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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
VIVIAN PATCIA CABERLON NUNES
A INCLUSÃO DIGITAL E SUA CONTRIBUIÇÃO NO COTIDIANO DE IDOSOS:
POSSIBILIDADE PARA UMA CONCEPÇÃO MULTIDIMENSIONAL DE
ENVELHECIMENTO
Porto Alegre
2006
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VIVIAN PATCIA CABERLON NUNES
A INCLUSÃO DIGITAL E SUA CONTRIBUIÇÃO NO COTIDIANO DE IDOSOS:
POSSIBILIDADE PARA UMA CONCEPÇÃO MULTIDIMENSIONAL DE
ENVELHECIMENTO
Dissertação apresentada como requisito para
obtenção do grau mestre, pelo Programa de
Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica
curso de mestrado da Pontifícia Universidade
Calica do Rio Grande do Sul.
Orientadora: Pro D.Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
Porto Alegre
2006
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VIVIAN PATCIA CABERLON NUNES
A INCLUSÃO DIGITAL E SUA CONTRIBUIÇÃO NO COTIDIANO DE IDOSOS:
POSSIBILIDADE PARA UMA CONCEPÇÃO MULTIDIMENSIONAL DE
ENVELHECIMENTO
Dissertação apresentada como requisito para
obtenção do grau mestre, pelo Programa de
Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica
curso de mestrado da Pontifícia Universidade
Calica do Rio Grande do Sul.
Aprovada em _______ de ________ de ________
BANCA EXAMINADORA:
_______________________________________
________________________________________
_________________________________________
AGRADECIMENTOS
Ao grupo de idosos voluntários que participaram das Oficinas de Informática,
por sua disponibilidade e apoio ao meu trabalho.
A colega Claudia Tacques que esteve comigo nas diversas situações do
Mestrado, com a qual pude compartilhar e dividir as preocupações.
Aos colegas de trabalho, amigos e familiares que sempre estiveram
presentes, através do seu apoio e preocupação com a minha saúde, com o meu
desempenho e Projeto.
Ao meu querido e amado marido, Adis César Ferreira Nunes, que foi
incansável com seu apoio carinhoso, compreensão e incentivo em todos os
momentos e situações que vivenciei durante o Curso de Mestrado.
A Deus, por sua infinita bondade e abertura dos caminhos nas mais diversas
situações e necessidades.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................8
1 CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO: DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .......13
2 OFICINAS DE INCLUSÃO DIGITAL E COTIDIANO: DISCUSSÃO DOS
RESULTADOS ..........................................................................................................37
3 A CONTRIBUIÇÃO DA INCLUSÃO DIGITAL NA VIDA COTIDIANA DO IDOSO
(artigo).......................................................................................................................47
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................54
RESUMO
A pesquisa realizada teve como objetivo analisar a percepção de idosos sob a contribuição
da inclusão digital em sua vida cotidiana e a mudança ocorrida em suas concepções de
envelhecimento, após freqüentarem oficinas pedagógicas de inclusão digital, assumindo-se
uma concepção de cotidiano construída a partir da complementaridade das idéias de Morin,
(1998, 1999), Heller (1987), Stuart (2002) e Luckman e Berger (1987) em que fica evidente a
importância das relações de autonomia/dependência na construção do sujeito/indivíduo e de
sua relação com o mundo e a tecnologia. Nos estudos de Kachar (2003), Azevedo e Souza
et al. (2002 e 2004), Garcia e Lentini (2002), Garcia, Lentini e Gennaro (2002) e Diáz (2001)
encontrou-se argumentos que corroboram a presença de potencial de constante
aprendizagem em idosos e conseqüente inclusão digital. O estudo foi desenvolvido numa
abordagem qualitativa/dialógica. Os dados foram coletados junto a 25 idosos que
freqüentavam há 6 meses oficinas pedagógicas de alfabetização digital, realizadas duas
vezes por semana, com duração de uma hora, sob a coordenação do Núcleo de Estudos
Interdisciplinares sobre Concepção de Envelhecimento do Programa de Pós-Graduação em
Gerontologia Biomédica do Instituto de Geriatria e Gerontologia, da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul. Durante o desenvolvimento das oficinas os idosos
participavam nas segundas-feiras de atividades de língua espanhola e nas quartas-feiras de
atividades que incluíam a aprendizagem do Word, Powerpoint e WWW/Internet, que foram
aplicadas na elaboração de apresentações sobre envelhecimento em PowerPoint e na
construção de homepage pelos idosos. Os dados foram coletados por observação
participante e por entrevista coletiva, utilizando-se os princípios da dialógica de Morin
(recursivo, hologramático e dialógico) na análise da realidade.A análise dos dados
compreendeu: leitura exploratória global dos registros das observações participantes e das
transcrições das entrevistas; leitura detalhada de cada material coletado; organização do
material por unidades contextuais; identificação das unidades de significados e classificão
em dimensões. Como principais contribuições da inclusão digital foi identificada que a
experiência vivida nas oficinas pedagógicas é uma possibilidade de reconstrução da
identidade do idoso como cidadão do mundo, como possuidor de capacidade para
aprendizagem contínua e para lidar com situações e desafios diários relacionados ao uso da
tecnologia, dando suporte para a reconstrução do conhecimento e a comunicação. Verificou-
se que a incluo digital contribuiu na capacitação de idosos para utilização de recursos
informatizados (Word, PowerPoint, WWW/Internet), na produção intelectual (constrão de
materiais instrucionais sobre envelhecimento); auxiliou na sua integração com a família; na
atualização da linguagem e na comunicação com o mundo, principalmente pelo
reconhecimento do potencial do idoso para a aprendizagem da tecnologia e de uma nova
linguagem, até então concebidas como prerrogativas dos mais jovens. O envelhecimento,
constituindo tema transversal dos materiais instrucionais elaborados pelos idosos nas
oficinas pedagógicas, possibilitou aos idosos perceberem que este processo é constituído
de diferentes dimensões, indo além da biológica, o que possibilitou tecer e compreender a
“arquitetura complexa” do fenômeno envelhecimento ao reconhecerem a presença das
dimensões psicológica, social, cultural e educacional.
PALAVRAS-CHAVE:
Contribuição, inclusão digital, cotidiano, idosos, concepção de envelhecimento
ABSTRACT
The following research aimed at analyzing the perception of elderly people under the
contribution of digital inclusion in their everyday life and the actual change in their
conceptions of aging, after their having attended digital inclusion pedagogical workshops. It
was done by taking a conception of quotidian (everyday life) complementarily built from the
ideas of Morin, (1998, 1999), Heller (1987), Stuart (2002) and Luckman & Berger (1987) in
which the importance of the autonomy/dependency relations in the construction of the
subject and its relation with the world and the technology is evident. In the studies of
Kachar (2003), Azevedo e Souza et al. (2002 and 2004), Garcia & Lentini (2002), Garcia,
Lentini & Gennaro (2002) and Diáz (2001) we found arguments that corroborate the
presence of potential of constant learning in the elderly and consequently digital inclusion.
The study was developed in a qualitative/dialogical approach. The data were collected from
25 elderly people who had been attending pedagogical workshops of digital literacy for six
months. The workshops were held twice a week, in one-hour sessions, under the
coordination of the ‘Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Concepção de
Envelhecimento’ (Center of Interdisciplinary Studies on Aging Conception) of the post
graduation Program in Biomedical Gerontology of the Institute of Geriatrics and Gerontology
of the Pontifícal Catholic University of Rio Grande do Sul (PUCRS). During the development
of the workshops the elderly participated of Spanish-language activities on Mondays and
computer operation activities (including how to work with MS Office Word, PowerPoint and
WWW/Internet) on Wednesdays. Such abilities were applied in the elaboration of PowerPoint
presentations on aging and on their building of homepages. The data were collected by
participative observation and by group interview, using Morin’s dialogical principles
(recursive, hologram and dialogical) in the analysis of reality. The analysis of the data
consisted of global exploratory reading of the records of participative observation and of the
interview transcripts; detailed reading of each collected material; organization of material by
contextual units; identification of significance units and the classification in dimensions. Out
of the main contributions of digital inclusion it was identified that the experience they had in
the pedagogical workshops is a possibility for the elderly to reconstruct their identity as
citizens of the world, one who has the ability to continued learning and can handle situations
and daily challenges related to the use of technology, giving support to the reconstruction of
knowledge and communication. It was verified that digital inclusion contributed on the
qualification of the elderly for using IT resources (Word, PowerPoint, WWW/Internet), on their
intellectual production (creation of instructional material on aging); it helped their integration
with the family; on their update for language and world communication, especially for the
recognition of the elderly potential for the learning of technology and a new language, things
so far conceived as prerogatives of the youth. The aging, as a transversal theme of
instructional material elaborated by the elderly in the pedagogical workshops, allowed them
to perceive this process to be constituted of different dimensions, going beyond the biological
one, which allowed them to weave and comprehend the “complex architecture” of the aging
phenomenon by recognizing the presence of the psychological, social, cultural and
educational dimensions.
KEY-WORDS:
Contribution, digital inclusion, quotidian (everyday life), elderly, conception of aging
INTRODUÇÃO
A importância da pesquisa na área da Gerontologia tem se mostrado
de grande relevância ao processo do desenvolvimento e do conhecimento humano.
Na chegada do século XXI e das possibilidades de novos olhares, mais forte ficou a
percepção de que o envelhecimento e a longevidade vêm acompanhando a
transformação da sociedade. Transformação que traz inseridos os recursos
informatizados em um caminho sem volta.
Os jovens e crianças durante muito tempo tiveram seu direito de
acesso `a tecnologia garantido e defendido, inclusive pelos idosos.
Os próprios idosos considerando-se indesejados foram descartando-se
e sendo descartados do meio do trabalho, social e familiar. Chegando, dentro de
seus parâmetros, a decidir por conta própria a busca de asilo ou casa de repouso,
que na maioria das vezes é paga por ele mesmo. Atitude com a qual a família sentia-
se aliviada. Mas isto não é passado. Hoje, em pleno século XXI ainda encontramos
situações como estas, pois idosos vivem um cotidiano envolvido por uma cultura que
os concebem como improdutivos, respondendo com uma atitude de passividade.
Assim sendo, lentamente abdicam de suas preferências, desejos, sentimentos de
valorização e solidariedade.
Dados
1
demonstram que a população de idosos vem aumentando
consideravelmente. Com os avanços tecnológicos da Medicina e os programas de
qualidade de vida sugeridos às pessoas, através dos meios de comunicação e dos
profissionais da saúde, a concepção de envelhecimento e de idoso parece estar
evoluindo, mostrando também que o idoso é pessoa ativa, e que tem muito a
contribuir com a sociedade, o que em tempos remotos não era percebido no Brasil.
1
IBGE. Perfil dos Idosos Responsáveis pelos Domicílios [online] 2002. [capturado 2006] Disponível
em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/25072002pidoso.shtm
9
A Informática, ao longo dos anos, tem comprovado que é uma
ferramenta de diversas possibilidades de formas de atuação e atualização. Tem
tamm se mostrado, como auxílio a novos modelos de organização da vida, com a
otimização do tempo de dispêndio para realização de trabalhos, tarefas .
2
É verdade que a informática aparece de maneira significativa, nos mais
diversos setores da sociedade, provocando transformações nos aspectos
econômicos e sociais, mexendo com valores e comportamentos das pessoas.
Entre as potencialidades permitidas pela informática, devemos
destacar as possibilidades de sua utilização no processo ensino-aprendizagem. Para
tanto, precisamos retomar algumas concepções sobre aprendizagem.
A aprendizagem pode ser vista como capacidade de adquirir cultura e
incorporar a cultura para assim fazer parte da sociedade; a aprender a conviver com
saberes relativos, parciais, fragmentos de conhecimentos que substituem as
verdades absolutas de antigamente e que requerem uma contínua reconstrução e
integração.
3
Desafio também é estar disposto a adquirir outros conhecimentos
culturalmente relevantes e/ou úteis para si, que refletem na convincia com o outro
no seu cotidiano. É ter a idéia de uma aprendizagem incessante. Por isso, é preciso
uma cultura da compreensão, da análise crítica, da reflexão sobre o que é feito e
sobre o que se acredita, para que se possa compreender e dar sentido ao
conhecimento, a partir da dúvida sobre ele.
