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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
SABERES DOCENTES EM AMBIENTES VIRTUAIS DE
APRENDIZAGEM
SALVADOR
2008
SOCORRO APARECIDA CABRAL PEREIRA
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SOCORRO APARECIDA CABRAL PEREIRA
SABERES DOCENTES EM AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação, área de concentração
Educação, Sociedade e Práxis Pedagógica como
requisito final para obtenção do título de Mestre em
Educação pela Universidade Federal da Bahia.
Prof. Dr. Nelson De Luca Pretto – Orientador
Profª Drª Cristina d’ Ávila - Co- orientadora
SALVADOR
2008
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SABERES DOCENTES EM AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM
Por
SOCORRO APARECIDA CABRAL PEREIRA
Dissertação aprovada com nota ___ como
requisito parcial para a obtenção do Título de
Mestre em Educação, tendo sido julgado pela
Banca Examinadora formada pelos professores:
____________________________________________________________
Prof. Dr. Nelson De Luca Pretto – Orientador, UFBA.
____________________________________________________________
Membro: Profª Dra.Cristina Maria d’Ávila Teixeira Maheu, UFBA
____________________________________________________________
Membro: Profª Dra.Edméa Oliveira Santos, UERJ
Salvador, 03 de julho de 2008
DEDICATÓRIA
Para minhas filhas, Ana Luísa e Letícia, que souberam vivenciar na
prática, por um período, uma educação a distância.
AGRADECIMENTOS
A Deus, Supremo benfeitor, que em sua grandeza e glória sempre iluminou meus passos.
A Darci, por seus saberes de mãe, e também de professora primária de escola pública, que
sempre acreditou no meu potencial.
Ao meu pai com quem aprendi a encarar a vida com alegria e entusiasmo.
Ao meu marido que, mesmo não gostando da idéia da esposa ir morar em Salvador, soube
construir saberes relativos às atividades do lar e, acima de tudo, cuidar das meninas como uma
verdadeira mãe.
Aos meus professores das disciplinas cursadas no mestrado, pelas interlocuções que
permitiram a construção de diferentes saberes.
Ao professor Nelson Pretto, pela oportunidade, leitura crítica e confiança no desenvolvimento
desse trabalho.
A toda a equipe do PROGED e, em especial, aos professores do curso, pela interação e
disponibilidade nessa caminhada. Aprendi muito com vocês.
A professora Maria Helena Bonilla, por seus saberes acadêmicos, que na itinerância da
pesquisa ajudaram a abrir as cortinas das discussões teóricas do meu trabalho. Sou muito grata
professora!
A professora Cristina D’ Ávila que me acolheu em um dos momentos mais dilemáticos dessa
pesquisa. Sua escuta sensível e seus saberes de uma professora-pesquisadora experiente foram
fundamentais para fortalecer a minha autoria.
As minhas amigas Cácia Rehem e Cássia Brandão, pelas discussões, leituras, sugestões e
conversas no MSN. Construímos uma verdadeira rede de saberes na itinerância do mestrado.
A amiga Nicia Riccio, que vivenciou comigo momentos alegres e conflituosos nessa
caminhada.
A todos os colegas e amigos do Grupo de Pesquisa em Educação, Comunicação e
Tecnologias, onde aprendi que um processo formativo não se resume apenas à escrita de um
texto, e sim um engajamento com os trabalhos do grupo, reuniões, discussões, publicações,
grupos de estudo, troca de saberes e, acima de tudo, o espírito da colaboração.
Às amigas (os) / parentes e parceiras(os) de trabalho: D. Chica, Theomeu, Ana Paula,
Luciano, Lícia, Jorge, Fabiane,Cristiane, Gil, Conceição, Sule, Kátia, Rita, Laís, Ivana e a
todos os outros que estão guardados na minha memória.
À UESB e a FAPESB pelas contribuições financeiras para que este trabalho fosse realizado.
O inesperado surpreende-nos. É que nos instalamos de maneira segura
em nossas teorias e idéias, e estas não têm estruturas para acolher o
novo. Entretanto, o novo brota sem parar. Não podemos jamais prever
como se apresentará, mas deve-se esperar sua chegada, ou seja, esperar
o inesperado. E quando o inesperado se manifesta, é preciso ser capaz
de rever nossas teorias e idéias, em vez de deixar o fato novo entrar à
força na teoria incapaz de recebê-lo.
EDGAR MORIN
.
RESUMO
O presente trabalho, intitulado Saberes Docentes em Ambientes Virtuais de Aprendizagem,
buscou refletir sobre a itinerância docente em educação online, de quatro professores que
atuaram no Curso de Tutores da UFBA. Compreender a natureza dos saberes docentes e sua
construção no contexto da cibercultura, evidenciando suas lacunas e possibilidades, foi nosso
objetivo. A abordagem metodológica utilizada foi a etnopesquisa-formação, tendo como
método o estudo de caso. Esta metodologia traz como principal característica a importância
do pesquisador vivenciar reflexões sobre o processo formativo juntamente com os sujeitos da
pesquisa, e assim potencializar momentos fecundos de formação sobre o que foi observado,
percebido e sentido na itinerância ao longo do trabalho. O estudo de caso permitiu uma
reflexão mais aprofundada da realidade em estudo, porque tivemos a oportunidade de
estabelecer constantes diálogos com os sujeitos da pesquisa, compreender os sentidos e
significados atribuídos à docência nesse cenário. A pesquisa mostra a importância de o
docente estar imerso no contexto digital, interagir, questionar e refletir sobre a dinâmica da
cibercultura. Deste modo, a experiência como aluno online em diferentes cursos de formação
continuada, os saberes oriundos da experiência online como professor e os saberes oriundos
das relações estabelecidas pelos professores com seus pares, evidenciaram o desafio de se
pensar a formação numa abordagem que contemple seu desenvolvimento pessoal e
profissional. A pesquisa também mapeou alguns saberes docentes oriundos do contexto da
cibercultura e os principais dilemas vivenciados pelos professores nesse cenário. Os
resultados da pesquisa apontam para a necessidade de mais investimentos de pesquisa nessa
área e, decorrente disso, a construção de um estatuto de conhecimentos sobre a docência
online.
Palavras-chave: Cibercultura -Educação Online- Saberes Docentes
ABSTRACT
This study, entitled Teacher Knowledge in Virtual Learning Environments, seeks to reflect on
the itinerant online educator—on four professors who participated in the UFBA teacher
training course. Stressing the nature of a teacher’s professional understanding, within the
framework and context of cyber culture, and highlighting its shortcomings and possibilities,
was our goal. The methodological approach used in this case study was “etnopesquisa-
formação”, a method that upholds as its primary feature the importance of procedure analysis,
where the researcher would jointly analyze the process of the research along with the subject
under study, and in this way enhance the fruitful moments of what was seen, understood, and
felt during the course of the work. In this manner, this approach allowed for a greater degree
of reflection on the investigated reality, on the meanings assigned to that particular scenario,
establishing therein a constant dialogue between the subject and the researcher. This study
demonstrates just how important it is for a professor immersed in a digital environment to ask
questions and reflect on the dynamics of cyber culture. It sheds light on the online experience
of students pursuing higher education, on the knowledge gained by teachers interacting with
their peers, and on the challenge of developing a training approach that addresses both the
personal and the professional. Further, the research maps out the teacher knowledge base
within the context of cyber culture, underlining the central dilemmas experienced by teachers
in this scenario, and pointing to a need for additional investment and research into the
emerging pedagogy of teaching online.
Keywords: cyber culture - online education - teaching methods
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1 Caracterização das atividades do Curso de Tutores da UFBA 2007.1 43
Figura 1 Tela de abertura do curso 1 44
Figura 2 Espaço coletivo 1 46
Figura 3 Módulo 1 48
Figura 4 Interface livro 48
Figura 5 Nós de rede 70
Figura 6 Sala de aula unidirecional (modelo um-todos) 75
Figura 7 Sala de aula interativa (modelo todos-todos) 76
Quadro 2 Comparação entre as modalidades de comunicação. 76
Figura 8 Metáfora da Hibridização apresentada por Couchot 77
Figura 9 Página inicial do Projeto Teleduc 92
Figura 10 Tela de Abertura do Ambiente Aula Net 93
Figura 11 Ambiente Moodle da UFBA 94
Figura 12 Ciclo de reflexão 105
Figura 13 Fuxico 166
Figura 14
Saberes docentes em AVA destacados na pesquisa 195
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................13
1.1
CONSTRUINDO MINHA ITINERÂNCIA DOCENTE...................................................13
1.2 PROBLEMÁTICA – ARTICULANDO OS NÓS DA PESQUISA ..................................23
1.2.1 Problema ........................................................................................................................27
1.3 OBJETIVOS.......................................................................................................................28
1.4 APRESENTANDO O TRABALHO..................................................................................28
2 DELINEANDO O OLHAR SOBRE A PESQUISA: ITINERÂNCIA E CAMINHAR
METODOLÓGICO ...............................................................................................................31
2.1 A ABORDAGEM DA ETNOPESQUISA FORMAÇÃO: DELINEANDO A
COMPREENSÃO DOS SABERES DOCENTES NA CIBERCULTURA ............................31
2.2 O MÉTODO DO ESTUDO DE CASO: UMA APROXIMAÇÃO AO CAMPO .............35
2.3 OS DIPOSITIVOS DE PESQUISA...................................................................................36
2.4 O CONTEXTO DA PESQUISA E O AMBIENTE DO CURSO DE TUTORES DA
UFBA .......................................................................................................................................40
2.4.1 PROGED – Aspectos institucionais, organizacionais e pedagógicos ........................40
2.4.2 O desenho didático do Moodle no contexto do Curso de Tutores da UFBA............44
2.5 O PERFIL DOS SUJEITOS DA PESQUISA: ENTRE O PESSOAL E O
PROFISSIONAL......................................................................................................................51
3 EM BUSCA DAS PRIMEIRAS CONEXÕES... O CENÁRIO DIGITAL E A
CONFIGURAÇÃO NÃO LINEAR DO CIBERESPAÇO .................................................55
3.1 REFLEXÕES SOBRE A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA .......................................55
3.2 O MEIO DIGITAL E SUA INFRAESTRUTURA TÉCNICA..........................................61
3.3 INFORMAÇÃO DISCRETA.............................................................................................63
3.4 CONFIGURAÇÃO HIPERTEXTUAL DO MEIO DIGITAL ..........................................68
3.5 INTERATIVIDADE ..........................................................................................................71
3.6 VIRTUALIDADE ..............................................................................................................78
4 O CONTEXTO DA CIBERCULTURA E A EMERGÊNCIA DOS AMBIENTES
VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM......................................................................................82
4.1 ALGUNS PRESSUPOSTOS DA CIBERCULTURA.......................................................82
4.2 NAVEGANDO SOBRE A CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO ONLINE...........................84
4.3 AMBIENTES DE APRENDIZAGEM: DESAFIOS E POTENCIALIDADES...............86
4.4 ALGUNS AMBIENTES DISPONÍVEIS NO CIBERESPAÇO .......................................91
4.4.1 Teleduc............................................................................................................................92
4.4.2 Aula Net..........................................................................................................................93
4.4.3 Moodle.............................................................................................................................94
5 OS SABERES DA DOCÊNCIA.........................................................................................99
5.1 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES .................99
5.2 REFLEXIVIDADE NA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES: DESAFIO PARA A
SUPERAÇÃO DA ALIENAÇÃO TÉCNICA.......................................................................102
5.3 PROFESSOR-PESQUISADOR: EM BUSCA DA MELHORIA DA PRÁTICA...........107
5.4 SABERES DOCENTES: SITUANDO A TEMÁTICA...................................................110
5.5 SABERES DOCENTES: ENFOQUES E ABORDAGENS............................................114
6 SABERES DOCENTES E CIBERCULTURA...............................................................121
6.1 NATUREZA E EDIFICAÇÃO DOS SABERES NA DOCÊNCIA ONLINE.................121
6.1.1 Saberes oriundos da experiência como discente online............................................124
6.1.2 Saberes oriundos da experiência online como professor .........................................128
6.1.3 Saberes oriundos das relações estabelecidas com os pares......................................131
6.2 OS SABERES DOS DOCENTES NOS AVA.................................................................134
6.2.1 As interfaces digitais fórum e chat – principal lócus da ação docente no AVA.....134
6.2.2 Docência online: uma pluralidade de saberes...........................................................141
6.2.2.1 Saberes da mediação pedagógica ...............................................................................142
6.2.2.2 Saberes interativos......................................................................................................153
6.2.2.3 Propostas de colaboração............................................................................................157
6.2.2.4 Saberes virtualizantes .................................................................................................164
6.2.2.5 Saberes tecnológicos...................................................................................................171
6.3 OS DILEMAS DOS DOCENTES ONLINE ....................................................................176
6.3.1 As listas de discussão potencializando a emergência dos dilemas docentes...........177
6.3.2 Os dilemas docentes e a não-linearidade da “aula online......................................178
6.3.3 Alguns dilemas do docente online ..............................................................................181
6.3.3.1 Dilema 1: atenção individual versus atenção grupal nos chats ..................................181
6.3.3.2 Dilema 2: cobrança da professora versus descontentamento da aluna.......................183
6.3.3.3 Dilema 3: leitura dos conteúdos versus participação consistentes nos fóruns ...........187
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS DE UMA OBRA ABERTA ............................................192
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................200
ANEXO..................................................................................................................................208
12
INTRODUÇÃO
C
C
ontar é muito dificultoso. Não pelos anos que já se passaram. Mas pela
astúcia que tem certas coisas passadas de fazer balance, de se remexerem dos
lugares. A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos; uns
com os outros acho que nem se misturam.
C
C
ontar seguindo, alinhavando, só mesmo sendo coisas de rasa
importância (...) Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da
gente do que outras de recente data. O senhor sabe; e se sabe, me
entende. Toda saudade é uma espécie de velhice.
João Guimarães Rosa
13
1 INTRODUÇÃO
Pretendo, nessa introdução, refletir sobre algumas experiências marcantes na minha
formação docente e destacar alguns processos formativos, principalmente em relação às
Tecnologias da Informação e Comunicação e, de forma mais particular, em relação à
Educação a Distância. Meu primeiro contato com essa temática, foi a partir do Programa de
Formação de Professores em Exercício (PROFORMAÇÃO), no qual vivenciei este debate
mais aprofundado em uma especialização em EAD. Alie-se a isso minha prática de algumas
propostas formativas em cursos de extensão, grupos de pesquisa, disciplinas da pós-graduação
e cursos de aperfeiçoamento. Esse cenário formativo pretende situar o leitor em relação ao
meu objeto de estudo e, posteriormente, apresentar a problemática, as questões e os objetivos
da pesquisa.
1.1
CONSTRUINDO MINHA ITINERÂNCIA DOCENTE
O foco dessa investigação de pesquisa, sempre esteve presente na minha itinerância.
Nascida na cidade de Jequié, minha família residia no distrito de Oriente Novo, onde
buscávamos, através do comércio, agropecuária e das atividades docentes, uma melhor
qualidade de vida para a nossa família. Portanto, desde criança, vivenciei, com minha mãe e
tia, conversas sobre as atividades docentes e as dificuldades encontradas na profissão do
professor, desde aquelas referentes às questões políticas até as questões relativas aos aspectos
metodológicos em sala de aula.
Assim, buscando uma vida mais digna e o acesso a uma educação de melhor
qualidade, fomos morar na cidade de Jequié, onde concluí o ensino primário, ginasial e o
curso do magistério no Instituto de Educação Régis Pacheco. O que marcou a minha formação
no curso normal foi, sem dúvida, a influência da psicologia comportamental e a tecnologia
educacional, que davam enfoque à dimensão técnica no nosso processo formativo, e
concebiam o docente como o grande organizador das atividades didáticas, que sendo
planejadas de forma rigorosa, iriam garantir resultados eficientes. Dessa forma, na sala de
aula reproduzíamos as orientações vivenciadas no curso normal, nos preocupando com os
detalhes dos planos de aula, as técnicas a serem desenvolvidas, a disciplina dos alunos e a
transmissão eficaz dos conteúdos.
14
Formada no magistério, comecei a lecionar numa pequena escola particular em
Jequié, onde igualmente o foco do trabalho docente era a transmissão do conhecimento e a
busca de estratégias de trabalho que pudessem garantir a aquisição dos conteúdos pelos
educandos. Desmotivada e inquieta com esses pressupostos educacionais pautados numa
concepção “bancária” de educação, fui cursar em Itabuna a licenciatura em Pedagogia,
desejosa de encontrar um maior aprofundamento teórico e novas referências para a minha
prática pedagógica.
Nessa caminhada, defronto-me com um curso de formação que separa teoria e prática
e com algumas ações docentes ainda muito conservadoras. Entretanto, em contato com a
discussão de alguns professores mais progressistas, passo também a compreender a dimensão
política da prática pedagógica, e a perceber um discurso que enfatiza maior compromisso do
educador com as classes populares. Vale ressaltar, que era início dos anos 90 e vivíamos
um processo de redemocratização no país, na busca da superação do autoritarismo implantado
desde a década de 60.
Retorno a Jequié e passo a lecionar no Instituto de Educação Régis Pacheco e,
posteriormente, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, onde me deparo com dois
grandes enfoques na formação dos professores: um mais teórico, dando ênfase aos
fundamentos da educação, e outro mais voltado às discussões acerca das questões didáticas
pedagógicas. Como professora de estágio, vivencio a dicotomia desses enfoques, literalmente
“na pele”, haja vista que as alunas, diante da complexidade da sala de aula, não conseguiam
articular as discussões teóricas travadas ao longo do curso, com a emergência das questões
que afloravam na sala de aula.
Passo então a perceber que as disciplinas teóricas, por estarem longe do ambiente de
trabalho do professor, contribuem muito pouco para as reflexões sobre a prática pedagógica,
assim como as disciplinas com um enfoque mais metodológico, quando trabalhadas de forma
desarticulada da prática docente e também das discussões teóricas, pouco podem contribuir
com a formação do futuro profissional. A questão é que, quando emergem os dilemas da sala
de aula, os referencias teóricos se mostram insuficientes diante da complexidade da prática,
necessitando-se de novos conhecimentos. Como o processo formativo era totalmente
dicotomizado, o diálogo acontecia de forma precária, pois a teoria e a prática ocupavam
lugares diferentes.
Essas experiências têm se revelado como grandes desafios na minha profissão, pois é
extremamente complexo lidar com os dilemas que emergem no dia-a-dia da sala de aula, tais
como: a relação professor-aluno, relação aluno-aluno, saberes curriculares e da experiência,
15
gestão da classe, discussão com os colegas etc., pois vivemos imersos em um contexto
dinâmico, de constantes desafios e cada nova decisão depende de inúmeras variáveis que o
docente precisa enfrentar.
É nesse sentido que devemos privilegiar a formação do professor, com base nas
propostas que estabeleçam relações entre a teoria e a prática, o pessoal e o social, o coletivo e
o individual, num tecer conjunto que preconize o Ser em sua totalidade.
Simultaneamente a essas experiências no ensino presencial, e em sintonia com as
reformas educativas da década de 90, tais como: elaboração do currículo básico nacional,
avaliação nacional das escolas, incentivo à formação de professores e a educação a distância,
é que passo a integrar, como docente, um programa de formação de professores a distância do
Ministério de Educação e Cultura (MEC), o Programa de Formação de Professores em
Exercício (PROFORMAÇÃO), um curso de nível médio à distância, de modalidade normal,
dirigido aos professores que, sem formação específica, encontram-se lecionando nas quatro
primeiras séries do ensino fundamental e nas classes de alfabetização das redes públicas das
regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
O meu envolvimento com PROFORMAÇÃO ocorreu no ano de 2000 e teve como
requisito fundamental a minha atuação como professora de Prática de Ensino no Curso do
Magistério e Pedagogia da UESB, além da formação necessária para docência nas disciplinas
do Programa. Dessa forma, passei a integrar a Agência Formadora de Jequié, na formação de
professores leigos das cidades circunvizinhas, ministrando a disciplina Organização do
Trabalho Pedagógico.
Durante a realização do programa, fomos nos defrontando com uma série de novas
atividades profissionais que até então não tínhamos vivenciado nas práticas presenciais, tais
como: o uso das tecnologias da informação e comunicação, análise de material impresso em
EAD e formação de orientadores em serviço. Vale destacar que esse projeto não esteve
voltado para a perspectiva da educação online. O acesso ao computador e à internet era feito
somente pelos professores do curso, com o objetivo de alimentar o sistema com dados do
programa e para organizar as atividades burocráticas desenvolvidas pela Agência Formadora.
O curso foi de fundamental importância, pois revelou, através do depoimento dos cursistas e
das observações nas atividades docentes, mudanças na prática pedagógica, mudanças em suas
concepções, mudanças na auto-estima, mudanças no desempenho dos cursistas e na escrita
dos memoriais.
16
Vivendo nesse cenário, no ano de 2004, fui selecionada para participar do Curso de
Especialização em Planejamento e Gestão de Sistemas de Educação à Distância, promovido
pela Universidade Estadual da Bahia e Secretaria de Educação do Estado da Bahia, cujo
objetivo era desenvolver e divulgar experiências nessa área, que possibilitassem o domínio
teórico e pedagógico, capaz de gerar soluções e apontar caminhos para a superação das
dificuldades de formação de professores no estado da Bahia, a fim de preparar pessoal técnico
docente e administrativo para gestar e planejar sistemas de ensino em EAD no nosso estado.
O curso foi basicamente presencial, com poucas atividades a distância. Durante o
período da especialização, emergia sempre nos debates em sala de aula a discussão acerca da
utilização do ambiente de aprendizagem e-proinfo
1
no contexto do curso, que seríamos
futuros gestores em educação à distância no Estado e observávamos que o ambiente de
aprendizagem da especialização não era utilizado segundo o paradigma da comunicação
interativa que debatíamos nas disciplinas.
Percebíamos também que faltava, na maioria dos docentes, habilidade em mediar as
discussões nos ambientes de aprendizagem, no sentido de promover interação entre os
participantes. Geralmente, a proposta de trabalho no ambiente de aprendizagem era a
participação em fórum de discussão, com uma temática definida pelo professor, que esse
ambiente, muitas vezes, era subutilizado por falta de mediação e provocação docente, bem
como de participação ativa dos alunos envolvidos.
Como trabalho monográfico, escrevi sobre as implicações da vivência no ambiente e-
proinfo na formação de gestores no estado da Bahia, refleti e aprofundei as discussões sobre a
educação online, analisei os fundamentos da interatividade propostos por Silva (2002) e, de
forma crítica, discuti as interfaces utilizadas no ambiente durante o curso de especialização.
Fui então percebendo a plasticidade do digital e seu potencial de reformulação livre
da mensagem, ao abrir infinitas perspectivas de trabalho na rede, bem como a subutilização
desse espaço no curso, utilizado apenas para a disponibilização de conteúdos pelo docente e
espaço de informações burocráticas da coordenação. Essas inquietações observadas e
articuladas com as discussões teóricas que fui tecendo na monografia, me levaram a refletir
sobre os desafios da docência nesse cenário, contrapondo-se a uma perspectiva
comunicacional unilateral, em que a emissão separada da recepção ressalta o papel do aluno
1
Ambiente Colaborativo de Aprendizagem à Distância desenvolvido pela Secretaria de Educação à Distância do
Ministério da Educação, em parceria com importantes instituições de ensino. Disponível em
htpp://www.eproinfo.mec.gov.br/.
17
como simples espectador e ressalta o papel do professor como o “dono da verdade” e detentor
do saber.
Nessa itinerância formativa, ingressei no Grupo de Pesquisas em Informática
Educativa da UESB, visando contribuir nas discussões sobre as tecnologias na Universidade.
Nas reuniões do grupo, presenciais e a distância, estávamos sempre a debater sobre a docência
online na instituição e trocar experiências sobre o nosso fazer docente em diferentes
ambientes de aprendizagem. Uma lacuna observada nas falas das colegas diz respeito ao
modelo de comunicação relatado nas experiências, os quais não se aproximam dos
pressupostos da interatividade aventados na pós-graduação da qual participei. Outra lacuna
que fui observando nas discussões do grupo, diz respeito à utilização das tecnologias digitais
na universidade. Somente os professores responsáveis pela disciplina Informática na
Educação inseriam, na sua proposta de trabalho, a utilização das TIC e de forma bastante
instrumental, dando ênfase ao “como fazer” domínio técnico da máquina –, investindo
apenas em disponibilização de softwares com foco na transmissão de informações, agora
revestido de som, imagem e texto, porém pautado na mesma concepção de educação bancária.
Após a especialização, participo com o grupo de pesquisadores da Universidade
Estadual da Bahia/UNEB-Campus I do curso Comunidades de Aprendizagem. Durante a
realização do curso, as discussões realizadas nos chats tiveram um papel crucial, haja vista
que, semanalmente, debatíamos sobre temáticas relativas à Cibercultura. Tive o primeiro
contato com a obra de Lévy, mais precisamente ao estudar o livro Cibercultura e sua temática
instigante: As tecnologias têm um impacto? Nesse texto, o autor afirma que a tecnologia não é
um ser autônomo separado do contexto cultural e social. É nesse sentido, que Lévy relaciona
as invenções tecnológicas aos seus momentos históricos, entendendo a tecnologia como
condicionante e não determinante. Evidencia a não-neutralidade da tecnologia, mas pontua
que, a depender de quem a usa e do contexto aplicado, será boa ou má.
Paralelo a essas discussões teóricas travadas no curso, fui observando a forma
dinâmica da condução do trabalho docente e de como é importante a equipe envolvida na
proposta estar interagindo com os discentes. Durante todo o trabalho, éramos estimulados a
ler, discutir, produzir textos coletivos e, principalmente, interagir com a comunidade de
aprendizagem. Os chats tiveram papel importante nessa caminhada, pois a cada sessão o
grupo responsável pelo curso aplicava uma metodologia de trabalho diferente, ora mediando
as discussões, ora deixando o grupo mais solto e se auto-organizando. Vale destacar que as
temáticas faziam parte dos conteúdos propostos no curso e que esses encontros síncronos
proporcionavam-nos momentos de interação importantes com o grupo, bem como
18
esclarecimento de nossas dúvidas, durante a semana, com os docentes e demais colegas.
Entretanto, ao analisar essa experiência, posso afirmar que uma grande lacuna do
curso foi relativa à disposição de conteúdos de forma linear, a exemplo dos textos em PDF,
subutilizando o potencial hipertextual da rede, pois as leituras eram feitas de forma
seqüenciada e, posteriormente, debatidas nos fóruns e chats. Com o potencial do hipertexto
digital, temos a possibilidade de navegar em diversos territórios e interagir de diferentes
maneiras, compondo a nossa itinerância no ciberespaço, sem precisarmos seguir rotas tão
fixas e determinadas.
Todavia, gostaria de ressaltar que o papel da mediação docente nos fóruns de
discussão foi de extrema importância, haja vista que as lacunas observadas nas discussões
teóricas eram refletidas de forma mais aprofundada pelos docentes. Nessas discussões eles
lançavam novos questionamentos ao debate, instigando novas reflexões. Esta vivência foi de
suma importância na minha caminhada como educadora, pois me impulsionou a vivenciar a
experiência como docente em ambientes de aprendizagem na disciplina Práticas Pedagógicas
do Ensino Fundamental da UESB.
O desafio de implementar uma proposta de Educação online na disciplina Práticas
Pedagógicas no Ensino Fundamental levou-me, em alguns momentos, a pensar sobre os novos
desafios em ser professor. Trabalhar com educação online, no contexto da cibercultura, requer
outra lógica para lidar com a informação. Os conteúdos precisam ser apresentados de forma
manipulável, e o pólo da emissão precisa ser liberado para a criação de práticas pedagógicas
realmente interativas. Não quero dizer com isso que na educação presencial esses
pressupostos não são fundamentais, porém tenho clareza que o digital potencializa muito mais
processos interativos, pela plasticidade da mensagem.
