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Universidade Federal do Rio de Janeiro
HABITAÇÃO POPULAR E PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO
NA REABILITAÇÃO DO CENTRO DO RIO DE JANEIRO
O CASO DO EDIFÍCIO NA RUA SENADOR POMPEU 34
KLEBER MARINHO CARDOZO
2009
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Universidade Federal do Rio de Janeiro
HABITAÇÃO POPULAR E PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO
NA REABILITAÇÃO DO CENTRO DO RIO DE JANEIRO
O CASO DO EDIFÍCIO NA RUA SENADOR POMPEU 34
KLEBER MARINHO CARDOZO
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção
do título de Mestre em Ciências em
Arquitetura, Linha de pesquisa Restauração e
Gestão do Patrimônio.
Orientador: Profª. Dsc. Cêça Guimaraens
Co-orientador: Prof. Dsc. Mauro C. O. Santos
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2009
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HABITAÇÃO POPULAR E PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO
NA REABILITAÇÃO DO CENTRO DO RIO DE JANEIRO
O CASO DO EDIFÍCIO NA RUA SENADOR POMPEU 34
Autor: Kleber Marinho Cardozo
Orientador: Profª. Dsc. Cêça Guimaraens
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ,
como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciências em
Arquitetura, Linha de pesquisa Restauração e Gestão do Patrimônio.
Aprovada por:
_______________________________________
Presidente, Profª. Dsc. Cêça Guimaraens
_______________________________________
Prof. Dsc. Mauro C. O. Santos (PROARQ-FAU/UFRJ)
_______________________________________
Prof. Dsc. Elizabete Martins (PROARQ-FAU/UFRJ)
_______________________________________
Prof. Dsc. Antonio Carlos Carpintero (FAU-UnB)
_______________________________________
Prof. Dsc. Eduardo Cotrim (IPP-SMU/Rio)
Rio de Janeiro
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C268
Cardozo, Kleber Marinho.
Habitação popular e preservação do patrimônio na
reabilitação do Centro do Rio de Janeiro: o caso do edifício
na rua Senador Pompeu, 34./ Kleber Marinho Cardozo. –
Rio de Janeiro: UFRJ/FAU, 2009.
xviii, 251f.: il., 30 cm.
Orientador: Cêça Guimaraens.
Dissertação (Mestrado) – UFRJ/PROARQ/Programa de
Pós-Graduação em Arquitetura, 2009.
Referências bibliográficas: p. 191-200.
1. Habitação popular. 2. Patrimônio cultural –
Preservação. 3. Renovação urbana – Centro (Rio de
Janeiro, RJ). 4. Rio de Janeiro (RJ) – Centro. I. Guimaraens,
Maria da Conceição Alves de. II. Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura. III. Título.
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A G R A D E C I M E N T O S
A Deus, por me munir de força e equilíbrio em todos os momentos.
Aos meus pais Valdi e Suely e às duas “mães do coração” Cida e Maria da Glória, pelo
cuidado e incentivo desde o início desta empreitada.
À amada Marçoise, pela inestimável colaboração e por compreender minha ausência
em momentos importantes.
Aos amigos André Parreiras, Gustavo Guimarães, Helena Galiza e Helga Santos pelos
conselhos valiosos e sugestões bibliográficas relevantes.
À professora e orientadora Cêça Guimaraens, por todas as observações pertinentes e
críticas construtivas.
Ao professor e co-orientador Mauro Santos, por todo auxílio prestado antes, durante
e após o Mestrado.
Aos demais professores e funcionários do PROARQ, sempre dispostos a colaborar.
Aos companheiros da turma de Mestrado 2007, por compartilhar angústias e alegrias
ao longo desta jornada.
À Doralice Duque, pela indicação do estágio na Divisão de Preservação de Imóveis
Tombados do Escritório Técnico da Universidade Federal do Rio de Janeiro
DIPRIT/ETU/UFRJ.
À CAPES, pela concessão da bolsa de Pós-Graduação.
Aos funcionários do Programa Novas Alternativas, em especial Nazih Heloui e Giselle
Massulo, por fornecer informações assaz importantes para a realização desta pesquisa.
Aos moradores do edifício da rua Senador Pompeu 34, em especial a Sra. Maria
Isabel e o Sr. Alonso, pela receptividade e solicitude.
A todos aqueles não citados que, mesmo em silêncio, me apoiaram, auxiliaram e
acreditaram na minha capacidade.
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R E S U M O
HABITAÇÃO POPULAR E PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO
NA REABILITAÇÃO DO CENTRO DO RIO DE JANEIRO
O CASO DO EDIFÍCIO NA RUA SENADOR POMPEU 34 - RJ
Autor: Kleber Marinho Cardozo
Orientador: Profª. Dsc. Cêça Guimaraens
Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em
Ciências em Arquitetura.
Os processos de degradação do ambiente construído e obsolescência funcional
identificados nas áreas centrais de diversas cidades do mundo motivaram, nas últimas
décadas, o desenvolvimento de planos para a recuperação física e econômica destas regiões.
Em muitos casos estas zonas, além de concentrarem grande quantidade de edifícios de
reconhecido valor histórico, servem como local de moradia para famílias de baixa renda.
Nesse sentido, constitui um enorme desafio às propostas de intervenção conciliar a melhoria
das condições de habitação para os segmentos populares, geralmente inadequadas, e a
conservação do patrimônio edificado. Com base neste desafio a dissertação analisa a
atuação do poder público na produção, preservação e recuperação de moradias populares
na área central do Rio de Janeiro e a relação das diretrizes adotadas no processo de
reabilitação e gestão destes edifícios com os problemas de conservação e uso identificados
no pós-ocupação. Para realizar esta verificação adotou-se como estudo de caso um antigo
cortiço do século XIX, localizado a rua Senador Pompeu 34 e tombado a nível municipal, que
foi reabilitado no período de 1996 a 2003.
Palavras-chave : 1. Habitação popular. 2. Patrimônio cultural Preservação. 3. Renovação
urbana – Centro. 4. Rio de Janeiro – Centro.
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A B S T R A C T
HABITAÇÃO POPULAR E PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO
NA REABILITAÇÃO DO CENTRO DO RIO DE JANEIRO
O CASO DO EDIFÍCIO NA RUA SENADOR POMPEU 34 - RJ
Autor: Kleber Marinho Cardozo
Orientador: Profª. Dsc. Cêça Guimaraens
Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em
Ciências em Arquitetura.
The processes of degradation of the built environment and functional obsolescence
identified in several central areas of cities in the world rise, in recent decades, the
development of plans for the physical and economic recovery of these regions. In many
cases these areas concentrate large number of buildings of recognized historic value and
serve as a place of housing for low income households. In this sense, is a major challenge to
the proposed intervention to reconcile the improvement of living conditions for the popular
segments, generally inadequate, and conservation of built heritage. Based on this challenge,
the dissertation examines the role of public authorities in the production, preservation and
restoration of popular homes in the central area of Rio de Janeiro and the connection
between the guidelines adopted in the process of rehabilitation and management of these
buildings and the problems of conservation and use identified post-occupancy. To perform
this check, adopted as a case study an old nineteenth-century slum, located at rua Senador
Pompeu 34 and tumbled at the municipal level, which was rehabilitated in the period 1996
to 2003.
Keywords : 1. Popular housing. 2. Cultural heritage – Preservation. 3. Urban renewal –
Downtown. 4. Rio de Janeiro – Downtown.
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S U M Á R I O
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE SIGLAS
INTRODUÇÃO
1. HABITAÇÃO POPULAR NA ÁREA CENTRAL DO RIO DE JANEIRO
Contexto político, econômico, social e urbano no século XIX
Fases de ocupação
1ª fase: proliferação e combate – a exploração de aluguéis e a política sanitária
2ª fase: segregação – a reforma de Pereira Passos
3ª fase: degradação – a ausência de investimentos e a especulação imobiliária
4ª fase: reabilitação – o incentivo à moradia no Centro
Tipologias arquitetônicas
Sobrados
Casas de cômodos
Estalagens e cortiços
Avenidas
Vilas Operárias
A produção de moradias para famílias de baixa renda
2. PRESERVAÇÃO E INTERVENÇÃO NO PATRIMÔNIO HABITACIONAL
Origens da preservação
Evolução das políticas de preservação
Ambiências e edifícios habitacionais preservados
Edifícios habitacionais tombados
Áreas de Proteção do Ambiente Cultural
Os bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo
O morro da Conceição
Intervenções em edifícios e áreas históricas
Programas e projetos na área central
Reabilitação urbana – SAs, Porto do Rio e proRIO Morro da Conceição
Reabilitação arquitetônica – Novas Alternativas, Morando no Centro e ReHabCentro
Outras experiências nacionais e internacionais
Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís
Programa de Reabilitação Urbana em Lisboa
Análise comparativa
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3. O CASO DO EDIFÍCIO NA RUA SENADOR POMPEU 34
Informações sobre o edifício
Inserção Urbana
Histórico
Tipologia arquitetônica
Tecnologia construtiva
O processo de reabilitação
Análise técnico-funcional no pós-ocupação
Escolha dos aspectos de análise
Visitas realizadas
Coleta de dados
Observações no local
Entrevistas
Análise da relação entre diretrizes e problemas
Diretrizes de preservação
Diretrizes habitacionais
Execução da obra
Gestão do imóvel
Uso
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANEXOS
Anexo I
Anexo II
Anexo III
Anexo IV
Anexo V
Anexo VI
Anexo VII
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Perguntas da entrevista com os moradores
Informações da reunião com o arquiteto Nazih Heloui
Fichas de análise do estado de conservação do edifício
Reprodução de cópia fotográfica do projeto de acréscimo do cortiço
Memorial de Reabilitação do cortiço
Cópia do Decreto de tombamento do edifício obtida no SEDREPAHC
Cópia da escritura obtida no 4º Ofício de Imóveis
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LISTA DE FIGURAS
Capítulo I
Figura I.1
Figura I.2
Figura I.3
Figura I.4
Figura I.5
Figura I.6
Figura I.7
Figura I.8
Figura I.9
Figura I.10
Figura I.11
Figura I.12
Figura I.13
Figura I.14
Figura I.15
Figura I.16
Figura I.17
Figura I.18
Figura I.19
Figura I.20
Figura I.21
Limites da área central no início do culo XIX. Elaboração do autor a
partir de www.brazilbrazil.com, 2008.
Localização das freguesias da área central na década de 1820.
Elaboração do autor a partir de MASHECK, GIESECK e DEVRIENT,
1890 apud BRAGA, 2003; VAZ, 1985; SANTOS, 1965;
www.brazilbrazil.com, 2008.
Localização das freguesias da área central na década de 1870.
Elaboração do autor a partir de MASHECK, GIESECK e DEVRIENT,
1890 apud BRAGA, 2003; VAZ, 1985; SANTOS, 1965;
www.brazilbrazil.com, 2008.
Distribuição das habitações populares na segunda metade do século
XIX. Elaboração do autor a partir de VAZ, 1985;
www.brazilbrazil.com, 2008.
Superlotação nas habitações populares. VAZ, 2002, p.34.
Tipologia rés-do-chão em Lisboa. LISBOA, 1993.
Edifícios de 3 a 4 pavimentos em Lisboa. LISBOA, 1993.
Tipologia do sobrado em lote estreito e comprido. REIS FILHO, 1970,
p.29.
Gabaritos dos sobrados no morro da Conceição construídos no
século XIX. PINHO e SIGAUD, 2000, p.14.
Setorização dos ambientes no sobrado. REIS FILHO, 1970, p.29.
Estalagem na rua do Senado. CARVALHO, 1995, p.135.
Planta típica da estalagem. BACKHEUSER, 1906, p.92.
Cortiço na rua Senador Pompeu. CARVALHO, 1995, p.134.
Planta típica do cortiço. VAZ, 2002, p.103.
Casas em avenidas. VAZ, 2002, p.60.
Planta típica da unidade. BACKHEUSER, 1906, p.92.
Vila Ruy Barbosa na rua dos Inválidos. VAZ, 2002, p.43.
Vila operária na rua Barão da Gamboa. Autor desconhecido, 2009.
Ocupações irregulares na rua do Livramento nº 73, 75, 77. OROZCO,
2007, p. 160-161.
Ocupações irregulares na rua do Livramento nº 76. OROZCO, 2007, p.
160-161.
Vila Pereira Passos. Foto do autor. 2008.
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Capítulo II
Figura II.1
Figura II.2
Figura II.3
Figura II.4
Figura II.5
Figura II.6
Figura II.7
Figura II.8
Figura II.9
Figura II.10
Figura II.11
Figura II.12
Figura II.13
Figura II.14
Figura II.15
Figura II.16
Figura II.17
Figura II.18
Figura II.19
Figura II.20
Figura II.21
Figura II.22
Figura II.23
Figura II.24
Figura II.25
Figura II.26
Vila Pereira Passos na Cidade Nova.
Foto do autor,
2008.
Cortiço na rua Senador Pompeu 34 no Centro. Foto do autor, 2008.
Limites e abrangência da APAC SAGAS. Google Earth adaptado pelo
autor, 2009.
Configuração dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo no início
do século XIX. CARDOSO et al, 1987, p.37.
Configuração dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo no final
do século XX. CARDOSO et al, 1987, p.143 adaptado pelo autor.
Cais e trapiches da praia da Saúde em 1840. CARDOSO et al, 1987,
p.55.
Palácio Episcopal. PINHO e SIGAUD, 2000.
Igreja de São Francisco Prainha. PINHO e SIGAUD, 2000.
Rua da Prainha no século XVIII. ARNAUT, 1984.
Rua do Valongo no século XVIII. ARNAUT, 1984.
Traçado urbano do morro da Conceição e adjacências em 1769.
www.brazilbrazil.com adaptado pelo autor, 2009.
Limites do morro da Conceição em 1838. www.brazilbrazil.com
adaptado pelo autor, 2009.
Intervenções urbanas propostas por Pereira Passos em 1904.
www.brazilbrazil.com adaptado pelo autor, 2009.
Imediações do morro em 1945 após a abertura das avenidas Rio
Branco e Presidente Vargas. www.brazilbrazil.com adaptado pelo
autor, 2009.
Tipologias na rua Júlia Lopes de Almeida. Foto do autor, 2008.
Tipologias na rua Senador Pompeu. Foto do autor, 2008.
Estilos e gabaritos na rua Marechal Floriano. Foto do autor, 2008.
Estilos e gabaritos na rua do Acre. Foto do autor, 2008.
Estilos e gabaritos na Sacadura Cabral. Foto do autor, 2008.
Conservação na rua do Acre. Foto do autor, 2008.
Conservação na rua Camerino. Foto do autor, 2008.
Maquete de intervenção do Projeto SAs. PROJETO SAs, 1998.
Áreas de intervenção do Plano Porto do Rio. www.rio.rj.gov.br, 2008.
Localização do edifício na Travessa do Mosqueira nº 20. PREFEITURA,
2003.
Fachada do edifício na Travessa do Mosqueira 20. PREFEITURA,
2003.
Planta do subsolo – sem escala. PREFEITURA, 2003.
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Figura II.27
Figura II.28
Figura II.29
Figura II.30
Figura II.31
Figura II.32
Figura II.33
Figura II.34
Figura II.35
Figura II.36
Figura II.37
Figura II.38
Figura II.39
Figura II.40
Figura II.41
Figura II.42
Figura II.43
Figura II.44
Figura II.45
Figura II.46
Figura II.47
Figura II.48
Planta do térreo
sem escala. PREFEITURA, 2003.
Planta do jirau – sem escala. PREFEITURA, 2003.
Localização do edifício na rua Sacadura Cabral 295. PREFEITURA,
2003.
Fachada do edifício na rua Sacadura Cabral 295. Foto do autor,
2007.
Planta do pavimento inferior. PREFEITURA, 2003.
Planta do pavimento superior. PREFEITURA, 2003.
Planta do pavimento inferior na ladeira João Homem 35 sem
escala. PREFEITURA, 2007.
Planta do pavimento superior na ladeira João Homem 35 sem
escala. PREFEITURA, 2007.
Fachada do edifício. PREFEITURA, 2007.
Bairro de Praia Grande em São Luís. VARGAS et al, 2005, p. 171.
Planta do térreo na rua do Giz 117 sem escala. LIMA et al, 2004,
p.131; AZEREDO, 2006, p.53. Planta do térreo na rua do Giz 117
sem escala. LIMA et al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53.
Planta do pavimento na rua do Giz 117 sem escala. LIMA et
al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53. Planta do térreo na rua do Giz
nº 117 – sem escala. LIMA et al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53.
Planta do pavimento na rua do Giz 117 sem escala. LIMA et
al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53. Planta do térreo na rua do Giz
nº 117 – sem escala. LIMA et al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53.
Fachada do edifício – sem escala. LIMA et al, 2004, p.131.
Localização das primeiras cidades a sofrerem ações de reabilitação
urbana em Lisboa. Google Earth, 2009.
Localização e limites do Bairro Alto em Lisboa. Google Earth
adaptado pelo autor, 2009.
Planta do ao pavimento na travessa da Laranjeira 26.
LISBOA, 1993, p.101.
Planta do 4º pavimento na travessa da Laranjeira nº 26. LISBOA,
1993, p.101.
Fachada frontal. LISBOA, 1993, p.101.
Planta do térreo na travessa do Poço da Cidade 52-54. LISBOA,
1993, p.103.
Planta do pavimento na travessa do Poço da Cidade 52-54.
LISBOA, 1993, p.103.
Planta do ao pavimento na travessa do Poço da Cidade 52-
54. LISBOA, 1993, p.103.
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Figura II.49
Figura II.50
Figura II.51
Figura II.52
Capítulo III
Figura III.1
Figura III.2
Figura III.3
Figura III.4
Figura III.5
Figura III.6
Figura III.7
Figura III.8
Figura III.9
Figura III.10
Figura III.11
Figura III.12
Figura III.13
Figura III.14
Figura III.15
Figura III.16
Figura III.17
Figura III.18
Figura III.19
Figura III.20
Planta do pavimento na travessa do Poço da Cidade 52-54.
LISBOA, 1993, p.103.
Fachadas do edifício. LISBOA, 1993, p.103.
Fachada frontal do edifício. LISBOA, 1993, p.103.
Obras de reabilitação no edifício. LISBOA, 1993, p.103.
Localização do cortiço. Google Earth adaptado pelo autor, 2008.
Parcelamento dos lotes e quadras do Morro da Conceição e entorno.
PINHO e SIGAUD, 2000 adaptado pelo autor.
Parcelamento dos lotes na rua do Acre. PINHO e SIGAUD, 2000.
Tipologias arquitetônicas na rua do Acre. PINHO e SIGAUD, 2000.
Relação entre a volumetria dos sobrados tradicionais e do cortiço.
Desenho do autor, 2009.
Relação entre o remembramento dos lotes e a arquitetura
produzida. Desenho do autor, 2009.
Planta de Bens Tombados e Preservados no Morro da Conceição.
PINHO e SIGAUD, 2000.
Planta Cadastral elaborada por Edward Gotto em 1871. PINHO e
SIGAUD, 2000.
Fachada proposta em 1909. AGCRJ, 1909.
Fachada na década de 1990. CEBRIAN, 1995.
Espacialidade do pátio interno. Autor desconhecido. Data indefinida.
Elementos compositivos das fachadas internas. Novas Alternativas.
2000.
Programa e espacialidade do pavimento inferior. Desenho do autor,
2009.
Programa e espacialidade do pavimento superior. Desenho do autor,
2009.
Relação entre o lote do cortiço e os demais lotes da rua Senador
Pompeu. PINHO e SIGAUD, 2000.
Relação entre o partido arquitetônico do cortiço e dos demais
sobrados da rua Senador Pompeu. Foto do autor, 2009.
Comparação entre a setorização do sobrado e do cortiço. REIS FILHO,
1970, p.29 e desenho do autor, 2009.
Paredes em taipa. Foto do autor, 2008.
Estrutura de piso em madeira. Foto do autor, 2008.
Tipos de esquadrias. Foto do autor. 2008.
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121
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Figura II
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Figura III.22
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Figura III.38
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Figura III.40
Figura III.41
Figura III.42
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Figura III.45
Figura III.46
Figura III.47
Figura III.48
Figura III.49
Figura III.50
Figura III.51
Estrutura do balcão. Foto do autor. 2008.
Estrutura deteriorada da circulação do pavimento superior. Novas
Alternativas, 1999.
Obras nas alvenarias. Novas Alternativas, 2000.
Obras na circulação. Novas Alternativas, 2000.
Cortiço antes da reforma. Novas Alternativas, 2000.
Cortiço após a reforma. Novas Alternativas, 2003.
Projeto de Reabilitação planta baixa do pavimento inferior. Novas
Alternativas, 2000.
Projeto de Reabilitação planta baixa do pavimento superior. Novas
Alternativas, 2000.
Projeto de Reabilitação planta de cobertura. Novas Alternativas,
2000.
Projeto de Reabilitação corte longitudinal. Novas Alternativas,
2000.
Projeto de Reabilitação – corte transversal. Novas Alternativas, 2000.
Projeto de Reabilitação – fachada. Novas Alternativas, 2000.
Manchas de umidade nos barrotes. Foto do autor, 2007.
Manchas e pichações na cantaria. Foto do autor, 2007.
Manchas no piso de madeira. Foto do autor, 2007.
Manchas no piso do pátio. Foto do autor, 2008.
Manchas no piso do pátio. Foto do autor, 2008.
Fissura no emboço. Foto do autor, 2007.
Descolamento do revestimento. Foto do autor, 2007.
Umidade na encosta do prisma. Foto do autor, 2007.
Umidade na empena. Foto do autor, 2007.
Manchas na pintura da escada. Foto do autor, 2007.
Empolamentos na pintura. Foto do autor, 2007.
Pichações na pintura. Foto do autor, 2008.
Umidade no forro de madeira. Foto do autor, 2007.
Umidade no forro de gesso. Foto do autor, 2007.
Esquadria externa deteriorada. Foto do autor, 2007.
Apodrecimento de esquadria interna. Foto do autor, 2007.
Fissuras no peitoril da janela. Foto do autor, 2007.
Danos nas esquadrias de madeira. Foto do autor, 2007.
Danos externos na esquadria de ferro. Foto do autor, 2007.
132
132
134
134
134
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151
151
H
xv
Figura II
I
.
52
Figura III.53
Figura III.54
Figura III.55
Figura III.56
Figura III.57
Figura III.58
Figura III.59
Figura III.60
Figura III.61
Figura III.62
Figura III.63
Figura III.64
Figura III.65
Figura III.66
Figura III.67
Figura III.68
Figura III.69
Figura III.70
Figura III.71
Figura III.72
Figura III.73
Figura III.74
Figura III.75
Figura III.76
Figura III.77
Danos internos na esquadria
de ferro.
Foto do autor, 2007.
Transpasse curto entre telhas . Foto do autor, 2007.
Fixação inadequada de rufos. Foto do autor, 2007.
Vazamento na caixa de visita. Foto do autor, 2007.
Tubulação de ferro rompida. Foto do autor, 2007.
Ausência de calhas. Foto do autor, 2007.
Buzinotes na fachada frontal. Foto do autor, 2008.
Entrada da rede telefônica. Foto do autor, 2007.
Fiação exposta. Foto do autor, 2007.
Instalação de máquina de lavar no pátio. Foto do autor, 2007.
Instalação de varais no tanque. Foto do autor, 2007.
Varais ao longo da circulação. Foto do autor, 2007.
Retirada de telhas do tanque. Foto do autor, 2007.
Adaptações de máquinas de lavar no interior das unidades. Foto do
autor, 2007.
Adaptações de máquinas de lavar no interior das unidades. Foto do
autor, 2007.
Adaptações de máquinas de lavar no interior das unidades. Foto do
autor, 2007.
Adaptações de socos em alvenaria. Foto do autor, 2007.
Modificação de esquadria. Foto do autor, 2007.
Instalação de grade. Foto do autor, 2007.
Reparo no banheiro. Foto do autor, 2007.
Reparo em esquadria. Foto do autor, 2007.
Instalação de divisórias. Foto do autor, 2008.
Mapeamento de Danos e Apropriações. Pavimento inferior. Sem
escala. Elaboração do autor, 2008.
Mapeamento de Danos e Apropriações. Pavimento superior. Sem
escala. Elaboração do autor, 2008.
Mapeamento de Danos e Apropriações. Cobertura. Sem escala.
Elaboração do autor, 2008.
Mapeamento de Danos e Apropriações. Fachada da rua Senador
Pompeu. Sem escala. Elaboração do autor, 2008.
151
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152
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152
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156
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157
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163
164
165
H
xvi
LISTA DE TABELAS
Tabela 1
Tabela 2
Tabela 3
Tabela 4
Tabela 5
Tabela 6
Tabela 7
Tabela 8
Tabela 9
Tabela 10
Tabela 11
Tabela 12
Tabela 13
Tabela 14
Crescimento da população no município e na área central entre 1856
e 1906. Elaboração do autor a partir de SANTOS, 1913; VAZ, 1985;
HAHNER, 1993; CARVALHO, 1995.
Distribuição das habitações populares na área central entre 1868 e
1895. Elaboração do autor a partir de SANTOS, 1913; VAZ, 1985;
HAHNER, 1993; CARVALHO, 1995.
População no município e na área central entre 1920 e 1960.
Elaboração do autor a partir dos Censos de 1920 e 1960 (folha 1)
consultados no AGCRJ, 2008.
Quantidade e tipos de domicílios existentes nos bairros em 2000.
Elaboração do autor a partir do Censo de 2000 do IBGE disponível
em www.armazemdedados.rio.rj.gov.br, 2008.
População residente nos bairros em 2000. Elaboração do autor a
partir do Censo de 2000 do IBGE disponível em
www.armazemdedados.rio.rj.gov.br, 2008.
Densidade domiciliar nos bairros em 2000. Elaboração do autor a
partir do Censo de 2000 do IBGE disponível em
www.armazemdedados.rio.rj.gov.br, 2008.
Alturas das edificações construídas entre 1852 a 1933. Elaboração do
autor a partir do Anuário de Estatística de 1895 e dos Censos de
1920 e 1933 consultados no AGCRJ, 2008.
Distribuição dos imóveis residenciais tombados na I, II e III RAs.
Elaboração do autor a partir de CARVALHO, 2000; PREFEITURA, 2004.
Empreendimentos realizados e propostos pelo Programa Novas
Alternativas. Elaboração do autor a partir de PREFEITURA, 2008.
Imóveis realizados pelo Programa de Cortiços. Elaboração do autor a
partir de OROZCO, 2007, p.115.
Imóvel realizado no morro da Conceição. Elaboração do autor a
partir de OROZCO, 2007, p.115.
Áreas úteis das unidades habitacionais do edifício. Elaboração do
autor, 2009.
Critérios para definição de áreas úteis mínimas em unidades
habitacionais. Elaboração do autor a partir de ORNSTEIN e ROMÉRO,
2003.
Relação entre o moradores ideal e o de moradores
encontrados por apartamento. Elaboração do autor, 2009.
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24
24
32
54
89
97
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180
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182
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xvii
LISTA DE QUADROS
Quadro 1
Quadro 2
Quadro 3
Quadro 4
Quadro 5
Quadro 6
Reorientação dos objetivos da Programa Novas Alternativas.
Elaboração do autor a partir de PREFEITURA, 2003; HELOUI, 2007.
Definição e atribuição dos agentes envolvidos. Elaboração do autor a
partir de PREFEITURA, 2003; HELOUI, 2007.
Comparação entre os exemplos de reabilitação no Rio, São Luís e
Lisboa. Elaboração do autor, 2009.
Patologias construtivas identificadas no edifício da rua Senador
Pompeu nº 34 no pós-ocupação. Elaboração do autor, 2008.
Modificações nos espaços identificadas no edifício da rua Senador
Pompeu nº 34 no pós-ocupação. Elaboração do autor, 2008.
Relações entre problemas de conservação e uso e diretrizes
adotadas no processo de reabilitação e gestão do imóvel. Elaboração
do autor, 2008.
91
93
116
160
161
186
H
xviii
LISTA DE SIGLAS
APA
APAC
BID
BNDES
BNH
CAIXA
CMPC
DGPC
DPHA
FCP
IAP
IBGE
INCRA
INSS
IPHAN
IPP
IPTU
ICOMOS
INEPAC
PAR
PRSH
RFFSA
SEDREPAHC
SMH
SPHAN
SPL
SPU
UNESCO
Área de Proteção Ambiental
Área de Proteção do Ambiente Cultural
Banco Interamericano de Desenvolvimento
Banco Nacional de Desenvolvimento
Banco Nacional de Habitação
Caixa Econômica Federal
Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural
Departamento Geral de Patrimônio Cultural
Divisão do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado
Fundação Casa Popular
Instituto de Aposentadoria e Pensão
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
Instituto Nacional do Seguro Social
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
Instituto Pereira Passos
Imposto Predial e Territorial Urbano
Conselho Internacional de Monumentos e Sítios
Instituto Estadual do Patrimônio Cultural
Programa de Arrendamento Residencial
Programa de Revitalização de Sítios Históricos
Rede Ferroviária Federal
Secretaria Extraordinária de Promoção, Defesa, Desenvolvimento e
Revitalização do Patrimônio e da Memória Histórico-Cultural da Cidade do
Rio de Janeiro
Secretaria Municipal de Habitação
Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
Superintendência de Planos Locais
Secretaria do Patrimônio da União
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabili
tação do Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
1
INTRODUÇÃO
O processo de degradação de edifícios e ambiências urbanas, identificado nas áreas centrais de
diversas cidades do mundo durante o século XX, é um fenômeno relacionado a diversos fatores
que incluem a ausência de intervenções e investimentos públicos e privados por longos
períodos, a crescente especulação imobiliária, o deslocamento dos antigos moradores para
outras regiões distantes do centro e a própria obsolescência funcional decorrente da falta de
renovação de usos. De um modo geral esta deterioração e relativo abandono observado nestas
áreas contribuiu, a longo prazo, para a preservação de diversos conjuntos arquitetônicos de
reconhecido valor histórico e cultural, remanescente dos séculos anteriores, que em muitos
casos são ocupados por estratos da população considerados de baixa renda. Com o objetivo de
promover a requalificação física, econômica e social destas regiões, diversas propostas de
intervenção urbano-arquitetônica têm sido desenvolvidas desde a década de 1970, no caso dos
países europeus e dos EUA e, mais recentemente, no caso dos países da América Latina,
apresentando alguns resultados concretos.
Baseado nesse contexto e em algumas experiências internacionais implementadas até o
momento
1
, é possível afirmar que constitui um grande desafio às políticas de reabilitação de
centros urbanos a solução e conciliação das questões relativas à melhoria das condições de
moradia da população residente e a conservação do acervo patrimonial que normalmente
caracterizam estas áreas. Sendo assim, a partir das propostas de requalificação realizadas no
Rio de Janeiro, a presente dissertação verifica a atuação do poder público na produção,
preservação e intervenção em moradias populares na área central da cidade e analisa em que
medida as diretrizes e ações adotadas no processo de reabilitação e gestão destes edifícios
influenciaram a conservação arquitetônica e o uso dos espaços no pós-ocupação. Para a
realização desta pesquisa o trabalho utilizou como estudo de caso uma habitação popular do
século XIX, tombada a nível municipal, que se localiza na rua Senador Pompeu nº 34 e faz parte
de um conjunto urbano de valor histórico e cultural compreendido pelos bairros da Saúde,
Gamboa e Santo Cristo e pelo morro da Conceição.
1
Bomfim e Zmitrowicz (2007) destacam como exemplos de recuperação de edifícios localizados em áreas
históricas e ocupados por população de poucos recursos a reabilitação da Cidade-Jardim da Butte Rouge localizado
no município de Hauts de Seine (França), a requalificação do bairro de San Salvario em Turim (Itália) e as
intervenções realizadas em Lisboa (Portugal).
H
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
2
Devido à importância como patrimônio arquitetônico da cidade, à localização e pelo fato de ter
conservado ao longo do tempo suas características tipológicas (pátio interno, divisão em
cômodos, equipamentos coletivos, volumetria e materiais construtivos) e usos originais
(residencial e comercial), este edifício foi selecionado pela Prefeitura para sofrer obras de
reabilitação no âmbito do Programa Novas Alternativas, da Secretaria Municipal de Habitação.
Os trabalhos de recuperação do edifício começaram em 1996 com atividades de vistoria do
estado de conservação, levantamentos fotográficos e desenvolvimento de projetos. Durante o
processo, concluído em 2003, foi desapropriado o imóvel (posteriormente adquirido pela
CAIXA), removidos os moradores, realizados os projetos básicos, executadas as obras com a
fiscalização da Prefeitura e ocupado por novos moradores com rendas entre três e seis salários
mínimos. De acordo com visitas realizadas no edifício em 2007 e 2008, decorridos cinco anos da
ocupação, foram verificadas diversas patologias construtivas e alterações realizadas pelos
moradores que interferiram nas características físico-funcionais do conjunto. A partir da
identificação das causas destes problemas, constatou-se que grande parte deles teve origem
nas diretrizes de intervenção adotadas e na execução da obra, sendo agravados, no pós-
ocupação, pela administração inadequada do imóvel.
Para proceder ao levantamento destas informações, optou-se pela execução de um estudo
exploratório, de natureza teórico-empírica, que utilizou dados do processo de reabilitação
(fotos, relatórios e memoriais), fornecidas pelo escritório do Programa Novas Alternativas, e
das visitas feitas ao imóvel. Nesse sentido, para a realização do estudo foram programadas
algumas atividades que compreenderam a coleta e a sistematização de dados. A coleta de
dados abrangeu a pesquisa e leitura de documentos sobre a reabilitação do cortiço com o
objetivo de identificar os parâmetros de intervenção adotados, as observações e avaliações
visuais das condições técnico-funcionais do edifício, o registro fotográfico das patologias
construtivas e das modificações identificadas no pós ocupação e a realização de entrevistas
com os moradores para obter informações sobre as condições de uso e conservação do edifício.
A sistematização dos dados incluiu a elaboração de quadros contendo os tipos e as causas das
patologias e intervenções verificadas, o mapeamento dos danos e das apropriações ocorridas
durante a fase de ocupação e a produção de fichas de análise da conservação do edifício. Com
base nos resultados das observações e entrevistas, foram analisadas as relações entre os
problemas de conservação e as ações adotadas durante a reabilitação, uso e gestão do edifício,
a fim de identificar as responsabilidades dos moradores e dos agentes públicos neste processo.
H
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
3
No que diz respeito à justificativa para a realização desta dissertação, acredita-se que as
informações obtidas e os resultados alcançados pela pesquisa serão úteis aos administradores
públicos que desenvolvem propostas de reabilitação de edifícios históricos para a população de
baixa renda, sobretudo no que diz respeito à formulação de diretrizes de intervenção, à
qualidade na elaboração de projetos e obras e à conservação do patrimônio arquitetônico.
Quanto ao embasamento teórico que deu suporte à elaboração do trabalho, foram utilizadas as
pesquisas e os conceitos estabelecidos por diversos autores que trataram sobre os temas
abordados nesta dissertação, abrangendo a habitação popular, a preservação do patrimônio e a
reabilitação urbano-arquitetônica.
Com relação à habitação popular no centro do Rio de Janeiro, Bernardes (1959) e Abreu (1987)
realizaram importantes estudos sobre as transformações urbanísticas ocorridas na área central
da cidade durante o século XIX. Silva (1965), Santos (1913) e Hahner (1993) analisaram os
principais fatores que influenciaram o adensamento populacional e a atração de trabalhadores
para o centro e acarretaram os problemas habitacionais e a proliferação dos cortiços no
referido século. Carvalho (1986), Rocha (1995) e Chalhoub (1996) verificaram de forma
abrangente o processo de erradicação dos cortiços e expulsão da população pobre da área
central à luz dos ideais de saneamento da cidade. Benchimol (1984) por sua vez forneceu
informações relevantes sobre os impactos causados pela reforma urbana conduzida pelo
prefeito Pereira Passos no início do século XX que culminaram com os conflitos entre o Estado e
os proprietários de imóveis, a erradicação das habitações populares do centro e deslocamento
dos moradores de baixa renda para a periferia. Mais recentemente, IBGE (2000) e Prefeitura
(2002) realizaram pesquisas importantes sobre a situação atual dos bairros da zona portuária
que incluíram a verificação do parque edificado e a caracterização socioeconômica desta
região. Para aprofundar o estudo sobre a arquitetura das habitações populares construídas no
Rio de Janeiro durante o século XIX, recorreu-se às considerações de Backheuser (1905), Vaz
(1985), Hahner (1993) e Reis Filho (1994) que analisaram as principais características e
transformações ocorridas nestas tipologias. Também foram importantes para a pesquisa as
considerações de Freyre (1961), que elaborou importante estudo de caracterização,
comparação e evolução das formas de habitação produzidas durante a era colonial, e de Reis
Filho (1970), que analisou a arquitetura residencial urbana brasileira deste período com base
nos conceitos de interdependência entre o lote e a edificação e de funcionamento da casa
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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baseado no trabalho escravo. Por fim, Carita (1994) forneceu alguns dados sobre as tipologias
arquitetônicas desenvolvidas em Portugal nos séculos XVII e XVIII que influenciaram as
características físico-funcionais identificadas nos sobrados construídos no Brasil.
No que se refere à preservação do patrimônio, Fonseca (1997) e Choay (2001) informaram
sobre as origens das práticas relativas à proteção de monumentos históricos, bem como a
respeito da evolução das políticas e legislações relativas ao assunto. Nesse sentido também
foram importantes os estudos de Kessel (2001), que verificou o surgimento dos primeiros
movimentos de preservação patrimonial no Brasil, e de Messentier (2004), que analisou os
efeitos da mudança ocorrida nas políticas desenvolvidas no Brasil na década de 1970, indicando
o crescimento do número de áreas urbanas sob proteção legal e a descentralização das ações
antes realizadas exclusivamente em nível federal. A respeito da proteção de ambiências e
edifícios históricos na área central do Rio de Janeiro, foram pesquisadas informações sobre
imóveis habitacionais tombados em Carvalho (2000) e Prefeitura (2004) e sobre as Áreas de
Proteção do Ambiente Cultural em Blasi (2004) e Prefeitura (1993). Para verificar os dados
relativos à formação e evolução urbana das ambiências históricas analisadas pela dissertação,
recorreu-se ao estudo de Cardoso et al (1987) acerca dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo
Cristo e à pesquisa de Zylberberg (1996) sobre o morro da Conceição. Finalizando os estudos
relativos ao assunto, foram pesquisados em Fonseca (1997), Giovannoni (1998) e Viollet-le-duc
(2000) as doutrinas que constituíram os alicerces da teoria e prática das intervenções em
edifícios históricos e em BOITO (2002), Cristinelli et al (2003), Brandi (2004) e nas Cartas
Patrimoniais foi verificada a evolução das noções e conceitos relativos aos tipos de intervenção
existentes, sobretudo a restauração e a reabilitação.
A abordagem da reabilitação urbano-arquitetônica foi realizada com base nas informações de
Castilho e Vargas (2006) sobre intervenções em centros urbanos, nas diretrizes do Plano Diretor
Decenal da Cidade do Rio de Janeiro (1993), que definiu as áreas sujeitas à intervenção do
Poder Público, nas pesquisas realizadas por Azeredo (2006) e Orozco (2007) em alguns imóveis
reabilitados na área central e nas propostas de intervenção desenvolvidas no Brasil e no
exterior. Entre os programas implementados foram analisados o Programa Novas Alternativas
no Rio de Janeiro, a partir de Pinho e Sigaud (2000), Prefeitura (2003) e Heloui (2007), o
Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís, baseado nos dados
fornecidos por Moreira (2003), Bandeira e Lamar (2004) e Espírito Santo (2006), e o Programa
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ação do Centro do
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de Reabilitação Urbana em Lisboa, de acordo com informações de Lisboa (1993), Lopes (2000) e
Lima (2004). Finalizando os estudos referentes à reabilitação, foram verificados em Cebrian
(1995) e Prefeitura (1999) o histórico, as diretrizes e a programação das atividades para a
recuperação do edifício analisado pela dissertação.
As informações relativas aos referencias teóricos e à pesquisa no estudo de caso foram
distribuídas em três capítulos. No primeiro, que trata da habitação popular na área central do
Rio de Janeiro, são apresentados os fatores que influenciaram o crescimento demográfico e a
conseqüente procura por moradia durante o século XIX, a trajetória das habitações populares
até o momento atual de reabilitação do centro da cidade, os estudos referentes às
características arquitetônicas destas tipologias e os reflexos das mudanças ocorridas no
processo de produção destas moradias a partir da década de 1930.
O segundo capítulo aborda a preservação e intervenção no patrimônio habitacional e verifica o
surgimento da idéia de preservação de monumentos no Brasil e no mundo, as transformações
nas políticas vigentes durante a segunda metade do século XX, a constituição do patrimônio
urbano e arquitetônico em áreas do Centro e da Zona Portuária caracterizadas pelo uso
residencial, a formação e evolução urbana dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo e do
Morro da Conceição, o desenvolvimento dos conceitos relativos à intervenção em edifícios e
áreas históricas e a comparação de alguns Programas destinados à recuperação de ambiências
e edifícios históricos implementados nas cidades do Rio de Janeiro, São Luís e Lisboa.
Com base nas informações e conceitos relacionadas à habitação, preservação e intervenção em
edifícios históricos, ora estabelecidos nos capítulos anteriores, o terceiro e último capítulo
analisa a inserção urbana, o histórico e as características arquitetônicas do cortiço da rua
Senador Pompeu nº 34, o processo de reabilitação deste imóvel e os problemas de conservação
e uso identificados no pós-ocupação. Também foram apresentados nesta parte do trabalho os
resultados da avaliação técnico-funcional realizada no edifício que contou com observações no
local e entrevistas com os moradores. Finalizando o capítulo, foram verificadas as relações
entre a ocorrência das patologias construtivas e modificações dos espaços e as diretrizes e
ações adotadas durante o processo de reabilitação e gestão do edifício.
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabili
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1. HABITAÇÃO POPULAR NA ÁREA CENTRAL DO RIO DE JANEIRO
Contexto político, econômico, social e urbano no século XIX
Os fatores que influenciaram o crescimento demográfico na área central da cidade e os efeitos
destes na demanda por moradia serão utilizados como ponto de partida para a análise do
panorama histórico e da crise da habitação ocorrida no Rio de Janeiro durante o século XIX.
Nesse sentido, serão estudados como causas responsáveis pela atração de trabalhadores e
novos habitantes para o centro a chegada da Família Real Portuguesa em 1808, o
desenvolvimento da atividade portuária e o processo de industrialização na segunda metade
deste século. Além da influência destes eventos no aumento da população, também serão
verificados seus reflexos nas transformações urbanas da região central neste período.
A primeira e, talvez, a mais importante observação a ser feita a respeito da chegada da Família
Real e de toda a Corte portuguesa ao Rio de Janeiro se refere ao impacto causado por este
acontecimento na precária estrutura colonial preexistente, seja em termos urbanos, sociais,
econômicos ou políticos. Os reflexos imediatos desta transição abrupta da pacata vida colonial
para a requintada vida cosmopolita puderam ser observados, sobretudo, na elevação do
número de habitantes
1
, na procura por habitação junto ao núcleo central da cidade e no
desenvolvimento das atividades comerciais e de serviços. Neste momento, o problema da falta
de moradia para os membros da Corte portuguesa foi solucionado através da expulsão dos
antigos moradores de suas residências, que eram confiscadas para abrigar a ‘população real’. A
este respeito Silveira (1995, p.42) considera que “a crise habitacional dos nobres foi transferida
para outros segmentos da população, que foram obrigados a sublocar parte de suas antigas
residências, ou então buscar novas localizações em áreas periféricas”.
Com relação ao incremento de novas funções na área central, observa-se que a partir da
chegada de D. João VI e da elevação do Rio de Janeiro à Capital do Reino Unido tem início um
novo período de crescimento da cidade, que foi impulsionado pela instalação de diversos
estabelecimentos comerciais ligados à importação e exportação, pela criação de importantes
instituições econômicas, administrativas e culturais e, principalmente, pelo desenvolvimento da
atividade portuária. A relevância do porto do Rio de Janeiro para as transações comerciais da
1
De acordo com Silveira (1995, p.41), com a chegada da Família Real “o acanhado núcleo colonial que abrigava
cerca de 60.000 habitantes, acolheu, de súbito, aproximadamente 15.000 novos moradores”.
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
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colônia era identificada desde século XVIII e contribuiu significativamente para a
transferência da capital da Bahia para o Rio em 1763. Entre os fatores que justificaram a
importância do porto no cenário nacional merecem destaque o estabelecimento do tráfego
marítimo direto e exclusivo entre o Rio e Lisboa após a invasão holandesa no nordeste, o
embarque do ouro explorado em Minas Gerais e a exportação da produção cafeeira, em franco
desenvolvimento na região do Vale do Paraíba na primeira metade do século XIX.
Este momento de crescimento econômico da cidade, caracterizado pelo desenvolvimento das
atividades portuárias, constituiu um dos principais motivos para a atração de mão-de-obra e
conseqüente aumento da população da cidade na primeira metade do século XIX
2
, o que
também gerou reflexos na busca por moradias próximas à zona portuária e intensificou os
problemas habitacionais iniciados com a chegada da Família Real. Durante a segunda metade
do século verificou-se o agravamento desta situação com a decadência da atividade agro-
exportadora, o aumento da produção manufatureira e o início do processo de industrialização.
A expansão do setor secundário na cidade, ocorrido com maior intensidade após a transição da
manufatura para a indústria em 1889, foi favorecida por um conjunto de fatores que incluíram
a presença do porto, a proximidade do mercado consumidor, a disponibilidade de matérias
primas, o declínio da produção cafeeira, o crescimento do comércio de importação e
exportação, a abolição da escravatura em 1888 e a ampliação gradativa do trabalho
assalariado. Devido à facilidade de escoamento e consumo da produção, a atividade industrial
se concentrou na área central da cidade e suas imediações, onde identificava-se a
predominância de estabelecimentos de pequeno porte e baixo nível de mecanização dedicados
à fabricação calçados, chapéus, confecções, bebidas e mobiliário (ROCHA, 1995, p.126-127;
ABREU, 1997, p.54-55). De um modo geral estas indústrias empregavam numerosa mão-de-
obra desqualificada composta por trabalhadores rurais, normalmente escravos alforriados e
imigrantes, que se deslocavam para a cidade em busca de emprego. É neste período que se
observa um aumento significativo das migrações decorrentes da redução das atividades
agrícolas
3
e verifica-se uma grande explosão demográfica na cidade sem que houvesse uma
correspondência na expansão da infra-estrutura urbana e na oferta de empregos e moradias.
2
Segundo Silveira (1995, p.42), “a população da cidade, que era de aproximadamente 100.000 habitantes em
1822, atingiu cerca de 140.000 em 1840”.
3
Rocha (1995, p.78) considera que, além da corrente migratória fluminense, representada pelos escravos, havia a
corrente migratória baiana, formada pelos soldados da campanha de Canudos.
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
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A presença deste elevado contingente populacional na cidade, identificado desde o início do
século, associado ao aumento da importância política, administrativa e econômica do Rio de
Janeiro motivou profundas transformações urbanísticas na área central, que ainda não
apresentava condições adequadas para abrigar as novas funções da capital e a massa de
trabalhadores oriunda das migrações. Durante a primeira metade do século XIX o
desenvolvimento desta região da cidade ocorreu sobre malha urbana obsoleta e sem
planejamento, cuja extensão era limitada pelos morros do Castelo, São Bento, Conceição e
Santo Antônio, pelo mar a leste e a norte e pelos Campos de São Domingos e de Sant’anna, a
oeste. Além desta área haviam poucas construções devido à existência de uma grande área
pantanosa que compreendia a Lagoa da Sentinella e o Mangal de São Diogo, como se pode
observar no mapa do início do século XIX.
LAGOA DA
SENTINELLA
MANGAL DE
O DIOGO
ÁREA
CENTRAL
Conceição
CAMPO DE
SANTANNA
São Bento
Castelo
Santo
Annio
Fig.I.1 Limites da área central no início do século XIX. Elaboração do autor a partir de www.brazilbrazil.com, 2008.
Quanto à setorização desta área urbanizada da cidade, pode-se dizer que até a década de 1820
esta restringia-se basicamente às freguesias centrais da Candelária, São José, Sacramento,
Santa Rita e Santana, nas quais se concentravam as atividades de moradia e trabalho que era
desenvolvido no porto, nos armazéns, nas oficinas, nas manufaturas, no comércio e na
administração pública (ABREU, 1997, p.37). A este respeito, Santos (1965, p.7) esclarece que a
cidade do Rio de Janeiro, nos seus primórdios, era dividida sob um aspecto eclesiástico em
diversas freguesias ou paróquias
4
que limitavam os territórios de jurisdição religiosa, em
princípio, e posteriormente passaram a abranger os territórios de jurisdição administrativa.
4
De acordo com Fridman (2008), o termo freguesia corresponde à designação portuguesa de paróquia que deriva
do grego parochos (aquele que fornece as coisas necessárias) ou paroikia (para = vizinhança, perto e oikos = casa).
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Fig.I.2 Localização das freguesias da área central na década de 1820. Elaboração do autor a partir de MASHECK,
GIESECK e DEVRIENT, 1890 apud BRAGA, 2003; VAZ, 1985; SANTOS, 1965; www.brazilbrazil.com, 2008.
Neste período, um dos obstáculos ao crescimento da cidade para além deste perímetro eram,
sem dúvida, as condições topográficas, que incluíam diversos morros e mangues. Porém, esta
expansão não encontrava apenas desafios na geografia da cidade, mas também na ausência de
meios de transporte públicos que facilitassem a ocupação de regiões mais distantes. Devido à
alta concentração populacional identificada na região central e à impossibilidade de
crescimento físico, o desenvolvimento do sistema de transportes tornou-se uma questão
urgente. A fim de solucionar este problema surgiram as linhas de ônibus movido a tração
animal em 1838, inaugurou-se a Estrada de Ferro Central do Brasil em 1858 e, com a ajuda do
Barão de Mauá, instalaram-se as primeiras linhas de bondes em 1868. Segundo Abreu (1997,
p.37), o ano de 1870 é considerado um marco na evolução urbana do Rio de Janeiro, pois
representa o momento em que “os dois elementos impulsionadores da expansão da cidade
(bondes e trens) passam a atuar sincronicamente”.
Esta evolução nos meios de transporte aliada à abertura de ruas e aterros de mangues
favoreceu, a partir de 1850, a ocupação mais intensa de outras freguesias periféricas ao Centro.
No entendimento da autora, trata-se de uma circunscrição eclesial em que se divide a diocese, palavra igualmente
de origem grega e utilizada no império romano, que tem o sentido de governo.
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A drenagem e aterros no Saco de São Diogo permitiram a ocupação de grande parte dos
terrenos junto ao caminho de Mata Porcos (Estácio) e na Cidade Nova, justificando a criação
das freguesias de Santo Antônio
5
e do Espírito Santo
6
. Nesse sentido, observou-se também que
a busca por novas áreas residenciais motivaram a expansão da cidade na direção da freguesia
do Engenho Velho
7
a oeste e das freguesias da Glória
8
e Lagoa
9
ao sul. Fez parte desta expansão
para além do núcleo antigo o deslocamento progressivo das classes abastadas da área central
para os novos bairros ao sul, justificado pelo processo de especialização funcional do centro,
que passou a abrigar predominantemente as atividades comerciais, administrativas e de
serviço, e pela ocupação cada vez maior desta região pela população de baixa renda, sobretudo
nas imediações da zona portuária.
Fig.I.3 Localização das freguesias da área central na década de 1870. Elaboração do autor a partir de MASHECK,
GIESECK e DEVRIENT, 1890 apud BRAGA, 2003; VAZ, 1985; SANTOS, 1965; www.brazilbrazil.com, 2008.
5
Esta freguesia, localizada onde se encontra atualmente o bairro da Lapa, foi criada em 1854 (ABREU, 1997, p.39).
6
Esta freguesia, criada em 1865, compreendia os atuais bairros da Cidade Nova, Catumbi, Estácio e Rio Comprido
(ABREU, 1997, p.39).
7
A freguesia do Engenho Velho corresponde ao atual bairro de São Cristóvão.
8
Esta freguesia ocupava a área compreendida pelos bairros da Glória e do Catete.
9
A freguesia da Lagoa se situava na região ocupada atualmente pelo bairro de Botafogo.
Engenho
Velho
Lagoa e
Glória
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Assim como nas freguesias periféricas, as freguesias centrais também sofreram importantes
transformações urbanas a partir de 1850. Além dos aterros de mangues e abertura de ruas,
foram executadas obras relacionadas ao calçamento de ruas com paralelepípedo, ao
fornecimento de iluminação a gás a partir de 1854, ao plantio de árvores, ao melhoramento de
praças e jardins públicos em 1860 e ao serviço de coleta de esgoto sanitário em 1862.
Apesar destas melhorias realizadas na infra-estrutura urbana do Rio de Janeiro, verificou-se que
as mesmas não foram capazes de acompanhar o acelerado desenvolvimento econômico
identificado na cidade a partir da primeira metade do século XIX e conter os efeitos deste
processo, sobretudo no que diz respeito à explosão demográfica ocorrida na área central. Neste
sentido, a impossibilidade da cidade em se adequar às rápidas transformações decorrentes da
chegada da Família Real, do desenvolvimento do porto e da industrialização refletiu-se na crise
que se instaurou na produção de habitações para a parcela da população composta por
imigrantes, escravos alforriados e demais brasileiros da classe pobre que vislumbravam novas
oportunidades de trabalho na capital. A construção, proliferação e remoção das moradias
produzidas para estes trabalhadores na área central da cidade obedeceram a determinadas
fases de ocupação que se estenderam até o século XX, como será visto a seguir.
Fases de ocupação
A fim de verificar como o poder público e a iniciativa privada trataram a questão da habitação
popular na área central do Rio de Janeiro, serão analisados quatro momentos distintos de
ocupação destas moradias que caracterizam sua trajetória até a atualidade. O primeiro é
caracterizado pela proliferação das moradias para trabalhadores da classe pobre e o combate
destas pela política sanitarista da época. O segundo corresponde à segregação destas
habitações e seus moradores para outras áreas da cidade após a reforma urbana realizada pelo
prefeito Pereira Passos. O terceiro abrange a degradação da área periférica ao centro de
negócios, onde ainda se localizam diversas habitações coletivas para famílias de baixa renda
produzidas no século XIX. O quarto e último diz respeito ao momento atual de reabilitação da
área central e incentivo ao uso habitacional.
1ª fase: proliferação e combate – a exploração de aluguéis e a política sanitária
Considerou-se como primeira fase da ocupação da habitação popular na área central o período
compreendido entre 1850 e 1900. A escolha da década de 1850 como ponto de partida se
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justifica por ser o período em que se iniciou a proliferação dos cortiços, relacionada ao
aumento do fluxo migratório de trabalhadores rurais e estrangeiros para a cidade e ao
crescimento do número de alforrias obtidas pelos escravos. Por outro lado, o ano de 1900
marca o período que antecede as reformas urbanas empreendidas pelo prefeito Pereira Passos.
Conforme visto anteriormente, o adensamento populacional ocorrido na cidade durante o
século XIX desencadeou uma busca generalizada por moradia na área central junto aos pólos
de atração de mão-de-obra, sobretudo o porto e as indústrias emergentes. Este crescimento
demográfico identificado tanto na cidade como nas freguesias centrais pode ser comprovado
através dos diversos censos realizados entre 1856 e 1906, como demonstra a tabela 1.
POPULAÇÃO DA ÁREA CENTRAL ENTRE 1856 E 1906
REGIÃO 1856 1872 1890 1906
CIDADE (Município) 188.158 274.972 522.651 811.443
10
FREGUESIAS /
CIRCUNSCRIÇÕES
Candelária 10.577 9.818 9.701 4.454
São José 15.088 20.010 42.017 44.878
Santa Rita 20.804 30.865 46.161 45.929
Sacramento - 26.909 30.663 24.612
Santana 19.173 38.446 67.533 79.315
Santo Antônio 12.222 20.629 37.660 42.009
Espírito Santo - 13.793 31.389 59.117
Tabela 1 – Crescimento da população no município e na área central entre 1856 e 1906. Elaboração do autor a
partir de SANTOS, 1913; VAZ, 1985; HAHNER, 1993; CARVALHO, 1995.
Analisando estes dados foi possível constatar que apenas na segunda metade do século XIX e
primeiros anos do século XX a população da cidade cresceu cerca de 400%. Grande parte deste
contingente se estabeleceu nas circunscrições centrais, onde a freguesia de Santana indicava a
maior concentração de habitantes desde 1872 e a freguesia da Candelária a menor população
desde 1856. Observou-se também que apenas as freguesias da Candelária e Sacramento
apresentaram redução no número total de moradores, sendo que as demais demonstraram um
aumento considerável de habitantes. Nesse sentido, as freguesias com maior crescimento
populacional foram Santana e Espírito Santo que quadruplicaram a quantidade de moradores
no período em questão.
10
De acordo com Santos (1913, p.168), do total de habitantes identificado na cidade em 1906 aproximadamente
25% (210.515) eram estrangeiros, sendo a maioria composta por portugueses (133.393).
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A inexistência de moradias em quantidade adequada para atender esta população que buscava
melhores oportunidades de vida e trabalho na capital do país motivou diversos proprietários de
imóveis na área central a adaptarem ou construírem edifícios para servir como habitação. A
construção de tais edifícios, classificados genericamente como cortiços, surge neste contexto
como fonte de renda para seus proprietários, que viam na crise habitacional uma alternativa
para a exploração de aluguéis. A maior concentração destas moradias coletivas ocorreu nas
freguesias mais antigas do centro e, sobretudo, em sua periferia imediata, como se observa no
mapa com a localização das habitações populares na região central.
Fig.I.4 Distribuição das habitações populares na segunda metade do século XIX. Elaboração do autor a partir de
VAZ, 1985; www.brazilbrazil.com, 2008.
A distribuição destas moradias também foi indicada pelos diversos censos realizados na cidade
entre 1868 e 1895, cujos dados foram categorizados na tabela 2.