3
Aprender pode significar coisas distintas, dependendo das
necessidades culturais. No presente estudo, aprender será entendido como
reestruturação dos conhecimentos, implicando de alguma forma, desaprender.
3
As mudanças baseadas na reorganização dos comportamentos ou do
conhecimento, vinculadas à aprendizagem construtiva, têm características
diferentes. Seu efeito não é substituir, mas integrar este comportamento ou iia
numa nova estrutura de conhecimento. Aprender, torna-se fruto da descoberta e da
exploração curiosa do mundo, produzindo conhecimento por reconstrução do
conhecimento já sistematizado.
3
2
Kachar V. Terceira Idade & Informática: Aprender revelando potencialidades. São Paulo: Cortez;
2003.
3
Pozo JI. Aprendizes e Mestres: A nova cultura da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed; 2002.
10
Sempre com a busca da aprendizagem existe um motivo e, tanto o
aprendiz como o mestre, se tiverem presente este motivo, encontrarão maior
probabilidade que a aprendizagem ocorra de forma mais satisfatória. O êxito na
aprendizagem está relacionada tamm com a interação entre ambos e seus pares,
são as potencialidades respeitadas na construção do conhecimento.
Conhecer como a informática pode ser parceira, permite compreender
e atender melhor à diversidade humana e apresentar algumas possibilidades de sua
utilização com as pessoas, contribuindo para a construção de condições de
acessibilidade, tanto à educação quanto ao trabalho. Este tem significado de vida
para o homem, traz o bem-estar e eleva a auto-estima, no qual necessidades
sociais são satisfeitas e conduzem a resultados úteis às pessoas.
Dizer que trabalho e informática não combinam com o idoso, não é
verdadeiro, pois estudos cientificamente comprovados apontam ao contrário,
afirmando que a atualização tecnológica que faz parte do mercado, tamm é
caminho do idoso que está presente em nossa sociedade e em ummero cada
vez mais significativo. Lembrando que Idoso, segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS) é a pessoa com 60 anos ou mais, nos leva a pensar que:
O declínio de algumas atividades não inviabiliza a
apropriação e o domínio do recurso tecnológico, mas exige um
contexto educacional específico que atenda às condições de
aprender sobre a máquina e por meio dela explorar outras
possibilidades de desenvolvimento do indivíduo.
2
É importante que o idoso seja introduzido no mundo da informática
com abordagens e metodologias adequadas a suas necessidades, uma vez que
este “novo instrumento” gera novas maneiras de relações sociais, familiares e
desenvolve formas de aprendizagem que atingem todas as idades e
automaticamente aproxima as gerações. Como também, rompe a idéia de que o
idoso não aprende ou não é produtivo.
O número de cursos de informática para idosos têm aumentado,
porém muitos são oferecidos sem o cuidado e o conhecimento necessário sobre o
desenvolvimento desta faixa etária.
As pesquisas sobre a aprendizagem e utilização do computador, por
idosos, no Brasil, são ainda escassas, por isto a metodologia de ensino e
aprendizagem específica para eles, apresenta muitos aspectos a serem estudados.
2
11
A presente pesquisa teve como objetivos a construção de pontos de
referência sobre a contribuição da inclusão digital no cotidiano de idosos e analisar
suas concepções de envelhecimento, tendo como menção a análise da concepção
inicial de envelhecimento, realizada com os mesmos idosos em pesquisa anterior,
identificando-se permanentes avanços na concepção deste fenômeno.
O estudo foi desenvolvido numa abordagem qualitativa/dialógica junto
a 25 idosos que freqüentam há 6 meses oficinas pedagógicas de alfabetização
digital, realizadas duas vezes por semana, com duração de uma hora, sob a
coordenação do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Concepção de
Envelhecimento do Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica do
Instituto de Geriatria e Gerontologia, da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul.
Os dados foram coletados por observação participante e por entrevista
coletiva, utilizando-se os princípios da dialógica de Morin (recursivo, hologramático e
dialógico) na análise da realidade.
Como critérios de cientificidade foram utilizados os propostos por Bauer
e Gaskell (2001): triangulação entre dados oriundos da observação participante e
das entrevistas; clareza na descrição dos procedimentos; construção do corpus;
descrição detalhada dos dados; clareza na compreensão/explicação da realidade.
A análise dos dados compreendeu os seguintes movimentos:
a) leitura exploratória global dos registros das observações participantes e das
transcrições das entrevistas;
b) leitura detalhada de cada material coletado;
c) organização do material por unidades contextuais;
d) identificação das unidades de significados e classificação em dimensões;
e) identificação de contradições;
f) síntese dos resultados.
Na presente pesquisa os aspectos destacados foram a contribuição
das oficinas de inclusão digital no cotidiano do idoso, incluindo a caracterização de
sua concepção de envelhecimento, estando este relatório de pesquisa constituído
na forma preconizada pelo Regulamento do Programa de Pós-Graduação em
Gerontologia Biomédica: após a introdução apresenta os capítulos 1 e 2 com a
discussão sobre a concepção de envelhecimento dos participantes do estudo e a
contribuição das oficinas de inclusão digital em seu cotidiano; apresentando-se a
12
seguir o capítulo de livro submetido ao conselho editorial para integrar o livro Actas
da Conferência Ibero-Americana (ISBN 972-99353-1-9), com idéias conclusivas e as
referências bibliográficas utilizadas nos capítulos da discussão, que serão
publicadas em outubro do corrente ano.
1 CONCEPÇÃO DE ENVELHECIMENTO: DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
As atividades desenvolvidas nas oficinas de inclusão digital foram e
estão sendo desenvolvidas, objetivando também o favorecimento de uma concepção
de envelhecimento transpassada pela consciência de que é um processo que não
significa apenas declínio, incluindo possibilidades para produção intelectual e para
utilização de recursos tecnológicos.
No presente estudo, concepção significa configuração original que
constituindo matriz para construções, combinando a aptidão para formar imagens
mentais com aptidão para produzir imagens materiais. Assim sendo, a concepção de
envelhecimento é construída em função de paradigmas, teorias, idéias, palavras,
mitos e discursos que permeiam o contexto cultural.
4
O ambiente de aprendizagem – oficinas pedagógicas - numa
perspectiva não simplificadora do uso do computador, utilizando-se este recurso
como meio para a reflexão sobre concepções humanas e o desenvolvimento de
funções intelectuais superiores, foi de extrema relevância para a realização do
presente estudo.
Os dados sobre concepção de envelhecimento foram coletados por
meio de entrevistas coletivas realizadas com grupos compostos por 04 idosos, tendo
uma duração aproximada de 50 minutos cada uma.
A partir dos dados coletados e analisados, foi constituído o quadro 1,
a seguir, no qual são apresentadas as unidades de significado emergentes das
entrevistas e a síntese das concepções de envelhecimento elaboradas a partir das
falas dos participantes do estudo.
As concepções de envelhecimento dos participantes de 1 a 15, que
pertenciam ao primeiro grupo das oficinas, foram organizadas no estudo realizado
por Glock
5
. Os dados sobre as concepções dos participantes de 16 a 25 foram
coletados e analisados no presente estudo , integrando-se as concepções dos dois
grupos na discussão teórica, como uma totalidade maior (25 idosos), como uma
amostra ampliada.
4
Morin, E. O Método 3: O conhecimento do conhecimento. Porto Alegre: Sulina; 1999.
5
Glock S. Concepções de envelhecimento em homepages elaboradas por idosos [dissertação] Porto
Alegre (RS): Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; 2005.
14
Unidades de registro
Concepção de envelhecimento
Participante 1
Potencial para aprendizagem, para novas formas de
comunicação, estabelecimento de novas relações e novas
dinâmicas de trabalho
Viver, renascer, reviver e despertar para a vida
processo natural, individual, com potencialidades
únicas e distintas
Ter capacidade para articular conhecimentos nas
diferentes áreas, mantendo vivo o potencial do ser humano
Representa a necessidade de estimulação e
desenvolvimento de habilidades presentes.
Principal fator é a inatividade.
É processo natural, individual, com potencialidades
distintas, incluindo potencial para aprendizagem, para o
estabelecimento de novas relações e novas dinâmicas de
trabalho e de articulação de conhecimentos de diferentes áreas
o que implica estímulo e desenvolvimento de habilidades já
presentes. É viver, renascer, reviver e despertar para a vida. O
principal fator limitante é quando há inatividade.
Participante 2
Potencial para aprendizagem e abertura para o mundo
É perda da autonomia e do interesse pela vida, ao
15
infinito
É quando se perde a autonomia e o interesse pela
vida, considerando-se incapaz e improdutiva, é um estado de
espírito
Desafios considerados bem-vindos para testar a
capacidade
considerar-se incapaz e improdutiva, constituindo um
estado de espírito, embora exista o potencial para
aprendizagem e a abertura para o mundo, necessitando
de desafios para testar a capacidade.
Participante 3
Ter curiosidade de conhecer o mundo e utilizar o
conhecimento anterior para melhorar a vida
Utilização das novidades, unindo o novo e passando
pelas experiências que exigem não fechar um conceito por
estar vivendo uma transição
Está mais na cabeça de cada um do que no processo
em si: até o próprio corpo pode ter uma idade e a mente
outra
Querer estar bem consigo mesmo para estar bem com
a vida, é viver o novo
É ter potencial para utilizar novas formas de
comunicação e convívio com os jovens
Está mais na mente de cada um do que no processo em
si, incluindo a possibilidade de conhecer o mundo e utilizar o
conhecimento anterior, para melhorar a vida; utilizar novidades,
demandando não fechar conceitos por estar vivendo uma
transição; precisa incluir o querer e o estar bem consigo; inclui
ter potencial para utilizar formas de comunicação e conviver
com a juventude.
16
Participante 4
Potencial para ampliação do conhecimento e meios de
comunicação
É viver o hoje com olhos voltados para o futuro, sem
esquecer o passado
É um fenômeno multidimensional que atinge de forma
diferente o corpo e a mente
É viver, renascer, reviver e despertar para a vida
É preciso ser ativo, capaz de oferecer respostas
criativas ao conjunto de mudanças sociais
É preciso saber viver com o progresso sem esquecer
princípios morais e adaptando-se os princípios convencionais
É um fenômeno multidimensional, que atinge de forma
diferente o corpo e a mente; é tempo de viver, renascer e
despertar para a vida, com potencial para amplião do
conhecimento e do uso dos meios de comunicação; é viver o
hoje com os olhos voltados para o futuro, não esquecendo o
passado; há necessidade de manter-se em atividade, com
capacidade para criação em relação às mudanças sociais;
envolve saber viver com o progresso sem esquecer princípios
morais, adaptando-se aos princípios convencionais.
Participante 5
Potencial para atualização e produtividade
Conhecimento dos avanços das últimas descobertas
Atividade, participação em iniciativas solirias e na
vida em família
Inclui potencial para atualização, produtividade e para o
conhecimento dos avanços das últimas descobertas, necessita
manter-se em atividade, participar em iniciativas solidárias e na
família, convivendo com pessoas que tragam alegria,
17
Convivências com pessoas que tragam alegria,
conhecimento e cultura
Muita leitura
conhecimento e cultura. É preciso ler muito.
Participante 6
Potencial para atualização
Saber viver
Atividades que dão satisfação
Reviver e renascer
Atividade, mesmo quando é preciso desconsiderar o
que a família deseja
Capacidade de realizar com sabedoria e criatividade
Dignidade, amor à vida e gostar de si mesmo
Pressupõe capacidade de realização com sabedoria e
criatividade, potencial para atualização; saber viver, reviver e
renascer com dignidade; ter amor `a vida e gostar de si mesmo;
desenvolver atividades que dão satisfação, mesmo quando é
preciso desconsiderar o que a família deseja.
Participante 7
Potencial para aprendizagem e para convivência
Abertura a grandes descobertas
Produtividade
Querer é poder
Inclui potencial para aprendizagem, convivência, abertura
a grandes descobertas e produtividade. Pressupõe querer
como poder, ter disponibilidade para ajudar aos outros e estar
de bem com a vida.
