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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião
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A presença da Assembléia de Deus e da Igreja Universal do Reino de
Deus no Congresso Nacional (1999-2006)
por
Saulo de Tarso Cerqueira Baptista
Orientador
Professor Doutor Leonildo Silveira Campos
São Bernardo do Campo, março, 2007.
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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião
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A presença da Assembléia de Deus e da Igreja Universal do Reino de
Deus no Congresso Nacional (1999-2006)
por
Saulo de Tarso Cerqueira Baptista
Orientador:
Professor Doutor Leonildo Silveira Campos
Tese apresentada em cumprimento parcial às
exigências do Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Religião, como requisito para
obtenção do grau de Doutor.
São Bernardo do Campo, março, 2007.
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FICHA CATALOGRÁFICA
Baptista, Saulo de Tarso Cerqueira
Cultura política brasileira, práticas pentecostais e neopentecostais: a
presença da Assembléia de Deus e da Igreja Universal do Reino de
Deus no Congresso Nacional (1999-2006) / Saulo de Tarso Cerqueira
Baptista. São Bernardo do Campo, 2007.
562p.
Tese (Doutorado) Universidade Metodista de São Paulo,
Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião, Curso de Pós-Graduação
em Ciências da Religião.
Orientador : Leonildo Silveira Campos
1. Brasil Política e governo, 1999-2006 2. Política e religião 3.
Assembléia de Deus Estudo de caso 4. Igreja Universal do Reino de Deus 5.
Pentecostalismo 6. Sociologia e religião 7. Cultura e política I. Título
CDD 261.70981
3
BANCA EXAMINADORA
Presidente _________________________________________
Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos
1º Examinador ______________________________________
Prof. Dr. Dario Paulo Barrera Rivera
2º Examinador ______________________________________
Prof. Dr. Décio Azevedo Marques de Saes
3º Examinador ______________________________________
Prof. Dr. Paul Charles Freston
4º Examinador ______________________________________
Prof. Dr. Joanildo Albuquerque Burity
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos que me ajudaram durante as pesquisas e elaboração desta tese. Seria
muito difícil registrar nomes de todos os parlamentares, professores, amigos, familiares e outras
pessoas, algumas até omitidas intencionalmente, visto que estavam correndo risco ao fornecerem
informações sensíveis sobre bastidores do poder, tanto no âmbito do Congresso Nacional como em
suas igrejas. Assim, faço aqui um agradecimento a essa extraordinária rede de colaboradores.
Da mesma forma quero nomear e agradecer as seguintes instituições e pessoas que
estiveram diretamente ligadas a este trabalho científico: Universidade Metodista de São Paulo;
Instituto Ecumênico de Pós Graduação em Ciências da Religião; Comunidade Ecumênica Halden
(Suíça); The United Methodist Church: General Board of Global Ministries (EUA); Igreja
Metodista da Pedreira (Belém PA); Professor Leonildo Silveira Campos, orientador e amigo;
Professora Sandra Duarte Souza; Professor Paulo Barrera; Professor James Reaves Farris; Professor
Décio Saes; Professor Paul Freston; Professor Joanildo Burity; Professor Alexandre Brasil Fonseca;
Professor Paulo Bessa; Professor Paulo Garcia; Margarida Francesquini; Professor Pedro Paulo
Maneschy; Professor Helmut Renders; Professor Geoval Jacinto da Silva; Bispo João Alves de
Oliveira Filho; Reverendo Natanael Marques; Edson D’Ávila; Jessé Pereira da Silva; Emily Linden
Moses; Eluzinete Pereira Garcia; Géter Borges de Sousa; Kléber Torres Soares Filho; Marcos
Padilha; Izídio Oliveira; Andreas Nufer; Raimundo Gonzaga (in memoriam); Euza Gonzaga;
Professor Raimundo Jorge; Professor Daniel Chaves de Brito; Aucilene Brito; Professor Mauro
Barreto; Professor Marcelo Galvão Baptista e Leonete Mota Sales.
Um agradecimento à minha família, cujos membros são: Teresa, Mara Ruth, Ana Marta,
Débora, Lia Raquel, Ester, Pablo, Tárik, Caio Felipe, Saulo Neto, Raki Mohamad, Marcos
Henrique, Larissa, Letícia, Jami Kelly, Sávio, Eduardo, Davi, Kenzo, Sachie, Akemi, Cláudio Raki,
Reginaldo, Lívia e Margarida.
Entendo que a qualidade da produção científica é conseqüência do pensar e agir segundo
suas teorias e práticas. As ciências não podem ser contaminadas por cosmovisões religiosas. No
fazer científico sou, portanto, agnóstico. Não trabalho com hipóteses que transcendam a natureza e
os processos sociais, ou que imponham concepções apriorísticas de história e sociedade.
Reconheço, porém, a ação de Deus em minha vida e, como cristão, sou grato a Ele pela
concretização deste projeto acadêmico.
5
BAPTISTA, Saulo de Tarso Cerqueira. Cultura política brasileira, práticas pentecostais
e neopentecostais: a presença da Assembléia de Deus e Igreja Universal do Reino de Deus
no Congresso Nacional (1999-2006). 2007. 562p. Tese (Doutorado em Ciências da
Religião) Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo.
RESUMO
Esta tese apresenta uma análise das práticas políticas de parlamentares pentecostais
e neopentecostais da Assembléia de Deus e Igreja Universal do Reino de Deus no
Congresso da República do Brasil, de 1999 a 2006. Compara essas práticas pentecostais e
neopentecostais com padrões de comportamento da cultura política brasileira e as ações
correspondentes do Estado nacional como preservador dessa mesma cultura. São estudados
os agentes religiosos citados desde a investida que suas igrejas fizeram na política nacional,
a partir da Constituinte de 1987-1988, mas o corte temporal são as duas legislaturas, de
1999 até 2006. O foco principal da análise é a Frente Parlamentar Evangélica constituída
em 2003. O envolvimento de pentecostais e neopentecostais em casos de corrupção e
apropriação de recursos públicos, conhecidos como “mensalão” e “máfia dos
sanguessugas”, é amplamente abordado no último capítulo deste trabalho.
Palavras-chave: Estado nacional, cultura política brasileira, pentecostalismo,
neopentecostalismo, Assembléia de Deus, Igreja Universal do Reino de Deus, Frente
Parlamentar Evangélica, corrupção.
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BAPTISTA, Saulo de Tarso Cerqueira. Brazilian political culture, Pentecostal and
Neopentecostal practices: the presence of the Assembly of God and the Universal
Church of the Kingdom of God in the National Congress (1999-2006). 2007. 562p.
Doctoral Thesis (Doctorate in Religious Sciences) The Methodist University of São
Paulo, São Bernardo do Campo.
ABSTRACT
This thesis presents an analysis of the political practices of Pentecostal and Neopentecostal
congressional representatives of the Assembly of God and the Universal Church of the
Kingdom of God in the Congress of the Republic of Brazil, from 1999 to 2006. It
compares the practices of Pentecostals and Neopentecostals with the standards of behavior
of Brazilian political culture and actions related to the National State as preserver of
culture. The religious agents of the referred to Churches are studied based on the
investment of their Churches in national politics, in relation to Constitutional Amendments
of 1987-1988, but the time frame of the research refers to two legislative periods, from
1999 to 2006. The main focus of the analysis is the Evangelical Parliamentary Front
founded in 2003. The involvement of Pentecostals and Neopentecostals in cases of
corruption and the appropriation of public resources, known as “mensalão” and “mafia dos
sanguessugas”, is given special attention in the last chapter of the research.
Key-words: National state, Brazilian political culture, Pentecostalism, Neopentecostalism,
Assembly of God, Universal Church of the Kingdom of God, Evangelical Parliamentary
Front, corruption.
7
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS........................................................................................................ 11
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS....................................................................... 12
INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 16
Idéia geral da pesquisa............................................................................................ 21
Hipóteses................................................................................................................. .24
Importância e justificativa da pesquisa.................................................................... 26
Metodologia............................................................................................................. 28
Tipos ideais.............................................................................................................. 31
Itinerário da pesquisa............................................................................................... 34
Conteúdo dos capítulos............................................................................................ 42
CAPÍTULO 1
CULTURA POLÍTICA BRASILEIRA E PENTECOSTALISMO............................... 44
Introdução............................................................................................................................. 44
1.1 Colonização, nação brasileira e comparações............................................................. 46
1.2 Modernização elitista e cultura política brasileira....................................................... 52
1.2.1 Etapas da “modernização conservadora”.................................................... 53
1.2.2 O golpe de Estado em 1964......................................................................... 61
1.2.3 Uma elite contra-reformista......................................................................... 69
1.2.4 Evangélicos na política: avaliação (1960)................................................... 75
1.2.5 Pentecostais e condição social..................................................................... 77
1.2.6 Evangélicos e clientelismo......................................................................... 79
1.3 Padrões e vícios da cultura política brasileira............................................................. 80
1.3.1 Espaço público............................................................................................. 80
1.3.2 Evangélicos e espaço público...................................................................... 83
1.3.3 Espaço público e identidades coletivas....................................................... 87
1.3.4 Autoritarismo............................................................................................... 89
1.3.5 Patrimonialismo........................................................................................... 95
1.3.6 Gregarismo.................................................................................................. 98
1.3.7 Futurismo..................................................................................................... 101
1.4 Religiosidade e cultura política brasileira................................................................... 109
1.5 Sociedade civil, novas identidades coletivas e pentecostalismos................................ 111
Conclusão............................................................................................................................. 123
CAPÍTULO 2
O ESTADO BRASILEIRO E O PENTECOSTALISMO.............................................. 125
Introdução............................................................................................................................. 125
2.1 Entre nacionalismo e dependência externa ................................................................. 128
2.2 O Estado do golpe militar de 1964.............................................................................. 133
8
2.3 Os evangélicos e a ditadura do golpe de 1964............................................................ 136
2.4 Um Estado empreendedor-burguês............................................................................. 142
2.5 Estado e capitalismo de periferia................................................................................. 143
2.6 Estado, cidadania e anticidadania................................................................................ 145
2.7 Estado e sociabilidade pouco cordial.......................................................................... 152
2.8 Estado e populismo...................................................................................................... 156
2.8.1 A ditadura de 1964 e as massas................................................................... 167
2.8.2 As esquerdas e a política de massas............................................................ 172
2.8.3 Uma situação instável.................................................................................. 174
2.9 Os pentecostais no contexto do Estado brasileiro....................................................... 180
Conclusão............................................................................................................................. 187
CAPÍTULO 3
PENTECOSTAIS E NEOPENTECOSTAIS NA POLÍTICA BRASILEIRA............. 190
Introdução............................................................................................................................. 190
3.1 Participação política pentecostal: mobilização estratégica.......................................... 193
3.2 Pentecostais, ascensão e queda de Fernando Collor.................................................... 208
3.3 Mídia, mobilização de recursos e capitalização política............................................. 213
3.3.1 Mídia............................................................................................................ 213
3.3.2 Mobilização de recursos .............................................................................. 218
3.3.3 Capitalização política.................................................................................. 223
3.4 Mentalidade e valores éticos em comportamentos pentecostais................................. 226
3.4.1 Mentalidade e ética...................................................................................... 226
3.4.2 Moralismo e intolerância ............................................................................. 229
3.4.3 Pragmatismo e conservadorismo................................................................. 232
3.5 Estratégias eleitorais e atuação de parlamentares........................................................ 237
3.5.1 Currais eleitorais.......................................................................................... 237
3.5.2 Religiosidade total iurdiana......................................................................... 247
3.5.3 Bancada....................................................................................................... 250
3.5.4 Escolha e troca de partido............................................................................ 255
3.6 Corrupção entre políticos pentecostais: mais joio do que trigo................................... 259
3.7 Avaliações de desempenho dos políticos pentecostais................................................ 265
Conclusão............................................................................................................................. 267
CAPÍTULO 4
O POLÍTICO PENTECOSTAL....................................................................................... 270
Introdução............................................................................................................................. 270
4.1 O “candidato oficial”................................................................................................... 271
4.2 A questão do partido.................................................................................................... 286
4.2.1 Situação ou oposição................................................................................... 288
4.2.2 Pequenos partidos. Legendas de aluguel..................................................... 290
4.2.3 Partidos de esquerda.................................................................................... 295
4.2.4 Troca de partido........................................................................................... 298
4.2.5 Partido evangélico: iniciativas pentecostais................................................ 301
4.3 A campanha do político pentecostal............................................................................ 308
4.3.1 Preparação dos candidatos: orientações...................................................... 309
4.3.2 Princípios e valores...................................................................................... 313
9
4.3.3 Perguntas e respostas................................................................................... 315
4.3.4 Outros apoios aos candidatos...................................................................... 317
4.3.5 Estratégias de campanha.............................................................................. 318
4.3.6 Finanças....................................................................................................... 321
4.3.7 Desempenho eleitoral.................................................................................. 325
4.3.8 Curral eleitoral............................................................................................. 327
4.4 A atuação do político pentecostal................................................................................ 337
4.4.1 Propostas para a sociedade.......................................................................... 347
Conclusão............................................................................................................................. 351
CAPÍTULO 5
FRENTE PARLAMENTAR EVANGÉLICA: AVANÇOS E TROPEÇOS................ 354
Introdução............................................................................................................................. 354
5.1 Origem, organização e objetivos da FPE.................................................................... 358
5.1.1 GAPE........................................................................................................... 360
5.1.2 Expansão...................................................................................................... 362
5.2 Cultos, conferências e outras programações............................................................... 363
5.3 Atuação da FPE: relacionamentos internos e externos............................................... 365
5.3.1 Estatuto do Desarmamento.......................................................................... 367
5.3.2 Lei de Biossegurança................................................................................... 368
5.3.3 Criacionismo................................................................................................ 368
5.3.4 Reforma Política.......................................................................................... 369
5.3.5 Emenda ao Código Civil............................................................................. 370
5.3.6 Relação com Israel....................................................................................... 373
5.4 Escândalos e corrupção............................................................................................... 374
5.4.1 O ethos pentecostal...................................................................................... 375
5.4.2 Escândalos na 52ª legislatura....................................................................... 380
5.4.3 Esquema dos “Sanguessugas”..................................................................... 395
5.4.4 Comissão Parlamentar Mista de Inquérito................................................... 401
5.4.5 Lino Rossi.................................................................................................... 406
5.4.6 Nilton Capixaba........................................................................................... 408
5.4.7 Bispo Rodrigues.......................................................................................... 410
5.4.8 Neuton Lima................................................................................................ 411
5.4.9 Outras informações...................................................................................... 413
5.4.10 Encaminhamentos da CPMI...................................................................... 421
5.4.11 Breve comentário....................................................................................... 423
5.5 Parlamentares evangélicos (1999-2007): avaliações................................................... 424
DIAP........................................................................................................................ 426
Auto-avaliações: FPE e GAPE................................................................................ 437
Conclusão............................................................................................................................. 440
CONCLUSÃO.................................................................................................................... 444
REFERÊNCIAS................................................................................................................. 459
10
ANEXOS............................................................................................................................. 473
Anexo 1 Roteiro de entrevista Identificação e questões......................................... 474
Anexo 2 Decálogo evangélico do voto ético............................................................. 482
Anexo 3 Senadores evangélicos (1999-2007)........................................................... 484
Anexo 4 Deputados evangélicos / Mandatos até 2007 / Classificação por nome..... 485
Anexo 5 Deputados evangélicos (1999 - 2003) / Classificação por nome................ 491
Anexo 6 Deputados evangélicos (2003 - 2007) / Classificação por nome................ 494
Anexo 7 Deputados evangélicos (2007 - 2011) / Classificação por nome................ 498
Anexo 8 Deputados evangélicos / Mandatos até 2007 / Classificação por igreja...... 501
Anexo 9 Deputados evangélicos (1999 - 2003) / Classificação por igreja................ 507
Anexo 10 Deputados evangélicos (2003 - 2007) / Classificação por igreja................ 510
Anexo 11 Deputados evangélicos (2007 - 2011) / Classificação por igreja................ 514
Anexo 12 Deputados evangélicos / Mandatos até 2007 / Classificação por estado.... 517
Anexo 13 Deputados evangélicos (1999 - 2003) / Classificação por estado............... 523
Anexo 14 Deputados evangélicos (2003 - 2007) / Classificação por estado............... 526
Anexo 15 Deputados evangélicos (2007 - 2011) / Classificação por estado............... 530
Anexo 16 Deputados evangélicos / Mandatos até 2007 / Classificação por partido.... 533
Anexo 17 Deputados evangélicos (1999 - 2003) / Classificação por partido............... 539
Anexo 18 Deputados evangélicos (2003 - 2007) / Classificação por partido............... 542
Anexo 19 Deputados evangélicos (2007 - 2011) / Classificação por partido............... 546
Anexo 20 Votação obtida pelos deputados federais da Assembléia de Deus
em 2002 e 2006............................................................................................ 549
Anexo 21 Votação obtida pelos deputados federais da Igreja Universal do
Reino de Deus em 2002 e 2006................................................................... 550
Anexo 22 Frentes Parlamentares (52ª legislatura: 2003 2007).................................. 551
Anexo 23 Cidadania AD Brasil: Projeto político da CGADB..................................... 556
11
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Representantes da Assembléia de Deus e da Igreja Universal no Congresso Nacional
(1987-2004). 19
Tabela 2 Números absolutos, percentuais em relação à população e taxa de crescimento dos
católicos, evangélicos tradicionais, pentecostais e outros (1980 2000). 21
Tabela 3 Parlamentares federais evangélicos (titulares e suplentes que assumiram) e mandatos
exercidos, 1933-1992. 185
Tabela 4 Parlamentares por denominação, quantidade de membros e índice de representação por
milhão de fiéis (legislatura 2003 2007). 221
Tabela 5 Transformações nos subcampos pentecostal e neopentecostal e emergência dos
seus agentes no campo político (1964-2006). 453
12
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ABC Associação Beneficente Cristã (da Igreja Universal do Reino de Deus).
ABC Região industrial paulista, formada, principalmente, pelos municípios
de Santo André, São Bernardo e São Caetano.
ABUB Aliança Bíblica Universitária do Brasil.
AD Assembléia de Deus.
ADESG Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra.
ADHONEP Associação dos Homens de Negócio do Evangelho Pleno.
AEVB Associação Evangélica Brasileira.
ALERJ Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.
ARENA Aliança Renovadora Nacional.
BIRD Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento, mais
conhecido como Banco Mundial.
BNDE Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico.
BNDES Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social.
BPC Igreja Pentecostal “O Brasil para Cristo”.
CCB Congregação Cristã no Brasil.
CEB Comunidade Eclesial de Base.
CEB Confederação Evangélica Brasileira.
CEPAL Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina.
CGADB Convenção Geral das Assembléias de Deus do Brasil, também
conhecida como Convenção das Assembléias de Deus da Missão.
CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
CNPB Conselho Nacional de Pastores do Brasil.
CONAMAD Convenção Nacional das Assembléias de Deus do Brasil, também
conhecida como Assembléia de Deus do Ministério Madureira.
13
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito.
CPMI Comissão Parlamentar Mista de Inquérito.
DENTEL Departamento Nacional de Telecomunicações.
DIAP Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.
ESG Escola Superior de Guerra.
FGV Fundação Getúlio Vargas.
FMI Fundo Monetário Internacional.
FP Frente Parlamentar.
FPE Frente Parlamentar Evangélica.
FTLA Fraternidade Teológica Latino Americana.
GAPE Grupo de Assessoria aos Parlamentares Evangélicos.
GI Grupo de Interesse.
GTME Grupo de Trabalho Missionário Evangélico.
IBAD Instituto Brasileiro de Ação Democrática.
IBGE Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
IEQ Igreja do Evangelho Quadrangular.
INSS Instituto Nacional de Seguridade Social.
IPES Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais.
ISER Instituto de Estudos de Religião.
IURD Igreja Universal do Reino de Deus.
LBA Legião Brasileira de Assistência.
LOTERJ Loteria do Estado do Rio de Janeiro.
MDB Movimento Democrático Brasileiro.
MEP Movimento Evangélico Progressista.
MPN Movimento Pentecostal e Neopentecostal.
14
MST Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra.
OMC Organização Mundial de Comércio.
OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público.
PC do B Partido Comunista do Brasil.
PCB Partido Comunista Brasileiro.
PCO Partido da Causa Operária.
PDS Partido Democrático Social.
PDT Partido Democrático Trabalhista.
PETROBRÁS Petróleo Brasileiro Sociedade Anônima.
PFL Partido da Frente Liberal.
PHS Partido Humanista da Solidariedade.
PIB Primeira Igreja Batista (do Pará).
PL Partido Liberal.
PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro.
PMR Partido Municipalista Republicano.
PP Partido Progressista.
PPB Partido Progressista Brasileiro.
PPS Partido Popular Socialista.
PR Partido Republicano.
PRB Partido Republicano doBrasil.
PRD Protestantismo da Reta Doutrina.
PSB Partido Socialista Brasileiro.
PSC Partido Social Cristão.
PSD Partido Social Democrático.
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira.
15
PSL Partido Social Liberal.
PSOL Partido Socialismo e Liberdade.
PSTU Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado.
PT do B Partido Trabalhista do Brasil.
PT Partido dos Trabalhadores.
PTB Partido Trabalhista Brasileiro.
PTC Partido Trabalhista Cristão.
PUC Pontifícia Universidade Católica (de São Paulo).
SUDENE Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste.
SUDEPE Superintendência do Desenvolvimento da Pesca.
SUMOC Superintendência da Moeda e do Crédito.
TSE Tribunal Superior Eleitoral.
UDN União Democrática Nacional.
UFJF Universidade Federal de Juiz de Fora.
UFMG Universidade Federal de Minas Gerais.
UFPA Universidade Federal do Pará.
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro.
UMESP Universidade Metodista de São Paulo.
UnB Universidade de Brasília.
UNICAMP Universidade Estadual de Campinas.
UNIMEP Universidade Metodista de Piracicaba.
USF Universidade São Francisco.
USP Universidade de São Paulo.
16
INTRODUÇÃO
O pentecostalismo brasileiro, nascido em 1910-11
1
, portanto, com menos de um
século de existência, não se constituiu em elemento formador da democracia liberal, nem se
impregnou dela, em sua prática interna, de modo que, neste particular, ele não tem
afinidade com o protestantismo chamado histórico. Além disto, por ter surgido nos Estados
Unidos da América, no final do século XIX, o pentecostalismo também não conviveu com
os movimentos sociais europeus, que desembocaram em experiências do chamado
socialismo real, apesar de ter convivido de perto com as mazelas da industrialização no
norte da América, fazendo ressoar clamores dos oprimidos da sociedade daquela região.
Passando, portanto, ao largo dos movimentos políticos de esquerda, o movimento
pentecostal encontrou melhor afinidade com a tradição autoritária, componente da cultura
latino-americana e brasileira. É importante destacar que, para isto, contribuiu a ideologia
fundamentalista, autoritária e intolerante em sua essência, trazida dos Estados Unidos da
América no bojo da proposta pentecostal
2
. Esse amálgama criou um tipo de ator político-
religioso, o povo pentecostal, disciplinado e controlado pelas oligarquias estabelecidas
dentro do próprio movimento.
No caso brasileiro, os partidos e grupos ansiosos por conquistar o poder perceberam
há duas ou três décadas a facilidade com que lideranças pentecostais
3
eram seduzidas a
cooptação, através de acordos fisiológicos e clientelistas. Perceberam, também, o potencial
eleitoral que resultava dessas adesões, em termos de quantidade de votos, porque as
congregações pentecostais, em geral, se comportavam como currais eleitorais.
A pesquisa que resultou nesta tese focalizou a participação dos pentecostais na
política nacional, privilegiando o comportamento de suas elites, como formuladoras de
estratégias para eleição de “candidatos oficiais” das igrejas e negociadoras de acordos com
1
As referências neste caso são, evidentemente, os trabalhos pioneiros de evangelização de Luigi Francescon, Daniel Berg e
Gunnar Vingren, o primeiro, fundando a Congregação Cristã no Brasil (em São Paulo, 1910), e os dois outros, a Assembléia de
Deus do Brasil (em Belém, 1911).
2
Este assunto foi abordado em dissertação de mestrado: BAPTISTA, Saulo. “Fora do mundo”, dentro da política: Identidade
e “missão parlamentar” da Assembléia de Deus em Belém. 2002, 166 p. Dissertação (Mestrado em Sociologia) Universidade
Federal do Pará, Belém.
3
Por conveniência, doravante será usado o termo pentecostal ou pentecostalismo para o conjunto dos pentecostais e
neopentecostais, com seus respectivos movimentos e igrejas, salvo em situações específicas, elucidáveis em cada caso.
17
diversos atores do quadro político, mas também como lobbies que patrocinam a
apresentação ou modificação de projetos de leis de interesse dos seus segmentos religiosos,
indo até além da condição de simples grupos de pressão, pois têm conseguido a proeza de
controlar algumas siglas partidárias, como PSC, PRB e parte do PL
4
. A atuação mais
visível da Assembléia de Deus e da Igreja Universal do Reino de Deus vem ocorrendo
dentro e a partir da chamada Frente Parlamentar Evangélica, na qual seus deputados e
senadores somaram mais de dois terços dos parlamentares, no caso da legislatura 2003-
2007.
A capacidade de controle dessas duas igrejas sobre o comportamento político dos
seus adeptos provou ser superior à dos partidos sobre seus respectivos filiados, pois as
igrejas demonstraram, na prática, que são capazes de garantir a fidelidade da maioria dos
membros, nos momentos das votações, por exemplo, o que lhes confere uma posição ímpar
no cenário eleitoral.
A pesquisa teve a intenção, também, de trazer subsídios sobre os impactos da
participação pentecostal para o processo de construção da democracia brasileira, mediante
consulta ao que foi publicado pela grande imprensa, através de discursos das igrejas,
editados em seus jornais internos, mas, sobretudo, através de entrevistas com atores
diretamente envolvidos na cena política, ou seja, parlamentares e líderes religiosos. Ainda
que apenas de forma implícita, tentou-se apresentar o pensamento de lideranças
pentecostais e neopentecostais sobre categorias básicas de um regime democrático, tais
como: público e privado, partidos e órgãos de representação da sociedade civil, gestão e
controle da res publica, direitos humanos, cidadania, pluralismo e multiculturalismo.
5
Os pentecostais, até três ou quatro décadas atrás, anos 50 e 60, eram desprezados
pela fatia mais influente da sociedade brasileira, especificamente a parcela conhecida como
formadora de opinião. Esse pouco interesse que eles despertavam se registrava, também, no
meio acadêmico. Quase não havia cientistas sociais interessados em estudar o
pentecostalismo, enquanto era fácil encontrar diversos pesquisadores que se dedicavam ao
4
As siglas PSC, PRB e PL correspondem, respectivamente, ao Partido Social Cristão, Partido Republicano do Brasil e Partido
Liberal.
5
Cf. o roteiro geral de entrevistas, em anexo específico.
18
estudo de religiões afrobrasileiras. Esse descaso ainda perdurava, quando surgiu o chamado
neopentecostalismo, em meados dos anos 70.
Dos anos de 1980 em diante, passou-se a registrar uma presença maior do tema
religião na imprensa. Junto com este despertar, assinalava-se realização de pesquisas, desde
simples coletas de informações até elaboração de teses acadêmicas sobre mutações no
campo religioso brasileiro, parte delas dedicadas aos pentecostais e neopentecostais. É
possível supor que este interesse se deva, entre outros motivos, à presença de suas
respectivas igrejas no cenário político, um fato reconhecidamente novo, e, também, ao
chamado “avanço” relativo dos pentecostais na composição da sociedade brasileira.
A mobilização de segmentos organizados da população para se fazerem representar
no Congresso Nacional eleito em 1986, neste caso um parlamento investido de poderes
para elaborar a nova Constituição da República do Brasil, contagiou, também, a maior
igreja pentecostal do País, a Assembléia de Deus, que decidiu fazer sua entrada oficial e
estratégica naquele espaço do poder legislativo.
6
Conseguiu eleger 13 deputados. Na
legislatura anterior, essa igreja elegera um representante, apenas.
7
A presença política de assembleianos e iurdianos cresceu nos anos mais recentes,
como se observa na tabela 1, a seguir:
6
Em reunião de janeiro de 1985, da Convenção Geral das Assembléias de Deus do Brasil, realizada em Anápolis (GO), foram
convidados a falar políticos evangélicos de outras denominações, como Íris Rezende e Daso Coimbra. Eles apelaram para que a
maior denominação pentecostal brasileira (a AD, evidentemente) se envolvesse no Congresso Constituinte. Em abril do mesmo
ano, a Convenção Geral convocou os presidentes de convenções estaduais para um encontro em Brasília. Após esse encontro, a
Assembléia de Deus de quatorze estados apresentou candidatos oficiais de seus próprios quadros e, em quatro estados, resolveu
apoiar outros candidatos pentecostais ou carismáticos. Desses dezoito, foram eleitos treze e um suplente assumiu o mandato após
o Congresso Constituinte. Na legislatura anterior, essa igreja tivera apenas um deputado. (FRESTON, Paul. Evangélicos na
política brasileira: história ambígua e desafio ético. Curitiba: Encontrão, 1994 p. 42-3 e 45).
7
A presença de pentecostais no Congresso brasileiro aconteceu, pela primeira vez, entre 1963-67, com a
eleição de um ex-metodista, Levy Tavares, graças ao apoio do líder da Igreja Evangélica Pentecostal O Brasil
para Cristo, pastor Manoel de Mello. Tavares foi reeleito para um segundo mandato. Passaram-se dois
mandatos sem presença de parlamentares pentecostais (1971-75 e 1975-79). Nos dois mandatos seguintes
(1979-83 e 1983-87), a AD manteve um deputado (José Fernandes, pelo Amazonas), enquanto a Igreja do
Evangelho Quadrangular elegia seu primeiro representante nesse último período (Mário de Oliveira, por
Minas Gerais). (FRESTON, Paul. Protestantes e política no Brasil: da Constituinte ao impeachment. Tese
de doutorado em Sociologia. Departamento de Ciências Sociais do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
da Universidade Estadual de Campinas, 1993: p. 164).
19
Tabela 1 Representantes da Assembléia de Deus e da Igreja Universal no Congresso Nacional
(1987-2004)
Quantidade de Parlamentares por Legislatura(*)
Denominações 1987-90 1991-94 1995-98 1999-2002 2003-04(**)
Assembléia de Deus
13 13 10 12 22
Igreja Universal do Reino de Deus
1 3 6 16 18
Fontes: FONSECA, Alexandre Brasil e Frente Parlamentar Evangélica.
8
(*) Essas quantidades costumam variar em cada legislatura, porque ocorrem arranjos
políticos, como, por exemplo, nomeação de parlamentar para algum ministério ou secretaria
de governo. O suplente que assume dificilmente coincide de ser outro membro da igreja do
titular.
(**) Quantidades de parlamentares observadas até junho de 2004.
De fato, a Assembléia de Deus apresentou um desempenho eleitoral extraordinário
ao fazer crescer sua bancada
9
de um para 13 deputados, na comparação entre a legislatura
anterior ao Congresso Constituinte e este. Em seguida, praticamente manteve essa presença
no parlamento, com pequenas variações nas três legislaturas seguintes, surpreendendo,
novamente, na última legislatura considerada (iniciada em 2003), quando cresceu em 83% a
quantidade de seus parlamentares, em relação à legislatura anterior.
No tocante à Igreja Universal, seu crescimento alcançou marcas impressionantes,
nas três legislaturas que sucederam ao Congresso Constituinte. Ou seja, acrescentou à
8
Cf. FONSECA, Alexandre Brasil Carvalho da. Secularização, pluralismo religioso e democracia no Brasil: um estudo sobre
evangélicos na política nos anos 90. Tese de doutorado em Sociologia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo, 2002, p. 127. Sobre a última legislatura os dados foram fornecidos pela Frente Parlamentar Evangélica,
em Brasília, junho de 2004.
9
Bancada, tecnicamente, é um termo para ser utilizado no caso de partidos e de coligações, porque pressupõe unidade em torno
de programa ou de projeto e exige a constituição formal de uma liderança que representa todos os parlamentares em algumas
ocasiões, fala e vota em nome deles, como conjunto coeso. A bancada pode “fechar questão”, ou seja, pode decidir pelo voto em
bloco dos seus membros, em torno de um tema. Para o caso dos parlamentares evangélicos, como para o caso de alguns
agrupamentos temáticos, ou lobbies, como o grupo dos ruralistas, da saúde, educação etc., é mais apropriado classificá-los como
frente parlamentar, como, de fato, se constituíram, desde 2003, os evangélicos, que elaboraram estatutos e se organizaram na
chamada Frente Parlamentar Evangélica. Cabe destacar aqui, que se percebe, na maneira de atuar dos parlamentares da Igreja
Universal, dentro do parlamento, uma disciplina de bancada. Já no caso das Assembléias de Deus, há um grau de liberdade maior,
embora seus parlamentares também votem em bloco, em algumas questões. Neste texto, será aplicado o termo bancada, em
sentido lato, salvo uma ou outra exceção, auto-identificável.
20
quantidade de parlamentares, respectivamente, mais 200%, 100% e 167%, em relação a
cada período anterior. Já na última legislatura, a bancada iurdiana cresceu apenas 12,5%,
mantendo, porém, uma super-representação (18 parlamentares), em relação à bancada das
Assembléias de Deus, visto que a IURD se trata de uma igreja com uma quantidade de
membros bem inferior à das Assembléias, no território brasileiro.
10
O outro aspecto mencionado, ou seja, o chamado “avanço pentecostal”
11
na
composição da sociedade brasileira fica bem caracterizado pela análise dos números dos
três últimos censos demográficos, apresentado na tabela 2 (da página seguinte).
A tabela 2 não oferece uma distinção precisa entre pentecostal e neopentecostal,
mas para o objetivo de identificar o crescimento destes agregados populacionais pode-se
tomar como base a linha dos “evangélicos pentecostais”. Do censo de 1980 ao de 2000, eles
praticamente triplicaram sua participação no conjunto da sociedade brasileira. Seu
crescimento somou mais de 200%, no mesmo período, e sua participação é superior a 10 %
da população. Em contrapartida, nesse jogo de soma zero, os católicos romanos reduziram
suas participação relativa de quase 89% para menos de 74%, uma perda de mais de 15
pontos percentuais, nesses vinte anos considerados. A tabela oferece outros dados
importantes, como o enorme crescimento dos “sem religião”, que não serão comentados,
por estarem fora do escopo deste trabalho.
10
Comparações entre quantidade de membros das igrejas AD e IURD só podem ser feitas com base em estimativas, devido, pelo
menos, a duas razões: (1ª) os pentecostais e neopentecostais costumam inflacionar seus números, em comparação com os
coletados nos recenseamentos do IBGE e, (2ª) a IURD não tem rol de membros, de modo que seus adeptos são estimados pela
quantidade de freqüentadores que lotam os enormes templos. Um bispo da Universal em Belém do Pará informou que é costume
fazer uma ficha de cadastro das pessoas que se submetem ao batismo. Contudo, não foi possível verificar se esta prática é
generalizada.
11
Título de livro do antropólogo Ari Pedro Oro (ORO, A. P. Avanço pentecostal e reação católica. Petrópolis: Vozes, 1996) e
expressão recorrente, principalmente, entre estudiosos do fenômeno pentecostal, de vertente católica.
21
Tabela 2 Números absolutos, percentuais em relação à população e taxa de crescimento dos
católicos, evangélicos tradicionais, pentecostais e outros (1980 2000)
Religião
1980
N Part.(%)
1991
N Part.(%) Cresc.(%)
2000
N Part.(%) Cresc.(%)
Católica romana
105.861.113
88,95
121.812.771
82,97 15,07
124.976.912
73,60 2,60
Evangélica
tradicional
4.022.343
3,38
4.388.284
2,99 9,10
7.159.383
4,22 63,15
Evangélica
pentecostal
3.863.503
3,25
8.179.708
5,57 111,72
17.689.862
10,42 116,27
Outras cristãs
_
-
2.050.466
1,40 -
2.699.171
1,59 12,12
Mediúnicas
1.538.230
1,29
2.292.830
1,56 49,06
2.908.761
1,71 26,86
Ou tras religiões
1.473.081
1,24
549.550
0,37 (62,69)
1.265.080
0,74 130,20
Sem religião
1.953.096
1,64
6.946.221
4,73 255,65
12.330.101
7,27 77,51
Sem declaração
299.686
0,25
595.979
0,41 98,87
382.489
0,23 (35,82)
Não classificada(*)
_
-
_
- -
387.411
0,23 -
TOTAL
119.011.052
100,00
146.815.818
100,00 23,36
169.799.170
100,00
15,65
Fonte: IBGE
(*) Significa um contingente da população que não foi enquadrada nos itens anteriores.
Idéia geral da pesquisa
A motivação da pesquisa que deu origem a esta tese encontra-se além da
constatação do crescimento numérico dos pentecostais e neopentecostais e do que eles
possam significar no campo religioso. Transcendeu, também, à verificação das conquistas
de espaço desse movimento no disputado campo político. O interesse investigativo
focalizou-se na relação entre os padrões da cultura política brasileira e a contribuição do
pentecostalismo como novo componente que já participava ativamente da sociedade, desde
os anos de 1910, mas estava quase ausente do jogo político nacional até 1986.
22
Visando delimitar o campo de estudo, foram enfocadas duas denominações
representativas dos pentecostais e neopentecostais: a Assembléia de Deus e a Igreja
Universal do Reino de Deus. As escolhas não foram aleatórias
12
, pois estas são as
denominações que têm atuado estrategicamente e de forma mais visível nas relações com o
campo político, além de comporem mais de dois terços dos membros da bancada
evangélica na Câmara Federal atual (legislatura 2003-2007)
13
.
Este projeto de pesquisa compreendeu a análise do comportamento político de
lideranças e parlamentares da Assembléia de Deus e da Igreja Universal do Reino de Deus
e algumas implicações dessa participação no processo de construção da democracia
brasileira, segundo a visão de dirigentes e parlamentares das próprias igrejas.
14
Também foi
estudada a atuação política de líderes e parlamentares pentecostais, relacionando-a com
valores tradicionais da cultura brasileira, como: autoritarismo, clientelismo, corporativismo,
fisiologismo, nepotismo e correlatos. As políticas que essas igrejas praticam intramuros
também foram examinadas, para completar uma visão mais abrangente acerca do
comportamento político desses atores sociais, em que pesem as dificuldades inerentes a este
tipo de investigação.
A questão que se buscou abordar na pesquisa foi:
Qual tem sido a prática política dos pentecostais e neopentecostais
dentro de suas igrejas e no campo político-partidário brasileiro, nos
últimos sete anos (1999-2006) e como essa prática política se relaciona
com a cultura política brasileira?
12
“A escolha do nível empírico de investigação deve, antes de tudo, ser tornada explícita pelos pesquisadores. O indivíduo, o grupo, a
sociedade, a organização global são patamares de pertinência que convém, antes de tudo, isolar analiticamente, para preparar mais
tarde ‘passagens’ para a articulação desses diferentes níveis entre si.” (BRUYNE, Paul de; HERMAN, Jacques; SCHOUTHEETE,
Marc de. Dinâmica da Pesquisa em Ciências Sociais: os pólos da prática metodológica. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1991,
p. 53, com grifo no original).
13
A Frente Parlamentar Evangélica identifica cerca de sessenta e um parlamentares declaradamente pertencentes a confissões
religiosas protestantes e pentecostais, dos quais quarenta e quatro são membros da Assembléia de Deus e da Igreja Universal do
Reino de Deus. Esta informação foi obtida em junho de 2004, podendo esses números variar, para mais ou para menos, em
quantidade que não tem ultrapassado 5%, durante o mandato, devido a acomodações partidárias, como a nomeação de um ou
outro para uma Secretaria de Governo Estadual, a fim de abrir espaço para a efetivação de suplentes, que, em geral, não são
evangélicos.
14
As observações referem-se ao período posterior ao Congresso Constituinte (ou seja, a partir de 1989), mas concentraram-se na
última legislatura, que teve início em 2003, devido à possibilidade de entrevistar parlamentares em pleno exercício de seus
mandatos.
23
No desenvolvimento do trabalho investigativo, tentou-se responder a algumas
questões auxiliares, como corolárias da principal, tais como: Que qualidade de política as
elites brasileiras praticam, coonestadas pela própria sociedade? Dentro deste conjunto
maior de práticas e jogos de poder, que qualidade de política tem sido praticada pelos
novos atores pentecostais e neopentecostais, seja nas relações que estabelecem
externamente com outros grupos, por exemplo, na Câmara e Senado Federal, e que
qualidade de política interna eles praticam, como parte constituinte de suas subculturas
religiosas? O jeito pentecostal
15
de fazer política é caudatário do modelo maior da
sociedade política brasileira? Ou se trata de um modelo peculiar, com afinidades e
contrastes em relação a esse modelo? Esse modo pentecostal de atuar na política reproduz
os vícios e as virtudes da cultura política brasileira ou traz aportes inovadores a ela?
Afinal, tendo em conta que segmentos bem representativos da base da pirâmide
sócio-econômica da sociedade nacional integram as igrejas pentecostais e, neste sentido,
o pentecostalismo consegue organizar referidos segmentos como nenhuma outra associação
tem conseguido fazê-lo foi relevante indagar: as formas de organização das igrejas
pentecostais, bem como a política praticada dentro delas, promovem um associativismo
emancipador, ou produzem subserviência, resignação, dominação, exclusão seletiva e
obediência acrítica? Em outras palavras: o pentecostalismo cria aparelhos ideológicos de
sustentação do status quo, cada vez mais importantes na conservação do modelo
hierárquico-autoritário-excludente da sociedade brasileira, ou ele se comporta como uma
cunha que abre brechas e ocupa lacunas capazes de fragilizar e, paulatinamente, contribuir
para a superação dessa pirâmide de desigualdades sociais que é a sociedade brasileira?
Hipóteses
As hipóteses que nortearam o trabalho foram elaboradas a partir da experiência do
pesquisador no mestrado em Sociologia, quando teve oportunidade de observar o
comportamento político e eleitoral de vereadores e entrevistar alguns líderes e membros da
15
Os termos pentecostal e pentecostalismo (empregados também no plural), ocorrerão, freqüentemente, neste texto, para
significar, de forma genérica e abrangente, tudo que se refere a pentecostalismo e neopentecostalismo, inclusive movimentos e
instituições desse subcampo religioso. Isto não impedirá que, em algumas situações, sejam feitas referências separadas, para dar
destaque aos respectivos entes sociais.
24
Assembléia de Deus, em Belém do Pará
16
. Posteriormente, já no doutorado, mas antes de
apresentar o projeto de qualificação, foi possível entrevistar o coordenador da bancada
federal da Assembléia de Deus, em Brasília, pastor e deputado federal Pedro Ribeiro (PL-
CE). No tocante à Igreja Universal do Reino de Deus, no mesmo contexto, foram
entrevistados o deputado federal Carlos Rodrigues (PL-RJ), ex-bispo e ex-coordenador da
bancada federal dessa Igreja, um assessor do deputado Vieira Reis (PMDB-RJ) e, também,
um assessor do deputado Wanderval dos Santos (PL-SP).
17
Segundo Bruyne, Herman e Schoutheete, “fatos estabelecidos (evidências
provisórias) servem de conteúdo para as hipóteses cujas implicações testáveis acarretarão a
descoberta de outros fatos que confirmarão ou infirmarão as hipóteses iniciais.
18
Nessa
linha de trabalho foram escolhidas três hipóteses.
Hipótese 1
A prática política dos pentecostais, dentro das igrejas, tem sido autoritária,
manipuladora e intolerante com os rebeldes.
Hipótese 2
A prática política dos pentecostais, nos campos partidário e parlamentar e em
relacionamentos com governos, tem sido fisiológica, clientelista e corporativa.
Lideranças e políticos pentecostais são cooptáveis e cooptadores, ou seja, fazem
o jogo da cooptação, portanto, essas práticas reforçam vícios da cultura política
brasileira, em aspectos como autoritarismo, clientelismo, corporativismo,
fisiologismo e nepotismo.
Hipótese 3
As práticas pentecostais contribuem para integrar, na condição de cidadania,
segmentos marginalizados pela sociedade, contribuindo, deste modo, para o
desenvolvimento do processo democrático brasileiro.
16
Cf. BAPTISTA, 2002.
17
As entrevistas com deputados da AD e IURD, bem como de assessores parlamentares, foram realizadas na terceira semana de
junho de 2004, em Brasília, e tiveram caráter exploratório, para construção do objeto de pesquisa deste projeto.
18
BRUYNE, HERMAN e SCHOUTHEETE, op. cit., p. 123.
25
Examinado segundo pesquisas antropológicas e sociológicas, o movimento
pentecostal é ambíguo em sua natureza: Trata-se de um movimento carismático, com
lideranças autoritárias, centralizadoras, que manobram os liderados, mas é, ao mesmo
tempo, um movimento que consegue incluir marginalizados sociais e elevar a auto-estima
de milhões de seguidores, os quais participam com entusiasmo da edificação de suas
comunidades religiosas.
O pentecostalismo continua a promover inclusão social, pois é um movimento de
cunho participativo e está em expansão. Não obstante, por constituir associações
hierárquicas, verticais, de caráter autoritário, pode configurar uma ameaça à democracia, na
medida em que o poder emana de suas lideranças e não das bases. De fato, igrejas, em
geral, não são democráticas em suas práticas internas, mas as pentecostais revelam-se
menos tolerantes quanto à liberdade de consciência e expressão e têm dificuldade em
aceitar o diferente. Registre-se, porém, que também são vítimas freqüentes de preconceitos
e discriminações, principalmente por parte da mídia. Feitas as devidas ponderações, pode-
se afirmar que, por um lado, o movimento pentecostal tende a dificultar o processo de
ra dicalização da democracia brasileira. Não obstante, a capacidade mobilizadora do
pentecostalismo, como religião que estimula todos os membros a participarem de
atividades sociais e celebrações diversas, tanto nos templos como nos próprios lares, é,
neste s entido, forte indicadora de práticas democráticas.
As igrejas pentecostais contribuem, ainda, para recuperar e restaurar pessoas,
afastando-as de vícios e formando corpos disciplinados para atuarem na sociedade. Isto
serve para incluí-las no, cada vez mais limitado, mercado de trabalho, melhorando a
condição de vida de uma parcela da população empobrecida e marginalizada, devido ao
modelo de capitalismo praticado no Brasil. Partidos políticos e outras organizações não têm
sabido lidar com esses contingentes de destituídos da condição de cidadania. No entanto,
igrejas pentecostais, em sua maioria, demonstraram competência e efetividade ao incluí-los
no processo de (res)socialização, elevando-lhes a auto-estima, libertando-os de vícios e
dando-lhes apoio em conquistas como saúde, emprego, geração de renda, ainda que nos
limites da economia informal, garantindo, assim, algum traço de cidadania, inalcançável de
outra forma, tais as condições de exclusão de contingentes enormes na sociedade brasileira
atual.
26
Importância e justificativa da pesquisa
A escolha do tema Cultura política brasileira, práticas pentecostais e
neopentecostais, está relacionada com a vivência pessoal do autor no mundo religioso, por
mais de cinco décadas, e em militância de partido político, durante mais de dez anos. Essas
experiências ensejaram-lhe reflexões, durante a graduação em Ciências Sociais (1995-
1999) e no mestrado em Sociologia (2001-2002), quando pesquisou práticas de poder
político dentro do campo religioso pentecostal, assim como relações deste com a sociedade
política, no Estado do Pará.
19
Além desses trabalhos, produziu texto durante especialização
em Filosofia (pós-graduação lato sensu, em 2001), quando discutiu a difícil conciliação da
religião do indivíduo com a religião civil em Rousseau, bem como apresentou diversas
comunicações em eventos científicos, além de artigos, os quais corroboram seu vínculo
acadêmico com esta área de pesquisa.
A produção científica sobre os pentecostais na política brasileira é ainda
relativamente escassa, para o conjunto da produção acadêmica em Ciências Sociais, embora
venha crescendo, desde os anos 90. Podem ser destacados aqui três exemplos de produção
nesta área específica: Paul Freston, que pesquisou a atuação dos evangélicos no Congresso
Constituinte de 1987-88, além de obras mais recentes.
20
Alexandre Brasil Fonseca, que
também estudou os evangélicos na política e na mídia (anos 90), atendo-se ao contexto do
Rio de Janeiro
21
, e Joanildo Burity, cujos trabalhos se referem a identidade religiosa e
comportamento político, com ênfase nos evangélicos, mas contemplando também o
ambiente católico
22
. Esses estudos versaram sobre pentecostais, mas não trataram
especificamente dos pentecostais na política. Há, também, estudos sobre os
neopentecostais, dos quais se destaca o de Leonildo Silveira Campos, referente à Igreja
19
Como Trabalho de Conclusão de Curso, na graduação, foi apresentado o texto Fundamentalismo como ideologia: a Igreja
Batista Regular no Brasil. 2000, 136 p. Trabalho de conclusão de curso. (Bacharelado e Licenciatura em Ciências Sociais)
Universidade Federal do Pará, Belém. No mestrado foi produzida a dissertação sobre a AD na política, já citada (BAPTISTA,
2002).
20
Cf. FRESTON, 1993; _______. Evangelicals and Politics in Asia, Africa and America Latina. Cambridge, UK: Cambridge
University Press, 2001.
21
Cf. FONSECA, Alexandre Brasil. Evangélicos e mídia no Brasil. Rio de Janeiro, Dissertação de mestrado em sociologia,
IFCS-UFRJ, 1997. _______. Secularização, pluralismo religioso e democracia no Brasil: um estudo sobre evangélicos na
política nos anos 90. Tese de doutorado em Sociologia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São
Paulo, 2002.
22
Cf. BURITY, Joanildo A. Identidade e política no campo religioso: estudos sobre cultura, pluralismo e o novo ativismo
eclesial. Recife: Editora Universitária da UFPE, 1997. ______. (Org.). Cultura e identidade: perspectivas interdisciplinares. Rio
de Janeiro: DP&A, 2002.
27
Universal do Reino de Deus
23
, e o de Ricardo Mariano, sobre as igrejas Nova Vida,
Universal do Reino de Deus, Internacional da Graça de Deus, Renascer em Cristo e
Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra
24
. Esses substanciosos trabalhos, embora se
tenham dedicado a atores religiosos desta pesquisa, não se propuseram a discutir,
especificamente, o papel deles como agentes políticos. Há também artigos e comunicações
em congressos sobre pentecostais na política, mas não se tinha registrado, ainda, uma
pesquisa mais extensa, acerca do comportamento pentecostal no ambiente partidário e
parlamentar, com enfoque na cultura política brasileira, como se tentou fazer neste caso.
Procurou-se analisar ingredientes do ethos pentecostal, relevantes para a
compreensão dessa face religiosa e política da sociedade brasileira. Por exemplo, a Igreja
Universal e a Assembléia de Deus praticam estratégias eficazes de conquista de votos em
suas campanhas eleitorais, mediante criação de verdadeiros “distritos eleitorais” para seus
candidatos e instrumentalização de partidos políticos para atenderem objetivos
corporativos, inclusive através do controle de “siglas de aluguel”
25
. Como resultado,
alcançaram expressiva presença em parlamentos municipais, estaduais e no nacional, tudo
compondo uma verdadeira engenharia política, que supera, em algumas circunstâncias, a
capacidade de mobilização e conquista de votos de agremiações partidárias experientes do
cenário político brasileiro.
A pesquisa serviu, também, para trazer algumas características da cultura política
brasileira, com as quais o pentecostalismo tem revelado afinidades, como clientelismo,
fisiologismo, nepotismo e autoritarismo. Por exemplo, no âmbito federal, a cobertura da
imprensa revelou episódios de negociação de votos de parlamentares pentecostais, em troca
de concessões de emissoras de rádio e outros favorecimentos, durante o governo do
Presidente Sarney.
26
O autoritarismo pentecostal se manifestou, entre outros casos, no
23
Cf. CAMPOS, Leonildo Silveira. Teatro, templo e mercado: organização e marketing de um empreendimento neopentecostal.
Petrópolis, Vozes, São Paulo, Simpósio e Umesp, 1999, 504 p
24
Cf. MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. São Paulo, Loyola, 1999, 246 p.
25
Siglas ou legendas de aluguel são formas comuns de se denominar partido político que não tem representação social. No Brasil
este tipo de partido funciona para receber cota partidária e se beneficiar do horário eleitoral gratuito no rádio e televisão. Com
estes recursos, assegurados na legislação partidária, seus dirigentes dispõem de trunfos para negociarem com os grandes partidos
possíveis composições de coligação. Nas relações com governos, os dirigentes dessas pequenas agremiações podem negociar
votos, dentro dos parlamentos, em troca de vantagens financeiras e ocupação de cargos públicos.
26
Antônio Flávio Pierucci registra episódios noticiados pelos jornais Folha de S. Paulo, Jornal do Brasil e O Estado de S. Paulo,
entre 1987 e 1988, como doações de verbas do Ministério do Planejamento e da Legião Brasileira de Assistência para a
Confederação Evangélica Brasileira, dirigida por pentecostais, a título de retribuição pela atuação destes no Congresso
28
“voto de cabresto” e na imposição da vontade de alguns pastores sobre suas congregações.
A liberdade de consciência também tem sido violada, através de mecanismos de coação
psicológica, como “profecias e revelações”, para que o membro ou freqüentador da igreja
siga a orientação do seu dirigente.
Do ponto de vista científico, esta pesquisa pretende ser uma singela, porém nova,
contribuição aos estudos do pentecostalismo e da política brasileira, ao relacionar valores e
procedimentos desta com a prática de um ator político emergente, ainda pouco estudado
pelos cientistas políticos, que é esse segmento religioso. O trabalho contribuiu para elucidar
aspectos da relação entre pentecostalismo, cultura política brasileira e democracia,
examinando como esses experimentos importantes se combinam e interagem no âmbito da
sociedade nacional.
Metodologia
Nesta seção são oferecidos breves subsídios teóricos que serviram para
problematizar a presença dos pentecostais e neopentecostais na política brasileira, conforme
perspectivas da Ciência Política e da Sociologia. Em seguida, apresenta-se uma abordagem
mais extensa do percurso metodológico em que se constituiu a própria investigação para
culminar nesta tese.
O que impulsiona a criação de teorias e hipóteses são problemas concretos extraídos
da realidade. A problematização é a interrogação sistematizada de algum aspecto dessa
realidade. As tentativas de resolução de problemas e os fracassos decorrentes fornecem um
acúmulo de experiências que se tornam matérias-primas para a geração de conhecimento
científico. Segundo Bruyne, Herman e Schoutheete:
A problemática é a visão global do próprio objeto da pesquisa e do domínio no qual ela se
desenrola. É o que faz o pesquisador dizer diante dos fatos ou das hipóteses: “é importante”
ou “é interessante”, ela opera a partir da seleção dos temas de reflexão e de pesquisa até o
mínimo detalhe da investigação empírica.
27
Constituinte, de acordo com os interesses do Executivo. Informa também sobre a campanha encabeçada pelo deputado Matheus
Iensen para prorrogar o mandato do Presidente Sarney de quatro para cinco anos. O deputado Iensen recebeu, logo depois, a
concessão de uma terceira emissora de rádio, para sua família explorar em Curitiba. (PIERUCCI, Antônio Flávio. Representantes
de Deus em Brasília: a bancada evangélica na Constituinte. In: PIERUCCI, Antônio Flávio, PRANDI, Reginaldo. A realidade
social das religiões no Brasil. São Paulo, Hucitec, 1996, p.163-191).
27
BRUYNE, HERMAN e SCHOUTHEETE, op. cit., p. 57-8.
29
A escolha do problema a ser investigado tem vínculo com a chamada relação com
os valores, enunciada por Max Weber. Problemática, conceitos e teoria são encaminhados e
estruturados na construção do objeto científico a partir dessa condição sociológica do
pesquisador. Julien Freund interpreta este aspecto da visão weberiana da seguinte maneira:
A relação com os valores constitui a base das perguntas que formulamos à realidade. [...]
Esta [relação] exprime, pois, o momento arbitrário que se acha no ponto de partida de toda
reflexão e de todo trabalho científico [...] É apenas nos limites desta seleção que o sábio
aplica os processos ordinários da investigação científica: observação precisa, crítica dos
textos, dos inquéritos ou dos documentos, determinação das relações da causalidade,
comparações etc.
28
A intuição tem, também, seu papel como método gerador de conhecimento, no
espaço da problematização. Bruyne, Herman e Schoutheete resumem três regras
bergsonianas alusivas a esta questão
29
: A primeira é a “crítica dos falsos problemas e
invenção dos verdadeiros, [...] os falsos problemas ou são inexistentes, ou são mal
colocados (aspecto problematizante).” A segunda é a “luta contra a ilusão, busca das
verdadeiras diferenças de natureza, das articulações do real [...] (aspecto diferenciador).” A
terceira é a “posição e resolução dos problemas em função do tempo, da duração, mais do
que do espaço (aspecto temporalizante).”
Tendo em conta o que foi apresentado na seção anterior desta Introdução e os
aspectos teóricos mencionados neste tópico, repete-se aqui a questão que orientou o
trabalho investigativo:
Qual tem sido a prática política dos pentecostais e neopentecostais dentro de suas
igrejas e no campo político-partidário brasileiro, nos últimos sete anos (1999-2006)
e como essa prática política se relaciona com a cultura política brasileira?
A partir desta questão-chave, o presente estudo é uma continuação ampliada do que
foi realizado durante o mestrado em Sociologia.
30
Naquela investigação procurou-se
entender por que a Assembléia de Deus havia mudado, radicalmente, quanto a sua visão e
28
FREUND, Julien. Sociologia de Max Weber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000, p. 42-3.
29
BRUYNE, HERMAN e SCHOUTHEETE, op. cit., p. 57, citando DELEUZE, G. Le bergsonisme. Paris: Presses
Universitaires de France, 1968, p. 1-28, e, BERGSON, H. La pensée et le mouvant. Paris: Presses Universitaires de France,
1934, p. 25-98.
30
Cf. BAPTISTA, 2002.
30
prática, acerca da participação de lideranças religiosas na política. Antes do Congresso
Constituinte de 1987-8, o pensamento hegemônico dos dirigentes assembleianos era que o
crente não deveria envolver-se com partido, sindicato e associações congêneres. Neste
sentido, a Igreja dissuadia-o de ser candidato ou mesmo militante em qualquer movimento
social, que não fosse a própria Igreja. No Congresso Constituinte, a Assembléia de Deus
agiu estrategicamente e conquistou várias cadeiras do Congresso Nacional. Nos anos
seguintes, pôde-se verificar um “efeito cascata”, pois foram eleitos vereadores e deputados
estaduais indicados pela mesma denominação evangélica, em diversos Estados da
Federação. Realizou-se uma pesquisa qualitativa, com entrevistas de parlamentares,
pastores e outros membros da AD em Belém, para captar, de diferentes perspectivas, o que
estava acontecendo e que rumos essa instituição estava tomando, na área pública.
A pesquisa prosseguiu no doutorado que desemboca nesta tese, incluindo as duas
agremiações evangélicas mais representadas no Congresso Nacional: Assembléia de Deus e
Igreja Universal. Foram escolhidas duas para permitir fazer comparações entre seus
objetivos e estratégias e relacionar a atuação de organizações tão díspares do
pentecostalismo com a cultura política da sociedade brasileira. A linha metodológica foi,
basicamente, a mesma adotada no mestrado, porém acatando a seguinte ponderação: “toda
pesquisa tem o propósito de resolver um problema específico que, em aspectos importantes,
não é parecido com nenhum outro problema, e [se] deve fazê-lo dentro de um ambiente
específico diferente de todos os que existiram antes”.
31
. Por esta razão, foram adotadas
abordagens apropriadas para a situação, sem descartar improvisações, pois, como orienta o
mesmo autor: “o sociólogo ativo não somente pode como deve improvisar as soluções que
funcionam onde ele está e resolve os problemas que ele quer resolver”.
32
Afinal, como
ensinam Quivy e Campenhoudt, “os métodos não são mais do que formalizações
particulares do procedimento, percursos diferentes concebidos para estarem mais adaptados
aos fenómenos ou domínios estudados”.
33
Antônio Carlos Gil denomina esse tipo de investigação de “pesquisa explicativa”,
pois “... têm como preocupação central identificar os fatores que determinam ou que
31
BECKER, Howard S. Métodos de pesquisa em Ciências Sociais. São Paulo: Hucitec, 1997, p. 13.
32
Ibidem, com grifos.
33
QUIVY, Raymond e CAMPENHOUDT, Luc Van. Manual de investigação em ciências sociais. Lisboa: Gradiva, 1998, p.
25, grafia de Portugal.
31
contribuem para a ocorrência dos fenômenos. Esse é o tipo de pesquisa que mais aprofunda
o conhecimento da realidade, porque explica a razão, o porquê das coisas”.
34
De fato,
adotando essa abordagem na pesquisa de mestrado, descobriu-se que a AD de Belém do
Pará estava em busca de reconhecimento público, obtenção de verbas e apoios para seus
projetos corporativos, queria enfrentar as concorrências da Universal e da Quadrangular, no
terreno da política, como também procurava atender anseios de uma nova safra de pastores.
Quanto a estratégias, a AD buscava utilizar partidos da situação, mas mantinha diálogo com
os de oposição. Para a membresia da Igreja, seus parlamentares eram apresentados pela
cúpula como “missionários na política”, a fim de justificar essa nova linha de conduta
pública, com o argumento de que “não estar na política era pecado de omissão”. Além
disto, seus vereadores se auto-afirmavam como padrões de boa conduta para outros
parlamentares, avaliação que não se conseguiu comprovar na consulta a outras fontes.
35
Tipos ideais
Discutir pentecostalismos e neopentecostalismos obriga o estudioso a elaborar
tipos ideais” e a recorrer a generalizações, mesmo quando se delimita o objeto de
observação a duas agremiações específicas, como ocorreu neste caso. Justifica-se, portanto,
um breve destaque sobre a construção de “tipos ideais”:
A utilização deste recurso está ligada à necessidade de rigor conceitual no labor
científico. Conceitos como classe, massa, capitalismo, feudalismo, freqüentes na análise
sociológica, dependem do contexto histórico em que estão sendo considerados. Para
estabelecer rigorosamente o sentido de cada conceito com que se pretende trabalhar na
perspectiva weberiana, o cientista deve construir um tipo ideal. De acordo com a
orientação de Weber,
... obtém-se um tipo ideal mediante a acentuação unilateral de um ou vários pontos de vista,
e mediante o encadeamento de grande quantidade de fenômenos isoladamente dados,
difusos e discretos, que se podem dar em maior ou menor número ou mesmo faltar por
completo, e que se ordenam segundo os pontos de vista unilateralmente acentuados, a fim de
se formar um quadro homogêneo de pensamento. Torna-se impossível encontrar
34
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4ª edição, São Paulo: Atlas, 2002, p. 42.
35
Cf. BAPTISTA, op.cit, p. 137 -43.
32
empiricamente na realidade esse quadro, na sua pureza conceitual, pois trata-se de uma
utopia..
36
Verifica-se que a elaboração de um tipo ideal está ligada à relação com os valores
do cientista. Tem base em aspectos da realidade, selecionados em consonância com as
hipóteses que nortearão a pesquisa. Este a priori hipotético é ponto de partida necessário
para a reflexão científica. O tipo ideal é sempre uma racionalização utópica, idealizada pela
acentuação de singularidades da realidade em estudo. O tipo ideal é uma ferramenta
artificial, um modelo para o confronto com o aspecto da realidade que se está analisando. É
ideal não no sentido moral ou ético, nem expressa aspiração de um devir. É apenas uma
construção teórica útil para se adentrar na realidade caótica, visando interpretá-la. Tem
caráter de ordenamento lógico e não valorativo. O cientista deve ter em mente o caráter
instrumental do tipo ideal e deve abandoná-lo, caso não se preste para o propósito da
pesquisa. Neste caso, convém rever suas hipóteses e elaborar outro tipo ideal, procedendo
assim tantas vezes quantas se mostrarem necessárias.
Para ser mais preciso, no caso desta pesquisa, analisar, por exemplo, as Assembléias
de Deus no Brasil é estar diante de um grande “guarda-chuva” de comunidades
pentecostais, distribuídas nos chamados “ministérios” e convenções, e que desenvolvem
uma variedade enorme de pentecostalismos, desde os que primam por uma formação
teológica razoável até alguns que se opõem à educação formal, desde os modelos mais
autoritários até poucas experiências de governo congregacional efetivo. Há pentecostais
conservadores, no sentido de acharem que estão zelando pela preservação das suas marcas
de origem, mas há aqueles que se julgam até pós-modernos, em que pese a confusão que
este conceito encerra. No caso do chamado neopentecostalismo, a confusão de conceitos é
maior, mesmo restringindo sua aplicação, no caso desta pesquisa, à monolítica Igreja
Universal do Reino de Deus. Sem dúvida, trata-se de uma igreja modelar na aplicação da
disciplina e hierarquia inquestionáveis, debaixo da “liderança papal” do bispo Edir Macedo,
primeiro e único, até a conclusão deste trabalho, em março de 2007. A Universal é uma
organização com estratégias bem definidas e agilidade ímpar na disseminação de diretrizes
e ordens de comando que emanam da cúpula. Nela os carismas de bispos, pastores, ex-mães
36
WEBER, Max. A “objetividade” do conhecimento nas Ciencias Sociais. In: COHN, Gabriel (org.). Weber. São Paulo: Ática,
1991, p. 106.
33
e pais de santo e demais obreiros, são instrumentos intensamente empregados para que os
objetivos e metas da grande corporação sejam cumpridos. O emprego confuso de conceitos
ocorre, porque a Igreja Universal não é, a rigor, uma atualização do pentecostalismo, ou
seja, não se trata de um novo pentecostalismo. Talvez seja melhor compreendê-la como
uma igreja pós-pentecostal, que extrapola imensamente o paradigma da designação que lhe
é aplicada, tal é o conjunto de empréstimos que ela faz do imaginário católico popular, de
religiões afro-brasileiras, do protestantismo histórico e evangelical, transformando todos
esses aportes numa nova síntese com dinamismo próprio, gerador de uma profusão de
produtos simbólicos para consumo da sua clientela. Uma verdadeira geradora de bens
intangíveis que opera na dimensão dos desejos e já é, em si, marca singular dessa nova
forma de fazer religião.
A propósito dessas novas constituições de identidades coletivas e as igrejas
chamadas neopentecostais são exemplos evidentes disto Stuart Hall escreve:
em toda parte, estão emergindo identidades culturais que não são fixas, mas que estão
suspensas, em transição, entre diferentes posições; que retiram seus recursos, ao mesmo
tempo, de diferentes tradições culturais; e que são produto desses complicados cruzamentos
e misturas que são cada vez mais comuns num mundo globalizado.
37
A tradição se apresenta como movimento de retorno, que tenta recuperar raízes e
quer purificar práticas do grupo, segundo padrões que estavam negligenciados, embora se
questione tal possibilidade, enquanto que a tradução atravessa fronteiras de diversas
tradições e procura produzir uma cultura compósita, híbrida, sincrética, negociada, impura
e, por isso mesmo, dificilmente assimilada no contexto em que tenta alojar-se. A Igreja
Universal é reconhecidamente bem sucedida nessa forma agressiva de construir uma nova
identidade religiosa.
Criar tipos ideais da cultura política brasileira também implica no risco de produzir
generalizações questionáveis. Entretanto, pelo menos aqui, a tradição ensaística é bem mais
antiga e consolidada, posto que bem alicerçada em clássicos como Gilberto Freyre, Sérgio
Buarque de Holanda, Caio Prado Júnior, Victor Nunes Leal, Raymundo Faoro e outros,
37
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2001, p. 88, com grifo no original.
34
com farta reflexão de continuadores e críticos, aos quais se recorreu para identificar padrões
culturais produzidos, reproduzidos e atualizados, permanentemente, pela sociedade
brasileira.
Itinerário da pesquisa
A pesquisa para o doutorado começou com visitas a templos da Igreja Universal,
nos bairros de Rudge Ramos (em São Bernardo) e Santo Amaro (São Paulo). O objetivo era
“sentir o clima” das celebrações, obter jornais e outras publicações da Igreja e tentar
aproximação com pastores e leigos. Da mesma forma, foram visitados templos da
Assembléia de Deus nos bairros Belém e Bom Retiro (em São Paulo), com o intuito
adicional de entrevistar seus líderes, pastores José Wellington Bezerra da Costa e Jabes
Alencar. Essas tentativas de entrevistas foram frustradas e suspensas, obrigando o
pesquisador a concentrar esforços em outras fontes. A experiência tem ensinado que alguns
líderes se cercam de barreiras, de tal modo que o acesso a eles, por parte de pesquisadores,
exige a descoberta de canais especiais, como pessoas que privam de confiança e intimidade,
em grau bastante elevado. Como as informações para a pesquisa não dependiam,
fundamentalmente, dessas entrevistas, procurou-se obtê-las em outras fontes.
O projeto de pesquisa começou a tomar forma quando se resolveu examinar o que a
imprensa paulistana e depois a carioca registravam acerca dos políticos pentecostais e
neopentecostais, entre 1989 e 2004. Durante o 2º semestre de 2003, foram obtidos textos de
cobertura jornalística, desde o Congresso Constituinte até 2002, dos parlamentares
evangélicos no Congresso Nacional, realizada pelos jornais Folha de S.Paulo e O Estado
de S.Paulo. A consulta foi feita com auxílio dos sistemas de busca eletrônica dos citados
veículos. A intenção era captar a visão da grande imprensa paulistana acerca dos
evangélicos, e, em particular, dos pentecostais na política: quais os parlamentares em maior
evidência na mídia escrita, como a atuação deles era repassada para os leitores, e questões
afins. A coleta serviu como matéria-prima para um colóquio no programa de doutorado em
Ciências da Religião da Universidade Metodista. Cabe salientar que a intenção era começar
pela visão dos “de fora”, acerca de políticos pentecostais, a partir da qual se faria uma
seleção de personalidades que seria recomendável entrevistar, compondo, desta forma, a
lista inicial de possíveis fontes. De fato, a partir dessas referências, foram feitas entrevistas,
35
em Brasília, no mês de junho de 2004. O material jornalístico referido também serviu para
a elaboração de um texto que se presumia viria a constar como capítulo desta tese, mas que
foi finalmente descartado, porque não combinava com o conjunto. Não obstante, sua
elaboração foi útil para sugerir, inicialmente, o percurso da pesquisa, e dar pistas para o
trabalho de análise.
Em geral, a mídia reproduziu estudos relevantes de alguns pesquisadores do campo
religioso, salvo poucas exceções, quando resvalou para comentários de senso comum,
preconceitos, estereótipos e discriminações. A partir dessas análises foi possível definir o
projeto de qualificação, sua abrangência, o que seria viável pesquisar ou não. Por exemplo,
a intenção original era descobrir acordos que as lideranças pentecostais teriam “fechado”
com os candidatos à presidência da República, desde 1989 até 2002. A investigação
preliminar, com apoio em informações da mídia e entrevistas de parlamentares, indicou que
essa linha de pesquisa seria infrutífera. Os jornais afirmavam que houve acordos,
negociações e negociatas, mas os parlamentares da Assembléia de Deus e da Igreja
Universal negavam a existência desses acordos, ou eram lacônicos quanto ao que se passara
nos bastidores das campanhas eleitorais. A partir dessa constatação, optou-se pela
realização de uma pesquisa mais ampla, enfocando a relação entre pentecostalismo e
cultura política brasileira.
No mesmo mês da visita a Brasília, junho de 2004, compareceu-se ao I Fórum de
Políticos da Assembléia de Deus do Estado de São Paulo, realizado no Hilton Hotel da
capital paulista. Foi um encontro de candidatos a prefeito e vereadores de todo o Estado,
que congrega cerca de 600 municípios. O evento teve o patrocínio do ex-governador
Anthony Garotinho, do Rio de Janeiro, e contou com lideranças paulistas do PSDB e PTB.
Durante o fórum, foram dadas orientações de campanha aos candidatos, pelos
coordenadores nacional e estadual de ação política da AD, bem como fornecidos materiais
impressos, para auxiliá-los em suas estratégias eleitorais. Conseguiu-se gravar grande parte
dos pronunciamentos, dos quais foram extraídos trechos relevantes, aplicados nesta tese.
Visitou-se o Congresso Nacional, onde foram gravadas entrevistas de deputados
federais pentecostais e assessores parlamentares, conforme mencionado nos parágrafos
anteriores. Além destes registros, foram obtidos depoimentos, em São Bernardo do Campo,
36
de um ex-pastor da Assembléia de Deus Madureira, que estudava Teologia na Universidade
Metodista, e de uma ex-esposa de pastor da Igreja Universal. Para colher informações
oficiais, continuou-se “visitando”, ocasionalmente, as home pages das igrejas-objeto desta
pesquisa na rede de computadores Internet.
Esta investigação científica compreendeu leituras de parte do que tem sido
elaborado no mundo acadêmico, seja sobre pentecostalismo e neopentecostalismo, seja
sobre cultura política brasileira. As leituras, ainda assim, não atingiram o volume e
qualidade que se almejava, mas abrangeram o que era possível, no período de quatro anos
de doutorado, dos quais pelo menos dois estiveram voltados para outros textos referentes ao
fenômeno religioso, nem sempre diretamente aplicáveis à pesquisa e raramente focalizados
na especificidade do tema desta tese.
O trabalho de campo concentrou-se mais em longas entrevistas com parlamentares e
lideranças das duas grandes organizações eclesiais, a Assembléia de Deus e a Igreja
Universal do Reino de Deus. Foram feitas cerca de 20 entrevistas com parlamentares
federais das várias regiões geográficas do Brasil e gravados encontros, cultos e outros
eventos, perfazendo um total de, aproximadamente, 30 horas de gravação. Em duas
ocasiões, foram feitas entrevistas coletivas, de forma interativa, com lideranças
intermediárias da Assembléia de Deus. Adotou-se esta técnica, a fim de estimular o debate
e manifestação de pontos de vista diferentes sobre política interna e atuação pública da
mesma denominação. O convívio com o cotidiano das duas igrejas pesquisadas se
intensificou, mediante visitas a alguns templos e participação em suas celebrações.
Fragilidades metodológicas podem ser apontadas, como, por exemplo, a aplicação
de critérios pouco rigorosos para a escolha das fontes de informação. Nem sempre se podia
ouvir aquela que seria a fonte mais indicada, mas aquela que se colocava à disposição para
responder aos questionamentos. No caso de parlamentares, foram ouvidos todos o que
aquiesceram às insistentes solicitações do pesquisador, no limite dos dias que era possível
permanecer em Brasília e nos espaços de agenda escassos de um parlamentar.
38
Neste
sentido, foi mais difícil encontrar deputados da Igreja Universal solícitos ao apelo para
38
Como não havia bolsa para a pesquisa, a permanência em Brasília foi relativamente curta; cerca de 12 dias úteis, repartidos em
duas oportunidades, nos meses de junho de 2004 e novembro de 2005. Posteriormente, obteve-se uma doação que permitiu
apenas saldar dívidas de mensalidades do doutorado.
37
serem entrevistados. Quanto a lideranças e pessoas da base das duas igrejas, as escolhas
também dependeram de boa vontade para colaborarem com a pesquisa.
Observa-se um “ar de desconfiança” muito acentuado contra jornalistas e
pesquisadores na Igreja Universal. Em algumas situações, para se colher um pouco do
muito que se buscava era inevitável suspender o uso de instrumentos de pesquisa, como o
gravador de som e até mesmo o caderno de anotações. No caso da Assembléia de Deus, o
comportamento era muito variado, mas sempre mais aberto. Durante a pesquisa, o autor foi
convidado para proferir palestras sobre história do pentecostalismo brasileiro,
características atuais do movimento e participação política das igrejas pentecostais e
neopentecostais, em quatro comunidades de Assembléias de Deus de linhas bem diferentes:
uma vez foi em São Paulo e três vezes em Belém do Pará. Também foi convidado pela
CNBB Norte 2, da Amazônia Oriental, para ministrar os mesmos temas em simpósio para
capacitação de agentes de pastoral da Igreja Católica na referida região. Nessas ocasiões
efetivaram-se debates e exercício bem aberto de crítica e autocrítica por parte de membros,
dirigentes leigos, padres, pastores e religiosos. Foi realizada uma entrevista coletiva com
pastores e líderes da Convenção das Assembléias de Deus do Estado do Pará, na sede da
própria entidade. Neste caso, verificou-se constrangimento dos pastores, quando o assunto
era a luta por hegemonia regional, que vem sendo travada, há alguns anos, entre alas
lideradas, respectivamente, pelos pastores Gilberto Marques e Samuel Câmara. O primeiro
comanda a convenção estadual do Pará, enquanto o segundo domina a região metropolitana
de Belém e controla a Rede Boas Novas, um complexo de rádio e televisão, com emissoras
no Brasil e em outros países. Outra entrevista interativa foi gravada com auxiliares de
congregações das AD do distrito de Icoaraci, situado na região metropolitana de Belém. Os
participantes dessa entrevista foram bastante autocríticos e generosos, a ponto de
fornecerem informações sobre os bastidores da política interna da Assembléia de Deus
paraense.
Muito do que foi realizado em campo aconteceu porque existia e ainda existe uma
rede de amigos e colaboradores de igrejas pentecostais AD e IEQ, principalmente os
quais acreditaram na relevância do trabalho e “conspiraram” para que fosse possível
entrevistar líderes e representantes políticos. Houve, também, fontes que revelaram
38
problemas de política interna das igrejas focalizadas. Nestes casos, para evitar riscos de
uma exposição indevida, seus nomes e dados sociográficos foram omitidos. A existência da
Frente Parlamentar Evangélica, desde 2003, cujos assessores são os mesmos dos
parlamentares, foi canal decisivo para o progresso das pesquisas em Brasília. A
participação do pesquisador em atividades do Movimento Evangélico Progressista (MEP)
abriu portas para contatos tanto em Brasília, como São Paulo e Belém, os quais resultaram
em algumas das entrevistas mencionadas.
Este tipo de pesquisa, na perspectiva de Ada de Freitas Dencker e Sarah Chucid Da
Viá, tem caráter etnográfico. Segundo estas autoras, uma abordagem deste tipo “busca
significados culturais de um determinado grupo”, combinando vários métodos de coleta de
dados. O enfoque etnográfico tem fundamento em duas hipóteses: a primeira, “o
comportamento humano é influenciado pelo contexto em que se situa” e a segunda, “é
impossível entender o comportamento humano sem tentar entender o quadro referencial
dentro do qual os indivíduos interpretam seus pensamentos, sentimentos e ações”.
39
Procurou-se observar os estágios de pesquisa que essas autoras sugerem, ou seja: primeiro
estágio, exploração, seleção e definição do problema; segundo, “busca sistemática dos
dados selecionados”; e, terceiro, “exploração da realidade” em contexto mais amplo.
40
É
evidente que o trabalho não teve uma seqüência linear tão regular, exposta, aliás, com
finalidade didática, pois, como se sabe, o labor empírico exige idas e vindas, avanços e
recuos, tentativas e erros, ao longo da investigação, produzindo uma trajetória sinuosa e
quase caótica, visto que é impossível aprofundar uma pesquisa sem reconsiderar hipóteses,
rever aspectos aparentemente assentados, descobrir novas perspectivas e passar por
circunstâncias imprevisíveis, mas que podem trazer resultados compensadores. A dúvida
metódica alimenta o avanço da investigação e mantém esta aberta para novas descobertas e
realizações.
Foram feitos, também, estudos e observações diretas da atuação de lideranças e
parlamentares das duas igrejas escolhidas. “Basicamente, a pesquisa [foi] desenvolvida por
meio da observação direta das atividades do grupo estudado e de entrevistas com
39
DENCKER, Ada de Freitas Maneti; DA VIÁ, Sarah Chucid. Pesquisa empírica em ciências humanas (com ênfase em
comunicação). São Paulo: Futura, 2001, p. 187.
40
Idem, p. 188.
39
informantes para captar suas explicações e interpretações do que [ocorreu] no grupo”,
conforme recomenda Antonio Gil.
41
Houve preparação prévia de uma série de perguntas para servir como roteiro,
durante as sessões de entrevista (cf. anexo específico). Contudo, a experiência ensinou que
devia ser feito um número reduzido de perguntas, corroborando assim com recomendação
de Quivy e Campenhoudt.
42
Na prática, pedia-se que cada entrevistado falasse de sua
trajetória política e religiosa, inserindo aqui e ali, algumas perguntas do roteiro. No início
da entrevista, procurava-se apresentar com clareza os objetivos do trabalho. Em seguida, a
palavra era franqueada ao depoente, que ficava à vontade para discorrer sobre os aspectos
que lhe tocavam mais de perto. Não obstante, faziam-se intervenções breves, para
conseguir “arrancar” informações relevantes, às vezes evitadas ou esquecidas. Deste modo,
utilizou-se o que Quivy e Campenhoudt denominam “empurrões”, manifestos em frases do
tipo: “O que o senhor quer dizer exatamente com isto? Que outros aspectos poderiam ser
considerados? Fale um pouco mais sobre este ponto”. Em resumo, foram acatadas as
seguintes recomendações:
Fazer o mínimo de perguntas possível;
Intervir da forma mais aberta possível;
Abster-se de se implicar a si mesmo no conteúdo;
Procurar que a entrevista se desenrole num ambiente e num contexto adequados;
Gravar as entrevistas.
43
O contexto desta pesquisa sobre a participação das lideranças pentecostais na
política brasileira partiu do novo ordenamento democrático, estabelecido pelo Congresso
Constituinte de 1987-88, estendendo-se até a atual legislatura, mas foram feitas remissões
ao passado para compor uma perspectiva histórica razoável. Contudo, o corte temporal
limitou-se às duas legislaturas recentes, 51ª e 52ª, e mais precisamente ao período
compreendido pelos anos de 1999 a 2006, com ênfase nos últimos quatro anos. O foco da
tese foram os parlamentares pertencentes à Assembléia de Deus e Igreja Universal do
Reino de Deus.
41
GIL, op. cit., p. 53.
42
QUIVY; CAMPENHOUDT, op.cit., p. 74.
43
Idem, p. 77.
40
Desenvolveu-se uma reflexão teórica sobre padrões da cultura política brasileira e o
desenvolvimento da democracia em face do componente religioso pentecostal e
neopentecostal, cada vez mais presente no cenário nacional. A ênfase concentrou-se,
portanto, nessa reflexão, ou seja, no estudo do comportamento político de lideranças e
políticos dos subcampos religiosos citados, como parte da cultura política nacional, e que
implicações a presença deles traz para a vida democrática do País. A extensão do trabalho
empírico esteve relacionada com o objetivo de obter caracterizações sobre qual cultura
política, qual democracia e qual pentecostalismo, têm estado atuantes na realidade
brasileira passada e recente. O resultado obtido, a partir dessas indagações, permitiu formar
tipos ideais, com o propósito de examinar as práticas políticas dos agentes religiosos
escolhidos.
44
Sobre cultura política e democracia, a pesquisa teve como base obras citadas nos
capítulos 1 e 2 desta tese. As fontes sobre pentecostalismo foram entrevistas com líderes,
pastores e políticos dessas igrejas focalizadas, a literatura científica, bem como jornais,
livros e outras publicações oficiais das duas denominações religiosas, além de matérias
veiculadas na imprensa secular.
A pesquisa constou de dois tipos principais de levantamento:
Tipo A Gravações de depoimentos de deputados das bancadas federais da AD e
IURD, e coordenadores políticos, em âmbito nacional e estadual, no caso da primeira.
45
Além dessas fontes, com atuação de maior destaque em processos eleitorais, foram
ouvidos, também, assessores parlamentares das duas igrejas.
Tipo B Informações sobre a atuação dos parlamentares em publicações do
Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP) e em páginas da Internet,
disponibilizadas pela Câmara de Deputados e pelo Senado Federal.
As entrevistas foram focalizadas e parcialmente estruturadas, como explica Gil:
focalizada quando, embora livre, enfoca tema bem específico, cabendo ao entrevistador
esforçar-se para que o entrevistado retorne ao assunto após alguma digressão; (...)
44
O “tipo ideal” mais explícito desta tese está no capítulo 4. Trata-se exatamente do político pentecostal.
45
No caso do coordenador da bancada da IURD, deputado Marcos de Jesus (PL-CE), foram infrutíferas reiteradas tentativas para
entrevistá-lo (mais de meia dúzia de vezes). Em que pese esta lacuna, conseguiu-se entrevistar, em junho de 2004, o ex-
coordenador, na época ainda deputado Carlos Rodrigues, figura carismática e um dos cem parlamentares mais influentes no
Congresso, segundo classificações do DIAP.
41
parcialmente estruturada, quando é guiada por relação de pontos de interesse que o
entrevistador vai explorando ao longo de seu curso”.
46
Cuidados foram adotados para não
induzir respostas, provocar resistências, antagonismos e ressentimentos. Também se buscou
clareza quanto aos termos empregados e formato das perguntas.
A escolha dos informantes recaiu naqueles que detinham informações sobre
estratégias e bastidores políticos das igrejas. Buscou-se dar ampla liberdade para cada
informante discorrer sobre os modos interno e externo de fazer política de sua igreja. Sabia-
se, de antemão, dos limites desse tipo de abordagem (levantamento Tipo A), pois o que se
consegue captar, normalmente, são opiniões, pontos de vista, explicações, críticas e
discursos apologéticos, embora também, com menor freqüência, dados objetivos. Para
garantir a qualidade de interpretação dessas informações, efetuou-se cuidadosa análise dos
conteúdos. Além disto, vale lembrar, novamente, que essas entrevistas foram coadjuvadas
por outras abordagens de coleta de informações (le vantamento Tipo B). Procurou-se levar
em consideração o conselho de Quivy e Campenhoudt:
O método da entrevista, seguida de uma análise de conteúdo, é seguramente o que mais se
utiliza em paralelo com os métodos de observação. A sua complementaridade permite, com
efeito, efectuar um trabalho de investigação aprofundado, que, quando conduzido com a
lucidez e as precauções necessárias, apresenta um grau de validade satisfatório.
47
O trabalho de análise foi precedido de categorização dos dados, ou seja, do
estabelecimento de um conjunto de categorias descritivas, fundamentadas no referencial
teórico da pesquisa. Conforme explicação de Gil, em “pesquisas qualitativas, o conjunto
inicial de categorias em geral é reexaminado e modificado sucessivamente, com vista em
obter ideais mais abrangentes e significativos”.
48
Neste sentido, foi dada atenção não
somente aos conteúdos explícitos dos levantamentos, mas também aos “conteúdos
implícitos, dimensões contraditórias e mesmo aspectos silenciados”
49
.
46
GIL, op.cit., p. 117, com grifos no original.
47
QUIVY; CAMPENHOUDT, op.cit., p. 2000.
48
GIL, op.cit., p. 134.
49
GIL, op. cit., p. 134, citando LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São
Paulo: EPU, 1986.
42
Conteúdo dos capítulos
Para finalizar esta parte introdutória, é feita, nos parágrafos seguintes, uma
apresentação breve de cada capítulo da tese.
O capítulo 1 trata de padrões da cultura política brasileira no contexto da sua
formação histórica e das relações sociais que a constituíram. A presença pentecostal,
inicialmente esporádica no espaço público, e a neopentecostal, mais recente, são discutidas
nas relações que mantêm com esses padrões culturais.
O capítulo 2 privilegia a abordagem do Estado como estruturador da ordem
econômica inserida no contexto mundial, seu papel como mediador das oligarquias e
burguesias, e, principalmente, a ação deste mesmo Estado como tutor das massas
trabalhadoras e despossuídas, através de uma política populista que abrangeu, inclusive, os
pentecostais. Há exemplos da relação destes atores religiosos com movimentos sociais e
com instâncias do poder, mas o destaque maior é dado para a não-participação pentecostal
em lutas travadas na sociedade.
O capítulo 3 apresenta a incursão dos pentecostais na política brasileira, a partir de
meados dos anos de 1980, com destaque para a forma peculiar como atuaram e o
estranhamento que provocaram em outros agentes da sociedade política. Paralelamente,
porém, o texto revela afinidades do mesmo grupo religioso com a real politik praticada no
Brasil.
O capítulo 4 se concentra na elaboração de um “tipo ideal”, o político pentecostal,
com base nas articulações que produzem, a figura emergente do “candidato oficial” de
igreja, a forma como este político escolhe e troca de partido, estratégias de campanha
eleitoral e atuação do mesmo político como representante da corporação que o elegeu.
Finalmente, o capítulo 5 trata da constituição da Frente Parlamentar Evangélica,
principais questões que ela privilegiou no debate político, envolvimento de metade dos
parlamentares evangélicos nos escândalos que abalaram o Congresso, durante a legislatura
de 2003-2007, e algumas avaliações sobre a atuação dessa mesma Frente Parlamentar.
Em resumo, o estudo da literatura científica produzida sobre pentecostais e
neopentecostais, a leitura de textos jornalísticos e literatura oficial das igrejas, referentes
43
aos políticos pentecostais, mas, sobretudo, a pesquisa de campo, com análise das respostas
dos entrevistados, somada a observações diretas de celebrações e outras atividades dos
grupos pesquisados, formaram um conjunto de informações capaz de permitir uma
interpretação da presença desses atores religiosos no cenário político brasileiro, com base
em instrumentos teóricos das Ciências Sociais, especificamente os que se referem a cultura
política, democracia e pentecostalismo. Desse conjunto de informações nasceu o texto desta
tese, que ora se oferece para julgamento do leitor.
44
Capítulo 1
Cultura política brasileira e
pentecostalismo
Introdução
A abordagem que aqui se procede não é histórica nem linear, porém recorre à
história social, com realce para aspectos da origem e estabelecimento do sentido de nação.
Também se recorreu ao método comparativo, para elucidar semelhanças e singularidades
entre a sociedade brasileira e outras congêneres. Inevitavelmente, este é um exercício de
utilização de tipos ideais no sentido weberiano. Cultura política e pentecostalismo
brasileiros são tipos ideais desenvolvidos nos parágrafos seguintes. As relações entre
ambos completam a trama do capítulo. Recorre-se, de passagem, aos primórdios da
sociedade brasileira e as marcas deixadas por essa empresa colonial, para logo prosseguir
com aportes sobre as fases do império e república, sempre na busca de identificar a cultura
política que aqui foi gerada.
Estudiosos da realidade brasileira, tais como Bernardo Sorj, Joanildo Burity,
Marcelo Baquero e Paulo Henrique Martins, têm concordado que não é possível acercar-se
45
de uma sociedade tão complexa como a nossa, com o intuito de compreendê-la, elegendo
um ou outro fator estruturante, como fundamento explicativo. Segundo Sorj,
50
, explicações
sociológicas que privilegiavam uma causa para entender a organização da sociedade e suas
contradições não se mostraram satisfatórias. Uma variante dessa abordagem, o pensamento
estruturalista, por exemplo, reduz o social a dicotomias, em sacrifício da rica variedade de
fatores que o constituem.
51
O emprego de paradigmas simplistas e as abordagens monocausais alimentam a
ilusão de um mundo social coerente, racional, que funciona consoante lógica única. Ciência
social construída nestes moldes contribui para produzir visões intolerantes da sociedade.
Segundo uma perspectiva pluralista, a realidade brasileira requer a busca de fatores
múltiplos que permitam dar inteligibilidade a seus processos de desenvolvimento. Neste
sentido, Sorj elege sete instituições, complementares e conflituosas, para mapear a
sociedade contemporânea, as quais são: “o patrimonialismo, o Estado como agente
racionalizador voltado para o crescimento econômico, o capitalismo, a desigualdade e
heterogeneidade sociais, os padrões culturais de sociabilidade, a lógica institucional e a
cidadania”.
52
Neste capítulo sobre os pentecostais e a cultura política nacio nal busca-se, em
primeiro lugar, arrolar padrões culturais da formação histórico-social brasileira. Em
seguida, procede-se à identificação de práticas sociais e políticas dos pentecostais, na
literatura existente, a fim de comparar este microcosmo religioso com o contexto de
sociedade no qual está inscrito. Pode-se afirmar que o pentecostalismo quase não teve
contato com o jogo da democracia na primeira metade do século XX. O mundo pentecostal
se formou radicalmente dualista, opondo igreja e mundo, bem e ma l, céu e terra, espírito e
matéria e assim por diante. A participação política era vista como algo mau. Este ethos
50
SORJ, Bernardo. A nova sociedade brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001, p. 11-12.
51
Segundo o paradigma estruturalista, há duas classes de estruturas: visíveis e ocultas. O estruturalismo seria um movimento que
busca na realidade visível estruturas dinâmicas e ocultas ou inconscientes. Uma estrutura se caracteriza por apresentar atributos de
totalidade, transformabilidade e auto-regulação. Pensadores dessa corrente reinterpretam uma chave anterior de leitura da
realidade. Por exemplo: Claude Lévi-Strauss estudou parentescos e mitos em tribos da Amazônia e Mato Grosso, a partir de
releituras da psicanálise e do marxismo. A proibição do incesto (realidade visível) ocultava a função de intercâmbio entre famílias
para formação da sociedade. Os mitos ocultam regras de sobrevivência no ambiente hostil da floresta. Outro caso foi Louis
Althusser, que releu Marx, descobrindo um duplo: o jovem Marx, do marxismo ideológico, e o Marx maduro, do marxismo
científico. Entre um e outro teria ocorrido uma “ruptura epistemológica”. Para leituras sobre essa corrente de pensamento sugere-
se a coletânea Estruturalismo: antologia de textos teóricos. Lisboa: Portugália; Martins, 1965, 417p. (Problemas, 24) que
contém textos de Foucault, Derrida, Lévi-Strauss, Godelier, Althusser, Lacan, Sartre, Barthes, Sebag e outros.
52
SORJ, op.cit., p. 12.
46
religioso não era uma escola de participação democrática, no sentido de formar
consciências críticas, deixar as pessoas pensarem, permitir que elas persuadissem outras e
se articulassem, visando promover experimentos novos na sociedade. Estava longe,
também, de ser uma escola de liberalismo político. Neste sentido, ficava difícil considerar a
contribuição pentecostal como facilitadora do processo de construção da democracia, caso
esta seja vista pelo viés liberal.
Não obstante, esse segmento religioso não estava incólume aos processos maiores
que ocorriam na sociedade. Só a título de exemplo, conforme análise de Christian Lalive
D’Épinay, sobre o pentecostalismo do Chile, nos anos 1960, verificava-se a incorporação
de massas do campesinato e do subproletariado urbano ao processo de democratização
daquele país, com ênfase na reforma agrária e no movimento pela moradia. Portanto, os
movimentos sociais aconteciam envolvendo o mesmo público que era atingido pelo
pentecostalismo.
53
1.1 Colonização, nação brasileira e comparações
A constituição da cidadania tem sido um grande desafio para a sociedade brasileira.
José Murilo de Carvalho aponta requisito fundamental: construir uma sociedade que
combine liberdade, participação e justiça social.
54
No Brasil conquistou-se a primeira; há
registros de alguma participação; todavia o fato mais evidente é a existência generalizada
de injustiças sociais. Do ato fundador, a conquista portuguesa em 1500, até o marco da
revolução de 1930, quando o país começa a experimentar grandes transformações, o autor
identifica “grande continuidade na economia, na composição das classes e grupos sociais e
nas relações sociais”, exceção feita apenas a uma mudança importante, a abolição do
regime escravo, em 1888.
55
Grosso modo, trata-se de uma interpretação muito ampla: o
período escravista como uma espécie de idade das trevas e a revolução de 30 como
contribuição das classes médias burguesas para a modernização do País.
56
53
D’ÉPINAY, Christian Lalive. O refúgio das massas: estudo sociológico do protestantismo chileno. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1970.
54
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004a.
55
. CARVALHO, José Murilo de. Fundamentos da política e da sociedade brasileiras. In: AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antônio
Octávio (orgs.). Sistema político brasileiro: uma introdução. Rio de Janeiro: Konrad-Adenauer-Stiftung; São Paulo: Unesp,
2004b, p. 21.
56
Acerca do papel das classes médias na República brasileira recomenda-se a obra: SAES, Décio. Classe média e sistema
político no Brasil. São Paulo: T.A.Queiroz, 1985.
47
No início os jesuítas monopolizaram o ensino e instituíram um sistema de educação,
mas o balanço dessa obra inclui destruição de culturas indígenas e imposição do
catolicismo ibérico. Quando foram expulsos, em 1759, a situação piorou, porque o Estado
não conseguia atender minimamente as demandas da nova sociedade. Os escravos eram
analfabetos, exceto uns poucos de cultura muçulmana. O patriarcalismo impedia a
educação das mulheres. No primeiro recenseamento, em 1872, havia somente 16% de
alfabetizados e, em 1920, ainda eram apenas 24%. Essa condição educacional reforçava o
quadro de desigualdades sociais. A Coroa portuguesa, em contraste com a espanhola, não
permitia a criação de universidades. Na época da independência, o Brasil contava com
1.242 formados pela Universidade de Coimbra, enquanto as colônias espanholas da
América Latina tinham cerca de 150 mil formados em suas 23 universidades.
57
A empresa colonial lusitana no Brasil fazia parte do sistema mundial de circulação
de mercadorias, que incluía o comércio escravista com a África e o de especiarias do
Oriente. “Colonizar significava ‘produzir para o mercado europeu’”, lembra Carvalho.
58
Desta forma, foi construída na América Portuguesa uma sociedade agrário-exportadora
para atender demandas de produtos primários da economia mundial, em regime de
exploração que empobrecia a colônia e gerava acumulação ampliada de capitais no
continente europeu. A emancipação política do Brasil em 1822 não alterou a natureza
exploratório-dependente dessa relação centro-periferia.
A mundialização, associada à urbanização, no século XX, trouxeram impactos no
que concerne à construção de cidadania, formulação de estratégias políticas e criação de
novos hábitos de consumo. As nações se to rnaram mais suscetíveis a esses impactos,
embora persistam em manter suas tradições. A estrutura de centro e periferia se reforçou no
cenário mundial. Formou-se um modelo cultural de civilização híbrida. No caso brasileiro,
subjazem marcas indeléveis da origem e colonização subsequente, que sempre resistirão a
tentativas de repúdio ou superação desta herança.
Nesta linha de identificação e rejeição das marcas de origem, Paulo Henrique
Martins cita como os fundadores dos Estados Unidos repeliam a cultura aristocrática da
57
CARVALHO, 2004b, p. 25.
58
Idem, p. 21.
48
pátria-mãe inglesa e favoreciam a liberdade burguesa, conforme o grande relato de Alexis
de Tocqueville, em Democracia na América.
59
O mesmo Martins lembra que, no sentido de
rejeição do genitor, Sigmund Freud, em Totem e tabu, revelava a pulsão dos filhos para
assassinarem o pai, a fim de viabilizarem uma nova ordem social
60
. Segundo o
entendimento de Martins, esses enfoques permitem relativizar algumas teorias de
desenvolvimento econômico e valorizar a dinâmica cultural. Deste modo, afirma ele,
concordando com Cornelius Castoriadis, que “toda sociedade se funda de modo mais ou
menos autônomo (ou heterônomo), criando suas próprias instituições ao combinar os
materiais que ela herdou de sua própria história o instituído , com a fabricação original e
criativa de novas significações o instituinte a partir de seu imaginário radical”.
61
.
A configuração atual dos estados-nação no mundo aponta para relações de
interdependência, mas revela, sobretudo, uma estrutura de desigualdades econômicas,
domínio tecnológico e influência política e cultural, que permite classificar os países em
centrais e periféricos, conforme Karl Deutsch.
62
Os países centrais tiveram um processo de
formação em que múltiplas identidades forjaram uma identidade global do Estado, de modo
que este e a sociedade guardam simetria. Nos países periféricos, cuja origem tenha sido a
colonização, a identidade se formou de fora para dentro, constituindo “culturas de
fronteiras”, nas quais o Estado não promoveu uma cultura nacional, síntese das identidades
regionais. No contexto atual é importante reconhecer essa estrutura de centro e periferia e
“entender como a globalização atinge desigualmente as sociedades centrais e periféricas,
promovendo exclusão social crescente para uns, e concentração de riquezas para outros”.
63
A formação política do Brasil esteve marcada por duas características: a primeira foi
o caráter estatal da empresa colonial; a segunda teve relação com a escassez de pessoas
para ocupar a colônia. A segurança, no interior do Brasil, ficou a cargo de ordenanças,
nome antigo dado a um corpo de tropas sob o comando de ricos fazendeiros. A coleta de
impostos era feita por contratadores, que exploravam a população e recebiam da Coroa uma
59
Cf. TOCQUEVILLE, Alexis de. Democracia na América. São Paulo: Edusp, 1969.
60
Cf. FREUD, Sigmund. Totem e tabu: alguns pontos de concordância entre a vida mental dos selvagens e dos neuróticos. Rio
de Janeiro: Imago, 1974.
61
MARTINS, Paulo Henrique. Cultura autoritária e aventura da brasilidade. In: BURITY, Joanildo A. (org.) Cultura e
identidade: perspectivas interdisciplinares. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p. 84-5.
62
Cf. DEUTSCH, Karl. Análise das relações internacionais. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982, p. 283-306.
63
MARTINS, op.cit., p. 86.
49
comissão pelo serviço realizado. Ao mesmo tempo era-lhes exigido o cumprimento de
metas, nem sempre alcançáveis, motivo que ocasionou a Inconfidência Mineira, pois a
queda da produção do ouro agravou esse quadro. As duas características da empresa
colonial permitiram um conluio entre a esfera estatal e a esfera privada. Conforme esclarece
Carvalho: “Essa mistura leva o nome de patrimonialismo, pois significa que o Estado
distribui seu patrimônio terras, empregos, títulos de nobreza e honoríficos a particulares
em troca de cooperação e lealdade”.
64
Em tal sistema não há cidadania. Há favorecimento
de um lado e lealdade do outro. Nesse terreno, proliferam relações clientelistas de
favorecimentos, privilégios e subserviência, daí a conclusão de Carvalho: “O clientelismo é
um resíduo do patrimonialismo”.
65
A propósito, pode-se mencionar o caráter ambíguo do pentecostalismo que veio a se
instalar em sociedades latino-americanas, no início do século XX. Lalive D’Épinay destaca
que, se de certo modo o fiel teve acesso a instâncias de poder da igreja, pois as estruturas de
participação favoreceram este acesso, esse poder sempre foi exercido pela hierarquia, que
reproduziu o caráter autoritário tradicional do contexto social maior. D’Épinay encontrou
semelhança das relações estabelecidas no meio pentecostal com as verificadas entre patrão
e agregados de uma fazenda, na sociedade tradicional chilena. De fato, ao ingressar na
comunidade de fé, o crente renuncia a sua individualidade e passa a se comportar dentro de
padrões da subcultura pentecostal que ele abraçou, caracterizada por forte controle social de
seus membros. Esta situação não é algo opcional, porque se trata de uma marca de
identidade, ou melhor, da própria natureza das comunidades pentecostais que se
estabeleceram no continente, salvo possíveis exceções, que se confessa desconhecer. Para
D´Épinay, o pentecostalismo é uma “continuidade descontínua” da sociedade tradicional.
Melhor seria, talvez, falar de “continuidade com rupturas”. Ele absorve o tempo livre quase
total da pessoa, inviabilizando sua militância nos espaços que promovem o jogo
democrático: partidos, sindicatos, associações civis etc. A militância pentecostal exclui
ativismo em qualquer outro espaço social. Trata-se de um movimento que reconstrói
64
CARVALHO, 2004b: p. 27.
65
Ibidem.
50
simbolicamente a sociedade tradicional em crise, superando a anomia decorrente da
falência desse velho modelo.
66
Na análise da sociedade brasileira, Martins descarta a idéia de uma “comunidade
nacional”, nascida de um processo integrativo das culturas locais, e propõe a busca de
compreensão da nossa cultura autoritária em três fontes: no pacto fundador, no imaginário
dos clãs do patriarcalismo colonial e no lugar do social que se formou a partir do
imaginário de poder criado.
67
Na Europa, o pacto fundador encontrou sua síntese quando
Estado e Indivíduo se firmaram como instituições centrais, ao longo de um processo que
durou do século XV ao XIX:
No seio da polarização entre Indivíduo e Estado, constituiu-se a rede cultural e lingüística da
comunidade nacional, forjaram-se as esferas públicas e privadas e a sociedade civil, todos
esses planos de circulação sendo animados por atores diversos a aristocracia, a burguesia
comerciante, a pequena burguesia, o campesinato, o proletariado urbano, entre outros , que
disputavam a construção de significações simbólicas e materiais da modernidade
ocidental.
68
Houve aí uma ruptura entre poder político e poder religioso em favor da autonomia
dos atores e instituições. A saga fundadora das colônias norte-americanas teve nos
puritanos colonizadores um padrão libertário contra a sociedade que reprimia um projeto
político-religioso radical e, de igual modo, um exemplo de arrojo para abrir fronteiras à
revelia dos habitantes da nova terra, que afinal foram exterminados. Não houve pacto com
os aborígenes, entre outros motivos, porque o paradigma da modernidade era incompatível
com as culturas locais. Os fundadores trouxeram o modelo bipolar Estado-Indivíduo,
radicalizando a prioridade do segundo termo na nova sociedade.
Na América Latina não houve pacto civilizatório entre indivíduos. Como já foi
mencionado, o que houve foi a implantação de uma empresa colonial. Ao Brasil foi trazida
a tradição patrimonialista de Portugal, associada com a tradição tomista-aristotélica que
procurava harmonizar o mundo divino com o mundo humano. Realizou-se um assalto
religioso-militar sobre os indígenas, representado pelo binômio cruz e espada. Começou-se,
66
D’ÉPINAY, op.cit., p. 344-5.
67
MARTINS, op.cit., p. 86.
68
Idem, p. 87.
51
portanto, com uma “estratégia autoritária: a de impor o domínio do imaginário cristão
medieval e da ordem política patrimonial, de que Portugal era herdeiro legítimo, sobre a
cultura local com vistas não à implantação de um sistema comunitário e multicultural, mas
a uma empresa exploradora com fins utilitários explícitos”.
69
Estabeleceu-se um pacto entre
as elites colonizadoras e a Igreja Católica que resultou na absorção destruidora das
populações indígenas e escravização de milhões de africanos e na construção de uma
sociedade hierárquica. A lei que garantia a ocupação da terra possibilitou a essas mesmas
elites a usurpação de glebas e sesmarias, origem dos latifúndios e da privação desse recurso
de raiz para a maioria da população.
70
A lógica da empresa colonial era a de saquear a
colônia para equilibrar as finanças da metrópole. No aspecto cultural, posteriormente, a
moda foi mimetizar modelos das cortes inglesa e francesa, a fim de constituir uma
inteligentzia colonizada.
71
Durante o século XIX, Portugal era vassalo da Inglaterra. O Brasil ficou debaixo de
duas dominações, até 1822, quando Dom Pedro I proclamou a independência. Este ato
decreto u o fim do domínio político direto exercido por Portugal, mas não alterou a
condição de dependência econômica do Brasil ao império britânico. A insatisfação e o
imaginário que essa posição subalterna alimentava foram transformados em valorização de
costume s e princípios que vinham de fora, uma espécie de baixa estima que promove o
descentramento, a cosmopolitização e a carnavalização do que é nosso. A cultura brasileira
resultante de tal sentimento de inferioridade tem, de fato, estas características. Na Europa e
Estados Unidos a burguesia construiu seu Estado moderno. No Brasil este papel foi
cumprido pela oligarquia colonial. Lá prevaleceu a lógica econômica e de mercado. Aqui,
“dominou a lógica da dádiva patrimonial, da construção vertical de vínculos de
solidariedades pessoais, prática medieval preservada intacta nos países ibéricos que não
conheceram os ventos da reforma religiosa e da revolução burguesa”.
72
A figura típica da
colonização norte-americana era a família de colonos. No Brasil, foi o clã agrário patriarcal
escravista. Recorrendo à imagem freudiana, o colonizador do Brasil foi um incestuoso que
69
Idem, p. 90.
70
Cf. HOLSTON, James. Legalizando o ilegal: propriedade e usurpação no Brasil. Revista Brasileira de Ciências Sociais. São
Paulo: Anpocs, n. 21, 1993.
71
Sobre essa valorização do que vem de fora cf. SANTOS, Boaventura de Sousa. Modernidade, identidade e cultura de fronteira.
In: ______. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez, 1995.
72
MARTINS, 2002: p. 93.
52
se livrou da castração paterna para satisfazer suas taras na mãe terra, violentando tanto os
habitantes tradicionais como os escravos que arrancou de outra mãe, a África.
73
1.2 Modernização elitista e cultura política brasileira
Em 1831, foi instituído o modelo de Guarda Nacional para substituir as ordenanças
da Colônia. O comandante dessa Guarda era o coronel, geralmente um proprietário rural
rico, que logo se tornou o chefe político regional. Com o advento da República e a
introdução do federalismo, as eleições de governadores passavam pelo apoio dessa
estrutura de coronéis. Em contrapartida, a distribuição de cargos públicos passava pela
indicação desses chefes políticos locais.
Formou-se uma pirâmide de poder: o coronel apoiava o governador, que apoiava o
presidente da República, que apoiava o governador, que apoiava o coronel. No melhor
estilo patrimonialista, o poder do Estado se aliava ao poder privado dos proprietários,
sustentando-se os dois mutuamente, em detrimento da massa dos cidadãos do campo e
das cidades que ficava à margem da política.
74
A dimensão da exclusão social no Brasil foi identificada pelo censo de 1920: havia
30,6 milhões de habitantes e apenas 180 mil eram médios e grandes proprietários, ou seja,
menos de 0,6% da população. Nesse topo da pirâmide social estavam os “coronéis” da
República.
O braço escravo africano sustentou a economia do Brasil durante quase quatro
séculos. O principal acontecimento social do Império foi a abolição do tráfico humano em
1850 e do regime escravista em 1888. A condição escrava criou um cancro social que
perdura na cultura brasileira. Ao negar a condição de ser humano ao escravo, o senhor
estava criando uma relação promíscua e inviabilizando a instituição da cidadania. A perda
de valores foi tamanha que havia escravo perseguindo seu semelhante e adquirindo escravo
tão logo obtinha sua alforria. Conforme escreveu Joaquim Nabuco, acerca da escravidão:
73
Idem, p. 94.
74
CARVALHO, 2004b: p. 27.
53
O que esse regímen representa, já o sabemos. Moralmente é a destruição de todos os
princípios e fundamentos da moralidade religiosa ou positiva a família, a propriedade, a
solidariedade social, a aspiração humanitária: politicamente, é o servilismo, a desagregação
do povo, a doença do funcionalismo, o enfraquecimento do amor da pátria, a divisão do
interior em feudos, cada um com o seu regímen penal, o seu sistema de provas, a sua
inviolabilidade perante a polícia e a justiça; econômica e socialmente, é o bem-estar
transitório de uma classe única, e essa decadente e sempre renovada, [...] a desmoralização
da autoridade desde a mais alta até à mais baixa ...
75
Somente abolida essa aberração social pôde-se começar, efetivamente, a
reconstrução de uma nação brasileira. Todavia as seqüelas continuaram indelevelmente
presentes, ao longo da história social brasileira. Exemplos dessas marcas estão nas
discriminações veladas e sutis que se praticam contra populações mestiças, pobres,
mulheres, e outras situações do gênero.
1.2.1 Etapas da “modernização conservadora”
As etapas do desenvolvimento econômico, social e político do Brasil, entre a
Primeira Guerra Mundial (1914-19) e o Golpe de Estado de 1964, foram analisadas por
Octavio Ianni da seguinte forma:
a época da transição para uma economia industrial no Brasil, assinalando essa etapa crucial
do desenvolvimento, pode ser simbolizada pela política de massas, como padrão de
organização política e sustentação do novo estilo de poder. A política de massas portanto,
diferente da política de partidos é o fundamento da democracia populista, que se
organizou paulatinamente nas décadas que antecederam a mudança repentina a ocorrida a
partir do Golpe de Estado de 1964.
76
O padrão populista respondia à inserção de novos contingentes populacionais nas
cidades, em decorrência dos processos de urbanização e industrialização, mas também
serviu às populações rurais, em fase posterior, principalmente no início dos anos 60, com a
integração da agricultura ao modo capitalista de produção.
75
NABUCO, Joaquim. O abolicionismo. In: SANTIAGO, Silviano (org.) Intérpretes do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
2002, p. 148-9 (Biblioteca Luso-Brasileira, Série Brasileira).
76
IANNI, Octávio. O colapso do populismo no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1988: p. 19, com grifos no
original.
54
Emilio Willems considera os processos de industrialização e urbanização,
emergentes no Brasil e no Chile, como preparatórios para um avanço do protestantismo
sobre o catolicismo tradicional.
77
Um protestantismo popular, com ética de frugalidade,
disciplina para o trabalho e cooperação, deu "sobrevivência de valores" à classe urbana
mais baixa, como instrumento para melhorar suas condições de vida e mobilidade social.
Na adesão à nova fé evangélica, Willems percebeu uma paradoxal continuidade: o
camponês mantinha laços frágeis de submissão ao catolicismo tradicional, devido a alguns
fatores, como: incipiente evangelização, carência de padres para lhe dar assistência
espiritual e distância da hierarquia da igreja em relação a sua base rural, motivada pelos
envolvimentos com a classe dominante, o que fazia a elite católica indiferente aos pobres.
Nesse ambiente, vicejou um catolicismo popular permeável à adesão ao pentecostalismo,
posto que as ênfases deste em experiências místicas, como o batismo do Espírito Santo e o
dom de línguas, e a prática da “cura divina”, associavam-se bem ao mundo miraculoso da
religiosidade popular católica.
78
O afluxo de populações egressas da zona rural para as cidades ampliou a
importância política destas no cenário nacional. Nesse novo contexto, setores das classes
médias urbanas se apresentam como agentes que reivindicam mudanças. Convém, todavia,
atentar para a tese de Décio Saes sobre a forma dessa participação:
A intervenção da classe média urbana na cena política, ao longo dos sucessivos períodos
(oligárquico, populista, autocrático-militar), não se faz sob forma unitária, e sim sob forma
fracionária. Mais ainda: a classe média urbana não é, ao longo dos períodos mencionados,
um bloco político monolítico, alinhado com a “classe dominante”, mas um agregado de
frações politicamente divididas entre a velha classe dominante e a nova classe dominante,
ou entre o bloco das classes dominantes e as classes populares.
79
77
Cf. WILLEMS, Emilio. Followers of the new faith: culture change and the rise of protestantism in Brazil and Chile. Nashville,
Tennessee: Vanderbilt University Press, 1967.
78
Segundo Thales de Azevedo, o catolicismo popular reúne elementos das crenças indígenas e africanas, no sentido de manipular
o sobrenatural para proveito do devoto carente. Os meios utilizados para alcançar as graças almejadas são ladainhas, rezas e
rudimentos do catecismo. Os devotos recorrem a benzedeiras e benzedores para se protegerem ou se livrarem dos males, mas há
forte presença de conformismo para suportar os males do corpo e da alma, atribuídos a causas sobrenaturais. “Nessa religiosidade
largamente sincrética, faz-se apelo em determinadas circunstâncias aos orixás do animismo de origem africana, aos espíritos dos
panteons aborígenes e às almas desencarnadas do espiritismo; também se recorre a ‘santos’ vivos, isto é, a sacerdotes e leigos aos
quais se atribui a capacidade de fazer ‘milagres’ ou de aliviar o mal por meio de bênçãos, rezas, invocações”. (AZEVEDO, Thales
de. Catolicismo no Brasil. Revista Vozes, Petrópolis, ano 63, n.2, fev. 1969, p. 123.)
79
SAES, 1984, p. IX, com grifos no original.
55
A partir dos movimentos de camadas médias da população urbana, entre estas os
militares, profissionais liberais, e parte da burguesia, dos anos de 1920, que desembocariam
na chamada Revolução de 30, cresceram atividades políticas e no campo das artes,
estabelecendo uma cultura urbana de maior alcance nacional. As organizações de esquerda
tiveram participação ativa nesse contexto.
A liquidação do padrão getuliano ou populista de desenvolvimento econômico social
iniciou-se no governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira (1956-60), que associou de
forma eficaz a política de massas e os compromissos crescentes com o capital externo. Em
conseqüência, instaurou-se, de modo agudo, o antagonismo entre o padrão getuliano e
também nacionalista de desenvolvimento, por um lado, e o padrão de desenvolvimento
associado e dependente, por outro. Portanto, é à época do governo de Juscelino Kubitschek
de Oliveira que se criam as condições mais importantes para a futura liquidação do
desenvolvimento nacionalista.
80
Até 1930, aproximadamente, a economia brasileira funcionava sob a égide do
modelo de exportação de produtos primários e importação de manufaturas. Nas três
décadas seguintes, o Estado comandou políticas de incentivo e financiamento para
estabelecer um parque industrial brasileiro que fosse capaz de substituir a importação de
produtos manufaturados.
Até 1945, os acontecimentos políticos estão abertamente vinculados à necessidade de
reduzir o poder político e econômico dos setores agrário-exportadores e importadores. Na
base destes interesses está a cafeicultura, como atividade econômica preponderante. Assim,
por um lado, estabelece-se o conflito entre as oligarquias tradicionais e os setores urbanos
nascentes, tais como a classe média, a burocracia civil e militar, os incipientes grupos de
empresários industriais e o proletariado nascente. Por outro lado, as lutas políticas estão
relacionadas com o confronto entre os diferentes projetos de modernização, democratização
e desenvolvimento econômico. Na base desses confrontos estão, no entanto, as contradições
entre a economia agrário-exportadora e a economia industrial em formação. Esses
confrontos são o fulcro dos acontecimentos até 1945.
81
O tenentismo é a expressão mais representativa dos conflitos dessa fase da vida
nacional. Tratava-se de um movimento reformista pequeno-burguês, comandado por jovens
80
IANNI, 1988: p. 19.
81
Idem, p. 25.
56
oficiais militares, em oposição ao governo de Artur Bernardes. Defendiam idéias liberais,
voto secreto, restauração da honra militar e um Judiciário independente; e combatiam as
mazelas da Velha República, como a corrupção eleitoral e o poder concentrado nas velhas
oligarquias.
82
O “tenentismo” era o movimento predominante nesse quadro renovador
composto pelas classes médias. Não se mostrava simpático com “políticos”, todavia seus
integrantes não conseguiram construir alianças amplas na sociedade, de forma que, em sua
fase final, tiveram que compor com líderes de partidos tradicionais. Nas insurreições dos
anos 20 e na Coluna Prestes, apresentavam um radicalismo romântico incapaz de repercutir
em mudanças do sistema político vigente.
83
Depois de recorrerem ao exílio, remanescentes
dessa coluna se aliaram a frações das oligarquias para enfrentar os que detinham o poder,
com exceção de Luís Carlos Prestes, que se filiou ao Partido Comunista. Segundo Ianni:
O tenentismo formou-se com base nas seguintes condições e fatores: urbanização;
crescimento da classe média; “revolução nas expectativas” da classe média, paralela ao seu
crescimento quantitativo, o que provoca o conflito entre a propensão a consumir e os
rendimentos exíguos; contradições entre as estruturas nascentes, resultantes das
transformações econômico-sociais e as estruturas vigentes, em geral rígidas; desdobramento
novo da prática habitual e tradicional de militarização das decisões e ações políticas;
incapacidade de os governantes e grupos dominantes modificarem as instituições,
ampliando o debate e a participação dos grupos sociais em formação e conservando o
mando ou o controle da situação; necessidade de transformar o liberalismo formal inerente à
“democracia patrimonial”, em liberalis mo efetivo. Em suma, as lutas políticas travadas a
partir de 1922 estão relacionadas com a necessidade de constituir-se um sistema cultural e
institucional adequado às exigências da sociedade urbano-industrial em formação.
84
No final da década de 30 foi formada a Aliança Liberal, uma composição de forças
político-oligárquicas de Minas, Rio Grande do Sul e Paraíba, em oposição ao Presidente
Washington Luiz (1927-30), que havia rompido a chamada “política do café-com-leite”,
quando preteriu o candidato da vez, o mineiro Antônio Carlos, em favor do paulista Júlio
Prestes. Essa aliança acolheu algumas reivindicações dos movimentos tenentista e operário,
82
Há várias obras sobre o assunto, como, por exemplo: CARONE, Edgar. O tenentismo. São Paulo: Difel, 1975; SANTA
ROSA, Virgínio. O sentido do tenentismo. São Paulo: Alfa-Ômega, 1976, e FORJAZ, Maria Cecília S. Tenentismo e política.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
83
Sobre Coluna Prestes, cf. MEIRELLES, Domingos. As noites das grandes fogueiras: uma história da Coluna Prestes. Rio de
Janeiro: Record, 1995; PRESTES, Anita L. A Coluna Prestes. São Paulo: Brasiliense, 1991.
84
IANNI, 1988: p. 25.
57
a fim de angariar apoios na sociedade.
85
Um dos chefes da Aliança Liberal, Antônio Carlos
de Andrada, costumava dizer: “Façamos a revolução antes que o povo a faça”.
86
Com este
espírito, cooptava as massas e procurava neutralizar qualquer tentativa de participação
popular na política. Segundo Saes: “A Aliança Liberal consagrava [...] o respeito
oligárquico pelas instituições democráticas nacionais, já que as disputas eleitorais e a
conciliação eram os únicos métodos de ação política admitidos ao nível da luta entre as
oligarquias regionais pela conquista da hegemonia política”.
87
A Revolução de 30 consistiu, de fato, numa transformação das estruturas de poder,
mas esta foi operada de cima para baixo.
88
A presença das camadas subalternas neste
cenário também foi uma iniciativa promovida pelas camadas “do alto”. São esses
componentes que permitem explicar o caráter populista dos regimes e da política nacional
nos anos subseqüentes.
No plano internacional, ao término dos anos 20, os Estados Unidos rivalizavam-se
com a Inglaterra no movimento de compra e venda de mercadorias brasileiras, embora os
britânicos ainda dominassem o transporte marítimo e os investimentos. A Alemanha era a
segunda maior transportadora de carga marítima em 1926, mas detinha pouco mais de
metade da tonelagem inglesa, apesar de ser a sua concorrente mais próxima. No campo
militar, “a substituição das missões inglesas pelas missões norte-americanas a partir de
1942, assinala o fim da hegemonia britânica nas relações econômicas externas do Brasil.
Simultaneamente, os norte-americanos empenham-se em ampliar a sua participação nos
programas econômicos brasileiros”.
89
O período de 1945 a 64 é marcado por maior presença de movimentos operários,
organizações de esquerda e setores organizados da população rural, nas questões sociais.
Conforme descreveu Ianni:
85
Cf. ALENCAR, Francisco; RAMALHO, Lúcia Carpi; RIBEIRO, Marcus Venício Toledo. História da sociedade brasileira.
Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985, p. 234.
86
Idem, p. 236.
87
SAES, op.cit., p.80.
88
O tema Revolução de 30 não será desenvolvido nesta tese. Há substanciosa bibliografia sobre o assunto. Sugere-se: FAUSTO,
Boris. A Revolução de 1930. São Paulo: Brasiliense, 1970; MEIRELLES, Domingos. 1930: os órfãos da Revolução. Rio de
Janeiro: 2005.
89
IANNI, 1988: p. 29.
58
Entre 1945 e 1964 entram em cena, em escala bem maior que antes, as massas assalariadas
em geral. A partir do Golpe de Estado contra Getúlio Vargas e o Estado Novo, em 29 de
outubro de 1945, o processo político brasileiro abrange amplamente os operários, os setores
médios da sociedade e os grupos de trabalhadores agrícolas. Isto significa que entram em
jogo as aspirações de bem-estar social de um proletariado cada vez mais numeroso, ao lado
de uma classe-média numericamente crescente. Além disso, colocam-se de modo jamais
conhecido antes as reivindicações dos trabalhadores agrícolas, em várias regiões do país. É
ainda nesse período que se multiplicam os grupos políticos de esquerda; e a juventude
universitária impõe-se ainda mais, como força política ativa e organizada.
90
Relacionado a esse contexto, Francisco Cartaxo Rolim traça um paralelo entre a
história do movimento operário-sindical brasileiro e a história do pentecostalismo,
assinalando como esse movimento religioso contribuiu para afastar seus membros daquele,
mediante pregação de uma obediência quase irrestrita às autoridades, respeito aos patrões e
à lei.
91
A adesão à fé pentecostal, em todo o Brasil, foi facilitada pela ausência de práticas
de mobilização e greves. A Igreja Católica fomentava esse estado de apatia da classe
trabalhadora, visto que a doutrina social do Vaticano e práticas da Ação Católica eram
opostas ao anarco-sindicalismo.
92
A decretação do Estado Novo (1937-45) por Getúlio
Vargas abortou de vez a possibilidade de greves e mobilização dos operários. O regime
controlou de forma paternalista, com legislação outorgada, o movimento sindical. A
legislação obreira pregava harmonia entre patrões e empregados, coincidente com a ética
pentecostal.
93
Essa tutela do Estado sobre os operários gerou um clima de calmaria que veio
a favorecer a expansão pentecostal.
94
O Estado do período de 1930 a 1943 resultava de uma composição heterogênea de
forças: de um lado, um grupo reformista, anti-oligárquico, com a vertente nacionalista do
90
IANNI, op.cit., p. 26.
91
Cf. ROLIM, Francisco Cartaxo. O que é pentecostalismo. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 50-60.
92
Idem, p. 63-4
93
ROLIM, Francisco Cartaxo. Pentecostais no Brasil: uma interpretação sócio-religiosa. Petrópolis: Vozes, 1985, p. 80-1.
94
Idem, 1987: p. 65.
59
tenentismo liderando as insatisfações dos setores que repudiavam a política regionalista dos
coronéis; de outro lado, oligarquias dissidentes, mas praticantes do mesmo modelo de
política coronelista, que não tinham interesse na modernização proposta pela burguesia
industrial ainda incipiente. Em quadro com essa complexidade, estabeleceu-se um “Estado
de compromisso”, como explica Francisco Weffort: “Estamos perante um Estado de
compromisso entre interesses diferentes e às vezes contraditórios, onde nenhum dos grupos
dominantes tem a capacidade de propor-se, à luz do debate político, como seu eixo de
equilíbrio”.
95
A “questão operária” deixa de ser “um caso de polícia”, como havia sido
tratada no passado e se torna uma questão de Estado: “isso representa a absorção da classe
operária nascente nas suas estruturas pela via da legislação do trabalho e do ‘sindicalismo
de Estado’”.
96
Deste modo, um marco importante da política populista foi a promulgação
da Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943, que beneficiou, principalmente, o
operariado industrial. Mais tarde, também sob a égide do populismo, no governo do
presidente João Goulart, foi aprovado o Estatuto do Trabalhador Rural (1963). Ambos os
diplomas legais estavam moldados no modelo de relações capital-trabalho vigentes desde a
era de Getúlio Vargas.
97
A estrutura de concentração da terra em poder de poucos compelia multidões a se
retirarem do campo, mesmo que não fosse esta sua aspiração. A população rural
confrontada com o sistema capitalista aspirava garantir instrumentos e recursos para sua
reprodução local, sem que fosse desarraigada. Havia consciência, nos mais esclarecidos,
que as oportunidades surgidas com a industrialização não podiam absorver todos os
expulsos da atividade agrícola. Nas ligas camponesas, organizadas no início dos anos de
1960, o advogado-militante Francisco Julião conseguiu arregimentar pentecostais. Ele
denunciava a influência conservadora do catolicismo, que favorecia latifundiários e
coronéis, em contraste com o exemplo bíblico dos profetas que condenavam os opressores.
Cartaxo Rolim destaca, também, iniciativas de mobilização popular feitas por pentecostais,
em Pindaré-Mirim (MA) e Parati (RJ), no início dos anos 60
98
.
95
WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003, p. 135.
96
SAES, 1984, p. 88.
97
ROLIM, 1987, p. 46.
98
JULIÃO, Francisco. Pasquim, nº 497, 05.11.1979. Entrevista.
60
A luta pela reforma agrária pretendia criar um enorme contingente de pequenos
proprietários, cujo papel, como agentes de transformação social, era assim avaliado por
Ianni:
No primeiro momento, eles são “revolucionários” em suas lutas pela posse da terra e o
enfraquecimento do poder econômico e político dos latifundiários. Mas no segundo
momento serão inevitavelmente conservadores, devido à relação de propriedade que
substitui a anterior. A posse da terra esgotará as motivações políticas anteriores. Trata-se de
uma proposição típica do socialismo reformista.
99
Já em 1959, Celso Furtado trouxe uma análise das possibilidades e limitações da
caatinga e do agreste, mostrando como os modelos indiscriminados de reforma agrária
propostos seriam desastrosos, caso não fossem pensados especificamente para as condições
ecológicas, culturais e de estrutura sócio-econômicas ali já postas. Na caatinga, escrevia
ele, a divisão da terra seria prejudicial tanto para a agricultura como para a pecuária,
podendo provocar o despovoamento da região, devido à pobreza do solo e escassez de
água. Já no agreste, havia necessidade de aglutinar terras extremamente subdivididas. Desta
maneira, Furtado defendia unidades produtivas de, pelo menos, 25 e 20 hectares,
respectivamente, para essas regiões, a fim de torná-las viáveis, economicamente
100
.
Acerca do quadro partidário da época, pode-se afirmar que refletia essas
características de mescla entre a velha sociedade oligárquica e a nova conformação urbano-
industrial.
A Constituição de 1946 estabeleceu o regime dos partidos nacionais. Entretanto, em larga
escala, eles funcionaram segundo os interesses locais e regionais. Em muitos casos, as
oligarquias continuaram seu predomínio, ainda que formulando os seus compromissos e
criando novas técnicas de atuação. O exame das coligações entre partidos, realizadas nas
várias eleições havidas depois de 1945, revela a multiplicidade das combinações possíveis.
Os programas jamais são obstáculos intransponíveis. Tanto assim que os partidos chegam a
ser definidos como sendo de direita ou esquerda, conforme a região ou estado do país, e
independentemente da sua definição no plano federal.
101
99
IANNI, 1988: p.47.
100
FURTADO, Celso. A Operação Nordeste. Rio de Janeiro: ISEB, 1959, p. 57 e 59-60, apud Ianni, 1988: p.49.
101
IANNI, 1988: p.60, grifado originalmente.
61
A política de massas produziu rupturas parciais entre a sociedade tradicional e a
sociedade urbano-industrial. Devido ao seu conteúdo nacionalista, de autonomia no plano
internacional, também acirrou ânimos de representantes da burguesia que pretendiam
associar o projeto desenvolvimentista aos capitais externos. Em 1954, o antagonismo entre
nacionalistas e defensores da integração internacional do País, via dependência de capitais
externos atingiu o auge. As pressões contra o governo de Getúlio Vargas e seu suicídio
evidenciam a vitória dos defensores do projeto internacionalista. Cumprida a transição,
Juscelino Kubitschek assume, tendo que conciliar os interesses de uma política integrada ao
capital externo com a herança da política de massas deixada pela era Vargas.
1.2.2 O golpe de Estado em 1964
As soluções autoritárias para os problemas históricos da sociedade brasileira foram
viabilizadas mediante manobras que aliciaram as classes médias. Segundo Ianni:
A classe média revelou-se a massa mais dócil às soluções autoritárias. Desde os momentos
áureos da política de massas, ela já vinha sendo preparada para aderir ao autoritarismo. Em
boa parte, o ademarismo, o janismo e o lacerdismo são as manifestações da política de
massas no seio da classe média: são amplamente aceitos nesse meio social.
102
A queda do governo de João Goulart foi antecedida de sucessivas mobilizações nas
principais metrópoles, que apelavam para valores tradicionais, como família, religião e
pátria: exemplo disto foram as chamadas “Marchas da Família com Deus, pela Liberdade”.
Elegeram-se como inimigos o comunismo e a corrupção. Nos bastidores dessas
mobilizações estavam interesses geopolíticos dos Estados Unidos da América e uma
operação político-militar, cujo fim último era a construção de um novo modelo econômico,
integrado ao capital internacional. Para Ianni:
Em boa parte, essas são as massas do ademarismo, janismo e lacerdismo.
Ambicionam a ascensão social a qualquer preço. O seu universo cultural e mental está
impregnado dos valores e padrões da classe dominante, os quais se difundem nos programas
de televisão e cinema, nas revistas e jornais. Por isso, vê nas lutas e reivindicações do
proletariado um perigo para as suas ambições. A massa operária atemoriza a massa da classe
média. Em conseqüência, esta se apega mais facilmente às soluções autoritárias, que alguns
102
Idem, p. 115.
62
setores da classe dominante lhe apresentam. Para amplos segmentos da classe média, o jogo
democrático (particularmente a existência e o funcionamento do Congresso Nacional, das
Assembléias Estaduais e mesmo das Câmaras Municipais) é encarado em termos dos seus
custos financeiros. Ao menos, aceitam essa argumentação. Por isso, também, anseiam por
esquemas ditatoriais. Por esse modo colocam-se freios às ambições da massa operária, ou
aos seus porta-vozes.
103
A sensibilização da classe média decorria de suas aspirações não correspondidas
pela capacidade de atendimento do sistema.
104
A escolarização e participação política
tornava esses setores mais exigentes, sem que desfrutassem de uma partilha melhor das
riquezas produzidas no país. Com essa classe estavam os militares que se sentiam
preteridos nos ajustes salariais, desde a época de Vargas, pois este lhes concedera aumento
de 230,5%, em 1951, mas não conseguira repetir a dose, quando Goulart era seu Ministro
do Trabalho, visto que aumentou seus soldos em “apenas” 93,5%.
Enquanto militares e demais segmentos médios se uniam e marchavam, o governo
populista de João Goulart acompanhava e apoiava as mobilizações do proletariado urbano.
Em 13 de março de 1964 foi realizado um comício na praça da (Estrada de Ferro) Central
do Brasil, no Rio de Janeiro, com a presença do próprio presidente da República, seus
ministros de Estado, lideranças sindicais e de outros movimentos. A tônica do evento foi a
defesa das chamadas reformas de base.
Essa presença freqüente das forças armadas, tão atuantes na vida política brasileira,
foi sempre um fator de desestabilização das instituições democráticas, mas era considerado
como algo normal pelos setores conservadores e reacionários:
A militarização da política é um fato normal na vida política brasileira. Por ocasião
de acontecimentos históricos importantes, os militares surgem como forças decisivas, ao
encaminhar, apressar, controlar ou obstar o desenrolar dos acontecimentos. Os movimentos,
as revoltas, as revoluções e os golpes que assinalam a época posterior à Primeira Guerra
103
Idem, p. 117.
104
Fábio Wanderley Reis chama a atenção para este tipo de “ingovernabilidade de sobrecarga”, quando as
demandas sociais se tornam crescentes e ultrapassam a capacidade de resposta dos aparelhos de governo. (Cf.
REIS, F. W. Dilemas da democracia no Brasil. In: AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antônio Octávio (orgs.).
Sistema político brasileiro: uma introdução. Rio de Janeiro: Konrad-Adenauer-Stiftung; São Paulo: Unesp,
2004, p. 391-409).
63
Mundial não podem ser compreendidos se não se explica como as forças militares
participam dos acontecimentos.
105
Os detentores das armas são sempre lembrados pelos que estão no poder e pelos que
o aspiram, em sociedades onde valores e práticas democráticas não estão fortemente
estabelecidos. Se os partidos políticos não têm ampla representatividade, a opinião pública
é induzida a acolher soluções golpistas. No Brasil, houve golpes de Estado sucessivos, em
1937, 1945, 1955, 1961 e 1964, sob a égide de militares. No entanto, esta explicação de que
os golpes acontecem porque as instituições políticas não estão consolidadas é insuficiente.
O golpe de 1964 conjugou objetivos estratégicos de agentes do capital financeiro-industrial
transnacional com agentes locais do capital dependente-associado a preocupações da elite
militar com a manutenção da ordem e a necessidade de, na lógica dessa elite, subordinar a
questão social aos objetivos nacionais. Dizendo de forma específica, os militares tratavam a
questão social sob a égide da “doutrina da segurança nacional”. Eles entendiam que as
“reformas de base” propostas pelo governo de João Goulart, a serem implantadas “na lei ou
na marra” como proclamavam vozes mais exaltadas dos movimentos populares, abririam a
sociedade brasileira para o movimento de expansão do comunismo soviético. A agência de
inteligência dos Estados Unidos (CIA) também compartilhava desse tipo de preocupação
geopolítica e contribuiu com seus serviços para o desencadeamento do golpe.
106
Os militares não formavam um bloco coeso do ponto de vista ideológico. Havia os
que defendiam uma política econômica nacionalista, com ênfase na substituição de
importações e na constituição de empresas estatais para setores estratégicos como petróleo,
siderurgia, energia elétrica, etc. Havia, também, os que eram simpáticos à associação com o
capital internacional, visando acomodar os diferentes interesses em jogo. A corrente
105
IANNI, 1988: p. 119.
106
Cf. DREIFUSS, René Armand. 1964: a conquista do Estado: ação política, poder e golpe de classe. Petrópolis: Vozes, 1981.
64
vitoriosa em 1964 foi esta última, que conduziu o golpe como forma de harmonizar
interesses econômicos, empresariais e políticos rumo à consecução de um modelo de
desenvolvimento integrado à economia global. Para os militares, era inconcebível permitir
que o Brasil enveredasse numa guerra revolucionária, com vistas a implantar uma república
sindicalista. Seria uma forma de democracia populista trazendo desdobramentos
inesperados e intoleráveis para a classe dominante do País.
Na administração norte-americana, o interesse pela consolidação das democracias
latino-americanas perdia força diante da suposta ameaça de propagação de novas
experiências políticas com ampla participação popular, como a que ocorreu em Cuba
(1959) e as que se realizaram posteriores ao golpe militar brasileiro, no Chile (1972) e
Nicarágua (1979). A prioridade dos Estados Unidos era manter seu controle político,
militar e econômico, sobre toda a América Latina, mesmo que isto significasse sacrificar
sistemas democráticos e promover ditaduras sanguinárias. O período que abrange Primeira
e Segunda Guerra Mundial experimentou a mudança do centro do sistema capitalista da
Inglaterra para os Estados Unidos. O golpe de 1964 estaria no final desse longo processo de
passagem do Brasil do campo de influência da libra esterlina para o espaço de controle do
dólar. Aquele momento histórico correspondia ao esgotamento do ciclo industrial de
substituição de importações, ciclo econômico este que incluía uma política externa
independente e que teve como seu grande mentor Getúlio Vargas, amplamente apoiado pela
massa trabalhadora.
A dependência da economia brasileira aos capitais internacionais, de forma
vantajosa para estes, começou no curto período da gestão Café Filho, após o suicídio do
presidente Vargas, mas ganhou força no governo de Juscelino Kubitschek, que o
sucedeu.
107
A guerra fria levou os EUA a formular políticas de ajuda e monitoramento das
nações latino-americanas sob a égide da “Aliança para o Progresso”. URSS e EUA haviam
estabelecido um novo “Tratado de Tordesilhas”, ao repartirem o planeta em duas áreas de
influência para cada um.
107
“Em 1955 o governo de Café Filho apresentou a famosa Instrução 113, da Superintendência da Moeda e do Crédito
SUMOC, permitindo que corporações multinacionais importassem equipamento por um preço 45% abaixo das taxas e isentando-
as da ‘cobertura cambial’ necessária à importação de maquinário, benefício este não desfrutado por firmas brasileiras”.
(DREIFUSS, 1981, p. 33).
65
Segundo Ianni, o golpe de 1964 foi uma operação político-militar destinada a
cumprir os seguintes objetivos:
a) Afastar o risco da tomada do poder pela esquerda; ou por grupos de nacionalistas
exaltados, adeptos da política externa independente e da doutrina do “Brasil Potência”.
b) Controlar as conseqüências negativas da inflação, restaurando o seu caráter de técnica de
poupança monetária forçada (inflação de rendimentos) e liquidando os mecanismos (política
de massas) que a fazem funcionar como inflação de custos.
c) Reintegrar o Brasil no sistema capitalista mundial (a “Civilização Ocidental”), segundo as
determinações da estratégia baseada na geopolítica, formulada com fundamento no
predomínio dos Estados Unidos e na hipótese de futura guerra total.
d) Finalmente (e em síntese), restaurar a integridade e a integração dos poderes político e
econômico, parcialmente dissociados nos últimos anos de vigilância da democracia
populista.
108
Desde 1930, o país passara por diversas mudanças. O fato que mais influiu para
estabelecer esse marco foi a grande crise da bolsa de Nova York, em 1929, responsável por
atingir a exportação de café e abalar o modelo agrário-exportador-oligárquico até então
prevalecente no país. A Segunda Guerra Mundial, uma década depois, contribuiu para
acelerar o esforço industrial com vistas à substituição de importações. Nos anos de 1950,
este esforço acelerou-se, com a implantação da indústria automobilística e, nos 70, com a
indústria pesada, petroquímica e outras.
Emilio Willems trata do comportamento político de protestantes e pentecostais,
comparando Brasil e Chile, no período aproximado de 1935 a 1965.
109
Em ambos os países,
a união da Igreja Católica com o Estado colocava as minorias evangélicas na
marginalidade. No Chile, esses vínculos eram mais fortes e perduraram até 1925, cerca de
35 anos depois de terem sido revistos na constituição republicana brasileira. A presença
insignificante de protestantes nessas sociedades dissuadia-os de participarem da vida
pública, reforçada pela má reputação que o senso comum atribuía à prática dos atores
políticos. Deste modo, a abstenção neste campo social era consistente com sua retirada das
atividades “mundanas”. Segundo Willems, nas décadas analisadas, essa atitude absenteísta
108
IANNI, 1988: p. 132
109
WILLEMS, 1967.
66
mudou, em função dos processos de democratização gradual e da abertura para grupos
minoritários se protegerem contra a discriminação, situações que ocorreram em compassos
e dinâmicas diferentes nos dois países.
Willems compara as instituições partidárias, percebendo-as mais centralizadas no
Chile e mais regionalizadas no Brasil, mais ideológicas no primeiro e mais fluidas no
segundo. No Brasil, a participação poderia ter sido mais efetiva, contudo o interregno
totalitário de 1937 a 1945 impediu essa atividade, que passou a ser exercida nos anos
seguintes. Mesmo assim, nas décadas mencionadas (1935-65), verificou-se um crescimento
da população protestante brasileira e um reconhecimento desta como força a ser levada em
conta nos embates eleitorais.
Quando Willems realizou seu trabalho, o pentecostalismo ainda era um subgrupo
marginal. A participação pentecostal era acanhada, comparada com sua presença de maioria
entre os evangélicos em geral e os parlamentares evangélicos, por exemplo, na Câmara
Federal e em muitos parlamentos estaduais e municipais, espalhados pelo Brasil, a partir do
final dos anos de 1980. Não havia, ainda, nos anos 60, o movimento neopentecostal e seus
agentes políticos, que surgiram em meados dos anos 70 e se tornaram um grande segmento
nos anos seguintes.
Sobre essa presença insignificante, transformada em ocupação estratégica, no curso
de apenas três ou quatro décadas, acrescenta-se a seguir o que escreveram pesquisadores
mais recentes. Campos, Freston e Mariano
110
indicam que o precursor das investidas
pentecostais na política foi Manuel de Mello, fundador da Igreja Pentecostal “O Brasil para
Cristo”, quando, no final dos anos 60, conseguiu eleger Geraldino dos Santos e Levy
Tavares, deputado estadual e federal, respectivamente. Lembra Campos que o
neopentecostalismo qualifica seus atores no cenário público com o rótulo “de Cristo”: há os
“atletas de Cristo”, os “artistas de Cristo” e, também, “os políticos de Cristo”, além de
outros, não necessariamente com o mesmo dístico, porém com o mesmo sentido.
110
Cf. CAMPOS, Leonildo S. De “políticos evangélicos” a “políticos de Cristo”: la trayectoria de las acciones y mentalidad política
de los evangélicos brasileños en el paso del siglo XX al siglo XXI. In: Ciencias Sociales y Religión. Porto Alegre, n. 7, p.157-86,
set. 2005; FRESTON, 1993, p. 164 e 171; MARIANO, 1999, e o próprio WILLEMS, 1967.
67
Segundo Mariano, exemplos da presença evangélica com predominância pentecostal
e neopentecostal são registrados na política, nos esportes e na mídia.
111
No caso da
Assembléia de Deus, representada por seus dois ramos principais (Missão e Madureira)
112
,
Mariano considera os respectivos esforços para acompanhar mudanças no campo
pentecostal e na sociedade da seguinte maneira: “Seu recente e deliberado ingresso na
política partidária e na TV, em busca de poder, visibilidade pública e respeitabilidade
social, ao lado de outras transformações internas, sinaliza de modo irrefutável sua tendência
à acomodação social, à dessectarização”.
113
Mariano dedica um capítulo de sua obra à
Igreja Universal do Reino de Deus e registra o envolvimento dela na política, desde 1986,
quando Roberto Augusto Lopes, um dos fundadores, foi eleito deputado federal
constituinte, pelo PTB, com a maior votação alcançada no Rio de Janeiro (54.332 votos),
na quele ano.
O crescimento da população pentecostal e sua participação como reduto eleitoral se
fizeram presentes numa sociedade já urbanizada, visto que população brasileira se
urbanizou, desde a metade do século XX, de modo que, em 2000, cerca de 80% dos
brasileiros estavam concentrados em cidades. Cresceu o eleitorado, tanto em termos
absolutos como relativos: em 1960, votaram 18% de brasileiros; em 1980, foram 47% os
votantes. A Constituição de 1988 restaurou o voto dos analfabetos, mais de cem anos
depois de terem sido expropriados desse direito. A idade mínima para o exercício do direito
de votar recuou para os 16 anos. Em 2004, o eleitorado abrangia quase 70% de todos os
brasileiros. O processo democrático sofreu interrupções nos períodos de 1937-45 e 1964-
85, marcados pelas ditaduras do Estado Novo e dos militares, respectivamente.
No que tange às relações entre esfera pública e esfera religiosa, a Igreja Católica,
após o golpe de 64, passou a exercer papel crítico importante, contribuindo tanto para a
conscientização de seus fiéis como para a mobilização de alguns, através, principalmente,
das comunidades eclesiais de base, que tiveram papel destacado para a retomada da
democracia, pós-regime militar. Segundo Campos:
111
MARIANO, op.cit., p. 15-7.
112
A Assembléia de Deus da Missão se refere às igrejas da Convenção Geral das Assembléias de Deus do
Brasil (CGADB) e a Assembléia de Deus Madureira identifica as igrejas da Convenção Nacional de
Assembléias de Deus do Brasil (CONAMAD).
113
MARIANO, 1999, p. 30.
68
Após 1968, iniciou-se um distanciamento da Igreja Católica brasileira daquele papel que
tradicionalmente lhe cabia na legitimação da ordem político-econômica estabelecida. A
opção preferencial pelos pobres” fez com que essa Igreja assumisse posturas contrárias aos
regimes militares na maioria dos Países latino-americanos. Enquanto isso, os demais grupos
religiosos, especialmente os evangélicos, optavam pelo silêncio ou, quando não, em alguns
casos, pelo apoio simpático, aberto e ostensivo aos regimes militares vigentes.
114
Robinson Cavalcanti sugere que os evangélicos foram atraídos pela possibilidade de
ocuparem o vazio deixado pela retirada dos católicos do espaço palaciano, mas que houve,
também, cooptação através de práticas clientelistas:
Encantados com o “desenvolvimento” e a “segurança”, bem como com a “liberdade
religiosa”, os evangélicos vão se tornando, a partir da década dos 70 (juntamente com os
maçons e os kardecistas) em sustentáculos civis do regime. Compreendendo a perda dos
“passageiros” católicos-romanos progressistas, o regime procura investir ao máximo nos
protestantes: visitas de cortesia, empregos, convênios, nomeações para cargos importantes,
convite para pastores cursar a ESG, etc. [...] Os evangélicos, sempre no passado uma
maioria (sic) discriminada, que por tanto tempo orara pelo livramento, saúda de bom grado a
nova situação, uma verdadeira “bênção”, e seguem inexoráveis no caminho da
constantinização.
115
A análise desse comportamento adesista continua, abrangendo diversos
ingredientes, desde a condição de marginalizados, a suposta ingenuidade e falta de
conhecimento dos evangélicos acerca das lides políticas, até uma particular interpretação
bíblica dos acontecimentos, alimentada por preconceitos das igrejas contra o comunismo
ateu. Nas palavras de Cavalcanti tem-se a seguinte avaliação:
A ingenuidade, o baixo nível de instrução, a reduzida experiência política, a credulidade,
tornam os evangélicos presas fáceis, cordeiros nas mãos de lobos. Nem todos eram assim
inocentes, e muitos vão perdendo a inocência no caminho, maculados por benesses e
mordomias, co-autores de delito, manipuladores de seus irmãos. O anti-politicismo vai, aos
poucos, sendo substituído pelo adesismo. Participar da política é válido, desde que seja a
favor do Governo. Rapidamente Romanos 13, com sua original interpretação, é promovido a
“texto áureo” dos evangélicos da ARENA-PDS. Votar na Oposição passou a se constituir
114
CAMPOS, Leonildo Silveira. Protestantes na primeira fase do regime militar brasileiro atos e retórica da Igreja Presbiteriana
Independente (1964-1969). Estudos de Religião, São Bernardo do Campo (SP), Ano XVI, n. 23, p. 83-140, jul./dez. 2002, p.
106.
115
CAVALCANTI, Robinson. Cristianismo e política: teoria bíblica e prática histórica. São Paulo: Nascente, 1985, p. 215.
69
em um pecado. Uma visão maniqueísta passou a ver a Oposição constituída de “maus”: os
comunistas. Na maioria das igrejas, quem não pensasse assim seria perseguido ou posto “no
gelo”. O protestantismo, ex-arauto da democracia e do progresso, veste a roupa do
integrismo e da Contra-Reforma. Um Protestantismo Tridentino, por sui generis que pareça,
foi o que passamos a conhecer.
116
1.2.3 Uma elite contra-reformista
Na perspectiva de Bernardo Sorj, a história brasileira revela duas características em
seu sistema institucional: primeira, a fragilidade e obsolescência de suas instituições pela
falta de recursos materiais e políticos e pelo uso patrimonialista que a elas é dado, e,
segunda, a disposição e flexibilidade para criar novas instituições, sem, necessariamente,
substituir de forma total as mais antigas.
117
Há uma aparência de flexibilidade e mudança,
mas o que prevalece é a persistente acomodação de interesses das elites com o propósito de
perpetuar seus privilégios.
Os pentecostais reproduzem este comportamento elitista, como se pode apreender
da análise de Paul Freston
118
, apresentada em forma de resumo a seguir:
A partir da campanha para o Congresso Constituinte (1986), os pentecostais vêm
elegendo candidatos oficiais: de 1987 a 1995, a Assembléia de Deus e a Igreja Universal
elegeram cerca de 40 parlamentares ao Congresso Nacional. A maioria deles tem vínculo
com a mídia, alguns são concessionários e outros apresentadores de programas evangélicos.
Os candidatos pentecostais são assim tipificados por Freston: “... são: homens proeminentes
na igreja como evangelistas, cantores ou apresentadores de programas; filhos ou genros de
pastores-presidentes; e empresários pentecostais que fazem acordos com seus líderes
eclesiásticos”.
119
Os beneficiários dessa presença na política são as cúpulas eclesiásticas.
Fortalece-se o poder familiar, o status público e as posições intra-eclesiásticas.
116
Idem, p. 216.
117
SORJ, 2001: p. 23.
118
Cf. FRESTON, Paul. Entre o pentecostalismo e o declínio do denominacionalismo: o futuro das igrejas históricas no Brasil. In:
CAMPOS, Leonildo Silveira; GUTIÉRREZ, Benjamin F. (org.). Na força do Espírito: os pentecostais na América Latina:
um desafio às igrejas históricas. São Paulo: AIPRAL/ Pendão Real, 1996, p. 257-75.
119
FRESTON, 1996, p. 261.
70
Os pastores pentecostais são donos de fato do poder político nas denominações
religiosas, não obstante o discurso igualitário e anticlerical que utilizam. Ainda que, neste
particular, guardem semelhança com outros políticos populistas, sofrem marginalização por
parte da sociedade. “A conexão pública ajuda a estruturação interna, fortalecendo posições
e organizações. A política também facilita o acesso à mídia, outro forte elemento de
estruturação de lideranças no mundo evangélico”.
120
A presença na política contribui,
adicionalmente, para ter acesso a recursos que servem de reforço em benefício desse campo
religioso popular.
Como alternativa a esta análise é interessante examinar outra perspectiva de conduta
política, desta vez focada em grupos neopentecostais, segundo o olhar do antropólogo Luiz
Eduardo Soares
121
. Este autor escreveu algumas reflexões sob impacto dos resultados do
Censo Institucional Evangélico de 1992,
122
realizado pelo Núcleo de Pesquisa do ISER,
que registrou um espetacular crescimento das igrejas pentecostais na região do Grande Rio.
No texto há uma abordagem das práticas agressivas do neopentecostalismo contra as
religiões afro-brasileiras, cujo exorcismo teatral e exibicionista se posiciona contra as
entidades dos terreiros, de modo que “atualiza uma integração orgânica com o antagonista,
orquestrando uma espécie de harmonia contrapontística”.
123
Essa forma de “orar com o
inimigo” indica o reconhecimento das entidades espirituais que integram o panteão dos
credos afro-brasileiros, por parte dos neopentecostais. Ao desencadear essa guerra
espiritual, o neopentecostalismo coloca o inimigo em relação igualitária, ainda que o
classificando nas hostes demoníacas. A tradição religiosa brasileira, na vertente majoritária
católica, embora tivesse seu ritual discreto e especializado para lidar com possessões
satânicas, tratava com desprezo e arrogância esses cultos considerados inferiores.
Os protestantes tradicionais consideravam as manifestações pentecostais produtos
do obscurantismo e indício da condição pré-moderna de seus irmãos “menos esclarecidos”
120
Ibidem.
121
Cf. SOARES, Luiz Eduardo. Dimensões democráticas do conflito religioso no Brasil: a guerra dos pentecostais contra o afro-
brasileiro. In: ______. Os dois corpos do presidente e outros ensaios. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993, p. 203-216.
122
Em 1992, o ISER realizou o Censo Institucional Evangélico, quando constatou a existência de 4 mil instituições evangélicas na
área metropolitana do Rio de Janeiro. Nos três anos anteriores haviam sido publicados no Diário Oficial registros de fundação de
710 novas igrejas, das quais 91,26% eram pentecostais e 80% delas situavam-se em áreas carentes. Em 1994, foi feita nova
pesquisa, durante as eleições presidenciais, com visitas a 40.172 domicílios e realização de 1332 entrevistas. (FERNANDES,
op.cit., p. 9-10).
123
SOARES, 1993, p. 204.
