360
.
Considerava-se interessante que viessem para o Brasil
principalmente indivíduos que tivessem algum pecúlio e não fossem
proletários, como fica evidente no “post-scriptum” da carta de Tavares
Bastos. No entanto, ainda que não o tivessem, se considerava sua vinda
vantajosa para o país apenas por sua presença em quaisquer atividade que
fosse, pois, com sua característica de “povo laborioso”, poderiam influenciar
a população nacional e impulsionar o desenvolvimento do país:
A raça anglo-americana não tem rival no mundo...
Eminentemente industriosa empreendedora e
perseverante imprimirá em nosso paiz notável impulso.
Nem é possível calcular o rápido progresso que terá o
paiz, se essa raça vier aproveitar os seus recursos
naturaes.
361
Desse modo, muitos imigrantes, principalmente norte-americanos,
ingressaram no país, como parte do projeto de civilização empreendido pelo
governo.
362
A aprovação desse projeto de imigração em específico não era
unanimidade entre os grandes proprietários de terra. A proposta foi aceita
principalmente entre os paulistas e aqueles que possuíam uma
diversificação nos negócios, que não viam como ameaça à sua propriedade a
vinda de proprietários; ao contrário, entendiam que sua presença, como
exposto, ampliaria ainda mais as possibilidades de negócios e lucros.
360
AUBERTIN, John J. Onze dias de viagem à Província de São Paulo com os senhores
americanos. Carta dirigida ao IImo. Sr. Barão de Piracicaba. o Paulo: Typographia Alemã,
1866.
361
Diário de São Paulo. São Paulo: Globo, 26/09/1865. p.1.
362
Para conhecer a organização e o cotidiano dessas colônias, ver, por exemplo: ZORZETTO,
Alessandra Ferreira. Op. cit., 2000; LAMB, Roberto Edgar. Imigrantes Britânicos em Terras
do Império Brasileiro: mobilidade, vivência e identidades em colônias agrícolas (1860-1889).
Tese (Doutorado em História Social), PUC/SP, São Paulo, 2003; GADELHA, Regina Maria
D’Aquino Fonseca Gadelha. Os núcleos coloniais e o processo de acumulação cafeeira (1850-
1920). Tese (Doutorado em História), PUC/SP, São Paulo, 1982; ALENCASTRO, Luis Felipe
de; RENAUX, Maria Luiza. “Caras e modos dos migrantes e imigrantes”. In: ALENCASTRO,
Luis Felipe de (Org.). História da Vida Privada no Brasil: Império. São Paulo: Companhia das
Letras, 1997. Para uma noção da administração, ver nos anexos carta com descrição do
Conselheiro Paula Souza, escrita ao empossar o diretor da colônia de Assungrey, na
Província do Paraná.
151
Os que se posicionavam contrários criticavam o governo e suas
promessas de facilidades, que incluíam mudanças na legislação, abordando
questões relativas à naturalização, religião, direitos políticos:
[...] o ex ministro da Agricultura Paula Souza, favoreceu
imediatamente essa indústria escrevendo ao ilustre”
celebre general Wood uma carta humilhante para nossa
raça e desoladora para nossas instituições políticas. E
para cumulo de tão desastroso plano administrativo
chegou a acenar, senão a prometer aos nossos futuros”
hóspedes a “reforma” da Constituição para a nivelação de
nossa sacrossanta religião com essas seitas acatólicas
que são deletérias de todos os bons princípios.
363
Assim, se por um lado entendia-se a religião protestante e a cultura
anglo-americana
364
como fatores que favoreceram o desenvolvimento
econômico e político desses países, como assinalara Tocqueville
365
e
acreditava o ministro Paula Souza, por outro os conservadores as viam como
ameaças ao costume religioso católico brasileiro, acusando seus entusiastas
363
Diário de São Paulo. São Paulo: Globo, 16/09/1866. p.1.
364
Sobre essa relação – capitalismo e moral cristã do protestantismo –, ver o estudo clássico
e obrigatório: WEBER, Max. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. São Paulo:
Companhia das Letras, 2004.
365
Fatores como a “situação acidental”, “as leise os “hábitos e costumes” seriam as razões
da democracia americana liberal, sendo este último de importância crucial, uma vez que são
os hábitos, os costumes e as crenças, no seu entender, a verdadeira causa da liberdade de
que gozava a democracia americana. Em sua cultura havia o hábito de discutir problemas
coletivos de ordem municipal, exercitando e aprendendo o autogoverno. Sua religião teria
conseguido reunir o espírito de religião com o espírito de liberdade, princípios
aparentemente antagônicos: “Assim, no mundo moral tudo está classificado, coordenado,
previsto, decidido antecipadamente. No mundo político tudo é agitado, contestado, incerto.
No primeiro, temos a obediência passiva, embora voluntária; no outro, a independência, o
desprezo pela experiência e a inveja de toda autoridade. Em lugar de se prejudicarem, estas
duas tendências, aparentemente o opostas, concordam uma com a outra, e parecem
prestar-se um mútuo apoio. A religião na liberdade civil um nobre exercício das
faculdades do homem; no mundo político, um campo concedido pelo Criador aos esforços da
inteligência. Livre e poderosa na sua esfera, satisfeita com o lugar que lhe é reservado, ela
sabe que seu império é ainda mais firme, porque reina com suas próprias forças e domina
sem apoio nos corações. A liberdade vê na religião uma companheira de lutas e triunfos, o
berço da sua infância, a fonte divina dos seus direitos. Considera a religião como a
salvaguarda dos costumes; os costumes como a garantia das leis e o penhor da sua própria
preservação.” TOCQUEVILLE, Alexis. A Democracia na América. Belo Horizonte: Itatiaia; São
Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1987. p.42; ARON, Raymond. As etapas do
pensamento sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p.317-92.
152
de especuladores e pouco preocupados com a “tradição” e os “bons
costumes”.
366
Subliminarmente, pode-se entender também nessa crítica ao
Gabinete Liberal do ministro Paula Souza uma oposição à configuração
desse projeto de imigração, pois a vinda de pequenos proprietários
significava uma ameaça aos grandes proprietários, cujas terras muitas vezes
eram incultas. Assim, estes viam nas propostas liberais um prenúncio de
“reforma agrária”, idéia que se fortalecia considerando-se o projeto
encaminhado por Tavares Bastos que previa confiscar tais propriedades para
a criação de colônias de imigrantes norte-americanos, além de outras
propostas que pretendiam criar impostos incidentes exclusivamente sobre
propriedades não produtivas.
Esses críticos aceitavam e acreditavam na imigração como a solução
para o problema da mão-de-obra, mas tal projeto imigrantista, segundo sua
visão, não resolveria a questão da falta de braços para a lavoura, uma vez
que incentivava a imigração de pequenos proprietários. Destarte, a imigração
seguindo o modelo de colônia era hostilizada “em nome dos interesses da
grande lavoura cafeeira”. Argumentava-se ainda que, com a formação de
colônias, se abriria um canal de concorrência na canalização de braços para
a grande lavoura, que, segundo entendiam esses críticos, deveria ser tratada
com prioridade.
A vinda de imigrantes trabalhadores diretamente para as fazendas se
deu somente décadas mais tarde, quando levas de europeus, em sua maioria
italianos, vieram abastecer as zonas cafeeiras de São Paulo, época em que a
experiência fracassada das colônias serviu de argumento para a
concretização desse novo projeto de imigração.
367
Contudo, o sistema de
366
ALENCASTRO, Luis Felipe de. “Proletários e Escravos: Imigrantes portugueses e cativos
africanos no Rio de Janeiro, 1850-1872”. Novos Estudos. n
o
21. São Paulo: CEBRAP, julho
de 1988. p.30-56.
367
Hostilizada por muito tempo, a formação de colônias de imigrantes foi reabilitada quando
se percebeu sua funcionalidade: “É a partir das primeiras superproduções de café, com a
correlata crise financeira e de braço, que se volta a cogitar os núcleos coloniais como
‘viveiros de trabalhadores para a grande lavoura’.” As colônias assegurariam o fornecimento
de mão-de-obra e garantiriam a redução de despesas, uma vez que os trabalhadores
seriam solicitados quando necessários, dispensando o empregador das despesas durante
todo o ano. BEIGUELMAN, Paula. A formação do povo no complexo cafeeiro: aspectos
políticos. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2005. p.92-3.
153
colônia foi colocado em prática e acabou promovendo a ocupação de
algumas cidades do interior paulista, entre as quais Americana, originada da
“Vila dos americanos”, pertencente à Comarca de Campinas, e sua vizinha
Santa Bárbara d’Oeste.
Esses núcleos coloniais de norte-americanos em São Paulo teriam
atraído as famílias que, quando da chegada no Brasil, haviam se instalado
em outras regiões do país. Sem alcançar êxito nessas outras localidades, ao
receberem notícias da prosperidade da região de seus concidadãos (que, em
sua maioria, se dedicavam à cultura e ao beneficiamento do algodão) e do
seu intenso comércio (propiciado pela facilidade de comunicação que a
instalação das estradas de ferro da Companhia Paulista proporcionara),
decidiram seguir rumo a essas colônias.
368
O problema da comunicação
inclusive era apontado como razão do fracasso sistemático das colônias.
369
IMAGEM 15 - Imigrantes Americanos: Foto da residência
da família Bookwalter.
370
O interesse dessa população norte-americana em emigrar teria
advindo da desestruturação econômica e social dos Estados Unidos em
368
A questão da comunicação era um dos principais motivos apontados para o fracasso
sistemático da colonização em outras partes do país: “É de pobres emigrantes abandonando
as suas colônias para onde tinham sido mandados, voltando a esta capital e procurando por
todos os meios regressar ao seu país, porque não encontram modos de subsistência nesses
núcleos colocados em pontos de difícil acesso.” Anais do Senado do Império, sessão de 17 de
agosto de 1875. Apud: Ibidem. p.90.
369
As imagens que seguem não são dos primeiros imigrantes americanos que vieram para o
Brasil, mas o provavelmente dos seus descendentes, aparentados, amigos, uma vez que
as notícias das primeiras levas são da década de 1860.
370
Fonte: Col. Judith Mac-knight Jones. Centro de Memória de Santa Bárbara d’Oeste - SP.
154
conseqüência da Guerra de Secessão (1861-5) a maioria dos que vieram
para o Paulo era originária da região Sul dos Estados Unidos –, aliada à
vontade de conquistar novos territórios, a exemplo de seus ancestrais
pioneiros, bem como à influência do “Manifest Destiny”:
A perspectiva de uma vida melhor, numa sociedade onde
lhes fosse permitido agir segundo seus próprios padrões
de liberdade e democracia, onde pudessem mesmo recriar
seu modo de vida, proporcionando a muitos a realização
de ideais planejados desde os antepassados europeus e
conservados graças à criação incessante de mitos, era
sem dúvida, forte motivo para que emigrassem.
Desconheciam, entretanto, que ainda agora agiam sob
influência de idêntica realização: à procura de um solo
que pudessem colonizar, reproduziam o movimento que
dois séculos e meio antes, os levara para a América.
371
Mas, se do lado brasileiro, com inspiração nas idéias liberais, se
imaginava que a cultura desse povo traria seus valores para o país, do outro
lado os emigrados buscavam o contrário, pois tinham como motivação a
possibilidade de inserção numa economia e cultura escravocratas com base
agrária, semelhantes àquelas a que estavam habituados antes da guerra
civil. Abertamente procuravam reconstituir o que haviam perdido com a
política de reorganização
372
e reconstrução de seu país de origem, liderada
pelos vencedores do norte. Nesse sentido, partir para outras partes era
também ato de rebeldia contra o poder dos “ianques”
373
, acompanhado de
outros fatores de ordem subjetiva, como o temor dos negros libertos que se
aglomeravam nas cidades, despertando o terror dos brancos, que
acreditavam ser alvos de uma possível rebelião.
374
Embora lhe fosse conveniente, o ministro Paula Souza não deixou de
comentar o desinteresse dos Estados Unidos em proteger seu progresso
criando estratégias para que seu povo permanecesse, e não o contrário,
como foi feito, praticamente expulsando-os. Seu comentário revela o quanto
estava certo da superioridade do povo norte-americano:
371
OLIVEIRA, Ana Maria Costa de. Op. cit., 1995. p.96-7.
372
Ibidem. p.37.
373
HARTER, Eugenen C. Op. cit., 1985. p.24.
374
ZORZETTO, Alessandra Ferreira. Op. cit., 2000. p.28.
155
Estamos como na época da revogação do Édito de Nantes
em que a astuta caducidade de Luis 14 lançou fora da
França sua melhor energia capital e industrial: o Sul
vencido, mas não convencido não que passar pelas forças
do Norte e prefere espatriar-se: o General Wood que
amanham para São Paulo representa de 50 a 60 mil
pessoas, que queiram vir: o General Beauregard vi
com elles, e todos trazem seos capitais, menos os
escravos, que nossa legislação não permite, vamos pois
ter rapidamente e inesperadamente um influxo immenso
de energia, industria e moralidade, e meo nome se ligará
talvez à mais bella pagina de nossa historia, se a isso
juntar outras reformas que tenho quase promtas
morrerei tranqüilo porque fiz meo dever.
375
Tavares Bastos também comentou o episódio com positividade, pois,
assim como a Holanda, a Alemanha e a Inglaterra, que tiraram proveito da
revogação do Édito de Nantes
376
, o Brasil deveria atrair, como o fez o
ministro Paula Souza, aqueles cuja situação após a guerra civil era odiosa.
“Como estes países europeus, nós daremos abrigo a homens industriosos,
que comunicarão ao nosso povo as suas artes, a sua perícia e a sua
atividade.”
377
Nos Estados Unidos, o que ocorria era um desinteresse dos
vencedores do norte em manter em seu território aquele povo apegado aos
valores aristocráticos e escravocratas que pretendiam suplantar. A
emigração desse povo apresentou-se como solução providencial, apesar das
tentativas de políticas de conciliação, partidas inclusive das lideranças
sulistas. O próprio General Lee, herói do Sul, expressou sua opinião
favorável à permanência do povo, atribuindo-lhe importância na
reconstrução do território e das vidas devastadas pela guerra, mas também
explicitou o papel que deveriam assumir nos rumos das novas políticas,
tornando-se cidadãos atuantes na nova ordem imposta ao país.
378
375
Carta ao filho Antonio. 09/10/1865. Arquivo Paula Souza - PS.865.10.09/3PS,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
376
O Édito de Fontainebleau, de 1685, significou a revogação do Édito de Nantes, assinado
em 1598 por Henrique IV, e dava certa tolerância religiosa na França. Com sua anulação,
grande contingente populacional, cerca de 300.000 protestantes, emigraram para outras
partes da Europa.
377
TAVARES BASTOS, Aureliano Cândido. Op. cit., 1976. p.62.
378
LEE, Robert E. “Recollections and Letters of General Robert E. Lee”. New York: Garden
City, 1926. p.162. Apud: HARTER, Eugene C. Op. cit., 1985. p.35-8.
156
Enfim, ainda que com interesses diversos, a imigração apresentou-se
como ponto em comum aos dois lados, tanto dos que tinham interesse em
emigrar, quanto dos que tinham interesse em receber os emigrados, e ainda
favoreceu as pretensões internas dos vencedores da guerra civil norte-
americana.
IMAGEM 16 - Imigrantes Americanos: Foto de pessoas no trole
em frente à casa de Luiz Pyles (1919).
379
Em suma, o modelo defendido e preconizado pelo então ministro
Paula Souza centrava-se não apenas nas necessidades emergentes do país,
mas também e principalmente na resolução a longo prazo de preocupações
de ordem social e cultural. Segundo seu entendimento, o futuro brasileiro
dependia das “raças” incorporadas, da natureza e civilização que o
influenciariam.
380
A imigração representava, então, para os que a defendiam
nesses moldes, a oportunidade de colocar o Brasil no encalço dos “povos
adiantados”. Era a esperança de civilização, que deveria vir acompanhada de
reformas de cunho político-institucional, colocando em xeque a centralização
monárquica em favor do federalismo. Idéia defendida pela próxima geração
dos Paula Souza.
379
Fonte: Col. Judith Mac-knight Jones. Centro de Memória de Santa Bárbara d’Oeste - SP.
380
WERNECK, Luiz Peixoto. “Idéias sobre a colonização”. Rio de Janeiro, 1855. Apud:
ALENCASTRO, Luis Felipe de. Op. cit., julho de 1988. p.32.
157
3.3 - REPÚBLICA FEDERATIVA PARA O BRASIL
No meio de um mundo velho, caduco que vai se
desmoronando tudo que acontece por aqui tem um certo
anacronismo ou putrefação como característica. [...] Toda
a minha atenção esta voltada para América [...] é de
que ha de sair as verdadeiras reformas, e de que se ha
de se vir a compreender a missão de Cristo tão mal
compreendida ate agora [...] tenho esperança na missão
da América.
381
Ainda jovem estudante, AFPS dava demonstrações de interesse e
admiração pelos Estados Unidos da América. Seu grande mentor foi seu pai,
e mais tarde recebeu a inspiração teórica de Alexis de Tocqueville
382
e Michel
Chevallier
383
. Ambos escreveram suas principais obras A Democracia na
América e Lettres sur L’Amerique Du nord, respectivamente quando
empreenderam viagem àquele país. Aliás, Tocqueville, ao analisar
detidamente a sociedade e as instituições norte-americanas, serviu de
inspiração a muitos autores, e vários deles se apropriaram de seus conceitos
e argumentos, ainda que tivessem posicionamento político bem distinto.
384
Em 1869, o jovem engenheiro Paula Souza, sem ocupação depois de
breve estada, durante o governo do liberal Saldanha Marinho (1816-1895),
na Inspetoria da Repartição de Obras Públicas da Província de São Paulo, a
exemplo de seus inspiradores, realizou viagem para os Estados Unidos.
381
Carta de Antônio Francisco de Paula Souza ao pai. Karlsruhe, 20/04/1866. Arquivo
Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
382
Alexis de Tocqueville (1805-1859), filho de família aristocrática francesa, permaneceu nos
Estados Unidos de maio de 1831 a fevereiro de 1832, juntamente com o amigo Gustave
Beaumont, a fim de estudar o sistema penitenciário norte-americano, enviados pelo governo
de Luis Felipe. Dessa viagem resultou a sua obra A Democracia na América, dividida em
duas partes. Entre suas outras obras também merece destaque Lembranças de 1848. Ver
também: CHEVALLIER, Jean-Jacques. As Grandes obras políticas: de Maquiavel a nossos
dias. Rio de Janeiro: Livraria Editora Agir, 1957. p.210-34.
383
Michel Chevalier (1806-1879) tinha formação em Engenharia, foi político e economista
liberal francês. Defendia o desenvolvimento industrial como a chave para o desenvolvimento
do progresso social. Enaltecia o modelo norte-americano de desenvolvimento após viagem
que realizou para aquela região.
384
FERREIRA, Gabriela Nunes. Centralização e descentralização no Império: o debate entre
Tavares Bastos e Visconde do Uruguai. o Paulo: Departamento de Ciência Política da
Universidade de São Paulo, Editora 34, 1999. p.66; 175-94.
158
Pretendia conhecer empiricamente como se organizava aquela sociedade e
como esta lidava com as questões que o inquietavam.
385
IMAGEM 17 - Engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza.
386
Em seus escritos vêem-se, somados às idéias liberais herdadas de
seus antepassados, acrescidas de sua vivência na Europa, os ideais de
liberdade e democracia, seguindo os valores norte-americanos. A apreciação
dos princípios morais dos povos da América do Norte não era novidade, uma
vez que seu pai, o Conselheiro, participara ativamente da introdução de tais
princípios em território brasileiro, acreditando na superioridade e
capacidade daquela nação, que, conforme imaginava, poderiam ser
transferidas para junto com os emigrantes daquele território. Assim como
Tocqueville, entendia que o caráter do povo norte-americano e sua formação
cultural haviam sido imprescindíveis na organização da nação norte-
385
A viagem de AFPS para os Estados Unidos estava nos planos traçados por seu pai
antes de falecer, mas seu intento principal era fazer com que o filho se especializasse na
profissão, observando como se organizavam e como trabalhavam os engenheiros,
especialmente do setor ferroviário, área da Engenharia com espaço promissor no Brasil, que
então estava em fase de construção e melhoramento de suas vias de comunicação. Carta do
Conselheiro ao filho Antonio. 08/12/1865. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de
Andrade, São Paulo.
Em sua estada por aquele país, trabalhou como carregador de algodão em St. Louis, no
Missouri: “o trabalho não desonra ninguém”. Depois, trabalhou como desenhista na
Empresa Rockford-Rhode-Island & St. Louis. SOUZA, Antônio Francisco. Diário de viagem
aos Estados Unidos, 1869. Manuscrito, s/d. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de
Andrade, São Paulo.
386
Fonte: RIBEIRO, Jacintho. Op. cit., 1899.
159
americana, no seu desenvolvimento econômico e, acima de tudo, na
afirmação entre eles dos princípios liberais e democráticos.
Da viagem de Paula Souza também resultou a publicação de um
pequeno livro, sugestivamente intitulado “A República Federativa do Brazil”,
escrito em 1869. A referida obra faz uma série de críticas à monarquia
brasileira, responsável, no seu entender, pelo atraso do país. Nela Paula
Souza expôs seu ponto de vista acerca das grandes questões da época, como
a liberdade, a separação entre igreja e Estado, instituições políticas,
escravidão, cidadania, instrução pública, entre outros, propondo soluções e
idéias resultantes de suas observações nos Estados Unidos.
IMAGEM 18 - Publicação de AFPS, 1869.
387
Portanto, o engenheiro escreveu seu livro marcadamente inspirado no
modelo de organização política dos Estados Unidos
388
vivenciado em sua
viagem, mas também descrito por Tocqueville –, país no qual todos os
387
Fonte: Biblioteca PUC/SP.
388
O federalismo em sua versão moderna é uma invenção norte-americana; assim, qualquer
interpretação da natureza dos Estados federativos deve, portanto, levar em conta suas
referências e instituições políticas inventadas na Convenção da Filadélfia. ARRETCHE,
Marta. “Federalismo e Democracia no Brasil: a visão da ciência política norte-americana”.
São Paulo em Perspectiva. Vol.15. n
o
4. São Paulo: Fundação SEAD, 2001. p.24. Ver o
verbete “Federalismo” em: BOBBIO, Norberto. [et. al.] Dicionário de Política. Brasília: Editora
da UNB; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000, p.475-486; e também LIMONGI,
Fernando Papaterra. “‘O Federalista’: remédios republicanos para males republicanos”. In:
WEFFORT, Francisco C. (Org.). Os clássicos da política. Vol.1. São Paulo: Ática, 2003.
p.243-87.
160
cidadãos têm o hábito de participar dos assuntos de ordem coletiva, devendo
exercitar o autogoverno primeiro no espaço vivenciado, estendendo-o
posteriormente aos assuntos do Estado
389
:
Um estado com a fórma de governo federativo não tem
probabilidade de progresso e adeantamento sem uma
larga acção dos indivíduos que o compõe. O indivíduo
deve ser activo ahi: e não cessar de concorrer para os
melhoramentos de seu município. Quanto maior parte
elle tomar nos negócios de seu município, quanto mais
rapidamente este ter os indivíduos de cada município
desenvolvem, este adeanta-se e progride.
A solidariedade que existe entre negócios humanos faz
com este progresso e adeantamento do município não
venha recahir unicamente em bem do mesmo município,
mas estende-se também á Província ou Estado. Os
munícipes portanto tractando de seu bem estar
particular não fazem sinão concorrer para o bem estar e
adeantamento do Estado ou província a que pertencem.
Como é de se crer que os habitantes de todos os
municípios tenham necessidades e queiram vê-las
conseguidas, segue-se que em geral os municípios todos
tenderão a melhorar-se e adeantar-se.
Como todos esses esforços tendem ao mesmo tempo em
adeantar o Estado, segue-se que este indubitavelmente
adeanta-se. Porém isto que se em um Estado ou
Província há de se dar em todos; e dahi resulta um
adeantamento geral da nação.
390
Seu pensamento expressa a mudança na conotação do que se
entendia por federalismo, que passava a distanciar-se daquela idéia simples
de confederação, cuja compatibilidade com a monarquia era possível.
391
A
noção de federalismo revelada na citação acima está vinculada ao
entendimento de que a formação do Estado-nação se daria a partir da soma
de interesses da elite. Daí a necessária participação ativa dos cidadãos, a fim
de, na defesa de seus interesses particulares, mobilizarem-se em torno de
causas mais amplas, até alcançar a unidade nacional.
389
ARON, Raymond. Op. cit., 2003. p.337.
390
PAULA SOUZA, Antonio Francisco de. A República Federativa do Brasil. São Paulo:
Typ.do Ypiranga, 1869. p.14-5.
391
A confederação pode ser definida como uma aliança entre estados independentes, sobre
os quais o Estado não poderia aplicar leis diretamente sobre os cidadãos sem sua
aprovação. Os estados eram a fonte da soberania. COSER, Ivo. Visconde do Uruguai:
Centralização e Federalismo no Brasil, 1823-1866. Belo Horizonte: Editora UFMG; Rio de
Janeiro: IUPERJ, 2008(b). p.31.
161
Nessa perspectiva, a Constituição deveria ser elaborada no sentido de
permitir a autonomia das Províncias, de modo que estas, no anseio de
atender às suas particularidades, acabassem também por levar o progresso e
a civilização ao todo. Em outras palavras, Paula Souza, marcadamente
influenciado pelas idéias liberais, defendia a descentralização do poder.
Destarte, a existência de conflito e desigualdade individual, como
também na instância provincial, não era vista com negatividade; ao
contrário, o conflito era entendido como salutar, uma vez que estimularia a
concorrência entre os indivíduos, e a conseqüência disso seria o progresso,
bem como o aperfeiçoamento moral, econômico e social. Assim, Paula Souza
entendia que “O cidadão ativo que melhor controla os recursos de sua casa
obtém, na competição entre os demais, uma posição mais vantajosa”.
392
O
mesmo poder-se-ia dizer em relação às províncias, que, tirando proveito de
suas potencialidades, progrediriam à medida que procurassem se sobressair
sobre as demais.
Suas idéias caminhavam no sentido do “aperfeiçoamento” do
federalismo, afinal, a monarquia de D. Pedro II, embora se apresentasse
como constitucional e representativa, não promovera, segundo a crítica que
se fazia, grandes avanços políticos, econômicos ou sociais. Dessa forma, a
monarquia passou a ser considerada entrave para o progresso e
desenvolvimento do país, sobretudo comparando-se a nossa história à dos
“irmãos do norte”.
A centralização monárquica contrariava a própria natureza da
constituição do país. Desde os tempos coloniais, uma série de fatores, como
a extensão do território brasileiro e a dificuldade da Coroa portuguesa em
ocupá-lo, fez com que as diversas localidades desfrutassem de certa
autonomia, o que acabou por estimular o surgimento de interesses
regionais, desconsiderando-se muitas vezes a autoridade administrativa do
governo-geral:
Diante das limitações, Portugal teve que recorrer à
iniciativa particular para defender expandir e desenvolver
a colônia americana. A criação das capitanias
392
Idem. Op. cit., 2008(a). p.968.
162
hereditárias em 1534 não tinha outro sentido. [...] A
colônia foi assim transformada em um sistema que
alguns chamaram de feudal, cada capitania
correspondendo a um feudo, cada donatário a um barão
ligado ao rei por um pacto de lealdade e cooperação.
Poderíamos também dizer que o sistema se aproximava
de uma federação, se da expressão guardarmos apenas o
aspecto de autonomia política das unidades componentes
do todo.
