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I.4 - Análise de uma prática clínica recortada do Campo Institucional da Atenção
Psicossocial cujo operador estruturante é o Sujeito
Orientados por esta ética, apresentaremos uma experiência clínica afirmadora da
operação do sujeito com o saber do inconsciente.
A prática analítica num CAPS, dispositivo clínico-político que fundamenta a mudança
de paradigma no campo do cuidado em Saúde Mental no Brasil, provocou-nos certas
inquietações. Estas novas estratégias de cuidado, advindas desta transformação, supõem uma
rede ampliada de dispositivos clínicos de atenção psicossocial extra-hospitalares, na qual o
CAPS é um instrumento estratégico fundamental. Sua função de ordenação da demanda do
território impõe, como função, a interconexão com diversos serviços, a saber: ambulatórios
ampliados de Saúde Mental com Oficinas Terapêuticas, Centros de Convivência, Serviços
Residenciais Terapêuticos, Leitos de Atenção Integral ( Urgência e Emergência Psiquiátricas)
em Hospital Geral, recursos sócio-culturais e comunitários, etc.
Os CAPS apresentam diversas práticas clínicas constituídas por múltiplas disciplinas
e saberes (médico-psiquiátricos, psicológicos, sociais, artísticos, etc.). Estes múltiplos saberes
e disciplinas constituem o que Laurent denominou como “[...] uma comunidade heterogênea,
que se funda sobre uma certa pragmática [...]”
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.
Para além das convergências e impasses que esses encontros podem produzir, e de
uma suposta antinomia existente entre a prática da Psicanálise, de um lado, e a prática dos
cuidados psicossociais, do outro, propomo-nos, com a apresentação desta experiência,
sustentar que a ética da psicanálise, enquanto balizadora da posição do analista, ao tomar o
operador sujeito como seu fundamento, constitui a direção pela qual o exercício e transmissão
da psicanálise se faz possível no campo da atenção psicossocial, e pode, deste modo,
inclusive, contribuir para o redimensionamento das diretrizes políticas e assistenciais
intrínsecas a este campo.
Vale destacar, de início, que a inclusão social e o resgate da cidadania não são, na
perspectiva psicanalítica, meros objetivos reabilitadores a serem alcançados, mas sim vetores
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LAURENT, Eric. “Psicanálise e saúde mental”. Op. cit., p. 165. É valido destacar esta dimensão de “uma certa
pragmática” intrínseca ao campo da saúde mental, já que no desdobramento desta dissertação apontaremos para
o DSM como “a pragmática do comportamento”. A elaboração de quais são as faces dessa pragmática inscrita no
campo da saúde mental, não é o objeto de nosso trabalho. Pretendemos, apenas, apontar que parece haver uma
certa correlação entre o pragmatismo da ciência contemporânea, na qual tomamos como paradigma o DSM, e
algumas práticas existentes nos CAPS.