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Fundação Edson Queiroz
Universidade de Fortaleza – UNIFOR
Vice-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação – VRPPG
Mestrado em Psicologia
Mara Aguiar Ferreira
Psicologia, trabalho e saúde: um estudo sobre a
atuação dos psicólogos no campo da saúde do
trabalhador
FORTALEZA
2007
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Fundação Edson Queiroz
Universidade de Fortaleza – UNIFOR
Vice-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação – VRPPG
Mestrado em Psicologia
Mara Aguiar Ferreira
Psicologia, trabalho e saúde: um estudo sobre a
atuação dos psicólogos no campo da saúde do
trabalhador
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em
Psicologia do Centro de Ciências Humanas da
Universidade de Fortaleza UNIFOR, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em Psicologia.
Linha de Pesquisa: Ambiente, Trabalho e Cultura nas
Organizações Sociais.
Orientadora: Profª. Regina Heloísa Mattei de Oliveira
Maciel, Dra.
Fortaleza – CE
Universidade de Fortaleza – UNIFOR
2007
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___________________________________________________________________________
F383p Ferreira, Mara Aguiar.
Psicologia, trabalho e saúde : um estudo sobre a atuação dos psicólogos no
campo da saúde do trabalhador / Mara Aguiar Ferreira. - 2007.
125 f.
Cópia de computador.
Dissertação ( mestrado) – Universidade de Fortaleza, 2007.
“Orientação : Profa. Dra. Regina Heloísa Mattei de Oliveira Maciel.”
1.Trabalho – Aspectos psicológicos. 2. Psicologia organizacional.
3. Medicina do trabalho. I. Título.
CDU 159.9:331.1
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AGRADECIMENTOS
- A Deus, por me iluminar nessa jornada e me permitir essa grande realização.
- Ao meu marido, Leonardo Rôla, pelo amor, apoio e compreensão das angústias e
ausências durante a construção da dissertação.
- À professora Drª. Regina Maciel, que acreditou em minha capacidade e me ajudou
a chegar ao fim de mais uma etapa da minha vida, por sua paciência e crítica
sempre construtiva.
- Ao professor Dr. Clerton de Oliveira Martins, pela empatia que estabeleceu comigo
e com o meu trabalho desde o início do Mestrado, bem como seu apoio e incentivo.
- À professora Drª. Tereza Gláucia Rocha Matos, pelo estímulo, escuta atenciosa e
sugestões sempre pertinentes.
- Ao professor Dr. Antônio Caubi Ribeiro Tupinambá, por ter aceitado prontamente o
convite de fazer parte da banca examinadora, bem como pelas brilhantes
contribuições apresentadas.
- Ao Conselho Regional de Psicologia, pelo apoio e disponibilização das informações
que viabilizaram este estudo.
- Aos profissionais de Psicologia que participaram da pesquisa, pelo interesse,
engajamento e disponibilidade.
- Às amigas que o mestrado me deu e que dividiram comigo importantes
experiências acadêmicas, em especial à Aline Moita, Juliana Theóphilo, Ana Patrícia
Oliveira dos Santos, pela força e por compartilharem momentos de incertezas e
alegrias.
- Ao professor Edson, por sua presteza e paciência nas aulas de estatística.
- Aos meus familiares, pela paciência e compreensão.
- A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desta
pesquisa.
RESUMO
Este estudo investiga as práticas dos psicólogos do trabalho voltadas para a promoção da
saúde dos trabalhadores, com o objetivo de identificar as atividades desenvolvidas por eles
na amenização do sofrimento dos trabalhadores e para a promoção da saúde no trabalho.
Além disso, analisa como os psicólogos se posicionam frente às práticas que desenvolvem e
como estas vêm atualmente contribuindo para a promoção do bem-estar dos trabalhadores.
A investigação, de natureza quanti-qualitativa, foi realizada com psicólogos que atuam em
organizações no Ceará. Os dados foram coletados pela aplicação de questionário, enviado
pela internet para os psicólogos inscritos no Conselho Regional de Psicologia do Ceará
(CRP11), e por meio de entrevistas semi-estruturadas com cinco profissionais da área. No
estudo quantitativo, verificou-se que 56,7% dos pesquisados relatam realizar atividades
voltadas para a promoção da saúde e prevenção do adoecimento no trabalho. Em relação à
qualificação dos psicólogos investigados, dos 56,7% que atuam em saúde do trabalhador,
60% afirmaram possuir capacitação nesta área. As entrevistas revelaram que o psicólogo
não tem a saúde do trabalhador como prioridade na sua atuação profissional. Embora
conheçam as principais teorias, o tema saúde do trabalhador parece obscuro para estes
profissionais que não foram capacitados para realizar uma leitura crítica sobre tal questão.
Desta forma, as ações desenvolvidas na área enfocada se mostraram insuficientes. Este
quadro se deve, provavelmente, a falhas na formação, à acomodação dos profissionais, a
uma visão excessivamente empresarial e à falta de articulação da categoria para viabilizar
troca de informações e conhecimentos. A preocupação com a saúde física mostrou-se
prioritária para os psicólogos em detrimento da saúde mental. Os Psicólogos do trabalho
utilizam de maneira acrítica modelos e estratégias de ação em saúde na forma de
programas pontuais, sem terem consciência do impacto e das repercussões que estes
exercem sobre os sujeitos.
Palavras-chave: saúde do trabalhador, psicologia organizacional, saúde ocupacional, trabalho.
ABSTRACT
This study investigates the work psychologists' actions and programs related to the
promotion of health at work. The research aims to identify activities and strategies
developed by psychologists in preventing workers' suffering and promotion of health at
work. It analyses the psychologists' viewpoint in relation to their practices and how these
practices contribute for promoting workers' well being. In the investigation, a quanti-
qualitative approach was used. The participants were a group of Ceará's organizational
psychologists. Data were collected by the application of a questionnaire, sent by the
internet to psychologists enrolled in Regional Council of Psychology of Ceará (CRP11),
and by semi-structured interviews with five professionals. The results of the quantitative
study showed that 56,7% of the participants develop activities related to promotion of
health and prevention of illness at work. However, only 60% of those have done some
kind of training in the area. The interviews revealed that organizational psychologists do
not have worker's health as priority in their professional routine. Although they know the
main theories, the theme "workers health" seems obscure and they do not have
qualification for a critical approach. The actions developed in the area are poor. This
picture is due, probably, to lack of professional qualification, accommodation of the
professional, to an excessive organization perspective and to a lack of articulation of the
category to allow the exchange of information and knowledge. The concern with the
physical health was shown as a priority for the psychologists instead of issues related to
mental health. The work psychologists use models and strategies in a non critical way
trough narrow programs and actions without awareness of the impact and the
repercussions that they exercise on the subjects.
Keywords: worker`s health, organization psychology, occupational health, labor.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Tempo de formação em Psicologia................................................................p. 92
Figura 2: Tempo de atuação em Psicologia do Trabalho......................................................p. 93
Figura 3: Momento em que os participantes começaram a atuar na área da psicologia do
trabalho..................................................................................................................................p. 94
Figura 4: Titulação................................................................................................................p. 95
Figura 5: Tipo de organização que trabalha atualmente........................................................p. 95
Figura 6: Freqüência com que realizam diversas atividades no trabalho............................p. 96
Figura 7: Cruzamento das questões titulação e opinião sobre se o psicólogo contribui
para a manutenção da saúde no trabalho.................................................................p. 99
Figura 8: Quais as principais dificuldades encontradas pelos psicólogos para ampliar sua
atuação na área da saúde do trabalhador.............................................................................p. 106
Figura 9: Como você avalia a formação acadêmica em psicologia para a atuação na área da
sáude do trabalhador?..........................................................................................................p. 107
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Tipo de prática que desenvolve na organização...................................................p. 96
Tabela 2: Freqüência e porcentagem das categorias do tipo de atividades realizadas para
prevenir o adoecimento no trabalho....................................................................................p. 102
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Principais características dos sujeitos colaboradores...........................................p. 61
Quadro 2: Concepções sobre a relação trabalho e o processo desaúde/adoecimento............p.99
Quadro 3: Categorias das atividades realizadas para promoção da saúde e prevenção do
adoecimento no trabalho......................................................................................................p. 101
Quadro 4: Categorias e respostas sobre como o psicólogo pode contribuir para a promoção da
saúde no trabalho.................................................................................................................p. 108
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................... p. 13
1.1. Definições: Da Psicologia Industrial à Saúde do Trabalhador............................. p. 14
1.2. O Trabalho e sua Trajetória..................................................................................p. 19
1.3. Trabalho, Identidade e Subjetividade
...................................................................p. 20
1.4. O Trabalho na Atualidade....................................................................................p. 25
1.5. O Conceito de Saúde.............................................................................................p. 28
1.5.1. Psicologia, Saúde Mental e Trabalho.........................................................p. 29
1.5.2. O Campo da Saúde do Trabalhador...........................................................p. 35
1.6. As Práticas dos Psicólogos nas Organizações no Contexto Brasileiro: Em Prol da
Organização ou do Trabalhador?............................................................................p. 40
2. OBJETIVOS.....................................................................................................................p. 56
2.1. Objetivo Geral..........................................................................................................p. 56
2.2. Objetivos Específicos...............................................................................................p. 56
3. MÉTODOS....................................................................................................................p. 57
3.1. Sujeitos Colaboradores da Pesquisa....................................................................... p. 58
3.2. Instrumentos e Técnicas de Investigação.................................................................p. 59
3.2.1. Pesquisa Quantitativa........................................................................................p. 59
3.2.2. Pesquisa Qualitativa...........................................................................................p. 60
3.3. Análise e Interpretação dos Dados Quantitativos......................................................p. 62
3.4. Análise e Interpretação dos Dados Qualitativos..........................................................p. 62
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO....................................................................................p. 65
4.1. Apresentação e Discussão dos Resultados das Entrevistas.........................................p. 65
4.1.2. Formação Acadêmica.........................................................................................p. 65
4.1.3. Percepção da Relação Entre Trabalho e o Processo de Saúde-Adoecimento......p.69
4.1.4. Visão sobre a Atuação do Psicólogo do Trabalho.............................................p. 73
4.1.5. O Psicólogo do Trabalho e a Promoção da Saúde do Trabalhador....................p. 78
4.1.6. Práticas em prol da saúde do trabalhador ou Não Práticas...............................p. 87
4.2. Análise e Discussão dos Resultados Quantitativos........................................................p. 92
4.2.1. Características da Amostra..................................................................................p. 92
4.2.2. As Práticas dos psicólogos...................................................................................p.95
4.2.3. A Inclusão da Saúde do Trabalhador...................................................................p. 97
4.2.4. A Formação.......................................................................................................p. 105
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................p. 112
6. REFERÊNCIAS...........................................................................................................p. 121
ANEXO 1: QUESTIONÁRIO............................................................................................p. 127
ANEXO 2: CARTA DE INFORMAÇÃO – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE
E ESCLARECIDO...........................................................................................p. 136
13
1. INTRODUÇÃO
Esta dissertação tem por finalidade investigar a atuação dos psicólogos do
trabalho no que concerne às práticas voltadas para o âmbito da saúde do
trabalhador. Procura averiguar que tipo de práticas os profissionais de Psicologia
desenvolvem para a promoção da saúde e prevenção do adoecimento no trabalho.
Pretende, ainda, identificar e descrever as estratégias de ação utilizadas pelos
psicólogos para o diagnóstico, a intervenção e o acompanhamento da saúde dos
trabalhadores, de modo a verificar como a Psicologia Aplicada ao Trabalho vem
edificando sua atuação e que tipo de instrumental metodológico disponibiliza em
suas intervenções.
Meu interesse pela temática advém de leituras realizadas a respeito do
assunto e, principalmente, da minha experiência profissional, que suscitou
questionamentos sobre as limitações e, sobretudo, as possibilidades de atuação do
psicólogo do trabalho em relação às práticas dirigidas ao objeto de estudo da ciência
psicológica: o sujeito. Tais questionamentos despertaram meu interesse para as
práticas realizadas pelos psicólogos que ampliam o que Bastos (1992) define como
“modelo restrito de atuação profissional”, limitado às atividades de recrutamento,
seleção e treinamento, o que transforma esses profissionais em um “instrumento
adicional de exploração do trabalhador”. De certa maneira, o modelo restrito de
atuação profissional subverte a missão do psicólogo de contribuir para a diminuição
do sofrimento dos sujeitos e colabora para sua alienação (Codo, 1989; Figueiredo,
1989).
14
Acredita-se que a investigação e a análise das práticas atuais dos psicólogos
do trabalho no âmbito da saúde laboral podem ser um passo importante e crucial
para o desenvolvimento e a consolidação deste espaço de aplicação.
Do ponto de vista acadêmico, o estudo pode contribuir para o aprofundamento
do conhecimento da atuação dos psicólogos no âmbito da saúde do trabalhador,
uma vez que essa questão ainda é pouco explorada. A dissertação pretende
colaborar também para a formação dos psicólogos que desejam atuar nessa área.
Além de suscitar uma apreensão crítica da atuação do psicólogo do trabalho, o
estudo visa fornecer subsídios que possibilitem maior clarificação dessa temática, de
modo a estabelecer novas linhas de investigação e aprimorar o instrumental teórico-
metodológico existente.
Do ponto de vista social, a dissertação pode contribuir para a socialização e a
reformulação de estratégias de intervenção do psicólogo do trabalho em prol da
qualidade de vida e do bem-estar dos trabalhadores, ampliando e consolidando os
espaços de atuação dos profissionais no campo de atenção à saúde do trabalhador.
1.1. Definições: Da Psicologia Industrial à Saúde do Trabalhador
Nas primeiras décadas do século XX, a Psicologia Aplicada ao Trabalho
surgiu como área de conhecimento no cenário brasileiro e vem configurando seu
campo de atuação desde então. Verifica-se, ao longo do tempo, que essa área
passou por uma evolução marcada pela adoção de diferentes referenciais e
metodologias, visando atender os problemas e desafios deflagrados pelos diversos
15
contextos sociais, econômicos e políticos em que a prática esteve inserida (Bastos,
2003; Sampaio, 1998).
As mudanças no universo laboral, decorrentes da reestruturação produtiva,
demandam a emergência e a ampliação dos espaços de intervenção dos psicólogos
que atuam no mundo do trabalho e das organizações que se voltam para aspectos
ligados à saúde e ao bem-estar dos trabalhadores (Zanelli, 1994a; Azevedo, 1995).
Zanelli (1994b), em um estudo para identificar movimentos emergentes nas
práticas dos psicólogos brasileiros nas organizações de trabalho, observou, como
principal eixo de transição do trabalho do psicólogo, a mudança de um fazer tido
como técnico para uma atuação estratégica. Essa transição traz em seu bojo a
realização de práticas integradas ao contexto atual e dirigidas na busca da saúde e
da qualidade de vida dos trabalhadores. Entretanto, apesar da abrangência de
estudos teóricos e empíricos sobre a atuação e formação dos psicólogos do trabalho
(Façanha, 2003; Venturi, 1996; Zanelli, 1994 a; Bastos, 1992; Malvezzi, 1979),
verifica-se a carência de estudos que contemplem a atuação dos profissionais de
Psicologia no que tange à área da saúde no trabalho.
Campos e Lamônaco (2003), em pesquisa para verificar os atributos mais
freqüentemente conferidos por graduandos de Psicologia à figura do psicólogo do
trabalho, perceberam que uma parte significativa dos alunos associa o fazer desse
profissional a questões de melhoria do ambiente laboral e de qualidade de vida.
Desse modo, os autores constataram que os estudantes associam o psicólogo às
novas práticas do mundo do trabalho e que, além das funções tradicionais, o
profissional dessa área deveria ter preocupações mais amplas com a saúde e o
16
bem-estar do trabalhador, visão bem mais condizente com o mercado de trabalho
existente nos dias atuais.
Ao longo do tempo, a Psicologia aplicada ao trabalho passou por uma
evolução que Sampaio (1998) divide em três momentos ou faces distintas.
A primeira face, denominada Psicologia Industrial, tem como cenário social a
revolução industrial deflagrada no início do século XX e caracteriza-se por uma
prática voltada para a maximização da produtividade, recebendo forte influência do
modelo taylorista de controle da produção. Trata-se, nesse período, de uma atuação
focada no atendimento das necessidades industriais de adaptação dos trabalhadores
às tarefas e resumia-se, inicialmente, em atividades de seleção e inserção de
profissionais, amparadas pelo uso efetivo de técnicas de testagem e avaliação
psicológica. Nesse momento, a psicologia do trabalho preocupava-se com o
aumento da eficiência laboral e desenvolvia estudos e pesquisas voltados para a
ampliação do rendimento humano no trabalho, principalmente.
Porém, apesar dos esforços empreendidos no intuito de adaptar o homem à
máquina, alguns estudos e observações, realizados na época, passaram a sinalizar
outras variáveis que repercutiam na produtividade. Nesse momento, então, a
Psicologia Industrial se volta para aspectos ligados à motivação, à comunicação e ao
funcionamento grupal, entre outros.
Durante a Segunda Guerra Mundial, a Psicologia Industrial encontra terreno
favorável para o aprimoramento das técnicas de seleção, treinamento e classificação
de pessoal, o que muito contribuiu para a consolidação da área. No entanto, uma
série de transformações econômicas e sociais demandava mudanças nas
17
organizações, de modo que os modelos e práticas utilizados no início do
desenvolvimento industrial não eram mais eficazes no contexto produtivo emergente.
A psicologia aplicada ao trabalho entra em seu momento dito organizacional. A
Psicologia Organizacional surge a partir do instante em que os psicólogos passam a
desenvolver instrumental teórico-prático para intervir junto às estruturas da
organização.
Para Sampaio (1998), a Psicologia Organizacional não representa um corte
radical com a Psicologia Industrial, mas a ampliação do nível de atuação, que a
produtividade ainda era elemento de atenção dos profissionais. De acordo com o
autor, não são poucas as críticas feitas à Psicologia Organizacional, em virtude de
seu caráter tecnocrático, de sua busca em amortecer as tendências nascidas das
divisões de classe e de sua orientação para a eficácia e a produtividade.
A partir da década de 1970, mudanças econômicas e sociais favorecem o
surgimento de uma série de estudos em diversas áreas, inclusive na administrativa,
cujas teorias adquirem caráter mais explicativo e crítico e se voltam para a análise do
contexto da organização do trabalho e sua relação com seu principal elemento: o
trabalhador. Nesse momento histórico surgem os pilares necessários para o
nascimento da terceira face da Psicologia do Trabalho, advindos da convergência de
estudos da Administração, da Sociologia e da própria Psicologia do Trabalho.
O terceiro momento da psicologia aplicada ao trabalho tem como ponto
central o trabalho em seus significados e manifestações. A atenção para a
produtividade é colocada em segundo plano, substituída pela preocupação com a
promoção da saúde e da qualidade de vida do trabalhador, o que demanda o
18
reposicionamento dos psicólogos do trabalho, na medida em que a primazia da
produtividade deve ceder espaço para a compreensão do homem que trabalha, tal
como assinala Sampaio (1998:27):
A grande diferença entre a Psicologia do Trabalho (stricto-sensu)
e suas antecessoras é que na primeira lugar para vislumbrar
o homem como sujeito desejante e seus esforços se voltam para
a saúde e o bem-estar humano, independente ou não do
aumento da lucratividade e da produtividade das organizações
produtivas. A terceira face preocupa-se com a compreensão do
humano em primeiro lugar.
O corpo conceitual da Psicologia do Trabalho é construído por duas diferentes
escolas: a escola latina, influenciada pela Psicanálise e pela Sociologia, que tem em
Dejours (1988,1994) um dos seus maiores expoentes, e a escola anglo-saxã, em
que estudos relacionados ao estresse laboral se destacam (Sampaio, 1998). Trata-
se, portanto, de um campo vasto, que tem ampliado seus estudos e penetração nas
últimas décadas, consolidando-se, cada vez mais, enquanto área de atuação e
pesquisa.
A evolução da disciplina, no entanto, foi mais incorporativa que seletiva. Os
profissionais da área mesclam instrumentos e práticas construídos nos vários
contextos, de modo que as três faces coexistem. Nessa perspectiva, o termo
“Psicologia do Trabalho” possui dois sentidos: um específico, de oposição às
inconsistências da Psicologia Industrial e da Psicologia Organizacional, que constitui
a Psicologia do Trabalho stricto-sensu, e um sentido genérico, que denota a
evolução e as inter-relações entre essas três faces que ainda coexistem nas práticas
19
dos profissionais, sentido este mais pertinente com o estado atual desse campo
profissional (Sampaio, 1998).
Desse modo, Psicologia do Trabalho é o termo adotado nesta investigação
para designar as práticas contemporâneas dos psicólogos que atuam em
organizações produtivas.
1.2. O Trabalho e sua Trajetória
Historicamente o trabalho sempre esteve presente na vida dos homens. O que
variava de uma sociedade para a outra era a concepção que se tinha da atividade
laboral.
As sociedades primitivas tomavam o trabalho como uma atividade de
subsistência. A partir das sociedades grego-romanas, esta atividade passa a ser
estruturada e organizada. Nessas sociedades, havia o labor, que pode ser
representado figurativamente pelo homem sobre o arado e pela mulher no parto;
tratava-se de algo passivo e submisso aos ritmos da natureza ou a outras forças
incontroláveis.
Aos homens livres cabia a práxis, que dizia respeito “àquele domínio da vida
ativa no qual o instrumento usado pelo homem é o discurso, a sua própria palavra”.
No espaço da polis, a cidade grega, efetivava-se a democracia dos iguais, dos
cidadãos tidos como livres, de modo que “o exercício da palavra é a atividade
significativa para o homem livre” (Albornoz, 2002: 48), aos não livres cabia o
trabalho. Esse estado de coisas também predominou durante o império romano.
20
Com a desestruturação do império romano, ocorre uma alteração significativa
na vida social. Os escravos passam a ser denominados servos, mantendo uma
relação de direitos e deveres com os senhores feudais. Neste período, a Igreja passa
a intervir no sistema social e a disseminar os princípios da tradição judaico-cristã que
concebem o trabalho como forma de salvação divina, associado ao castigo do
pecado original. Postulava-se que o homem e a mulher perderam a inocência do
paraíso, de modo que teriam, agora, de ganhar o pão com o suor do próprio rosto. A
Reforma Protestante, ocorrida no século XVI, levou a uma outra compreensão da
categoria trabalho, que passou a ser entendido como o caminho religioso para a
salvação, visto, portanto, como virtude e como a base da vida social.
Essa concepção de trabalho ganhou força e com o desenvolvimento social e
tecnológico cede lugar para a emergência de um outro tipo de organização social,
denominada capitalista. O capitalismo opera uma série de mudanças no modo de
entender e de organizar a atividade laboral que assume, paulatinamente, as
características que conhecemos na contemporaneidade.
1.3. Trabalho, Identidade e Subjetividade
No seu sentido mais natural e abstrato, trabalho pode ser definido como a
atuação do homem sobre a natureza, transformando-a para atender suas
necessidades por meio do trabalho. Essa atividade humana diferencia-se do trabalho
animal por seu caráter consciente e intencional, decorrente do pensamento
inteligente, que confere ao homem a capacidade de planejamento e organização
mental prévia dos resultados a serem alcançados (Braverman, 1987).