71
numa sociedade que não se modernizou completamente. Em tempos mais recentes, com o
advento de estudos acadêmicos sobre as religiões afro-brasileiras, passou-se a tratá-las
como objetos exóticos e ricos em simbologia, sinais da resistência de etnias e culturas
oprimidas. Esses aportes teóricos, em contexto de uma nova sociedade que reconhece sua
composição complexa, incentivaram atitudes de tolerância dos agentes religiosos
estabelecidos em classes superiores, o que já apontou um avanço, pois, até pouco tempo, as
elites, religiosas ou seculares, tratavam as religiões afro-brasileiras como caso de polícia,
haja vista a exigência de licença da autoridade policial para que os terreiros funcionassem,
requisito não considerado para outras religiões. Sobre esta mudança, Soares tece o seguinte
comentário:
Lembrando Tocqueville e Dumont, não seria impróprio sugerir que a tolerância dos
que não sentem a própria superioridade ameaçada expressa relações típicas de uma ordem
sócio-cultural de corte hierárquico, enquanto a disputa palmo a palmo, corpo a corpo, sem
tergiversações ou concessões, com o recurso a um estoque comum de idiomas rituais,
formas expressivas e linguagens religiosas (como é o caso da guerra religiosa popular
urbana, no Brasil contemporâneo), representa a emergência contundente de uma nova
configuração sociológica, de orientação igualitária, em cenário político-cultural que se
democratiza.
124
O reordenamento do campo religioso brasileiro nessas duas últimas décadas
(aproximadamente de 1985 a 2005) privilegia o “encontro de iguais”. Isto pode
corresponder ao abandono, de parcela da população, do paradigma hierárquico de relações,
da integração vertical, indispensável “para a preservação do poder das elites, para sua
moderada renovação sob tutela (ou por recrutamento do tipo paretiano) e para a limitação à
mobilidade ascendente”.
125
É fato notório que essa relação igualitária ocorre entre membros
das classes subalternas, “a guerra religiosa no interior das camadas populares é o maior
sinal de que, no Brasil pós-ditadura, as classes subalternas se aproximam e se ligam entre
si, organicamente, através, mais uma vez, da principal de suas linguagens, a
religiosidade”.
126
Ou seja, há muito em comum nesses grupos que se encontram: são, em
sua maioria, pessoas excluídas do campo político, seja pela informação negada ou
distorcida, seja pelo desinteresse ou revolta contra os atores dessa atividade; são excluídos
124
SOARES, 1993, p. 206
125
Ibidem.
126
Idem, p. 207.
72
do consumo, devido ao desemprego, subemprego e condições desumanas de vida, e, em
conseqüência de tudo isto, terminam excluídos da cidadania.
A nova integração conflituosa com os pentecostais obriga adeptos das religiões afro-
brasileiras a saírem da confortável subserviência ao branco protetor e a entrarem no vale-
tudo da competição religiosa. Soares identifica uma crise de hegemonia católica, composta
de dois movimentos: (1) Deslocamento progressivo do imaginário e da linguagem católicos
para o universo de imagens e vocabulário pentecostal. Antes o afro-brasileiro se protegia
sob o manto do sincretismo. Agora, frente ao militante pentecostal, ele é interpelado a
defender suas crenças, valores e práticas, com armas do confronto verbal e simbólico, sem
aquele guarda-chuva da tolerância, dos intelectuais e religiosos. Não se pode esquecer que
o próprio catolicismo também está sendo interpelado pela nova “avalanche pentecostal”. (2)
Deslocamento do catolicismo como centro articulador do universo dos pobres. Soares
conclui com uma questão instigante, que poderá, futuramente, ser transformada em
proposta de pesquisa:
Lutando contra seus próprios pares, do ponto de vista da estrutura de classes, vivem
seus desígnios e identificações com ardor inusitado, tomando-se mutuamente como
referência e invertendo a ordem brasileira multi-secular: o igualitarismo segmentar popular
substitui o patrimonialismo e a verticalidade estamental. As implicações políticas deste
processo não devem ser subestimadas. Quando elites deixam de dirigir a cultura, correm o
risco de ceder o comando político.
127
Em sua tese de doutorado, acerca do sentido contra-reformista da elite brasileira,
Elenise Scherer
128
começa fazendo alusão ao debate de 1898, entre Eduardo Bernstein e
Rosa de Luxemburgo, sobre reforma versus revolução, como processos alternativos para o
encaminhamento de mudanças numa sociedade. Scherer concorda que a primeira
alternativa, o reformismo, se tornou hegemônica no movimento operário ocidental, através
da social-democracia, mas também assinala que essa via não permite um salto do
capitalismo para o socialismo, embora seja capaz de trazer melhorias sociais, nada
desprezíveis, para os trabalhadores, além de favorecer alguns avanços democráticos.
127
Idem, p. 214.
128
A tese resultou na publicação do livro: SCHERER, Elenise. Tempo de contra-reforma. Manaus: Valer, 2000.
73
Não obstante, tomando-se em conta os acontecimentos das décadas de
redemocratização da América Latina, anos 80 em diante, ocorreu uma transfiguração do
sentido de reforma, caracterizado por políticas monetaristas de liberação financeira e
comercial, privatização de empresas estatais, controle da economia por agentes de
regulação externa, notadamente Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial e
Organização Mundial de Comércio, e fortalecimento do Executivo, que passou a governar
com “medidas provisórias”, uma forma de decreto que, praticamente, impõe fatos
consumados sobre o Legislativo, reduzindo sua margem de manobra e tolhendo seu papel
no Estado democrático. Este foi o preço pago pelos países subdesenvolvidos para se
integrarem ao novo desenho da economia global. Essas ditas “reformas estruturais” faziam
parte do receituário do FMI e Banco Mundial (BIRD), para conformar o Estado ao
paradigma de “Estado mínimo”. No caso brasileiro, as reformas previdenciária e fiscal
foram anunciadas de forma radical, mas não foram completadas, devido ao jogo de
acomodação de interesses das frações burguesas em disputa. Neste contexto, políticas
sociais de caráter populista antigas deram lugar a políticas focalizadas em públicos-alvos
específicos (de gênero, etnias etc.) ou em segmentos mais pobres (através de programas
como o Comunidade Solidária e o Fome Zero), com investimentos irrisórios, se forem
comparados com os serviços das dívidas interna e externa pagos à banca nacional e
internacional.
O cenário de “reformas” apontou retrocesso no movimento dos trabalhadores, com
perda de conquistas históricas. No âmbito mais geral, produziu enfraquecimento do sistema
democrático, pois debilitou algumas forças sociais no conjunto que determina a condução
política do País. Em breve retrospecto, Scherer reconhece que as classes dominantes do
Brasil nunca tiveram vocação reformista, no sentido clássico do termo. “As reformas
realizadas, na formação social brasileira, foram feitas pelo ‘alto’, sendo, portanto,
incompletas”
129
O discurso de Scherer se sustenta em correntes marxistas do pensamento
sociológico brasileiro, pois utiliza conceitos como “contra-revolução burguesa” (Octavio
Ianni), “revoluções interrompidas” e “democracia restrita” (Florestan Fernandes),
“conciliação pelo ‘alto’” (Carlos Nelson Coutinho), para apontar a estratégia de
modernização conservadora, que Lênin denominava “via prussiana”, pois se tratava de
129
SCHERER, op.cit., p. 13-17.
74
(re)arranjos sociais conduzidos por frações burguesas, sem participação ativa de camadas
subalternas da população, à semelhança do que aconteceu na Alemanha em final do século
XIX.
Scherer discorre, brevemente, sobre a revolução populista passiva da era Vargas, os
desdobramentos políticos posteriores, o regime militar de 1964, a retomada do processo
democrático e a elaboração da Carta Constitucional de 1988, na qual Florestan Fernandes
reconhecia avanços sociais, mas declarava que estes não desembocariam numa sociedade
civil civilizada, porque não se instalara a convivência de classes antagônicas e o consenso
acerca de problemas de interesse comum. Após esTa reflexão, Scherer conclui que as elites
econômicas brasileiras são “destituídas de cultura cívica, razão por que tendem a colocar
seus interesses e privilégios particularistas acima de tudo”.
130
São feitas revisões
constitucionais para manter a estabilidade política, mas cada constituição já nasce atrasada,
porque, o que se verifica “é a reposição do velho e tradicional padrão oligárquico e
patrimonialista da gestão da coisa pública”.
131
Estabelecido esse quadro de interpretação, Scherer se propõe a investigar
algumas particularidades sem perder a perspectiva de totalidade da
formação social brasileira, ou seja, os processos sociais que obstaculizam
as reformas, na sua historicidade: a contratualidade (in)conclusa; as
estratégias de conciliação e as (contra)reformas; a indistinção entre o
público e o privado como óbice para a construção da esfera pública, na
trama das relações sociais que a determinam.
132
Interessa nesta tese confrontar o comportamento de parlamentares e líderes
pentecostais com aspectos da cultura política brasileira, mencionados por Scherer. Segundo
ela, “os arranjos políticos pelo ‘alto’ tornaram-se (...) uma estratégia que faz parte da nossa
cultura política”, ou seja, “os donos do poder consolidaram padrões de dominação, face aos
130
SCHERER, 2000, p. 24.
131
Idem, p. 23.
132
Idem, p. 27, grifado no original.
75
setores da classe subalterna”.
133
Mais adiante Scherer explica como funciona essa
dominação, através do clientelismo. Também menciona que “os donos do poder recorrem à
conciliação em momentos em que as estruturas de poder encontram-se em risco”, como
ocorreu no golpe militar de 1964, na articulação do Colégio Eleitoral para a escolha de
Tancredo Neves e José Sarney (Presidente da República e Vice), como forma de
esvaziamento da campanha popular pelas eleições diretas, na ampliação do mandato de
José Sarney para cinco anos e na “coalizão partidária de 1994, que elegeu o quarto governo
da transição democrática”.
134
1.2.4 Evangélicos na política: avaliação (1960)
Antes de focar a prática recente dos pentecostais, convém lembrar a conduta de
parlamentares evangélicos, levantada por Emilio Willems, no início dos anos 1960: O autor
entrevistou 36 pastores da Igreja Presbiteriana do Brasil, sobre participação política,
direitos civis, escolha de partidos e presença de evangélicos nos parlamentos. Destaque foi
dado à atuação política do fundador da Igreja Pentecostal O Brasil para Cristo, pastor
Manoel de Mello, porque este apoiou, decisivamente, a eleição de um deputado federal, um
deputado estadual e 72 vereadores, todos do Estado de São Paulo. Essa militância de um
líder pentecostal foi contrastada com a “greve social” da Congregação Cristã no Brasil, que
sempre proíbiu seus membros de participarem como candidatos a eleições.
A avaliação dos pastores acerca do comportamento dos parlamentares evangélicos
foi bastante positiva, registrando-se, apenas, uma resposta divergente. No conjunto, 35
pastores concordaram virtualmente que os legisladores protestantes: "não defendiam
interesses pessoais"; eram "não sectários" no exercício de seu mandato; "defendiam a
liberdade de consciência"; tinham "mais respeito para com os direitos humanos"; estavam
dispostos a assumir "mais responsabilidade moral"; trabalhavam por uma “administração
honesta”; “trabalhavam mais”; "estavam mais interessados em resolver problemas sociais";
"exibiam convicção mais forte"; tinham "mais idealismo"; apresentavam "uma influência
mo ralizadora sobre as câmaras municipais"; mostravam "mais responsabilidade em gastar o
dinheiro dos contribuintes"; mostravam "maior interesse no bem-estar público"; tinham
133
Idem, p. 111.
134
Ibidem.
76
"mais coragem moral"; eram" mais progressistas" e " mais democráticos." Foram também
realizadas pesquisas entre estudantes de teologia das denominações metodista e
presbiteriana, acerca de participação política. A obra de Willems (1967) traz pesquisas
semelhantes que contemplam a realidade chilena. Está evidenciada pelas respostas uma
mentalidade triunfalista e carregada de complexo de superioridade, por parte dos pastores,
que julgaram os políticos evangélicos melhores do que seus pares não-evangélicos.
Willems ainda compara as condições do protestantismo histórico e do
pentecostalismo, a partir de uma análise de classes sociais:
As seitas pentecostais do Chile e do Brasil são organizações de classe, enquanto as
históricas não o são. Do mesmo modo como a maioria das seitas, as pentecostais rejeitam
aceitar os símbolos tradicionais, porque eles são símbolos das classes superiores. As seitas
pentecostais constituem-se em movimentos de protesto contra a estrutura de classes
existente, enquanto as igrejas históricas, devido à quantidade significativa de membros das
classes média e alta em seus quadros, claramente aceitam esses valores tradicionais como
realização educacional e profissional, saúde, poder político e semelhantes. Com efeito, elas
se esforçam por conciliar tensões e antagonismos de classe em suas próprias estruturas.
Essa atitude de acomodação torna-as sem atrativo para aqueles que procuram redenção dos
males de uma ordem social percebida como injusta.
135
Percebe-se que Willems comete uma confusão conceitual, quando afirma que os
pentecostais constituíam “organizações de classe”, na época de sua pesquisa. Mesmo que
essas igrejas fossem compostas exclusivamente de pessoas pobres, isto não caracterizaria
classe, no sentido marxista do termo. A classe deve estar referida a um modo de produção e
ao controle de meios para o funcionamento deste. O que Willems observou foi uma
formação marcadamente popular, uma “comunidade imaginada”, no sentido empregado por
Benedict Anderson
136
.
135
No original: “The Pentecostal sects of Chile and Brazil are class organizations, the historical churches are not. Like most sects,
the Pentecostalists refuse to accept the traditional symbols because these are symbols of the upper classes. The Pentecostal sects
are protest movements against the existing class structure, while the historical churches, to clearly accept such traditional values as
educational and occupational achievements, wealth, political power positions, and the like. In fact, they attempt to reconcile class
tensions and antagonisms in their own structures. Their accomodative attitude makes them less attractive to those who seek
redemption from the evils of a social order which is felt to be unjust.” (WILLEMS, 1967, p.218, tradução: STCB).
136
Cf. ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a expansão do nacionalismo. Lisboa:
Edições 70, 2005.
77
1.2.5 Pentecostais e condição social
A forte presença do movimento pentecostal entre camadas pobres da população
induziu Cartaxo Rolim a supor que foi assim desde a origem. Este aspecto precisa ser
relativizado, porque na obra Pentecostalismo: Brasil e América Latina,
137
Rolim faz uma
imediata associação da clientela dos missionários suecos, membros da Primeira Igreja
Batista do Pará (PIB), com a periferia urbana de Belém, habitada por “moradores pobres e
semi-analfabetos”.
138
Em seguida, contrasta-a com a parte urbana central “baluarte da fé e
dos outros católicos, [... onde se situam] a imponente catedral, a residência episcopal,
espaçosas e douradas igrejas, grandes conventos de religiosos com suas largas capelas”.
139
A história e a localização da Primeira Igreja Batista do Pará (PIB), em 1910-11, contradiz
Rolim. Essa igreja se reunia na rua João Balbi, a poucas dezenas de metros da Basílica de
Nazaré e do Colégio Gentil, onde fica guardada a imagem da santa, em perímetro habitado
por camadas médias da população de Belém. Havia pequenos comerciantes
140
e, inclusive,
pessoas que falavam fluentemente a língua inglesa, entre os membros dessa Igreja Batista.
Um deles, Adriano Nobre, ajudou os suecos a se comunicarem com a congregação.
141
Outro equívoco: Rolim entende que os suecos conquistaram aqueles batistas, porque
na igreja “só o pastor era dono da palavra”, enquanto na nova proposta pentecostal todos
podiam falar e ser ouvidos pelos irmãos. Ora, a PIB do Pará, desde sua origem em 1887, até
a chegada dos suecos, em novembro de 1910, permaneceu longos períodos sob liderança de
leigos, devido a sucessivas ausências do missionário fundador, Eurico Nelson, e à falta de
137
ROLIM, F. C. Pentecostalismo: Brasil e América Latina. Petrópolis: Vozes, 1994.
138
ROLIM, 1994: p. 29.
139
Idem, p. 28-9, 34.
140
O próprio diácono, pregador leigo, tesoureiro e moderador da igreja, José Batista de Carvalho, de nacionalidade portuguesa,
comerciante, aderiu às doutrinas pentecostais, indo organizar a Assembléia de Deus (cujo nome ainda não era este), em 1911. Cf.
ALMEIDA, Antônio Batista de. 80 anos construindo para a glória de Deus. Belém, <s. n.>, ca 1981.
141
Belém era o porto escoador de toda a produção de borracha, o ouro negro, importantíssimo item da pauta
de exportações do Brasil. A congregação batista, que foi apropriada pelos adeptos da nova doutrina, situava-
se na Cidade Velha, bairro tradicional e bem diferente da periferia pobre imaginada por Rolim. O senador
Manuel Barata, autor da Formação Histórica do Pará, contemporâneo dos acontecimentos, mencionava a
existência de u m jornal da igreja, “O Arauto Baptista”, quinzenal, que circulava na cidade em 1905. Em 1910,
a igreja contava com outro jornal, “O Radiante”, cujo redator, Manuel de Paula Barros, também se tornou
pentecostal. Estas informações e as do parágrafo seguinte estão na obra ALMEIDA, 1981, já referida, escrita
com base nas atas da Primeira Igreja Batista do Pará e em depoimentos de testemunhas dos acontecimentos
aqui relatados. Antonio Almeida, com quem o autor desta tese conviveu entre 1971 e 1981, foi membro da
PIB do Pará, desde os anos de 1920, e seu diácono, durante muitas décadas.
78
pastores para substituí-lo.
142
Rolim, nessa obra (1994), desenvolve teses relacionando o
pentecostalismo com a pobreza e a laicidade. Não se pretende contestá-las, mas provar que
elas não correspondem aos fatos na origem da Assembléia de Deus, em Belém. Ele estende
o que aconteceu em outro contexto e época, a Baixada Fluminense dos anos 50 aos 80,
conforme dados que utilizou, para um espaço-tempo que não guarda qualquer relação com
essa realidade. Exercício de indução e anacronismo sem dúvida estranhos.
No Estado do Rio Grande do Sul, Ari Pedro Oro, por sua vez, formula a hipótese da
proximidade religiosa entre os catolicismos tradicional-popular e de imigração com o
pentecostalismo gaúcho, confirmada pela maior presença deste em regiões onde
predominavam os referidos catolicismos.
143
Ao reconhecer o perfil social dos evangélicos,
Oro sugere que existe “uma ‘afinidade eletiva’ entre igrejas históricas e camadas médias e
igrejas pentecostais e camadas populares da sociedade”. Entretanto, ele aponta um quadro
mais complexo com a expansão dessas igrejas em sentidos opostos, nas mesmas camadas
sociais.
A obra de Oro apresenta aspectos comuns e diferenciadores do pentecostalismo em
relação ao neopentecostalismo. Como traços comuns ele identifica: a vocação para alcançar
os desfavorecidos; caráter exclusivista, anti-ecumenicidade e hostililidade para com os
cultos mediúnicos; apelo generalizado à manifestação das emoções e espiritualização dos
problemas sociais.
144
As características diferenciadoras do neopentecostalismo seriam as
seguintes: trata-se de um movimento de líderes fortes, que chegam a ser venerados; é um
pentecostalismo que liberalizou costumes e formas de vestir dos seus adeptos.
145
Porém,
como características mais importantes ele registrou: a ênfase na cura divina, um grande
destaque para as ações de demônios; práticas de exorcismos e ataques a entidades dos
cultos afro-brasileiros, e, como marca bem visível, o uso intenso da mídia eletrônica.
142
Eurico Nelson foi, de fato, o fundador e organizador da Primeira Igreja Batista do Pará. Porém, como, em 2 de fevereiro de
1897, ainda não era pastor ordenado, trouxe de Recife o missionário e pastor Salomão Ginsburg para realizar batismo dos
convertidos e, no mesmo dia, presidir o ato solene de organização da referida igreja (cf. ALMEIDA, op.cit., p.23-4).
143
Cf. ORO, 1996, p. 31.
144
Idem, p. 49-53.
145
Idem, p. 53-6.
79
1.2.6 Evangélicos e clientelismo
Outra marca da cultura política a ser examinada é a prática de clientelismo na
conduta da bancada pentecostal e das lideranças das igrejas. A questão que se levanta,
especificamente, é a seguinte: os atores pentecostais reforçam essa conciliação pelo ‘alto’
ou fazem valer a condição subalterna da maioria dos seus seguidores, organizando-os para
alcançarem conquistas no quadro da cidadania?
Antônio Flavio Pierucci elaborou um texto sobre a bancada evangélica no
Congresso Constituinte de 1987-88
146
, como parte de uma pesquisa para identificar
“bolsões de conservadorismo (...) entre as camadas populares” do Brasil.
147
Tratada como
bancada suprapartidária pelo presidente José Sarney, que assim a recebeu em audiência, sua
dimensão a colocava atrás, apenas, das bancadas dos três maiores partidos da época
(PMDB, PFL e PDS). Entretanto, a composição desse grupo não era homogênea, pois,
entre seus 33 integrantes, havia meia dúzia de perfil ideológico de esquerda, identificada
com teses progressistas populares, e um número bem maior que acompanhava o modo
clientelista-conservador de fazer política predominante naquela legislatura (1987-90).
Segundo Pierucci, os evangélicos “não se mostram capazes de separar as esferas da política
e da moralidade privada”.
148
Embora minoria, eles discursavam como maioria, porque
alegavam que a população, majoritariamente, tem sua crença em Deus. A plataforma
evangélica concentrou-se em temas da moralidade, em defesa de preceitos bíblicos
interpretados de modo a censurar costumes pouco aceitos ou aceitos com reservas na
sociedade. Para o autor, ali estavam constituídos uma nova direita e um novo populismo.
Este segundo aspecto era afirmado porque: “a direita religiosa, bíblico-fundamentalista e
moralista, tem a vantagem de fazer contatos mais imediatos, mais profundos e mais
persuasivos com as massas inseguras e assustadas do que outras formações ou linhagens de
direita mais secularizadas”.
149
O autor destacou, também, “o insaciável apetite dos crentes
146
Cf. PIERUCCI, 1996, p. 163-91.
147
Idem, p. 165.
148
Idem, p. 166.
149
Idem, p. 180.
80
conservadores por benesses, verbas, cargos e concessões de emissoras de rádio e canais de
TV: para suas igrejas, sim, mas também para si próprios”.
150
1.3 Padrões e vícios da cultura política brasileira
Nesta parte do capítulo será feita uma reflexão sobre a condição do espaço público
na sociedade brasileira, a emergência de identidades coletivas, em particular os
evangélicos, completando-se a abordagem com referências ao autoritarismo,
patrimonialismo, gregarismo e futurismo, como características da cultura política nacional.
1.3.1 Espaço público
“Nas sociedades democráticas, a esfera pública é o espaço político em que se dá a
passagem da vontade individual à vontade coletiva, o lugar onde os indivíduos negociam
seus interesses pessoais e suas representações do bem comum”.
151
. O problema é que a
sociedade brasileira, desde a origem e em sua forma histórica de desenvolvimento, tem
feito a autofagia do que é público mediante alargamento do espaço privado.
O ethos público, segundo Gabriel Cohn, que prefacia o livro de Adrián Gurza
Lavalle, é “um modo de orientação das condutas, das percepções, dos modos de pensar e
agir enfim, [referenciado] ao complexo de valores que regem a conduta no mundo social e
político nas suas relações com o mundo privado”.
152
Como a tese de Gurza, pesquisador
mexicano, trata de vicissitudes na constituição do espaço público no Brasil moderno, é
interessante acompanhá-lo em considerações que faz acerca desse ethos como chave
explicativa da vida e espaço públicos na sociedade brasileira. Assim, Gurza define ethos
público como um núcleo “de determinações culturais e psicológicas profundas (familismo,
cordialidade, privatismo ou incivilidade, por exemplo), que além de constituírem o âmago
da identidade nacional, transbordam-na fundando e modelando o espaço público”.
153
Gurza
não está tratando de uma mitológica “identidade nacional”, mas de uma “manifestação do
150
Idem, p. 189.
151
SORJ, Bernardo. A democracia inesperada: cidadania, direitos humanos e desigualdade social. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2004, p. 24.
152
GURZA LAVALLE, Adrián. Vida pública e identidade nacional: leituras brasileiras. São Paulo: Globo, 2004, p.12.
153
Idem, p. 63-4.
81
ímpeto do privado e de sua obra edificadora que, indiretamente, rarefaz o espaço vital do
público condenando-o à exigüidade”.
154
Uma síntese dos estudos sobre brasilidade que fizeram época no pensamento social-
político da primeira metade do século XX, com críticas de autores mais recentes neste
referencial, resultou na proposta de “leitura do espaço público”, como forma de traduzir a
“idiossincrasia da sociabilidade nacional essencialmente privatista, patrimonialista,
personalista, rural, familiar, agnatista ou patriarcal (...) para um terreno menor: o da vida
pública”.
155
Em seguida, Gurza explica como essa interpretação pela ótica do ethos público
funciona:
Nessa leitura, tudo se passa como se um mundo, cuja nota distintiva é sua
organização integral sob égide do privado, tivesse produzido a subsunção do público,
tornando-o uma projeção do privado: a cidade um mero apêndice da fazenda, a vida pública
uma simples transposição da sociabilidade familiar; e a política uma ferramenta de
açambarcagem na mão dos poderes patriarcais.
156
Os estudos de “identidade nacional” foram perdendo relevância na comunidade
intelectual, acusados de terem um caráter mistificador, por trazerem expressões ideológicas
do nacional e não darem conta das contradições efetivas da sociedade de classes e sua
condição dependente no contexto global.
157
Não obstante e de forma surpreendente,
observa Gurza Lavalle, o ethos público se emancipou de seus referentes originários da
afirmação de brasilidade e passou a denominar o conjunto de “empecilhos que obstam a
constituição do espaço público moderno no Brasil”.
158
Roberto DaMatta é um caso
específico de autor que utiliza de forma ampla e explícita essa abordagem cultural, sem
154
Idem, p. 99.
155
Idem, p. 100.
156
Ibidem.
157
Cf., por exemplo, LEITE, Dante Moreira. O caráter nacional brasileiro História de uma ideologia. São Paulo: Ática, 1992;
MOTA, Carlos Guilherme. Ideologia da cultura brasileira (1933-1974). São Paulo: Ática, 1977; e, mais recentemente, CHAUÍ,
Marilena. Brasil Mito fundador e sociedade autoritária. São Paulo: Perseu Abramo, 2000.
158
O autor identifica essa presença atualizada do ethos público, de diferentes modos, em textos de: Teresa Sales, “Raízes da
desigualdade social na cultura política brasileira”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, nº 25, ANPOCS, junho de 1994, p. 26-37; Vera
da Silva Telles, “A cidadania inexistente: incivilidade e pobreza Um estudo sobre o trabalho e a família na Grande São
Paulo. Tese de doutorado apresentada ao Departamento de Sociologia, USP, 1992; Marilena Chauí, Conformismo e resistência
Aspectos da cultura popular no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1996; José de Souza Martins, A sociedade do homem simples.
São Paulo: Hucitec, 2000; Guillermo O’Donell, “Situações Microcenas da privatização do público em São Paulo”. Novos
Estudos, nº 22, CEBRAP, outubro 1988, p. 45-52; e outros. (GURZA LAVALLE, 2004, p. 133).
82
nenhum constrangimento de voltar às tentativas de definir uma identidade brasileira
159
. O
problema, segundo Gurza, é que “a introdução do ethos na análise da vida pública induz
interpretações de causalidade circular, obliterando aspectos relevantes da realidade”.
160
Isto
acontece porque a ambigüidade e flexibilidade incorporadas em sua definição permitem
que se possa utilizá-lo como explicação em um conjunto enorme de problemas, de sorte que
“propõem-se como razões explicativas um conjunto de predicados que, na realidade,
formam parte dos atributos pressupostos na definição do sujeito o ethos , pelo que o
raciocínio discorre de maneira circular”.
161
A utilização indiscriminada do ethos pode adquirir caráter prescritivo-normativo,
em vez de servir como categoria problematizadora ou pelo menos explicativa. A lógica do
ethos aderiu a representações amplamente disseminadas de aspectos presentes na vida
pública do Brasil. Ou seja, ela atende a uma necessidade humana de conferir sentido ao
meio em que se vive. Como se trata de explicação generalizante, o ethos é de difícil
contestação, mas também não contribui, significativamente, para gerar conhecimento sobre
a realidade social e política brasileira. Sua aplicação traz implícita uma assimilação de
conceitos idealizados para uma sociedade moderna, os quais estão ausentes na sociedade
brasileira; portanto, temos a partir daí uma forma enviesada de apresentar um modelo
cívico republicano, pela afirmação de sua ausência. Tal qualificação do ethos, como forma
ambígua de pensar a realidade brasileira, não deve resultar em abandono da análise nessa
dimensão cultural do espaço público, mas deve servir como balizador da sua contribuição
relativa, junto com outras contribuições que se procurou agregar nesta pesquisa.
159
Lívia Barbosa dedicou-se à análise da obra de DaMatta, em tese publicada sob o título: O jeitinho brasileiro A arte de ser
mais igual que os outros. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
160
GURZA LAVALLE, op.cit.,p.136.
161
Idem, p. 157.
83
1.3.2 Evangélicos e espaço público
Pesquisas de Freston
162
indicam a crescente inserção dos pentecostais na política
brasileira e a capacidade de organização e mobilização que acumularam para defender,
principalmente, seus interesses corporativos. Revelam, além disto, os diferentes matizes da
atuação dos evangélicos em geral nesse mesmo contexto. Em tese de doutorado (1993),
Freston lida com a imagem pública dos pentecostais, inclusive preconceitos alimentados
pelo senso comum, refletidos na imprensa. Sua abordagem teve “um enfoque nacional,
institucional e parlamentar”, ou seja, uma abordagem em dimensão macroscópica.
163
Freston destaca a Assembléia de Deus como a única igreja evangélica com extensão e
distribuição equilibrada no território brasileiro, de modo que, com essa presença expressiva
e estratégia de atuação na Câmara Federal, deveria merecer melhor atenção de
pesquisadores.
Freston envereda pela análise das tipologias do protestantismo e pentecostalismo e
faz uma análise institucional das denominações, com ênfase na cultura e estratégia
políticas. Também procede a comparações entre elas nos mesmos aspectos. Segundo ele, o
neopentecostalismo tem cosmovisão aguerrida, que se expressa, também, na política.
A ‘guerra espiritual’, contrapartida protestante do reencantamento do mundo ocidental,
inova sobre o demoníaco a nível político e recomenda o exorcismo social. Reflete critérios
ideológicos (anti-PT) e a ambição de espaço na religião civil. A lacuna programática é às
vezes preenchida por alguma versão do reconstrucionismo, teologia política norte-americana
fortemente neoliberal e teocrática.
164
A observação acima refletia a postura da Igreja Universal no período entre o
Congresso Constituinte e a eleição de Fernando Collor (1986-89). As bandeiras políticas
dos parlamentares pentecostais eram a defesa das liberdades religiosas e a proteção da
família tradicional, completadas com a politização de questões morais.
Joanildo Burity fez pesquisa sobre a cultura política de candidatos evangélicos na
fala de entrevistados, não encontrando muita diferença de valores entre estes e outros
162
FRESTON, Paul. Evangélicos na política brasileira. Religião e Sociedade, Rio de Janeiro: ISER, nº 16/1-
2, 1992, e as obras citadas de 1993 e 1994, por exemplo.
163
FRESTON, 1993, p. 278, grifos no original.
164
Idem, p. 281.
84
postulantes que defendem a democracia liberal, a tradição cívico-republicana e se
sensibilizam diante de injustiças sociais.
165
Em capítulo da mesma obra, sobre pentecostais,
cultura e política, Burity discutiu ativismo religioso frente ao ideal de se construir uma
democracia, a partir das seguintes questões:
Como se cruzam valores religiosos e valores democráticos no contexto do novo ativismo
religioso? As práticas comunitárias (cotidianas) religiosas definem outros lugares de
experimentação democrática, além da esfera político-institucional? Como relacionar o
pluralismo de lógicas de ação implicado numa tal configuração e o pressuposto
consensualista da problemática da cultura política?
166
.
Em seguida Burity trata de aspectos do cenário religioso brasileiro em 1995, sob
impacto do “chute na santa” e, nesse contexto, analisa a relação entre religião e esfera
pública, com destaque para a liberdade religiosa. Sobre “as incursões pentecostais e a
reestruturação do campo religioso”, Burity escreve que o campo religioso está em processo
de rearrumação e o classifica como um campo agonístico
167
em que atores coletivos lutam
por reconhecimento. Diante da forma pentecostal aguerrida de afirmar a fé e, também, em
face dos exemplos de intolerância fora dos padrões que eles consideram bíblicos, Burity
percebe que “o pentecostalismo ainda carece de uma performance ou estratégia intelectual
consistente para enfrentar a complexidade das questões que vêm se colocando para a
sociedade brasileira neste fim de século”.
168
Antes de passar a outros autores, convém registrar a pergunta de Gurza Lavalle, no
marco desta abordagem, levadas em conta as ressalvas acima: “que tipo de vida pública é
gerada sob os efeitos da terrível heterogeneidade e desigualdade social transformadas mas
não superadas pelos processos de modernização vividos pelo país ao longo do século
165
Cf. BURITY, Joanildo A. Identidade e política no campo religioso: estudos sobre cultura, pluralismo e o novo ativismo
eclesial. Recife: Editora Universitária da UFPE, 1997.
166
BURITY, 1997, p. 63-4.
167
Nota de Burity: “Entendo por campo agonístico um feixe de relações em que a existência de dois ou mais grupos numa mesma
região do social não pode ser experienciada de forma neutra ou relaxada. A presença de um face ao(s) outro(s) é, em si, motivo de
disputa por ascendência, influência, controle ou domínio. Tal disputa pode se fundar no pressuposto de que a identidade de cada
grupo é a única forma verdadeira e, portanto, admissível, de se postar/portar diante do mundo. Neste caso, a relação agonística
visa tomar o lugar de, tomar posse de ou destruir o adversário e encerra um notável potencial de intolerância. Outra possibilidade
é de que, apesar de se vivenciar a própria identidade de forma arraigada, admita-se a contingência em si próprio, e não apenas no
adversário. Neste caso, a relação agonística implica em conflito, disputa, concorrência, mas guarda respeito ao adversário que se
expressa, no mínimo, numa atitude de ‘live and let live’. Para uma sólida reflexão sobre a relação entre agonismo e identidade, cf.
Connoly, 1992:166-67, 178-79, 191-93.” (BURITY, 1997, nota 2, p. 66) CONNOLLY, William E. Identity/Difference.
Democratic negotiations of political paradox. Ithaca/London, Cornell University, 1992.
168
BURITY, op.cit., p. 67.
85
XX?”
169
Por que essa sociedade convive com formas de sociabilidade que negam a
universalidade do direito (mesmo cientes dos seus limites numa democracia liberal) para
uma parcela tão grande da população brasileira? Essa convivência contraditória de
sociabilidades certamente alimenta a representação de um espaço público vazio de qualquer
sentido para o exército de marginalizados da formação social brasileira.
O ingresso de pentecostais na política tem permitido, de alguma forma, atenuar essa
aberração social. André Corten, em seu livro Os pobres e o Espírito Santo: o
pentecostalismo no Brasil, procede a uma análise de discurso daqueles que não são
reconhecidos pelo domínio do logos, mas que se manifestam, sobretudo, através dos
arroubos da emoção. Por sua ética e estética, os pentecostais tendem a chocar os espíritos
mais requintados daqueles que hoje são chamados “os politicamente corretos”. Quando
buscam ter representantes na política, fazem-no para garantirem um espaço na sociedade,
obterem algum tipo de reconhecimento e manterem seu estilo de culto. Mas, sem dúvida
nenhuma, os assembleianos já ocuparam “o espaço público e é a este nível que eles são
rejeitados. Eles são julgados inaceitáveis, mas eles não se retiram do ‘mundo’. Eles travam,
ao contrário, uma ‘guerra santa’ neste mundo”.
170
A glossolalia é encontrável tanto no pentecostalismo como nos movimentos
carismáticos das igrejas protestantes históricas e na Renovação Carismática Católica.
Nesses contextos, os cânticos são usados para criar o clima emocional intenso que leva os
participantes das reuniões ao êxtase. “O ‘falar em línguas’ é uma prece que não obedece a
nenhum tipo preestabelecido de prece nem formular pedidos (em voz alta ou em seu foro
íntimo), nem recitar fórmulas prontas ou inspirar-se nelas na improvisação de salmos, nem
adorar quer dizer, rezar sem a utilização (mesmo mental) de linguagem”.
171
Para o
pentecostal, esse é um dom de Deus, é uma língua divina, que comprova sua ligação direta
com o sagrado, independentemente de qualquer mediação. Trata-se de uma dupla ruptura:
com o mundo social e com o mundo clerical, embora seja um fenômeno que se manifesta,
geralmente, em ambiente coletivo.
169
GURZA LAVALLE, 2004, p. 166.
170
Cf. CORTEN, André. Os pobres e o Espírito Santo: o pentecostalismo no Brasil. Petrópolis, Vozes,
1996, p. 10.
171
Idem, p. 56.
86
O pentecostalismo é um “anti-establishment do protestantismo”.
172
[...] A tese é
que o caráter “inaceitável” destas manifestações religiosas é o indício de novas categorias
políticas ainda incapazes de formar uma língua política. [...] O “falar em línguas” é uma
forma extraordinária e arcaica de palavras que entra numa cadeia de discursos. [...] A
louvação é um enunciado que poderia ser político, mas que hoje é inaceitável para a língua
política.
173
Apoiados no texto de Corten, faz-se possível questionar fundamentos do sistema
político ocidental, cujo “enunciado primeiro” é o contrato que se estabelece entre partes:
deve haver alguém para autorizar (pode fazer) e outro para obedecer (deve fazer). Em
regimes do tipo paternalista prevalece outro “enunciado primeiro”: o do pedido. Em ambos
os casos, tanto no Estado liberal burguês como no Estado paternalista, a ação se dá através
de verbos performativos. O pedir é também uma ação, porque exige um retorno de
aceitação ou recusa. Já o tipo de “enunciado primeiro” da louvação aproxima-se de um
panegírico ou elogio. Não é um panegírico, porque este tem a intenção de fazer alguma
coisa narrar o poder. Logo, tem o poder de narração, enquanto que “a louvação não faz
nada, não dá nenhum poder”.
Para Corten, o político gera uma língua que define o que é e o que não é aceitável
socialmente. “O pentecostalismo na glossolalia ou no seu modo de recorrer ao
fundamentalismo é julgado inaceitável: indício de que ele carrega categorias não fora de
toda política, mas fora da língua política existente”.
174
A glossolalia não é uma língua, no
sentido convencional. Ela não preenche os requisitos de aceitabilidade, como um consenso
gramatical e uma performance lógica, porém, se inscreve, na comunidade que louva, como
uma forma lingüística que se caracteriza pelo seu excesso. O indizível é dito pela
extrapolação da língua convencional. Na “polis” pentecostal, a glossolalia é aceita, como
língua por excelência. Seus falantes desfrutam de prestígio político. Como “língua política”
da comunidade pentecostal, ela é sua marca distintiva.
Na sociedade liberal burguesa, os pentecostais não são “politicamente corretos”, não
recebem o beneplácito dos que controlam a “opinião pública”, embora se perceba que eles
172
CORTEN, op.cit., p. 57, fazendo referência a Brandt-Bessire e Anderson. (Brandt-Bessire, Daniel. Aux sources de la
spiritualité pentecôtiste. Prefácio de Walter J. Hollenweger. Genève: Labor/Fides, 1986. Anderson, M. Robert. Vision of the
disinherited: the making of American Pentecostalism. Oxford: Oxford University Press, 1979).
173
CORTEN, 1996, p. 118.
174
Idem, p. 131.
87
aspiram esse reconhecimento social, como ficou demonstrado pelos projetos de dias
especiais e praças da Bíblia obtidos do poder público, em centenas de cidades brasileiras.
“É porque os enunciados pentecostais não são politicamente aceitáveis que na opinião
pública não se acredita em milagres. Ao mesmo tempo, esta crença forma uma força
anônima e popular, uma força protopolítica”.
175
Essa barreira à aceitabilidade também se
passa com relação à “cura divina”, que não é reconhecida pela autoridade técnica do mundo
desencantado.
O texto de Corten é ferramenta sugestiva para analisar a emergência de um
movimento que não fala o código dominante, mas que encontrou espaço nos interstícios da
sociedade burguesa, por não fazer contestação explícita, mas sublimá-la em formas de
culto, de louvação e outros tipos de celebração do sagrado. Diante de uma sociedade que se
lhes apresenta hostil, os pentecostais criam a sua sociedade, onde a língua política é a
glossolalia. Isto se dá num contexto sectário, porque “a seita é a forma social que toma a
recusa do compromisso com o ‘mundo social’, inclusive o das Igrejas. Ela é utopia, ela é o
‘inaceitável’, o lugar próximo ainda das fundações originais em que o pobre vive o
religioso como o político, como o ‘seu’ político, como um ‘antipolítico’”.
176
1.3.3 Espaço público e identidades coletivas
Em sua tese, Scherer constatou que o espaço público está a encolher,
simultaneamente com o alargamento do espaço privado. Isto dificulta “a constituição de
uma esfera pública, entre nós, já que as mediações políticas e sociais não conseguem
firmar-se”.
177
A ausência de uma esfera pública consolidada traz como conseqüência danos
maiores para as classes subalternas, que deixam de participar do jogo democrático e são
privadas de seus direitos mais elementares.
Em contrapartida, esse enfraquecimento da esfera pública permite uma outra leitura,
inspirada na emergência de novas identidades coletivas, embora os efeitos sejam
igualmente danosos para a democracia. Cada vez mais, grupos específicos dentro da
sociedade mulheres, negros, homossexuais, emigrantes, sem-terra, sem-teto concentram
175
Idem, p. 150.
176
Idem, p. 162.
177
SCHERER, 2000: p. 145.
88
esforços em organização e divulgação de suas bandeiras, ao mesmo tempo em que
pressionam diversas instâncias do Estado para conquistarem reconhecimento e recursos
públicos em benefício do grupo, como forma de compensação por terem sido
historicamente excluídos ou discriminados. Suas reivindicações podem ser justas, mas,
neste caso, “o problema distributivo passa a ser avaliado em termos do que ‘meu grupo’
recebe na ‘distribuição do bolo’”, conforme observa Sorj, que, em seguida, acrescenta:
A demanda de direitos realizada pelas novas identidades coletivas, quando associada a
reivindicações distributivas, apresenta o risco da despolitização e da erosão do espaço
público, pois essas identidades questionam a política como produção de uma utopia comum
e transformam o sistema de representação em um processo de agregação de interesses de
fragmentos sociais...
178
Essa delimitação rígida de espaços por parte de atores sociais que constituíram
novas identidades coletivas vai minando a existência do espaço público, na medida em que
essencializam suas diferenças. A crença de que o diálogo no espaço público, com base em
valores compartilhados, é o fundamento da res publica, tende a desaparecer num tipo de
sociedade onde os interesses particularistas de grupos são promovidos à categoria
substantiva da construção democrática. É o que está acontecendo em novas formações
societárias inspiradas no multiculturalismo. Como explica Sorj: “O individualismo e a
crescente fragmentação simbólica causada pela valorização de culturas étnicas e/ou
religiosas que consideram suas lealdades e seus valores pessoais e/ou grupais prioritários e
não-negociáveis colocam em xeque a noção republicana de espaço público e bem
comum”.
179
Nesta pesquisa examinou-se a prática de agentes pentecostais, questionando se os
parlamentares pentecostais estão fazendo mediação entre seus representados e o poder
público, a fim de ampliar e consolidar o espaço público e reforçar a democracia. Ou, se essa
mediação se dá através de trocas de favor. Ou se tenta superar o componente autoritário,
substituindo o clientelismo pela luta por reconhecimento dos sujeitos coletivos
pentecostais. Vale lembrar que o patrimonialismo depende da preservação de práticas
personalistas de concessões, trocas de apoio por benesses, favores e privilégios, pois “a
178
SORJ, 2004, p.57-8.
179
Idem, p. 108.
89
dominação patrimonial é incompatível com a igualdade jurídica e as garantias institucionais
contra o arbítrio”.
180
Outra questão se refere a práticas de fisiologismo. A política deveria
ser conduzida por valores, mas o realismo político opera através de negociações para
atender interesses corporativos e um mínimo de interesse público. Pergunta-se: Que papel
os políticos pentecostais têm desempenhado nesse jogo? E mais: sob o enfoque de
constituição de novas identidades coletivas, os pentecostais constituem um grupo específico
empenhado na conquista de reconhecimento e na transferência de recursos públicos para
usufruto de suas corporações? Este capítulo já oferece elementos para discussão destas
questões. Mas convém prosseguir, examinando outros caracteres culturais da formação
social brasileira.
1.3.4 Autoritarismo
A aventura da brasilidade está marcada por uma cultura autoritária. Martins introduz
o conceito de cultura autoritária, para apresentar o autoritarismo em perspectiva histórica,
a partir de um pacto fundador do social, consoante diferentes momentos em que ele
permanece no imaginário e nas práticas de poder da sociedade brasileira.
181
Em seu texto,
são indicadas algumas abordagens referentes à cultura e civilização, segundo autores e
escolas do pensamento europeu. No caso brasileiro, Martins identifica estudos que
exageram acerca da influência da cultura global, quase negando uma especificidade da
cultura nacional (caso de obras de Octavio Ianni e Ricardo Antunes). Por outro lado, há,
também, autores que afirmam a singularidade brasileira (como, por exemplo, Gilberto
Freyre e Sérgio Buarque de Hollanda), alvos de análises críticas, mas sem dúvida
merecedores de ocupar o panteão dos clássicos do pensamento social brasileiro.
É importante analisar os regimes autocráticos impostos ao Brasil, particularmente o
Estado Novo de Getúlio Vargas (entre 1937 e 1945) e a ditadura dos militares (de 1964 a
1985). Porém, mais importante é identificar os componentes que fazem esta sociedade ter
caráter autoritário. Martins procurou fazer essa identificação em seu texto sobre brasilidade.
Nessa abordagem de cunho cultural, o autoritarismo é tratado como “um conjunto secular
180
Idem, p. 153.
181
MARTINS, 2002, p. 65-104.
90
de representações, crenças, valores e normas que impregnou, historicamente, por dentro e
molecularmente, as instituições públicas e privadas no Brasil”
182
Esse autoritarismo,
acrescenta Martins, “constitui um campo de forças que fornece a centralidade simbólica e
inspira tradicionalmente a organização das instituições do poder e da política no Brasil”.
183
A brasilidade produziu um autoritarismo que mescla componentes da gênese e dominação
lusitanas com uma modernidade mutilada e desenvolvida pela sociedade brasileira.
No processo social de atualização do autoritarismo, são identificáveis dois
componentes: o primeiro se apresenta em forma de dominação hierárquica e oligárquica,
que estabelece o lugar de cada indivíduo, mediante critérios de origem familiar, cor,
condição econômica e relacionamentos sociais; o segundo tem o caráter de exclusão social,
que associa o comportamento resistente de uma elite perpetuada no poder com o processo
de seleção darwiniana do próprio capitalismo. Para Martins, o importante é compreender o
“autoritarismo como uma exigência cultural específica do modo de instituição do poder e
da sociedade entre nós”.
184
O pesquisador norte-americano Andrew Chesnut percebeu, na experiência
pentecostal brasileira do batismo com o Espírito Santo, uma semelhança com relações
clientelistas da cultura.
185
O Espírito Santo funciona como uma espécie de patrão divino,
oferecendo proteção em troca de serviço e lealdade.
186
Mais adiante, Chesnut alerta para a
sacerdotalização dos dons em igrejas pentecostais mais recentes. Essa abundância de dons
nas mãos dos pastores e escassez para os membros da comunidade cria uma relação de
dependência, na qual o fiel se submete passivamente aos ditames dos seus líderes.
Chesnut denomina a organização da Assembléia de Deus de “autoritária
participatória” (ou participativa), sendo, assim, uma forma modificada de clientelismo. O
poder decisório da instituição é concentrado no pastor-presidente, coadjuvado por uma elite
de pastores, que lhe é absolutamente fiel. No nível intermediário da pirâmide de poder estão
182
Idem, p. 65.
183
Ibidem.
184
Idem, p.67.
185
Cf. dissertação, transformada em livro: CHESNUT, R. Andrew. Born again in Brazil: the pentecostal
boom and the pathogens of poverty. New Jersey: Rutgers University Press, 1997.
186
Idem, p. 96-7.
91
os dirigentes das congregações. A pirâmide desse modelo se completa com uma ampla base
de
membros comuns que se envolvem nas atividades diárias da igreja, através de uma extensa
rede de cargos e posições de baixo nível. Uma enorme “massa” de membros se sente como
parte integrante da instituição, ainda que esteja excluída de participar no processo de tomada
de decisões e exercício do poder eclesiástico, porque está ativamente engajada na pletora de
atividades das organizações internas da igreja.
187
Chesnut acrescenta que essa forma de clientelismo “preserva os privilégios do
patrão-pastor, enquanto incrementa o status do cliente-congregante. O poder eclesiástico é
extremamente concentrado no cargo de pastor-presidente, mas os crentes do sexo
masculino que sabem ler e que demonstram lealdade e alguma medida de carisma podem
aspirar ao prestigioso ofício ministerial”.
188
Martins discute os temas autoritarismo e autoridade e cultura e poder como pré-
requisitos ao objetivo de elucidar “a natureza, origem e reprodução de uma certa lógica de
dominação que se legitima pela negação de uma esfera pública aberta à participação
igualitária de todos os atores sociais”. Já se reconheceu que o sistema hierárquico brasileiro
nega para a maioria das pessoas “o ‘direito a ter direitos’”.
189
O autoritarismo como
degeneração do princípio de autoridade ocorre onde o poder é usurpado, imposto à revelia
dos subordinados e à custa da liberdade destes.
Walter Hollenweger associa a prática autoritária pentecostal com raízes religiosas
bem antigas, existentes no continente latino-americano antes da conquista pelos europeus.
Ele compara o poder dos pastores sobre a comunidade com uma relação xamânica: “El
pastor articula los temores latentes, a veces inconscientes y también las esperanzas de su
comunidad. (…) A pesar de su actitud aparentemente autoritaria, su poder depende
187
Texto original: “common members involve themselves in the daily activities of the church through a wide range of low-level
offices and positions. Though excluded from participation in the decision-making process and the exercise of ecclesiastical power,
a critical mass of members feel as though they are an integral part of the church through active engagement in the plethora of
church activities and organizations” (CHESNUT, 1997: p. 130, tradução: STCB).
188
No original: “preserves the privileges of the pastor-patron while increasing the status of the congregant-client. Ecclesiastical
power is extremely concentrated in the office of pastor-president, but literate male crentes who demonstrate loyalty and a measure
of charisma can aspire to prestigious ministerial office” (CHESNUT, 1997, p. 171, tradução STCB).
189
MARTINS, 2002: p. 76.
92
totalmente de la forma en que lo recibe la comunidad”.
190
De fato, quase sempre é possível
verificar uma relação de absoluta confiança entre “ovelha” e pastor.
Cartaxo Rolim destacou que o poder é fortemente concentrado no pastor ou grupo
de pastores pentecostais. Ao redor deles se forma uma corte de presbíteros, enquanto para a
imensa base de crentes resta apenas obedecer “as determinações que vêm de cima”.
191
Isto
se repete, também, nos estudos bíblicos preparados para a escola dominical, os quais já vêm
elaborados pela comissão de pastores nomeados pela instância de poder nacional. A
interpretação “ortodoxa” é sempre aque la que os pastores formularam para os crentes
consumirem.
192
As instituições públicas e privadas na América Latina passaram por processos de
modernização conservadora, com as elites conseguindo atualizar o regime patrimonialista
para usufruto das gerações seguintes. Isto aconteceu com pesados ônus para a sociedade,
pois se abdicou da racionalidade em favor de relações clientelistas e se sacrificou a
liberdade de consciência e opinião das classes subalternas. As igrejas pentecostais
acompanharam este tipo de modernização conservadora e autoritária. Por exemplo, a
Assembléia de Deus (CGADB) fez grandes investimentos para implantar sua rede de
televisão, criou uma logomarca nacional, vem estimulando pastores a fazerem cursos de
graduação e pós-graduação em áreas do conhecimento que não questionem seus
fundamentos e não hesita em agir politicamente para beneficiar a corporação. A Igreja
Universal já nasceu como uma organização empreendedora, equiparada, neste particular, a
outras mega-corporações do mercado globalizado. Bem cedo a Universal se envolveu em
vários ramos de negócio e adotou estruturas independentes para gerir cada uma das
empresas, todas, porém, sob o comando único, efetivo e eficaz do seu líder mundial, o
bispo Edir Macedo. Os parlamentares dessas igrejas negociam, ativamente, em favor de
suas corporações, seja no Congresso Nacional seja em outras assembléias de nível estadual
e local, praticando clientelismo semelhante a seus pares não ligados ao campo religioso.
A lógica clânica perdura em práticas oligárquicas que fazem a apropriação privada
de recursos públicos. Autoritarismo e nepotismo são instrumentos dessa lógica. A
190
Cf. HOLLENWEGER, Walter. El pentecostalismo: historia y doctrinas. Buenos Aires: La Aurora, 1976, p. 464 .
191
Cf. ROLIM, 1987, p. 41.
192
Idem, p. 44-5.
93
burguesia que se formou no Brasil é filha das oligarquias e convive perfeitamente com essa
cultura. Temos uma sociedade fechada e vertical constituída de espaços de privilégio para
os que dominam e obrigações para os dominados. Os atores que ocupam o topo dessa
pirâmide são: banqueiros, industriais e dirigentes de grupos econômicos, grandes
proprietários rurais e donos de agro-negócios. Eles definem e decidem o jogo político,
mantendo uma “democracia” capenga, e acionam os militares para recomporem o
ordenamento patrimonial, sempre que julgam haver necessidade (pelo menos foi assim até
passado recente).
A organização pentecostal tem um governo piramidal hierárquico que não é
escolhido pela base, embora esta o sustente legal e financeiramente e forneça os elementos
que preencherão seus quadros de diáconos, presbíteros e pastores, exemplo de submissão,
legitimado por uma interpretação fundamentalista de textos bíblicos. O pentecostalismo
reproduz a relação de dominação presente na sociedade capitalista. Rolim atribui a falta de
engajamento social a esse exercício permanente de submissão e obediência imposto aos
fiéis.
193
O conceito de cultura autoritária serve para oferecer uma compreensão das relações
de poder, de como funcionam as instituições e como se criam as representações, dentro de
um modelo hierárquico, no qual há um lugar distinto para cada segmento, segundo critérios
étnicos, econômicos, de apadrinhamento e prestígio social e político, ainda que seja
permitida alguma mobilidade social, em circunstâncias excepcionais, pois não se trata aqui,
evidentemente, de uma sociedade de castas. É nessa cultura que medra um “autoritarismo
congênito”. Nas palavras de Martins, “o autoritarismo nas instituições brasileiras é
congênito no sentido de que ele está no cerne de uma estrutura que aprisiona e submete a
lógica individualista a um jogo conspirativo regrado por uma lógica holística, hierárquica e
racista, boicotando as práticas autonomizantes que produzem a cidadania moderna”.
194
Conforme escreveu Sorj, “a sociedade brasileira contemporânea é autoritária,
exibindo profundas desigualdades sociais, mas pouco hierárquica”.
195
As desigualdades
193
Cf. p. ex., ROLIM, 1985, e outros textos já citados do mesmo pesquisador.
194
MARTINS, 2002, p. 99.
195
SORJ, 2001, p. 33, grifado no original.
94
sociais não se reproduzem numa estratificação hierárquica rígida, devido ao forte
componente de informalidade da cultura brasileira. Todavia, como quase não existe uma
convivência em ambiente escolar, que alimente a socialização num ambiente simbólico
igualitário, a desigualdade é aceita naturalmente. Por exemplo, é generalizada a
disponibilidade de mão-de-obra barata para serviços domésticos e informais. Há uma falta
de proteção do Estado para as faixas mais pobres, facilitando o paternalismo dos abastados
e práticas demagógicas de políticos sobre a população carente.
Enquanto as elites se reciclam dentro dessa cultura, os movimentos sociais ainda
não conseguiram conceber um projeto popular de hegemonia, mobilização e coordenação
competentes para gerar uma contracultura democrática. Referindo-se a relações de
desigualdade e dominação sobre índios, negros e mestiços na América Latina, Marcello
Baquero registra que se estabeleceram três tipos de culturas da desigualdade:
1. desigualdade ligada à origem: o outro é inferior e deve ser explorado
porque veio de outra etnia;
2. desigualdade ligada ao padrão clientelístico-patrimonialista: direitos que
deveriam ser universais foram transformados em privilégios para os
ocupantes do poder, de modo que não se construiu uma comunidade
nacional; por conseguinte, a sociedade assim fragilizada manteve-se
tutelada pelos “donos do poder”;
3. cultura da desigualdade estabelecida pela concepção neoliberal, na qual o
Estado se torna refém dos agentes do grande capital; neste contexto,
cidadão é tão somente aquele que é consumidor.
196
196
BAQUERO, Marcello (org.). Reinventando a sociedade na América Latina: cultura política, gênero, exclusão e capital
social. Porto Alegre/Brasília: UFRGS/Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), 2001, p. 65-6.
95
1.3.5 Patrimonialismo
Os estudos sobre patrimonialismo se referem à apropriação privada de bens
públicos, seja por políticos, funcionários, empresários ou quaisquer outros segmentos da
sociedade. Para Sorj, essa idéia “contrapõe-se a um tipo ideal de sociedade liberal ou
moderna na qual o Estado está separado do mercado, em que as burocracias funcionam de
acordo com regras universais e o governo expressa os projetos das representações políticas
constituídas a partir da sociedade civil”.
197
O patrimonialismo latino-americano é,
freqüentemente, associado a tradições das sociedades ibérica e mediterrânea. Para Weber o
patrimonialismo existe em sociedades feudais e arcaicas, relacionado à dominação do tipo
tradicional. Em geral, onde houver minorias que controlam e concentram poder e riqueza,
aí haverá patrimonialismo, variando de intensidade conforme a situação histórica
específica.
198
O patrimonialismo moderno se apresenta como prática de grupos sociais se
apropriarem de recursos econômicos e estratégicos, sem, necessariamente, estarem
legitimados por uma tradição. A vertente brasileira tem origem na colonização portuguesa,
que impôs um Estado tutor e explorador da sociedade. No final do século XIX, o sistema
político brasileiro era composto de poderes locais de grandes proprietários de terra, que se
reportavam a um poder central, herdado da colônia e do império, árbitro perante interesses
regionais e de grupos sociais.
O patrimonialismo brasileiro opera, hoje, em uma sociedade urbana, com
instituições liberais. Essa condição, contraposta a reivindicações de cidadania que incluem
ampliação de políticas sociais, permite considerá-lo fonte primeira dos problemas sociais e
“uma agressão aos valores da justiça, da igualdade e da convivência democrática”.
199
De
fato, com a acelerada urbanização da segunda metade do século XX, desenvolveu-se um
novo patrimonialismo de base urbana, no qual grupos dominantes dilapidam o Estado em
prol de seus interesses e usam seus aparatos repressores e jurídicos contra as camadas
empobrecidas da população.
197
SORJ, 2001, p. 13.
198
Cf. WEBER, Max. Economía y sociedad: esbozo de sociología compreensiva. México: FCE, 1999, p. 753-847.
199
SORJ, 2001, p.14.
96
O autor sugere um desdobramento dos tipos de patrimonialismo, da seguinte
maneira:
patrimonialismo dos políticos: com utilização de cargos públicos para auferir
vantagens econômicas, fazer concessões ao setor privado e praticar o nepotismo;
patrimonialismo dos funcionários públicos: pelo uso do cargo para receber
propinas, comissões, e extorquir setores marginalizados da população:
patrimonialismo privado: através de práticas da burguesia fornecedora ou
prestadora de serviços para o Estado, a qual manipula licitações, financia partidos
com recursos excedentes de contratos superfaturados e obtém créditos subsidiados,
bem como liberação para consumo de produtos e serviços de baixa qualidade, via
omissão ou relaxamento da atuação de órgãos fiscalizadores;
patrimonialismo fiscal, repressivo e jurídico: mediante uso dos aparelhos
correspondentes para garantir favorecimentos e impunidade, em vez da aplicação da
lei; a outra face deste tipo de patrimonialismo é a violência contra grupos
marginalizados, favelados, pobres, negros, índios etc.
200
Em tese de doutorado, Freston (1993) destaca a recriação utilitária da Confederação
Evangélica do Brasil, durante o Congresso Constituinte de 1987-8, como instrumento para
negociar votos em troca de verbas.
201
Em particular, Freston analisa a lógica corporativa da
Assembléia de Deus, tanto na forma de fazer política interna como externa: “A política
corporativa fortalece os líderes de classe média ou média-baixa nas igrejas-sedes (sic) sobre
a clientela pobre das congregações”.
202
Freston reflete sobre o significado do pentecostalismo na política, perante o desafio
do fortalecimento da democracia. Embora a bancada pentecostal assuma atitudes que a
aproximam da nova direita brasileira, ela se distancia desta quando repudia a pena de morte
e representa comunidades com expressiva presença de nordestinos, negros e mulatos.
Segundo ele, “não parece haver mais corruptos entre os evangélicos do que entre a
200
Idem, p. 15-6.
201
FRESTON, 1993, p. 230-32.
202
Idem, p. 284.
97
generalidade, mas certamente há mais fisiológicos”.
203
Este fisiologismo é fomentado pela
condição sectária: “é a apropriação da nação pela seita”.
204
O caráter fragmentário dos
evangélicos brasileiros, para Freston, faz bem à democracia, porque amplia o caráter plural
da sociedade. No caso pentecostal, há uma ascensão de segmentos pobres que, pela via
religiosa e política, estão conquistando espaços na esfera pública.
Em capítulo denominado “Da prática política”, na obra Pentecostalismo: Brasil e
América Latina, Rolim escreve sobre algumas incursões pentecostais nas eleições de 1982
a 1990.
205
Ele cita duas pesquisas: uma de Sandra J. Stoll, referente ao município de Embu
(SP), em 1982, e outra de G. U. Kliewer, sobre eleições em município (não especificado)
de Mato Grosso. Em ambos os casos os pesquisadores chegaram à mesma conclusão: os
interesses particulares dos pentecostais sobrepujam os interesses coletivos da sociedade.
Uma frase de um pentecostal, citada por Rolim, exemplifica bem isto: “Votar em
evangélicos e em candidatos do partido do governo é contar com recursos para nós”.
206
De
forma mais explícita, a estratégia é formar bancada da denominação, que deve fazer
campanha em dobradinha com candidato majoritário da situação, para depois cobrar este
serviço eleitoral na forma de benefícios materiais para a igreja.
No caso da Igreja Universal do Reino de Deus, Mariano descreve situações que
violentam a liberdade dos seus pastores, como planejamento familiar e vasectomia, ditados
pelos superiores da organização.
207
A instância máxima de comando da IURD é o Conselho
Mundial de Bispos, sucedido pelos Conselhos Nacionais e, mais abaixo, pelo Conselho de
Pastores, mas, na prática, quem decide sempre é o bispo primaz, Edir Macedo. Segundo
Roberto Augusto Lopes, na Universal não havia, de fato, assembléia-geral do presbitério:
Macedo tomava decisões, mandava redigir uma ata e a diretoria assinava, juntamente com
alguns pastores. Mesmo assim, o sucesso dessa denominação não se explica apenas pela
qualidade da sua liderança carismática. Mariano menciona o tipo de público atendido, o uso
eficiente dos meios de comunicação, uma certa padronização em seus produtos simbólicos,
203
Idem, p. 285.
204
Idem, p. 286, com grifo no original.
205
ROLIM, 1994, p. 72-6.
206
Idem, 1994, p. 74.
207
Cf. MARIANO, 1999, p. 60-2. É importante assinalar que este tipo de disciplina causa espécie a quem está habituado a olhar o
pentecostalismo segundo a perspectiva do individualismo liberal protestante, ou segundo pressupostos da autonomia do indivíduo
na modernidade. Entretanto, há exemplos de disciplina mais rígida do que a exigida na Igreja Universal, por parte de congregações
masculinas e femininas da Igreja Católica.
98
como ênfases de campanhas e até temas de pregação semanal, aliados à adequação dos
métodos de trabalho da Igreja a cada ambiente onde atua, como fatores importantes para
explicar esse sucesso.
208
Há, também, no texto de Mariano, uma ampla abordagem sobre o tratamento que a
mídia aplica à Universal, com destaque para ações e palavras de seu líder. O pesquisador
analisa versões de fatos e aponta preconceitos registrados na cobertura jornalística. Quanto
à participação da Universal na política, Mariano assinala a competência da Igreja para lidar
neste campo, que inclui ingredientes como: formas realistas, pragmáticas e utilitaristas de
praticar o jogo do poder, aplicação de clientelismo nas relações com as autoridades do
executivo e postura antiesquerda.
209
Seu engajamento na disputa por espaço político tem
objetivado defender interesses do conglomerado de empresas da Igreja, em contraposição a
fiscalizações da Receita Federal, Previdência Social e outras instâncias públicas. À
semelhança de outros políticos evangélicos e daqueles que seguem a linha oficial da Igreja
Católica, os parlamentares da Universal também se opõem à liberalização de costumes, no
que concerne à união civil entre homossexuais, legalização do aborto, descriminalização do
uso de drogas e causas afins.
208
Idem, p. 63-9.
209
Esta postura foi mudando já no final do segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, quando o jornal oficial
da Igreja, a Folha Universal, e seus parlamentares, faziam críticas ao caráter neoliberal do governo. A mudança de lado adotada pela
IURD culminou com o apoio dado, através do Partido Liberal, ao candidato do PT à presidência, em 2002, no segundo turno da
eleição. No primeiro turno, a Igreja demonstrou apoiar Anthony Garotinho, candidato assumidamente evangélico, concorrente
filiado ao PSB, naquele ano. A pesquisa de Ricardo Mariano foi anterior a estes acontecimentos, pois ele defendeu sua dissertação
de mestrado em 1995. (MARIANO, 1999, p. 91-8).
99
1.3.6 Gregarismo
“A sociabilidade brasileira é gregária, fundada na inserção em redes e, por
extensão, na valorização dos contatos pessoais”, segundo Sorj.
210
Enquanto as relações de
produção no campo e na cidade não se tornam eminentemente capitalistas, “permanecem
valores e padrões comunitários e patrimoniais”, que impedem a luta política dos
trabalhadores como classe para si.
211
Ianni assim discorre sobre este tema:
Em condições de existência marcadas pela situação comunitária e patrimonial tradicional,
impera o voto de cabresto, a política de campanário, o coronelismo, a tocaia, as técnicas do
engano, o misticismo, o mutirão, as relações de compadrio, inclusive com os proprietários
das terras e dos instrumentos de produção. Nesse universo, as tensões sociais desdobram-se
no misticismo ou na violência individualizada e anárquica. Nessa situação, o trabalhador
não dispõe de recursos culturais e intelectuais para definir o proprietário ou o capataz como
outro. Todos participam do mesmo nós. E quando ele pensa o proprietário das terras como
“outro”, não o toma como categoria política, mas apenas como categoria social, bafejada
pela tradição, a sorte e os laços de família.
212
Devido a essas condições, que limitavam a ação político-ideológica nas zonas rurais
do Nordeste, pode-se entender porque Ligas Camponesas e sindicatos rurais não avançaram
na radicalização pela reforma agrária ou em projeto mais arrojado, que seria uma revolução
popular, a partir do campo, no início dos anos 60:
Francisco Julião, que simbolizava a liderança radical de esquerda no ambiente rural
brasileiro em especial no Nordeste sabia que os trabalhadores agrícolas que estavam
formando ligas, associações e sindicatos não dispunham de experiência propriamente
política para avançar no sentido da revolução. Ele sabia que a “foice” nas mãos do
trabalhador era ainda um instrumento de violência anárquica e não de violência
revolucionária. A consciência que o trabalhador possuía da própria situação não lhe permitia
210
SORJ, 2001: p. 31, grifado no original.
211
A mudança do comportamento de massa para ações orientadas por interesses de classes, identificada na luta social como
passagem da condição de classe em si para a de classe para si, foi objeto de discussões entre autores marxistas. Confrontar, por
exemplo: LUKÁCS, György. História e consciência de classe. Porto: Escorpião; São Paulo: Martins Fontes, 1974;
POULANTZAS, Nicos. As classes sociais no capitalismo de hoje. Rio de Janeiro: Zahar, 1978 e MARCUSE, Herbert.
Ideologia da sociedade industrial. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
212
IANNI, 1988, p. 71, com grifos.
100
distinguir claramente entre a liga e o sindicato, o pelego e o líder, o padre e o misticismo,
Julião e Jango (João Goulart).
213
Os sindicatos rurais naquela época foram organizados com o mesmo caráter
assistencial e recreativo dos seus congêneres nas cidades. A Igreja Católica cumpria seu
papel conservador, de apoio e perpetuação da estrutura fundiária, protegendo os
latifundiários e usineiros do Nordeste, através da atuação do padre Melo
214
, que, para
tranqüilidade desses grandes proprietários, aproveitava a ignorância dos camponeses, como
obstáculo à sua conscientização política.
Em 1979, Regina Reyes Novaes apresentou dissertação de mestrado em
Antropologia Social, ao Museu Nacional, UFRJ, resultante de pesquisa sobre “o significado
e as repercussões da filiação religiosa de camponeses a uma Congregação da Assembléia de
Deus” no agreste pernambucano.
215
Em outras palavras, o objetivo de Novaes foi pensar as
repercussões da opção religiosa pentecostal na prática social de seus adeptos.
216
Era um
caso de aplicação do paradigma weberiano da ética, neste caso, uma ética pentecostal,
como forma de analisar relações sociais de uma comunidade rural brasileira.
Em seu estudo, Novaes observa condições de pertença e redes de relacionamento no
interior da comunidade pentecostal, mas trata, também, das relações de seus adeptos com a
sociedade rural envolvente e até de aspectos da migração deles para o mundo urbano. O
significado de “ser crente” numa região de catolicismo tradicional e popular foi estudado
em suas implicações identitárias, bem como o comportamento de seita do movimento, o
controle social sobre os fiéis e as defecções de alguns. O conjunto forma um quadro do
objeto em sua época e lugar.
213
Idem, p.77.
214
Padre Melo foi um dos dirigentes do Serviço de Orientação Rural de Pernambuco (SORPE), entidade ligada à Igreja Católica e
encarregada de organizar trabalhadores rurais em cooperativas e sindicatos. O padre Melo usava um discurso inflamado, mas suas
práticas eram conservadores. Ele tinha vínculos com o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), órgão financiado pela
Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos da América (CIA). Sobre o assunto, conferir: ANDRADE, Manoel Correia
de. Lutas camponesas no Nordeste. São Paulo: Ática, 1989; AZEVEDO, Fernando. As ligas camponesas. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1982; PAGE, Joseph. A revolução que nunca houve: O Nordeste do Brasil 1955-1964. Rio de Janeiro: Record,
1972; ABREU E LIMA, Maria do Socorro. O sindicalismo rural em Pernambuco.
http://www.fundaj.gov.br/licitacao/observa_pernambuco_01.pdf. Acesso em 20 de janeiro de 2007.
215
A dissertação foi publicada como: NOVAES, Regina Reyes. Os escolhidos de Deus: pentecostais, trabalhadores e cidadania.
Rio de Janeiro: Marco Zero, 1985, p. 9.
216
Idem, p. 24.
101
Novaes verificou que o comportamento dos “crentes” se regia pela ética da
submissão às autoridades. Em função disto, eram intransigentes na cobrança de seus
direitos trabalhistas, porque tinham bem assentado que competia aos patrões e governantes
zelarem pelo cumprimento da lei. O fato de se tratarem como irmãos levava-os a uma
relação horizontal intensa e facilitava o surgimento de líderes na comunidade, com efetivos
ganhos em aprendizado político. De certa maneira, o discurso religioso tinha ressonância
nas práticas sociais do grupo que foi objeto da pesquisa.
217
Toda sociedade, por mais individualista que se apresente, organiza-se em redes e
laços de solidariedade. No caso brasileiro, a existência dessas redes é reforçada pelo
patrimonialismo e pelo corporativismo. É difícil a prática da sinceridade e da crítica,
porque ninguém conhece os relacionamentos de seus pares e não sabe quando vai necessitar
de outra pessoa, num tipo de sociedade em que vale mais a informalidade, a boa vontade e
o favorecimento do que a racionalidade burocrática.
Sorj escreve que “a sociedade brasileira é lúdica”.
218
Admite-se que esta condição
esteja agregada à informalidade e flexibilidade com que se é capaz de enfrentar as mais
diversas situações. A sociedade brasileira, quer por sua composição étnica e miscigenação
quer pelas condições históricas de sua formação, não sucumbiu a níveis profundos de
disciplina dos corpos humanos que foi atingido por outras sociedades capitalistas. A
desvalorização do passado pode tê-la deixado livre de traumas, remorsos e culpas. Em
geral, são valorizados relacionamentos afetivos, o que favorece a sociabilidade, mas
também é um fator que colabora para a sobrevivência de práticas patrimonialistas.
1.3.7 Futurismo
Na percepção de Sorj, “a sociedade brasileira está voltada para o futuro”.
219
Existia um mito no século XIX, trazido da Europa e alimentado até recentemente, de que o
branqueamento da sociedade brasileira, pela miscigenação com os migrantes e a superação
do que havia de ruim em nossas três “raças” constitutivas (português, índio e negro),
217
Cf. NOVAES, 1985, p. 126-46.
218
SORJ, 2001, p. 35, grifo no original.
219
SORJ, 2001, p. 33, grifado.
102
permitiria o pleno aproveitamento das potencialidades naturais do Brasil, de modo a
permitir o desenvolvimento, neste território, de uma grande e vitoriosa sociedade. Todavia,
isto só iria acontecer no futuro, quando o predomínio da raça branca se tornasse realidade,
ou se estabilizasse uma nova raça, sem as impurezas e fraquezas das freqüentes misturas.
Implicações desse mito perduram na atitude aberta para com estrangeiros em
paralelo com uma desvalorização das raízes nacionais. Também a idéia de país pobre que
deveria prosperar permite o convívio pacífico de populações exploradas com uma elite rica
e poderosa, verdadeiro bolsão de plutocratas, rodeados de multidões privadas de bens
materiais e direitos de cidadania, sem que manifestem ressentimentos e promovam
mobilizações contra essas iniqüidades sociais.
A invenção deste País foi alicerçada no mito do “Brasil grande”, o paraíso do
Eldorado
220
, apequenado por uma sociedade com auto-estima bem reduzida ao se
contemplar no espelho de nações poderosas do hemisfério norte, principalmente.
Esforços de reversão para elevar a auto-estima brasileira foram realizados, como: a
Semana de Arte Moderna em 1922, a disseminação da ideologia do nacional-
desenvolvimentismo, nos anos de 1940 a 60, a construção de Brasília, com conseqüente
esforço de interiorização e modernização do País, e os mega-projetos da ditadura militar,
acompanhados de propaganda ufanista, cujo tema era o Brasil como potência emergente,
que ninguém seria capaz de segurar.
221
Entretanto, como lembra Carlos Lessa:
A apropriação do país do futuro pelo autoritarismo obrigou a oposição a dizer o quanto essa
visão era mentirosa. Se o Brasil Grande afirmava que não havia preconceito, a oposição
tinha que mostrar os preconceitos existentes. Se o discurso do Brasil Grande afirmava-o
capaz de prodígios, era preciso dizer que para cada feito havia um desastre adicional
220
Sobre o Eldorado, tratava-se de um lago, supostamente localizado na fronteira de Venezuela, Colômbia e Brasil, com muito
ouro acumulado em seu leito. Foram organizadas algumas expedições de europeus, principalmente espanhóis e alemães, que
rumaram em busca desse lugar. O fundamento do Eldorado era uma lenda sobre o ritual de coroação de certa tribo indígena, cujo
novo rei era besuntado de resina e todo o seu corpo coberto de ouro em pó (el hombre dorado). Durante a cerimônia, esse rei
mergulhava no lago e retirava o ouro da sua pele, enquanto a corte acompanhante lançava às águas jóias e outros artefatos
preciosos. Cf. LEY, Willy; CAMP, Spragna de. Da Atlântida ao Eldorado. Belo Horizonte: Itatiaia, 1961, p. 199-220.
221
No governo militar de Garrastazu Médici, eram propagados slogans, tais como, “Ninguém segura este país!” e “Brasil: ame-o
ou deixe-o!”, ou a letra da música da conquista do campeonato mundial de futebol: “A taça do mundo é nossa, com brasileiro não
há quem possa!”.
103
associado. Enfim, o discurso da demolição desqualificava tudo o que o governo autoritário
fizesse ou dissesse. Com isso, jogou-se fora a água do banho, mas com a criança dentro...
222
Essas tensões entre projetos de grandeza e realidades frustrantes não apagaram a
esperança do povo por dias melhores. A fé num “salvador da pátria”, a irromper como o
messias do sebastianismo brasileiro, com a grande tarefa de refundar a nação, reaparece
cada vez que se mergulha numa crise ou se instala um novo ciclo eleitoral.
223
Não obstante,
é preciso reconhecer que a imagem do político está em baixa, principalmente depois dos
escândalos de corrupção e conseqüente instalação de algumas comissões parlamentares de
inquérito, durante o primeiro governo Lula (2002-6). No mesmo período, eram dissipadas
expectativas de mudança econômica e política, exigidas pelo eleitorado que votou no
candidato do Partido dos Trabalhadores, com base em seu discurso de oposição. Isto
também trouxe enfraquecimento a movimentos sociais e provocou reformulações
partidárias no campo das esquerdas. Avaliações sobre o panorama político deste governo e
respectiva legislatura somente poderão ser realizadas, de forma menos apaixonada, daqui a
alguns anos.
As formas de ver o mundo, nos ambientes pentecostal e neopentecostal, acalentam
expectativas de um futuro melhor, seja no além seja aqui e agora, como se procura explicar
a seguir. Isto desempenha papel ativo como fator de influência na mentalidade popular
brasileira e apresenta implicações também na política.
Segundo Josildeth Consorte, “a mentalidade messiânica se apresenta sempre com as
mesmas características básicas, nas quais a crença na interferência do sobrenatural nas
transformações a serem operadas no mundo ocupa uma posição central”, adicionada à
crença “de que esta interferência se manifestará através do envio de um salvador”, o que
222
LESSA, Carlos. Auto-estima e desenvolvimento social. Rio de Janeiro: Garamond, 2000, p. 46.
223
O sebastianismo é uma construção do imaginário da cultura brasileira, cuja origem
está no mito do desaparecimento de D. Sebastião, rei de Portugal morto aos 24 anos de idade na
batalha de Alcácer-Kibir (África). Ele está presente em movimentos messiânicos, em caracteres
místicos gerais e modos de vida de populações rurais, nas diversas regiões do país,
mas também é encontrado em aspectos da cultura urbana e da mentalidade política
brasileiras. O sebastianismo deve ser tratado como um elemento de interpretação de
práticas políticas do nosso País. Leituras sobre o assunto: HERMANN, Jacqueline , No reino
do desejado - A construção do sebastianismo em Portugal (séculos XVI e XVII ), São Paulo: 1998;
PEREIRA DE QUEIROZ, Maria Isaura. Movimentos messiânicos no Brasil e no mundo. São Paulo:
Dominus/USP, 1965; CUNHA, Euclides da. Os sertões. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1936; e obras em
geral sobre messianismo no Brasil.
104
possibilitará o desencadear de um movimento com características messiânicas. O grupo que
assim crê também alimentará outras convicções, como:
a crença numa igualdade fundamental entre todos os seres humanos e num destino também
comum o encontro com o criador depois da morte; [...] uma crença em que o fim dos
tempos será precedido de sinais que só o enviado divino será capaz de perceber e
decodificar; uma crença em que só partilharão do reino da eterna felicidade os eleitos do
Senhor, ou seja, aqueles que ouvindo o messias alcançarão a salvação.
224
Esses ingredientes podem ser encontrados no objeto de pesquisa, tanto no
pentecostalismo clássico, tipo Assembléia de Deus, como no neopentecostalismo, tipo
Igreja Universal do Reino de Deus, para delimitá-los aqui em apenas dois exemplos.
Entretanto, em nenhum desses casos houve uma sublevação da ordem, formação de guetos
e conseqüente arregimentação das forças do Estado contra eles. É bem verdade que também
não foram movimentos acolhidos com cordialidade pela sociedade brasileira. Muito pelo
contrário, sua assimilação ainda guarda reservas, que se revelam aqui e ali, dependendo de
circunstâncias, como nas festas religiosas do catolicismo popular, quando se acentuam
diferenças entre “os crentes” e a maioria cató lica. De todo modo, entende-se que, apesar
das dificuldades apontadas, pode-se enfocar os movimentos pentecostais como expressões
messiânicas-milenaristas no contexto religioso brasileiro.
O pentecostalismo clássico, tipo Assembléia de Deus, oferece um modelo de
messianismo-milenarismo transcendente e futuro, no qual o messias Jesus Cristo
implantará um governo milenial, regido por ele, próximo do final dos tempos. Sua fonte
inspiradora principal é o dispensacionalismo, disseminado pelo advogado Cyrus Ingersol
Scofield.
225
Há uma riqueza de ingredientes nesta ideologia, que se pretende expor aqui,
resumidamente.
224
CONSORTE, Josildeth Gomes. Mentalidade messiânica. In: VV. AA. A vida em meio à morte em um país do terceiro
mundo. São Paulo: Paulinas; São Bernardo do Campo: IMS, 1983, p.44.
225
Obra de referência principal sobre dispensacionalismo é a “Bíblia de Scofield”: THE SCOFIELD REFERENCE BIBLE.
New York: Oxford University Press, 1945. Existe tradução em português: BÍBLIA SAGRADA com anotações do Dr. Scofield.
São Paulo: Imprensa Batista Regular, 1983. Cf. também o portal:
http://www.ipcb.org.br/Publicacoes/o_dispensacionalismo.htm. (acesso realizado em 12/09/2006).
105
Robson Guimarães, ao estudar o movimento pentecostal em Belo Horizonte (MG),
nas três últimas décadas do século XX, identificou a profecia de Joel, citada pelo apóstolo
Pedro
226
, como fundamental para a teologia da Assembléia de Deus. Segundo Guimarães:
[Essa profecia] relaciona diversos acontecimentos que apontariam para a chegada do “fim
dos tempos”: o derramamento do Espírito, a manifestação de dons espirituais miraculosos
profecias, visões, sonhos uma natureza transtornada e a extensão da salvação a todos os
povos. Em primeiro lugar, a promessa do batismo do Espírito se insere dentro da
emergência dos “últimos dias”; em segundo lugar, a pregação do Evangelho em todo o
mundo também será um acontecimento desencadeador da “consumação do século”; e, em
terceiro lugar, as manifestações de cura divina e de milagres dar-se-ão neste tempo
escatológico. Segundo a hermenêutica pentecostal, no decorrer da história da igreja cristã, a
partir da corrupção do cristianismo pelo catolicismo romano, este tempo que desembocaria
no fim de todas as coisas ficou em suspenso. Somente com a Reforma Protestante do século
XVI é que o cristianismo recuperaria parte do seu vigor original, atingindo, porém,
novamente a sua plenitude somente com o advento do movimento pentecostal. Por isso, ser
pentecostal desencadeia novamente o restabelecimento do processo dos últimos dias ou do
“fim dos tempos”, parado desde a “constantinização” da Igreja.
227
De acordo com esta interpretação, o pentecostalismo clássico é de fato uma crença
inspirada em acontecimentos escatológicos. E, neste caso, cabe a observação de Guimarães
sobre a centralidade da expectativa da segunda vinda de Cristo na experiência religiosa dos
assembleianos.
Na cosmovisão dos pentecostais da Assembléia de Deus, a crença na volta
iminente de Cristo desempenha um papel central. Ou seja, para a
compreensão do pentecostalismo, neste período [1970-2000], a crença na
segunda vinda de Cristo não pode ser considerada marginal, porque estes são
tempos apocalípticos. [...] Esta crença reforça e fortalece tanto a dimensão da
226
Cf. em qualquer exemplar da Bíblia o texto de Atos 2: 14-21.
227
GUIMARÃES, Robson Franco. Os últimos dias: crenças, sentimentos e atitudes dos pentecostais da igreja Assembléia de
Deus diante da volta de Cristo. Monografia apresentada em cumprimento parcial às exigências da disciplina História Social da
Religião do programa de pós-graduação em Ciências da Religião Mestrado. São Bernardo do Campo: Umesp, julho/2003, p.4-5.
(Inédita).
106
conversão quanto da experiência do batismo com o Espírito Santo e do
exercício dos dons espirituais.
228
Até aqui considerou-se uma face da questão: os messianismos-milenarismos
desenvolvidos em expressões tradicionais do movimento pentecostal. Tem sido comum
associar pentecostalismo com população pobre. Muitos estudos acadêmicos insistiram neste
enfoque
229
. Para tal tipo de pentecostalismo, a ética de rejeição ao mundo e a realização do
reino milenial fora da história se harmonizavam perfeitamente.
230
Ocorre que a partir dos anos 1970, acentuou-se um processo de mobilidade social
ascendente no campo pentecostal, com surgimento de novas igrejas e reformulação das
existentes, nas quais a tônica passava a ser um “basta” na miséria e sofrimento, através de
uma teologia que proclamava a condição superior do crente na Terra. Paulo Siepierski
assim se manifestou sobre este novo fenômeno:
Como em uma situação de rápidas transformações sociais quanto mais ajustada
uma resposta está em um determinado momento mais desajustada ela estará no próximo, a
mensagem pentecostal se tornou anacrônica. A esperança de um reino futuro já não é
atraente. O que seduz agora é um reino de Deus presente, universal, cujo desfrute está
acessível a todos. Ademais, o arrefecimento do fluxo migratório, agora direcionado do sul
para o noroeste, diminui substancialmente o público recém-urbanizado, tradicional celeiro
de pentecostais. Isso forçará o pentecostalismo a buscar conversos nas outras religiões
urbanas, principalmente na umbanda. Nessa nova realidade surge o pós-pentecostalismo,
que se diferencia tanto do pentecostalismo clássico como do protestantismo tradicional.
231
Este modo de buscar solução para os problemas da vida se expressa em cultos e
reuniões das igrejas neopentecostais. A Universal e a Internacional da Graça de Deus
passaram a fazer reuniões temáticas para tratar de pessoas com crises nos negócios, com
problemas familiares e emocionais, vítimas de maldições e “encostos”, desempregados,
enfermos e portadores de outras necessidades.
228
Idem, p. 5.
229
A associação do pentecostalismo com camadas pobres da população está presente em estudos de MARIZ (1994),
MACHADO (1996), ROLIM (1980), CHESNUT (1997), dentre outros.
230
Sobre este assunto, cf. WEBER, Max. Rejeições religiosas do mundo e suas direções. In: COHN, Gabriel (org.). Weber. São
Paulo: Nova Cultural, 1997. (Coleção Os Economistas), p. 155-189.
231
SIEPIERSKI, Paulo Donizéti. Mutações no protestantismo brasileiro: o surgimento do pós-pentecostalismo. In: DREHER,
Martim N. (org). 500 anos de Brasil e igreja na América Meridional. Porto Alegre: EST/Cehila, 2002, p. 414-5.
107
O modelo de messianismo-milenarismo, expresso no neopentecostalismo ou pós-
pentecostalismo, como prefere Siepierski, é imanente e presente, manifesto de duas
formas diferentes: a primeira, através da ética da prosperidade, pregada, principalmente,
pela Igreja Internacional, do missionário Romildo R. Soares, porém comum a outras igrejas
que pregam essa “confissão positiva”, e a segunda, através de um projeto concreto, a
Fazenda Canaã, vinculada à figura do bispo Marcelo Bezerra Crivella, da Igreja Universal
do Reino de Deus e atual senador pelo Estado do Rio de Janeiro (2003-10). Este
milenarismo realizado aqui e agora não se limitou às sessões de desafio à fé, onde esta é
testada pela entrega de ofertas cujo valor deve demonstrar o risco assumido pelo
contribuinte, ao depositar tudo o que tem sobre o altar, provando, assim, que aceitou o
desafio de fazer um trato com Deus. Ele se efetivou, também, através de amplas campanhas
de solidariedade pelo “povo sofrido do Nordeste”, a fim de arrecadar fundos para implantar
a referida fazenda, no estilo dos kibutz de Israel.
O poder aquisitivo e o padrão de vida da classe média brasileira vieram decaindo ao
longo das últimas três décadas, período que coincide com o nascimento e ascensão da
Igreja Universal do Reino de Deus. Esta igreja e outras que compõem o chamado
neopentecostalismo quebraram a tradição protestante e pentecostal clássica de ênfase na
disciplina, proibição de hábitos considerados mundanos e ascese de negação do presente
século. Essas novas igrejas e movimentos carismáticos que proliferaram igualmente em
igrejas tradicionais, no mesmo período e com mesma inspiração, trouxeram uma proposta
de prosperidade, vitória, saúde, sucesso nos negócios, segurança na profissão, enfim, de
fruição de riquezas que já estão preparadas por Deus para aqueles que acreditam e tomam
posse delas.
Ora, este discurso e o ambiente de exaltação emocional que ele provoca são muito
semelhantes aos surtos milenaristas dos cargo cults, principalmente no aspecto de
resultados, prometidos pelos clérigos. Os cultos cargo, ou “cargueiros”, constituíam um
conjunto de movimentos messiânicos surgidos na Oceania, em decorrência da chegada de
carregamentos de provisões, destinados quase exclusivamente aos brancos. Induzidos pelos
xamãs, os indígenas passaram a acreditar que esses carregamentos eram dádivas de seus
ancestrais, interceptadas e sequestradas pelos colonizadores europeus. A partir desta
108
concepção, os nativos repudiaram a religião dos missionários e reforçaram o culto aos
ancestrais, com expectativas milenaristas de prosperidade e restauração de suas culturas
232
.
Campos observa que:
são os indivíduos em trânsito, marginalizados, situados nas fronteiras de
ordenamentos sociais diversos, socialmente localizados nos pontos intermediários de
“províncias de significados”, ou em fase de “alternação”, que se entregam a sonhos que
implicam na negação do passado e do presente, e na aceitação de uma teodicéia, que lhes
garanta ser possível a mudança de vida, de uma forma imediata e global.
233
Essa forma de “compensação”, ainda que meramente simbólica, face as perdas de
qualidade de vida na classe média e negação do essencial na população empobrecida,
realizada através de promessas de prosperidade, tem tido tanto apelo popular que, na falta
de alternativa, levou setores politizados, como o Partido dos Trabalhadores, a se aliar com o
Partido Liberal, espaço onde estavam sendo executadas importantes estratégias do projeto
político da Igreja Universal do Reino de Deus. Ou seja, o maior segmento da esquerda
brasileira resolveu coonestar as ilusões do discurso “cargo” da Igreja mais atuante do
campo neopentecostal brasileiro.
Seria capitulação, oportunismo político, ou reconhecimento de impotência para virar
o jogo político, face à improvável capacidade de criar uma alternativa ao projeto neoliberal
em curso? Somente o desenrolar da história, em média ou longa duração, trará resposta a
esta pergunta. O fato é que, “o sucesso da pregação neopentecostal é o melhor exemplo da
falência de um projeto religioso modernizante, que provocou a cisão entre o desejo e
religião, imaginário e ritual, culto e lazer, corpo e alma”
234
A solução kibutz, trazida pelo bispo Crivella, é ideal para quem não quer enfrentar
questões como a perversa estrutura fundiária brasileira e a acumulação de riquezas,
concentradas pelos plutocratas do nosso País. Quem sabe, o que tem sido bom para os
capitais judeu-norte-americanos que se estabeleceram em Israel, deverá ser bom para os
nordestinos miseráveis do Brasil!...
232
Conferir o verbete Cargo cults . In: DESROCHE, Henri. Dicionário de messianismos e milenarismos. São Bernardo do
Campo: Umesp, 2000, p. 140.
233
Cf. CAMPOS, 1999, p. 436.
234
CAMPOS, 1999, p. 438.
109
Esse projeto não é apenas um efeito-demonstração de competência da Igreja
Universal, como se estivesse a proclamar: “Mesmo não tendo a máquina do governo nas
mãos, provamos que somos capazes de resolver os problemas do Nordeste. Deleguem o
poder a nossa corporação, que transformaremos o Brasil na nova Jerusalém celestial”. De
forma bem realista, a Fazenda Nova Canaã foi e continuará sendo um cabo eleitoral eficaz
na trajetória de ocupação dos reinos desta terra pela Igreja Universal do Reino de Deus.
Eles conseguiram estabelecer uma sintonia entre os sonhos dos oprimidos e a
realidade “intocável” dos “donos do poder”. Lembrando o que disse Campos, o milênio da
Igreja Universal já está presente e ocupa as 24 horas do dia.
235
Trata-se de uma nova forma
religiosa de populismo. A política praticada por esta Igreja se ajusta ao ideal que as forças
conservadoras tanto alimentam, inspiradas em Lampedusa, ou seja, prometem mudar tudo a
fim de não mudar nada.
236
1.4 Religiosidade e cultura política brasileira
“A sociedade brasileira é religiosa”.
237
Sorj considera a religiosidade brasileira “a
principal fonte de esperança, resignação e confiança no futuro da quase totalidade do
povo”.
238
Ele aponta a influência das religiões afro-brasileiras e evangélicas, embora
reconheça a tradição católica predominante. Além disto, constata, também, que há um certo
“pragmatismo” dos protagonistas religiosos, caracterizado pelo trânsito religioso e o
sincretismo.
Religiosidade e modernização política não estão dissociadas. Para Sorj, a formação
de instituições políticas modernas no Brasil não esteve integrada nem contraposta ao
discurso religioso
239
, mas este é apenas um aspecto da realidade, porque é possível perceber
que a religiosidade brasileira tem sido o substrato cultural do discurso econômico,
235
Idem, p. 439.
236
Esta idéia aparece como “solução” para os nobres latifundiários do sul da Itália manterem seus privilégios, conforme frase de
um personagem do romance “O leopardo” de Lampedusa: “se queremos que tudo fique como está, é preciso mudar tudo”. Há
edições em português. Cf. DI LAMPEDUSA, Giuseppe Tomasi. O gattopardo. Rio de Janeiro: Record, 2000; ____________. O
leopardo. São Paulo: DIFEL, 1960; e ____________. O leopardo. Barcarena, Portugal: Presença, 1997.
237
SORJ, 2001: p. 31, grifo no original.
238
Ibidem.
239
Idem, p. 31.
110
moralidade e todo o imaginário político que se manifestou (e costuma se manifestar) em
messianismos do advento de um “salvador da pátria”. Trata-se de sentimento que emerge
com facilidade (e com a mesma facilidade se frustra), como ocorreu durante a ascensão e
queda de Fernando Collor de Mello à presidência da República (1989-1991) ou na mais
recente eleição de Luís Inácio Lula da Silva e seu governo, que já na campanha era
condicionado pelos humores dos agentes do capital financeiro, e posteriormente conturbado
por diversos episódios de corrupção e investigações no âmbito parlamentar.
240
Essa religiosidade esteve presente em ações que culminaram no golpe militar de
1964. O Presidente João Goulart escreveu, de Montevidéu, minuta de uma entrevista para o
jornal Correio da Manhã. Em certo trecho do manuscrito, ele confere importância à
manipulação do sentimento religioso do povo brasileiro, como fator que pesou em sua
deposição. Foram realizadas as Marchas da Família, com Deus, pela Liberdade, de cunho
anticomunista, atiçadas por setores conservadores do catolicismo. Sobre elas, Jango
escreveu o seguinte: “nas grandes passeatas os cartazes não eram dirigidos contra a pessoa
do Presidente ou contra as reformas de base por ele preconizadas. Todos visavam a atingir
o sentimento profundamente religioso do povo e mostrar o perigo iminente da tomada do
poder pelos comunistas”.
241
A religiosidade também está presente no otimismo com o futuro, em grandes
projetos, como foi a construção de Brasília por Juscelino Kubitschek, e em obras faraônicas
da ditadura militar, causadoras de grande parte da dívida brasileira aos bancos
internacionais. Alguns destes projetos estão inacabados e abandonados: são ruínas que
comprovam a insanidade de quem governa contra os cidadãos. O mito de que “Deus é
brasileiro” é outra forma de manifestar esse otimismo. Está presente no futebol, em festas
em geral e no carnaval em particular, e, mais ainda, na celebração de uma natureza
exuberante, que de fato habilita o território do País como espaço ideal para a implantação
de inúmeros empreendimentos.
240
Haja vista a “Carta ao povo brasileiro”, divulgada na campanha de 2002, na qual o candidato Lula assegurava compromisso
com a continuidade da política financeira do seu antecessor. (Cf., por exemplo: BETTO, Frei. A mosca azul. Rio de Janeiro:
Rocco, 2006).
241
Cf. BANDEIRA, Moniz. O governo João Goulart: as lutas sociais no Brasil (1961-1964). Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1977: p. 166.
111
Segundo interpreta Sorj, tanto as características das religiões afro, com ênfase em
sentimentos e relações interpessoais, como as do catolicismo, no que tange à resignação e
esperança em milagres, reforçaram a cultura patrimonialista, embora ele reconheça que
inexistem pesquisas históricas neste campo, capazes de fundamentar sua opinião.
242
1.5 Sociedade civil, novas identidades coletivas e
pentecostalismos
A sociedade brasileira vem apresentando transformações substantivas, no contexto
da redemocratização do país, a partir do Congresso Constituinte de 1987-88. Desde aquele
tempo, as instituições políticas estão em processo de consolidação, enquanto que a
sociedade civil tem-se ampliado, seja pelo surgimento de novas organizações ou
fortalecimento das já existentes, seja pela tomada de consciência e inclusão de novos atores
e novas identidades coletivas, no jogo das forças sociais que compõem o espaço
democrático.
A teoria sociológica recente indica uma condição de fluidez para as identidades
coletivas da sociedade, construídas em relações sociais que variam para atender
necessidades dos atores envolvidos.
243
Entretanto, como isto se dá num campo de forças em
disputa, é inevitável que uns ganhem e outros percam. Essa mesma teoria aponta para o
caráter fragmentado, impuro e híbrido das novas identidades. E indicam que elas são
construídas pela mescla de diferentes tradições, segundo um processo de tradução que
permite a essa nova cultura híbrida resultante conviver em diferentes contextos. O quadro
brasileiro registra a existência e atuação de segmentos religiosos, de composição complexa,
agrupados nas categorias pentecostalismo e neopentecostalismo, cujo crescimento e atuação
marcam presença de forma singular na sociedade civil e no cenário político do País.
244
242
SORJ, 2001, p. 32.
243
Cf., por exemplo, HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2001; MELUCCI,
Alberto. A invenção do presente. Petrópolis: Vozes, 2001.
244
Uma visão geral desses segmentos religiosos e suas igrejas encontra-se, respectivamente, nas obras: CAMPOS; GUTIÉRREZ,
1996; e MARIANO, 1999.
112
A propósito do conceito sociedade civil, justifica-se um pequeno excurso. Esta
concepção tem percorrido a teoria política desde Aristóteles, passando por Rousseau,
Gramsci e outros, até chegar a um conjunto de teóricos atuais de diferentes convicções. No
caso desta tese, toma-se como ponto de partida a concepção de Charles Taylor, que trata
sociedade civil como “uma rede de associações autônomas e independentes do Estado, as
quais agrupam os cidadãos em torno de interesses comuns e que através de sua mera
existência ou atividade podem desencadear efeitos sobre a política”.
245
Para melhor
entendimento, acrescenta-se o seguinte: a sociedade civil abrange todo tipo de iniciativa
que promove espírito cívico de participação conjunta na construção de uma sociedade.
Neste sentido, ela é promotora de uma radicalização da democracia, mas, pela mesma
razão, gera um campo bastante heterogêneo e conflitivo de disputa de interesses e de
demandas, nas relações que mantém com os agentes econômicos (mercado) e com a
sociedade política ou o Estado. A sociedade civil também não é um agregado puro de
agentes da democracia. Há nela componentes que negam compromisso com esta forma de
governo, como grupos fundamentalistas de diversos tipos. Por conseguinte, deve-se evitar o
uso indiscriminado, acrítico, e apologético do conceito sociedade civil. Não obstante, pode-
se reconhecê-lo como mais um instrumento para ajudar a entender as sociedades complexas
que compõem a atual civilização.
Dependendo do enfoque a ser dado à questão da identidade evangélica, os
protestantes históricos, protestantes de missão, pentecostais e neopentecostais, estariam
enfrentando uma tremenda crise de identidade, um prolongado mal-estar, na interface com
a sociedade maior, mas também em relações internas do campo a que pertencem.
Verifica-se que a mídia secular, ao reproduzir o que pensa grande parte da
população brasileira, trata todos os pentecostais e protestantes, de forma confusa, dentro da
mesma categoria, ou seja os evangélicos como se só existisse uma identidade
evangélica. Um dos textos de Freston, publicado em 1996, traz análise do que vem
ocorrendo no campo religioso protestante-pentecostal. “Históricos” e “pentecostais” são
tipos ideais extremos de um continuum muito dinâmico, onde está acontecendo a
245
Apud COSTA, Sérgio. As cores de Ercília: esfera pública, democracia, configurações pós-nacionais. Belo Horizonte: UFMG,
2002, p. 45.
113
pentecostalização do protestantismo histórico e a historicização do pentecostalismo.
246
mobilidade social neste processo, percebido, principalmente, por uma ascensão do
pentecostalismo rumo às classes médias.
As mudanças ocorridas no campo religioso brasileiro, nos anos 50 e 60, são
apresentadas por Campos, com destaque para tensões entre protestantes e pentecostais,
perdas de espaço para aqueles e conquistas para estes, respectivamente. Nos anos 70, vem o
pentecostalismo com nova roupagem. É a era do “marketing do sagrado”, alcançando novos
nichos de consumidores de produtos religiosos. Neste contexto quem passa a ditar a
mensagem é a necessidade do consumidor, que vai receber “mercadorias simbólicas”,
preparadas sob medida para aliviar suas aflições.
247
Na abordagem de Pierre Bourdieu, sobre campo religioso, lê-se a seguinte
passagem:
A força material ou simbólica que as diferentes instâncias (agentes ou instituições)
podem mobilizar na luta pelo monopólio do exercício legítimo do poder religioso
depende, em cada estágio do campo, de sua posição na estrutura objetiva das
relações de autoridade propriamente religiosa, isto é, da autoridade e da força que
conquistarem no decorrer da luta.
248
Campos utiliza este princípio, para analisar mudanças no mundo religioso
protestante brasileiro, com a chegada dos neopentecostais.
249
O ingresso de atores num
campo social promove o deslocamento dos já estabelecidos. Os novos costumam se
apresentar como portadores de algo revolucionário. No caso do campo religioso, os
egressos anunciam-se como “profetas”, restauradores da verdadeira fé, em detrimento dos
estabelecidos, velhos “sacerdotes” ou “feiticeiros”. Religiões são impactadas por esses
movimentos. No caso do contexto urbano instala-se uma “situação de mercado”, que
ameaça a “situação de monopólio”
250
.
246
Cf. FRESTON, Paul. Entre o pentecostalismo e o declínio do denominacionalismo: o futuro das igrejas
históricas no Brasil. In: CAMPOS; GUTIÉRREZ, 1996, p. 257-75 e 269.
247
CAMPOS, 1996, p. 97.
248
Cf. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1974, p. 90, grifado no original
249
CAMPOS, 1996: p.96 e nota 43, às p. 117-8.
250
Cf. BERGER, Peter. O dossel sagrado: elementos para uma teoria sociológica da religião. S. Paulo: Paulinas, 1985.
114
Ao apreciar essas relações entre agentes do protestantismo histórico e agentes do
pentecostalismo, pode-se perceber a dinâmica de mutação do próprio campo e dentro deste,
de posições relativas dos seus respectivos representantes institucionais e mesmo dos
adeptos que fazem o cotidiano das denominações religiosas. Mudou a correlação de forças,
transferindo sua resultante do subcampo protestante para o pentecostal, se forem tomados
como critérios a população de adeptos, visibilidade social e presença nos parlamentos
municipais, estaduais e federal.
Para Campos, “o pentecostalismo no Brasil é tanto um movimento dinâmico como
também uma mentalidade”, porque: tem uma visão de mundo; adota práticas sincréticas,
misturando catolicismo popular, imaginário medieval e protestantismo evangelical; e assim
se manifesta como uma bricolagem religiosa. O pentecostalismo traduziu piedade e utopia
para a alma brasileira de modo não alcançável pelo protestantismo. O neopentecostalismo
acrescentou a esse imaginário popular a mentalidade de mercado, comunicação telemática e
organização empresarial. Isto provocou mudanças tanto na teologia como na eclesiologia
dos pentecostais. O culto passou a ser um espetáculo, um circo, um momento de magia,
dança, êxtase e discurso autoritário.
251
A divindade passou a ser alvo de barganhas, acionada pelo pastor-ator, a serviço do
crédulo doador. Tudo foi monetarizado. A “teologia da prosperidade” matou, na prática, a
escatologia apocalíptica. Cadeiras energizadas, com alusões ao que aconteceu no monte
Sinai e ao manto sagrado de Cristo. Fotografias, roupas, sabonetes, levados ao templo para
serem transfigurados em favor dos seus usuários. São práticas de curandeirismo, também
presentes em outras religiões brasileiras.
252
Afirmações de identidade lidam com aspectos de memória e permanência, em meio
a mudanças, e com construção de unidade, dentro da diversidade. Protestantes e
pentecostais pleiteiam o status de evangélicos, entre outros motivos, porque têm em
comum tradições da Reforma Protestante, e, no caso brasileiro, apresentam traços fortes da
obra missionária pietista e evangelical de agências oriundas, principalmente, dos Estados
Unidos da América.
251
CAMPOS, 1996: p. 98 e 102.
252
Idem, p.103.
115
Mariano também aponta mudanças no campo das chamadas religiões do Espírito,
que configuraram este novo subcampo neopentecostal. Como exemplos, ele assinala
aburguesamento parcial da membresia, institucionalização de denominações com
rotinização do carisma, busca de reconhecimento social e poder político pela nova geração
de pastores.
253
O neopentecostalismo trouxe como novidade a ênfase em sinais imediatos
de bênçãos, que os fiéis podem desfrutar aqui e agora e que substituiu o ascetismo de
rejeição ao mundo pelo sacrifício financeiro.
A Igreja Universal do Reino de Deus defende de forma aguerrida sua identidade no
espaço de influência que consegue alcançar. Ela está inventando uma tradição
254
, quando,
por exemplo, todo ano faz um programa especial, no mês de julho, pela rede de televisão
Record e o canal Mulher, no qual procura recuperar a saga histórica que a originou, tendo,
porém, o cuidado de omitir o papel determinante exercido na origem e durante os primeiros
três anos por Romildo Ribeiro Soares, como líder e principal pregador do movimento,
segundo informação de Roberto Augusto Lopes
255
, outro líder também esquecido, que se
retirou daquela igreja em 1987, dez anos depois de sua fundação. R. R. Soares saiu da
Igreja Universal em 1980 e fundou, no mesmo ano, a Igreja Internacional da Graça de
Deus, onde continua como líder absoluto, até a presente data (2006).
A prática da Igreja Universal indica sua necessidade de ganhar status histórico e
político no contexto da sociedade brasileira e perante outras parceiras eclesiais, recorrendo,
contudo, a uma falsificação da história, para atender sua necessidade beligerante de marcar
espaço dentro do já bastante congestionado subcampo neopentecostal, cuja dimensão se
agiganta, a cada dia, a ponto de ofuscar a presença de outros subcampos menos agressivos,
uma vez que estão menos avançados no uso de tecnologias mercadológicas e, sobretudo,
midiáticas.
256
253
MARIANO, 1999, p.8.
254
Confira HOBSBAUM, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra, 1984.
255
Informação publicada no Jornal da Tarde, em 09 de abril de 1991.
256
Quanto a essa prática de falsificação ou manipulação da história, lembramos que Horkheimer e Benjamin
trocaram correspondência, em 1937, sobre o assunto. Registra-se, aqui, uma parte do que foi resumido por
Flávio R. Kothe: Segundo Walter Benjamin, “a história é uma ciência e uma rememoração: aquilo que a
ciência ‘verifica’ pode ser retificado pela rememoração. Isto não no sentido de uma mera manipulação dos
dados históricos, mas no sentido de que esses ‘dados’ já são produtos da manipulação da história segundo os
interesses de classe subjacentes à historiografia oficial...” Daí, porque, cabe ao historiador “desconfiar de
todos os dados que lhe são fornecidos como dados históricos, já que estes tendem a uma visão apologética do
116
No sentido lato do termo, evangélico é um termo que identifica o cristianismo,
como movimento que se apresentou (e continua a se apresentar) portador da “boa notícia”
da salvação divina, tanto para judeus quanto para gentios.
257
Neste sentido, todas as
interpretações do cristianismo se autodenominam evangélicas.
No caso brasileiro, adotando uma tipologia em uso
258
protestantismo de
imigração, protestantismo de missão e pentecostalismo examina-se essa afirmação de
identidade nos dois últimos casos, porque são estes os que se envolvem em conflitos mais
evidentes e, também, os que se encontram mais espalhados em todo o território brasileiro.
A definição de evangélico no protestantismo de missão foi revigorada, a partir dos
anos 70, pelo Pacto de Lausanne e por movimentos como a Fraternidade Teológica Latino-
Americana e a Aliança Bíblica Universitária do Brasil, com uma atuação oposta aos
movimentos e instituições ligados ao ecumenismo do Conselho Mundial de Igrejas.
Freston, que colaborou com a ABUB, apresenta uma definição operacional, a mesma
adotada por David Bebbington, após considerar amplo debate sobre o assunto na literatura
sociológica britânica. Segundo esses autores, a categoria evangélico é definida mediante
quatro características: conversionismo ou ênfase na mudança de vida, ativismo ou ênfase
no compromisso com a evangelização e esforço missionário, biblicismo ou importância
dada ao lugar especial da Bíblia na alimentação da fé, e, crucicentrismo ou ênfase na
centralidade do sacrifício de Cristo na cruz. Os que professam a fé com estes ingredientes
são evangélicos; logo, não está em jogo, neste caso, a questão institucional.
259
O problema dessa aguerrida disputa pela identidade evangélica persiste, quando se
percebe que evangélico passou a ser uma categoria guarda-chuva, adotada pelos “de fora”,
passado ou, no máximo, apontam problemas do passado para louvar as soluções do bom presente.” KOTHE,
Flávio R. Introdução. In: ______ (org.) Walter Benjamin. São Paulo: Ática, 1991, p. 17. (Coleção Grandes
Cientistas Sociais).
257
Ênfase presente em todo o Novo Testamento, mas principalmente nas cartas paulinas. Por exemplo: Mt. 4:23; Mc. 16:15-16;
Rm. 1:16; I Co. 9; Ef. 1: 13; Fl. 1: 27-8.
258
Cf. a classificação de protestantes e pentecostais em: MENDONÇA, Antônio Gouvêa; VELASQUES
Filho, Prócoro. Introdução ao protestantismo no Brasil; SOUZA, Beatriz M. de; GOUVEIA, Eliane H.;
JARDILINO, José Rubens L. (Orgs.).Sociologia da Religião no Brasil: revisitando metodologias,
classificações e técnicas de pesquisa. São Paulo, PUC-UMESP, 1998.
259
No original, escreveu Freston: “Bebbington’s (1989) quadrilateral, used to study British evangelicalism from the 1730s to the
1980s, has found considerable acceptance as a working definition. It consists of four constant characteristics: conversionism
(emphasis on the need for change of life), activism (emphasis on evangelistic and missionary efforts), Biblicism (a special
importance attributed to the Bible, though not necessarily the fundamentalist shibboleth of ‘inerrancy’) and crucicentrism
(emphasis on the centrality of Christ’s sacrifice on the cross).” Em: FRESTON, Paul. Evangelicals and Politics in Asia, Africa
and America Latina. Cambridge, UK: Cambridge University Press, 2001, p.2. (Tradução: STCB).
117
para designar indistintamente protestantes e pentecostais. Este procedimento costuma ser
adotado, também, pelos grandes meios de comunicação, repercutindo, desta forma, o senso
comum prevalecente na sociedade. Para os que se incomodam com essa generalização, é
mais grave constatar que evangélico, cada vez mais, está servindo para designar os
seguidores de apóstolos, bispos, missionários e pastores, peritos em curas, em exorcismos
espetaculares e em fazer promessas de prosperidade. Esse segmento da população lota
templos e aparece, diariamente, como massa informe, em alguns canais abertos da televisão
brasileira.
Adeptos dos pentecostalismos mais antigos e intermediários, classificados nas
chamadas primeira e segunda onda pentecostais
260
, também se autodenominam evangélicos
e se incomodam quando são confundidas com adeptos do neopentecostalismo. Além disto,
muitos pastores aderiram ao estilo de seus colegas neopentecostais, de tal modo que está
proliferando, no pentecostalismo mais antigo e intermediário, o surgimento de igrejas locais
que adotaram a teologia da prosperidade e a confissão positiva, antes restritas às igrejas
neopentecostais.
261
Destacados esses aspectos da conturbada afirmação de identidade evangélica no
Brasil, dispõe-se de elementos para tecer algumas considerações com base em insights
teóricos de pensadores como Stuart Hall e Alberto Melucci, principalmente. Hall lembra
que as velhas identidades entraram “em declínio, fazendo surgir novas identidades e
fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito unificado.
262
Ele adota
a idéia de deslocamento ou “descentração” do sujeito. Pretende-se aplicá-la aqui para a
crise de identidade que vem sendo vivida pelos protestantes de missão, principalmente. De
fato, estes filhos da modernidade viviam dentro da fantasia de uma identidade unificada
260
Resumidamente: a primeira onda se refere aos pioneiros (1910-11) que implantaram a Assembléia de Deus
e a Congregação Cristã; a segunda, nos anos 50 e 60, é marcada pelo surgimento de igrejas pentecostais
autóctones, como a Brasil para Cristo e a Deus é Amor, mas também inclui a Igreja do Evangelho
Quadrangular; importada dos EUA; e a terceira, a partir de meados dos anos 70, é caracterizada pelo
surgimento das chamadas igrejas neopentecostais, com a Universal do Reino de Deus em destaque. (Cf.
FRESTON, 1996, p. 257-275.).
261
Sobre teologia da prosperidade e confissão positiva, podem ser lidos os livros de Kenneth Hagin, seu mais
conhecido autor, publicado, no Brasil, pela editora Graça Editorial, de São Paulo, pertencente à Igreja
Internacional da Graça de Deus. Visões críticas a essa teologia são encontradas, por exemplo, em FONSECA,
Alexandre Brasil. Evangélicos e mídia no Brasil. Bragança Paulista: Edusf; Curitiba: Ifan, 2003, e em
ROMEIRO, Paulo. Super crentes: o evangelho segundo Kenneth Hagin, Valnice Milhomens e os profetas da
prosperidade, S. Paulo: Mundo Cristão, 1993.
262
HALL, 2001, p. 7.
118
pelas certezas da “fé [...] uma vez por todas entregue aos santos”
263
. Seus sistemas
doutrinários e instituições sacralizadas eram tão celebrados intramuros que não admitiam
questionamentos. Rubem Alves até criou um tipo ideal inspirado nessa ideologia
denominacional o Protestantismo da Reta Doutrina (PRD).
264
Pois foi exatamente nesse
mundo de certezas que eclodiram, desde os anos 60, mas se ampliando em anos
subseqüentes, o movimento de “renovação espiritual”, a revolução musical pela onda
gospel e, depois do advento da confissão positiva e da neurolinguística, a fragmentação de
congregações em células, com experiências cada vez mais exóticas, indicando que houve
um liberar de emoções, onde predominavam formas de repressão em nome da fé.
Por outro lado, a afirmação da identidade evangélica, travada no campo da luta pela
produção e consumo de bens simbólicos, é uma questão que se revolve no campo das
relações sociais. Para Melucci:
A identidade coletiva é [...] uma definição construída e negociada pela ativação das relações
sociais entre os atores. Implica na presença de quadros cognitivos, de densas interações e
também das dimensões afetivas e emocionais. Aquilo que une os indivíduos em um “nós”
nunca é inteiramente traduzível na lógica do cálculo meios-fins ou na forma da
racionalidade política, mas comporta sempre margens de não negociabilidade das “razões e
dos modos de viver em conjunto.
265
Não existe uma identidade estável mantida por definição doutrinária, protegida por
estruturas institucionais ou por normas de comportamento. Talvez nunca tenha existido,
mas os processos históricos de “longa duração” podem ter permitido a grupos sociais
alimentarem essa concepção rígida de identidade coletiva. Ainda Melucci afirma que:
A identidade não se apresenta mais como um “dado da natureza, nem simplesmente como
o conteúdo de uma tradição na qual os indivíduos se identificam. Ela não é mais fundada
unicamente sobre o pertencimento a “associações reguladas normativamente (estados,
partidos, organizações). Os indivíduos e os grupos participam com a sua ação na formação
263
BÍBLIA SAGRADA, Judas 3.
264
Cf. ALVES, Rubem. Protestantismo e repressão. São Paulo: Ática, 1979.
265
MELUCCI, Alberto. A invenção do presente. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 158.
119
de sua identidade, que é o resultado de decisões e de projetos, além de condicionamentos e
de vínculos.
266
Há um outro aspecto do descentramento do sujeito, aplicável ao contexto da Igreja
Universal e de outras que copiam seu modelo. Quem entra para assistir um culto na IURD
percebe, sem muito esforço, que está dentro de um espaço vigiado por dezenas de olhos de
auxiliares do serviço religioso. Hall trata esta característica como o exercício da regulação e
da vigilância: “O poder disciplinar está preocupado, em primeiro lugar, com a regulação, a
vigilância é o governo da espécie humana ou de populações inteiras e, em segundo lugar,
do indivíduo e do corpo.” E, mais adiante, “qua nto mais coletiva e organizada [é] a
natureza das instituições da modernidade tardia, maior o isolamento, a vigilância e a
individualização do sujeito individual.
267
Primeiramente, o sistema da Universal regula a vida de pastores e bispos, conforme
modelo praticado por empresas transnacionais. Não existe área da vida que permaneça fora
do controle da corporação. Esse profissional não deve permanecer muito tempo à frente de
uma mesma comunidade local, porque é proibido criar laços afetivos com sua clientela. Há
controle sobre a vida da esposa, sobre o relacionamento do casal, sobre o planejamento
familiar, limitação do número de filhos e coisas do gênero, conforme metas estabelecidas
por instâncias superiores da organização. Essa regulação se estende, em seguida, sobre a
vida do próprio membro. Ele é controlado, através de mecanismos mais sutis de persuasão,
em suas decisões financeiras e até no exercício do voto, quando terá que aceitar o candidato
indicado pela igreja. É claro que essa coação se dá de forma emocional, pois ninguém
poderá impedir o membro de votar em qualquer candidato, mas os resultados de inúmeras
eleições mostram um alto índice de conformidade às determinações da igreja.
Movimentos sociais acontecem induzidos por diversos motivos. Quando há
descompasso entre as expectativas e as recompensas, é possível que um grupo se organize
para a mobilização, a fim de lutar por mudança. Mas quando o acúmulo de problemas é de
dimensão a desencorajar as pessoas ou estas não conseguem ligar suas insatisfações em
projetos convergentes, elas acabam se sentindo impotentes ou incapazes de promover a
266
Idem, p. 89.
267
HALL, 2001, p. 42-3.
120
mudança. Talvez nem cheguem a elaborar, conscientemente, esses raciocínios. Nestes
casos, uma saída que se verifica com alguma freqüência é a “sublimação” dos quadros da
vida. Segundo Melucci, “o grupo se transforma rapidamente em uma seita ou em uma
igreja, elabora ou reconhece alguns textos sagrados, cria rituais, funções sacerdotais e assim
por diante”.
268
Na realidade brasileira destes últimos trinta anos, as igrejas estabelecidas não
estavam respondendo as expectativas de segmentos sofridos da população, que foram
encontrar em novos movimentos religiosos uma resposta sublimada à crise desta sociedade
tão profundamente injusta. Surgiram então novas propostas de religiosidade e novas igrejas,
bem mais articuladas do que as existentes, nessa linha de “sublimação”. E eis que estão aí.
São elas que prometem prosperidade para aqueles que acreditam em suas receitas mágicas.
Elas substituem o adversário social pelo adversário sobrenatural. Em seus referenciais de
interpretação, não é o sistema econômico e seu arcabouço político e cultural a verdadeira
fonte das desgraças, mas os “encostos”, o “olho gordo”, as divindades do panteão das
religiões afro-brasileiras, os grandes causadores da miséria social em que vive este País. É a
solução do “tá amarrado” para os problemas da pobreza, da miséria e da violência, em
todos os graus e manifestações. Conforme explica Melucci:
A ação não se dirige contra o adversário social presente no sistema de referência do grupo,
mas contra um adversário simbólico que não tem nenhuma relação concreta com a
experiência do ator. Isto não comporta, portanto, nenhuma redefinição do campo de ação e
não produz efeitos em tal campo. A existência de um adversário distante e inalcançável não
provoca ação coletiva de tipo conflitual, e sim a produção de ideologia, de mitos, de ritos.
269
Esta é a receita da Igreja Universal para o grande público, embora ela mantenha
concessões de rádio e televisão e escale seus quadros para ocuparem cadeiras nos
parlamentos municipais, estaduais e federal, indicando claramente que não há ingenuidade
em seu projeto institucional de conquista de poder. Pelo contrário, há um elevado grau de
racionalidade instrumental na conquista dos objetivos que tem traçado como mega-
corporação transnacional já constituída pelo mundo afora.
268
MELUCCI, 2001, p. 59.
269
MELUCCI, 2001, p. 60.
121
O neopentecostalismo entrou forte no mercado simbólico da tradição protestante e
pentecostal. Ele não estava interessado em reproduzir suas tradições. Ele veio para inovar,
lançar novos produtos, conquistar novos mercados e tomar fatias significativas dos velhos
mercados ocupados pelas igrejas do protestantismo histórico e do pentecostalismo, se não
pela migração direta dos seus membros, pelo menos pela influência provocadora de
metamorfose em suas surradas práticas. De fato, está em curso acelerado, há algumas
décadas, a pentecostalização das igrejas protestantes. E, nos anos mais recentes, verifica-se
o fenômeno da neopentecostalização tanto destas como das igrejas pentecostais da primeira
e segunda ondas.
À falta de um novo código lingüístico, o neopentecostalismo teve que se valer de
parte da velha linguagem protestante e pentecostal clássica. É por esta razão que os
herdeiros de tradições mais antigas se incomodam tanto, porque ouvem e vêem os
pregadores da nova fé se comunicando com os mesmos códigos, tão afetivamente
acalentados em suas experiências religiosas. Também, é por semelhante razão que a
sociedade e a imprensa confundem todos numa única e ampla identidade evangélica.
Segundo Melucci:
Como sempre acontece na história dos movimentos, os novos atores falam sempre velhas
linguagens porque não têm ainda uma linguagem própria. Enquanto se formam, utilizando a
herança dos movimentos que os precederam, se enraízam na memória e nos símbolos do
passado. Essa situação cria toda a ambigüidade e a dificuldade de um momento de
passagem. Mas não se deve esquecer que estamos diante de fenômenos que têm pouco em
comum com a tradição categorial e lingüística que utilizam para definir-se.
270
A beligerância é inerente à conquista de espaço, mas é também necessária para
consolidar posições já conquistadas. Melucci explica que “as novas elites em formação
utilizam o canal do conflito para conquistar ou consolidar a própria posição”.
271
A Igreja
Universal, aqui representando paradigmaticamente o subcampo neopentecostal, usa a
linguagem da persuasão e da comparação com outras propostas religiosas oferecidas no
mercado, mas o faz de modo agressivo, mostrando sempre que é a melhor. Ela utiliza seus
bispos e pastores, que se apresentam na mídia com indumentária de executivos de
270
MELUCCI, 2001, p. 60.
271
Idem, p. 24.
122
empresas, na função de comunicadores e profissionais de marketing, para conquistarem
novos clientes.
Sem entrar no mérito da interpretação dos textos bíblicos de Atos e de Coríntios,
que não cabe fazer nesta pesquisa, o pentecostalismo nasceu como movimento cuja
intenção era resgatar o batismo com o Espírito Santo evidenciado pelo falar em línguas
estranhas (glossolalia), acenando que esta experiência era para os dias atuais, do mesmo
modo como teria sido para os apóstolos e outros cristãos do primeiro século da era cristã. O
neopentecostalismo não dá ênfase a esta tradição. Ele tem trazido em seu bojo muito mais o
enfoque da tradução, em detrimento do cultivo à tradição. Hall escreve que
em toda parte, estão emergindo identidades culturais que não são fixas, mas que estão
suspensas, em transição, entre diferentes posições; que retiram seus recursos, ao mesmo
tempo, de diferentes tradições culturais; e que são produto desses complicados cruzamentos
e misturas que são cada vez mais comuns num mundo globalizado.
272
A tradição se apresenta como movimento de retorno, que tenta recuperar raízes,
quer purificar as práticas do grupo, segundo padrões que estavam negligenciados, embora
se questione esta possibilidade, enquanto que a tradução atravessa fronteiras de diversas
tradições e procura produzir uma cultura compósita, híbrida, sincrética, negociada, impura
e, por isto mesmo, dificilmente assimilada no contexto em que tenta se alojar.
Esse hibridismo o pentecostalismo fez e continua fazendo, quando nasceu nos
arraiais protestantes e quando prossegue na obra de pentecostalizar o mesmo
protestantismo. Já o neopentecostalismo está fazendo muito mais, quando provoca
mudanças nos subcampos do protestantismo e do pentecostalismo, obrigando-os a
mimetizarem seu estilo mercadológico agressivo e sua teologia de sucesso e prosperidade.
Constata-se o mal-estar reinante no protestantismo de missão, por causa do
deslocamento da “sua” identidade evangélica para os neopentecostais. Considera-se,
também, que a sociedade em geral e a mídia percebem como evangélicos os que se
destacam por práticas mercadológicas e midiáticas. Finalmente, pela funcionalidade e
habilidade em responder novos desafios, entende-se que a identidade evangélica foi
272
HALL, 2001, p. 88.
123
inelutavelmente conquistada pelo neopentecostalismo. Prova disto é a reação mimética que
se vem alastrando por segmentos consideráveis de antigas igrejas protestantes e
pentecostais, como estratégia de sobrevivência e de manutenção no cada vez mais
disputado mercado religioso.
Conclusão
Procurou-se neste capítulo oferecer abordagens da sociedade brasileira por meio da
identificação de padrões de sua cultura política. Ao mesmo tempo, foram feitas incursões
nas etapas de formação econômica e política do País para apresentar o berço do nascimento
dessa brasilidade.
A empresa colonial portuguesa, o regime de escravidão, as relações internacionais
entre centro e periferia, o poder político local dos “coronéis”, a modernização
conservadora, a associação entre capitais internacionais e seus subalternos locais,
constituíram cenário para que se pudesse examinar como a sociedade, constituída na
interação de todos esses processos, produziu padrões de autoritarismo, populismo,
patrimonialismo, clientelismo, nepotismo, gregarismo e correlatos.
No mesmo contexto, examinou-se a presença relativamente recente do movimento
pentecostal e sua inserção como agente que assimilou essa brasilidade e ajudou a produzi-
la, na medida em que gerou uma religiosidade adequada à própria reprodução e expansão
como grupo, mas também capaz de dar sentido às massas humanas, tornando-as atores
coletivos adaptados ao conjunto da realidade brasileira.
Os pentecostais e neopentecostais avançam a passos largos em duas décadas de
participação no jogo da política, principalmente nos parlamentos de todos os níveis da
Federação. Eles souberam tirar proveito do modelo de organização autoritária para
canalizarem votos e ocuparem espaços no Estado, como estratégia para obterem benefícios
para suas corporações religiosas.
12
4
A prática dos políticos pentecostais, ressalvadas poucas exceções, é patrimonialista.
Porém só o fato de estarem presentes no espaço público obriga outros agentes a
reconhecerem o contingente de brasileiros que eles representam. Ou seja, há uma inclusão
precária, trata-se de um pequeno porém persistente e progressivo avanço na conquista de
cidadania para este segmento organizado em nome da fé.
A religiosidade pentecostal é poderoso fator de gregarização. Eles reforçam e
atualizam um traço antigo da cultura brasileira: as redes de compadrio. Na nova sociedade
urbana, pertencer à irmandade de fé é participar de uma rede de solidariedade para orar,
cantar, ouvir sermões, profetizar, evangelizar, falar línguas, expulsar demônios, fazer curas
divinas e, eventualmente, socorrer necessitados, principalmente “os domésticos da fé”. A
mesma religiosidade alimenta uma dimensão da cultura brasileira voltada para o futuro. Se
o Brasil é o país do futuro, o pentecostal “espera o reino que há de vir”, enquanto afirma
que “o Brasil é do Senhor Jesus”. O neopentecostal, por sua vez, já trouxe o futuro para o
presente, com as confissões positivas de tomada de posse da prosperidade, porque ele é
filho do “Senhor da prata e do ouro” e nasceu para “ser cabeça e não cauda”.
Os pentecostais e neopentecostais reviraram a identidade evangélica. Fizeram uma
composição dinâmica com elementos da tradição protestante, catolicismo popular e
religiões afrobrasileiras, compondo experimentos religiosos que se desenvolvem e se
expandem por toda a sociedade brasileira, mas funcionam também como produtos de
exportação. A presença desses agentes na política nacional é fruto do crescimento numérico
e, principalmente, da constituição, reforço e produção criativa de novas identidades
coletivas, nascidas em meio à enorme variedade de crenças da sociedade brasileira.
125
Capítulo 2
O Estado brasileiro e o
pentecostalismo
Introdução
O entendimento da cultura política brasileira requer uma análise do Estado que se
constituiu no País, em perspectiva histórica de suas relações com a sociedade nacional.
Durante os séculos XVI a XIX, o Brasil incrementou uma economia agrícola para
exportação de produtos primários. Seu ponto culminante correspondeu à fase do café, no
final do século XIX e limiar do XX. A cultura cafeeira foi o grande “fiador” do capitalismo
agrícola e serviu de plataforma de lançamento do novo capitalismo industrial nascente. As
mudanças no panorama econômico, devido a Primeira Guerra Mundial, quebra da bolsa de
Nova York e Segunda Guerra, somadas aos anseios internos por modernização do País,
induziram o poder público a desenvolver uma política de “substituição de importações”,
que foi adotada por Getúlio Vargas, desde os anos 30, estendendo-se até a queda de João
Goulart, em 1964.
Desde o governo de Juscelino Kubitschek, mas com maior determinação a partir do
golpe de 1964, o País ingressou num modelo econômico dependente do capital
internacional, com integração militar, política e industrial subordinada aos Estados Unidos
da América. Esses modelos de desenvolvimento, praticados com marcante presença do
Estado, se inserem nos dois pólos da chamada “revolução brasileira”, quais sejam: “a) o
126
nacionalismo reformista, com base na democracia populista; b) a ditadura ‘tecnocrata’, com
base na associação ampla com os setores externos”.
273
Sobre essa “revolução”, ainda em
vigor, Ianni esclarece que se trata de
um processo que compreende a luta por uma participação cada vez maior da população
nacional no debate e nas decisões políticas e econômicas. O florescimento da cultura
nacional, ocorrido em especial nas décadas de vinte a cinqüenta, indica a criação de novas
modalidades da consciência nacional. Nesse quadro é que se inserem os golpes, as
revoluções e os movimentos que assinalam os fluxos e refluxos na vida política nacional.
274
Essa etapa da industrialização, caracterizada pela “substituição de importações”
(1930-64), foi estudada, codificada e estimulada pela Comissão Econômica para a América
Latina (CEPAL), entre 1948 e 1956, com base no que estava acontecendo principalmente
em México, Argentina e Brasil.
275
A presença do Estado brasileiro foi decisiva nessa etapa,
e ficou patente em iniciativas como: a criação do Banco Nacional do Desenvolvimento
Econômico (BNDE), em 1952, da empresa estatal Petróleo Brasileiro Sociedade Anônima
(PETROBRÁS), 1953, e da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
(SUDENE), em 1959. Nos anos 40, Getúlio havia criado a Companhia Siderúrgica
Nacional, Companhia do Vale do Rio Doce, Superintendência do Plano para Valorização
Econômica da Amazônia e Banco de Crédito da Borracha. Segundo Ianni, a adoção desse
padrão de desenvolvimento industrial
envolve a reformu lação dos vínculos externos e com a sociedade tradicional. Com base na
política de massas e no dirigismo estatal, estabelece gradações nas rupturas estruturais
indispensáveis à sua execução. Fundamenta a política externa independente e implica uma
doutrina do Brasil como potência autônoma. Os elementos fundamentais desse padrão
político-econômico estão consubstanciados na democracia populista desenvolvida depois de
1945. Esse é o modelo getuliano.
276
273
IANNI, 1988, p. 21.
274
Ibidem.
275
Desenvolveu-se na época a chamada corrente de pensamento cepalino, elaborada por economistas e outros cientistas sociais
associados à Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina (CEPAL). Raúl Prebisch, da Argentina, e Celso
Furtado, do Brasil, eram expoentes dessa escola. (Para mais informações, conferir, por exemplo, CHILCOTE, Ronald H. Teorias
de política comparativa: a busca de um paradigma reconsiderado. Petrópolis: Vozes, 1997, p. 304-466).
276
IANNI, op.cit., p. 54.
127
A era Juscelino inaugura um novo momento do capitalismo industrial, que se
consolida e se expande com o Golpe de 1964: trata-se do capitalismo dependente,
associado aos capitais internacionais. Para Ianni:
Em certa medida, o modelo internacionalista ou de associação ampla é um dos
resultados inevitáveis do confronto e das contradições entre os dois anteriores. Em certo
sentido, é a restauração do modelo inicial como padrão colonial em termos novos. [...]
Sua implantação exige a liquidação da democracia populista, como estrutura política
nacional, tanto quanto a destruição da ideologia e prática da doutrina de independência
econômica e política. É uma combinação nova entre os setores agrário e industrial, no
âmbito da reprodução ampliada do capital.
277
Ianni conclui sua análise destas fases da industrialização ocorrida no Brasil,
afirmando que houve:
a. A ruptura parcial e a recomposição (sucessiva e alternadamente) das relações políticas e
econômicas com a sociedade tradicional e com os sistemas externos.
b. A frustração das tentativas de implantação de um modelo de desenvolvimento
econômico autônomo.
c. A combinação dos modelos exportador, substituição e associado, ou internacionalista,
num sistema econômico heterogêneo e contraditório.
d. A participação crescente do Estado no comando do processo econômico.
e. A transformação da região Centro-Sul (com centros nas cidades de São Paulo, Rio de
Janeiro e Belo Horizonte) em núcleo dominante na economia nacional.
f. A formação dos movimentos de massas com estruturas políticas e ideológicas de
sustentação do poder político orientado para o desenvolvimento industrial.
278
Entre 1949 e 1962, a agricultura brasileira cresceu 77%, sendo que a exportação
cresceu 27%, enquanto a produção para o consumo interno ampliou-se em 90%. A
população brasileira, entre 1950 e 60, cresceu 40%, e entre 1940 e 60 teve incremento de
quase 80%.
279
Os indicadores econômicos do início da década de 60 apontavam para o
esgotamento do modelo populista. Enquanto o produto nacional crescia a quase 7% ao ano,
277
IANNI, 1988, p. 54-5.
278
Idem, p. 39.
279
Idem, p. 41.
128
entre 1957 e 61, superando os 7% neste ano, declinou para 5,4% em 1962, com previsão
para 1,4%, em 1963, conforme registrava o Programa de Ação Econômica do Governo, de
1964-66, publicado em novembro de 1964.
280
Na política, o período era marcado por
sucessivas crises, desde a renúncia de Jânio Quadros, a conturbada posse de João Goulart e
sua permanência no poder, sob cerrada oposição de setores que não admitiam as anunciadas
“reformas de base”
281
. Essas crises desembocaram no golpe militar de 31 de março e 1º de
abril de 1964.
2.1 Entre nacionalismo e dependência externa
O modelo de substituição de importações e a política externa independente
conduzidos pelo governo Vargas, não foram suficientes para consolidar uma posição do
Brasil como nação economicamente autônoma. Relações de troca entre nossos produtos,
com baixo valor agregado, e produtos importados, com maior agregação tecnológica,
sofriam deterioração ao longo do tempo, ou seja, exportava-se cada vez maior quantidade
de produtos primários para comprar a mesma quantidade de produtos industriais. A
apropriação de tecnologia requeria reversão na política externa de favorecimento a
empresas transnacionais. Esta seria a forma de fazer avançar e tornar independente nosso
parque industrial. Persistir no modelo autóctone, de longa maturação, exigiria grandes
investimentos em educação e pesquisa. Contudo, não havia organização social e política
capaz de sustentar este tipo de política emancipatória, em que pese a opinião otimista de
Ianni, com a qual não se compartilha:
A entrada no estágio da industrialização abriu perspectivas a um desenvolvimento
capitalista autônomo. Entretanto, para que esse projeto se efetivasse, era necessária a
reformulação drástica dos vínculos estruturais internos e externos. E essa reformulação teria
sido possível em várias ocasiões críticas, no período entre 1914 e 1964. Os movimentos
armados, os golpes e as revoluções ocorridos nessa época são indicativos da possibilidade
280
Apud IANNI, 1988, p. 110.
281
As principais reformas agrária, constitucional, política e universitária constavam da Mensagem que o Presidente remeteria ao
Congresso em 1964. A Mensagem previa a realização de consultas à população, através de plebiscitos, com vistas a obter o
referendum popular para essas transformações. (BANDEIRA, 1977, p. 38-9 e 164-5).
129
de ampliar e consolidar a autonomia. Aliás, os movimentos de massas, a democracia
populista, o nacionalismo e o dirigismo estatal foram elementos concretos e, às vezes,
efetivos nessa direção. O modelo getuliano de desenvolvimento envolvia o aprofundamento
das rupturas estruturais. Além disso, nesses anos os sistemas políticos e econômicos
dominantes estavam em crise. As contradições internas do capitalismo mundial levaram ao
esfacelamento do predomínio da Inglaterra, Alemanha e França. Passo a passo, cresceu e
consolidou-se a preponderância dos Estados Unidos, no campo capitalista, e da União
Soviética, no campo socialista. Essa consolidação só se verificou depois da Segunda Guerra
Mundial. Em verdade, a guerra foi um acontecimento importante para a efetivação da
liderança econômica, política, militar e cultural dessas duas potências.
282
A Inglaterra perdeu sua influência econômica no Brasil ao longo das três primeiras
décadas do século XX. A Grande Depressão iniciada com a quebra da bolsa de Nova York,
em 1929, a crise do setor cafeeiro, os movimentos sociais e a revolução de 1930,
favoreceram a ampliação da presença de capitais norte-americanos na economia brasileira.
“Em 1950 os Estados Unidos já [detinham] mais de 70 por cento dos capitais estrangeiros
aplicados em empresas no Brasil”.
283
Essa troca de hegemonia britânica pela norte-
americana estava acontecendo em todo o Ocidente. No caso brasileiro, ela assumia a forma
de oligopólios.
Desde os anos de 1940, alguns setores da economia nacional estavam vinculados a
grupos externos, detentores do poder de decisão.
284
O governo Café Filho tornou possível a
entrada em ampla escala de capitais estrangeiros, com permissão, inclusive, para ingresso
de equipamentos usados, antigos e, às vezes, superados, sem cobertura cambial, quando
instituiu a Instrução 113 da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), em 17 de
janeiro de 1955. Isto veio a prejudicar diversos grupos nacionais, que eram obrigados a
comprar Promessas de Venda de Cambiais pagando taxas de mercado, enquanto seus
concorrentes estrangeiros desfrutavam das facilidades mencionadas. Sobre o assunto se
manifestou o jornal O Estado de S. Paulo, em editorial de 13/01/1961:
282
IANNI, 1988: p. 135.
283
Idem, p. 136.
284
Idem, p. 137.
130
Conviria estudar a influência da Instrução 113 da “SUMOC” na desnacionalização de
algumas indústrias nossas, desnacionalização que temos por contrária aos interesses do País.
Nestes últimos anos, várias firmas brasileiras viram-se forçadas a aceitar o controle de
grupos estrangeiros por não poderem suportar a concorrência dos mesmos no capítulo de
reequipamento. A única forma de sobreviver foi aceitarem a colocação do capital
estrangeiro sob a forma de importação, bens de equipamento, muitas vezes em caráter
majoritário.
285
Em que pese o sucesso dessa presença para os grupos estrangeiros na América
Latina, não houve tratamento preferencial dos países centrais em favor deste continente,
pois, a título de exemplo, a Iugoslávia, sozinha, recebeu mais dinheiro dos Estados Unidos,
entre 1945 e 1960, do que todos os países latino-americanos, juntos.
286
Embora não caiba aqui analisar a fundo o estabelecimento da ditadura de Getúlio
Vargas, implantada com o nome de Estado Novo, é possível afirmar que o estado de golpe,
que o precedeu, já estava em preparação desde 1935, mediante promulgação de uma Lei de
Segurança Nacional, fechamento da Aliança Nacional Libertadora e prisão de seus líderes,
principalmente Luís Carlos Prestes. O pretexto para esses atos foi encontrado na “ameaça
comunista” e nos levantes armados de militares simpatizantes dessa ideologia, em Natal,
Recife e Rio de Janeiro, no mesmo ano. Em 1936, o Congresso consentiu que Vargas
governasse sob estado de sítio, durante vários meses, e prendesse um senador e quatro
deputados. A Constituição de 1934 havia reconhecido Vargas como presidente do Brasil,
mas impedira sua reeleição. Candidatos para a eleição de 1938 se apresentaram, como
Armando de Sales Oliveira e Plínio Salgado, ambos provenientes do Estado de São Paulo, e
José Américo de Almeida, da Paraíba, porém Vargas se recusava a apoiá-los e não dava
sinais de compromisso com uma sucessão democrática. Lutas de rua entre os camisas-
verdes (integralistas) e facções de esquerda alimentavam a sensação de crise social, criando
clima favorável ao golpe. Os generais Góes Monteiro e Eurico Dutra queriam um “Exército
285
A presença do capital estrangeiro no Brasil, com implicações também no poder político, foi estudada por
Maurício Vinhas de Queiroz. Cf., QUEIROZ, M.V. Os Grupos Multibilionários, em Revista do Instituto de
Ciências Sociais, v. 2, n. 1, Rio de Janeiro, 1965, p. 47-77.
286
IANNI, 1988, p. 142.
131
forte dentro de um Estado forte”. Este conjunto de ameaças e anseios, forjados ou não,
convergiu para o ato golpista de Getúlio Vargas, em 10 de novembro de 1937.
287
A ditadura do Estado Novo, nos últimos anos de sua vigência, estruturou, através de
legislação, toda a área sindical e previdenciária, exercendo tutela sobre a classe
trabalhadora, de acordo com uma ideologia trabalhista teorizada por Alexandre Marcondes
Filho, ministro do Trabalho à época. O tripé institucional de controle do operariado era
completado pelo Partido Trabalhista Brasileiro, “baseado na coalizão dos sindicatos
dominados pelo governo e das forças ‘progressistas’, que Vargas esperava liderar, adotando
programas de industrialização, nacionalismo econômico e previdência social”.
288
O Estado
exercia controle de fato e de direito sobre os sindicatos, através da infiltração de pelegos em
suas diretorias, exigência de cadastro, concessão de licença para funcionamento e
arrecadação compulsória do imposto sindical, recurso este que se constituía em garantia de
sustentação financeira para a maioria deles.
O golpe de 1964, cujas sementes de concepção encontram-se nas décadas anteriores,
assinalou um novo patamar nas relações dos Estados Unidos com os países da América
Latina. Foi uma investida vitoriosa contra a democracia populista que vinha sendo
incentivada a partir da era Vargas. Desde 1945, as forças principais estavam divididas entre
o empresariado e os proletários. Nesse ano, o “movimento queremista” propunha uma
Assembléia Nacional Constituinte, com Getúlio Vargas na presidência da República, para
instaurar um modelo de desenvolvimento com democracia populista. As oligarquias e
detentores do poder econômico, no campo e na cidade, conseguiram neutralizar o
movimento e depor Vargas, no dia 29 de outubro de 1945. Não se descarta, nessa operação,
a participação de agentes dos capitais externos.
287
Uma análise detalhada desse período pode ser lida em SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo, 1930-1964. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1982, p. 42-89.
288
SKIDMORE, 1982, p. 63.
132
O novo presidente eleito, Marechal Eurico Gaspar Dutra (1946-50), dissipa reservas
do Tesouro Nacional em moeda estrangeira acumuladas durante a Segunda Guerra, ao
liberar, indiscriminadamente, a importação de produtos, muitos deles supérfluos.
Paralelamente ao governo de Dutra, o caudilho gaúcho Getúlio Vargas conseguia preservar
suas bases políticas, organizadas no Partido Social Democrático (PSD) e Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB). No primeiro, congregavam-se latifundiários e burgueses e, no
segundo, proletários e alguns segmentos urbanos. Funcionários públicos se distribuíam
entre os dois partidos. Este conjunto de dirigentes políticos e eleitores formava a base que
elegeria o chamado “pai dos pobres”, para o período seguinte de governo (1951-55). Na
manhã do dia 24 de agosto de 1954, Getúlio Vargas cometeu suicídio, em meio a uma crise
que envolvia denúncias de corrupção contra seu irmão, agravada por um atentado contra
Carlos Lacerda, supostamente planejado pelo guarda-costas do próprio presidente, Gregório
Fortunato, conforme acusou a oposição ao governo, na época. Naquele momento, cessava a
vida de um ser humano, porém permaneceria sua presença como símbolo maior do
populismo brasileiro, além de outros predicados, como os de herói e estadista, que
constituem parte do imaginário político brasileiro.
Após as interinidades que completaram o mandato anterior, Juscelino Kubitschek de
Oliveira foi eleito pelas mesmas forças agrupadas em torno de Getúlio Vargas. Todavia, o
governo de JK abandonou o modelo econômico endógeno, tendo, porém, a perspicácia de
recorrer ao habitual populismo. Ianni assim o descreve:
... essa evolução da economia, como modificação na orientação da política
econômica, foi realizada nos quadros da democracia populista. Houve uma conciliação
engenhosa da política econômica internacionalista com a política de massas, de base
nacionalista. Por isso, os anos posteriores foram anos críticos. Como o governo Kubitschek
não realizou a liquidação da democracia populista, estabeleceu-se e cresceu o divórcio entre
as tendências da estrutura econômica e as tendências da estrutura de poder. Em especial, a
democracia populista tornou-se um obstáculo cada vez mais insuportável ou inconveniente.
A dissociação entre o poder político e o poder econômico acentuava-se..
289
O contexto internacional era marcado pela guerra fria, de modo que os Estados
Unidos tratavam a América Latina como área de interesse para sua segurança. A
289
IANNI, 1988: p. 144.
133
documentação produzida por instituições e agentes oficiais do governo norte-americano
deixa bem clara essa perspectiva.
290
Cuba se tornou um mau exemplo de presença estranha,
apoiada pelo bloco soviético, exemplo que os Estados Unidos não admitia viesse a ser
repetido no continente latino-americano. Para tanto, não vacilou em estender apoio aos
go lpes e ditaduras que conseguiram sufocar iniciativas populares de ampliação das
democracias em diferentes países dessa região.
No caso brasileiro, o regime de 1964 era de interesse estratégico para os Estados
Unidos, não somente no aspecto político-militar, mas também no econômico:
Em confronto com o modelo do desenvolvimento econômico autônomo e da
política externa independente, o governo do Marechal Humberto de Alencar Castello
Branco põe em prática o padrão da interdependência. Trata-se de negar o modelo getuliano,
em sua prática e como ideologia. Por essa razão o acordo sobre a garantia de investimentos
privados, assinado por representantes dos governos do Brasil e dos Estados Unidos, em
fevereiro de 1965, é um documento fundamental e simbólico. Trata-se de um
desenvolvimento lógico do espírito da Aliança para o Progresso.
291
Em alguns casos, era melhor negócio para empresas norte-americanas atuar no
Brasil do que em sua pátria de origem, pois lá existiam legislação e controles antitrustes
bem mais severos do que os similares brasileiros. Patentes militares mais altas justificavam
essa benevolência com capitais externos sob o argumento de que a preservação da nossa
independência requeria a aplicação de um certo grau de interdependência nas áreas militar,
econômica e política.
292
2.2 O Estado do golpe militar de 1964
A política econômica dos militares seguia a ideologia da modernização, em
substituição à ideologia do desenvolvimento. O novo programa incluía uma reversão de
290
Cf. CERVO, Amado Luiz. Relações internacionais da América Latina : velhos e novos paradigmas.
Brasília: Instituto de Relações Internacionais (IBRI), Universidade de Brasília, 2001.
291
IANNI, 1988, p. 148.
292
Para demonstrar essa opção militar por um capitalismo dependente, Ianni transcreve parte de discurso do Presidente Marechal
Castello Branco, pronunciado no Itamarati, como orientação do regime recém-instaurado para a política externa brasileira. (Cf.
IANNI, op.cit., p. 149).
134
expectativas, contra o discurso e ação de sindicatos proletários e outros grupos que se
mobilizavam, durante os governos populistas anteriores. Junto a essa orientação, somava-se
a doutrina da interdependência.
A ordem instaurada pelo novo regime resultava do incômodo que a política de
massas e o nacionalismo de inspiração esquerdista provocavam na classe dominante do
Brasil. Era uma resposta que dava continuidade histórica a outras ações dos “donos do
poder”. Para Ianni: “Com o governo Castello Branco inicia-se um programa completo de
reformulação das instituições vigentes, de modo a ajustar as expectativas e ideologias das
diferentes classes sociais ao status quo. Com esse alvo, alteram-se progressivamente as
instituições econômicas e financeiras, políticas e educacionais”.
293
O Marechal Presidente
referia-se à ação militar de tomada do poder como iniciativa para corrigir as deformações
do processo de desenvolvimento brasileiro e efetivar uma “política de reconstrução
nacional”, na qual se priorizava a “restauração da ordem, em todas as áreas, e da
autoridade, segundo o princípio constitucional”.
294
Essa guerra ideológica para justificar a
agressão ao processo democrático era reforçada por pronunciamentos do ministro Roberto
de Oliveira Campos, que não se constrangia, como intelectual, de recorrer a Max Weber,
citando-o fora de contexto e sem respeito às convicções democráticas do pensador alemão,
com o objetivo de “desmascarar” o que ele denominava de mitos da condução econômica e
política que vigera até a chegada dos militares. Segundo Ianni, o ministro Campos
“combate o nacionalismo, a política de massas, as experiências do dirigismo estatal, o papel
do protecionismo alfandegário, etc. como se esses fatos fossem acontecimentos episódicos
ou mesmo fabulações”.
295
A reversão de expectativas era a contrapartida complementar da política da
interdependência no plano interno. Os militares não titubeavam em aplicar medidas
econômicas prejudiciais às pequenas e médias empresas brasileiras, visto que seu modelo
de modernização era, em si, concentrador e integrado a agentes externos.
293
IANNI, 1988, p. 153.
294
Parte de aula inaugural da Escola Superior de Guerra, proferida em março de 1965, conforme jornal O Estado de S. Paulo, de
17/3/1965. (Apud IANNI, 1988, p. 154).
295
IANNI, op.cit.: p. 156. Os pronunciamentos de Roberto Campos foram registrados pelo O Estado de S. Paulo em edições de
25/04/1965, p. 38, e de 03/09/1964, p. 20.
135
Por isso, a cooperação e a competição externas passam a ser variáveis naturais e desejadas
na política econômica governamental. Em outros termos, o “sacrifício” de empresas
brasileiras é encarado pelos governantes como um resultado inevitável do confronto entre
diferentes mentalidades empresariais e capacidades técnicas das organizações.
296
Na concepção de Roberto Campos, “esses fatos, bem como a desnacionalização, são
conseqüências inevitáveis da ‘mudança de escala de produção, maior exigência de capitais
e rápido surto tecnológico’”.
297
A tecnocracia estava imperando com toda sua truculência. Ianni faz contundente
análise desse modo de pensar e agir que levou a sociedade brasileira a sacrificar uma
geração, excluindo-a do processo de formação democrática. O regime militar optava
preferencialmente pela gestão externa na configuração da nova economia brasileira:
No pensamento do governo, em especial no pensamento de Roberto Campos, a
realidade nacional é reduzida arbitrariamente a uma totalidade sincrônica, em que se
manipulam os comportamentos, as instituições e as técnicas sociais como se se tratasse de
um conglomerado aritmético. Em essência, o pensamento e o programa governamentais
particularmente na forma que lhes dá Roberto Campos são inadequados lógica e
historicamente. Não correspondem à contemporaneidade da sociedade brasileira, em seus
processos econômicos políticos e culturais. Representam a realidade nacional segundo
modelo que não é historicamente constituído no País. Toma as categorias lógicas e teóricas
de um universo significativo alheio à história nacional. É mais uma experiência teórica e
prática de reificação, fato comum nas nações dependentes. Ao jogar com as teorias e os
mitos, o economista substituiu uns pelos outros, sem atentar para a sua natureza histórica e
as suas implicações culturais.
298
Constatava-se a consagração de esquemas teóricos aplicados por economistas que se
capacitaram em centros universitários de países do primeiro mundo, sem guardarem a
mínima relação com a complexidade das formações sociais de onde eram originários. Os
militares brasileiros apoiaram-se nesses ideólogos, em geral ávidos por encontrarem espaço
para suas experimentações, de preferência onde inexistissem freios e contrapesos,
ignorando que estes são necessários para o bem de qualquer sociedade, os quais somente
296
Idem, p. 157.
297
OESP, 25/12/1966, p. 36, apud IANNI, 1988, p. 158, nota 11.
298
IANNI, 1988, p. 159.
136
vicejam e se mantêm dentro de processos democráticos amadurecidos na própria prática
social.
2.3 Os evangélicos e a ditadura do golpe de 1964
O relacionamento dos evangélicos com a ditadura militar não pode ser descrito,
simplesmente, pelo alinhamento e adesão, embora no conjunto tenham predominado estas
posturas. Como a categoria evangélico abriga diferentes tradições, esta pluralidade também
se manifestou na interface com o regime. Houve opositores conscientes, principalmente a
minoria ligada ao movimento ecumênico e aos debates teológicos inspirados no
pensamento europeu do após-guerra, bem como na teologia latino-americana, cuja vertente
mais conhecida era a teologia da libertação. Não obstante, prevaleceu a influência
poderosa da ideologia conservadora-fundamentalista e anticomunista, conforme descreveu
Lyndon Santos:
As igrejas evangélicas passaram a receber um tipo de pregação mais conservador e
fundamentalista, oriundo das altas lideranças que apoiavam o regime. O ambiente
eclesiástico reproduziu o que a sociedade vivia sob símbolos e discursos religiosos. Os
evangélicos tornaram-se mais intolerantes com relação às diferenças, contradizendo sua
herança de tolerância. Ser evangélico era possuir uma ética pessoal exemplar, estar
preocupado com o comportamento e com a transmissão da experiência religiosa para os
“perdidos”.
299
A “herança de tolerância” a que se refere Santos sempre esteve mais na idealização
do que na realidade das denominações. As igrejas, que já antes não formavam cidadãos
para os movimentos sociais, embora nos anos 60 houvesse discursos de incentivo ao
engajamento em partidos e sindicatos
300
, criaram um tipo de militância religiosa interna, a
299
SANTOS, Lyndon de Araújo. O púlpito, a praça e o palanque: os evangélicos e o regime militar brasileiro. In: FREIXO,
Adriano de; MUNTEAL Filho, Oswaldo (org.). A ditadura em debate: estado e sociedade nos anos do autoritarismo. Rio de
Janeiro: Contraponto, 2005, p. 159.