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DISTRIBUIÇÃO DAS HABITAÇÕES POPULARES POR FREGUESIA
REGIÃO 1868 1875 1888 1895
FREGUESIAS /
CIRCUNSCRIÇÕES
Candelária - 7 - 1
São José 44 48 74 185
Santa Rita 50 59 66 164
Sacramento 31 48 74 53
Santana 154 231 329 111
Santo Antônio 69 86 115 163
Espírito Santo 65 108 158 22
Tabela 2 – Distribuição das habitações populares na área central entre 1868 e 1895. Elaboração do autor a partir
de SANTOS, 1913; VAZ, 1985; HAHNER, 1993; CARVALHO, 1995.
Com base no mapa e nos censos realizados verificou-se que a construção de habitações
coletivas para a população de baixa renda ocorreu com maior freqüência nas freguesias de São
José, Santa Rita, Sacramento, Santana e Santo Antônio. Assim como em termos populacionais, a
freguesia da Candelária foi aquela que apresentou menor quantidade de moradias populares,
provavelmente por se tratar do mais antigo e seleto bairro comercial do Rio de Janeiro
(HAHNER, 1993, p.39). Do total de freguesias centrais, apenas as de São José, Santa Rita e Santo
Antônio indicaram crescimento progressivo do número cortiços no período analisado, o que
pode ser justificado pela proximidade destas áreas do porto da cidade e, portanto, locais
bastante procurados para servir como moradia operária. Outras circunscrições, como é o caso
de Sacramento, Santana e Espírito Santo, demonstraram um aumento significativo na
quantidade de habitações até 1888 e uma redução drástica a partir de então, o que se explica
pela especialização funcional cada vez maior do centro em favor das atividades comerciais e
administrativas e pelo deslocamento dos moradores para outras regiões da cidade.
De um modo geral, as grandes concentrações de moradores
11
e habitações populares
identificadas nestas áreas durante a segunda metade do século XIX estavam relacionadas à
necessidade dos operários de residirem próximo aos locais de trabalho, geralmente o porto e
as indústrias, e às restrições de mobilidade desta população, uma vez que a implantação do
sistema de transportes ainda era incipiente e não atendia a todas as classes sociais. Apesar da
grande quantidade de cortiços construídos nas freguesias centrais, verificou-se que estes nunca
eram suficientes para acomodar a massa proletária que crescia exponencialmente, o que
11
No que diz respeito à população que ocupava os cortiços, Hahner (1993, p.40) informa que era constituída em
sua maioria por imigrantes europeus, sendo que em 1870 estas habitações abrigavam cerca de um quarto da
população estrangeira do Rio de Janeiro e menos de um décimo dos brasileiros.
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normalmente conduzia a um quadro de superlotação nestas habitações. Este adensamento
populacional característico das moradias coletivas foi confirmado através de levantamento
realizado por Santos (1913, p.365-368) acerca dos prédios construídos na zona urbana da
cidade no final do século XIX. As estatísticas indicaram que em 1890 havia 1.149 estalagens e
avenidas ocupadas por 18.388 pessoas e em 1900 existiam 456 avenidas com 4.589 casas e
1.064 estalagens abrigando 16.066 quartos
12
.
Fig.I.5 Superlotação nas habitações populares. VAZ, 2002, p.34.
A superlotação não era o único problema identificado nestas habitações. As dimensões
reduzidas dos cômodos destinados à locação e as condições inadequadas de iluminação e
ventilação conduziam a situações de extrema insalubridade, logo associadas às epidemias
13
registradas na cidade. A ocorrência de diversos surtos de febre amarela e outras moléstias a
partir de 1850 agravou ainda mais a situação destas habitações e da população pobre que
residia no Centro, suscitando “acalorados debates sobre a urgência de sanear a capital e a
conveniência de remover a grande massa proletária do centro para a periferia” (BENCHIMOL,
1984, p.111). A partir das discussões em torno da reforma urbana e sanitária da capital, que
incluíam as premissas de embelezamento e salubridade da área central, foi organizada a
Comissão de Melhoramentos da Cidade do Rio de Janeiro que tinha entre os seus integrantes o
engenheiro Francisco Pereira Passos. De acordo com relatório elaborado por esta Comissão em
1875, a prioridade estabelecida para os melhoramentos indicava que
12
Ainda segundo as pesquisas, em 1890 havia na área urbana da cidade cerca de 48.576 prédios, sendo 34.621
térreos, 5.076 assobradados e 8.879 sobrados, e em 1900 existiam 54.392 edifícios, compreendendo térreos e
sobrados.
13
As epidemias mataram, nos anos mais críticos (1873 e 1876), cerca de três a quatro mil habitantes numa
população estimada em 270.000 habitantes.
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em primeiro lugar devem ser realizadas obras de drenagem e aterro de pântanos,
realizações estas que devem ser acompanhadas pela construção de avenidas. Em
segundo lugar, o problema da rede de esgotos e finalmente o abastecimento de água
potável. Conclui também a comissão que, com relação à higiene, a principal causa de
insalubridade na cidade do Rio de Janeiro está na construção de habitações [...]
segundo esses engenheiros, as construções, além de seu alto padrão de insalubridade,
eram de um péssimo gosto arquitetônico, desprezando as leis mais simples de
harmonia e do bom gosto (ROCHA, 1995, p.48-49).
Analisando as intenções da Comissão foi possível observar que, desde o princípio, o discurso do
poder público em favor do saneamento da cidade tinha como principal justificativa a
insalubridade das habitações populares, sendo consolidado por outros argumentos secundários
como a estética das construções. Outro motivo importante, porém pouco explícito no processo
de combate e erradicação destas moradias iniciado na gestão do prefeito Barata Ribeiro, era a
remoção da classe pobre do Centro. Nesse sentido, Chalhoub (1996) examinou o processo de
erradicação dos cortiços à luz dos ideais de combate às classes perigosas adotados pelos
parlamentares da época. Este conceito, extraído das reflexões da escritora inglesa Mary
Carpenter e do escritor e policial francês M. A. Frégier no século XIX, foi apropriado e
deturpado por deputados brasileiros para justificar a necessidade de remoção da população
pobre que, por seus vícios, ociosidade e perigo de contágio, seriam perigosas à sociedade. A
este respeito, Chalhoub (1996, p.39) considerou que
sem dúvida semelhanças relevantes entre os conceitos de cortiço’ e de ‘classes
perigosas’: ambos supostamente descrevem ‘realidades’ a respeito dos bitos das
mesmas pessoas – as ‘classes pobres’ –, e se caracterizam muito mais pela fluidez, pela
ambigüidade, do que por qualquer esforço conseqüente de precisão de conceitos.
Identificou-se como ícone deste combate às classes perigosas e habitações insalubres no Rio de
Janeiro a demolição do cortiço conhecido como Cabeça de Porco em 1893 que exigiu uma
verdadeira operação de guerra para a remoção dos moradores e serviu como exemplo para
outros proprietários de cortiços na área central a respeito do rigor do poder público no
cumprimento da lei sanitária
14
.
Além de favorecer o combate à insalubridade das moradias e à remoção da população pobre
residente no Centro, a política de erradicação das habitações populares beneficiou o setor
privado. Com base nas campanhas empreendidas por médicos, engenheiros, empresários do
setor imobiliário e pela imprensa contra as péssimas condições físicas identificadas nestas
14
Na opinião de Chalhoub (1996, p.17), “a destruição do Cabeça de Porco marcou o início do fim de uma era, pois
dramatizou, como nenhum outro evento, o processo em andamento de erradicação dos cortiços cariocas”.
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moradias, o Estado passou a incentivar a substituição das habitações insalubres pelas
habitações higiênicas, concedendo isenção de impostos e terrenos às indústrias ou
construtoras que se propusessem a construí-las
15
. Na realidade, o que ocorria neste período era
a articulação dos interesses do Estado e do setor industrial no sentido de eliminar as moradias
coletivas do centro da cidade, remover a população pobre e controlar a força de trabalho.
Pode-se dizer que foi neste contexto de erradicação das moradias populares que o termo
cortiço adquiriu sua conotação negativa passando a representar, de acordo com os discursos
oficiais, as idéias de pobreza, insalubridade, promiscuidade e degradação social –, e que o
termo cabeça de porco foi escolhido como o símbolo das habitações coletivas cariocas do
século XIX (VAZ, 1992, p.31). No que se refere às restrições legais a este tipo de habitação,
verificou-se a atuação mais efetiva do Estado a partir da segunda metade do século XIX através
da regulamentação da obrigatoriedade da licença para construção em 1856 e da proibição
relativa à construção de estalagens no Centro e adjacências em 1873
16
. Nesse sentido também
foram criados o Decreto nº 391, de 10 de fevereiro de 1903, que tratava do Regulamento Geral
de Construções e Concertos de Prédios, e o Regulamento dos Serviços Sanitários a cargo da
União, de 08 de março de 1904, que estabeleceu regras sanitárias para estas moradias.
2ª fase: segregação – a reforma de Pereira Passos
Considerou-se como segundo momento de ocupação das habitações coletivas o período
compreendido pelas duas primeiras décadas do culo XX, quando então foram realizadas as
primeiras obras de renovação urbana na área central conduzidas pelo então prefeito do Distrito
Federal, o engenheiro Francisco Pereira Passos. Com base nesta reforma, executada entre 1902
e 1906, a antiga malha urbana derivada do período colonial sofreu profundas transformações
para se adequar à condição do Rio de Janeiro como capital da República e às atividades
políticas, administrativas e financeiras desenvolvidas na cidade. Uma das conseqüências destas
obras de modernização foi, sem dúvida, a demolição de inúmeros edifícios na área central para
a abertura e alargamento de ruas, uma das principais ações do plano de renovação. A este
respeito, Rocha (1995, p. 69) observa que ao final da administração de Passos, também
15
Tais incentivos estatais foram regulamentados através de dois Decretos Legislativos, um em 1882 e outro em
1888.
16
Id., 2002, p.32.
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conhecida como a era das demolições, “1681 habitações haviam sido derrubadas e quase vinte
mil pessoas foram obrigadas a procurar nova moradia no curto espaço de quatro anos”.
Estas transformações urbanísticas ocorridas na cidade acentuaram ainda mais a crise da
habitação observada desde o início do século XIX, contribuindo para a escassez de moradias,
aumento dos aluguéis, superlotação e agravamento das condições higiênicas. Neste momento,
o quadro de demolição das habitações populares associado à ausência histórica de moradias
destinadas à população de baixa renda desencadeou um intenso processo de segregação social
caracterizado pelo deslocamento de grande parte dos habitantes da área central para outros
bairros da periferia imediata e do subúrbio. Aqueles que se deslocavam para as freguesias
periféricas ao Centro normalmente se alojavam nos bairros da zona portuária e Cidade Nova,
ocupados tradicionalmente por estivadores, comerciários e operários das indústrias
17
. Nestes
bairros, os efeitos das migrações ocasionadas pelas obras puderam ser observados através do
aumento significativo da densidade demográfica e da quantidade de domicílios existentes, o
que certamente contribuiu para o agravamento das precárias condições de moradia
identificadas na região durante a segunda metade do século XIX.
Ao longo das primeiras décadas do século XX observou-se também que o processo de
segregação social, decorrente da reforma urbana, foi acompanhado por uma expressiva
renovação de usos da área central. Durante este período a coexistência de diversas atividades,
das mais especializadas às mais comuns, verificada no centro da cidade desde o início do século
XIX, não condizia mais com o novo status político-administrativo alcançado pelo Rio de Janeiro
após a transformação em capital do Brasil. Nesse sentido, crescia a necessidade de
especialização funcional do centro da cidade para atingir os objetivos do poder público e da
iniciativa privada, que certamente consideravam o uso residencial inadequado às intenções de
modernização da área central. O fato de este uso ter sido um dos mais afetados pela reforma
urbana indica que a permanência da população de baixa renda nestas áreas se tornou cada vez
mais indesejável e incompatível com os interesses especulativos do Estado, o que acentuou o
combate às habitações populares e a expulsão de seus moradores. No que diz respeito a este
assunto, Benchimol (1984, p.114) entende que
17
Ao analisar este processo de adensamento das freguesias periféricas ao centro, Backheuser (1905, p.89)
informou que são as ruas da Cidade Nova, da Gamboa, da Saúde, de Frei Caneca (que sempre foram a habitual
residência da gente pobre) as que hoje continuam a ser procuradas e por isso se enchem ainda mais os commodos
que os minguados vencimentos dos operários permittem pagar”.
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aqui reside o ‘nó górdioda renovação urbana: a expropriação e segregação de um
conjunto socialmente diferenciado de ocupantes do espaço central, modificado e
valorizado pela ação do Estado, e sua reapropriação por outros grupos sociais. O Plano
de melhoramentos [de Pereira Passos] atingiu áreas cuidadosamente selecionadas do
centro, desarticulando uma trama de relações econômicas e sociais, cuja permanência
ali se tornaria incompatível com a cidade requerida pelo grande capital e com a capital
requerida pelo Estado republicano.
Pode-se dizer que a reforma e a renovação de usos não atingiu apenas a parcela pobre da
população, mas também os proprietários de edifícios considerados como ruína pela Prefeitura.
Durante as intervenções, os prédios considerados ruinosos foram excluídos dos limites mínimos
estabelecidos para a indenização, o que permitiu ao prefeito enquadrar nesta categoria antigos
prédios coloniais ocupados por oficinas, estabelecimentos comerciais, cortiços e casas de
cômodos. Surgiram a partir de então diversos conflitos entre o Estado e a os proprietários de
imóveis no que diz respeito ao direito de propriedade, como bem observa Benchimol (1984,
p.114-115) ao afirmar que
as demolições levantaram uma densa nuvem de interesses privados feridos e de
descontentamento com o governo. Os que ficaram pura e simplesmente sem teto,
forçados a pagar aluguéis mais caros, em modos mais abarrotados e insalubres nos
quarteirões deteriorados remanescentes no centro e os proprietários, desde os
‘capitalistas’, que viviam das rendas proporcionadas por seus imóveis, aos pequenos
comerciantes e industriais dependentes da clientela operária que residia e trabalhava
no centro.
Era nítido o interesse do poder público em erradicar da área central não apenas o edifício
insalubre e a população pobre, mas também o proprietário de cortiços e explorador de aluguéis
que representava grande concorrência ao Estado no que diz respeito à especulação imobiliária.
A utilização dos antigos imóveis para locação desestimulava a construção de novos edifícios e
contrariava os interesses da indústria da construção civil, amplamente apoiada pela Prefeitura.
Nesse sentido, a eliminação destes prédios acarretaria a valorização dos terrenos na área
central e a possibilidade de aproveitamento de seu potencial construtivo para outros usos, o
que justificou as demolições em massa realizadas pelo Estado durante este período.
3ª fase: degradação – a ausência de investimentos e a especulação imobiliária
A terceira fase se refere ao período compreendido entre as décadas de 1920 e 1990, que foi
caracterizado pela ausência de políticas públicas e investimentos no sentido da reabilitação
urbano-arquitetônica, sobretudo no que diz respeito à periferia da área central de negócios.
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De um modo geral, observou-se ao longo de todo o século XX a continuidade dos processos de
renovação funcional e especulação imobiliária iniciados no século XIX e que certamente
influenciaram a degradação de edifícios e ambiências existentes nesta área da cidade, sendo
muitos deles de reconhecido valor histórico, artístico e cultural. Nesse contexto também
podem ser destacados outros motivos para a deterioração dos imóveis e degradação do
ambiente urbano, tais como o alto custo dos terrenos que estimularam a imobilização da terra,
o encortiçamento de antigos sobrados abandonados ou alugados pelas classes abastadas e
posteriormente ocupados pela população da classe baixa, a obsolescência funcional dos
edifícios de séculos anteriores, a verticalização dos edifícios e o desenvolvimento de sub-
centros que substituíram o crescimento espacial da área central para a periferia imediata, a
presença de elementos da paisagem natural como alguns morros que interferem na
continuidade da paisagem construída e isolam determinadas áreas, a exploração financeira dos
cortiços ainda existentes na região que são alugados a famílias de baixa renda e o desinteresse
dos proprietários de imóveis em realizar obras de reforma e manutenção.
Além da deterioração da ambiência física, também foi verificada nesta fase a continuidade do
processo de deslocamento da população residente, iniciado com a reforma urbana de Pereira
Passos, e a proibição do uso residencial na área central de negócios. De acordo com censos
realizados pelo IBGE nos anos de 1940, 1950 e 1960, a população existente no Município e o
número de habitantes do 1º Distrito, que abrangia as freguesias centrais, eram os seguintes:
POPULAÇÃO DA ÁREA CENTRAL ENTRE 1920 E 1960
REGIÃO 1920 1940 1950 1960
CIDADE (Município) 1.550.663 1.764.141 2.377.451 3.307.163
1º DISTRITO
Candelária - 1.812 1.069 435
São José - 9.256 6.684 4.696
Santa Rita - 15.987 9.567 9.388
Sacramento - 7.858 5.865 3.196
Santana - 20.290 14.911 10.835
Santo Antônio - 32.903 26.951 22.477
Espírito Santo - 42.440 37.227 31.515
São Domingos - 7.498 3.521 2.149
Ajuda - 7.441 11.103 5.332
Gamboa - 38.791 31.324 29.017
Tabela 3 – População no município e na área central entre 1920 e 1960. Elaboração do autor a partir dos Censos de
1920 e 1960 (folha 1) consultados no AGCRJ, 2008.
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ação do Centro do
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Analisando os dados da tabela observou-se que enquanto o Município indicava uma taxa de
crescimento demográfico entre 30% e 40% durante as décadas estudadas, as Circunscrições da
área central apresentavam grande decréscimo populacional. Entre 1940 e 1950 a Circunscrição
com maior redução foi a de São Domingos (53%) e entre 1950 e 1960 foi a da Candelária (59%),
provavelmente por se tratarem de áreas dedicadas quase que exclusivamente aos usos
comercial e de negócios. A Circunscrição de Santa Rita, que ocupava a área do atual bairro da
Saúde, apresentou um decréscimo muito grande entre 1940 e 1950 (40%) e muito pequeno
entre 1950 e 1960 (1,87%), registrando a menor queda neste período quando comparada às
outras áreas. Espírito Santo foi a Circunscrição com maior quantidade de habitantes em todas
as décadas analisadas, o que demonstra a ocupação mais expressiva da região da Cidade Nova
após o deslocamento dos moradores do núcleo mais antigo da cidade.
Quanto às restrições legais referentes ao desenvolvimento do uso habitacional em áreas
valorizadas do Centro, verificou-se que estas foram intensificadas ao longo do século XX. Em
1924, com a regulamentação do Decreto 2.021, identifica-se a “primeira iniciativa de
elaboração de um código de obras, que não tolera a instalação de indústrias e de vilas
habitacionais na zona central do Rio de Janeiro” (SOUZA, 1985, p.104). Em 1937, com a
promulgação do Decreto 6.000, é proibida a construção de vilas nas zonas central e portuária.
Em 1976 destaca-se a criação do Regulamento de Zoneamento ou Decreto 322 que estabeleceu
os usos e ocupações permitidos e proibidos nas zonas que definiu. De acordo com os artigos 14
e 22 deste Decreto, o uso residencial permanente passou a ser inadequado na região definida
como Área Central 2 (AC2) e tolerado na zona definida como Área Central 1 (AC1),
respectivamente
18
. Estas determinações do Regulamento quanto ao uso habitacional podem
ser justificadas pela tendência do mercado imobiliário em favorecer a implantação de
escritórios na área central de negócios, gerando reciclagem e valorização do uso do solo na
AC2, e pelas exigências de infra-estrutura e equipamentos de lazer para os empreendimentos
habitacionais que o Centro não comportava ou permitia, tais como garagens e playgrounds
19
.
18
A AC1 abrange basicamente a zona portuária da cidade e a AC2 corresponde à Área Central de Negócios.
19
Estas justificativas refletem a opinião do arquiteto Pedro Teixeira, da Coordenação Geral de Planejamento
Urbano da Secretaria Municipal de Urbanismo, emitida em visita realizada à Prefeitura no dia 04/11/2008. Este
arquiteto observou ainda que o uso residencial permanente sempre foi permitido na AC1.
H
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ação do Centro do
Rio de Janeiro
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22
4ª fase: reabilitação – o incentivo à moradia no Centro
Na quarta e última fase de ocupação habitacional da área central, iniciada a partir da década de
1990, observou-se uma importante mudança na postura do poder público com relação à
questão da moradia no Centro. Neste novo momento de atuação das políticas habitacionais, a
manutenção das moradias remanescentes do século XIX e o próprio uso habitacional passaram
a ser incentivados pelo Estado como instrumentos para a reabilitação de áreas centrais
degradadas e a preservação do patrimônio urbanístico-arquitetônico ainda existente nestas
regiões. A fim de analisar a situação atual da moradia na periferia imediata do Centro, foram
pesquisadas informações sobre os usos que ocorrem nesta região, as características do parque
edificado e da população residente e os incentivos legais relativos à revitalização destas áreas
através do uso residencial.
Com relação aos usos e atividades, a área central do Rio de Janeiro está subdividida em duas
regiões que apresentam diferentes graus de intensidade funcional e compreendem o cleo
principal ou centro e a zona periférica que envolve este cleo
20
. Pode-se dizer que o centro
21
corresponde à área de maior complexidade funcional da cidade, onde ocorre a predominância
das atividades relacionadas à administração pública, finanças, comércio e serviços. Por sua vez,
a zona periférica ao núcleo principal caracteriza-se por uma menor complexidade funcional,
com maior incidência das atividades comerciais, industriais e residenciais. Cabe observar que
em alguns trechos da área central a transição física e funcional entre o centro e sua periferia
imediata ocorre de forma abrupta, como é o caso do entorno do morro da Conceição
22
.
No que diz respeito às condições urbanístico-arquitetônicas da periferia imediata do centro,
ocupada em grande parte por residências destinadas à população de baixa renda, destaca-se
como principais características a presença de diversos sobrados remanescentes dos séculos
anteriores, a homogeneidade tipológica deste casario do período colonial e a degradação do
parque edificado e da ambiência urbana. Como foi visto anteriormente, esta periferia
20
De acordo com Silveira (1995, p.47), o primeiro reconhecimento institucional da distribuição diferenciada das
funções na cidade ocorreu em 1925, quando foi estabelecido o primeiro zoneamento de usos. Nessa ocasião o
Distrito Federal teve o seu espaço ordenado por meio de uma divisão em quatro zonas: Primeira, ou Central,
Segunda ou Urbana, Terceira ou Suburbana e Quarta ou Rural.
21
No Rio de Janeiro, o centro financeiro e administrativo da cidade também é denominado Área Central de
Negócios (ACN).
22
Segundo o IBGE (1967, p.40), a presença do morro da Conceição impediu a formação de uma faixa de transição
entre o centro e a periferia imediata, sendo brusco o limite entre o núcleo de atividades e a área em
obsolescência.
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correspondeu à principal área residencial urbana durante o século XIX e sofreu um intenso
processo de esvaziando populacional ao longo do século XX, transformando-se numa zona de
depósitos, oficinas, pensões, cortiços e prostíbulos. Na opinião de Silva (1965, p.374), trata-se
de uma zona densamente construída, “gerada numa época em que a cidade pouco se podia
expandir, devido à inexistência de transportes coletivos rápidos” e caracterizada por “prédios
estreitos e muito profundos, às vezes com três, ou mesmo quatro andares, onde a iluminação é
feita através de clarabóias e áreas internas, sempre de frente de rua e colados uns nos outros”.
A fim de aprofundar a análise da situação domiciliar, do perfil da população residente na área
central e das condições atuais de moradia, recorreu-se a alguns dados do censo do IBGE de
2000 e a pesquisas realizadas em 2002 sobre os bairros do Centro, Saúde, Gamboa e Santo
Cristo que correspondem à área de interesse desta dissertação
23
. De acordo com o censo, os
referidos bairros tinham a seguinte situação domiciliar:
DOMICÍLIOS NOS BAIRROS DO CENTRO E ZONA PORTUÁRIA EM 2000
DOMICÍLIOS CENTRO SAÚDE GAMBOA SANTO CRISTO
Quantidade
16.844
706
3.190
2.969
Espécie
Particular
Permanente
16.344 684 3.088 2.899
Particular
Improvisado
81 - 15 41
Coletivo
419
22
8
7
29
Particular
Permanente
por tipo
Casa
859
415
2075
1902
Apartamento
14.275
234
791
801
Cômodo
1.210
35
222
196
Tabela 4 – Quantidade e tipos de domicílios existentes nos bairros em 2000. Elaboração do autor a partir do Censo
de 2000 do IBGE dispovel em www.armazemdedados.rio.rj.gov.br, 2008.
Os dados indicam que o Centro é o bairro com maior quantidade de domicílios na área central,
onde predominam as unidades habitacionais particulares em apartamentos, em oposição aos
demais bairros, onde as casas constituem a maior parte dos domicílios. Proporcionalmente ao
número total de domicílios de cada bairro, o Centro e a Gamboa são as áreas que apresentam
maior porcentagens de cômodos (aproximadamente 7% do total). Em números absolutos, o
Centro é o bairro que comporta a maior quantidade de cômodos ainda existentes.
23
Não foram encontrados pela pesquisa dados mais atualizados sobre estes bairros, que fazem parte da I e II
Regiões Administrativas.
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No que se refere à população residente, o censo mostra que o Centro possui um número de
habitantes maior do que os outros três bairros somados. Em 2000, os moradores dos quatro
bairros, que perfaziam um total de 61.429 pessoas, correspondiam a apenas 1,05% da
população total do município.
POPULAÇÃO DOS BAIRROS EM 2000
REGIÃO
Nº DE HABITANTES
Cidade (Município)
5.857.904
Centro
39.1
35
Saúde
2.186
Gamboa
10.490
Santo Cristo
9.618
Tabela 5 – População residente nos bairros em 2000. Elaboração do autor a partir do Censo de 2000 do IBGE
disponível em www.armazemdedados.rio.rj.gov.br, 2008.
Quanto às condições de moradia desta população, verificou-se que poucas informações
existem a este respeito. O único parâmetro que pode ser analisado foi a densidade domiciliar.
Nesse sentido foi possível constatar que o bairro da Gamboa é o que apresenta maior
densidade, com aproximadamente 3 habitantes por unidade residencial. O Centro, que
apresenta maior população e maior número de domicílios, é o bairro com menor densidade.
DENSIDADE DOMICILIAR DOS BAIRROS EM 2000
CENTRO
SAÚDE
GAMBOA
SAN
TO CRISTO
População
39.135
2.186
10.490
9.618
Domicílios
16.844
706
3.190
2.969
Densidade
2,32
3,09
3,28
3,23
Tabela 6 – Densidade domiciliar nos bairros em 2000. Elaboração do autor a partir do Censo de 2000 do IBGE
disponível em www.armazemdedados.rio.rj.gov.br, 2008.
Com relação às pesquisas desenvolvidas nestas áreas para verificar a situação dos moradores,
merecem destaque os estudos elaborados por Silva (2002) e os levantamentos realizados pelo
Instituto Pereira Passos (IPP).
Silva conduziu importante pesquisa junto aos habitantes do centro e da periferia imediata e
coletou algumas informações sobre as justificativas para a permanência na área central e o
perfil dos moradores em potencial desta região. As respostas indicaram como estímulo à
moradia no Centro a proximidade do trabalho, os vínculos afetivos com parentes e com o
próprio bairro e o baixo custo da moradia. os dados levantados sobre os candidatos
interessados em residir na área central, inscritos nos Programas Habitacionais da Prefeitura,
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25
mostraram que a maior parte deles (34%) mora atualmente nos bairros próximos ao centro,
quase metade é formada por solteiros (44%) e a renda predominante encontra-se na faixa de 3
a 6 salários mínimos.
A pesquisa desenvolvida pelo Instituto Pereira Passos teve a intenção de avaliar a situação
socioeconômica da população residente na zona portuária do Rio. O estudo identificou nesta
área grande êxodo residencial, comercial e industrial que contribuiu para a desocupação e
abandono dos imóveis, o encortiçamento das edificações remanescentes e o agravamento das
condições de conservação. Verificou também que se trata de uma região onde mais de 1/3 dos
moradores reside a mais de vinte anos e que a renda salarial da maioria dos habitantes se situa
entre 1 e 3 salários mínimos sendo, portanto, considerados de baixa renda.
Gráfico 1 – Renda salarial dos moradores da área portuária. PREFEITURA, 2002.
Uma vez verificada a situação atual das moradias populares na área central, cabe analisar o
papel recente do Estado na reabilitação física e funcional desta região da cidade através do uso
habitacional. Nesse sentido, merecem destaque como formas de atuação da Prefeitura os
incentivos legais e os Programas desenvolvidos.
No que se refere aos incentivos legais, verifica-se a partir da década de 1990 uma atuação mais
efetiva da Prefeitura no que diz respeito à revitalização das áreas centrais periféricas
degradadas no Rio de Janeiro. Inicialmente, a ação do poder público esteve relacionada à
revisão e modificação da legislação que durante anos considerou como inadequado o uso
residencial nestas áreas, sobretudo na II Região Administrativa. Fez parte deste período a Lei nº
2.236, de 14 de outubro de 1994, que definiu as condições de uso e ocupação do solo da Área
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ação do Centro do
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de Especial Interesse Urbanístico da II Região Administrativa Centro
24
e estabeleceu medidas
para a revitalização do centro da cidade e seu entorno. Esta lei alterou as determinações do
Decreto 322/76 relativas à produção de habitações no Centro e definiu em seu artigo 4º que “o
uso residencial permanente e transitório é adequado em toda a Área de Especial Interesse
Urbanístico da II R. A.”. Também estabeleceu obrigações aos proprietários e locatários de
imóveis localizados nesta área com vistas à contribuir para a revitalização urbana. O artigo 18º
desta lei indica como medidas a serem tomadas:
I refazimento de passeios;
II restauração das marquises e fachadas que apresentem sintomas de deterioração que
causem risco à incolumidade pública;
III restauração das estruturas internas dos imóveis, quando passíveis de desabamento
ou de eventos que afetem a segurança coletiva;
IV renovação da fiação elétrica interna e externa ou sua substituição parcial, quando
exposta a risco;
V adoção de medida de prevenção contra incêndio, segundo as normas do Corpo de
Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro.
Complementando as determinações da Lei 2.236, foi criado recentemente o Decreto
23.226, de 30 de julho de 2003, que estimulou o uso residencial e misto nas Áreas Central e
Portuária da Cidade e sua periferia imediata. Sua redação definiu que:
Art. Os usos residencial e misto são adequados aos tipos de edificação previstos
para a I, II, III e VII Regiões Administrativas da Área de Planejamento 1.
Art. 2º As obrigações estabelecidas nos artigos 133 e 134 do RZ aprovados pelo
Decreto 322/76 terão seus padrões, custos e projetos adaptados às necessidades das
áreas mencionadas no Art. e às características dos empreendimentos de usos
residencial e misto nelas projetados.
Fazem parte também deste novo momento de reabilitação da área central e incentivo ao uso
habitacional, os diversos Planos e Programas elaborados pelos poderes públicos federal,
estadual e municipal que levam em conta este uso como indutor para recuperação desta região
da cidade. Destacam-se neste sentido os Programas Novas Alternativas, Morando no Centro e
ReHabCentro que também atuam na preservação do patrimônio existente nestas áreas. Estes e
os demais programas de intervenção urbano-arquitetônica serão devidamente analisados no
próximo capítulo.
24
A Área de Especial Interesse Urbanístico da II Região Administrativa Centro foi criada pelo Decreto nº 12.409,
de 9 de novembro de 1993.
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27
Após ter estudado o panorama da habitação popular na área central da cidade ao longo dos
séculos XIX e XX, serão analisadas a seguir as principais tipologias arquitetônicas produzidas
neste período que ainda fazem parte da paisagem urbana carioca do século XXI e são objeto de
intervenção das políticas atuais de reabilitação.
Tipologias arquitetônicas
As definições acerca das diferentes tipologias habitacionais populares cariocas do século XIX
sempre geraram dúvidas entre seus estudiosos. De um modo geral, as denominações variavam
de acordo com a conjuntura política, econômica e social em que eram criadas e com o grau de
precariedade das respectivas moradias, assumindo invariavelmente forte conteúdo ideológico.
Nesse sentido, dois termos precisam ser esclarecidos: o de habitação coletiva e o que foi
genericamente conceituado como cortiço.
De acordo com a Postura de 15 de setembro de 1892 as habitações coletivas seriam “todas as
que abrigarem sob a mesma cobertura, ou dentro da mesma propriedade, terreno etc.,
indivíduos de famílias diversas, constituindo unidades sociais independentes”. Durante o
período caracterizado pelo combate e erradicação das moradias populares na área central,
como foi visto anteriormente, tais habitações receberam diversas denominações que, num
dado momento, foram generalizadas como cortiço. A este respeito, Hahner (1993, p.40)
observa que durante as décadas de 1860 e 1870 apenas o termo cortiço era utilizado no Rio de
Janeiro, sendo que, na década de 1880, o termo estalagem passou a ser usado alternadamente
com o cortiço
25
. Pode-se dizer que o termo cortiço foi aquele utilizado pelas autoridades
sanitárias durante o século XIX para estigmatizar em definitivo as habitações coletivas
(CHALOUB, 1996, p.40), às quais eram associadas normalmente características que se desejava
combater. Sobre este conteúdo ideológico-negativo que caracterizava o termo cortiço, Vaz
(1985, p.75) esclarece que
a reconhecida decadência das condições de moradia de muitas destas edificações
margem à construção de um conteúdo ideológico cada vez mais depreciativo, de
desprezo e de condenação. O termo cortiço se generaliza, designando todas as
habitações coletivas, insalubres ou não, na forma de estalagem ou não. É somente
com o surgimento do termo avenida que a estalagem, forma arquitetônica inicial,
poderá se desvencilhar da sua conotação negativa.
25
Piccini (1999, p.22) informa que também foram vinculadas à palavra cortiço as denominações casa de modo,
cabeça-de-porco, estância, zungu, pensão, hotel, hospedaria, vila, quintal, estalagem e fileira de quartos ao longo
de um corredor.
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ação do Centro do
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28
A identificação de alguns elementos físico-funcionais do cortiço também serve como parâmetro
para conceituar o termo em seu sentido mais amplo. Segundo o que estabelece a Lei Moura
26
,
trata-se de uma moradia que pode apresentar todas ou algumas das características a seguir:
Ser constituída por uma ou mais edificações construídas em lote urbano;
Ser subdividida em cômodos alugados, subalugados ou cedidos;
Abrigar várias funções num mesmo cômodo;
Ter acesso e uso coletivo dos espaços não edificados e instalações sanitárias;
Apresentar circulação e infra-estrutura precárias e
Possuir superlotação e pessoas.
Segundo Piccini (1999, p.26), somam-se a estas características a ausência de manutenção,
infiltrações, entupimentos, curto-circuitos na rede elétrica e falta de iluminação e ventilação
naturais nos cômodos. Vaz (1985) também acrescenta que três elementos identificados
constantemente nestas habitações são as alcovas, os corredores e o pátio, que não apresentam
mais as mesmas características e funções desempenhadas nos antigos sobrados coloniais.
Observa-se que na transformação do sobrado em cortiço,
as alcovas deixam de ser recintos resguardados, os mais protegidos do interior da casa,
onde a castidade das donzelas poderia ficar a salvo de qualquer olhar intruso ou
indiscreto: passam a ser verdadeiras estufas, cubículos quentes, escuros e abafados.
Os corredores não são mais vistos como solução de privacidade; são agora estritos,
escuros e compridos demais. As áreas ou pátios, vazios que permitiam um mínimo de
iluminação e ventilação no interior do prédio, passam a ser vistas como úmidas e
infectas, sempre de proporções acanhadas e insuficientes (VAZ, 1985, p.33).
Apesar do termo cortiço representar de forma genérica todas as habitações coletivas
produzidas para famílias de baixa renda no século XIX, deve-se observar que cada uma destas
moradias apresentava determinadas características que as diferenciavam entre si. Com o
objetivo de identificar e distinguir as tipologias habitacionais mais importantes serão analisados
os elementos físicos e funcionais que lhes conferem identidade e sua evolução arquitetônica,
da mais rudimentar a mais higiência. Devido à grande variedade existente, serão verificadas
com mais atenção apenas as habitações urbanas, coletivas e permanentes, compreendendo as
casas de cômodos, cortiços, estalagens, avenidas e vilas operárias
27
. Antes de analisá-las,
26
Esta Lei, que redefine e normatiza os cortiços em São Paulo, foi regulamentada pela Prefeitura em 1991, através
da Lei Municipal nº 10.928.
27
Reis Filho (1994, p.25-33) informa que outras tipologias construídas no Brasil foram as casinhas, os mocambos,
os pavilhões para cortiços e as vilas comerciais. Entre as alternativas de alojamento estavam os quartos de alugar,
sótãos, porões, arcos, ruínas, jiraus, casebres e chalés (VAZ, 1985, p. 57-64).
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ação do Centro do
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29
porém, é importante distinguir os dois tipos de imóveis a partir dos quais se desenvolveram
estas moradias, classificados por Piccini (1999, p.23) como:
Imóveis transformados em habitações populares, construídos originalmente para uso
residencial unifamiliar, multifamiliar ou misto, com 1 ou 2 pavimentos e eventualmente com
porão e quintal. Apresentam ainda divisão dos cômodos originais em cubículos entre 4m² e
10m² e serviços sanitários coletivos externos, com média de 50 pessoas para cada 1 ou 2
banheiros e tanques e
Imóveis concebidos originalmente como habitações populares e construídos
especificamente para fins de locação. Constituem-se em lotes com edificações diferenciadas
do tipo vila de cômodos, horizontais ou assobradados, que apresentam ainda fileiras de
quartos nos fundos do terreno destinados ao uso misto, comercial ou residencial.
Inicialmente serão verificadas as características dos imóveis transformados em habitação
popular no Rio de Janeiro, normalmente sobrados coloniais que deram origem às casas de
cômodos, e posteriormente serão estudadas as tipologias concebidas exclusivamente para a
locação, incluindo as estalagens, cortiços, avenidas e vilas operárias.
Sobrados
Sobrados velhos, outrora de fidalgos, degradaram-se em cortiços [...] depois de 1888
[...] o cortiço fêz aumentar, o tanto de área, como de densidade. Assenhoreou-se
de muito sobrado velho. De muito morro. O destino dos sobrados maiores tem sido
este: transformarem-se, os mais felizes em armazéns, hotéis, colégios, pensões,
quartéis, repartições públicas, sedes de sociedades carnavalescas. Os outros em
cortiços, “cabeças de porco” e casas de prostitutas (FREYRE, 1961, p.182-183).
Com base nestas considerações observa-se que o sobrado corresponderia ao estágio inicial das
moradias populares definidas como cortiço, no sentido genérico deste termo. A partir desta
constatação, verificou-se a necessidade de estudar com mais atenção as características
arquitetônicas que configuram o sobrado a fim de melhor compreender as relações e os
aspectos físico-espaciais que caracterizam as habitações coletivas. Nesse sentido, serão
abordadas em princípio as origens, as influências sofridas e a conceituação do sobrado. No
momento seguinte serão estudados os elementos físicos que compreendem a relação entre
arquitetura e lote urbano, os materiais, as tecnologias construtivas e o gabarito destas
edificações. Por fim serão analisados os interiores e os aspectos funcionais.
A este respeito, Gilberto Freyre elaborou importante estudo de caracterização, comparação e
evolução das formas de habitação produzidas ao longo do período colonial, inicialmente com a
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30
casa grande e a senzala e posteriormente com o sobrado e o mucambo. De acordo com este
autor, na transição da residência rural para a urbana
28
verificou-se uma importante redução do
volume e da complexidade funcional antes observada na casa grande, o que certamente
influenciou as relações espaciais identificadas nos sobrados. Sendo assim, o sobrado
corresponderia à residência urbana de famílias abastadas nobres, comerciantes ou
latifundiários –, de espaços reduzidos em relação à casa grande e construída com bastante
freqüência nos séculos XVIII e XIX. Supõe-se que no Brasil o termo sobrado significava
originalmente “o espaço sobrado ou ganho devido a um soalho suspenso” que podia ser
caracterizado como sótão ou porão nos terrenos inclinados, sendo que, no século XVIII, podia
significar também “não o espaço, mas o próprio assoalho” (LEMOS, 1996, p.32-33).
Devido à colonização portuguesa, os sobrados construídos no Brasil sofreram fortes influencias
do estilo pombalino, próprio da Lisboa do século XVIII
29
. Como exemplo desta arquitetura
lusitana destaca-se as habitações produzidas no Bairro Alto onde, a partir do século XVI, foram
determinadas novas regras urbano-arquitetônicas estabelecidas pelo Senado e o rei para
combater alguns dos problemas resultantes da cidade medieval, tais como a insalubridade e
precariedade das construções. Segundo Carita (1994, p.106), uma das conseqüências destas
regulamentações foi a utilização progressiva da pedra e da alvenaria de tijolo nas construções
em detrimento das estruturas de madeira. Neste período observa-se que, apesar da evolução
identificada nas técnicas e materiais construtivos, os novos edifícios ainda obedeciam à
estrutura fundiária original, baseada na divisão medieval dos lotes. Durante os séculos XVII e
XVIII as edificações construídas no Bairro Alto e em toda Lisboa seguiam duas tipologias que
provavelmente influenciaram as habitações urbanas produzidas no Brasil, sendo classificadas
em (CARITA, 1994, p.107-108):
1- Edifício baixo de rés-do-chão e primeiro andar com vãos assimétricos e uma planta
com tendência para uma base quadrada. A pouca fenestração, com janelas de
peitoril ao nível do 1º andar, dá a este edifício um carácter maciço, e de afinidades
com as construções rurais dos arredores de Lisboa;
28
Cabe observar que esta transformação não ocorreu de forma abrupta, uma vez que durante a transição da casa
grande para o sobrado foi desenvolvida outra tipologia habitacional, a chácara, construída geralmente na periferia
dos centros urbanos (FREYRE, 1961).
29
A este respeito Lemos (1996, p.13) afirma que “a casa portuguesa, de uma maneira geral, mais se manifestou no
Brasil através de sua aparência decorrente das técnicas, dos materiais de construção e da tentativa de repetir
modismos estilísticos”, sendo que aqui as condições sócio-econômicas e o clima determinaram plantas,
agenciamentos e partidos arquitetônicos peculiares”.
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31
2- Fisionomia urbana de fachada, de 3 a 4 pisos, mais fenestrada, com janelas de
sacada ao nível dos diferentes andares e mantendo o alinhamento de vãos. Em
oposição à tendência para a planta quadrada, este lote desenha-se estreito e
comprido aproximando-se duma tradição de tipologia medieval.
Ainda de acordo com este autor, outras características da primeira tipologia seriam a formação
de um andar abaixo do telhado com pequenas janelas de peitoril, a ausência da sacada e o uso
de cantaria nas molduras dos vãos. Quanto à segunda tipologia, esta ainda conservava as
formas construtivas medievais e as dimensões dos lotes mediam, aproximadamente, 6,5m de
frente x 12 a 14m de profundidade. A estrutura destes edifícios era formada por um grupo de
barrotes ligados à empena lateral, que por sua vez se interligavam aos edifícios adjacentes e
passavam a ter comportamento de conjunto.
Figs.I.6 e I.7 Tipologia rés-do-chão e edifícios de 3 a 4 pavimentos em Lisboa, respectivamente. LISBOA, 1993.
Comparando-se as arquiteturas produzidas em Lisboa e no Rio de Janeiro durante os séculos
XVII, XVIII e XIX, percebem-se diversas semelhanças com relação à forma do lote estreito e
comprido – onde as edificações ocupavam todo o terreno e a estrutura se apoiava nas empenas
laterais –, à tecnologia construtiva e aos materiais utilizados. Sobre a influência do lote na
tipologia edilícia, Reis Filho (1970) observa que a habitação urbana brasileira do período
colonial estava vinculada ao conceito de interdependência entre arquitetura e lote urbano. A
este respeito, o autor considera que
[...] fundada no regime escravista, quer para a construção, quer para o uso, a
habitação urbana tradicional correspondeu a um tipo de lote padronizado e este a um
tipo de arquitetura bastante padronizada, tanto nas suas plantas, quanto nas suas
técnicas construtivas. Este esquema não é tipicamente brasileiro. Suas origens situam-
se no urbanismo medieval-renascentista de Portugal (REIS FILHO, 1970, p.32).
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Fig.I.8 Tipologia do sobrado em lote estreito e comprido. REIS FILHO, 1970, p.29.
Com relação às cnicas construtivas empregadas nos sobrados coloniais, pode-se dizer que
estas eram bastante primitivas, variando em função da importância da residência e poder
aquisitivo do proprietário. Nesse sentido, Freyre (1961, p.26) esclarece que nos casos mais
simples as paredes eram de pau-a-pique, adobe ou taipa de pilão e nas residências mais
importantes empregava-se a pedra e barro, mais raramente tijolos ou ainda pedra e cal. O
autor também informa que o sistema de cobertura era composto por telhado de duas águas e
que a construção sobre os limites laterais, na expectativa de construções vizinhas de mesma
altura, procurava garantir uma relativa estabilidade e a proteção das empenas contra a chuva.
Em função desta tecnologia construtiva rudimentar, a altura dos sobrados era muito limitada.
Até as primeiras décadas do século XX predominavam os edifícios com um pavimento no Rio de
Janeiro, sendo que na área central também se identificavam os de dois e três andares (SILVA,
1965, p.185). Este fato foi comprovado através dos dados fornecidos pelo Anuário de Estatística
de 1895 e censos realizados em 1920 e 1933
30
, que indicaram os gabaritos dos edifícios
construídos na cidade entre 1852 e 1933.
GABARITOS DAS EDIFICAÇÕES ENTRE 1852 E 1933
Pavimentos
1852
1872
1890
1920
1933
1
11.175
14.840
34.621
111.7
32
187.762
2
5.440 8.849 13.955
14.919
31.207
3
2.756
4.464
4
-
-
-
192
582
5 a 6
-
-
-
33
249
7 a 9
-
-
-
-
85
10 ou mais
-
-
-
-
37
Tabela 7 – Alturas das edificações construídas entre 1852 a 1933. Elaboração do autor a partir do Anuário de
Estatística de 1895 e dos Censos de 1920 e 1933 consultados no AGCRJ, 2008.
30
As fontes pesquisadas de 1852 a 1890 informaram três categorias de edifícios: térreos, assobradados e
sobrados. Como não ficou claro o número de pavimentos da tipologia sobrado, considerou-se nesta categoria
todos os edifícios de dois e três andares.
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A partir destes dados foi possível observar que os prédios de um pavimento sempre
apareceram em maior quantidade, em alguns momentos correspondendo a mais de 80% do
total edificado como ocorreu em 1933, e que apenas no período de 1920 a 1933 surgem os
primeiros edifícios com mais de sete pavimentos, o que demonstra uma evolução das técnicas
construtivas que permitiram a construção de edifícios mais altos.
Fig.I.9 Gabaritos dos sobrados no morro da Conceição construídos no século XIX. PINHO e SIGAUD, 2000, p.14.
No que se refere aos materiais que compunham os edifícios, estes variavam basicamente em
função dos recursos de seus proprietários e da disponibilidade de matéria prima nas regiões em
que eram construídos. Com relação às alvenarias, Freyre (1961, p.185) informou que “no Rio de
Janeiro utilizou-se largamente o granito das colinas próximas da cidade, fazendo-se argamassa
de cal de mariscos com areia do mar e barro”. Além da pedra, o tijolo de barro foi muito
utilizado na construção das alvenarias, geralmente executadas com grande espessura na
intenção de refrescar o interior dos sobrados. Também se fazia muito uso da madeira de lei,
sendo que, nas casas mais nobres, estas variavam entre o pau-ferro, pau-d’arco, pau amarelo,
cedro indígena e vinhático
31
. Cabe observar ainda que muitas vezes os materiais empregados
na construção destes edifícios eram de baixa qualidade, sobretudo quando produzidos para a
população com menores recursos. Ao analisar esta questão Freyre (1961, p.210) informou que
o que é certo é ter sofrido grande parte da população urbana dos maus efeitos de
tanta casa construída ao sabor dos interesses da economia privada; material, o pior
possível; tijolo, mal fabricado; argamassa de areia de água salgada; cal ‘contendo
matérias deliqüescentes em maior ou menor quantidade’; operários de terceira ordem
ou simples escravos [...] e o plano – o risco dos proprietários.
A respeito dos aspectos funcionais do sobrado, Silva (1965, p.244) e Reis Filho (1970, p.22)
consideraram que o funcionamento da casa durante o período colonial dependia única e
exclusivamente do trabalho escravo, o que influenciava não a realização dos afazeres
domésticos como também a própria qualidade técnico construtiva dos edifícios
32
.
31
Além da utilização habitual da madeira como elemento estrutural, estas foram bastante empregadas na
construção de esquadrias. Freyre (1961, p.192) observa que no Rio de Janeiro predominou até os fins da era
colonial a janela de grade de madeira.
32
Neste período a mão-de-obra escrava também era utilizada para a construção dos sobrados.
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Quanto às relações espaciais no interior destes edifícios, observa-se uma certa uniformidade na
setorização dos cômodos, inclusive nas residências das famílias mais abastadas. Normalmente,
a distribuição dos ambientes no sobrado era caracterizada pela presença de salas e lojas na
parte frontal do edifício, configurando o setor social, alcovas na parte intermediária, destinadas
ao repouso, cozinhas e quintais na parte dos fundos, formando o setor de serviço, e corredores
de interligação entre estes três setores (REIS FILHO, 1970, p.24). Como este programa
arquitetônico se desenvolvia em lote estreito e profundo, as condições de ventilação e
iluminação naturais no interior dos cômodos eram bastante precárias, sobretudo nas alcovas.
Fig.I.10 Setorização dos ambientes no sobrado. REIS FILHO, 1970, p.29.
Casas de cômodos
Representando uma das primeiras tipologias habitacionais populares urbanas produzidas no
Rio de Janeiro, a casa de cômodos surgiu a partir das diversas adaptações realizadas nas
estruturas remanescentes dos antigos sobrados coloniais para servir de abrigo à população de
baixa renda no século XIX
33
. Para verificar as definições relativas às casas de cômodos
34
recorreu-se a algumas fontes que foram unânimes no que diz respeito às características desta
tipologia. A definição oficial mais antiga sobre estas moradias foi encontrada no Regulamento
dos Serviços Sanitários de 1904 (apud BACKHEUSER, 1906) que as classificava como
33
Segundo Nava (apud VAZ, 1985, p.76), o processo de transformação destes sobrados em moradia popular
compreendia três etapas, sendo a primeira correspondente à residência de algum nobre ou político da República,
a segunda caracterizada pela pensão familiar e a terceira como casa de cômodos e cortiços.
34
Reis Filho (1994, p.29) as define também como cortiços em casarões.
LEGENDA:
1 – Loja
2 Corredor de acesso à residência,
independente da loja
3 – Salão
4 – Alcova
5 – Sala de viver ou varanda
6 – Cozinha e serviços
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habitações collectivas installadas em prédios grandes ou mesmo pequenos, com
divisões de madeira, cujos aposentos são alugados com ou sem mobília, por tempo
indeterminado, a indivíduos solteiros, de qualquer sexo, e a pequenas famílias de
diversas classes sociais, quase sempre em más condições de hygiene e asseio, onde
não se encontra o dono ou seu principal responsável, ficando assim completamente
abandonadas. Teem apparelhos sanitários em numero insufficiente e quase sempre
sem banheiro.
Backheuser (1905, p.89-90) conceitua as casas de cômodos como velhos casarões de muitos
andares, divididos e subdivididos por um sem número de tapumes de madeira, nos vãos de
telhados entre a cobertura carcomida e o forro carunchoso”, sendo considerada “a mais anti-
hygienica, a mais detestável das habitações collectivas”. Hahner (1993, p.176) as define como
“velhas mansões de vários andares [...] transformadas em habitações superpovoadas de
quartos e cubículos alugados”. Complementando estas considerações, Vaz (1985, p.75) observa
que um dos aspectos que diferenciava a casa de cômodos de outras tipologias habitacionais,
construídas para fins de locação, era a criação de quartos no interior de um edifício
preexistente ao invés da construção de quartos no quintal ou terrenos vazios.
Estalagens e cortiços
As definições de estalagens e cortiços geralmente se confundem, porém ambas as tipologias
apresentam condições de moradia um pouco melhores do que aquelas encontradas nas casas
de cômodos. Normalmente, as estalagens eram caracterizadas por grupos de unidades
habitacionais de porta e janela divididas internamente em sala, alcova e, eventualmente,
cozinha –, construídas em torno de um pátio ou junto a uma circulação, contendo ou não
instalações sanitárias e lavanderias coletivas
35
.
Fig.I.11 Estalagem na rua do Senado. CARVALHO, 1995, p.135. Fig.I.12 Planta típica da estalagem. BACKHEUSER, 1906, p.92.
35
Reis Filho (1994, p.29) também considera como estalagens os casarões encortiçados que funcionavam como
hotéis ou pensões precárias e que, nesse caso, assumiam um caráter de uso provisório e não permanente.
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Com relação ao cortiço
36
, Backheuser (1905, p.92) o classifica como uma estalagem antiga, de
aspecto primitivo, grotesco e mal acabado, em piores condições higiênicas, onde “as alcovas
são mais quentes, mais baixas e mais escuras” e a “separação das famílias é muito menos
accentuada”. Hahner (1993, p.176) por sua vez o define como “finas estruturas de madeira
consolidadas pelo tempo através de reformas clandestinas”, geralmente construídas ao redor
de um pátio interno de dimensões reduzidas, onde o pavimento superior era circundado por
varandas e alcançado com dificuldade por escadas íngremes e estreitas. Também merece
destaque a definição oficial estabelecida pelo Regulamento dos Serviços Sanitários de 1904
(apud BACKHEUSER, 1906, p.105-106) que conceituou o cortiço como
uma habitação collectiva, geralmente constituída por pequenos quartos de madeira ou
construção ligeira, algumas vezes installados nos fundos de prédios e outras vezes uns
sobre os outros; com varandas e escadas de difficil accesso; sem cozinha, existindo ou
não pequeno pateo, área ou corredor, com apparelho sanitário e lavanderia commum.
Fig.I.13 Cortiço na rua Senador Pompeu. CARVALHO, 1995, p.134. Fig.I.14 Planta típica do cortiço. VAZ, 2002, p.103.
Baseado nas definições pesquisadas foi possível identificar as principais características que
diferenciam os cortiços das estalagens
37
. Parece que nos cortiços os materiais construtivos
utilizados eram muito precários, o uso de elementos de madeira era freqüente, as unidades
36
Entre os tipos de cortiços existentes, merece destaque aquele definido por Reis Filho (1994, p.29) como cortiço
em meia-água por suas semelhanças com o cortiço da rua Senador Pompeu 34, que é o estudo de caso desta
dissertação. Tratava-se de uma edificação precária desenvolvida nos fundos dos terrenos de casas comerciais ou
residenciais encortiçadas e construída nas encostadas dos muros, sendo coberta por um único pano de telhado
denominado meia-água. Ainda segundo o autor, sob estes telhados havia dezenas de cubículos que se abriam para
um pátio central e em alguns pontos se localizavam banheiros e tanques para uso coletivo.
37
Ao diferenciar estas duas tipologias, Hahner (1993, p.40) informa que o nome estalagens era dado a uma série
de casas pequenas, construídas em conjunto e formando um quadrado. Nos cortiços, as acomodações individuais
eram quase sempre limitadas a um quarto, alcançado por uma escada comum e uma varanda”.
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habitacionais eram constituídas por um único cômodo, o edifício geralmente possuía dois
pavimentos, o andar superior era avarandado e acessado com dificuldade por escadas íngrimes
e havia sempre a presença de um armazém ou restaurante contíguo
38
.
Além destas características verificou-se que em muitas ocasiões a construção do cortiço se
estendia por longos períodos, sofrendo acréscimos constantes. Inicialmente era executado o
primeiro pavimento e, com o passar do tempo e aumento do lucro, o segundo. Sendo assim,
eram freqüentes as reformas e reconstruções realizadas nestas edificações, seja para aumentar
o número de quartos, seja para adequá-las às legislações sanitárias do século XIX
39
. Apesar da
freqüência com que eram realizadas as obras, normalmente utilizava-se materiais construtivos
de baixa qualidade que se deterioravam rapidamente e agravavam ainda mais as condições de
insalubridade
40
. Estas obras e ampliações em cortiços e estalagens e a transformação de
edifícios existentes em casas de cômodos foram proibidas pelos artigos 28 e 29 do Decreto
391 de 10/02/1903 (apud BACKHEUSER, 1906, p.104), que tinham a seguinte redação:
Art.28 a divisão de casas de vastas dimensões por cubículos de madeira, de modo a
se estabelecerem sob o mesmo tecto famílias diversas, é terminantemente prohibida,
por contrária a hygiene das habitações.
Art.29 nos cortiços existentes não se permittirá obra alguma, concerto ou reparação
que possam garantir sua segurança, só se tolerando pintura ou caiação e não se
permitindo novas edificações semelhantes em ponto algum.
Este Decreto informou ainda que nas novas habitações coletivas, excetuando-se os casos
anteriores, o pátio deveria ter, em qualquer lado, dimensão igual ou superior à maior altura das
fachadas e a edificação apresentar, pelo menos, uma latrina, um banheiro e um mictório para
cada grupo de vinte pessoas. Outras exigências também foram estabelecidas pelo Regulamento
dos Serviços Sanitários de 1904
41
que passou a tolerar a lavagem de roupas em tanques, desde
38
Também foi observado que no cortiço o lucro dos proprietários não se baseava apenas na exploração dos
aluguéis, mas também na venda de alimentos para seus inquilinos. De acordo com Edmundo (2003, p.222),
“cortiço e venda andam, geralmente, conjugados. O homem que mora, come. Nada mais natural, portanto, que
ver ao pé do leito de dormir, o prato de comer”.
39
A partir de dados fornecidos por Santos (1913, p.365-368) verificou-se que em 1910 o número de prédios
consertados excedeu o número de prédios construídos, o que pode refletir a iniciativa dos proprietários de
cortiços em adequar os edifícios à legislação sanitária de 1904. Foram registrados neste ano 2.318 prédios
construídos, 798 reconstruídos, 1.132 modificados e 3.752 consertados.
40
Edmundo (2003, p.223) observa que para a construção destes edifícios os empreiteiros lançavam mão de muitos
materiais antigos, compreendendo “caibros velhos, decrépitos portais, portas em desaprumo, gradis tortos, telhas
enegrecidas pela umidade e pelo tempo”.
