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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO
MARIZO VITOR PEREIRA
ANÁLISE DA CONCEPÇÃO ARQUITETURAL À LUZ DA
ARQUITETUROLOGIA: UM ESTUDO DA PRODUÇÃO DE EDIFÍCIOS DE
USO NÃO - RESIDENCIAL DO ARQUITETO JOÃO MAURÍCIO FERNANDES
DE MIRANDA, ENTRE 1961 E 1981.
NATAL/RN
2008
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MARIZO VITOR PEREIRA
ANÁLISE DA CONCEPÇÃO ARQUITETURAL À LUZ DA
ARQUITETUROLOGIA: UM ESTUDO DA PRODUÇÃO DE EDIFÍCIOS DE
USO NÃO - RESIDENCIAL DO ARQUITETO JOÃO MAURÍCIO FERNANDES
DE MIRANDA, ENTRE 1961 E 1981.
DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM ARQUITETURA E URBANISMO
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO GRANDE DO NORTE-
PPGAU/UFRN, COMO REQUISITO
PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO
DE MESTRE EM ARQUITETURA E
URBANISMO.
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO
PROJETO DE ARQUITETURA E
PERCEPÇÃO DO AMBIENTE
LINHA DE PESQUISA
PROJETO DE ARQUITETURA
ORIENTADORA:
DRª MAISA D. VELOSO
Natal/RN
2008
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Divisão de Serviços Técnicos
Catalogação da Publicação na Fonte / Biblioteca Central Zila Mamede
MARIZO VITOR PEREIRA
ANÁLISE DA CONCEPÇÃO ARQUITETURAL À LUZ DA
Pereira, Marizo Vitor.
Análise da concepção arquitetural à luz da arquiteturologia : um estudo
da produção de edifícios de uso não-residencial do arquiteto João
Maurício Fernandes de Miranda, entre 1961 e 1981 / Marizo Vitor Pereira.
– Natal, RN, 2008.
139 p. : il.
Orientador: Maisa D. Veloso.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo.
1. Concepção arquitetural Dissertação. 2. Arquiteturologia
Dissertação. I. Boudon, Philippe. II. Miranda, João Maurício Fernandes de.
III. Veloso, Maisa D. IV. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. V.
Título
RN/UF/BCZM CDU 72.011
MARIZO VITOR PEREIRA
ANÁLISE DA CONCEPÇÃO ARQUITETURAL À LUZ DA
ARQUITETUROLOGIA: UM ESTUDO DA PRODUÇÃO DE EDIFÍCIOS DE
USO NÃO - RESIDENCIAL DO ARQUITETO JOÃO MAURÍCIO FERNANDES
DE MIRANDA, ENTRE 1961 E 1981.
DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM ARQUITETURA E URBANISMO
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO GRANDE DO NORTE-
PPGAU/UFRN, COMO REQUISITO
PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO
DE MESTRE EM ARQUITETURA E
URBANISMO.
Dissertação aprovada em ------- / ------- /-------
BANCA EXAMINADORA
____________________________________
Prof. Dr. Hélio Costa Lima
Universidade Federal da Paraíba
____________________________________
Prof. Dr. Marcelo Tinoco
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
____________________________________
Profa. Dra. Maísa Veloso - Orientadora
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
____________________________________
Aos meus pais (in memoriam);
a Siina, a todos aqueles que passaram
- e passam - pela minha vida e aos
meus protetores.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço a DEUS a quem devo tudo. Meus sinceros
agradecimentos à minha orientadora, professora Dra. Maísa Dutra Veloso, por
aceitar a orientação deste trabalho e pela paciência que às vezes foi
necessária. Ao professor Dr Aldomar Pedrini pelo incentivo, pela ajuda, pelo
incansável espírito fraterno e contagiante alto astral. À professora Dra. Sonia
Marques, pelas animadas conversas sobre arquitetura e, também, pelo
incentivo.
Aos colegas do Departamento de Arquitetura – DARQ/UFRN, em
especial àqueles que me fizeram voltar a ser aluno, me introduziram nos
prazeres da pesquisa e me fizeram acreditar que ainda falta muito tempo para
me aposentar. Ao amigo e ex-colega de Departamento arquiteto João Maurício
Fernandes de Miranda - cujos projetos foram eleitos objetos de estudo - a
quem tenho grande respeito e admiração, pela competência, generosidade,
pela paciência com que me recebeu e pelas informações que me ajudaram a
desenvolver este trabalho. Aos colegas de curso cuja convivência me ajudou a
caminhar, e, com muito carinho, a Virgínia Laíse minha companheira de
estudos e de “sofrimento”. Agradeço, igualmente, aos professores do Programa
de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte - PPGAU/UFRN, principalmente àqueles que foram meus
mestres. Não posso esquecer de agradecer pela paciência e atenção
dispensadas por Silvinha – grande amiga -, por seu companheirismo e
conselhos e à Professora Dra. Gleice Azambuja, pelo incentivo e bom humor.
Um agradecimento reconhecido àqueles que foram meus alunos de
graduação na disciplina Projeto de Arquitetura 01, em 2006, com os quais tive
oportunidade de exercitar, embora de forma sucinta, alguns rudimentos
conceituais da Arquiteturologia. Tentativa frutuosa de experimentar o ensino de
arquitetura segundo uma abordagem voltada para o alcance de objetivos
pedagógicos, apesar das dificuldades inerentes, vivenciadas por todos nós.
Finalizando, gostaria de agradecer a todos aqueles que, de forma direta
ou indireta, contribuíram com suas opiniões, incentivo, atenção e críticas.
RESUMO
Este trabalho apresenta um estudo sobre a concepção arquitetural, tendo como
referência a Arquiteturologia, abordagem desenvolvida por Philippe Boudon,
arquiteto, professor e pesquisador francês. A partir de um recorte temporal
(anos 1961/1981) foi feita uma seleção na produção do arquiteto potiguar João
Maurício Fernandes de Miranda, reunindo seis exemplares - projetos de uso
não-residencial, sobre os quais foram realizadas leituras arquiteturológicas. O
objetivo Geral da pesquisa é exercitar o uso da metodologia de trabalho
desenvolvida por Philippe Boudon e equipe em sua obra “Enseigner la
Conception Architecturale” (2000), com ênfase especial na identificação das
escalas arquiteturológicas, suas funções, relações e modalidades de
ocorrência. A Arquiteturologia, portanto, sendo utilizada como instrumento de
estudo da concepção arquitetural.
Palavras-chave: Concepção Arquitetural. Arquiteturologia. João Maurício
Fernandes de Miranda.
ABSTRACT
This study explores the architectural conception process using the
Architecturologie as an instrument of analysis, based on “Enseigner la
Conception Architecturale” (2000), developed by Boudon - architect, lecturer
and French researcher. It begins with the selection of local architect´s works,
João Maurício Fernandes de Miranda, which resulted in six non residential
projects developed between 1961 and 1981.
Architectural readings were developed, with emphasis in the identification of
architecturological scales, their functions, relationship and modality of
occurrence.
Keywords: Architectural Conception. Architecturology. João Maurício
Fernandes de Miranda.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FOTOGRAFIAS
Foto 1 (Figura 1). Vista do convento de La Tourette, projeto de Le Corbusier,
França. Exemplo de grau zero da escala geográfica (negação da topografia, na
implantação do projeto).
Fonte: http://www.galinsky.com/buildings/latourette/tourette1.jpg. ...................38
Foto 2 (Figura 2). Vista dos arcos botantes. Exemplo de escolha realizada por
determinismo de ordem técnica. Fonte:
http://gardkarlsen.com/Paris2006/flying_buttresses_of_Notre_Dame_Paris.jpg.
...........................................................................................................................38
Foto 3 (Figura 3). Vista da circulação externa do Centro George Pompidou.
Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem funcional. Fonte:
http://gardkarlsen.com/Paris2006/front_of_Centre_Pompidou_Paris.jpg. ........38
Foto 4 (Figura 4). Vista da prefeitura de Siena, Itália, com destaque para a
torre. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem simbólica-
dimensional. Fonte:
http://www.hoteljoly.it/website%20modificato/arte_historia_florencia/siena.htm.
.......................................................................................................................... 39
Foto 5 (Figura 5). Vista superior da igreja de Miranda, Portugal. Exemplo de
escolha realizada por determinismo de ordem simbólica-formal. (planta em
forma de cruz)
Fonte:http://www.bragancanet.pt/patrimonio/mirandaigreja.htm. .....................40
Foto 6 (Figura 6). Vista da fachada da State street townhouses, New York.
Exemplo de solução orientada por determinismo de ordem de vizinhança.
Fonte:http://www.demel.net/statestreet.html .................................................... 40
Foto 7 (Figura 7). Vista da implantação no terreno, do edifício da Seagram em
Nova York. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem
parcelar. A implantação foi determinada pela forma do terreno e sua
localização de esquina. Fonte: http://www.thecityreview.com/park375.html ... 41
Foto 8 (Figura 8). Vista da implantação no terreno, da casa da cascata, de
Frank Lloyd Wright, EUA. Exemplo de escolha realizada por determinismo de
ordem geográfica. A solução respeita a topografia do terreno. Fonte:
http://www.bluffton.edu/~sullivanm/wrightpa/kaufmann.html.............................41
Foto 9 (Figura 9). Vista da cidade de Londres a partir do alto do edifício da
Swiss re. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem da
visibilidade. Visão especial da cidade.
Fonte:http://www.arcoweb.com.br/debate/debate105.asp,2007........................42
Foto 10 (Figura 10). Vista do teatro popular de Niterói, Rj, com destaque para a
rampa de acesso. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem
ótica. Fonte:
http://www.avizora.com/publicaciones/biografias/textos/textos_n/0011_niemeye
r_oscar.htm,200. ...............................................................................................42
Foto 11 (Figura 11). Vista da pirâmide do Louvre, Paris. Exemplo de escolha
realizada por determinismo de ordem sócio-cultural.
Fonte:http://www.rogerswebsite.com/Europe/17%20%20The%20Louvre%20Mu
seum%20in%20Paris.jpg.................................................................................. 43
Foto 12 (Figura 12). Manifestação da Arquitetura do Greek Revival. Exemplo de
escolha realizada por determinismo de modelo.
Fonte: http://www.bestseattleproperties.com/styles.htm ...................................43
Foto 13 (Figura 13). Casa de vidro, EUA. Exemplo de escolha realizada por
determinismo semântico.
Fonte:http://www.thecityreview.com/arcnow.html. ............................................44
Foto 14 (Figura 14). Le Corbusier. Museu do Crescimento Ilimitado. Exemplo
de solução de implantação no terreno, considerando a escala de extensão.
Fonte:
http://www.getep.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=145&Itemid
=16 ....................................................................................................................44
Foto 15 (Figura 15). Casa de terra dos Dogon, Mali. Exemplo de escolha
realizada por determinismo econômico (e sócio-cultural).
Fonte: http://www.linternaute.com/voyager/habitats-du-monde/construction-en-
terre-du-pays-dogon.shtml ................................................................................45
Foto 16 (Figura 16). Casa da música, Porto, Portugal. Exemplo de escolha
realizada por determinismo geométrico.
Fonte:http://www.vivercidades.org.br/publique222/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?i
nfoid=1223&sid=18............................................................................................45
Foto 17 (Figura 17). Pirâmide do Louvre, Paris. Exemplo de escolha,
mostrando a relação com a escala humana. Fonte:
http://www.tavooo.com/photos.php?lang=esp&gallery=900001115&img=13303..
...........................................................................................................................46
Foto 18 (Figura 20). Vista do espaço externo, lateral à nave, abrigado sob a
coberta. Fonte: acervo do autor, 2007...............................................................65
Foto 19 (Figura 21). Vista da capela com a cruz em primeiro plano.
Fonte: acervo do autor, 2007.............................................................................66
Foto 20 (Figura 23). Beiral da pirâmide/coberta.
Fonte: Acervo do autor, 2007............................................................................67
Foto 21 (Figura 25). Vista aérea mostrando a capela e a praça cívica.
Fonte: acervo da UFRN, 2005..........................................................................68
Foto 22 (Figura 26). Localização elevada da capela, mostrando o elemento que
marca a entrada. Fonte: acervo do autor, 2007.................................................68
Foto 23 (Figura 27). Vista da coberta da capela, entre as árvores. Fonte:
Acervo do autor, 2006........................................................................................69
Foto 24 (Figura 28). Vista dos vitrais que contornam a nave. Fonte: Acervo do
autor, 2006.........................................................................................................69
Foto 25 (Figura 29). Maquete do Hospital de Macaíba. Fonte: acervo do
arquiteto.1981....................................................................................................75
Foto 26 (Figura 46). Vista da Procuradoria Geral da República em Natal. Fonte:
acervo do arquiteto. 1974..................................................................................93
Foto 27 (Figura 53). Vista atual da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo do autor. 2008.............................................................................96
Foto 28 (Figura 63). Vista da sede do Tribunal Regional Eleitoral em
Natal.Fonte: acervo do arquiteto. 1973............................................................108
Foto 29 (Figura 64). Vista da sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.
Fonte: acervo do autor. 2008...........................................................................109
Foto 30 (Figura 66). Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.Fonte:
acervo do autor. 2008......................................................................................110
Foto 31 (Figura 69). Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.Fonte:
acervo do autor. 2008......................................................................................111
DESENHOS
Desenho 1 (Figura 18). Planta Baixa mostrando o cruzamento principal das
vigas de coberta. Fonte: acervo de JMFM, 2007...............................................64
Desenho 2 (Figura 19). Corte mostrando a nave semi-enterrada.
Fonte: acervo de JMFM, 2007...........................................................................65
Desenho 3 (Figura 22). Comparação entre as duas propostas de planta: a
tradicional e a da capela. Fonte:wikipedia /acervo do autor do projeto, 2007...66
Desenho 4 (Figura 24). Corte longitudinal, mostrando a relação da nave com o
terreno plano. Fonte: Acervo do autor do projeto, 2007....................................67
Desenho 5 (Figura 30). Planta-Baixa do Pavimento Térreo. Projeto do Hospital
de Macaíba. Fonte: acervo do arquiteto. 1981..................................................75
Desenho 6 (Figura 30-a). Zoneamento do Pavimento Térreo. Projeto do
Hospital Distrital de Macaíba. Fonte: acervo de JMFM. 1981...........................75
Desenho 7 (Figura 31). Planta-Baixa do Pavimento Superior. Projeto do
Hospital de Macaíba. Fonte: acervo do arquiteto. 1981....................................76
Desenho 8 (Figura 31-a). Zoneamento do Pavimento Superior. Projeto do
Hospital Distrital de Macaíba. Fonte: acervo de JMFM.1981............................76
Desenho 9 (Figura 32).Fachada . Projeto do Hospital de Macaíba.
Fonte: acervo do arquiteto. 1981.......................................................................77
Desenho 10 (Figura 33). Detalhe de fachada. Projeto do Hospital de Macaíba.
Fonte: acervo do arquiteto. 1981.......................................................................77
Desenho 11 (Figura 34). Fachada . Projeto do Hospital de Macaíba.
Fonte: acervo do arquiteto. 1981.......................................................................77
Desenho 12 (Figura 35).Fachada . Projeto do Hospital de Macaíba. Fonte:
acervo do arquiteto. 1981..................................................................................79
Desenho 13 (Figura 36).Fachada . Projeto do Hospital de Macaíba. Fonte:
acervo do arquiteto. 1981..................................................................................79
Desenho 14 (Figura 37).Corte . Projeto do Hospital de Macaíba. Fonte: acervo
do arquiteto. 1981..............................................................................................80
Desenho 15 (Figura 38). Perspectiva Externa do Projeto do Terminal
Rodoviário de Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1977.....................................84
Desenho 16 (Figura 39). Vista de Implantação do Projeto do Terminal
Rodoviário de Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1977.....................................85
.
Desenho 17 (Figura 40). Fachada Oeste e trechos de outras fachadas do
Projeto do Terminal Rodoviário de Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1977.....85
Desenho 18 (Figura 41). Detalhes de fachadas do Terminal Rodoviário de
Natal. Fonte: acervo do arquiteto 1977..............................................................86
Desenho 19 (Figura 42). Detalhes de fachadas do Terminal Rodoviário de
Natal. Fonte: acervo do arquiteto 1977..............................................................86
Desenho 20 (Figura 43). Detalhes de fachada do Terminal Rodoviário de Natal.
Fonte: acervo do arquiteto 1977........................................................................86
Desenho 21 (Figura 44). Planta-Baixa do Projeto do Terminal Rodoviário de
Natal (Bloco Principal). Fonte: acervo do arquiteto. 1977.................................88
Desenho 22 (Figura 45). Cortes. Projeto do Terminal Rodoviário de Natal.
Fonte: acervo do arquiteto. 1977.......................................................................89
Desenho 23 (Figura 47). Fachada Lateral da Procuradoria Geral da República
em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973.......................................................93
Desenho 24 (Figura 48). Planta Baixa do pavimento Térreo da Procuradoria
Geral da República em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973.......................94
Desenho 25 (Figura 49). Planta Baixa do primeiro pavimento da Procuradoria
Geral da República em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973.......................94
Desenho 26 (Figura 50). Planta Baixa do segundo pavimento da Procuradoria
Geral da República em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973.......................95
Desenho 27 (Figura 51). Planta de Situação e Coberta da Procuradoria Geral
da República em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973.................................95
Desenho 28 (Figura 52). Corte Longitudinal da Procuradoria Geral da
República em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973......................................95
Desenho 29 (Figura 54). Fachada Lateral e Detalhe da Procuradoria Geral da
República em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973......................................96
Desenho 30 (Figura 55). Fachada Principal da Procuradoria Geral da República
em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1973.......................................................97
Desenho 31 (Figura 56). Maquete da Catedral Metropolitana de Natal. Fonte:
acervo do arquiteto. 1966................................................................................100
Foto
Desenho 32 (Figura 57). Planta de Corte da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo do arquiteto. 1966.....................................................................101
Desenho 33 (Figura 58). Planta baixa da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo do arquiteto. 1966.....................................................................102
Desenho 34 (Figura 58-a). Esquema de organização espacial da Catedral
Metropolitana de Natal. Fonte: acervo do autor. 2008.....................................102
Desenho 35 (Figura 59). Vista Superior da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo do arquiteto. 1966.....................................................................103
Desenho 36 (Figura 60). Planta de corte da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo do arquiteto. 1966.....................................................................104
Desenho 37 (Figura 60-a). Corte esquemático da Catedral Metropolitana de
Natal.
Fonte: acervo de autor. 2008...........................................................................104
Desenho 38 (Figura 61). Fachada da Catedral Metropolitana de Natal. Fonte:
acervo do arquiteto. 1966................................................................................106
Desenho 39 (Figura 62). Detalhe de Fachada da Catedral Metropolitana de
Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1966...........................................................106
Desenho 40 (Figura 65). Fachada da sede do Tribunal Regional Eleitoral em
Natal, com detalhe. Fonte: acervo do arquiteto. 1972.....................................109
Desenho 41 (Figura 67). Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.Fonte:
acervo do arquiteto. 1972................................................................................110
Desenho 42 (Figura 68). Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.Fonte:
acervo do arquiteto. 1972................................................................................110
Desenho 43 (Figura 70). Implantação da sede do Tribunal Regional Eleitoral
em Natal. Fonte: acervo do arquiteto. 1972.....................................................112
Desenhos 44 e 45 (Figuras 70 e 71). Fachadas da Sede do Tribunal Regional
Eleitoral em Natal.Fonte: acervo do arquiteto. 1972........................................113
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS
RESUMO/ABSTRACT
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
1. INTRODUÇÃO...............................................................................................16
1.1 PROBLEMA DE PESQUISA........................................................................18
1.2 OBJETIVO GERAL..................................................................................... 19
1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS....................................................................... 20
1.4 JUSTIFICATIVA.......................................................................................... 20
1.5 METODOLOGIA......................................................................................... 21
1.6 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO............................................................... 22
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA.....................................23
2.1 SOBRE A ARQUITETUROLOGIA.............................................................. 23
2.1.1 Sobre o conhecimento.......................................................................... 24
2.1.2 Sobre a concepção................................................................................ 27
2.2 PROCESSO DE CONCEPÇÃO..................................................................31
2.2.1 Compreensão do processo.................................................................. 32
2.2.2 Espaço de concepção e modelo arquiteturológico.............................34
2.3 ESCALAS ARQUITETUROLÓGICAS – FUNÇÕES, RELAÇÕES E
MODALIDADES DE OCORRÊNCIA............................................................... 37
2.3.1 Identificação das pertinências............................................................. 37
2.3.2 Localização de escalas......................................................................... 47
2.3.2.1 Função de escalas.................................................................................47
2.3.2.2 Relação de escalas................................................................................49
2.3.2.3 Modalidades de ocorrência....................................................................51
3. UNIVERSO DE PESQUISA E SUA CONTEXTUALIZAÇÃO.......................53
3.1 ARQUITETURA MODERNA EM NATAL: A PRODUÇÃO DO ARQUITETO
JOÃO MAURÍCIO FERNANDES DE MIRANDA.............................................. 53
3.1.1 Influência da escola carioca no nordeste.............................................56
3.1.2 Arquitetura moderna em Natal: introdução e disseminação..............57
3.2 SELEÇÃO DA PRODUÇÃO DE JOÃO MAURÍCIO FERNANDES DE
MIRANDA NO PERÍODO 1961/1981: CRITÉRIOS E DEFINIÇÃO DA
AMOSTRA........................................................................................................ 59
3.2.1 O arquiteto João Maurício F. de Miranda e sua produção
compreendida entre os anos 1961 e 1981……………..............…………….. 61
4. ANÁLISE DOS PROJETOSSELECIONADOS.............................................63
4.1 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DA CAPELA ECUMÊNICA DO
CAMPUS DA UFRN, EM NATAL...................................................................... 63
4.2 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DO HOSPITAL
DISTRITAL DE MACAÍBA/RN...........................................................................74
4.3 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DO EDIFÍCIO DO
TERMINAL RODOVIÁRIO DE PASSAGEIROS DE NATAL/RN......................83
4.4 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DA PROCURADORIA
GERAL DA REPÚBLICA EM NATAL/RN..........................................................92
4.5 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DA CATEDRAL
METROPOLITANA DE NATAL/RN.................................................................100
4.6 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DO EDIFÍCIO DO
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL (TRE) DE NATAL/RN...........................108
5. CONSIDERAÇÕESFINAIS.........................................................................116
6. REFERÊNCIAS...........................................................................................124
APÊNDICES....................................................................................................129
16
1. INTRODUÇÃO
Tomamos conhecimento da obra do arquiteto Philippe Boudon quando
éramos aluno especial do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e
Urbanismo - PPGAU/UFRN, na disciplina Métodos e Técnicas de Projetação
Arquitetônica, em 2004. Nessa ocasião trabalhávamos o conteúdo do livro
Enseigner la Conception Architecturale” (BOUDON et al., 2000). Esse livro tem
por objetivo tornar compreensível através de qual trabalho surge a realidade
arquitetural, tornar comunicável a concepção, organizá-la, de fato, e dar os
meios para pensar as questões que propiciam a criação de um edifício, além
das convicções pessoais do arquiteto.
As possibilidades de exploração do conteúdo de suas obras, a
preocupação com o conhecimento da arquitetura enquanto ciência, bem como
o desejo de sistematizar informações que pudessem levar ao ensino de
arquitetura, logo nos animaram.
Por outro lado, havia, também, a vontade de homenagear um dos
arquitetos de destaque na produção da arquitetura local, igualmente
importante no período de consolidação da arquitetura moderna em Natal, João
Maurício Fernandes de Miranda. Tendo estudado arquitetura no Rio de
Janeiro e se estabelecido em Natal a partir de 1962, sua obra atravessa as
décadas de 60, 70, 80 e 90, entrando pelos anos 2000.
Este trabalho, portanto, representa a oportunidade de realizar antigos
anseios, enveredar pela produção da arquitetura local, enquanto se constitui,
ao mesmo tempo, exercício de aplicação dos princípios da metodologia de
trabalho desenvolvida por Boudon, no sentido de estudar a concepção da
arquitetura. Significa, também, em segundo plano, uma oportunidade de
analisar o potencial dessa metodologia como instrumento pedagógico, no
ensino de arquitetura, notadamente na área de projeto.
17
A ARQUITETUROLOGIA COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO NO ENSINO
DE PROJETO DE ARQUITETURA
Em se tratando de ensino de arquitetura, a Arquiteturologia permite,
entre outros, o ensino de projeto “à maneira de”, como o define Boudon (2002,
p.34-38), caracterizado pela prática de exercícios que exploram o que ele
chama “dispositivos de concepção” – voltados para um objetivo pedagógico -,
em um mesmo semestre letivo; desenvolvidos ao longo da fase que antecede a
prática do projeto, propriamente dito. De acordo com sua visão, as escolas de
arquitetura são de fato, inicialmente, escolas de arquitetos, estando o projeto
no centro do ensino. Este passa a ser limitado por um “savoir-faire” do projeto.
O ensino da concepção, estendendo a transmissão de conhecimentos, busca
fazer das escolas verdadeiras escolas de arquitetura.
Retomando o ensino de projeto “à maneira de”, Boudon continua
afirmando que o projeto apresenta finalidades diferentes dentro e fora da
escola. No interior do curso, sua finalidade é a construção do estudante; fora, o
projeto tem a finalidade de permitir a construção do edifício. Assim, no curso de
arquitetura, o foco no ensino de projeto deve incidir sobre um objetivo
pedagógico. Por isso a idéia dos exercícios.
Trata-se do desenvolvimento, em sala de aula, de uma atividade voltada
para um objetivo dado. Nesses exercícios percebe-se um programa
pedagógico (chamado tema dos exercícios, cada um com finalidade diferente)
em substituição ao programa de necessidades montado junto ao cliente – o
programa arquitetônico. Trabalham-se, ao mesmo tempo, aspectos teóricos e
práticos durante o processo de concepção. São consideradas singularidades,
alcance de objetivos particulares, como por exemplo: singularidade do arquiteto
estudado; singularidade dos temas; e, singularidade dos percursos trilhados
pelo estudante, diante dos percursos seguidos pelo arquiteto, alvo dos seus
estudos.
O interessante dessa pedagogia, no entender de Boudon, é que ela leva
o aluno ao encontro consigo mesmo, enquanto se confronta com o outro.
No ensino da arquitetura, portanto, propõe-se:
a concepção da arquitetura em substituição à sua apropriação
pelo exercício do projeto;
18
o desenvolvimento de conceitos e noções trabalhados em
exemplos e organizados em um sistema;
proposta de exercícios, com a finalidade de adquirir
conhecimentos teóricos e práticos sobre a concepção - mostra-se
o espaço arquitetural em suas diversas dimensões e fatos de
concepção.
Outra possibilidade de aplicação: enunciar as hipóteses de uma realidade
arquitetural particular, sobre o processo de concepção. Ainda, fornecer meios
de por e pensar problemas levantados por toda a concepção, independente
das convicções pessoais do arquiteto.
A Arquiteturologia pode ser aplicada para explicitar concepções
particulares em sua complexidade. Em termos de ensino, pode levar o aluno a
conceber suas propostas através de exemplos-tipo retirados da produção
existente, onde são exploradas as “questões vivas” de processos.
É atribuída à arquiteturologia a possibilidade de fazer emergir a
realidade arquitetural, através dos olhos do arquiteto - como aquele que
concebe; tornar comunicável a concepção, pela constituição de uma
linguagem que permite sua divulgação.