393
Assim, fica entendido que, após a independência, a opção pela
centralização política foi exceção. Uma conjuntura específica, incluindo a
ausência de conflitos entre as elites que controlavam o poder local e, no
âmbito externo, as independências conflituosas dos países latino-americanos
levando à sua fragmentação, fez com que se contrariasse a tendência de
federalismo.
394
Desse modo, evidencia-se que o centralismo e o federalismo foram
parte dos dilemas constitutivos da formação e do desenvolvimento do Estado
Nacional Brasileiro. A opção vencedora representava os interesses de
manutenção da unidade territorial e de reconhecimento e acordo entre as
elites acerca da real necessidade da concentração de um poder
centralizador.
395
Entre as questões da época, a que mais ocupou a mente dos
pensadores e políticos talvez tenha sido a escravidão, cuja vigência
descaracterizava, no entender de alguns pensadores, inclusive AFPS,
qualquer tentativa de organização de um Estado liberal e democrático no
Brasil. Sua existência contrariava o ideal dos direitos naturais do homem.
A escravidão, no entender de AFPS, tinha o poder de corromper,
rebaixar e aviltar os dois lados do sistema: senhores e escravos. Estes
porque deixavam de ser homens e eram convertidos em animais bravios; e os
senhores porque também eram desumanizados, haja vista sua ausência de
sentimento ao dominar o outro, vendo-o meramente como um capital que
393
CARVALHO, José Murilo de. Pontos e Bordados: Escritos de história e política. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 1998. p.156.
394
COSTA, Emília Viotti da. Op. cit., 1999. p.470.
395
ABRUCIO, Fernando Luiz. Os Barões da Federação: os governadores e a
redemocratização brasileira. São Paulo: Hucitec, Departamento de Ciência Política -USP,
1998. p.32.
163
deve resguardar a todo custo, valendo-se dos meios mais cruéis para fazê-lo
aceitar a condição a que fora reduzido, e o negro, coagido, tornava-se mais
obediente, fácil de controlar, contudo, menos apto para o trabalho.
396
A escravidão não era criticada por contrariar os princípios
naturais, como também por demonstrar na prática uma inviabilidade de
outra ordem: “A emancipação não é unicamente uma questão de
humanidade, mas sim também problema econômico.”
397
Paula Souza
entendia também que onde existisse escravidão, haveria, por conseqüência,
desprezo ao trabalho, e, no seu entender, o trabalho poderia erguer o
homem economicamente e, sobretudo, moralmente:
Por isso os paizes de escravos são o que continuamente
clamam por falta de braços para a lavoura, única
industria que possa supportar o trabalho escravo, e
apesar do continuo augmento desses braços nunca
podem adquirir algum bem-estar, sempre se acham no
estado o mais miserável possível de atraso. É impossível
adeantamento de um paiz, sem que o trabalho, fonte
inexgotável de bem estar e felicidade, seja ahi honrado,
sem que os cidadãos ganhem a vida á custa do “suor de
seu rosto”.
398
Assim, a escravidão tinha o poder de corromper homens
potencialmente trabalhadores, fazendo-os não ter interesse pelo trabalho
para não se igualarem aos escravos:
[...] como suppôr que um paiz com escravos se adeante?
O móvel o mais poderoso e efficaz para o desenvolvimento
humano foi, é e será sempre o interesse. Que interesse
podem ter homens que vivem no trabalho, mas cujo
396
Nota-se nessas suas afirmações influência marcante da filosofia de Montesquieu que
também exerceu forte influência sobre as idéias de Tocqueville acerca da escravidão: “A
escravidão propriamente dita é o estabelecimento de um direito que torna um homem
completamente dependente de outro, que é o senhor absoluto de sua vida e de seus bens. A
escravidão, por sua natureza, não é boa; não é útil nem ao senhor nem ao escravo; a este
porque nada pode fazer de forma virtuosa; àquele, porque contrai com seus escravos toda
sorte de maus hábitos, porque se acostuma, insensivelmente, a abandonar todas as
virtudes morais, porque se torna orgulhoso, duro, colérico, voluptoso, cruel.
MONTESQUIEU. Do espírito das leis. São Paulo: Difel, 1962. p.267.
397
Trabalho de Paula Souza sobre a libertação dos escravos. Manuscrito, s/d. Arquivo Paula
Souza - PSca.880 (2), Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
398
PAULA SOUZA, Antonio Francisco de. Op. cit., 1869. p.18.
164
trabalho em nada lhes melhora a sorte? Está claro que
nenhum.
399
As proposições de Paula Souza apresentavam certa consonância com
as idéias de José Bonifácio, que refutara a argumentação recorrente de que a
escravidão seria uma oportunidade dada aos negros para que recebessem
ajuda, sem a qual não sobreviveriam, não receberiam “a luz do evangelho ou
os caminhos da civilização”.
400
Os propugnadores da escravidão allegam para combater
a abolição, que o escravo é um animal, um bárbaro,
preguiçoso e estúpido; e que portanto si não houvesse
uma mão caritativa e boa, como a dos senhores, que os
dirija e guie, não poderiam viver, morreriam de miséria.
No entanto quando Las Casas nutriu a idea de
transportar negros para a América, e servirem como
escravos, era dizendo que eram robustos, forte e
trabalhadores; que cada um trabalhava por quatro
índios.
Que miséria! Para instituir-se um crime allega-se aptidão
para o trabalho; e para consertá-lo negasse a posse
daquella virtude que é a fonte de toda felicidade e todo
progresso.
401
Mas, pelo menos na época da escrita dessa obra, as idéias de ambos
distanciavam-se quanto à forma como deveria se dar a abolição. Para José
Bonifácio, mais moderado, esta deveria ser feita de modo lento e gradual,
enquanto AFPS entendia que deveria ser imediata, irrestrita, sem
indenização e preferencialmente espontânea.
402
Os defensores da primeira proposta diziam que a abolição gradual
seria a melhor maneira de resolver o problema, de modo que os escravos aos
poucos “aprenderiam” a vivenciar a liberdade e a exercer a sua cidadania. Se
não fosse assim, correr-se-ia o risco de surgir, por causa dos seus maus
399
Ibidem. p.18.
400
PRADO, Maria Emília. “Ordem Liberal, Escravidão e Patriarcalismo: As Ambigüidades do
Império do Brasil”. In: GUIMARÃES, Lucia Maria Paschoal; PRADO, Maria Emília (Orgs.). O
liberalismo no Brasil Imperial: origens, conceitos e prática. Rio de Janeiro: Revan, UERJ,
2001. p.168.
401
PAULA SOUZA, Antonio Francisco de. Op. cit., 1869. p.19.
402
A incompatibilidade das idéias de um e de outro neste quesito é perfeitamente
justificável, uma vez que José Bonifácio e Paula Souza viveram momentos históricos
distintos. José Bonifácio vivia no momento da construção do Estado Nacional brasileiro, e
por isso mesmo em discussões não colocava a questão da escravidão como prioridade.
165
hábitos, uma série de conflitos, revoltas e tumultos causados pelos ex-
escravos.
os que se posicionavam contrariamente a essa idéia, como AFPS,
mais radicais, diziam que nos lugares em que houve um rompimento brusco
do sistema escravista foram enfrentados menos problemas que naqueles
onde se tentou uma transição lenta e gradual para o trabalho livre.
Afirmavam ainda que, nessas regiões de abolição total e irrestrita, não a
produção aumentara, como também as forças necessárias para manter a
ordem, por causa da constante ameaça de conflito de escravos, tornaram-se
totalmente dispensáveis:
[...] mesmo na tão fallada ilha da Jamaica as cousas
correram bem melhor do que se esperava, pois
augmentou-se o numero dem fabricas de fazendas, obras,
etc. Na ilha Antigoa os resultados passaram muito além
das esperanças dos mais anciosos abolicionistas. O
numero de pequenas propriedades augmentou-se
consideravelmente e o valor da importação em logar de
diminuir como se suppunha augmentou-se muito. Isso
prova que na ilha Antigoa o bem estar geral não cessou
de existir, e pelo contrario que os libertos tinham uma
tendência para os costumes morigerados, pois que quase
todos desejavam estabelecer-se independentemente e
gosar pacificamente dos rendimentos de seu trabalho.
403
Sua análise deixa entrever as preocupações daqueles que se
posicionavam contrários à abolição. Pensavam que esta traria muita
desordem e convulsões sociais causadas pelos negros libertos, com seus
hábitos “imorais”; que a produção e o enriquecimento se veriam
comprometidos; e que o crescimento e progresso do país seriam
desestabilizados.
404
Contudo, a leitura que os defensores da abolição faziam da situação
era outra. Só se tinha a ganhar com o fim da escravidão, inclusive no sentido
moral, pois se passaria a respeitar não só os princípios naturais, como
também os preceitos cristãos, e como recompensa ainda se teria o
403
PAULA SOUZA, Antonio Francisco de. Op. cit., 1869. p.22.
404
Ver: AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda negra, medo branco: o negro no
imaginário das elites - século XIX. São Paulo: Annablume, 2004.
166
desenvolvimento econômico. Um país moralizado e em desenvolvimento
alcançaria a almejada civilização.
Enfim, o elemento servil era “a pedra de toque da felicidade do
Brazil”
405
. Da sua superação dependia a reorganização do Estado brasileiro
na sua forma de República Federativa, que estava subordinada ainda ao
efetivo exercício da cidadania estendida a toda a população, afinal, a
eficiência de um sistema republicano, democrático, federativo e liberal
depende da ação ativa dos indivíduos pautada no respeito às leis naturais e
ao princípio da liberdade. Nenhum sistema de governo nestes moldes
existiria sem o completo respeito a esses fundamentos essenciais.
O federalismo tinha, então, o significado de modernização e
civilização a partir de reformas nas instituições políticas. Dessa forma,
condenava-se o centralismo monárquico, e o federalismo apresentava-se
como a solução para um país com a estrutura e as proporções do Brasil.
406
Por conseguinte, a monarquia se tornou alvo de críticas, passando a
ser entendida como um entrave ao crescimento e responsável pelo atraso do
país. Sua constitucionalidade era questionada, como também a figura do
imperador enquanto sábio”, “patriota”, “desinteressado” e “mais primeiro
cidadão que imperador”
407
. Se assim o fosse,
Como então póde um paiz novo, cheio de esperanças, e
tendo realmente elementos para um progresso rápido e
duradouro como o Brazil, chegar ao estado de
decadência, de atraso e desmoralização a que chegou?
Creio que é isso unicamente devido a essa política
malfadada que nos trouxe a centralização administrativa.
O governo do Brazil deve ser de delegação do povo. No
entanto este preceito da constituição foi completamente
burlado pela simples introdução da política dependente
do governo. [...]
O imperador faz e defaz dos governos quando bem lhe
apraz [...] O governo do Brazil é a vontade única do
imperador.
408
405
PAULA SOUZA, Antonio Francisco de. Op. cit., 1869. p.23.
406
COSTA, Emília Viotti. Op. cit., 1999. p.470.
407
Carta de AFPS ao pai, o Conselheiro. 19/08/1861. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário
de Andrade, São Paulo.
408
PAULA SOUZA, Antonio Francisco de. op. cit., 1869. p.7.
167
O centralismo entendido como o poder do Estado em intervir em
todas as esferas da vida social –, para aqueles que comungavam os ideais do
liberalismo, francamente inspirados no caso norte-americano, era contra a
“natureza humana” e contra a idéia de liberdade, da qual, conforme se
defendia, derivava a prosperidade e riqueza das nações:
Em verdade, se o progresso social está na razão da
expansão das forças individuais, de que essencialmente
depende, como se não de condenar o sistema político
que antepõe ao indivíduo o governo, a um ente real, um
ente imaginário, à energia fecunda do dever, do interesse,
da responsabilidade pessoal, a influencia estranha da
autoridade acolhida sem entusiasmo ou suportada por
temor? Essa inversão das posições morais é fatalmente
resultado da centralização, seu efeito necessário, fato
experimentado não aqui ou ali, mas no mundo moderno e
no antigo, por toda a parte, em todos os tempos, onde
quer que tenha subsistido.
409
O centralismo, por sua natureza, obstaculizava o progresso moral,
econômico e, conseqüentemente, político do Brasil, impedindo, por seus
vícios, a construção de um regime verdadeiramente representativo.
Em contrapartida, os críticos da solução federalista pautavam-se nas
questões da unidade nacional, da paz e da justiça, que entendiam somente
serem garantidas ante a presença da monarquia. Negavam o federalismo,
argumentando também que a história do Brasil era bem distinta da história
dos Estados Unidos, referência obrigatória do modelo federalista.
410
Cabe
lembrar que freqüentemente se desvirtuava a idéia de confederação, na qual
os estados independentes se reúnem circunstancialmente para atender a um
objetivo comum.
411
os federalistas rebatiam os argumentos centralistas” afirmando
que o federalismo não excluía a defesa da unidade nacional, bem como que a
própria monarquia não oferecia garantias nesse sentido. O que ela fazia era
409
TAVARES BASTOS, Aureliano Cândido. A Província: estudo sobre a descentralização no
Brasil. São Paulo: Editora Nacional; Brasília: INL, 1975(b). p.16.
410
Essa justificativa era parte da argumentação de Paulino José Soares de Souza (1807-
1866), o Visconde do Uruguai. Sobre suas idéias paradigmáticas acerca da centralização,
ver, além do autor citado na nota seguinte: FERREIRA, Gabriela Nunes. Op. cit., 1999;
VISCONDE DO URUGUAI. Estudos práticos sobre a administração das províncias no Brasil.
Vol.2. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1865.
411
COSER, Ivo. Op. cit., 2008(b). p.52-3.
168
simplesmente ignorar os interesses e as realidades diversas das mais
longínquas regiões brasileiras, por falta de interesse, pela inviabilidade
imposta pela própria burocracia do governo imperial e também pelas
dificuldades de comunicação e transporte, o que acabava por relegar aqueles
que estavam fora do circuito do poder do Rio de Janeiro. A monarquia estava
então oprimindo uma parte do país e impedindo que ele se desenvolvesse.
Para os partidários desse pensamento, a unidade nacional dependia
da prosperidade e do desenvolvimento de cada província, pois assim estas
teriam condições de ver suas demandas atendidas, dissuadindo qualquer
movimento de revolta que pudesse resultar em manifestações separatistas.
Em 1832, o Senador Vergueiro já afirmava:
O único meio de conservarmos unidas todas as nossas
províncias consiste em habilitá-las para poderem curar
de suas necessidades e promover a sua prosperidade por
meio da influência dos seus próprios governos.
412
Assim, a solução federalista parecia ser a mais viável, porque, tendo o
país realidades diversas e interesses distintos, para o seu “adiantamento”
deveria haver leis apropriadas que respeitassem as diversidades e
localidades, e não a orientação geral dos Conselheiros do Estado, que sequer
tinham interesse em conhecer e respeitar as necessidades especiais de cada
Província. O que não significa que os interesses provinciais fossem tão
heterogêneos a ponto de haver a necessidade de desmembramento, e se
assim o fosse isso não deveria ser encarado como problema, pois antes livrar
o país de membros divergentes do que prejudicá-lo em seu crescimento.
assim o país poderia atingir com mais rapidez a larga estrada da civilização e
do progresso:
O Brasil, grande em território, com uma população
pequena formando núcleos de civilização apartados por
enormes distâncias precisa de um governo, que
completamente descentralizado possa dar vida e ajudar
essas aglomerações espalhadas pelo país inteiro.
412
Anais do Senado, 1832. p.71. Apud: DOLHNIKOFF, Miriam. Op. cit., 2005(b). p.64.
169
Por isso o Brasil mais cedo ou mais tarde entrará na
senda que lhe é a mais apropriada, formando a República
Federativa.
413
A idéia de federação ganhou força nos anos seguintes e tornou-se
uma das reivindicações do Partido Liberal e do Manifesto Republicano de
1870, elaborado com a participação do engenheiro Paula Souza,
integrante do universo da política.
A adesão ao pacto federativo significava a combinação de interesses
das elites provinciais e do Estado Nacional, isto é, a proposta federalista
garantiria a construção de um Estado em que as elites regionais teriam
maior participação e o direito de influir, conjuntura viabilizada mediante
uma reorganização de suas instituições políticas. Ao mesmo tempo, não
perderiam o controle de suas unidades regionais, autorizado por uma
Constituição com divisão das competências de cada instância, local e
nacional, com espaço para negociações, arranjos e conciliações.
Em São Paulo particularmente, a idéia de federação, pouco antes da
República, por volta de 1887, ganhou uma conotação diferente, atingindo
seu limite máximo com a proposta separatista pelos setores mais radicais.
414
A representação política das províncias ainda espelhava o domínio dos
grupos de antigas áreas de prosperidade econômica
415
que, nas últimas
décadas do século XIX, haviam sido suplantadas pela próspera cultura do
café no Centro-Sul, especificamente em São Paulo. Por isso, entendiam que
sua riqueza não condizia com a sua participação política no Império, sem
contar a denunciada injustiça quanto à arrecadação de impostos, que
acabava indo parar nos cofres do governo, não sendo revertida na mesma
413
PAULA SOUZA, Antonio Francisco de. Op. cit., 1869. p.14.
414
Sobre as idéias separatistas, ver, entre outros: ADDUCI, Cássia Chrispiniano. A Pátria
Paulista”: O separatismo como resposta à crise final do Império Brasileiro. São Paulo:
Arquivo do Estado, Imprensa Oficial, 2000.
415
Entre os senadores, de um total de 59, apenas 2 eram paulistas. A Câmara dos
Deputados em São Paulo possuía uma bancada de 8 deputados, enquanto Pernambuco 13,
Bahia 14, Rio de Janeiro 12, Minas Gerais 20. No Conselho de Estado sempre
predominavam representantes de outras regiões, além dos presidentes das Províncias, que
sempre provinham de outras regiões, como já era reclamado na Revolta Liberal de 1842: “Os
paulistas são captivo, / São captivo dos Bahiano, / Que d’elles podem dispô / Como Sinhô
Soberano! / Bahia é cidade, / Paulicéa é grota, / Viva Mont’Alegre, / Morra patriota!! / Ioio é
bahiano / É bahiano o inspectô, / É bahiano o Juiz do Civre, / E até mesmo o Promotô.” O
Tibyreçá. n
o
19. São Paulo, 21 de abril de 1842.
170
proporção em favor das localidades de onde proveio. Daí o enorme
descontentamento dos paulistas, a sua contundente defesa da República e o
sentido mais radical do federalismo.
416
Em suma, esse modelo político acabou por efetivar a participação
incisiva das elites e a defesa de seus interesses, utilizando os espaços da
política para pressionar no sentido de verem suas demandas atendidas,
vinculando o jogo político regional num outro mais amplo. O resultado disso
foi o fortalecimento dos grupos locais e o surgimento das oligarquias, que
teriam, nos anos subseqüentes, forte influência nos rumos econômicos,
sociais e políticos do país e desencadeariam o movimento republicano, bem
como a instalação de seu projeto político na Primeira República.
A estrutura de uma República Federativa, no entanto, definiu a
organização política do país a partir da Constituição de 1891, rompendo com
o centralismo herdado dos tempos imperiais. Todavia, por essa ocasião,
Paula Souza decidiu afastar-se da política, atuando como engenheiro e
dedicando-se à criação de “sua escola”, a Escola Politécnica, como se verá a
seguir.
416
COSTA, Emília Viotti. Op. cit., 1999. p.472-8.
171
CAPÍTULO IV -
DESERÇÃO OU RECONVERSÃO
172
No Brasil, as duas últimas décadas do século XIX foram marcadas
pela intensidade com que se discutiram alguns problemas de longa data,
discussões estas que resultaram em algumas modificações profundas no
todo social, senão concretamente, pelo menos na forma e aparência.
A crítica à monarquia alcançou uma maior amplitude nos grupos,
que, se antes não a defendiam, também não a questionavam. O problema
nacional, a escravatura, que ocupava a mente da elite proprietária, dos
intelectuais e dos políticos, encaminhou-se para o seu fim, mesmo que a
contragosto de alguns grupos, e a mão-de-obra imigrante subvencionada foi
tratada como solução para o problema da falta de braços, que atingia
principalmente os cafezais paulistas.
Uma “nova ordem” se configurava, trazendo consigo certo otimismo,
de algum modo estimulado pelas conquistas da ciência e da técnica, que
buscavam tornar real a possibilidade de redimir o país do atraso.
Progresso, civilização, modernidade tornaram-se as palavras de
ordem, e a elas, com a Proclamação da República, veio se juntar a cidadania,
o que demandou a necessidade de formar os cidadãos. Tal formação, no
entendimento de Paula Souza, deveria se dar por intermédio da educação e
do ensino profissionalizante, capacitando os indivíduos a realizarem seu
papel social. Nesse sentido, o domínio da tecnologia era visto como
indispensável para o desenvolvimento da indústria, e esta, numa progressão,
geraria riquezas, as quais todo o conjunto da sociedade teria o direito de
desfrutar.
4.1 - ENFIM, A REPÚBLICA!
[...] nada se mudaria; o Regime sim era possível, mas
também se muda de roupa sem mudar de pele. O
comércio é preciso. Os bancos são indispensáveis. No
sábado, ou quando muito na segunda-feira, tudo voltaria
ao que era na véspera, menos a Constituição.
417
417
ASSIS, Machado de. “Esaú e Jacó”. In: Obras Completas. Vol.1. Rio de Janeiro, Aguillar,
1971.
173
O engenheiro Paula Souza, por integrar a “Convenção de Itu” (1873),
era parte do grupo que se convencionou chamar de “republicanos históricos”
e, portanto, comungava das idéias do Manifesto Republicano, que tinha o
federalismo como uma das suas reivindicações mais contundentes. Como
explicado anteriormente (ver capítulo 3), a idéia de federalismo era
considerada parte da própria “natureza” brasileira, mas, diante de
conjunturas emergenciais, tal projeto fora protelado. Com o enfraquecimento
dos alicerces do Império em especial a escravidão –, o centralismo parecia
não ter mais sentido, e boa parcela das elites deixou de apoiá-lo. não
havia mais interesse em sustentá-lo depois que, com o movimento
republicano, as forças centrífugas do federalismo voltaram vigorosamente.
418
O movimento republicano em São Paulo era composto
primordialmente por grandes proprietários rurais. A lista dos convencionais
endossa tal afirmação.
419
A Convenção Republicana, que na congregação de
vários núcleos regionais paulistas deu origem ao mais “forte tronco
partidário”
420
, o Partido Republicano Paulista (PRP), ocorreu no ano de 1873,
no casarão que pertencia a Carlos de Vasconcellos de Almeida Prado.
A adesão da elite paulista ao movimento republicano estava
relacionada ao desenvolvimento da cafeicultura do oeste paulista,
constituindo uma economia inserida no capitalismo internacional em
expansão.
421
A época que coincide com o final do Império e o início da República
caracterizou-se pela circularidade de idéias das mais diversas vertentes do
pensamento europeu: positivismo, darwinismo, cientificismo,
418
CARVALHO, José Murilo. “Federalismo e Centralização no Império Brasileiro: História e
Argumento”. In: Pontos e Bordados: escritos de história e política. Belo Horizonte: UFMG,
1998. p.155.
419
SOLENNISAÇÃO do Cinconencentenario da Convenção de Itú. São Paulo: Companhia
Editora Melhoramentos, 1923. p.66-70.
SOUZA, Jonas Soares de. Notas sobre a Convenção de Itu. São Paulo: Universidade de São
Paulo, 1976. Separata de: Anais do Museu Paulista, vol.27.
420
WITTER, José Sebastião. República, Política e Partido: o PRF e a política dos
governadores. Bauru, SP: EDUSC, 1999. p.17.
421
SALLES, Iraci Galvão. Trabalho, Progresso e a Sociedade Civilizada: O Partido
Republicano Paulista e a política de o-de-obra (1870-1889). o Paulo: HUCITEC;
Brasília: INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1986. p.34.
174
evolucionismo
422
, acrescidas do republicanismo, que, de quando em quando,
eram expressas nas manifestações políticas. Contudo, foi a partir de 1870,
com a apresentação do Manifesto Republicano, que o ideal de República
ganhou status oficial
423
, e não provinha daqueles grupos dissonantes de
outras épocas; ao contrário, foi na elite economicamente privilegiada que tais
disposições ganharam força.
Em várias partes do país, como em São Paulo, surgiram, então,
clubes republicanos, liderados por uma elite cujas raízes encontravam-se em
Itu e em outras cidades do interior, como Campinas, Amparo, Jundiaí, entre
outras. Das reuniões promovidas nesses clubes emergiu a idéia de organizar
uma Convenção com os representantes republicanos das diversas
localidades do interior paulista.
424
O objetivo da Convenção era congregar os diversos “Clubs” das
diferentes localidades da província paulista, a fim de, por meio da união,
elaborar as bases de um programa que permitisse o estabelecimento de
ações de divulgação do ideário republicano e a estruturação de um partido.
Contudo, sua importância ia além do fato de ser a primeira forma organizada
de ação republicana. Foi nela que nomes que influiriam na condução política
do país despontaram. Américo Brasiliense, Francisco Glicério, Bernardino de
Campos, Prudente de Moraes, Cesário Mota, Cerqueira César, Américo
422
Essas idéias, ao chegarem ao país, muitas vezes “eram idéias mal absorvidas ou
absorvidas de modo parcial e seletivo, resultando em grande confusão ideológica”.
CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que o foi.
São Paulo: Companhia das Letras, 1987. p.42.
423
NOGUEIRA, Emília Costa. “O Movimento Republicano em Itú. Os fazendeiros do Oeste
Paulista e os Pródromos do Movimento Republicano”. Revista de História. Vol.IX. São Paulo,
1954. p.380.
424
A escolha da cidade de Itu para a Convenção explica-se pela inserção desta na rota da
cafeicultura do oeste paulista, uma espécie de centro regional da zona cafeeira, o que
facilitava a reunião, uma vez que grande parte dos proprietários cafeicultores era da região e
adepta das idéias republicanas: “Situada na Depressão Periférica assistia à vigorosa
expansão da cultura do café, ao alargamento das áreas cultivadas e ao afluxo de
contingentes novos de população, Itú rivalizava com Campinas na sua importância. Uma ou
outra poderia ter sido escolhida para sede da Convenção que procurava congregar os
representantes do interior. Ambas eram vigorosos centros de propaganda. O esforço dos
republicanos mais notáveis de Itú, principalmente dos Almeida Prado e dos Piratininga,
aliado ao fato de se inaugurar a estrada de ferro acabou por firmar a escolha nesta
cidade.” Ibidem. p.389.
A escolha da data 18 de abril de 1873 ocorreu em função da inauguração da linha férrea da
Companhia Ituana, o que facilitaria a locomoção dos representantes das várias localidades
da Província paulista.
175
Campos, entre outros, tornaram-se forças dominantes representativas do
interesse paulista diante do Estado republicano.
425
Contrariando a tese de que o movimento republicano foi resultado do
desenvolvimento capitalista e do surgimento de um grupo eminentemente
urbano, tendo como conseqüência a transferência de poder da aristocracia
rural
426
, verificou-se justamente o contrário, ou seja, que a maior parte dos
nomes que dele participaram era oriunda da elite agrária:
Ao compulsar as Atas do Partido Republicano de Itu e Rio
Claro, ao observar a proveniência dos convencionais de
1873 verificamos a coincidência da localização dos
principais núcleos que se fizeram representar na zona
Centro-Oeste paulista, bem como a presença de grande
número de lavradores entre os seus correligionários. Aqui
é o fazendeiro, é a aristocracia rural em grande parte que
compõe a ala de vanguarda que aparece nas fileiras do
Partido Republicano [...].
427
Cabe considerar que os fazendeiros paulistas, sobretudo da próspera
região cafeeira do oeste, tinham uma característica de diversificação nos
negócios. Ainda que fossem tradicionalmente fazendeiros, eram reconhecidos
investidores capitalistas e aplicavam seu dinheiro em diversas frentes de
atividades.