Outras questões importantes como a administração do ambiente e o acesso dos
alunos se revelam a todo o momento como desafios na caminhada. O ambiente de
aprendizagem e-proinfo, o único disponível na UESB na época, não era um ambiente fácil
para administração, pois requeria do profissional alguns conhecimentos relativos à
informática que, muitas vezes, o professor não dispõe. Com a ajuda das colegas do grupo de
pesquisa, esta dificuldade foi amenizada.
Outro desafio encontrado nesta caminhada foi em relação ao acesso à internet pelos
alunos. Os laboratórios disponibilizados pela instituição são bastante concorridos e a conexão
cai a todo o momento. A transição de práticas pautadas na mídia de massa para uma proposta
mais interativa requer o enfrentamento de muitos desafios, tais como a participação e
intervenção na mensagem de forma livre e plural, sem a centralização exclusiva do professor.
19
Contudo, as discussões nos fóruns, chats e reflexões sobre toda a vivência no estágio
possibilitaram outro lócus de reflexão sobre a prática pedagógica, além dos debates travados
na sala de aula presencial. Os projetos foram compartilhados, as experiências socializadas,
enfim, criou-se uma rede de colaboração no ambiente.
Essas lacunas me motivaram a buscar novos referenciais teóricos e experiências em
relação a essa temática. Destarte, o próximo passo foi me matricular como aluna especial no
Programa de Pós-Graduação da UFBA, na disciplina EAD e Difusão do Conhecimento.
Como objetivo principal do curso, tínhamos a formação de professores em EAD, com o
propósito de difundir conhecimentos para todas as faixas da sociedade brasileira. O princípio
da autogestão foi enfatizado nesse curso, pois se acredita que cada um deve assumir um papel
específico, em articulação com os papéis dos demais membros do grupo, no desenvolvimento
do coletivo.
Pelas próprias limitações técnicas dos ambientes de aprendizagem, a docente da
disciplina disponibilizou a organização do ambiente para todos os alunos, para que
pudéssemos vivenciar vários papéis: professor-coordenador, professor-orientador e alunos.
Tivemos então contato com o ambiente Teleduc
2
e Moodle
3
, observando criticamente suas
interfaces, bem como experienciando o potencial dos ambientes, inserindo atividades, textos,
links etc. A partir das discussões e análises dos dois ambientes, percebemos que o Moodle é
um ambiente de melhor navegabilidade, e de fácil administração, ao passo que o Teleduc
apresenta-se de modo mais “engessado”. Logo, o grupo optou por construir a proposta de
formação no ambiente Moodle.
Gostaria de ressaltar que esta experiência me fez refletir sobre a importância da
mediação pedagógica nos ambientes de aprendizagem. É de suma importância o docente estar
presente nas discussões do grupo, instigando, provocando, refletindo, enfim, exercendo o
papel de professor. Isso não que dizer que o centro é sempre o docente, pois este pode variar,
a depender das temáticas que estão sendo discutidas.
Nessa dinâmica, fui percebendo que o docente precisa desenvolver saberes referentes
à parte tecnológica dos ambientes de aprendizagem, para que possa construir dinâmicas de
trabalho em sintonia com as discussões teóricas sobre a educação na cibercultura, que requer a
2
O TelEduc (ROCHA, 2003) é um ambiente para a criação, participação e administração de cursos na Web
desenvolvido por pesquisadores do Nied (Núcleo de Informática Aplicada à Educação) da Unicamp,
disponível em: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/jornalPDF/220pag03.pdf
3
O Moodle é um ambiente de aprendizagem a distância podendo ser baixado, utilizado ou modificado por
qualquer indivíduo em todo o mundo. Disponível em http://www.moodle.org
20
vivência de processos interativos, hipertextuais, virtualizantes e colaborativos no ciberespaço.
Outra experiência significativa foi a minha participação na implementação da
proposta de educação online para a formação de professores nos Núcleos de Tecnologia do
Estado da Bahia, pela equipe de professores do NTE de Salvador. Desde a oficina com o
Ambiente Moodle no Instituto Anísio Teixeira (IAT), até os momentos de ambientação dos
professores da rede estadual, tenho percebido os desafios para a implementação de uma
docência online. No período de realização da oficina pedagógica com os multiplicadores,
percebi o quanto é importante os docentes saberem administrar o ambiente de aprendizagem,
propondo fóruns, chats, além de atividades desafiantes que busquem promover processos
interativos.
Nos debates realizados nos seminários do curso, bem como nas discussões nos
grupos de trabalho com os professores dos núcleos, ressaltou-se a importância de uma
superação da concepção curricular implementada nas escolas, baseada na fragmentação dos
saberes, na racionalidade técnica, e o desafio de pensarmos em novos arranjos curriculares,
onde a articulação de saberes e as propostas, tanto presenciais quanto a distância tivessem o
aprendente como autor do processo. Na experiência como aluna ao vivenciar a proposta do
curso, observo a importância do docente fazer questionamentos inteligentes durante o
processo e estimular os alunos a fazerem o mesmo.
Nesse contexto formativo, gostaria de destacar a importância do Grupo de Pesquisa
Educação, Comunicação e Tecnologias da Informação (GEC), que traz como foco principal
de trabalho o aprofundamento das questões teóricas em relação às tecnologias, bem como o
desenvolvimento de experiências significativas em diferentes espaços sociais com essas
tecnologias, além de contribuir com a análise de políticas públicas voltadas para estas
temáticas, em especial a educação à distância. Nas reuniões semanais e nas interações nas
listas de discussão do grupo, fui percebendo que as tecnologias da informação e comunicação
não são meras ferramentas a serviço da escola e sim elementos de cultura. Nesse sentido, fui
compreendendo o potencial dessas tecnologias no entrelaçamento de sujeitos, saberes,
informações e conhecimentos, possibilitando uma discussão mais horizontal na rede.
Em sintonia com essas discussões, participo da organização da III Semana de
Software Livre da FACED, com o objetivo de criar espaços para reflexão, discussão e
vivências sobre Software Livre e a Inclusão Digital na Formação de Professores. Esse debate
é imprescindível na pauta educacional, pois nos permite refletir sobre a liberdade de
expressão nesta sociedade, em que o software pode ser executado, copiado, distribuído e
modificado.
21
Buscando aprofundar a discussão sobre a formação de professores e, de forma mais
específica, a temática sobre os saberes docentes, me matriculo na disciplina Formação de
Professores: Currículo, Políticas e Experiências, ministrada pelo professor Roberto Sidinei
Macedo. Foram marcantes os debates sobre a profissionalização docente na
contemporaneidade, nos quais, fundamentados nas obras de Imbernón (2005), discutimos
sobre a necessidade de uma ruptura de uma concepção de profissionalismo baseada numa
visão tecnicista, que implementa inovações prescritas, por uma visão de profissional que
participe do processo de inovação e mudança. Percebemos a importância do profissional da
educação assumir a autoria do trabalho docente, tomando decisões educativas, éticas e morais,
onde o contexto coletivo seja determinante, rompendo assim de uma dimensão meramente
técnica e unidirecional da formação, para uma ótica de abordagem profissional em sintonia
com os desafios contemporâneos.
Fui percebendo então, a importância do professor que exerce a docência, tanto no
ensino presencial quanto à distância, que a competência profissional é construída em
constante interação no dia-a-dia do trabalho em sintonia com seus parceiros. Passo então a me
interessar cada vez mais pela temática dos saberes docentes, pois acredito que o professor que
atua na educação online é um profissional que tem toda uma itinerância formativa e, portanto,
já possui saberes provenientes de fontes variadas e de natureza muito diferente.
Concordo com Tardif (2002), quando refere que ensinar é mobilizar uma série de
saberes, reutilizando-os no trabalho para adaptá-los e transformá-los pelo e para o trabalho.
Assim, vou compreendendo que o professor que atua na docência presencial ou online, além
de possuir uma série de saberes profissionais, precisa também construir novos saberes em
sintonia com os desafios da cibercultura e as problemáticas vivenciadas na prática
pedagógica.
É nesse sentido que o curso Sala de Aula Interativa, promovido pelo SENAC/São
Paulo, foi uma das experiências mais significativas na minha trajetória em Educação online,
pois além de nos possibilitar um olhar mais apurado sobre os saberes docentes que emergem
nos ambientes virtuais de aprendizagem, nos permitiu uma fundamentação teórica coerente
com os alicerces da interatividade, e outro lócus de vivência dos pressupostos da comunicação
no século XXI.
O programa do curso teve como base um universo de temáticas direcionadas às
discussões sobre as posturas adotadas pelo professor na sala de aula, tanto presencial como a
distância. Uma das primeiras e mais instigadoras atividades do nosso curso foram as reflexões
sobre os professores que nos marcaram na nossa trajetória escolar. Fomos convidados a
22
construir um memorial e socializar com os colegas a nossa experiência. Ficou claro na análise
que práticas pedagógicas que não abrem espaço para a interatividade formam uma geração
acomodada e com uma perspectiva de pensamento totalmente linear.
Dessa forma, a atividade com a narrativa proposta pelo docente do curso, nos
instigou a refletir algumas questões: Até que ponto estamos reproduzindo na sala de aula os
professores que tanto criticamos? Como romper com a imagem e as representações dos
professores que perpetuaram uma docência unidirecional nas nossas práticas? Ficou claro, na
proposta de trabalho com a narrativa, que a formação precisa ser trabalhada sob o ponto de
vista do aprendente em interações com outras subjetividades, visto que a maioria dos
programas de formação limita-se às dimensões técnicas e tecnológicas, necessitando assim de
uma compreensão mais profunda dos processos através dos quais as pessoas se formam.
Nesse cenário, uma das pautas mais instigantes e fundamentais para a compreensão
desse contexto comunicacional foi a proposta de análise dos conceitos de mídia de massa e
mídia digital, pois estes nos possibilitam pensar numa outra abordagem de tratamento da
mensagem. Na mídia de massa, a mensagem encontra-se fechada e cabe ao receptor buscar
sua interpretação. Entretanto, com a mídia digital temos a possibilidade de modificá-la e
manipulá-la, graças ao seu formato em bits.
Em sintonia com os conceitos apresentados e articulando teoria e prática numa
perspectiva complexa, fomos desafiados a discutir nos fóruns estratégias de participação
colaborativa na sala de aula, sintonizadas com os princípios acima explicitados. O
aprofundamento teórico em relação a conceitos como Era Digital, Sociedade da Informação e
Cibercultura eram claramente observadas na condução do trabalho docente, ora
disponibilizando-os nas unidades, ora nos desafiando a pesquisar em outras fontes. Vale
ressaltar, mais uma vez, a importância dada ao trabalho em grupo e a colaboração entre os
colegas durante toda a trajetória.
Em todo processo de discussão das temáticas desenvolvidas no curso, o papel do
docente destacava-se, problematizando as discussões, mediando os fóruns e buscando
desenvolver estratégias de trabalho que dinamizassem os processos interativos no grupo.
Nesse processo formativo, passei a pensar na importância da dimensão pedagógica e de
gestão de uma sala de aula online, onde é preciso estar atento à dinâmica do grupo, às
interações, aos prazos e, principalmente, à construção de propostas que incentivem o trabalho
colaborativo.
23
Nessa dinâmica formativa, participo no ano de 2006 do Curso de Formação do
PROGED, que tem como objetivo contribuir com a disseminação da EAD no estado da Bahia,
sendo oferecido gratuitamente, com financiamento da Secretaria de Educação Básica-
MEC/SEB. Essa vivência me fez refletir sobre a importância da articulação de toda equipe de
trabalho, bem como ir observando a dinâmica interativa desenvolvida nas interfaces do
ambiente.
Toda essa caminhada como docente e aluna, principalmente em cursos online, vem
contribuindo para minhas observações em relação à questão da docência no contexto da
cibercultura e, de forma mais específica, com a temática dos saberes docentes nos ambientes
de aprendizagem. É nesse sentido que tenho clareza da implicação dessa temática com a
minha história de vida e de formação.
1.2 PROBLEMÁTICA – ARTICULANDO OS NÓS DA PESQUISA
O cenário contemporâneo, caracterizado pela presença das tecnologias da informação
e comunicação, tem nos desafiado a vivenciar novos conceitos, valores, processos e novas
dinâmicas, em decorrência da rapidez das constantes alterações que vêm ocorrendo no nosso
cotidiano. Essa nova realidade mundial tem levado estudiosos a fazerem questionamentos
sobre o papel das instituições educacionais frente às inúmeras transformações na nossa
sociedade.
Nesse contexto de mudanças, percebemos algumas ocorrências fundamentais
vivenciadas na contemporaneidade, tais como: o desenvolvimento da microeletrônica, da
microbiologia, da energia termonuclear, da cibercultura, além das novas formas de trabalho
que estão se configurando nesse cenário. Destaco a cibercultura como uma categoria
fundamental, por caracterizar a cultura contemporânea que traz, como marca principal, a
liberação do pólo de emissão, através das tecnologias digitais, potencializando a autoria dos
sujeitos envolvidos no processo.
Nesse sentido é que as dinâmicas de formação de professores para a docência online
são demandas da cibercultura, e precisam estar abertas à presença das tecnologias da
informação e comunicação (TIC) que se fazem presentes na nossa sociedade, na perspectiva
de contribuírem com a produção de conhecimento e cultura. Esta proposta aponta para a
lógica do digital que potencializa a troca, a discussão coletiva e o estabelecimento de vínculos
entre os participantes, contrapondo-se aos processos formativos centrados em sujeitos
iluminados.
24
É preciso destacar ainda que a utilização das TIC, nos diversos espaços formativos,
precisa também superar a visão reducionista centrada no instrucionismo, que tem como foco
apenas o desenvolvimento de mais uma técnica de ensino ou recurso didático, sem refletir
sobre o potencial comunicacional e pedagógico que elas trazem.
É nessa lógica que muitas propostas de educação à distância estão se configurando
no cenário atual, a partir da perspectiva da pedagogia da transmissão e na dinâmica um -
todos, com propostas educativas lineares e desarticuladas dos pressupostos da cibercultura,
que têm como princípios fundamentais: a interatividade, a colaboração e a hipertextualidade.
A colaboração contribui para o aprender junto, respeitando o pensamento alheio, a
convivência com a diferença e, sobretudo, a busca de soluções que servirão para todo o
coletivo. A interatividade nos desfia a dinamizar a reversibilidade entre emissão e recepção
superando a difusão da mensagem em mão única, dissolvendo-se fronteiras e permitindo aos
sujeitos autoria nas suas ações. A hipertextualidade se caracteriza por seu formato não-linear
de apresentar as informações, e pela possibilidade de integração de uma linguagem
audiovisual, com sons, textos e imagens, potencializando caminhos originais de navegação
hipertextual.
Repensando a formação a partir desse contexto, temos percebido uma série de
iniciativas de formação docente na internet, utilizando-se dos ambientes virtuais de
aprendizagem para a formação de professores. Essas propostas educativas, que utilizam
basicamente os meios telemáticos são caracterizadas por Moran (2003) como educação
online. Nesse contexto podemos reconhecer a proliferação de inúmeros cursos na rede,
visando atender à demanda de formação na sociedade atual, já que as vagas no ensino
convencional são restritas, e a escola não é mais concebida como o único espaço formativo.
Assim, os ambientes virtuais de aprendizagem vêm se configurando em outro espaço
para a formação dos professores, trazendo contribuições significativas para a educação
presencial e à distância. Em sintonia com a disponibilização desses ambientes, a portaria do
MEC 2.253 de 18 de outubro de 2001 flexibilizou as cargas horárias das disciplinas regulares,
que podem agora ser oferecidas em até 20%, nas Instituições de Ensino Superior. Dessa
forma, cada instituição poderá construir sua proposta a partir das suas demandas.
Na educação, de modo geral, e em especial nas propostas de educação online, o
desafio de ser professor ainda é maior, haja vista que não basta apenas disponibilizar
atividades na rede; é preciso mediar, com criatividade, as situações propostas, o que exige do
profissional a construção de novos saberes na sua prática pedagógica. Nesse sentido, é
necessário que o professor busque romper com uma concepção de docência pautada apenas na
25
transmissão de conhecimentos e torne-se um mediador da aprendizagem, estimulando
permanentemente o diálogo, a troca de experiências e a pluralidade de idéias.
Assim, a educação online amplia as exigências sobre o trabalho docente, em paralelo
ao desenvolvimento de pesquisas sobre a formação de professores que, na década de 90,
indicam a necessidade de se resgatar o papel do professor para além do discurso acadêmico,
dando enfoque ao desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional da profissão
docente. Dessa forma, é necessário reconhecer e considerar os saberes construídos pelos
docentes no seu contexto de trabalho.
Na década de 1970, segundo Candau (1998), o enfoque privilegiava a dimensão
técnica do processo de formação dos professores e especialistas da educação. Logo, o centro
da discussão na formação de professores assentava-se na instrumentalização técnica. Observa-
se nessa análise que os saberes dos professores não eram considerados importantes, pois o
centro do debate era o “como fazer” pedagógico, conhecimentos estes apresentados de forma
universal e, conseqüentemente, desvinculados das reais problemáticas vivenciadas pelos
docentes no seu ambiente de trabalho.
Entretanto, na década de 1980, de acordo com Borges e Tardif (2001) o discurso
educacional é dominado pela dimensão sociopolítica e ideológica da prática pedagógica. A
discussão central passa a ser a implicação política deste profissional com as classes populares
e o caráter político da prática pedagógica. Percebe-se, nesse debate, que mais uma vez os
saberes docentes restringiam-se apenas a um caráter político e técnico da profissão e a
discussão sobre a história de vida e da profissão docente não estavam no cerne do debate.
Nesse contexto, as pesquisas desenvolvidas na década de 1990, sob a influência da
literatura internacional, trazem novos enfoques e paradigmas nas discussões sobre a formação
dos professores enfatizando a importância de se considerar o professor no seu processo de
formação. Em seu estudo sobre a temática dos saberes docentes no Brasil, Nunes (2001), ao
estabelecer relações entre a formação de professores e a prática pedagógica, destaca a
importância do debate sobre os saberes docentes nesta década:
Neste período inicia-se o desenvolvimento de pesquisas que, considerando a
complexidade da prática pedagógica e dos saberes docentes, buscam resgatar
o papel do professor, destacando a importância de se pensar a formação
numa abordagem que além da acadêmica, envolvendo o desenvolvimento
pessoal, profissional e organizacional da profissão docente. (NUNES, 2001,
p.28).
26
Percebemos então neste cenário que, apesar de algumas iniciativas de formação
docente, tanto presencial quanto à distância, em que os saberes disciplinares e os saberes
curriculares parecem dominar a formação, tornando-se assim saberes exteriores, as
universidades e os centros de formação são as instituições que assumem a tarefa de produção
e legitimação dos saberes científicos e pedagógicos, ao passo que, aos professores compete se
apropriarem desses saberes, no decorrer da sua formação (TARDIF, 2002). Nessa perspectiva,
na maioria das vezes, os saberes experienciais são delegados a um segundo plano, como se
fossem saberes de menor valor, ora focando-se numa discussão meramente tecnicista e
voltada apenas as questões do como fazer, ora centrando-se numa discussão vazia sobre o
professor reflexivo, sem considerar as reais dificuldades encontradas no cotidiano do trabalho
docente.
É nesse sentido que Tardif (2002) considera o contexto do saber docente
fundamental, quando afirma ser impossível compreendê-lo fora do âmbito dos ofícios e
profissões, sem relacioná-lo com os condicionantes do trabalho. Para esse autor, o saber não é
uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores está relacionado com a pessoa e a
identidade deles, com sua experiência de vida, com sua história profissional e com as suas
relações com os alunos e seus pares. A partir dessas considerações, é que me interesso pela
reflexão que os docentes fazem sobre os seus saberes no contexto da educação online.
Os estudos sobre os saberes docentes, no cenário da cibercultura, precisam superar
uma visão meramente cognitivista e serem compreendidos como um processo construído ao
longo da carreira. Nesse sentido, o docente vai aprendendo a dominar o seu ambiente de
trabalho, na medida em que vai se inserindo nele. Assim, para que o professor construa os
saberes nesse novo contexto, ele precisa vivenciar a docência em diversos ambientes de
aprendizagem e mobilizar uma série de saberes, buscando responder aos desafios impostos
pelos condicionantes do trabalho. Logo, não basta somente dispor dos conhecimentos
acadêmicos e curriculares para a garantia de uma prática pedagógica eficaz; é preciso, antes
de tudo, segundo Tardif (2002, p.21), “mobilizar uma ampla variedade de saberes,
reutilizando-os no trabalho para adaptá-los e transformá-los pelo e para o trabalho”.
Nesse modelo de formação, como se pode observar, a questão dos saberes docentes
emerge a partir das ações e do contexto no qual os docentes intervêm. Assim, o que me
interessa é essa virada na forma de encarar os conhecimentos dos professores na sua prática
em ambientes online. É nesse cenário que vai se configurando essa proposta de pesquisa que
tem como objetivo investigar a questão dos saberes docentes nos ambientes virtuais de
aprendizagem, no contexto de um curso de formação de gestores na UFBA. Minha
27
inquietação parte da necessidade de compreender a natureza e a construção dos saberes
docentes no contexto digital, bem como investigar esses saberes que emergem nesse cenário.
Portanto, pensar na docência em ambientes de aprendizagem requer compreender as
diferentes fontes de saber e as relações dos professores com os mesmos, compreendendo a
mobilização destes saberes nos ambientes que, assim como na sala de aula presencial,
caracterizam-se pela multidimensionalidade, simultaneidade e imprevisibilidade (DOYLE,
1998, apud ZABALZA, 2003, p.10). Por um lado, isso faz com que a ação docente seja
atrativa e interessante e, por outro, dotada de incerteza e ansiedade.
1.2.1 Problema
Essa problemática nos desafia a pensar sobre a temática dos saberes docentes na
Cibercultura, compreendendo esse novo cenário sociotécnico caracterizado, principalmente,
pela plasticidade do digital, pela dinâmica dos processos interativos, hipertextuais e
virtualizantes que abrem inúmeras possibilidades de docência na rede. A convergência em
torno desse ponto conduz, por sua vez, à discussão sobre a temática dos saberes docentes com
destaque para as seguintes questões: os docentes produzem saberes no seu contexto de
trabalho; o saber está enraizado na nossa experiência de vida, na nossa história profissional e
na ralação com os alunos e seus pares; os saberes científicos e curriculares não dão conta da
complexidade da prática docente; o saber dos professores não pode ser simplificado a
questões comportamentais, e ainda, os saberes estão alicerçados em conhecimentos práticos.
É nesse sentido que me interesso pela visão dos docentes sobre os seus próprios
saberes, e isso, particularmente, no desenvolvimento de práticas pedagógicas nos ambientes
virtuais de aprendizagem (AVA). Sintetizando, as questões dessa pesquisa são as seguintes:
Que tipos de saberes docentes os professores mobilizam na sua ação educacional, nos
ambientes de aprendizagem? Como os saberes da experiência, vivenciados em diferentes
espaços de aprendizagem, podem contribuir para a prática docente online? Como esses
saberes são construídos no contexto da cibercultura?
28
1.3 OBJETIVOS
Em sintonia com esses questionamentos, estabeleço como objetivos dessa pesquisa:
Geral:
Analisar e compreender a natureza e os tipos de saberes docentes em ambientes
virtuais de aprendizagem.
Específicos:
Compreender as estratégias de trabalho desenvolvidas e utilizadas pelos docentes
nos ambientes de aprendizagem;
Identificar os saberes docentes que emergem no contexto da cibercultura,
mobilizados pelos professores;
Identificar dilemas, conflitos, dificuldades, aberturas e possibilidades que os
professores vivenciam na sua prática de educação online.
1.4 APRESENTANDO O TRABALHO
Tecidas essas considerações introdutórias, esta dissertação se divide, então em sete
capítulos, nos quais se configuram o marco referencial, a metodologia, o desenvolvimento da
pesquisa, análise dos dados e as considerações finais, a seguir relacionados.
O capítulo 2 é dedicado à abordagem epistemológica e metodológica da pesquisa,
bem como à descrição detalhada do campo, de modo a explicitar a proposta do curso de
tutores e seu desenho didático no ambiente Moodle.
No capítulo 3, O Cenário Digital e a Configuração não Linear do Ciberespaço,
reflito sobre alguns elementos marcantes da sociedade contemporânea e destaco o papel das
tecnologias da informação e comunicação nesse contexto, principalmente o potencial do
digital e suas implicações nas dinâmicas interativas, hipertextuais e virtuais que vêm
potencializando a construção de novos espaços formativos na contemporaneidade.
No capítulo 4, O Contexto da Cibercultura e a Emergência dos Ambientes Virtuais
de Aprendizagem, trago uma reflexão sobre os pressupostos da cibercultura e destaco algumas
características da educação online, bem como reflito sobre a subutilização e o potencial dos
Ambientes Virtuais de Aprendizagem nesse cenário.
No capítulo 5, Saberes Docentes, revelo os desafios contemporâneos na formação de
professores, a partir de três aspectos: a reflexividade, a pesquisa e os saberes da docência.
29
Destaco ainda a temática dos saberes docentes trazendo alguns enfoques e abordagens, de
forma a situar essa temática e sua importância para a presente pesquisa, não adentrando ainda
nas discussões sobre a docência na cibercultura.
No capítulo 6, Saberes Docentes e Cibercultura, analiso os dados da pesquisa, ao
tempo em que ressalto as noções subsunçoras que emergiram de um complexo jogo entre
empiria e teoria ao longo do processo. Para isso, apresento as falas autorizadas dos sujeitos da
pesquisa e o referencial teórico do professor-pesquisador na construção da sua autoria.
Por fim, tem o capítulo 7, Considerações finais de uma Obra Aberta, apresento as
reflexões finais acerca dos resultados obtidos e analisados no capítulo 6, bem como as
contribuições deste trabalho para propostas formativas em EAD e sugestões de temas para
futuras pesquisas.
30
METODOLOGIA
importante é ressaltar que, para conhecer como o outro
experimenta a vida, faz-se necessário o exercício sensivelmente difícil
de sairmos de nós mesmos. Há que nos desdobrar-nos, revirarmos,
suspendermos preconceitos, criticarmo-nos, abirmo-nos à certa
violação de habitus sagrados e solidificados da sociedade do “eu”.
Experiência intestina e radicalmente relacional da intercriticidade.
(MACEDO, 2006)
31
2 DELINEANDO O OLHAR SOBRE A PESQUISA: ITINERÂNCIA E CAMINHAR
METODOLÓGICO
Neste capítulo, apresento os pressupostos epistemológicos e metodológicos da
etnopesquisa formação em educação online, além de descrever o campo da pesquisa, desde
seus aspectos institucionais, organizacionais e pedagógicos, até o desenho didático do curso
de tutores da UFBA 2007.1. A opção pela etnopesquisa formação está alicerçada na idéia de
que em sintonia com os sujeitos que integram esse processo, é que iremos compreender os
saberes docentes emergentes no contexto digital, acreditando que esse caminhar é uma
construção que vai se articulando na interação com os envolvidos nessa trama.
2.1 A ABORDAGEM DA ETNOPESQUISA FORMAÇÃO: DELINEANDO A
COMPREENSÃO DOS SABERES DOCENTES NA CIBERCULTURA
Compreender a natureza e a construção dos saberes docentes nos ambientes virtuais
de aprendizagem (AVA) requer do pesquisador o rompimento com uma concepção de ciência
que relega a uma condição de não verdade a toda e qualquer outra forma de conhecimento,
que não seja pautada pelo método científico e suas regras metodológicas. É o paradigma
moderno que se estabelece a partir da cosmovisão cartesiana, pautando-se na mensuração,
quantificação, no controle e na previsibilidade, ao conceber o universo como uma máquina,
no qual, as leis e os princípios são totalmente controláveis e previsíveis. Esse modelo de
racionalidade chega também ao âmbito das ciências sociais que, para pleitear a mesma
credibilidade das ciências naturais, deveria estar pautada nos pressupostos da objetividade,
neutralidade e racionalidade.