1.1 PROBLEMA DE PESQUISA
A pesquisa desenvolvida nesta dissertação pretendia trabalhar, desde o
início, com a metodologia desenvolvida por Philippe Boudon, visando o estudo
do processo de concepção da arquitetura. O trabalho se propunha, também,
envolver a produção do arquiteto potiguar João Maurício F. de Miranda,
considerando sua produção entre os anos de 1961 e 1981. Paralelamente,
tinha a intenção de considerar a arquitetura moderna em Natal, especialmente
o período de sua consolidação na cidade (anos 60 e 70). Como afirma Seabra
de Melo (2004), a produção da arquitetura moderna se apresenta, nesse
período, como momento de consolidação e maior domínio sobre as
possibilidades do léxico formal e da técnica construtiva moderna; compreende,
também, a chamada fase do “Brutalismo Potiguar” e de dispersão do ideário
modernista, apresentando traços característicos que mostram influências do
denominado Brutalismo Paulista. (p.47)
19
Os ajustes que se seguiram nos fizeram ver que seria necessário
delimitar o trabalho com mais objetividade, para evitar possíveis equívocos.
Tornava-se imperativo mostrar a ênfase a ser dada sobre as questões que
diziam respeito ao estudo de concepção, tomando por objeto de estudo uma
seleção da produção de João Maurício. Assim, a preocupação com a produção
da arquitetura moderna em Natal passaria a ser secundária, não significando
que seria abandonada; isoladamente ela não constituiria elemento fundamental
em nossa pesquisa. Igualmente secundária, seria a consideração de possíveis
influências da Escola Carioca sobre a produção do nosso arquiteto,
considerando sua formação no Rio de Janeiro. Essas influências ainda seriam,
contudo, objeto de verificação, nas análises das obras do referido autor.
A partir dessa nova definição, decidimos nos concentrar na
Arquiteturologia e no estudo da produção de João Maurício, notadamente para
compreender seu “espaço de pensamento”, como suas idéias se organizaram
durante o processo de concepção de seus edifícios. Foi então que partimos
para identificar as escalas arquiteturológicas acionadas pelo arquiteto durante
as operações de concepção – referências que justificam suas decisões -, sua
incidência e as relações verificadas entre elas.
Embora Boudon enfatize o processo de concepção nos seus estudos da
arquitetura enquanto ciência, ele apresenta alguns exemplos em que o edifício
(o produto) constitui o objeto de estudo. Esse fato, juntamente com a narrativa
de experiência didática inspirada em sua metodologia, foi decisivo para a
elaboração de nosso trabalho.
1.2 OBJETIVO GERAL
O objetivo Geral da pesquisa é exercitar o uso da metodologia de
trabalho desenvolvida por Philippe Boudon e equipe em sua obra “Enseigner la
Conception Architecturale” (2000), com ênfase especial na identificação das
escalas arquiteturológicas, suas funções, relações e modalidades de
ocorrência. A Arquiteturologia será instrumento de estudo da concepção
arquitetural, na produção de projetos de uso não-residencial do arquiteto
potiguar João Maurício Fernandes de Miranda, no período 1961 a 1981.
20
1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Constituem objetivos específicos da presente dissertação:
compreender o funcionamento do modelo arquiteturológico;
identificar as escalas arquiteturológicas, presentes nas propostas
selecionadas de João Maurício F. de Miranda, e como funcionam ;
observar a atuação da “escala de modelo” na produção selecionada,
bem como a possibilidade da influência da “Escola Carioca,” no
desempenho desse papel;
perceber como funciona o espaço de concepção, na produção de João
Maurício Fernandes de Miranda;
refletir sobre a utilização da Arquiteturologia como instrumento de
ensino-aprendizagem nas aulas de projeto de arquitetura;
exercitar a possibilidade de uso da Arquiteturologia como instrumento de
estudo da produção do arquiteto João Maurício Fernandes de Miranda;
avaliar a possibilidade de uso da Arquiteturologia, como instrumento
eficiente no estudo da Arquitetura Moderna em Natal.
1.4 JUSTIFICATIVA
Estudar a produção de Philippe Boudon se constitui, ainda, em um
exercício pouco desenvolvido no Brasil. Suas obras permanecem
desconhecidas da maioria dos arquitetos brasileiros, apenas recentemente
tendo ocupado espaço no universo acadêmico. Por outro lado, a crise no
ensino de projeto nos cursos de arquitetura e urbanismo se ressente de
alternativas pedagógicas capazes de transformar esse ensino e torná-lo mais
objetivo. De considerar um foco que se projete sobre um objetivo pedagógico,
como afirma o citado autor.
A produção dos arquitetos potiguares, em boa parte, ainda permanece
desconhecida de todos, inclusive a de João Maurício, uma das menos
divulgadas. Essa confirmação considerou observações realizadas junto a
MUSA, CEPAU e PPGAU, setores ligados ao Curso de Arquitetura e
21
Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN, com base
em trabalhos disponibilizados para consulta.
Sintonizado com essas questões, decidimos adotar os procedimentos
metodológicos voltados para a sistematização das informações, calcados em
Boudon et al. (2000). Criador da Arquiteturologia, ele prioriza o estudo da
concepção arquitetural, daquilo que lhe é intrínseca, - diferente da arquitetônica
– pois, se a arquitetura construída é amplamente analisada ou comentada, o
trabalho de imaginação e elaboração, ao contrário, parece uma forma de caixa
preta tida como impenetrável. Segundo ele, compreender o processo de
elaboração do projeto se faz possível através da compreensão de conceitos
como espaço arquitetural, espaço de concepção, escala e modelo. Conceitos
que, sem dúvida, deverão orientar uma análise mais fecunda da questão.
1.5 METODOLOGIA
A pesquisa foi desenvolvida considerando a produção do arquiteto
potiguar João Maurício Fernandes de Miranda, no período 1961/1981. O
intervalo de sua produção, escolhido para análise, compreende os 20 primeiros
anos de sua atuação profissional - no RN. Esperou-se encontrar, nesse
período, caso confirmadas, influências mais marcantes sobre suas propostas,
exercidas pela Escola Carioca. Nossa pesquisa não contemplou as propostas
do arquiteto para edifícios de uso residencial – maior percentual em sua
produção. Optamos pelos edifícios de uso não - residencial por acreditarmos
ter em mãos maiores chances de analisar propostas com um maior nível de
elaboração, principalmente plástico. Esta expectativa se ampliou, quando se
levou em consideração propostas concebidas e apresentadas em concursos.
Foram selecionados inicialmente dez projetos, construídos e não-
construídos; posteriormente, essa seleção, por motivos técnicos, resultou em
seis. A seleção das propostas do arquiteto, desenvolvidas no período citado,
considerou para análise, como afirmado acima, apenas o uso não – residencial.
A título de critérios para a escolha, foram adotados, prioritariamente:
a existência de registro gráfico, disponível no escritório do autor;
aspectos qualitativos da informação gráfica capazes de fornecer
subsídios para a análise;
22
informação gráfica em quantidade suficiente, permitindo a
aplicação da metodologia de trabalho da Arquiteturologia;
Para complementar, convém registrar a importância dos “croquis” e do discurso
do autor, na análise dos projetos.
1.6 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
Esta dissertação se desenvolve em cinco partes que definem sua
estrutura. A primeira parte apresenta toda a inquietação que envolve o
trabalho. São definidos aí todos os elementos que irão nortear e justificar a
pesquisa, bem como a sua forma de apresentação.
A segunda parte apresenta toda a fundamentação teórico-metodológica
e se divide em três sub-partes: sobre a Arquiteturologia; processo de
concepção; e, escalas arquiteturológicas: funções, relações e modalidades de
ocorrência.
A parte de número três se intitula universo de pesquisa e sua
contextualização; se subdivide em duas partes: arquitetura moderna em Natal -
a produção do arquiteto João Maurício F. de Miranda; e, seleção da produção
do arquiteto entre os anos 1961/1981.
A quarta parte apresenta a leitura arquiteturológica dos projetos
selecionados. São apresentados resultados das leituras realizadas em seis
projetos que integram a seleção.
A última e quinta parte apresenta as considerações finais onde se pode
ver as conclusões e recomendações suscitadas pelo trabalho.
Seguem-se as Referências Bibliográficas e Apêndices.
23
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA
O presente capítulo apresenta as considerações levantadas no
desenvolvimento do trabalho, a título de suporte teórico – metodológico.
Serão apresentados os principais pontos que definem e estruturam a
Arquiteturologia (Boudon et al., 2000) considerando que todo este trabalho nela
se fundamenta. A finalidade dessa iniciativa é justificar e tornar compreensível
sua aplicação na identificação das escalas arquiteturológicas, presentes na
produção selecionada do arquiteto João Maurício Fernandes de Miranda, no
período em questão (1961/1981).
Desenvolve–se em três partes: sobre a Arquiteturologia – noções gerais;
processo de concepção, espaço de concepção, modelo arquiteturológico;
escalas arquiteturológicas - funções, relações e modalidades de ocorrência.
2.1 SOBRE A ARQUITETUROLOGIA
O trabalho de imaginação e elaboração do arquiteto tem se mantido
misteriosamente impenetrável, relegado ao universo da intuição. Quase toda
ênfase no estudo da arquitetura tem sido dada ao produto – o edifício.
Ao contrário dessa abordagem, a Arquiteturologia propõe uma
compreensão acessível da elaboração do projeto, “[...] da arquitetura como
pensamento do espaço” (Boudon, 2003), como que abrindo as portas dessa
“caixa negra” que, anteriormente, envolvia o processo, permitindo, assim, fazer
emergir a realidade da arquitetura. Propõe, dessa forma, o deslocamento da
ênfase para o processo de concepção.
A Arquiteturologia foi formulada em 1971, pelo arquiteto francês,
pesquisador e professor da Escola de Arquitetura Paris-La Villete, Philippe
Boudon. Essa iniciativa tinha por finalidade levar a arquitetura a definir seus
próprios axiomas e seus próprios conceitos, buscando as bases científicas de
uma verdadeira “Arquiteturologia” (estudo do “pensamento do espaço”),
confirmando, assim, o caráter científico da arquitetura, como foi definido por
Vitruvius (século I d.C.). Ou, considerando a arquitetura como objeto da
ciência, visão defendida por Boudon.
24
O exercício da Arquiteturologia permitiu, também, verificar o processo de
pensar o espaço tomando o edifício já construído como objeto de estudo,
utilizando assim o processo inverso ao originalmente imaginado. Os textos em
que Boudon realiza uma leitura arquiteturológica do edifício da Baker House
(Alvar Aalto) e do Instituto do Mundo Árabe (Jean Nouvel) ilustram essa
possibilidade e, ao mesmo tempo, levantam a potencialidade de utilização da
Arquiteturologia no ensino de projeto. Seu uso, portanto, como instrumento
pedagógico. (Boudon et al., 2000) Outro exemplo ilustrativo desse uso é
sugerido através do artigo intitulado “De l'idée au travail de conception: A
propos de la compétence d'échelle dans la chapelle des Pazzi de Brunelleschi”,
de autoria de Philippe Boudon, publicado em “Les Cahiers de la Recherche
Architecturale et Urbaine” - n° 7 - janvier 2001. Nesse artigo, Boudon analisa a
capela da família Pazzi, em Florença, com a intenção de ilustrar o princípio que
afirma: sobre a concepção é preciso considerar dois sentidos (a idéia que
alguém tem sobre uma coisa e o trabalho que traz essa coisa à existência).
Partindo da obra de Jean Guillaume, intitulada “Desaccord Parfait” (1990), que
trata do estudo desse edifício, Boudon analisa proporções, escala e modelo.
Em seu artigo “Enseignement du projet et enseignement de la
conception” (Boudon, 2002) é possível lê-se a respeito de experiências de
ensino realizadas pelo autor. O ensino de arquitetura “à maneira de”, conforme
sua definição.
2.1.1 SOBRE O CONHECIMENTO
Visando o conhecimento (científico) da arquitetura, a Arquiteturologia
estuda a concepção arquitetural
1
; ou seja, elege a concepção como objeto de
conhecimento - o que se passa na cabeça do arquiteto durante o desenrolar do
seu trabalho.
1
O termo “architecturale” utilizado por Philippe Boudon é traduzido neste trabalho como
arquitetural, seguindo o dicionário “Petit Larousse Illustré” (1990). Esse termo diz respeito à
arquitetura ou evoca uma obra de arquitetura. Já o termo arquitetônico, aqui preterido, segundo
o mesmo dicionário, seria relativo a um conjunto de regras técnicas próprias da arquitetura - à
própria técnica da arquitetura. O Novo Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira, em sua 1ª edição, 7ª impressão, de 1975, registra “arquitetônico” e
“arquitetural” como sinônimos, relativo à arquitetura.
25
O filósofo grego Platão (século IV A.C.), criador da Epistemologia, opõe
a crença ou opinião ("doxa", em grego) ao conhecimento. Para ele, a crença se
constitui em um determinado ponto de vista subjetivo. O conhecimento, no
entanto, é definido como crença verdadeira e justificada – também defendido
pelo filósofo Sócrates (século V A.C.), de quem Platão foi discípulo.
Sua teoria abrange o conhecimento teórico, o chamado “saber que”.
Esse tipo de conhecimento compreende o conjunto de todas as informações
que descrevem e explicam o mundo natural e social próximo a nós. Ele
consiste em descrever, explicar e predizer uma realidade - analisar o que
ocorre, determinar por que ocorre dessa forma - e utilizar esses conhecimentos
para antecipar uma realidade futura.
O conhecimento científico é considerado como a relação que se
estabelece entre o sujeito - que conhece ou deseja conhecer - e o objeto a ser
conhecido ou que se dá a conhecer (Rosas, 2003) – Estabelecendo uma
analogia, o arquiteto e sua concepção.
Para o filósofo Ghiraldelli Junior (2005), a definição do conhecimento
enquanto crença verdadeira, justificada – como já afirmavam Sócrates e Platão
–, prevaleceu até 1963, quando o filósofo americano Edmund Gettier surge
com novas idéias sobre o assunto, provocando uma revisão.
Ele argumentava sobre a existência de crenças verdadeiras e
justificadas que não chegam a constituir conhecimento, sendo necessário,
nesse caso, atentar à verificação das causas responsáveis pela sua produção.
Com isso, destacou a insuficiência de apenas se buscar sua justificação,
mostrando a fragilidade dessa expectativa.
Na identificação do conhecimento, diante de um dado enunciado, dever-
se-ia partir para verificar as causas que o produziram, antes de qualquer outra
iniciativa, – podendo–se estabelecer uma analogia entre o projeto e o trabalho
de concepção do arquiteto. O conhecimento foi definido, também, como
conjunto organizado de dados e informações, destinados a resolver um
determinado problema. (wikipedia, La Enciclopédia Libre)
É Boudon (2004, p.72) quem afirma, reforçando a posição de Gettier,
que “[...] a concepção é uma atividade não de resolução de problema, mas de
produção do que pode se apresentar como solução ao problema”.
Sistematização, portanto; busca de causas.
26
Tratando do conhecimento científico, “Conhecer perfeitamente é
conhecer pelas causas”, afirma Ruiz (1992, p.96) confirmando Gettier; o saber
científico não é creditado à inspiração mística, artística, religiosa e poética. É
aquele que pode ser demonstrado; explica os fenômenos.
Assim, o trabalho de imaginação e elaboração do arquiteto, a natureza
das operações que se sucedem durante o desenvolvimento do seu trabalho,
passam a ser alvo de consideração da Arquiteturologia. De um conhecimento
científico que deverá alimentar a relação sujeito/objeto, representada pelo
arquiteto e seu alvo perseguido; que busca as causas subjacentes ao
fenômeno/proposta em processo; e que se organiza de forma sistemática.
As idéias do arquiteto, sua criação, não se constituiriam em alvo da
Arquiteturologia; a criação, as idéias remeteriam ao universo da intuição, à
subjetividade. Só mesmo a concepção – as escolhas e decisões tomadas ao
longo do processo de criação - é vista como objeto de conhecimento.
Preocupada com o conhecimento científico, a Arquiteturologia se
interessa pelos objetos virtuais, processos (sob ângulo material e cognitivo),
em uma perspectiva que remete à participação humana em ações devidamente
finalizadas, concluídas. Considera o fazer – sucessão de idéias -, muito mais
do que o feito/executado. O mero exercício de projeto, como forma de
apropriação da arquitetura, não é suficiente para produzir conhecimento capaz
de conferir-lhe o caráter de ciência; capaz de explicar a concepção, entendida
como fundamental no conhecimento e, podemos acrescentar, no ensino da
arquitetura.
A complexidade do trabalho que se segue ao início do processo de
concepção interessa, também, à Arquiteturologia, supondo o compromisso
daquele que concebe, de tornar possíveis, no espaço real, as formas já
adotadas.
Considerada por seu criador a mais importante abordagem para o
conhecimento da arquitetura e do seu ensino, a Arquiteturologia se constitui em
trabalho teórico. Seu objeto, no entanto, não é o objeto empírico “arquitetura”,
embora seja por ele constituído. São as idéias - enquanto resultado de
escolhas realizadas pelo arquiteto -, que interessam, e os caminhos por elas
percorridos, ao longo do processo. A arquiteturologia parte de dois postulados:
o primeiro é a concepção, o segundo é a medida. Boudon concebe a medida
27
como uma das noções fundamentais na construção do modelo de
conhecimento da concepção, alertando para o fato de que se trata de um
conceito que difere do conceito de dimensão e da simples atribuição numérica.
Para ele, “o trabalho do arquiteto consiste em atribuir medidas a tudo o que não
existe [ainda]”.
O postulado da Arquiteturologia é de considerar que, de um modo geral,
todo espaço arquitetural é dotado de medidas e que todo arquiteto deve dar
medidas ao espaço. É o caráter necessário da medida em arquitetura que
constitui o ponto de partida do percurso teórico da arquiteturologia.
Focada na compreensão de como procede a elaboração do projeto, a
Arquiteturologia vai fazer uso, de forma progressiva, de conceitos considerados
fundamentais, como o espaço arquitetural, o espaço de concepção, a
escala e o modelo. Essa introdução progressiva se justifica pelo caráter
sistemático da investigação que, além do mais, também pretende tornar a
concepção comunicável.
Esses conceitos são especificações que nos ajudam a compreender as
coisas. Assim, podemos nomeá-las e expressá-las com palavras, tornando
viável a construção de uma linguagem. Os elementos que vão constituir a
linguagem identificada nos passos da atividade de concepção, trilhados pelo
arquiteto, durante o desenvolvimento de seu trabalho.
2.1.2 SOBRE A CONCEPÇÃO
Ao contrário do que comumente se tem visto, em relação ao estudo da
arquitetura, a Arquiteturologia se interessa pelo estudo do processo de
concepção arquitetural. Ao considerar a concepção da arquitetura como objeto
de conhecimento, a Arquiteturologia trata da descrição da complexidade do
trabalho que se segue às idéias que estão no início do processo e que supõe a
“embrayage”
2
das formas arquiteturais no espaço real.
A concepção se expressa através da natureza das operações
adotadas pelos arquitetos, durante seu trabalho – processo de concepção. A
2
Embrayage. O termo mantém a grafia original, em virtude de não encontrarmos em português
uma tradução que seja suficientemente esclarecedora de sua significação. Segundo Boudon,
significa articulação do espaço de concepção ao espaço real. (2000, p.246).
28
maioria das abordagens utilizadas para estudar a arquitetura é vista por
Boudon como complementar ao ponto de vista trabalhado pela arquiteturologia.
Importante é o papel que a concepção ocupa nessa abordagem, merecendo
destaque a seguinte afirmação:
A multiplicidade de abordagens convida a tornar preciso o que
chamamos concepção [...] precisar o ponto de vista sem, no entanto,
negar o interesse de uma diversidade de ângulos de aproximação,
aliás, frequentemente complementares ao da Arquiteturologia.
(BOUDON et al., 2000, p.5) (Tradução nossa).
Com o intuito de apresentar uma melhor caracterização da
Arquiteturologia, destacamos quatro elementos, na visão de Dominique
Raynaud (1999), em seu artigo: “Le schème: opérateur de la conception
architecturale”. São eles:
interessar-se por objetos virtuais (o edifício em projeto);
explorar os processos mais que os estados das coisas;
considerar esses processos tanto sob o ângulo material, como
sob o ângulo cognitivo;
abordar esses processos em uma perspectiva “poiética”,
implicando o reconhecimento de ações humanas finalizadas
3
.
Comentando os quatro itens, Boudon sublinha especialmente o
deslocamento de interesse para a concepção, que se destaca no primeiro,
constituindo uma melhor forma de conhecer a arquitetura. O segundo destaca
o processo de concepção. O terceiro chama atenção sobre as ciências da
concepção – ciências do artificial, segundo Herbert Simon, economista
americano. O quarto coloca o conhecimento em uma perspectiva histórica.
Acrescente-se, também, que a noção central da Arquiteturologia é permitir
comunicação entre as formas arquiteturais e o espaço real.
Afirmando a concepção como objeto de uma disciplina, e considerando
a atuação dos diversos pontos de vista no processo, Philippe Boudon assim se
expressou na apresentação do resumo de um artigo de sua autoria:
As abordagens da concepção variam segundo os pontos de vista das
diversas disciplinas. Se, como muitos pensam, o ponto de vista produz
[define] o objeto, tantos pontos de vista constituindo outros tantos
3
A “poiética” tem por objeto o estudo das potencialidades inscritas em uma situação dada, que
se abre para uma nova criação.
29
objetos, recebe o nome concepção. Em meio a essas disciplinas, a
Arquiteturologia constituiu o seu [ponto de vista] a partir de dois
postulados: concepção (o edifício é a representação do projeto que a
precedeu) e medida (o arquiteto atribui medidas ao espaço). [...] esses
dois postulados estão de fato no início de uma concepção
(arquiteturológica)... da concepção. [...]. (“Les nouveaux régimes de la
conception: langages, théories, métiers prospective” VI, 2004).
(Tradução nossa).
A Arquiteturologia se apresenta hoje como um campo teórico que propõe
modelizar a composição - inerente ao processo de concepção - em sua
complexidade cognitiva, através de conceitos que tratam sobre ações e
operações de atribuição de medidas espaciais. A arquiteturologia se constitui
em expressão de conhecimento teórico da arquitetura.
Se a Arquiteturologia constitui assim uma linguagem científica sobre a
concepção arquitetural, ela é também um campo de pesquisa que visa
esclarecer todo espaço concebido – arquitetural, urbano e paisagístico – como
também explicitar suas diversas percepções.
Para alcançar os fins a que se propõe, a Arquiteturologia necessita da
construção de um modelo – o modelo arquiteturológico. Conceitos como o
espaço arquitetural, o espaço de concepção, a escala e o modelo,
considerados fundamentais, são importantes para definir um conhecimento
elaborado a “priori”, podendo até participar de uma relação dialética com
conhecimentos elaborados a “posteriori” – caso de estudos que partem de
situações concretas.
A esse respeito, afirma Boudon:
[...] não criticamos os estudos que partem de casos concretos. Nós
entendemos somente ser necessário esclarecer que nossa abordagem
difere nesse ponto. Longe de pensar que uma forma seria boa e a
outra má, nós desejamos que se estabeleça muito mais uma relação
dialética entre esses dois tipos de pesquisa referentes à concepção
arquitetural (grifo nosso), em um vai-e-vem entre modelo teórico e
casos concretos [...]. (BOUDON et al., 2000, p.6) (Tradução nossa).
Este trabalho, também preocupado com a concepção arquitetural e
baseado em casos concretos, se constitui em um exercício – talvez um tanto
ousado – do uso da Arquiteturologia. Nesse caso, consideramos o instrumental
criado ou posto à disposição pela Arquiteturologia para empreender uma
“viagem de volta” – do produto para o processo de concepção.
Conforme visto acima, Boudon considera pertinente a pesquisa
elaborada a partir de casos concretos, e estabelecendo referência com a
30
concepção. Acredita poder haver um diálogo entre os dois tipos de pesquisa
que se propõem estudar a arquitetura.
O que nos move é a pretensão de tentar identificar quais escalas
arquiteturológicas podemos destacar – de forma mais intensa –, nas soluções
de projeto apresentadas pelas propostas selecionadas do arquiteto potiguar
João Maurício Fernandes de Miranda. Um exercício semelhante ao
desenvolvido pelo próprio Boudon, no capítulo oito do livro “Enseigner la
Conception Architecturale”(2000), em que aplica uma leitura arquiteturológica
ao edifício do Instituto do Mundo Árabe em Paris, concebido pelo arquiteto
Jean Nouvel, em 1981, além de leituras realizadas em outros projetos.
A Arquiteturologia, preocupada em estudar a arquitetura, também pode
ser aplicada à pesquisa. Embora não seja pretensão nossa aprofundar a
questão, neste trabalho, registramos alguns aspectos básicos que introduzem o
assunto.
Boudon identifica três situações fundamentais de pesquisa em
arquitetura: situação aplicacionista, situação hermenêutica e situação
axiomática.
Na situação aplicacionista a arquitetura é um campo de investigação
para disciplinas em que o objeto tem sido constituído fora: o social continua
objeto da sociologia, mesmo que o objeto de trabalho diga respeito à
arquitetura (os trabalhos de H. Raymond, sociólogo americano, por exemplo).
Na situação hermenêutica - ramo da filosofia que se debate com a
compreensão humana e a interpretação de textos escritos - a arquitetura passa
do estatuto de campo ao de objeto de um discurso onde se analisam/produzem
significações: é o caso da catedral gótica, para o historiador, segundo
Panofsky.
Por fim, na situação axiomática a arquitetura é mais que um objeto da
Hermenêutica e vem a ser um objeto teórica e verdadeiramente construído.
É o caso da Arquiteturologia que, ainda segundo Boudon, é de fato,
antes de mais nada e de forma axiomática, um objeto concebido artificialmente,
de onde surge uma série de questões na ordem de uma interrogação científica.
Comprometida com a elaboração de um conhecimento relativo à concepção
arquitetural – ela mesma definida como objeto de conhecimento -, partindo de
uma modelização concebida a “priori”.(Boudon, 1989)
31
2.2 PROCESSO DE CONCEPÇÃO
Diferentemente dos estudos de concepção da arquitetura que privilegiam
o produto – o edifício -, a Arquiteturologia se volta para o processo, no interior
do qual o arquiteto realiza as seleções e escolhas inerentes ao seu trabalho.
Ela se propõe envolver, mais precisamente, o trabalho propriamente dito de
revelar formas – devidamente dimensionadas. O trabalho de elaboração do
objeto arquitetural, um trabalho que atribui forma e medida ao espaço,
qualificando-o.
O processo de concepção, até agora visto apenas como de importância
capital para a Arquiteturologia, faz parte, na realidade, do universo de
concepção denominado espaço de concepção ou espaço do pensamento; o
espaço onde se desenvolve e se define o conhecimento sobre o objeto
arquitetônico. O universo de pensamento, no qual o arquiteto propõe processos
ou modalidades de concepção.
A esse propósito convém lembrar:
“A concepção de um edifício é conduzida por escolhas, intenções,
decisões que permitem ou às quais remetem a idéia. [...] Ela permite
colocar em relação intelecto e produção material: a idéia, em qualquer
lugar, opera no trabalho do arquiteto”. (BOUDON et al., 2000, p.18).
