Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA
PROPPEC
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS
CEJURPS
PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM GESTÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS – PMGPP
DESCENTRALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS SOCIAIS: o caso do Programa Saúde da
Família (PSF) no município de Correia Pinto (SC) no ano de 2006.
ZENALDA MARTINS VANIM DE MORAES
ITAJAÍ [SC], 2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA
PROPPEC
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS
CEJURPS
PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM GESTÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS – PMGPP
DESCENTRALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS SOCIAIS: o caso do Programa Saúde da
Família (PSF) no município de Correia Pinto (SC) no ano de 2006.
ZENALDA MARTINS VANIM DE MORAES
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora no Mestrado Profissionalizante
em Gestão de Políticas Públicas da
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI,
sob a orientação da professora, Doutora
Cláudia Rosane Roesler e coorientação do
professor, Doutor Guillermo Alfredo Johnson,
como exigência parcial para obtenção do título
de Mestre em Gestão de Políticas Públicas /
Profissionalizante.
ITAJAÍ [SC], 2008
ads:
APROVAÇÃO DA BANCA
Esta dissertação foi julgada APTA para a obtenção do título de Mestre em Gestão de
Políticas Públicas / Profissionalizante e aprovada, em sua forma final, pela Coordenação do
Programa de Mestrado Profissionalizante em Gestão de Políticas Públicas – PMGPP da
Universidade do Vale do Itajaí UNIVALI, Centro de Ciências Jurídicas, Políticas e Sociais
– CEJURPS.
__________________________________
Professora Cláudia Rosane Roesler
Orientadora
_________________________________
Professor Guillermo Alfredo Johnson
Coorientador
Apresentada perante a Banca examinadora composta pelos Professores
___________________________________________
- Presidente
___________________________________________
- Membro
__________________________________________
- Membro
Itajaí (SC), abril de 2008.
DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro para os devidos fins de direito e sob as penas da lei, que assumo total
responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a
Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Programa de Mestrado Profissionalizante
em Gestão de Políticas Públicas, a Banca Examinadora e a Professora Orientadora de toda e
qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Por ser verdade, firmo a presente.
Itajaí (SC), abril de 2008.
____________________________________
Zenalda Martins Vanim de Moraes
Mestranda
Meus agradecimentos:
À Professora Doutora Cláudia Rosane
Roesler, minha orientadora, que me honrou com sua
sabedoria, me acolheu e me conduziu com
compreensão e delicadeza à conclusão deste
trabalho;
Ao Professor Doutor Guillermo Alfredo
Johnson, meu coorientador, por sua especial atenção
com o tema deste trabalho diante de sua notória
capacidade intelectual;
Ao Professor Doutor Carlos Eduardo Sell,
primeiro professor escolhido como orientador, que
se afastou da Universidade do Vale do Itajaí para
seguir a carreira acadêmica, pela demonstração de
interesse pelo tema escolhido e incentivo a
continuar;
Ao Prefeito do município de Correia Pinto
Cláudio Roberto Ziliotto, pela compreensão no
desenvolvimento da minha vida profissional durante
todo o curso de mestrado e, principalmente, durante
a elaboração deste trabalho;
À amiga, enfermeira Léia Vieira Gallas,
pela presteza e companheirismo.
Sem a sua colaboração, a trajetória teria
sido muito mais difícil. Presença constante em todos
os momentos importantes da minha vida, e
especialmente, neste estudo.
Este trabalho dedico:
Aos meus pais, Samuel Martins e Emília
Latochéski Martins, por sempre acreditarem nos
seus filhos, não medindo esforços para permitir que
nossos sonhos se realizassem;
Ao meu marido João Carlos, pelo amor,
paciência e companheirismo demonstrados durante
todos esses 11 anos, especialmente, nos momentos
mais difíceis, nunca permitindo que eu desistisse;
Aos meus filhos Rafael e Gabriela, razões
da minha vontade de seguir buscando sempre o
melhor para poder ser exemplo. Obrigado por
entenderem minha ausência em alguns momentos de
suas vidas;
À minha irmã Deise, por me apoiar em
todos os momentos, mostrando como deve ser uma
verdadeira relação entre irmãos.
Ando devagar porque tive pressa e
levo este sorriso porque já chorei demais
Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem
sabe, eu levo a certeza de que muito
pouco sei, ou nada sei
Conhecer as manhas e as manhãs o
sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar, é
preciso paz pra poder sorrir, é preciso
chuva para florir
Penso que cumprir a vida seja
simplesmente compreender a marcha e ir
tocando em frente
Como um velho boiadeiro levando a
boiada eu vou tocando os dias pela longa
estrada, eu sou estrada eu vou
Todo mundo ama um dia, todo mundo
chora, um dia a gente chega e no outro
vai embora
Cada um de nós compõe a sua própria
história e cada ser em si carrega o dom
de ser capaz de ser feliz.
(Tocando em Frente – Renato Teixeira)
SUMÁRIO
LISTA DE QUADROS E GRÁFICOS....................................................................... .........09
LISTA DE SIGLAS...................................................................................................... ......... 10
RESUMO....................................................................................................................... ......... 11
ABSTRACT .................................................................................................................. ......... 12
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ ......... 13
CAPÍTULO I ................................................................................................................ ......... 17
1 FEDERALISMO E SUAS DEFINIÇÕES............................................................... ......... 17
1.2 UMA BREVE RECUPERAÇÃO HISTÓRICA DO FEDERALISMO............ ......... 21
1.2.1 A origem do federalismo ....................................................................................... ......... 21
1.2.2 A história do federalismo no Brasil....................................................................... .........24
1.3 FEDERALISMO E DESCENTRALIZAÇÃO .................................................... ......... 31
CAPÍTULO II............................................................................................................... ......... 36
2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS....................................................................................... ......... 36
2.1.1 Políticas públicas: breve revisão da literatura ....................................................... ......... 36
2.2 POLÍTICAS SOCIAIS........................................................................................... ......... 40
2.2.1 Políticas sociais: origens e definições ................................................................... ......... 40
2.2.2 A história das políticas sociais no Brasil............................................................... ......... 43
2.3 DESCENTRALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS SOCIAIS ..................................... ......... 50
CAPÍTULO III ............................................................................................................. ......... 54
3.1 BREVE HISTÓRICO DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL:
das origens à construção do SUS................................................................................. ......... 54
3.2 A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE PÓS-1988 .................... ......... 57
3.3 DESCENTRALIZAÇÃO DA POLÍTICA DE SAÚDE ...................................... ......... 60
3.4 O PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA (PSF) ................................................... ......... 64
3.4.1 O Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB)........................................... .........69
CAPÍTULO IV.............................................................................................................. ......... 73
4.1 AVALIAÇÃO ......................................................................................................... ......... 73
4.1.1 Avaliação e suas definições................................................................................... ......... 73
4.1.2 Avaliação e suas classificações ............................................................................. ......... 75
4.2 MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO............................................................... .........77
4.3 AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: políticas sociais........................ ......... 78
4.4 AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE: PSF........................................... ......... 81
CAPÍTULO V ............................................................................................................... ......... 85
5.1 APRESENTANDO O MUNICÍPIO DE CORREIA PINTO ............................. ......... 85
5.1.1 O PSF no município de Correia Pinto ................................................................... ......... 85
5.1.1.1 Preenchimento das fichas e relatórios e lançamento no SIAB dos
dados produzidos no Município ..................................................................................... ......... 87
5.1.1.2 Entrevista em grupo com os responsáveis pelo preenchimento dos documentos e
manejo do SIAB ............................................................................................................. .........87
5.1.1.3 Dados previstos nas fichas e relatórios e lançados no SIAB......................... ..............89
5.2 RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS ....................................................... .........94
5.2.1 Entrevistas individuais........................................................................................... ......... 94
5.2.1.1 Entrevista com a Coordenadora do PSF no município de Correia Pinto............ ......... 94
5.2.1.2 Entrevista com a Coordenadora do PSF na Secretaria Regional de Lages ........ .........97
5.2.1.3 Entrevista com o Gerente do Departamento da Atenção Básica da Secretaria
de Saúde do Estado de Santa Catarina............................................................................ ......... 99
5.2.1.4 Entrevista com a Coordenadora do Acompanhamento e Avaliação da
Atenção à Saúde do Ministério da Saúde ....................................................................... ....... 105
5.3 ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................................ ....... 110
5.3.1 Preenchimento das fichas e relatórios e lançamento no SIAB .............................. ....... 110
5.3.2 Relações intergovernamentais ............................................................................... ....... 112
CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... ....... 119
REFERÊNCIAS .......................................................................................................... ....... 123
APÊNDICES................................................................................................................. ....... 129
ANEXOS ....................................................................................................................... ....... 135
LISTA DE QUADROS E GRÁFICOS
QUADRO 01 – Atendimento médico e de enfermagem PSF – Relatório PMA2 –
Correia Pinto – Ano 2006..................................................................... ......... 89
QUADRO 02 – Atendimento médico e de enfermagem PSF – SIAB – Correia Pinto –
Ano 2006 .............................................................................................. ......... 89
QUADRO 03 – Cadastrados PSF – Correia Pinto – Ano 2006 ..................................... ......... 91
QUADRO 04 – Cadastrados (C), Acompanhados ACS (AACS) e Atendimento Médico
ou Enfermagem (AME) ao PSF – Correia Pinto – Ano 2006............. .........92
GRÁFICO 01 – Atendimento médico e de enfermagem PSF – Relatório PMA2 e
SIAB – Correia Pinto – Ano 2006....................................................... ......... 90
GRÁFICO 02 – Cadastrados PSF – Correia Pinto – Ano 2006 ..................................... ......... 91
GRÁFICO 03 – Atendimento médico e de enfermagem PSF por número médio de
cadastrados – Correia Pinto – Ano 2006............................................. .........93
LISTA DE SIGLAS
ACS – Agente Comunitário de Saúde
AMQ – Avaliação Melhoria da Qualidade
BPC – Benefício de Prestação Continuada
CIB – Comissão Intergestores Bipartite
CMS – Conselho Municipal de Saúde
DATASUS – Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde
DENASUS – Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde
DST – Doenças Sexualmente Transmissíveis
ESB – Equipe Saúde Bucal
ESF – Equipe Saúde da Família
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
LOA – Lei orgânica da Assistência Social
LOS – Lei Orgânica da Saúde
NEEP – Núcleo de Estudos de Políticas Públicas
NOAS – Norma Operacional de Assistência Social
NOB – Norma Operacional Básica
ONU – Organização das Nações Unidas
PAB – Piso da Atenção Básica
PACS – Programa Agente Comunitário de Saúde
PETI – Programa de Erradicação ao Trabalho Infantil
PIB – Produto Interno Bruto
PROESC – Programa do Ensino Superior Comunitário
PSF – Programa Saúde da Família
SC – Santa Catarina
SF – Saúde da Família
SIAB – Sistema de Investigação da Atenção Básica
SIS – Sistema de Informação Saúde
SRS – Secretaria Regional de Saúde
SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
TFD – Tratamento Fora do Domicílio
RESUMO
O tema da pesquisa realizada concentra-se na análise da descentralização no federalismo
brasileiro. Passa pelos caminhos da descentralização das políticas públicas, especificamente,
das políticas sociais até chegar à descentralização do sistema de saúde adotado como diretriz
pela Constituição Federal de 1988. O estudo tomou como objeto empírico de análise da
descentralização, o Programa Saúde da Família (PSF) no município de Correia Pinto (SC). O
cumprimento da responsabilidade de avaliação das ações e serviços de saúde pelas esferas
estatais foi o instrumento utilizado para confirmar a existência deste instrumento de
operacionalização da descentralização, e em conseqüência, confirmar se a descentralização
está acontecendo de forma completa, sob a marca do federalismo. Foram estabelecidos dentre
outros objetivos: investigar o tema descentralização e federalismo, políticas públicas, sociais e
de saúde, o PSF e seu sistema de avaliação. Os dados foram colhidos na Secretaria Municipal
de Saúde, referentes ao ano de 2006, através da busca nos documentos físicos, como fichas e
relatórios, documentos informatizados, como o Sistema de Informação da Atenção Básica
(SIAB) e através de entrevistas individuais e em grupo. A pesquisa demonstrou que inexiste
avaliação do Programa na esfera municipal e estadual, bem como que é restrita na esfera
federal, em descumprimento à previsão legal de responsabilidade comum entre as esferas.
Demonstrou que a inexistência da avaliação decorre, entre outras coisas, de uma deficiência
na relação intergovernamental, portanto, a ausência deste instrumento de operacionalização da
descentralização, resulta num modelo de descentralização incompleto, que não atende às
características do federalismo. Evidenciou-se a necessidade de amadurecimento da estrutura
da descentralização, especialmente, na utilização da estratégia de indução, para que se
obtenha êxito no desenvolvimento da proteção social.
================================================================
Palavras-chave: Descentralização
Políticas públicas
Avaliação
================================================================
ABSTRACT
The theme of this study is the analysis of the decentralization in the Brazilian federalism. It
investigates the decentralization of public policies, more specifically, social policies in the
decentralization of the healthcare system, adopted as a guideline by the 1988 Federal
Constitution. The empirical goal of this study is to analyze the decentralization of the Family
Health Program (FHP) in Correia Pinto, Santa Catarina. Evaluation of the responsibility for
the health services by the state authorities was the tool used to confirm the existence of this
decentralization, and consequently, to confirm whether decentralization is occurring in a
complete way, under the federalist system. Among the objectives, the following were
established: to investigate the subjects of decentralization and federalism, public, social and
health policies, the FHP, and its system of evaluation. Data for 2006 were collected from the
Municipal Secretary for Health, through a search of physical documents, such as forms and
reports, computerized documents, such as Sistema de Informação de Atenção Básica (SIAB)
(Basic Care Information System) and individual and group enquiries. The research showed
that no evaluation program at municipal and state levels exists, and that this evaluation is
restricted to the federal sphere, i.e. it does not fulfill the legal stipulation of shared
responsibility among the different levels of government. This study demonstrated that the lack
of evaluation is the result, among other factors, of the lack of relations between the different
levels of government, therefore, the absence of this operating tool for decentralization results
in an incomplete decentralization model, which fails to fulfill the characteristics of federalism.
The need for more maturity in the decentralization structure was pointed out, particularly in
the use of an induction strategy, to ensure that the development of social protection is
accomplished.
================================================================
Key words: Decentralization
Public policies
Evaluation
================================================================
13
INTRODUÇÃO
O Brasil adotou a forma federativa após a promulgação da Constituição Republicana
de 1891. Seguindo a trajetória do federalismo no Brasil, chegamos a Constituição Federal de
1988, que trouxe a descentralização, o fortalecimento do federalismo e o compromisso de
melhorar o serviço público.
A Constituição Federal de 1988 tornou tema importante a descentralização de
políticas públicas, ou seja, a transferência de gestão de serviços sociais, saúde, educação
fundamental, habitação, saneamento básico e assistência social do Governo Federal para os
Estados e Municípios, chamando a atenção para o estudo acerca da complexidade do processo
de redefinição das relações intergovernamentais.
O presente estudo procura incorporar elementos à reflexão sobre os limites e as
potencialidades da descentralização a partir da Constituição de 1988. Parte-se da premissa de
que a descentralização deve ser aprofundada com transferência da esfera federal para as
esferas subnacionais, de cooperação financeira e técnica, bem como se defende que as
relações intergovernamentais, que são decisivas para o desempenho da gestão, definem-se
reciprocamente entre os níveis de governo envolvidos. Ainda, que um bom exercício da
função regulatória e de acompanhamento por parte do governo federal e estadual é condição
necessária à eficiência dos programas sociais.
Segundo Falleti (2006, p. 52) na maioria dos países, a educação foi o primeiro setor a
ser descentralizado. “No Brasil, contudo, após o término do Estado desenvolvimentista, a
descentralização dos serviços de saúde precedeu a descentralização dos programas
educacionais e dos recursos.” Por esta razão, escolhemos a política de saúde para analisar a
descentralização, haja vista que sendo o primeiro setor brasileiro a ser descentralizado, a
princípio, estaria num processo de descentralização mais complexo, mais evoluído em relação
aos demais setores. Para tanto, propomos o estudo e análise de uma política pública de saúde
de nível federal que envolve a co-gestão estadual e municipal, especialmente, o Programa
Saúde da Família (PSF), no município de Correia Pinto no Estado de Santa Catarina (SC), no
ano de 2006.
No campo específico da saúde, a Constituição Federal, em seu artigo 198, prevê que
as ações e serviços públicos formam uma rede hierarquizada e regionalizada, constituindo um
sistema único. As diretrizes para reestruturação dos referidos serviços foram regulamentadas
através da Lei 8.080/90, e dentre elas, encontra-se a descentralização político-administrativa.
14
Neste sentido, de acordo com Carvalho e Santos (1995 apud KLEBA, 2005) a
descentralização político-administrativa do Sistema Único de Saúde (SUS) requer a
interdependência das esferas estatais na formulação, coordenação, execução,
acompanhamento, avaliação, controle e divulgação das ações, dos serviços e do nível de
saúde no território nacional.
A descentralização da saúde contém todos estes instrumentos de operacionalização?
Consideremos, então, a responsabilidade das esferas estatais na “avaliação” das ações e
serviços de saúde, como o instrumento de operacionalização da descentralização a ser
analisado.
De outra forma, embora o acompanhamento e o controle das ações não sejam o foco
principal da presente análise, serão considerados, em razão de serem requisitos
imprescindíveis para o exercício da avaliação.
Alguns estudos demonstraram que a descentralização da saúde possui muitos pontos
positivos, todavia, considerando as evidências de que é possível que tenha afetado a qualidade
dos serviços de assistência à saúde, compete-nos realizar o presente estudo, a fim de verificar
como esses serviços estão sendo providos.
Esta pesquisa tem como objetivos: geral, analisar a descentralização das políticas
sociais a partir da verificação do cumprimento da responsabilidade de avaliação pelas esferas
estatais de uma política pública de saúde de nível federal que envolve a co-gestão estadual e
municipal, o PSF no município de Correia Pinto (SC), em 2006; específicos, investigar
teoricamente o tema da descentralização e do federalismo nas ciências sociais do Brasil, das
políticas públicas no campo específico das políticas sociais e da política de saúde no Brasil,
descrever o PSF e seu Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB), analisar o PSF no
município de Correia Pinto através do SIAB, verificar o cumprimento das responsabilidades
assumidas pelas esferas de governo na área da avaliação na Saúde da Família, e, identificar os
limites e dificuldades da descentralização.
Para investigação do objeto e como meio para atingir os objetivos propostos, adotou-
se como metodologia de pesquisa a bibliográfica e a pesquisa quantitativa e qualitativa como
base metodológica da construção e análise dos dados.
O aporte metodológico quantitativo foi utilizado para verificar a existência de
supervisão e controle sobre os dados produzidos, uma vez que a inexistência desta forma de
acompanhamento dos dados comprometeria a própria confiabilidade das informações geradas,
e em conseqüência, a avaliação do Programa. Esta análise foi realizada através dos dados
constantes nos documentos físicos como fichas e relatórios, bem como através dos dados
15
constantes nos documentos informatizados como o SIAB, que entre outros, concentra dados
que contemplam: número de pessoas cadastradas e acompanhadas pelos profissionais do
Programa, registro de atividades, procedimentos e notificação de doenças, e relatórios de
consolidação dos dados.
Quanto à utilização deste aporte metodológico Bauer, Gaskel e Allum (2004)
justificam que a pesquisa quantitativa trabalha com números e usa modelos estatísticos para
explicar os dados. Caracteriza-se, também, pelo emprego da quantificação, tanto nas
modalidades de coleta de informações, quanto no tratamento delas por meio de técnicas
estatísticas.
O aporte metodológico qualitativo foi utilizado para analisar através de entrevistas
individuais e em grupo, a relação da política de saúde entre as esferas estatais, bem como
servirá de referência para leitura e análise dos dados. Segundo Bauer, Gaskel e Allum (2004),
a pesquisa qualitativa trabalha com interpretações das realidades sociais e é vista como um
empreendimento autônomo de pesquisa, no contexto de um programa de pesquisa com uma
série de diferentes projetos.
Quanto às técnicas de pesquisa, foi realizado um levantamento de dados, que
consistiu em pesquisa bibliográfica e de dados documentais do órgão público, bem como
foram realizadas entrevistas individuais com os responsáveis pela avaliação do Programa nas
três esferas estatais. No município, com a Coordenadora do PSF, no Estado, com a
Coordenadora da Secretaria Regional de Saúde e com o Gerente do Departamento da Atenção
Básica da Secretaria Estadual de Saúde, e na esfera federal, com a Coordenadora de
Acompanhamento e Avaliação do Departamento de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde,
para verificar como os dados do SIAB são avaliados pelas esferas estatais e quais foram as
suas intervenções para confirmar ou corrigir as ações. E, entrevista em grupo com os
responsáveis pelo manejo do SIAB, enfermeiras das equipes e digitadora do SIAB, para
verificar como são realizados os trabalhos de rotina de preenchimento das fichas e relatórios.
Os dados coletados foram analisados qualitativa e quantitativamente, estabeleceu-se
correlação entre eles, comparando-os e promovendo complementação mútua.
Diante disto, com vistas ao desenvolvimento da questão, o trabalho será dividido em
quatro capítulos. O primeiro, aborda a questão do federalismo sob a perspectiva das
definições e da história, com atenção especial à história do federalismo no Brasil,
identificando a questão da descentralização como traço peculiar do federalismo.
O segundo capítulo tratará da descentralização das políticas públicas, aborda sua
origem, definições e modelos. No campo específico das políticas sociais, aborda sua origem,
16
definições e evolução histórica. Ao final do capítulo se apresenta um estudo acerca da
descentralização das políticas sociais.
No terceiro capítulo, veremos a descentralização da política de saúde, passando pelo
processo histórico, ou seja, da origem à construção do SUS, seu processo de regulamentação,
até chegarmos ao PSF e seu sistema de informação, utilizado como mecanismo para
aprimorar a organização da atenção básica.
O capítulo seguinte tratará do exercício da avaliação, suas definições e classificações,
bem como dará ênfase à relação entre os institutos da avaliação e do monitoramento. Por fim,
trata da avaliação das políticas públicas no campo específico das políticas sociais, qual seja: a
política setorial da saúde, o PSF.
No quinto e último capítulo, reservou-se espaço para apresentar o município de
Correia Pinto e realizar a análise do objeto empírico da pesquisa com discussão das
informações e apresentação dos resultados.
O interesse pelo trabalho está relacionado à atividade profissional da autora.
Pertencente ao quadro de servidores do município de Correia Pinto, na função de
Procuradora-geral, por vezes acompanhou as dificuldades do gestor em assumir as
responsabilidades que lhe foram atribuídas em decorrência da descentralização. Da mesma
forma, considerando a possibilidade de participação na adoção das medidas necessárias a
adequação do sistema, é que se consolidou a idéia de estudar a real participação do município
na descentralização, especificamente, na área de avaliação dos programas sociais,
pretendendo-se contribuir com recomendações para o aperfeiçoamento da utilização da
estrutura da descentralização e do desenho institucional das políticas.
17
CAPÍTULO I
Neste capítulo proceder-se-á ao enfoque teórico que, inicialmente, aborda a questão
do federalismo sob a perspectiva das definições e da história, com atenção especial à história
do federalismo no Brasil. Identifica-se mais adiante a questão da descentralização como traço
peculiar do federalismo, adotada, recentemente, como diretriz pela Carta Magna nacional.
1.1 FEDERALISMO E SUAS DEFINIÇÕES
Antes de tratarmos das definições do federalismo, é oportuno salientar que
federalismo e federação são institutos distintos. Segundo Souza (2005) o federalismo é fruto
da teoria, do mundo de valores, e a federação é a aplicação concreta do federalismo.
Souza (2005, p. 170) conceitua federação como “resultado da união, da aliança entre
Estados, membros de um todo.E, federalismo como “uma forma de organização do Estado
em que o poder é exercido em dois planos, o primeiro é exercido pela União soberana e o
segundo pelos Estados autônomos.”
No mesmo sentido, segundo Burgess (1993 apud SOUZA, 2001) o federalismo é
tratado como um conceito de valor, como a recomendação e a promoção de apoio à federação.
Ainda, Baracho (1996 apud CAFFARATE, 2002, p. 02) assim faz a distinção:
O termo federalismo, em uma primeira perspectiva, vincula-se às idéias,
valores e concepções do mundo, que exprimem uma filosofia compreensiva
da adversidade na unidade. Quanto à federação, é entendida como forma de
aplicação concreta do federalismo, objetivando incorporar as unidades
autônomas ao exercício de um governo central, sob bases constitucionais
rigorosas.
Desta forma, mais do que uma distinção semântica, distinguir federação e
federalismo é importante ante a existência de grande variedade na prática dos princípios
federais dentro de cada federação, de forma que esses valores variam não apenas em relação
aos seus princípios, mas também de acordo com cada circunstância histórica, com a dinâmica
da economia política, dos partidos e da cultura política.
Outra distinção que merece destaque no estudo do federalismo é a existente entre
República Federativa e Unitária. De acordo com o disposto na Carta Constitucional de 1891,
18
o Brasil, adota como forma de governo, sob o regime representativo, a República Federativa
proclamada em 15 de novembro de 1889.
O termo República expressa uma forma de Governo eleito e não hereditário. A
Federação, por sua vez, marca a forma do Estado que institui a Constituição (ABREU, 2004).
As Constituições subseqüentes mantiveram o princípio de que o Brasil é uma
República Federativa, inclusive, sempre se proibiu expressamente qualquer tentativa de
vedação à federação. E assim, dispõe o parágrafo 4º, do artigo 60, da Constituição de 1988:
“Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: a forma federativa de
Estado.”
Abreu (2004, p. 47-48) explica a divergência entre República Federativa e Unitária.
A primeira,
é a que se estabelece na base da Federação entre vários Estados que, embora
congregados para composição do Estado soberano, persistem em manter
autonomia e independência, quanto a seus interesses, a seus negócios e a sua
administração, respeitadas, no entanto, as restrições de ordem constitucional,
onde se firmam as bases da unidade federal.
A última é concebida como sendo
a que se organiza tendo como base a centralização das principais funções do
Estado. As divisões geográficas do Estado, mesmo reputadas como divisões
administrativas, não m autonomia ou independência, no regime unitário.
Governo e administração pública são um só (ABREU, 2004, p. 48).
Para Arretche (2002a, p. 27) a distinção entre Estados federativos e unitários diz
respeito às formas de distribuição da autoridade política dos Estados nacionais.
Certos autores (LIJPHART, 1999; RIKER, 1997; PIERSON & LEIBFRIED, 1995
apud ARRETCHE, 2002a, p. 27-28), definem Estados Federativos como sendo:
[...] uma forma particular de governo dividido verticalmente, de tal modo
que diferentes níveis de governo têm autoridade sobre a mesma população e
território. Nesses Estados, o governo central e os governos locais são
independentes entre si e soberanos em suas respectivas jurisdições, pois cada
governo local – cuja jurisdição pode variar, conforme assim o definir a
Constituição está resguardado pelo princípio da soberania, o que significa
que estes são atores políticos autônomos com capacidade para implementar
(pelo menos algumas de) suas próprias políticas.
E, Arretche (2002a, p. 28) define os Estados unitários:
19
[...] aqueles em que apenas o governo central tem autoridade política própria,
derivada do voto popular direto. A unidade do Estado nacional está garantida
pela concentração de autoridade política, fiscal e militar no governo central,
ao passo que autoridade política dos governos locais é derivada de uma
delegação de autoridade da autoridade política central. Em tese, portanto, a
autonomia dos governos locais é mais reduzida nos Estados unitários do que
nos federativos.
Por seu turno, Pinto Filho (2002, p. 07) considera que “o Estado unitário se compõe
de um centro único gerador de todas as necessidades do Estado como legislação, execução e
administração. No estado unitário estão agrupadas as competências tipicamente estatais como
a representação externa, defesa, justiça etc.”
E, o mesmo autor, apresenta as características do Estado unitário:
No Estado unitário há necessariamente a existência de um único centro
representativo da soberania estatal, não concorrendo com ele nenhuma outra
organização intra-estatal, ainda que se admita que existam órgãos políticos
dotados de poderes legislativos (Espanha, Itália), somente o Estado central
pode representar a totalidade da nação em vel interno e externo. Outra
característica do Estado unitário é a da imediaticidade das relações jurídicas
entre o Estado e seus cidadãos. Não pode existir nenhum órgão político
intermediário que possa arregimentar demandas ou expedir ordens em
relação aos cidadãos do Estado. Todos os cidadãos de um Estado unitário
estão umbilicalmente ligados ao órgão político central. A quarta e mais
marcante característica é a que toca a indivisibilidade de um Estado unitário.
Este tipo estatal, ainda que se reconheça a existência de regiões delimitadas,
constitucionalmente se trata de um Estado único, sem divisões internas
(PINTO FILHO, 2002, p. 07).
Na colocação de Amaral (2006, p. 07) “no Estado Federado há uma complexidade de
pessoas jurídicas de direito público interno, todas detentoras de autonomia conferida pela
Constituição Federal. Todavia, em nível internacional, há um único titular de direitos e
obrigações, a saber: o Estado Federal.” E, no Estado unitário “o poder irradia de um único
centro, ou de divisões administrativas deste, sobre todo o território nacional. A adoção dessa
forma unitária de Estado está associada ao intuito do governo de governar sem ingerências, ou
sem a interferência de outros entes políticos.”
Destarte, em síntese, o Estado unitário se caracteriza pela centralização das funções
do Estado no governo central, logo, os governos locais, possuem autonomia reduzida. E, o
Estado Federal, por sua vez, é definido como a união de Estados, com autonomia e
independência entre si, devidamente prevista na Constituição.
Agora sim, tratando das definições de federalismo, tem-se que não existe um
conceito universal do que seja federalismo; todavia, em todas as definições estudadas, o
20
federalismo aparece com o mesmo significado. Com exceção ao pensamento de Abrucio
(2005) que acrescenta à definição de federalismo a idéia republicana, as demais diferenças
entre as definições, aparecem na utilização de palavras sinônimas como autonomia e
independência; divisão, repartição e multiplicidade; e união e relação.
Mendes e Gall (2000, p. 01) definem federalismo como
uma frágil e dinâmica forma de cooperação política para divisão de poder e
responsabilidades entre União, estados e municípios. Cada uma das esferas
de governo tem os seus próprios órgãos governamentais. A União pode agir
diretamente sobre os cidadãos de um estado, através de suas próprias
agências, sem estabelecer qualquer ligação com o governo e as autoridades
locais, desde que se limite ao conjunto de atribuições que lhe são próprias.
Também, é possível dizer o que seja o federalismo, ao menos teoricamente,
analisando-se as características do federalismo nos Estados Unidos da América, conforme
Schwartz (1984, p. 10 apud SOUZA, 2005, p. 170):
(i) como em todas as federações, a união de um número de entidades
políticas autônomas (os estados) para fins comuns; (ii) a divisão dos poderes
legislativos entre o Governo nacional e os estados constituintes, divisão esta
governada pela regra de que o primeiro é um ‘governo de poderes
enumerados’, enquanto os últimos são governos de ‘poderes residuais’; (iii)
a atuação direta, na maior parte, de cada um destes centros de governo,
dentro de sua esfera designada, sobre todas as pessoas e todas as
propriedades existentes dentro de seus limites territoriais; (iv) o
aparelhamento de cada centro com o complexo mecanismo de imposição da
Lei, tanto executivo quanto judiciário; e (v) a supremacia do Governo
nacional, dentro de sua esfera designada, sobre qualquer informação
conflitante de poder estadual.
Adalberto Pimentel Diniz de Souza (2005, p. 170) analisando as características
apresentadas, acentua: “federalismo é uma forma de Estado que visa conciliar esforços,
prerrogativas, competência e poder entre a União e os Estados.”
Da mesma forma, é possível dizer o que seja federalismo, analisando-se as
características básicas de uma federação, apresentadas por ABRUCIO (2005, p. 02):
Primeiro, a autonomia dos governos subnacionais, quer dizer, o princípio
básico da federação é a multiplicidade de centro de poder, diferenciando-se,
portanto, a federação do Estado unitário. Segundo, a interdependência, isto é,
como garantir que os diversos governos criem um pacto, porque se nós
garantirmos apenas a autonomia não federação, confederação.
Terceiro, a idéia republicana. Não por acaso a federação norte-americana
nasce com a república, e a nossa, esquecemos às vezes disso, também nasce
com a república. A idéia republicana significa que para se ter autonomia e
21
interdependência é preciso criar de um lado uma sociedade que controle o
Estado, ou seja, a idéia republicana é a idéia de coisa pública.
Segundo Bercovici (2004) a delimitação das esferas de atuação dos Estados-
Membros e da União que se chama de repartição das competências, é o ponto central do
federalismo, pressuposto da autonomia dos entes federados.
Para Abreu (2004) o Estado Federal, decorre da União de Estados livres e
independentes, portanto, soberanos, pelo menos no momento de sua constituição, com o
objetivo da criação de um Governo Nacional comum.
E, em definição clássica, Corwin (1964 apud BERCOVICI, 2004, p. 22) define
federalismo
de acordo com esta concepção, o Governo Nacional e os Estados são partes
mutuamente complementares de um único mecanismo governamental, ao
qual todos os poderes estão sujeitos com o propósito de realizar as atuais
determinações do governo, considerando-se a aplicabilidade destas
determinações, com o problema em questão (Trad. da Autora).
1
As definições adotadas pelos autores permitem delinear o perfil do que seja
federalismo. É um sistema nacional comum, onde o Governo Nacional e os Estados são
mutuamente partes complementares de um mecanismo de governo único, visando cooperação,
relação, conciliação de esforços, prerrogativas e competências entre os Estados, bem como
decorre da autonomia e da repartição de competências e responsabilidades entre os entes
federados.
1.2 UMA BREVE RECUPERAÇÃO HISTÓRICA DO FEDERALISMO
1.2.1 A origem do federalismo
O federalismo encontra referências na antiguidade, todavia, não consenso entre os
doutrinadores sobre a sua primeira forma.
1
“according to this conception, the National Government and the States are mutually complementary parts of a
single governmental mechanism all of whose power are intended to realize the current purposes of government
according to their applicability to the problem in hand”.
22
Abreu (2004, p. 17) assevera: “registra-se ao longo da história comportamentos
sociais e políticos que se identificam com o federalismo, ao menos conjunturalmente,
voltados à aglutinação das sociedades para a militarização e a intensificação do comércio.”
A origem do federalismo já era percebida nas anfictionias gregas, ou seja, nas
confederações formadas pelas antigas cidades gregas em torno de um centro religioso, onde se
reuniam, periodicamente, para tratar de assuntos comuns, mantendo o compromisso de
observar certos princípios de direito intertribal.
Da mesma forma, o federalismo de acordo com Souza (2005) era perceptível no
Estado Romano. Os exércitos romanos conquistavam novos territórios e ao grupo de pessoas
que neles viviam impunham uma nova ordem jurídica, subordinada a Roma.
Segundo Dallari (1986 apud ABREU, 2004, p. 18):
As federações que alguns autores pretendem ver na antiguidade, na Idade
Média, ou nos primeiros séculos da Era Moderna foram apenas alianças
temporárias, com objetivos limitados, não chegando a submissão total e
permanente dos aliados a uma Constituição comum, sob um governo
composto por todos e com autoridade plena, máxima e irrecusável sobre
todos.
Nos tempos modernos, foi a Suíça o primeiro país a contar com um tipo de governo
federal, embora, este tipo de governo somente se definisse como tal em 1848. Assim, a
organização federativa moderna foi proclamada pela primeira vez na Constituição dos Estados
Unidos, em 1787, e originou-se da evolução política das 13 colônias britânicas estabelecidas
na América do Norte.
O regime até então adotado pelos Estados Unidos era o confederativo. Bercovici
(2004, p. 11-12) traça um esboço de como funcionava a Confederação norte-americana:
A confederação possuía um órgão político central, o Congresso, de caráter
predominantemente diplomático, que carecia de autoridade própria,
respeitando a absoluta independência dos Estados associados. Os
representantes dos Estados se reuniam no Congresso para deliberar assuntos
de interesse comum. O Congresso era subordinado ao poder dos Estados,
sujeitando-se ao seu poder de veto. Dessa maneira, as decisões poderiam
ser tomadas pela unanimidade dos treze Estados.