18
Ajudar aos outros
Estar de bem com a vida
Participante 8
Diminuição da auto-estima
Capacidade de aquisição de conhecimento, de
desistência de coisas não importantes
Conhecimento de perda de condições para atividades
específicas dos jovens, mas, apesar das perdas e
dificuldade, ter a condição de alegrar-se com a vida futura
Necessidade de abertura para novas propostas
Potencial para aprendizagem que é a melhor maneira
para continuar vivo e produtivo
Enfrentamento de desafios para crescimento e amor
próprio
Inclui o conhecimento de perdas de condições para
atividades que são prerrogativas da juventude e a condição de
alegrar-se com o futuro, com capacidade para a aquisição de
conhecimento e para a desistência de coisas que não são
importantes, o que exige abertura a novas propostas e para a
aprendizagem, mantendo-se vivo e produtivo, enfrentando
desafios como o da diminuição da auto-estima, do crescimento
e do amor próprio.
Participante 9
É deixar de ser útil a si mesmo ou para os outros,
quando se pára de sonhar, de conhecer novas idéias, de
É quando a pessoa assume que está em declínio cognitivo,
considerando-se e deixando de ser útil a si ou aos outros,
19
alcançar metas
É a pessoa que define se vai ser velha de cabeça ou
não
Necessidade de utilizar o poder mental
Quarenta anos, como início da vida e melhor hora para
realizar os sonhos da juventude
Necessidade de continuar crescendo
abdicando de sonhos, de conhecer novas idéias, de
estabelecer metas. É preciso utilizar o poder mental, realizar os
sonhos da juventude, continuando a crescer.
Participante 10
É inerente ao ser humano
Inclui enfraquecer biologicamente e se transformar até
morrer
Pode ser retardado pela alimentação e exercícios
físicos
Potencial para viver a emoção da atualização, o que
acontece pelo mundo
Potencial para aprendizagem e comunicação
É inerente ao ser humano, incluindo o enfraquecimento
biológico, a transformação até morrer, o que pode ser
retardado pela alimentação e exercícios físicos; inclui potencial
para viver a emoção da atualização, conhecer o que acontece
pelo mundo, aprender e comunicar.
20
Participante 11
É sabedoria que se transmite para gerações
interligadas, o que leva a uma sabedoria universal
É sabedoria que se transmite para gerações interligadas,
levando a uma sabedoria universal.
Participante 12
Dificuldades que geram adaptações
Gera conhecimento que se tenta incorporar ao modo
de viver
Capacidade de novas relações, comunicação e
aprendizagem
Necessita de uma atitude de busca de novos
relacionamentos e aprendizagens
É desafiar o medo para vencer os desafios
Gera conhecimento que se tenta incorporar ao mundo da
vida, com capacidade de novas relações, comunicação e
aprendizagem, necessitando de atitude de busca de
relacionamentos e aprendizagem, embora com dificuldades,
que geram adaptações. Inclui desafiar o medo, para vencer os
desafios.
Participante 13
Potencial e sede de aprendizagem
Potencial para transmitir conhecimento para as
Pressupõe potencial e sede de aprendizagem, de transmitir
conhecimento para as pessoas com quem convive, sem
21
pessoas com quem convive, não sendo dono da verdade
Humildade, paz e amor
Capacidade para novas atividades
Querer é poder
considerar-se dono da verdade; inclui humildade, paz e amor,
com capacidade para novas atividades; querer é poder
Participante 14
Capacidade para aprendizagem, comunicação e
admiração da natureza e das relações interpessoais
Potencial para atualização
Pressupõe a capacidade para aprendizagem, comunicação
e admiração da natureza e das relações interpessoais,
incluindo potencial para atualização.
Participante 15
Potencial para comunicação, lúdico e para a
aprendizagem
Necessidade e inserção em atividades culturais,
sociais e econômicas
Inclui o potencial para comunicação, o lúdico e
aprendizagem, com necessidade de inserção em atividades
culturais, sociais e econômicas.
Elaborado por Silvio Glock
5
Fonte: Glock S. Concepções de envelhecimento em homepages elaboradas por idosos [dissertação] Porto Alegre (RS): Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul; 2005.
22
Quadro 2 – Concepção de envelhecimento (cont. do quadro 1)
Unidade de significado
Concepção de Envelhecimento
Participante 16
Uma etapa da vida
Desde que nascemos envelhecemos
Estou contente com a idade que tenho
A idade não é problema para mim
Deve ser bom para todos
Ter atividade física e mental
Ter saúde
Cada um faz a sua velhice
É processo que acontece desde o nascimento,
correspondendo a uma etapa da vida, que deve ser boa para
todos, incluindo atividades físicas e mentais para ter saúde,
pois cada um faz sua velhice. Possibilita o “estar contente”
quanto a idade, não se constitui em problema.
Participante 17
Diminuição da renovação das células dos tecidos, da
capacidade vital
Apresenta limitações nos movimentos
É percebido como algo natural, que envolve diminuição da
renovação das células dos tecidos e da capacidade vital,
apresentando limitações nos movimentos. Pressupõe a idade
23
Perceber como algo natural
A velhice não é o fim
Conhecer seus limites e viver na dignidade
de conhecer seus limites e viver com dignidade, não
constituindo a velhice como um fim.
Participante 18
É vida nova
Algumas pessoas acham que é o fim
Agora estou começando a viver
Vou a baile, vou a festas, faço musculação
Faço tudo que tenho direito
Pelos cabelos brancos, mas já andei pintando
Continuo fazendo o que fazia, é só usar a tecnologia
Estou melhor de quando tinha 20 anos
Não deveria ser trágica para certas pessoas
Vão decaindo, decaindo
As pessoas têm que ter atividades
Pretendo ir longe e com atividades (idade)
É vida nova, em que se começa a viver e a usufruir de
situações de lazer e de atividade, cuidados estéticos e de fazer
o que se considera ter direito, embora algumas pessoas
considerem ser o fim, com caráter de tragicidade que a levam
a entrar em declínio. É possibilidade de sentir-se melhor do
que, quando jovem, de alcançar maior longevidade.
24
Participante 19
Começo do fim
Começam as dores, os problemas, “cai a cara
As doenças aparecem
Faz 10 anos que me assustei com minha idade
Acho meu envelhecimento muito bom , pois sou ativa,
faço um monte de coisas, consigo caminhar
Estou viva ainda
Quero me conhecer melhor
Estou em desenvolvimento
Deus é quem sabe como deve ser
Deveríamos ser eternos para cuidar a quem amamos
É o começo do fim, aparecem as doenças, dores, problemas e
flacidez do rosto, causando surpresa ao serem detectados os
primeiros sinais. O envelhecimento pode ser percebido como
muito bom, envolvendo atividade, percepção de estar em
desenvolvimento e estar vivo, incluindo a vontade de
autoconhecer-se. Deveria ser eterno para possibilitar o cuidado
de quem amamos. Porém Deus é quem determina.
Participante 20
é não participar mais de nada
é ficar em casa
é não ter vontade de fazer as coisas
é ficar sedentário
estou ficando mais enrugada
É não participar mais de nada, é permanecer em casa, sem
vontade de fazer as coisas; é ficar sedentário, adquirir rugas e
perder a força. É a possibilidade da vida ser boa quando há
participação em grupos; tempo de usufruir de maior liberdade,
alegria e saúde; de ser ativo e de ter tempo para si e para
25
não tenho mais tanta forca
vida está boa, pois tenho amizades e participo de
grupos
antes eu estava presa
agora tenho mais liberdade, os filhos não ocupam tanto
de mim
ter bastante atividade
ter alegria
participar de tudo
conviver com filhos e netos
ter muita saúde que é importante
conviver com filhos e netos.
Participante 21
algo que não é bom
vai ficando com deficiências
buscar meios que auxiliem a lidar com seu
envelhecimento
buscar (os meios) de forma preventiva
fica mais maduro
observa mais as coisas
É algo que não é bom em razão das deficiências e
limitações, sendo preciso buscar meios que auxiliem a lidar
com o seu próprio envelhecimento, de forma preventiva,
qualificando corpo e mente, fazendo atividade física. É
amadurecimento com possibilidade de observar melhor as
coisas, ser mais aceito pela sociedade não sendo discriminado,
dar menos trabalho à família, envelhecendo com consciência e
26
qualificar corpo e mente
se preparar para estar bem
não dar trabalho para os demais
faço ginástica, estou bem para a minha idade
antes eu dava pulo, hoje é mais difícil
preocupação com a beleza interior
ser mais aceito pela sociedade
agora está ficando melhor
não ser tão discriminado
envelhecer com a consciência de compreender mais as
coisas
melhor compreensão.
Participante 22
tudo na vida envelhece
estamos envelhecendo
envelhecimento depende de cada um
toda idade é boa
estou envelhecendo bem
não tenho problemas de doença
O envelhecimento acontece em tudo e o homem também
está envelhecendo. É algo que depende de cada um e que vai
acontecendo gradativamente, com possibilidade de todas as
idades serem consideradas boas. Propicia a possibilidade de
fazer todas as atividades nas quais sinta-se capacitado, sem
problemas de doença o que pode trazer uma velhice com maior
27
faço todas as minhas atividades tranqüila
não tão ligeiro como fazia antes
ser assim mesmo, aos pouquinhos
tranqüilidade.
Participante 23
atingir uma idade plena, com saúde
é uma fase importante
aspecto físico, sinto carências
o espelho é mortal, ele e as fotos
a memória começa diminuir
no convívio social temos outra dimensão, para melhor
visão deixa de ser tão boa
ocorre como deve ser
em etapas
tem escala de valores
ter padrão de saúde
poder olhar para e ver tudo que fizemos, mas olhar para
frente e ver tudo que podemos fazer
É fase importante em que a memória tende a diminuir e na
imagem revelam-se as carências dos aspectos físicos. Se dá
em etapas e inclui escala de valores. É a possibilidade de
(para) atingir uma idade plena, com saúde e através do
convívio social, ter outra dimensão e poder olhar para tudo o
que fazemos, olhando para frente e vendo tudo que podemos
fazer.
28
Participante 24
organismo começa degenerar
vamos adquirindo mais experiências
mentalmente podemos ter evolução
depende de pessoa para a pessoa
mente e corpo podem ou não manter-se ativos
envelhecimento é mais na parte física
não faço mais o que fazia quando era jovem
é tolo pensar que podemos fazer as mesmas coisas nas
diferentes idades
na experiência de vida tenho mais discernimento
processo natural e gradativo
tenha reconhecimento e respeito
formação das gerações
O envelhecimento está relacionado `a parte física, em que
o organismo começa a degenerar, impossibilitando fazer a
atividade própria da juventude. No desenvolvimento mental
pode haver evolução, em que mente e corpo podem ou não se
manter ativos, dependendo de pessoa para pessoa. Inclui
aquisição de experiências de perceber o processo como
natural e gradativo com maior discernimento, auxiliando na
formação de gerações e na conquista de reconhecimento e
respeito.
Participante 25
fase da idade cronológica
ser humano perde alguns movimentos
É fase integrante da cronologia do ser humano, que se
caracteriza pela perda de alguns movimentos e o
29
fica com o pensamento comprometido
desgaste das células
enrugamento da pele
perde parte da vitalidade
se prevenir com a saúde
manter qualidade de vida
tudo envelhece
há um desgaste
“cada um colhe o que planta”
funções estão dentro dos parâmetros para minha faixa
etária
ter fé e confiança
contar com as pessoas com quem se convive
não sinto que o tempo passou
acontecer paulatinamente
de acordo com a natureza de cada um
a qualidade de vida corresponderá ao que vive em cada
fase distinta
comprometimento do pensamento. Há um desgaste das
células, perda de parte da vitalidade, enrugamento da pele,
havendo desgaste. Tudo envelhece pois são funções que estão
dentro dos parâmetros para esta faixa etária. É preciso
prevenir com saúde e manter a qualidade de vida, pois `a
qualidade do envelhecimento está associada a qualidade da
vida experienciada. Impende tamm ter fé e confiança,
contando com as pessoas de convívio, acontecendo
paulatinamente de acordo com a natureza de cada um.
Fonte: dados de entrevistas realizadas pela autora
30
A partir da análise das concepções de envelhecimento dos idosos
participantes emergiram as categorias biológica, psicossocial, cultural e educacional,
que passam a ser discutidas de forma globalizada; as idéias sobre envelhecimento
são muito antigas. Desde que o homem se conhece como homem, pensa no
envelhecimento.
6
Contudo, muitas vezes o envelhecer foi entendido ou é entendido
até hoje, em algumas culturas, como um castigo, algo ruim e/ou com caráter
negativo, em que é caracterizado por um processo de perda das capacidades
físicas, mentais e devido `a maior probabilidade de chegar à morte.