Igualmente importante para a compreensão da presente pesquisa, onde
se busca identificar escalas arquiteturológicas (prioritárias e secundárias, no
processo de concepção), suas funções, relações e modalidades de ocorrência.
A identificação dessas escalas, nos projetos selecionados da produção do
arquiteto potiguar João Maurício Fernandes de Miranda, pretende a
compreensão do processo de concepção que preside suas propostas. As
escolhas, intenções e decisões que orientam a concepção de sua produção.
Um exercício de arquiteturologia que apresenta como objetivo compreender,
além do mais, a atuação das características profissionais resultantes de sua
formação.
32
2.2.1 COMPREENSÃO DO PROCESSO
Ainda hoje, numerosos autores encaram o processo de concepção,
como mero processo de resolução de problemas. O processo de concepção
arquitetural não pode ser confundido com um processo de decisão sob pena de
uma restrição do campo de conhecimento: concepção se confundindo com
decisão. Nesse caso, para Boudon, a concepção remetendo à decisão termina
por perder sua identidade ou provocando uma volta à antiga “caixa preta”,
responsável pelo caráter hermético da concepção, defendido há tanto tempo e
superado pela perspectiva da Arquiteturologia. Redução também na
complexidade que envolve a concepção.
Compreender o processo de concepção significa compreender a relação
estabelecida entre o modelo arquiteturológico, o espaço de concepção e o
tempo (diacronia).
Para melhor esclarecimento sobre o que se pretende aprofundar,
vejamos os conceitos. O modelo - aquilo que é repetido, reutilizado no projeto -
é chamado operando. É determinado por sua importância, na operação que
define a medida. Modelo, portanto, é aquilo sobre o qual atuam as operações
de medida.
Do ponto de vista da concepção arquitetural, as dimensões não existem
a “priori” em número finito. É o arquiteto quem define as dimensões de seu
projeto, a fim de instalá-lo no espaço real. De torná-lo real, através de sua
execução.
O modelo (de conhecimento) deverá dar conta de fenômenos
apropriados ao trabalho de concepção em geral, podendo servir, também, para
o caso especial da concepção arquitetural.
No modelo arquiteturológico dimensionar é, às vezes, decidir o que está
por medir e lhe atribuir uma medida, visando compreender a atuação do
arquiteto durante a concepção. Para Boudon, “Medir é comparar dois universos
onde um permite a medida e o outro a recebe.” Toda medida supõe, então, um
ponto de vista e um instrumento de medida que depende desse ponto de vista;
o instrumento fornece a medida. Como se pode deduzir, a medida a que se
refere Boudon não é necessariamente sempre métrica.
33
Conforme sua apreciação, o espaço arquitetural, no processo de
concepção, deve ser distinguido do espaço físico ou morfológico da arquitetura,
pois pertence ao espaço do agir, do fazer.
O espaço onde se desenvolve e se define o conhecimento sobre o
objeto arquitetônico é chamado de espaço de concepção. Assim, o processo
de concepção se torna mais facilmente conhecido, quando se considera as
várias operações de medida distribuídas em um espaço/tempo, onde se
trabalha o conhecimento sobre o edifício – o produto. Tanto melhor será sua
compreensão (do processo de concepção) quanto mais clara for a relação
entre o espaço - onde se trabalha o conhecimento do objeto arquitetural - e o
modelo de conhecimento construído.
Adquirir o domínio sobre aquilo que Boudon define como espaço
arquiteturológico, se constitui em algo necessário para ajudar na compreensão
do processo de concepção.
O espaço arquiteturológico, segundo ele, corresponde à parte do espaço
de concepção que a modelização arquiteturológica permite explicitar. Isto é, o
espaço arquiteturológico permite expor o espaço de concepção de tal maneira
que o objeto arquitetural – o edifício – é compreendido como fruto de uma
concretização de um conjunto de hipóteses, de raciocínios, de decisões e de
operações em uma situação determinada. O domínio do espaço
arquiteturológico, mostrando o edifício como a concretização dessas hipóteses,
raciocínios, decisões e operações, ajuda na compreensão das iniciativas que
atribuem forma e medida ao espaço que se quer qualificar.
O espaço arquiteturológico é considerado por Boudon como primeira
hipótese para uma modelização teórica da concepção.
A propósito, em relação à modelização, Le Moigne
4
afirma que conhecer
é modelizar, ou seja, o processo de conhecer equivale à construção de
modelos do mundo/domínio a ser construído que permitem descrever e
fornecer explicações sobre os fenômenos que observamos.
4
Jean-Louis Le Moigne é um especialista francês em Epistemologia Construtivista. É citado
algumas vezes por Boudon et al. em sua obra Enseigner la Conception Architecturale.
34
O modelo, juntamente com a escala, é considerado suporte principal nos
estudos de Arquiteturologia. Constitui-se, na realidade, em um modelo de
conhecimento da concepção. Trata-se, antes de mais nada, de uma
representação que leva ao conhecimento. Um instrumento que permite a
interpretação de um fenômeno (espaço de concepção); como os objetos
arquitetônicos têm sido pensados.
A construção do binômio modelo/escala – conceitos fundamentais da
arquiteturologia - tem por objetivo tornar compreensível como se dá a
apreensão da repetição e da transformação, operações inerentes à concepção
arquitetural. Essa dupla de elementos serve para explicar a concepção e
permitir a construção de um modelo de representação daquilo sobre o qual
recai a atenção do arquiteto/”conceptor”. Articula o que é medido (modelo) ao
que lhe confere medida (escala).
Para que se possam descrever as operações realizadas pelo arquiteto,
durante o processo de concepção, esses elementos necessitam ser vistos
enquanto conceitos arquiteturológicos, ocupando funções específicas quando
das operações de medida – operando e operador.
Falar sobre o processo de concepção, significa penetrar na
complexidade que está em ação. No deslocamento de interesse, que parte:
do estudo do edifício para o projeto;
da abordagem diacrônica da produção arquitetural para a
idéia de processo de concepção;
e, do espaço arquitetural para o espaço de concepção do
arquiteto.
2.2.2 ESPAÇO DE CONCEPÇÃO E MODELO ARQUITETUROLÓGICO.
Importa, aqui, mostrar os conceitos de Espaço de Concepção e Modelo
Arquiteturológico e sua atuação para a compreensão das Escalas
Arquiteturológicas; como isso acontece direta e/ou indiretamente.
Foi dito que o espaço de concepção é o espaço onde se desenvolve e
se define o conhecimento sobre o objeto arquitetônico. O espaço de
concepção, por conseguinte, compreende o espaço arquiteturológico,
35
abrangendo muito mais do que o espaço de atuação da modelização
arquiteturológica.
Também foi dito, anteriormente, que o espaço arquiteturológico
corresponde à parte do espaço de concepção que a modelização
arquiteturológica permite explicitar. Corresponde ao universo de pensamento
no qual o arquiteto propõe processos de concepção.
Assim, pode-se afirmar que o espaço de concepção e o modelo de
conhecimento criado - arquiteturológico - concorrem para a compreensão do
espaço arquiteturológico. Em conseqüência, para explorar o processo de
concepção, indicando como os objetos arquiteturais foram/são pensados.
É preciso, portanto, que os conceitos de espaço de concepção e modelo
arquiteturológico sejam devidamente considerados, bem como sua relação com
a escala arquiteturológica, também. Esses conceitos já foram explorados em
ocasiões anteriores onde se atentou para sua importância no processo de
concepção e na relação com o espaço arquiteturológico. Agora, é preciso
observá-los sob outros aspectos, necessários para que se perceba sua relação
com a chamada escala arquiteturológica.
Antes de mais nada, na concepção arquitetural, a escala é considerada
como operador da operação de medida. No processo de concepção, a escala é
o que atribui medida. Recordando que “toda construção, quaisquer que sejam a
natureza e as qualidades, tem um tamanho, dimensões que podem ser
anunciadas em metros.” (BOUDON et al., 2000, p.103).
Comecemos por considerar o que se entende por escala
arquiteturológica.
Outra forma de consideração da escala percebe-a, também, como um
conjunto reunindo operações variadas que remetem a uma mesma pertinência
– relação entre uma medida e seu valor, em função de um espaço de
referência. Essa forma caracteriza a escala arquiteturológica.
Isto posto, raciocinando em termos de escala, destacamos a afirmação
de Boudon que diz, “a pertinência constitui a unidade teórica do termo escala.”
(BOUDON et al., 2000, p.119). Teorizar sobre escala passa necessariamente
pela questão da pertinência. Pensar a escala arquiteturológica significa, no
processo de concepção, pensar as dimensões e seu espaço de referência,
para cada uma das escolhas realizadas.
36
Porém, para que haja uma medida - em arquitetura - precisa-se de um
ponto de vista, de um instrumento que possa defini-la, bem como de um
arquiteto que possa conceber o objeto a ser revelado. Escala é ainda definida
por Boudon como aquilo que permite a instalação de uma grandeza, seja
métrica ou não. E, que supõe a medida de um edifício, ou parte dele, em
relação a um elemento que lhe é exterior.
Assim, a escala, considerada também como um conjunto que reúne
operações variadas, voltadas para uma mesma pertinência (a chamada escala
arquiteturológica), deverá revelar as medidas pertinentes a cada referência
definida ao longo do processo de concepção. Atua no espaço de concepção,
permitindo a instalação de grandezas que ajudam na revelação das formas do
objeto arquitetural.
Quanto ao modelo, é importante lembrar que este conceito - operando
do processo de concepção - difere de modelo arquiteturológico. Na primeira
versão, ele é apenas definido como o segundo elemento fundamental -
juntamente com a escala - no estudo da arquiteturologia.
Sua relação com as escalas arquiteturológicas se dá levando em conta a
consideração que ele - modelo - pode ser definido por uma organização
espacial, um objeto, uma figura, um conjunto de operações, entre outros. O
modelo é determinado por sua função na operação de medida, podendo adotar
uma grande variedade, ao longo do processo de concepção. Às vezes, definir
dimensões no modelo é decidir o que está por medir e lhe atribuir uma medida.
A segunda consideração mostra que o modelo arquiteturológico, por sua
vez, deve permitir compreender a atuação do arquiteto enquanto concebe. Já
não é apenas o operando do processo de concepção. Sua relação com a
escala arquiteturológica vai mostrá-lo comprometido com as referências
estabelecidas nas relações de pertinência ao longo de todo o processo.
Então, a identificação de escalas arquiteturológicas em determinado
projeto - objetivo desta pesquisa -, remete à identificação de relações de
pertinência selecionadas ao longo do processo de concepção. De como as
idéias povoaram a cabeça do arquiteto/”conceptor”. As operações de
transformação que aí acontecem, se sucedem, raramente se reproduzindo.
37
2.3 ESCALAS ARQUITETUROLÓGICAS – FUNÇÕES, RELAÇÕES E
MODALIDADES DE OCORRÊNCIA.
Este item se inicia com a conceituação de Escala Arquiteturológica,
apresentando as diversas pertinências identificadas pelo criador/autor da
Arquiteturologia.
Com o intuito de revelar a complexidade que encobre a concepção
arquitetural e, ao mesmo tempo, apresentar o funcionamento do modelo
arquiteturológico - importante no desenvolvimento da presente pesquisa -,
serão destacadas questões arquiteturológicas-chave, úteis na operação de
identificação das escalas arquiteturológicas.
Procura-se seguir, neste trabalho, a linha de raciocínio utilizada por
Boudon no capítulo oito de sua obra: ”Enseigner la Conception Architecturale
(2000). Trata-se da leitura arquiteturológica aplicada no projeto do edifício do
Instituto do Mundo Árabe, de autoria do arquiteto francês Jean Nouvel, que
fornece os elementos a serem também explorados neste trabalho, visando o
alcance dos objetivos por nós pretendidos.
As questões arquiteturológicas-chave acima referidas, no entender do
citado autor, são: localização de escalas, localização de funções e, relações e
modalidades de escalas. Essas questões serão devidamente consideradas e
desenvolvidas, fundamentando o exercício que constitui o presente trabalho.
2.3.1 IDENTIFICAÇÃO DAS PERTINÊNCIAS
Considerada como um conjunto de operações relacionadas a uma
mesma pertinência, definida por uma medida e seu valor, em função de uma
classe onde se situa a referência, a escala arquiteturológica apresenta um
número de vinte tipos de escalas, conforme identificação feita por Philippe
Boudon et al.(2000). No seu entender, trata-se de pertinências que podem ser
identificadas hoje, embora muitas outras possam ser imagináveis. São elas:
escala técnica, funcional, simbólica dimensional, simbólica formal, de
vizinhança, parcelar, geográfica, de visibilidade, ótica, sócio-cultural, de
modelo, semântica, de extensão, econômica, geométrica, cartográfica, de
representação, de níveis de concepção, global e humana. Lembrando que
38
a pertinência estabelece uma relação estreita entre o espaço de referência e a
medida a ser atribuída; e que o espaço de referência qualifica a medida.
Porém, quando a pertinência de uma escala é encontrada pelo
arquiteto/”conceptor” através da negação da relação direta com o espaço de
referência que a define, tem-se aí o grau zero dessa escala.
Figura 1. Vista do convento de La Tourette. Le Corbusier, França.1956/1960. Exemplo
de grau zero da escala geográfica (negação da topografia, na implantação do projeto).
Fonte: http://www.galinsky.com/buildings/latourette/tourette1.jpg
A seguir, as vinte pertinências identificadas serão conceituadas, de
acordo com o ponto de vista da arquiteturologia.
Por escala arquiteturológica técnica, compreende-se a escala
expressa através do ato de escolha (no espaço de concepção), a partir de
considerações de ordem técnica, visando incutir uma modalidade de atribuição
de medidas a uma parte ou ao todo do espaço arquitetural.
Figura 2. Vista dos arcos botantes. Notre Dame de Paris.(séc. XII/XVII). Exemplo de
escolha realizada por determinismo de ordem técnica.
Fonte: http://gardkarlsen.com/Paris2006/flying_buttresses_of_Notre_Dame_Paris.jpg
39
Escala arquiteturológica funcional é aquela resultante da atribuição
de medida a uma parte ou ao todo do espaço arquitetural, como decorrente da
influência de algum elemento externo responsável pelo destino, uso, ou pela
promoção de adaptação a um determinado uso.
Figura 3. Vista da circulação externa do Centro George Pompidou. Renzo Piano e
Richard Rogers, Paris,1977. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem
funcional. Fonte: http://gardkarlsen.com/Paris2006/front_of_Centre_Pompidou_Paris.jpg
No espaço de concepção, a atribuição de medida de grandeza (para
aumentar ou diminuir) resultando da associação a um conteúdo espiritual
visivelmente claro, define a escala arquiteturológica simbólica dimensional.
Figura 4. Vista da prefeitura de Siena, Itália (séc.XIV), com destaque para a torre.
Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem simbólica-dimensional.
Fonte: http://www.hoteljoly.it/website%20modificato/arte_historia_florencia/siena.html
40
A concepção do espaço arquitetural, formando um conteúdo espiritual
particular com a forma simbólica adotada, caracteriza a escala
arquiteturológica simbólica formal.
Figura 5. Vista superior da igreja de Miranda, Portugal (séc.XVI). Exemplo de escolha
realizada por determinismo de ordem simbólica-formal. (planta em forma de cruz)
Fonte:
http://www.bragancanet.pt/patrimonio/mirandaigreja.htm
A escala arquiteturológica de vizinhança considera a atribuição de
medidas por contigüidade, induzindo uma continuidade espacial entre os
elementos que participam da concepção e sua vizinhança.
Figura 6. Vista da fachada da State street townhouses. Scott Demel Architect, New
York, 2004. Exemplo de solução orientada por determinismo de ordem de vizinhança.
Fonte:
http://www.demel.net/statestreet.html
Definir a implantação do edifício, considerando como referências
elementos previamente fornecidos ao arquiteto, são atribuições da escala
arquiteturológica parcelar. Esses elementos se constituem em possíveis
41
permissões de tamanho, forma e limites do terreno, para uso no processo de
concepção.
Figura 7. Vista da implantação no terreno. Edifício da Seagram, Nova York. Mies van
der Rohe, 1958. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem parcelar. A
implantação foi determinada pela forma do terreno e sua localização de esquina.
Fonte:
http://www.thecityreview.com/park375.html
As medidas de uma parte ou do todo arquitetural, informadas a partir dos
pontos cardeais, situação e modelo do terreno, dados climáticos, entre outros,
são atribuições da escala arquiteturológica geográfica. Difere da escala
anterior, ao não levar em consideração os limites formais ou dimensionais do
terreno.
Figura 8. Vista da implantação no terreno. Casa da Cascata. Frank Lloyd Wright, EUA,
1935. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem geográfica. A solução respeita
a topografia do terreno.
Fonte: http://www.bluffton.edu/~sullivanm/wrightpa/kaufmann.html
42
No espaço arquiteturológico, definir um objeto de tal modo que ele seja
visto de um determinado lugar ou fazer com que determinado lugar seja visto a
partir dele, constituindo um ponto de vista no espaço real, caracteriza a
aplicação da escala arquiteturológica de visibilidade.
Figura 9. Vista da cidade de Londres a partir do alto do edifício da Swiss re. Londres,
Norman Foster architect, 2004. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem da
visibilidade. Visão especial da cidade.
Fonte: http://www.arcoweb.com.br/debate/debate105.asp
, 2007
A escala arquiteturológica ótica é resultante da ação de prover
solução a uma parte ou ao todo arquitetural, criando um ponto de vista
particular. Esse ponto de vista deve ser capaz de atrair o observador, fazendo
considerar as modalidades segundo as quais o objeto é visto. Difere da escala
anterior, pelo fato de atrair a atenção apenas para o objeto arquitetural – a
partir do exterior.
Figura 10. Vista do teatro popular de Niterói, Rj. (Oscar Niemeyer, 2007) Com destaque para a
rampa de acesso. Exemplo de escolha realizada por determinismo de ordem ótica.
Fonte:
http://www.avizora.com/publicaciones/biografias/textos/textos_n/0011_niemeyer_oscar.htm,200
7
43
Tomar em consideração convenções, formas tradicionais ou outras
heranças sócio-culturais para interferir no espaço arquitetural, definindo forma
e medida, constitui atribuição da escala arquiteturológica sócio-cultural.
Figura 11. Vista da pirâmide do Louvre, Paris (Pei,1989). Exemplo de escolha realizada
por determinismo de ordem sócio-cultural.
Fonte:http://www.rogerswebsite.com/Europe/17%20%20The%20Louvre%20Museum%
20in%20Paris.jpg
A escala arquiteturológica de modelo é acionada através da retomada
de um modelo anterior, efetuando-se eventualmente algumas modificações de
grau e natureza. É importante registrar dois tipos de modelo a serem
considerados separadamente: os abstratos – expressos por palavras - e os
morfológicos – expressos por formas. Também é importante não confundir com
“escala do modelo” em que apenas as dimensões são modificadas,
permanecendo a carga de significados.
Figura 12. Manifestação da Arquitetura do Greek Revival. New York (séc.XIX). Exemplo de
escolha realizada por determinismo de modelo.
Fonte: http://www.bestseattleproperties.com/styles.htm
44
As operações resultantes da escala arquiteturológica semântica são
permitidas ou sugeridas por palavras ou expressões verbais. As referências se
dão a partir de palavras que designam ordem de grandeza, recortam o espaço
e os objetos, ou constroem imagens dotando esses objetos de características
particulares.
Figura 13. Casa de vidro, EUA. Philip Johnson, 1949. Exemplo de escolha realizada
por determinismo semântico.
Fonte: http://www.thecityreview.com/arcnow.html
Toda operação de concepção interferindo no espaço arquiteturológico,
que considera o tempo em uma perspectiva de futuro, integra a escala
arquiteturológica de extensão.
Figura 14. Le Corbusier. Museu do Crescimento Ilimitado (1939). Exemplo de solução
de implantação no terreno, considerando a escala de extensão.
Fonte:
http://www.getep.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=145&Itemid=16
45
A referência expressa ao custo, nas decisões de concepção, caracteriza
a escala arquiteturológica econômica.
Figura 15. Casa de terra dos Dogon, Mali. Exemplo de escolha realizada por
determinismo econômico (e sócio-cultural).
Fonte: http://www.linternaute.com/voyager/habitats-du-monde/construction-en-terre-du-
pays-dogon.shtml
As considerações geométricas nas operações de medida, interferindo no
espaço arquiteturológico, expressam a aplicação da escala arquiteturológica
geométrica.
Figura 16. Casa da música, Porto, Portugal. Rem Koolhaas, 2006. Exemplo de escolha
realizada por determinismo geométrico.
Fonte:http://www.vivercidades.org.br/publique222/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1223&sid=
18
A escala arquiteturológica cartográfica trabalha com a referência
entre uma medida real e sua representação pertinente. Numerosas operações
46
nos remetem a uma pertinência cartográfica. Ela se encontra perfeitamente
definida quando o espaço de concepção coincide com o espaço de
representação.
Independente da pertinência, a escala arquiteturológica de
representação liga representante e representado. Não é a mesma coisa da
escala cartográfica que liga representante e referente.
Desenvolver operações de concepção, do micro ao macro, seguindo o
nível de representação devido a uma escala cartográfica ou, geralmente
recortar o espaço de concepção em sub-espaços de concepção, caracteriza a
escala arquiteturológica de níveis de concepção.
A pertinência considerada deve exercer uma dominância sobre as
demais, por assumir seu papel principal ou estruturante na concepção. A
função da escala arquiteturológica global é permitir essa ação, podendo
qualquer escala ser igualmente global.
A forma, o talhe ou as dimensões do corpo humano devem ser as
referências escolhidas, para estabelecer as relações nas operações de medida,
a intervir no processo de concepção. Assim funciona a escala
arquiteturológica humana.
Figura 17. Pirâmide do Louvre, Paris (Pei,1989). Exemplo de escolha, mostrando a
relação com a escala humana.
Fonte: http://www.tavooo.com/photos.php?lang=esp&gallery=900001115&img=13303
47
2.3.2 LOCALIZAÇÃO DE ESCALAS
Trata-se da localização das características do objeto arquitetural que
remetem, de forma patente, a uma ou mais escalas arquiteturológicas. A
observação – direta ou através de imagens -, bem como os discursos
formulados sobre o objeto, vão permitir que as escalas sejam localizadas. Uma
vez localizadas, elas podem ser vistas sob três aspectos: funções, relações e
modalidades de ocorrência. A localização de escalas arquiteturológicas ajuda,
também, na compreensão do processo de concepção que envolve e define
determinado projeto. Ela permite a seleção daquelas que atuam de forma mais
determinante na elaboração e desenvolvimento de estudos voltados para a
compreensão do projeto.
2.3.2.1 FUNÇÃO DE ESCALAS
Apontando o foco sobre o desenvolvimento do modelo arquiteturológico,
em toda sua extensão
5
, convém atentar para a forma de atuação que as
escalas adotam no processo de concepção. Acreditamos que o
reconhecimento das funções desempenhadas pelas escalas, deverá contribuir
para que possamos melhor identificá-las, considerando que essa operação se
constitui na iniciativa maior de nosso trabalho de pesquisa.
A propósito do assunto, Boudon afirma que elas podem desempenhar
diferentes funções no espaço de concepção e que essas diferentes funções
podem ser identificadas sob o termo “modo operatório”. E mais, a identificação
dessas funções é importante para a compreensão do trabalho de concepção,
principalmente no que diz respeito à atribuição de medidas. Convém
acrescentar que as funções ainda não anunciam qualquer pertinência, podendo
ser identificadas atuando, já, no início do processo de concepção.
“O modo operatório [conclui Boudon] é uma noção que permite
apreender a diversidade de fatos de medida bem no âmago do espaço de
concepção, ou seja em suas condições de elaboração”. (BOUDON et al. 2000,
p. 244). (Tradução nossa).
5
Tradução considerada para o termo “deployer”, segundo consulta ao dicionário Petit Larousse
Ilustré, 1990 p.311.
48
As dimensões arquiteturológicas servem de base para as operações de
escala – de referenciação
6
, de recorte ou dimensionamento. O ajuste para
definição da medida definitiva de um elemento, requer todo um trabalho de
concepção. Sabe-se que diferentes funções de escala são identificadas no
interior do espaço de concepção, podendo apresentar, de acordo com sua
forma de intervenção, a função de inicialização ou de limitação, “embrayage” e
representação.
A busca por essas identificações se dá em função da necessidade de
uma modelização mais elaborada - da concepção -, e da percepção de que as
escalas apresentam, de fato, diferentes funções. A definição da escala, como
operador da atuação modelo/escala, mostra uma interação que se estabelece
através de operações com função de inicialização e diz respeito ao espaço de
concepção como um todo. Essa interação sendo interrompida, a escala terá
função de limitação, em relação a anterior, atendendo as escolhas do
arquiteto/“conceptor”; caracteriza-se por ser parcialmente atuante.
Outras funções de escala que merecem destaque nos estudos de
arquiteturologia são as de “Embrayage” e Representação. Que algumas
escalas têm função de representação do espaço de concepção já se sabe -
estabelecem uma relação entre o representado e seu referente. No entanto,
uma escala com função de representação do espaço de concepção não toma
para si o encargo de articulação com o real – “Embrayage”. Para que isso
aconteça, é necessária a interferência de outra escala, a fim de que se
estabeleça a referência.
Considera-se que as diferentes percepções são organizadas pelo
arquiteto de maneira simultânea, no processo de concepção; e, reconhece-se
que as escalas arquiteturológicas são escalas de concepção.
Tratando das escalas e sua operacionalização, com relação à percepção
e sua participação no processo de concepção observa Boudon:
Perceber e conceber não remetem forçosamente à mesma
compreensão de um espaço [...] A concepção integra necessariamente
uma visão globalisante, e, decorre desse fato, que as diferentes
percepções possíveis levadas em conta pelo arquiteto são organizadas
6
O termo referenciação não é registrado nos dicionários da língua portuguesa de Holanda
Ferreira,(1975) e Huaiss (2001). Encontramos em textos de algumas áreas como
biblioteconomia e literatura, onde significa estabelecer referências com alguma coisa.
Mantivemos a forma aportuguesada da forma francesa “référenciation”.
49
de maneira simultânea (BOUDON et al., 2000, p. 26). (tradução
nossa).
Em relação à percepção e sua interação com as escalas
arquiteturológicas, ele assevera:
Por definição, as escalas arquiteturológicas são escalas de concepção.
[...] As mesmas pertinências que funcionam na concepção, funcionam
também na percepção. As escalas podem ser encaradas como
operadores segundo as quais espaços de referência são utilizados na
percepção: a concepção comporta uma representação da percepção
(BOUDON et al., 2000, p.248). (tradução nossa).
As operações de medida definidas a partir da relação entre uma medida
e seu valor, em função de um espaço de referência – pertinência -, são as
mesmas na concepção e na percepção. Daí, as mesmas escalas funcionam
para os dois casos, embora em uma situação particular, escalas diferentes
possam intervir.
Na determinação das escalas de concepção, isso se dá por uma
representação das escalas de percepção, embora o contrário não se verifique.
A percepção pode, ainda, ser leitura semântica. Nesse caso, em conseqüência,
os efeitos de conotação podem servir de motivo para transformação de uma
escala de percepção em escala de concepção.
O suporte arquiteturológico é definido como “[...] aquilo sobre o qual se
exerce, efetivamente, a representação do trabalho de uma escala”. (BOUDON
et al. 2000, p.250). Tem por função permitir o trabalho do arquiteto, através de
um recorte no espaço arquitetural. O suporte arquiteturológico, sobre o qual a
escala opera, define seu modo operatório. É importante para que se pense o
modo operatório dessa escala e se identifique as diferentes funções que ela
possa admitir.