21
Verifica-se que em quase todas as línguas, inclusive na portuguesa, o termo
trabalho possui diferentes conceituações, podendo ser concebido como uma
atividade de construção e expressão do sujeito e, também, como atividade rotineira,
incômoda e nefasta, conforme denota a etimologia do termo, advindo do latim
tripalium, expressão que remete a um instrumento de contenção e tortura (Albornoz,
2002).
O ser humano dedica grande parte de sua existência à atividade laboral.
Trata-se de uma prática de grande relevância, não pelo tempo que lhe é
empregado, mas por seu grande significado social. Para Antunes (2005), o trabalho
pode ser pensado como protoforma originária da vida humana, pois é na atividade
laboral que o sujeito produz e reproduz-se enquanto ser social. Desse modo, o
trabalho é o ponto inicial para a humanização do indivíduo e engendra uma dupla
transformação: na medida em que o trabalhador modifica a realidade e é por ela
modificado.
Através do trabalho, o homem não atende suas necessidades de
sobrevivência, como também de auto-realização. Trata-se de uma atividade por meio
da qual ele pode aprender, inovar e interagir de modo a consolidar uma identidade
pessoal e social. Constitui um elemento estruturante da vida do sujeito, fundamental
para seu equilíbrio mental. (Antunes, 2005; Codo, 1996; Albornoz, 2002).
O trabalho condiciona o nível de ingresso e o status social e compõe um lugar
relevante para o estabelecimento das relações interpessoais, constituindo-se a
principal fonte de realização pessoal e de desenvolvimento das habilidades e sendo,
22
assim, um dos mais importantes espaços de socialização e de definição de
identidades na vida dos adultos (Traverso-Yépez, 2002).
Jacques (1996), visando precisar melhor o termo trabalho e eliminar as
interpretações controversas que este carrega, estabelece uma articulação deste com
o conceito de identidade. Segundo a autora, essa articulação está fundamentada na
tradição teórica que concebe o processo de construção da identidade como contínuo
e complexo, em que o contexto social exerce um papel fundamental na inclusão e
exclusão dos atributos que representam e expressam o sujeito. Assim, a articulação
entre trabalho e identidade pode ser pensada como ocupando o lugar central do
valor social que o trabalho tem na nossa sociedade. Ë esse valor que faz com que a
prática laboral se destaque entre os papéis sociais representativos do eu, de modo
tal que a atividade profissional é tida como aquilo que o “sujeito é”.
A articulação citada entre trabalho e identidade torna pertinente a explicitação
do conceito de identidade, compreendido por Ciampa (1987) como um processo
contínuo de transformação que ocorre dentro de determinadas circunstâncias
materiais e históricas e que representa e engendra a pessoa, sendo esta
representação feita, primeiramente, a partir do nome que é dado ao sujeito. Depois,
as atividades desenvolvidas por ele vão lhe dando outras predicações, que são
papéis assumidos na forma de personagens e constituem os modos como a
identidade é representada no mundo. Dessa forma, o sujeito constrói sua identidade
ao longo de sua história, através das atividades que realiza e das relações que
estabelece com o mundo. Um dos campos principais em que essas relações se
instituem é o mundo do trabalho.
23
Para Jacques (1996:26), a inserção produtiva confere valorização social aos
sujeitos, constituindo-se como a principal esfera de aquisição de atributos
qualificativos da identidade do trabalhador. O sujeito se constrói em um contexto
sócio-histórico que exalta o ato de trabalhar e lhe confere valor positivo, faculta-lhe
significância ímpar na existência, constituindo-se como representante do eu, de
modo que os tipos e modos de relação que os indivíduos estabelecem com os
espaços de trabalho terão impactos profundos sobre sua identidade.
Codo (1996) também compreende o trabalho como um elemento fundamental
na construção da subjetividade, considerando-o o elo entre o indivíduo e a
sociedade. Segundo o autor, a atividade laboral constitui a atividade humana por
excelência, uma relação de dupla transformação entre o homem e a natureza,
geradora de significado, sendo um dos elementos essenciais na construção da
identidade.
Como visto anteriormente, o conceito de trabalho tem um caráter dinâmico,
uma vez que suas formas de organização e compreensão se modificaram
historicamente de acordo com as condições e necessidades sociais impostas pelo
próprio homem, de modo que a conceituação do termo nem sempre teve a
conotação e organização que verificamos na atualidade.
Nessa perspectiva, até a Idade Média, o trabalho não era organizado visando
à produtividade, mas sim à sobrevivência e não havia uma preocupação com
acumulação de produção. O modelo de trabalho era artesanal. O artesão era senhor
de sua atividade, dominava todas as etapas do processo produtivo e era proprietário
das ferramentas utilizadas na construção do produto. Cabia a ele decidir o melhor
modo de realizar o trabalho, determinando o ritmo e o período de tempo necessário à
24
realização da tarefa, bem como a forma de solucionar os problemas que surgiam
durante a jornada laboral. Esse modelo de trabalho se caracterizava como uma
atividade individualizada, singular, de caráter doméstico, pertencente apenas ao
sujeito que a executava, indissociado de sua vida familiar e social. O trabalho,
apesar de árduo, era uma atividade dotada de significado para o sujeito, sendo a
expressão direta de sua vontade e capacidade transformadora (Braverman, 1987).
Com a expansão do capitalismo, a atividade laboral deixa de ser uma
atividade individualizada e personalizada, voltada para a subsistência, e passa a ser
pautada no lucro e na produtividade, de modo que esta atividade mágica, sinônimo
da atividade humana, de nossa transcendência e humanidade, (...) foi abandonada e
substituída por tripalium (instrumento de tortura e submissão)” (Codo, 1996:36).
Essa associação da atividade laboral com martírio e sofrimento pode ser
explicada a partir da análise dos próprios princípios que regem o modelo de
produção capitalista. O capitalismo demanda intercâmbio de relações, mercadorias e
dinheiro, através de compra e venda da força de trabalho. Nesse sistema, os
trabalhadores são separados dos meios de produção e podem ter acesso a eles
vendendo sua força de trabalho por um salário, concebido como uma mercadoria. O
processo de trabalho é gerido em prol da acumulação do capital e criação de lucro.
O lucro é alcançado a partir da exploração máxima do potencial de trabalho do
homem, por meio do aumento da jornada, do uso de métodos mais produtivos ou,
ainda, por meio do aumento da intensidade e ritmo das atividades, passando pelo
controle, organização e divisão do trabalho (Braverman, 1987).
Esse modo de organização produtiva traz implicações para a prática laboral e
para o sentido do trabalho. De atividade fundamental de humanização e
25
desenvolvimento do ser social, o trabalho é pervertido, reduzido a um meio de
subsistência. O produto e a atividade laboral parecem alheios ao trabalhador, o que
faz com que o trabalho seja alvo de estranhamento e com que o sujeito se sinta
junto de si fora do trabalho e fora de si no trabalho (Antunes, 2005).
A transformação da humanidade em instrumento de uso do capital constitui
um processo danoso aos trabalhadores, que não são apenas desconsiderados como
seres humanos, mas utilizados de modo prejudicial, uma vez que sua atividade
crítica e inteligente se constitui em uma ameaça ao capital (Braverman, 1987).
1.4. O Trabalho na Atualidade
Nas últimas décadas, a chamada terceira revolução industrial deflagrou o
avanço da globalização, o que trouxe novas repercussões para o mundo do trabalho.
A globalização da economia gerou profundas transformações econômicas, sociais e
políticas. A competição sem fronteiras passou a demandar produtividade com
qualidade, exigindo, para isso, trabalhadores mais qualificados. A fim de atender às
novas demandas de trabalho, tem início, na década de 80, a reestruturação
produtiva, assinalando a passagem do modo de produção taylorista-fordista para o
modo de produção toyotista e ocasionando o surgimento de novas práticas
produtivas e modelos de gestão que enfatizam a competição, o desafio contínuo, a
produtividade máxima, a qualidade total (Goulart e Guimarães, 2002).
As concepções gerenciais surgidas após o enfraquecimento do modelo
taylorista-fordista passam a enfatizar o desempenho do trabalhador como sendo
fundamental para a produtividade, que é obtida não mais por meio do controle e da
26
racionalização do processo produtivo, mas por meio de uma das mais nefastas
técnicas de domínio comportamental: o controle psicológico.
Os atuais modelos de gestão empresarial buscam controlar os trabalhadores
de maneira sutil, invisível, por meio de estímulos de ordem psicológica e social,
visando condicionar e obter a colaboração espontânea, e com isso, o alcance dos
objetivos organizacionais (Oliveira, 2001).
O cenário organizacional atual, cada vez mais influenciado pela tecnologia da
qualidade, pautada no controle da produtividade, na maximização do desempenho
através da excelência, na delegação da responsabilidade, na descentralização das
decisões, na suposta autonomia em relação às tarefas, interfere nos processos de
construção e desenvolvimento do conhecimento, da conduta e da consciência dos
trabalhadores.
Desse modo, o modelo de gestão atual pode ser pensado como uma
estratégia de controle político-afetivo e cognitivo do desempenho que, por meio de
sua ideologia, busca a criação e a perpetuação de vínculos afetivos e intelectuais
que viabilizam a concordância e o compromisso dos trabalhadores para com os
interesses hegemônicos da organização, tal como assinala Oliveira (2001:67):
As novas tecnologias industriais revelam-se ambiciosas
estratégias de dominação da alma humana e a organização foi
reduzida a um sistema politico-econômico, sóciocultural e
simbólico-imaginário destinado a institucionalizar a relação de
submissão e a propor a seus membros, como razão e como
finalidade, a eficiência, a rentabilidade, o crescimento, a
hegemonia, e, como cimento da ação, a doutrina afirmada, o
dogma revelado, a educação transmitida.
27
Nesse cenário, a intensa competição mercadológica corrobora a manutenção
de um modelo de gestão/produção que se caracteriza pela diminuição dos ciclos de
produção, por mudanças na divisão do trabalho, pela consolidação de tecnologias de
informática nas empresas e pela excessiva cobrança de polivalência e qualificação,
com vistas à maior produtividade. A busca incessante por rendimento e lucratividade,
em virtude da competitividade gerada pela economia globalizada, faz com que as
organizações passem a utilizar as mais diversas estratégias de contenção de custos,
como cortes de pessoal, aumento da jornada laboral, criação de vínculos informais
de trabalho e aumento de metas.
Essas táticas empresariais, que incluem o enxugamento dos quadros
funcionais, a instabilidade dos vínculos trabalhistas, as contínuas exigências de
qualificação e de produtividade, vêm gerando impactos antagônicos nos
trabalhadores. A reestruturação produtiva tem melhorado a qualidade dos processos
de trabalho e favorecido o desenvolvimento de novos conhecimentos, competências
e habilidades, aspectos que podem levar à realização e ao fortalecimento da
identidade dos trabalhadores, além de terem provocado, em alguns setores, uma
melhoria nas condições de trabalho. Por outro lado, o contexto atual, caracterizado
pela elevada exigência de produtividade, pela falta de autonomia e pela ausência de
condições de crescimento profissional, faz com que o trabalho assuma um caráter
penoso que causa mal-estar e repercute, principalmente, na saúde mental dos
sujeitos (Mendes, 2003).
28
1.5. O Conceito de Saúde
A concepção de saúde é complexa e multifacetada. A definição mais difundida
é a encontrada no preâmbulo da Constituição da Organização Mundial da Saúde
(OMS, 2007), que concebe a saúde como um estado de completo bem-estar físico,
mental e social, e não apenas como ausência de doença. Nessa perspectiva, a
saúde pode ser entendida como a capacidade de um indivíduo ou grupo de realizar
aspirações, satisfazer necessidades e, ainda, lidar com o meio ambiente,
abrangendo os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas.
De acordo com essa perspectiva, a saúde é compreendida de maneira ampla,
abrangente, sendo considerada uma resultante de uma multiplicidade de fatores,
inclusive não-orgânicos, que interferem, direta ou indiretamente, na higidez humana,
como a dimensão mental. A saúde mental é especificamente definida pela OMS
como um estado de bem-estar em que o indivíduo tem consciência das suas
capacidades, é capaz de lidar com o estresse normal da vida, trabalhar
produtivamente e contribuir para sua comunidade. A definição de saúde expressa
pela OMS se contrapõe ao modelo biomédico tradicional, mas mantém a divisão
entre saúde mental e saúde física.
Dejours (1986) considera um equívoco compreender a saúde como um
estado e apresenta o conceito de vulnerabilidade, uma vez que os organismos
vivos, e dentre eles os homens, são caracterizados pelo movimento e não pela
estabilidade. Para ele, a saúde é um processo que envolve ter meios de traçar um
caminho pessoal e original em direção ao bem-estar físico, psíquico e social. O bem-
estar físico é a liberdade de regular as variações que aparecem no estado do
29
organismo, é a liberdade de adaptação; o bem-estar psíquico, por sua vez, é a
liberdade que é deixada ao desejo de cada um na organização de sua vida; e, por
fim, o bem-estar social é a liberdade de agir individual e coletivamente sobre a
organização do trabalho, ou seja, sobre o conteúdo do trabalho, sobre a divisão das
tarefas e dos homens e sobre as relações que estes mantêm entre si.
Salis (2004) faz um contraponto entre o conceito de saúde na antiguidade e
na modernidade, assinalando que, nesta última, o que predomina é uma visão
mecânica, cujo modelo seria a máquina. Na atualidade, esse conceito tem uma
conotação eminentemente química, biológica, de modo que o corpo é visto como
uma máquina e a doença física e mental como um defeito, um desequilíbrio
individual a ser corrigido a partir de uma intervenção meramente externa, não tendo
o sujeito grandes implicações nesse processo. na antiguidade, a doença não era
vista como uma deficiência, mas como um sinal de que algo na vida do sujeito
estava em desarmonia, de modo que era preciso repensar seu modo de vida,
resgatando o conhecimento de si mesmo para poder viver de acordo com sua
natureza. Saúde era, portanto, o reflexo da sintonia entre as dimensões da vida do
sujeito e seus desejos e aspirações.
1.5.1. Psicologia, Saúde Mental e Trabalho
Como discutido, a saúde tem sido concebida, em nossa sociedade, dentro
de uma perspectiva objetivista, naturalista e organicista, com ênfase no modelo
biomédico. Na Psicologia, isso não é diferente (González-Rey, 2004).
30
Além da forte influência do modelo biomédico, outro aspecto a ser
considerado para a compreensão da predominância que o conceito naturalista e
objetivista de saúde assume para a Psicologia está relacionado com o processo de
legitimação dessa disciplina enquanto ciência.
A Psicologia do século XIX, buscando atestar seu status científico, afasta-se
da filosofia e passa a enfatizar aspectos comportamentais, de modo tal que o social
assume um papel de promotor de contingências pontuais e objetivas sobre o sujeito,
o que resultou, segundo González-Rey (2004:118), ´´em uma naturalização
comportamental do ser humano``. Ainda segundo o autor, a ciência psicológica, em
seus primórdios, impregnada por uma visão comportamentalista e descritiva dos
fenômenos, passou a adotar o conceito de doença do modelo biomédico,
fundamentado na classificação de patologias com base em uma conjunção de
sintomas, o que embute a patologia no comportamento individual, tal como assinala
González-Rey (2004:119):
Nessa perspectiva se legitimavam como patológicos certos
conjuntos de sintomas individuais, o qual definiu uma forte
tendência à rotulação padronizada dos indivíduos em entidades
despersonalizadas (...). Foi imposto assim, um modelo descritivo
despersonalizado, que separou a doença do sujeito e ao mesmo
tempo, do social.
Nessa conjuntura, a psicologia passou a considerar os processos de saúde e
doença como opostos, definidos e classificados a partir da presença de
determinados sintomas e comportamentos individuais, classificados em categorias
31
nosográficas, dentro de uma ótica que nega toda a trama social envolvida nesses
processos humanos, inclusive o trabalho.
A realidade laboral era considerada pela psicologia como um mero cenário
para a emergência dos problemas de saúde. Segundo Ruiz (1999), o trabalho
humano não foi considerado pelos psicólogos como campo importante na
determinação do sofrimento psicológico, de modo que a patologização do psíquico
restringiu-se a mundos externos à atividade laboral.
O trabalho não tem sido considerado nos processos de adoecimento, o que
levou à marginalização dessa categoria dentro da psicologia, ciência que, por
imposição histórica, vem privilegiando o enfoque adaptativo e, por sua tradição
clínica, o modelo terapêutico. Dessa forma, o homem se reduz à dicotomia sadio-não
sadio, negligenciando-se a compreensão do comportamento a partir do paradigma
trabalho (Jacques, 1989).
Para Codo et al (1993), o que parece caracterizar o pensamento psicológico é
a construção de sistemas sem levar em conta o mundo criado pelo homem através
da atividade laboral e sua influência na estruturação do sujeito. A psicologia
estruturou psicologias nas quais o trabalho e seus significados intrínsecos e
subjetivos foram reduzidos a expressões numéricas de escalas de medidas e
desconsiderados enquanto processos sociais geradores de saúde ou de patologias.
Segundo Nardi (1996), a psicologia entra no contexto do trabalho adotando
uma lógica em que processos de adoecimento não eram analisados e tratados em
virtude do sofrimento gerado nos trabalhadores, mas em virtude da capacidade ou
incapacidade destes para produzir.
32
Todavia, as demandas do contexto laboral contemporâneo vêm impondo
importantes desafios à visão tradicional da psicologia, que passou, nos últimos anos,
por mudanças em seu âmbito interno, que viabilizaram um novo olhar sobre a
dimensão do trabalho. As teorias clássicas sobre a constituição do psiquismo
reservam ao trabalho um caráter secundário e têm sido objeto de questionamentos
de autores como Dejours (1988), de modo a reforçar a importância do trabalho na
constituição do sujeito e em sua inserção social, como estratégia de saúde e como
associado ao adoecimento mental (Jacques, 2003). Isto tem contribuído para que
questões relativas à saúde do trabalhador assumam, atualmente, centralidade na
área.
A saúde é, portanto, uma construção a partir da relação que o indivíduo
estabelece com as diversas atividades significativas de sua existência, entre as quais
se destaca, por sua significação psicossocial, o trabalho.
A relação entre saúde e trabalho é constatada desde a antiguidade e tem sido
objeto de inúmeros estudos, principalmente a partir da revolução industrial, quando o
trabalhador passou a vender sua força de trabalho e foi, com isso, submetido às
duras condições de trabalho impostas pelo modelo de produção capitalista (Minayo-
Gomez e Thedim-Costa, 1997).
Essa interface tem sido abordada historicamente por diversos modelos
originados em diferentes disciplinas. De um lado, temos a vertente da Medicina do
Trabalho e da Saúde Ocupacional, baseada no modelo biomédico, que salienta o
caráter biológico das patologias. Nessa vertente, o ambiente de trabalho é
considerado apenas enquanto um elemento de risco potencialmente desencadeador
33
de doenças em uma relação unicausal. De outro lado, têm-se os modelos focados no
estudo da inter-relação entre trabalho e os processos saúde-doença, cuja dinâmica
se inscreve mais marcadamente nos fenômenos mentais (...) (Seligmann Silva,
1994:51). Estes últimos abordam a saúde mental em seus vínculos com o trabalho,
considerando as repercussões físicas e mentais e suas interfaces na saúde dos
sujeitos oriundas da relação com o trabalho (Dejours et al, 1994).
No que tange às abordagens que se propõem a analisar as relações entre
trabalho e saúde mental, Tittoni (2002) destaca dois eixos, constituídos por
abordagens teórico-metodológicas diferentes.
O primeiro eixo relaciona-se ao diagnóstico dos sintomas psicológicos e sua
vinculação a situações de trabalho. Nessa perspectiva, temos as pesquisas de Codo
et al (1993), cuja ênfase está na construção de instrumentos diagnósticos que
possibilitem o estabelecimento de nexos causais entre os sintomas psicológicos e as
situações de trabalho, abordagem bastante similar ao da Medicina do Trabalho,
embora admita-se a possibilidade de multicausalidade.
O segundo eixo não enfatiza o diagnóstico das doenças ocupacionais, mas as
experiências e vivências dos trabalhadores relativas a seus cotidianos laborais e
suas situações de adoecimento. Nesse caso, destaca-se a Psicodinâmica do
Trabalho, baseada nos estudos e pesquisas de Dejours e seus colaboradores
(Dejours, 1988 e Dejours et al, 1994). Essa corrente de pensamento considera as
vivências de prazer-sofrimento no contexto laboral como os principais indicadores de
saúde no trabalho.
34
As condições de trabalho, é claro, podem resultar em processos de
adoecimento, decorrentes, por exemplo, da exposição a produtos químicos e de
acidentes com máquinas e equipamentos e outros agravos à saúde do trabalhador.
No entanto, no campo da psicologia, interessa compreender como o processo de
trabalho influencia e determina as vivências internas dos trabalhadores e é esse
aspecto que será abordado neste trabalho.
Segundo Mendes (2004), a saúde no trabalho é um estado marcado pelo
balanceamento entre as vivências de prazer e sofrimento, pela utilização de
mecanismos capazes de mobilizar os sujeitos em busca de relações mais
prazerosas e gratificantes.
O sofrimento está no centro da relação homem-trabalho, constituindo-se como
um campo de luta entre o sujeito e a situação de trabalho, que o empurra para o
adoecimento. O sofrimento é inevitável, mas sua presença não implica em
adoecimento, pois a normalidade e a patologia são estados decorrentes das
estratégias utilizadas pelos trabalhadores para lidar com o sofrimento, que fazem
com que este possa adquirir um caráter patológico ou criativo (Mendes, 2004).
O sofrimento patológico ocorre quando a organização do trabalho impõe ao
sujeito tarefas que paralisam a atividade psíquica. Deriva, ainda, da incongruência
entre o conteúdo das tarefas executadas e as aspirações de realização dos
indivíduos.
O sofrimento criativo advém do livre funcionamento em relação ao conteúdo
da tarefa e ocorre quando o trabalho é livremente escolhido e organizado,
oferecendo vias de descarga favoráveis às necessidades do sujeito e possibilitando
satisfação, identidade e reconhecimento.
35
Conforme Mendes (2004), o prazer no trabalho é um dos caminhos para a
saúde porque cria identidade pessoal e social pela via da valorização e do
reconhecimento. A saúde no trabalho configura-se na tentativa de modificar as
situações adversas, na busca de prazer e transformação. Pode ser vivenciada
quando os sujeitos utilizam, de forma eficiente, estratégias individuais e coletivas
para lidar com as adversidades encontradas.
O sofrimento e o adoecimento decorrem do esgotamento de todas as
tentativas de adaptação dos indivíduos ao trabalho, no sentido de ajustá-lo às suas
necessidades e desejos. A relação do sujeito com a organização do trabalho é
dinâmica, influenciada por um jogo de forças interativas em busca de regulação e
negociação, visando conciliar saúde e produtividade.
1.5.2. O Campo da Saúde do Trabalhador
O aumento crescente de problemas de saúde relacionados ao trabalho
contribuiu, ao longo dos últimos anos, para o surgimento de um corpo de práticas
ligado à saúde coletiva que configura o Campo da Saúde do Trabalhador.
O termo Saúde do Trabalhador surge, no Brasil, em meio ao contexto da luta
pela reforma sanitária, iniciada a partir da década de 1980, em virtude de demandas
advindas do movimento sindical e dos técnicos ligados àquela reforma (Nardi, 1999).