Estudiosos que trabalham na área da Gerontologia definem o período
de 60e 65 anos como a idade de início da velhice ou idade delinear, pois é por volta
desta idade que várias mudanças físicas e psicológicas tendem a se manifestar.
7
Há autores que categorizam adultos mais velhos em idosos jovens e
idosos velhos. Entretanto, os limites exatos de idade variam.
12
Para alguns, o idoso
jovem está entre 70 e 75 anos e o idoso velho pessoas com mais de 75 anos, outros
consideram os limites 60-80 ou 65-80 ou 65-75 para idosos jovens.
Alguns autores
8
propõem as categorias velhos jovens (60-69) velhos de
meia idade (70-79), velhos–velhos (89-89) e velhos muito velhos (80 ou mais). Para
outro autor
12
estes são sinônimos desnecessários para sexagenários, setuagenários,
octogenários, nonagenários e centenários. Outros dividem as pessoas com mais de
65 anos em terceira idade e quarta idade, constituindo a primeira um estilo de vida
ativo independente na velhice e a segunda um período de dependência.
Stuart-Hamilton
7
cita o estudo de DMwinter que verificou que a maioria
das pessoas mais velhas (72%) preferiam os termos cidadão sênior ou aposentado,
enquanto 5% preferiam idoso e 4% pessoas mais velhas, enquanto 61% dos mais
jovens preferem este último termo. Mas foram encontrados resultados
semelhantes
12
, embora com diferença menos acentuada entre os grupos etários. O
termo aposentado é questionável, pois pessoas se aposentam antes do 60 anos.
Independentemente de sinais de envelhecimento físico e mentais, estes são
medidos pela idade biológica e pela idade psicológica respectivamente
A idade biológica refere-se ao estado corporal de
desenvolvimento/degeneração física, sendo o envelhecimento popularmente
6
Néri AL. Desenvolvimento e envelhecimento: perspectivas biológicas, psicológicas e
sociológicas. Campinas: Papirus; 2001.
7
Stuart-Hamilton I. A Psicologia do Envelhecimento: uma introdução. Porto Alegre: Artmed; 2002.
8
Burnside I, Monea HE. Psychosocial caring throughout the life span. New York: McGraw-Hill; 1979.
31
caracterizado como um aumento de sabedoria (conhecimento sobre o mundo) e um
decréscimo nas faculdades mentais.
Há varias formas de medida da velhice. Não existe um ponto
determinado, único, em que a pessoa fica “velha”; e a idade cronológica sempre é
uma medida arbitrária e não muito exata, de modo que, o uso de um número único
para o limiar lhe daria um status enganadoramente objetivo.
9
O envelhecimento é uma experiência singular, cada pessoa na sua
individualidade sente e se percebe conforme seu gênero, raça, classe, religião;
enfim, depende de pessoa para pessoa. Os próprios termos variam quanto `a
nomenclatura, conforme a preferência das pessoas: idoso, velho, terceira idade,
mais velhos, idosos jovens e tardios.
Pedem que os chamem pelo nome e que não usem o “senhor ou
senhora”, “senão a idade pesa“ disse a entrevistada 19.
Independentemente de como são rotulados, os sinais de envelhecimento
existem e podem ser tanto físicos quanto mentais. São medidos respectivamente
pela idade biológica e pela idade psicológica.
10
A entrevistada 16, em observação
participante, ao se confundir em uma resposta da atividade, alerta: “não dá bola para
mim, pois a minha idade não ajuda mais minha cabeça” .
O envelhecimento, nos últimos anos, tem apresentado mudanças nas
suas concepções. Pesquisas na área da saúde e educação têm-nos mostrado quão
crescente tem sido os estudos sobre este assunto. Falar sobre envelhecimento, logo
nos reporta a pessoas, suas vidas, suas concepções.
O ciclo da vida humana é uma dinâmica comportamental que cada
indivíduo passa fase a fase, na qual não se deve esquecer a concepção de ser
humano, lembrando de sua constituição e estruturação física e psicológica.
12
O envelhecimento é singular e esta singularidade depende da
influência de circunstâncias histórico-culturais, de fatores intelectuais e de
personalidade e de patologias.
6
Pensando nisso, é possível afirmar que o envelhecimento é um
processo, uma fase normal do ciclo da vida, sendo necessário passar a entendê-lo
e conhecê-lo em seus diferentes aspectos e que isto faz parte de uma população
9
Guimarães GTD. Aspectos da Teoria do Cotidiano: Agnes Heller em Perspectiva. Porto Alegre:
EDIPUCRS; 2002.
10
Terra NL. Envelhecimento bem-sucedido. Porto Alegre: EDIPUCRS; 2003.
32
que cresce continuamente. Com outras palavras, podemos dizer que o
envelhecimento é um processo natural e inevitável da vida que na realidade, implica
um conjunto de dimensões biológicas, fisiológicas, psicológicas, socioculturais,
econômicas, educacionais e políticas. As dimensões, evidentemente não ocorrem
independentes umas das outras e naturalmente terão suas diferenças conforme os
novos tempos. O entrevistado 23, percebendo as necessidades da atualidade,
comentou:” Nós aposentados, se não soubermos apertar aquelas máquinas
eletrônicas que tem ali, é um problema sério. Cartão , lidar com o próprio cartão . Eu
acho que tudo isso ai pra nós bastante difícil. Mas não vamos pegar o pior , porque
estamos cursando as oficinas de informática.”
O crescente aumento do percentual de idosos na população mundial
1
,
pôs em evidência a problemática relacionada à velhice nas mais diversas
dimensões, fazendo com que os olhares se voltem para o estudo, pesquisa e busca
de alternativas para manter no maior espaço de tempo possível estas pessoas
potencialmente produtivas.
A mudança na proporção com referência a pessoas mais velhas na
população acaba trazendo problemas econômicos e sociais.
11
Aumentando a
proporção de adultos mais velhos, por definição, diminui os adultos mais jovens,
ditos em princípio como mais produtivos para a sociedade. A razão de
dependência na velhice (número de pessoas em idade de aposentadoria dividido
pelo número de pessoas em idade produtiva) aumentará de um quinto para um terço
até o ano de 2040
2
. No Brasil, não poderia ser diferente, a expectativa de vida
aumentou consideravelmente. O que fazer diante deste quadro? Seria a inclusão
digital uma alternativa para um melhor aproveitamento do tempo de vida? Como os
idosos se percebem diante disso?
No início das oficinas de informática, alguns idosos chegam com a
concepção de si e de seu envelhecimento semelhante com o que é dito na fala do
entrevistado 17: “Olha, sabe de uma coisa, no meu caso por exemplo, eu já estou
com uma certa idade. Não aprendi, não vou aprender, a gente aí vai levando, vai
escanteando“ . Demonstra um sentimento de incapacidade de aprendizagem devido
à idade. Entretanto, depois de alguns meses, fazendo parte das oficinas de
informática, o mesmo idoso falou: “mas tu já começa a conversar com outras
11
Papalia D, Olds SW. Desenvolvimento Humano. Porto Alegre: Artes Médicas; 2003.
33
pessoas, começa a pedir informações, pega um jornal vai ver o preço dos
computadores, os modelos, tudo. Então quer dizer: despertou uma curiosidade que
antes não existia.” Verifica-se o quanto é importante ofertar possibilidades para
continuidade de seu potencial.
Oferecer ou buscar somente a parte de entretenimento, reduzindo seu
mundo ativo às atividades físicas e de lazer, não é a melhor alternativa para valorizar
e aproveitar o potencial das pessoas idosas, há que se considerar outras opções de
cunho produtivo. A oficina de informática é uma delas, pois abre diversas
possibilidades na vida dos idosos.
No livro “Saber Envelhecer”, o autor
12
atesta: “Por certo, os que não
obtêm dentro de si os recursos necessários para viver na felicidade acharão
execráveis todas as idades da vida. Mas, todo aquele que sabe tirar de si próprio o
essencial não poderia julgar ruins as necessidades da natureza.” Demonstra que a
compreensão de envelhecimento é algo natural e que deve ser vivida
tranqüilamente, com qualidade e vivendo a atualidade.
Um envelhecimento com qualidade é aquele que inclui vida ativa e
resistência ante o desengajamento social, que inclui a tendência de contatos sociais
menos intensos e freqüentes.
6
A vida das pessoas é influenciada pelos aspectos anteriormente
citados e muitas vezes caracterizam um crescente declínio das funções dos
sistemas fisiológicos, comprometendo a saúde e no psicológico a perda na auto-
imagem e auto-estima. Estas perdas são significativas devido ao envelhecimento, no
sentido de se sentirem inúteis, pouco estimados e respeitados, com isto a sociedade
aliena o idoso do processo social e do direito à cidadania.
17
“Reconhecer o indivíduo portador da condição de longevidade significa
identificar nele traços que diferenciam dos demais grupos, bem como aproxima um
certo conjunto destes sujeitos. O processo de reconhecimento deste indivíduo
implica compreender quem é este novo ator no cenário da complexidade,
demandando- para tanto- seu processo de caracterização”.
13
No presente estudo, o potencial de idosos para aprendizagem foi citado
por 17 dos 25 participantes, constatando-se que os idosos que não mencionaram
este importante aspecto, integram o segundo grupo de entrevistados, dos quais o
12
cero MT. Saber envelhecer. Porto Alegre: L&PM Pocker; 1997.
13
Faleiros VP, Loureiro AML. Desafio do envelhecimento: vez, sentido e voz. Brasília: Universa; 2006.
34
participante 17 apresenta uma concepção de envelhecimento que enfatiza limitações
e outros sete, embora enfatizando limitações do envelhecimento, mencionam a
capacidade de se manterem produtivos.
Como os participantes da pesquisa permanecem freqüentando as
oficinas de inclusão digital, esta constatação propicia a oportunidade de
desenvolvimento de futuras atividades e discussões associadas aos dados
coletados em outros projetos desenvolvidos nos grupos (relativos à depressão e
memória, por exemplo), buscando-se explicação, compreensão e oferecer condições
para evolução na concepção de envelhecimento.“Cada situação de aprendizagem é
tamm oportunidade para fortalecer e elaborar o potencial de aprendizagem [...]
aprender pode ser aprendido, entretanto o potencial de aprendizagem não se
desenvolve automaticamente”.
14
A aprendizagem acontece a partir de diferentes estratégias cognitivas,
envolvendo a descoberta da relevância
20
, a curiosidade, a intenção e o interesse.
A consciência do desafio implicado na tarefa proposta, cujo
conhecimento se pretende seja aprendido, é de grande relevância, o que requer a
criação de situações em que os próprios aprendentes percebam que possuir ou não
os conhecimentos que precisam adquirir constitui uma diferença importante e
valiosa.
15
Assim sendo, a motivação para aprender está relacionada à
apresentação de tarefas como desafios orientados para o desenvolvimento de
capacidades e a oportunidade de percepção do próprio progresso.
21
A aprendizagem envolve autoconhecimento e autoconsciência
20
necessários para que o aprendente possa avaliar a qualidade de suas próprias
produções
16
“As pessoas que vivem em ambientes e sociedades diferentes,
desenvolvem aspectos diferentes do seu potencial de aprendizagem
20
tamm
influenciadas pelas crenças e valores culturais. Assim, existem culturas em que
aprender é para os jovens.
14
Claxton G. O desafio de aprender ao longo da vida. Porto Alegre: Artmed; 2005.
15
Alonso Tápia J. Motivar en la escuela. Madrid: Loyola; 2005.
16
Azevedo e Souza VB. O uso da Internet na construção do conhecimento sobre a área da
Gerontologia. Actas da Conferência Ibero-Americana. Madrid: IADIS; 2004.
35
No presente estudo, permeado por uma cultura em que idoso é muitas
vezes concebido como improdutivo, dos 25 idosos participantes da pesquisa, 24
apresentam concepções de envelhecimento que incluem formas de produtividade.
“Quando se está diante do desconhecido a aprendizagem é uma
opção. A decisão de aprender ou não pode ser uma decisão elaborada ou pouco
consciente”
20
Uma forma comum de regressão é não tentar, não buscar novas
aprendizagens em razão do significado de fracasso, pois muitas pessoas interpretam
como indicativo de falta de competência.