2.3.2.2 RELAÇÃO DE ESCALAS
Fatalmente, a identificação das escalas arquiteturológicas conduz à
necessidade de observar a relação entre elas, outro fator importante para a
compreensão do processo de concepção. Segundo Boudon: “Cada edificação
resulta do arranjo entre várias escalas, quer haja domínio de uma sobre as
outras ou não [...]”. (BOUDON et al., 2000, p.197). Cada escala determina algo
50
no processo de concepção, cuja complexidade não pode depender da
determinação de uma única escala.
Várias escalas concorrem para definição de uma mesma medida, assim
como para determinação da forma. Quando acontece uma associação de
várias escalas com a finalidade de definir uma só medida, a relação entre
essas escalas se dá por meio de sobredeterminação. Trata-se de uma
relação sincrônica.
Outro tipo de relação entre as escalas, definido em oposição à já citada,
é a relação por justaposição. Para que isso aconteça é necessário que haja
duas medidas coexistentes e dois suportes diferentes. Portanto, duas
dimensões e duas medidas.
Sobredeterminação e justaposição definem também as modalidades de
passagem de uma escala arquiteturológica a outra, no processo de concepção.
Acrescente-se a elas a modalidade de co-determinação de escalas. Segundo
essa modalidade, uma escala associada a outra pode agir de forma diacrônica,
a partir de uma necessidade do processo. O efeito suscitado pela primeira
escala termina por provocar reação sobre ela mesma.
Uma determinada escala pode assumir a função de outra. Por exemplo,
meta-escala – aquela que tem função a nível local ou global - pode ser também
escala dominante; uma escala semântica pode ter a função de escala global.
A propósito, toda escala – dita também elementar - pode ter função de escala
local ou de escala global. Qualquer escala que possa ser identificada como
participante no conjunto das pertinências é chamada dominante. Ela possui
valor de explicação global.
A meta-escala pode ainda ser principal ou estruturante. Ela é escala
principal quando aparece frequentemente no processo de concepção, mas
sem resultar qualquer efeito importante. Ela é escala estruturante quando, em
determinado caso de concepção, organiza o sistema de pertinências. Pode
resultar de um conjunto de escalas.
As modalidades de articulação entre as escalas trazem à tona a questão
do encadeamento de escalas. As operações de escala se sucedem na
dinâmica do processo de concepção podendo ser de ordem de uma
necessidade ou de uma intenção do arquiteto/”conceptor”. Esse grupamento de
escalas pode ser de Cascata e Revezamento ou, inferência e indução.
51
A cascata de escalas não compreende operações de referenciação, ela
é identificada quando operações de recorte ou de dimensionamento se ligam a
novas operações, de forma necessária. Nesse caso, a pertinência é dada por
outra escala, porém o suporte é o mesmo. Observa-se uma mudança de
pertinência, em que a modalidade operante é a sobredeterminação.
O revezamento de escalas se dá, quando operações de medida
consideram uma pertinência que mantém vínculo com outras pertinências
diferentes, conforme intenção do arquiteto. As diferentes pertinências mantêm
relações de dependência entre si e se estabelecem sobre um mesmo suporte.
A relação de escalas envolvendo duas medidas coexistentes e dois
suportes diferentes – justaposição -, traz novamente à tona a questão da
intencionalidade do arquiteto/”conceptor”. Ela atua na inferência, onde se
observa dois níveis de concepção com autonomia relativa, atendendo à
intencionalidade do projetista. Aí, as operações de medida de um nível estão
ligadas ao que acontece no precedente. No caso dessa relação resultar de
uma necessidade, estamos diante de indução.
As orientações iniciais de um projeto podem ser definidas, claramente,
pela atuação de um conjunto de escalas, organizadas entre si, permitindo ao
arquiteto/”conceptor” estabelecer relação de pertinência com as intenções
iniciais. Essa operação define o partido arquiteturológico.
2.3.2.3 MODALIDADES DE OCORRÊNCIA DE ESCALAS
A análise da relação entre as escalas, bem como a identificação de suas
propriedades comuns constituem operações importantes, para a compreensão
do processo de concepção.
Conforme Boudon: A enumeração da multiplicidade de escalas seria em
vão, se não se colocasse em relação as escalas entre si e se não se
identificasse suas propriedades comuns. (BOUDON, 2000, p.162). (tradução
nossa). Considerando as propriedades das escalas, destacam-se aquelas com
efeito local e aquelas com efeito global, traduzindo as visões espaciais que um
arquiteto tem sobre seu projeto; a espacialização da visão operacional de uma
escala. Em ambas, a visão do arquiteto/”conceptor” é fundamental. É ela que
define o ponto de vista adotado.
52
A escala com função global é aquela que segue um ponto de vista
com implicação global sobre o projeto. Ela repousa sobre um conjunto de
elementos – considerados importantes, naquele momento, na visão do
arquiteto - sem comprometer a totalidade dos elementos do projeto.
A escala com função local atua sobre uma parte desse projeto,
considerada elementar pelo arquiteto - possui implicação local; é aquela que
segue um ponto de vista responsável pelo recorte da parte, na atribuição de
medida. Também é chamada escala de nível de concepção.
Outra modalidade de ocorrência é o grau zero da escala. Para que isso
se verifique, as operações de referenciação, de dimensionamento ou de recorte
definem sua pertinência ao contrário, nessa escala. O grau zero resulta de uma
operação de referenciação e põe em relevo a margem de liberdade que
acompanha a concepção.
A escala arquiteturológica pode receber um tratamento por conotação.
Nesse caso, uma determinada escala receberá uma segunda denominação,
resultante de outra operação de medida. Expressão de nova pertinência.
Compatibilidade de escalas. Não se trata da mesma coisa que
sobredeterminação.
53
3. UNIVERSO DE PESQUISA E SUA CONTEXTUALIZAÇÃO
Este capítulo se compõe de duas partes. Na primeira, será apresentada
uma panorâmica sobre a arquitetura moderna no Brasil, pano de fundo para a
consideração da produção da arquitetura moderna em Natal.
Procura-se fundamentar o contexto em que surge e se desenvolve a
produção do arquiteto João Maurício Fernandes de Miranda, um dos mais
expressivos integrantes desse movimento no estado do Rio Grande do Norte.
O referido arquiteto fez seus estudos no Rio de Janeiro, na Faculdade Nacional
de Arqutetura, tendo concluído em 1961, ano em que inicia suas atividades em
Natal, como autônomo.
A segunda parte será dedicada à seleção dos projetos que definiram a
amostra, sobre a qual foi desenvolvido o presente trabalho de pesquisa. Foram
selecionados, ao todo, 10 projetos de uso não-residencial, concebidos entre os
anos de 1961 e 1981.
Procurou-se, nesta seleção, trabalhar com os exemplares mais
expressivos, no sentido de apresentar determinada elaboração projetual;
consequentemente, mais campo fértil para aplicação da arquiteturologia. Em
seguida, foram desenvolvidas análises voltadas para identificação das escalas
arquiteturológicas, interesse maior do trabalho.
3.1 ARQUITETURA MODERNA EM NATAL: A PRODUÇÃO DO ARQUITETO
JOÃO MAURÍCIO FERNANDES DE MIRANDA
Iniciamos com um breve panorama, pretendendo situar o contexto em
que se iniciou o processo no qual se insere a produção da arquitetura moderna
em Natal e, por extensão, do nosso arquiteto selecionado.
A realização dos pioneiros europeus do Movimento Moderno difundiu-se
no Brasil na década de 20, do século passado. O período de introdução da
Arquitetura Moderna no Brasil - com ênfase especial à chamada “Escola
Carioca” -, praticamente iniciou-se na década de 1930, data de sua chegada e
sua implantação em nosso país, principalmente no Rio de Janeiro.
Trata-se de um processo que levará à adoção dos princípios
corbusierianos, mesclados com nossa herança cultural, que veio mudar de uma
54
vez por todas a face da arquitetura brasileira e seu ensino. Os arquitetos
modernistas partiram, também, em busca de uma linguagem brasileira para os
postulados funcionalistas.
É com esse objetivo que são resgatados os velhos combogós, as treliças
e os azulejos de revestimento, para uso juntamente com os princípios
defendidos por Le Corbusier – “pilotis”; teto-jardim; autonomia das paredes, em
relação à estrutura; e janelas-cortina. Sem esquecer os “brises-soleil”.
Nesta fase, Ficher e Acayaba (1982) afirmam que,
“[...] os arquitetos brasileiros davam preferência às formas geométricas
claramente definidas, à separação entre estrutura e vedação,
permitindo maior liberdade no agenciamento interno dos edifícios, ao
uso sistemático do pilotis, aos panos de vidro contínuos, ao invés das
janelas tradicionais, e à integração da arquitetura com o entorno pelo
paisagismo e com as outras artes plásticas pelo emprego de murais,
painéis de azulejo decorado e escultura em substituição à decoração
aplicada.” (FICHER e ACAYABA, 1982, p.10)
Esse movimento se apresenta, conforme o define Paulo Santos (1981),
em quatro fases. Segundo seu entender, os acontecimentos que demarcam
cada fase são os seguintes:
“[...] Primeira fase – da posse de Lúcio Costa na ENBA-Escola
Nacional de Belas-Artes à visita de Le Corbusier; segunda fase – da
vinda de Le Corbusier / início da construção do edifício do MEC à
Pampulha; terceira fase – inaugurada com a construção da Pampulha,
até a construção de Brasília - fase de superação da ortodoxia funcional
e regularidade geométrica de traçados, rumo à procura da liberdade
formal, através da incorporação de novas idéias; quarta fase - da
construção de Brasília em diante. A primeira é chamada de
implantação, inicia em 1930 e vai até 1936; a segunda, de 1936 a
1941; a terceira, de 1941 a 1961; a quarta, iniciada com a construção
de Brasília.” (SANTOS, 1981, p.103).
No final desse período, encontram-se consolidados e definitivamente
codificados os postulados da doutrina da Arquitetura Moderna no Brasil
Os referidos postulados, uma vez codificados, assim foram relacionados
por Lúcio Costa:
“[...] a disponibilidade do solo apesar de edificado, graças aos pilotis,
cuja ordenação arquitetônica decorre do fato de os edifícios não se
fundarem mais sobre um perímetro maciço de paredes, mas sobre os
pilares de uma estrutura autônoma, os pisos sacados para uma maior
rigidez; as fachadas translúcidas guarnecidas – conforme se orientam
para a sombra ou não – de quebra-sol ou apenas dispositivo para
amortecer a luminosidade segundo a conveniência e a hora e,
motivadas pela circunstância de já não constituir mais a fachada
elemento de suporte, senão simples membrana de vedação e fonte de
55
luz, o que faculta melhor aproveitamento, em profundidade, da área
construída; a livre disposição do espaço interno, utilizado
independentemente da estrutura; a absorção dos vigamentos para
garantir a continuidade calma dos tetos; a recuperação ajardinada da
coberta.” (COSTA, 1995, p.168)
Considerando os princípios definidores da Arquitetura Moderna de Le
Corbusier, convém atentar para as características pelas quais seriam
identificados, posteriormente, os trabalhos da chamada Escola Carioca.
Houve na Arquitetura Moderna brasileira, um movimento liderado por
Lúcio Costa no Rio de Janeiro, que vai da década de 30 até os idos da
construção de Brasília, nos meados dos anos 50, chamado pelos críticos e
estudiosos europeus e norte-americanos de “Brazilian School”, “Cariocan
School”, “First National Style in Modern Architecture” e que é conhecido pela
historiografia brasileira como Escola Carioca. A influência da Escola Carioca se
fez visível em várias partes do Brasil, em obras de destaque nas principais
cidades do país.
O caráter dessa arquitetura se deu através da reunião dos elementos de
arquitetura e de composição identificados nos seus mais importantes projetos,
como os “brises-soleil”, o elemento vazado, os pilares de seção circular, além
dos elementos corbusierianos de composição cúbica e prismática.
É assim que o “brise-soleil” no Brasil, criado pelos modernistas cariocas,
tinha o sentido de proteger as fachadas e o edifício da intensa quantidade de
sol dos trópicos e não como mais um dos elementos modernos estéticos; o
pilotis”, outro elemento moderno da arquitetura no Brasil, foi usado para que
houvesse transparência no percorrer do terreno, e sombra e proteção, e não
apenas como elemento de vislumbre; o uso maciço do concreto armado, com
inteligência e criatividade, moldando-o às necessidades funcionais e não
apenas como morfologia projetual.
A disseminação dessa linguagem deu-se, em boa parte, pela participação
de profissionais do Rio de Janeiro ou daqueles que se formaram na Escola de
Belas Artes, depois Faculdade Nacional de Arquitetura, da Universidade do
Brasil.
A produção da Escola Carioca começa a se tornar expressiva, a partir da
concepção e construção do edifício do Ministério da Educação e Saúde
(1936/1943).
56
3.1.1 INFLUÊNCIA DA ESCOLA CARIOCA NO NORDESTE
Aqui se pretende explicitar, brevemente, o quanto a arquitetura moderna
do Nordeste deve à Escola Carioca. Notadamente a Acácio Gil Borsoi e seu
papel de divulgador da arquitetura moderna, praticada sob os princípios da
Escola Carioca.
A ida de arquitetos formados pela Escola Nacional de Belas-Artes do Rio
de Janeiro – posteriormente Faculdade Nacional de Arquitetura - para cidades
como Recife e Salvador estimulou a difusão do repertório da arquitetura
moderna, a partir dos anos 30.
Em Recife, aparece a figura de Luís Nunes, discípulo de Lúcio Costa,
que permanece de 1934 a 1937, deixando alguns projetos – verdadeiras
referências - construídos para a iniciativa pública. Em Salvador, destacam-se
as figuras de Paulo Antunes Ribeiro – década de 40 – e José Bina Fonyat, na
década de 50.
Nas décadas de 1920-30 chegavam também à capital paraibana os
primeiros arquitetos com idéias modernistas, dentre eles destacam-se: Pascoal
Fiorilo, Olavo Freire, Clodoaldo Gouveia, Hermenegildo Di Láscio, alguns deles
formados pela Escola de Belas-Artes do Rio de Janeiro. A nova linguagem
arquitetônica adotada sofria influência do modernismo europeu, em especial de
Le Corbusier, e seguia os exemplos das obras realizadas no Rio de Janeiro por
Lúcio Costa, Afonso Reidy, Carlos Leão, M. M. Roberto, entre outros; e em
Brasília, quando a obra de Niemeyer exerceu grande influência sobre a
produção moderna local.
Nos anos 50, em Recife, o carioca Acácio Gil Borsoi juntamente com o
arquiteto português Delfin Amorim, provocaram uma transformação na
arquitetura local. Borsoi formado no Rio de Janeiro e Amorim formado em
Portugal.
Acácio Gil Borsoi nasceu no Rio de Janeiro em 1924, concluindo o curso
de arquitetura em 1949, pela Faculdade Nacional de Arquitetura do Rio de
Janeiro; foi estagiário no escritório de Affonso Eduardo Reidy. Veio a Recife em
1951, contratado como professor do Curso de Arquitetura da Escola de Belas-
Artes da Universidade do Recife (fundado em 1932 e oficializado em 1948).
Posteriormente, curso de Arquitetura da Universidade Federal de Pernambuco-
57
UFPE. Enquanto Amorim mostra influências de Le Corbusier, Borsoi
demonstra, através de seu trabalho, influências de Reidy e Niemeyer e, em
segundo plano, de Lúcio Costa.
As bases para o surgimento da escola do Recife teriam sido a
conjugação das idéias de Costa, adaptadas ao contexto local, principalmente
através da contribuição sistemática de um educador de sólida formação cultural
– Delfin Amorim. (Silva, 2001).
Nos anos 50, Borsoi projeta importantes edifícios públicos, dentre eles o
Pronto Socorro do Recife (1955, atual Hospital da Restauração), o Museu de
Arte Moderna (1955, não construído), sua produção se estende a outros
programas modernos e ultrapassa a cidade do Recife, com projeto para o
Clube Cabo Branco, em João Pessoa.
Este período que coincide com o pós-guerra europeu consolidou no
Brasil a hegemonia do grupo carioca; o talento de Oscar Niemeyer influenciou
esta geração de jovens arquitetos, assim como os ensinamentos do célebre
arquiteto e urbanista Lúcio Costa, sobre a arquitetura tradicional e nosso
passado colonial. (Amaral e Naslavski, 2003).
3.1.2 ARQUITETURA MODERNA EM NATAL: INTRODUÇÃO E
DISSEMINAÇÃO
A cidade do Natal/RN, cidade provinciana, inicia o século XX com sua
arquitetura totalmente impregnada pelo estilo Neocolonial e pelo estilo
denominado Eclético. Sobrevivem, também, reminiscências do casario colonial
com seus telhados desaguando diretamente através dos beirais, durante muito
tempo delimitando o espaço das ruas.
Em 1935, no governo Rafael Fernandes, a cidade passa por
transformações urbanísticas que vão ter repercussões também com relação à
arquitetura. Uma nova linguagem arquitetônica é dada a conhecer através das
propostas para os novos edifícios públicos, como por exemplo, as Estações
Ferroviária e Aeroportuária, integrantes do projeto realizado pelo escritório de
Saturnino de Brito, em 1935.
58
O Mercado Público da Cidade Alta, inaugurado em 1937, apresenta uma
fachada totalmente destituída de ornamentos e com a predominância de linhas
retas.
Mais expressivo é o projeto do edifício da Comissão de Saneamento de
Natal, situado na Avenida Rio Branco e concebido também pelo escritório de
Saturnino de Brito. Em suas fachadas podem ser vistas influências de Walter
Gropius (BAUHAUS) e Le Corbusier. A semente está lançada. Surgem aos
poucos outras propostas influenciadas pela nova arquitetura, incluindo
habitações, em sua maioria.
Nos anos 50, Natal seria introduzida definitivamente na modernidade
arquitetônica. Observam-se alguns exemplares da mais pura expressão
modernista como a sede do América (1959), projeto de Delfin Amorim,
arquiteto português radicado em Recife; edifício do INSS/Ribeira (1954),
projeto de Raphael Galvão Júnior – arquiteto carioca; sede do ABC, projeto de
Agnaldo Muniz (1959) – desenhista local - , entre outros.
Considerando que o arquiteto de nosso interesse é potiguar, queremos
chamar a atenção para os arquitetos nascidos no RN que tiveram sua
formação em cursos de outros estados e, ao voltarem, contribuíram para
disseminar a Arquitetura Moderna em Natal, nas décadas de 50 e 60.
Vários desses arquitetos tiveram sua formação profissional basicamente
em dois estados, Pernambuco e Rio de Janeiro. Pernambuco tendo criado seu
curso de arquitetura na década de 50 e Rio de Janeiro ainda no século XIX.
Pode-se fazer referência a Ubirajara Galvão, Daniel Hollanda e
Raimundo Gomes formados pela UFPE, enquanto João Maurício Fernandes de
Miranda e Moacir Gomes são formados pela Faculdade Nacional de
Arquitetura, então Universidade do Brasil no Rio de Janeiro.
O trabalho desses profissionais reveste-se de uma importância muito
grande para a compreensão da evolução da arquitetura local, porém tem sido
pouco estudado e divulgado. Muito de sua produção foi destruída –
principalmente os “croquis” - ou não saíram do papel – a chamada arquitetura
potencial, conforme Chupin.
Esta dissertação tem, entre outras, a finalidade de contribuir para o
resgate da memória do período de produção da Arquitetura Moderna em Natal,
59
se debruçando sobre a contribuição de um de seus agentes, documentando e
analisando parte da sua produção.
3.2 SELEÇÃO DA PRODUÇÃO DE JOÃO MAURÍCIO FERNANDES DE
MIRANDA NO PERÍODO 1961/1981: CRITÉRIOS E DEFINIÇÃO DA
AMOSTRA
Iniciamos com a contextualização da produção da arquitetura moderna
em Natal, no período selecionado (1961/1981). Este período compreende duas
fases segundo Consulin
7
(2004), em sua dissertação de Mestrado “Yes. Nós
temos arquitetura moderna”: década de 60 – momento de consolidação e maior
domínio sobre as possibilidades do léxico formal e da técnica construtiva
modernos; década de 70 – fase do Brutalismo Potiguar (por apresentar traços
característicos que mostram influências do chamado Brutalismo Paulista) e de
dispersão do ideário modernista. Esta última é a fase que sucede à superação
da ortodoxia funcional e regularidade geométrica de traçados, rumo à procura
da liberdade formal, através da incorporação de novas idéias. (Santos, 1981)
Essa contextualização serve como referência, muito embora não
signifique que toda a produção selecionada deva, necessariamente, apresentar
traços do estilo brutalista.
Como vimos, a concepção de um edifício supõe a intervenção de várias
escalas, com o intuito de atribuir dimensões ao modelo; a identificação dessas,
suas funções e operações realizadas, se afiguram como importantes iniciativas
na compreensão do processo que envolve a concepção arquitetural.
Dentre as várias escalas arquiteturológicas, algumas se mostram alvo de
atenção especial. No nosso caso, a escala de modelo pode vir a ser de
extrema importância, em virtude da formação do arquiteto em questão e
possíveis influências dessa formação sobre a concepção de suas propostas.
Falamos da Escola Carioca, uma vez que João Maurício Fernandes de Miranda
7
Trata-se de um dos poucos estudos sobre a produção da arquitetura moderna em Natal.
Talvez o mais elaborado. Segundo sua autora, “este trabalho tem por objetivo apresentar a
arquitetura moderna potiguar através dos seus exemplares residenciais, investigando
especificidades dos seus aspectos formais, construtivos e espaciais que, em conjunto,
demonstram mais um sotaque da arquitetura moderna brasileira: o potiguar”.
60
cursou a Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro, tendo aí concluído o curso
de arquitetura em 1961.
O intervalo de sua produção, escolhido para análise, compreende os 20
primeiros anos de sua atuação profissional - no RN. Espera-se encontrar,
nesse período, caso sejam confirmadas, influências mais marcantes exercidas
pela referida escola sobre suas propostas. Nossa pesquisa não contempla as
propostas do arquiteto para edifícios de uso residencial – maior percentual em
sua produção. Optamos pelos edifícios de uso não residencial por acreditarmos
ter em mãos maiores chances de analisar propostas com um maior nível de
elaboração formal, principalmente nas propostas concebidas e apresentadas
em concursos.
De um total de 117 projetos (produção do período 1961/1981) de
residências, edifícios comerciais e edifícios públicos – construídos e não
construídos - foram selecionadas 10 propostas para análise aprofundada.
Foram adotados como critérios de escolha:
a existência de registro gráfico, disponível no escritório do autor;
aspectos qualitativos da informação gráfica capazes de fornecer
subsídios para a análise;
informação gráfica em quantidade suficiente, permitindo a
aplicação da metodologia de trabalho da Arquiteturologia;
memória do projeto, através do relato do seu autor.
O critério de seleção de maior peso, aquele que definiu as obras que
viessem apresentar maior diversidade de informação, enfim que tornasse
possível ter acesso a desenhos, croquis e a entrevistas com o autor, permitindo
a aplicação da abordagem escolhida.
As técnicas aplicadas previram também o uso da documentação indireta
- a pesquisa documental e bibliográfica -, além da análise qualitativa com base
na documentação (desenhos) e discurso, sendo prevista visita “in loco”.
Foi usada a observação direta intensiva para se obter aspectos da
realidade dos projetos executados e, também, para a aplicação de entrevistas.
A abordagem da Arquiteturologia, através das noções previamente
apresentadas, foi aplicada sobre o suporte gráfico – plantas, cortes, esboços e
perspectivas, etc – tendo em conta a possibilidade da Escola Carioca se
constituir na escala de modelo arquiteturológico aplicada pelo arquiteto. Esse
61
modelo se constitui em um modelo de conhecimento, capaz de contribuir na
interpretação do fenômeno que se pretende analisar.
3.2.1 O ARQUITETO JOÃO MAURÍCIO F. DE MIRANDA E SUA PRODUÇÃO
COMPREENDIDA ENTRE OS ANOS 1961 E 1981.
Trata-se de um profissional que, além da formação no Rio de Janeiro,
produziu projetos fortemente influenciados pela Arquitetura Moderna de
inspiração corbusieriana, tendo também atuação pedagógica destacada,
ministrando disciplinas nos cursos de Engenharia Civil e no Curso de
Arquitetura e Urbanismo da UFRN.
O arquiteto João Maurício Fernandes de Miranda nasceu em Natal(RN)
em 1933, concluindo seu curso de arquitetura pela Faculdade Nacional de
Arquitetura no Rio de Janeiro, em 1961.
A partir de 1962 retorna a Natal dividindo suas atividades entre o
escritório de arquitetura e a sala de aula.
Lecionou, inicialmente, na Escola de Engenharia da UFRN, de 1965 a
1974. Entre 1974 e 1976, organizou a montagem do Curso de Arquitetura e
Urbanismo da UFRN, do qual foi seu primeiro coordenador. Lecionou nesse
mesmo curso as disciplinas Planejamento Arquitetônico I, II e IV; e
Planejamento Urbano e Regional I e II, entre os anos 1975 e 1988..
Em 1981, ano de publicação de sua obra “380 Anos de História Foto-
Gráfica da Cidade de Natal - 1599–1979”, registrava a produção de 112
projetos executados e 20 anos de atividade profissional.
No início da década de 60, associou-se a Moacir Gomes e Daniel
Hollanda no escritório de arquitetura PLANARQ – Planejamento Geral de
Arquitetura Ltda. A partir de 1972, instala seu próprio escritório com o nome
JOÃO MAURÍCIO – arquitetura e urbanismo, em atividade até os dias de hoje.
Sua produção, no período demarcado para a pesquisa, inclui projetos
como a sede do D.E.R. (1965), juntamente com Moacir Gomes e Daniel
Hollanda; Edifício Barão de Rio Branco e Conjunto Residencial Normandie
(1970); edifício sede do TRE (1972); capela do Campus da UFRN (1973); sede
da Procuradoria Regional da República (1973); Ginásio do Campus da UFRN,
Escola Kennedy, ambulatório da Base Naval, (sem acesso às datas precisas);
62
fábricas Seridó (Natal) e Empele (São Gonçalo do Amarante); projetos de
várias residências e intervenção no patrimônio histórico local.
Sua formação, no Rio de Janeiro, aconteceu no período caracterizado
por SEGAWA (1998) como o de “Afirmação de uma Escola (a Escola Carioca)
1943-1960”. A adequação dos princípios corbusierianos à realidade local, a
essa altura, já merecia o reconhecimento da crítica internacional. A Escola
estava consolidada, e com ela seu léxico.
Para proceder à identificação e análise das escalas arquiteturológicas
foram, então, selecionados os seguintes projetos:
Catedral Metropolitana de Natal, Natal – 1966;
Tribunal Regional Eleitoral, Natal – 1972.
Procuradoria Regional da República, Natal – 1973;
Capela do Campus Central da UFRN, Natal – 1973;
Terminal Rodoviário de Natal, Natal – 1978;
Hospital Distrital de Macaíba, Macaíba, RN – 1981;
63
4. ANÁLISE DOS PROJETOS SELECIONADOS
Neste capítulo, serão analisados os projetos selecionados da produção
do arquiteto João Maurício, anunciados no capítulo anterior. A leitura
arquiteturológica aplicada nessas propostas pretende revelar as pertinências
de escalas que mais se destacaram em sua concepção, bem como as funções,
as formas de relacionamento e modalidades de ocorrência entre elas.