Dallari (1986 apud SOUZA, 2005, p. 173) salienta que “[...] na confederação os
integrantes se acham ligados por um tratado, do qual podem desligar-se a qualquer momento,
uma vez que os signatários do tratado conservam sua soberania e delegam os poderes que
quiserem e enquanto quiserem.”
23
Assim, considerando que a Confederação não passava da soma de componentes
políticos das antigas colônias inglesas, e que em razão da soberania, seria possível ao Estado
retirar-se da Confederação, em razão do reconhecimento do direito à secessão, o que ensejaria
o enfraquecimento e instabilidade do poder, o que se procurou foi dotar o novo país de um
governo efetivamente nacional.
Como solução para esse quadro, representantes dos Estados participantes da
Confederação reuniram-se na Convenção de Filadélfia, em 1787, onde ficou estabelecido que
a solução seria a adoção da forma federativa de Estado.
Neste sentido, Abrucio (2005) destaca que o resultado foi uma outra Constituição,
que estabelecia um novo modelo de Estado, o modelo federal, visto como adequado para
garantir a unidade norte-americana.
A formação federativa deu-se inicialmente com duas esferas de poder: a federal e a
estadual, sendo que os municípios ficaram no âmbito da competência estadual.
No que se refere à hierarquia entre os entes federados, verifica-se que uma esfera não
é superior à outra, entretanto, esta assertiva o é absoluta, uma vez que prevalência,
supremacia do poder federal em algumas circunstâncias ou sobre qualquer informação
conflitante do poder estadual.
a repartição de competências, no dizer de Bercovici (2004) se deu na federação
norte-americana, como em todas as demais, sob a prevalência do critério jurídico-formal no
estabelecimento da estrutura federal, delimitando-se as esferas de atuação dos Estados-
Membros e da União.
E mais adiante, o mesmo autor acrescenta que “as unidades federadas recebem
diretamente da Constituição Federal as suas competências, isto é, o reconhecimento de seus
poderes conjugado com a atribuição de encargos.” (BERCOVICI, 2004, p. 14).
Uma maior cooperação entre as duas esferas e à preponderância federal vem desde o
final do século XIX, mas a ruptura definitiva com o federalismo dualista, ou seja, com a
separação absoluta de competências, ocorre com o New Deal
2
de Franklin Delano
Roosevelt, ocorrido entre 1932 e 1945.
Schwartz (1984 apud CAFARATTE, 2002, p. 05) explica em que consiste a doutrina
do federalismo dualista:
2
De acordo com a Macropédia Barsa (1997) o termo New Deal, deriva do inglês e significa Nova Política, que
designa o programa de bem-estar público adotado nos EUA, pelo presidente Franklin Roosevelt, a partir de
1933. Teve o objetivo de atenuar a crise econômica no país decorrente da grande depressão mundial. Baseou-se
nas teorias de John Keynes.
24
De acordo com ela, tanto o Governo Federal quanto os governos estaduais
tinham destinado a eles uma área de poder rigidamente definida. Nesta visão,
o equilíbrio apropriado necessário ao funcionamento do sistema federal é
assegurado e mantido pela estrita demarcação da autoridade federal e
estadual. Os estados e a Nação são concebidos como rivais iguais e, ao
menos que haja uma delimitação gida de suas respectivas competências,
tem-se que a própria União sofra uma ruptura em decorrência de sua
rivalidade.
Segundo Bercovici (2004, p. 21) o que ocorreu com o federalismo norte-americano, a
partir do New Deal, “foi a transformação das relações União-Estados, dando origem às
tendências fundamentais das políticas públicas desenvolvidas posteriormente.
Comparativamente à União, os Estados perderam grande parte de sua autoridade e não a
recuperaram mais.”
E, o mesmo autor acrescenta que o Governo Federal se deu conta da necessidade da
colaboração dos poderes subnacionais para a realização do ambicioso programa proposto por
Roosevelt, e passou, então, a enfatizar não mais a competição, mas a coordenação entre a
União e os Estados, com o desenvolvimento do cooperative federalism, tornando o
federalismo um instrumento da promoção do bem-estar coletivo.
Após a criação do federalismo em 1787, países como Alemanha, União Soviética,
Austrália, Argentina, Brasil, Canadá, Índia, México e Venezuela, adotaram várias outras
adaptações do federalismo, de acordo com suas características, com respeito à extensão das
faculdades das distintas unidades administrativas e a sua dinâmica interna.
1.2.2 A história do federalismo no Brasil
Com a Inconfidência Mineira, começou a influência das idéias federalistas no Brasil.
A prova das intenções dos conspiradores é a existência de um exemplar da constituição dos
Estados Unidos, que pertenceu a Tiradentes. Ademais, se analisadas, todas as rebeliões de
fundo nativista que se lhe seguiram, mesmo depois de consumada a independência, tiveram
caráter federalista, principalmente, a Confederação do Equador em 1824, a Cabanagem em
1831 e a Revolução dos Farrapos em 1835.
O Federalismo no Brasil segue, estruturalmente, o modelo estadunidense. Entretanto,
segundo Souza (2005), Amaral (2006) e Bercovici (2004), o federalismo brasileiro formou-se
por motivos opostos aos que orientaram a formação da federação estadunidense. Enquanto
nos Estados Unidos da América, por meio da união das colônias, da dissolução de uma
25
confederação, foi constituída a federação, no Brasil o poder central subdividiu o poder entre
as Províncias, o Estado Unitário se desmembrou.
Portanto, ao contrário do que se costuma pensar, a decisão de adotar um regime
federal no Brasil não foi mera imitação do modelo americano. Diferente dos Estados Unidos,
que era um conjunto de Estados autônomos, o Brasil já era um Estado Nacional, com governo
baseado na monarquia. Enquanto lá, houve o que os teóricos chamam de atuação de uma
“forma centrípeta”, aqui, houve a atuação de uma “forma centrífuga”.
Segundo Amaral (2006, p. 05) existem três classificações para definir uma federação
em centrípeta ou centrífuga:
A primeira classificação considera a realidade interna de uma federação, ou
seja, como se distribuem as competências e poderes entre União e Estados-
Membros. Sendo assim, se uma federação concentra poderes e competências
na União, ela é mais centralizada e, denominada de federação centrípeta. Se
uma federação desconcentra competências e poderes da União, conferindo
maior autonomia aos Estados Membros, ela é mais descentralizada e,
denominada de federação centrífuga. A segunda classificação o leva em
conta a realidade interna de cada federação e sim qual o movimento histórico
que levou à formação do estado federado. Assim, se uma federação se
originou a partir de vários Estados Soberanos que abdicaram de suas
soberanias para formar um Estado Federado, o movimento realizado para se
formar essa federação foi de fora para dentro e, por isso, em face à sua
formação histórica, essa federação é centrípeta (caso americano). Todavia, se
uma federação se originou de um Estado Unitário que se desmembrou,
cedendo autonomia aos Estados-Membros, o movimento realizado para se
formar essa federação foi de dentro para fora e, por isso, em face à sua
formação histórica essa federação é centrífuga (caso brasileiro). A terceira
classificação, adotada pelo professor Luiz Quadros de Magalhães, baseia-se
no movimento atual existente numa federação. Em conformidade com esse
posicionamento, a federação dos EUA é uma federação centrípeta (busca
centralizar poderes e competências na União) e a federação brasileira é uma
federação centrífuga (busca descentralizar poderes e competências da União
em favor dos Estados e Municípios).
Em síntese, o federalismo centrípeto é aquele que se dirige para o centro, ou seja, em
que uma predominância de atribuições para União, como no caso da federação norte-
americana. O federalismo centrífugo é aquele que procura se afastar do centro, isto é, permite
com que os Estados-Membros tenham maior autonomia, como no caso da federação
brasileira.
Para autores como Abreu (2004), o processo de constituição de um Estado Federal
pode se dar por agregação ou por segregação em substituição as denominações, respectivas,
de centrífugo e centrípeto. A agregação resultaria da superposição do Estado Federal a
Estados existentes, a exemplo dos Estados Unidos e a segregação, teria por pressuposto a
26
obediência a imperativos políticos que efetivam a descentralização, fazendo surgirem Estados
subpostos, a exemplo do Brasil.
Depois da Independência do Brasil, ocorrida em 1822, Bercovici (2004) nos conta
que ocorreram vários conflitos entre o Imperador D. Pedro I e a Assembléia Constituinte que
culminaram com a dissolução da monarquia, em novembro de 1823, e a outorga, em 25 de
março de 1824, da Constituição do Império do Brasil.
Acrescenta que a Constituição do Império, de 1824, estabelecia, porém, um regime
de rigorosa centralização, onde as Províncias não podiam legislar sobre seus assuntos
específicos, bem como não havia previsão na Constituição de assuntos relacionados à
repartição das receitas entre Governo Central, as Províncias ou Municípios. Todavia, a
aprovação do ato adicional de 1834 trouxe importantes concessões no sentido de atenuar o
centralismo. Aprovado através da Lei 16, de 12 de agosto de 1834, deu causa a uma certa
descentralização, uma vez que as províncias foram dotadas de Poder Legislativo próprio e
tutela sobre os Municípios.
No entanto, de acordo com Bercovici (2004, p. 27) este início de descentralização
teve vida curta.
As condições políticas geradas pela constante instabilidade do período
regencial fizeram com que a maioria conservadora instalada no Legislativo,
autodenominada “Regresso”, aprovasse a Lei de Interpretação do Ato
Adicional (Lei 105, de 12 de maio de 1840), que reforçou o centralismo,
retirando várias prerrogativas dadas as Províncias, concentrando mais o
poder na Corte e nas mãos do Imperador.
E, em 1841, a criação da política, também centralizada, completou o dispositivo legal
unificador da administração imperial (BERCOVICI, 2004).
Os liberais reagiram à onda conservadora, provocando o chamado “Golpe da
Maioridade”, do qual saíram vitoriosos. Mais tarde, provocaram, também, a “Revolta Liberal”
e a “Revolução Praieira”, porém, foram derrotados. Com a derrota da Revolução Praieira
terminou o ciclo de revoltas do período imperial.
A reação contra o unitarismo, teve alento, também, na campanha de Tavares Bastos,
com seu livro A província (1870). No mesmo ano, o manifesto republicano, redigido por
Quintino Bocaiúva e Saldanha Marinho, considerava o sistema federativo essencial à
mudança do regime e exigia, entre outros temas, a implantação da Federação, nos moldes
norte-americanos.
27
Segundo Bercovici (2004, p. 29) “a solução para as novas aspirações e conflitos
surgidos com as transformações econômicas e sociais da segunda metade do culo XIX
parecia estar no federalismo. A centralização passou a ser vista como um entrave ao
desenvolvimento do país.”
Em 1885, Joaquim Nabuco apresentou na Câmara dos Deputados seu projeto
federalista. Em 1889, no último congresso do Partido Liberal, Rui Barbosa defendeu as
mesmas idéias, apoiado por José Antonio Saraiva.
Proclamada a República, o federalismo foi instituído pelo Decreto 1, de 15 de
novembro de 1889. O federalismo da Constituição de 1891, que dispunha em seu artigo
que: “A Nação brasileira adota como forma de governo, sob regime representativo, a
República Federativa proclamada a 15 de novembro de 1889, e constitui-se por união
perpétua e indissolúvel de suas antigas províncias, em Estados Unidos do Brasil”, era
moldado no federalismo dualista clássico e, praticamente ignorou a cooperação entre União e
entes federados.
O Art. desta Constituição restringia o auxílio federal aos Estados, exclusivamente,
aos casos de calamidade pública. Segundo Bercovici (2004, p. 32):
Paradoxalmente, foram as calamidades públicas, mais especificamente as
secas do Nordeste, que justificaram as primeiras medidas de relações
intergovernamentais tomadas sob o federalismo dualista do regime de 1891,
especialmente com as obras contra as secas levadas a cabo durante o
governo de Epitácio Pessoa (1919 -1922).
E, acrescenta Bercovici (2004, p. 32) “o resultado desse sistema foi a manutenção de
desigualdades gritantes entre os vários membros da federação. Os três Estados
economicamente mais fortes (São Paulo, Minas Gerais e, em menor grau, Rio Grande do Sul)
dominavam a República.”
No dizer de Souza (2001, p. 11) “a primeira constituição republicana, promulgada
em 1891, desenhou uma Federação “isolada” no sentido de que havia poucos canais de
comunicação e ligação entre os níveis de governo.” No sistema político implantado com a
República, o Poder Executivo sobrepunha-se aos demais. A “Política dos Governadores”
3
e o
Coronelismo eram as bases do regime político.
Neste período, o federalismo brasileiro sofreu impacto de autoritarismo pior do que
no período imperial. Com a revolução de 1930 e a chegada de Getúlio Vargas ao poder, o
3
Segundo Bercovici (2004) a “Política dos Governadores” era a subordinação do Congresso Nacional aos
interesses das oligarquias estaduais aliadas ao presidente da República.
28
novo Governo passa a ser o Poder Executivo e o Legislativo até que uma futura e incerta
Assembléia Constituinte restabelecesse a organização constitucional do país. A Assembléia
Constituinte foi instalada em 15 de novembro de 1933. Segundo Bercovici (2004, p. 39) havia
na Constituinte “um consenso em torno da manutenção (ao menos nominal) do federalismo.
Não foi apresentada nenhuma proposta abertamente unitarista. O que se procurou foi uma
definição mais precisa de federalismo, que podemos denominar cooperativo.”
A Constituição de 1934 enterra o que ficou conhecido como federalismo dual e
inaugurada o federalismo cooperativo, que marcará uma nova fase mundial.
Cafaratte (2002, p. 07) explica o federalismo cooperativo:
No federalismo cooperativo, uma mudança dos poderes de decisão nos
níveis de governo em benefício de um mecanismo, mais ou menos complexo
e formalizado, de negociação e acordo intergovernamental. Com isso há uma
tendência de redução das políticas que sejam conduzidas por um só governo,
havendo uma interdependência e coordenação das atividades
governamentais. Esta interdependência e coordenação têm como base uma
decisão voluntária de todos os entes da federação, não se fundamentando em
uma pressão hierárquica.
O debate e as disputas políticas se desenrolaram nos anos 30 entre os liberais,
“tenentes” e adeptos do autoritarismo.
De acordo com Bercovici (2004, p. 41) “os conflitos ocorridos entre 1934 e 1937
foram causados pela tentativa de institucionalizar um poder pós-revolucionário sobre a
estrutura política baseada novamente na política dos Estados.” E, acrescenta que “a
radicalização da luta entre os integralistas e os comunistas acabou por facilitar a reunião das
camadas dominantes e dos setores revolucionários, que se aliaram no apoio à ditadura do
Estado Novo.”
Assim, em 10 de novembro de 1937, com a instauração do Estado Novo, foi
decretada a intervenção federal em todos os Estados.
A Constituição de 1937, a polaca, como ficou conhecida por sua inspiração fascista
do regime polonês, era de fundo autoritário e, em razão disso, centralizadora. Nunca se
reconheceu tão pouca autonomia aos Estados. Tudo se decidia no palácio do Presidente da
República.
Durante o período de 1937 a 1945, em que vigorou o Estado Novo, o Brasil teve
interrompida não apenas a democracia representativa, mas a própria tradição federalista.
29
Segundo Amaral (2006, p. 04), “o período de 1937 a 1945 liquida com o
federalismo, mas a vitória da democracia contra o nazismo, na segunda grande guerra, fez
com que a ditadura Vargas chegasse ao fim.”
Pinto Filho (2002, p. 133) corrobora ao esclarecer que as correntes políticas, que não
auxiliaram o golpe de 1937, “vêem na Guerra Mundial uma oportunidade de contestar o poder
de Getúlio. em julho de 1942, começam as dissidências dentro da própria corporação
militar, alguns apoiando a entrada do país na guerra, outros preconizando a neutralidade.”
Então, com a Constituição de 1946 restabelece-se o Estado Federalista.
Neste sentido observa Bercovici (2004, p. 42-43):
A Constituição de 1946 consolidou a estrutura cooperativa no federalismo
brasileiro, prevista já em 1934, com grande ênfase na redução dos
desequilíbrios regionais, favorecendo, apesar do reforço do poder federal, a
cooperação e a integração nacional. Foi sob a vigência desta Constituição, na
década de 1950, que a Questão Regional ganhou importância no debate
político nacional, com a concepção de que a atuação estatal e o planejamento
eram elementos essenciais para o desenvolvimento. Desde então, todas as
constituições brasileiras têm a preocupação de tentar consagrar instrumentos
para a superação das desigualdades regionais.
De se notar que a Constituição de 1946 foi um marco na questão regional. E, desse
novo momento surgiram organismos regionais como a Superintendência do Desenvolvimento
do Nordeste (SUDENE), que tinham por função dinamizar as forças produtivas das suas áreas
de atuação e integrá-las ao sistema nacional.
A Constituição de 1946 inaugura um novo modelo, mesclando o princípio da
autonomia, do federalismo clássico, com o da cooperação, do modelo contemporâneo.
Bercovici (2004) explica que as reações adversas das elites nacionais e de boa parte
das classes médias acabaram por provocar o ambiente de instabilidade propício ao
desferimento do golpe militar.
O golpe militar ocasionou forte centralização na esfera da União, dando lugar a um
regime autoritário que enfraqueceu o princípio federativo. Com o Ato Institucional 5, foi
extinta, na prática, a Federação do Brasil, apesar de nominalmente estar previsto nas Cartas
outorgadas de 1967 e 1969. O “federalismo cooperativo” lugar ao chamado “federalismo
da integração”.
Sobre o assunto Bercovici (2004, p. 50-51) ensina:
A elaboração teórica do “federalismo de integração” é de Alfredo Buzaid,
então Ministro da Justiça do General Médice, que considerava o
30
desenvolvimento e a segurança nacional como fundamentos do novo
“federalismo”. Sob o pretexto da “integração nacional”, todos os
instrumentos de promoção do desenvolvimento econômico deveriam ser
centralizados na esfera da União. Para Buzaid, o “federalismo de integração”
iria além do federalismo cooperativo, atribuindo á União os poderes
necessários para dirigir a política nacional, evitar conflitos com as unidades
federadas e promover o desenvolvimento econômico com o máximo de
“segurança coletiva”. Realmente, o “federalismo de integração” foi tão além
do federalismo cooperativo que praticamente extinguiu o sistema federativo
brasileiro, sempre com a justificativa da “segurança nacional”. Em ntese,
sob a denominação de “federalismo de integração”, procuraram os juristas
ligados à ditadura militar esconder a supressão do federalismo naquele
período.
Com as reformas das instituições políticas ao longo dos anos 80 particularmente, a
retomada de eleições diretas em todos os níveis de governo a partir de 1982 e as deliberações
da Constituição Federal de 1988 recuperaram as bases federativas do Estado Brasileiro,
suprimidas durante a ditadura militar (ARRETCHE, 2002a).
A atual Constituição fez revigorar o sistema federativo brasileiro de forma
inovadora, numa característica especial da federação brasileira, pois elegeu o Município como
ente autônomo ao lado da União, Estados e Distrito Federal.
Agora as normas instituidoras de autonomia dirigem-se diretamente aos Municípios,
pois a Constituição de 1988 deu-lhes também o poder de auto-organização, ao deferir-lhe
autonomia para criar seu próprio documento magno, qual seja, a Lei Orgânica.
Meirelles (2000 apud AMARAL, 2006, p. 04), em sua exposição sobre o regime
municipal brasileiro conclui que: “o Município brasileiro é entidade estatal integrante da
Federação, e essa integração é uma peculiaridade nacional, sendo que em nenhuma outra
nação se encontra o Município constitucionalmente reconhecido como peça do regime
federativo.”
Amaral (2006) explica que um federalismo tridimensional, ou seja, participando
União, Estados Membros e Municípios como entes autônomos da federação, realmente
poderia ocorrer no Brasil. Em face da história do federalismo brasileiro, era necessária a
inclusão do Município como ente federativo, pois assim, seria possível a busca de uma
maior descentralização e, em conseqüência, o avanço na compreensão das instituições
democráticas.
De acordo com Bercovici (2004) a Constituição de 1988 institui, expressamente, o
Federalismo Cooperativo, enumerando em seu artigo 23, as matérias cuja competência é
comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios e em seu artigo 24, as matérias
que competem concorrentemente à União, aos Estados e ao Distrito Federal, ressalvando-se a
31
limitação da União em estabelecer apenas normas gerais e dos Estados e do Distrito Federal,
desde que não contrariem a lei federal, adaptá-las a suas especificidades. Os Municípios não
foram situados na área de competência concorrente do artigo 24, que lhes outorgou
competência para suplementar as legislações federal e estadual no que lhes couber.
O mesmo autor acrescenta que “na cooperação, nem a União, nem qualquer ente
federado pode atuar isoladamente, mas todos devem exercer sua competência conjuntamente
com os demais” (BERCOVICI, 2004, p. 56), esclarecendo que na repartição de competências,
a cooperação se revela nas chamadas competências comuns. Não existindo supremacia de
nenhuma das esferas na execução das tarefas, as responsabilidades também são comuns, não
podendo nenhum dos entes da Federação se eximir de implementá-las, pois o custo político
recai sobre todas as esferas de governo.
Destarte, a federação, a rigor, nada mais é do que um grande sistema de repartição de
competências. Abreu (2004, p. 50) observa:
Aliás, o Estado Federal nasceu no Brasil com a proposta de não concentrar o
poder nas mãos de uma única pessoa de direito público, mas de repartição,
de partilha entre as diversas coletividades que o compõem, exatamente para
evitar o surgimento de governos autoritários, que se materializa com a
centralização do poder.
Por esta razão, no dizer de Bercovici (2004) é que se tem como grande objetivo do
federalismo, na atualidade, a busca da cooperação entre a União e os entes federados.
1.3 FEDERALISMO E DESCENTRALIZAÇÃO
A relação entre federalismo e descentralização comporta tanto divergências quanto
afinidades. Segundo Almeida (2005, p. 05) “a relação entre federalismo e descentralização,
em termos conceituais e empíricos, está longe de ser simples e incontroversa.” De outra
forma, de acordo com Abreu (2004, p. 31) “federalismo e descentralização são temas que
comportam afinidades. O que diverge, nos diversos sistemas federativos espalhados pelo
mundo é exatamente a tendência centralizadora do poder.”
A princípio, o Estado Federal é um Estado constitucionalmente descentralizado,
muito embora nem toda descentralização numa Constituição produza um Estado Federal.
Contudo, não é correto afirmar que a definição de Estado unitário está relacionada à
centralização, tampouco, que a definição de Estado Federal é a descentralização, uma vez que
32
pode haver no Estado unitário, certa descentralização, bem como pode haver no Estado
Federal, certa centralização.
Arretche (2002a) exemplificando a possibilidade de existência de descentralização
no Estado unitário observa que o Reino Unido, é um Estado unitário cujas instituições
políticas concentram a autoridade política no governo central. Entretanto, do ponto de vista da
distribuição de competências, a gestão de políticas públicas é extensamente descentralizada.
A mesma autora, exemplifica a possibilidade de existência de centralização no
Estado Federal: “durante o regime militar, as relações intergovernamentais do Estado
brasileiro eram na prática muito mais próximas às formas que caracterizam um Estado
unitário que àquelas que caracterizam as federações.” (ARRETCHE, 2002a, p. 29).
Bercovici (2004, p. 50) complementa: “com os militares, o Governo Central passou a
enfeixar uma série de atribuições, ocasionando forte centralização na esfera da União. O
federalismo, praticamente desapareceu neste período, apesar de nominalmente estar previsto
nas Cartas de 1967 e 1969.”
Como se pode perceber, o andamento da descentralização não foi nem simples nem
linear. Tendências centralizadoras poderosas também estiveram presentes, aumentando a
complexidade do processo de redefinição das relações intergovernamentais.
De acordo com Resende e Afonso (2004, p. 302), a Constituição Republicana
“acolhia totalmente as idéias de descentralização e autonomia federal, iniciando um ciclo que
alterna períodos de descentralização e centralização do poder e que ainda é um traço peculiar
da Federação brasileira.”
Da mesma forma, em 1930, a ascensão de Getúlio Vargas, assinala uma nova história
da federação brasileira, marcada por oscilações entre períodos de centralização e
descentralização.
Souza (2001, p. 06) corrobora este entendimento ao escrever que “o federalismo
brasileiro não se formou pela dicotomia entre centralização versus descentralização, mas sim
por um continuum entre esses processos, o qual sempre guiou as relações de poder entre as
esferas central, regionais e locais.”
No dizer de Almeida (2005, p. 03) “a federação brasileira é um arranjo complexo em
que convivem tendências centralizadoras e descentralizadoras, impulsionadas por diferentes
forças, com motivações diversas, produzindo resultados variados.”
Ainda, como sistema de governo, o federalismo pode ser caracterizado pela
polaridade entre centralização e descentralização, dependendo dos poderes e dos recursos
33
alocados ao governo central, comparados aos alocados às partes federadas constitutivas do
país.
De acordo com Falleti (2006, p. 46):
considerando que, tanto em termos territoriais quanto populacionais, o Brasil
é o quinto maior país do mundo, não é de se surpreender que com o término
do modelo econômico desenvolvimentista e da ditadura militar (1964-1985),
o país assumisse a descentralização do governo como parte do processo de
redemocratização.
Para a mesma autora, a descentralização “é um processo de reforma do Estado,
composta por um conjunto de políticas públicas que transfere responsabilidades, recursos ou
autoridades de níveis mais elevados do governo para níveis inferiores, no contexto de um tipo
específico de Estado.” (FALLETI, 2006, p. 46).
Pinto Filho (2002, p. 10), juridicamente falando, define a descentralização como “o
reconhecimento por parte do Estado Central da existência de outros entes políticos habilitados
a intervir em certos domínios, possuindo poder de decisão, e, tendo, no exercício deste poder,
“autonomia”.”
Para o WORLD BANK (2002 apud ALMEIDA, 2005, p. 04) descentralização é a
“transferência de autoridade e responsabilidade, no que diz respeito a funções públicas, do
governo central para os governos locais ou intermediários, para organizações governamentais
semi-independentes e/ou para o setor privado.”
A descentralização de acordo com Riker, (1987 apud ARRETCHE, 2002) diz
respeito à distribuição das funções administrativas entre os níveis de governo.
Enfim, a descentralização se caracteriza pela transferência de autoridade e
responsabilidade do governo central para os subnacionais, com respectiva autonomia. Vale
lembrar que a descentralização não significa apenas a transferência de poder aos municípios,
mas a capacidade de exercê-lo.
De qualquer forma, independentemente da existência de períodos de centralização,
para que exista um Estado Federal é necessário que a Lei Magna pressuponha uma
descentralização legislativa, administrativa e política, independentes do órgão central da
ordem nacional.
Daí ser necessário, também, distinguir Descentralização Administrativa da
Descentralização Política, para que se possa perceber a marca do Federalismo, que exige
descentralização completa e não meramente administrativa (ABREU, 2004).
34
Maria Sylvia Zanella di Pietro, citada por Abreu (2004, p. 33) acentua que se fala em
“descentralização administrativa quando existe um poder superior, que detentor, em princípio,
da totalidade dos poderes, os distribui a outros órgãos que lhe ficam hierarquicamente
subordinados, a fim de facilitar os encargos públicos e a consecução dos fins estatais.”
Na descentralização política, ao revés, no dizer de Abreu (2004, p. 33):
multiplicidade de comandos, com pluralidade de centros de poder, sem
hierarquia. Nesta forma de descentralização, a repartição das competências
decorre da própria Constituição Federal que, estabelecendo esferas
autônomas, exclui a relação de subordinação hierárquica dos órgãos locais
do Poder Central.
Para Falleti (2006, p. 61) a Descentralização Administrativa:
Engloba o conjunto de políticas que transferem a administração e a provisão
de serviços sociais como educação, saúde, assistência social e moradia, aos
governos subnacionais. A descentralização administrativa pode acarretar a
transferência da autoridade na tomada de decisões sobre essas políticas, mas
esta não é uma condição necessária. Se receitas são transferidas do centro
para cobrir os custos de administração e provisão de serviços sociais, a
descentralização administrativa é financiada e coincide com a medida e
descentralização fiscal [...].
E, para a mesma autora, a Descentralização Política
é o conjunto de emendas constitucionais e de reformas eleitorais desenhadas
para abrir novos espaços – ou acionar espaços existentes, mas não utilizados
ou ineficazes para a representação das sociedades subnacionais. A
descentralização política transfere autoridade política ou capacidades
eleitorais para atores subnacionais (FALLETI, 2006, p. 61).
Destarte, estas formas de descentralização com base no tipo de autoridade transferida
se caracterizam, no caso da descentralização administrativa, pela delegação de poderes e
atribuições a governos subnacionais, hierarquicamente subordinados, com o fim de facilitar os
encargos públicos e, no caso da descentralização política, pela multiplicidade de centros de
poder, com considerável autonomia para as entidades regionais e locais, sem que haja
hierarquia.
O que realmente importa é compreender que num Estado Federal o Poder da União
não é superior ao do Estado-membro e vice-versa. Cada qual mantém nos assuntos de sua
reservada competência, superioridade, sem relação de subordinação ou hierarquia (ABREU,
2004).
35
De acordo com Falleti (2006) a nova Constituição aprofundou o processo de
descentralização política, enquanto a descentralização administrativa, não teve avanços.
Seguindo o entendimento desta autora, tem-se que o executivo nacional prefere a
descentralização administrativa à política, uma vez que procura livrar-se da responsabilidade
pelos gastos. E, os governos subnacionais preferem o inverso, ou seja, a descentralização
política à administrativa, uma vez que buscam mais autonomia política e menos
responsabilidades. Pode explicar o fato da Constituição de 1988 ter aprofundado o processo
de descentralização política, a constatação de que naquele período, durante a Assembléia
Constituinte de 1987-1988, as bancadas subnacionais que vinham fortalecidas de autonomia
política e de recursos, desempenharam papel de liderança para favorecer a autonomia
subnacional.
De qualquer forma, é fato que a relação entre a esfera federal e subnacionais
apresentou alterações com a nova correlação de forças pós-Constituinte.
Enfim, o que se pode perceber é que uma verdadeira associação entre
descentralização e federalismo, que a descentralização, concebida, lato sensu, é um
pressuposto para o federalismo, uma vez que a princípio, o Estado Federal é um Estado
constitucionalmente descentralizado, independentemente da existência dos períodos de
centralização.
36
CAPÍTULO II
O presente capítulo tratará da descentralização das políticas públicas, no campo
específico das políticas sociais. Inicialmente, através de uma revisão da literatura, aborda-se a
origem, as definições e os modelos das políticas públicas. Mais adiante, a questão das
políticas sociais, sua origem, definições e evolução histórica. Ao final do capítulo se apresenta
um estudo acerca da descentralização das políticas sociais, que vêm redesenhando a estrutura
organizacional do sistema de proteção social brasileiro.
2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS
2.1.1 Políticas públicas: breve revisão da literatura
A política pública enquanto área de conhecimento e disciplina acadêmica nasce nos
Estados Unidos de forma diferente à forma como as políticas públicas nasceram na Europa.
Segundo Souza (2006) enquanto na Europa a área de políticas públicas surgiu como um
desdobramento dos trabalhos baseados em teorias explicativas sobre o papel do Estado e de
uma das mais importantes instituições do Estado, o governo, nos EUA, ao contrário, a área
surge no mundo acadêmico sem estabelecer relações com as bases teóricas sobre o papel do
Estado, passando direto para a ênfase nos estudos sobre a ação dos governos.
No que se refere ao pressuposto que deu causa a constituição e a consolidação dos
estudos sobre políticas públicas, a mesma autora esclarece que é o de que “em democracias
estáveis, aquilo que o governo faz ou deixa de fazer é passível de ser formulado
cientificamente e analisado por pesquisadores independentes.” (SOUZA, 2001, p. 22). Assim
nasce a política pública, como subárea da ciência política para entender como e por que os
governos optam por determinadas ações.
Klaus Frey (2000, p. 214) explica quando começaram as análises de campos
específicos de políticas públicas nos Estados Unidos, na Europa e no Brasil:
37
A análise de políticas públicas como as políticas econômicas, financeiras,
tecnológicas, sociais ou ambientais, começou nos Estados Unidos no início
dos anos 50, ao passo que na Europa, particularmente na Alemanha, a
preocupação com determinados campos de política toma força a partir do
início dos anos 70. Já no Brasil, estudos sobre políticas públicas foram
realizados só recentemente. Nesses estudos, ainda esporádicos, deu-se ênfase
ou à análise das estruturas e instituições ou à caracterização dos processos de
negociação das políticas setoriais específicas.
Como se pode perceber, embora, as políticas públicas se tivessem introduzido no
mundo público nos anos de 1930, somente em 1950, começaram as análises de campos
específicos de políticas públicas. No caso do Brasil, começaram recentemente. E, no que se
refere às análises realizadas, tem-se que são carecedoras de embasamento teórico, uma vez
que o interesse de conhecimento próprio da ‘policy analysis’ é a empiria e a prática política.
Em seu estudo, “Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à
prática da análise de políticas pública no Brasil”, Klaus Frey, defende que a falta de teoria
sobre políticas públicas é explicável, haja vista que é preciso levar em consideração o fato de
que o instrumento analítico-conceitual (deficitário) foi elaborado nos países industrializados e,
portanto, é ajustado às particularidades das democracias mais consolidadas do Ocidente.
Defende, ainda, que é preciso uma adaptação do conjunto de instrumentos da análise de
políticas públicas às condições peculiares das sociedades em desenvolvimento.
A área de políticas públicas contou com quatro grandes fundadores: H. Laswell, H.
Simon, C. Lindblom e D. Easton. Celina Souza (2006, p. 23) apresenta a contribuição de cada
fundador:
Laswell (1936) introduz a expressão policy analysis (análise de política
pública), ainda nos anos 30, como forma de conciliar conhecimento
científico/acadêmico com a produção empírica dos governos e também como
forma de estabelecer o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e
governo.
Simon (1957) introduziu o conceito de racionalidade limitada dos decisores
públicos (policy makers), argumentando, todavia, que a limitação da
racionalidade poderia ser minimizada pelo conhecimento racional [...].
Lindblom (1959; 1979) questionou a ênfase no racionalismo de Laswell e
Simon e propôs a incorporação de outras variáveis à formulação e à análise
de políticas públicas, tais como as relações de poder e a integração entre as
diferentes fases do processo decisório o que não teria necessariamente um
fim ou um princípio [...].
Easton (1965) contribuiu para a área ao definir a política pública como um
sistema, ou seja, como uma relação entre formulação, resultados e o
ambiente [...].
38
Quanto à definição de políticas públicas, não existe uma única, nem melhor
definição. Mead (1995 apud SOUZA, 2006, p. 24) a define como “um campo dentro do
estudo da política que analisa o governo à luz de grandes questões públicas.”
Da mesma forma, Peters (1986 apud SOUZA, 2006, p. 24) define política pública
como “a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e
que influenciam a vida dos cidadãos.”
A definição mais conhecida continua sendo a de Leswell, (1936/1958 apud SOUZA,
2006, p. 24), ou seja, “decisões e análise sobre política pública implicam responder às
seguintes questões: quem ganha o quê, por quê e que diferença faz.”
Para Höfling (2001, p. 01) “políticas públicas são o Estado implantando um projeto
de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade.”
Pode-se, então, resumir política pública como o conjunto de ações do governo, que
pode agir diretamente ou através de delegação, na implantação de programas e ações voltadas
para diversas áreas da sociedade, que produzirão resultados ou mudanças no mundo real.
Muitos foram os modelos de análises de políticas públicas desenvolvidos, dentre os
principais, destacamos: o tipo da política pública e o ciclo da política pública.
No que se refere ao tipo da política pública, tem-se que Lowi citado por Souza
(2006) e Frey (2000, p. 219), elaborou a máxima: “a política pública faz a política”. Através
dessa máxima, Lowi quis dizer que cada tipo de política pública vai encontrar diferentes
formas de apoio e de rejeição e que disputas em torno de sua decisão passam por arenas
diferenciadas. Acreditamos que por esta razão, autores como Frey, denominaram este modelo
de política de “policy arena”.