41
O artigo 123 deste Regulamento, que tratava sobre as condições de higiene nas habitações coletivas,
determinou que “toda a casa que apresentar graves e insanáveis defeitos de hygiene, considerada, portanto,
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que abrigados e construídos sobre calçada cimentada, e proibiu o cozimento no interior dos
aposentos e nos corredores.
Avenidas
Com a proibição das casas de cômodos, estalagens e cortiços em 1903, surgia um novo tipo de
habitação coletiva permitida pela Prefeitura, mais higiênica, espaçosa e privativa: a avenida. De
acordo com Vaz (2002, p.44-45), as avenidas começaram a ser construídas por volta de 1890 e
sua tipologia “permitiu observar pelo menos duas transformações sofridas pela moradia: a
incorporação de melhoramentos de ordem sanitária e a ampliação do domínio individual /
privado sobre o coletivo / público”. Cabe observar que esta mudança nos espaços e
funcionamento da moradia, visível na transição dos cortiços para as habitações em avenidas,
decorreu não das condições impostas pela política sanitarista, mas também das próprias
transformações econômicas e sociais proporcionadas pela Abolição da Escravatura em nível
nacional e Revolução Industrial em nível mundial.
Com a supressão do trabalho escravo no interior das residências houve uma sensível redução
nas dimensões da casa e seus ambientes, sobretudo nas cozinhas e áreas de serviço. A este
respeito Bittar e Veríssimo (1999, p.122-123) consideram que no final do século XIX surgem as
“residências urbanas de lotes menores, quintais mais reduzidos e introduzindo uma área
marcada para serviços, com tanque agregado a um banheiro, fora do corpo da casa”. A
industrialização por sua vez ocasionou, nas residências urbanas, o processo de separação entre
o espaço de trabalho e o espaço de moradia, típico dos antigos sobrados coloniais. Nesse
sentido, Vaz (1985, p.38) confirma que “a medida que o modo de produção capitalista se torna
dominante [...] a casa não abrigará mais trabalho e habitação, mas apenas habitação, enquanto
que o trabalho se realizará na fábrica, na loja, no escritório”.
Quanto às definições e características tipológicas, Backheuser (1905, p.92) considerava a
avenida como uma estalagem aperfeiçoada composta por ruas centrais ladeadas por casinhas
individualizadas, que eram caracterizadas por instalações sanitárias independentes e ambientes
mais bem arejados e iluminados. Reis Filho (1994, p.33) também a definiu como cortiços em
vielas, as quais “apresentavam no exterior uma fachada de residência comum e no interior
inhabitavel, será desoccupada, fechada definitivamente por ordem do inspector sanitário, a juízo do delegado de
saúde, sendo marcado prazo para o inicio da demolição, findo o qual a Directoria Geral de Saúde Publica fará por si
esta demolição, cobrando do proprietário as despezas” (BACKHEUSER, 1906, p.105).
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eram conjuntos de pequenas habitações, que abriam para uma rua particular ou viela, tendo ao
fundo um espaço maior, de uso coletivo”. Oficialmente, as características das habitações
construídas em avenidas e vilas foram definidas pelo artigo 27 do Decreto 391 de 1903
(apud BACKHEUSER, 1906, p.103-104) ao estabelecer que:
Cada casa deveria constituir moradia separada e independente e ter cozinha, água esgoto e
quintal privativos, com área não inferior a quinze metros quadrados;
As casas seriam assobradadas ou de um só pavimento;
As ruas teriam seis metros de largura mínima, calçamento e iluminação;
Haveria fechamento no alinhamento dos logradouros públicos com muro e gradil de ferro.
Percebe-se através das definições e das indicações do Decreto que na avenida uma
individualização maior da unidade habitacional, diferente das casas de cômodos e cortiços e
parecida com a estalagem. Entretanto, na avenida, diferentemente da estalagem, as unidades
são equipadas com aparelhos sanitários e cozinhas, a setorização dos ambientes é melhor
definida e o quintal é privativo. Além disso, as circulações comuns são mais generosas e bem
definidas, não se restringindo a apenas um pátio ou corredor. Por fim, verifica-se nesta
tipologia um aumento da privacidade, da higiene e da segurança, com a melhoria da iluminação
nas áreas externas, o fechamento do acesso com gradis e a elevação do piso da habitação em
relação ao plano do passeio público.
Fig.I.15 Casas em avenidas. VAZ, 2002, p.60. Fig.I.16 Planta típica da unidade. BACKHEUSER, 1906, p.92.
Vilas operárias
As primeiras legislações referentes à construção de casas higiênicas para operários
42
surgiram
na transição do culo XIX para o século XX e compreenderam os Decretos nº 244, de 20 de
42
Na opinião de Lemos (1996, p.59-60) a expressão casa operária designava simplesmente a casa pequena ou o
que chamamos atualmente de casa popular, que naquele período era construída para locação.
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abril de 1896, e 842, de 09 de dezembro de 1901, que estabeleceram a obrigatoriedade da
construção de latrina ou banheiro, cozinha e tanque no interior de cada unidade habitacional
(VAZ, 2002, p.44).
Com base nestes Decretos verificou-se que as características das unidades habitacionais nas
vilas operárias se assemelhavam bastante àquelas identificadas nas avenidas. Ambas as
tipologias eram caracterizadas por moradias independentes com dimensões mínimas de 3,00m
de largura e 6,00m de profundidade, três cômodos no mínimo (sala, quarto e cozinha) e
instalações sanitárias individualizadas (PICCINI, 1999, p.26). A principal diferença entre estas
habitações era o fato das vilas operárias, também denominadas por Reis Filho (1994, p.31)
como vilas industriais, serem construídas sempre junto às fábricas, apresentarem unidades
alugadas aos operários e abrigarem armazéns de roupas e alimentos para consumo dos
funcionários. Como exemplo desta tipologia construída na área central do Rio de Janeiro
destaca-se a vila Ruy Barbosa que era considerada a mais importante da cidade até 1905
43
.
Fig.I.17 Vila Ruy Barbosa na rua dos Inválidos. VAZ, 2002, p.43.
Como foi visto até aqui, diversas tipologias habitacionais foram construídas para a população
de baixa renda na área central ao longo do século XIX e início do século XX, compreendendo
desde as mais rudimentares, as casas de cômodos, até as mais higiênicas e privativas, as vilas.
Durante este período foi possível identificar, além das características que as diferenciavam, a
43
A descrição de Backheuser (1906, p.90-92) a respeito desta vila construída em 1890 indicava que era composta
por uma larga rua central arborizada, calçada, iluminada e interceptada perpendicularmente por uma série de
travessas que abrigava grupos de habitações, em geral de dois pavimentos, destinados à acomodação de famílias
no andar térreo e solteiros no andar superior. Ainda de acordo com o autor, esta vila apresentava como inovações
para a época uma lavanderia a vapor e um forno de incineração de lixo.
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41
atuação de alguns agentes de produção que em determinados momentos apresentaram
objetivos diversos, como será analisado a seguir.
A produção de moradias para famílias de baixa renda
Analisando o processo de produção das habitações populares verificou-se que a década de
1930 foi considerada um divisor de águas no que diz respeito à responsabilidade pela provisão
destas moradias e aos interesses dos agentes envolvidos. De um modo geral, observa-se até a
referida década a atuação maciça da iniciativa privada na construção de moradias para famílias
de baixa renda e operários no centro da cidade, inicialmente realizadas por proprietários e
arrendatários de imóveis e posteriormente por empresários dos setores industrial e
imobiliário
44
. A partir deste momento e, sobretudo, após a criação da Lei do Inquilinato
45
,
ocorreram importantes transformações nesta forma de provisão habitacional vigente que,
segundo Bonduki (1998, p.209), foram caracterizadas pela redução dos investimentos privados,
pelo aumento progressivo da intervenção do Estado iniciada com a criação da Fundação Casa
Popular
46
em 1946 e desenvolvida em larga escala após a criação do Banco Nacional de
Habitação
47
em 1964 –, e pela maior atuação dos próprios trabalhadores através do auto-
empreendimento.
Quanto aos objetivos destes agentes públicos e privados pode-se dizer que, historicamente, a
produção de moradias populares na área central sempre esteve relacionada às idéias de lucro
com a exploração dos aluguéis nos cortiços, controle da mão-de-obra a partir da construção
das vilas operárias pelas indústrias, aquisição da casa própria baseada nas invasões de terrenos
vazios e edifícios arruinados e redução do déficit habitacional de acordo com as propostas
desenvolvidas pela Prefeitura a partir de 1994.
44
Apesar de não atuarem na produção de moradias na área central da cidade, merecem destaque no campo da
iniciativa privada os Institutos de Aposentadorias e Pensões que foram criados em 1933 e “voltavam-se para o
provimento de habitações aos trabalhadores vinculados a determinadas categorias profissionais, sobretudo da
indústria e do setor de transportes“ (OLIVEIRA, 2000, p. 128).
45
Esta lei foi regulamentada pelo Decreto-lei nº 4.598 de 1942 e determinava o congelamento dos aluguéis
residenciais por dois anos para tentar minimizar a crise da habitação que se agravou durante este período.
46
Trata-se da primeira agência institucionalizada a nível nacional voltada exclusivamente para a construção e
financiamento de casas populares para as classes de baixa renda.
47
Este órgão tinha como objetivo principal o financiamento e a construção de moradias populares na forma de
conjuntos habitacionais, caracterizados pelo adensamento populacional e pela falta de qualidade na unidade
habitacional. Com a extinção do BNH em 1986, a Caixa Econômica Federal passou a assumir a responsabilidade
pela produção destas habitações até o momento de municipalização das políticas habitacionais na década de
1990. Fez parte deste período a criação da Secretaria Municipal de Habitação do Rio de Janeiro em 1994.
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ação do Centro do
Rio de Janeiro
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Durante a crise da habitação na segunda metade do século XIX a relação de controle da mão de
obra através da habitação
48
, como ocorria no período colonial, deixou de ser observada, uma
vez que neste momento os lucros seriam obtidos através da locação dos cortiços para os
trabalhadores assalariados e não mais pela exploração direta da força de trabalho escrava.
Pode-se dizer que esta mudança identificada na figura e nas intenções dos agentes produtores
da habitação justificou-se pela passagem da economia agro-exportadora para a produção
industrial e estimulou significativamente a produção privada da habitação popular na área
central, que se beneficiou da demanda por moradias e da exploração dos aluguéis,
normalmente exorbitantes
49
. Como exemplo marcante deste momento destaca-se a
construção do célebre cortiço Cabeça de Porco e de centenas de outros dos quais restam
poucos edifícios, como é o caso do cortiço da rua Senador Pompeu nº 34.
Com o desenvolvimento do processo de industrialização ainda no final do século XIX, verificou-
se que o interesse na substituição das habitações coletivas insalubres pelas vilas operárias se
justificava pela intenção do Estado e do setor industrial em controlar e disciplinar a classe
operária como ocorria com os escravos nas senzalas
50
. Durante este período, o principal
objetivo das iniciativas blica e privada com a construção destas habitações era vincular o
emprego à moradia. A este respeito, Blay (1979, p.79) observa que a moradia enraizava o
trabalhador a uma dada empresa e reduzia suas possibilidades de lutar pelos próprios
interesses, uma vez que perder o emprego representaria perda da própria casa. Na área central
da cidade foram construídos apenas dois exemplares representativos deste tipo de habitação
compreendendo a já citada vila Ruy Barbosa, executada pelo empresário Artur Sauer, diretor da
Companhia de Saneamento do Rio de Janeiro, e a vila operária na rua Barão da Gamboa
projetada por Lúcio Costa.
48
Este controle era realizado através da construção de senzalas para os escravos, que podem ser consideradas
como um tipo rudimentar de habitação popular. Na opinião de Blay (1979, p.77), era pela habitação e pela
reclusão que o proprietário preservava sua mercadoria, o escravo, e prolongava a vida da própria força de
trabalho.
49
Cabe observar que em muitas ocasiões estes imóveis encortiçados pertenciam a imigrantes portugueses que
adquiriam ou herdavam terrenos e prédios na área central e os utilizavam para exploração das atividades
comerciais e residenciais. Uma análise interessante sobre este aspecto foi realizada por Aluísio Azevedo no
romance O Cortiço da década de 1880 no qual mostra o dono do cortiço como um imigrante e comerciante
português que constrói inicialmente seu restaurante e algumas casas na parte posterior do terreno, evoluindo
para a compra de um lote maior e a construção de cerca de noventa quartos em torno de um pátio.
50
Abreu (1997, p.57) considera que nesse momento o Estado passou a ajudar a empresa privada, assumindo pela
primeira vez a responsabilidade de subsidiar, pelo menos em parte, a reprodução da força de trabalho.
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Fig.I.18 Vila operária na rua Barão da Gamboa. Autor desconhecido. 2009.
Estas vilas continuaram a ser produzidas até a década de 1930, geralmente no subúrbio da
cidade, quando então foram iniciadas as atividades dos Institutos de Aposentadorias e Pensões
com a construção de diversos conjuntos habitacionais modernistas, também em regiões
afastadas do centro. No entendimento de Bonduki (1998, p.88), foi neste momento que se
observou uma mudança significativa na abordagem do problema habitacional que antes de
1930 se centrava na salubridade da moradia e após esta década passou a considerar como
questão principal o acesso à casa própria. Pode-se dizer que é a partir deste contexto em que
surge o ideal da casa própria entre os trabalhadores que se intensifica o processo de
autoconstrução da moradia, fomentado pela grande demanda por habitações não atendidas
pelo governo e pela própria conjuntura econômica. Este fenômeno do auto-empreendimento
passou a ocorrer com maior freqüência em favelas e loteamentos irregulares na periferia da
cidade, entretanto foi identificado também em menor grau na área central, onde foi
caracterizado por invasões em terrenos vazios e de edifícios em ruínas como indica recente
estudo realizado por Orozco (2007). Um exemplo destas ocupações foi identificado pela autora
na rua do Livramento, localizada no bairro da Gamboa.
Figs.I.19 e I.20 Ocupações irregulares na rua do Livramento nº 73, 75, 76 e 77. OROZCO, 2007, p. 160-161.
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Com o objetivo de controlar estas iniciativas populares e reduzir o significativo déficit
habitacional, observado desde o século XIX e agravado ao longo do século XX, o Estado passou
a intervir oficialmente na produção de moradias populares através de políticas habitacionais
desenvolvidas em nível nacional a partir da década de 1940 e em nível municipal desde a
década de 1990. Apesar desta atuação mais efetiva do poder público no sentido de solucionar o
problema da habitação no Rio de Janeiro verificou-se que, no caso da área central, a iniciativa
estatal na produção de habitações para a população de baixa renda foi praticamente nula ao
longo de todo o século XX, restringindo-se a apenas uma proposta implementada pela
Prefeitura no início deste século e a alguns poucos empreendimentos desenvolvidos pela
Secretaria Municipal de Habitação a partir 1994, como será visto no próximo capítulo. Entre
estas propostas, destaca-se como a mais importante produção habitacional financiada pelo
Estado na área central a Vila Pereira Passos, que está localizada no bairro da Cidade Nova e foi
construída em 1906
51
. Para a construção desta vila, o Decreto 1.042 de 18/07/1905 permitiu o
aproveitamento dos terrenos desapropriados para a abertura da avenida Salvador de e de
outros logradouros como parte das obras de reforma urbana realizadas pelo prefeito Pereira
Passos. De acordo com Abreu (1997, p.66) foram executadas nesta época 120 casas totalizando
12.743 m² de área construída nas ruas Mendes Campos, Salvador de Sá e Leopoldo.
Fig.I.21 Vila Pereira Passos. Foto do autor. 2008.
Com base na análise do panorama habitacional da área central do Rio de Janeiro foi possível
constatar que a transição da produção privada para a produção estatal da moradia popular não
trouxe benefícios concretos para esta região da cidade que, até o momento, apresenta poucas
51
Segundo Bonduki (1998, p.71), estas foram as primeiras moradias populares promovidas pelo setor público no
Brasil.
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propostas neste sentido. De um modo geral, o que se observou ao longo dos séculos XIX e XX
foi o predomínio absoluto do capital privado com os cortiços e vilas operárias, cujos aluguéis
ainda são explorados com menor intensidade, algumas iniciativas populares relacionadas ao
auto-empreendimento e a atuação inexpressiva do Estado que, por quase duzentos anos, se
manteve ausente deste processo
52
. Após a construção da Vila Pereira Passos, somente na
década de 1990, com a municipalização das políticas habitacionais, é que surgem algumas
propostas habitacionais do setor público caracterizadas pela recuperação do estoque
imobiliário, obsoleto e degradado existente na área central.
Analisando de forma abrangente a situação da periferia do centro da cidade no final do século
XX, à luz do processo de produção e erradicação das habitações populares, verificou-se que
esta região sofreu um processo progressivo de degradação física e funcional decorrente da
ausência de investimentos e da especulação imobiliária. Atualmente, grande parte destas áreas
é ocupada por moradores de baixa renda que residem em antigos cortiços e sobrados
deteriorados remanescentes do período colonial. A falta de investimentos e intervenções do
poder público durante este século também foi responsável pela preservação destas tipologias
habitacionais e de diversas ambiências dos séculos anteriores, cujas características são
protegidas pelos órgãos de preservação. No próximo capítulo será estudada a transformação
destes elementos urbano-arquitetônicos em patrimônio da cidade e analisados os programas
de reabilitação desenvolvidos pela Prefeitura para a recuperação das áreas degradadas.
52
Isto reflete a histórica intenção do poder blico de afastar o uso residencial e a população de menor renda do
centro, viabilizadas mediante um discurso embasado no saneamento, embelezamento e modernização da cidade
(SILVEIRA, 1995, p.48).
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2. PRESERVAÇÃO E INTERVENÇÃO NO PATRIMÔNIO HABITACIONAL
Origens da preservação
De acordo com Fonseca (1997, p.55), as primeiras práticas relativas à preservação de
monumentos históricos ocorreram na Itália do século XV e compreenderam a criação de
decretos papais que visavam à proteção de antigas edificações cristãs. Paralelamente a estas
ações surgia o interesse pela conservação dos remanescentes arquitetônicos da Antigüidade
Greco-Romana, fundamentado nos discursos de teóricos e artistas da época em defesa dos
vestígios históricos das sociedades precedentes. De um modo geral este interesse pela cultura
material do Classicismo perdurou até o final do século XVIII, quando então a Revolução
Francesa, a Revolução Industrial e a Reforma Protestante na Inglaterra “alteraram de forma
dramática o modo como uma dada cultura se relacionava com seu passado, provocando o
despertar da noção de ruptura entre passado e presente” (KÜHL apud VIOLLET-LE-DUC, 2000,
p.10). No caso da França, os efeitos desta ruptura puderam ser observados através de diversas
ações de vandalismo e destruição da produção cultural do período medieval, o que motivou o
surgimento das primeiras medidas tomadas por um Estado moderno com o objetivo de
preservar monumentos históricos
1
.
Oficialmente, foi a partir do século XIX que se estabeleceram as primeiras políticas de
preservação do patrimônio baseadas em dois modelos distintos: o francês e o inglês. A França
adotou um modelo “estatal e centralizador, que se desenvolveu em torno da noção de
patrimônio, de forma planificada e regulamentada, visando ao atendimento de interesses
políticos do Estado”, enquanto a Inglaterra utilizou um modelo que contou com o apoio da
sociedade civil e esteve voltado para “o culto ao passado e para a valorização ético-estética dos
monumentos” (FONSECA, 1997, p.62-63). O modelo francês teve maior repercussão na Europa
e influenciou diversos países latino-americanos no século XX, inclusive o Brasil.
Com relação ao movimento preservacionista na França, se identificava em 1789 a presença
de alguns dos principais elementos caracterizadores da política de preservação do patrimônio
nacional, tais como os museus, os inventários e o instituto do tombamento, que se
1
De acordo com Kühl (apud VIOLLET-LE-DUC, 2000, p.10-11), os relatórios elaborados pelo abade Grégoire na
última década do século XVIII, referentes aos vandalismos ocorridos após a Revolução na França, influenciaram de
forma significativa a atuação do Estado na proteção dos exemplares artísticos e arquitetônicos da Idade Média.
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encontravam definidos em sua estrutura
2
. Apesar da existência destes instrumentos ainda no
final do século XVIII, a institucionalização da atividade de preservação pelo Estado foi
oficializada com a criação do Comitê de Trabalhos Históricos em 1830, da Comissão dos
Monumentos Históricos em 1837 e com a promulgação da primeira lei referente à preservação
de monumentos históricos em 1887 (CHOAY, 2001, p.146). Cabe observar que a política de
proteção conduzida na França neste período se fundamentava em dois tipos de preservação:
preventiva e reacional. A primeira forma procurava combater a degradação física do
patrimônio, uma vez que “nas cidades e no campo, aqueles que adquiriram bens nacionais
puderam, impunemente, para lotear o terreno ou para converter em materiais de construção,
destruir alguns dos mais prestigiosos monumentos”
3
. A segunda visava enfrentar o vandalismo
ideológico a partir de 1792 com fins puramente econômicos.
A respeito das origens da preservação na Inglaterra, Barthel (1996, p.13-14) informa que estas
foram promovidas por escritores e artistas ligados ao movimento Romântico e que as primeiras
ações relativas à proteção e valorização da arquitetura medieval se desenvolveram a partir de
associações e movimentos sociais, que contavam com o apoio dos arquitetos John Stuart Mill,
John Ruskin e William Morris. No que se refere às associações, destacam-se a Commons
Preservation Society, criada em 1865 por estes arquitetos com o objetivo de ajudar a proteger
terrenos comunitários de valor histórico em Wimbledon e Hampstead, e a Society for the
Protection of Ancient Buildings, fundada em 1877 para protestar contra restaurações realizadas
de forma indevida e alterações em edifícios e monumentos históricos. Entre os movimentos
sociais mais importantes está o Save the Lake District, criado em 1893 por Robert Hunter,
Octavia Hill e Canon Hardwicke Rawnsley com o objetivo de proteger este sítio histórico e
paisagístico da especulação imobiliária
4
. Quanto à intervenção estatal na preservação de
monumentos históricos, Choay (2001, p.148) indica que esta ocorreu tardiamente com a
instituição do Ancient Monuments Protection Act em 1882, a regulamentação da primeira lei
referente ao assunto em 1889 e a fundação do Serviço dos Monumentos Históricos, órgão
estatal de proteção do patrimônio, em 1913.
2
Segundo Choay (2001, p.120), as atividades relativas à preservação neste período abrangeram ainda a criação do
termo monumento histórico, o levantamento do corpus em andamento, a criação de instrumentos jurídicos
(inclusive disposições penais) e de técnicas então exclusivas.
3
Ibid., p.105-106.
4
De acordo com Barthel (1996, p.14), este movimento foi considerado o primeiro símbolo importante da
preservação na Grã-Bretanha.
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No Brasil do século XIX ainda não se identificava a preocupação com a preservação do
patrimônio, já consolidada na Europa, devido principalmente ao processo de urbanização tardio
das terras brasileiras, verificado após a vinda da família Real em 1808, à destruição das provas
da opressão banida” sempre que se alcançava uma “meta libertária” no país (LEMOS, 1987,
p.35) e à ausência de uma arquitetura reconhecida como representativa da nação. Pode-se
dizer que as primeiras práticas relativas à preservação de monumentos históricos ocorreram
apenas no início do século XX com o surgimento do ideário neocolonial, que era visto como “a
materialização da redescoberta cultural do Brasil” (KESSEL, 2001, p.173). Os defensores do
Estilo Neocolonial, liderados por Ricardo Severo e José Marianno Filho, manifestavam grande
preocupação com a documentação dos remanescentes da época da dominação portuguesa e
demonstravam a importância de se criar instrumentos legais para a proteção destes
exemplares, o que resultou na elaboração do Tratado de Arte Tradicional do Brasil e na criação
do Museu Histórico Nacional em 1922
5
.
No sentido do estabelecimento de uma política efetiva de preservação do patrimônio e da
criação de um órgão federal de proteção destacam-se o projeto de lei do deputado Luiz Cedro
para a criação da Inspetoria dos Monumentos Históricos dos Estados Unidos do Brasil em 1923
(LEMOS, 1987, p.37), a proposta de José Mariano Filho para a definição da Inspectoria de
Monumentos Públicos de Arte em 1934 (KESSEL, 2001, p.180), a fundação do Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) em 1937 e a criação do Decreto-lei de 25 de
novembro de 1937 que regulamentou a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional.
No caso do Rio de Janeiro, a política de preservação do patrimônio foi conduzida pelo SPHAN
até a década de 1960 e se baseava unicamente no tombamento isolado de bens com valor
histórico e/ou artístico para o país. A partir da ampliação da noção de patrimônio verificada
durante este período, que passou a abranger a produção cultural da sociedade e não apenas os
monumentos de valor nacional, ocorreram importantes transformações na política de proteção
até então vigente no país que incluíram a criação de diversos órgãos de preservação em nível
estadual e municipal. Sendo assim, em 1964 foi criado o primeiro órgão estadual de
preservação do patrimônio, a Divisão do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (DPHA) que
passou à esfera municipal em 1975 e foi extinta em 1979, em 1975 fundou-se o Instituto
Estadual do Patrimônio Cultural (INEPAC) e em 1980 foi criado o Conselho Municipal de
5
Ibid., p.174.
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Proteção do Patrimônio Cultural (CMPC), sendo transformado em 1986 no Departamento Geral
de Patrimônio Cultural (DGPC). Em 2006 o DGPC foi substituído pela Secretaria Extraordinária
de Promoção, Defesa, Desenvolvimento e Revitalização do Patrimônio e da Memória Histórico-
Cultural da Cidade do Rio de Janeiro (SEDREPAHC), criada pelo Decreto 26.239 de 6 de março.
Antes de identificar e analisar os edifícios habitacionais tombados e as ambiências protegidas
na área central do Rio de Janeiro, decorrentes das transformações nas políticas de preservação,
cabe verificar como evoluíram as práticas de atribuição de valor ao patrimônio e as respectivas
influências nos instrumentos de proteção adotados.
Evolução das políticas de preservação
Durante a trajetória das políticas de preservação, a definição e proteção dos bens patrimoniais
sempre estiveram associadas às atribuições de valor e aos tombamentos realizados pelos
órgãos de tutela. De um modo geral, os critérios adotados para a proteção dos monumentos
até a primeira metade do século XX se fundamentavam exclusivamente nos seus valores
históricos, relacionados à idéia de nação, e / ou artísticos, referentes à idéia de estilo. A partir
da segunda metade deste século observam-se mudanças significativas nesse processo que
compreenderam a incorporação de valores culturais aos critérios de preservação e a evolução
da prática do tombamento individual para a proteção de ambiências.
A respeito da atribuição de valor, verificou-se que a razão mais importante para a proteção de
um bem era sua relação com a construção da identidade nacional, que poderia estar associada
a causas históricas, como na França, ou artísticas, como no Brasil. De acordo Choay (2001,
p.117-118), os valores atribuídos ao patrimônio monumental na França derivavam do valor
nacional
6
que inspirou as medidas de conservação tomadas pelo Comitê de Instrução Pública.
No Brasil, a questão da atribuição de valor durante o período de institucionalização da política
de preservação foi marcada por conflitos entre as correntes tradicionalistas, representadas por
Ricardo Severo e José Marianno, e o movimento modernista. Apesar das disputas em torno da
definição do que seria a nação brasileira (herdada dos europeus ou mistura de etnias) e dos
estilos a ela associados, os dois grupos concordavam que o critério artístico deveria servir de
6
Hierarquicamente, do mais importante para o menos importante, estavam o valor cognitivo ou afetivo, o valor
econômico e o valor artístico.
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base para a preservação (MAGALHÃES, 2001). As intenções de José Marianno puderam ser
observadas no artigo “A defesa do patrimônio artístico da nação” publicado em 1933:
[...] não é o critério histórico que eu reclamo, para servir de base ao tombamento dos
velhos monumentos arquitetônicos que restam. A proteção que eu reclamo, é em
favor dos edifícios que possuem mérito artístico, aqueles, cuja conservação se torna
necessária, para que através deles se possa compreender o sentimento da evolução da
arte de construir entre nós (MARIANNO FILHO, 1943, p.78 apud KESSEL, 2001, p.180-
181).
No que se refere aos modernistas, Mario de Andrade, no anteprojeto para criação do SPHAN
em 1936, também defendeu o valor artístico quando indicou que “o Estado deve reservar-se o
direito de preferência para a aquisição de tudo quanto interesse a defesa de seu patrimônio de
arte” (BRASIL, 1936 apud KESSEL, 2001, p. 181).
Esta utilização do critério artístico e, posteriormente, do critério histórico como base para
proteção dos monumentos vigorou absoluta no Brasil até a década de 1970, quando então se
verificou a incorporação dos valores culturais às políticas de preservação decorrentes da
ampliação da noção de patrimônio e do estímulo à participação da população no processo de
atribuição de valor. A partir deste momento observa-se que o surgimento da idéia de
patrimônio cultural
7
correspondeu a uma ampliação na quantidade e no tipo dos monumentos
históricos com valor para preservação, abrangendo desde a produção arquitetônica local até os
edifícios de reconhecida importância nacional. Nesse sentido, Choay (2001, p.12) esclarece que
todas as formas da arte de construir, eruditas e populares, urbanas e rurais, todas as
categorias de edifícios, públicos e privados, suntuários e utilitários foram anexadas sob
novas denominações: arquitetura menor, termo proveniente da Itália para designar as
construções privadas não monumentais, em geral edificadas sem a cooperação de
arquitetos; arquitetura vernacular, termo inglês para distinguir os edifícios
marcadamente locais; arquitetura industrial das usinas, das estações, dos altos-fornos,
de início reconhecida pelos ingleses.
Examinando com maior profundidade estas transformações na política vigente, foi possível
identificar importantes relações entre as mudanças ocorridas e a revisão das noções de valor e
identidade nacional, excepcionalidade do bem e função social do patrimônio.
Com base no novo contexto de democratização da política de preservação, verificou-se que a
idéia de preservar bens representativos da nação não se mostrava tão pertinente, pois seria
impossível um único estilo representar uma sociedade com realidades culturais tão diversas.
7
Messentier (2004, p.53) considera o patrimônio cultural como uma “expressão de conteúdo mais abrangente,
que evoca não só o histórico e o artístico, mas também o cotidiano e o popular”.
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Observou-se também que o critério de excepcionalidade do bem utilizado para justificar a
preservação passou a ser considerado inadequado, uma vez que a noção de patrimônio neste
período decorreria “menos de seus atributos estéticos que de sua capacidade de mobilizar
reações” (FONSECA, 1997, p.227). Da mesma forma foi revisto o papel do patrimônio na
sociedade contemporânea, cuja importância passou a ser avaliada mais pelos conteúdos e
significados transmitidos à sociedade do que apenas pelo valor material do objeto. A este
respeito, Londres (2001, p.193) afirma que
é, portanto, a partir de uma reflexão sobre a função de patrimônio, e de uma crítica à
noção de “patrimônio histórico e artístico”, que se passou a adotar – e não só no Brasil
concepção mais ampla de patrimônio cultural, o mais centrada em determinados
objetos – como os monumentos – e, sim, numa relação da sociedade com sua cultura.
De um modo geral, essa nova postura adotada pelas políticas de preservação influenciou
significativamente as justificativas para os pedidos de tombamento que ultimamente estão
mais relacionadas às noções de representatividade, exemplaridade, ameaça de perda, potencial
turístico e valor afetivo (FONSECA, 1997, p.214-215).
Com relação à evolução da prática do tombamento individual para a proteção de ambiências,
verificou-se que a necessidade e importância da proteção de sítios e centros históricos já
seriam observadas por John Ruskin em 1860, que foi o “primeiro a incluir os conjuntos urbanos
no domínio do patrimônio histórico a preservar” (LOPES, 2000, p.3), por Gustavo Giovannoni
em 1913 e reconhecida internacionalmente pela Carta de Veneza em 1964, que ampliou a
noção de monumento histórico
8
. No contexto da preservação de áreas históricas, Giovanonni
elaborou o conceito de arquitetura menor
9
que seria parte integrante de um novo monumento:
o conjunto urbano antigo. Nesse sentido, o autor considerava que
uma cidade histórica constitui em si um monumento, tanto por sua estrutura
topográfica como por seu aspecto paisagístico, pelo caráter de suas vias, assim como
pelo conjunto de seus edifícios maiores e menores; por isso, assim como no caso de
um monumento particular, é preciso aplicar-lhe as mesmas leis de proteção e os
mesmos critérios de restauração, desobstrução, recuperação e inovação
(GIOVANNONI, 1931, p.140 apud CHOAY, 2001, p.143).
8
De acordo com o artigo 1º da Carta de Veneza, a noção de monumento histórico compreende a criação
arquitetônica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma
evolução significativa ou de um acontecimento histórico. Estende-se não às grandes criações, mas também às
obras modestas, que tenham adquirido, com o tempo, uma significação cultural.
9
Giovannoni (1998, p.4) considera como arquitetura menor as obras modestas por sua escala e destino,
representativas da arquitetura popular, cotidiana ou vernacular.
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Analisando as idéias de Giovannoni compreende-se que a importância de uma cidade histórica
e, por conseguinte, uma das justificativas para preservação, deriva de sua forma e das relações
espaciais estabelecidas entre seus elementos. Silva (1996, p.168-169) confirma este fato ao
constatar que a atribuição de salvaguarda das cidades históricas baseia-se, atualmente, na
compreensão de que entre os valores a preservar está “a forma urbana definida pelo traçado e
parcelamento; as relações entre os diversos espaços urbanos, espaços construídos, espaços
livres e plantados”.
Este entendimento do ambiente urbano enquanto patrimônio, identificado de forma pioneira
na Europa do culo XIX, só foi observado no Brasil a partir da década de 1970. Até este
período os tombamentos realizados pelo SPHAN em núcleos históricos tinham em vista “antes
o número expressivo de bens excepcionais que neles se concentravam que propriamente o
conjunto enquanto objeto de interesse da proteção” (FONSECA, 1997, p.229), como ocorreu
em Ouro Preto e Tiradentes. A partir da revisão nas práticas de preservação compreendeu-se
que não os edifícios, mas também os sítios urbanos fossem eles cidades, bairros ou ruas,
guardariam valores a serem preservados e estariam associados aos processos de transformação
da própria sociedade.
Os resultados desta valorização do ambiente urbano enquanto patrimônio puderam ser
observados através do crescimento significativo do número de sítios históricos protegidos pelos
órgãos de preservação. Nesse sentido, Messentier (2004) atribuiu o aumento das áreas urbanas
sob proteção legal com fins de preservação a dois motivos principais: o aumento da
participação de setores da sociedade na definição do que seria patrimônio e a atuação dos
novos órgãos de preservação criados em diferentes esferas. No que diz respeito à reivindicação
popular em favor da preservação, Messentier (2004, p.52) considera que o
“interesse pelo patrimônio cultural das cidades deu-se no contexto do incremento tanto dos
movimentos sociais urbanos cujas referências eram as áreas de vizinhança e políticas urbanas
– quanto das lutas ambientalistas de modo geral”. Com relação à descentralização das ações de
preservação, este autor afirma que “nos anos 1970 os Estados da Federação e principalmente
os municípios vão desenvolver ações no sentido de submeter áreas urbanas a diretrizes
relativas à preservação do patrimônio cultural” (MESENTIER, 2004, p.50).
Baseado nestas reflexões de Messentier e nas considerações dos diversos autores até aqui
mencionados acerca das transformações ocorridas nas políticas de preservação, constatou-se
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que estas mudanças influenciaram de forma significativa os critérios até então adotados para
escolha dos bens a proteger e contribuíram para a inclusão de diversos edifícios e ambiências,
antes sem valor para a preservação, na listagem do patrimônio histórico, artístico e cultural de
diversas cidades. De acordo com os interesses desta dissertação, serão analisados a seguir os
efeitos destas transformações na preservação de monumentos no centro do Rio de Janeiro.
Ambiências e edifícios habitacionais preservados
Conforme visto anteriormente, foi apenas a partir da década de 1970 que se passou a observar
a atuação efetiva dos estados e municípios na proteção de monumentos e sítios. No caso do Rio
de Janeiro, estas ações incluíram o tombamento de diversas habitações populares construídas
na área central da cidade durante os séculos XIX e XX e a proteção de vários conjuntos
arquitetônicos através da criação das Áreas de Proteção do Ambiente Cultural (APACS).
Edifícios habitacionais tombados
O tombamento consiste num instrumento de proteção legal adotado nas esferas federal,
estadual e municipal, através do qual se pretende assegurar a preservação de bens móveis ou
imóveis que apresentem valor histórico, artístico, cultural ou ambiental. Segundo Lemos (1987,
p.85), “o tombamento é um atributo que se ao bem cultural escolhido e separado dos
demais para que, nele, fique assegurada a garantia da perpetuação da memória”.
Quanto aos efeitos do tombamento para a preservação dos edifícios históricos, pode-se dizer
que este instrumento atua apenas na proteção do patrimônio contra a destruição, porém não
estimula os proprietários na conservação dos imóveis devido às restrições legais que impõe.
Nesse sentido é possível afirmar que, se por um lado ele é eficaz na preservação da identidade
e da memória nacional ou local, por outro traz transtornos aos proprietários do bem no que diz
respeito às limitações de uso, dificuldade de comercialização, e custos de conservação. Na
opinião de Fonseca (1997, p.207),
dada as restrições que o tombamento impõe ao bem considerado enquanto
mercadoria, e os limites que acarreta ao uso do imóvel, esse instrumento costuma ter
conseqüências consideradas indesejáveis para estratos das classes média e alta, como
proprietários de imóveis em setores urbanos antigos e empresários da construção civil.
Essa situação, comum nas décadas anteriores, agravou-se, a partir dos anos 70, em
conseqüência da tendência ao tombamento de conjuntos e a uma preocupação maior
com o entorno dos bens tombados.
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Rio de Janeiro
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Apesar destas limitações impostas pelo tombamento, verificou-se que a ameaça de destruição
do patrimônio habitacional remanescente dos séculos XIX e XX na área central do Rio de
Janeiro, devido ao processo de renovação urbana, motivou a proteção legal de várias
habitações populares a nível federal e municipal, como ocorreu com a Vila Pereira Passos na
Cidade Nova e o cortiço da rua Senador Pompeu nº 34 no Centro (figuras II.1 e II.2).
Fig.II.1 Vila Pereira Passos na Cidade Nova. Foto do autor, Fig.II.2 Cortiço na rua Senador Pompeu 34 no Centro. Foto
2008. do autor, 2008.
De acordo com o levantamento de Carvalho (2000) e da Prefeitura (2004), existem atualmente
nos bairros da I, II e III Regiões Administrativas
10
que compreendem as áreas Portuária, do
Centro e do Rio Comprido, respectivamente –, cerca de trinta e cinco imóveis habitacionais
tombados, conforme pode ser observado na Tabela 8.
HABITAÇÕES TOMBADAS NA ÁREA CENTRAL
Bairros
Casa
Solar
Sobrado
Cortiço
11
Avenida
12
Vil
a
13
Centro
5 (F) + 3 (M)
1 (M)
7 (M)
5 (M)
1 (F)
3 (M)
Saúde
1 (F)
-
-
-
-
-
Santo Cristo
-
-
3 (M)
-
-
2 (M)
Caju
3 (F e M)
-
-
-
-
-
Cidade Nova
-
-
-
-
-
1 (M)
Tabela 8 – Distribuição dos imóveis residenciais tombados na I, II e III RAs. Elaboração do autor a partir de
CARVALHO, 2000; PREFEITURA, 2004. Foram adotados como legenda para os níveis de proteção dos imóveis:
(M) municipal e (F) federal.
10
Os bairros da Gamboa, Catumbi, Rio Comprido e Estácio, que também pertencem às Regiões Administrativas
analisadas, não apresentam imóveis residenciais tombados.
11
Foi possível verificar apenas o quantitativo de unidades habitacionais referente a quatro cortiços. Ao todo foram
identificadas 174 unidades, sendo 151 cômodos e 23 apartamentos de um quarto.
12
A Avenida Modelo abrange um sobrado e oito casas térreas.
13
As vilas do Centro totalizaram 56 casas e as de Santo Cristo 22 casas. Não foi identificado o mero de unidades
habitacionais da Vila Operária da Cidade Nova.
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Analisando a tabela observou-se que o Centro é o bairro com maior número de edifícios
tombados e maior variedade de tipologias habitacionais. Do total das edificações, as casas são a
tipologia com maior número de tombamentos, sendo grande parte deles em nível federal.
Percebeu-se também que é significativa a quantidade de habitações populares sob proteção
legal existentes na área central, as quais abrigam ainda um mero considerável de unidades
residenciais e moradores
14
. A tabela informou ainda que a maioria dos edifícios é tombada em
nível municipal, o que exemplifica as ações realizadas a partir da cada de 1970 decorrentes
da ampliação da noção de patrimônio e da descentralização da política de preservação. Estas
ações também foram responsáveis pela criação das APACs que, além dos edifícios tombados,
abrangem diversas habitações preservadas e tuteladas com valor de conjunto.
Áreas de Proteção do Ambiente Cultural
Com base nos resultados alcançados pelo Projeto Corredor Cultural na reabilitação de áreas
históricas do centro da cidade a partir de 1979, foram criadas em nível municipal as Áreas de
Proteção do Ambiente Cultural (APACs). De acordo com Blasi (2004, p.66), a APAC é um
“instrumento destinado a proteger as áreas com características ambientais urbanas notáveis e
relevantes à preservação da identidade cultural da cidade”. Nestas áreas, as edificações antes
ordinárias e sem valor para o tombamento adquirem status de patrimônio quando percebidas
num conjunto maior, sejam ruas, quadras ou mesmo bairros inteiros
15
.
Este entendimento do contexto urbano como patrimônio da cidade se refletiu na criação de
vinte e seis áreas de preservação no Rio de Janeiro, as quais abrigam cerca de cinqüenta mil
imóveis protegidos
16
. Devido à alta concentração de edifícios e ambiências remanescentes dos
séculos anteriores, os bairros da região central são os que apresentam maior quantidade de
áreas protegidas, perfazendo sete APACs: Corredor Cultural (Decreto 4.141/83, Lei 506/84 e Lei
1.139/87), Cidade Nova e Catumbi (Decreto 10.040/91), Estácio (Decreto 19.000/2000), Cruz
Vermelha (Decreto 11.883/92), Teófilo Otoni (Decreto 16.419/97), Mosteiro de São Bento
(Decreto 24420/04) e SAGAS (Decreto 5459/85, Lei 971/87 e Decreto 7351/88).
14
Cabe observar que o tombamento destas habitações está associado às mudanças ocorridas no campo
preservacionista a partir da década de 1970, que passou a considerar estas edificações como patrimônio histórico
e cultural representativo das estruturas e relações sociais estabelecidas na virada do século XIX-XX, época das
grandes transformações urbanas e da política de erradicação dos cortiços da cidade (PREFEITURA, 1995).
15
Nas APACs, independente do valor individual do edifício, o que importa é o valor do conjunto arquitetônico e
urbanístico que caracteriza a região.
16
Ibid., p.66.
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A respeito da salvaguarda das edificações existentes nas APACs, o Plano Diretor Decenal da
Cidade do Rio de Janeiro
17
estabeleceu em seu artigo 131 os critérios para escolha dos bens a
preservar e os níveis de proteção edilícia. Quanto às justificativas para preservação, definiu que
os bens deveriam apresentar, pelo menos, uma das seguintes características (PREFEITURA,
1993, p.62):
I – seja parte de um conjunto de bens de valor cultural na área na qual está inserido;
II apresente características morfológicas típicas e recorrentes na área na qual está
inserido;
III – constitua-se em testemunho das várias etapas da evolução urbana da área na qual
está inserido;
IV possua inequívoco valor afetivo coletivo ou se constitua em marco na história da
comunidade.
Com relação aos tipos de proteção, o Plano informou que os bens podem ser tutelados ou
preservados. Apesar de existirem, em alguns casos, edifícios tombados nestas áreas, o Plano
Diretor não os considera em seu texto, uma vez que o tombamento e a APAC são instrumentos
diferentes. Os bens preservados e tutelados foram definidos da seguinte forma
18
:
§ - Entende-se por bem preservado aquele que, situado em Área de Proteção do
Ambiente Cultural, deverá manter as características que tenham sido identificadas
como de importância para a ambiência e identidade cultural da Área, segundo critérios
estabelecidos pelo órgão de tutela.
§ 4º Entende-se por bem tutelado aquele que, situado em Área de Proteção do
Ambiente Cultural, integra a ambiência do bem ou conjunto preservado, podendo ser
modificado ou demolido, ficando a nova edificação sujeita a restrições para evitar a
descaracterização do conjunto preservado a critério do órgão de tutela.
No que se refere aos efeitos da criação das APACs na vida dos moradores e dos proprietários de
imóveis nestas regiões, identificou-se algumas melhorias quanto aos incentivos fiscais e o
aumento das dificuldades relativas à conservação dos edifícios históricos.
Como instrumento de preservação, um dos resultados positivos decorrentes da proteção de
ambiências foi a isenção de impostos municipais para proprietários de edifícios com valor
histórico, arquitetônico ou cultural e que tenham o interesse de reformar seus imóveis
19
. De
acordo com os resultados alcançados pelo Projeto Corredor Cultural, observou-se que estes
incentivos tiveram maior impacto nas áreas comerciais, onde os impostos são mais elevados,
17
O Plano Diretor, que dispôs sobre a política urbana do município, foi regulamentado pela Lei Complementar
16 de 1992.
18
Ibid., p.62-63.
19
Estas isenções tributárias foram definidas pela Lei 691 de 24 de dezembro de 1984.
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do que nas áreas residenciais, onde os impostos têm valor reduzido. Nesse sentido verificou-se
que nas regiões habitacionais, sobretudo naquelas ocupadas por população de baixa renda, as
isenções relativas ao Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) não compensaram os gastos
com a recuperação dos imóveis, o que pode ser confirmado através da deterioração do casario
identificada em diversas áreas do centro da cidade. A este respeito Blasi (2004, p.66) considera
necessária a criação de novos incentivos, principalmente quando se trata de áreas residenciais,
e entende que “a isenção fiscal como único instrumento de incentivo mostra-se insuficiente
para a real conservação do patrimônio carioca”.
Ainda com relação à conservação das habitações, pode-se dizer que a criação das APACs gerou
maiores encargos financeiros e restrições aos habitantes destas regiões devido ao status de
patrimônio concedido às edificações. No caso do centro da cidade, observou-se que muitas
destas áreas de proteção estão localizadas na periferia do núcleo de negócios e abrangem
setores urbanos degradados e ocupados por moradores de baixa renda, o que torna ainda mais
complexa a questão da manutenção dos imóveis históricos aí existentes. Nesse sentido é
possível concluir que, se por um lado a proteção de ambiências representou a preservação de
importante acervo arquitetônico e urbanístico da cidade, por outro significou o agravamento
das questões relativas à conservação dos imóveis.
Devido ao interesse do presente trabalho pelos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, uma
vez que o estudo de caso desta dissertação se localiza nesta região, serão analisadas apenas as
informações referentes à APAC SAGAS e ao projeto que lhe deu origem.
O Projeto SAGAS surgiu a partir da mobilização das associações de moradores dos bairros da
Saúde, Gamboa e Santo Cristo em prol da preservação do conjunto arquitetônico existente
nesta região e das propostas desenvolvidas pelo Grupo de Trabalho Comunitário e Institucional
para a Valorização do Patrimônio Cultural dos Bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, criado
em 1983 e formado por representantes de instituições blicas, privadas e membros da
sociedade civil. Baseado nas propostas do Grupo de Trabalho foi criado o Decreto 5459 de
08 de novembro de 1985, posteriormente transformado na Lei 971 de 04 de maio de 1987 e
regulamentado pelo Decreto nº 7351 de janeiro de 1988. Basicamente, estas legislações
determinaram o tombamento de 23 edificações e nove pinturas de bares, a delimitação da
Área de Proteção Ambiental (APA), a criação de normas de zoneamento, uso e ocupação e a
preservação de 1782 edificações existentes nos bairros mencionados e em parte do Centro.
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A Área de Proteção Ambiental dos bairros da Saúde, Gamboa, Santo Cristo e parte do Centro, a
maior da cidade, tem como limites “ao Norte o porto da cidade; ao sul, a avenida Presidente
Vargas e o ramal principal da RFFSA; ao leste a Praça Mauá e avenida Rio Branco e a oeste, o
Terminal Rodoviário Novo Rio e avenida Francisco Bicalho” (PREFEITURA, 1995, p.43).
Fig.II.3 Limites e abrangência da APAC SAGAS. Google Earth adaptado pelo autor, 2009.
O zoneamento proposto pelo Decreto 7351 / 88 dividiu a área dos bairros em dois setores: o
setor 1, onde se concentra o uso residencial, e o setor 2, onde se localizam as atividades
portuárias. A APA, por sua vez, foi dividida em quatro zonas: Área Central 1 (AC-1), Área Central
2 (AC-2), Zona Residencial 3 (ZR-3) e Zona Residencial 5 (ZR-5). A rua Senador Pompeu, onde se
localiza o edifício analisado pela dissertação, está incluída na ZR-3, é Centro de Bairro 1A (CB-
1A) no trecho entre a rua Camerino e a rua da Conceição e deve obedecer ao alinhamento
existente. Nesta rua existem, aproximadamente, 80 imóveis preservados pela APA.
No que se refere aos parâmetros de uso e construção, o referido Decreto estabeleceu que:
Art. 4º o uso residencial será adequado em toda a área.
Art. 11º as edificações deverão obedecer ao alinhamento existente, ficando
automaticamente revogados os projetos de alinhamento (PA) nos trechos que lhes são
correspondentes.
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Art. 18º a área mínima útil das unidades residenciais será de 30,00 (trinta metros
quadrados).
A fim de entender melhor a importância e as características destes bairros que justificam a
preservação das ambiências, será analisada a seguir a evolução urbana da Saúde, Gamboa,
Santo Cristo e morro da Conceição e a caracterização atual destas áreas.
Os bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo
Apesar das diversas transformações urbanísticas ocorridas na área central da cidade desde o
século XIX, estes bairros, que configuram a zona portuária da cidade, ainda conservam muitas
de suas características originais, abrangendo desde antigos traçados viários coloniais a
monumentos e conjuntos arquitetônicos de valor histórico, artístico e cultural reconhecidos
pelo IPHAN, INEPAC e SEDREPAHC. Pode-se dizer que a presença destes elementos
morfológicos e tipológicos de séculos passados na paisagem atual dos bairros decorre,
principalmente, da ausência de investimentos e intervenções urbanísticas pelo poder público
por longos anos, do isolamento do dos bairros em relação centro de negócios, devido às
condições geográficas, e da presença de diversos edifícios tombados pelo órgão federal de
proteção, o que garantiu a preservação do entorno imediato destes bens. A respeito da
manutenção da ambiência original nesta região, Cardoso et al (1987, p.135) afirmam que
a área portuária não se transforma do mesmo modo que o restante da cidade, através
do processo ininterrupto de construção, demolição e reconstrução. não se
derrubam casas para levantar pequenos prédios, que por sua vez são substituídos por
arranha-céus. Ao contrário, uma vez estabelecidas, aquelas formas se cristalizaram,
preservando através da sua imagem o passado da cidade.
De um modo geral, observa-se na região três períodos de urbanização: o anterior ao século XIX,
em que ocorre a formação e as primeiras ocupações, o próprio século XIX, considerado como
fase de desenvolvimento e o século XX, caracterizado pela consolidação do tecido urbano e
marcado por diversas intervenções na infra-estrutura. Até o culo XIX a área era ocupada
basicamente por grandes chácaras, edifícios religiosos e de uso militar. Nos séculos seguintes,
os bairros mantiveram os usos que lhes deram origem, abrigando casas particulares e
habitações para operários em lotes menores desmembrados das chácaras, e foram utilizados
para outras atividades que dinamizaram sua ocupação, tais como a atividade portuária, com a
construção de cais e trapiches, e a atividade comercial, com o estabelecimento do comércio
atacadista, venda de escravos e pequenas manufaturas.
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Consta que em 1573, Manuel de Brito obteve como sesmaria “o outeiro chamado mais tarde de
São Bento, e todas as terras que o cercavam, até o morro da Conceição” (CARDOSO et al, 1987,
p.19). Em 1590 este morro foi doado aos beneditinos, fato que atraiu vizinhos para aquela área
da cidade. Esta sesmaria foi registrada com o nome de Prainha, sendo que, este nome também
passou a designar os logradouros que foram sendo criados, como o largo da Prainha (atual
Praça Mauá) e a rua da Prainha (atual rua do Acre). Ao longo do século XVII verificam-se as
primeiras ocupações no morro da Conceição com a instalação dos frades carmelitas na ermida
da Conceição e dos franciscanos na ermida de São Francisco da Prainha. No final deste século,
“as encostas dos morros de São Bento, da Conceição e do Livramento e seu entorno, apesar de
ocupadas, ainda se caracterizavam como arrabaldes da cidade, integrando-se precariamente à
malha urbana”
20
.
Durante o século XVIII, a transferência da capital do país de Salvador para o Rio de Janeiro, em
1763, acelerou o processo de urbanização do núcleo da cidade, o aumento da população e a
expansão para outras áreas, inclusive na direção dos morros da Conceição e Providência. Esta
ocupação se caracterizou pela instalação de chácaras que desestimularam e retardaram a
urbanização da área. Apenas no final do século, com a transferência do mercado de escravos da
rua Direita para o Valongo, é que se observa a execução dos primeiros aterros nos terrenos
alagadiços, abertura de poucas ruas, como a rua do Valongo (atual Camerino) em 1760 e o
desenvolvimento do sistema de transporte marítimo entre esta região e outros bairros. Estes
fatos estimularam o estabelecimento de outros ocupantes além dos chacareiros.
Pode-se dizer que a urbanização da região ocorreu efetivamente após a chegada da família
real em 1808. Na primeira metade do século XIX, a divisão das chácaras existentes em lotes
menores, a realização de diversos aterros em mangues e trechos da orla e a abertura de outras
ruas estimularam a ocupação das planícies e a construção de alguns cais, trapiches e armazéns.
Em 1809 foram abertas as ruas Príncipe dos Cajueiros, atual Senador Pompeu e a rua da
Princesa, atual Barão de São Félix (PREFEITURA, 1977, p.27 da I RA). Apesar do
desenvolvimento urbano das planícies, “os morros da Saúde, do Livramento, de Paulo Caieiro e
de São Diogo, que acompanhavam o litoral da área, tinham um aspecto ainda bastante rural.
Sua ocupação era esparsa, limitando-se a grandes chácaras” (CARDOSO et al, 1987, p.37).
20
Ibid., p.19-20.
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Fig.II.4 Configuração dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo no início do século XIX. CARDOSO et al, 1987, p.37.
Na segunda metade deste culo a inauguração da Estrada de Ferro D. Pedro II em 1858 foi um
dos principais fatores de desenvolvimento da região. Segundo Cardoso et al (1987, p.71), “dez
anos depois da entrada em operação da estrada de ferro, toda a costa, da Prainha à Praia
Formosa, estava ocupada”. Neste período observa-se a construção de diversos prédios
residenciais, comerciais, trapiches e armazéns em terrenos demarcados no litoral. Uma das
transformações mais significativas nesta área foi a urbanização dos morros. “Nos morros da
Conceição e da Saúde, que já contavam com um número significativo de edificações, abriram-se
ladeiras, becos e travessas, permitindo sua total ocupação”
21
.
No início do século XX as obras de renovação urbana conduzidas pelo Prefeito Pereira Passos
influenciaram significativamente a paisagem construída. Fizeram parte destas intervenções o
alargamento, incorporação e prolongamento de ruas importantes da região, tais como a
Marechal Floriano, Acre e Camerino. A execução das obras nesta última rua
exigiu a demolição de quase todos os prédios existentes e o corte de pequeno trecho
da encosta do morro da Conceição. Para evitar o deslizamento do morro, foi
construído um alto muro de sustentação e a encosta foi ajardinada dando origem ao
Jardim do Valongo (CARDOSO et al, 1987, p.105).
Outras obras de modernização realizadas ao longo do século foram a construção do novo cais,
inaugurado em 1910, a construção das avenidas Rodrigues Alves e Francisco Bicalho, o aterro
de praias e recôncavos remanescentes e a urbanização completa da área aterrada, constituída
por lotes de grandes dimensões traçado viário ortogonal.
21
Ibid., p.76.
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Fig.II.5 Configuração dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo no final do século XX. CARDOSO et al, 1987, p.143 adaptado
pelo autor.
Com relação aos usos que motivaram a ocupação dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo
pode-se dizer que, até o século XIX, as atividades de maior importância desenvolvidas na região
estavam relacionadas exclusivamente ao comércio de escravos e ao porto. A instalação do
mercado de escravos no Valongo após 1760 atraiu para a área uma série de outros usos que
passaram a dar suporte a esta atividade principal. A especialização de atividades econômicas e
comerciais contribuiu, no século XVIII, para o surgimento das atividades portuárias no litoral da
Prainha, Valongo e praia da Saúde.
Na primeira metade do século XIX o comércio de importação e exportação e a atividade
portuária se estabelecem como os principais usos da região, ocupando todo o litoral
compreendido pela Prainha e praias do Valongo, da Gamboa e do Saco do Alferes. De acordo
com Cardoso et al (1987, p.58-59),
o aumento da produção de café, produzido em escala crescente a partir de 1830 no
vale do Paraíba, foi o principal fator de dinamização do litoral da Prainha. Cais e
trapiches multiplicaram-se pela área, onde também se estabeleceram grandes
armazéns de exportação de café.
Novas funções e estabelecimentos surgiram em função destas atividades principais. Por volta
da década de 1830 destacaram-se, no litoral e ruas adjacentes, a construção de
embarcadouros, armazéns para exportação de café, pequenas manufaturas, cocheiras,
tabernas e a fundação da companhia de navegação para passageiros e cargas. Nas décadas de
1840 e 1850, identifica-se a presença do comércio atacadista e de armazéns para madeira,
mantimentos e molhados.
SANTO CRISTO
GAMBOA
SAÚDE
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Fig.II.6 Cais e trapiches da praia da Saúde em 1840. CARDOSO et al, 1987, p.55.