Inicialmente, será apresentada uma leitura da proposta estabelecendo
possíveis relações com cada uma das pertinências apresentadas por Boudon
et al.(2000) – Escalas elementares. Essa leitura fornecerá os elementos que
definirão as escalas arquiteturológicas que mais se evidenciam e como elas se
articulam. A observação da edificação “in loco” (quando se tratar de obra
executada) e/ou do registro gráfico (único registro disponível no caso da
chamada arquitetura de papel), serão complementados pelos discurso(os)
produzido(os) pelo autor do projeto e outras fontes possíveis.
4.1 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DA CAPELA ECUMÊNICA DO
CAMPUS DA UFRN, EM NATAL.
O projeto arquitetônico da Capela Ecumênica do Campus Central da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte-UFRN resultou de um concurso
fechado, instituído pela universidade em 1973, tendo sido convidados os
arquitetos potiguares Ubirajara Galvão e João Maurício Fernandes de Miranda,
além do paraense Alcir Meira, com resultado favorável ao arquiteto João
Maurício. Sua construção se deu nesse mesmo ano, tendo sido inaugurada em
dezembro do ano seguinte.
A Arquiteturologia, como foi dito no capítulo anterior, procura apreender
a complexidade do trabalho de concepção do arquiteto desde as idéias que
estão no início do processo e supondo a “embrayage” do espaço de concepção
com o espaço real.
Concebida sob a forma de pirâmide, totalmente em concreto aparente, o
volume principal que compõe a capela apresenta o cruzamento de suas
colunas inclinadas deslocado em relação ao centro da figura geométrica que
define a nave. Essa modificação, como afirmou Miranda, “foi motivada pelos
64
estudos de acústica, previamente desenvolvidos, com o objetivo de garantir
boa propagação do som no interior da nave”. Enfatizando a liberdade de
criação do arquiteto, João Maurício colocou como importante esses estudos de
acústica, resultando na definição da dimensão das faces da pirâmide. Resulta,
também, dos mesmos estudos, a inclinação dessas faces e a autonomia na
definição dos tamanhos dos quatro triângulos que definem o volume. Levou-se
em consideração o local do altar como fonte de emissão do som que deveria
ser distribuído por toda a nave. Outra solução de ordem técnica diz respeito ao
revestimento da coberta. Foi recomendado, na época da construção, o uso de
alumínio para acabamento, não tendo sido executado, segundo o arquiteto
autor da proposta, por falta de recursos. Tem-se, portanto, soluções
determinadas por considerações de ordem técnica que remetem a uma
pertinência (escala arquiteturológica técnica), expressas através de atos de
escolha do arquiteto.
Outra escolha presidida pela escala arquiteturológica técnica foi o uso do
concreto armado. Sua flexibilidade plástica permitiu, com facilidade, a
execução da forma prevista.
Figura 18. Planta Baixa mostrando o cruzamento das vigas principais de coberta.
Fonte: acervo de JMFM, 2007.
A solução da nave semi-enterrada foi Justificada pelo autor do projeto
como possibilidade de permitir acesso visual às cerimônias, a partir do espaço
externo de circulação que contorna a nave.
65
Figura 19. Corte mostrando a nave semi-enterrada.
Fonte: acervo de JMFM, 2007.
Foi criado o espaço da nave propriamente dito, onde a participação dos
fiéis seria direta; e uma outra opção para os que quisessem assistir de fora.
Criou-se um espaço de circulação em nível mais elevado (acima do nível de
piso da nave), onde as pessoas poderiam também deambular; uma forte
analogia com o alpendre da casa colonial. Os vitrais deveriam apresentar
partes fixas e móveis, possibilitando acesso visual a partir do exterior. Na visão
do autor do projeto, o espaço ecumênico deveria conotar a idéia de liberdade,
possibilitando diversas formas de participação. A escala arquiteturológica
funcional, pois, é expressa mediante a influência dessas escolhas
comprometidas com o uso.
Figura 20. Vista da circulação externa, lateral à nave, abrigada sob a coberta.
Fonte: acervo do autor, 2007.
A edificação apresenta uma cruz em sua fachada principal, deslocada da
pirâmide. A grande dimensão atribuída a este elemento serve para destacar o
uso simbólico da cruz na identificação da função básica do edifício. Esta
pertinência define a escala arquiteturológica simbólica dimensional. Ao
66
mesmo tempo, o elemento cruz estabelece uma referência visual, capaz de
atrair a atenção do observador e indicar o acesso principal à nave. É útil para
orientar o usuário a partir do exterior, assim como mostrar o volume que marca
a entrada do edifício, resultando da aplicação da escala arquiteturológica
ótica.
Figura 21. Vista da capela com a cruz em primeiro plano, mostrando também os
volumes que indicam o acesso.
Fonte: acervo do autor, 2007.
O grau zero da escala arquiteturológica simbólica formal é
encontrado na solução da planta da capela. Esta foi concebida diferente da
planta tradicional do templo católico (sempre aludindo à cruz), apresentando
apenas o percurso que liga a entrada ao altar. Sua forma se apresenta
desprovida de simbologia – a forma trapezoidal não possui nenhum significado
no universo cristão -, sem qualquer conteúdo espiritual.
Figura 22. Comparação entre as duas propostas de planta: a tradicional e a da capela.
Fonte:wikipedia /acervo de JMFM, 2007.
67
Como já foi dito, a nave da capela foi concebida semi-enterrada.
Considerando que não se trata de um determinismo topográfico, pois a porção
de terreno na qual ela está implantada é plana, esta solução expressa o grau
zero da escala arquiteturológica geográfica. Por outro lado, podemos afirmar
que os generosos beirais definidos pelo limite inferior da pirâmide, projetando
sombra, resultam de dimensionamento inspirado por essa mesma escala, em
função do clima local e da preocupação com o conforto térmico.
Figura 23. Beiral da pirâmide/coberta.
Fonte: Acervo do autor, 2007.
Figura 24. Corte longitudinal, mostrando a relação da nave com o terreno plano.
Fonte: Acervo de JMFM, 2007.
A topografia do terreno foi decisiva para definição do local de
implantação do edifício religioso. Conforme depoimento do autor do projeto,
“buscou-se o local mais elevado, que oferecia melhor visão, para aí ser
localizada a capela.” Aplica-se assim a escala arquiteturológica de
visibilidade. A concepção da praça cívica foi posterior, locada em frente à
capela, sendo situada em cota de nível mais baixa.
68
Figura 25. Vista aérea mostrando a capela e a praça cívica.
Fonte: acervo da UFRN, 2005.
Figura 26. Localização elevada da capela, mostrando o elemento que marca a entrada.
Fonte: acervo do autor, 2007.
A presença da coberta de quatro águas, conforme analogia estabelecida
pelo autor do projeto, expressa pertinências da escala arquiteturológica
sócio-cultural. Segundo seu discurso, ele afirmou que a forma piramidal da
capela resultou da analogia com a coberta da casa grande colonial de quatro
águas. Outra analogia que pode ser registrada diz respeito aos vitrais coloridos
que contornam três das quatro faces da nave, remetendo às catedrais góticas.
Essas soluções, operantes no espaço de concepção, caracterizam
pertinências da escala arquiteturológica de modelo – no caso, modelo
morfológico. A presença do concreto armado, a exploração plástica da
estrutura e a forte geometrização da forma podem ser considerados elementos
tomados de modelos anteriores (Escola Carioca, Brutalismo Corbusieriano),
igualmente resultantes da mesma pertinência.
69
Figura 27. Vista da coberta da capela, destacando-se entre as árvores. Fonte: Acervo
do autor, 2006.
Figura 28. Vista dos vitrais que contornam a nave. Fonte: Acervo do autor, 2006.
A presença marcante da geometria, definindo a volumetria do edifício, a
estrutura e a planta trapezoidal da nave, expressa a pertinência da escala
arquiteturológica geométrica. Segundo afirmação do autor do projeto, não se
trata de determinação econômica. Em virtude de exercer uma dominância
sobre as demais, essa escala assume seu papel principal ou estruturante na
concepção. A função da escala arquiteturológica global é aplicada à escala
técnica e à escala funcional, recorrentes ao longo do processo de concepção.
A escala arquiteturológica humana tem sua expressão mais forte no
dimensionamento dos volumes que abrigam o acesso de entrada e o
apartamento do vigário. A relação estabelecida entre a dimensão do corpo
humano e os ambientes apresenta-se, aí, de forma mais visível.
70
O projeto arquitetônico da capela apresenta vínculo mais forte com doze
escalas elementares, das vinte pertinências de escala apresentadas por
Boudon.
FUNÇÕES DE ESCALAS
Identificadas as principais escalas arquiteturológicas na leitura do projeto
do arquiteto João Maurício, passamos a examinar as funções que essas
escalas apresentam, durante o processo de concepção.
Iniciamos com a pergunta: o que estaria em jogo, na cabeça do
arquiteto, no início da concepção da capela do campus da UFRN, em Natal?
Como já foi dito, a forma de atuação das escalas ao longo do processo
de concepção, pode variar enormemente, sendo esta revelada através do
termo “modo operatório.” Com o intuito de proceder a uma modelização mais
detalhada da concepção, serão levantadas as escalas que participam de forma
mais decisiva do processo de concepção da capela. A ênfase recai sobre as
funções de inicialização. As demais funções não serão alvo de identificação
por terem uma atuação secundária em relação a essas.
O projeto se apresenta definido por formas nitidamente geométricas,
simples e marcantes - predominando a pirâmide de coberta da nave -,
facilmente apreendidas pela visão, sob a luz do sol da cidade do Natal. A
considerar pela determinação dessas formas na definição do edifício, a escala
geométrica parece presidir a escolha inicial do partido arquitetural, fornecendo
um ponto de vista para o início do processo de concepção.
Na origem do projeto, pode-se considerar ainda a presença da escala
técnica. Como afirmou o autor da obra, partiu-se de estudos de acústica que
foram decisivos na definição inicial da volumetria, bem como no
dimensionamento dos triângulos que formam a pirâmide de coberta. Esses
estudos também foram importantes na definição do ponto de cruzamento das
vigas principais, sobre a planta da nave. Em razão da ênfase atribuída, essas
escalas terão função de inicialização para o projeto. Igualmente importante
como escala de inicialização pode-se eleger a escala funcional, que orienta
todas as decisões tomadas pelo arquiteto, no espaço de concepção. Temos,
portanto, três escalas elementares, consideradas na função de inicialização do
71
projeto da capela. Essas escalas são embrayantes, pois permitem a
articulação com o espaço real. É importante registrar a presença da escala
sócio-cultural enquanto escala de modelo. Deve-se a esta pertinência a
analogia do deambulatório (espaço de circulação externa, em volta da nave)
com o alpendre das casas nordestinas, como afirmou o autor.
RELAÇOES DE ESCALAS
No processo de concepção, as diferentes funções adotadas pelas
escalas, naturalmente conduzem a relações e articulações entre as mesmas. E
mais, sabe-se que uma construção não pode se limitar a determinação
procedente de uma única escala. Partindo dos três modos de relação de
escalas apresentados por Philippe Boudon, passaremos a observar como se
dá o relacionamento daquelas já identificadas como de importância na
concepção do edifício em pauta.
Observando-se a atuação das escalas técnica, geométrica e
funcional, percebe-se sua participação ativa no dimensionamento da
volumetria da nave da capela, entre outros. Considerando a associação entre
as três, na definição das dimensões da citada nave, conclui-se por um modo de
relação por sobredeterminação, uma vez que elas se unem para definição de
uma única medida, de forma sincrônica.
Outra definição de medidas que é resultante de uma associação é dada
pelas escalas de modelo, sócio-cultural e técnica. Mais uma associação por
sobredeterminação. Trata-se da definição das medidas que compõem três das
paredes laterais da nave da capela. Chama-nos a atenção a porção superior
(onde se situam os vitrais). Concorrem, na definição de suas medidas,
pertinências resultantes dos espaços de referência que levam em conta o
modelo (os vitrais, o alpendre), os usos culturais (o alpendre da casa colonial) e
as possibilidades técnicas permitidas pelo concreto. A escala técnica
encontra-se presente nessas duas associações de escalas marcadas pela
sobredeterminação, confirmando, pois, a importância de seu modo de atuação.
Três outras escalas se associam também por sobredeterminação, para a
definição das medidas do elemento situado à entrada da nave. Escalas
funcional, humana e ótica. Este elemento atende as pertinências que
72
consideraram a função do espaço, seus usuários e a indicação do acesso
principal do templo. Predomina, entretanto, o ponto de vista ótico. No momento
que o arquiteto decide utilizar a escala ótica para estabelecer as dimensões do
elemento, esta escala passa a ser co-determinada pelas outras duas.
Em relação à fachada principal, a composição considera a pertinência
procedente da escala funcional e da escala humana, na definição do
elemento de acesso. Sua volumetria apresenta dimensões de alturas
diferentes, embora mantendo certa relação com a altura do espaço que separa
a pirâmide do solo – área ocupada pelos vitrais. A relação entre essas escalas
caracteriza o modo de justaposição, mostrando duas dimensões e dois
suportes de medida.
Um exame da volumetria geral mostra uma pirâmide que se destaca,
além de dois outros volumes menores. Observa-se uma mudança de escalas
entre eles. No primeiro, o dimensionamento privilegia a escala técnica,
enquanto nos outros dois as dimensões refletem, primordialmente, a escala
funcional.
MODALIDADES DE OCORRÊNCIA DE ESCALAS
As escalas técnica, funcional e geométrica foram definidas como
escalas inicializantes. A escala geométrica, devido a sua participação no
processo, determina ao partido um ponto de vista global, como também
pontos de vista relativos a níveis de concepção particulares. Cada elemento do
edifício tem suas dimensões determinadas por essa escala, cujo determinante
maior – a presença marcante da geometria - constitui a linguagem
predominante. As formas se destacam contra um fundo composto pelas dunas,
estabelecendo um contraponto. Um verdadeiro grau zero de escala de
vizinhança.
Considerando as escalas que atuam de forma global e em operações de
medida relativas a partes do edifício, a atenção se volta, mais uma vez, para as
escalas técnica, geométrica e funcional. As duas primeiras com caráter mais
global, em razão de sua participação na maior parte das operações, a partir da
definição da volumetria básica; do partido. A última relacionada tem uma
atuação intensa no dimensionamento do projeto, embora, em alguns
73
momentos, a pertinência encontrada seja definida por outra escala – simbólica,
por exemplo.
A escala de visibilidade apresenta uma participação muito limitada no
processo de concepção. Ela é acionada apenas no momento de implantação
no terreno, quando se escolhe a cota mais elevada. Igualmente atuante de
forma limitada, observa-se o ponto de vista operado através da escala ótica. A
definição das dimensões de altura da cruz, à frente da fachada principal,
resulta de escolha com implicação apenas local.
A escala geométrica, como vimos, tem implicação global no projeto. No
momento em que ela é acionada para definição dos vitrais que contornam a
nave, ela passa a ter implicação também local.
Outra modalidade de ocorrência é o grau zero da escala. Foi
identificado o grau zero da escala arquiteturológica geográfica. Observou-se
a solução da nave semi-enterrada sem que a topografia do terreno assim
determinasse. Outro grau zero de escala foi identificado na escala
arquiteturológica simbólica formal, definida pela planta da capela que foge à
definição tradicional da nave das igrejas católicas - ruptura muito recorrente
nos projetos de arquitetura moderna: catedral de Brasília, por exemplo. O ponto
de vista adotado pelo arquiteto privilegia a função – no primeiro caso – e a
técnica – no segundo. A observação atenta indicará outros graus zero de
escalas, como no caso da definição das dimensões da cruz plantada em frente
à capela. Sua altura, por exemplo, não resulta de determinante de ordem
técnica, mas de ordem simbólica.
As constatações acima ilustram negação intencional do projetista
durante operações de referenciação, dimensionamento ou recorte – as três
operações constitutivas da escala arquiteturológica -, ao longo do processo de
concepção, definindo pertinências nessas escalas de forma invertida.
Mobilizadas ao contrário.
A escala arquiteturológica pode receber um tratamento por conotação.
A idéia de liberdade, segundo seu autor, presidiu a concepção arquitetônica da
capela do campus da UFRN, em Natal. Criado com a intenção primordial de
atender a cultos de diversas religiões, o edifício se apresenta desprovido de
símbolos exclusivos, expressão de uma única crença.
74
Essa idéia, refletida no espaço, foi expressa por uma coberta em forma
de pirâmide. A forma do templo – casa de DEUS – se inspira na forma da
habitação com telhado em quatro águas – casa do homem. A escala simbólica
é operada, orientando as operações da pertinência técnica. A significação
conotativa do signo “casa” é trabalhada na definição do partido
arquiteturológico, configurando um tratamento de escala por conotação. A
solução apresentada pelo arquiteto, criando a pirâmide, conota simbologia e
técnica. Expressa a modernidade de forma geométrica e através do concreto.
A escala sócio-cultural é solicitada na consideração do ponto de vista
inicial, permitindo o desenvolvimento do partido. A analogia com o alpendre
resulta, também, da mesma solicitação.
Como já foi apresentado anteriormente, a atuação das escalas técnica,
geométrica e funcional, na definição das dimensões da nave da capela,
define um modo de relação por sobredeterminação, uma vez que elas se unem
para definição de uma única medida. As escalas de modelo, sócio-cultural e
técnica se unem numa associação por sobredeterminação para definição das
medidas que compõem três das paredes laterais da nave da capela. Três
outras escalas se associam também por sobredeterminação, para a definição
das medidas do elemento situado à entrada da nave. Escalas Funcional,
Humana e Ótica. Essas associações apresentam, também, compatibilidade
de escalas, pois, segundo Philippe Boudon toda sobredeterminação supõe a
compatibilidade, embora o inverso não seja sempre confirmado.
4.2 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DO HOSPITAL
DISTRITAL DE MACAÍBA/RN
O projeto arquitetônico do Hospital Distrital de Macaíba/RN foi concebido
em 1981, atendendo a uma solicitação do então Prefeito da cidade, embora
não tenha sido executado. Foi dimensionado para funcionar como hospital
geral, devendo atender a clientela da região onde se insere o município.
Situada em terreno ligeiramente inclinado, próximo ao rio Jundiaí que passa ao
lado, a edificação projetada em dois pavimentos, com características
volumétricas preponderantemente horizontais e geométricas, apresenta planta-
baixa se desenvolvendo em torno de um pátio central.
75
Figura 29. Maquete do Hospital Distrital de Macaíba. Fonte: acervo de JMFM.1981.
O pavimento térreo é ocupado pelos setores de urgência, ambulatório e
serviços.
Figura 30. Planta-Baixa do Pavimento Térreo. Projeto do Hospital Distrital de Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Figura 30-a. Zoneamento do Pavimento Térreo. Projeto do Hospital Distrital de Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
76
No pavimento superior ficam o centro cirúrgico, enfermarias e
apartamentos.
Figura 31. Planta-Baixa do Pavimento Superior. Projeto do Hospital Distrital de
Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Figura 31-a. Zoneamento do Pavimento Superior. Projeto do Hospital Distrital de
Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Suas fachadas resultam de composições definidas por linhas horizontais
e verticais, perfazendo entre si ângulos de 90º.
77
Figura 32. Fachada Principal. Projeto do Hospital Distrital de Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Basicamente se apresentam divididas em duas faixas horizontais. A
inferior, mais simples, com poucas aberturas; a superior, mais trabalhada,
exibe aberturas verticais situadas entre a platibanda e uma viga horizontal que
marca o início do pavimento superior.
Figura 33. Detalhe de fachada, mostrando a divisão dos dois pavimentos.
Projeto do Hospital Distrital de Macaíba. Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Figura 34. Fachada Posterior. Projeto do Hospital Distrital de Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Embora tenha tido ótima recepção por parte do cliente, conforme
depoimento do autor, o projeto jamais saiu do papel.
78
Na observação do projeto do edifício do Hospital Distrital de Macaíba, é
possível localizar características que remetem às escalas arquiteturológicas,
tomando por base os desenhos e as afirmações do seu autor.
Serão destacadas as escalas técnica, geométrica e funcional por
serem aquelas que mais oferecem pertinência para dimensionar o espaço
arquitetural, ao mesmo tempo em que se mantêm presentes ao longo de todo o
processo de concepção. São elas que orientam a maior parte das escolhas
feitas pelo arquiteto. Seu resultado percebe-se na organização da planta-baixa,
na definição da volumetria e nos aspectos que caracterizam as relações
funcionais no edifício.
Durante a concepção do referido projeto as escolhas presididas por
considerações de ordem técnica, segundo afirmação do próprio autor, são
responsáveis por boa parte das soluções apresentadas. São percebidas,
sobretudo, na definição prévia do zoneamento adotado; no
dimensionamento/definição volumétrica da caixa da água; na utilização de
rampas de acesso e no dimensionamento dos elementos que fazem a proteção
contra a insolação direta das fachadas do pavimento superior. Este último
também se deve à pertinência geográfica (aspectos climáticos, insolação e
ventilação dominante).
As referidas considerações, visando incutir uma modalidade de
atribuição de medidas a uma parte ou ao todo do espaço arquitetural, assim se
justificam: O zoneamento considera a organização espacial dos ambientes, as
relações de proximidade entre eles, bem como os fluxos de circulação,
tomando como referência estudos previamente realizados por especialistas em
arquitetura hospitalar. O aspecto técnico precede a funcionalidade
.
A definição da planta-baixa, em termos gerais, é orientada por essas
considerações, cabendo os ajustes pertinentes a outra etapa, quando da
definição da funcionalidade. A altura da caixa da água foi definida a partir da
necessidade de garantir pressão satisfatória, considerando a demanda e a
eqüidistância dos diversos pontos a atender, bem como os dois pavimentos
superpostos. Trata-se, por conseguinte, de outra atuação da escala
arquiteturológica técnica. Outra definição de dimensões que considerou a
escolha técnica é a adoção de rampas - além de escadas -, na interligação dos
dois pavimentos. Outro ato de escolha que expressa essa escala diz respeito à
79
definição dos elementos que fazem a proteção contra a insolação direta das
fachadas do pavimento superior.
A escala arquiteturológica geométrica é identificada na definição da
volumetria geral, na concepção das fachadas e também na implantação no
terreno. Como se pode observar, a geometria se faz presente, de forma
incisiva, na definição de todas as formas que compõem a proposta.
Figura 35. Projeto do Hospital Distrital de Macaíba, destacando a linguagem geométrica da
fachada. Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Figura 36. Fachada Lateral. Projeto do Hospital Distrital de Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
O mesmo se pode afirmar da composição das fachadas e da rigidez da
implantação sobre o terreno.
A presença da escala Funcional acompanha todo o processo de
concepção do projeto. Essa escala apresenta caráter global.
Outras pertinências de escala podem ser percebidas, com menor
ênfase, ao longo do citado processo. É o caso da escala simbólica
dimensional e de visibilidade que atuam sobre a caixa da água.
80
Figura 37. Corte Esquemático. Projeto do Hospital Distrital de Macaíba.
Fonte: acervo de JMFM. 1981.
Ao mesmo tempo, seu dimensionamento expressa compromisso com o
símbolo que conota (marco), enquanto funciona, também, como ponto de
referência visual. A escala Geográfica é expressa através da solução
encontrada para combater a insolação das fachadas e sombreamento da
circulação dos consultórios do andar térreo. À escala Ótica é credenciada a
mudança de tratamento da fachada principal, em relação às demais. A
organização espacial da planta em volta do pátio mostra que a escala de
Modelo foi acionada. Uma vez mais, a ênfase sobre a escala arquiteturológica
funcional é precedida por outra.
FUNÇÕES, RELAÇÕES E OCORRÊNCIAS DE ESCALA
As escalas técnica, geométrica e funcional atuam no início da
concepção; têm, portanto, função de inicialização. O ponto de vista para o
começo do trabalho é fornecido pela escala técnica; as informações técnicas
geram a definição prévia do zoneamento adotado: desenvolvimento da planta-
baixa, em torno do pátio aberto, com a organização dos ambientes e destaque
para os fluxos de circulação.
Essas mesmas escalas vão definir, também, o partido arquiteturológico.
Todas elas vão permitir tornar precisas as orientações iniciais do projeto, dar
pertinências às intenções iniciais. Pode-se constatar, ainda, outras idéias
presentes nesse momento, como por exemplo, em relação à caixa de água.
Além do aspecto técnico, houve a intenção de transformá-la em marco de
referência. Para isso, foi considerado o ponto de vista fornecido pelas escalas
simbólico-dimensional / de visibilidade / ótica.
81
Com relação às escalas com pontos de vista global e local,
destacamos as escalas técnica e a de função como global, pelo fato delas
englobarem um conjunto de elementos presentes ao longo de todo o processo.
O mesmo não se afirma quanto à escala ótica, em relação ao tratamento das
fachadas. Percebe-se que a fachada principal sofre uma transformação em seu
traçado que a torna diferente das demais, atraindo a atenção do observador
sobre si. Nesse caso, a escala Ótica tem a função de escala com ponto de
vista local. Outros pontos de vista são fornecidos pelas escalas de modelo e
geográfica. O uso do pátio, na organização da planta-baixa, se orienta por um
ponto de vista que pode ser considerado local, em virtude de se tratar apenas
de um recorte. A escala geográfica, responsável pelo sombreamento da
circulação dos corredores dos consultórios, no pavimento térreo, também
apresenta uma função local. Trata-se de outro recorte operacionalizado.
No geral, pode-se afirmar que as escalas técnica, funcional e
geométrica consideram pontos de vista que a definem como de função global;
a escala simbólica-dimensional, de visibilidade, geográfica, ótica e de
modelo podem ser definidas como de função local. Uma mesma escala pode
apresentar vários pontos de vista, dependendo do contexto em que é
considerada. Tomemos como exemplo a escala técnica que é considerada
atuando sob um ponto de vista global. Esse ponto de vista passa a ser local
quando atua na definição de dimensões como a dos elementos que
possibilitam a proteção das paredes contra a insolação.
Partindo do princípio que cada edificação resulta da atuação de várias
escalas observam-se algumas associações, como por exemplo: na definição da
volumetria, da caixa de água e do tratamento das fachadas do pavimento
superior. A definição da volumetria resulta da associação entre as escalas
técnica, de função e geométrica, e do ponto de vista de visibilidade; a
definição da caixa de água envolve as escalas técnica, geométrica, de
visibilidade, simbólica-dimensional e ótica, resultando do ponto de vista
simbólico-dimensional; e, a definição do tratamento das fachadas do pavimento
superior associa as escalas técnica, geográfica e geométrica, comprometida
com o ponto de vista geográfico. Todas essas associações se dão por
sobredeterminação, em que várias escalas se reúnem para atuar, em
sincronia, sobre uma única operação de medida.
82
Quando a escala técnica age sobre a definição das aberturas das
janelas, a escala geográfica determina o dimensionamento da proteção das
fachadas do pavimento superior. Nesse caso, coexistem abertura e
tratamento, caracterizando relação de escalas por justaposição.