Nardi (1999) define o campo da Saúde do Trabalhador como um conjunto de
conhecimentos e práticas oriundos de diversas disciplinas, tais como: Medicina
Social, Saúde Pública, Sociologia, Engenharia, Psicologia, entre outras, que
possibilitam uma nova maneira de entendimento da relação saúde-trabalho e
36
preconizam uma forma diferenciada de atenção aos trabalhadores e de intervenção
em ambientes de trabalho.
Um fator fundamental para a consolidação desse campo foi a introdução de
alterações significativas, a partir de 1986, propostas pela VIIIª Conferência Nacional
de Saúde e Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e consolidadas na
Constituição Brasileira de 1988 e na Lei Orgânica da Saúde de 1990, alterações que
possibilitaram a construção de uma prática que rompe com a hegemonia do modelo
médico e com a separação do conhecimento em disciplinas não integradas entre si,
de modo a propor ações integradas e interdisciplinares (Nardi, 1997).
Trata-se, portanto, de um campo que nasce com uma proposta diferenciada
dos modelos de intervenção e regulação das relações saúde e trabalho até então
predominantes, ligados à Engenharia de Segurança do Trabalho e à Saúde
Ocupacional.
A Saúde Ocupacional é uma abordagem das relações trabalho e saúde-
doença que concebe o corpo humano como uma máquina, que pode ser exposto a
fatores ou agentes de risco. Desse modo, as conseqüências do trabalho para a
saúde são resultantes da interação do organismo a agentes externos de ordem
química, física, biológica ou ainda mecânica. Nesta perspectiva, o trabalho é
analisado a partir de características empiricamente detectáveis que irão nortear
intervenções que possibilitam adaptar o ambiente e as condições de trabalho a
parâmetros estabelecidos para a média de trabalhadores normais quanto à
suscetibilidade a agentes e fatores ambientais. Desta forma, a área da Saúde
Ocupacional visa adequar o ambiente de trabalho ao homem e os homens ao seu
trabalho.
37
Ao contrapor-se ao saber da Saúde Ocupacional, a área da Saúde do
Trabalhador volta-se para as relações configuradas pela organização-divisão do
trabalho tais como: o ritmo, a duração da jornada, o trabalho em turnos, a
fragmentação/conteúdo das tarefas, a hierarquia, o controle da produtividade, cujas
conseqüências para a saúde se manifestam através de distúrbios mentais e/ou
doenças degenerativas (Lacaz, 2007).
Trata-se de um corpo de práticas e conhecimentos que enfatiza a
determinação social do processo saúde-doença, privilegiando o trabalho, que passa
a ser analisado como um processo, inscrevendo-se nas relações sociais de
produção.
Dentro dessa perspectiva, é fundamental pesquisar os impactos que o
capitalismo exerce sobre o processo de trabalho e que podem se apresentar sob a
forma de alienação, sobrecarga ou subcarga de trabalho.
A abordagem em Saúde do Trabalhador visa recuperar o lado humano da
atividade laboral e sua capacidade de provocar danos à saúde dos sujeitos que
trabalham. Deste modo, se propõe a intervir nas relação trabalho-saúde-doença,
tendo como referência o surgimento de um novo ator social: a classe operária, em
uma sociedade marcada por grandes transformações políticas, econômicas e
sociais.
O campo desconstrói a concepção de trabalhador como um ser passivo na
medida em que o considera um agente de mudanças, portador de saberes e
vivências sobre seu trabalho e capaz de intervir na realidade e transformá-la,
participando ativamente do controle da nocividade, da definição das prioridades de
intervenção e da elaboração de estratégias transformadoras. Estabelece ainda uma
38
nova forma de compreensão das relações entre saúde e trabalho e propõe uma nova
prática, na qual o trabalhador torna-se participante essencial nas ações de saúde
que possibilitam construir formas de subjetivação e inserção laboral promotoras da
minimização do sofrimento psíquico.
Trata-se de um campo que privilegia medidas de prevenção e intervenção e
que incorpora o conhecimento dos trabalhadores em prol da maximização dos
esforços pela melhoria das condições de trabalho e a defesa da saúde. Para Sato
(1992:117):
A questão que se coloca para a atuação em saúde do
trabalhador é, partindo do conhecimento prático dos
trabalhadores, identificar propostas de modificação do trabalho,
visando o maior conforto e menor sofrimento para os
trabalhadores.
O campo da Saúde do Trabalhador constitui, portanto, um espaço de atuação
que tem como principais objetos o trabalhador e sua saúde, buscando enfatizar
questões relacionadas com o sofrimento e o adoecimento dos grupos sociais
inseridos no contexto produtivo. Nesta perspectiva, é fundamental observar as
determinações geradas pelas condições gerais de produção, de vida e trabalho, de
forma a priorizar uma visão totalizante, considerando os determinantes econômicos,
políticos, sociais e ideológicos que se objetivam no campo das lutas e contradições,
geradas pelo sistema capitalista.
Para este campo, a saúde do trabalhador é determinada por condições
internas e externas ao ambiente laboral. Condições estas impostas ao trabalhador
39
nas relações e na organização do trabalho, responsáveis, em última instância, pelas
formas e modo de trabalhar, viver e morrer destes sujeitos.
A Área da Saúde do Trabalhador, no Brasil, tem como principal pilar o
compromisso com a mudança do quadro de saúde da população trabalhadora.
Envolve o empenho tanto de setores sindicais atuantes frente a determinadas
situações mais problemáticas de suas categorias, quanto ações institucionais
conduzidas por profissionais seriamente compromissados em sua opção profissional.
Como campo de atuação e de produção de conhecimento orientados para
uma ação transformadora, a Saúde do Trabalhador defronta-se continuamente com
novos objetos e demandas, o que faz com que esta seja uma área em eterna
construção. Trata-se de um campo interdisciplinar por natureza, na medida em que a
relação trabalho-saúde enfocada é bastante complexa para ser contemplada por
uma única disciplina. Desse modo, é fundamental incorporar o cabedal de conceitos
dos diversos campos de conhecimento a partir de uma proposta integradora que
possibilite a construção de interfaces e engendre novos olhares sobre a realidade
laboral.
Segundo Gomes e Thedim Costa (1997), o tratamento interdisciplinar envolve
a busca de articulação de dois planos de análise, o que abrange o contexto social,
político, econômico e cultural –, que estipula as relações travadas no espaço de
trabalho - e o relativo a determinadas características dos processos de trabalho com
potencial de repercussão na higidez dos trabalhadores.
40
1.6. As Práticas dos Psicólogos Nas Organizações No Contexto Brasileiro:
Em Prol da Organização ou do Trabalhador?
A área da Psicologia voltada para aspectos relacionados ao mundo do
trabalho e das organizações possui várias denominações e comporta, ainda,
distintas definições, em que subjazem diferentes posicionamentos sobre os
propósitos desse campo.
De acordo com Spector (2006), a psicologia aplicada ao trabalho constitui-se
na aplicação dos princípios psicológicos à organização e ao ambiente de trabalho.
Trata-se de um campo amplo e diversificado, dedicado a auxiliar as organizações a
obterem o melhor de seus funcionários e a gerenciar a eficiência organizacional,
assim como ajudá-las a cuidar da saúde e do bem-estar dos trabalhadores.
Krumm (2005), com base nas diretrizes da American Psicological Association
(APA), define a Psicologia do Trabalho como a aplicação da teoria e da metodologia
psicológica aos problemas das organizações e aos problemas dos grupos e
indivíduos em ambientes organizacionais (p. 04). Essa área compreende atividades
tradicionais ligadas à seleção e à produtividade.
O exame das definições de Krumm (2005) e de Spector (2006) denota o
posicionamento desses autores no que tange á realização de uma prática pautada
eminentemente nos interesses da organização em detrimento das demandas do
trabalhador.
Por outro lado, vários autores definem a psicologia do trabalho a partir de um
posicionamento distinto sobre o compromisso desse campo, sustentando que a
atuação deve visar à promoção da saúde no trabalho.
41
Zanelli e Bastos (2004) denominam a área da psicologia aplicada ao trabalho
de “Psicologia Organizacional e do Trabalho”, definindo-a como um campo de
compreensão do comportamento humano no contexto de trabalho. Segundo os
autores, deve haver um compromisso de analisar e compreender como interagem as
várias dimensões que caracterizam a vida das pessoas, grupos e organizações, a
fim de elaborar práticas e ações que possam promover e resguardar o bem-estar e a
qualidade de vida das pessoas. Na mesma linha, Goulart (1998) descreve a
“Psicologia do Trabalho” como um campo de aplicação dos conhecimentos advindos
da ciência psicológica a questões relacionadas ao trabalho humano, com vistas à
promoção da saúde do trabalhador e sua satisfação em relação ao trabalho.
Figueiredo (1990) acredita que os psicólogos que atuam no contexto de trabalho
devem atuar buscando contribuir para a melhoria do ambiente laboral, realizando
uma série de ações que garantam, preventivamente, a saúde mental dos
trabalhadores.
Segundo Malvezzi (1990), os psicólogos que atuam na área do trabalho não
devem perder de vista seu compromisso com a saúde mental do trabalhador, o que
se relaciona com o desenvolvimento da liberdade e a realização do potencial e da
qualidade de vida. Em sua perspectiva, saúde e produtividade podem ou não ser
objetivos antagônicos. A produtividade, no contexto atual, não pode ser
simplesmente ignorada, mas também não deve ser priorizada. a saúde do
trabalhador, que foi sacrificada desde o início da industrialização, deve ser
focalizada, de modo que o psicólogo deve ter em mente a relação entre sua prática e
esses dois objetivos.
42
Porém, apesar da amplitude das práticas que as definições da área apontam,
Zanelli (2002) assinala que o exercício das atividades de trabalho pelos psicólogos
que atuam nesse campo tem sido prejudicado desde suas origens. Isso se deve, em
grande parte, a falhas na estruturação do currículo dos cursos de graduação, que
passaram por poucas alterações desde seu surgimento, em 1964. Isto limita a
preparação para a atuação na área do trabalho a algumas poucas disciplinas, não
integradas entre si, com carga horária insuficiente e limitadas a prover conteúdos e
técnicas tradicionais que raramente estão em consonância com a prática realizada
nas organizações.
Tupinambá (1987:100) considera que “a descaracterização da psicologia
organizacional se intensifica a partir do ‘clinicismo’ que permeia a formação e os
currículos de psicologia nas universidades brasileiras.
A precariedade da formação se apóia em diversos fatores, relacionados à
preferência da maioria dos psicólogos pela área clinica e pela predominância de
disciplinas acadêmicas nessa área, na qual se visualiza o ser humano de forma
individualizada, com ênfase na vida emocional, pessoal, desconectada do contexto
social, do mundo do qual fazem parte as organizações (Keller, 2002).
A partir de pesquisa realizada com psicólogos, Zanelli (2002) verificou que a
formação é tida por esses profissionais como deficiente e tecnicista, baseada em
conteúdos limitados e desatualizados, que privilegiam uma abordagem centrada no
indivíduo e que não fornecem os subsídios teóricos e práticos necessários para uma
atuação competente. O trabalho humano, enquanto conteúdo de aprendizagem, é
pouco enfatizado e insuficiência no fornecimento de temas voltados para a saúde
43
mental no trabalho, de modo que falta referencial que permita a apreensão crítica da
realidade política e maior clareza no que tange á própria inserção nas relações de
produção. As falhas na formação contribuem para o encaminhamento de
profissionais despreparados, sem posicionamento crítico, desconectados da
realidade laboral em que irão se inserir.
Um conjunto de fatores influencia essa realidade. Estes envolvem a instância
individual, relacionada aos valores e à motivação pessoal do psicólogo, a cultura
predominante do grupo de profissionais dessa categoria, as condições de formação
citadas, a história recente das atividades dos profissionais, sua competência de
gerar oportunidades de inserção e determinações históricas e econômicas que
constituem esse mercado profissional.
Muitas são as conseqüências para a área da psicologia do trabalho
decorrentes das falhas na formação e na atuação profissionais. Verifica-se que o
psicólogo atua no contexto do trabalho sem clareza e compreensão crítica do próprio
papel, o que o leva a se limitar a um ativismo sem conscientização, o qual se traduz
em uma prática mecânica e repetitiva e faz com que esse profissional seja moldado
nas empresas a partir de padrões que interessam, prioritariamente, à produção.
A restritividade e a ineficácia das atividades dos psicólogos levam ao
descrédito e ao comprometimento da imagem social desse profissional, contribuindo
para que haja uma visão preconceituosa e enviesada da área, muitas vezes
compartilhada pelos próprios psicólogos, que se referem a ela como “uma espécie
de irmã menor da psicologia” ou “lobo mau da psicologia” (Codo, 1989; 195).
44
Em virtude das circunstâncias, a Psicologia aplicada ao trabalho tem sido, ao
longo da história, alvo de críticas contundentes, que assinalam o caráter manipulador
e ideológico da área e sua subordinação aos imperativos do capital (Figueiredo,
1989).
Zanelli (2002) identifica três tipos de orientações ético-políticas dos psicólogos
que atuam em organizações: (1) Aqueles que concordam com a situação de
dominação existente nas organizações e atuam para preservá-la; (2) Aqueles que
reconhecem as dificuldades do enfrentamento das questões relacionadas aos
conflitos de interesses e buscam modos de emancipação do trabalhador e melhoria
de sua qualidade de vida; (3) Aqueles que se vêem como mediador de conflitos, em
detrimento do trabalhador. As diferentes orientações ético-políticas apontadas pelo
autor mostram não haver um critério preponderante unificando as práticas dos
psicólogos nas organizações, denotando a falta de consenso entre esses
profissionais acerca dos objetivos dessa atuação, aspectos que contribuem para a
“estigmatização” do campo.
No Brasil, o surgimento da psicologia aplicada ao trabalho pode ser traçado,
tendo em vista o próprio progresso da psicologia enquanto ciência e profissão no
cenário brasileiro (Tupinambá, 1987). A industrialização crescente trouxe novas
exigências para a ciência psicológica que pôde colaborar com um conhecimento que
possibilitou a diferenciação entre pessoas para a formação de grupos mais
homogêneos na escolha e a seleção de trabalhadores apropriados para a empresa
(Bock, 2003). Em termos sociais, a origem do campo está diretamente relacionada
ao panorama econômico das primeiras décadas do século XIX, período marcado
45
pela diversificação da atividade produtiva decorrente da industrialização
impulsionada pelo ciclo do café.
O plantio do café deflagra a instalação das indústrias no país e, com isso, o
surgimento de conflitos de interesses entre o operariado industrial, descontente com
as novas condições de trabalho, e os detentores do capital. O empresariado,
preocupado com a gradual organização da classe trabalhadora, busca novas formas
de contenção e manutenção do status vigente através da utilização dos princípios de
administração científica da produção propostos por Taylor.
Nesse contexto, a psicologia do trabalho tem suas primeiras aplicações
práticas, sendo chamada a intervir para garantir o abastecimento e a manutenção de
mão-de-obra e a eficiência econômica através de variadas estratégias de adaptação
psicológica do homem ao trabalho.
Constata-se, pois, uma prática discursiva que, baseada no
entendimento psicofisiológico, valoriza o potencial humano como
um motor que pode ser aprimorado, estabelecendo-se pela
utilização destes conhecimentos como área de saber/poder que
influencia na histórica relação de forças entre capital e trabalho
(Faé, 2002: 99).
O incremento da área da psicologia do trabalho, no Brasil, esteve diretamente
atrelado ao apogeu do uso dos testes psicológicos, que forneceram o instrumental
necessário para legitimar as primeiras aplicações do saber da Psicologia no contexto
de trabalho. Nesse período, foram formados os primeiros psicotécnicos, termo então
atribuído ao profissional que aplicava os conhecimentos da Psicologia ao trabalho.
Destaca-se, nesse momento, o trabalho do engenheiro suíço Roberto Mange,
46
coordenador do primeiro curso de psicotécnica realizado em São Paulo, que tinha
como intuito instrumentar técnicos para seleção e preparação dos sujeitos para o
trabalho.
No desenvolvimento do campo da Psicologia aplicada ao trabalho, vale
ressaltar a importância do Instituto de Organização Racional do Trabalho (IDORT),
que tinha a finalidade de buscar soluções para os problemas empresariais,
estudando a organização da prática administrativa, as práticas de seleção e o
treinamento dos trabalhadores. Outras instituições que também contribuíram com a
preparação de técnicos em testagem psicológica para fins de seleção e orientação
profissional foram o Instituto de Seleção e Orientação Profissional de Pernambuco,
criado em 1925 sob a orientação do psiquiatra Ulisses Pernambuco, e o Instituto de
Seleção e Orientação Profissional da fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro
(Zanelli, 2002).
Posteriormente, o IDORT teve sua atuação enfraquecida e, em seu lugar,
foram criados o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) em 1938, o
Laboratório de Psicotécnica do SENAI em 1942 e o Instituto de Seleção e Orientação
Profissional (ISOP) em 1947, este, sob a coordenação de Mira y Lopez, atingiu a
maior amplitude nacional (Faé, 2002).
A década de 60 marcou efetivamente o surgimento da psicologia industrial no
Brasil, por obra de diversos profissionais que realizaram uma intensa luta pela
regulamentação e profissionalização do trabalho do psicólogo no país, de modo que,
em 27 de agosto de 1962, sob a Lei nº. 4.119, após o Decreto-lei nº. 53464, de 21 de
janeiro de 1964, o curso de Psicologia foi regulamentado e a profissão de psicólogo,
47
legalizada. Nesse período a psicologia escolar e a organizacional contavam com
uma tradição de pelo menos três décadas de aplicação em variadas áreas de
trabalho(Zanelli, 2002: 29).
Sobre as circunstâncias relacionadas ao surgimento e desenvolvimento da
psicologia aplicada ao trabalho no Brasil, Zanelli (2002) salienta que as origens
desse campo ocorreram fora do âmbito acadêmico. As pressões do desenvolvimento
industrial promoveram o incremento da área para consumo próprio, situação que
perdura até hoje, distanciando o trabalho acadêmico da aplicação nas organizações,
o que gera uma discrepância entre os conteúdos repassados na formação e as
demandas e problemáticas impostas pela realidade de trabalho aos profissionais da
área, e traz, portanto, sérias repercussões para suas práticas.
Na visão de Goulart (1998), apesar do ecletismo do campo, em que se
conjugam diferentes práticas e metodologias, o que se verifica em relação à área é
que ela está se renovando, atendendo às mudanças ocorridas nas últimas décadas,
tanto no conceito quanto na forma de organização do trabalho, a fim de proporcionar
contribuições mais críticas e objetivas.
Para Zanelli e Bastos (2004), a prática do psicólogo nas organizações, como
qualquer prática social, não pode ficar à parte das transformações do contexto e do
desenvolvimento da ciência. No cenário contemporâneo, o que se verifica, em
comparação com o núcleo básico das atividades dos psicólogos no início dessa
prática, é que ela tem sido efetivamente ampliada.
Em uma análise atual do campo da psicologia do trabalho, percebe-se que
novas práticas foram incorporadas às clássicas e que diferentes níveis de atuação
48
organizacional estão sendo contemplados pelo psicólogo (técnico, estratégico,
político). Além disso, as práticas tradicionais sofreram transições e
redimensionamentos em virtude das mudanças no contexto de trabalho, tal como
salientam Zanelli e Bastos (2004: 490):
Alguns movimentos estão reconfigurando a prática profissional
do psicólogo organizacional e do trabalho no Brasil. O primeiro
deles ocorre no interior das práticas tradicionais e que
constituem o núcleo central da representação do que significa
ser psicólogo organizacional, influenciadas pelo desenvolvimento
científico e pelas transformações no contexto de trabalho. O
segundo movimento inovador caracteriza-se como um
alargamento do cargo, ou seja, a inserção do psicólogo em
equipes multidisciplinares (...). O terceiro movimento destaca
transições que estão configurando uma intervenção do psicólogo
em âmbitos mais complexos da própria organização (...) os
psicólogos têm analisado as implicações da construção
psicossocial em suas influências sobre a saúde do trabalhador.
A Psicologia ligada ao trabalho vem, portanto, trilhando um longo e difícil
caminho na busca de demarcar seu real foco de investigação e intervenção. Durante
muito tempo, a Psicologia do trabalho manteve distante seu olhar para a relação
entre trabalho e saúde, como se isso não fizesse parte do seu escopo. O foco de sua
atenção era a obtenção da produtividade e da lucratividade empresarial em
detrimento do interesse pela categoria trabalho e pelo discurso do trabalhador (Grisci
e Lazzarotto, 2002).
Sato (2003) afirma que a disciplina tem apresentado, em seu processo de
desenvolvimento, duas perspectivas de atuação: uma articulada com a
administração e a engenharia e a outra embasada na leitura da Psicologia Social e
da Saúde Coletiva.
49
Na primeira vertente, a psicologia continua utilizando-se de seu referencial
teórico para atender as necessidades da produção por meio dos trabalhos de
seleção de pessoal, treinamento e avaliação de desempenho. Trata-se de uma
vertente da Psicologia que é consolidada na sua aplicabilidade no mercado de
trabalho. Para a segunda vertente, importam os problemas sociais e humanos no
trabalho, presentes nos espaços organizacionais e fora deles.
A Psicologia do Trabalho apresenta-se, portanto, como um campo
dicotomizado que congrega dois movimentos de atuação distintos, debruçando-se
sobre diferentes objetos. Um deles prioritariamente voltado para os interesses
organizacionais ligados à produtividade e o outro pautado no sujeito que trabalha,
em sua saúde e bem-estar. A questão que se coloca nesta pesquisa é verificar qual
dessas duas tendências prepondera atualmente na prática dos psicólogos.
Para Jacques (2003), observa-se, na atualidade, um crescente interesse dos
profissionais de Psicologia pelo campo da saúde do trabalhador. Porém o que se
verifica, comumente, é uma indefinição teórico-metodológica devido ao
desconhecimento do assunto, o que produz tentativas ingênuas de mesclar
conceitos e técnicas com fundamentos epistemológicos distintos. Segundo a autora,
não uma tentativa de articular pressupostos diversos, mas, simplesmente, emprestar
conceitos e técnicas sem uma reflexão sobre as diferentes concepções de homem,
homem/sociedade, ciência e pesquisa que lhes fundamentam.
Para Spink (1992), o engajamento da Psicologia com as questões da saúde
no trabalho tem sido recente, tanto pela lentidão ou restrição do debate sobre as
condições de trabalho e saúde ocupacional, quanto pela tendência da Psicologia a
50
se voltar ora a uma psicologia gerencial, ora a uma prática clínica de consultório. No
entanto a autora aponta que esse quadro vem se transformando:
Trabalhos de teses e de dissertações, comunicações em congressos e
mesas-redondas são testemunhos de que a Psicologia começa a
reconhecer o mundo em volta e a necessidade de uma atuação em
mais larga escala com outros colegas e outros grupos profissionais
(Spink, 1992: 93).
A incipiência das contribuições da Psicologia na área se deve, ainda, à
dificuldade de sistematizar uma prática de médio alcance entre os níveis macro e
micro de atuação. Trabalhar no nível macro envolve uma atuação em nível
epidemiológico, buscando freqüências e incidências, o que significa mudar a
discussão das formas de tratamento para as de prevenção no contexto
organizacional. O nível micro compreende o trabalho individual, que prescinde da
análise do contexto externo (Spink, 1992).