Na presente pesquisa, os idosos não se sentiram intimidados ante a
perspectiva de fracasso em razão do preconceito inculcado na cultura que a
tecnologia é coisa de jovens. Embora se tenha observado o sentimento pela
possibilidade do fracasso e de estragar a máquina, os idosos participantes não
desistiram ante a possibilidade de se exporem à possibilidade da não aprendizagem.
Isso significa que traziam a esperança e a convicção que aprenderiam. Alguns
participantes, mesmo levando um maior tempo para aprender, principalmente os que
não têm computador em casa, foram persistentes, confirmando sua disponibilidade e
intenção para aprender.
Os idosos percebem a importância da aquisição de conhecimentos de
diferentes áreas, buscando a atualização e a produtividade: têm consciência de que
possuem papel relevante na sociedade, que é preciso estar receptível a novas
propostas.
Entre as conquistas na dimensão educacional, encontra-se o aceso à
comunicação, que auxilia no desenvolvimento da aprendizagem, que pressupõe a
capacidade de continuar aprendendo e sentir que ainda está vivo e em busca de
autoconhecimento.
As transformações sociais e culturais ocorrem a partir de
aprendizagens. Entretanto, ainda há poucas iniciativas educativas que contemplem
a educação de idosos e sua formação permanente.
Estudos recentes, realizados
5,
17, 18
mostram que o idoso tem interesse
em aprender a utilizar o computador e outras ferramentas do mundo informatizado,
para que possa gerenciar situações do cotidiano.
17
Ferreira AJ, Concepção de envelhecimento de um idoso autor: Um estudo de caso [dissertação]
Porto Alegre (RS): Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; 2005.
36
2 OFICINAS DE INCLUSÃO DIGITAL E COTIDIANO: DISCUSSÃO DOS
RESULTADOS
Oficinas constituem “espaços” pedagógicos teórico-práticos criados para
vivência, reflexão/reconstrução de conhecimento: são espaços em que se aprende
fazendo a partir de problematização, investigação, descoberta e cooperação.
19
Oficina é um local de trabalho, de elaboração de algo para ser usado; é uma
forma de ensinar e de aprender que exige imaginação; de promoção da combinação
do trabalho individual e da tarefa social, visando à aproximação entre teoria e
prática, na busca de respostas para problemas da realidade, de indagação e de
apropriação do conhecimento.
20
A vida cotidiana pode ser compreendida como a vida de todo dia, dos
mesmos gestos e ritmos, é ir à escola, ao trabalho, à igreja, é ler o jornal, assistir
televisão, etc. A “história é vivida e, em primeira instância, decifrada no cotidiano.
(...) de modo algum o cotidiano pode ser confundido com as rotinas e banalidades
de todos os dias (...).”
21
Afirma ainda que os momentos da vida cotidiana e os
espaços são no público e no privado.
Os integrantes das oficinas contam sobre seu dia-a-dia profissional e
com a família, trazendo como depoimento a apresentação de diferenças no antes e
no atual cotidiano vivido por eles. A entrevistada 16, falando do seu cotidiano, trouxe
um depoimento significativo: “Eu vim aqui pra apagar de uma depressão muito
grande. Eu perdi uma pessoa muito querida, que foi o meu esposo. Isso me deixou
muito, muito triste. Triste com a vida. E sem ânimo. Então, a partir do momento
que comecei a vir aqui, realmente, eu conheci novas pessoas e conhecer as
pessoas tamm nesta faixa etária, que já tiveram dificuldades como todo mundo
tem, não é?“ Perceber que existem outras pessoas, da mesma faixa etária, que
tammm situações vividas em seu cotidiano, confortou-a de maneira a sentir-se
capaz de continuar sua vida na busca de novas perspectivas.
18
Wehmeyer COT. O ensino com o uso de recursos informatizados na aprendizagem da língua
espanhola por idosos [dissertação] Porto Alegre (RS): Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul; 2006.
19
Vieira E. Oficinas de ensino: o quê?, por quê?, como?. Porto Alegre: EDIPUCRS; 2002.
20
Ander-Egg E. Evaluación de programas de trabajo social. Buenos Aires : Humanitas; 1990.
21
Martins JS. A sociabilidade do homem simples: cotidiano e história na modernidade anômala. São
Paulo: Hucitec; 2000.
37
Porém, pensá-lo em “um prisma teórico implica descobrir o incomum
no repetido”
15
O repetido não ocorre do nada, ele pressupõe uma ação da pessoa
sobre determinado objeto. Ou seja, a vida cotidiana, ”é a constituição e reprodução
do próprio individuo e conseqüentemente da própria sociedade “.
22
“O cotidiano revela diversas atividades exercidas sobre um terririo,
onde se desenvolvem as diferentes práticas sociais e suas respectivas socialidades
através dos tempos”.
28
Não se pode dissociar o cotidiano da história da sociedade,
pois os fatos históricos nascem no cotidiano remetem à idéia de repetição, contudo,
esse espaço não é só de reprodução, mas de produção, de construção e
reconstrução. Obviamente não pode fazer tudo ao mesmo tempo, existe uma
seleção, uma escolha que acaba determinando uma escala de valores e por
conseqüência de ações. É espaço rico de significados, no qual se pode aprofundar a
busca dos desvendamentos de seus enredos. “É na vida cotidiana que a história se
desvenda ou se oculta”.
27.
Um dos principais desafios é a sua própria superação e a
dimensão do não-cotidiano. O cotidiano é hoje redescoberto como momento de
análise da complexidade do dado social, numa perspectiva de que o cotidiano possa
ser o espaço onde os processos simbólicos são elaborados e reelaborados na sua
interdependência com outros processos simbólicos, o que faz do cotidiano um
espaço de compreensão do processo simbólico e das relações de poder
envolvidas
24
.
Podemos perceber esta afirmativa nas entrelinhas das falas que vêm a
seguir. Como diz a entrevistada 10: “nós somos importantes e eu me sinto
importante em contribuir para este projeto. Nós somos muito mais que alunos aqui
neste projeto. Nós estamos contribuindo para as Ciências. A entrevistada 09
complementa: “Eu me sinto tão bem quando eu venho aqui nas aulas que parece...,
parece que a gente renova” A entrevistada 10 revelou: “Eu só me interessava por
aquilo que eu gostava. Agora, não. Eu, me chama atenção tudo. Isso é muito
importante, pra mim.”
A entrevistada 04 faz questão de falar: “Pra mim o que mudou, foi que
rompi uma barreira”, demonstrando sentimento de capacidade, poder de gerenciar
situações e autodomínio.
22
Heller A. O Cotidiano e a História. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 1972.
38
O entrevistado 11, refletindo sobre o processo de construção de seu
conhecimento, suas dificuldades e facilidades na aprendizagem, se deu conta que
a cada dia:” Então, vou aprendendo com os outros!
Como concluiu o entrevistado 07: “é uma necessidade humana”,
quando conversavam no grupo sobre a importância das relações criadas nas
oficinas.
De certa forma foi o que aconteceu com a entrevistada 12 que se
deparou com uma situação na qual teve que buscar meios para considerar-se
reinserida na vida familiar e social. Cursando a oficina de informática externou: “
Noto que tenho contribuído, inclusive, em conversações, porque a minha família, os
meus familiares, todos... Eu tenho, inclusive, um filho que é tri esperto nesta parte de
informática. Os meus netos e os meus bisnetos. Hoje é a era da informática, então
eles já conversam comigo e eu já entendo alguma coisa . Primeiro eu ficava alheia.
Eu me sentia muito mal. Então esta minha entrada aqui, foi muito, muito proveitosa.”
O sujeito que faz parte da família, nela se insere pela existência e pela
experiência, que é parte da existência.
12
É na sua vincia que aprende com a
repetição cotidiana de diversos atos e valores, ao mesmo tempo aprende com a
inovação e a ruptura daquilo que se faz presente no dia-a-dia.
Além da relação familiar existem os diferentes grupos de convívio, que
no espaço cotidiano poderá ser reconstruído numa teia relacional, em um movimento
onde se fazem sempre novas relações sociais. A entrevistada 12 remete-se `a
importância da: “[...] possibilidade de diálogo com pessoas desconhecidas.” A
relação de reciprocidade que ocorre vai consolidando os grupos numa troca de
sentimentos e de compartilhar emoções entre as pessoas, conforme a fala da
entrevistada 09: “Eu acho uma coisa muito importante foi conhecer um grupo de
amigos. E a nossa turma parece bem entrosada. Temos comunicação. A gente se
encontra. Eu fiquei tão feliz! Que me deu um calor por dentro, uma coisa gostosa.
“O recurso grupal, através de um processo de reflexão, diálogo,
congregação, poderá ser o momento de uma abertura para o processo de
conscientização do potencial do sujeito.”
15
É nesta complexa teia da interdependência humana que se encontra
o potencial da existência da transformação, da possibilidade de saída dos
emaranhados que a vida proporciona a todos sem discriminação.A idéia implícita
39
nesta concepção de cotidiano é a do indivíduo como sujeito ativo produtor de
sentidos.
15
A sociedade está sendo produzida pela e para as pessoas. O aporte
fundamental seria ver a vida cotidiana como espaço em que se produz a sociedade
e não só onde ela se reproduz. É espaço de vida do ser humano. É onde se
desenrolam suas experiências, opções, idéias, sentimentos, capacidade intelectual e
criadora.
A constatacão de que os critérios de seleção das
escolhas cotidianas a serem feitas sofreram alguma
modificação tipificam uma característica fundante daquilo que
se pretende desenvolver como processo de (des)construção de
um paradigma de desenvolvimento sustentável tido como fator
de qualidade de vida por esses novos atores no cenário da
(pós)modernidade.
19
Os sentimentos e afetividade que perpassam nos grupos têm grande
contribuição para o desenvolvimento das potencialidades e manutenção da busca
constante do ser ativo, dinâmico, produtivo. “Nossos sentimentos são nossa
reação ao que percebemos através dos sentidos e é através dos sentimentos que
nos relacionamos conosco mesmos.”
23
Se não podemos nos relacionar conosco
mesmos, não podemos nos comunicar com os outros.
À medida que a pessoa se relaciona consigo e com o outro, que se
abre mais em relação aos seus sentimentos, melhor conseguirá interpretar o mundo
o qual está experimentando. “Os sentimentos são a maneira como nos percebemos.
São nossa reação ao mundo que nos circunda. São a maneira pela qual
percebemos que estamos vivos.”
30
Sentir tamm é uma forma de conhecer e interpretar o mundo, o
cotidiano, a realidade. Já que “os sentimentos são o ponto de partida para o
conhecimento”
28
Na manifestação do entrevistado 07, demonstra sua preocupação
com a falta de conhecimento da informática e com o sentimento de exclusão que o
envolve: “ Na minha vez, quando me aposentei, foi no momento em que a
computação passou a predominar, eu me senti despejado da sociedade. Quando
comecei com o manejo do computador, me senti reintegrado ao meio social. Hoje,
o meio social não dispensa o computador. O computador me prejudicou, na época
eu estava no topo e, quando chegou o computador, me botou lá numa base. Bem
23
Viscott DS. A Linguagem dos Sentimentos. São Paulo: Summus Editorial;1982.
40
em baixo. Me senti desintegrado. Este dano foi por que caí em conhecimento de
computação. Eu preciso registrar que estou aqui dentro.”
Cada pessoa tem seu modo de sentir e cada um pode aprender a lidar
com os seus sentimentos da maneira mais eficaz utilizando-os da forma mais
sincera possível. “A finalidade de compreender seus sentimentos, permitindo-lhe
que fluam até sua natural conclusão, é tornar-se tão aberto e tão livre de
sentimentos negativos, de tal forma que você possa tornar seu próprio eu mais
elevado, mais criativo e mais produtivo.”
30
Considerando que prestar atenção em nossos sentimentos, auxilia na
compreensão do mundo que nos circunda, podemos dizer que há grande
probabilidade de facilitar as relações em grupo, permitindo melhor desempenho no
que se refere à aquisição de conhecimentos. Para a entrevistada 12 seu sentimento
de realização está relacionado `a busca de conhecimentos: ”É a realização de um
sonho que eu sempre tive. De poder estar dentro de uma faculdade, aumentando o
meu conhecimento, embora sendo através da terceira idade, eu estou realizando
este meu sonho de muitos e muitos anos atrás. É isso ai.”