Percebe-se nessa discussão o caráter objetivo da ciência moderna, acreditando que o
objeto traz em si todas as possibilidades para se chegar à verdade procurada. Deixa-se de lado
as questões subjetivas, pois o destaque nesse modelo de ciência é a mensuração dos dados e a
construção de leis que poderiam ser testadas em quaisquer contextos. Essa visão traz no seu
bojo o caráter mecanicista da ciência, ao se preconizar ser a natureza uma máquina que pode
ser montada e desmontada para a criação de leis universais a serem aplicadas em qualquer
contexto. Perde-se, nesse modelo, a dimensão de interdependência entre os fenômenos, pois
se acredita que os seres humanos estão situados acima ou fora da natureza.
32
Assim, o fechamento em hipóteses pré-elaboradas, a ausência de reflexão política
sobre a ciência, o método universalista, o culto a generalizações e metanarrativas, o privilégio
de uma epistemologia frente a outras formas de construção do saber, são algumas posturas
apresentadas por Macedo (2004) que precisam ser superadas na construção de uma ciência na
qual as pautas humanas sejam estruturantes no embasamento da pesquisa.
Diante desses desafios, Morin (2003) nos convida a fazer Ciência com Consciência,
em que são fundamentais a reflexão filosófica, a consciência política, moral e ética na
construção do conhecimento. Este desafio requer uma compreensão mais complexa da
realidade, ao desconstruir uma visão simplista e incorporar a reflexão e discussão dos saberes
vivenciados pelos sujeitos envolvidos no processo. Já Macedo (2002) nos alerta que para
pensarmos a complexidade é preciso esclarecer que esta não elimina a simplicidade, mas
incorpora a diologicidade, opondo-se radicalmente às antinomias e simplificações.
Dessa forma, a compreensão sobre os saberes docentes nas práticas online requer
uma proposta de pesquisa de inspiração fenomenológica, com o objetivo de se compreender e
interpretar os significados que os docentes dão à sua prática no contexto da cibercultura. A
perspectiva da fenomenologia, apesar de se opor ao modo de fazer ciência do positivismo,
aproxima-se desta na rigorosidade para o conhecimento da realidade.
Sob esse enfoque, precisamos estar abertos ao que se mostra no cotidiano. Daí a
necessidade de penetração no contexto, buscando a compreensão do fenômeno, ou seja, o que
se mostra a si em si mesmo tal como é. É nesse sentido que Macedo (2006) nos chama a
atenção para o mergulho do pesquisador no contexto da pesquisa, bem como numa
permanente atitude de desvencilhamento de seus preconceitos e abertura ao fenômeno.
Isso significa um esforço enorme, no sentido de compreender o fenômeno em estudo,
superando-se uma concepção generalista que estabelece o que deve ser visto a priori. Em
lugar de certezas pré-estabelecidas, precisamos desenvolver uma atitude de estranhamento, no
sentido de tentarmos apreender os modos de pensar, sentir e agir dos sujeitos ou grupos
estudados. É preciso alertar, portanto, que não somos ingênuos em acreditar que o
pesquisador não traz consigo experiências anteriores, bem como uma abordagem teórica
coerente com o estudo. Entretanto, faz-se necessário um movimento constante de reflexão, no
sentido de se descrever a situação e compreendê-la nos seus múltiplos aspectos e significados.
Diante do exposto, e em sintonia com as discussões da fenomenologia, é que se faz
necessário uma atitude hermenêutica, tendo em vista a compreensão do fenômeno, sua
interpretação e, posteriormente, uma nova compreensão dos seus significados. Daí a
importância da descrição como um possível caminho ao fenômeno que se mostra. Por isso, a
33
principal preocupação do pesquisador tem que ser com os sentidos e significados que os
sujeitos atribuem às suas ações e à realidade que os cercam. Assim, faz-se necessária a busca
da construção coletiva e do diálogo com o ator social, no sentido de descrever e interpretar o
fenômeno que se apresenta, na interação das práticas pedagógicas do ambiente virtual de
aprendizagem. Dessa forma, na convivência direta junto ao contexto da cibercultura,
poderemos compreender os significados de docência que afloram no ambiente de estudo, a
partir das práticas e dos discursos desenvolvidos pelos sujeitos da pesquisa.
Nessa perspectiva, o estudo pressupõe a abordagem da etnopesquisa formação, que
requer a compreensão da ordem social no seu cotidiano, indo a campo com vistas à
compreensão do contexto de cultura em que o ator social está imerso, além de perceber seus
etnométodos. Desta forma, em uma interação plena com os sujeitos e através dos dispositivos
utilizados estaremos provocando o desvelamento do objeto.
A etnopesquisa crítica formação destaca a importância do pesquisador vivenciar
reflexões sobre o processo formativo juntamente com os membros do grupo. Dessa forma, a
definição da problemática, a busca dos dados, a validação dos mesmos, e a análise e
interpretação requerem do pesquisador, segundo Macedo (2004), discussões coletivas com o
grupo envolvido, em busca de corpo e legitimação.
Nesse contexto, será de fundamental importância a interação com os sujeitos que irão
vivenciar processos formativos em AVA, para se compreender como os saberes docentes são
construídos na dinâmica da docência. Assim, faz-se necessário ir a campo, não no sentido de
simplesmente “coletar os dados” e levar um referencial teórico totalmente construído; é
fundamental experienciar com os sujeitos da pesquisa e conseqüentemente com os objetos
técnicos – suas construções e seus etnométodos.
Para Sacramento (2006) a opção pela etnopesquisa crítica/formação, na intenção de
pesquisa sobre a docência nos ambientes virtuais de aprendizagem, justifica-se também por
proporcionar aos educadores:
reflexão crítica sobre a prática pedagógica;
vivência colaborativa da proposta de pesquisa com os atores sociais;
formação de professores reflexivos–na-ação e sobre a ação (SHON, 2000);
compreensão dos etnométodos que emergem das práticas cotidianas;
vivência da autoformação, co-formação e eco-formação (NÓVOA, 1995).
34
Dessa forma, a etnopesquisa/formação estará proporcionando ao pesquisador
vivenciar um movimento constante e contínuo de construção e reconstrução da aprendizagem
pessoal e profissional, envolvendo saberes, experiências e práticas. Neste sentido, os
professores, ao se tornarem pesquisadores reflexivos, vão vivenciando o movimento
permanente de questionamento e aprofundamento, a fim de compreender melhor o contexto
em que estão inseridos.
Destarte, a etnopesquisa formação possibilita uma experiência formadora que
articula, hierarquicamente: saber fazer, conhecimentos, funcionalidade e significação, técnicas
e valores num espaço-tempo que oferece a cada um a oportunidade de uma presença para si e
para a situação, por meio da mobilização de uma pluralidade de registros (JOSSO, 2004).
Sob essa perspectiva, precisamos estar atentos à emergência das noções subsunçoras,
fruto da competência teórica do pesquisador com a imersão no campo de pesquisa. Esta
concepção opõe-se a uma visão meramente prescritiva ou normativa, que se apóia unicamente
no referencial teórico para a compreensão do campo de pesquisa, como se esse servisse
apenas à sua legitimação. Essa visão se distancia dos objetivos desta pesquisa, pois a
compreensão da natureza dos saberes docentes, bem como sua construção, no contexto da
cibercultura, requer dar voz aos docentes e, por conseguinte, dialogar com o referencial
teórico da pesquisa.
Para Macedo (2004, p.205), nesse processo de diálogo da teoria com a empiria,
algumas operações cognitivas são fundamentais ao pesquisador: distinção do fenômeno em
elementos significativos; exame minucioso desses elementos; codificação dos elementos
examinados; reagrupamento dos elementos por noções subsunçoras; sistematização textual do
conjunto; produção de uma meta análise ou uma nova interpretação do fenômeno estudado.
Sendo assim, faz-se necessário um esforço do pesquisador para organizar e sintetizar
os “dados” analisados, não abrindo mão de um aguçado senso crítico e curiosidade em face da
realidade que se apresenta. Do mesmo modo, nesse movimento exigente de interpretação dos
“dados”, o pesquisador reagrupa as informações em noções subsunçoras, também conhecidas
como categorias de análise, configurando-se então numa nova síntese.
35
2.2 O MÉTODO DO ESTUDO DE CASO: UMA APROXIMAÇÃO AO CAMPO
Em sintonia com os pressupostos da abordagem da etnopesquisa formação, a opção
do método de pesquisa recaiu sobre o estudo de caso. Esse método faculta a investigação e
reflexão em um contexto particular. O estudo de caso também permite ao investigador uma
compreensão mais aprofundada da realidade em estudo, e busca retratar o dinamismo de uma
situação numa forma muito próxima do seu acontecer natural.
Para André (1995), além do estudo de caso se caracterizar pelo conhecimento
particular de uma realidade, está focado muito mais no processo do que no produto,
requerendo do pesquisador algumas qualidades, tais como: tolerância à ambigüidade,
sensibilidade e comunicação. Em relação ao primeiro item, a autora afirma que não existem
protocolos prontos que busquem orientar minuciosamente o pesquisador e orientações
precisas para a tomada de decisão para essa ou aquela situação. Sob essa ótica, entendo que o
trabalho precisa ser uma obra aberta na qual as decisões são tomadas à medida que vão
surgindo. Em relação à sensibilidade, a referida autora nos desafia a recorrer constantemente a
nossas intuições, percepções e emoções, no sentido de se compreender a emergência do
fenômeno em estudo. É preciso também saber olhar além das aparências para tentar ir
definindo novas ações no decorrer do processo. Com relação à comunicação, precisamos
desenvolver a empatia a fim de nos colocarmos no lugar do outro para compreender o que
estes sujeitos dizem, pensam e sentem.
No âmbito dessa pesquisa, desenvolvi minhas observações no Curso de Tutores da
UFBA 2007.1 oferecido pelo Programa de Formação Continuada de Gestores da Educação
Básica (PROGED), no período de abril a junho de 2007, no qual atuei como pesquisadora
participante. O ambiente virtual de aprendizagem Moodle
4
foi o principal lócus de
desenvolvimento das atividades do curso. Os sujeitos da pesquisa são os quatro professores do
curso, os cursistas e a pesquisadora.
A escolha pelo Curso de Tutores da UFBA como campo está pautada,
principalmente, pela experiência significativa que tive participando da proposta no ano de
2006; por ser um curso de formação continuada desenvolvida na UFBA sobre a temática da
Educação à Distância; por ter 80% da sua carga horária à distância; e por trazer temáticas
relativas à questão da docência na Cibercultura, tais como: aspectos metodológicos em EAD,
4
http://www.moodle.ufba.br/course/view.php?id=423
36
planejamento em EAD, elaboração de conteúdos de aprendizagem em EAD e tutoria. Além
disso, o curso apresenta um diferencial – a atuação de quatro docentes no mesmo ambiente de
aprendizagem, enriquecendo assim a discussão sobre a temática.
Conforme o acima exposto, durante toda a itinerância do estudo, fui me aproximando
dos sujeitos da pesquisa e estabelecendo com eles, constantes diálogos, tendo em vista
compreender seus saberes, etnométodos e dilemas nas interações registradas no ambiente
virtual de aprendizagem. A aproximação ao campo se deu mediante a amizade com uma das
participantes da equipe do PROGED, a qual estendeu o meu contato juntamente com a
coordenação e os professores. Como havia participado ativamente do curso, no ano de
2006, a aproximação se tornou mais fácil. Nessa ocasião, fiz uma apresentação oficial dos
objetivos da pesquisa em um dos encontros presenciais e também no fórum aberto do curso,
me colocando à disposição para eventuais questionamentos.
Para tanto, durante todo o processo de interação no ambiente virtual de
aprendizagem, nos encontros presenciais do curso, no desenvolvimento das entrevistas e na
participação da lista de discussão com os docentes e a equipe de coordenação do projeto, pude
exercitar uma escuta sensível, com o objetivo de perceber o “universo afetivo, imaginário e
cognitivo do outro, para compreender do interior as atitudes e os comportamentos, o sistema
de idéias de valores, de símbolos e de mitos” (BARBIER, 2002, p.94).
Nesse sentido, urge rejeitar uma perspectiva de trabalho distante da reflexão com os
sujeitos da pesquisa e buscar, em constante diálogo com eles, compreender a origem desses
saberes e sua construção, no intuito de desenvolver práticas pedagógicas em sintonia com os
pressupostos da cibercultura e, conseqüentemente, com os fundamentos da educação online.
2.3 OS DIPOSITIVOS DE PESQUISA
Os dispositivos
5
utilizados na pesquisa foram: a observação participante no ambiente
virtual de aprendizagem do curso (interação dinâmica nas discussões, conforme o já referido),
a entrevista e a discussão ativa na lista do grupo do PROGED.
A observação participante foi de suma importância nesse estudo, haja vista a
compreensão da vida afetiva e imaginária dos membros do grupo na discussão sobre a
educação à distância, o planejamento pedagógico em EAD, e o papel dos tutores nos
5
A autora Edméa Santos, respaldada na obra de Ardoíno (2003, p.80), compreende o dispositivo como “uma
organização de meios materiais e/ou intelectuais, fazendo parte de uma estratégia de conhecimento de um
objeto”. (SANTOS, 2005, p.129)
37
ambientes de aprendizagem. De acordo com Macedo (2004), quanto mais o observador se
envolver com os sujeitos da pesquisa, mais estará capacitado para compreender os
significados e ações que brotam da cotidianidade vivida por eles. Nesse sentido, o
envolvimento do pesquisador é fundamental, pois só através da interação com o grupo é que o
conhecimento vai ser construído. Desta forma, a integração dos saberes do senso comum com
os saberes científicos, através da participação ativa dos atores sociais na construção da
pesquisa, proporciona maior relevância social à proposta de trabalho.
Para André (1995), na observação participante, por estar o pesquisador em constante
interação com o campo, precisa desenvolver uma atitude de vigilância, evitando a imposição
de suas concepções. Nota-se, então, que precisamos nos colocar no lugar do outro para
compreender a lógica de seu pensamento. Nessa perspectiva, fui me aproximando da
coordenação, dos docentes, dos alunos e junto com eles procurei entender a dinâmica do curso
e os significados atribuídos à docência.
Contribuindo para a reflexão dessa questão, Macedo (2004) ressalta a importância da
participação ativa do sujeito no contexto da pesquisa, bem como a participação dos sujeitos
envolvidos no processo. Dessa forma, rompemos com a concepção normativa que separa
sujeito e objeto e apostamos na idéia de uma reflexão conjunta, em busca da construção de
novos conhecimentos.
No processo de observação do curso, as interfaces do ambiente virtual de
aprendizagem foram utilizadas como dispositivos da pesquisa. Entre elas, podemos citar: o
fórum de discussão, que se caracteriza como uma interface assíncrona
6
e o chat ou bate-papo
caracterizado como uma interface síncrona
7
. Outro dispositivo de pesquisa que surgiu, durante
a vivência no campo, foi a participação na lista de discussão do curso, onde os docentes e a
equipe de coordenação partilhavam seus dilemas e dialogavam sobre o acompanhamento do
mesmo.
A importância desses dispositivos justifica-se pela análise das mediações utilizadas
pelos docentes na condução da proposta de trabalho, que acreditamos num processo de
comunicação baseado nos pressupostos da interatividade. Nessa direção, vivenciamos a
construção de espaços de aprendizagem, nos quais os sujeitos envolvidos no processo têm a
possibilidade de criar, recriar, modificar, agir em tempo real, ser autores e co-autores de
produções”. Nessa gica, participei ativamente das discussões buscando maior implicação
6
São aquelas utilizadas em tempo real. Os aprendizes participam das atividades assíncronas do curso, no tempo
que lhes conveniente.
38
como os sujeitos envolvidos.
Igualmente, as observações foram importantes na composição de um quadro
detalhado das ações do docente no ambiente de aprendizagem no Curso de Tutores da UFBA,
nos chats
8
propostos no ambiente Educarede e no MSN
9
. Além disso, foram significativas as
interações entre docentes e coordenação do curso na lista de discussão do Yahoo! Grupos
10
,
na sua interação com os alunos e colegas de trabalho, no desenvolvimento das atividades
docentes nos fóruns e chats, nos procedimentos utilizados, nos discursos junto aos seus alunos
nos chats e fóruns que iam se configurando no processo. Para tanto, afora acompanhar as
discussões em cada grupo, participei dos debates com professores e cursistas nos diferentes
espaços de aprendizagem.
Outro dispositivo relevante nesse estudo foi a entrevista, para o aprofundamento das
questões observadas na comunicação entre alunos-alunos, alunos-professores, professores-
professores. Segundo Macedo (2004), esse instrumento deve ser de caráter “não diretivo”,
porém não se deve confundir com nenhuma estruturação. Faz-se necessário, portanto, um
roteiro flexível, onde a informação inesperada possa ser incluída. Além disso, para o autor,
[...] a entrevista é um rico e pertinente recurso metodológico na apreensão de
sentidos e significados e na compreensão das realidades humanas, na medida
em que toma como uma premissa irremediável que o real é sempre resultante
de uma conceituação; o mundo é aquilo que pode ser dito, é um conjunto
ordenado de tudo que tem nome, e as coisas existem através das
denominações que lhes são emprestadas (MACEDO, 2004, p.165).
Refletir sobre a questão da conceituação atribuída pelo homem à sua realidade
remete às conjecturas sobre a importância do diálogo no processo de entrevista, na escuta do
outro para se tentar compreender o seu significado. Para Bohm (2005), o diálogo é uma
corrente de significados que flui entre nós e por nosso intermédio, que nos atravessa, enfim”.
Trata-se de fazer emergir novos significados e novas compreensões, unido as pessoas numa
constante troca de interação.
Na realidade, procuro aqui dar visibilidade às práticas construídas no cotidiano que
informam e formam o ato educativo, pois corroboro com o que Macedo (2004, p.86) infere:
7
São aquelas em que os sujeitos. estão online ao mesmo tempo
8
O chat do ambiente do educarede foi utilizado no curso de tutores 2007.1, devido a dificuldades técnicas com o
chat do ambiente Moodle. Disponível em: http://www.educarede.org.br/educa/index.cfm.
9
O MSN Web Messenger permite conversar online e em tempo real usando apenas um navegador da Web. O
chat do MSN também foi utilizado durante o curso para reuniões online do grupo de professores do PROGED,
bem como para encontros síncronos com os alunos.
10
Permite criar espaço para troca de mensagens relativas a um assunto específico ou para reunir um grupo de
interesse comum em listas de discussão.
39
“compreender os atores pedagógicos e suas construções implica em superar a homogeinização
e a esteriotipação das pesquisas normativas e prescritivas, é dar-lhes outro significado: aquele
de sujeito do ato educativo”.
Quanto ao tipo de entrevista, optei pelo modelo semi-estruturado, em sintonia com a
problemática da pesquisa, o referencial teórico e metodológico. Nesse sentido, em muitos
momentos vivenciamos diálogos totalmente livres com os sujeitos da pesquisa,
principalmente as discussões da lista de tutores da UFBA, nas quais freqüentemente
emergiam questões relativas à docência no curso. Por outro lado, realizamos entrevistas por
meio de um roteiro flexível, a fim de atender aos objetivos da investigação. Este dispositivo
proporcionou uma abertura para as novas informações que iam surgindo no decorrer do
processo, o que acarretou novos sentidos para o estudo desses saberes docentes.
Em média, as entrevistas tiveram a duração de 1h e 10 min e foram gravadas com a
permissão dos sujeitos. Logo em seguida, o material foi ouvido intensamente, intercalando a
escuta das gravações com o material transcrito, de modo a afinar a escuta, deixando aflorar as
noções subsunçõras, contribuindo para as primeiras análises e o esclarecimento de minhas
questões.
Nesse processo, precisei voltar aos objetivos da pesquisa para uma melhor definição
do objeto de estudo. Em seguida, procurei devolver as entrevistas aos professores, por e-mail,
para que pudessem ler a transcrição e talvez discordar ou modificar suas proposições.
Nenhum professor fez alteração no material; entretanto responderam ao e-mail agradecendo a
atenção e o cuidado.
As entrevistas aconteceram nos mais diferentes lugares, horários e momentos. No
chat do MSN, no núcleo de tecnologia, no shopping, durante a semana, após o trabalho, pela
manhã, pela tarde, ou à noite. Destaco esse aspecto, pois isso retrata a disponibilidade dos
professores em contribuir com a pesquisa, encontrando sempre um tempinho para nos atender.
Outro dispositivo que também utilizei no processo da pesquisa foi o questionário,
com o objetivo de conhecer o grupo de professores nos aspectos relativos à sua formação, seu
tempo de serviço, sua experiência profissional, e seu envolvimento com a EAD. O
questionário também foi enviado por e-mail, e todos gentilmente o responderam.
40
2.4 O CONTEXTO DA PESQUISA E O AMBIENTE DO CURSO DE TUTORES DA
UFBA
Neste momento, é essencial conhecer de forma mais aprofundada o contexto em que
ocorreu a pesquisa, desde seus aspectos institucionais e organizacionais, até o desenho
didático do curso, onde foram tecidas as interações entre os sujeitos envolvidos no processo.
2.4.1 PROGED – Aspectos institucionais, organizacionais e pedagógicos
O curso de tutores da Universidade Federal da Bahia faz parte de um conjunto de
ações do Ministério da Educação e Cultura (MEC) que tem como objetivo principal a
melhoria da qualidade do ensino e aprendizagem dos alunos da rede pública de ensino. Neste
prisma, o MEC criou a Rede Nacional de Centros de Pesquisa e Desenvolvimento (REDE),
fomentando o desenvolvimento e a oferta de alguns programas de educação permanente,
distribuídos em 20 centros pelo Brasil, implementando ações que contribuam com a formação
continuada de educadores e gestores.
No âmbito de ações dessa REDE, o programa de Educação e Linguagem,
Educação Matemática e Científica, Ensino de Ciências Humanas e Sociais, Artes e Educação
Física e Gestão e Avaliação da Educação. Nesse contexto, a Universidade Federal da Bahia,
através do Centro de Estudos Interdisciplinares (ISP)
11
, integra o Programa de Formação
Continuada de Educação Básica (PROGED)
12
.
Tendo em vista o desafio na promoção de cursos de formação continuada de
gestores, que atuam nos sistemas municipais de educação e nas diferentes unidades de ensino
espalhadas no estado da Bahia, o PROGED traz, então, como objetivo maior de seus cursos
de formação continuada, a promoção da qualificação técnica adequada aos desafios da
11
O Centro de Estudos Interdisciplinares para o Setor Público - ISP, antigo Instituto de Serviço Público, é um órgão
suplementar da Universidade Federal da Bahia, criado mais de 30 anos para prestar consultoria e desenvolver projetos em
organizações públicas e privadas, em nível nacional e local, nas áreas de Modernização Administrativa, Recursos Humanos,
Pesquisa e Avaliação. Disponível em: http://www.isp.ufba.br/apresentacao.html.
12
O PROGED resulta de convênio, firmado em julho/2004, com vigência de quatro anos, entre o Ministério da
Educação/Secretaria de Educação Básica (MEC/SEB) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA). O Programa está
integrado à Rede Nacional de Centros de Pesquisa e Desenvolvimento da Educação (REDE/MEC). Na UFBA está
registrado na Pró-Reitoria de Extensão e é executado pelo Centro de Estudos Interdisciplinares para o Setor Público (ISP).
O ISP, órgão suplementar da UFBA, criado há mais de 40 anos, presta consultoria e desenvolve projetos em organizações
públicas e
privadas, em nível nacional e local, nas áreas de: Desenvolvimento de Talentos Humanos, Sistemas e Processos
Gerenciais, Gestão Educacional, Pesquisa e Avaliação Educacional.
41
legislação educacional, em sintonia com as necessidades educacionais vivenciadas pelo
contexto em que esses sistemas e unidades de ensino se inserem.
É nessa dinâmica que o PROGED, através do curso de Formação de Tutores em
EAD, pretende contribuir com o debate sobre Educação à distância na Bahia, oferecendo
cursos de forma gratuita, e tendo como órgão de financiamento a Secretaria de Educação
Básica MEC/SEB. Trata-se de um curso de formação continuada, oferecido em nível de
extensão, na modalidade à distância, que traz no seu bojo a idéia de que a formação se ao
longo da vida e extrapola o âmbito formal, incorporando diferentes metodologias, nos
diversos percursos formativos dos sujeitos envolvidos.
A escolha pela modalidade à distância, está pautada na idéia de que se pode abranger
um número maior de profissionais que residem em diferentes localidades do estado, ao
mesmo tempo em que contribui com a socialização das tecnologias da informação e
comunicação nos processos de gestão educacional.
Como forma de garantir a concepção de formação continuada inerente à proposta de
trabalho, o curso tem como objetivo geral formar tutores para atuar na modalidade de
educação à distância, prioritariamente, em cursos de formação de gestores de sistema
municipais e de unidades escolares. Traz como público alvo, servidores públicos com
formação pedagógica (pedagogos, licenciados, especialistas em educação, mestrandos em
educação, mestres em educação, doutorandos em educação, ou doutores em educação) que
desenvolvem atividades em sistemas municipais ou estaduais de ensino, tendo como
prioridade os técnicos da Secretaria de Educação, coordenadores pedagógicos ou gestores de
unidades escolares. Vale ressaltar, que na versão do Curso 2007.1, foram disponibilizadas
algumas vagas para os funcionários da UFBA.
A seleção dos inscritos é organizada em duas etapas: na primeira fase, é feita uma
análise do perfil dos cursistas, através de uma ficha de inscrição e observação do currículo e,
logo em seguida, uma atividade prática no computador, com objetivo de averiguar habilidades
mínimas relativas à escrita e à informática. Na versão analisada, foi feita a análise do
currículo, devido a questões de prazo junto ao Ministério da Educação, para o oferecimento
do curso.
Em relação à concepção pedagógica do curso, as diretrizes delineadas na proposta
definem alguns princípios: a provisoriedade do conhecimento; a interdisciplinaridade; a
educação como espaço de construção da democracia; a educação como processo dialógico;
a pesquisa como princípio educativo; a autonomia do educando; e a necessidade de novas
competências.
42
O primeiro estabelece, como premissa fundamental, a transitoriedade do
conhecimento, passível de revisão, reformulação e ressignificação.
A interdisciplinaridade ressalta a importância da abertura do conhecimento a outros
campos do saber, mesmo tendo como foco um campo específico de trabalho. Os
conteúdos pautados numa perspectiva de análise onde a ética, o respeito, a
solidariedade e a justiça social, destacam-se como fundamentais e caracterizam uma
perspectiva de educação baseada na democracia.
A educação como processo dialógico traz em sua concepção a importância de se
pensar em propostas de educação à distância na quais o diálogo seja fundante,
contrapondo-se a uma concepção superficial de troca de idéias, ou à imposição de
idéias de um sujeito ao outro. Nessa dinâmica, acredita-se num constante processo
dialógico entre o cursista e professor, cursista e cursista, cursista coordenação, enfim,
entre todos os sujeitos evolvidos no processo.
A pesquisa como princípio educativo revela que a indagação, a curiosidade, são
requisitos fundamentais na construção do conhecimento. Nessa lógica, espera-se que o
sujeito na construção do seu próprio conhecimento precisa investir nessa perspectiva,
interagindo com seu entorno.
O desenvolvimento da autonomia é outro pressuposto fundamental nas diretrizes
pedagógicas do PROGED, pois, nesse cenário, o aluno tem a possibilidade de traçar
seu próprio caminho, escolher o que estudar, o que ler, no momento coerente com a
sua disponibilidade. Isso não quer dizer que a proposta do curso está fundamentada no
autodidatismo do aluno e na anulação do papel do docente. O que fica claro nas
diretrizes do curso é uma perda de centralidade da figura do professor como sujeito
principal do processo, e um grande incentivo no processo de autonomia do aprendiz. É
nesse sentido que as diretrizes apontam para o item a seguir:
A necessidade de novas competências, no sentido de que não basta apenas acessar
as informações disponibilizadas na internet, e sim o desenvolver uma atitude
investigativa e crítica.