O modelo da policy arena, refere-se, portanto, no dizer de Frey (2000, p. 223) aos
“processos de conflito e de consenso dentro das diversas áreas de política, as quais podem ser
distinguidas de acordo com seu caráter distributivo, redistributivo, regulatório ou
constitutivo.”
Souza (2006, p. 28) define as políticas distributivas como “decisões tomadas pelo
governo que geram impactos mais individuais do que universais, ao privilegiar certos grupos
sociais ou regiões, em detrimento do todo.” Frey (2000, p. 223) segue a mesma linha:
“políticas distributivas beneficiam um grande número de destinatários, todavia em escala
relativamente pequena.”
As políticas redistributivas, na visão de Souza (2006, p. 28) atingem maior número
de pessoas e impõe perdas concretas e no curto prazo para certos grupos sociais, e ganhos
39
incertos e futuros para outros.” Para Frey (2000, p. 224) estas políticas têm como objetivo “o
desvio e o deslocamento consciente de recursos financeiros.”
Já as políticas regulatórias são definidas por Souza (2006, p. 28) “como mais visíveis
ao público, envolvendo burocracia, políticos e grupos de interesse.” Frey (2000, p. 224) as
define como “políticas que trabalham com ordens e proibições, decretos e portarias.”
Por último, as políticas constitutivas, que no dizer de Souza (2006, p. 28) “lidam com
procedimentos.” E, para Frey (2000, p. 224) “são as políticas que determinam as regras do
jogo e com isso a estrutura dos processos e conflitos políticos.”
O segundo modelo, ou seja, o ciclo da política pública vem descrito por Souza
(2006) como a tipologia que a política pública como um ciclo deliberativo, formado por
vários estágios e constituindo um processo dinâmico e de aprendizado. Acrescenta, que o
ciclo da política pública é constituído dos seguintes estágios: definição de agenda,
identificação das alternativas, avaliação das opções, seleção das opções, implementação e
avaliação. Ainda, o ciclo da política blica vem descrito, em síntese, por Frey (2000) como
uma subdivisão do agir público em fases parciais do processo político-administrativo de
resolução dos problemas.
Importante destacar os elementos principais das diversas definições e modelos sobre
políticas públicas sintetizados por Souza (2006, p. 36):
A política pública permite distinguir entre o que o governo pretende fazer e o
que, de fato, faz.
A política pública envolve vários atores e níveis de decisão, embora seja
materializada através dos governos, e não necessariamente se restringe a
participantes formais, já que os informais são também importantes.
A política pública é abrangente e não se limita a leis e regras.
A política pública é uma ação intencional, com objetivos a serem
alcançados.
A política pública, embora tenha impactos no curto prazo, é uma política de
longo prazo.
Destarte, conhecer um pouco da história, das definições e dos modelos das políticas
públicas se faz necessário para que possamos compreender melhor o mundo das questões
públicas, as atividades do governo que repercutirão na vida dos cidadãos. E, principalmente,
para que possamos acompanhar a constituição das políticas públicas através da tradução dos
propósitos e dos programas eleitorais em planos e ações que efetivamente produzam
resultados reais para a sociedade.
40
2.2 POLÍTICAS SOCIAIS
2.2.1 Políticas sociais: origem e definições
Na verdade, não como indicar um período específico de surgimento das políticas
sociais. Segundo Pierson (1991 apud BEHRING; BOSCHETTI, 2007, p. 47) as políticas
sociais
se gestaram na confluência dos movimentos de ascensão do capitalismo com
a Revolução Industrial, das lutas de classe e do desenvolvimento da
intervenção estatal. Sua origem é comumente relacionada aos movimentos
de massa social-democratas e ao estabelecimento dos Estados-nação na
Europa ocidental do final do século XIX.
No que se refere à generalização das políticas sociais, Behring e Boschetti (2007, p.
47) explicam que se situa “na passagem do capitalismo concorrencial para o monopolista, em
especial na sua fase tardia, após a Segunda Guerra Mundial (pós-1945).” Entretanto, foi a
mobilização e a organização da classe trabalhadora que determinaram a generalização dos
direitos políticos. Assim, de forma gradual, surgiam as políticas sociais nos países, tudo
dependia da pressão exercida pela classe trabalhadora.
No Brasil, “a questão social se colocou como questão política a partir da primeira
década do século XX, com as primeiras lutas de trabalhadores e as primeiras iniciativas de
legislação voltadas ao mundo do trabalho.” (BEHRING; BOSCHETTI, 2007, p. 78).
Conquanto esteja expresso que a questão social no Brasil somente se colocou como
questão política a partir da primeira década do século XX, a história das políticas sociais no
Brasil, não pode ser contada sem incluirmos uma reflexão sobre a trajetória dos movimentos
populares do século XIX, haja vista o fato de que lá estão suas raízes.
O campo das políticas sociais, na colocação de Teixeira (1985), recebe sua melhor
definição quando tratado sob a égide do conceito de cidadania.
Assim, o autor define políticas sociais como aquelas que
tratariam dos planos, programas e medidas necessárias ao reconhecimento,
implementação, exercício e gozo dos direitos sociais reconhecidos em uma
dada sociedade como incluídos na condição de cidadania, gerando uma pauta
de direitos e deveres entre aqueles aos quais se atribui a condição de
cidadãos e seu Estado (TEIXEIRA, 1985, p. 02).
41
A teoria adotada por Teixeira, ou seja, a teoria da cidadania, encontra fundamento no
pensamento de T. H. Marshall que citado por Behring e Boschetti (2007), considera a política
social um elemento central e indissociável da cidadania.
Entretanto, Behring e Boschetti (2007, p. 102) observam que autores como J. M.
Barbalet, criticam o trabalho de T. H. Marshall, por entenderem que inexiste uma teoria da
cidadania. De modo geral, criticam “sua linearidade, sua tentativa de generalização da
experiência inglesa numa suposta teoria da cidadania, e sua explícita subsunção da
desigualdade à cidadania.”
Contudo, inobstante a polêmica acerca da relação entre política social e cidadania,
um estudo acerca das definições das políticas sociais não poderia deixar de abordar suas
diferentes concepções, sob a égide da cidadania ou não.
Para Höfling (2001, p. 02) as políticas sociais “se referem a ações que determinam o
padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, para a
redistribuição dos benefícios sociais visando a diminuição das desigualdades estruturais
produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico.”
Em síntese, as políticas sociais podem ser definidas como ações implementadas pelo
Estado, destinadas a apresentar respostas políticas apropriadas às demandas sociais.
Quanto às medidas de proteção social implementadas pelo Estado através das
políticas sociais, podemos distingui-las em três modalidades: Assistência Social, Seguro
Social e Estado do Bem-Estar Social.
A Assistência Social, segundo Teixeira (1985) inclui o reconhecimento de uma
necessidade, e alguma proposta de aliviá-la. Caracteriza-se por assumir que esta situação de
necessidade decorre de um problema de caráter do necessitado, razão pela qual a assistência é
provida em condições que tentam parcialmente compensar falhas passadas e prevenir contra
falhas futuras.
Na definição prevista na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), Lei 8.742,
de 07 de dezembro de 1993, os objetivos das políticas de assistência social são a proteção à
família, à infância, à adolescência e à velhice; apoio a crianças e adolescentes carentes;
promoção da integração ao mercado de trabalho; habilitação e reabilitação das pessoas
portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; a garantia de um
salário-mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e aos idosos com 70
anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-
la provida por sua família.
42
O Seguro social tem como característica destinar-se à cobertura da população
assalariada com a qual se estabelece uma relação jurídica do tipo contratual: os benefícios são,
em regra, proporcionais a contribuição efetuada, não guardando relação imediata com as
necessidades do beneficiário (TEIXEIRA, 1985).
Por último, o Estado do Bem-Estar Social. Teixeira (1985) observa que esta
modalidade de proteção social rompe com as concepções de proteção social com base na
evidência da necessidade ou do contrato firmado, e propõe uma relação de cidadania plena, na
qual o Estado está obrigado a fornecer a garantia de um mínimo vital a todos os cidadãos, em
relação à saúde, educação, pensão, seguro desemprego, etc..
RIZOTTI (2001) assevera que no Brasil, jamais chegou a ser constituído o Estado de
Bem-Estar Social. Enquanto o welfare state europeu era estruturado, o Estado brasileiro dava
início a um processo de desenvolvimento amplamente apoiado na utilização do fundo público
para a realização dos investimentos essenciais ao desenvolvimento econômico (meios de
transporte, comunicações, indústrias de base e geração de energia, entre outros). Razão pela
qual, o Estado brasileiro obteve uma insuficiente resposta das políticas públicas às questões
sociais.
Com efeito, ao invés de respostas políticas apropriadas às demandas dos movimentos
sociais organizados, as políticas sociais brasileiras caracterizaram-se de modo geral, pela
repressão a tais movimentos. Entretanto, como se pode verificar, analisando a história das
políticas sociais no Brasil, elas são resultado em certa medida, da luta social.
Neste sentido, cabe salientar a colocação de Scholz (2002, p. 599) acerca das
políticas sociais no Brasil:
As políticas sociais no Brasil são historicamente insuficientes diante da
dimensão dos problemas enfrentados pela imensa maioria da população.
Mais compensatórias do que transformadoras, as ações do governo nessa
área atenuam os efeitos sem atacar as raízes da miséria e sem alterar as
estruturas que sustentam o atual quadro de exclusão social. Os programas
oficiais sempre se caracterizaram pela fragmentação, clientelismo,
centralização dos recursos e baixa capacidade redistributiva.
A leitura da questão colocada nos mostra que o desenvolvimento social brasileiro
está longe de ser adequado. É preciso que as ações do governo na área das políticas sociais
esbocem soluções que realmente transformem o mundo real e resultem na diminuição da
desigualdade produzida pelo desenvolvimento socioeconômico,
no sentido da questão
econômica se sobrepor à necessidade de superação das desigualdades sociais, através da
43
flexibilização das relações de trabalho e de postos de trabalho, quando a parcela mais pobre é
quem sofre os efeitos do desemprego.
2.2.2 A história das políticas sociais no Brasil
De acordo com Rizotti (2001, p. 04) os movimentos sociais “que emergiram no
contexto brasileiro do século XIX caracterizaram-se, essencialmente, pela inexistência de
algum projeto político e social que lhes dotasse de unidade histórica quanto às estratégias de
intervenção e à base social na qual se apoiavam.”
Continua Rizotti, lembrando que dentre as principais lutas e movimentos sociais da
época, merecem ser destacados, pela abrangência de sua base social: o movimento da
Cabanagem (1830-1836), porque chegou a instituir um governo local próprio no Pará, ficando
conhecido como o primeiro governo de base índio-camponesa da história do Brasil no período
imperial; a Revolução Farroupilha (1835-1845), porque remetia sua identificação à grande
massa de homens livres pobres que constituíam sua base social; e a Revolução Praieira (1847-
1849), por se tratar de um levante político organizado que agregou elites intelectuais e
políticas e uma importante participação popular na oposição ao governo imperial.
Rizotti (2001, p. 06) registra que esse período “demarcou o momento a partir do qual
as reivindicações populares, expressas nos movimentos sociais, passaram a ser respondidas
através de ações assistenciais que, a despeito de seu caráter pontual, introduziam na pauta
política do país a questão da desigualdade social.”
Entretanto, somente na década de 1930 aconteceriam mudanças importantes no papel
desempenhado pelo Estado brasileiro, passíveis de causarem alterações no campo dos direitos
sociais. Segundo Rizotti (2001) o enfrentamento à questão social havia se tornado,
definitivamente, uma bandeira e uma necessidade do regime pós-revolucionário de 1930.
O estudo de Maria Luiza Amaral Rizotti permite compreender porque as políticas
sociais nascidas no período não surgiriam determinadas diretamente pelas demandas
populares expressas nos movimentos sociais da época, mas encontrariam sua origem na
iniciativa estratégica do Estado. A resposta estaria no fato de que o caminho ao poder traçado
pela nova elite emergente requeria, a ação social do Estado para proporcionar a qualificação
da força de trabalho e o desenvolvimento econômico e social do país e de legitimação política
do governo.
A primeira constituição do país a possuir um capítulo referente à ordem econômica e
social, foi a Constituição Federal de 1934, esta constituição também foi a primeira a prever
44
responsabilidades sociais para o Estado. Entre as novas iniciativas governamentais no campo
das políticas sociais, foi instituída a assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante.
Rizotti (2001, p. 10-11) analisa o resultado da introdução dessas obrigações sociais
no sistema legal e observa:
Se por um lado, a introdução dessas obrigações do poder público no novo
sistema legal indicava um salto de qualidade nos serviços sociais existentes,
expressando novas determinações políticas e ideológicas na relação entre o
Estado e a sociedade civil, por outro as formulações da política social
introduzidas pelo modelo adotado na esfera governamental, além de
manifestamente assistencialistas, eram correntemente utilizadas como
instrumentos de controle e repressão das reivindicações por melhores
condições de vida promovidas por segmentos organizados da classe
trabalhadora.
Assim, embora o novo sistema legal trouxesse inovações na área das políticas
sociais, deixou de oferecer um modelo adequado à organização dessas políticas, em razão da
forma como o governo formulou suas ações, definidas como assistencialistas ou utilizadas
para controlar e reprimir as reivindicações por melhores condições de vida.
Contudo, se comparado às mudanças que ocorreriam com a instalação do Estado
Novo, no ano de 1937, pode-se dizer que o referido sistema legal promoveu conquistas
expressivas para a organização das políticas sociais no país. A nova Carta Constitucional
apresentava grandes retrocessos no que se refere às liberdades políticas e aos direitos sociais.
Rizotti (2001) acrescenta a esta situação, o fato de que o novo panorama político do
país, após a instauração da ditadura varguista, tornava extremamente difícil a sustentação
desses direitos pela via de mobilização popular. Embora não tenham sucumbido por
completo, as manifestações populares foram reprimidas com força cada vez maior, a ponto de
terem suas conseqüências neutralizadas pelo aparelho de Estado.
A década de 1940 foi marcada pelo início de novas linhas de atuação na área por
parte do Estado, a saber: os programas de enfrentamento a pobreza.
O período que se sucedeu ao fim do Estado Novo (1945 e 1964), consigna o
predomínio da política populista, ou seja, de forma genérica, aquela que tem o povo como
fonte principal de inspiração e referência. Segundo Rizotti (2001, p. 12):
as bases dessa política populista encontravam-se estabelecidas desde o
período final do governo Vargas, no qual a conjuntura política internacional
e a emergência de movimentos sociais que contestavam o regime autocrático
no país, colocavam em cheque a continuidade do governo Vargas.
45
Com o fim do Estado Novo, no ano de 1946, foi promulgada uma nova Constituição
Federal. De acordo com Rizotti (2001, p. 13) este novo sistema legal
registrou mudanças no capítulo da Ordem Econômica e Social, acentuando o
papel do Estado no desenvolvimento econômico e atribuindo-lhe a
responsabilidade da justiça social. Seu texto final registrava ainda a
necessidade de conciliação da ordem econômica, devendo esta última
encontrar-se em conformidade com os princípios de justiça social.
E, ainda, restabeleceu os direitos que haviam sido conquistados por conta da
Constituição Federal de 1934.
Entretanto, considerando o fato de que este período foi marcado pela política
populista, os novos direitos sociais prescritos na Constituição de 1946, teriam de ser
implementados neste contexto, o que por sua vez dificultou a sua efetivação. Desta forma, as
alterações trazidas pelo novo texto constitucional proporcionaram apenas pequenas
modificações no âmbito das políticas sociais no país.
Organizações políticas importantes deram origem a uma grande reação política às
reformas propostas, cujo atendimento às suas reivindicações não eram somente no campo das
demandas emergenciais, mas requeria transformações mais consistentes na condição social de
vida.
Importante a explicação de Rizotti (2001) sobre as características dos governos
populistas para compreendermos o porquê da dificuldade na incorporação de reivindicações
populares de maior profundidade:
Ao analisarmos as características fundamentais dos governos populistas,
compreendemos o motivo pelo qual apresentavam esta dificuldade na
incorporação efetiva das reivindicações populares de maior profundidade.
Isto se devia, fundamentalmente, ao fato de que no contexto do populismo, a
ação política institucional orientava-se pela expansão pontual de benefícios
sociais, sem que tal expansão consistisse realmente no reconhecimento de
novos direitos sociais, ou sequer no estabelecimento de políticas duradouras
(RIZOTTI, 2001, p. 15).
Assim, a ausência do Estado no reconhecimento de novos direitos sociais ou no
estabelecimento de políticas duradouras, reforçava o caráter seletivo previsto na história das
políticas sociais, dando causa às reações políticas e, nas palavras da mesma autora “a
organização de um sistema fadado ao insucesso.” (RIZOTTI, 2001, p. 15). Passou-se, então,
ao questionamento do modelo populista de exercício do poder.
46
Inobstante à situação, acrescentou-se à forma de tratamento dado à questão social, o
caráter corporativo da expansão dos direitos sociais no país, retomando uma característica que
já se fazia presente no período do Estado Novo. É exemplo da existência de corporativismo, o
fato de que algumas categorias profissionais passaram a possuir o monopólio de
representação.
Fagnani (1989 apud RIZOTTI, 2001) descreve que neste período, também, a gestão
dos serviços sociais foi reestruturada, desenvolvendo-se um modelo de financiamento das
políticas sociais em contradição com o regime populista, a exemplo: da política
previdenciária. Todavia, ainda havia políticas inteiras que dependiam exclusivamente do
orçamento fiscal, a exemplo: da saúde pública, da educação, da suplementação alimentar e do
transporte de massas.
Não seria necessário dizer que este modelo de financiamento, que atendia a apenas
parte das políticas, associado aos privilégios concedidos a somente algumas categorias
resultaria no enfraquecimento dos direitos sociais.
Segundo Rizotti (2001) em meados da década de 1960, o padrão de constituição das
políticas sociais brasileiras havia incorporado por completo as formas determinantes que
caracterizariam as respostas à questão social no país. Em primeiro lugar, o privativismo, e em
segundo lugar, o caráter seletivo das políticas implementadas, destinadas quase que
exclusivamente aos segmentos sociais incorporados ao mercado de trabalho.
E, a mesma autora, acrescenta que neste mesmo período, o contexto político
brasileiro prenunciava uma era de grandes transformações sociais. Nos mais diversos campos
da vida nacional eclodiam movimentos sociais abrangentes, todavia, os setores conservadores
da sociedade esboçariam uma rápida reação a esses movimentos, o que resultaria na
derrubada do governo constitucional do país, seguido da instauração de um governo ditatorial,
sustentado e regido pelas forças militares nacionais. Chegava ao fim a era dos governos
populistas.
O advento da ditadura militar brasileira transformou por completo a conjuntura
política e social do país, no qual a União implementaria uma forma de gestão centralizada dos
programas sociais em desenvolvimento.
O regime autocrático estabeleceu uma forte repressão a toda espécie de
mobilização popular, relegando as lutas sociais em curso ao plano da
ilegalidade e tornando necessária, para manter em evidência as
reivindicações por melhorias na qualidade de vida da população, a
incorporação da bandeira política de restauração do Estado de Direito no
país (RIZOTTI, 2001, p. 19).
47
Em seu estudo, “A política social no governo FHC e o sistema de proteção social”,
Sônia Draibe (2003), apresenta as características do sistema brasileiro de proteção social,
construído entre 1930 e aproximadamente os anos de 1970. Segundo a autora, o sistema de
proteção social daquele período era um sistema de grandes dimensões e complexidade
organizacional, envolvendo recursos entre 15% e 18% do PIB, integrado por praticamente
todos os programas próprios dos modernos sistemas de proteção social, exceto o seguro-
desemprego, cobrindo grandes clientelas, mas de modo desigual e muitíssimo insuficiente.
A mesma autora continua sua apresentação para observar que do ponto de vista da
relação público-privado, a predominância dos sistemas sociais públicos, tanto os universais
como educação e saúde como os secundários, não impedia, muito pelo contrário, que o setor
privado lucrativo abocanhasse boa parte da provisão social.
No final da década de 1970 o modelo de desenvolvimento instaurado pelo regime
militar daria seus primeiros sinais de esgotamento e, no período de 1977 a 1982, agravaram-se
as condições gerais de vida da população, fazendo ressurgir, agora com força renovada, os
movimentos sociais de reivindicação.
Rizotti (2001) explica como se deu o recuo do governo federal na sua política de
investimentos sociais ante a constatação de que os recursos fiscais seriam insuficientes para
manter as políticas sociais sob sua responsabilidade:
Antevendo os efeitos da crise social dos anos 80, o governo federal já
concluíra, ainda durante a crise do petróleo, que os recursos fiscais de que
disporia seriam por demais precários para a manutenção das políticas sociais
sob sua responsabilidade. Pressionado por um desempenho econômico
aquém do esperado, e pela perspectiva de degradação do quadro econômico
futuro que a conjuntura internacional prenunciava, o governo federal recuou
na sua política de investimentos sociais e em infra-estrutura, passando a
adotar um programa de controle gido do orçamento público. Os efeitos
dessa nova condição financeira seriam rapidamente sentidos no campo das
políticas sociais (RIZOTTI, 2001, p. 23).
Diante desta situação, a questão social voltou a fazer parte da agenda pública da
sociedade brasileira, tornando obrigatório o debate em torno da transição para a democracia,
no qual os benefícios e serviços se converteriam em ‘direitos’ das populações necessitadas.
No dizer de Rizotti (2001, p. 28) “tratava-se de naquele momento se instaurar no país, talvez
pela primeira vez em sua história, uma democracia social.”
O governo da Nova República reconhece a gravidade da questão social e adota as
seguintes medidas:
48
A introdução de agentes políticos autônomos, portadores dos interesses da
classe trabalhadora da sociedade na política brasileira, proporcionou um
rompimento com a tradição de tutela aos movimentos sociais. A
consolidação da ordem democrática e a resposta às demandas sociais
existentes teriam de ser forjadas num único processo de luta política que se
iniciava nos quadros da abertura: confundiam-se mutuamente a luta pela
reforma agrária e a extensão da legislação trabalhista ao campo, a
reorganização das instituições de representação da sociedade civil e a
bandeira da escola pública e gratuita, a criação de conselhos de
representação popular e a edificação do sistema Único de Saúde (RIZOTTI,
2001, p. 28).
Os movimentos sociais continuavam se intensificando, suas reivindicações por novas
políticas sociais, no sentido de superar o caráter seletivo dos serviços públicos, resultariam na
configuração do novo ordenamento constitucional brasileiro.
A saída encontrada pelo governo da Nova República para responder à necessidade de
constituição das bases de uma transição pactuada, foi na colocação de Rizotti (2001, p. 30) “a
proposição de medidas modificadoras das políticas setoriais que, se o eram tidas como
transformadoras do modelo de seguridade social existente, ao menos incorporavam medidas
emergenciais de atendimento às reivindicações sociais mais agudas.”
Rizotti (2001, p. 33) caracteriza sumariamente o governo da Nova República como
o momento no qual se colocaram definitivamente os desafios da universalização,
descentralização e nova hierarquização dos serviços nas políticas sociais brasileiras.”
Lembrando, que a afirmação da responsabilidade governamental na realização das políticas
sociais só viria definitivamente na nova ordem constitucional de 1988.
De uma forma mais específica, Draibe (2003) analisa as reformas adotadas na área
das políticas sociais do país nos períodos de 1980 e 1990. Observa que esses dois momentos
foram marcados por reformas diferentes, seja porque se deram em diferentes ambientes
econômico, político e cultural, seja em razão dos princípios e valores da sua condução. Assim,
referindo-se à década de 1980, como o primeiro ciclo, afirma:
A agenda reformista do primeiro ciclo, como se sabe, é a da democratização.
Processada na primeira fase da Nova República, e simbolicamente encerrada
com a promulgação da Constituição de 1988, ganhou uma tradução
particular no campo das políticas sociais: a reforma do sistema de proteção
sob a dupla chave de democratização e da melhoria da sua eficácia. Em boa
medida, o acerto de contas com o autoritarismo supunha um dado
reordenamento das políticas sociais, o qual respondesse às demandas da
sociedade por maior equidade e pelo alargamento da democracia social.
Também a melhora da eficácia das políticas inscreveu-se naquela agenda,
uma vez que se reconhecia ser já significativo o esforço de gestão que o país
realizava na área social em face de seus medíocres resultados. No plano
institucional, objetivos desse teor sustentaram proposições de
49
descentralização, maior transparência e accountability dos processos
decisórios, acompanhados do reforço da participação social, grandes idéias-
força que fechavam o círculo da democratização do Estado (DRAIBE, 2003,
p. 04).
Logo, as reformas realizadas no primeiro ciclo caracterizado pela democratização, ou
seja, reforma no sistema de proteção, resposta ao autoritarismo, melhora na eficácia das
políticas, descentralização, transparência nos processos decisórios e a participação social,
seriam consagradas pela promulgação da Constituição de 1988. Têm-se como reformas
completas nas áreas sociais deste ciclo: saúde e assistência social; como reformas parciais: a
previdência social; como inovações ou início de mudança: o seguro-desemprego.
No que se refere à década de 1990, ou seja, o segundo ciclo, Draibe (2003, p. 05)
afirma:
[...] o reordenamento da política social proposto no segundo ciclo de
reformas nem partiu do zero nem operou em qualquer vazio social. Essa
verdade de toda e qualquer situação de reforma política aqui tem um
particular significado, o de que o movimento reformador dos anos de 1990
teve de se haver tanto com o legado histórico do sistema de proteção social
como com esse outro legado social, institucional, político e cultural deixado
pelo ciclo democratizante de reformas. Por recentes que fossem as novas”
políticas sociais, suas marcas e caras institucionais estavam, nos anos de
1990, abrigadas nos princípios sob os quais se armaram, em suas regras e
órgãos, muitos ainda em implementação. E, sobretudo , em seu “pessoal”,
nos seus principais atores, entre os quais as suas próprias burocracias e
quadros técnicos dirigentes, mas fundamentalmente as suas clientelas e redes
de apoio, antigas e novas.
A partir dessas considerações, pode-se perceber que o segundo ciclo de reformas
seguiu, basicamente, o legado histórico do sistema de proteção social e o legado social
deixado pelo primeiro ciclo, ou seja, pelo ciclo da democratização. Neste ciclo, ocorreram
reformas parciais: na política de saúde, na política educacional (ensino fundamental) e outra
vez na Previdência Social; inovações ou início de mudança: na educação infantil e no ensino
médio, nos programas de inserção produtiva, e nos de combate à pobreza.
Destarte, embora os dois ciclos tenham acontecido em diferentes ambientes
econômico, político e cultural, cada qual com seus princípios e valores, trazem relação em si,
uma vez que o segundo foi marcado pelas características do primeiro. De qualquer forma,
embora sejam reconhecidos avanços no setor, poucas foram as reformas completas realizadas
na área das políticas sociais durante os dois ciclos.
50
Dos avanços no processo de democratização consagrados pela Constituição Federal
de 1988, destacamos a descentralização, haja vista a expectativa de que esta dinâmica
produziria os mais positivos resultados esperados da ação do Estado. Corrobora Arretche
(2002a, p. 26) ao se referir à descentralização: “esperava-se, produziria eficiência,
participação, transparência, accountability, entre outras atividades esperadas da gestão
pública”. Portanto, era através da descentralização que se pretendia chegar ao sucesso das
reformas realizadas no primeiro e mantidas no segundo ciclo.
2.3 DESCENTRALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS SOCIAIS
Conquanto a descentralização das políticas públicas tenha sido uma das maiores
reivindicações democráticas dos anos 1970 e 1980, seguindo a trajetória do federalismo
brasileiro, verifica-se que somente no final dos anos 1980, com as deliberações da
Constituição Federal de 1988, recuperaram-se as bases federativas suprimidas durante a
ditadura militar, tornando tema importante, à descentralização de políticas públicas,
particularmente, na área das políticas sociais, ou seja, a transferência de gestão de serviços
sociais, saúde, educação fundamental, habitação, saneamento básico e assistência social do
Governo Federal para Estados e Municípios.
Desde então, segundo Arretche (1999), profundas têm sido as mudanças no sistema
de proteção social brasileiro, primeiro, porque a gestão de serviços referentes às políticas
sociais até o início dos anos 1990 era centralizada, em virtude do legado do regime militar,
segundo, em razão da alteração na natureza das relações intergovernamentais.
Em seu estudo, “Políticas sociais no Brasil: descentralização em um Estado
federativo”, Arretche (1999) analisou o processo de descentralização das políticas públicas de
saneamento, habitação, educação assistência social e saúde, nos seguintes estados do Brasil:
Bahia, Ceará, Pernambuco, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, chegando a conclusão de
que a transformação do formato centralizado em descentralizado não pode ser espontânea no
Brasil, ou seja, a descentralização depende de incentivos dos governos estaduais para se
realizar, uma vez que 50.000 habitantes é um parâmetro aceitável para que uma cidade tenha
uma densidade política e econômica que lhe permita assumir a própria gestão de suas políticas
sociais e cerca de 90% dos municípios do país estão abaixo desse parâmetro.
Assim, acrescenta que governos interessados em transferir atribuições de gestão de
políticas públicas devem implementar estratégias bem-sucedidas de indução para obter a
51
adesão dos governos locais (ação política deliberada), a fim de compensar obstáculos à
descentralização derivados daqueles fatores de natureza estrutural (capacidade fiscal e
administrativa e cultura cívica local) ou institucional (legado das políticas prévias, regras
constitucionais e a própria engenharia operacional de cada política social).
Arretche (1999) afirma que no caso brasileiro não é suficiente que a União se retire
de cena para que, por efeito das novas prerrogativas fiscais e políticas de estados e
municípios, estes passem a assumir competências de gestão. Tampouco, basta aumentar as
fontes autônomas de recursos das unidades locais ou transferir recursos de uma maneira geral.
Logo, o escopo da descentralização dependeria diretamente da continuidade no tempo da
implementação de estratégias de indução destinadas a compensar obstáculos derivados da
incapacidade fiscal e/ou administrativa.
Já, em relação à alteração na natureza das relações intergovernamentais, Arretche
(1999, p. 02) lembra que foi um Estado dotado de características que caracterizam um Estado
unitário que consolidou o Sistema Brasileiro de Proteção Social, entretanto, “a redefinição de
competências e atribuições da gestão das políticas sociais tem-se realizado sob as bases
institucionais de um Estado federativo.”
Assim, levando-se em consideração que no Estado federativo, os governos
subnacionais podem aderir, não aderir ou combater certas decisões federais, dada sua
autonomia como entes federativos, pode-se entender a dinâmica do processo de
descentralização.
Na realidade, analisando-se o tempo utilizado para instalação do processo de
descentralização das políticas sociais no Brasil, ou seja, lento até meados dos anos 1990, tem-
se de acordo com Arretche (2000) que os governos locais apresentaram resistência em
assumir a responsabilidade pela gestão das políticas sociais, uma vez que pretendiam
preservar sua autonomia para gastar os recursos recém-adquiridos com a descentralização
fiscal.
Resistência, que segundo a mesma autora, foi sendo quebrada pelas reformas das
políticas sociais realizadas pelo governo Fernando Henrique Cardoso, através da
implementação de um extensivo programa de transferência de função de gestão, que alterou a
distribuição de competências entre os municípios, os estados e o governo federal, como a
desestatização dos serviços habitacionais e de saneamento, a transferência da totalidade dos
serviços de atenção básica para os municípios, e a municipalização da oferta de matrículas no
ensino fundamental.
52
Foram às competências concorrentes as adotadas pelos constituintes de 1987-88 para
a maior parte das políticas sociais brasileiras. Arretche (2004, p. 22) explica que “assim,
qualquer ente federativo estava constitucionalmente autorizado a implementar programas nas
áreas de saúde, educação, assistência social, habitação e saneamento. Simetricamente,
nenhum ente federativo estava constitucionalmente obrigado a implementar programas nestas
áreas”.
Decorre deste fato na avaliação de Arretche (2004) que a Constituição de 1988
descentralizou receita, mas não encargos. Corrobora este entendimento, Falleti (2006, p. 77-
78) ao observar que “embora recursos tenham sido redistribuídos para os governos
subnacionais, as responsabilidades foram amplamente mantidas como competências
concorrentes entre os níveis de governo, sem qualquer regra sobre como essas competências
seriam compartilhadas.”
Esta situação, acerca do não estabelecimento de regras que determinassem como as
competências concorrentes seriam compartilhadas entre os níveis de governo, nos remete à
discussão sobre os efeitos do federalismo nas políticas públicas.
Segundo Arretche (2004, p. 22):
esta distribuição de competências é própria para produzir os efeitos
esperados pela literatura sobre federalismo e políticas públicas: superposição
de ações; desigualdades territoriais na provisão de serviços; e mínimos
denominadores comuns nas políticas nacionais. Estes efeitos, por sua vez,
são derivados dos limites à coordenação nacional das políticas.
Em complemento, Arretche (2004, p. 17) nos mostra como são vistos os Estados
federativos com relação às políticas públicas:
Estados federativos são encarados como propensos a produzir níveis,
comparativamente mais baixos de gastos sociais, bem como menor
abrangência e cobertura dos programas sociais. Tenderiam ainda a tornar
mais difíceis os problemas de coordenação dos objetivos das políticas,
gerando superposição de competências entre os diferentes níveis de governo,
dada a relação negativa entre dispersão da autoridade política e consistência
interna das decisões coletivas.
Já, na avaliação de Bercovici (2004, p. 63) “é a falta de uma política nacional
coordenada, e não a repartição de competências concorrentes e comuns, que faz com que
determinados programas e políticas públicas sejam realizados por mais de uma esfera
governamental e outros por nenhuma.”
53
Quanto ao fato das políticas públicas serem elaboradas e implementadas dentro dos
marcos do sistema federal, o mesmo autor, entende que é essencial que se evite a concepção
racionalista e artificial que vê o federalismo apenas como um problema de organização, tendo
em vista o objetivo da otimização e da eficiência máxima da atuação estatal. Acrescenta que
esta concepção tecnocrática não leva em consideração os processos históricos da evolução e
formação do Estado federal concreto, lembrando que uma federação não visa,
necessariamente, à auto-sustentação financeira e absoluta de todos os seus entes federados,
mas sim, as transferências e trocas das mais diversas naturezas.
De todo modo, é preciso que se clarifique a divisão de competências e se instituam
leis complementares que regulamentem as normas para cooperação entre os entes federados,
numa ampliação da coordenação nacional das políticas, para que se tenha maior abrangência e
eficiência nos programas sociais.
Enfim, a descentralização das políticas sociais deve prescindir de políticas definidas
nacionalmente, um planejamento com a participação de todos os entes federados com o
objetivo do desenvolvimento das condições sociais de vida. Para Arretche (2000 apud
BERCOVICI, 2004, p. 70) este é o aparente paradoxo no processo de descentralização de
políticas sociais no Brasil, ou seja, “o sucesso da descentralização está ligado ao
fortalecimento das capacidades institucionais e administrativas do Governo Federal, que é o
nível de governo que dirige e coordena a implementação das políticas descentralizadas pelo
ente federado.”
Para Arretche (2004), a área de política descentralizada mais avançada no Brasil é a
da saúde, uma vez que apresenta um programa federal deliberado, o Sistema Único de Saúde.
Segundo Falleti (2006, p. 52) na maioria dos países, a educação foi o primeiro setor a
ser descentralizado. “No Brasil, contudo, após o término do Estado desenvolvimentista, a
descentralização dos serviços de saúde precedeu a descentralização dos programas
educacionais e dos recursos.”
Daí a explicação para se ter à saúde como a área de política descentralizada mais
avançada, ou seja, além de apresentar uma ação política deliberada, coordenada, ainda foi o
primeiro setor brasileiro a ser descentralizado, razão pela qual, a princípio, estaria num
processo de descentralização mais complexo, mais evoluído em relação às demais áreas.
54
CAPÍTULO III
O presente capítulo tratará da descentralização da política de saúde, passando pelo
processo histórico que deu origem à construção do SUS, seu processo de regulamentação,
chegando ao PSF e seu Sistema de Informação, utilizado como mecanismo para aprimorar a
organização da Atenção Básica.