Durante a segunda metade deste século as atividades comerciais e portuárias prosseguiram
com bastante intensidade. Foram inaugurados em 1879 na Gamboa, o terminal ferroviário-
marítimo da Companhia Docas D. Pedro II e a Estação Marítima “como solução para o grande
acúmulo de mercadorias depositadas na estação terminal da estrada de ferro, no Campo de
Santana” (ZYLBERBERG, 1996, p.28). A partir de 1880 surgiram na Saúde as primeiras fábricas
da região que, acompanhando a vocação portuária e de exportação, se dedicaram à construção
naval e à moagem de cereais.
Pode-se afirmar que a consolidação funcional da zona portuária ocorreu no século XIX e que,
nesse sentido, o século XX não apresentou grandes transformações. O fato de maior
importância seria o aumento do número de fábricas e oficinas com fins diversos, entre eles
gráficas e confecções. O dinamismo do novo porto associado às funções comerciais e fabris
acentuou a presença operária e o adensamento da região, refletindo na demanda por mais
habitações próximas aos locais de trabalho. Segundo Cardoso et al (1987, p.152),
“a proximidade moradia/trabalho é marcada pela própria localização dos bairros, junto ao
Centro e junto ao porto, os dois principais pólos de absorção da mão-de-obra local”.
Nesse sentido, especial atenção deve ser dada ao uso e aos edifícios habitacionais na região da
Saúde, Gamboa e Santo Cristo, uma vez que estes permearam todos os séculos de ocupação.
Pode-se dizer que as primeiras ocupações residenciais nestas áreas ocorreram no século XVIII
com a instalação de diversas chácaras, porém foi somente por volta de 1830 que se identificou
a construção das primeiras residências de menor porte, localizadas em grande parte nos
morros da Conceição e da Saúde.
As tipologias habitacionais que configuram o local abrangem moradias unifamiliares em térreos
e sobrados e multifamiliares em estalagens, cortiços, avenidas e vilas. Normalmente
“constituem o casario característico do Rio do final do século XIX e, pelo seu grande número,
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respondem pela harmonia arquitetônica e urbanística da ambiência local” (CARDOSO et al,
1987, p.151). Entre as moradias construídas para trabalhadores, merecem destaque os cortiços
e estalagens nas ruas General Caldwell, General Pedra, Nabuco de Freitas, Barão de São Félix e
Senador Pompeu, apresentando esta última alguns exemplares tombados, a Vila Operária na
rua Barão da Gamboa, projetada por Lúcio Costa, e o Conjunto Habitacional dos Marítimos, que
ocupa parte do morro da Providência. Outra área de importância histórica, considerada um dos
marcos de ocupação da cidade e que ainda conserva diversos exemplares habitacionais, é o
morro da Conceição.
O morro da Conceição
A ocupação do morro da Conceição, antigo morro do Padre Salsa, teve início com a construção
da ermida de N. S. da Conceição em 1634 que foi doada por volta de 1655 à Ordem do Carmo e
ocupada pelos capuchinhos franceses em 1667 (ZYLBERBERG, 1996, p.55). Durante o século
XVIII, a ocupação e urbanização do morro e imediações foram intensificadas com a construção
de diversos edifícios militares e religiosos e a abertura de ruas. Foram construídos o Palácio
Episcopal (1702), que serviu como residência para o Bispo D. Francisco de São Jerônimo
(CARDOSO et al, 1987, p.16), a Fortaleza da Conceição (1713), construída após a invasão de
Dugauy-Trouin para a defesa da cidade contra as invasões estrangeiras (SILVA, 1965, p.119), a
prisão do Aljube (1733) que foi utilizada para a reclusão de eclesiásticos
22
, a igreja de São
Francisco da Prainha (1738-1740) em terras da Ordem Terceira da Penitência doadas pelo
padre Francisco Mota em 1704
23
e algumas residências na encosta do morro próximo ao mar
(ZYLBERBERG, 1996, p.20).
Fig.II.7 Palácio Episcopal. PINHO e SIGAUD, 2000. Fig.II.8 Igreja São Francisco Prainha. PINHO e SIGAUD, 2000.
22
Ibid., p.84.
23
Ibid., p.204.
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Ainda neste século foram abertas a rua da Pedreira (1713), atual rua da Conceição (BERGER,
1974, p.40-41), a rua do Aljube (1733), atual rua do Acre, a rua do Valongo (1760), atual
Camerino (BERGER, 1974, p.31) e as ladeiras do Pedro Antonio, da Prainha (atual ladeira da
Fortaleza da Conceição) e do adro de São Francisco (ZYLBERBERG, 1996, p.21).
Fig.II.9 Rua da Prainha no século XVIII. ARNAUT, 1984. Fig.II.10 Rua do Valongo no século XVIII. ARNAUT, 1984.
Fig.II.11 Traçado urbano do morro da Conceição e adjacências em 1769. www.brazilbrazil.com adaptado pelo autor, 2009.
Outro acontecimento importante ocorrido durante o século XVIII foi a criação da freguesia de
Santa Rita em 1721. De acordo com Santos (1965, p.123) esta freguesia
ficou dividida em dois distritos de juiz de paz: o primeiro abrangia as edificações desde
a Igreja Matriz até o fim da rua do Valongo, ao lado do Morro da Conceição, exclusive,
e da mesma matriz até o fim das ruas da Prainha e dos Pescadores, de ambos os lados,
até o Arsenal da Marinha, em frente à Ilha da Cobras; o segundo abrangia o resto da
freguesia, começando da rua da Prainha, exclusive as praias do Valongo e da Gamboa,
os morros da Saúde e da Conceição e a Ilha de Santa Bárbara.
No século XIX teve prosseguimento a abertura de ruas e acessos ao morro e se estabeleceu a
vocação da área como local de moradia operária. Quanto à construção de vias públicas, foram
abertas a rua Nova do Príncipe em 1809, atual Senador Pompeu, a rua de São Joaquim em
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1815, atual avenida Marechal Floriano (BERGER, 1974, p.82-83), a rua da Saúde em 1855, atual
Sacadura Cabral (CHIAVARI, 1998, p.27) e as ladeiras da Conceição, da Fortaleza da Conceição
(atual ladeira João Homem) e do Escorrega (CARDOSO et al, 1987, p.36). Após a abertura dos
principais logradouros nos séculos XVIII e XIX, verificou-se que os limites do morro da Conceição
ficaram definidos pela rua Sacadura Cabral ao norte, a rua Senador Pompeu ao sul, a rua do
Acre a leste e a rua Camerino a oeste.
Fig.II.12 Limites do morro da Conceição em 1838. www.brazilbrazil.com adaptado pelo autor, 2009.
Com relação à ocupação habitacional do morro e imediações, estas se justificaram pela
proximidade de empresas comerciais, indústrias e oficinas, localizadas em grande número no
largo da Prainha (atual Praça Mauá) e rua da Saúde, e pela dificuldade em se encontrar
moradias mais ao centro da cidade. Foram construídas inúmeras residências em pequenos
lotes, desmembrados das antigas chácaras, e proliferaram as habitações populares insalubres.
A este respeito, Zylberberg (1996, p.33) observa que
vários regulamentos criados na segunda metade do século para regularizar a
construção de habitações populares nas várias freguesias da cidade (para evitar a
proliferação de epidemias) não incluíam seus morros [...] isto deve ter incentivado a
Ordem [Terceira] e outros proprietários de lotes a construir casas cujos aluguéis
representaram excelentes fontes de renda, notadamente à proporção que as encostas
dos morros se apresentavam como alternativa numa época em que a crise
habitacional se aprofundava.
Esta ocupação se consolidou ao longo da primeira metade do século XX, quando então
ocorreram importantes transformações urbanísticas em seu entorno imediato que incluíram as
reformas realizadas pelo prefeito Pereira Passos entre 1902 e 1906 (figura II.13) e a abertura de
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importantes avenidas, entre elas a Rio Branco e Presidente Vargas (figura II.14). Na opinião de
Zylberberg (1996, p.43), estas obras contribuíram decisivamente para isolar o morro do centro
financeiro da cidade, desvalorizar seus imóveis e manter preservadas as características da
ambiência original.
Fig.II.13 Intervenções urbanas propostas por Pereira Passos Fig.II.14 Imediações do morro em 1945 após a abertura das Avs.
em 1904. www.brazilbrazil.com adaptado pelo autor, 2009. Rio Branco e Presidente Vargas. www.brazilbrazil.com adaptado
pelo autor, 2009.
A fim de evitar a destruição e descaracterização do patrimônio remanescente nesta área foram
tomadas providências legais para a proteção dos monumentos localizados no morro da
Conceição e adjacências. Nesse sentido, em 1938 foram tombados pelo IPHAN seis imóveis,
incluindo o Palácio Episcopal, a Fortaleza da Conceição, a igreja de o Francisco da Prainha, o
conjunto arquitetônico e paisagístico do Morro do Valongo, o Palácio Itamaraty e a Igreja de
Santa Rita. Dando prosseguimento a estas atividades, o IPHAN iniciou em 1984 o projeto Morro
da Conceição e entornos, com o objetivo de regulamentar as intervenções nos imóveis
existentes na região, e criou em 1986 a Portaria 02 com o intuito de definir especificações
para construções e reformas no entorno dos bens tombados. Em nível municipal, verificou-se a
inserção do morro na área de proteção ambiental do Projeto SAGAS através do Decreto 7351
de 1988.
Atualmente, o entorno do morro da Conceição sintetiza o que ocorre nos bairros da Saúde,
Gamboa e Santo Cristo em termos de tipologia arquitetônica, degradação física e uso. Apesar
da proteção legal vigente relativa ao patrimônio, identifica-se na região grande quantidade de
imóveis históricos em estado de conservação precário, além de muitas ruínas e terrenos vazios.
A fim de verificar as características dos edifícios existentes nesta área, o grau de conservação,
as atividades que neles se desenvolvem e o tráfego de veículos e pedestres, foi realizado
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levantamento nos seguintes logradouros: ruas Camerino, Senador Pompeu, Conceição, Júlia
Lopes de Almeida, Andradas, Leandro Martins, Acre, Sacadura Cabral, Marechal Floriano e
Travessa do Liceu.
Quanto às tipologias das edificações, predominam os sobrados coloniais com dois pavimentos,
fachadas de estilo Eclético, coberturas com telhas francesas e platibandas, balcões em ferro e
janelas retangulares em madeira, com verga reta, no pavimento superior e portas de enrolar
em ferro no pavimento inferior. Esta configuração é típica nas ruas Camerino, Conceição, Júlia
Lopes de Almeida e Senador Pompeu.
Figs.II.15 e II.16 Tipologias nas ruas Júlia Lopes de Almeida e Senador Pompeu, respectivamente. Foto do autor, 2008.
Na avenida Marechal Floriano e ruas Leandro Martins e Acre, identificam-se contrastes na
paisagem construída devido à coexistência dos sobrados com edifícios modernos de gabarito
elevado. As ruas dos Andradas e Sacadura Cabral são as que apresentam maior variedade de
gabaritos (um a mais de dez pavimentos) e diversidade de estilos (Eclético, Art-déco, Moderno).
Figs.II.17, II.18 e II.19 Estilos e gabaritos nas ruas Marechal Floriano, Acre e Sacadura Cabral, respectivamente. Foto do autor,
2008.
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Com relação ao estado de conservação, verificou-se que a degradação física do conjunto
arquitetônico existente ocorre em todas as ruas analisadas. Este fato decorre de muitos fatores
tais como a falta de investimento público em infra-estrutura, a desvalorização imobiliária, a
obsolescência funcional e o alto custo das obras em edifícios de valor patrimonial que muitas
vezes são ocupados por moradores de baixa renda. A conservação dos edifícios foi classificada
como moderada na avenida Marechal Floriano, nas ruas do Acre, Andradas, Júlia Lopes,
Leandro Martins e Senador Pompeu e ruim nas ruas Camerino, Conceição e Sacadura Cabral.
Estas últimas apresentam o maior número de ruínas e terrenos vazios identificados na área,
sendo que, na rua Sacadura Cabral, verificam-se também alguns imóveis reformados
recentemente.
Fig.II.20 Conservação na rua do Acre. Foto do autor, 2008. Fig.II.21 Conservação na rua Camerino. Foto do autor, 2008.
A respeito dos tipos de uso identificados no local, predomina a atividade comercial nos térreos
dos edifícios. O uso residencial se restringe aos pavimentos superiores, sendo que, em alguns
casos, estes se encontravam fechados. Dentre os tipos de comércio existentes, o de
alimentação é o que se encontra com maior freqüência, abrangendo lanchonetes, mercearias e
restaurantes. Este ramo está presente em todas as ruas analisadas. Outras atividades
observadas no local, com certa regularidade, são os estacionamentos, em edifícios-garagem ou
terrenos vazios, depósitos de bebidas, com maior incidência no largo de São Francisco da
Prainha, e sapatarias e lojas de materiais esportivos, na avenida Marechal Floriano. Esta
avenida e a rua do Acre são os logradouros que apresentam maior intensidade do uso
comercial. As ruas Camerino, Senador Pompeu, Sacadura Cabral e Travessa do Liceu têm
intensidade moderada e as ruas da Conceição, Júlia Lopes, Andradas e Leandro Martins
possuem comércio esparso, onde são encontrados muitos prédios fechados.
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No que se refere ao tráfego de veículos e pedestres, as ruas que apresentaram fluxo mais
intenso são a Camerino, Acre e avenida Marechal Floriano. As ruas Senador Pompeu, Conceição
e Sacadura Cabral têm fluxo moderado e as ruas Júlia Lopes, Andradas e Leandro Martins
possuem fluxo muito reduzido, talvez por serem menores que as outras. O único logradouro
sem trânsito de veículos é a Travessa do Liceu, porém apresenta fluxo intenso de pedestres e
dá acesso ao morro.
Com base no estado de degradação edilícia identificado neste local e no reconhecimento do
morro da Conceição e dos bairros da zona portuária como patrimônio histórico, artístico e
cultural da cidade, o poder público tem realizado desde a década de 1990 importantes
intervenções urbano-arquitetônicas no sentido de recuperar e preservar estas regiões. Antes,
porém, de verificar as características e o andamento destes projetos, serão estudados alguns
conceitos e tipos de intervenção em áreas e edifícios históricos que servirão como parâmetro
para a análise da reabilitação do estudo de caso desta dissertação.
Intervenções em edifícios e áreas históricas
As intervenções para recuperação e preservação de monumentos tiveram início com a
restauração de edifícios no século XIX e evoluíram para outras formas de intervenção durante o
século XX, incluindo aquelas relacionadas aos centros e sítios históricos. Segundo Solà-Morales
(2006), o termo intervenção pode ser entendido como “um conceito geral que engloba diversas
ações sobre as obras históricas, desde sua estrita conservação até a transformação profunda”.
De um modo geral, tais intervenções sempre estiveram relacionadas à escala do patrimônio a
preservar, as quais podem ser classificadas em escala urbana – incluindo regiões, cidades,
distritos históricos (bairro) e complexos históricos (conjunto edificado) –, e escala
arquitetônica, abrangendo os monumentos isolados e os monumentos deslocados (FITCH,
1981, p.21). Para melhor estudar as questões históricas e conceituais relativas às intervenções,
será verificada inicialmente a evolução destes aspectos no campo da arquitetura e
posteriormente em nível urbano.
Com relação à restauração do patrimônio arquitetônico, verifica-se que até século XIX “as
intervenções feitas em edifícios preexistentes eram resultado, geralmente, de exigências
práticas e voltadas para sua adaptação às necessidades da época(KÜHL apud BOITO, 2002,
p.15). Este tipo de abordagem em relação ao edificado, observada inicialmente na Grécia e
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Roma antigas, indicou que as intervenções baseadas na recuperação e reutilização dos
elementos originais se justificavam mais por razões funcionais, econômicas e religiosas do que
pela salvaguarda dos valores históricos e artísticos do bem (CRISTINELLI et al, 2003), o que
demonstrou durante este período a inexistência do restauro no sentido moderno do termo
24
.
No que diz respeito à motivação econômica destas intervenções, Fitch (1981, p.17) considera
que, devido aos custos elevados da construção nova, “todo artefato era usado e reutilizado até
o desgaste completo, o qual era adiado por meio de remendos e remodelações”.
Apesar destas adaptações e reconstruções realizadas sobre os edifícios antigos terem
continuado ao longo de toda a Idade Média, Kühl (apud BOITO, 2002, p.15-16) observa que no
período compreendido entre os séculos XV e XVIII ocorreu o amadurecimento de várias noções
relacionadas à restauração, tais como o respeito pela matéria original, a idéia de reversibilidade
e distingüibilidade, a importância da documentação e de uma metodologia científica, o
interesse por aspectos conservativos e de mínima intervenção e a noção de ruptura entre
passado e presente. Segundo Cristinelli et al (2003), foi somente a partir do Renascimento e,
mais especificamente, do período neoclássico que se identificaram as primeiras tentativas de
restauro enquanto prática de preservação
25
, procurando valorizar o monumento não com a
finalidade de melhorar sua função, mas enquanto obra que detém um interesse como
realização artística ou recordação histórica.
A respeito da evolução da restauração como metodologia de intervenção, verificou-se que na
segunda metade do século XVIII ocorreram os primeiros indícios na transição do restauro dito
empírico, do Renascimento, para o restauro considerado científico, fundamentado em bases
conceituais e metodológicas. De acordo com Kühl (apud BOITO, 2002, p.15-16), o restauro
assumiu durante este período “uma conotação fundamentalmente cultural, baseada em
análises sistemáticas, com maior rigor e método nos procedimentos, e com o julgamento
alicerçado no conhecimento histórico e em análise formais”. Apesar destas transformações, foi
apenas no século XIX que se estabeleceram as primeiras teorias sobre a restauração de edifícios
históricos, fundamentadas inicialmente nas doutrinas intervencionistas de Eugéne Emmanuel
24
Viollet-le-Duc (2000, p.30) confirma que “os romanos restituíam, mas não restauravam, e a prova é que o latim
não tem palavra que corresponda à nossa palavra restauração, segundo o significado que a ela damos hoje.
Instaurare, reficere, renovare não querem dizer restaurar, mas restabelecer, reedificar”.
25
O restauro deste período, relacionado à conservação do monumento e caracterizado por uma ausência de
teoria, foi definido como empírico (CRISTINELLI et al, 2003).
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Viollet-le-Duc na França e nas idéias conservadoras de John Ruskin na Inglaterra. Pode-se dizer
que reside na formulação destas teorias o ponto focal sobre o qual se devem analisar todos os
outros conceitos e considerações relativos à intervenção nos monumentos históricos
desenvolvidos a partir do século XIX.
O cerne da questão que caracteriza a divergência entre as duas idéias é justamente o da
pertinência da intervenção para a preservação do monumento. Enquanto Viollet-le-Duc
considerava a “restauração interpretativa” como alternativa necessária para a valorização
estética e funcional do Bem, Ruskin defendia a realização de conservações periódicas como
única forma de assegurar a sobrevivência da obra, desconsiderando qualquer trabalho de
restauração. A este respeito, Carbonara (apud BRANDI, 2004, p.11) considera que a alternativa
conservação / recriação evidente na contraposição de idéias entre Ruskin e Viollet-le-Duc
espelha outra dicotomia mais profunda, representada pela relação historicidade / artisticidade
do objeto da restauração.
Viollet-le-Duc adotava para a realização das intervenções a noção de monumento ideal que não
era necessariamente a do projeto original, mas a adequada a cada caso, e utilizava o método de
reintegração estilística, procurando atingir ou resgatar a unidade de estilo do monumento,
“não importando se, para tanto, tivessem que ser sacrificadas várias fases da passagem da obra
no correr do tempo e feitas substituições maciças” (KÜHL apud BOITO, 2002, p.16-17). Dentre
suas formulações a respeito da restauração destacou a necessidade de “restaurar não apenas a
aparência do edifício, mas também a função portante de sua estrutura” e a importância da
“reutilização para a sobrevivência da obra, pois restaurar não é apenas uma conservação da
matéria, mas de um espírito da qual ela é suporte” (VIOLLET-LE-DUC, 2000, p.23).
Ao contrário de Viollet-le-Duc, Ruskin “preconizava um grande respeito pela matéria original,
pelas marcas da passagem do tempo na obra, aconselhando manutenções periódicas, mas
admitindo a possibilidade de ‘morte’ de uma edificação” (KÜHL apud BOITO, 2002, p.17). Um
dos aspectos mais importantes da doutrina de Ruskin e que justificava a prevalência da
conservação sobre a restauração era a reverência pela idade do edifício. Na visão deste teórico,
o caráter sagrado da produção arquitetônica das gerações passadas residia no fato de terem
resistido às sucessões de eventos históricos e conservarem, como parte de sua essência, as
marcas impressas pela passagem do tempo (CHOAY, 2001, p.154). A partir desse entendimento,
considerava os edifícios dos séculos precedentes como documentos a serem preservados em
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seus aspectos originais e via a arquitetura como “meio de conservar o passado, não em suas
produções materiais e modos de vida, como também em suas virtudes morais” (FONSECA,
1997, p.63).
Analisando a influência destas idéias no campo da restauração, verificou-se que a postura
intervencionista de Viollet-le-Duc prevaleceu sobre os ideais conservadores de Ruskin e se
mostrou mais adequada no sentido da preservação do patrimônio, não apenas por considerar a
necessidade de recuperação dos aspectos estéticos do bem, mas também por indicar a
importância da atualização de seus aspectos funcionais. Apesar de esta teoria ter sido a mais
difundida e aplicada, pode-se afirmar que ambas as doutrinas lançaram as bases conceituais e
metodológicas do restauro como o entendemos atualmente e abriram caminho para a
formulação das diversas diretrizes de intervenção em sítios e edifícios históricos estabelecidas
ao longo dos séculos XIX e XX.
Alguns destes critérios de intervenção haviam sido formulados por Viollet-le-Duc e outros
foram estabelecidos a partir da segunda metade do século XIX por Camilo Boito (1835-1914),
mediador das propostas de Viollet-le-Duc e John Ruskin e pioneiro do restauro filológico
26
,
Gustavo Giovanonni (1873-1947), que definiu e classificou os tipos de restauro
27
e criou alguns
conceitos relativos à reabilitação de edifícios e áreas históricas, Cesari Brandi (1906-1988), que
fez reflexões sobre a influência dos aspectos históricos e artísticos nas restaurações,
fundamentadas nos preceitos do restauro crítico
28
, e diversos outros teóricos e documentos
29
que abordaram a questão da intervenção no patrimônio.
26
O Restauro Filológico correspondeu a uma vertente da restauração identificada na Itália durante o século XIX
que enfatizava o valor documental da obra e classificava as intervenções em categorias, tais como completamento,
liberação, inovação, recomposição, entre outras.
27
De acordo com Lacerda e Lins (1988), Giovannoni classificou os tipos de restauro, de acordo com o trabalho
necessário a ser realizado, em:
a) Restauro de consolidação essencialmente técnico e limitado ao tratamento das lesões após identificação das
causas;
b) Restauro de recomposição ou anastilose recolocação, na posição original, de fragmentos coletados no local
do monumento;
c) Restauro de liberação – retirada dos acréscimos “sem valor”;
d) Restauro de complementação – integração das massas, evitando-se a reconstrução ou a inovação;
e) Restauro de inovação acréscimo de novos volumes segundo nova concepção, somente quando de estrita
necessidade.
28
O Restauro Crítico se opõe às considerações do restauro científico e “parte da afirmação de que toda
intervenção constitui um caso em si, não classificável em categorias [...] nem responde a regras prefixadas ou a
dogmas de qualquer tipo” (CARBONARA, 1997 apud BRANDI, 2004, p.13).
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Violet-le-Duc estabeleceu, ainda na primeira metade do século XIX, alguns conceitos
importantes relacionados à durabilidade, comodidade e adequação de uso que nortearam suas
intervenções em edifícios históricos. Para este teórico, existe uma condição dominante nas
restaurações que é a de “substituir toda parte retirada somente por materiais melhores e por
meios mais eficazes ou mais perfeitos”, a fim de que “o edifício restaurado tenha no futuro, em
conseqüência da operação a qual foi submetido, uma fruição mais longa do que a decorrida”
(VIOLLET-LE-DUC, 2000, p.54). Esta idéia demonstra de forma clara a opinião de Violet-le-Duc a
respeito da influência da intervenção para a durabilidade das obras arquitetônicas, que só
poderia ser alcançada através da utilização de materiais e métodos contemporâneos. Além da
melhoria dos aspectos técnico-construtivos, considerava que “o edifício não deve ser menos
cômodo do que era antes da restauração”
30
, uma vez que toda intervenção destinada a reparar
deficiências deveria contribuir para melhorar o desempenho físico e funcional da edificação.
Em suas reflexões também estabeleceu relações entre o uso proposto nas intervenções e a
conservação das características do edifício histórico, entendendo que “o melhor meio para
conservar um edifício é encontrar para ele uma destinação, é satisfazer tão bem todas as
necessidades que exige esta destinação, que não haja modo de fazer modificações”
31
.
Os critérios definidos por Violet-le-Duc vigoraram absolutos até a década de 1880 quando
então outro teórico, Camilo Boito, reformulou os conceitos precedentes relacionados ao
restauro e criou novos princípios de intervenção em edifícios históricos
32
, estabelecendo
alicerces importantes para a teoria da restauração contemporânea. Entre as diretrizes
estabelecidas por Boito na década de 1880, que ainda servem como parâmetro para as
intervenções contemporâneas realizadas em edifícios históricos, merece destaque a ênfase no
valor documental dos monumentos, a utilização de materiais diversos do original nos
acréscimos, complementações de partes deterioradas e preenchimento de lacunas para coibir
falsificações, a lei da mínima intervenção nas obras de consolidação para evitar a perda ou
29
A partir da década de 1930 foram organizadas pelo International Council of Monuments and Sites (ICOMOS) as
Cartas Patrimoniais, que consistem em recomendações internacionais sobre a preservação e intervenção no
patrimônio arquitetônico e urbanístico baseadas nos conceitos e diretrizes elaborados pelos principais teóricos dos
séculos XIX e XX.
30
Ibid., p.64.
31
Ibid., p.65.
32
Os princípios gerais de intervenção formulados por Camilo Boito foram propostos na conferência Os
Restauradores ocorrida em 1884 em Turim.
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alteração de elementos característicos e o respeito pelas várias fases da edificação, admitindo-
se apenas a eliminação de acréscimos de valor inferior ao do monumento (BOITO, 2002, p.21).
Na primeira metade do século XX destacam-se as atuações de Gustavo Gionannoni e Cesari
Brandi no campo da reabilitação de monumentos históricos e da teoria da restauração,
respectivamente. No que diz respeito à intervenção no patrimônio arquitetônico, Giovannoni
(1998, p.148) considera que é preferível valorizar internamente e restaurar os edifícios
existentes, que acrescentar e unir elementos exteriores novos e reduzir a densidade das
construções e da população, que aumentar o volume das edificações. Com relação aos aspectos
conceituais do restauro, Brandi julga que só se pode falar em restauração se o objeto for
reconhecido como obra de arte e que qualquer intervenção a ser realizada em sua matéria
deve levar em conta os aspectos históricos e artísticos o caracterizam, relegando a segundo
plano a sua funcionalidade. Sobre a aplicação destes conceitos às obras arquitetônicas, Brandi
(2004, p.131-132) entende que a arquitetura deve ser também considerada obra de arte e,
como tal, “goza da dúplice e indivisível natureza de monumento histórico e de obra de arte, e o
restauro arquitetônico recai também sob a instância histórica e a instância estética”. Este
teórico considera ainda que nas intervenções deve-se recorrer a um “juízo de valor” para se
determinar a “prevalência de uma ou de outra instância” e define, como princípios de
intervenção, que a restauração deve ocorrer somente sobre a matéria do objeto e
“deve visar ao restabelecimento da unidade potencial da obra de arte, desde que isso seja
possível sem cometer um falso artístico ou um falso histórico, e sem cancelar nenhum traço da
passagem da obra de arte no tempo”
33
.
Além dos conceitos definidos por teóricos renomados e reconhecidos internacionalmente,
foram pesquisados outros princípios a serem considerados nas intervenções relacionados à
reversibilidade, compatibilidade e autenticidade. De acordo com as Orientações metodológicas
relativas a intervenções de restauro a serem executadas em edifícios históricos, informadas por
Cristinelli et al (2003, p.9), deve-se respeitar sempre os princípios da reversibilidade das
intervenções, dando preferência a utilização de materiais que possam ser substituídos sem
danos ao Bem, e da compatibilidade mecânica, química e física entre os materiais do edifício
original e os que forem adicionados a partir das reformas, para garantir um comportamento
homogêneo da edificação e evitar futuros problemas construtivos. Também a questão da
33
Ibid., p.31-33.
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autenticidade, considerada de forma implícita por Camilo Boito quando considerou a lei da
mínima intervenção e a utilização de materiais diversos do original, consiste num dos princípios
fundamentais para a restauração de edifícios históricos. A este respeito, a Carta de Brasília
34
(1995) define que,
o significado da palavra autenticidade está intimamente ligado a idéia de verdade:
autêntico é o que é verdadeiro, o que é dado como certo, sobre o qual não há dúvidas.
Os edifícios e lugares são objetos materiais, portadores de uma mensagem ou de um
argumento cuja validade, no quadro de um contexto social e cultural determinado e de
sua compreensão e aceitação pela comunidade, os converte em patrimônio.
Poderíamos dizer, com base neste princípio, que nos encontramos diante de um bem
autêntico quando há correspondência entre o objeto material e seu significado.
A fim de preservar a autenticidade artística e histórica do patrimônio arquitetônico nas
intervenções, Campello considera que não deve substituir, sem rigorosa justificativa, os
materiais originais por materiais modernos, mais duráveis, de mais fácil manutenção,
admitindo apenas a “introdução de material novo ou de técnica contemporânea nas partes não
visíveis da construção com o objetivo de racionalizar sua manutenção, garantir sua
estabilidade, melhorar suas condições de conforto ou prolongar a sua vida útil” (CAMPELLO,
1999, p.6-7). Ainda segundo o autor, estas recomendações se aplicariam, sobretudo, aos
edifícios localizados em sítios históricos, onde pode-se permitir uma liberdade maior nas partes
internas e deve-se evitar as alterações na volumetria e tipologia construtiva.
De acordo com Choay (2001, p.171-172), as experiências precursoras e pontuais na forma de
lidar e intervir nos monumentos históricos, baseadas nos conceitos e princípios até aqui
expostos, vigoraram sem grandes alterações durante cerca de um século, entre 1860 e 1960, e
se concentraram na preservação de grandes edifícios religiosos e civis. Durante a segunda
metade do século XX, com as mudanças ocorridas nas políticas de preservação, o
desenvolvimento de novas tecnologias construtivas e a necessidade de atualização funcional
das edificações antigas, verificou-se o aumento do número de intervenções em tipologias
arquitetônicas de menor escala e o surgimento de novos tipos de intervenção que passaram a
abranger, além da restauração, diversas formas de recuperação do patrimônio classificadas
segundo determinadas justificativas, características e níveis de profundidade.
34
Este documento foi elaborado pelos países do Cone Sul com o intuito de discutir a questão da autenticidade do
patrimônio histórico a partir da realidade regional da América Latina.
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Com base na análise realizada sobre os trabalhos de Barrientos e Qualharini (2002), Andrade
Junior (2005) e Claper (2008), que estudam os tipos de intervenção arquitetônica existentes,
constatou-se que quando estas ocorrem em edifícios com valor histórico são empregados com
maior freqüência os conceitos de restauração, reconstrução e reabilitação e, nas ocasiões em
que são realizadas em edifícios comuns, são utilizados os termos requalificação, reconversão,
retrofit, reforma e reciclagem. De acordo com os objetivos desta dissertação, serão verificados
apenas os termos relacionados aos edifícios históricos.
Normalmente, as definições relativas à restauração foram elaboradas por diversos teóricos que
trataram a questão da preservação do patrimônio e encontram-se expressas em algumas Cartas
Patrimoniais. Quanto aos teóricos, Viollet-le-Duc (2000, p.29) foi um dos primeiros a conceituar
a restauração ao considerar que “restaurar um edifício não é mantê-lo, repará-lo ou refazê-lo, é
restabelecê-lo em um estado completo que pode não ter existido nunca em um dado
momento”. Para Brandi (2004, p.30) a restauração constitui “o momento metodológico do
reconhecimento da obra de arte, na sua consistência física e na sua dúplice polaridade estética
e histórica, com vistas à sua transmissão para o futuro”. Na opinião de Campello (1999, p.3)
consiste na “recuperação de valores antigos com expurgo dos elementos superpostos ou
desfiguradores e recomposição das características originais dos componentes arquitetônicos”.
No que diz respeito às Cartas Patrimoniais, destaca-se a definição contida na Carta de Lisboa
(1995) que entende a restauração como um conjunto de ações especializadas que tem por
finalidade resgatar integral ou parcialmente a concepção original de uma construção ou os
momentos mais significativos da sua história”. A partir da verificação destas definições
percebe-se que um traço comum em todas elas que entende a restauração como a
restituição e valorização dos aspectos estéticos e históricos de uma edificação existente,
considerados relevantes para a preservação.
Outro conceito aplicado aos edifícios históricos é a reconstrução, porém esta é aceitável
apenas em casos especiais e deve ser baseada em evidências históricas e documentações
indiscutíveis. De acordo com a Carta de Burra (1980) trata-se do “restabelecimento, com o
máximo de exatidão, de um estado anterior conhecido, distinguindo-se pela introdução na
substância existente de materiais diferentes, sejam novos ou antigos”. A Carta de Lisboa (1995)
considera a reconstrução como “todas as obras realizadas para refazer total ou parcialmente
uma construção existente, no lugar que ela ocupa, conservando os aspectos essenciais do
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traçado original” e Brasil (2005, p.13) a define como “conjunto de ações destinadas a restaurar
uma edificação ou parte dela, que se encontre destruída ou em risco de destruição, mas ainda
não em ruínas”. Com base nestes conceitos entende-se que a reconstrução consiste na
reconstituição das características originais de um bem que tenha sofrido algum tipo de dano.
Outro tipo de intervenção, bastante difundido a partir da década de 1980
35
, é a reabilitação. De
um modo geral, o conceito de reabilitação está relacionado às idéias de utilidade e função e
varia de acordo com o grau de importância histórica da edificação. No sentido de edifícios
comuns, o conceito corresponde ao termo britânico refurbishment que pode ser definido,
segundo o Royal Institution of Chartered Surveyors, como a “reparação, renovação e
modificação extensas de um edifício para colocá-lo de acordo com os critérios econômicos ou
funcionais equivalentes aos exigidos a um edifício novo para o mesmo fim” (MANSFIELD, 2001).
No que diz respeito à intervenção em edifícios com valor patrimonial, o conceito corresponde
ao termo americano rehabilitation e é entendido, segundo o Secretary of Interior’s Standards
for Rehabilitation, como
o ato ou processo de possibilitar um uso eficiente e compatível de uma propriedade
através de reparações, alterações e acréscimos, preservando, ao mesmo tempo, as
partes ou características que transmitem os seus valores histórico, cultural e
arquitetônico (MORTON et al, 1997).
Outras definições foram indicadas pela Carta de Lisboa (1995), que considera a reabilitação
como “ações que visam à recuperação e reintegração física de uma construção, uma vez
resolvidas todas as deficiências construtivas, funcionais, de higiene e segurança acumuladas ao
longo dos anos, e buscam uma modernização para melhorar o desempenho de suas funções”, e
por Roders (2007, p.170-175 apud CLAPER, 2008, p.58-59), que a conceitua como intervenções
que abrangem a conservação, retirada e/ou adição de materiais, componentes e sistemas em
edifícios existentes, mantendo o uso original (reuso) ou destinando-lhes uma nova função
(conversão). Nesse sentido, o reuso é considerado uma abordagem passiva da reabilitação e
consiste na melhoria do desempenho dos sistemas pré-existentes. a conversão é uma
abordagem ativa da reabilitação e implica diversas mudanças que dependem das condições
físico-funcionais do edifício, do seu valor enquanto patrimônio e dos objetivos da nova função.
35
Segundo Barrientos e Qualharini (2002), foi a partir do final da década de 1980 que as construtoras passaram a
ter interesse pelo setor da reabilitação de edifícios, apresentando atualmente, em alguns países europeus, uma
participação de cerca de 50% no total de negócios da construção civil.
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De acordo com Garcia (1992 apud ANDRADE JÚNIOR, 2005), entre os níveis de intervenção
adotados na reabilitação estão as modificações internas em edificações existentes, que
abrangem desde a atualização dos edifícios antigos às novas exigências da legislação (instalação
de escadas, rampas, elevadores, sistema de combate à incêndio, etc.) até a adaptação destes a
novos usos. Nas modificações para atualização funcional o uso vigente do edifício histórico é
mantido, porém o realizadas alterações visando atender a novas demandas que muitas vezes
modificam de forma radical a espacialidade da edificação. Alguns dos mais recorrentes modelos
de atualização funcional na arquitetura contemporânea estão ligados à atualização dos edifícios
culturais, particularmente teatros e museus, tendo como exemplos as intervenções realizadas a
partir da década de 1950 por Carlo Scarpa no Museu de Castelvecchio em Verona (1956-67) e
na Fundação Querini-Stampalia em Veneza (1961-63).
Baseado nestes conceitos e características conclui-se que a reabilitação arquitetônica consiste
em procedimentos adotados para a melhoria do desempenho funcional da edificação, através
da atualização das instalações, dos equipamentos e da organização espacial para torná-la apta
à reutilização nos moldes contemporâneos. Cabe observar que este termo também se aplica às
intervenções urbanísticas significando, neste sentido, o conjunto de intervenções realizadas em
infra-estrutura urbana existente para adaptá-la a novas necessidades, abrangendo a
preservação da identidade e das características do ambiente construído, a melhoria das
condições físicas e funcionais do parque edificado, a criação / recuperação de equipamentos
comunitários e espaços públicos e a elevação da qualidade de vida da população residente
(CARTA DE LISBOA, 1995; MARICATO, 2001, p.126). Pode-se dizer que a reabilitação urbana foi
abordada de forma pioneira por Gustavo Gionannoni no início do século XX ao tratar da
questão da preservação de centros históricos.
Giovannoni foi um dos primeiros teóricos a considerar a necessidade de proteção do
“patrimônio urbano” para além dos monumentos arquitetônicos e procurou conciliar, nas
proposições relativas ao planejamento urbano, a preservação da cidade antiga e o
desenvolvimento da cidade moderna. Partindo do princípio que “os conjuntos contextuais
característicos trazem a marca dos séculos em seu traçado e sua arquitetura” e “as questões
relativas ao passado têm como objeto, de um lado, sua conservação e, do outro, sua adaptação
a uma nova função vital” (GIOVANNONI, 1998, p.93), este autor propôs para a recuperação dos
sítios históricos um procedimento intervencionista baseado na adequação dos tecidos antigos à
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vida contemporânea, evitando a descaracterização das estruturas remanescentes e
melhorando as condições de conforto, transporte e ocupação. Nesse sentido, estabeleceu que
as intervenções sobre o centro antigo deveriam se limitar a “um pequeno número de
adaptações, a complementos arquitetônicos modestos e respeitosos do contexto”, uma vez
que “a transformação radical dos bairros antigos é incompatível com sua qualidade estética”
(GIOVANNONI, 1998, p.112-113). Entre as diretrizes sugeridas por Giovannoni para preservação
destes núcleos históricos estão o afastamento do tráfego intenso através da utilização de meios
de comunicação subterrâneos e da criação de circuitos periféricos, o deslocamento do centro
de negócios para outras regiões a partir da criação de subcentros e a redução da densidade
populacional.
Além destes critérios de preservação, Giovannoni criou importantes conceitos que
fundamentaram suas propostas a cerca da reabilitação de áreas históricas tais como o
contextualismo, o desdobramento, o enxerto e o clareamento. Com base no contextualismo,
Giovannoni defende a preservação da ambiência dos núcleos históricos, minimizando a
inserção de elementos novos, e nega a autonomia dos edifícios singulares, fazendo do
quarteirão a unidade arquitetônica mínima
36
. Por meio do desdobramento, propõe a separação
e coexistência das duas formações urbanas distintas (antiga e moderna) através da dissociação
das redes de circulação maior (regional) e menor (local), com o intuito de preservar o caráter
físico e as condições de vida próprias do centro antigo e permitir simultaneamente o
desenvolvimento da cidade moderna
37
. No que diz respeito ao enxerto, sugere a inserção de
novos edifícios ou bairros na periferia do centro antigo, interligados a este através dos meios de
comunicação muito rápidos, onde se desenvolveria a cidade moderna sobre estrutura urbana
ou rural pré-existente. Por fim, com relação ao clareamento, propõe a demolição de algumas
edificações ou grupos de casas para criar áreas livres nos bairros antigos, possibilitando o
aumento do número de espaços públicos, jardins e a aeração das quadras
38
.
Apesar destes conceitos de intervenção em áreas históricas terem sido formulados no início do
século XX, as primeiras propostas para a requalificação de centros urbanos foram
implementadas apenas nas décadas de 1950 e 1960 e baseavam-se no conceito de renovação
36
Ibid., p.6.
37
Ibid., p.171-172.
38
Ibid., p.5.
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urbana
39
, seguindo a lógica modernista de demolição e reconstrução (CASTILHO e VARGAS,
2006, p.7). A partir de meados da década de 1970 teve início um segundo momento nas
práticas de intervenção que passaram a associar a recuperação e desenvolvimento urbano à
preservação do patrimônio histórico e cultural remanescente, seguindo alguns dos preceitos
elaborados por Giovannoni e outros expressos na Carta de Veneza (1964). Este período,
caracterizado pela preservação urbana e ocorrido entre as décadas de 1970 e 1990, surgiu
como oposição ao movimento anterior de renovação, norteado pelos ideais do Modernismo, e
reforçou a “importância da preservação das vizinhanças e a restauração histórica de edifícios
considerados significativos como os novos símbolos de status e distinção”
40
. Durante esta fase
identificou-se um maior envolvimento da sociedade, dos gestores públicos e da iniciativa
privada na defesa do patrimônio histórico que passou a ser considerado como elemento de
resgate da identidade e cidadania. Entre as estratégias implementadas para a preservação de
edifícios e centros históricos neste período destacam-se a elaboração de leis e recomendações
internacionais, tais como a Carta de Washington em 1986 para a salvaguarda de monumentos e
sítios históricos, e a criação de diversas agências de proteção. Apesar da mobilização em prol da
preservação do conjunto edificado, estas ações “resultaram em intervenções isoladas, dirigidas
à restauração de edifícios históricos, sem a devida consideração do entorno urbano”
41
.
No caso brasileiro, o processo de recuperação de áreas centrais históricas teve início a partir da
criação da Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e da Fundação Pró-memória
em 1979
42
. Na década de 1980 ocorreram as primeiras intervenções de reabilitação em centros
históricos realizadas pelo Banco Nacional da Habitação (BNH), que financiou as obras de infra-
estrutura urbana no Pelourinho e patrocinou o projeto piloto para recuperação de imóveis de
uso habitacional em Olinda. Ainda nesta década foi elaborada a Carta de Petrópolis, em 1987,
que estabeleceu premissas para a preservação de sítios históricos urbanos. Com relação aos
programas desenvolvidos a nível nacional, destacam-se a criação do Programa Monumenta
pelo Ministério da Cultura e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em 1999, o
39
De acordo com a Carta de Lisboa (1995), a renovação urbana é uma intervenção que implica a demolição de
estruturas existentes em áreas degradadas, que não apresentem valor enquanto patrimônio arquitetônico ou
conjunto urbano a ser preservado, e sua conseqüente substituição por novos usos e edificações caracterizadas por
tipologias arquitetônicas contemporâneas.
40
Ibid., p.16.
41
Ibid., p.17.
42
Ibid., p.25.
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Programa de Revitalização de Sítios Históricos (PRSH), lançado pela Caixa Econômica Federal
em 2000, e o Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, elaborado pelo Ministério
das Cidades em 2003. Muitos dos programas realizados a nível federal, estadual e municipal
contam com a parceria do Sítio Internacional sobre La Revitalizacion de Centros Historicos de
Ciudades de America Latina y del Caribe (SIRCHAL) que consiste numa rede para a reabilitação
de centros históricos de países latino-americanos patrocinada pelo Governo francês, o BID a
UNESCO, entre outras. A metodologia Ateliê SIRCHAL, que compreende estudos de viabilidade,
técnicas de reabilitação, locação social, intervenções em perímetros de atuação integrada,
implantação de escritórios técnicos, entre outros, tem sido adotada como um dos instrumentos
de reabilitação urbana no Brasil (CAIXA, 2006).
No Rio de Janeiro, a primeira proposta de intervenção em conjuntos históricos ocorreu em
1979 com o Projeto Corredor Cultural, que tinha como objetivo a recuperação e preservação do
acervo patrimonial localizado em áreas históricas do centro da cidade através da concessão de
incentivos fiscais e do favorecimento aos usos comercial e cultural
43
. A partir desta experiência
foram definidas, em nível municipal, as áreas de interesse patrimonial sujeitas à proteção e
intervenção do Poder Público e desenvolvidos diversos Programas de reabilitação urbano-
arquitetônica para os bairros da área central.
Programas e Projetos na área central
Com relação às regulamentações legais referentes à preservação e reabilitação de sítios
históricos, o Plano Diretor Decenal da Cidade do Rio de Janeiro estabeleceu em seus capítulos
IV e V as áreas sujeitas à intervenção municipal e as diretrizes de uso e ocupação por Áreas de
Planejamento. De acordo com o artigo 57 do Plano, estas regiões estão sujeitas a alguns tipos
específicos de intervenção que incluem a reestruturação e a proteção ambiental.
As áreas sujeitas à reestruturação são aquelas que necessitam de “revitalização, de renovação,
de ocupação, de obras ou alterações em sua estrutura física, sistema viário, saneamento básico
e equipamentos urbanos ou alterações nas condições de uso e ocupação do solo” (PREFEITURA,
43
Duas inovações implementadas a partir do Projeto Corredor Cultural foram a utilização do “instrumento do
zoneamento em substituição ao modelo clássico do tombamento, praticado no Brasil desde 1937 até aquela
época, para garantir juridicamente a preservação do patrimônio histórico e cultural” (PINHEIRO, 2004, p.74) e a
criação da lei de incentivos fiscais, regulamentada pelo Decreto 6.403 de 1986, que isenta o proprietário do
pagamento do IPTU nos casos em que realiza obras de reforma no imóvel.
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1993, p.31). Na Área de Planejamento 1 (AP1)
44
, as regiões sujeitas à reestruturação estão
delimitadas pelos bairros da Zona Portuária (Saúde, Santo Cristo e Gamboa, exceto a APA
regulamentada pelo Decreto 7351/88) e do Caju.
As áreas sujeitas à proteção ambiental necessitam de “proteção legal e de manutenção,
recuperação ou revitalização nas condições do meio ambiente natural ou construído”
45
. Entre
as áreas sujeitas à proteção na AP1 estão o Morro da Conceição e as áreas da Zona Especial do
Corredor Cultural do Centro da Cidade e do Projeto SAGAS. Quanto ao uso e ocupação da Área
de Planejamento 1, foram definidos como diretrizes
46
:
I – incentivos ao uso residencial permanente e transitório;
III desenvolvimento das propostas de proteção das áreas da Saúde-Gamboa-Santo
Cristo, de Santa Teresa e de Catumbi;
V – adensamento dos bairros periféricos à Área Central de Negócios, com manutenção
de suas características ambientais, econômicas e sociais;
VII revitalização da área portuária, como expansão do Centro, garantidas a
manutenção e modernização das atividades necessárias ao Porto do Rio de Janeiro;
XIII incentivo à localização de usos e atividades residenciais, comerciais e de serviços
ligados ao lazer e à cultura, para melhor utilização da infra-estrutura nos horários de
ociosidade;
XVII valorização e conservação das edificações e dos conjuntos arquitetônicos de
interesse cultural e paisagístico da área.
A partir da definição destas diretrizes e da delimitação das áreas históricas sujeitas à
intervenção verificou-se importantes mudanças na legislação municipal que passou a
incorporar, nas premissas de reabilitação da área central, o incentivo à habitação e à
preservação do patrimônio arquitetônico e ambiental. Com base nesta transformação a
Prefeitura tem desenvolvido desde a década de 1990 diversos programas de reabilitação
urbana, que visam à melhoria da infra-estrutura e a recuperação física destas ambiências, e
alguns programas de reabilitação arquitetônica, que se restringem a intervenções pontuais em
imóveis localizados nessas regiões. Entre os programas urbanos que conciliam a questão da
habitação e da preservação do patrimônio estão o SAs, o Porto do Rio e o PRO-Rio Morro da
Conceição. Com relação aos programas arquitetônicos destacam-se o Novas Alternativas, o
Morar no Centro e o ReHabCentro.
44
De acordo com Prefeitura (1993, p.97), a AP1 abrange os bairros da Saúde, Gamboa, Santo Cristo, Cajú, Centro,
Catumbi, Rio Comprido, Estácio, Cidade Nova, São Cristóvão, Mangueira, Benfica, Paquetá e Santa Teresa.
45
Ibid., p.31.
46
Ibid., p.32, grifo nosso.
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Programas de reabilitação urbana
Projeto SAs
Trata-se de uma proposta elaborada pela Superintendência de Planos Locais (SPL) e pela
Coordenação de Planejamento da Secretaria Municipal de Urbanismo no final de 1994 que
consiste na revitalização social, econômica e cultural do corredor viário formado pelas ruas
Estácio de Sá, Salvador de Sá, Mem de Sá e adjacências
47
. As intervenções previstas pelo
Projeto visam à requalificação dos espaços públicos e privados de cerca de trinta e seis quadras
nas regiões da Cidade Nova, Catumbi, Estácio e Centro e compreendem a revisão do sistema
viário, a recuperação de residências deterioradas, a produção de moradias populares, a
preservação de edifícios históricos
48
, a revisão da legislação urbanística e a realização de
programas de geração de renda e regularização fundiária. Sua implementação foi dividida em
duas fases, sendo que a primeira teve início em janeiro de 1995 e abrangeu o trecho do bairro
da Cidade Nova compreendido entre o Teleporto e o Sambódromo
49
. De acordo com os
objetivos do Programa, a escolha desta área como setor de intervenção prioritário se justificou
pela “proximidade com o Teleporto, os terrenos vazios junto à Avenida Presidente Vargas, a
deterioração do casario da APAC da Cidade Nova, o potencial da área quanto à acessibilidade e
a proximidade com o Centro do Rio entre outros motivos”. (PROJETO SA’s, 1998, p.15).
Fig.II.22 Maquete de intervenção do Projeto SAs. PROJETO SAs, 1998.
47
A elaboração do Projeto contou também com a consultoria do professor e arquiteto português Nuno Portas.
48
Entre as intervenções previstas em edificações históricas merece destaque a recuperação da Vila Operária na
avenida Salvador de Sá, construída pela Prefeitura no início do século XX.
49
A partir de 1996, o desenvolvimento do Projeto SAs foi incorporado ao Projeto de Estruturação Urbana (PEU) do
Rio Comprido.
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Plano Porto do Rio
Trata-se de um Plano elaborado pela Prefeitura no final da década de 1990 para promover a
recuperação e revitalização urbano-arquitetônica dos bairros da Zona Portuária do Rio de
Janeiro. Com base neste objetivo foram propostos pelo Plano o incremento da função
residencial na região, com a ocupação de terrenos vazios e reforma de edifícios históricos para
fins habitacionais, a reestruturação do sistema viário, a requalificação dos espaços públicos, o
estabelecimento de parcerias públicas e privadas, a revisão da legislação urbanística e o
desenvolvimento de programas de geração de emprego e renda (BRASIL, 2005, p.28;
PREFEITURA, 2008). A partir de 2004 a implementação destas intervenções passou a contar
com a colaboração do Grupo de Trabalho Interministerial, criado pelo Governo Federal em
2004, cujo objetivo é
avaliar as propostas da Prefeitura do Rio de Janeiro para a reabilitação da área
portuária do Porto do Rio de Janeiro, especialmente envolvendo imóveis e recursos
próprios da União para definir em que intervenções o Governo Federal poderia realizar
parcerias e quais instrumentos poderiam ser utilizados ou criados para acompanhar e
implementar as ações programadas (BRASIL, 2005, p.30).
As atividades deste Grupo tiveram início a partir da criação de quatro subgrupos de trabalho:
Habitação, Transportes, Urbanismo e Arranjo Institucional e Projetos Específicos. Entre as
atribuições do Subgrupo Habitação, coordenado pelo Ministério das Cidades, destacam-se a
avaliação das propostas do Instituto Pereira Passos relativas ao incentivo do uso residencial na
região, a análise dos projetos desenvolvidos pela Secretaria Municipal de Habitação e a
definição dos procedimentos necessários à alienação de imóveis da União ou de órgãos da
Administração Pública Federal para fins habitacionais
50
.
Devido aos resultados alcançados pelo Grupo de Trabalho, foi firmado em 2006 um Acordo de
Cooperação Técnica entre os Ministérios das Cidades, da Cultura, dos Transportes e do
Planejamento, Orçamento e Gestão, a Prefeitura, a Companhia das Docas do Rio de Janeiro, o
BNDES e a CAIXA. Até o momento está programada, no âmbito do Plano Porto do Rio, a
realização de cinqüenta e sete empreendimentos habitacionais em edifícios e terrenos do INSS,
SPU, INCRA e RFFSA, sendo que nove destes imóveis da União e um do INSS foram
disponibilizados para o Programa de Arrendamento Residencial (PAR).
50
Ibid., p.31.
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Fig.II.23 Áreas de intervenção do Plano Porto do Rio. www.rio.rj.gov.br, 2008.
Programa de Recuperação Orientada (proRIO) - Morro da Conceição
Através do Decreto 17.109 de 1998 foi criado o Programa de Recuperação Orientada
(proRIO) que escolheu o morro da Conceição para a realização do projeto piloto
51
. Trata-se de
uma proposta de intervenção em áreas históricas que apresenta como principais diretrizes a
recuperação do patrimônio urbanístico, arquitetônico e paisagístico existente na região, a
requalificação dos espaços públicos degradados e a reabilitação do parque habitacional
obsoleto. Entre as ações previstas pelo Programa estão a revisão da legislação urbanística e de
preservação do patrimônio, o desenvolvimento de projetos de educação patrimonial, a
capacitação da mão-de-obra local e o aproveitamento do potencial turístico do morro. Devido à
complexidade e extensão destas atividades, o Programa foi dividido em duas etapas: pré-
operacional e operacional.
A etapa pré-operacional compreendeu os levantamentos topográficos, identificação dos
projetos em andamento na AP1 (Morro da Conceição, Pier Mauá, Gamboa, Frente Marítima,
SAs, Teleporto, RIO MAR e Praça Tiradentes), pesquisas sobre os principais Planos Urbanísticos
incidentes na Área Portuária (Reforma Pereira Passos, Plano Agache, Plano Doxiadis, PUB RIO e
51
A fim de auxiliar o desenvolvimento do Programa foi firmado em 1998 um acordo de cooperação técnica entre a
Prefeitura e o governo francês no qual participaram técnicos e especialistas em patrimônio e reabilitação (PINHO e
SIGAUD, 2000, p.14).
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Plano Diretor), identificação da legislação vigente (Portaria 002 do IPHAN, Resolução Estadual
23 e Decreto 7531/88 - SAGAS), reconhecimento dos bens de valor histórico (Fortaleza da
Conceição, Palácio Episcopal, Igreja de São Francisco da Prainha, Conjunto Arquitetônico e
Paisagístico do Jardim e do Morro do Valongo e a Pedra do Sal), mapeamento geológico-
geotécnico, análise dos serviços públicos (abastecimento de água, esgotamento sanitário,
sistema de drenagem, gás, iluminação e coleta de lixo), pesquisas ambientais (arquitetônica,
socioeconômica, fundiária, imobiliária e arqueológica) e caracterização da área (uso e ocupação
do solo, relações com a cidade, planos visuais, elementos da paisagem, vias públicas, perfis das
vias, organização comunitária, ocupação e evolução urbana) (PINHO e SIGAUD, 2000, p.29-65).
Alguns dados importantes levantados por estas pesquisas merecem destaque. Com relação à
situação socioeconômica, foi verificado que em 2000 havia no morro trezentas e oitenta
edificações residenciais, sendo duzentas e quarenta e nove unifamiliares e cento e trinta e uma
multifamiliares. Também foram computados neste censo mil e cinqüenta e três domicílios, dos
quais trezentos e cinqüenta e sete eram apartamentos em prédios com mais de vinte unidades
localizados na base do morro. Os domicílios ocupados abrigavam cerca de dois mil habitantes,
incluindo moradores antigos, em grande parte descendentes de portugueses e espanhóis, e
moradores recentes, em sua maioria migrantes nordestinos. Além destes dados, foram
identificados na etapa pré-operacional alguns problemas relacionados ao acelerado processo
de degradação física e social da região e à complexa situação fundiária que dificulta a
implementação de projetos habitacionais
52
.
A etapa operacional correspondeu ao desenvolvimento de propostas setoriais, incluindo
projetos de interesse patrimonial, de ambiência urbana e paisagística, especiais e
habitacionais. No que diz respeito às propostas habitacionais, foram estabelecidos parâmetros
para ocupação de terrenos vazios, adequação e revisão da legislação, regularização fundiária e
operações de reabilitação em edifícios existentes. Com base nestas diretrizes ficou definido que
as novas unidades habitacionais, construídas em lotes vazios, deveriam ser dimensionadas de
acordo com a renda dos moradores e ter de um a três quartos. Nesse sentido, também foi
decidido que a prioridade na aquisição destas unidades seria dada às famílias residentes no
local, a fim de conter o aumento da população do morro. Além da definição dos parâmetros de
52
De acordo com Pinho e Sigaud (2000, p.46-47), os três principais proprietários do morro em 2000 eram o
Exército, a Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Ordem Terceira da Penitência de São Francisco da Prainha.
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intervenção, foram encontradas nesta etapa algumas dificuldades na implementação das
propostas habitacionais relativas às restrições legais (gabaritos máximos, exigências quanto ao
parcelamento e taxa de ocupação), aos entraves administrativos impostos para o licenciamento
e à ausência de linhas de financiamento destinadas aos proprietários para reforma dos imóveis.