Um “levante da guarnição do Rio de Janeiro”, a proclamação da
República, resultou da articulação entre os republicanos cariocas (Quintino
Bocaiúva, Aristides Lobo, Sampaio Ferraz, entre outros) e os militares
(Benjamin Constant, Sólon Ribeiro, Serzedelo Corrêa, Marechal Deodoro e
outros). Mas o grupo paulista não se manteve isolado, galgando ações
políticas.
O projeto paulista de República previa a implantação de uma
República Federativa, afinal, o centralismo monárquico contrariava os
425
BARRIGUELLI, José Cláudio (Org.). O pensamento político da classe dominante paulista
(1873-1928). São Carlos, Arquivo de História Contemporânea/ UFSCAR, 1986. p.6.
426
Não se pode negar, porém, que os princípios que mobilizaram o movimento republicano
desta parcela da elite paulista, como a abolição da escravatura, a imigração, o trabalho
assalariado, a colonização de terras, organização de crédito para a lavoura, a liberdade
religiosa, o casamento civil, eram expressões do movimento no sentido da modernização das
relações capitalistas de produção. Ibidem. p.3.
427
NOGUEIRA, Emília Costa. Op. cit., 1954. p.402.
176
interesses econômicos e políticos de São Paulo. Os econômicos porque
grande parte dos impostos oriundos da região era utilizada pelo governo
central para propósitos alheios aos interesses locais, desviando um capital
que poderia ser aplicado, por exemplo, na ampliação da malha ferroviária
paulista, essencial para a produção cafeeira, e na implementação da
imigração subsidiada, indispensável para atender a demanda de braços da
cafeicultura.
428
E políticos porque aqueles que em São Paulo atuavam
diretamente na política se reconheciam como principais responsáveis pela
riqueza e pelo dinamismo econômico do país, mas consideravam que sua
representatividade política no Senado, na Câmara e no Conselho de Estado
não era correspondente à sua atuação.
429
Nesse contexto regional, em que se verificavam problemas de cunho
nacional dívidas em conseqüência da Guerra do Paraguai, conflitos em
torno da mão-de-obra, o Poder Moderador, a aproximação entre o governo e
os conservadores, a excessiva centralização monárquica que obstaculizava
interesses regionais –, se deu a formação do Partido Republicano Paulista
430
,
que essas questões afetavam diretamente a expansão da riqueza na
região. Assim, pode-se afirmar que:
[...] o PRP se organiza como porta-voz de uma parcela dos
fazendeiros paulistas descontente com a política do
regime monárquico e buscava na República Federativa a
alternativa para a solução de seus problemas. Sendo esse
setor da classe dominante o detentor da parcela mais rica
da produção nacional o café no Oeste paulista –, tinha
de solucionar dois graves problemas: a reorganização do
mercado de trabalho e a participação política.
431
Destarte, sendo indiscutível a influência da filosofia positivista no ato
da Proclamação da República e na forma de governo imposta por ele, “o
dístico da bandeira nacional – Ordem e Progresso seria evidência suficiente
428
São Paulo contribuía anualmente com uma renda de 20.000:000$000 e recebia desta
apenas 3.000:000$000. MARTINS, Ana Luíza. O despertar da República. São Paulo:
Contexto, 2001. p.62.
429
COSTA, Emília Viotti da. Da monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo:
Fundação Editora da UNESP, 1999. p.475.
430
ZIMMERMANN, Maria Emília Marques. O PRP e os fazendeiros do café. Campinas:
Editora da UNICAMP, 1986. p.33-5.
431
Ibidem. p.36.
177
para fincar as bases da nova república sobre o ideário positivista”.
432
O
discurso republicano perpassava pelos ideais do liberalismo, que, aliás,
durante todo o século XIX foi posição política de relevo.
433
Contudo, as palavras que mais ressoavam de seus fundamentos,
quanto às questões mais polêmicas, como a abolição da escravidão, eram
“ordem” e “moderação”. O tom do discurso revelava que não havia consenso
no interior do grupo, e a moderação era tentativa de conciliar os diversos
pontos de vista, principalmente entre os fazendeiros mais conservadores,
que não pretendiam abrir mão da escravidão, e os “cultuadores” da figura do
imperador.
O discurso de Saldanha Marinho destacava os aspectos do
movimento republicano nesta fase conciliatória:
Os republicanos no Brasil têm sobremodo assentado seu
plano em uma base, que é a revolução pacífica, a
revolução da idéia; calmos, tranqüilos, aguardam firmes
o futuro, salvo circunstâncias extraordinárias, salvo a
perseguição ou outra qualquer emergência, que precipite
em acontecimentos, esse núcleo de homens sinceros, de
abnegação e de boa-fé, se manterá, enquanto puder, em
perfeita paz com a sociedade em que vive, respeitando as
leis do país, em tanto quanto possam ser respeitadas, e
até que se consiga a reforma desejada.
434
O republicanismo defendia a liberdade religiosa, a separação entre
Igreja e Estado, o casamento civil, mas a questão prioritária para os
republicanos pertencentes aos quadros da elite paulista era concernente à
mão-de-obra, uma vez que era do seu interesse que se encontrasse a solução
para a demanda de braços para a lavoura cafeeira. Percebe-se, assim, que os
ideais do PRP eram a expressão dos interesses da elite paulista, mas seus
partidários também se diziam defensores dos direitos da soberania do povo e
da representatividade política.
432
BRESCIANI, Maria Stella. “Brasil: liberalismo, republicanismo e cidadania”. In: SILVA,
Fernando Teixeira da. [et. al.] República, liberalismo, cidadania. Piracicaba: Editora UNIMEP,
2003. p.18.
433
Ibidem. p.18.
434
Joaquim Saldanha Marinho em discurso à Câmara Temporária, sessão de 23 de abril de
1879. Apud: HOLANDA, Sérgio Buarque de. O Manifesto de 1870”. In: HOLANDA, Sérgio
Buarque de. [et. al.] O Brasil Monárquico, v. 5: do Império à República. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2004. p.256.
178
Nos anos mais próximos da proclamação da República, o discurso do
PRP, então firmado como Partido e tendo participado de eleições de modo
sistemático e obtido resultados positivos – como disse Campos Salles
435
, “[...]
estou satisfeitíssimo com o resultado geral da eleição republicana.
Mostramos força, firmeza e brio. Muito bem...”
436
–, tornou-se mais incisivo,
não tangenciando temas problemáticos, mas assumindo posturas. Em 1887,
a abolição da escravidão era uma questão de tempo e o PRP assumiu sua
postura na defesa da liberdade e da solução imigrantista:
Felizmente esses meios estão conhecidos e postos em
pratica: a expontaneidade dos senhores transformando o
escravisado em trabalhador livre e a corrente da
immigração vieram mostrar que estava achada a solução.
A escravidão desapparece, mas o trabalhador pratico e
accomodado ao systema de lavoura fica.
437
De toda forma, o enfrentamento do assunto não significou grandes
alterações no seu modo de pensar, haja vista que o fim da escravidão se deu
de forma pacífica, buscando-se evitar grandes convulsões, rupturas e
radicalizações. A própria situação do negro liberto não modificou a estrutura
social de então.
O programa do PRP tinha como base a oposição à centralização
monárquica, expressando seu descontentamento com relação a ela e
responsabilizando-a pelos problemas e desordens, bem como por não mais
conseguir contemporizar e assegurar a pacificação dos conflitos. A República
Federativa era apresentada como o ideal de sociedade organizada, de
modernidade e de adequação aos “novos tempos” comandados pela riqueza e
pela elite de poder oriunda do café.
435
Francisco Glicério, no entanto, faz sua reclamação: “7.º e 8º. derrotados. No dia 15 serei
também degollado. Entrectanto cada vez mais decidido a bater me pela República.” Carta
enviada a Paula Souza. Campinas, 11 outubro de 1889. Arquivo Paula Souza, Biblioteca
Mário de Andrade, São Paulo.
436
Carta de Campos Salles a Paula Souza. São Paulo, 1889. Arquivo Paula Souza, Biblioteca
Mário de Andrade, São Paulo.
437
Manifesto do Partido Republicano paulista sobre a questão do elemento servil; datado de
06 de julho de 1887; publicado na Província de São Paulo”, em 16 de julho de 1887. Apud:
ZIMMERMANN, Maria Emília Marques. Op. cit., 1986. p.57.
179
O sistema monárquico era visto como incompatível com o
federalismo. A monarquia significava centralização, ainda que fosse
constitucional e representativa. Os paulistas almejavam ter autonomia,
impossível, segundo eles, dentro da monarquia. República sem federalismo
também não lhes interessava, pois incorria no risco de haver os mesmos
vícios centralizadores do sistema anterior. Os sistemas inglês e norte-
americano eram utilizados como exemplos ilustrativos do que queriam
expressar no primeiro, ainda que possuísse uma monarquia
constitucional, o rei ainda tinha autoridade de interferir nos outros poderes,
e o segundo era composto por Estados independentes e autônomos entre
si.
438
A notícia da República foi recebida em São Paulo com festas e
esperanças, conforme expressava Tobias de Albuquerque em carta enviada a
Paula Souza:
É com immenso jubilo que tomo a liberdade de
communicar a V. As. que o povo de S. Manoel ficaram
possuídos e quazi possessos ao receberem a noticia
glorioza da proclamação da República Brazileira!
Começou as festividades em regozijo a data 15 de
novembro a 16 as 5.30 da manhã com toda pompa
finalizando hontem (19) com um trem especial para o
Porto Martins para cujo fim preparou-o o mais que
possível com palmeiras e flores esta na frente da machina
collocou-se 3 bandeiras com o barrete frigio (sendo duas
vermelhas, e uma grande no centro feita de tiraz brancas,
vermelha e preta e ao lado superior da haste a frigio
republicana) de S. Manoel seguiram 92 pessoas
incluzive a corporação Muzical e com as pessoas que
embarcaram nas demais estações completou mais de 130
pessoas mais ou menos.
Os passeantes totalmente collocaram nos chapeos fitas
vermelhas e a frige.
Foram emittidos bilhetes de 1.º com direitos a volta não
havendo distinção de classe, pois que compoz-se de um
carro e 3 vagãos [...] bem limpos e enfeitados etc.
Foi callorozamente saudado Eleodoro
439
da Fonseca, e em
seguida Prudente, Pestana e C. Salles, e assim também
forão saudados: a Directoria da Cia. Ituana e sua illustre
pessoa, e logo em seguida agradeci como empregado da
Cia. agradeci as saudações e saudei a união republicana
438
Ibidem. p.107-8.
439
Foi transcrito como estava no original manuscrito.
180
deste município e os seus chefes principaes e ao
florescente município de S. Manoel.
Peço licença para congratuar-me para com sua
respeitável pessoa e os demais companheiros e saudar
com todo orgulho: Viva os Estados Unidos do Brazil!
[...]
440
Os “cidadãos”
441
brasileiros pareciam empolgados. No entanto, em
outra missiva, também glorificando o 15 de novembro, Tobias de
Albuquerque oferece a indicação do caráter e o significado da Proclamação:
Tomo a liberdade de offerecer-lhe parabéns sobre o feliz
êxito do grande movimento que acaba de acontecer aqui
tudo vae em paz e quassi todos apparecem ser muito
satisfeictos, no dia que V. S. foi para São Paulo, a musica
e muito povo do Salto vierão aqui, e hoje da tarde correu
um trem especial de 4 carros de [?], F Cezario e Barrros
vierão juntos, trouxeram 2 Bandeiras da República = star
stripes wuth a red cornver = e uma Bandeira vermelha
com ave liberta escripto em lettras [...].
Que glória para o paiz passar pelo uma crise assim
sem morrer muitas pessoas, mostra que os
Republicanos planejarão bem o terreno. [...]
e mais uma vez = parabéns = a dois Republicanos
verdadeiros, V. S. e Dr. Prudente.
442
Os intentos foram alcançados, como o da abolição da escravidão, sem
convulsões, e mais uma vez a mudança foi dirigida pela elite. Com a
passagem do Império à República, formou-se um sistema de poder
articulado aos interesses dos “novos donos da situação”
443
. Tal transição
“parece ter obedecido antes à dinâmica de uma história pouco ‘precipitada’
[...] do que ao espetaculoso nós górdios que caracterizam os grandes
momentos [...]”
444
.
440
Carta enviada a Paula Souza por Tobias de Albuquerque. São Manoel, 20 de novembro
de 1889. Arquivo Paula Souza - PS.889.11.20, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
(grifo original)
441
O termo cidadão passou a ser usado freqüentemente, como se de observar na
correspondência analisada.
442
Carta enviada a Paula Souza, por J. Williamser. Itu, 14/11/89. Arquivo Paula Souza,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo. (destaques nossos)
443
CARDOSO, Fernando Henrique. “Dos governos militares a Prudente Campos Sales”. In:
FAUSTO, Boris (Org.). O Brasil Republicano, v. 1: estrutura de poder e economia. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. p.15.
444
Ibidem. p.15.
181
O rumo que a República tomou, então, dirigida pelos militares, não
atendeu necessariamente às expectativas dos que muito haviam
comungado de seus princípios teóricos.
4.2 - A TECNOLOGIA E IDEOLOGIA
Historicamente vinculado às idéias liberais e ainda aos preceitos da
maçonaria
445
, Paula Souza não deixou de sofrer influência também do
positivismo, teoria bem recepcionada entre os grupos da elite, talvez por
terem encontrado nessa doutrina uma justificativa positivada da organização
social capitalista. Suas formulações neutralizavam os conflitos conseqüentes
da divisão social, que, então, era positivada, pois entendiam que tal
segmentação era parte da própria natureza da sociedade, que funcionava
como um organismo cujas partes constitutivas eram heterogêneas, mas
solidárias umas às outras, uma vez que o conjunto se orientava para a
conservação, subordinado a um poder central e superior, o estado positivo:
O detentor do capital, assim como o operário, nada mais
é do que um servidor da coletividade e deve ter sempre
em vista os interesses desta última na aplicação da
riqueza, de que não é senão o gestor no próprio interesse
da sociedade.
446
Assim, em tempo de esperanças de transformação, os princípios
comtianos apresentaram-se como embasamento “bem conveniente” para a
compreensão da sociedade brasileira. Contudo, entre os paulistas a
influência do positivismo foi muito menos contundente que entre os setores
militares da capital do país, o Rio de Janeiro.
447
A intelectualidade paulista
estava vinculada aos grandes proprietários, que tradicionalmente afiliavam-
se mais aos princípios liberais.
445
A Maçonaria desenvolveu importante papel na divulgação e propaganda do ideário
republicano. No próximo item se abordará um pouco mais o assunto das escolas noturnas
que criaram a fim de “ilustrar para libertar”.
446
LINS, Ivan. Perspectivas de Augusto Comte. Rio de Janeiro, 1965. p.104.
447
CARVALHO, José Murilo de. A formação das Almas: o imaginário da República no Brasil.
São Paulo: Companhia das Letras, 1990. p.27-8.
182
O engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza foi coetâneo do
movimento intelectual e político que ficou conhecido como “Geração de
1870”, composto por jovens que buscavam em certas correntes intelectuais
(cientificismo, spencerianismo, liberalismo, darwinismo social) argumentos e
idéias que expressassem o seu descontentamento ao “status quo”
monárquico.
448
Não se tratava meramente de importação de idéias, mas da
busca de um referencial que servisse no combate aos modos de pensar e agir
no Império. Buscavam compreender a situação que vivenciavam, a fim de
propor linhas mais eficazes de ação política.
449
Os que tomavam parte nesse movimento eram, em geral, oriundos da
elite insatisfeita ou alijada do arranjo imperial, marcado pelo centralismo
monárquico e pela ordem escravocrata, que ocupavam lugar privilegiado na
crítica que estabeleciam, pois eram mais próximos das disposições liberais e
viam o centralismo monárquico e a escravidão como entraves à
modernização da sociedade brasileira.
No interior desse movimento fazia-se presente uma diversidade de
idéias, que entre seus membros havia liberais republicanos, novos
liberais, positivistas abolicionistas, federalistas positivistas gaúchos e
federalistas científicos paulistas.
450
Paula Souza não esteve diretamente
vinculado a nenhum desses grupos; no entanto, sua própria trajetória
familiar e seu diploma universitário adquirido na Europa lhe davam
condições de participar das discussões em torno dos problemas de sua
época, principal razão do movimento. De modo geral, suas idéias abarcavam
um pouco das disposições de cada um dos grupos, unidos pela ânsia de
fundamentar seu ideário na condução de projetos reformistas:
Atualização da sociedade com o modo de vida promanado
da Europa; a modernização das estruturas da nação, com
a sua devida integração na grande unidade internacional;
e a elevação do nível cultural e material da população. Os
caminhos para se alcançar esses horizontes seriam a
aceleração da atividade nacional, a liberação das
448
ALONSO, Angela. “Crítica e Contestação: o movimento reformista da geração de 1870”.
Revista Brasileira de Ciências Sociais. Vol.14. n
o
44. São Paulo: ANPOCS, 2000. p.35-55.
449
Ibidem. p.35-55.
450
Idem. Idéias em movimento: a geração 1870 na crise do Brasil-Império. São Paulo: Paz e
Terra, 2002.
183
iniciativas soltas ao sabor da ação corretiva da
concorrência e a democratização, entendida como
ampliação da participação política. Como se vê, uma lição
bem acatada de liberalismo progressista. Para completar,
a assimilação das doutrinas típicas do materialismo
cientificista então em voga [...].
451
Como paulista alinhado às idéias liberais que herdou e adquiriu,
Paula Souza poderia ser identificado como pertencente ao grupo dos
“federalistas científicos”. Afinal, entendia que, para sair da situação de
atraso em que se encontrava, o país deveria reformar suas instituições
políticas, acabando com a monarquia e o centralismo por intermédio da
implantação do modelo federativo, visto mesmo como panacéia para a cura
de todos os males, bem como libertar os escravos e investir na
industrialização por meio do aprimoramento técnico, reconhecendo São
Paulo na dianteira desse processo:
De alguns anos à esta parte ninguém poderá negar que
São Paulo agita-se e trabalha para melhorar e aumengtar
suas indústrias [...]
Nossa principal fonte de riqueza é o café [...] sem dúvida
tem feito o progresso de São Paulo.
452
No entanto, reconhecia e apontava os problemas que subsistiam, bem
como o quão se poderia aproveitar essa disposição paulista para
industrializar-se, modernizando e aplicando recursos tecnológicos, bem
como desenvolvendo técnicas de organização do trabalho nos moldes do
sistema capitalista,
O transporte desse produto demandou a construção de
estradas de ferro, no entanto o sistema de vendê-lo de
comerciá-lo é ainda o mesmo dos primeiros tempos desta
indústria, o mesmo fato observa-se com a
comercialização do açúcar. Parece que nada se tem feito.
Nossas fazendas produzem-se e fabrica-se quase que
tudo e ao mesmo tempo e com o mesmo pessoal. As
melhores fazendas de café vão fazendo felizmente certa
divisão de trabalho e como conseqüência ahi produzem-
451
SEVCENKO, Nicolau. Literatura como Missão: Tensões sociais e criação cultural na
Primeira República. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p.97.
452
Esboço rápido de nossas indústrias comparada à dos Estados Unidos. Manuscritos, s/d.
Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
184
se mais com menos pessoal que antes, mas em geral o
princípio econômico da divisão do trabalho é pouco
compreendido ainda. Demais as poucas máquinas que se
serviam para substituir o trabalho humano são ainda
uma prova do pouco espírito industrial existente [...].
Falta de espírito, tino comercial: estradas, transportes,
ausência de estabelecimentos de crédito e transporte de
dinheiro [...]. Nos Estados Unidos plantam sentados na
boléia e não com as mãos, plantam sem grande trabalho.
Quão diversamente se passam as coisas na grande nação
americana!
453
O país não possuía o “tino” que os americanos do norte possuíam;
nesse sentido, tinha muito que aprender para adequar-se à lógica capitalista
e ao progresso que eles desfrutavam.
Os republicanos, ao criticarem a monarquia e defenderem suas
idéias, elaboravam relatórios e debatiam acerca da situação da agricultura,
da indústria, do comércio e da educação no país. Esses escritos de Paula
Souza expressavam a estratégia de divulgação das propostas republicanas,
utilizando como elemento comparativo os Estados Unidos, que tinham o
regime político que se almejava, considerado único caminho para a
superação dos problemas expostos.
Na defesa da modernização da indústria, das relações e da
organização do trabalho subentendia-se a sobrepujança dos limites do
homem, sujeitando a natureza em seu proveito. O progresso significava,
então, o caminho inevitável em direção ao bem-estar social, por meio do
aumento da produção da riqueza, proporcionado pelo aprimoramento de
técnicas. Paula Souza condensava esses propósitos:
Sendo então a indústria a materialização suprema do
esforço pela criação de riquezas, defender a indústria
nacional era o mesmo que aludir ao progresso, à evolução
dos costumes e à civilização tão almejados.
454
453
Esboço rápido de nossas indústrias comparada à dos Estados Unidos. Manuscritos, s/d.
Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
454
TURAZZI, Maria Inez. A euforia do progresso e a imposição da ordem: a engenharia, a
indústria e a organização do trabalho na virada do século XIX ao XX. Rio de Janeiro:
COPPE, São Paulo: Marco Zero, 1989. p.80.
185
Assim, nota-se que foi significativo o papel do engenheiro nesse
processo de domínio da natureza na configuração de uma “nova sociedade” e
nesse ideário:
É a nossa classe, descendente de Prometheu que
empunha o comando das massas sociais.
[...]
A tarefa do engenheiro é sagrada porque representa o
domínio da Humanidade sobre as forças da natureza que
atuam no meio físico.
Portanto, os engenheiros consideravam ter o domínio das forças
naturais e também se viam como aptos a dirigir outras instâncias da vida:
Nós engenheiros, por educação e destino, somos infensos
à demagogia e à disciplina truculenta porque a disciplina
social que exercemos sobre as massas proletárias
consiste em impor a nossa direção pela justeza de nossas
previsões.
Elas não nos seguem pela obediência inconsciente e
passiva, mas pela confiança em nossos acertos,
esclarecidos pela demonstração contínua da nossa
orientação científica.
E não poderia ter outro feitio o nosso comando porque o
nosso fim é adaptar o meio às contingências humanas,
aumentando o conforto, diminuindo o labor pesado e
estreitando as distâncias pelo aperfeiçoamento das vias
de comunicação.
Não admitiam os conflitos sociais e de interesse, entendendo que sob
a sua direção inclusive as classes subalternas poderiam ser atendidas, uma
vez que sua “ciência” também tinha o poder de amainar a fadiga do
trabalhador, ao se empregar a técnica em seu favor:
Domamos a violência das ondas creando enseadas
artificiais protegidas por maciços quebramar e corrigimos
a escarpa com muralhas aprumadas. Retemos as
violências das inundações com o represamento das
barragens ciclópicas. Abrimos os caminhos pelas vias
terrestres, aproximando as vozes com as rêdes
telefônicas: trazemos a domicílio a energia solicita da
eletricidade; fertilizamos os campos; transformamos os
minérios em utensílios e máquinas.
186
Em todos os ramos da atividade pacífica forma a
nossa classe, a elite dirigente, mas essa direção não
tem a feição truculenta dos comandos guerreiros nem a
violência intolerante das demagogias tumultuárias.
Porque não somamos os impulsos cegos das massas;
porque agimos pela orientação das ciências
positivas que representam a delegação das elites das
gerações passadas.
Não podemos assentar a nossa força na supremacia da
força bruta das multidões, chamem-se elas exércitos ou
turbas democráticas. [...] impomos a nossa ordem,
demonstrando a exatidão das soluções científicas.
Atenuamos o peso da tarefa proletária inventando a
máquina; multiplicamos os pães manipulando reações
químicas; aumentamos a potência humana, conduzindo
energias.
Representamos a ordem nova onde a fraternidade e a
liberdade devem fulgurar como uma aurora regeneradora
da alma humana.
455
Embora longa, a citação revela a imagem que o engenheiro construía
de si mesmo e o quão considerava seus colegas de profissão preparados para
a tarefa que a sociedade demandava. Os engenheiros estavam devidamente
“esclarecidos” para atuar em todos os aspectos da vida política, econômica,
social, cultural, isto porque sua formação permitia o domínio da ciência e
seu conhecimento era empírico e, portanto, inquestionável. Nesse sentido, a
eles todas as instâncias da vida de qualquer classe social, elite ou
proletária – deveriam se sujeitar.
Paralelamente à participação no movimento republicano, Paula Souza
– que na época de sua atuação mais ativa nesse movimento, início da década
de 1870, morava na Rua Boa Vista, em São Paulo, e tinha sua casa
freqüentada por republicanos como Luiz Gama e diversos correligionários
com quem mantinha ativa correspondência passou a dedicar-se também à
construção de ferrovias, o que o fazia mudar de cidade e residência muitas
vezes, estabelecendo-se ora em Rio Claro, ora em Piracicaba, ora em
Campinas.
455
MARTINS, Egydio. “O papel do engenheiro na sociedade moderna”. Boletim do Instituto de
Engenharia. n
o
142. Vol.XXIX. São Paulo, fevereiro de 1939.
187
No ano de 1871, o engenheiro Paula Souza foi encarregado dos
estudos de uma linha férrea que, passando por Porto Feliz, ligaria Itu a
Piracicaba. Posteriormente, foi nomeado engenheiro-chefe da Estrada de
Ferro Ituana, permanecendo neste posto praticamente até a conclusão da
obra. Foi neste período que participou da “Convenção de Itu”.
Em 1883, ocupou o cargo de engenheiro-chefe da Estrada de Ferro
que ligaria Rio Claro a São Carlos. Terminada tal obra, retornou a Itu, onde
assumiu o cargo de Inspetor Geral da Ituana.
Em meio a esses trabalhos, Paula Souza desenvolveu atividade de
engenharia urbana em Rio Claro. Mas é possível notar que, entre os anos de
1879 e 1881, sua vida profissional foi marcada essencialmente:
[...] pela intensificação de sua atividade junto ao setor
ferroviário da província pela abertura de seu campo de
atuação para outros setores da Engenharia, aqui
pontuados: rede de abastecimento para Campinas e
Amparo (1879/1880); projeto de criação da Carta
Corográfica da Província (1880); integra a comissão de
Estudos da Viação da Província (1881); projeto de estrada
de rodagem do Quilombo; estudo para a implantação de
uma linha de bondes em Campinas (1881), além dos
trabalhos topográficos junto ao seu escritório
particular.
456
Pode-se afirmar que, junto com todas as transmutações do período,
os engenheiros emergiram como a intelectualidade, considerados por si
mesmos como autônomos em relação à elite, embora, na verdade, fossem
oriundos dela, parte dela e estivessem a serviço dela.
456
CAMPOS, Cristina de. Ferrovias e Saneamento em São Paulo. O engenheiro Antonio
Francisco de Paula Souza e a construção da rede de infra-estrutura territorial e urbana
paulista, 1870-1893. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo), FAU/USP, São Paulo,
2007. p.139-40.
188
IMAGEM 19 - Publicação de Paula Souza, 1879.
457
Por isso, o interesse pela formação de engenheiros profissionais
eleitos para conduzir a modernidade por meio do ensino técnico
profissionalizante estava visceralmente ligado aos interesses elitistas de um
grupo em específico. Esse movimento em prol da técnica, da tecnologia e do
avanço científico carregava consigo os mesmos ideais que mobilizaram o
movimento político da época, sobretudo os movimentos abolicionista,
republicano e federalista. No entanto, laureados pela dita neutralidade
científica, os engenheiros colocaram-se acima desses interesses.
Diante do quadro social, econômico e político do final do século XIX,
engenheiros e Engenharia ocuparam espaços, aproximando-se cada vez mais
dos centros do poder e atuando inclusive diretamente na política.