3.1 BREVE HISTÓRICO DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL: das origens à
construção do SUS
O nascimento da saúde pública no Brasil, de acordo com Andrade, Pontes e Martins
Junior (2000, p. 01)
deu-se na transição do século XIX para o século XX, no período
compreendido entre o fim da monarquia e o início da “República Velha”.
Configurou-se em um processo de elaboração de normas e organizações
sanitárias e de mudança nas práticas dominantes até então. Ficou conhecido
como “sanitarismo campanhista”, [...].
Em sua obra “Saúde e Democracia: história e perspectivas do SUS” Lima, Gerchman
e Edler (2005) estabelecem uma relação entre a história das políticas de saúde e o processo de
construção do Estado Nacional. Segundo estes autores, as pesquisas realizadas no Brasil
desde a década de 1980
apontam para o fato de as políticas, instituições e idéias mobilizadas em
torno do papel das políticas de saúde na formação das noções de cidadania,
na construção dos Estados nacionais e das burocracias e nas mudanças entre
Estado e sociedade serem constitutivas da formação do Estado Nacional, dos
processos de extensão da cidadania e da imaginação social (LIMA;
GERCHMAN; EDLER, 2005, p. 29).
Até meados do século XIX, os responsáveis pela organização de serviços
assistenciais eram os governos locais ou estaduais, cabia aos Estados a responsabilidade pelas
ações de saúde, saneamento e educação, todavia, a atuação do Estado era pouco efetiva.
Santos Filho (1991 apud KLEBA, 2005) refere que as ações do Estado na época restringiam-
se à vigilância dos navios e à limpeza esporádica das ruas e de lugares públicos como parques
55
e portos. E, Kleba (2005, p. 148) complementa “restringiam-se a programas e ações isoladas,
visando principalmente grandes cidades como o Rio de Janeiro [...]”
Segundo Lima, Gerchman e Edler (2005, p. 32):
[...] As medidas de proteção social e, em particular, a assistência médica
viriam a ter um reconhecimento legal como política pública com a aprovação
da Lei Eloi Chaves de 1923, resultado do crescente impacto do que passou a
ser definido como a questão social do país. Até então, muitas categorias de
trabalhadores organizavam associações de auxílio mútuo para lidar com
problemas de invalidez, doença e morte.
O movimento sanitarista da Primeira República (1889-1930), de acordo com Labra et
al. (1982 apud LIMA; GERCHMAN; EDLER, 2005, p. 30) “foi expressão das mais
marcantes dos projetos nacionalistas e de reforma social que se intensificaram no contexto da
Primeira Guerra Mundial.” Este movimento, segundo os mesmos autores, transformou a
saúde em questão social e política, considerando-a como o grande obstáculo à civilização.
Entre as conquistas do movimento, destacam a criação, em 1920, do Departamento Nacional
de Saúde Pública.
Na definição de Teixeira (1995, p. 39) citado por Kleba (2005, p. 165-166) o
movimento sanitarista
é um processo de mudanças das normas legais e do aparato institucional, os
quais regulam e excetuam a assistência à saúde dos cidadãos. Uma mudança
assim incorre na transferência de poder político a diferentes grupos
populares e lhes dá voz na busca do direito universal à saúde e na construção
de um sistema assistencial adequado.
A partir de 1930, de forma mais específica, a partir de 1934, mudanças significativas
e gradativas começaram a ser efetivadas na esfera institucional da saúde, através de reformas
estatais, entre outras, a associação entre assistência médica previdenciária e trabalhadores
urbanos e uma atenção maior dispensada a saúde da população rural.
Em 1953 foi criado o Ministério da Saúde. O modelo de gestão adotado no Brasil de
acordo com Lima, Gerchman e Edler (2005, p. 44-45) “estabeleceu um padrão de atuação
pública que combinava centralização normativa e descentralização executiva, canalizando
para a instância administrativa estadual o gerenciamento dos serviços públicos de saúde, sob a
orientação do governo central.” Nos anos que se seguiram teve início o questionamento
acerca do formato centralizado de gestão.
56
O período compreendido entre 1945 e 1964, foi marcado pela relação entre saúde e
doença e os problemas do desenvolvimento e da pobreza e a reação do ‘sanitarismo
desenvolvimentista’ ao ‘campanhismo’.
De acordo com Lima, Gerchman e Edler (2005, p. 55) “esse movimento na direção
da descentralização, da horizontalidade, da integração das ações de saúde, da implantação dos
serviços e de articulação da saúde com as reformas sociais foi abortado três meses depois pelo
golpe militar de 31 de março de 1964.”
Durante o período militar a saúde pública foi colocada em segundo plano,
ocasionando graves conseqüências para a qualidade da saúde, bem como a inacessibilidade
dos serviços de saúde à população.
No dizer de Kleba (2005, p. 159) “até meados da década de oitenta, a maior parte da
assistência pública era realizada através de convênios com os serviços privados, que usavam,
muitas vezes, equipamentos adquiridos com subsídios públicos para prestar assistência
particular.”
Embora houvesse muita resistência às mudanças no sistema de saúde, a situação
tornou-se insustentável. A constatação de uma medicina de cunho individual e assistencialista
e a situação caótica da saúde da população resultou no Movimento da Reforma Sanitária que
possibilitou a reforma em fins da década de 70.
O processo de abertura política foi completado pelo último presidente militar,
general João Figueiredo (1979-1985). Para Lima, Gerchman e Edler (2005, p. 73):
A década de 1980 se inicia com um movimento cada vez mais forte de
contestação ao sistema de saúde governamental. As propostas alternativas ao
modelo oficial de atenção à saúde caracterizam-se pelo apelo á
democratização do sistema, com participação popular, a universalização dos
serviços, a defesa do caráter público do sistema de saúde e a
descentralização.
Com o advento da Nova República, em 1986, ocorreu um evento de grande
importância para a saúde brasileira, a VIII Conferência Nacional de Saúde.
Os trabalhos da VIII Conferência Nacional de Saúde serviram de base para discussão
e direcionamento das mudanças que foram impressas ao setor saúde, tanto pelo Executivo, na
implantação do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), em 1987, como pelo
Legislativo, na elaboração da Constituição, em 1988 (MENDES, 1996 apud RIGOBELLO,
2006).
57
Com a promulgação da Constituição Federal Brasileira, em 1988, ficou garantido o
acesso universal, equânime e integral à saúde para todos os cidadãos brasileiros, devendo tal
direito ser garantido pelo Estado.
3.2 A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE PÓS-1988
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 196, institui, expressamente, o direito
à saúde: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem a redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.”
Este direito à saúde, reconhecido pela Constituição, foi regulamentado através da
publicação da chamada “Lei Orgânica da Saúde (LOS)”, que é composta pelas Leis
Complementares 8.080/90 e 8.142/90.
A Lei 8.080/90 disciplina a descentralização político-administrativa do SUS,
detalhando os princípios, diretrizes e aspectos de organização e financiamento do sistema. A
Lei 8.142/90 regulamenta a participação da comunidade no sistema, bem como as
transferências de recursos financeiros entre as três esferas de governo.
Barreto Junior e Silva (2004, p. 07) apresentam as atribuições e competências de
cada nível de governo definidas pela Lei 8.080/90:
[...]. Aos municípios, coube o gerenciamento e execução dos serviços
públicos de saúde, criando os sistemas locais. Aos Estados, coube promover
a descentralização dos serviços e ações de saúde, prestando apoio técnico e
financeiro aos municípios. Apenas supletivamente os Estados executarão
ações e serviços de saúde. Suas atribuições referem-se principalmente, ao
acompanhamento, ao controle e à avaliação das redes hierarquizadas do
SUS, bem como a gestão dos sistemas públicos de alta complexidade, de
referência regional e estadual.
Além destas leis, o Ministério da Saúde, a fim de organizar o SUS, vem utilizando
outros instrumentos normativos, como Portarias e Normas Operacionais Básicas (NOBs). No
dizer de Andrade; Pontes e Martins Junior (2000, p. 02) as NOBs são publicadas com o
objetivo de regular as transferências de recursos financeiros da União para os Estados e
Municípios, o planejamento das ações de saúde e os mecanismos de controle social. Até o
momento foram publicadas três NOBs: 01/91, 01/93 e 01/96.
58
De acordo com Teixeira, Paim e Vilasbôas (1998) citados por Jorge Luiz Rigobello
(2006, p. 21), a NOB 01/91, possuía características “inamspianas”, pelo fato de ainda
conservar a linha de ação daquela instituição, tais como o pagamento por produção de
serviços.
A NOB 01/93, procurou disciplinar a construção do Sistema Único de Saúde, e, ao
contrário da NOB 01/91, sem demonstrar o pagamento por produção. Através dela foi
instituída uma nova forma de relação, retomando a descentralização. A NOB 01/93 definiu as
regras de habilitação estadual e municipal ao SUS. Estabeleceu que a habilitação somente
pode ocorrer por solicitação municipal, a qual pode se dar mediante três formas de adesão: a
gestão incipiente; a gestão parcial; e a gestão semiplena dos serviços. De qualquer forma, os
Municípios deveriam assumir maior responsabilidade.
Com o objetivo de superar as limitações da NOB 01/93, especialmente no que se
refere à descentralização, à gestão e o financiamento, foi publicada a NOB 01/96, na qual
dentre as principais mudanças implementadas estão, segundo Teixeira, Paim e Vilasbôas,
(1998 apud Rigobello, 2006, p. 21):
[...] a redefinição das responsabilidades federais e estaduais em relação à
saúde, a busca, por meio de incentivos, de uma estratégia para mudança no
modelo de saúde vigente, assim como a avaliação de resultados, as
transferências de repasses financeiros regularmente e automaticamente fundo
a fundo, a definição de tetos financeiros para os Estados e Municípios,
criação do Piso da Atenção Básica (PAB) e destinação de incentivos ao
Programa Saúde da Família (PSF).
Esta NOB estabeleceu como uma de suas finalidades prioritárias, a transformação do
modelo de atenção à saúde. Trouxe como tema principal a “Gestão plena com
responsabilidade pela saúde da população”, ampliando as responsabilidades dos municípios.
Para isso criou duas categorias de gestão: a Gestão Plena da Atenção Básica e a Gestão Plena
do Sistema Municipal.
A primeira credencia o gestor municipal para, prioritariamente, elaborar a
programação municipal dos serviços básicos, gerir unidades ambulatoriais
próprias e contratar, controlar, auditar e pagar aos prestadores de serviços,
procedimentos e ações de assistência básica. A segunda propicia ao gestor a
possibilidade de elaborar toda a programação municipal, inclusive a de
prestação de assistência ambulatorial especializada e hospitalar, conferindo
assim aos municípios a ampliação de sua responsabilidade no tocante às
necessidades da população (ANDRADE; PONTES; MARTINS JUNIOR,
2000, p. 03).
59
Ponto importante da presente NOB é a previsão de que os Estados e a União na
gestão do sistema, são sempre corresponsáveis pelo SUS em suas respectivas competências
ou na ausência da função municipal.
Na tentativa de solucionar determinados problemas resultantes da NOB 01/96 e para
reorganizar a atenção regional em sistemas de saúde não necessariamente confinados aos
territórios municipais, o Ministério da Saúde, editou, em 2002, a Norma Operacional de
Assistência à Saúde (NOAS) nº 01/2002. De acordo com Barreto Junior e Silva (2004, p. 10):
seus principais objetivos foram ampliar a responsabilidade dos municípios
na atenção básica; estabelecer a regionalização como estratégia de
hierarquização dos serviços de saúde e de busca de maior equidade; criar
mecanismos para o fortalecimento da capacidade de gestão do SUS e
atualizar critérios de habilitação dos Estados e municípios.
Outra forma de regulamentação do SUS foi a publicação da Portaria 399/GM, de
22 de fevereiro de 2006, na qual restou estabelecido o Pacto pela Saúde 2006. Referida
Portaria prevê a revisão anual do pacto, assumindo o compromisso com base nos princípios
constitucionais do SUS, de buscar a resolução dos problemas de saúde da população,
conforme sua necessidade, com a integração dos seus três componentes essenciais, o Pacto
pela Vida, o Pacto em Defesa do SUS e o Pacto de Gestão do SUS (BRASIL, 2006a).
O Pacto de Gestão do SUS estabelece as responsabilidades de cada ente federado,
buscando assim diminuir as duplicidades de ações, respeitando as iniqüidades e diferenças
regionais, reforçando a territorialização da saúde como base para organização dos sistemas,
estruturando as regiões sanitárias e instituindo colegiados de gestão regional, reiterando a
importância do controle social (BRASIL, 2006a).
As prioridades deste Pacto são:
- Definir a responsabilidade sanitária de cada instância gestora do SUS, superando o
atual processo de habilitação;
- Estabelecer diretrizes para a gestão do SUS, dando ênfase à/ao descentralização,
regionalização, financiamento, programação pactuada integrada, regulação, participação e
controle social, planejamento, gestão do trabalho e educação continuada na saúde (BRASIL,
2006a).
Por fim, restou publicada a Portaria 648/GM/2006, que aprovou a Política Nacional
da Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da
Atenção Básica para o PSF e o PACS. Esta Portaria, estabeleceu que o PSF é estratégia
prioritária do Ministério da Saúde para organizar a Atenção Básica, que tem como um de seus
60
fundamentos possibilitar o acesso universal e contínuo a serviços de saúde de qualidade,
reafirmando os princípios básicos do SUS (BRASIL, 2006b).
Através da regulamentação apresentada, pode-se visualizar em síntese, a trajetória do
sistema de saúde, com previsão na Constituição de 1988, nas leis 8.080/90 e 8.142/90, nas
NOBs 01/91, 01/93 e 01/96, na NOAS 01/2002, da Portaria 399/GM/2006 e da Portaria
648/GM/2006.
3.3 DESCENTRALIZAÇAO DA POLÍTICA DE SAÚDE
No caminho da reestruturação dos serviços de saúde, destaca-se a descentralização,
e, em conseqüência, a transferência de decisões e competências em relação à assistência à
saúde aos níveis estadual e municipal.
A Constituição Federal em seu artigo 198 prevê que as ações e serviços públicos na
área da saúde formam uma rede hierarquizada e regionalizada, constituindo um sistema único.
As diretrizes apresentadas para a referida reestruturação foram regulamentadas através da Lei
8.080/90, e dentre elas, encontra-se a descentralização político-administrativa, que de acordo
com Kleba (2005, p. 173-174) decorre do
repasse de responsabilidades aos gestores locais, possibilitando a
organização do sistema assistencial de forma regionalizada e hierarquizada e
garantindo a distribuição e utilização dos recursos de forma racional,
coordenada e eficiente, bem como o planejamento em critérios
epidemiológicos.
De acordo com Arretche (2003) entre os anos de 1988 e 1993, na Constituição
Federal de 1998, nas leis 8.080/90 e 8.142/90, e na NOB/93, foram estabelecidas as
instituições formais do SUS, que podem ser classificadas em três dimensões, a primeira se
refere à influência do eleitor sobre as decisões dos governantes em um regime democrático, a
segunda diz respeito à natureza das relações entre os níveis de governo e a terceira, às
relações entre governos e sociedade civil.
Cumpre-nos destacar a segunda dimensão da estrutura institucional do SUS, que diz
respeito à natureza das relações entre os veis de governo, salientando, que coube ao
município a responsabilidade de prestar atendimento à população, e à União e aos estados a
cooperação técnica e financeira necessária ao desempenho dessa função. Costa et al. (1999
apud ARRETCHE, 2003, p. 07) explica que “a lei 8.080/90 não apenas reforçou a atribuição
61
municipal de planejamento e execução dos serviços de saúde, como ampliou a função da
União de alocação de recursos e regulação do desempenho das ações municipais e estaduais.”
O processo de descentralização da saúde, não ocorreu de forma homogênea no país.
De acordo com dados do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (NEEP), em seu relatório
do ano 2000, pesquisas permitiram observar “modelos próprios” de descentralização, isto é,
estados e municípios tentando buscar nos recursos locais físicos, financeiros e humanos a
melhor maneira de se adaptar às novas regras (VOGT, 2002).
De acordo com o mesmo autor, os resultados da descentralização também não são
homogêneos e por diversas razões: dimensão continental do país, diferenças regionais e uma
enorme quantidade de municípios existentes, mais de 5000, dos quais a maioria de pequeno
porte.
Andrade, Pontes e Martins Junior (2000, p. 05) corroboram esta assertiva ao
informarem que as diferenças entre os entes federativos é um dos vários problemas do
processo de descentralização, uma vez que dos municípios brasileiros, 40% possuem menos
de 10 mil habitantes, e apenas 0,6% mais de 500 mil.
Um estudo realizado pelo pesquisador, Hudson Pacífico da Silva, do Núcleo de
Estudos de Políticas Públicas (NEPP), da Unicamp citado por Vogt (2002), mostra que nos
últimos doze anos o processo de descentralização da saúde tem apresentado resultados
positivos. Mas devido à heterogeneidade dos estados e municípios brasileiros, muitos não
apresentam condições financeiras e humanas para assumir todos os compromissos requeridos
nesse novo processo.
Se, de um lado, o processo de descentralização apresentou avanços para o sistema de
saúde, de outro lado, existem evidências de que tenha afetado a qualidade dos serviços de
assistência à saúde. Analisando a bibliografia pertinente pode-se perceber que as descrições
dos pontos positivas do processo de descentralização, vêm sempre acompanhados das
referidas evidências.
Esta dualidade vem demonstrada no comentário de Gerschman (apud VOGT, 2002,
p. 02):
Em alguns municípios houve importantes avanços através de iniciativas da
gestão municipal, que injetou recursos próprios e foi além das diretrizes
federais e estaduais. Em outros, observa-se que as implementações de
programas e experiências assistenciais são formuladas exclusivamente no
nível federal e são incorporadas pela gestão municipal, apenas como uma
forma de injetar recursos externos, principalmente federais, no município.
62
Da mesma forma, vem demonstrada na colocação de Costa (2001 apud BARRETO
JUNIOR; SILVA, 2005) no qual considera que o processo de descentralização projetou as
secretarias municipais de saúde na esfera dos governos municipais; ampliou a capacidade de
gestão em razão das novas responsabilidades; aumentou a força de trabalho em saúde
coletiva; e induziu a maior comprometimento de recursos do orçamento municipal com o
setor saúde. De outra forma, admite que ao analisar o processo de descentralização setorial,
existem, mesmo que em pequeno número, evidências de que ela tenha afetado de modo
negativo a qualidade dos serviços, que a municipalização tenha causado negligência de
mecanismos de responsabilização dos governos locais ou mesmo que ela possa ter produzido
uma crise de legitimidade do sistema público de saúde.
E, no dizer de Kleba (2005) a reforma na saúde, descentralizando as decisões e
competências, veio como uma estratégia necessária, visando garantir a racionalização e a
melhoria da assistência. A autora reconhece avanços como a delegação da coordenação do
sistema de saúde local à administração municipal; o financiamento com base em critérios
como população residente; a criação de programas que privilegiam a atenção básica; o
aumento da oferta de serviços conforme as demandas locais. No entanto, assevera que existem
inúmeras deficiências na implementação das medidas de transferência de responsabilidades e
competências para os municípios que muitas vezes superam sua capacidade.
Outra questão que se deve levar em consideração ao se analisar os avanços e as
limitações da descentralização é a regionalização, haja vista que esta questão de acordo com
Souza (2001 apud BARRETO JUNIOR; SILVA, 2005, p. 12) “passa a se destacar no debate
setorial, no final dos anos 90, como possibilidade de promover a descentralização com
equidade no acesso aos serviços”, através de uma “maior articulação entre os sistemas
municipais e de fortalecimento das secretarias estaduais de saúde na sua função reguladora
para assegurar a organização de redes assistenciais regionalizadas, hierarquizadas.”
Merece destaque a referência sobre a questão da regionalização realizada por
Carvalho e Santos (1995) que citados por Kleba (2005) explicam que regionalizar não
significa apenas distribuir os serviços e ações espacialmente, mas também e, sobretudo,
organizá-los com o indispensável suporte técnico e de recursos humanos, com suficiência de
recursos e poder decisório definido. Logo, o êxito da integração entre as três esferas de
governo depende de uma conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e
humanos na prestação de serviços à saúde da população. Concluem que a descentralização
político-administrativa do SUS requer “a interdependência das esferas estatais na formulação,
coordenação, execução, acompanhamento, avaliação, controle e divulgação das ações, dos
63
serviços e do nível de saúde no território nacional.” (CARVALHO; SANTOS, 1995, p. 85
apud KLEBA, 2005, p. 320).
A resposta para esta questão segundo Barreto Junior e Silva (2005) estaria na NOAS
01/2002, que aparece centrada na questão da regionalização e com a revalorização do papel
do gestor estadual.
Falando no papel do Estado na descentralização da saúde, vale lembrar que além da
formulação e orientação de políticas e programas a implementar e implementados,
respectivamente, compete ao Estado, se comprometer com a melhora na qualidade dos
serviços prestados.
Porém, de acordo com Vogt (2002, p. 03) “no processo de descentralização da saúde,
a maioria dos estados ainda é ausente. A grande maioria oferece pouco ou nenhum empenho
na organização ou no desenvolvimento de áreas supramunicipais de saúde, [...]”
É certo que os municípios devem garantir o primeiro nível de atenção à saúde dos
cidadãos e garantir a universalidade de acesso ao SUS, conquanto, também é certo que cabe
ao gestor estadual na visão de Barata et al. (2003 apud BARRETO JUNIOR, 2004) o papel de
avaliar e acompanhar essas atividades, visando a melhoria da qualidade e resolubilidade da
assistência primária desenvolvida pela esfera municipal.
Kleba (2005, p. 322) explica que
embora o município seja designado como o responsável imediato pelo
atendimento das necessidades e demandas de saúde do seu povo e das
exigências saneadoras em seu território, os poderes públicos federal e
estadual são sempre co-responsáveis na promoção e consolidação dos
princípios do SUS.
A mesma autora acrescenta
as normas expedidas pelo governo com a função de regulamentar os papéis
dos diferentes níveis de governo explicitam as responsabilidades dos níveis
nacional e estadual quanto à assessoria técnica e política, e quanto à
execução das tarefas, cuja complexidade e alcance extrapolam a esfera e a
capacidade gerencial do município (KLEBA, 2005, p. 322).
Exemplo da situação referida pode ser a verificada na região Oeste de Santa
Catarina, onde de acordo com Kleba (2005) a concessão de garantia de assistência financiada
pelo Estado a todos os cidadãos, sem distinção quanto a sua posição no mercado de trabalho,
teve como conseqüência imediata um aumento significativo dos usuários do serviço público
daquela região, representando para o poder público local, um aumento considerável dos
64
problemas administrativos, uma vez que as esferas de governo nacional e estadual não deram
o suporte necessário (repasse de recursos financeiros suficientes e assessoria técnica
adequada) para sustentar o processo.
Na realidade, porém, o que se percebia na região do Oeste catarinense,
principalmente na relação entre a esfera estadual e a municipal, era a continuidade da prática
clientelista e paternalista, ou, na maioria dos casos a omissão do Estado em relação aos
municípios (KLEBA, 2005).
Continuando sua análise sobre o papel do Estado na descentralização da saúde Kleba
(2005, p. 328) faz referência às Secretarias Regionais de Saúde apontando:
As Regionais têm sido utilizadas muitas vezes como um instrumento de
negociação política, de acordo com os interesses do partido que está no
poder, inviabilizando a condução de saúde da região. A nomeação dos
coordenadores destas regionais tem seguido essencialmente critérios de
afinidade político-partidária, o que revela o descompromisso do governo
estadual com a construção do SUS. Os coordenadores são geralmente
pessoas externas ao quadro funcional da Secretaria Estadual de Saúde, não
estando, portanto, familiarizados com a dinâmica operacional da instituição,
desconhecendo muitas vezes, a proposta do SUS.
Enfim, embora, na visão de Arretche (2002b) ao longo da cada de 90, o governo
federal tenha sido muito bem-sucedido em transferir para os municípios brasileiros a
responsabilidade pela gestão dos serviços públicos de saúde. E, de Andrade, Pontes e Martins
Junior (2000) o processo de descentralização da saúde tenha sido o eixo condutor da reforma
do Estado no Brasil e em alguns casos represente a sua própria estruturação, é importante
considerar que este processo precisa ser aprimorado, fortalecido, haja vista a constatação entre
outros limites, de um afastamento do Estado no seu real papel no SUS.
Na busca de mecanismos para aprimorar o desenho do modelo assistencial do SUS,
surgiu o PSF, que vem funcionando como uma estratégia de organização da atenção básica e
tem demonstrado resultados satisfatórios.
3.4. O PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA (PSF)
O Ministério da Saúde lançou o PSF em 1994, baseado em experiências de outros
países onde existiram propostas semelhantes, a exemplo de Cuba, local onde o PSF teve
65
origem. Seu objetivo de acordo com Viana e Fonseca (2001 apud SINGER, 2002), é a
reorganização da prática assistencial com a ênfase passando da cura para prevenção.
Ainda, segundo os Cadernos da Atenção Básica do Ministério da Saúde:
[...] o objetivo geral da estratégia Programa Saúde da Família é de contribuir
para a reorientação do modelo assistencial a partir da atenção básica, em
conformidade com os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS),
imprimindo uma nova dinâmica de atuação nas Unidades Básicas de Saúde,
com definição de responsabilidades entre os serviços de saúde e a população
(BRASIL, 2000a).
A adesão dos municípios ao programa foi gradativa, iniciou com poucos municípios,
porém, a adesão foi se espalhando pelos municípios brasileiros e o programa foi se destacando
como estratégia de redesenho do modelo assistencial do SUS.
O PSF é viabilizado através de equipes de saúde, que devem estar aptas para
apresentar respostas às propostas de melhor qualidade na assistência, bem como harmonia no
desenvolvimento das ações.
De acordo com o Ministério da Saúde, a equipe deve ser composta no mínimo por
um médico, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem ou técnico de enfermagem e de até
dez agentes comunitários de saúde e deve se responsabilizar por um número de até 1.000
famílias, com um limite de até 4.500 pessoas cadastradas na área de abrangência da unidade
de saúde da família (BRASIL, 2000b).
O número de 4.500 habitantes correspondia a, aproximadamente, 1.000 famílias, o
mesmo foi instituído tendo como base os dados do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) de 1991 que indicavam 4,5 habitantes por família.
No ano de 2000 os dados do IBGE passaram a indicar que a média de habitantes por
família é de 3,4 habitantes/casa. E, a partir daquele ano, o Ministério da Saúde tem
considerado como média, 3.450 habitantes por equipe.
A Portaria 648/2006, além das características do processo de trabalho das equipes
de Atenção Básica, prevê que são características do processo de trabalho da Saúde da Família:
I – manter atualizado o cadastramento das famílias e dos indivíduos e
utilizar, de forma sistemática, os dados para a análise da situação de saúde
considerando as características sociais, econômicas, culturais, demográficas
e epistemológicas do território;
II Definição precisa do território de atuação, mapeamento e
reconhecimento da área adstrita, que compreenda o segmento populacional
determinado, com atualização contínua;
66
III – diagnóstico, programação e implementação das atividades, segundo
critérios de riscos à saúde, priorizando os problemas da saúde mais
freqüentes;
IV Prática do cuidado familiar ampliado, efetivada por meio do
conhecimento da estrutura e da funcionalidade das famílias que visa propor
intervenções que influenciem os processos de saúde-doença dos indivíduos,
das famílias e da própria comunidade;
V Trabalho interdisciplinar e em equipe, integrando áreas técnicas e
profissionais de diferentes formações;
VI Promoção e desenvolvimento de ações intersetoriais, buscando
parcerias e integrando projetos sociais e setores afins, voltados para a
promoção da saúde, de acordo com prioridades e sob coordenação da gestão
Municipal;
VII Valorização dos diversos saberes e práticas na perspectiva de uma
abordagem integral e resolutiva, possibilitando a criação de vínculos de
confiança com ética, compromisso e respeito;
VIII – Promoção e estímulo à participação da comunidade no controle
social, no planejamento, na execução e na avaliação das ações; e
IX Acompanhamento e avaliação sistemática das ações implementadas,
visando à readequação do processo de trabalho (BRASIL, 2006).
O que se espera das equipes é que elas se destaquem do modelo clínico, de
autonomia médica, para uma relação aonde outros saberes sobre o processo saúde e doença
possam ser articulados. Esta articulação deve ser reafirmada como uma possibilidade de
auxílio à transformação do modelo assistencial.
Outro ponto importante contemplado pela Portaria 648/2006, foi a redefinição das
responsabilidades de cada nível de governo no PSF, na seguinte forma:
Compete às Secretarias Municiais de Saúde e ao Distrito Federal:
I – inserir a estratégia de Saúde da Família em sua rede de serviços visando à
organização do sistema local de saúde;
II – definir, no Plano de Saúde, as características, os objetivos, as metas e os
mecanismos de acompanhamento da estratégia Saúde da Família;
III garantir infra-estrutura necessária ao funcionamento das equipes de
Saúde da Família, de Saúde Bucal e das unidades básicas de referência dos
Agentes Comunitários de Saúde, dotando-as de recursos materiais,
equipamentos e insumos suficientes para o conjunto de ações propostas;
IV assegurar o cumprimento de horário integral jornada de 40 horas
semanais – de todos os profissionais na equipe de saúde da família, de saúde
bucal e de agentes comunitários de saúde, com exceção daqueles que devem
dedicar ao menos 32 horas de sua carga horária para atividades na equipe de
SF e até 8 horas do total de sua carga horária para atividades de residência
multiprofissional e/ou de medicina de família e de comunidade, ou trabalho
em hospitais de pequeno porte, conforme regulação específica da Política
Nacional dos Hospitais de Pequeno Porte;
V realizar e manter atualizado o cadastro dos ACS, dos enfermeiros da
equipe PACS e dos profissionais das equipes de Saúde da Família e de
Saúde Bucal, bem como da população residente na área de abrangência das
67
equipes de Saúde da Família, de Saúde Bucal e ACS, nos sistemas Nacionais
de Informação em Saúde definidos para esse fim; e
VI estimular e viabilizar a capacitação específica dos profissionais das
equipes de Saúde da Família.
Compete às Secretarias Estaduais de Saúde:
I pactuar com a Comissão Intergestores Bipartite estratégias, diretrizes e
normas de implementação e gestão da Saúde da Família no Estado, mantidos
os princípios gerais regulamentados nesta Portaria;
II – estabelecer no Plano de Saúde estadual metas e prioridades para a saúde
da Família;
III submeter à Comissão Intergestores Bipartite (CIB), no prazo máximo
de 30 dias após a data do protocolo de entrada do processo, a proposta de
implantação ou expansão de ESF, ESB, e ACS elaborada pelos municípios e
aprovada pelos Conselhos de Saúde dos municípios;
IV – submeter à CIB, para resolução, o fluxo de acompanhamento do
cadastramento dos profissionais das Equipes de Saúde da Família, de Saúde
Bucal e ACS nos sistemas de informação nacionais, definidos para esse fim;
V submeter à CIB, para resolução, o fluxo de descredenciamento e/ou o
bloqueio de recursos diante de irregularidades constatadas na implantação e
nos funcionamentos das Equipes de Saúde da Família, de Saúde Bucal e
ACS, a ser publicado como portaria de resolução da CIB, visando à
regularização das equipes que atuam de forma inadequada;
VI analisar e consolidar as informações enviadas pelos municípios,
referentes à implantação e ao funcionamento das Equipes de Saúde da
Família, de Saúde Bucal e ACS;
VII enviar, mensalmente, ao Ministério da Saúde o consolidado das
informações encaminhadas pelos municípios, autorizando a transferência dos
incentivos financeiros federais aos municípios;
VIII – responsabilizar-se perante o Ministério da Saúde pelo monitoramento,
o controle e a avaliação da utilização dos recursos de incentivo da Saúde da
Família transferidos aos municípios no território estadual;
IX prestar assessoria técnica aos municípios no processo de implantação e
ampliação da SF;
X articular com as instituições formadoras de recursos humanos do estado
estratégias de expansão e qualificação de cursos de pós-graduação,
residências médicas e multiprofissionais em Saúde da família e educação
permanente, de acordo com demandas e necessidades identificadas nos
municípios e pactuadas nas CIBs; e
XI – acompanhar, monitorar e avaliar o desenvolvimento da estratégia Saúde
da Família nos municípios, identificando situações em desacordo com a
regulamentação, garantindo suporte às adequações necessárias e divulgando
os resultados alcançados.
Compete ao Distrito Federal:
I estabelecer, no Plano de Saúde do distrito Federal, metas e prioridades
para a Saúde da Família;
II – analisar e consolidar as informações referentes à implantação e ao
funcionamento das equipes de Saúde da Família, de Saúde Bucal e ACS;
68
III responsabilizar-se junto ao Ministério da Saúde pelo monitoramento, o
controle e a avaliação da utilização dos recursos de incentivo da Saúde da
Família transferidos ao Distrito Federal; e
IV – acompanhar, monitorar e avaliar o desenvolvimento da estratégia Saúde
da Família no Distrito Federal, identificando e adequando situações em
desacordo com a regulamentação e divulgando os resultados alcançados.
Compete ao Ministério da Saúde:
I definir e rever, de forma pactuada, na Comissão Intergestores Tripartite,
as diretrizes e as normas da Saúde da Família;
II garantir fontes de recursos federais para compor o financiamento da
Atenção Básica organizada por meio da estratégia Saúde da Família;
III apoiar a articulação de instituições, em parceria com Secretarias de
Saúde Estaduais, Municipais e do Distrito Federal, para capacitação e
garantia de educação permanente específica aos profissionais da Saúde da
Família;
IV articular com o Ministério da Educação estratégias de expansão e de
qualificação de cursos de pós-graduação, residências médicas e
multiprofissionais em Saúde da Família e em educação permanente;
V – analisar dados de interesse nacional relacionados com a estratégia Saúde
da Família, gerados pelos sistemas de informação em saúde, divulgando os
recursos obtidos; e
VI para a análise de indicadores, de índices de valorização de resultados e
de outros parâmetros, o lculo da cobertura populacional pelas ESF, ESB e
ACS será realizado a partir da população cadastrada no sistema de
informação vigente.
Conquanto as responsabilidades de cada esfera de governo no PSF tenham sido
redefinidas com a publicação da Portaria 648/2006, o que se observa é que entre outras, a
responsabilidade pela avaliação do desenvolvimento e do desempenho do Programa, manteve-
se conjunta entre as esferas.
Esta manutenção, certamente, decorre do fato de que o PSF funcionará bem num
sistema integrado de serviços de saúde, que envolva ações coordenadas nos três veis de
governo, porque, no dizer de Mendes (2002, p. 54) “se a oferta dos serviços de atenção
primária é de responsabilidade inequívoca dos municípios, as condições para que essa oferta
se dê, com oportunidade e com qualidade, deve ser compartilhada pelos governos federal,
estaduais e municipais.”
O PSF tem demonstrado resultados positivos, entretanto, é preciso que se atente para
os obstáculos à sua implantação. Em sua obra, “A atenção primária à saúde no SUS”, Eugênio
Vilaça Mendes (2002), relaciona alguns desses obstáculos: deficiência na compreensão do
PSF como uma estratégia de organização do sistema de serviços de saúde, fragilidade
institucional do SUS para dar conta do processo de condução da implantação do PSF, falta da
69
continuidade da atenção à saúde, excessiva utilização do PSF na atenção às condições agudas,
infra-estrutura inadequada das unidades básicas de saúde, deficiências do sistema de apoio
diagnóstico, deficiência de medicamentos essenciais para a atenção primária à saúde,
profissionais de saúde não adequados em quantidade e qualidade à estratégia do PSF,
obstáculos relativos ao trabalho das equipes e o subfinanciamento do PSF.
Evidencia, ainda, obstáculo à efetiva implantação do SUS, as constatações do
Relatório de Gestão, publicado em 2004, pelo Departamento Nacional de Auditoria do
Sistema Único de Saúde (DENASUS), aonde restou demonstrado que no exercício de 2003,
este departamento, executou ações de auditoria em todos os Estados da Federação. Nestas
auditorias, foram constatadas várias não conformidades. No caso do PSF, cumpre-nos
destacar como constatações mais relevantes e/ou freqüentes (BRASIL, 2004):
I não acompanhamento, controle e supervisão sistemática e continuada pela
coordenação estadual do PSF;
II inexistência de supervisão por parte das coordenações estaduais do Programa
junto às equipes do PSF do município;
As constatações apresentadas mostram que ainda muito para aprimorar. Como
vimos, mister o envolvimento dos três níveis de governo na superação destes obstáculos.