Uma atuação de médio alcance permite uma prática voltada para o trabalho
em si, possibilitando que “a análise epidemiológica se torne ´curativa` e o processo
de cura individual ´preventivo`” (Spink, 1992: 97), na medida em que se precisa tanto
dos estudos epidemiológicos, para ampliar a conscientização sobre a questão, como
também do trabalho individualizado.
A atuação do psicólogo deve ter um papel decisivo no sentido de prevenção e
da conquista da saúde (Kyrillos Neto, 1997). Para tanto, é fundamental antepor
resistências, ampliar o conceito de atuação psicológica no trabalho, rever antigas
práticas e redesenhar a atuação. É necessário que o profissional reflita sobre seu
51
papel e amplie seu campo de atuação, de forma que sua contribuição possa ser
evidenciada e notada (Raffih et al, 2001).
Nessa perspectiva, podem ser elencadas algumas práticas de intervenção do
psicólogo no âmbito da saúde do trabalhador, tais como: pesquisas com a finalidade
de identificar e contextualizar fatores ergonômicos e psicossociais que repercutem
para o surgimento de doenças no trabalho e a criação de estratégias integradas
através de uma atuação interdisciplinar, visando prevenir patologias. Podem,
também, ser viabilizadas sessões de discussão e grupos focais com os membros da
organização, a fim de explicitar e resolver conflitos entre as forças contraditórias. E,
finalmente, intervenções nos diversos grupos ocupacionais, facilitando mudanças de
atitudes e percepção sobre o trabalho, de modo a preparar os sujeitos para a gestão
de sua atividade laboral (Mendes, 2003).
A promoção da saúde no trabalho exige do psicólogo uma atuação de caráter
interdisciplinar que abrange o campo físico, o psicológico e o social. Assim, o
profissional de Psicologia, enquanto agente de mudanças, deve ter uma visão crítica
e global dos processos organizacionais, que possibilite construir espaços de diálogo,
a fim de promover a criação de um ambiente favorável à produtividade e ao bem-
estar dos trabalhadores.
O psicólogo do trabalho deve atuar dentro de uma perspectiva preventiva em
saúde, a partir de diagnósticos e intervenções que minimizem os fatores ligados ao
adoecimento. Esse profissional tem o desafio de transformar uma atividade laboral
fatigante em equilibrante, flexibilizando aspectos da organização do trabalho, de
52
maneira a deixar ao trabalhador uma maior liberdade para encontrar os métodos
mais convenientes para a realização da tarefa (Kyrillos Neto, 1997).
Compete ao psicólogo implementar ações que contemplem os sujeitos
trabalhadores, que valorizem o potencial humano e que oportunizem seu
crescimento e reconhecimento. A prática desse profissional deve estar pautada em
estratégias preventivas e corretivas que assegurem o sucesso e o bem-estar globais.
Hashimoto (2004) apresenta uma proposta de atuação da Psicologia no
âmbito da saúde coletiva que busca oferecer escuta para as questões do mundo
interno dos trabalhadores, as quais emergem diante da impotência frente a tantas
situações adversas que enfrentavam no cotidiano, concomitantemente à apreensão
de seus significados e sua associação com o mundo do trabalho. Trata-se de uma
possibilidade de atuação que, por meio de pesquisa ou de intervenções, oportuniza
escuta aos membros da empresa que vivenciam situações de sofrimento em
contextos pessoais e de trabalho, considerando a busca dessas pessoas por
melhores condições de vida.
Sato (1992), a partir de sua atuação na área sindical, assinala que, na
conjuntura atual, calcada no capitalismo, em que se tem, em relação à saúde do
trabalhador, um corpo de leis e uma visão que não atendem às necessidades dos
trabalhadores, é que se delineiam as possibilidades de atuação do psicólogo nessa
área. A intervenção do profissional de Psicologia pode ser realizada a partir de duas
grandes perspectivas: pela via da subjetividade e pela via do conhecimento do
trabalhador.
53
A atuação do psicólogo na linha da subjetividade implica em criar estratégias
em que esta seja levada em conta. Isto significa refletir sobre a relação capital-
trabalho dentro e fora dos locais de trabalho, repensando as condições de trabalho,
levando em consideração as diferenças e necessidades individuais, ponderando
sobre novas formas de organização do trabalho que permitam flexibilizar a divisão de
poderes e o conteúdo das tarefas e atentando para as particularidades subjetivas.
Para tanto, é fundamental ouvir os trabalhadores, considerando o conhecimento
adquirido por estes em sua vivência diária no contexto laboral. Isto implica em adotar
uma nova maneira de construir o conhecimento sobre o trabalho em sua relação com
a saúde que se diferencie dos pressupostos adotados pela ciência. Também implica
em oferecer um espaço de escuta e discussão a respeito do cotidiano laboral do
trabalhador, em que possam ser colocados os problemas e dificuldades em prol de
viabilizar transformações, negociações e medidas de prevenção, sendo fundamental
refletir sobre a natureza do conhecimento prático, suas determinações e seu
processo de construção, a fim de entender sua lógica.
A concepção de promoção de saúde predominante no campo da saúde do
trabalhador demanda do psicólogo do trabalho a edificação de uma prática calcada
em um posicionamento ético-político que proporcione a construção de relações
laborais asseguradoras do bem-estar dos trabalhadores e da minimização de seu
sofrimento.
Para que haja o redimensionamento das práticas dos psicólogos do trabalho,
a primeira medida é o resgate do humano, de maneira que os profissionais passem a
orientar suas práticas não apenas pelas necessidades dos sistemas, mas pelas
54
necessidades dos sujeitos. Isto demanda a reestruturação do conceito de homem, de
modo que a representação preponderante de homem estático, passivo e estável,
disposto a ajustar-se às condições ambientais dadas, seja substituída por uma
compreensão que preconize o caráter dinâmico do ser humano, que se constrói
continuamente através do trabalho (Jacques, 1989).
Nesse diálogo teórico sobre os propósitos da prática do psicólogo do trabalho,
torna-se pertinente ressaltar a Resolução de nº. 002/2006 do Conselho Federal de
Psicologia (CFP, 2006), que estabelece o seguinte juramento para a profissão:
Como psicólogo, eu me comprometo a colocar minha profissão a
serviço da sociedade brasileira, pautando meu trabalho nos princípios
da qualidade técnica e do rigor ético. Por meio do meu exercício
profissional, contribuirei para o desenvolvimento da Psicologia como
ciência e profissão na direção das demandas da sociedade,
promovendo saúde e qualidade de vida de cada sujeito e de todos os
cidadãos e instituições.
O juramento é explícito quanto aos princípios que devem reger a prática
profissional: a busca da saúde e da qualidade de vida dos sujeitos.
Diante do exposto, esta pesquisa tem como objetivo verificar a configuração
atual da área, no Ceará, a fim de constatar até que ponto os psicólogos têm
considerado em suas práticas o bem-estar e a saúde dos trabalhadores, de modo a
honrar o juramento que fizeram ao abraçar a profissão.
55
Nesse contexto, as perguntas colocadas nesta pesquisa são:
Qual a visão atual dos psicólogos sobre a saúde no trabalho e sobre a
relação de suas práticas para a prevenção e manutenção da saúde dos
trabalhadores?
Que atividades são realizadas pelos psicólogos para a promoção e a
prevenção da saúde do trabalhador?
56
2. OBJETIVOS
2.1. Objetivo geral
Investigar as práticas dos psicólogos voltadas para a promoção da saúde dos
trabalhadores nas organizações.
2.2. Objetivos específicos
Identificar as atividades desenvolvidas pelos psicólogos voltadas para a
amenização do sofrimento e para a promoção da saúde dos trabalhadores.
Analisar como as práticas dos psicólogos vêm atualmente contribuindo para a
promoção do bem-estar dos trabalhadores.
Investigar a visão dos psicólogos sobre suas práticas para a prevenção e a
manutenção da saúde dos trabalhadores.
57
3. MÉTODOS
A problemática levantada foi investigada por uma pesquisa de campo de
caráter descritivo, utilizando uma metodologia que englobou as abordagens
qualitativa e quantitativa.
Segundo Oliveira (1997), a abordagem qualitativa possibilita compreender e
classificar processos dinâmicos experimentados por determinados grupos sociais.
Esse tipo de método tem características não estruturadas que permitem desvelar
percepções, crenças, relações e sentidos dos comportamentos dos sujeitos (Alves,
1992).
No que concerne ao método quantitativo, trata-se de uma abordagem
focalizada e estruturada, que utiliza dados mais objetivos, cuja coleta se realiza
através da obtenção de respostas estruturadas e cujas técnicas de análise são
dedutivas (isto é, partem do geral para o particular). Trata-se, pois, de um método
que permite enunciar generalizações sobre os significados coletados, possibilitando
“trazer à luz dados indicadores e tendências observáveis” (Minayo & Sanches, 1993:
247).
Um discurso recente sobre os dois enfoques metodológicos é o de May (2004:
146):
[...] ao avaliar esses diferentes métodos, deveríamos prestar atenção,
[...], não tanto aos métodos relativos a uma divisão quantitativa-
qualitativa da pesquisa social como se uma destas produzisse
automaticamente uma verdade melhor do que a outra -, mas aos seus
58
pontos fortes e fragilidades na produção do conhecimento social. Para
tanto é necessário um entendimento de seus objetivos.
Nessa perspectiva, o pluralismo metodológico adotado nesta investigação se
justifica em virtude da natureza da temática. Procurou-se obter dados que não
permitissem generalizações e projeções sobre a atuação dos psicólogos
pesquisados, mas que também pudessem captar opiniões, representações, pontos
de vistas, percepções, apreender significados e percepções, aprofundamentos que o
método quantitativo não contemplaria.
Some-se a essa justificativa a perspectiva atual de compreender as duas
abordagens não mais como contrárias, mas como complementares, na medida em
que constituem formas diferentes de abordar o fenômeno e que, quando utilizadas
conjuntamente, permitem uma apreensão mais completa do objeto de estudo
(Minayo e Sanches, 1993).
3.1. Sujeitos colaboradores da pesquisa
Os psicólogos que atuam no estado do Ceará foram os indivíduos enfocados
na pesquisa.
Segundo dados do Conselho Regional de Psicologia do Ceará (CRP 11),
estavam regularmente cadastrados 2351 profissionais, em agosto de 2007. O CRP
11 não possui dados quantitativos ou qualitativos sobre a área de atuação dos
psicólogos inscritos. Desse modo, para viabilização do estudo quantitativo, utilizamos
o quantitativo total dos psicólogos inscritos.
59
Os participantes da pesquisa qualitativa, cinco, foram escolhidos pelo critério
de acessibilidade e disponibilidade de participar da pesquisa.
Critérios como sexo e idade não foram utilizados, pois não evidências
teóricas ou empíricas de que esses fatores possam influir na natureza das práticas
realizadas.
3.2. Instrumentos e técnicas de investigação
3.2.1. Pesquisa Quantitativa
A investigação quantitativa foi realizada com o intuito de atingir o maior
número possível de psicólogos. O instrumento utilizado na coleta dos dados foi um
questionário (Anexo 1), composto de 24 questões, sendo 22 de múltipla escolha e 2
abertas.
Visando facilitar o acesso ao instrumento e ampliar o percentual de resposta
aos questionários, o estudo foi realizado através da internet. Para isso, foi criado um
site com as questões da pesquisa (disponível em www.tecsites.com.br/pesquisa).
O CRP 11, embasado na Resolução 002/2005, de 27 de julho de 2005,
encaminhou, via on-line, nos dias 15/05/2007 e 12/06/2007, o link do site do
questionário da pesquisa para os endereços eletrônicos de todos os psicólogos
cadastrados. Os questionários preenchidos foram enviados para o endereço
eletrônico da pesquisadora para compilação, preservando a identidade dos
respondentes através da utilização do modo de envio/recebimento em que o
remetente aparece como desconhecido.
60
O instrumento foi disponibilizado na internet por um período de 4 meses. Ao
longo do período, os questionários preenchidos foram automaticamente enviados
para o e-mail da pesquisadora com remetente desconhecido. No total, foram
recebidos 60 questionários preenchidos.
3.2.2. Pesquisa Qualitativa
Para o estudo qualitativo, foram realizadas entrevistas com cinco psicólogos.
As entrevistas foram individuais, mediadas por um roteiro norteador, composto de
questões abertas que possibilitaram o aprofundamento das respostas, bem como a
formulação de novas questões. As questões colocadas foram:
Poderia me falar sobre as atividades que você desenvolve em sua
prática profissional?
alguma outra atividade inerente ao seu campo de atuação que você
considera importante ou necessária que seja desenvolvida na
empresa?
Como você situa a questão da saúde do trabalhador na sua prática de
trabalho?
Como você compreende a relação entre trabalho e processo de
saúde/doença?
Como você percebe o seu campo de atuação no que tange ao âmbito
de promoção da saúde do trabalhador?
As entrevistas foram gravadas após a anuência dos participantes, que
assinaram um Termo de Consentimento de participação da pesquisa (Anexo 2).
61
Cada entrevistado foi esclarecido sobre os objetivos e procedimentos da pesquisa,
momento em que foi enfatizada a garantia de anonimato.
Os psicólogos que fizeram parte da pesquisa foram convidados por meio da
sistemática de indicação, técnica conhecida como “bola de neve”. Para isso,
consultamos inicialmente uma profissional com grande experiência na área da
Psicologia do Trabalho, que indicou um colega que, por sua vez, indicou outra
profissional, e, assim, sucessivamente. Esta estratégia viabilizou a obtenção de cinco
sujeitos colaboradores. Os profissionais indicados foram contactados para o
agendamento das entrevistas através de contato telefônico e optaram por realizar a
pesquisa no seu próprio local de trabalho.
O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (COÉTICA), da
Universidade de Fortaleza e aprovado sem ressalvas.
O quadro 1 mostra as principais características dos sujeitos colaboradores.
Quadro 1: Principais características dos sujeitos colaboradores
SC
SEXO
IDADE
TITULAÇÃO
TIPO DE
ORGANIZAÇÃO
TEMPO DE
FORMADO
TEMPO DE
ATUAÇÃO
A F 40
anos
Especialização
e MBA
Indústria 15 anos 15 anos
B F 49
anos
Especialização Transporte urbano 20 anos 20 anos
C F 38
anos
Especialização Indústria 16 anos 16 anos
D F 46
anos
Mestrado Bancária 25 anos 22 anos
E F 39
anos
Mestrado Construção civil 18 anos 18 anos
62
3.3. Análise e Interpretação dos Dados Quantitativos
Os dados obtidos por meio da aplicação dos questionários foram submetidos
à análise estatística com o auxílio do programa estatístico SPSS (Statistical Package
for the Social Sciences) versão 15.0 para Windows.
3.4. Análise e Interpretação dos Dados Qualitativos
Os dados coletados através das entrevistas foram transcritos e submetidos a
uma análise de conteúdo fundamentada na metodologia proposta por Lefévre e
Lefévre (2003): o Discurso do Sujeito Coletivo, que, por sua vez, baseia-se no
aparato teórico da Psicologia Social e nos conceitos da Teoria das Representações
Sociais.
Lefévre et al (2000) compreendem as representações sociais como a
manifestação do que pensa ou reflete determinada população sobre certo tema.
Essa manifestação é expressa, dentre outros meios, pelo discurso.
As representações sociais podem ser compreendidas, de maneira geral, como
uma forma de saber popular, de conhecimento prático, socialmente construído para
dar sentido à realidade cotidiana (Sato, 1995; Spink, 1993).
O Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) representa um recurso metodológico
destinado a tornar mais claras e expressivas as representações sociais através de
um conjunto de procedimentos de tabulação e organização de dados discursivos que
envolve a análise do material verbal coletado. A análise visa extrair, de cada um dos
depoimentos individuais, as Idéias Centrais e Ancoragens e suas correspondentes
Expressões-chave, que compõem um ou mais discurso-síntese, utilizado para
63
expressar um dado pensar ou representação sobre o fenômeno e que fazem com
que o discurso de todos seja o discurso de um, denominado Discurso do Sujeito
Coletivo (Lefévre et al. 2000).
As expressões-chave constituem pedaços ou fragmentos discursivos que
devem ser selecionados pelo pesquisador e que mostram a essência do conteúdo do
discurso ou a teoria subjacente. Desse modo, selecionar as expressões-chave
significa, em resumo, refinar o discurso de tudo o que é irrelevante, acessório,
buscando obter a essência do conteúdo do pensamento, tal como ela aparece no
discurso analisado.
As ancoragens constituem traços de conceituações, hipóteses e ideologias
que são usadas pelos depoentes para enquadrar situações particulares que se
interpõem no discurso.
A idéia central é uma expressão lingüística que revela, descreve e nomeia, da
maneira mais sintética e precisa possível, o(s) sentido (s) de cada um dos discursos
analisados e de cada conjunto homogêneo de expressões-chave, o qual vai dar
nascimento, posteriormente, ao DSC.
Desse modo, o DSC consiste em um discurso-síntese homogêneo, construído
a partir do encadeamento entre idéias centrais, ancoragens e suas respectivas
expressões-chave, representando, pois, a reunião de todas as possibilidades
imaginárias oferecidas por um dado grupo social, num certo momento, para pensar
determinado tema.
O Discurso do Sujeito Coletivo é, portanto, um modo de expressar diretamente
a representação social de um dado grupo social, permitindo que ele (no caso desta
pesquisa, os psicólogos que atuam no mundo do trabalho) possa ser visto como
64
autor e emissor de discursos comuns sobre determinado tema (em nosso caso, a
saúde do trabalhador).
65
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1. Apresentação e Discussão dos Resultados das Entrevistas
Foram realizadas cinco entrevistas semi-estruturadas, cujas questões
abordaram temas relativos à prática dos psicólogos nas organizações.
Conforme a metodologia escolhida para a análise, foram realizadas leituras
sucessivas das transcrições das entrevistas e sublinhados os trechos dos
depoimentos que viriam a compor os conjuntos temáticos a serem analisados. Os
trechos de natureza temática comum foram reunidos e identificados por meio de
Idéias Centrais. Este processo viabilizou a emergência das seguintes Idéias
Centrais:
Formação Acadêmica.
Compreensão da relação entre trabalho e o processo de saúde-adoecimento.
Visão sobre a atuação do psicólogo do trabalho.
O psicólogo do trabalho e a promoção da saúde do trabalhador.
Práticas em prol da saúde do trabalhador ou não práticas.
4.2.1. Formação Acadêmica
A idéia central, formação acadêmica, envolve aspectos relacionados ao modo
como os psicólogos analisam a formação acadêmica em Psicologia no que tange à
preparação para atuação na área da Psicologia do Trabalho. Engloba aspectos
relacionados aos conteúdos programáticos, às disciplinas, à natureza dos
66
conhecimentos repassados, ao tipo de abordagem dos conteúdos, á experiência,
formação e preparação dos professores.
Os pesquisados destacam que a formação acadêmica para atuação na
Psicologia do Trabalho é restrita e insuficiente. Os conteúdos são limitados,
generalistas, desvinculados do contexto de trabalho, de modo que fornecem pouca
compreensão dessa prática.
Os psicólogos citam o predomínio do viés clínico no conteúdo das disciplinas,
cujo enfoque é centrado no indivíduo. Também consideram os programas das
disciplinas estereotipados e tecnicistas, na medida em que se restringem ao
fornecimento de um conjunto de instrumentos e técnicas descontextualizados com as
demandas atuais do mercado, o que favorece a formação de profissionais
despreparados, cujos conhecimentos se limitam às práticas de recrutamento,
seleção e treinamento.
Na faculdade tinha muito isso, o próprio conteúdo curricular, o direcionamento para
a área clínica é muito grande, que era considerada a área nobre da psicologia,
psicólogo que não é clínico não é psicólogo, tinha muito essas nuances. Então, eu
acredito que tem a haver com a orientação da faculdade, que valoriza muito a clínica,
a gente tem poucas cadeiras de disciplina organizacional e quando têm, sinceramente,
as que eu fiz não me acrescentaram em nada, era muito aquela visão tipo
recrutamento, seleção e treinamento, sabe?. Eu fui ver um pouco de visão sistêmica
quando fiz especialização (Psicólogo C).
Quando eu me formei, era visão clínica total, vi psicologia organizacional porque eu
fiz um trabalho, fiz minha monografia, fui fazer uma visita pra empresa, mas num
tinha nem a vivência. E aí, assim, minha vivência é meu campo de organizacional de
verdade, porque o que eu aprendi, na época, digamos assim, foi na prática (Psicólogo
B).
67
Os entrevistados também assinalam que a formação não fornece o
embasamento teórico suficiente para uma atuação consistente na área, de modo que
os profissionais acabam por obter do próprio campo as diretrizes que irão orientá-lo
em sua prática, o que resulta na construção de um saber acrítico e limitado.
E, assim, por exemplo, eu, na minha formação...eu não tive visão nenhuma de
organização. Eu aprendi na prática mesmo (Psicólogo E).
O psicólogo está 100% despreparado. A faculdade não prepara. Eu tive uma grata
benção na minha vida porque a empresa me propiciou inúmeros cursos fora daqui.
Coisas que eu não aprofundei na faculdade, tive meras duas disciplinas de psicologia
organizacional, então assim, a pratica profissional que a gente presencia na maioria
das vezes de seleção é uma merreca, eu acho que me fiz profissional porque tinha um
espaço de pratica e me foi dado uma formação conceitual dada pela empresa
(Psicólogo D).
De acordo com Zanelli e Bastos (2004), as falhas na formação contribuem
para que o psicólogo fique limitado na sua atuação e seja visto como um técnico,
com poucas possibilidades de ação, de modo que deixam de participar e intervir com
efetividade nas decisões organizacionais e de contribuir com mais efetividade para o
reconhecimento e avanço de sua área de atuação.
Outro aspecto apontado pelos pesquisados é a ausência de conteúdos que
abordem a categoria trabalho de maneira consistente, considerando sua centralidade
na vida dos sujeitos e os impactos e inter-relações entre a atividade laboral e os
processos de saúde e adoecimento. Os conteúdos são defasados e não contemplam
temas relacionados à saúde no trabalho.
68
O que se deve a nossa formação que não é estimulada para isso... Aqui em Fortaleza
né? A nossa formação na área de psicologia organizacional, ela não tem a qualidade
de vida e a saúde do trabalhador como essencial...o processo de formação do
psicólogo organizacional dentro das universidades é voltado para o conceito de clima,
conceito de cultura, conceito de relações de poder, conceito de liderança no que diz
respeito a aspectos mais subjetivos. vem o instrumental em recrutamento e seleção,
em avaliação de desempenho. Então assim, a saúde do trabalhador eu acho que ela
pode até ser vista, mas na formação ela é tímida. Até questão fundamental como o
conceito de trabalho, não é vista da forma como deveria (Psicólogo E).
Os pesquisados assinalam ainda que a restritividade da sua formação para
atuação na área do trabalho não envolve apenas o nível de graduação, mas também
os programas de pós-graduação. Observam que poucos são os cursos lato sensu ou
stricto sensu voltados para a preparação dos psicólogos que atuam nesta área.
O que nós temos, hoje, em termos de opção de formação desse profissional, né?