300
Quando a conjuntura política parecia favorável às forças reformistas e de esquerda, ligadas ao governo de João Goulart, igrejas
conservadoras deram espaço para manifestações compatíveis com o momento. “Em setembro de 1962, o Supremo Concílio da
Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) aprovou o ‘Pronunciamento social’, documento de clara inspiração progressista. Dentre outros
compromissos, a IPB deveria ‘incentivar seus membros a assumirem uma cidadania responsável, como testemunhas de Cristo, nos
sindicatos, nos partidos políticos, nos diretórios acadêmicos, nas fábricas, nos escritórios, nas cátedras, nas eleições e nos corpos
administrativos e judiciários do país’” (SANTOS, 2005, p. 172). “Em 1963, foi divulgado o ‘Manifesto dos pastores batistas do
Brasil’, que, dentre outros aspectos, defendia a Constituição de 1946, a Carta das Nações Unidas e a Declaração dos Direitos
137
fim de prender os fiéis ao sagrado, reduzindo ao mínimo suas incursões no mundo social.
Neste mesmo ambiente interno, tradições eclesiais de democracia formal eram mantidas:
democracia direta, no caso das igrejas de organização congregacional, e indireta, nas igrejas
go vernadas por presbitérios e similares. Estas práticas serviram, ainda que timidamente,
para a capacitação política de evangélicos que se lançaram na vida pública, antes, durante e
após o regime militar.
Santos sintetiza, simbolicamente, em três espaços, a trajetória política dos
evangélicos, durante o regime militar: púlpito, praça e palanque. Do púlpito se afirmava,
nos anos 70, que “crente deve votar no governo” e “crente não se mete em política”. A
ênfase estava colocada na obediência às autoridades, conforme Romanos 13, e na frase de
Jesus: “Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” (Mateus 22:21), com
a intenção de separar as esferas do político e do religioso. Para Santos: “Se quisermos
encontrar alguns dos principais porta-vozes do regime militar no espaço e no tempo
cotidianos do período pós-64, busquemos os milhares de pregadores dominicais”.
301
E
mais: “Não somente as prédicas noturnas, mas o ensino regular e sistematizado nas escolas
dominicais e nos seminários teológicos, onde se formavam lideranças eclesiásticas, foi um
dos instrumentos de reprodução de valores e idéias do regime”.
302
O bipartidarismo
imposto pelos militares calhava bem na mentalidade maniqueísta da maioria evangélica.
Era fácil demonizar a oposição, agrupada no MDB (Movimento Democrático Brasileiro), e
associar a prática da vontade divina aos que se organizavam na Arena (Aliança Renovadora
Nacional), braço do governo militar.
Os evangélicos podiam ocupar a praça com desenvoltura, a fim de fazerem
proselitismo, porque seus discursos religiosos favoreciam ao regime, mesmo quando não
era esta a intenção. O uso de alto-falantes e a entrada em cena de novas emissoras de rádio-
difusão, com espaços de programação para igrejas evangélicas, marcaram o período. Em
Humanos. Apelavam para que seus princípios fossem ‘universalmente aplicados, de sorte a serem banidos da face da Terra a
exploração do homem pelo homem ou pelo Estado, em qualquer das suas formas, e os totalitarismos de toda espécie, assegurando-se a prática da
verdadeira democracia’. O manifesto estimulava os membros das igrejas à participação efetiva na vida política do país, integrando-
se nas organizações de classe. Preconizava a urgência das reformas agrária, eleitoral, administrativa e da Previdência Social, como
meios de combater as injustiças sociais, o cerceamento das ‘liberdades essenciais’, além de outras reivindicações” (SANTOS, op.cit.,
p. 172-3). Como no sistema batista cada comunidade local é autônoma, este manifesto dos pastores não podia representar a
vontade da denominação. Contudo, ambos os documentos serviram, pelo menos formalmente, para colocar as respectivas igrejas
dentro da discussão dos grandes temas sociais e “reformas de base” propostas pelo governo de Jango.
301
SANTOS, op.cit., p. 162.
302
Ibidem.
138
décadas seguintes, com a pentecostalização de parte do protestantismo e o surgimento do
neopentecostalismo, ocorreu o avanço para a mídia televisiva. Este era um caminho de
evolução previsível. O uso destes meios poderosos de propaganda da fé contribuiu para a
popularização de líderes evangélicos, facilitando o ingresso de alguns deles no campo
político-eleitoral.
A presença no palanque resultou em representação no Congresso. Entre 1950 e
1964, foram eleitos de nove a treze parlamentares evangélicos, quase todos de igrejas
históricas não-pentecostais. Em 1964, havia dez deles no Congresso, sendo cinco
presbiterianos, dois batistas, dois congregacionais e um pentecostal. Representavam
eleitores de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Suas campanhas não tinham caráter
corporativo, pois não contavam com apoio oficial das denominações a que eram filiados.
Leonildo Campos compara o modo de participar na política dos antigos candidatos
de tradição protestante histórica com o novo modo corporativo de conquistar espaços
públicos praticado principalmente por denominações pentecostais e neopentecostais.
303
Campos desenvolve dois “tipos ideais de políticos: os políticos evangélicos e os políticos
de Cristo. Os primeiros inspiravam-se em idéias liberais dos norte-americanos e não eram,
a rigor, portadores de uma utopia transformadora da sociedade. Estavam motivados por
valores como liberdade de consciência e separação Igreja e Estado, bandeiras cuja defesa
era necessária, por causa da influência muito forte da Igreja Católica no espaço público
apesar da condição laica da República. Esses políticos, que surgiram principalmente a partir
dos anos 1930, não representavam projetos corporativos de suas igrejas. Eram resultantes
de iniciativas individuais e buscavam votos no público evangélico, apenas por pertencerem
a esse ambiente. De fato, havia resistências, por parte das igrejas evangélicas, de se
envolverem com política, seja partidária, sindical ou nos movimentos sociais em geral.
Campos analisa as razões históricas e sociológicas dessa fuga às “coisas do mundo”, fruto
de uma “teologia cansada de guerra”, que veio com a obra missionária norte-americana.
303
CAMPOS, Leonildo Silveira. Os políticos de Cristo uma análise do comportamento político de
protestantes históricos e pentecostais no Brasil. In: BURITY, Joanildo A. e MACHADO, Maria das Dores C.
(org.). Os votos de Deus: evangélicos, política e eleições no Brasil. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Ed.
Massangana, 2006, p. 29-89. Essa abordagem de tipos ideais foi originalmente apresentada pelo autor no GT
Religião e Sociedade, durante a XXVI reunião da ANPOCS, em Caxambu (MG), outubro de 2002, com o
título: Os “políticos de Cristo” - as mutações do comportamento político de protestantes históricos e de
pentecostais no Brasil.
139
O outro tipo ideal, proposto por Campos, é o “político de Cristo”, cuja prática, “ao
contrário da forma de atuar de muitos dos antigos ’políticos evangélicos’, não passa pela
valorização do sistema partidário, nem pela defesa de ideologias políticas, propriamente
ditas.”.
304
A atuação deste novo agente, que iria se consolidar a partir do Congresso
Constituinte de 1987-88, é pautada por demandas corporativas da denominação. São os
objetivos da igreja, a serem alcançados no jogo de relações dentro dos aparelhos do Estado,
que irão determinar definição de candidatos, escolha de partidos e estratégias eleitorais,
para garantir a conquista da fatia desejada de poder, geralmente nos parlamentos, embora
também não esteja descartada a disputa para cargos majoritários. Os candidatos podem
estar distribuídos em diferentes partidos, pois é feita uma rigorosa análise das chances
eleitorais, a partir de cálculos de quociente eleitoral. Portanto, a questão não é ideológica.
Como destaca Campos:
Os partidos ou programas não [...] fazem diferença alguma [para os candidatos], porque o
essencial para eles é a manutenção do apoio da Igreja que o elegeu. Sem essa Igreja, ele
nada é; perde a função de locutor, pois o discurso não lhe pertence; não passa de um mero
ator coadjuvante, que participa de uma dramaturgia que não dirige; e recebe da instituição
que o escolheu um script pronto para uma atuação fundamentada na plena, total e irrestrita
obediência às autoridades religiosas. O “político de Cristo” é uma figura vazada, que
somente a instituição, as massas ou as circunstâncias, podem preencher.
305
Durante o regime militar, houve repressão interna nas igrejas presbiterianas (do
Brasil e Independente, ou seja, IPB e IPI) e nas igrejas da Convenção Batista Brasileira.
Alguns membros foram delatados e entregues aos torturadores por seus próprios irmãos de
fé. Pastores se tornaram alunos da Escola Superior de Guerra, como foram os casos de
Nílson do Amaral Fanini, da convenção batista citada, e Firmino da Anunciação Gouveia
presidente da Assembléia de Deus no Pará, para ficar em apenas dois exemplos, dentre
muitos que constam nos arquivos da ESG e das ADESG
306
. Em dissertação de mestrado
307
foram registrados alguns fatos que indicaram a convivência amistosa da Assembléia com o
regime.
304
CAMPOS, 2006, p.85.
305
Idem, p. 85-6.
306
Sigla da Associação de Diplomados na Escola Superior de Guerra, existente em cada unidade da federação brasileira, unidades
estas responsáveis, também, pela disseminação da ideologia militar entre lideranças da sociedade, no período da ditadura (1964-
85).
307
BAPTISTA, 2002, p.130-1.
140
A conquista do poder pelos militares foi festejada pela Assembléia de Deus como
manifestação da providência de Deus, para evitar que o Brasil caísse nas garras do
comunismo, comparado a um monstro que subjugava 900 milhões de pessoas no mundo,
segundo o jornal Estandarte, de março-abril de 1964.
308
Enquanto a Assembléia de Deus adquiria visibilidade e se credenciava como
organização confiável para os militares no poder, as duas regionais da Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB) na Amazônia eram motivos de preocupação para essas
autoridades castrenses, em razão das posturas críticas assumidas pelos bispos, diante do
regime autoritário.
A partir da gestão do Coronel Jarbas Passarinho no Ministério da Educação, a Assembléia
de Deus voltou a receber subvenção do Estado, destinada à construção do seu instituto
teológico. No período de 1970 a 1974, foram US$ 28,035.00 de doações dessa fonte,
conforme atas administrativas da Igreja, do mesmo período.
309
Com o trabalho do deputado estadual Antônio Teixeira
310
e do federal Gabriel Hermes
Filho, o Seminário Teológico da Assembléia de Deus, em Belém, foi considerado de
utilidade pública, obtendo, assim, isenção de impostos.
311
Enquanto a igreja recebia essas benesses e verbas do Estado, o jornal Estandarte, de
fevereiro de 1970, verberava um editorial contra os pastores que se engajassem na política.
Em 1982, foi a vez da Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia (Sudam)
ajudar o Abrigo de Idosos “Etelvina Bloise”, com a quantia de US$ 2,913.00, a pedido do
então senador Jarbas Passarinho.
312
Em 1985, durante quatro meses, o pastor Firmino Gouveia participou de um curso na Escola
Superior de Gu erra, juntamente com outros líderes nacionais de denominações evangélicas
brasileiras.
Algumas denominações tradicionais realizaram “limpezas” nos quadros docentes de
suas instituições formadoras de pastores e, em situações extremas, decidiram fechar as
portas das próprias instituições. Conforme relata Santos:
As intervenções nas instituições teológicas funcionaram para expurgar lideranças que
passaram a ser vistas como semeadoras de idéias modernistas, ecumênicas e comunistas.
Foram também um meio de tornar seus ensinos afeitos aos interesses dos novos dirigentes
denominacionais alinhados ao regime instaurado. A perseguição, a censura e o cerceamento
308
Este registro foi citado por CHESNUT, 1997, p.148.
309
Idem, p. 150.
310
Português de nascimento, o deputado Antônio Teixeira era membro da Assembléia de Deus. Exerceu diversos mandatos e
ocupou a presidência da Assembléia Legislativa do Pará. Era também ligado aos panificadores do mesmo estado.
311
CHESNUT, p. 150-151.
312
Idem, p. 152-153.
141
da liberdade dos artistas e intelectuais, promovidos pelo regime ditatorial, tiveram seu
equivalente nas instituições religiosas por iniciativa das ‘novas’ cúpulas de dirigentes
eclesiásticos concordantes com o poder.
313
A tradição liberal de governo interno dessas igrejas do protestantismo histórico, que,
a rigor, não era tão cultivada no dia a dia, ficou mais fragilizada, ao incorporar práticas
autoritárias do regime. Jornais denominacionais ampliaram a censura ideológica que já
praticavam, houve concentração de poder em lideranças intolerantes, além dos já citados
episódios de fechamento de seminários e delação de líderes para os aparelhos de repressão.
A coisa funcionou como se houvesse um caldo de cultura autoritário à espera de que se
manifestasse um regime de mesma natureza para que fosse instaurada a intolerância, sem
constrangimento e de modo ostensivo, nessas igrejas.
No sentido quantitativo, o regime fez bem a esse segmento religioso. Em 1970, os
evangélicos totalizavam 4.833.106 de pessoas, ou 5,2 % da população brasileira. Em 1980,
eram 7.885.650, correspondendo a 6,6 % do total, e em 1991, somavam 13.157.094, ou
seja, 9,0 % da população. No caso dos pentecostais, o censo demográfico somente passou a
dar tratamento específico a partir de 1980, quando foram registrados 3.863.320, portanto
3,2 % da população. Em 1991, eles alcançaram a marca de 8.768.929, equivalendo a 6,0 %
do total de habitantes do País.
314
Pode-se afirmar que o campo religioso evangélico passou por mudanças
irreversíveis ao conviver pacificamente com o regime militar. Santos considera que:
A visibilidade numérica e a presença mais evidente na paisagem das cidades, a utilização de
meios de comunicação como televisão e rádio, o potencial de votos nas eleições, a presença
de políticos evangélicos nas instâncias do poder político, a força institucional das
denominações e a ampliação de seus patrimônios tudo isso produziu posições outrora não
adotadas por parte dos evangélicos.
315
313
SANTOS, 2005, p. 178.
314
JACOB, César Romero et alli. Atlas da filiação religiosa e indicadores sociais no Brasil. Rio de Janeiro: PUC; São Paulo:
Loyola, 2003, p. 34.
315
SANTOS, op.cit., p. 180.
142
2.4 Um Estado empreendedor-burguês
O Estado brasileiro não se caracteriza apenas como espaço de práticas
patrimonialistas. Ele vai além, como viabilizador da ordem capitalista. De 1930 a 1980,
marcou forte presença como ente organizador da economia e produtor, através de políticas
e empresas públicas, fazendo que o Brasil alcançasse um crescimento econômico com
elevadas taxas no contexto mundial. Esse Estado já trazia uma vocação centralizadora e
empreendedora, desde o período colonial, face sua característica de poder externo e acima
da sociedade, que pairava sobre as oligarquias locais, como árbitro e legitimador de
privilégios dessas mesmas forças. Também se verificou uma continuidade da atuação
unificadora do Estado, em aspectos como: expansão e manutenção do território, atuação
diplomática, implantação de infra-estrutura e qualificação burocrática dos funcionários.
316
A relação desse Estado-empresário frente aos interesses emergentes da sociedade
foi marcada por dificuldades que podem ser pontuadas da seguinte maneira, seguindo, em
linhas gerais um resumo de Sorj:
a face autoritária, tecnocrática e elitista do Estado se opôs à crescente mobilização
da sociedade em busca da democracia e da justiça social;
o Estado sempre se manteve como espaço de práticas patrimonialistas, em benefício
de políticos e empresários, aqueles pelo fomento ao clientelismo, a fim de se
manterem no poder, e estes realizando a acumulação capitalista de variadas formas;
partes representativas do operariado e da classe média não foram cooptados pelo
Estado; os sindicatos de funcionários se tornaram focos de resistência ao regime
autoritário
317
, principalmente a partir do sindicalismo praticado na região do ABC
paulista, em final dos anos 70 e início dos 80;
316
Cf. SORJ, 2001, p. 16-7.
317
Embora Sorj não mencione, é preciso registrar o fato de que desde a era Vargas houve cooptação dos trabalhadores, através de
uma política sindical tutelada pelo Estado, junto com a criação do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Enquanto Getúlio Vargas
se tornava líder dos “trabalhadores do Brasil” e conquistava a massa de despossuídos como o “pai dos pobres”, ele ajudava a
organizar as velhas oligarquias e outros grupos conservadores dentro do Partido Social Democrático (PSD).
143
nos anos de 1970, o Estado criou uma reserva de mercado em informática que
resultou no atraso tecnológico dessa área, com conseqüências para outros setores;
a persistência no modelo de crescimento, via empresa estatal, perdeu força;
enquanto isto acontecia, o endividamento externo e posterior serviço dessa dívida
debilitaram a capacidade de investimento do mesmo Estado;
nos anos de 1980, a burguesia já não dava sustentação ao regime; a sindicalização
de trabalhadores no ABC e de funcionários dos serviços públicos e estatais, em todo
o Brasil, potencializou segmentos bem organizados da população; a sociedade
exigia democratização, que veio na segunda metade da mesma década, simbolizada,
principalmente, pelos trabalhos do Congresso Constituinte, entre 1987 e 1988.
318
2.5 Estado e capitalismo de periferia
A forte presença do Estado como formulador de políticas industriais e organizador
da produção caracteriza-o como indutor de um capitalismo dependente. De fato, as relações
e o modo de produção da sociedade brasileira são, predominantemente, capitalistas. Não
obstante, como se tem observado, persistem na sociedade brasileira instituições sociais que
não têm relação necessária com a dinâmica do capitalismo de mercado, tais como: o
patrimonialismo, uma acentuada desigualdade social contrabalançada por vigorosa
sociabilidade, e o Estado racionalizador, com forte presença na economia. Também cabe
reconhecer que essas instituições foram influenciadas e remodeladas pelo processo de
acumulação material, gigantesco e, sobretudo, concentrador, para benefício de poucos
grupos que dominam a economia do País.
O pensamento cepalino interpretava o capitalismo latino-americano como
“incompleto” e em processo de “transição”. Nos anos de 1970, passou a dominar uma
lógica econômica de acumulação capitalista que ignorava a condição dependente desse
sistema econômico. “A globalização e, em especial, os problemas criados pela dívida
318
SORJ, 2001, p. 18-9.
144
externa colocaram a problemática do desenvolvimento brasileiro dentro de uma análise de
fluxos econômicos globais, na qual o país parecia haver perdido sua autonomia”.
319
O
patrimonialismo, neste contexto, teria duas leituras: a dos liberais, para quem esse
componente cultural seria produto da insuficiente aplicação das regras de mercado, e a da
esquerda, para quem a prática patrimonialista seria apenas uma das formas de exploração
exercida pela classe dominante. Sorj observa que tem havido certa inibição na análise
crítica do patrimonialismo, seja porque intelectuais de esquerda consideram o fato de
alguém se ocupar com o tema da corrupção uma forma de tergiversar típica da direita, a fim
de não encarar a questão estrutural da exploração capitalista, seja porque esses mesmos
intelectuais usufruem, em grande medida, de privilégios corporativos intrínsecos às bases
sociais do campo acadêmico brasileiro.
320
Na interpretação de Sorj, a crença de que certas instituições da sociedade brasileira
sejam funcionais ao capitalismo carrega dois equívocos: o primeiro é a suposição de que o
capitalismo tenha características essenciais, dissociadas do processo histórico no qual se
desenvolveu; o segundo é acreditar que o capitalismo se apresenta como um todo coerente,
independente dos condicionamentos culturais presentes antes e durante o desenvolvimento
deste modo de produção. Para Sorj, enquanto os economistas brasileiros acreditavam na
“pureza” do capitalismo, cientistas sociais de outros países aplicavam-se ao estudo das
influências de tradições, redes sociais e valores religiosos, de modo a reconhecerem uma
diversidade de capitalismos afinados com suas respectivas instituições locais.
321
Neste sentido, considera-se pertinente estudar o papel do pentecostalismo na
realidade brasileira, porque se trata de uma das muitas criações (ou recriações) nativas
“através das quais os brasileiros enfrentam seus problemas materiais e emocionais
imediatos e fazem renascer o sentido e a esperança em suas vidas”, conforme destacou
Regina Novaes em um de seus textos sobre pentecostalismo no ambiente urbano.
322
319
Idem, p. 20.
320
Ibidem.
321
SORJ, 2001, p. 20. Exemplo desse exercício intelectual são estudos sobre o desenvolvimento de capital social em comunidades
pobres que emergiram para uma condição sócio-econômica melhor, realizados por ideólogos do Banco Mundial e outros sem
vínculo com essa instituição. Uma obra reconhecida no campo acadêmico é PUTNAM, Robert D. Comunidade e democracia:
a experiência da Itália moderna. Rio de Janeiro: FGV, 1996.
322
NOVAES, Regina. Pentecostalismo, política, mídia e favela. In: VALLA, Victor Vincent (org.). Religião e cultura popular.
Rio de Janeiro: DP&A, 2001, p. 41-74.
145
2.6 Estado, cidadania e anticidadania.
Serão feitas, preliminarmente, breves considerações sobre este tema de capital
importância na história política. Para os gregos, ser cidadão era participar ativamente da
vida da polis; para os romanos, era gozar de determinados privilégios políticos e jurídicos;
para os anglo-saxões, estava na igualdade perante a lei e no usufruto da propriedade e
liberdade individuais. Nas experiências revolucionárias, francesa em 1789 e russa em 1917,
cumulativamente a todo o conjunto citado de requisitos, somava-se a exigência de justiça
social como valor substantivo para o pleno exercício da cidadania. Todavia, ser cidadão é
sempre uma forma particular de pertença a uma comunidade e acesso aos direitos e
responsabilidades que esta garante. A cidadania moderna, segundo Sorj, resulta de uma
bricolagem histórica, onde entram ingredientes normativo-utópicos e analítico-descritivos
de diversas tradições.
323
Ainda Sorj se refere ao estudo de Roberto Schwarz, sobre as “idéias fora do
lugar”
324
, resultado da confrontação entre liberalismo e práticas sociais brasileiras. Todavia,
para Sorj, esta tese tem que ser relativizada, pois pode minimizar a importância das
instituições em conquistas recentes da cidadania e também porque ela pode induzir o leitor
a acreditar que em outras sociedades há coerência entre o sistema jurídico formal e as
práticas sociais, o que não passa de uma idealização.
325
A ineficácia dos aparelhos jurídicos e repressivos no Brasil deixa toda a população
ameaçada, mesmo aquela parcela que goza de privilégios negados à maioria dos brasileiros.
Como não faz sentido haver subcidadãos e supercidadãos, Sorj admite que todos os
brasileiros se enquadram na condição de não-cidadãos.
326
Por esta razão, a cidadania
continua sendo referência de algo almejado, porém não conquistado, haja vista as pesquisas
de opinião, que Sorj consultou, terem apresentado como principais problemas da sociedade
brasileira a falta de justiça social e a impunidade dos poderosos. Nessas sondagens
mesclaram-se valores democráticos e religiosos, com experiências de luta contra o regime
323
SORJ, 2001, p. 25.
324
Esse estudo constitui o primeiro capítulo da obra: SCHWARZ, Roberto. Ao vencedor as batatas: forma literária e processo
social nos inícios do romance brasileiro. São Paulo: Duas Cidades, Ed. 34, 2000, (Coleção Espírito Crítico).
325
SORJ, 2001, p. 25-6.
326
Idem, p. 25.
146
militar, mobilizações pelas “diretas-já” em 1984, deposição do presidente Collor em 1992,
além de discursos ambíguos da mídia. Outros sinais de que a população desenvolveu uma
visão crítica contra o status quo e aspira mudanças, para que se torne realidade o exercício
de valores democráticos e de plena cidadania, são as suspeitas levantadas,
sistematicamente, contra políticos, e insatisfações contra a impunidade e inoperância das
instituições, no que tange à punição de corruptos e fraudadores.
327
Sem acesso igual a bens
coletivos, como emprego, educação, saúde, moradia e previdência, a cidadania continuará
sendo uma quimera distante dos brasileiros.
Sociedades capitalistas criam instituições para administrar conflitos gerados pela
inevitável distribuição desigual de riquezas, dentro da ordem liberal. No caso europeu,
destacam-se sindicatos e partidos; nos Estados Unidos, verifica-se uma grande
fragmentação social, configurada pela atuação de grupos de interesse e manifestações de
mero individualismo. No caso do Brasil, a organização e minimização do conflito social
estão atrasadas, porque os donos do poder, as elites, têm subestimado a capacidade de
demandar da população carente e conservam os esquemas de negação da cidadania. Faltam
investimentos em educação, não há interesse em desenvolver valores da nacionalidade,
reconhecer a diversidade cultural e potencializá-la, estimular o papel ético e agregador das
religiões e tornar o Estado brasileiro um verdadeiro servidor da sociedade. Falta,
principalmente, ampliar e radicalizar a democracia, sobretudo na dimensão econômica da
redução das disparidades sociais e regionais.
Segundo Sorj, as elites brasileiras têm controlado o conflito social “pelo alto”,
através de benesses e distribuição de cargos públicos. Foram cooptadas lideranças sindicais
com o imposto obrigatório e uma legislação que as favorecia. Os grupos no comando do
Estado instituíram empréstimos e financiamentos subsidiados, benefícios fiscais e
favorecimentos aduaneiros, como formas de retribuição aos agentes econômicos que
financiam suas eleições, ou como forma de legislarem corporativamente, visto que não é
incomum empresários ocupando lugares no parlamento e nos executivos, a fim de
praticarem mais eficazmente o patrimonialismo em causa própria.
328
327
Idem, p. 26.
328
SORJ, 2001, p. 26-7.
147
A prática política brasileira se apóia em uma disciplina frouxa que suporta trocas de
siglas partidárias numa mesma legislatura, o que obriga o executivo a negociar cada voto,
em cada matéria, individualmente, para obter maiorias ad hoc. O vínculo do eleitor ao seu
representante é também problemático, pois é difícil e trabalhoso o acompanhamento do
desempenho do parlamentar e, no caso do eleito não estar correspondendo às expectativas
dos eleitores, é quase impossível a estes retirarem o mandato que outorgaram ao político
relapso. O sistema de governo presidencialista, com a instituição das “medidas
provisórias”, tornou mais remoto o ideal do equilíbrio de poderes. No sistema vigente, o
parlamentar é muito mais um lobista de interesses de grupos privados do que um
representante popular de um projeto de sociedade.
O regime militar de 1964 destruiu o antigo sistema partidário e substituiu-o por um
sistema com duas frentes de composições bem heterogêneas: de um lado, os que apoiavam
o regime, cooptados mediante concessões de emissoras de rádio, cargos no governo e
recursos em prol de “fundações” dos próprios parlamentares; de outro, todos os que se
opunham ao regime, a partir de ideologias diversas, desde liberais convictos até
esquerdistas radicais. Desde o Congresso Constituinte de 1988, quando foi superada a
vigência dessa camisa de força imposta pela ditadura militar (1964-85), tem sido difícil
consolidar o sistema partidário, devido a diversos fatores, com destaque para a legislação,
tendo-se em conta que ela favorece a criação de legendas de aluguel e facilita práticas
patrimonialistas, corporativistas e clientelistas. Tanto direita como esquerda fazem uso do
patrimonialismo e do corporativismo. O Partido dos Trabalhadores, por exemplo, construiu
parte de sua base no funcionalismo público, que tem defendido seus interesses de forma
corporativa, resistindo a uma reforma do Estado e a transformações no sistema produtivo e
tecnológico, de que o País tanto necessita.
329
Como um representante bem estruturado da
direita, o Partido da Frente Liberal congrega banqueiros e oligarcas rurais, além de políticos
que sustentaram a ditadura militar, todos bastante experimentados no jogo que os garante
perpetuarem-se no poder. A competência destes grupos esteve sendo demonstrada na forma
hábil como se reciclaram para aliar práticas patrimonialistas com discurso “atualizado” de
privatizações, liberalização da economia e projetos de responsabilidade social.
329
SORJ, 2001, p. 27.
148
A construção de um projeto de sociedade é complicada, diante de um cenário
político caracterizado por partidos frágeis, organizações mediadoras, como sindicatos e
outras associações, fragmentadas em seus objetivos, classes médias distribuídas em grupos
divergentes e uma grande massa de pessoas excluídas das condições básicas de
sobrevivência. Há um distanciamento, ou até antagonismo, entre essa sociedade e o Estado
que dela se serve, pois este permanece sob controle de minorias que manobram instâncias
de poder como instrumentos para fazerem apropriação de riquezas produzidas
coletivamente.
O modo como esta concentração de bens foi feita pode ser percebido pela
estratificação e discriminação que o mesmo Estado faz na partilha de serviços públicos. De
fato, o Estado disponibiliza, de forma seletiva, o acesso a serviços de água, eletricidade,
esgoto, transporte, telefone, segurança, moradia, coleta de lixo, saúde e educação, para
populações integradas na economia formal, com privilégios para as mais abastadas e
prejuízo para as populações pobres que moram em periferias e lugares insalubres da rede de
cidades brasileiras. A generalização é cabível, pois, embora haja exceções, não se
vislumbra reversão deste quadro. Por esta razão, Sorj assegura que “o acesso diferenciado
a bens de consumo coletivo é um elemento central na composição da desigualdade social
no Brasil”.
330
Sorj também constata que “a desigualdade social tem forte componente espacial”
no Brasil.
331
Existe uma concentração maior de pobres nas regiões Nordeste e Norte, assim
como nas zonas rurais. É consensual a crítica à modernização conservadora na agricultura,
responsável pela expulsão de milhões de pessoas do campo, desde os anos 60, mas essa
crítica carece de aprofundamento quanto aos aspectos positivos e negativos da migração.
Por exemplo, houve concentração de populações nas cidades e aumento de sua capacidade
de mobilização. Também se registraram variações nas taxas de natalidade, com
conseqüências para a distribuição espacial da pobreza entre as regiões geográficas e entre
campo e cidade. Segundo Sorj: “A distribuição espacial desigual da pobreza cria tensões
para o sistema político na medida em que exige políticas regionais compensatórias, tarefa
330
SORJ,2001, p. 21, grifos no original.
331
Idem, p. 22, idem.
149
árdua pela dificuldade de transferir recursos para regiões com baixa capacidade de gestão
autônoma, e onde os altos níveis de desigualdade favorecem práticas patrimonialistas”.
332
Não é só no aspecto econômico e espacial que se verifica a discriminação, pois “a
desigualdade social no Brasil tem um forte componente racial e de gênero”.
333
Os negros
são os mais atingidos por práticas de preconceito no mercado de trabalho, como, também,
pela ação da polícia e sistema judiciário, seja no acesso a empregos e remuneração, seja
pela suspeição e rigor na apuração de delitos e crimes. Ações afirmativas pouco
prosperaram e geraram mais polêmica do que bons resultados, como alternativa para
romper o imenso quadro de desigualdades, embora se reconheça que houve avanços,
principalmente na tomada de consciência do problema. Face à ampla miscigenação, fica
difícil definir quem é negro na sociedade brasileira. O problema é muito complexo, pois,
como ressalta Sorj:
... frente ao modelo americano, de formação de identidades políticas através do
associativismo e da afirmação dos direitos cívicos de minorias, ou do modelo europeu, no
qual a legitimidade de uma minoria passa por sua relação com e contraposição à ideologia
do que seja nacional, a cultura brasileira se constituiu [...] em torno da abertura para o novo
e a absorção da diversidade dentro de um sincretismo religioso e cultural, em grande parte à
margem da relação com o Estado.
334
Deste modo, a adoção de políticas de reconhecimento, importadas do hemisfério
norte, em vez de trazer solução adiciona novos componentes à já complicada dinâmica de
discriminação brasileira. Trata-se de um remendo estranho para o roto tecido social
brasileiro, embora convenha que sejam apreciados esses esforços, enquanto se tenta
adequá-los à realidade local, já que melhores propostas não têm sido apresentadas. As
mulheres também são discriminadas, apesar de constituírem mais de um terço da força de
trabalho. Há uma tendência à elevação do nível educacional feminino, o que sinaliza para
possíveis melhorias de sua condição profissional, inclusive em postos de chefia, desde que
superados preconceitos de gênero.
Já foi mencionada a relação entre região e lugar de moradia e o acesso aos serviços
básicos para a população. Quanto a condições de emprego e proteção social, que
332
Ibidem.
333
Ibidem.
334
SORJ, 2001, p. 22-3.
150
possibilitam ou dificultam o acesso a bens de consumo, tem-se, simplificadamente, três
categorias:
a) funcionários públicos, com faixa salarial bem variada, mas com estabilidade e
regras de aposentadoria mais favoráveis do que as do setor privado;
b) assalariados do setor privado, inscritos na previdência social, com formas diversas
de relações de trabalho e ampla variação de salários;
c) trabalhadores sem proteção social, constituindo a maior parte da força de trabalho,
desde empreendedores até ambulantes, serviçais domésticas e assemelhados.
Se em todas as sociedades o Estado tem papel na diferenciação e manutenção da
estrutura de classes, no Brasil este papel é mais relevante, porque sua presença é mais
marcante aqui.
335
Assim, é possível considerar o Estado a serviço das elites muito mais um
vilão do que um grande pai, como procuravam aparentar os agentes do populismo,
sobretudo durante a era Vargas, mas constituindo-se, realmente, em retórica comum e
atualizada de governantes brasileiros. O fato é que grande parte da população perdeu a
proteção paternalista e caiu na marginalidade de órfãos de pai vivo desse mesmo Estado.
336
O pentecostalismo ajuda a reforçar esse quadro de anticidadania, segundo a
perspectiva de Cartaxo Rolim. Em Pentecostais no Brasil (1985), ele destaca que a vertente
branca norte-americana do pentecostalismo trouxe para a sociedade brasileira uma religião
“marcada pela nítida separação entre o religioso e o social”.
337
Não era apenas uma questão
de omissão, mas de recusa ao compromisso sócio-político, uma forma radical de afastar os
crentes da atividade sindical e partidária. Segundo Rolim, a nova ordem do Estado Novo,
de 1937 a 45, que reprimia os sindicatos, instalou condições favoráveis para a expansão do
pentecostalismo. Reduzidos os canais de solidariedade sindical, restou à religião
pentecostal preencher esse espaço, junto às camadas pobres da população urbano-industrial.
335
SORJ, 2001: p. 24.
336
O objetivo não é meramente criticar programas sociais como Fome Zero, do governo Lula (2003-6), ou Comunidade Solidária, do
anterior (FHC, 1994-2002), mas o que se pretende é evidenciar que estes esforços constituem medidas pontuais e paliativas, sem
qualquer tipo de empenho para alterar a estrutura social estratificada da sociedade brasileira.
337
ROLIM, 1985, p. 41 e 71.
151
A legislação obreira pregava harmonia entre patrões e empregados, coincidente com a ética
religiosa mencionada.
338
Rolim levanta uma questão com fundamento teórico em Weber, Marx, Gramsci e
Poulantzas, para interpretar o fenômeno pentecostal na formação social brasileira: de que
modo os agentes da religião se relacionam com as forças produtivas e como o
pentecostalismo se situa no plano ideológico-político da sociedade? Uma possível resposta
é: a mensagem pentecostal remete ou transfigura a solução dos males sociais para a esfera
do poder de Deus.
339
A organização pentecostal tem um modelo piramidal hierárquico cujo governo não é
escolhido pela base, embora esta o sustente, legal e financeiramente, e forneça elementos
que preencherão seus quadros de diáconos, presbíteros e pastores: exemplo extremo de
submissão, legitimado por uma interpretação fundamentalista de textos bíblicos. De fato, o
pentecostalismo reproduz a relação de dominação que caracteriza a sociedade capitalista.
Rolim atribui a falta de engajamento social a este exercício permanente de submissão e
obediência imposto ao crente, no dia a dia da vida das comunidades pentecostais.
340
Conforme análise feita por Novaes, o comportamento dos pentecostais não seria tão
dócil à dominação, como se costuma propagar de forma até estereotipada. O último
capítulo de sua obra, “Os escolhidos de Deus”, é denominado O apartamento das “coisas
do mundo” e as formas de participação política dos agricultores.
341
Nesse texto, a autora
indica que as eleições intensificavam os contatos dos “ricos” com os “pobres”, porém de
uma forma utilitarista, com troca de votos por favores. Novaes verificou que “os crentes”
levavam para a política aspectos de sua pertença religiosa, como intransigência na busca de
direitos trabalhistas e submissão ao veredicto da autoridade: “Os crentes contaminam a luta
pelos direitos com suas convicções e determinações”.
342
A condição de “irmãos” levava-os
a uma “convivência mais intensa entre iguais”, fomentava surgimento de líderes e
capacitava-os politicamente. Para Novaes, “ao dar realidade a determinados traços, o crente
transforma o que antes era modelo idealizado em uma ética. Ética no sentido mais
338
Idem, p. 80-1.
339
Idem, p. 179-81.
340
Ibidem.
341
NOVAES, 1985, p. 126-38.
342
Idem, p. 143.
152
profundo: em um motor de vida que pressupõe militância”,
343
ou seja, estavam ali as
exigências da fé traduzidas como prática social.
2.7 Estado e sociabilidade pouco cordial
Nos anos 50, o Brasil ingressou num processo de industrialização que atraiu
populações para as cidades, ampliou o mercado de consumo e enfraqueceu costumes
tradicionais. As transformações sociais favoreceram uma ascensão do individualismo,
associada à ampliação das incertezas, enfraquecimento da autoridade tradicional e
surgimento de novas identidades coletivas.
Segundo Sorj, embora a literatura acadêmica negligencie o papel da sociedade
nacional no processo de individualização, os “valores, gostos e atitudes compartilhados”
continuam relacionados ao modo de ser de cada nacionalidade.
344
Há um mapeamento
cognitivo-afetivo-social mais amplo, no qual se insere um habitus, entendido este como um
“sentido genérico de interiorização e corporificação de atitudes e conhecimentos da classe e
grupo social específico” a que pertencem os indivíduos.
345
Portanto, cabe ao sociólogo
tentar identificar esse conjunto, que funciona como substrato de comportamento para o
“saber viver” numa dada sociedade. É bom lembrar, porém, que nenhum sistema social tem
um caráter coerente de valores. Há uma infinidade de condutas possíveis e inimagináveis,
em cada formação humana, junto com princípios compartilhados, sem que, todavia, estejam
direcionadas para superação das desigualdades sociais. Como alerta Sorj:
Supor a existência de um código comum de sociabilidade não implica que estejamos
introduzindo um conceito de caráter nacional que homogeneíza e iguala tudo nem que
inexistam importantes subculturas e diferenças entre as classes sociais. Formas
compartilhadas de sociabilidade são mecanismos necessários, inclusive para reproduzir as
diferenças sociais.
346
343
Idem: p. 146.
344
SORJ, 2001, p. 28.
345
Ibidem.
346
Idem, p. 29.
153
Pode-se afirmar que a sociedade brasileira oferece um quadro de sociabilidade com
características desenvolvidas em processos de longa duração, das quais Sorj destaca
algumas, enunciadas em itálico, que serão apresentadas e comentadas a partir deste ponto:
1) “A sociabilidade brasileira tem frágeis componentes cívicos, isto é, uma baixa
identificação com os símbolos políticos do Estado e a noção de interesse público”.
347
Há uma distância entre o “ser brasileiro” e os símbolos políticos e cívicos. Não há
uma formação cívica e se houvesse seria dificultada pela desconfiança que a sociedade tem
em relação ao Estado, devido a este se comportar, historicamente, como espaço de
privilégios. Diferente do que se observa na Europa e até na América Latina, em países do
Cone Sul, o Estado brasileiro não tem sido capaz de utilizar a educação como instrumento
de propagação de uma ideologia nacional. Patrimonialismo, clientelismo e impunidade
contribuíram para esse descredenciamento do Estado como formador de valores cívicos.
Sorj acrescenta: “A partir de uma baixa estima pelo Estado se desenvolve uma cultura de
falta de respeito e burla generalizada à lei. Assim, a cultura brasileira e a formação de
identidades funcionam em certa medida de forma independente do sistema político”.
348
um lado positivo nisto: não se desenvolveu no Brasil uma cultura xenófoba e intolerante,
como ocorreu em países da Europa, por exemplo.
O patrimonialismo, como era de se esperar, disseminou relacionamentos promíscuos
entre o público e o privado, dificultando mesmo a percepção de fronteiras entre esses
espaços. O público é percebido como “terra de ninguém”, a impunidade incentiva o
desacato à lei e os costumes tendem a alimentar uma cultura de transgressão, como a burla
às leis de trânsito, às normas de segurança, etc. “No Brasil, o costume é não levar as leis a
sério”.
349
2) “A sociedade brasileira apresenta práticas racistas, apesar de ser ideologicamente
contrária ao racismo”.
350
347
Idem, p. 30.
348
Ibidem.
349
Ibidem. Magalhães Barata, interventor no Pará, durante o Estado Novo, costumava dizer mais ou menos assim: “lei é potoca:
para os amigos os privilégios, para os inimigos os rigores da lei”. Este dístico baratista é citado no Pará sempre que se evoca a
figura daquele que foi seu mais notável caudilho. Pela condição de liderança que ele e outros exerceram e exercem, o mau exemplo
deles tem feito escola até os tempos atuais. Infelizmente, este pouco caso para com os deveres cívicos e com as leis em geral não é
uma questão regional; trata-se de problema nacional.
350
SORJ, 2001, p. 31.
154
Considerando a presença negra tão marcante na cultura brasileira e as
discriminações que seus integrantes sofrem, por que o movimento negro não é forte e
amplamente disseminado? Respostas sugeridas por integrantes do próprio movimento e por
pesquisadores fundamentam-se em argumentos, tais como: a existência de um racismo
interiorizado, traumas da opressão que já sofreram, falta de conscientização e deficiências
em nossa cultura democrática. Sorj concorda com estas idéias, mas prefere considerar a
especificidade da cultura o fator explicativo da fragilidade do movimento negro, quando
criou “uma dinâmica de tolerância, sincretismo e absorção da diferença, sem eliminar o
preconceito na prática”. Essa cultura dócil e mesmo submissa vicejou à margem do Estado
nacional. Diferentemente do que ocorreu em outros países, no Brasil não surgiu uma
ideologia sistematizada de racismo, que, de modo ostensivo, discriminasse o negro, a ponto
de induzi-lo a reforçar sua identidade. A pouca importância dada à memória contribui,
também, para um esquecimento dos horrores da escravidão.
351
Deve-se lembrar, porém, que houve disseminação de ideologias racistas no Brasil,
entre 1870 e 1914, inspiradas em idéias de autores como Gobineau, Renan, Gustave Le
Bon, Lapouge e Gumplowicz. No geral, eles faziam uma apologia da “raça branca” em
detrimento de outras. Alguns escritores brasileiros, como Euclides da Cunha, Sílvio
Romero, Capistrano de Abreu e Nina Rodrigues, discutiram a mestiçagem como
“problema” na formação do homem brasileiro. Nossa sociedade estaria ameaçada a ter um
lugar medíocre no conjunto das nações, a menos que houvesse um “branqueamento” da
população, através do ingresso de europeus e outros povos brancos, ou mediante
desenvolvimento de uma “raça histórica” autóctone, a se constituir em processo de longa
maturação. Estes seriam caminhos possíveis para fugir do perverso determinismo a que
estava condenada a nação brasileira. Segundo Carlos Lessa:
Gumplowicz afirmava que se as fronteiras ficassem fechadas por um longo
período, a mestiçagem, estabilizada, daria origem a uma raça histórica
homogeneizada e capaz de realizar um processo civilizatório. Euclides da
Cunha acreditou que o sertanejo nordestino e o caboclo amazônico seriam
351
SORJ, op.cit., p. 31-3.
155
protótipos da raça histórica brasileira e sujeitos possíveis da nossa
civilização.
352
Cabe lembrar aqui que o pentecostalismo brasileiro teve origem na vertente branca
do movimento pentecostal norte-americano, trazido pelos suecos Daniel Berg e Gunnar
Vingren, e pelo italiano Luigi Francescon, pioneiros da Assembléia de Deus e da
Congregação Cristã no Brasil, respectivamente. Por suas iniciativas foram plantadas
sementes que floresceram e frutificaram em igrejas verdadeiramente populares, mas que
nem por isso deixaram de reforçar a ideologia do branqueamento, pois a mentalidade era
“salvar” os brasileiros dos vícios implantados pelo catolicismo português, mas também das
maldições trazidas pelas religiões de matrizes africanas e indígenas. Ou seja, a mentalidade
pentecostal era a mentalidade do branco norte-americano, com raízes italianas, suecas e
anglo-saxãs.
3) “A sociedade brasileira é violenta”.
353
Mesmo quando aparenta ser uma sociedade cordial e lúdica várias evidências
indicam que há uma guerra civil deflagrada na sociedade brasileira. São quadrilhas de
traficantes de drogas em associação com setores da polícia controlando favelas, gangues de
rua, torcidas organizadas, pessoas exploradas como escravas em fazendas, prisioneiros em
condições desumanas superlotando celas de prisões, crianças e adolescentes sobrevivendo
em ruas de grandes cidades, ou, também, superlotando dependências de casas de
“recuperação”. A condução irresponsável de veículos no trânsito ainda é uma das maiores
causas de morte no Brasil. Essas situações exemplificam a omissão do Estado, o que
estimula a perpetuação da violência em grau superlativo.
354
Enquanto em outros processos civilizadores a sociedade inventou o Estado, no
Brasil aconteceu o inverso, o Estado foi construído pelo colonizador e elites locais, como
instrumento fundador e autoritário acima da sociedade nacional. A herança patrimonialista
352
LESSA, 2000, p. 39-40.
353
SORJ, 2001, p. 34.
354
Ibidem.
156
portuguesa, num mundo mercantilista dominado pelos ingleses, desembocou suas
contradições aqui. A mentalidade lusitana privilegiava a ostentação perdulária, o poder e a
glória; o mercantilismo anglo-saxão exaltava a poupança e o investimento. Assim,
estabeleceu-se no Brasil uma cultura híbrida, porém mais inclinada ao modelo lusitano, e,
ao mesmo tempo, admiradora do sucesso material inglês e do êxito intelectual francês.
Nessa sociedade elitista foi negada a cidadania para o pobre livre e para todos os que se
situavam na periferia do modelo econômico. A esse pobre restava agregar-se a algum
poderoso para obter concessões e ser tratado como beneficiário de uma falsa cordialidade
paternalista. “Essa cidadania concedida foi reproduzida graças a uma ‘cultura política da
dádiva’ que se sustenta num certo fetiche da igualdade e de encurtamento das distâncias
pessoais, que tem justamente a finalidade de esconder as desigualdades sociais”.
355
Um indivíduo carente e acuado não pode expressar-se livremente, portanto não é
cidadão. Instituições representativas não se desenvolvem onde o indivíduo é cerceado pela
ação de grupos clânicos, corporativos, patrimonialistas e hierárquicos. Enquanto não
houver quebra dessas estruturas, a esfera pública estará atrofiada e o Estado será refém de
grupos privados. Em tal “modelo de cidadania de poucos” a cultura autoritária continuará a
impulsionar um tipo de “modernização” conservadora.
2.8 Estado e populismo
O populismo é um fenômeno presente na sociedade brasileira, desde a configuração
política estabelecida pela Revolução de 1930. Trata-se de um estilo de governar sensível às
pressões populares, que procura conduzir as massas, através da manipulação de suas
aspirações. Costuma-se considerá-lo uma tentativa de resposta das oligarquias à crise de
comando político, devido à sua incapacidade para manter hegemonia, no quadro de forças
redesenhado com a emergência de novos atores sociais. Também é uma forma de desviar o
foco do liberalismo, cujas promessas modernizantes estão sempre presentes nos discursos,
mas ausentes na prática. O populismo veio com a era de Getúlio Vargas (1937-45) e
355
MARTINS, 2002, p.98.
157
continuou sendo praticado como paternalismo carismático de outros governantes, após a
Segunda Guerra, entre 1945 e 1964.
Sobre algumas interpretações do populismo, Ianni faz os seguintes destaques:
o populismo foi uma deformação demagógica, carismática, do processo democrático que se
estava ensaiando; teria sido um produto da atuação da esquerda brasileira, renegando seu
compromisso com o socialismo e a revolução; foi responsável por desacertos
governamentais e de partidos políticos, justificando o golpe de estado de 1964;
compreendeu lutas e mudanças durante as quais o país ensaiou a formação do capitalismo
nacional; foi uma época de crise de hegemonia, quando classes sociais antagônicas fizeram
e refizeram acordos; seria a primeira experiência da social democracia brasileira; um
período crítico da história da sociedade brasileira, quando as contradições da revolução
burguesa poderiam desdobrar-se na revolução socialista.
356
A política de massas era componente fundamental no projeto de Getúlio Vargas,
que pretendia imprimir reformas na sociedade brasileira. Ianni a descreve como
a combinação de interesses econômicos e políticos do proletariado, classe média e burguesia
industrial [... com vistas] a favorecer a criação e expansão do setor industrial, tanto quanto
do setor de serviços. Em concomitância, criam-se instituições democráticas, destinadas a
garantir o acesso dos assalariados a uma parcela do poder.
357
Essa engenharia política visava romper os vínculos com a “sociedade tradicional” e
conduzir o País a um patamar de modernização sem provocar rupturas. Para Ianni, a
composição do proletariado urbano, com a presença cada vez mais numerosa de egressos
do mundo rural, explicava a inexperiência política da classe:
Com as migrações internas, no sentido das cidades e dos centros industriais
particularmente intensas a partir de 1945 aumenta bastante e rapidamente o contingente
relativo dos trabalhadores sem qualquer tradição política. O seu horizonte cultural está
profundamente marcado pelos valores e padrões do mundo rural. Neste, predominam formas
patrimoniais ou comunitárias de organização do poder, de liderança e submissão, etc. Em
particular, o universo social e cultural do trabalhador agrícola (sitiante, parceiro, colono,
camarada, agregado, peão, volante, etc.) está delimitado pela religião, a violência e o
356
IANNI, 1988, p. 10.
357
Idem, p.55-6.
158
conformismo, como soluções tradicionais. Esse horizonte cultural modifica-se na cidade, na
indústria, mas de modo lento, parcial e contraditório.
358
A prática populista revela a debilidade dos grupos dominantes urbanos, que não
conseguiram substituir plenamente as velhas oligarquias agrárias no domínio da política,
até porque eles trouxeram em sua companhia frações descontentes dessas oligarquias para o
cenário do movimento de “modernização pelo alto”, iniciado pelos tenentes, nos anos 20,
mas somente instalado no poder quando Getúlio Vargas assumiu a presidência, em 1930, ao
impedir a posse do candidato eleito, Júlio Prestes, ligado às elites paulistas.
Esse novo bloco no poder admitiu no cenário político a emergência de massas
populares envolvidas no processo de urbanização e industrialização, porém o fez aliciando-
as por meio de legislação paternalista, que as impedia de se descobrirem e se organizarem
na condição de “classe para si”.
A liderança da Revolução de 1930 coube a chefes caudilhos, como Getúlio Vargas,
e algumas figuras de classe média. Embora o sistema oligárquico tivesse entrado em crise,
por ser excludente e servir, quase com exclusividade, aos agentes da economia agrária
exportadora, principalmente cafeeira, as classes médias e os setores industriais em
formação não conseguiam aglutinar forças, nem gerar lideranças, para retirarem as funções
do Estado do comando das velhas oligarquias agrárias. Com o desenrolar do movimento de
1930, houve uma ampliação das bases sociais da República. Neste contexto, a liderança da
Revolução resolveu manobrar as massas para consolidar sua posição de controladora do
Estado.
A débâcle econômica do café, após a quebra da bolsa de Nova York, foi socializada,
ou seja, a sociedade foi forçada a pagar a política de sustentação de preços do produto no
mercado. Os industriais faziam pressões sobre o Estado, exigiam benesses e medidas
protecionistas, tirando proveito como classe econômica, embora não controlassem
diretamente o sistema político. As classes médias, constituídas, principalmente, por
funcionários públicos, militares e profissionais liberais, arregimentaram-se como forças
importantes nas lutas contra as oligarquias, desde os anos 20, com destaque para as
358
Idem, p.57.
159
insurgências militares de 1922, 24 e 26, acolhidas com simpatia pela população urbana.
Idéias liberais, consagradas desde a Constituição de 1891, moralização dos sufrágios e dos
costumes políticos em geral, eram bandeiras dessas frações da sociedade. Em que pesem
todas essas iniciativas, as classes médias não tiveram, naquela conjuntura, capacidade para
conquistar o poder e concentrar em seus quadros a hegemonia do movimento
modernizador, com vistas a imprimir o sentido liberal-democrático que defendiam. A falta
de lastro econômico obrigava-as a acompanharem líderes políticos pertencentes ao padrão
da grande propriedade rural. Sob este particular, apresentavam enorme diferença em
relação às classes médias norte-americanas, formadas de pequenos proprietários
independentes.
359
A Revolução de 30 foi uma transformação das estruturas de poder operada de cima
para baixo. A presença das camadas subalternas neste cenário também era uma iniciativa
promovida pelas camadas “do alto”. São estes componentes que permitem explicar o
caráter populista dos regimes e da política nacional nos anos subseqüentes. A aparente
ausência das classes subalternas no processo revolucionário tem explicação que não se
traduz como uma hipotética indiferença. As oligarquias se dividiram em dois blocos: de um
lado, grupos ligados ao poder central, latifundiários e exportadores de café, principalmente;
de outro lado, os que se agrupavam na oposição, como o industrial Antônio Carlos, de Juiz
de Fora, o caudilho Getúlio Vargas, do Rio Grande do Sul, e outros líderes regionais,
explorando descontentamentos diversos. Estes formaram a Aliança Liberal, requentando o
velho liberalismo democrático de setores urbanos e segmentos de classe média, como os
militares, enquanto instrumentalizavam camadas mais pobres. As propostas do grupo se
limitavam à ampliação do voto e alguns progressos menores no campo político. Getúlio foi
escolhido candidato à Presidência da República para suceder Washington Luiz. Era uma
candidatura com o objetivo de atrair o máximo de votos, em todas as classes e por todos os
meios. Conforme descreveu Virgínio Santa Rosa, crítico da época:
a plataforma, pela força imperiosa das circunstâncias, devia ser anódina, descolorida, sem
caracterizações fortes... A Aliança Liberal apresentava-se como um remanso acolhedor para
todos os descontentamentos e todas as esperanças. O pobre, o milionário, o operário, o
359
Sobre as classes médias como atores políticos desse período examinar SAES, 1984.
160
funcionário, o comunista, a feminista, todos podiam confiar na serenidade de ação do
candidato por ela indicado
360
.
Vargas indicava que seu governo seria de apoio aos capitalistas, mas, também, de
proteção ao trabalhador. Inegavelmente, tratava-se de um avanço, ao ser comparado com o
anterior, que considerava a questão social como apenas um caso de polícia. As massas
populares, portanto, mesmo não organizadas, representavam um fator de preocupação para
ambos os lados das oligarquias em disputa, agrário e industrial.
A república das oligarquias, derrotada em 1930, não tinha espaço para as classes
populares. Mesmo com a ascensão dos novos dirigentes, a participação continuou ínfima. O
eleitorado inscrito era de 3,5% da população brasileira em 1933, aumentando para 6,5% em
1934, quase 22% em 1950 e 22,2% em 1960. Não obstante, após 1930, a presença popular
se torna fator importante no processo político, visto que representantes da oligarquia
dissidente e de classes médias no governo não formavam um bloco de sustentação sólido
para a nova composição de poder. Essa condição de equilíbrio instável foi desembocar no
golpe que instaurou a ditadura do Estado Novo em 1937. Ainda que essa configuração
política fosse nova, em comparação com a da Velha República, permanecia, porém, a
dependência à economia exportadora do café, o que obrigaria o governo a lidar com
interesses contraditórios entre diferentes atores do jogo político. Isto permitiu ao governo
assumir função de árbitro e, conforme análise de Francisco Weffort,
361
fez surgir condições
para a prática do populismo, quais sejam: “a personalização do poder, a imagem (meio real
e meio mítica) da soberania do Estado sobre o conjunto da sociedade e a necessidade da
participação das massas populares urbanas”.
362
Sem classe hegemônica e sem base social
de poder, a ditadura Vargas recorre às massas populares urbanas, das quais se torna
protetora. A propaganda oficial faz o ditador se tornar conhecido como “o pai dos pobres”.
O fim da ditadura encerrou o monopólio de Vargas na política de massas, mas não
encerrou a tradição populista que prosseguiu em outras circunstâncias nos governos
subseqüentes. Da era Vargas o sistema político herdou uma estrutura de partidos, com o
360
SANTA ROSA, Virgínio. O sentido do tenentismo. São Paulo: Alfa-Ômega, 1976, p. 51-2. A primeira edição foi publicada
em 1933 e a segunda em 1964.
361
Cf. WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. In: FURTADO, Celso. Brasil : tempos modernos. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1979, p. 49-75.
362
Idem, p. 61, grifado no original.
161
PSD (Partido Social Democrático) agrupando setores conservadores da atividade agrária, e
o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), como sigla dos trabalhadores reconhecidos ao seu
fundador, o próprio Vargas. Estes dois partidos compunham uma aliança funcional para
conquista e manutenção do poder com ingredientes de conservadorismo e populismo. Na
oposição, grande parte das classes médias urbanas se agrupava na UDN (União
Democrática Nacional), que se caracterizou, desde cedo, como uma agremiação de direita,
envolvida em golpes. Foi assim na posse de Vargas, em 1950, na crise que o levou ao
suicídio, em 1954, na posse de Juscelino Kubitscheck, em 1955, e na preparação do golpe
militar de 1964.
O presidente Jânio Quadros, sucessor de JK, renunciou em 1961, desencadeando um
período de crises, que se prolongou da posse do vice João Goulart, rejeitado pelas forças
políticas mais conservadoras, até sua queda, em 1964. O programa de “reformas de base”,
anunciado pelo governo Jango, estimulou mobilizações no campo e na cidade. A reação
veio logo, unindo setores das classes médias, grandes proprietários, burguesia industrial,
banqueiros, capitalistas estrangeiros e, principalmente, militares. O populismo de Jango,
sem ter lastro na composição com as forças dos grupos dominantes, desequilibrou o sistema
institucionalizado de desigualdades e permitiu a destruição do frágil processo democrático
em curso desde 1945. Esse populismo não tinha estrutura de sustentação para sobreviver à
mobilização golpista dos setores conservadores mencionados, os quais se sentiram
ameaçados com o despertar de forças populares urbanas, mas também rurais; estas
representadas, principalmente, pelas Ligas Camponesas do Nordeste do País.
O populismo é um fenômeno com diversas facetas. No período de 1945 a 1964,
marcou presença no comportamento político de três presidentes e de alguns governadores,
em forma de estilos personalistas de liderança e conteúdos ideológicos confusos, mas tendo
em comum o constante esforço para manipular aspirações populares, conter suas
manifestações e garantir seus votos. Este fenômeno, entretanto, não pode ser reduzido à
mera passionalidade das massas conduzidas, de forma oportunista, por líderes carentes de
princípios e valores éticos, como se fosse uma espécie de aberração social. Afinal, ele
marcou regimes políticos e formas de governar em vários decênios de história do Brasil,
estendendo-se até governos mais recentes, posteriores à Constituição de 1988.
162
A complexidade do populismo se revela em duas faces: como instrumento
estruturante para as elites se assegurarem de seu comando sobre as massas e como forma
destas populações carentes extravasarem insatisfações e manifestarem seus anseios
legítimos de mudança social. Neste particular, a participação crescente das massas traz
latentes indicações, mesmo que tímidas, de que o poder dos grupos dominantes permanece
sob ameaça. Como fenômeno complexo, há que se buscar, portanto, as raízes do populismo
na história da república brasileira.
É fato incontestável que não se produziu, no seio do proletariado, uma consciência
de classe. A democracia populista favoreceu “a conciliação de interesses em benefício da
industrialização e em nome do desenvolvimento nacionalista”.
363
Para ficar clara esta
questão, é necessário estabelecer distinção entre luta popular-democrática e luta de
classes.
364
A luta popular-democrática ocorre entre o povo e o bloco no poder. A luta de
classes compreende os conflitos no âmbito das relações de produção de uma sociedade. A
luta entre o povo e o bloco no poder não é luta de classes, mas é luta pela radicalização da
democracia. Esta era a luta desencadeada por setores urbanos da classe média nos anos 30.
A classe dominante teve que cooptar aspirações populares para transformar ideologias de
classes dominadas em ideologias corporativas, praticando o populismo.
365
Isto foi feito no
movimento sindical, quando seus agentes coletivos foram reduzidos a grupos de pressão
corporativos, sob controle do Estado. Através de medidas reformistas, o bloco composto de
oligarquias rurais e burguesia urbana neutralizava o discurso da classe operária. Setores das
classes médias, no desejo de ampliar a democracia, mas sem possuírem uma ideologia de
classe específica, oscilavam entre o discurso burguês e a ideologia do proletariado.
Segundo Laclau, uma classe tem capacidade articulatória para exercer hegemonia quando
363
IANNI, 1988: p.59.
364
Adota-se aqui a abordagem de LACLAU, Ernesto. Política e ideologia na teoria marxista: capitalismo, fascismo e
populismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
365
O fundamento analógico do populismo é o povo. Analógico no sentido aristotélico, que admite sentidos diferentes, mas
encontra referência em um elemento comum. O apelo populista passa por cima das divisões em classes e mantém ambigüidades,
porque povo é um conceito ambíguo que carece de status teórico definido. “O populismo surge historicamente ligado a uma crise
do discurso ideológico dominante”, que é parte de uma crise social mais geral. “O povo nunca consegue ser totalmente absorvido
por nenhum discurso de classe, porque o campo ideológico sempre apresenta uma certa abertura e sua estruturação nunca é
completa” “O populismo não é, em conseqüência, expressão do atraso ideológico de uma classe dominada, mas, ao contrário,
uma expressão do momento em que o poder articulatório desta classe se impõe hegemonicamente sobre o resto da sociedade.
Este é o primeiro movimento da dialética entre povo e classes: As classes não podem afirmar sua hegemonia sem articular o povo a seu
discurso; e a forma específica desta articulação, no caso de uma classe que, para afirmar sua hegemonia, tem que entrar em confronto com o bloco de poder
em seu conjunto, será o populismo”. (LACLAU, op.cit., p. 171, 182 e 201, grifado no original).
163
participa das relações de produção. Como as classes médias têm participação secundária
nas relações de produção capitalistas, elas
ressentir-se-ão da ausência de um princípio articulatório próprio e a unificação de sua
ideologia dependerá das outras classes. Em conseqüência, nunca terão condições de se
constituírem em classes hegemônicas. [...] Se a hegemonia de uma classe consiste em
articular a seu próprio discurso as interpelações não classistas, e se as classes só existem,
aos níveis político e ideológico, como princípios articulatórios, segue-se que uma classe só
existe como tal, a estes níveis, na medida em que lutar por sua hegemonia.
366
Como a organização proletária era fraca, as interpelações das classes médias
tendiam a serem absorvidas pelo discurso dominante do chefe político, que em sua
estratégia populista se apresentava como o “pai dos pobres”. Este não era apenas um rótulo,
porque o regime se dirigia aos “trabalhadores do Brasil” e neutralizava a luta destes com
aplicação de clientelismo, ou seja, atendendo demandas pontuais, para desarticular a
organização de classe.
367
O quadro partidário reflete essas mesmas características de mescla entre a velha
sociedade oligárquica e a nova conformação urbano-industrial. A Carta Magna de 1946
estabelecia uma estrutura de partidos nacionais. Esta configuração, entretanto, não se
verificava na prática, pois prevaleciam as condições bem sedimentadas de poder local e
regional, controlado por suas respectivas oligarquias. O que estas lideranças faziam, para
simular adaptação ao novo quadro, era formar uma rede de compromissos com seus pares,
enquanto apoiavam uma liderança nacional, cuja ação dependia, necessariamente dessa
rede. Segundo Ianni:
O exame das coligações entre partidos, realizadas nas várias eleições havidas depois de
1945, revela a multiplicidade das combinações possíveis. Os programas jamais são
obstáculos intransponíveis. Tanto assim que os partidos chegam a ser definidos como sendo
de direita ou esquerda, conforme a região ou estado do país, e independentemente da sua
definição no plano federal.
368
366
Idem, p. 170.
367
Corporativismo e clientelismo são formas de neutralizar a luta política da classe operária, através da cisão entre luta popular e
luta socialista. No corporativismo a luta de classes é negada. Povo e classe estão separados. Não é a classe operária que representa
os interesses históricos da nação, mas o bloco de poder.
368
IANNI, 1988, p. 60, itálicos no original.
164
A política de massas teve base no nacionalismo desenvolvimentista, núcleo
ideológico em que se engajaram setores das classes médias “civis e militares, liberais e
esquerdistas, assalariados e estudantes universitários”. O Estado era peça indutora do
processo, na criação de instituições, formulação e implementação de políticas. “É nesse
contexto que se situam as conquistas das classes assalariadas, em especial do proletariado”,
concretizadas no salário mínimo, Consolidação das Leis do Trabalho e Estatuto do
Trabalhador Rural, este importante para fazer o populismo chegar ao campo.
369
O
sindicalismo, subvencionado pelo imposto sindical, funcionava debaixo do controle do
Estado, como parte necessária dessa política de massas. A debilidade de um Estado que
recorre ao populismo se manifesta, portanto, nessas relações de compromisso com os
grupos dominantes, embora fracionado, e na manipulação das massas populares, com o
intuito de mantê-las desorganizadas e sob controle.
A análise feita até aqui seria parcial e tendenciosa caso viesse a omitir ou colocar
em plano secundário o papel importante da iniciativa das camadas subalternas. O Estado
em si não inventa uma força social. Embora heterogêneas, as massas urbanas estavam
presentes e evidentemente mobilizadas a requererem ações do poder público. As relações
que se estabeleceram entre setores dominantes e subalternos tinham caráter de manobra de
massa e mascaramento das classes sociais. A era Vargas promoveu a “dádiva” de uma
legislação trabalhista limitada à massa urbana, para não conflitar com interesses dos
grandes proprietários rurais. Não obstante, ao promover esses direitos, mesmo sob os
limites de uma relação populista, o mesmo Estado estabeleceu mecanismos de regulação da
cidadania.
Ao adotar medida seletiva em favor da população urbana o governo estimulou a
migração campo-cidade, com conseqüências na dinâmica de promoção social e política das
populações mobilizadas. Segundo Weffort:
As massas de imigrantes rurais que conquistam a grande cidade, e que atingem os novos
empregos criados pelo desenvolvimento urbano-industrial, dão o primeiro passo para a
conquista de sua cidadania social e política. O ingresso do migrante na vida urbana é o
primeiro passo para sua conversão em cidadão social e politicamente ativo e para a
369
Idem, p. 56.
165
dissolução dos vínculos tradicionais de lealdade e de submissão aos potentados rurais ou aos
chefes políticos dos pequenos municípios.
370
A ação populista permitiu de fato alguma ascensão social, embora seja temerário
generalizar, pois muitos que ingressaram na cidade apenas foram engrossar os bolsões de
miséria das periferias. Contudo, naquele contexto, o populismo significou possibilidade de
participação política que, mesmo manipulada, era um avanço para camadas sociais antes
excluídas de qualquer protagonismo nas relações de poder. O ingresso na cidade significava
pressão em busca de emprego e consumo, demandas mínimas de uma pré-cidadania.
Segundo Laclau, “a revolução brasileira de 1930 expressou um acúmulo de
contradições”.
371
Enquanto na Argentina e Uruguai, os conflitos entre setores agrário e
industrial, sob o modelo de uma democratização liberal, ocorreram ao longo de décadas, o
mesmo tipo de embate se acumulou, em prazo mais curto, no Brasil, potencializado por
lutas inter-regionais, vindo a eclodir no movimento de 1930. Devido à “extrema
regionalização do país”, as classes médias brasileiras não conseguiram organizar um
partido político que se impusesse às oligarquias regionais. Houve algum esforço neste
sentido, em 1910, quando Rui Barbosa postulou a presidência. Outra iniciativa liberal-
democrática frustrada foi a criação do Partido Democrático de São Paulo. Os tenentes mais
radicais do Exército “tentaram levar a cabo um programa democrático e de modernização
do país, através de uma ruptura completa com o sistema político oligárquico e com o
Estado liberal. É nestes setores que se pode encontrar os primeiros traços de uma ideologia
populista”.
372
Somente com a instauração do Estado Novo, em 1937, Vargas impôs seu domínio.
Mesmo assim, jamais conseguiu ter “um movimento unificado e homogêneo”. Como
acrescenta Laclau:
[Ele teve que ser] um articulador de forças heterogêneas, sobre as quais estabelece seu
controle político através de um complicado sistema de alianças. Se nas zonas mais
370
WEFFORT, 1979, p. 68.
371
LACLAU, 1978, p. 197.
372
Ibidem.
166
industrializadas do país consegue implantar sólidas bases de apoio independente, na
classe operária e em vastos setores da classe média, nas regiões do interior tinha de
procurar apoio nas máquinas políticas tradicionais. Esta fragmentação de seu suporte
político reflete-se na impossibilidade de constituir um partido político unificado: as
forças que o apóiam se organizam em dois partidos. O Partido Social Democrático
(PSD) agrupava as forças conservadoras da coalizão; o Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB) baseia-se nos setores urbanos, especialmente operários, e tenta, a partir deles,
desenvolver um jacobinismo populista.
373
O getulismo carregou, permanentemente, uma dupla face: um populismo
fragmentário, sem abrangência nacional, e um conservadorismo subordinado aos humores
das elites. Citando Laclau:
O Getulismo nunca foi genuinamente populista. Pelo contrário, oscilou em um
movimento pendular: nos momentos de estabilidade, sua linguagem tende a ser
paternalista e conservadora; nos momentos de crise, quando os elementos conservadores
da coalizão desertam, lança-se, resolutamente, na via do populismo isto é, do
desenvolvimento do antagonismo latente nas interpelações democráticas. Porém, nestes
momentos, uma lógica política elementar se impunha: as bases sociais a que se dirige o
discurso populista foram até agora, no Brasil, insuficientes para assegurar o poder
político. Isto ficaria demonstrado pelo destino de Vargas, em 1945, em 1954 e
finalmente pela queda de Goulart, em 1964.
374
Uma mudança de rumos no populismo teria duas alternativas: a socialista ou a
afirmação capitalista plena. A primeira, ensaiada em várias tentativas de mobilização e
373
LACLAU, 1978, p. 198.
374
Ibidem.
167
alianças foi abortada pela segunda, que teve no Golpe de 1964 seu avanço vitorioso
375
, pois
já começara, alguns anos antes, no Programa de Metas de Juscelino Kubitschek, que abrira
a economia brasileira, de forma a beneficiar investidores estrangeiros. Militares passaram a
dialogar estreitamente com a burguesia financeira e industrial para harmonizar objetivos e
estratégias de consecução de um projeto integrado ao capital internacional. A derrocada do
governo Goulart foi o fim da política de massas. Nas palavras de Ianni:
O comício [de 13 de março de 1964, na Central do Brasil], em que se reuniram o Presidente
da República, Ministros de Estado e líderes nacionalistas e de esquerda, é o clímax e o fim
da política de massas: como técnica de sustentação do poder político e como expressão
fundamental da democracia populista.
376
2.8.1 A ditadura de 1964 e as massas
As elites exigiam a substituição da democracia populista por um sistema que
harmonizasse o econômico e político na linha dos seus interesses. Segundo Ianni:
nesse quadro, o poder civil e o poder militar confundem-se num só poder. Trata-se de
“depurar” o sistema institucional, de modo a torná-lo congruente com as exigências dos
novos compromissos assumidos pela sociedade nacional: consigo mesma e com os centros
externos de decisão.
377
Naquele momento, lutar contra o populismo significava excluir as massas do
cenário político e impor um novo tipo de liderança. Significava, também, substituir o
nacionalismo e as bandeiras de esquerda por novas definições de modernização dependente,
que os militares preferiam denominar “interdependente”. De imediato, apresentava-se um
problema: os novos atores no poder careciam de carisma e aceitação popular. A visão
racionalista e tecnocrática dos militares junto com seus parceiros civis ignorava ou negava
este aspecto da dinâmica social. Entendiam eles que a ideologia da segurança nacional e o
alinhamento estratégico para tornar o Brasil uma potência, harmonizada com a geopolítica
norte-americana, seria suficiente para impor o novo ordenamento a toda a sociedade, sem
375
O Golpe de 1964 foi “uma operação político-militar destinada a limpar o terreno para a execução mais ampla e eficaz isto é,
ortodoxa do modelo internacionalista” (IANNI, 1988, p. 110-1).
376
IANNI, op.cit., p. 108.
377
Idem, p. 161.
168
necessidade de ouvi-la. Eles eram os intérpretes dos anseios do povo brasileiro, pelo menos
assim acreditavam, e bastava isto. Ianni faz um diagnóstico deste modo de lidar com a
sociedade:
Qualquer governante pode desconhecer as leis fundamentais das relações sociais e da
história, mas ninguém pode governar contra essas leis. Por isso, o novo estilo de liderança
não ganha nem pode ganhar a opinião pública. É muito difícil que uma coletividade se
movimente, como um todo e decididamente, com uma ideologia de cuja elaboração ela não
participou; e de cujas transformações ela não participa. Os grupos e classes sociais ou as
massas precisam ser levados a identificar-se de algum modo na ideologia dominante, caso
contrário o divórcio entre governantes e governados será crescente. Nesse sentido, se é
verdade que os governantes (desde 1964) se esforçam por reintegrar os poderes econômico e
político, é também verdade que o governo e o povo se dissociam em escala progressiva. O
povo se sente governado, mas não se sente participante do governo. O poder estruturou-se
unilateralmente, negando principalmente as experiências históricas posteriores a 1945.
378
Até mesmo o engajamento de empresários e de setores civis conservadores era
difícil, embora houvesse coincidência de interesses com o novo poder político instaurado
pela força militar. Não eram poucos os esforços para garantir esse tipo de participação, que
já vinha sendo preparada através do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e do
Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), organizações civis que contribuíram
ideologicamente para a eclosão do golpe militar. O primeiro fora organizado por
empresários paulistas e o segundo recebera apoio financeiro da embaixada dos Estados
Unidos, ambos tendo, na prática, como objetivo, a desestabilização do governo de João
Goulart.
379
Esse alinhamento econômico-político-militar, apoiado na doutrina geopolítica de
uma “Civilização Ocidental”, sob liderança dos Estados Unidos da América, tão cara aos
estrategistas da caserna, como o General Golbery do Couto e Silva, teve desdobramentos
378
IANNI, 1988, p. 163.
379
Farta documentação e análise sobre as atividades do IBAD e IPES estão na obra: DREIFUSS, 1981. Cf., também, ALENCAR;
RAMALHO; RIBEIRO, 1985, p. 304.
169
futuros e indicava afinidade com o que hoje se conhece como “pensamento único” do
modelo neoliberal de economia e política, visto que este também é uma construção
elaborada à revelia dos interesses sociais e econômicos da maioria da população. “Tratava-
se, então, de opor de fato e tão definitivamente quanto possível uma barreira à
democracia populista. Buscava-se recompor as estruturas de dominação e apropriação,
parcialmente dissociadas na época da vigência do modelo getuliano”.
380
Mesmo reconhecendo este aparente desprezo dos líderes da “redentora” de 1964
pela massa, é necessário chamar atenção para alguns matizes do quadro da época. O regime
militar, desde cedo, apelou para discursos populistas, como, por exemplo, quando justificou
a unificação da previdência social num único instituto, apresentado como solução para
oferecer um serviço melhor distribuído socialmente, visto que o modelo até então vigente
sustentava grupos privilegiados. Também fez propaganda do Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço, que acabava com a estabilidade no emprego, como se este novo modelo fosse
melhor para as massas trabalhadoras. O populismo dos militares esteve evidente na
utilização de slogans como “ninguém segura este País”, “ame-o ou deixe-o”, e, mais ainda,
na política de “pão e circo”, adotada durante a campanha para que a seleção de futebol
conquistasse o tricampeonato mundial em 1970. Uma das músicas reproduzidas
constantemente proclamava que: “vencendo o mundo inteiro” [...] “com brasileiro não há
quem possa”.
No campo estratégico, as relações entre indústria nacional e os militares
apresentavam afinidades. Até então, as Forças Armadas eram equipadas com armamentos e
outros implementos importados. Além de serem, em grande parte, obsoletos, esses
materiais bélicos exigiam grandes gastos para sua manutenção. No contexto do novo
regime, estreitaram-se os laços entre o empresariado e as Forças Armadas para que estas
tratassem de padronizar suas demandas de equipamentos enquanto a indústria brasileira se
capacitava, a fim de atender as novas exigências de suprimento. Na concretização desses
acordos, ganhavam os dois lados. Ianni destaca o valor da aliança proposta:
Deste modo inicia -se a institucionalização do complexo industrial-militar no Brasil.
A nova concepção de “segurança nacional” redefinindo e ampliando a noção de “defesa
380
IANNI, 1988, p. 165-6.
170
nacional” exige a reformulação das relações entre as Forças Armadas e a Indústria. A
eficácia do poder militar depende da forma pela qual ele se relaciona ao setor industrial. Por
esse motivo procura-se estabelecer um “parque industrial-militar” adequado às perspectivas
que se abrem ao País.
381
A classe empresarial se tornava aliada das Forças Armadas, reforçando
politicamente o novo regime. Estavam estabelecidas novas composições entre poder
econômico, político e militar. “Em verdade, é o ‘poder político’ dos grupos dominantes que
adquire novas dimensões, ao criar-se o ‘parque industrial-militar’”.
382
As demandas da
sociedade são induzidas a se subordinarem a esse projeto de “grandeza nacional”, no qual a
“segurança” é um pré-requisito interno e externo. Em lugar das propostas de mudança
estrutural do antigo governo, que repercutia anseios de alguns segmentos e organizações da
sociedade, o novo regime impunha-se pelo princípio da estabilidade. “Assim, recomenda-se
que os trabalhadores em geral aceitem o ‘novo trabalhismo’, isto é, uma nova imagem dos
seus interesses de classe, em harmonia com os interesses das outras classes”.
383
Ianni
enuncia os pontos centrais da nova política definida pelo regime militar para a classe
trabalhadora:
a) Acabar com a participação das classes assalariadas particularmente o
proletariado nas decisões políticas em geral [...].
b) Controlar (ou anular) a capacidade dos grupos burgueses de oposição à política
econômica inaugurada em 1964 (associação aberta e ampla com capitais e organizações
internacionais) apoiarem-se nas classes assalariadas, ou funcionarem como os seus porta-
vozes. Em realidade, enfraquecer as bases políticas dos setores nacionalistas identificados
com o modelo nacionalista de desenvolvimento.
c) Em conseqüência, restaurar o controle da classe dominante sobre o “comportamento” do
fator fundamental da produção, manipulando-se tão completamente quanto possível o custo
relativo da força de trabalho, a sua eficácia produtiva, etc. Por isso, o princípio da
“estabilidade” dos assalariados (após dez anos de atividade na empresa) é transformado em
“seguro-desemprego”, libertando a empresa de um encargo fixo e permanente. Em outros
termos, restaura-se o “confisco salarial”, por meio do controle rígido e centralizado da
política de salários e dos movimentos sindicais.
381
IANNI, 1988, p. 167.
382
Ibidem.
383
IANNI, op.cit., p. 168.
171
d) Em suma, liquidar com a política de massas, enquanto técnica de sustentação do poder
político e enquanto manifestação essencial da democracia populista. Com esta finalidade,
altera-se a lei sobre a greve, controlando-se rigorosamente as possibilidades de sua
utilização, como técnica de reivindicação econômica ou política.
384
Ianni conclui que “as relações de classe são reformuladas, jurídica e politicamente,
em termos bastante claros e diversos da definição vigente antes de 1964. As modificações
da legislação sobre partidos, sindicalização, greve, previdência social, etc. revelam a
estrutura básica da ‘nova imagem do trabalhismo’ no Brasil”.
385
O direito de greve foi
restringido de tal maneira que perdeu a condição de instrumento político de pressão dos
trabalhadores. Fazer greve passou a ser um ato encarado como atentado contra a “segurança
nacional”.
A questão central não era eliminar a “demagogia” e a forma “carismática” de
manipular as massas. O que era almejado pelo regime e seus aliados civis era a condução
da sociedade segundo o interesse dos grandes capitalistas e em prol de projetos do Brasil
potência, concebido pela elite militar. Nos pronunciamentos oficiais, entretanto, o governo
se apresentava como intérprete da opinião pública, que não desejava agitações, mas, ao
contrário, almejava a ordem, a disciplina, o soerguimento do País. Enquanto proclamava
essa ideologia, o regime extinguia as agremiações partidárias e promovia a cassação de
políticos, intelectuais, professores, lideranças sindicais e estudantis, e militantes de
movimentos populares. No conjunto, as medidas autoritárias visavam varrer da sociedade o
que esta mesma havia construído durante a vigência de um experimento democrático, que
havia durado quase duas décadas, de 1945 a 1964. Para Ianni:
Os Atos Institucionais, a Constituição imposta por meio do Legislativo submisso
em 1967, a reforma da legislação trabalhista, a depuração da estrutura partidária, a reforma
universitária, o controle das organizações sindicais e estudantis são fatos encadeados.
Correspondem à intenção de reaglutinar os poderes políticos e econômicos em nova direção.
Destinam-se a derrotar o modelo nacionalista de desenvolvimento, enquanto estrutura de
poder e política econômica. Simultaneamente, derrotam-se as classes assalariadas e parte do
empresariado nacional.
386
384
Idem, p.171.
385
Ibidem.
386
IANNI, 1988, p. 174.
172
2.8.2 As esquerdas e a política de massas
Diante dos grandes projetos historicamente estabelecidos pelas elites o agrário-
exportador, de substituição das importações e o associado ao capital internacional as
esquerdas não foram capazes de formular e disseminar um projeto socialista que
conquistasse corações e mentes. Nas palavras de Ianni, o dilema da esquerda, entre 1922 e
45 pode ser assim enunciado:
Oscilou entre a teoria marxista-leninista da revolução, como posição teórica, e o tenentismo,
como linha política efetiva; entre uma teoria revolucionária e o ‘putschismo’
387
posto em
prática no levante de 1935. Além disso, foi obrigada a desenvolver uma luta persistente e
muitas vezes difícil contra o integralismo, a ditadura do Estado Novo, o nazismo, pela
anistia aos presos políticos (Luís Carlos Prestes, Agildo Barata e outros, líderes ou não)
detidos durante todo o período do Estado Novo. Desde a sua fundação, por um grupo de
operários e intelectuais, em 1922, até o final da Segunda Guerra Mundial, o Partido
Comunista preparou quadros partidários e auxiliares e acumulou experiências, procurando
conformar a teoria da revolução a uma sociedade que está ingressando na época industrial.
O dilema consistia em encontrar as correspondências práticas das contradições formuladas
teoricamente.
388
Depois de 1945, os comunistas optaram pelo reformismo, como tática para solapar
os interesses de latifundiários, burguesia comercial e americanófilos. Assim, trabalharam
em apoio à construção de uma frente ampla, unindo operários, setores da classe média,
estudantes, intelectuais, lideranças populistas, militares e segmentos da burguesia
industrial. Por questão tática, a esquerda apoiou o modelo “substituição de importações”,
como “etapa necessária no processo revolucionário brasileiro”. No bojo dessa opção,
aceitou a política de massas, sem, contudo, ser capaz de tomá-la como ponto de partida para
alcançar a classe trabalhadora, conscientizar esta e promover a “luta de classes”. Ou seja, as
esquerdas acompanharam os setores de vanguarda da classe dominante, ora apoiando o
tenentismo, ora defendendo reformas institucionais de interesse da burguesia industrial com
aval da classe média.
387
Putsch s. m. (pal. Al.) Sublevação de um grupo político armado.” (HOUAISS, Antônio (Dir.) Pequeno Dicionário
Enciclopédico Koogan Larousse. Rio de Janeiro: Larousse do Brasil, 1979).
388
IANNI, 1988, p. 82.
173
Resumindo o panorama apresentado, Ianni escreve:
Essa é uma síntese da política populista com a linha política da esquerda, envolvendo
proletariado, burguesia nacional e outros setores da sociedade. É uma combinação do padrão
de substituição de importações com as reformas de base, em nome do desenvolvimento
nacionalista. Essa é a essência da democracia populista, como modelo político de
desenvolvimento.
389
A adesão à política de massas foi uma estratégia seguida por outros partidos,
movimentos e agremiações da sociedade civil. Para estas forças, isto significava uma forma
realista de fazer política. Para os comunistas era uma aliança tática, mesmo que implicasse
em sacrifício, no curto prazo, da teoria marxista-leninista da revolução. Feito um balanço,
ficou evidente que a eficácia do populismo foi mais poderosa do que a força e o talento do
conjunto das esquerdas. Há que se reconhecer habilidade no populismo de vertente getulista
em “atrair e absorver políticos e intelectuais formados nos movimentos de esquerda”.
390
Sobre esta forma de jogar com interesses conflitantes e fazer acomodações, Ianni faz o
seguinte diagnóstico:
Em verdade, o modelo getuliano nunca foi um projeto global. Não chegou a ser formulado
de modo sistemático. Como modelo político de desenvolvimento, singularizado no
populismo, estrutura-se ao acaso dos acontecimentos, das vitórias e dos obstáculos. Alguns
grupos e líderes perceberam as suas virtualidades, mas não conseguiram formular um
projeto globalizador. Era uma mescla de empirismo e inteligência, audácia e manobra. Foi o
resultado histórico das ações e interesses de diferentes grupos e classes sociais. Ele se
produziu no jogo dos antagonismos internos e externos que singularizam essa etapa da
história nacional.
391
2.8.3 Uma situação instável
389
IANNI, 1988, p. 83.
390
Idem, p. 103.
391
Idem, p. 107.
174
Em sua obra O colapso do populismo, Ianni tentou “reconstruir o que ocorreu nos
principais momentos da história social brasileira na época do populismo”.
392
Assim, ele
procurou explicar possibilidades e limites do desenvolvimento político-social brasileiro nas
condições estabelecidas desde a época de Vargas até a vigência do regime militar de 1964-
85, com atenção especial para a política de massas praticada e reprimid a durante o mesmo
período. Em primeiro lugar, examinou “o desenrolar das rupturas estruturais verificadas” e,
simultaneamente, “as relações entre os processos políticos e os processos econômicos, no
âmbito das transformações da estrutura social global”.
393
Essa análise colocou-o perante o
imperialismo e a atuação da burguesia nacional. Neste sentido, “as relações de classes
surgiram em suas manifestações concretas; obscuras ou claras, de antagonismo ou
acomodação. E o populismo, em suas diferentes modalidades (getulismo, trabalhismo,
populismo de esquerda, etc.) foi caracterizado e interpretado, no contexto social e
econômico em que realmente surgiu”.
394
A obra tratou, portanto, da formação, ascensão,
apogeu e declínio da política de massas. O populismo brasileiro foi percebido a partir de
Vargas e seus aliados. Depois de 1930, ele se configurou como movimento político, com o
crescimento de um proletariado urbano, que criava seu imaginário e instituições. Os
governantes passaram a atender parte das demandas das massas e instrumentalizar suas
mobilizações para legitimarem projetos elitistas de poder.
Assim, pode-se afirmar que a entrada das massas no quadro das estruturas de poder é
legitimada por intermédio dos movimentos populistas. Inicialmente, esse populismo é
exclusivamente getulista. Depois, adquire outras conotações e, também, denominações.
Borghismo, queremismo, juscelinismo, janguismo e trabalhismo são algumas das
modulações do populismo brasileiro.
395
Essa política de massas é componente das transformações econômico-sociais e
políticas que marcam a própria sociedade brasileira e essa política
está em relação dinâmica com a urbanização e os desenvolvimentos do setor terciário da
economia brasileira. Mais ainda, o populismo está relacionado tanto com o consumo em
392
Idem, p. 175.
393
Idem, p. 176.
394
Ibidem.
395
Idem, p. 176, itálicos no original.
175
massa como com o aparecimento da cultura de massa. Em poucas palavras, o populismo
brasileiro é a forma política assumida pela sociedade de massas no país.
396
Nessas manobras sobre as massas estavam presentes estratégias de setores da
burguesia e das esquerdas. Os burgueses, com maior acesso ao poder, tinham comando
mais efetivo das ações, “controlavam os aparelhos burocráticos dos partidos e organizações
comprometidas com a política de massas. Em geral, eles eram os demagogos mais bem
sucedidos junto às massas. Alguns alcançaram a categoria de personalidades
carismáticas”.
397
A decadência do populismo é notória, a partir do governo de Juscelino Kubitschek.
Aliás, essa política de massas sobreviveu sempre em continuadas crises, porque nos marcos
de uma sociedade burguesa, os trabalhadores convivem com dificuldades, sempre que
almejam ocupar espaços de participação nas instâncias de poder. Ianni identifica “duas
ordens de pressões” nessa relação burguesia-massa. Em primeiro lugar, a intolerância dos
mais reacionários e conservadores contra a ascensão das massas no jogo político. Eles
temiam nesse processo a própria destruição da hegemonia burguesa. Também se
incomodavam com o jogo que a burguesia industrial praticava, usando as massas para
reforçar seu poder de barganha no mercado interno e externo. Em segundo lugar, a
burguesia mais próxima do populismo se apresentava dividida e exibia comportamento
ambíguo devido incertezas quanto aos limites do seu jogo com as massas. E, de fato, o
populismo, apesar do seu alcance limitado, sempre foi um instrumento de politização das
massas. A participação dos trabalhadores nas campanhas eleitorais, em todos os níveis, e
em campanhas específicas, como “o petróleo é nosso”, nos debates pelas “reformas de
base” do governo de Goulart e em movimentos sociais, possibilitou, sobremaneira, a
politização da classe trabalhadora.
As esquerdas estiveram, também, bastante envolvidas com o populismo. Uma das
formas de estar presente nas massas populares, para os partidos e organizações de esquerda,
era através da infiltração de militantes. Outra era através de alianças e participação em
396
Idem, p. 177, com grifos.
397
Ibidem.
176
campanhas. Às vezes, as próprias lideranças de esquerda abriam mão de sua ética
ideológica e se convertiam em convictas lideranças populistas.
Neste quadro, pode-se compreender o que Ianni denomina de “colapso do
populismo”, em 1964. Trata-se de um fenômeno que se manifesta em ambiente de
antagonismo de classes. Conforme ele explica:
Como política de aliança de classes, é uma política de aliança de contrários. Ao mesmo
tempo, a sua posição no contexto político de uma sociedade de tipo capitalista criava novas
condições de crise. Em épocas de ‘normalidade’ a aliança sempre funcionava, em algum
grau. Mas em ocasiões críticas, surgiam necessariamente os antagonismos.
398
O Brasil apresentava queda no desempenho econômico desde 1962. No período que
antecedeu o golpe de 1964, eram crescentes as reivindicações dos trabalhadores por
recuperação salarial e mudanças radicais. Os trabalhadores mantinham-se em estado de
mobilização e greves freqüentes. Suas organizações se fortaleciam, enquanto o movimento
sindical fazia alianças com partidos populistas e de esquerda. A politização acontecia de
forma crescente. Em outra frente social, as organizações burguesas se sentiam ameaçadas
pela mobilização das massas. A situação política caracterizava-se por sucessivas crises,
desde a renúncia de Jânio Quadros, em 1961. A posse do vice, João Goulart, foi efetivada
em meio a pressões golpistas dos conservadores. Escreve Ianni: “Os golp istas que
aplicaram um golpe sobre o golpe de Jânio (este sob o artifício da renúncia) não puderam
resistir às pressões da opinião pública e aos indícios de organização de milícias populares.
Entregaram o governo do país ao Vice-Presidente João Goulart”.
399
Leonel Brizola,
governador do Rio Grande do Sul, liderou a chamada “rede da legalidade” para garantir a
posse do conterrâneo e correligionário.
Goulart era um líder populista formado na tradição de Vargas. Governava sob
pressão e alimentava os antagonismos. Isto contribuiu para que as forças burguesas,
sentindo-se ameaçadas em seus privilégios, reforçassem laços internos, e promovessem a
união de conservadores, liberais, empresários do setor interno e seus pares dependentes do
capital externo. Para Ianni, “a verdade é que a política de massas estava indo muito longe,
398
IANNI, 1988, p. 177.
399
Idem, p. 178.
177
numa época de enfraquecimento do poder político da burguesia”.
400
A situação se agravava
para os donos do poder, à proporção que o populismo avançava também dentro da
sociedade agrária, em organizações como as Ligas Camponesas. A articulação política
envolvia o Partido Trabalhista (PTB), o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e era apoiada
na sociedade civil por movimentos sociais e igrejas, com destaque para o setor progressista
da Igreja Católica.
A reação não se fez esperar, com a burguesia agrária unindo-se à industrial,
comercial e financeira. O quadro permitia vislumbrar possibilidade de desfecho
revolucionário ou de golpe dos setores conservadores. Prevaleceu este último. Havia,
também, e até de forma mais evidente, a possibilidade de uma saída reformista, com apoio
nos capitalistas nacionais, que aprovavam a “política externa independente”, originária da
era Vargas. Segundo Ianni: “A contrapartida da política externa independente seria
necessariamente o capitalismo nacional. Isto é, um sistema capitalista disposto de centros
políticos de decisão efetivamente nacionais. Esta virtualidade estava implícita no Plano
Trienal, que Goulart não conseguiu pôr em prática”.
401
Nesse embate de forças tão díspares,
o que prevaleceu foi o setor aliado ao capital internacional e às inclinações das Forças
Armadas americanófilas, lembrando, aqui, que soldados brasileiros haviam lutado sob
comando das forças dos Estados Unidos, na Segunda Guerra, e continuavam mantendo
laços estreitos, através de treinamentos e estratégias, com o complexo militar daquele
“grande irmão do Norte”. Ianni afirma: “No conjunto das opções amadurecidas durante o
período crítico da democracia populista, a que se impôs foi a ditadura da burguesia”.
402
Sob o manto protetor do governo norte-americano, “instaurou-se a ‘doutrina da
interdependência’, como orientação política, econômica, militar e cultural”.
403
Os governos
dos Estados Unidos não tinham afinidades com Getúlio nem com seu afilhado Jango,
porque consideravam que o populismo desses líderes poderia levar o Brasil a constituir uma
“ditadura sindicalista”, com risco de evoluir para uma “guerra revolucionária”.
400
Idem, p. 179.
401
Idem, p. 180.
402
Ibidem, com itálicos.
403
Ibidem.
178
“Apoiados numa concepção defasada de sistemas geopolíticos mundiais, os
golpistas de 1964 puseram em prática uma ditadura totalmente comprometida com o
governo norte-americano”.
404
Concepção defasada de geopolítica, porque já estava em
franco declínio a fase da Guerra Fria, sob a bipolaridade Washington-Moscou e suas
respectivas zonas de influência. A “interdependência” era um eufemismo para mascarar a
dependência estrutural e o subdesenvolvimento. “Conforme sugere Hélio Jaguaribe, em
1964 inaugurou-se um regime colonial-fascista no Brasil”, subordinado à perspectiva
geopolítica de Washingto n.
405
A dependência estrutural mencionada vinha desde as
medidas econômicas de Juscelino Kubitschek, que deram continuidade à abertura do setor
industrial brasileiro ao capital internacional iniciada por Café Filho, em condições
desfavoráveis para capitalistas nacionais não associados aos de fora.
Ao assumirem o poder, os golpistas perseguiram dois objetivos: aprofundar laços de
dependência externa, defendidos como a “doutrina da interdependência”, e combater
violentamente a política de massas. A legislação autoritária objetivava destruir o
movimento sindical, as organizações populares e o sistema partidário. Com isto golpistas
visavam “afastar o perigo” do comunismo e enfraquecer a burguesia nacionalista. Ainda no
tempo do regime militar, Ianni escrevia:
Em nome da “purificação” (ou modernização) do sistema político-econômico brasileiro,
cria-se uma cultura do fascismo. Vítimas do maniqueísmo inerente à sua concepção do
processo político, os governantes e os grupos econômicos que eles servem estão criando
instituições, símbolos e atitudes fascistas. Esse é o preço que o povo brasileiro está
pagando à aberta militarização do poder político. Aliás, a tendência para o fascismo é
outra característica essencial da dependência estrutural”.
406
404
Ibidem.
405
Apud IANNI, op.cit.: p. 181.
406
IANNI, op.cit., p. 182, com itálicos no original.
179
A radicalização da direita produziu um retrocesso político com perdas irreparáveis
para as gerações diretamente atingidas, mas também com conseqüências difíceis de prever
para as gerações que sucederam o período do regime militar (1964-85). Essa “decadência
política”, nas palavras de Ianni, atingiu não só os inimigos daquele regime, mas a todos,
particularmente burguesia e classe média. A “pacificação” mencionada nos discursos dos
golpistas não veio e não virá, enquanto forem ignorados os agentes sociais que formam a
maioria do povo brasileiro, e dentro desta, os mais prejudicados, ou seja, os reduzidos à
condição de miséria. Haverá insatisfação e poderão surgir tensões revolucionárias sempre
que o comando político se mantiver divorciado da massa assalariada e das populações
pobres e miseráveis. Neste modo de governar, o mesmo de sempre, as elites ampliam e
agravam os dilemas da sociedade brasileira. Todos os segmentos, porém, vão,
gradualmente, aperfeiçoando suas formas de estarem presentes nas lutas políticas. Em
palavras conclusivas de Ianni:
Assim, as relações entre as classes sociais adquirem contornos cada vez mais nítidos. À
medida que se asfixiam os movimentos das massas (no proletariado urbano e rural), surgem
novas manifestações da luta de classes. O populismo terá sido apenas uma etapa na história
das relações entre as classes sociais. Nesse sentido é que se pode dizer que no limite do
populismo está a luta de classes. Da mesma forma, no limite da ditadura de vocação fascista
pode estar a sociedade socialista.
407
Uma ressalva, apenas, à conclusão do mestre Ianni: o populismo pode ter sofrido
um golpe mortal, em 1964, mas, no bojo das contradições sociais brasileiras, ele tem saído
de seu estado quase terminal e retornado, como forma de contribuir para um equilíbrio
precário da sociedade, desde a retomada do Estado de Direito, pós-regime militar. Esse
populismo permite que as ações das elites, no afã de ampliar seus capitais, não rompam de
todo com o tecido social formado por massas trabalhadoras e descamisadas em suas
relações com o todo da sociedade. O controle das massas destituídas de bens é feito, por
exemplo, através de políticas assistencialistas e movimentos sociais que mantêm o povo
com alguma chama de esperança. Nestes movimentos estão inseridos inúmeros
movimentos religiosos e igrejas que propõem “soluções” espirituais para problemas
materiais. Todavia, o mesmo populismo que ilude de igual modo contribui para promover,
407
IANNI, op.cit., p. 177, com itálicos no original.
180
bem ou mal, mais cedo ou mais tarde, a politização de uma parcela considerável da
população de deserdados. Sem dúvida, há virtude no populismo, como há virtualidades no
contexto histórico em que ele se manifesta. Não desapareceram as utopias. Elas também
podem estar sublimadas em formas de religiosidade, mas esta é outra face da questão.
2.9 Os pentecostais no contexto do Estado brasileiro
Desde a instalação da República do Brasil e promulgação de sua Carta
Constitucional, em 1891, estava estabelecida oficialmente a separação entre o Estado e a
Igreja Católica.
408
Entretanto, fatores como o sufrágio restrito, a estrutura política sob
controle das oligarquias rurais e a presença reduzida, ou quase nula, de protestantes,
explicam o porquê da permanência hegemônica do catolicismo no espaço social e
institucional da República recém-nascida.
Há registro de um médico piauiense, Joaquim Paranaguá, abolicionista e
republicano, deputado constituinte em 1891, e senador até 1906, o qual, ao deixar o senado,
se torna batista. Em 1920, ele liderou a organização do Instituto Industrial Batista de
Corrente, no Piauí. Seu irmão, Benjamin, fundou três igrejas batistas.
409
Os luteranos eram
monarquistas e se isolaram do novo regime republicano, recolhendo-se em sua cultura
germânica.
410
A chegada dos pentecostais ao Brasil somente é registrada a partir de 1910, com o
italiano Luigi Francescon, em São Paulo e Santo Antônio da Platina (Paraná), e em 1911,
com os suecos Daniel Berg e Gunnar Vingren, em Belém do Pará, todos imigrantes
provenientes dos Estados Unidos da América. O italiano dedicou-se à formação da
Congregação Cristã no Brasil e os suecos promoveram o movimento pentecostal na
Primeira Igreja Batista do Pará, de onde saiu um grupo para constituir a Missão Apostólica,
408
A separação entre o Estado brasileiro e a Igreja Católica foi estabelecida, legalmente, em 7 de janeiro de 1890, pelo decreto 119
A, do novo governo republicano recém-instalado.
409
Cf. LÉONARD, Émile. O protestantismo brasileiro. São Paulo: ASTE, 1963, p. 98-9; CRABTREE, A. R. História dos
baptistas do Brasil até o anno de 1906. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Baptista, 1937, p. 217; FRESTON, 1994, p. 19-20.
410
Sobre o assunto, recomenda-se a leitura de: DREHER, Martin. Igreja e germanidade. São Leopoldo: Sinodal, 1984, p. 41-3.
181
posteriormente denominada Assembléia de Deus. Essas iniciativas pentecostais tinham um
sentido sectário e avesso ao envolvimento na política.
Mesmo os poucos protestantes que marcaram presença na política tiveram
dificuldades para convencerem os membros de suas igrejas acerca da importância de
ocuparem esse espaço público. Basta observar que houve apenas um constituinte
evangélico, em 1933-34 e em 1946, o pastor metodista Guaracy Silveira. Em relatório para
as igrejas evangélicas, ele escrevia: “Dois grandes erros o protestantismo tem cometido no
Brasil: fugirem os crentes... dos sindicatos de trabalhadores, e fugirem dos partidos
políticos populares...”.
411
O Estado de Pernambuco teve um governador interino saído dos quadros da
Assembléia de Deus, embora esta igreja não tenha registrado fato tão relevante em sua
história oficial. O governador Antonio Torres Galvão foi um dos fundadores da Assembléia
de Deus em Abreu e Lima e líder sindical no mesmo distrito, pertencente ao município de
Paulista, cidade situada na região metropolitana de Recife. Foi eleito presidente do
Sindicato dos Trabalhadores de Fiação e Tecelagem de Paulista. Esteve presente na
fundação do Partido Social Democrático (PSD) em Pernambuco e foi eleito constituinte
estadual em 1947. Reeleito em 1950, escolheram-no presidente da Assembléia Legislativa.
Quando o governador Agamenon Magalhães faleceu em 1952, Galvão assumiu o governo
durante quatro meses, convocou eleições e entregou o cargo ao eleito.
O distrito de Abreu e Lima reaparece no cenário da política assembleiana, nos anos
de 1980, com o deputado federal constituinte Salatiel Carvalho, pertencente à Assembléia
de Deus de Abreu e Lima, filho de um pastor do Piauí e genro de um pastor-presidente em
Pernambuco. Salatiel ascendeu na política, ligado ao senador Marco Maciel e filiado ao
PFL, mas durante o Congresso Constituinte não seguiu orientações do partido em algumas
votações, afirmando que adotava esta estratégia para escapar da baixa avaliação do
Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP). De fato, alcançou nota 8,5,
muito acima da média de 4,61, obtida pelo conjunto de evangélicos. Pragmático, ganhou
concessão de rádio em Jaboatão, em troca do seu voto a favor da prorrogação do mandato
411
Apud FRESTON, 1994: p. 24.
182
de Sarney. Ele afirmou que: “Se o presidente quisesse cem anos para trocar cem rádios, eu
trocava mesmo. Se fosse para divulgar o evangelho, eu trocava”. Eis aí um argumento
típico do clientelismo pentecostal, que defende a apropriação de recursos públicos para o
proselitismo, sem respeitar a ética e valores republicanos. Na eleição de 1989, Salatiel
tornou-se o coordenador da campanha de Fernando Collor de Mello entre os evangélicos.
Passada a eleição, com a vitória de Collor, Salatiel passou a queixar-se que o presidente não
nomeara nenhum dos seus indicados para cargos no novo governo.
412
Entre os anos de 1946 e 1987, 50 evangélicos estiveram exercendo 108 mandatos no
Congresso Nacional. Menos de 5% destes mandatos foram exercidos por pentecostais. Nos
anos de 1950, começa a participação pentecostal, através da Igreja Pentecostal O Brasil
para Cristo (BPC), cujo fundador e líder, Manoel de Mello, apoiou Adhemar de Barros
como candidato a prefeito de São Paulo e ganhou um terreno, onde conseguiu construir um
templo de alumínio, depois demolido por ordem do próprio Adhemar, já prefeito, que neste
episódio cedeu às pressões do clero paulistano.
413
Manoel de Mello decide, então, adotar
outra estratégia de participação política: investir na eleição de parlamentares de sua
confiança e submetidos ao seu controle. Em 1962 ele lança e elege um deputado federal
pelo PSD, o ex-metodista Levy Tavares. Em 1966, este é reeleito pelo MDB, em
dobradinha com Geraldino dos Santos, que vence a disputa para deputado estadual, pela
mesma legenda. Com o advento da ditadura militar, ambos se transferem para a Arena. A
iniciativa de Mello viria a ser seguida, duas décadas depois, pelas igrejas objeto desta
pesquisa: Assembléia de Deus e Igreja Universal do Reino de Deus. À semelhança da
Brasil para Cristo, submissa ao braço forte de Manoel de Mello, a Igreja Universal tem um
déspota, o bispo-presidente Edir Macedo. A BPC inaugurou, portanto, a política de lançar
candidatos da corporação, precursora da que hoje é adotada pela Igreja do Evangelho
Quadrangular, Assembléia de Deus e Igreja Universal.
No início dos anos 60, o quadro de mobilizações populares e o perfil populista do
governo do presidente João Goulart assustavam a maioria dos evangélicos e em grau
superlativo os pentecostais. A origem norte-americana de muitos missionários, formados
412
Idem, p. 52.
413
Idem, p. 30.
183
dentro de uma ideologia anti-soviética e anticomunista, marcou a mentalidade dos
membros das igrejas do protestantismo histórico e do pentecostalismo. Para eles, os
grandes inimigos eram o catolicismo romano e o comunismo ateu. Durante o período do
governo de João Goulart, pastores e igrejas mobilizaram seus fiéis em vigílias de oração, a
fim de livrar o Brasil da “ameaça comunista”.
Os evangélicos foram além deste apoio ao regime militar. Alguns pastores, inclusive
da Assembléia de Deus, fizeram cursos na Escola Superior de Guerra (ESG) e na
Associação de Diplomados desta, a ADESG. Um deputado federal e maçom da Igreja
Congregacional, Daso Coimbra, com longa história no parlamento, onde permaneceu
durante sete mandatos, era intermediador das indicações de pastores para os cursos da ESG.
Ele tinha essa prerrogativa em virtude do seu alinhamento ideológico com o regime militar
e, provavelmente, também, por ser irmão de um almirante.
414
A tímida presença pentecostal no Congresso experimenta uma mudança abrupta nas
eleições de 1986. A Assembléia de Deus, principalmente, mas também a Igreja
Quadrangular e a Universal, resolvem investir na eleição de representantes para o
Congresso Constituinte. De modo bem pentecostal, afirmava um candidato naquela
ocasião: “É tempo de agir, pois esta pode ser a última Constituição, antes da volta de
Cristo”.
415
Esta nova atenção dada à política pelos pentecostais começara nas unidades da
federação, em 1978, com candidaturas às Assembléias Legislativas e Câmaras de
Vereadores. As práticas de persuasão, legitimação e justificativa, para que os membros
aceitassem a participação corporativa de sua igreja na política, incluíam slogans do tipo:
“Crente vota em crente”
“Irmão vota em irmão”
416
“Trabalhador pentecostal vota em trabalhador pentecostal”
414
Idem, p. 59.
415
O candidato era João de Deus Antunes, apud FRESTON, 1994: p. 39.
416
Título de um livro de autor pentecostal, que havia trabalhado como assessor no Congresso Nacional, mas cuja visão não tinha
nada de republicana: SYLVESTRE, Josué. Irmão vota em irmão: os evangélicos, a Constituinte e a Bíblia. Brasília: Pergaminho,
1986.
184
“Evangélico vota em evangélico”.
417
Entretanto, nesse final dos anos de 1970, não estava inaugurada, ainda, a era das
candidaturas planejadas e lançadas pelas corporações pentecostais. Mesmo assim, foram
eleitos dois deputados federais em 1982: Mário de Oliveira, pastor da Igreja do Evangelho
Quadrangular em Minas Gerais, e José Fernandes, leigo da Assembléia de Deus no
Amazonas. O Mensageiro da Paz, em maio de 1981, ainda anunciava que era vedado aos
ministros do Evangelho serem candidatos, salvo se pedissem licença de suas atividades
pastorais.
A expectativa da sociedade brasileira sobre o Congresso Constituinte de 1987-88
contagiou a Assembléia de Deus, mas na fase preparatória, quando foi criada a Comissão
de Estudos Constitucionais, conhecida como “Comissão de Notáveis”, presidida pelo
jurista Afonso Arinos, os pentecostais não mostravam, ainda, suficiente articulação para
conseguirem bancar um representante, embora já tivessem o maior contingente de
população evangélica. Na ocasião, como tem sido recorrente, não havia um órgão de
representação dos evangélicos para funcionar como interlocutor institucional perante o
Estado. As autoridades do governo federal resolveram acatar uma indicação da Ordem dos
Ministros Evangélicos do Brasil (OMEB), que escolhera o pastor presbiteriano
Guilhermino Cunha, formado em direito, mestre em teologia e ex-aluno da ESG, para
integrá-lo à referida comissão.
Iniciando sua arregimentação com vistas a formar uma bancada no Congresso
Constituinte, a Convenção Geral das Assembléia de Deus no Brasil, reunida em Anápolis,
em janeiro de 1985, convidou os políticos Íris Rezende e Daso Coimbra, para falarem aos
convencionais, a fim de sensibilizá-los acerca da importância do momento político e
convencê-los da necessidade de se envolverem, como líderes da maior força evangélica do
País, na ocupação de espaços públicos. Em abril do mesmo ano, a Convenção Geral reuniu
os presidentes das convenções estaduais em Brasília para prepararem suas bases na escolha
de candidatos ao Congresso Constituinte. Enquanto isto, o Mensageiro da Paz exercia um
papel conscientizador, veiculando matérias sobre a importância da participação da Igreja na
política do Brasil. Em 18 Estados a Assembléia de Deus lançou candidatos a deputado
417
Os slogans citados estão no livro de FRESTON, 1994, p. 40, 43 e 57.
185
federal. A colheita desta semeadura foi surpreendente: de apenas um deputado a Igreja
passou a contar com 13 parlamentares no Congresso Nacional, além de suplentes. Freston
apresenta a seguinte tabela, que revela o novo interesse dos pentecostais no espaço
parlamentar:
Tabela 3 - Parlamentares Federais Evangélicos (Titulares e Suplentes que Assumiram) e
Mandatos Exercidos, 1933-1992
Parlamentares Mandatos exercidos
Períodos Total Históricos Pentecostais
Total Históricos Pentecostais
1933-1987
50 47 (94%) 3 (6%) 109 104 (95%)
5 (5%)
1987-1992
49 22 (45%) 27 (55%) 67 29 (43%) 38 (57%)
1933-1992
88* 60 (68%) 28 (32%) 176 133 (76%)
43 (24%)
* O total é de apenas 88 e não 99 (50+49), porque 11 parlamentares atuaram antes e depois de 1987,
sendo nove protestantes históricos e dois pentecostais.
Fonte: FRESTON, 1994: p. 46.
Em apenas cinco anos (1987-92), os pentecostais tiveram nove vezes mais
parlamentares do que em 54 anos anteriores (1933-87). Esta participação saltou de 6% para
55% nos períodos referidos. Ou de 5% para 57%, se forem considerados os mandatos
exercidos.
As igrejas que passaram a ter este comportamento de lançar candidatos foram
Assembléia de Deus, Evangelho Quadrangular e Igreja Universal. Outras grandes
denominações pentecostais, como a Congregação Cristã no Brasil (CCB), Brasil para Cristo
e Igreja Pentecostal Deus é Amor, não acompanharam esta prática. Mas é oportuno
assinalar que este tipo de absenteísmo nem sempre é respeitado, por parte de membros
isolados dessas igrejas.
Quase metade dos parlamentares evangélicos no Congresso Nacional, entre 1987 e
1992, estava vinculada a veículos de comunicação, sendo que dois haviam dirigido o
Dentel (Departamento Nacional de Telecomunicações). O comunicador evangélico leva
vantagem sobre seu concorrente que não tem um público tão específico. Há forte
186
identificação entre o emissor e o receptor. Ambos comungam da mesma fé e da mesma
paixão: a “salvação dos pecadores”.
418
A agilidade das igrejas pentecostais ocuparem espaços na política, em contraste com
a apatia das protestantes históricas, pode ser interpretada com o auxílio de chaves
hermenêuticas da própria política e da teologia. As denominações pentecostais têm
comando autoritário, exigem consenso teológico e exercem maior controle sobre o
cotidiano dos membros. Parte deste consenso e controle está na ideologia de que o crente
vive na luz, enquanto o incrédulo vive nas trevas. Logo, “é melhor votar num crente do que
escolher um ímpio”. As igrejas do protestantismo histórico tanto influenciaram como
receberam influência do liberalismo clássico. Sabe-se que, nesta concepção, a escolha
política é assunto do indivíduo no pleno exercício de sua liberdade, ou, em outras palavras,
trata-se de um assunto de foro íntimo: a escolha de candidato deve passar pela consciência
de cada um. Também concorre para isto a idéia, ainda vigente, de que religião trata de
coisas espirituais, enquanto política lida com questões materiais. Ambas não devem ser
misturadas, segundo esta forma de pensar, pois o sagrado não deve ser contaminado pelo
profano. Os pentecostais também adotam esta dicotomia, mas a contornam quando tratam
seus candidatos como missionários incumbidos de levar o testemunho do evangelho ao
meio político.
Freston observa que a presença massiva da Assembléia de Deus na política, com seu
eleitorado espalhado em todo o País, alterou a composição da representação evangélica,
reforçando os quadros provenientes do Nordeste, Centro Oeste e Norte. A presença
pentecostal também permitiu o ingresso de líderes com mais baixa escolaridade, embora
pertencentes às elites das igrejas. Alguns desses parlamentares são, a propósito,
empresários. Na questão étnica, os eleitos pelo voto pentecostal trouxeram significativo
reforço para a presença de negros, mulatos e mestiços, no parlamento brasileiro.
Em função do vínculo primordial com a igreja que o elegeu, o político pentecostal
pratica o nomadismo partidário, sempre que isto seja necessário.
418
FRESTON, 1994, p. 55-6.
187
Os candidatos da Assembléia de Deus são geralmente detentores de capital familiar,
pois são pastores ou pertencem ao clã dos pastores, na condição de genros ou filhos de
pastores-presidentes. Quando não se trata de capital familiar, prevalece o capital econômico
mesmo do candidato empresário, que geralmente ajuda a igreja com seu dízimo ou ofertas.
Outros são portadores de carismas, como cantores e pregadores-evangelistas, ou reúnem
algumas dessas características em diferentes graus. Em todos os casos, têm que cultivar
relacionamentos e fazer acordos com o colegiado de pastores, para se tornarem “candidatos
oficiais” da igreja.
Conforme mencionado, a Assembléia de Deus prestigia e premia, com indicação
para ser seu candidato, o leigo empresário que ajuda a igreja com bens materiais. Muitos
deles fazem parte da Associação dos Homens de Negócio do Evangelho Pleno (Adhonep).
São pequenos comerciantes e empresários de porte econômico variado, funcionários
públicos e profissionais liberais. Em que pese a Assembléia ter muitos pobres em seu meio
e contar com alguns poucos na militância em sindicatos e movimentos populares, não
considera esta prática um requisito desejável para a escolha dos seus “candidatos oficiais”.
Para a liderança da igreja, é preferível que seus escolhidos não tenham tal tipo de
envolvimento, porque consideram que o compromisso com outras organizações da
sociedade civil pode inviabilizar a fidelidade aos interesses corporativos da denominação.
Os poucos fatos comentados trataram da presença pentecostal na política brasileira,
até meados dos anos de 1990. No capitulo seguinte, será feita abordagem mais substanciosa
tanto da Assembléia de Deus, como da Igreja Universal, com remissão ao período já
tratado, mas com ênfase maior nos anos recentes, até 2006, quando, também, se ampliou a
ação dos agentes políticos destas denominações no espaço público.
Conclusão
O Estado brasileiro tem sido, ao longo da história da República, espaço de lutas por
hegemonia das oligarquias agrárias e burguesias comercial, industrial e financeira. A
grande massa de trabalhadores entrou nessa luta para defender seus interesses, em
momentos quando vigorou a democracia, contudo sem obter ganhos significativos na
188
partilha das riquezas. Junto aos produtores estava a massa pobre da população como ator
coadjuvante, “organizada” pelo próprio Estado populista.
A ascensão das camadas médias da população, potencializadas pela ação do
movimento tenentista, gerou pressões sobre o Estado oligárquico, enquanto já se verificava
um processo de urbanização, durante os anos de 1920. A República Velha daquele período
mostrou-se incapaz de abrigar esses novos agentes da política no bloco de poder das
oligarquias, de modo que foi superada pela composição de forças gerada pela própria
Revolução de 30. Contudo, o poder das oligarquias não desapareceu, pois o Estado da nova
ordem que emergiu em 1930 foi um “Estado de compromisso” entre antigos e novos
detentores do poder econômico, sob a liderança de Getúlio Vargas. Nessa conciliação “pelo
alto” o Estado assumiu a tarefa de manobrar as massas de trabalhadores e marginalizados,
por meio de legislação, políticas paternalistas e propaganda. O movimento sindical ficou
debaixo da tutela do Estado. A Igreja Católica, com sua doutrina social e organizações
correspondentes, contribuiu para que não fossem assimiladas pelos trabalhadores as
experiências socialistas em voga na Europa.
A política populista de Vargas era sinal de que as elites governavam, mas
precisavam conter as pressões populares para que não houvesse avanço na organização dos
trabalhadores. Nesse jogo de forças, o equilíbrio era instável, de tal modo que o próprio
Vargas sucumbiu sob os golpes dos grupos conservadores.
Os pentecostais faziam parte da imensa massa manobrada pelo populismo.
Adotavam uma postura política de não-participação, porque haviam aprendido que “o reino
de Deus não é deste mundo” e o mundo da política pertencia ao reino das trevas. Na
seqüência do raciocínio, concluía-se que o crente não deveria envolver-se com partido,
sindicato, associações e movimentos similares. O pentecostalismo havia herdado uma
teologia da matriz evangélica norte-americana, que favorecia a obediência acrítica a toda
autoridade. Desde que esta garantisse a liberdade de culto e se apresentasse como Estado
leigo, conforme prescreviam constituições republicanas, a autoridade devia ser respeitada e
apoiada como agente divino, segundo essa teologia.
189
Os pentecostais tinham pavor do comunismo e o consideravam inimigo mortal, que
poderia extingui-los se conquistasse o poder. Os evangélicos em geral associavam
mobilizações dos trabalhadores, como passeatas, comícios e greves, com estratégias dos
comunistas para solapar a ordem constituída. Havia exceções a essa auto-exclusão da
política, que foram identificadas neste capítulo, mas o quadro geral caracterizava as igrejas
pentecostais como forças desmobilizadoras dos seus fiéis no que se refere às lutas sociais.
Durante o regime militar de 1964 a 1985, lideranças pentecostais foram, de fato,
cooptadas. Igrejas se reuniam em vigílias de oração, pedindo para Deus livrar o Brasil do
comunismo. O golpe militar foi saudado pela maioria dessas igrejas como ação divina
contra os que estavam levando o País ao caos. Os militares levaram alguns pastores mais
influentes para receberem doutrinação na Escola Superior de Guerra.
O modelo de organização pentecostal assimilou o padrão autoritário latino-
americano. “Pastores” devem cuidar de “rebanhos”. Os fiéis são “ovelhas”, massa de
multidões manobrada pelo líder cuja autoridade não pode ser contestada, pois fazê-lo é
insurgir-se contra o “ungido” do Senhor. Um Estado populista encontrou massas
pentecostais que já estavam disciplinadas para viverem sob tutela.
Em resumo: a ideologia pentecostal conduziu os fiéis para o absenteísmo social,
manteve-os submissos de forma acrítica às autoridades públicas e colaborou para que as
práticas populistas do Estado tivessem nessa religião uma fiel aliada para dificultar a
conscientização e mobilização da classe trabalhadora.
190
Capítulo 3
Pentecostais e neopentecostais
na política brasileira
Introdução
A ideologia protestante norte-americana transplantada para o Brasil formou um
protestantismo predominantemente escapista e sectário. A solução dos problemas sociais
era apresentada de forma simplista na fórmula da salvação individual: se todas as pessoas
se converterem ao evangelho, pregado nos moldes trazidos pelos missionários, o Brasil será
transformado num país justo, acreditavam os adeptos desse tipo de protestantismo. As
vertentes mais comprometidas com o social ofereciam, no melhor dos casos, uma proposta
educacional de cunho liberal e, portanto, também individualista, o que não deixava de ser
uma contribuição importante, longe de ser subestimada, num país onde o setor público
relegava a educação para um lugar marginal.
419
Este era o quadro predominante, mas havia matizes que o tornavam mais complexo.
Primeiro, porque a evangelização não se dava num vazio de cultura. A complexa sociedade
419
Sobre o assunto, há diversos estudos, tais como: MESQUIDA, Peri. Hegemonia norte-americana e educação protestante no
Brasil: um estudo de caso. Juiz de Fora: EDUFJF; São Bernardo do Campo: EDITEO, 1994. HACK, Osvaldo H. Protestantismo
e educação brasileira: presbiterianismo e seu relacionamento com o sistema pedagógico. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana,
1985. WARDE, Mirian. Americanismo e educação: a fabricação do homem novo. São Paulo, PUC, 2000 (Projeto de Pesquisa do
Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política e Sociedade). VIEIRA, Cesar Romero Amaral. Política e
educação na primeira República: influências, utopias e ideologias liberais norte americanas na Reforma da Instrução Pública
Paulista de 1890. Anais do III Simpósio de Dissertações e Teses. Piracicaba: PPGE/UNIMEP, 2003, p. 37-41.
191
brasileira traduziu as contribuições norte-americanas em formas locais de denominações
evangélicas, dentro de um processo de amálgama entre culturas de origem anglo-saxã e
lusitano-afro-indígena, com ingresso de religiosidades protestantes plantadas em terreno de
catolicismos sincréticos, estes por sua vez constituídos de transplantes e traduções
culturais, envolvendo o catolicismo português e as religiões da África e dos povos
indígenas da terra brasileira conquistada e colonizada. Em segundo lugar, os próprios
missionários provinham de embates religiosos que envolviam puritanos, pietistas, igrejas de
“santidade”, do “evangelho social”, conservadores e fundamentalistas, para citar as
principais correntes do protestantismo, que lutavam por hegemonia nas diversas
denominações da sociedade norte-americana. O protestantismo que nasceu neste contexto e
se propagou no final do século XIX e início do XX era avesso a compromisso social e
participação política. Como conseqüência direta, o movimento das “religiões do Espírito”
que eclodiu nesse protestantismo, também se apresentou refratário à questão social.
Segundo Leonildo Campos:
O Pentecostalismo, que se tornou público em Los Angeles a partir de 1906, era
filho dileto de todo esse background que a mística protestante puritano-metodista havia
gerado nos EUA no decorrer dos séculos XVIII e XIX. Como resultado dessas influências, a
ação e as lutas políticas se tornariam desde então, para muitos evangélicos brasileiros, um
espaço “sujo” e “indigno” dos “verdadeiros crentes”, os quais não deveriam oferecer
“pérolas aos porcos”.
420
Mesmo sem um projeto político institucional, houve protestantes presentes na
política brasileira, principalmente a partir da década de 1930. Documentos marcantes foram
produzidos por pastores e líderes do Rio de Janeiro e São Paulo, pertencentes a
denominações evangélicas, ao ensejo das eleições para a Assembléia Nacional Constituinte
em 1933.
421
A preocupação de minoria religiosa em sociedade de tradição fortemente
católica levava-os a assumirem a bandeira da liberdade de culto para todas as religiões e a
da separação entre Igreja e Estado. Muitos desses protestantes estavam na política tangidos
por interesses de classe. Segundo Campos, “muitos deles refletiam interesses dos
420
CAMPOS, 2006, p. 35.
421
Cf. CAMPOS, 2006, p. 38-42, e REILY, Duncan Alexander. História documental do protestantismo no Brasil. São Paulo:
Aste, 1993, p.228-9, sobre divórcio, e nota 82, p. 311. Idem p. 277 e seguintes.
192
proprietários de terras e das classes urbanas vinculadas pelo republicanismo, maçonaria e
anticlericalismo católico-romano”.
422
Os pentecostais, devido ao caráter de seita, optaram, desde a chegada ao Brasil e
durante décadas, a não participarem de movimentos sociais, sindicatos e partidos políticos.
Os episódios esparsos, referentes a mobilizações em ligas camponesas, ou casos isolados de
líderes políticos, como o governador interino de Pernambuco, Antônio Torres Galvão, este
em 1952, foram exceções a confirmar a regra do absenteísmo social dos pentecostais.
Quando muito, as denominações toleravam a presença de leigos nessas atividades, mas
alertando-os e orientando os crentes em geral para os perigos da contaminação com o
mundo.
Em que pese essa orientação, houve pentecostais no parlamento federal e em alguns
estaduais, principalmente a partir dos anos de 1960. Em São Paulo, a Igreja Pentecostal “O
Brasil para Cristo”, elegeu o deputado federal Levy Tavares e o estadual Geraldino dos
Santos. Em Minas Gerais, a Assembléia de Deus tinha um estadual, João Gomes Moreira.
No Pará, havia o deputado estadual Antônio Teixeira e o vereador Sebastião Bronze, ambos
da chamada igreja-mãe da Assembléia de Deus. No Maranhão, apresentava-se Costa
Ferreira, hoje um veterano dos parlamentos, o membro que ostenta a maior quantidade de
mandatos na Frente Parlamentar Evangélica, em Brasília. Todavia, estes exemplos não
podiam ser enquadrados como uma presença planejada pelas respectivas denominações, a
não ser no caso da Igreja O Brasil para Cristo, pois seu fundador, Manoel de Mello, era um
grande articulador, não só interno, mas, sobretudo, para fora da igreja, tanto em relações
inter-eclesiais como políticas. Ele promoveu importante atividade de incentivo a
candidaturas também no interior do Estado do Rio de Janeiro, em apoio a seus candidatos,
ligados ao PDT de Brizola.
Uma nova investida dos pentecostais para a política teve lugar em algumas unidades
da Federação, no final dos anos de 1970, com candidaturas aos legislativos estaduais e
municipais. Todavia, não estava inaugurada, ainda, a era das “candidaturas oficiais”, que
veio predominar, somente, a partir de meados dos anos de 1980. A expectativa da
422
CAMPOS, op.cit., p.33, nota 6.
193
sociedade brasileira para a realização de uma Assembléia Nacional Constituinte
423
provocou enorme mobilização entre as lideranças da Convenção Geral das Assembléias de
Deus no Brasil.
3.1 Participação política pentecostal: mobilização estratégica
O quadro de omissão política pentecostal muda, radicalmente, a partir de 1986,
mediante construção de projetos corporativos com vistas a exercerem influência na
elaboração da nova Carta Constitucional. Neste sentido, foram mobilizadas as lideranças
mais expressivas da Assembléia de Deus, Evangelho Quadrangular e Universal do Reino de
Deus. Esta última compreendeu, nos primeiros anos de sua existência, a importância de
participar do jogo político, tão logo alcançou uma escala expressiva para competir no
campo eleitoral. Ao contrário da Assembléia de Deus, a Igreja Universal não produziu uma
cultura antipolítica entre seus membros, que a dificultasse na conquista de espaços nesse
terreno. O bispo-presidente Edir Macedo comandou seus quadros, logo que isto foi
possível, para conquistarem cadeiras em parlamentos estaduais e em Brasília. Começando
com um deputado federal em 1986, elegeu, sucessivamente, três em 1990, seis em 94, 17
em 98 e 18 em 2002, além de uma quantidade muito maior de deputados estaduais e
vereadores, garantindo representação em quase todas as unidades da federação. Os
discursos da Assembléia e da Universal, para convencerem seus fiéis da necessidade de
elegerem pessoas de confiança, ou seja, quadros da própria Igreja, incluíam críticas aos
“políticos tradicionais”, porque, segundo eles, eram pessoas que estavam no espaço público
“para defenderem interesses particulares”. Não obstante, a ênfase maior da mobilização
pentecostal na política tem sido a denúncia de questões que solapam a sociedade e
evidenciam uma influência diabólica no mundo, conforme a teologia própria do grupo, tais
como: liberação do aborto, união civil de pessoas do mesmo sexo, imoralidade na televisão
e assuntos, em geral, ligados a costumes.
Freston afirma que a participação corporativa de pentecostais na política não se
deveu a mudanças teológicas.
424
De fato, eles não abandonaram a doutrina da iminente
423
A Assembléia Nacional Constituinte, almejada por muitos brasileiros, foi reduzida a um Congresso Constituinte, devido à
imposição das forças conservadoras que dominavam a política brasileira no momento da sua convocação (meados dos anos de
1980). O conservadorismo que se manifestou na ocasião tem raízes profundas e parece capaz de se manter indefinidamente na
política brasileira, como se pode induzir do que foi relatado nos capítulos 1 e 2 desta tese.
194
volta de Cristo precedida da ampliação da maldade no mundo, mas, por outro lado,
verifica-se que tem havido um arrefecimento do lugar central dessas crenças, concomitante
com uma nova ênfase no aqui e agora, seja devido ao consumismo, seja em imitação aos
que pregam a chamada confissão positiva e a teologia da prosperidade, seja, ainda, em
alguns casos, pelo despertar para maiores responsabilidades nas questões sociais, como
dimensão importante da fé cristã, aspecto este outrora negado ou negligenciado.
Mesmo assim, o envolvimento na política se deveu a outros fatores, como defesa de
interesses institucionais, mobilização de recursos para garantirem condição mais vantajosa
no jogo competitivo do mercado religioso, emulação entre corporações do mesmo sub-
campo pentecostal e necessidade de maior inserção no espaço público, para exercerem
influência direta em questões que os incomodam, ligadas à preservação da família
tradicional, costumes, sexualidade e liberdade de culto, no estilo pentecostal,
evidentemente. Em seus discursos teológicos, os pentecostais ainda desprezam o mundo,
mas na prática política fazem questão de receber reconhecimento, títulos honoríficos,
exposição favorável na mídia e valorização dos símbolos do movimento, em ruas e praças,
por exemplo. Ou seja, continuam a “desprezar o mundo” mas fazem questão das
homenagens mundanas.
A arregimentação dos pentecostais para o Congresso Constituinte esteve também
relacionada com a idéia do advento de um novo pacto nacional. A elaboração da Carta
Constitucional seria o momento de refundação da sociedade brasileira, no que tange ao
estabelecimento de novas relações, quando minorias organizadas teriam a chance de
garantirem direitos e exigirem a efetivação de um sistema democrático mais inclusivo,
identificado com as demandas sociais. Durante o Congresso Constituinte, os pentecostais
apelaram para “a fé do povo brasileiro”, sempre que este mito ajudou como argumento para
garantir a presença pública de símbolos caros aos evangélicos: foi deste modo que
conseguiram aprovar a aposição permanente de uma Bíblia aberta sobre a mesa do
Congresso e a referência a Deus na nova Constituição.
425
Tais fatos foram comemorados no
424
FRESTON, 1994, p. 62 e seguintes.
425
É pertinente destacar que este uso da Bíblia como fetiche ou amuleto não é aceito por amplíssima parcela dos protestantes
históricos e nem mesmo por muitos pentecostais. O uso do nome de Deus em espaços republicanos também é encarado com
restrições por protestantes que defendem o Estado como expressão laica de uma sociedade pluralista. É possível interpretar que
195
Mensageiro da Paz (novembro de 1987) como “amarga derrota para os ateístas”. Freston
teceu o seguinte comentário, a propósito do assunto:
Não foi a única vez que a AD invocou o sentimento da maioria em favor de suas posições.
A “fé do povo brasileiro”, geralmente rejeitada como um paganismo disfarçado, agora
torna-se arma estratégica na luta por espaço na religião civil. Quando líderes pentecostais
abandonam o apoliticismo, dão grande importância à colocação de símbolos e rituais
evangélicos na esfera pública.
426
Algumas questões merecem ser enunciadas: estaria a Assembléia de Deus em
posição contrária à tradição protestante republicana de um Estado laico e agnóstico? Ou
seria apenas uma forma oportunista de se manifestar, visto que “a fé do povo brasileiro”
sempre foi rejeitada pelos pentecostais, devido à intolerância quanto à opção majoritária da
população pelo catolicismo? O fato é que os parlamentares pentecostais só resolveram
exaltar a religiosidade do povo brasileiro, quando esta serviu como argumento para abrirem
espaços públicos aos seus símbolos religiosos, sinal de que o poder secular deveria estar
subordinado ao sagrado, ou, na hipótese mais provável, com o objetivo de demarcar o
território público como “propriedade do Senhor Jesus”, e assim exorcizá-lo de presenças
demoníacas, conforme recomendam as estratégias de “batalha espiritual”, adotadas,
principalmente, pelos neopentecostais.
O ingresso institucional da Assembléia de Deus para formar bancada no Congresso
Constituinte explorou o sentimento de medo dos seus fiéis. O presidente da Convenção
Geral das Assembléias de Deus do Brasil (CGADB), José Wellington Bezerra da Costa,
afirmou em entrevista a Freston que “a CNBB estava com um esquema armado para
estabelecer a religião católica como a única religião oficial”.
427
Em Recife, houve
distribuição de um folheto com o título: “Por que a AD lançou candidatos em todo o
Brasil?”. No texto, constava suposta declaração de um padre que afirmara a pastores
evangélicos que a futura Constituição iria proibir reuniões religiosas em logradouros
públicos.
428
Estes boatos indicaram quão vulnerável era o público assembleiano à guerra da
este uso do livro fundamental dos evangélicos (a Bíblia: “única regra de fé e prática”) sobre a mesa dos parlamentos seja apenas
um símbolo e não um fetiche.
426
FRESTON, 1994, p. 80.
427
Idem, p. 65.
428
Ibidem.
196
contra-informação, pois de outro modo suas lideranças não teriam arriscado disseminar
coisas tão absurdas.
O Mensageiro da Paz de março de 85 insinuava que muitas desgraças do Brasil,
como inflação, imposições do Fundo Monetário Internacional, enfartes em ministros,
tremores de terra no Ceará, naufrágios no Amazonas, secas no Nordeste, eram provocadas
pela idolatria dos brasileiros, reforçada com a instituição do feriado nacional de 12 de
outubro, em homenagem a Aparecida, a padroeira católica do Brasil. O combate dos
pentecostais à hegemonia católica, o desejo de eleger um presidente evangélico, a repetição
recorrente da frase bíblica “o Senhor te porá por cabeça e não por cauda” o slogan
sempre usado em adesivos e proclamado em celebrações “o Brasil é do Senhor Jesus”
são exemplos de que esses movimentos religiosos combatem a Igreja Católica, porque
querem competir por mais espaços tanto no campo material como no imaginário religioso
da sociedade brasileira. Nessas investidas há algo de aspiração constantiniana que revela
distância da idéia leiga de república, pois mesmo a separação Igreja Estado, matéria
defendida pelos pentecostais, não o é como tese, mas como arma contra os privilégios da
Igreja Católica na América Latina. Neste sentido, pentecostais e neopentecostais estão bem
distantes de protestantes, embora estes também sempre tenham combatido a hegemonia
católica, porque entendiam que os vícios da política brasileira não teriam existido, pelo
menos com as características que apresenta, caso nossa colonização tivesse recebido a
influência anglo-saxã, em lugar da portuguesa, convicção que os motivou a investirem na
implantação de instituições educacionais, desde a segunda metade do século XIX.
429
Argumentos mais fortes do que boatos de conspirações contra a liberdade religiosa
foram os que alertavam para o reconhecimento legal de novos costumes, que, na ótica
evangélica e também católica, ameaçavam a instituição familiar. Lideranças da Assembléia
de Deus lembravam que a nova constituição poderia acolher a legalização do aborto, o
casamento de homossexuais e a liberação das drogas.
430
429
Para uma apreciação sobre os empreendimentos protestantes na educação brasileira, remete-se o leitor às referências
bibliográficas citadas na nota 1 deste capítulo.
430
FRESTON, 1994, p. 67.
197
A conscientização para o ingresso na política também explorou o argumento da
partilha de recursos. Segundo o escritor Josué Sylvestre, líder leigo da Assembléia de Deus,
o crente colabora para “financiar a idolatria e a feitiçaria”, pois, ao pagar os impostos, uma
parte é alocada como verba do Orçamento da União, a ser aplicada conforme o desígnio de
cada parlamentar. E continua Sylvestre, com o seguinte argumento de cunho corporativo:
“vejam que volume fabuloso de recursos poderia estar ajudando nossas organizações no
setor social e educacional”.
431
As aspirações pentecostais no sentido de ter um espaço garantido na religião civil
brasileira
432
e de partilhar recursos públicos da mesma forma que outros grupos religiosos
têm feito é compreensível. Afinal, o Brasil já tem uma população plural no aspecto
religioso e os grupos evangélicos somam aproximadamente 15% desta composição,
conforme o censo de 2000 (IBGE). Com a diferença que esta minoria evangélica, em
contraste com a maioria, é, quase toda, bem atuante em seus compromissos religiosos,
enquanto que os católicos, em torno de 70% dos brasileiros, não têm o mesmo tipo de
engajamento em sua igreja.
Após preparar o público interno, foi fácil para a Assembléia de Deus obter a
chancela dos partidos que serviriam para o propósito de eleger representantes pentecostais
na maioria das unidades da Federação. A estrutura partidária brasileira é sabidamente fraca.
A ausência de voto distrital puro ou misto, com lista preparada pelo partido, deixa aberta a
possibilidade para agremiações mais organizadas da sociedade civil fazerem uso da sigla
partidária meramente como instrumento eleitoral, sem assumirem de fato compromisso
ideológico com o programa do partido. Há exceções, por exemplo, nos poucos partidos cuja
doutrina é aplicada com rigor, como os que praticam o chamado “centralismo
democrático”.
433
Nestes, não há lugar para invasões de grupos religiosos coesos. Sendo a
431
SYLVESTRE, 1986, p. 62-4.
432
O conceito de religião civil, segundo Robert Bellah, refere-se ao conjunto de crenças, símbolos e rituais
que exercem papel decisivo no desenvolvimento das instituições de um Estado-nação e se torna um
instrumento de auto-compreensão compartilhado pela sociedade como um todo. (Cf. BELLAH, R. Civil
religion in America, DAEDALUS 96, winter 1967. BELLAH, R. et al. Habits of heart. Individualism and
commitment in American life. Berkeley: University of California Press, 1985).
433
Nos partidos comunistas leninistas, chama-se centralismo democrático a um sistema de organização
interno no qual, diante de uma determinada questão programática, as bases do partido tem direito à discussão
livre da mesma questão, eventualmente podendo até mesmo constituir facções em torno das teses (este direito
de facção foi abolido no Partido Comunista Russo em 1920, mas adotado de novo por determinados grupos
198
marca “Assembléia de Deus” um guarda-chuva de denominações e “ministérios”, com
presença em praticamente todos os municípios brasileiros, essa estrutura partidária aberta e
frouxa favoreceu a eleição dos candidatos pentecostais, cuja votação era bem distribuída no
território de cada Estado.
O contexto do Congresso Constituinte se deu na chamada década perdida dos anos
de 1980. A AD teve, durante o período, amplo contingente egresso do êxodo rural,
ocupante das periferias nas grandes cidades. Mesmo assim, a igreja tem permanecido bem
presente nos mais de 5 mil e 500 municípios brasileiros.
434
Apesar dos pentecostais terem,
proporcionalmente a outros grupos cristãos, maior quantidade de membros em faixas mais
pobres e miseráveis, eles não têm projetos que beneficiem essas populações. Não se
destacam na formulação de políticas sociais e, muito menos, apresentam diagnósticos e
projetos estruturais para a erradicação da pobreza. A iniciativa da Universal de implantar a
Fazenda Canaã, em Irecê, na Bahia, por exemplo, foi muito mais uma vitrine para eleger o
bispo Marcelo Crivella ao Senado, em 2002, pelo Rio de Janeiro, do que um projeto-
modelo para ser replicado em outras localidades. De fato, a IURD não deu prioridade à
ação social e, neste particular, aproxima-se de outras denominações pentecostais.
A presença crescente dos pentecostais na política brasileira trouxe uma dupla
descontinuidade: ingresso de lideranças sem experiência nesse campo, portanto estranhos
aos agentes tradicionais, e estabelecimento de uma outra linguagem, a da religião, no
espaço da política.
435
Esta presença tem gerado mal-entendidos e mal-estares, por causa do
caráter híbrido do modo de fazer política desses novos atores: por um lado, eles
confessionalizam a política, enquanto na outra ponta de suas atuações politizam a fé.
trotskistas). Quem provocou a questão e produziu a tese tem direito de defendê-la e em seguida é feita uma
votação sobre o que foi debatido. Determinadas teses são submetidas democraticamente ao julgamento da
assembléia, tanto no que se refere a assuntos (teses) como para eleições à direção partidária, até o momento
em que se chegue a uma definição temática ou escolha de dirigente. A partir daí, todos os militantes do
partido passam a defender e implementar as posições e teses adotadas pela maioria. O que se deve levar em
conta é o resultado final, de modo que a decisão da maioria será cumprida. Estejam os filiados de acordo ou
não, todos aceitam categoricamente a posição vencedora. Resumindo: total liberdade na discussão interna, e
total uniformidade na política a ser defendida externamente ao partido (a qual foi aprovada pela maioria).
Informação baseada em texto de http://pt.wikipedia.org/wiki/Centralismo_democr%C3%A1tico, acesso em
05/09/2006.
434
A quantidade de municípios em setembro de 2006 era de 5.561, conforme constava no site:
http://www.municipionline.com.br/default.htm, acessado em 05/09/2006.
435
Cf. BURITY, Joanildo A. Religião,voto e instituições políticas: notas sobre os evangélicos nas eleições 2002. In: ______,
MACHADO (orgs.), 2006, p. 173-4.
199
Trazem turbulência, portanto, para campos controlados pelos estabelecidos há bastante
tempo na religião e na política brasileiras. O mal-estar devido à presença dos pentecostais
se apresenta tanto nas esquerdas como em setores conservadores e até mesmo no meio
acadêmico. Às vezes parece que as reações buscam fundamento num viés iluminista, que
não faz jus à cultura política, comportamentos coletivos e, muito menos, ao padrão de
política de massas tão arraigado na trajetória social brasileira.
A participação pentecostal pós-1986 causou impacto, porque veio como uma
operação planejada e executada pelas corporações eclesiais e revelou objetivos de clara
instrumentalização do espaço político, com vistas a obter recursos e privilégios para as
instituições religiosas, através de práticas clientelistas manifestas sem constrangimento.
Esta nova forma de incursão também incomodou por se tratarem de grupos religiosos
relativamente novos, menos de um século de vida para os mais antigos pentecostais e
apenas três décadas para os neopentecostais, conhecidos ambos pelo comportamento
sectário, proselitista, intransigente e autoritário, ou numa palavra, antiliberais, adentrando
uma sociedade política onde as elites têm assumido o liberalismo como ideal desejado,
embora não demonstrem compromisso maior com sua prática e saibam que seu discurso
está fora de lugar.
436
Não obstante todas essas dificuldades, o projeto eleitoral dos
pentecostais segue firme, porque tem votos garantidos para conquistar espaços nos
parlamentos e quiçá em alguns governos municipais. Eles estão trazendo novos
ingredientes para uma religião civil em processo de mutação, junto com produção de outras
identidades grupais.
As eleições presidenciais de 2002 configuraram dois projetos nesse campo
religioso: a candidatura Garotinho, com amplo apoio dos pentecostais e adesão menor de
neopentecostais; e a candidatura Lula, com participação da Igreja Universal, através de sua
posição bastante influente na executiva nacional do PL, o principal partido aliado do PT.
Esses projetos revelaram, de um lado, aspirações constantinianas, e de outro, a pujança de
uma minoria religiosa organizada. Para Burity, “essas modalidades refletem um
436
Cf. SCHWARZ, 2000, p. 9-31.
200
pensamento estratégico sobre a contribuição evangélica à sociedade brasileira e sobre o
peso da cultura evangélica na religião civil do país”.
437
Há que se reconhecer, adicionalmente, que a sociedade brasileira passa por
processos de transformação, nos quais a religião joga um papel importante. Está havendo
uma reconfiguração do quadro de forças religioso, dentro do qual não só pentecostais e
neopentecostais crescem, mas também os sem-religião. Significa que a religião civil
brasileira está em mutação, com uma riqueza de pluralidade capaz de favorecer a ampliação
do processo democrático, caso sejam acolhidas todas as crenças religiosas e não-religiosas,
e que estas se façam atuantes e influentes no espaço público, assim como já estão no espaço
privado.
A ideologia dos pentecostais é muito influenciada pela visão escatológica
dispensacionalista. Em outras palavras, eles interpretam alguns textos bíblicos como
profecias sobre o final dos tempos, segundo uma leitura superficial e precária do quadro das
relações internacionais. De acordo com essa ideologia, as dispensações são eras históricas
classificadas dentro de uma economia divina, que rege toda a trajetória da humanidade. A
dispensação atual começou com a ascensão de Jesus Cristo e vai terminar com sua segunda
vinda, ou seja, esta é a dispensação da igreja.
438
A leitura pentecostal é dualista: entende
que o poderio norte-americano e a consolidação do Estado de Israel são cumprimento de
profecias relativas à vinda do Reino de Cristo.
A subserviência da política à lógica da concentração capitalista tem recebido
oportuna ajuda de agentes das “religiões do espírito” antigas e novas, embora esta não seja
consciente nem planejada, mas isto é pouco relevante para os resultados, na medida em que
promovem a sublimação dos problemas sociais, tratando-os como questões espirituais, obra
dos demônios da miséria, do desemprego, da inveja, do “encosto”, “mau-olhado” e “olho
gordo”, demônios estes a serem exorcizados por profetas da “prosperidade”, funcionários
de corporações religiosas, algumas delas transnacionais. Criou-se, portanto, um mercado de
bens simbólicos, que concentra bens materiais nessas empresas da fé. Uma enorme massa
437
BURITY, op.cit., 2006, p. 176-7.
438
. Cf. BÍBLIA SAGRADA com anotações do Dr. Scofield 1983, e também o portal:
http://www.ipcb.org.br/Publicacoes/o_dispensacionalismo.htm, acesso realizado em 12/09/2006.
201
de empobrecidos transfere seus parcos recursos de sobrevivência para milagreiros que
prometem acionar os poderes divinos a fim de fazê-los prosperar. Desta forma, mobilizam
um mercado de bens nada desprezível na economia das camadas sociais que atendem.
Não cabe aqui entrar nos pormenores das interpretações pentecostais, aliás, muito
minuciosas, mas o que foi dito permite entender por que a ideologia desse movimento apóia
o capitalismo e não tem lugar para o desenvolvimento de utopias igualitárias. A ascensão
econômica do indivíduo é bem vista e festejada como sinal comprobatório da bênção
divina, em forma de recompensa do Todo-poderoso à fidelidade do crente. A corporação
pentecostal não tem projeto de sociedade, porque a ordem mundana “jaz no maligno”, vai
de mal a pior e não deve ser consertada, pois tal atitude seria uma rebeldia ao vindouro
julgamento divino. A intervenção celeste há de ser um ato espetacular, quando os reinos do
mundo serão extintos para darem lugar ao reino de Cristo. A implantação deste ocorrerá
como uma catástrofe para os “ímpios”. Os fiéis serão poupados porque haverá o
arrebatamento da igreja e a derrota definitiva de Satã com seus seguidores, durante o
milênio anunciado no livro de Apocalipse.
439
Somente nessa ocasião estará implantado o
Reino divino, nos céus e na terra. Neste quadro, apresentado de forma sucinta, dá para
perceber que não existe espaço para compromisso das instituições pentecostais com
projetos de mudança social, seja pela via das reformas, seja por revolução, pois ambas as
vias dependem do engenho humano, enquanto as dispensações constituem ações divinas
inexoráveis e determinísticas sobre as civilizações humanas. Assim, compete ao político
pentecostal apenas tirar partido das circunstâncias, em benefício da sua corporação, visto
que ela é agência do reino divino que está para vir. O objetivo do representante pentecostal,
dentro deste quadro, é reforçar a corporação que o elegeu.
Os pentecostais não são herdeiros de velhas elites políticas, não estão treinados em
algum modo liberal de comportamento e formam um conjunto heterogêneo, no sentido
ideológico. Aliás, nem sequer demonstram estarem interessados em questões desta
natureza. O desconforto para os setores conservadores da política brasileira foi grande,
desde as eleições de 2002, porque pentecostais e neopentecostais fizeram alianças
inusitadas com candidatos de esquerda, como Lula e Garotinho. Nestes segmentos também
439
Cf. qualquer edição da Bíblia Sagrada, livro de Apocalipse, cap. 20.
202
era difícil digerir essas alianças. A mobilização religiosa em espaços imprevisíveis veio
reforçar a tese de crise, esvaziamento ou deslocamento da política dos ambientes
tradicionais para os religiosos. Como consequência, a linguagem de alguns candidatos vem
adquirindo novo estilo, com vistas a alcançar o segmento evangélico. Por outro lado, pode-
se raciocinar no sentido oposto: o da expansão do político, enquanto os agentes religiosos
reclamam por ética e transparência, ainda que seus enunciados se limitem a manifestar
decepção com desmandos de agentes públicos ou só consigam atingir o diapasão de um
discurso moralista. Este tipo de linguagem reforça, evidentemente, o lado conservador, o
qual escamoteia a persistente dominação de classe, que se mantém inalterada, enquanto se
processam atos retóricos de denúncia de escândalos ou defesa de “costumes tradicionais da
família brasileira”.
O pentecostalismo é um movimento fragmentado em milhares de igrejas, muitas
delas agrupadas em denominações. É quase impossível que grupo tão heterogêneo e tão
pulverizado seja capaz de constituir órgãos verdadeiramente representativos para
dialogarem com o Estado. Nos diversos conselhos municipais, estaduais e federais, que
requerem representantes da sociedade civil, o dilema da autoridade estatal é identificar um
interlocutor legítimo desse segmento religioso, seja para ocupar assento, seja apenas para
traduzir o pensamento do grupo. No Congresso Constituinte de 1987-88, um conjunto de
evangélicos ligados ao Centrão
440
reativou de forma oportunista a Confederação Evangélica
Brasileira e a apresentou ao governo Sarney como entidade legítima dos evangélicos para
obtenção de verbas, cargos e favores, em troca de votos que garantiriam a prorrogação do
mandato de quatro para cinco anos do próprio Sarney. Após esta manobra de “ressurreição”
da CEB seus dirigentes se envolveram em atos de corrupção.
A liderança do bloco evangélico eleito para o Congresso Constituinte de 1987-88
foi ocupada, inicialmente, pelos protestantes históricos Daso Coimbra e Fausto Rocha.
Pouco tempo depois, foram substituídos pelos deputados Gidel Dantas e Salatiel Carvalho,
pentecostais com experiência em administração pública. Dantas e Carvalho eram menos
conservadores e mais pragmáticos do que os líderes anteriores, além de serem mais
440
O “Centrão” foi uma frente parlamentar de partidos e tendências de direita que se organizou durante o Congresso Constituinte
de 1987-88, para barrar propostas transformadoras como reforma agrária, sindical, bancária, tributária etc. Um dos líderes desse
segmento conservador era o deputado evangélico Daso Coimbra, do Rio de Janeiro.
203
representativos para um grupo cuja maioria era formada de pentecostais. Os novos
comandantes trataram logo de reativar a Confederação Evangélica Brasileira (CEB), para
usá-la como pessoa jurídica, habilitada a receber recursos do governo destinados a projetos
sociais de entidades evangélicas. De fato, o que ocorreu foi uma apropriação de uma
organização dos protestantes históricos, com uma trajetória em projetos cooperativos,
defesa de minorias e compromisso social, por um grupo de parlamentares ávidos para
transformá-la em balcão de negócios.
A CEB fora criada no contexto da Constituinte de 1934, para neutralizar tentativas
dos católicos contra a liberdade de culto e pluralidade religiosa. Passada aquela
Constituinte, a CEB dedicou-se à educação religiosa e projetos sociais, até ser sufocada
pelo regime militar.
441
Embora não estivesse extinta, já não funcionava há duas décadas.
Dos 13 cargos de diretoria dessa nova CEB, oito foram ocupados pela Assembléia de Deus,
que também escolheu dois dos três membros do Conselho Fiscal.
A diretoria recém-empossada reivindicava para a CEB o mesmo status de
reconhecimento público da CNBB, exigindo que o governo destinasse aos evangélicos o
equivalente a 1/3 das verbas repassadas aos católicos, conforme noticiou o Correio
Brasiliense de 7/8/1988. A Legião Brasileira de Assistência (LBA) e a Secretaria Especial
de Ação Comunitária doaram, a fundo perdido, recursos para a CEB. Nas vésperas da
votação para que fosse prorrogado o mandato do presidente Sarney, o Jornal do Brasil de
30/11/1987 denunciou repasse de cem milhões de cruzados da LBA para a CEB. Esta
entidade tornou-se instrumento de captação clientelista de recursos, a serviço,
principalmente, de deputados e líderes da Assembléia de Deus.
441
Para se ter uma idéia da distância entre a CEB original e a reativada em 1987, leiam-se trechos de
depoimento de um participante da primeira nos anos de 1960: “A Confederação Evangélica do Brasil (CEB)
foi fundada em 1932. [...] Reunia [...] igrejas evangélicas para cooperação nas áreas de ação social, educação
cristã, trabalhos de juventude e atividades diaconais. Enfim, era uma organização que, realmente, promovia a
fraternidade e o trabalho conjunto entre as igrejas evangélicas. [...] Foi a primeira organização ecumênica
organizada no Brasil. A CEB tinha um (...) Setor de Responsabilidade Social da Igreja. [...] Entre 1956 e 61,
organizou três conferências que ficaram conhecidas como Conferências do Nordeste. O tema era Cristo e o
Processo Revolucionário Brasileiro [...] Foi, provavelmente, a primeira vez no Brasil que cristãos e marxistas
se encontraram.” (Depoimento do sociólogo Anivaldo Padilha, ligado ao movimento ecumênico e à
organização Koinonia. Cf. http://www.cese.org.br/Campanhas/juventude.doc.doc, acesso em 24/07/2006).