3.4.1 Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB)
O Ministério da Saúde, através do DATASUS, em 1998, criou um sistema especial
de informação, o SIAB, devido à necessidade de gerenciamento das informações obtidas nas
visitas às comunidades.
Segundo o Manual do SIAB, ele produz relatórios que auxiliarão as próprias equipes,
as unidades básicas de saúde às quais estão ligadas e os gestores municipais a acompanharem
o trabalho e avaliarem a sua qualidade. E, permitem, através do conhecimento da realidade da
população, a readequação dos serviços sempre que necessário (BRASIL, 1998).
O SIAB tem também o papel de fiscalizador do desenvolvimento das ações, uma vez
que para o recebimento do incentivo, as equipes devem informar mensalmente a produção das
ações realizadas no Município, sob pena de ser bloqueado o repasse de recursos financeiros,
que é destinado da União para o Município através do PAB. Saliente-se aqui, a possibilidade
do controle realizado limitar-se à punição, restando esclarecer: A quem se destina a referida
70
punição? Ao Município por deixar de receber o recurso ou ao cidadão que depende do serviço
de saúde?
Embora o SIAB possa ser operacionalizado de maneira manual e/ou informatizada, o
Manual do SIAB, determina que ele deve ser informatizado, bastando que o Município
procure o DATASUS ou a Coordenação Estadual do Programa de Agentes Comunitários de
Saúde/Programa Saúde da Família (PACS/PSF), para instalar, gratuitamente, o programa.
As informações processadas pelo SIAB sobre a população visitada e/ou atendida são
recolhidas em fichas de cadastramento e acompanhamento, e analisadas a partir de relatórios
de consolidação de dados (BRASIL, 1998, p. 08). São instrumentos de coleta de dados
utilizados pelas equipes:
- Ficha A - Cadastramento Familiar;
- Ficha B-GES - Acompanhamento de Gestante;
- Ficha B-HA - Acompanhamento de Hipertensos;
- Ficha B-DIA - Acompanhamento de Diabéticos;
- Ficha B-TB - Acompanhamento de pacientes com Tuberculose;
- Ficha B-HAN - Acompanhamento de pacientes com Hanseníase;
- Ficha C - Acompanhamento de Crianças;
- Ficha D – Registro de atividades, procedimentos e notificações.
Com exceção da Ficha D, todas as outras fichas são preenchidas pelo Agente
Comunitário de Saúde, em razão da visita domiciliar mensal, devidamente supervisionado
pelo enfermeiro.
A ficha A é preenchida nas primeiras visitas que o ACS faz às famílias de sua
comunidade, devendo ser atualizada sempre que ocorrerem alterações nos dados previamente
registrados. Deve ser preenchida uma ficha por família. Através do preenchimento desta ficha,
as equipes podem conhecer as condições de vida das pessoas e melhor planejar suas
intervenções.
As fichas do grupo B (B-GES, B-HA, B-DIA, B-TB e B-HAN), devem ser utilizadas
para monitoramento de pessoas que necessitem de um acompanhamento mais sistemático, são
grupos prioritários para monitoramento. Devem ser atualizadas mensalmente.
A ficha C refere-se ao Cartão da Criança e deve ser verificada, mensalmente, pelo
Agente Comunitário de Saúde, que observará a vacinação, o desenvolvimento da criança e
suas intercorrências.
A ficha D é utilizada por todos os profissionais das equipes, possui campos
específicos para cada categoria profissional, todavia, alguns destes campos são comuns a mais
71
de uma categoria. Os registros dessa ficha devem ser anotados mensalmente, com o devido
fechamento no final de cada mês.
Além dos instrumentos utilizados para coleta de dados, as equipes utilizam
instrumentos de consolidação de dados:
- Relatórios A1, A2, A3 e A4 - Relatórios de consolidado anual das famílias
cadastradas;
- Relatórios SSA2 e SSA4 - Relatório de situação de saúde e acompanhamento das
famílias;
- Relatórios PMA2 e PMA4 – Relatórios de produção e marcadores para avaliação.
Os relatórios A1, A2, A3 e A4 têm por objetivo consolidar os dados das famílias
cadastradas, através da utilização das informações previstas na ficha A. Estes relatórios
devem ser preenchidos apenas nos Municípios onde o sistema ainda não está informatizado.
Os relatórios SSA2 e SSA4 têm o objetivo de consolidar as informações sobre a
situação de saúde das famílias acompanhadas em cada área. Os dados para preenchimento do
relatório SSA2 são os provenientes das fichas A, B, C e D. De outra forma, o relatório SSA4
deve ser utilizado somente onde o sistema de informação não estiver informatizado. O
preenchimento destes relatórios deve ser feito por profissional de nível superior da equipe.
Os relatórios PMA2 e PMA4 destinam-se a consolidar mensalmente os dados
referentes à produção de serviços e a ocorrência de doenças e/ou situações consideradas como
marcadoras, por área. Os dados para preenchimento do relatório PMA2 são os provenientes da
ficha D e do relatório SSA2. No que se refere ao relatório PMA4, deve ser preenchido apenas
nos municípios onde o sistema não esteja informatizado. O preenchimento destes relatórios
deve ser feito por profissional de nível superior da equipe.
De acordo com Silva e Laprega (2005, p. 821):
Com a consolidação do SUS, houve a necessidade de uma melhor
estruturação dos Sistemas de Informação em Saúde (SIS), para que os
mesmos seguissem a lógica do acompanhamento integral pregada pelo novo
sistema de saúde, assegurando a avaliação permanente da situação de saúde
da população e dos resultados das ações executadas, [...].
Os mesmos autores acrescentam que “desta forma, os municípios passaram a ser
responsáveis pela produção, organização e coordenação das informações em saúde, devendo
deixar de lado o mero papel de coletor e repassador de dados”. Silva e Laprega (2005, p. 821)
Moraes e Tasca et al. (1994;1995 apud SILVA; LAPREGA, 2005, p. 822)
relacionam as características do SIS em funcionamento no Brasil, cumprindo-nos destacar: “a
72
ausência de mecanismos de avaliação e controle da qualidade dos dados produzidos.”
Segundo estes autores, a presença desta característica entre outras, é a razão para a ocorrência
apenas da descentralização da digitação, processamento e acesso aos dados.
Conquanto, considerando que o SIAB representa uma fonte de dados de grande
valor, uma vez que serve para acompanhar o trabalho do PSF e avaliar a sua qualidade, deve-
se buscar a adequação do sistema, que, atualmente, se enquadra nas características dos outros
SIS, a fim de aumentar a sua importância na democratização do SUS.
73
CAPÍTULO IV
Este capítulo tratará do exercício da avaliação. Inicia apresentando as definições e
classificações da avaliação. Mais adiante, discute a diferença entre monitoramento e
avaliação. Por fim, trata da avaliação das políticas públicas no âmbito das políticas sociais e
da avaliação das políticas de saúde no âmbito da política setorial da saúde, denominado PSF.
4.1 AVALIAÇÃO
4.1.1 Avaliação e suas definições
Em termos da concepção, etimologicamente, na definição de Silva (2001, p. 48) o
termo avaliação significa “valor, esforço de apreciar efeitos reais, determinando o que é bom
ou ruim.”
Ao conceber a avaliação como sistemática, Silva (2001) afirma que esta tem sua
identidade sustentada por se propor a responder a determinadas questões básicas. Desta
forma, uma vez que esta observação atravessa a questão conceitual, cumpre-nos destacar em
primeiro: Por que avaliar?
Refere-se ao mérito da avaliação, cuja questão central é saber por que lutar
tão arduamente para produzir informações sobre programas e políticas
sociais. As motivações para que se proceda avaliação de políticas e
programas sociais são de diferentes ordens: de ordem moral, que se refere á
exigência de probidade dos gestores na gestão do programa e, dos usuários
na apropriação dos benefícios; de ordem política, que se refere a verificação
dos propósitos da política ou programa em relação aos princípios de justiça
minimamente aceitos bem como a possibilidade de as avaliações
contribuírem para o controle social dos programas sociais e servirem de
instrumento de pressão social sobre o estado; de ordem instrumental, que se
relaciona com a geração de informações para monitorar o programa; de
ordem técnica, referindo-se à possibilidade de a avaliação contribuir para
clarificação do problema social que motivou o programa, tendo em vista a
construção de um referencial comum; para sistematização da prática em
desenvolvimento; para correção, melhoria e avanço técnico do programa
para melhor servir à população alvo e para identificação de resultados e
impactos; de ordem econômica, tendo em vista a racionalização e melhor
aplicação de recursos (SILVA, 2001, p. 51).
74
E, cumpre-nos destacar em segundo, porém, sem ordem de preferência: Para que
avaliar?
Os objetivos da avaliação são de diferentes ordens, podendo visar limites de
uma ação; identificar mudanças, potencialidades, problemas, organizar
informações; subsidiar tomadas de decisões etc. Recusa-se aqui a avaliação
com mero propósito de controle, de fiscalização de amedrontamento e
destaca-se o compromisso com valores éticos e com a não neutralidade, o
que reafirma a perspectiva de mudança da política, com alteração da prática
imediata dos programas sociais na direção desejada, tendo como referência
as demandas sociais (SILVA, 2001, p. 51-52).
Portanto, avalia-se um programa para através do mérito e do motivo da avaliação,
que pode ser de ordem moral, política, instrumental e técnica, buscar a melhoria do programa
e do serviço prestado à população alvo, através da identificação dos resultados e de uma
melhor aplicação dos recursos. Da mesma forma, avalia-se um programa para visar seus
limites, mudanças, potencialidades e problemas, com vistas a subsidiar o processo de tomada
de decisões sem caracterizar um mero controle, mas a mudança na direção desejada.
Voltando à definição de avaliação temos que:
A avaliação é uma forma de pesquisa social aplicada, sistemática, planejada
e dirigida; destinada a identificar, obter e proporcionar de maneira válida e
confiável dados e informação suficiente e relevante para apoiar um juízo
sobre o mérito e o valor dos diferentes componentes de um programa (tanto
na fase de diagnóstico, programação ou execução), ou de um conjunto de
atividades específicas que se realizam, foram realizadas ou se realizarão,
com o propósito de produzir efeitos e resultados concretos; comprovando a
extensão e o grau em que se deram essas conquistas de forma tal que sirva de
base ou guia para uma tomada de decisões racional e inteligentes entre
cursos de ação, ou para solucionar problemas e promover o conhecimento e
a compreensão dos fatores associados ao êxito ou ao fracasso de seus
resultados (AGUILAR, 1994 apud ROCHA, 2003, p. 08).
Alternativamente, avaliar para Werneck (1996 apud GARCIA, 2001, p. 26):
[...] não significa apenas medir, mas, antes de mais nada, julgar a partir de
um referencial de valores. É estabelecer, a partir de uma percepção
intersubjetiva e valorativa, com base nas melhores medições objetivas, o
confronto entre a situação atual com a ideal, o possível afastamento dos
objetivos propostos, das metas a alcançar, de maneira a permitir a constante
e rápida correção de rumos, com economia de esforços (de recursos) e de
tempo. Sua função não é necessariamente punitiva, nem de mera constatação
diletante, mas a de verificar em que medida os objetivos propostos estão
sendo atingidos para tomar a melhor decisão subseqüente e agir com a
máxima oportunidade.
75
A avaliação foi definida também como
o processo orientado a determinar a sistemática e objetivamente a
pertinência, eficiência, eficácia e impacto de todas as atividades à luz de seus
objetivos. Trata-se de um processo organizativo para melhorar as atividades
ainda em marcha e ajudar a administração no planejamento, programação e
futuras tomadas de decisões (ONU, 1984 apud COHEN e FRANCO, 1993,
p. 76).
Como vimos, a avaliação possui duas diferentes concepções, eis que integra tanto a
vida cotidiana quanto a vida profissional. Vista como um julgamento no campo profissional, a
avaliação é definida, em síntese, como o ato de coletar e promover informações de forma
sistemática para possibilitar a tomada de decisão na busca dos objetivos específicos.
4.1.2 Avaliação e suas classificações
Browen e Wildavsk (1984 apud SILVA, 2001, p. 59) também apresentam uma ampla
classificação, tomando como critério o conteúdo ou objeto da avaliação, cumprindo-nos
destacar o tipo quase-avaliação (quase-evaluation):
O foco dessa avaliação é limitado e tangencial, direciona-se a determinadas
questões de mérito referentes ao processo (quantas pessoas o programa
atende? como saber se serve a estas pessoas?) ou aos resultados (como os
resultados ocorrem? como são distribuídos), sendo ignoradas as variáveis
contextuais que afetam a implementação, portanto, nem sempre permitindo
formular um juízo valorativo.
A avaliação de políticas públicas costuma, ainda, ser distinguida em termos de sua
efetividade, eficácia e eficiência, distinção esta que é no dizer de Arretche (2001) basicamente
um recurso analítico destinado a separar aspectos distintos dos objetivos e, por conseqüência,
da abordagem e dos métodos e técnicas de avaliação.
Destarte, por avaliação de efetividade, entende-se o exame da relação entre a
implementação de um determinado programa e seus impactos e/ou resultados, isto é, seu
sucesso ou fracasso em termos de uma efetiva mudança nas condições sociais prévias da vida
das populações atingidas pelo programa sob avaliação (FIGUEIREDO & FIGUEIREDO,
1986 apud ARRETCHE, 2001).
Arretche (2001, p. 32) acrescenta que nas avaliações de efetividade, a maior
dificuldade metodológica consiste precisamente em revelar que os resultados encontrados
76
(sejam eles no sentido do sucesso ou do fracasso) “estão causalmente relacionados aos
produtos oferecidos por uma dada política sob análise. Por esta razão, estudos confiáveis
sobre efetividade dos programas são muito difíceis, e mesmo raros.” Esclarece que, na
verdade, “a tradição brasileira em políticas públicas (se é que podemos afirmar que já exista
entre nós uma tradição nesta área) é bastante pobre em termos de estudos de avaliação da
efetividade das políticas.” (ARRETCHE, 2001, p. 32).
Por avaliação de eficácia, entende-se a avaliação da relação entre os objetivos e
instrumentos explícitos de um dado programa e seus resultados efetivos (FIGUEIREDO &
FIGUEIREDO, 1986 apud ARRETCHE, 2001, p. 34). Eficácia é definida também como “o
grau em que se atinge os objetivos e as metas de uma ação orientada para um alvo particular,
em um determinado período de tempo, independente dos custos nos quais se incorra” Garcia
(2001, p. 37).
De acordo com Arretche (2001, p. 34) a avaliação de eficácia é
seguramente a mais usualmente aplicada nas avaliações correntes de
políticas públicas. Isso porque ela é certamente aquela mais factível e menos
custosa de ser realizada. [...]. Nesse tipo de avaliação, a maior dificuldade
consiste na obtenção e confiabilidade das informações obtidas.
Por avaliação de eficiência, entende-se a avaliação da relação entre o esforço
empregado na implementação de uma dada política e os resultados alcançados
(FIGUEIREDO & FIGUEIREDO, 1986 apud ARRETCHE, 2001, p. 34). Eficiência é
definida também como “a relação existente entre os produtos resultantes da realização de uma
ação governamental programada e os custos incorridos diretamente em sua execução.”
(GARCIA, 2001, p. 38).
Por fim, classifica-se a avaliação no que se refere às diferenças metodológicas
inerentes a avaliações que tratam do impacto de programas e processos desenvolvidos pelos
mesmos.
No dizer de Peres (1998 apud ROCHA, 2003, p. 08)
enquanto a avaliação de impacto diz respeito aos efeitos do programa sobre a
população alvo, a avaliação de processo representa chances de monitoração
das etapas responsáveis pela produção do efeito esperado, e da própria
dinâmica do curso das decisões e atividades-meio, sendo esta uma
perspectiva bastante promissora.
De acordo com Lobo (2001) no caso de programas sociais a avaliação de impacto
pode sofrer limitações que são próprias da natureza dos problemas a enfrentar. Uma delas é a
77
questão dos efeitos produzidos pela intervenção governamental. Outra é à capacidade
explicativa de um único tipo de intervenção propiciada por determinado programa, para
justificar alguma mudança na situação a ser equacionada.
Em se tratando de processos, na análise da mesma autora, “a avaliação se estrutura
de forma que privilegie análises qualitativas. A idéia de processo supõe variações político-
institucionais num continuum de tempo e espaço. [...]” (LOBO, 2001, p. 80).
Da mesma forma que a avaliação de impacto, a avaliação de processo também
apresenta limitações, Lobo (2001) refere-as destacando as inevitáveis variações em
circunstâncias específicas, dentro de um mesmo programa, como a localização espacial, o
tamanho das localidades, a capacidade institucional de resposta dos agentes executores, o
ambiente político no qual se desenrolam as atividades previstas; as generalizações feitas a
partir de avaliações fragmentadas e que não obedecem a uma estratégia pré-definida; e alguns
problemas institucionais que afetam a implementação de programas sociais e que
inevitavelmente terão impacto sobre a avaliação, como a descontinuidade político-
administrativa.
Conquanto, o que se observa é que atualmente vem se desenvolvendo a idéia de que
uma política, ou um programa deva ser acompanhado por pesquisas específicas, através do
monitoramento constante do processo de implementação.
4.2 MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO
O monitoramento ou acompanhamento deve ser diferenciado da avaliação, oportuno,
porque atividades de monitoramento costumam ser consideradas atividades de avaliação. Em
decorrência, de acordo com Faria (2001, p. 47) “a correção ad-hoc dos rumos de um plano
acaba sendo considerada como atividades de aprimoramento do próprio programa, mesmo
quando não ocorrem modificações de conteúdo, metodologia e adequação.”
Assim, enquanto o monitoramento é uma atividade gerencial interna que se realiza
durante o período de execução e operação, a avaliação pode ser realizada tanto antes ou
durante a implementação como ao concluir a mesma ou mesmo algum tempo depois, para
quando se prevê que o projeto provocou todo o seu impacto (COHEN e FRANCO, 1993).
Monitoramento, na definição da ONU (1984 apud COHEN e FRANCO, 1993, p. 77)
é o:
78
[...] exame contínuo ou periódico efetuado pela administração, em todos os
seus níveis hierárquicos, do modo como se está executando uma atividade.
Com isso, se procura assegurar que a entrega de insumos, os calendários de
trabalho, os produtos esperados se consubstanciem nas metas estabelecidas e
que outras ações que são necessárias progridam de acordo com o plano
traçado.
De outra forma, considerando que o monitoramento se propõe a indicar a
necessidade de intervenção oportuna que confirma ou corrige as ações monitoradas,
considerando a importância da informação para um mínimo de factibilidade da avaliação é
que surge a relação entre acompanhamento e avaliação. Conforme Faria (2001) sistemas de
informação bem montados e em uso desde o começo do programa, possibilitam estratégias de
avaliação que correspondam a seus objetivos.
Assim, esclarecidas as diferenças e a relação entre monitoramento e avaliação, ao
final, tem-se que um processo de monitoramento e controle eficaz desde o início do programa,
é requisito essencial para o exercício da avaliação e a qualidade dos programas.
4.3 AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: políticas sociais
O exercício da avaliação de acordo com Worthen et al. (1997 apud MOREIRA,
2002) desde que entendida como o exame e o julgamento para a determinação de valor e
tomada de decisão, teve origem no início da humanidade, propagando-se até a atualidade. De
acordo com a autora, a prática da avaliação sempre foi empregada pelo ser humano de modo
informal na rotina da sua vida, através de percepções altamente subjetivas, ocorrendo quando
uma escolha é feita entre várias alternativas, sem evidência formal sobre o mérito destas
alternativas.
Foi somente em 1930, durante a Grande Depressão Americana, que a avaliação
adquire um caráter sistemático. Neste período Tyler e Smith avaliaram um programa na área
da educação, conhecido como Avaliação de Tyler”, que até nossos dias exerce alguma
influência no planejamento e avaliação (COOK, 1997 apud MOREIRA, 2002).
Moreira (2002, p. 01) explica que
a necessidade de avaliar os programas públicos logo após a segunda Guerra
Mundial, levaram a criação de novos métodos de avaliação, decorrentes da
pressão das autoridades do governo e políticos, na aplicação de técnicas de
“gerenciamento científico” que vinham sendo empregadas pelos militares e
pela indústria americana.
79
Assim, no final da década de 1950 a avaliação estava sendo exercida tanto pelos
países do primeiro mundo como pelos menos desenvolvidos (MOREIRA, 2002).
Segundo Silva (1997 apud SILVA, 2001, p. 44) foi durante os anos 60, nos Estados
Unidos, que ocorreu a expansão das atividades de avaliação de programas, financiada pelo
governo federal americano. “Nessa década, registrou-se grande ampliação de financiamentos
federais estadunidense para avaliação de programas sociais, cuja preocupação central era a
construção de modelos que permitissem dimensionar o grau de sucesso/fracasso das
instituições estatais na área social.”
A partir dos anos de 1970, em razão de questionamentos acerca da aplicação de
recursos em programas sociais, no dizer de Moreira (2002, p. 01) “a avaliação passou a fazer
parte do planejamento e gerenciamento de programas sociais nos países industrializados.”
O desenvolvimento social latino-americano encontra-se em situação que está longe
de ser satisfatória. De acordo com Cohen e Franco (1993, p. 15) “a crise econômica sofrida
pela região no princípio dos anos oitenta afetou as condições de vida de importantes
segmentos da população.”
No Brasil, a partir dos anos 80, verifica-se um crescimento do interesse pelas
avaliações de programas. Nessa mesma época aprofunda-se a crítica ao padrão de políticas
sociais desenvolvidas na América Latina e, especificamente, no Brasil. Silva (2001, p. 46)
salienta que “essas críticas se referem, contundentemente, ao mau uso do dinheiro público e à
desfocalização dos programas sociais em relação à população mais necessitada.” Outra razão
para o crescimento do interesse pelas avaliações, segundo a mesma autora, decorre das
exigências dos organismos internacionais, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano
de Desenvolvimento, os quais demandavam reforma dos programas sociais, pautada pela
focalização, descentralização e privatização, incluindo a avaliação das políticas sociais como
condição para seu financiamento.
Como se pode perceber, no Brasil, a prática de avaliação de políticas e programas
sociais teve origem para controlar a utilização dos recursos e para condicionar o acesso a
financiamentos, razão pela qual, mesmo que atualmente se encontre em processo de
desenvolvimento, pode-se dizer que o fato de se apresentar restrita, servindo muitas vezes
para punir ao invés de se constituir em instrumento eficaz para o controle social das políticas
sociais, é resultado, em certa medida, do legado histórico deixado pelo exercício de avaliação
de políticas e programas.
Considerando que o objetivo da avaliação dos programas sociais é “aprimorar sua
capacidade de oferecer adequada atenção aos cidadãos” (FARIA, 2001, p. 48), os técnicos
80
responsáveis em facilitar as decisões políticas através da proposta de soluções fundamentadas
devem promover a avaliação dos programas, a fim de auxiliar na sua formulação e
implementação e contribuir para seu aperfeiçoamento.
Neste sentido, Cohen e Franco (1993, p. 15) explicam que
é especialmente importante centrar-se na elaboração de projetos sociais, já
que, em uma situação de escassez de recursos e necessidades incrementadas,
será ainda mais imprescindível a tarefa de comparar, escolher e descartar
projetos alternativos, procurando aumentar a racionalidade das opções
adotadas.
Entretanto, acrescentam, “na América Latina, a avaliação dos programas sociais não
é freqüente, para não dizer excepcional e, em geral, os atores sociais envolvidos são
refratários a avaliar o que realizam.” (COHEN e FRANCO, 1993, p. 15).
Conclui, portanto, Arretche (2001) citando Figueiredo & Figueiredo (1986), que a
avaliação de políticas públicas consiste na adoção de métodos e técnicas de pesquisa que
permitam estabelecer uma relação de causalidade entre um programa x e um resultado y, ou,
ainda, que na ausência do programa x, não teríamos o resultado y.
A adoção de avaliação de políticas públicas é, ainda, vista como um instrumento
democrático, na medida em que serve de controle sobre o uso dos recursos, tornando-se
necessária para um bom governo.
Da mesma forma, ao abordar o tema da avaliação das políticas sociais Gomes (2001,
p. 18) coloca-o no contexto atual da discussão sobre a cidadania e a democracia no Brasil,
defende a tese de que
a avaliação tem uma perspectiva política que deve ser resgatada no sentido
de contribuir para garantir a efetivação e universalização dos direitos de
cidadania, mas essa contribuição se realiza quando os resultados por ela
produzidos servem para instrumentalizar a população nessa luta por
cidadania.
Todavia, assegura que “tal avaliação revela-se totalmente inadequada quando se trata
de analisar as políticas sociais, que as mudanças sociais ocorrem a partir da interação de
inúmeros fatores que não podem ser totalmente controlados pela ação prevista nos planos.”
(GOMES, 2001, p. 18).
Citando Arretche (1998), Gomes (2001, p. 20) explica:
[...] não existe possibilidade de qualquer modalidade de avaliação ou análise
de políticas públicas que possa ser apenas instrumental, técnica ou neutra.
81
Avaliar programas sociais é se interrogar a seu respeito, tentar elucidar sua
finalidade, a forma como são produzidos seus resultados e a que práticas
sociais se articulam e reforçam. Não basta, portanto, concordar com a
importância dos processos avaliativos, mas se questionar sobre o pontencial
da avaliação como instrumento para tornar visível a intensidade das
demandas no campo das políticas sociais em nossa sociedade. A avaliação
implica, assim, no exercício de um importante direito democrático: o
controle sobre as ações de interesse público.
Corrobora Melo (2001, p. 11)
a avaliação de políticas públicas não constitui um exercício formal
“desinteressado”, à semelhança de um cálculo de custo-benefício. Ela está
fortemente ancorada num conjunto de valores e noções sobre a realidade
social partilhados pelos membros relevantes de uma maioria de governo -
incluídos elites políticas e burocráticas -, que os permite distinguir a “boa”
da “má” política.
Atualmente, no exercício da avaliação, novas metodologias vêm sendo desenvolvidas
com o objetivo não apenas de demonstrar a efetividade e os resultados de políticas e
programas, mas de melhorar a qualidade dos serviços para atender às necessidades do
mercado. Contudo, resta demonstrada a necessidade da avaliação das políticas sociais com o
fim de promover eficiência na sua implementação, na consecução dos objetivos propostos e
de uma verdadeira gestão pública.
4.4 AVALIAÇÃO DA POLÍTICA DE SAÚDE: PSF
No Brasil, com o estabelecimento do SUS que define como princípios a
descentralização da gestão administrativa, a universalidade, a eqüidade, a integralidade, a
hierarquização e a regionalização, novas estratégias, vêm sendo implantadas na promoção da
saúde. Moreira (2002, p. 01) lembra que “a municipalização das ações e serviços de saúde
vem exigindo cada vez mais o emprego de métodos de avaliação para subsidiar na redefinição
de diretrizes e estratégias para a efetivação do atual sistema de saúde.”
Da mesma forma, cada vez mais se torna imprescindível implementar atividades de
avaliação contínuas sobre a efetividade dos programas e de intervenções específicas que
subsidiem os gerentes a tomar decisões acertadas. Conquanto por meio da
institucionalização da avaliação poder-se-ia ter um instrumento importante para a tomada de
decisão no âmbito das políticas sociais.
82
Sulbrandt (1989 apud LOBO, 2001) esclarece que tal institucionalização, certamente
vai demandar determinada capacidade institucional não totalmente disponível na
administração pública:
[...] além da superação dos fatores de ordem política já mencionados. Está se
falando da capacitação de pessoal, treinamento mesmo, para ordenar e
utilizar resultados advindos da avaliação; do desenvolvimento de estratégias,
métodos e técnicas específicas para atender a situações diferenciadas; da
definição sobre quem faz o quê. Tem sido levantada a possibilidade de
criação de unidades próprias dentro das diversas estruturas organizacionais
com a função de coordenar o processo de avaliação dos programas
(SULBRANDT, 1989 apud LOBO, 2001, p. 78).
No caminho da institucionalização da avaliação, o Ministério da Saúde, no ano de
2005, através da Coordenação do Acompanhamento e Avaliação da Atenção Básica,
almejando a superação do enfoque burocrático e punitivo dos processos avaliativos realizou
um estudo acerca da avaliação em saúde no Brasil, considerando o papel dos gestores federal,
estadual e municipal na institucionalização da avaliação.
Nesse estudo, o gestor federal aparece como indutor da institucionalização da
avaliação nas esferas estaduais, o gestor estadual, como executor das atividades de avaliação
no estado e indutor da operacionalização da avaliação nas esferas estadual e municipal e o
gestor municipal, como executor e indutor da operacionalização da avaliação na esfera
municipal.
Entretanto, nas três esferas, constatam-se processos de avaliação incipientes; pouco
incorporados às práticas dos serviços de saúde; com caráter mais prescritivo, burocrático e
punitivo que subsidiário do planejamento e gestão; e, que não se constituem, ainda, em
instrumento de suporte ao processo decisório nem de formação dos sujeitos que deveriam
estar envolvidos.
Assim, através do componente da política de avaliação: monitoramento e avaliação
de intervenções no âmbito nacional, o Ministério da Saúde, ao final, propôs como projeto
prioritário, entre outros, a avaliação para melhoria da qualidade, cujos objetivos específicos
seriam: incentivar a integração dos processos avaliativos e propiciar a avaliação como
instrumento efetivo para a tomada de decisão.
Neste contexto, no campo da política setorial de saúde, especificamente, no PSF, o
Ministério da Saúde, em julho de 2005, lança o projeto Avaliação para Melhoria da Qualidade
(AMQ), no propósito de oferecer, aos gestores municipais, ferramentas de avaliação e gestão
83
da qualidade da estratégia Saúde da Família, consolidando a proposta de prioridade na
avaliação para melhoria da qualidade.
O projeto iniciou com a disponibilização do Documento Técnico, do site e de um
aplicativo digital para o banco de dados da AMQ. Foram realizadas oficinas macro regionais
para ampla divulgação e incentivo à articulação com os Planos Estaduais de Monitoramento e
Avaliação. E, em janeiro de 2006, foram lançados os Cadernos de auto-avaliação, em cinco
versões, cada uma delas dirigida a um participante específico do processo no âmbito
municipal.
De acordo com o Ministério da Saúde (2007, p. 17) o projeto AMQ
busca estreitar a relação entre os campos da avaliação e da qualidade no
âmbito da estratégia Saúde da Família, possibilitando, aos atores diretamente
envolvidos nos municípios, ferramentas facilitadoras para o diagnóstico
situacional e planejamento de intervenções para o alcance das situações
desejadas (BRASIL, 2007).
A AMQ tem como diretrizes o processo de auto-avaliação, a livre adesão pelos
gestores municipais, a ausência de premiações ou punições relacionadas aos resultados e a
privacidade das informações (perfil do usuário) (BRASIL, 2007).
Importante lembrar, neste momento, que para aderir ao SUS, a administração
municipal, como requisitos mínimos, deveria criar além um Fundo Municipal de Saúde e um
Conselho Municipal de Saúde, um Sistema de Controle e Avaliação sobre os serviços sob sua
coordenação.
O projeto utilizou a metodologia de avaliação quantitativa, baseada em padrões de
qualidade. No texto “A avaliação como um processo que enfatiza aprendizado e mudanças”,
Takeda e Diercks (2007, p. 12) destacam os pressupostos que fundamentaram a metodologia:
avaliar é uma responsabilidade. Não avaliar pode ser comparado a pilotar um
avião sem instrumentos de navegação aérea, sem indicadores das condições
de vôo e do motor. É voar sem bússola, altímetro, velocímetro, indicadores
de nível de combustível, óleo e temperatura da água; avaliar é uma forma de
participação; avaliar sem culpabilizar; e, conhecer o contexto da avaliação.
Para as autoras, para que a avaliação seja colocada no cotidiano das equipes do
Serviço de Saúde Comunitário, alguns passos devem ser seguidos como: desmistificar
conceitos; definir objetivos; reunir e analisar informação; e desenhar um plano (que inclui os
mecanismos para avaliar mudanças).
84
De acordo com a Coordenação de Acompanhamento e Avaliação (CAA/DAB/MS),
84 municípios brasileiros finalizaram todas as etapas da avaliação até o início de dezembro de
2006. Na apresentação dos resultados iniciais, que ocorreram durante um Seminário de
Apresentação de Resultados, o projeto foi descrito como de altíssima aceitação nos mais
diversos círculos em que foi apresentado. E, depoimentos provenientes dos instrumentos e do
fórum de discussão ratificaram o potencial qualificador do AMQ para o fortalecimento da
gestão municipal em atenção básica (BRASIL, 2005).
Como se pode perceber, o sistema de avaliação do Ministério da Saúde vem fazendo
progressos, se desenvolvendo. A colocação do projeto AMQ à disposição dos Municípios
demonstra que o gestor federal está buscando desempenhar o seu papel de indutor da
institucionalização da avaliação nas esferas subnacionais.
Cabe salientar nas palavras de Garcia (2001, p. 25) as características fundamentais de
um processo avaliativo exitoso:
i) deve ser útil para as partes envolvidas no processo; ii) tem que ser
oportuno, ou seja, realizado em tempo hábil para auxiliar a tomada de
decisão, que é um processo incessante; iii) tem que ser ético, isto é,
conduzido de maneira a respeitar os valores das pessoas e instituições
envolvidas, em um processo de negociação e de entendimento sobre os
critérios e medidas mais justas e apropriadas; iv) tem que ser preciso, bem
feito, adotando-se os cuidados necessários e os procedimentos adequados
para se ganhar legitimidade.
Enfim, além da busca por um processo avaliativo exitoso, que se apresente útil,
oportuno, ético e preciso, é necessário, primeiro, que todas as esferas exerçam seu papel de
indutores da institucionalização da avaliação, segundo, que todas as esferas contem com um
Sistema de Controle e Avaliação, e, terceiro, que atividades de avaliação sejam contínuas
sobre a efetividade dos programas, somente assim, poder-se-ia ter um instrumento importante
para a tomada de decisão.
85
CAPÍTULO V
5.1 APRESENTANDO O MUNICÍPIO DE CORREIA PINTO
O município de Correia Pinto, teve início em 1766, quando Antonio Correia Pinto de
Macedo, chegou à região dos campos de Lages e se estabeleceu nas proximidades do Rio
Canoas. Em 1920, Antonio Laureano Ramos, decretou que a vila constituída passaria a ser um
Distrito, com a denominação de Correia Pinto. Emancipou-se de Lages em 1982 (CIASC,
2002).
De acordo com o mesmo Centro de Informática e Automação, o Município está
localizado às margens da BR-116, entre Lages e Curitiba, o Município com extensão
territorial de 623,7 Km², tem uma extensa área reflorestada sendo a madeira a principal fonte
de riqueza. Na agricultura, destaca-se a produção de feijão, maçã, alho e pimentão. Outra
fonte de riqueza é o mel, com uma produção de 40 toneladas anuais, fruto de mais de 1.200
colméias. Destaca-se, também na pecuária.
Em razão de sua localização geográfica privilegiada, Correia Pinto abriga a empresa
Klabin Papéis/SA, maior exportadora e recicladora de papéis do Brasil, e as obras do futuro
aeroporto regional.
Segundo resultado da amostra do censo demográfico do IBGE realizado em 2007, o
Município possui 14.871 habitantes.
O Município mantém como programas sociais: Sentinela, Programa de Erradicação
do Trabalho Infantil (PETI), Prestação de Serviço à Comunidade, Liberdade Assistida, Bolsa
Família, Casa de Passagem e, especificamente, na área da saúde: Tratamento Fora do
Domicílio (TFD), Benefício de Prestação Continuada (BPC), Consórcio da Saúde, Doenças
Sexualmente Transmissíveis (DST), Programa contra a Dengue, Farmácia Básica e PSF. Com
exceção dos programas Casa de Passagem e Consórcio da Saúde que são, respectivamente,
municipal e regional, os demais programas são do governo federal.