43
Em relação à organização das atividades curriculares do curso, o quadro 1 retrata o
delineamento das mesmas de forma mais sintética:
Quadro 1 – Caracterização das atividades do Curso de Tutores da UFBA 2007.1
PANORAMA GERAL DAS ATIVIDADES
Encontro Presencial 24/04/2007 cadastramento do cursista. Distribuição do material didático.
Apresentação da proposta do curso. Palestra de abertura.
ETAPAS MÓDULOS FÓRUNS MATERIAL
ÁUDIO
VISUAL
CHAT
Fórum:
Possibilidades e
limitações da EAD
Educação à distância
– uma nova
modalidade
educacional
Fórum: Opine
1ª ETAPA
(25 de abril a 4
de maio de 2007)
Aspectos
Metodológicos
Fórum: Opine
Aula 1: EAD e
Educação online
Profª F1
Distâncias e proximidades no
processo de aprendizagem na
Educação presencial e na
Educação a Distância.
Fórum: Fuxicando
sobre a produção de
conteúdos em EAD
Planejamento em
EAD
Fórum: Opine
2ª ETAPA
Planejamento e
Elaboração de
Conteúdos
(05 a 16 de maio
de 2007
Elaboração de
conteúdos de
aprendizagem em
EAD
Fórum: Opine
Aula 2: Autoria
Profº F1
Potencialidades do Ambiente
Virtual
17 de maio de 2007 – Encontro presencial – Avaliação da 1ª e 2ª ETAPAS Seminário sobre Gestão Educacional
Fórum: O papel da
tutoria
O tutor na EAD: que
sujeito é esse?
Fórum: Opine
3ª ETAPA
TUTORIA
(05 a 16 de maio
de 2007
Do quadro de giz às
práticas de ensino
online
Fórum: Opine
Aula 3: Tutoria
Profº F1
Interatividade na EAD
4ª ETAPA
Construção do
TCC
(27 de maio a 5
de junho de 2007
Com base nos módulos de Gestão
6 de junho de 2007 – Data limite para postagem da auto–avaliação
11 de junho de 2007 Encontro presencial Apresentação dos ambientes virtuais (avaliação final) e
fechamento do curso
Fonte: http//www.moodle.ufba.br
Como podemos observar nesse quadro 1, a proposta do curso contemplou três
atividades presenciais em Salvador e atividades online no ambiente Moodle. Outro aspecto
importante a considerar diz respeito à carga horária do curso, com duração total de 200 horas,
distribuídas em atividades presenciais e em atividades à distância. Os encontros presenciais
tiveram uma duração de oito horas cada, totalizando 24h horas e as atividades à distância
totalizaram 176 horas no ambiente virtual.
Nessa versão do curso 2007.1, foco de análise dessa pesquisa os encontros
presenciais aconteceram em três momentos distintos. O primeiro teve como pauta principal
apresentar os objetivos do curso, toda equipe de trabalho, o ambiente de aprendizagem
Moodle e os pressupostos teóricos da educação à distância que fundamentam a proposta do
PROGED. No segundo encontro presencial, tivemos uma palestra pela manhã sobre
44
planejamento em EAD, com ênfase na discussão sobre o trabalho de conclusão de curso,
alguns esclarecimentos da coordenação quanto à dinâmica do ambiente de aprendizagem,
além de outra palestra sobre Gestão Educacional, com o objetivo de subsidiar as discussões
teóricas sobre o TCC
13
. Nesse mesmo encontro, os grupos puderam se reunir para começar a
articular a proposta de trabalho em grupo e escolher a temática de estudo que iria nortear o
projeto. Finalizando os encontros presenciais, já na terceira etapa, tivemos a apresentação dos
trabalhos de conclusão de curso, em que cada grupo explanou sobre o desenho didático da
proposta que haviam construído e explicaram como se deu o processo de cooperação em rede.
2.4.2 O desenho didático do Moodle no contexto do Curso de Tutores da UFBA
O desenho didático do “Curso de Tutores da UFBA”, oferecido pelo Centro de
Estudos Interdisciplinares para o Setor Público - ISP, no ambiente Moodle se deu a partir do
entrelaçamento de diferentes atividades e da disponibilização de algumas interfaces do
ambiente. É importante ressaltar que, apesar de cada interface no ambiente possuir certa
finalidade de trabalho, a coordenação dos cursos e os professores direcionam e dinamizam a
utilização dos mesmos, de acordo com as suas demandas.
Assim, logo na entrada do curso, observamos dois boxes principais: um mais
didático trazendo os espaços de ambientação e as etapas do curso, e outro destinado à parte
administrativa e operacional como: calendário, próximos eventos, mensagens, lista de
participantes etc. Para ter acesso ao ambiente de aprendizagem do Curso de Tutores da
UFBA, o estudante precisa de um login e de uma senha pessoal.
Figura 1 - Tela de abertura do curso 1
O espaço aberto no ambiente Moodle, categorizado como Ambientação, teve como
13
Refere-se ao trabalho de conclusão de curso desenvolvido de forma colaborativa pelos estudantes do curso,
com o objetivo de vivenciar a construção de uma proposta de trabalho no ambiente de aprendizagem Moodle.
45
objetivo principal acolher os cursistas no ambiente de aprendizagem e fornecer-lhes algumas
informações importantes relativas ao seu funcionamento. Esta fase inicial do curso
caracterizou-se como um momento de “adaptação” do aluno ao ambiente, ao processo e ao
grupo do qual fazia parte.
Dessa forma, foi disponibilizado um tutorial com áudio aonde as informações
operacionais sobre o ambiente iam sendo narradas e exibidas na tela, facilitando assim a
compreensão da dinâmica de seu funcionamento. Complementando o tutorial, tivemos
também um manual específico sobre o Moodle, que teve como objetivo orientar as ações
básicas de acesso e utilização do ambiente virtual.
Outro material interessante foi um manual com informações sobre a proposta do
curso, objetivando fornecer questões relativas aos aspectos institucionais e pedagógicos da
proposta, bem como informar o cronograma das atividades obrigatórias do curso e os
indicadores de avaliação. Além desse material, uma mensagem de acolhimento dava as boas-
vindas aos cursistas, destacando a importância do trabalho cooperativo para o sucesso do
grupo.
A interface Perfil também foi incentivada para que os cursistas pudessem socializar
informações pessoais e profissionais que poderiam ser acessadas por todos os membros do
curso. De modo geral, os participantes fizeram uma breve descrição pessoal, citaram a cidade
de origem e destacaram com mais relevância sua formação profissional e sua área de atuação.
A grande maioria inseriu sua foto, contribuindo assim com uma marca de referência visual no
processo de interação.
No fórum de apresentação aberto por cada professor, os cursistas tiveram a
oportunidade de se apresentar de forma mais aprofundada, trazendo informações importantes
tanto em relação a questões pessoais quanto profissionais. Percebi que as apresentações
pessoais são de suma importância no contexto dos cursos, pois possibilitam o início da
formação dos vínculos afetivos, que irão servir de base para a aprendizagem colaborativa.
Para Silva (2002) as informações disponibilizadas nessa interface favorecem encontros e
autorias coletivas, e permitem ao professor maior conhecimento do grupo e a oportunidade de
canalizar ações específicas voltadas para as necessidades individuais e coletivas.
46
Figura 2 - Espaço coletivo 1
Outro espaço bem dinâmico, disponibilizado para todo o grupo, foi o Espaço
Coletivo, com objetivo de socializar diferentes interfaces que viabilizassem processos
interativos. O rum de notícias trouxe como principal proposta a postagem de avisos e
notícias sobre o curso. Dessa forma, este fórum foi de suma importância no desenvolvimento
das atividades, pois a coordenação informava sobre a agenda dos encontros presenciais, os
formadores disponibilizavam os horários e as memórias dos chats, além de ser um espaço
aberto à socialização de eventos importantes na educação. É interessante destacar que, apesar
de ter como principal foco as notícias e os avisos, estes fóruns acabaram abrindo debates
relevantes sobre questões educacionais, e promovendo a interatividade entre os participantes.
Além do fórum de notícias, houve o fórum integração e tira dúvidas, onde todos os
participantes do curso podiam abrir um tópico e mediar discussões de seu interesse, bem
como tirar dúvidas sobre o Moodle e a estrutura do curso de modo geral. Este espaço foi de
imprescindível para a interação e conversas descontraídas entre os participantes do curso, que
podiam ali se articular com os colegas para organizar trabalhos, abrir tópicos para a discussão
de temáticas específicas de seu interesse, tirar dúvidas, enviar mensagens em diferentes
formatos para seus colegas, discutir os vídeos aulas, socializar descobertas sobre a dinâmica
do ambiente, enfim, debater temáticas gerais que não constavam na programação oficial do
curso.
Com o objetivo de estimular os bate-papos informais, a coordenação disponibilizou o
chat intervalo, onde em qualquer momento que o cursista acessasse o ambiente, poderia
interagir com os colegas ou professores, desde que fossem agendados os encontros, ou quando
os participantes estivessem online. Um complicador em relação ao uso dos chats foi a
instabilidade do ambiente Moodle em relação a esse tipo de atividade síncrona, levando
alunos e formadores a utilizarem outros espaços na rede.
47
Outra interface disponível no ambiente de aprendizagem foi o diário de bordo. O
diário teve como principal objetivo promover um espaço para as anotações e reflexões do
cursista sobre seu processo de aprendizagem. Nesse sentido, os diários se tornaram recursos
de reflexão sobre a própria prática profissional. Vale ressaltar, que todas as anotações feitas
pelos estudantes podiam ser comentadas pelos docentes. Entretanto, apesar de alguns cursistas
utilizarem essa interface para refletir sobre sua caminhada no curso, foram poucos os docentes
que acessaram essa interface em busca de compreender a articulação entre as experiências
acadêmicas e profissionais dos estudantes na itinerância do curso, bem como refletir junto
com o cursista esse processo. Uma limitação observada no diário de bordo é que este não
pode ser socializado entre os colegas, restringindo assim a interação todos-todos e a
construção coletiva do conhecimento.
A midiateca foi outra interface disponibilizada no ambiente, objetivando a
socialização de diferentes formatos de arquivos (vídeos, apresentações em áudios etc.) no
estilo digital. Além dos docentes e equipe de coordenação do curso postarem alguns arquivos,
os estudantes também tiveram a possibilidade de inserir textos, imagens, áudios, deixando de
ser apenas meros consumidores de informações e passando a contribuir na co-autoria do
curso.
Nessa mesma linha, havia o glossário geral aonde os participantes podiam criar e
manter uma lista de definições, como num dicionário. O link permitiu um enriquecimento do
glossário, haja vista que os conteúdos do curso podiam se articular dentro do próprio ambiente
e também fora deste. Assim, o glossário abriu mais uma possibilidade para os participantes
participarem da dinâmica do curso, exercendo sua co-autoria.
Os formadores também tiveram um fórum no ambiente de aprendizagem, visando
discutir questões relativas ao curso, como a disponibilização de atividades, problemas
encontrados nas interfaces do ambiente, dúvidas dos docentes, orientações da equipe técnica
etc. Outros espaços fora do Moodle foram utilizados por toda a equipe de coordenação e
professores, no intuito de discutirem o andamento do curso, planejarem os encontros
presenciais, socializarem estratégias de trabalho, enfim, vivenciarem de forma coletiva a
dinâmica do mesmo. Assim, tivemos uma lista de discussão no Yahoo! Grupos e também
interações síncronas no MSN. Vale ressaltar a importância de espaços de discussão coletiva
nos diferentes ambientes de aprendizagem da rede, oportunizando aos sujeitos o
compartilhamento de conhecimentos, práticas e saberes, além de possibilitar reflexões em
grupo sobre sua prática docente.
48
Figura 3 - Módulo 1
O conteúdo do curso, foi organizado em etapas articuladas entre si, contendo, em
cada uma, dois módulos temáticos com textos organizados de forma hipertextual e dialógica,
desafiando o estudante a conhecer e aprofundar alguns pressupostos teóricos da educação à
distância, bem como refletir sobre suas experiências em sintonia com essas discussões. Para a
disponibilização desses conteúdos, a equipe utilizou a interface livro, permitindo ao
participante a liberdade de navegação, a partir de diversos pontos.
Figura 4 - Interface livro
A primeira etapa intitulada Educação à Distância, compreendeu o módulo I:
Educação à distância Uma nova modalidade Educacional? Neste módulo foram
disponibilizados conteúdos relativos ao panorama histórico de EAD, teorias pedagógicas e
concepções de EAD, a questão das políticas públicas, o contexto legislativo educacional, a
colaboração, e a interatividade.
a temática: Aspectos Metodológicos em EAD, iniciou o módulo II com conteúdos
relativos às distâncias e proximidades na Educação, bem como as mídias utilizadas em EAD.
Esta etapa forneceu subsídios para uma discussão mais ampliada sobre os pressupostos da
EAD na sociedade contemporânea. A etapa 2 trouxe como tema o Planejamento e a
elaboração de conteúdos. o módulo 3 a temática foi Planejamento em EAD, e a
49
disponibilização dos seguintes conteúdos: planejamento de atividades, elaboração de
relatórios e a relação entre tutores e a equipe de suporte. O módulo 4 trouxe como foco
principal a Elaboração de conteúdos de aprendizagem em EAD, com conteúdos referentes ao
hipertexto e à relação conteúdo suporte. Este módulo forneceu embasamento teórico para a
elaboração do planejamento do TCC, bem como a elaboração de material didático
hipertextual.
A terceira etapa trouxe a discussão sobre Tutoria, com o módulo 5 tendo como
temática: O tutor em EAD: que sujeito é esse? Neste foram abordados conteúdos relativos a
concepções de tutoria, suas funções e atribuições. Do quadro giz às práticas de ensino online,
efetivamos o início do módulo 6, com discussões pautadas em questões relativas ao
acompanhamento do cursista, aspectos motivacionais e pedagógicos. Dessa forma, esse
módulo refletiu de forma ampla as concepções de docência que permeiam as discussões sobre
EAD no cenário atual.
A quarta e última etapa trouxe como tema geral a Construção do TCC, com base
nos conteúdos de Gestão Educacional. Esses conteúdos, disponibilizados no ambiente,
possibilitaram aos estudantes iniciar o desenvolvimento da proposta de conclusão de curso,
pois apresentaram uma gama de temáticas relativas à gestão escolar. Entretanto, os grupos
tiveram liberdade de pesquisar em outras fontes materiais relativas ao tema. Dessa forma, os
conteúdos disponibilizados no ambiente foram utilizados como pré-textos para disparar as
discussões nos fóruns e chats do curso, sem se tornarem uma camisa de força que impedisse o
acesso a outras pautas. Destaco também a importância de vídeos aula que, em sintonia com os
conteúdos dos livros, facilitaram ainda mais a compreensão das propostas de discussões das
temáticas. Vale ressaltar, que os módulos e vídeos foram sendo disponibilizados no decorrer
do curso, a partir da organização didático-pedagógica da proposta de formação do PROGED.
Cabe destacar que, apesar do planejamento do curso ter sido definido
anteriormente pela equipe docente juntamente com a coordenação, algumas propostas foram
inseridas durante o processo de trabalho, visando atender às demandas dos estudantes. Nessa
dinâmica, tivemos enquetes disponibilizadas pelos docentes nas discussões sobre os horários
de chats, fóruns com tópicos abertos pelos alunos, fóruns com boletins disponibilizados pelos
docentes, agregação de diversos textos pelos estudantes etc. Esse movimento retrata o
potencial do meio digital, ao facultar modificações no desenho do curso, bem como abrir
novas dinâmicas de trabalho.
50
Outro fator relevante em relação ao planejamento e às etapas do curso, diz respeito à
identificação de dois grandes momentos. O primeiro, voltado preferencialmente para a
formação teórica do gestor, envolvendo as discussões nas três primeiras etapas. O segundo,
mais prático, permitindo ao estudante desenvolver uma proposta colaborativa de trabalho no
ambiente de aprendizagem. Apesar dessa organização, não percebi no curso uma total
separação entre teoria e prática, pois, mesmo nas discussões das temáticas, os discentes foram
experienciando as interfaces do ambiente e, na construção do TCC, precisaram recorrer a um
vasto referencial teórico.
Em relação ao trabalho docente desenvolvido no Curso de Tutores da UFBA,
tivemos a participação de quatro professores, com o objetivo de mediar as discussões nos
fóruns e chats, bem como planejar atividades para o curso e orientar os estudantes na
elaboração do TCC. Cada professor ficou responsável pelo acompanhamento de um grupo de
30 alunos. Em cada etapa, foi disponibilizado um fórum e chat específico por grupo, com o
objetivo de discutir as temáticas de cada módulo e promover a interação entre os
participantes. É importante destacar que os fóruns não eram fechados quando os prazos
estipulados pela coordenação iam sendo vencidos, o que facilitou aos sujeitos maior liberdade
de participação. Os alunos que não conseguiam participar dos horários dos chats negociados
com os professores tinham abertura para interagir nos bate-papos dos outros grupos.
É importante ressaltar que a docência vivenciada no curso de tutores da UFBA foi
exercida por quatro professores que partilhavam atividades coletivas via ambiente virtual de
aprendizagem, no qual mediavam o trabalho do seu grupo. Cada grupo vivenciava atividades
consideradas “obrigatórias” com seus colegas, e outras mais livres com todo o grupão. Como
atividades obrigatórias, tínhamos os fóruns temáticos, os chats e o trabalho do TCC, mais
restrito às discussões do grupo, porém abertos aos demais para a observação dos respectivos
debates. Vale ressaltar, que os chats, apesar de serem definidos na proposta inicial como uma
atividade restrita a cada grupo, puderam ser vivenciados com outros professores e colegas do
curso, a partir das necessidades percebidas no processo.
Além dessas atividades consideradas obrigatórias, os cursistas também foram
solicitados a participar do fórum opine para que pudessem postar as impressões e avaliações
de cada módulo. Merece destaque o fato de que, apesar de cada grupo de alunos interagir em
fóruns específicos, relativos às temáticas de discussão do seu grupo, eles podiam acessar os
fóruns dos outros colegas e ler as postagens, contudo, sem contribuir com as discussões.
51
Em relação às atividades avaliativas, a proposta do curso deixa claro que cada aluno
precisa participar do rum e chat específicos do seu grupo em cada etapa, construir
conjuntamente com seus colegas a atividade de TCC e fazer a sua auto-avaliação. Logo, as
estratégias avaliativas de cada professor estavam pautadas nos indicadores de qualidade,
disponíveis no ambiente. O cumprimento de todas as atividades referentes ao curso habilita o
aluno a receber um certificado, que é expedido pela Universidade Federal da Bahia.
2.5 O PERFIL DOS SUJEITOS DA PESQUISA: ENTRE O PESSOAL E O
PROFISSIONAL
O grupo estudado nesta pesquisa foi formado por quatro professores que atuaram no
curso de tutores da UFBA 2007.1. Esses docentes são oriundos de diferentes formações e
campos de conhecimento, sendo que: dois têm formação em Pedagogia, um tem licenciatura
em Letras e outro em História. Em relação aos cursos de pós-graduação voltados para a
atuação em EAD, tivemos um com doutorado, outro com mestrado, um com especialização e
um último cursando especialização na área.
Minha participação nessa investigação foi de total implicação, pois vivenciei todos
os encontros presenciais realizados em Salvador, bem como fui inscrita no curso como
professora tutora, podendo transitar livremente pelas discussões nos fóruns, chats etc. Assim,
discutia com os professores e alunos as temáticas de estudo, e várias vezes assumi o papel de
mediação nos grupos, compreendendo mais de perto a complexidade do trabalho docente nos
AVA. Nesse contexto, abri um fórum de discussão no ambiente de aprendizagem, e coloquei
algumas questões da pesquisa para a discussão com o grupo, em busca de dialogar sobre a
temática dos saberes docentes. Destaco também a minha participação na lista de discussão do
grupo, como fator fundamental para a observação do planejamento do curso e à socialização
dos saberes e dilemas profissionais dos docentes.
Os professores e alunos que participaram da pesquisa tiveram sua identidade
preservada, por isso me refiro a eles utilizando umacodificação, que foi estabelecida a partir
de critérios que é apenas do meu conhecimento. Essa numeração foi utilizada da mesma
forma, tanto nas falas dos docentes nos fóruns, chats, nas entrevistas e listas de discussão,
conforme especificação: F – professor formador; PC – professor colaborador e PP – professor
pesquisador. Na análise da última noção subsunçora,“os dilemas do docente online”,
incorporei também a importante fala de uma das coordenadoras do curso, pois sua inquietação
desafiou os docentes a refletirem sobre a problemática em discussão. Refiro-me a ela como
52
CC – coordenação do curso.
Apresento a seguir um melhor detalhamento da formação desses professores, bem
como algumas de suas singularidades observadas ao longo da pesquisa.
F1 tem 33 anos de idade e formação inicial em Pedagogia. Tem doutorado em
educação, e estudou a Educação online. É professora universitária e atua sete anos como
docente online, tendo como principal foco de trabalho a formação de professores no contexto
da cibercultura. Além da graduação, atua em cursos de formação continuada, extensão e
também em programas de pós-graduação. Participa ativamente de congressos, seminários e
simpósios nessa área, com diversos artigos publicados. Seu trabalho de mediação nos fóruns e
chats me chamou bastante a atenção, pela sua criatividade, consistência teórica nas discussões
com os alunos e, principalmente, por contribuir de forma substancial no desenvolvimento do
curso em discussões com seus pares, compartilhando seus saberes, sua experiência e também
socializando seus dilemas profissionais.
F2 tem 39 anos de idade e formação inicial em letras. Tem especialização em
Informática na Educação e mestrado em Educação com ênfase nas tecnologias digitais e
EAD. Atua no Núcleo de Tecnologia de uma cidade do interior, basicamente se dedicando à
formação de professores, além de ser professora em uma universidade particular. Em relação
à docência na educação online, ela tem quatro anos de experiência. Gosta do que faz e ressalta
que é apaixonada pela educação à distância, desde sua primeira experiência no mestrado.
Pude notar, no desenvolvimento do curso de tutores, a afetividade que a professora tinha para
com seus alunos, desde o primeiro encontro presencial, buscando conhecê-los, e sondar suas
expectativas. Nos fóruns, esse aspecto também foi observado, tratando os alunos de forma
toda especial. Destaco também a competência profissional dessa professora na mediação dos
fóruns e chats e sua constante preocupação com a participação dos alunos. Vale destacar que
ela sempre buscou compartilhar na lista de discussão do grupo os seus dilemas profissionais.
F3 tem 31 anos, é licenciado em História e, além de atuar como professor de história
no ensino fundamental e médio, é especialista em gestão escolar e coordenador pedagógico na
rede municipal. Tem quatro anos de experiência como docente online, e do grupo de
professores ele foi o primeiro a atuar no Curso de Tutores do PROGED. Ele destaca a
importância do trabalho colaborativo entre os professores, no planejamento do curso e nas
discussões sobre a prática pedagógica. Consegue se comunicar de forma simples com os
alunos, e busca sempre problematizar as discussões nos fóruns e chats. Demonstrou, ao longo
do curso, uma forte preocupação com a questão da leitura dos módulos e a participação dos
alunos nos fóruns e chats. Uma característica peculiar ao professor é o seu senso de humor,
53
quebrando protocolos e descontraindo o grupo.
F4 tem 26 anos e é licenciada em Pedagogia, sendo que a docência no PROGED foi
a sua primeira experiência em Educação online. Trabalha na Secretaria de Educação e está
concluindo uma especialização em EAD. Ela demonstrou bastante dificuldade na condução
dos chats, ressaltando na entrevista que se sentia bastante confusa. Como todos os
professores, F4 buscou sempre problematizar as temáticas nos fóruns de discussão, e
incentivar a participação dos alunos. Pude observar que F4 participava pouco da lista de
discussão dos professores do grupo.
54
CONEXÕES DIGITAIS NO CIBERESPAÇO
computador desconectado, projetado para o indivíduo
cartesiano, solipsista, deu lugar ao computador comunitário,
associativo, cooperativo. Assim emerge a cibercultura, trazendo um
enorme desafio para a educação a distância na universidade do
século XXI. (LEMOS, 2002).
55
3 EM BUSCA DAS PRIMEIRAS CONEXÕES... O CENÁRIO DIGITAL E A
CONFIGURAÇÃO NÃO LINEAR DO CIBERESPAÇO
Este capítulo tem como objetivo refletir sobre a configuração da sociedade
contemporânea e abordar sobre o papel das tecnologias nesse contexto, a partir de uma breve
análise histórica sobre as três revoluções industriais que marcaram a humanidade e a
imbricação da tecnologia e sociedade.
Em seguida, discutirei as características e dinâmicas do contexto digital,
imprescindíveis para o estudo sobre os saberes docentes na cibercultura, na medida em que
esse contexto tem sido utilizado como espaço de várias experiências pedagógicas, a exemplo
dos ambientes virtuais de aprendizagem em práticas pedagógicas presenciais e à distância.
3.1 REFLEXÕES SOBRE A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA
Nas sociedades contemporâneas, as rápidas transformações no mundo do trabalho, o
avanço tecnológico que configura a sociedade em rede e os meios de informação e
comunicação vêm incidindo fortemente na educação, aumentando os desafios para torná-la
uma conquista democrática efetiva. Essa nova realidade mundial tem levado estudiosos a
questionar sobre o papel da escola ante as transformações econômicas, políticas, sociais e
culturais do mundo atual.
Esse contexto de mudanças advém de um processo acelerado de transformações
técnico-científicas. Acredita-se, por um lado, que a tecnologia assumiu o papel da força
produtiva dos trabalhadores, com o aumento da produção em contrapartida com a diminuição
considerável do trabalho humano. Por outro, não se pode esquecer que esse fenômeno é o
resultado concreto da ação humana, logo, resultante de interesses econômicos conflitantes do
capitalismo. Dessa forma, apesar das divergências sobre a compreensão desta realidade, não
se pode negar a revolução da técnica e da ciência e, conseqüentemente, as implicações nos
diferentes segmentos sociais.
Nesse contexto, o dilema do determinismo tecnológico é, provavelmente, um
problema infundado, conforme sinaliza Castells (2005, p.43): “a tecnologia é a sociedade, e a
sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas ferramentas tecnológicas”.
Destarte, as tecnologias são produto de uma sociedade e de uma cultura que cotidianamente
busca inventar, produzir e criar, de formas diferentes, as técnicas.
56
Lévy (1999), em sintonia com Castells (2005), discute que a técnica é produzida
dentro de uma cultura e uma sociedade encontra-se condicionada por suas técnicas. O autor
fala em condicionamento e não em determinismo, ao expressar a idéia de que as tecnologias
abrem muitas possibilidades que não poderiam ser imaginadas sem a sua presença. Assim,
não existe uma técnica melhor do que a outra, e sim contextos sociais diversificados com
propostas diferentes relativas ao seu uso. Portanto, é preciso superar essa visão reducionista
de determinismo tecnológico, com base na compreensão de que na perspectiva do
condicionamento se abrem infinitas possibilidades aos contextos socioculturais, o que não
quer dizer que todas estas brechas são potencialmente aproveitadas. O desenvolvimento da
informática pessoal e, conseqüentemente, o uso da internet, é um exemplo claro desse debate.
Não se planejou de forma determinista as suas futuras implicações; estas foram
paulatinamente sendo apropriadas e ressignificadas a partir das necessidades sociais.
As relações entre tecnologia e sociedade apontam para o fato de que o Estado tem
fundamental importância neste processo. Segundo Castells (2005), o Estado tem um papel
decisivo, seja na promoção ou interrupção do desenvolvimento e inovação tecnológica, à
medida que, dentro de um determinado contexto social, este organiza as forças sociais
dominantes que irão definir ações ou não concernentes à modernização tecnológica.