O Programa teve duração de três anos, com início em 1998 e término em 2000. Das diretrizes e
propostas de intervenção elaboradas, poucas foram realmente implementadas. Quanto aos
projetos urbanos, conduzidos pelo Instituto Pereira Passos, foram executadas apenas algumas
obras no calçamento das ruas e nas redes de instalação. A respeito dos projetos habitacionais,
realizados pelo Programa Novas Alternativas, foi construído e comercializado somente um
empreendimento na Ladeira João Homem em 2005. Segundo informações das arquitetas Gisele
Masullo e Sônia Martins, foram licenciados recentemente mais dois projetos para os terrenos
da Ladeira João Homem 41 e 66 que ainda aguardam a contratação das obras.
Programas de reabilitação arquitetônica
Programa Novas Alternativas
[...] a experiência desenvolvida pela Prefeitura, através do Programa Novas
Alternativas da Secretaria Municipal de Habitação, oferece exemplos de oportunidades
para o incremento do uso habitacional no Centro, através da recuperação de sobrados
e casarões mal-conservados e em ruínas, e da ocupação de vazios resultantes de
demolição e desabamento de edificações, propondo sua adaptação para uso
habitacional nos moldes atuais. Com estes projetos estão sendo lançados os
fundamentos de um importante instrumento na reabilitação urbana das áreas
preservadas da cidade, onde a Prefeitura, como agente promotor e a Caixa Econômica
Federal, como agente financeiro, associados à iniciativa privada, terão papel
estratégico. (PREFEITURA, 2003, p.6)
O Programa Novas Alternativas, como informa a epígrafe acima, faz parte da política
habitacional definida pela Prefeitura do Rio de Janeiro em 1994 e desenvolve propostas
habitacionais para áreas históricas do centro da cidade baseadas na reabilitação de antigos
sobrados deteriorados, subutilizados ou abandonados, na recuperação de ruínas e na
construção nova em lotes vazios. Entre os objetivos que nortearam as primeiras ações do
Programa destacam-se a renovação de áreas centrais degradadas, a melhoria das condições de
moradia da população local, a redução do ficit habitacional para famílias de baixa renda e a
preservação do patrimônio arquitetônico.
Além da reabilitação de imóveis no Centro, que engloba a recuperação de cortiços, ruínas e da
Vila Operária Pereira Passos, na avenida Salvador de , suas atividades compreendem a
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ação do Centro do
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elaboração de propostas habitacionais para o Morro da Conceição e o bairro de São Cristóvão,
o projeto Vila Carioca e intervenções em áreas residuais de conjuntos habitacionais. Ao
momento foram concluídos dez empreendimentos na área central, totalizando cento e
dezenove unidades residenciais e onze lojas. Segundo informações coletadas na gerência do
Programa, existe a previsão de mais sessenta e quatro empreendimentos com mil novecentas e
oitenta e quatro unidades residenciais e trinta e seis lojas (Tabela 9).
EMPREENDIMENTOS DO PROGRAMA NOVAS ALTERNATIVAS
Natureza do
empreendimento
Qtde
Localização
Nº de
unidades
de
lojas
Posse /
Propriedade
Imóveis
com
dívida
IPTU
Concluídos 10
2 – Centro
1 – Saúde
2 – Lapa
1 – S. Teresa
1 – Cruz Vermelha
2 – Gamboa
1 – Morro Conceição
119 11
8 – CAIXA
2 – Prefeitura
-
Contratados para
obras
4 4 – Gamboa 52 3 Prefeitura -
A contratar 11
3 – Centro
2 – Estácio
2 – Gamboa
4 – Morro Conceição
127 9 Prefeitura -
Em
desapropriação
32
13 – Gamboa
2 – Morro Conceição
3 – Cidade Nova
6 – Cruz Vermelha
4 – Centro
1 – Saúde
3 – Lapa
541 24 Particular 21
Negociação com
a União
5
4 – Gamboa
1 – Cidade Nova
143 - União 2
Parceria com a
iniciativa privada
12
4 – Gamboa
1 – Rio Comprido
5 – São Cristóvão
1 – Central
1 – Santa Teresa
1.121 - Particular 5
Tabela 9 – Empreendimentos realizados e propostos pelo Programa Novas Alternativas. Elaboração do autor a
partir de PREFEITURA, 2008.
De acordo com a tabela, metade dos imóveis contemplados está em fase de desapropriação,
sendo de propriedade particular, e grande parte deles apresenta dívidas de IPTU. A maioria dos
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
90
imóveis selecionados para as intervenções se localiza em APACs, principalmente nos bairros do
Centro, Saúde, Gamboa, Cidade Nova, Estácio, Lapa e Santa Teresa, no Morro da Conceição e
na região da Cruz Vermelha. Destes bairros, a Gamboa é o que compreende o maior número de
propostas.
Para a realização destes empreendimentos o Novas Alternativas conta com a parceria da Caixa
Econômica Federal que, através de algumas linhas de financiamento, viabiliza a execução das
obras e a posterior locação dos imóveis. Entre as diversas modalidades de crédito oferecidas
merece destaque o Programa de Arrendamento Residencial (PAR) que consiste numa forma de
aluguel com a opção de compra da unidade no final do contrato, destinado a famílias com
renda entre três e seis salários mínimos. A CAIXA disponibiliza, para a realização de obras
financiadas pelo PAR, R$ 20.000,00 por unidade habitacional e define alguns parâmetros de
projeto, tais como área mínima útil de 37m², tipologia mínima de sala, dois quartos, cozinha e
banheiro e limite máximo de quinhentas unidades por empreendimento.
Outra iniciativa da Caixa Econômica Federal foi o lançamento do Programa de Revitalização de
Sítios Históricos (PRSH) em dezembro de 2000, com o intuito de viabilizar as operações de
reabilitação de edifícios históricos, disponíveis nos centros urbanos, para fins residenciais. A
partir do PRSH a CAIXA criou o PAR em sítios históricos, destinado ao financiamento das
unidades produzidas em imóveis de valor patrimonial. Como nestes casos se trata de
reabilitação de edifícios antigos e não de construção nova, as regras para o financiamento são
mais flexíveis no que diz respeito às tipologias habitacionais e ao repasse financeiro que atinge
R$ 40.000,00 por unidade. Segundo informações do arquiteto Nazih Heloui, gerente do
Programa Novas Alternativas, o primeiro imóvel financiado pelo PAR em sítios históricos do
Brasil foi o cortiço da rua Senador Pompeu 34.
Ainda de acordo com Heloui (2007), a parceria firmada entre a Prefeitura e a CAIXA se justificou
pela diminuição do aporte financeiro destinado ao Novas Alternativas após mudanças na
gestão político-administrativa do município em 2000. A partir desta parceria verificou-se a
reorientação dos objetivos iniciais do Programa e da própria política habitacional desenvolvida
para a área central. A incorporação de novas linhas de financiamento ao processo de
construção e reabilitação de edifícios influenciou significativamente a tipologia da unidade
habitacional produzida, o público atendido até então e a própria gestão dos imóveis, conforme
demonstra o Quadro 1.
H
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
91
REORIENTAÇÃO DOS OBJETIVOS DO PROGRAMA
Características
Objetivos iniciais do
Programa Novas Alternativas
Mudanças após a parceria
com a CAIXA
Tipos de intervenção
Reabilitação
Restauração fachadas
Construção nova
Restauração de fachadas
Construção nova
Tipo de imóvel
Sobrados e Cortiços
Ruínas
Terrenos vazios
Ruínas
Terrenos vazios
Tipo da unidade residencial
Quartos/cômodos
Bhos e lavanderia coletivos
Apartamentos com sala, um
ou dois quartos, cozinha,
banheiro e área de serviço
Perfil do morador
Pessoas solteiras
Casais sem filho
Pessoas solteiras
Casais sem filho
Famílias
Público atendido População residente Novos moradores
Faixa de renda Até 3 salários mínimos Acima de 3 salários mínimos
Forma de pagamento Locação social
Arrendamentos com opção
de compra da unidade (PAR)
Financiamento das obras Subsídios da Prefeitura
Financiamento da CAIXA
Subsídios da Prefeitura
Gestão do imóvel ONG Espiral
CAIXA
Administradora
Quadro 1 – Reorientação dos objetivos da Programa Novas Alternativas. Elaboração do autor a partir de
PREFEITURA, 2003; HELOUI, 2007.
Comparando-se as duas fases do Programa percebe-se que a intervenção do tipo reabilitação
foi excluída das propostas habitacionais, o que demonstra a opção pela construção nova em
detrimento das edificações existentes. Os efeitos desta mudança são positivos quanto ao
repovoamento do centro e à diminuição do número de terrenos ociosos ou subutilizados,
entretanto, não atuam na solução dos problemas relativos à degradação do parque edificado e
às condições de moradia da população residente, de suma importância para o processo de
reabilitação urbana. Neste caso, os cortiços e sobrados deteriorados que foram contemplados
inicialmente Programa também deixaram de ser atendidos.
Nas primeiras intervenções realizadas, a tipologia da unidade produzida para o perfil do
morador do Centro e adequada aos recursos municipais disponíveis se assemelhava às
habitações coletivas do século XIX, caracterizada por pequenos quartos com banheiros e
lavanderias coletivas, porém adaptadas às mínimas condições de conforto das habitações
modernas. De acordo com Prefeitura (2003), “o cortiço e a casa de cômodos, a vila de fundos
com sobrado na frente do lote, o pequeno edifício de apartamentos e o casarão unifamiliar,
H
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
92
indicaram o caminho das propostas, tanto no dimensionamento das unidades quanto nas
soluções espaciais”. Devido às exigências da CAIXA para a concessão do financiamento, os
imóveis produzidos pelo Novas Alternativas passaram a ter áreas entre 20m² e 45m², valores
entre R$ 25.000,00 e R$ 60.000,00 e a ser estruturados com sala, um ou dois quartos, banheiro,
cozinha e área de serviço, diferentemente das unidades produzidas originalmente. Com base
nestas determinações, a (re)produção da tipologia cortiço foi extinta das ações do Programa.
Segundo Heloui (2007), foi a partir da reabilitação do cortiço da rua Senador Pompeu 34 que
ocorreu a extinção do banheiro coletivo e a incorporação do mesmo à unidade habitacional.
Também foram verificadas mudanças significativas na escolha do público atendido pelas
propostas. O público inicial, identificado como o perfil do morador do centro, eram casais sem
filhos, idosos e estudantes universitários com rendas até 3 salários mínimos. Devido ao
aumento nas dimensões e no custo final das unidades, o Programa passou a atender apenas
famílias com renda acima de 3 salários mínimos. De acordo com Heloui (2007), na transição da
gestão municipal “constatou-se um paradigma entre o objetivo inicial do Programa de atender
ao morador do centro e a pressão por moradia para suprir o déficit habitacional, sendo que a
necessidade de suprir essa demanda acabou assumindo total importância”. Neste caso, as
mudanças ocorridas quanto à escolha dos usuários indicaram a preferência pela atração de
novos moradores para o centro em detrimento da melhoria da qualidade de vida daqueles que
residem atualmente nesta região.
Com relação ao pagamento das unidades, a orientação inicial privilegiava a locação social para
famílias de baixa renda. Com a mudança do público alvo, as novas linhas de financiamento
passaram a incentivar o arrendamento com a opção de compra da unidade no final do
contrato, atualmente de quinze anos. Os empreendimentos que antes eram construídos com
subsídios da Prefeitura contam atualmente com recursos da CAIXA, que financia a maior parte
das obras. Estas alterações na estrutura financeira do Programa tiveram importantes reflexos
na forma de gestão dos imóveis, antes realizada por uma ONG e hoje feita por administradoras
contratadas pela CAIXA.
A partir das transformações sofridas pelo Programa verificou-se também a definição mais
precisa das atribuições dos principais agentes envolvidos no processo de reabilitação e
manutenção dos edifícios, incluindo os promotores (Prefeitura, CAIXA e construtoras) e os
gestores (moradores, CAIXA e administradoras), como se observa no Quadro 2.
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ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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ATRIBUIÇÕES DOS AGENTES PROMOTORES E GESTORES
FASES AGENTES ATRIBUIÇÕES
Reabilitação / Construção nova
Prefeitura
Secretaria Municipal de
Habitação (SMH)
Seleção dos imóveis
Realização e custeio das
desapropriações
Cadastro dos futuros moradores
Desenvolvimento/terceirização
dos projetos
Aprovação dos projetos nos
órgãos competentes
Seleção das construtoras
Fiscalização das obras
Complementação dos custos
das obras através de subsídios
Secretaria Municipal de
Patrimônio Cultural
(SEDREPAHC)
Definição das diretrizes de
intervenção nos casos de
edifícios históricos
Agente financeiro Caixa Econômica Federal
Aquisição do imóvel
Escolha dos moradores
Custeio das obras, limitado a R$
40.000,00 por unidade
Financiamento das unidades
através das linhas disponíveis
(PAR, Crédito Associativo, etc.)
Construtoras Definidas por licitação Execução das obras
Ocupação
Moradores
Escolhidos através de
cadastro
Uso
Manutenção
Gestores públicos
e privados
Caixa Econômica Federal Cobrança dos aluguéis e
condomínios
Realização de obras nas partes
preservadas
Administradoras
Quadro 2 – Definição e atribuição dos agentes envolvidos. Elaboração do autor a partir de PREFEITURA, 2003;
HELOUI, 2007.
Apesar da parceria com a CAIXA ter sido decisiva para a continuidade do Programa, diversos
problemas ainda persistem no processo de produção de moradias na área central. Heloui
(2007) indicou que entre as dificuldades enfrentadas pelo Programa estão a legislação restritiva
de preservação do patrimônio quanto à adaptação de edifícios históricos para uso habitacional,
a redução dos recursos destinados à realização dos empreendimentos, a complexidade da
questão fundiária na área central, a lentidão do poder judiciário nas questões relativas à
desapropriação e as dívidas com concessionárias e IPTU existentes nos imóveis escolhidos para
intervenção. Somam-se às dificuldades do Programa os problemas sociais e de preservação que
ainda permanecem à margem deste processo, tais como a inexistência de financiamentos e
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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subsídios destinados à população com renda até três salários mínimos, que configura o perfil
do morador de diversas áreas do centro, e a ausência de políticas de conservação do
patrimônio destinadas à auxiliar os proprietários e moradores nas questões relativas à
manutenção de edifícios históricos.
A análise da atuação do Programa na área central também indicou que os empreendimentos
realizados obedeceram a duas linhas específicas de intervenção: reabilitação de cortiços e
construção nova a partir de fachadas em ruínas ou terrenos vazios. De acordo com os
interesses desta dissertação serão analisados apenas a produção relativa aos cortiços e aos
projetos habitacionais desenvolvidos pela Secretaria Municipal de Habitação no morro da
Conceição, previstos pelo Programa proRIO.
O processo de recuperação dos cortiços teve início em 1996 com a criação de um Grupo de
Trabalho da Prefeitura responsável pela definição de parâmetros de intervenção com vistas à
reabilitação destas edificações para uso residencial de baixa renda. De acordo com as
considerações do Grupo ficou estabelecido que as reformas compreenderiam, prioritariamente,
a melhoria das condições de estabilidade através de obras de reforço estrutural, eliminação de
infiltrações, introdução de instalações sanitárias coletivas e/ou individuais e melhoria das
instalações elétricas e de ventilação dos cômodos.
Para a condução destas intervenções foi criado, no âmbito do Programa Novas Alternativas, o
Projeto de Reabilitação de Cortiços que visava recuperar as condições básicas de habitabilidade
e a qualidade da ambiência urbana local, aumentar a oferta de cômodos de aluguel no Centro,
promover a alternativa da locação social e garantir a manutenção e conservação dos imóveis
(PREFEITURA, 1995). Cabe observar que antes deste Projeto, a Prefeitura já havia tentado
trabalhar na recuperação de cortiços através da Operação Imóveis Habitados que tinha como
objetivo a melhoria das condições de moradia nas habitações coletivas degradadas. A
estratégia de atuação se fundamentava no investimento do valor dos aluguéis pagos pelos
moradores nas obras de reforma dos imóveis. Brigas jurídicas entre a Prefeitura e proprietários
acabaram por inviabilizar a operação.
No caso do Novas Alternativas foram selecionados seis imóveis para intervenção, porém
apenas três sofreram obras de reabilitação. Entre os empreendimentos realizados estão os
edifícios da travessa do Mosqueira 20 na Lapa, da rua Sacadura Cabral 295 na Saúde e da rua
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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Senador Pompeu 34 no Centro, que fizeram parte do projeto piloto do Programa. Os dois
primeiros foram reabilitados com recursos municipais e o último com subsídios da Prefeitura e
financiamento da CAIXA. Apenas o imóvel da Travessa do Mosqueira seguiu os objetivos iniciais
do Projeto de Cortiços (melhorias em edificações existentes e manutenção dos moradores).
Figs.II.24 e II 25 Localização e fachada do edifício na Travessa do Mosqueira nº 20. PREFEITURA, 2003.
Fig.II.26 Planta do subsolo – sem escala. PREFEITURA, 2003.
Fig.II.27 Planta do térreo – sem escala. PREFEITURA, 2003.
Fig.II.28 Planta do jirau – sem escala. PREFEITURA, 2003.
Travessa do Mosqueira
Travessa do Mosqueira
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ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
96
Apesar de se tratar de um cortiço em edificação existente, no imóvel da rua Senador Pompeu
houve substituição da população residente. O edifício da rua Sacadura Cabral se diferenciou
dos demais por se tratar de construção nova em terreno vazio com fachada remanescente,
porém mantendo a idéia dos cômodos e equipamentos coletivos dos cortiços. Não foram
executadas obras no cortiço da rua Senador Pompeu 51, tombado pelo município e que teria
vinte apartamentos de um quarto, dois de dois quartos e duas lojas, na casa de cômodos da rua
do Monte 59, que teria seis apartamentos de um quarto e na casa de cômodos da rua Cunha
Barbosa 39 na Saúde, que abrigaria vinte e quatro cômodos e uma loja (PREFEITURA, 2003).
Figs.II.29 e 30 Localização e fachada do edifício na rua Sacadura Cabral nº 295. PREFEITURA, 2003; Foto do autor, 2007.
Fig.II.31 Planta do pavimento inferior. PREFEITURA, 2003.
Fig.II.32 Planta do pavimento superior. PREFEITURA, 2003.
Rua Sacadura Ca
bral
Rua Sacadura Cabral
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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HABITAÇÕES POPULARES RECUPERADAS PELO PROGRAMA
Localização
Propriedade
Tipologia
unidades
sanitários
Área
média
(unidade)
Custo
unidade
Ano
Travessa
do
Mosqueira
20
Municipal
Casa de
cômodos
10
quartos
1 para
cada 3
unidades
18 m²
R$
16.135,00
1998
Rua
Sacadura
Cabral
295
Municipal
Construção
nova e
fachada
antiga
16
quartos
e 1 loja
1 para
cada 3
unidades
13 m²
R$
10.312,50
1998
Rua
Senador
Pompeu
34
CAIXA Cortiço
23 aptos
de 1
quarto e
2 lojas
1 para
cada
unidade
20 m²
R$
27.260,87
2003
Tabela 10 – Imóveis realizados pelo Programa de Cortiços. Elaboração do autor a partir de OROZCO, 2007, p.115.
Por se tratar de um imóvel tombado, ter maior área útil por unidade e possuir banheiros
individualizados, o edifício da rua Senador Pompeu apresentou custos de reabilitação mais
elevados que os outros dois empreendimentos. As intervenções realizadas neste imóvel
demonstraram uma melhoria na qualidade da habitação produzida pelo Programa que, após
esta experiência, deixou de desenvolver propostas habitacionais caracterizadas por cômodos e
equipamentos coletivos.
Quando comparados os custos por destes edifícios com os custos para construções novas,
percebe-se que a reabilitação ainda é mais onerosa. De acordo com Bomfim e Zmitrowicz
(2007, p.89), o custo para construção de habitações novas financiadas pelo PAR em 2005 girava
em torno de R$ 615,00 o m², sem contar o custo com infra-estrutura e equipamentos
comunitários. Nos edifícios reabilitados pelo Programa, os custos por m² da unidade ficaram em
R$ 896,00 na Travessa do Mosqueira, R$ 793,00 na Sacadura Cabral e R$ 1.363,00,00 na
Senador Pompeu sendo, portanto, mais elevados que o padrão adotado pelo PAR. Verificou-se
que estes custos se justificaram mais pela inclusão de obras de restauração em partes
preservadas do que pela melhoria em infra-estrutura e conforto, o que pode ser confirmado
através da permanência de unidades de dimensões reduzidas e dos equipamentos coletivos. O
caso específico destes imóveis demonstrou como os custos elevados na reabilitação
inviabilizaram a realização de outras intervenções em edifícios históricos e estimularam a
construção nova em terrenos vazios nas propostas atuais desenvolvidas pelo Programa.
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ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
98
Com relação à situação destes imóveis no pós-ocupação, algumas visitas realizadas por técnicos
da Prefeitura e outros pesquisadores (AZEREDO, 2006; OROZCO, 2007) indicaram diversos
problemas relacionados ao uso e manutenção dos edifícios. Orozco (2007, p.104) verificou
condições de adensamento na ocupação de alguns cômodos no edifício da rua Sacadura Cabral,
adequados inicialmente ao perfil do morador do centro (solteiros e casais sem filhos). Foi
constatado pela autora que “esses cômodos foram ocupados por famílias de baixa renda às
vezes em condições de amontoamento: encontrou-se um caso onde moram 4 pessoas num
cômodo de apensa 11 m²”.
A respeito da conservação dos edifícios, Heloui (2007) informou que a situação atual dos
cortiços recuperados é bastante diferente daquela após as obras, devido à ausência de
manutenção, e que a responsabilidade do Novas Alternativas se encerra com o habite-se. Na
opinião deste arquiteto, “quem tem que criar uma política de conservação não é a Secretaria
de Habitação e sim a Secretaria do Patrimônio Histórico que preservou ou tombou o imóvel”.
Segundo a arquiteta Gisele Masullo, sub-gerente do Programa Novas Alternativas, durante a
ocupação destes imóveis houve problemas de rejeição na utilização dos equipamentos
coletivos, o que constituiu um dos motivos para a modificação das unidades produzidas.
Atualmente, o Projeto de Reabilitação de Cortiços está suspenso devido às exigências da CAIXA
quanto ao padrão mínimo da unidade para o financiamento. De um modo geral, os problemas
de adensamento na ocupação dos cômodos, a ausência de manutenção e a insatisfação de
alguns moradores com relação aos equipamentos coletivos indicaram que as opções pela
construção de edifícios novos e reabilitação de edifícios antigos, respeitando a tipologia do
cortiço, foram inadequadas. A partir das avaliações constatou-se certa piora nas condições de
moradia e conservação edilícia que, a longo prazo, pode significar o regresso à situação
encontrada antes das obras.
Após a experiência com os cortiços, o Programa desenvolveu outros projetos habitacionais a
partir de vazios urbanos e ruínas, como ocorreu no morro da Conceição. O único
empreendimento realizado até o momento localiza-se na ladeira João Homem 35 no terreno de
uma antiga chácara onde localizava-se a casa de João Homem (PREFEITURA, 2003). As unidades
do tipo duplex, comercializadas em 2005, foram financiadas com recursos da CAIXA e subsídios
da Prefeitura.
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ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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Fig.II.33 Planta do pavimento inferior na ladeira João Homem nº 35 – sem escala. PREFEITURA, 2007.
Fig II.34 Planta do pavimento superior na ladeira João Homem nº 35 – sem escala. PREFEITURA, 2007.
Fig.II.35 Fachada do edifício. PREFEITURA, 2007.
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EMPREENDIMENTOS NO MORRO DA CONCEIÇÃO
Localização Propriedade Tipologia
unidades
sanitários
Área
média
(unidade)
Custo
unidade
Ladeira
João
Homem 35
CAIXA
Construção
nova
5 aptos
de 1 e 2
quartos
1 para
cada
unidade
48 m²
R$
51.656,00
Tabela 11 – Imóvel realizado no morro da Conceição. Elaboração do autor a partir de OROZCO, 2007, p.115.
Programa Morando no Centro
Devido a mudanças na gestão da Prefeitura do Rio de Janeiro em 2000, a Secretaria Municipal
de Habitação criou o Programa Morando no Centro na tentativa de diferenciar suas atividades
em relação ao Programa antecessor. A sutil diferença entre eles estaria na área de abrangência:
enquanto o Novas Alternativas prevê intervenções na área central e em outros bairros da
cidade, o Morando no Centro atua exclusivamente neste bairro. Segundo Martins (2008) não
distinção entre o Novas Alternativas e o Morando no Centro. Este foi um nome fantasia
criado para focar as intervenções realizadas no Centro num determinado momento”.
Atualmente os dois programas coexistem e promovem a reabilitação e construção de edifícios
de uso misto (residencial e comercial) em áreas centrais degradadas. A comercialização das
unidades é feita através da gerência de fomento, em parceria com a CAIXA.
ReHabCentro
Este grupo, liderado pelas arquitetas Helena Galiza e Lais Coelho, realiza um trabalho voluntário
de assistência técnica para a transformação de um edifício de propriedade do Estado do Rio de
Janeiro, localizado na rua da Constituição 21, em habitação para famílias que recebem até três
salários mínimos. As ações do grupo incluem a regularização fundiária do imóvel, a criação de
um programa de geração de renda para as famílias que residem no local, a elaboração de
projetos para a implantação de nove unidades habitacionais e o acompanhamento das obras.
Esta iniciativa conta com a participação dos próprios moradores, através da Associação
Moradia Digna nas Áreas Centrais, e a parceria da Caixa Econômica Federal. Os recursos para a
realização deste empreendimento provêm do Programa Crédito Solidário e do Programa de
Reabilitação de Áreas Centrais, totalizando um montante de R$ 350.000,00 (GALIZA, 2008).
Durante as obras, os moradores serão temporariamente removidos e terão os custos de
relocação assumidos pela Secretaria Estadual de Habitação.
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ação do Centro do
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101
Outras experiências nacionais e internacionais
Além dos Planos e Programas desenvolvidos na área central do Rio de Janeiro, foram
identificadas no Brasil e no exterior diversas experiências relacionadas à reabilitação de áreas e
edifícios históricos através do uso habitacional, como é o caso do Progetto Periferie em Turim,
do Projeto Living Over the Shops em Londres, do Programa de Reabilitação Urbana em Lisboa,
do Programa de Regeneración Habitacional en el Centro Histórico de la Ciudad de México, do
Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís e do Projeto
Rememorar em Salvador. Devido à extensão do assunto serão analisados apenas dois casos, o
de São Luis do Maranhão e o de Lisboa, que servirão como parâmetro comparativo para as
intervenções realizadas no Rio de Janeiro.
Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís
Durante o século XVIII, o dinamismo da atividade portuária e o aporte financeiro decorrente
das exportações influenciaram significativamente as transformações urbanístico-arquitetônicas
ocorridas no centro de São Luis, que incluíram a construção de diversas edificações
caracterizadas pelo estilo barroco pombalino, utilizado na reconstrução de Lisboa após o
terremoto de 1755
53
(ESPÍRITO SANTO, 2006, p.162-163). Estas mudanças observadas na cidade
durante o século XVIII não aconteceram com a mesma intensidade ao longo do culo XIX e
primeira metade do século XX, quando então sucessivos períodos de estagnação econômica no
Maranhão contribuíram, num primeiro momento, para o abandono do patrimônio edificado na
área central de São Luis e, num segundo momento, para a ocupação destes edifícios pela
população de baixa renda.
No culo XIX, a ausência de transformações na malha urbana do centro da cidade e o
abandono das edificações pelas classes abastadas favoreceram, de certa forma, a preservação
da arquitetura colonial urbana do culo anterior, apesar de seu estado de deterioração. O
esvaziamento destes imóveis ocasionou ainda, nas décadas de 1930 e 1940, mudanças
significativas na ocupação da área central decorrentes dos deslocamentos populacionais. De
acordo com Espírito Santo (2006, p.165), é neste momento que se inicia o encortiçamento dos
casarões remanescentes e se identifica a desvalorização imobiliária da região.
53
As tipologias habitacionais típicas deste período os solares, os sobrados de até quatro pavimentos e as casas
térreas –, ocupavam toda a área do lote e apresentavam fachadas com ritmo regular e simétrico de aberturas,
configurando o que ficou conhecido no Brasil como arquitetura colonial urbana.
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Este processo de degradação física e social identificado na área central durante este período,
aliado à ameaça de destruição das edificações históricas, motivou o governo federal a delimitar
e tombar o Centro Histórico de São Luís em 1955 com o intuito de preservar o patrimônio
arquitetônico e urbanístico remanescente. A partir do reconhecimento do valor deste conjunto
a nível mundial, a UNESCO concedeu em 1997 o título de Patrimônio da Humanidade a mil
trezentos e sessenta e nove imóveis e logradouros existentes nesta região.
A proteção do Centro Histórico foi acompanhada por uma renovação de usos da área que
compreendeu a dinamização do comércio, da prestação de serviço e das atividades
institucionais, porém mantendo-se o uso residencial característico. De acordo com dados da
Prefeitura Municipal de São Luís, em 1998 havia no Centro o predomínio do uso residencial
unifamiliar em todo o conjunto preservado, um percentual significativo de imóveis
desocupados, edifícios com gabarito predominante de um pavimento, estado de conservação
regular a péssimo nos imóveis federais e bom nos imóveis estaduais e estilos arquitetônicos
ligados ao tradicional português e ao popular (ESPÍRITO SANTO, 2006, p.173).
Atualmente, o Centro está dividido em três zonas: a Zona de Proteção Histórica, que abrange as
áreas de tombamento Federal e Estadual, a Zona de Interesse Social e a Zona Central. Esta
região é habitada por pouco mais de quarenta mil pessoas e o conjunto tombado compreende
cinco mil seiscentos e sete imóveis preservados por legislação federal, estadual e municipal
54
.
Parte do Centro Histórico ainda conserva o uso residencial, porém a maioria dos prédios de
valor histórico é utilizada como repartições públicas (BANDEIRA e LAMAR, 2004, p.125). Na área
delimitada pela UNESCO o uso comercial é o mais freqüente.
Complementando os tombamentos realizados nas três esferas de proteção, diversos programas
de preservação e intervenção vêm sendo implementados na região do Centro Histórico desde
1979. O primeiro deles, o Projeto Praia Grande, surgiu da necessidade de recuperação do
acervo edificado degradado no Centro devido ao abandono da área. Suas atividades foram
divididas em cinco etapas que compreenderam obras da Praça do Comércio (1980 a 1982),
realização de estudos e projetos (1983-1987), restauração e reabilitação de imóveis (1987 a
1990), implementação do Projeto Piloto Habitação (1990 a 1994) e a recuperação de
edificações nos bairros Portinho e Desterro (1995 a 1999).
54
Ibid., p.170.
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Fig.II.36 Bairro de Praia Grande em São Luís. VARGAS et al, 2005, p. 171.
Em 1998 foram definidas as primeiras diretrizes do Plano Municipal de Gestão do Centro
Histórico de São Luís a partir de discussões entre órgãos públicos, iniciativa privada e
moradores do Centro Histórico. Este Plano, cuja elaboração contou com o apoio do Ministério
das Cidades, tinha por objetivo promover a reabilitação do Centro através da aplicação do
conceito de Conservação Urbana Integrada
55
, utilizado em diversas cidades do mundo como
Lisboa e Turim e em fase de implantação em algumas cidades brasileiras como Natal e Salvador
(BRASIL, 2005, p.58; MOREIRA, 2003, p.25).
Além destes Planos e Projetos verificou-se também o desenvolvimento de algumas propostas
que conciliaram a recuperação do patrimônio arquitetônico e o incentivo ao uso habitacional.
As primeiras ações nesse sentido ocorreram no âmbito do Projeto Praia Grande e foram
realizadas pelo Subprograma de Habitação do Estado do Maranhão entre 1990 e 1994. Neste
período foi implementado o Projeto Piloto Habitação que resultou na reabilitação de um
sobrado para uso misto (residencial e comercial), localizado na área de proteção da UNESCO, e
atendeu a dez famílias (MOREIRA, 2003, p.44). Outra iniciativa foi a transformação de alguns
casarões em habitação social pelo Programa de Desenvolvimento do Turismo do Nordeste
(Prodetur-NE), entre 1995 e 1997, utilizando recursos do BID e dos governos federal e estadual
(ESPÍRITO SANTO, 2006, p.180-181).
55
Segundo Espírito Santo (2006, p.174), este conceito engloba um conjunto de instrumentos de planejamento e
ações de gestão direcionadas para áreas urbanas existentes, com o objetivo de garantir o desenvolvimento
sustentável por meio da manutenção de suas estruturas físicas e sociais, devidamente integradas com novos usos
e funções.
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A partir de 2000 as propostas da Prefeitura e do governo do Estado relativas à produção
habitacional no Centro Histórico passaram a ser orientadas pela metodologia Ateliê SIRCHAL.
Em 2001 teve início a parceria entre a Prefeitura de São Luís e a Caixa Econômica Federal que
resultou no desenvolvimento de sete estudos de viabilidade para a construção de setenta e
cinco unidades habitacionais de um e dois quartos, sala, cozinha, banheiro e área de serviço,
além de vinte e uma lojas (MOREIRA, 2003, p.47). Neste mesmo ano o governo do Estado criou
o projeto piloto de recuperação de imóveis para uso habitacional, destinados a funcionários
públicos. De acordo com dados do Subprograma de Habitação do Centro Histórico de São Luís,
até 2003 haviam sido concluídos seis empreendimentos com um total de quarenta e oito
unidades habitacionais e vinte e duas lojas
56
. Outras intervenções similares foram previstas no
Plano de Reabilitação do Centro Histórico de São Luís, criado em 2005, que propôs “estratégias
não para a recuperação dos prédios históricos, mas também formas para garantir a moradia
e oportunidades de trabalho e renda para os moradores da área” (BRASIL, 2005, p.57). Nesse
sentido foi lançado o Plano de Reabilitação do Bairro do Desterro com o objetivo de promover a
recuperação física e a melhoria das condições de moradia dos casarões encortiçados existentes
no bairro
57
, que são ocupados atualmente por diversas famílias de baixa renda.
Um dos resultados da parceria entre a Prefeitura de São Luís e a CAIXA foi a elaboração do
projeto de reabilitação de um sobrado do século XVIII, localizado na rua do Giz 117. Este
logradouro faz parte da Cidade Baixa, importante centro financeiro no início do século XIX e
local onde se realizavam transações bancárias, de comércio e exportação. A rua do Giz, que
pertence do Centro Histórico, apresenta diversos edifícios reformados que estão incluídos no
Programa de Preservação do Governo do Estado e são utilizados em grande parte por órgãos
públicos (SOUZA, 2002, p.66).
O sobrado em questão localiza-se na Zona de Preservação Histórica (ZPH) e é tombado pelo
IPHAN. Trata-se de um edifício com três pavimentos, uso misto (comercial no térreo e
residencial nos demais pavimentos) e área construída estimada de 888,53 que, durante a
realização do estudo, foi vendido e encontrava-se desocupado. O projeto de reabilitação
propôs a construção de doze apartamentos de dois quartos para famílias de classe média, com
área útil em torno de 45m², e duas lojas. O custo médio por unidade habitacional foi estimado
56
Ibid., p.87-88.
57
Este bairro está localizado na área de tombamento estadual e corresponde à região com maior densidade
habitacional do Centro Histórico (BRASIL, 2005, p.59).
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em R$ 44.858,00 e por unidade comercial em R$ 55.375,15 (MOREIRA, 2003, p.82-86;
BANDEIRA e LAMAR, 2004, p.128-129).
Fig.II.37 Planta do térreo na rua do Giz nº 117 – sem escala. LIMA et al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53.
Fig.II.38 Planta do 1º pavimento na rua do Giz nº 117 – sem escala. LIMA et al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53.
Fig.II.39 Planta do 2º pavimento na rua do Giz nº 117 – sem escala LIMA et al, 2004, p.131; AZEREDO, 2006, p.53.
Rua do Giz
Rua do Giz
Rua do Giz
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Fig.II.40 Fachada do edifício – sem escala. LIMA et al, 2004, p.131.
Quanto às diretrizes adotadas para a intervenção no imóvel, estas obedeceram às normas para
modificações internas e de fachada definidas pelo órgão de preservação federal. De acordo
com Bandeira e Lamar (2004, p.128), “as obras de adaptação foram limitadas ao mínimo,
conservando-se as formas externas e evitando-se alterações das características tipológicas, da
organização estrutural e da seqüência dos espaços internos”. Foram propostos o emprego de
divisórias em gesso acartonado e painéis pré-fabricados tipo wall, o aproveitamento estrutural,
a construção de paredes auxiliares nos banheiros e cozinhas, a retirada de acréscimos no pátio,
a recuperação e substituição das esquadrias de fechamento das varandas, a manutenção da
cobertura em telhas do tipo colonial e a substituição das cores da fachada
58
.
Com relação aos resultados alcançados pelos programas de reabilitação do Centro Histórico de
São Luís, Espírito Santo (2006, p.183-184) considera que estes “não foram suficientes para
reverter o quadro de gradual deterioração por abandono do centro preservado, bem como não
conseguiram incentivar a permanência da função residencial na área”. Parte desta situação foi
confirmada pela Prefeitura em 1998, que indicou um percentual significativo de imóveis
federais desocupados e mal conservados. A redução do uso habitacional, identificada com
maior freqüência no trecho de tombamento federal e de proteção da UNESCO, se justifica pela
presença cada vez mais elevada dos usos institucional e comercial no Centro Histórico e pelas
condições precárias de habitação nos edifícios antigos, que motivam o abandono e a mudança
58
Ibid., p.128-129.
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dos moradores para outras regiões. Outro objetivo que parece não ter sido alcançado pelo
Programa de Reabilitação do Centro Histórico de São Luís diz respeito às ações de Conservação
Urbana Integrada, uma vez que o que se identifica atualmente “é apenas um conjunto de ações
isoladas, agrupadas por subprogramas que apresentam as diferentes ações dos sucessivos
governos estaduais na área” (ESPÍRITO SANTO, 2006, p.184).
Programa de Reabilitação Urbana em Lisboa
O início do processo de Reabilitação Urbana em Lisboa remonta à década de 1970 quando
então foi lançado o Programa para a Recuperação de Imóveis Degradados (PRID) através do
Decreto-lei 704/76. Em 1985 criou-se o Programa de Reabilitação Urbana (PRU),
posteriormente denominado Programa de Reabilitação de Áreas Degradadas (PRAUD), e em
1987 criou-se o manifesto Alfama recuperação ou morte, através da mobilização dos
moradores deste bairro em prol da preservação do patrimônio e melhoria das condições de
habitabilidade. Este manifesto resultou na instalação de escritórios técnicos nos bairros de
Alfama e Mouraria para dar início às operações piloto de reabilitação urbana, que depois se
estenderam ao Bairro Alto e Madragoa (LOPES, 2000, p.4).
Fig.II.41 Localização das primeiras cidades a sofrerem ações de reabilitação urbana em Lisboa. Google Earth, 2009.
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A partir dos resultados positivos alcançados com a reabilitação destes bairros, que conjugaram
a recuperação do patrimônio edificado e a manutenção da população residente, a Câmara
Municipal de Lisboa criou na década de 1990 a Direcção Municipal de Reabilitação Urbana,
órgão incumbido de coordenar o processo de reabilitação, e os Gabinetes Técnicos Locais, que
seriam responsáveis pela condução das intervenções em cada bairro. A estrutura administrativa
da Direção de Reabilitação foi dividida em Direcção Municipal de Planeamento e Gestão
Urbanística, que elabora os instrumentos de planejamento das áreas de intervenção, a Direcção
Municipal de Construção e Conservação de Edifícios, que projeta, fiscaliza e executa as obras, o
Departamento de Gestão Social, que atua na gestão do parque habitacional e realojamento da
população e o Departamento do Patrimônio Cultural, que realiza a salvaguarda e conservação
do patrimônio artístico, arquitetônico e cultural.
As ações de reabilitação implementadas pela Câmara Municipal apresentam como objetivos
principais a requalificação dos espaços de moradia e de comércio, a melhoria da qualidade de
vida e das condições econômicas e sociais nos bairros degradados, a recuperação do
patrimônio arquitetônico remanescente, a preservação da morfologia urbana e revitalização
dos espaços públicos, a manutenção da população residente e a atração de novos moradores
(LIMA, 2004, p.14 e 15; LISBOA, 1993). De um modo geral, as propostas desenvolvidas para os
núcleos históricos de Lisboa são caracterizadas pela adoção do conceito de Reabilitação
Urbana Integrada, que recomenda não somente intervenções no edifício isolado, mas também
o contexto urbano, pela prioridade na recuperação do parque habitacional, “conjugando a
atitude passiva da conservação / reparação com a atitude activa de dotação de condições e
equipamentos de habitabilidade onde não existiam” (LISBOA, 1993, p.96), e pela participação
dos moradores locais no processo de reabilitação, uma vez que as intervenções são realizadas
de acordo com as necessidades destes usuários. Nesse sentido, o poder público considera que a
manutenção da população local garante a preservação da identidade do bairro e aumenta o
controle social exercido espontaneamente pelos moradores, refletindo em veis maiores de
segurança (LOPES, 2000, p.7).
Quanto aos procedimentos operacionais adotados, inicialmente é declarada pela Prefeitura a
Área Crítica de Recuperação e Renovação Urbanística que corresponde ao objeto da
intervenção. A partir daí são adotados dois instrumentos para a realização das obras: a
expropriação dos imóveis de interesse público e o direito de preferência na alienação de
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terrenos e edifícios. Somente após esta fase é que são implementados os projetos e realizadas
as licitações pelos Gabinetes Locais (LISBOA, 1993, p.54; LIMA, 2004, p.15). A atuação é
caracterizada por um modelo descentralizado de gestão urbana, a partir do qual é instalado em
cada bairro um Gabinete que conduz as intervenções e permite o contato direto com o usuário
(LOPES, 2000, p.11). Caracterizam ainda este processo a busca de parcerias com a iniciativa
privada para a realização das intervenções e o monitoramento após o término das obras.
A respeito dos financiamentos, foram criados vários Programas de apoio financeiro para e
realização de obras de reabilitação, tais como o REHABITA, o RECRIPH, o SOLARH e o RECRIA.
Este último, denominado Regime Especial de Comparticipação na Recuperação dos Imóveis
Arrendados, foi criado em 1988 e é destinado aos proprietários de edifícios antigos que
pretendem realizar obras de reformas nas unidades residenciais e se comprometem a manter
os inquilinos. O financiamento utiliza subsídios municipais e federais a fundo perdido que
podem chegar a 65% do valor das obras. Além destes existem ainda financiamentos externos
provenientes da União Européia e UNESCO.
Com relação às intervenções, identificam-se dois tipos geridos pelos Gabinetes Técnicos Locais:
os Projetos Integrados e as Ações Especiais (LIMA, 2004, p.17). Nos Projetos Integrados são
propostos, entre outros, a reabilitação de edificações, a modernização da infra-estrutura
urbana e a revalorização patrimonial. Nas Ações Especiais são realizadas a reciclagem de
imóveis para adequá-los como equipamentos coletivos, incluindo projetos de inserção social e
de criação de empregos. Uma vez que o objetivo principal nas reabilitações é manter a
população residente, três situações costumam ocorrer durante as intervenções: a realização de
obras com as famílias no próprio local, a remoção temporária dos moradores para alojamentos
provisórios até o término das obras e, nos casos extremos, a remoção das famílias para áreas
próximas, geralmente no mesmo bairro
59
.
Nas áreas ocupadas por população de baixa renda, a melhoria das condições de habitação
muitas vezes são realizadas através de intervenções mínimas de modo a reduzir os custos com
as obras e evitar encargos incompatíveis para os moradores. Segundo “A intervenção é mínima
quando se guarda o máximo substituindo o que não pode ser reutilizado. A demolição é
praticada apenas nos casos em que a recuperação é de todo impossível” (LOPES, 2000, p.8).
59
Ibid., p.15.
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De acordo com o estado de degradação de cada edifício, são adotados quatro níveis de
reabilitação: ligeira, média, profunda e excepcional (PORTO VIVO, 2005, 40-41). A Reabilitação
ligeira é realizada em edifícios com estado de conservação razoável, não sendo necessário
intervir nos sistemas construtivos. São feitos pequenos reparos nas instalações de banheiros e
cozinhas, melhorias na iluminação e ventilação dos compartimentos, pequenas obras na
cobertura, caixilharias exteriores e recomposição de rebocos. A Reabilitação média
compreende as ações da reabilitação ligeira e inclui a recuperação ou substituição de
esquadrias e demais elementos de madeira, reparo ou reforço de elementos estruturais,
substituição de instalações elétricas e hidráulicas, recuperação de revestimentos externos e
internos e a melhoria na distribuição dos espaços. A Reabilitação profunda abrange os tipos de
intervenção anteriores e intervém profundamente na distribuição e organização interna da
edificação , podendo alterar o número de unidades e o próprio uso do edifício. Estas alterações
implicam em demolições e reconstruções e obrigam à desocupação dos edifícios. Por fim, a
Reabilitação excepcional se justifica se o edifício apresentar reconhecido valor patrimonial.
Uma vez que é necessária a adoção de técnicas de restauro, os custos deste tipo de intervenção
são mais elevados.
Entre as propostas de reabilitação implementadas em Lisboa destaca-se o caso do Bairro Alto
que é caracterizado pelos usos comercial e residencial, tem boa infra-estrutura e é ocupado por
população relativamente idosa, de baixa renda e grau primário de escolaridade (LISBOA, 1993,
p.96). Com relação à arquitetura, o Bairro Alto apresenta grande variedade tipológica que pode
ser classificada em quatro grandes grupos de acordo com a época de sua construção. O
primeiro, datado da fundação do bairro e abrangendo do final do século XV até os primórdios
do século XVIII, caracteriza-se por edifícios estreitos, de fachada vertical e com um máximo de
quatro pavimentos; o seguinte corresponde ao período Pombalino e compreende desde
meados do século XVIII até o terceiro quartel do século XIX; o terceiro, que vai da segunda
metade do século XIX até meados do XX, é caracterizado por construções com alterações de
referências técnicas e construtivas Pombalinas e pela mistura de antigas e novas técnicas
construtivas, conhecidos como Gaioleiros; e finalmente o último tipo que vai da segunda
metade do século XX até os dias atuais, período onde se consolida o modernismo (LISBOA,
1993, p.94; AZEREDO, 2006, p.32).
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Fig.II.42 Localização e limites do Bairro Alto em Lisboa. Google Earth adaptado pelo autor, 2009.
As primeiras intervenções realizadas no bairro foram caracterizadas pela política de Renovação
Urbana do centro histórico degradado, que resultaram na demolição do parque edificado,
inserção de novas construções, aumento da especulação imobiliária e expulsão dos moradores
locais. Esta situação motivou a criação de associações de moradores que passaram a defender
o patrimônio arquitetônico e cultural da região (CABRITA, 1993, p. 19 apud AZEREDO, 2006,
p.30). Nesse sentido foi criado em 1985 o Programa de Reabilitação Urbana (PRU) para a
recuperação do bairro, que teve como objetivo a preservação da morfologia urbana, a
restauração do patrimônio arquitetônico, a melhoria das condições de habitabilidade e a
manutenção da população residente
60
. Dando prosseguimento a este processo, foi definida
pela Câmara Municipal em 1990 a Área Crítica de Recuperação e Reconversão Urbanística do
Bairro Alto / Bica, quando então as propostas passaram a ser implementadas pela Direcção de
Reabilitação Urbana e Gabinetes Locais (LISBOA, 1993, p.96). Entre as intervenções realizadas
nas áreas históricas degradadas durante este período destacam-se as obras de recuperação de
antigos sobrados localizados na Travessa da Laranjeira, nº26 e na Travessa do Poço da Cidade,
nº52 e 54.
60
Ibid., p.31.
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A respeito do imóvel da Travessa da Laranjeira nº26, sabe-se que se trata de um edifício do
século XVII, de acentuada verticalidade, com 5 pavimentos e 5 unidades habitacionais de um
quarto, cuja reabilitação foi concluída em 1993. Devido ao estado precário da edificação,
procedeu-se a uma intervenção profunda em que foram refeitos todos os pavimentos das
zonas úmidas, reformulados os espaços existentes para a introdução de instalações sanitárias e
cozinhas em todas as unidades, reconstruídos os pavimentos de madeira com substituição dos
elementos degradados, recuperada a cobertura e mantidos o esquema cromático e a estrutura
em madeira na zona frontal. Durante as obras os moradores foram realojados
temporariamente, retornando ao imóvel após o término das mesmas (LISBOA, 1993, p.101).
Fig.II.43 Planta do 1º ao 3º pavimento na travessa da
Laranjeira nº 26. LISBOA, 1993, p.101
Fig.II.44 Planta do 4º pavimento na travessa da Fig.II.45 Fachada frontal. LISBOA, 1993, p.101.
Laranjeira nº 26. LISBOA, 1993, p.101.
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As obras de reabilitação no imóvel da Travessa do Poço da Cidade 52-54 também foram
concluídas em 1993. Trata-se de edifício com 6 andares e 5 unidades residenciais com um
quarto, de pré-existências setecentistas até ao andar, que teve após o terremoto de 1755 a
adição dos outros pavimentos e após o século XIX a introdução de varandas. Como ocorreu o
colapso do prédio antigo, houve reformulação no tipo de intervenção proposta, passando de
reabilitação profunda para construção nova. Devido à situação de instabilidade do edifício, os
residentes foram transferidos em 1992 para alojamentos provisórios e retornaram após o
término das obras. Foram previstos pelo projeto novas instalações sanitárias, cozinhas, escadas
e iluminação no interior das unidades, mantida a tipologia da fachada e incluídas varandas ao
nível do 1º pavimento (LISBOA, 1993, p.102-103).
Fig.II.46 Planta do térreo na travessa do Poço Fig.II.47 Planta do 1º pavimento na travessa do Poço
da Cidade nº 52-54. LISBOA, 1993, p.103. da Cidade nº 52-54. LISBOA, 1993, p.103.
Fig.II.48 Planta do 2º ao 4º pavimento na travessa Fig.II.49 Planta do 5º pavimento na travessa do Poço
do Poço da Cidade nº 52-54. LISBOA, 1993, p.103. da Cidade nº 52-54. LISBOA, 1993, p.103.
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Figs.II.50, II.51 e II.52 Fachadas e obras de reabilitação no edifício. LISBOA, 1993, p.103.
Análise comparativa
A partir da análise dos Programas e exemplos de recuperação de edifícios habitacionais no Rio
de Janeiro, em Lisboa e em São Luis foi possível estabelecer comparações a fim de identificar,
além das semelhanças e diferenças existentes, os pontos positivos que devem ser mantidos
e/ou incorporados nas políticas de reabilitação e as questões que podem ser melhoradas.
Quanto às semelhanças, foi observado que todas as áreas de intervenção analisadas
apresentaram parque habitacional degradado e obsoleto, patrimônio arquitetônico mal
conservado e ocupação por população de baixa renda, envelhecida e com perfil pouco
qualificado. Em Lisboa e no Rio de Janeiro são característicos os usos comercial e residencial.
Em São Luis, além destes, existe a presença do uso institucional. Verificou-se que, geralmente,
os processos de reabilitação destas regiões foram iniciados a partir da mobilização da
população local no sentido da proteção do patrimônio histórico e que diversos Programas
demonstraram em seus objetivos a intenção em conciliar o incentivo ao uso habitacional e a
recuperação do patrimônio arquitetônico existente. Com relação aos tipos de intervenção
realizados nos edifícios históricos, grande parte das propostas desenvolvidas nas três cidades
optou pela mínima intervenção e aproveitamento máximo dos elementos construídos.
A respeito das diferenças, Portugal foi a primeira das três cidades a apresentar propostas para a
reabilitação de edifícios residenciais em áreas históricas, destacando-se o caso de Alfama na
década de 1980. São Luis e Rio de Janeiro só apresentaram as primeiras iniciativas na década de
1990, como o Projeto Praia Grande e o Programa Novas Alternativas, respectivamente.
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Sobre as características dos processos de reabilitação, foram observadas grandes diferenças no
que diz respeito à abrangência das intervenções e ao público atendido. Quanto às intervenções,
Lisboa adota o conceito de Reabilitação Urbana Integrada e, a partir dele, define as Áreas
Críticas de Recuperação e implementa as obras de reabilitação arquitetônica. São Luis tem
procurado implementar este conceito a partir do Plano de Reabilitação do Centro Histórico,
lançado em 2005, porém a maioria das propostas desenvolvidas até o momento são pontuais e
não em conjunto. No Rio, assim como em São Luis, as ações implementadas estão mais ligadas
à reabilitação e preservação arquitetônica do que à reabilitação urbana. A respeito do público
atendido, identificou-se no caso de Lisboa a preocupação com a manutenção dos moradores
locais e a reabilitação de parte dos edifícios históricos para este público. Em São Luis observou-
se a existência de propostas tanto para a população de baixa renda quanto para a classe média.
No Rio de Janeiro, apenas as primeiras experiências buscaram a manutenção dos moradores,
sem muito sucesso. A maioria das propostas implementadas não contemplou a população
residente que foi substituída por moradores de renda mais elevada.
Também foram verificadas algumas diferenças administrativas e financeiras nas políticas
adotadas. Lisboa apresenta uma política municipal de reabilitação bem estruturada e integrada
que cuida simultaneamente do urbanismo, das obras, da gestão e do patrimônio. Além dos
diversos departamentos a nível municipal, a gestão descentralizada através dos Gabinetes
Locais direciona as intervenções a nível local e favorece a participação da população no
processo de reabilitação. No Rio de Janeiro esta integração foi observada somente na
elaboração dos planos de intervenção. A implementação das propostas é realizada basicamente
no âmbito das Secretarias de Habitação e de Urbanismo. A gestão das intervenções é
centralizada e não a participação da população local no processo de reabilitação. Quanto ao
aporte financeiro, Lisboa conta com diversos Programas de apoio para a realização das obras,
inclusive destinados aos proprietários de imóveis históricos. No caso de São Luis e do Rio de
Janeiro as obras são realizadas em grande parte com recursos da CAIXA e subsídios do Estado
ou Município. Não existem linhas de financiamento específicas que auxiliem e incentivem os
proprietários na reabilitação de edifícios degradados. O estímulo aos proprietários se restringe
a incentivos legais e se mostra ineficaz nas áreas onde este imposto apresenta valor reduzido.
Sobre as tipologias edilícias e unidades habitacionais, verificou-se que em Lisboa e São Luis
houve preferência pela reabilitação de antigos sobrados e habitações populares enquanto no
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Rio de Janeiro a maioria das propostas se baseou na construção nova em terrenos vazios. As
unidades produzidas para a população de baixa renda apresentaram dimensões reduzidas
compostas por sala, quarto cozinha e banheiro no caso de Lisboa ou apenas um cômodo no
caso das primeiras intervenções no Rio. Nas unidades destinadas à classe média observaram-se
áreas maiores e a presença de dois quartos, a exemplo do sobrado reabilitado em São Luis e de
algumas propostas mais recentes no Rio. Com base nestas informações, elaborou-se um quadro
comparativo entre alguns dos exemplos de reabilitação pesquisados nas três cidades.
COMPARAÇÃO ENTRE OS EXEMPLOS DE REABILITAÇÃO
Cidade Rio de Janeiro São Luis Lisboa
Localização do imóvel
rua Sacadura Cabral rua do Giz travessa da Laranjeira
Configuração do lote
Gabarito / Tipologia
do edifício
Época de construção
1998 com fachada do
século XIX
Século XVIII Século XVII
Tipologia da unidade
Área útil 13 m² 45 m² 30 m²
Programa da unidade
Um cômodo com
banheiros coletivos
Sala, 2 quartos,
cozinha e banheiro
Sala, 1 quarto,
cozinha e banheiro
Público atendido
População local
Novos moradores População local
Perfil do morador
Idosos, solteiros e
casais sem filho
Famílias
Idosos, solteiros e
casais sem filho
Faixa de renda Baixa renda Classe média Baixa renda
Tipo de intervenção
Construção nova em
terreno vazio
Intervenção mínima
em edifício existente
Intervenção profunda
em edifício existente
Quadro 3 – Comparação entre os exemplos de reabilitação no Rio, São Luis e Lisboa. Elaboração do autor, 2009.
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Avaliando os pontos positivos e negativos identificados a partir da comparação entre as três
cidades, conclui-se que em muitos aspectos o processo de reabilitação conduzido em Lisboa
serve de exemplo para as propostas implementadas no Rio de Janeiro e em São Luis. Nesse
sentido, poderiam ser incorporados às políticas nacionais o conceito de Reabilitação Urbana
Integrada, compreendendo a revitalização do entorno além das intervenções nos edifícios
históricos, novas linhas de financiamento aos proprietários de edifícios degradados em sítios
históricos a fim de estimular a recuperação do patrimônio edificado e a criação de Programas
de Reabilitação bem definidos e estruturados que adotassem o exemplo dos Gabinetes
Técnicos Locais na condução das intervenções nos bairros das áreas centrais. Outras melhorias
que poderiam ser consideradas no processo são a diversificação do tipo de público atendido,
abrangendo a manutenção da população residente e a atração de novos moradores, e a
diversificação dos tipos de intervenção, compreendendo prioritariamente a recuperação dos
edifícios existentes e, em alguns casos, a construção de edifícios novos em vazios urbanos
integrados ao entorno.
Algumas críticas podem ser feitas quanto à opção pela intervenção mínima em edifícios
antigos. Nem sempre as intervenções mínimas são vantajosas no que diz respeito à
conservação nos-ocupação. O problema implícito neste tipo de intervenção é a manutenção
onerosa dos elementos originais do edifício, sobretudo quando as obras de reabilitação
carecem de qualidade, quando os custos são reduzidos e os edifícios são destinados à
população de baixa renda. Apenas a inserção de instalações sanitárias adequadas e a
restauração de elementos construtivos deteriorados nem sempre são suficientes. Em cada caso
deve-se estudar quando é pertinente a substituição de elementos e materiais a fim de
aumentar a durabilidade da edificação e a facilitar a manutenção.
