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apreensão sensível ou inteligível. [...] Que ela emane do sol sensível ou do sol
inteligível, a luz, desde Platão, condiciona todo o ser” (LÉVINAS, 1998, p.53). Frente
à escritura de Marguerite Duras, submerge-se, então, no incógnito, no obscuro, nos
infinitos desconhecidos; seja a noite, o sono, o sonho, a morte, a doença da morte, o
fim, o mar, a mulher, o corpo da mulher:
Vous dites pour dormir sur le sexe étale, là où vous le connaissez pas.
Vous dites que vous voulez essayer, pleurer là, à cet endroit-là du monde.
Elle sourit, elle demande : Vous voudriez aussi de moi?
Vous dites: Oui. Je ne connais pas encore, je voudrais pénétrer là aussi. Et
aussi violentemment que j’ai l’habitude. On dit que ça résiste plus encore,
que c’est un velours qui résiste plus encore que le vide (DURAS, 1984,
p.9)
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.
Penetra-se nesse desconhecido, onde as formas das coisas são dissolvidas
na noite, diluídas no infinito. A representação, no que se refere à presentificação do
não-presente, torna-se a recuperação do irrecuperável, perdida em vaguidão.
Apenas metáfora sem referente, significante cujo significado se perdeu. “Na noite,
quando estamos presos a ela, não lidamos com coisa alguma. [...] No entanto, essa
ausência é, por sua vez, uma presença absolutamente inevitável” (LÉVINAS, 1998,
p.68). Há uma presença, e é justamente o enfoque nessa presença (já desprovida
de ausência) que permite falar-se de uma apresentação, antes que de uma
representação.
Almeja-se apresentar aquilo que tende a ser ocultado, o próprio significado, o
referido; para transpor o abismo, a linguagem volta para si mesma e evidencia os
próprios bastidores do processo de escrita. “Elle aurait parlé le temps du parcours,
de temps en temps, voyez” (DURAS, 1977, p.40)
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. As narrativas de Marguerite
Duras suscitam o questionamento sobre a própria possibilidade de se narrar uma
história, visto que as ações que desencadeiam a diegese, nesse caso, seriam puros
atos de fala, constituir-se-iam como o relato do relato. Em Le camion, o texto do que
poderia ser um roteiro de cinema é lido por Marguerite Duras e Gérard Depardieu;
em Le navire night, há o encontro entre a escritora/diretora e Jacquot Benoit na
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“Você diz que para dormir sobre o sexo distendido, ali onde você não conhece. Você diz que você
quer experimentar, chorar ali, nesse lugar ali do mundo. Ela sorri, ela pergunta: Você quer também a
mim? Você diz: Sim. Eu não conheço ainda, eu queria penetrar também ali. E tão violentamente
quanto costumo. Dizem que isso resiste ainda mais, que é um veludo que resiste ainda mais que o
vazio” [Tradução de Jorge Bastos].
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“Ela falaria do período do percurso, de vez em quanto, sabe?” [Tradução de José Sanz].