Uma escala pode atuar durante o processo de concepção, levando
outras consigo, de forma diacrônica, (cascata de escalas). As operações de
uma escala, nesse contexto, se ligam a novas operações, sendo a pertinência
decorrente de outra escala. A definição do sombreamento da circulação dos
consultórios do térreo (escala Geográfica) mantém vínculo com as operações
de medida advindas da adoção do pátio (escala de modelo). A decisão
relativa à definição da caixa de água (em princípio decorrente de uma escala
técnica) leva a outra definição que se apóia na questão da visibilidade. Trata-
se de um encadeamento de escalas do tipo revezamento.
No desenvolvimento dessa proposta, algumas operações de escala
encontraram sua pertinência ao contrário. Pode-se observar isso na
constatação de ausência de influência do meio construído imediato na
definição da edificação; da forma do terreno, na definição da implantação; de
heranças sócio-culturais, como referência; de expressões verbais definindo o
edifício e de indicação de possível área de expansão do projeto. São definidas
de tal maneira que o arquiteto decidiu fazer uso do chamado grau zero de
escala. São negadas, no desenvolvimento da proposta do hospital, as
pertinências, por via direta, das seguintes escalas: de vizinhança, de
parcelamento, sócio-cultural, semântica e de extensão. Assim, aspectos
ligados a essas escalas como contigüidade vicinal, projeção da edificação no
terreno em relação com sua forma, seu tamanho e seus limites, o uso de
soluções orientadas por práticas ou herança cultural não participam das
escolhas realizadas pelo arquiteto durante a concepção da proposta.
A idéia de conotação traduz um segundo significado que é colocado
sobre a significação direta – denotação. Inicialmente a idéia de caixa de água
remete a um reservatório com capacidade de armazenar água e distribuí-la. A
essa idéia se sobrepõe uma outra, de expressão vertical da forma, com o fim
de criar um referencial visual. A escala simbólica-dimensional foi alvo de um
tratamento por conotação.
83
Na modalidade de ocorrência de escalas, outro aspecto a ser
considerado é a compatibilidade. Por princípio, todas as escalas que se unem
por sobredeterminação apresentam compatibilidade. O inverso, no entanto,
não se verifica, conforme afirma Boudon. Nem todas as escalas que
apresentam compatibilidade entre si, se unem por sobredeterminação.
Levantadas estas questões sobre a concepção da proposta do Hospital
Distrital de Macaíba, sobre as iniciativas tomadas por seu conceptor/arquiteto,
a partir dos desenhos e depoimentos, torna-se mais clara a possibilidade de
aplicação da Arquiteturologia no conhecimento da arquitetura e seu potencial
como instrumento de ajuda em sala de aula, no ensino de projeto.
4.3 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DO EDIFÍCIO DO
TERMINAL RODOVIÁRIO DE PASSAGEIROS DE NATAL/RN
Concebido em 1977, pelo arquiteto João Maurício Fernandes de
Miranda, esse projeto foi fruto de um concurso de anteprojetos de arquitetura,
realizado a nível estadual, sob responsabilidade da Secretaria de Transportes e
Obras Públicas do RN e da Prefeitura Municipal do Natal. Trata-se de mais
uma proposta de arquitetura de papel, em virtude de não ter sido executada.
O Terminal de Passageiros deveria ser considerado do tipo “C” -
conforme designação do Manual de Implantação de Terminais Rodoviários de
Passageiros / Ministério dos Transportes - e composto pelos setores de
operação1 (embarque e desembarque); de uso público; de operação2
(predomínio de comércio); e de administração. Sua capacidade final, prevista,
deveria apresentar dezoito plataformas de embarque e dez de desembarque.
Descartando a solução em uma única edificação, a proposta foi
concebida como um conjunto definido por três volumes, predominantemente
horizontais que se articulam, somados a um outro vertical (castelo de água). Os
três horizontais apresentam um corpo principal (definido, porém com
possibilidade de expansão) e dois secundários. Na área de cota mais baixa do
terreno, o pé-direito corresponde a dois pavimentos (setor de embarque e
desembarque), com a ligação ao piso de cota mais alta realizada através de
84
rampa. De acordo com o Edital do concurso, a implantação deveria se dar por
etapas (na prática, duas, como se lê na Memória do projeto à página I-4).
Figura 38. Perspectiva Externa do Projeto do Terminal Rodoviário de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1977.
O Terminal deveria ser implantado em uma área de aproximadamente
10 ha, ladeando o encontro de duas avenidas, no bairro Cidade da Esperança.
Caracterizado como residencial de baixa renda, apresentando, também, baixa
densidade de ocupação, esse bairro apresentava vazios urbanos, praticamente
não havendo edificações na vizinhança do terreno. Em relação à forma do
terreno, a edificação proposta apresenta implantação tomando como referência
eixos ortogonais, paralelos aos lados. A concepção buscou evitar cruzamento
de circulação entre os fluxos de ônibus urbano e rodoviário, bem como de
pedestres. Situa-se o Terminal, portanto, como ponto de transição para o
usuário - conforme afirma seu autor -, ente os sistemas de acesso viário urbano
e rodoviário. (Memória do Projeto p. I-2).
85
Figura 39. Vista de Implantação do Projeto do Terminal Rodoviário de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1977.
Suas formas se apresentam caracterizadamente simples e geométricas.
Definidas em função da solução estrutural, elas compõem fachadas, conforme
se lê na memória do projeto, “resultantes da proteção e contraste das sombras”
(p. I-5).
Figura 40. Fachada Oeste e trechos de outras fachadas do Projeto do Terminal Rodoviário de
Natal, mostrando a importância da estrutura em sua definição.
Fonte: acervo de JMFM. 1977.
Tratam-se de formas originadas por um jogo de horizontais e verticais,
exibindo marcação predominantemente horizontal e apresentando
transparência no preenchimento dos espaços.
86
Figura 41. Fachada parcial do Terminal Rodoviário de Natal, mostrando a importância da
estrutura em sua definição. Fonte: acervo de JMFM. 1977.
Figura 42. Fachada parcial do Terminal Rodoviário de Natal, mostrando a importância da
estrutura em sua definição e o destaque da caixa de água. Fonte: acervo de JMFM. 1977.
Figura 43. Detalhe de fachada do Terminal Rodoviário de Natal. Composição valorizando a
estrutura e os elementos de vedação. Fonte: acervo de JMFM. 1977.
Destaca-se a caixa de água, concebida como elemento funcional e, ao
mesmo tempo, monumental. Uma referência espacial que pode ser alcançada
visualmente, à distância.
No desenvolvimento do processo de concepção da proposta, as
considerações de ordem técnica, na atribuição de medidas ao espaço
arquitetural, constituem operações das mais recorrentes. A começar pela
87
categorização atribuída ao Terminal, que além de se deter nos aspectos
funcionais, toma como ponto de partida dimensões pré-estabelecidas, todas
definidas a partir de considerações eminentemente técnicas. A definição das
áreas dos ambientes que constituem os setores de operação (embarque e
desembarque), de uso público, de operação (predomínio de comércio) e de
administração, assim como da modulação estrutural resultam dessa
pertinência. Daí decorre que a definição da volumetria do conjunto e das
fachadas também encontra sua referência na escala técnica, pelo vínculo que
mantém com a estrutura.
A pertinência conferida pela mesma escala pode ser vista na definição
da caixa de água, embora se perceba a incidência de outras escalas, como a
de visibilidade e a ótica. Além de conter a água, a construção funciona como
marco de referência e como algo que foi criado para ser visto à distância.
A categorização atribuída ao terminal indica, também, previamente, a
forma de uso da edificação, reflexo da atuação da escala funcional. E porque
não, de Modelo, quando se sabe da existência de um Manual que dispõe sobre
todos os esquemas? Essa mesma escala vai atuar, de forma clara, na
utilização de rampas ligando os dois níveis de piso e, ao mesmo tempo, na
definição das funções em planta e áreas de circulação - evitando cruzamentos.
A função, nesse projeto, como determinante de operação de medidas se
apresenta como outro referencial de uso constante. A concepção arquitetônica
é definida como simples e fortemente funcional. A organização da planta-baixa
do bloco principal, desenvolvida ao longo de um eixo longitudinal, expressa
essa escolha. O resultado em planta chega a apresentar um caráter marcial, ao
observarmos a distribuição rígida das funções no plano, confirmando sua
importância na elaboração da proposta e sua prioridade sobre outros aspectos,
como o plástico, por exemplo.
88
Figura 44. Terminal Rodoviário de Natal. Planta-Baixa do Bloco Principal.
Fonte: acervo de JMFM. 1977.
O destaque da caixa de água sobre a volumetria das edificações, com
sua grande dimensão, demonstra uma intenção de ir além da preocupação
com os aspectos técnico-funcionais. Percebe-se associação a um conteúdo
que se realiza em outro plano. O volume ganha em monumentalidade,
estabelece-se uma referência visual. (escala simbólica-dimensional, além
das duas outras citadas acima).
O terreno em declive, como se pode observar nos cortes, leva o
arquiteto a criar um duplo pé-direito no setor de embarque/desembarque. Um
sistema de rampas conecta os dois níveis de piso; esta solução traduz uma
recorrência à escala arquiteturológica geográfica, motivada pelo declive do
terreno. Igualmente, identifica-se a mesma recorrência na adoção de
generosos beirais e no desnível da coberta do bloco principal (como se pode
ver na perspectiva do conjunto). Essa solução traduz a necessidade da
proteção contra a insolação das paredes e da entrada de luz natural, na
iluminação da circulação.
89
Figura 45. Projeto do Terminal Rodoviário de Natal. Cortes mostrando a implantação no
terreno. Fonte: acervo de JMFM. 1977.
É prevista a expansão do bloco principal, que deve variar de forma
proporcional ao aumento da capacidade de embarque do Terminal, conforme
memória do projeto. Trata-se de uma operação de concepção que considera o
tempo em uma perspectiva de futuro, expressão da escala arquiteturológica
de extensão.
Juntamente com as escalas técnica e funcional, a escala econômica
teve participação definitiva na seleção de escolhas realizadas pelo arquiteto.
Trata-se de um determinante que orienta, conforme memória do projeto, todos
os passos trilhados pelo arquiteto / “conceptor”. O resultado plástico reflete
claramente essa questão. A simplicidade de linhas e a geometrização de suas
formas (também resultante da escala geométrica) traduzem, de modo claro,
os determinismos mais expressivos, de forma racional.
Duas outras escalas foram alcançadas ao contrário. Refiro-me à escala
de vizinhança e à escala sócio-cultural. Observa-se o grau zero da escala
de vizinhança, considerando que, em nenhum momento, qualquer dimensão foi
atribuída levando em consideração as edificações do entorno do Terminal. O
mesmo se pode afirmar quanto à influência de heranças sócio-culturais
utilizadas como referência na definição da proposta. Espacial ou
morfologicamente.
90
Não se pode esquecer a presença da escala humana, ajudando a
dimensionar ambientes, circulações, entre outros, apesar das dimensões
monumentais da edificação (como se pode ver em desenho de fachada, na fig.
42).
FUNÇÕES, RELAÇÕES E MODALIDADES DE OCORRÊNCIA DE ESCALAS
Passemos a examinar as funções que essas escalas apresentam,
durante o processo de concepção. Convém lembrar que as escalas remetem a
operações de referenciação, recorte e dimensionamento, podendo ocupar
diferentes funções no espaço de concepção. Igualmente, que uma mesma
escala pode ocupar funções diferentes, reveladas pelo seu “modo operatório”.
Comecemos pelo tratamento das orientações iniciais do projeto.
Identificadas as principais escalas arquiteturológicas na sua leitura, qual ou
quais participam, de forma expressiva, da escolha inicial do partido
arquiteturológico? Pelos aspectos considerados e pelas confirmações,
principalmente através dos desenhos, três escalas se destacam no processo
de concepção do Terminal. São elas: a técnica, a de função e a geométrica.
As três têm participação ativa na definição do partido, pois organizadas entre
si, permitem ao arquiteto dar pertinência às suas intenções iniciais. Assim
sendo, a proposta se define sob a determinação dessas escalas, de forma
constante, conforme se pode observar nas características da proposta.
Dentre elas, o ponto de vista fornecido para começar o projeto provém,
sobretudo, da escala técnica, que tem no Manual de Implantação de
Terminais Rodoviários do MT, anexo ao Edital do Concurso, uma forte
referência. É preciso destacar a presença da escala econômica no início do
projeto. O custo da obra contribui para determinar suas características que vão
desde a definição da estrutura, escolha dos materiais, até a adoção das
formas.
A função de Inicialização é desempenhada pela escala técnica, pelo
fato dessa comandar o início da concepção, impondo um ponto de vista a todo
o processo (ponto de vista Global). Observa-se a pertinência permitida por
essa escala, no dimensionamento do espaço de concepção e em algumas
operações de referenciação, respondendo a quase todas as demandas por
91
atribuição de medidas. Pode-se atribuir essa função também às escalas ditas
de função e geométrica, pela intensidade com que participam desse
momento, como também do partido arquiteturológico. Outra participação
especial no processo de concepção se deve à escala econômica, responsável
pelas decisões, em todos os momentos.
Como exemplo de ponto de vista Local, chamamos a atenção sobre a
definição dos generosos beirais, concebidos para proteger do sol,
principalmente. Dentre as diversas escalas, destacamos as mais importantes
que atuam como escala em nível de concepção. São elas: simbólica-
dimensional, de visibilidade e ótica, que se associam na definição da caixa
de água; geográfica, na definição de rampas de acesso; e, de extensão, na
possibilidade de expansão do bloco principal.
Todas as escalas citadas remetem, predominantemente, a operações de
dimensionamento. As demais, contempladas na identificação, apresentam
função apenas embrayante, permitindo articulação com o espaço real.
Segundo afirmação de Philippe Boudon et al. (2000), a concepção de
um edifício pressupõe a intervenção de várias escalas que podem se articular
por Justaposição ou Sobredeterminação. Observando as escalas identificadas,
percebe-se a presença constante das três que se juntam para atuarem como
de inicialização/partido arquiteturológico: técnica, de função e geométrica
(acrescente-se a de custo). As relações estabelecidas entre essas escalas
voltam-se para as funções citadas. Um olhar mais atento registra o caráter de
junção que preside a atuação dessas escalas em quase todos os momentos,
caracterizando a relação por sobredeterminação. Outro caso de relação
semelhante se dá na definição da caixa de água. Juntam-se as escalas de
visibilidade, ótica e simbólica dimensional. Nenhuma relação expressiva por
Justaposição foi identificada.
Já anunciamos as modalidades de ocorrência de grau zero das escalas
de vizinhança e sócio-cultural. Como vimos, a proposta não contou com a
intervenção de heranças culturais ou sociais, muito menos qualquer influência
possível, de operacionalização de medidas, presidida pelas dimensões do
entorno construído. Considerando a determinação das escalas técnica e de
função, bem como sua participação efetiva nas operações de medida,
produzindo uma proposta totalmente racional, justifica-se o grau zero de escala
92
registrado em relação à escala sócio-cultural. O ponto de vista considerado se
atém apenas aos aspectos funcionais e técnicos. Nenhuma forma ou medida
foi atribuída ao espaço arquitetônico que tenha levado em consideração
alguma convenção, forma tradicional ou herança cultural.
A predominância de soluções técnicas e funcionais resulta de uma
escala econômica, que funciona como símbolo da racionalidade e fornece o
ponto de vista para o desenvolvimento da proposta. É o caso, por exemplo, da
organização da planta-baixa do bloco principal, que chega a apresentar um
desenho estático, atendendo, primordialmente, a prerrogativas de ordem
quantificável. Por outro lado, observa-se a total compatibilidade dessas
escalas, quando se trata de definir a volumetria do conjunto, determinada pela
escala geométrica.
4.4 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DA PROCURADORIA
GERAL DA REPÚBLICA, EM NATAL / RN.
Projeto arquitetônico concebido em 1973, o edifício da Procuradoria
Geral da República, em Natal, atendeu a uma solicitação do Procurador, à
época, o Sr. Francisco das Chagas Rocha. O projeto resultou construído, tendo
sido implantado na Avenida Deodoro da Fonseca, Cidade Alta, em um terreno
central de quadra, voltado para o poente, cuja vizinhança se constituía de
edificações residenciais de um e dois pavimentos. Segundo seu autor, a
execução obedeceu fielmente à proposta apresentada. Hoje, a edificação se
encontra em estado decadente, embora ainda não totalmente
descaracterizada, principalmente devido à mudança da Procuradoria para outro
endereço.
A concepção da proposta considerou, de início, as características do
terreno estreito, devendo abrigar um programa relativamente grande, em razão
das necessidades do cliente. O arquiteto apelou para uma solução que
implanta a edificação no centro do terreno, com os pavimentos distribuídos em
desnível. São três pavimentos locados em função de uma escadaria central; os
dois pavimentos superiores estando separados entre si, apenas por um lance
(meio pé direito) de escada. O acesso do térreo ao primeiro andar, no entanto,
se desenvolve ao longo de dois lances. O pavimento térreo concentra as
93
funções voltadas para o atendimento do público, juntamente com as de serviço
e apoio; no segundo pavimento foram instaladas as funções administrativas,
assessorias e biblioteca; o último pavimento foi reservado ao gabinete do
procurador-chefe, sala de reuniões e secretaria.
Segundo depoimento do autor, a volumetria foi pensada com a intenção
de apresentar “vazios, sem ligação entre si”. É definida por uma composição
que se inspira na linguagem geométrica modernista, em que o cubo se destaca
como geratriz.
Figura 46. Vista da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1974.
As fachadas apresentam, em conseqüência, uma composição dinâmica,
a partir de um jogo de horizontais e verticais, destacando arcadas nas laterais
(com a função de protegê-las contra a insolação intensa) e alturas variadas.
Figura 47. Fachada Lateral da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1973.
No processo de concepção da proposta os determinantes funcionais e
geométricos, como se pode aferir dos desenhos, tiveram prioridade sobre os
94
demais. Segundo afirmação do arquiteto João Maurício, o programa discutido
com o cliente foi decisivo para a implantação da edificação no terreno,
sobretudo na forma de ocupação vertical, como já foi comentado
anteriormente. Igualmente, a presença das formas geométricas se constitui em
outro fator de peso na concepção do edifício. É clara a pertinência geométrica
para as soluções adotadas na proposta.
Os determinantes técnicos, aparentemente, apresentam influência
secundária na concepção da proposta; sobretudo, se fazem presentes através
do programa (responsável pelo dimensionamento dos ambientes e pela
organização dos espaços).
Figura 48. Planta Baixa do pavimento Térreo da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1973.
Figura 49. Planta Baixa do primeiro pavimento da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo do arquiteto. 1973.
95
Figura 50. Planta Baixa do segundo pavimento da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1973.
A forma de implantação no terreno também reflete o determinismo
técnico. Resulta da observação dos recuos mínimos exigidos e adota uma
solução de ocupação vertical especial. Apesar disso, não há indícios que
coloquem a pertinência técnica em evidência.
Figura 51. Planta de Situação e Coberta da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM . 1973.
Figura 52. Corte Longitudinal da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1973.
96
A proposta não lança mão de determinante simbólico dimensional ou
formal. Assim, não apresenta uma forma comprometida com aspectos ligados a
questões simbólicas,
Embora o programa, indiretamente, tenha determinado a altura da
edificação, a relação com as edificações da vizinhança, coincidentemente, se
apresentava de forma equilibrada, na época de sua construção. Ainda hoje é
possível observar-se essa relação resultante.
Figura 53. Vista atual da Procuradoria Geral da República em Natal. Fonte: acervo do autor.
2008.
A planta de locação do edifício no terreno foi solucionada tomando como
referência a forma do lote (determinante parcelar), mantendo paralelismo com
suas faces.
A orientação geográfica foi responsável pela concepção das fachadas
laterais, principalmente. Vê-se, aí, a presença de uma arcada que atua como
brise soleil”, proteção contra a insolação excessiva. Tratam-se, na realidade,
de “brises” verticais, arrematados por arcos plenos.
Figura 54. Fachada Lateral e Detalhe da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1973.
97
Quanto à visualização, o arquiteto pretendeu criar um jogo de volumes
separados por vazios. O volume que se destaca na fachada principal, no último
pavimento, participa da composição com a função específica de chamar a
atenção para o conjunto. Esta solução mostra a atuação da escala de
visibilidade.
Figura 55. Fachada Principal da Procuradoria Geral da República em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1973.
A presença das arcadas, nas fachadas laterais, pode ser vista como
determinada por uma pertinência sócio-cultural (escala sócio-cultural). Trata-
se de um elemento bastante explorado pela arquitetura brasileira colonial e
moderna, constituindo-se em herança cultural, retomada pelo arquiteto. Aqui
elas apresentam, conforme afirmação do autor, dupla função:composição de
fachada e proteção solar”. O uso do arco também pode ser considerado como
remetendo à pertinência de modelo (escala de modelo – morfológico). Nesse
caso, o que está sendo levado em conta é o elemento arco - elemento de
composição -, aqui retomado e reproduzido em série – arcada. Inúmeros são
os exemplos, desde as galilés das igrejas barrocas brasileiras até os edifícios
de Brasília.
Em relação à importância atribuída à função, a escala funcional assume
o caráter de escala global estruturante, pois este determinante está presente
estruturando toda a proposta; lembrando, segundo o autor do projeto, o
programa de necessidades foi resultado de estudos com o cliente -
98
organização das funções. Já a escala geométrica assume o caráter de escala
global dominante; ela colabora com o conjunto das pertinências, mas não
ordena o sistema. As escalas funcional e geométrica, considerando que elas
são escalas globais, são vistas como meta-escalas, em virtude da ênfase que
recai sobre elas no processo de concepção; as demais são apenas
elementares - conceito que envolve todas elas.
A relação estabelecida com a escala humana preside toda a proposta.
A representação do homem, na fachada principal, em duas posições, ilustra
esse fato. A escala humana, por conseguinte, assume o papel do determinante
com mais importância do que a escala simbólica formal, apesar do caráter
público da edificação.
FUNÇÕES, RELAÇÕES E MODALIDADES DE OCORRÊNCIA DE ESCALAS
Como já é do nosso conhecimento, as escalas podem assumir várias
funções no espaço de concepção, em meio ao processo de atribuição da
medida definitiva de uma parte ou da totalidade do espaço arquitetural.
Observar as diferentes funções das escalas no espaço de concepção permite
traçar uma modelização mais aprofundada desse processo - a concepção. De
acordo com a abordagem arquiteturológica, as escalas podem assumir as
funções de inicialização, limitação, “embrayage” e representação.
A operação de recorte (“Découpage”) se apresenta como uma das três
operações constitutivas da escala arquiteturológica. Esta operação define
sobre o que vai incidir a atribuição de medida e resulta da seleção de alguns
elementos, por parte do arquiteto, sobre os quais concentra seu trabalho. Tem-
se o exemplo da caixa de água, cuja função extrapola a decisão técnica, e a
arcada das fachadas laterais. A primeira, integrando a composição volumétrica
e a segunda protegendo as paredes da insolação e compondo a fachada.
As escalas funcional e geométrica desempenham função de
inicialização no processo de concepção. O determinismo exercido por elas
abre esse processo. As funções que definem o programa começam por
determinar, como já foi dito, a ocupação vertical do espaço - incidindo na
solução de implantação -, ao mesmo tempo em que o arquiteto trabalha o jogo
99
de “vazios sem ponto de contato entre os volumes”, como foi definido por ele,
fazendo uso de uma linguagem plástica bastante simplificada.
Essas escalas impõem um ponto de vista ao partido global, muito
mais do que a níveis de concepção particulares - permitindo precisar as
orientações iniciais do projeto; o partido arquiteturológico. Um ponto de vista
local é definido pela solução apresentada para proteção das paredes das
fachadas laterais. A necessidade dessa proteção leva o arquiteto a adotar a
arcada contendo os “brises”, conforme se pode observar nas figuras 47 e 54.
Todas essas escalas concorrem para a definição das medidas atribuídas
à edificação, sendo a escala funcional e a geométrica as mais influentes; em
segundo plano, como já assinalado, se situa a escala técnica.
No processo de concepção, as soluções procedem da determinação
proveniente de várias escalas. Apresentaremos, a seguir, alguns exemplos de
modalidade de ocorrência de escalas observados no processo de operação
de medidas. As escalas funcional, geométrica e técnica concorrem,
associadas, para a solução da volumetria, resultante do programa e de sua
distribuição no espaço. Já a funcional, associada à técnica, concorre para
determinação da organização espacial, horizontal e verticalmente. A
composição das fachadas resulta da associação entre as escalas funcional,
geográfica e a sócio-cultural. Considerando que estas escalas estão
associadas para determinação de uma mesma medida, a relação entre elas
caracteriza a chamada modalidade de sobredeterminação. As escalas
consideradas neste exercício possuem função “embrayante”, permitem
articulação com o real. Quanto às demais funções, não se percebe, de forma
expressiva, escalas resultantes de interação (jogo modelo/escala) apresentada
por meio de limitação.
A articulação entre as escalas traz à tona questionamento sobre a
maneira como esta acontece, quer seja por necessidade do projeto ou intenção
do projetista. Considerando que foram apenas identificadas relação de escalas
por sobredeterminação (ação conjunta de escalas), esta é a modalidade, na
visão da Arquiteturologia, que caracteriza o encadeamento por cascata de
escalas. Dessa forma, as operações envolvendo as escalas em questão se
conduzem, entre si, determinando medidas distintas, tendo um mesmo suporte.
100
4.5 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DA CATEDRAL
METROPOLITANA DE NATAL / RN.
A proposta arquitetônica da Catedral Metropolitana de Natal foi
concebida em 1966, estando a Arquidiocese desta cidade sob a direção do
Arcebispo D. Nivaldo Monte.
Pela terceira vez, a arquidiocese empreendia esforços para construção
de uma catedral. Em 1935, o então arcebispo D. Marcolino Dantas teve a
primeira iniciativa; em 1945, a iniciativa foi retomada, porém novamente sem
sucesso. O estudo preliminar apresentado pelo arquiteto João Maurício, em
1966, previa um volume piramidal de base hexagonal, ladeado por cinco
volumes prismáticos de base retangular. O conjunto era presidido por uma cruz
formada por quatro lâminas retangulares verticais, separadas entre si, mas
presas a uma lâmina horizontal quadrada, possuindo a mesma altura da
pirâmide. O local de implantação seria a Praça Pio XII - ao lado do Cinema Rio
Grande -, situada na Avenida Deodoro da Fonseca, Cidade Alta.
Sua concepção buscou privilegiar a estrutura em concreto armado, cuja
forma não deveria apresentar apenas função de sustentação. A proposta,
entretanto, não chegou a ser executada.
Figura 56. Maquete da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1966.
101
A nave semi-enterrada da catedral
8
apresentava iluminação zenital,
possibilitada por um rasgo (medindo 1,50m de largura), coincidindo com as
arestas da pirâmide de seis faces que constituía o volume principal.
Figura 57. Planta de Corte da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1966.
Contornando a pirâmide central, foram dispostos cinco volumes menores
que atendem a funções específicas como: sacristia, capelas (2), salão, sala de
celebrações e batistério. As fachadas apresentavam o destaque da pirâmide,
as vigas que estruturavam suas faces e as superfícies dos volumes que
serviam aparentemente de base.