Outra questão que precisa ser melhor resolvida diz respeito às diferenças nos tamanhos das
unidades destinadas à classe baixa e à classe média. Como foi visto nos exemplos das três
cidades, para a população de baixa renda foram produzidos cômodos ou apartamentos de um
quarto e para usuários de maior renda apartamentos de dois quartos. Este fato indica de modo
geral que a situação dominante nas intervenções de reabilitação é a que relaciona a renda do
morador ao tamanho da unidade e não a que relaciona o tamanho da família às dimensões da
unidade. Neste casos, o custo da obra e, por conseqüência, o tamanho da habitação, não
podem ser condicionados pela capacidade do morador em pagar pela moradia. Independente
H
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilit
ação do Centro do
Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
118
da renda, as dimensões dos apartamentos devem ser adequadas ao tamanho da família que irá
ocupá-lo. Sendo assim verifica-se a importância da locação social em relação à venda da
unidade, sempre que os subsídios públicos forem adequados a este fim, e sua influência na
qualidade da habitação produzida para a população de baixa renda.
Para estudar com maior profundidade estas e outras questões envolvidas neste tipo de
intervenção, será analisado no próximo capítulo um exemplo emblemático de reabiltação
arquitetônica na área central da cidade do Rio de Janeiro, em que se buscou a conciliação da
habitação para famílias de baixa renda e a preservação do patrimônio histórico. Através deste
estudo de caso será verificado como determinadas diretrizes e ações adotadas pelo poder
público neste processo podem influenciar a conservação dos elementos construídos e o uso dos
espaços no pós-ocupação.
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
119
3. O CASO DO EDIFÍCIO NA RUA SENADOR POMPEU 34
Informações sobre o edifício
Inserção Urbana
Para explicar e analisar a inserção do cortiço em seu contexto urbano, caracterizado pelo morro
da Conceição e adjacências, recorreu-se inicialmente às considerações de Freyre (1961) a
respeito da localização das habitações populares junto aos morros e à relação identificada por
Reis Filho (1970) entre as características do lote colonial, o tipo de arquitetura produzida e a
própria aparência das cidades. Quanto às origens da ocupação dos morros e planícies de
diversas cidades brasileiras e distribuição das classes sociais, Freyre (1961, p.181) observa que
no Rio de Janeiro, e parece que, até certo ponto, na capital da Bahia, em Ouro Preto,
em Olinda, as casas da gente pobre foram construídas a princípio ao dos morros.
Dos morros, os ricos, os Jesuítas e os frades se assenhorearam logo, para levantarem
nos altos suas casas-grandes, suas igrejas e seus conventos [...] os casebres e
mucambos foram-se levantando, rasteiros, pelas partes baixas e imundas das cidades.
Pelos mangues, pela lama, pelos alagadiços.
Estudando a história do morro da Conceição, verificada no Capítulo 2, é possível confirmar
este fato, onde a ocupação da parte alta ocorreu com a instalação de instituições religiosas e
militares nos séculos XVII e XVIII e a apropriação da parte baixa se desenvolveu no século XIX
com o estabelecimento de edifícios comerciais e residenciais, muitos destinados à moradia
operária. Faz parte do contexto de ocupação habitacional da região a construção do cortiço da
rua Senador Pompeu nº 34, localizado na base sul do morro (figura III.1) e pertencente à antiga
freguesia de Santa Rita. Atualmente este edifício faz parte bairro do Centro que corresponde à
II Região Administrativa.
Fig.III.1 Localização do cortiço. Google Earth adaptado pelo autor, 2008.
MORRO DA CONCEIÇÃO
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
120
Com relação aos aspectos urbanísticos e arquitetônicos desta região, pode-se dizer que os
principais elementos que caracterizam a ambiência e a tornam peculiar o a tipologia das
edificações e a configuração do sítio urbano, ambos remanescentes dos culos XVIII e XIX.
Estudos realizados por Nestor Goulart Reis Filho referentes à evolução da arquitetura
residencial brasileira demonstraram que os edifícios construídos durante o período colonial e,
conseqüentemente, o aspecto das cidades, estavam diretamente relacionados ao tipo de lote
em que estavam implantados. Na opinião de Reis Filho (1970, p.22),
pode-se afirmar com segurança que durante o período colonial a arquitetura
residencial urbana estava baseada em um tipo de lote com características bastante
definidas. Aproveitando antigas tradições urbanísticas de Portugal, nossas vilas e
cidades apresentavam ruas de aspecto uniforme, com residências construídas sobre o
alinhamento das vias públicas e paredes laterais sobre os limites dos terrenos.
Estabelecida a influência do lote na arquitetura e na paisagem urbana do morro e adjacências,
cabe analisar com maior profundidade as características dos terrenos e quadras que
constituem esta área. Segundo Pinho e Sigaud (2000, p.63), a tipologia dos terrenos existentes
no morro da Conceição e seu entrono imediato é representada pelo lote urbano colonial, com
testada estreita entre 4,5m e 8,0m de largura e grande profundidade, variando de 15m a 30m.
Apesar de este ser o tipo mais freqüente, a presença de terrenos com maiores dimensões
que derivam de remembramentos dos lotes primitivos. Dado a variedade de dimensões dos
lotes e o condicionamento do traçado viário à topografia local e ao alinhamento das
edificações, a forma das quadras geralmente é irregular. Uma vez que as edificações são
coladas nas divisas, a aeração interna das quadras normalmente ocorre a partir da junção das
áreas livres nos fundos dos lotes, configurando o conceito de quadra fechada com o miolo livre.
Fig.III.2 Parcelamento dos lotes e quadras do Morro da Conceição e entorno. PINHO e SIGAUD, 2000 adaptado pelo autor.
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
121
Figs.III.3 e III.4 Parcelamento dos lotes e tipologias arquitetônicas na rua do Acre. PINHO e SIGAUD, 2000; Foto do autor, 2008.
No que diz respeito às relações entre o terreno e a arquitetura do cortiço, verificou-se que para
a construção do edifício foram remembrados dois lotes característicos do período colonial. De
acordo com informações do Registro Geral de Imóveis (Anexo VII), as dimensões atuais deste
terreno são 15,05m de largura e 35,50m de comprimento. Observou-se que a ocorrência deste
remembramento influenciou significativamente a arquitetura produzida, dando origem a uma
tipologia peculiar quando comparada com os sobrados tradicionais. Enquanto os lotes estreitos
e profundos geraram edifícios longitudinais e retangulares colados nas divisas, com ventilação e
iluminação através da fachada principal e dos fundos do terreno, os lotes remembrados do
cortiço permitiram a criação de um edifício com volumetria diferenciada, composto por alas
coladas nas divisas circundando um pátio interno, e com ventilação e iluminação a partir do
centro do terreno abrangendo todos os cômodos.
VOLUMETRIA GERADA PELO LOTE ESTREITO E PROFUNDO VOLUMETRIA GERADA PELOS LOTES REMEMBRADOS
Fig.III.5 Relação entre a volumetria dos sobrados tradicionais e do cortiço. Desenho do autor, 2009.
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do
Centro do Rio de Janeiro
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122
Fig.III.6 Relação entre o remembramento dos lotes e a arquitetura produzida. Desenho do autor, 2009.
Esta tipologia peculiar do cortiço bem como aquela identificada nos sobrados coloniais ainda
fazem parte da paisagem construída do morro da Conceição e seu entorno imediato, uma vez
que não houve grandes transformações no parcelamento dos lotes e na forma das quadras a
partir de 1870. Segundo pesquisas de Pinho e Sigaud (2000, p.63) a tipologia dos terrenos
existentes e o alinhamento das edificações ainda são os mesmos que deram origem ao
processo de ocupação da região. Devido à preservação das características do sítio e de sua
arquitetura foram criadas legislações para proteção deste patrimônio histórico a partir da
década de 1980. Nesse sentido, o Plano Diretor Decenal da Cidade do Rio de Janeiro definiu o
morro da Conceição como área integrada ao Patrimônio Paisagístico e Cultural sujeita à
Proteção Ambiental (figura III.7). As legislações atuais de proteção do patrimônio, vigentes na
área, compreendem
1
:
em nível federal, a Portaria 002 de 14/03/1986 criada pelo IPHAN;
em nível estadual, a Resolução Estadual 23 de 27/04/1987 instituída pela Secretaria de
Estado de Cultura e
em nível municipal, o Decreto 7531 de 14/01/1988, que definiu a Área de Proteção
Ambiental (APA) de parte dos bairros da Saúde, Gamboa, Santo Cristo e Centro (SAGAS) e a
Lei 2236 de 14/10/1994, que regulamenta a Área de Especial Interesse Urbanístico da AR II
do Centro.
1
Ibid., p.34-35.
LOTE 2
LOTE
1
N
rua Senador Pompeu
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do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
123
Fig.III.7 Planta de Bens Tombados e Preservados no Morro da Conceição. PINHO e SIGAUD, 2000.
Histórico
Durante a crise de moradias no século XIX, a rua Senador Pompeu, então denominada rua Nova
do Príncipe, foi ocupada por diversas habitações populares coletivas e freqüentada por diversos
operários que trabalhavam no porto, comércio e em fábricas estabelecidas na região. De
acordo com Gerson (2000, p.209-210), a rua abrigou neste período,
um tipo de residência coletiva para trabalhadores fora de uso entre nós e das quais
as últimas existentes são, talvez as que nela subsistem, tão mal conservadas, algumas
prestes a caírem aos pedaços conjuntos à semelhança de quartéis, com a sua parte
assobradada dispondo de varanda de madeira, dispostos em forma de quadrilátero,
com um amplo pátio, este dotado também de tanques para lavanderias, e alguns
construídos provavelmente em lugares antes ocupados por cocheiras de empresas de
tílburis e carroças, tão freqüentes no bairro antes dos progressos do transporte
motorizado [...]
A construção do cortiço localizado no atual número 34 desta rua, antigos 26 e 28 de acordo
com Cavalcanti (1878), deve ser entendida neste contexto, que corresponde à época de
proliferação deste tipo de moradia para a classe trabalhadora de baixa renda na área central da
cidade. O projeto original e o construtor do edifício não foram identificados pela pesquisa,
talvez por ter sido executado em etapas ou sem a cooperação de técnicos especializados.
Estima-se por mapas, plantas de época (figura III.8) e documentos pesquisados no SEDREPAHC
2
que a construção tenha sido iniciada em 1868.
2
Alguns dados sobre a história e as características do edifício foram encontrados nas Fichas de Inventário de Bens
Imóveis elaboradas pelo Projeto SAGAS em 1985.
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
124
Fig.III.8 Planta Cadastral elaborada por Edward Gotto em 1871. PINHO e SIGAUD, 2000.
Estes documentos também indicaram que desde a origem o edifício serviu ao uso misto
(comercial e residencial), porém não foram encontrados registros que comprovassem os
motivos para a construção e ampliações posteriores do imóvel. Com base nas pesquisas
históricas de Cebrian (1995), foram levantadas três hipóteses para este fato:
a) abrigar os trabalhadores das indústrias locais
b) acomodar os moradores do cortiço Cabeça-de-Porco, demolido em 1893
c) hospedar os soldados que transitavam pela cidade no final do século XIX
Complementando as pesquisas de Cebrian, supõe-se que o edifício tenha sido construído para a
exploração dos aluguéis, uma prática comum entre os proprietários de terrenos e sobrados na
área central durante a crise da habitação no século XIX. Zylberberg (1996, p.36) afirma que
“boa parte dos moradores do morro, como de toda a freguesia de Santa Rita, parece ter sido de
trabalhadores ligados às atividades portuárias, muitos deles estrangeiros portugueses e
espanhóis principalmente”.
De acordo com documentos pesquisados no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro
3
, foram
realizadas em 1909 obras de reforma e ampliação no cortiço. Estima-se que os motivos para a
execução destes serviços estejam relacionados à adequação do edifício à legislação higienista
de 1904 e ao aumento da quantidade de trabalhadores que passaram a freqüentar esta área do
Centro, devido à construção do Cais do Porto e às obras de modernização da Praça Mauá.
3
Os documentos foram localizados no códice L.O. 1909 / CX 05 / DOC 18 e compreenderam as plantas do projeto
de reforma e o pedido de licença à Prefeitura.
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
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125
Com relação à propriedade e a numeração do edifício, os registros de Cavalcanti (1878)
indicaram que em 1878 o imóvel pertencia à Maria Joaquina Ferreira de Oliveira e as
numerações dos lotes eram 26 e 28. De acordo com o pedido de licença à Prefeitura para a
execução das obras em 1909, verificou-se que o proprietário era Antônio José Pereira e
permaneciam as mesmas numerações anteriores. Baseado na escritura do Ofício do Registro
de Imóveis (Anexo VII), em 1976 a propriedade do imóvel pertencia a João Pereira Ferreira,
Augusto Ricardo Ferreira e Joaquina Pereira Ferreira e as numerações do edifício haviam sido
alteradas para 34 e 36. Consta também neste documento que foi realizada a imissão de posse
do imóvel para o Município do Rio de Janeiro em 1999 e foi concedido o 34 ao edifício após
o habite-se das obras de reabilitação concluídas em 2002. As diversas mudanças de
proprietários, muitos deles estrangeiros, e de numeração, como ocorreram neste e em diversos
edifícios da região, indicam as transformações urbanas pelas quais passou a área central e a
complexa questão fundiária que caracteriza o Morro da Conceição e seu entorno.
A respeito da proteção do cortiço enquanto patrimônio arquitetônico sabe-se que o
tombamento provisório deste e de diversos outros edifícios na área definida pelo Projeto
SAGAS foi solicitado através da Lei 166 de 27 de maio de 1980 e do Decreto 5047 de 17 de
abril de 1985. O cortiço foi tombado em definitivo pelo Conselho Municipal de Proteção do
Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro através do Decreto 6057 de 23 de agosto 1986 como
edificação residencial (cortiço) e comercial. Também foi tombada, por este mesmo decreto,
uma pintura de autoria de Manoel Araújo Rodrigues, localizada no Café e Bar Príncipe Pompeu
(hoje inexistente). Não foi encontrada nos documentos e pastas pesquisadas no SEDREPAHC
nenhuma informação específica sobre as causas para o tombamento do cortiço. Supõe-se que
tenha sido solicitado pelo fato do edifício ter conservado muitas das características originais
desta tipologia habitacional do culo XIX (cômodos voltados para pátio interno, equipamentos
coletivos, materiais construtivos, volumetria, entre outros) e não ter sofrido muitos acréscimos
ao longo do tempo. Pode-se afirmar que o tombamento deste edifício foi resultado da nova
política de preservação adotada a partir da década de 1970 no Brasil, que considerou como
patrimônio os bens históricos e culturais ligados às classes populares.
Tipologia arquitetônica
Trata-se de um prédio com dois pavimentos, área construída de 1004,72 e unidades
residenciais agrupadas em quatro alas que circundam um pátio interno retangular. A fachada
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126
principal do edifício localiza-se na rua Senador Pompeu e por esta se tem acesso ao pátio e às
duas lojas. A existência do pátio central descoberto e da fachada com largura maior que os
sobrados tradicionais deve-se ao remembramento de dois lotes estritos e profundos, como foi
visto anteriormente, o que possibilitou o surgimento da tipologia peculiar do cortiço.
A fachada principal apresenta forma retangular, com a largura maior que a altura, revestimento
em emboço e pintura, coroamento em platibanda e quatorze esquadrias dispostas em dois
níveis, sendo sete portas no pavimento inferior e sete janelas no pavimento superior.
Comparando-se a fachada proposta pelo projeto de reforma em 1909 com aquela encontrada
em 1995, verificou-se mudanças nos tipos de vãos das esquadrias e na decoração da alvenaria.
Em 1909 as portas ao nível do térreo apresentavam vergas retas (figura III.9), enquanto que na
década de 1990 apresentavam vergas curvas, em arco pleno (figura III.10). Além deste fato, as
esquadrias do pavimento superior apresentavam elementos decorativos no início do século XX,
que na última década deste século não existiam mais. Durante a pesquisa não foram
encontrados registros da época destas alterações. Também não foi descoberto se os elementos
de fachada previstos em 1909 foram, de fato, executados.
Fig.III.9 Fachada proposta em 1909. AGCRJ, 1909. Fig.III.10 Fachada na década de 1990. CEBRIAN, 1995.
O pátio é um espaço retangular de 7,50 x 24,50m que serve como acesso aos cômodos do
pavimento inferior e à escada que conduz à circulação do pavimento superior (figura III.11).
Este ambiente também funciona como prisma de iluminação e ventilação para todos os
cômodos, abriga os tanques de uso comunitário e é utilizado para atividades domésticas e de
lazer. Caracterizam as fachadas internas do pátio o balcão
4
em madeira que serve de circulação
4
Vasconcellos (1979, p.105) define balcão como uma peça sacada em pavimento superior que permite o trânsito
de pessoas, diferentemente da varanda e do alpendre, que são cobertos e apoiados diretamente no solo, e da
sacada, considerada como peça saliente e descoberta que não permite o trânsito.
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
127
no pavimento superior e esquadrias de diferentes tipologias, muitas delas com bandeiras
triangulares em veneziana (figura III.12).
Fig.III.11 Espacialidade do pátio interno. Autor desconhecido, Fig.III.12 Elementos compositivos das fachadas internas.
data indefinida. Novas Alternativas, 2000.
Quanto ao histórico construtivo do cortiço, Cavalcanti (1878) indicou que em 1878 o imóvel
apresentava apenas um pavimento e era ocupado da seguinte forma: no nº 26 existiam trinta e
nove cômodos e no 28 havia uma venda e dois cômodos. Em 1909 foi solicitada à Prefeitura
a reconstrução do edifício, cuja licença foi concedida em 15/09/1909. De acordo com o projeto
de reforma e acréscimo (Anexo IV) e o requerimento do proprietário
5
, as obras
compreenderam a concretagem da área coberta junto à rua Senador Pompeu, a construção do
pavimento superior da ala frontal, a execução de cozinhas, latrinas e banheiros comunitários
nos fundos do lote, o revestimento das paredes e a abertura de duas clarabóias. Não foram
encontrados registros específicos sobre a época de construção do pavimento superior
contornando o pátio nas alas laterais e dos fundos, a execução dos tanques comunitários e a
transformação da cozinha e depósito no módulo dos fundos em estalagem. Entretanto, a partir
da análise do projeto de 1909, constatou-se que o pavimento superior foi construído entre
1878 e 1909, pois as alas laterais são demonstradas de forma esquemática apesar de não
mostrar a divisão dos cômodos, os tanques foram construídos após 1909, pois não aparecem
nas plantas, e a transformação do módulo posterior em estalagem também é posterior a 1909,
uma vez que de acordo com o projeto de reforma esta parte do edifício seria destinada aos
equipamentos coletivos.
Com relação ao programa arquitetônico e elementos construtivos existentes no período de
1910 e 1985, o Inventário do SEDREPAHC (1985) forneceu a seguinte descrição:
5
As plantas e o pedido de licença pesquisados no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro indicaram que os
engenheiros responsáveis pelo projeto e pela execução da obra foram Pimentel e Meiale.
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128
O térreo apresenta 12 cômodos compostos, cada um deles, por porta e janela com
cancela. Ressalta o gosto Neogótico simplificado nas esquadrias com bandeiras
triangulares em veneziana. Na área comum, está localizada uma bateria de tanques
(8), coberta por um telheiro [...] também nesta área estão localizados os banheiros
comuns e uma cozinha que atende apenas a quatro cômodos. O segundo pavimento é
composto por vinte cômodos e um W.C. com mesmo partido arquitetônico do térreo.
O pavimento possui, em toda a sua extnsão, um corredor modulado por pilaretes de
madeira com guarda corpo, também em madeira, cujos módulos são em “X”.
A análise de Cebrian (1995) a este respeito difere um pouco do que foi informado pelo
SEDREPAHC, talvez pelo fato do edifício ter sofrido modificações ou acréscimos no período de
1985 a 1995. De acordo com a autora, o programa na década de 1990 compreendia:
No pavimento inferior: treze cômodos (com aproximadamente 10m² cada um), três
sanitários (sendo um feminino e dois masculinos), uma cozinha, um depósito, oito tanques
coletivos e duas lojas voltadas para a rua Senador Pompeu;
No pavimento superior: vinte e dois cômodos, um sanitário e um apartamento. Este último
ocupava a área correspondente a três cômodos e possuía sanitários e cozinha privativos.
Fig.III.13 Programa e espacialidade do pavimento inferior. Desenho do autor, 2009.
Fig.III.14 Programa e espacialidade do pavimento superior. Desenho do autor, 2009.
Como foi verificado pelas descrições, o fato do edifício de ser colado nas divisas e a presença de
lojas na testada do lote e habitações no pavimento superior, remetendo à tipologia do sobrado,
guardam semelhanças com a produção arquitetônica do período colonial. As similaridades
entre o cortiço analisado e os sobrados podem ser percebidas inicialmente pela forma e ritmo
das aberturas, pelo gabarito reduzido e alinhamentos. Segundo Reis Filho (1970, p.24),
ANTIGO Nº 26
ANTIGO Nº 28
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
129
a uniformidade dos terrenos correspondia à uniformidade dos partidos arquitetônicos:
as casas eram construídas de modo uniforme e, em certos casos, tal padronização era
fixada nas Cartas Régias ou em posturas municipais. Dimensões e número de
aberturas, altura dos pavimentos e alinhamentos com as edificações vizinhas foram
exigências correntes no século XVIII. Revelam uma preocupação de caráter formal, cuja
finalidade era, em grande parte, garantir para as vilas e cidades brasileiras uma
aparência portuguesa.
Fig.III.15 Relação entre o lote do cortiço e os demais lotes III.16 Relação entre o partido arquitetônico do cortiço e dos demais
da rua Senador Pompeu. PINHO e SIGAUD, 2000. sobrados da rua Senador Pompeu. Foto do autor, 2009.
Apesar do interior do cortiço possuir características peculiares, este também apresenta
semelhanças com os sobrados em termos de setorização. As comparações podem ser feitas
com as lojas na parte frontal do edifício configurando o setor social, de contato com o público,
os cômodos destinados ao repouso e a circulação no setor intermediário da edificação e os
equipamentos coletivos e de serviço, como os banheiros, cozinhas e tanques no fundo do lote.
Fig.III.17 Comparação entre a setorização do sobrado e do cortiço. REIS FILHO, 1970, p.29 e desenho do autor, 2009.
SERVIÇO
REPOUSO E
CIRCULAÇÃO
SOCIAL
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130
Outras semelhanças identificadas foram as características das janelas, cujas folhas são divididas
em duas partes e remetem a cocheiras e estrebarias, comuns no andar térreo de alguns
sobrados coloniais destinados a guarda de animais, a presença de cômodos enfileirados, como
ocorria nas senzalas e a distribuição dos cômodos em torno de um pátio interno, típico das
chácaras coloniais. Através destas características, percebe-se no edifício a influência de três
tipologias habitacionais precedentes.
Quanto às diferenças entre o edifício analisado e os sobrados, pode-se afirmar que, por se
tratar de uma habitação popular, o funcionamento do cortiço não se baseava no trabalho
escravo como ocorria nos sobrados coloniais, o que justifica em parte as condições de
insalubridade nas moradias para famílias de baixa renda. Também não se identifica a relação
entre o tipo de habitação e os estratos sociais, característica do período colonial. Esta relação é
demonstrada por Reis Filho (1970, p.28) quando considera que “habitar um sobrado significava
riqueza e habitar casa de ‘chão batido’ caracterizava a pobreza”. Apesar de se assemelhar à
tipologia do sobrado, com dois pavimentos, o edifício analisado destinava-se à moradia
popular. Enquanto o térreo dos sobrados destinava-se às lojas e acomodação de escravos e
animais, o pavimento inferior do cortiço, além das lojas, também é ocupado por habitação.
Neste caso, a tipologia não corresponde à condição social do usuário. Outra diferença
identificada diz respeito à ventilação e iluminação dos cômodos, que se mostraram melhores
no cortiço do que nos sobrados. Ao estudar estes últimos, Freyre (1961, p.208) considerou que
“na habitação do burguês intermediário, tanto quanto na do menos abastado e na do mais
opulento, o sistema de divisão de peças era o mesmo: sala da frente, grande e às vezes bem
arejada; o resto da casa, úmido, escuro. Alcova e corredores sombrios”. No caso específico do
cortiço da rua Senador Pompeu 34 a presença do pátio interno e de esquadrias com veneziana
e vidro representou avanços em relação à salubridade das unidades, com a entrada de mais luz
e ar no interior dos cômodos, e demonstrou qualidade ambiental superior quando comparado
aos sobrados coloniais e às demais tipologias habitacionais populares.
Tecnologia construtiva
As técnicas e materiais utilizados para a construção do edifício compreenderam as fundações
em pedra de mão, as alvenarias auto portantes em tijolo de barro maciço no pavimento
inferior, as paredes divisórias de taipa, as estruturas de piso (unidades e circulação externa do
pavimento superior) compostas por barrotes de madeira tipo pinho de Riga de 6 x 10 cm, os
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pisos em tabuado corrido com juntas secas, o forro em tabuado liso e a cobertura composta
por estrutura de madeira e telhas cerâmicas dos tipos capa-canal e francesa (SOARES, 1996),
com uma água voltada para o terreno nas alas laterais e dos fundos e duas águas na ala frontal,
sendo uma voltada para o terreno e outra voltada para a platibanda na fachada principal.
Fig.III.18 Paredes em taipa. Foto do autor, 2008. Fig.III.19 Estrutura de piso em madeira. Foto do autor, 2008.
Com base nas características descritas observa-se a presença simultânea de elementos
associados ao primitivismo tecnológico do período colonial, representados pelos tipos de
fundação, alvenaria e estrutura dos pavimentos, e elementos relacionados às novas técnicas e
materiais desenvolvidos a partir da industrialização, identificados através dos tipos de telha e
esquadria empregados. Nesse sentido é possível afirmar que a diversidade técnico-construtiva
verificada no edifício reflete a própria evolução tecnológica que caracterizou a produção
arquitetônica da segunda metade do século XIX. Segundo Reis Filho (1970, p.48), o
aperfeiçoamento das técnicas construtivas durante este período possibilitou o surgimento de
“casas construídas com tijolos e cobertas com telhas de tipo Marselha, onde a madeira serrada
permitia um acabamento mais perfeito de janelas, portas e beirais”. Este fato pode ser
observado no cortiço através da presença de telhas do tipo francesa, em meio a telhas do tipo
capa-canal, e pela tipologia das esquadrias de madeira, algumas com folhas em veneziana e
vidro e outras com bandeiras triangulares em veneziana
6
. O balcão do pavimento superior
também demonstra avanços com relação às técnicas de aparelhamento da madeira. Além das
peças verticais e horizontais que compõem a estrutura, verifica-se nos quadros do guarda-
corpo a presença de peças diagonais definidas como Cruz de Santo André ou Aspas Francesas
6
Vasconcellos (1979, p.107) considera que a partir do século XIX difundem-se as janelas de verga redonda ou em
arco pleno, geralmente com bandeiras de vidro em caixilhos fixos, e surgem outros tipos de esquadrias, como o
ogival, conseqüente da tentativa de neo-goticismo.
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(VASCONCELLOS, 1979, p.34), utilizadas para melhor estabilizar o conjunto e transmitir as
cargas deste para os barrotes do piso.
Fig.III.20 Tipos de esquadrias. Foto do autor. 2008. Fig.III.21 Estrutura do balcão. Foto do autor. 2008.
O processo de reabilitação
Em 1996, quando foram realizados os primeiros relatórios de vistoria e apresentadas as
primeiras propostas de intervenção pela Secretaria Municipal de Habitação (SMH), foi
identificada a degradação de diversos elementos construtivos. De acordo com relatório de
Soares (1996), as estruturas em madeira do piso do pavimento superior, do telhado e da
circulação externa apresentavam alto grau de apodrecimento devido ao ataque de cupins e
infiltração de águas pluviais. A fundação, alvenarias e pilares foram considerados estáveis.
Fig.III.22 Estrutura deteriorada da circulação do pavimento superior. Novas Alternativas, 1999.
Como se trata de um bem tombado, as diretrizes para recuperação e substituição destes
elementos construtivos deteriorados, bem como a realização de melhorias nas condições de
habitabilidade do imóvel foram definidas por um Grupo de Trabalho, criado em 1996 e
composto por técnicos do DGPC e SMH, e aprovadas pelo Conselho Municipal de Proteção do
Patrimônio Cultural (CMPC). Os parâmetros de intervenção e uso adotados para a reabilitação
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
133
do edifício, o programa proposto e as especificações dos serviços principais foram
apresentados através do Memorial Descritivo da Reabilitação do Cortiço da rua Senador
Pompeu, nº34/36 (Anexo V). Algumas diretrizes estabelecidas de grande importância foram
(PREFEITURA, 1999):
conservação da forma original do prédio (fachadas, esquadrias, alpendre, telhados);
preservação de trechos para registro dos métodos construtivos utilizados na época;
manutenção do uso residencial nos moldes de cortiço, para o qual o edifício foi
concebido oiginalmente;
desdobramento de duas unidades residenciais originais em uma, conservando o
ritmo original da compartimentação;
instalação de banheiro e cozinha em cada unidade residencial.
O Memorial também possibilitou a identificação dos elementos recuperados e substituídos no
processo e os materiais de acabamento utilizados. Entre as intervenções realizadas merecem
destaque:
Fundações – as fundações, do tipo baldrame, sofreram reforço.
Lajes a estrutura em barroteamento de madeira de lei (Pinho de Riga) das unidades do
pavimento foi substituída por laje tipo volterrana, com contrapiso em cimentado. A laje do
térreo foi mantida e o contrapiso em cimentado foi recomposto.
Pisos o piso original em tabuado de madeira foi recuperado nas unidades da ala frontal e
substituído por pisos em cimentado e em cerâmica (box dos banheiros) nas demais
unidades. O piso original em pé-de-moleque no pátio foi substituído por cimentado áspero.
Alvenarias foram utilizadas alvenarias em tijolo maciço autoportante no térreo
(restauradas conforme o original), em concreto celular nas fachadas internas do
pavimento (substituiu a taipa existente) e em tijolo cerâmico furado, entre as unidades, no
térreo e 1º pavimento (substituiu a taipa existente). O revestimento das alvenarias da
fachada frontal foi feito com emboço, reboco e pintura, o das alvenarias das fachadas
internas receberam tratamento com argamassa de cal e pintura (figura III.23) e o das
alvenarias internas foi feito com emboço, pintura e azulejo (áreas molhadas).
Circulação no pavimento superior foi recuperada toda a estrutura em madeira (ipê), com
substituição de todas as peças defeituosas ou danificadas (figura III.24). O piso, em pranchas
de madeira apoiadas sobre barrotes, foi substituído por outro semelhante ao original.
Tanque coletivo teve a estrutura remanescente demolida e foi reconstruído, conforme o
original, com novas instalações hidrossanitárias e recomposição do telhado.
Esquadrias as originais remanescentes foram restauradas através de decapagem química,
emassamento e pintura com substituição de partes danificadas por madeira de lei. As
demais foram refeitas conforme o original.
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134
Instalações foram substituídas as redes elétrica, hidráulica, sanitárias e de gás e
reestruturadas as redes de águas pluviais e drenagem. Foram implantadas redes para
futuras instalações telefônicas e de antena e executado um banheiro para cada unidade
residencial, composto por lavatório, vaso sanitário e chuveiro.
Forros os de madeira existentes nas unidades foram substituídos por lambri de pinus com
revestimento em pintura. Os forros da circulação externa do 1º pavimento foram
recuperados. Foram executados rebaixos em gesso nos banheiros.
Coberturas todo o madeiramento foi substituído por peças tratadas contra cupim. Parte
das telhas cerâmicas tipo capa-canal foi reaproveitada (no módulo dos fundos) e as demais
substituídas por telhas francesas. Foi colocada ainda uma subcobertura Tyvec para
impermeabilizar o telhado. Houve recomposição do telhado original da ala frontal.
Fig.III.23 Obras nas alvenarias. Novas Alternativas, 2000. Fig.III.24 Obras na circulação. Novas
Alternativas, 2000.
Além das intervenções descritas, o processo de reabilitação do cortiço finalizado em 2003
(figuras III.25 e III.26) transformou os trinta e oito cômodos e as instalações comerciais
existentes em vinte e três apartamentos de um quarto e duas lojas. O projeto básico de
arquitetura (figuras III.27 a III.32) foi desenvolvido pela Secretaria Municipal de Habitação, que
também atuou na fiscalização da obra executada pela empresa Conservadora Luso Brasileira. O
DGPC limitou-se documentar as intervenções no cortiço, emitindo pareceres técnicos ao CMPC.
Fig.III.25 Cortiço antes da reforma. Novas Alternativas, 2000. Fig.III.26 Cortiço após a reforma. Novas Alternativas, 2003.
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Com base nas informações pesquisadas sobre o processo de reabilitação do edifício e nos
diversos conceitos relativos à intervenção no patrimônio arquitetônico estudados no Capítulo 2
foi possível analisar a influência das mudanças ocorridas no Programa Novas Alternativas nas
obras realizadas no cortiço, os conflitos gerados pelos tipos de intervenção adotados, a
adequação das diretrizes estabelecidas para a recuperação do edifício aos critérios definidos
pelos teóricos da restauração e o posicionamento do DGPC frente às intervenções propostas.
Através de pesquisas realizadas, constatou-se que o imóvel da rua Senador Pompeu 34 foi o
último edifício da tipologia cortiço recuperado pela Prefeitura no Rio de Janeiro e marcou
definitivamente a transição entre os objetivos iniciais e atuais do Programa Novas Alternativas,
o que pode ser comprovado através de alguns traços característicos presentes tanto na
arquitetura como nos procedimentos operacionais. No que diz respeito à arquitetura, esta
transição foi observada através das mudanças nas unidades habitacionais, que passaram a
contar com um quarto e banheiros individualizados, ainda que sem área de serviço, e da
manutenção da lavanderia e do pátio coletivos, conforme as primeiras propostas desenvolvidas
pela Prefeitura. Quanto aos procedimentos operacionais, verificou-se simultaneamente nas
intervenções realizadas a preocupação em conciliar a habitação e a preservação do patrimônio,
associada às intenções iniciais do Programa, e a adoção de outras medidas relacionadas às
novas orientações do Novas Alternativas, tais como a substituição dos moradores anteriores de
baixa renda por novos de baixa renda e classe média baixa, a mudança do sistema de locação
social pelo sistema de arrendamento, a diversificação da fonte de recursos para a realização
das obras e a alteração do tipo de gestão que antes era realizado por uma ONG e atualmente é
conduzido pela Caixa Econômica Federal (CAIXA).
Além da coexistência de elementos relacionados às duas fases do Programa, identificou-se
também na recuperação do edifício uma mistura de intervenções que compreenderam a
restauração, a reabilitação e a reconstrução, o que gerou alguns conflitos entre as premissas de
preservação do patrimônio e de atualização funcional da edificação. Esta dicotomia entre
preservação e modernidade, identificada nas intervenções em edifícios históricos, podem ser
claramente observadas na comparação das idéias defendidas por Glauco Campello e Ramón
Gutiérrez. Ao tratar das intervenções no patrimônio arquitetônico localizado em sítios
históricos, Campello (1999, p.7) defende que as construções de características homogêneas,
da mesma época do sítio tombado, ou que guardam com ele um alto grau de afinidade, devem
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ser tratadas com os critérios da preservação e restauração”, admitindo apenas uma liberdade
relativa nas intervenções internas. Demonstrando maior flexibilidade com relação ao assunto,
Gutiérrez entende a reabilitação como alternativa mais viável na recuperação de habitações em
áreas históricas e indica que cada caso deve ser estudado à parte. Segundo este autor,
a oportunidade de oferecer moradia e resgatar o patrimônio exige também que se
encontre a justa medida. Falamos em reabilitar uma moradia transformada em cortiço,
e não restaurá-la. Os limites serão fixados por cada caso onde se intervenha: suas
características, sua tipologia, o estado do imóvel, a valorização da obra no contexto, a
possibilidade de refuncionalização etc. Mas de qualquer forma, para que a obra seja,
de modo geral, mais econômica que a construção de uma moradia nova, é necessário
pensar em reabilitar e criar condições de habitabilidade e qualidade de vida digna em
moradias onde se deve implantar serviços comunitários, consolidar as estruturas,
repor elementos e dotar das instalações imprescindíveis. Se pensarmos em restaurar
cada um dos edifícios de um centro histórico, estaremos falando de uma operação
impossível (GUTIÉRREZ, 1989, p.146).
Pode-se dizer que, no caso do cortiço, a degradação de diversos elementos construtivos, o
comprometimento da estrutura e a necessidade de melhoria das condições de conforto
justificariam a reabilitação como intervenção principal, entretanto observou-se que durante as
obras o fato do edifício ser um patrimônio tombado norteou os principais parâmetros de
intervenção e determinou a prevalência da preservação sobre a modernização. Nesse sentido,
apesar de terem sido executadas obras importantes no sistema estrutural e na organização
espacial das unidades residenciais, verificou-se que as diretrizes elaboradas se pautaram mais
pela valorização e preservação dos aspectos estéticos e históricos do edifício do que pela
melhoria de seu desempenho funcional e atualização tecnológica, o que demonstrou a
preferência pela restauração como intervenção mais importante e uma maior afinidade com as
idéias conservadoras de Campello.
Analisando com maior profundidade as diretrizes e ações adotadas para a preservação do
cortiço, observou-se que algumas respeitaram certos critérios estabelecidos pelos teóricos da
restauração, enquanto outras mostraram-se inadequadas. Com relação aos critérios
respeitados, verificou-se que as diretrizes definidas para a recuperação do edifício seguiram as
orientações de Giovannoni (1998, p.148) quanto às modificações na volumetria dos edifícios
históricos, as quais indicam que é preferível “valorizar internamente e restaurar os edifícios
existentes, que acrescentar e unir elementos exteriores novos” e “reduzir a densidade das
construções e da população, que aumentar o volume das edificações”. Nesse sentido, as
intervenções realizadas no imóvel deram preferência à restauração dos elementos construtivos
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141
existentes, evitando acréscimos e preservando a volumetria original, e atuaram no sentido da
redução do número de moradores no edifício, o que comprova a adequação às considerações
de Giovannoni. Também foram atendidas as recomendações de Campello (1999, p.6-7) quanto
à introdução de materiais novos ou cnicas contemporâneas apenas nas partes não visíveis da
construção, o que foi conseguido através da execução das lajes em concreto e da inserção de
tijolos cerâmicos e de concreto celular no interior das unidades. A lei da mínima intervenção
defendida por Boito (2002, p.22) também foi respeitada durante as obras, uma vez que foram
reaproveitados ao máximo os materiais originais e susbstituídos apenas aqueles em avançado
estado de degradação.
Com relação aos critérios não atendidos, verificou-se que não foi respeitado o princípio da
reversibilidade das intervenções no tocante às modificações realizadas no sistema construtivo,
caracterizadas pela substituição dos barrotes originais de madeira por laje tipo volterrana e das
alvenarias em taipa por blocos cerâmicos e de concreto celular. Trata-se de um caso onde os
materiais inseridos não podem ser retirados ou substituídos sem danos ao Bem, entretanto,
devido ao estado de deterioração da estrutura original, pode-se dizer que esta era uma obra
considerada necessária para melhorar a utilização e durabilidade da edificação. Estas
modificações se justificam através das considerações de Campello (1999, p.6-7), que aceita a
substituição dos materiais originais por materiais modernos apenas em casos extremos e com o
objetivo de “racionalizar sua manutenção, garantir sua estabilidade, melhorar suas condições
de conforto ou prolongar a sua vida útil”.
Além do princípio da reversibilidade, as intervenções também desconsideraram as orientações
de Boito (2002, p.21-22) no que diz respeito à utilização de materiais diversos do original nos
acréscimos, complementações de partes deterioradas e preenchimento de lacunas para coibir
falsificações”. Esta inadequação foi verificada na substituição do piso da circulação do
pavimento superior e de algumas esquadrias que, apesar de terem sido refeitos conforme o
original, não apresentam nenhum traço que os diferencie dos elementos remanescentes ou
que indique se tratar de elementos novos introduzidos durante as obras. Neste caso, a opção
pela inserção de elementos idênticos ao original sem a devida distinção gerou dificuldades na
identificação do que pertence de fato ao edifício e o que foi acrescentado durante a
reabilitação, comprometendo a autenticidade da edificação histórica e dando margem a
falsificações.
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142
Outras inadequações a respeito do processo de restauração / reabilitação do edifício foram
indicadas pelo Departamento Geral de Patrimônio Cultural (DGPC), que participou da definição
das diretrizes de intervenção e acompanhou a execução das obras. De acordo com relatórios
consultados na gerência do Programa Novas Alternativas em 2007 verificou-se que este Órgão
de preservação se mostrou contrário às sugestões propostas pela Secretaria Municipal de
Habitação referentes à substituição do sistema construtivo, às modificações nas unidades
residenciais e às alterações na cobertura –, por entender que estas prejudicariam a
autenticidade estética e histórica do edifício.
Sobre as intervenções no sistema estrutural, o DGPC considerou que o partido adotado
descaracterizou o cortiço como tipologia construtiva ao inserir elementos como laje pré-
moldada e fechamentos em pumex, entre outros materiais contemporâneos colocados em
substituição aos elementos originais. No entendimento do Órgão, “o sistema construtivo dos
cortiços é um dos mais importantes pontos a serem preservados pelo tombamento, tendo em
vista o contexto em que foram construídos” (PREFEITURA, 1996, p.3).
Quanto às modificações nas unidades habitacionais, o DGPC julgou que a intervenção
desconsiderou o cortiço como tipologia funcional ao inserir sanitários individualizados nos
apartamentos e ao reorganizar seus espaços internos. Na visão deste Órgão, tais alterações
comprometeram uma das principais características deste tipo de habitação popular, os
banheiros coletivos, e interferiram na compartimentação original dos cômodos, unificados para
a formação das novas unidades.
A respeito das obras na cobertura, o DGPC questionou as modificações realizadas pelo projeto
de reabilitação na tipologia original do telhado
7
devido à inserção de prismas de iluminação e
ventilação nos fundos do lote. Este Órgão também considerou questionável a reprodução,
durante as obras, do entelhamento misto conforme o original, uma vez que se corria o risco de
incorrer num caso de falsificação. Nesse sentido, sugeriu a colocação de telhas francesas em
toda cobertura e o reaproveitamento das telhas canais remanescentes para a cobertura dos
tanques. Na prática esta orientação foi adotada parcialmente, uma vez que as telhas capa-canal
foram colocadas no módulo dos fundos e as telhas francesas nos outros módulos e no tanque.
7
A cobertura original do cortiço era composta por telhas do tipo capa-canal, nas alas laterais e dos fundos, e
finalizada por uma faixa de telhas francesas que protegiam a circulação do pavimento superior. A cobertura da ala
frontal, diferentemente do restante do edifício, sempre foi composta por telhas francesas.
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Analisando a posição do DGPC frente às intervenções, verificou-se uma preocupação excessiva
deste Órgão com a recuperação e preservação dos elementos originais do edifício em
detrimento da solução dos problemas funcionais existentes. De um modo geral, constatou-se
que a rigidez dos critérios adotados para a restauração do edifício e a opção pela mínima
intervenção restringiu algumas ações importantes e necessárias de reabilitação, tais como a
inserção de áreas de serviço nas unidades e a substituição de materiais de difícil manutenção
por outros mais duráveis, e refletiu-se em diversos problemas de conservação e uso no pós-
ocupação, como será verificado a seguir nas observações realizadas no local e nas entrevistas
com os moradores.
Análise técnico-funcional no pós-ocupação
Escolha dos aspectos de análise
Foram selecionados para análise apenas os aspectos construtivos e funcionais da edificação.
Entre os elementos construtivos que serão verificados estão o sistema estrutural, alvenarias,
cantarias, revestimentos de piso, parede e teto, esquadrias, cobertura e instalações prediais.
Para verificação dos aspectos funcionais foram escolhidos dois ambientes: as unidades
habitacionais e as áreas comuns.
Após a escolha dos aspectos, foram definidos os parâmetros analíticos. Estes parâmetros
correspondem ao objeto da investigação nos elementos escolhidos. Nos elementos
construtivos serão verificadas as patologias construtivas e com relação aos elementos
funcionais serão examinadas as apropriações e modificações nos espaços.
Visitas realizadas
Foram realizadas quatro visitas ao edifício para coleta de dados. A primeira visita ocorreu na
manhã do dia 20/04/07, com duração de uma hora. Nesta ocasião foram observadas algumas
características do entorno do edifício, tais como acesso, vias principais, tráfego e paisagem. Não
foi possível neste dia fazer vistorias no interior do cortiço, uma vez que o síndico não se
encontrava no local. O produto desta etapa foi o registro fotográfico do entorno e da fachada
principal do edifício.
A segunda visita aconteceu na manhã do dia 21/04/07, com duração de três horas. Foi
estabelecido o contato com a Sra. Maria Izabel, síndica e moradora do cortiço, que
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acompanhou a visita. Neste dia foram realizadas análises visuais do estado de conservação do
edifício, anotações sobre as patologias construtivas e intervenções físicas identificadas e
registros fotográficos. Foi possível visitar ainda os apartamentos 205, 212 e 213. Entre a
segunda e a terceira visita foi formulado um roteiro técnico para orientar as observações das
visitas subseqüentes.
A terceira visita foi feita na manhã do dia 28/10/07, com duração de quatro horas. Nesta data
foi registrado no roteiro preliminar os danos e intervenções encontrados, as causas prováveis e
a localização destas anomalias. Foram feitos novos registros fotográficos e visitas aos
apartamentos 101, 106, 206 e 207.
A quarta e última visita ocorreu em 20/12/08, ao longo de todo o dia. Nesta ocasião foram
feitas entrevistas com os moradores a fim de descobrir as opiniões e informações relativas às
condições de moradia e conservação do edifício.
Coleta de dados
Esta etapa compreendeu a pesquisa de informações sobre o edifício e todos os agentes
envolvidos na sua produção e uso. Com esse objetivo, foram utilizados dois procedimentos:
observações no local, através de fotos e levantamentos, para verificação e avaliação do
estado atual de conservação e utilização do edifício. Foram elaborados nesta fase quadros,
fichas e mapas organizando as informações obtidas;
realização de entrevistas com os moradores do edifício analisado. Estas entrevistas tiveram
por finalidade descobrir informações sobre os níveis de satisfação dos usuários e as formas
de uso, conservação e administração do edifício realizadas a partir de 2003.
Observações no local
a) Patologias Construtivas
Sistema estrutural
Não foram identificadas patologias que comprometessem o sistema estrutural nos pilares em
tijolo maciço no térreo, nos pilares em madeira da circulação externa do pavimento superior e
nas lajes em concreto das unidades do pavimento superior. As fundações não puderam ser
verificadas, porém a inexistência de recalques ou rachaduras nos demais elementos
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construtivos indica que não problemas nesse sentido. Os únicos elementos que
apresentaram patologias foram os barrotes em madeira do tipo ipê na circulação externa do
pavimento superior. Foram identificadas manchas em todo o barroteamento devido à
infiltração de água das chuvas e de algumas plantas existentes no local. Verificou-se que as
peças estão visivelmente úmidas e com a cor alterada (figura III.33). Segundo Prudêncio (2007)
trata-se de um problema meramente estético, não havendo perigo de desabamento com
relação ao estado atual de conservação.
Fig.III.33 Manchas de umidade nos barrotes. Foto do autor, 2007.
Alvenarias e Cantarias
Verificou-se que as alvenarias não apresentaram patologias, entretanto as cercaduras
8
em
pedra das esquadrias localizadas na fachada da rua Senador Pompeu apresentam crostas
negras
9
e pichações (figura III.34). formação de manchas escuras nas molduras das portas e
na base do edifício devido aos respingos de água da chuva com sujeira e às incrustações de
fuligem. A ocorrência de manchas é acentuada pela inexistência de um beiral na parte superior
da edificação, que ajudaria a afastar as águas pluviais do plano de fachada, evitando assim os
respingos. Foram identificadas também diversas pichações feitas com tintas e grafites
decorrentes das ações de depredação.
8
De acordo com Almeida (2000, p.12), Cercaduras são elementos que emolduram vãos de porta e janelas das
edificações. Quando em pedra, as partes que constituem peitoril, ombreiras e vergas nas janelas, soleira, ombreira
e verga nas portas são confeccionadas em blocos separados e recebem esmerado tratamento de cantel.
Executadas para permanecerem aparentes, têm a finalidade estética de ressaltar a cadência dos cheios e vazios da
fachada do edifício, enriquecendo-o e valorizando a leitura arquitetônica.
9
Crosta Negra é a incrustação de fuligem na superfície das pedras que provocam manchas escuras. Os elementos
produzidos na queima de combustíveis, combinados com a umidade do ar, dão origem a ácidos que também
atacam a pedra, produzindo crostas ou corroendo-a.
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Fig.III.34 Manchas e pichações na cantaria. Foto do autor, 2007.
Revestimentos de piso
Os revestimentos cerâmicos dos pisos nas unidades residenciais visitadas apresentam bom
estado de conservação. Com relação ao tabuado de madeira existente nas unidades 211, 212 e
213, localizados na ala frontal do edifício, foram verificadas diversas fissuras e arranhões
decorrentes do uso e do próprio desgaste natural do material, uma vez que se trata de um
elemento original do edifício que não foi substituído pelas obras de reabilitação.
A respeito do piso em madeira localizado na circulação externa do pavimento superior, foram
observadas diversas manchas de umidade ocasionadas pela infiltração de água (figura III.35). A
ação de regar as plantas colocadas no piso pelos moradores pode ter contribuído para o
surgimento das manchas que normalmente se encontram junto à alvenaria. O acúmulo de água
próximo às paredes indica também problemas no caimento do piso.
Fig.III.35 Manchas no piso de madeira. Foto do autor, 2007.
O cimentado áspero existente no pátio interno apresentou diversas fissuras e manchas de
umidade que podem estar relacionadas à infiltração de água, ao desgaste pelo uso ou mesmo
pela qualidade do material empregado na obra (figuras III. 36 e 37).
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Figs.III.36 e III.37 Manchas no piso do pátio. Foto do autor, 2008.
Revestimentos de parede
Os revestimentos cerâmicos das paredes nas unidades residenciais visitadas apresentam bom
estado de conservação. O revestimento das paredes nas áreas externas foi um dos elementos
construtivos que mais apresentou patologias construtivas. A qualidade dos materiais utilizados
na obra associada à presença constante da umidade ocasionou o surgimento de fissuras nas
argamassas de revestimento, bem como descolamentos, manchas e empolamentos nas
pinturas. Também foram verificadas sujidades e pichações decorrentes do uso dos espaços.
Foi detectada fissura no emboço da alvenaria de tijolo maciço no pavimento térreo, junto ao
apartamento 101 (figura III.38). As origens mais prováveis dessa patologia são o acúmulo de
água na base da alvenaria, devido a problemas de caimento do piso ou drenagem insuficiente,
os respingos da água da chuva e a qualidade dos materiais utilizados na argamassa. Neste caso,
a umidade ascendente por capilaridade da água provocou a expansão e descolamento da
argamassa. A expansão da argila, presente na composição da alvenaria, pode ter contribuído
também para a erosão da argamassa.
Outra patologia identificada foi o descolamento
10
de parte do revestimento do prisma de
iluminação e ventilação junto à unidade 106 (figura III.39). Neste caso, a desagregação da
superfície do reboco e a descamação da pintura ocorreram em função da expansão dos sais
solúveis presentes na alvenaria, da infiltração de água oriunda da encosta do terreno (figura
III.40) e do vazamento nas instalações hidrossanitárias existentes no piso e parede do prisma.
10
Corresponde à queda da argamassa ou tinta da alvenaria na forma de escamas ou placas (VERÇOZA, 1991,
p.146).
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148
Fig.III.38 Fissura no emboço. Fig.III.39 Descolamento do revestimento. Fig.III.40 Umidade na encosta do prisma.
Foto do autor, 2007. Foto do autor, 2007. Foto do autor, 2007.
Foram observadas manchas de umidade na empena lateral esquerda do edifício, junto ao
telhado da ala frontal (figura III.41), e na laje de fechamento da escada (figura III.42). Com
relação à empena, a presença de umidade ascendente decorre da incapacidade do rincão em
dar vazão ao volume de água das chuvas. Neste caso, a origem da patologia pode estar
associada à execução inadequada dos rufos, à ausência de calhas condutoras de águas pluviais
e ao caimento inadequado do telhado. A respeito da escada, alguns trechos da pintura
apresentam manchas com coloração e texturas diferenciadas, o que pode ter sido causado pela
infiltração de água das chuvas e/ou existência de sais solúveis na argamassa.
Fig.III.41 Umidade na empena. Foto do autor, 2007. Fig.III.42 Manchas na pintura da escada. Foto do autor, 2007.
Ainda na escada, foram identificados empolamentos
11
na pintura da alvenaria de fechamento
lateral (figura III.43). Neste caso podem estar ocorrendo infiltrações de água através dos pontos
11
Klüppel e Santana (2007, p.180) definem empolamento como a formação de bolhas ou vesículas contendo
sólidos, líquidos ou gases, cujas origens estão nas superfícies mal preparadas ou oleosas, no excesso de umidade
na parede e no ambiente e na repintura sobre tinta de má qualidade.
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de fixação do guarda-corpo metálico na alvenaria, que foi recuperado durante as obras de
reabilitação.
As patologias nos revestimentos de parede também ocorrem na fachada frontal do edifício.
Verificou-se a presença de diversas manchas e pichações com tintas e esmaltes na pintura da
alvenaria que certamente contribuem para a descaracterização do conjunto arquitetônico
tombado (figura III.44). Estas ações de depredação foram encontradas apenas no nível do
pavimento inferior.
Fig.III.43 Empolamentos na pintura. Foto do autor, 2007. Fig.III.44 Pichações na pintura. Foto do autor, 2008.
Revestimentos de teto
A inadequação da madeira utilizada nos forros das unidades e circulações (lambri de pinus) e a
presença constante de umidade devido à infiltração da água das chuvas contribuíram para o
surgimento de algumas patologias construtivas neste elemento. Em grande parte das unidades
visitadas foram verificadas manchas de umidade no forro, junto à alvenaria, e sinais de
escorrimento de água na pintura da parede (figura III. 45). Nestes casos, a infiltração da água
está relacionada a problemas de estanqueidade da cobertura decorrentes de falhas de
execução e/ou falta de manutenção. A infiltração causou também o apodrecimento de trechos
do forro na circulação externa do pavimento superior. Observou-se que a maioria dos danos
nos forros ocorre neste pavimento. Também foram identificadas manchas de umidade no
rebaixo em gesso do banheiro da unidade 101 que estão relacionadas a vazamentos nas
instalações hidrossanitárias dos banheiros das unidades 201 e 213 (figura III. 46).
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150
Fig.III.45 Umidade no forro de madeira. Foto do autor, 2007. Fig.III.46 Umidade no forro de gesso. Foto do autor, 2007.
Esquadrias
A baixa qualidade dos materiais utilizados, a execução inadequada da obra, a infiltração
constante da água das chuvas e as ações de depredação ocasionaram a deterioração de
diversas esquadrias, tanto na área externa, como no interior das unidades.
No pátio interno foram encontradas esquadrias bastante danificadas, como é o caso da porta
dos medidores de gás no térreo (figura III.47). Após verificações no local, constatou-se que a
madeira utilizada era de baixa qualidade (aglomerado) e inadequada para uso externo. As
esquadrias internas de algumas unidades também apresentam sinais de deterioração, como é o
caso da porta do banheiro do cômodo 106 (figura III.48). Neste caso a infiltração da água
causou o apodrecimento do marco e o desgaste das ferragens, provocando a queda da porta.
Fig.III.47 Esquadria externa deteriorada. Foto do autor, 2007. Fig.III.48 Apodrecimento esquadria interna. Foto do autor, 2007.
A maior parte das esquadrias apresenta problemas relativos à pintura e à massa de
revestimento. A infiltração da água das chuvas e a falta de caimento adequado provocaram
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151
diversas fissuras nos revestimentos dos peitoris e folhas das janelas (figura III.49), que foram
encontradas com maior freqüência na fachada da rua Senador Pompeu.
Fig.III.49 Fissuras no peitoril da janela. Foto do autor, 2007.
Na fachada principal foram verificadas manchas e pichações com tintas e esmaltes nas
esquadrias de madeira (figura III.50), bem como o descascamento da pintura do portão de ferro
que acesso ao edifício, na sua superfície externa e interna (figuras III.51 e III.52). Estas ações
de depredação, assim como aquelas verificadas nas alvenarias, ocorrem somente no térreo.
Fig.III.50 Danos nas esquadrias de madeira Fig.III.51 Danos externos na esquadria Fig.III.52 Danos internos na esquadria
Foto do autor, 2007. de ferro. Foto do autor, 2007. de ferro. Foto do autor, 2007.
Cobertura
Todos os problemas construtivos identificados na cobertura estão relacionados à execução da
obra. Observou-se em alguns pontos o transpasse muito curto nas interseções dos planos do
telhado, o que pode ser um dos motivos de infiltração de água nas unidades (figura III.53).
Também foram encontrados problemas nos rufos metálicos do telhado, que apresentam
problemas de fixação na alvenaria e fissuramento na argamassa de assentamento (figura III.54).
Essas falhas geram vários pontos de infiltração na junção entre a cobertura e as empenas dos
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edifícios vizinhos. Provavelmente faltaram detalhes executivos e fiscalização para orientar a
correta condução da obra.
Fig.III.53 Transpasse curto entre telhas . Foto do autor, 2007. Fig.III.54 Fixação inadequada de rufos. Foto do autor, 2007.
Instalações prediais
Nas observações realizadas não foram identificados problemas nas instalações elétricas,
hidráulicas e de gás. Com relação às instalações hidrossanitárias, foram encontrados
vazamentos na caixa de visita do piso e na tubulação de ferro embutida na parede do prisma de
iluminação e ventilação junto à unidade 106 (figuras III.55 e III.56). Também foi identificado
vazamento nas instalações dos banheiros das unidades 201 e 213. As causas destes problemas
podem estar na execução inadequada da obra, na baixa qualidade das tubulações utilizadas ou
no uso incorreto.
Fig.III.55 Vazamento na caixa de visita. Foto do autor, 2007. Fig.III.56 Tubulação de ferro rompida. Foto do autor, 2007.