Acaba se restringindo. Se você quiser fazer um mestrado hoje na área organizacional
e você não tiver disponibilidade, eles não têm um mestrado no Ceará que...assim, um
mestrado profissionalizante, mas que tenha um foco na organização...todos os
mestrados, os dois que tem no Ceará são focados na área clínica. Eu acho que isso
limita também os profissionais (Psicólogo A).
Os aspectos evidenciados pelos entrevistados estão de acordo com o
pensamento de Zanelli (2002) que assinala que a preparação para atuação na área
do trabalho é falha e tecnicista. O autor aponta que a formação acadêmica em
Psicologia não fornece subsídios teóricos mínimos que garantam uma atuação
congruente com as demandas atuais do contexto laboral.
Em relação ao tema formação acadêmica, pode-se compor o seguinte
discurso do sujeito coletivo (DSC):
69
A faculdade não prepara. O direcionamento para a área clínica é muito grande, a
gente tem poucas cadeiras de disciplina organizacional e quando tem, sinceramente,
não acrescentaram muito, na medida em que eu não tive visão nenhuma de
organização e de saúde do trabalhador. Eu aprendi foi na prática mesmo e percebo
ainda que existem poucas oportunidades de pós-graduação na área.
4.2.2. Percepção da Relação entre Trabalho e o Processo de Saúde-
Adoecimento
A idéia central “percepção da relação entre trabalho e o processo de saúde-
adoecimento” explicita como os psicólogos percebem, a partir da sua prática, a
relação entre o trabalho e o processo de saúde e adoecimento. Abrange o modo
como os psicólogos concebem esta relação e observam os aspectos envolvidos
nesta interface no seu cotidiano de trabalho.
Os pesquisados evidenciaram observar a existência de uma relação direta
entre trabalho e o processo de saúde-adoecimento, ou seja, a existência de uma
implicação direta da atividade laboral no bem-estar dos sujeitos.
Essa relação é tudo! (risos) Não tem jeito! Essa coisa a gente passa a maior parte da
vida no trabalho ela e real, né? Ela é real. Então assim, quando você não esta feliz
você somatiza muitas coisas, não tem jeito né?Então eu acho que é uma relação
direta. O ambiente de trabalho ele pode gerar saúde ou não né? E assim, não tá feliz,
não é o seu lugar (Psicólogo E).
Eu acho que o adoecimento acontece quando a pessoa não está no lugar adequado, é
como se ela tivesse desenvolvendo uma violência, uma auto-violência, um trabalho
que não está agregando satisfação a ela. Então, se acontece isso, essa satisfação, ela é
baixa, isso gerando um nível de tensão e, automaticamente, compromete a saúde
dessa pessoa. Eu vejo dessa forma. E a vida profissional, ela já é sufocante por si, né?
70
Se ela gera um nível de insatisfação muito alto, então, nisso, com certeza, fica muito
mais elevado. Desse modo, é direta; à medida que sua satisfação aumenta, você,
automaticamente, isso pode lhe proporcionar um nível de saúde melhor (psicólogo A).
Eu vejo muito essa relação direta mesmo, eu acho que trabalho tem tudo a ver com
saúde sim... E assim não dá para a gente desvincular, achar que não tem essa relação,
o ambiente de trabalho sim se ele não for adequadamente controlado, ele interfere no
equilíbrio e pode ocasionar doenças ocupacionais (psicólogo C).
Os pesquisados também apontam que elementos relacionados com o
contexto particular dos sujeitos podem repercutir na sua saúde e o trabalho pode ser
apenas o palco para a apresentação das patologias geradas fora do contexto laboral.
Então, sem sombra de dúvida, no trabalho, muitas doenças surgem, seja pela relação,
seja pela própria condição de trabalho, a gente sabe que trabalhos bem insalubres
ou então assim, é no trabalho que ele reflete o que vem de casa. Se ele tem um
problema fora, ele reflete aqui, porque ninguém é esquizofrênico, de deixar da porta
para fora suas questões (psicólogo C).
O trabalho também é visto como um elemento que contribui de maneira
indireta para a emergência de problemas de saúde. Desse modo, pode atuar como
elemento desencadeador de uma condição anterior do sujeito.
Lógico que a doença não é exatamente decorrente da prática de trabalho, né? Tudo
tem um histórico. Tem empresa que tem mais, tem empresa que tem menos, não sei,
mas, assim, o trabalho, eu acho que o trabalho leva a isso. Ele leva a um estresse
maior, que a pessoa carregada com um monte de outras coisas, então adoece
(psicólogo D).
A seqüência das expressões-chave presentes nos depoimentos possibilitou a
construção do seguinte DSC:
71
Eu vejo a existência de uma relação direta entre trabalho e saúde. O trabalho
repercute nos sujeitos e interfere diretamente no seu equilíbrio.
Trata-se de uma compreensão da relação trabalho e saúde que se relaciona
com o pensamento de Dejours (1988), que concebe a organização do trabalho como
uma “porta de entrada” do sofrimento e doença mental enquanto geradora de
angústia e de estratégias defensivas. Nesta perspectiva, o trabalho se apresenta
como um fator que interage com uma constituição psíquica préexistente, de modo
que variáveis individuais desempenham um papel decisivo na formação e
apresentação de um problema psicopatológico. O trabalho vai atuar, deste modo,
como palco para o desvelamento do sofrimento e pontencialização de uma condição
que remete à história individual do sujeito.
Os pesquisados observaram ainda que o trabalho, dependendo das condições
e da organização, pode atuar como agente promotor de sofrimento e adoecimento
físico e mental.
Esta perspectiva está fundamentada em uma abordagem psicossocial dos
processos de adoecimento, que no Brasil tem Codo (2002) como um dos seus
maiores representantes.
As pesquisas de Codo são fundamentadas nas concepções marxistas e nos
pressupostos da Psicologia Social Histórica-Crítica que concebem o trabalho como
um fator constitutivo do psiquismo e do processo saúde/doença mental. Segundo o
autor, o sofrimento psíquico e a doença mental ocorrem quando, e apenas quando,
afeta atividades humanas geradoras de significado por excelência, como o trabalho.
72
Eu particularmente acho que ele pode ocupar os dois lugares, pois vi na empresa
casos de indivíduos 100% sãos em termos de dinâmica e estrutura de personalidade
que tiveram depressão por causa do trabalho (Psicólogo A).
A questão é considerada bastante complexa para um dos pesquisados. Este
denotou não ter uma concepção fechada sobre essa inter-relação. Acredita que o
trabalho interfere na saúde, mas se questiona sobre como se esta interferência.
Conjectura se o mesmo atua como agente causador de patologias anteriormente
inexistentes ou se age apenas como elemento desencadeador de condições pré-
existentes.
Olhe, isso é um nó! Agora, me apertou você perguntar. Por eu vou lhe dizer uma
coisa, hoje eu tenho assim, isso foi uma coisa que carregou, durante toda a época de
estudo, assim, até que ponto o trabalho ele precipita ou ele é o agente causador. Se
você me perguntar hoje se eu tenho uma convicção, não... Então eu acho que o
ambiente de trabalho para algumas pessoas ele contribui, eu tenho vários casos lá,
a pessoa tinha uma estrutura de personalidade ou por história de vida, ela já trazia
alguns dados que mostram uma certa vulnerabilidade certo? E que a estrutura
organizacional quando ela entra com uma certa pressão, com a forma de organização
do trabalho, ela só, digamos assim, cria uma visibilidade para a ocorrência da
patologia (Psicólogo A).
Quanto a essa questão, o DSC seguinte expressa os depoimentos obtidos.
O trabalho pode ocupar os dois lugares, de agente causador ou de precipitador de
doenças, dependendo da situação de trabalho e das características dos trabalhadores.
73
4.2.3. Visão sobre a atuação do psicólogo do trabalho
A idéia central “visão sobre a atuação do psicólogo do trabalho” refere-se ao
modo como o psicólogo concebe sua atuação e como compreende os objetivos do
seu faze e como ele(a) percebe a realidade atual da área. Inclui ainda o
posicionamento ético-político que embasa a atuação, abrangendo as formas de
pensar as relações trabalhistas, o posicionamento frente aos interesses das classes,
o modo como o profissional se situa frente aos objetivos das diversas partes.
Os psicólogos assinalam que houve mudanças na atuação ao longo dos anos,
mudanças estas impulsionadas pela evolução econômica e social.
Então assim, houve uma evolução, né? Gradual, lenta, mas houve... Então assim, essa
geração vai fazer movimento muito forte, a nossa geração é uma geração acomodada
ao status atual, essa geração não! Então assim eu acredito nesse movimento por conta
dessa mudança mesmo, que está em andamento, mas tímido ainda (risos) (Psicólogo
E).
As psicologias que se formam, hoje, eles tão saindo desse casulo, que foi inicialmente
traçado, né? Porque, assim... você se formou, era clínica, porque, na faculdade, né?
Hoje, o campo organizacional cresceu e se desenvolveu muito e foi tão assim... foram
muitas pessoas que vivenciaram uma empresa, que agiram numa empresa, ajudou,
eu acho que ajudou muito e tá ajudando as pessoas que tão saindo das faculdades com
uma visão cada vez maior do que é a organização (Psicólogo B).
Na visão dos entrevistados, a prática do psicólogo do trabalho é orientada por
concepções de ordem pessoal e construída de acordo com a vivência individual de
cada profissional, sendo desprovida de diretrizes norteadoras. Os pesquisados
74
pontuaram a ausência de uniformidade nos modos de atuação, de maneira que
coexistem vários modelos e formas de realizar o trabalho.
Eu acho que há varias formas de atuação do psicólogo organizacional. Se você
entrevistar oito psicólogos, você vai ter oito visões diferentes, ééé por quê? Porque
cada psicólogo tá hoje num momento de acordo com a historia que ele viveu, né? Com
o que ele acredita, com o que ele pensa (Psicólogo E).
Os pesquisados denotam, em seu discurso, a preocupação contínua com a
produtividade e com a lucratividade da empresa. Referem-se a isso como se estas
representassem os objetivos maiores de sua prática. Os benefícios gerados para os
trabalhadores são tidos como conseqüência da utilização das estratégias
organizacionais. Os profissionais buscam implementar prioritariamente atividades
que contribuam para a obtenção do retorno financeiro e para o fortalecimento do
negócio e passam a considerar o alcance desses resultados empresariais como
indicador do cumprimento de sua missão enquanto trabalho do psicólogo.
Então, uma prioridade que a gente tem assim, além de suprir, deixar a empresa
sempre com a necessidade de pessoas suprida, muito mais do que isso, é procurar,
assim, o desenvolvimento dessas pessoas e fazer com que tudo isso junte, um bom
resultado, que vai se agregar à empresa. Agregar lucratividade sem dúvida, porque
não adianta você ter esse preconceito, “ah, em empresa não se deve falar em lucro; se
deve falar sim”, né? Então, assim, a empresa tem os objetivos dela, e a gente, através
desse trabalho com as pessoas, em conjunto, e cada vez mais vai fazer com que essas
pessoas, que também têm os objetivos pessoais delas, sejam mais sintonizadas nessa
direção, né?... Às vezes, é uma coisa que pode resolver com a questão da gestão.
Então, você evita um problema maior, e aquilo gera o quê? Gera motivação, né? Eles
se sentem valorizados, eles se sentem com voz, né? Claro que vai cair na
produtividade (Psicólogo B).
75
Meu trabalho é formar essa liderança, capacitá-los para que eles sejam os melhores
gestores para que eles consigam fazer das suas equipes, equipes motivadas, equipes
satisfeitas, que tenham resultado. Então, é contribuir realmente para o resultado da
empresa, contribuir para o resultado do negócio, né, pois, assim cumprimos nossa
missão (Psicólogo C).
Sobre o modo como se posicionam frente aos interesses diversos, a psicóloga
E enfatizou que os profissionais da área devem prioritariamente atuar como
parceiros dos gestores da empresa em que exercem suas atividades:
Eu coloco muito em sala de aula que o psicólogo organizacional tem que deixar de ser
uma função de linha, né? De ser técnico, tá, para ele ser realmente um parceiro
estratégico dos acionistas (Psicóloga E).
Para Figueiredo (1989), os psicólogos utilizam com freqüência um discurso
enfocando a importância de proporcionar um ambiente mais humano e saudável. No
entanto, estes profissionais estão utilizando essas estratégias discursivas com o
intuito prioritário de reduzir custos, aumentar a eficiência e elevar a produtividade,
conforme podemos verificar no depoimento do psicólogo C.
Então são situações que contribuem para a saúde dele, mas que também é lógico,
trazem resultados para nós, no sentido de que, é lógico que um paciente, um
funcionário que tem uma patologia, tem mais possibilidade de vir a se ausentar da
empresa ou qualquer outro tipo de ocorrência, não é? (Psicólogo C).
Nessa perspectiva, podemos compreender a utilização da estratégia de
obtenção de resultados por meio do estabelecimento de metas e objetivos,
associadas ao desafio, a responsabilidade e a promoção de crescimento, como um
dos artifícios utilizados pelos psicólogos para manipular a subjetividade do
76
trabalhador, e, assim, escamotear malefícios, favorecendo interesses hegemônicos
(Figueiredo,1989)
Como o nosso processo de formalização de metas é democratizado e compartilhado,
ou seja, ninguém formaliza uma meta que ela não esteja que ela é capaz, então a gente
evita que a meta seja uma pressão, mas com que a meta seja um desafio, ou seja, que
a pessoa possa canalizar a energia para alcançar aquele fim (Psicólogo E).
A gente faz aqui esse movimento de trabalhar as pessoas, de puxá-las para aquele
objetivo da empresa, que irão permitir que eles realizem as coisas pessoais deles, que
também tá em paralelo com o crescimento da empresa (Psicólogo B).
Outro aspecto que chama a atenção é a ideologia presente em certos
discursos em que os psicólogos se colocam como mediadores de interesses distintos
e enfatizam a possibilidade de uma conciliação pautada em benefícios e ganhos
recíprocos.
O que não quer dizer que a gente é assistencialista. Por que uma coisa que a gente
trabalha muito com o nosso funcionário aqui é (pausa) existe uma contrapartida,
assim, se ele recebe um salário, se ele é bem remunerado para fazer o trabalho dele,
ele vai ser cobrado para fazer o trabalho seja bem feito. Se a gente o EPI, ele tem
que usar o EPI e ele vai ser punido se não o fizer (Psicólogo C).
Os pesquisados sustentaram, em seus depoimentos, que a empresa não deve
ser vista como a única responsável em suprir as demandas dos trabalhadores.
O que eu acho que seria legal é que cada pessoa, eles não vissem a empresa como
aquele pai ou aquela mãe, que tem de suprir, né? Então, uma tendência que a gente
tem aqui é mostrar que empresa não deve ser paternalista, que eles têm um valor, e
que tudo é conquistado (Psicólogo B).
77
Então a gente trabalha muito com ele com a noção de responsabilidade, por que
ninguém quer coitadinho aqui, ninguém quer aquela figura de funcionário que acha
que ele é vítima do sistema, que o patrão sempre é o ruim e ele é o bonzinho, não a
gente trabalha numa relação que você tem muita liberdade, mas que tem uma
contrapartida que é muita responsabilidade e a gente muita responsabilidade ao
nosso funcionário, ele tem um nível razoável de autonomia, mas é lógico que isso tem
um preço e ele tem que dar a parte dele (Psicólogo C).
Estes depoimentos deixam explícita a apologia que os psicólogos fazem à
autonomia como uma estratégia que visa claramente eximir a responsabilidade e
diminuir a obrigação moral da organização para com os sujeitos que ali trabalham.
Diante desses posicionamentos, a psicóloga B questionou sua própria prática
e os motivos que a levaram a atuar eminentemente em prol dos objetivos
organizacionais, em detrimento das necessidades do trabalhador. A entrevistada
chegou a explicitar que precisa se manter na empresa em virtude da remuneração,
que sofre, mas que precisa atuar conforme os desígnios dos detentores do capital.
Assim... Eu me dirigi pra essa área, mas nem sei bem se é isso que eu quero, pois é um
sofrimento grande, eu fazendo isso por causa do salário, porque, assim, a gente
podia evitar a doença, mas eu preciso me manter aqui, então, vou dar isso mesmo...
Eu acho assim, que é muito uma questão pessoal mesmo... Tem pessoas que são mais
desafiadoras, tem pessoas que são mais curiosas, têm outros que não.
O discurso de B traz à tona um aspecto pouco evidenciado na literatura que
são as vivências de prazer e sofrimento inerentes aos psicólogos que atuam em
organizações. Silva e Merlo (2002) realizaram uma pesquisa com psicólogos que
atuam em organizações privadas e observaram a ocorrência de sofrimento
decorrente da carga excessiva de trabalho, de conflitos entre os valores da empresa
78
e os pessoais, dos cerceamentos da organização, da falta de autonomia e
reconhecimento, da percepção da falta de organização e de força da categoria,
dentre outros aspectos.
Nesta perspectiva, as vivências de sofrimento estão presentes nas práticas
dos psicólogos que atuam nas organizações. Este profissional é um trabalhador, e
como tal, sofre por ter que se submeter às demandas patronais que vão de encontro
aos seus valores e conhecimentos.
O seguinte DSC resume a questão.
Uma prioridade do psicólogo é procurar o desenvolvimento das pessoas e fazer com
que um bom resultado, que vai se agregar à empresa. Para isso, para ele ser um
parceiro estratégico dos acionistas, desenvolvendo ações que puxem para o
crescimento da empresa e, assim, contribuam para a saúde dos trabalhadores
No discurso fica explícito que a saúde do trabalhador é vista como alvo de
atenção secundária, na medida em que tal preocupação é derivada da atenção
primária, dada aos fatores, que na visão dos psicólogos, interferem mais diretamente
nos resultados organizacionais.
4.2.4. O Psicólogo do Trabalho e a Promoção da Saúde do Trabalhador
A idéia central “o psicólogo do trabalho e a promoção da saúde do
trabalhador” está relacionada à visão que o psicólogo tem da sua atuação no âmbito
de promoção da saúde laboral. Inclui os modos de pensar essa atuação, e ainda
como avaliam as perspectivas de atuação neste âmbito.
79
Os psicólogos entrevistados consideram que a saúde do trabalhador é antes
de tudo uma responsabilidade individual.
Eu acho assim é... O psicólogo não pode ser visto como o todo poderoso, como o
único responsável dentro da organização a proporcionar a saúde do colaborador, né?
(Psicólogo C).
Então assim não curto muito esse papel do psicólogo como protetor pai ou mãe dos
colaboradores, cuidando da saúde deles, não! Quem tem que cuidar da saúde deles
são eles, tá? Não tem jeito, então assim ééé, o papel do psicólogo é ele proporcionar
um ambiente que acaba te permitindo cuidar da sua saúde, mas não eu cuidar para
você (Psicólogo C).
Neste discurso, aparece uma visão simplista, naturalista e objetivista de
saúde, compreensão reforçada ao longo da história da Psicologia em virtude de
condições ligadas à emergência e consolidação desta área enquanto ciência,
aspectos discutidos por González-Rey (2004) e citados anteriormente (ver item
1.3). A partir dos depoimentos, observa-se que esta visão ainda se mantém e
direciona o olhar do psicólogo. A saúde do trabalhador é concebida como uma
condição própria do sujeito e se expressa através da ausência ou presença de
sintomas que remetem a sua biologia ou ecologia individual e cuja manutenção não
é influenciada pelos espaços nos quais os sujeitos se organizam e interagem. Esta
visão de saúde pode estar fundamentando as práticas, ou melhor, a ausência de
práticas efetivas dos psicólogos na área da saúde do trabalhador.
O psicólogo não se sente diretamente implicado na promoção de saúde
dentro do ambiente organizacional, não atenta para esse papel, de modo que
poucas são as atividades planejadas e implementadas que levam em conta a saúde
80
do trabalhador. Muitas atividades são realizadas com outros objetivos e acabam
secundariamente contribuindo na promoção de saúde.
Realizamos assim uma gama de atividades que acabam repercutindo na saúde dos
trabalhadores. Ao trabalhar clima, cultura, o trabalho por meta, estamos gerando
motivação, o que vai trazer benefícios também para a saúde dele ( Psicólogo A).
Os pesquisados avaliam a prática nesse âmbito como acanhada e motivada
por aspectos relacionados ao contexto externo. Desse modo, assinalam que as
atividades que são realizadas não são frutos de um maior amadurecimento da
prática, mas uma resposta ao movimento do mercado.
Esse papel do psicólogo é tímido ainda, acho que no mercado, tímido. Talvez esse seja
um dos papéis não tão a vista né? Como recrutamento e seleção, como treinamento,
como avaliação de desempenho que é um olhar muito mais intrínseco. Então assim,
éée, ele hoje é tímido. Proporcionalmente em relação a outras atividades da área ele
é tímido. Essa é a minha percepção. Acho que uma tendência até pelo próprio
movimento do trabalho, né?. E então assim, eu acho que é um movimento de mercado
natural que está proporcionando isso, mas eu não acho que é um movimento do
psicólogo organizacional não. Não acho que é! Acho que esse movimento do mundo
não é fruto de um trabalho do psicólogo organizacional, eu acho que a gente esta indo
na onda. Mas não é um movimento nosso em prol da saúde do trabalhador, em prol do
equilíbrio, não (Psicólogo C).
Ainda sobre esse aspecto, os pesquisados esclarecem que os psicólogos
ainda não concebem a promoção de saúde como uma ação prioritária. Isso se deve
principalmente a falta de percepção do impacto que as ações de saúde têm para os
81
sujeitos e ainda devido à insipiência de ações que assegurem um ambiente
organizacional mais saudável.
Eu acho que nós, psicólogos organizacionais, ainda não quebramos paradigmas para
encarar isso como uma coisa que vai fazer bem ao ser. Se fosse para resumir em uma
palavra, acho que a nossa atuação nesse sentido é tímida. De construção de um
ambiente organizacional que seja mais saudável, essencialmente mais saudável. Eu
não falando de massoterapia, de ginástica laboral, não falando de coisas
pontuais. Eu falando de um ambiente organizacional que proporcione mais esse
equilíbrio. Eu acho que nossa contribuição é tímida (Psicólogo C).
Sobre as razões da restritividade de suas práticas no âmbito da saúde do
trabalhador, os pesquisados apontam várias justificativas tais como: falhas na
organização da rotina no que concerne ao estabelecimento de prioridades, falta de
visão sistêmica, visão do empresariado, falta de visão do psicólogo sobre as
possibilidades de intervenção, fragmentação do conhecimento do psicólogo do
trabalho, desarticulação da categoria, acomodação, falta de interesse do psicólogo
em galgar novos espaços na empresa que o possibilitem falta de benchmarking etc.
A gente se perde no dia a dia, no gerenciamento, em coisas mais concretas e não
atentamos essa questão, eu acho que isso também é outra coisa, a falta de enxergar a
quebra de paradigmas que também existe e a outra a visão do empresariado, que
também ainda não é essa. Poucos são os psicólogos que tem uma atuação mais
sistêmica. Para o Ceará temos um longo caminho a percorrer. Isso se deve em
primeiro lugar por não ter uma visão generalista, por serem especialistas e entende
muito bem de uma coisa, como aplicar teste. essa visão sistêmica e acabam cobrando
do profissional que ele seja mais departamental e não sistêmico e também um pouco
de acomodação do RH de aceitar esse tipo de posição. (Psicólogo C).