204
O presidente da CEB era Gidel Dantas, da Igreja de Cristo, uma tradicional
denominação do pentecostalismo cearense. Foram abertos escritórios da Confederação em
17 Estados, além da sede nacional em Brasília. A imprensa denunciou o fisiologismo e
avidez dos parlamentares evangélicos no Congresso Constituinte. Nessa ocasião, uma parte
da diretoria pediu demissão, outras lideranças evangélicas exigiram auditoria externa, mas
não foram atendidas. Durante três anos a CEB conseguiu sobreviver. As igrejas
protestantes permaneceram omissas, durante todo o período de descaracterização dessa
histórica entidade. Um líder presbiteriano, Guilhermino Cunha, ainda ocupou a secretaria
geral, durante mais de um ano, e procurou defender a nova CEB. Os batistas, que haviam
recusado participarem da Confederação, na fase pioneira, tiveram um diretor nessa nova
fase, o deputado Fausto Rocha, porém ele logo se afastou do cargo. A denominação que
mais apostou na CEB reativada e que mais se beneficiou dela foi a Assembléia de Deus. O
próprio presidente da CGADB fez parte da diretoria, na fase terminal, com o intuito de
salvar a organização.
Com o término das votações da Constituição de 1988, minguaram as verbas do
governo federal para a CEB. Os escritórios foram fechados em 1989 e a sede nacional em
1990, ano em que também foi extinta a própria Confederação, o que veio a suscitar alguns
problemas. O distrato foi negociado com o reverendo Izaías Maciel, proprietário de uma
organização de assistência social conhecida pela sigla COBRASE. Os bens do espólio
passaram para um filho do deputado Gidel Dantas, que instalou uma empresa no mesmo
local onde funcionara a sede da Confederação, segundo notícia do Jornal do Brasil, em
8/4/1991.
Este não foi o único episódio que envolveu Gidel Dantas. O governo Sarney
concedeu ao mesmo deputado o poder político de preencher os cargos de direção da
Superintendência do Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE), inclusive coordenadorias
regionais nos Estados. A Associação de Servidores da SUDEPE denunciou que estava
havendo desvio de recursos, durante a gestão do grupo ligado a Gidel Dantas. A crise se
instalou no órgão de pesca e o governo resolveu extingui-lo.
442
Esta foi uma estranha forma
442
Cf. Jornal do Brasil, 7/8/1988.
205
da autoridade máxima do País “resolver” o problema: destruiu um órgão prestador de
serviços e, ao mesmo tempo, poupou os corruptos.
A Assembléia de Deus é uma rede de poderosos grupos regionais ou supra-regionais
chamados “ministérios”, que guardam muito da tradição nortista-nordestina das oligarquias.
Seus membros, embora não fazendo parte dessas oligarquias, reproduziram a organização
social autoritária dos antigos coronéis de barranco e de roça da política brasileira.
443
Os
suecos que trouxeram a fé pentecostal viviam uma condição de marginalizados. Na pátria
de origem, a Suécia, não pertenciam à igreja oficial a Luterana e, nos Estados Unidos da
América, faziam parte de um conjunto de emigrantes operários sem garantia do usufruto de
direitos humanos básicos, no final do século XIX. Para muitos a comunicação era difícil,
porque não haviam aprendido o inglês, o que dificultava a integração na nova sociedade. O
batismo com o Espírito Santo e a glossolalia, praticada dentro do novo movimento,
tornava-os diferentes e inassimiláveis nas denominações evangélicas tradicionais (batista,
presbiteriana e metodista, principalmente). Mesmo assim, eram brancos e, como tais,
compartilharam com brancos norte-americanos de práticas de discriminação racial contra
negros, índios e mestiços. Não transportaram o racismo dos EUA para o Brasil, mas
trouxeram a falta de compromisso com a justiça social, muito comum no mundo evangélico
norte-americano, que temia o “Evangelho Social”
444
e movimentos radicais, de comunistas
e sindicalistas.
Com todos estes ingredientes, formou-se uma denominação de oprimidos, sem
consciência das estruturas que os marginalizavam. Acrescente-se a isto o fato de serem
guiados por uma doutrina messiânica, milenarista e triunfalista, que os levava a se julgarem
443
A análise desta categoria de poder político local, o coronel, está na clássica obra de LEAL, Victor Nunes. Coronelismo,
enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. São Paulo: Alfa-Ômega, 1975.
444
Para uma noção bem sucinta, segundo Alderi Matos: “O ‘evangelho social’ foi um movimento de grande
importância no protestantismo norte-americano por cerca de cinqüenta anos (1880-1930). Influenciado pelo
liberalismo teológico, mas distinto do mesmo em vários aspectos, foi uma resposta à crise urbana ocasionada
pelo crescimento econômico dos Estados Unidos após a Guerra Civil. Seus principais teóricos foram
Washington Gladden, Josiah Strong e especialmente Walter Rauschenbusch (1861-1918), um pastor batista e
professor de seminário cujo livro O Cristianismo e a Crise Social o tornou nacionalmente famoso em 1907.
Outros livros seus foram Cristianizando a Ordem Social (1912) e Uma Teologia para o Evangelho Social
(1917). O movimento pretendia dar uma resposta bíblica e cristã à situação de exploração e abandono
experimentada pelos trabalhadores e imigrantes que viviam nos cortiços das grandes cidades. Insistia em
conceitos como ‘a implantação do reino de Deus na terra’ e a importância de uma ‘sociedade redimida’.
(MATOS, Alderi Souza. “Fazei o bem a todos”: os cristãos e a responsabilidade social. Página do MEP:
http://www.mep.org.br/fazei_o_bem_a_todos.htm, acessada em 05/09/2006).
206
superiores e iluminados e a reproduzirem nas igrejas práticas autoritárias dos seus
opressores. É verdade que o novo sistema religioso foi uma versão mitigada da estrutura
vertical presente no contexto social brasileiro, pois o pentecostalismo tem sido,
historicamente, mais aberto à ascensão dos que aprenderam a manejar seus códigos de
poder do que a sociedade nacional. De fato, na Assembléia de Deus, o membro mais
empobrecido da base pode chegar ao posto mais elevado da denominação, através de um
aprendizado prático e, sobretudo, uma conduta de dedicação aos objetivos da Igreja,
reforçada pela habilidade no trato com seus superiores.
A cultura assembleiana valoriza, também, a ascensão material, mas aquele que sobe
socialmente e na hierarquia política nunca pode esquecer que é um “irmão”, um parceiro da
irmandade de servos de Cristo. Há uma permanente expectativa e cobrança de bom
desempenho por parte do conjunto de fiéis que forma a base das congregações locais,
embora a estrutura da denominação não ofereça bons mecanismos de fiscalização e controle
dos que exercem autoridade em seu meio, facilitando, assim, que surjam déspotas.
Nesse contexto de mobilização estratégica dos pentecostais tradicionais para o
Congresso Constituinte de 1987-88 veio situar-se um novo ator político: a Igreja Universal
do Reino de Deus. Roberto Augusto Lopes foi o primeiro parlamentar da Igreja Universal
no Congresso, como o mais votado deputado federal do PTB do Rio de Janeiro, em 1986.
Atuou durante a legislatura do Congresso Constituinte (1987-90). Fundador da igreja, junto
com outros três líderes, foi também Lopes quem abriu a sucursal em São Paulo e inaugurou
a ordem episcopal na IURD, em 1981, junto com Edir Macedo. Há indícios de que sua
capacidade de liderança, fortalecida pelo mandato parlamentar, tornaram ele uma figura
incômoda para o caudilho Edir Macedo, pois na mesma legislatura foi compelido a se
afastar da Igreja.
No período seguinte, 1991-94, a Universal optou por candidatos leigos e elegeu dois
deputados federais no Rio de Janeiro e um em São Paulo. Posteriormente, a igreja viria a
207
mesclar sua representação com bispos, pastores, leigos e leigas. A bancada eleita em 2002,
com 17 parlamentares, foi composta por cinco leigos, duas leigas e dez clérigos.
445
A entrada da IURD em diversos setores empresariais, principalmente na mídia
televisiva, com a aquisição da Rede Record em 1989, exigiu que ela investisse, desde cedo,
na formação e ampliação de uma base de apoios políticos. A Universal não gastou energia e
argumentos para convencer pastores e membros sobre a necessidade de ter parlamentares a
seu serviço. Devido ao caráter de igreja com um bispo-primaz absoluto, uma espécie de
papa, a decisão de investir na política foi tomada e acatada de forma tranqüila por todas as
instâncias dessa denominação neopentecostal.
Além disto, cabe ressaltar que o freqüentador da IURD é um cliente. Como em
qualquer relação cliente-fornecedor, o consumidor geralmente não se preocupa com o
processo de produção, distribuição e comunicação mercadológica adotado para colocar os
bens fabricados no mercado. O que lhe interessa, de fato, é conseguir um produto de
qualidade a preço compatível. Se a Igreja esclarece esse cliente-fiel que precisa ter
representantes nos parlamentos para continuar oferecendo-lhe os bens simbólicos de que
necessita, ele prontamente vota nos candidatos apresentados, sem entrar no mérito da
estratégia que originou esse novo ator político-religioso, desde que os bens que busca lhe
sejam disponibilizados.
Em diversas oportunidades a IURD se apresentou como uma “igreja perseguida”.
Isto desenvolveu um sentimento entre os membros de que ali estava mais uma característica
da autenticidade do cristianismo vivido e pregado por seus bispos e pastores, em
semelhança ao que ocorreu com Jesus Cristo e discípulos, ao longo da história. As
perseguições aumentaram a coesão e solidariedade entre os freqüentadores e,
principalmente, destes para com pastores e bispos da Igreja.
Desta forma, explica-se porque o candidato iurdiano não precisa fazer grandes
esforços de campanha. Quem faz isto é a rede de bispos e pastores, que orienta os fiéis em
como deverão votar. Para que seja maximizado o resultado da votação, a Igreja distribui os
445
A quantidade e condição eclesial dos parlamentares são próximas da apresentada. Como alguns pastores e bispos preferiram
declarar outra profissão para os registros do Congresso Nacional, houve dificuldade em se obter, de modo exato, esta
classificação.
208
candidatos em “distritos eclesiais”. Foi assim que aconteceu com Laprovita Vieira, um
pastor-empresário, e Aldir Cabral, delegado da Polícia Federal, nas eleições de 1990, no
Estado do Rio. Ao primeiro coube a maior parte da capital, Niterói, Campos e a região dos
lagos. Ao segundo restou um pouco da capital, a Baixada Fluminense e quase todo o
interior do Estado.
446
A crise do desemprego e o empobrecimento da população poderiam ter favorecido o
crescimento de partidos de massa como o PT (e de fato o fez), mas o consolo espiritual que
as igrejas pentecostais e neopentecostais ofereceram dentro deste tipo de cenário de
carências sociais surtiu mais efeito do que o proselitismo ideológico dos partidos, no
esforço de conquistar adeptos para suas propostas de solução dos problemas da sociedade.
Deste modo, a entrada das igrejas pentecostais na política, desde meados dos anos de 1980,
preencheu um vazio que a conscientização ideológica e a militância em partidos, sindicatos
e outros movimentos populares não foi capaz de fazer. Trata-se de populismo religioso, ou
seja, um tipo de cooptação e domesticação de massas, com nicho social específico, que
conta com representação significativa no Congresso Nacional, onde pentecostais e
neopentecostais constituíram mais de 7 % dos parlamentares eleitos para o período 2003-
2007.
3.2 Pentecostais, ascensão e queda de Fernando Collor
Os grandes veículos da imprensa escrita do Rio de Janeiro e São Paulo registraram,
em 1989, manifestações de líderes da Igreja Quadrangular, Assembléia de Deus e Igreja
Universal, em favor da eleição de Fernando Collor de Mello. Freston reproduziu as
seguintes declarações:
“Votem em Collor, homem culto, honrado, patriota, estadista e de princípios cristãos”
(Daniel Marins, deputado estadual da Igreja do Evangelho Quadrangular, em O Estado de
S. Paulo, 3/12/1989).
“Seu governo será marcado pela seriedade que o acompanha” (Pr. José Wellington,
presidente da Convenção Geral das Assembléias de Deus, no Jornal do Brasil,
16/10/1989).
446
FRESTON, 1964, p. 58-9.
209
“Collor fará um excelente governo” (Bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de
Deus, na revista Veja, 6/12/1989).
447
Enquanto não contavam com um candidato de suas fileiras, os pentecostais
apoiavam aquele que se colocava como inimigo das esquerdas, ou seja, dos “comunistas”,
conforme generalização adotada por lideranças pentecostais. Não obstante, nutriam
esperanças em contar com a candidatura para a presidência do então Ministro da
Agricultura no governo Sarney, Íris Rezende, originário da Igreja Cristã Evangélica de
Goiás. Durante a gestão de Rezende no referido ministério, foram promovidos cultos de
ações de graças em reconhecimento às safras recordes, consideradas por setores
evangélicos como respostas às orações e resultados das sábias decisões de um “servo do
Senhor”, tal como aconteceu com José no Egito.
448
O presidente da Assembléia de Deus,
ramo Madureira, durante um congresso nacional de sua igreja, registrado pela Folha de São
Paulo (17/4/1989, p. A-5), “profetizou”, na mesma época, que o Brasil teria um presidente
evangélico.
Como a eleição de 1989 apresentou disputa maior entre Collor, Lula e Brizola e foi
decidida no segundo turno, entre os dois primeiros, os pentecostais deram apoio massivo a
Collor, enquanto eram orientados para negarem seus votos ao “marxista ateu” Lula.
449
A
Igreja Universal apoiou Collor desde o primeiro turno, concedendo-lhe espaço em suas
emissoras e distribuição de “santinhos” nos templos. Apesar deste apoio, a Universal não
recebeu a contrapartida esperada do governo Collor. A Rede Record foi adquirida dias
antes da eleição, mas Collor chegou a pressionar Edir Macedo para este repassá-la ao
empresário José Carlos Martinez.
450
No primeiro turno, o eleitorado da Assembléia de Deus estava dividido entre Maluf,
Afif, Covas e Collor. Em São Paulo, na igreja-sede do Belenzinho, Maluf era o candidato
preferido dos assembleianos. Não obstante, grupos minoritários organizaram comitês de
apoio a Brizola e a Lula, nas diversas regiões do Brasil, em algumas comunidades dessa
447
Cf. FRESTON, 1994, p. 85.
448
A vida de José do Egito é narrada nos capítulos 37 a 50 do primeiro livro da Bíblia, Gênesis.
449
Mais uma desinformação para confundir eleitores evangélicos: Lula tem vínculos com a religião católica e recebeu,
sistematicamente, apoio de setores progressistas da respectiva igreja, tanto no movimento sindical da região do ABC, em São
Paulo, como no próprio Partido dos Trabalhadores.
450
OESP, 20/07/91.
210
igreja, à revelia de suas lideranças autoritárias. O Movimento Evangélico pró-Leonel
(MEL) foi dirigido pelo empresário carioca Washington de Souza. Tratava-se de grupo bem
eclético, presente no Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Bahia e Pará, com assembleianos,
evangelicais e ecumênicos. O apresentador de televisão Silas Malafaia ajudou este
movimento. Brizola tinha a seu favor o fato de haver sido educado em ambiente metodista.
O Movimento Evangélico pró-Lula conseguiu estar presente em 17 Estados, no primeiro
turno, mas não obteve espaço em comícios e programas de televisão, exceto através de uma
brevíssima aparição do bispo anglicano dom Robinson Cavalcanti no horário eleitoral
gratuito. Esta falta de investimento no segmento evangélico se deveu à insensibilidade da
Frente Brasil Popular, movimento-base da campanha de Lula, acerca da importância de
elaborar mensagem apropriada para um público tão específico com é o evangélico. Os
líderes da Frente optaram por investir num comitê inter-religioso, sem demonstrarem ter
um mínimo de conhecimento do ethos evangélico e pentecostal.
No segundo turno, os dois grandes ramos da Assembléia de Deus, Missão e
Madureira, se mobilizaram em favor de Collor, sob comando de seus respectivos
presidentes, José Wellington e Manoel Ferreira. O deputado federal Salatiel Carvalho foi
um dos líderes dessa campanha. No registro de Freston:
A estratégia do Movimento Pró-Collor era voltada para líderes evangélicos eclesiásticos,
políticos e empresariais. Basicamente pentecostal, dirigia-se, não ao membro comum, mas
sim, aos pastores, para que estes orientassem seus rebanhos. Collor, dizia, combateria a
corrupção, apoiaria Israel e governaria com a ajuda dos evangélicos. Além disso, era o único
candidato capaz de derrotar a esquerda “atéia” que perseguiria as igrejas.
451
Embora não se disponha de pesquisa da votação pentecostal no segundo turno, é
possível que ela tenha contribuído com aproximadamente cinco milhões de votos para a
eleição de Fernando Collor.
452
Bem cedo, no início do governo Collor, os líderes da
Assembléia de Deus se frustraram, porque, segundo eles, o novo presidente não retribuiu,
com cargos e outras benesses, o apoio que havia recebido. O próprio deputado Salatiel não
pôde nomear o principal gestor da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco Chesf
451
FRESTON, 1994, p. 91.
452
É importante registrar que a eleição de Collor se deu por uma diferença de 6% dos votos, cerca de quatro milhões de eleitores.
Cf. NICOLAU, Jairo Marconi (org). (1998), Dados eleitorais do Brasil (1982-1996). Rio de Janeiro: Iuperj/Revan, 1998.
211
conforme pretendia.
453
O comportamento dos líderes pentecostais foi objeto de avaliação de
Freston:
Por que várias hierarquias pentecostais apoiaram Collor? Pesaram sua pregação contra a
corrupção (tema político de cunho moral, facilmente compreensível para o pentecostal
despolitizado), a promessa de mudanças e a postura messiânica “antipolítica” (atraente para
os segmentos sociais a que pertencem muitos pentecostais). Outro trunfo foi sua auto-
apresentação como “temente a Deus”, em contraste com o “ateu” Lula. Vários líderes e
deputados pentecostais diziam que Lula perseguiria os evangélicos. A plausibilidade dessa
idéia deve-se ao tratamento dado à religião nos países comunistas. A presença do símbolo
comunista em bandeiras do PC do B nos comícios de Lula evocava essa história.
454
Naquele momento, quando ainda pairava o “espectro do comunismo”,
455
o
candidato do PT era estigmatizado pelas igrejas pentecostais e neopentecostais. Muitos
boatos contra Lula foram propagados nessas comunidades. Dizia-se que as administrações
petistas impediriam cultos em espaços públicos, os templos iriam ser transformados em
escolas, a bandeira do Brasil seria substituída pela bandeira vermelha dos comunistas e
outras afirmações semelhantes. Alguns pentecostais reclamavam da aliança de setores
católicos com comunistas, como ameaçadora aos interesses pentecostais.
O episódio do impeachment de Collor poderia ter sido uma oportunidade para os
evangélicos melhorarem suas imagens tão desgastadas, principalmente devido ao
desempenho fisiológico, durante o Congresso Constituinte. Todavia, houve muita vacilação
e ambigüidade por parte dos parlamentares desse grupo. No final de agosto de 1992, 31%
eram a favor do impedimento do presidente, mas um mês depois já eram 91%. No mesmo
período, os indecisos, ausentes e que se abstiveram de votar, variaram de 62% para zero,
enquanto os defensores de Collor mantiveram-se estáveis entre oito e nove por cento. As
oscilações dos evangélicos foram maiores do que as da totalidade dos parlamentares.
456
Sobre este comportamento, a coluna de Jânio de Freitas na Folha de S. Paulo verberou
453
Cf. Diário de Pernambuco, 19/5/90, p. A18.
454
FRESTON, 1994: p. 92.
455
O muro de Berlim, que separava a Alemanha em duas zonas de influência, uma comunista e outra capitalista, caiu em 9 de
novembro de 1989. A União Soviética foi fragmentada em diversas repúblicas durante o ano de 1991. Estes dois eventos foram
reveladores da decadência do chamado “socialismo real”. Nos anos seguintes, a partir daí, perdeu força o argumento pentecostal
sobre o perigo da “ameaça comunista”, como forma de dissuasão para os fiéis evitarem contato com partidos de esquerda.
456
FRESTON, 1994, p.97.
212
contra os evangélicos, chamando-os de “especialistas em venda” para os “especialistas em
compra”, do governo.
457
No dia após a votação final do impeachment, Freitas escreveu: “O Planalto só notou
que o impeachment passaria à 1 hora de ontem, quando soube que a bancada dos
evangélicos fechara com a oposição”.
458
O deputado José Felinto, da Assembléia de Deus
do Paraná, propôs-se a subornar membros da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre
corrupção no governo Collor, para isentá-lo das acusações. O parlamentar Felinto foi expulso do PST.
459
O
deputado Orlando Pacheco manteve-se “indeciso” até receber dinheiro do vice-líder do governo
para votar contra o impeachment.
460
O jornal Mensageiro da Paz, mesmo depois do impeachment, colocou-se em
posição defensiva, de modo evasivo, talvez para minimizar sua postura em favor de Collor.
O argumento usado pelo órgão oficial dos assembleianos da CGADB foi uma frase bíblica:
“atire a primeira pedra aquele que estiver sem pecado”.
461
A AEVB foi a organização
evangélica que esteve firme, durante todo o impeachment, fazendo pressão sobre os
deputados e cobrando deles comportamento condizente com a ética cristã.
462
Durante a realização do Congresso Latino Americano de Evangelização (Clade III),
em Quito, no Equador, setembro de 1992, houve manifestação pública de repúdio ao
presidente Collor, em frente à embaixada do Brasil. A delegação brasileira, com mais de
cem evangélicos, acompanhou o processo, através de noticiários das televisões, e fez uma
visita ao embaixador, a fim de expressar a indignação dos evangélicos contra o escândalo
que estava acontecendo no Brasil, com o envolvimento direto do Presidente da República.
Foram realizadas, também, vigílias de oração, durante o mesmo evento.
457
FSP, 5/9/1992, p. 1-5.
458
FSP, 30/9/1992: p. 1-4.
459
FRESTON, 1994, p. 98 e 163.
460
FSP, 21/9/1992, p. 1-5.
461
Mensageiro da Paz, out.1992.
462
Sobre a Associação Evangélica Brasileira (AEVB), sua origem, propósitos e organização, consultar: FRESTON, Paul.
bíblica e crise brasileira. São Paulo: ABU, 1992.
213
3.3 Mídia, mobilização de recursos e capitalização política.
Quando as cúpulas das igrejas pentecostais desta pesquisa resolveram ingressar
institucionalmente nas eleições do País, era óbvio que buscavam influir no jogo político,
mas o tipo de influência só veio a ficar claro pela atuação dos seus parlamentares. Em vez
de priorizarem mudanças no sistema normativo, preferiram obter recursos públicos para
usufruto privado, enquadrando-se perfeitamente na tradição patrimonialista da política
brasileira.
3.3.1 Mídia
O interesse pentecostal quanto aos meios públicos de expressão se manifestou,
principalmente, na conquista de concessões de canais de rádio e televisão. O governo
Sarney utilizou estes veículos como moedas de troca para os constituintes votarem
conforme sua orientação. A porcentagem de evangélicos que se beneficiou com este
esquema equivaleu à que favoreceu o conjunto maior de parlamentares. Receberam
estações de rádio, entre outros, os deputados João de Deus, Arolde de Oliveira, Mário de
Oliveira e Matheus Iensen. Fausto Rocha ganhou um canal de televisão.
463
Quase metade dos parlamentares evangélicos no Congresso Nacional, entre 1987 e
1992, estava vinculada a veículos de comunicação, sendo que dois haviam dirigido o
Dentel (Departamento Nacional de Telecomunicações). Na utilização da mídia como
instrumento para fazer campanhas políticas ou promover interesses corporativos, o
comunicador evangélico leva vantagem sobre seu concorrente que não tem um público tão
específico. Há forte identificação entre o emissor e o receptor. Ambos supostamente
comungam da mesma fé e paixão: a “salvação dos pecadores”.
464
No Rio de Janeiro, o empresário Francisco Silva, com passagem pela indústria
farmacêutica e proprietário de emissoras de rádio, se autodenominava membro da
Congregação Cristã, embora a Igreja negasse sua filiação. O fato é que ele soube ocupar um
vácuo institucional, pois a CCB sendo uma mega-igreja com discurso antipolítico, estava
sujeita à ação de aproveitadores. Devido a sua distância dos meios de comunicação,
463
FRESTON, 1994, p. 81.
464
Idem, p. 55-6.
214
dificilmente essa Igreja viria a público desmentir a ação de oportunistas ou membros mais
ousados, que empregassem o nome da instituição para angariar votos, conforme assinalou
Freston.
465
Não obstante, esta passou a ser uma questão curiosa: como todo membro da
CCB sabe que sua denominação não se envolve em política, qualquer candidato que se
apresente em nome dela será considerado um impostor, logo, dificilmente conquistará votos
neste reduto eleitoral. Porém, como não se pode subestimar a extraordinária perspicácia de
Francisco Silva, é possível que tenha existido uma operação estratégica, cuja finalidade
seria a implantação de um nicho de mídia especializada para a grande clientela evangélica.
A filiação a alguma igreja era necessária, para credenciar Silva no campo evangélico como
pessoa familiarizada e pertencente ao meio. Com o poder econômico que detinha (e detém)
e os instrumentos de comunicação que vem disponibilizando, Silva vive cercado de
lideranças de diversas igrejas. Ele pode negociar serviços, obter reconhecimento dessa
clientela, atender interesses diversos e ampliar seu capital político pessoal e de seus pares;
estes, ao contrário dele, ajustados ao âmbito das denominações evangélicas.
466
A prorrogação do mandato de Sarney de quatro para cinco anos deveu-se a uma
emenda do deputado Matheus Iensen, da AD, um dos beneficiados com concessão de
emissora de rádio. Ele, curiosamente, reconhecia que a administração de Sarney era má,
porém justificava esse mau desempenho com um argumento escatológico: “a crise [...] é de
todos os países e confirma o que diz a Bíblia: o mundo irá de mal a pior quando estiver
perto do fim”.
467
Os evangélicos contribuíram muito para estender a permanência de Sarney
no governo, com 76% dos votos a favor, enquanto, no total, o presidente conseguiu 59%
dos votos do Congresso para manter-se no posto por mais um ano.
Durante o governo de Itamar Franco, outubro de 1992 a dezembro de 1994, houve
diligências das autoridades fiscalizadoras nos negócios da Universal, a fim de apurarem
prováveis irregularidades. Essas fiscalizações prosseguiram durante o governo de Fernando
Henrique Cardoso. A relação entre Igreja Universal e PSDB também passou por muitas
dificuldades. Alguns trechos de reportagem da Folha de S. Paulo, em janeiro de 1996,
465
Idem, p. 54-5.
466
Para melhor entendimento da estratégia de Francisco Silva e dessa dinâmica de uso da mídia por políticos evangélicos, sugere-
se o exame da obra: FONSECA, Alexandre Brasil. Evangélicos e mídia no Brasil. Bragança Paulista: Edusf; Curitiba: Ifan,
2003.
467
Jornal do Brasil, 8/1/1988.
215
trazem reclamações de Carlos Rodrigues, deputado federal, bispo e coordenador político da
Igreja, reforçadas por comentários dos apresentadores do programa 25
a
Hora, da Rede
Record, bispo Honorilton Gonçalves e pastor Ronaldo Didini no mesmo tom de indignação
contra os tucanos, conforme transcrições a seguir:
Segundo [Honorilton] Gonçalves, FHC procurou a Universal antes de começar a
subir nas pesquisas de opinião. “Tivemos uma reunião na casa do pastor Didini, em que
estavam Fernando Henrique e José Serra (ministro do Planejamento), além de mim, do dono
da casa e de uma quinta pessoa de quem não me lembro”. Rodrigues disse que os
evangélicos votaram “em massa” em Fernando Henrique Cardoso porque acreditavam que,
por ter sido perseguido, ele não permitiria que a liberdade religiosa fosse coibida. “E hoje
estamos vendo aí um grupo que diz que quer ficar 20 anos no poder permitindo essa
calhorda perseguição contra nós.” A FHC e ao vice, Marco Maciel, Rodrigues perguntou
como a Universal poderá defender, nas próximas eleições, “certas idéias liberais e de direita
ou de centro” nas igrejas. “Uma de nossas bandeiras sempre foi que o socialismo iria nos
perseguir, e, hoje, estamos vendo que a Rede Globo usa o poder instalado para nos
perseguir”. Didini foi mais direto em seu recado aos políticos. “A TV Globo ainda tem o
poder de divulgação, mas nós temos o poder de mobilização. Senhores políticos, não
venham bater às nossas portas à época das eleições porque vocês vão ganhar também um
verdadeiro não” [...] Covas recebeu, de fato, o apoio da Universal no pleito de 1994 porque,
eleito, iria “defender a Igreja Universal de perseguições injustas”. A afirmação aparece na
Folha Universal jornal oficial da igreja dias antes das eleições. Assim como o então
candidato ao Senado pelo PSDB e hoje ministro do Planejamento, José Serra, Covas chegou
a participar de uma reunião da Universal no parque Boa Vista, em São Paulo. Durante a
cerimônia, ambos foram chamados ao púlpito pelo pastor Ronaldo Didini e apresentados
como os candidatos da Igreja Universal.
468
O que mais indignava os próceres da Universal era a postura rigorosa de órgãos de
fiscalização do Governo contra a Record, bem diferente do modo tolerante e até omisso
como tratava a rede Globo e outras emissoras, em situações semelhantes. Daí, segundo o
bispo Rodrigues, a necessidade da IURD constituir uma bancada federal, para defender
seus empreendimentos. O mesmo Rodrigues afirmou que a IURD elegia parlamentares para
defendê-los de discriminação disfarçada, como as fiscalizações que sofriam da Receita
Federal e da Previdência, cuja freqüência e rigor eram bem maiores que os praticados
contra a Rede Globo. Esta, dizia ele, tem dívidas, mas é favorecida pelo governo federal,
468
FSP, 04/01/1996.
216
através do BNDES, coisa que não acontece com a Record, que pode até atrasar
recolhimentos, mas tem como pagar com recursos próprios e cumpre sempre seus
compromissos. “Queremos isonomia de tratamento”, completava o bispo.
A presença neopentecostal em vários canais abertos da televisão brasileira, às vezes
simultaneamente, ainda que em horários de menor custo, portanto de baixa quantidade
relativa de telespectadores, tem propagado um modo de analisar e diagnosticar o cotidiano,
caracterizado pela busca de soluções mágicas para problemas sociais. Mas, também, tem
servido para elevar a auto-estima de multidões, cujos efeitos sociais mereceriam estudos
específicos. Enquanto não se dispõe destes, pode-se afirmar que o modo neopentecostal de
ver o mundo já gera demandas no campo da comunicação política. É sempre importante
lembrar que o jogo eleitoral é um jogo de sedução. Assim sendo, a linguagem dos
candidatos visa conquistar corações e mentes, mas muito mais os primeiros. Os candidatos
evangélicos, principalmente os que disputam cargos proporcionais, falam uma linguagem
que comunica para suas tribos e que, conseqüentemente, rende votos. A utilização desses
códigos particulares não tem ficado restrita a candidatos de dentro do grupo. Desde os anos
de 1990, cresce o número de políticos não-evangélicos que fazem discurso religioso e
freqüentam templos em época eleitoral, o que serve para atestar não apenas o caráter
oportunista e manipulador de suas campanhas, mas também confirmar o grande peso
relativo do eleitor que decide seu voto levando em consideração a religiosidade do
candidato.
Esta questão pode indicar, também, esvaziamento do político, no que tange ao
escape para outra linguagem. Todavia, ao acompanhar discursos nos parlamentos, o
panorama é outro. Os políticos evangélicos se despem do jargão religioso para falarem com
desenvoltura no padrão esperado de retórica parlamentar. Aliás, lidar com essa arte não é
problema para quem, semanalmente, arrebata corações em púlpitos de igrejas, com sermões
emocionais, e ganha eleições em disputas internas pelo poder eclesiástico. A adaptação para
realizar performances em tribunas parlamentares não é difícil, embora o mais importante
esteja fora delas, que é o articular-se com os diversos grupos do poder, o fazer a política de
bastidores e conquistar espaços junto a lideranças de partidos e em comissões estratégicas.
217
Também isto eles aprendem a fazer a partir da experiência que acumularam no comando de
denominações religiosas, a principal escola de muitos deles.
A Igreja Universal tem feito sua incursão no mundo de forma complexa,
mimetizada e segmentada. Estabeleceu empresas em diversos ramos de negócio, participa
da indústria cultural, com jornal e emissoras de televisão e rádio, comunica-se na
linguagem dos diversos públicos e recorre aos mesmos artifícios de marketing dos
concorrentes em cada setor de negócios nos quais atua. Deste modo, reserva horários para o
proselitismo religioso, com produção de qualidade compatível com o público que pretende
atingir. Assim, consegue atrair espectadores e ouvintes, seduzir consumidores para seus
produtos, obter retorno financeiro, gerar lucro, e ganhar adeptos para a Igreja. Ou seja,
emprega um marketing agressivo, de acordo com o melhor figurino. Os recursos são
canalizados, também, para o projeto de reino divino que ela concebeu, pois, como qualquer
igreja, ela tem teologia e teodicéia próprias. Talvez esse projeto não seja tão divino na
perspectiva dos seus críticos, devido à efetiva instrumentalização de meios materiais, que a
IURD mobiliza em sua estratégia de crescimento e conquista de mercados.
A Universal é uma igreja que apresenta imensa plasticidade de criação e ofertas para
sua clientela. A cúpula da Igreja, em si mesma, funciona como vanguarda na produção de
mercadorias simbólicas, tanto nos templos como na mídia, fazendo sintonia entre estes
espaços, sempre que possível. Por exemplo, em junho de 2006, quando as congregações
locais em todos os templos estavam em campanha evocando a epifania de Moisés no monte
Sinai, relativa ao recebimento das tábuas da lei, a Torá dos judeus, na mesma ocasião o
programa Repórter Record exibia programação especial rememorando a suposta trajetória
dos hebreus pelo deserto da Arábia, desde a saída do cativeiro no Egito até a chegada ao
referido monte, com produção esmerada de jornalismo cultural.
A Assembléia de Deus, que também tem emissoras de rádio e uma rede de
televisão, reproduz linguagem e modo de ser intra-muros nos programas que propaga em
mídia aberta. Ao contrário da IURD, a comunicação midiática da AD se apresenta apenas
como instrumento para ampliar a propagação de cultos e outras atividades que acontecem
nos templos, ou como uma alternativa de programação aos outros canais, a fim de que seus
membros deixem de assistir e ouvir as televisões e rádios “dos ímpios”. Em resumo, os
218
assembleianos não desenvolveram faces distintas de interlocução com a sociedade,
característica esta bastante forte em práticas da Universal.
Ao se credenciarem com seus trunfos no cenário político potencial eleitoral e
votos de “bancada” as igrejas pentecostais têm conquistado concessões de rádio e
televisão. No caso da AD, a situação é ambígua: um grupo de emissoras encontra-se sob
comando da denominação, mas outra parte, a maioria, é controlada por famílias de líderes
pentecostais. No caso da Igreja Universal, os interlocutores externos, seja governo,
oposição ou qualquer outro, sabem que estão lidando com uma igreja que controla uma
grande rede de televisão aberta, com cobertura nacional e internacional, a Record, além de
outras menores, Rede Mulher (nacional) e Rede Família (no Estado de São Paulo).
3.3.2 Mobilização de recursos
As lideranças pentecostais recorrem a motivações, apelos e estratégias para
mobilizar pessoas e captar recursos em benefício de suas organizações. A política passou a
ser um campo de ação fecundo para este exercício. Antes os pentecostais evitavam a
política como coisa suja, espaço do “reino das trevas”. Agora ocupam-na como lugar de
recursos a serem resgatados para o “reino da luz”, representado por suas denominações
religiosas. A luta continua sendo espiritual, mas com efeitos bem materiais. O fato de
estarem presentes na política não modificou para eles a natureza diabólica deste campo. A
missão dos representantes pentecostais é, principalmente, resgatar recursos “das trevas”
para o benefício de suas corporações. Na cultura política brasileira isto é apenas mais uma
modalidade de patrimonialismo, com dimensão corporativa.
Apesar dessa vinculação à tradição patrimonialista brasileira, a participação das
instituições pentecostais na política acontece de forma democrática, pois elas atuam
respeitando as regras do jogo. Se os pentecostais têm sido apanhados em corrupção e outras
práticas viciadas, este é um aspecto que os iguala a outros péssimos agentes da sociedade
política, mas não os deslegitima, pelo contrário, os confirma, na condição de integrantes do
sistema.
219
Exemplos da mobilização de recursos advindos dessa participação política são
inúmeros, mas um é bastante expressivo. As cúpulas das igrejas Universal e Assembléia de
Deus Madureira se uniram para formar, em julho de 1993, o Conselho Nacional dos
Pastores do Brasil (CNPB), um órgão de ataque à Associação Evangélica Brasileira
(AEVB), formada por evangélicos de centro-esquerda. O CNPB parecia querer se tornar
um equivalente evangélico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), voz
pública dos bispos católicos romanos, embora fosse notória a incapacidade de seus
mentores em alcançar clérigos fora das duas igrejas, ou seja, continuariam de fora pastores
da maioria de igrejas e denominações evangélicas. Apostavam, talvez, na ignorância dos
de fora” do mundo evangélico, para se apresentarem como representação desse amplo
segmento, onde houvesse chance de assim procederem.
A tendência a emprestar importância indevida ao Conselho de Pastores, fruto de
indução promovida por seus próprios organizadores, pode ter dado certo, em algumas
situações. O fato é que, seja ou não devido a isto, o governador Joaquim Roriz doou um
terreno de 123.312 m2 no Setor de Mansões do Distrito Federal, para que o CNPB
construísse sua sede nacional, um auditório para 15 mil pessoas, estúdios de rádio e
televisão, editora e outras instalações. Na época, o deputado federal Benedito Domingos, da
AD Madureira, escudeiro fiel do pastor Manoel Ferreira, era o presidente nacional do
mesmo partido de Roriz, o PPB (Partido Progressista Brasileiro), sigla também de Paulo
Maluf, Francisco Dornelles e Delfim Netto.
469
Nos anos seguintes, esses órgãos de representação, AEVB e CNPB, perderam
substância, o que permite a qualquer observador reafirmar a realidade fragmentada do
universo evangélico, incapaz de formar sólidos instrumentos de representação. Além disto,
a AEVB, porém muito mais o CNPB, expressava iniciativa personalíssima de líderes
carismáticos, cujo interesse não era a construção de movimentos de base, para ajudar na
469
Um assessor do Grupo de Assessoria aos Parlamentares Evangélicos informou no dia 16/10/2006 que o
terreno não foi invadido e continua em poder da Assembléia de Deus Madureira. Existe, de fato, projeto
técnico para construção. A mesma fonte acredita que “com a eleição do Senador Paulo Otávio a Vice-
Governador e com a permanência do Benedito Domingos como [deputado] distrital, haverá condições de
construção no local”. E mais, com a eleição para deputado federal de Manoel Ferreira, bispo-presidente da
AD referida, haverá “motivação maior para que as obras sejam logo iniciadas.
220
organização política do imenso contingente de pessoas abrigadas em igrejas pentecostais,
neopentecostais e, em geral, evangélicas do Brasil.
Existem, também, órgãos como os Conselhos de Pastores e Ordens de Ministros
Evangélicos em diversas unidades da Federação brasileira. São associações classistas,
constituídas para servirem aos clérigos evangélicos, mas, na ausência de outras associações
representativas do conjunto maior, vez por outra se tornam representantes ad hoc do
universo evangélico, acionadas por autoridades públicas, embora careçam de legalidade e
legitimidade para exercerem tal função. Segundo informa Campos, há “um Conselho
Interdenominacional dos Ministros Evangélicos do Brasil, presidido por Silas Malafaia,
[com] função pública em eventos de caráter eleitoreiro”.
470
Certamente é mais fácil lidar com uma instituição como a Igreja Católica, do que
lidar com um campo tão pulverizado, como é o evangélico. Entretanto, independente disto,
o fato é que os agentes da política precisam acostumar-se com a presença destes novos
atores. Os desempenhos eleitorais da IURD e AD atestam que ambas são instituições bem
sucedidas no campo da política. A mensagem eloqüente para políticos mais antigos é que
precisam rever seus paradigmas em face desta nova variável eleitoral. A capacidade de
mobilização dos pentecostais para eleger seus representantes, com vistas a atuarem,
principalmente, em prol de interesses corporativos, pode ser avaliada na Tabela 4, que
apresenta relações entre quantidade de parlamentares e contingente presumível de membros
de cada denominação representada no Congresso:
470
CAMPOS, 2006, p.54, nota 39.
221
Tabela 4 Parlamentares por denominação, quantidade de membros e índice de
representação por milhão de fiéis (legislatura 2003 2007)
471
Denominação (*) Quantidade de
parlamentares (A)
Quantidade de membros
(milhões) (B)
Índice de representação
(A/B)
Assembléias de Deus 23 8, 4 2,7
Igreja Universal 17 2,1 8,1
Igrejas Batistas 10 3,1 3,2
Igreja Quadrangular 4 1,3 3,1
Outras (**) 10 11,3 0,9
TOTAL 64 26,2 2,4
Fonte: Congresso Nacional (em junho/2004) e Fundação IBGE (censo 2000).
(*) Foram discriminados os grupos evangélicos que elegeram maior número de parlamentares: representantes
do pentecostalismo tradicional (AD), idem do pentecostalismo da segunda fase (IEQ), representantes do
protestantismo de missão (IB) e uma denominação do neopentecostalismo (IURD)
(**) Inclui: Presbiteriana (2 parlamentares), Luterana (2), Sara Nossa Terra (2), Internacional da Graça (1),
Adventista (1), Maranata (1) e Metodista (1).
A análise da tabela acima junto com a relação nominal de deputados evangélicos
que permitiu sua construção (cf. anexos), permite que sejam feitas algumas observações:
As Assembléias de Deus, maior grupo evangélico brasileiro, têm uma representação
de 2,7 parlamentares federais para cada milhão de assembleianos, portanto apenas
um pouco acima da média do conjunto de evangélicos brasileiros (2,4) e,
relativamente, abaixo da representação com que contam os batistas (3,2).
Considerando que as denominações batistas não fazem política corporativa, pois
ainda predomina nessas igrejas o princípio da autonomia entre política e instituição
religiosa, é possível que a grande presença registrada não resulte em benefícios
471
A Tabela 4 foi elaborada com anacronismo, pois a quantidade de parlamentares se refere a junho de 2004 enquanto a
população evangélica foi extraída do censo de 2000. Não foi possível obter números precisos sobre os parlamentares evangélicos
em 2000, para comparar com populações do último censo, nem se dispôs de taxa de crescimento de cada grupo religioso, entre
2000 e 2004, para trabalhar com uma alternativa, que seria estimar a população para 2004, compatibilizando-a com a quantidade
de parlamentares no mesmo ano. Apesar desta inconsistência, referida tabela permite que sejam comparados os índices de
representação entre os grupos religiosos, conforme se deseja.
222
corporativos, diferentemente do que ocorre com a atuação de parlamentares
assembleianos e respectivas corporações.
Entre os nove deputados batistas: quatro pertencem ao PT, dois ao PL e outros são
filiados ao PFL, PP, PDT, sendo um em cada partido. O único senador batista
pertence também ao PL. A eleição desses parlamentares se deveu mais a esquemas
eleitorais e apoios de bases alheias a projetos corporativos de igrejas, pois isto
(ainda) não existe no mundo batista, embora a votação de alguns tenha um
componente importante captado em congregações do grupo religioso em destaque.
A Igreja do Evangelho Quadrangular tem projeto corporativo eleitoral. Neste
sentido, a atuação dos 3,1 parlamentares para cada milhão de fiéis destina-se a gerar
benefício efetivo para a denominação, o que não se pode afirmar no caso dos
batistas, mesmo com um índice de representação um pouco maior (3,2). Sendo a
Quadrangular uma igreja bem menor que as Assembléias de Deus, tem, contudo, a
característica de ser uma corporação nacional mais coesa. Deste modo, pode contar
com o grupo de parlamentares que elegeu quase da mesma forma como a Universal
utiliza sua “bancada”. A Quadrangular, porém, não tem uma estrutura tão
concentrada num bispo como é o caso da IURD. As decisões nacionais da IEQ
dependem de uma cúpula que leva em conta, em graus variáveis, o poder de
lideranças regionais.
A Igreja Universal se coloca à frente de todas as demais, como corporação super-
representada no Congresso: 8,1 parlamentares para cada milhão de fiéis.
Considerando o Congresso como um todo, com 594 parlamentares, e a população
brasileira com 169,5 milhões de habitantes (IBGE, censo 2000), o índice de
representação nacional seria de 3,5 parlamentares para cada milhão de habitantes.
Neste caso, a população da Igreja Universal conta com mais do dobro de
parlamentares que o cidadão brasileiro tem à sua disposição, (ou seja, 2,3 vezes a
média brasileira). Portanto, em termos relativos, a “bancada” da IURD é o mais
forte lobby a serviço de um grupo religioso, no parlamento do Brasil.
223
3.3.3 Capitalização política
Os candidatos da Assembléia de Deus são geralmente detentores de capital familiar,
pois são pastores ou pertencem a algum clã de pastores, na condição de genros ou filhos de
pastores-presidentes. Quando não se trata de capital familiar, impera mesmo o capital
econômico: a escolha recai sobre um candidato-empresário, que geralmente ajuda a igreja
com seu dízimo ou ofertas. Outros são portadores de carismas, como cantores e pregadores-
evangelistas, ou reúnem algumas dessas características em diferentes graus. Em todos os
casos, têm que cultivar relacionamentos e fazer acordos com o colegiado de pastores, para
se tornarem “candidatos oficiais” da igreja.
Conforme mencionado, a Assembléia de Deus prestigia e recompensa, com
indicação para ser seu candidato, o leigo empresário que ajuda a igreja com bens materiais.
Muitos deles fazem parte da Associação dos Homens de Negócio do Evangelho Pleno
(Adhonep)
472
. São pequenos comerciantes e empresários de porte econômico variado,
funcionários públicos e profissionais liberais. Em que pese a Assembléia ter muitos pobres
em seu meio e contar com alguns poucos em militância sindical e movimentos populares,
não considera a atuação política um requisito desejável para a escolha dos seus “candidatos
oficiais”. Para a liderança da igreja, é preferível que seus escolhidos não tenham tal tipo de
envolvimento, porque consideram que o compromisso com outras organizações da
sociedade civil pode inviabilizar a fidelidade aos interesses corporativos da denominação.
A Assembléia de Deus e a Igreja Universal têm transformado carisma eclesial em
capital político. Vale dizer, o eleitor, membro ou freqüentador fiel, vota no “candidato da
igreja”, porque ele confia na instituição e quer ajudá-la, expandindo-a para o espaço
político. O carisma do candidato e o partido têm pouco peso entre os fatores que decidem o
voto. O que influi mais intensamente é o carisma da instituição. Em alguns casos, pode
existir escolha entre dois ou mais nomes lançados pela denominação, mas até isto é difícil,
472
A Adhonep “foi fundada nos EUA em 1952 por Demos Shakarian, um próspero empresário americano de ascendência
armênia. Depois, o trabalho cresceu e se espalhou pelos cinco continentes. Atualmente a Associação está presente em mais de 120
países. Só no Brasil, a Adhonep conta com mais de 700 capítulos, nome dado às unidades associativas que a integram. Reunindo
empresários, profissionais liberais e autoridades civis e militares, a Adhonep tem como objetivo permitir que amigos compartilhem
vitórias, sucessos, oportunidades e experiências pessoais com outros amigos”. (Extraído de
http://www.evangelica.com.br/Artigos/artigos.painel.asp?tp=185&sg=52, acesso em 11/10/2006).
224
pois ao definir a estratégia eleitoral a coordenação política da igreja também decide em
quais distritos cada candidato será destacado para angariar votos.
A estratégia de candidatura oficial, com escolha pela cúpula de bispos, no caso da
IURD, ou mediante processo seletivo que envolve uma triagem dos pré-candidatos e
votação por um colégio eleitoral de pastores, prática observada na Assembléia de Deus do
Pará, em 2000, está consistente com a visão de mundo dessas igrejas e com a organização
autoritária que sustentam. As cosmovisões pentecostal e neopentecostal interpretam o
mundo como “reino das trevas”, no qual a igreja deve fazer incursões para resgatar pessoas,
bem como, também, seqüestrar recursos e oportunidades, os quais serão aplicados em
projetos da própria instituição. O raciocínio é simples e pode ser resumido no seguinte
argumento pentecostal: “Sabemos que ‘o mundo jaz no maligno’, logo todas as pessoas e
bens que nossa igreja puder resgatar das mãos do inimigo serão usados no reino de Deus.
Portanto, é melhor que esses recursos sejam gerenciados pelo povo escolhido do que pelos
ímpios”. A tese “irmão vota em irmão” é mais precisamente definida como: “irmão vota em
irmão, desde que este seja um candidato da nossa igreja”.
Uma constatação cada vez mais evidente é que os segmentos pentecostais e
neopentecostais são hoje, no Brasil, de fundamental importância, capazes mesmo de
decidirem uma eleição. Interessante que IURD e PT se aproximaram, nas eleições de 2002,
com o discurso da “ética em governar”. A essa bandeira, a Universal propagava, também,
seu compromisso com os pobres, através de atividades da Associação Beneficente Cristã e
Projeto Fazenda Canaã. No ocaso do primeiro governo Lula, em 2006, a IURD e o PT
compartilharam, adicionalmente, a experiência comum de terem alguns de seus líderes
envolvidos em escândalos.
Toda essa movimentação dos pentecostais e neopentecostais no cenário político
brasileiro era previsível, a partir da constatação do seu crescimento.
473
Segundo Campos:
A politização de uma Igreja é uma conseqüência natural da multiplicação dos espaços
sociais ocupados por ela na sociedade, do aumento da concorrência no campo religioso e da
473
De acordo com recenseamentos da Fundação IBGE, os católicos diminuíram, em termos relativos, de 95,2 % (em 1940) para
73,8 % (em 2000), enquanto os evangélicos aumentaram de 9,1 % (em 1991) para 15,5 % (em 2000). Este crescimento se
verificou, principalmente nas duas últimas décadas, nos segmentos pentecostais e neopentecostais.
225
multiplicação de seus interesses patrimoniais, financeiros e burocráticos, que inicialmente
seriam considerados meramente mundanos pelos empreendedores iniciais ou seus
fundadores.
474
Um fato, talvez, menos previsível seria o envolvimento desses políticos em
escândalos de corrupção, se forem considerados, apenas, os discursos deles, como
justificativa para defenderem a presença de representantes evangélicos nos parlamentos.
Todavia, ao ser feita uma análise à luz de características da cultura política brasileira,
reproduzidas em práticas internas dessas igrejas, tais como a direção autoritária, o espírito
corporativo em detrimento do interesse coletivo, e, principalmente, o nepotismo, um caso
particular da lógica patrimonialista brasileira, tão comum no meio pentecostal, não
surpreenderia ao observador a afinidade eletiva
475
desses políticos com esquemas de
corrupção. E isto é comprovado pelo indiciamento de vários deles em CPIs. Alguns
reconheceram a força das provas de seus delitos, quando renunciaram ao mandato, como
foi o caso do ex-bispo Rodrigues, enquadrado no escândalo do “mensalão”, pela Comissão
de Ética da Câmara e na CPMI que investigou superfaturamento de ambulâncias adquiridas
com verbas individuais de parlamentares.
476
Ao renunciar para fugir de uma possível
condenação, o ex-bispo não contava com a possibilidade de vir a ser criada a CPMI dos
sanguessugas, que o atingiu sem proteção da imunidade parlamentar. Deste modo, Carlos
Rodrigues foi preso, para responder processo por envolvimento em quadrilha fraudadora
dos cofres públicos. O tema da participação de parlamentares evangélicos em esquemas de
corrupção é tratado no último capítulo deste trabalho.
474
CAMPOS, 2006, p. 81.
475
Sobre afinidade eletiva, escreve Löwy: “O itinerário desse termo é curioso: vai da alquimia à sociologia,
passando pela literatura romanesca. Tem por padrinhos Alberto, o Grande (século XIII), Wolfgang Goethe e
Max Weber. Em nossa utilização do conceito, tentamos integrar as diferentes acepções de que a expressão se
impregnou ao longo dos séculos. Designamos por ‘afinidade eletiva’ um tipo muito particular de relação
dialética que se estabelece entre duas configurações sociais ou culturais não redutível à determinação causal
direta ou ‘influência’ no sentido tradicional” (LÖWY, Michael. Redenção e utopia. São Paulo: Cia. das
Letras, 1989, p. 13, grifos no original).
476
Esta CPMI do superfaturamento das ambulâncias instalou-se em junho de 2006 e tornou-se conhecida como a CPMI dos
“sanguessugas”. Há mais informações sobre essa CPMI no capítulo 5 desta tese.
226
3.4 Mentalidade e valores éticos em comportamentos
pentecostais.
A prática política dos pentecostais se apresenta em consonância com o que tem
acontecido nas sociedades contemporâneas, onde identidades coletivas intermediam a
relação Estado Indivíduo, fato reconhecido por Norberto Bobbio, ao afirmar que “os
grupos e não os indivíduos são os protagonistas da vida política numa sociedade
democrática”
477
.
3.4.1 Mentalidade e ética
A agilidade das igrejas pentecostais para ocuparem espaços na política em contraste
com a apatia das protestantes históricas pode ser interpretada com o auxílio de chaves
hermenêuticas da própria política e da teologia. As denominações pentecostais adotam
comando autoritário, exigem consenso teológico e exercem maior controle sobre a vida
cotidiana dos membros. Parte deste consenso e controle está na ideologia de que “o crente
vive na luz”, enquanto “o incrédulo vive nas trevas”. Como corolário deste raciocínio
resulta para o fiel que “é melhor votar num crente do que escolher um ímpio”.
Igrejas do protestantismo histórico receberam forte influência do liberalismo
clássico, fenômeno que não se verificou com igrejas pentecostais, devido, principalmente,
serem formadas de grandes contingentes populacionais à margem das benesses da
sociedade. Sabe-se que, na concepção liberal, a escolha política é assunto do indivíduo
como pleno exercício de sua liberdade, ou, em outras palavras, trata-se de assunto de foro
íntimo, portanto, a escolha de candidato deve passar pela consciência de cada um. Também
concorre para isto a idéia, ainda vigente, de que religião trata de coisas espirituais, enquanto
política lida com questões materiais. Nesta perspectiva, é bom que ambas não se misturem,
pois o sagrado não deve ser contaminado pelo profano. Os pentecostais também adotam
esta dicotomia, mas a contornam, na medida em que tratam seus candidatos como
“missionários” credenciados pela igreja para levarem o testemunho do evangelho ao meio
político.
477
Cf. BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986, p. 23.
227
A ética aplicada pelos políticos pentecostais não elabora adequadamente a relação
entre o que é público e o que é privado. Em alguns casos, interesses menores se sobrepõem
aos maiores. O autor da emenda para prorrogação do mandato de Sarney, Mateus Iensen,
foi autor de outra emenda polêmica, sobre abolição de direito autoral para músicas com
letra baseada em textos bíblicos. A ética pública da Assembléia de Deus pode ser avaliada
nos dois casos: para a emenda dos cinco anos de Sarney não houve crítica, embora atingisse
todo o povo brasileiro, visto que ela era apresentada em troca de uma emissora de rádio
para a igreja. Já a emenda da abolição do direito autoral foi criticada severamente, porque
feria interesses de alguns compositores evangélicos. Posteriormente, verificou-se que a
emissora de rádio concedida nem sequer ficou sob controle da igreja, mas em poder da
família do deputado, o que gerou reclamações de outros líderes da AD contra Iensen.
478
É importante assinalar aqui a forma como a Igreja Universal se comporta em relação
ao Estado, com variações de comportamento que oscilam em função de interesses
patrimoniais e mercadológicos da corporação. A Universal aproximou-se de Fernando
Collor, durante o período de aquisição da Rede Record. Este esforço, porém, não impediu
que a emissora e demais empresas da Igreja fossem fiscalizadas pelas delegacias da
Receita, Polícia Federal e outras agências do governo, por conta de suspeitas e denúncias de
sonegação fiscal, crimes de colarinho branco e outros ilícitos. Seu líder máximo, bispo Edir
Macedo, foi preso entre 24 de maio e 04 de junho de 1992. Na ocasião, recebeu
solidariedade do pastor Nilson Fanini, conhecido líder batista.
479
Quando aconteceu o ocaso
político do presidente Collor e o desfecho da sua aventura política na grande operação
popular de impeachment, foi fácil para a IURD (e também para outros grupos pentecostais
e neopentecostais) indicar “a causa” dessa derrota: Collor estava envolvido com “cultos
478
Jornal do Brasil, 20/6/1988.
479
Nílson Fanini foi presidente da Convenção Batista Brasileira e da Aliança Batista Mundial. No socorro ao bispo Edir Macedo
ele provavelmente estava retribuindo um enorme favor que o bispo da Universal lhe fizera, ao livrá-lo das dívidas da falida TV
Rio, na qual constava como proprietário. Bispo Edir Macedo adquiriu este canal de televisão, através de um “contrato de gaveta”,
em 1992, visto que a concessão em favor de Fanini ainda não havia expirado. Segundo reportagem da Folha de São Paulo em
18/07/1999, “A TV (que, na época, se chamava Rádio Difusão Ebenezer) pertencia ao bispo (sic) Nilson do Amaral Fanini, da
Primeira Igreja Batista do Niterói (RJ), e ao empresário e ex-deputado federal Múcio Athayde. Certidões do 1º Ofício de Registro
de Títulos e Documentos do Rio mostram que a venda foi efetivada no dia 28 de fevereiro de 1992, embora a transferência do
controle só tenha sido autorizada pelo Ministério das Comunicações em 1996. A compra foi feita em nome de Alba Maria Silva da
Costa, Claudemir Mendonça de Andrade, José Fernando Passos Costa, José Antônio Alves Xavier, Márcio de Araújo Lima e João
Monteiro de Castro dos Santos, que freqüentavam o templo do bairro da Abolição, na zona norte do Rio. De acordo com as
certidões, eles se comprometerem em pagar Cr$ 18,8 milhões (cerca de US$ 11,7 milhões) em 15 parcelas mensais pela emissora e
ainda assumiram dívidas da empresa. No total, a TV custou US$ 20 milhões, segundo confirma o superintendente da Rede
Record, Dermeval Gonçalves. Xavier. Um dos seis sócios, disse à Folha que só emprestou seu nome para a operação”.
228
satânicos” e “entidades das trevas”. A Universal não só diagnosticava a derrocada de
Collor, mas justificava sua mudança brusca de outrora aliada collorida para fervorosa
participante da marcha nacional que gritava em coro o “fora Collor!”.
No campo da política, a Universal, que havia sido sistematicamente a igreja mais
agressiva contra o Partido dos Trabalhadores, nas eleições presidenciais de 1989 e 1994,
operou uma autotransformação acelerada (e quase instantânea), que a qualificou para ser
aliada do projeto petista de poder, vitorioso nas eleições de 2002.
480
Depoimento do ex-
bispo e então deputado Carlos Rodrigues explica este processo de mudança tão radical.
Devido a supostas perseguições do governo FHC à Igreja, a Folha Universal passou a fazer
uma cobertura crítica do governo tucano e a não apoiar sua reeleição já em 1998. Todavia,
a opção por Lula somente veio a ocorrer na campanha seguinte, em 2002. Mas a construção
desta aliança tem uma história, assim relatada pelo referido líder da IURD:
Há coisa de seis anos atrás, o Lula me procurou, junto com o Cristovam Buarque, e disse
para mim... ( O encontro foi no edifício aonde o PT tinha um escritório, aqui no centro da
cidade, em Brasília)... junto com o Cristovam que era governador, na época. Me disseram o
seguinte. O Lula me disse: “Você tem que me ajudar. Os evangélicos, a Igreja Universal,
têm que me ajudar a mudar esse País. Tem que mudar essa Nação”. Eu disse a ele na
época eu não era parlamentar, eu era bispo da Igreja Universal em Brasília Eu disse a ele
que nós... não estava na nossa hora. Ainda não era hora da gente fazer uma política
partidária, mas que ele aguardasse. Eu me elegi deputado federal e fui oposição ao Fernando
Henrique. Não ao Fernando Henrique, ao governo, é... ao governo que não mudou nada em
nosso País, pelo contrário. Então, eu é... cheguei aqui [na Câmara] e comecei a fazer uma
mudança. A levar muitos evangélicos para a oposição ao governo Fernando Henrique,
mostrando que havia um preconceito, uma discriminação, contra o povo evangélico... O
governo tinha um pacto com a elite do País, os pobres não tinham nenhum valor, mostrando
que a maioria do povo evangélico gemia debaixo daquele governo, um governo que tinha
uma clara aliança com o capital, com os poderosos, com a elite, com os grandes banqueiros,
grandes empresários. É, porque o governo Fernando Henrique não era um governo que iria
levar a nação à prosperidade, é, como um todo, exceto certos grupos que ficaram mais e
mais ricos no nosso País, que é o que a gente está vendo hoje. Bom, levei, é, fiquei nesses
quatro anos na oposição ao Fernando Henrique e comecei a crescer o Partido Liberal,
480
Sobre o comportamento pentecostal e neopentecostal nas eleições de 1989 a 2002, cf. CAMPOS, 2006, p. 29-89.
229
sempre nessa vertente de trabalhar para fazer uma aliança com os socialistas, com a
esquerda.
481
O discurso de políticos da IURD apela para a “guerra espiritual”, como chave de
interpretação da realidade. Corrupção, falcatruas, dificuldades na aprovação de projetos
benéficos para a Igreja e mesmo para a sociedade como um todo, ou seja, quaisquer
obstáculos para que prospere a obra, que eles interpretam como expressão da “vontade
divina”, constituem-se ações de espíritos malignos ligados à política. São sugestivas
declarações de Carlos Rodrigues para a Folha Universal, em 18/01/1998, quando ele
afirmou: “O diabo está alojado dentro do Congresso Nacional, criando leis injustas e
erradas”. O Jornal do Brasil, algum tempo depois (em 29/10/2001), registrou o seguinte:
“Os espíritos que atuam na política, disse recentemente o Bispo Rodrigues, são os espíritos
dominadores, os príncipes das trevas”. Neste contexto de “guerra espiritual” torna-se lógico
para os fiéis dessa igreja que votar num servo de Deus é estar contribuindo no combate
contra os demônios que controlam a política do País. Portanto, mais do que um dever
cívico, trata-se de oportunidade para defender o bem e destruir as forças do mal. A IURD
produz uma re-significação do voto no âmbito cosmológico da guerra santa entre o divino e
o demoníaco, conforme análise de Pablo Séman.
482
3.4.2 Moralismo e intolerância
A defesa da família tem sido a grande bandeira dos pentecostais nos parlamentos.
Pesquisadores estrangeiros, como David Martin e David Stoll juntos com o próprio Freston,
encontraram um componente revolucionário antimachista no pentecostalismo.
483
Neste
particular, contrapondo-se à opinião de Pierucci, que identificou um sentido patriarcal de
família entre os pentecostais
484
, Freston escreveu: “a essência do conceito pentecostal de
família não é o patriarcalismo, mas o antimachismo”.
485
481
Entrevista do deputado Carlos Rodrigues em seu gabinete na Câmara Federal. Brasília, 17 de junho de 2004.
482
Cf. SÉMAN, Pablo. A Igreja Universal do Reino de Deus: um ator e suas costuras da sociedade brasileira contemporânea.
Debates do NER, nº 3, PPGAS/UFRGS, Porto Alegre, setembro/2001, p. 87-96.
483
Cf. MARTIN, David. Tongues of fire: the explosion of protestantism in Latin American. Oxford: Blackwell, 1990, p. 181-2;
STOLL, David. Is Latin América turning protestant? Berkeley: University of Califórnia Press, 1990, p.318-9; e FRESTON,
1994: p. 76.
484
Cf. PIERUCCI, Antônio Flávio de Oliveira. Representantes de Deus em Brasília: a bancada evangélica na Constituinte. In:
PIERUCCI; PRANDI, 1996, p. 163-191.
485
FRESTON, 1994: p. 76.
230
Trata-se de uma visão idílica desses grupos religiosos. Basta lembrar aqui alguns
fatos, que contrariam a opinião otimista sobre questões de família e gênero, nesse grupo
religioso: em primeiro lugar, a maior denominação pentecostal, a Assembléia de Deus, não
admite o exercício pastoral para mulheres; segundo, não são tão raros os casos de assédio
emocional e sexual que ocorrem no ambiente dessas igrejas, provocados por pastores, em
alguns casos punidos com suspensão, transferência
486
ou afastamento, e em outros,
simplesmente abafados; em terceiro lugar, há casos de agressão de mulheres pelos maridos,
em lares pentecostais.
487
Portanto, não se pode afirmar que existe uma “revolução
antimachista” entre os pentecostais. O que existe é um combate a costumes libertários,
embora isto, também, esteja arrefecendo, pois as novas gerações já não aceitam o “caminho
estreito” imposto pelas antigas, que consistia de inúmeras proibições quanto a vestuário,
lazer, bebida, manifestações artísticas e uma lista infindável, denominada por alguns
antigos assembleianos de um “conjunto de doutrinas” (sic). Por outro lado, há um reforço
ao poder do macho como cabeça da família, “assim como Cristo é o cabeça da igreja”
488
.
Na pauta dos parlamentares pentecostais, junto com a defesa da família, tem estado
sempre em evidência o combate à legalização do aborto, ao reconhecimento da união civil
entre homossexuais e à liberação das drogas. Esses legisladores também desejam coibir a
pornografia, principalmente nos canais abertos de televisão. Sotero Cunha, da Assembléia
de Deus, por exemplo, era intransigente no Congresso Constituinte quanto ao aborto legal,
não o admitindo nem mesmo em caso de estupro. Freston
489
e Pierucci
490
registram um
diálogo de Sotero com a senadora adventista Eunice Michiles:
Sotero: - Está provado cientificamente que a mulher pode evitar o estupro.
Eunice (rebatendo): - Mesmo com um revólver apontado para a cabeça?
486
A transferência de pastor para outra congregação tem sido tratada, ironicamente, como medida disciplinar, quando deveria ser
considerado um tipo de crime corporativo, pois o grupo que detém o poder acoberta, nestes casos, o infrator, isenta-o de punição
e ainda põe em risco outras mulheres e famílias.
487
Nas entrevistas realizadas em pesquisa de mestrado este problema aflorou, mesmo não estando previsto nas perguntas
formuladas aos entrevistados (BAPTISTA, 2002).
488
A frase citada pertence à epístola aos Efésios, atribuída a Paulo, cap. 5:22-23. Lá está escrito: “As mulheres sejam submissas ao
seu próprio marido, como ao Senhor; porque o marido é o cabeça da mulher, como também Cristo é o cabeça da igreja, sendo
este mesmo o salvador do corpo”. (Cf. BÍBLIA SAGRADA. 2. ed. revista e atualizada. Tradução de João Ferreira de Almeida.
São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993).
489
FRESTON, 1994, p. 77.
490
PIERUCCI, 1996, p. 185-6.
231
Sotero: - Bem, pode perder a vida, mas evitar o estupro... [Deste modo] a mulher morrerá
com honra.
Neste assunto o grupo pentecostal era mais alinhado com a orientação da CNBB do
que os próprios católicos. A “defesa da vida desde a concepção” recebeu voto favorável de
93% dos pentecostais, 46 % dos protestantes e apenas 22 % de todos os parlamentares.
491
A
exceção pentecostal era a deputada Benedita da Silva, filiada à Assembléia de Deus.
Baseada em experiência própria, ela explicava que quando era empregada doméstica, optou
por fazer um aborto “porque não tinha a menor condição de receber o [seu] filho naquela
época”.
492
Benedita defendia elevação de salários e implantação de creches, para melhorar a
condição da mulher pobre, e reconhecia a gravidade social do aborto clandestino, bem
como os fatores de miséria e pressão social que levavam a esse ato de desespero. Enquanto
os pentecostais eram tão enfáticos nessas questões ligadas a costumes, eram omissos e
insensíveis para os grandes problemas da injustiça social.
Neopentecostais e pentecostais, em geral, condenam a prática de homossexualismo
e discriminam os que revelam essa orientação homoerótica. Algumas igrejas, como a
Universal, atribuem tal comportamento à presença de “encostos”. Logo, nestes casos, a
solução é exorcizar os demônios que causam a suposta aberração. Alguns entendem que
legislar contra a prática homossexual contribuirá para reduzir sua incidência. Uns poucos
defenderam no Congresso Constituinte a igualdade de direitos para os homossexuais, como
atitude cristã de respeito ao cidadão, inclusive com leis de combate à discriminação.
Benedita da Silva, neste grupo minoritário, sofreu pressão de sua igreja, que na época ainda
era a Assembléia de Deus.
493
O Mensageiro da Paz, em setembro de 1987, acusava-a de
deixar “as determinações partidárias” falarem mais alto do que as convicções religiosas.
Para muitos pentecostais, incluir na legislação o combate ao aborto,
homossexualismo, droga e outros vícios, como a bebida e o cigarro, constitui-se uma forma
de afirmar que “o Brasil pertence ao Senhor Jesus”, ou seja, o grupo religioso mencionado
alimenta um sentido místico de resgatar a sociedade do “poder das trevas” para o “reino da
luz”, através do processo legislativo. Uma das contradições da atuação dos parlamentares
491
FRESTON, 1994, p. 77.
492
Apud FRESTON, idem.
493
Algum tempo depois do mandato de 1987-90, Benedita da Silva se filiou a uma igreja presbiteriana.
232
pentecostais está no fato de alçarem a defesa da família como prioridade, mas, ao mesmo
tempo, apoiarem políticas econômicas neoliberais que destroem essas mesmas famílias, na
medida em que geram amplo desemprego, sucateamento dos equipamentos públicos, falta
de verbas para educação, saúde e habitação e abandono das políticas sociais em geral.
494
Será que a conduta pentecostal na política ameaça o processo democrático, visto que
tende a estabelecer um corte religioso, onde a laicidade deveria ser defendida como valor
republicano?
495
Pelo que já foi discutido anteriormente, não existe um alinhamento
evangélico que justifique esse temor de que esteja em gestação uma guerra religiosa no
Brasil. Escaramuças podem ocorrer, como já ocorreram, mas têm sido esporádicas e de
pouco fôlego.
3.4.3 Pragmatismo e conservadorismo
Os evangélicos e mesmo os pentecostais constituem uma pluralidade em vários
sentidos. Pode-se reconhecer que há uma tendência a caminharem com forças governistas
de ocasião, mas devido à alternância destas, os grupos referidos têm apostado em diferentes
opções políticas. Tanto a AD como a IURD, fazem complexas avaliações, nas unidades
federativas da república brasileira, para decidirem quem irão apoiar e quais partidos
oferecerão melhores chances de vitória aos seus candidatos, isto a partir de cálculos de
quociente eleitoral, associados a estimativas de concentrações de votos para outros
concorrentes ao mesmo cargo do partido sob análise.
A Igreja Universal tem maior capacidade de aproveitamento do seu colégio eleitoral
porque este apresenta tendência menos dispersiva e revela maior obediência à orientação
emanada do comando religioso. Nas eleições para Presidente da República a IURD define
claramente sua opção e orienta as bases. No plano regional e em eleições proporcionais,
analisa cada caso e também orienta claramente seu eleitorado. Neste sentido, essa Igreja
age como um grande partido, com enorme poder de mobilização. Não existe interesse da
cúpula em discutir ideologicamente as motivações de suas escolhas, nem sequer entre seus
pares, até porque essas deliberações ocorrem por razões corporativas, do pragmatismo
494
FRESTON, 1994: p.117.
495
Esta questão também é discutida por Joanildo Burity no texto que tem sido citado. (Cf. BURITY, 2006, p.
192-202).
233
ligado ao fortalecimento do complexo organizacional que constitui o grande conglomerado
iurdiano.
Realmente, os dois grandes grupos religiosos, Assembléia e Universal, estão agindo
dentro do jogo democrático, com fiel respeito às regras deste. Portanto, tendem a contribuir
para a continuidade do processo. Não há sinais de desejarem criar qualquer projeto
alternativo de regime de governo. Pelo contrário, reforçaram no passado, pela inércia, mas,
a partir do Congresso Constituinte até o presente, por uma atuação bem estruturada,
continuam a fortalecer um tipo de democracia perpetuadora de desigualdades sociais, a
democracia que de fato se pratica no País. Neste sentido, assemelham-se ao padrão da
maioria dos agentes políticos, guiados pelo senso comum: são agentes conservadores
dentro da sociedade civil e da sociedade política brasileira, mesmo que não seja esta a
intenção consciente de alguns deles.
Isto remete para uma constatação registrada por Freston, em palestra plenária do I
Congresso da Associação Evangélica Brasileira: “A classe política evangélica se parece
muito com a classe política em geral. Nossos políticos não são os grandes vilões da história,
mas certamente também não são o sal da terra e a resposta para o Brasil”.
496
Burity amplia
este raciocínio, quando reconhece que a ética política de parlamentares e eleitores
evangélicos não é diferente da praticada pelo conjunto da população.
497
Eles não
constituem uma escola política, seja para formar quadros, seja para elaborar um projeto
para o Brasil. Exercem pouca influência nos partidos em que atuam e são pouco
influenciados pelas ideologias desses mesmos partidos, cujos programas funcionam mais
como requisito para preencher exigências legais do que para nortear a prática dos seus
filiados. São partidos gelatinosos, que se movem ao sabor das ondas dos oportunismos
políticos. O próprio Partido Republicano Brasileiro (PRB), por exemplo, criado por
iniciativa de próceres da Igreja Universal, não ostenta marcas distintivas que o aproxime de
“partidos cristãos” de outros países.
498
496
Essa palestra foi proferida em Brasília, no dia 22/07/1994. Submetida a “ligeiras alterações”, serviu como capítulo conclusivo
do livro FRESTON, 1994, p. 135-148.
497
BURITY, 2002, idem, 2006, p. 199.
498
Cf. http://www.tse.gov.br/partidos/partidos_politicos/prb/estatuto_prb_alterado.doc para conhecer programa e estatuto do
PRB.
234
Os parlamentares assembleianos e iurdianos não são dados a tomar posições
radicais. Eles se portam de forma pragmática, cautelosa e conservadora, ao mesmo tempo
em que apresentam avidez na obtenção de benesses para suas igrejas. Alianças e
alinhamentos entre eles e outros atores políticos ocorrem por troca de cargos e diversas
formas de retribuição que o governo possa oferecer. Circunstâncias locais e interesses
políticos regionais, de fora do meio evangélico, determinam algumas composições de
políticos pentecostais e neopentecostais com os caciques da política brasileira. Eles se
orientam pelo princípio maquiavélico de conquistar, manter e ampliar o poder, mesmo que,
talvez, não tenham lido O Príncipe.
499
Neste sentido, guardam semelhança com outros
políticos tradicionais, cujo padrão de fazer política é o patrimonialismo. Em suma, não
existe um voto qualificado evangélico no parlamento brasileiro, salvo exceções: nestes
casos, provêm de parlamentares ligados a partidos de esquerda, a maioria deles membros de
igrejas protestantes históricas. As poucas questões que unem os integrantes da Frente
Parlamentar Evaangélica são compartilhadas com outros grupos, inclusive o de
parlamentares organicamente católicos. Em geral, os políticos evangélicos são de pouca
expressão, motivo por que quase não figuram na relação dos mais influentes líderes do
parlamento brasileiro.
É possível afirmar que há correlação entre crença religiossa e comportamento
político. Se o processo de secularização avançou ou não no Brasil, trata-se de uma boa
discussão a ser feita; mas independente disto pode-se perceber que existe um senso comum
religioso capaz de influenciar a escolha do candidato, em algumas situações. Exemplo bem
conhecido foi a derrota de Fernando Henrique Cardoso para Jânio Quadros, na disputa ao
cargo de prefeito de São Paulo, em 1985. Na véspera da eleição o candidato-sociólogo
titubeou ao ser inquirido, pelo jornalista Boris Casoy, se acreditava ou não em Deus.
500
499
Existem diversas edições em português desta obra clássica do florentino. Cf. MAQUIAVEL, N. O príncipe. São Paulo: Nova
Cultural, 1987 (Os pensadores); São Paulo: Martins Fontes, 1995; idem, Rio de Janeiro: Letras e Artes, 1965; idem, Rio de Janeiro:
Vecchi, 1955.
500
O jornalista Carlos Lima descreveu a derrota inesperada de FHC da seguinte maneira: Certo da vitória,
FHC cometera, na ocasião, três erros básicos e imperdoáveis. Em entrevista ao jornalista Boris Casoy, FHC
disse não acreditar em Deus e admitiu que já tinha experimentado o cigarrinho do capeta, a maconha. O
terceiro e principal erro do ex-presidente foi a prepotência de sentar-se na cadeira do prefeito para ser
fotografado e divulgar na mídia. Janistas nem precisaram aproveitar o fato, limitaram à divulgação de
panfletos com uma cruz e a inscrição Cristão vota em Jânio e se encarregaram de propalarem a preocupação
235
O próprio Fernando Henrique, em entrevista a Cristovam Buarque, conta sua
versão:
CRISTOVAM: Pois é... Mas então, nessa sua idade o que é que preocupa mais?
FHC: Esqueçam que eu li... (Risos) O curioso é que a minha resposta sobre esse negócio de
Deus foi correta. Foi o Boris Casoy que perguntou a pedido da Folha. E ele fez a pergunta
correta. E eu disse: Olha, Bóris, eu fiz uma besteira... Porque eu tinha almoçado na Folha e
o Otavinho [Otávio Frias Filho, diretor editorial do jornal Folha de São Paulo] me disse: e se
lhe perguntassem se acredita em Deus? E eu disse: .Ninguém vai me perguntar isso. Então
ele mandou perguntar. Então quando o Bóris perguntou, eu disse: mas isso não tava no
combinado! dando a impressão de que havia uma combinação, mas não havia. Porque eu
tinha tido um almoço com eles lá. Então não havia combinação nenhuma. Então ele
perguntou e eu disse: Olha aqui, isso não é pergunta que se deva fazer a um candidato. Não
tem que perguntar ao candidato qual é a convicção dele, porque isso é uma coisa pessoal. Eu
não seria arrogante de dizer que não existe Deus, ou uma coisa desse tipo assim... O que
você tem que perguntar é se eu respeito as religiões. Porque o que o prefeito tem é que
respeitar todas as religiões e os que não tem religião. Essa foi a minha resposta. E isso foi
lido como se eu tivesse dito que não acreditava em Deus. Que eu era ateu. Mais grave que o
ateu, foi a maconha. Porque eu tinha dado uma entrevista para a Miriam Leitão na Playboy e
me perguntaram muitas coisas, inclusive sobre maconha. E eu disse: Olha, uma vez eu
estava em Nova York, num bar famoso que tem lá, em um banquete com meus primos,
primas e tal e alguém deve ter acendido um negócio de maconha, passou aquilo e eu achei
horrível... Um cheiro horroroso. Pronto, daí tiraram que eu era maconheiro. E o Jânio usou
isso... não ele, mas mandou usar, e distribuíram panfletos dizendo... Uma vez eu fui à cidade
de Tiradentes, na periferia de São Paulo, quase uma favela, e a mulher disse: Você vai
distribuir maconha no lanche das crianças? Na merenda das crianças? Isso foi terrível...
501
No caso das igrejas objeto desta pesquisa, tem-se um número significativo de
eleitores que votam segundo a orientação dos seus líderes religiosos: em maior
percentagem na Igreja Universal e em menor na Assembléia de Deus.
502
Existe,
da possibilidade da maconha ser misturada à merenda escolar. Não deu outra, São Paulo dormiu FHC e
acordou Jânio Quadros. Eu estava lá. Não votei no Jânio, mas o Jânio ganhou e, dessa vez, não renunciou. Fez
sim, desinfetar a cadeira que FHC tinha sentado. (LIMA, Carlos Alberto de.
http://www.diarionews.com.br/exibenoticia.php?id=15184, em 26/10/2004, acesso em 15/08/2006).
501
Entrevista realizada em Providence, EUA, em 7/11/2004. Este trecho foi extraído de
http://www.cebela.org.br/imagens/Materia/195-216%20entrevista%20fhc.pdf, acesso em 15/08/2006.
502
Não se tem conhecimento de pesquisa específica sobre este assunto, mas as quantidades de freqüentadores da IURD e da AD
comparada com a quantidade de parlamentares eleitos para a legislatura federal em 2003-2007 permite que se faça esta afirmação.
236
evidentemente, o eleitor autônomo, que formula sua escolha a partir de diversas variáveis.
Esta menor obediência relativa dos assembleianos aos seus líderes foi motivo de queixa do
deputado Francisco Olímpio, pastor da Assembléia de Deus em Pernambuco:
A nossa igreja não tem ainda aquela conscientização política de eleger representantes de sua
própria igreja, de seu segmento, isso é uma falha que com o tempo a gente vai corrigindo. [ -
Mas o senhor foi votado...] Fui votado em todos os municípios do Estado de Pernambuco.
Nós tivemos 10%, apenas 10% [dos votos de assembleianos], por essa falta de
conscientização. Nossa igreja, hoje, tem 700 mil membros [em Pernambuco]. É uma das
maiores igrejas do Brasil em termos de convenção. Porque lá só tem uma convenção. A
convenção da Missão. Hoje nós temos mais de 600 mil membros, a minha votação foi isso:
60 mil votos. Agora, provavelmente, terá, diante do trabalho, provavelmente a igreja agora
nos dará mais votos. [ - Tem diferença entre campanha da Assembléia e da Universal? Eu
acho que tem. Eu acho que tem o seguinte. Eu acho que a igreja evangélica Universal partiu
na frente e tem uma consciência política mais acurada hoje. Existem as exceções, existem
certas exceções. Mas você candidato de outra igreja, você não chega nem na porta da igreja
Universal, porque eles não aceitam. Já a nossa Assembléia de Deus: “Oh! Você veio nos
visitar?” coloca até a oportunidade... Alguns, né? Por exemplo, na Assembléia de Deus, eu
tenho uma igreja que tem o quê? 700 mil membros. Digamos que eu tenha 20%, certo? Se
eu tiver 20% de 700 mil, eu tenho 140 mil votos. Correto? A minha Universal tem 90 mil
membros. O candidato teve 90 mil votos. (É o Marcos de Jesus, lá de Pernambuco.) Certo,
certo? Quer dizer, eles estão mais... eles perdem junto com um só. Já o meu não, o meu, eu
tenho 20%. Saiu 80, 80 para quem é empregado da prefeitura, 80 de quem quer votar pra
não sei o quê (...) Mas é diferente da Igreja Universal. Elas fazem o comércio mesmo,
fechado: “Não entra ninguém aqui”. Nem na porta da igreja você distribui o material de
outro. Se for distribuir lá fora, o pessoal do Marcos de Jesus não aceita. Jamais vai chegar
ali e distribuir. É questão da cultura e da conscientização política.
503
A revista IstoÉ divulgou uma pesquisa, em 2002, que revelava pouca influência da
orientação do líder religioso na escolha do candidato pelo eleitor: apenas um em cada
quatro eleitores aceitava a indicação do seu líder eclesiástico na hora de votar.
504
Certamente esta proporção se eleva na IURD e, com percentual menor, na AD, mas em
nenhum caso isto vai determinar uma confessionalização do voto na sociedade brasileira.
A Universal, com apenas um quarto da quantidade de participantes da segunda, elegeu 18 deputados federais e um senador,
enquanto a Assembléia de Deus elegeu apenas 22 deputados e, também, uma senadora.
503
Entrevista com o deputado Francisco Olímpio, realizada em seu gabinete da Câmara Federal, em Brasília, 21/11/2005. Na
campanha de 2006, o pastor Francisco Olímpio foi candidato, mas não conseguiu ser reeleito.
504
Apud BURITY, 2006, p.200.
237
Voto é escolha complexa que se dá segundo uma conjunção de fatores, muitos deles
emergentes no momento da eleição. A religião comparece entre estes fatores, com maior ou
menor peso, conforme a trajetória de cada indivíduo. De qualquer maneira, os políticos da
Universal e da Assembléia sabem que devem respeitar os espaços sagrados, principalmente
se fazem uso deles em campanhas eleitorais. Convém manter a coesão da “comunidade dos
santos”. A palavra “santos”, empregada aqui, no sentido bíblico de separados ou
comprometidos com o serviço divino, ou seja, refere-se aos próprios membros de igrejas
evangélicas, conforme eles assim entendem.
3.5 Estratégias eleitorais e atuação de parlamentares
Pelo que foi tratado a pouco, justifica-se fazer uma análise mais ampla do tipo de
eleitorado nessas igrejas. Mais precisamente, elas podem ser caracterizadas como reduto
garantido de votos, sob manobra de seus líderes. São “currais eleitorais”? E quanto à
atuação dos parlamentares, eles constituem bancadas, no sentido rigoroso do termo, ou seja,
votam da forma que determinam suas igrejas?
3.5.1 Currais eleitorais
Tanto a Assembléia de Deus como a Igreja Universal, demarcam territórios
eleitorais como reserva de mercado do voto em favor da corporação. Os candidatos são
investidos pela cúpula da igreja para cumprirem uma “missão” nos parlamentos ou em
cargos executivos, nestes com menor freqüência. A demarcação de território tem os
seguintes significados: nos distritos previamente definidos pela liderança da igreja,
candidatos escolhidos fazem jus a uma divulgação ostensiva ou sutil, mas sempre
assegurada pelos dirigentes do culto; enquanto que candidatos membros da igreja, mas que
se lançaram de forma independente ou à revelia da cúpula, são ignorados quando adentram
nos templos, ou, na melhor das hipóteses, são apresentados como simples membros, sem
que seja feita referência a sua condição eleitoral. No caso de candidato não reconhecido que
faz propaganda nos arredores do templo, ele é considerado invasor de território e duramente
tratado como rebelde e oportunista.
238
Na Igreja Universal é quase impossível um candidato, sem “unção” da cúpula, ser
aceito pelos fiéis, pois a grande maioria destes acata de forma acrítica as determinações dos
bispos e pastores. Já na Assembléia de Deus aparecem, de vez em quando, bolsões de
resistência.
505
Segundo Machado, nas eleições de 2002, no Rio de Janeiro, a Universal
preferiu recrutar seus candidatos entre os membros da hierarquia religiosa e o processo de
escolha se deu por decisão do Conselho de Bispos.
506
No caso da Assembléia de Deus, o processo de escolha das candidaturas é feito da
seguinte maneira. Os interessados apresentam seus nomes ao Conselho Político, formado
de pastores da absoluta confiança do presidente da igreja. Este Conselho, que faz uma
triagem dos pré-candidatos, elimina grande parte deles e leva os remanescentes para a
cúpula da igreja autorizar a realização de um escrutínio no colégio eleitoral de pastores. Os
critérios usados na triagem incluem viabilidade eleitoral, mas, principalmente, a afinidade
do candidato com o grupo que detém o poder na igreja. Paralelamente, esse Conselho
define a quantidade de candidatos que vai lançar e examina os partidos que a igreja poderá
utilizar, com base em chances de cada legenda face ao quociente eleitoral para aquela
eleição.
Alguns aspirantes a candidato, que foram excluídos nessa triagem, se rebelam e se
lançam na campanha eleitoral, à revelia do Conselho Político da Igreja. Em casos
específicos, fazem isto porque representam anseios de dissidentes ou opositores do grupo
no poder. Outros, simplesmente, porque têm aspiração política e acreditam em seu
potencial de votos, geralmente insignificante. Esses tipos de candidatos acabam por se
constituírem um problema para o projeto corporativo da igreja. Exemplo disto foi a eleição
de 2002, para a Câmara Municipal, em Porto Alegre, quando a AD lançou dois candidatos
oficiais, mas teve dois outros oficiosos, e não conseguiu eleger nenhum. Oro escreveu a
propósito: “Os próprios líderes religiosos da Assembléia de Deus reconhecem que a
dificuldade de eleger os candidatos ‘oficiais’ deve-se ao fato de que outros membros da
505
Em Belém do Pará, nas eleições de 2000, ouviu-se relatos de formação de comitês eleitorais em prol de “candidatos rebeldes”.
Esses comitês eram formados por membros da AD que não acatavam recomendações da coordenação política da igreja. Em
alguns casos o “candidato rebelde” era preferido porque financiava a instalação do comitê nas residências, enquanto o “candidato
oficial” não dispunha de verba para essa finalidade.
506
MACHADO, Maria das Dores Campos. Evangélicos e as eleições de 2002 no Rio de Janeiro: as disputas pelo poder legislativo
em perspectiva. In: BURITY; ______ (orgs.), 2006, p. 108.
239
Igreja também se lançam candidatos, dividindo, conseqüentemente, os votos dos
irmãos”.
507
Os pretendentes escolhidos na seleção prévia, mas derrotados no colégio de
pastores, costumam ser mais dóceis, porque não foram rejeitados pelo núcleo poderoso da
igreja. De qualquer maneira, candidato não credenciado, que insiste em disputar eleição, é
repelido, quando tenta “invadir” territórios, conforme já foi explicado. Em geral, os
candidatos da igreja não devem fazer campanha ostensiva dentro dos templos. É suficiente,
prudente e de bom tom, comparecer às reuniões, pois os dirigentes de cultos irão anunciar
“a presença do nosso candidato” e convidá-lo para orar, fazer uma leitura de texto bíblico,
ou, apenas, para “dar uma palavrinha de saudação aos irmãos”. Fazer propaganda
convencional ou pedir voto no templo e no púlpito pode prejudicar o candidato, porque se
tratam de locais sagrados. Os que cometem este equívoco tendem a serem rejeitados pelo
eleitorado assembleiano.
Burity levanta questionamentos que são traduzidos aqui como relativização da
influência do carisma institucional sobre decisões políticas dos indivíduos pentecostais.
508
Será que a autoridade da igreja é tão eficaz a ponto de neutralizar outras influências? Trata-
se de uma força de comando sobre os fiéis ou existem outras vozes na babel evangélica, ou
no campo político como um todo, que também concorrem para a formação de opinião no
caso desses eleitores? De todo modo, diferentes comportamentos institucionais estão
presentes neste campo religioso, como ressalta Burity:
há igrejas pentecostais que não se envolvem com a política em nenhum sentido comparável
à IURD (ex. Deus é Amor, Congregação Cristã no Brasil), embora sejam clientelistas, como
há igrejas com grande sucesso eleitoral que são muito mais divididas em suas escolhas, ou
somente se unificam após trabalhosos processos de consulta e deliberação (como a
Assembléia de Deus). Ao mesmo tempo são igrejas que exercem forte controle sobre sua
membresia e conseguem traduzi-lo em formas majoritárias de comportamento político.
Neste sentido, o carisma institucional é importante, característico de grupos com tradição de
minoria ainda arraigada e organizacionalmente ainda muito próximos de uma estrutura
sectária, mas seus efeitos na política não são unidirecionais.
509
507
ORO, Ari Pedro. A Igreja Universal e a política. In: BURITY; CAMPOS (org.), 2006, p.132, grifo no original.
508
BURITY, 2006, p. 193-4.
509
BURITY, 2006, p.194-5.
240
As igrejas pentecostais brasileiras atuam numa sociedade aberta, mas conseguem
exercer quase um monopólio do tempo livre dos fiéis, através de cultos, atividades em
organizações internas da igreja, estudos de escola dominical, leituras de boletins e diversas
publicações (inclusive Mensageiro da Paz e Folha Universal), visitas a membros enfermos
e ou com outro tipo de problema e atividades afins. A influência das denominações
pentecostais sobre a vida do fiel é realmente gigantesca. Contudo, têm-se registrado
iniciativas de grupos minoritários na contramão dessa hegemonia da cúpula da igreja,
principalmente na AD, durante os certames eleitorais. Dissidentes conseguem promover
debates, formar comitês, produzir materiais de campanha e realizar panfletagem, em favor
de partidos de esquerda e candidatos rejeitados pelo corpo diretivo da denominação.
510
A conduta política de pentecostais e neopentecostais depende dos fatores já
mencionados, mas tem relação, também, com a possibilidade de novas e melhores
oportunidades de conquista, visto que a presença no espaço público habilita-os a
participarem dos jogos de poder, onde terão acesso a recursos aplicáveis na competição
religiosa. Neste campo, porém com menor peso, continuam a atuar evangélicos de
diferentes matizes (evangelicais, ecumênicos e protestantes diversos), formadores de
opinião, que também contribuem para diversificar o quadro dos comportamentos religiosos
na política.
Uma estratégia de discurso utilizada freqüentemente por candidatos novatos, ou
recém-egressos no jogo eleitoral, é a de desqualificar a chamada “classe política”. Tem sido
assim, por causa dos escândalos de corrupção que a sociedade brasileira vem assistindo,
desde tempos bem recuados, mas principalmente a partir de 1992, com o processo que
levou o presidente Collor ao impeachment. Embora muitos candidatos evangélicos tenham
estado no rol dos envolvidos em escândalos, como foi no Congresso Constituinte de 1987-
88 e no caso dos “anões do Orçamento”
511
, a propaganda antipolítica vinha sendo usada por
510
Foram acompanhadas iniciativas do gênero, em Belém (PA), de 1989 a 2002. Muitos assembleianos atuaram (e atuam) no
Movimento Evangélico Progressista (MEP) e se envolveram em sindicatos e partidos de esquerda, com significativa conquista de
espaço no âmbito interno das congregações da AD, principalmente no distrito de Icoaraci, região metropolitana da capital
paraense.
511
Entre 1989 e 1993, o Orçamento Geral da União era manipulado no Congresso por um esquema de
corrupção que incluía governadores, ministros, senadores e deputados. Havia distribuição de comissões para
favorecer empreiteiras e recursos eram desviados, também, para entidades beneficentes fictícias. No período
considerado, cerca de 50 milhões de dólares foram destinados a essas instituições. As denúncias do técnico
em orçamento e operador do esquema, José Carlos Alves dos Santos, levaram à instalação de uma CPI.
241
candidatos da Igreja Universal. Campos registra alguns exemplos, que são transcritos
aqui.
512
Paulo De Velasco, um profissional do ramo financeiro, eleito deputado federal nos
anos de 1990, posteriormente descartado pela igreja, entendia o espaço político como
território para cumprir uma missão, no sentido místico-religioso. Ele declarou à Folha
Universal, em 21/8/1994, quando era candidato à reeleição, o seguinte:
Mais uma vez respondemos “presente” a um chamado da Igreja. Um dia quando ainda era
obreiro, entrei no Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, durante a reunião da IURD, em
oração entreguei o meu tempo a Deus, dizendo: “Senhor, gasta a minha vida na tua obra”.
Ele me ouviu [...] Fui chamado para cumprir uma missão e tenho, nestes quase quatro anos,
tentado desempenhá-la na extensão total de nossa capacidade e na clássica, dinâmica e
ilimitada capacidade do Senhor dos Impossíveis...
Jorge Wilson, candidato da IURD a deputado federal, expressou-se da seguinte
maneira, no mesmo veículo de comunicação oficial da citada igreja:
Os evangélicos estão escolhendo seus candidatos a cargos públicos dentro de seu próprio
povo, para evitar as traições tão comuns nesta atividade. Eu não sou candidato por vaidade
ou interesse pessoal. Sou candidato como homem de Deus, escolhido pelo povo de Deus...
não é o cargo que importa, e sim a questão primordial de dar continuidade à Obra do Senhor
[...] exercerei o mandato em consonância com a orientação espiritual dada pelas Palavras
Sagradas [...] quem tem Deus no coração não pode votar em quem está nas trevas. Nosso
lema é fé para mudar... o povo está saturado. Ninguém agüenta mais a forma da política
feita no Brasil. Os políticos agem como se tivessem currais eleitorais, com votos
encabrestados.
513
Alguns integrantes da quadrilha eram parlamentares de pequena estatura, daí o caso ter sido denominado
escândalo dos anões do Orçamento. No relatório final, a CPI pediu a cassação de dezessete deputados e um
senador e recomendou a continuação de investigações sobre doze outros congressistas, além de não-
parlamentares, encaminhados ao Ministério Público. A rede de corrupção envolvia doze construtoras.
Segundo site do grupo Abril: Dos dezoito parlamentares acusados pela CPI do Orçamento, seis foram
cassados, quatro renunciaram antes do julgamento e oito acabaram absolvidos na Câmara. O Ministério
Público Federal deu seqüência às investigações e conseguiu abrir ações contra todos os envolvidos. Os casos
já estavam no Supremo Tribunal Federal, mas uma mudança nas regras processuais, em agosto de 1999, fez
os processos voltarem à primeira instância. Assim, os anões ganharam. O dinheiro roubado não foi devolvido
aos cofres públicos.” (Cf. http://veja.abril.uol.com.br/idade/corrupcao/orcamento/resultado.html, acessado em
30/09/2006).
512
CAMPOS, Leonildo S. Os políticos de Cristo uma análise do comportamento político de protestantes históricos e
pentecostais no Brasil. In: BURITY; MACHADO (orgs.), 2006, p. 57-8.
513
Folha Universal, 28/8/94, p. 2B.
242
A autoridade pentecostal, para usar o discurso antipolítico, provavelmente ficará
enfraquecida depois dos envolvimentos de parlamentares pentecostais e neopentecostais
nos casos conhecidos como “mensalão” e “máfia dos sanguessugas”. O primeiro,
denunciado pelo deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) e que deu origem a uma
comissão parlamentar de inquérito, consistia numa contribuição de agentes governamentais
para deputados da chamada “base de apoio” ao governo Lula, a fim de persuadi-los a
votarem em favor deste nos assuntos em tramitação no Congresso. O caso foi batizado de
“mensalão”, porque citadas doações ocorriam às vésperas de votações importantes, e
tinham, portanto, periodicidade, de acordo com a agenda parlamentar. Foram indiciados
deputados como o ex-bispo Carlos Rodrigues e o ex-bispo Wanderval dos Santos, ambos
da Igreja Universal. O segundo escândalo, também objeto de CPI, correspondeu à apuração
de compras superfaturadas de ambulâncias, em diversos estados da federação, mediante
uma rede de corrupção organizada por empresários, parlamentares e assessores destes.
Cerca de metade dos deputados da Frente Parlamentar Evangélica foram indiciados pela
CPMI, a maior parte deles pertencentes à Assembléia de Deus (CGADB) e à Igreja
Universal.
Marcelo Crivella é um paradigma de estratégia eleitoral que explorou o sentimento
de aversão ou reserva do eleitor aos quadros profissionais da política. Bispo da Igreja
Universal, nascido em 9/10/1957, carioca, obteve 3.743.289 de votos, correspondentes a
21,6 % dos votos válidos, conquistando uma cadeira de senador, pelo Estado do Rio de
Janeiro, em 2002. Derrotou candidatos tradicionais como Arthur da Távola e Leonel
Brizola. É importante assinalar que Crivella evitou mencionar sua condição de bispo da
IURD, embora seus opositores tenham explorado isto para estigmatizá-lo perante os
eleitores.
O sucesso do candidato se deveu também, ou principalmente, ao fato de poder
apresentar-se como “aquele que já fez”, mesmo fora da política, visto que desde meados
dos anos de 1990 ele soube “colar” seu nome à implantação da Fazenda Canaã, na Bahia,
um projeto integrado de irrigação, produção agrícola, educação, habitação e demais
requisitos para melhorar a condição de vida de alguns nordestinos carentes. Este projeto
também trabalha a dimensão simbólica da conquista da “terra prometida”: Canaã. Portanto,
243
toca no imaginário messiânico da cultura brasileira, onde está sempre presente o
sebastianismo. Além dessa Fazenda em Irecê (BA), Crivella criou, em 2003, uma
organização não-governamental, a Sorria Meu Rio, para atender populações carentes do
Rio de Janeiro.
Uma pesquisa realizada sob coordenação de Maria das Dores C. Machado, com
base nas eleições de 2002 no Rio de Janeiro, revela que a maioria dos candidatos
evangélicos apresentados nos programas eleitorais gratuitos de televisão preferiram
explicitar suas pertenças religiosas. Segundo Machado:
Dito de outra forma, além daqueles que professaram verbalmente suas crenças, percebeu-se
que vários candidatos lançaram mão dos símbolos religiosos ou das frases e salmos que
percorriam a tela durante a exibição de seus rostos e números. Tais estratégias sinalizam que
a identidade religiosa foi adotada pela maioria desses políticos como principal atributo
eleitoral.
514
De dezoito candidatos cuja propaganda impressa foi analisada, treze não
apresentaram proposta nenhuma e onze se dedicaram a tratar apenas de temas religiosos.
Dos dez eleitos, quatro pertenciam à Igreja Universal e obtiveram mais de metade da
votação do conjunto de candidatos com vinculações religiosas (53,41 %). A mesma
pesquisa permitiu identificar, na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, a
expressiva presença de 37,2 % de parlamentares evangélicos (2003-2007), para uma
participação deste grupo religioso na população fluminense de 21,13 %, conforme dados do
IBGE em 2000. A Assembléia de Deus, que antes tinha apenas dois deputados, triplicou
sua bancada. No conjunto, a bancada evangélica cresceu 62,5 % em relação à legislatura
anterior.
515
O desempenho da Igreja Universal e da Assembléia de Deus (Missão e Madureira),
no Rio de Janeiro em 2002, foi realmente muito eficaz. Os 17 candidatos da Universal
conquistaram 22,1 % dos votos de toda a frente evangélica, enquanto as Assembléias de
Deus, com seus 27 eleitos, obtiveram 21,8 % da votação, um desempenho bem mais fraco,
em termos relativos. Mais uma vez, a IURD provou sua capacidade de exercer maior
514
MACHADO, 2006, p. 98.
515
MACHADO, 2006, p.112.
244
influência sobre os membros, pois em se tratando de uma igreja com menor número de
fiéis, o desempenho de seus candidatos sugere que houve menos votos em candidatos
estranhos à Igreja, do que no caso das Assembléias de Deus. Por outro lado, a conquista de
votos teve relação com práticas clientelistas. “Afinal”, como escreveu Machado:
quase a metade dos legisladores evangélicos apresentava vínculos com centros sociais
localizados nas zonas mais carentes do Estado. Esse é um expediente comum entre os
políticos brasileiros, que seguem a lógica das permutas entre pequenos serviços sociais e os
votos dos eleitores de pouca escolaridade e baixa renda que, [...] quando participam de
grupos católicos e pentecostais, tendem a apoiar com mais intensidade as trocas
clientelísticas”.
516
A disciplina interna da Igreja Universal, na relação com seus candidatos, pode ser
inferida quando ela deixa de apoiar um candidato e torna pública esta decisão em seu
principal jornal, a Folha Universal. Este tipo de comportamento permite várias leituras,
porque a Igreja não costuma revelar os motivos que a levam a tornar proscrito alguém que
antes era pessoa-chave em seu projeto. Tanto pode ser uma desistência por livre e
espontânea vontade do candidato, como pode indicar sinal de rebeldia do indivíduo à
organização, ou quebra de confiança da instituição para com alguém que lhe servia de
representante, mas já não merece esta condição.
517
A Igreja Universal costuma preparar-se para a campanha eleitoral e divulgar seus
candidatos de forma mais contundente do que outros grupos religiosos. Segundo Oro, a
IURD tem feito campanha de alistamento eleitoral dos jovens maiores de 16 anos que a
freqüentam. Ela efetua algo como um recenseamento dos fiéis para auxiliar os bispos na
análise da potencialidade eleitoral da região sob seu comando. Quando Carlos Rodrigues
era o coordenador político, entre 1998 e 2002, esses dados regionais eram examinados pelo
conjunto de bispos. Com base em quociente eleitoral e número de eleitores ligados à Igreja,
eles deliberavam sobre quantidade de candidatos a serem lançados. Em 2002, a Igreja fez
campanhas ostensivas nos templos, com apresentação dos candidatos, distribuição de
516
Ibidem.
517
Em edição de 15-21 de setembro de 2002, a Folha Universal comunicou a seus leitores que os candidatos à reeleição no Rio de
Janeiro, Mário Luiz e Magaly Machado, assim como Eriberto da Silva Faria, ex-pastor e candidato no Ceará, haviam deixado de
contar “com o apoio dos membros da Igreja Universal do Reino de Deus”. Aconteceu o mesmo com o pastor Paulo Moreira, no
Rio Grande do Sul. Sucessivas vezes tentou-se entrevistar este deputado federal, em Brasília, na segunda quinzena de novembro
de 2005, mas a equipe do seu gabinete alegou que ele não era mais representante da IURD e que não daria entrevista.
245
material, e afixação de peças publicitárias (tipo banners), inclusive no palco-altar de cada
templo. Em algumas ocasiões, os líderes do culto explicavam didaticamente o manuseio da
urna eletrônica. A Universal conseguiu, inclusive, que a Justiça Eleitoral instalasse uma
urna eletrônica em seu principal templo, na cidade de Porto Alegre, no domingo, 15 de
setembro, oferecendo, deste modo, oportunidade para que os fiéis treinassem como
deveriam usar o equipamento para o ato de votar.
518
Outro segmento evangélico, não ligado aos parlamentares, tendo à frente um líder
carismático, Caio Fábio d’Araújo Filho, fundou em 1991 a Associação Evangélica
Brasileira (AEVB), com propósitos, dentre outros, de levantar a questão da ética cristã na
política, expressos, por exemplo, no Decálogo Evangélico do Voto Ético, divulgado em
março de 1994.
519
O citado documento insistia no direito inalienável de cada cristão exercer
sua liberdade de consciência e não permitir que pastores invadissem o terreno da cidadania
para transformar ovelhas em massa de manobra e curral eleitoral. Também eram
condenadas práticas corporativas de grupos evangélicos. Três artigos do Decálogo,
transcritos a seguir, servem para ilustrar o que se afirmou:
II. O cristão não deve violar a sua consciência política. Ele não deve negar sua maneira de ver a realidade social,
mesmo que um líder da igreja tente conduzir o voto da comunidade noutra direção; [...]
IV. Os líderes evangélicos devem ser lúcidos e democráticos. Portanto, melhor do que indicar em quem a
comunidade deve votar é organizar debates multipartidários, nos quais, simultânea ou alternadamente,
representantes das correntes partidárias possam ser ouvidos sem preconceitos; [...]
VI. Nenhum cristão deve se sentir obrigado a votar em um candidato pelo simples fato de ele se confessar
cristão evangélico. Antes disso, os evangélicos devem discernir se os candidatos ditos cristãos são pessoas
lúcidas e comprometidos com as causas de justiça e da verdade. E mais: é fundamental que o candidato
evangélico queira se eleger para propósitos maiores do que apenas defender os interesses imediatos de um
grupo religioso ou de uma denominação evangélica. É óbvio que a igreja tem interesses que passam também
pela dimensão político-institucional. Todavia, é mesquinho e pequeno demais pretender eleger alguém apenas
para defender interesses restritos às causas temporais da igreja. Um político de fé evangélica tem que ser,
sobretudo, um evangélico na política e não apenas um "despachante" de igrejas. Ao defender os direitos
518
ORO, 2006, p. 123-4.
519
O texto integral do Decálogo encontra-se em anexo desta tese. Sobre o processo que culminou na criação da AEVB, há um
relato em FRESTON, Paul. Fé bíblica e crise brasileira Posse e política: esoterismo e ecumenismo. São Paulo: ABU, 1992,
p.138-161.
246
universais do homem, a democracia, o estado leigo, entre outras conquistas, o cristão estará defendendo a
Igreja.
520
O conteúdo deste Decálogo feria, profundamente, a tradição autoritário-caudilhesca
e a prática comum de líderes pentecostais de transformarem igrejas em currais eleitorais. O
pastor Silas Malafaia, da Assembléia de Deus (CGADB), por exemplo, rotulou o
documento de “Decálogo da Rebelião”. Ele não admitia que o eleitor-evangélico, na
formação de sua própria consciência cidadã, tivesse autonomia para analisar programas de
governo e outras fontes, sem a palavra “orientadora” do seu pastor. Também não eram
bem-vindos debates políticos nos templos. No entender de Malafaia, a AEVB estava
insuflando uma rebelião dos membros de igreja contra seus pastores. Na Folha Universal
de 21 e 28/8/94, o mesmo líder escreveu:
O pastor não é um cidadão comum. Ele é o homem de Deus tratado na Bíblia como o anjo
da Igreja [...] tem autoridade espiritual para aconselhar o povo de Deus em todas as áreas da
vida. Sua palavra jamais será a de um cidadão comum [...] que os pastores possam conduzir
suas ovelhas da melhor maneira possível, porque existem muitos lobos querendo solapar a
autoridade pastoral e, com isso, dispersar o rebanho. Que Deus nos guarde.
O que o pastor Malafaia escreveu sugere que há mais de um grau de cidadania: o
membro de igreja é apenas um cidadão comum, enquanto o pastor é um cidadão especial.
Curiosa classificação, que, de fato, anula com o princípio clássico da cidadania como
relação entre iguais, e é contrária a forma de convivência estabelecida por Jesus Cristo, para
seus discípulos, conforme se pode constatar no episódio do lava-pés, quando ele declara
que o maior entre seus seguidores é aquele que está a serviço dos demais.
521
520
O texto do Decálogo utilizado nesta tese foi extraído de www.montesiao.pro.br, acesso em 24/07/2006.
521
BÍBLIA SAGRADA, João 13: 1-16.
247
3.5.2 Religiosidade total iurdiana
Uma questão freqüentemente levantada pelos que observam à distância o universo
pentecostal é se há, de fato, fidelidade de voto dos membros no candidato indicado pela
igreja e, em caso positivo, por que isto acontece? No caso da IURD, as pesquisas realizadas
em alguns Estados do Brasil confirmaram índices elevados de fidelidade de voto.
522
A
ligação entre os políticos da IURD e seus eleitores ocorre através de informações
veiculadas na Folha Universal. O parlamentar é chamado, eventualmente, a prestar contas
do seu trabalho em espaço do referido semanário.
523
No caso da Universal, a influência sobre o membro é maior, porque o comando é
mais rígido, as relações horizontais entre fiéis são frágeis e a persuasão dos dirigentes é
muito forte. Vozes divergentes não são toleradas. Os que insistem em fazer oposição
podem ser classificados como agentes de forças demoníacas. A IURD molda a opinião dos
fiéis, com uma extensa programação religiosa, de forma direta em seus templos, e indireta
via canais de televisão. O jornal Folha Universal mantém seções ou editorias semelhantes
às de outros jornais da chamada grande imprensa, para manter informados, nos principais
assuntos do cotidiano, o freqüentador da IURD, conforme a maneira de pensar do comando
da igreja. Nesse conjunto de veículos e mensagens, a Universal constrói uma visão de
mundo cuja chave de interpretação requer a entrega total do fiel aos ditames da instituição.
Toda a dinâmica da relação fiel igreja na Universal do Reino de Deus é
constituída em dimensão de totalidade. Louvor, novenas, penitências, “descarregos”,
entrega de bens, obediência no ato de votar, e o mais que houver, ou for criado pela
inesgotável fábrica de criatividade iurdiana. Em todas estas coisas os fiéis seguem as
orientações dos “ungidos” pastores e bispos. Aquele que adere às fórmulas religiosas da
Universal é convencido de que todos os aspectos de sua vida passam a funcionar melhor
quando ele os entrega para o magistério da Igreja conduzir: trata-se de um fenômeno que
denominamos aqui religiosidade total. Esta condição de entrega absoluta é indispensável
522
Cf. trabalhos de Oro, Miranda e Machado, referentes a eleições no Rio Grande do Sul, Ceará e Rio de Janeiro, respectivamente,
em: BURITY; MACHADO (orgs.), 2006.
523
Também se constatou que a Assembléia de Deus em Belém (PA), entre 2000 e 2002, garantia espaço para seus vereadores
prestarem contas das atividades que desenvolviam na câmara municipal, através de boletim dominical, distribuído nas mais de
trezentas congregações locais da chamada “igreja-mãe”.
248
para que o controle das mentes e corações dos indivíduos seja exercido plenamente pela
instituição.
A igreja de Edir Macedo não promove debates sobre programas e candidaturas e,
neste particular, é mais fechada para discussões políticas do que as Assembléias de Deus.
Na época eleitoral, as decisões são tomadas pela cúpula da IURD e os membros são
informados, apenas, em que nomes deverão votar. Alguns candidatos são desconhecidos da
maioria, pois, em alguns casos, se trata de bispo ou pastor de uma outra região, que a Igreja
transferiu para o novo domicílio eleitoral, onde é lançado candidato, após cumprir o prazo
mínimo exigido por lei. Os fiéis elegem esses candidatos “paraquedistas”, visto que muitos
freqüentadores, não todos, certamente, obedecem o comando da Igreja, do mesmo modo
como colocam um copo d’água sobre o televisor, em obediência à determinação do bispo,
no momento da “oração da cura”. Votar no candidato da Igreja é parte da religiosidade
total do fiel iurdiano. Esta é uma explicação para o fenômeno da taxa de fidelidade de voto
altíssima alcançada na Universal, onde já foi constatado que 95% de seus seguidores
votaram em candidatos da Igreja, conforme apurou o ISER, em 1994.
524
Ou seja, a IURD
controla paixões e pensamentos de seus fiéis em todos os aspectos da vida, tais como:
religião, negócios, política e afetividade. Ora, se ela é capaz de exercer tamanha influência
sobre a clientela, faz isto de modo muito mais efetivo sobre seus clérigos, escalados para
representá-la no espaço público. Para ter resultado mais efetivo na campanha eleitoral,
sobretudo no sentido de alcançar o público que não freqüenta os templos, mas acompanha
programas de rádio e televisão, a Universal costuma escalar como candidatos pastores ou
bispos que foram diuturnamente expostos na mídia.
Este padrão de obediência à orientação dos dirigentes, observado por membros e
congregados dessas igrejas em processos eleitorais, reflete a fortíssima coesão que se forma
na dimensão vertical do associativismo pentecostal e neopentecostal. Associativismo de
caráter autoritário hierárquico e de rígida disciplina, com maior rigor no caso da Igreja
Universal. Não obstante tudo isto, o eleitor é sempre um agente livre em sua vontade. Por
esta razão, há que se buscar outro motivo para essa fidelidade. Membros da Assembléia de
Deus falam que é melhor escolher um irmão do que um “ímpio”, pessoa que “está nas
524
FERNANDES et alli, 1998, p. 146-7.
249
trevas”. No caso da IURD, estamos diante de um fenômeno de trocas. As pessoas que
procuram seus templos são bastante carentes e estão dispostas a dar ofertas, tempo, serviço
e, também, seus votos (por que não?) em troca de bem-estar emocional e espiritual e de
bênçãos materiais “profetizadas” pelos pastores. A motivação para que essa troca se efetive
é a fé dos freqüentadores dos cultos nas promessas dos pastores, as quais são apresentadas
com base em interpretações iurdianas de textos bíblicos, reforçadas por performances
teatrais com profuso emprego de signos e símbolos.
A IURD é uma igreja diferente, também, quanto ao conceito de missão. Em outras
igrejas no sentido ideal, pois a prática nem sempre corresponde ao discurso prevalece o
conceito romântico de que o missionário entrega sua vida para servir em plagas distantes,
como resposta individual e inquestionável, a um chamado divino. Cabe à instituição,
apenas, disponibilizar os meios para que o vocacionado obedeça a esta ordem
transcendente. Na Igreja Universal, o indivíduo uma vez admitido torna-se soldado da
instituição. Neste particular, há alguma semelhança com ordens religiosas católicas. É a
Igreja que planeja e aloca seus recursos, materiais e humanos, nos diversos países, a partir
de estratégias de expansão e estabelecimento de metas, como qualquer outra organização
do mercado globalizado.
Sobre outras estratégias da Igreja Universal para conquistar espaços no campo
político, convém transcrever o que publicou um jornal carioca, antes das eleições
municipais de 2004:
As mudanças na estratégia eleitoral foram decididas, recentemente, em uma reunião entre
Edir Macedo e os líderes espirituais da igreja. O trabalho social em áreas carentes antes
excomungado pelos tradicionalistas da igreja ganhará forças nas eleições municipais do
ano que vem. Os centros sociais e as intervenções em áreas carentes serão pré-requisitos
obrigatórios para a escolha dos candidatos. [...] O uso de nomes de cargos hierárquicos da
igreja como pastor e bispo na campanha será controlado. O cuidado pretende evitar a
rejeição por parte dos eleitores que não são evangélicos. A cúpula da Universal também está
preocupada com reclamações de fiéis sobre a atuação de vereadores e deputados que,
250
adotando nos nomes os cargos na igreja, fecham as portas dos gabinetes. A falta de atenção
com o eleitorado arranharia a imagem da Universal.
525
Os pentecostais deixaram a greve social de lado e entraram na era da participação,
mas não querem misturar-se aos incrédulos. Os neopentecostais estão criando sua própria
cultura como tradução para si das regras gerais da sociedade de consumo. Fizeram da
religião um amplo mercado de bens, tanto materiais quanto simbólicos.
3.5.3 Bancada
Discute-se se houve uma “bancada evangélica” no Congresso Constituinte. Do
ponto de vista estrito da Ciência Política teria que ser feita uma análise das votações para
calcular os índices pertinentes, que determinam percentual majoritário e minoritário,
verificado em cada votação, unidade e lealdade referente ao conjunto da bancada e
condição de fidelidade à posição do líder.
526
Infelizmente, não foi possível, nos limites
desta pesquisa, obter dados das votações, para calcular citados índices. Todavia, os 32
titulares e dois suplentes eleitos em 1986 formavam um bloco suprapartidário informal à
semelhança de outros com os quais o governo tinha que negociar cada questão que era
colocada em pauta, quase que de forma pontual.
Sob a ótica do funcionamento da Câmara de Deputados, faz-se necessário distinguir
“bancada” de “frente parlamentar”, pois existem as duas coisas e são bem distintas.
Seguindo uma outra conotação, diferente da apresentada no parágrafo anterio r, bancada é
um termo genérico para fazer referência a um agrupamento de parlamentares que têm algo
525
O Dia, 21/07/2003, p. 7, apud MACHADO, 2006: p.11.
526
Os índices citados são, pela ordem: a) índice de Rice, que calcula o percentual majoritário em relação ao
lado minoritário: por exemplo, em uma votação em que 60% dos deputados da bancada votaram de um modo
e 40% de outro, o índice de Rice seria igual a 20 (60-40); b) índice de unidade da bancada, calculado
dividindo-se o total de votos do lado majoritário de uma votação pelo total de votantes (ou membros) da
bancada; c) índice de lealdade é obtido dividindo-se o número de vezes que o parlamentar votou com a
bancada pelo número de vezes em que ele compareceu para votar (faltas podem ser tratadas como voto
contrário ao da bancada); d) índice de fidelidade à posição do líder do partido: calculado, para cada votação,
dividindo-se o total de deputados que votaram seguindo a indicação do líder pelo total de deputados da
mesma bancada que estavam presentes na votação (ou sobre o total da bancada). Cf. respectivamente, os
seguintes textos: LIMONGI, Fernando e FIGUEIREDO, Argelina Cheibub. (1995), "Partidos Políticos na
Câmara dos Deputados: 1989-1994". Dados, vol. 38, n
o
3. SANTOS, Fabiano. (1997), "Patronagem e Poder
de Agenda na Política Brasileira". Dados, vol. 40, n° 3. STANLEY, Harold e NIEMI, Richard. (1995), Vital
Statistics on American Politics. Washington, CQ Press. MAINWARING, Scott. e PÉREZ -LIÑÁN, Aníbal.
(1998), "Disciplina Partidária: O Caso da Constituinte". Lua Nova, n° 44.
251
em comum. Por exemplo: a bancada do Estado de São Paulo, a bancada feminina, a
bancada dos evangélicos. Neste sentido, a bancada pode ter reuniões para falar de diversos
projetos. A bancada gaúcha pode tratar dos problemas gerais do seu Estado, tais como:
transporte, abastecimento, desemprego, saúde etc. Já a frente parlamentar constitui uma
associação de parlamentares que se define para defender projetos especificamente de uma
área. Assim é possível identificar uma Frente Parlamentar da Saúde, do Agronegócio, da
Educação e outras. A Frente Parlamentar é uma instituição com personalidade jurídica,
estatuto próprio e regimento interno. Pode, inclusive, contratar funcionários, eleger
diretoria, manter contabilidade, cobrar contribuições, enfim, praticar coisas típicas de uma
organização burocrática.
O acompanhamento da atuação dos componentes da Frente Parlamentar Evangélica
permite afirmar que não existe uma “bancada evangélica” no sentido técnico do termo,
definido pelos índices adotados na Ciência Política, como bem expressou o deputado
Gilmar Machado, batista, do PT de Minas Gerais:
Por que bancada evangélica? Bancada se constitui do partido. Partidos formulam bancadas.
Aqui na Casa você nunca diz (vou dar um exemplo), você nunca diz: bancada disso,
bancada daquilo. Nós temos que ir à Frente da Saúde, da Educação, da Universidade.
Bancada é aquilo que você compartilha, em que você tem uma uniformidade. No partido
você tem. Partido é uma bancada, ele tem uma organização. Nós evangélicos não temos.
Nós somos evangélicos, mas cada um com suas posições, portanto, não cabia você constituir
uma bancada em que tivesse alguém que ia falar por todos nós e nós tivéssemos que
[acatar]. O líder da bancada fala e ele pode expressar posições em nome de todos os outros.
Já uma frente, não. O presidente de uma frente ele tem que consultar os membros para tomar
posições. E ela, por exemplo, a frente significa [que] eu não tenho o compromisso de seguir
nenhuma questão, já na bancada, a bancada pede uma questão e, eu sou obrigado a
encaminhar. Uma bancada não pode fechar uma questão e obrigar a todos nós a seguir, já
que somos evangélicos, nós temos diferenciações políticas e ideológicas que, às vezes, nos
separam. Em uma frente não. Uma frente comporta um parlamentar de esquerda, como um
parlamentar do PT, como pode comportar um parlamentar de direita do PFL. Nós
evangélicos nós podemos ter essa distinção. Mas numa bancada nós não tínhamos condições
de fazer isso. O coordenador de uma frente ele não pode sair expressando, negociando
coisas em nome dos evangélicos. Já em uma bancada ele poderia fazer isso [...] E naquele
momento, com todo o respeito que nós tínhamos pelo bispo Rodrigues, ele não podia
25
2
expressar, já que nós tínhamos... não é? A Igreja Universal é uma grande igreja, mas ela não
pode falar em nome de todos os evangélicos, como também o coordenador da nossa frente,
que é da Assembléia de Deus, não pode falar por todas as denominações. Não é porque eu
sou batista, mas é porque nós temos as nossas diferenciações, que têm que ser respeitadas.
Nós nos unificamos no louvor, podemos nos unificar em alguns temas, mas eu não posso
depois, em um fechamento de questão, ter que encaminhar igual a todos os demais; por isso,
então, nós fizemos uma... Eu e o deputado Pinheiro tivemos um jantar na casa do bispo
Rodrigues, na época, e não concordamos. Portanto não foi possível ser constituída a frente, a
bancada, e ela só foi possível agora, nessa nova legislatura então, porque aí criou-se um
certo... Um outro clima de insatisfações e tal, que não possibilitaram naquele momento a
continuidade da aglutinação em termos de bancada. Não só por parte de nós batistas, mas...
deputados do PT, mas outros começaram a entender o que nós dizíamos, tanto é que nessa
legislatura agora se chegou à conclusão que o melhor era constituir a Frente. Tanto é que a
Frente foi constituída sem nenhuma dificuldade, dentro da lógica e da concepção também
que nós estamos tratando. A Frente não tem autorização para ir negociar coisas com o
Governo em nome dos evangélicos, primeiro porque tem igrejas, como é o caso, por
exemplo, de nós, os batistas, que não aceitamos... Nós defendemos a separação do Estado e
da Igreja e não aceitamos o Estado tutelar ou sustentar atividades. Mas respeitamos quem,
por exemplo, defende essa posição, então essa foi uma das razões de não termos uma
bancada e de hoje sermos uma Frente”.
527
Sobre o processo que deu origem à Frente Parlamentar Evangélica, além do
depoimento do deputado Gilmar, é sugestivo conhecer a perspectiva de uma assessora
parlamentar que trabalhou na elaboração do regimento interno. Os assessores desses
deputados constituem o Grupo de Apoio Parlamentar Evangélico. Foi na condição de
membro deste grupo que ela trabalhou elaborando documentos e propostas para a FPE. Sua
entrevista ocorreu em setembro de 2006, após diversos escândalos que atingiram
parlamentares evangélicos, como os ex-bispos Carlos Rodrigues e Wanderval Santos, bem
como o presidente da FPE, Adelor Vieira, e outros:
No começo nós não aceitamos muito que fosse formada a Frente Parlamentar Evangélica.
Porque não existe assunto especificamente evangélico para eles cuidarem, dentro da
Câmara. Existe assuntos que precisam ser considerados aspectos cristãos. Mas não existe
um assunto, não existe um projeto de lei especificamente evangélico! Não existe! E o que
acontece? Mesmo assim resolveram que deveria ser feita a FPE. E aí a FPE foi instituída
527
Entrevista com o deputado Gilmar Machado, em refeitório do Anexo III da Câmara dos Deputados, no dia 30/11/2005.
253
com diretoria, com tesouraria, com contribuições, os parlamentares contribuem
mensalmente com um valor pequeno para a FP, para questões de material, de impressão, de
telefonemas, de viagens de uma pessoa ou outra da FPE. Não é um valor muito alto, acho
que é em torno de cem reais por mês que cada um contribui. É. Eles têm uma organização,
estatuto e regimento interno. Eu não participei efetivamente da questão do estatuto, porque o
estatuto, para ser aprovado eles pegaram um mais ou menos parecido com uma outra FP que
já existia e acabaram fazendo, para aprovar, para que ela fosse lançada no prazo que eles
queriam. Foi uma coisa um tanto atropelada, o estatuto. O regimento interno, não. Este fui
eu que escrevi. E por que escrevi o regimento interno? Havia depois que a FP começou a ser
projetada, alguns questionamentos acerca do membro: quem é de fato membro da FP? Todo
parlamentar que se diz evangélico? Ou alguém que se identifica tão somente com a causa
evangélica? Nós tínhamos um exemplo de um católico que era membro da FP e não era
evangélico. Então detalhes começaram a ter que ser respondidos e esses detalhes acabaram
indo para o regimento interno, que eu escrevi e não foi aprovado. Por quê? Um dos capítulos
do regimento interno é com relação à exclusão e a punição do membro da Frente
Parlamentar. E quando a gente estava escrevendo este capítulo foi justamente quando
estourou o escândalo com o bispo Rodrigues e com o bispo Wanderval. O bispo Wanderval
ele foi excluído da Igreja Universal, antes do mensalão, quando ele se envolveu, quando
teve um relacionamento íntimo com uma secretária. Ele perde o nome de bispo, tanto é que
o nome parlamentar dele é deputado Wanderval, não é mais bispo. Por exemplo, o membro
que fosse condenado pela Comissão de Ética da Câmara ele deveria continuar na FP ou não?
Quando essas questões começaram a ser discutidas aconteceu o escândalo com o Wanderval
e aí todo mundo com dó de excluir o Wanderval, que era um problema de ordem pessoal,
acabaram não querendo continuar a discutir o regimento. E em seguida acontece o escândalo
com o bispo Rodrigues. Tanto que se você pegar a folha da FPE eles dois continuam como
membros da Frente Parlamentar. Então não houve de fato a exclusão desses nomes. Só que
aí, quando a gente começa a cobrar do presidente da FPE uma posição, porque aí a gente
começa a ser questionado pela imprensa: “Esse pessoal continua ou não continua na
Frente?” Quando a gente começa a exigir uma posição, estoura o esquema dos
sanguessugas , que tem inclusive o presidente da FPE envolvido. Aí pronto, aí arquiva-se
todo o estudo do regimento interno, a FP fica desorganizada, desarticulada, acontecendo
apenas os cultos dentro da Câmara. Não mais atividades da FP. Isto é lamentável, porque
um dos trabalhos que a FP estaria apresentando no período eleitoral era uma carta de
proposta aos presidentes da República, aos candidatos a presidente da República. E havia
um material muito rico. Um dos aspectos desse material diz respeito a políticas indígenas;
nós temos muito a contribuir nesta área. E existia também um outro pedido da FP, que era a
equiparação do reajuste do aposentado ao salário mínimo. Você sabe que o aposentado e o
254
pensionista têm perdido muito com a falta desta equiparação. E isto era uma proposta nossa,
mas que dado tanto escândalo, ninguém teve coragem de entregar aos candidatos.
528
Todavia a questão não se esgota aí, pois também neste sentido, expressou-se
Alexandre Brasil Fonseca, a uma consulta do presidente do Movimento Evangélico
Progressista, sobre o caráter ou não de bancada da Frente Evangélica. Neste caso, a dúvida
estava relacionada com o alinhamento ou não do grupo no caso das votações, aspecto de
alguma forma já tratado, para o qual Fonseca tem a seguinte opinião:
A Frente Parlamentar Evangélica não vota em bloco. Nem a Frente, nem mesmo a bancada
da Universal ou da AD ou de qualquer igreja... Essa coisa de bancada evangélica é mais
mito da imprensa do que efetividade nas votações do Congresso. Serve mais para dar
visibilidade e fazer pressão... E quando vota igual, em pouquíssimas questões, geralmente é
algo ligado a valores, moral, e nos quais os partidos não fecham questão. E é bom lembrar
que nestes tópicos o bloco evangélico é tão “unido” quanto o bloco católico... Outra situação
é em casos de favorecimentos, como aconteceu por ocasião do antigo Centrão na
Constituinte. A Universal que seria mais direcionada nas principais disputas da legislatura
anterior só fechou votação em uma, a favor da Lei da Mordaça... talvez soubessem que ao
tirar um pouco da liberdade do Ministério Público de atuar teriam mais tranqüilidade.
Preocupação que ganha mais sentido diante dos últimos acontecimentos.
529
Pelo que foi apresentado até aqui, não se pode falar de um carisma institucional que
determine votações em bloco, por parte de parlamentares pentecostais ou neopentecostais, a
não ser em casos excepcionais, quando envolve questões de interesse das corporações a que
pertencem, ou quando está em jogo o tipo de moralidade defendida pelas igrejas
evangélicas, mais tolerantes do que a Igreja Católica no caso de métodos anticoncepcionais,
mas se aproximando desta nos casos de oposição ao aborto e união civil de homossexuais.
A revista Eclésia registrava, em setembro de 2002, que “os congressistas ligados ao
povo evangélico [...] são submetidos mais às orientações partidárias e aos interesses
pessoais do que às igrejas que os elegeram”. No caso dos parlamentares da Universal,
percebe-se a existência de uma coordenação em permanente sintonia com a direção da
Igreja. Todavia, mesmo diante dessa indiscutível disciplina, não se pode afirmar que os
528
Entrevista com assessora da Frente Parlamentar Evangélica, realizada em Brasília, 15/09/2006.
529
Texto extraído de email circular de Alexandre Fonseca, [email protected], disponível em 19/07/2006.
255
parlamentares da IURD constituem uma bancada. Eles geralmente não votam de forma
unida, porque têm que seguir a orientação dos diversos partidos a que pertencem. Há que se
considerar, porém, que os próprios partidos nem sempre fecham questão nas votações, o
que permite ao parlamentar iurdiano votar segundo o interesse da Igreja, ou de acordo com
outras conveniências. Para Oro, a distribuição dos parlamentares da Igreja Universal em
diferentes partidos é um fato que
ao invés de denunciar uma incapacidade política da IURD ou uma dificuldade de
entendimento entre os deputados iurdianos, parece, antes, revelar o modo “sofisticado” de
fazer política da Universal, que distribui os seus deputados em diferentes partidos para
alcançar melhor grau de barganha política, o que não impede que em determinadas situações
os interesses da Igreja se sobreponham aos dos partidos.
530
3.5.4 Escolha e troca de partido
A complexidade e variedade de grupos envolvidos na composição do poder, bem
como o dinamismo de alianças ad hoc que são praticadas na política brasileira, tem levado
as igrejas desta pesquisa a lançarem candidatos por diversos partidos. Entretanto, partidos
com forte disciplina interna não são adequados para a atuação deles, daí não escolherem PC
do B e PT, e terem fraca presença no PFL e no PSDB. Graças à disciplina que cada igreja
mantém sobre seus parlamentares, inclusive estabelecendo um deles como coordenador de
“bancada”, fica estabelecida uma condição que credencia o grupo como negociador
confiável, seja na interlocução com o governo seja com a oposição. Os parlamentares
votam segundo o desejo da cúpula da igreja, até porque costumam fazer parte dela.
Normalmente, eles têm boa margem de manobra para negociarem seus votos, nos casos em
que o partido não fecha questão e o assunto não fere a mentalidade eclesial. Essa
flexibilidade de atuação permite que dialoguem e apóiem diversas causas, exceto quando
entram em pauta temas como aborto, união legal de homossexuais, pena de morte, liberação
de bebidas alcoólicas, cigarros e armas. Na questão fundiária, os parlamentares pentecostais
estão mais próximos da bancada ruralista do que dos movimentos de trabalhadores sem
terra, embora existam muitos pentecostais em acampamentos do MST e correlatos. Alguns
parlamentares apóiam políticas afirmativas para negros, quilombolas etc. Apóiam, também,
530
ORO, 2006, p. 121.
256
missões proselitistas em nações indígenas e se distanciam de pastorais de solidariedade e
valorização das etnias, como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI, católico) e o
Grupo de Trabalho Missionário Evangélico (GTME), este pertencente a igrejas ligadas ao
movimento ecumênico.
Há partidos que não convêm para as igrejas pentecostais e neopentecostais, porque
são agremiações que exigem disciplina ideológica dos filiados, conforme mencionado. É o
caso de partidos de esquerda, mas também se aplica a alguns de direita, como o PFL.
531
Este partido não demonstra interesse em mantê-los, salvo para ampliar alguma estratégia
populista, como ocorre na Bahia, onde Antônio Carlos Magalhães coopta muitos
evangélicos para aumentar sua influência sobre a massa eleitoral e fortalecer a condição de
maior cacique político daquele Estado. No Rio de Janeiro, por influência de Garotinho,
muitos líderes dessas igrejas se filiaram ao PSB. O mesmo aconteceu em Pernambuco, por
causa de Miguel Arraes. Quando Garotinho trocou de sigla e Arraes faleceu, diversos
políticos evangélicos deixaram o referido partido. Os exemplos citados evidenciam o
quanto o populismo pode instrumentalizar eleitores de igrejas que internamente praticam
governo autoritário: é que, nestes casos, fica mais fácil manobrar as massas com o discurso
religioso, para fins políticos.
O PSDB não costuma ser priorizado pelos pentecostais, embora existam alguns
nesse partido. Podem ser feitas suposições, sobre essa baixa preferência. Trata-se de um
partido de tradição laica, elitista, embora com discurso republicano, pouco afeito a relações
com camadas populares, como são as que compõem, majoritariamente, as igrejas
pentecostais e neopentecostais. Ademais, nem PFL nem PSDB cedem seus cargos de
comando a políticos dessas igrejas, diferente do que ocorre com o PL, PTB, PP e PSC,
principalmente.
Outro fato que se constata entre parlamentares pentecostais e neopentecostais é o
trânsito pelo espectro partidário ou troca freqüente de partidos. Júlia Miranda destaca o
exemplo do deputado federal Almeida de Jesus, da Igreja Universal no Ceará. Antes de se
531
O PFL expulsou dos seus quadros, através de rito sumário, o deputado federal João Batista, bispo-presidente da IURD no
Brasil, quando ele foi flagrado transportando malas com 20 milhões de reais e alguns milhares de dólares. Embora reconhecendo
que o transporte de dinheiro não era crime, o PFL alegou que aquela não era atividade compatível para a condição de um
deputado.
257
filiar à igreja, lutava como líder comunitário e radialista, sem conseguir vitória eleitoral.
Em 1996, já como candidato da IURD, foi eleito vereador pelo PTB, o segundo mais
votado do Estado. Ele havia transitado pelo PFL, PSC e PDT. Em 1998, foi eleito deputado
federal pelo PMDB.
532
Pedro Ribeiro, pastor da Assembléia de Deus e deputado federal eleito pelo PL,
abandonou o partido antes de tomar posse e se filiou ao PTB, indo depois para o PMDB.
Foi acusado pelo deputado Almeida de Jesus de se beneficiar com os votos de legenda do
PL, conseguidos, principalmente, pela Igreja Universal. Uma vez eleito, Pedro Ribeiro
conquistou a confiança dos seus pares e da cúpula da CGADB para liderar a “bancada” da
Assembléia de Deus, na legislatura 2003-07. Essa “dança das cadeiras” do pastor Ribeiro
foi justificada pelo presidente nacional do Conselho Político da AD (Missão), Ronaldo
Fonseca, pastor em Brasília, com as seguintes palavras:
“O Pedro está cumprindo uma determinação da instituição (Assembléia de Deus) que é a
base eleitoral dele” (O Povo, 09/09/2003). E ele explica que ficaria muito difícil coordenar
os 18 parlamentares da igreja em 7 partidos; daí a decisão de agrupá-los em apenas três
PMDB, PSC e PTB “com cujas direções nacionais há bastante envolvimento por parte da
Assembléia de Deus”. Ele não se furta a acrescentar que, por ocasião da reforma política,
todos os parlamentares ligados à igreja serão orientados a votar a favor da fidelidade
partidária.
533
As práticas políticas do deputado federal e presidente do PL no Ceará, Almeida de
Jesus, da Igreja Universal, exemplificam a afinidade do modo de fazer política dessa igreja
com os vícios da cultura brasileira, nos aspectos de fisiologismo, clientelismo e
corporativismo. Ao apoiar o candidato Juraci Magalhães (PMDB) a prefeito de Fortaleza,
em 2000, Almeida ganhou uma Secretaria Regional. Esta negociação permitiu que ele
cedesse seu mandato a um suplente federal do PMDB, Mauro Benevides, um veterano, para
atender conveniências locais. Na eleição estadual de 2002, o PL apoiou o candidato petista
José Airton para governador, derrotado por Lúcio Alcântara do PSDB, mas logo em
seguida Almeida de Jesus pleiteava cargos estaduais e municipais e argumentava:
532
MIRANDA, Júlia. Nós, vocês e eles: os desafios de uma convivência (in)desejada. In: BURITY; MACHADO, 2006, p. 149.
533
MIRANDA, 2006, p. 159-60.
258
“votamos no José Airton (PT) no primeiro e segundo turnos, mas a eleição já passou. Se o
governo do estado quiser trabalhar com a bancada do PL, vai trabalhar”. Falando de ônus e
bônus de ser base aliada governista, ele pergunta ao prefeito Juraci Magalhães: “se nós não
tivermos espaço de secretário, chefes de distritos e outros cargos em autarquias, de que
adianta dar apoio ao prefeito?”.
534
O fato é que a prática política dessas igrejas se caracteriza pela instrumentalização
de partidos e do próprio sistema de representação parlamentar, com o propósito de ampliar
o poder eclesiástico. Segundo Miranda:
Os recursos financeiros para as igrejas e a possibilidade de exercer pressão no parlamento
para tocar a expansão denominacional são, no dizer dos pastores, o objetivo da sua
participação política. Os grupos religiosos utilizam a ambigüidade da relação entre partido
político e igreja, e apenas imprimem sua marca ao processo de caracterização do nosso
sistema partidário, ao utilizarem os partidos somente como condição sine qua non, cuja
lógica da representatividade com base em programas e propostas é totalmente subvertida,
uma vez que subsumida pela lógica e objetivos próprios a cada igreja.
535
Isto coloca no debate o deslocamento das relações Indivíduo Estado para relações
corporativas, nas quais partidos são meios e agremiações religiosas são fins, na empreitada
de conseguir recursos públicos para segmentos sociais que, até poucas décadas atrás, não
estavam organizados como agentes políticos coletivos. O debate precisa ser alimentado,
porque o espaço e os recursos são públicos. Mesmo reconhecendo que a distribuição destes
é injusta na ordem liberal, qualquer prática que promova participação de novos agentes
precisa ser trabalhada de forma republicana, a fim de melhorar a qualidade da democracia
que se constrói em constante processo de transformação.
534
Trechos de entrevista para o jornal cearense O Povo, 24/11/2002, apud MIRANDA, 2006, p. 161.
535
Idem, p. 165.
259
3.6 Corrupção entre políticos pentecostais: mais joio do que
trigo
É importante retornar à análise da presença evangélica no Congresso Constituinte de
1987-88. Ali foi criado o Centrão, um grupo governista supra-partidário e conservador, que
atuava nas diversas comissões. Dos seus 18 coordenadores, dois eram evangélicos: Daso
Coimbra (congregacional do Rio de Janeiro) e Eraldo Tinoco (batista da Bahia). A avidez
dos pentecostais, liderados por Gidel Dantas, era tamanha, que Daso Coimbra gravou
alguns telefonemas nos quais eles faziam exigências descabidas de recompensas materiais
para votarem alinhados com o Centrão.
536
Como os coordenadores do Centrão não puderam
atender essas expectativas, Gidel rompeu com o bloco, levando consigo 18 parlamentares.
Um deputado evangélico, que não pertencia ao grupo desses 18, afirmou que Gidel era
maestro de uma banda ridicularizada pelos colegas. Um assessor de Sarney declarou a esse
mesmo evangélico dissidente: “Seus irmãos têm uma goela larga”.
537
A votação dos evangélicos sobre a reforma agrária deu mostras do compromisso da
maioria com a manutenção das injustiças sociais. Faltaram 13 votos para a emenda da
reforma agrária ser aprovada. No processo de escrutínio, 22 evangélicos colocaram-se
contra a emenda, sendo que alguns deles definiram seus votos na última hora. Pairam
suspeitas que alguns destes tenham recebido suborno da União Democrática Ruralista
(UDR) para impedirem a reforma agrária.
538
A nova legislatura, iniciada em 1991 trouxe, também, novos escândalos. Em
novembro desse ano, o deputado Jabes Rabelo, freqüentador de igreja batista em Cacoal,
Rondônia, foi cassado por ligações com o narcotráfico. Seu irmão transportava cocaína e
portava uma carteira falsa de assessor da Câmara Federal, assinada pelo próprio Jabes.
Freston discorre sobre vários casos de corrupção, registrados a seguir, envolvendo,
principalmente, parlamentares da Assembléia de Deus.
Manoel Moreira veio de família pobre e casou com uma filha do pastor-presidente
da igreja em Campinas. Como candidato a deputado federal, fez “dobradinha” política com
536
O fato foi registrado por BARBOSA, Maria Lúcia Victor. O voto da pobreza e a pobreza do voto: a ética da malandragem.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988, p. 267-8.
537
FRESTON, 1994, p. 75.
538
FRESTON, 1994: p. 81.
260
Joel Freire Costa, postulante à Assembléia Legislativa de São Paulo, filho de José
Wellington, presidente da Convenção Geral das Assembléias de Deus do Brasil. Na
Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados, Moreira obteve verbas para nove
entidades assistenciais que alegaram nunca terem recebido os recursos (Correio Popular,
Campinas, 14/11/93). Ele fazia intermediação de emendas, estava ligado a empreiteiras e
tinha cacife para preencher cargos na Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL) e obter
contratos para empresas de seu interesse.
539
O deputado estadual Joel Freire esteve envolvido em irregularidades no orçamento
do Estado de São Paulo. O Correio Popular de Campinas acusou-o de ter recebido propina
da empreiteira Servaz (CP, 13/11/1993). O deputado estadual Carlos Apolinário, ligado à
Assembléia de Madureira, constava em documento da mesma Servaz com a anotação “5%
Valo”, referente à barragem do Valo Grande (Revista Veja, 3/11/1993).
O deputado federal João de Deus, da AD-RS, era acusado de apropriar-se de parte
da verba de US$63,5 mil destinada à Ação Social Evangélica de Porto Alegre (FSP,
25/11/1993). O deputado Matheus Iensen destinou verba de US$48 mil para uma
instituição fantasma do Paraná. Um filho deste parlamentar era o presidente, outro era o
tesoureiro e a mulher de Iensen era presidente do conselho fiscal (Revista Veja, 6/10/1993).
O mesmo deputado apresentou a emenda dos cinco anos de Sarney e se postou em defesa
de Collor, mas votou contra este, logo que percebeu que a votação pelo impeachment ia ser
vitoriosa.
540
O pastor Manoel Ferreira, presidente da AD Madureira, teve envolvimentos com a
administração de Joaquim Roriz, no Distrito Federal. Ganhou um terreno de 123.312 m2 no
Setor de Mansões, para a igreja e o CNPB (Conselho Nacional dos Pastores do Brasil)
541
.
Moreira era influente no Partido Progressista, o mesmo de Roriz, porque mantinha seus
parlamentares nesta legenda. A Folha denunciou que foram encontrados pela CPI dos
Anões do Orçamento US$3,2 milhões nas contas bancárias de Roriz (FSP, 21/11/1993).
Este conhecido político sempre foi prestigiado pelo caudilho da Assembléia de Madureira e
539
Idem, p. 101.
540
Ibidem.
541
Para o Conselho de Pastores foram reservados apenas 3000 m2 dos mais de 123 mil metros quadrados doados pelo
governador Roriz às organizações presididas pelo bispo assembleiano Manoel Ferreira.
261
descrito como “fiel executor da vontade de Deus” e “grande amigo dos evangélicos”,
conforme o jornal dessa igreja (O Semeador, out. 1993).
Francisco Silva, o dono da Rádio Melodia FM, foi acusado de extorquir um
advogado para não ser incluído na CPI das fraudes do INSS (FSP, 17/11/1993). Itsuo
Takayama e Salatiel Carvalho foram citados em reportagem da revista Veja (6/10/1993),
como recebedores de dinheiro para trocarem de partido. O primeiro mudou do PFL para o
PP e PSD, em apenas uma semana. Esta prática abrangeu outros deputados da Assembléia
de Deus.
Freston fez o seguinte comentário:
Mais do que erros individuais, o que precisa ser questionado é um modelo de fazer política.
A igreja cresceu, mas, em vez de transformar o país, assimilou a cultura política. A
moralização da vida pública prossegue sem a nossa participação. Boa parte da classe política
evangélica está tão comprometida com a cultura política que não tem a menor possibilidade
de ser “sal da terra”.
542
Freston completou suas observações com um desafio para os membros das duas
Assembléias de Deus, tomando-as como a maior denominação evangélica brasileira, no
sentido de partirem para uma ação de repúdio às práticas escusas da ala de políticos e
outros líderes corruptos: “Como a maior igreja, suas ações determinam em boa parte a
imagem pública evangélica. É necessário dizer claramente que sua situação é preocupante.
Os elementos sãos, tanto membros como pastores, precisam ir além da mera recusa
silenciosa de dar o voto, para o protesto ativo e coordenado”.
543
Os evangélicos tradicionais tiveram uma representação minoritária de esquerda na
política, antes de 1986, e conseguiram manter esta marca, durante o Congresso
Constituinte, com Lysâneas Maciel, Celso Dourado, Edésio Frias, Nélson Aguiar e
Benedita da Silva, esta a única pentecostal do grupo. A deputada Benedita, apesar de ter
pertencido à Assembléia de Deus, durante o Congresso Cons tituinte, nunca foi valorizada
por sua denominação e terminou migrando para o presbiterianismo. Sua prática política foi
forjada em associações comunitárias apoiadas pela Igreja Católica Romana. O fato de
542
FRESTON, 1994, p. 104.
543
FRESTON, 1994: p. 105, com grifos no original.
262
pertencer ao PT também trazia dificuldades para sua aceitação na Assembléia. Nunca foi
“candidata oficial” da igreja, mas teve apoio de membros desta, quando se candidatou à
prefeitura do Rio de Janeiro em 1992. Na ocasião, a AD apoiou, oficialmente, o candidato
Francisco Dornelles.
Dentro do PT também era difícil a sobrevivência de evangélicos. Na campanha da
Frente Brasil Popular (pró-Lula), em 1989, a liderança responsável pelo diálogo com outras
religiões reduzia a noção do tipo evangélico ao pregador da praça da Sé, em São Paulo.
Deste modo, o evangélico de esquerda era um ser duplamente deslocado e marginalizado,
“considerado pouco espiritual na igreja e pouco ideológico no partido”, conforme explicou
a deputada Benedita da Silva.
544
Nos dias 27 e 28 de agosto de 1993, a liderança do Movimento Evangélico
Progressista organizou o II Fórum Nacional de “Discussão e entendimento entre
evangélicos e partidos progressistas”, em Campinas (SP). A motivação principal era tentar
uma ação crítica contra o comportamento de parlamentares evangélicos que comprometiam
a boa reputação do protestantismo tradicional. Destacam-se, a seguir algumas
manifestações de participantes daquele evento.
O então deputado distrital Wasny de Roure, do PT-DF, se manifestou denunciando
o fisiologismo evangélico: “seja na busca de uma rádio ou de um telhado, muitas igrejas
são ávidas de acesso ao poder. Precisamos criar uma igreja vinculada, não à esquerda ou à
direita, mas ao conceito de serviço que Jesus nos deu”.
545
.
Da palavra de Valdir Steuernagel, presidente da Fraternidade Teológica Latino
Americana (FTLA), Freston destacou o seguinte: “’somos mais para celebração ufanista e
respostas baratas’. Antes, os evangélicos eram minoria com mentalidade de gueto e sonhos
escapistas. Agora, os sonhos são de ocupação de espaços. ‘Não cabemos mais nos guetos,
estamos ocupando as praças. Mas não sabemos direito o que isso significa. Ficamos
encantados com o poder’”
546
544
Apud FRESTON, 1994, p. 112.
545
FRESTON, 1994, p. 113, com grifo.
546
Idem, p. 115.
263
Os irmãos Terena, Marcos e Carlos, também estavam presentes. Carlos apontou o
compromisso dos católicos com os direitos dos indígenas, em contraste com a omissão dos
missionários protestantes e pentecostais, que só se interessavam em estar nas tribos para
fazerem proselitismo.
547
Ainda no tema corrupção, em outro momento, um fato a ser assinalado no Rio de
Janeiro foi a implantação do programa Cheque-cidadão, pelo governo de Anthony
Garotinho. Consistia na doação mensal de cem reais mensais para famílias carentes,
sacados do erário estadual. A autoridade responsável pelo programa era um pastor da
Assembléia de Deus, Everaldo Dias. Ele cadastrou majoritariamente as congregações de
sua denominação religiosa, entre as associações habilitadas a receberem e distribuírem os
donativos. Uma pesquisa realizada pela FGV Opinião comprovou afinidade maior a
práticas clientelistas e patrimonialistas entre pentecostais e católicos, do que entre
protestantes históricos e filiados a outras religiões ou entre os sem-religião. Segundo os
autores da pesquisa, Alberto Almeida e Zairo Cheibub, essas práticas têm apoio em
elementos doutrinários dos grupos citados.
548
A contaminação da política por vícios
semelhantes extrapolou o universo religioso. O governo Garotinho não tinha
constrangimento em se valer de práticas clientelistas como instrumento de sua política de
massas:
Se aqui corporativismo, clientelismo e patrimonialismo aparecem imbricados, veremos mais
adiante que as práticas clientelísticas extrapolaram o universo das denominações que
participavam diretamente e ainda participam de programas populares do governo estadual.
A proliferação de centros sociais com nomes dos políticos e a criação de entidades
filantrópicas ligadas às igrejas, que funcionam basicamente com recursos humanos e
financiamento de agências governamentais, indicam que muitos são os caminhos para a
troca de votos.
549
Na política, a IURD opera com todo um arsenal simbólico e doutrinário, dentro de
uma cosmovisão religiosa. Ela desloca a política para o campo religioso e vice-versa. O
discurso da Igreja na política é em defesa da moral pública, da ética, como de resto é o
547
Idem, p. 116.
548
Não se tem conhecimento se os pesquisadores Almeida e Cheibub explicitaram os pontos de doutrinas que se afinam com as
práticas dos respectivos grupos. Na falta de acesso direto à pesquisa, cita-se MACHADO, 2006, p. 105.
549
MACHADO, 2006: p. 106.
264
discurso de todas as agremiações religiosas. Todavia, como alguns de seus parlamentares
foram apanhados em corrupção, a Igreja recorreu à explicação teológica para esses
escândalos: afirma que tudo foi obra demoníaca e os parlamentares não resistiram às
tentações. O próprio Carlos Rodrigues envolveu-se nos casos Waldomiro Diniz
550
,
“mensalão”
551
e “sanguessugas”
552
, além de ser acusado como mandante no assassinato do
pastor e deputado estadual Valdeci Paiva, no Rio de Janeiro
553
. Outros envolvidos em
corrupção foram o ex-bispo deputado federal Wanderval Santos, também no “mensalão” e
no caso “sanguessugas”, a irmã do bispo Edir Macedo, deputada Edna Macedo, acusada de
receber, como “sanguessuga”, R$ 30 mil em espécie e R$ 10 mil, através de conta bancária
do filho, lotado como assessor em seu gabinete. Outros deputados iurdianos constaram do
relatório dessa CPMI sobre a máfia das ambulâncias. Quando o escândalo da Loterj foi
divulgado, a Universal tratou de afastar Rodrigues do episcopado e informar imediatamente
esta decisão ao grande público, em nota oficial, através da Rede Record. Nos casos
posteriores, foi impossível evitar o enorme desgaste da instituição, mesmo tendo impedido
que eles fossem novamente candidatos às eleições de 2006.
Para os que utilizam uma chave espiritualista de interpretação neopentecostal,
conforme foi referido, os freqüentes escândalos da política brasileira confirmam que tudo é
ação de forças demoníacas. Cada líder que cai é lamentado, banido, rapidamente esquecido
e substituído. Para isto as corporações pentecostais e neopentecostais são ágeis. “Cair da
graça”, ou “perder a comunhão”, segundo a linguagem pentecostal, é obra do “inimigo
número um de nossas almas”: o demônio. Portanto, tudo deve ser resolvido a partir deste
código religioso, de ampla abrangência espiritual e material, como crêem seus seguidores.
550
Desvio de verbas de publicidade da Loteria do Estado do Rio de Janeiro para a campanha eleitoral de 2002, quando
Waldomiro Diniz era apoiado pelo bispo Rodrigues. Parte desse dinheiro alimentou contas da esposa e filho do bispo. (Cf. jornal
O GLOBO, 22/09/2005, editoria País, p. 14)
551
Esquema de pagamentos periódicos a deputados da “base aliada” do PT, para motivá-los a votar em matérias de interesse do
governo, durante a gestão do presidente Lula, entre 2003 e 2005. O operador desse esquema era o empresário Marcos Valério
Fernandes de Souza, prestador de serviços de publicidade para órgãos e empresas federais. Suas agências superfaturavam serviços
e ele alimentava parlamentares com parte desse valor excedente. O escândalo foi apurado em comissão parlamentar de inquérito e
na Comissão de Ética da Câmara Federal.
552
Superfaturamento de ambulâncias, envolvendo parlamentares, assessores, funcionários de ministérios, prefeitos e outros
gestores públicos. Cf. cap. 5 desta tese.
553
Valdeci Paiva foi executado a tiros, sumariamente, nas proximidades da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, em fevereiro
de 2003, mas as suspeitas mais fortes de quem terá sido o mandante do crime convergiram para o suplente de Paiva, que assumiu
seu mandato, e não para o bispo Rodrigues.
265
O remédio para a sociedade brasileira, segundo essas vertentes religiosas seria
eleger seus agentes, a fim de realizar a moralização dos parlamentos e executivos.
Entretanto, com a incidência de uma enorme quantidade de políticos pentecostais
apanhados em falcatruas, tem sido difícil para suas instituições sustentarem este discurso.