A China, no final do século XIV, encontrava-se potencialmente preparada para
iniciar seu processo de industrialização, pois contava com uma série de inventos importantes,
tais como a energia hídrica, o arado de ferro, a invenção da bússola e, principalmente, a
invenção do papel e da imprensa. Entretanto, as inovações tecnológicas iam de encontro à
relação harmoniosa entre o homem e a natureza, fundamentos imprescindíveis na cultura
chinesa. Por outro lado, estas inovações ficaram centralizadas na mão do Estado durante
séculos, o qual não demonstrou interesse pelo desenvolvimento tecnológico.
A partir do exemplo da China, pode-se perceber que quando o Estado não toma como
foco de ação o desenvolvimento tecnológico, “um modelo estatista de inovação leva à
estagnação por causa da esterilização da energia inovadora autônoma da sociedade para criar
e aplicar tecnologia”. (CASTELLS, 2005, p. 47). Percebe-se, nessa análise, que o Estado tem
papel fundamental nos diversos contextos sociais, seja promovendo ou mesmo impedindo o
desenvolvimento tecnológico do seu país. Ao contrário da China, o Japão, sob orientação
estatal, e com seu histórico de desenvolvimento na área da engenharia, avança rumo à sua
revolução informacional, no final do século XX.
57
Dessa forma, para se compreender de forma mais contextualizada o cenário
tecnológico contemporâneo, é importante analisar algumas características das três revoluções
industriais, buscando entender a imbricação entre tecnologia e sociedade e seus
desdobramentos na atualidade.
Historicamente, foram três as Revoluções Científicas e Tecnológicas da
Modernidade. A primeira advém da segunda metade do século XVIII, na Inglaterra,
completamente vinculada ao processo de industrialização fabril, em substituição da produção
artesanal. A máquina a vapor pode ser considerada a vedete dessa revolução, pois até então os
trabalhadores utilizavam sua força muscular ou a energia animal. Outra característica bastante
relevante nesta época foi o surgimento do trabalho em assalariado, bem como a imposição do
tempo, a disciplina e a fiscalização dos trabalhadores.
Com o surgimento do aço, da energia elétrica e o desenvolvimento dos meios de
comunicação e de transportes, na segunda metade do século XIX, tem início a segunda
revolução científica e tecnológica. O destaque, neste cenário, é para o potencial da energia
elétrica, responsável pelo desenvolvimento de outras esferas, a exemplo do telégrafo,
transportes, iluminação, além do desenvolvimento dos motores elétricos. Essa revolução
caracteriza-se também por uma maior dependência dos conhecimentos científicos e pela
centralização econômica em países como os Estados Unidos da América (EUA) e a
Alemanha. Observa-se, nesse período, a influência de Taylor na discussão sobre
administração científica do trabalho, ocasionando assim uma fragmentação, hierarquização,
individualização e especialização de tarefas. Daí o surgimento de escolas industriais e
profissionalizantes e a divisão técnica do trabalho.
Contribuindo para a caracterização desse cenário, Lemos (2002) denomina esse
período de fase do confronto. Para esse autor, essa fase reflete o contexto da modernidade e
demonstra a supremacia da razão em relação às questões materiais, a fragmentação entre
mente e corpo, a substituição da religião pela ciência com destaque para a tecnologia, que
coloca o homem como “um deus na administração racional do mundo” (LEMOS, 2002, p.52).
De acordo com esses fundamentos, percebe-se o caráter mecanicista da ciência, acreditando-
se que a natureza é uma máquina que pode ser montada e desmontada para a criação de leis
universais a serem aplicadas em qualquer contexto. Perde-se, nesse modelo, a dimensão de
interdependência entre os fenômenos, pois se acredita que os seres humanos estão situados
acima ou fora da natureza.
58
Não se pode perder de vista, que essas revoluções mudaram, de maneira decisiva, a
localização de riqueza e poder no mundo, e trouxeram uma avalanche de novos produtos de
aplicações tecnológicas para a sociedade. Esse avanço tecnológico trouxe também, segundo
Castells (2005), ambições e conflitos imperialistas. Assim, os países que lideraram esse novo
sistema tecnológico, a exemplo da Inglaterra e dos EUA, tiveram grande supremacia sobre as
nações que ficaram à margem dessa segunda revolução, em virtude do mecanismo de
acumulação de riquezas inerente ao capitalismo moderno. Esses países passaram a concorrer
economicamente em busca de novos mercados, solucionando assim seus problemas de
excedente de produção e controle das fontes fornecedoras de matéria-prima.
Ao corroborar com a análise do desenvolvimento tecnológico, Lemos (2002) elenca
a telepresença, os mundos virtuais, o tempo instantâneo, a abolição do espaço e do tempo
como categorias que vêm caracterizar a terceira revolução industrial ou fase da ubiqüidade
pós-moderna ou mesmo fase da informação e comunicação digital. Outros autores
caracterizam essa fase como revolução informacional, revolução científica e técnica,
revolução informática, era digital, a sociedade técnico-informacional.
Destaco também a contribuição de Bell (1976) citado por Bonilla (2005) que ressalta
algumas características da sociedade pós-industrial, entre as quais cito: 1) troca de uma
economia produtora de mercadorias para outra produtora de serviços (comércio, finanças,
transporte, saúde, recreação, pesquisa, educação, governo); 2) proeminência das classes
profissionais ou técnicas, uma vez que as tarefas requerem formação universitária; 3)
centralidade do conhecimento teórico como fonte de inovação e formulação política da
sociedade; 4) controle da tecnologia e das contribuições tecnológicas; 5) criação de uma nova
“tecnologia intelectual”, com o objetivo de substituir os juízos por algoritmos.
Como se pode perceber na caracterização desses autores, a informação passa a
ocupar papel central na sociedade, o que requer um processo de formação permanente em um
cenário de avanço das tecnologias que, por seu lado, demanda um profissional muito mais
capacitado. Assim, com o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação
(TIC), as dinâmicas de aprendizagem também se ampliam, pois estas promovem a conexão
entre diferentes espaços. Logo, a escola não pode mais ser considerada como o único local de
aquisição do conhecimento.
Essa revolução traz também em sua base o desenvolvimento da cibernética, da
microbiologia, da engenharia genética, da informática, das fibras óticas, dos chips, além do
aperfeiçoamento dos meios de transporte e comunicação. No entanto, a principal característica
da terceira revolução é, sem dúvida, as transformações técnico-científicas caracterizadas pelo
59
desenvolvimento da microeletrônica, dos computadores e das telecomunicações. Isso tem
trazido para os professores, um grande desafio: a construção de novos saberes em sintonia
com essas transformações.
Nesse contexto de inovações, vivenciamos os avanços da microeletrônica no nosso
dia-a-dia, utilizando produtos e serviços tais como: agendas eletrônicas, calculadoras,
geladeiras, TV, vídeo, DVD, auto-atendimento nos bancos, jogos eletrônicos etc. Não resta
dúvida que a revolução da tecnologia da informação foi fundamental para a implementação de
um importante processo de reestruturação do sistema capitalista, a partir da década de 80.
Castells (2005, p. 39) apresenta algumas características advindas desse processo, tais como:
maior flexibilidade de gerenciamento; descentralização das empresas e sua organização em
redes; considerável fortalecimento do papel do capital vil-à-vis; trabalho com o declínio
concomitante da influência dos trabalhadores; individualização e diversificação cada vez
maiores das relações de trabalho; incorporação maciça das mulheres na força de trabalho
remunerada; intervenção estatal para desregular os mercados de forma seletiva e desfazer o
estado de bem-estar social.
Para se manter de modo hegemônico, o capitalismo se reestrutura reorganizando suas
formas de produção e de consumo, eliminando as fronteiras comerciais, buscando integrar
mundialmente a economia. Nesta lógica, o principal objetivo é fortalecer os países com maior
poder econômico e submeter os países pobres como consumidores.
Castells (2005) afirma que a tecnologia da informação foi para essa revolução o que
o motor a vapor e a energia elétrica foram para as revoluções anteriores. Acrescenta ainda que
a grande diferença dessa revolução para as demais não é o acumulo de informações e sim a
aplicação dessas informações para a geração de novos conhecimentos. É nesse contexto de
um grande volume de informações, aliado ao surgimento de novas formas de comunicação,
que o cenário contemporâneo vem se afirmando.
Algumas características importantes da revolução informacional são pontuadas por
Castells (2005, p.108 e 109), ao enfocar esse cenário: a informação como matéria-prima, ou
seja, os conhecimentos e informações podem ser aplicados na geração de novos
conhecimentos; A penetrabilidade dos efeitos das novas tecnologias, pois apesar de não
sermos determinados por elas, toda a nossa vivência, tanto individual como coletiva, é
permeada pelas mesmas; lógica das redes em qualquer sistema ou conjunto de relações,
implementadas graças às tecnologias da informação e comunicação; flexibilidade,
caracterizada pela capacidade de reconfiguração em uma sociedade que muda
constantemente; convergência de tecnologias, em que as trajetórias tecnológicas antigas ficam
60
literalmente impossíveis de serem distinguidas em separado. Dessa forma, o cenário
contemporâneo é caracterizado pela velocidade em que essas transformações vão se inserindo
na nossa vida cotidiana, reconfigurando práticas e promovendo transformações nos âmbitos
sociais, políticos, econômicos e culturais. É importante destacar que esse processo de
reconfiguração não elimina ou substitui os fenômenos antecedentes, e sim abrem novas
possibilidades que serão ou não aproveitadas.
Sem dúvida, o grande ícone dessa revolução é o computador com sua infinita
potencialidade de uso e autoria, através da internet. De início, a rede foi utilizada por
cientistas e pesquisadores dos Estados Unidos e pelo Departamento de Defesa norte-
americano no final dos anos 60. Paulatinamente, a conexão em rede foi crescendo e passou a
ser utilizada por universidades, empresas, governos e indivíduos. Cabe a ressalva de que o
movimento da contracultura, ensejada por jovens entusiastas dos computadores, os quais
tinham como objetivo a democratização da tecnologia, foi fundamental no desenvolvimento
da internet, pois se buscava desenvolver a tecnologia e socializá-la gratuitamente,
possibilitando assim maior amplitude de comunicação.
A descoberta do modem, que permitiu a transferência direta de arquivos em
computadores, foi fruto desse movimento. Se na década de 70 estes aparelhos eram bastante
lentos, volumosos e caros, em meados dos anos 90 sua capacidade de transmissão passou a
superar o de uma linha telefônica do cidadão comum. Nesse ínterim, ganha relevo também os
BBS
14
, fóruns eletrônicos com o uso do PC
15
e linhas telefônicas, facilitando assim uma
comunicação mais interativa.
Silva (2002), ao destacar a importância do computador na sociedade contemporânea,
argumenta que, se por um lado este artefato caracteriza-se pela sua centralização, à medida
que tudo tende a passar por este por meio de sua configuração em rede, por outro, apresenta
um caráter extremamente descentralizador, a partir da configuração do hipertexto. Esse
caráter móvel e hipertextual que possibilita a utilização de janelas que se abrem e fecham traz
a possibilidade, a partir da década de 70, de um formato mais comunicacional.
14
Um BBS (acrónimo inglês de bulletin board system) é um sistema informático, um software, que permite a
ligação (conexão) via telefone a um sistema, através do seu computador, e interagir com ele, tal como hoje se faz
com a internet
.
15
A expressão "computador pessoal" é geralmente abreviada para a sigla PC, cujo significado em inglês é
"personal computer".
61
em 1990 a internet conseguiu difundir-se a partir da WWW (World Wide Web)
que oferecia aos usuários a busca de informações na rede de forma mais facilitada. Essa
acessibilidade às informações é geralmente disponibilizada por universidades, empresas e
usuários, promovendo assim a interligação de milhares de pessoas e, conseqüentemente, de
informações, tornando a humanidade uma “aldeia global”. Segundo Libâneo (2003) são
características da Revolução Informacional:
a) o surgimento de uma nova linguagem comunicacional, uma vez que
circulam e se tornam comuns termos como realidade virtual, ciberespaço,
hipermídia, correio eletrônico e outros, expressando novas realidades e
possibilidades informacionais;
b) os diferentes mecanismos de informação digital, de acesso à informação e
de pesquisas e ligações entre matérias sempre atualizadas e qualificadas;
c) as novas formas de entretenimento e de educação (TV educativa, à
distância, vídeos, softwares etc.);
d) o acúmulo de informações e as infindáveis condições de armazenamento.
(LIBÂNEO, 2003, p.68).
Esse cenário de mudanças vem desafiando as instituições educativas e, em especial,
os profissionais da educação a um constante processo de atualização profissional,
principalmente no que diz respeito à utilização das tecnologias da informação e comunicação
em propostas educacionais. A inserção dos educadores nessa discussão requer uma análise
crítica das propostas formativas delineadas pelas instituições, evitando-se um simples
enquadramento na dinâmica imposta pelo sistema. Isso significa reconhecer novos desafios
para a educação e, particularmente, para a formação de professores que precisa se pautar em
projetos de formação, onde a dinâmica comunicacional lhes possibilite produzir conteúdos,
partilhar experiências, enviar informação, manipular mensagens e vivenciar plenamente a
dinâmica digital.
3.2 O MEIO DIGITAL E SUA INFRA-ESTRUTURA TÉCNICA
Toda essa potencialidade comunicacional oportunizada pela revolução
informacional, não seria possível sem a mudança da base material da informação. A
digitalização nos possibilitou uma melhor difusão da mensagem, por seu formato ser
estruturado agora em linguagem binária 0 e 1. Isso fez com que as mensagens pudessem ser
manipuladas e modificadas, possibilitando assim uma comunicação mais interativa.
Dessa forma, faz-se necessário uma análise mais aprofundada das características do
meio digital, tanto física como social, para uma melhor compreensão de suas potencialidades
e lacunas na construção de uma comunicação mais interativa na cibercultura. Nesse sentido, o
62
estudo sobre a digitalização da informação, é um aspecto fundamental neste trabalho, pois o
desenvolvimento de propostas pedagógicas, neste novo espaço, requer a compreensão de
outra lógica para lidar com a informação.
O sistema digital, portanto, caracteriza-se principalmente por ser traduzido em
números. Apresenta também um caráter descontínuo, arquivando e processando informações
num sistema binário de 0 e 1. “Um bit não tem cor, tamanho ou peso e é capaz de viajar à
velocidade da luz. Ele é o menor elemento atômico no DNA da informação. É um estado,
ligado ou desligado, verdadeiro ou falso, para cima ou para baixo, dentro ou fora, preto ou
branco”, revela Negroponte (1995, p. 19). Nesse sentido, o processo de digitalização requer a
extração de amostras colhidas em intervalos curtos, que possibilitam a obtenção de uma
replica perfeita do sinal. Tomando como exemplo o som, os intervalos entre as amostras
apresentam-se separadas por pequenas frações de tempo que não nos propiciam a percepção
de sons distintos, fazendo-nos ouvir como se fossem sons contínuos.
Para Lévy (1999), a digitalização agrega principalmente a organização, o
armazenamento e a distribuição da informação em um contexto que se expande de forma cada
vez mais veloz. A organização das informações é executada pelos processadores
16
responsáveis pela codificação através de cálculos aritméticos e lógicos sobre os dados. Após a
codificação, as informações são armazenadas em suportes diversos como os cartões de chips,
discos rígidos etc.
Observa-se, a cada ano, maior desenvolvimento das memórias e, por conseguinte,
maior potencial de armazenamento, bem como maior rapidez de acesso e confiabilidade. Uma
vez armazenada, a informação utiliza-se de diversos suportes para a sua disseminação, como
discos, disquetes e a conexão direta. Esse sistema possibilita que a mensagem seja, na maioria
das vezes, transmitida e copiada indefinidamente, sem perda da informação. Sobre esta
questão Lévy esclarece:
A informação digitalizada pode ser processada automaticamente, com um
grande grau de precisão quase absoluto, muito rapidamente e em grande
escala quantitativa. Nenhum outro processo, a não ser o processo digital,
reúne, ao mesmo tempo, essas quatro qualidades. A digitalização permite o
controle das informações e das mensagens “bit a bit”, número binário a
número binário, e isso na velocidade de cálculo dos computadores. (LÉVY,
1999, p. 52).
16
Conhecidos também como órgãos de tratamento da informação, que executam cálculos a grande velocidade de
forma
repetitiva, a exemplo dos chips. (LÉVY, 1999, p.33)
63
Toda essa precisão do digital, permitindo que a informação seja tratada de forma
eficiente e complexa, é fruto do processo de codificação numérica que possibilita a
manipulação das informações de forma bastante rápida e fácil, graças ao potencial dos
computadores, os quais são responsáveis pela realização do processamento de informações.
Podemos, dessa forma, digitalizar imagem, som ou qualquer outra informação que possa ser
medida. Isso traz novos desafios à ação docente na contemporaneidade.
3.3 INFORMAÇÃO DISCRETA
No meio informacional, o digital é conhecido como sinônimo de discreto, pois as
atividades realizadas neste meio possibilitam distinguir cada elemento constituinte desses
dados ou ações. Por outro lado, o meio analógico caracteriza-se por ser contínuo, ou seja, não
é possível identificar os elementos um a um e sim a partir de uma visão do todo. Para
compreender melhor a diferença entre o discreto e o contínuo, cabe aqui recorrer à metáfora
utilizada por Scheinerman (2003) citado por Moura (2004):
A diferença é perfeitamente ilustrada pelos relógios de pulso. A matemática
contínua corresponde aos relógios analógicos - o tipo que separa os ponteiros
das horas, minutos, segundos. Os ponteiros se movem suavemente ao longo
do tempo. Do ponto de vista de um relógio analógico, entre 12:02 pm e
12:03 pm um mero infinito de diferentes tempos possíveis, na medida
em que o ponteiro dos segundos percorre o mostrador. No entanto, a
matemática discreta é comparável a um relógio digital, em que há apenas um
número finito possível de tempos diferentes entre 12:02 pm e 12:03 pm. Um
relógio digital não reconhece frações de segundo! Não há tempo entre 12:02:
03 e 12:03:04. O relógio salta de um instante para o próximo. (p. 7)
Assim, o digital ou discreto assume um conjunto predeterminado de valores, dentro
de certo intervalo ou campo discreto, como o observado no exemplo do relógio digital. O
sistema analógico, pelo contrário, caracteriza-se por ser indiscriminado e incontável, estando
relacionado a tudo aquilo que pode ser tratado por analogia ou comparação, assumindo, dessa
forma, todos os valores intermediários e partições, ou seja, um conjunto infinito de valores,
mesmo dentro de certo intervalo.
No contexto informacional, podemos perceber as características do discreto ainda
através, por exemplo, de um texto digitalizado: é possível mudar a fonte da letra, a cor, contar
os caracteres, levantar palavras repetidas, localizar determinadas palavras de forma ágil e
rápida. Essas ações são possíveis, porque as informações são codificadas pelos
computadores de forma simbólica e numérica, podendo ser posteriormente registradas,
tratadas, difundidas e manipuladas.
64
Os mbolos utilizados na comunicação digital, diferentemente dos índices e ícones,
são signos arbitrários, tais como o simbolismo matemático e muitos sistemas lingüísticos.
Pierce, citado por Tenório (2003, p.48), apresenta a tri-partição dos signos buscando
distinguir a comunicação analógica da digital. De acordo com o autor, nos índices não se
percebe ainda uma ruptura entre significante e significado, pois os mesmos retratam sempre
uma manifestação direta da coisa ou fenômeno. As marcas de nossos pés na areia demonstram
esta interligação e a ausência do corte semiótico.
Em ralação aos ícones, o corte semiótico é parcial, pois a relação com a
representação se por analogia, substituindo-se um objeto por algo semelhante. A fotografia
e a escultura retratam este fenômeno, pois há representação por algo análogo. Em relação aos
símbolos, acontece algo diferente, pois os mesmos não operam por analogia e sim distinção.
Esse corte semiótico é o que faz com que os símbolos sejam considerados arbitrários e
discretos, operando sempre por exclusão, por oposição binária, alterando o estado interno em
ligado e desligado (0 ou 1). A palavra rosa não tem perfume de “rosas”, ou qualquer outra
característica destas. O caráter simbólico, nesse contexto, passa a depender de um código que
ordena as ligações e permutações de sua cadeia seqüencial. Assim, os índices e ícones são
signos da comunicação analógica, enquanto os símbolos são signos da comunicação digital.
Para compreender melhor esse processo de digitalização, Couchot (1993) refere
como a imagem numérica modificou os modelos de representação. O autor afirma que, sem o
desenvolvimento dos processos analíticos, não teríamos a possibilidade de decomposição da
imagem. Três categorias são apresentadas por Couchot, de forma a exemplificar a passagem
da imagem analógica para as imagens digitais.
Uma primeira categoria é caracterizada como imagens analógicas do tipo óptico-
químico, na qual o cinema e a fotografia se destacam utilizando a tecnologia da câmera
escura. A reprodução da imagem é conseguida através da fixação, por meio de reações com
substâncias químicas.
a imagem óptico-eletrônica produz a fixação da imagem através de processos
eletromagnéticos, a exemplo da TV e do vídeo. Apesar do avanço em relação ao movimento e
à possibilidade de edição, o princípio de geração da imagem é o mesmo do cinema e da
fotografia, apresentando-se também de forma contínua e indeterminada.
65
Dando uma guinada nesse processo, desponta a criação da imagem por meio da
infografia
17
, temos a ruptura com o princípio da mara escura e a instauração da uma gica
numérica, que vai possibilitar o processamento da imagem, numa linguagem informática no
computador. É esse potencial do digital que nos possibilita fazer modificações nos textos e
nas imagens, introduzindo novas formas de trabalhar o objeto nesse meio, modificando a sua
recepção. Esse cenário de mudanças, tendo como foco a linguagem numérica, vem desafiando
a construção de propostas educativas no ciberespaço, que precisam entrar em sintonia com o
potencial do meio digital, abrindo possibilidades de manipulação e adentramento na
mensagem, que se torna agora um mundo cercado pelo dinamismo das constantes
transformações.
Portanto, o advento do computador possibilitou o domínio sobre o ponto da imagem
e, conseqüentemente, o tratamento numérico da informação. Assim, a imagem passa a ser
devidamente ordenada, pois o pixel permite a passagem da imagem ao número e vice-versa.
“O pixel é a expressão visual, materializada na tela, de um cálculo efetuado pelo computador,
conforme as instruções de um programa”, refere Couchot (1993, p. 42). Dessa forma, a lógica
figurativa que estabelecia no mesmo plano o sujeito, o objeto e a imagem, não trabalha mais
com a representação e sim com a simulação. Esse processo acontece, porque não se tem mais
uma relação direta entre um ponto da unidade ótica e um ponto do objeto real. Diferentemente
da lógica figurativa, o que preexiste ao pixel não é uma imagem e sim um programa que tem a
função de calcular. Logo, não se tem mais uma representação do real e sim uma simulação,
porque a imagem separa-se e liberta-se do real. Sobre a imbricação sujeito, objeto e imagem
nesse novo cenário, Couchot esclarece:
A topologia do sujeito, da imagem e do objeto fica abalada: as fronteiras
entre esses três atores da Representação se esbatem. Eles se desalinham, se
interpenetram, se hibridizam. A imagem torna-se imagem-objeto, mas
também imagem-linguagem, vai e vem entre programa e tela, entre as
memórias e o centro de cálculo, os terminais; torna-se imagem-sujeito, pois
reage interativamente ao nosso contato, mesmo ao nosso olhar: ela também
os olha. O sujeito não mais afronta o objeto em sua resistência de realidade,
penetra-o em sua transparência virtual, como entra no próprio interior da
imagem. (COUCHOT, 1993 p. 42).
De forma correlata, Lemos (2003b), ao discutir sobre a relação entre imagem e
natureza, nesse cenário digital, afirma que a natureza é substituída por um simulacro. Dessa
forma, o foco centra-se agora no modelo do objeto, contrapondo-se aos processos de produção
de imagem da fotografia e da televisão que se baseavam na representação concreta do objeto.
17
Para Plaza (2003) a infografia é a criação de imagens com a colaboração da informática.
66
No entanto, o autor alerta que, apesar dos objetos perderem o vínculo com a
natureza, e serem concebidos agora como um programa, isso não os tornam menos
importantes, pois os modelos criados para serem digitalizados precisam de referências
anteriores que são os objetos originários.
Dessa forma, o contexto digital apresenta algumas características peculiares
destacadas por Vaz (2006), quando se refere às facilidades no trato da informação digital.
Uma primeira, fundamental, é poder ser manipulável, possibilitando assim a sua
reformulação de forma livre. Este aspecto do digital facilita a manipulação de som, imagem e
textos e possibilita, principalmente, adentrar na mensagem. Essa possibilidade de
transformação torna-se quase infinita e muito mais rápida. Outra característica importante é
que a informação pode ser passível de trabalhar em rede. Sob esse prisma, mesmo as
pessoas estando dispersas geograficamente, elas podem partilhar de uma mesma informação
de forma muito mais econômica, pois a informação transformada em bits facilita a
transmissão de dados. A densidade da informação digital traz a facilidade de poder
armazenar informações em pequenos espaços físicos. Um exemplo prático é o CD–ROM
(Disco Compacto - Memória Apenas de Leitura), uma mídia que pode armazenar qualquer
tipo de conteúdo, desde dados genéricos, vídeo e áudio, ou mesmo conteúdo misto. A
informação digital é comprimível, pois é possível armazenar mais informações no mesmo
espaço físico, podendo ser descomprimida a partir da solicitação do usuário. Este aspecto é de
suma importância no contexto digital, porquanto se refere à largura da banda, que é
responsável pela transferência de um local para outro. Como última característica, o autor
afirma que a informação é imparcial, porque para o computador o importante é que o código
binário seja compreensível e as informações sejam codificadas.
Percebe-se, a partir das características apresentadas pelo autor, que o contexto digital
difere de outros meios por apresentar um caráter plástico e não linear das informações.
Enquanto que, num livro impresso, os parágrafos, as frases, páginas e os capítulos seguem
uma ordem estabelecida pelo autor e pela própria configuração física e seqüencial do suporte
escrito, a aleatoriedade da leitura está restrita sempre a três dimensões. no meio digital, as
informações extrapolam a tridimensionalidade, característica da escrita, e apresentam-se como
uma rede multidimensional de indicadores apontando para novas formulações, a partir das
ações do sujeito. Assim, o processo de digitalização “ao texto um caráter móvel,
caleidoscópio, que apresenta sua faceta, gira, dobra-se e desdobra-se à vontade frente ao
leitor” (LÉVY, 1999, p. 56).
67
Em relação às imagens, existe também a possibilidade de redimensioná-las com total
liberdade. Um exemplo disso são os editores que vêm sendo utilizados no processamento de
imagens e fotografias. É possível, através do programa, transformar fotos, alterar cores,
remover partes indesejadas das imagens e converter arquivos entre diferentes formatos de
imagem digital. No entanto, todo esse potencial do digital vem sendo subutilizado em
propostas educativas, cujo intuito é apenas modernizar as ações pedagógicas e atrair cada vez
mais alunos. É o caso de propostas pedagógicas em ambientes virtuais de aprendizagem com
a disponibilização de imagem, arranjos hipertextuais e interfaces como fóruns, chats,
midiateca, apenas dando um tom contemporâneo ao debate através das tecnologias digitais,
porém na sua concepção não permitem a liberdade de expressão, experimentação e
colaboração entre os sujeitos envolvidos no processo.
A acessibilidade à informação e a transferência de arquivos são dois outros aspectos
importantes proporcionados pelo meio digital. Esse potencial abre inúmeras dinâmicas de
trabalho em rede, pois permite partilhar das mesmas informações em contextos geográficos
diferentes. Através de um computador conectado à internet, executamos ações como calcular
e simular, utilizando dados de outro computador situado a quilômetros de distância. Com uma
taxa de transmissão adequada e usando um software compatível, podemos acessar o banco
dados de computadores distantes com muita rapidez.