O mundo da vida cotidiana não somente é tomado como uma
realidade certa pelos membros ordinários da sociedade na conduta subjetivamente
dotada de sentido que imprimem em suas vidas, mas é um mundo que se origina no
pensamento e na ação dos homens comuns, sendo afirmado como real por eles.
24
Estes autores enfatizam: “A vida cotidiana apresenta-se como uma realidade
interpretada pelos homens e subjetivamente dotada de sentido para eles `a medida
em que forma um mundo coerente.” Este mundo coerente acontece a medida que o
homem aproveita suas experiências e interliga seus conhecimentos.
Pensando em suas experiências e percebendo a construção de seu
conhecimento, a entrevistada 10 interligou estes dois aspectos, usando o
computador como referência: “Pra mim ele veio trazer um entendimento melhor das
coisas. Com este avanço que teve, a partir do momento em que eu aprendi a utilizar
o computador, passei a observar bastante coisa que eu não ligava . E também
ajudou a pesquisa.” A entrevistada 03 concorda dizendo: “É, abriram caminhos.
(...) com o conhecimento do computador tu vai descobrindo:como é que eu faço essa
24
Berger P, Luckmann T. A Construção Social da Realidade: tratado de sociologia do conhecimento.
Petrópolis, Vozes;1985.
41
coisa.” É neste descobrir e construir, que as experiências vão acumulando e as
conexões se transformando em conhecimento.
A acumulação das experiências do indivíduo, forma um acervo social
do conhecimento o qual será utilizado na sua relação com os outros. Além disto,
este acervo social do conhecimento será transmitido de geração para geração e
utilizado pelo indivíduo na sua vida cotidiana.
31
Segundo estes autores, “O conhecimento do senso comum é o
conhecimento que se partilha com os outros nas rotinas normais, evidentes da vida
cotidiana. ”O entrevistado 11 disse: “Antes eu não tinha com quem discutir , aqui eu
tenho. E o que eu aprendi lendo, não encaixava bem. Aqui, na prática, com outras
pessoas, com os monitores, adquiri maiores conhecimentos em computação.
Inclusive na parte escrita e na parte da Internet”.
O conhecimento da vida cotidiana estrutura-se em termos de
convivências, entre diferentes tipos de indivíduos. É verdade que não partilhamos
nossos conhecimentos com todos os semelhantes e pode haver algum
conhecimento que não partilhamos com ninguém. Podemos dizer tamm que
compartilhar conhecimentos familiares é diferente de partilhar conhecimentos
profissionais. Por tanto, na vida cotidiana é possível detectar os diferentes tipos de
conhecimentos e como e com quem devem ser aplicados ou não.
Assim, na maior parte do tempo, os encontros com os outros na vida
cotidiana são típicos em duplo sentido, apreende-se o outro como o tipo, e interatua-
se com ele numa situação que é por si mesma típica.”
31
A participação no acervo social do conhecimento permite assim a “
localização“ dos indivíduos na sociedade e o “manejo” deles de maneira apropriada
para partilhar e ampliar os conhecimentos.
O conhecimento da vida cotidiana tem a qualidade
de um instrumento que abre caminho através de uma floresta
e enquanto faz isso projeta um estreito cone de luz sobre
aquilo que está situado logo adiante e imediatamente ao
redor, enquanto em todos os lados do caminho continua a
haver escuridão.
31
A compreensão da linguagem é por isso essencial para entender a
realidade de vida cotidiana. A linguagem estabelece pontes entre diferentes zonas
dentro da realidade da vida cotidiana e as integra em uma totalidade dotada de
42
sentido. “A vida cotidiana é sobretudo a vida com a linguagem e por meio dela, de
que se participa com os semelhantes.”
31
Depoimentos como do entrevistado 23 realmente são preocupantes na
sociedade atual: “Eu fui bancário, mas vejo dificuldades. Desde o tempo que eu
exercia a profissão e agora, eu vou em determinadas agências, no dia de
pagamento para aposentados é um caos , porque não sabem acessar o caixa
eletrônico, então tem que ter um monitor ali do lado. A pessoa tem que dizer a
senha para monitor. Quer dizer, se tem um espertalhão do lado, ouve a senha, já
gera outro problema sério. Quer dizer então, que as pessoas têm que se
conscientizar e seguir no mundo virtual.”
“A interação com a tecnologia abre um leque de múltiplas e
caleidoscópicas imagens, provenientes das diversas experiências e singulares
expressões”
2
. É uma nova realidade que o idoso assume para si, podendo colocar-
se no papel mais participativo, introduzido num mundo digital, dando novo sentido a
esta fase de sua vida.
Com a participação nas oficinas de informática, a entrevistada 03,
notou diferenças no seu cotidiano: “Trouxe contribuição em casa, se eu tenho que
fazer as minhas despesas, o que eu tenho que gastar, eu sento no computador e
faço tudo o que eu tenho, o que não tenho, o que devo , o que não devo e puxo
aquela fórmula, quando eu vejo: aí já está pronto. Ensinei meu marido, ensinei
minha filha. Se ela tem alguma coisa, uma viagem, alguma coisa pra fazer, vai lá na
planilhazinha, sobe não sobe...”
A entrevistada 09 também manifestou a contribuição que o uso do
computador trouxe para seu cotidiano: “Tu queres saber alguma coisa, algum curso
que vai ter, algum evento, tu entra lá, busca mais informações. Por exemplo pra
fazer Imposto de Renda. Eu acho ótimo isso!”
A inclusão digital aumenta a possibilidade de se aproximar mais dos
filhos e netos devido `a necessidade dos novos tempos. Inclusive podem aprender
mais sobre assuntos que geralmente são de seu interesse.
Assim, temos “a informática como uma possibilidade de reconstrução
da identidade do idoso, de sua inclusão e de sua projeção para o futuro”
25
o que há
poucos anos não era nem cogitado, principalmente pensar em futuro para idoso.
25
Arantes RP. Velho com novo olhar: a informática redimensionando as relações. [dissertação] São
Paulo (SP): Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; 2000.
43
Todavia, o computador é com certeza, um recurso que serve de apoio, veio e está
aí, para beneficiar o homem. Ajuda a afastar a idéia de que o idoso só sabe falar do
passado, a desaparecer obstáculos para a aprendizagem que são vistos em
função da questão cronológica e possibilita o idoso a construir idéias , a produzir e
a transformar.
Há de se considerar depoimentos como o da entrevistada 10: “E o meu
cotidiano com o computador, ele.... Eu escrevo muito, então ele realmente pra mim
foi ótimo pra isso. Para escrever . E eu comecei a compreender a máquina,
entender a máquina. Eu mexo nela com segurança e achei tamm que ela ficou
muito vagarosa, porque eu tenho uma 2000 e hoje eu quero uma mais ligeirinha.
Aqui é mais rápida. Eu achei interessante. Agora, a agilidade nos dedos, mudou
alguma coisa no físico , isso sim. Na atenção e através desta informática aí que
todo dia eu tenho prestado atenção. E isso é devido ao curso, aqui. Eu realmente,
me chama atenção.” De um simples ato de escrever, com o recurso atualizado,
passou a ver novas possibilidades, a sentir o prazer e motivação no seu fazer.
O aprendiz idoso pode mostrar-se com suas próprias palavras e
imagens, desconstruir preconceitos, demonstrar potencialidades para aprender e
produzir intelectualmente. Assim, na expansão dos sonhos e sentimentos por meio
da escrita eletrônica, contar um pouco do muito que aprendeu e aprende, nas
diferentes histórias vividas.
Há muito a aprender sobre o envelhecimento, muito a estudar e
pesquisar. As pessoas que atingem a longevidade desejam qualidade nesta
longevidade e o melhor aproveitamento possível dos anos de vida que a
acompanharão. É notória a busca que as pessoas idosas vêm traçando para se
manter em atividade e o caminho que percorrem para acompanhar a evolução da
sociedade que ainda as marginaliza.
Pessoas do século XX, querendo sobreviver no século XXI, onde os
desafios são constantes e a tecnologia avança de forma quase assustadora,
oscilando a economia o que deixa as pessoas, cada vez mais, sem saber se
conseguirão sustentar a si e a família por mais tempo. Faz-se necessário estar `a
frente dos novos tempos, evitar a dependência e aumentar a possibilidade de
subsistência e de inserção social.
Estas razões fazem buscar meios de acolher, incluir e manter incluídos
e ativos idosos na sociedade, bem como, auxiliá-los na sua inclusão digital.
44
Nas concepções de cotidiano, apresentadas neste referencial, inclui o
conhecimento das tecnologias, os recursos informatizados, o mundo digital que faz
parte de nossa sociedade.
45
De: CIAWI 2006 [ciawi_sec@iadis.org]
Enviado em: sábado, 29 de abril de 2006 20:28
Para: Vivian Patricia Caberlon Nunes
Assunto: Artigo enviado
Prezado Autor
O artigo abaixo mencionado foi enviado com sucesso para a Conferência
IADIS CIAWI 2006. O seu artigo vai ser atribuído pelo menos a dois revisores para
avaliação e entraremos em contacto consigo logo que o seu artigo tenha sido revisto
(espera-se que até ao dia 16 de Junho).
O processo de revisão estará completo quando receber um email dizendo se
o seu artigo foi aceite ou se foi rejeitado. O email que lhe será enviado terá os
comentários dos revisores. Se o seu artigo for aceite, ser-lhe-á pedido que faça as
alterações necessárias e proceder posteriormente ao envio final do seu artigo.
Melhores Cumprimentos,
Inmaculada J. Martínez,
Flavia Maria Santoro,
Pedro Isaías,
Co-Chairs da Conferência IADIS CIAWI 2006
José María Gutiérrez,
Chair do Programa da Conferência IADIS CIAWI 2006
***********************
Detalhes do Artigo:
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Your Paper Title is: A CONTRIBUIÇÃO DA INCLUSÃO DIGITAL NA VIDA
COTIDIANA DO IDOSO
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A CONTRIBUIÇÃO DA INCLUO DIGITAL NA VIDA COTIDIANA DO
IDOSO
Mestranda Vivian Patrícia Caberlon Nunes
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/ Instituto de Geriatria e Gerontologia
Av. Ipiranga, 6690 – 3º andar HSL
90610-000 - Porto Alegre - RS - Brasil
vivian.caberlon@pucrs.br
Drª Valdemarina Bidone de Azevedo e Souza
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/ Instituto de Geriatria e Gerontologia
Av. Ipiranga, 6690 – 3º andar HSL
90610-000 - Porto Alegre - RS - Brasil
valde@pucrs.br
RESUMO
A necessidade do uso dos recursos da Informática vem crescendo diariamente de forma contínua e rápida. A linguagem da
informática e o conhecimento sobre o computador passaram a ser símbolos da cultura contemporânea, independentemente da
área de especialização e de faixa etária, influenciando na autovalorização e no desenvolvimento de uma nova cidadania -
social e solidária -. A pesquisa realizada teve como objetivo analisar a percepção de idosos sob a contribuição da inclusão
digital em sua vida cotidiana e a mudança ocorrida em suas concepções de envelhecimento, após freqüentarem oficinas
pedagógicas de inclusão digital, assumindo-se uma concepção de cotidiano construída a partir da complementaridade das
idéias de Morin, (1998, 1999), Heller (1987), Stuart (2002) e Luckman e Berger (1987) em que fica evidente a importância
das relações de autonomia/dependência na construção do sujeito/indivíduo e de sua relação com o mundo e a tecnologia. Nos
estudos de Kachar (2003), Azevedo e Souza et al. (2002 e 2004), Garcia e Lentini (2002), Garcia, Lentini e Gennaro (2002) e
Diáz (2001) encontrou-se argumentos que corroboram a presença de potencial de constante aprendizagem em idosos e
conseqüente inclusão digital. O estudo foi desenvolvido numa abordagem qualitativa/dialógica. Os dados foram coletados
junto a 24 idosos que freqüentam há 6 meses oficinas pedagógicas de alfabetização digital, realizadas duas vezes por semana,
com duração de uma hora, sob a coordenação do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Concepção de Envelhecimento
do Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica do Instituto de Geriatria e Gerontologia, da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Durante o desenvolvimento das oficinas os idosos participavam nas segundas-
feiras de atividades de língua espanhola e nas quartas-feiras de atividades que incluíam a aprendizagem do Word, Powerpoint
e WWW/Internet, que foram aplicadas na elaborão de apresentações sobre envelhecimento em PowerPoint e na construção
de homepage pelos idosos. Os dados foram coletados por observação participante e por entrevista coletiva, utilizando-se os
princípios da dialógica de Morin (recursivo, hologramático e dialógico) na análise da realidade.A análise dos dados
compreendeu: leitura exploratória global dos registros das observações participantes e das transcrições das entrevistas;
leitura detalhada de cada material coletado; organização do material por unidades contextuais; identificação das unidades de
significados e classificação em dimensões. Como principais contribuições da inclusão digital foi identificado que a
experiência vivida nas oficinas pedagógicas é uma possibilidade de reconstrução da identidade do idoso como cidadão do
mundo, como possuidor de capacidade para aprendizagem contínua e para lidar com situações e desafios diários relacionados
ao uso da tecnologia, dando suporte para a reconstrução do conhecimento e a comunicação. Verificou-se que a inclusão
digital contribuiu na capacitação de idosos para utilização de recursos informatizados (Word, PowerPoint, WWW/Internet),
na produção intelectual (construção de materiais instrucionais sobre envelhecimento); auxiliou na sua integração com a
família; na atualização da linguagem e na comunicação com o mundo, principalmente pelo reconhecimento do potencial do
idoso para a aprendizagem da tecnologia e de uma nova linguagem, até então concebidas como prerrogativas dos mais
jovens. O envelhecimento, constituindo tema transversal dos materiais instrucionais elaborados pelos idosos nas oficinas
pedagógicas, possibilitou aos idosos perceberem que este processo é constituído de diferentes dimensões, indo além da
biológica, o que possibilitou tecer e compreender a “arquitetura complexa” do fenômeno envelhecimento ao reconhecerem a
presença das dimensões psicológica, social, cultural e educacional.