Mesmo assim, não se tem perspectiva de recuo do investimento pentecostal no campo
político, embora se saiba que a nova Frente Parlamentar Evangélica ficou reduzida a dois
terços, para a legislatura 2007-11, em relação à anterior, como provável sinal de indignação
dos eleitores pentecostais e neopentecostais aos desmandos de seus representantes.
3.7 Avaliações de desempenho dos políticos pentecostais
O acompanhamento dos parlamentares evangélicos, desde 1986, permite eliminar
alguns estereótipos. O voto desse conjunto não é mais conservador nem mais à direita do
que o da média dos parlamentares federais. Durante o Congresso Constituinte, nas votações
de interesse dos trabalhadores, os evangélicos ficaram próximos da média, enquanto os
pentecostais obtiveram pontuação acima da média. A média geral foi de 4,94. Os
evangélicos obtiveram 4,61 e os pentecostais alcançaram 5,06. A avaliação foi feita pelo
DIAP, Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, atribuindo notas para cada
constituinte, no intervalo de 0 a 10, incluindo os extremos. A nota máxima indicava que o
parlamentar foi favorável ao trabalhador em todas as votações do processo
constitucional.
554
Freston sintetizou na seguinte frase o modo pentecostal de votar no Congresso
Constituinte: “Podemos dizer que os pentecostais na ANC não foram uma ‘direita
ideológica’, mas sim, um ‘centro fisiológico’”.
555
É comum, no meio pentecostal, encarar ascensão social como sinal de bênção. Seus
líderes prosperam e ganham reconhecimento como pessoas abençoadas. Entre eles não há
uma ideologia anticapitalista, embora também não adotem o neoliberalismo. Aliás, não há
554
FRESTON, 1994, p. 82 e 157 a 161.
555
Idem, p.82.
266
entre eles clareza id eológica, seja em economia seja em política. As votações dos
pentecostais e neopentecostais seguem, em geral, as orientações dos partidos, salvo em
temas ligados à moral e aos costumes, como aborto e união civil de homossexuais, quando
adotam o modo de pensar majoritário dos evangélicos, que é um pensar conservador.
Uma análise da filiação partidária indica que os evangélicos estiveram amplamente
distribuídos em partidos de apoio e de oposição ao governo, durante a legislatura de 1999 a
2003. Em 2001, Alexandre Fonseca registrava 32 parlamentares na situação e 25 na
oposição.
556
Na Frente Parlamentar Evangélica, que atuou na legislatura seguinte (2003-
07), eles se distribuíram em aproximadamente 45% na chamada base aliada, 35% na
oposição e 20% sem identidade bem definida. Observou-se nessa legislatura que os votos
evangélicos eram marcadamente fisiológicos, como tem sido o de grande parte do
Congresso, fato que permite a governos sem maioria consolidada em coligações partidárias,
como foram os casos de Collor e Lula, criarem maiorias circunstanciais, na base de
distribuição de cargos e outras benesses.
Regina Novaes resiste a aceitar estereótipos sobre o voto do eleitorado evangélico.
Segundo ela, não se pode simplesmente enquadrar o comportamento evangélico como
alienado ou fundamentalista, nem afirmar que seu voto é de cabresto. Com efeito, para se
fazer jus a uma análise sensata, convém evitar homogeneizações e previsões estáticas do
comportamento de eleitores evangélicos, da mesma forma como se deve proceder com
qualquer grupo de cidadãos, salvo organizações extremamente radicais, nas quais o
indivíduo não tem autonomia de decisão.
556
Apud ORO, 2006, p. 123.
267
Conclusão
Os pentecostais demoraram para entrar na política. Enquanto os protestantes tiveram
participação nos legislativos do País, desde os anos de 1930, os pentecostais somente
despertaram para a necessidade de elegerem seus candidatos meio século depois.
Entretanto, quando o fizeram, principalmente a partir do Congresso Constituinte de 1987-
88, provocaram alterações no meio político e religioso. Pode-se afirmar que, pelo seu modo
de ser, politizaram o pentecostalismo e pentecostalizaram a política. As mudanças geradas
em ambos os campos determinaram a necessidade de adaptação dos agentes mais antigos
desses espaços de poder.
As práticas políticas dos pentecostais revelaram que eles são ativos mobilizadores
de recursos públicos para beneficiar suas organizações. Eles tiveram êxito, por exemplo, na
conquista de concessões de rádio e televisão. Organizaram-se em bloco para negociar
benefícios no âmbito do Congresso e nas relações com o Governo. Também repetiram os
mesmos vícios do patrimonialismo, clientelismo e nepotismo que encontraram nessas
instâncias da vida política do País.
As cúpulas das igrejas desta pesquisa Assembléia de Deus e Universal do Reino
de Deus deram prova de sua capacidade de organização, no campo da política, do mesmo
modo como já haviam demonstrado isto na construção de suas poderosas denominações. A
Igreja Universal, principalmente, provou ser mais ágil e mais coesa na exploração das
oportunidades políticas do que a Assembléia de Deus. A IURD praticamente já nasceu com
a visão de operar com desenvoltura o jogo da política. O modelo autoritário de sua
organização, com um núcleo central forte e uma voz de comando incontestável, facilitou
seu sucesso eleitoral e permitiu que ela constituísse, com menos de três décadas de
existência, uma bancada coesa de parlamentares no Congresso, quase do porte da bancada
da quase centenária Assembléia de Deus. Isto ocorreu, em parte, porque a Assembléia de
Deus teve que “costurar” alianças entre seus grupos regionais de poder para alcançar
melhor capacidade de ação no Congresso. Neste sentido, afirma-se que há semelhança entre
268
a organização do poder na Assembléia de Deus e a velha política brasileira das oligarquias
regionais, em que o poder era distribuído entre os “coronéis” da República.
Pode-se concluir que o pentecostalismo definitivamente se politizou e se credenciou
como ator político no cenário brasileiro. Ao fazê-lo, trouxe novas energias ao processo
democrático, pois, até onde se percebe, aceita com tranqüilidade as regras da democracia
representativa liberal, tirando proveito para si, encarnado em corporações, que operam,
também, como verdadeiros grupos de pressão. A presença pentecostal evidencia que o
processo democrático está aberto a novas contribuições, com possibilidade de inclusão de
outros segmentos populacionais, que, neste caso, estão entre os mais pobres da sociedade.
Também se constata que os parlamentares dessas igrejas, no conjunto, apresentam níveis de
escolaridade um pouco abaixo do verificado no Congresso como um todo, embora
ofereçam, também, quadros bastante qualificados, tanto na escolaridade formal quanto na
habilidade em participar dos jogos políticos. Eles inflamam o debate dos costumes,
compartilhando a arena com outros grupos que se dedicam a questões de gênero, etnia e
políticas de reconhecimento, porém o discurso do grupo evangélico favorece mais o lado
moralista e, às vezes, intolerante, da cultura brasileira.
A sociedade política e o mundo acadêmico não podem ignorar mais a presença
desses novos agentes religiosos com ambições de maior participação no processo
democrático brasileiro. A democracia brasileira é uma construção em processo. Até agora
ela tem servido para administrar desigualdades. Muitas vezes, a legislação tem sido criada
para ampliar essas desigualdades ou preservar privilégios, através de mecanismos
tributários, orçamentários, de incentivos fiscais e outros. Os problemas estruturais do
sistema econômico não se constituem em preocupação para o conjunto de pentecostais e
neopentecostais ingressos nas atividades partidárias. O que importa para eles, na condição
de participantes relativamente novos, é serem reconhecidos e aceitos. Eles não sentem
desconforto com os métodos da real politik jogos de bastidores, eliminação política de
adversários, falta de transparência no trato da coisa pública porque em suas instituições
reproduzem-se os mesmos vícios da cultura política brasileira.
Deste modo, não há como esperar grandes contribuições saneadoras, de mérito
revolucionário, nem mesmo reformista, provenientes desses grupos religiosos. Suas
269
iniciativas têm sido, quase sempre, no sentido de reforçar as corporações que representam.
De qualquer maneira, há mérito nessa participação. O mérito é o fato deles incluírem, no
jogo democrático, segmentos da população que antes eram tratados indistintamente como
massa, no populismo genérico dos políticos tradicionais.
A nova forma de inclusão que os pentecostais promovem é através de um populismo
religioso, em escala menor e mais atento às necessidades específicas do seu público,
mesmo que a prioridade seja para questões corporativas e de cunho moralista. Existe,
também, tentativa de política social em benefício de populações empobrecidas, como
ocorreu no Rio de Janeiro, sob a gestão do governador Garotinho. Uma delas foi o
programa cheque-cidadão, que doava, mensalmente, a quantia de cem reais, sacados do
erário estadual. Gerenciado por um pastor da Assembléia de Deus, Everaldo Dias, sua
implementação trouxe favorecimento para membros desse grupo religioso.
Não se pode negar que a presença dos pentecostais na política traz incômodo,
porque se trata de gente sem o perfil tradicional daqueles que já estavam há mais tempo
nessas lides. Como os espaços são limitados, o ingresso de novos implica na exclusão de
alguns mais antigos. Todavia, quando estes novos se dispõem a jogar o mesmo jogo,
inclusive os truques, a assimilação deles pelos controladores do campo se torna mais fácil.
270
Capítulo 4
O político pentecostal
Introdução
No capítulo anterior procurou-se enfocar as trajetórias dos pentecostais e
neopentecostais na política brasileira, com base, principalmente, na produção acadêmica e
alguns aportes extraídos de notícias publicadas na chamada grande imprensa do País. Neste
capítulo pretende-se traçar a figura do político pentecostal como “tipo ideal”
557
, realçando
suas principais características, a partir dos contextos sociais responsáveis pela criação e
desenvolvimento deste ator político, que são as próprias denominações pentecostais e
neopentecostais. O político pentecostal lida com o sistema partidário e aqui se procura
analisar como ele escolhe uma legenda, que relações se estabelecem entre o projeto da
corporação à qual ele pertence e essa legenda. Também é observado o fenômeno da troca
freqüente de partido no grupo político estudado. A campanha do “candidato oficial” da
igreja e a atuação dos que se elegem para defender os interesses do seu grupo religioso
completam o tipo do político pentecostal aqui apresentado.
557
Sobre tipo ideal, cf. WEBER, Max. A “objetividade” do conhecimento na ciência social e na ciência política 1904. In: _____.
Metodologia das Ciências Sociais Parte I. São Paulo: Cortez; Campinas: Unicamp, 1993, p. 107-54. FREUND, Julien.
Sociologia de Max Weber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000, p. 47-61; RINGER, Fritz. A metodologia de Max
Weber: unificação das ciências culturais e sociais. São Paulo: EDUSP, 2004, p. 114-24.
271
4.1 O “candidato oficial”.
As igrejas Evangelho Quadrangular, Assembléia de Deus e Universal do Reino de
Deus, decidiram, desde a campanha para o Congresso Constituinte de 1987-8, conquistar
espaços na política brasileira, a partir de estratégias corporativas, com a preparação dos
membros para votarem em candidatos oficialmente escolhidos pelas lideranças
denominacionais. A fim de lograrem êxito nessa empreitada, confirmado pela adesão e
apoio dos membros, participação destes nas campanhas e votação em favor de seus
candidatos, essas igrejas enfatizaram o tema da unidade de propósitos, como valor que
deveria ser cultivado por seu corpo de freqüentadores. Exemplo disto está em sermão do
coordenador nacional de ação política da Assembléia de Deus, pastor Ronaldo Fonseca,
para candidatos a vereadores, prefeitos e vice-prefeitos de São Paulo.
558
Ele questionava os
ouvintes:
Meu irmão, como é que tu quer ganhar a eleição se você não conseguiu o voto nem da
esposa? (risos) Tem que dar um jeito. E os teus filhos? E o teu marido, o Costinha, vai
votar? E os filhos vão votar? E o marido vai votar? A esposa vai votar? “Oh, eu não estou
conseguindo votos nem dentro de casa”, então tem alguma coisa errada aí. Primeiro que a
política não pode dividir a família. Nem a igreja nem a família. Não é política, é projeto.
Qualquer projeto nosso tem que estar de acordo com a família. Senão você pode nadar,
nadar, nadar e morre na praia. Não tem jeito. Unidade gente. Todo mundo falando a mesma
língua. Todo mundo no mesmo propósito. Ninguém podia sair da ordem.
559
E uma das
coisas mais difíceis para nós nesse projeto político é conseguir a unidade de um povo em
torno de um nome.
Na mesma fala, Fonseca insistia que “todo o povo deveria estar unido dentro do
mesmo propósito”, embora reconhecesse que “unidade nem sempre é fácil de manter”. E
dava a seguinte explicação:
Eu sou pastor de igreja há vinte anos. E como é difícil quando você vai escolher o
candidato, meu Deus do céu. Porque tem um irmãozinho que representa aquela família, tem
um outro lá também. Aí escolhe esse aqui e ofende o outro lá. As pessoas que têm
558
Mensagem do pastor Ronaldo Fonseca, no fórum de candidatos da AD-SP para as eleições municipais de 2004, no São Paulo
Hilton, em junho de 2004.
559
O pastor Ronaldo Fonseca se referia a um episódio da queda dos muros de Jerusalém, narrado na Bíblia, livro de Josué, cap. 5,
texto este que serviu de base para sua mensagem.
272
pretensão política é que têm que ter juízo. Facilitar para o pastor. Facilitar para a igreja,
facilitar para o ministério. Agora não é tua vez, é a vez do outro, depois vai chegar a sua
vez, espera meu irmão. Em um grupo social nós temos que esperar nossa vez. Não
podemos desentoar, temos que estar no tom do grupo. Eu não entendo...
560
A Assembléia de Deus tem acumulado experiência, mediante realização de prévias
em todo o Brasil, para a escolha de seus “candidatos oficiais” aos parlamentos,
principalmente. O colégio eleitoral dessas prévias é formado por pastores e obreiros da
Igreja. No caso das eleições municipais do Estado de São Paulo, em 2004, cada pastor ou
membro que desejava contar com o apoio da Igreja, como “candidato oficial”, teve que
assinar um documento, antes da prévia, no qual renunciava a se candidatar e se
comprometia a apoiar outro candidato vencedor, caso seu nome não fosse o escolhido. O
coordenador político estadual, pastor Paulo Freire, assim se expressou perante os inscritos:
Irmãos, eu não estou vendo candidato, eu estou vendo o projeto político da CGADB
561
.
Qualquer um dos senhores que ganhar a prévia, nós vamos apoiar, porque nós não estamos
olhando candidato, nós estamos olhando o projeto. Então, ganhando nós vamos apoiar e
vamos exigir o compromisso que vocês assinaram conosco. Por quê? Porque nós somos
crentes, a Igreja. A eleição vem, ela passa e nós vamos continuar todos juntos, trabalhando
para Jesus. Nós não podemos, em hipótese nenhuma, chegar a ponto de ir contra a Igreja.
Não podemos fazer isso. Então vamos fazer um negócio limpo, bonito, cristão, para a gente
não ter problema nenhum. Foi feita a eleição, um ganhou e os demais, então, aderiram ao
apoio. Esses não vão sair porque assinaram um compromisso conosco. Se saírem, eu vou
chegar no púlpito e dizer: Eles têm o direito de sair porque a Constituição lhes dá o direito
de sair. Só que eles assinaram um compromisso com a Igreja de não saírem e apoiarem o
candidato vencedor da nossa prévia interna. Portanto, ele está saindo por fora, quebrando
um acordo que fez com a Igreja. Agora, se ele quebra um acordo antes da eleição, imagine
depois? Depois de eleito, depois de vereador, ele não consegue nem lembrar que existe
igreja. Nem que existe compromisso com nada. Essa é a maneira que nós estamos
trabalhando.
562
Apesar dos esforços da cúpula da Assembléia de Deus, por unidade e disciplina
como parte da estratégia eleitoral, são freqüentes, em todo o Brasil, as quebras de
560
Ibidem.
561
CGADB é a sigla que corresponde à Convenção Geral das Assembléias de Deus do Brasil.
562
Pastor Paulo Freire, fórum de candidatos da AD-SP, eleições municipais de 2004, hotel SP-Hilton, junho de 2004.
273
compromisso desses postulantes a “candidato oficial”, devido à característica da própria
denominação, que é dispor de um núcleo de poder nacional fraco e lideranças regionais
fortes, o que serve de motivação para relaxar os laços de hierarquia em toda a corporação.
Todavia, quando acontece essa quebra de compromisso, o candidato extra-oficial não pode
fazer sua campanha dentro dos templos. “Aquele que sai como candidato que não é
mantenedor de mandato, se não é vereador, então ele pode até assistir aos cultos,
normalmente, claro, mas ele faz a campanha dele do portão para fora da igreja”,
acrescentava o pastor Freire, explicando em seguida: “Porque se nós permitirmos, irmãos,
que esses irmãos que não participaram da prévia, [...] se nós permitirmos que eles ocupem
nossos púlpitos, eles vão acabar arrebentando com o projeto da igreja”.
563
Não sendo possível evitar o lançamento de candidatos extra-oficiais, a Assembléia
de Deus tem radicalizado a disciplina contra pastores e diáconos que se recusam a aderir ao
“candidato oficial”. A cúpula da Igreja entende que um candidato avulso pode dispersar os
votos assembleianos, mas pode, também, agregar mais eleitores para o conjunto de
candidatos ligados à Igreja. Além disto, um candidato assembleiano vitorioso, mesmo não
tendo recebido a “unção” da igreja, pode ser cooptado, posteriormente, para trazer
benefícios para ela, como ocorreu com o deputado Neuton Lima, conforme relato do
mesmo Paulo Freire:
O que está saindo por fora não vai atrapalhar porque entende o projeto da igreja e
vai acabar ganhando bem, amanhã ou depois. O deputado Neuton Lima chegou para o
pastor José Wellington quando saiu candidato a deputado federal pela primeira vez, chegou
para o pastor José Wellington e o pastor disse: “Desculpe Neuton, eu não sabia que você
era candidato e já fiz compromisso com outro candidato. Você é como um filho para mim:
se eu soubesse que você ia sair candidato, eu teria dado minha palavra, mas eu já dei a
minha palavra e eu não posso te apoiar”. E o que aconteceu? O Neuton lutou, saiu por fora,
acreditou e ganhou a eleição. Ganhou a eleição em um dia, no outro dia foi para o pastor
José Wellington e disse: “Pastor, está aqui, sou deputado da Assembléia de Deus. Sou filho
desta Casa. Coloco o meu mandato a disposição da Igreja. Quero ser representante da
Igreja”. Pastor José Wellington disse: “Perfeitamente. O nosso compromisso com o outro
563
Ibidem.
274
candidato era de apoiá-lo para ele ser eleito. Ele se elegeu. Ele não tem compromisso
conosco e nem nós também com ele. Acabou. Nosso deputado agora é Neuton Lima”. E
tem sido até então. Veio agora a eleição, foi eleito para a glória do Senhor. Tem muitos que
estão saindo por fora, que naturalmente entendem que a Igreja não pode apoiá-los porque
tem um candidato escolhido. Ele pode ir, fazer a campanha e, ganhando ele, pode vir e
fazer parte do projeto. Sendo parte do projeto ele não sai mais. Sendo parte do projeto não
sai mais. Então é essa a orientação que nós estamos passando a todos dirigentes e pastores.
Amém meus irmãos? “Amém”. Se vocês não quiserem acreditar em mim, perguntem ao
pastor José Wellington, mas não façam um teste.
564
Deste modo, não é atitude inteligente hostilizar candidatos avulsos. Já um pastor ou
diácono rebelde, ou seja, que apóia candidato extra-oficial, constitui-se em ameaça para a
estabilidade da organização. O pastor Paulo Freire contou o caso de um diácono que fazia
campanha contra o candidato oficial da Igreja e a favor de um outro. Ao receber denúncia,
chamou o dissidente e manteve com ele a seguinte conversa:
“Não fica bem irmão: faça propaganda do seu candidato sem jogar lama no nosso.
Fica ruim para você, para nós. Isso é muito feio”. Ele disse: “Pastor, o senhor vai me
desculpar, o senhor é meu pastor, mas em questão política é outra coisa, entendeu? E eu
vou continuar falando mal dele porque ele não presta”. Falei: “Faça o que o senhor quiser,
estou lhe pedindo, mas é um direito que o senhor tem”. Eu fui para a sede, chamei o [...]
líder dos diáconos da sede, e falei: “Essa pessoa aqui perdeu minha confiança. Pode tirar o
nomezinho dele daí, deixa ele sentado”. Quando ele chegou para trabalhar o irmão disse:
“O pastor pediu para tirar. Não tem condições de você continuar nos ajudando”. Ele pegou
a credencial de diácono e falou: “Pastor, se eu não sirvo, está aqui minha credencial”. O
pastor disse: “Muito obrigado, eu preciso trabalhar com homens da inteira confiança, o
ministério precisa trabalhar, porque hoje é um projeto desses que você não apóia, amanhã é
um projeto de evangelismo, projeto de construção, projeto de compra de terreno ou
qualquer outro projeto, você vai ter que [se] levantar contra... Então, fique sentadinho ai.
Vou cortar o mal pela raiz, que comigo você não serve para trabalhar”.
565
564
Ibidem.
565
Ibidem.
275
Em outro caso, um dirigente do interior paulista, que servia a um candidato extra-
oficial, estranhou o chamado à disciplina e fez algumas ponderações, tentando tornar claro
que seu compromisso com a dimensão religiosa da Igreja não o obrigava a aderir à linha
política da mesma. Os argumentos desse dirigente de congregação foram inúteis e ele teve
que acatar a imposição da cúpula, pois esta entende que o projeto político é peça chave para
os objetivos estratégicos da Assembléia de Deus na sociedade brasileira. O pastor-
presidente, José Wellington, recomendou ao coordenador político estadual, Paulo Freire,
que fosse interpelar o dissidente. O relato desse encontro é bastante sugestivo e merece ser
transcrito:
Vá, converse com ele e se ele não aderir, (que ele já tem conhecimento), se ele não aderir
ao projeto eu vou tirá-lo do setor”. Eu fui, conversei com o irmão e ele não acreditou no que
eu falei. Ele falou: “Ah, que é isso? O pastor vai me tirar por causa de política?” Falei:
“Não; não é por causa de política não, é por causa do projeto da Igreja. O irmão está sendo
desobediente ao projeto nosso, da Igreja, irmão”. Não acreditou, tudo bem. Lá na frente,
continuou fazendo a mesma coisa, foi chamado, chamou o Lelis, conversou com o Lelis, o
Lelis conversou com ele também. Marcamos uma outra reunião. Nesta outra reunião,
conversei com o pastor José Wellington, antes da reunião, e ele disse: “Pode apertar e se ele
não abrir mão, eu vou substituí-lo”. Volto para a reunião, falei, e falei sério, mostrando para
os irmãos como é que tinha que ser. Ele ou vai aderir ao projeto ou então sai fora. Entendeu?
A orientação que nós estamos dando aos nossos dirigentes e pastores é essa. Se você tem um
candidato ou um compromisso pessoal com um outro candidato chegue lá e diga: “Pastor,
eu não posso continuar a frente da congregação porque eu tenho um compromisso com
outro candidato que não é o nosso, que não é o escolhido. Eu sinto muito, eu não posso”. Vá
trabalhar com o seu candidato, não tem problema nenhum. Agora: estar na frente da
congregação... O dirigente da congregação tem que apoiar o projeto político. Está certo?
Isso aconteceu, nós falamos para a pessoa. Ela não acreditou, foi falar com o pastor depois
disso. O Pastor falou: “Aquilo que o pastor Paulo falou está certo. E tem outra coisa, não
adianta vir com o seu padrinho, que eu tiro você e tiro seu padrinho também”. Então a coisa
é séria. Depois ele mesmo lá no setor, chamou os dois candidatos em uma reunião com os
obreiros e disse: “Irmãos, a coisa está mais séria do que eu pensava. Então, por favor, vamos
trabalhar direitinho e assim, assim, assim e assim”. Aderiu, glória a Deus, graças a Deus!
Então, meus queridos, a orientação que nós estamos dando é essa. Porque o candidato que
276
sai por fora só vai ter espaço se o dirigente der. Se o dirigente trair o projeto. Trair o seu
pastor-presidente. Aí ele vai ter espaço. Agora, se não houver isto, vai dar tudo certo.
566
A Assembléia de Deus (Missão) realiza prévias para escolha dos seus candidatos,
mas as relações de parentesco do postulante, principalmente com o presidente da Igreja em
seu Estado, têm grande influência nessa decisão. Outra particularidade que influi na escolha
é o reconhecimento de que o interessado prestou ou tem prestado relevantes serviços para a
Igreja. Há uma etapa de pré-seleção, na qual são estabelecidos os nomes a serem oferecidos
para o conjunto de pastores que irão votar na prévia. Uma assessora de deputados da Frente
Parlamentar Evangélica apontou o caráter nepotista das indicações de “candidatos oficiais”
da Assembléia de Deus. Ela expressou sentimentos de quem convive dia a dia com os
parlamentares dessa grande denominação:
Eu tenho acompanhado a política dentro da AD, também. Lá a coisa acontece de uma outra
forma. Lá é eleito geralmente o genro do pastor presidente do Estado. É eleito geralmente o
filho do pastor presidente. Deixa te dar um exemplo: deputado Isaías Silvestre de Minas
Gerais. O pai dele é o pastor [...] Silvestre, pastor presidente das AD de Minas Gerais.
Vamos ver o deputado Agnaldo Muniz, de Roraima, da Assembléia de Deus. A esposa dele
é a filha do presidente das Assembléias de Deus de Roraima. Vamos ver também a questão
do deputado Takayama. O deputado Takayama, das Assembléias de Deus do Paraná, ele é
tido como o maior missionário das Assembléias de Deus do Paraná. Vamos citar o exemplo
do deputado Raimundo [Santos, do Estado do Pará] ... Então na Assembléia de Deus é tudo
ali muito entre família. Eles são escolhidos pelo relacionamento que eles têm com o
presidente. De que forma eles são relacionados ao presidente e se submetem ao presidente
da igreja. E aqui vai uma crítica: a igreja evangélica poderia, sim, ter representantes, mas em
lugar nenhum está garantido que esse representante tinha que ser o seu próprio pastor. Eu
pergunto: será que a igreja de Roraima não teria ninguém com conhecimento jurídico ou na
área social, ou na área da saúde, ou da educação, que pudesse vir aqui e fazer melhor que o
deputado Agnaldo Muniz? [...] Então um grande erro que eu entendo na igreja. Por que tem
que ser um pastor o candidato? Por que não pode ser um bom membro? Pessoas que já
estejam envolvidas com causas políticas, com causas sociais, uma pessoa que já... Eu
acredito que não precisava nem ser um evangélico, mas uma pessoa comprometida com
algumas causas [...] Aqui vai mais uma crítica e mais uma observação.
567
566
Ibidem.
567
Depoimento da assessora Mônica, gravado em Brasília, 15/09/2006. “Mônica” é nome fictício, para preservar a integridade da
fonte.
277
A escolha do candidato oficial é o ponto de chegada de uma longa campanha interna
que mobiliza pastores e liderados nos municípios e estados onde há candidatos da igreja. A
Igreja do Evangelho Quadrangular, por exemplo, escolhe e homologa em Convenção
Estadual os nomes dos concorrentes oficiais. A movimentação é muito intensa:
aqueles grandes nomes que querem ser eleitos começam a distribuir material de propaganda,
começam a visitar as igrejas para pregar [...] E as mensagens são muito direcionadas. As
mensagens são muito bonitas, muito bem escritas, para impressionar o pastor local e a
liderança local. Esses pastores começam a se envolver com os pastores mais pobres que
tem isso na Igreja Quadrangular: tem os grandes caciques e tem o pobre coitado lá do
interior, que ninguém presta atenção nele, a não ser num momento desses, em que querem
votos. Então, o que acontece? Começa a haver, no Estado ali uma mobilização tão grande
para essa campanha, que é para a Convenção Estadual onde vão ser escolhidos os nomes.
568
Nessa mesma denominação, a campanha interna, realizada em São Paulo, para a
escolha de candidato a deputado federal, legislatura de 2003-7, gerou diversos conflitos. Já
existia um deputado que pleiteava concorrer à reeleição. Durante os seis meses que
precederam a Convenção para oficializar o candidato da Igreja desenrolou-se uma tensa
campanha. Aproveitando este exemplo, com a intenção de mostrar como a Igreja se desvia
de suas atividades tradicionais e se comporta como um partido político, a pastora Raquel
faz o seguinte relato:
a Igreja por seis meses se envolve só com a campanha para aquela Convenção. E é briga, é
confusão, pastor falando mal de pastor. Entre eles começam a circular denúncias, cartas
anônimas, começam a circular todos os tipos de confusões que você imaginar, tudo isso
pensando apenas na prévia, na Convenção em que serão homologados os nomes. Depois de
todos os tipos de puxa -tapetes, de arrastão, de confusão, de alianças, de brigas, acontece a
Convenção Estadual. E o voto é secreto, o voto é por urna. Apuram-se os votos e aquele que
é homologado o nome como “candidato oficial”, ele se torna um deus e todos os outros, que
brigaram com ele o tempo todo, são obrigados, agora, a trabalhar para ele na campanha
eleitoral, lá com o partido.
569
Passada essa fase de lutas internas e aprovado o nome do “candidato oficial” da
igreja, os pastores passam a cumprir uma fase de persuasão dos membros, para que
568
Depoimento da pastora Raquel, da Quadrangular, interior de São Paulo, gravado em 15.09.2006. “Raquel” é pseudônimo. Essa
pastora pediu sigilo de sua identidade, para evitar retaliações.
569
Ibidem.
278
trabalhem em prol do escolhido, a fim de conquistarem votos, também, de pessoas de fora
da denominação. O calendário eleitoral é tão extenso e exige tanta dedicação, que a
Quadrangular consome, pelo menos, 25 % do tempo em atividades dessa natureza. Ou, nas
palavras da pastora Raquel: “a cada quatro anos a Igreja Quadrangular perde, pelo menos,
um ano, envolvida com a política partidária”. A campanha consome recursos da Igreja, não
somente dinheiro, mas tempo dos pastores e de alguns membros, e coloca a própria infra-
estrutura de prédios e de transporte a serviço da campanha dos candidatos. Essa ampla
atividade política não é, propriamente, voluntária. Trata-se de um projeto corporativo,
imposto de cima para baixo. Nas palavras de Raquel:
Todo evento que tem no Estado aquele “homem oficial”, aqueles “nomes oficiais , são
convidados. Os pastores têm reunião com eles, para montarem estratégia política, pelo
menos duas vezes por mês. Os pastores têm que ajudar na confecção de material. Os
pastores têm que colocar os seus carros, a sua gasolina, o dinheiro da sua igreja à disposição
daquele candidato. Quando aquele candidato vai à igreja local, o pas tor hospeda, o pastor dá
comida, o pastor dá toda a estrutura. Então o que acontece? A igreja investe dinheiro, tempo
e gente, nessa campanha para as eleições. E aí depois começa o grande problema, que é a
coação, ameaça, o medo. O pastor que não obedecer à Convenção Estadual e que não
trabalhar pelo candidato da Igreja ele sofre, inclusive, sanções. Você pode ver no estatuto: a
palavra sanção não está explícita no estatuto, mas o estatuto faz um apelo à fidelidade à
igreja e à submissão à autoridade. Entre linhas, isto quer dizer: se você não votar no
candidato da igreja, você pode, inclusive, perder o seu cargo de pastor. E aí, começa-se todo
um medo, toda uma coação, e os pastores começam a trabalhar em cima dos membros, da
necessidade de votar naquele candidato.
570
A forma de trabalhar é estabelecida, também, pela cúpula da Igreja. São
confeccionados e distribuídos manuais, com pautas de mensagens sobre “autoridade e
submissão”. Os membros que não forem obedientes às ordens dos pastores estarão sob
“maldição”. São realizados estudos bíblicos, mensagens, lições de escola dominical, sobre
o tema “cidadania”, mas o emprego de todo o material impresso e exposições orais deve
convergir para a propaganda do candidato. Mais do que simples divulgação, os membros
são coagidos a votarem no candidato da Igreja.
570
Ibidem.
279
Além da Quadrangular e Universal, a concepção de candidatura como projeto
corporativo é adotada tanto pela CGADB (Assembléia de Deus “Missão”) como pela
Conamad (AD “Madureira”). Esta condição permite que a campanha seja menos onerosa,
no sentido financeiro, mesmo não sendo este o objetivo principal a ser atingido
571
. Na
mensagem aos candidatos da eleição municipal de 2004, em São Paulo, o pastor Ronaldo
Fonseca pregava:
Candidato que não tem a benção de seu líder não ganha eleição. Se ganha, não prospera. Se
ganha não prospera, tem que haver humildade. Tem que haver um projeto institucional. Esse
negócio de projeto individual. Político que tem uma candidatura própria individual tem que
ter muito dinheiro para ganhar a eleição e é político que não presta. Quando chega lá não faz
nada. Chega lá e não faz nada. É só uma vaidade pessoal. Político bom é aquele que
representa um grupo social. Que tem representatividade. E nós, evangélicos, temos como
ganhar a eleição sem dinheiro. Infelizmente, na época que chega a eleição, vêm os
poderosos do dinheiro e começam a comprar muita gente por que nós não temos unidade.
Porque se nós tivermos unidade, meu irmão, não há dinheiro no mundo que derrube nosso
projeto. Com unidade nós podemos vencer qualquer poder econômico.
572
Sobre essa experiência de trabalhar com pouco dinhe iro, o pastor Pedro Ribeiro,
referindo-se a campanha anterior, de 2002, no Ceará, afirmava o seguinte:
O projeto Cidadania [AD Brasil] no Ceará foi muito bem sucedido, porque nós pegamos
como a muleta, ou seja, eu, candidato a deputado federal, pastor no interior do Estado, sem
dinheiro, e o candidato a deputado estadual, um médico, vereador da capital, mas também
sem dinheiro. E nenhum... eu tinha uma história rápida, política, de um mandato completo
de vereador. Ele tinha metade de um mandato, dois anos. Mas nós pegamos a visão do
projeto Cidadania, o estatuto do projeto, pelo menos o que estava alinhavado, e divulgamos,
dizendo: Nós somos candidatos oficiais da Convenção Geral. Então, irmãos, hoje a
Assembléia de Deus resolve não só olhar para a comunidade brasileira, como uma
comunidade carente de salvação, mas também carente de salários-mínimos, de dignidade, de
justiça, e quer fazer um deputado”. Então, nós que aproveitamos bem, aí demos o exemplo
para todo o Brasil de... conseguindo uma votação expressiva... Eu fui votado em todos os
cento e oitenta e quatro municípios do Estado. Eu só obtive 51.278 votos, porque eu tenho
571
A campanha mais barata para deputado federal, em 2006, segundo registros do Tribunal Superior Eleitoral, foi a do candidato
eleito Marcos Antônio (PSC-PE), que obteve 62.019 votos. A Frente Parlamentar Evangélica cadastrou este candidato como
membro da Igreja Metodista Wesleyana. Sua prestação de contas informa despesas de R$ 5.580,27, receitas de R$ 5.700,00,
resultando em valor investido por voto de R$ 0,089. (Cf. site http://congressoemfoco.ig.com.br/Noticia.aspx?id=12394, acessado
em 06.12.2006).
572
Pastor Ronaldo Fonseca, São Paulo Hilton, junho de 2004.
280
potencial, eu espero na reeleição dobrar, porque há um potencial muito bom, mas, mesmo
assim, sem gastar dinheiro eu não visitei metade dos campos, metade do Estado, porque eu
não tive condições fui votado em todos os municípios. Então, quando o pastor José
Wellington diz, e é publicado no Mensageiro da Paz, publicado nesse jornal novo agora, o
AD Brasil, que o povo toma conhecimento, certamente a maioria adere, a maioria adere. É
impressionante.
573
O pastor Pedro Ribeiro, deputado federal pelo Ceará, compara a antiga forma de
votar dos membros da Assembléia de Deus, que atendiam pedidos de candidatos das velhas
oligarquias do Nordeste e beneficiavam candidatos estranhos à igreja, com a forma atual,
de escolha de candidatos da corporação. Ele explica a nova estratégia eleitoral da sua
igreja:
A minha estratégia? A geral da Assembléia de Deus, na Convenção Geral, que foi através de
um Conselho, [...] presidido pelo pastor Ronaldo [Fonseca], emitiu um documento com as
orientações básicas de como a gente se conduzir. Quem pode se candidatar? Como é
escolhido? Foi escolhido por prévia, que depois de escolhido deve receber o apoio das
lideranças. [Cabe] às lideranças estaduais falarem com os pastores de cada município para
eles apoiarem, e daí o candidato visitar, levando a visão que tem, pregando e dando o
testemunho de sua vida e fazer de tudo para que o líder não vote mais naquela família que
historicamente ele votava, porque já serviu há muito tempo. É hora de servir ao “doméstico
da . Porque essa história muita gente dizia, porque a gente sabe que tem isso: no interior,
por exemplo, se a gente voltar cinqüenta anos, vem do vovô e da vovó, sempre a família
votou na família “X”. Agora não, agora chegou a hora da “família dos santos. Vamos votar
nos evangélicos. Então tem sido essa a nossa estratégia. Foi muito boa e eu acho... outra
coisa que eu procuro fazer, olha, eu sou candidato da Convenção Geral. Se os irmãos
perguntarem, lá do Rio para São Paulo, perguntarem quem é o pastor da Convenção, vão
responder que é o deputado Pedro Ribeiro. Então, um candidato oficial para representar a
denominação. Isso é muito importante. A estratégia nossa funcionou bem, eu acho que é por
aí.
574
Já o deputado Gilberto Nascimento, de São Paulo, um Estado que teve dois
representantes da Assembléia de Deus na Câmara Federal, entre 2003 e 2007, quando
indagado se o processo eleitoral nas igrejas pentecostais era um exemplo de prática de
curral eleitoral, reagiu com a seguinte resposta:
573
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, gravada em gabinete da Câmara Federal, dia 18 de junho de 2004.
574
Entrevista do mesmo deputado Pedro Ribeiro, em seu gabinete. Brasília, 24 de novembro de 2005.
281
Não, pelo contrário, até porque, hoje, as igrejas são muito democráticas. São poucas as
igrejas, hoje, principalmente as pentecostais, são poucas as igrejas que dizem o seguinte: “é
esse candidato; tem que ser esse candidato”. Você pega, por exemplo, a minha igreja, que é
a Assembléia de Deus, ela é muito democrática. Correto? Quer dizer: eu sou da igreja, mas
se chegar uma outra pessoa lá, um outro deputado, ele também é apresentado, a igreja dá
opções. A nossa igreja, principalmente, a igreja pentecostal, volto a dizer, no caso da
Assembléia de Deus, ela não é uma igreja sectária; não é? Ela dá opções, ela dá tanto que
normalmente a igreja não tem só um candidato, tem alguns candidatos. Logicamente, ela dá
uma condição de escolha a esses candidatos. Agora, logicamente ela orienta: “vamos ajudar
os domésticos da fé”, e aí é uma coisa até bíblica, não é? Quer dizer, aquele que comunga
conosco, aquele que pode fazer uma defesa nossa, dentro dos nossos princípios. Então eu
acho que, repito, não tenho essa coisa de entender que a igreja se torne uma espécie de
curral eleitoral. Pelo menos as nossas não.
575
O projeto de ocupação de espaços, através da imposição de “candidatos oficiais”,
garantiu, de fato, às maiores igrejas pentecostais, conquistar algumas cadeiras nas “casas do
povo” da sociedade brasileira. Os próprios deputados eleitos admitem. Pedro Ribeiro se
considera um deputado da Convenção Geral das Assembléias de Deus, portanto, um
representante institucional, para atender interesses da maior ala das Assembléias de Deus
no Brasil. O deputado Zequinha Marinho, do Pará, embora tivesse participado em
movimento de trabalhadores, antes de ingressar na carreira parlamentar
576
, reconhece que
sem o apoio oficial da Assembléia de Deus não teria sido eleito:
Fui candidato oficial e sem a Igreja eu não estaria aqui. É bom que se registre isso. Eu e o
Raimundo Santos. Eu tive 52% de toda a votação de dentro da Igreja. Claro que onde a
gente foi, trabalhou e produziu alguma coisa, você foi mais bem votado, aonde você não foi,
paciência, vem meia dúzia de votos, dois, três, dez, vinte, ou até mais um pouquinho,
dependendo da consciência do pastor, do líder daquelas pessoas, que tem uma visão a mais
idealista da coisa.
577
Como o deputado paraense indicou, a condição de candidato oficial é importante,
mas não é suficiente para assegurar a vitória de qualquer candidato. O deputado Gilberto
575
Entrevista com o deputado Gilberto Nascimento, última semana de novembro de 2005, gravada no gabinete da liderança do
presidente do PMDB, deputado Michel Temer.
576
O deputado federal Zequinha Marinho foi representante local da Associação dos Empregados do Banco da Amazônia, em
Conceição do Araguaia (PA), antes de ser eleito primeiro suplente de deputado estadual e assumir uma cadeira no legislativo
paraense, em 1997.
577
Entrevista gravada em café da manhã com o deputado Zequinha Marinho, dia 25 de novembro de 2005, na lanchonete de
cobertura do prédio principal do Congresso, em Brasília.
282
Nascimento, em fórum de preparação dos candidatos para as eleições municipais de 2004,
no Estado de São Paulo, alertava que a “unção” eclesial não deveria gerar espírito de
acomodação em seus ouvintes. Pelo contrário, deveriam usar essa prerrogativa para incitar
os membros da igreja a se comprometerem como co-responsáveis e verdadeiros cabos
eleitorais de uma campanha que é do interesse da organização religiosa a que pertencem.
As palavras do deputado foram as seguintes:
Não chegue nunca e diga “eu sou candidato”. Chegue sempre e pergunte: “Escuta, o que o
senhor acha de eu ser candidato? O senhor vai orar por mim? Vai me ajudar?”. Coloca a
pessoa para ser responsável, co-responsável com você. Está certo? Na hora que ela for co-
responsável com você, ela também tem responsabilidade. Tanto que, no momento da
dificuldade, você vai chegar para ele e vai dizer: “Escuta, eu estou aqui porque você
também me incentivou”. Aí você fala: “Oh Gilberto, eu faço assim porque eu sou o
candidato oficial”, não é assim? Você é o candidato oficial, mas se o povo não estiver com
você, também é complicado. É importantíssimo ser candidato oficial, é um grande passo,
mas você tem que ter as pessoas também. Porque se não, daqui a pouco, você chega na
igreja e as pessoas falam: “Não, o candidato oficial da igreja é fulano de tal”. Mas os
dirigentes vão ter o direito também de, democraticamente, escolher um outro candidato.
Então, para que um candidato oficial, não é pastor Lelis? Se o dirigente vai ter um outro
candidato, o candidato oficial é candidato de quem? Então, é importantíssimo ser candidato
oficial, mas é importante também que o povo saiba disso.
578
Sem essa reconhecida vantagem de ser apoiado oficialmente pelas grandes
denominações pentecostais, há alguns candidatos deste campo religioso que se aventuraram
na disputa eleitoral e foram vitoriosos, como foi o caso do deputado federal Cabo Júlio. O
depoimento dele revela um tipo de Assembléia de Deus periférica, atuante no contexto do
conglomerado de ministérios que adotam este nome, e informa também o tipo de estratégia
que ele utilizou para ser eleito:
Entrevistador: - Deputado, o senhor foi “candidato oficial” da Assembléia de Deus da
Convenção Geral?
Deputado Cabo Júlio: - Não. Até porque a minha igreja é pequenininha. Minha igreja só tem
três mil votos. Eu não sou [candidato oficial]: 90% do meu voto é da polícia e 10% da
igreja. A diferença é que, embora a minha igreja seja pequena, é gente aguerrida, que faz
578
Deputado Gilberto Nascimento, fórum de preparação dos candidatos da AD, no hotel São Paulo Hilton, em junho de 2004.
283
boca de urna, faz campanha, faz tudo. Eu sou deputado no meu segundo mandato. Eu
comecei na vida política, eu liderei uma greve por melhores salários em Minas Gerais e por
causa disso, na época, eu fui expulso da polícia. No ano seguinte minha classe resolveu se
organizar politicamente. Eu também sou pastor da Assembléia de Deus em Belo Horizonte.
Tanto minha classe quanto a minha igreja resolveu se organizar e eu, sem nenhum pedigree,
sem nenhum parente na política resolvi aceitar esse desafio. E um desafio difícil, porque na
época eu tinha levado a greve contra o Governo do Estado e o Governo me condenou como
arquiinimigo número um. E sem dinheiro nenhum, a gente fazendo campanha na garra, na
luta. Até porque, junto comigo, foram mais 180 colegas expulsos e a gente tinha que ganhar
a eleição para tentar reverter isso. E, no ano de [19]98, no meu primeiro mandato, fui o
deputado mais votado de Minas Gerais. Tive 217 mil votos e no ano seguinte, assim que eu
tomei posse, nós conseguimos reverter a situação de todos os policiais que foram expulsos.
E foram expulsos por quê? Porque tiveram a coragem de, na época, dizer à sociedade que
estavam ganhando até um salário mínimo. Eu já estou no meu segundo mandato.
579
A propósito, também em entrevista de 1º/12/2005, o deputado pastor Francisco
Olímpio, da Assembléia de Deus de Pernambuco, negava a identidade assembleiana do
deputado Cabo Júlio: “Ele já não pertence a nossa igreja, é de uma outra igreja”. De fato,
este líder do movimento de policiais mineiros pertence a uma das inúmeras facções que usa
o nome carismático “Assembléia de Deus”, uma espécie de franquia sagrada, muito popular
em todo o território brasileiro.
Para completar esse quadro sui generis do mundo político, o “candidato oficial” de
igreja pentecostal, será examinada a prática da Igreja Universal do Reino de Deus. Não há
muita informação, porque se trata de um grupo religioso que coloca dificuldades para
responder pesquisas. A escolha de candidatos oficiais na Universal deve ser entendida no
contexto do empreendimento total dessa organização. Do mesmo modo como a IURD
escala pessoas do seu quadro de obreiros para atuarem na televisão, rádio, editora e outras
frentes de trabalho, internas e externas ao ambiente eclesial, assim também ela escolhe
quem vai atuar na política.
João Mendes, empregado da Embratel durante 13 anos, quando esta ainda era uma
empresa estatal, graduou-se em economia, passou por uma experiência de conversão
religiosa em 1981, recebeu preparação de pastor em curso ministrado pelo bispo Edir
579
Entrevista com o deputado Cabo Júlio, em seu gabinete da Câmara em Brasília, dia 1º de dezembro de 2005.
284
Macedo e exerceu pastorado em tempo parcial, na baixada fluminense. Renunciou ao
emprego estável da Embratel e foi ser pastor de dedicação exclusiva no Rio, depois no
Piauí, São Paulo e, novamente, Rio de Janeiro. Em seguida, foi designado administrador da
editora e gráfica da IURD. Na passagem de 1996 para 97, foi consagrado bispo e, em 2002,
chamado para servir na política, como candidato a deputado federal pelo Estado do Rio.
Segundo ele, “a Igreja já tem essa tradição de lançar candidatos, de colocar alguns dos seus
servos na política. E eu fui escolhido em uma convenção da igreja, [...] somente de bispos,
foram somente os bispos do Rio de Janeiro e de São Paulo. Não foram todos os bispos, mas
pelo menos os do Brasil estavam todos presentes”.
580
A decisão pessoal foi difícil: “Deus
me deu essa vitória, com muita reticência, porque eu me questionei muito, por que estava
indo para a política? A gente sabe que a política esta permeada, cheia de problemas. De
coisas que não são muito agradáveis, muita corrupção, muitas coisas que não são... que não
condizem com a nossa conduta”
581
. Mesmo assim o bispo já estava pensando em reeleição,
quando foi entrevistado: “Eu estou ouvindo dizer que os bispos e a direção da Igreja
querem que eu volte. Espero que Deus confirme isso. Se Deus confirmar eu volto”.
582
Não
voltou, porque, juntamente com a maioria dos parlamentares da Universal, foi arrolado na
CPI sobre superfaturamento de ambulâncias e a Igreja resolveu não lançá-los como
candidatos à reeleição.
De modo semelhante, o pastor Marcos Abramo foi convocado para atuar no
legislativo como deputado federal. Em entrevista, ele colocou-se como um pastor que
continua pastor e apenas está desempenhando o papel de pastor na política:
Eu vejo o seguinte, só para resumir. Na Igreja que eu pertenço, nós temos o trabalho
pastoral, que é estar no altar pregando o evangelho, levando às pessoas o conhecimento de
Deus. Quando a gente é chamado para a administração, para a política, então a cúpula
escolhe uma pessoa que vê que tem capacidade e condição e ali unge para que ela possa
assumir uma responsabilidade. Então, o lado da igreja para mim não mudou nada. Eu estou
como político, mas antes de ser político, ainda eu tenho a virtude do homem de Deus. Isso
ninguém tira. Eu tenho uma autoridade dada pelos homens, autorizada por Deus, e eu tenho
uma autoridade de Deus. Então, eu assumo isso de uma forma onde eu possa saber o
580
Entrevista concedida pelo deputado federal e bispo João Mendes de Jesus, em seu gabinete de Brasília, novembro de 2005.
581
Ibidem.
582
Ibidem.
285
seguinte: Eu sou pastor, levo às pessoas o conhecimento de Deus, levo às pessoas o que
Deus tem prometido, e hoje sou político. Eu quero levar da mesma forma para as pessoas
leis que possam beneficiá-las em todos os aspectos. E é isso que eu vejo no âmbito da
política.
583
Na mesma entrevista o deputado Abramo dá a entender que foi escalado pela
direção da Igreja e está no parlamento como um soldado que obedece a determinações. Não
foi uma opção pessoal: “Eu vou ser sincero para o senhor, eu não queria ser político. Não
queria. Na Universal não existe a pessoa que quer. Eu recebi e foi-me outorgado isto. Você
vai ser [deputado]. Eu que sou uma pessoa submissa a Deus e respeito as autoridades, disse:
‘Eis-me aqui’”
584
. Ainda assim, o pastor Abramo defende que a Universal proceda como
tem feito e amplie, se puder, sua presença no Congresso: “Isso não é uma estratégia, isso é
sabedoria. Se você sabe que você tem condição de eleger quatro e você põe um, e você sabe
que aquele um vai ser muito mais votado que todos os outros, isso é falta de sabedoria. Na
política é a quantidade que faz diferença”
585
.
A deputada Zelinda Novaes apontou alguns requisitos de qualificação que a
Universal observa, para escolher seus candidatos. Em primeiro lugar, é importante o
parecer dos líderes da Igreja que conhecem mais diretamente o desempenho do possível
candidato. Porém, como a decisão é sempre na instância superior, a escolha do candidato é
prerrogativa de um conselho de bispos:
Veja bem, dentro de cada município ou estado, a gente percebe uma pessoa que tem
determinada liderança já, ou que tem determinados conhecimentos. Também não pode pegar
uma pessoa totalmente desinformada, despreparada, para trazer a um parlamento. É a
questão da confiança, a questão do fácil acesso, de ter popularidade, de ter um certo
carisma, de ter compromisso com o evangelho, de ter mais ou menos um perfil. Porque claro
que a gente vê que as pessoas se corrompem, mas vê quem é que tem determinada... que tem
um comportamento de lisura, ética, moral, é honesto. Seria mais ou menos isso. Eles pedem
mais ou menos um currículo, pedem informações a outras pessoas, normalmente aos
pastores que estão há um tempo, pessoas de um certo relacionamento. Não é só dizer: “eu
583
Entrevista do deputado federal Marcos Abramo, gravada em seu gabinete de Brasília, 1º/12/2005.
584
Ibidem.
585
Ibidem.
286
quero ser candidato”, e ser candidato. E tem um conselho de bispos, que eles passam por
apreciação desse conselho.
586
A Universal trabalha com distritos eleitorais para maximizar os resultados da
votação, de modo a eleger a quantidade de candidatos que as previsões indicarem. A
deputada Zelinda exp licou que a Igreja faz essa distribuição e procura aproveitar outras
oportunidades, como entidades e grupos de fora que queiram apoiar seus candidatos,
embora isto seja difícil.
Essas experiências sobre a constituição do “candidato oficial” nessas grandes igrejas
servem para introduzir outra questão relevante para as estratégias políticas do campo
pentecostal e neopentecostal. Trata-se da escolha de partido e do lugar que vem sendo
ocupado por este tipo de político religioso que compõe grupos com interesses específicos
dentro dos parlamentos brasileiros.
4.2 A questão do partido.
O contexto faz o político. Esta afirmação exige esclarecimentos específicos, no caso
do político pentecostal. Por se tratar de político que pertence a um coletivo suprapartidário,
mas com interesse em algumas questões, ele deve atender às demandas da instituição que o
conduziu ao parlamento ou ao executivo. Além disto, como seu grupo de interesse não é
um segmento econômico, profissional, ou de políticas específicas, como é o caso de certas
bancadas, tipo a ambiental, da saúde, educação, habitação e semelhantes, o político
pentecostal necessita estar sintonizado com os anseios diversos da sua base eleitoral,
simultaneamente com o atendimento de demandas da cúpula da igreja que representa.
Ademais, esse político deve zelar pela coesão da comunidade de fé, desde o processo
eleitoral, mantendo-a durante os mandatos que conquistar. Regina Novaes percebeu esta
especificidade do clientelismo político-religioso, quando afirmou:
586
Entrevista da deputada federal Zelinda Novaes, gravada em seu gabinete, Brasília, dia 30/11/2005.
287
Para além das diferenças entre as religiões no tempo e no espaço , há um desafio comum
que os vários tipos de “funcionários religiosos” devem contornar: nos templos, nas igrejas
(centros e terreiros) não se faz política da mesma maneira que se faz no partido ou no
sindicato. A eficácia da política no espaço religioso implica na busca de manutenção dos
laços religiosos que unem aqueles que partilham da mesma fé. Caso contrário, enfraquece-se
a “comunidade religiosa”, colocando em risco sua razão de ser.
587
Um aspecto que sempre importa realçar é o dinamismo das comunidades
pentecostais e neopentecostais. Não vai ser encontrada tamanha vitalidade de participação
em partidos, sindicatos e outras associações. Pelo menos, não no sentido de serem capazes
de reunir tão grande quantidade de voluntários com tanta freqüência, de até várias vezes por
semana, como as igrejas deste subcampo religioso. Novaes generaliza esta constatação para
os evangélicos e escreve:
As igrejas evangélicas têm alto índice de freqüência e são vistas como celeiros de eleitores
congregados. E, de fato, se olharmos em nossa volta, veremos que não há outra instituição
que reúna tantas vezes as mesmas pessoas durante a semana. Assim sendo, é preciso
reconhecer que os espaços de agregação de evangélicos fazem, hoje, diferença no jogo
eleitoral. Ainda que as possibilidades de sucesso de candidatos evangélicos dependam
também [...] das experiências pessoais e de outros vínculos políticos que cada fiel/eleitor
possa ou não ter paralelamente, “ser evangélico” tornou-se uma nova variável neste jogo de
relações entre campo político e campo religioso.
588
587
NOVAES, Regina Reyes. Crenças religiosas e convicções políticas: fronteiras e passagens. In: FRIDMAN, Luiz Carlos (org.).
Política e cultura: século XXI. Rio de Janeiro: Relume Dumará; ALERJ, 2002, p. 90.
588
Idem, p.91.
288
4.2.1 Situação ou oposição
No jogo complexo de atuação do político pentecostal, o atendimento às demandas
da igreja e da base eleitoral prevalece acima de qualquer ética de convicção ideológico-
partidária. No dizer de uma assessora da Frente Parlamentar Evangélica, referindo-se à
Igreja Quadrangular, mas cujo raciocínio se aplica às igrejas que estão em destaque neste
estudo:
A Igreja do Evangelho Quadrangular não tem critério para escolher partido. Partido que der
a legenda para candidatos da Igreja eles apóiam. Nós temos inclusive candidatos e alguns
vereadores eleitos no Brasil Quadrangular que são PT, outros são PFL, outros são PP,
depende muito de qual partido vai dar a legenda para esse parlamentar. E eles então não têm
o melhor critério para escolher o melhor partido, a linha de pensamento, se é um governo
radical, se vai ser um governo neoliberal, se vai ser um governo de esquerda. Não se
preocupam com nada. Nem com a ideologia do partido. A única coisa que eles se
preocupam é: vai dar legenda e tem chance de se eleger? Claro que eles acabam não
procurando grandes partidos, como PMDB, PSDB, por uma questão de legenda; eles não
vão conseguir eleger seus candidatos. Mas é assim que funciona, sem nenhum critério para
escolher o partido para aquela pessoa que vai ser o representante da igreja no pleito
eleitoral.
589
Na verdade, existe critério para escolha de partido, mas esta não é dilemática,
quanto à opção entre ser de situação ou oposição. A própria coordenação política da igreja
examina, com o candidato, as alternativas de legenda partidária, tendo em conta chances
concretas de eleição, com base no quociente eleitoral e potencial de voto dos concorrentes
da legenda sob análise. Sobre este tema, manifestou-se o presidente da Frente Parlamentar
Evangélica, deputado Adelor Vieira:
Nós temos aqui uma posição indiferente em relação a situação e oposição. Porque nós
estamos vivendo no País um momento difícil. Um momento em que os partidos ainda não
estão consolidados e nós temos a multiplicidade de partidos. Então, houve um tempo,
quando [...] não tinha partido político, que era o regime militar. E nós estamos vivendo
poucos anos na democracia. Não deu tempo ainda para a gente aprender o que precisa
aprender em relação à democracia. E aí eu digo o seguinte, em relação a atuar na oposição
ou na situação: aqui em Brasília eu posso ser oposição, mas eu chego na capital
589
Palavras da assessora Mônica, em depoimento gravado em Brasília, no dia 15 de setembro de 2006.
289
[Florianópolis], lá é situação. Eu vou ao meu município e pode não ser nem oposição nem
situação (sic). Então, eu acho, onde nós estivermos plantados, ali nós temos que dar o bom
fruto. Se fizer oposição, seja uma oposição consciente, seja uma oposição em cima de fatos
concretos. Se tiver que fazer uma denúncia, busque provar ...
590
Conforme enfatizou o deputado Adelor, as condições variam em diferentes
instâncias de poder. O mesmo político pode ser candidato de oposição no município, mas
estar na situação perante o governo estadual ou federal. Isto não é algo inerente ao grupo
pentecostal, mas ao sistema político brasileiro. Tem a ver com a chamada verticalização de
alianças, tema presente em quase todas as eleições que abrangem os planos estaduais e
federal. Neste contexto, as igrejas sob análise são bem pragmáticas: distribuem seus
candidatos em diferentes legendas, de modo a garantir, primeiramente, a possível vitória, e,
em segundo lugar, estar próxima do poder nas diferentes configurações partidárias. Por
exemplo, a deputada federal Zelinda Novaes, da Igreja Universal na Bahia, explicou que
sua denominação distribui os políticos em diversos partidos, porque depende de situações
locais. Há partidos que reconhecem e temem a força eleitoral desse tipo de candidato:
Alguns têm medo de serem desbancados, porque vem um candidato forte e eles não querem
dar a legenda. E às vezes é necessário você buscar aquele partido que lhe é mais
conveniente, que lhe garanta a sua eleição. E também depende muito da situação de cada
Estado, de cada município. Isso é muito relativo. Na Universal nós temos um grupo aliado
[ao governo federal]. Porque, veja bem, às vezes você tem compromisso lá com o governo
do Estado, [...] que é contra o governo federal. Em outros, a situação é contrária. Então, é
como eu lhe disse, tem que olhar muito a realidade de cada local.
591
A escolha de partido, que implica em atuar próximo ou longe do governo, é uma
questão resolvida também de forma prática, na Assembléia de Deus. O deputado Adelor:
Eu acho que dentro das circunstâncias, do momento atual de cada eleição, você tem que
montar uma estratégia de acordo com a legenda. O voto de legenda é um voto que tem que
ser computado sempre, principalmente na proporcional. Na eleição para vereador, para
deputado estadual e para deputado federal. Então aí, dependendo do Estado do vereador,
dependendo do município, do deputado estadual do Estado e do deputado federal também
590
Entrevista do deputado federal Adelor Vieira, gabinete em Brasília, gravada no dia 22/11/2005.
591
Entrevista da deputada federal Zelinda Novaes. Brasília, dia 30/11/2005.
290
do Estado, ele vai ver onde ele tem mais chance de, no universo de votos que ele consegue,
de estar dentro de uma legenda, da legenda para que ele consiga o objetivo.
592
Seu raciocínio sobre este assunto foi completado com o argumento de que a
infiltração em diversos partidos permite uma ação de grupo de interesse mais forte e
efetiva, quanto aos resultados:
Então eu acho que nós estando dentro de todos os partidos há uma capilaridade maior. Nós
podemos influenciar e esse exemplo nós tivemos nesta última legislatura. Quantos projetos
nós derrubamos aqui. Quantos nós freamos aqui. Porque nós vamos ao nosso partido e
dizemos o que eu digo no PMDB: Não conte conosco e comigo tem mais de sessenta
deputados que vão votar contra o projeto”, aí, eles então alteram o negócio.
593
Esta opinião foi reforçada por outro deputado da Assembléia de Deus, Francisco
Olímpio, de Pernambuco:
No momento que se precisa da aprovação de um projeto, de uma resolução, se precisa
contar com o apoio de todos os partidos. Até para entrar em um regime de urgência. E se eu
não tenho amizade com os outros partidos, se eu sou uma pessoa fechada em um partido, eu
não vou conseguir o apoio de ninguém [...] Então [atuar em] um partido só, eu acho muito
prejudicial até. Então, hoje, nós temos os nossos representantes de todos os partidos. Exceto
do partido comunista, não é? Não temos. Graças a Deus!.
594
4.2.2 Pequenos partidos. Legendas de aluguel.
A condição do parlamentar pentecostal ora servir ao governo ora estar na oposição é
algo que requer a análise de um contexto mais complexo, para ser compreendida. Esse
contexto inclui o funcionamento do Congresso, o peso relativo de influência dos grupos
que o compõem e as relações entre Executivo e Legislativo.
O Congresso abriga elites que coincidem, aproximadamente, com os detentores do
poder nos grandes partidos. Trata-se de um conjunto de parlamentares que ocupam cargos
nas Mesas da Câmara e do Senado, bem como os principais cargos nas comissões
592
Entrevista do deputado federal Adelor Vieira, 22/11/2005.
593
Ibidem.
594
Entrevista do deputado federal Francisco Olímpio, em Brasília, novembro de 2005.
291
permanentes destas casas. Eles são vulgarmente chamados “cardeais”, participam,
ativamente, do “poder de agenda”, são capazes de determinar as grandes negociações,
estabelecer o andamento dos projetos e respectivas votações, em acordo com o
Executivo.
595
Em torno desses “cardeais”, também conhecidos como o “alto clero”,
gravitam blocos de parlamentares com menor poder de influência. A estes, resta o trunfo do
próprio voto nas matérias que são colocadas na ordem do dia, ou, no caso de pertencerem a
um grupo de pressão, a possibilidade de negociarem, de forma coletiva, o apoio e voto em
assuntos de interesse do governo federal, sempre articulados com as lideranças mais
influentes do Congresso. Não deve ser esquecido, neste quadro, o poder dos governadores
sobre parcelas das bancadas de cada estado da federação.
Na classificação de Carlos Ranulfo Melo, “deputados com acesso a recursos” são os
que preenchem, pelo menos, um dos seguintes requisitos: “(1) participaram da Mesa
Diretora na condição de titulares; 2) integraram o Colégio de Líderes; 3) presidiram alguma
das treze Comissões Permanentes da Câmara; 4) compuseram o Ministério; 5) fizeram
parte do secretariado em seu Estado de origem ou em sua capital”.
596
Além destes
requisitos, figuram como influentes no Congresso parlamentares com liderança informal,
seja como articuladores, formadores de opinião ou formuladores de projetos. Eles estão, por
exemplo, entre as “cabeças” do Congresso, classificados segundo critérios do
Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), em publicação editada
595
Sobre poder de agenda, escreve o cientista político Fabiano Santos: “Assumo, como premissa de
racionalidade política, que os políticos possuem preferências com relação às questões que devem compor a
agenda pública, bem como à maneira de solucioná-las. Assumo, ademais, que os deputados brasileiros
procuram maximizar seu acesso a cargos governamentais. [...]
O poder de agenda do presidente e das lideranças partidárias remete à estrutura institucional que organiza o processo legislativo.
Mais especificamente, o que importa agora é observar as regras e procedimentos de formulação da agenda parlamentar, os núcleos
de elaboração das políticas efetivamente aprovadas e os agentes de maior influência nesse processo. A questão central gira em
torno da extensão dos direitos parlamentares dos deputados sem postos na burocracia parlamentar vis-à-vis as prerrogativas de
poder acumuladas nas mãos das lideranças partidárias e a capacidade do Poder Executivo de iniciar e influenciar o processo
legislativo. [...]
A hipótese aqui é a de que quanto maior a pauta de direitos parlamentares do deputado médio e menor o poder de agenda das
lideranças e do presidente, menor é o grau de colaboração do primeiro com relação às proposições legislativas enviadas pelo
Executivo. [...]
Assumo que em qualquer situação, no caso brasileiro, a coalizão de apoio ao presidente será formada a partir da distribuição de
portfolios ministeriais. O que varia é a natureza dos partidos beneficiados pela distribuição. Em um caso, na ausência de poder de
agenda, parece racional ao governo buscar entendimentos com a oposição formal, isto é, com membros do Parlamento cujas
preferências se afastam da orientação do partido pelo qual o presidente se elegeu.”
SANTOS, Fabiano. Patronagem e Poder de Agenda na Política Brasileira. Dados. Rio de Janeiro, v. 40, n. 3,
1997. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0011-
52581997000300007&lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 12 de dezembro de 2006.
596
Cf. MELO, Carlos Ranulfo. Retirando as cadeiras do lugar: migração partidária na Câmara dos Deputados (1985-2002).
Belo Horizonte: UFMG, 2004, p. 70 e 182, notas 14 e 15.
292
anualmente. Neste contexto, os parlamentares pentecostais formam um segmento
representativo do “baixo clero”, que opera em condição subalterna à dos comandantes do
jogo político que acaba de ser explicitado. A expressão é pejorativa e se aplica a deputados
de atuação discreta que formam uma espécie de maioria silenciosa na Câmara.
Como todo político que se mantém no espaço de poder em função dos votos que
conquista em cada eleição, o parlamentar pentecostal direciona recursos para sua base
eleitoral. Os recursos que estão ao seu alcance são os alocados para emendas individuais
dos parlamentares ao Orçamento da União. Ocorre que, aprovadas essas emendas no
Congresso, a liberação de recursos depende de trâmites burocráticos e da disposição
política do Executivo, através de cada Ministério gestor do programa em que se enquadra a
emenda do parlamentar. Em outras palavras, o Orçamento não é impositivo: ou seja, não é
aprovado e executado na íntegra, livre de embargos da autoridade do Governo. Esta forma
de funcionamento do Legislativo, subalterno ao Executivo gera insatisfação entre os
parlamentares, principalmente entre os menos influentes, que são os mais atingidos. A
manifestação do deputado Zequinha Marinho é bem sugestiva, a este respeito:
Infelizmente, a estrutura de poder montada na República, ela é horrível. Quer dizer, o
mandato só presta se, de repente, você estiver na base de apoio” [do Governo]. Nós temos
que corrigir isso. O deputado é deputado independente do partido, da situação, da oposição,
onde ele estiver. Ele é deputado e o que ele tem que fazer aqui, se um dos papéis dele é
intermediar recursos para o seu Estado e para as instituições que ele representa, ele tem que
fazer esse mandato aonde for, sem a necessidade de mudar de partido.
597
O parlamentar pentecostal, na condição de integrante do chamado “baixo clero”,
tem melhores oportunidades de exercer liderança partidária caso escolha pertencer a uma
legenda pequena. Todavia, pertencer a um partido com poucos parlamentares reduz os
espaços de atuação, dentro e fora do Congresso, porque, conforme legislações específicas,
os cargos legislativos e o tempo de propaganda gratuita do partido na mídia são distribuídos
com base na representatividade eleitoral de cada partido. Desta forma, a sobrevivência no
sistema partidário induz os pequenos partidos a fazerem acordos com os maiores. A
implicação disto é fazer tais partidos abdicarem de ter projetos próprios, que dependem da
597
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, dia 25 de novembro de 2005.
293
conquista e manutenção efetiva de fatias do poder nos quadros de comando do País. O
mesmo deputado Marinho expôs o seguinte raciocínio:
O tamanho do partido é o que indica, também, outras coisas. Que dizer, um partido pequeno
não conta com os mesmos privilégios que contam os partidos grandes, como o PMDB. Mas
ele tem certeza que como o PMDB é um partido, quer dizer, é uma federação você vê que
em cada lugar o grupo PMDB pensa de um jeito você vê que é um partido enorme, mas
não possui uma liderança que congregue todo mundo, nem Ulisses Guimarães, que era o
grande ídolo do PMDB. Então, os partidos pequenos são incentivados realmente. Mas os
partidos pequenos para largarem de ser siglas de aluguel, ele precisam ter um projeto.
Entendeu? Precisam ter um projeto. Projeto de ocupação de espaço e de poder. Para não ser:
entre aqui, fique ali. Isso é prejudicial à democracia, até porque, até certo ponto, porque a
democracia pressupõe a igualdade de oportunidades. E o partido pequeno termina dando
essa chance, quer dizer, você não é filiado a partido nenhum, mas tem potencial, tem
credibilidade, em voto, como a gente diz aqui na Casa. De repente, não sai candidato pelo
PSDB: está cheio, lotado. Mas a democracia, infelizmente, se isso é um mal, é um mal
necessário, porque oportuniza as oportunidades (sic) do simples, do pequeno, em uma
sociedade que está aí. Não fica apenas para os grandes caciques, porque, se não, você elitiza
as coisas e as minorias são completamente impossibilitadas de se movimentar e ter espaço.
Porque o mandato é que faz isso, não adianta gritar do lado de fora. Você tem que gritar do
lado de dentro. Então, os partidos pequenos, apesar dos pesares, oportunizam isso. Para ele
largar de ser um partido de aluguel, ele precisa ter um projeto. Nós temos um projeto. Um
projeto de curto, de médio e de longo prazo. E nós vamos chegar lá, se Jesus não voltar
logo, não é?
598
A condição desses partidos caracteriza subserviência a governadores e outros
detentores do poder. Eles funcionam como extensões de partidos maiores, legendas
auxiliares para alguns jogos políticos, lugares de acomodação de protegidos ou indesejados
em agremiações de primeira linha. Devido a isto, são chamados “legendas de aluguel”.
Entre junho de 2004 e novembro de 2005, em entrevistas com parlamentares da Assembléia
de Deus, constatou-se que o ex-governador e candidato à Presidência da República,
Anthony Garotinho, exercia grande influência em algumas dessas siglas de aluguel e sobre
diversos políticos, um deles o deputado pastor Pedro Ribeiro, presidente do PSC no Ceará,
que falou sobre as dificuldades desses partidos nanicos:
598
Ibidem.
294
Quanto à questão do partido de aluguel, isto é, infelizmente, a situação do que tem menos
força, menos cultura, menos dinheiro. Sempre o seu trabalho é de servir. Aí, infelizmente, o
partido menor é cooptado pelo partido maior porque não tem força para dar condição para o
partido crescer. Então a gente usa esses termos para reduzir mesmo. Usa porque é assim.
Então, isso acontece, de fato, como, por exemplo, o PSC; é uma sigla muito simpática,
simpatizada pela Nação, que nunca cresceu. Garotinho está investindo; inclusive o PSC é
comandado por mim no Estado do Ceará. Eu botei como auxiliar um advogado, que agora
vai concorrer, no mínimo, com 14 candidatos a deputado estadual, em plenas condições de
eleger um ou dois. Assim o partido começa a crescer e assim, São Paulo, pelo que eu vejo,
na área de São Paulo, a gente pode fazer de quatro a cinco deputados estaduais, um ou dois
federais. Então, muda o perfil do partido completamente, quem sabe não seja a redenção
para ele deixar de ser essa sigla de aluguel.
599
O mesmo deputado Ribeiro, em entrevista de junho de 2004, havia discorrido sobre
articulações de Garotinho com outras agremiações, como o Partido Trabalhista Cristão
(PTC) e o Partido Trabalhista do Brasil (PT do B). Na época, Garotinho havia deixado o
PSB, a partir do qual fora candidato à Presidência da República, e se filiara ao PMDB, mas
envidava esforços em prol da organização de partidos pequenos, bem como apoiava a
migração de parlamentares evangélicos para, se possível, assumirem o controle dessas
legendas em seus respectivos Estados. Havia uma idéia de, em momento oportuno, fundir
esses pequenos partidos, para escaparem à chamada cláusula de barreira.
600
O deputado
Ribeiro dava uma idéia da influência de Garotinho no Congresso, em meados de 2004:
Hoje o Garotinho tem uma força extraordinária... Você vê que aqui no Congresso ele tem 25
deputados federais, juntando a nós que somos do PMDB e os que são do PSC. E acredito
que ele vai fazer tudo para conquistar espaço e ser o candidato do PMDB a Presidente da
República em 2006. Se não, ou com a ajuda desses partidos que eu falei, não é? PPC, PTC,
599
Entrevista com o deputado Pedro Ribeiro, em Brasília, dia 24/11/2005.
600
A cláusula de barreira é prevista na Lei dos Partidos Políticos: esse dispositivo determina que tem direito
a funcionamento parlamentar, em todas as Casas do Legislativo para as quais tenha elegido representante, o
partido que, na eleição para a Câmara dos Deputados, obtenha no mínimo 5% dos votos apurados,
distribuídos em pelo menos 1/3 dos estados, com um mínimo de 2% do total de cada um deles. Por
funcionamento parlamentar entende-se o conjunto de regras que definem a atuação dos partidos na Casa,
como o direito à liderança e à participação nas comissões. A Comissão Especial da Reforma Política propôs a
redução do percentual para 2% dos votos apurados nacionalmente, não computados os brancos e nulos,
distribuídos em pelo menos nove estados. O partido também precisaria eleger, no mínimo, um representante
em cinco estados. (Disponível em: http://www.camara.gov.br/internet/agencia/materias.asp?pk=%2070179,
acesso em 12 de dezembro de 2006).
295
PT do B, com o PSC, formando aí uma frente... Eu acho que a gente deve orar e pensar a
esse respeito de todos nos juntarmos, dando forças ao nosso irmão Anthony Garotinho.
601
O apoio de Garotinho às coordenações políticas nacional e estaduais da Assembléia
de Deus era evidente, através de apoio financeiro e logístico para a realização de alguns
fóruns, em que era feita a preparação dos candidatos oficiais da igreja para as eleições
municipais daquele ano (2004). No fórum de São Paulo, realizado no hotel Hilton, por
exemplo, foi feito agradecimento público ao Secretário de Segurança do Rio de Janeiro,
Anthony Garotinho, pelo apoio que garantiu a realização do evento. Ele deveria comparecer
para encerrar o encontro, mas, devido a problema de saúde, foi impedido de fazê-lo.
4.2.3 Partidos de esquerda
A opção por partidos pequenos lembra, ainda, os partidos radicais de esquerda
(PSTU, PSOL, PCO e outros). Mas a natureza destes é muito diferente da dos outros
mencionados. Os partidos de esquerda são bem definidos ideologicamente e praticam forte
disciplina, observada pelos militantes. Alguns parlamentares pentecostais mantêm-se como
opositores desses partidos, outros os encaram com simpatia, mas reconhecem dificuldades
no ambiente pentecostal, para aceitação de suas práticas, as quais funcionam como barreiras
a uma aproximação e atuação nessas legendas. Aliás, dificuldades existem, também, da
parte dessas agremiações partidárias para conviverem com o universo pentecostal.
Para o deputado Gilberto Nascimento, do PMDB e Assembléia de Deus de São
Paulo, a dificuldade dos pentecostais com partidos de esquerda tem raízes históricas. Esses
partidos eram sectários, tinham aproximação com regimes de países comunistas. Segundo
ele:
Partidos estiveram em regimes que perseguiram as nossas igrejas, perseguiram o povo. [...]
Então, exatamente por isso, os nossos deputados, os nossos vereadores, os nossos políticos,
eles nunca se atrelaram muito aos partidos de esquerda, porque eles entenderam que o
601
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, Brasília, 18/06/2004.
296
passado, na linha desses partidos, como a Rússia, Albânia e assim por diante, a nossa forma
de aceitação de fé foi perseguida por esses regimes na época, nesses países .
602
O deputado Francisco Olímpio, do PSB de Pernambuco, veterano pastor da
Assembléia de Deus e anticomunista declarado, afirmou em entrevista que o programa
ideológico-filosófico do partido pouco interessa à Igreja. Sua filiação ao PSB foi por “uma
questão de adequação” às condições da política regional, sob comando do “falecido Dr.
Arraes”. Mas, segundo ele, “o PSB é um partido central; não é um partido comunista, não é
um partido subversivo e não é um partido ultra-direita. É um partido central,
centralizador”.
603
A deputada Zelinda Novaes, da Igreja Universal na Bahia, ligada ao PFL de
Antônio Carlos Magalhães, entende que os partidos de esquerda, como o PT, criariam
dificuldades para um evangélico votar segundo suas convicções religiosas:
Os partidos de esquerda são mais radicais e nós precisamos trabalhar com esse tipo de
espírito democrático para você votar ou não matérias de acordo com os seus princípios, com
as suas convicções. Isso é muito criticado, mas não tem como abrir mão disso. Você tem um
eleitorado, você tem um segmento que você representa, como é que você vai chegar e votar
só porque o seu partido quer que você vote? Quando a gente estava buscando uma legenda,
eu, por exemplo, fui sincera para o meu partido, para Antônio Carlos, para as lideranças, que
em algumas matérias eu infelizmente não poderia votar com eles, e eles aceitaram. E você
sabe que o PT é mais radical ainda. Mas mesmo assim eu acho que tem evangélico no PT.
Não tem?
604
O deputado Zequinha Marinho lembrou que há evangélicos, embora poucos, em
partidos de esquerda. Isto porque os pentecostais, em particular, são doutrinados para
obedecerem. Deste modo, têm dificuldade para acompanharem movimentos grevistas,
piquetes e conflitos em geral. Segundo ele:
O evangélico, quer queira quer não queira, tem o perfil de uma pessoa discreta, de uma
pessoa, digamos assim, trabalhada para obedecer, etc. etc. Partido de esquerda, ele termina
confrontando com o comportamento e com o perfil [do evangélico]. É aonde a gente tem
que arrebentar o pau da barraca, discordar frontalmente, e às vezes de formas pouco
602
Entrevista com o deputado federal Gilberto Nascimento, em Brasília, novembro de 2005.
603
Entrevista com o deputado federal Francisco Olímpio, em Brasília, novembro de 2005.
604
Entrevista com a deputada federal Zelinda Novaes, em Brasília, dia 30 de novembro de 2005.
297
convencionais (risos). Às vezes você tem que fazer isso de formas pouco convencionais, o
que não recomenda muito para um bom evangélico. Um bom e tradicional evangélico fazer.
Então isso termina diminuindo o número de evangélicos pentecostais nesses movimentos
sociais, nessas brigas de porta de indústria promovidas pelo sindicato, etc. etc. No MST nós
temos muitos irmãos no MST, trabalhando, buscando a terra, não sei o que, não sei o que. A
gente acha meio esquisito, meio estranho. Vai do que, aquele negócio, Paulo falou: “Todas
as coisas me são licitas, mas nem todas as coisas me convêm” . Cada um tem esse negócio
aqui dentro. E, por isso, eu acho que posso participar, mas não me vejo, não me vejo muito
bem fazendo essa briga aqui, fazendo essa greve, fazendo isso, fazendo aquilo.
605
Quase na mesma linha de raciocínio, o deputado Pedro Ribeiro apontou os atos
simbólicos radicais de movimentos e partidos de esquerda como obstáculos à participação
dos pentecostais nessas agremiações. Não obstante, ele tem verificado uma tendência em
alguns jovens de sua igreja para aderirem a partidos como o PSOL e o PC do B, por
exemplo. A partir de sua experiência para escolher um partido, ele explica:
Vou citar o meu caso. Pastor de ofício, de tempo integral, automaticamente, ao procurar um
partido, eu procuro um partido de centro-esquerda. Um partido não tão radical. Porque, por
exemplo, eu toda vida fui convidado pelo PDT, pelo PSB, que eu tenho simpatia, mas, dali a
poucos dias, dada até a movimentação dos partidos, nós poderíamos ir todos para o PDT.
No momento que eu estava analisando isso, foi na época do “escândalo da cueca
606
, que
todos os deputados, os vereadores, os líderes, iam para a praça da Ferreira, no Ceará, os
homens com a cueca por cima da calça, e as mulheres com a calça, com a calcinha, por
cima. Então, [são] essas coisas radicais que às vezes um filiado de um partido de esquerda
605
É bom repetir: o deputado Zequinha Marinho foi representante eleito da Associação dos Empregados do Banco da Amazônia,
em Conceição do Araguaia (PA), em meados dos anos de 1990, antes de assumir uma cadeira de deputado na Assembléia
Legislativa do Pará. (Entrevista concedida pelo deputado Marinho, em Brasília, no dia 25/11/2005).
606
O “escândalo da cueca” refere-se ao episódio da prisão do senhor José Adalberto Vieira da Silva, secretário de organização do
PT do Ceará e chefe de gabinete do deputado estadual José Nobre Guimarães, no aeroporto de Congonhas (SP), em 8 de julho de
2006, porque transportava, ilegalmente, 200 mil reais em mala e cem mil dólares (cerca de 237 mil reais) em peça de sua roupa
íntima. O deputado José Nobre é irmão do deputado federal José Genoíno, que ocupava a presidência nacional do PT, quando o
fato ocorreu. O nome de José Nobre apareceu entre os beneficiados pelo empresário Marcos Valério no chamado “escândalo do
mensalão”. Ele próprio reconheceu ter recebido 250 mil reais do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, para pagar dívidas de
campanha eleitoral. O Conselho de Ética da Assembléia Legislativa do Ceará acusou o deputado de haver usado recursos
financeiros não declarados em sua campanha. Não obstante, em votação secreta de 20 de dezembro de 2006, a mesma Assembléia
Legislativa resolveu absolver o parlamentar dessa acusação, evitando, assim, que fosse cassado seu mandato. Fontes da Internet,
acessadas em 23/3/2007:
http://pt.wikinews.org/wiki/Dirigente_do_Partido_dos_Trabalhadores_%C3%A9_preso_com_mala_c
heia_de_dinheiro_no_aeroporto_de_S%C3%A3o_Paulo;
http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI584976-EI306,00.html e
http://pt.wikinews.org/wiki/Deputado_envolvido_no_esc%C3%A2ndalo_da_cueca_%C3%A9_absolv
ido.
298
tem que fazer. Eu vou chegar na porta de uma fábrica, bater panela? Então, quer dizer, às
vezes até... ficariam até melhor... e os que estão é porque nasceram lá. A maioria já era do
partido, cresceu e virou político, deputado, vereador. O Walter Pinheiro, [da Igreja Batista e
do PT da Bahia], por exemplo, um homem de bem, preparado, crente de mão cheia mesmo,
ele tem histórico no PT. Tanto que ele tem sofrido amargamente por não ter saído de tanto
amor que tem ao partido
607
. A maioria é por isso. Se a gente ia, era para a centro-esquerda,
porque na esquerda a gente tem que fazer esse tipo de coisa e é difícil.
608
4.2.4 Troca de partido
Um fenômeno endêmico na Câmara Federal é a migração partidária. Carlos Ranulfo
Melo constatou que, entre 1985 e 2002, houve 1041 trocas de partido, envolvendo 852
deputados, correspondentes à média de 29% de mudanças efetuadas por deputados eleitos
nas cinco legislaturas do período.
609
Ele também constatou que migram “com mais
intensidade, os deputados que fazem parte da grande massa de congressistas de menor
expressão na Câmara”.
610
E o fazem para obterem melhor posição de ganho em
negociações com o Executivo, terem acesso a recursos, em forma de verbas para sua base
eleitoral, e garantirem maior segurança para sua reeleição, inclusive alternativas de
financiamento de campanha.
611
Ainda o mesmo autor explica:
Atuando em uma Câmara em que sua possibilidade de influenciar sobre o resultado do
processo legislativo é praticamente nula, dada a centralização dos trabalhos nas mãos de
uma elite, parcela expressiva dos deputados tem optado pela busca de um melhor
posicionamento junto ao núcleo decisório do sistema, mudando, sempre que necessário, de
partido.
612
Sobre troca de partido, o deputado Zequinha Marinho manifestou seu mal-estar em
fazer parte desse jogo e atribuiu a falta de fidelidade partidária ao próprio Executivo, que
607
O deputado Walter Pinheiro foi solidário com alguns deputados que saíram do PT Chico Alencar, Ivan Valente e Orlando
Fantazzini motivados pelo escândalo da compra de votos de parlamentares, com envolvimento do ministro da Casa Civil, José
Dirceu, e que resultou na CPI conhecida como “do mensalão”.
608
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, em Brasília, 24/11/2005.
609
MELO, 2004: p. 161.
610
Idem, p. 74.
611
Idem, p. 55, 63, 75-6, 88.
612
Idem, p. 94.
299
favorece ou dificulta o acesso a recursos orçamentários, de acordo com o apoio que recebe
ou deixa de receber de cada parlamentar:
Eu vejo o parlamento de uma forma bem plural de pensamento. Você pode estar na estrema
esquerda, no centro, de um lado ou para outro, mas você tem que representar o pensamento
do povo que você representa. Você comunga, você fala daquela língua, você pensa daquele
jeito. [...] Se Deus quiser, nós vamos aprovar a fidelidade partidária, que aí a gente termina
se blindando em relação ao Executivo, que o Executivo é o pai e a mãe de toda a ruindade
que acontece aqui dentro, em função de ele pegar o Orçamento da União e transformar isso
em um objeto de negociação política. Quer dizer, você é do PSTU, você quer levar recursos
para o seu Estado, então larga o PSTU e vem aqui para debaixo da Casa Civil. Isso é um
absurdo, um instrumento da União, um instrumento do Governo, não pode servir disso.
Então, isso tem sido a raiz de todos os males que têm acontecido aqui no Congresso
Nacional. Não adianta você fazer reforma política para ali, para acolá, se você não corrigir
esse principio aí. No dia que você tiver um Orçamento e esse Orçamento seja votado,
aprovado e esse Orçamento seja impositivo, você acaba com toda essa farra, com toda essa
promiscuidade, com todo esse problema e torna o deputado o representante do povo.
613
A experiência de Pedro Ribeiro, do Ceará, que transitou por três partidos, é
esclarecedora. Ranulfo Melo afirma que “os deputados optam pelas alternativas de ação
capazes de maximizar suas chances de sucesso na carreira política”
614
. Ao ser perguntado
sobre critérios que levam um pentecostal à escolha do partido em que vai atuar, o deputado
Ribeiro respondeu:
É muito variado. Não tem norma. Eu acho que isso é muito circunstancial. De repente um
cidadão, como no meu caso, eu fui eleito pelo PL; quando cheguei aqui, fui abordado por
pessoas nossas, como o caso do deputado Silas Câmara, muito influente do PTB: que,
como deputado, eu não era nada no Estado”. E o PTB me ofereceu a presidência no Estado.
Isso para um deputado é muito importante. Então eu fui para o PTB para somar, para galgar
a condição de presidente do PTB no Estado. Então foi uma circunstância de mudança. Eu
estava como presidente do PTB, montando já perto de cem diretórios no Estado, quando o
Anthony Garotinho, do qual sou aliado desde a minha eleição, foi para o PMDB, e disse que
eu tinha que ir com ele para o PMDB, que não abria mão. Estou no PMDB com ele e isso é
uma coisa muito circunstancial. Então cada um tem a sua história. Infelizmente, enquanto
não passa a fidelidade partidária, ninguém pode exigir de ninguém porque não há mesmo.
613
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, dia 25/11/2005.
614
MELO, op. cit., p. 113-4.
300
Embora todos nós sejamos a favor; saiu a fidelidade, nós votamos a favor dela. Nem que
seja daqui a dois anos, quatro, cinco, nós vamos votar. Quando tiver, nós vamos respeitar.
Por enquanto não tem. Hoje é circunstancial mesmo. Esse troca-troca é por isso. Agora...
desculpe... ontem. Já que nós estamos falando hoje, 24 de novembro [de 2005], ontem, 23,
até por iniciativa de um deputado do Ceará, Bismarck Maia, foi aprovada a mudança no
regimento interno da Casa, no que concerne à estruturação de comissões internas da Casa.
Ou seja, agora a verdadeira razão de troca-troca era, era outra coisa. O PTB, quando me
pediu, me pediu que eu fosse logo, para quando a Casa fosse instalada, ao invés dos 18
deputados que eles tinham elegido, eles teriam 33, pois, contava até ontem para a
composição dessas formações, para enchimento de cargo, o número de deputados quando
iniciasse a legislatura. O partido só elegeu 18, mas tinha 33, vale 33. De agora em diante, ele
pode ter 50, só vale os 12 que elegeu. Então foi uma forma de fidelidade. Foi uma forma de
coibir esse troca-troca.
615
A troca de partido possibilitou efetivo ganho político para o deputado Ribeiro, pois
lhe permitiu assumir o comando estadual de um partido que gravita em zonas de influência
dos governos federal e estaduais. Mas, como existe um sonho pentecostal de eleger um
presidente evangélico, e Garotinho era alternativa viável naquele momento, Ribeiro e
outros parlamentares da Assembléia de Deus seguiram esse líder, com vistas a reforçar sua
posição dentro do PMDB. Garotinho, porém, é presbiteriano e a AD tem seu projeto
corporativo. Neste sentido, a denominação, através de seu Conselho Político Nacional,
resolveu priorizar o ingresso de parlamentares no Partido Social Cristão, respeitando,
porém, outras vinculações partidárias, em função de circunstâncias locais e regionais. O
deputado Zequinha Marinho, do Pará, foi um dos que saiu do partido que o elegeu para
seguir o projeto assembleiano. Ele informou o seguinte:
O Conselho Político Nacional da Convenção Geral da Assembléia de Deus está tentando
estruturar pelo Brasil afora o Partido Social Cristão, PSC, com o objetivo de quê? De tentar
congregar as lideranças políticas e evangélicas, principalmente da Assembléia de Deus, e
buscar quem mais esteja interessado. Então, esse início nos trouxe algum desgaste, pois
tínhamos que deixar nossos partidos de origem, onde nascemos politicamente. Não como
uma representação evangélica, mas como uma representação popular comum como qualquer
uma outra. Então isso foi sempre um pouco traumático, mas nós vamos levar isso à frente.
Nós queremos, se Deus quiser, trabalhar o Partido Social Cristão no Brasil todo. Eu, lá no
615
Entrevista do deputado federal Pedro Ribeiro, na Câmara, em Brasília, dia 24/11/2005.
301
meu Estado, eu presido o partido. Estou na luta: não é fácil você trabalhar construindo do
chão, lá da base, de baixo, mas a gente chega lá, é preciso que a gente faça isto.
616
Uma troca de partido por razão distinta das apresentadas até aqui, foi a do deputado
João Mendes de Jesus, bispo da Igreja Universal. Eleito para a Câmara Federal, pelo PDT,
ele foi vítima de uma postura anticlerical de Leonel Brizola e sentiu-se coagido a procurar
outro partido. O episódio, relatado pelo bispo, foi o seguinte:
Eu fui eleito pelo PDT e o nosso querido e saudoso Brizola, em uma reunião nacional do
partido, ele disse que iria cuidar para que não viesse mais para o PDT bispos e pastores,
“essa gente” palavra do Brizola. Então, foi forte isso. Ele tinha dito que foi criado, que o
pai dele de criação era um evangélico, que ele conhecia o evangelho e me estranhou muito
ele dizer isso em uma reunião. Todos os deputados viram. Foi cruel e acho que ali, com isso,
ele pediu a minha saída. Daí eu saí do partido e assumi a presidência de um partido
pequenininho, chamado PSL, e que agora eu percebi que o partido não era um partido. Além
de não ser um partido cuja direção não era uma direção, digamos assim, que a gente pudesse
dispensar uma confiança. Eu percebi também que eu não teria a condição de me eleger nesse
partido. Então, você tem que procurar um partido onde você tenha a possibilidade de você
ter uma eleição. Daí eu procurei o PSB. Eu procurei, escolhi o PSB, Partido Socialista
Brasileiro. Nós somos cristãos e somos partidários da causa social, não tenho dúvida disso.
E estou muito feliz de ter ingressado no Partido Socialista Brasileiro. Então, o que me
ocasionou essa mudança foi isso.
617
4.2.5 Partido evangélico: iniciativas pentecostais.
A definição tradicional de grupos de pressão exclui seus integrantes da presença
direta em aparelhos de poder político. Segundo Maurice Duverger, os grupos de pressão
“não participam diretamente da conquista do poder e de seu exercício: agem sobre o poder,
mas permanecendo fora dele; fazem ‘pressão’ sobre ele. [...] Os grupos de pressão
procuram influenciar os homens do poder, porém não colocando no poder a seus próprios
homens..
618
Sobre o mesmo assunto também discorreram Robert Dowse e John Hughes:
616
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, 25/11/2006.
617
Entrevista do deputado federal João Mendes de Jesus. Brasília, novembro de 2005.
618
DUVERGER, Maurice. Sociologia política. Rio de Janeiro: Forense, 1968, p. 442.
302
Consideramos que el grupo de interés es una asociación de individuos, que no es un partido
político tal como lo hemos definido, y cuyo objeto es influir en el gobierno de modo
favorable para los intereses del grupo. Nos referimos a grupos constituidos y organizados
formalmente, y no a simples categorías como los estratos ocupacionales, las mujeres, los
inmigrantes, etc. Estas categorías pueden ser la base de los grupos de intereses, pero no son
grupos de interés en el sentido en que los concebimos nosotros. […] Están más ocupados en
promover los intereses de un grupo seccional concreto, cualquiera que éste fuere. Como es
lógico, esta distinción presenta en algunos casos varios problemas. Un grupo de interés
puede alcanzar un grado que le aproxime a un partido político al desarrollar una plataforma
más amplia y menos restringida.
619
De fato, a história dos partidos políticos está aí para demonstrar que não apenas os
grupos de interesse (ou de pressão, como preferem alguns autores) podem se aproximar de
atuação mais ampliada, semelhante à de partidos, mas alguns deles, efetivamente, se
convertem em partidos. Ou, dito de outro modo, grupos de interesse também são geradores
de partidos. O movimento sindical britânico deu origem ao Partido Trabalhista inglês, há
um século atrás, enquanto, no caso brasileiro, o “novo sindicalismo” da região industrial do
ABC paulista foi uma importante vertente para a formação do Partido dos Trabalhadores,
nos anos de 1980. Portanto, os próprios autores citados, Dowse e Hughes, reconhecem que:
hay grupos de interés que acaban convirtiéndose en partidos políticos. Por ejemplo, los
sindicatos británicos del siglo XIX eran importantes grupos de interés que en 1900
contribuyeron a la formación del Labour Representation Comité [Comité de Representación
Laborista] para promocionar a candidatos obreros al Parlamento. En 1906 el LRC se
transformó en el partido laborista.
620
A Frente Parlamentar Evangélica é um grupo de interesse que teve origem na
mobilização das igrejas pentecostais para uma atuação corporativa no Congresso
Constituinte de 1987-88. Devido a interesses em comum, eles se agregaram a protestantes
históricos e outros evangélicos. Ainda nesse Congresso Constituinte, estabeleceram uma
pauta de valores que consideravam fundamentais para a defesa da família brasileira. Além
disto, trataram de garantir a pluralidade religiosa na legislação brasileira, bandeira antiga
dos protestantes, que a empunharam junto com os maçons e outros agentes da política,
619
DOWSE, Robert E.; HUGHES, John A. Sociologia política. Madrid: Alianza Editorial, 1975, p. 466.
620
Idem, p. 464-5.
303
desde o advento da República, no final do século XIX. Como a FPE reuniu em seu bojo
igrejas que concorrem fortemente no mercado religioso pela conquista de adeptos e essas
igrejas são instituições consolidadas, com culturas organizacionais bastante distintas, têm-
se mantido o caráter de “frente”, sem perspectiva de evoluir para um partido dos
evangélicos como um todo.
621
Isto, porém, não impediu que as duas denominações desta
pesquisa, Assembléia de Deus e Igreja Universal, desenvolvessem iniciativas próprias na
relação com os partidos.
A Universal filiou parte dos seus parlamentares no Partido Liberal e conseguiu
ocupar posições-chave nas direções executivas de alguns Estados da Federação e na própria
executiva nacional, onde Carlos Rodrigues assumiu a vice-presidência do partido. Esta
estratégia colocou a igreja como parceira oculta chave para a composição da aliança PT e
PL, que contribuiu para a vitória de Lula à presidência da República em 2002. A
Assembléia de Deus, na tentativa de emular a Igreja Universal, também procurou ocupar
uma legenda, o PSC, onde alocou parte dos seus parlamentares e fez crescer a importância
desta sigla para eventuais composições futuras, que a coloquem como parceira no poder,
tanto em alianças regionais como nacional.
No fórum de preparação de candidatos da Assembléia de Deus para as eleições
municipais de São Paulo, houve pergunta sobre este assunto e o coordenador político
estadual se manifestou sobre o que a cúpula da igreja pensa nesta matéria:
Uma outra pergunta: “Pastor Ronaldo, tem condições de futuramente criar um partido das
Assembléias de Deus?” (Resposta do pastor Paulo Freire:) Meus irmãos, a igreja não
precisa e não deve ter um partido da igreja. Política se faz através de partidos, nossos
candidatos terão que estar filiados a algum partido. A única preocupação, que para isso o
Conselho Político tem se preparado, está trabalhando para isto, e se vier a reforma política, e
parece que vem, essa reforma tem como objetivo pegar pelo contra-pé os candidatos
evangélicos, para eles não terem o controle, o domínio dos partidos, e na reforma política,
possivelmente, haverá a aprovação da fidelidade partidária, então, para isso, a Igreja está se
preparando, e há um partido em que o Conselho Político, a liderança da igreja Assembléia
621
Há parlamentares, como o deputado Zequinha Marinho, que acredita na possibilidade de união dos evangélicos, caso se
levantem lideranças reconhecidas: “Nós só vamos ter uma certa união e o fortalecimento partidário com a construção de grandes
lideranças no futuro. Com a construção de grandes lideranças. Se isso avançar, a gente vai ter um partido que vai se destacar e
muita gente vai se abrigar à sombra dele. Por enquanto, nós estamos construindo um processo”. (Entrevista em Brasília,
25/11/2005).
304
de Deus está dando a direção e o controle deste partido a nível nacional. Esse partido está
sendo reestruturado. Então se vier essa reforma, nós temos uma alternativa em um partido
em que a liderança executiva desse partido estará nas mãos desse Conselho Político dos
irmãos da igreja Assembléia de Deus. Agora, um partido da Assembléia de Deus, isso nós
não teremos.
622
Esta estratégia da Assembléia não tem aprovação geral. Alguns parlamentares
preferem permanecer em partidos onde já têm seu espaço garantido. O pastor Francisco
Olímpio, deputado do PSB de Pernambuco, demonstrou mais uma vez seu mal-estar em
misturar assuntos de política com a visão sagrada que tem de igreja: “Eu acho que a igreja
não pode estar fazendo parcerias com partidos políticos. É uma questão minha”
623
Sobre o
PSC, especificamente, ele afirmou que era uma sigla do governador Garotinho, usada para
atrair alguns pastores, “que não é o nosso caso” acrescentou ele. Provocado sobre a
utilização do PSC como estratégia da Assembléia de Deus, ele a considerou equivocada,
pois poderia prejudicar a reeleição de alguns parlamentares, devido ao pequeno tamanho da
legenda, em quantidade de eleitores. Segundo o deputado:
Talvez o PSC não alcance os cinco por cento da barreira, correto? Então, em todos os
lugares eles estão bem, porque eles estão juntando todos os crentes e colocando em um
partido. Mas em outros eles estarão tirando, talvez, até um parlamentar daqui. Por exemplo,
o pastor Milton Cárdias, que é do PTB do Rio Grande do Sul. Eles agora querem lançar o
candidato do PSC. Aí, vai acontecer [que] Milton Cárdias pode perder o mandato. A gente
vai perder um deputado com a qualidade do pastor Milton Cárdias para satisfazer a vontade
de um partido. Então, em todas essas incongruências existe o certo e existe o errado. Existe
a parte positiva e a parte negativa. Existem coisas que podem trazer benefícios, mas existem
coisas que podem trazer patentes e translúcidos [prejuízos]. Isso é claro e objetivo.
624
A Universal, todavia, resolveu evoluir dentro do sistema partidário e o fez através
da criação de um partido. No início, em 2003, denominou-o Partido Municipalista
Renovador, que obteve registro definitivo em 25 de agosto de 2005, mas, em 14 de março
de 2006, foi deferida mudança de nome para Partido Republicano Brasileiro, conforme
resolução do TSE nº 22.167/06. No contexto de uma república instituída com o discurso da
separação Igreja e Estado, defendido pela própria Igreja Universal, seria estranho se esta
622
Pastor Paulo Freire, fórum de candidatos da AD-SP, eleições municipais de 2004, hotel SP-Hilton, junho de 2004.
623
Entrevista do dep. Francisco Olímpio em Brasília, novembro de 2005.
624
Ibidem. Os deputados Milton Cardias e Francisco Olímpio não foram reeleitos em 2006.
305
agremiação religiosa criasse um partido “evangélico”, daí porque os próprios mentores da
nova sigla, tendo à frente o então deputado Carlos Rodrigues, se apressaram em afirmar que
o PRB não pertencia à Igreja, lembrando que o próprio vice-presidente da República,
empresário José Alencar, era filiado ao partido. De fato, o estatuto do PRB é semelhante ao
de outros partidos. Segundo o deputado Zequinha Marinho, a Universal praticamente
copiou o estatuto do PL para elaborar o do PRB.
625
Não há dúvida quanto a vinculação do PRB com a Igreja Universal. O deputado
Mendes de Jesus, bispo desta igreja, falou sobre a criação do partido:
[O PRB] é uma idéia que surgiu do ex-bispo Rodrigues, que teve essa idéia de fazer o
partido. Na verdade o Conselho de Bispos não era muito favorável a ter partido. Não
entendia para que isso. Foi uma guerra muito grande. Ele travava essa batalha internamente
para criar e criou o partido. Depois que ele saiu acabou, veio uma outra coordenação e
achou que era interessante manter e fazer, até que aprovamos lá. A Igreja conseguiu através
dos seus membros lá aprovar o partido. É interessante? É. É interessante ter um partido e
tal, ter uma cara, mas fica uma dúvida entre nós. Estar em um partido como o PRB, ou estar
no PSB, que diferença fazia? So zinho nenhum partido vai chegar a lugar nenhum.
626
Um partido com essa origem terá dificuldades para agregar evangélicos de outras
igrejas. Como a Assembléia deu prioridade à ampliação do PSC, estão colocadas duas
supostas alternativas de filiação, para os que acreditam na viabilidade de um partido sob
controle dos evangélicos. O deputado Marinho, como presidente estadual do PSC no Pará,
comparou as duas possibilidades e declarou:
Nós estamos trabalhando o PSC, de modo que no futuro eu entendo que aquele que melhor
se estruturar, ele vai terminar sendo a sombra de abrigo de muita gente. Vamos ver. Como
eu disse, a Universal tem a sua forma, pensa diferente, não junta muito, tem um projeto
625
Indício mais forte de que o estatuto do PL foi utilizado para a elaboração de igual documento do PRB foi
um lapso ocorrido em seu artigo 43, na versão de 25/08/2005 do Estatuto, arquivada no TSE, onde é
mencionada a sigla PL onde deveria estar PRB. “Art. 43 - As bancadas do PL nas Câmaras Municipais de
Vereadores, nas Assembléias Legislativas e Senado Federal constituirão suas lideranças de acordo com as
normas regimentais das respectivas Casas Legislativas e com as normas baixadas pela respectiva Comissão
Executiva, podendo, inclusive, adotar as regras estabelecidas para a eleição do Líder do Partido na Câmara
dos Deputados, abaixo discriminadas:” (Grifo nosso. Versão disponível no site:
http://www.tse.gov.br/partidos/partidos_politicos/prb/estatuto25805.doc, acessado em 20/12/2006).
626
Entrevista do deputado João Mendes de Jesus, em Brasília, novembro/2005.
306
meio diferente do nosso. Nós pensamos não só hoje, nós estamos pensando até onde a vista
dá, em relação ao futuro. Vamos ver. O tempo dirá como é que vai ser isso amanhã.
627
Para o presidente da Frente Parlamentar Evangélica, Adelor Vieira, a Universal tem
um projeto de poder e está fazendo uma espécie de ensaio com a formação de um partido
sob seu controle:
Eu acho que eles querem que a Igreja Universal tenha essa estratégia. Eles tinham inclusive,
segundo eu tenho informação, eles tinham um projeto de poder também. Um projeto de
poder. Não sei se, ainda, eles mantêm esse projeto de poder. E, por isso, eles montaram essa
estratégia. [Mas] nem todos da Universal estão lá, porque eles vão deixar passar primeiro a
eleição [de 2006]. Eu não sei se essa estratégia vai dar certo, não é? Eles querem primeiro se
eleger em um outro partido. Mas se houver a mudança da legislação aqui, eles poderão ter
problemas, também, com a fidelidade partidária. Então, não dá para a gente afirmar nada.
628
Há uma questão pragmática nessa criação do PRB. A questão não é ter um partido
evangélico, mas garantir a condição de controle de uma legenda (neste caso, por uma
igreja), coisa que só caciques de partidos têm à disposição, para beneficiarem seus grupos
de aliados. A deputada Zelinda Novaes expressou esta necessidade, ressalvando que o
objetivo não era ter um partido exclusivo de evangélicos:
Bem, você sabe que é difícil você manter um partido só evangélico. Agora, a gente quer ter
um partido que a gente tenha liberdade para conseguir legenda, porque é muito difícil na
época das eleições. E a gente já está começando a ver alguns sinais de algumas pessoas que
pretendem se candidatar não estão conseguindo legenda. Então, [será] um partido que tenha
acesso, mas ele não vai ser um partido só de evangélicos. Ele é um partido que vai ter
pessoas. Alencar, por exemplo, vice-presidente, ele é filiado ao partido. Então ele não vai
ficar restrito somente a evangélicos. Agora, os evangélicos vão ter fácil acesso e não vão
sofrer aquela rejeição. Porque nós temos tido dificuldades.
629
A iniciativa da Universal foi apreciada por uns e rejeitada por outros. O
coordenador da bancada da Assembléia de Deus, pastor Pedro Ribeiro, considerou que foi
627
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, 25/11/2005.
628
Entrevista do deputado Adelor Vieira, em Brasília, 22/11/2005.
629
Entrevista da deputada Zelinda Novaes, em Brasília, 25/11/2005.
307
uma providência competente a criação do PRB,
630
mas reconhece que será mantida a
pluralidade no universo de políticos evangélicos:
Nós já sabemos que tem esse partido criado pela Universal que vai ser, parece, Partido
Republicano. Começa forte, como todas as coisas que a Universal faz. É muito bem
planejado. Cooptando o vice-presidente da República, com total mobilização para ser
candidato a presidente, com um vice evangélico. Negócio muito bem articulado. Então, em
caso como este, que também a Universal começa mais com o pessoal dela, mas também vai
cooptar outros políticos. Então eu acho muito interessante. Tirou muita gente do PL. A
gente conversa aqui sobre a possibilidade de criar um partido, mas jamais um partido, por
exemplo, jamais os evangélicos todos irão para o PR. Como se a gente criasse um outro,
dessa ala mais suave, juntando Assembléia, com Graça, presbiterianos e batistas, também
não vamos conseguir todos nós. Porque tem gente que é histórica do PT que não sai. Gente
que é histórica do PSDB, do PFL que não sai. Então, eu não acho mal. Eu acho que se tiver
é bom. Não faz muita diferença. É mais um.
631
A criação do PRB não foi bem aceita por outros parlamentares evangélicos. O
veterano político do PMDB e da Assembléia de Deus, Gilberto Nascimento, manifestou
restrições à criação de um partido evangélico e prognosticou dificuldades para o partido
criado pela Igreja Universal:
A criação de um partido evangélico não me agrada muito essa idéia. Porque acaba ficando
uma coisa muito sectária, não é? Eu acho que um partido tem que ter um programa e nesse
programa ele pode ter divergências e convergências. É um partido político, não é uma
associação cristã, não é uma associação de igrejas. Então, eu não comungo muito com essa
coisa de partido evangélico. As perspectivas do PMR? Eu não vejo grandes perspectivas
não, pois é um partido que já nasce com um carimbo, não é nem de um segmento dos
evangélicos, é de uma igreja evangélica. Isso é muito ruim!
632
Na análise que Duverger faz sobre a relação entre grupo de pressão e partidos, ele faz
referência a “partidos subordinados a grupos de pressão”: “um partido político subordina-se
a um grupo de pressão de tal forma que se torna um órgão anexo do mesmo sob esta
noção”.
633
Poderia ocorrer o caso de um partido fundado pela Igreja Universal se tornar
630
Em 2005, devido à mudança recente de nome, o Partido Republicano Brasileiro (PRB) era referido pelos deputados
entrevistados ora como Partido Republicano ora como Partido Municipalista Republicano.
631
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, em Brasília, 24/11/2005.
632
Entrevista do deputado Gilberto Nascimento, Brasília, novembro de 2005.
633
DUVERGER, 1968, p.457.
308
subordinado a ela? Dificilmente. O PRB é um partido laico, como outro qualquer. Seu
estatuto foi provavelmente inspirado no estatuto do PL. Ele abriga figuras públicas, como o
vice-presidente da República, José Alencar, empresário reconhecido por sua luta contra os
juros elevados praticados pelo sistema bancário brasileiro. Entretanto, não é impossível que
a IURD conquiste o controle do partido, indicando os postos-chave em executivas
municipais, regionais e nacional, dessa legenda. Neste caso, ocorreria o que Duverger
chama de “dependência mascarada”.
634
4.3 A campanha do político pentecostal.
Um bom pré-requisito para uma competente campanha é a qualificação do próprio
candidato. Apesar dessa idéia parecer óbvia, ela não esteve presente nas intervenções da
maioria dos entrevistados. Apenas dois parlamentares tocaram neste assunto: o senador
Magno Malta (ES) e o deputado Raimundo Santos (PA), ambos do PL. O senador inseriu
este assunto no contexto do papel público da igreja, como instituição que, segundo ele, tem
a obrigação de melhorar a sociedade:
Só tem uma instituição que, definitivamente, pode ajudar essa sociedade a ser melhor, que é
a igreja [...]. Então, ela tem que vir urgentemente, mas, madura, e sabendo estabelecer
critérios para quem vai mandar para a vida pública: homens de caráter de fato,
comprometidos com Deus, com a sua família, com lutas sociais, comprometidos com o
dízimo... E com lutas sociais, acima de tudo. E com um preparo, acima de tudo, para discutir
as questões sociais de uma forma contundente, e com coragem suficiente para fazer
enfrentamentos que são necessários na sociedade, onde o crime organizado estabeleceu para
si um Estado paralelo. Então, a igreja tem que vir e vir rápido.
635
A preocupação do deputado Santos com a qualificação dos candidatos foi
manifestada às vésperas das eleições municipais de 2004. Para ele, melhorar a qualidade
dos quadros da igreja na política permitiria elevar o conceito dos evangélicos e traria
benefícios para a sociedade. A palavra do veterano deputado paraense foi a seguinte:
634
Idem, p. 458.
635
Entrevista do senador Magno Malta, em Brasília, no dia 18 de junho de 2004. O deputado Walter Pinheiro (PT-BA)
possibilitou esse contato e esteve presente, no início da entrevista, no gabinete do senador.
309
Olha, nessa linha da igreja ocupar o seu espaço, eu defendo a seguinte posição: nós temos
que ocupar esses espaços, mas temos que ter pessoas qualificadas para ocupar esses espaços,
que eu acho mais interessante não ocupar o espaço, do que ocupar o espaço para uma função
que a pessoa não está preparada, não teria um mínimo de preparo, e vai nos envergonhar e
atrapalhar. Por exemplo, a gente eleger um prefeito só porque é evangélico, mas se ele não
tem a mínima noção de administração pública, a menor vivência, então é preferível que ele
não seja nem candidato, porque, ao chegar lá esse prefeito, nós, como evangélicos,
estaremos prejudicando esse irmão sem prepará-lo para se candidatar, uma vez que ele não
tem preparo ou qualificação e, daqui a pouco, vai estar até totalmente atrapalhado e
respondendo vários processos. Então eu entendo que é importantíssimo, não se deve perder
nenhum espaço. Mas que nós estamos em uma linha, também, e a Convenção Geral da
Assembléia de Deus está defendendo a mesma linha de preparo, de conversação, de fóruns,
para que quem for candidato a vereador saiba qual o papel de um vereador, que um
candidato a prefeito saiba qual o papel de um prefeito, e que ele não deve, simplesmente,
postular uma prefeitura por uma vaidade, por uma condição individual de aparecer, de
crescer individualmente, mas ele deve sim postular a prefeitura tendo consciente qual o
papel de um prefeito e tendo a vocação política para administrar, porque assim nós
estaremos ocupando de forma legítima o nosso espaço e não apenas isso, mas o nome do
senhor Jesus estará sendo glorificado, através daquele vereador ou daquele prefeito que tem
a lei da comunhão com Deus. Que a coisa mais importante é o conhecimento de Deus, ele
também tem o preparo para desempenhar a sua missão, então ele estará ajudando na
glorificação do nome do senhor Jesus e estará, também, elevando no seio da sociedade o
nome da igreja. Então, essa é a nossa visão para essas eleições. Eu tenho certeza que vamos,
no Pará, eleger muitos vereadores, prefeitos, vice-prefeitos evangélicos. E o que mais me
deixa feliz é dizer que, hoje, nós crescemos muito em termos da qualidade dos nossos
integrantes, da qualidade dos nossos quadros nas igrejas. Então vamos eleger e eleger
pessoas que têm a fé, mas que também tem a qualificação necessária para desempenharem a
sua missão legislativa ou no executivo.
636
4.3.1 Preparação dos candidatos: orientações.
A campanha do pentecostal que concorre a uma eleição, como candidato oficial das
igrejas pesquisadas, tem um período de preparação, coordenado pela comissão nacional ou
estadual, conforme a amplitude dessas eleições. Em alguns municípios, a Assembléia de
636
Entrevista do deputado Raimundo Santos, no seu gabinete da Câmara, em Brasília, junho de 2004.
310
Deus tem uma coordenação política, mas para racionalizar os poucos recursos disponíveis e
garantir controle sobre o conjunto de candidatos, a coordenação estadual se envolve tanto
nas eleições estaduais como nas municipais. No caso desta pesquisa, as informações sobre
campanhas foram obtidas em observações diretas, durante a realização de um fórum de
preparação dos candidatos da Assembléia nas eleições municipais de 2004, no Estado de
São Paulo, e em entrevistas com parlamentares, em 2004 e 2005.
A tradição protestante e pentecostal recorre sempre ao que está escrito na Bíblia
para orientar a atuação dos crentes na sociedade. Não é diferente no caso de campanhas
eleitorais. A Assembléia de Deus promoveu fóruns de preparação de candidatos em
diversos Estados do Brasil, em 2004, para as eleições de vereadores, prefeitos e vice-
prefeitos. No fórum de São Paulo estiveram presentes os coordenadores de ação política,
nacional e estadual. Ao coordenador nacional, pastor Ronaldo Fonseca, coube dirigir uma
palavra aos candidatos. Ele proferiu um sermão em estilo religioso tradicional, com base no
capítulo seis do livro de Josué. As práticas de Josué, como líder que guiou o povo hebreu
durante a conquista da terra de Canaã, serviram de inspiração para as instruções que o
coordenador transmitiu aos candidatos. O relato bíblico foi contextualizado como diretriz e
resposta para as dificuldades e desafios que os candidatos da Assembléia de Deus iriam
enfrentar naquela eleição. Alguns trechos do sermão do pastor Ronaldo serão transcritos a
seguir
637
, para dar a conhecer as ênfases aplicadas como preparação dos candidatos:
Quando você oferece o seu nome para disputar uma eleição, você está buscando uma
conquista. Na vida nós temos conquistas a serem realizadas. Acontece que conquista traz
consigo duvida: “Será que vai dar certo? Será que não vai? Quando abrir a urna, como é que
vai ser? Como é que não vai ser?”. Conquista trás consigo o desânimo. Talvez vocês já
tenham colocado o seu nome, tirado o nome: “Eu vou? Eu não vou? Estou desanimado; eu
acho que não vai dar certo”. Porque conquista, ela traz consigo, também, o desânimo.
Qualquer conquistador dirá, se ele for sincero, que passou pela mente dele a vontade de
desistir, o desânimo, as incertezas. A conquista ela traz consigo a expectativa de como vai
ser.
637
Mensagem do pastor Ronaldo Fonseca, apresentada ao I Fórum Político das Assembléias de Deus do Estado de São Paulo, em
auditório do São Paulo Hilton Hotel, no dia 10 de junho de 2004, em São Paulo, capital.
311
Os candidatos foram reconhecidos e encorajados como líderes que já lidam com o
sucesso em suas carreiras de pastores e obreiros da Igreja: “Amados, nós já temos a
natureza conosco da conquista. Todos nós somos conquistadores, uns mais, outros menos.
Mas todos nós somos conquistadores. Aliás, para nós estarmos aqui é porque somos
conquistadores, é porque somos vitoriosos [...].” Como em toda reunião pentecostal, as
duas centenas de candidatos, ali presentes, respondia com “Amém! Aleluia! Oh, glória!”
enquanto o orador prosseguia:
Você tem que trazer com você essa característica porque você é um sucesso. Você não pode
imaginar ganhar uma eleição ou construir um projeto imaginando o insucesso. A minha
palavra tem esse sentido de injetar em vocês essa confiança, para que você entenda que você
já é um sucesso por natureza. [...] Você tem que acreditar em você. Você tem que entender
que você é uma possibilidade de sucesso. E você tem condições de ser vitorioso, de ser
vitoriosa.
A elevação da auto-estima era reforçada através de dinâmicas de encorajamento
coletivas, sob orientação do coordenador: “Aproveite agora e vire para o seu irmão e diga:
‘irmão você é um sucesso’ (burburinho). Diga para ele: ‘Você é um sucesso’ (aplausos).
Diga aí: ‘Você é um sucesso! Você vai ganhar a eleição! Você é vitorioso! (burburinho)
‘Glória! Já ganhou!’” Estava instalado o clima pentecostal típico, na reunião de treinamento
dos candidatos.
O coordenador voltou ao texto bíblico para analisar as estratégias que Josué usou na
destruição dos muros da cidade de Jericó, enquanto procurava transformá-las em diretrizes
para os candidatos definirem suas estratégias, no contexto específico de cada um. Insistiu
que todos deveriam exercitar ao máximo a virtude da criatividade. Citou exemplos
contemporâneos, como Enéias do Prona, que aproveitava os poucos segundos da
propaganda eleitoral gratuita, a que tinha direito na mídia, com a frase simples e de
impacto: “Meu nome é Enéias!” Citou exemplo de campanha que testemunhou:
Você tem que criar alguma coisa. Você não pode fica sentado. Não, não pode ficar sentado.
Você tem que criar alguma coisa, irmão: criatividade. Ora, tem um cidadão em uma cidade
na qual eu fui pastor que ganhou a eleição. Sabe como, irmão? Em cima de um burro. Ele
escreveu o nome dele todinho, as faixas enroladas todinhas no burrinho dele e ele sentado
em cima. Não falava nada não. Só o burrinho andando na rua. (risos) E ele só assim. E o
312
burrinho está lá. Várias faixas enroladas no burro e o burrinho lá, só o olho dele aberto.
(risos) Sabe o que aconteceu? Foi o mais votado para vereador na cidade. O homem lá fez e
ganhou!
Incentivou a criação de slogans, referindo-se ao exemplo do candidato Neuton
Lima, que criou o mote “gente da gente lá” na campanha para deputado federal e
ganhou a eleição em 2002. Pastor Ronaldo deu ênfase à criatividade exercitada pelo próprio
candidato:
Se você tiver dinheiro, que quase não tem, procure um marqueteiro que tem uma idéia e pa-
pa-pá. Mas muitas vezes o que o marqueteiro faz nem funciona direito. Aquilo que vem de
você, que vem de sua cabeça, da sua visão mesmo, normalmente, é o que funciona e
funciona muito bem. O que você tem que fazer é ter criatividade. Faz alguma coisa aí. Pega
um ovo de galinha, por exemplo, pinta seu nome e sai distribuindo ovo por aí. (risos)
Alguma coisa aí. Eu estou falando assim, mas eu quero dizer o seguinte. Seja criativo.
Em outro momento, respondendo a perguntas dos candidatos, o deputado federal
Gilberto Nascimento, também presente ao fórum, deu conselhos práticos, como o seguinte:
A eleição de vereadores é o voto artesanal. Imagine, por exemplo: Quem é candidato?
Vamos pegar um candidato aqui na frente. Seu nome, qual é? “Paulo Julio”. Quantos
votos você precisa na sua cidade? “Dois mil votos”. Hoje faltam 116 dias para a eleição.
Vamos imaginar que faltassem cem dias. Você precisa, sabe, arrumar quantos votos por dia?
Vinte votos. Para ter 20 votos certos, você precisa falar com pelo menos 40 pessoas por
dia.
638
Outra estratégia recomendada pelo coordenador Ronaldo Fonseca aos candidatos foi
que eles deveriam confundir os adversários:
Josué foi criativo, Josué foi criativo. E Deus deu para ele a estratégia. Que tipo de estratégia
vocês estão montando? ‘Eu estou montando uma estratégia para minar o meu inimigo’. Sabe
o que a bíblia diz? A bíblia mostra para nós que quando Deus colocou o povo rodeando a
cidade era para confundir o inimigo. Confundir inimigo é coisa de político.
638
Palavra do deputado Gilberto Nascimento, durante o I Fórum Político das Assembléias de Deus do Estado de São Paulo, em auditório
do São Paulo Hilton Hotel, no dia 10 de junho de 2004, em São Paulo, capital.
313
Sem, necessariamente, fazer alusão a Carl Schmitt, o coordenador da Assembléia de
Deus estava tratando do embate político como uma guerra entre inimigos.
639
4.3.2 Princípios e valores
Houve um momento na preparação dos candidatos em que foram apresentados
alguns princípios e valores, a título de sugestão para inspirar suas condutas na campanha e
na vida pública, em geral. Embora não tenha sido planejada, esta parte foi preenchida por
um político não-evangélico do PSDB, o deputado federal Antônio Carlos Mendes Thame,
que estava ali como representante do candidato a prefeito de São Paulo, senador José Serra.
Thame fora escalado para uma simples saudação, mas produziu discurso ético, preenchendo
lacuna que se esperava não devesse existir em evento de políticos religiosos. Excertos do
seu pronunciamento, apresentados em seguida, oferecem um resumo dos pontos que ele
abordou:
Como é que uma pessoa entra para a política? [Em] primeiro lugar, aqueles que se dispõem
a ter uma participação política são pessoas que, normalmente, não estão contentes com a
realidade que estão vendo, sentindo. Estão querendo transformar a realidade. [...] Esta é a
primeira percepção. A percepção de que uma ação isolada é infrutífera e que é preciso estar
juntos para mudá-la. E é por isso que entram para a política. [...].
A segunda percepção é a percepção de que não adianta atuar só nas conseqüências.
Normalmente, os candidatos são pessoas que já atuaram como voluntários em instituições
filantrópicas, instituições de benemerência e é muito importante que assim o façam.
Percebem que se atuarem na política vão atuar nas raízes. Poderão atuar naquilo que está nas
causas das desigualdades e dos problemas sociais. E que, portanto, poderão dar uma
contribuição muito eficiente para mudar essas desigualdades e diminuir essas injustiças. [...]
A política tem que ser feita com ética e [...] a nossa ação, o nosso mandato, não começa no
dia em que tomamos posse. Começa já, agora, na campanha. A forma como se faz
campanha condiciona o que vai ser o mandato. E, por isso, tomei a liberdade de conversar
com o senador [José Serra] e, juntos, discutirmos [os] pontos [a seguir]: [...]
639
Cf. SCHMITT, Carl. O conceito de político. Petrópolis: Vozes, 1992.
314
A ação política começa na campanha e [...] nós não podemos ser camelôs ilusórios,
prometer aquilo que não podemos cumprir. Nós só podemos prometer aquilo que nós vamos
fazer. [...]
O segundo ponto é a transparência. Não há nada durante a campanha que a gente não possa
contar a todos. Nada que a gente vai fazer que seja feito de madrugada é porque não é bom.
Tudo que nós fizermos tem que ser à luz do dia tem que ser feito de uma forma clara. [...]
A população hoje exige e cobra dos nossos políticos é que eles tenham uma ação política
voltada para quem mais precisa. Para os mais pobres. [...] É preciso deixar claro que nós
estamos com uma administração voltada para os mais pobres e preocupada em criar uma
rede de proteção social fundada na família. Não adianta planos soltos. Um te dá uma bolsa
para escola, outro dá algo para o desempregado... É preciso que a família seja o núcleo das
atenções e da ação política. [...]
Nós queremos que a ação política seja um indutor da dignidade. E para induzir dignidade é
preciso deixar claro que cada momento de quem tem um mandato é um momento dedicado
para tentar criar emprego e para estimular o empreendedorismo. [...]
O próximo ponto, [...] é a questão da gestão compartilhada. Que a gente citaria apenas dois
pontos. O que é gestão compartilhada? Gestão compartilhada é a busca de soluções
conjuntas com a população. Não querer resolver tudo sozinho. Tentar ouvir
permanentemente a população, mas, mais do que ouvir, enxergar que a sociedade
organizada mostra sempre o caminho mais rápido, mais barato e mais eficiente para resolver
os seus próprios problemas. [...]
Por último. Último ponto. Definir bem as parcerias. Definir quem são os nossos parceiros.
Os parceiros da ação do prefeito, dos vereadores e de cada um de nós. [...]
Lá no Eclesiastes, no versículo 10 (sic), diz que “tudo quanto que te vier à mão para fazer,
faze-o com o melhor das tuas forças, porque no além, para onde tu irás, não há obra nem
projeto nem conhecimento nem sabedoria”. [...] Nós temos que estar aliados a pessoas que,
quando pegarem alguma coisa para fazer, façam da melhor forma possível, com o sentido de
que têm só uma oportunidade de fazer bem feito. Quando eleitos, tenho certeza, com o
apoio das igrejas, eleitos façam do seu mandato aquilo que está nesse versículo. Aproveitem
cada minuto dessa graça, desse mandato que recebem pela graça de Deus, pelo voto que
recebem por confiança dos seus eleitores, para melhorar a vida de nossos semelhantes e
ajudá-los a dar a nossa contribuição para transformar este país onde tivemos o privilégio de
315
nascer, Um país rico, não um país rico em estatísticas, mas um país rico, acima de tudo, na
qualidade de vida do nosso povo.[...].
640
Cada candidato foi desafiado pelo coordenador Ronaldo Fonseca a estabelecer
propósitos para a vida. Ter clara consciência do estágio da vida no qual se encontra, quais
objetivos pretende atingir na carreira política e como procederá para alcançá-los. Da parte
do mesmo líder, pouca ênfase foi dada a aspectos éticos do comportamento do candidato,
salvo quando recomendou que deveriam ter uma estratégia para confundir o concorrente,
mas que não deveriam usar as mesmas “armas que eles usam lá fora”. Acrescentou o
coordenador: “A Bíblia diz que as armas de nossa milícia não são carnais. Esta é uma
milícia nossa, não são [armas] carnais. E sim, poderosas em Deus para a destruição das
fortalezas. (“Amém”, “Aleluia”). Então, meu irmão, você pode montar sua estratégia, mas
sempre dentro do limite da palavra de Deus, nunca fora disso”.
641
4.3.3 Perguntas e respostas
Após essas intervenções, no momento de resposta a perguntas dos candidatos, o
pastor Ronaldo explicou de que modo estava tentando imprimir um padrão visual nas
propagandas eleitorais do pessoal da Assembléia de Deus em todo o Brasil:
Nós estamos em nosso escritório central, ali em Brasília, criando um padrão para a nossa
campanha visual. Então, os vereadores que quiserem, nós queremos que todos usem este
padrão, claro, nós vamos mandar a arte para você e você vai idealizar isso na gráfica local.
Mas nós temos um padrão de campanha, estamos trabalhando em nosso escritório de
Brasília para isto, para que chegue a vocês através das comissões estaduais e municipais.
Chegue até os irmãos este projeto. Estamos imaginando que Deus vai nos dar uma saída, no
sentido de colocar na mão de vocês uma certa estrutura de campanha.
642
As orientações aos candidatos também tinham o tom de advertência. A eleição é
uma guerra na qual o candidato tem um preço a pagar, como advertia o deputado Gilberto
Nascimento:
640
Pronunciamento do deputado federal Mendes Thame (PSDB), aos candidatos da Assembléia de Deus às eleições municipais
do Estado de São Paulo, no fórum de preparação destes, realizado no São Paulo Hilton Hotel, em junho de 2004.
641
Palavra do coordenador nacional de política da AD, pastor Ronaldo Fonseca, no fórum de preparação dos candidatos da igreja
para as eleições municipais do Estado de São Paulo, no SP Hilton Hotel, em junho de 2004.
642
Orientações do pastor Ronaldo Fonseca aos candidatos às eleições municipais de 2004, apresentadas durante o I Fórum Político
das Assembléias de Deus do Estado de São Paulo, em auditório do São Paulo Hilton Hotel, no dia 10 de junho de 2004, em São Paulo,
capital.
316
Se você está aqui nesta caminhada achando que vai desistir com facilidade, então é melhor
desistir já. Nem entra na guerra. Esta é uma luta grande. Esta não é uma luta fácil. Esta não
é uma luta que quando você fala: ‘minha câmara diminuiu de 11 para sete, eu vou perder a
eleição’. Não. É aí que você vai ver que Deus está na sua vida. Se tiver um vai ser você.
Amém? (aplausos).
643
Mais adiante, o mesmo deputado disse:
Política é uma coisa para ter determinação. Política não é uma coisa para você achar que vai
fazer com tranqüilidade, ser candidato e ganhar a eleição. Não. Política é determinação.
Política é você, primeiro, sair com acordo com a sua família. Gente, uma mulher chata na
eleição, te tira a eleição. Mas sabe quando ela fica chata? Quando você não combina com
ela.
644
O pastor Ronaldo havia lembrado na prédica que a eleição é uma conquista
construída com bastante antecedência:
Não existe conquista sem estratégia. Deus deixa claro: “Quer ganhar, Josué? Então, espera
aí que eu vou te dar uma estratégia para você ganhar” (sic). Quer ganhar a eleição meu
irmão, minha irmã? Tem que ter estratégia. Não fica pensando que eleição se ganha no dia
da eleição. Quando é a eleição? Dia três de outubro. Daí você pensa: “Dia primeiro de
outubro, mais ou menos, eu vou começar a pensar.” Já perdeu.
645
Essa preparação antecipada deve ter como fundamento o projeto existencial de cada
um:
Existem muitas pessoas que não têm projetos para sua própria vida. É bem possível que nós
tenhamos candidatos aqui que estejam dizendo o seguinte: “Oh, eu nem queria esse negócio
aqui. Mas me colocaram, eu estou aqui e, sabe, eu estou indo. Não é um negócio para mim.
Vais perder a eleição. Vai perder a eleição. “Ah, sabe como é, o pastor pediu. Sabe como é?
Os amigos, daí eu estou aí”. Escuta, mas este é um projeto que você deseja para sua vida,
para sua vida? Você consegue vislumbrar? Consegue chegar? “Não, não, não. Eu não vejo
nada disso. Eu só vejo derrota”. Então é melhor tirar o nome.
646
643
Palavra do deputado Gilberto Nascimento, durante o I Fórum Político das Assembléias de Deus do Estado de São Paulo, auditório do
São Paulo Hilton Hotel, 10 de junho de 2004, São Paulo, capital.
644
Ibidem.
645
Mensagem do pastor Ronaldo Fonseca, apresentada ao I Fórum Político das Assembléias de Deus do Estado de São Paulo, em
auditório do São Paulo Hilton Hotel, dia 10 de junho de 2004, SP, capital.
646
Ibidem.
317
Esta seção de orientações, incentivos e exortações, aos candidatos da Assembléia de
Deus foi encerrada com uma chamada a um compromisso, feita pelo coordenador estadual,
pastor Paulo Freire:
E chegou a hora de nós nos despertarmos. Estamos fazendo isso em boa hora, em um bom
tempo. E vamos trabalhar. Vamos sair daqui conscientes de que na verdade é uma
conquista, mas uma conquista que nós temos plena condição de alcançá-la, bastando, então,
somente, seguirmos as instruções que temos recebido aqui. Na verdade, Deus tem falado
conosco nas palavras destes homens que têm utilizado esta tribuna para nos trazer
orientações sábias, orientações importantes para prosseguir. Agora, não vamos abrir mão
desses princípios, dessas orientações, porque são elas que nos farão vencedores. Nós sempre
temos dito que o nosso grande desafio é realmente trabalhar, despertar a consciência da
cidadania, a consciência daquilo que nós somos, daquilo que nós representamos e daquilo
que nós podemos alcançar. Para isso nós temos um projeto. Como disse o pastor Ronaldo,
este projeto teve apenas um início, mas nós sabemos onde podemos chegar e como podemos
chegar. Então vamos continuar trabalhando neste projeto que eu tenho certeza que a nossa
vitória será muito grande.
647
4.3.4 Outros apoios aos candidatos
Além dessa iniciativa de preparação de candidatos, através de fóruns promovidos
em diversas capitais do Brasil, os deputados da Assembléia de Deus estavam ajudando
candidatos que atuavam em seus respectivos redutos eleitorais, como explicou o deputado
federal Zequinha Marinho, da AD no Pará:
O que nós fizemos? Nós tentamos ajudar. O que significa ajudar? Arrumar o ‘santinho’ para
o vereador. Santinho aquele cartazinho [cartãozinho] pequeno. Aquilo que nós tivemos
alcance nós fizemos como forma de estimular a participação no processo e a somar um
pouco mais de mandatos. Melhoramos um pouco. Hoje nós já temos um pouco mais de
vereadores, prefeitos e vice-prefeitos evangélicos, dentro e fora do partido. Muita gente se
saísse do partido ia desarticular sua eleição, então foi aconselhada a permanecer no partido
para vingar a eleição e evitar um tropeço. A gente tem que saber como se comporta em um
momento eleitoral. E depois vai-se resolvendo isso, vai-se encaminhando a questão político-
partidária. A estratégia do ano que vem [2006] é a mesma. É tentar convencer somar
647
Palavra do coordenador do I Fórum Político das Assembléias de Deus do Estado de São Paulo, pastor Paulo Freire, em auditório do
São Paulo Hilton Hotel, 10 de junho de 2004, SP, capital.
318
esforços, mobilizar. Como eu disse, a nossa igreja é diferente das outras, não é o presidente
que fala assim, “vamos fazer isso”, e todo mundo faz.
648
A Igreja Universal tem sua estratégia própria de preparação dos candidatos, que não
foi possível conhecer, através de observação direta. Também, nas entrevistas, não foi
explicada como era feita a preparação dos candidatos da Igreja, nos bastidores da
campanha. Apenas colheu-se uma breve menção da deputada federal Zelinda Novaes, sobre
sua participação na campanha municipal de 2004, no Estado da Bahia:
A gente participa sim, ajuda os candidatos e tudo. O nosso trabalho é muito no corpo a
corpo. Ajuda a se reunir com as entidades, bairros, outras denominações, que nos convidam.
Porque nós temos muitas denominações mais pequenas que não têm candidato e que a gente
está sempre dando apoio. E antes das eleições a gente se aproxima, se coloca a disposição.
Estive, principalmente em Vitória da Conquista, Camaçari, Candeia, Dias D’Ávila... Deixa
eu ver mais... Foram diversos [municípios] onde nós tivemos candidatos. Principalmente
interior.
649
4.3.5 Estratégias de campanha.
O político pentecostal sabe que o maior trunfo de campanha à sua disposição é o
voto quase cativo das comunidades que o identificam como “candidato oficial da Igreja”.
Deste modo, ele concentrará esforços na divulgação da candidatura no âmbito dos distritos
eclesiais que o apóiam. Contudo, deverá fazê-lo consciente de que se trata de um ambiente
de igreja, onde falar de política ainda é tabu para as gerações mais antigas do
pentecostalismo. Na Assembléia de Deus do Pará, por exemplo, os pastores têm sido
proibidos de usar o púlpito para fazerem propaganda política. Não só o lugar é sagrado,
mas também o tempo, pois evitam fazer propaganda aos domingos. Para contornar essa
restrição, o coordenador de cada distrito eclesial realizou reuniões com as lideranças das
comunidades nos sábados e na véspera da eleição, em 2004. Nesses encontros foram dadas
orientações de como divulgar o nome do candidato oficial entre os demais membros da
648
Entrevista do deputado federal Zequinha Marinho, em Brasília, dia 25 de novembro de 2005.
649
Entrevista da deputada federal Zelinda Novaes, em Brasília, dia 30 de novembro de 2005.
319
Igreja.
650
Estes cuidados são necessários, porque, afinal, uma igreja existe para atender
demandas religiosas de seus fiéis. O projeto eleitoral não é sua atividade-fim.
No contato direto com a massa de membros e freqüentadores, a propaganda pode
apelar para o vale-tudo. Em Belém, devido ao movimento dos homossexuais contra
discriminação em transportes coletivos, prontos-socorros e ambientes de trabalho, alguns
pastores e candidatos contra-atacaram, alertando seus eleitores que os homossexuais
estavam pleiteando “carteirinha” de passagem nos ônibus, junto à prefeitura, e que era
dever dos pentecostais eleger seus representantes para impedirem esses privilégios.
651
A
mesma fonte comentou que “os homossexuais conseguiram a primeira passeata gay com o
apoio dos [políticos] evangélicos [...]. Com o apoio dos evangélicos que barganharam o
‘dia da reforma’. Para a reforma [protestante] ganhar [sua data comemorativa no calendário
da cidade], tiveram que barganhar pelo dia da passeata gay.”
652
Curiosamente, completaram
esses líderes pentecostais, “até hoje não fizeram uma programação em relação ao dia da
reforma, [enquanto] a passeata gay cada dia mais cresce.”
653
Voltando para o tema campanha do candidato assembleiano, o deputado Pedro
Ribeiro descreveu a estratégia estabelecida pela Convenção Geral das Assembléia de Deus
do Brasil. Ele a reconhece como uma franca evolução do voto de cabresto, do tempo dos
coronéis da roça ou coronéis de barranco, no caso da Amazônia, para um voto corporativo,
em gente da “família dos santos”.
654
Esta observação confirma o que constatou Lalive
D’Épinay, quando indicou que havia um paralelo entre o terrateniente da sociedade agrária
e o pastor pentecostal, que substituía parcialmente aquele, assumindo função paternalista-
autoritária nas sociedades em processo de urbanização, na América Latina.
655
A campanha do candidato não fica restrita ao arraial dos irmãos. Alguns políticos
pentecostais, por já serem liderança de movimento social, ou por terem experiência em
650
Informação obtida em entrevista interativa com um grupo de cinco líderes da Assembléia de Deus em Belém, distrito de
Icoaraci, no salão social do templo-sede do distrito, em janeiro de 2006.
651
Entrevista com um grupo de cinco líderes da Assembléia de Deus em Belém (PA), distrito de Icoaraci, no salão social do
templo-sede do distrito, em janeiro de 2006.
652
Ibidem.
653
Ibidem.
654
“Família dos santos” e “domésticos da fé” é linguagem bíblica que os evangélicos usam para se referirem à comunidade de
crentes à qual pertencem, seja em sentido local, regional ou mais amplo.
655
Cf. D’ÉPINAY, 1970.
320
processos eleitorais mais amplos, caso típico dos deputados federais, são praticamente
induzidos a ampliar o horizonte de campanha. A deputada Zelinda Novaes, da Igreja
Universal, por exemplo, cuidava do trabalho social nesta denominação e tinha experiência
como servidora pública, em cargo de confiança na prefeitura de Camaçari, antes de ser
candidata. Embora seu eleitorado seja majoritariamente das comunidades de sua igreja, ela
contou com a Internacional da Graça de Deus, em uma eleição para deputada estadual e
com parte dos fiéis da Casa da Bênção na Bahia. O voto tem um componente de
reconhecimento e gratidão pelo apoio que ela concede a projetos sociais:
Você sabe que fica aquela gratidão, não é? E eles não são fechados em torno de um
candidato. Então eu tenho uns espaços lá fora, em muitas igrejas pequenas, como, por
exemplo, a Peniel, que é essa que tem a casa de recuperação que eu tenho ajudado muito,
investido não com recursos, mas com trabalho, nessa questão de combate à dependência
química. Então, eu tenho [ajudado] deficientes, eu já fiz muitos trabalhos nesse segmento.
656
Outro parlamentar com experiência eleitoral externa ao reduto pentecostal, embora
seja um deputado orgânico do projeto de conquista de poder da CGADB, é Zequinha
Marinho. Sua prática no movimento sindical bancário e em lides políticas anteriores deram-
lhe o preparo necessário para construir uma rede de apoio e conquistar votos, através dela,
em 2002. A votação de Marinho foi, em sua maior parte, obtida no interior do Estado do
Pará:
Eu sou do interior. Eu sou da cidade de Conceição do Araguaia, interior do interior, fica a
quase mil quilômetros da capital do Estado. Então eu sou, como diz o pessoal, da bancada
caipira e como eu sempre vivi no interior... Eu nasci na roça, como dizem outros, na
fazendinha do meu pai. Sou nascido em casa. Então isso eu acho muito bom. Interior para
mim é uma festa. As cidades pequenas têm toda uma particularidade. Eu não tive cinco mil
votos em Belém. Eu tive em Belém quatro mil e quinhentos votos, dois mil seiscentos e
trinta em Ananindeua, se somar tudo não dá dez mil votos em Belém e Belém
metropolitana. Aí não foi muito voto evangélico, aí foi em função de parcerias com
deputados estaduais que tinham penetração ali e de uma articulação que foi feita com
lideranças de comunidades, porque ali dentro manda o Raimundo Santos, o nosso
656
Entrevista da deputada federal Zelinda Novaes, gravada em seu gabinete, Brasília, dia 30/11/2005.
321
companheiro, deputado aqui dentro, e ele teve uma votação expressiva em Belém e Belém
metropolitana.
657
4.3.6 Finanças
As campanhas de candidatos pentecostais demandam poucos recursos financeiros,
se comparadas a campanhas de candidatos que não têm à disposição um eleitorado quase
cativo, como o das igrejas pentecostais que têm projeto eleitoral. O deputado Gilberto
Nascimento, da Assembléia de Deus, ao falar sobre reforma política, defendeu o
financiamento público de campanha para livrar os candidatos de grupos econômicos que os
financiam, mas ressalvou que “na igreja é uma campanha diferenciada, é uma campanha
muito mais barata, relativamente muito mais barata, porque ela tem um público
definido”.
658
Um assessor de parlamentar da Universal reforçou este argumento e
acrescentou algumas peculiaridades do contexto político desta igreja. Segundo ele, a IURD
tem um grande trunfo para atrair partidos: candidatos desta Igreja arrastam votos em
quantidade capaz de fazer quociente eleitoral que os elege e pode eleger outros, ampliando
deste modo a bancada do partido que os acolhe. Talvez haja exagero do assessor, pois nem
todo candidato da IURD carreia tantos votos assim. Entretanto, o carisma institucional
desta igreja é muito forte e atrai público disposto a fazer o que seus líderes recomendarem.
Segundo o mesmo assessor, a campanha é mais barata por causa deste carisma:
... o gasto financeiro é menor que o dos outros. Por quê? O cara chega na igreja e fala “O
bispo Fulano de Tal vai vir aqui dar a palavra de manhã”. A igreja vai estar lotada desde as
sete da manhã. Até o trânsito vai estar engarrafado. Porque ele vai falar 15 minutos às dez
da manhã, às seis da manhã já está cheio. Se ele vai falar às quatro da tarde, meio dia já tem
gente. Então esse tipo de coisa que um candidato só consegue se levar o Zezé de Camargo e
Luciano. Tem que levar uma atração para poder [atrair gente]. E lá não, não precisa disso.
659
A Assembléia de Deus é uma denominação com enorme carisma, mas não tem
bispos.
660
Seus templos também lotam, durante as diversas celebrações. Não há, porém,
657
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, dia 25 de novembro de 2005.
658
Entrevista do deputado Gilberto Nascimento, em Brasília, novembro de 2005.
659
Entrevista concedida por um assessor de deputado da Igreja Universal, em Brasília, em meados de junho de 2004. A fonte
pediu que sua identidade fosse omitida.
660
O bispo presidente da Assembléia de Deus Madureira, deputado pastor Manoel Ferreira, é uma exceção no conjunto das
Assembléias de Deus. Em geral, as igrejas desta tradição não adotam a figura de bispo. Preferem designar de “pastor presidente” o
líder de um distrito, região, convenção ou ministério.
322
esse comportamento emocional em torno de personalidades, que faz transitar do campo
religioso ao político a dedicação dos fiéis, a ponto de fazerem, sem questionamentos, o que
a liderança da igreja lhes recomenda.
Candidato oficial da Assembléia de Deus sabe quão importante é a chancela da
Igreja para o sucesso de sua candidatura, mas reconhece a necessidade de ajuda financeira,
ou em forma de materiais diversos e apoio logístico para a campanha. A coordenação
política nacional também estava atenta a isto, em 2004, porém confessou suas limitações. O
coordenador Ronaldo Fonseca fez um relato da dimensão do projeto “Cidadania AD
Brasil” e demonstrou como seria inviável angariar recursos e distribuí-los aos milhares de
candidatos, espalhados em todos os rincões do País:
Meus irmãos, uma das grandes dificuldades do candidato é, realmente, a área financeira. Eu
já disse hoje e vou repetir. Muitas vezes o poder econômico nos ameaça, mas nós falamos
aqui, hoje, na unidade, que a unidade nos faz vencer a eleição, sem dinheiro. Obviamente
que alguma coisa precisa. Nós temos andado muito preocupados com isso, porque essa parte
é a mais difícil do projeto. Como fazer chegar a vocês alguma coisa no sentido de dar uma
certa estrutura, condições para que possa fazer uma eleição dentro do mínimo possível. Ora,
se nós da Assembléia de Deus vamos ter, aproximadamente, cinco mil candidatos a
vereadores em todo o Brasil eu fico pensando, onde é que nós vamos arrumar dinheiro?
Então, supomos que nós fossemos fazer o seguinte... Igreja não tem dinheiro para isso.
Igreja não usa o seu dinheiro para a política. Dinheiro da igreja não é para isso. Mas
digamos que a gente fale: “vamos conseguir dinheiro para dar para os vereadores para
resolver os problemas deles; vamos fazer o seguinte, para não dar muito para eles, vamos
dar mil reais”. Mil reais não é nada, mas faz um cálculo, são cinco mil, quanto daria?
Cinco milhões. Aí é muito. Então, queria só que vocês nos ajudassem em oração. Nós
estamos orando para que Deus nos dê uma saída com sabedoria, para que nós possamos
trabalhar visando dar o mínimo de estrutura possível para vocês. Claro que existem muitos
caminhos. Existem os apoios, as alianças que nós vamos fazer em todo o Brasil. Nós temos
candidatos a prefeito, inclusive temos o senador Serra, que será candidato a prefeito aqui.
Teremos os candidatos a prefeito, que nós poderemos estar costurando uma aliança com
eles, visando, também, buscar esta estrutura de campanha que é absolutamente possível.
661
661
Palavra do pastor Ronaldo Fonseca, no fórum de candidatos da AD-SP para as eleições municipais de 2004, no São Paulo
Hilton, em junho do mesmo ano.
323
As dificuldades enfrentadas pelo coordenador foram testemunhadas pelo deputado
Neuton Lima, que reforçou o discurso de Fonseca:
Nós estamos correndo atrás de tentar viabilizar recursos para a comissão política do Estado
de São Paulo. Pastor Ronaldo, coitado, está ficando quase sem cabelo. A preocupação dele é
maior ainda, é com o Brasil; todos os estados do Brasil. E nós temos que arrumar, no
mínimo, o papel com o carimbo da comissão política para dar para os nossos vereadores.
Gilberto sabe o quanto que a gente tem corrido. Ele também tem corrido, viu gente? Eu sei o
trabalho do Gilberto. Temos corrido para ver se a gente viabiliza as condições mínimas
necessárias. Eu sei a vida desse homem aí, pastor Paulo: é cuidar da Igreja, da comissão
política, do conselho de doutrina, é presidindo a Igreja de Campinas, que é grande que só. E
conversa comigo toda semana. Colocou um assessor dele para comandar alguns projetos em
algumas prefeituras e as coisas estão caminhando. Quer dizer, todo mundo tem que correr
atrás para ver se sobra uma migalha daquelas lá, que cai da mesa do Senhor, para ver se dá
para a gente dividir com os nossos candidatos. Mas não seja este fator econômico que
desestimule vocês não. Acreditem: eu não tinha a mínima condição de me eleger deputado
em 98 e ganhei. Em 2002, mais ainda, porque ainda diziam: “o Neuton mudou de partido,
vai precisar de muitos votos e ainda não ganha a eleição”. Deus deu. Acabei de pagar minha
dívida de campanha agora, em abril de 2004.
662
A manifestação do deputado Lima era importante, porque havia expectativa de que
ele e outros parlamentares assembleianos pudessem ajudar seus irmãos naquela campanha.
Afinal, na eleição seguinte, de 2006, eles precisariam contar com o apoio dos vereadores.
Tentando evitar um provável assédio dos aspirantes a vereador sobre os deputados,
adiantou-se o pastor Ronaldo, com a seguinte declaração:
Dinheiro ninguém tem. Eu vou dizer uma coisa para vocês. Eu moro em Brasília e estou
junto deles lá. Olha meu irmão, eu vou ser sincero com vocês. Eu tinha tanta vontade de
pedir uma oferta para deputado, mas depois que eu fui morar em Brasília e conviver com
eles, irmão, eu chego lá e tenho vontade de tirar o dinheiro e dar para eles. Irmão, deputado
não tem dinheiro. Deixa eu ser sincero com vocês, não tem dinheiro. Esses dias, um
companheiro nosso esteve no meu gabinete, coitado, estava até chorando, e mostrou para
mim: “Ronaldo senta aqui um pouquinho. Três contas bancarias minhas e olha aqui como é
que eu estou, tudo no vermelho. E ainda quando vem uma convocação extraordinária falam
mal de nós”. Deputado não tem dinheiro não, é muito difícil. Como é que deputado vai
662
Palavra do deputado federal Neuton Lima, no fórum de candidatos da AD-SP para as eleições municipais de 2004, São Paulo
Hilton, junho de 2004.
324
bancar campanha para vereador em todo Brasil: Por exemplo, Estado de São Paulo, 645
municípios e nós vamos ter candidatos na maioria. Como é que vai bancar? Realmente não
tem condições.
663
Mesmo com essas dificuldades, a coordenação estadual de São Paulo não descartava
a possibilidade de dar apoio para os candidatos que quisessem realizar fóruns municipais.
Retomando a palavra, o deputado Neuton Lima recomendou que o orçamento de campanha
de cada candidato se adequasse aos limites de recursos que cada um tivesse assegurado:
Gilberto está aqui lembrando uma coisa muito séria. Não fica trocando cheque. Não pegue
dinheiro de agiota. Não faz isso, não faz dívida irmão. Eu, quando saí candidato a prefeito
agora, meu pai chegou e disse: Meu filho, pelo amor de Deus, você vendeu seu
apartamento, vendeu carro, está pagando a dívida e vai fazer mais uma?”. Eu fiz um
compromisso com meu pai e com a minha esposa: eu não faço mais dívida. E não estou
fazendo. Se tiver dinheiro eu faço a campanha. Se não tiver dinheiro, eu vou fazer a
campanha, como? Eu não sei, Deus vai prover e assim que você deve acreditar. A comissão
política vem para te apoiar. Te ajudar, te orientar. Na medida do possível que ela tiver, ela
vai investir e você também. Agora, se não chegar, faça, e Deus vai honrar sua fé e você vai
ser um vitorioso.
664
(Aplausos).
Com a experiência acumulada de ter vencido várias campanhas, o deputado Gilberto
Nascimento sugeria que os candidatos deixassem a parte financeira sob controle da esposa:
Tem eleição que você se desespera: “Acho que eu vou perder a eleição”. Porque você acha o
seguinte: “Se a pessoa me pede tal coisa, e eu não der, talvez seja esse voto que vai me
faltar”. Também não entra nessa neura, nesse desespero, não. Na campanha, minha [esposa]
Débora controla o meu dinheiro. E ela não me deixa gastar mesmo. Sempre o cartão do
banco fica com ela.
665
4.3.7 Desempenho eleitoral
As dificuldades apontadas pelos dirigentes da Assembléia de Deus em 2004, seja a
insuficiência de recursos, seja a precariedade logística de apoio aos candidatos, podem
justificar, em parte, o resultado obtido na eleição. A expectativa era eleger cerca de três mil
vereadores, mas foram eleitos um terço deste total. Os deputados Gilberto Nascimento (SP)
663
Palavra do pastor Ronaldo, no fórum mencionado.
664
Palavra do deputado Neuton Lima, no mesmo fórum.
665
Palavra do deputado Gilberto Nascimento, no fórum dos candidatos da Assembléia de Deus de São Paulo, em junho de 2004.
325
e Pedro Ribeiro (CE) avaliaram esse desempenho e fizeram diversas ponderações. Ambos
reconheceram que a Assembléia de Deus tem pouca experiência em processos eleitorais.
Segundo Nascimento:
Esse processo para a Igreja é um processo novo. Essa organização para nós ainda é uma
coisa nova. Porque, eu repito, eu fui o primeiro vereador da Assembléia de Deus em São
Paulo. Isso em 1982. Então, nós temos um processo de 20 anos que a gente está se
organizando para isso. Quer dizer, quem não tinha nada, para chegar a esse número de quase
mil vereadores no Brasil inteiro, eu acho que nós caminhamos bem. Poucos partidos têm
isso. Então, o segmento evangélico caminhou muito bem. E volto a dizer, hoje são quase mil
vereadores. Então, caminhou bem.
666
A análise do deputado Pedro Ribeiro foi mais ampliada. Situou o candidato a
vereador no contexto das relações com o prefeito, que por sua vez já tem vínculos com
deputados, geralmente alheios à Assembléia de Deus. Ribeiro também lembrou o impacto
do corte de emendas individuais ao Orçamento da União, efetuadas pelo Executivo, visto
que essas emendas constituem fonte importante para os deputados alimentarem suas bases
políticas locais, em troca de votos. O pouco tempo dos pentecostais na política não
permitia, ainda, que a Assembléia de Deus já dispusesse de um quadro de parlamentares
com vários mandatos. Este tipo de parlamentar veterano vai formando, ao longo do tempo,
uma rede de apoio, que se consolida em sucessivas campanhas. O depoimento do deputado
cearense foi o seguinte:
Nós da Assembléia de Deus elegemos em torno de mil [vereadores]. Foi essa a estatística
levantada. Foi pouca. O desempenho foi fraco. Teve tudo a ver ainda com a nossa
neoficidade (sic) e a nossa falta de estrutura. Porque o seguinte: o vereador é a peça mais
difícil para se trabalhar. Porque ele vive no município, ele serve ao prefeito. O prefeito
normalmente tem o seu deputado. Como nós não éramos, não somos deputados daquele
prefeito, é preciso a gente levantar homens com o nome excelente dentro da igreja e
condições para trabalhar, o que nós não temos. O que eu pude ajudar aos meus candidatos,
pelo menos eu pude ajudar a 126 candidatos. Qual foi a minha ajuda? Material gráfico,
pacote de “santinho”, pacote de marcador, não pude fazer outra coisa. Eu demonstrei... pelo
menos papelzinho eu mandei, pelo menos boa vontade eu tive, eu não podia fazer mais.