458
Nessa
dinâmica inseria-se Paula Souza, detentor de capital social, habilidades e
conhecimentos que o habilitaram a cumprir um papel no interior de uma
elite da qual ele já era parte por herança. Todavia, na sua perspicácia,
atualizou-se num processo de reconversão, afinal, quando os tempos
mudam, a necessidade de se reestruturar as estratégias de
457
Fonte: Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
458
FURTADO, Janaina Lacerda. “O engenheiro e o político: as relações entre discurso
político e o discurso científico na trajetória de Francisco Pereira Passos”. Revista da SBHC.
Vol.4. n
o
2. Rio de Janeiro, jul./dez. 2006. p.146-53.
189
reprodução,
459
sempre orientadas pelo “capital social”, pela cultura e pelas
interiorizações objetivas da sociedade de sua época ou de seu grupo.
460
No mesmo período da criação da Escola Politécnica (1894), também a
Comissão Geográfica e Geológica da Província de São Paulo (1886)
461
, o
Instituto Agronômico de Campinas, o Horto Florestal, o Instituto Adolfo Lutz,
o Instituto Butantã, a Faculdade de Medicina e o Instituto Franco da Rocha
foram núcleos de pesquisa científica e tecnológica oriundos diretamente da
poupança global gerada na economia cafeeira do segundo período.
462
A
criação dessas diversas instituições partiu da idéia comum de “fé na
ciência”, ou seja, entendia-se que as ciências poderiam gerar um real
desenvolvimento econômico, político e cultural.
463
Nesse sentido, a ciência era vista como instrumento eficaz para a
solução dos problemas, podendo inclusive inserir São Paulo nos circuitos
científico-intelectuais nacional e internacional.
464
Tais iniciativas
relacionavam-se à valorização da ciência, mas não se deve excluir o interesse
459
Por estratégia de reprodução entende-se um conjunto de práticas mediante as quais os
indivíduos, ou grupos, tendem a conservar ou aumentar seu patrimônio (que não é
necessariamente riqueza material) e, portanto, manter ou melhorar suas posições na
estrutura das relações sociais. Como produto do habitus, as estratégias de reprodução
contêm uma parcela de adaptabilidade ao presente, que, por sua vez, encerra uma dose de
antevisão do futuro, como o fez o pai do engenheiro ao insistir que seus filhos estudassem
Engenharia, antevendo as mudanças e o papel daquela ciência nessa sociedade ansiosa por
ser moderna. Ver: TRIGO, Maria Helena Bueno. “Habitus, Campo e Estratégia: uma leitura
de Bourdieu”. Cadernos CERU. Série 2, n
o
9. São Paulo, 1998. p.553.
460
BOURDIEU, Pierre. “Campo Intelectual e Projeto Criador”. In: Problemas do
Estruturalismo. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1968. p.136.
461
A Comissão Geográfica e Geológica foi criada em 1886 e era presidida por Orwille A.
Derby. Tinha por objetivo empreender o mapeamento do Estado de o Paulo, de modo que
facilitasse e racionalizasse a ocupação de suas terras. Possibilitou a interação de
engenheiros, geólogos e geógrafos. Paula Souza manteve estreita relação com a Comissão;
são diversas as missivas recebidas de Orwille Derby. Chegaram a fazer um abaixo-assinado
quando pediu exoneração do cargo que exercia no governo do Estado de São Paulo. Entre as
assinaturas do abaixo-assinado pode-se identificar a assinatura, além de Derby, de Teodoro
Sampaio, entre outros membros da Comissão. Abaixo-assinado. 10/03/1891. Arquivo Paula
Souza - PS.891.03.10, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
462
VARGAS, Milton. [et.al.] “Indústria da construção e a tecnologia no Brasil”. In:
MOTOYAMA, Shozo (Coord.). Tecnologia e industrialização no Brasil: uma perspectiva
histórica. o Paulo: Editora da UNESP, Centro de Educação Tecnológica Paula Souza,
1994. p.33.
463
FERREIRA, Antonio Celso. A epopéia bandeirante: letrados, instituições, invenção
histórica. São Paulo: Editora UNESP, 2002. p.97.
464
MOI, Claudia. “Homens de ciência: a atuação da elite letrada na cidade de São Paulo na
criação da Comissão Geográfica e Geológica”. Cordis. Revista Eletrônica de História Social
da Cidade. Disponível em: <www.pucsp.br/revistacordis>.
190
pelo atendimento das necessidades econômicas dos cafeicultores, cuja
intenção era melhor e o mais rápido possível aproveitar as riquezas naturais.
Quando eleito deputado (1892), Paula Souza aventou a criação de
uma escola de Engenharia, mas adiou tal intento quando se afastou do
cargo em virtude de ter sido convidado por Floriano Peixoto a assumir a
pasta das Relações Exteriores, ainda no mesmo ano. Contudo, não ficou
muito tempo no cargo, migrando logo em seguida para a pasta da
Agricultura, mas, também por divergências com o governo, preocupado com
a Revolta da Armada e a Federalista, acabou por exonerar-se.
465
Como parte de seus projetos estava também o elogio à educação,
entendida como solução para todos os males, capaz de difundir novas idéias,
desenvolver o espírito científico, além de oferecer qualificação profissional, de
modo que se corrigissem as “desarmonias sociais”
466
, e de promover o
progresso do país, cada qual com sua função social.
Assim, de volta ao Congresso Estadual, Paula Souza, seguindo essa
concepção de educação, dedicou-se à defesa do ensino técnico-
profissionalizante.
4.3 - ENSINO TÉCNICO E SALVAÇÃO DA POBREZA
Possuímos o mais gigantesco systema fluvial, e quase que
não temos navegação interior; temos a lavoura, e falta-
nos o braço, temos, a metéria prima, e não temos fábrica,
temos a mina, e não possuímos o mineiro, cumpre-nos
resolver tudo isso, accumulando energias, que nos
tornem verdadeiros senhores de nossa terra. Tudo isso
convida, senhores a nos aparelharmos para essa lucta
que nos dará o domínio de tantas forças perdidas, de
tantas riquezas abandonadas e de tantos productos
naturaes que o trabalho ainda não valorisou.
467
465
Ver nos anexos um documento na íntegra no qual explica-se porque Paula Souza
afastou-se do Governo de Floriano Peixoto.
466
FERREIRA, Antonio Celso. Op. cit., 2002. p.96.
467
Discurso de Cesário Motta Junior, por ocasião da inauguração da Escola Politécnica. Cf.:
ESCOLA POLYTECHNICA. “Histórico da Escola Polytechnica de S. Paulo”. In: Annuario da
Escola Polytechnica. São Paulo, 1908. p.8.
191
A República nasceu arrebatada pelos ideais de modernidade e pelo
otimismo proporcionado pelas descobertas da ciência. Precisamente a última
década do século XIX foi marcada por grandes descobertas e pelo impacto da
Revolução Científico-Tecnológica, conhecida também como Segunda
Revolução Industrial.
468
A Escola Politécnica de São Paulo (1894) nasceu, sob o signo da
ciência e da tecnologia, como caminho para o progresso e a modernidade.
Expressava a concretização do projeto republicano paulista e a confirmação
da incompetência da monarquia para dirigir os destinos do país.
Em seu discurso de inauguração, Paula Souza refez o caminho do
desenvolvimento da tecnologia no Brasil, especificamente em São Paulo,
lembrando o quanto o regime centralizador deixou a desejar. A idéia de
ciência e tecnologia, segundo ele, não era nova; fazia parte das
idealizações de “nossos avós”. Lembrou do fechamento do Gabinete
Topográphico, ensaio de formação de uma escola de engenheiros
construtores de estradas
469
:
[...] apezar da grande falta de homens práticos, capazes
de bem delinear e executar as estradas n’aquela
epocha, reputadas indispensáveis para a prosperidade de
São Paulo, após a extincção d’aquella modesta tentativa,
que aliás ia produzindo excellentes fructos, nada mais
se ensaiou entre nós d’aquele gênero. Era evidente que
estava reservado ao governo Republicano, que é o
governo do povo, pelo povo, e em proveito do povo, a
tarefa de cuidar seriamente desse emprehendimento; e
agora é que realmente se poderá esperar de semelhante
instituição, os benefícios que nossos Avós, tão
sabiamente anteviam.
E realmente, Senhores, si por ventura tivesse vingado
aquella patriótica tentativa e produzido os seus naturaes
effeitos quanta desgraça, quanto dispêndio inútil de
esforço e de boa vontade não se teria evitado nas
468
SEVCENKO, Nicolau. “O prelúdio republicano, astúcias da ordem e ilusões do
progresso”. In: SEVCENKO, Nicolau (Org.). História da vida privada no Brasil. Vol.3. São
Paulo: Companhia das Letras, 1998. p.7-48.
469
O Gabinete Topográfico foi criado durante o governo liberal do brigadeiro Tobias de
Aguiar, seu tio-avô, em 1835, e fechado com a assunção dos conservadores. CAMPOS,
Cândido Malta. Os Rumos da Cidade: urbanismo e modernização em São Paulo. São Paulo:
SENAC, 2002. p.41.
192
emergências difficeis que atravessa a nossa Patria no
momento actual?
470
Seguindo o seu discurso, fez elogio à República e questionou a
Monarquia centralizadora, bem como a tradição no país de se estudar
Direito:
Si conhecimentos mathemáticos e technicos fossem mais
divulgados entre nós, como o são os das sciencias sociais
e jurídicas, não assistiríamos hoje essa curiosa anomalia
de ver aquelle mesmo povo que o sabia quão
pacificamente resolve os mais difficeis problemas sociais
e políticos como o da abolição da escravidão e essa
gloriosa transformação política de 15 de novembro de
1889, importar os gêneros mais indispensáveis á vida e
até mesmo recorrer á industria estrangeira para obtenção
dos mais simples artefactos e apparelhos necessários á
defesa da Patria ameaçada de ruína e devastação.
O século XIX foi marcado também pela fé na ciência.
471
O saber
científico era visto como fundamento do progresso e condição para se tomar
parte no mundo civilizado. Progresso e produção científica eram faces da
mesma moeda. Todas as outras formas de atividade intelectual
subordinavam-se aos princípios científicos.
472
As Exposições Universais espelhavam essa maneira de pensar.
473
Ao
exporem o que tinham de mais avançado em termos de tecnologia os países
470
Discurso de Paula Souza, por ocasião da inauguração da Escola Politécnica de São
Paulo. Cf.: ESCOLA POLYTECHNICA. Op. cit., 1908. p.11.
471
Sobre a presença do “cientificismo” no Brasil, ver: SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo
das Raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-1930. São Paulo:
Companhia das Letras, 1993; COSTA, Angela Marques da, SCHWARCZ, Lilia Moritz. 1890-
1914: no tempo das certezas. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
472
HOBSBAWN, Eric J. A Era do Capital: 1848-1875. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
p.261.
473
“Festa da Modernidade”, as Exposições Universais eram verdadeiros espetáculos de
exibição e exaltação ao progresso, à ciência e à técnica, à máquina, à civilização. Eram
exibidos os mais recentes inventos, as máquinas mais modernas, tudo que levasse o
visitante ao deslumbramento. O Brasil, no encalço europeu e norte-americano, também
participou dessas exposições; ademais, criou as “Exposições Nacionais”, merecendo
destaque a Exposição comemorativa da abertura dos portos, em 1908, e a exposição do
centenário da independência, em 1922, no Rio de Janeiro. As exposições eram, em grande
medida, a expressão das transformações decorrentes da Revolução Industrial e do
capitalismo, endossando a convicção de que esses novos valores técnica e progresso
eram paradigmas dos povos civilizados, significando que sua assimilação paulatina e
sistemática conduziriam o mundo a um futuro promissor. SEVCENKO, Nicolau. A corrida
193
participantes, reafirmavam a associação entre progresso material e evolução
tecnológica como produto da ciência.
Assim, a necessidade de ingressar na modernidade tinha passagem
obrigatória pelo investimento no desenvolvimento da tecnologia, e, de
preferência, se deveria também alcançar o reconhecimento, ser aceito,
exibindo-se nessas vitrines mundiais.
Paula Souza, homem cosmopolita, tinha clara noção desse
significado. Viajado, pôde presenciar a distância do Brasil das nações
civilizadas:
Eu que tenho estado muitas vezes ausente de meu país,
em muitas nações civilizadas tive sempre um sentimento
sem dúvida também n’esta viagem tivestes, e é a [...] de
tristeza, não de saudade da pátria, mas por ser a pátria
pequenina, e [...] compasso de seus jovens e miseráveis
exploradores, enquanto outras nações elevam-se [...]
policiam-se e progridem.
474
Entendia que esse distanciamento poderia ser encurtado
investindo-se em ciência e tecnologia, e também que a formação de
profissionais qualificados era essencial nesse processo.
475
para o século XXI: no loop da montanha-russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
p.15.
Paula Souza, não deixou de visitar esses “templos do progresso”; foi da exposição da
Filadélfia que trouxe para o Brasil a novidade Decauville (ver capítulo 2). PLUM, Werner.
Exposições Mundiais no século XIX: espetáculo da transformação sociocultural. Bonn,
Friedrich Ebert Stfung, 1979; PESAVENTO, Sandra Jatahy. Exposições Universais:
espetáculos da modernidade do século XIX. São Paulo: Hucitec, 1997; BARBUY, Heloísa. A
Exposição Universal de 1889 em Paris. São Paulo: Loyola, 1999.
474
Carta de Paula Souza para Francisco Glicério. Itu, 12/02/1888. Arquivo Francisco
Glicério, CMU/UNICAMP. (grifo original)
475
O engenheiro aparecia como o profissional privilegiado entre os agentes transformadores
vinculados às concepções científicas e progressistas daquela época. Apresentavam-se como
os promotores do desejado desenvolvimento. Condensavam em si os princípios que deveriam
reger essas transformações: conhecimento científico, técnica e idealismo. Por isso, Paula
Souza entendia ser prioritário investir na formação desses profissionais. Em discurso de
inauguração, Anhaia Mello, vice-diretor da instituição e professor, afirmava: “[...] os seus
filhos, os engenheiros, que são os operosos intermediários entre os concebedores e os
executores directos dos mais importantes trabalhos humanos da ordem material, serão
também, pelo influxo benéfico da disciplina mental e elevadíssima de seus ensinamentos
superiores, valentes propugnadores da moral real, do progresso espiritual e da verdadeira
civilização do nosso idolatrado São Paulo e do nosso estremecido Brasil.Discurso de Luiz
Anhaia Mello. Cf.: ESCOLA POLYTECHNICA. Annuario da Escola Polytechnica de São Paulo
para o anno de 1900. São Paulo: Typographia do Diário Official, 1900. p.406.
194
A educação fazia parte das idéias de Paula Souza muito tempo,
talvez influenciado pelo pai e pelo avô, que entendiam ser o diploma
passaporte para uma participação social efetiva, principalmente na política
(ver apresentação). Em seus escritos mais antigos, apontava sua crença
no poder da educação, em coerência com sua idéia de sociedade civilizada.
A educação, segundo ele, tinha a capacidade de melhorar e
aperfeiçoar a natureza humana nos seus aspectos físico e moral, mas
também deveria ter um sentido prático e utilitário. Em termos políticos,
somente um povo com acesso à educação teria condições de levar a efeito os
preceitos do liberalismo e da democracia. Com o advento da República, essa
premissa tornou-se ainda mais premente.
Ao lado de temas como liberdade religiosa, escravidão/abolição,
federalismo/centralismo monárquico e casamento civil, Paula Souza, em
1869, em A República Federativa, abordou a importância da instrução,
dizendo ser esta o caminho para se atingir o pleno desenvolvimento
individual e, por conseguinte, do todo social:
Para que alguém possa se interessar por alguma cousa é
preciso que elle a conheça, e possa avaliar as vantagens
que elle ou seus concidadãos tiram com isso. Um
ignorante comprehende mal os seus interesses, [...] Para
que haja a actividade individual acima mencionada, é
mister que esses indivíduos sejam instruídos. O governo
federativo é também o que mais necessidade tem que os
cidadãos sejam instruídos. Não basta haver necessidades
intelectuaes, ou antes apesar dellas a federação atraza-
se, e atraza-se muito, si os cidadãos não teem certo grau
de instrucção que lhes permitte tomar parte activa nos
negócios do paiz, e principalmente nos de seus
respectivos municípios.
476
Neste texto discutia sobretudo a temática da liberdade na instrução
pública, que, segundo sua opinião, deveria ficar a cargo das municipalidades
– ponto de vista que deve ser levado em conta, uma vez que estava na defesa
do federalismo como forma de organização política.
476
Paula Souza, Antônio Francisco de. A República Federativa do Brasil. São Paulo: Typ. do
Ypiranga, 1869.
195
Eleito deputado na primeira legislatura republicana e presidente da
Câmara, em 1892, apresentou o projeto que refletia sua mentalidade liberal
e cientificista, entendendo serem estes preceitos o liberalismo e o
cientificismo fundamentais no encaminhamento do país ao progresso e à
modernidade. Na tramitação do projeto e nos embates no Legislativo, tecia
duras críticas às instituições de educação que não tinham por finalidade
atender às necessidades práticas tanto do indivíduo, na sua luta pela
sobrevivência, como do país, que necessitava atingir suas potencialidades
mediante o domínio da tecnologia.
477
A apresentação do projeto revelava seu ponto de vista acerca da
educação:
[...] pedi a palavra para apresentar um projeto de lei
autorizando a fundação de uma escola especial no
Estado, a qual na minha opinião, pode trazer grande
benefícios a São Paulo [...] as principais dificuldades com
que hoje lutamos são em grande parte devidas à falta de
pessoal que tenha conhecimento pratico necessários das
inúmeras industrias que nesta época de progresso
espontaneamente surgem no nosso Estado. E essas
dificuldades aumentam justamente agora quando nossa
instrução elementar é por demais insuficiente e a
secundaria quase que esta reduzida a preparar alunos
para as academias superiores, e ainda assim bastante
descuidada [...].
Observando esses factos que se dão no nosso paiz e os
exemplos altamente edificantes dos Estados Unidos da
América do Norte, convenci-me de que a criação da escola
de que tracta o meu projeto era uma necessidade
inadiável.
478
A instrução então tinha dois sentidos: a garantia do progresso
material individual e, conseqüentemente, social; e a superação da
ignorância. Em outras palavras, a instrução tinha a capacidade de promover
a qualificação da mão-de-obra para a emergente sociedade industrial que se
delineava em São Paulo e, portanto, de impulsionar o desenvolvimento, como
também de possibilitar a formação de um corpo de cidadãos que a República
477
O projeto da Fundação da Escola Politécnica foi apresentado em 1891 e em 1893 foi
definitivamente aprovado.
478
Apresentação do Projeto da Escola Politécnica por AFPS. Cf.: SÃO PAULO. Annaes das
Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo -
ALESP, São Paulo.
196
exigia, a fim de que o regime fosse efetivamente consolidado, uma vez que o
período ainda era de sérias perturbações, e com o povo instruído, capacitado
para a participação que o novo regime necessitava, a situação poderia ser
diferente. Era preciso encontrar uma via de cooperação entre os grupos
sociais distintos, dando acabamento e legitimidade à República
inconclusa.
479
Foi desse modo que a instrução pública tornou-se parte
significante das preocupações republicanas.
480
Era essa instrução que os idealizadores da Escola Politécnica
pretendiam facultar. A crença no poder da instrução que procuravam
implementar era ampla e ambiciosa; não queriam meramente o
desenvolvimento científico e tecnológico, mas um ensino que desse conta de
suas preocupações quanto à democracia, à representação e à cidadania,
características inerentes aos seus projetos políticos liberais.
481
O principal argumento contrário ao projeto da Escola Politécnica de
São Paulo afirmava ser ele elitizante
482
, pois, ao contrário do que achavam os
seus defensores, ia na contramão dos princípios republicanos e dos direitos
de cidadania. Isso porque não atenderia às necessidades do povo, limitando
seus benefícios a um grupo restrito, o que não obedecia ao princípio
479
A crença na educação não era voltada somente para o ensino superior proposto pelo
projeto da Politécnica. Muitas construções escolares foram feitas no período, demonstrando
também o interesse na formação desde as primeiras letras. Paula Souza foi diretor do
Gymnasio da Capital em 1893, logo que foi inaugurado (hoje funciona o E. E. de São Paulo,
no Parque D. Pedro). Sua passagem pelo ministério, e adepto que era das questões da
educação, abriu canal de comunicação com Ms. Brown, por exemplo, responsável pela
Escola Normal da Praça. Diversas missivas foram encontradas nas quais ela expõe suas
idéias sobre a educação, tecendo também elogios à figura de Paula Souza, pelo compromisso
com a educação. Ms. Brown também aproveita a oportunidade para pedir auxílio do governo
para a realização de obras nas instalações que ela entendia serem fundamentais para a
promoção da educação. Ver carta nos anexos.
480
O interesse pela educação nesse período transpareceu principalmente a partir de 1890,
com a reforma Benjamin Constant no âmbito federal e a reforma Caetano de Campos, em
1892, em São Paulo, na área da escola primária e normal. As iniciativas nesse sentido
tomaram maiores proporções nos anos subseqüentes, especificamente a partir de 1915, com
o chamado “Entusiasmo pela Educação”. Mas foi a partir da década de 1930 que se
realizaram concretamente os frutos semeados desde os últimos anos do império brasileiro.
NAGLE, Jorge. Educação e Sociedade na Primeira República. São Paulo: E.P.U. - Editora
Pedagógica e Universitária, 1974; Idem. “A Educação na Primeira República”. In: FAUSTO,
Boris. O Brasil Republicano. Sociedade e Instituições (1889-1930). Tomo III, Vol.2. São
Paulo: Difel, 2004. p.260-91.
481
CERASOLI, Josianne Francia. A Grande Cruzada: Os engenheiros e as engenharias de
poder na Primeira República. Dissertação (Mestrado em História), UNICAMP, Campinas -
SP, 1998. p.34.
482
Ibidem. p.53.
197
democrático republicano de educação para todos. Assim, toda a atenção do
governo deveria estar voltada para atender prioritariamente as necessidades
da educação básica, no intuito de atender um maior número de pessoas:
A evolução do nosso progresso mental não se de
manifestar pela criação de escolas superiores e sim pela
difusão das escolas primárias, tão amplamente que
venhamos a reduzir o vergonhosíssimo estado de
ignorância em que nos achamos, e fazer desaparecer essa
tristíssima porcentagem de analfabetos que coloca o
Brasil no ínfimo dos lugares entre as nações
civilizadas.
483
Ambas as partes, de defesa e de crítica do projeto, tinham por
objetivo levar o país ao mesmo patamar dos países civilizados. No entanto,
seus posicionamentos políticos e princípios divergentes faziam com que os
meios para alcançá-lo fossem vistos de maneira diversa.
O principal crítico do projeto de Paula Souza na Câmara foi o
deputado Gabriel Prestes (1867-1911). Sua postura era claramente em favor
do ensino primário, que, no seu entender, era a única maneira de elevar o
homem culturalmente. Segundo ele, o ensino técnico/ profissionalizante não
dava conta da formação integral do ser humano. Para ele, o ensino deveria
oferecer o conhecimento do mundo e da sociedade, para somente depois
proporcionar especialização prática em uma profissão qualquer.
Neste aspecto, Paula Souza argumentou não desconsiderar a
formação básica do indivíduo, como se viu em seu discurso de apresentação,
quando falava da importância e deficiência do ensino primário e secundário.
Porém, não concordava em negligenciar o ensino técnico, justificando que
seu projeto procuraria atender um grupo privilegiado, tendo em vista que se
tratava de uma escola de ensino superior:
[...] porque o considera um projeto de criação de uma
escola superior, e assim sendo vai exclusivamente
beneficiar um número muito insignificante de cidadãos,
vindo, em conseqüência disso, argumentar as
dificuldades do nosso estado social, diferenciando ainda
483
Fala do Deputado Gabriel Prestes. Cf.: SÃO PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de
1892. Arquivo da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo - ALESP, São Paulo.
198
mais as classes que trabalham daquelas que são
favorecidas pela fortuna e não precisam despender tanto
esforço material para viver como os primeiros: que por
isso preferência exclusivamente ás escolas de
instrução primaria.
É muito louvável, sem vida, o ponto de vista do nosso
colega, infelizmente, porém nenhuma sociedade atual, ao
menos no mundo ocidental, chegou ainda á perfeição de
poder prescindir das escolas especiais. Entre todos os
países não nenhuma ainda, por mais adiantada que
esteja a instrução publica, por melhor adaptadas que
sejam as leis que os regem, por mais bem observadas que
seja pelo pessoal docente, onde se tenha chegado ao
ponto de a simples instrução elementar suprir os
conhecimentos necessários a vida na sociedade.
484
Paula Souza refutou a acusação de seu projeto ter caráter
elitista e, ao argumentar, possibilitou mais uma vez vislumbrar o seu
distanciamento da visão de mundo de seu antagonista:
É, pois, o ponto de vista do nosso collega elevadíssimo,
na qual o de todos os homens terem a mesma aptidão,
estarem nas mesmas condições de ter todos os
conhecimentos, e poderem galgar todas as posições sem
distincção de classe; mas é esse ponto de vista
justamente a que me dirigi quando elaborei este projecto.
Não tenho em vista classe nenhuma.
Uma das nossas felicidades no Brazil, apesar do atrazo
em que estamos debaixo de outros pontos de vista,
consiste justamente em não ter classes. Nós não temos
classes. Formamos um todo de cidadãos do mesmo
paiz. Eu não conheço classe alguma; si alguém tem esse
preconceito e se julga superior aos outros, o faz para
seu uso particular, mas a verdade é, repito, que não
classes.
485
O deputado Gabriel Prestes, membro da Comissão de Instrução
Pública da Câmara dos deputados, era parte de um grupo que defendia a
idéia de ensino integral, que consistia no indivíduo ter conhecimento do
mundo por meio de sua formação humanística, sem especializações nem
privilégios
486
, única maneira, segundo ele, de qualquer pessoa conseguir
superar as desigualdades sociais. Até mesmo porque entendia que o ensino
484
Ibidem.
485
Ibidem. (destaques nossos)
486
CERASOLI, Josianne Francia. Op. cit., 1998. p.56.
199
profissionalizante era realizado pelo Liceu de Artes e Ofícios (1873) e
outras instituições partidas de iniciativas particulares
487
.
Produto de seu tempo e imbuído do habitus da sua classe social,
Paula Souza não entendia desse modo.
488
Ao dizer que não via no Brasil a
divisão social em classes, percebe-se que havia assumido a idéia de
democracia pelo menos teoricamente –, segundo a qual todos,
indistintamente, deveriam ser reconhecidos como cidadãos. Pensava a
sociedade como uma unidade corporativa, na qual cada um, segundo sua
especialização, deveria dar sua parcela contributiva no crescimento do todo.
Nesse sentido, investindo-se no aprimoramento individual do
cidadão, conseqüentemente a sociedade e o país progrediriam. Num misto de
idéias individualistas liberais e corporativistas, afirmava ser “essa escola
superior uma escola que prepare os moços para o futuro, por seus próprios
esforços, desenvolverem suas aptidões”
489
, para serem úteis a si e à pátria.
Segundo sua visão, o meio de progresso naquele momento era o
domínio da tecnologia, daí sua defesa do ensino profissionalizante,
indispensável para o desenvolvimento da indústria, e esta, atingindo sua
potência, geraria riquezas. Assim, a industrialização e o ensino técnico
profissionalizante, em relação de dependência, seriam a “salvação da
pobreza”
490
do país e dos indivíduos que dele faziam parte. Desconsiderava
487
Paula Souza, nesse aspecto, defendia o seu projeto afirmando que o tipo de formação que
pretendia o era o que o Liceu oferecia: “Aquela escola vai ser uma escola excelente, muito
boa para formar artesãos; mas não é uma escola de mecânica, é uma escola de maquinistas;
não é uma escola de engenheiros, é uma escola de mestre de obras; é uma escola excelente
muito útil e necessária [...]”, mas não se deveria confundir uma Escola Politécnica, com uma
escola de artesãos, “onde se vão buscar os conhecimentos necessários às artes e ofícios.”
