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isso). A ocidentalização certamente perdeu sua força entre muitos muçulmanos, e o califado
separou, de fato, vários países que eram apenas invenções da imaginação do colonizador.
Quando penso nisso, não sei como pudemos deixar de ver a ascensão do jovem
Califa – ficamos todos surpresos, tanto os crentes como os infiéis. De repente, o jovem
pregador tinha um mundo de seguidores. Até mesmo antes de ser proclamado Califa, sucessor
do profeta – que a paz esteja com ele –, ele foi reverenciado em todos os lugares pelos fiéis.
Talvez porque não fosse membro da Al Qaeda e não tivesse liderado nenhum movimento
político, como fez nosso avô. Sua espiritualidade era aparente. Ele não havia se maculado
com o sangue de inocentes, o que impediu, quer nosso avô admitisse ou não, que muitos
apoiassem a Al Qaeda. Ele recebeu promessas da aliança e doações de dinheiro de todo o
mundo muçulmano – das Filipinas, Indonésia, Malásia, Usbesquistão, Afeganistão e
Paquistão. Alguns membros das elites governantes também o apoiaram, buscando fortalecer
suas posições. Na Europa e na América, muçulmanos não-praticantes despertaram para sua
verdadeira identidade e fé e, em alguns casos, deixaram seus pais e parentes já
ocidentalizados para retornar à terra natal. Até mesmo alguns infiéis se impressionaram com a
sua espiritualidade – o Papa, por exemplo, tentou iniciar um diálogo inter-religioso com essas
pessoas. Ocidentais a favor da antiglobalização o idolatraram. Em um curto período de tempo,
ficou claro que não havia alternativa a não ser proclamar aquilo pelo qual muitos haviam
esperado: o Novo Califado.
Quanta confusão semeamos entre os cruzados! Um mundo praticamente
esquecido penetrou no Ocidente, e as histórias dos primeiros califas, de repente, se tornaram
best-sellers na Amazon.com. Eles tinham absoluta certeza de que trilharíamos o mesmo
caminho rumo ao secularismo e talvez até mesmo esperassem nossa conversão ao sistema de
valores judaico-cristão. Você consegue imaginar a expressão nos seus rostos quando atletas
muçulmanos recusaram suas nacionalidades durante os jogos Olímpicos e proclamaram sua
aliança ao califado? Tudo veio abaixo: as estruturas que o Ocidente tentou usar para nos
aprisionar na sua ordem mundial – democracia, Estados nacionais e uma sistema internacional
administrado por eles – pareciam estar em frangalhos.
O petróleo também os preocupava, e nós os tínhamos na palma da mão por
causa disso. Conforme as incertezas invadiram o mercado, correram boatos de que os EUA e
os países da OTAN tomariam os campos petrolíferos para garantir que o califado não o
fizesse. Soubemos depois que os EUA não conseguiram convencer seus aliados da
necessidade de intervenção militar, e que Washington temia provocar uma revolta muçulmana
no mundo todo.
A essa altura irrompeu a violência com os xiitas – algo que, de certa forma, já
suspeitávamos. O Califa acreditava que o Irã estava por trás do problema. O Irã sentiu-se
desconfortável com a proclamação do califado. A Província Oriental Saudita, com sua grande
população xiita e onde estão localizados os campos petrolíferos, tornou-se particularmente
vulnerável. Os governantes dos países do Golfo também influenciaram.
Então, suspeitamos que o distúrbios estavam sendo fomentados pelo Iraque,
dominado pelos xiitas, e, por trás do Iraque, pelos EUA e a CIA. Mas se os infiéis norte-
americanos estavam realmente por trás das perturbações – o que, creio, era o caso – ,eles
sofreram as conseqüências. A tênue paz que os EUA construíram com tanto esforço no Iraque
veio abaixo quando a insurgência sunita recomeçou repentinamente. Os rebeldes proclamaram
o verdadeiro califado e combateram tanto os xiitas quanto os norte-americanos.