PALAVRAS-CHAVE:
Contribuição, inclusão digital, cotidiano, idosos, concepção de envelhecimento
47
1. INTRODUÇÃO
A palavra cotidiano vem do latim cotidie ou cotidianus, significando o dia-a-dia, o comum, o habitual. Porém,
o se reduz aos usos e costumes ou ao rotineiro. A história vivida é decifrada no cotidiano e não pode ser
banalizada, confundindo-se com as rotinas. Refletir sobre a vida cotidiana implica descobrir o incomum no
comum, o comum no incomum.
O cotidiano contribui na constituição/reprodução/transformação do sujeito/indivíduo e dos grupos nos
quais se insere e, conseqüentemente, na própria sociedade que, ao transfor-los, transforma-se e é por eles
transformada: mesmo um olhar individualizado precisa pensar o sujeito/indivíduo de forma contextualizada, pois
a vida cotidiana inclui conviver e relacionar-se com outras pessoas e com o ambiente. Os seres humanos vivem
numa rede complexa de relações, sendo uns dependentes de outros.
Após o nascimento convive-se com a emergência da presença do outro para a construção do eu. E este
eu é estruturado, constrdo/reconstruído na vida social, sendo a noção de sujeito/indivíduo fortalecida e
consolidada no decorrer da exisncia. O sujeito se insere/é inserido na família, no mundo.
No dia-a-dia ocorrem aprendizagens com a reprodução cotidiana de pensamentos, atos, sentimentos e
valores, ao mesmo tempo em queaprendizagens com a inovação e a ruptura com o conhecimento anterior.
A rede de relações se estabelece além do ambiente familiar, nos diferentes grupos de convívio,
permeados por crenças, convicções, mitos, tabus que auxiliam na reconstrão da teia relacional, em
movimentos recursivos em que são tecidas novas relações sociais. É nesta complexa teia da interdependência
humana que se encontra o potencial de transformação/reprodução/avanço/regressão, da possibilidade/limitação
de construção de estratégias frente aos desafios que a vida proporciona e, entre estes, educar/educar-se/ser
educado para um uso construtivo da tecnologia.
Até o início da última década doculo XX, ser analfabeto em infortica era uma situação comum nas
diversas faixas etárias. Entretanto, a partir do momento que os recursos informatizados passaram a fazer parte do
dia-a-dia, nos mais diversos setores da sociedade ocorreram transformações nos aspectos econômicos e sociais,
questionando valores e comportamentos o que gerou avanço e inovação, desconforto e sentimento de menos
valia nas pessoas que permaneciam alijadas ao progresso (Kachar,2003).
No final século XX, a informática, a grande parceira no desenvolvimento da linguagem, passou a
permitir a exploração de distintas formas de comunicão verbal (fala, escrita, gestos) e a revalorização da
comunicação não-verbal (icônica). Sua importância foi sendo ampliada à medida que passou a ser incorporada
no cotidiano.
A utilização do computador e a busca de domínio da informática foram crescendo diariamente de forma
contínua e rápida. A linguagem da informática e o conhecimento sobre o computador passaram a ser símbolos da
cultura contemporânea, atualizada e inclusiva. Sua penetração na sociedade inicialmente era restrita aos
profissionais especializados. Hoje, seu uso independe de área de especialização e de faixa etária, influenciando
na autovalorização, auto–imagem e conseqüentemente, na auto-estima de idosos (Papalia, 2003).
A tese que sustentou a realização da presente pesquisa afirmava que programas educativos destinados a
idosos com o suporte de novas tecnologias, convocando para uma interação pedagógica motivacional
diferenciada, precisam potencializar o direito à diferença, afirmando identidades ao mesmo tempo em que se
ocupam com o desenvolvimento intelectual, articulando uma nova cidadania (social e solidária), a partir da
contextualização e problematização do cotidiano.
2. DESENVOLVIMENTO DO ESTUDO E SEU REFERENCIAL
Na contemporaneidade, é cada vez mais premente a demanda por novos conhecimentos, saberes e habilidades (
Pozo, 2002). A aprendizagem mediada pelo uso de recursos informatizados, vista como capacidade de
adquirir/reconstruir/incorporar a cultura, amplia horizontes ao instituir a consciência de que os saberes são
provisórios, parciais e que, pela reflexão, podem levar à substituição de verdades absolutas pela connua
reconstrução e integração de novos conhecimentos (POZO, 2002). Talvez este seja um dos grandes desafios
principalmente para as pessoas idosas, cuja orientão paradigmática encaminha para uma concepção de
aprendizagem associada somente à memorização.
Na pesquisa realizada, com o objetivo de analisar a percepção de idosos sob a contribuição da
inclusão digital em sua vida cotidiana e a mudança ocorrida em suas concepções de envelhecimento após
freqüentarem oficinas pedagógicas de inclusão digital, assume-se uma concepção de cotidiano construída a partir
da complementaridade das idéias de Morin, (1998, 1999), Heller (1987), Stuart (2002) e Luckman e Berger
(1987) em que fica evidente a importância das relações de autonomia/depenncia na construção do
sujeito/indivíduo e de sua relação com o mundo e a tecnologia. Nos estudos de Kachar (2003), Azevedo e Souza
et al (2002 e 2004), Garcia e Lentini (2002), Garcia, Lentini e Gennaro (2002), Diáz (2001) encontrou-se
48
argumentos que corroboram a presença de potencial de constante aprendizagem em idosos e conseente
inclusão digital.
2.1 METODOLOGIA
A pesquisa foi desenvolvida numa abordagem qualitativa/dialógica tendo como objetivo principal analisar a
contribuição da inclusão digital no cotidiano de 24 idosos que freqüentam há 6 meses oficinas pedagógicas de
alfabetização digital, realizadas duas vezes por semana, com duração de uma hora, sob a coordenação do Núcleo
de Estudos Interdisciplinares sobre Concepção de Envelhecimento do Programa de Pós-Graduação em
Gerontologia Biomédica do Instituto de Geriatria e Gerontologia, da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul.
Durante o desenvolvimento das oficinas os idosos participavam nas segundas-feiras de atividades de
língua espanhola e nas quartas-feiras de atividades que incluíam a aprendizagem do Word, Powerpoint e
WWW/Internet que encontraram aplicação na elaboração de apresentações sobre envelhecimento em PowerPoint
e na construção de homepage pelos idosos.
Os dados foram coletados por observação participante e por entrevista coletiva, utilizando-se os
prinpios da dialógica de Morin (recursivo, hologratico e dialógico) na análise da realidade.
Como critérios de cientificidade foram utilizados os propostos por Bauer e Gaskell (2001):
a) a triangulão entre dados oriundos da observação participante e das entrevistas;
b) a clareza na descrição dos procedimentos;
c) a construção do corpus o que permitiu uma coleta sistemática de dados, numa amostra cujo tamanho foi
delimitado por evidências de saturação (quando os discursos não trouxerem mais novidade) o que permitiu a
generalização analítica (a partir da discussão teórica);
d) a descrição detalhada dos dados, comprovando-se como surgiram generalizações analíticas e as
interpretações, fornecendo-se a linguagem e os indícios do próprio material qualitativo coletado, dando
credibilidade aos resultados;
e) a clareza na compreeno/explicação da realidade a partir das discussões realizadas sobre os dados
coletados na observação participante nas reuniões semanais dos pesquisadores que integram o grupo de pesquisa,
contextualizando os resultados em relação a aspectos psicossocioculturais e paradigmáticos.
A análise dos dados compreendeu os seguintes movimentos:
a) leitura exploratória global dos registros das observações participantes e das transcrições das entrevistas;
b) leitura detalhada de cada material coletado;
c) organização do material por unidades contextuais;
d) identificação das unidades de significados e classificação em dimensões;
e) identificação de contradições;
f) síntese dos resultados.
2.2 Resultados e discussão teórica
A partir da análise da realidade verificou-se que a inclusão digital contribuiu na capacitação de idosos para
utilização de recursos informatizados (Word, PowerPoint, WWW/Internet), na produção intelectual (construção
de materiais instrucionais sobre envelhecimento); auxiliou na sua integração com a família; na atualização da
linguagem e na comunicão com o mundo. A inclusão digital possibilitou uma maior aproximação e
comunicação com os filhos e netos, principalmente pelo reconhecimento do potencial do idoso para a
aprendizagem da tecnologia e de uma nova linguagem, até eno concebidas como prerrogativas dos mais
jovens.
Esta constatação foi realizada a partir da análise de depoimentos dos idosos sobre suas expectativas
iniciais em relação `a própria aprendizagem, registrados em dissertações de Mestrado recentemente concldas
(Jackle, 2005; Glock, 2005 e Wehmeier, 2006) e da concepção de envelhecimento explicitada ao final dos 6
meses de participação nas oficinas.
Dos vinte e quatro idosos (25), um (1) afirmou não perceber uma importante contribuição da inclusão
digital em seu cotidiano. Entretanto, pela observação participante percebeu-se que houve um avanço no
relacionamento destes dois idosos com os demais participantes. Inicialmente apresentavam dificuldade para se
relacionarem com os demais idosos. Após seis meses percebeu-se sua integração no grupo, participando
ativamente nos momentos de discussão e orientação coletiva.
Entre as razões que levaram os idosos a participarem das oficinas pedagógicas encontram-se a busca de
novas aprendizagens e de inserção nos benefícios de avanços da contemporaneidade. Um dos idosos participante
da pesquisa afirmou ter sido surpreendido ao ouvir alguém afirmar: “quem não sabe usar o computador será um
analfabeto”. Relata que começou a pensar sobre a veracidade da afirmação, tendo comentado: “Tudo o que se
49
fala hoje em dia em algum momento está ligado com a informática. Comecei a pensar o que seria este contexto...
Euo tinha a noção que poderia ser considerado analfabeto futuramente. Já no presente a gente se depara com
certas situações em que se tem que saber digitar alguma coisa, principalmente no Banco” (agência bancária).
Outro participante afirmou “ Eu entrei aqui completamente alheia e sem saber absolutamente nada de
nada, o que era a informática. E vim por aquele desejo de aprender, de saber mais alguma coisa, porque eu
continuo dizendo que nunca é tarde para se aprender. Eu, como não sabia nada, ficava ali com a minha cabecinha
funcionando pra ver se conseguia guardar, tanto que eu tenho um caderno. O que um dos nossos monitores dizia
eu escrevia rapidinho, para poder gravar. Tive momentos de bastante preocupação, se eu ia vencer a tarefa ou
não . Agora estou achando muito proveitoso. Eu acho inclusive que estou mais familiarizada. Os monitores
quando nós reiniciamos as oficinas, fizeram todo um retrospecto para ver em que ponto nós estávamos. Eu achei
isso uma atitude de muita atenção pra nós,(...).