SÃO PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da Assembléia Legislativa do
Estado de São Paulo - ALESP, São Paulo.
488
Quanto ao seu principal opositor, Gabriel Prestes, não foi possível levantar sua origem
social com maiores detalhes. Foi professor normalista, jornalista, diretor da Escola Normal
da Praça e como parlamentar sempre demonstrou interesse e envolvimento pelas questões
ligadas à educação.
489
SÃO PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da Assembléia Legislativa
do Estado de São Paulo - ALESP, São Paulo.
490
Ibidem. Além dos debates na Câmara, o ensino técnico e profissionalizante também
apareceu no discurso do professor Luiz de Anhaia Mello, na inauguração da Escola
Politécnica: “Como o nosso mais poderoso propulsor scientifico da indústria, que, aqui,
como além, é a salvadora da pobreza e a inimiga da guerra, a Escola Polytechnica prestará
immenso axilio ao nosso grande Estado e ao Brazil em geral, aproveitando de modo
completo as bellas intelligencias nacionaes no desenvolvimento das incommensuraveis
riquezas, que profusamente estão espalhadas em São Paulo, em todos os Estados da
nossa República”. ESCOLA POLYTECHNICA. Op. cit., 1900. p.405-6.
200
as contradições sociais e os conflitos, sendo “um instrumento apto a
consolidar a eficiência e concentração do sistema e a destruir as forças
centrifugas ideológicas e classistas”.
491
Paula Souza não admitia a existência de classes no Brasil:
O que é a grande maioria de homens que alêm da
instrucção rudimentar nada mais possuem dos
conhecimentos os mais elementares. O que é uma
dúzia de homens que freqüentam academias e que são
portadores de diplomas e de pergaminhos que falam
muito em biologia, em sociologia e outras coisas mais, e
que, no entanto, não são capazes de fazer uma addição
de quatro parcellas!
492
Além da crítica à excessiva valorização dos “diplomas e pergaminhos”
e do conhecimento pouco útil, nota-se em sua fala como Paula Souza
entendia a sociedade, continuando sua justificativa do não reconhecimento
de classes. O que existia, segundo sua visão marcadamente influenciada
pelas idéias republicanas e maçônicas, entre elas a de que somente a
educação seria capaz de transformar o indivíduo, passando este a
desenvolver suas potencialidades como cidadão crítico, consciente de seus
direitos e deveres cívicos, enfim, capacitando-o para o exercício pleno da
cidadania –, era “a ignorância, única barreira a dividir a sociedade em dois
campos, o último privilégio a destruir”
493
, ponto de vista muito próximo,
inclusive, do pensamento de Campos Salles, seu contemporâneo.
Assim, com esse objetivo (destruir aquele “privilégio”), grupos
envolvidos no movimento republicano – que muitas vezes eram também
maçons, com interesse outrossim em conseguir adeptos para a causa
republicana que contribuíssem na sua legitimação de cidadãos participativos
segundo a sua ótica criaram as escolas noturnas para a alfabetização de
491
BOBBIO, Norberto [et.al.] “Corporativismo” in: Dicionário de Política. Brasília: Editora da
UNB; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000. p 287-291.
492
SÃO PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da Assembléia Legislativa
do Estado de São Paulo - ALESP, São Paulo.
493
SALLES, Manuel F. de Campos. “Um contraste”. Gazeta de Campinas. Campinas - SP,
12/06/1873. Apud: MORAES, Carmen Sylvia Vidigal. “A maçonaria republicana e a
educação: um projeto para a conformação da cidadania (1867 a 1937)”. In: SOUZA, Cynthia
Pereira de (Org.). História da Educação: Processos, práticas e saberes. São Paulo: Escrituras,
2003. p.10.
201
adultos, trabalhadores livres e mesmo escravos. A precursora desse
movimento pela educação foi a Loja Maçônica América, em 1873, da qual
Paula Souza era membro, que sustentava, além de uma biblioteca popular,
uma escola noturna com 156 alunos matriculados, todos operários ou filhos
de operários.
Em diversas outras municipalidades também surgiram iniciativas
semelhantes. Em 1874, funcionava em Mogi Mirim uma escola que atendia
23 alunos, entre eles alguns escravos. No ano seguinte, seu corpo discente
aumentou para cerca de 42 alunos. em 1878, seus cursos, lecionados
gratuitamente, foram ampliados e seu número de alunos quintuplicou em
relação ao ano de 1875, passando a instituição a atender 214 alunos, 23
deles escravos. Também foram fundadas escolas mantidas por lojas
maçônicas em Araraquara, Tatuí, Sorocaba, Taubaté e Itu região em que
Paula Souza chegou a lecionar.
494
Por meio de seu projeto para a Escola, Paula Souza parecia tentar
introduzir no país um modelo de ensino de Engenharia e de escola com base
em sua própria experiência como aluno na Alemanha e na Suíça. Seguindo
essa orientação, propôs a criação de um curso preparatório
profissionalizante, com o sentido de atender e também de demonstrar que se
preocupava com a educação elementar, comprovando com isso sua
habilidade política, prevendo em que ponto seu projeto seria questionado. O
curso deveria funcionar da seguinte forma
495
:
Os moços que tiverem freqüentado apenas o 1.º anno
possam prestar enormes e relevantes serviços a nossa
industria, aquelles que tiverem concluído o 2.º anno,
muito mais, e aquelles que tiverem completado o curso
preparatório, não prestarão enormíssimos serviços ás
nossas industrias, como exercerão perfeitamente os
cargos que hoje são exercidos por aquelles que cursam a
escola superior de engenharia. Não poderão
naturalmente, no 1.º anno competir com estes que
494
MORAES, Carmen Sylvia Vidigal. Op. cit., 2003. p.5-26. Sobre a maçonaria no Brasil e
sua atuação, ver: VIEIRA, David Queirós. O protestantismo, a maçonaria e a questão
religiosa no Brasil. Brasília: Editora da UNB, 1980; HOLANDA, Sérgio Buarque de. “Da
Maçonaria ao Positivismo.” In: O Brasil Monárquico, v. 5: do Império à República. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. p.289-305.
495
A escola preparatória prevista no projeto de Paula Souza nunca chegou a funcionar.
202
possuem títulos e pergaminhos; mas em poucos anos de
pratica ficarão habilitados a rivalizar com os melhores.
496
A Escola Politécnica de São Paulo foi criada pela Lei n
o
191, de 24 de
agosto de 1893, produto da fusão de duas outras leis: a n
o
26, de 11 de maio
de 1892, e a n
o
64
497
, de 17 de agosto, promulgadas no governo de
Bernardino de Campos, cujo vice-presidente era José Álvares Cerqueira
Cesar, e o Secretário do Interior Cesário Motta. Era então a terceira escola de
Engenharia do país; antes dela, haviam sido fundadas a Escola de Minas,
em Ouro Preto, no ano de 1876, com os cursos de Metalurgia e Engenharia
de Minas, e a Escola Politécnica do Rio de Janeiro
498
.
A Escola deveria ter por finalidade formar engenheiros práticos,
construtores e condutores de máquinas, mestres de oficinas e diretores de
indústrias.
499
Para a sua instalação o governo do estado de São Paulo
utilizou um prédio situado na Avenida Tiradentes, o antigo solar do Marquês
de Três Rios.
Para iniciar os cursos, foi nomeado para o cargo de Diretor Antonio
Francisco de Paula Souza. Do primeiro grupo de professores fizeram parte
Luiz Anhaia Mello nomeado também vice-diretor –, Manoel Ferreira Garcia
Redondo, Francisco Paula Ramos de Azevedo, João Pereira Ferras, Francisco
Ferreira Ramos e Carlos Gomes de Souza Shalders.
500
Depois de nomeados seu Diretor e corpo docente, deu-se a
inauguração da Escola Politécnica de São Paulo, no dia 15 de fevereiro de
496
SÃO PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da Assembléia Legislativa
do Estado de São Paulo - ALESP, São Paulo.
497
Esses dois projetos previam a organização de uma Associação Protetora das Ciências de
São Paulo e uma Escola Superior de Agricultura e outra de Engenharia. SANTOS, Maria
Cecília Loschiavo dos. Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 1894-1984. São
Paulo: Reitoria da USP, Fundação para o desenvolvimento tecnológico da Engenharia, 1985.
p.12; “Dossiê Poli 100 anos”. Revista Politécnica. n
o
208. São Paulo, 1994.
498
A história da Escola Politécnica do Rio de Janeiro remonta ao período colonial;
conservava, desde os primórdios de sua criação, uma característica militar, e seu currículo
seguia o modelo da École Polytechnique de Paris, no qual prevalecia o ensino teórico. A
Escola de Minas de Ouro Preto também seguia os mesmos preceitos franceses da Escola do
Rio de Janeiro, fundada em 1876; privilegiava o ensino mineralógico e geológico, não tinha o
perfil politécnico. Sobre a escola, ver o trabalho de: CARVALHO, José Murilo de. A Escola de
Minas de Ouro Preto: o peso da glória. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.
499
“Histórico da Escola Polytechnica de S. Paulo”. Revista Polytechnica.. Número
extraordinário. São Paulo, 13 de abril de 1918.
500
“Histórico da Escola Polytechnica de S. Paulo”. ESCOLA POLYTECHNICA. Op. cit., 1908.
p.6.
203
1894, contando com 31 alunos matriculados e 28 ouvintes distribuídos nos
seguintes cursos: Engenharia Civil, Engenharia Industrial, Engenharia
Agrícola e Artes Mecânicas.
501
IMAGEM 20 - Solar do Marquês de Três Rios, primeira locação da POLI.
502
Nas acaloradas discussões travadas na Câmara em torno da
prioridade no investimento para educação e do seu caráter, outra questão se
colocava, dessa vez a respeito da vocação brasileira: industrialismo ou
agrarismo.
Ao defender o ensino tecnológico e profissionalizante, Paula Souza
deixava claro seu entendimento de que o progresso se daria mediante a
sociedade industrializada, e o engenheiro via em São Paulo um movimento
“espontâneo” nesse sentido, considerando que as potencialidades do Estado
deveriam ser aproveitadas. Em contrapartida, os “conservadores” vinculados
à riqueza gerada pelo café tentavam a todo custo convencer de que seus
interesses iam ao encontro dos interesses gerais, acusando aqueles que
defendiam a tecnologia, a fim de desenvolver uma indústria nacional, de
antipatriotas, pois, segundo entendiam, iam contra a “natural” vocação do
país, que, para eles, era agrícola.
503
501
Em 1899, Paula Souza criou o Gabinete de Resistência dos Materiais, germe do atual
Instituto de Pesquisas Tecnológicas, o IPT.
502
Fonte: Instituto de Engenharia, São Paulo.
503
MATOS, Maria Izilda Santos de. Trama e Poder: A trajetória polêmica em torno das
indústrias de sacaria para o café (São Paulo, 1888-1934). Rio de Janeiro: Sette Letras, 1996.
p.180.
204
Paula Souza, em seu discurso, procurava chamar a atenção para a
possibilidade de desenvolvimento proporcionada pelo domínio da tecnologia,
usando como exemplos as experiências dos países mais “adiantados”, em
especial os Estados Unidos, inclusive na agricultura. Ele achava que deveria
haver uma diversificação das atividades econômicas, potencializadas com
uma organização racional. Contudo, seus opositores viam nisso um
desperdício de tempo, afinal, a vocação natural de São Paulo e do Brasil era,
conforme defendiam, para a exportação de matéria-prima e importação de
todos os outros produtos. Respeitando essa sua vocação, o país garantiria
seu bem-estar, desfrutando dos avanços promovidos pela tecnologia dos
países “civilizados”, sem ter de sacrificar energias para trilhar um caminho
que ainda não desbravara.
De relance, esse discurso agrarista parece ser apenas direcionado
para a crítica à industrialização e, por conseguinte, à urbanização,
defendendo interesses dos grandes proprietários rurais que se viam
ameaçados. Cabe salientar que o discurso ruralista utilizou como estratégia
ao seu movimento os ataques aos setores urbanos e industriais; contudo, o
conjunto de suas idéias e seu raio de ação eram muito mais amplos,
profundos e politizados do que parecia.
504
Do outro lado, os industrialistas entendiam que deveria haver uma
superação. A indústria era vista como sinal de progresso, e o país deveria
reunir esforços nesse sentido, como argumentou o deputado Alfredo Pujol
505
ao defender o ensino técnico e profissionalizante:
504
Afirma-se que havia uma série de outros interesses embutidos nesse dogma de “vocação
agrícola”. Sobre o assunto, ver: MENDONÇA, Sonia Regina de. O Ruralismo Brasileiro (1888-
1931). São Paulo: Hucitec, 1995.
505
Alfredo Gustavo Pujol (1865-1930) concordava com o projeto de Paula Souza, mas o
significa que ambos comungavam os mesmos ideais, e propunha algumas ressalvas. Assim
como Gabriel Prestes, era membro da Comissão de Instrução Pública da Câmara, mas
discordava no sentido da imposição do ensino integral e afirmava que a educação elementar
isoladamente não seria capaz de garantir o desenvolvimento esperado, bem como que a
criação de uma escola profissional não seria prejudicial ao ensino primário, antes o
complementaria. Para Pujol, o ensino superior era tão necessário quanto o ensino técnico-
profissional, pois garantiria a formação adequada de uma elite dirigente: “O meu distinto
colega da comissão de instrução pública trouxe, a meu ver, perante esta Câmara umas
teorias socialistas encadernadas em um volume de Augusto Comte, e que me parecem
absolutamente condenatórias do ensino superior, que eu, entretanto, considero como a base
da seleção intelectual necesssária a toda a sociedade civilizada.” Alfredo Pujol. Cf.: SÃO
PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da Assembléia Legislativa do
Estado de São Paulo - ALESP, São Paulo. CERASOLI, Josianne Francia. Op. cit., 1998. p.65.
205
É fora de duvida que o futuro da pátria brazileira, o
futuro da República, é inconstestavelmente o
industrialismo. Mas a indústria moderna reclama a
instrucção técnica do operário como o meio valorizador
do trabalho e como elemento de elevação moral, exige que
se saiba fazer scientificamente aquillo que até agora tem
dominado o empirismo puro.
506
A defesa da industrialização como sinônimo de progresso e
modernidade incluía também a modernização do campo. Paula Souza
posicionava-se favorável à agricultura; o que criticava era a idéia de o país se
tornar totalmente dependente dela. Considerava que se deveria investir em
várias frentes econômicas, incluindo o melhor aproveitamento dos recursos
naturais e das potencialidades agrícolas, mas também o aprimoramento da
tecnologia no campo. Tanto que inicialmente existia na Politécnica um curso
de Engenharia Agrícola, que somente deixou de existir quando da fundação
da ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luíz de Queiróz)
507
, que
concentrou os cursos dessa natureza.
O modelo de ensino adotado na Escola Politécnica era inspirado nas
escolas alemã e suíça (Tecnioshe Hochschule), nas quais se deu a formação
de Paula Souza.
508
Essa opção foi duramente criticada por Euclides da
Cunha, em artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo, em 24 de maio
e 1
o
de junho de 1891, chegando a afirmar acerca do projeto:
É verdadeiramente consternadora a leitura do projeto que
cria o Instituto Politécnico de São Paulo. Vazio de
orientação, incorretíssimo na forma, e filosoficamente
506
Alfredo Pujol. Cf.: SÃO PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da
Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo - ALESP, São Paulo.
507
Luiz Vicente de Souza Queirós era primo de Paula Souza, filho de sua tia Francisca de
Paula Souza Queirós, a baronesa de Limeira.
508
Na correspondência com o pai, Paula Souza sempre relatava suas experiências práticas
quando estudante na Europa: “No dia 2 tivemos os nossos últimos concursos no semestre: o
primeiro anno de Engenharia teve de construir uma janella para a casa de uma estação de
caminho de ferro.Á maior parte o pode concluir com o trabalho senão no dia seguinte;
mas alguns meos companheiros e eu concluímos as 6 horas da tarde tendo começado as 9
da manha. Era uma janella muito simples; mas debaixo de muitas condições, e allem d’isso
devia se fazer os detalhes conjunctamente; de maneira geral tivemos muito que trabalhar.
Carta ao pai. Zurich, 05/06/1862. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São
Paulo.
206
deficiente, repelimos de todo a idéia de que ele possa vir a
modelar a nossa mentalidade futura [...].
509
Euclides da Cunha, oficial-engenheiro formado na Escola do Rio de
Janeiro, adepto dos modelos franceses para os seus cursos, fora
influenciado pelo princípio positivista de que o ensino de Engenharia deveria
ser eminentemente matemático, “de cujos princípios seriam deduzidas as
práticas”
510
. Para ele, existia na proposta de Paula Souza uma quebra na
hierarquia dos conhecimentos científicos.
511
Para Paula Souza, no entanto, a opção que fizera justificava-se pela
atenção prioritária dada ao ensino prático, experimental, baseado nas
ciências aplicadas às indústrias, de modo que se pudesse intervir
diretamente na sociedade, inserindo seus alunos no mercado de trabalho de
tal maneira que sua atuação fosse sentida no grau de desenvolvimento
industrial e tecnológico que se alcançaria.
512
Simbolicamente, essa ênfase dada ao ensino prático também tinha o
significado de superação do regime monárquico e de tudo que a ele estivesse
relacionado, como a cultura livresca associada aos bacharéis. Até então, a
atividade que demandasse conhecimento intelectual no país era comandada
por eles. Assim, se a Monarquia fora responsável pela situação de atraso em
que o país se encontrava, deveria ser atribuída certa carga de
responsabilidade também à sua “intelligentsia”.
Depois de cumprir seu mandato como deputado e presidente da
Câmara Estadual, Paula Souza afastou-se da atuação política direta,
dedicando-se à direção da Escola Politécnica até o seu falecimento, em 1917.
O que não significa que não tenha atuado politicamente.
509
Apud: GALVÃO, Walnice Nogueira (Org.). Euclides da Cunha. São Paulo: Ática, 1984.
p.68.
510
Sobre a discussão, ver: SANTANA, José Carlos Barreto de. “Euclides da Cunha e a Escola
Politécnica de São Paulo”. Estudos Avançados. n
o
10. Vol.26. São Paulo: Instituto de Estudos
Avançados da USP, 1996.
511
A divergência nos princípios da formação da Escola Politécnica de São Paulo não impediu
Euclides da Cunha de tentar fazer parte do quadro de professores. Interesse que foi
dissuadido ante a afirmação de seu amigo Reinaldo Porchat de que o critério para a escolha
dos primeiros lentes da Escola foi puramente político. Ibidem. p.315.
512
GALVÃO, Walnice Nogueira (Org.). Op. cit., 1984. p.68. Sobre a discussão, ver:
SANTANA, José Carlos Barreto de. Op. cit., 1996.
207
Membro de uma parte da elite paulista sempre atenta às
transformações, Paula Souza procurou atualizar o seu habitus,
reconvertendo o seu capital social. Tal empresa parece ter sido eficiente, pois
da Escola Politécnica de São Paulo saíram muitos dos nomes que
compuseram a elite dirigente paulista, desde os primeiros anos de sua
fundação até os dias atuais.
513
4.4 - ATUANDO NA CIDADE
E como era preciso que nos illudíssimos, fascinando-nos
com vistosas miragens, decretam-se avenidas e
boulevards, multiplicando os empréstimos [...]
especialmente agora que tudo deve ser chic, como as
avenidas da moda e os palacetes dos architectos de fama
[...].
514
Paula Souza, reconhecido como o idealizador da Escola Politécnica de
São Paulo, foi diretor desta instituição desde a sua inauguração até 1917,
quando veio a falecer. Por ocasião da comemoração dos 90 anos da sua
fundação, no ano de 1984, uma publicação comemorativa editada pela
Escola consignava:
A Politécnica é, pois, uma instituição paulista, que
nasceu sob a premência das necessidades de
desenvolvimento da antiga metrópole do café, hoje
transformada no primeiro centro industrial do país. Ela
participou e participa de modo ativo e decisivo, do
desenvolvimento da cidade, em todos os níveis:
econômico, social, tecnológico e político.
515
Depreende-se daí que a história comprovou os argumentos
defendidos nos debates por ocasião da apreciação do projeto da Escola no
Legislativo Paulista: ensino técnico, com vistas ao domínio do conhecimento
513
Espaço de luta pela hegemonia, a cidade continha diversas referências suas e do grupo
do qual era parte. Seus nomes ficaram na memória da cidade: a Rua Brigadeiro Tobias,
Senador Queirós, Brigadeiro Luís Antônio de Souza, Marquês de Itu, Barão de Tatuí, Barão
de Limeira, Rua Paula Souza, Rua Antonio Paes, Baronesa de Itu e tantos outros nomes da
elite.
514
ROMERO, Sílvio. O Brazil Social. Rio de Janeiro: Typ. do jornal do Commercio, 1907.
515
SANTOS, Maria Cecília Loshiavo dos. Escola Politécnica da Universidade de São Paulo,
1894-1984. São Paulo: Fundação para o desenvolvimento da Engenharia, 1985. p.14.
208
científico, capaz de promover a industrialização e o progresso do povo
paulista. Muitas personalidades da vida política paulista passaram pela
Politécnica, desde os seus primórdios até a atualidade, como se previa nos
discursos das primeiras formaturas.
Diversos trabalhos a respeito da Escola Politécnica foram elaborados,
uns com caráter institucional, abordando, em geral, a história de sua
criação, seus marcos, seus partícipes ilustres, seu percurso até os dias
atuais e seu papel no desenvolvimento de São Paulo e do país.
516
O sujeito
histórico Paula Souza aparece nesses trabalhos não como idealizador e
organizador do processo de florescimento da Escola, mas também como
aquele que deu a ela a feição de excelência na formação “de homens
práticos, capazes de responder às demandas de uma sociedade que se
estruturava e pretendia virar o século engajada num acelerado processo de
modernização”.
517
Cristalizou-se a idéia da criação da Poli como a realização do sonho e
o resultado do empenho de Paula Souza.
518
Porém, pouco destaque se deu à
sua figura para além da fundação da Escola
519
; ainda que se reconheça que
“[...] nunca se poderá separar o nome do ‘criador’ do nome da ‘criatura’”
520
,
nas palavras do ex-aluno, sua atuação como engenheiro também deixou
marcas na cidade.
Quando foi inaugurada a Escola Politécnica (1894), a cidade de São
Paulo o era mais aquela cidade pequena situada entre o triângulo dos
rios Tietê, Anhangabaú e Tamanduateí. A população passava por um
crescimento significativo, iniciado por volta de 1872-1886, período em que
aumentou 52% (de 31.385 para 47.697 habitantes), mas a grande arrancada
se deu entre 1890-1900, quando os moradores da cidade passaram de
64.934 para 239.820. São Paulo era, em 1890, a quinta cidade brasileira em
516
ESCOLA POLITÉCNICA. Escola Politécnica: Cem anos de Tecnologia Brasileira. São
Paulo: Grifo, 1993.
517
Ibidem. p.22.
518
Foram encontrados indícios de que havia controvérsias quanto à indicação de Paula
Souza para a direção da instituição. Não foi possível investigar mais a fundo por quais
razões seu nome prevaleceu; contudo, pode-se conjeturar que suas relações sociais talvez
tenham colaborado nesse sentido.
519
CAMPOS, Cristina de. Op. cit., 2007.
520
D’ALESSANDRO, Alexandre. A Escola Politécnica de São Paulo: histórias de sua história.
Vol.1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1943. p.21.
209
termos populacionais, atrás de Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Belém. Ao
findar o século XIX, era a segunda, atrás do Rio de Janeiro, apesar da
significativa diferença dos números entre uma e outra.
521
Símbolo da modernidade e do progresso, a cidade passou a ser um
dos principais focos da Engenharia, que atuou no sentido de intervir nos
problemas conseqüentes do crescimento do contingente populacional e das
novas funções que a cidade adquiria, o que demandou o desenvolvimento e
aprimoramento de técnicas concernentes ao saneamento (abastecimento de
água, coleta de esgotos, drenagem), às obras viárias, ao transporte urbano,
entre outras.
Quanto aos meios de transporte e comunicação, seu aperfeiçoamento
estava vinculado à produção cafeeira, que tinha necessidade da abertura de
canais de exportação e penetração no interior, o que resultou na
concentração do fluxo comercial entre São Paulo e Santos, gerando impacto
sobre a capital.
522
Durante a administração de João Teodoro Xavier (1872-1875), foram
lançadas as bases para a reformulação e modernização da cidade. Em sua
gestão, que ficou conhecida como a “segunda fundação de São Paulo”,
diversas iniciativas foram postas em prática. As mudanças realizadas foram
assim relatadas em 1910:
Substituição dos terrenos paludosos e miasmáticos, em
frente ao antigo Mercado da rua Vinte e Cinco de Março,
por um dos passeios mais aprazíveis e saudáveis, a ilha
dos Amores, no lugar onde existem hoje o Mercado do
Peixe e o Almoxarifado Municipal; a beleza e segurança
do morro do Carmo, medonho outrora por suas altas e
ruinosas muralhas de pedra; abertura da Rua do
Hospício até a ponte da Mooca, tendo sido um dos
trabalhos mais dispendiosos pelas grandes e importantes
obras de arte construídas à margem do rio [...] a
construção da rua Conde d’Eu, hoje General Glicério, de
521
FAUSTO, Boris. Trabalho urbano e conflito social, 1890-1920. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2000. p.18.
522
CAMPOS, Cândido Malta Campos. Os rumos da cidade: urbanismo e modernização em
São Paulo. São Paulo: Editora SENAC, 2002, p. 43.
210
982 metros de extensão e 13 de largura e os
melhoramentos notáveis do Pari e do Gasômetro e do
extenso aterrado deste nome, com 2000 metros de
comprimento e 12 de largura, pondo-o em comunicação
com o centro da cidade.
523
Nesta fala abordava-se um assunto preocupante na época: a questão
da salubridade da cidade. Avenidas largas eram construídas como forma de
medida sanitária, com base na teoria miasmática, então em voga.
A modernização da cidade de São Paulo, iniciada com João Teodoro e
continuada com João Alfredo, foi ampliada com a subida dos republicanos
ao poder. Com o regime federativo, as antigas províncias ganharam maior
autonomia, e as questões de ordem urbanística passaram a fazer parte das
prerrogativas do Estado e algumas das municipalidades.
Na gestão de Prudente de Moraes Barros
524
(1889-1890) como
presidente do governo provisório do Estado de São Paulo foi criada a
Superintendência de Obras Públicas, órgão similar ao que existia no
Império, e para ocupar o cargo de diretor convidou Paula Souza.
Em 1890, ao assumir a Superintendência, que era subordinada à
Secretaria de Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Paula Souza deu
prioridade aos problemas sanitários que, como foi dito, faziam parte
das preocupações na gestão de João Teodoro –, problemas estes que haviam
contribuído para a ocorrência de um surto de febre amarela que atingira o
estado. Suas ações eram no sentido de resolver o saneamento urbano, que
previa o abastecimento de água, a criação de um sistema de esgotos, a
organização da drenagem e o aterramento de regiões de várzeas, além da
canalização de rios e córregos.
523
Antonio Egydio Martins. Apud: TOLEDO, Benedito Lima. São Paulo: três cidades em um
século. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1981. p.70.