82
O pesquisado B avaliou sua prática e concluiu que sua atuação está mais
compatível com a atuação de um psicólogo organizacional, voltada para a
manutenção dos interesses do empresariado do que um psicólogo do trabalho, que
tem um papel direcionado para intervir nas condições e na forma de organização do
trabalho, elementos promotores de sofrimento e adoecimento.
O pesquisado questionou ainda sobre o espaço que o profissional teria para
atuar seguindo a visão da psicologia do trabalho. Segundo seu pensamento, as
empresas não têm interesse em contratar psicólogos que se preocupem
prioritariamente com o bem-estar e a qualidade de vida dos trabalhadores.
Eu me dou conta que era menos psicóloga do trabalho e mais organizacional. Hoje eu
diria para você assim, eu estou mais crítica depois do mestrado, hoje eu diferencio
bem. Eu diria para você que hoje a psicologia que muitos de nós fazemos dentro das
organizações ela não é efetivamente uma psicologia para a saúde e não é uma
psicologia do trabalho, ela é uma psicologia organizacional. O que é que eu estou
fazendo de diferença, a psicologia organizacional é como se eu criasse uma
acomodação para que a pessoa adoeça e fique por aí. Na psicologia do trabalho, não.
A psicologia do trabalho ela vai de forma mais direta e objetiva em cima da
organização do trabalho, das condições de trabalho, ela analisa os riscos, que eu
fico pensando que de qualquer forma esse trabalhador não vai ter muita chance
mesmo não. Porque mesmo eu reconhecendo como psicóloga do trabalho, as
empresas não contratam psicólogos do trabalho. Se você vier com um discurso aonde
você vá buscar priorizar a condição da saúde do trabalhador, mesmo sabendo que vai
ter um custo mais barato, que esse empregado vai ser mais produtivo (Psicólogo B).
Para alguns pesquisados, a atuação no âmbito de promoção da saúde do
trabalhador não se mostra inviável, quer seja em virtude do fator tempo, quer seja
em virtude dos recursos que são disponibilizados com esse intuito. Os custos
83
financeiros são enfatizados como inviabilizadores de uma ação mais abrangente.
Trata-se de um tipo de discurso que longe de refletir sobre a relação custo/benefício
desse tipo de atuação, busca ainda justificar e eximir a responsabilidade da empresa
para com esse tipo de prática:
A gente não tem essa condição de fazer isso. A gente só, a gente sabe que precisa,
a gente orienta, previne. Não dá pra ficar aprofundando não, até porque é
conhecer, num pra fazer muita coisa, né? A gente não tem tempo não. Outro
aspecto é que é muito difícil a empresa chegar pra bancar tudo o que se precisaria
fazer, né? Eu acho que o setor público que tem que acolher essas pessoas, né?
(Psicólogo B).
A psicóloga A assinala que a saúde física é um aspecto que geralmente é
contemplado nos projetos desenvolvidos nas empresas, mas admite a insipiência de
práticas voltadas para a dimensão mental. Observamos que o psicólogo restringe
seu olhar sobre a saúde física e pouco desconsidera a dimensão que deveria ser
prioritária na sua prática, a dimensão mental.
Pra gente, é uma prioridade. Assim, a saúde, ela é negligenciada em termos de saúde
emocional, de saúde psíquica, né? E, assim, hoje, isso deixa muito a desejar, deixa
muito a desejar, e uma preocupação muito mais com uma saúde física, sabe?
Então, assim, a gente se preocupa em dar um toque, em dar um plano de saúde, a
gente se preocupa em fazer todos os exames, estar realmente atento e dar o suporte
necessário quando o funcionário precisa. Agora, em termos de saúde mental, eu acho
que isso é muito pobre, muito pobre mesmo, em todas as organizações, não aqui
(Psicólogo A).
84
A pesquisada aponta que esta realidade é fruto da negligência, da falta de
iniciativa e da falta de competência do psicólogo em criar estratégias para
contemplar essa necessidade. A pesquisada toma antes de tudo para si e para sua
categoria a responsabilidade de ter idéias e procurar formas de fazer com que os
gestores compreendam a importância de investir na saúde do trabalhador e apóiem
as ações realizadas pelo psicólogo.
Acho profissional de psicologia do trabalho negligente em relação a essa questão. Ele
poderia oferecer mais oportunidades e buscar mais oportunidades. Acho que ainda
não foi feito por falta de iniciativa mesmo... e por isso que eu digo que a
responsabilidade não é do empresário, é nossa, quem vende essa idéia somos nós...se
ele nunca escutou isso, ele não tem como apelar também (Psicólogo A).
Eu acho que poderia ter uma parceria melhor pra se fazer um trabalho via
profissionais de fora, de você também fazer algumas ações, por exemplo, grupos de
discussão... Não que fossem grupos de terapia, mas grupos de discussão (Psicólogo
A).
Sobre as condições favorecedoras da ampliação da atuação do psicólogo no
âmbito da saúde do trabalhador, os pesquisados apontam a necessidade de
desenvolver uma articulação com profissionais de outras áreas para a criação de
parcerias. Comentam ainda a necessidade de incrementar a capacitação técnica na
área.
Também, de se ter mais possibilidades de qualificação, tá? Porque eu acho que,
assim, aqui no Ceará, é muito pobre de qualificação e de funções mesmo sobre essa
prática, sabe? Eu acho que precisaria ter uma ação mais efetiva, eu acho que a gente
precisaria estar mais integrado e, às vezes, a gente essas iniciativas surgindo, mas
85
elas morrem. Falta ao profissional um pouco mais de bagagem, de base, prele poder
intervir... Eu acho que, muitas vezes, ele não diagnostica... É, eu acho, porque as
ferramentas quem cria somos nós, sabe? Eu acho que, ao invés de reclamar, a gente
pode criar um montão de coisa. (Psicólogo A).
Na época do mestrado eu trabalhava na área de saúde e organizacional, só que
quando eu comecei a ver psicologia do trabalho eu vi que eu não fazia muito a saúde
no trabalho não, porque de certa forma algumas coisas eram mais para criar uma
acomodação do que para resolver, o que foi me gerando um campo de muito
incômodo e assim algumas coisas, eu acho que perante a empresa eu fiz errado,
perante a minha consciência eu fiz correto e perante até o próprio código de ética do
profissional, porque, por exemplo, em algumas situações o que eu fazia era alertar o
trabalhador (Psicólogo D)
A capacitação na área obtida por meio de cursos de curta e/ou de longa
duração, promove o incremento de uma maior bagagem teórico-conceitual e leitura
mais crítica da realidade, fundamental para a ampliação do enfoque e o re-
posicionamento ético-político do profissional. Os entrevistados ressaltam, ainda, a
necessidade da ampliação do enfoque através da integração do psicólogo com
profissionais de outras áreas do conhecimento, em equipe multiprofissional, a fim de
facilitar novos olhares sobre o contexto organizacional, e, assim, uma maior
compreensão dos diversos fatores que repercutem na higidez humana.
É preciso trabalhar em equipe, para mudar a visão dos administradores, dos
assistentes sociais, e até a visão do médico, sabe? O médico que atua em empresa, ele
precisa ter essa visão mais ampla também do que é essa doença. Muitas vezes, a gente
tá numa empresa só pra poder ter um limitador de problemas de saúde, mas, assim, às
vezes, a gente faz uma análise, por exemplo, de pessoas faltosas aqui no trabalho, né?
86
E o que será que leva ela a faltar com tanta freqüência e periodicamente? Ou, então,
aquilo está relacionado com o líder da sua equipe, está relacionado com o horário de
trabalho, está relacionado com a mudança de uma nova atividade? Então, isso precisa
ser analisado, essas informações, num âmbito muito maior, sabe? Numa dimensão
maior e não na dimensão só operacional, sabe? (Psicólogo B).
O pesquisado aponta a necessidade de um olhar mais acurado sobre os
diversos fatores que podem estar ligados ao adoecimento através de ações de
diagnóstico e pesquisa de absenteísmo, turn over, licença médica, etc.
Sobre as perspectivas de futuro para esse âmbito de atuação, os profissionais
denotam otimismo em virtude das transformações constantes do mercado laboral, as
paulatinas melhorias na formação e pela ampliação da visão do empresariado.
Hoje, as psicologias que se formam, hoje, eles tão saindo desse casulo, que foi
inicialmente traçado, né?... Eu acho que, de uma forma geral, à condição de hoje em
dia é que o ser humano, ele sendo visto de forma diferente, né? Pelos próprios
empresários, pelas próprias empresas (Psicóloga B).
Os pesquisados refletem que, em virtude do contexto atual, necessidade
de contemplar a saúde do trabalhador e que, se o psicólogo não estiver preparado
para assumir este fazer, ele será abrangido por outras áreas do conhecimento.
demanda, necessidade e é um espaço que precisa ser ocupado. Se a gente não
ocupar, alguém vai ocupar, pode ter certeza (Psicóloga A).
O DSC resultante pode ser assim construído:
87
Esse papel do psicólogo de trabalhar visando a saúde do trabalhador é tímido por
falta de conscientização da importância dessas ações para o sujeito. A saúde física é
mais priorizada do que a saúde mental. Este quadro ocorre devido: à falta de visão
sistêmica; a visão do empresariado; falhas no gerenciamento da rotina;
desarticulação da categoria, acomodação; falta de capacitação; falta de competência
em articular parcerias com outras áreas de conhecimento.
4.2.5. Práticas ou Não Práticas em prol da saúde do trabalhador
Essa idéia central está diretamente relacionada aos objetivos da pesquisa.
Ela abrange as ações utilizadas e descritas pelos psicólogos para promover a saúde
laboral. Engloba ainda estratégias de ação utilizadas e os posicionamentos que
embasam essas intervenções.
O pesquisado A revelou que busca trabalhar a saúde dentro de uma
perspectiva preventiva, através da divulgação e investigação de aspectos
indicadores e promotores de adoecimento.
A gente trabalha muito também de forma preventiva e, assim, todas as pessoas são
treinadas pra estarem muito atentas a esses sinais de não saúde. Se você vê que o
funcionário tá muito tenso, se você vê que o rendimento dele cai muito, então você faz
uma investigação: por que que isso tá acontecendo com ele? (Psicólogo A).
A modalidade de intervenção de cunho corretivo também se fez presente no
discurso dos entrevistados, por meio de ações de encaminhamento de
trabalhadores. Na realidade, observamos que a atuação no âmbito da saúde do
trabalhador denota-se eminentemente focada no encaminhamento dos profissionais
adoecidos para tratamento com profissionais conveniados com a empresa.
88
A partir do adoecimento, a gente pensa uma estratégia. Se for uma doença física, ele
tem um acompanhamento, né?... E, se for uma doença emocional, a gente encaminha
também pra um profissional especializado (Psicóloga B).
Passamos a manhã toda hoje falando sobre isso, sobre alguns casos, algumas pessoas,
como a gente vai tratar, como a gente tentar um encaminhamento para aquela
pessoa (Psicóloga C).
A preocupação com o encaminhamento dos trabalhadores doentes para
outras instituições leva à seguinte reflexão: até que ponto esta atividade constitui
uma estratégia que visa minimizar o sofrimento e restabelecer o bem-estar dos
sujeitos, ou se trata de uma tentativa de diminuir a visibilidade dos sintomas
decorrentes de patologias deflagradas pelo contexto e ainda desviar a atenção da
necessidade de realização de ações mais globais e eficazes na promoção de saúde.
A preocupação com a saúde física mostra-se prioritária para os psicólogos.
Estes descrevem uma série de benefícios voltados para a prevenção e tratamento de
condições físicas. A atenção aos aspectos físicos ligados às condições de trabalho é
premente, o que pode ser creditado à incontestabilidade dos vínculos entre estes e a
saúde dos sujeitos. Este fato apresenta-se como uma grande contradição e denota a
insipiência da visão do psicólogo sobre o conceito de saúde e a ausência de um
olhar mais aprofundado sobre o sujeito e sobre os fatores que repercutem no seu
equilíbrio e bem-estar.
Nós temos o ambulatório, temos plano de saúde e tem um acompanhamento
sistemático da pessoa. Nós temos, fazemos todos os acompanhamentos que são
periódicos, que ele tem que fazer uma bateria de exames de 6 em 6 meses ,e também,
assim, algo que é da parte da observação também. Se faz encaminhamento a algum
especialista, dependendo do que ele apresenta. Embora, por exemplo, a gente não
89
tenha necessidade, obrigatoriedade, de ter médico e técnico de enfermagem aqui, nós
temos no ambulatório, médicos e técnicos de enfermagem, porque a gente percebe que
casos que o nosso limite de plano de saúde é muito baixo, tem assim algumas
coisas que são mais evidentes, por exemplo, dengue, não tem como fugir quando
aparece casos de dengue, gripe, mas uma preocupação com isso, temos
preocupação também com o barulho e a poeira, por isso tornamos obrigatório o uso
do EPI (Psicóloga A).
Se a pessoa tem um problema de saúde, aí a gente faz um acompanhamento, vê como é
que ele tá, se ele seguindo a orientação médica...Então, assim, quem de licença
médica ou, então, quem doente, com atestado, a gente acompanha qual o problema
deles. Às vezes, é uma hipertensão, num é, tem que ir no médico, quê que a pessoa
precisando...Nós temos um médico na empresa...Então, a gente tenta acompanhar,
acompanha bem de perto a saúde do nosso trabalhador (Psicóloga B).
A gente faz um acompanhamento periódico. De repente, assim, aquelas pessoas que
têm um nível de pressão sempre alterada, é necessário trabalhar com margem de
orientação, de acompanhar. A gente tem uma preocupação com as condições de
trabalho, com nossos carros, pra dar uma condição melhor. Porque assim...lógico que
o motorista vai passar até que horas? o dia inteiro e tal, mas assim...num vai dar um
conforto exagerado, mas o que a gente pode minimizar de desconforto, a gente
minimiza. Como é que é isso? Todo motorista, ele tem a liberdade de dizer. Às vezes, a
cadeira num boa...vai automaticamente a comunicação e a empresa
automaticamente consegue. Então, é procurar favorecer a condição de trabalho dele
pra, cada vez mais, minimizar...o que? O que realmente é um desconforto. Então,
assim, coisas nesse sentido (Psicóloga C).
Quando questionados sobre a realização de ações voltadas para a promoção
da saúde no trabalho, os psicólogos assinalam a realização de projetos, de semanas
90
de saúde ou de eventos genéricos voltados para a conscientização, a educação e o
envolvimento dos trabalhadores.
Então, por exemplo, na semana do dia 9 ao dia 13, nós vamos ter aqui a Semana da
Saúde. E, nessa semana, além de fazer toda uma programação interna, a gente
também convida os familiares para virem até a empresa, tá? (Psicóloga A).
Nós temos um projeto que é o projeto De bem com a vida, esse projeto ele é novinho,
na realidade a gente tava com várias ações isoladas e agente decidiu pegar essas
ações e contextualizar dentro de um projeto único, que trata das dimensões né?, Então
ele trata das questões informativas, de cuidado da saúde, então a gente tem um
sistema de informativos, aí a gente tem algumas questões voltadas para a saúde
mesmo que e massoterapia, semana da saúde, e as olimpíadas, que que são
encontros que a também gente promove aqui, a gente estimulou essa questão do
esporte, muita gente era sedentário e hoje não é mais, eee é isso, ele se ressume a
essas questões (Psicóloga B).
Agora, para cuidar desse bem-estar nos temos programas como acampamento para
jovens, é uma atividade que demanda três dias começa numa sexta-feira e vai até o
domingo à tarde, são para filhos de funcionários Nós também temos a festa de natal
que é o evento Dia da família, ou seja, é um evento para a família, acontece durante o
dia e tem toda uma programação, porque a X valoriza muito a família, nada de fazer
festa para o funcionário, não, é para a família, a família tem que participar em
todos os momentos, outro projeto que nós temos é o encontro de esposas. A campanha
de vacinação, por exemplo, é extensiva aos dependentes, a gente divulga e o
funcionário vai pagar metade do valor da vacina para cada dependente. (Psicóloga
C).
Como te falei, a medicina do trabalho é subordinada a mim. Então o que a gente faz.
Primeiro a gente tem uma programação anual de saúde que inclui palestras, que
inclui uma semana interna de prevenção de acidentes, onde a gente também coloca
eventos de saúde e nós temos um acompanhamento mesmo médico dos nossos
funcionários, onde a gente tem um programa que a gente chama de PCMSO, onde
91
estão definidos quais são os exames médicos necessários na admissão, no periódico,
no demissional e a gente também tem, é, algumas práticas como, por exemplo, a gente
acompanha os atestados médicos, se a gente identifica algum funcionário que tenha
uma condição, por exemplo, hipertensão, ele tem um tratamento diferenciado, o
médico faz um acompanhamento diferenciado dele, então não para acompanhá-lo
só no exame periódico e anual (Psicóloga E).
A preocupação com a saúde mental é relegada pelos profissionais da
subjetividade. Estes utilizam de maneira acrítica modelos e estratégias de ação em
saúde sob a forma de programas e ações pontuais, sem terem consciência do
impacto e das repercussões que exercem sobre os sujeitos.
Verificamos a ausência de ações voltadas para o coletivo dos trabalhadores,
tal como proposto por Dejours (1994), e a ausência de utilização de instrumentos de
pesquisa e intervenção pontuadas por Mendes (2003), viabilizadas através de
sessões de discussão e grupos focais com os membros da organização.
DSC:
Se a pessoa tem um problema de saúde, aí a gente faz um acompanhamento, vê como é
que ele tá, se ele seguindo a orientação médica e faz encaminhamento dos
profissionais adoecidos para tratamento com profissionais conveniados com a
empresa. Realizamos semana da saúde e programas de qualidade de vida.
92
4.2. Análise e Discussão dos Resultados Quantitativos
Participaram da pesquisa 60 psicólogos. Para a análise inicial dos dados,
foram construídas as distribuições de freqüência de cada questão do instrumento. Os
cruzamentos das respostas foram analisados por meio do teste de Qui-Quadrado.
Foram consideradas como significativas, em todas as análises, as diferenças com
um nível p<=0,05 (5%).
4.2.1. Características da Amostra
88% (53) dos psicólogos pesquisados eram mulheres e 12% (7) homens. A
idade média dos respondentes foi de 33,9 anos (Desvio Padrão= 7,355 anos).
A média de tempo de formação em Psicologia dos pesquisados foi de 8,42
anos (DP= 6,63 anos). 58,3% dos participantes possuem até 8 anos de formação, o
que demonstra tratar-se de uma amostra de psicólogos com formação relativamente
recente. Apenas 5% dos respondentes possuem mais de 20 anos de formação,
conforme mostra a Figura 1.
28,3%
30,0%
18,3%
18,3%
5,0%
Até 3 anos De 4 a 8
anos
9 a 13 anos 14 a 20
anos
Mais de 20
anos
Figura 1 : Distribuição da amostra por tempo de formação em Psicologia
93
A média do tempo de atuação dos respondentes na área do trabalho é de
8,48 anos (DP= 6,55 anos), ligeiramente superior ao tempo de formação. A
distribuição por faixa de tempo de atuação é mostrada na Figura 2.
23,3%
40,0%
15,0%
16,6%
5,0%
Até 3 anos De 4 a 8
anos
9 a 13 anos 14 a 20
anos
Mais de 20
anos
Figura 2: Distribuição da amostra por por tempo de atuação em Psicologia do Trabalho
A fim de avaliar o momento em que cada pesquisado começou a atuar na
área da Psicologia do Trabalho, recodificaram-se as respostas do tempo de
formação em psicologia e tempo de atuação na psicologia do trabalho (Figura 3).
Verifica-se que 45% dos psicólogos começaram a atuar na área antes de se
graduarem, o que geralmente se através de estágios ou projetos de extensão.
25% dos psicólogos passaram a atuar na área quando se graduaram, o que
sugere que, provavelmente, não realizaram atividades extracurriculares na área
(estágios e projetos de extensão e pesquisa). Zanelli (2002) e Bastos (1992)
apontam como fundamental para a construção de uma atuação consistente e
congruente com os princípios postulados na universidade os estágios curriculares na
disciplina. Observa-se, ainda, que 30% dos respondentes passaram a atuar na área
94
somente algum tempo depois da graduação, o que pode ter relação com a inferência
de Zannelli (2002) de que muitos psicólogos, influenciados pelo conteúdo e ambiente
eminentemente clínico da graduação, têm esta área como foco de interesse inicial e
que, ao se defrontarem com as dificuldades desse mercado e com a vasta gama de
oportunidades oferecidas no âmbito da Psicologia do Trabalho, acabam migrando
para esta área, sem ter, muitas vezes, interesse e formação teórica para uma
atuação competente.
45%
25%
30%
Anterior a graduação
Logo após a
graduação
Posterior a graduação
Figura 3: Distribuição da amostra quanto ao momento em que os participantes começaram a
atuar na área da psicologia do trabalho
A Figura 4 apresenta a distribuição quanto à titulação dos pesquisados. Digna
de nota é a pequena porcentagem dos entrevistados que investiram em pós-
graduação stricto sensu: apenas 13,5% dos profissionais. Este fato pode ser
creditado a uma série de fatores, mas, principalmente, à escassez de programas de
Mestrado e Doutorado com linha de pesquisa em Psicologia do Trabalho na região e
o caráter tecnicista da atuação, que faz com que os profissionais não se voltem para
atividades ligadas ao ensino e à produção de conhecimento.
95
20,3%
66,1%
11,8%
1,7%
Graduação
Especialização
Mestrado
Doutorado
Figura 4: Distribuição da amostra quanto à titulação
A maioria dos psicólogos participantes atua em organizações privadas: 73%,
contra 26% que atuam em instituições públicas. A Figura 5 mostra a distribuição do
grupo quanto ao ramo de atuação das empresas em que trabalha.
3,3%
1,7%
23,3%
3,3%
13,3%
11,1%
0,0%
20,0%
10,0%
Bancário Informática Servo Turismo Comércio Servo de
saúde
Indústria Outro Não
respondeu
Figura 5: Distribuição da amostra quanto ao tipo de organização em que trabalha atualmente
4.2.2. As Práticas dos psicólogos
A Tabela 1 apresenta a freqüência com que os psicólogos relataram realizar
as atividades apresentadas no questionário. Para uma melhor visualização, esses
96
resultados são apresentados de forma gráfica na Figura 6. Nota-se a alta
porcentagem dos participantes que relata trabalhar sempre com recrutamento e
seleção (85%) e com uma certa freqüência em treinamento, desenvolvimento e
comportamento organizacional. Esse perfil é condizente com a descrição das
práticas dos psicólogos da área feita por Zanelli (2002) e Figueiredo (1989).
Tabela 1: Tipo de prática que desenvolve na organização
18,3% 21,7% 13,3% 6,7% 40,0%
11,7% 20,0% 16,7% 6,7% 45,0%
0% 27,1% 27,1% 23,7% 22,0%
13,6% 50,8% 11,9% 13,6% 10,2%
25,9% 32,8% 12,1% 13,8% 15,5%
3,4% 25,4% 22,0% 23,7% 25,4%
33,3% 31,7% 16,7% 10,0% 8,3%
18,6% 30,5% 23,7% 15,3% 11,9%
5,0% 23,3% 23,3% 15,0% 33,3%
50,0% 28,3% 10,0% 8,3% 3,3%
Recrutamento
Seleção
Treinamento
Avaliação de Desempenho
Promoção da saúde do trabalhador
Desenvolvimento organizacional
Aconselhamento de carreira
Programa de Qualidade de vida no trabalho
Comportamento organizacional
Relações trabalhistas
Nunca
De vez em
quando
Frequentemente
Quase
sempre
Sempre
Figura 6: Distribuição das respostas quanto à freqüência com que realizam diversas atividades
no trabalho.