5.1.1 O PSF no município de Correia Pinto
O projeto para implantação do PSF no município de Correia Pinto, protocolado junto
à Secretaria Estadual de Saúde, apresenta como justificativa de implantação, as precárias
86
condições de vida da população, haja vista um índice de mortalidade infantil de 0,015 (por mil
nascidos vivos), a ausência de saneamento básico e o alto índice de miserabilidade.
De acordo com o mesmo projeto, o Município se encontra habilitado pela NOB
01/96 e inserido, conforme aprovação prevista na Ata do Conselho Municipal de Saúde
(CMS) de 29/06/1999, na Gestão Plena de Atenção Básica de Saúde.
Através do cadastramento seriam realizados os diagnósticos precoces e fornecidas as
informações para atualização da situação local. O PSF atenderia a, aproximadamente, 1.900
famílias, totalizando 9.500 habitantes, portanto, 70,15% dos habitantes do Município, uma
vez que era composto por 13.541 habitantes, de acordo com o censo demográfico do IBGE
realizado em 2000. Atualmente, prevê um atendimento em média de 3.667 famílias,
totalizando 13.184 habitantes, portanto, 88,65% dos habitantes do Município, uma vez que é
composto por 14.871 habitantes, de acordo com censo demográfico do IBGE realizado em
2007.
Ainda, de acordo com o projeto de implantação, as atividades do Programa seriam
avaliadas através de relatórios mensais; pesquisas semestrais com os usuários da área de
abrangência, utilizando formulário escrito; e através de encontros entre as equipes que
compõem o Programa.
Da mesma forma, a avaliação do Programa, previsto para o ano de 2006, no Plano
Municipal de Saúde, previa entre outros, a aplicação junto à comunidade de instrumento de
avaliação do desempenho das equipes e grau de satisfação dos usuários, bem como a
avaliação do sistema de informações.
Assim, o PSF foi implementado no Município, há aproximadamente, oito anos,
através da Lei Municipal 0922/2000, de 27 março, de 2000. Esta Lei autorizava como
previsto no projeto, a implantação de 02 equipes multiprofissionais, compostas por médico,
enfermeiro, técnico em enfermagem e auxiliar em enfermagem.
Em 14 de janeiro de 2005, com a publicação da Lei 1.282/2005, o Município, ficou
autorizado a implantar até 07 equipes multiprofissionais, compostas por médico, cirurgião
dentista, enfermeiro, cnico em enfermagem, técnico em higiene dental, auxiliar de
consultório dentário e agente comunitário de saúde. Através desta Lei, também foi criada a
função de Coordenador do PSF.
O Município tem 05 equipes multiprofissionais implantadas, conquanto, o Programa
é dividido em 05 áreas, estando implantadas as áreas I e II, no bairro São João, a área III, no
bairro Nossa Senhora Aparecida, a área IV, no Centro e a área V, no bairro Florestal. Cada
área é composta, respectivamente, por: 05, 02, 04, 05 e 07 micro-áreas. Cada micro-área é
87
atendida por um Agente Comunitário de Saúde (ACS). Logo, o Programa conta com 05
médicos, 05 cirurgiões dentistas, 05 técnicos de enfermagem, 05 técnicos em higiene dental,
05 auxiliares de consultório dentário e 23 ACS. Além destes profissionais, atendem o PSF, o
Coordenador do Programa que exerce também a função de Assessor do Secretário da Saúde e
o servidor responsável pela digitação dos dados.
Os recursos para execução do Programa são provenientes de repasses do Ministério
da Saúde e complementados com dotações do Orçamento Municipal destinadas às ações e
serviços de saúde.
5.1.1.1 Preenchimento das fichas e relatórios e lançamento no SIAB dos dados produzidos no
Município
O SIAB do município de Correia Pinto é operacionalizado na versão informatizada.
Os dados por ele processados contemplam o número de famílias cadastradas, o
acompanhamento de gestantes, diabéticos, hipertensos, crianças, pacientes hansenianos,
pacientes tuberculosos e pacientes com DST/AIDS, através dos ACS, do médico e da
enfermagem. Contemplam, também, registro de atividades, procedimentos e notificação de
doenças. As informações sobre a população visitada e/ou atendida são recolhidas em fichas de
cadastramento e acompanhamento, e analisadas a partir de relatórios de consolidação de
dados.
A forma como ocorre a coleta dos dados, o preenchimento das fichas e relatórios e o
lançamento no SIAB no Município, podem ser verificadas através das informações obtidas:
5.1.1.2 Entrevista em grupo com os responsáveis pelo preenchimento dos documentos e
manejo do SIAB
A entrevista foi realizada em 05 de junho de 2007, às 19:00h, na Secretaria
Municipal de Saúde do Município. Os atores definidos para entrevista foram: as enfermeiras
responsáveis pelas equipes e a responsável pela digitação dos dados.
Quanto à pergunta objeto da entrevista (Apêndice A), refere-se ao pedido de
descrição da rotina de trabalho das equipes, especialmente, quanto ao preenchimento das
fichas e relatórios e lançamento dos dados no SIAB, com o objetivo de se verificar como
ocorre a produção dos dados e a confiabilidade dos dados informados. A entrevista foi
88
realizada pessoalmente, anotada com a devida autorização das entrevistadas. Passamos à
descrição da entrevista:
Questionadas acerca da rotina dos profissionais das equipes no preenchimento das
fichas e relatórios e no lançamento dos dados no SIAB, as entrevistadas responderam que
conforme dispunha o Projeto de implantação do PSF, o início do Programa foi marcado pela
visita dos ACS às famílias, no sentido de realizar o cadastramento através do preenchimento
da ficha A (cadastro familiar), que a partir desta data passou a ser atualizada mensalmente.
Além do preenchimento da ficha A, os ACS também preenchem o relatório SSA2 (relatório
de situação de saúde e acompanhamento das famílias). Realizam uma visita por mês em cada
família, podendo ser mais de uma, dependendo da necessidade.
Explicam que os ACS são acompanhados pelo enfermeiro de cada equipe, com quem
se reúnem todas as manhãs e finais de tarde para definir, respectivamente, quantas e quais
visitas serão realizadas e apresentar o resultado das visitas.
Referem que no final de cada mês, o ACS apresenta para o enfermeiro da equipe, a
Ficha A e o relatório SSA2. No que se refere à ficha A, além de apresentar ao enfermeiro da
equipe, encaminha à digitadora do Programa, a fim de que o SIAB seja alimentado.
Continuam, esclarecendo que a enfermeira, mensalmente, de posse dos dados da
Ficha A e do Relatório SSA2 de cada ACS, consolida os dados por micro-área num único
documento, o Relatório SSA2. Na consolidação dos dados no Relatório SSA2, há necessidade
de se avaliarem, além da Ficha A, as Fichas B (grupos prioritários para monitoramento) e C
(acompanhamento de crianças). Todavia, estas fichas não são preenchidas pelas ACS, e sobre
este fato a observação de uma das enfermeiras das equipes “elas dizem que se trata de muito
papel, então, as anotações são feitas em cadernos”.
Além do Relatório SSA2, a enfermeira consolida os dados existentes na Ficha D
(registro de atividades, procedimentos e notificações), recolhida de cada membro da equipe,
com exceção do ACS, preenchendo o Relatório PMA2 (relatório de produção e marcadores
para avaliação).
Novamente, a enfermeira, mensalmente, encaminha para Coordenadora do
Programa, Relatórios SSA2 e PMA2. A Coordenadora do Programa analisa os relatórios e
encaminha para digitadora para alimentar o SIAB. Alimentado, o SIAB emite 02 boletins que
fornecem um panorama geral, o primeiro que consolida a Ficha A (dados analisados em
relação à cobertura pelo Ministério da Saúde para liberação dos recursos) e o segundo, que
89
Consolida o PMA2. Por fim, a digitadora os encaminha para a Secretaria Regional de Saúde
de Lages.
Quanto ao treinamento dos profissionais para o desenvolvimento das ações, referem
que na implantação do Programa foram oferecidos dois treinamentos para os ACS, o primeiro,
através do Município com apoio dos profissionais da região e do Estado, o segundo, através
do Pólo Estadual de Capacitação. Todavia, em razão da rotatividade de pessoal, somente uma
profissional ACS permanece na função, portanto, atualmente, as profissionais que atuam no
Programa não receberam treinamento, apenas são acompanhadas pelo enfermeiro da equipe.
A servidora responsável pela digitação dos dados não recebeu nenhum treinamento específico
para o manejo do SIAB.
5.1.1.3 Dados previstos nas fichas e relatórios e lançados no SIAB
Os quadros abaixo apresentam os dados referentes ao preenchimento do Relatório
PMA2 e seu lançamento no SIAB no ano de 2006, quanto ao número de atendimentos
médicos e de enfermagem, nas prioridades: diabetes, hipertensão, puericultura e pré-natal
(Anexo A), eis que são as prioridades de maior prevalência nas áreas de abrangência e de
acordo com o Programa se tratam das prioridades que apresentam grupos e segmentos
populacionais em situação de maior vulnerabilidade:
Atendimento Médico e Enfermagem PSF – Relatório PMA2 – Correia Pinto – Ano 2006
Prioridades Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.
Diabetes 36 106 42 47 46 73 20 45 16 31 31 42
Hipertensão 45 163 101 130 100 101 75 155 43 69 66 80
Puericultura 02 16 50 74 78 106 99 61 35 21 19 151
Pré-natal 41 180 122 98 96 112 108 104 69 82 88 57
QUADRO 01: Atendimento Médico e Enfermagem – PMA2 – Correia Pinto – 2006
FONTE: Relatório PMA2 – Secretaria Municipal de Saúde
Atendimento Médico e Enfermagem PSF – Lançados SIAB – Correia Pinto – Ano 2006
Prioridades Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.
Diabetes 36 106 42 47 46 73 20 45 14 31 31 42
Hipertensão 45 163 101 130 100 101 75 155 31 69 66 80
Puericultura 02 16 50 74 78 106 99 92 23 21 19 151
Pré-natal 41 180 122 68 96 112 108 82 102 82 88 57
QUADRO 02: Atendimento Médico e Enfermagem – SIAB – Correia Pinto – 2006
FONTE: SIAB – Secretaria Municipal de Saúde
90
Analisando os dados do quadro 01, pode-se perceber que a prioridade pré-natal no
mês de abril de 2006, apresentou 98 atendimentos médicos e de enfermagem no relatório de
acompanhamento PMA2, todavia, a mesma prioridade apresentou 68 atendimentos no
lançamento do SIAB no quadro 02. Da mesma forma, as prioridades puericultura e pré-natal
apresentaram no mês de agosto, respectivamente, 61 e 104 atendimentos no relatório de
acompanhamento PMA2 e, 92 e 82 atendimentos no lançamento do SIAB. Ainda, todas as
prioridades, apresentaram no mês de setembro, respectivamente, 16, 43, 35 e 69 atendimentos
no relatório de acompanhamento PMA2 e 14, 31, 23 e 102 atendimentos no lançamento do
SIAB. Para melhor visualizar as divergências entre os dados previstos no Relatório PMA2 e
os dados lançados no SIAB, vejamos o gráfico 01 a seguir:
Legenda:
Dados constantes das fichas e relatórios de acompanhamento (FRA)
X
Dados lançados no Sistema de Informação Básica (SIAB)
Divergência entre os dados FRA vs SIAB
Atendimento Médico e Enfermagem PSF no
Município de Correia Pinto - Ano 2006
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
500
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
FRA
SIAB
jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
No. Atendimentos
Diabetes Hipertensão Puericultura Pré-natal
FRA - Dados constantes das Fichas e Relat. de Acompanhamento
SIAB - Dados lançados no SIAB
GRÁFICO 01: Atendimentos Médicos e Enfermagem Relatório PMA2 e SIAB Correia
Pinto – 2006
FONTE: Relatório PMA2 e SIAB – Secretaria Municipal de Saúde
Considerando que os dados informados no SIAB se referem à consolidação dos
dados constantes do Relatório PMA2, tais dados deveriam coincidir, cumprindo-nos ressaltar
uma deficiência no sistema de monitoramento do programa, no que se refere à conferência
dos dados, o que por sua vez, dificulta a confiabilidade das informações obtidas.
91
Esta deficiência pode ainda ser verificada se analisarmos o quadro 03 que apresenta
os dados informados para Secretaria Regional de Saúde no ano de 2006, referentes ao número
de cadastrados no Programa, nas mesmas prioridades (Anexo B):
Cadastrados PSF - Correia Pinto – Ano 2006
Prioridades Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.
Diabetes 305 308 314 314 318 316 314 296 295 275 201 291
Hipertensão 1130 1152 1167 1179 1150 1114 1094 1040 1034 981 687 1056
Puericultura 478 521 527 562 556 595 559 465 580 542 464 569
Pré-natal 76 92 100 86 82 77 77 69 72 76 52 62
QUADRO 03: Castrados PSF – Correia Pinto - 2006
FONTE: SIAB – Secretaria Municipal de Saúde
Observando os dados, percebe-se que o mês de novembro se comparado ao mês de
outubro apresentou uma considerável queda em todas as prioridades. Chama a atenção, o fato
de que os dados voltaram ao mesmo parâmetro no mês de dezembro.
O gráfico 02 abaixo demonstra a evolução do número de cadastrados ao longo do
ano de 2006, chamando a atenção para a redução de 25,1% no número de cadastrados se
comparados os meses de outubro e novembro:
Cadastrados PSF no Município de Correia Pinto
Indicadores do Sistema de Informação Básica - Ano 2006
0
500
1000
1500
2000
2500
jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
No. Cadastrados
Diabetes Hipertensão Puericultura Pré-natal
Redução de 25,1% comparado
com o mês anterior.
GRÁFICO 02: Cadastrados PSF – Correia Pinto – 2006
FONTE: SIAB – Secretaria Municipal de Saúde
92
Outra verificação pode ser feita, se analisarmos o quadro 04 que apresenta os dados
informados para Secretaria Regional de Saúde no ano de 2006, referentes ao número de
cadastrados, número de acompanhamentos realizados pelos ACS e número de atendimento
médico e de enfermagem nas mesmas prioridades (Anexo B):
Prioridades Diabetes Hipertensão Puericultura Pré-natal
C AACS AME C AACS AME C AACS AME C AACS AME
Janeiro
305 305 36 1130 1130 45 478 478 02 76 76 41
Fevereiro
308 308 106 1152 1152 163 521 521 16 92 92 180
Março
314 314 42 1167 1167 101 527 527 50 100 100 122
Abril
314 314 47 1179 1179 130 562 562 74 86 86 68
Maio
318 318 46 1150 1150 100 556 556 78 82 82 96
Junho
316 316 73 1114 1114 101 595 595 106 77 77 112
Julho
314 314 20 1094 1094 75 559 559 99 77 77 108
Agosto
296 296 45 1040 1040 155 465 465 92 69 69 82
Setembro
295 295 14 1034 1034 31 580 580 23 72 72 102
Outubro
275 275 31 981 981 69 542 542 21 76 76 82
Novembro
201 201 31 687 687 66 464 464 19 52 52 88
Dezembro
291 291 42 1056 1056 80 569 569 151 62 62 57
QUADRO 04: Cadastrados (C), Acompanhados ACS (AACS) e Atendimento Médico ou Enfermagem
(AME) ao PSF - Correia Pinto - 2006
FONTE: SIAB – Secretaria Municipal de Saúde
Como se pode perceber, os dados informados com relação ao acompanhamento dos
ACS repetiram-se ao dos cadastrados em todos os meses do ano.
De outra forma, analisando o número de atendimento médico e de enfermagem,
verifica-se que em algumas prioridades os atendimentos são realizados em um número muito
inferior ao número de cadastrados no Programa, demonstrando que os atendimentos não
correspondem às recomendações dos órgãos competentes.
De acordo com as condições clínicas do paciente, a Sociedade Brasileira de
Hipertensão recomenda o seguimento dos pacientes conforme o valor de pressão arterial
encontrado, variando da intervenção imediata (hipertensão grave) a um ano (pressão arterial
normal). Em relação a diabetes mellitus, a Sociedade Brasileira de diabetes recomenda
avaliação a cada três ou quatro meses para pacientes estáveis e com controle satisfatório. No
caso do pré-natal, o número de consultas recomendadas pelo Ministério da Saúde para uma
boa atenção durante a gestação é igual a seis consultas. E, na puericultura, o número de
consultas recomendadas pelo Ministério da Saúde, na faixa etária de 0-5 anos, faixa que
93
abrange o PSF, é igual a 13 consultas, sendo que 07 consultas no primeiro ano de vida, 03
consultas no segundo ano de vida e 01 consulta por ano no terceiro, quarto e quinto anos de
vida.
Considerando que o objetivo da presente pesquisa é verificar o cumprimento da
responsabilidade de avaliar o Programa pelas três esferas de governo e a apresentação dos
dados se propõe a demonstrar a forma como é realizado o monitoramento e a avaliação dos
referidos dados e a ausência de intervenção nos casos em que não atendimento do objetivo
proposto, como por exemplo, números de atendimento médicos e de enfermagem abaixo do
recomendado, propõe-se uma análise quanto ao número de atendimentos por cadastrados
acerca das prioridades diabetes e hipertensão, uma vez que correspondem às precedências que
não necessitam de informação individual, diferentemente das prioridades pré-natal que requer
o número de consultas realizadas durante a gestação e puericultura que requer a identificação
da criança por faixa etária.
Desta forma, o gráfico abaixo mostra a relação entre o número de atendimentos das
prioridades diabetes e hipertensão no ano pelo número médio de pessoas cadastradas por mês
no PSF em 2006. Logo:
Atendimento Médico e Enfermagem PSF por Cadastrados
no Município de Correia Pinto - Ano 2006
0
1
2
3
4
5
Diabetes Hipertensão
No. Atendimentos no Ano
Referência Associações Brasileiras de Diabetes e Hipertensão
Média Anual do Município de Correia Pinto
GRÁFICO 03: Atendimento Médico e enfermagem PSF por médio cadastrados Correia Pinto
2006
FONTE: Associação Brasileira de Diabetes e hipertensão e SIAB/ Secretaria Municipal de Saúde
94
No que se refere à prioridade diabetes, temos que em 2006 foram realizados 533
atendimentos para uma média de 295,6 pessoas cadastradas. Matematicamente: 533/295,6 =
1,8 atendimentos/cadastro. Assim, comparando este número com a referência estabelecida
pela Associação Brasileira de Diabetes, pode-se dizer que se encontra, praticamente, 50%
abaixo do que representaria a melhor hipótese, ou seja, de 3 a 4 consultas. Cabe salientar, que
por se tratar de um dado estatístico médio, pode existir cadastrado que tenha sido
acompanhado em 3 ou 4 consultas/ano.
Quanto à prioridade hipertensão, tem-se que em 2006 foram realizados 1.116
atendimentos para uma média de 1.065,3 pessoas cadastradas. Matematicamente:
1.116/1.065,3 = 1,1 atendimentos/cadastro. Assim, se considerarmos que todos os casos de
atendimento fossem de pressão arterial normal, poderíamos de forma mediana ponderar que
nesta prioridade o município estaria dentro dos padrões estabelecidos pela Associação
Brasileira de Hipertensão. No entanto, é muito difícil embora obviamente não seja
impossível – que todos os cadastrados na prioridade hipertensão tenham pressão arterial
normal.
Por fim, verificou-se também, que os dados físicos presentes na Secretaria Municipal
de Saúde, são somente os referentes aos últimos dois anos. E, os dados informatizados do
SIAB, são somente os referentes aos anos de 2005, 2006 e 2007.
5.2 RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS
5.2.1 Entrevistas individuais
Conforme previsto nos objetivos deste trabalho, após a análise dos dados físicos e da
obtenção das informações através de entrevista com os responsáveis pelo preenchimento dos
documentos e manejo do SIAB (Apêndice A), realizou-se entrevistas individuais com os
responsáveis pela avaliação do PSF nas esferas municipal, regional/estadual e federal
(Apêndice B) considerando que os dados produzidos no Município de Correia Pinto são
encaminhados para a Secretaria Regional de Saúde, sendo que esta os encaminha para a
Secretaria Estadual de Saúde que, via DATASUS, os encaminha para o Ministério da Saúde, a
fim de verificar como ocorre a relação entre essas esferas.
95
Tais atores foram escolhidos porque têm a responsabilidade de conduzir a avaliação
dos Programas nas esferas que se pretende estudar, o que torna possível apreender a visão dos
atores envolvidos diretamente no processo de avaliação do Programa PSF nas três esferas de
governo. Ademais, as entrevistas permitiram complementar e esclarecer as características e
discrepâncias observadas nos dados do Programa lançados através do SIAB.
Os atores definidos para as entrevistas foram: Coordenador do PSF no município de
Correia Pinto, Coordenador do PSF na Secretaria Regional de Saúde, Gerente do
Departamento da Atenção Básica do Estado de Santa Catarina e a Coordenadora de
Acompanhamento e Avaliação da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde.
Quanto às perguntas (Apêndice B), referem-se tanto diretamente ao processo de
avaliação quanto ao acompanhamento/monitoramento e à cooperação técnica, requisitos
essenciais para o exercício da avaliação. Fundamentaram-se no disposto na Lei 8.080/90 que
disciplinou a descentralização político-administrativa do SUS, apresentando as atribuições e
competências de cada nível de governo e na Portaria nº. 648/2006, que prevê as características
do processo de trabalho da Estratégia Saúde da Família e as responsabilidades de cada nível
de governo no PSF. Foram adaptadas de acordo com o nível de responsabilidade de cada
esfera estatal no âmbito da política da saúde.
Neste sentido, ao Município, caberia, definir no Plano de Saúde, os mecanismos de
acompanhamento da estratégia Saúde da Família e o acompanhamento e avaliação sistemática
das ações implementadas; ao Estado, caberia promover a descentralização dos serviços e
ações de saúde, o acompanhamento, o controle e à avaliação das redes hierarquizadas do SUS,
especificamente, da estratégia Saúde da Família nos municípios; e, ao Governo Federal
caberia a análise dos dados de interesse nacional relacionados com a estratégia saúde da
família, gerados pelos sistemas de informações em saúde. Às três esferas, é conjunta a
responsabilidade pela avaliação e pela indução da avaliação.
Contudo, as perguntas fundamentaram-se na idéia de um possível descumprimento
da responsabilidade de monitoramento e avaliação pelas esferas, de um possível afastamento
da busca da qualidade do Programa, na procura pela forma de relação existente entre as
esferas e de um possível descumprimento dos gestores do seu papel como indutores da
avaliação.
As entrevistas foram realizadas pessoalmente, gravadas com a devida autorização
dos entrevistados e, literalmente transcritas. Passamos à descrição das entrevistas:
96
5.2.1.1 Entrevista com a Coordenadora do PSF no município de Correia Pinto
A Coordenadora do PSF no município de Correia Pinto é servidora do quadro de
provimento efetivo de pessoal do Município, na função de Enfermeira, exerce a função
gratificada dois anos. A entrevista foi realizada em 19 de julho de 2007, às 19:00h, na
Secretaria Municipal de Saúde de Correia Pinto.
Questionada acerca da forma como ocorre o acompanhamento dos dados do PSF
pela Secretaria Municipal de Saúde e o seu encaminhamento através do SIAB à Secretaria
Regional de Saúde, a Coordenadora Municipal explica que o acompanhamento dos dados
ocorre primeiro, quanto ao preenchimento dos campos corretamente. Segundo, através de uma
análise dos dados por grupos e/ou programas de Atenção, estabelecendo comparativo com o
cadastro e parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Saúde ou pela Organização Mundial
da Saúde. Depois deste processo, informa que os boletins, os impressos, são encaminhados
para o setor de digitação para alimentação do SIAB, e posterior encaminhamento à Secretaria
Regional da Saúde. Todavia, ressalta, que os dados enviados não retornam ao Município, não
existe uma contra-referência.
Noutra pergunta buscou-se constatar a preocupação do Município com a qualidade
do Programa, questionando-se a existência de intervenção por parte da esfera municipal na
verificação da situação atual com a ideal diante de possíveis afastamentos do objetivo, a
exemplo, nos casos em que o número de atendimentos aparece abaixo do número esperado.
Sobre esta questão, esclarece que o PSF tem como objetivo o desenvolvimento de ações de
promoção, prevenção e educação em saúde para população em geral, prioritariamente, para
grupos e segmentos populacionais em situação de maior vulnerabilidade como crianças,
hipertensos, diabéticos e gestantes. Considera que estes grupos devem ter acompanhamento
mensal, conforme quantitativo levantado pelo cadastro. Assim, informa que quando os
registros apontam acompanhamento menor que o número de cadastrados, a estratégia que vem
sendo implementada pela Coordenação junto com as equipes de PSF, é o da implantação de
consultas de enfermagem com estes grupos específicos.
Sobre a existência de avaliação do PSF na esfera municipal, explica que a avaliação
do resultado das ações do PSF deveria ser feita a partir do estabelecimento de um comparativo
entre os programas nos anos anteriores ao PSF com os anos de atuação do programa nas ações
de caráter preventivo como, programa de imunização, coberturas vacinais, coleta de
papanicolau. Refere que outro dado a ser analisado, o que se relaciona com a redução de
97
internações hospitalares por infecção respiratória aguda, doenças diarréicas, diabetes
descompensado, crises hipertensivas, complicações na gestação. Entende que também é
importante analisar os coeficientes de mortalidade geral, materna, neonatal e infantil.
Acrescenta que em razão da rotatividade de pessoal e da utilização dos profissionais
que atuam no PSF em outros serviços, ações como as de monitoramento e avaliação restam
prejudicadas, não acontecendo como deveriam, ou seja, de forma rotineira e sistemática.
Questionada, ainda, sobre a utilização da avaliação no processo de tomada de decisão,
demonstra que entende que as estratégias somente podem ser readequadas a partir da análise e
avaliação dos dados.
No que se refere à forma de avaliação proposta pelo Município no Projeto de
Implantação do Programa e no Plano Municipal de Saúde como a realização de pesquisa junto
aos usuários do Programa, encontros entre as equipes do Programa da região ou avaliação do
sistema de informação, informa que até o momento, nenhum tipo de avaliação proposta tanto
no Projeto de Implantação do Programa quanto no Plano Municipal de Saúde foi realizado.
Por fim, quanto à transferência de cooperação técnica na execução do Programa por
parte das esferas estadual ou federal, deixa claro que a única cooperação transferida ao
Município pelas esferas estadual e federal, é de repasse de recurso financeiro e fiscalização da
composição das equipes.
5.2.1.2 Entrevista com a Coordenadora do PSF na Secretaria Regional de Saúde de Lages
A Coordenadora do PSF da Secretaria Regional de Saúde é servidora do quadro de
provimento efetivo de pessoal do Estado de Santa Catarina, formada em Administração de
Empresas, exerce a função comissionada de Coordenadora do Programa há três anos. A
entrevista foi realizada em 17 de agosto de 2007, às 14:00h, na Secretaria Regional de Saúde
de Lages.
Explicando a forma como a Secretaria Regional acompanha os dados referentes ao
PSF recebidos do Município através do SIAB, a Coordenadora Regional esclarece que após o
recebimento das informações os dados são analisados, a fim de verificar se todos os dados
necessários foram realmente enviados, salientando que, caso falte algum dado, estes são
devolvidos ao Município para correção. Os dados são analisados, também, para que se
verifique o número de equipes, possíveis erros de digitação que possam descredenciar o
98
Município, e para verificar a cobertura que deve estar sempre acima de 80% sob pena de
suspensão do incentivo por parte do Ministério da Saúde. Nas palavras da Coordenadora “[...]
a gente verifica a cobertura, tem que estar sempre acima de 80%, sempre, se for abaixo, o
Ministério corta o incentivo [...]” Esclarece que se a cobertura estiver abaixo de 80%, os
dados são devolvidos para o Município para que seja feita a devida correção “se tiver abaixo a
gente manda de volta para os Municípios para eles acertarem.” Depois destas análises, afirma
que os dados são encaminhados para o Estado.
Questionada acerca da atuação da Secretaria Regional nos casos em que o número de
atendimentos aparece abaixo do número esperado, demonstrando um possível afastamento do
objetivo do Programa, refere que quando se verifica um número de atendimento abaixo do
esperado, intervenção por parte da Secretaria Regional de Saúde. Esta intervenção
acontece através de contato telefônico entre os representantes da Secretaria Regional e do
Município, a fim de verificar se não houve erro de digitação. Não havendo erro de digitação,
verifica-se quantos atendimentos o médico está realizando ou deixando de realizar. Assevera:
“[...] fora isso, a gente não pode ter muita interferência, porque mais é o gestor que tem o
compromisso de fazer isso. Às vezes a gente sabe que é até jogado os dados pra dentro, mas a
gente não pode interferir, a não ser quando a gente faz a supervisão [...]
Acrescenta “na supervisão a gente tem um formulário, a gente manda pra
Florianópolis, a gente sabe que aquele dado está baixo, a gente manda pra Florianópolis que
também analisa e manda pra CIB, e a CIB é que manda de volta pra nós pra gente retornar
para os Municípios e sim com o parecer da CIB, eles têm prazo de 30, 60, 90 para ajeitar,
caso contrário é cortado o incentivo.”
Sobre a existência de avaliação do PSF na Secretaria Regional de Saúde, de modo
geral, afirma que é realizada em relação à cobertura e em relação à composição das equipes,
como por exemplo, a existência de profissionais contratados em dois Municípios. Informa que
a mesma verificação é realizada pela Secretaria Estadual da Saúde e pelo Ministério da Saúde.
Complementa, o monitoramento e avaliação ocorrem na forma de supervisão “a gente vai, faz
uma entrevista, a gente tem um formulário com todas as perguntas que a gente vai fazer pra
eles, desde quantas consultas, quantas visitas, o que eles fazem, orientação.”
De forma mais específica, explica o sistema adotado para a realização da referida
supervisão:
Antes era semestral, todo semestre a gente passava Município a Município,
depois passava tudo de novo, agora, depois de tudo que aconteceu a gente
99
parou um pouco. De supervisão, este ano não teve nenhuma até agora, nada,
nada. [...] A gente está sem avaliação porque a gente estava sem
coordenadora, troca de coordenadora, a gente não sabia que coordenadora
vinha, daí não tinha recurso pra gente poder ir, em função também da licença
pra tratamento de saúde minha e do Roberto. A gente está parado agora, mas
havia supervisão semestral. Ela era sempre feita, toda vida. A gente passava
no Município, escolhia uma ou duas equipes dependendo da quantidade que
tinha no Município, fazia esta avaliação, depois retornava lá [...]
Considerando a declaração de que a supervisão não está acontecendo e por
conseqüência não avaliação, ao questionamento acerca da relação entre a avaliação e o
processo de tomada de decisão, limitou-se a informar que não relação entre a avaliação e a
tomada de decisão “no momento não está sendo feito, não está sendo feito nada por enquanto,
como a gente não pode ir lá, a gente não está elaborando nada.”
No que se refere ao sistema de indução da avaliação, por parte da Secretaria Regional
ao Município, foram as palavras da Coordenadora Regional “de posse das informações que
eles nos repassam a gente tenta detectar se eles estão fazendo avaliação ou não, mas a gente
não vai especificamente lá pra fazer a avaliação.”
De outra forma, quanto à cooperação técnica dispensada ao Município, informa que a
capacitação é realizada pelo Pólo, porém, não tem conhecimento sobre como o Pólo tem
desenvolvido suas ações, se está capacitando ou não. as orientações, vêm sendo repassadas
na medida em que são recebidas pela Coordenação Regional:
Quando eles querem implantar novas equipes a gente orienta, quando eles
querem profissionais, pedem pra nós, a gente tenta localizar profissionais pra
eles, apoio técnico, tudo que necessitam, se ligarem para nós, a gente vai
atrás. O recurso quando é bloqueado, a gente descobre pra eles porque foi
bloqueado, este tipo de suporte técnico a gente para os Municípios. Se o
Município diz que precisa de orientação, a gente marca um dia pra ele aqui
na Regional pra tudo, desde a montagem da equipe, as dúvidas e mesmo se a
gente não sabe, a gente liga pra Florianópolis e esclarece a dúvida dele.
5.2.1.3 Entrevista com o Gerente do Departamento da Atenção Básica da Secretaria de Saúde
do Estado de Santa Catarina
O responsável pela avaliação do PSF no nível estadual é servidor do quadro de
provimento efetivo de pessoal do Estado de Santa Catarina, na função de médico, exerce a
função comissionada de Gerente da Atenção Básica há quatro anos e seis meses.
100
A entrevista foi realizada em 11 de julho de 2007, às 14:00h, no Departamento de
Atenção Básica do Estado de Santa Catarina, em Florianópolis.
O início da resposta ao questionamento sobre a forma como ocorre o
acompanhamento pela Secretaria de Estado da Saúde dos dados referentes ao PSF
encaminhados pelo Município através do SIAB, contou com um esclarecimento acerca da
cronologia do encaminhamento dos dados. De acordo com o Gerente, até o dia 05 de cada
mês o Município deve fechar o processamento dos dados do mês anterior e enviá-los para
Regional. Do dia 05 ao dia 10, a Regional encaminha os dados para o Estado. Até o dia 15, o
Estado envia a base de dados para o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde
(DATASUS) do Rio. Sobre esta cronologia, assevera:
Este prazo nem sempre funciona, por isso que algumas coisas que deveriam
ser feitas em termos de olhar, monitorar alguns defeitos do banco de dados
não são feitos a contento ou a tempo, porque os dados, o Município passa
nos dia 05 e a Regional acaba passando no dia 12 ou 13 e acaba que nós, às
vezes não temos tempo suficiente para fazer o que deveria ser feito.
Esclarece que, atualmente, o sistema em sua nova versão, já apresenta algumas
críticas para conferência em relação à quantidade de agentes que estão cadastrados e a
quantidade de equipes que estão cadastradas para receber o incentivo. Mesmo assim, algumas
vezes, os dados mostrados na tela não são levados em consideração pelo próprio Município. O
erro pode ser de digitação dos dados, mas o Município deixa de receber o recurso por não ter
corrigido.
Sobre o acompanhamento dos dados recebidos, primeiro, faz uma crítica à ão da
Secretaria Regional de Saúde “a Regional nem sempre ou nunca que eu saiba, dificilmente
confere alguns dados que são possíveis para tentar a correção antes de enviar pra nós.”
Segundo, afirma que no Estado, poucas são as conferências de monitoramento sobre o
assunto.
Explica que a primeira conferência se refere à verificação do recebimento das três
partes do banco de dados. Que o primeiro banco é o banco do cadastro das equipes, requisito
básico para fazer o repasse. Quando este primeiro banco de dados não é encaminhado, o
Município aparece como se não tivesse enviado nada. O segundo banco seria o que se chama
de produção, ou seja, a quantidade de procedimentos feitos ou realizados pela equipe médica,
enfermeiro e auxiliar. E, o terceiro banco se refere aos dados dos agentes, número de visitas a
diabéticos, gestantes, etc. Salienta que o sistema aponta e discrimina a falta do segundo ou do
terceiro banco, mas quando falta o primeiro banco é como se tudo fosse zerado.
101
Assim, verificado a falta desses dados, nas palavras do Gerente “você liga para a
Regional, liga para o Município, pergunta o que aconteceu, manda de volta, verifica o erro e
assim para ver se corrige e dá tempo de encaminhar para o Rio já corrigido e o município não
tenha dificuldade. Isto é basicamente o monitoramento que a gente faz antes de enviar os
dados daquele mês para Rio.”
Continua, para explicar a segunda forma de conferência, a realizada depois de
alimentados os dados do Município. Refere-se à consolidação dos dados e à elaboração de
uma crítica chamada inconsistência cadastral, para verificar se profissionais em mais de
uma equipe no mesmo Município ou em Municípios diferentes. Constatada duplicidade de
cadastramento em mais de um local, o Estado encaminha para o Município, para correção no
prazo de três meses.
E, a terceira conferência, que também é realizada pelo Ministério da Saúde, é a que
se chama de cobertura, percentual de cobertura ou percentual de famílias que estão
cadastradas no SIAB em relação àquelas que os agentes indicam que estão acompanhando.