Não se faz mais necessário o armazenamento de informações em nossas máquinas,
pois estas estão disponíveis na rede. Dessa forma, além de utilizarmos os aplicativos
disponíveis, precisamos contribuir com a alimentação dessa memória coletiva. Um exemplo
disso é o grande avanço das comunidades virtuais na efetivação de projetos comuns, de forma
cooperativa, compartilhando informações e construindo conhecimento, mesmo encontrando-
se distantes fisicamente. A transferência de arquivos também desempenha um papel
importante nesse processo, pois permite que possamos copiar informações da memória de um
computador para o outro (LÉVY, 1999).
Essa partilha de informações, intensificada pelo meio digital, potencializa as ações na
rede, abrindo infinitas formas de trabalho e ampliando seu uso enquanto produção humana. A
rede, na perspectiva de Castells (2005, p. 556), pode ser compreendida como “um conjunto de
nós interconectados”. As redes se caracterizam também por serem abertas e terem capacidade
de estar sempre se expandindo de forma não linear. Nessa lógica, os centros estão em
constante movimento, evitando assim a formação de estruturas hierárquicas e cristalizadas. A
imersão do sujeito nessas redes pressupõe, diferentemente da dinâmica das mídias de massa,
uma participação efetiva nos diferentes espaços de comunicação, rompendo com uma visão
68
meramente consumista e receptiva da informação, oportunizando assim, aos sujeitos, a
vivência de diversos espaços de interação. Isso traz novos desafios à ação do professor nesse
novo contexto, pois não é mais possível centrar os processos educativos numa perspectiva
individual pautada no binômio ensinar aprender. O novo cenário educacional precisa ser
reconfigurado, considerando-se os processos cooperativos nos quais os sujeitos são co-autores
na configuração de novos saberes.
3.4 CONFIGURAÇÃO HIPERTEXTUAL DO MEIO DIGITAL
Uma característica também peculiar ao meio digital é o seu formato hipertextual. A
dinâmica do hipertexto rompe com narrativas cristalizadas e circulares da oralidade e com a
seqüencialidade da escrita, apresentando-se como um fenômeno dinâmico, aberto e veloz.
Essa possibilidade de interconexão traz característica fundamental do hipertexto digital a
não linearidade.
Em virtude disso, as informações são organizadas e indexadas através de links. Os
links possibilitam a ligação de um a outro. De acordo com Correia e Andrade (1998), o
link é considerado um dos conceitos mais importantes do hipertexto, pois é através dele que
se salta de um ponto a outro no documento. Estas ligações podem ser representadas por
palavras, frases, gráficos ou ícones, podendo produzir resultados diferentes, desde a
transferência para um novo tópico, até a execução de um programa de computador.
Além do link, a noção de navegação é fundamental para se compreender o aspecto
não seqüencial do hipertexto digital. Temos a liberdade de navegar de site em site, de um
lugar para o outro, sem precisarmos seguir uma rota direcionada por alguém. Isso possibilita
que façamos leituras em sintonia com as nossas necessidades com um simples click no mouse.
Daí a grande diferença do hipertexto digital para os textos clássicos disponibilizados nos
livros – o seu caráter interativo. Lemos (2002, p.123) afirma que “o ciberespaço é um
hipertexto mundial interativo, onde cada um pode adicionar, retirar e modificar partes dessa
estrutura telemática, como um organismo auto-organizante, um cybionte em curso de
concretização”. Todas estas potencialidades do meio digital dão ao hipertexto um caráter
dinâmico e não linear semelhante a um caleidoscópio.
Com um ou dois cliques, obedecendo por assim dizer ao dedo e ao olho, ele
mostra ao leitor uma de suas faces, depois outra, um certo detalhe ampliado,
uma estrutura complexa, esquematizada. Ele se redobra e desdobra à
vontade, muda de forma, se multiplica, se corta e se cola outra vez de outra
forma. Não é apenas uma rede de microtextos, mas sim um grande metatexto
69
de geometria variável, com gavetas, com dobras. Um parágrafo onde pode
aparecer ou desaparecer sob uma palavra, três capítulos sob uma palavra
desses capítulos, e assim virtualmente sem fim, de fundo falso em fundo
falso (LÉVY, 1993, p. 41).
Sob este aspecto, percebe-se que a configuração digital do hipertexto possibilita uma
forma diferente de recepção de mensagens, textos, e imagens, e a instauração de condições
favoráveis no desenvolvimento de atividades pedagógicas no ciberespaço, por permitir a
construção de diversos percursos interativos e não lineares dos sujeitos envolvidos no
processo. É nesse sentido que a idéia de navegação é fundamental por abrir a perspectiva de
múltiplas itinerâncias, rompendo assim com as seqüências fixas e estáveis.
O hipertexto, então, retrata associações e inter-relações de informações textuais, on-
line (Web) ou off-line (CD-ROM), numa dinâmica complexa proporcionada pelos links. Esse
potencial do hipertexto, advindo do meio digital, se diferencia do suporte escrito pela sua
velocidade e instantaneidade na passagem de um para outro. “Na leitura clássica, por
exemplo, (textos impressos), o leitor se engaja em um processo também hipertextual, que a
leitura é feita por interconexões que remetem para fora de uma ‘linearidade do texto”
(LEMOS, 2002, p.123). Corroboro com Lemos, pois quando estamos imersos no processo de
leitura, fornecemos ao texto informações presentes na nossa memória, buscando uma melhor
compreensão, além de recorrermos às referências do texto buscando estabelecer uma maior
conexão com outras fontes.
Dessa forma, fica claro que a noção de hipertexto e da leitura não linear não é uma
exclusividade do meio digital. A grande diferença está na navegação rápida, na mixagem de
diversas linguagens e, sobretudo, na interatividade proporcionada por esta estrutura
hipertextual. Esse potencial do hipertexto é possibilitado pela especificidade do meio digital
que permite a manipulação e reformulação livre da informação, de forma diversificada,
emergente, plural e viva.
É importante destacar que, antes mesmo da revolução digital, já havia hipertextos.
Citações, notas de rodapé, verbetes e termos em dicionários são exemplos de ligações
contidas em lexias que levam o leitor a outra lexia, permitindo, desta forma, que o leitor crie o
seu próprio caminho de leitura. De acordo com Aquino, fundamentada em Primo, Recuero e
Araújo (2004)
No entanto, a idéia de hipertexto não é de hoje, nem surgiu com o advento da
Internet, ela vem desde os séculos XVI e XVII com as chamadas
marginalias. Estas seriam como índices pessoais, citações de textos,
remissões a outras partes ou outros textos feitas pelos leitores dos livros da
época, anotadas nos cantos das páginas destes e depois transferidas para um
caderno de “lugares comuns”, para que posteriormente pudessem ser
70
consultadas Porém, foi com o advento da revolução digital e com toda a sua
bagagem tecnológica que o hipertexto ganhou novas formas de se
concretizar, sendo produzido em larga escala. (AQUINO, 2006, s/p)
Figura 5- Nós de rede
Fonte: Doyle Graph (Wolfram Mathworld)
Destarte, o hipertexto poderá contribuir de forma significativa para uma concepção
de educação que rompa com um estudo linear, pautando-se agora numa montagem de
conexões não seqüenciais. Esse enfoque traz consigo a idéia de que o ciberespaço se constitui
de diversos centros móveis, que saltam de um a outro, permitindo a construção de diversas
autorias, rompendo com a centralidade única na figura do professor. Lévy (1993) assim define
o hipertexto:
Tecnicamente, um hipertexto é um conjunto de nós ligados por conexões. Os
nós podem ser palavras, páginas, imagens gráficos, ou partes de gráficos,
seqüências sonoras, documentos complexos que podem eles mesmos ser
hipertextos. Os itens de informação não são ligados linearmente, como em
uma corda com nós, mas cada um deles, ou a maioria, estende suas conexões
em estrela, de modo reticular. Navegar em um hipertexto significa, portanto,
desenhar um percurso em uma rede que pode ser tão complicada quanto
possível. Porque cada nó, por sua vez, pode conter uma rede inteira (LÉVY,
1993, p. 33).
O hipertexto digital possibilita operar com diversos caminhos e fazer diversas
leituras, contrapondo-se a uma proposta de educação hierarquizada e linear. Lévy (1993, p.25-
26) caracteriza-o em seis princípios: (1) Princípio da metamorfose, onde a rede está em
constante mudança; esse caráter de abertura proporciona movimento e auto-organização aos
sujeitos envolvidos nessa dinâmica; (2) Princípio da heterogeneidade caracterizado pela
convergência de diferentes mídias (palavras, sons, textos); (3) Princípio da multiplicidade e
de encaixe das escalas de forma semelhante a um fractal, onde qualquer ou conexão,
quando analisado, pode se revelar como sendo composto por toda uma rede; (4) Princípio da
exterioridade caracterizado pela dependência exterior, tanto para seu crescimento e sua
diminuição como para sua composição e recomposição; (5) Princípio da topologia, no qual o
funcionamento se por vizinhança, proximidade, envolvimento; e (6) Princípio da
mobilidade dos centros partindo do pressuposto de que não existe um centro único e sim
diversos centros móveis. Esses centros se movem de um lugar para outro, através dos nós,
que a leitura é feita por interconexões. Nesse sentido, a prática docente, em particular, precisa
71
superar a narrativa do falar/ditar e a perspectiva linear da informação, mas interagir com as
diferentes vozes e a pluralidade de expressões individuais e coletivas na arquitetura de outro
espaço de participação e aprendizagem.
Dessa forma, o hipertexto se caracteriza por seu formato não-linear de apresentar as
informações, e pela possibilidade de integração de uma linguagem audiovisual, com sons,
textos e imagens, potencializando caminhos originais de navegação hipertextual, onde cada
sujeito se torna responsável pela sua itinerância.
3.5 INTERATIVIDADE
A linguagem digital proporcionada pelas tecnologias da informação e comunicação,
caracterizadas principalmente pela plasticidade, flexibilidade e rapidez dos bits, possibilita
maior interatividade nos processos comunicacionais, o que muda consideravelmente as
práticas docentes no ciberespaço. Esta se constitui num dos fundamentos da cibercultura a
possibilidade de intervenção e participação na mensagem.
Assim, a interatividade é a palavra de ordem na sociedade, onde tudo é
comercializado como interativo, desde o tênis até os aparelhos eletrodomésticos. Essa
banalização do termo interatividade está pautada na promessa, por parte do usuário, de algum
tipo de intervenção ou participação nos acontecimentos. Sfez (1994, apud PRIMO, 2007)
afirma que a banalização do termo interatividade extrapola o âmbito econômico e invade o
mercado teórico, desde os discursos pautados no cenário da engenharia dos sistemas, até
mesmo no âmbito da sociologia, seduzidos pelo encantamento das tecnologias da informação
e comunicação. Entretanto, apesar de toda essa banalização, a questão da interatividade está
diretamente associada ao modelo de comunicação que emerge na década de 70, com a
popularização da informática e a transição da lógica da distribuição, para a lógica da
comunicação (SILVA, 2002).
A internet se destaca como a grande matriz desse cenário, por apresentar o canal de
comunicação aberto e possibilitar uma efetiva participação na mensagem, seja através dos
jogos eletrônicos, mensageiros instantâneos, televisão interativa, cursos à distância etc. Esse
potencial interativo da rede vem contribuindo com inúmeras propostas de educação à
distância e desafiando os docentes a pensarem em diferentes estratégias de trabalho na
formação de professores.
72
Entretanto, existem várias concepções do termo interatividade, desde abordagens
centradas nos fluxos de emissão e recebimento, passando pela ão dialógica homem-
máquina, relação mensagem-meio, até uma visão mais ampliada que remete à fusão emissão-
recepção que extrapola o meio digital.
Lemos (2002) atrela o conceito de interatividade aos meios digitais, ao afirmar que,
diferentemente dos meios analógicos caracterizados pelos media tradicionais, a interação
técnica se diferencia pelo seu cunho eletrônico digital. Dessa forma, o autor centra a discussão
na relação dialógica entre o homem e os artefatos tecnológicos. Portanto, a interação homem-
técnica é uma atividade tecno-social que sempre esteve presente na civilização humana.
A tecnologia é, e sempre foi, inerente ao social. Utilizada no seu sentido
mais amplo, ela é constitutiva do homem e de toda vida em sociedade.
Interação homem-tecnologia é uma atividade tecno-social presente em todas
as etapas da civilização. O que vemos hoje com as tecnologias do digital,
não é a criação da interatividade propriamente dita, mas de processos
baseados em manipulação de informações binárias. (LEMOS, 2002, p. 112).
Os diversos veis de interação técnica são apresentados por Lemos (2002, p.113-
114), no percurso tecnológico da televisão, procurando demonstrar a evolução do suporte
técnico analógico-mecânico ao eletrônico-digital.
Nível 0 estágio em que a televisão expõe imagens em preto e branco, dispõe de um
ou dois canais e se restringe à ação de ligar e desligar o aparelho;
Nível 1 com a utilização do controle remoto possibilita ao telespectador zappear,
isto é, navegar por diversos canais; percebe-se uma maior autonomia na escolha dos
programas;
Nível 2 a possibilidade de utilização de equipamentos como o vídeo, câmeras
portáteis, permite ao telespectador a apropriação do objeto TV e certa liberdade, na medida
em que ele pode gravar e assistir o programa de acordo com a sua necessidade. Este aspecto é
fundamental, pois institui uma temporalidade própria, independente da disponibilização da
mesma.
Nível 3 com os sinais da interatividade de caráter digital, o usuário tem a
possibilidade de interferir no conteúdo da mensagem. O telespectador pode então interferir no
conteúdo, a partir do telefone (como no programa Você Decide), por fax ou correio
eletrônico.
Nível 4 destaca-se o desafio da TV interativa, potencializando a participação via
internet, ao conteúdo informativo das emissões em tempo real.
73
Dessa forma, percebemos que a interatividade potencializada pelo nível eletrônico-
digital amplia a possibilidade de o usuário interagir com a informação, passando de um
modelo um-todos, de caráter transmissionista, para outro modelo todos-todos, descentralizado
e universal, em que a informação circula livremente.
No caso da TV digital, abrem-se novas possibilidades de espaços de aprendizagem
abertos e plurais, onde o usuário terá acesso a uma participação mais efetiva na mensagem. É
por isso que Silva (2002) afirma que o desafio digital da interatividade requer outra
perspectiva de comunicação.
Supõe uma modalidade comunicacional absolutamente diferente daquela que
caracteriza a imagem estática irradiada pela tela da TV. A primeira define-se
como campo de possibilidades diante da intervenção do usuário; a segunda é
estática (mesmo sendo móvel, fragmentária) e apresenta-se como
transmissão que separa emissão e recepção. Portanto, é a comunicação
interativa que destaco quando repito com Lévy: devemos aprender como
movimento contemporâneo da esfera tecnológica (SILVA, 2002, p.69).
Contribuindo com o debate sobre interatividade no contexto comunicacional, Lévy
(1999) afirma que o destinatário de uma informação nunca está passivo, pois ele decodifica,
interpreta, participa, enfim, interage com a informação. Ainda, segundo o autor, “a
interatividade assinala muito mais um problema, a necessidade de um novo trabalho de
observação, de concepção e de avaliação dos modos de comunicação do que uma
característica simples e unívoca atribuível a um sistema específico”, (LÉVY, 1999, p.82) não
se limitando, portanto, às tecnologias digitais.
Lévy apresenta ainda diferentes graus de interatividade, a depender do dispositivo de
comunicação e da relação com a mensagem. Temos, por exemplo, mensagens lineares que
não podem ser alteradas em tempo real, como no caso da imprensa, rádio, televisão e cinema,
gerando uma difusão unilateral da mesma, até as dinâmicas com trocas de mensagens entre os
participantes facultadas pelo correio eletrônico e pelas redes de correspondências.
Nesta perspectiva de intervenção em tempo real, Primo (2007) toma os integrantes
como foco principal dos processos comunicacionais, e apresenta a interação mútua e a
interação reativa. O enfoque relativo à interação mútua traz consigo a visão de que é na
relação mantida entre os participantes que deve ser o foco principal de estudo nas interações
via computador, superando-se o foco ora no emissor, ora no receptor. Rompe-se então com a
idéia de que a soma de ações individuais de cada integrante é responsável pelo processo de
interação, e acredita-se na análise a partir das relações mantidas entre os participantes.
Percebe-se neste enfoque a superação de uma visão de transmissão e destaca-se a concepção
recursiva para a qual o comportamento de cada pessoa é afetado e afeta o de seus pares. Em
74
relação à interação reativa, o que se observa é a predominância de certa estabilidade e a total
ausência de negociação entre os participantes. “É a abertura ao contestar, ao discordar, que
diferencia a interação mútua das interações reativas, onde o debate não tem lugar, pois esbarra
em informações e trocas derradeiras” (PRIMO, 2007, p.132).
Sendo assim, a discussão sobre a interação mediada por computador não pode ser
reduzida simplesmente ao potencial técnico das máquinas, esquecendo-se das complexas
relações entre os sujeitos envolvidos no processo. Na educação à distância, por exemplo, essa
visão é reducionista, por desconsiderar as trocas interativas entre os participantes e reduzir a
relação a um processo mecânico de envio e recebimento de mensagens.
Ainda sobre a interatividade, a análise proposta por Silva (2002) abarca esse
fenômeno de forma mais ampla, extrapolando também a relação dispositivo/mensagem, e
desafiando-nos a pensar em um “mais comunicacional de modo expressivamente complexo,
ao mesmo tempo atentando para as interações existentes e promovendo mais e melhores
interações seja entre usuário e tecnologias digitais ou analógicas, seja nas relações
presenciais ou virtuais entre os seres humanos” (SILVA, 2002, p.20). Para a educação, tanto
presencial quanto à distância, esse conceito é de suma importância, pois requer a abertura para
uma maior intervenção dos sujeitos na dinâmica comunicacional, modificando as ações dos
docentes e discentes nos diferentes espaços de aprendizagem.
Essa nova gica, potencializada pelo meio digital, onde a emissão separada da
recepção vai perdendo paulatinamente a sua força no contexto da cibercultura, remete a uma
comunicação muito mais interativa. Silva (2002) elenca três fatores históricos que
demonstram a emergência da interatividade: o aspecto tecnológico, mercadológico e social.
No aspecto tecnológico o computador destaca-se como espaço de manipulação e de
adentramento, possibilitando ao usuário interferências no conteúdo da tela, diferentemente de
uma lógica onde apenas poderíamos acessar a informação. As múltiplas conexões e janelas
móveis abrem espaço para uma comunicação mais interativa na cibercultura. Vale ressaltar
que todo esse potencial proporcionado pelas tecnologias é fruto também da disposição social
do usuário no desejo de interferir na informação. Logo, a imbricação entre desenvolvimento
técnico e sociedade precisa ser compreendida de forma recursiva, pois ao mesmo tempo em
que a tecnologia se incorpora no social, o social se inscreve na técnica. Em relação à esfera
mercadológica, teríamos uma maior interatividade entre o consumidor e produto com a
utilização das tecnologias, configurando-se assim outra concepção de marketing que busca
estratégias dialógicas entre cliente-produto-produtor. O consumidor, no contexto da
telemática, não permanece mais passivo como na lógica das mídias de massa, pois é
75
convidado a adentrar e modificar o conteúdo. E, por último, teríamos o fator social com o
controle remoto, do joystick do videogame e o mouse contribuindo para a emergência de um
espectador que deseja adentrar na mensagem.
Esses fatores históricos apresentados pelo autor deixam clara a importância da
superação do esquema clássico de comunicação no qual a emissão-mensagem-recepção
encontra-se organizada de forma unilateral, e abre a possibilidade de pensarmos em outro
arranjo comunicacional baseado na ligação bidirecional emissor-mensagem-receptor. Dessa
forma, o emissor passa a oferecer um leque de elementos para a manipulação do receptor, que
se coloca agora como um produtor da mensagem, a qual é ressignificada sob sua intervenção.
É importante ressaltar que a superação desse esquema clássico de comunicação só foi possível
em virtude do desenvolvimento dos processos analíticos que possibilitaram o processamento
da imagem e, por conseguinte, novas dinâmicas de trabalho nesse contexto, alterando as
formas de recepção.
Nessa perspectiva, a mensagem é compreendida como um universo aberto a
constantes solicitações dos sujeitos. Do ponto de vista da sala de aula no meio digital, a
configuração desse esquema de comunicação traz implicações importantes para a docência no
contexto da cibercultura, pois desafia o professor a superar a linearidade e a dicotomia
emissão-recepção. Cabe aqui ressaltar que essa nova lógica comunicativa requer dos
professores um rompimento com um modelo de “educação bancária” que centraliza a ação
comunicativa na figura do professor, mantendo o educando numa mera posição de
consumidor de informação.
Figura 6 - Sala de aula unidirecional (modelo um-todos)
Fonte: Marco Silva
76
Figura 7 - Sala de aula interativa (modelo todos-todos)
Fonte: Marco Silva
A superação da lógica da comunicação pautada na unidirecionalidade, onde um
emissor e um receptor passivo é criticada por Silva (2002) que propõe uma configuração
comunicacional, onde a participação ativa do sujeito é apresentada através da tríade
comunicacional emissão-recepção-mensagem, demonstrada no Quadro 2 que traz a
comparação entre as modalidades de comunicação unidirecional e interativa:
Quadro 2 - Comparação entre as modalidades de comunicação.
A COMUNICAÇÃO
MODALIDADE UNIDIRECIONAL MODALIDADE INTERATIVA
MENSAGEM: fechada, imutável, linear,
seqüencial.
MENSAGEM: modificável, em mutação, na
medida em que responde às solicitações daqueles
que a manipulam.
EMISSOR: “contador de histórias”, narrador, que
atrai o receptor (de maneira mais ou menos
sedutora e/ou por imposição) para o seu universo
mental, seu imaginário, sua récita.
EMISSOR: designer de software”, constrói uma
rede (não uma rota) e define um conjunto de
territórios a explorar; ele não oferece uma história
a ouvir, mas um conjunto intrincado (labirinto) de
territórios abertos a navegações e dispostos a
interferências, a modificações.
RECEPTOR: assimilador passivo. RECEPTOR: “usuário”, manipula a mensagem
como co-autor, co-criador, verdadeiro conceptor.
Fonte: Silva (2002, p. 73).
Nesse sentido, a comunicação no meio digital precisa estar em sintonia com os
fundamentos da interatividade e pautada nos binômios apresentados por Silva (2002):
participação-intervenção, bidirecionalidade-hibridação e potencialidade-permutabilidade.
O primeiro define a possibilidade que o sujeito tem de alterar percursos através do
desafio de se converterem em gestores dos meios de comunicação, de tal modo que a
perspectiva tecnológica abre um leque de possibilidades para os sujeitos envolvidos no
77
processo poderem intervir no processo de comunicação. Dessa forma, temos acesso a um
jornal e entramos em contato com a redação, no mesmo instante da leitura da vinculação da
notícia, em virtude na instantaneidade proporcionada pelas tecnologias digitais, que rompem
com barreiras de espaço e tempo. A perspectiva comunicacional apontada nesse binômio abre
novos horizontes de aprendizagem, de forma mais dialógica, polissêmica, através da
utilização de chats, blogs, fóruns de discussão etc. Isso não garante, no entanto, que a
participação-intervenção vai sempre ocorrer. A definição desse binômio se dará através da
autoria do sujeito mobilizado (SILVA, 2002).
O binômio bidirecionalidade-hibridação critica uma comunicação unidirecional que
separa emissor de receptor, posicionando-se numa perspectiva de que não mais emissor
nem receptor, pois todo emissor é um receptor e vive-versa. Couchot (1993) destaca a
hibridização como um aspecto essencial na alteração do estatuto do autor, espectador e obra
ao analisar a arte digital. A imagem circular retrata a fusão do autor, espectador e obra,
diferentemente da estrutura apresentada em formato triangular, com posição estanque e
definida. Ainda para o autor, esse processo foi potencializado em virtude da ordem numérica
que permitiu uma imagem sempre em processo, tornando-se suscetíveis de modificação. As
discussões nos chats exemplificam a hibridização entre os participantes, pois a dinâmica
comunicacional potencializada pelas tecnologias digitais permite que todos sejam emissores e
receptores ao mesmo tempo.
Em minha caminhada como aluna online, venho percebendo uma subutilização dos
pressupostos desse binômio, pois a maioria dos cursos oferecidos na internet ainda está
centrada numa perspectiva unidirecional, tanto em relação à disposição dos conteúdos, através
da disposição de telas lineares e listas intermináveis de exercícios, como também na
manutenção de uma concepção de docência assumida pelos professores como os detentores
do saber e que não permitem processos de co-autoria com seus alunos.
Figura 8 – Metáfora da Hibridização apresentada por Couchot
Fonte: Silva (2002, p. 125)
78
O terceiro e último binômio: permutabilidade-potencialidade destaca a possibilidade
de o usuário buscar informações de forma não seqüencial na rede. O sistema digital, com sua
infinita capacidade de armazenamento e de combinações, dá condições aos usuários não só de
navegar com liberdade, mas também de construir narrativas e percursos em sintonia com sua
necessidade de navegação. À medida que se vai navegando e construindo novos percursos,
outras possibilidades de combinações vão surgindo, exatamente pela estrutura hipertextual da
rede.
Todo esse potencial proporcionado pelo meio digital tem sentido se o sujeito
apropriar-se dos artefatos tecnológicos na perspectiva de intervenção e participação na
mensagem. Em ambientes virtuais de aprendizagem, o papel do professor é fundamental nessa
dinâmica, pois ele é o responsável pela mediação e disponibilização de uma estrutura
hipertextual que busque transformar imagem, som e texto em algo essencialmente navegável e
manipulável.
3.6 VIRTUALIDADE
Ilusão, ausência de realidade, falsidade, imaginação são alguns usos freqüentemente
utilizados para designar a compreensão do virtual no contexto contemporâneo. Em
contrapartida, a realidade é definida como a efetuação material, uma presença tangível. Dessa
forma, fica claramente explícita, no uso cotidiano desses conceitos, a dicotomia entre estas
duas dimensões da realidade, onde o virtual pertenceria ao mundo da ilusão e o real ao mundo
da existência. Daí, a utilização irônica de expressões como: professores virtuais, referindo-se
ao professor que trabalha à distância, sala de aula virtual, aluno virtual entre outros. Lévy
(1996) não descarta esta dimensão cotidiana de significação do virtual, afirmando que este
conceito não deixa de ter uma pequena afinidade com as representações utilizadas no uso
corrente. Porém, o autor alerta que esta visão é um tanto quanto grosseira para fundamentar
uma teoria geral. Entretanto, Lemos et al, (1999) discordam da dimensão dicotômica e
cotidiana desse conceito, afirmando que as virtualizações e atualizações fazem parte da
realidade e é uma falácia conceber o virtual como oposto ao real.
Para se compreender de forma mais efetiva esta relação, Lévy (1993, p. 47) traz
também a dimensão filosófica da questão afirmando que “é virtual aquilo que existe apenas
em potência e não em ato, o campo de forças e de problemas que tende a resolver-se em uma
atualização”. Acrescenta ainda o autor que “o virtual não se opõe ao real e sim ao atual:
virtualidade e atualidade são apenas dois modos diferentes da realidade”. A partir dessas
79
reflexões, fica claro que, apesar de não se poder determinar precisamente a presença de uma
entidade virtual em determinado espaço-tempo, esta se atualizará em diferentes situações.
As relações entre digitalização e virtualização, no contexto da cibercultura, podem
ser observadas através do potencial técnico de armazenamento das informações e das
diferentes formas de comunicação. De uma maneira mais direta teríamos os códigos dos
computadores invisíveis e praticamente independentes de coordenadas espaço-temporais,
podendo ser acessada, a depender das solicitações dos usuários. Esta invisibilidade se
aproxima do virtual, na medida em que a tradução em códigos binários 0 e 1 é inacessível,
enquanto tal, ao ser humano. A atualização é possível através da exibição em textos,
imagens e sons.
