Em sua principal obra, La España del Cid,
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Pidal defendeu que o PMC deveria ser lido
como um testemunho histórico do que era exatamente a Península Ibérica no século XI,
argumentando arduamente que seu protagonista fora um verdadeiro “herói nacional”. O filólogo e
historiador pareceu ignorar, ingênua ou propositalmente, as nuances do documento que tinha em
mãos. Contudo, com retórica e metodologia, que no momento de redação da tese eram
consideradas impecáveis e indiscutíveis,
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ele solidificou idéias que ainda hoje parecem
irrefutáveis, apesar da série de trabalhos historiográficos que vão de encontro às suas teses.
Talvez seu nome tenha se firmado como historiador graças aos seus trabalhos como filólogo,
considerados excelentes, por este motivo, suas idéias, ainda hoje, mesmo refutadas, mantém-se
através de seus seguidores.
Menéndez Pidal e sua La España del Cid desencadearam uma série de discussões sobre o
Cid histórico e literário. Dentre estas, podemos destacar o livro de Richard Fletcher, Em Busca de
El Cid,
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os trabalhos de Colin Smith, como sua Introducción à edição crítica do PMC, e uma
variedade de artigos de outros autores
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que tentaram, cada um a sua maneira, separar, sem
sucesso, o “El Cid” histórico do literário.
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Conseqüentemente, devido todo furor causado pelo livro de Menéndez Pidal e seus
muitos objetivos, as discussões acerca da datação e autoria do PMC foram aumentando cada vez
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MENÉNDEZ PIDAL, Ramón. La España del Cid. 4 ed. Madrid: Espasa-Calpe, 1947. 2 v. Cabe ressaltar que tal
tratado foi escrito como resposta a tese lançada em 1849 por Reinhardt Dozy, num artigo intitulado Le Cid d'Après
de Nouveaux Documents, em que foi defendido que El Cid havia sido um “mercenário” que lutou por riquezas na
península até mesmo se associando a muçulmanos. Menéndez Pidal, anos mais tarde, ao ler tal trabalho, refutou
Dozy em seu livro, afirmando que o cavaleiro havia sido um cristão exemplar e símbolo espanhol. Cf. DOZY,
Reinhardt. Le Cid d'Après de Nouveaux Documents. In:___. Recherches sur l’Histoire et la Littérature de
l’Espagne Pendant le Moyen Âge. 2 ed. Leyde: E. J. Brill, 1860. 2 v. V. 2. p. 1-6.
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Menéndez Pidal lançou mão do Positivismo em seu livro, tão em voga em seu período de redação. E parece tê-lo
mantido mesmo em suas reedições revisadas, ignorando, assim, a reviravolta teórico-metodológica que a História
passou no início dos anos trinta, pelo menos na França, com o surgimento da revista Annales d'Histoire Économique
et Sociale. Cf. BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989): A Revolução Francesa da Historiografia. São
Paulo: Unesp, 1997; DOSSE, François. A História em Migalhas: Dos Annales à Nova História. São Paulo/
Campinas, SP: Ensaio/ Editora Unicamp, 1994.
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FLETCHER, op. cit.
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Dentro de tal variedade podemos citar: ARMISTEAD, Samuel G. Dos Tradiciones Épicas Sobre el Nacimiento del
Cid. Nueva Revista de Filología Hispánica, n. 46, p. 219-248, 1988; WEBBER, Ruth House. Historicidad y
Tradicionalidad en el Cantar de Mio Cid. In: BELLINI, Giuseppe (Ed.). VII Congreso de la Asociación International
de Hispanistas, Venecia, 1980. Actas... Roma: Bulzoni, 1982, p. 581-590. V. II; SEVILLA-QUIÑONES DE LEÓN,
Margarita C. Torre. El Linaje del Cid. In: BARRIO BARRIO, Juan Antonio (Coord.). Anales de la Universidad de
Alicante (Historia Medieval), n. 13, p. 6-49, 2001-2002.
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Sobre El Cid literário e suas transformações no decorrer dos séculos, ver o artigo: MARTÍNEZ RICO, Eduardo. El
Cid: El Heróe Literario a Través de los Siglos. Dicienda: Cuadernos de Filología Hispánica, v. 24, p. 337-245,
2006. Neste estudo, Martinéz Rico, seguindo a escola pidalina, vai além dos preceitos estabelecidos por Menéndez
Pidal em firmar El Cid como um “herói nacional” e o apresenta como um “modelo universal”, graças ao modelo de
herói perfeito presente no poema e a variedade de releituras do PMC da literatura ao cinema.