Atualmente, esclarece que é aceitável que no mínimo 90% das famílias que estão sendo
acompanhadas pelo agente estejam cadastradas no SIAB, todavia, todos os meses, este
percentual fica abaixo de 90% em, aproximadamente, de 03 a 06 Municípios. Na maioria dos
casos, por erros de digitação muito simples de serem corrigidos, mas não esta correção.
Então, verificado o erro, o Estado encaminha o relatório para o Município para correção.
Quanto à qualidade dos dados, indagado sobre a forma de intervenção da esfera
estadual nos casos em que o número de atendimentos aparece abaixo do número esperado,
demonstrando um possível afastamento do objetivo, explica que o monitoramento de
qualidade ou dos dados de produção ou de qualidade de cadastro de população não está sendo
realizado de forma rotineira, eis que demanda muito trabalho. Refere que estão sendo feitos
vários relatórios para comparar, por exemplo, o percentual de população por faixa etária de
cada Município com a população do SIAB e com o IBGE. Complementa, esclarecendo que
esta comparação foi realizada no ano passado, e o trabalho foi enorme, uma vez que a
população tem faixa etária diferente do IBGE. Os relatórios foram encaminhados para as
Regionais e para os Municípios, a fim de que verificassem se as diferenças entre o IBGE e o
SIAB eram muito grandes.
Apresenta outro relatório, referindo que foi elaborado para estabelecer a comparação
da prevalência das doenças. Comparou-se, por exemplo, o número de hipertensos que existem
no Município, percentualmente, nos município A, B, C e D. As tabelas foram feitas por
Regionais, permitindo que o Município comparasse, então, a sua prevalência de diabéticos na
102
população adulta com a do outro Município. Procurou-se oferecer dados reais que levassem o
Município a conferir se aqueles dados são bons ou ruins.
Refere que foi realizado, também, relatório sobre a produção de consultas médicas e
visitas domiciliares, sempre fazendo tabelas comparativas entre os Municípios, cujo primeiro
objetivo seria mostrar o número de consultas realizadas nos municípios “o teu médico faz 500
consultas mês, o outro faz 300, outro faz 400, não existe nenhuma norma que deva ser uma,
outra ou outra, num mês tem a visita domiciliar, procedimentos de enfermeiro [...]” O
segundo objetivo seria verificar a questão da incongruência ou distorções nos dados de
produção ou de cadastros de famílias. Salienta que este problema é mais difícil de ser
corrigido, uma vez que ninguém vai ser penalizado, inclusive, porque o sistema não faz
nenhuma crítica a esta situação “se tiver um s o município de Correia Pinto, vem lá, 01
consulta médica, tudo bem, o sistema não faz nenhuma crítica e se no outro mês vier 1.000,
também não tem nenhuma critica nestas questões.” Entende que este tipo de análise, deve ser
feito por amostragem, aonde deve haver uma comparação entre os Municípios.
Aponta a questão do amadurecimento das equipes, uma vez que na estratégia está
marcado que deve existir um entendimento, um diagnóstico melhor da situação de saúde da
população que atende, inclusive, fatores sociais, econômicos, ambientais, e também está
indicado que se deve avaliar o resultado do que foi feito:
[...] tem que olhar bem o número das coisas feitas para verificar se houve
modificação no perfil epidemiológico da população. Esta atitude,
preocupação não é comum de todos, uns alegam a demanda, a pressão da
demanda, que dificulta a preocupação com avaliações, verificar as coisas,
mas basicamente é a falta de costume que nós temos de não olhar aquilo que
nós fazemos com o que resultou, normalmente olha o indivíduo em si,
infartou, melhorou, não melhorou, mas consolidar estes dados para poder
trazer uma avaliação do resultado de trabalho é uma coisa que não é comum
nos serviços de saúde.
Esclarece que estes acompanhamentos demandam muito trabalho e tempo,
entendendo que a realização pelo Município é mais fácil “nós fizemos uma vez pra mostrar
como se faz uma tabela, está marcado, explicado.”
E continua, justificando que o número de atendimentos médico e de enfermagem é
preocupação que foi repassada não para os Municípios, mas para todos os gerentes regionais:
Tem gente que falsifica os dados do SIAB, tem gente que neste mês
esqueceu, então pega os mesmos dados do mês anterior e bota de novo,
repete. Eu tive em Blumenau, numa época, uma enfermeira num posto,
103
quando estava fazendo esses compactos, pegava todo mês, botava uma rie
de dados lá, sem dizer quem que era, tem um posto que estava repetindo 3 ou
4 meses os mesmos dados, horríveis, do ponto de vista de que não poderia
existir aquela quantidade de procedimentos todos iguais.
Afirma que o Estado não tem nenhuma condição para fazer este tipo de análise, de
pesquisa “aqui é simplesmente monitorar o banco de dados da parte de cadastro para que o
Município não deixe de receber o dinheiro e segundo a medida que a gente vai tendo
possibilidade, vai fazendo estes pequenos relatórios.”
Sobre a existência de avaliação do Programa na Secretaria Estadual de Saúde, deixa
claro que o Estado ainda não fez nenhuma avaliação do PSF. Segundo o Gerente, existe um
monitoramento feito em 2002 pelo Ministério da Saúde. As avaliações existentes não são
globais, são apenas pontuais: “você tem estudos universitários, de professores ou estudantes
de pós-graduação que estavam fazendo avaliação. Eu fiz meu estudo de pós-graduação,
fazendo uma avaliação da qualidade dos dados do SIAB, alguns dados do SIAB.”
De acordo com o Gerente, o Estado e as Regionais não apresentam uma programação
bem consistente “tem dia que a gente pode fazer e faz, tem dinheiro para viajar, não tem, não
tem disponibilidade sempre, são as visitas que nós chamamos de supervisão e que tem um
enfoque mais de apoio técnico, de ir discutir, verificar, tentar identificar falhas e discutir
correções possíveis, estar discutindo para superar os problemas que tem ou não fiscalização.”
Refere que as visitas têm sentido educativo. Salienta que as supervisões são feitas da seguinte
forma: “tem época que a gente faz isso mais seguidamente, tem época que a gente faz menos,
as regionais a mesma coisa. A gente faz programação, atende demandas, mas também um
pouco aleatório, assim, esparramar no Estado para cobrir todas as áreas.”
Acrescenta, “agora, avaliar o que resolveu ou o que resultou, ou modificou com a
implantação do Saúde da Família no Estado, uma avaliação mais ampla, ele não é feito.”
Ressalta que dois anos o Estado iniciou o Programa do Ensino Superior
Comunitário (PROESC), colocando em discussão a definição de monitoramento e avaliação,
bem como a sua importância. Explica:
[...] porque são procedimentos pouco freqüentes na Secretaria de Estado da
Saúde e também nos Municípios. São atividades que deviam ser por
primeiro. Se chegar ao posto de saúde ou numa unidade dessas do PSF em
Correia Pinto, chegar pra equipe e pedir alguns dados epidemiológicos,
alguma avaliação, mudança de perfil epidemiológico depois de dois ou três
anos que eles estão trabalhando, se eles têm alguma resposta sobre isso.
Aquilo que devia ser uma rotina no serviço público que é monitorar o seu
trabalho, que é avaliar o resultado do seu trabalho, ele é muito pouco
resolvido.
104
Ainda, que este projeto do PROESC, apresenta um software em condições
operacionais para apoiar uma proposta de avaliação da Atenção Básica, não especificamente o
PSF, mas a Atenção Básica. Trata-se de uma proposta com outro enfoque, diferente daquela
habitual que se tem no setor. Foi feito um projeto piloto, com um grupo de Municípios, e a
partir do segundo semestre continua o trabalho com os Municípios, informando-os sobre
monitoramento e avaliação. “Aqui o nosso entendimento primeiro é tentar monitorar o
processo para ele poder funcionar dentro daquilo que é previsto, para depois poder avaliar.”
“Que fique bem claro, não tem nenhum processo de avaliação do PSF de Santa Catarina [...].
Não temos isso, porque isso não é fácil, é muito complicado fazer este tipo de avaliação, vo
tem uma evolução das coisas, você inicia um processo novo, quanto ele vai influenciar
naquela evolução, acelerar, desacelerar tendência. É complicado e, realmente, não foi feito.”
Embora, admitindo que o Estado esteja trabalhando dentro de um padrão de
monitoramento e não de avaliação, questionado sobre a relação entre o processo de avaliação
e de tomada de decisão, assegura que a tomada de decisão tem acontecido no sentido de
implementar a estratégia, que é construída sobre a realidade. Exemplifica:
A CIB, 04 anos, fez um encaminhamento dando um tempo de tolerância
para os Municípios recontratarem ou reporem profissionais, basicamente,
médicos que saíam, que pela sistemática do Ministério daquele momento, do
SIAB, saía um médico da equipe, o sistema já desconsiderava aquela equipe,
ficam o enfermeiro, os auxiliares, a agente, mas a equipe no Ministério para
fins de repasse, deixou de existir. Essa era a norma. Aqui, então, se tomou
uma decisão, de que ok, vamos dar dois meses por nossa conta, sem
conhecimento do Ministério, agora, na Portaria do ano passado que
reformulou a Atenção Básica, já foi reconsiderado isso, então o Município
tem 03 meses para repor o profissional que sair.
Sobre o papel do gestor estadual como indutor da operacionalização da avaliação nas
esferas municipais, pode-se dizer que a resposta a este questionamento, limitou-se a descrever
a forma como ocorrem as visitas do Estado e da Regional nos Municípios, não havendo uma
manifestação acerca da existência ou não de ações que indiquem a indução do processo de
avaliação nos Municípios.
No tocante a transferência de cooperação técnica da esfera estadual para a esfera
municipal para a execução do Programa, refere que ocorre na forma de capacitação de
pessoal, de forma não específica, através de reuniões, seminários, cursos que são feitos pelos
grupos regionais. E, de forma específica, através do apoio mais dirigido:
105
Então, vamos fazer uma visita em Correia Pinto, habitualmente, se vai na
unidade, conversa com o pessoal da unidade ou com o Secretário Municipal
ou responsável que ele delega, para discutir aquilo que a gente achou que
está bom ou que não está bom. Uma discussão muito centrada, muito
dirigida em cima de situações concretas, não geral, porque a geral vai nos
cursos, seminários que se organiza de uma forma não sistemática. Mas,
quando da nossa intervenção junto às Regionais, é difícil encontrar um
Município que não participou de alguma reunião em que se discutiu
encaminhamentos administrativos ou técnicos.
Independente das ações referidas conclui “pode-se dizer que o apoio técnico, o apoio
técnico do Estado para os Municípios é deficiente ou deficitário. Se discute o tempo todo,
como superar, melhorar este apoio aos Municípios, mas até hoje o resultado, a avaliação meio
rápida dá pra dizer que ele tem sido ao longo do tempo é deficiente.”
5.2.1.4 Entrevista com a Coordenadora de Acompanhamento e Avaliação do Departamento de
Atenção à Saúde do Ministério da Saúde
A responsável pela avaliação do PSF no nível federal é servidora do quadro de
provimento efetivo de pessoal do Governo Federal, na função de médica, exerce a função
comissionada de Coordenadora de Acompanhamento e Avaliação do Departamento de
Atenção à Saúde há seis meses.
A entrevista foi realizada em 20 de junho de 2007, às 14:00h, no Departamento de
Atenção Básica da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, em Brasília.
Sobre o acompanhamento, controle dos dados encaminhados pelo Município através
do SIAB para o Ministério da Saúde, explica que existem algumas formas utilizadas, como
um sistema de informações exclusivo da Estratégia Saúde da Família e outro sistema de
informação geral em saúde. O SIAB que é o Sistema de Informação da Atenção Básica é o
sistema que captura as informações no âmbito municipal, envia ao Estado, que envia ao
DATASUS. O DATASUS que é um órgão do Ministério da Saúde envia para o Departamento
de Atenção Básica da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde.
Menciona que os procedimentos de acompanhamento pelo Ministério da Saúde, são
de composição das equipes, produção da equipe, ações de saúde, indicadores de resultado, a
fim de verificar se há impacto ou não na saúde das crianças, dos adultos, de toda população, e
de alguns grupos que são referência.
106
Lembra que outra forma de acompanhamento que ocorre no âmbito financeiro,
uma vez que estes dados estão vinculados à transferência de recursos.
Enfim, além dos sistemas citados, informa que existe o sistema de informação sobre
nascidos vivos, sobre mortalidade que é o SIF de notificação de doença “a gente lança mão de
vários indicadores, não só das informações contidas neste sistema de informação pra fazer a
avaliação e o monitoramento.”
Ao ser questionada sobre a produção das equipes, ou seja, sobre a existência de
intervenção do Ministério da Saúde nos casos em que o número de atendimentos não
corresponde ao esperado ocasionando um possível afastamento do objetivo, a Coordenadora
Nacional esclarece que o Ministério da Saúde trabalha com o conceito de autonomia de esfera
de gestão no SUS. Que no sistema constitucional, as leis 8.080/90 e 8.142/90, prevêem
autonomia de gestão e execução pela esfera municipal ou quem executa a atenção à saúde na
esfera municipal e, co-gestão com o Estado e o Governo Federal em co-financiamento e em
co-responsabilidade. Que o Ministério da Saúde a princípio, baseia-se na capacidade de
gestão dos Estados e Municípios, sendo este, o aspecto positivo da descentralização, que é
exatamente fazer a regionalização. “Então, pressupõe-se que o primeiro sobre estas
informações está no próprio local de coleta das informações. As informações surgem nas
equipes, então, é uma primeira obrigação da equipe de gestão, o olhar e a discussão desta
informação, antes da intervenção do Ministério da Saúde.”
Enfatiza que a intervenção do Ministério da Saúde ocorre num nível mais estratégico,
como verificar se a equipe está completa ou não, se houve alguma denúncia dos órgãos de
controle, se a equipe está duplicada, ou seja, se um mesmo profissional está cadastrado em
dois Municípios, trata-se mais, de uma questão de ordem legal. O filtro mais refinado, não
chega diretamente no Ministério, em razão da existência da esfera do Estado. Explica que o
Ministério vem implementando uma série de estratégias, como uma política de avaliação da
Atenção Básica, em que se está trabalhando o fortalecimento da equipe estadual, uma vez que
o Estado está mais próximo:
A gente tem um número, inclusive de corpo técnico, você vê que toda
avaliação e monitoramento está nesta sala, do Brasil inteiro, então a gente
não tem capacidade de olhar, se a gente não contar com a co-
responsabilidade dos níveis de gestão, então, nós temos que contar com a
equipe estadual, com as regionais de saúde, porque todo Estado tem,
principalmente, os Estados grandes como Santa Catarina, que tem as
regionais e que as regionais têm este papel de serem os representantes do
Estado próximo aos municípios.
107
Continua, explicando que o Ministério é como uma testemunha, um histórico que é
acionado para confirmar uma informação. O que o Ministério faz é um acompanhamento não
de dados de produção, mas dos indicadores de saúde:
Nós temos quatro indicadores de saúde na Portaria, que são atrelados à nossa
responsabilidade, então, a gente tem alguns indicadores, tem todo um
conjunto de indicadores hoje que estão no pacto pela saúde, o número da
Portaria é 91, se você quiser consultar, o indicadores globais que hoje os
Municípios, o Estado e o Governo Federal estão pactuando como
compromissos para melhoria do Estado e da condição de saúde da
população, é um conjunto de 50 indicadores de saúde que esta Portaria
aborda. Destes 50 indicadores tem 21 que são da Atenção Básica, então a
gente olha anualmente, que esta informação é construída todos os meses,
claro, então a gente tem um olhar mensal pra este conjunto de indicadores,
que eles são muito mais de resultado de intervenções, então equipes, a gente
olha a cobertura pelo Saúde da Família.
Entende que a verificação da produção da equipe é atribuição precípua do gestor
municipal com sua equipe de trabalho. O Ministério divide esta responsabilidade e, do ponto
de vista do gestor federal olha os dados de resultado, “se a equipe atendeu tantos ou tais, isto a
gente vai ver depois o quanto isso influenciou ou não, então a gente olha indicadores muito
mais que a gente chama de resultado do que aqueles de processo, embora, também olhamos
quando demandados.”
Explica a atuação do Ministério de acordo com a Portaria 648/2006:
Então, a gente tem aqui na Portaria os principais indicadores, hoje a gente
analisa os municípios em relação a estes indicadores aqui, está na Página 37,
que a média anual de consultas médicas por habitantes nas especialidades
básicas, então eu vou olhar mês a mês a minha produção, mas existe um
indicador de que a gente precisa prestar ao cidadão, então é de uma média
que a gente consensua à frente dos países da América Latina de no mínimo,
1 e 1,5 consulta, é um indicador meio engraçado, mas é 1 e 1,5 consulta.
Santa Catarina se eu não me engano, pactuaram 1,9, quer dizer tem Estado
que já tem condição de pactuar quase 2 consultas habitante/geral, isso é dado
geral, mas quer dizer que cada cidadão teve acesso pelo menos uma vez,
outros nenhuma vez porque não precisaram, outros duas, quer dizer o
indicador é um número geral, a gente parte de medidas de epidemiologia,
então a gente tem este indicador. Outro indicador é a proporção de nascidos
vivos de mães com 4 ou mais consultas de pré-natal, então se mensalmente
aquela equipe está ou não produzindo, mas o Município tem que dar conta
de suas gestantes serem atendidas na rede pública com 4 ou mais consultas, e
a razão de mulheres com exames cérvico-vaginais, entre 25 e 59 anos,
selecionado de todos os 21 indicadores principais, estes quatro. As mulheres
que tiveram acesso à prevenção de câncer oncológico, do câncer do colo de
útero e a cobertura vacinal. Então, a gente pegou ações gerais da população,
imunização e pré-natal e câncer feminino, colo de útero, como ações
marcadoras do que está acontecendo, então, estes indicadores são muito
108
importantes como todos os outros, mas estes mais, porque a gente está,
sim a gente olha Município a Município, e no caso do indicador não estar
atendendo, aí sim a gente contata o Estado, pergunta o que está acontecendo,
etc.
A Coordenadora do Programa Saúde da família do Município de Correia Pinto, Léia
Vieira Gallas, acompanhou a entrevista e se manifestou no sentido de que uma
preocupação acerca do acompanhamento das prioridades pelo profissional enfermeiro.
Referiu que o acompanhamento não precisa ser feito exclusivamente pelo médico, podendo
ser feito pelo enfermeiro. Todavia, os boletins, os impressos não contemplam a consulta de
enfermagem, contemplam atendimento médico e de enfermagem, não diferenciando quantas
são consultas médicas e quantas são de enfermeiro.
Em resposta, a Coordenadora de Acompanhamento e Avaliação do Departamento de
Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, explica que se encontra sub judice o dispositivo
previsto no anexo I, da Portaria 648/2006, que prevê como atribuição específica do
enfermeiro a realização de assistência integral (promoção e proteção à saúde, prevenção de
agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde), mais especificamente,
no que se refere à realização de consulta de enfermagem, de forma que a consulta de
enfermagem não pode ser considerada na forma prevista na Portaria:
E, o segundo item, realizar consulta de enfermagem, nós estamos sendo
processados por causa deste segundo artigo aqui, então, tudo reflete a nossa
realidade, infelizmente a gente não teve como incorporar, esta questão não
está decidida, existe uma contenda neste sentido, nós que fizemos inúmeras
justificativas, nós levantamos o que nós temos como medir consultas de
enfermagem pelo SAI, a gente faz um comparativo, nós medimos com outro
sistema de informação. Na nossa análise técnica a gente o quanto
aumentou a atenção a saúde da população a presença do enfermeiro, mas
ainda não temos como assimilar, enquanto esta Portaria não estiver
regulamentada.
No tocante à existência de avaliação do PSF na esfera federal, informa que o
Ministério da Saúde tem uma avaliação realizada por um pesquisador americano em conjunto
com a Secretaria de Vigilância e Saúde que mostrou que cada 10% de cobertura municipal no
Saúde da Família se torna mais efetivo do que outros fatores sobre a população, tais como:
saneamento, alimentação, etc., perdendo apenas para o analfabetismo da mãe, o que
demonstra o impacto social do Saúde da Família. E, uma outra pesquisa, realizada em todos
os municípios do Brasil que possuem mais de cem mil habitantes. Diz respeito a um estudo de
109
linha de base, que mostra o quanto o modelo Saúde da Família é mais eficaz, mais efetivo que
o modelo de Atenção Comum.
Acredita que a avaliação realizada tem servido como instrumento efetivo para a
tomada de decisão, na medida em que as pesquisas indicam que é preciso continuar. Afirma
que nos últimos cinco anos, foram feitos estudos muito relevantes para a tomada de decisão,
como por exemplo, a publicação da Portaria 648/2006, em função de uma percepção, de uma
avaliação de que existiam 27 Portarias para normatizar o assunto.
Acrescenta que as pesquisas feitas levantam dois problemas principais, o primeiro é a
permanência do profissional médico na equipe, em decorrência da baixa especialização em
clínica geral, em saúde da família ou saúde da comunidade, uma vez que os profissionais são
especialistas do sistema, são outros especialistas que não da Atenção Básica Primária, de
forma que a pesquisa está mostrando que é preciso qualificar o médico e o enfermeiro da
equipe. O segundo, são as condições de infra-estrutura das unidades de saúde, o profissional
de fato, sem condições de trabalho devido à estrutura.
Quanto ao incentivo à integração dos processos avaliativos entre as esferas e o
processo de indução da avaliação às esferas estadual e municipal, aponta a existência de dois
projetos principais, o plano estadual de fortalecimento do monitoramento e avaliação em que
o Ministério tem um projeto financiado pelo banco mundial para a Estratégia Saúde da
Família. Neste projeto se prevê um componente estadual e, para este componente estão
previstos recursos para todos os Estados. O projeto prevê três fases em dez anos e se
encontra no final da primeira fase. A primeira fase contou com a apresentação por parte dos
Estados, de um projeto de capacitação da sua própria equipe em monitoramento e avaliação
com apoio de um centro colaborador, uma universidade, um instituto de pesquisa, para clarear
a avaliação de uma maneira baseada na utilidade, na tomada de decisão e não no aspecto
punitivo. O outro, é o material do FIP, uma avaliação para a melhoria da qualidade da atenção
à Saúde da Família. “Este é um trabalho com padrão de qualidade que nós elaboramos. Então,
a este material o gestor municipal adere por livre vontade, as equipes também fazem uma
adesão interna e é uma auto avaliação, não é uma avaliação externa.” Salienta que os dois
projetos citados são exemplos concretos de como o Ministério busca trabalhar o referencial.
Por último, sobre a transferência de cooperação técnica às esferas menciona “este é
um nó, é que na verdade, uma equipe muito enxuta, mas a gente teve muitas iniciativas e
tem sempre pautado oficinas de capacitação, eu estou dizendo, especificamente, de
monitoramento e avaliação [...]” Explica que a capacitação geralmente acontece em
110
seminários ou em projetos específicos como seminários temáticos de avaliação da Atenção
Básica. Na sua visão, a cooperação é ainda insuficiente, poderia ser maior.
Lembra que, além destas iniciativas, o Ministério tem uma rotina de envio de
técnicos para as atividades estaduais e municipais quando solicitado:
Vai fazer uma capacitação, vai fazer uma oficina, o Município vai fazer um
seminário, sempre que é solicitada a presença de um técnico a gente procura
atender, com consultas internas ou externas, a gente contata alguém que é
referência no Ministério da Saúde que possa atender a solicitação”. A gente
faz isso pró-ativamente, propõe pautas, geralmente, em torno de um tema,
por exemplo, no ano passado a gente teve uma rodada grande em relação a
este projeto em que há um instrumento de planificação que é o PROGRADO
e a Portaria, fora três temas que a gente fez uma rodada grande em todo
Brasil, sempre buscando a Secretaria Estadual como ponto de difusão, a
gente procura nunca ir diretamente ao Município, sempre chamar o Estado,
pra mobilizar, pra acordar.
Com relação ao referencial da descentralização da avaliação, enfatiza que, em sua
opinião, a avaliação é função precípua da gestão. Havendo descentralização tem que haver
iniciativa de avaliação das outras esferas também, tem que fomentar. Considera que é preciso
que se tenha a avaliação em conjunto com a auditoria, uma vez que nem todos os gestores são
muito mobilizados ou convencidos das suas responsabilidades.
5.3 ANÁLISE DOS DADOS
Analisando os dados obtidos através da entrevista com os responsáveis pelo
preenchimento das fichas e relatórios e pelo manejo do SIAB; da coleta de dados do SIAB; e
do conteúdo das falas das entrevistas individuais com os responsáveis pela avaliação do
Programa nas três esferas de governo pôde-se chegar as seguintes constatações:
5.3.1 Preenchimento das fichas e relatórios e lançamento no SIAB
A informação prestada pelas enfermeiras de que as ACS não utilizam as fichas B e
C, de acordo com a orientação do manual do SIAB, por entenderem “que se trata de muito
papel” contraria recomendação do Ministério da Saúde. Conforme vimos no Capítulo III,
subitem 3.4.1 (p. 69), ao tratarmos do SIAB, as fichas do grupo B (B-GES, B-HA, B-DIA, B-
111
TB e B-HAN), devem ser utilizadas para monitoramento de pessoas que necessitem de um
acompanhamento mais sistemático, são grupos prioritários para monitoramento. Devem ser
atualizadas mensalmente. A ficha C refere-se ao Cartão da Criança e deve ser verificada,
mensalmente, pelo Agente Comunitário de Saúde, que observará a vacinação, o
desenvolvimento da criança e suas intercorrências. Neste sentido, caberia uma discussão
acerca de possíveis reformulações no sistema, para uma melhor adaptação ao trabalho das
equipes que reclamam do excesso de documentos a serem preenchidos.
De outra forma, a informação de que a Ficha A é entregue pelo ACS diretamente
para a digitadora do Programa para alimentação do SIAB, antes de ser encaminhada para a
Coordenadora do Programa para análise, evidencia que é possível que os dados da ficha A
alimentem o SIAB sem a análise da Coordenadora.
Situação semelhante pôde ser constatada na análise dos dados referentes ao relatório
PMA2 e os dados lançados no SIAB, uma vez que deveriam coincidir e como se viu nos
quadros 01 e 02 (p. 89) e no gráfico 01 (p. 90), apresentam divergências, apontando
deficiência no monitoramento dos dados.
Ainda, corroborando a deficiência no referido monitoramento, constatou-se a não
intervenção, diante de uma considerável queda de 25,1% no número de cadastrados no mês de
novembro em relação aos cadastrados do mês de outubro, em todas as prioridades analisadas,
conforme demonstrado no quadro 03 (p. 91) e gráfico 02 (p. 91), levando-nos a questionar
como seria possível, por exemplo, que pessoas diabéticas, repentinamente, deixassem de ser
diabéticas ou, simplesmente, desaparecessem. Certamente, a resposta estaria num erro de
registro.
Pode-se dizer então, que a falta de supervisão e controle dos dados produzidos,
devidamente demonstrados através do não preenchimento das fichas de acordo com a
determinação do manual de orientação do SIAB, do encaminhamento de fichas para
alimentação do SIAB sem a devida análise da Coordenadora do Programa, do erro na
digitação dos dados previstos no relatório PMA2 no momento da alimentação dos SIAB e do
erro no registro dos cadastrados, compromete a própria confiabilidade das informações
geradas, razão pela qual, merece maior atenção por parte dos responsáveis pelo
monitoramento dos dados no Município, uma vez que somente uma melhoria na
confiabilidade da produção dos dados permitirá a análise da efetividade do Programa.
Como vimos no capítulo anterior, monitorar é condição para avaliar. O
monitoramento requer a produção sistemática e automatizada de informações precisas. Logo,
o processo de avaliação requer qualidade no registro dos dados, sem o qual não será possível
112
estabelecer as prioridades das ações em saúde. A informação válida é fundamental para um
mínimo de factibilidade da avaliação. É preciso que se criem condições favoráveis para a
qualificação dos dados na composição do sistema de monitoramento. Condições que
simplifiquem e proporcionem a organização dos procedimentos de coleta e tratamento dos
dados em todos os ciclos da implementação.
5.3.2 Relações intergovernamentais
Quanto à relação existente entre os níveis de governo pode-se começar pela
constatação que diz respeito aos dados de acompanhamento dos ACS em relação aos
cadastrados no Programa. Os dados previstos no quadro 04 (p. 92) demonstram que eles se
repetem em todos os meses do ano. Cabe ressaltar que é muito difícil embora obviamente
não seja impossível – que tais dados correspondam à realidade.
Uma das razões para uma cobertura de acompanhamento em 100%, talvez esteja no
fato de que além da composição das equipes e do preenchimento de todos os dados, é a
cobertura através da consolidação da Ficha A, o dado analisado pelo Ministério da Saúde para
liberação dos recursos. A preocupação reside no fato dos Municípios buscarem,
prioritariamente, atingir a cobertura exigida para recebimento do recurso em detrimento da
qualidade do Programa. Esta situação pode ser verificada se analisarmos um dado que não é
requisito para liberação dos recursos que é o caso do número de atendimentos médicos e de
enfermagem em relação ao número de cadastrados no Programa.
Como vimos no quadro 04 (p. 92), e no gráfico 03 (p. 93), o número de atendimentos
médicos e de enfermagem se encontra abaixo do esperado, no mínimo, em relação à
prioridade diabetes, demonstrando que os atendimentos não correspondem às recomendações
dos órgãos competentes. Sobre esta realidade, ou as consultas não estão sendo feitas ou não
estão sendo registradas corretamente, cumprindo-nos ressaltar séria omissão.
De acordo com a Coordenadora do PSF no Município, a estratégia adotada quando
os registros apontam acompanhamento menor que o número recomendado é a realização de
consultas de enfermagem. No entanto, que se considerar que as consultas de enfermagem
não substituem as consultas médicas, restando demonstrada uma inadequada forma de
controle.
Sobre este assunto, como visto na entrevista com a Coordenadora de
Acompanhamento e Avaliação do Departamento de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde,
113
encontra-se sub judice o dispositivo previsto no anexo I, da Portaria 648/2006, que prevê a
possibilidade de realização da consulta de enfermagem, de forma que a consulta de
enfermagem não pode ser considerada na forma prevista na referida Portaria, pelo menos, até
o final da demanda judicial.
Quanto às demais esferas, constatou-se que não realizam análise em relação ao
número de atendimento médico e de enfermagem, ante o entendimento de que a competência
desta análise seria do gestor municipal.
Cabe salientar a colocação do gerente estadual no sentido de que o acompanhamento
dos dados de produção não está sendo feito pelo Estado, em razão de demandar muito
trabalho, bem como porque o sistema não apresenta nenhuma crítica sobre o número de
atendimentos, não importando se num mês uma consulta e no outro mil consultas. E, da
Coordenadora de Acompanhamento e Avaliação do Departamento de Atenção à Saúde do
Ministério da Saúde, que trabalhou com o conceito de autonomia de esfera de gestão no SUS,
a falta de estrutura e de recursos humanos e a regionalização para justificar a ausência desta
análise por parte da esfera federal.
Quanto à alegação da autonomia municipal, tem-se que a assertiva de que o
Município é o responsável imediato pelo atendimento das demandas de saúde, não libera as
demais esferas da responsabilidade, do comprometimento com a melhora na qualidade dos
serviços prestados.
Neste sentido, no dizer de Kleba (2005, p. 322), citada no capítulo III, item 3.3
“Descentralização da política da saúde”, embora o município seja nomeado como “o
responsável imediato pelo atendimento das necessidades e demandas de saúde do seu povo e
das exigências saneadoras em seu território, os poderes públicos estadual e federal são sempre
co-responsáveis na promoção e consolidação dos princípios do SUS”.
Quanto à regionalização compete lembrar o destaque dado por Carvalho e Santos
citados por Kleba (2005) no mesmo capítulo, quando explicaram que regionalizar não
significa apenas distribuir os serviços e ações espacialmente, mas também e, sobretudo
organizá-los com o indispensável suporte técnico e de recursos humanos, com suficiência de
recursos e poder decisório definido.
Conquanto, para isso, é preciso primeiro que o Ministério da Saúde esteja em
condições de prestar o suporte necessário. O que por sua vez, ainda carece de adequações,
pelo menos, foi o que restou comprovado nas palavras da Coordenadora, ao referir que o
Ministério não pode fazer análises como a produção dos profissionais, em razão do número de
técnicos que trabalham no monitoramento e avaliação, referindo que o monitoramento e a
114
avaliação do Brasil inteiro cabiam em uma sala, evidenciando a necessidade de uma melhora
na estrutura e no quadro técnico.
O que se pode perceber é que o Município não utilizou a estratégia adequada para
corrigir o afastamento do objetivo. A Secretaria Regional de Saúde, o Estado e o Ministério
da Saúde, de posse dos dados, não os analisaram, principalmente, porque entendem que a
competência é do Município, cabendo-nos registrar uma omissão das esferas estadual e
federal em relação ao município, ante a falta de empenho no monitoramento das referidas
ações, bem como que a qualidade dos dados não vem sendo prioridade do Programa.
Assim, no que se refere ao cumprimento da responsabilidade de avaliação do
Programa pelas esferas de governo, objetivo principal do presente trabalho, a análise dos
dados demonstrou que não avaliação na esfera municipal, primeiro, ante a confirmação de
que não monitoramento nem intervenção adequados, segundo, porque ao descrever como é
feita a avaliação do Programa, a Coordenadora do Programa no Município, referiu como a
avaliação “deveria” ser feita, terceiro, pela inexistência de dados físicos e informatizados na
Secretaria de Saúde do Município, e quarto, porque o Município não cumpriu o que havia
proposto no projeto de implantação do programa nem no Plano Municipal de Saúde para
desenvolvimento do processo de avaliação, ou seja, não existem relatórios de pesquisa com os
usuários, bem como não reuniões entre as equipes do PSF da região, nem avaliações do
sistema de informação.
Na esfera estadual, representada, primeiro pela Secretaria Regional de Saúde, pode-
se verificar que a descrição da avaliação é a mesma do monitoramento, razão pela qual se
evidencia a falta de avaliação dos dados, inclusive, havendo confusão entre monitoramento e
avaliação. Neste sentido, embora tenhamos visto no capítulo IV, item 4.2 “Monitoramento e
avaliação” que há uma relação entre estas atividades, uma vez que o monitoramento se propõe
a indicar a necessidade de intervenção oportuna que confirma ou corrige as ações
monitoradas, também vimos no mesmo capítulo, que é costume a confusão entre estas
atividades, no entanto, as ações de monitoramento não modificam o conteúdo, a metodologia
e a adequação do Programa. Desta forma, a realização do monitoramento ao revés da
avaliação pode, inclusive, prejudicar o andamento do programa.
Outra confirmação da falta de avaliação na Secretaria Regional de Saúde decorre da
constatação de como são realizadas as supervisões, citadas como forma de avaliação.
Analisando os registros do Município junto à Secretaria Regional de Saúde atestou-se que
durante o período em que a Coordenadora está respondendo pelos trabalhos, somente duas
supervisões foram feitas, a primeira junto à equipe da área IV, do Centro, em 31/08/2005, e a
115
segunda junto às equipes das áreas I e II, do bairro São João, em 27/09/2006. Portanto, as
supervisões não ocorrem, nem ocorreram semestralmente, bem como equipes que não
receberam nenhuma supervisão.
A falta de comprometimento da Secretaria Regional de Saúde, com a qualidade do
Programa, fica evidenciada no momento em que a Coordenadora refere que tem
conhecimento de que muitas vezes os dados são jogados no sistema, porém, não pode
interferir.
Na segunda representação da esfera estadual, Departamento da Atenção Básica,
constatou-se que os procedimentos adotados são referentes ao monitoramento e, ainda, como
o próprio Coordenador declarou “poucas são as ações de monitoramento.” Sobre a avaliação,
tem-se que não houve nenhuma avaliação do PSF, corroborado nas palavras do Gerente “o
Estado ainda não fez nenhuma avaliação do PSF.”