524
Prudente de Moraes era meio parente de Paula Souza; ele casou-se com Sofia, que era
prima de Paula Souza, filha do Barão de Piracicaba II, o “tio Rafael”.
211
IMAGEM 21 - Paula Souza em pé, ao lado de Prudente de Moraes
(governo provisório 1889-1890).
525
Esse plano de saneamento da cidade compreendia, além das questões
de infra-estrutura supracitadas, também melhoramentos diversos pautados
na emergente ciência higiênica. Os saberes científicos dos engenheiros,
aliados aos dos médicos sanitaristas
526
, passaram a ter função vital nessa
“nova cidade” que se delineava, ao mesmo tempo em que novos poderes se
constituíam com o advento republicano e com a necessidade de imprimir em
sua feição o tom da modernidade, em contraposição ao ultrapassado, antigo,
arcaico, representados pela monarquia superada.
Paula Souza afastou-se do cargo de direção na Superintendência de
Obras Públicas
527
, por ocasião do convite do Banco União para explorar
estrada de ferro de Uberaba a Coxim.
528
Contudo, ainda assim participou da
525
Fonte: Revista Polytechnica. São Paulo, 1918.
526
MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho. Bauru -
SP: EDUSC, 2002. p.32-6.
527
Carta do presidente do Estado de São Paulo Américo Brasiliense, aceitando o pedido de
exoneração de Paula Souza. Arquivo Paula Souza - PS.891.03.13, Biblioteca Mário de
Andrade, São Paulo.
528
Carta de agradecimento do Banco União pelo reconhecimento dos serviços prestados pela
comissão de Obras Públicas. São Paulo, 31/10/1892. Arquivo Paula Souza - PS.892.10.31,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
212
elaboração do plano de saneamento das várzeas
529
, como comentou
Cerqueira Cesar, membro da comissão:
De posse de vosso officio de 9 do corrente expondo-me a
circunstancia de força maior porque deixastes de firmar
com vossa assignatura os projectos organisados para o
saneamento da várzea do Carmo, pela Comissão de que
fazeis parte, e reconhecendo que esses projectos estão de
perfeito accordo com as vossas idéas assumis toda a
responsabilidade por elles; cabe-me agradecer-vos tal
declaração, que importa no abono da vossa reconhecida
competência profissional em favor dos mencionados
projectos.
Outrossim, cabe-me agradecer-vos as indicações que
desenvolvestes para a organização de um plano completo
de aformoseamento e conveniente collocação dos edifícios
públicos nesta capital, o que bem prova o vosso
extremado interesse porquanto pode concorrer par o
engrandecimento do nosso Estado.
530
Devidamente saneados e reestruturados, os espaços da cidade
deveriam ter nova funcionalidade. Nesse sentido, diversas disposições foram
sugeridas por Paula Souza. Além do saneamento das várzeas, que entendia
ser prioridade do governo, se deveria fazer uma série de desapropriações em
favor da utilidade pública. Na etapa seguinte, sugeriu que as funções
administrativas do governo fossem centralizadas numa mesma região, que
poderia ser embelezada por jardins, mas também apresentar austeridade,
seriedade, de forma a expressar a “modernidade” e a promessa dos “novos
tempos” representados pela recém-nascida República:
Nesses prédios assim desapropriados poder se ia
estabelecer desde já provisoriamente todas as repartições
públicas do Estado que hoje funcionam em prédios
alugados e para os quais paga o Estado alugueis
elevados, e no espaço assim obtido poder se ia projetar,
sob um plano geral adequado aos serviços do Estado, os
prédios próprios a esses serviços e executá-los à medida
que as rendas e condições financeiras do Estado
permitirem.
529
Cartas de Olavo Augusto Hummel, para o engenheiro Paula Souza. São Carlos,
31/03/1891 - PS.891.03.31 Uberaba, 28/04/1891 - PS.891.04.28. Arquivo Paula Souza,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
530
Carta de Cerqueira César para o engenheiro Paula Souza. São Paulo, 24/03/1892.
Arquivo Paula Souza - PS.891.03.24, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
213
A zona inclinada que do Palácio e da rua do Carmo se
estenda até as margens do rio Tamanduateí poderia ser
transformada em um jardim, que ficaria ligado à várzea,
ajardinada também, e dentro do qual se construiria um
museu nas condições do Museu da cidade de “La
Plata”
531
, para o que possuímos excelente pessoal e
início importante na Comissão Geográfica e Geológica do
Estado.
Na parte plana, hoje ocupada pela parte posterior do
Palácio e prédios adjacentes, poder-se-ia edificar o
Palácio do Poder Legislativo do Estado, tendo numa ala
os recintos destinados aos arquivos dessas corporações, e
finalmente nessa mesma parte central, mas em
pavimento superior a Biblioteca do Estado e Museu
Histórico do Estado de São Paulo.
No local atualmente ocupado pelo Coreto Musical do
jardim do palácio poder se ia construir, fronteando o
atual edifício da Tesouraria, e em proporções idênticas,
um edifício igualmente federal onde funcionassem as
repartições o correio e telégrafo.
Em outras quadras, dando maior amplitude ás ruas de
acesso aos largos da e ao grande largo Central do
estado transformando o beco do Pinto em rua
conveniente, poder se ia construir os edifícios
apropriados á morada do Governador ou Presidente do
Estado, aos Tribunais diversos, à Polícia, etc.
Todas estas edificações deveriam ser executadas sob um
plano geral bem concebido e em harmonia com os
serviços que terão de prestar, e ter o aspecto severo e
elegante que correspondam bem á grandeza e a
prosperidade do Estado à que pertencem.
Assim realizadas essas obras aquela parte central da
cidade seria realmente saneada e embelezada,
concorrendo eficazmente para melhorar muito os
trabalhos das diversas repartições públicas que ela
encerraria.
Bem sei que tais medidas saem muito fora dos nossos
moldes acanhados e dos nossos hábitos de nada
empreender sob um ponto de vista geral e com a previsão
do futuro, nos contentando sempre com soluções
incompletas, as mais das vezes provisórias, mas é preciso
nesse particular mudarmos de rumo: é preciso que ao
531
Paula Souza tinha realizado viagem à Argentina e provavelmente inspirou-se no que viu,
pois Buenos Aires enfrentara uma série de problemas, com uma população superior à do
Rio de Janeiro, e conseguiu organizar a cidade, “oferecendo a imagem de uma Paris na
América do Sul”. O projeto de melhoramentos para Buenos Aires foi de responsabilidade do
arquiteto Joseph Antoine Bouvard, alto funcionário da Prefeitura de Paris, o mesmo que por
ocasião da apresentação dos projetos de melhoramentos para São Paulo foi solicitado a dar
seu parecer. REIS, Nestor Goulart. “Algumas experiências urbanísticas no início da
República: 1890-1920”. Caderno de Pesquisa do LAP. São Paulo: Laboratório de Estudos
sobre Urbanização, Arquitetura e Preservação, USP, s/d. Disponível em:
<www.usp.br/fau/antigo/dephistoria/lap>. Acesso em: janeiro de 2009. Ver também:
SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil (1900-1990). São Paulo: EDUSP, 1998.
214
menos tais trabalhos sejam bem lembrados e é o que
tomo a liberdade de fazer.
532
Entendia-se que a cada parte da cidade cabia uma função. Ruas
eram alargadas, expressando a influência do urbanismo parisiense, mas
também a consonância com os preceitos da ciência higiênica.
533
Contudo, as obras de caráter urbanístico só foram efetivadas na
gestão do prefeito Antonio Prado (1840-1929), com a direção de Obras
Públicas de Vítor da Silva Freire, uma vez que passaram a ser de
responsabilidade das municipalidades.
534
Mas se pôde notar que algumas
sugestões de Paula Souza foram incorporadas e serviram de inspiração aos
projetos postos em prática, apoiados pelos engenheiros da Politécnica, que
expressaram:
[...] O Sr. Conselheiro Antonio Prado é, dizem-no todos,
uma das mais sympathicas figuras desse regimen feliz de
progresso. Possamos todos nós vê-lo sempre nesse
bellissimo plano. A Revista Polytechnica saúda o
benemérito cidadão.
535
532
Relatório dos Estudos para o saneamento e aformoseamento das várzeas adjacentes à
cidade de São Paulo, apresentado ao presidente do Estado Dr. Américo Brasiliense de
Almeida Mello, pela Comissão para esse fim nomeada em 1890, pelo então governador, Dr.
Prudente José de Moraes e Barros. o Paulo, 1891. (destaques nossos) Arquivo do Estado
de São Paulo - AESP.
533
A preocupação por parte das autoridades governamentais com o saneamento acabou por
nortear suas políticas de urbanização, gerando territórios de exclusão social na cidade.
AVELINO, Yvone Dias. Saúde Pública e Cidade: Territórios de Exclusão Social, Memórias,
Tensões e Poderes”. In: ANPUH - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE HISTÓRIA. Anais do XIX
Encontro Regional de História - ANPUH. São Paulo: Poder, violência e exclusão. Vol.1. o
Paulo: ANPUH-SP, 2008. p.317.
534
As obras empreendidas na administração do prefeito Antonio Prado contaram, em sua
maioria, com profissionais ligados à Escola Politécnica, “órgão de difusão de conhecimento
na época”: Vítor da Silva Freire era professor de tecnologia industrial e mecânica; Lúcio
Martins professor de topografia, entre outros que figuravam no quadro docente da
Politécnica, ou eram seus ex-alunos, como Alexandre de Albuquerque (1880-1940), que
desempenhou papel de destaque na elaboração de um projeto de melhoramentos da capital,
concorrendo com Vitor da Silva Freire e Samuel das Neves. Foi também o primeiro ex-aluno
a chegar à direção da Escola Politécnica em 1937, cargo que exerceu por 20 anos. RICCI,
Sandra. Os engenheiros e a cidade, São Paulo, 1904-1926. Dissertação (Mestrado em
História), PUC/SP, São Paulo, 2006. p.43-4.
535
“Justa Homenagem”. Revista Polythechnica. n
o
2. Vol.1. São Paulo, janeiro de 1905.
p.117-8.
215
Articulados, os engenheiros da Escola Politécnica e a administração
municipal de São Paulo participaram ativamente das transformações da
cidade.
Nos primeiros anos da República, as preocupações do governo do
Estado estavam concentradas nas obras de saneamento e abastecimento de
água. Assim, foi criada a Companhia Cantareira de Água e Esgotos,
promovendo novas obras na Serra da Cantareira, bem como a ampliação da
rede de esgotos e a desativação dos chafarizes públicos. Ademais, foi criada
uma Repartição de Águas e Esgotos estadual e promulgado o digo
Sanitário de 1894.
536
O governo principiou uma série de construções de caráter
institucional, e o nome de destaque nesses projetos de intervenção
urbanística na cidade foi o do engenheiro-arquiteto Francisco Paula Ramos
de Azevedo (1851-1928).
537
Seus projetos materializaram no espaço da
cidade os anseios republicanos.
538
Ramos de Azevedo e Paula Souza desfrutavam uma relação que
transcendia o trabalho; eram amigos que partilhavam idéias. Empreenderam
em conjunto alguns projetos, merecendo destaque o projeto da Escola
Normal da Praça (1894), um edifício da série de edifícios institucionais
contido no programa do governo republicano: Tesouraria da Fazenda (1891),
Secretaria da Agricultura, ambas no largo do Palácio, Liceu de Artes e
536
CAMPOS, Cândido Malta. Op. cit., 2002. p.61.
537
Ramos de Azevedo era paulista e foi criado em Campinas; estudou fora do Brasil,
diplomando-se engenheiro-arquiteto pela Universidade de Gand, na Bélgica, em 1878. Além
dessas obras citadas, de caráter institucional, seu escritório foi responsável pelo
planejamento e execução de inúmeras obras e construções pela cidade. Foi o arquiteto
favorito da elite paulista da época. Também foi diretor do Liceu de Artes e Ofícios de 1895 a
1928, foi vice-diretor da Escola Politécnica entre os anos de 1900 e 1917 e assumiu o cargo
de diretor com o falecimento de Paula Souza de 1917 a 1921. FICHER, Sylvia. Os arquitetos
da Poli: ensino e profissão em São Paulo. São Paulo: FAPESP/Edusp, 2005. p.51-9;
SAMARA, Eni de Mesquita. Diretores da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo:
vidas dedicadas a uma instituição. São Paulo: EPUSP, 2003. p.23-9.
538
A cidade inevitavelmente acaba expressando as idéias e interesses: “A cidade apresenta
dois aspectos complementares: é simultaneamente pólo de diferenças que se exprimem na
ordenação interna e se separam de forma mais ou menos visível os grupos sociais, as
funções, a utilização do solo; e é também centro de convívio, de convergência que domina e
atenua, tanto quanto possível, os efeitos da distância.” RONCAYOLO, Marcel. “Cidade”.
Enciclopédia Einaudi. Vol.8 - Região. Porto: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1986. p.441.
216
Ofícios (1900) e o prédio novo da Escola Politécnica (1899)
539
, o edifício Paula
Souza
540
, considerado marco na produção arquitetônica no que se refere à
arquitetura de escolas.
IMAGEM 22 - Edifício Paula Souza - prédio novo da Escola Politécnica.
541
De um modo geral, a política de remodelação da cidade perpassava
pela idéia de embelezamento e funcionalidade dos espaços públicos,
atribuindo novas funções, por exemplo, ao centro da cidade
542
, que o
incluía a moradia popular. Seguindo as orientações sanitaristas do Código
539
São diversas as missivas de Francisco de Paula Ramos de Azevedo no arquivo Paula
Souza, como, por exemplo, a carta em que ele comenta sobre as obras que realizava na
Tesouraria da Fazenda. Trocavam comentários sobre as obras, orçamentos e materiais:
Tenho presente as suas estimadas cartas de 17 e 21 do mez pp. As quaes não respondi ate
este momento um pouco pelo trabalho excessivo que me deu a organização do projecto da
Thesouraria um pouco por esperar sempre poder fallar ao arens e d’elle obter um orçamento
em idênticas condições dos da Casa Arbenz para remeter-lhe. Estou, como o amigo, mais
inclinado aos mechanismos franceses, porem, se em relação ao motor obtivermos iguaes
condições de preço, parace-me que deveríamos preferir os do Arens [...] Não por estes
terem melhor acceitação como porque poderíamos conciliar a geral satisfação dos nossos
associados, sem prejuízo algum. estimaria, como nós, comprar ao Arens pelas relações de
amizade e parentesco e ate o momento que estes negócios não nos vem prejuízo convem
aceitar ao tal ensejo [...].” Ramos de Azevedo. Arquivo Paula Souza - PS.889.02.08,
Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
540
O Edifício Paula Souza, inaugurado em janeiro de 1899 para abrigar os cursos
especializados da Politécnica, abriga hoje o CEETPS - Centro Estadual de Educação
Tecnológica Paula Souza, autarquia de regime especial, associada à Universidade Estadual
Paulista “Júlio Mesquita Filho".
541
Fonte: Instituto de Engenharia, São Paulo.
542
ROLNIK, Raquel. A cidade e a lei: legislação, política urbana e territórios na cidade de
São Paulo. São Paulo: Studio Nobel, 1997. p.66-7.
217
Sanitário de 1894 e do Código de Posturas Municipal de 1886, buscou-se a
solução para a habitação do proletário na criação de vilas operárias.
543
Paula Souza realizou um detalhado estudo nesse sentido e acreditava
ser esta uma boa solução para resolver o problema:
A questão a melhoria da habitação do proletário,
muitos annos que preocupa seriamente os governos, os
philantropos e os industriaes, de todos os paizes
civilizados. Todos esses paizes possuíam leis favorecendo
as consctrucções de casas hygienicas e econômicas,
destinadas a operários e em muitos, é bem grande o
numero de sociedades cooperativas para a edificação de
villas operárias. Apesar de todos esses esforços e do
muito que se tem conseguido, infelizmente ainda se está
muito longe de ter attingido uma solução completa e
satisfatória da questão.
544
As primeiras propostas de construção de casas operárias agrupadas
em vilas em São Paulo datam de 1893, idealizadas por empresários que
requeriam isenções e outros favores do poder municipal.
545
O trabalho
elaborado por Paula Souza é indicativo desse sentido, pois, depois de
detalhar todas as possibilidades, concluiu:
Deste pequeno estudo chegamos a convicção de que um
empreendimento tendo por objetivos a consctrucção de
casas operarias será uma empreza de resultado
precários. O capital empregado estará pouco garantido e
não teremmuneração correspondente. Será mais uma
obra da philamtropia do que um emprego de capital.
Para este ultimo objetivo seria muito preferível a
construção de casas para pequenas famílias de
tratamento, que possam pagar alugueis de 200 a 400
mensais, assim com a construção de casas com vários
appartamentos ou mesmo ele quartos, confortáveis e
543
LEMOS, Carlos A. C. A República ensina a morar (melhor). São Paulo: HUCITEC, 1999.
544
Memorial apresentado sobre a construcção sobre casas para operários pelo Engenheiro
Civil A. de Paula Souza. s/d. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
545
Sobre o tema, ver: BLAY, Eva. Eu não tenho onde morar. São Paulo: Nobel, 1985. A
autora discute, nos seus mais diversos aspectos, a construção das vilas operárias, inclusive
“como centro de desfrute capitalista”. Ainda sobre o tema das vilas operárias, vale conferir:
DECCA, Maria Auxiliadora Guzzo de. A vida fora das Fábricas: Cotidiano Operário em São
Paulo (1920-1934). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987; e também TEIXEIRA, Palmira Petratti.
A fábrica do Sonho: trajetória do Industrial Jorge Street. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
218
hygienicos para rapazes solteiros empregados no
commercio, na industria ou estudantes.
546
Mas, ainda que não se apresentassem vantajosas em termos de lucro,
para Paula Souza, essas propostas de moradia popular trariam vantagens
aos empresários que nelas investissem, pois, ao proporcionarem maior
conforto e bem-estar aos seus trabalhadores, aumentariam a sua eficiência
no trabalho, tornando-o mais estável,
[...] evitando greves e descontentamentos, sempre
causando grandes prejuízos. A administração d’essas
Villas, conquanto trabalhassem, está isenta dos prejuízos
causado pela falta de pagamento dos alugueis e a
fiscalização, para a boa conservação dos prédios é
relativamente fácil pela possibilidade de disciplina e
educar o inquilinato. A essas vantagens, colhidas pelos
grandes industriaes, ainda teríamos que acrescentar a
referente ao bom conceito, que adquiriram da opinião
publica, o que não é para desprezar, sobretudo em se
tratando de homens de negocio, alem de satisfazerem o
seu amor próprio, pela consciência de terem [...] para a
melhoria da vida da grande maioria de seus
semelhantes.
547
Cabe mencionar que o presente estudo não pretendeu percorrer o
caminho dos problemas enfrentados em decorrência da modernização de São
Paulo ou abordar as intervenções urbanísticas a fundo, mas ver a cidade
também como espaço dos embates da elite e o papel dos engenheiros
desempenhando a função de intelectuais a serviço desse segmento social.
Nesse sentido, a cidade nesta época condição da produção cafeeira e das
atividades a ela relacionadas
548
– e a sua urbanização são vistas como
espaços de poder e símbolos dos valores e aspirações dessa elite.
546
Memorial apresentado sobre a construcção sobre casas para operários pelo Engenheiro
Civil A. de Paula Souza. s/d. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
547
Memorial apresentado sobre a construcção sobre casas para operários pelo Engenheiro
Civil A. de Paula Souza. s/d. Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
(grifos originais)
548
CANO, Wilson. Raízes da Concentração Industrial em São Paulo. Rio de Janeiro: Difel,
1977.
219
IMAGEM 23 - Paula Souza, em 1916.
549
Paula Souza, um dos “arautos da modernidade”, tomou parte nessa
intelectualidade que entendia a Engenharia como ciência capaz de pôr fim ao
atraso e aos resquícios do colonialismo, encaminhando a cidade e o país nas
sendas do progresso. A “sua escola”, como freqüentemente aludem as
publicações em sua homenagem, e como ele mesmo costumava dizer, impôs-
se como centro irradiador
550
dos conhecimentos científicos e técnicos
necessários a essa empresa para a cidade.
549
Fonte: LEMOS, Carlos A. C. Ramos de Azevedo e seu escritório técnico. São Paulo: PINI,
1998.
550
Não se propôs aqui estudar minuciosamente a atuação dos engenheiros formados pela
Politécnica, entendendo-se que, ainda que a Escola tenha surgido sob um signo de
modernidade e de pensamento político, não significa que aqueles que estudaram
comungassem os mesmos ideais. Para uma análise da dinâmica social estabelecida entre os
engenheiros formados e o Estado de São Paulo, nas mais diversas esferas, ver: SOUZA,
Ana Cláudia Ribeiro. Escola Politécnica e suas ltiplas relações com a cidade de São Paulo,
1893-1933. Tese (Doutorado em História), PUC/SP, São Paulo, 2006.
220
CONSIDERAÇÕES FINAIS
221
[...] tendo nas veias o sangue da verdadeira aristocracia,
o terceiro Paula Souza não desmentiu um momento a
sua excellente linhagem: antes, durante toda a sua vida e
em todos os actos , mais a vigorou o seu brilho sem
jaça.
551
A preocupação que norteou este estudo foi procurar apresentar as
bases da elite paulista, isto é, o cabedal econômico, social, político e cultural
que propiciou a gênese e conformação de uma dada sociabilidade de um
grupo social específico, a partir da trajetória de vida de uma individualidade,
Antonio Francisco de Paula Souza, o engenheiro, enquanto representante
não apenas de um grupo familiar, mas de um substrato social que o
transcendeu. Tal opção justifica-se por sua existência paradigmática, bem
como por ter presenciado e participado dos principais acontecimentos de São
Paulo e do país ao longo de sua história.
Assim, se propôs, por intermédio de uma abordagem biográfica,
partir do sujeito histórico Paula Souza em suas relações de sociabilidade
para o entendimento de questões mais amplas, ligadas aos caracteres ou à
forma própria de ser da elite paulista. Procurou-se, então, compreender
como se deu a gênese dessa elite para além do capital oriundo do complexo
cafeeiro que a projetou nacionalmente. Marcada por uma organização
estruturada na instituição familiar como instrumento para a realização de
alianças políticas ou mesmo para a ampliação do patrimônio, a partir dos
laços de lealdade e solidariedade, muitos nomes de famílias proeminentes se
forjaram nesse período.
A família Paula Souza é um modelo. Detentora de poder econômico e
atuante na vida política por diversas gerações, estudá-la em sua origem,
desde os tempos coloniais, teve o significado de contribuir na elucidação de
como o grupo social se posicionou estrategicamente na aquisição e
manutenção de poder.
Em meados do século XIX, esta elite paulista cafeeira encontrava-se
consolidada, momento em que, também afinada com a ordem internacional,
reconheceu a necessidade de “modernização”, tomada como meio de
expansão do capital, mas também deveria vir acompanhada de alterações
551
Boletim do Instituto de Engenharia. São Paulo, 1917.
222
políticas que propiciassem facilidades para tal desenvolvimento, e ainda de
novos códigos culturais que distinguissem o grupo que se julgava
competente no seu encaminhamento. Com esse tom, os grupos da elite
engajaram-se nos movimentos abolicionista, republicano, federalista,
entendendo-os como parte dessa “modernidade”, da qual se achavam
legítimos condutores.
Dessa maneira, as novas demandas sociais abriram os horizontes
para a Engenharia cuja ascensão o pai do engenheiro previa ao
encaminhar os filhos para a Europa –, contrapondo-se à cultura livresca do
grupo intelectual dominante no Império, os bacharéis. A Engenharia
assumiu os ideais científicos, comprometida com o desenvolvimento material
do país. Era a “ciência” capaz de conferir materialidade aos anseios de
modernidade.
Acompanhando-se Paula Souza em sua trajetória política, pôde-se
conferir seu empenho em concretizar seu ideal de progresso e civilização, no
qual a educação profissionalizante, o ensino prático, o trabalho qualificado e
a instrução afinada com os ideais republicanos tinham papel de
destaque.
Sua atuação em São Paulo foi vigorosa, influindo para além das
questões que envolveram a instituição da Politécnica. Atuou, por exemplo,
na composição da malha ferroviária e na organização material da cidade de
São Paulo para receber os “novos tempos”, a fim de resolver questões de
ordem urbanística, que, na sua visão, atrapalhavam o aproveitamento das
potencialidades na construção do progresso.
Depois de fundada a Escola Politécnica de São Paulo, Paula Souza
efetivamente afastou-se do exercício direto da política para dedicar-se
integralmente à direção da “sua escola”. Hoje é considerado o responsável
pela defesa e introdução do ensino técnico em São Paulo; contudo, de se
relativizar e questionar essa sua atribuição, haja vista que ele não era o
único defensor desse ideal de nação centrada no desenvolvimento da
tecnologia, nem era o único na idealização de uma escola superior de
Engenharia para São Paulo. Nesse sentido, a análise de sua história
mediante a documentação estudada composta em sua maioria por fontes
223
oriundas de arquivo pessoal permite atribuir sua posição à herança de seu
nome e às conexões políticas e sociais que desfrutava.
A proposta de abordagem deste estudo a análise da formação
pessoal de Paula Souza para se compreender posicionamentos, idéias,
projetos da elite paulista, no exame de suas práticas e dos meios de que
dispôs para garantir sua reprodução social possibilitou verificar ainda a
sua capacidade de adequação às imposições de novas demandas sociais.
Aqueles que não se adequaram, desprovidos do capital econômico de que
dispunham, apegaram-se à posse de valores simbólicos, numa tentativa de
preservar sua identidade de elite, desqualificando os demais grupos sociais,
mesmo enriquecidos, mas desprovidos do capital cultural, inerente aos
paulistas quatrocentões.
Procurou-se, assim, no decorrer deste trabalho, contribuir para a
discussão do caráter da elite paulista, mas também para o entendimento da
conformação do sistema capitalista em São Paulo, que procurava integrar-se
na lógica internacional.
Neste estudo foi possível perceber como outras questões menores
acabam por ser expressão de anseios maiores, como, por exemplo, o
“cientificismo” e o desejo de racionalização, a promessa de modernidade, a
eleição do engenheiro como profissional qualificado para encaminhá-la, as
interferências na cidade e como esta foi transformada em espaço de poder e
de exclusão, além das questões da organização do trabalho e do incentivo à
qualificação do trabalhador mediante o ensino-técnico e profissionalizante.
Este, se por um lado resolveria o problema da indústria crescente
entendida como fundamental para o progresso do país, segundo a visão
industrialista que reclamava mão-de-obra especializada, tendo de importá-
la para suprir sua necessidade, por outro funcionaria como uma “pedagogia”
de organização social, diante das novas relações de trabalho que advieram
na passagem do século XIX para o XX.
O ensino técnico profissionalizante é ainda hoje alvo de discussões
entre os envolvidos na causa da educação, do ponto de vista de propostas
pedagógicas e perspectivas de educação distintas. Em pleno ano (2009) que
marca as comemorações dos 100 anos da rede federal de Educação
224
Profissional e Tecnológica no Brasil considerando como marco o decreto
7566/09, que previa a criação de 19 escolas de aprendizes artífices durante
o governo de Nilo Peçanha, em setembro de 1909 –, é quase consensual na
opinião pública que o ensino técnico/profissionalizante consiste na melhor
maneira de se encaminhar o jovem, sobretudo aquele oriundo das camadas
subalternas da população, ao mercado de trabalho.
O que se nota é a permanência do discurso que se deu por ocasião da
defesa de suas origens, mais de cem anos: diz-se que os novos tempos
exigem maior desempenho dos profissionais, e que a educação não pode
alhear-se dessas transformações, passando a oferecer cursos que favoreçam
a melhoria da qualidade de vida. A educação profissional deve, então, estar
integrada ao trabalho, à ciência, à tecnologia e conduzir ao permanente
desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva e social.