A concepção do edifício foi precedida por explicações e esclarecimentos
prestados por padres da arquidiocese, sobre a liturgia da igreja católica e o
funcionamento de uma catedral, em todos os detalhes - ambiente por
ambiente. O programa de necessidades foi resultado de discussões com o
cliente: previa o percurso que remete o fiel ao altar principal, iniciado na
entrada do templo; a locação do batistério ao lado da entrada. Próximos ao
altar, foram reservados espaços para autoridades e situado o coro; em volta da
nave, foram localizadas capelas e salões para celebrações. Por trás do altar,
foi localizada a sacristia, semi-enterrada; na parte central da nave, foram
dispostos os bancos para o público. Sob a sacristia, totalmente enterrada, foi
localizada a capela do santíssimo – a cripta.
8
Solução semelhante à da Capela do Campus da UFRN, inclusive quanto à forma do volume
que cobre a nave.
102
Figura 58. Planta baixa da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1966.
Figura 58-a. Esquema de organização espacial da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo do autor. 2008.
O conjunto foi implantado no terreno fazendo coincidir duas faces da
pirâmide com dois lados; as quatro faces restantes foram dispostas de forma
inclinada, cada uma formando um ângulo de 30º com os demais lados.
103
Figura 59. Vista Superior da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1966.
Passemos à identificação das escalas arquiteturológicas, iniciando com
as decisões tomadas pelo arquiteto no processo de concepção da proposta,
em função dos determinantes técnicos e funcionais: o programa de
necessidades, previamente discutido e definido, trouxe consigo uma conotação
técnica expressa, por exemplo, em uma seqüência de espaços que deveria ser
contemplada. Em alguns elementos, as dimensões matemáticas já são
previamente fixadas. A estrutura de coberta, a definição da forma, a solução de
iluminação zenital também resultaram de operação de medida fortemente
influenciada pela escala técnica. O programa também interfere nas decisões
para estabelecer medidas que dizem respeito às funções. Sua organização no
espaço arquitetural recorre à pertinência funcional.
A dimensão da pirâmide – elemento principal da volumetria – bem como
da cruz fixada no exterior expressam, de forma eloqüente, o simbolismo
inerente ao templo. A escala simbólica dimensional se manifesta no tamanho
imposto a esses elementos, no sentido de enfatizar a associação da arquitetura
com o divino. A forma ascendente da pirâmide, por sua vez, resulta de uma
operação que buscou a associação da forma com um símbolo que melhor
pudesse expressar a função do edifício. O arquiteto, aqui, recorreu à escala
simbólica formal.
104
Quanto a influências da vizinhança, na concepção da proposta, o
arquiteto não observa qualquer possibilidade. A volumetria do edifício
naturalmente se destaca do entorno, definido, à época, por construções de um
e dois pavimentos. A escala de vizinhança é, portanto, negada, ou mesmo
buscada ao contrário, o que configura seu grau zero.
O espaço onde deveria ser implantado o conjunto se aproximava da
forma quadrada; a locação foi solucionada considerando os lados do terreno
como referência e as possibilidades resultantes. A escala parcelar é
responsável pela operacionalização das medidas. Duas faces do hexágono são
paralelas aos lados da parcela urbana, enquanto que as outras quatro formam
ângulos com as duas faces do terreno.
No espaço de concepção, os dados climáticos, a orientação e a
topografia não são considerados para informação de medidas. A solução da
nave semi-enterrada se apresenta como grau zero da escala geográfica, uma
vez que a topografia do terreno é totalmente plana.
Figura 60. Planta de corte da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1966.
Figura 60-a. Corte esquemático da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de autor. 2008.
105
A dimensão vertical da pirâmide e da cruz que, juntas, compõem a
volumetria da catedral permite sua visualização à distância. Esta solução pode
ser vista remetendo à escala de visibilidade. Igualmente, o acesso
subterrâneo à nave permite uma visão de seu interior, resultante da recorrência
à mesma escala, desta vez com efeito local. O observador é situado em
posição privilegiada para realizar a interação com o espaço. Considerando a
relativamente pequena dimensão do terreno e a pouca largura das ruas do
entorno, a visão à distância se vê prejudicada, demonstrando, assim, a
prioridade do determinante técnico na solução adotada.
A presença da iluminação zenital, segundo o arquiteto, ajudaria também
na exaustão do ar quente, pois os vidros seriam fixados de forma sobreposta
para permitir sua passagem. Observando sob outro ângulo, essa iluminação
cria um novo interesse para o espaço da nave. Nesse caso, pode-se afirmar
que o arquiteto fez uso da escala ótica.
Apesar da amplidão da nave – dotada de conforto visual, principalmente
-, a tradição do templo católico apresenta a organização do espaço interno
destacado por duas colunatas que delimitam o percurso em direção ao altar
principal. Assim, surgem três naves – uma principal e duas laterais. Temos,
aqui, uma planta hexagonal com o altar-mor situado na extremidade oposta à
entrada - início e fim do percurso acima referido. Nesse caso, a escala sócio-
cultural foi encontrada ao contrário, numa transgressão – nave única. Outro
grau zero de escala. Ao mesmo tempo, substituindo o referencial, esta
solução reproduz o modelo observado na Catedral de Brasília, dentre outros.
Determinado pela escala de modelo.
A presente proposta se desenvolve estabelecendo referências com a
forma triangular, com o acesso subterrâneo e com o modelo de organização
funcional católico. Essa referência resulta de operações de medida em que a
escala de modelo foi o determinante. Os modelos acionados foram: a forma
ascendente, voltada para o alto (tomada da pirâmide egípcia e explorada nas
igrejas góticas), as catacumbas romanas e o “mise-en-scène” litúrgico católico -
responsável pela organização do espaço interno da nave. A recém inaugurada
catedral de Brasília (primeira fase concluída nos anos 1959/1960) também
106
comparece como uma fonte de inspiração para o arquiteto: nave semi-
enterrada, com entrada através de passarela subterrânea, de piso inclinado.
Embora o determinante econômico não tenha tido papel diretamente
decisivo na concepção do templo, segundo afirmação do autor, a questão
econômica tende a se confundir com a necessidade de racionalização, própria
a uma empreitada dessa envergadura. A importância da escala econômica,
portanto, não pode ser descartada, mesmo atuando de forma indireta.
A geometria fornece os elementos que definem a linguagem utilizada
pelo arquiteto. Pirâmide e prismas definem, de forma simplificada, a volumetria
do conjunto. A escala geométrica tem seu papel de destaque em todo o
espaço de concepção.
Figura 61. Fachada da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1966.
Figura 62. Detalhe de Fachada da Catedral Metropolitana de Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1966.
107
FUNÇÕES, RELAÇÕES E MODALIDADES DE OCORRÊNCIA DE
ESCALAS.
Várias escalas participam do processo de concepção; são chamadas a
atuar no espaço de concepção. Consequentemente, percebe-se variação de
funções no desempenho das escalas.
Como as escalas identificadas se apresentam em suas articulações, no
processo de concepção? Pelo que já foi exposto, as escalas funcional,
geométrica e técnica interagem no jogo modelo/escala sob a forma de
inicialização. Elas presidem as primeiras operações empreendidas pelo
arquiteto. A liturgia, a influência da linguagem geométrica e a técnica do
concreto armado se antecipam enquanto determinantes, orientando o início do
processo de concepção da proposta. O ponto de vista imposto ao partido global
é dominado por essas escalas (principalmente as duas primeiras) que
presidirão todo o processo – ponto de vista global. Essas mesmas escalas
vão ser responsáveis pelo partido arquiteturológico, por fornecerem as
orientações iniciais do projeto. As escalas identificadas são, ao mesmo tempo,
embrayantes, desempenham função de articulação do espaço de concepção
com o espaço real.
As relações entre as escalas estão presentes durante toda a concepção,
onde se pode observar até o domínio de uma sobre as outras. Casos há em
que várias escalas se associam para definir soluções e atribuir medidas,
inclusive relacionadas a um mesmo suporte. Pode-se observar a associação
das escalas geométrica, técnica, simbólica, funcional e de modelo na definição
da forma da catedral; para a solução adotada de implantação no terreno, foram
determinantes as escalas parcelar, funcional e de modelo. Na composição das
fachadas foram atuantes as escalas geométrica e técnica; a solução estrutural
resultou de operações envolvendo as escalas geométrica, técnica e funcional.
As soluções voltadas para organização das funções no espaço foram
determinadas pela associação entre as escalas funcional, sócio-cultural,
técnica, simbólica e de modelo – a escala ótica foi atuante na definição da
iluminação zenital. Essa associação entre escalas caracteriza a modalidade
de sobredeterminação, em virtude de atuarem de forma sincrônica, na
mesma atribuição de medida.
108
As escalas com função de inicialização mostram que há, entre elas, uma
ação com efeito diacrônico - uma escala remetendo a outra - e mútuo -
biunívoco -, caracterizando uma co-determinação de escalas.
Quanto às relações de escala predominantes na concepção, segundo a
abordagem aquiteturológica, a modalidade de sobredeterminação vai definir as
relações de escala caracterizadas como cascata de escalas. No nosso caso,
salvo as escalas de inicialização - já caracterizadas -, as demais apresentam
relações resultantes de efeito sincrônico, porém sem caráter mútuo; voltadas
para o mesmo suporte.
4.6 LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DO TRIBUNAL
REGIONAL ELEITORAL (TRE) DE NATAL / RN.
O projeto arquitetônico da sede do Tribunal Regional Eleitoral-TRE de
Natal foi concebido pelo arquiteto João Maurício em 1972, atendendo
solicitação do então Presidente. Mais uma vez o cliente define o programa de
necessidades com o arquiteto, através de discussões que antecederam as
primeiras operações para instauração do processo de concepção. Interessante
exemplar da arquitetura moderna na cidade, situado na Praça André de
Albuquerque, Cidade Alta, ocupa um terreno de esquina, estreito e longo,
voltado para nascente.
Figura 63. Vista da sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal, na época de sua construção.
Fonte: acervo de JMFM. 1973.
109
Figura 64. Vista atual da sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.
Fonte: acervo do autor. 2008.
Distribuídas em três pavimentos, as funções se apresentam voltadas
para o público e de apoio, no térreo; no segundo pavimento estão as funções
administrativas, biblioteca e serviço médico; o terceiro pavimento concentra a
direção, a presidência e a sala de sessões. Há ainda um subsolo onde fica a
garagem e o apartamento do zelador.
A volumetria é definida por um prisma de base retangular, com suas
faces (fachadas) compostas por elementos verticais e horizontais em concreto
aparente, apresentando vazios preenchidos por vidro. A fachada voltada para o
nascente apresenta forte equilíbrio entre cheios e vazios, enquanto a fachada
voltada para o poente é totalmente protegida por “brises” verticais. O material
predominante na construção é o concreto aparente, aceito com reserva pelo
cliente, à época, em virtude de seu acabamento bruto.
Figura 65. Fachada da sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal, com detalhe.
Fonte: acervo de JMFM. 1972.
110
Figura 66. Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal. Detalhes de fachada.
Fonte: acervo do Autor 2008.
Figura 67. Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.
Fonte: acervo do arquiteto. 1972.
Figura 68. Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1972.
111
Figura 69. Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.
Fonte: acervo do autor. 2008
Segundo depoimento do autor, “tudo é estrutura”. O espaço interno é
definido como planta livre, totalmente independente, fiel ao princípio de mesmo
nome da Arquitetura Moderna, criado pelo arquiteto Le Corbusier, constituindo-
se em um dos seus cinco princípios básicos.
O desenvolvimento da proposta apostou na monumentalidade, segundo
afirmação do autor, como característica a ser perseguida, em razão do caráter
público da edificação
9
. As considerações de ordem técnica na atribuição de
medida foram atuantes na eleição do concreto armado como material
predominante na construção; na solução de planta livre; na ênfase dada à
estrutura e no tratamento da fachada voltada para o poente.
Os determinantes funcionais foram ativos na consideração do
programa de necessidades, na organização do espaço interno e na adoção da
planta livre.
A escala simbólica dimensional foi responsável pela solução adotada
para as fachadas, voltada para atribuição de valor monumental à edificação. A
grandeza que é portadora de sentidos em arquitetura, nesse caso, não remete
apenas ao tamanho, mas a outro tipo de escolha, comprometido com um
conteúdo mais expressivo em termos de significação Tira-se partido do
9
Em relação à proposta da Procuradoria Geral da República, a concepção da sede do TRE
apresenta mais ênfase quanto à questão da monumentalidade, inclusive com um nível maior
de elaboração plástica.
112
tratamento das fachadas, não necessariamente do aumento ou diminuição de
um elemento. Incide também nessa operação a escala ótica, igualmente
recorrente quando o arquiteto tem a intenção de valorizar a edificação, para
isso estabelecendo ênfase na monumentalidade. É considerado o ponto de
vista expresso através do tratamento das fachadas, a partir do qual o edifício
deverá ser lido.
Os elementos que fazem parte do entorno da edificação não interferiram
nas operações de atribuição de medidas, em parte ou no todo do espaço
arquitetural, durante a concepção. Resultam de escolhas que vão de encontro
ao que compete à escala de vizinhança, constituindo Grau zero da mesma.
A implantação no terreno mostra que o espaço do lote foi
completamente ocupado pela construção. A forma do lote se impõe para definir
as medidas de sua projeção, ilustrando a atuação da escala de parcelamento.
Figura 70. Sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal. Implantação no terreno.
Fonte: acervo de JMFM. 1972.
A orientação geográfica do terreno evidencia o tratamento a que foram
submetidas as fachadas voltadas para Leste e Oeste. A concepção da
proposta considera a ligeira inclinação descendente que a topografia do terreno
apresenta, no sentido frente/fundos. Na parte mais baixa situa-se a entrada da
garage, no subsolo. As soluções implantadas refletem a atuação da escala
geográfica, determinante nessas operações de atribuição de forma e medida.
O acesso do público ao edifício é feito através de uma escadaria – na
versão original; hoje substituída por uma rampa – que se liga a um bloco
destacado na fachada, de alto a baixo. Este elemento chama a atenção para o
acesso principal, em virtude da dimensão e tratamento de superfície em
113
relação ao restante da fachada, se constituindo em um recorte no espaço de
concepção. Trata-se de uma operação de ordem da escala de visibilidade.
A estrutura foi concebida para apresentar função plástica, ao mesmo
tempo em que garante a planta livre. Trata-se de uma estrutura aparente
compondo as fachadas, principalmente as laterais. É possível encontrar
referências na arquitetura moderna de Le Corbusier, na sua fase brutalista, e
no edifício do Ministério da Educação do Rio de Janeiro e até na arquitetura
moderna de Kenzo Tange. As citadas referências ilustram a atuação da escala
de modelo. Apesar de ter sido construído um anexo em 2000, não fazia parte
da proposta inicial reserva de espaço para expansão.
Figuras 71 e 72. Fachadas da sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal.
Fonte: acervo de JMFM. 1972.
O uso do concreto aparente pode ser considerado como uma solução
determinada pela escala econômica, pois dispensa reboco e pintura. A
racionalização que se faz necessária na concepção e execução, naturalmente
reflete um componente econômico.
A linguagem geométrica foi amplamente utilizada na concepção da
proposta, traduzindo a influência da arquitetura moderna. Um grande prisma à
semelhança das unidades de habitação de Corbusier, preside a composição
volumétrica. As colunas que compõem as fachadas voltadas para o nascente e
poente apresentam a forma cilíndrica, uma solução que extrapola o significado
114
apenas estrutural do elemento. A escala geométrica tem uma atuação
predominante.
As escalas geométrica, de função e técnica estão presentes em todo o
processo de concepção orientando soluções e escolhas por parte do autor,
revelando sua maneira estruturadora de atuação como escalas globais. O
caráter de monumentalidade priorizado na concepção do projeto remete a
escala humana a segundo plano. Ela é acionada, principalmente, nas
definições de áreas e larguras - espaço horizontal -, como determinante nas
operações de medida.
FUNÇÕES, RELAÇÕES E MODALIDADES DE OCORRÊNCIA DE
ESCALAS.
O processo de concepção de uma proposta é revelador de escolhas,
intenções e decisões que tornam a idéia viável ou são usados como
referências para tal. Esse processo tem início quando o arquiteto procura
instaurar o jogo modelo/escala, o esquema de concepção.
Que escalas estão presentes neste momento, no início das operações
de concepção do edifício do TRE? O arquiteto inicia o processo consciente do
programa de necessidades a considerar, das referências em termos de forma e
material de construção. Por outro lado, considerando que material e técnica de
construção caminham lado-a-lado, pode-se afirmar que havia informações
técnicas a serem consideradas, contados onze anos de experiência profissional
do autor. As escalas funcional, técnica e geométrica desempenham, assim,
a função de inicialização.
O ponto de vista para iniciar o projeto é fornecido pela associação das
três escalas; elas deverão orientar as decisões de concepção a serem tomadas
durante todo o processo (incidência global), ao mesmo tempo em que
definem o partido arquiteturológico. É interessante atentar para os pontos de
vista que recortam as fachadas, principalmente as voltadas para o nascente e
poente. No caso da voltada para o nascente, o ponto de vista enfatiza o
aspecto técnico associado ao compositivo, com ênfase na plástica. As escalas
técnica e geométrica predominam. A solução adotada na fachada voltada para
o poente resulta de um ponto de vista que enfatiza o aspecto técnico associado
115
à proteção contra a insolação. Nesse caso, predominam as escalas técnica e
geográfica.
As escalas identificadas através da leitura permitem a articulação com o
espaço real, são, portanto,”embrayantes”, não possuindo função de
representação. A identificação da atuação de cada escala, de certa forma,
antecipa traços característicos do processo de concepção adotado pelo autor,
como também a importância por ele atribuída a cada uma.
Alguns escalemas podem ser localizados nas fachadas, por exemplo.
Centraremos nossa atenção sobre a fachada voltada para o nascente, em
virtude de seu destaque entre as demais, atentando para a localização de
escalemas de escala ótica e geométrica. Isto é, os fatos responsáveis pela
solução adotada a partir dos determinantes geométricos e de escala ótica, na
definição de medidas. Deve-se a esses as soluções que atuam sobre o
material (concreto e vidro) e as dimensões propostas, com a intenção de lhe
conferir monumentalidade.
As escalas se relacionam e se articulam de formas as mais variadas, no
processo de definição do edifício; cada solução encontrada, durante o processo
de concepção, pode resultar do envolvimento de uma, duas ou até mais
escalas. As relações encontradas neste exercício de leitura são
predominantemente do tipo cascata de escalas, atuam de forma sincrônica.
Prevêm um grupamento delas, articuladas de forma seqüenciada, em que as
operações para atribuição de medida guardam necessariamente relação entre
si e são totalmente controladas pelo arquiteto. Este tipo de relação,
considerando que as escalas atuam conjuntamente e correspondem a uma
mesma dimensão arquitetural, apresenta a modalidade de
sobredeterminação.
116
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desde o início desta dissertação nossa pretensão foi trabalhar com a
abordagem proposta por Philippe Boudon – a Arquiteturologia – aplicada à
análise da produção do arquiteto João Maurício Fernandes de Miranda, nos
limitando ao período 1961/1981, por motivos já conhecidos.
Sentimos a necessidade de melhor conhecer o trabalho de Boudon,
associando o interesse pela proposta pedagógica, ao nosso ver, capaz de
transformar o ensino de arquitetura – inspirado em experiência de ensino
apresentada por ele - e, também, ao desejo de inventariar e analisar parte da
produção do referido arquiteto potiguar. Os primeiros passos da pesquisa não
deixaram ver, com a clareza necessária, o caminho a ser trilhado com
objetividade, pois faltava definir melhor seus limites, no início do curso. A
proposta de trabalho parecia uma mistura que envolvia Arquiteturologia, a
produção do arquiteto João Maurício, a Escola Carioca, a arquitetura moderna
em Natal e o ensino de arquitetura. Pouco a pouco, fomos desvelando o
objetivo real do nosso trabalho e o percurso a ser tomado, atribuindo o peso
necessário a cada item acima relacionado.
Definimos que nossa preocupação teria foco na concepção da
arquitetura, e para isso usaríamos o instrumental disponibilizado pela
Arquiteturologia. Assim, procuramos exercitar o uso desse instrumental
aplicando-o a uma seleção de propostas arquitetônicas do profissional acima
mencionado, tomando como base a obra “Enseigner la Conception
Architecturale” (Boudon et al., 2000), em razão do seu caráter de manual;
enfatizando a identificação das escalas arquiteturológicas, suas funções,
relações e modalidades de ocorrência.
Essa delimitação colocava em segundo plano as preocupações com a
Escola Carioca e com o ensino de arquitetura. Ou, pelo menos, os colocava em
seu devido lugar; a arquitetura moderna em Natal seria objeto de estudo em
outra oportunidade. De fato, os objetivos específicos trazem dois itens onde se
pode ver que aquelas preocupações são contempladas como ponto para
observação (caso da influência da Escola Carioca) e ponto para reflexão
(Arquiteturologia como instrumento pedagógico). A ênfase recai, de forma
prioritária, sobre a identificação das escalas e como elas se articulam, no
117
processo de concepção. Decidimos, portanto, desenvolver um trabalho que nos
levasse a exercitar o método arquiteturológico, como primeira etapa de um
estudo que se espera aprofundar futuramente.
Redefinidos os objetivos, partiu-se então para o trabalho propriamente
dito. Inicialmente, a seleção dos projetos de João Maurício previa um total de
10 unidades que seriam submetidas à leitura arquiteturológica. Analisadas as
três primeiras, como etapa inicial da leitura das propostas, observou-se uma
tendência à repetição de alguns esquemas, de algumas determinações que
presidiram o processo de concepção desses projetos. Parecia haver, por parte
do arquiteto, intenção de seguir um modelo que viesse, no final, revelar o perfil
de seu espaço de pensamento. Feita a constatação, partiu-se para a redução
do total de propostas a serem analisadas, atendendo à sugestão da banca de
exame da qualificação. Portanto, seis dos 10 projetos iniciais foram submetidos
à leitura arquiteturológica, na qual foram identificadas as escalas atuantes e
seu modo de articulação.
As leituras arquiteturológicas realizadas nos seis projetos tiveram como
base os desenhos, algumas imagens tomadas in loco e o discurso do arquiteto.
Nos depoimentos concedidos, ele deixou clara a falta de hábito de preservar
croquis” e outros desenhos que não os meramente técnicos. Naquele período,
“Não era um hábito comum entre os arquitetos”, assim se referiu ele. Os
estudos preliminares mais básicos eram, todos, apresentados com o uso de
instrumento.
Os desenhos encontrados em seu escritório são plantas, cortes,
fachadas, entre outros; todos representados na melhor expressão do desenho
arquitetônico. Técnico, entretanto. Assim, as leituras arquiteturológicas não
puderam considerar o processo de concepção por meio dos “croquis” iniciais. O
discurso do arquiteto se constituiu no principal instrumento da memória dos
projetos.
Outro aspecto interessante foi a característica do discurso. Apesar de ter
sido docente do Curso de Arquitetura e Urbanismo-CAU/UFRN trata-se,
sobretudo, de um profissional de prancheta, com discurso pragmático sem um
arcabouço teórico muito elaborado. Formado sob a égide da máxima
“arquitetura não se ensina, se aprende”, percebeu-se certa relutância do
arquiteto em estudo quanto a aceitar a busca por referências projetuais, ao
118
menos de forma consciente - como se isso significasse “copiar os outros”;
embora fosse considerada a possibilidade dessa busca. Afinal, espera-se do
profissional arquiteto, antes de tudo, criatividade, pensamento que segue a
linha identificada por Comas (1986) como subjetiva / intuitiva na qual o
arquiteto é considerado um “gênio criador”. Apesar desta dificuldade,
conseguimos fazer algumas associações entre os projetos do arquiteto e
algumas tendências da arquitetura à época.
Em termos gerais, o exercício de leitura arquiteturológica aplicada aos
seis projetos de João Maurício levou em conta, de início - para consideração
posterior -, dois aspectos principais: propostas para concursos e propostas
contratadas pelo cliente (baseadas na demanda). E, também, arquitetura de
papel - propostas não construídas - (baseadas na natureza). Pertencem ao
primeiro grupo o projeto da Capela do Campus da UFRN (1973) e o do
Terminal Rodoviário de Natal (1978); ao segundo grupo pertencem: o projeto
da Catedral Metropolitana de Natal (1966), o Tribunal Regional Eleitoral de
Natal (1972), a Procuradoria Regional da República de Natal (1973) e o
Hospital Distrital de Macaíba/RN (1981). Dessa amostra foram construídos: a
Capela do Campus, o Tribunal Regional Eleitoral e a Procuradoria Regional da
República. As demais não foram executadas, permanecendo apenas no papel.
A questão da tipologia não foi considerada em caráter prioritário, embora tenha
sido alvo de algumas considerações.
Os dois projetos concebidos para concurso apresentam as mesmas
pertinências arquiteturológicas, já identificadas como escalas de inicialização.
Nesse aspecto, não se registra qualquer destaque em relação aos demais
projetos, concluindo-se pela importância que essas escalas representavam
como determinantes inicias no processo de concepção, na produção do
arquiteto em pauta.
A observação do desempenho do arquiteto na concepção de propostas
para concursos fazia parte de nossas preocupações iniciais. Alimentávamos a
expectativa da possibilidade de resultados com características não
necessariamente semelhantes às solicitações cotidianas de projeto. A amostra
que temos em mãos revela, no entanto, que tal fato não aconteceu,
principalmente no caso do Terminal Rodoviário. A solução apresentada é muito
simples e até recorrente, como podemos avaliar através da leitura
119
arquiteturológica realizada em outra parte do trabalho, no capítulo anterior. Na
realidade o projeto se impõe pela dimensão do talhe e racionalismo construtivo,
decorrente, preponderantemente, do determinante funcional. A proposta da
Capela do Campus da UFRN, no entanto, se impõe por seu caráter plástico,
geométrico e pela visibilidade decorrente da localização em ponto elevado.
Apesar de uma solução espacial também muito simples, seu uso religioso
naturalmente, em geral, requer mais elaboração. Em termos gerais, o nível de
complexidade e elaboração não varia, de forma visível, para os dois grupos. O
tipo de demanda, consequentemente, não alterou, de forma palpável, os
resultados projetuais.
Em virtude do caráter recorrente das pertinências escala técnica, escala
de função e escala geométrica, pode-se afirmar que estas constituem as
principais dimensões, consideradas pelo arquiteto em suas propostas. A
exceção é dada pelos projetos para a capela do campus da UFRN e a catedral
metropolitana de Natal (uso religioso) que apresentam uma outra dimensão em
destaque: a simbólica; embora seja percebido impacto causado pela geometria.
Assim, constata-se que a dimensão geométrica define a forma, a
dimensão funcional ajusta o uso à forma, a dimensão técnica possibilita a sua
execução. Uma analogia com os três princípios vitruvianos “venustas”, “utilitas”
e “firmitas”, tão determinantes na arquitetura moderna, tão caros ao
funcionalismo que lhe serve de base.
O resultado do exercício de leitura dos seis projetos trouxe à tona
algumas outras conclusões. Com relação à identificação das escalas, é notória,
mais uma vez, a ênfase atribuída às três escalas referidas acima. Em todos os
projetos analisados elas desempenham a função de escalas de inicialização.
Juntas, elas determinam o início das operações de concepção. No caso da
capela e da catedral, outra escala atua como iniciante, além destas três – a
escala de modelo. Nos dois projetos, o simbolismo que acompanha a forma da
coberta – pirâmide – precede a definição das medidas reveladoras do talhe da
edificação. Nessas propostas, percebeu-se, também, um destaque para as
escalas arquiteturológicas cuja atuação reflete, diretamente, sobre o aspecto
plástico da edificação.
