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pelas estruturas sociais da região sob o influxo das políticas neoliberais
durante a década. (SEOANE e TADDEI, 2001, p. 169)
Desde 1999, dezenas de milhares de pessoas reuniram-se em dois tipos
distintos de iniciativas: o protesto contra os projetos das grandes
instâncias mundiais de decisão – Banco Mundial, Fundo Monetário
Internacional (FMI), OMC, União Européia – e o outro, mais
institucional, os Fóruns mundiais, continentais, nacionais, locais. Essas
reuniões tornaram-se um fato político central. (HOUTART, 2003).
Sem entrar muito numa discussão sobre as conquistas
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e os limites
70
desses
movimentos do altermundialismo
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, é possível afirmar que suas críticas direcionadas
ao neoliberalismo (ou à globalização neoliberal) somadas aos questionamentos ao
“Consenso de Washington” oriundos do interior do próprio establishment cumpriram,
em alguma medida, o papel de “crítica” - enfatizado por Boltanski (1999) - e, de
alguma maneira, abalaram a legitimidade do discurso defendido pelos organismos
internacionais, que se viram na necessidade de mudar suas estratégias de justificação,
em prol da manutenção de sua legitimidade e de seu projeto de poder. Ou seja, de
algum modo, essas críticas pressionaram o modo de justificação do capitalismo
globalizado, que se viu na necessidade de se transformar. Nos termos de Boltanski
(1999), a crítica cumpriu, nesse momento, o papel de “motor nas mudanças do
espírito do capitalismo” (BOLTANSKI, 1999, p. 69), mudanças estas que raramente
são radicais
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.
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A grande conquista desses movimentos parece ser a de tentar recriar a utopia no mundo
contemporâneo. Na medida em que se afirma que “um outro mundo é possível”, é questionada, ou
mesmo derrubada, a tese do “fim da história” dos anos oitenta/noventa e abrem-se novos horizontes
para o mundo social, muito embora não esteja claro de que horizontes se tratam.
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Em relação ao Fórum Social Mundial de Porto Alegre, por exemplo, Emir Sader (2003) afirma que o
fato de seu Comitê Organizador ter sido composto majoritariamente por organizações não-
governamentais fez com que o caráter do evento fosse o de “espaço de aglutinação da ‘sociedade
civil’”, fato do qual Sader destaca duas problemáticas. Por um lado, ressalta a possibilidade de
“coincidências perigosas do resgate da “sociedade civil” com movimentos neoliberais (...), [as quais,
contudo,] não tiveram até aqui efeitos negativos que desfigurassem o caráter (...) antineoliberal dos
fóruns” (SADER, 2003, p. 86). Por outro lado, Sader afirma que essa opção pela “sociedade civil”
também “deixa de fora os partidos e os governos, ao assumir a oposição sociedade civil/Estado. Esse
aspecto é mais grave, não apenas porque um movimento antineoliberal não pode prescindir de
nenhuma força numa luta ainda tão desigual, mas principalmente porque se abstrai das temáticas do
poder, do Estado, da esfera pública, da direção política e até mesmo, de alguma forma, da luta
ideológica.” (idem). E continua: “esse aspecto termina sendo grave porque, se levado estritamente
adiante, limita a formulação de propostas alternativas ao neoliberalismo. Nesse caso, a busca de
alternativas fica restrita ao marco local (...) sem propostas globais de projetos negadores e superadores
do neoliberalismo como proposta global do capitalismo” (ibidem, p. 87).
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Reunidos em torno da idéia de que “um outro mundo [ou outra globalização] é possível”.
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Boltanski (1999, p. 70-71) destaca três possíveis efeitos da crítica sobre o “espírito do capitalismo”:
(i) ela pode deslegitimar o espírito vigente, minando as modalidades de adesão social a ele associadas;
(ii) a crítica força o capitalismo a respondê-la. Para conservar a adesão social, o espírito do capitalismo