97
No que se refere à freqüência com que executam atividades voltadas para a
saúde do trabalhador, 58,7% dos entrevistados ou não realizam tais atividades
(25,9%) ou as realizam apenas esporadicamente (32,8%), o que, novamente, está
de acordo com o perfil descrito por Zanelli (2002). Segundo o autor, a restritividade
das práticas pode estar relacionada a falhas na formação acadêmica, falta de
motivação pessoal do psicólogo, ausência de aparato teórico-metodológico de base,
cultura do grupo de profissionais da categoria, falta de competência técnica e visão
excessivamente empresarial.
Computou-se o número de práticas desenvolvidas e verificou-se que, dentre
as 10 atividades citadas no questionário (recrutamento, seleção, treinamento,
avaliação de desempenho, promoção da saúde do trabalhador, desenvolvimento
organizacional, aconselhamento de carreira, programa de qualidade de vida no
trabalho, comportamento organizacional e relações trabalhistas), 40% dos
respondentes exercem entre 8 ou 9 delas e 31.7% informaram executar todas as 10
atividades citadas. Esses dados possibilitam inferir uma diversificação de atividades,
sem que haja um maior enfoque na saúde do trabalhador, pois apenas 15,5% dos
respondentes desenvolvem assiduamente essa prática em seu trabalho.
4.2.3. A Inclusão da Saúde do Trabalhador
96,6% dos entrevistados concordam com a afirmação de que a Psicologia
auxilia na promoção da saúde do trabalhador, sendo que 53,3% concordam
plenamente e 43,3% apenas concordam. 3,4% se posicionaram como indiferentes
em relação à questão ou discordaram da assertiva. Assim, apesar de terem relatado
não exercerem práticas voltadas à saúde do trabalhador com freqüência,
98
reconhecem a importância da contribuição da Psicologia nessa esfera. Além disso,
95% dos pesquisados acreditam haver relação entre trabalho e o processo de
saúde/doença.
A relação entre o nível de titulação do pesquisado e sua opinião sobre se o
psicólogo do trabalho contribui para a manutenção da saúde no trabalho mostrou
diferenças estatisticamente significativas, como mostra a Figura 7. Dos psicólogos
que têm o nível de graduação, 66,7% concordam plenamente que este profissional
contribui para a manutenção da saúde. Dos que têm grau de especialista, 51,3%
concordam plenamente. Dos mestres, 42,9% acreditam que o psicólogo contribui
para a manutenção da saúde no trabalho. Pode-se inferir que quanto maior a
titulação, menor é a percepção da contribuição dada pelo psicólogo para a
manutenção da saúde no trabalho (χ².= 60; p = 0,001). Isto pode estar relacionado
ao fato de que quanto mais qualificados os psicólogos, maior o acesso destes a
leituras, artigos e reflexões que permitem uma apreensão mais crítica sobre a
realidade, além de uma consciência ético-política mais acentuada.
Foi solicitado aos psicólogos que se posicionassem sobre como observam a
relação trabalho e processo de saúde/doença no seu cotidiano por meio da
concordância ou discordância de sentenças quanto a refletirem sua prática
profissional. Cada sentença corresponde a uma concepção distinta sobre a natureza
da relação trabalho e o processo de saúde/adoecimento, conforme mostra o Quadro
2.
99
100,0% 0,0%0,0%0,0%
57,1% 42,9%
2,6% 46,2% 51,3%
33,3% 66,7%
Graduão
Especializão
Mestrado
Doutorado
Discordo totalmente Discordo Indiferente Concordo Concordo plenamente
Figura 7: Cruzamento das questões titulação e opinião sobre se o psicólogo contribui para a
manutenção da saúde no trabalho.
Quadro 2: Concepções sobre a relação trabalho e o processo de saúde/adoecimento
O processo de saúde/doença está associado a determinados
sintomas e comportamentos de ordem individual, e o trabalho, bem
como outras instâncias da vida do sujeito, pode eventualmente atuar
como cenário para a emergência de patologias, cuja
descompensação depende exclusivamente da estrutura do sujeito.
Desse modo, considero que pouca ou nenhuma relação entre
esses conceitos.
Modelo
biomédico
O processo saúde/doença é processo dinâmico, sendo influenciado
pelo contexto social e pelas condições e relações de trabalho. O
trabalho se apresenta como um fator que interage com uma
constituição individual préexistente, de modo que este trabalho é um
elemento desencadeante no processo de saúde/doença. Nessa
perspectiva, concebo a existê
ncia de uma relação indireta entre
esses conceitos.
Psicodinâmica
do trabalho
O processo saúde/doença é socialmente determinado, de modo que
o trabalho consiste em um elemento altamente significativo da
existência humana, constitutivo do psiquismo e do processo
saúde/doença e consideram, desse modo, a existência de uma
relação direta entre a condição de trabalho e o surgimento, a
freqüência e a gravidade das doenças.
Psicologia
Social/
Epidemiológico
55,2% verificam, em sua prática, uma relação entre trabalho e saúde pautada
na visão da Psicologia Social. 43,3% dos pesquisados concebem o processo
100
saúde/doença dentro do viés da psicodinâmica do trabalho e apenas 1 entrevistado
(1,7%) concorda com a perspectiva do modelo biomédico. A constatação de maior
percentual de pesquisados que observam as interações entre trabalho e saúde, a
partir do modelo da Psicologia Social e da Psicodinâmica do Trabalho, denota o
enveredamento para uma compreensão mais integral do sujeito, considerando sua
totalidade histórica e social. Portanto, apesar da pouca atuação, os entrevistados
reconhecem a relação entre saúde e trabalho.
Sobre a realização de práticas voltadas para a promoção da saúde e
prevenção do adoecimento no trabalho, 56,7% relatam realizar atividades voltadas
para este objetivo, o que contrasta com os 74% que afirmaram, inicialmente, realizar
práticas de promoção da saúde do trabalhador.
Assim, contrariamente ao que afirmam alguns pesquisadores (González-Rey,
2004; Ruiz, 1999; Zanelli, 2002), os psicólogos acreditam haver uma relação entre
trabalho e saúde, apesar de não exercerem uma prática consistente nesse sentido.
O modelo biomédico como matriz explicativa dessa relação foi o escolhido com
menor freqüência, denotando a atualização e conhecimento dos psicólogos quanto
às teorias mais aceitas na área.
Talvez a ausência de conteúdos essenciais a uma formação direcionada para
a Psicologia do Trabalho, como as informações relativas à saúde mental no trabalho,
como sugere Zanelli (2002), tornem a atuação mais restritiva, mas os entrevistados
demonstram conhecer os principais fundamentos e um pouco mais da metade deles
exerce atividades relacionadas à promoção e prevenção da saúde.
101
46,7% dos entrevistados mencionaram, espontaneamente, o seu tipo de
atuação na saúde do trabalhador. As respostas fornecidas foram organizadas por
categorias e, em seguida, foram calculadas as freqüências e porcentagens de cada
categoria. Foram discriminadas 3 grandes categorias, como mostra o Quadro 3. A
Tabela 2 mostra a respectiva freqüência de respostas em cada uma das categorias.
Quadro 3: Categorias das atividades realizadas para promoção da saúde e prevenção do
adoecimento no trabalho.
CATEGORIA RESPOSTAS
Atividades
corretivas
Atendimento individual de pessoas com queixas de sofrimento relacionado
ao trabalho.
Acompanhamento médico e acompanhamento nutricional.
Aconselhamento de funcionários, encaminhamento a psicólogos clínicos.
Grupo de apoio ao dependente químico, grupo de trabalho do
absenteísmo.
Atividades
preventivas
Ações conjuntas com a CIPA.
Acompanhamento da prática e atuação dos lideres minimizando os fatores
desencadeantes identificados previamente em pesquisas, entrevistas ou
conversas com colaboradores.
Grupos de encontro para conscientização dos alunos, trabalhadores,
empresários, lideres sobre a prevenção de doenças no trabalho.
Espécie de roda viva, onde em grupo elencamos as principais doenças que
a mídia apresenta e discutimos as suas origens e como se livrar delas (sua
prevenção).
Facilitação de processos ligados à gestão de pessoas, de mudanças,
estratégica.
Levando a uma reflexão sobre os diversos modelos administrativos que
constituem uma cultura organizacional (poder, falta de liderança nos grupos,
desvalorização do fundo de criatividade presente nas operações entre os
indivíduos).
Práticas de exercícios laborais, acompanhados com o objetivo de
prevenção das doenças do trabalho, bem como favorece a saúde do corpo e
mente; programas motivacionais com o objetivo de melhoria da
produtividade, ambiente e relações interpessoais e esporte.
Programa de qualidade de vida - análise ergonômica, ginástica laboral.
Combate ao stress, trabalho com os líderes, pois suas práticas afetam
diretamente os colaboradores.
Projetos de motivação e melhoria de benefícios.
102
Semana da saúde, grupos de discussão, pesquisa, análise de situações.
Atividades
educativas
Aulas (graduação e pós-graduação), consultoria, treinamentos (fechados
ou abertos), grupos de encontro para conscientização dos alunos,
trabalhadores, empresários, lideres sobre a prevenção de doenças no
trabalho.
Oficinas de saúde ocupacional.
Palestras ao trabalhador sobre QVT, estresse, sobre saúde da mulher,
prevenção contra drogas e tabagismo, cuidados com a postura no trabalho.
Atividades Educativas conjuntas com a CIPA.
Promoção de palestras com profissionais da saúde.
Treinamentos internos de desenvolvimento humano, cursos de relações
humanas, oficinas, grupos de discussão.
Tabela 2: Freqüência e porcentagem das categorias do tipo de atividades realizadas para
prevenir o adoecimento no trabalho.
Categoria Freqüência Porcentagem (%)
Atividades corretivas
4 14.3
Atividades preventivas
25 89.3
Atividades educativas
15 53.6
Além disso, dos 55% de entrevistados que mencionaram as práticas que
realizam, 90,9% afirmaram desenvolver essas práticas freqüentemente, quase
sempre ou sempre.
Sobre o caráter das ações realizadas em saúde do trabalhador, 64,7% dos
psicólogos consideram esse tipo de atividade como um processo, que deve ser
realizado de maneira contínua, rotineira e sistemática na organização, o que mostra
que os profissionais possuem uma visão mais ampliada da necessidade e
importância desse tipo de prática. Além disso, a maioria (76,5%) acredita ser um
trabalho preventivo.
103
Segundo Kyrillos Neto (1997), a promoção de saúde no trabalho exige do
psicólogo uma visão crítica e global dos processos organizacionais, que possibilite
construir espaços de diálogo, a fim de promover a criação de um ambiente favorável
à produtividade e ao bem-estar dos trabalhadores. Dessa forma, o psicólogo do
trabalho deve atuar dentro de uma perspectiva preventiva em saúde, a partir de
diagnósticos e intervenções que venham a impedir a ocorrência de adoecimento
decorrente da atividade laboral.
Em relação à modalidade mais utilizada pelos psicólogos na promoção da
saúde no trabalho, verifica-se que a maioria (82%) utiliza a modalidade grupal, o que
corrobora o proposto por Mendes (2003), que aponta a importância de serem
viabilizadas sessões de discussão e grupos focais com os membros da organização,
a fim de explicitar e resolver conflitos entre as forças contraditórias e de intervenções
nos diversos grupos ocupacionais, facilitando mudanças de atitudes e percepção
sobre o trabalho. Apenas 12% dos psicólogos revelaram realizar atividades de
prevenção de modo individual, o que nos leva a conjecturar sobre a possibilidade
desse tipo de atividade ser exercida por psicólogos que atuam dentro de uma
perspectiva corretiva, intervindo de modo particularizado quando o agravo à saúde é
deflagrado. Dos 28 psicólogos que afirmaram atuar na modalidade grupal, 29%
realizam oficinas, 21% grupos de educação em saúde, 14% grupos de encontro e
11% realizam grupos de apoio.
Sobre a realização de um trabalho integrado e interdisciplinar voltado para a
saúde do trabalhador, 64,7% dos pesquisados informaram que realizam trabalho em
conjunto com outros profissionais da empresa. Zanelli (2002) expõe que, para que
haja o engajamento e a participação em equipes multiprofisssionais, é necessário,
104
primeiramente, que o psicólogo possua uma visão ampliada e habilidades para
identificar os vários aspectos da realidade que não se restrinjam ao campo da
psicologia. É fundamental também que o psicólogo conheça conceitos, fundamentos
e linguagens das outras áreas de atuação paralelas ao seu campo de atividade e
que tenha habilidade e capacidade de diálogo com essas áreas. Essa preparação
para a interdisciplinaridade é relegada na formação acadêmica, que se limita a
conteúdos restritos ao campo da Psicologia e que pouco enfatiza a interlocução com
as demais áreas profissionais.
Dos 35 entrevistados que responderam à questão sobre o estabelecimento de
parcerias com algum tipo de instituição para a otimização de ações voltadas para a
promoção da saúde laboral, 51,4% deles afirmaram fazer parcerias. Foram citadas
parcerias com o CEREST (Centro de Referência de Saúde do Trabalhador), SESI
(Serviço Social da Indústria), DRT (Delegacia Regional do Trabalho) e empresas
privadas de programas de saúde e segurança no trabalho. Não foram citadas
parcerias com SENAC, CAPS, INSS, sindicatos dos trabalhadores e ministério
público. A ausência de parceria com instituições tais como o CAPS (Centro de
Atenção Psicossocial) faz refletir sobre a insipiência desse tipo de articulação,
fundamental para a promoção de um suporte efetivo ao trabalhador. Este quadro
leva também a refletir sobre as possíveis causas da quase inexistência de parcerias,
que pode ser atribuída à falta de informação dos psicólogos, à falta de capacidade
de articulação ou, até mesmo, ao desinteresse dos profissionais.
Na questão: Em seu trabalho, você desenvolve alguma ação voltada para os
trabalhadores que apresentam algum dano físico ou psicossocial relacionado ao
trabalho?, 33,3 % dos psicólogos responderam negativamente. Embora não sejam
105
maioria, esse percentual é expressivo e leva a pensar que a negligência pode estar
relacionada ao fato da Psicologia ter entrado no contexto do trabalho, adotando uma
lógica em que processos de trabalho não eram analisados considerando o
sofrimento gerado nos trabalhadores (Nardi, 1996). Ao longo da história da
Psicologia aplicada ao trabalho, não houve o fortalecimento de uma visão que
possibilite ler e compreender os elos entre o trabalho e os processos de
saúde/doença. Os trabalhadores, mentalmente ou fisicamente adoecidos, não são
alvos de ações corretivas e reparadoras, não recebem ajuda ou assistência por parte
da empresa e ainda são avaliados em sua capacidade ou incapacidade para
produzir e têm que arcar sozinhos com os danos sofridos e carregar consigo as
marcas geradas pelo próprio trabalho.
4.2.4. A Formação
Em relação à formação dos investigados no campo da saúde do trabalhador,
60% revelaram possuir capacitação específica na área. Dos psicólogos que relatam
ter capacitação (n=36), 41,7% afirmam que a capacitação foi obtida através de
cursos de curta duração, 25% através de cursos de especialização, 19,4% em
disciplinas do curso de graduação e 14,3% por meio da realização de mestrado. O
doutorado não foi citado como fonte de capacitação na área por nenhum dos
respondentes.
O fato de a predominância da capacitação específica em saúde do
trabalhador ter sido obtida através de cursos de curta duração, (41,7%) ajudam a
compreender uma das possíveis razões para o elevado percentual de psicólogos que
106
não desenvolvem, de forma sistemática e competente, atividades de promoção da
saúde do trabalho. Na medida em que cursos de pequena carga horária possibitam
apenas a aquisição de conhecimentos genéricos e superficiais, estes não viabilizam
a aquisição de um cabedal de conhecimentos suficiente para uma atuação
condizente com as demandas do mercado.
Quanto à suficiência do nível de conhecimento em saúde do trabalhador do
psicólogo para a prática do trabalho, 26,3% dos psicólogos consideram seus
conhecimentos suficientes para atuação na área. A maioria (73.7%), porém, não
avalia seu conhecimento como adequado para atuar na área.
Quanto às principais dificuldades encontradas pelos psicólogos para ampliar a
sua atuação no âmbito da saúde, 59,3% (n=35) creditam como principal obstáculo a
visão empresarial; 15,3% (n=9) à cultura da categoria; 10,2% (n=6) à ausência de
aparato teórico-metodológico de base. As respostas restantes se dividiram entre a
falta de competência técnica dos psicólogos do trabalho; falhas na formação
acadêmica e falta de motivação pessoal do psicólogo, como mostra a Figura 8.
Figura 8: Distruição das respostas à questão: Quais as principais dificuldades encontradas
pelos psicólogos para ampliar sua atuação na área da saúde do trabalhador.
107
54% consideram a formação regular para a atuação no âmbito da saúde do
trabalhador; 17% boa e o mesmo percentual considera-na ruim; 12% como péssima.
Nenhum dos entrevistados considera a formação ótima ou excelente (Figura 9).
12%
17%
54%
17%
Péssima
Ruim
Regular
Boa
Figura 9: Distruição das respostas à questão: Como você avalia a formação acadêmica em
psicologia para a atuação na área da sáude do trabalhador?
A formação acadêmica em Psicologia é uma questão que merece destaque,
pois, segundo Zanelli (2002), ela é deficiente e tecnicista, baseada em conteúdos
restritos e desatualizados, que não contemplam os subsídios teóricos e práticos
necessários para uma atuação competente. A categoria trabalho é pouco enfatizada
e insuficiência no fornecimento de temas voltados para a saúde mental no
trabalho. As falhas na formação contribuem para a inserção de profissionais
despreparados para atuarem como agentes de mudanças e como promotores de
melhores condições de vida no contexto laboral e a maioria sabe disso, tanto que
avaliam a formação como apenas regular.
Com relação à questão aberta Em sua opinião, como o psicólogo pode
contribuir para a promoção da saúde e prevenção do adoecimento no trabalho? 80%
dos entrevistados responderam. As respostas obtidas foram organizadas por
108
categorias. Nesse caso, foram discriminadas 9 categorias, apresentadas no Quadro
4.
Quadro 4: Categorias e respostas sobre como o psicólogo pode contribuir para a promoção da
saúde no trabalho.
CATEGORIAS RESPOSTAS
Ações de
conscientização/sensibili-
zação
Conscientizar trabalhadores sobre seus direitos e a
importância de cuidar da saúde.
Conscientizando as pessoas da importância da saúde
do trabalhador.
Ações preventivas
Atuar em campanhas de prevenção de doenças.
Promovendo na organização uma cultura voltada para o
bem-estar do trabalhador nos âmbitos: social, psicológico
e biológico, através de práticas que busquem a qualidade
de vida no trabalho, promovendo, assim, a saúde do
mesmo.
Divulgando e refletindo com os trabalhadores e
empresários de áreas específicas sobre riscos á saúde do
trabalhador.
Elaboração e desenvol. de
projetos
Elaboração de programas de qualidade de vida no
trabalho.
Procurando desenvolver projetos voltados para a saúde
do trabalhador.
Elaborando projetos que tenham como objetivo levar ao
trabalhador conhecimento, técnicas, proporcionando
momentos no fazer profissional que possibilitem a
promoção da saúde e uma reflexão sobre o adoecer no
trabalho.
Elaborar projetos estratégicos que visem à superação
dos fatores envolvidos na dialética entre o indivíduo e seu
trabalho que podem estar ocasionando doenças
Parceria com equipe
multiprofissional
Interagindo com diversos órgãos, acessando a equipe
multidisciplinar.
Com parcerias de especialistas na área de saúde.
Trabalhar em conjunto com outros profissionais,
engenheiros, médicos, fisioterapeutas.
Postura ética-política
Deixar de ser um profissional administrativo que visa
números e passam a ser um profissional que prima pela
subjetividade e bem-estar do funcionário.
109
Sendo um mediador entre empresários e funcionários
em busca de uma melhor qualidade de vida no trabalho.
Tomando a saúde do trabalhador como foco e
assumindo postura ética-política compatível.
O psicólogo precisa estar ligado à direção da empresa e
esta acreditar na importância de promover saúde no
trabalho e até mesmo quantificar as perdas financeiras
que o empresário teria não atentando para essas
questões.
Mediando as questões de conflito existentes no
ambiente de trabalho.
Ações educativas
Distribuição de cartilhas e outros materiais com estórias
e esclarecimentos sobre questões de saúde.
Campanhas educativas tanto para empregados como
para empregadores.
Com cursos de capacitação/formação profissional,
primeiramente. Promovendo curso preventivo na área da
saúde no trabalho, desde workshops, encontros
psicoterápicos, biodança etc.
Ações corretivas
Realizar aconselhamento psicológico.
Realizar encaminhamento para atendimentos.
Apreender e aprender a realidade em que está inserido,
através de vivências grupais, jogos, dramatizações, a fim
de promover espaços catárticos que dêem vazão aos
afetos.
Capacitação técnica
Atualizando-se com a temática.
Especializando-se na área
Apresentando qualificação técnica para atuação.
Atuando como foi ensinado na graduação,
questionando, sugerindo, mostrando possibilidades,
relacionando a promoção da saúde do trabalhador com o
aumento da produtividade, de forma matemática, se fosse
o caso.
Estando preparado teoricamente para as interfaces do
trabalho na saúde do trabalhador, ou seja, se capacitando
mais para entender os aspectos impactantes que o
trabalho exerce sobre o psiquismo humano.
Desenvolvendo trabalhos que associam o aprendizado
voltado para atuação em clínica com adequações à
realidade organizacional, aspectos que deveriam ser
considerados durante a formação universitária.
Ações de
Levantando necessidades, diagnosticando o que pode
ser feito.
110
pesquisa/Diagnóstico
Com pesquisas que ajudem a descobrir fatores de
adoecimento.
Fazendo pesquisas internas.
Avaliar recursos materiais, estrutura hierárquica, nível
de satisfação.
Pesquisando os fatores envolvidos na dialética entre o
indivíduo e seu trabalho que podem estar ocasionando
doenças.
Realizando pesquisas de clima e satisfação para que
seja possível diagnosticar pontos de vista e receber
sugestões; monitorando resultados da empresa e os
contrapondo com dados que acompanhem a saúde do
trabalhador.
Montar pequenos diagnósticos de fatores promotores de
saúde e dificuldades em determinados locais de trabalho
Tabela 3: Freqüência e porcentagem das categorias sobre como o psicólogo pode contribuir na
promoção da saúde e prevenção do adoecimento no trabalho.
Categoria Freqüência Porcentagem (%)
Ações de
conscientização/Sensibilização
16 26,7
Ações preventivas
18 30,0
Elaboração e desenvolvimento de
projetos
22 36,7
Parceria com equipe multiprofissional
9 15,0
Postura ética-política
5 8,3
Ações educativas
11 18,3
Ações corretivas
11 18,3
Capacitação técnica
07 11,7
Ações de pesquisa/ Diagnóstico
11 18,3
111
112
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta dissertação teve por objetivo discutir aspectos relacionados às práticas
dos psicólogos que atuam no mundo do trabalho e das organizações por meio de
uma investigação de cunho quali-quantitativo.