A escala de vizinhança, como foi possível observar, ocupa uma posição
especial, dentre as pertinências encontradas em grau zero de escala. A
120
linguagem geométrica, característica da arquitetura moderna, invade o meio
urbano ignorando qualquer influência exercida pelo entorno edificado, em
qualquer de suas dimensões. Altura, forma, composição de fachadas, por
exemplo, resultam de determinantes funcionais, em sua maioria, acrescidos
dos ditames da arquitetura moderna, frequentemente caracterizada por:
rejeição de estilos históricos como fonte de definição da
forma;
adoção do princípio de que as necessidades materiais e
funcionais determinam o resultado;
adoção da estética da máquina;
rejeição do ornamento;
simplificação da forma e eliminação do detalhe
desnecessário;
adoção da estrutura aparente;
a forma é determinada pela função.
Outra pertinência encontrada através da negação da escala (grau zero
de escala) diz respeito aos determinantes geográfico e sócio-cultural. No
primeiro caso, trata-se da solução de semi-enterrar parte do projeto, sem que
seja esta uma imposição da topografia do terreno (nos exemplos dados, as
naves das propostas para a capela e a catedral). No segundo, uma imposição
da estética da arquitetura moderna, manifesta, nos nossos exemplos, por
rejeição à associação a elementos regionais ou históricos, ou com o meio
construído mais próximo. É interessante observar como a associação de
escalas é recorrente na atribuição de medidas, em parte do espaço arquitetural
ou no seu todo.
No que diz respeito à escala de modelo, a influência se manifesta
através da história da arquitetura e das características da arquitetura moderna.
A história da arquitetura fornece os modelos dos vitrais góticos, do arco como
elemento decorativo, da casa-grande colonial e das catacumbas subterrâneas
dos cemitérios romanos. A arquitetura moderna participa com o uso do
concreto armado, da estrutura com função plástica e da geometrização da
forma. As duas primeiras remetem ao Brutalismo, enquanto a outra à
arquitetura moderna, em essência.
121
A escala de modelo, alvo de nossa expectativa quanto a possíveis
influências da Escola Carioca sobre a produção do arquiteto João Maurício,
revelou que o mesmo a utilizou como referência, ainda que não assumida, haja
vista o uso maciço do concreto armado, com inteligência e criatividade,
moldado às necessidades funcionais e não apenas como morfologia projetual;
os “brises soleil", o elemento vazado, os pilares de seção circular, os elementos
corbusierianos de composição cúbica e prismática.
Essas influências podem ser vistas, com mais ênfase, na definição
volumétrica da capela, que parece se inspirar em Vilanova Artigas e, também,
em Oscar Niemeyer - onde é possível observar alguns traços atribuídos à sua
produção. Segundo Bruand (1981), rejeição de todo tradicionalismo; novos
materiais e técnicas; e, valorização da arquitetura como arte plástica. Podem
ainda ser confirmadas na sede do TRE, com sua estrutura de concreto
aparente e o tratamento de fachada com uso de “brises” verticais.
Observa-se, por outro lado, uma tendência à definição de um modelo de
concepção próprio do autor dos projetos, que se repete nos exemplares
analisados (a presença constante e marcante das três escalas, por exemplo –
escala técnica, escala de função e escala geométrica). Como já foi dito, essas
escalas acompanham todo o processo de concepção dos projetos analisados,
fazendo-se notar desde sua função de inicialização, apresentando, inclusive,
ponto de vista global. As demais escalas atuam, em geral, de forma unitária,
diferentemente em cada projeto.
De forma geral, as pretensões iniciais se mantiveram, apenas sendo
alvo de ajustes em prol de mais objetividade para o trabalho. As dificuldades
encontradas ao longo do percurso podem ser classificadas em dois tipos. A
dificuldade inerente à complexidade da Arquiteturologia que se constitui, de
forma minuciosa, numa construção que exige muita atenção para ser
compreendida; e a dificuldade natural para se fazer uma leitura
arquiteturológica de projetos sem os desenhos iniciais, dispondo apenas de
desenhos técnicos e do discurso do autor. No nosso caso, considerando,
também, o tempo que separa o ano de concepção da proposta e o de
realização da leitura. Observamos dificuldade, por parte do autor das obras
analisadas, em lembrar certos detalhes que participaram da concepção.
122
Dentro do possível, procuramos agir em busca de nossos objetivos,
conscientes de que essas dificuldades, mais que atrapalhar, aguçariam nossa
percepção, nos motivando a explorar cada elemento ou detalhe que se nos
apresentasse. Mesmo assim, foram registradas, ainda, algumas dificuldades,
durante o exercício das leituras arquiteturológicas, com relação à identificação
de escalas e suas modalidades de atuação. De qualquer maneira, o exercício
aplicado remeteu ao aprendizado de lições capazes de confirmar a importância
da Arquiteturologia para alcance de nosso objetivo. E de sua eficácia na
compreensão do funcionamento das operações de medida no espaço de
concepção.
Embora seja constatada a necessidade de um maior domínio na
compreensão do conteúdo da Arquiteturologia, seu uso como instrumento
pedagógico em sala de aula, no ensino de arquitetura, pode se constituir em
grande contribuição para estabelecer o diferencial entre o antes - a
consideração do programa de necessidades - e o depois – consideração do
programa pedagógico. Esta é uma questão que merece, sem dúvida, ser
aprofundada em ocasião oportuna.
Considerando os conceitos fundamentais da Arquiteturologia, o exercício
realizado mostra que, quanto ao espaço arquitetural - partindo do princípio de
que ele foi pensado -, a produção de nosso estudado se constituiu em uma
pequena amostra que levou à compreensão de como se organiza em
arquitetura o pensamento sobre o construído (a concepção). Para isso,
concorrendo sempre o jogo modelo/escala, em todo o processo. Juntamente
com esse pensamento, como se deu a “embrayage” - a ligação com o real – e
as possibilidades de execução.
O espaço de concepção é chamado “o espaço do fazer” – onde se
desenvolve o conhecimento sobre o edifício -, somente dado a perceber pelas
modalidades, pelas operações que permitem a concepção do espaço
arquitetural. Corresponde, como foi dito, ao universo de pensamento no qual o
arquiteto propõe processos de concepção; o espaço de concepção
compreende o espaço arquiteturológico que, por sua vez, o enuncia e permite
sua exploração. No nosso caso, o conhecimento sobre os edifícios analisados
se ressente da falta dos desenhos iniciais, bem como do registro gráfico da
seqüência de etapas no desenvolvimento da proposta. Em conseqüência,
123
verifica-se uma lacuna em prol da percepção da ação do arquiteto no espaço
de concepção, preenchida, em parte, pelo seu discurso.
A geometria atuou como um instrumento de concepção e de projeção
em todos os projetos analisados. Não só porque permitiu apreender o espaço,
como também pela recorrência do arquiteto a figuras geométricas com valor de
modelo. Basta lembrar que, como determinante, a referência geométrica esteve
presente, como escala de inicialização, em todos eles.
Satisfeita nossa pretensão inicial, continua, no entanto, a necessidade
de maior aprofundamento no estudo da obra de Philippe Boudon. Tentamos,
neste trabalho, identificar apenas escalas arquiteturológicas e suas
articulações, conscientes de estarmos realizando uma pequena “demarche” se
considerarmos a complexidade que envolve a Arquiteturologia e, por
conseguinte, a concepção arquitetural.
124
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http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp190.asp Acesso em:
20/07/2007.
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Periódicos
PROJETO DESIGN. S.Paulo: Arco Editorial Ltda.
AU. S.Paulo: Pini Editores.
Arquitextos. Informativo Vitruvuis. (www.vitruvius.com.br)
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APÊNDICE
1. CAPELA ECUMÊNICA DO CAMPUS DE NATAL
QUESTÕES COLOCADAS AO AUTOR DO PROJETO, A PARTIR DE UM
ROTEIRO QUE CONTEMPLA OS SEGUINTES ASPECTOS:
Determinismos de ordem técnica - enfatizando a liberdade de criação do
arquiteto, JMFM colocou como importante os estudos de acústica
desenvolvidos, resultando na definição da dimensão das faces da pirâmide.
Resulta também dos mesmos estudos a inclinação dessas faces e a autonomia
na definição dos tamanhos dos quatro triângulos. Levou-se em consideração o
local do altar como fonte de emissão do som que deveria ser distribuído por
toda a nave. Outra solução de ordem técnica diz respeito ao revestimento da
coberta. Foi recomendado na época o uso de alumínio para acabamento, não
tendo sido executado por falta de recursos. Outra escolha presidida pela escala
arquiteturológica técnica foi o uso do concreto, em virtude de sua característica
plástica.
Determinismos de ordem funcional- justificou-se a solução da nave semi-
enterrada como possibilidade de acesso às cerimônias pelo lado de fora. Foi
criado o espaço da nave propriamente dito, onde a participação dos fiéis seria
direta; e uma outra opção para os que quisessem assistir de fora. Criou-se um
espaço de circulação em nível mais elevado, onde as pessoas poderiam
também deambular, uma perfeita analogia com o alpendre da casa colonial. Os
vitrais deveriam possibilitar o acesso visual. Na visão do autor, o espaço
ecumênico deveria conotar a idéia de liberdade, possibilitando diversas formas
de participação.
Determinismos de ordem econômica- nenhuma limitação econômica provocou
qualquer decisão de caráter conceptivo, nas palavras do autor do projeto. Muito
ao contrário, o reitor em exercício na época (Prof Genaro Fonseca) expressou
a preocupação em começar a construção do campus a partir do edifício
130
religioso, como que solicitando as bênçãos de Deus para o empreendimento
que se iniciava, marcado pela execução dessa obra.
Determinismos de ordem topográfica- a topografia do terreno foi decisiva para
definição do local de implantação do edifício religioso. Afinal buscou-se o local
mais elevado para aí ser localizada a capela. A definição da praça foi posterior.
Determinismos de ordem plástica- a forma da capela resultou da analogia
com a coberta da casa grande colonial de quatro águas. Outra analogia que
pode ser registrada diz respeito aos vitrais coloridos que remetem às catedrais
góticas.
Com relação a possíveis influências atuantes na concepção do projeto, JMFM
se refere ao arquiteto americano Paul Rudolph, no que diz respeito ao uso do
concreto bruto. Lembrando que tal fato remonta a Le Corbusier, por ocasião da
construção da Unidade de Habitação de Marselha, Maison Jaoul, Chandigard,
Convento de La Tourette, entre outros. Sem esquecer Oscar Niemeyer, pela
exploração da plasticidade do concreto.
2. LEITURA ARQUITETUROLÓGICA DO PROJETO DO HOSPITAL
DISTRITAL DE MACAÍBA/RN
QUESTÕES COLOCADAS AO AUTOR DO PROJETO a partir de roteiro que
contempla os seguintes aspectos:
Determinismos de ordem técnica – Foi considerada determinante de ordem
técnica a proximidade das funções que guardam dependência entre si, em um
hospital desse porte. É importante considerar que se trata de um hospital geral,
com pretensão de raio de atendimento regional. Outro determinante de ordem
técnica foi a definição da altura da caixa da água, que deveria garantir pressão
satisfatória, considerando a eqüidistância dos diversos pontos a atender e os
dois pavimentos superpostos. Ainda outro determinante, foi a utilização de
rampas na interligação dos dois pavimentos, em função de permitir essa
conexão através de menor esforço dispendido pelos usuários que a utilizam.
Alguns determinantes, também de ordem técnica, foram responsáveis pela
131
definição das fachadas, principalmente no pavimento superior. É o caso dos
elementos que fazem a proteção contra a insolação direta, por exemplo.
Determinismos de ordem funcional – Segundo o autor do projeto, os
determinismos funcionais são de tamanha importância na concepção do projeto
que chegam a influenciar na definição da volumetria do edifício. A planta-baixa
se desenvolve em torno da circulação que conecta as principais funções e
conduz os usuários, estruturando, inclusive, sua relação com a rua. Igualmente
importante do ponto de vista funcional é a distribuição das atividades nos dois
pavimentos, reservando o pavimento superior para as funções que requerem
mais tranqüilidade, intimidade e especialização. A implantação da edificação no
terreno, igualmente, resulta de escolhas determinadas pela funcionalidade. O
acesso principal se dá pela cota mais alta, simplesmente pela proximidade da
rua. O terreno possui apenas uma frente; não há influência da topografia nessa
definição.
Determinismos de ordem econômica - Aparentemente, segundo expressou o
autor do projeto, não houve limitações impostas pela economia na concepção
do edifício. O aspecto racional que se pode observar, incluindo a modulação
em planta, não apresenta qualquer relação com imposição de ordem
econômica nesse nível. Trata-se apenas de atendimento aos princípios que
são coerentes com a arquitetura moderna e com aspectos práticos ligados à
execução.
Determinismos de ordem topográfica - O terreno, onde deveria ser implantado
o edifício, fica nas proximidades do rio Jundiaí, apresentando uma pequena
inclinação no sentido longitudinal, com cota ascendente, em relação à rua. A
disposição das rampas, situadas no lado contrário à entrada, une os dois
pavimentos e tira proveito dessa declividade, permitindo a comunicação direta
entre as enfermarias, centro cirúrgico, setor de serviços e circulação interna.
Determinismos de ordem plástica – Formas geométricas puras definem a
volumetria da edificação, apresentando características predominantemente
horizontais. O racionalismo presente no programa e no dimensionamento dos
132
ambientes se reflete também na forma adotada, caracterizada pela presença
de planos ortogonais, definindo ângulos de 90º.
Determinismos de outras possíveis influências – Mais uma vez é possível
observar influências do Brutalismo corbusieriano, na definição da volumetria do
edifício.
3. PROJETO DO EDIFÍCIO DO TERMINAL RODOVIÁRIO DE
PASSAGEIROS DE NATAL/RN
QUESTÕES COLOCADAS AO AUTOR DO PROJETO A PARTIR DE
ROTEIRO QUE CONTEMPLA OS SEGUINTES ASPECTOS:
(Leitura da memória do projeto)
Determinismos de ordem técnica – Em virtude da dimensão do
empreendimento, o racionalismo que caracteriza a proposta mostra que a
mesma é regida, principalmente, pelo determinante técnico. Como se pode
observar no documento em apreço, sua presença é exigida em praticamente
todos os momentos da concepção. No aspecto plástico (definição das formas),
espacial (dimensionamento e organização dos ambientes), como também
construtivo (modulação), a técnica predomina, ora buscando experiências
anteriores sistematizadas (know-how), ora buscando economicidade de
execução.
Determinismos de ordem funcional – A funcionalidade é considerada requisito
básico na concepção do projeto. Juntamente com o aspecto técnico, preside
quase todas as escolhas feitas pelo autor. Esse requisito deve interferir
diretamente na adoção do partido, conforme se pode ler no documento /
memória consultado, responsável pela adoção da simplicidade de formas e
linhas comprometidas com a valorização da estrutura.
Determinismos de ordem econômica – A questão econômica preside todas as
etapas da concepção do Terminal. O custo se constitui em requisito
fundamental, motivando a adoção do sistema construtivo modulado, entre
outros. Também a solução plástica encontrada, tem sua justificativa no aspecto
econômico.
133
Determinismos de ordem topográfica - O terreno, onde deveria ser implantado
o edifício, possui três frentes e uma declividade acentuada na parte posterior.
O Terminal ocupa a parte plana.
Determinismos de ordem plástica – A leitura da memória do projeto permite
observar as seguintes características: Concepção arquitetônica simples,
funcional e a adequada à realidade atual.(1977); adoção de um partido plástico
funcional no sentido de valorização estrutural; contribuição estética
fundamental na composição das fachadas, com pureza e simplicidade de
formas e linhas, resultantes da proteção e contraste das sombras.
Determinismos de outras possíveis influências – Mais uma vez é possível
observar influências do Brutalismo corbusieriano, na definição da volumetria do
edifício.
Este exercício se desenvolve, identificando as escalas mais expressivas, suas
funções, relações e modos de ocorrência. Para isso, o registro gráfico e o
discurso do autor do projeto são utilizados como fonte de informação. Através
dessa operação, procura-se observar que questões foram trabalhadas pelo
arquiteto - e como -, durante o processo de concepção; que referências foram
acionadas. Possíveis problematizações formuladas sobre a proposta,
envolvendo qualquer elemento ou momento do processo de concepção,
deverão encontrar resposta a partir da consideração dessas questões e de sua
análise.
4. PROJETO DO EDIFÍCIO DA PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
EM NATAL
QUESTÕES COLOCADAS AO AUTOR DO PROJETO, A PARTIR DE
ROTEIRO QUE CONTEMPLA OS SEGUINTES ASPECTOS:
Determinismo de ordem técnica – Através de entrevista aberta com o autor do
projeto, podemos constatar que esse determinismo se fez notar a partir da
observação de um programa de necessidades - principalmente das dimensões
que definem os ambientes -, fruto de discussão com o cliente, objetivando
melhor atender seus objetivos e aproveitar o espaço exíguo do terreno. A
134
concepção da estrutura e a escolha dos materiais de construção também
refletem essa dimensão (técnica). É atribuída a esse determinismo a solução
de ocupação vertical do espaço, em torno de uma escada que permite o
acesso aos pavimentos. Com exceção do espaço reservado ao atendimento
público, os demais pavimentos são afastados, entre si, por um só lance de
escada, o que significa meio pé-direito. Isso se faz possível pelo fato de cada
pavimento se desenvolver ao longo de apenas um lado da escada, de forma
alternada.
Determinismo de ordem funcional – A organização das funções no espaço -
principalmente horizontal -, reservou a área de atendimento do público
colocando-a diretamente em contato com a rua, ao mesmo tempo em que
situou o gabinete do Procurador-Geral na posição mais afastada, em virtude da
importância desse cargo. Em conseqüência, o jogo volumétrico concebido
refletiu essa consideração, dando como resultado volumes alternados.
Determinismo de ordem econômica – Apesar da solução de ocupação vertical
ser atribuída a questões de ordem técnica, é possível observar que,
indiretamente, a questão econômica também é contemplada, nesse caso. De
modo geral, não foi confirmada junto ao autor do projeto, a dimensão
econômica justificando qualquer solução adotada.
Determinismo de ordem topográfica – Diante do programa de necessidades
apresentado, as características do terreno, estreito, longo e de meio de quadra,
foram responsáveis pela solução de implantação adotada. Obedecidos aos
recuos mínimos, praticamente a construção ocupa todo o espaço do lote,
exigindo desenvolvimento vertical em pavimento térreo, acrescido de mais dois
outros. A orientação geográfica, expondo ao sol as fachadas mais longas,
exigiu uma solução de proteção contra a insolação excessiva. Foram adotados
brises verticais arrematados por arcos plenos na parte superior. A edificação
apresenta uma altura que estabelece relação de equilíbrio com a vizinhança,
onde predomina construções de um e dois pavimentos.
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Determinismo de ordem plástica – A influência do cubo na definição
volumétrica da proposta se constitui em uma escolha predominantemente
comprometida com a estética. De formação essencialmente modernista, o
autor aplica a linguagem geométrica fazendo uso de volumes que se alternam
e, segundo ele, alimentam um “jogo de volumes separados por vazios”. A
arcada que protege as fachadas laterais contra a insolação, resultou também,
de uma escolha determinada pela dimensão plástica, tendo por referência seu
uso na arquitetura moderna e na arquitetura colonial. Observa-se que a mesma
marca as fachadas de forma ritimada.
O início do processo de concepção do projeto traz consigo, de forma muito
clara, a influência da arquitetura modernista e da linguagem geométrica,
associadas à funcionalidade expressa através do programa de necessidades.
5. PROJETO DA CATEDRAL METROPOLITANA DE NATAL
QUESTÕES COLOCADAS AO AUTOR DO PROJETO, A PARTIR DE
ROTEIRO QUE CONTEMPLA OS SEGUINTES ASPECTOS:
Os fatores técnicos que se destacam na concepção da proposta arquitetônica
da catedral estão relacionados ao uso do concreto armado, em função de sua
liberdade plástica, da área a cobrir, do trabalho estrutural requerido e, também,
à concepção de uma estrutura cuja forma não apresentasse apenas função de
sustentação. Em alguns momentos, o determinante técnico respondeu a
exigências da função do espaço, ditada pela liturgia católica. Um exemplo claro
é a ausência de pilares no interior da nave principal, a localização da cripta em
pavimento subterrâneo, bem como a solução que permite o domus de
iluminação sobre a sacristia. Outra solução na qual intervem o determinante
técnico é a iluminação zenital da nave, permitida por um rasgo (medindo 1,50m
de largura) coincidindo com as arestas da pirâmide de seis faces, que define o
volume principal. Convém lembrar a execução da cruz/monumento - exterior à
pirâmide - igualmente em concreto, com 25 metros de altura. Ainda, a
implantação semi-enterrada da nave. Constitui-se, portanto, em um
determinante com participação ampla no processo de concepção.
136
Os fatores funcionais estão presentes, como determinantes, durante todo o
percurso do trabalho de concepção, a começar pela definição da volumetria
geral. Contornando a pirâmide central, foram dispostos volumes menores que
atendem a funções específicas como: sacristia, capelas (2), salão, sala de
celebrações e batistério. A concepção da catedral foi precedida por explicações
e esclarecimentos prestados por padres da arquidiocese, sobre a liturgia da
igreja católica e o funcionamento de uma catedral, em todos os detalhes;
ambiente por ambiente. O programa de necessidades tendo sido elaborado em
seguida, foi coerente com esses ensinamentos. Assim, foi considerado o
percurso que se dirige ao altar principal, iniciado na entrada do templo, tendo
sido localizado o batistério ao lado da entrada. Próximos ao altar, foram
reservados espaços para autoridades e o coro; em volta da nave, foram
localizadas capelas e salões para celebrações. Por trás do altar, foi localizada
a sacristia, semi-enterrada; na parte central da nave, foram dispostos os
bancos para o público. Sob a sacristia, totalmente enterrada, foi localizada a
capela do santíssimo – a cripta.
Não foi informada qualquer decisão projetual em que o determinante
econômico tenha tido papel de destaque, apenas foi registrada a participação
de um engenheiro calculista – Hélio Varela – no acompanhamento da definição
da estrutura, em função do volume de concreto a ser demandado na execução
da proposta. Indiretamente, a questão econômica tende a se confundir com a
necessidade de racionalização, própria a uma empreitada dessa envergadura.
A topografia do terreno é totalmente plana, sendo desnecessários movimentos
de terra ou quaisquer intervenções semelhantes. No entanto, foram previstas
escavações para permitir a implantação da proposta que conta com nave e
sacristia semi-enterradas e a cripta totalmente subterrânea. A implantação no
terreno considera a visibilidade do conjunto sem definição de frente e fundo. De
qualquer das quatro ruas que limitam o terreno, a visão que se tem do conjunto
edificado apresenta o mesmo esmero no tratamento fachadístico. Esse terreno
onde se previa a construção da catedral era ocupado por um praça (Praça Pio
XII) situada na Av. Deodoro da Fonseca, na Cidade Alta. Apresenta forma de
quadrilátero e, na época, era ladeada por edificações de um só pavimento,
137
salvo o cinema Rio Grande que apresenta pé direito equivalente a três
andares, no mínimo. Devido à relativamente pequena dimensão do terreno
(112mx90m) e à pouca largura das ruas que o contornam, não se obtém
afastamento suficiente para apreciação do conjunto em perspectiva; o registro
visual do observador sendo feito, sempre, a pouca distância. Em relação à
forma do terreno, o conjunto foi implantado fazendo coincidir duas faces da
pirâmide com dois lados; as quatro faces restantes foram dispostas de forma
inclinada, cada uma formando um ângulo de 30º com os demais lados do
terreno. Não se percebe preocupação com questões climáticas. Não há
indicação de como proceder para combater ou evitar o calor gerado no interior
da nave, por exemplo.
A linguagem geométrica predomina na solução plástica resultante. Trata-se
de uma pirâmide de base hexagonal ladeada por prismas de base retangular.
Ao lado desse conjunto, uma cruz formada por quatro lâminas retangulares
verticais, separadas entre si, presas a uma lâmina horizontal quadrada.
Inicialmente, o processo de concepção foi presidido por exigências
funcionais, associadas a determinismos litúrgicos. Isso ficou bastante
evidenciado pelo autor da proposta. Igualmente importante nesse momento, foi
a simbologia adotada – analogia com as catacumbas romanas, localizadas no
sub-solo, cujo acesso se dava a partir de uma passarela que conduzia ao
subterrâneo. A recém inaugurada catedral de Brasília (primeira fase executada
entre 1959/1960) também comparece como uma fonte de inspiração para o
arquiteto: nave semi-enterrada, com entrada através de passarela de piso
inclinado.
6. PROJETO DO EDIFÍCIO SEDE DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL
EM NATAL
QUESTÕES COLOCADAS AO AUTOR DO PROJETO, A PARTIR DE
ROTEIRO QUE CONTEMPLA OS SEGUINTES ASPECTOS:
Dentre os fatores técnicos que se apresentaram como determinantes na
concepção do edifício sede do Tribunal Regional Eleitoral em Natal,
destacaram-se: a eleição do concreto armado como material de construção, a
138
solução de planta livre, os balanços e a interseção de planos na definição da
volumetria, merecendo do arquiteto, autor da proposta, a definição de que
nesse projeto “tudo é estrutura”. Acrescente-se, ainda, a solução de proteção
da fachada “posterior”, executada, também, em concreto armado. Segundo o
arquiteto, a idéia de monumentalidade presidiu as etapas da concepção; os
determinantes de ordem econômica, por sua vez, tiveram participação no
desenvolvimento da idéia, de forma a garantir o racionalismo construtivo
inerente a uma proposta do nível desse edifício (Por exemplo, a simplificação
da estrutura/forma). Exceção para o uso do concreto aparente, conforme o
autor, como uma solução diretamente inspirada pela dimensão econômica.
Os determinantes funcionais foram de grande importância na concepção do
edifício do TRE. Esses levaram à solução da planta livre (junto com os
determinantes acima referidos) e à localização dos ambientes, em atenção à
definição do programa de necessidades, amplamente discutido com o cliente.
O autor enfatizou o uso da rampa nesse projeto, caracterizando a preocupação
com a acessibilidade - a partir de 1985 passou a ser exigência legal (lei
7405/85). Desses determinantes resultou, também, a ocupação vertical do
espaço, situando a garagem no subsolo.
O terreno onde foi implantado o edifício é de esquina, longo e estreito,
apresentando uma topografia com pequena inclinação. Em virtude de sua
orientação, as duas fachadas com maior área requereram atenção especial;
uma porque fica voltada para nascente, podendo receber grande áreas
envidraçadas e a outra porque fica voltada para o sol poente, necessitando de
proteção. A solução adotada foi determinada pela situação geográfica,
evitando a penetração do sol da tarde no interior da edificação, cuja construção
ocupa toda a área do terreno.
Determinismos de ordem plástica – A edificação apresenta uma forma
prismática simples, no entanto, é possível observar influências da arquitetura
do Ministério da Educação, no Rio de Janeiro e da arquitetura de Le Corbusier,
especialmente do período brutalista (“beton brut” – Chandigard, Unidade de
habitação). A definição da estrutura aparente obedece a esse determinismo,
com sua linguagem geométrica - contrastando com o entorno imediato -,
139
balanços e uso do concreto aparente. A solução adotada para as fachadas
permite, como afirmou o autor, “leituras diferentes, em horários diferentes, em
função da variação da projeção das sombras”.
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