Nesse contexto, a comunicação é exemplificada pelo autor como outra possibilidade
de virtualização, pois proporciona redes de relacionamento independentes de lugares e
diferença de horários. O autor afirma também que, apesar de outras possibilidades de
comunicação (telefone, cartas etc.) permitirem uma maior interatividade, as
particularidades técnicas do ciberespaço potencializam o encontro de diferentes pessoas, sem
embargo da dispersão geográfica e diferença de horários (LÉVY, 1996).
No entanto, as reflexões sobre o virtual não podem ser concebidas apenas no âmbito
da informatização. Segundo Lévy (1996), a despeito dos processos de digitalização serem
considerados como o fundamento técnico da virtualização, existem outros vetores importantes
nesta dinâmica que extrapolam as redes digitais, a exemplo da imaginação, memória, do
conhecimento e da religião, dimensões estas que levaram ao abandono da presença, muito
antes da informatização. Assim, “a virtualização é um processo característico do movimento
de autocriação que faz surgir a espécie humana, que a acompanha ao longo de sua história e
que constitui a essência da transição cultural acelerada que vivemos hoje”. (BONILLA, 2005,
p. 131).
Lemos et al (1999) em sintonia com Lévy (1996), trazem o virtual como um
processo de questionamento, e exemplificam a leitura (interpretação) como um processo de
virtualização e a escrita como processo de atualização. Nessa lógica, no processo de escrita
sobre determinada temática, virtualizamos determinada questão na escolha de uma ou outra
abordagem. Esse processo vai sempre sendo renovado à medida que o sujeito, ao ler o texto,
vivencia processos de virtualização, pois na dinâmica da leitura ele questiona e traz outras
referências.
80
É no contexto dessa discussão sobre virtualidade, como potencial fecundo de
questionamento, que se faz necessário aprofundar a compreensão dos ambientes online de
aprendizagem, a fim de se compreender sua articulação com os pressupostos da cibercultura e
o delineamento de propostas educativas inovadoras no ciberespaço. É sobre esse assunto que
iremos refletir no capítulo 4.
81
CIBERCULTURA E AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM
saber–luxo, o trabalho–transação de conhecimentos, as novas tecnologias da
inteligência individual e coletiva mudam profundamente os dados do problema da
educação e da formação. O que é preciso aprender não pode mais ser planejado nem
precisamente definido com antecedência. Os percursos e perfis de competências são todos
singulares e podem cada vez menos ser canalizados em programas e cursos válidos para
todos. Devemos construir novos modelos e espaços de conhecimentos, no lugar de uma
representação em escalas lineares e paralelas, em pirâmides estruturadas em “níveis”,
organizadas pela noção de pré-requisitos e convergindo para saberes “superiores”, a
partir de agora devemos preferir a imagem de espaços de conhecimento emergentes,
abertos, contínuos, em fluxo, não lineares, se reorganizando de acordo com os objetivos
ou contextos, nos quais cada um ocupa uma posição singular e evolutiva.
(LÉVY, 1999:158)
o
82
4 O CONTEXTO DA CIBERCULTURA E A EMERGÊNCIA DOS AMBIENTES
VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM
Este capítulo traz uma reflexão sobre o potencial educacional dos ambientes virtuais
de aprendizagem, como um dos principais meios telemáticos disponíveis no ciberespaço na
construção de propostas educativas. Discute alguns fundamentos da cibercultura, tais como a
nova configuração espaço-temporal, a liberação do pólo de emissão e a conexão generalizada,
potencializando a emergência da educação online. Destaca, ainda, o potencial comunicacional
e pedagógico dos ambientes virtuais de aprendizagem, propondo a construção de conteúdos
hipertextuais, a partir de algumas categorias fundamentais, tais como: usabilidade,
multivocalidade, intratextualidade, intertextualidade e multilinearidade. Traz também, de
forma ampla, três ambientes de aprendizagem disponíveis na rede o Teleduc, o Aulanet e o
Moodle.
4.1 ALGUNS PRESSUPOSTOS DA CIBERCULTURA
O processo de digitalização e o desenvolvimento da cibercultura vêm promovendo a
utilização do meio digital como lócus de inúmeras experiências pedagógicas, principalmente
propostas relacionadas à educação online. Dessa forma, faz-se necessário uma análise mais
aprofundada do fenômeno da cibercultura, a fim de se compreender a emergência dos
ambientes virtuais nesse cenário.
Na visão de Lemos (2003a, p. 12), a cibercultura destaca-se “como a forma sócio-
cultural que emerge da relação simbiótica, entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias
de base microeletrônica que surgiram com a convergência das telecomunicações com a
informática na década de 1970”. Nesse sentido, a cibercultura configura-se como a cultura
contemporânea, haja vista que já vivenciamos as tecnologias da informação e comunicação no
dia-a-dia, tais como o uso do celular, caixas eletrônicos, a arte eletrônica, a música eletrônica,
votação eletrônica, a educação online, dentre inúmeras outras.
Lévy (1999, p. 32) conceitua a cibercultura como “conjunto de técnicas (materiais e
intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos, de pensamento e de valores, que se
desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço caracterizado como o novo
ambiente de comunicação que surge com a interconexão mundial de computadores”.
83
Percebe-se, na definição dos autores, a relação estabelecida entre sociedade e
tecnologia, principalmente a partir da década de 70, com o advento da microinformática e da
internet, que trouxeram a possibilidade de nos comunicarmos e nos reunirmos por interesses
comuns, para trocar mensagens, arquivos, fotos e, acima de tudo, compartilhar nossas idéias e
sentimentos. Esse potencial proporcionado pelo suporte da informação faz com que a
mensagem se torne leve e manipulável graças ao processo de digitalização, abrindo inúmeras
perspectivas de comunicação e novas práticas educacionais.
Estes aspectos remetem à dinâmica da cibercultura, e sua possibilidade de alterar a
relação espaço-temporal. Se nas sociedades orais, as mensagens eram produzidas e recebidas
em um mesmo contexto e os emissores e receptores tinham a possibilidade de vivenciar um
universo parecido de significado, a escrita viabiliza que as mensagens produzidas por pessoas,
em contextos diferentes, possam ser compartilhadas em outros contextos, o que faculta a
difusão do sentido de suas produções. A grande problemática dessa configuração é o
distanciamento entre o emissor da mensagem e o seu destinatário, que teria agora o desafio de
interpretar a mensagem, de acordo com o significado matricial de origem.
Entretanto, a emergência do ciberespaço, definido por Lévy (1999, p.17) como “o
espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias
dos computadores”, traz em seu bojo o desafio de se pensar o universal sem totalidade,
semelhante ao das sociedades orais, onde havia o compartilhamento do mesmo contexto,
porém em outro arranjo, permeado pelas tecnologias da informação e comunicação. Esta
dinâmica permeada pelas TIC possibilita a humanidade se comunicar, partilhar e vivenciar
experiências, construindo assim um universal sem totalidade, pois à medida que este universal
vai crescendo, vai tornando-se cada vez menos totalizável. Assim, a tecnologia digital, que
possibilita um caráter plástico e fluido da informação, vem romper com a narrativa
seqüenciada da escrita, e se apresenta de forma descontínua, ampliando as possibilidades de
uso do ciberespaço, enquanto espaço de comunicação humana. Todo esse potencial do meio
digital requer maior acuidade numa outra dimensão espaço-temporal.
Sobre esse assunto, Lemos (2003a, p. 14) revela:
Vivemos uma nova conjuntura espaço-temporal marcada pelas tecnologias
digitais-telemáticas onde o tempo real parece aniquilar, no sentido inverso à
modernidade, o espaço de lugar, criando espaços de fluxos, redes planetárias
pulsando no tempo real, em caminho para a desmaterialização dos espaços
de lugar. Assim, na cibercultura podemos estar aqui e agir à distância. A
forma técnica da Cibercultura permite a ampliação das formas de ação e
comunicação sobre o mundo. (LEMOS, 2003a, p.14).
84
Se na Modernidade a concepção de tempo resume-se a uma noção linear, na qual as
idéias de progresso e de história pareciam inalteradas e cronologicamente definidas, o
ciberespaço nos desafia a vivenciarmos outra dinâmica baseada na compressão do tempo.
Essa noção se caracteriza, principalmente, pela comunicação eletrônica que circula pelos
fluxos de intercâmbios entre locais distantes, selecionados, enquanto a experiência
fragmentada permanece presa aos lugares.
Ao analisar esse aspecto espaço-temporal, Castells (2005) infere que o tempo, na
verdade, é intemporal, diretamente relacionado ao espaço de fluxos. Para o autor, na
sociedade informacional é o espaço, caracterizado pelo fluxo de informações, que agora
organiza o tempo. O espaço de fluxos é conceituado como:
a organização material de tempo-compartilhado de práticas sociais que
funcionam por fluxos. Por fluxo eu entendo sucessões propositadas,
repetitivas, programáveis de troca e interação entre posições fisicamente
deslocadas, organizadas por atores sociais nas estruturas econômicas,
políticas e simbólicas de sociedade (CASTELLS, 2005, p. 501).
Assim, para que se possa aproveitar melhor o potencial da educação com a utilização
das TIC, principalmente no que diz respeito à flexibilização do tempo e ao rompimento de
obstáculos espaciais, é preciso se investir em propostas educacionais na rede que superem a
visão mecanicista de transmissão de conhecimento, intensificando dinâmicas interativas e
hipertextuais.
Nesse cenário, e com a disponibilidade cada vez maior de artefatos gratuitos na
WEB, que permitem as pessoas criarem espaços de aprendizagem, a discussão sobre
ambientes online emerge como uma possibilidade de criação e socialização de saberes de
pessoas que geograficamente não se encontrariam. Insisto mais uma vez na importância da
codificação digital que proporciona melhor acessibilidade à informação e configuração de um
processo comunicacional em mutação, respondendo às solicitações dos usuários.
4.2 NAVEGANDO SOBRE A CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO ONLINE
Conforme o referido, a cibercultura surge como conseqüência das implicações
socioculturais da microinformática e do movimento de contracultura americana que,
diferentemente dos grandes centros de poder, busca maior democratização da informação.
Juntamente a esse movimento, desenvolve-se a ciência da informática trazendo a
possibilidade da leitura da realidade em linguagem digital.
85
Dentre as diversas possibilidades abertas pelo paradigma digital, ocorre a liberação
do pólo da emissão que veio intensificar as várias relações sociais. Exemplo disso são os
blogs, os chats, os fóruns de discussão, os e-mails, que potencializam a comunicação cada vez
mais de forma interativa. Ressalta-se também a importância da conexão, que une os homens
entre si através da máquina, numa constante troca de informações.
Nesse contexto, emerge uma série de iniciativas de cursos de especialização,
extensão e graduação, pautados nas orientações da legislação vigente
18
, que tem como
preocupação básica a construção de novos espaços de aprendizagem via internet. Vale
destacar a importância da portaria 2.253/2001 que permite as instituições de ensino utilizar
um modelo híbrido de ensino nos seus cursos, ampliando os processos interativos nas
propostas educacionais. Para Branco (2003), essa portaria desafia as universidades a
repensarem suas práticas em relação à utilização das tecnologias da informação, superando
uma concepção do computador como máquina de digitar, e vivenciando plenamente a cultura
das redes. A Portaria n. 2.253, de 18 de outubro de 2001, nos deu esta possibilidade, como se
vê em seu Art. 1º:
As instituições de ensino superior do sistema federal de ensino poderão
introduzir, na organização pedagógica e curricular de seus cursos superiores
reconhecidos, a oferta de disciplinas que, em seu todo ou em parte, utilizem
método não presencial, com base no artigo 81 da Lei 9.394, de 1996, e no
disposto nesta Portaria.
Outro aspecto que Branco chama a atenção é em relação à compreensão do que seja
educação à distância, que vem ampliar as concepções de ensino, antes confinadas à sala de
aula. Nesse contexto, podemos reconhecer a importância da criação de comunidades virtuais
de aprendizagem no compartilhamento de práticas, conhecimentos, dinamizando a partilha de
saberes e o crescimento de todos.
Essas propostas educativas, que utilizam basicamente os meios telemáticos como a
videoconferência, teleconferência e internet, são caracterizadas por Moran (2003) como
educação online. Para o autor, a educação online permite diferentes desenhos de cursos, desde
propostas totalmente virtuais, até perspectivas presenciais, potencializando as dinâmicas da
sala de aula convencional.
18
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - 9394/96 - Art.80, Decreto 2.494/98 e Decreto n.º 5.622/05,
Portarias MEC nº 301/98, nº 2.253/2001 e nº 4.059/04, e a Portaria nº. 2/2007 que dispõe sobre os procedimentos
de regulação e avaliação da educação superior na modalidade à distância.
86
Em relação à educação à distância, ele afirma que “é um conceito mais amplo que o
da educação online. Um curso por correspondência é à distância e não é online(MORAN,
2003, p.40). Este conceito vem sendo ressignificado por diferentes instituições sociais, com
destaque às universidades, no sentido de proporcionar cursos de formação, bem como
potencializar as discussões na educação presencial. A partir daí, existe uma diversidade de
propostas, desde aquelas centradas no docente, e com pouca interação, até aquelas centradas
no trabalho em grupo com bastante interatividade.
Contribuindo com a discussão sobre a educação online, Almeida (2003a), reforça o
seu uso via a internet, e a caracteriza como uma modalidade de educação, cuja comunicação
ocorre de forma síncrona e assíncrona. Ressalta a autora que as interações entre os
participantes podem ocorrer a partir de diferentes perspectivas comunicacionais, quais sejam:
comunicação um-a-um, comunicação de um-todos e comunicação todos-todos. A terceira
perspectiva traz como desafio a superação de propostas educativas hierárquicas e lineares,
incluindo o debate plural de idéias e a possibilidade de intervenção e alteração na mensagem.
Para Santos (2005), o conceito de educação online está diretamente ligado ao
desenvolvimento da cibercultura por possibilitar: a convergência de mídias, os encontros entre
diferentes pessoas afastadas geograficamente, a vivência da interatividade, a aprendizagem
colaborativa e os processos de comunicação síncronos e assíncronos. Para essa autora, todo
esse potencial da educação online diferencia-se das práticas convencionais de EAD, que têm
como foco principal a auto-aprendizagem. A autora ressalta que essa perspectiva é
reducionista, por não propiciar a dialógica entre os sujeitos, centrando-se apenas na resolução
de atividades propostas no material do curso e a posterior entrega ao professor-tutor.
O grande desafio da educação online não está centrado unicamente na
disponibilização de ambientes e interfaces gratuitas para a sua utilização nos diferentes
espaços educativos, e sim na compreensão desses artefatos como potencializadores de práticas
pedagógicas inovadoras que permitam aos aprendizes interações e co-autoria na construção do
conhecimento e do seu próprio processo de aprendizagem.
4.3 AMBIENTES DE APRENDIZAGEM: DESAFIOS E POTENCIALIDADES
Resgatando o potencial da cibercultura, principalmente no que diz respeito à
liberação do pólo da emissão e à conexão generalizada, os ambientes de aprendizagem se
destacam como um dos principais meios telemáticos para o desenvolvimento de propostas em
educação online, principalmente no que diz respeito à formação de professores.
87
Para Almeida (2003b, p.331), “os ambientes digitais de aprendizagem são sistemas
computacionais disponíveis na internet, destinados ao suporte de atividades mediadas pelas
tecnologias da informação e comunicação”. A autora traz também, como potencial desses
ambientes, a integração de várias mídias, linguagens e recursos, além de uma melhor
organização das informações e a possibilidade de uma maior interação entre as pessoas e o
objeto de conhecimento. É nesse sentido, que os docentes são desafiados a construírem novas
estratégias de trabalho no contexto digital, permitindo o adentramento e construindo propostas
que promovam cooperação e co-autoria.
Em sua definição sobre Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA), Santos (2003,
p. 223) também destaca a interação como um aspecto fundamental, quando o conceitua como
"espaço fecundo de significação onde seres humanos e objetos técnicos interagem,
potencializando assim a construção de conhecimentos, logo a aprendizagem". A autora
ressalta que este conceito é muito mais amplo, considerando-se o próprio ciberespaço como
um AVA, devido à sua configuração aberta e flexível.
Sob esse aspecto, a Web permite a navegar por obras abertas, sendo esta uma
ferramenta basilar para processos de virtualização e atualizações nos processos educativos.
Uma lista de discussão na web, por exemplo, é entendida como um espaço aonde mensagens
são socializadas no formato do correio eletrônico. No entanto, mais que simples espaço para
troca de mensagens essas listas podem ser vistas como
(...) instrumentos que servem como verdadeiro coletivo inteligente, onde os
assuntos agrupados de forma temática são tratados por especialistas das mais
diversas áreas, discutindo, comentando ou informando. Formam-se assim
fóruns permanentes, proporcionando trocas mais profundas do que as obtidas
nos chats, por exemplo. Cria-se uma comunidade informativa extremamente
importante no processo pedagógico (LEMOS et al, 1999).
É essa produção e socialização de saberes e informações, que vêm contribuindo para
a expansão do ciberespaço e possibilitando a multivocalidade, simulações e autonomia nos
processos de criação e autoria em diferentes espaços geográficos. Não como negar que a
codificação digital, responsável pelo caráter plástico, hipertextual e fluido da mensagem, foi
determinante para uma melhor acessibilidade à informação e a configuração de um processo
comunicacional em constante transformação em sintonia com as demandas dos sujeitos.
Defino o ambiente online de aprendizagem como uma arquitetura técnico-social que
possibilita o desenvolvimento de práticas pedagógicas interativas, na construção colaborativa
de conhecimentos entre os diferentes sujeitos. Esta definição corrobora com Santos (2003),
cuja idéia central se pauta num modelo comunicação todos-todos, onde o adentramento e a
88
manipulação da informação são aspectos fundamentais na construção de novos saberes no
ciberespaço.
Entretanto, apesar da evidência do potencial comunicacional e educativo
potencializado pelos AVA, o que se percebe em diferentes contextos educativos é a sua
subutilização. Muitas propostas vivenciadas nestes ambientes continuam pautadas na gica
da distribuição da informação, na cópia na reprodução, e na linearidade desconsiderando
projetos educativos que favoreçam o trabalho cooperativo potencializado pelo meio digital.
Dessa forma, propostas fechadas, pautadas na linearidade e transmissão dos conteúdos e que
não dialogam com o contexto se tornam sem relevância para o educando, transformando-os
em meros repetidores de um currículo sem significado. Essa mesma noção de ordem, tão
vivenciada na escola, traz no seu bojo a idéia de professor dono da verdade e detentor de todo
o saber. Com a utilização das TIC pode-se cair no mesmo risco, reforçando a perspectiva
instrucionista, na medida em que estas tecnologias serviriam para endossar a lógica linear
da aula expositiva.
Analisando os reflexos dessa metodologia, em diferentes ambientes educacionais,
venho percebendo que, na metodologia expositiva, o aluno recebe tudo pronto, não
problematiza, não é desafiado a fazer relação com o que já conhece e acaba sempre se
acomodando.
Demo (2003) denuncia esse caráter instrucionista da educação ao afirmar:
Num primeiro momento, instrucionismo é “linearizar” a aprendizagem no
plano da mera lógica seqüencial, tornando-a reprodutiva e mantendo o
aprendiz na condição de objeto. Num segundo momento, o instrucionismo
evita o saber pensar, ou seja, uma das bases mais flagrantes da autonomia,
induzindo à subalternidade [...] (DEMO, 2003, p.78).
Prossegue o autor na análise, retratando que na nova mídia encontramos a abordagem
instrucionista, a exemplo da proposta da teleconferência, utilizada muitas vezes como
panacéia de alguns cursos a distância. Assim, a centralização e a exposição unilateral não
desafiam o sujeito na construção de seu processo de aprendizagem, que “esta aparece em
outro ambiente, tipicamente reconstrutivo-político, no qual o aluno é convidado a pesquisar e
elaborar com mão própria para poder manejar conhecimento com autonomia” (DEMO, 2003,
p. 79). Entretanto, algumas propostas pautadas nessa metodologia e que possibilitam
contextualizações históricas, abertura ao debate entre os participantes, o desenvolvimento de
reflexões sobre as questões em pauta e a promoção debate todos-todos, permite uma maior
participação dos sujeitos envolvidos no processo. Contudo, sua utilização exclusiva não
conta das demandas dos sujeitos envolvidos no processo. Na visão de Pretto,
89
[...] o uso como instrumentalidade esvazia esses recursos de suas
características fundamentais, transformando-os apenas num animador da
velha educação, que se desfaz velozmente, uma vez que o encanto da
novidade também deixa de existir. (PRETTO, 1996, p.114).
Sob esse prisma, a perspectiva da instrumentalização é reducionista, pois limita o
potencial das tecnologias no contexto social e, em especial, nos ambientes de aprendizagem,
pois, nessa gica, a tecnologia acaba sendo utilizada para reproduzir uma perspectiva
educacional centrada na transmissão de informações. Ela caracteriza-se basicamente por
desconsiderar os contextos educativos como espaços coletivos e sim como uma justaposição
de individualidades, além de não reconhecer que o conhecimento se dá na relação sujeito-
objeto-realidade. Além desses fatores, nega-se a perspectiva comunicacional interativa
possibilitada pelo contexto digital.
Em minha caminhada como aluna e docente online, venho percebendo que, apesar do
potencial aberto pelo contexto digital e pela cibercultura, de uma comunicação mais interativa
na perspectiva todos-todos, as propostas disponibilizadas nos AVA continuam centradas
numa via de mão única, reproduzindo o modelo comunicacional de massa onde a emissão é
separada da recepção ou mascara-se o discurso de um feedback meramente mecanicista,
reduzindo o processo a um simples envio e recebimento de mensagens.
Destaco também a opinião de Okada (2003), ao considerar os ambientes
instrucionistas aqueles que trazem como foco a transmissão da informação em aulas
expositivas, centrando-se apenas na proposta dos conteúdos, e não proporcionando aos alunos
uma interação efetiva na dinâmica do trabalho. Para ela, essa configuração do ambiente
assemelha-se a aula expositiva convencional, onde o professor transmite o conteúdo e o aluno
individualmente desenvolve sua auto-aprendizagem.
Contra esta lógica, o ambiente virtual de aprendizagem deve ser pensado como
espaço de auto-organização de seres humanos e objetos técnicos, trazendo como desafio a
construção de concepções pedagógicas que reflitam uma proposta hipertextual, interativa e
colaborativa (SANTOS, 2003). A autora destaca algumas questões importantes para a
construção de sites que sejam AVA no ciberespaço:
a) Criar sites hipertextuais que agreguem intertextualidade, intratextualidade,
multivocalidade, navegabilidade, mixagem e multimídia.
b) Potencializar a comunicação interativa síncrona e assíncrona.
c) Criar atividades de pesquisa que estimulem a construção do
conhecimento, a partir de situações-problema, onde o sujeito possa
contextualizar questões globais e locais do seu objeto cultural;
d) Criar ambiência para avaliação formativa, onde os saberes sejam
construídos num processo comunicativo de negociações, onde a tomada de
decisões seja uma prática constante para a (re) significação processual de
90
autorias e co-autorias.
e) Disponibilizar e incentivar conexões lúdicas, artísticas e navegações
fluidas. (SANTOS, 2003, p. 225).
Nielsen (1994, apud SANTOS, 2005), estabelece cinco regras básicas para um
melhor uso das interfaces digitais. Uma primeira seria o fácil acesso, onde a clareza, a
simplicidade e o desenho acessível facilitariam a navegação no ambiente; o uso eficiente
possibilitaria a clareza e a transparência ao estudante na administração e maximização do
tempo; ser memorizável é uma regra que diz respeito à disposição dos ícones utilizados,
obedecendo a certo padrão e buscando facilitar a ambientação dos estudantes com essa
categorização, fica mais fácil identificar as interfaces do ambiente e conhecer as atividades
propostas em cada módulo; minimizadora de erros é outra regra importante em relação ao
aspecto da usabilidade; refere-se ao apoio ao estudante em caso de dificuldades para navegar
e buscar as informações; satisfaz o cliente no intuito de estabelecer relação com o perfil
cognitivo e cultural do estudante.
Em sua tese de doutoramento, Santos (2005) aprofunda a discussão sobre a
elaboração de conteúdos hipertextuais em AVA, e sugere algumas características para a
elaboração desses conteúdos: usabilidade, multivocalidade, intratextualidade,
intertextualidade e multilinearidade.
O primeiro diz respeito à funcionalidade e estética da arquitetura do ambiente de
aprendizagem, com vistas a facilitar a navegação e leitura do sujeito na dinâmica do curso.
Já a multivocalidade refere-se à agregação de vários pontos de vista das temáticas em
estudo, potencializando uma pluralidade de idéias e de debates. Este caráter multirreferencial
permite ao estudante uma discussão mais abrangente e a construção de sua própria itinerância
intelectual. Muitos cursos à distância não contemplam este aspecto e as discussões ficam
reduzidas a um só referencial teórico, o que impossibilita uma maior polifonia de idéias.
A terceira característica importante, a intratextualidade, enfatiza a utilização de
conexões no próprio documento. Os links internos são responsáveis pela ligação do hipertexto
principal com outras conexões no próprio ambiente. Este aspecto permite uma dinâmica de
diálogo entre diferentes textos, imagens fixas ou em movimento, sons, gráficos entre outras
formas. Este aspecto é de fundamental importância na elaboração de conteúdos hipertextuais,
pois facilita a navegação no mesmo ambiente e a articulação entre os diferentes formatos de
conteúdos. Cursos que trabalham com esta perspectiva tendem a articular melhor as
discussões que estão sendo provocadas, pois existe a possibilidade de relacionar conceitos
importantes trabalhados nas temáticas em discussão, bem como esclarecer dúvidas em relação
91
a estes temas.
No que tange à intertextualidade, esta permite a abertura do texto ao exterior e
faculta ao estudante o acesso a diferentes sites com temáticas semelhantes à proposta de
estudo do curso. Esta experiência é bastante rica, haja vista que amplia a capacidade de
análise de diferentes pontos de vista, enriquecendo a leitura através da abertura a diversos
textos, estabelecendo-se um verdadeiro diálogo que o leitor constrói, traçando seu próprio
caminho. Este aspecto é fundamental no contexto da cibercultura, pois permite ao estudante
construir sua itinerância ao longo do processo, não ficando somente restrito aos conteúdos do
curso.
E, por último, a autora destaca a multilinearidade que é uma das principais
características do hipertexto digital. Cursos que contemplem este aspecto devem permitir
também uma navegação sobre diferentes ângulos. Perspectivas de trabalho engessadas e
lineares, que não incluam o movimento, a incerteza e a imprevisibilidade, podem desmotivar
o estudante no seu processo de estudo. Daí, a necessidade do conteúdo do curso estar
disponível, permitindo ao educando acessar as informações a partir de qualquer ponto.
Dessa forma, o ambiente não limita a navegação dos participantes e promove uma
comunicação centrada nos pressupostos da interatividade, permitindo ao sujeito a autoria de
suas ações. Assim, o professor, tanto no ensino presencial quanto à distância, deve gerir
situações facilitadoras da aprendizagem, articular diferentes pontos de vista, instigar o diálogo
entre os alunos e a produção conjunta, a busca de informações e a expressão do pensamento
do aluno, orientando-o em suas produções e na recuperação e análise dos registros e suas
respectivas reformulações (ALMEIDA, 2003a).
4.4 ALGUNS AMBIENTES DISPONÍVEIS NO CIBERESPAÇO
Podemos encontrar diversos ambientes de aprendizagem no ciberespaço, que
utilizam diferentes interfaces de comunicação e interação, alguns agregando tecnologias mais
simples, outras tecnologias mais sofisticadas. Apresento de forma mais genérica o Teleduc e o
Aula Net e discuto de forma mais aprofundada as características do ambiente Moodle, que foi
lócus do desenvolvimento dessa pesquisa.
92
4.4.1 Teleduc
O Teleduc
19
é um ambiente de ensino à distância que permite a realização de cursos
via internet. Está sendo desenvolvido conjuntamente pelo Núcleo de Informática Aplicada à
Educação (Nied) e pelo Instituto de Computação (IC) da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp).