Neste trecho de relato percebe-se a motivão implícita no desafio enfrentado pela idosa ao decidir por
sua inclusão no mundo digital, predispondo-se para a busca de conhecimentos culturalmente considerados
relevantes e úteis.
Por tratar-se de oficinas pedagógicas desenvolvidas numa concepção acadêmica, as atividades foram
realizadas sob uma das teses de Pozo (2002, p.45): “a cultura da aprendizagem direcionada para reproduzir
saberes previamente estabelecidos deve dar passagem a uma cultura da compreeno, da análise crítica, da
reflexão sobre o que fazemos e acreditamos (... ) para compreender e dar sentido ao conhecimento, duvidando
dele”.
Aprender pode significar coisas distintas dependendo das necessidades culturais: “em toda atividade
humana se está produzindo aprendizagem em maior ou menor dose.” A idéia é que aprender implica reconstruir
conhecimentos e comportamentos anteriores. Ou seja, “a aprendizagem é concebida precisamente como uma
reestruturação dos conhecimentos e comportamentos presentes no aprendiz” (Pozo, 2002). Aprender implica
desaprender para reaprender a aprender (Morin, 1999) .
Partindo-se da reflexão de que toda aprendizagem implica mudança, mas nem todas mudanças são de
mesma natureza, nem de mesma intensidade ou duração, é possível afirmar que há formas diferentes de
desaprender. Seria a aprendizagem das novas tecnologias uma delas?
As mudanças baseadas na reconstrão dos comportamentos e do conhecimento, vinculadas à
aprendizagem construtiva, têm características peculiares. Seu efeito não é substituir, mas integrar o
comportamento ou a idéia numa nova estrutura de conhecimento. A aprendizagem está associada à descoberta e
à exploração curiosa do mundo, produzindo conhecimento por reconstrução do conhecimento já sistematizado; é
um sistema complexo composto por subsistemas que interagem entre si: os resultados da aprendizagem (o que se
aprende), os processos (como se aprende) e as condições práticas (em que se aprende) (Pozo, 2002).
Idosos integrantes das oficinas pedagógicas revelam que não gostam de ser chamados de velhos,
preferem o termo terceira idade, melhor idade ou estar/ser idoso.
Segundo Kachar ( 2003), o declínio de algumas atividades o inviabiliza a apropriação e o domínio do
recurso tecnológico, mas exige um contexto educacional que atenda às condições de aprender sobre a máquina e
por meio dela explorar outras possibilidades de desenvolvimento.
O processo de envelhecimento, está associado a alterações biológicas, a questões sociais, psicológicas,
culturais e educacionais. O envelhecimento é uma experiência singular, em que cada pessoa, na sua
individualidade, sente e percebe-se idoso de forma diferenciada.
Entre as principais contribuições que a inclusão digital trouxe, encontra-se a relatada por um dos
participantes: “o conhecimento da informática na vida trouxe entrosamento, entusiasmo e eles (familiares) me
telefonam para saber como é que eu vou no trabalho. Inclusive os meus bisnetos. Eu encontrei com eles ontem
e a primeira coisa foi que ela (bisneta) me abraçou e perguntou: o teu computador, bisa, como é que vai? Sabe, o
interesse. E ela tem 9 anos. Então eu achei isso válido. Por que, assim, embora a distância, convivendo comigo
neste aspecto me dá tanta satisfação. Eles reclamaram e agora ficam radiantes. Há muito tempo, quando ela era
menorzinha, um dia ela me falou do computador e perguntou se eu tinha e se eu sabia ligar o computador. Eu
respondi:o, meu amor, a bisao sabe. E ela respondeu: ‘Bisa, tu é da idade da pedra. Esta foi uma das
razões que me motivou mais ainda. Eu disse: Vou mostrar pra ela que não há idade da pedra atualmente. Que
hoje em dia há progresso. É valorizar o nosso interior, o nosso intelecto também.
A inserção no mundo digital, entre as diversas possibilidades que oferece, auxilia na expano dos
sonhos e sentimentos mais valia, que vai se desenvolvendo à medida que os idosos passam a perceber a reação
de seus familiares e amigos em relação à sua capacidade de aprender a usar os recursos informatizados.
No presente estudo constatou-se mudança na concepção de envelhecimento dos idosos: de uma concepção de
envelhecimento em que apenas a dimeno biológica era enfatizada, os idosos evolram para uma concepção
em que se fizeram presentes as dimensões social, psicológica, cultural e educacional, aproximando-se da
concepção hoje preconizada pelos teóricos da área da Gerontologia..
Pesquisas realizadas sobre concepção de envelhecimento de idosos (Azevedo e Souza e Luzzi, 2004;
Azevedo e Souza et al., 2005; Jackle, 2005 e Glock, 2005) têm mostrado que inicialmente é comum a
50
demonstração de um sentimento de incapacidade de aprendizagem atribuído à idade, que vai diminuindo à
medida que percebem sua capacidade para aprender.
Nesta direção, uma das participantes da pesquisa comentou: “Quando a gente coma a aprender, vê
tantas possibilidades que já começa a gostar dele (do computador), a ver a possibilidade enorme. Agora a gente
quer muito mais do que quando o tinha o computador.”
Após alguns meses como participantes das oficinas pedagógicas, os idosos falaram sobre o início, das
novas relações, da busca de informações sobre o computador, demonstrando motivação, curiosidade e
capacidade para aprender. Verificou-se o quanto é relevante oferecer a oportunidade de continuidade nas oficinas
após a conclusão do tempo de inclusão previsto. A possibilidade de não permanecerem participando das oficinas
era motivo de preocupação. A inclusão digital não se limita a meros seis meses. Precisa ter continuidade para
que realmente seja incorpora no cotidiano.
A vida cotidiana não se reduz a “casa e quarto”, ao “rotineiro e repetitivo”, não podendo ser o cotidiano
confundido com as rotinas e banalidades de todos os dias (Martins, 2000). O desafio do cotidiano está na
superação do próprio cotidiano (Guimarães, 2000) e essa superação inclui o não-cotidiano, que de certa forma
revela sutis desafios ao cotidiano.
A idéia implícita na concepção de cotidiano é a sujeito/individuo produtor de sentidos (Guimarães,
2002). É espaço de vida do ser humano; é onde se desenrolam experiências, opções, idéias, sentimentos,
capacidade intelectual e criadora. Os sentimentos são a reação ao que é percebido através dos sentidos e é
através dos sentimentos que se dão as relações consigo mesmo e com o mundo (Viscott, 1982). Sentir também é
uma forma de conhecer e interpretar o mundo, o cotidiano, a realidade; os sentimentos são pontos de partida para
o conhecimento (Heller, 1993).
A falta de conhecimento sobre o mundo digital envolve os idosos num sentimento de exclusão
(Kachar,2003). Considerando-se que prestar atenção aos próprios sentimentos auxilia na compreensão do mundo
circundante, pode-se afirmar que os idosos que buscaram as oficinas pedagógicas de inclusão digital foram
movidos também pela escuta do sentimento de não pertencer/querer pertencer à contemporaneidade.
O “domínio” da informática, o conhecimento desta linguagem, é um caminho a ser explorado,o
apenas para auxiliar os idosos em seus afazeres cotidianos ou para ocupar o tempo ocioso, mas principalmente
para que os idosos se sintam produtivos e valorizados, sendo incentivados na busca de novas aprendizagens.
3. CONCLUSÕES
A experiência vivida nas oficinas pedagógicas de inclusão digital constitui uma possibilidade de reconstrão da
identidade do idoso como cidadão do mundo, com capacidade para aprendizagem connua e para lidar com
situações e desafios diários relacionados ao uso da tecnologia, dando suporte para a reconstrução do
conhecimento, a produção intelectual, a comunicação.
O rompimento com atividades de inclusão digital para idosos que reforçam a discriminação,
reivindicando-se uma abordagem reflexiva e crítica, é o posicionamento assumido na presente pesquisa.
Neste sentido, o envelhecimento, constituindo tema transversal dos materiais instrucionais elaborados
pelos idosos nas oficinas pedagógicas, possibilitou aos idosos perceberem que este processo é constituído de
diferentes dimensões, indo além da biológica, o que possibilitou tecer e compreender a “arquitetura complexa”
do fenômeno envelhecimento.
A proposta pedagógica interdisciplinar das oficinas precisou ser constituída/reconstituída durante o
percurso, a partir das interações entre as áreas de conhecimento envolvidas. Participaram como ensinantes nestas
oficinas profissionais pertencentes às áreas da Psicologia, Pedagogia, Letras (espanhol), Fisioterapia e
Gerontologia. Assim sendo, a proposta pedagógica dependia, na sua própria existência, do tema transversal –
envelhecimento – o que auxiliou no aprofundamento do conhecimento sobre a problemática vivida pelos idosos
em seu cotidiano.
Assumiu-se nas oficinas o comprometimento com ações que favorecessem a consecão da
transversalidade. Nestas situações de convívio interprofissional, como interdisciplinadores”, ocorreram situações
em que foi preciso improvisar, a partir de uma reflexão-na-ação fluente e integrada, proposta por Schön (2000).
Cada integrante, escutando a si mesmo e aos outros, percebia a direção que as ações estavam tomando o que
viabilizou ajustamentos: idéias passaram a ser discutidas e assumidas, elaboradas e transformadas.
Cada profissional envolvido ao expor seus argumentos contribuiu para a unidade de objetivos que deu
ao planejamento a característica de uma ordem previsível. Ocorreram variações do surgimento da oportunidade
de combinar e recombinar idéias, dentro de uma configuração que deu coerência às ações. À medida que os
profissionais envolvidos conseguiam perceber os resultados das ações interdisciplinares, fortaleciam sua
motivação para aprender a trabalhar com idosos e deixarem-se surpreender com a superão das limitações
iniciais por parte dos idosos.
51
A partir dos resultados encontrados na presente pesquisa, é possível afirmar que a inclusão digital de
idosos contribui para uma maior valorização social e a reinserção como cidadão contemponeo com capacidade
de integração aos novos tempos, numa concepção em que não basta aprender a ligar, desligar o computador,
apertar botões e teclas, aprender a acessar caixas eletrônicos. Isto é muito pouco para pessoas que têm muito a
oferecer e desenvolver. É preciso oferecer espaço para que os idosos vivam experiências em ambientes
universitários, permeados pela criticidade e a criatividade, onde possam perceber–se/serem percebidos como
produtivos intelectualmente.
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IDÉIAS CONCLUSIVAS
Na pesquisa realizada, através de observação participante e de
entrevistas feitas com os idosos integrantes das Oficinas Pedagógicas de Inclusão
Digital, após desenvolver a análise e triangulação dos dados, é possível afirmar que
os idosos apresentam uma concepção de envelhecimento em processo de
reelaboração: a análise de suas entrevistas iniciais (Projeto Matriz) revelavam
concepções associadas essencialmente à dimensão biológica enquanto os
resultados da presente pesquisa indicam uma concepção na qual aparecem, além
da dimensão biológica, a social, a psicológica, a cultural e a educacional,
aproximando-se da concepção hoje preconizada pelos teóricos da área da
Gerontologia.
Idosos participantes, ao fazerem referência ao seu cotidiano e
experiências mais recentes, trazem a concepção de que o envelhecimento é um
estágio produtivo, de descobertas e possibilidades de uma vida mais aproveitada,
com menos trabalho e novas descobertas. Já não percebem seu cotidiano como
algo repetitivo, mas em movimento, crescimento, desenvolvimento ( aprendizagem/
conhecimento), percebendo-se na dinâmica da vida em que a inclusão digital
possibilita o gerenciamento de rotinas, o acesso ao conhecimento e `a comunicação
com a família e com os jovens, o que permite sentir-se integrado/reintegrado no
meio de convívio e no mundo virtual.
Assim sendo, a inclusão digital de idosos tem potencial para contribuir
para uma maior valorização social e a reinserção como cidadão contemporâneo,
com capacidade de integração aos novos tempos, para os quais tem o que oferecer
e desenvolver.
53
Constatou-se que o uso dos recursos informatizados permite ao idoso
mostrar seu potencial de aprendizagem, possibilitando a reconstrução de suas
concepções e de seu cotidiano.
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