O assunto merece um maior aprofundamento e, no meu ponto de
vista, deve transcender à sua funcionalidade. Poucas referências são
encontradas no sentido de explicitar suas vantagens para o setor patronal e
a sua relação com a ordem capitalista. Os discursos são muito semelhantes
aos do século XIX e início do XX: o ensino técnico é considerado “salvação da
pobreza” e de todas as suas implicações, como a violência, as drogas, entre
outras. Recentemente, o próprio presidente da República, Luiz Inácio Lula
da Silva, declarou-se produto do ensino técnico profissionalizante.
O engenheiro Paula Souza legou ao seu filho Geraldo Horácio de
Paula Souza (1889-1951), médico higienista, seu habitus de classe, como
também ele herdara de seus antepassados os valores que nortearam seus
posicionamentos e suas ações. Geraldo procurou seguir o mesmo caminho
traçado pelo pai no sentido político, pois, como membro da elite, tinha
acesso às instâncias de poder e partilhava das idéias de racionalização do
trabalho. Nesse sentido, participou da fundação do IDORT (Organização
Racional para o Trabalho), em 1931, e do SENAI (Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial), em 1942.
Tais organismos criados a partir de iniciativas de industriais
paulistas –, cuja tônica era a organização racional do trabalho e o preparo de
mão-de-obra qualificada para atender à demanda, diante do crescimento
225
industrial pelo qual São Paulo passava, eram a expressão também do desejo
de ordenação social mediante a organização e valorização do trabalho.
Assim como seu pai no fim da vida, o “quarto Paula Souza” não se
dispôs a participar ativamente e diretamente na política, o que pode ser
revelador do quanto essa elite da qual ele fazia parte, aberta às mudanças,
encontrou um modo de se reconverter, descobrindo outros meios de inferir
no social.
226
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ARQUIVOS E BIBLIOTECAS CONSULTADOS
Acervo Arquivístico e Biblioteca do Museu Republicano “Convenção de Itu”
MP-REP/USP, São Paulo.
256
Arquivo da Assembléia Legislativa de São Paulo - ALESP, São Paulo.
Arquivo do Instituto de Engenharia de São Paulo - IE, São Paulo.
Biblioteca da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - FAUUSP, São Paulo.
Biblioteca da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP, São
Paulo.
Biblioteca da Faculdade Politécnica da Universidade de o Paulo - POLI/
USP, São Paulo.
Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP, São
Paulo.
Biblioteca do Museu Paulista - MP/USP, São Paulo.
Biblioteca do Instituto de Pesquisas Tecnológicas - IPT, São Paulo.
Centro de Memória - CMU-UNICAMP, São Paulo.
Setor de Obras Raras da Biblioteca Mário de Andrade - BMA, São Paulo.
Arquivo do Estado de São Paulo - AESP, São Paulo.
Centro de Memória de Santa Bárbara D’Oeste - SP.
Instituto de Estudos Brasileiros - IEB, São Paulo.
IEB/USP
AUBERTIN, John J. Onze dias de viagem à Província de São Paulo com os
senhores americanos. Carta dirigida ao IImo. Sr. Barão de Piracicaba. São
Paulo: Typographia Alemã, 1866.
CMU/UNICAMP
Coleção Francisco Glicério Cerqueira Leite.
Coleção manuscritos Antonio Francisco de Paula Souza.
MUSEU REPUBLICANO “CONVENÇÃO DE ITU”
Inventários
Inventário de Gertrudes Celidônea Cerqueira (1862), maço 80.
Inventário de Bento Francisco de Paula Souza (1878), maço 114b.
257
Inventário amigável de Antonio Barros Penteado (capitão) e sua mulher
Maria Paula Machado (1829), maço 36A.
Inventário de Maria Barros Paula Souza (1851), maço 60 B.
Autos cíveis de justificação Francisco Paula e Souza (1817), maço 22.
Autos de depósito Antonio Francisco de Paula Souza (1860), maço 76.
Autos de embargo de bens da Vergueiro & Cia. (1863).
ARQUIVO DO ESTADO DE SÃO PAULO - AESP
RELATÓRIO DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, COMÉRCIO E OBRAS
PÚBLICAS. Ministro Dr. Antonio Francisco de Paula Souza, Agricultura. Rio
de Janeiro: Typographia Perseverança, 1866.
RELATÓRIO APRESENTADO À ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA PROVINCIAL DE
SÃO PAULO. Sr. Dr. João Teodoro Xavier de Matos, presidente da província.
São Paulo, 5 de fevereiro de 1873.
RELATÓRIO APRESENTADO À ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA PROVINCIAL DE
SÃO PAULO. Sr. João Teodoro Xavier de Matos, presidente da província. São
Paulo, 5 de fevereiro de 1874.
RELATÓRIO APRESENTADO À ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA PROVINCIAL DE
SÃO PAULO. Sr. Dr. João Teodoro Xavier de Matos, presidente da província.
São Paulo, 14 de fevereiro de 1875. São Paulo: Typographia do “Diário”,
1875.
RELATÓRIO DOS ESTUDOS PARA SANEAMENTO DAS VÁRZEAS
ADJACENTES À CIDADE DE SÃO PAULO. São Paulo, 1891.
DIVISÃO DO ACERVO HISTÓRICO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA -
DAHALSP
SÃO PAULO. Annaes das Sessões Ordinárias de 1892. Arquivo da
Assembléia Legislativa - ALESP, São Paulo.
SÃO PAULO. Discurso recitado pelo exmo. Presidente Raphael Tobias de
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BIBLIOTECA DA ESCOLA POLITÉCNICA DE SÃO PAULO - POLI/USP
ANNUÁRIO DA ESCOLA POLYTECHNICA DE SÃO PAULO. São Paulo:
Typographia do Diário Oficial, 1900.
2
58
ANNUÁRIO DA ESCOLA POLYTECHNICA DE SÃO PAULO. São Paulo:
Typographia do Diário Oficial, 1908.
REVISTA POLYTECHNICA. 2. Vol. 1. São Paulo: Seção de Obras do Estado
de São Paulo, janeiro de 1905.
REVISTA POLYTECHNICA. . n
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54. São Paulo: Seção de Obras do Estado de
São Paulo, 1917.
REVISTA POLYTECHNICA. N
o
extraordinário. São Paulo: Seção de Obras do
Estado de São Paulo, 13 de abril de 1918.
AZEVEDO, Ramos de (Coord.). “Notas Biográficas”. Revista Polytechnica. São
Paulo: Seção de Obras do Estado de São Paulo, N. extraordinário, 13 de abril
de 1918.
ARQUIVO DO INSTITUTO DE ENGENHARIA - IE
BOLETIM DO INSTITUTO DE ENGENHARIA. “Antonio Francisco de Paula
Souza”. n
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1. Vol.I. São Paulo, outubro de 1917.
MARTINS, Egydio. “O papel do engenheiro na sociedade moderna”. Boletim
do Instituto de Engenharia. Vol.XXIX. n
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15. Vol.II. “Antonio Francisco de Paula Souza”.
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REVISTA INDUSTRIAL DE SÃO PAULO. n
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belo exemplo da capacidade do povo paulista”. São Paulo, julho de 1945.
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profissional em São Paulo”. São Paulo, abril de 1947.
REVISTA ENGENHARIA. Vol.64. Instituto de Engenharia: especial 90 anos.
São Paulo: Engenho, set./out. 2006.
BIBLIOTECA DA FACULDADE DE DIREITO DE SÃO PAULO - USP
Projeto para o levantamento da carta carográfica da Província de São Paulo,
apresentado pelos engenheiros Antonio Francisco de Paula Souza, Adolfo
Augusto Pinto e J. Pinto Gonçalves. São Paulo, Typographia da
“Constituinte”, 1880.
Relatório da Repartição dos negócios da agricultura e obras públicas,
apresentado pelo ministro Antonio Francisco de Paula Souza, 1866.
259
BIBLIOTECA DA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA - PUC/SP
SOLENNISAÇÃO do Cinconencentenario da Convenção de Itú. São Paulo:
Companhia Editora Melhoramentos, 1923.
SOUZA, Antonio Francisco de Paula. A República Federativa no Brasil. São
Paulo: Typ. Ypiranga, 1869.
BIBLIOTECA MUNICIPAL DE SÃO PAULO “MÁRIO DE ANDRADE” - Setor
de Obras Raras - BMA
HOMEM DE MELLO, Francisco Ignacio Marcondes, Barão Homem de Mello.
Esboços biographicos por Homem de Mello. Rio de Janeiro: Typ. do Diário do
Rio de Janeiro, 1862.
Arquivo do Conselheiro, o médico Dr. Paula Souza
Cartas
José Bonifácio. Santos, 11 de junho de 1862.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). Côrte, 21 de agosto de 1862.
(?) Paes de Barros. S.l., 1863.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). São Paulo, 12 de maio de 1863.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). São Paulo, 1864.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). São Paulo, 18 de agosto de 1864.
J. Durão Annaes. S.l., 1865.
Estevan Inácio da Cunha Galvão. S.l., 1865.
Fidencio Nepomuceno Prates. S.l., 1 de fevereiro de 1865.
João Guilherme D’Aguiar Whitaker. S.l., s/d.
João Guilherme D’Aguiar Whitaker. São Paulo, 22 de maio de 1865.
(?) de Sá. Rio de Janeiro, 31 de maio de 1865.
C. José Hormeyer. Viena, 2 de junho de 1865.
Joaquim Cândido de Azevedo Marques. São Paulo, 4 de junho de 1865.
João Guilherme D’Aguiar Whitaker. Sítio, 14 de junho de 1865.
260
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). Rio de Janeiro, 10 de julho de
1865.
José Leite Penteado. São Paulo, 15 de julho de 1865.
Nicolau de Campos Vergueiro. Santos, 17 de julho de 1865.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). S.l., s/d.
Tavares Bastos. S.l., 2 de agosto de 1865.
Antonio Moreira de Barros. Taubaté, 4 de agosto de 1865.
Bernardo Avelino Gavião Peixoto. São Paulo, 17 de agosto de 1865.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). S.l., 2 de setembro de 1865.
John James Aubertin. São Paulo, 4 de setembro de 1865.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). S.l., 14 de setembro de 1865.
José Leandro de Godoi Vasconcelos. S.l., 19 de novembro de 1865.
Francisco Fernando Paes de Barros. S.l., 24 de setembro de 1865.
Calazans. São Paulo, 3 de outubro de 1865.
Bernardo Avelino Gavião Peixoto. São Paulo, 08 de abril de 1865.
Marquês de Olinda. S.l., 10 de outubro de 1865.
Christon Van Treyl. Rio de Janeiro, 11 de outubro de 1865.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). S.l., 14 de outubro de 1865.
José Pedro Dias de Carvalho. Rio de janeiro, 14 de outubro de 1865.
Guilherme Scully. Rio de Janeiro, 17 de outubro de 1865 (duas cartas do
mesmo dia).
Guilherme Scully. Rio de Janeiro, 17 de outubro de 1865.
Calazans. São Paulo, 24 de outubro de 1865.
Ricardo Gumbleton Daunt. Campinas - SP, 24 de outubro de 1865 e 3 de
outubro de 1865.
Santos Lopes. Arêas, 24 de outubro de 1865.
Manuel Pinto de Souza Dantas. Gabinete da presidência da Bahia, 11 de
novembro de 1865.
Bernardo A. Gavião Peixoto. S.l., 04 de novembro de 1865.
261
Ignácio da Cunha Galvão. Rio de Janeiro, 07 de outubro de 1865.
William Scully. Rio de Janeiro, dezembro de 1865.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). S.l., s/d.
Aureliano Candido Tavares Bastos. S.l., 15 de dezembro de 1865.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). Vapor Magé, 26 de dezembro de
1865.
Guilherme Scully. Rio de Janeiro, 29 de dezembro de 1865.
Ignácio da Cunha Galvão. Rio de Janeiro, 03 de abril de 1866.
Ignácio da Cunha Galvão. Rio de Janeiro, 04 de janeiro de 1866.
Sebastién, August Sissom. Rio de Janeiro, 4 de janeiro de 1866.
Tomás Pompeu de Souza Brasil. Fortaleza, 19 de janeiro de 1866.
João da Silva Carrão (Conselheiro Carrão). São Paulo, 4 de janeiro de 1865.
Adolfo de Barros Cavalcante de Lacerda. Desterro, 9 de fevereiro de 1866.
José Vieira Couto de Magalhães. Belém, 11 de fevereiro de 1866.
Carlos Pinto de Figueiredo. S.l., 15 de fevereiro de 1866.
Antônio José Maria Pego Júnior. Corrientes, 16 de fevereiro de 1866.
Jean Louis Rodolphe Agassiz. S.l., 25 de fevereiro de 1866.
C. Furquim de Almeida. S.l., 28 de fevereiro de 1866.
Aureliano Candido Tavares Bastos. Rio de Janeiro, 3 de março de 1866.
Aureliano Candido Tavares Bastos. Rio de Janeiro, 6 de março de 1866.
Marquês de Olinda. Corte, 30 de março de 1866.
H. M. Lane. Rio de Janeiro, 06 de abril de 1866.
Guilherme Scully. Rio de janeiro, 10 de abril de 1866.
Joaquim Lourenço Corrêa. Araraquara, 20 de abril de 1866.
Guilherme Scully. São Paulo (Rua Direita, 59), 15 de maio de 1866.
Francisco Antônio de Sousa Queirós. S.l., s/d.
Joaquim Machado Nascente de Azambuja. New York, 30 de abril de 1866.
262
Major C. Clark. Rio de Janeiro, 04 de junho de 1866.
Richard Francis Burton. S.l., s/d.
Joaquim Machado Nascente de Azambuja. S.l., s/d.
Ferreira Soares. S.l., s/d.
Marquês de Olinda. S.l., 19 de junho de 1865.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 30 de junho de 1866.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 5 de julho de 1866.
J. M. F. Gaston. S.l., 12 de junho de 1866.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 15 de julho de 1866.
Francisco de Souza Queirós. São Paulo, 19 de julho de 1866.
Raphael Francisco de Paula Souza. Itu, 20 de julho de 1866.
Francisco Antônio de Carvalho. S.l., 24 de julho de 1866.
Herman Haupl. Rio de Janeiro, 25 de julho de 1866.
Ernesto Diniz Street. S.l., s/d.
Vicente de Souza Queirós. São Paulo, 26 de julho de 1866.
Marquês de Olinda. S.l., 29 de Julho de 1866.
Marquês de Olinda. S.l., 30 de Julho de 1866.
José Agostinho Moreira Guimarães. S.l., 30 de julho de 1866.
Rafael Tobias de Barros, Vicente de Souza Queirós, Antonio Paes de Barros.
Lenções, 2 de agosto de 1866.
José Severino Fernandes. São Paulo, 3 de agosto de 1866.
Abaixo assinado (Furquim d’Almeida, Tavares Bastos, Fernando Cortiço,
Herman Haupl, Fernando Augusto da Rocha, Quintino Bocayuva, C. J.
Hassan). Rio de Janeiro, 4 de agosto de 1866.
Ernesto Diniz Street. Rio de Janeiro, 9 de agosto de 1866.
José Ildefonso de Souza Ramos Gomide. Rio de Janeiro, 10 de agosto de
1866.
Antônio Pereira Rebouças Filho. S.l., 19 de agosto de 1866.
João Witacker. Limeira, 19 de agosto de 1866.
263
Adolpho de Barros Cavalcanti de Lacerda. Desterro, 20 de agosto de 1866.
Américo Brasiliense de Almeida e Melo. São Paulo, 4 de outubro de 1866.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 1.º de setembro de 1859.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 3 de abril de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 19 de abril de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 5 de julho de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. Zurich, 4 de julho de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 19 de agosto de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 1.º de setembro de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. Zurich, 3 de outubro de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 1861 (1).
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 1861 (2).
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 1861 (3).
Francisco de Barros Paula Souza. S.l., 3 de abril de 1862.
Francisco de Barros Paula Souza. Zurich, 4 de dezembro de 1863.
Francisco de Barros Paula Souza. Zurich, 20 de dezembro de 1863.
Francisco de Barros Paula Souza. Zurich, 3 de abril de 1864.
Francisco de Barros Paula Souza. Zurich, 21 de novembro de 1864.
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 20 de Fevereiro de 1865 (?).
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 4 de março de 1865.
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 4 de abril de 1865.
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 20 de maio de 1865.
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 20 de junho de 1865.
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 20 de maio de 1866.
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 23 de junho de 1866.
Francisco de Barros Paula Souza. Carlruhe, 20 de abril de 1866.
José Maria Lisboa. São Paulo, 18 de maio de 1865.
264
Sebastien August Sisson. Rio de Janeiro, 24 de agosto de 1865.
Joaquim Saldanha Marinho. S.l., 06 de novembro de 1865.
Pedro de Araújo Lima. S.l., 16 de outubro de 1865.
Ernesto Diniz Street. Rio de Janeiro, 20 de junho de 1866 (em francês).
Francisco de Paula Souza (irmão de conselheiro). São Paulo, 9 de julho de
1866.
José Mendes de Paiva. Rio Comprido, 10 de julho de 1866.
Inspectoria Geral de Instrução Pública. São Paulo, 23 de agosto de 1866.
Aristides de Souza Spinola. S.l., 1866.
Joaquim Eduardo Leite Brandão. S.l., 1866.
Francisco Joaquim de Miranda. S.l., 6 de janeiro de 1866.
D. W. C. Van Treyl. Rio de Janeiro, 31 de janeiro de 1866.
Marquês de Olinda. S.l., 06 de abril de 1866.
Ativa
S/ identificação do receptor, 1864.
Conselheiro Carrão, 1865.
Agente da Companhia de Vapores entre Estados Unidos e Brazil, s/d.
S/ identificação do receptor, 1865.
Christon Van Treyl. Rio de Janeiro, 26 de outubro de 1865.
Sr. Whaley. Rio de Janeiro, 4 de janeiro de 1866.
Herman Haupl. Rio de Janeiro, 5 de agosto de 1866.
Aos Diretores da sociedade Internacional de imigração. S.l., 7 de agosto de
1866.
Francisco de Paula Souza. São Paulo, 4 de abril de 1862.
Bilhete para Marquês de Olinda. S.l., 9 de setembro de 1865.
Cartas enviadas aos filhos
São Paulo, 30 de março de 1863.
265
São Paulo, 20 de março de 1863.
São Paulo, 19 de abril de 1863.
São Paulo 19 de maio de 1863.
São Paulo 18 de julho de 1863.
São Paulo 18 de agosto de 1863.
Rio de Janeiro, 23 de dezembro de 1863.
Rio de Janeiro 09 de julho de 1864.
São Paulo, 19 de dezembro de 1864.
São Paulo, 19 de junho de 1865.
São Paulo, 19 de janeiro de 1865.
São Paulo, 19 de março de 1865.
São Paulo, 04 de abril de 1865.
Rio de Janeiro, 12 de maio de 1865.
Rio de Janeiro, 07 de junho de 1865.
Rio de Janeiro, 26 de junho de 1865.
Rio de Janeiro, 08 de agosto de 1865.
Rio de Janeiro, 02 de agosto de 1865.
Rio de Janeiro, 07 de julho de 1865.
Rio de Janeiro, 09 de dezembro de 1865.
Rio de Janeiro, 24 de novembro de 1865.
Rio de Janeiro, 08 de dezembro de 1865.
Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 1866.
Rio de Janeiro, 24 de março de 1866.
Rio de Janeiro, 24 de abril de 1866.
Rio de Janeiro, 7 de junho de 1866.
S.l., 9 de julho de 1866.
S.l., 7 de agosto de 1866.
266
Rio de Janeiro, 24 de outubro de 1866.
Itu, 20 de setembro de 1861.
Itu, 29 de abril de 1861.
Itu, 14 de abril de 1861.
Itu. 14 de janeiro de 1862.
Itu, 29 de janeiro de 1862.
Itu, 2 de junho de 1862.
Itu, 29 de agosto de 1862.
Itu, 29 de abril de 1862.
S.l., 1861.
Itu, 29 de julho de 1862.
São Paulo, 4 de abril de 1862.
Itu, 29 de outubro de 1862.
Rio de Janeiro, 24 de janeiro de 1863.
São Paulo, 1 de abril de 1863.
São Paulo, 18 de junho de 1863.
São Paulo, 4 de julho de 1863.
Itu, 14 de julho de 1863.
São Paulo, 19 de julho de 1863.
Itu, 14 de agosto de 1863.
São Paulo, 18 de abril de 1863.
Itu, 29 de outubro de 1863.
Rio de Janeiro, 8 de fevereiro de 1864.
Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 1864.
Rio de Janeiro, 9 de março de 1864.
Rio de Janeiro, 24 de março de 1864.
Rio de Janeiro, 24 de abril de 1864.
267
Rio de Janeiro, 9 de maio de 1864.
Rio de Janeiro, 2 de maio de 1864.
Rio de Janeiro, 7 de junho de 1864.
Rio de Janeiro, 8 de junho de 1864.
Rio de Janeiro, 7 de agosto de 1864.
Rio de Janeiro, 24 de agosto de 1864.
Itu, 29 de setembro de 1864.
Itu, 24 de outubro de 1864.
São Paulo, 19 de novembro de 1864.
São Paulo, 3 de março de 1865.
S.l., 24 de maio de 1866.
S.l., 22 de junho de 1866.
S.l., 24 de agosto de 1866.
S.l., 7 de fevereiro de 1866.
Outros documentos do arquivo do Conselheiro Paula Souza
Lista de candidatos do 1.º districto para eleição provincial.
Carta do filho Francisco para mãe (Maria Raphaela de Barros). S.l., 20 de
dezembro de 1861.
Carta da mãe Maria para Antônio e Francisco. Itu, 19 de julho de 1862.
Carta de Francisco para mãe. S.l., s/d.
Convite da parte do Conde A. L. de Josienski. Rio de Janeiro, 4 de outubro
de 1865.
Convite da Real Sociedade Portuguesa Amante da Monarchia e Beneficente.
S.l., 25 de outubro de 1865.
Carta de D. Maria Raphaela de Barros para o filho Antônio. S.l., nov. de
1866.
Carta de João Francisco de Paula Souza para Antônio. Itu, 20 de novembro
de 1866.
Projecto sobre a extinção da escravidão no Brasil. S.l., 1866.
268
Partilha de bens.
“Lembranças políticas do anno de 1864”.
Manuscrito com comentários políticos. S.l., 18 de agosto de 1864.
Manuscrito com comentários políticos. S.l., setembro de 1864.
“Notas durante a Sessão de 1865”.
“Anotações ano de 1865”.
Manuscrito com comentários políticos. S.l., 1865.
Manuscrito com comentários políticos. S.l., 19 de junho de 1866.
Carta de D. Maria Raphaela de Barros para Antônio. S.l., novembro de 1866.
Arquivo Paula Souza, engenheiro
Diários
SOUZA, Antonio Francisco de Paula. Notas de viagem. 1869
Notas biográficas de Antonio Francisco de Paula Souza. S.l., 1918.
Jornais
Jornal “O Estado de S. Paulo”. São Paulo, 03 de maio de 1914, 14 de abril de
1917, 15 de abril de 1917.
Discursos
20/04/1892
02/05/1892
20/05/1892
24/06/1899
26/06/1900
26/06/1901
20/06/1903
29/06/1905
Discurso em memória a Prudente de Moraes, s/d
269
Cartas
Jorge Miranda. Campinas, 27 de novembro de 1869.
João Gonçalves Pinto. São Paulo, 18 de novembro de 1879.
Bento Tomás Viana. Santos, 24 de janeiro de 1880.
João Pinto Gonçalves. São Paulo, 04 de fevereiro de 1880.
João Pinto Gonçalves. São Paulo, 12 de fevereiro de 1880.
Bento Tomás Viana. Santos, 24 de março de 1880.
Bento Tomás Viana. Santos, 10 de junho de 1880.
Bento Tomás Viana. Santos, 26 de julho de 1880.
Bento Tomás Viana. Santos, 29 de julho de 1880.
Bento Tomás Viana. Santos, 4 de agosto de 1880.
Bento Tomás Viana. Santos, 25 de setembro de 1880.
Bento Tomás Viana. Santos, 29 de setembro de 1880.
Antônio Cândido Rodrigues. São Paulo, 07 de março de 1881.
João Tobias de Aguiar. Fazenda Nova Java, 14 de março de 1881.
João Tobias de Aguiar. São Paulo, 14 de março de 1881.
Antônio Paes de Barros. São Paulo, 9 de abril de 1881.
Antônio Paes de Barros. São Paulo, 13 de abril de 1881.
Francisco Emídio da Fonseca Pacheco. Itu, 24 de abril de 1881.
Antonio Leite de Almeida Prado. Itaicy, 28 de abril de 1881.
Francisco Emídio da Fonseca Pacheco. Itu, 14 de maio de 1881.
Francisco de Godoi Moreira. Campinas, 08 de junho de 1881.
João Tobias de Aguiar. Fazenda Nova Java, 16 de junho de 1881.
Antônio Paes de Barros. Pirassununga, 16 de junho de 1881.
Rafael de Aguiar Paes de Barros. São Paulo, 25 de junho de 1881.
Bento Tomás Viana. Santos, 2 de julho de 1881.
Bento Tomás Viana. Santos, 18 de julho de 1881.
270
Antônio Paes de Barros. Pirassununga, 24 de julho de 1881.
Antônio Paes de Barros. São Paulo, 22 de agosto de 1881.
Rafael de Aguiar Paes de Barros. São Paulo, 18 de setembro de 1881.
Benedito Augusto Vieira Barbosa. São Paulo, 03 de outubro de 1881.
Bento Tomás Viana. Santos, 29 de outubro de 1881.
Antônio Paes de Barros. São Paulo, 29 de outubro de 1881.
Bento Tomás Viana. Santos, 07 de janeiro de 1882.
Alberto Swinerd. Campinas, 12 de julho de 1882.
Bento Tomás Viana. Santos, 20 de julho de 1882.
Bento Tomás Viana. Santos, 26 de julho de 1882.
Antonio Pereira da Costa Sobrinho. Cuscuzeiro, 25 de novembro de 1882.
Antônio da Costa Alves Ferrreira. Curumbatahy, 16 de fevereiro de 1883.
João Tibiriçá Piratininga. Paris, 04 de março de 1883.
Antônio Carlos de Arruda Botelho, Conde do Pinhal. Rio Claro, 01 de maio
de 1883.
Bento Tomás Viana. Santos, 20 de julho de 1883.
Lacerda, Camargo & Arbery. São Paulo, 15 de julho de 1886.
Francisco Glicério de Cerqueira Leite. Campinas, 16 de outubro de 1883.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. Campinas, 06 de agosto de 1886.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. Campinas, 09 de setembro de 1886.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 23 de março de 1887.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 07 de maio de 1887.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 13 de maio de 1887.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 18 de maio de 1887.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 24 de agosto de 1887.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 07 de setembro de 1887.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 14 de outubro de 1887.
271
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 15 de novembro de 1887.
Câmara Municipal de Itu. Itu, 11 de agosto de 1888.
Cândido Franco de Lacerda. São Paulo, 02 de novembro de 1888.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 08 de fevereiro de 1889.
Francisco Glicério de Cerqueira Leite. São Paulo, 03 de março de 1889.
Lacerda, Camargo de & Cia. São Paulo, 28 de março de 1889.
Adolfo Afonso da Silva Gordo. São Paulo, 25 de julho de 1889.
Autor não identificado. S.l., 26 de julho de 1889.
Manuel Ferraz de Campos Sales. São Paulo, 04 de setembro de 1889.
Francisco Glicério de Cerqueira Leite. Campinas, 11 de outubro de 1889.
J. Williamson. Itu, 17 de novembro de 1889.
Tobias de Albuquerque. São Manoel, 20 de novembro de 1889.