Agora elegemos e temos vinte e poucos desses aí no Ceará. Também sofremos em 2004 um
666
Ibidem.
326
grande problema do gigantesco corte através [...] das emendas individuais. [Houve, também]
corte de vereadores. De 21, um município que tinha 21 [vereadores], caiu para nove. Agora,
isso quer dizer, nós temos uns 50 ou 60 primeiros suplentes. Também cortaram demais.
Cortaram 8.300, deveriam cortar 5 mil e poucos. [Foi o] Supremo Tribunal Eleitoral (sic).
Então, o nosso desempenho não foi melhor por causa disso. A nossa neoficidade, a nossa
falta de estrutura, historicamente não éramos [da política] e, porque também, o que era 21
caiu para nove. Outra coisa, afora disso, que é verdadeira e faz falta: com quatro ou cinco
mandatos, você tem outra estrutura. Vai crescendo.
667
Em Belém do Pará, onde o quadro de vereadores foi reduzido de três para um, na
mesma eleição de 2004, líderes do distrito eclesial de Icoaraci (na grande Belém)
ponderaram que o eleitor assembleiano está mais conscientizado: “[o eleitor] vê que no
bairro que ele mora tem alguém que faz alguma coisa e vota nessas pessoas que
trabalham”.
668
Entre esses líderes entrevistados, estavam dois que trabalharam para
candidato não-oficial, porque não concordaram com o processo de escolha restrito a um
colégio de pastores e dirigentes de congregação, excluindo, portanto, os membros da Igreja.
“Em Icoaraci, são mais de dez mil membros e nós não temos um candidato a vereador
nosso”. Além disto, os vereadores que buscavam reeleição não se destacaram na ação
social, reclamou um dos líderes:
É hora de uma estrutura melhor, uma organização melhor, e termos o nosso candidato, para
que a Assembléia aqui em Icoaraci venha a se destacar nos trabalhos sociais, não só na parte
cristã. “Ah, salvação, Jesus te cura, Jesus te abençoa!” Mas cadê o trabalho? Cadê a
qualificação profissional para os jovens? Aquelas oficinas? Nós não fazemos. É só: “Jesus te
ama, Jesus te dá uma bênção!” Mas cadê a nossa participação como cidadãos?
669
Os vereadores da Assembléia de Deus de Belém (PA) também perderam um forte
instrumento que sensibilizava o eleitor pentecostal a favor deles. Era costume os vereadores
conseguirem a cessão de ônibus para eventos da Igreja, através de tráfico de influência,
envolvendo Câmara, Prefeitura e empresas de transportes coletivos. Todavia, a própria
Câmara de Vereadores resolveu coibir essa prática e as empresas de ônibus decidiram que a
cessão de transporte passasse a ser assunto tratado exclusivamente pelo sindicato dos
667
Entrevista do deputado federal Pedro Ribeiro, em Brasília, 24/11/2005.
668
Entrevista interativa com um grupo de cinco líderes da Assembléia de Deus em Belém, distrito de Icoaraci, no salão social do
templo-sede do distrito, em janeiro de 2006.
669
Ibidem.
327
proprietários, o que reduziu drasticamente a margem de manobra clientelista dos vereadores
pentecostais.
4.3.8 Curral eleitoral
Pensar os evangélicos como um curral eleitoral é uma simplificação que está
distante da complexa realidade. Mesmo restringindo o universo de observação para os
pentecostais ou neopentecostais, não cabe essa visão reducionista deste subconjunto. Os
evangélicos brasileiros compõem um aglomerado de multiformes experiências religiosas e
variadas condutas políticas. Regina Novaes tem reconhecido essa variedade. Segundo ela:
Vinte anos depois do início da terceira onda pentecostal, o conjunto dos evangélicos se
apresenta hoje como um complexo mosaico. Há disputas entre as denominações. As
tentativas de articulá-las em organismos têm esbarrado em várias dificuldades. Além das
denominações grandes e conhecidas, há um imenso conjunto de microdenominações
independentes entre si que, em muitas situações, se resumem a um “ponto de culto”
localizado em casas ou salas de uma favela ou bairro periférico. É possível que estes fiéis
evangélicos busquem, por iniciativa própria e/ou do pastor, votar em candidatos
evangélicos. No entanto, nada garante que outros tipos de pertencimentos, lealdades e
adesões familiares e/ou locais não influenciem os votos dos membros da Igreja. Em resumo,
não há garantia de consensos entre denominações, nem de que evangélicos votem
necessariamente de acordo com a orientação do pastor, nem podemos dizer que evangélicos
votem sempre em evangélicos.
670
Como o foco desta pesquisa é o comportamento político da Assembléia de Deus e
da Igreja Universal, há possibilidade de aprofundar essa discussão se ambas se aproximam
ou não de “currais eleitorais”. Ou seja, se seus respectivos dirigentes conseguem fazer que
os votos dos membros e freqüentadores sejam votos cativos para os candidatos indicados
oficialmente pela igreja.
No caso da Assembléia de Deus, constatou-se que os esforços da corporação têm
recebido uma resposta bem aquém da desejada por seus líderes. Não há indicadores
precisos de geografia do voto, mas se tem indícios que permitem fazer esta afirmação. As
diversas vertentes do conjunto chamado Assembléia de Deus congregam mais do dobro de
670
NOVAES, 2002, p. 86.
328
adeptos da Igreja Universal, mas os assembleianos conseguiram manter uma bancada de, no
máximo, 24 representantes no Congresso, em Brasília, na 52ª legislatura (2003-2007),
enquanto a Universal chegou a dispor de até 18 parlamentares, em longo período da mesma
legislatura. Em termos proporcionais, portanto, a presença da Universal tem sido bem
maior do que a das Assembléia de Deus, no Poder Legislativo federal.
Um exercício com os números das eleições para deputado federal em 2002 foi feito
por Zequinha Marinho. Este parlamentar constatou que menos de metade dos eleitores da
Igreja, votaram em seus candidatos a deputado federal:
A nossa igreja tem mais de 700 mil membros no Pará. [...] Digamos que tenha 350 mil
eleitores. Pois, eu tive, vamos arredondar, 40 mil votos dentro da igreja, o Raimundo Santos
teve 66. [...] Então vamos somar 66, ele milita mais só dentro da igreja, 66 mil com mais 40
mil são 106 mil. Se nós temos um universo de 350 mil eleitores evangélicos e só
aproveitamos 106 mil votos, digamos assim, não dá para... Tem muita coisa para avançar,
para ser trabalhado, para ser conscientizado, para ser comandado. Nossa igreja, hoje, é uma
igreja completamente diferente, pela idade que tem. Pela forma como foi instituída, criada,
vivida. Se você chega na Igreja Universal, a liderança da igreja é muito forte. Eles falam
assim, “vamos eleger esse vereador, esse deputado”, e vão embora. Todo mundo vota e nem
sabem quem é o cara. O cara nunca foi lá, nunca deu um prego em uma barra de sabão,
nunca beneficiou em nada. Na nossa igreja não, ou tu vais lá, trabalha, se torna conhecido,
se enturma e tal, para você conquistar algum voto (sic).
671
A rejeição do rótulo de “curral eleitoral”, por parte de parlamentares de ambas as
igrejas, é compreensível, porque tem conotações pejorativas que menosprezam a
capacidade de discernimento dos eleitores. O deputado Marinho procurou provar com
números a impropriedade dessa classificação para a Assembléia de Deus no Pará. Já seu
companheiro de Pernambuco, pastor Francisco Olímpio, da mesma igreja, reagiu à
designação, mas defendeu com veemência o voto corporativo, porque, para ele, o crente
deve votar em alguém que se assemelhe a ele, que rejeita vícios e pecados, tais como
embriaguez, fumo e adultério. A argumentação desse deputado-pastor não escondeu que ele
defendia o voto do assembleiano em alguém da mesma igreja, mesmo que houvesse outros
671
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, 25/11/2005.
329
candidatos evangélicos no páreo. Em resposta à pergunta se a Assembléia de Deus era um
curral eleitoral, Francisco Olímpio fez a seguinte declaração:
Absolutamente. De maneira nenhuma. Agora, não é um curral eleitoral, porque a gente não
força, a gente não vive fazendo campanha direto, a gente apenas precisa conscientizar o
povo da necessidade de ter homens sérios aqui. Então, se o senhor é um homem evangélico,
o senhor não bebe, o senhor não joga, o senhor não fuma, o senhor não adultera, por que o
senhor não vai votar em um homem que não bebe, não fuma, não joga e não adultera? Por
que o senhor vai votar em um adúltero? [...] Por que o senhor vai votar em um parricida, um
matricida, aí? Um matador, um drogado? Porque, se em todos os segmentos, desculpe a
expressão, mas até os homossexuais querem se levantar para ter o seu segmento, como que
o senhor, crente evangélico, não pode ter o seu representante? Então, essa é a linha. Não é
um curral eleitoral. É uma conscientização política que deve haver, que eu devo eleger um
representante que eu confie nele. E a confiança do crente não é nem tanto na capacidade
técnica daquela pessoa. A capacidade técnica, a capacidade escolar, isso vale, não me resta
dúvida, mas o meu voto como crente é mais a credibilidade que eu tenho na pessoa como
crente, de ele se eleger e continuar lendo a Bíblia, orando. Não vai chegar aqui, vai-se
misturar e começar a tomar cerveja por aí. Aí se acabou a minha fé, a minha credibilidade.
Então, o crente evangélico da Assembléia de Deus, ele quer eleger alguém de acordo como
ele é. Correto?
672
A lógica defendida pelo deputado da Assembléia de Deus de Pernambuco é
compartilhada por milhares de eleitores que escolhem candidatos com os quais se
identificam religiosamente. Há, de fato, nestes casos, uma aliança entre religião e voto,
embora, como observou Novaes, essa relação não permita fazer previsões de
comportamento, principalmente se o universo de observação se amplia para o conjunto dos
evangélicos:
Enfim, no que diz respeito aos evangélicos, evidenciam-se ligações entre religião e votos.
Isto porque, via de regra, em suas igrejas aliam o sentimento de perseguição dos “escolhidos
por Deus” com a assiduidade, a freqüência ao templo, a ênfase na palavra (leitura,
comentário, testemunho), que aproximam a religião com o calendário da vida real. Contudo,
é preciso lembrar que não há um centro que responda por todos. Não há quem possa dizer
que controle a capilaridade das novas denominações autônomas e independentes entre si. Se
não é fácil entender este fenômeno que às vezes, parece ser único, orgânico e poderoso e,
672
Entrevista com o deputado Francisco Olímpío, em Brasília, novembro de 2005.
330
outras vezes, parece múltiplo, segmentado e frágil, mais difícil ainda é prever suas
conseqüências políticas eleitorais.
673
A Igreja Universal tem maior capacidade do que a Assembléia, para induzir seus
fiéis a votarem em candidatos da Igreja. Não se fez pesquisa direta para aferir esse
comportamento, mas as vitórias nas urnas têm provado que a IURD é mais eficaz na
condução dos seus quadros aos parlamentos brasileiros do que outras agremiações
pentecostais e neopentecostais. Votar em candidato da Igreja é algo assimilado
pacificamente pelos membros. Uma entrevistada revelou pouco interesse em política, mas
deixou patente sua confiança nas orientações da Igreja, em qualquer área da vida, inclusive
nesta da escolha de quem deve representá-la. O diálogo foi o seguinte:
Entrevistador Como a Universal orienta seus freqüentadores nas eleições?
Dona Laurita Eles dizem o seguinte. Que cada um vota em quem quer. Mas o que eles
dizem é o seguinte: em vez de votar em um homem aqui fora, [melhor] votar em um homem
de Deus. Mas eles dizem o seguinte: vocês votam em quem vocês quiserem. Não é
obrigado...
Entrevistador Eles dão um folheto com o nome do candidato?
D. Laurita Dá. Em todo canto dão isso. Eles só têm vereador e deputado. E agora senador,
que é o bispo Marcelo Crivella.
Entrevistador Política traz benefício para a Igreja?
D. Laurita Olha, isso aí, o negócio de política, eu nem entendo isso...
Entrevistador Mas a senhora votou nos candidatos da Universal?
D. Laurita Votei.
Entrevistador A senhora sabe o nome deles?
D. Laurita Eu até esqueço. Passa tanto pastor por aí... Já foi o Carlinhos de Jesus, que ele
não ganhou nessa eleição, tem o pastor Raul, também. Não sei se é ele que ficou com o
cargo. E tem o outro, que eu esqueci o nome dele, um que é bigodudo, esse eu não lembro o
nome dele. Agora tem o bispo. Como é o nome dele? Se for guardar o nome de todos esses
pastores... porque é cheio de pastor. Eu esqueci o nome do bispo que agora ganhou nessa
eleição.
674
Este diálogo é apenas um exemplo isolado de como se comporta uma eleitora da
Universal. Sua relação com a política, não obstante, se assemelha à de muitos brasileiros
673
NOVAES, 2002, p. 92-3.
674
Entrevista com a senhora L.A.L., 62 anos, que vive de lavar e passar roupas, em bairro da periferia de Belém do Pará, onde foi
realizada a entrevista, em janeiro do 2006. (Laurita é pseudônimo usado aqui para preservar a fonte). L.A.L. freqüenta,
diariamente, a Igreja Universal, há sete anos.
331
que logo se esquecem em quem votaram. O que merece destaque no exemplo de dona
Laurita é que ela acata as orientações da IURD, porque encontrou nesta igreja o que,
segundo ela, faltava em outras. Segundo suas próprias declarações:
Na Quadrangular eu servi 11 anos. Agora eu vou falar curto e certo. Na Universal a gente
não deve mentir. Diz que a gente tem que falar a verdade. Eu nunca escutei uma palavra nas
outras igrejas como as que eu escutei na Universal. Não sei se é porque ela é muito rigorosa.
Se ela tiver que dizer alguma coisa, o pastor diz. Diz sem medo. E eles ensinam a verdade.
Ele diz que o pastor está lá em cima para falar a verdade para os seus membros. [...] Prefiro
a Universal porque... justamente pelas palavras que eu não ouvi na outra igreja. Dizer que é
pecado isso, pecado aquilo... Que é errado isso, errado aquilo. Eu nunca escutei na outra
igreja.
675
As respostas dessa entrevistada em outras questões também enfatizaram a
autoridade e disciplina que ela encontrou somente na IURD. De igual modo, foram estas as
características realçadas pelos deputados e assessores que falaram da mesma denominação,
principalmente os integrantes dela. A Universal é uma organização com o poder
centralizado e bem definido. Ela escolhe e destitui candidatos como escala qualquer outro
empregado da corporação. A deputada Zelinda Novaes descreveu o processo:
Nós quando somos chamados, nós sabemos que é um período transitório. Você é deputado,
você pode depois não ser. Você tem consciência disso, porque você é avisado que você não
é detentor de um mandato vitalício. Você pode ser escolhido na próxima eleição, como pode
também não ser escolhido. Você tem um compromisso moral de também continuar no
mandato votando nos interesses da Igreja, atendendo as necessidades. Isso vai muito de uma
questão pessoal de foro íntimo, porque têm muitos que abandonam o barco. E, se você não é
candidato, e a Igreja achar que não é mais conveniente, achar que você já deve dar o lugar a
outra pessoa, eu acho que você tem o compromisso de participar das eleições, de ajudar os
outros candidatos, passando a experiência que a gente já tem. Alguns espaços que a gente
conquistou fora da instituição. Então, a estratégia é esta.
676
Um assessor de deputado e bispo da IURD foi mais além e comparou a Igreja com
uma corporação militar. Ele explicou que existe um conselho de 12 bispos comandados
pelo bispo Edir Macedo. Este conselho deliberou retirar os cargos eclesiásticos dos
675
Ibidem.
676
Entrevista da deputada federal Zelinda Novaes. Brasília, dia 30/11/2005.
332
parlamentares, logo depois do primeiro escândalo que atingiu o deputado bispo
Rodrigues
677
: “Os bispos, os pastores, todos eles perderam seus cargos na Igreja. Então
nenhum deles, hoje, é bispo ou pastor na Igreja. Nenhum deles recebe remuneração da
Igreja. Nenhum deles sobe no púlpito da Igreja. Nenhum dele prega no púlpito da
Igreja.”
678
A única exceção foi o senador Crivella, que permaneceu como bispo:
Foi o único. É sobrinho. Mas não é pelo fato de ser sobrinho, mas é porque não atingiu a
imagem dele. Foi feita uma avaliação e a imagem dele não foi atingida, então, ele se
preservou disso aí. Olha só. Aí você tira o cargo de todo mundo, cargo eclesiástico. E todo
mundo passa a ser o quê? Deputado Federal Fulano de tal. Só. E não com o título de bispo
ou pastor. ( - E nem de Jesus?) Não, isso também perdeu. E, então, o que a Igreja fez? É
como no quartel. E ai eu digo, é como no quartel mesmo. Porque errou, até que provem o
contrário, você está fora da função, não comanda mais a tropa, esse cidadão fica de lado.
Por exemplo, na Igreja Católica: Um padre, para assumir a batina ele leva, em média, 12
anos de estudo e aí, quando ele comete um erro, a Igreja tem a preocupação de mover um
processo administrativo de disciplina, que vai apurar isso e tem que apresentar provas e tal.
E nisso há uma demora, ele só perde a função de padre quando esse processo gastou mais de
dez anos, 12 anos. Aí vai até Roma, chegando lá ele ganha uma bula papal, destituindo ele
da função. Então é um processo demorado. Na Igreja Universal, como eles não fazem um
curso, não têm uma formação teológica, [o processo] é mínimo, alias é muito mínimo.
Então, se na hora você está em um cargo, é porque eu estou te colocando, é uma função de
confiança. No dia que você perdeu a confiança, você me traiu a confiança, você perdeu.
Tanto é que todo mundo que sai tenta entrar na justiça com uma ação e todos eles perdem,
porque na realidade é isso mesmo, é o processo. Então uma pessoa entra lá: primeiro ele
entra e é membro, ele senta; depois ele fica em pé, ele vai ser obreiro; depois ele caminha
677
Em fevereiro de 2004, o bispo Rodrigues perdeu o título de bispo e foi destituído do conselho de
bispos e da coordenação da bancada parlamentar da Igreja Universal, na Câmara Federal.
Oficialmente, o conselho de bispos da Igreja Universal do Reino de Deus informou que o
afastamento está sendo feito diante das notícias que vinculam o nome de bispo Rodrigues ao do
ex-assessor do Governo Waldomiro Diniz. (Jornal do Brasil, 20/2/2004). Diniz se tornara um dos
principais homens de confiança do ministro José Dirceu (Casa Civil) e havia acusação de que ele negociava
com bicheiros o favorecimento em concorrências, em troca de propinas e contribuições para campanhas
eleitorais. A indicação de Diniz para dirigir a Loteria do Estado do Rio de Janeiro fizera parte de um acordo
político com o bispo Rodrigues. O funcionamento ilegal de bingos no Rio de Janeiro contava com o
beneplácito do presidente da Loterj, que recebia propinas e as repartia com o bispo e pessoas que este
indicava. (Cf. http://www.senado.gov.br/agencia/print.aspx?codNoticia=50023, acessado em
27/12/2006)
678
Entrevista do assessor Oséias (nome fictício, para proteger a fonte), que trabalha em gabinete de deputado da IURD, gravada
em Brasília, junho de 2004.
333
para o púlpito, ele vai ser um pastor auxiliar; e depois que ele está lá no púlpito, ele sobe no
palanque e vai ser um pastor regional; e daí ele vai ganhando posto e daqui a pouco ele é
bispo. Para ele cair, só basta uma falha dele. Uma falha moral, qualquer tipo de falha o
destitui daquela função.
679
A Universal tem um comando firme e determinado. O mesmo estilo de comando era
praticado pelo deputado Carlos Rodrigues, quando coordenou a bancada da Igreja na
Câmara, em Brasília. O depoimento de uma assessora de outro deputado evangélico é bem
esclarecedor da forma como Rodrigues tratava seus pares. Era relação de chefe com seus
subordinados, ditada pela hierarquia interna da Igreja, que se sobrepunha à condição de
igualdade, conquistada mediante o sufrágio nas urnas. A rigor, havia lógica nessa relação,
pois o mandato político fora obtido por conta do carisma da instituição e não, propriamente,
das virtudes pessoais do parlamentar. O depoimento da assessora foi o seguinte:
Quando as Igrejas começaram a mandar parlamentares para cá, elas verificaram que os
parlamentares da Igreja Universal eram muito bem organizados. E aqui eu conto o
testemunho como eu vi, a forma como o bispo Rodrigues coordenava aquele grupo. Em
1999, nós tivemos um problema com missões indígenas no Brasil e nós precisávamos ter o
maior número de parlamentares possível apoiando as missões indígenas. E eu ia falar com
os deputados da Universal. Todos eles me diziam: Se o bispo concordar, a gente assina.
Então eu não podia nunca pedir apoio a um bispo, a um pastor da Universal, sem antes falar
com o bispo. Eles não assinavam uma única PEC, um único projeto de lei, um único
requerimento, se não tivesse passado pelo crivo do bispo Rodrigues. E aí a gente tem que
entender o seguinte. O bispo foi sim envolvido em alguns escândalos de corrupção, mas a
gente não pode tirar dele o mérito que ele era organizado, articulado e extremamente
inteligente, e sabia exercer autoridade sobre aquela bancada. Para ter uma idéia, eu já
cheguei a ver o bispo repreender deputado, na minha frente, porque chegou a uma reunião
três minutos depois da hora marcada. Eu vi o bispo repreender um parlamentar, na minha
frente, eu estava numa reunião com ele, quando o bispo perguntou: ‘você pensa que esta
fazendo aqui o quê? Que aqui é sua igreja?’ Então, era uma forma assim de trazer a bancada
ali. E eu acredito que alguns pastores da Universal se rebelaram contra esse poder e esse
domínio. Mas o que o bispo queria o tempo todo era deixar as coisas entre eles muito bem
esclarecidas e eles terem a mesma posição. Ninguém falava diferente do bispo. Quando um
falava, refletia toda a imagem da Universal.
680
679
Ibidem.
680
Depoimento da assessora Mônica, gravado em Brasília, setembro de 2006. (Mônica é nome fictício).
334
Os indícios apresentados sobre a forma como a Assembléia de Deus e a Igreja
Universal lidam com a política permitem perceber que há uma indução para que os fiéis das
duas igrejas votem nos candidatos da corporação. A organização centralizada, hierárquica,
e com comando único da Igreja Universal, alimenta uma cultura na qual os comandados
valorizam a disciplina e acatam as decisões sem levantarem questionamentos. Pelo menos,
não se verifica o extravasar de insatisfações para além dos muros da instituição. Na
Assembléia de Deus não existe esse centro forte de poder. Em contrapartida, as
coordenações políticas enfrentam dificuldades para atingirem os objetivos estabelecidos.
Em que pese tantos sinais de autoritarismo na cultura da Igreja Universal, R. Novaes
descobre certa contribuição pedagógica desta instituição em prol da formação da cidadania.
Para esta pesquisadora:
Os evangélicos pentecostais [...] estão sobretudo em segmentos da população brasileira em
que predominam o desemprego, a falta de escolaridade, a insegurança. Observação e
entrevistas revelam que, para muitos evangélicos, a participação na Igreja Universal do
Reino de Deus representa a primeira experiência de “conversar sobre política”, de valorizar
o voto como escolha baseada em programas e interesses. Para muitos, a Folha Universal,
distribuída gratuitamente, é o único jornal em que já leram sobre “política do país”. Assim
como é um veículo de constante “prestação de contas” dos eleitos aos seus eleitores.
681
Rotular de “voto de cabresto” o voto dos eleitores dessas igrejas e tratá-las como
“currais eleitorais” é empregar classificações simplistas, que não contribuem para
identificar os processos de participação política, incipientes e autoritários, mas que
acontecem nessas organizações, capazes de mobilizar milhões de pessoas, todas as
semanas, fato difícil de ser alcançado por outras instituições brasileiras. Ainda é Novaes
quem destaca esta característica das igrejas evangélicas:
As igrejas evangélicas têm alto índice de freqüência e são vistas como celeiros de eleitores
congregados. E, de fato, se olharmos em nossa volta, veremos que não há outra instituição
que reúna tantas vezes as mesmas pessoas durante a semana. Assim sendo, é preciso
reconhecer que os espaços de agregação de evangélicos fazem, hoje, diferença no jogo
eleitoral. Ainda que as possibilidades de sucesso de candidatos evangélicos dependam
também, como já foi dito, das experiências pessoais de outros vínculos políticos que cada
681
NOVAES, 2002, p.92.
335
fiel/eleitor possa ou não ter paralelamente, “ser evangélico tornou-se uma nova variável
neste jogo de relações entre campo político e campo religioso.
682
Há um reconhecimento de que a participação das igrejas na política tem contribuído
para elevar a qualidade do eleitorado que as freqüenta. Segundo a deputada Zelinda
Novaes, o político é muito cobrado pelos membros da igreja. No caso da IURD, o próprio
jornal Folha Universal tem contribuído para conscientizar os fiéis. Esta parlamentar
declarou o seguinte:
Hoje, dentro da própria igreja, já está muito dividido, o pessoal está politizado. Por
exemplo, nós temos dentro da Igreja um jornal, a Folha Universal, que divulga os projetos e
os trabalhos de cada um, os pronunciamentos, as posições em determinadas votações, e hoje
[já se ouve]: “Deputada, olha, infelizmente eu não vou mais votar na senhora, porque o seu
partido fez isso, aquilo, vocês votaram contra a Previdência e tal”. Então, você se lembra
que os evangélicos eram muito eu não diria bitolados mas limitados quanto a política? Então
se fechavam, nem procuravam saber. Mas hoje está todo mundo politizado, os pastores estão
se politizando, estão começando a ver a necessidade. Até porque, o ser humano é, queira ou
não, com um partido político ou não, ele é um ser político, [...] diariamente ele está
participando de política, ele participa da política da escola de seu filho, do seu condomínio,
do prédio onde ele mora, enfim, qualquer ação de um indivíduo hoje tem uma participação
política. E também quando a gente vai botar a necessidade de votar em um candidato da
Igreja, a gente não coloca essa necessidade só pedindo voto. Nós não vamos lá para dar
emprego, para isso, para aquilo. Então, ele tem então a condição de discernir, de fazer uma
avaliação, se ele vota ou não naquele projeto. Porque ele já conhece o projeto político do
deputado.
683
Entretanto, assim como as igrejas pentecostais podem estar contribuindo para
fortalecer a cidadania, elas podem também enfraquecer movimentos reivindicatórios. Em
junho de 2004, o deputado Isaías Silvestre (AD-MG) fez um relato, em reunião da Frente
Parlamentar Evangélica, sobre o modo como mobilizou lideranças das igrejas evangélicas
de Minas Gerais, a fim de ajudarem o governador Aécio Neves a debelar uma greve de
funcionários públicos e efetivos das polícias militar e civil. Segundo o deputado Silvestre,
que é filho do presidente da Assembléia de Deus mineira:
682
NOVAES, 2002, p. 91.
683
Entrevista da deputada Zelinda Novaes. Brasília, 30/11/2005.
336
O governador de Minas Gerais me chamou, há uns 15 dias atrás, e mostrou a dificuldade de
enfrentar e lidar com as greves dos funcionários públicos, da polícia militar e da polícia
civil, e pediu ajuda das igrejas evangélicas. E eu levei ao palácio todos os líderes de igrejas
evangélicas de Minas Gerais para o governador dar um relatório, agradecer a eles pela
eleição e (eu não fiquei na reunião) apresentei a eles e saí logo. Mas, depois o governador
me chamou, agradecendo, porque ele não sabia que a igreja tem uma união dessa natureza e
se reporta com tanta facilidade ao público e ao povo de Minas Gerais. Então, a gente vê
[que] a responsabilidade que nós temos aqui é muito grande. Porque ela começa a surtir
resultado maior que o esperado. A greve dos policiais de Minas Gerais foi de sexta a terça-
feira, e não teve impacto. Porque aquela [iniciativa] que o governador fez, de antecipar o
pedido das Forças Armadas foi [idéia] dos evangélicos, mostrando a ele que, se ele quisesse,
um [apoio] para abafar a greve, de forma ordeira, de nós conversarmos com as famílias,
[era] mostrar quanto um policial ganha, porque um policial soldado ganha 900 e poucos
reais. E soltaram para as famílias que eles ganhavam 300. Então mostrou às igrejas que os
policiais ganhavam 900 reais. E que eles estavam tratando a coisa com bastante [exagero].
Exatamente, então por isso mesmo nós evangélicos estamos com uma situação muito boa
em Minas Gerais. Então é um relatório que é fruto colhido pela rede parlamentar evangélica.
Porque o governador viu que os evangélicos agiriam pacíficos, sem barulho, que surte efeito
na prática. Nós temos o nosso povo reunido toda semana, no mesmo lugar, bonitinho,
cheirosinho, sem bagunça, ouvindo e repassando, sendo formadores de opinião, e o
governador vê isso. E ele foi bem sucedido nas greves e agradeceu indiretamente à Frente
Parlamentar Evangélica, embora, que os outros deputados não participaram diretamente,
mas nos bastidores ouviram e participaram.
684
O entusiasmo do deputado Silvestre com essa reunião, realizada à noite para que
não houvesse cobertura da imprensa, levou-o a comparar a ida dos pastores ao palácio do
governador ao encontro de Nicodemos com Jesus:
[O governador] marcou a reunião no palácio. Só foram os evangélicos e nem a segurança
sabia que estavam reunidos ali os líderes evangélicos. [...] Foi só o governador e o secretário
nessa reunião. Não levou mais ninguém, para não sair na imprensa que ele estava pedindo
socorro às igrejas evangélicas.
685
684
Depoimento do deputado federal Isaías Silvestre, em reunião da Frente Parlamentar Evangélica. Brasília, junho 2004.
685
Ibidem.
337
4.4 A atuação do político pentecostal.
A atuação de um grupo de parlamentares específico depende de vários fatores:
condição de classe social dos membros, forças políticas que apoiaram a eleição e que
prestigiam seus mandatos, inclusive alimentando perspectiva de reeleição, pressões
institucionais, compromissos partidários, relações corporativas, relacionamentos com
bancadas informais do parlamento, ligações com governo ou oposição, interesses privados
dos parlamentares. A lista certamente não se exaure, mas no caso do segmento pentecostal,
há fatores que influenciam de forma mais intensa. Neste caso, se destacam as igrejas que os
elegeram e as relações que os parlamentares estabeleceram com o Legislativo e o
Executivo.
Os políticos pentecostais vieram, em sua maioria, de camadas populares. Como este
termo é impreciso, ajuda dizer que eles não nasceram de famílias ricas, oligarquias
tradicionais da política, elites da intelectualidade, artistas ou profissionais liberais. Pesquisa
coordenada por Leôncio Martins Rodrigues, comparando a 51ª legislatura (1999-2003) com
a 52ª (2003-2007), constatou que “entre uma legislatura e outra, a composição social da
Câmara dos Deputados se tornou significativamente mais popular e menos elitista no curto
período de quatro anos.”
686
O ingresso de políticos pentecostais contribuiu para essa
mudança. “As organizações sindicais e profissionais e as denominações pentecostais foram
apontadas como as principais ou mais visíveis portas de entrada na política das classes
populares.”
687
De fato, uma análise da bancada evangélica ajudou a revelar a contribuição
deste segmento social, com suas distinções internas, para a popularização da Câmara, pois:
mostrou as diferenças nas fontes sociais de recrutamento entre, por um lado, os deputados
que exercem a profissão de pastor, ministro ou bispo de alguma igreja evangélica
(basicamente Assembléia de Deus e Igreja Universal do Reino de Deus) e, por outro, os que
são apenas fiéis das igrejas evangélicas. Desse modo, a popularização da composição da
Câmara dos Deputados deve-se aos deputados vindos das igrejas pentecostais.
688
686
RODRIGUES, Leôncio Martins. Mudanças na classe política brasileira. São Paulo: Publifolha, 2006, p. 165.
687
Idem, p. 167.
688
Idem, p. 91.
338
Dentro da Câmara, os agentes políticos da Assembléia de Deus e Universal do
Reino de Deus ajudam a compor esta parte nova de representantes da sociedade, que antes
não tinha espaço na composição do legislativo. Cabe examinar se a atuação deles contribui
com propostas inovadoras, moderadas ou conservadoras. Sabe-se que as igrejas desses
deputados são contra movimentos radicais. Martins Rodrigues comenta que em outros
países onde houve “ascensão parlamentar de políticos originários do sindicalismo, de
grupos étnicos ou religiosos e de outros setores relativamente marginais, [...] os recém-
chegados quase sempre acabaram por desempenhar um papel de moderação ante as
pressões de movimentos radicais que vêm de fora do sistema político institucional.”
689
E
explica que, “em larga medida, esse ‘efeito moderador’ deriva do fato de os recém-
chegados terem passado a fazer parte do sistema de poder, responsáveis em maior ou menor
medida pela conservação das instituições nas quais eles tanto se esforçaram para entrar e
agora precisam defender.”
690
À luz destas considerações, pode-se começar a análise pelo caso da atuação da
Igreja Universal. Quando esta igreja teve problemas com a Receita Federal, em 1995, ela
resolveu ampliar sua representação no Congresso. Durante o primeiro mandato do
presidente Fernando Henrique Cardoso, seus parlamentares tentaram colaborar com o
Governo, mas não sentiram que tenha havido retribuição equivalente ao apoio que
ofereceram. Segue o depoimento de um assessor de importante bispo-deputado:
Quando chegou no segundo mandato, a Igreja também mandou muitos deputados para cá,
então esses deputados começaram a verificar como é essa questão de poder. Primeiro, não é
uma coisa fácil. Segundo, os isola do povo. Então, ainda está sendo um exercício de
aprendizado muito duro, porque você tem que caminhar e caminhar no meio de cobras. Tem
pessoas que estão há sete, dez mandatos, e não caem. E aí é uma coisa complicada. [...] Mas
a gente tem que aprender a andar nisso aí. As vezes ‘ah, eu sou a favor’, ‘eu sou contra o
salário-mínimo’, mas o deputado precisa é que as verbas dele tenham aprovação, para ele
poder atender o necessitado lá no interior. Então essa verba só vai sair na medida em que eu
voto favorável com o governo. ‘Se eu não votar, eu não tenho a verba. Então, o que é que eu
vou fazer? Eu vou ter que votar com o governo. Porque, se não, a minha verba não sai e o
prefeito precisa. E tem gente que pode morrer lá na ponta. Porque o governo não vai botar o
689
Idem, p. 172.
690
Ibidem.
339
dinheiro lá. E se colocar, vai comprar meia dúzia de remédios. Não é isso que se precisa.
Você precisa montar um posto de saúde com ambulância, aparelhar esse posto de saúde e
colocar medicamentos. Então você precisa de muito mais coisas do que simples mente
colocar esses medicamentos.’ E aí, o governo tem um programa que vai colocar somente os
remédios em um posto de saúde que esta caindo, esse posto de saúde que não tem
equipamento, um posto de saúde que não tem uma ambulância. Então eles têm que tomar
esse tipo de decisão, e são coisas que precisam de decisão rápida; é decidido lá no plenário,
enquanto estão tomando um cafezinho. ‘Como é que nós fazemos, e tal e tal, não sei o que?’
E é assim que vai. Por isso que um vota contra, o outro vota a favor, outro segue uma
orientação partidária, mas existem também essas questões muito particulares.
691
O depoimento é sinuoso, mas deixa claro que os deputados da Universal tiveram
que aprender a lidar com os detentores do poder no Governo Federal e no Legislativo. Na
Câmara, tiveram que se acomodar entre os figurantes do chamado “baixo clero”. Para
conseguir liberação de verbas das emendas individuais ao orçamento da União, aprenderam
a freqüentar ministérios e assumir uma postura de subserviência ao Governo.
Esse mesmo assessor recuou seu relato ao tempo do Congresso Constituinte, a fim
de situar os políticos do “baixo clero” desde sua origem, no novo quadro de normalização
institucional do País. Quando foi formado o grupo de parlamentares mais conservadores do
parlamento constituinte, que eram contra reformas sociais, chamado “Centrão”, a maioria
dos evangélicos passou a negociar com este grupo.
692
Nas palavras do assessor Oséias:
E aqui se criou aquela questão do Centrão, e aí se envolveram os evangélicos. O Centrão na
realidade vendeu bancadas. Vender bancada é do tipo: “Você deixa comigo que eu consigo
os votos”. “Mas qual é a minha paga?” “A sua paga vai ser uma diretoria em tal lugar, uma
estação de rádio.” Naquela época tinha muito isso. “Então você vai ganhar uma estação de
rádio, vai ganhar uma diretoria de uma Petrobrás, de uma Eletrobrás.” Então você fazia sua
indicação, para onde você quisesse. [...] Vendeu bancadas aqui dentro. Os deputados
evangélicos, que pegavam os novos, porque não tinham conhecimento da coisa. Daí, o outro
que estava há mais tempo, pegava e arregimentava: “Eu quero que vote nesse aqui, porque
esse projeto é bom para a gente”. “E o que eu ganho?” “Ah, eu vou te dar um negócio. O
que você quer?” “A diretoria da Sunab”. Mas o grande mesmo era aqui em Brasília: os caras
691
Entrevista do assessor Oséias, que trabalha em gabinete de deputado federal da IURD, gravada em Brasília, junho de 2004.
(Oséias é nome fictício, para proteger o informante).
692
Cf. FRESTON, 1994.
340
ganharam funções em ministério, funções em empresas estatais, coisas grandes; quem tinha
esse poder de articulação na época. Com o passar do tempo, os outros que eram comprados
começaram a pensar: “Espera aí, eu também posso participar”. Então, cada igreja começou a
correr atrás do seu rebanho, para poder trazer mais gente, fazer mais grupos aqui dentro.
Então foi feito isso. Você tem a bancada da Universal, a bancada da Assembléia de Deus,
que são as duas maiores aqui. A maior é a da Assembléia, mas você tem umas
particularidades que são bem distintas. Por exemplo, o pensamento da Universal é um só, só
um manda, determina e acabou. Na Assembléia de Deus já é diferente. Você tem uma
particularidade no Nordeste, que é diferente de São Paulo, que é diferente do Rio de Janeiro,
que é diferente do Centro-Oeste. Então, cada um puxa para seu lado, cada um tem uma idéia
diferente, cada um tem seu problema particular e tem que resolver seu problema lá. Então,
eles mesmos têm dificuldade no entrosamento das propostas aqui dentro. É quando o
governo ganha ou perde. Porque o cara fala assim: “Olha, eu estou em nome da igreja”. O
outro fala assim: “Eu estou em nome do partido”. E o outro fala assim: “Eu estou em nome
do meu município”. O outro fala assim: “Eu estou em meu nome mesmo”. E quando um
deputado tem o entendimento que está em nome dele mesmo, esse é o mais perigoso, porque
qualquer vento leva ele, ninguém sabe aonde ele vai.
693
O parlamento é um espaço de relações onde os grupos mais organizados e
poderosos da sociedade travam uma luta permanente, para manterem, suprimirem ou
criarem legislação que favoreça seus interesses. Os menos organizados são sub-
representados ou não conseguem nenhum tipo de interlocução no Congresso. Grupos em
ascensão, como os pentecostais, tendem a serem domesticados nessas “casas do povo”.
Martins Rodrigues explica o porquê dessa domesticação:
Ocorre que todos que chegam à vida parlamentar encontram uma instituição em
funcionamento, com regras formais e informais estabelecidas há muito tempo que não são
fáceis de alterar por meios democráticos, quer dizer, sem o apoio de “movimentos de
massas” externos aos órgãos representativos. Por isso, a tendência que depois de certo
tempo se impõe aos novatos é de assimilação de reprodução dos costumes e valores “da
casa”. As características das velhas elites tendem a modelar as novas, o que dificulta
mudanças radicais.
694
693
Entrevista de Oséias, assessor de deputado federal da IURD, gravada em Brasília, junho de 2004.
694
RODRIGUES, 2006, p. 173.
341
O assessor Oséias explica como o governo faz o monitoramento dos parlamentares e
como estes, por sua vez, também fazem manobras para conseguirem recursos do governo:
Até uma abstenção, até o fato de [um político] falar que está no ministério para uma
audiência, isso atrapalha uma votação aqui dentro, isso dá um prejuízo imenso para nós.
Mas o cara pega e fala assim: “Eu vou me ausentar só para fazer uma pressão no governo”.
Todos eles, os 54 [deputados da Frente Parlamentar Evangélica] são monitorados todo dia
na tela do computador. O cara sabe onde o cara está, se o cara foi receber no ministério ou
não, qual é a indicação que ele pediu, se será atendido, qual a verba dele. (Mas quem que
controla?) A Casa Civil, a Casa Civil tem [controle] de todos eles, de todo mundo. Por
exemplo, antigamente quem tinha isso era o Executivo. A gente achava que com um
democrata, alguém do PT, alguém de esquerda, isso não aconteceria. Mas é onde mais
acontece, porque, na realidade, a oposição cresceu aqui e ficou robusta.
695
Neste contexto do “caminhar no meio de cobras”, metáfora que o assessor
parlamentar da IURD usou para a atuação no Congresso, procurou-se saber como os
deputados pentecostais negociavam seus votos, face, principalmente, questões que
interessavam ao Governo. A palavra “negociar” foi tomada como ofensa, por vários deles.
Mas, mesmo assim, responderam, invocando princípios bíblicos e ditames da própria
consciência, enquanto houve, também, parlamentares que explicaram como negociavam e
faziam acordos para obterem o que pretendiam. Seguem alguns exemplos. No caso do
pastor Francisco Olímpio, a decisão do voto é
de acordo com a minha consciência e o meu partido. Aliás, os partidos, ao nos acolherem,
eles já sabem o nosso posicionamento. Se é alguma coisa que vem conflitar com a nossa
Bíblia, com a nossa igreja, com a nossa fé, eles me respeitam. Agora, se não tem nada a ver
com Bíblia, é questão do Executivo, é questão do Governo, quem é da base do Governo, vai
com o Governo.
696
Para o mesmo Olímpio, é difícil servir dentro do parlamento na condição de
evangélico, porque nem sempre o deputado pode acompanhar o seu partido: “Tem que ficar
com a Bíblia, está entendendo? É o seu posicionamento como crente.”
697
O deputado
Marcos Abramo repeliu a palavra “negociar”: “Seria até uma ofensa falar isso”. Mas
695
Entrevista do assessor Oséias, Brasília, junho de 2004.
696
Entrevista do deputado federal Francisco Olímpio, em Brasília, novembro de 2005.
697
Ibidem.
342
explicou seu modo de votar: “[decido] pela minha consciência [...] Eu não tenho negociata
aqui, eu tenho meus princípios”.
698
Em seguida explicou como lida com a questão da
disciplina partidária:
Nós temos a seguinte diretriz: a gente vota com o partido. Nós temos a nossa agremiação,
nós temos o partido que está nos dando apoio. Nós temos uma afinidade. Eu, quando estava
no PFL, eu votei junto com o partido, mas existiam projetos que eram para beneficiar a
população e que o PFL era contra, mas eu fui a favor, porque eu tenho isso, eu tenho esse
princípio. Agora eu estou no PP. No PP eu vou estar votando junto com o PP, tanto que se
existir projetos que não beneficiam a população, eu vou continuar sendo contra e o próprio
PP tem ciência disso.
699
Já o deputado Gilberto Nascimento lembrou o exemplo da votação de emenda que
alterou o Código Civil, para indicar como os evangélicos compuseram seus interesses com
os interesses dos partidos:
Hoje, nós somos 59 deputados evangélicos. O que a gente tem observado: em momento
nenhum você viu qualquer notícia de negociação de voto por interesse pessoal ou por
interesse de seu segmento. O que você faz é uma composição para mudar posições. Para
você ter um exemplo, quando nós estávamos votando a alteração do Código Civil, quando
queriam tornar as igrejas como associações, para nós termos também o voto dos outros
deputados, nós trouxemos os partidos políticos para que também ganhassem essa imunidade
e, conseqüentemente, nós somamos com os outros. Mas foi uma coisa muito clara e nós
fizemos isso, logicamente, para preservar as nossas igrejas a que pudessem seguir as suas
idéias de fé, que é a Bíblia Sagrada.
700
Os deputados pentecostais firmam posição, geralmente, em questões de costumes.
Nesta área, os partidos de centro-direita, em que eles estão filiados, liberam as votações. A
deputada Zelinda Novaes, da Universal e ligada ao grupo carlista do PFL baiano,
esclareceu:
Nós sabemos que cada parlamentar ele deve seguir a orientação do seu partido, porque
nenhuma liderança partidária vai aturar você votando contra as orientações do partido. Mas
existe uma fle xibilidade de todos os parlamentares de sentarem com o seu líder e dizer
assim: “Essa matéria eu não posso votar, porque viola meus princípios morais, éticos, ou vai
prejudicar meu segmento”. Como aquele caso do Código Civil que eu te falei. Aquilo ia
698
Entrevista do deputado federal Marcos Abramo. Brasília, 1º/12/2005.
699
Ibidem.
700
Entrevista do deputado federal Gilberto Nascimento, Brasília, novembro de 2005.
343
prejudicar as igrejas, tanto católica como evangélica de um modo geral. Agora, se você ficar
o tempo todo só votando contra o partido, vai chegar uma hora que o partido vai te excluir.
Porque não é interessante ele ter um integrante e ele não votar na hora da votação. Mas isso
tem que ser conciliado. Por exemplo: aborto, felizmente o meu partido também vai votar
contra, o Rodrigo Maia me ligou hoje, enquanto eu estava na comissão. Mas, se meu partido
fosse votar a favor do aborto, eu teria que dizer para ele: “Olha, eu não vou votar porque
fere os meus princípios”. Agora cabe a ele saber se pune ou se não pune. Casamentos de
homossexuais e umas outras matérias que já passaram por aqui. (A biossegurança?).
Coincidiu que bem nesse dia eu não estava aqui, mas não houve consenso dentro do grupo
evangélico. Alguns votaram a favor, mas muitos votaram contra. Então, veja bem, a gente
parlamentar sempre [se] encontra para aprofundar esses debates, essas discussões, para ver
se consegue melhorar esse projeto, mas essa questão partidária... O problema de bingos,
problemas de drogas, isso aí há sempre um consenso, os casamentos entre homossexuais...
A gente ouve que nesses pontos não tem divergência de maneira nenhuma. Até porque não
tinha como, porque nós fomos aqui, o nosso pessoal nos acompanha, não tinha porque você
defender, ser contra uma bandeira dessas, aliás, ser a favor de uma bandeira dessa que não
tem nada a ver com a gente.
701
Com a mesma lógica de raciocínio se manifestou o deputado pastor Pedro Ribeiro,
coordenador da bancada da Assembléia de Deus. Segundo ele, o parlamentar tem que se
manter alinhado com o partido, mas compor com outros segmentos, sempre que for
possível, para obter apoios, também, quando necessitar. A liberação de recursos de
emendas individuais pode condicionar a votação do deputado pentecostal, conforme expôs
o representante da Assembléia de Deus do Ceará:
Eu acho que a linguagem negociar não pode existir. O parlamentar, pelo menos o
evangélico, precisa fazer tudo para, se a matéria for de forma genérica, geral, votar sempre
com o seu líder, com o partido, mas as lideranças nunca jogam com uma matéria sem
discutir, e bastante. E mesmo concordando, plenamente ou não, mas se o líder do partido
concordar em votar não, eu acho que se ele não domina a matéria e não tem nada contra sua
ética moral ou o bem estar da família, ele tem que votar com o seu partido. Se, por exemplo,
ele é instado a ser cooptado para votar de uma forma diferente por um interesse e tal, eu
acho que, se é por amizade, para angariar prestígio, e se aquilo não vai prejudicar ninguém,
eu acho que seria por aí. Agora eu acho que negociar por dinheiro, negociar por liberação de
emenda, eu inclusive sou a favor de que não devia ter emenda. Ou se essas emendas
existissem fossem obrigatórias para o governo liberar. Esses tantos milhões destinam-se a
701
Entrevista da deputada federal Zelinda Novaes. Brasília, dia 30/11/2005.
344
não sei quantas emendas de deputados. Como agora nós temos cinco milhões em emendas
individuais. Então, o pastor Pedro Ribeiro tem cinco milhões para botar onde quiser e
acabou. Não precisasse para sair, de votar contra ou a favor do Governo. Eu, pelo menos, fui
altamente sacrificado, porque eu não votei. Eu sou do partido aliado. O Governo queria que
fosse um [salário-]mínimo de 260 e eu não votei. Então eles cortaram minhas emendas em
uma série de coisas. Então isso fica ruim porque prejudica o cidadão, Mas negociar, a gente
aliviando o termo, fazer um entendimento de como votará, a gente tem que sempre fazer
tudo de acordo com a liderança do partido. Se possível o deputado deve fazer tudo para
saber do que está votando, para não votar à toa. “Ah, você votou em que?”, “Ah, não sei,
votei aí com o líder. Digamos, se realmente não prejudica, digamos, chega a classe dos
Fiscais da Fazenda com esse negócio do receitão. Vou votar sim, olha, não fede nem
cheira para nós, nem prejudica a Nação, e vou ajudar uma classe importante, então, vou
votar com vocês. Eu acho que deve ser assim, com a consciência. Eu acho que é por aí.
Negociar com interesse escuso não pode nunca, porque não deve ser assim.
702
As relações de interesse entre sociedade, Estado e Governo, precisam ser bem
discernidas e foram articuladas na resposta do deputado Zequinha Marinho. Ele não fez
restrições ao termo “negociar”. Como dirigente do PSC e integrante da estratégia da
Assembléia de Deus na ocupação deste partido, Marinho explicou os fatores que leva em
consideração para decidir seu voto:
Aqui na casa a gente negocia normalmente. Nós votamos com aquilo que não prejudica a
sociedade. Apoiamos o Governo, mas na hora que a gente vê que a coisa pega, que a
medida, mesmo que necessária ao Estado brasileiro, ao Governo... Porque tem coisa que
favorece o Governo, tem coisa que favorece o Estado e tem coisa que favorece a sociedade.
Você tem que ter muita clareza e é por isso que a pessoa que vem para cá não pode ser
qualquer pessoa. Não pode ser a Maria que vai com as outras . Tem que ter muita
consciência da conseqüência daquilo que ele vota, para o povo. Quem é que está ganhando
com isso? Quem é que vai ganhar com isso? Na medida que agrada só o Governo, porque o
Governo tem o seu interesse político, o Estado tem o seu interesse, como empresa pública,
instituição pública, e a sociedade tem o seu interesse. Nem tudo que é bom para o Estado,
nem tudo que é bom para a empresa pública, é bom para a sociedade. Então, a gente tem
independência na hora de votar. Eu voto de acordo com aquilo. Nos direcionamos o PSC:
assim, é pequenininho, então a gente vota com o Governo. Quando a gente vota com o
Governo a gente tem a consciência que aquilo é interessante por isso, isso e isso. Os pontos
positivos são maiores e mais importantes que os pontos negativos, porque não tem jeito de
702
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, em Brasília, 24/11/2005.
345
ser 100% só uma coisa. Tem sempre uns itens que são bons, outros que são amargos,
outros... Mas quando a maioria dos pontos é interessante, estamos com o Governo. Agora
quando o negócio pega, se aquilo arrebenta com o povo que está lá na ponta, que vive já
pela misericórdia de Deus, não contem conosco de jeito nenhum. E o outro lado, é aquela
questão do ponto de vista cristão. Aí não tem Governo, não tem ninguém que nos abra. Nós
temos compromisso com Deus e com a Bíblia. Com os nossos princípios. Isso aí não se
negocia. Esse é um ponto inegociável, porque tem que ser reto.
703
Essa votação do salário-mínimo de 2004, mencionada pelo deputado cearense
dividiu a base de apoio do Governo Lula. Foi submetida ao plenário uma emenda da
oposição para ajustar o salário em 275 reais. O Governo insistiu em fixar o ajuste nos 260
reais, recomendados pelas autoridades da área econômica, com argumentos de que este era
o limite possível. Votar contra o Governo neste caso era fazer o que desejavam os eleitores
de baixa renda e outros setores da sociedade. Entretanto, a pressão do Executivo sobre sua
base parlamentar era muito forte, com conseqüências previsíveis, como não atendimento
dos pleitos dos deputados junto aos ministérios e bloqueio na liberação das emendas
individuais. Os 57 deputados que compunham a Frente Parlamentar Evangélica na ocasião
votaram da seguinte maneira: 20 foram a favor do aumento do salário-mínimo, ou seja,
votaram contra o Governo; 26 apoiaram o Governo e 11 não compareceram. Não houve
registro de abstenção. Em entrevista, Raimundo Santos explicou seu voto:
Olha, o meu partido, que apóia o Governo, e eu tenho apoiado também o Governo, ele
apoiou os 260. Mas, eu, depois de estudar, não ficou provado, não ficou provado, aqueles
que tentaram me explicar que o Governo não tinha condições de permitir um reajuste um
pouco maior, então não me convenceram, eu entendi e entendo que com alguns outros cortes
em outros setores, seria possível, se reajustar mais 15 reais e que aquilo que se argumenta
que iam explodir as contas públicas, iam explodir a Previdência, eu acho que não é por aí,
poderia sim explodir, se não tivesse um trabalho em outros setores. E dessa maneira, como o
desemprego está grande, mas a gente sabe que o salário-mínimo hoje, ele não é nem
mínimo. Não dá para praticamente nada. Então eu acho que eu, depois de estudar, não me
senti à vontade com a minha consciência para votar os 260 e por isso que eu votei pelos
275.
704
A Igreja Universal tem uma história política marcada por uma mudança radical: de
opositora ferrenha a Lula e seu partido para aliada estratégica do PT, na aliança que este fez
703
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, dia 25/11/2005.
704
Entrevista do deputado Raimundo Santos, em Brasília, junho de 2004.
346
com o PL, a fim de viabilizar a conquista da presidência da República em 2002. Esta nova
postura credenciou a bancada da Universal como aliada do Governo, em que pese alguns
deputados da Igreja terem permanecido no PFL, partido que se manteve na oposição. Uma
igreja que define claramente seus inimigos, a IURD trouxe para o Congresso esta marca. O
coordenador de sua bancada, até início de 2004, deputado Carlos Rodrigues, sempre
manifestou sua insatisfação aos líderes do PT pelo espaço que a Igreja Católica estava
tendo no Governo e que era negado aos evangélicos. Em junho de 2004, ele fez o seguinte
relato:
Bom, eu vim para cá, me aproximei do PT, me aproximei do Genoíno, do Zé Dirceu, de
todos os líderes do PT e... houve uma distensão, não é? Eles desconfiavam da gente, tinham
ódio da gente, a gente desconfiava e tinha ódio deles. Esse ódio acabou e começou a haver
uma aproximação. Também eu comecei a dizer a eles que muito do que havia é porque a
Igreja Católica ela domina uma parte do PT e ela influencia, ela insuflava essa briga da
Igreja, do PT, via partido, porque ela sabia que um dia o PT seria poder, e perseguia a gente.
Eu acredito que eu consegui, é, sepultar aquele passado dentro da Igreja Universal e dentro
do PT também. O PT e o Lula foram na minha casa, o Zé Dirceu... várias vezes, vários
expoentes do PT, aqui em Brasília, e a gente fez aliança em vários lugares, e o [PT] ganhou
o poder e, pelo contrário, sempre honrou a gente. Até hoje nós somos muito honrados, o PT
trata os evangélicos de um modo honrado. É lógico que, é, à Benedita, a nossa governadora
evangélica, foi dada a Ação Social justamente, também, por esse motivo,... Ela não soube
aproximar os parlamentares evangélicos do ministério dela, até para a gente proteger ela do
que fizeram, porque lincharam ela, acabaram com a liderança dela em Brasília... E
colocaram lá um cidadão que é um homem honesto, direito, mas é um homem totalmente
ligado à cúpula romana. E eu tenho certeza que foram... foi a Igreja Católica que derrubou a
Benedita, para tirar um evangélico e botar um padre, porque o Patrus é um padre, é um
homem... agora é um homem decente, um homem correto, um homem... Mas hoje os
evangélicos como grupo, como segmento, não tem nenhuma representação no Governo
Lula. Isso não tem, não é?
705
Esse mal-estar que o deputado Rodrigues manifestou, sobre tratamento desigual que
os pentecostais recebem na política, também foi expresso pela deputada Zelinda Novaes. O
exemplo que ela deu ocorre na sociedade. De certa forma, o que se passa na política é
reflexo de comportamento social. O tratamento privilegiado não é concedido somente à
705
Entrevista do deputado Carlos Rodrigues, em seu gabinete da Câmara, em Brasília, no dia 17 de junho de 2004. Naquela
ocasião, esse deputado já estava destituído das funções de bispo e coordenador da bancada da IURD, mas ainda não havia
renunciado ao mandato parlamentar.
347
Igreja Católica. No caso da legislação ambiental, a deputada comparou a diferença de
tratamento dada às festas carnavalescas e aos cultos pentecostais:
Você vê que eu, por exemplo, moro na Pituba [bairro de Salvador BA]. Agora que já
começam os ensaios dos blocos de carnaval, você não dorme no final de semana,
principalmente, com trio elétrico e pornografia e gente falando. Mas uma igreja ela pode
estar ali distante que o pessoal implica, é uma coisa que todo mundo implica com uma
igreja, e a gente tem cobrado esse tipo de isonomia de tratamento, porque é impossível que
um candomblé, que um bloco de carnaval pode passar a noite inteira incomodando o
silêncio e uma igreja não pode. E ela tem influenciado aqui em diversos projetos, nós já
conseguimos algumas conquistas. Claro que são pequenas. Nós já passamos tanto tempo
excluídos da política e o pessoal ainda não aceita a gente como esse tipo... Eles acham que é
mais uma intromissão, que o lugar de pastor, de evangélico é na igreja e não aqui, porque
durante muito tempo o voto do evangélico foi usado, porque o pessoal chegava lá e
levantava as mãos que aceitava Jesus e sumia e nunca mais aparecia. Então, não tinha
nenhum compromisso com a causa.
706
4.4.1 Propostas para a sociedade
A participação das igrejas pentecostais e neopentecostais na política, como tem sido
discutida nesta tese, está longe de se apresentar como execução de um projeto dos
evangélicos para a sociedade brasileira. Estes grupos não têm um projeto para o Brasil.
Aliás, nem se deveria esperar algo tão ousado desses segmentos religiosos, se o próprio
protestantismo que há mais tempo aqui se instalou, com profissionais mais preparados, no
sentido da formação teórica, jamais teve essa pretensão. A rigor, quem conhece o mundo
evangélico sabe que ainda persiste a lógica simplista de que é possível transformar a
sociedade a partir do indivíduo. Prevalece a idéia de que bastaria converter todas as
pessoas, ao evangelho de Jesus Cristo, de acordo com as concepções doutrinárias que eles
defendem, para que a sociedade no todo fosse automaticamente reformada. Com base neste
paradigma, são ignoradas, na conformação da realidade: a força das instituições, a
influência estruturante das relações sociais, o peso das tradições e a importância da
construção histórica. Dentro de tal visão, não há lugar para qualquer projeto de sociedade,
evidentemente.
706
Entrevista da deputada Zelinda Novaes, em Brasília, 30/11/2005.
348
Todavia, indaga-se qual o projeto político da Assembléia de Deus, porque os líderes
dessa igreja costumam fazer menção ao “Projeto Cidadania AD Brasil”, sempre que se
reúnem com seus políticos, e fazem uso desta designação, em diferentes oportunidades, o
que induz o observador desavisado a supor que se trata de alguma proposta para o País. Nas
entrevistas, o que se pôde constatar é que o plano da cúpula da Assembléia de Deus se
resume, apenas, ao propósito de eleger o máximo de candidatos de sua escolha, em cada
eleição municipal, estadual e nacional. O deputado Pedro Ribeiro, em junho de 2004, falava
com entusiasmo desse “projeto”:
É com muita alegria que nós [...] estamos participando dessa nova visão da Assembléia de
Deus no Brasil, porque nós já estamos comemorando os nossos 93 anos e até aos 90 anos de
atividade na Nação apenas alguns cidadãos, pastores ou membros da Igreja, [...] decidiram
candidatar-se. Mas agora, com o lançamento do projeto Cidadania AD Brasil foi o projeto
que nos levou à eleição em 2002, elegendo 22 deputados federais, 29 estaduais é que nós
estamos vendo que esta Igreja se consolida, não apenas como uma igreja que pugna, que
luta para a transformação do homem na esfera espiritual, psicológica, emocional, mas
também, agora, para a transformação do homem na área social, quer dizer, o homem em
busca da cidadania. E eu vejo que agora para essas próximas eleições, com essa
performance que temos hoje, da maior bancada na Câmara Federal, nós haveremos de eleger
é a meta do projeto Cidadania eleger, pelo menos, um vereador em cada um dos cinco
mil, 700 e tantos municípios que a Nação tem. Eu tenho a impressão que nós elegeremos
mais. Então, acredito que depois do dia três de outubro, além de milhares de vereadores,
teremos algumas dezenas, quem sabe até cheguemos a uma centena, de vice-prefeitos e
prefeitos. Então, é com muito entusiasmo que eu vejo essa nova posição da Assembléia de
Deus no Brasil.
707
Em novembro de 2005, o mesmo parlamentar explicava, de forma mais precisa, em
que consistia o projeto “Cidadania AD Brasil”:
O projeto político da Assembléia de Deus é com a idéia de oferecer a cada Estado um
deputado estadual, pelo menos; vereadores nas câmaras, tanto da capital, quanto do interior,
assim como deputados federais de cada Estado, na câmara dos deputados e daí em diante.
Quem sabe, não diretamente, mas apoiando alguém como tem surgido, por exemplo,
Anthony Garotinho, que busca a presidência, ajudá-lo, como fizemos da outra vez, a chegar
à presidência da República. Ou seja, o projeto político da Assembléia de Deus é oferecer,
707
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, em Brasília, 18/06/2004.
349
através desses homens transformados pelo Senhor, à nossa sociedade, ao nosso País, uma
contribuição de boa vontade, de pessoas que pela ética e pela moral, fazem a diferença no
trato político, na ética política. Então, o projeto geral é este. E o que nós obtivemos? Em
2002, o projeto conseguiu eleger 21 deputados federais, eu não recordo bem agora, mas na
maioria dos Estados. Eu sei que no Piauí, não; no Rio Grande do Norte não fez; não me
lembro todos os Estados agora que não fizeram. Alagoas não fez. O Espírito Santo tem um
que não é da Assembléia, [mas] foi apoiado por nós. Então, 21 estamos aqui. Serginho
também é um que não é evangélico e foi apoiado, mas na grande maioria dos Estados nós
fizemos. E agora? Para o próximo [mandato] é eleger de 30 a 40 deputados federais, agora,
para 2006. Essa é [a meta] o que o pastor Ronaldo, que é o presidente, Ronaldo Fonseca,
presidente do nosso Conselho Político e os demais membros desejam alcançar em 2006.
Coisa que não é muito fácil [devido a] visão que têm no nosso meio [...] alguns que não
querem se envolver plenamente, acham que não [se] deve investir na política.
708
Nesse mesmo tom triunfalista, falou o coordenador nacional da AD aos candidatos
às eleições municipais de São Paulo, em 2004:
Amados, é isso que nós queremos. Queremos tomar as cidades de todo o Brasil das mãos do
diabo. Este é nosso projeto. Nós não podemos ter um projeto politiqueiro. Simplesmente
buscando o poder como fim. Não amados, nós queremos influenciar esta nação. Nós
queremos mostrar a diferença para esta nação. Nós queremos tirar esta nação das garras, das
mãos, do diabo. Nós queremos tomar esta cidade. Nós queremos tomar este País nesse
sentido. Não uma decisão revolucionária da igreja, no sentido político partidário. Não meus
amados, mas de conceito. Nós queremos tomar esta cidade sim, porque acreditamos que
temos os melhores nomes para oferecer a esta Nação. Os nomes mais íntegros, mais fiéis,
principalmente dentro dos princípios e preceitos da palavra de Deus, que está sendo hoje
enxovalhada, rasgada e jogada fora. Os princípios morais estão sendo destruídos nesta
Nação. A igreja é um resgate, a igreja é um escape. Escutem bem o que disse um dos
poderosos desta Nação, um dos nomes mais poderosos desta Nação, no dia de hoje, (não é o
presidente da República), mas é um dos nomes mais poderosos, numa mesa, sentado com
um grupo de líderes, lá dentro do Congresso nacional, recentemente, isto. Aquele cidadão
disse isto: “Nós precisamos barrar os crentes”, foi a expressão dele, “nós precisamos barrar
os crentes, os crentes já foram longe demais”. Ele disse isto, buscando defender a reforma
política. Mas nós não estamos preocupados com reforma política, do jeito que vier nós
708
Idem, em 24/11/2006.
350
vamos conquistar (aplausos). Que venha o que vier. Porque nós sabemos onde nós
queremos ir.
709
Com igual modo de situar a AD na política, o coordenador estadual para São Paulo,
pastor Paulo Freire, acrescentou a importância dos pentecostais na sociedade, conforme os
diversos papéis que cabe a cada um exercer:
Nós sabemos que a Igreja tem uma representatividade no nosso País [...] representada pelo
número de membros, [...] teoricamente. Na realidade é muito mais do que isto. Porque nós
temos irmão, por exemplo, que é membro da igreja e pertence a um grupo de pessoas
evangélicas. Então ele pertence à comunidade evangélica, mas ao mesmo tempo ele é um
advogado. Então ele pertence à comunidade evangélica, mas ele também pertence àquele
outro segmento, que é o segmento dos advogados. Outros são funcionários públicos,
pertencem também ao segmento dos funcionários públicos. Então o elemento está
representando os advogados, [...] está representando os evangélicos, mas está também
representando o funcionalismo público. Então quando a gente faz o confrontamento (sic)
desses segmentos, nós sabemos que nós temos condições de ir muito mais longe do que nós,
muitas vezes, imaginamos que poderíamos chegar. E mais do que isso: com a formação que
nós temos dentro da palavra de Deus, nós precisamos, podemos realmente ser esta opção
que nós sabemos que o País precisa. De pessoas tementes a Deus, pessoas que são
verdadeiras autoridades morais, que podem ocupar diversos cargos na política ou na
administração política de nosso País, nossos estados e nossos municípios.
710
Uma visão bem crítica e mais condizente com a realidade da presença das igrejas na
política pareceu ter o deputado Carlos Rodrigues, da Igreja Universal, quando foi
entrevistado em junho de 2004. Ele negava, peremptoriamente, que, no conjunto, os
evangélicos tivessem projeto e estratégia de conquista do poder:
Todo lugar que você vai tem um evangélico... Então, isso já ajuda muito, não é?... Está
certo. Agora eu quero dizer a você que eu não vejo projeto... Ah, os evangélicos têm um
projeto pra chegar ali” Não têm. Infelizmente não têm. Tem o Garotinho. Tem o
Garotinho, mas não é um projeto evangélico, não é um projeto dos evangélicos. O
Garotinho é um político evangélico, não é? Ele pode até chegar. E os evangélicos, se ele
chegar, vão estar lá com ele? Vão, acredito que sim, não é? Acredito, mas... não é um
709
Palavra do coordenador nacional de política da AD, pastor Ronaldo Fonseca, no fórum de preparação dos candidatos da igreja
para as eleições municipais do Estado de São Paulo, no SP Hilton Hotel, em junho de 2004.
710
Palavra do coordenador estadual de política da AD no Estado de São Paulo SP, pastor Paulo Freire, no fórum de preparação
dos candidatos da igreja para as eleições municipais do mesmo Estado, no SP Hilton Hotel, em junho de 2004.
351
projeto dos evangélicos. Um projeto dele e ele, claro, busca... Eu não vejo um projeto dos
evangélicos para chegar ao poder, ou até para construir um partido que vá ter um objetivo
claro. Eu acho que isso demora [...] Você não constrói um objetivo, um partido, um projeto
de poder, sem uma estratégia. Eu não conheço ninguém que está montando essa estratégia
assim.
711
Conclusão
Desde o momento quando as igrejas pentecostais decidiram investir seus capitais
religiosos na eleição de candidatos orgânicos para atender interesses corporativos e influir
na elaboração da nova Carta Constitucional, em 1986, registraram-se mudanças no
cotidiano de suas comunidades. As igrejas passaram a trabalhar, de dois em dois anos, de
forma semelhante aos partidos políticos, como agências credenciadoras de candidatos a
serem lançados pela corporação religiosa. Nestes casos os partidos são apenas canais legais
para o registro da candidatura. Em ritmo cíclico, desencadeia-se a cada eleição uma enorme
mobilização para definir quem serão os candidatos “ungidos”, tanto para os cargos
municipais como para os estaduais e federais.
O processo de escolha do candidato varia de denominação para denominação. A
Assembléia de Deus e a Igreja do Evangelho Quadrangular têm em comum a experiência
de disputas internas acirradas e a mobilização das comunidades para transformarem o
escolhido no nome a ser aclamado pelos membros da igreja e sufragado nas urnas, com o
máximo de votos do grupo religioso. Essas igrejas realmente envidam esforços para que a
escolha oficial não seja contestada e chegam a coagir os pastores e membros rebeldes. Na
IURD nem sequer existe disputa, porque a definição da candidatura é uma prerrogativa do
conselho de bispos. Também não costuma haver dissidentes, porque aquele que arrisca
assumir esta condição decreta sua própria expulsão do quadro de empregados da Igreja.
Enquanto na Assembléia de Deus as relações de parentesco são importantes,
podendo determinar a escolha do candidato, na Igreja Universal não é tão evidente este
requisito, salvo nos casos de parentes do bispo Edir Macedo, pois como se sabe, o senador
711
Entrevista do deputado Carlos Rodrigues, em Brasília, em 17/06/2004.
352
Marcelo Crivella é seu sobrinho e a deputada federal Edna Macedo é sua irmã. Em geral, a
escolha depende mesmo é da confiança da cúpula da Igreja no escolhido.
O fato de essas igrejas funcionarem como currais eleitorais facilita as campanhas e
exige poucos gastos financeiros. Contudo, esta mesma característica atrofia o sentido de
liberdade cidadã e dificulta a educação política nos aspectos de respeito ao interesse
público e compromisso radical para a construção de uma efetiva democracia no Brasil.
O político pentecostal escolhe partido em função das chances eleitorais, no que não
é diferente de muitos outros. Atuar na situação ou oposição é também uma questão de
circunstância e conveniência, não só para o próprio político, mas, principalmente, para a
corporação religiosa que ele representa. As igrejas pesquisadas distribuem seus candidatos
em vários partidos, para ampliar a rede de influência nos parlamentos e nas relações com os
governos, facilitando assim negociações de diferentes tipos. Mesmo trabalhando com
diversas legendas, tanto a IURD como a AD têm agido com propósito de controlar algum
partido. A IURD constituiu o Partido Republicano do Brasil (PRB), enquanto a AD tem
ocupado o Partido Social Cristão (PSC), mas somente com o decorrer do tempo será
possível avaliar se estas estratégias foram bem projetadas para atingir os objetivos das
respectivas igrejas.
Os parlamentares pentecostais são quase todos pertencentes ao “baixo clero”, uma
espécie de maioria menos influente, porém muito importante na vida do Congresso, porque
é sempre cortejada pelas lideranças que buscam apoio para as votações de matérias
legislativas decisivas tanto para o governo como para a oposição. O Executivo é também
um grande demandante desses congressistas menos prestigiados, com o objetivo de manter
e ampliar sua base de apoio, sem a qual não conseguiria governar.
Ainda persistem dificuldades de assimilação dos partidos de esquerda por parte de
parlamentares pentecostais e vice-versa. Mas o que distancia o político pentecostal desses
partidos não é tanto a questão ideológica, embora esta não tenha desaparecido, e sim a
dificuldade primordial consiste no fato dessas agremiações serem as mais disciplinadas do
sistema de partidos e não conviverem com orientações de grupos estranhos às suas
instâncias internas de decisão. Há, também, uma dificuldade para os pentecostais da base
353
das igrejas se integrarem em movimentos sociais: a maioria deles resiste quando se trata de
participar em greves, passeatas e outras formas de contestação, porque continuam
associando obediência às autoridades com manifestação da vontade divina em suas vidas. A
rigor, sem se aperceberem, estão elevando o status da autoridade, a tal ponto que esta passa
a ser venerada como é uma divindade, abaixo apenas da divindade superior
O político pentecostal troca de partido motivado pela mesma razão que impulsiona
outros políticos: obter melhor acesso aos recursos públicos e garantir a reeleição. Além
disto, as trocas são feitas, no caso do pentecostal, para atender também aos interesses da
igreja.
As campanhas de candidatos pentecostais revelam deslizes éticos, cuja origem está
na política intramuros praticada pelas próprias igrejas. No vale-tudo das campanhas é
permitido intimidar os eleitores com boatos e caluniar os adversários, com o objetivo de
destruí-los moralmente.
O político pentecostal trabalha mais com o carisma da igreja do que com o seu
próprio carisma. A atuação deste tipo de político se concentra bastante em questões
moralistas e de costumes, na mesma linha dos conteúdos éticos que norteiam as igrejas de
onde ele procede. Não se espere um projeto alternativo de sociedade que tenha origem
neste grupo de políticos o qual, apesar desta lacuna, continua a nutrir aspirações de eleger
um presidente da República evangélico, porque “o Brasil é do Senhor Jesus”, segundo eles.
354
Capítulo 5
Frente Parlamentar Evangélica:
avanços e tropeços.
Introdução
A Frente Parlamentar Evangélica apresenta características de grupo de interesse,
como será possível verificar neste capítulo. Grupo de interesse (GI) se refere a uma
coletividade que se organiza para defender princípios e valores e alcançar objetivos e metas
importantes para sua sobrevivência e fortalecimento, dentro de uma sociedade e perante o
Estado. Os GI podem estar dentro ou fora das estruturas constitucionais deste.
Embora a literatura sociológica adote os termos grupo de interesse e grupo de
pressão, optou-se pelo primeiro, porque oferece enfoque mais abrangente para esse tipo de
fenômeno. Assim, entende-se que o conjunto de parlamentares evangélico é um grupo de
355
interesse que exerce pressão sobre as instituições do Estado, como principal modo de
alcançar seus objetivos.
712
Segundo Dowse e Hughes
713
, um aumento de população que tem algo em comum,
como valores religiosos ou identidade étnica, agravada por ameaça de alguma natureza ou
cerceamento de direitos, tende a se organizar em grupo de interesse, para proteger-se. Outra
possível motivação para o surgimento desses grupos é o desejo coletivo de promover
alguma causa, como desarmamento, proteção ambiental, revitalização de valores culturais e
assemelhados. O aumento de indivíduos com afinidades não é o bastante, para que surja um
GI. Há necessidade que eles desenvolvam em conjunto um processo de conscientização,
para resolverem organizar-se com propósitos determinados. Algo como a passagem de um
estado de afinidades compartilhadas, para uma disposição à mobilização efetiva e luta, em
prol da causa comum.
No caso dos pentecostais, houve aumento considerável de adeptos, com taxas de
crescimento superiores às da população brasileira, durante a segunda metade do século XX.
E eles julgavam que o Congresso Constituinte de 1987-1988 poderia restringir suas formas
de organização e a própria liberdade de culto. Também entendiam que a família tradicional
brasileira estava ameaçada por novos costumes que não condiziam com a interpretação que
eles adotam para um modelo cristão de família. Na primeira situação, eles identificavam a
Igreja Católica como inimiga, capaz de mobilizar parlamentares para reduzir o espaço de
liberdade das igrejas evangélicas. Na segunda, tomada também como ameaça, a instituição
católica poderia ser a mais forte aliada para coibir legalização do aborto, união civil de
homossexuais, pornografia e pornofonia nos meios de comunicação e outras questões
semelhantes. Deste modo foi sendo organizada uma bancada de interesse, que conseguiu
agregar quase todos os evangélicos eleitos para o Congresso Constituinte.
712
De fato, entidades de classe, grupos profissionais, torcidas organizadas, movimentos religiosos, étnicos, de gênero e outros,
podem atuar como grupos de pressão a qualquer momento. Abordagens do assunto foram examinadas, para esta pesquisa, em:
DUVERGER, Maurice. Sociologia polí tica . Rio de Janeiro: Forense, 1968; DOWSE, Robert E.; HUGHES, John A. Sociologia
política. Madrid: Alianza Editorial, 1975; MEYNAUD, Jean. Os grupos de pressão. Lisboa: Publicações Europa-América, 1966;
SCHERER-WARREN, Ilse. Movimentos sociais: um ensaio de interpretação sociológica. Florianópolis: EdiUFSC, 1989;
GALLINO, Luciano (dir.). Dicionário de sociologia. São Paulo: Paulus, 2005 PEDROSO, Elizabeth M. Kieling. Movimento
sindical e de defesa dos direitos humanos como grupos de pressão. In: PETERSEN, Áurea T., _______, ULRICH, M. Alayde A.
Política brasileira: regimes, partidos e grupos de pressão. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1999.
713
Cf. DOWSE; HUGHES, John, 1975.
356
A visão tradicional de grupos de pressão mostra que eles atuam, geralmente, com o
propósito de influenciar na elaboração de políticas públicas, junto às burocracias técnicas
do Estado. Para isto, têm necessidade de contar com quadros também qualificados.
Ampliando esta visão, pode-se afirmar que os grupos de interesse são instâncias
intermediárias de segmentos sociais, cujos propósitos se expressam através de seus
representantes eleitos. Instâncias intermediárias porque os GI representam as bases que os
elegeram nas relações com o Estado.
O exercício da soberania popular é fugaz e espasmódico. Ocorre apenas quando os
eleitores definem quem lhes deve governar ou representar, ou em algum eventual plebiscito
ou consulta popular. O cidadão não tem conhecimento preciso das forças que operam nos
bastidores do poder. Supõe-se, porém, que segmentos organizados em grupos de interesse
exerçam maior influência sobre as instituições públicas. Isto se constitui incentivo para
alguns segmentos se organizarem. Foi o que de fato aconteceu com uma parte do segmento
religioso pentecostal.
No universo das igrejas evangélicas têm surgido estratégias híbridas de condução de
pessoas aos parlamentos e aos postos executivos. Há denominações, como Assembléia de
Deus, Igreja do Evangelho Quadrangular e Universal do Reino de Deus, que operam
corporativamente, com vistas a conquistar espaços nos parlamentos. Por outro lado, há
igrejas que não alimentam esta visão: a presença de parlamentares dessas confissões resulta
de iniciativas desenvolvidas em movimentos distintos do campo religioso, como
associações de professores, sindicatos e outros. A rigor, essas igrejas não fazem um esforço
específico para terem representantes, porque consideram que este assunto é prerrogativa do
indivíduo-cidadão, questão de foro íntimo, e que o canal para fazer política é o partido e
não a igreja. A observação da carreira de alguns políticos evangélicos revela que este
discurso ainda tem relevância dentro das chamadas igrejas do protestantismo histórico.
Não obstante, ao se encontrarem dentro do Congresso Nacional, quase todos os
parlamentares evangélicos têm buscado aproximação com os eleitos das igrejas
pentecostais, para juntos formarem uma frente comum de atuação, dentro de um viés
religioso evangélico. Isto se tornou possível porque eles têm bandeiras em comum,
relacionadas com o fortalecimento da família tradicional e a preservação de costumes tidos
357
como condizentes com os “princípios bíblicos” que o grupo defende. A declaração do
deputado Adelor Vieira, coordenador da FPE (2003-07), revela essa afinidade: “a Frente
Parlamentar Evangélica trabalha em defesa da família, da moral e dos bons costumes”.
714
Tanto isto é verdadeiro que a Frente definiu sua missão com a seguinte frase: “Influenciar
as políticas públicas do Governo, defendendo a sociedade e a família no que diz respeito à
moral e os bons costumes”.
715
Com essa definição simples, os parlamentares da Frente Evangélica podem estar
abrigados em diferentes partidos, como, aliás, defendeu o mesmo Adelor, ao se manifestar
contra a criação de um partido evangélico: “A igreja tem a visão, deve permanecer a visão
do Reino de Deus, que é a visão de alcançar a todos, de não discriminar. E o partido, se for
só um partido evangélico, ele pode se fragilizar, no caso do País, e talvez não conseguir
legenda também. Vai ter uma repulsa, sempre”.
716
A presença nos diversos partidos tem-se
constituído em estratégia para ampliar a capilaridade dos evangélicos no Parlamento,
facilitando a conquista dos objetivos da Frente.
Para uma assessora de deputado pentecostal, a FPE foi criada para buscar consensos
na atuação dos parlamentares evangélicos, coisa difícil de ser alcançada, conforme ela
própria reconhece:
Era essa a intenção: era organizar os parlamentares e dar a eles uma uniformidade em
algumas questões. É difícil chegar a um consenso. Por exemplo, com relação ao aborto: a
Igreja Universal ela se manifestou favorável em alguns casos ao aborto. Já os demais
membros da Frente Parlamentar não manifestaram posição favorável a nenhum dos casos
previstos em lei, inclusive. Então, é difícil você congregar todo mundo em torno de um
único tema. Mas era essa a intenção, sim, da Frente Parlamentar.
717
Esta mesma questão foi analisada pelo coordenador da bancada da Assembléia de
Deus, deputado Pedro Ribeiro, em junho de 2004:
714
Cf. Revista da Frente Parlamentar Evangélica, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 3. Afirmações semelhantes são
recorrentes, em publicações oficiais da FPE e declarações de seus membros, em materiais de propaganda, editados e distribuídos
pelos respectivos gabinetes.
715
FPE, op.cit., p.6.
716
Entrevista do deputado Adelor Vieira, em Brasília, 22;11;2005.
717
Entrevista da assessora parlamentar Mônica. Brasília, setembro de 2006.
358
Alguns têm pensado de a gente formar um partido, aglutinando todos os evangélicos. Outros
mais entendidos acham que não é inteligente, porque a gente estando assim pulverizada em
vários partidos, a gente pode contribuir influenciando nas bancadas. A gente pode numa
questão de encaminhamento, não é? dependendo do partido, marchar atendendo a essas
forças políticas e nas questões pontuais, como já tivemos aqui na Casa, então nós nos
juntamos, independente de partido, pedimos permissão aos nossos líderes e votamos juntos,
como foi o caso da mudança do Código Civil, como foi o caso de não permitir que ficasse
dentro do Código a questão de manipulação, produção, armazenamento de embriões... E aí,
tem algumas vitórias que a gente tem obtido assim por esta unidade. Então, essa história de
estarem todos num partido ainda é muito controversa. Eu acredito que vai haver crescimento
nesse sentido, mas vai ser difícil aglutinar todos.
718
5.1 Origem, organização e objetivos da FPE
Antes de se constituir a Frente Parlamentar Evangélica, com estatutos e diretoria,
havia cultos separados dos integrantes da Assembléia de Deus, Igreja Universal e
protestantes tradicionais. Como explicou o deputado Gilmar Machado:
[A Frente] começou a ser discutida no início de 2003, com a nova legislatura. Em 2002
acabou a legislatura anterior, [quando] não foi possível fazer isso, e começou então essa
Frente. Ela, na verdade, começou, também, a partir da volta, da unificação de um culto,
todas as quartas-feiras, a partir desse trabalho, da reunião para a oração conjunta, que pela
primeira vez agora temos. Nós tínhamos na legislatura passada reuniões separadas: a
Universal tinha o seu culto, nós, das igrejas tradicionais, tínhamos o nosso café e outros da
Assembléia de Deus também se reuniam e agora, em 2003, nós conseguimos então, unificar
em um único evento, em um único culto, agora não mais com a lógica que a gente tinha que
era o impasse também de trazer pessoas para falar, pregar... agora não: são os próprios
parlamentares que se revezam na direção e no trazer da mensagem. A partir dali, então, nós
achamos que era interessante constituirmos a Frente, para discutir temas que para nós seriam
importantes, como a questão do projeto, que depois, o presidente Lula sancionou, de
regularização em questão dos templos, questão sonora nos templos, e, ao mesmo tempo,
outros projetos que nós estamos ainda discutindo, a respeito da lei da questão civil do
tratamento das igrejas e também a discussão dos projetos da transgenia e das células tronco.
Então, era importante o nosso trabalho conjunto.
719
718
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, em Brasília, 18/11/2004.
719
Entrevista do deputado Gilmar Machado. Brasília, novembro de 2005.
359
A Frente Parlamentar Evangélica foi instalada, oficialmente, no dia 18 de setembro
de 2003, em solenidade com cerca de 300 pessoas, entre parlamentares, lideranças de
igrejas e outros convidados, no Plenário Ulysses Guimarães da Câmara dos Deputados. Na
mesma ocasião foi realizada uma sessão solene em homenagem ao Dia Nacional de
Missões Transculturais. O deputado Adelor Vieira (PMDB-SC), da Assembléia de Deus,
presidiu o evento. O deputado Pastor Pedro Ribeiro (PMDB-CE) foi o autor da homenagem
às Missões e explicou: “O objetivo é transpor barreiras culturais para evangelizar e plantar
igrejas, aqui incluídas as que trabalham com populações indígenas, com povos de outros
países e com subgrupos que vivem marginalizados, respeitando a identidade cultural de
cada povo”.
720
No final da sessão, o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP),
recebeu, como doação para o acervo da biblioteca da Casa, exemplares do Novo
Testamento, traduzidos para 30 línguas indígenas. O acontecimento foi festivo, com
palavra de 15 deputados e apresentação de cantores sacros.
Essa coesão do grupo evangélico não é algo costumeiro. Alguns deputados apóiam a
FPE, mas não comparecem em seus eventos. Outros nem sequer se identificam com o
movimento, embora não escondam sua identidade religiosa. Mas há também aqueles que
vêm de tradição evangélica, porém são difíceis de serem identificados, por não terem este
interesse específico, quando estão no parlamento. Uma assessora exemplificou essas
situações, no caso de dois parlamentares da Igreja do Evangelho Quadrangular:
A Frente Parlamentar Evangélica, apesar de agregar 61 parlamentares, nem todos
participavam de suas atividades. E nem todos participavam dos seus cultos: o pastor Josué
Bengtson, por exemplo, nunca foi a um culto da FPE. Nem nessa legislatura nem na
legislatura anterior. E das atividades da Frente Parlamentar ele esteve presente em uma ou
duas, quando eram de grande porte, como entrega de prêmios, premiação, jantares. É, mas
se dizia, sim, coerente com tudo que era feito. Assinava tudo que se pedia, apoiava lá no
plenário tudo que era pedido, mas não tinha uma participação efetiva, não. Ao contrário do
deputado pastor Reinaldo, que acreditou na organização do grupo e era, inclusive, o
primeiro-vice-presidente da FPE.
721
720
Revista FPE, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 5.
721
Entrevista de assessora parlamentar de deputados da FPE. Brasília, setembro de 2006.
360
A mesma assessora realçou uma outra característica desse grupo de evangélicos: em
seu interior se desenvolveu um crescente clima de fraternidade, acolhimento e apoio mútuo.
Os parlamentares se encontravam para momentos de descontração e práticas religiosas.
Segundo ela, os integrantes da Frente constituíram uma verdadeira confraria de amigos, que
não avançou, porém, no sentido de agir como grupo de interesse (ou grupo de pressão):
[A Frente] acabou de fato não sendo o que todo mundo esperava. Acabou virando apenas
uma grande confraria de irmãos, onde se reuniam para orar, fazer vigília, cantar, comer,
mas, tomar posições, tomar partido, tomar iniciativas, foram poucas. A Frente Parlamentar
nesse sentido não funcionou. Funcionou, sim, como um lugar para um acolher o outro. Um
chorar com o outro, ser amigo do outro. Inclusive eu falo que o nosso deputado Adelor
Vieira funcionou mais com o papel de agregador dentre eles, do que propriamente um
parlamentar, um papel que a Frente Parlamentar estava querendo desenvolver. Acho que
deve continuar a Frente? Sim. Acho que devem continuar os princípios da Frente
Parlamentar Evangélica na próxima legislatura, mas não precisava ser um grupo organizado
com CNPJ, com toda aquela estrutura, mas que tivesse uma única preocupação: qualidade.
Que os parlamentares que viessem investissem um pouco nesse grupo de assessores,
colocassem ali pessoas que de fato entendam do processo legislativo como um todo, para
que estivessem acompanhando e orientando o trabalho da Frente Parlamentar Evangélica.
722
5.1.1 GAPE
Logo no início de suas atividades, a FPE criou o Grupo de Assessoria aos
Parlamentares Evangélicos (GAPE), composto por assessores dos próprios parlamentares,
organizados em quatro comitês: Jurídico, de Comunicação, Assuntos Políticos e Eventos.
Um chefe de gabinete de deputado da Igreja Universal, entrevistado em 2004, falou sobre
esta iniciativa:
Criou-se no ano passado uma Frente, [...] com todos os parlamentares evangélicos. E
paralelo a isso, por sugestão minha e de outros colegas de bancada e chefes de gabinete, nós
formamos o Grupo de Assessores Parlamentares Evangélicos. Por quê? Eu tenho
particularidades, que o outro tem, que o outro não tem. Mas existem coisas que nos unem.
Por exemplo, se é questão da igreja, se é questão, por exemplo, gay, se é questão do som da
722
Ibidem.
361
igreja, daquele negócio do estatuto da cidade e tal, de coisas que nos unem, nisso aí, a gente
senta, a gente discute.
723
O GAPE começou a funcionar com um líder, três vice-líderes e três secretários.
Além dos comitês, foi prevista a instalação de comissões especiais, para acompanhar os
projetos de interesse dos parlamentares evangélicos, em tramitação no Congresso. No final
de 2004 havia quatro comissões, monitorando projetos sobre: alterações no novo Código
Civil, união civil entre pessoas do mesmo sexo, reconhecimento de cursos de Teologia e
reforma política. A assessora Mônica participava ativamente do GAPE e falou sobre a
atuação desse grupo:
Os membros do GAPE geralmente são chefes de gabinete ou assessores de parlamentares
que possam contribuir em elaboração de documentos, de pareceres e de posições. Eu sou
membro do GAPE. Fui uma das grandes incentivadoras que esse grupo existisse, pelo
seguinte, Saulo. O GAPE poderia estar orientando os parlamentares de uma forma geral, de
como atuarem e de como se posicionar diante de questões. E o GAPE se reunia, cumpria seu
papel. Os chefes de gabinete estavam sempre reunidos, elaborando. Nós fazíamos um
acompanhamento, por exemplo: projetos de lei em tramitação na Casa que ferem os valores
da família. Nós estávamos acompanhando campanhas saudáveis como quem é contra quem
financia baixaria com relação à televisão. A gente estava acompanhando a questão dos
comerciais de televisão voltados para crianças, que continuam abusivos. Então o GAPE
estava ali pegando o que havia de bom na Casa, para que os deputados pudessem estar
acompanhando e orientando, para que os deputados fossem alertados sobre que tipo de
documento não assinar, que tipo de CPI participar, de que forma atuar na CPI, vendo
também as questões do Governo se eram prioritárias ou não, a questão do Orçamento. Então
o GAPE funcionava como um auxiliar da Frente Parlamentar Evangélica.
724
723
Entrevista do chefe de gabinete Oséias. Brasília, junho de 2004.
724
Entrevista da assessora Mônica. Brasília, setembro de 2006.
362
5.1.2 Expansão
A FPE resolveu criar sucursais nos 27 Estados, Distrito Federal e milhares de
municípios brasileiros. As primeiras unidades foram instaladas nos Estados de Paraíba,
Ceará, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Acre, Rondônia e Roraima. Na Paraíba o evento
ocorreu no dia 18 de março de 2004, coordenado pelo deputado federal Philemon
Rodrigues e seu filho Enaldo Rodrigues. O deputado estadual pastor Fausto Oliveira
assumiu a representação local da FPE. Dois dias depois foi a vez do Ceará. A liderança foi
entregue ao deputado estadual Jaziel Pereira (PHS-CE). Em ambos os Estados foi destacada
a importância da unificação dos evangélicos pelos canais da política, embora o predomínio
da Assembléia de Deus fosse bastante evidente. Ainda no mês de março de 2004,
aconteceram instalações de filiais da Frente em Minas Gerais (dia 22) e Rio Grande do Sul
(dias 29). Em Minas se fez notar a presença de parlamentares batistas, como o ex-atleta de
futebol João Leite, eleito deputado estadual pelo PSDB, mas servindo como Secretário de
Ação Social e Desporto do Estado, e o deputado federal Gilmar Machado, do PT, além de
vereadores evangélicos da capital. O grupo escolheu como representante da FPE-MG o
deputado estadual George Hilton, da Igreja Universal. No Rio Grande do Sul, a pedido do
deputado federal Milton Cardias, a instalação da FPE ocorreu durante a realização da
Convenção das Assembléia de Deus do referido Estado, na cidade de Palmeira das Missões.
Foram divulgadas pelo coordenador nacional da FPE ações já realizadas, como alteração no
Código Civil, em prol da autonomia das igrejas, e proibição de clonagem e uso de embriões
humanos, em pesquisas científicas. O representante da Convenção Geral das Assembléia de
Deus do Brasil, pastor Alcino Toledo, destacou que a Frente já estava sendo acionada para
obter o reconhecimento, pelo Ministério da Educação, de um curso superior de Teologia
que funciona sob sua coordenação.
Um novo ciclo de expansão da FPE ocorreu em julho de 2004. No dia 1º foi
realizada a instalação da sucursal do Acre, por iniciativa dos deputados federais Zico
Bronzeado e Henrique Afonso, ambos do PT. Houve adesão do deputado estadual Helder
Paiva e de vereadores da capital acreana. O dia seguinte foi oportunidade da FPE ser
instalada em Rondônia, sob a liderança do deputado estadual Renato Velloso (PFL-RO).
Nilton Capixaba informou, na oportunidade, que aderira à fé evangélica 90 dias depois de
363
sua eleição para deputado federal: “Aceitei a Jesus e tenho procurado honrar o meu povo e
fazer a diferença nesse Estado. Em Rondônia, 40% do povo é evangélico. A FPE está unida
na Câmara, não há divergências. A Bíblia é a maior constituição que nós temos, porque ela
não muda e não falha”.
725
No dia 4 de julho a Câmara de Vereadores de Boa Vista, em
Roraima, recebeu os deputados federais pastor Frankembergen (PTB-RR), João Campos
(PSDB-GO), Adelor Vieira (PMDB-SC), Silas Câmara (PTB-AM), além de lideranças
locais, que organizaram a FPE estadual, sob a coordenação do vereador pastor Antônio
Filho (PMDB), da Igreja Quadrangular da capital roraimense.
5.2 Cultos, conferências e outras programações.
A constituição da FPE contribuiu para estreitar laços de relacionamento e amizades
entre seus parlamentares. Muitos já se conheciam no ambiente das respectivas igrejas,
quando, na condição de líderes, participavam de eventos regionais e nacionais. O
Coordenador da FPE, deputado Adelor Vieira, afirmou: “Nosso trabalho tem se
fundamentado na união entre os parlamentares, prova disto tem sido o culto devocional que
realizamos todas as quartas-feiras na Câmara Federal”.
726
O coordenador desses cultos, em
2004, era o deputado pastor Pedro Ribeiro, também vice-presidente da FPE e líder da
Assembléia de Deus no Ceará. No início, havia dificuldade para reunir todos os
evangélicos, porque os parlamentares da Igreja Universal do Reino de Deus já realizavam
um culto no mesmo dia e horário. Entretanto, houve entendimento de modo a unificar as
celebrações. Segundo o deputado Ribeiro:
Desde o início da Legislatura e da realização dos Cultos, há um entrosamento e uma
crescente amizade, respeito e consideração entre os deputados de todas as denominações
presentes na Casa. Aliás, todos têm se manifestado reconhecedores e entusiastas pela
realização e presença nos cultos. O nascedouro da própria Frente Parlamentar Evangélica é
produto deste compartilhar.
727
A notícia desses cultos chegou ao Palácio do Planalto, de tal modo que o presidente
Luís Inácio Lula da Silva manifestou desejo de que a Frente promovesse eventos
725
Revista FPE, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 11.
726
Idem, p. 3.
727
Idem, p. 20.
364
semelhantes no espaço do Executivo. A FPE também decidiu preparar convites e textos de
evangelização para distribuir a todos os parlamentares do Congresso Nacional.
Interessante notar como a marca pentecostal se evidencia no ambiente público da
chamada Casa do Povo. O deputado Pedro Ribeiro relatou “a cura da filha da deputada
Edna Macedo (PTB-SP), através da Oração da Fé, mesmo estando ela em outro Estado”.
728
Esse mesmo parlamentar propagou uma experiência pessoal. Durante check-up médico foi-
lhe recomendado submeter-se a cateterismo em São Paulo. Na véspera do exame ele esteve
presente ao culto da FPE e foi alertado por um pastor visitante que o demônio “quis pegá-
lo, mas que Deus havia lhe dado um coração novo”. Pedro Ribeiro completa seu
testemunho: “Após o cateterismo, ficou confirmada lesão em duas artérias no ventrículo
esquerdo, mas que não seria necessária qualquer intervenção cirúrgica, porque eu tinha um
coração robusto e forte, que jamais sofrerá qualquer enfarte. Isto foi confirmado pelos
médicos de São Paulo e do Distrito Federal”.
729
Os cultos da FPE têm como coordenador musical o deputado Raimundo Santos (PL-
PA), figura bastante conhecida nos aeroportos de Brasília e Belém, porque leva sempre em
sua bagagem um acordeon, seu companheiro inseparável nas campanhas políticas, desde
quando foi candidato a deputado estadual, pela primeira vez, em 1986. Santos é filho do
mais antigo pastor da Assembléia de Deus do Pará, Joaquim Santos, que em setembro de
2004 havia completado cem anos de existência, dos quais 70 na atividade pastoral. O
deputado Santos marcou posição bem conservadora na linha de costumes, característica dos
integrantes da Frente, em discussões de projetos sobre legalização da prostituição, prática
do nudismo e união civil de homossexuais.
A revista da FPE descreveu o ambiente dos cultos e a atuação da equipe dirigida por
Raimundo Santos, com as seguintes palavras: “O plenário II das Comissões da Câmara dos
Deputados reservado às reuniões técnicas tornou-se meeting gospel, onde, todas as
728
Idem, p. 8.
729
Ibidem.
365
quartas-feiras, parlamentares evangélicos realizam cultos de adoração a Deus, ficando a
cargo do parlamentar e de sua equipe, a celebração do louvor”.
730
No encerramento das atividades do ano de 2003, a FPE realizou um culto de Santa
Ceia, no ambiente da Câmara dos Deputados, com a presença de senadores, deputados
federais e convidados, destacando-se um coral de mulheres de uma igreja de Taguatinga e a
vinda do bispo Átila Brandão, da Igreja Caminho das Árvores, de Salvador (BA). Além dos
cultos semanais, habitualmente realizados no Plenário II das Comissões, a Frente promoveu
um culto de ação de graças, no início das atividades legislativas de 2004, com a presença
de, aproximadamente, 400 pessoas. A proposta veio do deputado batista Walter Pinheiro
(PT-BA), o qual, durante a cerimônia, relatou as vitórias alcançadas pela FPE em 2003:
“Tivemos uma grande conquista com a mudança no Código Civil, e hoje, com este evento,
presenciamos mais uma conquista memorável”. Em seguida, acrescentou: “Nos queremos a
entrega de Deus na vida dos homens que governam este País” (sic).
731
Anualmente, a FPE promove uma Conferência Nacional de Parlamentares
Evangélicos. A primeira conferência foi realizada nos dias 25 e 26 de novembro de 2004,
com a presença de aproximadamente 300 pessoas. A sessão solene foi aberta com a palavra
do presidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha. O tema geral foi “O Parlamentar
Evangélico e as Transformações Sociais no Brasil”. Houve entrega de prêmios “Destaque
Nacional” para 85 pessoas que a Frente quis homenagear, nas áreas de Evangelização,
Missão, Educação, Assistência Social e Atuação Política. Foram convidados conferencistas
do Brasil e de outros países, como o deputado angolano Ricardo Teodoro, o norte-
americano Rendy Johnson, o vice-governador e membro da Assembléia de Deus do Rio
Grande do Norte, Antônio Jácome, o metodista gaúcho e ex-ministro do Superior Tribunal
Militar, Aldo Fagundes, e o palestrante Francisco Schork.
732
5.3 Atuação da FPE: relacionamentos internos e externos.
A Frente Parlamentar Evangélica marcou seu primeiro ano de existência, 2004,
correspondente ao segundo da 52ª legislatura, com diversas iniciativas. Além de atividades-
730
Revista da Frente Parlamentar Evangélica, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 16.
731
Idem, p. 21.
732
Informações obtidas na revista Ação Parlamentar , do gabinete do Dep. Adelor Vieira, Brasília, 2005, p.21.
366
meio, como a criação do Grupo de Assessoria aos Parlamentares Evangélicos (GAPE) e a
instalação de sucursais em sete Estados da Federação, algumas medidas foram tomadas
como parte de sua finalidade, tais como:
a) audiência com o Ministro das Comunicações, para pleitear concessões de
emissoras de rádio e televisão;
b) providências junto ao Ministério da Educação para reconhecimento de
cursos superiores de Teologia;
c) apoio ao programa de erradicação do analfabetismo no Brasil;
d) iniciativas para alteração do Código Civil, através de apresentação do
Projeto de Lei 634/03, acompanhamento e intenso trabalho de articulação,
até obter sua aprovação no Congresso e sanção da Lei pelo Presidente da
República;
e) discussão de projeto de lei que restringia a programação religiosa nos
veículos de comunicação radiofônica e televisiva;
f) abordagens para poupar comunidades evangélicas de serem penalizadas
devido a níveis elevados de ruído em cultos e celebrações, devido a
exigências da legislação ambiental;
g) debates sobre contribuição previdenciária, no caso da categoria profissional
ministro religioso.
A FPE manteve, durante a 52ª legislatura, uma jornalista, Josiane Lanzarin
Spengler, que além de produzir material de divulgação, acompanhava a repercussão das
atividades da Frente em veículos de comunicação. A Frente foi bastante citada pela
imprensa (Folha de S. Paulo, revista Época e Jornal do Brasil), durante a aprovação da Lei
dos Transgênicos. O Correio Brasiliense destacou a organização da Frente Evangélica, em
comparação com outras similares do Congresso. O mesmo jornal também registrou a
atuação decisiva da Frente nos casos de: mudança do Código Civil, para liberar as igrejas
de serem registradas como associações ou fundações; proibição da clonagem de embriões,
que estava proposta em projeto de lei sobre biossegurança e retirada de pauta da proposta
de união civil entre pessoas do mesmo sexo.
733
As atividades da FPE também foram objeto
de entrevista do jornal Los Angeles Times com o presidente deputado Adelor Vieira,
publicada no dia 7 de junho de 2004.
733
Revista da Frente Parlamentar Evangélica, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 10.
367
Antes de apresentar temas nos quais a Frente Parlamentar Evangélica firmou
posição, é importante assinalar que não havia esforço para fechar questão em nenhuma
votação. O presidente Adelor Vieira deixou muito clara esta orientação, quando foi
entrevistado:
Bem. Nem a Assembléia de Deus, que tem a maior bancada (são 20 parlamentares), nem as
outras, dentro da nossa orientação, como presidente da Frente Parlamentar Evangélica,
votam fechado. Nós não fechamos questão em nada. Agora, nós trabalhamos na
conscientização, nós fizemos várias reuniões e, ao final, a gente deixa sempre livre para que
cada um possa, de acordo com a sua consciência, fazer a sua votação e quase sempre a
votação é igual. Mas já tivemos casos que a bancada divergiu.
734
Solicitado a declinar estes casos em que houve divergências, o deputado lembrou a
votação do salário mínimo de 2004, a reforma da previdência, a questão das células-tronco.
E acrescentou: “Eu não procuro colher os votos para saber o quorum que deu, para não
ferir. Porque eu acho que cada parlamentar deve ter o seu de votar. Deve ter o seu direito de
votar. Então a responsabilidade vai ser dele. Então eu sou contra o cerceamento do direito
do parlamentar de exercer o seu direito de voto.”
735
A seguir, alguns temas que mereceram
atuação destacada da Frente Parlamentar Evangélica
5.3.1 Estatuto do Desarmamento
O projeto de lei nº 10.826, de 22/12/2003, conhecido como Estatuto do
Desarmamento, trazia em seu artigo 27 a obrigatoriedade do uso de detectores de metal, em
locais onde comparecessem mais de mil pessoas. A multa para os responsáveis por eventos
que não cumprissem essa determinação va riava entre cem mil a 300 mil reais. O deputado
João Campos (PSDB-GO) percebeu que o projeto, já aprovado pelo Senado, não excluía os
templos. Diante disto, afirmava ele: “A imposição de multa desse valor poderia implicar no
fechamento da igreja com a venda do patrimônio para garantir o pagamento da multa”.
736
Com base no inciso VI do artigo 5º da Constituição Federal, que determina ao poder
público garantir a proteção aos locais de culto e suas liturgias, o parlamentar, que pertence
à Assembléia de Deus Madureira, propôs alteração ao texto legal, de modo que a
734
Entrevista do deputado Adelor Vieira. Brasília, 22/11/2005.
735
Ibidem.
736
Revista FPE, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 18.
368
autoridade eclesiástica ficou isenta da obrigação de instalar detectores de metal nos
templos.
5.3.2 Lei de Biossegurança
Os parlamentares evangélicos acompanharam com interesse as discussões sobre o
projeto de lei nº 2401/2003, relativo à segurança e fiscalização em atividades que lidam
com organismos geneticamente modificados e seus derivados. Nesta votação, os
evangélicos estiveram juntos com os católicos e conseguiram proibir
quaisquer manipulações genéticas de células germinais humanas e embriões humanos;
clonagem humana para fins reprodutivos; produção de embriões humanos, exceto para
realização de procedimentos com finalidade de diagnóstico, prevenção e tratamento de
doenças e agravos, bem como clonagem terapêutica com células pluripotentes, não
embrionárias.
737
Esta decisão foi comemorada pelos grupos de parlamentares religiosos como a
“vitória da vida”. O deputado Gilmar Machado se manifestou sobre este caso:
A bancada evangélica conseguiu, a partir de um relatório apresentado pelo deputado
Henrique Afonso, do PT evangélico do Acre, (ele é presbiteriano), nós conseguimos então
nos unificar em torno do relatório que ele fez, assegurando a utilização de células tronco já
em pessoas, mas com os embriões tendo restrições. [...] Aí [...] o que eu queria colocar? [A
questão] da trangenia, a questão dos transgênicos, possibilitando a partir de
acompanhamentos, todos tendo uma fiscalização e um controle maior. A mesma coisa no
que diz respeito aos embriões. Isso então nos possibilitou votarmos unificados nessa
questão. Tem o projeto do aborto agora que está tramitando, que tem a oposição da Frente.
Nós estamos agora formulando um texto para que a gente possa subsidiar a coordenação
nossa para podermos votar então o projeto.
738
5.3.3 Criacionismo
A Frente Parlamentar Evangélica demonstrou interesse nas discussões sobre Ensino
Religioso, tendo enviado dois assessores, Sandro Jadir Albuquerque e Inaldo Santos, ao 2º
congresso nacional referente ao tema, realizado no Rio de Janeiro, em junho de 2004. O
737
Idem, p. 25.
738
Entrevista do deputado Gilmar Machado. Brasília, novembro de 2005.
369
objetivo da FPE era apoiar a proposta de inclusão da teoria criacionista na grade curricular
das escolas de ensino fundamental. Para tanto, criou uma comissão de parlamentares,
liderada pelo deputado pastor Reinaldo (PTB-RS), que tratou de pressionar o Executivo
nessa matéria. Segundo esse parlamentar:
o primeiro passo foi contatar o ministro da Educação, Tarso Genro, com o objetivo de
requerer a inclusão da proposta do criacionismo científico em livros didáticos. Caso a
indicação não seja acatada pelo Ministério, a Frente deve entrar com um projeto de lei
regulamentando a ação, mesmo entendendo ser esta uma prerrogativa do Executivo, e não,
do Legislativo.
739
Para o presidente da FPE, Adelor Vieira, a alternativa de ir diretamente ao Ministro
da Educação teria eficácia maior do que aprovar um projeto de lei sobre o assunto. O
deputado Milton Cardias declarou que seriam empreendidos “todos os esforços cabíveis
para atender este pleito”.
740
Muitos colégios evangélicos já ensinam o criacionismo. A pressão de líderes
pentecostais para que o assunto conste do currículo escolar é grande. O presidente de
Conselho Político da Convenção Geral das Assembléias de Deus, pastor Ronaldo Fonseca,
reclamou que a discussão estava atrasada:
Porque nós, que aceitamos criacionismo, não como teoria, mas como verdade, temos que
aturar a teoria evolucionista imperando nas escolas e faculdades, direcionando os estudos
para essa teoria? Como país democrático, devemos dar a opção ao aluno sobre o que ele
quer aprender e estudar. Não se deve impor o criacionismo, mas também não se deve impor
a teoria do evolucionismo como está acontecendo hoje.
741
5.3.4 Reforma Política
A Reforma Política, projeto cujo relator, na 52ª legislatura, era o deputado Ronaldo
Caiado (PFL-GO), foi um dos assuntos que mereceu sucessivos debates no âmbito da
Frente Evangélica. Além do próprio relator, os deputados Roberto Freire (PPS-PE) e Carlos
Rodrigues (PL-RJ), este um dos mais influentes membros da FPE, procuraram apresentar
739
Revista FPE, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 26.
740
Ibidem.
741
Revista FPE, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 26.
370
as implicações da Reforma, segundo estava configurada no projeto. Seus grandes temas,
apresentados pelo relator, eram: financiamento público de campanhas eleitorais; listas de
candidatos pré-ordenadas pelos partidos para as eleições proporcionais, as chamadas “listas
fechadas”; proibição das coligações partidárias nas eleições proporcionais, e criação de
federações partidárias, nas quais os partidos deveriam permanecer filiados pelo prazo
mínimo de três anos.
Para o deputado Carlos Rodrigues:
a lista vai-nos fazer caminhar para o bipartidarismo, onde não há renovação. O poder
econômico vai continuar dominando e a Reforma como está vai aumentar o poder de quem
manda, além de acabar com as alianças e coligações. E, o que mais me incomoda é que
seremos julgados por delegados de partido e não mais pelo povo.
742
Rodrigues apoiava o instituto da fidelidade partidária para os dois primeiros anos de
cada legislatura, enquanto o projeto previa para os dois últimos. O presidente Adelor Vieira
entendia que o projeto de reforma penalizava as minorias parlamentares e defendia que “o
correto seria trabalhar na Reforma Partidária”.
743
Esta tese foi aceita pela Frente, que
nomeou uma comissão para apresentar um esboço de Reforma Partidária, composta dos
deputados Carlos Rodrigues (PTB-RJ), Milton Cardias (PTB-RS) e Gilberto Nascimento
(PMDB-SP), este assumindo a coordenação do trabalho.
5.3.5 Emenda ao Código Civil
A grande realização da Frente Evangélica, durante a 52ª legislatura, foi, sem dúvida,
a operação que culminou com importante alteração no novo Código Civil, que já havia sido
aprovado, conforme Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. O novo Código, em seu artigo
44, previa, apenas, três tipos de pessoas de direito privado: associações, sociedades e
fundações. O Código que vigorava desde 1916 reconhecia, explicitamente, as sociedades
civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias. Além disto, para se adequar à nova
lei, as organizações religiosas e os partidos políticos teriam que alterar seus estatutos para
se enquadrarem em um dos tipos previstos, até janeiro de 2004. A partir de 2002, alguns
742
Idem, p. 15.
743
Ibidem.
371
líderes evangélicos
744
começaram a denunciar os problemas que adviriam para as igrejas,
devido à implantação da nova lei. Como as igrejas teriam que submeter seus estatutos ao
Estado, havia um entendimento que estava sendo violado o princípio da separação entre
essas instituições: o Estado teria poder para intervir nos assuntos das igrejas, tais como:
critérios para organização, quorum para deliberações, forma de governo e correlatos.
O movimento conseguiu constituir uma Comissão Especial na Assembléia
Legislativa do Rio de Janeiro, presidida pelo deputado Édino Fonseca, para debater os
impactos do novo Código sobre as igrejas. Foi elaborada emenda popular com o objetivo de
coletar um milhão e 700 mil assinaturas e propor alteração no novo Código. A mobilização
sensibilizou muitos evangélicos e teve ressonância em Brasília, de modo que a Frente
Parlamentar Evangélica resolveu encampar a iniciativa. O deputado Raimundo Santos
explicou o seguinte:
Se nós não estivéssemos aqui presentes, os evangélicos, neste mandato, as igrejas estariam
no nível de qualquer associação porque o Código Civil assim colocou as igrejas e dessa
forma elas estariam vulneráveis à ação de qualquer pessoa que poderia conquistar, no Poder
Judiciário, ou por influência junto ao próprio Ministério Público, uma intervenção na igreja,
uma intervenção na administração da igreja e aí nós teríamos a igreja cerceada na sua
própria liberdade de culto. Então, hoje, depois de tantas décadas, a igreja acordou, porque
ela sabe que se não estiver presente no poder, nos poderes instituídos, ela vai fazer, vai
cumprir sua missão de uma forma raquítica.
745
Finalmente, foi elaborado o Projeto de Lei 634/03, aprovado por unanimidade na
Câmara e Senado, o qual trouxe nova redação ao artigo 44 da Lei nº 10.406, de 10/01/2002.
No novo artigo 44 aprovado, as organizações religiosas e os partidos políticos tiveram
reconhecimento específico como pessoas jurídicas de direito privado. A autonomia dessas
instituições foi garantida no § 1º do mesmo artigo, onde se lê: “São livres a criação, a
organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo
vedado ao Poder Público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e
744
O jornal A voz profética na política, junho 2004, Ano 1, órgão de divulgação do mandato do deputado estadual Édino
Fonseca (PSC-RJ), cita os seguintes líderes religiosos e juristas, que se mobilizaram contra a condição restritiva do novo Código,
para as igrejas: Pastor e Juiz Federal Dr. Paulo Roberto Capanema, Bispo Manuel Ferreira, Pr. Isaías de Souza Maciel, Reverendo
Dr. Guilhermino Cunha, Pr. Nemuel Kessler, Apóstolo Doriel de Oliveira, Pr. Getúlio Mapa, Pastor Samuel B. Lessa, Pr.
Vanderlei Bibá, Pr. Desembargador Roberto Cortês e Dr. Zenóbio Fonseca.
745
Entrevista do deputado Raimundo Santos. Brasília, junho de 2004.
372
necessários ao seu funcionamento”. Embora o projeto tenha sido do deputado Paulo
Gouvêa, na época integrante da Igreja Universal, foi, de fato, uma iniciativa construída em
mutirão, conforme declarou o deputado Adelor Vieira, em discurso de 06/11/2003: “O
projeto que esta Casa acabou de aprovar, da lavra do Deputado Paulo Gouvêa, com esforço
concentrado dos integrantes da Frente Parlamentar Evangélica e com a dedicação ímpar do
eminente Deputado João Alfredo, relator da matéria, justifica-se a nossa satisfação”. O
deputado ex-bispo Carlos Rodrigues, quando perguntado sobre a contribuição dos
parlamentares evangélicos para a democracia, afirmou, categoricamente, que ele redigira o
projeto de alteração do artigo 44 do Código, e abrira canais para sua aprovação:
Bom, o problema é o seguinte: A democracia ela é uma construção contínua. Qual é o maior
bem da democracia? A liberdade. É o maior bem da democracia. E, eu digo a você que, para
o meio evangélico, a liberdade que hoje nós temos é conseqüência do trabalho desses
parlamentares abnegados que nós temos aqui. Porque quando você associa democracia... o
maior adjetivo da democracia é a liberdade. Se não tivéssemos aqui, não vou dizer 30 ou 40,
uns 20 deputados evangélicos de fato e de verdade que estão aqui dentro trabalhando
diariamente, o evangelho teria muitos motivos de ser perseguido aqui. Já teriam muitas leis.
Eu próprio, quantas leis eu derrubei contra as instituições religiosas! O caso do Código Civil
nasceu aqui, dessa mesa aqui, eu rascunhei o Código Civil... Pedi o deputado Paulo
Gouvêa para assinar o Código Civil, projeto. Protocolei, fui na Comissão de Constituição e
Justiça, no plenário, consegui a assinatura dos líderes, trabalhei muito! O Código Civil
seria uma desgraça, seria uma desgraça, para a instituição. Não para a causa de Jesus,
porque a causa, o Senhor, Ele... nem a cruz pôde mantê-lo preso, nem os grilhões da morte,
mas a instituição física ela iria sofrer muito, ela ia ter muito problema... Em várias outras
leis, não é?, que diariamente estão criando leis que tentam barrar o trabalho da instituição,
pessoa jurídica, no caso...
746
Outro deputado que reivindicou para si a paternidade da emenda ao Código Civil
para adequá-lo à situação das igrejas foi o pastor Francisco Olímpio:
Então, quando nós chegamos aqui, a lei ordinária, que era o Código Civil, que tinha sido
aprovado agora, após a Constituição, ela caracterizava as igrejas dos segmentos evangélicos
como associações, como fundações. Então, Deus nos deu graça, nos iluminou e nós fomos
autor do projeto 1273, retirando do diploma legal do Código Civil, da lei ordinária, essa
parte e deixando agora a igreja como pessoa jurídica de direito privado, regida pelos seus
746
Entrevista do deputado Carlos Rodrigues, gravada em seu gabinete de Brasília, no dia 17/06/2004; grifo acrescentado.
373
próprios estatutos. Isto aí serviu para elencar todo esse processamento e outros, para
apresentar o substitutivo. E a Frente Parlamentar Evangélica levantou-se em frente ao
plenário, conseguimos apressar, em regime de urgência urgentíssima, e hoje foi modificado
o artigo concernente a este ato, e hoje a igreja é regida pelos seus próprios estatutos,
elegendo presidente, [...] nos seus afazeres e atos constitutivos, com plena liberdade de
acordo com a Bíblia, a palavra de Deus, nos seus próprios estatutos. Então, isso aí já é uma
coisa de ação nacional. Deus nos deu a honra. Nós tivemos projetos a respeito do impacto de
vizinhança, a respeito de construções de templos. O nosso mandato é da igreja, certo? Deus
nos entregou o mandato para representar o nosso segmento, que nós fazemos com muita
humildade.
747
5.3.6 Relação com Israel
Em nome da Frente Evangélica uma comissão de oito parlamentares visitou o
embaixador de Israel no Brasil, Daniel Gazit, em novembro de 2003, acompanhada pelo
representante da comunidade judaica na Câmara dos Deputados, o deputado paulista Walter
Feldman, e por um evangelista, Pedro Laurindo, incentivador dessa aproximação. O
objetivo do encontro foi estreitar relacionamentos entre os dois países e promover ações de
intercâmbio cultural e educacional. O presidente da FPE, deputado Adelor Vieira, assumiu
compromisso de orar pela paz em Israel e buscar aliados com o mesmo objetivo. O
embaixador Gazit declarou na oportunidade: “Os senhores estão apoiando uma causa justa.
Hoje nos acusam de tudo, mas estamos lutando contra o terror. Nosso objetivo é libertar o
País, não queremos mais violência, nem mais terror. Somos a favor da autonomia palestina,
queremos sentar e negociar”.
748
No final da visita o embaixador convidou os parlamentares
evangélicos para uma visita a Israel.
Em janeiro de 2004, 16 deputados federais, representantes da Confederação Israelita
do Brasil e federação correspondente do Estado de São Paulo, acompanhados de dois
jornalistas, permaneceram durante dez dias em Israel. Visitaram universidades, o
Parlamento, a indústria aeronáutica, e autoridades como os ministros da Ciência e
Tecnologia, Comércio e Indústria, Relações Exteriores, e o prefeito de Jerusalém. Foram
acertados intercâmbios educacionais e científicos, para a ida de 25 a 50 técnicos agrícolas e
da pecuária de leite, bem como profissionais e universitários de informática e ciências
747
Entrevista do deputado Francisco Olímpio. Brasília, novembro de 2005.
748
Revista FPE, nov.2004, ano 1, nº 1, Brasília (DF), p. 17.
374
exatas, com objetivo de realizarem estudos em suas respectivas áreas. A revista da FPE
registrou:
A Frente Parlamentar Evangélica assumiu duas grandes missões perante a Nação Israelita.
Uma delas é levar a versão oficial do conflito milenar que impera na Região, divulgando os
fatos reais, a verdadeira versão do conflito. A outra missão é promover a paz entre os povos
judeu e árabe que vivem no Brasil, juntamente com a Frente Parlamentar Brasil/Israel. Os
evangélicos serão o elo de ligação para promover um acordo de paz.
749
A iniciativa dos parlamentares evangélicos torna pública a mentalidade favorável à
causa de Israel, que predomina nas igrejas pentecostais e evangélicas brasileiras. Prevalece
nessas comunidades uma interpretação de textos bíblicos e profecias acentuadamente a
favor de triunfos bélicos e dominação israelense sobre outros povos que habitam o Oriente
Médio, notadamente os palestinos. Diante deste contexto, parece ironia ou, no mínimo,
ingenuidade, os evangélicos se colocarem como “elo de ligação para promover um acordo
de paz” entre os povos mencionados.
5.4 Escândalos e corrupção
Antes de tratar diretamente dos escândalos e episódios de corrupção que tiveram
políticos pentecostais como agentes ativos e passivos, principalmente na legislatura que se
finda (2003-2007) é importante fazer um excurso sobre o berço que molda esses políticos.
De onde vêm? Em que escola da vida são formados? Nos capítulos anteriores desta tese já
há elementos para inferir respostas a estas perguntas, mas convém acrescentar outros
subsídios, para melhor compor este quadro de referência sobre os antecedentes do político
pentecostal, durante o tempo em que ele está sendo forjado nas relações do dia a dia da
igreja. A tentativa de explicação desse ethos pentecostal se compõe de duas partes. Na
primeira, recorre-se ao testemunho de uma pastora quadrangular, sobre o modo como o
pentecostal estabelece seus valores morais, em termos do que, para sua comunidade
religiosa, é o certo e o errado, é pecado ou deixa de ser pecado. E, ainda, o modo como essa
mesma comunidade classifica o que considera pecado. Na segunda parte, recorre-se a
depoimentos de lideranças intermediárias da Assembléia de Deus no Pará, que enfocam,
749
Idem, p. 23.
375
criticamente, contradições da política interna praticada em ministérios e distritos eclesiais
daquele Estado.
5.4.1 O ethos pentecostal
A questão da ética dos pentecostais na política foi preocupação da assessora
parlamentar, Mônica, quando entrevistada, em setembro de 2006. Ela discorreu sobre o
assunto, apontando que, no universo pentecostal e neopentecostal, o que se discute é se
determinados comportamentos devem ser classificados como pecados ou não. E mais: eles
estabelecem uma escala, que define o que é pequeno, médio e grande pecado. Entretanto,
essas classificações não dizem respeito a assuntos de interesse da sociedade. Mesmo no
exercício da vida pública, o que mais incomoda as igrejas não é se um parlamentar trabalha
contra ou a favor do desemprego, da saúde pública, da educação, ou se vota contra ou a
favor de aumento no salário mínimo, e assim sucessivamente. O que mais preocupa essas
igrejas é se um parlamentar bebe cerveja, fuma cigarro ou adultera, por exemplo. Na
entrevista, ao ser perguntada sobre a relação que os parlamentares pentecostais e
neopentecostais fazem entre ética cristã e ética política, a assessora ofereceu as seguintes
explicações:
Eles só conhecem uma palavra, que é pecado. Só que eles, às vezes, entendem o que é
pecadinho e o que é pecadão. Dificilmente, você vai escutar um deputado evangélico
aprovar o casamento entre homossexuais, porque eles acham que é abominação. Então eles
têm alguns conceitos formados do que é pecado, mas eles não têm uma compreensão do que
seja ética política. Eles não têm uma compreensão do que seja certo e errado, dentro de uma
atividade política-partidária. Eles não têm uma compreensão do que seja ser membro de um
partido e ser conivente com os ideais deste partido. Por exemplo, eu conheço bons líderes
evangélicos que estão no PFL. Será que eles sabem de verdade o que é um governo
neoliberal? Será que eles sabem de verdade quais são as filosofias daquele partido? Não,
não têm [noção]. E aí, quando eu falei para você do pecado, há coisas que a igreja banalizou
muito, como, tirar vantagens. E aí os deputados acabam ferindo éticas cristãs e políticas
partidárias, quando eles se envolvem em esquemas de corrupção, em esquemas de
financiamento, quando eles se deixam serem levados pela questão do lobby. Tudo que
puder, de uma forma ou de outra, beneficiar a igreja, eles não entendem como pecado.
Presta atenção no que vou te dizer agora: alguns deputados que estão envolvidos no
esquema das sanguessugas, eles não fizeram isso para terem dinheiro no bolso, eles fizeram
376
isso para conseguirem ambulâncias e viaturas para suas igrejas e as obras sociais de suas
igrejas. Você entende o que estou falando? Eles se envolvem nos esquemas de fraude, de
corrupção, passam por cima da ética, em benefício da igreja, como se os fins justificassem
os meios. E depois é o seguinte: eles não têm a compreensão do que é certo e errado, ali
onde está. Alguns daqueles homens das ambulâncias chegaram a dizer para eles o seguinte:
deputado, eu não vou ter que pagar para alguém 6% lá no seu Estado, para vender uma
ambulância para mim? Ao invés de eu pagar 6% para um vendedor, que vai lucrar, eu dou
para o senhor, para sua obra social. O senhor vai ser o meu vendedor de ambulância”. Sobre
essa ética, eles acham que não estava errado. “Espera aí, se o coitado vai ter que botar um
vendedor lá no Estado para apresentar o produto e eu posso, em vez do vendedor, eu posso
ganhar, não é errado”. Então eles entendem que os 6% que eles vão tirar da ambulância
estaria sendo tirado para um vendedor. Então não é errado. Não é pecado eles tirarem os 6%
de uma ambulância, como uma comissão de venda. E não como parte de um esquema que
está desviando dinheiro público. Então para você entender que eles não têm na verdade uma
compreensão de ética cristã e ética política. O que é pecado, às vezes, acaba sendo uma
arma para enfrentar o Inimigo
750
.
751
Outra visão do uso que a Assembléia de Deus faz da política veio de líderes locais
da AD paraense. Para eles, existe simplesmente um jogo de interesses entre a cúpula e os
parlamentares, de modo que nenhum benefício sobra nem para os membros da Igreja, nem
para a sociedade em geral, como resultado dessa conquista de espaços na máquina pública.
Da entrevista com cinco membros da liderança intermediária do distrito de Icoaraci, em
Belém do Pará, um deles expressou-se da seguinte maneira:
Em Belém, não houve mudança que eu visse nenhuma, até porque [a cúpula] se fecha
politicamente, se fecha num grupo fechado de pastores a portas fechadas. E depois, quando
é eleito [o candidato oficial], o que se faz é a portas fechadas entre eles e não vem benefício
nenhum para os membros, para as igrejas, para os bairros. Se existe um benefício é somente
para a cúpula central da Igreja, a qual ninguém tem acesso. No caso do [deputado]
Raimundo Santos, ele vive ali para dar apoio para TBN [Televisão Boas Novas]. Fora isso,
[o que] Raimundo Santos fez? Até agora eu não vi. Na Assembléia de Deus daqui eu não vi
nenhum trabalho dele, só mesmo show, que eles trazem algum cantor aí de fora. Fora isso
não há nada. Então não traz interferência nenhuma. Ele vive só mesmo manipulado pelo
pastor [Samuel] Câmara, que apóia ele. Se tiver que arrumar alguma coisa no templo
750
Nota do entrevistador: “Inimigo” é uma forma comum do pentecostal fazer referência ao diabo ou chefe dos demônios,
segundo a concepção própria de sua religião.
751
Entrevista de Mônica, assessora parlamentar de um deputado pentecostal, em Brasília, setembro de 2006. “Mônica” é nome
fictício para proteger a fonte.
377
central, a igreja sede é que é beneficiada, o resto não tem nenhum resultado. Só, tanto na
área federal, área municipal e área estadual.
752
A Assembléia de Deus é uma organização na qual os pastores concentram poder,
enquanto os membros obedecem e trabalham. Neste contexto, líderes locais de
congregações de um distrito da Igreja, em Belém do Pará, denunciaram desigualdades
sociais e econômicas que são praticadas, em função dessa estrutura de mando, característica
da denominação e de outros grupos pentecostais, que exclui as bases das decisões sobre a
partilha de recursos arrecadados, através de dízimos e ofertas. As críticas, transcritas a
seguir, foram feitas por um sargento das forças armadas, um líder sindical, um vendedor,
um dirigente de associação filantrópica e um assessor de vereador:
Eu tenho um tio que ele dizia que é assim:”No céu é Cristo, aqui é isto
753
. Hoje os pastores
só querem dinheiro. Campo “gordo”, onde todo pastor quer ir. O pastor quer saber quanto
rende lá. Você vai para uma convenção, eu sempre estou em uma convenção, mas não é
querendo posição de pastor. Quando eu estou lá é porque eu trabalho com vendas. Eu sou
negociante. Aí eles querem saber: “Sicrano, quanto é que está rendendo lá? As ovelhas estão
boas? Se estão boas, vamos permutar, porque o meu [rebanho] lá está bom”. É um
comércio. Em uma convenção, que era para se tratar de melhorias, como vai o campo, é a
situação do comentário. O pastor ali reúne e quem trabalha é os membros. Aí tira dinheiro
dos membros. O membro já dizimou, já ofertou, mas ainda quer uma contrapartida, uma
outra oferta para ajudar. Hoje eu dirijo uma congregação onde nós temos que ficar com uma
renda de 20% do bruto. Como nós vamos fazer melhoria, fazer [trabalho] social, com 20%,
vamos dizer, 500 reais? Ou de 400, ou de 300, por aí? Se uma luz que chega é cem reais?
Então é difícil fazer a obra de Deus onde tem líderes que não vêem esse lado. Só vê o lado,
por exemplo, do templo central deles. Tudo que entra aqui é para beneficiar a quem? O líder
maior. Que o resto, os outros, vão só sofrer. Acabou, senão eu falo demais.
754
também sinais de má aplicação do dinheiro arrecadado. No Barreiro, bairro da
capital paraense, presenciou-se o esforço de membros para completar um piso de lajotas do
santuário. Durante a mesma entrevista interativa, realizada em Icoaraci, um líder de
congregação declarou:
752
Entrevista interativa com líderes da Assembléia de Deus em Belém (PA), distrito de Icoaraci, em janeiro de 2006.
753
Isto, no caso, era dinheiro, pois o entrevistado, enquanto falava, roçava a ponta do dedo polegar com a do indicador.
754
As citações são de cinco líderes da Assembléia de Deus de Belém (PA), distrito de Icoaraci, em entrevista interativa, gravada
em janeiro de 2006. Quatro deles eram auxiliares de congregação e um havia sido afastado do mesmo cargo. Além de auxiliares,
um era diácono e outro coordenador de jovens e de ação social.
378
Você esteve lá presente, você viu o pessoal trabalhando na lajota. Você sabe quantas ofertas
surgiram para lajotar aquela igreja? Já é a terceira vez. Terceira vez e não fizeram a obra. E
agora estão fazendo de novo. Sacrificando o povo para fazer o mesmo trabalho. E o povo
está lá, trabalhando, cooperando e tem essa disponibilidade. Na Assembléia de Deus,
infelizmente tem esse problema. E no interior é pior, porque no interior o dízimo é do pastor
e a oferta é da igreja. Se a igreja render dez mil dez mil é do pastor e o que dá de oferta é da
igreja.
Os critérios de partilha da arrecadação mudam do interior para a capital do Pará,
mas há sempre, em qualquer caso, uma concentração de renda em favor dos pastores e das
sedes municipal e regional. Prossegue a explicação do entrevistado: “Aqui em Icoaraci,
hoje, o pastor, [...] ele tinha um salário, um piso, e mais a comissão. Comissionamento,
como nós falamos na linguagem de vendedor. Tinha dez ou 15 salários[-mínimos], mais
15% da renda”. Este tipo de concentração independe do porte da comunidade. Existe em
grandes e pequenas congregações locais: “Tem lugares, como São José, onde todo o dízimo
é do pastor. Se der 50 mil em um mês, tudo é dele, o dízimo. E eu conheço lugares que são
menores...”, mas a exploração é a mesma, estava implícito no raciocínio dessa fonte.
755
Tal quadro de desigualdades tem gerado insatisfações. A própria motivação desses
líderes para concederem entrevista e as críticas que fizeram são indícios de inconformismo,
no seio da Assembléia de Deus. Essa estrutura de controle dos pastores sobre os membros
prevalece devido à passividade da maioria dos membros, que aceita tais regras, mas
também porque o grupo sabe que um dia alguns poderão alcançar o mesmo posto de
dominação, para usufruir idênticos privilégios. O medo também contribui para que
permaneçam as desigualdades. Os que se rebelam são alijados:
Por exemplo, eu sou do contra [...] Se eu tivesse colocando meu problema aqui em pauta, se
eu tivesse contando para [o pastor-presidente], eu como auxiliar, eu não vou a diácono
nunca. Porque eu não concordo com isso. [...] Eu dou o dízimo, dou oferta e ainda tenho que
contribuir. Aquele irmãozinho que ganha um salário-mínimo, ele tira o dízimo, tira a oferta,
ela vai viver de que, com esse salariozinho? Então, eu sou franco e por eu ser franco, na
maioria das vezes, eu posso pagar o preço de não ir mais adiante. De eu não chegar a um
diácono, de eu não chegar a um presbítero. Por quê? Porque eu não concordo e sou franco.
Se, por exemplo, essa conversa vazar daqui e chegar à administração, ao ministério, eu estou
755
Esta explicação era do “vendedor negociante” do grupo de entrevistados de Icoaraci, já mencionados.
379
queimado. Pronto. Acabou-se. Por quê? Eu não concordo com eles. Aqueles que vão
subindo, que vão a presbítero, vão a pastor, estão concordando com tudo. Está
entendendo.
756
Em que pese tantas dificuldades, essas vozes são sinais de outra concepção de
igreja, menos autoritária e mais comprometida com uma ação social transformadora. As
palavras do diácono e presidente de uma associação beneficente servem de exemplo:
Eu ouvi isso, agora, recente, com um amigo nosso. Ele disse: “Olha, não fica falando isso,
porque se tu falar, tu vai te queimar”. Eu disse: mas eu não tenho sonho de ir a nenhum
lugar. A minha visão é de melhorias, a minha visão é social. A palavra de Deus edifica, mas
a palavra de Deus não enche barriga. Então nós temos que fazer um [serviço] social dentro
da Igreja. Olha, com a associação a gente é bombardeado: “você não tem mais o que fazer;
você tem tempo para estar brincando ainda de associação?” Quer dizer, não quer saber de
trazer oficina, cursos profissionalizantes, não quer fazer um [trabalho] social, somente saber
da palavra. Está correto? Eu acho que não. Jesus ensinou que a gente deve dar um pão. Dar
a palavra, mas dar o pão; o alimento também. E, se não, porque não só dar o pão, mas dar
um curso para ele aprender? É o que acontece.Tem muitos hoje que estão-se omitindo de
falar, negando seu raciocínio para não chegar a se queimar; se não, não vão chegar a pastor
ou a presbítero.
757
O entrevistado de Icoaraci que perdeu o cargo de auxiliar de congregação
apresentou sua interpretação para este fato:
Eu dirigi uma igreja, agora eu estou encostado. Mas antes de me encostarem, eu estava
fazendo um trabalho nessa igreja. A minha preocupação é com o espiritual e também fazia
um trabalho social entre os irmãos para atender aos irmãos mais necessitados. Eu não me
preocupo muito com o material, o construir, o fazer, eu não me preocupo com isso. Já um
outro de uma outra igreja, devido a ele fazer, devido ele construir, devido ele se interessar,
ele vai ali e consegue uma carrada de aterro, consegue meia dúzia de tábua, foi rapidinho
que o pastor distrital promoveu ele a diácono. Devido ao interesse dele de fazer, de ir, de
conseguir isso, aquilo e tal, foi rapidinho. Enquanto aquele que se preocupa com o
espiritual, com o social, ele é encostado de lado. Foi o que aconteceu comigo.
758
756
Palavra de integrante do grupo de entrevistados de Icoaraci, gravada em janeiro de 2006.
757
Ibidem.
758
Ibidem.
38
0
Nesta pesquisa não foi possível encontrar um grupo de membros da Universal que
estivesse disposto a apresentar uma visão crítica da estrutura de poder da sua igreja, como
ocorreu no caso da Assembléia de Deus. Deve haver pessoas com a mesma disposição na
IURD, mas a dificuldade de contatos foi maior do que na Assembléia. O fato é que ambas
as denominações têm um regime de governo autoritário, porém a Universal é centralizada.
As unidades locais desta funcionam como filiais de uma empresa, enquanto que a
Assembléia é descentralizada em congregações locais, reunidas em áreas, que formam um
distrito. Os distritos, por sua vez, formam um campo ou ministério, que tem um pastor-
presidente com seus adjuntos. A cúpula do ministério tem poderes para decidir sobre
salário de pastores, construção de templos, outros investimentos e destinação dos recursos
em geral. Os ministérios se organizam em convenções de âmbito regional, estadual e
nacional. Esta é uma visão bastante simplificada do principal ramo da Assembléia de Deus
do Brasil (CGADB), da forma como está estruturada no Estado do Pará.
5.4.2 Escândalos na 52ª legislatura
A trajetória de parlamentares pentecostais no Congresso Nacional tem sido marcada
por episódios envolvendo parte significativa deles em atos ilícitos, quebra de decoro
parlamentar e corrupção. No Congresso Constituinte, a “bancada evangélica” da época teve
membros que se corromperam, por exemplo, para prolongar o mandato do presidente
Sarney de quatro para cinco anos, em troca de concessões de emissoras de rádio. No
episódio dos “anões do Orçamento”, houve participação ativa de pentecostais. Nessas duas
décadas de presença política nos parlamentos, patrocinada por igrejas desse subcampo
religioso, não houve uma legislatura que escapasse de atos desabonadores desse grupo.
Durante a 52ª legislatura, de 2003 a 2007, os episódios de envolvimento de
pentecostais começaram com acusações contra o bispo deputado Carlos Rodrigues. Em
2004 ele foi acusado de estar envolvido no esquema de arrecadação de recursos dos bingos
do Rio de Janeiro, coordenado pelo presidente da Loteria Estadual, Waldomiro Diniz, cuja
esposa havia sido chefe de gabinete do deputado Rodrigues em Brasília. Nesse mesmo ano,
ele foi citado pelo deputado Roberto Jefferson como um dos beneficiários do esquema do
“mensalão”, que consistia em distribuição de dinheiro, conforme orientação do ministro
381
chefe da Casa Civil, José Dirceu, para alguns deputados votarem em favor de matérias de
interesse do Governo. As quantias eram variáveis e tinham como fontes supridoras
empresas do senhor Marcos Valério Fernandes de Souza, que prestavam serviços nas áreas
de publicidade e propaganda para estatais e órgãos do Governo Federal. As quantias eram
pagas, geralmente, por uma agência do Banco Rural, em Brasília.
Desde fevereiro de 2004, devido às acusações que ligavam o nome de Rodrigues à
LOTERJ e ao bicheiro Carlinhos Cachoeira, que intermediava relações de Waldomiro
Diniz com as casas de bingo, o deputado havia perdido a condição de bispo e de
coordenador da bancada da IURD. Em entrevista de junho de 2004 ele estava na
expectativa de ser inocentado, como se pode verificar em suas palavras:
Eu continuo como membro da Igreja. Não sei o que vai ser do meu futuro político. A Igreja
pediu que até que a minha inocência seja provada eu fique parado. Faltam 54 dias para
terminar a CPI. Depois vai ter mais quinze dias para votar. Eu tenho fé em Deus, certeza,
que vou ser inocentado. Eu vou voltar a fazer política. Enquanto isso, eu estou parado. Eu
não estou trabalhando na coordenação de vereador. Eu acho que... a gente... Nós que somos
disciplinados, não é, a gente obedece e... como Elias foi para o deserto, ficou lá esperando,
eu também estou esperando... Por, não sei, e não vou me envolver nessa eleição; coisa que
eu há vinte anos fazia. Toda eleição eu me envolvia, ajudava e tal, mas a Igreja tem outros;
outros líderes, outras pessoas, que cuidarão da eleição de nossos vereadores e deputados. E
também a Igreja ela está estabelecida de uma forma que ela transcende aos políticos. A
Igreja Universal hoje, ela... ela... não só a Igreja Universal, mas o espírito do País, não há
uma perseguição violenta contra os evangélicos. Acho que nós já passamos aquela fase
crítica.
759
Um outro episódio já o havia atingido, no ano anterior. No dia 24 de janeiro de 2003
foi assassinado o deputado pastor Valdeci Paiva que havia terminado o mandato de
deputado federal e fora eleito deputado estadual pelo Rio de Janeiro. Uma filha de Carlos
Rodrigues era nora de Valdeci. O bispo foi acusado de ser o mandante do assassinato, mas
as investigações o inocentaram e, ato contínuo, ele processou seus acusadores, os quais
foram condenados. O suposto envolvimento de Rodrigues no “caixa 2” da LOTERJ,
alimentado pelas casas de bingo, também não ficou provado. De qualquer maneira, estes
dois episódios tiveram como conseqüência a perda do posto de bispo e o esvaziamento do
759
Entrevista do deputado Carlos Rodrigues. Brasília, 17 de junho de 2004.
382
poder que ele detinha sobre a bancada, na qualidade de coordenador. Para se ter uma idéia
da importância do bispo Rodrigues na IURD e do que representaram estas perdas, são
transcritos, a seguir, trechos de depoimento à Comissão de Ética, referentes a sua defesa
contra acusações de que ele participava do “mensalão”, feitas pelo deputado Roberto
Jefferson:
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Por fim, Deputado, o senhor usou uma expressão
peculiar em relação à transferência, à extração, à troca de partidos por parte de Deputados.
O senhor sempre falou assim: “Tirei três do PTB, tirei”... [...]
O SR. DEPUTADO CARLOS RODRIGUES - Companheiro, a Bíblia diz que a ovelha
ouve a voz do seu pastor. Esses deputados foram eleitos por mim. Eu fazia a eleição deles,
orientava, caminhava com eles, orientava em tudo, aonde iam, o partido que deveriam
escolher, como deveriam fazer a campanha. E eu chamava e eles vinham, porque faziam
parte de um grupo político. Os interesses do grupo político estavam acima dos nossos
interesses pessoais. E nós queríamos construir uma oposição. Eu entendi que o Governo
Fernando Henrique era um governo que não tinha visão para o social e eu dizia: “Olha, nós
temos que mudar o nosso País porque o nosso povo é um povo que passa fome. O povo
evangélico que freqüenta a igreja é o povo que ganha menos, que passa fome, passa mais
apertado e o Governo Fernando Henrique é um governo que não tem sensibilidade social.
Vamos fazer oposição a esse governo”. E chamei vários. Vieram muitos para o partido. E eu
acho que a minha decisão foi certa. E nós entendíamos que o presidente Lula seria um
presidente que teria uma visão social e daria chance àqueles que não têm chance neste País.
Por isso nós fomos para a oposição. E V.Exa. pode ver, pela votação do PL no governo
passado, que nós éramos 100% ao lado do PT. E não tínhamos nada, não tinha indicação,
não tinha cargo nenhum. Fizemos um mandato sem nenhuma indicação, mas fizemos um
mandato muito feliz. Graças a Deus, conseguimos eleger um homem que tem sensibilidade
social.
[...]
O SR. DEPUTADO MORONI TORGAN [...] A relação com o Delúbio como é que
acontecia?
O SR. DEPUTADO CARLOS RODRIGUES - Minha relação com o Delúbio, eu o conheci
quando acabou minha eleição, e o Lula foi para o segundo turno, o Deputado Walter
Pinheiro me ligou e disse: “Eu gostaria que você viesse para São Paulo e coordenasse
comigo, com o Magno Malta, com o Deputado Gilmar Machado um comitê evangélico pró-
Lula.” E eu fui para São Paulo, fiquei lá no comitê, às minhas expensas, hospedado no hotel,
pagando almoço com o meu dinheiro, e viajei o Brasil com o meu dinheiro, fazendo eventos
evangélicos para o Lula.
383
O SR. DEPUTADO MORONI TORGAN - Não teve nenhum fundinho de campanha?
O SR. DEPUTADO CARLOS RODRIGUES - Não. Aí conheci o Sr. Delúbio; conheci o Sr.
Delúbio lá e o Sr. Sílvio Pereira e outros companheiros lá no... porque a gente se reunia
muito lá na sede do PT para combinar onde é que... Por exemplo, eu fui, apoiei Ana Carepa.
Não existe uma pessoa assim em Belém? Ela foi candidata, tivemos um evento, fiz um
evento com ela e em outras cidades, apoiando o Lula, apoiando o PT pelo segmento
evangélico. Eu ia nos líderes das igrejas e dizia: “Olha, queremos fazer”. E aí muita gente
com preconceito ainda contra o Presidente Lula, e eu, o Gilmar, o Walter Pinheiro
desmontávamos esse preconceito, dizendo: não, não há preconceito no meio do PT contra os
evangélicos. Porque os evangélicos, que eram apolíticos, aprenderam que o diabo usava
barba e tinha quatro dedos, infelizmente. E nós, que começamos a conhecer o PT e o Lula,
fomos desmontando essa imagem no Brasil de que o PT ia ascender ao poder e ia fechar as
igrejas evangélicas. Esse foi o nosso trabalho.
O SR. DEPUTADO MORONI TORGAN - Só para encerrar, Sr. Presidente, eu gostaria de
saber: nessas suas andanças e logo depois nós tivemos eleições municipais, nunca houve aí
uma possibilidade de uma ajuda financeira para o PL, para os candidatos, o que seria
natural?
O SR. DEPUTADO CARLOS RODRIGUES - Olha, eu não tratava desse assunto, porque
eu estava circunspecto ao caso evangélico e ao Rio de Janeiro, meu Estado. Eu não tinha
essas conversas.
760
Neste depoimento, Rodrigues manteve a linha de negar que houvesse “mensalão”,
fazendo coro com autoridades do Governo, inclusive o presidente Lula. De forma lógica,
ele também negou que tivesse recebido qualquer quantia do senhor Marcos Valério, a
quem, acrescentava, não conhecia, “nem sabia que era careca”. Posteriormente, ficou
provado que o deputado Rodrigues havia determinado ao motorista Célio Marques
Siqueira, do gabinete do deputado Wanderval Santos, que se dirigisse a uma agência do
Banco Rural em Brasília, para receber “encomenda lacrada”. Esta encomenda tratava-se de
150 mil reais remetidos de Belo Horizonte pela secretária Simone Vasconcelos, de uma das
empresas de Marcos Valério, a SMP&B, e serviu de prova para o indiciamento do ex-bispo
Wanderval no mesmo escândalo.
Carlos Rodrigues foi um dos 18 deputados citados no relatório preliminar das CPIs
dos Correios e do Mensalão, de setembro de 2005. Neste documento foi recomendada
760
Depoimento do deputado Carlos Rodrigues ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, no dia 6 de julho de 2005,
na qualidade de testemunha.
384
abertura de processo por quebra de decoro parlamentar contra todos esses deputados. Para
escapar dos efeitos de uma possível condenação, como perda de mandato e inelegibilidade
pelos próximos oito anos, Rodrigues antecipou-se à abertura do processo na Comissão de
Ética e renunciou ao mandato, vislumbrando a possibilidade de se candidatar novamente
em 2006, o que não ocorreu.
761
O ocaso do deputado Wanderval, por seu turno, teve início com um problema
familiar que o levou a perder a condição de bispo. Tanto ele como o deputado Rodrigues,
passaram a freqüentar a Igreja Universal como membros. Ambos descrevem a maneira
como estavam vivendo esta nova experiência, em depoimentos ao Conselho de Ética da
Câmara:
O SR. DEPUTADO CARLOS RODRIGUES - Nobre Deputado Jairo Carneiro, aos 18 anos
de idade, eu abracei a fé evangélica. Sou filho de portugueses. Entrei para o seminário, fiz o
seminário evangélico da Assembléia de Deus no Rio de Janeiro. Casei-me aos 21 anos de
idade e fundei, junto com o Bispo Edir Macedo Bezerra, a Igreja Universal do Reino de
Deus. Ali trabalhei por 29 anos da minha vida. A instituição decidiu que eu deveria entrar
para a política de mandato, porque eu já fazia política. Durante 20 anos, coordenei a área
política da Igreja, 14 dos quais sem mandato. Fazia campanha. Acabava a campanha, eu
voltava para a área sacerdotal, religiosa. Abri neste Brasil mais de mil igrejas. Fundei a
Igreja Universal no Estado de São Paulo, em Pernambuco, no Espírito Santo, no Rio Grande
do Sul, no Rio de Janeiro, inúmeras. Viajei para vários países: Guiné Bissau, Moçambique,
Angola, África do Sul, Portugal, Espanha. Fundei a Igreja na Espanha e ajudei a fundar a
Igreja na América Latina quase toda. Um dia, decidiram que eu deveria entrar na política, e
foi o que fiz. [...]
Eu fui o primeiro pintor, o primeiro pedreiro, o primeiro faxineiro da Igreja, o primeiro
pastor, o primeiro obreiro da Igreja, quando a Igreja nada tinha. E trabalhei muito tempo
sem salário, muitas e muitas vezes sem almoçar e sem jantar. Passei fome e muitas vezes
dormia no altar da Igreja, porque a Igreja nada tinha, nada tinha. (Choro. Pausa.) Eu...
Sempre que eu falo na Igreja, eu me emociono, porque foi a minha vida que eu passei lá. E
eles não foram corretos comigo, pois não me deram o direito da dúvida. Qualquer bandido
merece o direito da dúvida, mas não eu. A maioria dos bispos que estão lá hoje foram
batizados por mim, que preguei o Evangelho a muitos deles, busquei muitos deles na favela,
na criminalidade, tirei muitos deles do tráfico, das drogas, pregando o Evangelho para eles.
761
Informações disponíveis em http://www1.folha.uol.com.br/folha/Brasil/ult96u72183.shtml.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/Brasil/ult96u78224.shtml. acessados em 6 de janeiro de 2007.
385
E eles não foram corretos comigo, não ficaram solidários, nem sequer me deram o direito da
dúvida. E eu me magoei. Eu fiquei magoado e disse a eles: “Para a Igreja eu não volto mais,
não vou exercer nunca mais o ministério”. (Choro.) Eu sou um homem cheio de defeitos, de
erros, mas eu nunca cometi o erro de deixar um amigo meu abandonado, mesmo que ele
estivesse errado, porque um pastor tem que ter compaixão das pessoas. Por isso, afastei-me
e fui afastado do sacerdócio. E eu não tenho culpa desse assunto da LOTERJ. A CPI provou
isso. [...] O Bispo Macedo foi preso. No dia em que ele foi preso, eu era Bispo na Bahia.
Peguei o avião e fui para lá. Fiquei dormindo na cadeia os 15 dias, até ele sair de lá. Fiquei
dormindo na porta da delegacia, num banco da delegacia. Eu disse: “Macedo, só vou sair
daqui quando você sair. Eu vou sair junto com você”. De todos eles, não houve um que
tivesse algum problema pessoal que eu não tenha comparecido. Eu disse: “Olha, estou do
teu lado”. E quando eu precisei, quando eu errei, eles não foram solidários comigo. Então,
eu fiquei magoado, porque isso não é companheirismo, não. [...]
O SR. DEPUTADO JAIRO CARNEIRO - V.Exa. não é mais vinculado à Igreja?
O SR. DEPUTADO CARLOS RODRIGUES - Eu sou membro da Igreja, vou aos domingos
ao culto, sento lá (choro) no último banco...
762
...................................................................................................................................................
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - O senhor continua membro da Igreja Universal
do Reino de Deus?
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Continuo sim, senhor, sentando no último
banco, apenas cuidando da minha vida espiritual.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Mas o Deputado Carlos Rodrigues também
declarou isso. Aliás, usou a mesma expressão. Ele continua membro da Igreja, apesar da
injustiça que sofreu, perdendo a condição inclusive de bispo. Vai lá, senta no último banco,
paga o dízimo. O senhor está numa condição análoga à dele? Houve algum problema dentro
da Igreja?
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Houve sim, senhor. Um problema familiar
que eu tive, um problema pessoal, um problema íntimo. A Igreja exigiu que eu tomasse uma
decisão e eu acabei tomando uma decisão e também... Quer dizer, afastei-me da Igreja, mas
não pelos problemas iguais aos dele, mas uma outra coisa totalmente diferente, que não me
cabe aqui... É um problema pessoal, um problema familiar.
763
Na Comissão de Ética, a defesa do deputado Wanderval conseguiu demonstrar que
ele não tinha envolvimento com o esquema operado pelo senhor Marcos Valério. Nem
sequer sabia que seu motorista havia estado a serviço do deputado Rodrigues, porque este
762
Depoimento do deputado Carlos Rodrigues ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, no dia 6 de julho de 2005.
763
Depoimento do deputado Wanderval Santos ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, no dia 17 de novembro
de 2005.
386
requisitava, diretamente, os serviços dos empregados dos gabinetes de todos os deputados
da IURD sem necessidade de dar conhecimento a nenhum deles.
Aqui é importante discorrer sobre o modo de funcionamento da bancada da IURD:
Até a queda do deputado Rodrigues este tinha poderes absolutos sobre os políticos da Igreja
Universal. Era ele quem escolhia os candidatos em todo o Brasil, ou dava a palavra final
sobre essa escolha, orientava as campanhas e determinava os passos de cada um, em
assuntos que considerasse relevantes para a Igreja. Rodrigues também definia os partidos
em que deveriam filiar-se, bem como trocas de partidos, sempre que julgasse conveniente,
de acordo com estratégias que traçava dentro da Câmara e em função de relações com o
Governo, como se pode constatar em trechos de depoimento escolhido dentre diversos que
destacam esse controle absoluto de Rodrigues sobre a bancada da Universal:
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Depois já o segundo mandato o senhor disputou
pelo PL?
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Pelo PL. Fui eleito pelo PL.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Mas o senhor afirmou aqui que foi eleito pela
Igreja Universal do Reino de Deus. E aí creio que cabe também uma averiguação melhor,
porque o senhor afirmou que a Igreja tem uma disciplina própria, uma hierarquia, o senhor
afirmou mesmo que foi eleito pela Igreja Universal do Reino de Deus e não pelo PL, pela
orientação que a Igreja dava e provavelmente chegou a, se não me engano, 140 mil eleitores
nessa última?