A respeito do sistema de águas pluviais, foi verificada a ausência de calhas e tubulações de
descida de água no pátio interno. No projeto de reabilitação foram especificadas calhas de
alumínio e prumadas de águas pluviais em PVC ao longo de todo o beiral do telhado no pátio
interno que não foram executadas durante as obras (figura III.57). A ausência desses elementos
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153
de captação contribuiu para o aparecimento de diversas patologias construtivas relacionadas à
infiltração da água e favoreceu o acúmulo de água no piso do pavimento inferior. Ainda com
relação ao sistema de captação, foi observada na platibanda da fachada frontal a adaptação de
três buzinotes em PVC para escoamento das águas pluviais (figura III.58). Estes elementos
foram construídos, de forma inadequada, para dar vazão ao volume de água das chuvas que
não é comportado pela calha existente. É possível concluir que durante o projeto e/ou
execução da obra houve o subdimensionamento deste elemento, que acabou por gerar
problemas de infiltração nas unidades 211, 212 e 213.
Fig.III.57 Ausência de calhas. Foto do autor, 2007. Fig.III.58 Buzinotes na fachada frontal. Foto do autor, 2008.
Com relação à rede telefônica, foram encontrados problemas de instalação no pátio interno. De
acordo com o projeto de reabilitação do edifício, foram previstas tubulações para a passagem
das instalações futuras. Após a entrega da obra, a empresa que executou a rede telefônica
desrespeitou as normas de segurança necessárias a esse tipo de serviço, deixando toda a fiação
exposta e sem o isolamento apropriado (figuras III.59 e III.60). Neste caso, trata-se de serviço
mal executado que não teve a fiscalização dos órgãos competentes.
Fig.III.59 Entrada da rede telefônica. Foto do autor, 2007. Fig.III.60 Fiação exposta. Foto do autor, 2007.
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154
b) Alterações dos espaços
Áreas comuns (pátio interno e circulação do pavimento superior)
Foram identificadas algumas adaptações físicas nas áreas comuns que estão relacionadas às
diretrizes de intervenção adotadas no processo de reabilitação. Entre as modificações
realizadas pelos moradores estão a instalação de máquinas de lavar, as adaptações de varais de
roupa e a modificação no telhado do tanque comunitário.
No projeto de reabilitação do edifício não foram previstas áreas de serviço nas unidades
residenciais. A restauração do tanque coletivo foi então uma alternativa para suprir esta
ausência, uma forma reduzir o custo final da obra e a tentativa de manter vivas as relações
sociais que sempre ocorreram nas áreas coletivas dos cortiços. Neste caso, as diretrizes
propostas para a recuperação do edifício priorizaram a economia e a tradição em detrimento
do conforto, uma vez que não foi previsto nas unidades um local específico para lavar e secar
roupas. Algumas conseqüências desta decisão foram as adaptações de máquinas de lavar roupa
no acesso às unidades (figura III.61) e a utilização inadequada de varais no tanque (figura III.62).
Figs.III.61 e III.62 Instalação de máquina de lavar no pátio e varais no tanque, respectivamente. Foto do autor, 2007.
Também foi identificada a colocação de varais de roupa no guarda corpo da circulação do
pavimento superior (figura III.63). Além da presença constante da umidade, devido o contato
das roupas molhadas com a estrutura de madeira, a instalação destes elementos tem
contribuído para a degradação da peça do corrimão por atrito e representam uma carga
adicional à estrutura da circulação que não estava dimensionada no projeto.
Outra intervenção verificada foi a retirada de algumas telhas da cobertura do tanque coletivo
(figura III.64). Segundo relato dos moradores, a água que incide sobre o beiral durante as
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155
chuvas respinga na fachada e nas esquadrias da unidade 107 e penetra no interior desta
residência. Neste caso constatou-se que a reconstrução da cobertura do tanque causou
desconforto aos moradores e favoreceu modificações indevidas nos elementos construtivos.
Fig.III.63 Varais ao longo da circulação. Foto do autor, 2007. Fig.III.64 Retirada de telhas do tanque. Foto do autor, 2007.
Unidades habitacionais
Foram observadas como modificações mais freqüentes a instalação de máquinas de lavar,
construção de socos no acesso às unidades, adaptações nas esquadrias, execução de reparos
inadequados e mudanças na compartimentação e tamanho dos apartamentos. As causas destas
alterações têm origem na execução da obra, obsolescência do sistema de drenagem da rua,
necessidade de privacidade, ausência de orientação técnica e dimensão reduzida das unidades.
A ausência de áreas de serviço nos apartamentos e a preferência de alguns moradores em não
utilizar o tanque comunitário motivaram diversas adaptações de máquinas de lavar no interior
das unidades residenciais (figuras III.65 e III.66). Como não foram previstas instalações
hidrossanitárias para estes equipamentos, os moradores costumam aproveitar, de forma
inadequada, as instalações do banheiro para realizar estas adaptações (figura III.67).
Figs.III.65, III.66 e III.67 Adaptações de máquinas de lavar no interior das unidades. Fotos do autor, 2007.
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Também foi observada a execução de socos em alvenaria no acesso a algumas unidades do
pavimento inferior, a fim de evitar a penetração da água das chuvas (figura III.68). Segundo
relatos, as galerias de águas pluviais da rua são ineficientes quando ocorrem chuvas muito
intensas, ocasionando o transbordamento da caixa de visita no acesso ao edifício e a entrada
de grande volume de água e detritos no pátio.
Fig.III.68 Adaptações de socos em alvenaria. Foto do autor, 2007.
Outra adaptação realizada foi a modificação de esquadrias. Um dos moradores substituiu a
porta de acesso à sua unidade, originalmente composta por uma folha, por outra com duas
folhas, alterando o padrão existente no edifício (figura III.69). Segundo ele, esta intervenção foi
feita para melhorar a ventilação da residência. Nesta mesma unidade foi instalada uma grade
na janela (figura III.70).
Fig.III.69 Modificação de esquadria. Foto do autor, 2007. Fig.III.70. Instalação de grade. Foto do autor, 2007.
Quanto à manutenção realizada pelos próprios moradores, foram verificados reparos nas
instalações sanitárias, nos revestimentos dos banheiros de algumas unidades (figura III.71) e
em algumas esquadrias (figura III.72). Percebeu-se que estas intervenções foram executadas
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sem a devida orientação técnica dos órgãos de preservação e gestão condominial. Nestes casos,
a inobservância dos procedimentos corretos de conservação afetou não a estética do
edifício, mas também se transformou em fonte potencial de novas patologias.
Fig.III.71 Reparo no banheiro. Foto do autor, 2007. Fig.III.72 Reparo em esquadria. Foto do autor, 2007.
Em algumas unidades visitadas, observou-se que os moradores instalaram divisórias para
melhor compartimentar os ambientes (figura III.73). Este fato foi verificado com maior
freqüência nas unidades da ala frontal (apartamentos 211, 212 e 213). Por ter sido uma das
partes do edifício preservada conforme o original, não foram construídas, durante as obras de
reabilitação, alvenarias sobre a estrutura existente em madeira no pavimento superior. Como
se tratam de unidades ocupadas por duas ou mais pessoas, provavelmente a necessidade de
compartimentação se deve à necessidade por privacidade.
Fig.III.73 Instalação de divisórias. Foto do autor, 2008.
Em apenas um caso ocorreu o remembramento de unidades para transformá-las num
apartamento maior. Os proprietários das unidades 206 e 207 pertencem à mesma família (pai e
filho), o que facilitou o procedimento. Apesar deste tipo de alteração ser proibida pela CAIXA,
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158
entendimentos entre os moradores e a instituição viabilizaram a idéia. Trata-se de um caso
específico, mas que abre precedente para outras modificações desta natureza.
c) Conclusões sobre as observações
A partir das observações no local foi possível identificar tanto problemas de projeto como de
execução da obra. Com relação às obras, alguns materiais de qualidade questionável foram
utilizados, refletindo-se em patologias construtivas e na necessidade de substituições de alguns
elementos durante a fase de ocupação. Diversos problemas verificados na cobertura,
instalações e esquadrias demonstraram falhas de execução que podem estar associados à falta
de especialização técnica da mão-de-obra, à ausência de projetos executivos ou à rapidez na
realização dos serviços. Nesse sentido pode-se afirmar que determinados procedimentos
adotados durante as obras não foram adequados à intervenção num edifício histórico.
Em termos de projeto, observou-se que algumas diretrizes adotadas durante a reabilitação
contribuíram para a ocorrência de diversas modificações feitas pelos moradores no pós-
ocupação, tais como a recomposição da cobertura do tanque comunitário, a ausência de área
de serviço nas unidades residenciais e a execução de apartamentos com dimensões reduzidas.
A respeito da degradação e descaracterização do edifício, foram identificadas três causas
principais: endógenas (originárias da própria edificação, devido ao processo de reabilitação),
exógenas (provocadas pelo uso ou falta de manutenção) e naturais (decorrentes das condições
climáticas). Entre as causas endógenas destacam-se as falhas de projeto, a execução
inadequada da obra e a utilização de materiais construtivos de baixa qualidade, como foi visto
anteriormente. As causas exógenas estão relacionadas às depredações na fachada, reparos
inadequados e ausência de conservação. Com relação aos fatores climáticos, a umidade
provocada pelas chuvas causou diversos danos ao edifício, identificados com maior freqüência
nos componentes de madeira. Os elementos construtivos mais afetados pela ação destes três
agentes foram os revestimentos de piso, parede e teto, as esquadrias e a cobertura. Dentre os
ambientes, o que sofreu maior quantidade de apropriações foram as unidades residenciais.
Após a identificação e análise das patologias e apropriações, foi possível classificar os
problemas em três categorias: construtivos, funcionais e estéticos. Entre os problemas
construtivos estão a deterioração dos revestimentos de parede, o apodrecimento do forro da
circulação, as patologias das esquadrias, as falhas na execução telhado, os vazamentos nas
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instalações prediais, a ausência de elementos captação águas pluviais e as fiações expostas. Os
problemas funcionais compreendem as adaptações de quina de lavar e varais nas unidades
e áreas externas, a subutilização do tanque e a inadequação dimensional das unidades
habitacionais quando ocupada por duas ou mais pessoas. Os problemas estéticos abrangem as
manchas de umidade nos barrotes, piso da circulação do pavimento superior, piso do pátio e
forro das unidades, pichações na fachada frontal e fissuras no piso de madeira da ala frontal.
De um modo geral, as patologias estão relacionadas aos aspectos construtivos e estéticos
enquanto grande parte das modificações dos espaços está associada aos aspectos funcionais e
estéticos. Através da análise verificou-se que os problemas estéticos são os mais freqüentes,
porém não são os mais graves. Em termos de hierarquização, os aspectos construtivos foram
considerados de maior gravidade, seguidos pelos funcionais e estéticos. As observações
indicaram que a maior parte das patologias tem origem na restauração e substituição dos
elementos construídos, afetando tanto o bem-estar dos moradores como a integridade física
do edifício. Além destas implicações, os problemas construtivos demandam soluções mais
onerosas que os demais e maior manutenção. Com relação aos outros aspectos, pode-se dizer
que os funcionais interferem diretamente no conforto dos usuários e os estéticos atuam
exclusivamente sobre a aparência do edifício, sendo de mais fácil solução.
Com base em todos os problemas de conservação identificados, constatou-se a ausência de
ações periódicas de manutenção corretiva e preventiva programadas para o edifício. Nesse
sentido, poucas providências foram tomadas para evitar a deterioração dos elementos
construídos e corrigir os danos existentes, sobretudo nas áreas externas, onde maior
incidência de patologias construtivas. Agravou esta situação a atuação inexpressiva Caixa
Econômica Federal no sentido da manutenção das áreas preservadas e da solução dos
problemas da obra. A redução do prazo do arrendamento de quinze para cinco anos,
estabelecida pela Medida Provisória nº 350/06, pode significar a redução dos gastos e da
responsabilidade da CAIXA sobre estes imóveis.
Para ilustrar, classificar e sistematizar os dados coletados nas vistorias relativos às patologias
construtivas e às modificações realizadas pelos moradores foram elaborados quadros e mapas
de danos e apropriações que serão apresentados a seguir.
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Quadro 4 – Patologias construtivas identificadas no edifício da rua Senador Pompeu nº 34 no pós-ocupação. Elaboração do autor, 2008.
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Quadro 5
Modificações nos espaços identificadas no edifício da rua Senador Pompeu nº 34 no pós
-
ocupação. Elaboração do autor, 2008.
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Entrevistas
Sobre a pesquisa de informações com os moradores, realizada em dezembro de 2008, optou-se
pela aplicação de entrevistas estruturadas compostas por vinte e oito perguntas divididas em
três partes: informações gerais (dados dos entrevistados) com doze perguntas,
opiniões/informações sobre a conservação do edifício com oito perguntas e
opiniões/informações sobre o uso dos espaços com oito perguntas. Das dezesseis perguntas
elaboradas na segunda e terceira partes, seis foram feitas exclusivamente a Sra. Maria Isabel,
síndica do edifício (Anexo VI). As entrevistas duraram em média vinte e dois minutos, sendo
que a mais rápida durou onze minutos e a mais longa cinqüenta e cinco minutos.
Verificou-se no local que dos vinte e três apartamentos existentes, dois estavam desocupados e
dois foram remembrados em uma única unidade habitacional, perfazendo então um total de
vinte apartamentos ocupados. Das vinte famílias que ocupam atualmente o edifício, doze
responderam às entrevistas, cinco não foram encontradas em casa e três não puderam ou
quiseram participar. De cada família participante foi selecionado apenas um membro para a
realização da entrevista. Quanto às lojas, apenas uma estava em funcionamento, sendo
utilizada para venda de cosméticos. O proprietário não foi encontrado para a realização da
entrevista.
a) Informações gerais
Dando início à primeira parte da entrevista, verificou-se que a idade dos participantes variou
entre quarenta e sessenta e três anos. Quanto à ocupação dos moradores entrevistados, quatro
são aposentados, dois trabalham na área médica (técnico de enfermagem), uma atua na área
de informática (operadora técnica), uma trabalha no comércio (vendedora), duas são
empregadas domésticas e dois são profissionais liberais (projetista e designer gráfico).
Dos oito moradores que atuam no mercado profissional, seis trabalham no Centro, um na Barra
e um em Copacabana. A renda familiar, incluindo ativos e aposentados, variou entre R$ 700,00
e R$ 2000,00. Considerando o salário mínimo vigente de R$ 415,00, as rendas informadas
foram distribuídas da seguinte forma:
0 S.M. a 2 S.M. (até R$ 830,00) – três moradores
2 S.M. a 3 S.M. (de R$ 830,00 a R$ 1245,00) – três moradores
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3 S.M. a 4 S.M. (de R$ 1245,00 a R$ 1660,00) – quatro moradores
4 S.M. a 5 S.M. (de R$ 1660,00 a R$ 2075,00) – dois moradores
Com relação à quantidade de moradores por unidade habitacional, três apartamentos são
ocupados por um morador, quatro apartamentos têm dois moradores, dois apartamentos
abrigam três moradores e três apartamentos possuem quatro moradores. Dois moradores
informaram que a presença de outras pessoas em seus apartamentos é provisória.
Normalmente as famílias são caracterizadas por pessoas solteiras, amigos, casais sem filho,
casais com filho (um ou dois), mães com filhos (um a três) e mães com filho e netos (um ou
dois).
De todos os entrevistados, onze informaram que residem no edifício há cinco anos e apenas um
reside sete meses. Grande parte das famílias que moram atualmente no imóvel foram as
primeiras a ocupá-lo após as obras de reabilitação do edifício, concluídas em 2003. Alguns
informaram ter recebido as chaves em novembro de 2003.
Os aluguéis pagos variam em função da renda de cada morador. O menor valor de aluguel
informado foi R$ 144,00 e o maior 205,00. O valor pago pelo condomínio, R$ 55,00, é igual para
todos os moradores.
A respeito dos bairros que em que residiam anteriormente, as respostas foram bastante
diversificadas. Foram informados os seguintes bairros: Praça da Bandeira, Realengo, Cosmos,
Ilha do Governador, Itanhangá, Bairro de Fátima e Centro. De todos os bairros, o Centro
apareceu com maior freqüência (quatro respostas). Quanto à forma de moradia anterior, nove
entrevistados informaram que moravam em apartamento alugado, dois em casa própria e um
na casa dos pais.
Todos os moradores informaram como justificativa para morar no Centro a proximidade de
tudo, sobretudo dos locais de trabalho, o que os poupa tempo e dinheiro. Outras respostas
indicaram a facilidade de deslocamento, seja pela quantidade de meios de transporte ou por
conseguir resolver várias coisas a pé, e a relação afetiva com bairro.
b) Conservação do edifício
Na segunda parte da entrevista foram feitas cinco perguntas aos doze moradores entrevistados
e três perguntas exclusivamente a Sra. Isabel. As cinco perguntas visavam obter informações
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sobre o conhecimento da história do edifício, as vantagens ou desvantagens de morar no local,
o uso do manual de conservação, as dificuldades encontradas na manutenção do prédio e as
obras ou modificações realizadas no apartamento. As três perguntas à síndica tinham por
objetivo coletar dados sobre as obras, as despesas e limpeza do edifício.
A maioria dos moradores conhece pouco sobre a história do edifício. Alguns sabem
determinados fatos através de pesquisas realizadas na internet e contato com pessoas que
visitam o prédio (professores, técnicos da Prefeitura, etc.). De um modo geral, sabem que o
prédio é um patrimônio histórico tombado, era anteriormente um cortiço mau freqüentado,
tendo sido utilizado para atividades ilícitas como venda de drogas e prostituição, e que
residia o filho de um compositor de samba famoso. A Sra. Maria Tereza, que reside a trinta
anos no Centro e morava anteriormente no nº 51 da rua Senador Pompeu, forneceu
informações sobre o edifício baseada em sua própria experiência. Segundo ela, o local antes da
obra era uma vila muito antiga e muito bagunçada”. Sabe que a Prefeitura removeu todos os
moradores anteriores, indenizou-os e o prédio permaneceu muito tempo fechado, tendo as
obras durado mais de quatro anos.
Grande parte dos entrevistados gosta de morar num edifício antigo. A opinião de três
moradores exemplificam bem este fato: a Sra. Arlete dos Santos admira a arquitetura, a Sra.
Maria Pereira acha diferente, gostoso e bonito e a Sra. Maria Isabel de Souza se orgulha em
dizer que mora em cortiço. As vantagens apontadas pela maioria em morar no prédio foram os
baixos valores dos aluguéis e a tranqüilidade da vizinhança. Um dos entrevistados elogiou o
critério de seleção dos moradores pela Caixa Econômica Federal e afirmou que os vizinhos
eram muito tranqüilos. Quanto às desvantagens em morar no edifício foram informadas a
necessidade constante de manutenção, a falta de apoio da CAIXA e da Prefeitura na solução de
problemas decorrentes da obra, a impossibilidade de fazer determinadas mudanças na
arquitetura uma vez que o edifício é tombado e a dimensão dos apartamentos, que segundo
alguns são muito pequenos.
Alguns moradores mencionaram não ter recebido o manual de uso e conservação do edifício e
outros disseram ter recebido e lido o seu conteúdo. A Sra. Maria Isabel esclareceu esta questão
informando que não existe o manual, somente o contrato com cláusulas a respeito da execução
de obras no edifício e conduta dos moradores. No contrato é definido que dentro dos
apartamentos os moradores podem realizar obras, desde que informadas previamente à CAIXA,
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e que os mesmos não podem alterar a parte externa, sendo proibidos de pintar esquadrias e
paredes de cores diferentes da original, instalar aparelhos de ar condicionado, colocar antenas,
entre outros. Informou também que, após a ocupação do imóvel, foi realizada uma reunião
entre os moradores e a administradora para tratar sobre as formas de conservação do edifício.
Um dos moradores relatou que tem consciência de que durante quinze anos é arrendatário,
respeita os vizinhos, não põe nada no meio da vila e não coloca som alto. Outro informou que
se os moradores seguissem tudo o que recomenda o manual, ninguém faria obra alguma.
Praticamente todos os moradores demonstraram dificuldades na conservação do edifício. Estas
dificuldades foram justificadas pela ausência de dinheiro para realizar as obras, geralmente
onerosas, pela falta de qualidade na obra realizada pela Prefeitura e pela omissão da CAIXA no
auxílio à conservação da área externa e solução de problemas decorrentes da obra de
reabilitação.
Quanto ao custo da manutenção, um morador informou que gostaria de conservar mais a casa,
porém existem outras prioridades antes da conservação que demandam dinheiro, tais como
alimentação, contas, entre outras. Outro morador considerou que os materiais de construção
estão muito caros e os moradores ganham pouco.
Com relação à falta de qualidade na obra um morador disse encontrar dificuldades de
manutenção tanto na parte interna como externa devido a problemas que sempre reaparecem.
No interior do apartamento convive com vazamentos provenientes das tubulações de esgoto
dos apartamentos do pavimento superior que não consegue resolver, tendo em certa ocasião
caído o forro em gesso do banheiro. Relatou que isso interfere no uso dos cômodos e obriga o
isolamento de áreas dentro do apartamento. Externamente enfrenta problemas de umidade do
solo e da chuva que geralmente provocam o estufamento da parede externa. Disse ter
realizado obras, mas estes problemas sempre retornam.
Sobre a inércia dos órgãos responsáveis, todos os moradores relataram que apesar dos diversos
contatos estabelecidos durante os cinco anos de ocupação e presença de técnicos
documentando os problemas existentes no edifício, nenhum dos órgãos responsáveis (CAIXA,
Prefeitura e administradora) tomou providências para ajudar técnica e financeiramente na
realização de obras na área externa, onde a intervenção dos moradores é limitada, nem na
solução de problemas das obras concluídas em 2003. Um exemplo são os problemas ocorridos
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na ala frontal do prédio, relacionados à calha e ao piso de madeira original. Dois moradores
informaram ter tido sérios problemas de infiltração no apartamento, proveniente da calha do
telhado, durante três anos, tendo tomado as providências para resolver o problema, por conta
própria, em dezembro de 2005. Apontaram também problemas de conservação do piso que se
encontra muito deteriorado. Disseram que, além de não poder substituí-lo por um piso de mais
fácil manutenção, não recebem auxílio para conservação. Acha que a ala frontal, por ser mais
antiga e preservada, deveria ter o apoio financeiro da CAIXA, uma vez que esta é proprietária
do imóvel. Não acham justo ter que arcar com os custos para reformá-lo sozinhos.
A maioria dos entrevistados disse que ajuda a conservar o edifício mantendo a casa limpa e
pintada. Além disso, limpam e lavam a escada e o pátio uma vez por semana. Um dos
moradores disse que procura conscientizar os outros sobre a manutenção das cores originais
das esquadrias e paredes e a necessidade de conservar as fachadas do edifício para que ele
possa durar mais.
Todos realizaram algum tipo de obra em seus apartamentos. As modificações mais comuns
foram a colocação ou substituição de revestimentos cerâmicos em pisos e paredes, a pintura de
paredes, a substituição do vaso sanitário e descarga, a adaptação de máquinas de lavar e a
instalação de divisórias. Segundo os moradores, os revestimentos e louças originais eram de
baixa qualidade e provavelmente durariam pouco, o que motivou a substituição. A instalação
das máquinas se justificou porque muitos moradores não utilizam o tanque coletivo e a
colocação de divisórias ocorreu pela necessidade de compartimentar os ambientes. Outras
obras menos citadas foram a pintura de esquadrias, a substituição da pia da cozinha, reparos na
calha da fachada frontal, devido aos vazamentos constantes, a divisão da porta de acesso de
um dos apartamentos em duas folhas para melhorar a ventilação, uma vez que é o único
apartamento com uma janela, a abertura de vão na parede entre cômodos para circular mais ar
e a interligação de dois apartamentos, pela necessidade de espaço maior para uso dos filhos.
Finalizando as entrevistas sobre conservação do patrimônio, a Sra. Maria Isabel informou que
em cinco anos as únicas obras realizadas pela administradora na parte externa foram a limpeza
de caixas d’água, a substituição do quadro de luz e a troca das portas do PC e do PI.
Geralmente, quando há necessidade de obras, os próprios moradores arcam com as despesas e
contratam os profissionais para execução dos serviços. Quando estas ocorrem na parte externa,
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
171
as despesas são divididas entre todos e criam-se cotas extras. A limpeza e manutenção da área
externa (pátio, escada e circulação) é feita pelos próprios moradores uma vez por semana.
c) Uso dos espaços
Na terceira parte da entrevista foram feitas cinco perguntas aos doze moradores entrevistados
e três perguntas exclusivamente a Sra. Isabel. As cinco perguntas visavam obter informações
sobre a utilização de equipamentos coletivos, a dimensão dos apartamentos, o conforto, a
privacidade e a satisfação com o local em que mora. As três perguntas à síndica tinham por
objetivo coletar dados sobre o fornecimento de serviços públicos, a situação do local em dias
de chuva, a noite e fins de semana e a administração do edifício.
A respeito da utilização do tanque coletivo, as respostas foram bastante variadas. Dos doze
moradores entrevistados, cinco não usam por achar arcaico e anti-higiênico, três não utilizam,
mas não vêem problema se tiverem que usar, três usam eventualmente, principalmente para
lavar tapetes, e apenas um utiliza com freqüência para lavar roupas pesadas. As respostas
indicaram que, como a maioria dos moradores tem máquina de lavar em casa ou lavam a roupa
em outro lugar, não sentem necessidade de utilizar os tanques do pátio. Por este motivo
informaram que os tanques são utilizados para outros fins, servindo como depósito ou local
para lavagem de panelas. Um morador acha que a forma de utilização atual do tanque
realmente traz a impressão de se estar morando num cortiço. Grande parte acha que a
quantidade de tanques existentes é desnecessária. Gostariam de reduzir o número destes para
dois e transformar o resto do espaço em churrasqueira. Todos costumam secar as roupas
usando varal de chão ou adaptando secador portátil no guarda-corpo do pavimento superior.
Com relação ao tamanho do apartamento, oito moradores indicaram ser adequado às
necessidades da família e quatro informaram ser inadequado. Normalmente, aqueles que
acham o tamanho adequado moram sozinhos ou com mais uma pessoa. Uma exceção ocorreu
com um apartamento onde vivem quatro pessoas e o entrevistado considerou a dimensão
ideal. Neste caso foi informado que uma pessoa está morando provisoriamente. Os que
acharam as dimensões do apartamento inadequadas moram com mais duas ou três pessoas,
em geral o cônjuge e filho(s). Duas famílias cresceram com a vinda de filhos e netos. Outra
exceção identificada foi a existência de uma pessoa que mora sozinha e sentiu a necessidade de
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
172
remembrar duas unidades habitacionais em uma, buscando mais espaço. O morador informou
que unificou os dois apartamentos para ter mais conforto quando receber os filhos e amigos.
Todos os moradores entrevistados acham seus apartamentos confortáveis devido às obras que
realizaram para adequá-los aos seus gostos e necessidades. De acordo com um morador, seu
apartamento não tem luxo, mas também não tem pobreza. Outro morador disse que não
trocaria seu apartamento por um com dois quartos em outro local. A ventilação e iluminação
naturais foram consideradas muito boas, exceto em um apartamento que possui apenas uma
janela, o que levou o morador a modificar a folha da porta de acesso. Alguns moradores
informaram que seus apartamentos são um pouco úmidos, principalmente naqueles localizados
nos fundos do terreno. Outros disseram ter combatido e eliminado os focos de umidade
existentes. A maioria acha o local muito tranqüilo, sem muito barulho. A ocorrência de ruídos
foi mais percebida nos apartamentos localizados na fachada da rua Senador Pompeu,
decorrente da circulação de veículos durante o dia e do lazer de crianças durante à noite. Parte
dos moradores acha o prédio seguro e muitas vezes dormem com as janelas abertas.
Sobre a privacidade, seis informaram que tem privacidade em seus apartamentos, três não
têm, mas não se incomodam e três não têm e se incomodam. Alguns disseram que os vizinhos
vigiam sempre os passos uns dos outros, mas já se acostumaram a esta situação. Outros
informaram que os vizinhos poderiam ser mais discretos e que, de vez em quando, são
incomodados enquanto descansam. Uma frase dita por um dos moradores sintetiza bem a
convivência no edifício: “o problema todo da vila é que os moradores acham que a tua casa é a
extensão da casa deles”.
Apesar dos problemas enfrentados, todos estão satisfeitos em morar no edifício, seja com a
arquitetura, os vizinhos ou a proximidade do trabalho. Alguns inclusive têm a intenção de
comprar o apartamento no final do arrendamento. Para os moradores, o que poderia melhorar
seria a conservação das áreas comuns e da fachada e a assistência dada pela CAIXA. Um dos
moradores relatou que gostaria de aumentar o tamanho do apartamento.
Finalizando as entrevistas sobre condições de moradia, a Sra. Maria Isabel informou que não
costuma faltar água nem luz e que o lixo sempre é recolhido. A segurança também é boa. A
presença de empresas, igrejas e comércio na rua motivou a instalação de várias câmeras. O
único problema é o esgoto. Segundo ela, em dias de chuva a rua enche e a caixa de visita que
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fica na entrada do edifício transborda, fazendo com que o esgoto entre junto com a água no
pátio. Existem problemas na galeria de águas pluviais e no caimento da rua que nunca foram
solucionados. Confirmou que à noite e nos fins de semana o local é muito vazio, porém ainda é
lucrativo morar no Centro. De acordo com a moradora, “a noite não tem nada, mas fica muito
perto dos lugares que tem. No subúrbio também não tem nada”. Acha que o bairro ainda não
está preparado para receber moradias, pois ainda falta infra-estrutura adequada (esgoto,
iluminação, etc.). A respeito da administradora do imóvel, disse que não fizeram muita coisa
em cinco anos. Apenas costumam distribuir os boletos para pagamento do aluguel e
condomínio e às vezes tiram fotos dos problemas do edifício, sem tomar maiores providências.
Informou que em 2009 outra administradora assumirá o edifício.
d) Conclusões sobre as entrevistas
Analisando as informações coletadas foi possível constatar que substituição dos revestimentos
e louças sanitárias realizada pelos moradores representou, simultaneamente, a afirmação de
um novo status social e a busca por melhores condições de conforto. As respostas indicaram
como justificativa para estas modificações o fato de terem sido utilizados materiais de baixa
qualidade para execução das obras e a inadequação destes ao gosto dos usuários. A mudança
de status também pode ser verificada através da substituição da nomenclatura utilizada para a
identificação das unidades. A indicação cômodo” deixada pela Prefeitura no acesso a cada
unidade habitacional, com a intenção de resgatar a ambiência antiga do cortiço, está sendo
gradualmente modificada pelos moradores pelo termo “apartamento”, conforme consta na
escritura. Alguns acham adequada a substituição por não se tratar mais de um cortiço.
Observou-se a necessidade de alguns usuários em modificar a compartimentação da unidade,
talvez para buscar maior privacidade dentro do próprio apartamento ou aproximá-lo do padrão
mínimo de habitação, dividido em sala, quarto, cozinha e banheiro. Alguns não gostaram de
receber as unidades sem divisões internas, sentindo-se incomodados com o “espaço muito
aberto” ou a “falta de paredes a o teto”. Em alguns casos, o aumento do número de
integrantes da família pode estar associado a este fato.
Ainda com relação às mudanças no pós-ocupação, verificou-se que o fato do edifício ser um
patrimônio tombado restringe a liberdade dos moradores em realizar modificações nas áreas
comuns e nos apartamentos. As opiniões mostraram que alguns gostariam de mudar
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determinadas partes do edifício, mas não podem. As alterações mencionadas com maior
freqüência no desejo dos moradores foram a substituição do acabamento das esquadrias, a
diminuição do número de tanques, a construção de uma churrasqueira e a execução de jiraus
no pavimento superior de ala frontal do prédio, que tem pé-direito de quatro metros.
No que diz respeito à convivência entre vizinhos, percebeu-se a existência de um controle
permanente por parte dos moradores de tudo o que acontece no edifício, incluindo a chegada
de visitantes, a realização de atividades no pátio ou em casa, a observação de hábitos, entre
outros. De acordo com as entrevistas, esta situação de vigilância agrada a alguns, pois aumenta
a sensação de segurança, e desagrada a outros, por diminuir a privacidade.
Sobre a conservação do edifício, as entrevistas indicaram que poucos conhecem algum fato da
história do cortiço, a maioria realizou obras nas unidades e todos encontram muitas
dificuldades na conservação das partes de uso coletivo do prédio. Tais dificuldades foram
justificadas pela ausência de dinheiro para a execução das reformas necessárias, pela
necessidade constante de manutenção, devido à reincidência dos problemas decorrentes da
obra e à idade do edifício, e pelas restrições do órgão de proteção municipal no tocante às
intervenções nas áreas externas. Outro fato identificado que interfere na conservação é a
presença de moradores com renda abaixo de três salários mínimos, os quais não se enquadram
nos pré-requisitos exigidos pelo PAR para a ocupação do imóvel.
Quanto às responsabilidades pelos problemas de conservação, observou-se que a CAIXA, atual
proprietária do imóvel, não fornece apoio técnico e financeiro aos moradores no sentido da
manutenção das partes externas e preservadas, a administradora, contratada pela CAIXA, não
atua na conservação e realiza somente a cobrança do condomínio, aluguéis e taxas eventuais, a
construtora fiscalizada pela Prefeitura não executou uma obra de reabilitação adequada, o que
refletiu em problemas no pós-ocupação, e os moradores não foram instruídos para preservar
adequadamente o imóvel. Com base neste panorama constatou-se que nenhuma providência
tem sido tomada para a efetiva conservação do edifício, o que tem levado os moradores a
atuarem por conta própria na solução dos problemas que nem sempre são resolvidos da
melhor maneira. Todos demonstraram insatisfação com a atuação da administradora e da
CAIXA. Segundo os entrevistados, apesar de todas as reivindicações feitas para a realização de
obras de manutenção e solução dos problemas construtivos, nenhuma atitude foi tomada.
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175
Com relação ao uso dos espaços, as entrevistas evidenciaram que grande parte dos moradores
não utiliza os tanques comunitários por achar anti-higiênico ou por possuírem máquinas de
lavar adaptadas no interior das unidades ou no pátio. Alguns entrevistados criaram subdivisões
em seus apartamentos através da instalação de divisórias e parte deles demonstraram
insatisfações no que diz respeito à privacidade. Outro problema identificado foi a ocupação de
algumas unidades por mais de dois moradores, o que contraria as premissas estabelecidas pelo
Programa Novas Alternativas e afeta as condições de habitabilidade. Também foi mencionada a
deficiência do sistema de captação de águas pluviais da rua que provoca, em dias de chuva, a
entrada de grande volume de água e esgoto no edifício dificultando o acesso ao mesmo.
Análise da relação entre diretrizes e problemas
Com base na análise do processo de reabilitação do edifício e nos dados coletados nas
observações e entrevistas, constatou-se que a inadequação de algumas diretrizes de
intervenção adotadas e a ocorrência de falhas na execução da obra, gestão do imóvel e uso
contribuíram para o surgimento de diversos problemas físico-funcionais que afetaram tanto o
edifício como seus moradores. Para estudar estas relações com maior profundidade, serão
apresentadas e discutidas a seguir as diretrizes e ações que deram origem às patologias
construtivas e alterações dos espaços identificadas no pós-ocupação.
Diretrizes de preservação
Um dos grandes problemas decorrentes das diretrizes de intervenção estabelecidas diz respeito
à preservação de materiais originais do edifício que necessitam de manutenção constante.
Durante o processo de reabilitação foram substituídos apenas os elementos que estavam
comprometidos, o que certamente influenciou a redução dos custos de execução da obra.
Observando o estado de conservação atual do edifício comprova-se que esta orientação foi
incoerente e inconseqüente, uma vez que desconsiderou o fato dos moradores serem de baixa
renda e, portanto, com rendas incompatíveis aos encargos de manutenção de um edifício
antigo. Neste caso verificou-se claramente um conflito entre as diretrizes de preservação e a
realidade econômica do usuário. Uma alternativa mais adequada seria a substituição dos
materiais antigos por outros contemporâneos, de maior durabilidade e mais fácil manutenção,
mantendo-se um pequeno trecho do edifício original para o registro histórico das técnicas e
materiais tradicionais. De um modo geral, as intervenções poderiam ter enfatizado apenas a
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176
preservação dos aspectos volumétricos e das relações espaciais que ocorrem no edifício e ter
deixado a questão da utilização dos materiais construtivos mais flexível, o que certamente
facilitaria a manutenção pelos moradores. Com base nos problemas de conservação e uso
identificados a partir das observações e entrevistas, considerou-se como inadequadas as
seguintes diretrizes de preservação:
a) Recuperação do piso em madeira original nas unidades do pavimento superior na ala frontal
A opção pela recuperação do piso em madeira das unidades da ala frontal, como forma de
registro dos materiais originais do edifício, foi uma das diretrizes de preservação adotadas que
gerou problemas de conservação. As entrevistas indicaram que os moradores destes
apartamentos encontram dificuldades financeiras para a manutenção destes elementos, o que
é agravado pela falta de auxílio da CAIXA, proprietária do imóvel, nas questões relativas às
reformas dos trechos preservados do edifício e orientações técnicas aos usuários sobre o uso. A
ausência de manutenção pode ser facilmente verificada pelo estado atual do piso que
apresenta sinais de desgaste pelo uso e ataque de cupins. Cabe aqui refletir sobre o ônus que
esta diretriz gerou ao morador no pós-ocupação e sua conseqüência na preservação deste
elemento construtivo. Não seria melhor ter substituído o piso original por outro de mais fácil
manutenção e maior durabilidade para população baixa renda? Verificou-se neste caso que a
substituição exclusiva dos elementos originais deteriorados do edifício atendeu apenas aos
critérios de preservação exigidos pelos órgãos de proteção e à necessidade de redução dos
custos da obra, desconsiderando as condições financeiras do morador para o qual a obra foi
realizada.
b) Recuperação do telhado da ala frontal
Assim como os pisos em madeira da ala frontal, todos os elementos da cobertura deste trecho
do edifício foram restaurados conforme o original. A reutilização de telhas antigas e a ausência
de revisão das calhas quanto à capacidade de escoamento geraram, durante a ocupação,
diversas infiltrações e manchas nos forros em madeira das unidades, conforme observações no
local. Analisando a ocorrência destes problemas segundo os critérios de intervenção
estabelecidos por teóricos da restauração, constatou-se a inadequação das obras realizadas
para recuperação do telhado às orientações de Viollet-le-Duc (2000, p.64), as quais indicam que
“o edifício não deve ser menos cômodo do que era antes da restauração”. Nesse sentido
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177
entende-se que toda intervenção destinada a reparar deficiências nas edificações deveria
contribuir para melhorar a qualidade e desempenho dos espaços, equipamentos e instalações
quando comparados à situação pré-existente, o que não aconteceu na restauração da
cobertura.
Verificou-se também que estes problemas de execução ocasionaram reparos inadequados por
parte dos moradores, que providenciaram a instalação de buzinotes em PVC na paltibanda da
fachada frontal para resolver o problema da infiltração. Segundo informações das entrevistas,
esta providência foi tomada após várias reivindicações à CAIXA que se mostrou omissa em
relação à solução do problema. Identificou-se no caso da restauração do telhado que os
problemas de infiltração decorreram das premissas de intervenção adotadas que optaram
pela preservação de elementos construtivos antigos e subdimensionados –, da execução
inadequada da obra e da administração do imóvel.
c) Recuperação da estrutura em madeira da circulação do pavimento superior
O problema gerado a partir da preservação dos barrotes originais em madeira da circulação é
mais estético do que financeiro. A ocorrência de infiltrações e manchas de umidade são
problemas permanentes que não afetam financeiramente o morador, mas contribuem para a
descaracterização visual do edifício. Com base nas patologias construtivas observadas,
concluiu-se que a utilização da madeira na área externa foi inadequada, podendo ter sido
substituída por outros elementos mais duráveis, como estruturas metálicas, sem alterar as
características volumétricas originais da circulação.
d) Recuperação das esquadrias de madeira originais
Apesar do tipo de madeira das esquadrias originais ser de boa qualidade, estas necessitam
manutenção constante como todo material construtivo antigo. O alto custo para a recuperação
destes elementos, seja em termos materiais ou de mão-de-obra, é incompatível com a renda
dos moradores, o que representa um problema para a conservação do edifício. A questão da
dificuldade de manutenção associada à inadequação das obras de restauração e à ausência de
contrapartida da CAIXA na solução dos problemas da área externa teve como conseqüência a
deterioração de diversas esquadrias, conforme as observações comprovaram. Apesar destes
problemas e das restrições impostas aos moradores quanto à intervenção na área externa,
estes realizam eventualmente a pintura destes elementos.
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178
e) Substituição do piso do pátio central
Analisando as intervenções realizadas no pátio foi possível concluir que a reabilitação
desconsiderou a gica do edifício colonial no sentido da drenagem da chuva pelo terreno, o
que pode ser confirmado através da substituição do piso original permeável em pé-de-moleque
por outro impermeável em concreto áspero. A respeito da captação de águas pluviais nos
sobrados, Reis Filho (1970, p.26) esclarece que
o sistema de cobertura, em telhado de duas águas, procurava lançar uma parte da
chuva recebida sobre a rua e a outra sobre o quintal, cuja extensão garantia, de modo
geral, a sua absorção pelo terreno. Evitava-se, desse modo, o emprego de calhas ou
quaisquer sistemas de captação e condução das águas pluviais, os quais constituíam
verdadeira raridade.
Com base nestas considerações seria justificável a recuperação do piso original do pátio, dado
sua importância funcional, ou pelo menos a substituição por outro tipo de piso permeável de
melhor qualidade, mais fácil manutenção e que apresentasse melhor resultado. Ao invés da
especificação do concreto áspero com juntas de 1,25 x 1,25m, que apresenta atualmente
diversas fissuras e manchas, poderiam ter sido utilizados blocos de concreto intertravado que
permitissem a absorção da água pelo terreno conforme o original. Uma vez que não foram
executadas calhas no beiral do telhado do pátio interno durante as obras de reabilitação, a
escolha de pisos permeáveis teria sido mais adequada para melhorar o escoamento do volume
de água das chuvas e para minimizar o acúmulo desta no térreo.
f) Reconstrução do tanque coletivo
A opção pela recomposição do tanque gerou algumas reflexões com relação à pertinência em
se recuperar equipamentos coletivos do século XIX para reutilização em pleno século XXI.
Quanto às implicações funcionais desta decisão, pode-se dizer que a tentativa de resgatar as
antigas tradições ou realização de afazeres domésticos como ocorria nas habitações populares
do século XIX desconsiderou as exigências de conforto da sociedade moderna, inclusive para
moradores de baixa renda.
No que diz respeito aos aspectos culturais, observou-se que a intenção de se reproduzir em
algumas propostas de reabilitação os hábitos europeus de utilização de equipamentos coletivos
teve resultados insatisfatórios. Como foi demonstrado através das entrevistas e das avaliações
em outros edifícios recuperados pelo Programa Novas Alternativas, o morador carioca,
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179
diferentemente do europeu, rejeitou a idéia das lavanderias e banheiros coletivos, o que
justifica a subutilização do tanque no caso do cortiço analisado.
Outra questão verificada foi a validade da reconstrução do tanque e de sua cobertura no
sentido da preservação do patrimônio. Algumas recomendações a respeito da reconstrução de
bens com valor histórico, artístico e/ou cultural foram indicadas pela Carta de Burra (1980) que
estabeleceu as seguintes condições para a realização deste tipo de intervenção:
Art. 17º - A reconstrução deve ser efetivada quando constituir condição sine qua non
de sobrevivência de um bem cuja integridade tenha sido comprometida por desgastes
ou modificações, ou quando possibilite restabelecer ao conjunto de um bem uma
significação cultural perdida.
Art. 18º - A reconstrução deve se limitar à colocação de elementos destinados a
completar uma entidade desfalcada e não deve significar a construção da maior parte
da substância de um bem.
Analisando o caso do tanque segundo as considerações desta Carta, observou-se que a opção
pela reconstrução deixou dúvidas quanto à pertinência e autenticidade, o que pode ser
comprovado através do histórico construtivo do imóvel. As pesquisas realizadas sobre o edifício
indicaram que o tanque não fez parte da construção original do cortiço e nem da reforma
realizada em 1909, tendo sido executado posteriormente. Sendo assim, apresenta menor valor
histórico e artístico quando comparado com outros elementos originais que melhor
caracterizam a edificação, tais como a volumetria, o telhado, o balcão do pavimento superior e
as esquadrias. Com base nestas informações, verificou-se que a reconstrução do tanque não
constituiria uma “condição sine qua non” de sobrevivência do cortiço e tampouco representaria
para o edifício o restabelecimento de uma “significação cultural perdida”. Nesse sentido, a
história da edificação demonstra que o tanque não constitui elemento imprescindível para a
identificação e reconhecimento do bem enquanto patrimônio arquitetônico.
Outro aspecto que justificaria a incoerência da reconstrução seria o fato de que grande parte
da estrutura do tanque havia desaparecido antes das obras de reabilitação
12
, o que contraria
as recomendações da Carta no sentido de se evitar a “construção da maior parte da substância
de um bem”. Cabe observar também que a orientação padrão do IPHAN não admite a
reconstrução de bens culturais, o que desaprova a solução adotada.
12
Este fato foi confirmado através de fotos pesquisadas na gerência do Programa Novas Alternativas, como
demonstrou a figura III.25.
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Além das implicações funcionais e culturais ocasionadas por esta diretriz de intervenção,
verificou-se que a recomposição da cobertura do tanque interferiu no conforto dos moradores
e gerou incômodos com relação à incidência de água das chuvas nas unidades, devido à
proximidade entre telhado e a parede dos apartamentos. Como foi comprovado pelas
observações e entrevistas, este fato foi responsável pela retirada de algumas telhas pelos
moradores a fim de se evitar a reincidência do problema.
Diretrizes habitacionais
Além das diretrizes de preservação do patrimônio, foram estabelecidos parâmetros para
adequação técnica e funcional do edifício às necessidades modernas de moradia. Entretanto,
algumas falhas de projeto e especificação de materiais, decorrentes destes parâmetros,
ocasionaram problemas que influenciaram não a conservação do patrimônio arquitetônico,
como também o conforto dos moradores. Entre os critérios e decisões que se mostraram
inadequados destacam-se:
a) Desdobramento de duas unidades residenciais originais em uma, conservando o ritmo
original da compartimentação
A opção pelo agrupamento de dois cômodos originais determinou o dimensionamento dos
novos apartamentos que, segundo orientações do Programa, seriam compostos por sala,
quarto, cozinha e banheiro, abrigariam apenas pessoas solteiras e casais sem filho e teriam área
útil média de 20m², variando de 17m² no caso mais extremo a 36m² no caso mais confortável
(Tabela 12). Para verificar a adequação das áreas úteis destas unidades ao número de
ocupantes por apartamento, foram utilizados como parâmetro alguns indicadores de
desempenho habitacional, nacionais e internacionais (Tabela 13).
ÁREAS ÚTEIS DOS APARTAMENTOS
Áreas das unidades Nº apartamentos
Entre 17 e 18 m² 105, 106, 201, 205
Entre 18 e 20 m² 107, 108, 109, 110, 208, 209
Entre 20 e 23 m² 101, 102, 103, 104, 202, 203, 204, 210, 212
Entre 23 e 36 m² 206+207 (remembradas), 211, 213
Tabela 12 – Áreas úteis das unidades habitacionais do edifício. Elaboração do autor, 2009.
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CRITÉRIOS DE DESEMPENHO HABITACIONAL – ÁREAS ÚTEIS MÍNIMAS
Fonte de critérios
Áreas úteis mínimas para unidades com 1
dormitório e 2 moradores
Rosso (Europa)
13
34,00 a 39,00 m²
Ministérios do Equipamento Social e
14
Qualidade de vida (Portugal)
30,50 m²
Institut de Tecnologia de La Construcción de
15
Catalunya (Espanha)
38,00 m²
Silva (Brasil)
16
26,32 m² (com área de serviço) e 24,22 m²
(sem área de serviço)
Tabela 13 – Critérios para definição de áreas úteis mínimas em unidades habitacionais. Elaboração do autor a
partir de ORNSTEIN e ROMÉRO, 2003.
Comparando-se os critérios de desempenho com as áreas úteis dos apartamentos do edifício,
verificou-se que 90% destes estavam abaixo dos requisitos mínimos
17
recomendados para
unidades com um dormitório e dois moradores. Somente os apartamentos 211 e 213
apresentaram áreas úteis acima do mínimo sugerido. Mesmo sendo unidades adequadas para
pessoas solteiras, grande parte dos apartamentos visitados era ocupada por dois ou mais
moradores. Foram identificadas inclusive unidades habitacionais, com menos de 23 m²,
ocupados por três e até quatro moradores, o que indicou condições insatisfatórias de moradia.
Apesar destas inadequações, parte dos moradores entrevistados considerou o tamanho de seus
apartamentos satisfatório. Com base nos parâmetros definidos por Silva (1982), que
apresentaram as menores áreas em comparação às demais fontes de critérios, foram
estabelecidas relações entre o que seria a quantidade ideal de moradores por apartamento e o
que foi encontrado no local (Tabela 14).
13
Rosso (1990 apud ORNSTEIN e ROMÉRO, 2003, p.55).
14
Ministérios do Equipamento Social e Qualidade de vida (1983 apud ORNSTEIN e ROMÉRO, 2003, p.55).
15
Institut de Tecnologia de La Construcción de Catalunya (1998 apud ORNSTEIN e ROMÉRO, 2003, p.57).
16
Silva (1982 apud ORNSTEIN e ROMÉRO, 2003, p.58).
17
Silva (1982, p.28) define requisito mínimo como “o conjunto de condições abaixo das quais o espaço da
habitação contribuiria com significativa probabilidade para comprometer ou impedir o desenvolvimento pessoal
e/ou coletivo dos usuários, tendo em vista padrões culturais já assimilados pelo meio social”.
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AVALIAÇÃO DO DIMENSIONAMENTO DAS UNIDADES
Apartamento Área (m²)
18
Nº moradores
ideal
Nº de
moradores
encontrados
Avaliação
101 23,00 1 4 Inadequado
106 17,05 1 2 Inadequado
107 19,00 1 4 Inadequado
202 20,55 1 3 Inadequado
203 22,60 1 2 Inadequado
204 22,60 1 2 Inadequado
205 17,31 1 1 Adequado
206 + 207 36,05 4 1 Superdimensionado
209 18,95 1 1 Adequado
211 35,32 4 4 Adequado
212 22,40 1 2 Inadequado
213 35,94 4 2 Superdimensionado
Tabela 14 – Relação entre nº moradores ideal e nº de moradores encontrados por apartamento. Elaboração do
autor, 2009.
Dos apartamentos visitados, apenas dois eram ocupados por um morador e, portanto,
apresentaram áreas compatíveis. Com relação aos maiores apartamentos do edifício, ocorrem
duas situações distintas. O apartamento 211 apresenta relação área útil / nº de morador
adequada (35m² para 4 moradores), enquanto o apartamento 213, que também possui área de
35m², está superdimensionado, uma vez que é ocupado apenas por duas pessoas. Um caso
atípico, mas que também representa superdimensionamento, foi o agrupamento das unidades
206 e 207, ocupadas por um único morador. A situação dos demais apartamentos visitados foi
considerada inadequada. A pior relação área útil / nº moradores foi identificada na unidade
107, com quatro moradores ocupando um espaço de 19,00m².
Com base nos critérios de desempenho é possível afirmar que o dimensionamento dos
apartamentos foi adequado ao público “solteiro” e inadequado ao público “casais sem filho”.
Neste caso, percebe-se que a diretriz adotada priorizou a “manutenção da compartimentação
original” em detrimento das condições adequadas de conforto da habitação. Os projetos e
parâmetros de intervenção poderiam ter diversificado o tamanho das unidades, destinando
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Silva (1982) também determina que a área mínima útil de unidades habitacionais com dois dormitórios e quatro
moradores é de 34,12 m².
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apartamentos maiores para casais, a partir do remembramento de três unidades originais, e
menores para solteiros, agrupando duas unidades originais em uma. Além das influências dos
técnicos da Prefeitura nesta questão, a CAIXA, como proprietária do imóvel, deveria realizar um
controle maior do número de moradores por apartamento, a fim de evitar problemas de
densidade populacional no pós-ocupação. Ocorrem casos em que famílias mais numerosas
habitam apartamentos menores e pessoas solteiras e famílias menores residem em
apartamentos maiores, demonstrando incoerências na distribuição e ocupação das unidades.
b) Ausência de área de serviço nas unidades
A decisão de criar unidades residenciais sem áreas de serviço contribuiu significativamente para
as adaptações de máquinas de lavar e varais de roupa nas áreas externas e nos apartamentos.
Neste caso é possível afirmar que a diretriz de projeto adotada contrariou as recomendações
de Viollet-le-Duc no que diz respeito à adequação de uso nas intervenções. Segundo este autor,
“o melhor meio para conservar um edifício é encontrar para ele uma destinação, é satisfazer
tão bem todas as necessidades que exige esta destinação, que não haja modo de fazer
modificações” (VIOLLET-LE-DUC, 2000, p.65). Diante das alterações realizadas no pós-ocupação,
constatou-se que algumas deficiências funcionais identificadas no edifício original não foram
apropriadamente solucionadas durante as obras, o que gerou desconforto aos moradores na
realização de tarefas domésticas e demonstrou que a função habitacional talvez não tenha sido
a mais indicada para a conservação do edifício.
A partir da análise do processo de reabilitação, verificou-se que esta falha de diretriz e de
projeto está provavelmente relacionada à recuperação do tanque. O discurso oficial de
reconstrução do tanque coletivo por questões de preservação e reutilização conforme
tradições antigas também serviu aos interesses de redução de custos do empreendimento.
Neste caso, a recomposição do tanque surgiu como alternativa para evitar a inserção de novas
instalações nas unidades residenciais, o que certamente elevaria o valor da obra. Percebeu-se
neste caso como a redução de custos afetou o conforto do usuário no pós-ocupação e
estimulou alterações indevidas no ambiente construído.
c) Especificação de materiais
Entre os materiais especificados e inseridos durante as obras, alguns se mostraram impróprios
para o local e o uso proposto. Na área externa foram especificados pisos em madeira para a
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circulação do pavimento superior que apresentam atualmente manchas de umidade. Neste
caso, apesar de se tratar de um problema apenas estético, poderia ter sido especificado um
material mais apropriado ao uso externo. Outro problema observado foi a instalação de portas
em aglomerado nos medidores de gás no pátio que são substituídas constantemente pelos
moradores devido a rapidez em que se deterioram. No interior das unidades foram escolhidos
forros de madeira tipo pinus, de pouca durabilidade e inadequado a este uso, que também
apresentam manchas.
Com base nestes problemas identificados no pós-ocupação, verificou-se a inadequação das
diretrizes adotadas às orientações de Viollet-le-Duc quanto à durabilidade dos edifícios
históricos após as intervenções. De acordo com este teórico,
nas restaurações, uma condição dominante que se deve ter sempre em mente. É a
de substituir toda parte retirada somente por materiais melhores e por meios mais
eficazes ou mais perfeitos. É necessário que o edifício restaurado tenha no futuro, em
conseqüência da operação a qual foi submetido, uma fruição mais longa do que a
decorrida (VIOLLET-LE-DUC, 2000, p.54).
Além das falhas detectadas na definição das diretrizes e na execução das obras, pode-se
associar também o comprometimento da durabilidade do edifício à redução dos custos durante
a reabilitação. Nesse sentido, o condicionamento dos custos ocorreu através da utilização de
materiais pouco duráveis e que necessitam de constante manutenção, o que proporcionou aos
moradores encargos financeiros indesejáveis e pode provocar, a longo prazo, a perda do
próprio patrimônio. A especificação de materiais de baixa qualidade foi um dos motivos
apontados pelos moradores para a substituição dos revestimentos e equipamentos sanitários
nas unidades, conforme indicou as entrevistas. Não se teve acesso durante a pesquisa à
especificação das louças para o empreendimento, porém alguns usuários informaram que estas
sempre apresentavam problemas.
Execução da obra
Através das observações no local constatou-se que grande parte das patologias construtivas
que ocorrem no edifício tem origem na execução da obra realizada pela empresa Conservadora
Luso Brasileira. Os problemas de execução podem ter sido agravados pela fiscalização
inadequada pela Prefeitura, emprego de mão-de-obra pouco especializada, ausência de
projetos executivos ou problemas financeiros. A cobertura, instalações, esquadrias e
revestimentos de parede foram os elementos que mais apresentaram patologias decorrentes
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das obras. As entrevistas informaram que alguns problemas são reincidentes, tais como
vazamentos e infiltrações, o que indica a necessidade de reparos prioritários na cobertura e
instalações.
Gestão do imóvel
A administração realizada pela empresa Torres e a gestão realizada pela CAIXA foram bastante
criticadas pelos moradores. Foi relatada por todos os entrevistados a falta de apoio financeiro
para a conservação da parte externa e da parte preservada, a omissão dos gestores na solução
dos problemas decorrentes da obra de reabilitação e a morosidade na tomada de providências.
Esta situação conduziu muitas vezes à realização de reparos inadequados pelos próprios
moradores, que são proibidos de intervir na área externa. Analisando esta situação, pode-se
concluir que a degradação da área externa e dos elementos preservados do edifício está mais
relacionada à ausência da atuação da CAIXA, que é a proprietária do imóvel e deveria resolver
as questões de sua competência, do à incapacidade do morador de conservar o edifício antigo.
Uso
Alguns dos problemas identificados estão relacionados à ausência de orientação técnica aos
moradores sobre o uso e manutenção dos elementos construídos. Exemplificam esta questão
as manchas de umidade identificadas no piso da circulação do pavimento superior, decorrentes
da infiltração de água das plantas, e alguns reparos realizados em banheiros, esquadrias e na
cobertura. Também fazem parte do uso inadequado as ações de depredação na fachada que
indicam a ausência de programas de educação patrimonial na vizinhança.
A seguir serão apresentadas, sob a forma de quadro, as relações entre os problemas de
conservação e uso identificados no edifício e as diretrizes / ações adotadas no processo de
reabilitação e gestão do imóvel.
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Quadro 6
Relações entre problemas de conservação e uso e diretrizes adotadas no processo de reabilitação e gestão do imóvel.