No que se refere à esfera federal, ficou evidenciada a existência de avaliações que
demonstraram, de acordo com a Coordenadora, principalmente, que o modelo de Saúde da
Família é mais eficaz que o modelo de Atenção Comum, razão pela qual restou indicado que
se deve continuar. Todavia, esta avaliação foi realizada em Municípios com mais de cem mil
habitantes, o que não é o caso do município de Correia Pinto e da maioria dos municípios
brasileiros que são de pequeno porte, não possuindo capacidade de gerir suas políticas sociais
e assumir todos os compromissos resultantes do processo de descentralização. De acordo com
Arretche (1999) citada no capítulo II, item 2.3 “Descentralização das Políticas sociais”,
50.000 habitantes é um parâmetro aceitável para que uma cidade tenha uma densidade política
e econômica que lhe permita assumir a gestão de suas políticas sociais e cerca de 90% dos
municípios do país estão abaixo desse parâmetro.
Portanto, diante desta situação e da declaração da Coordenadora de que “o Ministério
da Saúde se baseia na capacidade de gestão dos Estados e Municípios”, pode-se entender
porque o processo de avaliação não está acontecendo. O Município não possui condições de
gerir sua própria política social, o Ministério da Saúde se baseia na capacidade de gestão dos
Municípios, a conseqüência, é a delegação de competência entre as esferas ocasionando a não
realização do instrumento de operacionalização da descentralização político-administrativa do
SUS, no caso, a avaliação do Programa.
Enfim, como se pôde perceber, as esferas Municipal e Estadual o realizam
nenhuma forma de avaliação do Programa, ficando a avaliação por conta da realizada pelo
Ministério da Saúde, embora, não abrangesse o Município estudado. Conquanto,
considerando a declaração da Coordenadora do Município de que não existe retorno dos
116
dados, significa dizer que no município de Correia Pinto não se sabe como o Programa está se
desenvolvendo, se as ações estão dando bons ou maus resultados.
A não realização da avaliação do Programa contraria o disposto na Portaria
648/2006, que como vimos no capítulo III, item 3.4 “O Programa Saúde da Família (PSF)” (p.
64) estabelece que a avaliação do desenvolvimento e do desempenho do programa, é
responsabilidade conjunta das esferas.
Ademais, a ausência de medidas de avaliação evidencia que as atividades têm se
pautado na consolidação e no repasse dos dados, analisa-se apenas a cobertura, possíveis erros
de digitação ou a composição das equipes e, ainda, não de forma rotineira e sistemática.
Assume relevância dentre as dificuldades para a realização da avaliação, a utilização
dos profissionais em outras áreas, como o caso da Coordenadora do PSF do Município, que
também é assessora do Secretário de Saúde, deixando claro, a falta de compromisso dos
Gestores Municipais com o Programa.
Notou-se também, que na transferência de cooperação técnica, como por exemplo, a
capacitação de pessoal, embora se tenha confirmado a realização de capacitação na forma de
seminários e reuniões, bem como a designação de técnicos da esfera federal para dar suporte
ao Estado e ao Município quando solicitado, todas as esferas reconheceram que a questão da
cooperação técnica ainda é deficiente.
Outra questão é a do papel das esferas regional/estadual e federal como indutores da
operacionalização da avaliação nas esferas municipais como visto no capítulo IV, item 4.4,
“Avaliação da Política de Saúde (PSF)” (p. 81). Para tanto, buscou-se identificar quais as
medidas adotadas pelas referidas esferas para induzir a existência da avaliação na esfera
municipal.
Na esfera regional/estadual não foi encontrada nenhuma medida para induzir a
operacionalização da avaliação no Município. Já na esfera federal, notou-se um aspecto
positivo, a existência dos projetos: Planos Estaduais de Monitoramento e Avaliação e
Avaliação da Melhoria da Qualidade junto ao Município (AMQ).
O projeto referido como avaliação da melhoria da qualidade como vimos no capítulo
IV, item 4.4 “Avaliação da política de saúde: (PSF)” se refere ao Projeto Avaliação para
Melhoria da Qualidade da Estratégia Saúde da Família (AMQ). Foi colocado à disposição dos
Municípios, através da livre adesão, em 2005. E, de acordo com o Ministério da Saúde, seu
objetivo específico é incentivar a integração dos processos avaliativos e propiciar aos gestores
municipais, ferramentas de avaliação e gestão da qualidade da estratégia Saúde da Família,
consolidando a proposta de prioridade na avaliação para melhoria da qualidade.
117
A colocação de projetos como o AMQ à disposição dos Municípios demonstra que o
gestor federal está buscando desempenhar o seu papel de indutor da institucionalização da
avaliação. No entanto, considerando que o Projeto foi colocado à disposição em 2005 e que
até a presente data o Município não aderiu, compete-nos questionar a suficiência da
capacidade de indução.
Contudo, primeiro, é necessário que se estabeleçam processos de monitoramento e
controle eficazes em todas as esferas, para depois se possibilitar estratégias de avaliação
condizentes com os objetivos do programa. Segundo, é imprescindível que se implementem
intervenções específicas e atividades de avaliação contínuas sobre a efetividade dos
programas, a fim de que se tomem decisões acertadas. No Ministério da Saúde, na medida em
que as avaliações foram realizadas, observou-se que têm mostrado a necessidade de qualificar
os profissionais e melhorar a infra-estrutura das unidades de saúde, corroborando a assertiva
de que a avaliação serve como instrumento efetivo para a tomada de decisão.
No entanto, a avaliação ainda é restrita. E, como vimos no capítulo IV, subitem 4.1.1
“Avaliação e suas definições” (p. 73) sem avaliar um Programa não como buscar a sua
melhoria, não como identificar seus limites, suas potencialidades e problemas, bem como
não como subsidiar o processo de tomada de decisão na busca da mudança na direção
desejada.
A direção desejada é aquela buscada durante todo transcorrer da história do SUS.
Buscou-se um sistema político democrático federativo, constituído por instâncias
descentralizadas, com desenvolvimento da atenção aos indivíduos, capaz de diminuir as
desigualdades de acesso a serviços públicos e melhorar a qualidade destes serviços.
Ocorre que, somente se chegarão a estes objetivos, se processos como o de
monitoramento e avaliação dos Programas, instrumentos de operacionalização da
descentralização político-administrativa do SUS, forem realizados de verdade, forem levados
a sério pelas esferas estatais, ao contrário, estaremos diante de um grande desperdício, no que
se refere às iniciativas, evoluções e mudanças significativas ocorridas no percurso do SUS
para chegar a uma melhora na qualidade dos serviços.
A descentralização deve servir para produzir avanços no sistema de saúde, todavia,
esta dificuldade observada nas relações intergovernamentais, no processo de monitoramento e
avaliação e na transferência de cooperação técnica, demonstra que a descentralização pode ter
despertado negligência de responsabilização nos representantes do governo, uma vez que
inexistem mecanismos para responsabilizá-los por eventuais falhas na gestão, palavras do
Gerente da Atenção Básica do Estado ao explicar a ausência de análise dos dados de produção
118
nos atendimentos médicos e de enfermagem “este problema é mais difícil de ser corrigido,
uma vez que ninguém vai ser penalizado.”
Em conseqüência, no federalismo cooperativo, desejado pelo setor saúde e adotado
pela Constituição Federal de 1988, não se consegue perceber a cooperação, é pequeno o
empenho e o apoio das esferas estadual e federal aos municípios na consolidação dos
princípios do SUS.
119
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto na fundamentação teórica deste trabalho, o federalismo, definido como
um sistema nacional comum, no qual governo nacional e Estados são partes complementares
de um governo único, que visa à cooperação entre os Estados, com autonomia, repartição de
competências e responsabilidades, foi adotado pelo Brasil sob o modelo cooperativo, no
sentido de estabelecer competências comuns para União, estados e municípios.
Vincula-se às características do federalismo brasileiro o processo de
descentralização, do qual se esperava produziria os mais positivos resultados. Corrobora
Arretche (2002a, p. 26), já citada no capítulo II, subitem 2.2.3 “A história das políticas sociais
no Brasil” ao se referir à descentralização: “esperava-se, produziria eficiência, participação,
transparência, accountability, entre outras atividades esperadas da gestão pública.”
No entanto, para que se possa perceber a marca do federalismo na descentralização,
que é vista como a transferência de autoridade e responsabilidade do governo central para os
subnacionais, esta deve acontecer de forma completa, ou seja, através da descentralização
legislativa, administrativa e política.
Conquanto, a presente pesquisa tinha como objetivo verificar o cumprimento da
responsabilidade de avaliação de cada esfera estatal, numa política pública de saúde, o PSF,
programa do governo federal que envolve a co-gestão estadual e municipal, a fim de verificar
a presença deste instrumento de operacionalização na descentralização político-administrativa
do SUS. Em conseqüência, verificar se a descentralização ocorre de forma completa, sob a
marca do federalismo.
Nesta perspectiva, a pesquisa evidenciou que o excesso de documentos a serem
preenchidos no desenvolvimento do Programa, impõe discussões acerca de reformulações no
sistema, bem como que a falta de supervisão e controle dos dados, requer maior atenção por
parte dos responsáveis pelo monitoramento do programa no Município. Estas são condições
que contribuirão para uma melhor adaptação ao trabalho das equipes e para uma produção de
dados mais confiáveis. Lembrando que, sem a criação de condições que simplifiquem a
produção e organizem o tratamento dos dados não será possível avaliar a efetividade do
Programa.
Outra constatação, a repetição dos dados pelos ACS em relação ao número de
cadastrados e acompanhados, mostra que uma preocupação com o atendimento da
cobertura exigida para a transferência dos recursos em detrimento da qualidade do Programa
120
por parte do Município, que teme a punição com a suspensão da transferência dos recursos
pelo Ministério da Saúde. Todavia, a mesma falta de comprometimento com a qualidade do
Programa pôde ser constatada em relação às demais esferas. Quando observado um possível
afastamento do objetivo, como no caso do número de atendimentos abaixo do recomendado, o
Município utilizou uma estratégia inadequada no momento da intervenção para correção da
ação, já as esferas estadual e federal, sequer intervieram para tentar corrigir a mesma ação.
Ponto principal, que demonstra um sério obstáculo à descentralização, é a clara
delegação de competências entre as esferas, no sentido de se atribuir a responsabilidade pelo
acompanhamento e avaliação dos dados de produção e do Programa à esfera Municipal,
ocasião em que nenhuma das esferas realizou a avaliação. Suas atividades se pautaram na
consolidação dos dados, análise da cobertura, correção de erros de digitação ou de
composição das equipes, ou seja, ações de monitoramento, prejudicando sobremaneira o
processo de tomada de decisão.
Esta delegação de competência deriva da Lei 8.080/90, que em seu artigo 15, incisos
I e II, estabeleceu a avaliação das ações e serviços como competência comum à União,
estados e municípios. Da mesma forma, estabeleceu a avaliação das ações e serviços como
competência de cada esfera de governo, à direção nacional do SUS em seu artigo 16, inciso
XVII; à direção estadual do SUS em seu artigo 17, inciso II; e à direção municipal do SUS em
seu artigo 18, inciso I. Atualmente, a Portaria 648/06, redefiniu as responsabilidades de cada
esfera de governo na Atenção Básica e no PSF, mantendo a avaliação como responsabilidade
conjunta entre as esferas.
O fato da lei 8.080/90 ter estabelecido a avaliação das ações e serviços como
competência comum às três esferas de governo, bem como ter estabelecido a avaliação das
ações e serviços como competência de cada esfera de governo, permite que uma esfera atribua
à outra a competência de avaliar. De todo modo, além da necessidade da realização de um
planejamento estratégico nacional do SUS por todas as esferas, é preciso que se clarifique a
divisão de competências, a fim de que cada esfera entenda qual a sua real atribuição.
Cabe lembrar que, embora, caiba ao município a responsabilidade de prestar
atendimento à população, e à União e aos estados a cooperação técnica e financeira necessária
ao desempenho desta função, compete às esferas estadual e federal se comprometer com a
melhora na qualidade dos serviços prestados na esfera municipal, inclusive, porque é evidente
a dependência econômica, administrativa e política dos Municípios ao governo estadual ou ao
governo federal. Na realidade, porém, o que se percebeu no caso da avaliação do PSF no
município de Correia Pinto, foi uma restrita participação das esferas estadual e federal.
121
Apesar disso, há que se registrar o esforço do Ministério da Saúde para cumprir o seu
papel como indutor da institucionalização da avaliação no Município através da colocação à
disposição dos Municípios dos projetos: Planos Estaduais de Monitoramento e Avaliação e,
Avaliação para Melhoria da Qualidade da Estratégia Saúde da Família – AMQ.
Saliente-se, ainda, a falta de condições das esferas estadual e federal para prestarem o
suporte necessário ao Município, demonstrando uma deficiência na transferência de
cooperação técnica. Deficiência verificada, inclusive, na ausência de retorno dos dados ao
Município, que não sabe como o Programa está se desenvolvendo, se vem trazendo bons ou
maus resultados.
Diante destas constatações, pode-se dizer que a descentralização político-
administrativa do SUS, no que se refere à responsabilidade de avaliação das ações e serviços
de saúde, não tem acontecido com interdependência entre as esferas estatais. E, considerando
que a interdependência entre os níveis de governo é definidora do desempenho da gestão das
políticas sociais, pode-se compreender a inexistência de políticas sociais adequadas e
suficientes. Pode-se, também, dizer que a descentralização político-administrativa do SUS não
contém todos os seus instrumentos de operacionalização, o que por sua vez demonstra que a
descentralização não ocorre de forma completa.
Como vimos no capítulo IV, item 4.4 “Avaliação da política de saúde: (PSF)”,
somente através da institucionalização da avaliação poder-se-ia ter um instrumento importante
para a tomada de decisão no âmbito das políticas sociais, bem como poder-se-ia colaborar
para o sucesso da descentralização.
Nossa avaliação é a de que está na hora da esfera federal, nível de governo que dirige
e coordena a implementação das políticas descentralizadas, fortalecer a sua capacidade
institucional e administrativa, suas estratégias de indução, sua função regulatória e de
acompanhamento, a transferência de cooperação técnica, para poder dotar o Município de
capacidade institucional.
Da esfera estadual, espera-se um maior comprometimento com a melhora na
qualidade dos serviços prestados, um maior empenho na organização e no desenvolvimento
das áreas municipais de saúde e, principalmente, que garanta o suporte necessário para
sustentar o processo de descentralização.
Da mesma forma, está na hora do comparecimento efetivo do poder público
municipal na implementação de um Sistema de Controle e Avaliação, através da criação de
uma unidade própria dentro da Secretaria Municipal de Saúde com a função de coordenar o
processo de avaliação dos programas, com pessoal capacitado e treinado para monitorar,
122
avaliar e utilizar os resultados advindos da avaliação. Ainda, o Município deve aderir a
projetos de auto-avaliação, como o projeto Avaliação para Melhoria da Qualidade AMQ do
Ministério da Saúde.
Enfim, é imprescindível que se implementem e aprimorem os mecanismos de
monitoramento e avaliação, tanto no município, quanto nas esferas estadual e nacional como
forma de contribuição para solução do problema social que motivou a implementação do
Programa.
Sem esta decisão, que se impõe aos gestores públicos, é pouco provável que a
descentralização alcance resultados positivos e que se consiga eficiência nas atividades da
gestão pública, seja por carência de embasamento para a tomada de decisões ou pela
dificuldade na elaboração de políticas públicas, como políticas sociais que apresentem
respostas políticas apropriadas às demandas sociais e que produzam resultados reais para a
sociedade.
O caminho para que a descentralização seja reconhecida como uma estratégia
necessária para garantia da melhoria na assistência às demandas locais, para que acorra de
forma completa, sob a marca do federalismo cooperativo e não como um processo de
digitalização e repasse de dados, depende de uma atuação conjunta, complementar entre as
esferas, visto que na cooperação, nenhum ente federado pode atuar isoladamente. Por esta
razão, que se buscar maior efetividade da descentralização e do federalismo cooperativo
adotado pela Constituição, através da abolição da competição e da adoção da coordenação
entre a União e os Estados. Somente assim, o federalismo pode se tornar instrumento do bem-
estar coletivo.
A própria existência de um Estado Federal pressupõe descentralização legislativa,
administrativa e política, sem as quais não teremos uma autêntica democracia no Brasil. O
aumento da competição entre as esferas estatais, no sentido de se atribuir uns aos outros a
responsabilidade pelas políticas públicas tem sido a característica da Federação Brasileira. É
fundamental reconstruir esta Federação, principalmente, criando fortes mecanismos de
interdependência e cooperação entre os níveis de governo.
123
REFERÊNCIAS
ABREU, Cesar Augusto M. R.. Sistema federativo brasileiro: degeneração e reconstrução.
Obra Jurídica Ed. 2004.
ABRUCIO, Fernando. Pacto federativo. Discurso sessão extraordinária. 2005. Disponível
em: http://alerj.rj.gov.br/taqalerj.nsf/0/1ab624370f0b4107032567980065f?. Acesso em: 25
maio 2006.
ALMEIDA, Maria Hermínia Tavares. Recentralizando a federação. Revista Sociologia
Política, nº 24. Curitiba, junho, 2005.
AMARAL, Daniela Simões. Federalismo brasileiro: a busca da descentralização como
forma ideal de Estado Federado. Artigos, outubro, 2006. Disponível em:
http://www.praetorium.com.br/?section=artigo&id=149. Acesso em: 04 set. 2007.
ANDRADE, Luiz Odorico Monteiro de; PONTES, Ricardo José Soares; MARTINS
JUNIOR, Tomaz. A descentralização no marco da reforma sanitária no Brasil. Washington,
Revista Panamericana de Saúde Pública, vol. 8, nº 1-2, 2000.
ARRETCHE, Marta. Políticas sociais no Brasil: descentralização em um Estado federativo.
RBCS, v. 14, n. 40, junho, 1999.
_____. Estado federativo e políticas sociais: determinantes da descentralização. Rio de
Janeiro: Revan. 2000.
_____. Tendências no estudo sobre a avaliação. In: RICO, Elizabeth Melo. (Org). Avaliação
de políticas sociais. 3 ed. São Paulo: Cortez: Instituto de Estudos Especiais, 2001.
_____. Relações Federativas nas políticas sociais. Educ. Soc. Campinas, v. 23, n. 80,
setembro, 2002.
_____. Federalismo e relações intergovernamentais no Brasil: a reforma de programas sociais.
Revista de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, vol. 45, nº. 3, 2002.
_____. Federalismo e políticas sociais no Brasil: problemas de coordenação e autonomia.
São Paulo em Perspectiva, 2004.
124
_____. Financiamento federal e gestão local de políticas sociais: o difícil equilíbrio entre a
regulação, responsabilidade e autonomia. Ciência & Saúde Coletiva. Rio de Janeiro, vol. 8,
nº. 2, 2003.
BARRETO JUNIOR, Francisco Irineu; SILVA, Zilda Pereira da. Reforma do sistema de
saúde e as novas atribuições do gestor estadual. São Paulo em Perspectiva. São Paulo, vol.
18, nº 3, julho, 2004.
BAUER, Mertin W; GASKELL, George; ALLUM, Nicholas C. Qualidade, quantidade e
interesses do conhecimento. In: BAUER, Marin W.; GASKELL, George (Ed.). Pesquisa
qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. 3ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
BEHRING, Elaine Rossetti; BOSCHETTI, Ivanete. Política social: fundamentos e história.
3.ed. São Paulo: Cortez, 2007.
BERCOVICI, Gilberto. Dilemas do estado federal brasileiro. Porto alegre: Livraria do
Advogado Ed., 2004.
BRASIL, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Editora Revista dos
Tribunais, São Paulo.
BRASIL. Lei Orgânica da Saúde 8.080, de 19 de setembro de 1990. Brasília. Disponível
em: http://saude.gov.br/doc/lei 8080.htm. Acesso em: 03 mar. 2007.
BRASIL. Lei 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Brasília. Disponível em:
http://www.conasems.org.br/doc/lei8114.htm. Acesso em: 03 mar. 2007.
BRASIL, Presidência da República. Lei Orgânica da Assistência Social, 8.742, de 7 de
dezembro de 1993, publicada no DOU de 8 de dezembro de 1993.
BRASIL. Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde – SUS (NOB 01/96),
Departamento de Imprensa Nacional/Diário Oficial da União. Brasília, 1996.
BRASIL. Ministério da Saúde, SIAB: Manual do Sistema de Informação de Atenção Básica.
Secretaria de Assistência à Saúde, Coordenação de Saúde das Comunidades. Brasília, 1998.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Cadernos de Atenção Básica.
Programa Saúde da Família. A implantação da Unidade de Saúde da Família, Brasília, 2000a.
125
BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Saúde da Família. Brasília, 2000b.
BRASIL. Ministério da Saúde. Relatório de Gestão 2003. Departamento Nacional de
Auditoria do SUS DENASUS. Brasília, 2004. Disponível em: http://sna.saude.gov.br.pdf.
Acesso em: 30 jan. 2008.
BRASIL. Ministério da Saúde. Monitoramento e avaliação da atenção básica em saúde.
Coordenação de acompanhamento e Avaliação da Atenção Básica. Brasília, 2005.
BRASIL. Ministério da Saúde. Divulga o Pacto pela Saúde 2006 consolidação do SUS e
aprova as Diretrizes Operacionais do Referido Pacto. Portaria nº. 399/GM de 22 de fevereiro
de 2006. Diário Oficial da União nº. 39, 23/02/2006, seção 1. Brasília, DF, fevereiro de
2006a.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 648, de 28 de março de 2006. Aprova a Política
Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a
organização da Atenção sica para o Programa Saúde da Família (PSF) e o Programa de
Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Diário Oficial, Brasília, 2006b.
BRASIL. Ministério da Saúde. Avaliação da atenção básica: experiências e possibilidades.
Revista Brasileira Saúde da Família, ano VIII, nº. 13, Brasília, 2007.
CAFARATTE, Viviane Machado. Federalismo: uma análise sobre sua temática atual.
Agosto, 2002. Disponível em: http://jus2.vol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3249. Acesso em:
04 set. 2007.
CIASC. Centro de Informática e Automação de Santa Catarina, 2002. Disponível em:
http://www.sc.gov.br/portalturismo/Default.asp?CodMun=253&Pg=1. Acesso em: 29 mar.
2008.
COHEN, Ernesto; FRANCO, Rolando. Avaliação de projetos sociais. Rio de janeiro, 1993.
CORREA, Tatiana Berns; VIEIRA, Bräscher Regina. Plano Municipal de Saúde de Correia
Pinto. Correia Pinto, 2006.
DRAIBE, Sônia M. A política social no período FHC e o sistema de proteção social. São
Paulo. 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci. Acesso em: 04 out.
2007.
126
FALLETI, Tulia. Efeitos da descentralização nas relações intergovernamentais: o Brasil em
perspectiva comparada. Sociologias. Porto Alegre, ano 8, n. 16, jul/dez 2006, p. 46-85.
FARIA, Regina M.. Avaliação de programas sociais: evoluções e tendências. In: RICO,
Elizabeth Melo. (Org.). Avaliação de políticas sociais. 3 ed. São Paulo: Cortez: Instituto de
Pesquisas Especiais, 2001.
FREY, Klaus. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da
análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e Políticas Públicas, 21, junho de
2000.
GALLAS, Léia Vieira. Projeto de Implantação do PSF. Correia Pinto, 2006.
GARCIA, Ronaldo Coutinho. Subsídios para organizar avaliações da ação
governamental. Texto para discussão nº 776. Brasília, janeiro, 2001.
GOMES, Maria de F. C. Marques. Avaliação de políticas sociais e cidadania: pela
ultrapassagem do modelo funcionalista clássico. In: SILVA, Maria Ozanira da Silva e. (Org.).
Avaliação de políticas e programas sociais: teoria & prática. São Paulo: Veras Editora,
2001.
HÖFLING, Eloísa Matos de. Estado e políticas (públicas) sociais. Campinas, 2001.
Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci. Acesso em: 26 set. 2007.
KLEBA, Maria Elisabeth. Descentralização do sistema de saúde no Brasil: limites e
possibilidades de uma estratégia para o empoderamento. Chapecó: Argos, 2005.
LIMA, Nísia Trindade, GERCHMAN, Silvia; Edler, Flavio Coelho. Saúde e democracia:
história e perspectivas do SUS. Rio de janeiro: Editora Fiocruz, 2005.
LOBO, Thereza. Avaliação de processos e impactos em programas sociais: algumas questões
para reflexão. In: RICO, Elizabeth Melo. (Org.). Avaliação de políticas sociais. 3 ed. São
Paulo: Cortez: Instituto de Estudos Especiais, 2001.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 11 ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
MELO. Marcus André. As sete vidas da agenda pública brasileira. In: RICO, Elisabeth Melo.
(org.). Avaliação de políticas sociais. 3 ed. São Paulo: Cortez: Instituto de Estudos Especiais,
2001.
127
MENDES, Eugênio Vilaça. A atenção primária à saúde no SUS. Fortaleza: Escola de Saúde
Pública do Ceará, 2002. 92 p.
MENDES, J. Marcos; GALL, Norman. O que é federalismo? Braudel Papers, 24, 2000.
Disponível em: http://www.normangall.com/brazil.art9eng.htm. Acesso em: 04 set. 2007.
MOREIRA, Tadiana Maria Alves. Estudo de caso da avaliação da descentralização das
ações pragmáticas de hanseníase. [Doutorado] Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de
Saúde Pública; 2002.
PINTO FILHO, Francisco Bilac M.. A intervenção federal e o federalismo brasileiro. Rio
de janeiro: Forense, 2002.
RESENDE, Fernando; AFONSO, José Roberto. A Federação brasileira: desafios e
perspectivas. In: RESENDE, Fernando e OLIVEIRA, Fabrício Augusto de. (Org.).
Federalismo e integração econômica regional: desafio para o Mercosul. Rio de Janeiro:
Konrad Adnauer Stiftung, 2004.
RIGOBELLO, Jorge Luiz. A utilização do Sistema de Informação Básica – SIAB pelos
profissionais médicos das equipes de saúde da família, dos municípios de abrangência da
Direção Regional de Saúde XVIII, Ribeirão Preto, S. P., 2006.
RIZOTTI, Maria L. A.. Estado e sociedade civil na história das políticas sociais
brasileiras. Londrina, 2001. Disponível em: http://www.uel.br/proppg/semina-22-1-21-
29.pdf. Acesso em: 26 set. 2007.
ROCHA, Miriam T. V. Sodré. O gestor municipal de saúde e o programa de saúde da família:
estudos de casos. . [Especialização] Universidade Federal do Mato Grosso, Instituto de Saúde
coletiva; 2003. Disponível em: http://busms.saude.gov.br/bus/ct/pdf/miriam.monografia.pdf.
Acesso em: 26 set. 2007.
SCHOLZ, Cley. Assistência Social. In: LAMOUNIER, Bolívar e FIGUEIREDO, Rubens. A
era FHC um balanço. São Paulo: Cultura Editora Associados, 2002.
SILVA, Anderson Soares da; LAPREGA, Milton Roberto. Avaliação crítica do sistema de
Informação da Atenção Básica (SIAB) e de sua implantação na região de Ribeirão Preto,
São Paulo, Brasil. Caderno de Saúde Pública: Rio de Janeiro, 2005. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n6/21.pdf. Acesso em: 15 abr. 2007.
128
SILVA, Maria Ozanira da Silva e. Avaliação de políticas e programas sociais: aspectos
conceituais e metodológicos. In: SILVA. Maria Ozanira da Silva e. (Org.). Avaliação de
políticas e programas sociais: teoria & prática. São Paulo: Veras editora, 2001.
SINGER, André. Saúde. In: LAMOUNIER, Bolívar e FIGUEIREDO, Rubens. A era FHC
um balanço. São Paulo: Cultura Editores Associados, 2002.
SOUZA, Adalberto Pimentel Diniz de. A mecânica do federalismo. Brasília a. 42, n. 165,
jan./mar., 2005.
SOUZA, Celina. Federalismo e gasto social no Brasil: tensões e tendências. Lua Nova:
revista de cultura e política, nº 52, jan., 2001.
SOUZA, Celina. Políticas Públicas: uma revisão da literatura. Sociologias. Porto Alegre, ano
8, n. 16, jul/dez 2006, p. 20-45.
TAKEDA, Silva M. Pasa; DIERCKS, Margarida Silva. A avaliação como um aprendizado
que enfatiza aprendizado e mudanças. In: Ministério da saúde. Avaliação d Atenção Básica:
Experiências e possibilidades. Brasília, 2007.
TEIXEIRA, Carmem Fontes; PAIM, Jairnilso Silva.; VILASBÔAS, Ana Luiza. SUS,
modelos assistenciais e vigilância da saúde. Texto elaborado para a oficina de vigilância em
saúde do IV congresso Brasileiro de epidemiologia. Iesus, VII, 1998.
TEIXEIRA, Sonia M. F.. Política social e democracia: reflexões sobre o legado da
seguridade social. Rio de janeiro, 1985. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci. Acesso em: 26 set. 2007.
VOGT, Carlos. Descentralização e a municipalização da saúde. Políticas Públicas:
proteção e emancipação. 2002. Disponível em: http://www.com
ciencia.br?reportagens/ppublicas/pp06.htm. Acesso em: 02 jan. 2007.
129
APÊNDICES
130
APÊNDICE A - ENTREVISTA COM OS RESPONSÁVEIS PELO
PREENCHIMENTO DOS DOCUMENTOS E MANEJO DO SIAB NO MUNICÍPIO DE
CORREIA PINTO
NOME DOS ENTREVISTADOS:
FORMAÇÃO:
CARGO:
TEMPO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO:
CARGO PROVIMENTO:
DATA:
Como é a rotina dos profissionais das equipes do Programa no preenchimento das
fichas e relatórios e no lançamento dos dados no SIAB?
131
APÊNDICE B – AVALIAÇÃO DO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA
AVALIAÇÃO DO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA - ESFERA
MUNICIPAL
ENTREVISTA COM O COORDENADOR MUNICIPAL DO PROGRAMA
SAÚDE DA FAMÍLIA DO MUNICÍPIO DE CORREIA PINTO
NOME DO ENTREVISTADO:
FORMAÇÃO:
CARGO:
TEMPO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO:
CARGO PROVIMENTO:
DATA:
1. Como ocorre o acompanhamento pela Secretaria Municipal de Saúde dos dados referentes
ao PSF encaminhados pelo Município através do SIAB à Secretaria Regional de Saúde?
2. Nos casos em que o número de atendimentos aparece abaixo do número esperado, existe
intervenção da esfera municipal para verificação da situação atual com a ideal e verificação de
um possível afastamento do objetivo? Avaliação da qualidade dos dados.
3. Existe avaliação do PSF na esfera municipal?
4. As ações de fiscalização, monitoramento e avaliação do Programa são realizadas de forma
rotineira e sistemática? Qual sistema?
5. De que forma a avaliação tem servido como instrumento efetivo para a tomada de decisão?
6. Além da cooperação financeira, o município recebe cooperação técnica da esfera estadual
ou federal para a execução do Programa? Quais as formas de cooperação técnica?
7. Os dados encaminhados às esferas estadual e federal retornam para o Município?
8. O Município vem cumprindo com o proposto no Projeto de Implantação do PSF e no Plano
Municipal de Saúde, no que diz respeito à forma de avaliação?
132
AVALIAÇÃO DO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA - ESFERA
REGIONAL
ENTREVISTA COM O COORDENADOR DO PROGRAMA SAÚDE DA
FAMÍLIA DA SECRETARIA REGIONAL DA SAÚDE
NOME DO ENTREVISTADO:
FORMAÇÃO:
CARGO:
TEMPO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO:
CARGO PROVIMENTO:
DATA:
1. Como ocorre o acompanhamento pela Regional de Saúde dos dados referentes ao PSF
encaminhados pelo Município através do SIAB?
2. Nos casos em que o número de atendimentos aparece abaixo do número esperado, existe
intervenção da Regional de Saúde para verificação da situação atual com a ideal e verificação
de um possível afastamento do objetivo? Avaliação da qualidade dos dados.
3. Há avaliação do PSF na Secretaria Regional de Saúde?
4. As ações de fiscalização, monitoramento e avaliação do Programa são realizadas de forma
rotineira e sistemática? Qual sistema?
5. De que forma a avaliação do PSF tem servido como instrumento efetivo para a tomada de
decisão?
6. Além da cooperação financeira transferida da esfera federal para a esfera municipal, o
município recebe cooperação técnica da Regional de Saúde para a execução do Programa?
Quais as formas de cooperação técnica? Capacitação, apoio, etc.
7. Existe fiscalização por parte da Regional de Saúde, no sentido de verificar se as avaliações
estão ocorrendo na esfera municipal?
133
AVALIAÇÃO DO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA - ESFERA
ESTADUAL
ENTREVISTA COM O GERENTE DO DEPARTAMENTO DA ATENÇÃO
BÁSICA DA SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE
NOME DO ENTREVISTADO:
FORMAÇÃO:
CARGO:
TEMPO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO:
CARGO PROVIMENTO:
DATA:
1. Como ocorre o acompanhamento pela Secretaria de Estado da Saúde dos dados referentes
ao PSF encaminhados pelo Município através do SIAB?
2. Nos casos em que o banco de dados informa a produção mensal das equipes, todavia, o
número de atendimentos aparece abaixo do número esperado, existe intervenção da esfera
estadual para verificação da situação atual com a ideal e verificação de um possível
afastamento do objetivo? Avaliação da qualidade dos dados.
3. Há avaliação do PSF na Secretaria Estadual de Saúde?
4. As ações de fiscalização, monitoramento e avaliação do Programa são realizadas de forma
rotineira e sistemática? Qual sistema?
5. De que forma a avaliação tem servido como instrumento efetivo para a tomada de decisão?
6. De que forma ocorre a cooperação técnica da esfera estadual para a esfera municipal para a
execução do Programa? Capacitação de pessoal.
7. Considerando que é papel do gestor estadual ser indutor da operacionalização da avaliação
nas esferas municipais, existe fiscalização no sentido de verificar se as avaliações estão
ocorrendo na esfera municipal?
134
AVALIAÇÃO DO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA - ESFERA FEDERAL
ENTREVISTA COM A COORDENADORA DE ACOMPANHAMENTO E
AVALIAÇÃO DO DEPARTAMENTO DE ATENÇÃO BÁSICA DA SECRETARIA
DE ATENÇÃO À SAÚDE DO MINISTÉRIO DA SAÚDE
NOME DO ENTREVISTADO:
FORMAÇÃO:
CARGO:
TEMPO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO:
CARGO PROVIMENTO:
DATA:
1. Como ocorre o acompanhamento pelo Ministério da Saúde dos dados referentes ao PSF
encaminhados pelo Município através do SIAB?
2. Nos casos em que o banco de dados informa a produção mensal das equipes, todavia, o
número de atendimentos aparece abaixo do número esperado, existe intervenção da esfera
federal para verificação da situação atual com a ideal e verificação de um possível
afastamento do objetivo?
3. Há avaliação do PSF na esfera federal?
4. De que forma a avaliação tem servido como instrumento efetivo para a tomada de decisão?
5. Sendo objetivo da Coordenação de Acompanhamento e Avaliação incentivar a integração
dos processos avaliativos, quais as medidas adotadas?
6. As ações de fiscalização, monitoramento e avaliação do Programa são realizadas de forma
rotineira e sistemática? Qual sistema?
7. Além da cooperação financeira transferida da esfera federal para a esfera municipal para a
execução do Programa, sabemos que existe a transferência de cooperação técnica, poderia
descrever as formas de transferências de cooperação técnica?
135
ANEXOS
136
ANEXO A – RELATÓRIO PMA2 E LANÇAMENTO NO SIAB NO ANO DE 2006,
QUANTO AO NÚMERO DE ATENDIMENTOS MÉDICOS E DE ENFERMAGEM, NAS
PRIORIDADES: DIABETES, HIPERTENSÃO, PUERICULTURA E PRÉ-NATAL
137
138
139
140
141
142
143
144
145
146
147
148
149
150
151
152
153
ANEXO B – LANÇAMENTO NO SIAB NO ANO DE 2006, NÚMERO DE
CADASTRADOS, ACOMPANHADOS PELOS ACS E ATENDIMENTOS MÉDICOS E
DE ENFERMAGEM, NAS PRIORIDADES: DIABETES, HIPERTENSÃO,
PUERICULTURA E PRÉ-NATAL