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Não, nessa última foram 178 mil votos.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Cento e setenta e oito mil votos.
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - A primeira 115 e pouco.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Correto. E o senhor falou que essa disciplina
própria e essa hierarquia foram transportadas para o Parlamento. Até na sua defesa, o Dr.
Marcelo ressalta que o Deputado, sendo membro da Igreja Universal do Reino de Deus, em
razão da hierarquia dessa entidade religiosa, ele se submetia ao Deputado Carlos Rodrigues,
bispo, naquela época, da Igreja. E por conta dessa submissão este tinha plena autoridade
sobre ele, sobre V.Exa. e seus funcionários. Quer dizer, é um mandato submisso, é uma
espécie de mandato secundário. O senhor sentiu assim? Isso me parece, do ponto de vista
das relações políticas republicanas, extremamente grave. Essa submissão, esse poder que
um outro mandato, eleito nas mesmíssimas condições que V.Exa., num Estado laico, ter
esse poder determinante, inclusive sobre todos os seus funcionários. O senhor podia
explicitar melhor essa hierarquização? Isso que eu poderia chamar uma espécie de
387
terceirização de mandato por causa de uma hierarquia que é estranha à própria instituição
política, às regras republicanas vigentes?
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS Pois é. Essa hierarquia é como eu
expliquei, ela já vinha dentro da Igreja, até porque a gente não teria ou não tinha nenhuma
experiência política, e o ex-Deputado Carlos Rodrigues era uma pessoa que coordenava
muito bem a política. Mas essa hierarquia, não somente minha, mas de todos aqueles que
faziam parte da bancada da Igreja, era totalmente subordinada a ele. Tanto que no primeiro
mandato, nos nossos gabinetes, algumas pessoas foram nomeadas. Já no segundo mandato
não, eu já nomeei outras pessoas, até porque eu entendi que eu teria que ter pessoas
capacitadas. Porque não tendo uma experiência política e se o senhor não tem uma
assessoria que possa auxiliá-lo, ajudá-lo na confecção de projetos de leis, na orientação das
Comissões, fica difícil. E eu me destaquei, a partir do momento em que eu resolvi a colocar
essa qualidade técnica dentro do meu gabinete. Mas, no primeiro mandato, realmente isso
aconteceu. E depois que aconteceu, que ele saiu da coordenação do processo político, da
coordenação interna da Igreja, aí a gente ficou mais à vontade para trabalhar.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Então a sua decisão de sair do PTB para o PL foi
por obediência a uma determinação hierárquica.
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Hierárquica.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Uma ordem.
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Uma ordem.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - E jamais houve conflito entre essa estrutura da
Igreja Universal do Reino de Deus? É bom destacar isso: o senhor não se refere à bancada
evangélica como um todo.
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Não, senhor.
O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Era uma regra própria dos parlamentares ligados
à Igreja Universal do Reino de Deus. Isso não gerava conflito com as estruturas partidárias,
que têm bancadas, têm líderes, têm determinações próprias?
O SR. DEPUTADO WANDERVAL SANTOS - Não, não gerou porque o seguinte: quando
a gente veio para o PL, a gente veio para fazer oposição. E, para fazer oposição, era melhor
ficar dentro do PL do que dentro do PTB. Então, ele entendeu que eu tinha de sair do PTB e
deu ordem, e eu saí do PTB.
764
Diante deste quadro, pode-se dizer que os deputados da IURD não tinham
autonomia. Os recursos de seus gabinetes estavam a serviço do coordenador, Carlos
Rodrigues, sempre que ele tivesse necessidade de requisitá-los. Isto abrangia o próprio
mandato do parlamentar. Deputados de fora da Universal também confirmaram esse modo
764
Ibidem.
388
de funcionamento do grupo, como Sandro Mabel e Carlos Sampaio. Leia-se depoimento do
primeiro:
O SR. DEPUTADO SANDRO MABEL [...]Só queria dizer ao Deputado Chico Alencar,
aos nobres pares, que a Igreja Universal [...] tem uma característica que é a seguinte, mais
ou menos: as pessoas que vão para a Igreja Universal já tentaram tudo na vida. Quando ela
vai para a Igreja Universal, a disciplina é o fator principal naquela Igreja. Eu fiquei
impressionado ao ver a disciplina. Quem conhece a Igreja Universal, é a disciplina que
marca, quer dizer, é a fé e a disciplina, como bem disse o Deputado Carlos Sampaio. Há
coisas que nós não conseguimos compreender, porque só vivendo a Igreja Universal é que
se vai conhecer. [...] Quando eu fui eleito [...] pude então conviver com essa bancada que
existia e eu vi a disciplina imposta pelo Bispo Rodrigues. Mas não era disciplina pejorativa,
não, porque não tira a liberdade do parlamentar, a não ser nas questões que eles fecham:
“Isso vai votar assim!” Não tem conversa, votam daquele jeito. Agora, o Deputado
Wanderval, para se ter uma idéia, tem 53 projetos apresentados; ele tem três que já estão no
Senado, sobre diversos temas. Três já estão em votação no Senado, um deles de
parcelamento de solo urbano que unifica tudo. Inclusive está dando muita discussão esse
projeto, é muito interessante, que regulariza as favelas que foram construídas, os
parcelamentos, no âmbito municipal, estadual. É um projeto excelente. Ele tem projetos em
todas as áreas. Então, não que o deputado perca a identidade dele. [...]
O Bispo Rodrigues era o todo-poderoso da Igreja, mas não era o todo-poderoso porque ele
era o todo-poderoso, porque ele tinha metralhadora, não, mas é porque ele construiu aquilo
inteirinho, ele construiu toda aquela posição que ele criou na Igreja. E quando a gente
conversa com essas pessoas, tipo o Wanderval, o Bispo Rodrigues, aprende muita coisa,
assim, algumas filosofias, umas coisas interessantes, principalmente na visão que o
Wanderval tem e nos projetos de lei. Quando você conhece, você vai passando a admirar
ainda mais. Lá, na nossa bancada, nós sempre, nas votações, não chamávamos... Quando
tinha uma votação mais complicada, nós não precisávamos chamar todos os Deputados,
porque eles se reuniam depois. Nós chamávamos o líder deles, que era o Carlos Rodrigues.
[...] Então, ele trocava idéia com o pessoal, dentro do que tinha sido trocado, a não ser
quando era reunião de bancada, porque, logicamente, todos participam. Mas tem essa visão.
Eu achei interessante o Deputado Carlos Sampaio, na observação que fez, também, dizer
que é difícil a gente entender, de fora, o porquê disso. Mas é o caso dos sindicalistas, que se
reúnem em três, em quatro, e defendem aquela posição, de qualquer jeito; é o caso de
partidos que defendem uma posição e não querem saber se está certo ou está errado; é o
caso da bancada ruralista, que tem, entre os seus membros, alguns que defendem a
agricultura. Ali, não tem conversa para eles. Para eles, tudo o que é mais importante é a
389
agricultura. Então, é o que cria este parlamento. Seria interessante a diversidade de pessoas,
a diversidade, muitas vezes, de segmentos, que são representados dentro do parlamento.
Agora, na época, quando surgiu o fato, pela imprensa, o Deputado Wanderval chegou
angustiado, nesse assunto, procurando o Rodrigues, falando: Não é possível ter feito isso
comigo”. Estava indignado, chegou na Liderança. Nós fomos conversar juntos. O Rodrigues
explicou para ele. Eu falei para ele, talvez até para o Líder e para o Costa: Wanderval, eu
acho que você devia demitir esse motorista. Sabe o que ele falou para mim? Ele falou uma
coisa importante: Sandro, este motorista ganha um salariozinho que sustenta a família dele.
Ele não tem nada a ver com a história. Você conhece como funciona o Rodrigues: ele
manda aqui, manda ali, manda ali. Esse cara já foi no supermercado, ele leva filho na
faculdade, ou faz isso, faz aquilo. Quer dizer, é uma pessoa que trabalha para o Rodrigues,
como outros motoristas de outros deputados”. Eu falei: “É, mas, politicamente...”. Ele falou:
“Sandro, eu vou ser injusto”. Eu achei interessante a posição dele, na época. “Eu vou ser
injusto com esse homem, que defende o pão dele, ali. Ele não tem nada a ver. Mandaram ele
a um lugar: vai, traz, faz...”. Então, falou: “Eu vou analisar essa história”. Quando ele saiu
da sala, eu falei: “Wanderval, você está certo, nem analisa essa história. Você está certo.
Nós estamos querendo matar quem não tem nada a ver com a história”. Quer dizer, o cara
que foi lá cumprir uma missão, que não tem nada a ver com essa história, vai ser o primeiro
que nós vamos cortar a cabeça. Porque mandar embora o motorista é a mesma coisa que
caçar o nosso mandato. Ele estaria caçando o motorista dele, que seria demitido porque
ajudou ou qualquer coisa nesse sentido. Então, eu só queria dar este depoimento a esta
Comissão, porque eu conheço o Wanderval há muito tempo. Eu acredito nesse moço. Se o
senhor ler, deputado, os projetos dele, o senhor vai ver com que liberdade e seriedade ele
trabalha, dentro das restrições que existem de disciplina na Igreja. Essa, existe. E se ele foi
eleito, ele saiu... Só concluindo, Presidente. Se ele foi eleito... Ele saiu sem ser conhecido
numa cidade e vira eleito. Eu vejo lá na minha cidade que há dois bispos novos que
chegaram lá, há pouco tempo. Um vai ser deputado estadual e o outro federal. E vão os dois
eleitos. Então, essa é uma posição. E, depois, então, a Igreja os submete a fazer, a ter uma
liderança que comanda algumas ações. Mas a liberdade de trabalhar ele tem, e trabalhou
bastante. Eram só essas observações a fazer, Sr. Presidente.
765
No final deste episódio, devido a esse regime de “obediência devida” à autoridade
da Igreja, a Comissão de Ética poupou o deputado Wanderval Santos. Menos sorte teve o
ex-deputado Carlos Rodrigues, pois já na condição de cidadão comum, sem imunidade
parlamentar, foi preso pela Polícia Federal, em maio de 2006, como suspeito de participar
765
Palavra do deputado Sandro Mabel, por ocasião do depoimento de Wanderval Santos ao Conselho de Ética e Decoro
Parlamentar da Câmara, no dia 17 de novembro de 2005.
390
de um grande esquema de apropriação de verbas do erário público, conforme se explicará a
seguir.
A Câmara ainda estava sob o impacto do esquema do “mensalão” quando foram
instaurados inquéritos na Justiça Federal, sobre atos ilícitos de malversação de recursos do
Orçamento da União, provenientes de emendas dos parlamentares, para compra de
equipamentos e veículos destinados a prefeituras. A Polícia Federal batizou a investigação
que desenvolvia sobre esse mesmo objeto de “Operação Sanguessuga”. Com base em
denúncia do Ministério Público à Justiça Federal de Mato Grosso, foi instalada uma
comissão parlamentar mista de inquérito, com a incumbência de apurar a participação de
parlamentares nas irregularidades constatadas em compras superfaturadas de ambulâncias e
equipamentos hospitalares para prefeituras e organizações sociais. Era a CPMI “das
ambulâncias” ou “dos sanguessugas”, como ficou conhecida.
Nos meses que separaram o “mensalão” do escândalo dos “sanguessugas”,
conseguiu-se realizar entrevistas para esta tese, em Brasília, quando foram ouvidos alguns
deputados pentecostais e neopentecostais. Como o “mensalão” havia atingido apenas os ex-
bispos e deputados Rodrigues e Wanderval, o discurso dos pentecostais, principalmente os
da Assembléia de Deus, era de que os evangélicos se pautavam pela honestidade e
testemunho exemplar. E mais: eles serviam de exemplo para seus pares de outras religiões e
do grupo sem-religião, dentro do Congresso. Eis alguns trechos desses depoimentos:
Do deputado Adelor Vieira:
Com relação aos escândalos, eu fico com o que a Bíblia diz: É necessário que venha o
escândalo, porém, ai daquele pelo qual vier o escândalo. Então nós temos uma
responsabilidade muito grande aqui. Talvez, muito mais de viver o evangelho, do que de
fazer alguma coisa aqui. Acho que o povo cobra mais porque quer saber se nós somos
realmente cristãos verdadeiros aqui. É muito mais que um relatório de cem páginas, quer
saber qual o meu comportamento aqui. Como é que é o deputado Adelor lá? Como é que é
o testemunho dele lá?” Então se você disser, “não sei, tenho a minha dúvida”, ou então se
disser: “o deputado Adelor é assim”, ou “o fulano você pode confiar, eu assino embaixo”,
então, eu acho que essa influência nossa, dos líderes evangélicos no parlamento é
fundamental. Graças a Deus, aqui nós temos, Deus tem-nos dado graça, onde nós temos
procurado nos pautar com dignidade. Há um preço a pagar, o preço é alto, preço de
391
renúncia, de resignação, para você poder dizer não a determinadas coisas, você estar
blindado, entendeu? E prosseguir. Não é como dizer: euo fumo, porque eu sou crente”,
eu não fumo porque eu não preciso fumar, Jesus me libertou disso, eu estou satisfeito com
o que tenho. Então você pode dizer: Não, eu estou satisfeito com o que eu estou fazendo,
a minha condição é assim, respeito sua posição e tal, respeito que você fume e tal. Fumar faz
mal a saúde, você deve saber disso aqui, mas eu não vou fumar. E se possível, quer fumar,
fuma do outro lado, aqui não. Esse é o comportamento que nós precisamos ter e a
influência que nós passamos lá. Agora, em relação ao escândalo que está aí, nós não somos
juízes. Eu tenho defendido isso na condição de presidente da Frente [Evangélica]. Quem sou
eu para julgar? É o que a Bíblia diz: se alguém está em pé, cuide, não caia. Por que eu
vou, agora, eu vou me precipitar para fazer aquilo? Aí eu fico naquela que Jesus disse antes
aos acusadores da Maria Madalena, eu não vou condenar se eles vão condenar. Então, deixa
fazer as coisas, deixa passar esse processo, vamos ver como é que fica. Cada um vai dando a
sua explicação, no devido tempo e tal. Alguns dizem: Não, vocês têm que fazer uma nota,
vocês têm que declarar”. Tem pedidos até aqui. Eu não sou guardador do meu irmão! Nós
procuramos até falar, temos o culto aqui, devocional, que o senhor já participou, temos
outras manifestações, mas acho que essa situação perante o escândalo, para nós, é uma
situação de cautela, de alerta, para nós, de cuidado e até de exemplo, de ensino para nós.
Para nós tirarmos lições desse procedimento.
766
O deputado Pedro Ribeiro procurou, apenas, minimizar a questão:
Quanto a deputados participarem do escândalo, eu acho que a sua pergunta fortaleceu. Foi
forte demais para a realidade. Porque só quem apareceu, de evangélico, nessa questão foi o
bispo Rodrigues, que era de antes, que era problema anterior e não desses problemas agora,
que era possível, está provado, que ele pediu propina para aquele bicheiro e tal, tal, tal. Ele
não era mais bispo da Universal na época, ele já havia caído e colocaram também o
Wanderval, que é bispo da Universal também. Era. Que disse que era para o outro. Se
defendeu muito bem e acho que até nem vai ser cassado pela defesa dele. Apareceu o irmão
Neuton Lima, de São Paulo, mas que foi jogado covardemente, porque aventaram,
presumiram, por conta de o deputado Roberto Jefferson ter assumido que recebeu quatro
milhões e nunca ter dito para onde foram os quatro milhões, eles aventaram que ele teria
dado para candidatos a prefeito. Facilmente foi provado que não recebeu coisa nenhuma.
Então, graças a Deus, isso foi alvo das minhas constantes orações e choro na presença de
Deus, como coordenador da bancada da Assembléia de Deus e vice da Frente [Parlamentar],
para não sermos envolvidos em escândalos. Nós temos passado incólumes, praticamente,
766
Entrevista do deputado Adelor Vieira, em Brasília, 22 de novembro de 2005.
392
porque os casos dos meninos já eram velhos. Então nós passamos incólumes com isso aí.
Não apareceu ninguém com mensalão nem coisa nenhuma. Nenhum evangélico.
767
O deputado Marcos Abramo, da Igreja Universal, usou um argumento de que o bom
procedimento de uns, no presente, va i cobrir erros que tenham sido praticados por outros,
no passado:
Veja bem. A partir do momento em que você erra, você está sujeito a penalidades. Eles,
como lideranças políticas que erraram, eles tiveram suas penalidades. Então, o próprio povo
da Igreja tem essa consciência. E a gente ensina isso para as pessoas. Olha, você está bem,
é claro que vai colher o bem. Fez o mal, é certo que irá colher o mal. Ele tem o princípio
dele, ainda, que é ajudar as pessoas, beneficiar as pessoas, mas a Igreja tem princípios. Se
você fere esses princípios, claramente você estará sendo colocado fora. (Mas o senhor não
sentiu que a queda do bispo Rodrigues abalou dentro da Igreja ou não?). Olha, eu penso o
seguinte: O melhor cobre o pior. Hoje nós temos vários representantes. Hoje o senhor ouve
falar muito de Collor? Mas o senhor sabe que o Collor existiu. Nós temos o Fernando
Henrique, mas o senhor ouve falar muito de Fernando Henrique? Hoje o senhor ouve falar
do Lula. O importante é o hoje. O hoje é o importante, o hoje mostra a diferença. Eu olho
para o passado como uma experiência. Eu olho para o passado como uma direção que aquilo
mostrou o que acontece, o que se passa, que o ser humano é falho. Nós somos sujeitos a
erros, mas nós somos sujeitos também a ter a coisa mais importante, que é o perdão. Perdão
então ele teve. Agora, se você quer seguir o seu caminho, quem vai poder te impedir?
768
O deputado Francisco Olímpio foi ufanista. Entende que a Frente Evangélica tem
sido uma grande bênção para as Casas do Congresso:
Olha, eu acho que hoje nós estamos mais fortalecidos do que nunca. Porque hoje já se diz
em uma sessão solene da Frente Evangélica: Vocês estão abençoando esta Casa”. Porque,
graças a Deus, não tem um evangélico envolvido nessas coisas. Apareceu o nome de um ou
dois e foi coisas que... Apareceu um que ia com uma mala de dinheiro e que a mala de
dinheiro era da Igreja. Não era de dinheiro público tomado. Era uma oferta que ele fez.
Botaram na mala dele. Podia ter dez, mas a mala era da Igreja. Está entendendo? Não há
envolvimento. Aquele outro caso daquele presbítero de São Paulo que foi inocentado, não
havia coisa. Então, quando saiu esse escândalo, eu, como crente, recebi o choque; o choque
natural. Mas hoje eu agradeço até a Deus, por ter havido essas coisas, porque veio à tona
uma miséria que existe aí, um mar de lama, e os nossos irmãos estão, graças a Deus, isentos
767
Entrevista do deputado Pedro Ribeiro, em Brasília, 24 de novembro de 2005.
768
Entrevista do deputado Marcos Abramo, Brasília, novembro de 2005.
393
e fortalecidos nas suas bases. E as igrejas estão reconhecendo que elegeram homens de
Deus. Agora, se alguém cai o senhor está dizendo que caiu, está certo? se alguém cai, a
queda [gera] conseqüências. Mas, 90%, 99%, estão, graças a Deus, isentos disso daí, sem
fazer os conchavos. Entendeu?
769
Para os deputados Gilberto Nascimento e Zelinda Novaes, os escândalos haviam
sido mínimos. Argumentavam que essas coisas sempre iriam existir e que restava a todos
ter mais cuidado para aprender com os erros:
Deputado Gilberto Veja: o envolvimento, ainda, graças a Deus, ele tem sido mínimo. Não
deveria ter tido nenhum, correto? Mas o envolvimento hoje é mínimo, o envolvimento do
nome de alguns evangélicos aí em recentes escândalos. Por outro lado, o político evangélico
no parlamento ele, logicamente, tem que ser diferenciado na sua maneira de agir, na sua
maneira de ser, evitando envolvimento com aquilo que possa ferir os princípios da igreja. É
bem nessa direção.
Deputada Zelinda Não, não abalou porque a gente acompanhando a evolução dos tempos,
inclusive, até na Bíblia, você vê que sempre houve escândalos. Davi foi um homem segundo
o coração de Deus, Davi tinha uma fé como ninguém, no entanto Davi se envolveu em
escândalos. A família de Davi foi uma família que foi fragmentada. [...] Tudo teve na
família dele: crime, estupro, mas as coisas continuaram a andar. Em qualquer lugar, eu
passo a dizer que a natureza humana é corruptível. Agora, a gente influencia sim. O pessoal
vê a postura, a seriedade. Agora, tivemos essa crise. Nunca vamos viver sem crise, de
repente podemos ter até maiores. A gente tem orado, tem pedido para que isso não aconteça,
mas essa daí aconteceu. Sei lá, de repente isso tenha vindo para abrir mais os olhos da gente,
para vigiar mais, para ter mais cuidado.
770
Não obstante, percebia-se que, quando se insistia na indagação sobre a forma como
foram feitas as emendas individuais de 2005, havia deputado que respondia com evasivas,
como foi o caso do próprio deputado Gilberto Nascimento, que tentara minimizar o
escândalo do envolvimento de membros da Frente Parlamentar Evangélica no “mensalão”:
Olhe, as igrejas hoje estão procurando ter o seu trabalho voltado para o social, inclusive com
fundações, com OSCIPs
771
. Durante muito tempo a igreja não teve essa participação. Então,
isso também para a igreja é uma coisa nova. [...] Veja, se nós pegarmos, por exemplo, as
769
Entrevista do deputado Francisco Olímpio, Brasília, novembro de 2005.
770
Entrevistas dos deputados Gilberto Nascimento e Zelinda Novaes, em Brasília, novembro de 2005.
771
A sigla OSCIP se refere a Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público.
394
fundações, elas são muito poucas. Fundações que têm um trabalho. Fundações que têm um
trabalho social muito forte, mas que tudo isso para nós ainda é muito novo. [...] (O senhor
poderia dizer como o senhor orientou suas emendas?) Olha, eu acabei orientando as minhas
emendas, logicamente, para alguns municípios. Eu não tive muita emenda direcionada a
essas fundações, porque ainda são muito poucas, então eu não fiz nenhum direcionamento
para... em pouca coisa, por exemplo, eventualmente, para, nessa coisa, por exemplo, de
unidade de saúde, de atenção à saúde, essas são algumas emendas que nós colocamos que dá
para colocar nessas entidades.
772
Ao contrário do deputado Gilberto, seu colega Zequinha Marinho (PSC-PA)
descreveu com desenvoltura a estratégia usada para fazer que suas emendas chegassem ao
destino desejado. O deputado paraense direcionou uma parte de suas emendas
orçamentárias para um hospital da Assembléia de Deus, recém-instalado em Belém, mas
havia dificuldades burocráticas que poderiam inviabilizar a liberação da verba pelo
Ministério da Saúde, mas foram contornadas através de um procedimento que o
parlamentar explicou. O diálogo foi o seguinte:
Entrevistador O hospital da AD tem apoio do Governo do Estado?
Deputado Marinho Tem apoio do Governo do Estado, ele nos cede os convênios, nos
cedeu parte dos equipamentos que já estão lá, vai fazer um conveniozinho, pelo menos no
primeiro ano, para a gente se estruturar, com parte de funcionários, para que a gente possa
embalar, andar com as próprias pernas e depois tocar a vida.
Entrevistador Ele está credenciado para receber verba de emendas individuais?
Deputado Marinho Não. Nós usamos da seguinte forma para jogar a emenda lá. Você joga
no Governo do Estado, na Secretaria de Estado da Saúde Pública e a Secretaria convenia
com a instituição do hospital lá, que é a Associação Amazônica Evangélica. Essa instituição
que cuida e comanda o hospital é quem manda e recebe os recursos e presta contas ao
Governo. Então, tem que fazer uma curva, você joga a bola para o Estado e o Estado faz o
restante lá.
773
O artifício de preparar emendas genéricas passou a ser adotado para evitar a perda
do recurso, quando a emenda designada para uma instituição deixava de ser aplicada
porque a beneficiária deixava de preencher algum requisito. Ao ser adotado este
procedimento, todavia, abriu-se uma brecha para a ação de empresas como a do esquema
772
Entrevista do deputado Gilberto Nascimento, Brasília, novembro de 2005.
773
Entrevista do deputado Zequinha Marinho, em Brasília, no dia 25/11/2005.
395
dos “sanguessugas” que será apresentado a seguir. No relatório da Comissão de Inquérito
que analisou este esquema, consta o seguinte:
Com o passar dos anos, verificou-se um aumento de emendas individuais com localização
indefinida, dando maior flexibilidade ao parlamentar para a escolha do município
beneficiado no momento da execução orçamentária. Não por acaso várias emendas
utilizadas pelo esquema da Planam têm essa natureza genérica, pois flexibilizavam a escolha
de prefeituras e entidades envolvidas.
774
5.4.3 Esquema dos “Sanguessugas”
Se no caso do “mensalão” apenas dois deputados da Frente Parlamentar Evangélica
foram acusados de recebimento de propinas para votarem segundo a vontade do Governo,
no caso dos “sanguessugas” o impacto das denúncias foi avassalador contra os integrantes
dos blocos pentecostal e neopentecostal: metade da bancada da Assembléia de Deus e
quase a totalidade da bancada da IURD foram acusadas de receberem “comissões” para
favorecerem uma quadrilha que operava, simultaneamente, no Congresso, Ministério da
Saúde e junto a prefeituras, conforme será descrito nas páginas a seguir. Foi como se
tivesse caído o véu de santidade da face desses parlamentares evangélicos. Já não havia
mais como dissimular suas operações escusas, realizadas com a proteção do mandato que
haviam obtido com empenho da cúpula de suas igrejas, da qual eram (ou ainda são)
partícipes, mas de fato concedido a eles pelos membros e freqüentadores, por confiarem
que se tratavam de “servos de Deus”, de quem se espera a melhor conduta.
A este respeito, se manifestou o sociólogo Alexandre Brasil Fonseca, em agosto de
2006:
Dos 72 parlamentares denunciados pela CPI da máfia das ambulâncias, quase 40% (28) se
proclamam “deputados evangélicos” e 36% (26) participam da Frente Parlamentar
Evangélica, segundo folheto distribuído pelo gabinete de seu presidente, o deputado
(também denunciado) Adelor Vieira (PMDB-SC) e que é composta por 60 parlamentares.
Quase 15% de todos os deputados foram denunciados, enquanto entre os parlamentares
evangélicos que ocupam cerca de 11% das cadeiras do Congresso Nacional esta cifra
chega a impressionantes 45%. Praticamente a metade da bancada dos evangélicos parece ter
774
CONGRESSO NACIONAL. Relatório dos trabalhos da CPMI “das Ambulâncias”. Brasília, 2006, p. 87.
396
se envolvido no escândalo dos sanguessugas. O problema não reside exatamente na
confissão religiosa professada, mas pelo fato de que boa parte deles acionou suas redes e
estruturas eclesiásticas em sua atuação político-eleitoral, a qual, desde a bancada evangélica
na Constituinte de 1986, tem se tornado cada vez mais significativa no cenário eleitoral e
partidário brasileiro. [...] Candidatos oficiais são apoiados pelas lideranças eclesiásticas, e,
dessa forma, toda ação eleitoral fica semelhante a uma pescaria no aquário. Isso ocorre pelo
acesso facilitado desses candidatos aos eleitores, os quais consideram seriamente a questão
de "representante de grupo" para a votação proporcional.
775
A ação do Ministério Público, no caso “sanguessuga” começou por iniciativa da
Procuradoria da República no Acre, quando comunicou, em 2002, à Procuradoria em Mato
Grosso, que um grupo de pessoas estava fraudando licitações, a fim de utilizar recursos do
Fundo Nacional de Saúde, liberados a partir de emendas individuais de parlamentares,
acolhidas no Orçamento da União. O grupo denunciado pertencia a uma empresa com sede
em Cuiabá, que operava como fornecedora de ambulâncias, mas praticava preços
superfaturados.
A Procuradoria determinou a instauração de 77 inquéritos policiais para apurar os
fatos e identificar os envolvidos. Em outubro de 2004, enquanto os trabalhos de
investigação tramitavam no Ministério Público Federal, Polícia Federal e Secretaria da
Receita Federal, a Controladoria Geral da União produziu documento sobre fiscalizações
realizadas em Rondônia pelo critério de sorteios públicos. A partir do 5º e 6º sorteios o
órgão fiscalizador constatou “coincidência de fornecedores e participantes de processos de
licitação de unidades móveis de saúde em vários municípios, em diferentes Estados, e
passou a monitorar esses acontecimentos”.
776
Constatou, além disto, que havia
direcionamentos de licitações, fraudes, superfaturamentos, adulteração de documentos e
outras irregularidades nos processos, sempre que “um seleto grupo de empresas [...] se
revezavam entre si na tarefa de contratar com o Poder Público”.
777
Observou, também, a Corregedoria que a ação do grupo formado pelas empresas
SANTA MARIA COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA., COMERCIAL RODRIGUES, LEAL
775
Email circular de Alexandre Brasil Fonseca, remetido aos participantes do grupo mepconsu[email protected], em
30/08/2006.
776
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Denúncia ao Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do Estado de
Mato Grosso, Cuiabá, 1º de junho de 2006, p.26.
777
Ibidem.
397
MÁQUINAS LTDA., KLASS COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES E PLANAM COMÉRCIO E
REPRESENTAÇÃO LTDA., mais um conjunto de outras que entraram depois, se estendera a
outros Estados da Federação. Estava-se, portanto, diante de uma organização criminosa
complexa, atuando com desenvoltura na apropriação de verbas públicas. A partir daí, o
Ministério Público obteve autorização do Poder Judiciário para quebrar o sigilo telefônico
dos empresários da família TREVISAN-VEDOIN, líderes das operações.
O esquema já vinha funcionando há alguns anos e sua consistência se devia aos
cuidados do grupo empresarial em: monitorar a elaboração do Orçamento Geral da União,
cooptar deputados e assessorá-los na preparação de emendas, elaborar projetos junto às
prefeituras, acompanhar a execução orçamentária nos ministérios, cuidar da realização de
convênios entre União, municípios e organizações sociais de interesse público. Por último,
o grupo cuidava dos processos licitatórios para que as prefeituras convidassem somente as
empresas que pertenciam a eles. Com isto era possível superfaturar centenas de contratos de
compra e venda de veículos hospitalares, de modo que o excedente pecuniário gerado pelas
fraudes permitisse pagar “comissões” aos parlamentares e outros envolvidos na rede de
corrupção. Os preços dos produtos fornecidos pela quadrilha eram 120% superiores aos
valores vigentes no mercado, conforme planilhas da denúncia apresentada pelo Ministério
Público.
Este processo criminoso funcionava porque havia deputados e assessores
parlamentares que liberavam senhas privativas para elaboração das emendas, funcionários
do Ministério da Saúde a serviço da quadrilha e, na ponta, prefeitos e auxiliares, bem como
dirigentes de organizações sociais, envolvidos em maior ou menor grau com essa rede de
corrupção. Foram aliciados analistas de projetos, membros de comissões de licitação e
responsáveis por aprovação de prestações de contas. O esquema operou quase totalmente
na área de saúde, mas também entrou na área de ciência e tecnologia com projetos de
inclusão digital. No total foram movimentados cerca de 110 milhões de reais desviados dos
cofres públicos.
No relatório da CPMI, a amplitude da ação criminosa dos Vedoin é apresentada
com os seguintes dados:
398
Somente no período de 2000 a 2004, quando se especializou em unidades móveis de saúde e
em equipamentos médico-hospitalares [o grupo PLANAM]:
- alcançou várias dezenas de parlamentares;
- constituiu laços na estrutura do Governo Federal, em mais de um mandato presidencial;
- envolveu quase 600 prefeituras e inúmeras entidades privadas;
- manipulou quase um terço dos convênios vinculados às ambulâncias, realizados pelo
Governo Federal no período (cerca de 900 de um total de 3.048);
- recebeu quase R$ 80 milhões de dotações orçamentárias da Saúde.
778
Na denúncia, os Procuradores do Ministério Público Federal explicaram que as
fraudes prosperaram devido ao estabelecimento de quatro núcleos: uma base empresarial
consolidada, setores-chave no Ministério da Saúde sob comando de membros da quadrilha,
uma enorme rede de políticos motivados para receberem propinas, e uma equipe de
confiança da quadrilha escolhida para fazer a circulação e distribuição do dinheiro
arrecadado ilicitamente.
779
O modo de operar dessa rede criminosa, com base em depoimento do senhor Luiz
Antônio Trevisan Vedoin, prestado à Justiça Federal de Mato Grosso, em julho de 2006,
consistia do seguinte:
1º) Técnicos da PLANAM e de cerca de 20 empresas ligadas ao esquema
elaboravam projetos para a compra de ambulâncias pelas prefeituras.
2º) Os Vedoin acertavam com deputados e senadores as emendas em benefício das
prefeituras.
780
Luiz Antônio Vedoin declarou ter aliciado 77 prefeitos e agido em mais de
450 cidades de 22 Estados. Os Estados onde a quadrilha teve maior atuação foram Mato
Grosso, com 110 municípios; Minas Gerais, 42; Rondônia, 36, e Rio de Janeiro, 29. Foram
pagos mais de um milhão de reais em suborno só para prefeituras.
778
CONGRESSO NACIONAL. Relatório dos trabalhos da CPMI “das Ambulâncias. Brasília, agosto, 2006, p. 58.
779
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Denúncia ao Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do
Estado de Mato Grosso, Cuiabá, 1º de junho de 2006, p.32.
780
Houve caso de emendas em que a PLANAM não fez contato com o parlamentar. Entretanto, como esta empresa fazia
acompanhamento da execução orçamentária, tomava conhecimento de emendas de parlamentares (envolvidos ou não com o
esquema) e fazia contato direto com a prefeitura, caso houvesse receptividade desta, a PLANAM fraudava a licitação,
superfaturava os bens fornecidos e deixava de pagar os 10% de comissão do parlamentar autor da emenda, auferindo, assim, lucro
maior, nestes casos.
399
3º) O acerto com os parlamentares implicava em pagamento de comissão de 10% e
em alguns casos 15% ou mais do valor dos bens superfaturados. Uma parte do valor podia
ser adiantada ao deputado, enquanto o complemento era quitado quando a verba do
Ministério estava liberada para o município, a licitação concluída e os pagamentos
efetuados aos Vedoin. Segundo o relatório da CPMI: “Houve também diversas negociações
no ‘mercado futuro de emendas’, basicamente ocorridas durante o período de campanha
eleitoral de 2002, quando os parlamentares aceitavam o ‘adiantamento’ sob promessa de,
uma vez eleitos, apresentarem as emendas para aquisição de unidades móveis de saúde.
781
4º) No caso de 62 parlamentares, os Vedoin conseguiram ter o controle das senhas
de uso exclusivo dos parlamentares, que permitiam alterar projetos, planilhas etc. Com isto,
a quadrilha detinha maior controle sobre o processo. Consta no relatório da CPMI:
Luiz Antônio [Vedoin] disse que tinha as senhas, uma para a indicação e outra para o
acompanhamento, dos seguintes parlamentares: João Mendes, José Divino, Vieira Reis,
Reginaldo Germano, Raimundo Santos, Edna Macedo, Elaine Costa, Enivaldo Ribeiro e
Ricarte de Freitas. Segundo o Sr. Luiz Antônio Trevisan Vedoin, todas as senhas dos
parlamentares, em seu poder, foram apreendidas durante a operação policial, as quais lhe
foram passadas pelos próprios parlamentares. Todas as vezes que fez uso dessas senhas, na
indicação de municípios e entidades, definição de valores e finalidades das emendas, se deu
em perfeito acordo com os próprios parlamentares.
782
................................................................................................................................................
Luiz Antônio afirmou que tinha as senhas, uma para a indicação e outra para o
acompanhamento, dos seguintes parlamentares: João Mendes, José Divino, Vieira Reis,
Reginaldo Germano, Raimundo Santos, Edna Macedo, Elaine Costa, Enivaldo Ribeiro e
Ricarte de Freitas.
783
.................................................................................................................................................
Sobre a acusada Adarildes, afirmou o Sr. Luiz Antônio Trevisan Vedoin que era seu contato
em relação aos seguintes deputados, pertencentes à bancada da Igreja Universal do Reino de
Deus: Marcos de Jesus, Wanderval Santos, Vieira Reis, Paulo [Gouvêa]. Disse que
Adarildes possuía a senha individual desses parlamentares, necessária para elaboração das
emendas individuais. Segundo ele, tanto as entidades beneficiadas como os valores das
781
CONGRESSO NACIONAL. Relatório dos trabalhos da CPMI “das Ambulâncias. Brasília, agosto, 2006, p. 54.
782
Idem, p. 632.
783
Idem, p. 655.
400
emendas decidia em conversas com Adarildes. Aduziu, ademais, que era Adarildes a
responsável por essas definições. Pelos serviços que prestava, Adarildes recebia 3% (três
por cento) sobre o valor das emendas (fl. 1008). Luiz Antônio disse que os parlamentares da
bancada recebiam 10% (dez por cento) sobre o valor das emendas gerenciadas por
Adarildes. Com efeito, ele próprio pagou diretamente esse percentual aos parlamentares,
como: Paulo Gouvêa, Aldir Cabral, Wagner Salustiano, De Velasco, Pastor Jorge Pinheiro,
Reginaldo Germano e Bispo Wanderval Santos (fl. 1086).
784
5º) A máfia dos sanguessugas aliciou funcionários do Ministério da Saúde em
postos-chave e conseguiu colocar a funcionária pública Maria da Penha Lino como
assessora especial do Ministério, para acelerar a execução das emendas dos parlamentares
ligados ao grupo. A indicação desta servidora para o Ministério foi feita pelo deputado José
Divino, da Igreja Universal.
6º) Os pagamentos de comissões e outras verbas a parlamentares e assessores, bem
como suborno para funcionários das áreas de projetos, licitações, prestações de contas e
outras, eram feitos em espécie e contas bancárias dos envolvidos ou de familiares e pessoas
usadas como “laranjas”. Houve também quem recebesse carro como pagamento.
784
Idem, p. 921.
401
5.4.4 Comissão Parlamentar Mista de Inquérito
Enquanto prosseguiam investigações para apurar responsabilidades criminais do
bando Vedoin no âmbito do Judiciário, inclusive de ex-parlamentares participantes, foi
instalada no Congresso uma Comissão Mista Parlamentar de Inquérito a “CPMI das
Ambulâncias” com o objetivo de “apurar as denúncias envolvendo a ‘Operação
Sanguessuga’, realizada pela Polícia Federal, para investigar quadrilha que atuava na
aquisição fraudulenta de insumos estratégicos para a saúde”, conforme Requerimento nº
77/2006 CN, aprovado em sessão plenária do Congresso Nacional, no dia 14 de junho de
2006.
785
Cabe aqui um comentário. Sabe-se que a sociedade tem reagido com ceticismo
quando ouve falar de CPI, pois se sente frustrada, visto que os culpados raramente são
punidos. O fato é que não há um conhecimento, suficientemente disseminado, sobre os
limites deste tipo de processo legislativo. Por falta deste conhecimento, espera-se,
equivocadamente, que uma Comissão de Inquérito investigue, apure os delitos e aplique
sanções aos delinqüentes. Ocorre que a separação de poderes impede tal abrangência de
ação no Legislativo. O procedimento penal é exclusivo do Judiciário. Mesmo assim, a
investigação de uma CPI tem poderes adicionais para acelerar a reunião de provas,
manifestar-se sobre infrações e seus autores e encaminhar suas conclusões para que a
Justiça tome as medidas cabíveis. As Casas do Congresso têm obrigação de zelar pela ética
na política, exigir dos seus integrantes conduta exemplar e aplicar sanções, inclusive cassar
mandatos, quando o caso exigir. É por esta razão que o comportamento corporativo de
parlamentares que se protegem mutuamente, dentro do Congresso, é repugnante para a
sociedade que os elegeu.
Em menos de dois meses de trabalho, a CPMI das Ambulâncias arrolou nomes de
uma centena de deputados e senadores, supostamente envolvidos. As investigações se
processaram sob “segredo de justiça”, até que, no dia 8 de agosto de 2006, o juiz da 2ª Vara
785
CONGRESSO NACIONAL. Relatório dos trabalhos da CPMI “das Ambulâncias”. Brasília, agosto, 2006, p. 15.
402
Federal em Cuiabá, Jeferson Schneider, afastou este obstáculo, possibilitando acesso
público aos resultados das investigações, ainda que estes fossem apenas parciais.
Segundo o relatório da CPMI divulgado em agosto de 2006, a empresa PLANAM
começou a fornecer ambulâncias às prefeituras de Mato Grosso, em 1998, com unidades de
transporte que eram equipadas no Paraná. A partir de 2000, com o objetivo de ampliar
ganhos e ter flexibilidade para superfaturar os bens fornecidos, a família Vedoin criou as
empresas SANTA MARIA, KLASS e EPP ENIR RODRIGUES DE JESUS, em nome de terceiros,
mas efetivamente controlada pelos mesmos titulares da PLANAM. Nessa mesma época,
atraíram o deputado federal Lino Rossi, evangélico batista, para apresentar emendas ao
Orçamento e ganhar comissão de 10% sobre o valor do faturamento. Bem cedo o grupo
sentiu necessidade de ampliar seu mercado para fora do território matogrossense e
diversificar operações, com fornecimentos, também, de insumos hospitalares. Foi em
função destas demandas que os Vedoin trouxeram outras empresas para o grupo.
No âmbito parlamentar, Lino Rossi tornou-se aliciador de outros deputados, como
Nilton Capixaba e Renildo Leal, ambos da Assembléia de Deus. Neste começo das
atividades da rede, eram conquistados dois ou três parlamentares por semana. Em alguns
casos o contato era feito indiretamente, através de assessores e chefes de gabinete.
Em entrevista para esta pesquisa, uma assessora que ingressou na Câmara em 1999,
explicou que o esquema já funcionava bem antes, mas sem pagamento de comissões.
Outros esclarecimentos dessa relação entre lobistas-fornecedores e políticos, que não
constaram do relatório da CPMI, estão na gravação. Quando começou o esquema dos
“sanguessugas”, em 1999 e 2000, a PLANAM operava com um grupo pequeno de
parlamentares, que não chegava a uma dezena. Seus operadores tinham tanta certeza que
iam ganhar as licitações, que o parlame ntar já recebia antecipada sua comissão. Como
explica essa fonte:
Eles tinham tanta certeza que eles iam ganhar a licitação, que aquele parlamentar que
indicasse que eles iam ganhar um milhão já recebia antecipado. Então muitos deputados, na
hora que a emp resa procurava[-os] diziam: “eu vou indicar um milhão em ambulância para
o meu Estado e você vai participar da licitação. Só o fato de prometer, a pessoa já trazia o
dinheiro e já dava para o parlamentar [a comissão]. Aí, você pergunta: “que garantia eles
403
tinham que aquele parlamentar iria liberar as suas emendas? Todas! Eles tinham esquema
dentro do Ministério da Saúde que garantia que os projetos que eles estavam cuidando
seriam examinados primeiro e seriam liberados, independente de partido. Era um esquema
com técnicos do Ministério. Então, foi assim que começou, foi assim que eu vi crescer. Vi
muita gente se envolver. E não concordava muito com aquela história da comissão de
vendas.
786
Não há dúvida que era uma forma de disfarçar desvio de dinheiro público, sob a
justificativa que era para ajudar municípios pobres. “Eu mostrava para os parlamentares
que uma licitação dirigida era muito perigosa”, mas esses alertas, segundo a fonte, não
eram levados a sério. No começo o esquema envolvia poucos parlamentares, mas nesse
grupo original o conjunto de evangélicos já era muito representativo. De duas dezenas de
envolvidos, segundo a informante, pelo menos oito eram evangélicos. Esses foram trazidos
pelo deputado Lino Rossi e foram entrando no esquema.
Aqueles oito já tinham levado vantagem. Começaram a contar para os evangélicos que o
negócio era bom, quente e que tinha retorno. O que acontece? Aquele grupo menor começou
a contar para o grupo maior que valia a pena. Então o que aquele grupo de evangélicos fez?
Pegou o pessoal da PLANAM e começou a levar nos outros deputados evangélicos eleitos,
fechando a PLANAM com os deputados evangélicos.
787
Deve-se reconhecer que este tipo de corrupção é pequeno em valores
movimentados, se comparado com outros esquemas que existem no Congresso Nacional.
Ocorre que esse esquema pequeno é acessível a parlamentares do chamado “baixo clero”,
enquanto as grandes negociatas estão fora do alcance deles. A assessora Mônica comenta:
Há parlamentares que se queimaram por causa de quatro mil reais. Isto daqui é muito
pequeno em relação aos grandes esquemas com operadoras de telefonia, aos grandes
esquemas de construção de grandes obras, aos grandes esquemas do agro-negócio. Aos
grandes esquemas que existem no País, infelizmente, com relação à recuperação e
construção de estradas, aos grandes esquemas de construção de aeroportos, a grandes brigas
pelos pedágios...
788
786
Entrevista da assessora parlamentar de deputado da FPE, Mônica, em Brasília, setembro de 2006.
787
Ibidem.
788
Ibidem.
404
De fato, estes grandes negócios são privativos do pessoal do “alto clero”. É coisa de
elite. O esquema dos “sanguessugas” era acessível aos parlamentares de pouca expressão
no cenário econômico. E o dinheiro vinha rápido, de tal maneira que os evangélicos
quiseram assegurar somente para eles essa forma de ganho, como se dissessem aos
poderosos, segundo as palavras da assessora: “vocês se divertem com o ‘pirulito’ de vocês
que a gente se diverte com o nosso”. “Era um irmão querendo beneficiar o outro”.
789
É importante dar espaço para um comentário sobre a origem e o contexto social dos
parlamentares evangélicos, conforme análise da mesma assessora, embora nenhuma
explicação justifique o que aconteceu:
A maioria desses deputados evangélicos não são ricos. Eles são pastores e quando chegam
aqui no Congresso eles são cobrados. É igreja que quer construção de telhado, é igreja que
quer aparelho de som, é igreja que quer que ele pague a excursão do grupo de jovens. Os
membros que deram [o voto] começam a cobrar. É um jogo de troca: sujo, feio, fedido! E
esses pastores não têm de onde tirar e precisam, às vezes, por mão nessas coisas aí dos
sanguessugas. [...] Um deputado chegava para o outro [e dizia:] “Cara, tem um homem aí
que quer abençoar o seu mandato, com recurso”. Eles usavam a palavra “abençoar”. E o
cara do sanguessuga até usava esse discurso: “Olha, eu vim aqui porque eu quero abençoar o
senhor, lhe ajudando”. Era esse o discurso. Então um passava para o outro, porque era uma
coisa rápida, fácil, e que estava gerando dinheiro.
790
O esquema se propagou como uma “ação entre amigos”, ou, melhor dizendo, “uma
ação entre irmãos”. Isto explica porque a incidência de envolvidos foi maior entre os
parlamentares evangélicos. “Eles [os evangélicos] não queriam dividir esse bolo, essa fatia,
com outro grupo. Tipo assim: ‘olha, isso aqui é uma coisa entre nós’.” O problema se
alastrou a tal ponto entre os evangélicos e fora deste grupo
que chegou uma hora [quando] seu Darci [Vedoin] disse que ele não agüentava mais o
assédio dos deputados. E é verdade. Teve uma hora em que, especialmente no governo Lula,
a liberação dos recursos começou a demorar muito. E esses parlamentares começaram a
cobrar do seu Darci antecipado, como ele fazia no governo FHC. E o que acontece: ele não
tinha dinheiro e os parlamentares [o pressionavam]. Ele queria parar. Por exemplo, ele
queria parar num número de 40 parlamentares, 50. Mas sempre tinha um evangélico para
789
Ibidem.
790
Ibidem.
405
apresentar um irmão para ele: “olha aqui o meu irmão, tem que abençoar o meu irmão, tem
que por o meu irmão no esquema”. Infelizmente, foi dessa forma que tudo aconteceu.
791
Apenas para provocar a informante e induzi-la a desenvolver uma vertente de
análise com base em “teorias de conspiração e perseguição”, foi feita a seguinte pergunta:
“Assessora, essa ‘operação sanguessuga’ teria sido uma armadilha contra os evangélicos?”
A resposta dela foi a seguinte:
Não acredito que exista um esquema montado. O que eu acredito é o seguinte. Começou a
se investigar os sanguessugas, certo? E descobriram que tinha nomes de todos os partidos.
No início, não creio que foi para pegar os evangélicos, não. Porque é difícil você saber no
começo quem é e quem não é evangélico, a não ser aqueles que têm nomes de pastores ou
bispos. O que aconteceu com o esquema dos sanguessugas não era para pegar os deputados
evangélicos. Era um esquema descoberto, que tinha gente de todos os partidos envolvidos e
apenas um do PT. No princípio, nem esse do PT estava envolvido, depois é que ele foi
descoberto, que é o deputado João Grandão de Mato Grosso do Sul. Então, veja o que
acontece com o esquema. Esse esquema ele era assim um esquema pesado, mas se a gente
for pensar bem com relação ao esquema do “mensalão”, em números e valores, ele não era
tão alto quanto o “mensalão”, não. De jeito nenhum. Falar que o que foi desviado é aquilo
tudo, não. Não foi não. Porque um número bem grande de emendas não foram liberadas, só
que, na hora de computar, computou-se tudo que ele ganhou em licitação. Mas nem tudo
que ele ganhou em licitação ele levou ainda. Não foi liberado o recurso ainda. Temos que
entender o seguinte: quando foi visto que esse esquema do sanguessuga podia ser explorado,
para que se esquecesse um pouco o do mensalão, eu acho que a intenção maior foi esta.
Foi pegar os sanguessugas para pegar outros partidos que não o PT. Só que, por infelicidade
nossa, uma grande maioria era evangélico. Mas não creio que foi uma espécie de armadilha,
não.
792
Também havia uma hipótese de jogo de interesses localizados, sendo o principal
caso o que envolvia o deputado Nilton Capixaba. Ou seja, as denúncias teriam sido
patrocinadas por interessados em incriminar o deputado Nilton Capixaba de Rondônia,
visto que lá a luta pelo Senado era muito grande, envolvendo os espaços políticos de
Romero Jucá e de outros líderes da região e o movimento dos garimpeiros. Os negócios da
791
Ibidem.
792
Ibidem.
406
mineração e o ingresso do candidato Nilton Capixaba poderiam desbancar grupos muito
fortes de Rondônia. De fato, a assessora afirma que:
A investigação começou muito nessa linha, de pegar o Nilton Capixaba. Não os evangélicos,
mas o Nilton Capixaba. Tanto é que se você acompanha o jornal Correio Braziliense vai ver
que quem primeiro estourou o esquema de ambulâncias foi o jornal Correio Braziliense em
cima do Nilton Capixaba. Só que a partir dele se pegou todo mundo.
793
Não se pode descartar, sumariamente, a hipótese da exploração do caso para atingir,
também, a imagem dos evangélicos, pois de fato havia uma presença expressiva de
evangélicos no esquema. Ao explorar o caso, a imprensa fazia questão de mencionar que o
parlamentar era evangélico. Houve caso de evangélico cujo envolvido era o assessor e não
o parlamentar. No caso da assessora Ada
794
, que havia trabalhado com o deputado Carlos
Rodrigues e depois foi para o gabinete do deputado Pedro Ribeiro, a divulgação da
imprensa ligando o nome dela ao fato de estar lotada no gabinete do deputado cearense
prejudicou a imagem dele, de tal modo que ele não conseguiu ser reeleito. Posteriormente,
porém, foi descoberto que Ribeiro também estava envolvido no esquema.
A condição de “baixo clero” dos evangélicos favoreceu, de fato, o envolvimento
maior deles na máfia dos sanguessugas. Alguns parlamentares foram mais atuantes do que
outros nas atividades do grupo. De acordo com a assessora entrevistada e outras fontes
citadas, a forma de participação de cada um consistiu no seguinte:
5.4.5 Lino Rossi
Este parlamentar de Mato Grosso foi um dos articuladores no início das operações,
quando a família Vedoin resolveu ampliar suas atividades. Este deputado foi um dos
campeões de emendas para as prefeituras de Mato Grosso. Seu papel foi decisivo para que
o grupo ampliasse negócios em outros Estados, visto que era ele quem arrebanhava seus
colegas para participarem de operações com a PLANAM, embora não fosse o único a assumir
esta atividade. Segundo a assessora Mônica:
793
Ibidem.
794
ADARILDES MARIA DE MORAES COSTA, conhecida como ‘ADA, brasileira, servidora pública
federal, [...] conforme denúncia do Ministério Público.” (MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Denúncia ao
Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, Cuiabá, 1º de
junho de 2006).
407
Foi ele quem ensinou praticamente esse esquema à PLANAM, tipo: “olha, vou por alguém
com você lá no Congresso; vamos aumentar seu escritório”. E a forma como Lino Rossi
conheceu o pessoal da PLANAM é muito engraçada. Eles no aeroporto trocaram as malas e
na hora de destrocar as malas se conheceram.
795
Em seguida, conforme o relato, cada um se apresentou e colocou seus préstimos
profissionais à disposição do outro: “O que você faz? Ah, eu sou deputado. Ah, eu
tenho um escritório de consultoria para projetos”. A partir daí Rossi propõe uma espécie de
sociedade: De que forma eu posso ajudar mais seu escritório e o senhor pode me
ajudar?”.
796
Essa história do encontro de Darci Vedoin com Lino Rossi consta do depoimento do
primeiro, prestado em Cuiabá, durante a 6ª reunião da CPMI, no dia 11/07/2006:
O SR. DARCI JOSÉ VEDOIN Às vezes eu estou rindo aqui, mas é por causa do modo
como eu conheci o Deputado Lino Rossi. Estava relembrando e veio o sorriso. Nós
estávamos esperando a bagagem e tinha três malas iguais: a do Senador Jonas, Lino Rossi e
a minha. Pegando essa mala, eu peguei a mala trocada. Peguei a do Lino Rossi, que não
tinha feito a cirurgia ainda. Eu cheguei em casa. Quando abri a mala, a roupa era bem maior
do que eu. Liguei para o Lino, que ficou de ir lá no escritório e foi lá no escritório. E aí nós
começamos... Aí ele me perguntou o que eu fazia. Digo: estou fazendo unidades móveis de
saúde. “Rapaz, é uma boa! Ambulância e tal. Vamos fazer?” Vamos fazer. E aí
começamos a fazer as emendas para Mato Grosso.
797
O jornal O Globo, em edição de 1º de agosto de 2006, resumiu depoimento de Luiz
Antônio Vedoin, que revela a avidez do deputado Rossi para alcançar recursos da área
saúde, tendo, para tanto, estabelecido empresa própria, depois de se desligar da PLANAM:
Para ampliar seus negócios no Congresso, o chefe da máfia dos sanguessugas criou braços
para alcançar parlamentares em todos os partidos. Segundo Luiz Antônio Vedoin, os
deputados Lino Rossi (licenciado), Ricarte de Freitas (PTB-MT), Nilton Capixaba (PTB-
RO) e o ex-deputado Carlos Rodrigues (sem partido) cresceram tanto no esquema que
passaram a trabalhar na cooptação de outros parlamentares. Segundo Vedoin, Lino Rossi,
ex-apresentador de TV, chegou a propor que, além das propinas cobradas sobre suas
795
Entrevista da assessora parlamentar de deputado da FPE, Mônica, em Brasília, setembro de 2006.
796
Ibidem.
797
CONGRESSO NACIONAL. Relatório dos trabalhos da CPMI “das Ambulâncias. Brasília, agosto, 2006,
pág. 540.
408
próprias emendas, recebesse mais 2% de comissão sobre as emendas de cada parlamentar
que levasse para o esquema. Em seu depoimento à Justiça Federal, Vedoin disse ter
considerado o percentual alto e ter rompido com Lino Rossi depois de dar de presente a ele
uma carreta, um Fiat Ducato e fazer cerca de 70 repasses de comissões pelas emendas
apresentadas pelo parlamentar em cinco anos. O Fiat Ducato de fato está no nome da mulher
de Lino Rossi. Após o racha, aproveitando-se dos conhecimentos adquiridos com os
sanguessugas, segundo Vedoin, Rossi teria criado um esquema particular. Segundo o
empresário, Rossi conseguiu R$650 mil de recursos extra-orçamentários para o município
de Chapada dos Guimarães (MS) e R$300 mil para Luciara (MS) para a compra de
equipamentos médicos hospitalares. "A empresa vencedora, nessas licitações, pertence à
esposa do deputado Lino Rossi", denunciou Vedoin, em seu depoimento.
5.4.6 Nilton Capixaba
Uma outra pessoa que atuou muito nesse esquema foi o deputado Nilton Capixaba.
“Ele faz parte do PTB e foi ele quem apresentou o pessoal do esquema sanguessuga para o
deputado Josué Bengtson, na época [1999]”
798
. O deputado Nilton é evangélico e chegou a
ocupar a segunda-secretaria da Câmara dos Deputados, através de uma estratégia bem
sucedida do PTB. A distribuição de cargos na Câmara segue regras já acordadas entre os
partidos: a presidência é geralmente garantida para o partido majoritário. No biênio 2001-
2002, o deputado Nilton Capixaba ganhou a indicação do PTB para ser o segundo-
secretário. O PTB na época era um partido pequeno. A segunda-secretaria era
tradicionalmente reservada para a região norte do Brasil. O deputado Nilton Capixaba,
muito esperto e persuasivo, convenceu o PTB que ele deveria ser o nome do norte do Brasil
para este cargo na Mesa da Câmara. Havia outros evangélicos da Amazônia, na época, que
reuniam credenciais de representatividade, como Josué Bengtson, da Igreja Quadrangular, e
Renildo Leal, da Assembléia de Deus, ambos, também, indiciados, posteriormente, no
escândalo sanguessuga. Como Josué Bengtson era presidente da Comissão da Amazônia e
Renildo fazia parte do Instituto Getúlio Vargas, a segunda-secretaria ficou com Nilton
Capixaba. Ele conseguiu ser reeleito para o biênio seguinte e permanecer na Mesa, como
terceiro-secretário, no biênio 2005-2006. Prossegue o depoimento da assessora:
O PTB era um partido com muitos evangélicos. Nilton Capixaba já estava trabalhando com
o pessoal da PLANAM e tinha ambições de se eleger senador. Fez o seguinte acordo com a
798
Entrevista da assessora Mônica. Brasília, set. 2006.
409
PLANAM: Cada parlamentar que eu lhe apresentar você dá para o parlamentar 8% e para
mim 2%. Começou agora a terceirizar indicação. [...] Eu sei disso porque ouvi muitas
histórias de assessores. Depois, e aí foi o Nilton Capixaba quem levou a PLANAM para
conhecer o deputado Josué Bengtson e lá o deputado Josué Bengtson não pediu recurso
nenhum para ele, mas houve uma promessa que ele indicaria, sim, a PLANAM para algumas
prefeituras. E se a PLANAM podia fazer o seguinte: [para] aquelas obras sociais que o
deputado tinha, [a empresa] doaria ambulâncias para as obras sociais. E você sabe que nas
regiões ribeirinhas do Pará há muito problema de saúde e a Igreja Quadrangular fazia um
trabalho com relação à malária e precisava de ambulancha, são ambulâncias em lanchas.
Posteriormente, ficou-se sabendo que a cada lote de uma certa quantidade de ambulâncias
para as prefeituras indicadas pelo deputado Bengtson, a IEQ ganhava uma para sua obra
social. Não houve propina para o deputado paraense, mas o Nilton Capixaba ganhou
comissão. O deputado Josué Bengtson parece que teve na conta da Igreja 19 mil reais
depositado para compra de uma ambulancha, que acabou entrando até como uma espécie de
oferta para a igreja, para a obra social, mas o Nilton Capixaba ganhou sim seus dez por
cento, seus dois, seus três, em cima do Josué Bengtson.
799
Em 2003, o deputado Nilton Capixaba tentou envolver um outro deputado:
O mesmo Nilton Capixaba, em 2003, levou para o meu parlamentar o esquema de
sanguessuga. Só que em 2003 eu já sabia do que estava ocorrendo nos bastidores. Eu não
deixei o meu parlamentar fechar com a PLANAM. E até me lembro que o meu deputado,
muito ingenuamente, disse assim para mim: Eu acho que você está exagerando [...]. Você
acha que o irmão Nilton Capixaba, segundo-secretário da Câmara, me colocaria numa fria?
Então era a minha palavra contra a palavra do Nilton Capixaba, o irmão “querido” que
queria abençoá-lo. Só que aí, mesmo contra a minha vontade, a PLANAM começou a
freqüentar o nosso gabinete e no [caso desse deputado] a promessa também não era
dinheiro. Era o seguinte: Eu tenho uma empresa de consultoria e eu consigo liberar suas
emendas”. Então estava entrando nas prefeituras do [deputado] para agilizar projetos. E
[esse deputado] não teria nenhuma vantagem financeira nisso. Só que eu acho e tenho
certeza hoje, depois de tudo que eu fiquei sabendo, que [o deputado] não teria o dinheiro,
mas o Nilton Capixaba, de cada emenda que [ele] passasse para a PLANAM a comissão iria
para o Nilton Capixaba.
800
799
Entrevista da assessora parlamentar Mônica. Brasília, setembro de 2006.
800
Ibidem. (Com a intenção de proteger a fonte, retirou-se, neste trecho da entrevista, o nome do deputado para quem Mônica
trabalhava).
410
No jornal O Globo, de 28/07/2006, há a seguinte nota sobre Capixaba:
Considerado por Vedoin peça-chave na máfia, o deputado Nilton Capixaba (PTB-RO)
teria dívida ‘ao redor de R$150 mil’ com a quadrilha. Foi ele que, segundo o empresário,
apresentou a primeira emenda do esquema, em 1999, para a compra de uma ambulância
pela prefeitura de Cacoal, em Rondônia”. O jornal O Estado de S. Paulo, de 19 de julho de
2006, traz um resumo das atividades desse parlamentar:
Deputado Nilton Capixaba (PTB-RO) Na contabilidade da Planam, constam repasses de
pelo menos R$ 437 mil atribuídos ao deputado e a seus assessores. Ajudaria a expandir o
esquema dentro da Câmara. Tem inquérito aberto no STF. Nilton foi afastado das funções
de integrante da Mesa Diretora da Câmara. PPS, PV e PSOL pediram ao Conselho de Ética
abertura de processo de perda de mandato por envolvimento no esquema dos sanguessugas.
5.4.7 Bispo Rodrigues
Outro nome chave do esquema da PLANAM foi o deputado Carlos Rodrigues,
porque, devido à forma como ele comandava a bancada da Igreja Universal, como um
rebanho que lhe obedecia às ordens cegamente, o seu ingresso significou, praticamente, o
ingresso de todo o grupo dessa Igreja. Segundo a assessora: “O outro nome, que eu já falei,
é o bispo Rodrigues, porque lá atrás ele começou... Alguns evangélicos [foram] contar para
ele do esquema, ele entrou e, ele entrando, todos da Universal acabaram entrando com
ele”
801
.
Sobre as atividades do deputado Rodrigues e sua assessora, Adarildes Moraes
Costa, o jornal O Globo publicou em 28/07/2006 o seguinte:
Na bancada do PL, segundo Vedoin, quando o ex-deputado Carlos Rodrigues era o líder,
cabia a ele coordenar e administrar as emendas apresentadas na bancada dos evangélicos.
Rodrigues negociava o percentual de propina e as emendas que seriam apresentadas por
cada um. Sempre em favor da Planam. Segundo Vedoin, ele operava o esquema junto com a
chefe de gabinete da liderança do PL, Adarildes Moraes Costa. Em certo momento, contou o
empresário, a assessora teria ficado mais forte no esquema que o próprio Rodrigues e teria
passado a negociar pessoalmente as emendas. Além de cobrar comissão de 3% sobre o valor
das emendas negociadas de cada parlamentar que ela controlava, segundo Vedoin, Adarildes
vendia a emenda para esquemas concorrentes do grupo e passou a chantagear a Planam,
801
Entrevista da assessora Mônica. Brasília, set. 2006.
411
ameaçando revelar o esquema. Rodrigues convenceu Vedoin a pagar R$200 mil. "Caso
contrário denunciaria o esquema da bancada da Igreja Universal; que esse incidente ocorreu
logo após o deputado Bispo Rodrigues ter renunciado ao mandato, em outubro de 2005; que
Bispo Rodrigues, diante dessas chantagens, procurou o interrogando pedindo para que
ajudasse a resolver essa situação de Adarildes e chegou a reunir-se com ela e o interrogando
no flat Meliá Brasília; que para Adarildes não denunciar aceitou receber R$200 mil em
cheques garantia", diz o depoimento de Vedoin.
5.4.8 Neuton Lima
A assessora Mônica atribui certa importância ao papel do deputado Neuton Lima na
operação “sanguessuga”, devido a sua proximidade com pessoas da cúpula da Assembléia
de Deus do Estado de São Paulo:
O Neuton Lima, que é aquele de São Paulo, da Assembléia de Deus, filho do pastor-
presidente da Assembléia de Deus ali de uma região próxima de São Paulo, da capital,
muito atuante. Ele, por ser da Assembléia de Deus, influenciou os demais da Assembléia de
Deus, como Gilberto Nascimento, Isaías Silvestre...
802
No “Estadão” de 19/07/2006, há um resumo sobre a denúncia de Luiz Vedoin,
divulgada pela CPMI: “Deputado Neuton Lima (PTB-SP) - Nos grampos, Luiz Antônio
informa a seu pai que mandou ‘dez (R$ 10 mil) para o deputado. Foi coordenador da
bancada Parlamentar da Igreja Assembléia de Deus (1999-2002). O jornal Correio
Popular, de Campinas, pólo da região onde o deputado tem seu reduto eleitoral, trouxe
artigo de Fábio Gallacci, em 28/07/2006, com informações sobre doação de ambulâncias
para entidade da Assembléia de Deus de São Paulo e explicações de Neuton Lima sobre a
questão:
Em 2003, o deputado federal Neuton Lima (PTB), de Indaiatuba, “presenteou” seus
eleitores ligados à igreja Assembléia de Deus de Campinas com uma van zero-quilômetro,
da marca Iveco, transformada em ambulância. O veículo, agora, desperta suspeitas da CPI
dos Sanguessugas, em Brasília, que já investiga Neuton. Uma fonte da Agência Anhangüera
de Notícias (AAN) afirmou que Luiz Antônio Vedoin, sócio da empresa Planam, envolvida
no escândalo das compras superfaturadas de ambulâncias, garantiu em conversa gravada,
802
Ibidem.
412
segundo a fonte ter dado de presente a Neuton um veículo com as mesmas características
no mesmo ano de 2003.
A entrega da ambulância, que chegou até com um grande laço de presente vermelho, foi
registrada inclusive com fotos em um informativo da Assembléia de Deus chamado
Clarim. A reportagem da AAN obteve uma cópia deste informativo e confirmou que o
veículo foi realmente cedido como forma de agradecimento de Neuton aos votos recebidos
nas eleições de 2002 [...] Em gratidão aos 6.983 eleitores de Campinas que contribuíram
para sua reeleição (de Neuton) à Câmara Federal e os 4.777 votos que também contribuíram
para a eleição do deputado estadual Adilson Rossi, o irmão Neuton Lima presenteou a
Assistência Social de nossa igreja com uma UTI móvel, relata o informativo. O veículo,
segundo o jornal da igreja, foi cedido à Associação Beneficente Daniel Berg (ADB), que faz
parte do braço social da Assembléia de Deus, e era presidida na época por Lea Cornélio
da Costa. Ela é mulher de Paulo Roberto Freire da Costa, pastor, líder deste grupo religioso
em Campinas e presidente estadual da Comissão Política da Convenção Geral das
Assembléias de Deus Ministério Belém (CGADB). Em uma foto estampada no informativo,
o casal Lea e Paulo Roberto aparece dentro da ambulância, com o próprio pastor na direção
do veículo. Freire foi procurado pela reportagem para comentar o assunto, mas não retornou
as ligações. As tentativas de contato da reportagem foram feitas durante mais de um mês. A
capa do Clarim ainda apresenta uma carta enviada da Câmara dos Deputados pelo próprio
Neuton em que ele agradece a uma pessoa identificada como “irmão Amaro”, por ele ter
coordenado a sua campanha em Campinas. “Obrigado pela confiança em nós depositada,
agradeceu Neuton em sua nota oficial. Logo abaixo da notícia da entrega da ambulância e da
carta do deputado federal petebista, o informativo ainda apresenta um outro texto que traz
uma convocação: “Abençoe Campinas com seu voto”. O texto que vem logo em seguida
tenta mobilizar os participantes da igreja a escolher um candidato para as eleições
municipais de 2004. Pela primeira vez, o povo de Deus poderá indicar um candidato ‘gente
da gente’”, informa o texto.
Em uma informação repassada por integrantes da própria CPI esta semana, o deputado
Neuton teria supostamente recebido de presente da Planam um veículo avaliado em R$ 67
mil, que tanto poderia ser um microônibus como uma van. Os parlamentares da comissão
ouvidos pela AAN não fizeram qualquer ligação formal entre o veículo supostamente dado a
Neuton com a ambulância que chegou de presente aos eleitores da Assembléia de Deus
campineira, mas uma linha de investigação para saber se os dois veículos em questão são, na
verdade, um só já foi aberta em Brasília. Em 2004, Neuton teve a sua candidatura a prefeito
de Indaiatuba impugnada pela Justiça Eleitoral por ter percorrido a cidade com uma frota de
ambulâncias. O deputado recorreu e conseguiu revalidar a sua posição de candidato.[...]
Em entrevista à AAN em seu gabinete em Brasília esta semana, o deputado federal Neuton
Lima (PTB) admitiu que enviou uma ambulância da marca Iveco à Assembléia de Deus de
413
Campinas. É uma ambulância e uma unidade odontológica. Estão lá servindo a
comunidade”, disse. “Eu estive lá na entrega.” Ele negou ter recebido qualquer veículo da
Planam. Questionado sobre os trâmites legais que fizeram com que a viatura chegasse até a
igreja, Neuton afirmou que a ambulância é resultado de uma emenda parlamentar de autoria
dele onde o beneficiado era o Ministério Belém de São Paulo, grupo que abriga as
Assembléias de Deus. O deputado citou um projeto chamado Centro de Evangelismo Unido
(CEU) onde, segundo o petebista, são feitos consórcios com vários municípios do Estado de
São Paulo e, a partir disso, ambulâncias e unidades odontológicas percorrem as cidades para
atender a população necessitada, oferecendo medicamentos e consultas gratuitas. Isso
acontece na periferia de Campinas também. Temos tudo devidamente registrado com
fotografias e relatórios. Apesar de o informativo Clarim informar em seu texto que o
veículo entregue em Campinas em 2003 tratava-se de uma UTI móvel, Neuton desmentiu
esta informação. Ela até teria corpo para ser uma UTI, mas faltam os equipamentos. Entre
2003 e 2004, Neuton apresentou duas emendas ao Orçamento solicitando a liberação de
verbas para a compra de ambulâncias para a Instituição Filantrópica e Educacional Parábola,
sediada na Vila Ester, em São Paulo. O valor total liberado foi de R$ 1,6 milhão. Em um
preço estipulado de R$ 50 mil cada veículo, seria possível comprar 32 viaturas. A direção da
entidade beneficiada, que sequer tem uma garagem para um veículo, afirma que não recebeu
nada até agora. Na semana passada, a reportagem da AAN localizou sete ambulâncias que
seriam da Parábola em um galpão na periferia de Capela do Alto. (FG/AAN).
5.4.9 Outras informações
Para a assessora Mônica, que presenciou durante pelo menos cinco anos as
movimentações do grupo PLANAM em gabinetes de Brasília, os nomes de maior destaque
foram os apresentados acima. Não obstante, há outras informações no seu depoimento, que
merecem ser apresentadas.
Então eu destacaria esses nomes. E o Nilton Capixaba, por ser do PTB, acabou
influenciando o pastor Reinaldo do PTB, [...] que [...] não entrou no esquema [mas]
influenciou o Jefferson Campos, que é da Quadrangular e do PTB. Jefferson Campos foi
envolvido no esquema, não só pelo Nilton Capixaba como também pelo deputado Gilberto
Nascimento da Assembléia de Deus. Tanto é que as emendas do Jefferson Campos e do
Gilberto Nascimento são para a mesma entidade, uma tal de Associação Alfa Comunitária.
E aí [vai] uma crítica, porque: como é que uma associação comunitária, que não desenvolve
nenhum projeto na área da saúde, recebe em torno de quatro milhões de reais e é liberado? E
414
hospitais que têm credenciais aí na área da saúde não conseguem liberar? O que mostra que
o esquema da sanguessuga tinha uma grande ramificação dentro do Ministério da Saúde,
porque a entidade que você indicasse para ter uma ambulância ganhava. Você podia ter uma
padaria comunitária, sua padaria comunitária ganharia uma ambulância! E como justificar
isso? Então eram esquemas e regras que eram burladas dentro do Ministério da Saúde, com
ramificação dentro do Executivo, que eu acho que logo isso vai ser descoberto. [...] Então
está aí. Por que que acabou os da Quadrangular envolvidos? Os três da Quadrangular são do
PTB; foram aí aliciados por Nilton Capixaba. Os da Universal pelo bispo Rodrigues, que
estava no esquema no passado. E os da Assembléia de Deus assim, porque Nilton Capixaba
é da Assembléia de Deus”.
803
Em seguida Mônica apresenta um exemplo de como um deputado recém-eleito, ao
fazer os primeiros contatos para se instalar em Brasília tratar de apartamento, obter sala
para instalar seu gabinete na Câmara, tentar constituir uma equipe de trabalho, escolher
chefe de gabinete e assessores tinha grande probabilidade de ser cercado por pessoas que
participavam da “operação sanguessuga”. Foi o que ocorreu com o deputado Isaías
Silvestre, de Minas Gerais, e outros:
Eu vou contar uma particularidade para você. Deixe eu citar dois nomes, que aí você vai
entender o que eu estou falando: o deputado Renildo Leal, ele era médico, jovem, da
Assembléia de Deus do Pará e do PTB. Ele não foi reeleito para 2003. Como ele não foi
reeleito, o seu gabinete ficou sem emprego. Os seus funcionários ficaram sem emprego.
Chegou na Casa o deputado Isaías Silvestre, filho do pastor de Minas Gerais. Isaías Silvestre
acho que é do PSC, não tenho certeza do partido dele... ou PPS, alguma coisa assim.
Quando Isaías Silvestre chegou na Casa, pastor, dinâmico, querendo fazer algum trabalho
[...] nos primeiros momentos que ele esteve na Casa, logo depois de eleito, ainda em
novembro de 2002, [...]. O que acontece? Ele recebe um telefonema do amigo que não foi
eleito, que é o Renildo Leal do Pará, indicando o chefe de gabinete dele para trabalhar com
ele... Ia ficar desempregado: O menino é bom, é inteligente, fez Direito, chama-se
[Fulano]”. O deputado Isaías Silvestre claro que acatou a sugestão do amigo, porque seria
um menino que é formado em Direito, inteligente”, que já estava na Casa. Então Isaías
Silvestre contratou o [Fulano]. Detalhe: Este funcionário estava no esquema com Renildo
Leal. Então quando Isaías Silvestre entra na Câmara, o assessor também convence ele a
entrar no esquema. E, do mesmo jeito que o Renildo Leal se deu mal, o Isaías Silvestre
também se deu mal por causa de um assessor. Agora, a exemplo [deste], existiram outros
casos de parlamentares. Por exemplo, o pastor Pedro Ribeiro [...] quando o bispo Rodrigues
803
Ibidem.
415
foi cassado, a assessora dele ficou desempregada, a irmã Ada. E o pastor Pedro Ribeiro
gostava muito da irmã Ada. O pastor Pedro Ribeiro deu emprego a ela, só que ela estava no
esquema. Só que nem deu tempo dela convencer o pastor Pedro entrar no esquema, porque o
pastor Pedro não se envolvia com questões de saúde. Ele tinha um outro trabalho lá no
Estado dele. Então, alguns parlamentares [...] foram vítimas de assessores corruptos,
ambiciosos, que acabaram colocando os chefes nos esquemas, tão somente para que eles
pudessem também ganhar, porque alguns assessores também ganhavam com isso. Tipo
assim: você chama o rapaz da PLANAM e fala: “Olha, não precisa oferecer dez por cento
com o meu deputado. Ele é novo, não entende... Oferece cinco: cinco para ele e cinco para
mim. Por isso que há muito dinheiro entrando em conta de assessores. Não pensa que são
assessores que recebem para entregar para o deputado não. Não. São assessores que também
ficam com parte do dinheiro do esquema.
804
A assessora Mônica recapitula os nomes de deputados mais atuantes e aproveita
para lembrar de outros e, também, para declarar que houve assessores bastante ativos
nessas operações:
Citei alguns nomes: Nilton Capixaba, Lino Rossi, Neuton Lima, Gilberto Nascimento, Isaías
Silvestre, Josué Bengtson, o Jefferson Campos. Esses são os da bancada evangélica, que eu
vejo assim mais articulados com o esquema. E, destacando um também que é o Wanderval,
o bispo Wanderval, que esteve envolvido, e o bispo... o Vieira Reis, o deputado Vieira Reis,
do Rio de Janeiro, e que o maior articulador nessa história foi o assessor dele, foi o que foi
preso. E você vai identificar a imagem do assessor dele. É aquele que, quando aparecem as
imagens da prisão, é um barbudo, gordinho, algemado para trás, vestido de bermuda. Aquele
é assessor do deputado Vieira Reis, é o Cristiano. Um menino que a gente gostava muito,
mas que a gente sempre soube que estava no esquema.
805
Sobre existência de outras redes de empresas envolvidas com atividades de
corrupção, a fonte confirmou que existem:
É verdade sim. Deixa eu te contar uma coisa. No Estado do Rio Grande do Sul o esquema
da sanguessuga não prosperou muito, [...] porque o Ministério Público Estadual é muito,
muito exigente. O Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul é tido para mim
como o mais eficiente do Brasil. Inclusive foi uma grande surpresa para mim. Bom, que o
Judiciário do Rio Grande do Sul é pioneiro no Brasil em jurisprudências, em julgado, isso
todo mundo sabe. Mas o controle lá, também, é muito maior. E o Tribunal de Contas do
804
Ibidem.
805
Ibidem.
416
Estado não aceitava que uma prefeitura do Rio Grande do Sul comprasse ambulâncias de
uma empresa do Mato Grosso, sendo que no Estado tem fabricantes, tem montadoras de
ambulâncias. Então os prefeitos que tentaram comprar com a PLANAM tiveram suas
prestações de contas recusadas. A partir daí o Estado do Rio Grande do Sul não prosperou
no esquema. Só que, ao saber que empresas de fora não podiam ganhar, empresas locais do
Rio Grande do Sul começaram a se organizar, para oferecerem para os parlamentares do Rio
Grande e os prefeitos o mesmo esquema. Então, de repente vai ser estourado ali no Rio
Grande uma outra PLANAM, que não tem nada a ver com seu Darci, mas copiou o modelo. E
aí, isso na área da Saúde, mas eu quero te lembrar que o mesmo esquema, parecido com o
das ambulâncias, já está sendo diagnosticado no Ministério da Ciência e Tecnologia,
empresas que pegavam ônibus e transformavam em escolas de informática. Então outros
segmentos vão surgir também: os ônibus de informática, como eu creio que vai estourar
logo a questão de umas emendas na área da Cultura, e aí vai pegar alguns evangélicos. Se
você olhar as emendas dos evangélicos, você vai ver que alguns deles colocaram uma
emenda para um tal de Show na...” é... “Word Gospel Brasil, alguma coisa assim. E o
mesmo grupo que está fazendo o Word Gospel no Paraná está fazendo em São Paulo, é a
mesma empresa que organiza. Então essa empresa veio procurar o deputado para oferecer
uma emenda ao Ministério da Cultura, para um evento gospel, que eles conseguiam liberar a
emenda, mas desde que eles organizassem o evento no Estado. Então existem sim outros
esquemas, que eu creio que vão começar a surgir logo, logo, e que vai começar a estourar,
que vai envolver deputados evangélicos, não-evangélicos. Eu creio que agora pode se fazer
uma análise criteriosa nas emendas dos parlamentares. E nesse sentido, Saulo, eu mesma
comecei a investigar algumas coisas. E... descobri assim uma coisa superchata, (até vou te
mandar algumas matérias sobre isso). Por exemplo, o deputado Mário de Oliveira ele não
está envolvido diretamente com os sanguessugas. Eu sei que ele negociou, mas o nome dele
não apareceu. Mas se você olhar as emendas dele de 2002 e 2003, ele mandou as emendas
na íntegra para o Hospital Fábio Varela, que é do deputado Lael Varela. Entendeu? Como é
que você pega todas as suas emendas, você que teve votos no Estado inteiro e joga todas as
suas emendas em um único hospital do seu amigo? E esse Lael Varela já está sendo
investigado por outros casos de corrupção, inclusive na questão do “mensalão”. Então, se a
Justiça quiser, a Controladoria Geral da União quiser, o TCU quiser, não precisa ir longe,
uma pequena análise na indicação das emendas vai observar que havia muitos esquemas no
Congresso Nacional que envolviam as emendas. Aí você pergunta: e por que não veio à
tona até agora? E aqui, Saulo, eu termino a minha entrevista te falando o seguinte: é muito
fácil se diagnosticar, simples, se descobre. Mas, as entranhas de um processo desses vai
requerer provas e vai requerer denúncias.
806
806
Ibidem.
417
Sobre outros parlamentares citados nas denúncias apuradas pela CPMI, transcreve-
se resumos do jornal O Estado de S. Paulo, publicados em 19/07/2006, para que se possa
ter uma visão abrangente da extensão do problema no âmbito daqueles que compuseram a
Frente Parlamentar Evangélica, durante a 52ª legislatura:
Deputado Almeida de Jesus (PL-CE) - No livro caixa eletrônico da Planam, é atribuído ao
deputado um repasse de R$ 10 mil por intermédio de um terceiro. "Dep. Almeidinha de
Jesus - CE", informa a planilha. Está sob investigação em inquérito no Supremo. Membro e
Obreiro da Igreja Universal do Reino de Deus. Foi filiado ao PDT, PFL, PMDB e ao PTB.
Deputado Almir Moura (PFL-RJ) - Os integrantes do esquema tinham as senhas dos
projetos de Moura. Nos grampos, o empresário Nilton Simões, ligado ao esquema, conversa
com Luiz Antônio Vedoin sobre consultar Moura a respeito de uma terceira pessoa que está
"querendo pegar dinheiro" fora do combinado. É radialista e ministro evangélico. Foi filiado
ao PL e ao PMDB.
Deputado Cabo Júlio (PMDB-MG) - Dois repasses, no total de R$ 4,8 mil, são registrados.
Nos grampos, Alessandra Vedoin, empresária do esquema, reclama de um prefeito mineiro
e diz que em represália, vai suspender "o cheque do Cabo Júlio". Sua conta bancária está
nos arquivos da Planam. Está sob investigação em inquérito no STF. É policial militar e
integrante da bancada da segurança. Foi filiado ao PL, PSB, PSC e ao PST.
Deputado Cleonâncio Fonseca (PP-SE) - Documentos apreendidos pela PF indicam que o
esquema das ambulâncias tinha as senhas do deputado para acompanhamento de projetos.
Um funcionário de seu gabinete tem os dados bancários registrados nos arquivos da Planam.
Foi filiado a UDN, Arena, PDS, PFL, PMDB, PP, PPB, PPR, PRN e ao PSDB.
Deputada Edna Macedo (PTB-SP) - As escutas mostram contato constante e direto da
deputada com a quadrilha. Luiz Antônio pede (e obtém) os dados bancários de Otávio
Bezerra, filho de Edna, preso na Operação Sanguessuga. É irmã do bispo Edir Macedo da
Igreja Universal do Reino de Deus.
Deputado Isaías Silvestre (PSB-MG) - Os grampos indicam contato direto do deputado com
Darci Vedoin. Os documentos mostram que em 2004, os empresários do esquema detinham
a senha para acompanhar uma de suas emendas no Ministério da Saúde. Vice-líder do PSB,
está em seu primeiro mandato político.
Deputado Jefferson Campos (PTB-SP) - Em novembro de 2005, o deputado liga para Darci
Vedoin marcando um encontro. Outros empresários do esquema demonstram, nas escutas,
conhecer o deputado. É radialista, advogado, e Ministro do Evangelho. Foi secretário de
Ação Política do Estado de São Paulo.
418
Deputado João Batista (PP-SP) - Há referência, nas escutas, a um suposto pagamento de R$
5 mil para "Marcelo do João Batista". De fato, o deputado tem em seu gabinete funcionário
com esse nome. Os grampos mostram que Darci teria agendado encontros com o deputado e
que acompanhava de perto suas emendas. Está em seu primeiro mandato político.
Deputado João Mendes de Jesus (PSB-RJ) - Nas escutas da PF, Darci e seu filho Luiz
Antônio combinam, em 13 de fevereiro, de levar R$ 20,3 mil para o deputado na semana
seguinte. Uma planilha intitulada "em espécie", atribui R$ 21,7 mil a "João Mendes", que,
segundo a PF, seria "provavelmente" o deputado. Já foi bispo evangélico. Foi filiado ao
PDT, PL e ao PSL.
Deputado José Divino (PTB-RR) - Os grampos indicam contato direto do deputado com o
empresário Darci Vedoin. O número da conta corrente de Divino no Banco do Brasil estava
registrado nos arquivos da Planam. Radialista, exerce seu primeiro mandato como deputado
federal. Foi vice-líder do PMDB em 2004 e 2005.
Deputado Marcos Abramo (PP-SP) - Nos grampos, Jô, contadora de uma entidade paulista
favorecida com ambulâncias diz a Alessandro, empresário do esquema, que o deputado
Abramo "brigou, querendo a parte dele" na entrega de um veículo. "Quem fica em cima
quando vai entrar dinheiro para comprar veículo é o Marcos Abramo, através da Viviane e
do Júnior". Afirmou a contadora. Exerce seu primeiro mandato como deputado federal.
Deputado Pastor Amarildo (PSC-TO) - A contabilidade registra dois repasses de R$ 30 mil
no total. Tem emendas acompanhadas pelos empresários dos esquema. Amarildo é
integrante da bancada evangélica.
Deputado Paulo Baltazar (PSB-RJ) - Na contabilidade da Planam, os repasses para o
deputado e alguns assessores somam R$ 87,5 mil somente entre 2001 e 2002. Está sob
investigação formal no STF.
Deputado Raimundo Santos (PL-PA) - Nas escutas, um funcionário do gabinete de Santos
manda um recado para Darci. Se a ambulância destinada ao município de São Felix não for
entregue rápido, o deputado perde a eleição e Darci "não precisa procurar ele para mais nada
em Brasília". Raimundo é mencionado na coluna "observações" junto ao nome de Ubiratan
Novelino Filho. Novelino tinha seus dados bancários arquivados nos computadores da
Planam. Raimundo Santos exerce seu terceiro mandato como deputado federal.
Deputado Reginaldo Germano (PP-BA) - Nos grampos, Luiz Antônio orienta sua irmã
Alessandra a depositar R$ 15 mil na conta do deputado. Dita CPF, agência e conta. A
conversa ocorreu no dia 22 de dezembro de 2005. Germano é radialista e vice-líder do PP.
Deputado Vieira Reis (PRB-RJ) - Teve um funcionário seu C ristiano de Souza Bernardo
preso da Operação Sanguessuga. Conforme os documentos da PF, os integrantes do
419
esquema tinham as senhas pessoas do deputado para acompanhar emendas na Saúde. Reis é
radialista e está em seu primeiro mandato político.
Deputado Wanderval Santos (PL-SP) - No livro-caixa, há um repasse de R$ 50 mil. Tem as
emendas acompanhadas pelo grupo. Está sob investigação em inquérito do STF. Seu
assessor sacou R$ 100 mil das contas de Marcos Valério. O deputado foi absolvido pelo
plenário da Câmara que o livrou de perder o mandato por envolvimento no esquema do
mensalão, mas foi denunciado pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando
Souza.
Deputada Zelinda Novaes (PFL-BA) - Nos grampos, empresários do esquema comentam
que falaram com a deputada e ela "vai fazer (emendas) também". Em 2004, o esquema tinha
senha para acompanhar pelo menos uma emenda de sua autoria. A deputada foi integrante
do Conselho de Ética e presidiu o PFL Mulher.
A CPMI procedeu à apuração a partir de trabalhos realizados pelo Ministério
Público Federal, Corregedoria Geral da União e Polícia Federal. Ouviu depoimentos dos
proprietários da Planam e grupo de empresas ligadas a ela, bem como ouviu servidores
públicos denunciados. Remeteu essas denúncias aos parlamentares e recebeu suas
manifestações. Valeu-se ainda a Comissão de uma imensa quantidade de docume ntos:
Apenas para referir-se a arquivos digitais, à parte a documentação em papel, a CPMI
recebeu mais de 33.000 arquivos, entre gravações de áudio, transcrições de depoimentos,
fotocópias digitalizadas de documentos, etc”.
807
A Comissão teve acesso a gravações de
escutas telefônicas, foi obtida a quebra de sigilo bancário dos envolvidos. Também foram
consultados registros contábeis das firmas ligadas à grande rede de fraudes. A pesquisa
incluiu, também, o histórico de emendas individuais e coletivas de cada parlamentar citado.
Após esses trabalhos, foi redigido e divulgado o relatório parcial da CPMI que tem
sido citado nesta tese. Nele consta a natureza dos crimes cometidos, em diferentes “níveis
de comprometimento”, para cada pessoa investigada. O conjunto de delitos permite que o
relator conclua:
Os elementos objetivos inferidos a partir da leitura do apurado e comprovado, tanto nas
instâncias policial e judicial, como no âmbito deste órgão investigatório, configuram,
fundamentalmente, crimes contra a administração pública, sejam elas do tipo penal
807
CONGRESSO NACIONAL. Relatório dos trabalhos da CPMI “das Ambulâncias”. Brasília, agosto, 2006, p. 190-191.
420
capitulado como delitos praticados por servidor, sejam elas do tipo definido como crimes de
particular contra a coisa pública. No que diz respeito à primeira categoria de ilícitos, o
conjunto probatório, inquestionavelmente, aponta para a ocorrência dos crimes de concussão
(art.316 CP); corrupção passiva (317 CP); condescendência criminosa (320 CP) e advocacia
administrativa (321 CP). No que diz respeito à segunda categoria de ilícitos, a materialidade
comprovada indica, pelo menos, ter havido exploração de prestígio (332 CP) e corrupção
ativa (333 CP).
808
Sobre possíveis penas a serem aplicadas aos culpados, pelos órgãos competentes,
referiu-se o mesmo documento:
O texto da Lei Maior reputa como gravíssimas as ofensas aos princípios éticos reitores da
atividade administrativa. Tanto é assim que o §4º do citado art. 37 prevê o apenamento com
a suspensão dos direitos políticos, a perda do cargo público, a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário pela prática de ato que infrinja tal dever de conduta, tudo sem
prejuízo da ação penal cabível. Reiterando o preceito, o inciso V, do artigo 15, excepciona
das garantias relativas à intangibilidade dos direitos políticos os casos de improbidade. Para
preservar a moralidade no exercício dos mandatos legislativos é prevista a sanção máxima
(perda da representação) quando o congressista atentar contra o decoro parlamentar (art. 55,
inciso I), como tal entendido o abuso das prerrogativas ou a percepção de vantagem
indevida (art. 55, § 1º).
809
O relatório da CPMI esclareceu os limites de sua atividade e as providências que lhe
cabia cumprir após a apuração das denúncias:
Pelas razões de direito amplamente expostas, tem esta CPMI o dever de analisar, com
cuidado e precisão, os elementos de prova existentes capazes de legitimar uma
recomendação de abertura de processo no âmbito do Conselho de Ética das Casas do
Congresso Nacional. Inegavelmente, a materialidade de fatos ilícitos está comprovada além
de qualquer sombra de dúvida. O ordenamento jurídico foi fraudado em diversos aspectos
para legitimar compras espúrias, por diversos Municípios, de ambulâncias e equipamentos
médicos. No curso dos acontecimentos diversas pessoas se locupletaram. Não cabe a esta
Comissão indiciar ou decretar a culpabilidade de quem quer que seja. No exercício da sua
função investigadora cumpre, apenas e tão somente, identificar se os elementos de prova
obtidos configuram justa causa para recomendar à Mesa da Casa à qual pertence o
parlamentar o encaminhamento da matéria ao Conselho de Ética ou à continuidade das
808
Idem, p. 958.
809
Idem, p. 960.
421
investigações pela Corregedoria Parlamentar competente. Nesta instância, após amplo
contraditório, concluir-se-á pela culpabilidade ou não, recomendando o que de direito for ao
plenário. O que resta a esta Comissão fazer no momento é, com base nas provas disponíveis
relativamente ao elemento subjetivo, apontar os congressistas contras os quais há indícios
suficientes de participação no esquema delituoso. Em relação a estes, e tão somente a estes,
cabe recomendar à Mesa da Casa à qual pertença o encaminhamento da documentação ao
Conselho de Ética para as providências da sua alçada.
810
5.4.10 Encaminhamentos da CPMI
Na parte final do relatório da CPMI foram feitos dois tipos de encaminhamentos
para as Mesas do Congresso. Um grupo de 72 parlamentares foi considerado suspeito de
“conduta incompatível com o decoro parlamentar”. Outro grupo bem menor, composto por
18 deputados, foi poupado, por falta de indícios que justificassem apurações pelo Conselho
de Ética da Câmara. No que concerne aos evangélicos, a Comissão de Inquérito enquadrou
29 deles no primeiro grupo e apenas três no segundo.
811
A seguir são transcritos os trechos
do relatório, com os nomes dos 32 evangélicos citados, conforme classificação
mencionada:
Encaminhamento às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal
para instauração de processos disciplinares
Com fundamento no disposto no Capítulo 5 deste Relatório, esta Comissão Parlamentar
Mista de Inquérito decide, com relação aos parlamentares abaixo listados, enviar os
elementos de prova colhidos à Mesa da Casa Legislativa a que pertença o parlamentar,
com recomendação da respectiva remessa ao Conselho de Ética para apuração e
adoção das medidas regimentais da sua competência em razão de conduta
incompatível com o decoro parlamentar, com fundamento no art. 14, §4o, I da
Resolução no 25/2001 da Câmara dos Deputados e no art. 15, I, da Resolução no
20/1993.
1. Deputado Adelor Vieira
2. Deputado Agnaldo Muniz
810
Idem, p. 962.
811
Por oportuno, cabe lembrar que, em depoimento ao Juiz da 2ª Vara da Justiça Federal de Mato Grosso, o réu Darci José
Vedoin havia citado 39 parlamentares evangélicos como participantes das operações de direcionamento de emendas e
recebimento de comissões. E havia relacionado 15 nomes de evangélicos sobre os quais ele negava qualquer envolvimento com o
esquema. Portanto, pode-se concluir que sete dos nomes de evangélicos denunciados por Vedoin foram isentados de suspeição
pela CPMI.
422
4. Deputado Almeida de Jesus
6. Deputado Almir Moura
10. Deputado Cabo Júlio
12. Deputado Carlos Nader
15. Deputado Cleonâncio Fonseca
20. Deputada Edna Macedo
26. Deputado Heleno Silva
30. Deputado Isaias Silvestre
31. Deputado João Batista
36. Deputado João Mendes de Jesus
38. Deputado Jorge Pinheiro
39. Deputado José Divino
40. Deputado José Militão
41. Deputado Josué Bengtson
44. Deputado Lino Rossi
47. Deputado Marcos Abramo
48. Deputado Marcos de Jesus
50. Deputado Neuton Lima
51. Deputado Nilton Capixaba
53. Deputado Pastor Amarildo
54. Deputado Paulo Baltazar
56. Deputado Paulo Gouveia
58. Deputado Raimundo Santos
59. Deputado Reginaldo Germano
66. Deputado Vieira Reis
67. Deputado Wanderval Santos
70. Senador Magno Malta
Arquivamento das imputações em relação aos parlamentares contra os quais
não foram apurados indícios suficientes de prática de condutas
incompatíveis com o decoro parlamentar
Com fundamento no disposto no Capítulo 5 deste Relatório, bem como nas manifestações
prévias apresentadas, esta Comissão Parlamentar M ista de Inquérito decide, com relação aos
parlamentares abaixo listados, deixar de encaminhar as respectivas imputações,
determinando seu arquivamento, em virtude da inexistência de provas para
recomendar a instauração de procedimento disciplinar.
5. Deputado Gilberto Nascimento
8. Deputado Jefferson Campos
423
18. Deputada Zelinda Novaes.
812
5.4.11 Breve comentário
O objetivo desta pesquisa não foi o de analisar vulnerabilidades do sistema de
emendas ao Orçamento, nem fragilidades dos instrumentos de fiscalização do Estado, que
se têm mostrado insuficientes para acompanhar a execução de programas e convênios entre
entidades do Governo, prefeituras e organizações civis. Mesmo assim, convém tecer
algumas observações. Fica evidenciado, por este episódio dos “sanguessugas”, que não há
um compromisso de prefeitos e parlamentares com o planejamento de políticas públicas,
enquanto se destaca forte interesse, tanto no Executivo como no Legislativo, para que o
sistema de saúde se mantenha à mercê de clientelismos, porque isto dá maior espaço para
práticas populistas. Este vício, foi fator, dentre outros, que permitiu relações promíscuas da
quadrilha Vedoin com as instituições do Estado, conforme mencionou a servidora Maria da
Penha Lino, quando explicava o modus operandi da quadrilha à Justiça Federal:
... QUE normalmente, possuem maior prioridade nas análises os projetos decorrentes de
emendas parlamentares; QUE pelo fato do orçamento ser autorizativo, o efetivo pagamento
dependerá de negociações políticas junto à Casa Civil e ao Planalto; QUE as emendas
parlamentares individuais, na área de saúde, incluídas na lei orçamentária, não levam em
consideração os planos de saúde elaborados e aprovados pelos respectivos conselhos de
saúde dos municípios; QUE essa falta de sintonia entre as emendas e o plano municipal é
que dá espaço para que os parlamentares possam eleger outras prioridades, as quais nem
sempre coincidem com as prioridades eleitas pelo conselho de saúde; QUE essa margem de
liberdade é que, também, permitiu, em certa medida, com que a empresa Planam atuasse de
forma tão efetiva na elaboração dos projetos e na definição de seus objetos, sem que fossem
levadas em consideração as necessidades das entidades beneficiadas; ...
813
O relatório da CPMI também destaca essa prática de liberação de emendas em troca
de voto do parlamentar em favor do Governo, pratica esta que, embora antiga, tem a mesma
lógica do “mensalão” mais recente. Consta no relatório o seguinte parágrafo:
812
CONGRESSO NACIONAL. Relatório dos trabalhos da CPMI “das Ambulâncias. Brasília, agosto, 2006, p. 965-973.
Manteve-se a numeração das listas de parlamentares citados e os grifos do documento original. Foram omitidos, obviamente, os
nomes dos parlamentares não-evangélicos.
813
Idem, p. 59.
424
Ao longo dos anos, diversos atores que começaram a participar do processo de elaboração
de emendas parlamentares e posterior formalização e execução de convênios tornaram-se
profundos conhecedores desses trâmites e exigências, passando a atuar na assessoria de
parlamentares exclusivamente nessa área, tornando-se, por sua qualificação, profissionais
valorizados. Na outra perspectiva, as emendas parlamentares individuais foram tendo seus
valores aumentados de exercício a exercício, chegando hoje a R$ 5 milhões por deputado
por ano. Ao longo de diversos Governos, [para] sua aprovação estabeleceu-se mediação na
relação entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo, e são inúmeras as denúncias
veiculadas na imprensa, nos últimos anos, de liberação de valores altíssimos a título de
emendas parlamentares em datas próximas às votações de matérias do interesse do Poder
Executivo, ou em anos eleitorais. Nesse contexto, proliferaram, portanto, a ocorrência de
ilícitos, mediante a participação de atores como o Grupo Planam, que representa a dimensão
empresarial de um esquema que conta com servidores do Poder Executivo que facilitam a
tramitação dos processos em seus respectivos órgãos, e com os agentes especializados que
atuam como assessores parlamentares ou mesmo na qualidade de consultores para
elaboração de projetos, e parlamentares.
814
5.5 Parlamentares evangélicos (1999-2007): avaliações.
Nesta seção são apresentadas avaliações externas e auto-avaliações do que foi o
grupo de parlamentares evangélicos nas legislaturas de 1999-2003 e 2003-2007, bem como
se tece considerações sobre a nova safra de políticos evangélicos eleitos para o quatriênio
2007-2011, provenientes do mesmo subcampo religioso.
O conjunto de parlamentares evangélicos pode variar em quantidade, dentro de uma
legislatura, devido a vários motivos. Além dos titulares eleitos, há suplentes, que aguardam
oportunidades para assumirem o posto, o que de fato ocorre, seja por impedimento do
titular, seja como resultado de acordos que envolvem partidos, forças políticas regionais e
estratégias das próprias igrejas. Há casos de parlamentares que se afastam para assumir
ministérios e secretárias de governo, por exemplo, e há situações em que o parlamentar se
afasta na metade do mandato, porque foi eleito para o cargo de prefeito ou vice-prefeito.
Deste modo, as listas de parlamentares de 1999-2003, 2003-07 e 2007-11, apresentadas nos
anexos, referentes à 51ª, 52ª e 53ª legislaturas, constituem tentativa de incluir todos os
814
Idem, p. 116.
425
titulares e suplentes que, em algum momento, assumiram o mandato. No caso de apenas
quatro dos 115 identificados, não foi possível definir a igreja que freqüentam, embora
fontes consultadas registrem que se trata de “parlamentar evangélico”, no sentido estrito
que se adota nesta pesquisa, ou seja, aquele que pertence a igrejas protestantes, pentecostais
e neopentecostais.
No efetivo exercício parlamentar, pode-se afirmar que, em média, a 51ª legislatura
contou com 51 deputados federais e dois senadores, a 52ª teve 58 deputados e três
senadores e a 53ª legislatura, que será iniciada em março de 2007, deve apresentar algo da
ordem de 40 deputados e dois senadores. No Senado, para esta próxima legislatura, deixou-
se de incluir a ministra Marina Silva, titular do Ministério do Meio Ambiente, e Paulo
Octávio, vice-governador eleito do Distrito Federal.
815
Essa safra de políticos das três últimas legislaturas referidas é composta de 68%
pertencentes a denominações pentecostais e neopentecostais.
816
Durante o período de 1999
a 2007, as Assembléias de Deus contaram com 35 parlamentares, enquanto a Igreja
Universal teve o concurso de 29 representantes. Tendo em vista os modelos e práticas de
funcionamento dessas igrejas, pode-se afirmar que a Universal esteve mais forte como
grupo de pressão, embora sua bancada fosse menor. Examinando-se, porém, as
quantidades, ao longo do período, as Assembléias contaram com 16 e 23 deputados na 51ª e
52ª legislaturas e deverá ter apenas 13, na 53ª legislatura. Os números da Igreja Universal
foram de 13 e 16, devendo trazer somente seis deputados, nas legislaturas respectivas.
817
De acordo com as quantidades apresentadas, a nova bancada das Assembléias de Deus
corresponderá a 57% da que expirou seu mandato em 2007, enquanto a bancada da IURD
será de apenas 38% da que era, no mesmo período. Pode-se afirmar que o escândalo dos
“sanguessugas” foi o principal fator dessas reduções, tendo causado maior redução relativa
no grupo da Universal, porque também sua bancada foi a que teve mais parlamentares
citados nos processos de corrupção.
815
Na data em que foi redigido este parágrafo, 02 de janeiro de 2007, havia possibilidade de Marina Silva e Paulo Octávio estarem
fora do Senado da República, na legislatura de 2007-11.
816
Do total de 111 parlamentares cuja igreja foi identificada, 76 são pentecostais ou neopentecostais.
817
Os totais de 35 e 29 representantes das Assembléias e Universal, no período de 1999-2007, não correspondem, obviamente, às
somas de parlamentares das três legislaturas, visto que alguns deles conseguiram ser reeleitos.
426
5.5.1 DIAP
O acompanhamento da atuação dos evangélicos no Congresso é feito, sob a ótica do
movimento sindical, pelo DIAP.
818
Este departamento distingue a “bancada evangélica”
como uma das sete bancadas informais mais atuantes na Câmara e Senado.
819
Sabe-se que
existem outros tipos de acompanhamento, como os que são feitos para atender demandas
dos setores bancário e industrial, por exemplo, e outros trabalhos de escritórios de
consultoria em assuntos econômicos e políticos. Todavia, somente se teve acesso às
pesquisas do DIAP, a partir das quais se examinou o que continha acerca dos evangélicos.
Da série denominada Os “Cabeças” do Congresso Nacional foram examinadas as edições
de 1998, 1999, 2002, 2003 e 2006.
820
Esta publicação tem como proposta
identificar, anualmente, os 100 parlamentares com mais habilidades para elaborar,
interpretar, debater ou dominar regras e normas do processo decisório, bem como para
manipular recursos de poder, de tal modo que suas preferências ou do grupo que lideram
prevaleçam no conflito político.
821
Nessas cinco edições examinadas apenas seis dos 115 perlamentares evangélicos
foram reconhecidos como “cabeças” pelo DIAP, ou seja, 0,5% do conjunto, o que reforça o
enquadramento dessa “bancada” na condição de “baixo clero”.
A classificação do DIAP contempla cinco categorias de atuação, assim descritas:
FORMADORES DE OPINIÃO São parlamentares [...] chamados a arbitrar conflitos ou
conduzir negociações políticas de grande relevância. Normalmente, são deputados ou
senadores experientes, com trânsito fácil entre as diversas correntes e segmentos
representados no Congresso e visão abrangente dos problemas do País. [...] São os que se
pode chamar de líderes de alta patente, respeitados e legitimados pelo grupo ou corrente
política que lideram.
818
DIAP é a sigla do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.
819
As “bancadas informais” destacadas pelo DIAP são: ruralista, sindicalista, evangélica, empresarial, da saúde, da educação e dos
meios de comunicação. (Cf. DIAP. Radiografia do novo Congresso: legislatura 2007-2011. Série Estudos Políticos. Ano IV.
Brasília: DIAP, novembro de 2006.)
820
As edições referentes a 2000, 2001, 2004 e 2005 da série Os “Cabeças” do Congresso Nacional já se esgotaram.
821
DIAP. Os “Cabeças” do Congresso Nacional: pesquisa sobre os 100 parlamentares mais influentes. Ano XIII. Brasília:
DIAP, 2006, p. 9.
427
ARTICULADORES / ORGANIZADORES São parlamentares com excelente trânsito nas
diversas correntes políticas, cuja facilidade de interpretar o pensamento da maioria os
credencia a ordenar e criar as condições para o consenso. [...] Como interlocutores dos
líderes de opinião, encarregam-se de difundir e sustentar as decisões ou intenções dos
formadores de opinião. [...] Normalmente, têm livre acesso aos bastidores, ao poder
institucional e alto grau de fidelidade às diretrizes partidárias ou ideológicas do grupo
político que integram. [...]
NEGOCIADORES Em geral líderes partidários, os negociadores são aqueles
parlamentares que, investidos de autoridade para firmar e honrar compromissos, sentam-se á
mesa de negociação respaldados para tomar decisões. [...] Procuram previamente conhecer
as aspirações e bases de barganha dos interlocutores para estabelecer sua tática de
convencimento. [...] É bom negociador aquele parlamentar que, sem abrir mão de suas
convicções políticas, respeita a vontade da maioria mantendo coeso seu grupo político.
DEBATEDORES São parlamentares ativos, atentos aos acontecimentos e principalmente
com grande senso de oportunidade e capacidade de repercutir, seja no plenário ou na
imprensa, os fatos políticos gerados dentro ou fora do Congresso. São, por essência,
parlamentares extrovertidos, que procuram ocupar espaços e explorar os assuntos que
possam ser notícia. [...] Com suas questões de ordem, de encaminhamento, discussão de
matérias em votação, obstrução do processo deliberativo, dominam a cena e contribuem
decisivamente na dinâmica do Congresso. São os parlamentares mais procurados pela
imprensa.
FORMULADORES São os parlamentares que se dedicam à elaboração de textos com
propostas para deliberação. Normalmente são juristas, economistas ou pessoas que se
especializaram em determinada área. [...] O debate, a dinâmica e a agenda do Congresso são
fornecidos basicamente pelos formuladores, que dão forma às idéias e interesses que
circulam no Congresso.
822
O reconhecimento do DIAP à atuação dos evangélicos pode ser resumido nas
referências feitas aos seis parlamentares abaixo, dos quais são apresentadas informações
mais detalhadas de quatro deles:
Deputado Walter Pinheiro (PT-BA), da denominação batista, assíduo
freqüentador dos cultos organizados pela Frente Parlamentar Evangélica, foi o único
parlamentar desta frente que constou nas cinco edições dos “Cabeças” do Congresso
examinadas. Ele teve como característica principal reconhecida a de debatedor, em quatro
822
Idem, p. 13-14.
428
edições, e de articulador-organizador, em uma. Como característica secundária ele foi
apontado como negociador, por quatro vezes. A publicação de 2006 trouxe o seguinte
comentário sobre o parlamentar baiano:
Conhecedor profundo de assuntos de infra -estrutura, inclusão digital, telecomunicações,
ciência e tecnologia, é muito respeitado pela qualidade de seus pronunciamentos. É autor do
projeto de lei que obriga o governo a utilizar o software livre em seus computadores.
Oriundo do movimento sindical, tem sido um defensor incansável dos assalariados,
incluindo trabalhadores do setor privado, servidores públicos e aposentados e pensionistas.
Acompanha e defende, com o mesmo empenho que nutre pelo patrimônio público e
interesses nacionais, as demandas do Nordeste em geral e da Bahia em particular. Ex-líder
do PT na Câmara, com excelente trânsito no Congresso, é um dos mais competentes e
eficazes negociadores do partido. Destaca-se como articulador.
823
Deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ), coordenador da bancada da Igreja Universal
até fevereiro de 2004. Nas cinco edições dos “Cabeças” do Congresso, ele foi classificado
por três vezes como articulador-organizador, sua característica principal, e como
negociador, característica secundária, em uma das ocasiões. A partir de 2004, Rodrigues
teve seu nome vinculado ao escândalo do “mensalão”, o que o levou a renunciar ao
mandato. Em 2005, já sem mandato, ele foi citado nos processos referentes à máfia dos
“sanguessugas”. Devido a estes episódios, ele ficou fora das avaliações do DIAP, desde
2004. O último registro sobre sua atuação, em 2003, foi o seguinte:
Fundador e coordenador político da Igreja Universal do Reino de Deus, é um dos principais
líderes evangélicos no Congresso. Vice-líder do PL na Câmara e membro titular da
Comissão de Constituição e Justiça, atua na defesa da imunidade tributária das entidades
sociais, religiosas, filantrópicas e culturais, bem como no combate à prostituição infantil e à
propaganda abusiva das indústrias tabagistas e de bebidas alcoólicas. Ativo nos trabalhos de
plenário e das comissões, seus pronunciamentos abordam temas regionais e nacionais,
especialmente sobre questões morais, temas da infância e verbas para programas sociais.
Destaca-se como articulador.
824
Senadora Marina Silva (PT-AC) membro da Assembléia de Deus. Das edições
dos “Cabeças” do Congresso examinadas, ela comparece em apenas duas, porque foi
823
Idem, p. 45.
824
DIAP. Os “Cabeças” do Congresso Nacional : pesquisa sobre os 100 parlamentares mais influentes. Ano X. Brasília: DIAP,
2003, p. 24.
429
requisitada pelo Governo Lula para ocupar o Ministério do Meio Ambiente. O DIAP
reconheceu-a, prioritariamente, como debatedora, e, em segundo lugar, como negociadora,
em ambas as ocasiões. Em 2002, último ano em que Marina atuou no Congresso, o DIAP
registrou a seguinte avaliação:
Senadora, 1º mandato, acreana, professora. Vinculada aos movimentos ecológico e sindical,
ingressou na vida pública como vereadora em Rio Branco (1989-91) e deputada estadual
(1991-95). Formada em história, sua trajetória política sempre esteve voltada para a defesa
dos menos favorecidos, da educação popular e dos seringueiros, além do tema que a tornou
conhecida internacionalmente: meio ambiente. Ex-líder do bloco de oposição no Senado
PT, PDT, PSB e PPS é uma parlamentar aguerrida. Debatedora qualificada, é muito ativa
nos debates de plenário. Foi a única representante do Parlamento brasileiro que o presidente
dos Estados Unidos, em visita ao Brasil, fez questão de conhecer. Esquerda.
825
Senador Paulo Octávio (PFL-DF) Vinculado à Igreja Sara Nossa Terra, teve uma
indicação do DIAP, quando exercia mandato de deputado federal (1999-2003), e outra, na
qualidade de senador (2003-11). Em ambas as oportunidades ele foi classificado,
principalmente como articulador-organizador, mas também foi reconhecido uma vez como
debatedor e outra vez como formulador, nestes casos como características secundárias. Na
edição dos “Cabeças” de 2006, há o seguinte destaque:
Dirigente empresarial e grande incorporador do Distrito Federal. [...] Casado com uma neta
de Juscelino Kubitschek, é um defensor entusiasta de Brasília. Além da luta para manter a
sede dos órgãos federais no DF, para a inclusão de Brasília nos roteiros turísticos, foi
membro da Comissão Pró-Olimpíadas Brasília 2000 e presidente da Associação Brasília
Olímpica 2000 e 2004. Deputado federal por dois mandatos, estreou no Senado com
desenvoltura de veterano. Com bom trânsito no Congresso, foi vice-presidente da Comissão
de Assuntos Econômicos e presidente da Subcomissão de Turismo no Senado. Atual
terceiro-secretário do Senado, destaca-se como articulador.
826
Senador Íris Rezende (PMDB-GO) Tem seu nome associado à Igreja Cristã
Evangélica. Cumpriu mandato de 1995 a 2003. O DIAP registrou sua atuação nas edições
de 1998, 99 e 2002, como articulador-organizador. Nesta última há a seguinte informação:
825
Idem. Ano IX. Brasília: DIAP, 2002, p. 40.
826
Idem. Ano XIII. Brasília: DIAP, 2006, p. 40.
430
Político experiente, foi vereador, deputado estadual, prefeito de Goiânia, governador do
Estado de Goiás por dois mandatos e ministro da Agricultura no governo Sarney e da
Justiça, no primeiro governo de FHC. Foi presidente das Comissões de Constituição e
Justiça e de Infra-Estrutura do Senado. Parlamentar atuante, presidiu a Comissão Mista que
examinou os Projetos de Segurança Pública. Grande liderança regional no Estado de Goiás,
goza de excelente prestígio e trânsito no Congresso, onde se destaca como articulador.
Centro.
827
Deputado Ônyx Lorenzoni (PFL-RS) luterano, seu nome constou na lista dos
cem “cabeças” de 2003, como debatedor, contudo não há informações adicionais sobre o
parlamentar nessa publicação do DIAP.
Como se pode observar, dos seis “cabeças” evangélicos do Congresso, houve
apenas um deputado da Igreja Universal e uma senadora da Assembléia de Deus, Carlos
Rodrigues e Marina Silva, respectivamente. O bispo Rodrigues era, de fato, a voz de
comando da Universal, enquanto coordenou a bancada desta Igreja. Quanto a senadora
Marina, não existe vínculo dela com a instituição Assembléia de Deus que a credencie
como voz política da denominação. Durante esta pesquisa, foram feitas reiteradas tentativas
para entrevistá-la, como liderança política da Assembléia. Finalmente, sua assessora e
porta-voz, a antropóloga evangélica Jane Villas-Boas, esclareceu a relação entre Marina e a
Assembléia de Deus, conforme se pode depreender da leitura de trechos de emails trocados
entre dezembro de 2005 e agosto de 2006, transcritos a seguir:
ENTREVISTADOR:
Jane, [...] as questões [...] relacionadas com política e cultura interna da Assembléia de Deus
tocam em pontos sobre os quais eu gostaria de saber como a Ministra pensa, pois de
qualquer maneira suponho que ela pertence a esta denominação e não concorda com muita
coisa que faz parte da tradicional cultura assembleiana...
ASSESSORA DA MINISTRA MARINA:
... Em relação ao que você propõe, tenho certeza que ela não teria um depoimento sobre
dificuldades de ser evangélica e de ser política. Não é essa a experiência dela. Pelo
contrário, as pessoas a respeitam muito. Do Presidente Lula ao porteiro do Ministério.
Nunca a vi enfrentar qualquer constrangimento por ser mulher, ou negra, ou evangélica ou
política. Como ambientalista e ministra ela tem pessoas que não gostam da atuação dela,
827
Idem. Ano IX. Brasília: DIAP, 2002, p. 32.
431
alguns que até torcem para que ela desapareça da face da terra. Mas esse não é seu tema, não
é?
ENTREVISTADOR:
Jane, [...] Você me deu um ótimo esclarecimento. [...]Diante disto, veja como pode me
ajudar nesta pesquisa. Suas opiniões são valiosas para mim. Quero a manifestação da
Ministra, porém seus feedbacks como assessora e antropóloga são importantíssimos. Se vc.
permitir, usarei suas opiniões, tendo o cuidado de não identificar a fonte, citando apenas que
se trata de “uma assessora de ministério”, ou algo semelhante.
[Percebo que] a Ministra não tem dificuldade com a questão que levantei, porque se trata da
relação entre uma personalidade pública que atua neste espaço, dando um testemunho ético
reconhecido. Logo, temos que mudar o enfoque. Talvez devamos procurar saber a visão
crítica da Ministra em relação ao grupo religioso, no qual ela se converteu e se alimenta
comunitariamente como cristã, e a forma como este grupo pratica política interna e externa.
[...] No caso da entrevista com a ministra, pondere o seguinte:
1) Discute-se historicamente a relação Igreja e Política. A Assembléia de Deus, da qual a
Ministra é membro (suponho), optou por atuar na política (parlamentos, prefeituras etc.)
de forma corporativa, conseguindo carrear recursos e exercer influência nas legislações
federal, estadual e municipal, em benefício do próprio grupo religioso. (Isto não chega a
ser estranho, num País que nasceu como empresa de exploração da Coroa Portuguesa
atrelada à Igreja Católica. Todavia é estranho para uma tradição protestante que pregava
a separação entre Igreja e Estado. É preciso reconhecer, também, que o Pentecostalismo
e o Neopentecostalismo não prezam muito esta tradição).
2) Gostaria de saber o que pensa a Ministra sobre esta opção quase constantiniana da AD,
cuja meta é eleger vereadores indicados pela Igreja em cada um dos 5.600 municípios
brasileiros, além de prefeitos, vice-prefeitos, deputados estaduais e federais e outros
cargos mais importantes, onde for possível. Sabemos, também, que há um sonho de
conseguir eleger um presidente evangélico.
3) Como a Ministra é assembleiana, pergunto se AD (e IURD) já tentaram aproximar-se
dela com intuitos corporativos, por exemplo, para beneficiarem-se do seu prestígio a
fim de abrir portas no governo, ou conseguir algum tipo de vantagem. (Vantagem
legítima, evidentemente, pois acredito que ninguém teria coragem de procurar a
Ministra sem fundamento legal e legítimo). (a) Saulo.
ASSESSORA DA MINISTRA (email de 29/08/2006):
... Penso que você já deve ter sido "estrangulado" pelo calendário de sua tese. Portanto é
provável que já estejamos em um quadro de "decurso de prazo". Mas ainda assim, gostaria
de agir civilizadamente com sua demanda e dar as respostas que devem ser dadas.
1. As suas linhas de investigação são muito estimulantes, e sua atuação missionária
certamente irá nutrir quem busque por esse tipo de esforço que você está fazendo. Por isso
432
mesmo a Ministra, que realmente não tem uma participação orgânica na AD, ela apenas
congrega e faz pregações em cultos quando é convidada (em todas as denominações), não
gostaria de emitir opiniões formadas por demanda, sem a correspondente vivência. Se assim
o fizesse, estaria praticando uma leviandade com a comunidade em que ela congrega e, de
certa forma, com toda a AD. A manifestação de uma visão crítica, como você coloca ser seu
objetivo identificar, supõe a doação prévia de esforço e investimento pessoal na interação
com os demais membros, senão ficaria vazia, talvez pernóstica, não é mesmo?
2. Não sei exatamente, da minha correspondência com você, o que você considerou "minha
opinião", mas se for útil para você, desde que eu tenha escrito, pode citar. Gostarei de ajudar
sua missão.
3. A pergunta 3, posso responder que quando uma pessoa tem uma imagem pública, e uma
prática que sustenta essa imagem, de ser ética, dificilmente alguém aparece para fazer
qualquer proposta que agrida os princípios que essa pessoa tenha. Assim, não soube jamais
de qualquer tentativa de obter tráfico de influência de dirigentes da AD junto à Ministra. Há
pedidos de ajuda, de membros da Igreja em que ela congrega, que para serem atendidos
dependem de outros Ministérios. Mas eles vêm de pessoas simples, que não entendem do
funcionamento do mundo das instituições públicas, suas etiquetas, protocolos e códigos de
conduta. Não considero que sejam fruto de uma cultura organizacional ou alguma estratégia
corporativa. Até porque quando explico os limites protocolares da atuação de um Ministro
em relação á área de responsabilidade de outros, eles entendem, às vezes ficam
envergonhados por não ter pensado sobre as circunstâncias e consequências, enfim, vê-se
que foram movidos pelo objetivo de achar solução para algo que os está preocupando, nada
mais.
[...] Concluindo, meu irmão: quer uma boa entrevista com a Marina? Escreva um livro sobre
meio ambiente! { :-) } para circular entre os evangélicos. Vai ser uma entrevista tremenda!
Carinhosamente, Jane.
(email de 31/08/2006):
... Pode citar-me nominalmente, porque a Ministra só tem uma assessora, os outros
membros da equipe de quatro, são homens. Eu estaria identificada de qualquer forma. E não
há problemas quanto a divulgação do que te escrevi...
Diante do que foi apresentado, fica patente que só havia uma liderança
neopentecostal orgânica reconhecida como um dos “cabeças” do Congresso, nas avaliações
do DIAP examinadas.
433
Outra publicação do mesmo departamento intersindical avaliou os parlamentares
candidatos a prefeito e vice nas eleições municipais de 2000.
828
Consta que participaram 94
deputados e cinco senadores. Com a intenção de orientar o movimento sindical acerca do
comportamento político desses candidatos, a mesma publicação incluiu “o voto dos
parlamentares em dez matérias de interesse da sociedade em geral e dos assalariados em
particular”
829
, que tratavam dos temas abaixo:
Previdência: ampliação da quantidade de contribuições e exigência de idade
mínima para concessão de aposentadoria.
Salário mínimo de R$ 151: rejeição de emendas que permitiam aumento do
salário mínimo para R$ 177.
Conciliação na empresa: restrições ao acesso do trabalhador à Justiça do
Trabalho, obrigando-o a fazer conciliação na empresa.
Fim do Regime Jurídico Único: extensão do regime de contratação pela CLT
no serviço público, com perdas de direito a estabilidade e aposentadoria
integral.
Combate ao nepotismo: proibição de emprego de parentes no serviço
público.
Proteção ao servidor: extensão para aquele que executa atividade privativa
do Poder Público da mesma proteção que usufrui o integrante de carreira do
Estado.
Critérios justos de avaliação do servidor: ampla defesa e critérios para
dispensa de servidor por desempenho insuficiente.
Redução do prazo prescricional: redução de prazo para reclamação dos
direitos dos trabalhadores rurais.
828
Cf. DIAP. “Prefeitáveis” 2000: radiografia dos deputados e senadores candidatos. Série Estudos Políticos. Ano I. Brasília:
DIAP, 2000.
829
Idem, p. 7.
434
Responsabilidade fiscal: prioridade para pagamento de juros pela União, em
detrimento de despesas com pessoal, investimentos em infra-estrutura e
políticas sociais.
Isenção de custas do empregado por arquivamento de ação: elimina punição
ao trabalhador em razão de arquivamento de ação trabalhista (lei do rito
sumaríssimo).
830
O rol de evangélicos candidatos ao poder municipal, contou com oito deputados:
cinco concorreram para prefeito e três para vice-prefeito. Apenas uma mulher evangélica
esteve incluída neste grupo, como candidata a prefeita. São individualizados, a seguir, esses
parlamentares, com base nos registros fornecidos pelo DIAP:
Cabo Júlio (PL) Candidato a prefeito de Belo Horizonte (MG). [...] “Pastor
evangélico, liderou o movimento dos policiais mineiros por melhores salários em 1997.
Filiado ao PL desde 1997, integra a bancada evangélica no Congresso. Suas principais
bandeiras de campanha foram a melhoria da segurança pública e a desmilitarização da
polícia”. Votou em favor dos assalariados em oito das dez matérias avaliadas pelo DIAP.
831
Lino Rossi (PSDB) Candidato a prefeito de Várzea Grande (MT). “Apresentador
de televisão e radialista [...] há mais de 15 anos, no primeiro caso, e 26 anos, no segundo”.
Votou contra o trabalhador em nove matérias avaliadas e esteve ausente no caso de uma
votação.
832
Josué Bengtson (PTB) - Candidato a vice-prefeito de Belém (PA). “[...] Paulista,
pastor evangélico da Igreja Quadrangular. [...] Sua principal bandeira é o combate ao
tráfico de drogas. Parlamentar de atuação discreta [...]”. Votou contra o assalariado em seis
matérias, a favor em duas, absteve-se em uma votação e não compareceu em outra.
833
830
A publicação do DIAP trouxe um capítulo com o título: “Notas técnicas e explicação das matérias selecionadas”, com
informações mais detalhadas sobre essas matérias que passaram por votação em plenário, (Cf. DIAP. Radiografia do novo
Congresso: legislatura 2007-2011. Série Estudos Políticos. Ano IV. Brasília: DIAP, 2000, p. 15-17).
831
Idem, p. 28.
832
Idem, p. 30.
833
Idem, p. 31.
435
Miriam Reid (PDT) Candidata a prefeita de Macaé (RJ). Esteve durante a maior
parte da legislatura licenciada, ocupando o cargo de Secretária da Criança e do Adolescente
do Estado do Rio de Janeiro. Votou sempre a favor dos assalariados. Na única votação que
não compareceu é porque estava licencidada.
834
Paulo José Gouvêa (PL) Candidato a prefeito de Porto Alegre. Radialista,
apresentador de televisão e pastor da Igreja Universal. Votou cinco vezes a favor do
trabalhador, três vezes contra e esteve ausente em duas votações.
835
Waldir Schmidt (PMDB) Candidato a prefeito de São Leopoldo (RS). Votou
contra os trabalhadores em oito votações, ausentou-se em uma e absteve-se em uma.
836
Bispo Wanderval Santos (PL) Candidato a vice-prefeito de São Paulo (SP).
Empresário da área de comunicação, pastor (sic) da Igreja Universal do Reino de Deus [...]
interlocutor das instituições evangélicas que desenvolvem projetos assistencialistas”. Foi
favorável ao trabalhador em sete votações, contrário em duas e ausentou-se em uma.
837
Lamartine Posella (PMDB) - Candidato a vice-prefeito de São Paulo (SP). “Pastor,
formado em teologia e fundador presidente da Igreja Batista Palavra Viva”. Votou contra os
interesses dos trabalhadores em três oportunidades e também a favor em outras três;
ausentou-se em três votações e estava licenciado em uma.
838
Em 2003, o DIAP publicou estudo sobre Perfil, propostas e perspectivas do
governo Lula. Neste estudo foram citados três evangélicos pertencentes a comissões
responsáveis por políticas públicas. Na área social, constou o nome do deputado Gilmar
Machado (PT-MG), da denominação batista. Na área de infra-estrutura, tinham assento os
deputados Bispo Rodrigues (PL-RJ), da Universal, e Walter Pinheiro (PT-BA), batista. Os
três pertenciam ao bloco de apoio ao governo Lula. Na seção “Quem é quem no governo
Lula”, foram apresentados os ministros de Estado. A ministra Maria Osmarina Marina
Silva de Lima foi reconhecida como líder sindical que assessorava Chico Mendes, em sua
834
Idem, p. 35.
835
Idem, p. 38.
836
Idem, p. 39.
837
Idem, p. 41.
838
Idem, p. 44.
436
luta pela sobrevivência dos povos da floresta amazônica. Como senadora, desde 1994,
Marina apresentou projeto de “regulamentação do acesso aos recursos da biodiversidade” e
conduziu no PT, entre 1995 e 1997, a Secretaria Nacional de Meio Ambiente e
Desenvolvimento. O DIAP destacou que “segundo a ONU, [ela] está entre as vinte e cinco
mulheres mais importantes do mundo na área de desenvolvimento sustentável das áreas
verdes”.
839
Outra evangélica mencionada foi Benedita da Silva, ministra de Assistência e
Promoção Social, que se “destacou [...] no Congresso por sua atuação em prol das
reivindicações dos movimentos sociais, contra a discriminação a mulheres, negros e
indígenas e em defesa do meio ambiente”.
840
Benedita foi senadora pelo Rio de Janeiro,
eleita em 1994, e vice-governadora, durante a gestão de Anthony Garotinho, tendo exercido
o governo do Estado do Rio, quando Garotinho renunciou ao cargo para ser candidato à
presidência da República em 2002.
Em estudo prospectivo denominado Radiografia do novo Congresso, há o seguinte
comentário sobre a “bancada evangélica” recém-eleita para a 53ª legislatura:
A bancada evangélica foi a que mais diminuiu entre os grupos de pressão organizados que
atuam no Congresso. Diferente do que vinha acontecendo nas últimas três eleições gerais, os
evangélicos perderam quadros importantes e a bancada chegará menor à 53ª Legislatura. O
DIAP classifica como integrante da bancada evangélica, além dos bispos e pastores, aquele
parlamentar que professa a fé segundo a doutrina evangélica.
A evolução quantitativa da bancada evangélica nas legislaturas anteriores foi resultado do
êxito eleitoral de bispos e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), cuja
principal liderança na Câmara era o ex-bispo Carlos Rodrigues. O ex-deputado renunciou ao
mandato em 2005 quando teve seu nome envolvido no escândalo do mensalão. Em 2006,
novamente a IURD sofreu desgaste de imagem por causa dos parlamentares citados na
CPMI das Sanguessugas.
Além da IURD, o escândalo da compra superfaturada de ambulâncias respingou sobre
parlamentares integrantes de outras igrejas evangélicas, especialmente a Assembléia de
Deus. Muitos deles desistiram da candidatura ou tiveram seus nomes vetados pela cúpula
dessas igrejas. Outros tentaram a reeleição, mas foram barrados nas urnas. Entre os que não
se reelegeram ou não se candidataram, 16 tiveram seus nomes envolvidos na máfia das
ambulâncias. Não retornará para a Câmara em 2007, por exemplo, o atual coordenador da
839
DIAP. Perfil, propostas e perspectivas do governo Lula. Série Estudos Políticos. Ano III. Brasília: DIAP, fevereiro de
2003, p. 38.
840
Idem, p. 44.
437
bancada evangélica, deputado Adelor Vieira (PMDB/SC), que é membro da Assembléia de
Deus. Ele é um dos acusados no relatório parcial da CPMI das Sanguessugas e também está
sob investigação do Ministério Público Federal.
No Senado Federal, o bispo Marcelo Crivella (PRB/RJ), da IURD, continuará sendo o
principal interlocutor da bancada evangélica. Derrotado na disputa ao Governo do Rio de
Janeiro, Crivella tem mandato até 2011. Outro senador que integra a bancada evangélica é
Magno Malta (PL/RJ), membro da Igreja Batista, cujo nome também figura entre os
investigados na CPMI das Sanguessugas.
Em levantamento parcial, o DIAP identificou 36 parlamentares integrantes da bancada
evangélica: 17 deputados reeleitos, 15 deputados novos e 4 senadores que têm mandato até
2011.
841
5.5.2 Auto-avaliações: FPE e GAPE
Na própria Frente Parlamentar Evangélica houve quem opinasse sobre o
desempenho dos evangélicos. Um exemplo disto foi a análise feita pelo deputado Walter
Pinheiro (PT-BA):
... antigamente a “bancada evangélica” era constituída só para barganhar. A Frente avançou,
modificou o caráter. Eu não participei da “bancada evangélica”, porque discordava
exatamente desse mérito... Tenho participado da Frente... Acho que a Frente ainda tem um
pouco dessa distorção, mas ela já ampliou bastante, conseguiu [...] entrar nos debates,
discutir as questões, o posicionamento dos evangélicos em relação a temas como reeleição,
[...] biossegurança e tal. Mesmo que aqui ou acolá vincule o tema com aspectos religiosos,
mas a bancada tem avançado também do ponto de vista de políticas sociais, ainda que com
dificuldades, mas acho que a própria transformação de Frente obriga a que você discuta
segmentos. É como você discute informática, como você discute frente de trabalho, como
você discute frente em defesa da universidade, é natural que num debate de frente tenda a se
subscrever ou se ater a um tema muito correlato com esse segmento. Por isso até eu tenho
ficado, eu diria, até mais no conservadorismo. Mas a bancada avançou bastante. Eu acho
que a gente tem tido ganhos, a partir de uma nova cultura, de uma nova representação; e a
ruptura daquela história de que “bancada evangélica” era contada como quem conta garrafa,
841
DIAP. Radiografia do novo Congresso: legislatura 2007-2011. Série Estudos Políticos. Ano IV. Brasília: DIAP, novembro
de 2006, p. 33.
438
para poder barganhar cargos, barganhar posições, aí tentar usar isso na hora de votações.
Então aí eu acho que isso é um avanço importante e, principalmente, vários segmentos da
bancada têm tido uma participação decisiva na Casa em projetos que não são vinculados às
questões religiosas, mas, principalmente, vinculados a políticas públicas e, eu diria, à ação
política na sua palavra mais direta. Então, eu acho que nós tivemos um ganho. É preciso
ainda ampliar, é preciso é, melhorar bastante, qualificar, e que eu acho que essa Frente
trouxe uma novidade, que não é a questão só do segmento, mas a importância do segmento
ter capacidade de enxergar o todo da política e atuar inclusive sintonizando as questões do
segmento com as questões da sociedade.
842
Opinião crítica foi apresentada por uma assessora que serviu em gabinetes de
deputados pentecostais e atuou, também, no Grupo de Assessoria aos Parlamentares
Evangélicos (GAPE). Ao ser perguntada sobre o comportamento e influência dos políticos
evangélicos no Congresso, ela respondeu:
Se eu fosse dar uma nota de um a dez [...] eu daria três, três, considerando resultados,
considerando atuação. Mas se eu fosse considerar intenção, eu daria acho que em torno de
seis. Só que não é com boa intenção apenas que se faz um bom trabalho parlamentar. Não é
movido de grande paixão pelos pecadores que esses homens vão chegar aqui e vão brilhar.
Não! Existe dentro dos parlamentares evangélicos muita gente bem intencionada. E rotular
todos eles e colocar todos num paredão como corruptos é um pecado, inclusive. Porque há
pessoas ali que pensam que estão com a unção de José, vieram ao palácio e se estão no
palácio têm que alimentar o seu povo. Há alguns ali que acham que estão com a unção de
Daniel. Que são Daniel, que são homens que foram escolhidos, que vão influenciar num
reino. Alguns até que se acham Ester, que fora trazida, que era Hadassa, e foi transformada
em Ester. Então, há todo esse sentimento aí de querer fazer alguma coisa. De querer fazer a
obra de Deus. De querer implantar o reino de Deus. Então, se eu for considerar intenção, eu
daria seis. Se eu for considerar resultado, eu reafirmo, minha nota seria três.
843
O presidente da FPE, deputado Adelor, além de avaliar de forma positiva o
desempenho da Frente, vislumbrava, em novembro de 2005, a possibilidade do grupo vir a
ser ampliado para 90 ou cem deputados, nas duas próximas legislaturas:
Hoje, no Congresso Nacional nós temos a Frente Parlamentar Evangélica, que tem 63
parlamentares, sendo 60 deputados federais; uma parcela expressiva, não é? Temos uma
842
Entrevista do deputado Walter Pinheiro (PT-BA). Brasília, 17 de junho de 2004.
843
Entrevista da assessora Mônica. Brasília, setembro de 2006.
439
meta, quem sabe, nós podemos chegar a 90 parlamentares, quem sabe, cem parlamentares
nas próximas legislaturas; talvez não nessa, mas na outra. Chegando, assim, mais ou menos
dentro do limite do que hoje nós representamos na sociedade. Se na sociedade nós somos
em torno de 25 a 30%, eu acho que dentro de mais uma ou duas legislaturas nós podemos
alcançar, recuperar esse tempo perdido. Agora, é um crescimento fabuloso, considerando
que nós estamos trabalhando nessa questão há mais ou menos 20 anos, apenas.
844
O parlamentar catarinense avaliou, também, o desempenho eleitoral de sua igreja, a
Assembléia de Deus, nas campanhas municipais de 2004. Sobre a atuação da igreja na
política e, em particular, acerca do projeto “Cidadania AD Brasil”, cujo propósito era eleger
pelo menos um vereador em cada município brasileiro, Adelor Vieira respondeu o seguinte:
Eu acho que [o projeto] deu uma grande contribuição. Eu acho que nós deveríamos
aperfeiçoá-lo. Nós deveríamos estar trabalhando um pouco mais esse projeto para que
pudéssemos aumentar a nossa representatividade aqui. Eu acho que já teve um avanço
grande. A Casa Publicadora [das Assembléias de Deus - CPAD] já fez muito também: hoje
nós temos muito acesso através do periódico Mensageiro da Paz, do próprio jornal AD
Brasil, mas dá para fazer mais. Eu acho que nós temos uma estrutura muito grande, nós
temos uma Assembléia, no mínimo uma, em cada município do Brasil. Nós temos
capacidade de oferecer muito mais ao Governo para contribuir na área da fome, na área da
educação, da alfabetização, na área da saúde, nós podemos contribuir muito, nós podemos
fazer muito, nós podemos fazer muita coisa. E eu acho que a Assembléia de Deus não está
explorando todo esse potencial, principalmente ao que diz respeito à credibilidade que tem a
igreja Assembléia de Deus, que não se iguala a nenhuma outra. Nós mantemos ainda, graças
a Deus, essa credibilidade que está acima, sem falsa modéstia, de qualquer outra
denominação. (Quantos vereadores foram eleitos, no Brasil?) Vereadores? Em torno de mil
vereadores. É expressivo. Em torno de 60 prefeitos. Esses números nós precisamos ainda
quantificar mais, trabalhar mais e tal. Mas eu acho que podemos fazer muito mais.
845
Após essas avaliações e opiniões, segue a conclusão deste capítulo sobre a Frente
Parlamentar Evangélica e seus integrantes.
844
Entrevista do deputado Adelor Vieira. Brasília, 22/11/2005.
845
Ibidem.
440
Conclusão
Grupos de interesse que exercem pressão sobre instituições públicas resultam,
geralmente, do crescimento que algum segmento da sociedade experimenta e das ameaças
que o afligem ou que supõe estejam pairando sobre sua integridade. A “bancada
evangélica” no Congresso Constituinte de 1987-88 e as que lhe sucederam nas legislaturas
seguintes, até se constituir como Frente Parlamentar Evangélica, nasceram e continuaram
devido ao crescimento e demandas específicas do segmento evangélico, principalmente o
pentecostal, frente à sociedade e ao Estado que cuida de seu ordena mento institucional.
A FPE tem servido de referência tanto para parlamentares protestantes, pentecostais
e neopentecostais, como para outros grupos no Congresso e perante o Governo. Mesmo que
alguns parlamentares evangélicos não freqüentem reuniões e cultos dessa Frente, quase
todos os que professam essa fé se reconhecem como membros dela e tratam de questões
político-religiosas levando em consideração o tipo de assessoria que ela oferece.
A atuação da FPE foi decisiva na alteração da lei do Código Civil para distinguir as
igrejas de outras associações, o que sem dúvida reforçou as garantias constitucionais em
prol da liberdade de culto. A Frente também atuou nos seguintes temas: estatuto do
desarmamento, lei da biossegurança, ensino religioso e teoria criacionista e reforma
política. A FPE manifestou apoio ao Estado de Israel, com viagem de alguns membros à
chamada Terra Santa, transportando assim para o Congresso uma ideologia de igrejas
evangélicas que confundem interesses geopolíticos israelenses contemporâneos com
interpretações referentes ao Israel dos tempos bíblicos, como se o Estado judeu atual fosse
continuidade do antigo, idealizado em profecias e literaturas semelhantes, de interesse do
movimento sionista.
Na 52ª legislatura (2003-2007), o grupo de evangélicos foi impactado pelo
envolvimento de metade dos membros da FPE no esquema de compras superfaturadas de
ambulâncias, a chamada Operação Sanguessuga, e de dois deputados da IURD no
escândalo de recebimento de propinas para votar em favor do Governo, a CPMI do
“mensalão”, sendo que um deles foi considerado inocente. No caso dos sanguessugas, 32
441
deputados evangélicos foram apontados como envolvidos e apenas três tiveram processos
arquivados por insuficiência de provas.
O ethos pentecostal não contribui para preparar políticos com uma visão republicana
e comprometida com mudanças, visando tornar a sociedade brasileira menos injusta no que
concerne aos aspectos de distribuição das riquezas, educação e saúde para todos, superação
das disparidades econômicas regionais e outros problemas da mesma importância, cujo
enfrentamento poderia ajudar a estabelecer uma efetiva democracia no País.
O mundo pentecostal reforça o autoritarismo, a partir da política praticada
internamente pelas igrejas. Várias fontes da Assembléia de Deus consultadas falaram de
governo interno arbitrário, prática de salários elevadíssimos para alguns pastores e falta de
controle e fiscalização na aplicação do dinheiro doado pelos fiéis. Contudo, a insatisfação
dessas fontes indica que já existe resistência ao caudilhismo pentecostal, mesmo que ainda
não seja suficiente para promover maiores mudanças. No caso da IURD, o poder
centralizado e a característica da organização, como empresa supridora de bens simbólicos
para freqüentadores que se satisfazem apenas em consumir o que lhes é oferecido, não
indica qualquer iniciativa de formação de grupos para discutir os problemas internos de
governo da Igreja. Deste modo, parece mais distante a possibilidade de mudança nesta
agência neopentecostal.
A participação de evangélicos no esquema dos sanguessugas, a maioria pertencente
às igrejas desta pesquisa, foi bastante ativa e decisiva para o sucesso da máfia. Os
deputados Lino Rossi, Nilton Capixaba e Carlos Rodrigues se destacaram como aliciadores
de outros parlamentares. Alguns admitiam como “bênção” o esquema lucrativo de desviar
parcelas de recursos públicos em benefício próprio ou de sua igreja. Sabe-se que este
esquema foi pequeno em valores desviados, se comparado aos grandes negócios da
privatização de concessões de telefonia, distribuição de energia elétrica, recuperação de
estradas e outros, praticados pelos “cardeais” do Congresso e outras grandes personalidades
da economia e política brasileiras. Todavia, nestes casos, há suspeitas, mas não tem havido
denúncias com comprovação suficiente para sensibilizar a sociedade e levá-la a reagir à
corrupção praticada em grande escala.
442
Os parlamentares pentecostais são pressionados por suas bases para canalizarem
recursos ou obterem convênios que beneficiem igrejas locais. Ao surgir a oportunidade de
atender essas demandas com recursos das emendas orçamentárias e ainda sobrar alguma
comissão para si, muitos se revelaram sem integridade, como cumpridores de um mandato
parlamentar, indignos de exercerem qualquer função pública. Há evidências de fragilidade
estrutural no processo da execução orçamentária e respectiva fiscalização. Contudo, a
correção destas falhas não promoverá mudança no caráter das pessoas.
A quantidade de evangélicos envolvidos, principalmente pentecostais, é suficiente
para demonstrar que organizações autoritárias sem mecanismos de controle do exercício do
poder fomentam o surgimento de lideranças com graves lacunas de caráter, capazes de
prejudicar coletividades inteiras. Neste aspecto, a participação pentecostal na política, ao
permitir acesso apenas a seus quadros de privilegiados, não pode ser reconhecida como
inclusão de um segmento social, mas apenas como reprodução contemporânea da política
de currais eleitorais para beneficiar cúpulas de igrejas, estendendo privilégios do ambiente
civil da religião para o espaço da política, onde se efetua uma ampliação de poderes dessas
oligarquias religiosas, com prejuízos incalculáveis para os fiéis e a sociedade.
A presença pentecostal no Congresso vinha crescendo a cada legislatura e havia
expectativa de que continuasse seguindo essa tendência. Todavia, devido à participação de
pentecostais no escândalo do mensalão e, principalmente, na máfia dos sanguessugas,
houve uma redução significativa da quantidade de deputados eleitos para a 53ª legislatura
(2007-2011). Em números aproximados, houve uma queda de 60 para 40 representantes. A
Assembléia de Deus reduziu de 23 para 13 deputados, enquanto a Universal encolheu de 16
para seis deputados. É possível que o eleitorado da AD tenha desviado seus votos dos
deputados que buscavam reeleição para candidatos de fora da Igreja, como demonstração
de repúdio àqueles que se envolveram em práticas escandalosas, manchando o bom nome
da Igreja. No caso da IURD, a situação pode ter sido diferente, embora tenha havido
redução, relativamente maior, de sua bancada. A direção da Igreja resolveu trocar os
candidatos envolvidos no processo dos “sanguessugas” por candidatos novatos, mas supõe-
se que o breve tempo disponível não tenha sido suficiente para divulgar esses novos nomes
ao público que constitui seu eleitorado cativo. Contudo, não convém descartar a hipótese,
443
ainda que pouco provável, de que os eleitores da IURD também tenham evitado votar nos
candidatos recomendados pela Igreja.
Em toda a história dos pentecostais no Congresso brasileiro o nome mais influente,
pela liderança e capacidade de articulação em prol da sua igreja, foi o do ex-bispo Carlos
Rodrigues. Este reconhecimento vem de fontes diferentes, como assessores, deputados e do
Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP). Excluindo a senadora
Marina Silva, que não faz política como parlamentar orgânica de igreja, o único pentecostal
“cabeça” do Congresso na avaliação do DIAP foi o deputado Rodrigues. Isto corrobora a
classificação dos pentecostais como participantes do chamado “baixo clero” do parlamento
brasileiro. Portanto, no Congresso, os pentecostais e neopentecostais são “cauda” e não
“cabeça”.
846
846
Lideranças pentecostais e neopentecostais adotaram um discurso para justificar e incentivar a participação
de suas denominações na política, baseados em Deuteronômio 28: 13, texto este escrito para o Israel antigo:
O Senhor te porá por cabeça, e não por cauda; e só estarás em cima, e não debaixo, se obedeceres aos
mandamentos do Senhor teu Deus, que hoje te ordeno, para os guardar e cumprir” (grifo acrescentado). Esta
idéia parece persistir na cultura dos judeus. A propósito, transcreve-se um ensinamento judaico sobre ingestão
de cabeça de carneiro, língua ou peixe com cabeça: “Costuma-se ingerir um destes alimentos para que
sejamos cabeça e não cauda: de carneiro, para lembrar o mérito do sacrifício de Yitschac que foi substituído
por um carneiro; de peixe, para que o ser humano se multiplique como os peixes. ‘Yehi Ratson milefanêcha
shenihyê lerosh velô lezanav’. ‘Possa ser Tua vontade que sejamos como a cabeça e não como a cauda’.”
Fonte: http://chabad.org.br/datas/rosh/rosh007.html, acesso em 2/4/2007.
444
CONCLUSÃO
O foco desta pesquisa foi o modo pentecostal de fazer política à luz dos caracteres
da cultura brasileira. Perguntava-se, desde o início do trabalho, se o ingresso dos
pentecostais na política, com suas crenças e valores e seu modo de mobilizar multidões
para fins religiosos, acrescentaria aportes inovadores ao espaço público ou apenas
reproduziria a forma costumeira de fazer política no Brasil. O que foi possível descobrir
foram facetas do mundo pentecostal e suas estratégias para estar presente como ator
coletivo nas relações com o Estado brasileiro, através de representantes escolhidos pelas
comunidades espalhadas em todo o País, aos quais é entregue a missão de defender as
idéias do movimento e buscar benefícios para as instituições eclesiásticas.
Nos dois primeiros capítulos procurou-se destacar que a formação social, econômica
e política do Brasil, a partir do empreendimento colonial português, introduziu como
componentes desta nova nação a exploração e a desigualdade. O poder se concentrou,
historicamente, em oligarquias locais, subordinadas à lógica de dominação dos capitais
internacionais, europeus até o século XIX, passando para a hegemonia norte-americana no
século XX, sob a égide de uma globalização, definida por políticas financeiras e de
mercado que suplantam barreiras nacionais. Para assegurar benefícios materiais e
privilégios de toda ordem, os controladores do poder desenvolveram práticas de subsunção
do espaço público pelo privado, bem como recorreram a instrumentalização das populações
mais pobres, manipulando-as como massa informe. Assim se entende porque proliferaram
padrões e vícios na cultura política brasileira, tais como: patrimonialismo, populismo,
clientelismo, nepotismo, gregarismo e afins. Toda essa obra foi feita com o concurso de
instituições e agentes religiosos do catolicismo. No século XIX ingressaram na sociedade
brasileira grupos do protestantismo histórico, como presbiterianos, metodistas e batistas, e
no início do século seguinte, o movimento pentecostal.
O pentecostalismo inseriu-se nesse contexto, a partir de 1910, como componente
bastante identificado com os segmentos populares. Não veio, porém como movimento
contestador da ordem constituída. De fato, durante seu desenvolvimento até a
institucionalização, o ramo que formou a Assembléia de Deus optou por um modelo
autoritário de igreja, no qual o poder foi concentrado na figura do pastor. A Congregação
445
Cristã no Brasil, que não foi tratada nesta pesquisa, criou uma gerontocracia. Ambas,
porém, enfatizaram a dimensão escatológica da fé, afastando os fiéis de qualquer
envolvimento com lutas sociais. Esta ênfase do movimento pentecostal consistia na
preparação dos crentes para a volta iminente de Jesus Cristo e o desprezo para com as
“coisas do mundo”. No sentido organizacional, a Assembléia de Deus se estruturou como
uma igreja de líderes carismáticos, inicialmente suecos, com passagem pelos Estados
Unidos, depois brasileiros, que se espalharam pelo nordeste, sudeste e todas as regiões do
Brasil. A dinâmica do movimento pentecostal se deveu a um voluntarismo participativo, no
qual o trabalho era socializado, mas as decisões eram impostas de cima para baixo.
847
Esta
característica ainda perdura, caracterizando a dominação eclesiástica assembleiana como
um poder de pastores-presidente regionais, no comando de um séqüito de auxiliares de
confiança.
O ativismo pentecostal adotou parte da tradição protestante do “sacerdócio universal
dos crentes”, quando manteve aberto a todos o acesso à divindade, ou seja, o livre acesso
do crente aos bens espirituais, no espaço do templo e fora dele, sem necessariamente
depender de intermediação sacerdotal. Deste modo, verifica-se que o crente pentecostal
típico interpreta a Bíblia, profetiza, ora e faz prosélitos, de forma tão desenvolta quanto os
próprios pastores. O pentecostal ensina, faz estudos bíblicos, participa de curas divinas e
expulsão de demônios,
848
promove correntes de oração, prega, canta e dirige cultos em
templos, residências e praças. Já no caso dos neopentecostais, a situação tem outros
matizes, pois se nota uma substituição do acesso livre do fiel a experiências com o divino
por uma crescente sacerdotalização em que o crente passa a depender cada vez mais da
mediação de pastores e obreiros para obter as bênçãos que procura. Contudo as sessões de
descarrego, vigílias, cultos de prosperidade, terapias do amor e uma variedade de reuniões
oferecidas durante toda a semana nos milhares de templos dessas igrejas são realizadas com
entusiasmo e participação. O fato é que tanto o pentecostalismo como o neopentecostalismo
promovem participação dos fiéis nos atos religiosos, mas negam a estes o direito de
847
Sobre este assunto, recomenda-se leitura da dissertação: ALENCAR, Gedeon Freire. Todo poder aos
pastores, todo trabalho ao povo, todo louvor a Deus. Assembléia de Deus 1911-46: origem, implantação
e militância. Dissertação de Mestrado em Ciências da Religião. Universidade Metodista de São Paulo, 2000.
848
Em Ciências Sociais não cabe discutir a fé em si mesma e a autenticidade de fenômenos sobrenaturais que constituem
conteúdos dessa crença. Compete ao cientista examinar os efeitos que convicções religiosas são capazes de produzir no
comportamento social dos crentes, comunidades e sociedades em que vivem.
446
compartilharem do governo da igreja, por se estruturarem de forma autoritária, através de
uma oligarquia de bispos ou pastores que tudo decidem e apenas comunicam aos
seguidores aquilo que compete a estes tomar conhecimento para cumprirem, como servos
obedientes. No caso tanto da Assembléia de Deus como da Igreja Universal, se pode
afirmar que as lideranças assembleianas e iurdianas assimilaram o caudilhismo latino-
americano e o coronelismo brasileiro.
Os pastores e bispos são mais caudilhos do que clérigos. Embora muitos, por
vocação, exerçam bem a função pastoral, de cuidar e consolar suas ovelhas, o modelo de
organização requer que eles se imponham de forma autoritária, o que faz com que a relação
entre líder e liderados se caracterize como tutela e dependência, respectivamente. A
organização pentecostal assimilou, de fato, o padrão mandonista do chefe político
brasileiro. Na Assembléia de Deus a força de presidentes de “ministérios”, convenções e
distritos impediu o fortalecimento de um centro de poder, mas possibilitou a formação de
uma rede gigante de “feudos” com seus suseranos, senhores, vassalos e súditos. Ou seja, o
maior grupo pentecostal do Brasil, a Assembléia de Deus, com suas duas convenções
nacionais CGADB e CONAMAD mas, principalmente a primeira, parece constituir
uma grande federação de caudilhos, cujo poder é transferido para filhos, parentes próximos
e pastores de confiança, estes, em alguns casos, sem vínc ulos de parentesco, quando não há
vocacionados dentro do clã para manter a sucessão familiar.
Na Igreja Universal, todo o poder emana do bispo Edir Macedo, que constitui a
equipe de bispos auxiliares, a seu bel prazer, para governarem o complexo religioso-
empresarial-midiático espalhado em dezenas de países. Os freqüentadores da IURD não
parecem cogitar de discutir o governo da igreja, visto que não foram registrados sinais de
iniciativas com esta finalidade de abrir o governo na dimensão horizontal da base da IURD.
Para que alguém entre no circuito fechado da gestão da Igreja, terá que entrar no esquema
de recrutamento de obreiros auxiliares, ganhar aos poucos a confiança dos superiores e
ascender, fazendo carreira interna como profissional do empreendimento de Edir Macedo,
pois fora desta trajetória o freqüentador, mesmo o mais dedicado e assíduo, será apenas um
a mais na grande massa de consumidores dos bens simbólicos que a Igreja produz.
447
Uma organização autoritária que exclui os fiéis de participarem de todas as
decisões, embora sejam eles que a sustentam, se não tiver uma estrutura burocrática
adequada, com instâncias equilibradas de segregação de funções e instrumentos de controle
e fiscalização, torna-se campo propício para o abuso de poder e práticas de corrupção e
escândalos. O indivíduo inteligente e capaz, ao participar de uma organização fechada,
cujos códigos de comando e conduta são compartilhados por poucos, tende a fazer acordos
para benefício de si mesmo e da cúpula à qual pertence. Este tipo de ambiente desenvolve
caracteres antidemocráticos e uma cultura contrária ao bem-estar coletivo.