Joaquim Borges Montoro de Morais. Itu, 31 de dezembro de 1889.
Cláudio dos Santos. S.l., 1890.
Bernardino José de Campos Jr. São Paulo, 15 de março de 1890.
Cândido Gonçalves Gomide. Mogy Mirin, 17 de abril de 1890.
(documento c/ assinatura danificada). S.l., 13 de maio de 1890.
Joaquim Antonio do Amaral Gurgel. Mogy das Cruzes, 09 de julho de 1890.
Bernardino José de Campos Jr. (Memorandum). S.l., 13 de outubro de 1890.
Prudente José de Moraes Barros. São Paulo, 09 de setembro de 1890.
Abílio Soares. São Paulo, 12 de setembro de 1890.
Prudente José de Moraes Barros. São Paulo, 29 de setembro de 1890.
Jorge Tibiriçá Piratininga. São Paulo, 04 de novembro de 1890.
Jorge Tibiriçá Piratininga. São Paulo, 24 de novembro de 1890.
José Alves Paes Leme (ofício). São Paulo, 07 de março de 1891.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 09 de março de 1891.
José Luis Coelho (ofício). São Paulo, 09 de março de 1891.
272
Abaixo Assinado. S.l., 10 de março de 1891.
Américo Brasiliense de Almeida e Melo (ofício). S.l., 13 de março de 1891.
Olavo Augusto Hummel. São Carlos, 31 de março de 1891.
Olavo Augusto Hummel. Uberaba, 28 de abril de 1891.
José Alves de Cerqueira César. São Paulo, 24 de março de 1892.
Gonçalves Bastos. São Paulo, 18 de abril de 1892.
Alfredo Ellis. Rio de Janeiro, 12 de junho de 1892.
Bernardino José de Campos Jr. São Paulo, 15 de setembro de 1892.
Alfredo Ellis. São Paulo, 23 de abril de 1893.
Prudente José de Moraes Barros. Piracicaba, 24 de abril de 1893.
Cesário Mota Jr. São Paulo, 25 de abril de 1893.
José Ayrosa Galvão. Rio Grande, 05 de maio de 1893.
Joaquim Maria Machado de Assis (ofício). S.l., 20 de maio de 1893.
Bento Francisco de Paula Souza. São Paulo, 24 de maior de 1893.
Alcindo Guanabara (Telegrama). Paris, 24 de maio de 1893.
Américo Brasílio de Campos. Nápoles, 26 de maio de 1893.
Cônego Amador Bueno. S.l., 30 de maio de 1893.
Álvaro de Melo Coutinho de Vilhena. Capital Federal, 12 de junho de 1893.
José de Melo Carvalho Muniz Freire. Victória, 24 de junho de 1893.
Demóstenes da Silva Lobo. Capital Federal, 27 de junho de 1893.
(assinatura não identificada). Rio de Janeiro, 28 de junho de 1893.
M. Valadão. Rio de Janeiro, 15 de julho de 1893.
R. Reidy. Rio de Janeiro, 16 de julho de 1893.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 19 de julho de 1893.
João José Correia de Morais. Rio de Janeiro, 21 de julho de 1893.
Bernardino José de Campos Jr. São Paulo, 24 de julho de 1893.
Antônio Augusto Fernandes Pinheiro. Rio de Janeiro, 27 de julho de 1893.
273
José Bento de Paula Souza. São Paulo, 01 de agosto de 1893.
Francisco Glicério de Cerqueira Leite. Rio de Janeiro, 02 de agosto de 1893.
Prudente José de Moraes Barros. Rio de Janeiro, 05 de agosto de 1893.
“Um brasileiro Paulista”. S.l., 20 de agosto de 1893.
Domingos Corrêia de Morais. São Paulo, 26 de agosto de 1893.
Cesário Mota Jr. (ofício). S.l., 15 de agosto de 1894.
Cesário Mota Jr. São Paulo, 7 de novembro de 1894.
Cesário Mota Jr. São Paulo, 10 de novembro de 1894.
Estevão Leão Bourroul. São Paulo, 15 de fevereiro de 1895.
Bernardino José de Campos Jr. São Paulo, 11 de outubro de 1895.
Francisco Ferreira Ramos. New York, 23 de outubro de 1895.
José de Paula Leite de Barros. Itu, 27 de janeiro de 1896.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 14 de abril de 1896.
João Pereira Ferraz. São Paulo, 15 de abril de 1896.
Antônio de Araújo Ferreira Jacobina. Rio de Janeiro, 18 de abril de 1896.
Campos Sales (ofício). S.l., 04 de maio de 1896.
João Francisco de Paula Souza. Rio de Janeiro, 29 de maio de 1896.
Adolfo Afonso da Silva Gordo. São Paulo, 1 de setembro de 1896.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. São Paulo, 5 de abril de 1897.
J. V. de Azevedo. S.l., 12 de julho de 1899.
J. Williamson. Alto da Serra, 24 julho 1900.
José Bento de Paula Souza. Sorocaba, 28 de julho de 1900.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 15 de agosto de 1900.
Emílio A. H. Schnoor. São Paulo, 28 de novembro de 1900.
Cornélio v. de Camargo. S.l., s/d.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 14 de março de 1901.
Augusto Carlos da Silva Teles. São Paulo, 30 de março de 1901.
274
Cornélio Vieira de Camargo. Tatuhy, 07 de abril de 1901.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 8 de abril de 1901.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 28 de abril de 1901.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 30 de abril de 1901.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 03 de maio de 1901.
Antônio da Silva Prado. São Paulo, 26 de dezembro de 1901.
Washington Luiz Pereira de Souza. São Paulo, 03 de janeiro de 1902.
Orville Adelbert Derby. São Paulo, 17 de março de 1902.
Antônio de Toledo Piza e Almeida. São Paulo, 25 de junho de 1902.
Olavo Augusto Hummel. Jahú, 30 de agosto de 1903.
Carlos de Campos (ofício). S.l., 12 de junho de 1905.
Januário de Oliveira. Rio de Janeiro, 09 de maio de 1906.
H. Monmouth Smith. Brooline, 12 april 1870.
Francisco de Paula Ramos de Azevedo. Campinas, 21 de novembro de 1881.
Luís Antônio de Anhaia. Itu, 4 de novembro de 1881.
Jorge Miranda. S.l., 1890
José Alves de Cerqueira César. S.l., 01 de maio de 1890.
Bernardino José de Campos Jr. São Paulo, 8 de maio de 1890.
Jorge Tibiriçá Piratininga. São Paulo, 21 de outubro de 1890.
Paulo de Sousa Queirós. São Paulo, 07 de fevereiro de 1897.
Antônio Mercado. São Paulo, 25 de fevereiro de 1897.
Alfredo Ellis. São Paulo, 04 de abril de 1892.
Bento Magalhães (bilhete). S.l., s/d.
Jesus Martin Bolstad. Rio de Janeiro, 25 de abril de 1893.
Francisco Glicério de Cerqueira Leite. Rio de Janeiro, 14 de junho de 1893.
Cesário Mota Jr. São Paulo, 17 de junho de 1893.
Francisco de Paula Rodrigues Alves. S.l., 02 de julho de 1893.
275
Prudente José de Moraes Barros. Rio de Janeiro, 27 de julho de 1893.
José Francisco de Brito. S.l., agosto de 1893.
Prudente José de Moraes Barros. S.l., 16 de agosto de 1896.
Prudente José de Moraes Barros. Capital Federal, 21 de agosto de 1893.
Alcindo Guanabara. Paris, 23 de agosto de 1893.
Jerônimo H. Calazans Rodrigues. Rio de Janeiro, 31 de agosto de 1893.
Teodoro Fernandes Sampaio. São Paulo, 17 de maio de 1894.
Cesário Mota Júnior. S.l., 13 de julho de 1894.
José Inácio de Mello. Jatahy, 04 de março de 1895.
Fernando Lobo Leite Pereira. Rio de Janeiro, 09 de julho de 1895.
César de Sousa. S.l., 21 de agosto de 1895.
Bernardino José de Campos Jr. São Paulo, 13 de novembro de 1895.
José Mesquita de Barros. São Paulo, 01 de fevereiro de 1896.
Bernardino José de Campos Jr. S.l., 27 de fevereiro de 1896.
Bernardino José de Campos Jr. Rio de Janeiro, 11 de agosto de 1900.
Francisco de Assis Peixoto Gomide. São Paulo, 11 de novembro de 1901.
Luis Pereira Barreto. São Paulo, 07 de janeiro de 1902.
William Speers. S.l., 31 de março de 1902.
Daniel Makinson Fox. London, 31 de dezembro de 1903.
Afonso de Escragnolle Taunay. Rio de Janeiro, 11 de agosto de 1906.
Rodolfo Batista de São Tiago (ofício). S.l., 21 de dezembro de 1913.
Thomas Wallace da Gama Cochrane. Rio de Janeiro, 1893.
Thomas Wallace da Gama Cochrane. Superintendência Geral de imigração
na Europa, 25 de maio de 1893.
Escola Modelo. São Paulo(Rua do Carmo), 6 de maio de 1892.
Ms. Browne - Escola Modelo. São Paulo, 4 de abril de 1892.
Fernando Lobo. Itu, 19 de dezembro de 1892.
276
Cartas enviadas ao pai
Zurich, 3 de setembro de 1861.
Zurich, 22 de fevereiro de 1863.
Zurich, 4 de março de 1863.
Zurich, 22 de março de 1863.
Zurich, 18 de maio de 1863.
Zurich, 20 de julho de 1863.
Carlsruhe, 23 de outubro de 1863.
Carlsruhe, 01 de fevereiro de 1864.
Carlsruhe, 28 de março de 1864.
Carlsruhe, 17 de abril de 1865.
Carlsruhe, 04 de maio de 1865.
Carlsruhe, 30 de maio de 1865.
Carlsruhe, 21 de junho de 1865.
Carlsruhe, 22 de julho de 1865.
Carlsruhe, 21 de agosto de 1865.
Carlsruhe, 05 de setembro de 1865.
Carlsruhe, 20 de setembro de 1865.
Carlsruhe, 07 de novembro de 1865.
Carlsruhe, 07 de dezembro de 1865.
Carlsruhe, 04 de janeiro de 1866.
Carlsruhe, 06 de fevereiro de 1866.
Carlsruhe, 24 de março de 1866.
Carlsruhe, 20 de abril de 1866.
Carlsruhe, 22 de maio de 1866.
Carlsruhe, 21 de junho de 1866.
Carlsruhe, 06 de novembro de 1866.
277
Documentos diversos do engenheiro
Carta do Grêmio Polytechnico. São Paulo, 24 de abril de 1914
Carta da diretoria da Polytechnica para família Paula Souza. São Paulo, 20
de agosto de 1917.
Carta de Archimedes Pereira Guimarães para Geraldo Horácio de Paula
Souza. São Paulo, 28 de outubro de 1917.
Carta de Eustáquio Toledo para Geraldo H. de Paula Souza. São Paulo, 07 de
outubro de 1943.
Carta de Ignácio M. de Azevedo do Amaral (Escola Nacional de Engenheiros)
para Geraldo H. de Paula Souza. Rio de Janeiro, 21 de dezembro de 1943.
Carta de Ignácio M. de Azevedo do Amaral (Escola Nacional de Engenheiros)
para Geraldo H. de Paula Souza. Rio de Janeiro, 31 de dezembro de 1943.
Decreto de Março de 1893: “Liberação de verba para comissão de imigração
nos Estados do Norte”.
Declaração convertendo a repartição de Superintendência geral da imigração
na Europa em Comissão de propaganda e defesa do Brazil na Europa.
Capital Federal, junho de 1893.
Decreto São Paulo Railway Company.
Reclamação (impresso). Great northern Railway Brazil Company Limited.
Programa do curso de engenharia dos anos 1864/1865 (escola da
Alemanha).
Orçamentos do escritório de engenharia de Campinas para a fazenda do
comendador Luís Antonio de Souza Barros, Joaquim da Silveira Mello, Dr.
João Tobias de Aguiar e Castro, Augusto Lorena (Barão do Pinhal), ano
1881.
Título de nomeação para o cargo de “Director da Superintendência de Obras
Públicas”. São Paulo, 3 de janeiro de 1893.
Registro das sessões da Câmara dos Deputados do ano de 1892.
Convite para festa em beneficio dos feridos na guerra do Rio Grande do Sul.
20 de junho de 1893.
Nomeação para presidência da mesa nas eleições para presidente, vice e
senador. 12 de fevereiro de 1896.
Documento com anotações dos nascimentos dos filhos.
Notas de genealogia.
278
Biografia do engenheiro Antônio Francisco de Paula Souza (documento
manuscrito, sem autor).
Estudos do sistema ferroviário.
“Trabalho do Dr. Paula Souza sobre a libertação dos escravos”.
Boletim da Sociedade de Geographia do Rio de Geografia.
Bilhetes diversos do ano de 1892.
Discurso ao presidente do Estado. 15 de fevereiro de 1894.
Discurso. s/d.
Discurso para colação de grau da Escola Politécnica. 15 de dezembro de
1916.
Notas do American Society of Engineers. S.l., fevereiro de 1906.
Titulo de nomeação para o cargo de ministro de Estado das Relações
Exteriores. S.l., dezembro de 1892.
Titulo de nomeação para o cargo de ministro de Estado da Viação e Obras
Públicas – Capital Federal, 22 de abril de 1893.
Titulo de nomeação para o cargo de Diretor da Escola Politécnica. São Paulo,
14 de novembro de 1893.
Titulo de nomeação para o cargo de Diretor interino Director do Gymnasio
da Capital. São Paulo, 14 de novembro de 1893.
Titulo de nomeação para o cargo de lente cathedrático da 2.ª cadeira do 1.º e
2.º ano de engenharia civil.
Titulo de nomeação para o cargo de Secretário de Estado e negócios da
Agricultura Comércio e Obras públicas. São Paulo, 26 de abril de 1898.
Projeto de Programa para os estados da comissão encarregada de dar
parecer sobre a viação da província. 1881.
Publicação: SOUZA, Antonio Francisco de Paula. Estradas de Ferro da
Província de São Paulo. São Paulo: Tipografia do Correio Brasiliense, 1873.
Manuscrito: “Esboço rápido e algumas de nossas industrias comparadas às
dos Estados Unidos”
Memorial apresentado sobre a construcção sobre casas para operários pelo
Engenheiro Civil A. de Paula Souza. s/d.
279
ANEXOS
280
ANEXO I - Gráfico Genealógico 2
281
ANEXO II - Imagens
"Tio Diogo", por ocasião da Guerra do Paraguai.
552
552
Fonte: O Cabrião. São Paulo: Editora da UNESP, 2000.
282
Tio Antonio” e sua esposa Maria Paes de Barros, c. 1885.
553
553
Fotografia. Acervo Modesto Carvalhosa. Fonte: BARROS, Maria Paes de. No tempo de
dantes. São Paulo: Paz e Terra, 1998.
283
Francisco de Paula Souza e Mello.
554
Geraldo Horácio de Paula Souza.
555
554
Fonte: TAUNAY, Affonso d’Escragnolle. Grandes Vultos da Independência Brasileira. São
Paulo: Melhoramentos, 1922.
555
Fonte: Biblioteca Virtual em Saúde. Disponível em: <www.bvs-psi.org.br>.
284
Engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza.
556
Engenheiro Antonio Francisco de Paula Souza.
557
556
Fonte: SÃO PAULO. Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Disponível em:
<www.al.sp.gov/web/acervo/presidentes>.
557
Fonte: ESCOLA POLITÉCNICA/USP. Disponível em: <www.poli.usp.br>.
285
ANEXO III - Cartas
Carta de Francisco ao pai pedindo que o autorize
a estudar agricultura
558
Meo Caro Pai
Zurich 4 de dezembro de 1863
Com que praser recebi a sua do mez passado mas depois de ter a lido
fiquei muito triste porque não pude festejar o seu dia de annos;
Meu querido pai vou por meio desta pedir-lhe um favor; O Sr.
Mandou-me para aprender Ingenharia e vi que eu não tinha nenhum talento
para as Mathematicas, e tenho talento e grande praser para Agricultura por
isso pesso esse favor de me deixar aprender para ser Agricultor.
Como estou matriculado para isso posso tomar lições de
Mathematicas e além disso lição de Botânica e Quimica, se V. M. me der
lisença de estudar Agricultura então devo entrar numa escola especial na
Alemanha, e deve custar muito mais barato porque os rapazes devem morar
na Escola mesmo. E se V. M. quer que eu estude a Ingenharia devo ir para
Carlsruhe ou para Stutgard a onde é muito cara, porque eu não poderei
entrar mais na escola Polytecnica de Zurich por causa dos mestres, que
comportaram-se tão mal com um dos melhores alunos que é meu mano, que
não faltava uma aula. La eu mesmo não tenhogosto para Ingenharia.
A escola de Agricultura de é muito boa Hocherine é uma Aldeiazinha
na Baviera, muito linda paisagem; na escola terá quando muito 200 rapazes.
Eu poderei ficar pronto em dois anos (?) que praser para mim se
quando poder voltar para essa terra tão cara que he Brasil.
Meu Pai (?) se eu lhe falei tão claramente que eu não tinha gosto
para Ingenharia. Eu lhe peço em nome de minha may para me deixar
aprender Agricultura.
O Pacheco lhe manda pedir o favor de escrever ao pay delle para
deixar elle aprender Agricultura também.
Meu pai eu lhe pesso que me escreva logo [...]
558
Fonte: Arquivo Paula Souza - PS 863.12.04, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
286
Aceite muitas lembranças de meu Mano primo Juca? E do Pacheco.
De lembranças a todos de la e um abraço? A todos meus manos.
Quem dera que eu podesse abrasalos com meus braços mesmo.
Aceite deste seu filho um abraço bem apertado.
Francisco
Meu pai não se zange de minha índole de ser Agricultor.
287
Instruções do Conselheiro acerca da administração da colônia de
Assungrey, na Província do Paraná
559
Na administração da colônia seu trabalho diário e constante deverá
se manter a boa ordem entre os colonos, ou emigrantes, procedendo de
modo que encontrem em V. Mce. um protetor, conselheiro paternal, e não
um gerenciador e caprichosa autoridade.
V. Mce. deve quanto for possível evitar fazer sentir a autoridade que o
revestiu o Governo Imperial promovendo entre os habitantes da colônia a
eleição de autoridades locais, ou coloniais, que por consenso e vontade da
maioria distribua entre seos concidadãos a justiça como melhor for possível:
para este fim deverá ser aproveitada a legislação brasileira que regula as
eleições e a vida municipal no Império. Para este fim a Providência da
Província com quem V. Mce. deverá se entender se não a este respeito
como a respeito de tudo o que houver mister a colônia lhe fornecerá as leis
que me refiro.
Com quanto as colônias administradas pelo governo não sejão
regidas por essas leis, é conveniente que V. Mce. as aplique quanto for
possível para habituar e apressar a entrada das colônias no gozo do direito
comum brasileiro. Se por enquanto elas estão privadas dele [...] para que os
ônus inerentes a esses gozos não dificultem seu desenvolvimento, sendo que
todos serão colonos, em presença da lei, ou das auctoridades iguais a todos
os mais brasileiros. Aquelas autoridades, que forem eleitos ou designados
pela maioria da colônia poderão providenciar quanto ás ruas caminhos
vicinais, culto público, ensino escolar, vivendo enfim uma vida mais ou
menos semelhantes à nossos bairros e capelas ou Towship da União
Americana, e V.Mce, dirigindo, estimulando ao trabalho para libertarem-se
em breve da ação excepcional do governo, trará ao conhecimento deste para
intermédio do Presidente da Província ou mesmo diretamente todas as
necessidades da colônia á seu cargo para que sejão supridas em fará na
colônia cumprir-se todas as ordens e determinações do Governo Imperial.
Cada mês dará V. Mce. conta do que houver ocorrido quer em relação á
559
Fonte: Arquivo Paula Souza - PS866.01.04/1, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
288
venda das terras aumento da população, produção, estrada aberta,
movimento de importação e exportação quer em relação ás vias de
comunicação precisas térreas ou fluviais, estabelecimento de casas de
ensino, culto, polícia, etc.
Achará V. Mce. na colônia a correspondência do governo e o
reulamento pelo qual se rege a colônia. Deve atender tanto uma, como outra
coisa, por execução o que for imediatamente preciso e informar o governo no
mais curto prazo possível do estado em que se encontra a colônia em todos
os sentidos reclamando as providencias, que julgar conveniente e oportunas.
difícil, senão impossível e quase inútil estabelecer e prevenir todas
ocorrências presumíveis determinando o modo como deverá V. Mce. em cada
uma delas. Deixo seo juízo, e critterio confiando em seo bom senso e
interesse a solução delas devendo quanto possível recorrer V. Mce. ao
Governo Provincial e Geral para pedir authorização, providencias e
conselhos.
Carta do Conselheiro Paula Souza ao Sr. Whaley.
289
Motivos por que Ant.º se exonerou do cargo de ministro
560
Em virtude do grande desenvolvimento econômico do nosso Estado a
capacidade de transporte da S. Paulo Railway começava a ser insuficiente
em 1893 para prevenir pois uma crise de effeitos desastrosa tornou-se
necessariamente cortar a duplicação das suas linhas.
Exposta esta situação ao Marechal Floriano ficou combinado que meo
pae apresentasse o projecto para uma renovação de contrato entre S. Paulo
Railway e o governo Federal. Depois de acurados estudos meo pae organisou
o projeto e em meados de agosto de 93 submetheu o ao julgamento do
Marechal. Decorreram-se vários dias sem que o Marechal desse uma solução
ou oposição a respeito. Esta demora de uma solução desgostou a meo pai
que a interpretou como sendo devido a digergencia de ponto de vista e
n’essas condições não quis mais continuar a fazer parte do Governo. Pedio a
sua exoneração em fins de Agosto de 93 que lhe foi concedida a 4 ou 5 de
Settembro véspera da revolta da esquadra. Ora a revolta de 6 de Settembro
inesperada pela maioria da nação, mesmo para os Ministros de então, não
foi surpresa para o Marechal Floriano.
Soube se depois que o Marechal estava com muita antecedência ao
par do movimento planejado e este facto explica os motivos que o levaram a
adiar a solução do problema de ordem administrativa por mais importantes
que fossem preocupado como estava em defender a constituição seriamente
ameaçada n’aquella época.
Biografia manuscrita do engenheiro Antonio Francisco de Paula
Souza.
560
Fonte: Arquivo Paula Souza - PS Ca.18/1 (sem identificação do autor, mas é atribuída à
sua esposa Ada Herweg), Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
290
Carta de Ms. Browne (Escola Modelo)
561
Escola Modelo, Rua do Carmo.
6 de Maio, 1892
O Sr. Paula Souza
Deputado do Congresso do Estado; -
Hontem li, no jornal do “Estado de S. Paulo”, a última parte do seu
discurso na sessão do congresso de 2 de maio.
É impossível para mim dar expressão á minha gratidão para aquelle
discurso é tempo, que aos Brazileiros despertam-se e começam de tomar
medidas para o desenvolvimento de seu povo. Sou estrangeira. porem
tenho nas minhas veias, o amor de liberdade e o espírito de patriotismo de
uma Americana do Norte, e desejo ver o Brazil dotado de um amor de
liberdade baseado sobre a intelligencia sobre o desenvolvimento das
faculdades humanas.
Mando ao Senhor uma cópia de um papel escripto ao pidido da
Escola Normal este papel forma uma parte do relatório da Escola Normal
que já está diante da “commissão de instrução publica.
Quero fallar com o senhor a respeito dos interesses da Escola Modelo.
Estou na escola cada dia entre ás 9-30 de manhã até 5 de tarde.
Se o senhor podia me fazer o favor de vir aqui para uma curta
conversa, ficarei muito obrigada.
Marcia P. Browne.
561
Arquivo Paula Souza, Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo.
291
ANEXO IV - Colônias de Parceria em São Paulo (1850-1860)
562
1857 (*) 1860(**)
MUNICÍPIOS FAZENDAS PROPRIETÁRIOS
N.º
famílias
Total
N.º
famílias
JUNDIAÍ
São José
Sítio Grande de St.º
Antonio
São Joaquim
Antonio J. P. Guimarães
Comendador Antonio de Queirós
Teles
Tem. Coronel Joaquim Benedito de
Queiros Teles
7
14
7
38
68
34
8
76
7
CAMPINAS
Boa Vista
Tapera
Laranjal
Soledade
-
Sete Quedas
Boa Esperança
das Dores
São Francisco
Sítio Novo
Floriano de Camargo Penteado
Maria Inocência de Sousa
Luciano Teixeira Nogueira
Herculano Florence
Joaquim Ignacio de Vasconcelos
Machado
Joaquim Bonifácio do Amaral
Antonio de Camargo Campos
Pedro José dos Santos
Francisco de Camargo Penteado
Antonio Rodrigues Barbosa
23
15
36
2
-
16
15
6
10
9
98(a)
67
146
18
-
89(a)
65(a)
25
47
52
5
7
9(a)
2(h)
1(h)
8(h)
-
-
-
-
AMPARO
Boa Vista
São Joaquim
-
João Leite da Cunha Moraes
Joaquim Mariano Galvão de Moura
Lacerda
Francisco Mariano Galvão Bueno
16
2
4
71
-
-
14
2
4
PIRASSUNUNGA
Cresciumal
Sen. Francisco Antonio de Sousa
Queirós
20(a) 102(a) -
LIMEIRA
São Jerônimo
Santa Bárbara
Palmira
Morro Azul
Tatu
Capitão Diniz
Senador Vergueiro ou
Ibicaba
Idem
Idem
Dr. Lourenço Franco da Rocha
Alferes Joaquim Franco de
Camargo
Candido José da Silva Serra
Joaquim da Silva Diniz
Sem. Nicolau Pereira de Campos
Vergueiro
78
38(c)
-
20(a)
35
3
177
348
203(d)
-
123
142
10
816
63(b)
49(d)
5
7
-
-
32(h)
RIO CLARO
Angélica
São Lourenço
Biri e Covetinga
Bôa Vista
Boa Vista
São João do Morro
Grande
Idem
Com. Luiz Antonio de Souza Barros
José Elias Pacheco Jordão
Benedito Antonio de Camargo
Ana Joaquina Nogueira de Oliveira
João Ribeiro dos Santos Camargo
33
65
31
27(a)
10
7
153
332
156
148(a)
46
37
(g)
92(h)
18(h)
35(a)
-
-
PIRACICABA
Santo Antonio
Morro Alto
Sant’Ana
Elias Silveira Leite (Elias Velho)
José Rodrigues César
José de Camargo Penteado
7(b)
2(b)
2(b)
-
-
-
7
-
-
CAPIVARI
Bom Jardim
Capitão Salvador Nardi de
Vasconcelos
- - 1(h)
TOTAL
35 fazendas 31 proprietários 737 3.434
452=(2.260
hab.)
(*) os dados incluem colonos brasileiros, alemães, suíços, portugueses e belgas.
(**) os dados incluem sobretudo colonos suíços, mas existem outras famílias de colonos não registradas, indicadas pela letra (h)
(a) O n.º inclui parceiros brasileiros.
(b) 58 famílias são de alemães.
(c) Dados só incluem colonos brasileiros.
(d) Dados só incluem colonos portugueses.
(e) Não há consenso sobre sua localização, dizem também pertencer a Piracicaba
(f) Reúne os colonos das duas fazendas.
(g) Fazenda não visitada para contabilização
562
Fonte: GADELHA, Maria D’Aquino Fonseca. Os núcleos coloniais e o processo de
acumulação cafeeira (1850-1920): contribuição ao estudo da colonização em São Paulo. Tese
(Doutorado em História), USP, São Paulo, 1982. p.98.
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