O discurso dos psicólogos mostra sua insatisfação com a formação
acadêmica para atuação na Psicologia do Trabalho. Essa formação é considerada
restrita e insuficiente. Os conteúdos são tidos como limitados, generalistas,
desvinculados do contexto de trabalho e centrados no viés clínico, de modo que
fornecem pouca compreensão dessa área de atuação da psicologia. Os pesquisados
relatam que a restritividade na formação dos profissionais para atuação na área do
trabalho não envolve apenas o nível de graduação, mas também os programas de
pós-graduação.
Apesar disso, observam a existência de uma relação direta entre trabalho e o
processo de saúde-adoecimento, ou seja, a existência de uma implicação direta da
atividade laboral no bem-estar dos sujeitos, podendo o trabalho atuar como agente
promotor de saúde mas também de sofrimento e adoecimento físico e mental.
Assinalam que elementos relacionados com o contexto particular dos sujeitos
podem repercutir na sua saúde, e o trabalho pode ser apenas o palco para a
emergência de patologias pré-existentes, ou, ainda, atuar como elemento
desencadeador de uma condição anterior.
Quanto à visão dos entrevistados sobre a prática do psicólogo do trabalho,
afirmam que não um modelo unificado de atuação, que a forma como atuam é
113
orientada por concepções de ordem pessoal e construída de acordo com a vivência
individual do profissional.
Apesar da inexistência de uma convergência na atuação, uniformidade no
discurso no que diz respeito à preocupação contínua que os pesquisados revelam
com a produtividade e com a lucratividade da empresa, aspectos que parecem
nortear o planejamento e a realização das suas ações, de modo tal que a promoção
de saúde não aparece como prioritária.
Sobre as razões da restritividade de suas práticas no âmbito da saúde do
trabalhador, os pesquisados apontam várias justificativas, tais como a falta de visão
sistêmica, a visão do empresariado, a falta de visão, falhas no gerenciamento da sua
rotina, desarticulação da categoria, acomodação, a falta de benchmarking, entre
outras. Apontam como condições favorecedoras da ampliação da atuação a
necessidade de desenvolver uma articulação com profissionais e o incremento da
formação em nível de graduação e pós-graduação.
As intervenções em saúde do trabalhador se fazem presentes no discurso dos
entrevistados por meio de ações de encaminhamento dos trabalhadores para
profissionais ou instituições fora da empresa, cujo foco da atenção é a saúde física.
Este aspecto apresenta-se como uma grande contradição e denota a visão limitada
que o profissional de Psicologia tem sobre a saúde humana e que é expresso
através da utilização de ações pontuais, isoladas e ineficazes na sua tarefa de
contribuir para a minimização do sofrimento humano no trabalho.
A análise dos questionários mostrou e reforçou o quadro fornecido pelas
entrevistas: um pouco mais da metade dos pesquisados (56,7%) realizam atividades
voltadas para a promoção da saúde, apesar da grande maioria (96,6%) dos
114
pesquisados acreditar que a psicologia auxilia na promoção da saúde do
trabalhador.
Apenas cerca da metade dos entrevistados (60%) possuem capacitação
específica para o trabalho na área e essa capacitação foi obtida em cursos de curta
duração e de especialização. Poucos (14,3%) disseram ter cursado mestrados e o
doutorado não foi citado como fonte de capacitação na área por nenhum dos
respondentes. Por outro lado, os psicólogos se mostraram cientes da insuficiência de
conhecimentos em saúde do trabalhador e avaliaram seu conhecimento como
inadequado para atuar na área.
Quanto às principais dificuldades encontradas pelos psicólogos para ampliar a
sua atuação no âmbito da saúde, a maior parte (59,3%) acredita que a visão
empresarial é o principal obstáculo.
Os resultados obtidos através das entrevistas e dos questionários
demonstram que o psicólogo não tem a saúde do trabalhador como prioridade na
sua atuação profissional. Mobilizados pelas mudanças no contexto laboral atual, os
profissionais ainda ensaiam suas primeiras aproximações com a temática,
desprovidos de qualquer aparato conceitual que responda a suas indagações.
Revelam ter noções vagas sobre a importância dessa temática e se mostram
inseguros em suas colocações. O tema saúde do trabalhador parece obscuro para
esses técnicos que não foram capacitados para realizar uma leitura crítica sobre a
questão. Desta forma, as ações desenvolvidas na área se mostraram escassas e
insipientes.
Um aspecto importante é que muitas ações voltadas para promoção da saúde
do trabalhador foram sugeridas pelos psicólogos nos questionários, mas tais
115
atividades não foram evidenciadas nas entrevistas. Nenhum dos entrevistados
relatou, de maneira consistente, a realização de atividades voltadas para a promoção
da saúde do trabalhador. Os psicólogos parecem ter noção do que poderiam fazer
em prol dos trabalhadores, mas não colocam em prática o que possuem
conceitualmente. Esta incoerência entre discurso e ação revelou-se um traço
presente em praticamente todo o material coletado.
Uma série de fatores contribui para a configuração atual desse quadro. A
formação foi apontada nos questionários e nas entrevistas como insuficiente na
disseminação de conteúdos ligados à saúde mental no trabalho. Outros aspectos
verificados referem-se à acomodação dos profissionais da área, à ideologia
dominante, à falta de capacitação e de articulação da categoria para viabilizar troca
de informações e conhecimentos.
O que se observa é que os psicólogos do trabalho se posicionam como
parceiros da organização e constroem sua identidade profissional a partir das
diretrizes impostas pelos detentores do capital, tomando como se fossem seus os
interesses hegemônicos. Trata-se ainda do mesmo posicionamento verificado nos
primórdios deste campo, quando a Psicologia do Trabalho se insere, no Brasil, num
contexto de industrialização crescente em que a preocupação com a maximização
da produção era central. Em certa medida, os psicólogos continuam com as mesmas
preocupações que, em outras condições históricas, demandaram o surgimento do
seu fazer, de modo que a preocupação com aspectos voltados para a relação entre
saúde e trabalho ainda permanecem alheios a esse campo.
Os psicólogos que trabalham nas organizações não diagnosticam fatores
ligados ao adoecimento no trabalho, apenas tentam prevenir de maneira genérica os
116
problemas de saúde ou os tratam quando chegam até ele. Um pouco mais da
metade (56,7%) realizam práticas que tenham como intuito promover a saúde dos
trabalhadores e, desses, 23,5% realizam trabalho de cunho corretivo, no intuito de
reparar ou minimizar os problemas e abalos à saúde já causados pelo trabalho.
Diante deste quadro, os próprios profissionais revelam, nos seus
depoimentos, que se consideram distantes de um modelo de atuação focado no
bem-estar e na saúde do trabalhador. Sua prioridade é o alcance dos resultados
empresariais que são tomados como indicadores do cumprimento de sua missão
enquanto psicólogos do trabalho.
A partir do exposto, o questionamento que pode ser feito é se os psicólogos
estão fazendo o que deveriam para promover a saúde dos trabalhadores: a serviço
de quem estão suas práticas?
O psicólogo que atua no mundo do trabalho obedece ao juramento de atuar
visando a saúde e a qualidade de vida dos trabalhadores. Desse modo, o
profissional deveria buscar, por meio de suas práticas, promover a saúde física e
mental dos trabalhadores, desenvolvendo atividades que minimizem o sofrimento e
promovam o seu bem-estar. Mas os resultados da pesquisa indicaram exatamente o
oposto: os psicólogos participantes, na sua grande maioria, pautam sua prática nos
interesses da empresa, visando, principalmente, a produtividade, o negócio.
Como assinala Zanelli (2002), os psicólogos deveriam evitar atuar como
objeto de esvaziamento de seu próprio fazer, contribuindo para o descrédito e a
desvalorização social da categoria. Ao contrário, cabe a este profissional tomar para
si o desafio de desconstruir o preconceito e a aversão que a psicologia
organizacional carrega, através de uma atuação embasada, competente e
117
socialmente relevante, que aqui se traduz como uma psicologia voltada para a
promoção da saúde do trabalhador.
A partir dos resultados deste trabalho, pode-se sugerir alguns temas a serem
aprofundados e investigados, tais como a realização de pesquisas com a
participação dos trabalhadores ou de outros profissionais da empresa que interagem
com o psicólogo em seu trabalho.
Um outro aspecto importante, não abordado neste trabalho, é a atuação do
psicólogo nas organizações como consultor. A investigação da prática desses
profissionais poderia complementar os resultados obtidos aqui, promovendo uma
fotografia mais ampla da atuação do psicólogo organizacional.
118
6. REFERÊNCIAS
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Seligmann-Silva, E. (1994). Desgaste Mental no Trabalho Dominado. Rio de Janeiro:
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Silva, C. D, P. & Merlo, A. C (2002). Prazer e sofrimento de psicólogos no trabalho de
empresas privadas. Psicologia Ciência e Profissão, 27 (1), pp.132-147.
Spector, P. (2006). Psicologia nas Organizações. São Paulo: Saraiva.
Spink, M. J. P. (1993). O conceito de representação social na abordagem psicossocial.
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Campos (org.), Psicologia e Saúde: Repensando Práticas. São Paulo: Hucitec.
123
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Crítico. Petrópolis: Vozes.
Traverso-Yépes, M. A. (2002). Trabalho e saúde: subjetividades em um contexto de
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Tupinambá, A. C. R. (1987). A psicologia organizacional no Brasil: sua evolução e
situação atual. Revista de Psicologia da UFC, 5 (2): 95-104.
Venturi, E. P. C. (1996). Atuação do psicólogo organizacional em Curitiba. Psicologia
Argumento, 15 (6), 31-48.
Zanelli, J. C. (1994 a). O Psicólogo nas Organizações de Trabalho: Formação e
Atividades Profissionais. Florianópolis: Paralelo 27.
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nas organizações de trabalho: Implicações para a formação. In R. Achcar (Org.),
Psicólogo Brasileiro: Práticas Emergentes e Desafios para a Formação. São
Paulo: Casa do Psicólogo.
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Artmed.
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organizações e trabalho. In J. C. Zanelli; J. E. Borges-Andrade. & A. V. B. Bastos,
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil. Porto Alegre: Artmed.
124
ANEXO 1
QUESTIONÁRIO
125
Prezado (a) Psicólogo (a):
Esta pesquisa faz parte de um estudo de pós-graduação stricto
sensu (mestrado) e tem por finalidade investigar a prática dos psicólogos
que atuam na área organizacional e do trabalho. Conto com a sua
colaboração para preencher o questionário abaixo.
Gostaria de ressaltar que a participação nesse estudo é voluntária e,
se você decidir não participar ou quiser desistir de continuar em qualquer
momento, tem absoluta liberdade de fazê-lo.
Serão omitidas todas as informações que permitam identificá-lo(a).
Na divulgação dos resultados desta pesquisa, sua identidade será mantida
no mais rigoroso sigilo.
Participando da pesquisa, você contribuirá para a compreensão do
fenômeno estudado e para a produção de conhecimento científico.
1-Tipo de Organização:
( ) 1. Pública
( ) 2. Privada
2- Ramo de organização que trabalha atualmente:
( ) 1. Transporte urbano ( ) 6. Comércio
( ) 2. Bancário ( ) 7. Serviço de saúde
( ) 3. Informática ( ) 8. Indústria
( ) 4. Serviço ( ) 9. Construção civil
( ) 5. Turismo ( ) 10. Outro(s) 10.1. Especifique__________
3- Sexo:
( ) 1. Masculino
( ) 2. Feminino
4-Idade:
_____ANOS _____ MESES
5- Tempo de formado em Psicologia:
____ANOS
126
6- Tempo de atuação na área da Psicologia organizacional e do trabalho:
_____ANOS ____ MESES
7-Titulação:
( ) 1. Graduação
( ) 2. Especialista
( ) 3. Mestrado
( ) 4. Doutorado
8-Que tipo de atividades você desenvolve na sua prática profissional? Responda com
que freqüência exerce tais ações: Obs.: Marque mais de uma opção, caso trabalhe
com mais de um tipo de atividade.
Recrutamento
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Seleção
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Treinamento
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Avaliação de Desempenho
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Promoção da saúde do trabalhador (avaliação de posto e rotinas de trabalho,
segurança do trabalho, treinamentos em segurança e saúde no trabalho etc)
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Desenvolvimento organizacional (cultura, clima, conflitos, poder, relações humanas)
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Aconselhamento de carreira
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
127
Programa de Qualidade de vida no trabalho
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Comportamento organizacional (grupos, liderança, comprometimento, comunicação)
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqü
entemente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
Relações trabalhistas
( ) 1.Nunca ( )2.De vez em quando ( )3.Freqüen
temente ( )4.Quase sempre
( )5.Sempre
9- Avalie o seu grau de concordância em relação à seguinte afirmação:
O psicólogo organizacional e do trabalho contribui para a manutenção
da saúde no trabalho.
( ) 1. Discordo totalmente
( ) 2. Discordo
( ) 3. Indiferente
( ) 4. Concordo
( ) 5. Concordo plenamente
10- Como você avalia a relação entre trabalho e
processo de
saúde/doença?
( ) 1. Nenhuma relação
( ) 2. Pouca relação
( ) 3. Muita relação
11-Ainda sobre a relação entre trabalho e
processo de saúde/doença,
assinale o que considera verdadeiro em sua prática:
( ) 1.
O processo de saúde/doença está associado a determinados sintomas e
comportamentos de ordem individual e o trabalho, bem como outras
instâncias da
vida do sujeito, pode eventualmente atuar como cenário para a emergência de
patologias, cuja descompensação depende exclusivamente da estrutura do sujeito.
Desse modo, considero que há pouca ou nenhuma relação entre esses conceitos.
( ) 2.
O processo saúde/doença é processo dinâmico, sendo influenciado pelo
128
contexto social e pelas condições e relações de trabalho. O trabalho se apresenta
como um fator que interage com uma constituição individual pré
existente, de modo
que este trabalho é um
elemento desencadeante no processo de saúde/doença.
Nessa perspectiva, concebo a existê
ncia de uma relação indireta entre esses
conceitos.
( ) 3.
O processo saúde/doença é socialmente determinado, de modo que o
trabalho consiste em um elemento altamen
te significativo da existência humana,
constitutivo do psiquismo e do processo saúde/doença. Dessa forma, considero a
existência de uma relação direta entre a condição de trabalho e o surgimento, a
freqüência e a gravidade das doenças.
12.a - Você desenvolve algum tipo de prática voltada para a promoção da
saúde e prevenção do adoecimento no trabalho?
( ) 1. Não
( ) 2. Sim
Se respondeu Não a esta questão, pule para a questão 20.
12.b - Se SIM, qual(is)?
Especifique:_______________________________________
13- Com que freqüência você realiza as práticas voltadas para a promoção
da saúde e prevenção do adoecimento no trabalho, relacionadas acima?
( ) 1. Nunca
( ) 2. De vez em quando
( ) 3. Freqüentemente
( ) 4. Quase sempre
( ) 5. Sempre
129
14- O trabalho que você realiza na área de saúde do trabalhador é visto
como um processo por você e sua empresa ou é apenas como um
trabalho eventual?
( ) 1. Processo
( ) 2. Eventual
15- Em sua opinião, o trabalho que você realiza nessa área possui um
caráter:
( ) 1. Preventivo
( ) 2. Corretivo
16.a -
Assinale a modalidade de intervenção em promoção de saúde e
prevenção do adoecimento no trabalho que você realiza: Obs.: Marque
mais de uma opção, caso trabalhe com mais de uma modalidade.
( ) 1. Individual
( ) 2. Em grupo
( ) 3. Outra(s) 3.1. Especifique_________
16.b - Se realiza trabalho em grupo, qual a modalidade mais utilizada?
Obs.: Marque mais de uma opção, caso trabalhe com mai
s de uma
modalidade.
( ) 1. Grupo Operativo
( ) 2. Grupo de Educação em Saúde
( ) 3. Grupo de Encontro
( ) 4. Grupo de Apoio
( ) 5. Oficinas
( ) 6. Outra(s) 6.1. Especifique_________
17.a - Em sua prática profissional, voc
ê desenvolve algum trabalho
sistemático em saúde do trabalhador com profissionais de outras áreas, em
130
equipe multiprofissional?
( ) 1. Não
( ) 2. Sim
17.b - Se sim, com quais profissionais costuma trabalhar?
Obs.:
Marque mais de uma opção, caso tr
abalhe com mais de um tipo
de profissional.
( ) 1. Médico
( ) 2. Engenheiro
( ) 3. Enfermeira
( ) 4. Técnico de segurança no trabalho
( ) 5. Assistente Social
( ) 6. Outro(s) 6.1. Especifique__________
18.a - Você desenvolve algum
a parceria com alguma instituição/programa voltado
para a prevenção e/ou manutenção da saúde dos trabalhadores?
( ) 1. Não
( ) 2. Sim
18.b -
Se sim, qual(is)? Obs.: Marque mais de uma opção, caso
trabalhe com mais de uma instituição.
( ) 1. SESI
( ) 2. SENAC
( ) 3. DRT
( ) 4. CAPS
( ) 5. INSS
( ) 6. Sindicato dos trabalhadores
( ) 7. CEREST
( ) 8. Empresa privada de programas de saúde e segurança no trabalho
( ) 9. Ministério Público
( ) 10. Outro(s) 10.1. Especifique__________
131
19.a -
Em seu trabalho, você desenvolve alguma ação voltada para os
trabalhadores que apresentam algum dano físico ou psicossocial
relacionado ao trabalho?
( ) 1. Não
( ) 2. Sim
19.b - Se sim, qual(is)?
Obs.: Marque mais de uma opção, caso
desenvolva mais de um tipo de trabalho.
( ) 1. Atendimento individual
( ) 2. Atendimento grupal
( ) 3. Grupo de apoio
( ) 4. Acompanhamento
( ) 5. Encaminhamento
( ) 6. Outro(s) 6.1. Especifique__________
Quanto à sua formação e atuação:
20.a -
Você possui algum conhecimento/capacitação na área de saúde do
trabalhador?
( ) 1. Não
( ) 2. Sim
20.b - Se sim, qual(is)?
Obs.: Marque mais de uma opção, caso
tenha mais de um tipo de conhecimento/capacitação.
( ) Disciplina(s) do Curso de Graduação em Psicologia
( ) Curso de curta duração
( ) Especialização
( ) Mestrado
( ) Doutorado
21- Você considera seu(s) conhecimento(s) e/ou capacitação (ões) sufici
entes para
a atuação nessa área?
( ) 1. Não
( ) 2. Sim
22-
Qual(is) a(s) principal(is) dificuldade(s) que o psicólogo encontra para ampliar
132
sua atuação nessa área?
Obs.: Marque mais de uma opção, caso perceba mais
de uma dificuldade.
( ) 1. Falhas na formação acadêmica
( ) 2. Falta de motivação pessoal do psicólogo
( ) 3. Ausência de aparato teórico-metodológico de base
( ) 4. Cultura do grupo de profissionais da categoria
( ) 5. Falta de competência técnica
( ) 6. Visão empresarial
( ) 7. Outra(s) 7.1. Especifique__________
23- Como você avalia a formação acadêmica em Psicologia para a atuação
na área?
( ) 1. Péssima
( ) 2. Ruim
( ) 3. Regular
( ) 4. Boa
( ) 5. Ótima
( ) 6. Excelente
24-
Em sua opinião, como o psicólogo pode contribuir para a promoção da saúde e
prevenção do adoecimento no trabalho?
Obrigado(a) pela disponibilidade!
Em breve, este estudo estará disponível para todos os interessados nessa
área.
133
ANEXO 2
CARTA DE INFORMAÇÃO – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE
E ESCLARECIDO
134
CARTA DE INFORMAÇÃO - CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Caro(a) Senhor(a) psicólogo(a):
Eu, Mara Araújo Aguiar, psicóloga, portadora do CIC 63797550391, RG 97002347868,
estabelecido(a) na Avenida Senador Virgílio Távora, 1700, apto 902, Dionísio Torres, CEP 60170-251,
na cidade de Fortaleza, cujo telefone de contato é (85) 3461-1577/91214726, pretendo desenvolver
uma pesquisa de mestrado com psicólogos que atuam em organizações.
Este estudo tem por finalidade conhecer aspectos da sua prática profissional, obter dados
sobre sua atuação, objetivando com isso contribuir para o crescimento da sua área.
Desse modo, necessito que você me conceda uma entrevista em que realizarei os seguintes
procedimentos:
Pedirei para você conversar comigo, para discutirmos alguns pontos sobre sua prática
profissional. A coleta de dados será individual, mediada por um roteiro norteador composto de
questões que permitam contemplar os objetivos da pesquisa. No caso, a fala será gravada com o
auxílio de um gravador digital.
A sua participação nesta pesquisa é voluntária e não determinará qualquer risco, nem trará
desconfortos. Também é garantida a liberdade da retirada de consentimento a qualquer momento e
deixar de participar do estudo.
Informo que você tem a garantia, em qualquer etapa do estudo, de esclarecimento de
eventuais dúvidas. Não existirão despesas ou compensações pessoais para o participante em
qualquer fase do estudo. Também não há compensação financeira relacionada à sua participação. Se
existir qualquer despesa adicional, ela será absorvida pela pesquisadora.
Além disso, sua participação é importante para a ampliação do conhecimento a respeito das
práticas dos psicólogos do trabalho.
Garanto que as informações obtidas serão analisadas em conjunto com outras pessoas, não
sendo divulgada a identificação de nenhum dos participantes. Você tem o direito de ser mantido
atualizado sobre os resultados parciais das pesquisas e, caso seja solicitado, darei todas as
informações que solicitar.
Eu me comprometo a utilizar os dados coletados somente para pesquisa, e os resultados
serão veiculados através de artigos científicos em revistas especializadas e/ou em encontros
científicos e congressos, sem nunca tornar possível a sua identificação.
Em caso de dúvida quanto aos seus direitos, escreva para o Comitê de Ética em Pesquisa em
Seres Humanos COÉTICA/UNIFOR. Endereço Avenida Washington Soares, 1321, Edson
Queiroz. CEP 60.811-905 – Fortaleza-CE.
Segue o termo de consentimento livre e esclarecido para ser assinado, caso não tenha ficado
qualquer dúvida sobre a pesquisa.
135
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende às exigências legais, o Sr. (a)
______________________________________________________________,
portador(a) da cédula de identidade ___________________________, após
leitura minuciosa da CARTA DE INFORMAÇÃO AO PESQUISADO, devidamente
explicada pela profissional em seus mínimos detalhes, ciente dos
procedimentos aos quais será submetido, não restando quaisquer dúvidas a
respeito do lido e explicado, firma seu CONSENTIMENTO LIVRE E
ESCLARECIDO concordando em participar da pesquisa proposta.
Fica claro que o pesquisado pode a qualquer momento retirar seu
CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO e deixar de participar desta pesquisa
e ciente de que todas as informações prestadas tornaram-se confidenciais e
guardadas por força de sigilo profissional (art. 9
o
. do Código de Ética profissional do
Psicólogo).
E, por estarem de acordo, assinam o presente termo.
Fortaleza-Ce, _______ de ________________ de _____.
________________________________ ________________________________
Assinatura do pesquisado Assinatura do Pesquisador
Livros Grátis
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