Um exemplo do que foi afirmado encontra-se no ex-bispo Carlos Rodrigues,
coordenador da bancada da IURD na Câmara, até 2003, e que foi o maior destaque entre os
líderes pentecostais e neopentecostais nas duas últimas legislaturas (51ª e 52ª). Ele era
reconhecidamente autoritário e implantou um regime de disciplina e hierarquia na bancada
da Igreja Universal, no qual tirou toda a autonomia dos seus pares. Sem precisar fazer
referência aos processos de corrupção em que Rodrigues foi citado, basta lembrar o
confisco da representação popular que ele fez, ao tolher os liderados, para indicar a
deformação do sentido de fazer política que tem vigorado nessa Igreja. Deputados eleitos
pelo voto secreto de milhares de eleitores foram transformados em meros despachantes de
um poderoso bispo, que era braço direito do chefe da denominação. Pergunta-se: esta Igreja
mudará seu modo de fazer política, depois da revelação destes fatos? Pode-se responder que
dificilmente haverá essa mudança, pois para que isto acontecesse, teria que ser reformulada
a estrutura de comando da Igreja, que hoje concentrada e personalizada no bispo Macedo.
A face pública da Universal reflete a natureza de suas relações internas de poder. Até o
final desta pesquisa não se observou sinais de abertura nesse sistema de poder da IURD.
As igrejas Assembléia de Deus e Universal do Reino de Deus souberam aproveitar
seus modelos autoritários, comentados nesta tese, como instrumento para conquistar votos
junto aos fiéis e, conseqüentemente, ocupar cadeiras nos parlamentos brasileiros, a partir
dos anos de 1980. O projeto político de ambas perseguiu dois objetivos principais: em
primeiro lugar, mobilizar recursos e apoios do poder público em benefício das respectivas
denominações religiosas e, em segundo, exercer influência nos parlamentos para que a
legislação ali elaborada viesse a expressar propósitos dessas igrejas no que tange à defesa
da própria corporação e da família brasileira, segundo suas concepções de moralidade.
448
Deste modo, essas bancadas pentecostais tem-se posicionado, constantemente, contra a
liberação do aborto, união civil de homossexuais e pesquisas com utilização de embriões
humanos. Por outro lado, lutaram a favor do desarmamento, inclusão do criacionismo
bíblico na educação escolar, e garantia de preservação de suas práticas religiosas.
849
Além
de preocupações dessa natureza, não se constatou, durante a pesquisa, interesse da Frente
Parlamentar Evangélica na elaboração de um projeto de legislação mais abrangente e
transformador para a sociedade brasileira. Diante disto, pode-se afirmar a respeito dessas
lideranças da Assembléia de Deus e Igreja Universal que elas têm fomentado um
movimento com ênfase em comportamentos e não em princípios.
Na condição de movimento de massas, o pentecostalismo tem dado mais ênfase a
regras do que a princípios. O moralismo pentecostal é reconhecidamente forte, mas a
fundamentação ética dos costumes que ele prega é fraca. Para as oligarquias que comandam
o movimento pentecostal é mais cômodo alimentar esse modelo baseado em receitas de
comportamento do que promover uma educação libertadora. Regras são exteriorizadas e
enunciadas de forma objetiva, mas não têm inspiração em conteúdos éticos que dêem
sentido profundo para a vida. A política pentecostal pode ser exemplificada como segue:
para um seguidor de regras, é pecado fumar e consumir bebida alcoólica, mas não é pecado
legislar em favor de banqueiros, como ocorre no Brasil, e sonegar recursos para
alimentação, moradia e saúde, que supririam multidões de necessitados. No sentido ético,
participar de um esquema de corrupção não é tão condenável, desde que beneficie a igreja
com ambulâncias ou concessões de rádio, por exemplo, porque isto amplia sua capacidade
de “ganhar almas para Cristo”.
A fraqueza ética da política pentecostal se manifesta, também, na forma como
utiliza eventos religiosos para fins eleitorais, como shows gospel, concentrações
evangelísticas em estádios e ginásios, “marchas para Jesus”, além do uso do púlpito para
convencer os fiéis a votarem no “candidato oficial”, embora, neste caso, já exista proibição
do Conselho Político Nacional da Assembléia de Deus (CGADB), até porque tal prática
849
Sobre liberdade de culto e práticas pentecostais, tem havido dificuldade, em alguns municípios, para igrejas com poucos
recursos materiais obterem licenças de construção e adaptação de templos, face exigências contidas em códigos de edificações
específicas de cada localidade. Quanto a práticas de culto, alguns grupos pentecostais se sentem reprimidos devido a exigências
legais que estabelecem limite no nível de emissão de sons, em determinados horários. Conforme observou a deputada Zelinda
Novaes, as autoridades costumam ser mais tolerantes com escolas de samba e blocos carnavalescos do que com igrejas, embora
estas sejam mais ordeiras em suas reuniões.
449
provoca rejeição ao candidato, por parte de fiéis que fazem questão de distinguir entre
espaço sagrado e espaço profano, como lhes havia sido ensinado pela própria denominação,
em passado recente, como até 20 ou 30 anos atrás.
O ativismo pentecostal não desenvolve consciências críticas. A atuação do crente na
igreja prepara-o para dirigir reuniões, falar em público, cantar, organizar eventos, e coisas
similares, mas não o prepara para exercitar um pensamento questionador, ou discernir as
ideologias que fundamentam grupos econômicos e partidos, para garantir a consecução de
seus interesses pela sociedade.
Em pesquisa realizada no início dos anos de 1960, Emílio Willems ouviu pastores
presbiterianos acerca do desempenho de políticos evangélicos. As respostas revelaram
ausência de crítica e até uma visão ufanista e triunfalista sobre o comportamento desses
protestantes nos parlamentos. Mesmo que não se registrasse, na época, fatos desabonadores
contra aqueles políticos, era injustificável tanto entusiasmo, face os poucos resultados de
sua atuação, diante dos problemas sociais que, em geral, eles não tratavam como
prioridade. De fato, a ideologia da superioridade moral do evangélico na política persistiu
nas décadas seguintes e se expressou no ambiente pentecostal, em que pese freqüentes
envolvimentos desses parlamentares em processos de corrupção. A mesma concepção
deturpada da realidade serviu para fomentar, dentro e fora do Brasil, a idéia de que é
possível salvar uma nação, desde que se constitua um messias evangélico para governá-la,
apoiado por parlamentares também evangélicos. Deste modo, tem-se observado que boa
parte dos líderes pentecostais busca um “salvador da pátria” e se sente satisfeita em ser
cooptada por essa figura carismática.
A política recente da América Latina registra pentecostais nas fileiras dos
simpatizantes e seguidores de Augusto Pinochet, no Chile; Alberto Fujimori, no Peru; Rios
Montt e Jorge Serrano, na Guatemala, e Fernando Collor, no Brasil. O pentecostalismo tem
atração por regimes autoritários, devido a afinidades entre estes e suas estruturas de
organização eclesiástica. De fato, há componentes culturais comuns entre a tradição de
caudilhos, coronéis e chefes políticos latino-americanos e tradicionais pastores-presidentes
das igrejas pesquisadas.
450
Ainda relacionado à formulação messiânica como solução para os males da
sociedade brasileira, constatou-se um distanciamento dos pentecostais da tradição
protestante radical, leia-se, sobretudo, batista, quanto ao princípio de separação entre Igreja
e Estado, associado a uma idéia de que os evangélicos podem trazer a solução para os
problemas do Brasil, desde que se eleja um presidente que professe a fé evangélica.
Portanto, neste sentido lideranças pentecostais alimentam certo constantinismo.
As denominações pentecostais e neopentecostais sonham com a possibilidade de
elegerem um presidente evangélico para o Brasil. Em 2002, a Assembléia de Deus apoiou
Anthony Garotinho no primeiro turno. Durante as campanhas municipais de 2004,
Garotinho acompanhou os fóruns de preparação dos candidatos da AD, fez doações para
viabilizar esses eventos, marcou presença em alguns e deixou evidente que suas ações eram
parte de uma preparação bem antecipada para se lançar candidato à presidência em 2006, o
que de fato não se concretizou por motivos alheios à sua vontade, como a imposição de
obstáculos contra sua candidatura dentro do seu próprio partido, o PMDB, os quais ele não
conseguiu superar.
A tentação constantiniana dos pentecostais se concretizou na Guatemala, com as
ditaduras de Rios Montt e Jorge Serrano. Essas experiências serviram de péssimos
exemplos aos que acompanham a política na América Latina, mas não foram suficientes
para eliminar o sonho dos pentecostais brasileiros, que, em geral, desconhecem a história
dos ditadores guatemaltecos. A possibilidade de eleger um evangélico à presidência do
Brasil é algo, porém, que parece estar cada vez mais distante.
Passada a época dos governos militares, os pentecostais se adaptaram à nova ordem
da democratização e rapidamente encontraram um nicho de participação no sistema
democrático. Quando assim o fizeram foi com muito sucesso, pois no caso brasileiro
vigorou a disciplina de “curral eleitoral”, imposta nas igrejas pesquisadas e em outras,
como a Igreja do Evangelho Quadrangular e Assembléia de Deus Madureira, para garantir a
eleição dos “candidatos oficiais”, embora se deva relativizar esta observação, haja vista o
caso da última eleição, em 2006. Após os escândalos do “mensalão” e dos “sanguessugas”,
os membros da Assembléia de Deus da Missão e os fiéis da Igreja Universal reagiram
contra os corruptos, diminuindo a votação para “candidatos oficiais” de suas denominações.
451
As posições políticas dos pentecostais e neopentecostais são bastante maleáveis. A
Igreja Universal demonizava Lula em 1989, mas foi decisiva com seu apoio para eleger o
mesmo Lula em 2002. Pode-se afirmar que mudou o modo de se comportar do candidato
petista nesse interregno, mas, sem dúvida, a cúpula da Universal alterou radicalmente seu
discurso durante o período. Os parlamentares da Assembléia de Deus têm-se distribuído
entre oposição e governo. Aliás, o mesmo ocorre com a IURD. E o fato se dá, em ambas,
por conveniência das igrejas e seus políticos, em face de arranjos que conjugam conjunturas
regionais e nacional. As bancadas dessas igrejas se posicionam em função de circunstâncias
e acordos, os quais passam também pelas instâncias dos partidos onde seus representantes
se congregam.
Outra constatação que resultou da pesquisa foi a da crescente disputa dos atores
coletivos, no campo religioso, em busca de reconhecimento e, no campo político, à procura
de mais recursos para fortalecerem suas denominações. Essas disputas constituem parte da
construção de identidades coletivas, na qual a tradição é inventada e a história é revista,
segundo versões oficiais de cada grupo. A afirmação da identidade implica criação e
nomeação de inimigos. Daí poder-se afirmar que o comando do movimento pentecostal tem
necessidade de nomear inimigos.
Tendo superado o estágio de seita e constituído suas igrejas e denominações, o
movimento pentecostal renova sua motivação e acumula energias com a afirmação de
identidade, através da nomeação de inimigos históricos, sempre atualizados conforme a
necessidade. O catolicismo é um desses inimigos tradicionais, sempre reativados pelo
movimento. Para afirmar-se numa sociedade católica, os pentecostais têm buscado a
aprovação de títulos honoríficos, em favor de pastores com certo destaque local ou
regional. Além disto; já conseguiram implantar praças da Bíblia em diversas cidades,
aprovar datas comemorativas como Dia do Pastor, Dia do Diácono, Dia da Reforma
(Protestante) e assemelhados, em muitos municípios brasileiros.
Antes da derrocada do “socialismo real”, evidenciada na dissolução da União
Soviética e queda do muro de Berlim, ao final dos anos de 1980, os pentecostais eram
sectariamente anticomunistas. Diante do fracasso desses regimes na Europa e das vitórias
de presidentes de centro-esquerda no Brasil e América Latina, houve uma perda de ênfase
452
no discurso anticomunista, mas a idéia de que o comunismo é um arquiinimigo em estado
latente que ainda pode voltar não desapareceu de todo. Daí a distância que pentecostais e
neopentecostais continuam mantendo com relação aos movimentos populares, pois vêem
resquícios de comunismo nessas formas de organização das lutas sociais.
No mesmo sentido se inclui, também, a falta de enfrentamento das questões sociais
e a espiritualização ideológica dos problemas da sociedade, remetendo-os ao mundo das
causas sobrenaturais. Através deste artifício, as igrejas e seus representantes excluem de
suas agendas políticas ou tratam de forma equivocada o problema das desigualdades
econômicas, sociais e regionais, que afligem a sociedade brasileira.
Foi examinada na pesquisa a atuação do Estado brasileiro, desde a passagem de uma
república de oligarquias rurais para uma república de capitães de indústria e seus
desdobramentos posteriores. A Assembléia de Deus nasceu na República Velha e assimilou
práticas de mandonismo dos coronéis e caudilhos, de modo que ainda mantém, na
atualidade, chefes regionais que seguem esse padrão autoritário. A Igreja Universal, de
origem mais recente, nascida durante o regime militar (1964-85), organizou-se em contexto
da globalização financeira e de mercados, no qual se instituiu como empresa ágil sob um
forte comando centralizado.
A ideologia pentecostal da Assembléia de Deus contribuiu para o absenteísmo
social e político até os anos de 1980, mas a dimensão autoritária e anticomunista da mesma
ideologia facilitou uma opção de suas autoridades da Igreja em prol do regime militar.
Ao ingressarem de forma corporativa na política tanto a Assembléia de Deus como
a Igreja Universal adotaram o comportamento populista de manobrar fiéis para obterem
ganhos eleitorais, segundo objetivos determinados pelas cúpulas das respectivas igrejas. A
presença dessas corporações religiosas no espaço público tem repetido vícios da cultura
brasileira, no modo populista, clientelista, patrimonialista e nepotista de fazer política. Esse
conjunto de observações foi resumido no quadro seguinte, que mostra o que aconteceu de
1964 até 2006, nos subcampos pentecostal e neopentecostal, em relação com a política, e as
reações protestantes face a emergência desses novos atores sociais.
453
Tabela 5 Transformações nos subcampos pentecostal e neopentecostal e emergência dos seus
agentes no campo político (1964-2006)
Anos de 1960 Anos de 1970 até 1985 De 1986 a 2006
Igrejas pentecostais e protestantes
alarmadas com as mobilizações
populares fazem vigílias de oração e
sermões pela Pátria.
Igrejas pentecostais convivem de
forma tranqüila com a ditadura
militar.
O movimento pentecostal e
neopentecostal (MPN) se adapta ao
processo de democratização e busca
reconhecimento no espaço público.
Dirigentes pentecostais professam o
anticomunismo em contexto de
delação (*) e definem o catolicismo
como heresia ou falso cristianismo.
O MPN mantém o anticomunismo
como parte da definição de identidade
e assume o antipetismo, por
identificar esse partido (o PT) como
agente do comunismo.
O MPN persiste na identificação do
catolicismo como inimigo.
Verifica-se um arrefecimento do
anticomunismo e antipetismo, no
MPN, mas persiste o anticatolicismo.
Líderes pentecostais são cooptados
pelo regime militar. Algumas
lideranças cursaram a Escola Superior
de Guerra.
Algumas lideranças pentecostais
transformam suas igrejas em curral
eleitoral de candidatos do regime
militar.
Lideranças pentecostais e
neopentecostais investem o capital
religioso de suas denominações em
candidatos próprios. Cria-se a figura
do “candidato oficial dessas igrejas.
Igrejas e políticos pentecostais e
neopentecostais revelam pragmatismo
político, em alianças casuísticas com
governos estaduais e federal.
Os pentecostais são sistematicamente
marginalizados pelos protestantes
históricos
Neste período, surgem e se
desenvolvem movimentos
neopentecostais. Estes declaram
guerra espiritual contra religiões
afrobrasileiras e atacam a Igreja
Católica por causa do uso de imagens
(ícones dos santos). Também adotam
a teologia da prosperidade e a
batalha espiritual, com suas
respectivas promessas de felicidade
imediata e retiradas de encosto,
descarregos e correlatos.
No neopentecostalismo, continua a
guerra espiritual expressa na
agressividade contra religiões
afrobrasileiras e contra as imagens do
panteão católico. Continua a pregação
da teologia da prosperidade e os
exorcismos, sendo estes realizados
como performances teatrais.
Neste período, os pentecostais ainda
eram pouco representativos no
conjunto dos evangélicos.
Pentecostais e neopentecostais
experimentam grande expansão
material e promovem manifestações
de ufanismo e triunfalismo, durante o
período.
O crescimento do MPN torna-se
preocupação para os protestantes
históricos.
Ocorrem dissidências em
denominações protestantes e partes
delas se pentecostalizam.
Pentecostais e neopentecostais obtêm
concessões públicas de rádio e
televisão.
Igrejas neopentecostais fazem ampla
utilização da mídia para conquistar
adeptos.
Igrejas protestantes tentam imitar o
estilo neopentecostal em suas práticas
e celebrações.
A música gospel invade as liturgias
dessas igrejas.
(*) Houve líderes protestantes no período militar (1964-85) que delataram seus parceiros, principalmente na
Igreja Presbiteriana do Brasil. (Cf. CAMPOS, 2002, p. 83-140).
O ingresso dos pentecostais e neopentecostais na política brasileira indica ampliação
do processo democrático, apesar dos limites e vícios de suas práticas, apresentados na
pesquisa e nestas considerações conclusivas. Suas lideranças têm enorme capacidade
454
mobilizadora, sabem negociar e fazer o jogo da pressão nos espaços dos poderes
legislativos e executivos.
No conjunto, os parlamentares pentecostais e neopentecostais no Congresso
Nacional têm escolaridade um pouco abaixo da média dos seus pares. Essa presença de
atores com nível de escolaridade abaixo da média geral do grupo, no principal espaço de
elaboração das leis do País, revela que as igrejas pentecostais e neopentecostais, ao
participarem da esfera pública, estão contribuindo para que as “casas do povo” promovam
inclusão de segmentos menos favorecidos da população no sistema representativo da
política brasileira.
A presença pentecostal também tem contribuído para inflamar debates sobre
políticas de costumes, novas composições familiares, reconhecimento de identidades
coletivas emergentes, ampliação de direitos básicos em áreas como educação, saúde, e
outras igualmente importantes para repensar e redefinir o sentido de nação, em meio a
tantas injustiças. Uma sociedade controlada historicamente por grupos privilegiados não
está preparada para lidar com pessoas tão diferentes, que alçaram os parlamentos e agora
interpelam o caráter restritivo estabelecido nos espaços de poder da sociedade brasileira.
Esta é uma contribuição nova que se verifica com a presença de novos atores coletivos no
Congresso Nacional, não só pentecostais e neopentecostais, mas também sindicalistas e
representantes de outros movimentos populares.
O ingresso das igrejas pentecostais e neopentecostais na política, através de
“candidatos oficiais”, exigiu a criação de dinâmicas no interior de suas denominações, para
escolha de representantes, e condicionou o calendário religioso ao calendário eleitoral.
Adicionalmente, essa nova atuação pública tem exigido que lideranças de igrejas e de
partidos dialoguem e tomem decisões conjuntas, a fim de obterem ganhos mútuos nas
disputas pelas diversas fatias de poder.
O carisma das igrejas desta pesquisa, reconhecido por membros e freqüentadores,
tem garantido a realização de campanhas eleitorais com baixos custos financeiros para os
padrões do setor no Brasil. Todavia, esse mesmo carisma não tem sido usado para
promover uma educação cívica que exalte a liberdade do cidadão, o compromisso com a
455
democracia e o respeito aos valores republicanos, até porque a retórica religiosa tem sido
direcionada para absolutizar o discurso de cada igreja, que se comporta como sendo “a
melhor agência do evangelho”, “a mais fiel intérprete da verdade”, ainda que não adote
esses enunciados de modo explícito.
Ainda com relação aos partidos, a pesquisa indicou que as igrejas agem em duas
direções, procurando tirar proveito das circunstâncias: por um lado, distribuem seus
candidatos em algumas legendas, a fim de ampliarem suas chances de vitória e formarem
uma rede ampliada de influência nos legislativos; por outro, selecionam legendas pequenas,
em que possam exercer efetivo controle, havendo casos em que conseguiram conquistar
cargos-chave de diretórios regionais e até do nacional.
A pesquisa revelou, também, que os parlamentares pentecostais somente conseguem
compor o chamado “baixo clero” do Congresso Nacional, o que já era previsível, porque
eles não provêm de famílias “tradicionais”, não estão ligados aos grandes grupos que
controlam a economia, nem são veteranos nos meandros da política nacional. A condição
de “baixo clero” coloca-os mais vulneráveis à cooptação pelas forças da situação, porque
estas controlam os recursos e cargos da máquina burocrática do País, mas também coloca-
os como alvo de assédio da oposição, que conta com essa mesma massa de parlamentares
para enfrentar o governo.
As igrejas da pesquisa não apresentaram afinidades com partidos de disciplina
interna mais rigorosa, principalmente as agremiações consideradas de esquerda. Estes
partidos, além de primarem por uma razoável disciplina, têm reconhecida atuação nos
movimentos sociais. As lideranças pentecostais defrontam-se com enormes dificuldades
para apoiarem greves e outras manifestações populares, de caráter contestatório, além de
não poderem controlar esses partidos, como eventualmente têm conseguido fazer com
legendas sem ênfase em princípios doutrinários. O espectro do comunismo ainda paira no
imaginário de algumas lideranças pentecostais.
A migração partidária e o envolvimento da maioria dos parlamentares pentecostais
em esquemas de corrupção, constatada na 52ª legislatura, indicam que esses políticos são
tão vulneráveis, ou até mais, do que seus colegas de outras religiões ou sem-religião, que
456
compõem igualmente o chamado “baixo clero”. Um dos motivos para esta vulnerabilidade
é o assédio de alguns pastores e suas comunidades por recursos e cargos, conforme relato
de entrevistados, o que comprova a carência de educação republicana nas igrejas
pesquisadas.
A legislatura de 2003-2007 registrou a constituição da Frente Parlamentar
Evangélica logo no primeiro ano. Para que isto acontecesse, já vinha amadurecendo uma
discussão entre parlamentares evangélicos sobre a melhor forma de se organizarem no
Congresso, mas também contribuíram outros fatores, tais como:
Esses políticos se encontravam com freqüência e participavam juntos dos cultos
semanais, realizados no espaço da Câmara de Deputados, o que foi promovendo
um sentimento de unidade entre os membros do grupo;
Eles também se reuniam para discutir matérias legislativas de interesse comum;
A maioria desses parlamentares pertencia à maioria menos influente do
Congresso, identificada como o “baixo clero” da Instituição.
Embora o Congresso registrasse na 52ª legislatura cerca de 113 frentes
parlamentares (v. anexo respectivo), a FPE adquiriu mais visibilidade do que a maioria das
outras frentes por sua atuação e pelo interesse de outros grupos políticos em observarem
seu desempenho. Os evangélicos se autodenominam diferentes e são considerados assim
por observadores externos, independentemente de possíveis juízos de valor.
A citação de membros da Frente Parlamentar Evangélica em esquemas de corrupção
abalou a imagem do grupo dentro do Congresso, junto às comunidades religiosas e perante
a nação brasileira. A queda de votação sofrida pela maioria dos candidatos à reeleição pode
ser tomada como um indicador desse abalo de imagem.
850
A atuação política de parlamentares pentecostais e neopentecostais, da Assembléia
de Deus e Igreja Universal, respectivamente, foi marcada pelas características já
examinadas em destaque nesta conclusão. Não obstante, no processo democrático que se
850
Sobre as votações obtidas em 2002 e 2006 por candidatos a deputado federal das Assembléias de Deus e Igreja Universal do
Reino de Deus, conferir anexo específico.
457
desenrola no País, a presença desses novos atores sinaliza contribuições para a sociedade,
as quais são destacadas ou reiteradas nos pontos abaixo:
1º) O conteúdo religioso do movimento pentecostal confere esperança e novo
sentido de vida para milhões de brasileiros.
2º) A capacidade de mobilizar pessoas semanalmente e até diversas vezes por
semana cria um sentido de solidariedade e compromisso nessas comunidades religiosas,
pouco encontrado em outras organizações sociais.
3º) A entrada dessas comunidades na política significou inclusão de parcelas da
população outrora marginalizadas dos processos de decisão do País, ainda que se reconheça
que a estrutura hierárquica das igrejas enfraquece o significado dessa participação, pois os
representantes eleitos pertencem a oligarquias religiosas e tratam de fortalecer suas
posições com os novos recursos mobilizados, através da política.
4º) Os pentecostais, assim como os sindicalistas, ingressaram no Congresso
provocando dois fatos: redução, ainda que pequena, da presença dos capitalistas, e
diminuição tímida, mas real, do caráter elitista das “Casas do Povo”. Sabe-se que as
conseqüências dessa composição “mais popular” do Parlamento são de pouca monta,
porque os burgueses costumam delegar a representação política, cooptando parlamentares
de outras classes, através de financiamento de campanhas, negociação de cargos públicos e
outras medidas aliciadoras.
5º) A presença dos pentecostais tem revelado aos demais parlamentares e à
sociedade, outras faces do Brasil: a das chamadas “religiões do Espírito”, com ênfase em
curas divinas, línguas estranhas, prosperidade e batalhas contra demônios. Ou seja, uma
visão de mundo oposta à mentalidade “esclarecida” dos mais elevados na pirâmide social,
que propagam “idéias fora do lugar”, porque se mantêm de costas para esses brasis da luta
cotidiana pela sobrevivência, os quais se reproduzem sem acesso aos bens da cultura
erudita e geram suas identidades nas escolas da bricolagem social e da sabedoria popular.
6º) Os pentecostais estão aprendendo a prática da convivência democrática e, junto
com ela, as velhas manhas e artimanhas dos grupos que se engalfinham no Congresso, um
458
microcosmo imperfeito e muito limitado da própria sociedade, mesmo admitindo que haja
representatividade em sua composição, coisa bastante discutível. Os políticos pentecostais
não são melhores nem piores do que seus pares. Eles são semelhantes aos parlamentares de
outras religiões e aos sem religião. Os pentecostais têm atuado dentro de um Estado de
direito e procuram respeitar as regras do jogo democrático. Nos episódios em que tentaram
fraudar os cofres públicos, foram devidamente denunciados e indiciados, da mesma
maneira como ocorreu com outros atores que cultivavam imagens também moralistas,
como era o caso de integrantes da bancada do Partido dos Trabalhadores, arrolados no
esquema do “mensalão”. Espera-se que o desenrola r dos processos disciplinares a que eles
respondem possa trazer como resultado a inibição de práticas corruptas ou, na melhor
hipótese, a depuração dos quadros políticos das igrejas e partidos envolvidos. Como efeito
imediato, pôde-se observar que as bancadas da Assembléia de Deus e da Universal do
Reino de Deus, eleitas para 2007-2011, diminuíram para menos da metade do contingente
que possuíam na 52ª legislatura.
Como última observação, pode-se afirmar que a democracia brasileira avança
timidamente, porém amplia suas bases, e os pentecostais e neopentecostais, que participam
destas bases, estão aprendendo mais com os próprios erros do que com eventuais acertos.
As igrejas do movimento pentecostal e neopentecostal também são participantes ativas
neste aprendizado. Quem sabe, em futuro não muito distante, seus membros poderão
repensar e repudiar os modelos oligárquicos e absolutistas de funcionamento de suas
organizações. A sociedade política também está aprendendo a acolher novos atores,
respeitá-los e, pelo menos, discutir políticas de reconhecimento para executar ações
afirmativas em favor de grupos que tiveram perdas ao longo da história de injustiças que
tem marcado esta Nação. Isto representa pouco, mas já é um passo importante, enquanto a
sociedade não conseguir superar o modelo de “democracia” vigente, que conserva
privilégios para poucos e exclui de direitos básicos a maioria da população brasileira.
459
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Weber. São Paulo: Nova Cultural, 1997. (Coleção Os Economistas), p. 155-189.
WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. In: FURTADO, Celso. Brasil:
tempos modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979, p. 49-75.
WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2003.
WILLEMS, Emilio. Followers of the new faith: culture change and the rise of
protestantism in Brazil and Chile. Nashville: Vanderbilt University Press, 1967.
473
ANEXOS
474
ROTEIRO DE ENTREVISTA IDENTIFICAÇÃO E QUESTÕES
Ref.: Data:
Dados sociográficos do entrevistado:
1 - Nome: --------------------------------------------------------------------------
2 - Sexo: ------------------------------ 3 - Idade: ------------
4 - Trajetória religiosa (denominações e tempo em cada):
5 - Estado civil: ------------------------------
6 - Família (esposa, filhos, citando idade, sexo e religião):
7 - Instrução: -------------------------------------------------------------------------
8 - Naturalidade: ----------------------------------------------------------------
9 - Profissão: -------------------------------------------------------------------------
10 - Outras informações (opcional):
Caso necessite de mais espaço para as respostas, use o verso.
475
Tópicos para Entrevista com Parlamentares Pentecostais e
Neopentecostais
1. Papel da religião no sistema político.
2. Comportamento dos (neo)pentecostais na política.
3. Projeto político dos (neo)pentecostais.
4. Atuação preferencial: legislativo ou executivo.
5. Benefícios da política para a Igreja/Denominação.
6. Conscientização para a cidadania.
7. Participação de membros de igreja em partidos, sindicatos etc.
8. Interesse público e interesse das igrejas.
9. Parcerias entre igrejas e outras instituições em projetos sociais.
10. Voto distrital e candidaturas (neo)pentecostais.
11. Transformação de prestígio religioso em capital político.
12. Representatividade e legitimidade do líder (neo)pentecostal no espaço político.
13. Influência do político evangélico nos parlamentos. Situação perante os escândalos.
14. Como político (neo)pentecostal escolhe atuar na situação ou na oposição?
15. Escolha de partidos. Legendas de aluguel. Partido de evangélicos.
16. Como o político (neo)pentecostal decide seu voto? (Mencionar alguns casos).
17. Estratégia eleitoral de sua Igreja/Denominação nas eleições de 2004 e anteriores.
18. Projeto eleitoral da Igreja/Denominação: histórico e estágio atual.
19. Diferenças entre as formas de fazer política da Assembléia e da Universal e de seus
respectivos políticos.
20. Relacionamento entre essas igrejas e os poderes públicos.
21. Como sua Igreja/Denominação interpreta as desigualdades sociais? E o que ela faz?
22. A Igreja e as relações entre esfera privada e esfera pública. Relação entre líder
religioso e elite local/regional.
23. Afirmação e reconhecimento da identidade (neo)pentecostal na sociedade.
476
QUESTÕES
Grupo 1
Perguntas sobre as relações Igreja e Sociedade, Igreja e Política,
dirigidas a parlamentares e líderes das denominações religiosas
objeto da pesquisa:
1. Parlamentar/Pastor: Qual é o papel da religião no sistema político?
2. Parlamentar/Pastor: Como se comportam os evangélicos (pentecostais) na política
brasileira?
3. Parlamentar/Pastor: Têm os evangélicos um Projeto político ou agem de uma forma
reativa, somente?
4. Parlamentar/Pastor: Por que os evangélicos pentecostais estão mais presentes na
área legislativa e não na executiva?
5. Parlamentar/Pastor: Que recompensa a ação política traz para as igrejas evangélicas
que indicam os seus políticos ao Parlamento?
6. Parlamentar/Pastor: Como se situam os membros de sua Igreja/Denominação em
relação aos direitos de cidadania? (Acesso à educação, saúde, habitação, proteção
social, etc.) Eles têm consciência disto? Eles têm-se organizado para reivindicar
seus direitos?
7. Parlamentar/Pastor: O senhor tem levado os membros de sua Igreja/Denominação a
participarem do seu partido político? Tem estimulado a participarem de outras
organizações, tipo: sindicatos, movimentos sem terra, sem teto, associações de
bairro, etc.? Por que? Como o senhor estimula participação dos membros de sua
Igreja/Denominação na sociedade? Como o senhor os ensina a praticarem sua
condição de cidadania?
477
8. Parlamentar/Pastor: Que relação existe entre os interesses dos pentecostais e os
interesses públicos?
9. Parlamentar/Pastor: Que tipos de parceria sua Igreja/Denominação realiza com
outros grupos na sociedade, para projetos sociais comuns, ou para reivindicações
perante os poderes públicos?
10. Parlamentar: Sobreviveriam os deputados evangélicos em um sistema de voto
distrital?
11. Parlamentar: De que forma o capital político é acumulado no Brasil e como os
evangélicos (pentecostais) dele participam? Como converter capital religioso em
capital político?
12. Parlamentar: O líder político que tem um capital pessoal excepcional (exemplo:
Edir Macedo) consegue transferir o seu capital adquirido em uma tradição religiosa
para o campo da política?
13. Parlamentar: O político evangélico tem representatividade e legitimidade aceita
pelos demais políticos no Parlamento brasileiro?
14. Parlamentar: Que influência os políticos evangélicos exercem no Parlamento?
15. Parlamentar: O senhor mantém uma posição sistemática de oposição ou de apoio ao
governo? Por quê?
16. Parlamentar: Quando o senhor negocia a votação de algum projeto ou qualquer
matéria a ser decidida no Parlamento, quais os fatores que o levam a tomar uma
decisão? Pode citar alguns casos específicos?
17. Parlamentar: Quais as semelhanças e diferenças no modo de fazer política entre um
político da Assembléia de Deus e um político da Igreja Universal do Reino de
Deus? O senhor poderia discorrer sobre outras variações no modo de fazer política
dos evangélicos em geral?
478
18. Atuação externa: Como funciona a relação entre a liderança da Igreja/Denominação
e a autoridade (municipal, estadual, federal)? Há troca de algum benefício, verba,
cargo no governo, por voto ou outros apoios políticos? Como os membros em geral
se comportam a respeito deste assunto?
19. Atuação externa: Como sua Igreja/Denominação encara a participação de seus
membros nos movimentos sociais (sindicatos, partidos, centros comunitários,
movimentos de sem terra, de sem teto, etc.)?
20. Atuação externa: Como sua Igreja/Denominação interpreta as desigualdades
sociais? O que ela faz em relação a isto?
21. Atuação externa: Como sua Igreja/Denominação lida com o Estado, a coisa pública?
Tenta usá-lo para benefício da Igreja, ou defende a separação entre esfera privada (a
Igreja) e esfera pública (o Estado)?
22. Atuação externa: Descreva a relação entre o líder da Igreja/Denominação e a elite
local ou regional.
23. Atuação externa: Pelo conhecimento que você tem de sua Igreja/Denominação,
existe uma compreensão generalizada do que é coisa pública e coisa privada? Por
exemplo: é bem aceita a utilização de verba da União, do Estado ou da Prefeitura,
para ser aplicada em projetos da Igreja? É normal a apropriação de um espaço (tipo
praça, prédio público, etc.) para uso permanente dos evangélicos?
24. Atuação externa: Como o povo pentecostal tem procurado construir e afirmar sua
identidade coletiva na sociedade brasileira?
479
Grupo 2
Perguntas sobre costumes, relações de gênero e etnia, vigilância
grupal, política interna e externa, mais direcionadas aos membros
das Igrejas/Denominações objeto da pesquisa:
1. Controle social: Há algum tipo de controle do grupo sobre a vida de cada família ou
de cada indivíduo? Descreva como funciona isto?
2. Cultura e costumes: Que aspectos, vícios e virtudes, da cultura brasileira você
identifica na vida cotidiana de sua Igreja/Denominação?
3. Etnia: Como é tratada a condição do negro em sua Igreja/Denominação? Tem uma
pastoral ou ministério específico para tratar desta questão? Há pastores negros na
mesma proporção da população de membros negros?Gênero: Como tem sido tratada
a questão da mulher em sua Igreja/Denominação? (Retrospecto, situação atual e
perspectiva futura).
5. Gênero: Qual o espaço político interno e externo que a mulher tem em sua
Igreja/Denominação?
6. Sexualidade: Como são tratadas as questões da sexualidade: sexo antes e fora do
casamento, aborto, homossexualismo, etc., em sua Igreja/Denominação? Como
sobrevivem pessoas que se enquadram nessas situações dentro de sua Igreja? E
quando há líderes nestes casos, como a Igreja lida com esta realidade?
7. Política interna: Como acontecem conspirações para liquidar ou afastar uma
liderança? Líder afastado tem chance de reabilitação?
8. Política interna: De que modo alguém faz carreira na Igreja/Denominação,
considerando a trajetória de simples membro a pastor, bispo e presidente? Que
relacionamentos essa pessoa precisa criar, cultivar, etc.? O que pode destruir uma
carreira? Qual a receita para alguém se manter no poder ad aeternum?
480
9. Política interna: Existe um círculo de cortesãos em volta do líder, uma espécie de
séqüito palaciano?
10. Política interna: Existem estratificações dentro da Igreja? Em outras palavras: Há
famílias/membros mais importantes e influentes, que gozam de privilégios, na
Igreja? Há, também, famílias/membros que são marginalizados? Analise essa
realidade. Cada pessoa conhece o seu lugar e o aceita? O que determina essas
desigualdades? (Condição econômica, tradição familiar, cor, condição social, outros
motivos?).
11. Política interna: Há nepotismo na Igreja/Denominação? Explique como isto tem
funcionado.
12. Política interna: O que dá status para uma pessoa em sua Igreja/Denominação? Em
outras palavras: O que é valorizado, de fato, em sua Igreja/Denominação? (Poder,
ostentação, dinheiro, bens, conhecimento, oratória, posição social, dom de línguas,
profecia, humildade, ou outros valores? Quais valores você identifica?).
13. Política interna: Quem é mal visto pelo grupo? Quem está fora da mentalidade
pentecostal? Essas pessoas diferentes conseguem permanecer e sobreviver dentro do
grupo, mesmo pensando e agindo de forma contrária aos padrões?
14. Política interna: Quem são os “donos do poder” ou os “donos da igreja” ? Existe ou
não existe isto?
15. Política interna: Você considera que existe um regime autoritário em sua
Igreja/Denominação? Descreva-o. Por que ele existe? Como é que funciona este
regime? Como os membros se comportam face a isto? Como se perpetua este
sistema? Você acha que ele é indispensável para a existência da Instituição? Como
as novas gerações reagem a este regime? Têm sido criadas estratégias para
contornar/burlar este sistema sem que a pessoa tenha que sair da Igreja?
481
16. Relacionamentos: Analise o relacionamento patrão-empregado, quando ambos são
evangélicos. Comente a situação específica de empregada doméstica, caseiro, etc.
cujo patrão/patroa é evangélico/a.
17. Relacionamentos: Como são tratadas as desigualdades sociais em sua
Igreja/Denominação, tendo em consideração o que ensina Atos 2: 42-7? (Os cristãos
vendiam suas propriedades e repartiam o produto entre todos. Não havia
necessitado algum entre eles. Não havia propriedade privada etc.). A pergunta é
feita porque o Pentecostalismo se considera um movimento restaurador do
cristianismo primitivo.
18. Retrospectiva: Compare a Igreja/Denominação de hoje com a de 30 anos atrás, nos
relacionamentos internos, nas relações com a sociedade e em outros aspectos que
desejar. O que restou da herança dos fundadores ou, pelo menos, das gerações que
você conheceu no passado?
19. Atuação externa: Como o povo pentecostal tem procurado construir e afirmar sua
identidade coletiva na sociedade brasileira?
482
Anexo 2
Decálogo Evangélico do Voto Ético
I. O voto é intransferível e inegociável. Com ele o cristão expressa sua consciência como cidadão. Por isso, o voto precisa refletir a
compreensão que o cristão tem de seu País, Estado e Município;
II. O cristão não deve violar a sua consciência política. Ele não deve negar sua maneira de ver a realidade social, mesmo que um
líder da igreja tente conduzir o voto da comunidade noutra direção;
III. Os pastores e líderes têm obrigação de orientar os fiéis sobre como votar com ética e com discernimento. No entanto, a bem
de sua credibilidade, o pastor evitará transformar o processo de elucidação política num projeto de manipulação e indução
político-partidário;
IV. Os líderes evangélicos devem ser lúcidos e democráticos. Portanto, melhor do que indicar em quem a comunidade deve votar
é organizar debates multipartidários, nos quais, simultânea ou alternadamente, representantes das correntes partidárias possam
ser ouvidos sem preconceitos;
V. A diversidade social, econômica e ideológica que caracteriza a igreja evangélica no Brasil impõe que não sejam conduzidos
processos de apoio a candidatos ou partidos dentro da igreja, sob pena de constranger os eleitores (o que é criminoso) e de
dividir a comunidade;
VI. Nenhum cristão deve se sentir obrigado a votar em um candidato pelo simples fato de ele se confessar cristão evangélico.
Antes disso, os evangélicos devem discernir se os candidatos ditos cristãos são pessoas lúcidas e comprometidos com as causas
de justiça e da verdade. E mais: é fundamental que o candidato evangélico queira se eleger para propósitos maiores do que
apenas defender os interesses imediatos de um grupo religioso ou de uma denominação evangélica. É óbvio que a igreja tem
interesses que passam também pela dimensão político-institucional. Todavia, é mesquinho e pequeno demais pretender eleger
alguém apenas para defender interesses restritos às causas temporais da igreja. Um político de fé evangélica tem que ser,
sobretudo, um evangélico na política e não apenas um "despachante" de igrejas. Ao defender os direitos universais do homem,
a democracia, o estado leigo, entre outras conquistas, o cristão estará defendendo a Igreja.
VII. Os fins não justificam os meios. Portanto, o eleitor cristão não deve jamais aceitar a desculpa de que um evangélico político
votou de determinada maneira porque obteve a promessa de que, em assim fazendo, conseguiria alguns benefícios para a igreja,
sejam rádios, concessões de TV, terrenos para templos, linhas de crédito bancário, propriedades, tratamento especial perante a
lei ou outros "trocos", ainda que menores. Conquanto todos assumamos que nos bastidores da política haja acordos e
composições de interesse, não se pode, entretanto, admitir que tais "acertos" impliquem na prostituição da consciência cristã,
mesmo que a "recompensa" seja, aparentemente, muito boa para a expansão da causa evangélica. Jesus Cristo não aceitou
ganhar os "reinos deste mundo" por quaisquer meios, Ele preferiu o caminho da cruz.
VIII. Os votos para Presidente da República e para cargos majoritários devem, sobretudo, basear-se em programas de governo, e
no conjunto das forças partidárias por detrás de tais candidaturas que, no Brasil, são, em extremo, determinantes; não em
função de "boatos" do tipo: "O candidato tal é ateu"; ou: "O fulano vai fechar as igrejas"; ou: "O sicrano não vai dar nada para
483
os evangélicos"; ou ainda: "O beltrano é bom porque dará muito para os evangélicos". É bom saber que a Constituição do país
não dá a quem quer que seja o poder de limitar a liberdade religiosa de qualquer grupo. Além disso, é válido observar que
aqueles que espalham tais boatos, quase sempre, têm a intenção de induzir os votos dos eleitores assustados e impressionados,
na direção de um candidato com o qual estejam comprometidos.
IX. Sempre que um eleitor evangélico estiver diante de um impasse do tipo: "o candidato evangélico é ótimo, mas seu partido não
é o que eu gosto", é compreensível que dê um "voto de confiança" a esse irmão na fé, desde que ele tenha as qualificações para
o cargo. Entretanto, é de bom alvitre considerar que ninguém atua sozinho, por melhor que seja o irmão, em questão, ele
dificilmente transcenderá a agremiação política de que é membro, ou as forças políticas que o apoiem.
X. Nenhum eleitor evangélico deve se sentir culpado por ter opinião política diferente da de seu pastor ou líder espiritual. O
pastor deve ser obedecido em tudo aquilo que ensina sobre a Palavra de Deus, de acordo com ela. No entanto, no âmbito
político-partidário, a opinião do pastor deve ser ouvida apenas como a palavra de um cidadão, e não como uma profecia divina.
(Extraído de www.montesiao.pro.br, acesso em 24/07/2006. Este decálogo pode ser encontrado, também, em diversos sites,
como: www.teologiabrasileira.com.br/Materia.asp?MateriaID=80, www.urrodoleao.com.br/materia_133.htm,
http://pitocos.blogspot.com/2002_07_01_pitocos_archive.htm, e outros, o que indica o impacto positivo que o documento
causou e a demanda por este tipo de proposta no ambiente evangélico).
484
Anexo 3
SENADORES EVANGÉLICOS (1999-2007)
N°
Nome Senador Igreja Partido
UF
Profissão Mandato
1 ÍRIS REZENDE
Cristã
Evangélica PMDB GO
Advogado e
Agropecuarista 1995-2003
2 MARINA SILVA
Assembléia de
Deus
PT AC
Professora 1995-2003
SENADORES EVANGÉLICOS (2003-2007)
N°
Nome Senador Igreja Partido
UF
Profissão Mandato
1
FRANCISCO PEREIRA
1
PL ES
2003-2011
2
ÍRIS REZENDE (DONA)
1
Cristã
Evangélica PMDB GO
Empresária 2003-2011
3 MAGNO MALTA
Batista
Renovada PL ES
Teólogo e Cantor 2003-2011
4 MARCELO CRIVELA Universal PRB RJ
Engenheiro 2003-2011
5
MARINA SILVA
2
Assembléia de
Deus PT AC
Professora 2003-2011
6 PAULO OCTÁVIO
Sara Nossa
Terra PFL DF
Empresário,
Construtor Civil 2003-2011
(1) Suplente que assumiu durante parte do mandato. (2) Licenciada. Ministra do Meio Ambiente.
SENADORES EVANGÉLICOS (2007-2011)
N°
Nome Senador Igreja Partido
UF
Profissão Mandato
1 MAGNO MALTA
Batista
Renovada
PL ES
Teólogo e Cantor 2003-2011
2 MARCELO CRIVELA Universal PRB RJ
Engenheiro 2003-2011
3 MARINA SILVA
Assembléia de
Deus PT AC
Professora 2003-2011
4
PAULO OCTÁVIO
1
Sara Nossa
Terra
PFL DF
Empresário,
Construtor Civil
2003-2011
(1)Eleito vice-governador do DF, para o quatriênio 2007-2011.
485
Anexo 4
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 /
CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
1 ADELOR VIEIRA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus SC
x 1
2 ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus
RJ
x 1
3 AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus RO
x x 2
4 ALDIR CABRAL Universal RJ
x 3
5 ALMEIDA DE JESUS Universal CE
x x 2
6 ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça RJ
x 1
7 AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus TO
x x 2
8 ANA ALENCAR Presbiteriana TO
x 1
9 ANDRÉ ZACHAROW (DIÁCONO) Batista PR
x 1
10 ANDRÉIA ZITO Batista RJ
x 1
11 ANTÔNIO BULHÕES (BISPO) Universal SP
x 1
12 ANTONIO CRUZ (DR. E PRESB.) Assembléia de Deus MS
x x x 3
13 AROLDE DE OLIVEIRA Batista RJ
x x 6
14 CABO JÚLIO (PASTOR)
Assembléia de Deus
Independente
MG
x x 2
15 CARLOS MANNATO Maranata ES
x x 2
16 CARLOS NADER Assembléia de Deus RJ
x x 2
17 CARLOS RODRIGUES (BISPO) Universal RJ
x x 2
18 CARLOS WILLIAN (PASTOR) Quadrangular/Maranata MG
x x 2
19 CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira
MA
x 1
20 CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus SE
x x 5
21 COSTA FERREIRA (DIÁCONO) Assembléia de Deus MA
x x 5
486
Anexo 4
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 /
CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
22 EBER SILVA Batista RJ
x 1
23 EDINHO MONTEMOR Batista SP
x x 2
24 EDNA MACEDO Universal SP
x 1
25 EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra RJ
x x 2
26 ERALDO TINOCO Batista BA
x 5
27 EULER MORAIS GO
x 1
28 FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus AP
x x 4
29 FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus RJ
x 1
30 FLÁVIO BEZERRA Universal CE
x 1
31 FRANCISCO OLÍMPIO (PASTOR) Assembléia de Deus PE
x 1
32 FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma
SP
x 1
33 FRANKEMBERGEN (PASTOR) Assembléia de Deus RR
x 1
34 GÊ TENUTA Renascer em Cristo SP
x 1
35 GEORGE HILTON Universal MG
x 1
36 GERSON GABRIELLI Batista BA
x x 2
37 GESSIVALDO ISAÍAS Universal PI x 1
38 GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus SP
x 1
39 GILMAR MACHADO Batista MG
x x x 3
40 GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada MG
x 1
41 HELENO SILVA (PASTOR) Universal SE
x 1
42 HENRIQUE AFONSO (PASTOR) Presbiteriana AC
x x 2
43 HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada MG
x x 3
487
Anexo 4
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 /
CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
44 ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica GO
x 1
45 ISAÍAS SILVESTRE (PASTOR) Assembléia de Deus MG
x 1
46 JAIR DE OLIVEIRA (PASTOR) Verdade que Liberta ES
x 1
47 JEFFERSON CAMPOS (PASTOR) Quadrangular SP
x 1
48 JOÃO BATISTA (BISPO) Universal SP
x 1
49 JOÃO CAMPOS (PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira
GO
x x 2
50 JOÃO MENDES DE JESUS (BISPO) Universal RJ
x 1
51 JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus TO
x 1
52 JOÃO PAULO GOMES DA SILVA Universal MG
x 1
53 JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal DF
x 1
54 JORGE TADEU MUDALEN Internacional da Graça SP
x 1
55 JORGE WILSON Universal RJ
x 2
56 JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus AC
x 1
57 JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal RJ
x 1
58 JOSUÉ BENGTSON (PASTOR) Quadrangular PA
x x 2
59 JÚLIO REDECKER Luterana RS
x x x 4
60 JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus ES
x 1
61 JUSMARI OLIVEIRA Batista BA
x 1
62 LAMARTINE POSELLA Batista SP
x 2
63 LÉO VIVAS Universal RJ
x 1
64 LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) MG
x 1
65 LIDIA QUINAN Presbiteriana GO
x 2
488
Anexo 4
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 /
CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
66 LINCOLN PORTELA (PASTOR) Batista Renovada MG
x x x 3
67 LINO ROSSI Batista MT
x x 2
68 LUÍS CARLOS HEINZE Luterana RS
x x x 3
69 LUIZ MOREIRA Universal BA
x 3
70 MAGNO MALTA Batista ES
x 1
71 MANOEL FERREIRA (PASTOR) Assembléia de Deus RJ
x 1
72 MARCOS ABRAMO (PASTOR) Universal SP
x 1
73 MARCOS ANTÔNIO Metodista Wesleyana PE
x 1
74 MARCOS DE JESUS (PASTOR) Universal PE
x x 2
75 MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular MG
x x 6
76 MATTOS NASCIMENTO RJ
x 1
77 MILTON BARBOSA (PASTOR) Assembléia de Deus BA
x 1
78 MILTON CARDIAS (PASTOR) Assembléia de Deus RS
x 1
79 MIRIAM REID Comunidade RJ
x 1
80 NATAN DONADON Batista RO
x x 2
81 NECHAR (DR.) Assembléia de Deus SP
x 1
82 NEUCIMAR FRAGA (PASTOR) Batista ES
x x 2
83 NEUTON LIMA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus SP
x x 2
84 NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus RO
x x 2
85 OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal PR
x x 2
86 ONYX LORENZONI Luterana RS
x x 2
87 PAULO BALTAZAR Metodista RJ
x x 2
489
Anexo 4
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 /
CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
88 PAULO BAUER Luterana SC
x 3
89 PAULO DE VELASCO Universal SP
x 2
90 PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal RS
x x 2
91 PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra DF
x 2
92 PAULO ROBERTO Universal RS
x 1
93 PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus CE
x 1
94 PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus MG
x x 4
95 RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PA
x x 3
96
REGINALDO GERMANO
(PASTOR)
Universal BA
x x 2
97 REINALDO (PASTOR) Quadrangular RS
x 1
98 RENILDO LEAL Assembléia de Deus PA
x 1
99 ROBSON RODOVALHO (BISPO) Sara Nossa Terra DF
x 1
100
SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus AM
x 1
101
SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus PE
x 4
102
SÉRGIO BRITO Batista BA
x 2
103
SÉRGIO CARVALHO RO
x x 2
104
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana MG
x x 3
105
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus AM
x x x 3
106
SUELI VIDIGAL Batista ES
x 1
107
TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus PR
x x 2
108
VALDECI PAIVA Universal RJ
x 1
109
VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus AP
x x 3
490
Anexo 4
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 /
CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
110
VIEIRA REIS (BISPO) Universal RJ
x 1
111
VINÍCIUS CARVALHO Universal RJ
x 1
112
WAGNER SALUSTIANO Universal SP
x 2
113
WALTER PINHEIRO Batista BA
x x x 4
114
WANDERVAL SANTOS (BISPO) Universal SP
x x 2
115
WASNY DE ROURE (DIÁCONO) Batista DF
x 1
116
WERNER WANDERER PR
x 3
117
WILSON SANTOS Adventista MT
x x 2
118
ZELINDA NOVAES Universal BA
x 1
119
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PA
x x 2
120
ZICO BRONZEADO Batista AC
x 1
491
Anexo 5
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
1 AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
2 ALDIR CABRAL Universal PFL RJ Policial Federal
3 ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE
Servidor Público,
Obreiro IURD
4 AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PPB TO Empresário
5 ANTÔNIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PMDB MS Médico
6 AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Economista
7 CABO JÚLIO
Assembléia de Deus
Independente PST MG
Policial Militar
8 CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
9
CARLOS RODRIGUES
(BISPO) Universal PL RJ Bispo e Radialista
10
CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
11
COSTA FERREIRA Assembléia de Deus PFL MA
Torneiro Mecânico,
Advogado,
Professor, Pastor
12
DE VELASCO Universal PSL SP Advogado
13
EBER SILVA Batista PST RJ Pastor
14
ERALDO TINOCO Batista PFL BA
Administrador e
Professor
15
EULER MORAIS PMDB GO
Economista,
Servidor Público
16
FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PSDB AP Socióloga
17
GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Comerciante
18
GESSIVALDO ISAÍAS Universal PMDB PI Pastor
19
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
20
GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada PMDB MG
Empresário,
Construtor Civil
21
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
492
Anexo 5
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
22
JORGE WILSON Universal PSDB RJ Advogado
23
JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus PSL AC
Professor
24
JOSUÉ BENGTSON Quadrangular PTB PA Pastor
25
JÚLIO REDECKER Luterana PPB RS Advogado
26
LAMARTINE POSELLA Batista PMDB SP Pastor
27
LIDIA QUINAN Presbiteriana PSDB GO
Empresária e
Enfermeira
28
LINCOLN PORTELA Batista (apoio IURD) PSL MG
Radialista e Pastor
29
LINO ROSSI Batista PSDB MT
Radialista e
Apresentador de TV
30
LUÍS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS Produtor Rural
31
LUIZ MOREIRA Universal PFL BA
Médico Militar
32
MAGNO MALTA Batista PL ES Pastor, Cantor
33
MARCOS DE JESUS Universal PL PE Radialista
34
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PST MG
Pastor
35
MATTOS NASCIMENTO PST RJ Músico
36
MIRIAM REID Comunidade PSB RJ Assistente Social
37
NEUTON LIMA Assembléia de Deus PFL SP Advogado
38
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
39
OLIVEIRA FILHO Universal PL PR Radialista, Pastor
40
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico e Bancário
41
PAULO JOSÉ GOUVÊA Universal PL RS Pastor e Radialista
42
PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra PFL DF
Empresário,
Construtor Civil
43
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PL MG
Servidor Público e
Teólogo
493
Anexo 5
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
44
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
45
REGINALDO GERMANO Universal PFL BA
Radialista (Militante
Negro)
46
RENILDO LEAL Assembléia de Deus PTB PA Médico
47
SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus PMDB PE
Engenheiro
Eletricista
48
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
49
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Cafeicultor
50
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Técnico de
Construção Civil
51
VALDECI PAIVA Universal PSL RJ Radialista
52
VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
53
WAGNER SALUSTIANO Universal PPB SP Advogado
54
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicação
55
WANDERVAL SANTOS
(BISPO) Universal PL SP
Agricultor e
Empresário de
Comunicação
56
WERNER WANDERER PFL PR Agricultor
57
WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
494
Anexo 6
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
1
ADELOR VIEIRA
(PRESBÍTERO)
Assembléia de Deus PMDB SC
Professor e
Securitário
2 AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
3 ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE Servidor Público
4 ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça PL RJ Pastor
5 AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PP TO Empresário
6 ANA ALENCAR Presbiteriana PSDB TO Cirurgiã Dentista
7
ANDRÉ ZACHAROW
(DIÁCONO)
Batista PP PR
Economista e
Advogado
8
ANTONIO CRUZ (DR. E
PRESB.)
Assembléia de Deus PTB MS Médico
9 CABO JÚLIO (PASTOR) Assembléia de Deus PSB MG
Policial Militar
10
CARLOS MANNATO Maranata PDT ES Médico
11
CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
12
CARLOS RODRIGUES
(BISPO) Universal PL RJ Radialista
13
CARLOS WILLIAN (PASTOR)
Quadrangular PST MG
Advogado
14
CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
15
COSTA FERREIRA
(DIÁCONO) Assembléia de Deus PFL MA
Advogado e
Professor
16
EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP Advogado
17
EDNA MACEDO Universal PTB SP Servidora Pública
18
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
19
FRANCISCO OLÍMPIO
(PASTOR)
Assembléia de Deus PSB PE Pastor
20
FRANKEMBERGEN
(PASTOR)
Assembléia de Deus PTB RR Pastor
21
GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Empresário
22
GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus PMDB SP Jornalista
495
Anexo 6
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
23
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
24
HELENO SILVA (PASTOR) Universal PL SE Pastor
25
HENRIQUE AFONSO
(PASTOR)
Presbiteriana PT AC
Professor
26
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
27
ISAÍAS SILVESTRE
(PASTOR) Assembléia de Deus PSB MG
Comerciante
28
JAIR DE OLIVEIRA
(PASTOR) Verdade que Liberta PMDB ES Pastor
29
JEFFERSON CAMPOS
(PASTOR) Quadrangular PMDB SP Pastor
30
JOÃO BATISTA (BISPO) Universal PFL SP Economista
31
JOÃO CAMPOS (PASTOR) Assembléia de Deus PSDB GO
Servidor Público
Estadual
32
JOÃO MENDES DE JESUS
(BISPO)
Universal PSB RJ Economista
33
JOÃO PAULO GOMES DA
SILVA
Universal PL MG
Advogado
34
JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal PL DF Pastor
35
JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal PMDB RJ Pastor
36
JOSUÉ BENGTSON
(PASTOR)
Quadrangular PTB PA Pastor
37
JÚLIO REDECKER Luterana PP RS Advogado
38
LINCOLN PORTELA
(PASTOR)
Batista PL MG
Radialista e TV
39
LINO ROSSI Batista PP MT
Radialista e
Apresentador de TV
40
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS
Engenheiro e
Produtor Rural
41
MARCOS ABRAMO
(PASTOR)
Universal PFL SP
Técnico Em
Telecomunicações
42
MARCOS DE JESUS
(PASTOR) Universal PL PE Radialista
43
MILTON BARBOSA
(PASTOR) Assembléia de Deus PFL BA
Pastor
44
MILTON CARDIAS (PASTOR)
Assembléia de Deus PTB RS Pastor
496
Anexo 6
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
45
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
46
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
47
NEUTON LIMA
(PRESBÍTERO)
Assembléia de Deus PTB SP Advogado
48
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
49
OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal PL PR Radialista
50
ONIX LORENZONI Luterana PFL RS Veterinário
51
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico
52
PAULO BAUER Luterana PFL SC
Administrador de
Empresas e Contador
53
PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal PL RS Radialista
54
PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB CE Radialista
55
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PTB PB Servidor Público
56
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
57
REGINALDO GERMANO
(PASTOR)
Universal PFL BA
Radialista
58
REINALDO (PASTOR) Quadrangular PTB RS Pastor
59
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
60
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Empresário
61
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
62
TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB PR Empresário
63
VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
64
VIEIRA REIS (BISPO) Universal PMDB RJ Pastor
65
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico Em
Telecomunicações
66
WANDERVAL SANTOS
(BISPO) Universal PL SP Empresário
497
Anexo 6
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
67
WASNY DE ROURE
(DIÁCONO)
Batista PT DF
Economista e
Servidor Público
68
WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
69
ZELINDA NOVAES Universal PFL BA
Economista e
Professora
70
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA Contador
71
ZICO BRONZEADO Batista PT AC
Estudante
498
Anexo 7
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
1 ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus
PL RJ
Esp. de Segurança
Pública
2 ANDRÉIA ZITO Batista PSDB RJ Estudante de Direito
3 ANTÔNIO BULHÕES (BISPO)
Universal PMDB SP Administrador
4 ANTONIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PP MS Médico
5 AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Professor
6 CARLOS MANATO Maranata PDT ES Médico
7 CARLOS WILLIAN Maranata / Quadrangular PTC MG
Advogado
8 CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira
PAN MA
9 EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP Advogado
10
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
11
FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PMDB AP Socióloga
12
FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus PSC RJ Estudante
13
FLÁVIO BEZERRA Universal PMDB CE Bispo
14
FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma PMDB SP Empresário
15
GÊ TENUTA (BISPO) Renascer em Cristo PFL SP
16
GEORGE HILTON Universal PP MG
Teólogo, Radialista e
Apresentador de TV
17
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
18
HENRIQUE AFONSO Presbiteriana PT AC
Professor
19
ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica PMDB GO
Empresária
20
JOÃO CAMPOS
Assembléia de Deus
Madureira
PSDB GO
Delegado de Polícia
21
JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus PFL TO Pecuarista
22
JORGE TADEU MUDALEN
Internacional da Graça de
Deus
PFL SP
499
Anexo 7
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
23
JÚLIO HEDECKER Luterana PSDB RS Advogado
24
JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus PSC ES Pastor
25
JUSMARI OLIVEIRA Batista PFL BA
26
LÉO VIVAS Universal PRB RJ Bispo
27
LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) PMDB MG
Adm. de Empresa e
Economista
28
LINCOLN PORTELA Batista Renovada PL MG
Radialista
29
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PP RS
Engenheiro e
Produtor Rural
30
MANOEL FERREIRA
(PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira PTB RJ Advogado
31
MARCOS ANTÔNIO
Assembléia de Deus ou
Metodista Wesleyana PSC PE Cantor e Compositor
32
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PSC MG
Pastor
33
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
34
NECHAR (DR.) Assembléia de Deus PV SP Médico
35
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
36
ONYX LORENZONI Luterana PFL RS Veterinário
37
PAULO ROBERTO Universal PTB RS Professor
38
ROBSON RODOVALHO
(BISPO)
Sara Nossa Terra PFL DF Professor
39
SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus PTB AM
40
SÉRGIO BRITO Batista PDT BA
Policial Civil e
Engenheiro
41
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
42
SUELI VIDIGAL Batista PDT ES
Estudante de
Jornalismo
43
TAKAYAMA Assembléia de Deus PMDB PR Empresário
44
VINÍCIUS CARVALHO Universal PT do B
RJ Empresário
500
Anexo 7
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR NOME
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
45
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicações
46
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA Contador
501
Anexo 8
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR IGREJA
Nome Deputado Igreja
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos até
2007
1 WILSON SANTOS Adventista x x 2
2 ADELOR VIEIRA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus x 1
3 AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus x x 2
4 ANTONIO CRUZ (DR. E PRESB.) Assembléia de Deus x x x 3
5 CARLOS NADER Assembléia de Deus x x 2
7 CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus x x 5
8 COSTA FERREIRA (DIÁCONO) Assembléia de Deus x x 1
9 FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus x 1
10 FRANCISCO OLÍMPIO (PASTOR) Assembléia de Deus x 1
12 FRANKEMBERGEN (PASTOR) Assembléia de Deus x 1
14 GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus x 1
15 ISAÍAS SILVESTRE (PASTOR) Assembléia de Deus x 1
16 JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus x 1
18 JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus x 1
19 JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus x 1
21 MANOEL FERREIRA (PASTOR) Assembléia de Deus x 1
23 MILTON BARBOSA (PASTOR) Assembléia de Deus x 1
24 MILTON CARDIAS (PASTOR) Assembléia de Deus x 1
25 NECHAR (DR.) Assembléia de Deus x 2
26 NEUTON LIMA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus x x 2
27 NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus x x 1
502
Anexo 8
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR IGREJA
Nome Deputado Igreja
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos até
2007
28 PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus x 4
29 PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus x x 3
30 RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus x x 1
31 RENILDO LEAL Assembléia de Deus x 4
32 SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus x 1
33 SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus x 3
34 SILAS CÂMARA Assembléia de Deus x x x 2
35 TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus x x 3
36 VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus x x 2
37 ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus x x 4
38 FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus x x 2
39 AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus x x 2
40 CABO JÚLIO (PASTOR)
Assembléia de Deus
Independente
x x 2
6 CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira
x 1
41 JOÃO CAMPOS (PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira
x x 1
22 MARCOS ANTÔNIO
Assembléia de Deus ou
Metodista Wesleyana x 1
20 JUSMARI OLIVEIRA Batista x 1
42 ANDRÉ ZACHAROW (DIÁCONO) Batista x 1
43 ANDRÉIA ZITO Batista x 6
44 AROLDE DE OLIVEIRA Batista x x 1
45 EBER SILVA Batista x 2
46 EDINHO MONTEMOR Batista x x 5
503
Anexo 8
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR IGREJA
Nome Deputado Igreja
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos até
2007
47 ERALDO TINOCO Batista x 2
48 GERSON GABRIELLI Batista x x 3
49 GILMAR MACHADO Batista x x x 2
50 LAMARTINE POSELLA Batista x 1
52 LINO ROSSI Batista x x 1
53 MAGNO MALTA Batista x 2
54 NATAN DONADON Batista x x 2
55 NEUCIMAR FRAGA (PASTOR) Batista x x 2
56 SÉRGIO BRITO Batista x 1
57 SUELI VIDIGAL Batista x 4
58 WALTER PINHEIRO Batista x x x 1
59 WASNY DE ROURE (DIÁCONO) Batista x 1
60 ZICO BRONZEADO Batista x 1
51 LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) x 2
61 GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada x 3
62 HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada x x 3
63 LINCOLN PORTELA (PASTOR) Batista Renovada x x x 1
64 MIRIAM REID Comunidade x 1
11 FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma x 1
65 ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica x 1
66 ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça x 1
17 JORGE TADEU MUDALEN
Internacional da Graça de
Deus
x 1
504
Anexo 8
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR IGREJA
Nome Deputado Igreja
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos até
2007
67 ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus x 4
68 JÚLIO REDECKER Luterana x x x 3
69 LUÍS CARLOS HEI NZE Luterana x x x 2
70 ONYX LORENZONI Luterana x x 3
71 PAULO BAUER Luterana x 2
72 CARLOS MANNATO Maranata x x 2
73 PAULO BALTAZAR Metodista x x 1
74 ANA ALENCAR Presbiteriana x 2
75 HENRIQUE AFONSO (PASTOR) Presbiteriana x x 2
76 LIDIA QUINAN Presbiteriana x 3
77 SILAS BRASILEIRO Presbiteriana x x 1
78 JEFFERSON CAMPOS (PASTOR) Quadrangular x 2
79 JOSUÉ BENGTSON (PASTOR) Quadrangular x x 6
80 MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular x x 1
81 REINALDO (PASTOR) Quadrangular x 2
82 CARLOS WILLIAN (PASTOR) Quadrangular/Maranata x x 2
13 GÊ TENUTA (BISPO) Renascer em Cristo x 1
83 EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra x x 2
84 PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra x 1
85 ROBSON RODOVALHO (BISPO) Sara Nossa Terra x 3
86 ALDIR CABRAL Universal x 2
87 ALMEIDA DE JESUS Universal x x 1
505
Anexo 8
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR IGREJA
Nome Deputado Igreja
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos até
2007
88 ANTÔNIO BULHÕES (BISPO) Universal x 2
89 CARLOS RODRIGUES (BISPO) Universal x x 1
90 EDNA MACEDO Universal x 1
91 FLÁVIO BEZERRA Universal x 1
92 GEORGE HILTON Universal x 1
93 GESSIVALDO ISAÍAS Universal x 1
94 HELENO SILVA (PASTOR) Universal x 1
95 JOÃO BATISTA (BISPO) Universal x 1
96 JOÃO MENDES DE JESUS (BISPO) Universal x 1
97 JOÃO PAULO GOMES DA SILVA Universal x 1
98 JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal x 2
99 JORGE WILSON Universal x 1
100
JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal x 1
101
LÉO VIVAS Universal x 3
102
LUIZ MOREIRA Universal x 1
103
MARCOS ABRAMO (PASTOR) Universal x 2
104
MARCOS DE JESUS (PASTOR) Universal x x 2
105
OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal x x 2
106
PAULO DE VELASCO Universal x 2
107
PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal x x 1
108
PAULO ROBERTO Universal x 2
109
REGINALDO GERMANO (PASTOR) Universal x x 1
506
Anexo 8
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR IGREJA
Nome Deputado Igreja
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos até
2007
110
VALDECI PAIVA Universal x 1
111
VIEIRA REIS (BISPO) Universal x 1
112
VINÍCIUS CARVALHO Universal x 2
113
WAGNER SALUSTIANO Universal x 2
114
WANDERVAL SANTOS (BISPO) Universal x x 1
115
ZELINDA NOVAES Universal x 1
116
JAIR DE OLIVEIRA (PASTOR) Verdade que Liberta x 1
117
EULER MORAIS x 1
118
MATTOS NASCIMENTO x 2
119
SÉRGIO CARVALHO x x 3
120
WERNER WANDERER x 1
507
Anexo 9
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
1 WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
2 AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PPB TO
Empresário
3 ANTÔNIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PMDB MS
Médico
4 CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
5 CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
6 COSTA FERREIRA Assembléia de Deus PFL MA
Torneiro Mecânico,
Advogado,
Professor, Pastor
7 JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus PSL AC
Professor
8 NEUTON LIMA Assembléia de Deus PFL SP Advogado
9 NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
10
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PL MG
Servidor Público e
Teólogo
11
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
12
RENILDO LEAL Assembléia de Deus PTB PA Médico
13
SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus PMDB PE
Engenheiro
Eletricista
14
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Técnico de
Construção Civil
15
VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
16
FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PSDB AP Socióloga
17
AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
18
CABO JÚLIO
Assembléia de Deus
Independente PST MG
Policial Militar
19
AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Economista
20
EBER SILVA Batista PST RJ Pastor
21
ERALDO TINOCO Batista PFL BA
Administrador e
Professor
50
8
Anexo 9
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
22
GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Comerciante
23
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
24
LAMARTINE POSELLA Batista PMDB SP Pastor
25
LINO ROSSI Batista PSDB MT
Radialista e
Apresentador de TV
26
MAGNO MALTA Batista PL ES Pastor, Cantor
27
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicação
28
LINCOLN PORTELA Batista (apoio IURD) PSL MG
Radialista e Pastor
29
GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada PMDB MG
Empresário,
Construtor Civil
30
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
31
MIRIAM REID Comunidade PSB RJ Assistente Social
32
JÚLIO REDECKER Luterana PPB RS Advogado
33
LUÍS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS Produtor Rural
34
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico e Bancário
35
LIDIA QUINAN Presbiteriana PSDB GO
Empresária e
Enfermeira
36
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Cafeicultor
37
JOSUÉ BENGTSON Quadrangular PTB PA Pastor
38
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PST MG
Pastor
39
PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra PFL DF
Empresário,
Construtor Civil
40
ALDIR CABRAL Universal PFL RJ Policial Federal
41
ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE
Servidor Público,
Obreiro IURD
42
CARLOS RODRIGUES
(BISPO)
Universal PL RJ Bispo e Radialista
43
DE VELASCO Universal PSL SP Advogado
509
Anexo 9
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
44
GESSIVALDO ISAÍAS Universal PMDB PI Pastor
45
JORGE WILSON Universal PSDB RJ Advogado
46
LUIZ MOREIRA Universal PFL BA
Médico Militar
47
MARCOS DE JESUS Universal PL PE Radialista
48
OLIVEIRA FILHO Universal PL PR Radialista, Pastor
49
PAULO JOSÉ GOUVÊA Universal PL RS Pastor e Radialista
50
REGINALDO GERMANO Universal PFL BA
Radialista (Militante
Negro)
51
VALDECI PAIVA Universal PSL RJ Radialista
52
WAGNER SALUSTIANO Universal PPB SP Advogado
53
WANDERVAL SANTOS
(BISPO) Universal PL SP
Agricultor e
Empresário de
Comunicação
54
EULER MORAIS PMDB GO
Economista,
Servidor Público
55
MATTOS NASCIMENTO PST RJ Músico
56
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
57
WERNER WANDERER PFL PR Agricultor
510
Anexo 10
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
1 WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
2
ADELOR VIEIRA
(PRESBÍTERO)
Assembléia de Deus PMDB SC
Professor e
Securitário
3 AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
4 AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PP TO
Empresário
5
ANTONIO CRUZ (DR. E
PRESB.) Assembléia de Deus PTB MS
Médico
6 CABO JÚLIO (PASTOR) Assembléia de Deus PSB MG
Policial Militar
7 CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
8 CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
9
COSTA FERREIRA
(DIÁCONO)
Assembléia de Deus PFL MA
Advogado e
Professor
10
FRANCISCO OLÍMPIO
(PASTOR)
Assembléia de Deus PSB PE Pastor
11
FRANKEMBERGEN
(PASTOR)
Assembléia de Deus PTB RR
Pastor
12
GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus PMDB SP Jornalista
13
ISAÍAS SILVESTRE
(PASTOR)
Assembléia de Deus PSB MG
Comerciante
14
JOÃO CAMPOS (PASTOR) Assembléia de Deus PSDB GO
Servidor Público
Estadual
15
MILTON BARBOSA
(PASTOR)
Assembléia de Deus PFL BA
Pastor
16
MILTON CARDIAS (PASTOR)
Assembléia de Deus PTB RS Pastor
17
NEUTON LIMA
(PRESBÍTERO)
Assembléia de Deus PTB SP Advogado
18
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
19
PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB CE
Radialista
20
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PTB PB Servidor Público
21
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
22
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
511
Anexo 10
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
23
TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB PR Empresário
24
VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
25
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA Contador
26
ANDRÉ ZACHAROW
(DIÁCONO)
Batista PP PR
Economista e
Advogado
27
EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP Advogado
28
GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Empresário
29
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
30
LINCOLN PORTELA
(PASTOR)
Batista PL MG
Radialista e TV
31
LINO ROSSI Batista PP MT
Radialista e
Apresentador de TV
32
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
33
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
34
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico Em
Telecomunicações
35
WASNY DE ROURE
(DIÁCONO) Batista PT DF
Economista e
Servidor Público
36
ZICO BRONZEADO Batista PT AC
Estudante
37
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
38
ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça PL RJ Pastor
39
JÚLIO REDECKER Luterana PP RS Advogado
40
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS
Engenheiro e
Produtor Rural
41
ONIX LORENZONI Luterana PFL RS Veterinário
42
PAULO BAUER Luterana PFL SC
Administrador de
Empresas e Contador
43
CARLOS MANNATO Maranata PDT ES Médico
44
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico
512
Anexo 10
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
45
ANA ALENCAR Presbiteriana PSDB TO
Cirurgiã Dentista
46
HENRIQUE AFONSO
(PASTOR) Presbiteriana PT AC
Professor
47
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Empresário
48
CARLOS WILLIAN (PASTOR)
Quadrangular PST MG
Advogado
49
JEFFERSON CAMPOS
(PASTOR)
Quadrangular PMDB SP Pastor
50
JOSUÉ BENGTSON
(PASTOR)
Quadrangular PTB PA Pastor
51
REINALDO (PASTOR) Quadrangular PTB RS Pastor
52
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
53
ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE
Servidor Público
54
CARLOS RODRIGUES
(BISPO)
Universal PL RJ Radialista
55
EDNA MACEDO Universal PTB SP Servidora Pública
56
HELENO SILVA (PASTOR) Universal PL SE Pastor
57
JOÃO BATISTA (BISPO) Universal PFL SP Economista
58
JOÃO MENDES DE JESUS
(BISPO) Universal PSB RJ Economista
59
JOÃO PAULO GOMES DA
SILVA Universal PL MG
Advogado
60
JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal PL DF
Pastor
61
JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal PMDB RJ Pastor
62
MARCOS ABRAMO
(PASTOR)
Universal PFL SP
Técnico Em
Telecomunicações
63
MARCOS DE JESUS
(PASTOR)
Universal PL PE Radialista
64
OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal PL PR Radialista
65
PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal PL RS Radialista
66
REGINALDO GERMANO
(PASTOR)
Universal PFL BA
Radialista
513
Anexo 10
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
67
VIEIRA REIS (BISPO) Universal PMDB RJ Pastor
68
WANDERVAL SANTOS
(BISPO) Universal PL SP Empresário
69
ZELINDA NOVAES Universal PFL BA
Economista e
Professora
70
JAIR DE OLIVEIRA
(PASTOR)
Verdade que Liberta PMDB ES Pastor
71
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
514
Anexo 11
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
1 ANTONIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PP MS
Médico
2 FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus PSC RJ Estudante
4 JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus PFL TO
Pecuarista
5 JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus PSC ES
Pastor
7 NECHAR (DR.) Assembléia de Deus PV SP
Médico
8 SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
9 TAKAYAMA Assembléia de Deus PMDB PR
Empresário
10
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA
Contador
11
FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PMDB AP
Socióloga
12
SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus PTB AM
13
CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira PAN MA
14
JOÃO CAMPOS
Assembléia de Deus
Madureira PSDB GO
Delegado de Polícia
15
MANOEL FERREIRA
(PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira PTB RJ Advogado
6 MARCOS ANTÔNIO
Assembléia de Deus ou
Metodista Wesleyana PSC PE
Cantor e Compositor
16
JUSMARI OLIVEIRA Batista PFL BA
17
ANDRÉIA ZITO Batista PSDB RJ Estudante de Direito
18
AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Professor
19
EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP
Advogado
20
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
21
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
22
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
23
SÉRGIO BRITO Batista PDT BA
Policial Civil e
Engenheiro
515
Anexo 11
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
24
SUELI VIDIGAL Batista PDT ES
Estudante de
Jornalismo
25
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicações
26
LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) PMDB MG
Adm. de Empresa e
Economista
27
LINCOLN PORTELA Batista Renovada PL MG
Radialista
3 FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma PMDB SP
Empresário
28
ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica PMDB GO
Empresária
29
JORGE TADEU MUDALEN
Internacional da Graça de
Deus PFL SP
30
ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus PL RJ
Esp. de Segurança
Pública
31
JÚLIO HEDECKER Luterana PSDB RS
Advogado
32
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PP RS
Engenheiro e
Produtor Rural
33
ONYX LORENZONI Luterana PFL RS
Veterinário
34
CARLOS MANATO Maranata PDT ES
Médico
35
CARLOS WILLIAN Maranata / Quadrangular PTC MG
Advogado
36
HENRIQUE AFONSO Presbiteriana PT AC
Professor
37
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PSC MG
Pastor
38
GÊ TENUTA (BISPO) Renascer em Cristo PFL SP
Empresário
39
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
40
ROBSON RODOVALHO
(BISPO)
Sara Nossa Terra PFL DF
Professor
41
ANTÔNIO BULHÕES (BISPO)
Universal PMDB SP
Administrador
42
FLÁVIO BEZERRA Universal PMDB CE
Bispo
43
GEORGE HILTON Universal PP MG
Teólogo, Radialista e
Apres. de TV
44
LÉO VIVAS Universal PRB RJ Bispo
516
Anexo 11
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR IGREJA
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
45
PAULO ROBERTO Universal PTB RS
Professor
46
VINÍCIUS CARVALHO Universal PT do B
RJ Empresário
517
Anexo 12
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
1 HENRIQUE AFONSO (PASTOR) Presbiteriana AC x x 2
2 JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus AC x 1
3 ZICO BRONZEADO Batista AC x 1
4 SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus AM x 1
5 SILAS CÂMARA Assembléia de Deus AM x x x 3
6 FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus AP x x 4
7 VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus AP x x 3
8 ERALDO TINOCO Batista BA x 5
9 GERSON GABRIELLI Batista BA x x 2
10 JUSMARI OLIVEIRA Batista BA x 1
11 LUIZ MOREIRA Universal BA x 3
12 MILTON BARBOSA (PASTOR) Assembléia de Deus BA x 1
13 REGINALDO GERMANO (PASTOR) Universal BA x x 2
14 SÉRGIO BRITO Batista BA x 2
15 WALTER PINHEIRO Batista BA x x x 4
16 ZELINDA NOVAES Universal BA x 1
17 ALMEIDA DE JESUS Universal CE x x 2
18 FLÁVIO BEZERRA Universal CE x 1
19 PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus CE x 1
20 JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal DF x 1
21 PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra DF x 2
518
Anexo 12
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
22 ROBSON RODOVALHO (BISPO) Sara Nossa Terra DF x 1
23 WASNY DE ROURE (DIÁCONO) Batista DF x 1
24 CARLOS MANNATO Maranata ES x x 2
25 JAIR DE OLIVEIRA (PASTOR) Verdade que Liberta ES x 1
26 JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus ES x 1
27 MAGNO MALTA Batista ES x 1
28 NEUCIMAR FRAGA (PASTOR) Batista ES x x 2
29 SUELI VIDIGAL Batista ES x 1
30 EULER MORAIS GO x 1
31 ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica GO x 1
32 JOÃO CAMPOS (PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira
GO x x 2
33 LIDIA QUINAN Presbiteriana GO x 2
34 CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira MA x 1
35 COSTA FERREIRA (DIÁCONO) Assembléia de Deus MA x x 5
36 CABO JÚLIO (PASTOR)
Assembléia de Deus
Independente MG x x 2
37 CARLOS WILLIAN (PASTOR) Quadrangular/Maranata MG x x 2
38 GEORGE HILTON Universal MG x 1
39 GILMAR MACHADO Batista MG x x x 3
40 GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada MG x 1
41 HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada MG x x 3
42 ISAÍAS SILVESTRE (PASTOR) Assembléia de Deus MG x 1
43 JOÃO PAULO GOMES DA SILVA Universal MG x 1
519
Anexo 12
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
44 LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) MG x 1
45 LINCOLN PORTELA (PASTOR) Batista Renovada MG x x x 3
46 MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular MG x x 6
47 PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus MG x x 4
48 SILAS BRASILEIRO Presbiteriana MG x x 3
49 ANTONIO CRUZ (DR. E PRESB.) Assembléia de Deus MS x x x 3
50 LINO ROSSI Batista MT x x 2
51 WILSON SANTOS Adventista MT x x 2
52 JOSUÉ BENGTSON (PASTOR) Quadrangular PA x x 2
53 RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PA x x 3
54 RENILDO LEAL Assembléia de Deus PA x 1
55 ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PA x x 2
56 FRANCISCO OLÍMPIO (PASTOR) Assembléia de Deus PE x 1
57 MARCOS ANTÔNIO
Assembléia de Deus ou
Metodista Wesleyana PE x 1
58 MARCOS DE JESUS (PASTOR) Universal PE x x 2
59 SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus PE x 4
60 GESSIVALDO ISAÍAS Universal PI x 1
61 ANDRÉ ZACHAROW (DIÁCONO) Batista PR x 1
62 OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal PR x x 2
63 TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus PR x x 2
64 WERNER WANDERER PR x 3
65 ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus
RJ x 1
520
Anexo 12
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
66 ALDIR CABRAL Universal RJ x 3
67 ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça RJ x 1
68 ANDRÉIA ZITO Batista RJ x 1
69 AROLDE DE OLIVEIRA Batista RJ x x 6
70 CARLOS NADER Assembléia de Deus RJ x x 2
71 CARLOS RODRIGUES (BISPO) Universal RJ x x 2
72 EBER SILVA Batista RJ x 1
73 EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra RJ x x 2
74 FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus RJ x 1
75 JOÃO MENDES DE JESUS (BISPO) Universal RJ x 1
76 JORGE WILSON Universal RJ x 2
77 JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal RJ x 1
78 LÉO VIVAS Universal RJ x 1
79 MANOEL FERREIRA (PASTOR) Assembléia de Deus RJ x 1
80 MATTOS NASCIMENTO RJ x 1
81 MIRIAM REID Comunidade RJ x 1
82 PAULO BALTAZAR Metodista RJ x x 2
83 VALDECI PAIVA Universal RJ x 1
84 VIEIRA REIS (BISPO) Universal RJ x 1
85 VINÍCIUS CARVALHO Universal RJ x 1
86 AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus RO x x 2
87 NATAN DONADON Batista RO x x 2
521
Anexo 12
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
88 NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus RO x x 2
89 SÉRGIO CARVALHO RO x x 2
90 FRANKEMBERGEN (PASTOR) Assembléia de Deus RR x 1
91 JÚLIO REDECKER Luterana RS x x x 4
92 LUÍS CARLOS HEINZE Luterana RS x x x 3
93 MILTON CARDIAS (PASTOR) Assembléia de Deus RS x 1
94 ONYX LORENZONI Luterana RS x x 2
95 PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal RS x x 2
96 PAULO ROBERTO Universal RS x 1
97 REINALDO (PASTOR) Quadrangular RS x 1
98 ADELOR VIEIRA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus SC x 1
99 PAULO BAUER Luterana SC x 3
100
CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus SE x x 5
101
HELENO SILVA (PASTOR) Universal SE x 1
102
ANTÔNIO BULHÕES (BISPO) Universal SP x 1
103
EDINHO MONTEMOR Batista SP x x 2
104
EDNA MACEDO Universal SP x 1
105
FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma SP x 1
106
GÊ TENUTA (BISPO) Renascer em Cristo SP x 1
107
GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus SP x 1
108
JEFFERSON CAMPOS (PASTOR) Quadrangular SP x 1
109
JOÃO BATISTA (BISPO) Universal SP x 1
522
Anexo 12
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja UF
1999 /
2003
2003 /
2007
2007 /
2011
Mandatos
até 2007
110
JORGE TADEU MUDALEN
Internacional da Graça de
Deus SP x 1
111
LAMARTINE POSELLA Batista SP x 2
112
MARCOS ABRAMO (PASTOR) Universal SP x 1
113
NECHAR (DR.) Assembléia de Deus SP x 1
114
NEUTON LIMA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus SP x x 2
115
PAULO DE VELASCO Universal SP x 2
116
WAGNER SALUSTIANO Universal SP x 2
117
WANDERVAL SANTOS (BISPO) Universal SP x x 2
118
AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus TO x x 2
119
ANA ALENCAR Presbiteriana TO x 1
120
JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus TO x 1
523
Anexo 13
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
1 JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus PSL AC
Professor
2 SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Técnico de
Construção Civil
4 VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
3 FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PSDB AP Socióloga
5 ERALDO TINOCO Batista PFL BA
Administrador e
Professor
6 GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Comerciante
7 LUIZ MOREIRA Universal PFL BA
Médico Militar
8 REGINALDO GERMANO Universal PFL BA
Radialista (Militante
Negro)
9 WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicação
10
ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE
Servidor Público,
Obreiro IURD
11
PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra PFL DF
Empresário,
Construtor Civil
12
MAGNO MALTA Batista PL ES Pastor, Cantor
13
EULER MORAIS PMDB GO
Economista,
Servidor Público
14
LIDIA QUINAN Presbiteriana PSDB GO
Empresária e
Enfermeira
15
COSTA FERREIRA Assembléia de Deus PFL MA
Torneiro Mecânico,
Advogado,
Professor, Pastor
22
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PL MG
Servidor Público e
Teólogo
18
GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada PMDB MG
Empresário,
Construtor Civil
23
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Cafeicultor
19
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
20
LINCOLN PORTELA Batista (apoio IURD) PSL MG
Radialista e Pastor
16
CABO JÚLIO
Assembléia de Deus
Independente
PST MG
Policial Militar
524
Anexo 13
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
21
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PST MG
Pastor
17
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
24
ANTÔNIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PMDB MS Médico
25
LINO ROSSI Batista PSDB MT
Radialista e Apres.
de TV
26
WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
28
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
27
JOSUÉ BENGTSON Quadrangular PTB PA Pastor
29
RENILDO LEAL Assembléia de Deus PTB PA Médico
30
MARCOS DE JESUS Universal PL PE Radialista
31
SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus PMDB PE
Engenheiro
Eletricista
32
GESSIVALDO ISAÍAS Universal PMDB PI Pastor
34
WERNER WANDERER PFL PR Agricultor
33
OLIVEIRA FILHO Universal PL PR Radialista, Pastor
35
ALDIR CABRAL Universal PFL RJ Policial Federal
36
AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Economista
37
CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
38
CARLOS RODRIGUES
(BISPO) Universal PL RJ Bispo e Radialista
42
MIRIAM REID Comunidade PSB RJ Assistente Social
43
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico e Bancário
40
JORGE WILSON Universal PSDB RJ Advogado
44
VALDECI PAIVA Universal PSL RJ Radialista
39
EBER SILVA Batista PST RJ Pastor
525
Anexo 13
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
41
MATTOS NASCIMENTO PST RJ Músico
45
AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
47
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
46
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
50
PAULO JOSÉ GOUVÊA Universal PL RS Pastor e Radialista
48
JÚLIO REDECKER Luterana PPB RS Advogado
49
LUÍS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS Produtor Rural
51
CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
54
NEUTON LIMA Assembléia de Deus PFL SP Advogado
56
WANDERVAL SANTOS
(BISPO) Universal PL SP
Agricultor e
Empresário de
Comunicação
53
LAMARTINE POSELLA Batista PMDB SP Pastor
55
WAGNER SALUSTIANO Universal PPB SP Advogado
52
DE VELASCO Universal PSL SP Advogado
57
AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PPB TO Empresário
526
Anexo 14
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
1
HENRIQUE AFONSO
(PASTOR)
Presbiteriana PT AC
Professor
2 ZICO BRONZEADO Batista PT AC
Estudante
3 SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
4 VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
5 GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Empresário
6
MILTON BARBOSA
(PASTOR) Assembléia de Deus PFL BA
Pastor
7
REGINALDO GERMANO
(PASTOR) Universal PFL BA
Radialista
8 WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico Em
Telecomunicações
9 ZELINDA NOVAES Universal PFL BA
Economista e
Professora
10
ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE Servidor Público
11
PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB CE Radialista
12
JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal PL DF Pastor
13
WASNY DE ROURE
(DIÁCONO)
Batista PT DF
Economista e
Servidor Público
14
CARLOS MANNATO Maranata PDT ES Médico
15
JAIR DE OLIVEIRA
(PASTOR)
Verdade que Liberta PMDB ES Pastor
16
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
17
JOÃO CAMPOS (PASTOR) Assembléia de Deus PSDB GO
Servidor Público
Estadual
18
COSTA FERREIRA
(DIÁCONO)
Assembléia de Deus PFL MA
Advogado e
Professor
19
CABO JÚLIO (PASTOR) Assembléia de Deus PSB MG
Policial Militar
20
CARLOS WILLIAN (PASTOR)
Quadrangular PST MG
Advogado
21
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
22
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
527
Anexo 14
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
23
ISAÍAS SILVESTRE
(PASTOR) Assembléia de Deus PSB MG
Comerciante
24
JOÃO PAULO GOMES DA
SILVA Universal PL MG
Advogado
25
LINCOLN PORTELA
(PASTOR)
Batista PL MG
Radialista e TV
26
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Empresário
27
ANTONIO CRUZ (DR. E
PRESB.)
Assembléia de Deus PTB MS Médico
28
LINO ROSSI Batista PP MT
Radialista e Apres.
de TV
29
WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
30
JOSUÉ BENGTSON
(PASTOR)
Quadrangular PTB PA Pastor
31
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
32
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA Contador
33
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PTB PB Servidor Público
34
FRANCISCO OLÍMPIO
(PASTOR)
Assembléia de Deus PSB PE Pastor
35
MARCOS DE JESUS
(PASTOR) Universal PL PE Radialista
36
ANDRÉ ZACHAROW
(DIÁCONO) Batista PP PR
Economista e
Advogado
37
OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal PL PR Radialista
38
TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB PR Empresário
39
ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça PL RJ Pastor
40
CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
41
CARLOS RODRIGUES
(BISPO)
Universal PL RJ Radialista
42
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
43
JOÃO MENDES DE JESUS
(BISPO)
Universal PSB RJ Economista
44
JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal PMDB RJ Pastor
528
Anexo 14
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
45
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico
46
VIEIRA REIS (BISPO) Universal PMDB RJ Pastor
47
AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
48
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
49
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
50
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
51
FRANKEMBERGEN
(PASTOR) Assembléia de Deus PTB RR Pastor
52
JÚLIO REDECKER Luterana PP RS Advogado
53
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS
Engenheiro e
Produtor Rural
54
MILTON CARDIAS (PASTOR)
Assembléia de Deus PTB RS Pastor
55
ONIX LORENZONI Luterana PFL RS Veterinário
56
PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal PL RS Radialista
57
REINALDO (PASTOR) Quadrangular PTB RS Pastor
58
ADELOR VIEIRA
(PRESBÍTERO) Assembléia de Deus PMDB SC
Professor e
Securitário
59
PAULO BAUER Luterana PFL SC
Administrador de
Empresas e Contador
60
CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
61
HELENO SILVA (PASTOR) Universal PL SE Pastor
62
EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP Advogado
63
EDNA MACEDO Universal PTB SP Servidora Pública
64
GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus PMDB SP Jornalista
65
JEFFERSON CAMPOS
(PASTOR)
Quadrangular PMDB SP Pastor
66
JOÃO BATISTA (BISPO) Universal PFL SP Economista
529
Anexo 14
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
67
MARCOS ABRAMO
(PASTOR) Universal PFL SP
Técnico Em
Telecomunicações
68
NEUTON LIMA
(PRESBÍTERO) Assembléia de Deus PTB SP Advogado
69
WANDERVAL SANTOS
(BISPO)
Universal PL SP Empresário
70
AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PP TO Empresário
71
ANA ALENCAR Presbiteriana PSDB TO Cirurgiã Dentista
530
Anexo 15
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
1 HENRIQUE AFONSO Presbiteriana PT AC
Professor
2 SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus PTB AM
3 SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
4 FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PMDB AP Socióloga
5 JUSMARI OLIVEIRA Batista PFL BA
6 SÉRGIO BRITO Batista PDT BA
Policial Civil e
Engenheiro
7 WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicações
8 FLÁVIO BEZERRA Universal PMDB CE Bispo
9
ROBSON RODOVALHO
(BISPO)
Sara Nossa Terra PFL DF Professor
10
CARLOS MANATO Maranata PDT ES Médico
11
JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus PSC ES Pastor
12
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
13
SUELI VIDIGAL Batista PDT ES
Estudante de
Jornalismo
14
ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica PMDB GO
Empresária
15
JOÃO CAMPOS
Assembléia de Deus
Madureira
PSDB GO
Delegado de Polícia
16
CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira
PAN MA
17
CARLOS WILLIAN Maranata / Quadrangular PTC MG
Advogado
18
GEORGE HILTON Universal PP MG
Teólogo, Radialista e
Apresentador de TV
19
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
20
LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) PMDB MG
Adm. de Empresa e
Economista
21
LINCOLN PORTELA Batista Renovada PL MG
Radialista
22
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PSC MG
Pastor
531
Anexo 15
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
23
ANTONIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PP MS Médico
24
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA Contador
25
MARCOS ANTÔNIO
Assembléia de Deus ou
Metodista Wesleyana
PSC PE Cantor e Compositor
26
TAKAYAMA Assembléia de Deus PMDB PR Empresário
27
ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus
PL RJ
Esp. de Segurança
Pública
28
ANDRÉIA ZITO Batista PSDB RJ Estudante de Direito
29
AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Professor
30
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
31
FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus PSC RJ Estudante
32
LÉO VIVAS Universal PRB RJ Bispo
33
MANOEL FERREIRA
(PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira
PTB RJ Advogado
34
VINÍCIUS CARVALHO Universal PT do B
RJ Empresário
35
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
36
JÚLIO HEDECKER Luterana PSDB RS Advogado
37
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PP RS
Engenheiro e
Produtor Rural
38
ONYX LORENZONI Luterana PFL RS Veterinário
39
PAULO ROBERTO Universal PTB RS Professor
40
ANTÔNIO BULHÕES (BISPO)
Universal PMDB SP Administrador
41
EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP Advogado
42
FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma PMDB SP Empresário
43
GÊ TENUTA (BISPO) Renascer em Cristo PFL SP Empresário
44
JORGE TADEU MUDALEN
Internacional da Graça de
Deus
PFL SP
532
Anexo 15
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR
ESTADO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
45
NECHAR (DR.) Assembléia de Deus PV SP Médico
46
JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus PFL TO Pecuarista
533
Anexo 16
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR PARTIDO
Nome Deputado Igreja UF Partido
Mandatos até
2007
1 CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira
MA PAN 1
2 SÉRGIO BRITO Batista BA PDT 2
3 CARLOS MANNATO Maranata ES PDT 2
4 SUELI VIDIGAL Batista ES PDT 1
5 ERALDO TINOCO Batista BA PFL 5
6 GÊ TENUTA (BISPO) Renascer em Cristo SP PFL 1
7 GERSON GABRIELLI Batista BA PFL 2
8 JORGE TADEU MUDALEN
Internacional da Graça de
Deus SP PFL 1
9 JUSMARI OLIVEIRA Batista BA PFL 1
10 LUIZ MOREIRA Universal BA PFL 3
11 MILTON BARBOSA (PASTOR) Assembléia de Deus BA PFL 1
12 REGINALDO GERMANO (PASTOR) Universal BA PFL 2
13 ZELINDA NOVAES Universal BA PFL 1
14 PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra DF PFL 2
15 ROBSON RODOVALHO (BISPO) Sara Nossa Terra DF PFL 1
16 COSTA FERREIRA (DIÁCONO) Assembléia de Deus MA PFL 5
17 WERNER WANDERER PR PFL 3
18 ALDIR CABRAL Universal RJ PFL 3
19 AROLDE DE OLIVEIRA Batista RJ PFL 6
20 ONYX LORENZONI Luterana RS PFL 2
21 PAULO BAUER Luterana SC PFL 3
534
Anexo 16
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR PARTIDO
Nome Deputado Igreja UF Partido
Mandatos até
2007
22 JOÃO BATISTA (BISPO) Universal SP PFL 1
23 MARCOS ABRAMO (PASTOR) Universal SP PFL 1
24 JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus TO PFL 1
25 ALMEIDA DE JESUS Universal CE PL 2
26 JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal DF PL 1
27 MAGNO MALTA Batista ES PL 1
28 NEUCIMAR FRAGA (PASTOR) Batista ES PL 2
29 JOÃO PAULO GOMES DA SILVA Universal MG PL 1
30 LINCOLN PORTELA (PASTOR) Batista Renovada MG PL 3
31 RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PA PL 3
32 MARCOS DE JESUS (PASTOR) Universal PE PL 2
33 OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal PR PL 2
34 ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus
RJ PL 1
35 ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça RJ PL 1
36 CARLOS NADER Assembléia de Deus RJ PL 2
37 CARLOS RODRIGUES (BISPO) Universal RJ PL 2
38 PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal RS PL 2
39 HELENO SILVA (PASTOR) Universal SE PL 1
40 WANDERVAL SANTOS (BISPO) Universal SP PL 2
41 FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus AP PMDB 4
42 FLÁVIO BEZERRA Universal CE PMDB 1
43 PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus CE PMDB 1
535
Anexo 16
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR PARTIDO
Nome Deputado Igreja UF Partido
Mandatos até
2007
44 JAIR DE OLIVEIRA (PASTOR) Verdade que Liberta ES PMDB 1
45 EULER MORAIS GO PMDB 1
46 ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica GO PMDB 1
47 GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada MG PMDB 1
48 LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) MG PMDB 1
49 SILAS BRASILEIRO Presbiteriana MG PMDB 3
50 SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus PE PMDB 4
51 GESSIVALDO ISAÍAS Universal PI PMDB 1
52 TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus PR PMDB 2
53 EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra RJ PMDB 2
54 JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal RJ PMDB 1
55 VIEIRA REIS (BISPO) Universal RJ PMDB 1
56 NATAN DONADON Batista RO PMDB 2
57 ADELOR VIEIRA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus SC PMDB 1
58 ANTÔNIO BULHÕES (BISPO) Universal SP PMDB 1
59 FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma SP PMDB 1
60 GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus SP PMDB 1
61 JEFFERSON CAMPOS (PASTOR) Quadrangular SP PMDB 1
62 LAMARTINE POSELLA Batista SP PMDB 2
63 VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus AP PP 3
64 GEORGE HILTON Universal MG PP 1
65 ANTONIO CRUZ (DR. E PRESB.) Assembléia de Deus MS PP 3
536
Anexo 16
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR PARTIDO
Nome Deputado Igreja UF Partido
Mandatos até
2007
66 LINO ROSSI Batista MT PP 2
67 ANDRÉ ZACHAROW (DIÁCONO) Batista PR PP 1
68 LUÍS CARLOS HEINZE Luterana RS PP 3
69 AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus TO PP 2
70 HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada MG PPB 3
71 CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus SE PPB 5
72 WAGNER SALUSTIANO Universal SP PPB 2
73 AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus RO PPS 2
74 LÉO VIVAS Universal RJ PRB 1
75 CABO JÚLIO (PASTOR)
Assembléia de Deus
Independente
MG PSB 2
76 ISAÍAS SILVESTRE (PASTOR) Assembléia de Deus MG PSB 1
77 FRANCISCO OLÍMPIO (PASTOR) Assembléia de Deus PE PSB 1
78 JOÃO MENDES DE JESUS (BISPO) Universal RJ PSB 1
79 MIRIAM REID Comunidade RJ PSB 1
80 PAULO BALTAZAR Metodista RJ PSB 2
81 EDINHO MONTEMOR Batista SP PSB 2
82 JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus ES PSC 1
83 MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular MG PSC 6
84 ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PA PSC 2
85 MARCOS ANTÔNIO
Assembléia de Deus ou
Metodista Wesleyana PE PSC 1
86 FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus RJ PSC 1
87 JOÃO CAMPOS (PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira
GO PSDB 2
537
Anexo 16
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR PARTIDO
Nome Deputado Igreja UF Partido
Mandatos até
2007
88 LIDIA QUINAN Presbiteriana GO PSDB 2
89 WILSON SANTOS Adventista MT PSDB 2
90 ANDRÉIA ZITO Batista RJ PSDB 1
91 JORGE WILSON Universal RJ PSDB 2
92 SÉRGIO CARVALHO RO PSDB 2
93 JÚLIO REDECKER Luterana RS PSDB 4
94 ANA ALENCAR Presbiteriana TO PSDB 1
95 JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus AC PSL 1
96 VALDECI PAIVA Universal RJ PSL 1
97 PAULO DE VELASCO Universal SP PSL 2
98 EBER SILVA Batista RJ PST 1
99 MATTOS NASCIMENTO RJ PST 1
100
HENRIQUE AFONSO (PASTOR) Presbiteriana AC PT 2
101
ZICO BRONZEADO Batista AC PT 1
102
WALTER PINHEIRO Batista BA PT 4
103
WASNY DE ROURE (DIÁCONO) Batista DF PT 1
104
GILMAR MACHADO Batista MG PT 3
105
VINÍCIUS CARVALHO Universal RJ PT do B 1
106
SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus AM PTB 1
107
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus AM PTB 3
108
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus MG PTB 4
109
JOSUÉ BENGTSON (PASTOR) Quadrangular PA PTB 2
538
Anexo 16
DEPUTADOS EVANGÉLICOS / MANDATOS ATÉ 2007 / CLASSIFICAÇÃO
POR PARTIDO
Nome Deputado Igreja UF Partido
Mandatos até
2007
110
RENILDO LEAL Assembléia de Deus PA PTB 1
111
MANOEL FERREIRA (PASTOR) Assembléia de Deus RJ PTB 1
112
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus RO PTB 2
113
FRANKEMBERGEN (PASTOR) Assembléia de Deus RR PTB 1
114
MILTON CARDIAS (PASTOR) Assembléia de Deus RS PTB 1
115
PAULO ROBERTO Universal RS PTB 1
116
REINALDO (PASTOR) Quadrangular RS PTB 1
117
EDNA MACEDO Universal SP PTB 1
118
NEUTON LIMA (PRESBÍTERO) Assembléia de Deus SP PTB 2
119
CARLOS WILLIAN (PASTOR) Quadrangular/Maranata MG PTC 2
120
NECHAR (DR.) Assembléia de Deus SP PV 1
539
Anexo 17
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
1 ALDIR CABRAL Universal PFL RJ Policial Federal
2 AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Economista
3 COSTA FERREIRA Assembléia de Deus PF L MA
Torneiro Mecânico,
Advogado,
Professor, Pastor
4 ERALDO TINOCO Batista PFL BA
Administrador e
Professor
5 GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Comerciante
6 LUIZ MOREIRA Universal PFL BA
Médico Militar
7 NEUTON LIMA Assembléia de Deus PFL SP Advogado
8 PAULO OCTÁVIO Sara Nossa Terra PFL DF
Empresário,
Construtor Civil
9 REGINALDO GERMANO Universal PFL BA
Radialista (Militante
Negro)
10
WERNER WANDERER PFL PR Agricultor
11
ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE
Servidor Público,
Obreiro IURD
12
CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
13
CARLOS RODRIGUES
(BISPO)
Universal PL RJ Bispo e Radialista
14
MAGNO MALTA Batista PL ES Pastor, Cantor
15
MARCOS DE JESUS Universal PL PE Radialista
16
OLIVEIRA FILHO Universal PL PR Radialista, Pastor
17
PAULO JOSÉ GOUVÊA Universal PL RS Pastor e Radialista
18
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PL MG
Servidor Público e
Teólogo
19
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
20
WANDERVAL SANTOS
(BISPO) Universal PL SP
Agricultor e
Empresário de
Comunicação
21
ANTÔNIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PMDB MS
Médico
540
Anexo 17
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
22
EULER MORAIS PMDB GO
Economista,
Servidor Público
23
GESSIVALDO ISAÍAS Universal PMDB PI Pastor
24
GLYCON TERRA PINTO Batista Renovada PMDB MG
Empresário,
Construtor Civil
25
LAMARTINE POSELLA Batista PMDB SP Pastor
26
SALATIEL CARVALHO Assembléia de Deus PMDB PE
Engenheiro
Eletricista
27
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Cafeicultor
28
VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
29
AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PPB TO
Empresário
30
CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
31
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
32
JÚLIO REDECKER Luterana PPB RS Advogado
33
LUÍS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS Produtor Rural
34
WAGNER SALUSTIANO Universal PPB SP Advogado
35
AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
36
MIRIAM REID Comunidade PSB RJ Assistente Social
37
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico e Bancário
38
FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PSDB AP Socióloga
39
JORGE WILSON Universal PSDB RJ Advogado
40
LIDIA QUINAN Presbiteriana PSDB GO
Empresária e
Enfermeira
41
LINO ROSSI Batista PSDB MT
Radialista e Apres.
de TV
42
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
43
WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
541
Anexo 17
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (1999 - 2003) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
44
DE VELASCO Universal PSL SP Advogado
45
JOSÉ ALEKSANDRO Assembléia de Deus PSL AC
Professor
46
LINCOLN PORTELA Batista (apoio IURD) PSL MG
Radialista e Pastor
47
VALDECI PAIVA Universal PSL RJ Radialista
48
CABO JÚLIO
Assembléia de Deus
Independente
PST MG
Policial Militar
49
EBER SILVA Batista PST RJ Pastor
50
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PST MG
Pastor
51
MATTOS NASCIMENTO PST RJ Músico
52
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
53
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicação
54
JOSUÉ BENGTSON Quadrangular PTB PA Pastor
55
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
56
RENILDO LEAL Assembléia de Deus PTB PA Médico
57
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Técnico de
Construção Civil
542
Anexo 18
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
1 CARLOS MANNATO Maranata PDT ES Médico
2
COSTA FERREIRA
(DIÁCONO)
Assembléia de Deus PFL MA
Advogado e
Professor
3 GERSON GABRIELLI Batista PFL BA
Empresário
4 JOÃO BATISTA (BISPO) Universal PFL SP Economista
5
MARCOS ABRAMO
(PASTOR)
Universal PFL SP
Técnico Em
Telecomunicações
6
MILTON BARBOSA
(PASTOR)
Assembléia de Deus PFL BA
Pastor
7 ONIX LORENZONI Luterana PFL RS Veterinário
8 PAULO BAUER Luterana PFL SC
Administrador de
Empresas e Contador
9
REGINALDO GERMANO
(PASTOR) Universal PFL BA
Radialista
10
ZELINDA NOVAES Universal PFL BA
Economista e
Professora
11
ALMEIDA DE JESUS Universal PL CE Servidor Público
12
ALMIR MOURA (PASTOR) Internacional da Graça PL RJ Pastor
13
CARLOS NADER Assembléia de Deus PL RJ
Advogado e
Empresário
14
CARLOS RODRIGUES
(BISPO)
Universal PL RJ Radialista
15
HELENO SILVA (PASTOR) Universal PL SE Pastor
16
JOÃO PAULO GOMES DA
SILVA
Universal PL MG
Advogado
17
JORGE PINHEIRO (PASTOR) Universal PL DF Pastor
18
LINCOLN PORTELA
(PASTOR)
Batista PL MG
Radialista e TV
19
MARCOS DE JESUS
(PASTOR)
Universal PL PE Radialista
20
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
21
OLIVEIRA FILHO (PASTOR) Universal PL PR Radialista
543
Anexo 18
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
22
PAULO GOUVÊA (PASTOR) Universal PL RS Radialista
23
RAIMUNDO SANTOS Assembléia de Deus PL PA Advogado
24
WANDERVAL SANTOS
(BISPO) Universal PL SP Empresário
25
ADELOR VIEIRA
(PRESBÍTERO) Assembléia de Deus PMDB SC
Professor e
Securitário
26
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
27
GILBERTO NASCIMENTO Assembléia de Deus PMDB SP Jornalista
28
JAIR DE OLIVEIRA
(PASTOR)
Verdade que Liberta PMDB ES Pastor
29
JEFFERSON CAMPOS
(PASTOR)
Quadrangular PMDB SP Pastor
30
JOSÉ DIVINO (PASTOR) Universal PMDB RJ Pastor
31
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
32
PEDRO RIBEIRO (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB CE Radialista
33
SILAS BRASILEIRO Presbiteriana PMDB MG
Empresário
34
TAKAYAMA (PASTOR) Assembléia de Deus PMDB PR Empresário
35
VIEIRA REIS (BISPO) Universal PMDB RJ Pastor
36
AMARILDO (PASTOR) Assembléia de Deus PP TO Empresário
37
ANDRÉ ZACHAROW
(DIÁCONO) Batista PP PR
Economista e
Advogado
38
JÚLIO REDECKER Luterana PP RS Advogado
39
LINO ROSSI Batista PP MT
Radialista e Apres.
de TV
40
VALDENOR GUEDES Assembléia de Deus PP AP
Professor e Químico
Industrial
41
CLEONÂNCIO FONSECA Assembléia de Deus PPB SE
Agropecuarista e
Citricultor
42
HERCULANO ANGHINETTI Batista Renovada PPB MG
Produtor Rural
43
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PPB RS
Engenheiro e
Produtor Rural
544
Anexo 18
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
44
AGNALDO MUNIZ Assembléia de Deus PPS RO
Advogado
45
CABO JÚLIO (PASTOR) Assembléia de Deus PSB MG
Policial Militar
46
EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP Advogado
47
FRANCISCO OLÍMPIO
(PASTOR) Assembléia de Deus PSB PE Pastor
48
ISAÍAS SILVESTRE
(PASTOR) Assembléia de Deus PSB MG
Comerciante
49
JOÃO MENDES DE JESUS
(BISPO)
Universal PSB RJ Economista
50
PAULO BALTAZAR Metodista PSB RJ Médico
51
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA Contador
52
ANA ALENCAR Presbiteriana PSDB TO Cirurgiã Dentista
53
JOÃO CAMPOS (PASTOR) Assembléia de Deus PSDB GO
Servidor Público
Estadual
54
SÉRGIO CARVALHO PSDB RO
Médico
55
WILSON SANTOS Adventista PSDB MT
Professor
56
CARLOS WILLIAN (PASTOR)
Quadrangular PST MG
Advogado
57
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
58
HENRIQUE AFONSO
(PASTOR)
Presbiteriana PT AC
Professor
59
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico Em
Telecomunicações
60
WASNY DE ROURE
(DIÁCONO) Batista PT DF
Economista e
Servidor Público
61
ZICO BRONZEADO Batista PT AC
Estudante
62
ANTONIO CRUZ (DR. E
PRESB.) Assembléia de Deus PTB MS Médico
63
EDNA MACEDO Universal PTB SP Servidora Pública
64
FRANKEMBERGEN
(PASTOR)
Assembléia de Deus PTB RR Pastor
65
JOSUÉ BENGTSON
(PASTOR)
Quadrangular PTB PA Pastor
545
Anexo 18
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2003 - 2007) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF Profissão
66
MILTON CARDIAS (PASTOR)
Assembléia de Deus PTB RS Pastor
67
NEUTON LIMA
(PRESBÍTERO) Assembléia de Deus PTB SP Advogado
68
NILTON CAPIXABA Assembléia de Deus PTB RO
Comerciante
69
PHILEMON RODRIGUES Assembléia de Deus PTB PB Servidor Público
70
REINALDO (PASTOR) Quadrangular PTB RS Pastor
71
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
546
Anexo 19
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
1 CLEBER VERDE
Assembléia de Deus
Madureira
PAN MA
2 CARLOS MANATO Maranata PDT ES Médico
3 SÉRGIO BRITO Batista PDT BA
Policial Civil e
Engenheiro
4 SUELI VIDIGAL Batista PDT ES
Estudante de
Jornalismo
5 AROLDE DE OLIVEIRA Batista PFL RJ
Engenheiro e
Professor
6 GÊ TENUTA (BISPO) Renascer em Cristo PFL SP Empresário
7 JOÃO OLIVEIRA Assembléia de Deus PFL TO
Pecuarista
8 JORGE TADEU MUDALEN
Internacional da Graça de
Deus PFL SP
9 JUSMARI OLIVEIRA Batista PFL BA
10
ONYX LORENZONI Luterana PFL RS Veterinário
11
ROBSON RODOVALHO
(BISPO) Sara Nossa Terra PFL DF
Professor
12
ADÍLSON SOARES (DR.)
Internacional da Graça de
Deus
PL RJ
Esp. de Segurança
Pública
13
LINCOLN PORTELA Batista Renovada PL MG
Radialista
14
NEUCIMAR FRAGA Batista PL ES
Representante
Comercial
15
ANTÔNIO BULHÕES (BISPO)
Universal PMDB SP Administrador
16
EDUARDO CUNHA Sara Nossa Terra PMDB RJ Economista
17
FÁTIMA PELAES Assembléia de Deus PMDB AP Socióloga
18
FLÁVIO BEZERRA Universal PMDB CE
Bispo
19
FRANCISCO ROSSI Comunidade de Carisma PMDB SP Empresário
20
ÍRIS REZENDE (DONA) Cristã Evangélica PMDB GO
Empresária
21
LEONARDO QUINTÃO Batista (Lagoinha) PMDB MG
Adm. de Empresa e
Economista
547
Anexo 19
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
22
NATAN DONADON Batista PMDB RO
Servidor Público
23
TAKAYAMA Assembléia de Deus PMDB PR Empresário
24
ANTONIO CRUZ (DR.) Assembléia de Deus PP MS
Médico
25
GEORGE HILTON Universal PP MG
Teólogo, Radialista e
Apres. de TV
26
LUIS CARLOS HEINZE Luterana PP RS
Engenheiro e
Produtor Rural
27
LÉO VIVAS Universal PRB RJ Bispo
28
EDINHO MONTEMOR Batista PSB SP Advogado
29
FILIPE RIO DE CARA NOVA Assembléia de Deus PSC RJ Estudante
30
JURANDYR LOUREIRO Assembléia de Deus PSC ES Pastor
31
MARCOS ANTÔNIO
Assembléia de Deus ou
Metodista Wesleyana
PSC PE Cantor e Compositor
32
MÁRIO DE OLIVEIRA Quadrangular PSC MG
Pastor
33
ZEQUINHA MARINHO Assembléia de Deus PSC PA Contador
34
ANDRÉIA ZITO Batista PSDB RJ Estudante de Direito
35
JOÃO CAMPOS
Assembléia de Deus
Madureira
PSDB GO
Delegado de Polícia
36
JÚLIO HEDECKER Luterana PSDB RS Advogado
37
GILMAR MACHADO Batista PT MG
Professor
38
HENRIQUE AFONSO Presbiteriana PT AC
Professor
39
WALTER PINHEIRO Batista PT BA
Técnico em
Telecomunicações
40
VINÍCIUS CARVALHO Universal PT do B
RJ Empresário
41
MANOEL FERREIRA
(PASTOR)
Assembléia de Deus
Madureira PTB RJ Advogado
42
PAULO ROBERTO Universal PTB RS Professor
43
SABINO CASTELO BRANCO Assembléia de Deus PTB AM
548
Anexo 19
DEPUTADOS EVANGÉLICOS (2007 - 2011) / CLASSIFICAÇÃO POR
PARTIDO
Nome Deputado Igreja Partido
UF
Profissão
44
SILAS CÂMARA Assembléia de Deus PTB AM
Empresário
45
CARLOS WILLIAN Maranata / Quadrangular PTC MG
Advogado
46
NECHAR (DR.) Assembléia de Deus PV SP Médico
549
ANEXO 20
VOTAÇÃO OBTIDA PELOS DEPUTADOS FEDERAIS DA ASSEMBLÉIA DE DEUS EM 2002 E 2006
CANDIDATO
ESTADO
PARTIDO
VOTAÇÃO
2002
VOTAÇÃO
2006
ACRÉSCIMO
/DECRÉSC.
ADELOR VIEIRA (PRESBÍTERO) SC PMDB 105.464 47.341 -58.123
AGNALDO MUNIZ
RO PPS
35.707 21.891 -13.816
AMARILDO (PASTOR)
TO PP
40.541 11.735 -28.806
ANTONIO CRUZ (DR. E PRESB.) MS PTB 76.443 57.464 -18.979
CABO JÚLIO (PASTOR)
MG PSB
116.506 58.198 -58.308
CARLOS NADER
RJ PL
59.914 29.559 -30.355
CLEBER VERDE
MA PAN
71.734 71.734
CLEONÂNCIO FONSECA
SE PP
41.075 25.892 -15.183
COSTA FERREIRA
MA PFL
64.719 55.131 -9.588
FÁTIMA PELAES
AP PMDB
17.297 17.297
FILIPE RIO DE CARA NOVA
RJ PSC
51.062 51.062
FRANCISCO OLÍMPIO (PASTOR) PE PSB 57.544 33.483 -24.061
FRANKEMBERGEN (PASTOR)
RR PTB
9.198 7.033 -2.165
GILBERTO NASCIMENTO
SP PMDB
240.664 72.320 -168.344
ISAÍAS SILVESTRE (PASTOR)
MG PSB
68.058 21.912 -46.146
JOÃO CAMPOS (PASTOR)
GO PSDB
61.323 67.573 6.250
JOÃO OLIVEIRA
TO PFL
32.704 32.704
JURANDYR LOUREIRO
ES PSC
33.863 33.863
MANOEL FERREIRA (BISPO)
RJ PTB
80.016 80.016
MILTON BARBOSA (PASTOR)
BA PFL
47.661 30.640 -17.021
MILTON CARDIAS (PASTOR)
RS PTB
40.804 14.262 -26.542
NECHAR (DR.)
SP PV
42.173 42.173
NEUTON LIMA (PRESBÍTERO)
SP PTB
127.677 13.314 -114.363
NILTON CAPIXABA
RO PTB
36.129 14.623 -21.506
PEDRO RIBEIRO (PASTOR)
CE PMDB
51.278 44.280 -6.998
PHILEMON RODRIGUES
PB PTB
37.224 24.602 -12.622
RAIMUNDO SANTOS
PA PL
68.526 59.683 -8.843
SABINO CASTELO BRANCO
AM PTB
138.932 138.932
SALATIEL CARVALHO
PE PMDB
39.296 20.997 -18.299
SILAS CÂMARA
AM PTB
71.578 104.965 33.387
TAKAYAMA (PASTOR)
PR PMDB
110.856 85.093 -25.763
VALDENOR GUEDES
AP PP
6.653 6.202 -451
ZEQUINHA MARINHO
PA PSC
76.177 91.577 15.400
SOMA
1.691.015 1.487.551 -203.464
Fonte: TSE
Obs.: Constam da tabela candidatos que venceram pelo menos uma das eleições. Embora a tabela não inclua
todos os candidatos da AD, é possível afirmar-se que o eleitorado cativo dessa denominação decresceu na
comparação entre 2002 e 2006.
550
ANEXO 21
VOTAÇÃO OBTIDA PELOS DEPUTADOS FEDERAIS DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE
DEUS EM 2002 E 2006
CANDIDATO
ESTADO PARTIDO VOTAÇÃO
2002
VOTAÇÃO
2006
ACRÉSCIMO
/DECRÉSC.
ALDIR CABRAL RJ PFL 50.281 -50.281
ALMEIDA DE JESUS CE PL 85.727 -85.727
ANTÔNIO BULHÕES (BISPO) SP PMDB 109.978 109.978
CARLOS RODRIGUES (BISPO) RJ PL 192.640 -192.640
EDNA MACEDO SP PTB 118.474 -118.474
FLÁVIO BEZERRA CE PMDB 51.136 51.136
GEORGE HILTON MG PP 83.109 83.109
HELENO SILVA (PASTOR) SE PL 45.158 -45.158
JOÃO BATISTA (BISPO) SP PP 121.255 -121.255
JOÃO MENDES DE JESUS (BISPO) RJ PSB 59.740 -59.740
JOÃO PAULO GOMES DA SILVA MG PSB 71.197 36.922 -34.275
JORGE PINHEIRO (PASTOR) DF PL 41.288 -41.288
JORGE WILSON RJ PSDB 8.148 -8.148
JOSÉ DIVINO (PASTOR) RJ PMDB 77.489 -77.489
LÉO VIVAS RJ PRB 83.127 83.127
MARCOS ABRAMO (PASTOR) SP PP 109.468 -109.468
MARCOS DE JESUS (PASTOR) PE PL 80.084 -80.084
OLIVEIRA FILHO (PASTOR) PR PL 67.945 56.248 -11.697
PAULO JOSÉ GOUVÊA RS PL 103.959 7.724 -96.235
PAULO ROBERTO RS PTB 84.123 84.123
REGINALDO GERMANO (PASTOR) BA PFL 65.607 2.090 -63.517
VIEIRA REIS (BISPO) RJ PMDB 79.203 -79.203
VINÍCIUS CARVALHO RJ PT do B 59.524 59.524
WANDERVAL SANTOS (BISPO) SP PL 177.456 -177.456
ZELINDA NOVAES BA PFL 51.196 -51.196
SOMA 1.606.315
573.981 -1.032.334
Fonte: TSE
Obs.: Constam da tabela candidatos que venceram pelo menos uma das eleições. Embora a tabela não inclua
todos os candidatos da IURD, é possível afirmar-se que o eleitorado cativo dessa denominação decresceu na
comparação entre 2002 e 2006.
551
Anexo 22
Frentes Parlamentares (52ª Legislatura: 2003-2007)
Frentes Parlamentares
(por ordem de descrição)
PUBLICADAS EM 2003
Publicação Descrição Coordenador/Presidente
Telefone
1 26/11/2003 ADOÇÃO João Matos 3215-5720/3720
2 24/4/2003 ADVOGADOS Luiz Piauhylino 3215-8027
3 5/5/2003 AMBIENTALISTA Fernando Gabeira 3215-5332
4 1/12/2003 ANTIDROGAS Givaldo Carimbão 3215-5732
5 11/12/2003 APOIO AO PROGRAMA
ANTÁRTICO BRASILEIRO -
PROANTAR
Josias Quintal 3215-5611
6 2/12/2003
APOIO ÀS COOPERATIVAS DE
SAÚDE
Serafim Venzon 3215-5245
7 2/12/2003 CENTRO-OESTE
Sen. Jonas Pinheiro e Dep.
Sandro Mabel
3311-2272
8 12/3/2003 COMBATE À FOME, À
POBREZA E À MISÉRIA
João Caldas 3215-5440
9 1/12/2003 COMBATE À PIRATARIA E
SONEGAÇÃO FISCAL
Vanessa Grazziotin 3215-5724
10 3/12/2003 COMBATE AO USO DO
CIGARRO
Alexandre Cardoso 3215-5205
11 9/12/2003 CONTRA O CÂNCER Dr. Pinotti 3215-5525
12 19/8/2003 CRIAÇÃO DE NOVOS
ESTADOS E TERRITÓRIOS NO
BRASIL
Ronaldo Dimas e Sebastião
Madeira
3215-5943/5405
13 20/10/2003 CULTURA Darci Coelho 3215-5309
14 26/9/2003 DEFESA DA AQÜICULTURA E
PESCA
Selma Schons 3215-5825
15 23/7/2003 DEFESA DA ATIVIDADE
FÍSICA
Cláudio Cajado 3215-5630
16 1/12/2003 DEFESA DA EDUCAÇÃO
PROFISSIONAL
Alex Canziani 3215-5842
17 16/10/2003 DEFESA DA IGUALDADE
RACIAL
Luiz Alberto 3215-5954
18 9/12/2003 DEFESA DA INDÚSTRIA
AERONÁUTICA BRASILEIRA
Marcelo Ortiz 3215-5931
19 10/9/2003 DEFESA DA INFRA-
ESTRUTURA NACIONAL
Eduardo Gomes 3215-5950
20 4/11/2003 DEFESA DA MORADIA
POPULAR
Ary Vanazzi 3215-5369
552
21 12/11/2003 DEFESA DA REGULARIZAÇÃO
DO USO E OCUPAÇÃO DOS
TERRENOS DE MARINHA
Renato Casagrande 3215-5662
22 2/12/2003 DEFESA DA SEGURANÇA
PÚBLICA
Alberto Fraga 3215-5321
23 28/11/2003 DEFESA DAS POLÍTICAS
PÚBLICAS PARA A JUVENTUDE
Reginaldo Lopes 3215-5565
24 4/9/2003 DEFESA DAS RODOVIAS E
USUÁRIOS - TRANSFRENTE
Geraldo Thadeu 3215-5248
25 9/12/2003 DEFESA DAS SANTAS CASAS
DE MISERICÓRDIA,
HOSPITAIS E ENTIDADES
FILANTRÓPICAS DA ÁREA DE
SAÚDE
Marcelo Ortiz 3215-5931
26 13/8/2003 DEFESA DO
DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL DOS
RECURSOS MINERAIS,
HÍDRICOS E SANEAMENTO
AMBIENTAL
Hamilton Casara 3215-5342
27 2/12/2003
DEFESA DO FINANCIAMENTO
PÚBLICO E SOBERANIA
NACIONAL
Ivan Valente 3215-5716
28 28/7/2003 DEFESA DO RIO DOCE Ivo José 3215-5573
29 2/12/2003 DEFESA DO TURISMO Alex Canziani 3215-5842
30 27/11/2003 DEFESA DOS DIREITOS DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Dep. Maria do Rosário,
Dep. Telma de Souza e
Sen. Patrícia Saboya
3215-5471/5467
31 1/12/2003 DEFESA DOS POVOS
INDÍGENAS
Eduardo Valverde 3215-3435
32 25/7/2003 DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL E APOIO ÀS
AGENDAS 21 LOCAIS
Sen. Serys Slhessarenko e
Dep. Edson Duarte
3311-2291/3215-
5535
33 20/11/2003 ECOLOGIA URBANA E A
QUESTÃO DOS RESÍDUOS
(LIXO)
Dr. Pinotti 3215-5525
34 16/7/2003 EDUCAÇÃO Paulo Lima 3215-5507
35 16/9/2003 EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA Professor Irapuan Teixeira
3215-5513
36 21/3/2003
ERRADICAÇÃO DO TRABALHO
ESCRAVO E DO TRABALHO
INFANTIL
Paulo Rocha 3215-5483
37 2/12/2003 ESPORTE Ivan Ranzolin 3215-5601
38 4/9/2003 EVANGÉLICA Adelor Vieira 3215-5441/3441
39 1/7/2003 HABITAÇÃO E
DESENVOLVIMENTO URBANO
Ricardo Izar 3215-8974/5634
40 20/10/2003 INDÚSTRIAS TÊXTEIS, DE
CONFECÇÕES E DE MODA
Ildeu Araujo 3215-5382
41 3/12/2003 LIVRE EXPRESSÃO SEXUAL Iara Bernardi 3215-5360
42 27/11/2003 MICRO E PEQUENA EMPRESA
Gerson Gabrielli 3215-5439
553
43 21/5/2003 MUNICIPALISTA João Leão 3215-5535
44 2/12/2003 PESCA E AQÜICULTURA Edison Andrino 3215-5703
45 16/7/2003 PRÓ-REDUÇÃO DA CARGA
TRIBUTÁRIA
Giacobo 3215-5762
46 25/8/2003 PRODUÇÃO, EMPREGO E
DESENVOLVIMENTO
Augusto Nardes 3215-5936
47 4/12/2003 REGIMES PRÓPRIOS DE
PREVIDÊNCIA MUNICIPAL
Luiz Carlos Hauly 3215-5220
48 29/9/2003 SANEAMENTO BÁSICO Rose de Freitas 3215-5937
49 21/5/2003 SEMI-ÁRIDO Wilson Santiago 3215-5534
50 31/7/2003 SILVICULTURA Gervásio Silva 3215-5418
PUBLICADAS EM 2004
Publicação Descrição Coordenador/Presidente
Telefone
51 17/11/2004 ACOMPANHAMENTO DA DÍVIDA
PÚBLICA, DO SISTEMA FINANCEIRO E
DA POLÍTICA DE JUROS
Dra. Clair 3215-5469
52 31/3/2004 AGÊNCIAS REGULADORAS Ricardo Barros 3215-5412
53 12/5/2004 APOIO AO SETOR DE CELULOSE E
PAPEL DO BRASIL
Antonio Carlos Pannunzio
3215-5403
54 14/5/2004 APOIO AOS LABORATÓRIOS
FARMACÊUTICOS OFICIAIS
Carlos Willian 3215-5472
55 9/7/2004 APOIO AOS PROGRAMAS PARA O
DESENVOLVIMENTO SOCIAL E
COMBATE À FOME
Carlos Willian 3215-5472
56 3/2/2004 COMBATE À CORRUPÇÃO Paulo Rubem Santiago e
Antonio Carlos Biscaia
3215-
5229/5414
57 13/2/2004 COOPERATIVISMO Zonta 3215-5366
58 22/3/2004 CRIAÇÃO DA JUSTIÇA AGRÁRIA Dr. Rodolfo Pereira 3215-5546
59 20/9/2004 DEFESA DA CARREIRA E DA
PROFISSIONALIZAÇÃO DOS
SERVIDORES PÚBLICOS
Carlos Mota 3215-5578
60 18/5/2004 DEFESA DA INDÚSTRIA
CINEMATOGRÁFICA BRASILEIRA
Sen. Ideli Salvatti
61 6/7/2004 DEFESA DA REFORMA POLÍTICA COM
AMPLA PARTICIPAÇÃO POPULAR
Mariângela Duarte 3215-5371
62 29/1/2004 DEFESA DA UNIVERSIDADE PÚBLICA
E GRATUITA
Dep. Luciana Genro e Sen.
Heloísa Helena
3215-
5203 e
311-3197
63 2/12/2004 DEFESA DA VASP Ricardo Izar 3215-5634
64 18/5/2004 DEFESA DAS ÁGUAS Odair 3215-5556
65 14/4/2004 DEFESA DO TRÂNSITO SEGURO Beto Albuquerque 3215-5338
66 25/3/2004 DEFESA DO TRANSPORTE
FERROVIÁRIO - FPTF
Jaime Martins 3215-5333
67 29/4/2004 HEPATITES E TRANSPLANTES Geraldo Thadeu, Angela
Guadagnin, Nelson Proença
e outros
3215-5248
68 19/11/2004 IDOSO Fernando Coruja 3215-5245
554
69 20/5/2004 INFORMÁTICA Júlio Semeghini 3215-5242
70 18/3/2004 LIVRO E LEITURA Júlio Lopes 3215-5334
71 10/3/2004 MOBILIZAÇÃO PELA ENGENHARIA Sen. Marcelo Crivella 3311-
5730/5225
72 17/11/2004 PAZ E DESARMAMENTO Fernando de Fabinho 3215-5904
73 27/1/2004 SAÚDE Rafael Guerra 3215-
7484/5239
74 29/3/2004 TRANSPORTE PÚBLICO Jackson Barreto 3215-5733
75 14/5/2004 UNIVERSIDADE PARA TODOS Vieira Reis 3215-5352
76 26/10/2004 VALORIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA
Augusto Nardes 3215-5936
PUBLICADAS EM 2005
Publicação Descrição Coordenador/Presidente
Telefone
77 11/11/2005 APOIO À AGROPECUÁRIA Moacir Micheletto 3215-5478
78 11/4/2005 DEFESA DA BR 153 Amauri Gasques 3215-5354
79 14/3/2005 DEFESA DA BR-319 Humberto Michiles 3215-5580
80 13/4/2005 DEFESA DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E
INOVAÇÃO
Renato Casagrande 3215-9650
81 19/5/2005 DEFESA DA FERROVIA NORTE-SUL Barbosa Neto 3215.5736
82 1/9/2005 DEFESA DA REGULARIZAÇÃO
FUNDIÁRIA DOS ESTADOS DA
AMAZÔNIA
Dr. Rodolfo Pereira 3215-5546
83 11/11/2005 DEFESA DA REPRESENTAÇÃO
PROPORCIONAL DOS MUNICÍPIOS
BRASILEIROS
Mário Heringer 3215-5212
84 29/4/2005 DEFESA DA REVITALIZAÇÃO DO RIO
SÃO FRANCISCO
Fernando Ferro 3215-5427
85 21/10/2005 DEFESA DA VIDA - CONTRA O
ABORTO
Luiz Bassuma 3215-5617
86 24/6/2005 DEFESA DO CARVÃO MINERAL Francisco Turra e Yeda
Crusius
3215-
5801/3801
87 3/10/2005 DEFESA DO CONSUMIDOR Celso Russomanno 3215-5756
88 10/8/2005 DEFESA DO LEITE Capitão Wayne 62-9253-
7027
89 20/6/2005 DEFESA DO PROJETO RONDON Hamilton Casara 3215-5342
90 18/4/2005 DEFESA DO RIO DE JANEIRO Eduardo Paes 3215-5742
91 11/4/2005 DEFESA DOS DIREITOS DOS
SERVIDORES E POLICIAIS MILITARES
DOS EX-TERRITÓRIOS FEDERAIS DO
ACRE, AMAPÁ, RORAIMA E RONDÔNIA
E DO ANTIGO DISTRITO FEDERAL
Coronel Alves 3215-5419
92 10/8/2005 DEFESA DOS PEQUENOS E MÉDIOS
LATICÍNIOS DO BRASIL - FPMLB
Capitão Wayne 62-9...
93 31/5/2005 DIREITO À LEGÍTIMA DEFESA
Alberto Fraga e Luiz Antonio
Fleury
3215-
5321/5945
555
94 21/9/2005 FORTALECIMENTO DA ASSISTÊNCIA
TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL -
EXTENSÃO RURAL PÚBLICA
Osvaldo Reis 3215-5835
95 14/2/2005 HIDROVIAS NACIONAIS Raimundo Santos 3215-5809
96 6/7/2005 LATINO-
AMERICANA PELO SOFTWARE
LIVRE E A INCLUSÃO DIGITAL
Vanderlei Assis 3215-5935
97 14/7/2005 MUNICÍPIOS DA FAIXA DE
FRONTEIRA
Vander Loubet 3215-5838
98 29/4/2005 PELO FINANCIAMENTO DA
SEGURANÇA PÚBLICA E DO SISTEMA
PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
João Campos 3215-5315
99 14/3/2005 PROFISSÕES REGULAMENTADAS Paulo Magalhães 3215-5903
100
19/5/2005 RADIODIFUSÃO Paulo Borhausen 3215.5601
101
14/9/2005 REFORMA URBANA Zezeu Ribeiro 3215-5571
102
12/4/2005
REGULAMENTAÇÃO E NORMATIZAÇAO
DA INTERNET NO BRASIL
Marcos Abramo 3215-5311
103
2/9/2005 TRANSPORTE MULTIMODAL E
LOGÍSTICO NA BACIA DO RIO
PARANÁ E SEUS ENTORNOS
Vitorassi 3215-5806
104
20/6/2005 VALORIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO Humberto Michiles 3215-5580
PUBLICADAS EM 2006
Publicação Descrição Coordenador/Presidente
Telefone
105
25/7/2006 APOIO À CULTURA POPULAR
BRASILEIRA
Luiz Piauhylino 3215-5224
106
6/4/2006 AVICULTURA Carlos Batata 3215-5707
107
27/12/2006 DEFESA DA CAPOEIRA Fernando de Fabinho 3215-5904
108
11/2/2006 DEFESA DA ENERGIA DE FONTES
RENOVÁVEIS
Mauro Passos e Ivan
Valente
3215-
5337/5716
109
27/6/2006 DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA
COM DEFICIÊNCIA
Gonzaga Mota 3215-5636
110
16/3/2006 DIREITOS DOS ANISTIADOS
POLÍTICOS
Lucia Braga 3215-5642
111
28/12/2006
FRENTE PLURISSETORIAL EM DEFESA
DAS FORÇAS ARMADAS
DEP. ALEXANDRE CARDOSO 3215-5205
112
7/6/2006 FRUTICULTURA JORGE KHOURY 3215-5424
113
29/5/2006 PRÓ-BIOCOMBUSTÍVEIS Antônio Carlos Mendes
Thame
3215-5624
Fonte: Congresso Nacional.
556
ANEXO 23
CIDADANIA AD BRASIL
851
PROJETO POLÍTICO DA CGADB
A valorização do voto evangélico
Conselho Político Nacional da CGADB
RONALDO FONSECA DE SOUZA
Presidente
PAULO FREIRE COSTA
Vice-presidente
GEREMIAS DO COUTO
Secretário
LELIS WASHINGTON MARINHOS
Relator
851
Este Regulamento, bem como o Jornal AD Brasil, produzidos pelo Conselho Político Nacional da Assembléia de Deus
(CGADB), estavam disponíveis no endereço eletrônico http://www.cpnad.com.br. Estranhamente, no final de 2006 ou início
de 2007, a direção da Assembléia de Deus retirou essa home-page da Internet. A presente cópia foi recuperada de um original
em formato .pdf, fornecido pelo jornalista Kleber Torres Soares Filho, no dia 13/4/2007.
557
CIDADANIA AD BRASIL
PROJETO POLÍTICO DA CGADB
O Conselho Político Nacional, órgão pertencente à estrutura organizacional da Convenção Geral
das Assembléias de Deus no Brasil CGADB, procurando dar cumprimento às atribuições que lhe
foram convencionalmente designadas, almejando promover o intercâmbio de idéias e experiências
políticas existentes em todo o Brasil, objetivando discutir princípios éticos e estratégias de ação,
propondo apoiar, preferencialmente, os membros das Assembléias de Deus vinculados à CGADB
que apresentem vocação política, bem como despertar a consciência de cidadania do nosso povo, e,
sobretudo,
CONSIDERANDO que a Assembléia de Deus é uma denominação histórica que congrega o maior
contigente evangélico do País, sendo representada expressivamente em cada Unidade da Federação;
CONSIDERANDO a necessidade de estimular uma consciência de maior preocupação para com as
questões sócio-políticas, incentivando uma conduta pautada na ética, no respeito ao ser humano, às
instituições e, acima de tudo, nos princípios cristãos;
CONSIDERANDO que as crises existentes no mundo, envolvendo a fome, a pobreza, a violência,
estão a reclamar das autoridades constituídas e da sociedade organizada iniciativas mais concretas
comprometidas com a solidariedade humana e o espírito de fraternidade;
CONSIDERANDO o potencial da nossa denominação, envolvendo não só a quantidade, mas
também a qualidade de nossos membros congregados, para as funções ligadas à vida social e
política do nosso país;
CONSIDERANDO a crise moral porque passa a Nação brasileira, evidenciada principalmente na
programação, quase sempre de baixo nível, da TV brasileira e demais meios de comunicação;
CONSIDERANDO as graves denúncias que permeiam o mundo político, demonstrando a
necessidade de uma mudança radical para o fim da corrupção;
CONSIDERANDO as dificuldades que as nossas lideranças enfrentam no contato com as
autoridades constituídas em busca de soluções, envolvendo não só os interesses da Igreja e de seus
membros, mas também da comunidade;
CONSIDERANDO que devemos manter a vigilância na defesa da liberdade religiosa e, por
conseguinte, tendo em vista a necessidade de neutralizar, enquanto evangélicos, leis nocivas que
venham agredir essa Liberdade;
CONSIDERANDO, finalmente, a determinação conferida a este Conselho pela Convenção Geral
das Assembléias de Deus no Brasil CGADB, é que apresentamos o presente PROJETO
CIDADANIA AD BRASIL da CGADB.
I. ESTRUTURA ORGANIZACIONAL
A estrutura organizacional para executar o Projeto Cidadania AD Brasil da CGADB será
composta do Conselho Político Nacional, dos Conselhos e Politicos das convenções e
ministérios estaduais, e distrito federal, ligados à CGADB, e estes poderão criar sub-comissões à
critério de cada convenção. Será aberto um Escritório Político em Brasília, bem como em cada
Estado, objetivando o assessoramento espiritual, técnico e político de evangélicos,
preferencialmente, das AD’s e que exerçam funções públicas. Experiências eficazes de
conselhos políticos já existentes serão incorporadas na estrutura do conselho Político Nacional.
II. RECURSOS FINANCEIROS
558
Os recursos financeiros para a instalação e manutenção da estrutura organizacional para executar
o Projeto Cidadania AD Brasil da CGADB poderão ser originários da CGADB, dos Ministérios,
das Convenções Estaduais e Distrito Federal ligados à CGADB, de contribuições voluntárias e
outros.
III. COMPETÊNCIAS
1. Compete ao Conselho Político Nacional, sempre em atenção às orientações da Mesa Diretora
da Convenção Geral, no âmbito do Projeto Cidadania AD Brasil da CGADB:
a) assessorar a Convenção Geral, Convenções Estaduais e Distrito Federal, Ministérios em
matéria de sua competência;
b) promover gestões no sentido de fornecer uma estrutura de campanha para os candidatos,
dentro dos critérios estabelecidos pela legislação eleitoral vigente;
c) assessorar o candidato eleito durante o desempenho do seu mandato;
d) criação de uma home-page para veicular os trabalhos do Conselho;
e) promover parcerias com os Institutos de Pesquisas para o levantamento de perfis políticos
de interesse;
f) elaborar o cadastro político nacional;
g) criar veículo de comunicação para divulgar as atividades políticas;
h) organizar o Fórum Nacional de Políticos das AD’s, bem como os Fóruns regionais, com o
objetivo de criar um ambiente permanente de debates e estudos sócio-políticos;
i) assessorar mediante o apoio do pastor presidente de convenções ou ministérios na
avaliação e indicação de candidatos;
j) planejar, organizar, coordenar, em âmbito nacional, estadual e municipal as matérias de sua
competência;
k) manter arquivo atualizado da legislação eleitoral;
l) promover a organização da capelania parlamentar;
m) promover a conscientização política dos membros das Assembléias de Deus;
n) fazer gestões no sentido de efetivar a política partidária na forma da legislação regedora da
matéria;
o) sempre que houver mais de um representante da AD, em qualquer instância do poder
legislativo, o Conselho Político Nacional coordenará a escolha de um líder da bancada na
câmara federal, o Conselho Político Estadual coordenará a escolha nas assembléias
legislativas. O Conselho Político Municipal nas respectivas câmaras.
2. Ao Conselho Político Estadual e ao Sub-Conselho Político Municipal compete, nos seus
respectivos âmbitos, as mesmas atribuições do Conselho Político Nacional, devendo, estes,
seguir as diretrizes estabelecidas por aquele, no que couber.
3. Nos casos dos Estados ou Municípios em que haja mais de uma Convenção ou Ministério, o
Conselho Político Nacional buscará mediar o entendimento para que se crie apenas um
Conselho para gerir o processo político no Estado ou Município.
4. O Conselho Político Nacional estará presente, e à disposição quando solicitado pelo conselho
político estadual, através da convenção estadual, para mediar, nas divergências existentes ou
559
que venham a existir, que serão dirimidas por uma Comissão mista designada pelo Conselho
Político Nacional, “in loco”.
III. CRITÉRIOS DE ESCOLHA DO CANDIDATO
Define-se o candidato da Assembléia de Deus o pretendente que:
1) For preferencialmente membro da Igreja há mais de três (3) anos.
2) Der público e notório testemunho cristão.
3) Desfrutar de bom conceito.
4) Exercer liderança comunitária e tiver preparo para o cargo.
5) Tiver conhecimento da base doutrinária da Igreja.
6) Tiver seu nome submetido aos Pastores e outros Líderes da Assembléia de Deus e for
recomendado e indicado para participar da triagem dos nomes.
7) Receber o credenciamento concedido pelo órgão competente da CGADB, através de
encaminhamento da Convenção Estadual, após cumpridos os critérios estabelecidos pelo
Conselho Político Estadual e pelo Sub-Conselho Político Municipal.
8) Assinar o Termo de Compromisso em que se explicitarão as obrigações e direitos do interessado.
9) Não comprometer seu testemunho cristão ética e moralmente.
10) Será considerado candidato nato o político detentor de mandato, que estiver de acordo com os
critérios estabelecidos pela Conselho Político das convenções e Ministérios Estaduais e Distrito
Federal e Conselho Político Nacional.
IV - COMPROMISSOS DO CANDIDATO
1. O candidato da Assembléia de Deus declarará o compromisso de posicionar-se
intransigentemente contra:
a) a prática de aborto;
b) a legalização da união dita conjugal de pessoas do mesmo sexo;
c) a corrupção de qualquer natureza;
d) o impatriotismo dos que contrariam os legítimos interesses da nossa Pátria e outras matérias
que venham a ser decididas pela Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil em
assuntos que contrariem os princípios doutrinários.
2. O candidato da Assembléia de Deus declarará, por outro lado, que defenderá, constantemente, a
liberdade de culto e outros interesses das Assembléias de Deus e demais igrejas, como também
políticas sociais e os interesses dos humildes e necessitados.
3. O Candidato credenciado, uma vez eleito ou nomeado para cargo público, se comprometerá em
contribuir com 5% (cinco porcento) dos seus subsídeos (sic) para um Fundo Nacional,
adminstrado pelo Conselho Político Nacional, sendo 50% destinado para os Conselhos Políticos
Estaduais e 50% para o Conselho Político Nacional, com o objetivo de viabilizar o projeto
político da CGADB.
4. O candidato comprometer-se-à a defender interesses vinculados a projetos de comunicação das
AD’s.
560
5. O político apoiado pelas igrejas obriga-se a prestar, perante à Conselho Político Nacional, e ao
Conselho Político Estadual, relatório de suas atividades, em datas e ocasiões a serem
estabelecidas.
V - MANUAL DE ORIENTAÇÃO POLÍTICA PARA MINISTROS
Elaborar um manual de orientação para ministros, visando preservar a unidade da Igreja, a
imagem do pastor, do candidato e unificar a condução do processo eleitoral do projeto cidadania
AD Brasil. O manual consta em anexo.
VI - MANUAL DE ORIENTAÇÃO POLÍTICA PARA CANDIDATOS
Criar um manual de orientação política para candidatos, oferecendo-lhes diretrizes sobre:
Imagem do candidato, escolha de Legenda, Marketing político, Dicas de Oratória, Sugestões de
Estratégias para Campanhas.
VII - MANUAL DE ORIENTAÇÃO PARA MEMBROS E CONGREGADOS DO CIDADANIA
AD BRASIL A VALORIZAÇÃO DO VOTO EVANGÉLICO
Elaborar um manual de orientação para membros e congregados, visando a conscientização da
necessidade de elegermos nossos legítimos representantes entre nossos irmãos, com respaldo
bíblico, despertando inclusive o espírito de cidadania de nosso povo.
VIII DISPOSIÇÕES GERAIS
1 -Em boletim a ser editado pelo órgão competente, serão divulgados os atos de que tratam estas
normas, inclusos o reconhecimento do candidato da Assembléia de Deus e a anulação do
reconhecimento no caso de transgressão, assegurando-se a este o amplo direito de defesa.
2 -As igrejas ou os crentes, particularmente, terão o reconhecimento da CGADB por apoiar, sem
restrição, os candidatos credenciados, respeitada a legislação eleitoral, desde que esse apoio não fira
a dignidade dos que o concedem ou dos que o recebem.
3 Os membros dos conselhos políticos nacional e estaduais e sub-conselhos municipais que
pleitearem cargos eletivos deverão afastar-se a partir do início do processo de avaliação e escolha
dos candidatos, sendo substituídos por outro indicados pelas respectivas convenções ou ministérios.
4 Os casos omissos serão decididos pelo Conselho Político Nacional da CGADB.
MANUAL DE ORIENTAÇÃO POLÍTICA PARA MINISTROS
I INTRODUÇÃO:
Amigos do Evangelho: Texto transcrito do livro Irmão vota em irmão, de Josué Silvestre.
(capítulo 6)
II PROCESSO DE ESCOLHA DO CANDIDATO:
Considerando a afinidade entre o pastor e o pretenso candidato, é de fundamental importância o
referendo do pastor no quesito de público e notório testemunho cristão, além de observar o
preenchimento de todos os requisitos de critérios de escolha de candidato, que consta no projeto
político da CGADB, que são;
Define-se o candidato da Assembléia de Deus o pretendente que:
a) For preferencialmente membro da Igreja há mais de três anos.
b) Der público e notório testemunho cristão.
c) Desfrutar de bom conceito.
561
d) Exercer liderança comunitária e tiver preparo para o cargo.
e) Tiver conhecimento da base doutrinária da Igreja.
f) Tiver seu nome submetido aos Pastores e outros Líderes, da Assembléia de Deus, e for
recomendado e indicado para participar da triagem dos nomes.
g) Receber o credenciamento concedido pelo órgão competente da CGADB, através de
encaminhamento da Convenção Estadual, após cumpridos os critérios estabelecidos pela
Comissão Política Estadual
h) Assinar o Termo de Compromisso em que se explicitarão as obrigações e direitos do
interessado.
i) Não comprometer seu testemunho cristão ética e moralmente.
j) Poderá ser considerado candidato nato, o político detentor de mandato, que estiver de acordo
com os critérios estabelecidos pela Comissão Política Nacional.
k) Políticos com mandatos que, eventualmente, venham tornar-se membros das AD’s, e queiram o
apoio oficial da denominação, estarão sujeitos às mesmas normas aqui contidas.
1. Para preservar a sua imagem, após observados os critérios anteriores, o pastor deve escolher
membros que representem toda a igreja (diretoria-ministérios-departamentos-membresia)
para criar uma comissão local com o propósito de conduzir a decisão de escolha do
candidato. Esta comissão ouvirá os candidatos e encaminhará ao pastor os nomes mais
viáveis, o qual fará o encaminhamento para a Comissão Política Estadual e à Comissão
Política Municipal, ficando o mesmo protegido dos desgastes do processo de escolha.
2. Os pretensos candidatos deverão assinar o compromisso de respeitarem a decisão da prévia
ministerial, nos termos do item II, alínea f.
3. Para preservar a unidade da igreja o pastor deve efetuar uma consulta ao ministério com os
nomes indicados pelas comissões respectivas, admitindo como candidatos oficiais os mais
votados.
4. Com o referendo do pastor, o nome escolhido deverá ser encaminhado à apreciação da
Comissão Política Estadual, para que, uma vez aprovado, o candidato tenha o apoio oficial da
denominação.
III A CONDUÇÃO DO PROCESSO ELEITORAL:
1. No caso da persistência de candidaturas oficiosas, estas não terão o apoio da Igreja nem da
denominação, ficando claro que esta decisão resume-se ao processo político-eleitoral, não
incluindo as questões de ordem eclesiástica, o que por certo instalaria um clima de guerra
dentro da igreja, prejudicando a unidade do corpo de Cristo.
2. O processo eleitoral na igreja deverá ser conduzido pelo pastor em harmonia com a
Comissão Política Estadual e a Comissão Política Municipal.
3. Na condução do processo eleitoral o pastor deve observar que o púlpito da igreja, bem
como os cultos, não são lugares apropriados para apresentação de propostas eleitorais, o
que preservará a imagem do pastor, do candidato e a unidade da igreja.
4. O pastor que desonrar o compromisso com o candidato oficial, com atitude desonesta,
desleal, comprovadamente caracterizada, responderá perante a Convenção Estadual e a
Convenção Geral das Assembléias de Deus.
562
MANUAL DE ORIENTAÇÃO POLÍTICA PARA CANDIDATOS
1. NORMAS DE ORIENTAÇÃO POLÍTICA PARA CANDIDATOS
O candidato ao exercício de cargo político apoiado pelas Assembléias de Deus assumirá perante a
Convenção Geral e, por conseguinte, perante as igrejas o compromisso de:
a) Ter os princípios contidos na Bíblia Sagrada como orientadores permanentes de todas as suas
atividades;
b)Observar rigorosamente as normas contidas no Termo de Compromisso que assegura ao
candidato prioridade no apoio da igreja;
c) Optar por partido político que, através de seus diretórios ou convenções, solicitar o apoio do
órgão competente da CGADB;
d)Exercer o mandato com o reconhecimento de que “todo poder emana do povo” e de que, por
isso, todo empenho deve ser no sentido de servir e não ser servido;
e) Defender a igreja e os evangélicos, prioritariamente, tendo em mente a discriminação com
que sempre foram tratados pelos governantes;
f) Defender o nosso país e o seu povo, sempre que interesses opostos se levantarem contra nós,
no parlamento, na administração e em qualquer segmento da sociedade;
g)Lutar intransigentemente pela moralização do país, posicionando-se contra os agentes da
deteriorização dos costumes;
h)Lutar contra a corrupção na administração pública em todos os setores;
i) Integrar a bancada evangélica, se possível, sem perder de vista a autenticidade de que deve
ela revestir-se;
j) Combater a injusta concentração de rendas nas mãos do pequeno grupo privilegiado que fez
do Brasil um dos mais censurados países do mundo;
k)Combater a prática do aborto e da pena de morte, uma vez que a vida pertence apenas àquele
que a criou, bem como matérias que venham a ser decididas pela Convenção Geral das
Assembléias de Deus no Brasil em assuntos que contrariem os princípios doutrinários;
l) Combater tudo o que favoreça o homossexualismo, sem discriminar com crueldade as
criaturas que o praticam, porquanto merecem a oportunidade que Deus dá a todos de
regeneração;
m) Apresentar relatório de suas atividades parlamentares e políticas, em datas e locais
estabelecidos pela Mesa da CGADB, no caso de mandato federal (senador, deputado etc), e
pela Convenção Regional, se for o caso (deputado estadual, vereador, prefeito e vice-
prefeito).
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