Elaboração do autor, 2008.
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CONCLUSÃO
Com base no estudo dos programas de reabilitação urbano-arquitetônica desenvolvidos
recentemente na área central do Rio de Janeiro, foi possível tecer algumas considerações sobre
os resultados alcançados na compatibilização da habitação popular e da preservação do
patrimônio neste processo. A partir da pesquisa realizada no estudo de caso, procurou-se
entender como a articulação das políticas e diretrizes habitacionais e de preservação, adotadas
na reabilitação do imóvel, influenciaram a conservação do patrimônio arquitetônico no pós-
ocupação e o uso dos espaços pelos moradores. No edifício da rua Senador Pompeu 34
verificou-se a dificuldade dos novos moradores, mesmo com renda maior que os anteriores, em
conservar o imóvel histórico satisfatoriamente. Seja pelos custos envolvidos no processo, pelos
problemas de administração, diretrizes de intervenção adotadas ou qualidade nas obras
realizadas, o fato é que, atualmente, este edifício reabilitado a pouco mais de cinco anos
apresenta sinais evidentes de deterioração física.
Analisando de forma criteriosa as causas das patologias construtivas, percebeu-se que os
problemas de conservação identificados atualmente no edifício decorrem mais das diretrizes
e ações adotadas no processo de reabilitação e gestão do que da incapacidade financeira e
cultural dos moradores, o que foi confirmado pelas observações e entrevistas no local.
Certamente existe o problema do custo da conservação, porém a maioria dos moradores
indicou ter noção de como se deve utilizar o edifício. A grande questão, que nunca é resolvida,
é a solução dos problemas decorrentes da obra realizada pela Prefeitura e a contrapartida da
CAIXA na conservação das partes preservadas e da área externa. Nesse caso, não se trata de
exigir uma postura paternalista do poder público, mas de responsabilidade sobre os serviços
realizados. Essa situação é agravada pelas mudanças nas gestões políticas, em que o governo
atual nunca assume os problemas do governo anterior.
De um modo geral, as influências das políticas habitacionais e de preservação nos problemas de
conservação estão relacionadas à preservação de materiais originais do edifício durante as
obras, cuja manutenção é onerosa ao morador, à especificação de materiais impróprios ao uso
proposto, à ausência de projetos executivos para orientação das obras e à gestão inadequada
do imóvel no pós-ocupação. Somam-se a estas causas algumas falhas na execução e fiscalização
da obra e a falta de orientação técnica aos moradores nas questões relativas ao uso de alguns
elementos e partes do edifício. Também foi verificado que as diretrizes influenciaram de forma
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significativa o uso dos espaços do edifício. Isto foi comprovado a partir da reconstrução e
subutilização do tanque coletivo, cujo uso é incoerente à cultura brasileira e necessidade de
conforto contemporânea, e das modificações realizadas no pátio e nos apartamentos
decorrentes da ausência de área de serviço nas unidades residenciais.
A partir da observação dos problemas de conservação e uso no estudo de caso, concluiu-se que
algumas questões precisam ser melhor resolvidas no processo de reabilitação de edifícios em
áreas históricas para famílias de baixa renda no Rio de Janeiro.
Uma questão importante a ser analisada é a qualidade da obra produzida para este público. A
redução dos custos na produção da habitação popular é uma questão enraizada nas políticas
habitacionais brasileiras e tem graves reflexos nas condições de moradia. Como foi visto no
estudo de caso e em outros exemplos de reabilitação de cortiços implementados pelo
Programa Novas Alternativas para famílias de baixa renda, o baixo subsídio destinado aos
empreendimentos se refletiu na construção de unidades de tamanho reduzido, na manutenção
de equipamentos coletivos, na utilização de materiais construtivos de qualidade questionável
para a viabilização da obra e, conseqüentemente, na insatisfação dos moradores. A partir
destes exemplos percebe-se a necessidade de revisão no aporte financeiro destinado a estes
imóveis e conclui-se que a subordinação do conforto do morador aos baixos subsídios
destinados à realização da obra é uma questão que deve ser evitada em empreendimentos
semelhantes.
Outro fator que deve ser analisado diz respeito ao custo da manutenção e seus reflexos, tanto
para o edifício como para os moradores de baixa renda. Como foi observado no estudo de caso
e comprovado pelas entrevistas, o ônus com a manutenção de elementos construtivos originais
do edifício mostrou-se incompatível com a renda dos moradores, abaixo de 6 salários mínimos.
Esta inadequação indica a necessidade de revisão os parâmetros relativos à preservação, a fim
de evitar o comprometimento da renda do morador com a manutenção onerosa.
Além das considerações relativas à melhoria das obras de reabilitação e à reorientação das
diretrizes de preservação, outras recomendações relevantes podem ser feitas sobre a
adequação do uso e do usuário proposto para estes edifícios, a comercialização das unidades e
a seleção dos imóveis para intervenção.
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Com relação à adequação do uso, deve-se verificar se o incentivo ao uso habitacional para
famílias de baixa renda em edifícios antigos e tombados é realmente o mais indicado para
estimular a reabilitação urbana, a preservação do patrimônio e bem estar dos usuários. É
necessário que este uso seja satisfatório nas três escalas: cidade, edifício e morador. Poderiam
ser experimentadas outras alternativas de uso para estes edifícios, de modo que a função
seja compatível com a manutenção. Nos casos em que seja escolhido o uso habitacional de
baixa renda, é imprescindível que este esteja associado a outros usos geradores de renda
(comercial, cultural, turístico, etc.) para não comprometer a conservação do edifício e a renda
do morador. Este fato não foi observado no estudo de caso que, apesar de ter duas lojas,
apenas uma está em funcionamento e é de propriedade particular.
A respeito do perfil do usuário, torna-se necessário a escolha de moradores com rendas
compatíveis aos custos de conservação. Apesar das críticas aos processos de gentrificação
identificados na reabilitação de diversas cidades do mundo, o poder aquisitivo do usuário
influencia significativamente a conservação do edifício e deve ser levado em consideração. A
grande dificuldade encontrada seria então atrair a classe média e alta para a área central, sem
expulsar as classes de baixa renda residentes. Para atrair novos moradores seriam
necessários mais investimentos em infra-estrutura urbana, como segurança e iluminação,
incentivos para o construtor e o comprador e a diversificação das tipologias habitacionais
produzidas. Para manter a população residente, o melhor caminho seria diminuir as ocupações
irregulares em terrenos e ruínas e incentivar a ocupação de edifícios públicos desocupados
existentes na área central. Caberia aqui uma pesquisa mais aprofundada do poder público no
que se refere à identificação dos imóveis mais adequados a cada uma das três classes. A
sugestão dada aqui seria a reabilitação de edifícios mais antigos com menor número de
unidades para a classe alta, que possuem mais condições de conservá-los, a produção de
imóveis novos em vazios urbanos para a classe média e a recuperação de edifícios públicos
desocupados para a classe baixa, que possibilitassem a produção de um número maior de
unidades e não exigissem manutenção constante.
Sobre a comercialização das unidades, é necessário verificar se a venda é realmente mais
indicada que a locação social nos casos de produção de habitações para famílias de baixa renda
em edifícios históricos. Atualmente, a política de reabilitação se baseia na venda das unidades e
no financiamento a longo prazo realizado pela Caixa Econômica Federal. Uma vez que a renda
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destes moradores é incompatível com os custos de manutenção destes edifícios, torna-se
incoerente a venda e pertinente a locação. Uma solução para este problema seria a realização
de uma reengenharia financeira que possibilitasse à Prefeitura a compra e administração do
edifício histórico, hoje realizadas pela CAIXA. No imóvel da rua Senador Pompeu 34 alguns
moradores demonstraram a intenção de comprar suas unidades ao final do arrendamento, o
que gera mais incertezas sobre a manutenção do edifício tombado. Com base nos problemas de
conservação identificados no estudo de caso, é possível afirmar que a institucionalização de
edifícios históricos para a venda das unidades ao público de baixa renda representa um
equívoco que deve ser evitado.
No tocante à escolha dos imóveis para intervenção, seria interessante a realização de estudos
para avaliar o custo-benefício da reabilitação de edifícios antigos em comparação à
construção nova em terrenos vazios na área central. No caso do Rio de Janeiro, muitos
entraves ainda são identificados quando se pretende recuperar um imóvel preservado ou
tombado, tais como legislação restritiva, regularização fundiária, custos com obras de
restauração, baixo número de unidades produzidas, entre outros. Normalmente, o processo de
reabilitação também enfrenta outro problema: o da remoção da população residente. Em
muitos casos, os edifícios antigos localizados em áreas degradadas da cidade são ocupados por
moradores com renda inferior a três salários que não são beneficiados pelas linhas de
financiamento disponíveis. Esse fato acarreta, na maioria das vezes, a substituição destes
moradores por outros com maior poder aquisitivo, como ocorreu no estudo de caso.
Finalizando as considerações relativas ao assunto, constatou-se que o processo de reabilitação
do edifício localizado na rua Senador Pompeu 34 poderia ter sido conduzido de outra maneira,
dando mais ênfase ao conforto, à cultura e à realidade financeira do morador, do que
exclusivamente à preservação do patrimônio. Nesse sentido, a análise deste estudo de caso
demonstrou que ainda falta um equilíbrio maior entre as questões que envolvem a produção
de habitações para este segmento da população e a apropriada conservação do patrimônio
arquitetônico no contexto da requalificação da área central do Rio de Janeiro, o que poderia ser
alcançado através de uma maior flexibilização das diretrizes de intervenção, de uma revisão nos
critérios para escolha dos imóveis a serem contemplados pelos Programas, beneficiando
também edificações preservadas e tuteladas em estado de degradação, e do estímulo à
participação dos moradores na realização dos projetos e das obras.
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Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
201
ANEXOS
Anexo I – Perguntas da entrevista com os moradores do edifício na rua Senador Pompeu 34.
Anexo II Compilação das informações obtidas na reunião com o arquiteto Nazih Heloui,
gerente do Programa Novas Alternativas, em 21/03/07.
Anexo III – Fichas de análise do estado de conservação do edifício.
Anexo IV Reprodução de cópia fotográfica do projeto de acréscimo do cortiço.
Original de 1909.
Anexo V Cópia do Memorial de Reabilitação do cortiço adquirida na gerência do Programa
Novas Alternativas.
Anexo VI Cópia do Decreto de tombamento do edifício obtida na Secretaria Extraordinária de
Promoção, Defesa, Desenvolvimento e Revitalização do Patrimônio e da Memória Histórico-
Cultural da Cidade do Rio de Janeiro (SEDREPAHC).
Anexo VII – Cópia da escritura do terreno obtida no 4º Ofício de Imóveis.
H
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabili
tação do Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
202
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
PROARQ – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura
Mestrado em Arquitetura – Restauração e Gestão de Patrimônio
Mestrando: Kleber Marinho Cardozo
Profª Orientadora: Cêça Guimaraens
Estudo de caso: EDIFÍCIO DA RUA SENADOR POMPEU 34
Prezado(a) usuário(a). Ao participar desta entrevista você estará colaborando com o desenvolvimento da
pesquisa para a dissertação de Mestrado Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na
Reabilitação do Centro do Rio de Janeiro: o caso do edifício na rua Senador Pompeu 34. O
objetivo da pesquisa é obter informações sobre as condições de conservação e uso do edifício histórico.
MUITO OBRIGADO POR SUA COLABORAÇÃO!
Data da entrevista _____ /_____ /________
ANEXO I - ENTREVISTA AOS MORADORES
A- INFORMAÇÕES GERAIS
1. Nome
2. Idade
3. Número do apartamento
4. Ocupação
5. Bairro onde trabalha
6. Valor da renda familiar em salários mínimos
7. Quantidade e idades dos moradores do apartamento
8. Tempo de residência no edifício
9. Valor pago pelo aluguel e condomínio
10. Bairro em que residia anteriormente
11. Forma de moradia anterior
12. Motivos para morar no Centro
B- OPINIÕES / INFORMAÇÕES SOBRE A CONSERVAÇÃO DO EDIFÍCIO
13. O que sabe sobre a história deste edifício? Onde aprendeu?
14. Que vantagens e/ou desvantagens você identifica em morar num edifício antigo?
15. Você recebeu algum manual ou orientação sobre como utilizar ou conservar este edifício? Já
usou estas informações em alguma ocasião? Qual?
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
203
16. Você encontra dificuldades na conservação do edifício? Quais? O que faz para ajudar a
conservá-lo?
17. Você fez obras ou modificações em seu apartamento? Quais? Por quê? Na sua opinião, o
edifício e seu apartamento precisam de obras atualmente? Quais?
18. Quais obras o edifício já sofreu desde que veio morar aqui?
19. Quem executa os serviços quando há necessidade de obras? Quem assume as despesas?
20. Como é feita a limpeza e manutenção do edifício? Quem realiza este serviço e com que
freqüência?
C- OPINIÕES / INFORMAÇÕES SOBRE O USO DOS ESPAÇOS
21. Qual a sua opinião sobre utilizar equipamentos coletivos como o tanque e o pátio para
realizar algumas tarefas domésticas? Onde e como você lava e seca suas roupas?
22. Você acha o tamanho do seu apartamento adequado às necessidades de sua família? Por
quê? Sua família cresceu desde que veio morar aqui?
23. Você acha o seu apartamento confortável? Por quê? Comente sobre a ventilação,
iluminação, ruído e umidade no seu apartamento.
24. Você tem privacidade no seu apartamento em relação aos seus vizinhos?
25. Você está satisfeito com o prédio e o apartamento em que mora? Por quê? Na sua opinião,
o que poderia melhorar?
26. Qual a regularidade no fornecimento dos serviços públicos (água, esgoto, energia, coleta de
lixo,...)? É satisfatória?
27. Como fica o local em dias de chuva? E a noite e nos fins de semana?
28. Comente a respeito da administração do edifício.
OBS: As perguntas de nº 18, 19, 20, 26, 27 e 28 serão feitas exclusivamente a Sra. Isabel, síndica
do edifício.
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
204
ANEXO II
Entrevista com o arquiteto Ahmed Nazih Murad Heloui gerente do programa Novas
Alternativas – e a arquiteta Gisele Masullo – subgerente do programa – em 21/03/07
Relação dos assuntos que foram abordados:
O programa começou na gestão do prefeito Luís Paulo Conde, onde o secretário de
habitação era o Sérgio Magalhães;
O programa surge para apresentar soluções para a grande quantidade de imóveis
abandonados, em ruínas e subutilizados na área central, criando opção de moradia para
um público diferenciado e respondendo a grande demanda por habitação em áreas
centrais e bem servidas de infra-estrutura, aliado a valorização do patrimônio
arquitetônico e cultural do Rio de Janeiro;
Funciona potencialmente como um importante programa de reabilitação, na medida em
que ele ajuda a romper esse quadro de estagnação e degradação dessa importante área da
cidade;
O programa foi criado para atender um público diferente do que é atendido atualmente;
Esse programa não é uma experiência brasileira, é uma experiência européia do período do
pós-guerra;
O programa identificou o perfil do morador do centro: casais sem filhos, idosos e
estudantes universitários;
Existe diferença entre a tipologia cortiço no RJ e em SP. Cortiço no RJ são unidades com 1
quarto, banheiros coletivos, lavanderias coletivas e algumas vezes cozinhas coletivas;
Foi verificado que essa tipologia atendia ao público com o perfil identificado para o
morador do centro;
Nazih relatou que quando estudou em Roma, o edifício em que ele se instalou tinha a
mesma tipologia do cortiço e funcionava muito bem;
Explicou que quando muda o governo, mudam todas as filosofias. Quando mudou o
governo, não havia o mesmo aporte financeiro para o programa como havia no governo
anterior. Tiveram então que buscar recursos na Caixa Econômica Federal, a qual não
financia a tipologia de cortiço (banheiro coletivo). Foram obrigados então a trazer o
banheiro para dentro das unidades. Nos cortiços da Travessa do Mosqueira e Sacadura
Cabral o banheiro é coletivo. no cortiço da Senador Pompeu, recuperado com recursos
da CEF, cada unidade tem o seu banheiro, mas conserva a lavanderia coletiva;
Cidade do RJ tem hoje um déficit habitacional em torno de 800.000 a 1.000.000 de
moradias;
Nazih informou que existe um estudo constatando que temos hoje, aproximadamente,
5.000 imóveis no centro que podem sofrer um retrofit para habitação e ajudar a reduzir
esse déficit, estando localizados numa região bem infraestruturada. Essa economia com
infraestrutura, quando comparamos com outros empreendimentos para habitação de
baixa renda na periferia, acaba viabilizando essas intervenções na área central;
Ao longo do tempo o programa foi evoluindo. Começou a haver uma rejeição da lavanderia
coletiva por parte dos moradores (cada morador hoje, por mais pobre que seja, tem a sua
máquina de lavar). Surgiu então a necessidade de se incorporar uma área de serviço na
unidade. Informou que a lavanderia e banheiros coletivos funcionam em várias partes do
mundo, mas aqui o. Atualmente os imóveis do Novas Alternativas são estruturados com
unidades de sala, 1 ou 2 quartos, banheiro, cozinha e área de serviço, diferentemente do
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
205
programa original. Por exemplo, hoje na Travessa do Mosqueira encontramos um perfil de
morador para o qual o programa não foi designado (são encontradas inclusive famílias
inteiras). Não era esse o objetivo inicial. Constatou-se então um paradigma entre a pressão
por moradia para suprir o déficit habitacional e o objetivo inicial do programa de atender
ao perfil do morador do centro. A necessidade de suprir essa demanda acabou assumindo
total importância. Nesse momento começa uma briga entre a Secretaria de Habitação e o a
Secretaria do Patrimônio Histórico, pois para adaptar um sobrado do fim do século XIX para
moradia, geralmente são necessárias várias intervenções e as vezes, por questão de 50cm,
não se viabiliza um empreendimento. Entra também nessa briga a Secretaria de Urbanismo
que estabelece que toda a moradia gerada pela Secretaria de Habitação deve ser voltada
para a baixa renda, sendo que o programa atende um público que é de classe média (de 3 a
6 salários mínimos), beneficiados pelo PAR (Programa de Arrendamento Residencial);
Os sobrados históricos entram em degradação muito rápido. Se as pessoas não tiverem um
poder aquisitivo alto para conservá-los, em 3 ou 4 anos está deteriorado novamente
(caso da Travessa do Mosqueira). É preciso ter uma população residente que possa manter
o edifício;
Quando se fala em centro do RJ, está se falando em sítio histórico. RJ foi a côrte e a capital
federal. Para preservar as edificações na área central, pertencentes a esse passado
histórico importante, a prefeitura criou alguns instrumentos como as APAC’s (7 na área
central), o SAGAS, o Corredor Cultural, o projeto SA’s (compreendido pelas ruas Salvador
de , Estácio de e Mem de Sá), fora os 200 prédio tombados pelo Patrimônio Histórico
federal, estadual e municipal. Existe uma complexidade muito grande em se trabalhar no
centro do RJ, que é uma região toda preservada. E que está preservada, o Patrimônio
também tem uma certa responsabilidade na conservação desses prédios, o que não
acontece. A prefeitura do RJ tem uma política muito bem estruturada de preservação, mas
não tem nenhuma política de conservação. Hoje, dentro da prefeitura, o único órgão que
faz conservação é o Novas Alternativas e é com quem o Patrimônio Histórico mais briga.
Existe um nó ainda que precisa ser desatado;
Qualquer financiamento que se pega na CEF é chamado de baixa renda, mas na prática ela
não financia imóveis para a baixa renda. Por exemplo, num financiamento pelo PAR, para
quem recebe de 3 a 6 salários mínimos, ela dá preferência a quem ganha 6 salários
mínimos;
A Secretaria de Urbanismo acha que o Novas Alternativas encheu o centro do RJ de pobres,
mas ao mesmo tempo é a que mais pressiona o programa para recuperar os edifícios.
Sempre que vai fazer as vistorias, encontra a grande quantidade de prédios em ruína, com
risco de desabar. Tanto o Patrimônio Histórico como a SMU brigam com o Novas
Alternativas o tempo todo, mas qualquer problema que acontece nessas secretarias, em
relação a prédios com risco de desabar, é ao programa que eles recorrem.
Os cortiços restaurados não estão mais como foram entregues após a obra. Visitando eles
hoje, encontraremos uma outra situação. A partir do momento que se consegue o habite-
se, o programa não tem mais responsabilidade sobre os edifícios. Quem tem que criar uma
política de conservação não é a SMH e sim o Patrimônio Histórico que preservou / tombou
o imóvel, no caso o DGPC (hoje SEDREPACH).
Quando o Programa Novas Alternativas foi criado, o secretário Sérgio Magalhães levou a
idéia do programa para a C.E.F., a qual achou a proposta tão interessante que resolveu
lançar em todo o Brasil um programa denominado Revitalização de Sítios Históricos,
baseado na experiência do Novas Alternativas. Atualmente, em várias cidades históricas do
Brasil, como é o caso de Salvador, Recife, Olinda, São Luis e Belém, são encontrados
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
206
programas semelhantes ao Novas Alternativas, baseados na experiência do Rio de Janeiro.
Segundo Nazih, o programa conseguiu uma projeção maior no Rio de Janeiro devido ao
grande aporte financeiro do poder público envolvido no processo, que muitas dessas
outras cidades não dispõem. Nazih não conhece nenhuma experiência de reabilitação
urbana em todo o mundo sem que houvesse um grande aporte financeiro do poder
público. Na opinão dele, este não é um programa que se auto gerencia. Não é possível
desapropriar, contratar projeto, fazer obra e no final vender uma unidade por R$ 40.000,00
e achar que este valor cobrirá todas as despesas. O custo de uma habitação dessa no
centro da cidade vale em torno de R$ 60.000,00 a R$ 70.000,00.
Os casarões recuperados pelo programa eram voltados, originalmente, para o aluguel
social que era a idéia que havia sido implementada. Quando mudou o governo, a idéia do
aluguel social não vingou mais. Isso foi muito discutido com relação à revitalização do
bairro de São Cristóvão, onde uma cooperação entre a prefeitura do Rio de Janeiro e a
prefeitura de Paris. Uma das grandes críticas que a prefeitura de Paris faz à política
habitacional implementada no Brasil é que nós não temos a figura do aluguel social. Na
França, por exemplo, não se produz uma unidade de R$ 70.000,00 e vende por R$
40.000,00. O morador vai pagar o aluguel social. Quando os primeiros casarões foram
recuperados, a idéia era mais ou menos essa. Com a mudança de gestão, as Ong’s que
faziam esse acompanhamento e ajudavam na administração dos imóveis não tiveram o seu
contrato renovado e isso acabou indo para as mãos do Nazih. O governo atual privilegia a
venda da unidade para o morador. Segundo Nazih, todo o brasileiro sonha ter a casa
própria. Esse sonho praticamente não existe fora do Brasil. Citou a época do governo
Sarney onde a inflação girava em torno de 80% ao mês e quando nenhum morador queria
ter o seu aluguel reajustado todo mês nessa porcentagem. Esse fato gerou um trauma na
população que começou a buscar com maior freqüência a casa própria e rejeitar o aluguel
social. A casa própria era sinônimo de segurança. O aluguel social na Europa não é feito
pelo poder público e sim por empresas privadas, as quais constroem e recebem um
subsídio da prefeitura. No Brasil, dos R$ 70.000,00 apenas R$ 40.000,00 é repassado para o
morador, que paga o imóvel através do PAR. Segundo Nazih, uma solução para este
problema seria o aluguel social. Nesse caso, é necessário mudar a mentalidade das
pessoas, a cultura. A filosofia da casa própria onera muito o poder público. Por exemplo, a
prefeitura paga ao proprietário pela desapropriação de um casarão no centro em torno de
R$ 70.000,00. O terreno é vendido para a C.E.F. à base de R$ 2,00 o metro quadrado. Então
a prefeitura desapropria o imóvel por R$ 70.000,00 e vende para a CEF por R$ 500,00. O
Programa contrata (terceiriza) ou faz o projeto de arquitetura e o de graça para a CEF.
Para a construção, a C.E.F. entra com, no máximo, R$ 40.000,00 por unidade e o custo da
obra sai por, aproximadamente, R$ 50.000,00 por unidade. A prefeitura tem que entrar
com R$ 10.000,00 por unidade, complementando o custo da obra. Nesse processo, a
prefeitura entra com o imóvel, resolvendo as pendências fundiárias e pagando a
desapropriação, vende o terreno para a CEF por um valor irrisório, elabora e aprova o
projeto, acompanha e complementa financeiramente a obra. A CEF compra o terreno,
transformando-se na proprietéria, cobre parte dos custos da obra, repassa as unidades
habitacionais para os futuros compradores através de financiamento (PAR, Crédio
Associativo, etc.) e gerencia o imóvel durante o período do financiamento, que gira em
torno de 15 anos. Isso mostra que o aporte financeiro precisa ser muito grande. Não
adianta não querer vender o imóvel e fazer o aluguel social que não dará certo, pois as
pessoas querem a casa própria.
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Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
207
Segundo Nazih, é possível resolver o problema habitacional no Brasil através do aluguel
social. Apenas o poder público não vai resolver este problema. É necessário o incentivo da
construção civil, da iniciativa privada. Em nenhum país do mundo, inclusive nos socialistas,
o poder público sozinho o conseguiu resolver a questão habitacional. É preciso garantir
que o morador possa ter sempre condições de pagar o seu aluguel e que os reajustes desse
aluguel nunca sejam superiores ao do salário.
A preocupação da Secretaria de Urbanismo e do SEDREPACH é correta. Por mais que uma
restauração seja muito bem feita, depois de quatro ou cinco anos os elementos
construtivos precisarão de manutenção. Será que uma população de baixa renda terá
condições de contratar um artesão, alugar andaimes, etc. para a execução desses serviços?
Certamente não. Nazih acha que caberia ao Patrimônio Histórico não apenas preservar,
mas também ter responsabilidade sobre a conservação desses imóveis. Precisaria ser
estabelecida uma política de conservação. O reflexo disso é a falta de conservação atual
encontrada nos edifícios reabilitados.
Para Nazih, com 6 salários mínimos é possível arcar com a conservação do edifício.
Segundo ele, é possível avaliar se os moradores estão contribuindo para a conservação
do edifício daqui a alguns anos. Ainda é muito cedo. Os moradores de cortiços reabilitados,
com banheiros coletivos, não tem condições de conservar. Na opinião de Nazih, a venda
das unidades habitacionais não é a solução para estes casarões. Se o público atendido
fossem estudantes, casais sem filhos e idosos e fosse adotado o esquema do aluguel social,
pois assim prefeitura seria responsável pelos casarões, então seria possível mantê-los. Esta
população que hoje aceita morar nestes casarões, pagando prestações de R$ 80,00 por
mês para adquirir as unidades, o terão condições de manter os imóveis. É por isso que
houve uma mudança de foco no programa.
Nazih comentou sobre as críticas que são feitas ao programa, em trabalhos acadêmicos,
que não levam em consideração a evolução sofrida pelo programa.
Quando o migrante chega ao Rio de Janeiro ele se instala perfeitamente nas casas de
cômodos. Quando se tenta oferecer esta tipologia como uma forma definitiva de
habitação, ele rejeita. O que mais se encontra no centro do Rio são sobrados
transformados em cortiços, com banheiros e lavanderias coletivas, onde as pessoas vivem
perfeitamente pagando aluguel, porém se houver a restauração das unidades como forma
definitiva de habitação para eles comprarem há uma rejeição. O aluguel ele aceita pagar,
mas a prestação não. Isso não aconteceria com um estudante.
Segundo Nazih, o objetivo principal do Novas Alternativas não é produzir habitação e sim
fomentar (estimular) a habitação. Ainda segundo ele, é muito difícil vender uma idéia.
Quando se restaura uma ruína e se coloca oito, nove ou dez unidades residenciais nela, os
proprietários desses casarões abandonados começam a perceber o potencial que eles têm
nas mãos. Na verdade, a intenção é que os proprietários venham a desenvolver esta
tipologia sem a interferência do poder público. O maior problema que existe hoje no
centro do Rio de Janeiro é a questão fundiária. Quando se anda pelo centro da cidade e se
uma ruína ou terreno vazio, provavelmente este imóvel pertence a um português que
voltou para Portugal, a um espanhol que morreu e não deixou herdeiros, ou o imóvel tem
vários herdeiros, ou pertence a irmandades religiosas, etc. O RJ era distrito federal até
1960, então o imóvel que era do distrito federal continua a pertencer à União ou passa a
pertencer ao distrito da Guanabara? Depois houve a fusão do Estado da Guanabara com o
Estado do RJ e criou-se o município do RJ. Os terrenos do Estado da Guanabara passam a
ser patrimônio do Estado do RJ ou do município do RJ? Nem os procuradores sabem dizer.
Existem grandes quantidades de imóveis oriundos da época em que o RJ era distrito federal
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
208
que não se sabe se pertencem à União, ao Estado do RJ ou ao município do RJ. Existem
imóveis que começaram a ser desapropriados em 1997 e até hoje não foram resolvidos.
Existem hoje no Novas Alternativas empreendimentos que podem ser licitados
imediatamente, com emissões de posse emitidas em juízo (desapropiações), mas que não
podem ter RGI pois constam como réu ignorado. Possuem a licença em mãos para começar
a construir, mas não pode por não ter o RGI. Ainda vigora na cabeça dos juízes a questão
da propriedade privada como sendo intocável, de acordo com a Constituição de 1988. A
terra ainda não é vista com um fim social.
Quando algum proprietário procura o programa com a intenção de vender um imóvel na
área central com a documentação em dia, Nazih procura convencer este proprietário a
contratar um arquiteto e fornece ajuda para desenvolver um projeto para aquela tipologia,
adequado à área central, para aprovar o projeto junto ao SEDREPACH, SMU e Corpo de
Bombeiros e para entrar em contato com a CEF a fim de evitar a desapropriação. Nazih
entra com a desapropriação quando a questão fundiária é complicada. A única forma de se
proceder à regularização fundiária é através da desapropriação.
Outra dificuldade apontada por Nazih é que nós brasileiros não somos um povo muito
empreendedor.
Nazih recebe muitas propostas de proprietários que desejam vender terrenos na área
central. Normalmente os proprietários de terrenos ou ruínas no centro acham que com o
dinheiro da desapropriação conseguem comprar um bom apartamento na zona sul. Ele
procura desestimular a venda, mostrando ao proprietário o potencial econômico do
imóvel, e dar suporte à elaboração, aprovação e licitação do projeto. Via de regra, estes
proprietários optam por vender o terreno. O mesmo acontece com as construtoras. Tanto
proprietários como construtoras esperam que o programa desaproprie o imóvel e faça o
projeto, a aprovação e o licenciamento.
O programa tem avançado porque se tem conseguido atrair construtoras de outros
estados do Brasil. Normalmente as construtoras que executam as obras do Novas
Alternativas são de Minas Gerais e São Paulo, pois as construtoras cariocas estão muito
voltadas para o mercado da Barra da Tijuca, Jacarepaguá e Recreio.
A decadência da área central não é um problema que acontece somente no RJ. Muitas
cidades brasileiras e do mundo passaram pelo mesmo problema. Dentro deste contexto
macro existem 3 questões que são inerentes ao RJ: 1 Os Planos Diretores antigos o
Plano Diretor de 1935 considerava o uso habitacional no centro como tolerado. Em 1970
foi proibida a construção de habitações na área central. Somente a partir de 1993 é que
voltou a ser permitido o uso habitacional na área central. 2 A mudança da capital do país
do RJ para Brasília até o final dos anos 50, provavelmente o centro do RJ era o centro
mais cosmopolita do país. Milhares de funcionários blicos federais (deputados federais,
senadores, sedes das embaixadas, sedes dos bancos, etc.) trabalhavam e consumiam na
área central. No início dos anos 60 esta estrutura saiu do RJ e muitos prédios que foram
esvaziados por este fato permanecem ociosos até o dia de hoje. 3 – A desativação do porto
do RJ no início do século XX o porto do RJ era o principal porto do Brasil. Em meados do
século XX este passa a ser o porto mais importante do Brasil. Todo o movimento de
carga e descarga de caminhões, trens, milhares de pessoas trabalhando e vivendo em
função do porto e, de repente, o porto foi transferido para Sepetiba, em Itaguaí. Ocorreu
então um esvaziamento muito grande da área central.
Em 1980 havia cerca de 94.000 pessoas morando na área central. Em 1991 eram 75.000 e
em 2000 eram 60.000. A população flutuante gira em torno de 600.000 pessoas circulando
na área central, podendo chegar a mais de 1.000.000 em algumas épocas do ano.
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
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209
A atuação do Novas Alternativas privilegia, atualmente, as áreas da Saúde, Gamboa e Santo
Cristo, as imediações das ruas Salvador de Sá, Estácio de e Mem de Sá, a região da Cruz
Vermelha e a área do Corredor Cultural ?
Ressaltou a quantidade das APAC’s e citou Santa Tereza. A rua da Carioca é tombada pelo
INEPAC e está dentro do Corredor Cultural. Existe uma sobreposição de leis de
preservação.
A maior parte dos imóveis beneficiados pelo Novas Alternativas ficam em áreas de APAC.
Nessas regiões, a maioria dos imóveis são preservados e o tombados. Na verdade, não
existe uma rigidez de técnicas de restauro. Isso aconteceu somente no edifício da rua
Senador Pompeu 34, pois é tombado pelo Patrimônio Histórico. Neste existiu uma
preocupação de manter o madeiramento em bom estado, substituindo apenas o que
estava deteriorado, etc. Este processo acontecerá, provavelmente, no imóvel da rua dos
Inválidos (esquina com a rua do Riachuelo), pois esta rua é tombada pelo IPHAN. Este
terreno em fase de desapropriação.
Tipologia típica dos lotes no centro: terrenos estreitos e profundos.
O Novas Alternativas procura projetar edifícios contemporâneos integrados ao sítio
histórico. Isto pode ser observado na preservação do lote original, da platibanda, cimalha,
aberturas, esquadrias, sacadas, enfim de todos os elementos arquitetônicos.
Possuem uma equipe em campo selecionando e identificando os imóveis a serem
adquiridos. Normalmente entram com a desapropriação, desenvolvem os projetos,
aprovam os projetos nos órgãos licenciadores, fazem parcerias com instituições
financeiras, acompanham as obras, fazem o cadastramento da população residente
(transferem as famílias residentes, muitas vezes em situação de risco, para o aluguel social)
e atuam na seleção de novos moradores (possuem cadastro na coordenadoria de
fomento). Quando selecionam os moradores para determinado empreendimento, dão
prioridade a eles para que peguem financiamento para aquela moradia.
o parceiros do Novas Alternativas o SEDREPACH, na aprovação e flexibilização da
legislação, a SMU, a Secretaria de Fazenda, na desapropriação dos imóveis, que o
transformados em propriedade municipal dispensando-se a votação na Câmara Municipal,
a CEF, financiando parte dos empreendimentos e, após a conclusão das obras, atuando no
gerenciamento dos imóveis e os cartórios, no levantamento das dimensões precisas dos
lotes. Durante 15 anos, período do PAR em que a CEF é proprietária, esta é responsável
pela conservação do imóvel. O PAR na verdade é um leasing habitacional. Os imóveis não
são comprados imediatamente. A opção de compra ocorre apenas no final dos 15 anos.
O perfil dos empreendimentos realizados pelo programa são comercializados na faixa de
R$ 25.000,00 a R$ 60.000,00. Acima desse valor, existem opções mais atrativas em outros
bairros da cidade.
As famílias atendidas devem ter salários entre 3 e 6 salários mínimos. Atualmente a classe
de 1 a 3 salários mínimos está totalmente excluída de qualquer tipo de financiamento.
Segundo Nazih, não adianta deixar de beneficiar os moradores desta faixa salarial com
imóveis na área central e depois arcar com os custos desta decisão, aumentando as
moradias em favelas e áreas de risco, que muito tempo atingiram áreas nobres da
cidade. Segundo ele, a cidade pertence a todos. Quando se faz um trabalho de reabilitação,
parte desses imóveis deveriam ser destinados a quem ganha de 1 a 3 salários, parte para
quem ganha de 3 a 6 e parte para quem ganha de 6 a 20 salários. Não adianta também
beneficiar diversas famílias de baixa renda que não conseguirão arcar com a manutenção
dos sobrados.
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
210
Até o início do século XX as habitações possuíam uma grande loja na parte inferior do
edifício e a moradia na parte superior. Ao longo de 70 ou 80 anos estes imóveis se
deterioraram e é normalmente assim que a SMH desapropria o imóvel: o prédio caiu e
parte da fachada também. Essa é uma intervenção típica do Novas Alternativas: mantém-
se uma pequena loja no térreo, uma habitação na fachada principal, um prisma de
iluminação e ventilação e, aproveitando o grande -direito, propõe-se de 3 até 4
pavimentos.
Segundo Nazih, os imóveis antigos reabilitados se deterioram muito rapidamente.
Normalmente são construções de 150 a 200 anos atrás. Se não houver uma manutenção
ou uma política de preservação bem estruturada, que pode ser feita por exemplo através
da Secretaria de Proteção do Patrimônio Histórico, estes edifícios entrarão em declínio
cada vez mais rápido.
Nos primeiros imóveis reabilitados (Sacadura Cabral e Travessa do Mosqueira) os
banheiros e as lavanderias são coletivos. No Cunha Barbosa será feito algo próximo daquilo
que foi executado no Senador Pompeu 34: união de 2 modos que serão quarto e sala
com banheiro e cozinha dentro da unidade. Este imóvel foi recuperado pelo Novas
Alternativas para ser um cortiço, mas devido à rejeição dos moradores, serão feitas novas
obras com estas adaptações para ser comercializado, num total de 24 unidades. Isto
mostra a evolução do programa e a mudança de gestão política. Provavelmente houve
exigências da CEF para conceder o financiamento.
Não cabe à SMH fiscalizar a conservação do edifício.
A partir da reabilitação do imóvel da rua Senador Pompeu 34 é que ocorre a extinção do
banheiro coletivo. Cada unidade, oriunda da união de 2 cômodos, passou a ter o banheiro
individualizado com um quarto, uma sala e uma cozinha. Originalmente eram 38 cômodos
que, após a reforma, foram transformados em 23 unidades. O perfil do morador da
Senador Pompeu é diferente da Sacadura Cabral e Travessa do Mosqueira. Abrange
famílias pequenas, casais ou pessoas solteiras. Após a ocupação, a SMH não tem controle
sobre o número de habitantes que passa a ocupar os imóveis, principalmente após a
compra definitiva das unidades. A SMH não seleciona famílias grandes para ocupar estes
imóveis. O controle é feito somente na seleção dos moradores e não após a ocupação.
O programa habitacional da prefeitura é muito vasto, com empreendimentos na zona
oeste com 2 quartos pelo mesmo preço que os imóveis de 1 quarto no centro. Então são
para estas unidades que direcionam as famílias. As tipologias do centro são outras.
Devido à rejeição ocorrida nos primeiros imóveis reabilitados e com as exigências para a
concessão financiamento da CEF, a tipologia cortiço com banheiros coletivos passou a ser
evitada.
O exemplo da rua Francisco Muratori, em Santa Tereza, corresponde a outra característica
da evolução do programa. A intervenção criou unidades do tipo loft francês, com sala,
quarto, banheiro e pequena cozinha, porém com lavanderia coletiva. Nesse momento, a
lavanderia ainda não foi adaptada para o interior da unidade, configurando uma área de
serviço. Esse tipo de intervenção ajuda a baratear o valor final da unidade. Nazih citou que
em Nova Iorque muitos prédios de classe média possuem lavanderias coletivas que são
bastante utilizadas pelos moradores, os quais abrem mão da máquina de lavar dentro de
casa. É uma questão cultural. No Brasil, todos têm a sua máquina de lavar, por mais pobre
que seja. Nos casos dos edifícios reabilitados pelo programa, alguns moradores
adaptaram suas máquinas de lavar no box do banheiro. As unidades atuais produzidas pelo
programa dispõem de sala, quarto, cozinha, banheiro e área de serviço. O lado negativo
desta evolução nas intervenções (banheiro e área de serviço dentro das unidades) seria o
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211
ônus financeiro que recai sobre o programa, pois as melhorias que são realizadas
representam um custo maior por unidade para a prefeitura. A unidade ao invés de custar
R$ 40.000,00 passa a custar R$ 50.000,00 e assim por diante. No final, o morador não quer
morar na baixada fluminense e também não quer ou não pode pagar R$ 50.000,00 ou R$
60.000,00 por uma unidade no centro.
O Novas Alternativas faz um acompanhamento nas unidades produzidas com relação às
questões de projeto que não deram certo ou não foram bem aceitas pelos moradores.
Segundo Nazih, quando há vistorias da prefeitura nos imóveis os moradores reclamam de
tudo, sendo que a solução da maioria dessas reclamações não compete a prefeitura. É
importante que o pesquisador que estuda o programa tenha esta visão. É preciso distinguir
o que é falha do poder público e o que é desejo do morador, que muitas vezes exige do
poder público uma postura paternalista. Citou que nos primeiros cortiços reabilitados, com
a saída das ONG’s, o Novas Alternativas teve que administrar os imóveis e resolver muitos
desentendimentos entre os moradores.
No morro da Conceição foi realizado um empreendimento que abrange unidades de até 2
quartos, sendo que na parte inferior da unidade encontram-se a sala, cozinha, banheiro,
área de serviço e na parte superior os quartos.
intenção de transformar galpões vazios na Gamboa, remanescentes do porto, em
habitações.
O programa possui 119 unidades habitacionais concluídas. Estão em fase de licitação 168
unidades. Existem 225 unidades licenciadas, aguardando o final da desapropriação para
começar as obras, e 340 unidades em fase de projeto, num total de 852 unidades. Existem
mais 185 imóveis cadastrados para futuras desapropriações.
Como dificuldades enfrentadas apontou a situação fundiária complexa, os próprios federais
e estaduais com a documentação não regularizada, legislação bastante restritiva,
principalmente a do patrimônio histórico, dívidas de concessionárias, poder judiciário
lento, problemas em cartórios (metragens reais dos terrenos não coincidem com as
escrituras), necessidades de desapropriação para regularização fundiária.
Todo o processo de recuperação do edifício da rua Senador Pompeu 34 foi acompanhado
pelo Patrimônio Histórico (DGPC), que orientou as intervenções físicas.
Quando a construção das unidades em imóveis preservados, são utilizados materiais
contemporâneos, como tijolo de barro, estrutura metálica, cimento, areia, etc. A
importância histórica deles está na volumetria.
Nazih é contra a reconstrução do imóvel quando ele já deixou de existir, como é o caso do
imóvel na rua dos Inválidos que está sendo desapropriado. Acaba se transformando num
edifício cenográfico, num falso histórico. Segundo ele, a restauração deve acontecer antes
do prédio ruir.
Comentou ser contra a transformação da garagem Poula, antiga garagem de carruagens,
em habitações na rua Gomes Freire. Segundo ele, o uso habitacional para a tipologia que
existe é inadequado. A forma de viabilizar economicamente o empreendimento seria
construir um edifício anexo para aproveitar o grande pátio lá existente. A intenção é não
descaracterizar o imóvel que, a princípio, deveria estar reabilitando.
Nazih rebateu algumas críticas feitas pela Secretaria de Proteção do Patrimônio Histórico
de que em alguns imóveis são feitos fachadismos. Segundo ele o fachadismo ocorre
quando se demole um conjunto de imóveis preservados em bom estado e se mantém as
suas fachadas. Reaproveitar ruínas não pode ser considerado fachadismo. Para Nazih, a
Secretaria de Proteção do Patrimônio deveria criar uma política de conservação para
impedir que estes imóveis se deteriorem e venham abaixo.
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212
Os empreendimentos da rua do Livramento correspondem à tipologia habitacional mais
atual em desenvolvimento, não por exigência do próprio programa, mas também da
CEF, dos moradores e do mercado. Segundo Nazih, uma situação era aquela idealizada pelo
Conde e o Sérgio Magalhães para o programa, de maneira afetiva, bucólica, etc. e outra é
trazer o programa para a realidade das pessoas e do mercado. Atualmente as divergências
com a Secretaria do Patrimônio são muito menores, pois se chegou ao consenso de que
a única solução para o centro do RJ é o programa Novas Alternativas.
De acordo com a arquiteta Gisele, os moradores ficaram muito satisfeitos com os
empreendimentos, alguns inclusive habitavam anteriormente casas de cômodos. Com o
passar do tempo, os próprios moradores quiseram construir banheiros dentro das
unidades. O programa desenvolveu alguns estudos para esses imóveis, porém foi inviável a
execução devido o tamanho reduzido do espaço disponível. A partir de então tornou-se
perceptível a existência de um mínimo de condições que as pessoas desejavam nos dias de
hoje. Percebeu-se que até a menor célula de habitação deveria possuir um sanitário
incorporado e uma cozinha do tipo americana, sendo ainda aceita a lavanderia coletiva. Por
menor que fosse a faixa de renda, os moradores já possuíam eletrodomésticos.
No caso do Senador Pompeu houve uma batalha muito grande entre o Departamento de
Patrimônio, a SMH e a CEF para descobrir como o empreendimento seria viabilizado sem
deturpá-lo como bem tombado, mantendo o uso anterior. Para tanto foi considerada a
existência da grande quantidade de mobília e eletrodomésticos atualmente, o que
justificou a substituição do barroteamento por laje de concreto devido à sobrecarga. Foi
recomposta a fachada interna do pátio, a cobertura e o módulo dos fundos. O restante foi
praticamente refeito internamente. Cada conjunto de 2 cômodos foi transformado em uma
unidade.
Os primeiros imóveis foram reabilitados com verba da prefeitura. Quando esta verba
acabou, a prefeitura buscou novas formas para dar continuidade ao programa. Nesse
período a CEF surgiu como parceira, que inicialmente viabilizava e financiava 2 quartos.
Devido às tipologias encontradas no centro, a CEF passou a admitir e viabilizar imóveis de 1
quarto. A unidade de quarto, sala, cozinha e banheiro se transformou no padrão adotado
pela CEF para o PAR em sítios históricos, configurando uma linha de financiamento
específica.
O Novas Alternativas fazia apenas o projeto básico. A contratação dos projetos executivos
ficariam a cargo das construtoras. Como o custo das obras eram grandes e o número de
unidades pequeno, as construtoras acabavam não contratando os projetos executivos para
não terem mais despesas. Esse fato gerou muitos problemas. A partir de então foram
adotados nos projetos detalhes padrão (soleira, chapim, padronização das esquadrias
internas, mesma especificação indicada pelo PAR, etc.). Nos projetos, o programa passou a
incluir elementos da vida moderna: ar condicionado, telefone, campanhia, etc.). Por um
lado isso encarece a obra. O fato do imóvel se localizar em sítio histórico torna a obra
mais cara que uma unidade habitacional nova na baixada, devido à recuperação de
fachada, cobertura, etc. Para o construtor, que repassa esse custo para o comprador, isso
onera o valor da unidade. A vantagem é a infra-estrutura (rede de água, esgoto, energia,
etc.) já consolidada na área central.
O programa atende atualmente uma população que recebe de 5 a 6 salários mínimos. O
programa não atende mais a população que era atendida nos primeiros cortiços
recuperados.
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A partir do Novas Alternativas as concessionárias, a Secretaria de Patrimônio e a própria
CEF passaram a abrir concessões para a viabilização desses empreendimentos.
O cortiço da rua Senador Pompeu foi o único imóvel tombado que sofreu intervenção do
programa.
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Sistema estrutural Barrotes em madeira tipo Ipê
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Manchas de umidade Infiltração de água da chuva
COMENTÁRIOS
Foram identificadas manchas em todo o barroteamento de madeira que sustenta a circulação
externa do pavimento superior. As peças estão visivelmente úmidas e com a cor alterada.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Circulação externa do pavimento superior
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Revestimento de piso Tabuado em madeira
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Manchas de umidade Infiltração de água das plantas
COMENTÁRIOS
A ação de regar as plantas localizadas na circulação externa do pavimento superior contribuiu
para o surgimento de manchas de umidade no piso de madeira junto à alvenaria. A
proximidade dos vasos em relação ao piso favoreceu o acúmulo e infiltração da água. Pode
haver também problemas no caimento do piso.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Circulação externa do pavimento superior
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Revestimento de parede Argamassa e pintura com tinta acrílica
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Fissura
Respingos de água da chuva
Acúmulo de água na base da alvenaria
COMENTÁRIOS
No emboço da alvenaria de tijolo maciço no pavimento térreo foi detectada uma fissura. Neste
caso, a umidade ascendente por capilaridade da água provoca a expansão e descolamento da
argamassa. A expansão da argila, presente na composição da alvenaria, pode ter contribuído
também para a erosão da argamassa.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Trecho de fachada entre as unidades
101 e 102
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Revestimento de parede Argamassa e pintura com tinta acrílica
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Descolamento
Presença de sais solúveis nos materiais
Infiltração de água da encosta do terreno
Rompimento de tubulações hidrossanitárias
COMENTÁRIOS
Foi identificada criptoflorescência em parte do revestimento das alvenarias do prisma de
iluminação e ventilação no pavimento inferior. Verificou-se a degradação da superfície do
reboco e a descamação da pintura em função da presença de sais solúveis na alvenaria, no
reboco ou que foram trazidos pelas fontes de umidade.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Prisma de iluminação e ventilação junto à
unidade 106
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Revestimento de parede Argamassa e pintura com tinta acrílica
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Empolamento
Acúmulo de água na base da alvenaria
Infiltração da água da chuva
COMENTÁRIOS
Foram identificados empolamentos na pintura da alvenaria de fechamento lateral da escada.
Neste caso, podem estar ocorrendo infiltrações de água através dos pontos de fixação do
guarda-corpo metálico na alvenaria e/ou por capilaridade (umidade ascendente) devido ao
acúmulo de água na base da parede.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Escada
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Revestimento de parede Argamassa e pintura com tinta acrílica
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Pichações Depredação
COMENTÁRIOS
Foi verificada a ocorrência de manchas e pichações com tintas e esmaltes na pintura da
fachada frontal que contribuíram para a descaracterização do conjunto arquitetônico. Este
dano ocorre apenas no pavimento inferior.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Fachada da Rua Senador Pompeu
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do
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Revestimento de teto Forro em lambri de Pinus
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Manchas de umidade
Falhas nos elementos da cobertura
Infiltração da água da chuva
COMENTÁRIOS
A qualidade da madeira utilizada nos forros das unidades e circulações, associada à
presença constante da umidade, ocasionou o surgimento de patologias construtivas. Em
grande parte das unidades visitadas foi verificada a presença de manchas de umidade no forro,
junto à alvenaria, e sinais de infiltração na pintura da parede. A incidência maior desses danos
se dá no pavimento superior logo abaixo do telhado.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Interior da unidade 106
Interior das unidades 205 e 212
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Esquadria Madeira, massa acrílica e pintura esmalte sintético
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Apodrecimento
Infiltração de água da chuva
COMENTÁRIOS
Nas fachadas do pátio interno foram encontradas esquadrias bastante danificadas, como é o
caso da porta dos medidores de gás no térreo. Após verificações no local constatou-se que a
madeira utilizada era de baixa qualidade (aglomerado) e inadequada para uso externo.
As esquadrias internas de algumas unidades também apresentam sinais de deterioração, como
é o caso da porta do banheiro do apartamento 106. Segundo informações da moradora, a
infiltração da água causou o apodrecimento do marco da porta e o desgaste de suas ferragens,
ocasionando a queda da porta.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Medidores de gás, acesso às unidades 108 e 109
e interior da unidade 106
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Esquadria
Madeira, massa acrílica e pintura esmalte sintético
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Fissuras na massa de revestimento
Execução inadequada
Infiltração da água da chuva
COMENTÁRIOS
A maior parte das esquadrias apresenta problemas relativos à pintura e à massa de
revestimento, identificados através de fissuras e estufamentos. Estas patologias construtivas
foram verificadas com maior freqüência nas esquadrias das fachadas.
Segundo relatos de alguns moradores, ocorre entrada de água das chuvas nas unidades
através das esquadrias. A infiltração da água e a falta de caimento adequado provocaram
fissuras nos revestimentos dos peitoris e folhas das janelas.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Janela na fachada da unidade 212
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Esquadria Madeira, massa acrílica e pintura esmalte sintético
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Pichações Depredação
COMENTÁRIOS
Foi verificada a ocorrência de manchas e pichações com tintas e esmaltes nas esquadrias de
madeira da fachada frontal que contribuíram para a descaracterização do conjunto
arquitetônico.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Fachada da Rua Senador Pompeu
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ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Cobertura Rufo em chapa metálica
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Fissuras na argamassa de assentamento Execução inadequada
COMENTÁRIOS
Os rufos metálicos do telhado apresentam problemas de execução no que diz respeito à fixação
na alvenaria e fissuramento na argamassa de assentamento. Essas falhas geram vários pontos
de infiltração na junção entre a cobertura e as empenas dos edifícios vizinhos. Provavelmente
faltaram detalhes executivos para a correta condução da obra.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Telhado
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Instalações prediais Captação de águas pluviais
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Ausência de calhas Execução inadequada
COMENTÁRIOS
No projeto de reabilitação do edifício foram especificadas calhas de alumínio distribuídas ao
longo de todo o beiral do telhado no pátio interno, que não foram executadas durante as obras.
A ausência desse elemento de captação contribuiu para o aparecimento de diversas patologias
construtivas relacionadas à infiltração da água e favoreceu o acúmulo de água no piso do
pavimento inferior.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Telhado no pátio interno
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ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Instalações prediais Instalações hidrossanitárias
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Vazamento Rompimento de tubulações
COMENTÁRIOS
Foram encontrados vazamentos na caixa de visita do piso e na tubulação de ferro embutida na
parede do prisma de iluminação e ventilação no pavimento inferior. Estes problemas
provocaram a infiltração da água por capilaridade nas encostas do terreno e contribuíram para
o surgimento de patologias construtivas nos revestimentos da alvenaria.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Prisma de iluminação e ventilação junto à
unidade 106
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Instalações prediais Instalações telefônicas
PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS
TIPO CAUSAS
Fiação exposta Execução inadequada
COMENTÁRIOS
De acordo com o projeto de reabilitação do edifício, foram previstas tubulações para a
passagem das instalações telefônicas. Após a entrega da obra, a empresa que executou a rede
telefônica desrespeitou as normas de segurança necessárias, deixando toda a fiação exposta e
sem o isolamento apropriado. Representa grande risco à edificação e aos moradores devido à
possibilidade de incêndio, causado por um curto-circuito, e de choque elétrico, uma vez que os
fios estão em contato com o portão de ferro. Trata-se de um caso de serviço mal executado que
não teve a fiscalização dos órgãos de preservação competentes.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Circulação de acesso e pátio interno
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Pátio interno
Espaço retangular com 7,50 x 24,50m que serve de acesso às
unidades residenciais do pavimento inferior e funciona como
prisma de iluminação e ventilação dos apartamentos
APROPRIAÇÕES
TIPO CAUSAS
Adaptações de máquinas de lavar Ausência de área de serviço nas unidades
COMENTÁRIOS
No projeto de reabilitação do cortiço não foram previstas áreas de serviço nas unidades
residenciais. Este fato ocasionou diversas adaptações no pátio interno para acomodação de
máquinas de lavar roupa. Estas apropriações, estimuladas por soluções inadequadas de projeto,
contribuíram para a descaracterização da ambiência do pátio e o desconforto do usuário.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Acesso às unidades 105 e 107
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Pátio interno
Espaço retangular com 7,50 x 24,50m que serve de acesso às
unidades residenciais do pavimento inferior e funciona como
prisma de iluminação e ventilação dos apartamentos
APROPRIAÇÕES
TIPO CAUSAS
Adaptações no telhado Respingos da água das chuvas
COMENTÁRIOS
Outra forma de interferência física é a adaptação feita na cobertura do tanque comunitário. Foi
observada a retirada de algumas telhas do beiral do telhado, próximo a unidade 107. Segundo
relato dos moradores, a água que incide sobre o beiral telhado nas chuvas intensas respinga na
fachada e nas esquadrias da unidade e penetra no seu interior. A solução inadequada do
projeto e processo de reabilitação causou, no período pós-ocupação, desconforto ao morador e
favoreceu modificações indevidas nos elementos construídos.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Tanque coletivo
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Circulação externa no pavimento superior
Elemento que serve de acesso às unidades residenciais do
pavimento superior. Possui largura de aproximadamente 1,00m,
estrutura em madeira tipo Ipê e circunda todo o perímetro do
pátio interno.
APROPRIAÇÕES
TIPO CAUSAS
Adaptações de varais de roupa Ausência de área de serviço nas unidades
COMENTÁRIOS
Foi verificado o uso de varais de roupa no guarda corpo da circulação. Além da presença
constante da umidade, dado o contato das roupas molhadas com a estrutura de madeira,
ocorrem a degradação da peça do corrimão pelo atrito com o varal e um esforço adicional
(carga) na estrutura do guarda-corpo.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Guarda-corpos de todas as alas
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
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ANEXO III – FICHA DE ANÁLISE DO ESTADO DE CONSERVAÇÃO
ELEMENTO COMPOSITIVO
ITEM DESCRIÇÃO I ESPECIFICAÇÃO
Unidades residenciais
Unidades com áreas entre 17m² e 35m² compostas por sala,
quarto, cozinha e banheiro
APROPRIAÇÕES
TIPO CAUSAS
Adaptações de máquinas de lavar Ausência de área de serviço nas unidades
COMENTÁRIOS
A ausência de áreas de serviço nos apartamentos e a preferência de alguns moradores em não
utilizar o tanque comunitário motivaram diversas adaptações de máquinas de lavar no interior
das unidades residenciais. Como não foram previstas instalações hidrossanitárias para estes
equipamentos, os moradores aproveitam, de forma inadequada, as instalações do banheiro
para realizar as adaptações.
IDENTIFICAÇÃO VISUAL
LOCALIZAÇÃO FOTO
Unidade 101
Unidades 205 e 207
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do
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
232
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
233
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
234
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
235
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
236
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
237
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
238
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
239
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
240
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
241
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
242
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
243
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
244
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
245
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
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O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
246
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
247
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
248
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
249
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
250
Habitação Popular e Preservação do Patrimônio na Reabilitação
do
Centro do Rio de Janeiro
O caso do edifício na rua Senador Pompeu 34
251
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