Figura 9 - Página inicial do Projeto Teleduc
.
O principal objetivo da criação desse ambiente foi a necessidade de suporte para a
formação de professores, tendo como foco o trabalho com informática educativa. Para o
desenvolvimento das interfaces, a equipe ouviu atentamente as demandas dos usuários, e
vivenciou um trabalho colaborativo, o que gerou um resultado satisfatório, pois o ambiente
demonstra funcionalidade acessível, mesmo para pessoas que não entendam de computação.
Para Rocha (2003), o desenvolvimento do ambiente tem como perspectiva maior a
utilização da internet como meio para a construção de conhecimentos, a facilidade e
flexibilidade do uso, por parte dos usuários, que podem adequar sua proposta pedagógica às
ferramentas disponibilizadas.
As funcionalidades oferecidas pelo Teleduc estão agrupadas em três grupos:
interfaces de coordenação, interfaces de administração e interfaces de comunicação. As
interfaces de coordenação têm como objetivo principal organizar as ações no curso,
informando aos alunos as intenções da proposta, e contribuindo para uma melhor organização
e compreensão da dinâmica de trabalho. As interfaces de comunicação podem ser
acessadas dentro do ambiente, a exemplo do correio, bate-papo, fóruns de discussão e mural.
Entretanto, com o desenvolvimento de novas versões, se pode enviar e-mail externo aos
destinatários, porém a resposta pode ser dada a partir do acesso ao ambiente. As interfaces
93
de administração têm como objetivo dar apoio ao gerenciamento do curso, através do suporte
e da administração e não são visíveis aos alunos (ROCHA, 2003).
4.4.2 Aula Net
Figura 10 - Tela de Abertura do AmbienteAula Net
O ambiente Aula Net
20
foi desenvolvido no Laboratório de Engenharia de Software
(LES) do Departamento de Informática da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ), para a
administração, criação, manutenção e participação em cursos à distância.
A filosofia do ambiente se fundamenta no princípio da cooperação entre os alunos e
entre alunos e docentes, tendo como suporte as interfaces da internet. Traz como premissas a
interatividade nas propostas dos cursos, a utilização por pessoas que não são especialistas na
área e a reutilização de conteúdos já existentes em mídia digital.
Vavassori e Raabe (2003) destacam o docente, o aprendiz e o administrador como os
principais autores do ambiente, ressaltando a função dos mesmos. Para esses autores,a
construção da proposta educativa é de responsabilidade do docente, que conta com uma série
de ferramentas como o fórum, chat, portfólio etc. O aprendiz é de suma importância na
dinâmica do ambiente, que sua participação ativa é fundamental no desenvolvimento de
processos cooperativos com os demais participantes. As questões mais técnicas, relativas à
matrícula e ao registro no AVA, são de responsabilidade do administrador, que opera
continuamente no ambiente.
Completam ainda os autores, que o ambiente dispõe de algumas interfaces para a
disponibilização dos cursos, que são: os mecanismos de comunicação, de coordenação e de
cooperação. Os mecanismos de comunicação possibilitam o envio de mensagens aos docentes
19
http://teleduc.nied.unicamp.br/pagina
20
http://aulanet.cinted.ufrgs.br/aulanet2
94
e à coordenação do curso, além da criação de grupos de discussão, grupos de interesse,
debates através de chat e o contato com os participantes conectados no ambiente. Já os
mecanismos de coordenação como avisos, planos de aula, tarefas, avaliação e relatórios de
participação, permitem a criação de atividades e um melhor acompanhamento dos estudantes.
Tendo como foco o trabalho coletivo, os mecanismos de cooperação disponibilizados no
ambiente como a bibliografia, a webliografia, a documentação, o download, a co-autoria
docente e a co-autoria do aprendiz permitem que os sujeitos possam cooperar uns com os
outros, socializando seus saberes e construindo novas habilidades (VAVASSORI & RAABE,
2003).
4.4.3 Moodle
Figura 11- Ambiente Moodle da UFBA
.
O Moodle
21
(Modular Object – Oriented Dynamic Learning Environment) é um
ambiente de aprendizagem à distância que foi desenvolvido pelo australiano Martin
Dougiamas, em 1999. As crenças de Martin nas inúmeras possibilidades da educação baseada
na internet o levaram a fazer mestrado e doutorado na área de Educação, combinando sua
experiência em ciência da comunicação com teorias sobre a construção do conhecimento,
natureza da aprendizagem e da colaboração.
O Moodle é um software livre, pois acesso ao código fonte
22
, podendo-se usufruir
de quatro liberdades fundamentais: uso, cópia, modificação e redistribuição. Com esse código
em mãos, associado às quatro liberdades mencionadas anteriormente, garante-se uma maior
21
http://www.moodlebrasil.net/moodle/
22
“Código fonte é o conjunto de palavras escritas de forma ordenada, contendo instruções em uma das
linguagens de programação existentes no mercado, de maneira lógica. As linguagens compiladas, após ser
compilado o digo fonte, transformam-se em software” (Wikipédia). Disponível na URL:<
http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_fonte>. Acesso em: 06 ago.2007.
95
acessibilidade do conhecimento a todos. Dessa forma, existe a possibilidade de se ter acesso
ao ambiente de forma gratuita, modificar ou desenvolver novos módulos, corrigir erros e
resolver problemas. Nesta lógica, o Moodle pode ser instalado sem nenhum custo em qualquer
servidor, nos desobrigando a fazer atualizações ou pagar por manutenção, como nos softwares
proprietários
23
.
Estas características m promovendo a utilização do ambiente por diversas
instituições em todo o mundo, e impulsionou a formação de uma comunidade de pesquisa
24
,
na qual os integrantes discutem desde questões relativas à criação de novas ferramentas, até
propostas pedagógicas do ambiente e de suas interfaces. A existência dessa comunidade é
fundamental para o sistema, pois as dúvidas de um usuário podem ser respondidas por seus
colaboradores em qualquer parte do mundo.
Em relação às questões pedagógicas, o seu criador Martin Dougiamas adotou o
Construcionismo Social como fundamento educacional da proposta do ambiente. Esta teoria
se baseia no pressuposto de que as pessoas aprendem melhor quando estão engajadas em um
processo social de construção de conhecimento pelo ato de construir alguma coisa para o
outro. Desta forma, o conceito deixa clara a importância do trabalho em grupo no
desenvolvimento da aprendizagem, e a constante negociação de significados entre seus
membros. Estes aspectos são evidenciados no Moodle, onde o enfoque do trabalho se em
ferramentas que possibilitam a discussão e o compartilhamento de experiências (PULINO
FILHO, 2007).
A seleção das ferramentas para o desenvolvimento do trabalho pedagógico pode ser
feita pelo professor, que vai escolher de acordo com os objetivos do curso. Assim, o docente
pode selecionar chats, fóruns, diário de bordo, disponibilizar o livro com alguns conteúdos do
curso, tarefas, entre outras possibilidades.
Para Alves e Brito (2005), o Moodle destaca-se dos outros ambientes por permitir a
utilização das interfaces de forma flexibilizada, podendo, através de diferentes metáforas,
pleitear outras perspectivas, pautado na mesma funcionalidade. Um chat, por exemplo, pode
ser utilizado como ponto de encontro entre os participantes, assim como espaço de discussão
de determinada temática do curso. O fórum pode ser utilizado como um portfólio, um
relatório de atividades de campo, bem como espaço para discutir conceitos. Os autores
destacam a importância dessas possibilidades, pois o professor não precisa ficar dependendo
23
Código fonte fechado, caro e com necessidade de contrato de manutenção.
96
do conhecimento técnico de um profissional da área, que são as demandas colocadas pela
prática pedagógica que irão desafiá-lo na construção de novas propostas.
Os cursos no Moodle podem ser configurados em três formatos, escolhidos de acordo
com a atividade educacional a ser desenvolvida. São eles: Formato Social, onde o tema é
articulado em torno de um fórum publicado na página principal; Formato Semanal, no qual o
curso é organizado em semanas, com datas de início e fim; Formato em Tópicos, onde cada
assunto a ser discutido representa um tópico que não tem limite de tempo pré-definido.
O ambiente dispõe de interfaces de comunicação, de avaliação, de disponibilização
de conteúdos e de administração e organização. Para seu acesso, a página do curso apresenta
dois tipos de entrada: o material e as atividades. O material geralmente é utilizado para a
organização de conteúdos que podem ser disponibilizados por meio de textos simples, páginas
Web e links para arquivos ou endereços da internet. No item atividades, o usuário pode
adicionar as interfaces de comunicação, avaliação, além das complementares como os
glossários, diários etc. O chat e o fórum são as ferramentas de comunicação disponíveis no
ambiente. O fórum traz um diferencial fundamental dos outros ambientes, que é o envio e
recebimento das mensagens via e-mail. Isso facilita a interação do participante com as
discussões do curso (CASTILLO, 2005).
Além disso, o Moodle, em particular, permite configurar três tipos de fóruns: o fórum
de discussão simples, o fórum geral e a inserção de um novo tópico. No formato da discussão
simples, um tópico único, em uma única página, geralmente usado para organizar
discussões pontuais sobre determinada temática. O fórum geral traz como principal
característica a abertura para o início de nova discussão, através da inserção de novos tópicos.
O formato relativo à abertura de um novo tópico de discussão permite a abertura de apenas
um novo tópico, onde todos os participantes podem responder às mensagens.
O fórum permite também a configuração de ações a serem executadas pelos
participantes do curso. Outra particularidade do Moodle é o recebimento ou não das
mensagens postadas no fórum. Cabe a cada equipe de trabalho definir se os alunos serão ou
não assinantes.
A definição de tipos de grupo é outra ação importante potencializada por esse
ambiente, pois permite escolher a forma mais adequada de utilização do fórum. São
basicamente três formatos: a)
Nenhum grupo: não distinção entre grupos; b) Grupos
24
Comunidade brasileira do Moodle.org. Disponível em < http://moodle.org/course/view.php?id=35> . Acesso
em 06 de ago. 2007.
97
separados: membros de grupos iguais interagem entre si, mas não com membros de outros
grupos; c)
Grupos visíveis: eles não interagem, mas podem ver as mensagens e atividades de
outros grupos.
O ambiente dispõe de algumas interfaces de avaliação como pequenas enquetes,
disponibilização de tarefas, avaliação de trabalho dos colegas e questionários, no auxílio das
questões pedagógicas. Em relação às demandas administrativas, o ambiente disponibiliza, na
lateral esquerda da tela do curso, a relação de participantes, gerenciamento dos arquivos dos
cursos, relação de notas etc.
Assim, os ambientes virtuais de aprendizagem podem ser utilizados como suporte
para a educação online, apoio às atividades de sala de aula, cursos de extensão, formação
continuada, ampliando as interações para além daquelas inerentes ao espaço-tempo, face-a-
face. As opções curriculares de cada instituição, a articulação do grupo de trabalho e os
objetivos educacionais pleiteados é que irão definir o desenho didático e a concepção
educacional do ambiente.
É nesse sentido que iremos discutir no capítulo 5, de forma mais aprofundada, os
desafios contemporâneos na formação de professores, e mais especificadamente os saberes
docentes.
98
SABERES DOCENTES
É sábio aquele que sabe usar o conhecimento para integrar à própria realidade. (...)
A arrogância epistêmica do cientista é o antônimo da sabedoria porque não tem
senso de relatividade, senso de contingência, senso de delimitação”. (
Antônio
Joaquim Severino
in: Jornal Folha de São Paulo, 30/11/2007: Caderno 5, p. 14).
99
5 OS SABERES DA DOCÊNCIA
Este capítulo tem por objetivo trazer uma discussão mais ampla sobre os desafios
contemporâneos na formação de professores, situando os avanços tecnológicos e a
importância do resgate da profissionalização docente. Reflete sobre alguns enfoques e
tipologias dos saberes que servem de base à docência, como aspectos imprescindíveis à
profissionalização docente sem, contudo, enfatizar profundamente a discussão dos saberes
docentes na educação online, pois se trata de uma caracterização mais geral do campo de
estudo para a introdução da questão.
5.1 DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
O cenário contemporâneo, caracterizado pelos avanços tecnológicos, tem nos
desafiado a vivenciar uma nova relação com a informação, principalmente no que diz respeito
à velocidade com que estas circula, gerando momentos de incerteza no contexto mais amplo
da sociedade e, de forma particular, nas instituições educacionais. Em especial, as tecnologias
da informação e comunicação vêm possibilitando a emergência de novas atitudes, novos
valores e troca de saberes, exigindo de nós habilidade para compreender melhor essa
realidade e para buscar soluções em sintonia com os problemas do nosso tempo.
De forma mais específica, esse cenário de mudanças traz novos desafios à formação
profissional e, em especial, à formação de professores, que requer melhor qualificação para se
vivenciar a dinâmica social, principalmente em relação à mutação contemporânea do saber na
sociedade atual. Lévy (1999, p. 157) salienta que “pela primeira vez na história da
humanidade, a maioria das competências adquiridas por uma pessoa no início de seu percurso
profissional estarão obsoletas no fim de sua carreira”. Segundo o autor, a aprendizagem
constante, a troca de saberes e a produção de conhecimentos são características fundamentais
na organização do trabalho na sociedade contemporânea.
Conforme infere Lévy (1998), a configuração do ciberespaço potencializa o
desenvolvimento da inteligência coletiva, por meio das tecnologias intelectuais que nos
possibilitam vivenciar novas formas de acesso à informação e o desenvolvimento de novos
estilos de raciocínio e de conhecimento. Nessa lógica, o profissional nunca estará formado,
demandando continuamente novas perspectivas de trabalho que contemplem a construção de
novos conhecimentos.
100
Sob esse prisma, a formação docente, cuja base está na implementação de propostas
de ensino, tanto presencial como à distância, mediadas pelas TIC, no que tange à
aprendizagem de novos conhecimentos esta deve emergir das necessidades contextualizadas
dos sujeitos, em diálogia com uma cosmovisão aberta à desordem, à multiplicidade cultural, à
reflexão ético-política, por meio da crítica social do conhecimento e do conhecimento
educacional. Nessa perspectiva, não podemos pensar em projetos de formação com currículos
engessados, que não dialoguem com o contexto, a exemplo das propostas de educação online
baseadas na proposta linear da informação, bem como numa abordagem comunicacional de
cultura de massa, na qual as informações são distribuídas, separando emissão e recepção.
Assim, o contexto da cibercultura e a emergência da educação online reconfiguram
outra dinâmica em processos de formação de professores, na qual a plasticidade da
informação potencializa uma articulação da aprendizagem personalizada e coletiva em rede, a
partir das tecnologias da informação e comunicação. É fundamental considerar, nessa
discussão, a inclusão dos saberes da experiência, adquiridos pelos sujeitos nos diferentes
espaços sociais e profissionais, de forma a valorizar a participação de cada indivíduo, no
intuito de que esses conhecimentos sejam integrados e mobilizados enriquecendo
culturalmente a todos. Como forma de garantir o cumprimento dessas finalidades, a academia
teria um papel fundamental em relação à orientação e ao reconhecimento dessas experiências,
utilizando todo o potencial do ciberespaço, principalmente no desenvolvimento de propostas
de ensino à distância (LÉVY, 1999).
Daí a necessidade de substituir uma concepção de profissionalização baseada numa
visão tecnicista, que implementa inovações prescritas, por uma visão de profissional que
participe do processo de inovação e mudança. É indispensável que o profissional da educação
assuma a autoria do seu trabalho, tomando decisões educativas, éticas e morais, tendo o
contexto coletivo como cenário determinante, rompendo assim com uma dimensão
meramente técnica e unidirecional da formação, rumo à outra ótica de abordagem profissional
sintonizada com os desafios contemporâneos. Esse desafio se torna ainda mais urgente diante
do cenário sociotécnico da cibercultura, que possibilitou a emergência da educação online, e o
surgimento de ambientes virtuais de aprendizagem como espaços plurais de formação
docente, o que requer um professor muito mais atuante no seu percurso formativo.
Para Ramalho, Nuñez e Gauthier (2004), o enfoque da formação, cuja base está na
racionalidade técnica, gera um processo de desprofissionalização, pois o docente é visto como
um executor e consumidor de saberes profissionais produzidos por especialistas. Essa
perspectiva de formação é pautada no treinamento de habilidades, e os conteúdos são
101
descontextualizados das demandas que emergem da prática docente, gerando uma dicotomia
teoria/prática.
Contribuindo para a discussão dessa questão, encontramos em Imbernón (2005) a
reflexão sobre a profissão docente diante dos desafios da chamada sociedade globalizada, do
conhecimento ou da informação, evitando uma formação baseada nos pressupostos da
racionalidade técnica, na qual a transmissão do conhecimento se mediante a aplicação
mecânica de receitas e intervenções, oferecidas a partir de fora, geralmente pelo grupo de
acadêmicos e pesquisadores universitários, bem como por especialistas que assumem funções
administrativas de planejamento e controle no sistema educacional. Para a superação dessa
visão tecnicista, o autor sugere propostas curriculares, que possibilitem a aprendizagem,
interpretação, compreensão e reflexão sobre a realidade social.
Percebemos, nessa análise, uma preocupação com a superação do tecnicismo, pois
essa perspectiva pauta-se na idéia de que os profissionais resolvem seus problemas mediante a
aplicação de técnicas e teorias propostas pelos especialistas. Na realidade, ao final do
repertório proposto como solução para as demandas da prática, o profissional não sabe como
resolver as problemáticas emergentes do seu contexto de trabalho. Assim, em uma sociedade
que traz como base o desafio da formação permanente, a perspectiva tecnicista torna-se
reducionista, porquanto não conta de acompanhar a mutação contemporânea do saber,
mediante a velocidade da informação.
Nesta conjuntura, é imperioso que os profissionais reflitam criticamente sobre a sua
prática e produzam conhecimento frente às constantes transformações vivenciadas. A
dinâmica de formação precisa estar sincronizada com as TIC, com vistas a contribuir com a
produção de conhecimento e cultura, que a lógica do digital potencializa a troca, a
discussão coletiva e o estabelecimento de vínculos entre os participantes.
Diante da fecundidade de discussões sobre a formação docente, na tentativa de se
romper com a perspectiva da racionalidade técnica, e da dicotomia teoria-prática,
principalmente no que se refere à implementação das tecnologias da informação e
comunicação na prática dos professores, o presente trabalho – Os saberes docentes em
ambientes de aprendizagem discute de forma mais específica algumas pautas
imprescindíveis à formação do docente e, em especial, do docente online: a reflexividade, a
pesquisa e os saberes da docência. A articulação entre estes elementos, de forma sistêmica,
contribui com a concepção mais ampliada da docência no ciberespaço.
102
5.2 REFLEXIVIDADE NA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES: UM DESAFIO PARA A
SUPERAÇÃO DA ALIENAÇÃO TÉCNICA
Em relação à idéia de professor reflexivo, Schön (2000) é um dos principais
representantes dessa teoria, a partir de sua análise em diferentes reformas curriculares nos
EUA. Para o autor, a perspectiva curricular que enfatiza primeiramente os enfoques teóricos,
seguidos de sua aplicação e, por último, um estágio para aplicação dos conhecimentos
técnicos-profissionais, não conta das diferentes demandas colocadas pela profissão, pois
estas superam as reflexões teóricas e as respostas técnicas apresentadas ao longo da formação.
Essa fragmentação é facilmente percebida quando os conhecimentos teóricos são
confrontados com as demandas da prática cotidiana, mostrando-se insuficientes e inúteis.
Schön (2000) assevera que a formação do profissional deve basear-se na
epistemologia da prática, tomando o contexto profissional como lócus formativo, no qual
sujeito vai paulatinamente construindo conhecimento, através da reflexão, análise e
problematização, além do desenvolvimento do conhecimento tácito mobilizado no cotidiano
da profissão.
Em relação à epistemologia da prática, a reflexão de Monteiro (2002, p.115) bastante
pertinente, quando infere que
a epistemologia da prática refere-se à produção (technê) de um saber,
permitido por um outro olhar (thôréô), sobre o que e quê é feito (prássô).
Por isso, é possível teorizar sobre a prática, pois essa é observável; toda
prática (prássô) submetida a um novo olhar (theôréô) pode ser modificada.
Sob este enfoque, percebemos de forma clara a valorização da prática pedagógica, a
partir da reflexão onde os desafios colocados pela docência promovem a construção de novos
saberes, configurando um conhecimento prático. Percebe-se então, nesse contexto, a
importância do papel da teoria, no sentido de oferecer aos docentes diferentes perspectivas de
análise na (re) visão de suas práticas. Na educação em geral, essa reflexão é imprescindível,
pois os docentes se defrontam com uma variedade de situações imprevisíveis, requerendo do
profissional o desenvolvimento de habilidades para gerir as situações emergentes.
Sob a ótica de Alarcão (2005), a idéia de professor reflexivo está assentada no
pressuposto de que o ser humano é um ser criativo e não um mero executor de idéias e
práticas que lhe são exteriores. Nessa perspectiva, destaca-se a noção de profissional que,
diante da incerteza e imprevisibilidade do seu trabalho, age de modo inteligente e flexível.
Daí a importância de se pensar em contextos formativos que favoreçam o desenvolvimento da
capacidade reflexiva do professor, superando um nível meramente descritivo, para outro que
103
retrate interpretações articuladas do contexto de trabalho.
Quanto aos processos de formação de professores, tendo como base os pressupostos
da reflexão, recorremos a Kemmis (1995, apud GÓMEZ, 1995, p. 104 e 105), que esclarece a
natureza desse conceito:
1. A reflexão não é determinada biológica ou psicologicamente, nem é
pensamento puro, antes expressa uma orientação para a ação e
refere-se às relações entre o pensamento e a ação nas situações
históricas em que nos encontramos.
2. A reflexão não é uma forma individualista de trabalho mental, quer
seja mecânica ou especulativa, antes pressupõe e perfigura relações
sociais.
3. A reflexão não é nem independente dos valores, nem neutral, antes
expressa e serve interesses humanos, políticos, cultuais e sociais
particulares.
4. A reflexão não é indiferente nem passiva perante a ordem social,
nem propaga meramente valores sociais consensuais, antes reproduz
ou transforma activamente as práticas ideológicas que estão na base
da ordem social.
5. A reflexão não é um processo mecânico, nem simplesmente um
exercício criativo de construção de novas idéias, antes é uma prática
que exprime o nosso poder para reconstruir a vida social, ao
participar na comunicação, na tomada de decisão e na ação social.
Como Kemmis, entendo que o processo de reflexão não pode ser concebido como
uma categoria individualizada que pode ser analisada à margem dos contextos em que são
gerados. Assim, essa análise precisa estar em sintonia com as experiências humanas,
carregadas de valores, interesses sociais e cenários políticos. Daí, o desafio para que o
acadêmico estar já articulado à realidade concreta dos indivíduos.
Contribuindo para o debate sobre essa questão, Imbernón (2005) ressalta a
importância de os programas de formação investirem no desenvolvimento do profissional
reflexivo, possibilitando aos professores a aquisição de conhecimentos, habilidades e atitudes
para enfrentar as problemáticas postas pela prática docente e pelo contexto social mais amplo.
Isso requer o desenvolvimento de propostas de formação que dotem os profissionais de
instrumentos intelectuais para a análise e busca de soluções das questões em que se deparam.
Para Contreras (2002, p. 110),
[...] os problemas que demandam atitudes reflexivas dos profissionais são
aqueles para os quais não são válidas as soluções acumuladas em seu
repertório de casos. São aquelas situações para as quais não se têm, em
princípio, nem sequer uma forma adequada de interpretá-las, de tal maneira
que é necessário entender simultaneamente a situação e modificá-la.
104
Do que foi exposto até aqui, fica clara a importância do diálogo e do embate entre os
docentes, no sentido de propiciar trocas reflexivas sobre sua prática, contribuindo para uma
maior qualificação de sua profissão e, conseqüentemente, uma melhoria do seu trabalho.
Gómez (1995), inspirando-se em Habermas e Shön, distingue três conceitos que
integram o pensamento prático do professor: conhecimento na ação, reflexão-na-ação e
reflexão sobre a acção e sobre a reflexão-na-acção.
Em relação ao conhecimento na ação, teríamos a dimensão do saber- fazer, inerente a
toda atividade humana. São ações que vamos realizando de forma espontânea sobre as quais
não exercemos nenhum controle. Assim, o conhecimento não vem antes da ação e sim está na
ação. Entretanto, vivenciamos situações em que nos distanciamos das ações que estamos
realizando, ou mesmo pensamos sobre as nossas ações, no momento em que estão sendo
realizadas.
É o que Schön caracterizou como reflexão-na-ação, que traz alguns desdobramentos
para a prática profissional, pois as semelhanças entre as situações vivenciadas nos fazem
desenvolver um repertório de cnicas e de ações que servirão de sustentáculo para as novas
decisões. São saberes da experiência que vão alimentando o nosso conhecimento da prática,
que vão se tornando cada vez mais repetitivos e estáveis. Porém, quando as situações
problemáticas, colocadas pelo contexto do trabalho, não conseguem ser respondidas pelo
repertório de experiências que se construiu, o profissional é desafiado a buscar soluções em
relação aos novos desafios que vão se configurando. Esse desafio é fundamental para a
aquisição de novas aprendizagens. Por último, a reflexão sobre a ação e sobre a reflexão-na-
ação, dizem respeito às análises realizadas pelos sujeitos a posteori sobre as características de
suas ações. O profissional, então, analisaria a sua prática aplicando instrumentos mais
conceituais na busca de uma melhor compreensão e reconstrução da mesma. O autor ainda
ressalta que esses processos não são independentes e, sim se complementam na garantia de
uma prática mais efetiva.
Como forma de garantir o cumprimento dessas finalidades, Alarcão (2005) sugere a
pesquisa-ação, que traz como pressuposto fundamental a idéia de que a reflexão sobre a
experiência profissional, tem um grande valor formativo, pois a compreensão da realidade é
fruto da implicação dos sujeitos envolvidos. Para ela, a metodologia da pesquisa-ação
contribui para a sistematização da reflexão, pois traz como características fundamentais o
caráter participativo, motivador e apoiador do grupo, além do impulso democrático e a
contribuição para a mudança.
105
Nesse sentido, a autora indica três construções teóricas que, articuladas com os
pressupostos da pesquisa-ação-formação, contribuem com o desenvolvimento individual e
coletivo dos docentes, no seu processo de aprendizagem: a pesquisa ação; a aprendizagem
experiencial e a abordagem reflexiva. Articulando estas três perspectivas, um primeiro passo
seria a definição e compreensão das problemáticas emergentes da prática docente, pautadas
em processos de observação e reflexão, onde as experiências seriam analisadas e
conceituadas, servindo de referência para novas experiências. Esse processo retrata a
aprendizagem numa dinâmica cíclica, em constante desenvolvimento.
Contribuindo para a reflexão dessa questão, Smyth (1991, apud CONTRERAS,
2002), sugere um ciclo em quatro fases que representam os tipos de reflexão que os docentes
deveriam adotar, conforme figura 12:
1. Descrever: o que eu faço?
2. Informar: qual o significado do que eu falo?
3. Confrontar: como cheguei a ser dessa maneira?
4. Reconstruir: como poderia fazer as coisas de forma diferente?
1
1
.
.
D
D
E
E
S
S
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C
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R
I
I
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Ç
Ã
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O
O
“Quais são minhas práticas?”
Exemplo de práticas que refletem:
Regularidade
Contradições
Fatos relevantes
Fatos não – relevantes
Incluindo os elementos:
Quem?
O que?
Quando?
Figura 12 – Ciclo de reflexão
2
2
.
.
I
I
N
N
F
F
O
O
R
R
M
M
A
A
Ç
Ç
Ã
Ã
O
O
“Quais teorias se expressam em
minha prática?”
Analisar as descrições para
identificar as relações entre os
elementos. Sobre esta base,
formular proposições do tipo:
“parece como se...”
4
4
.
.
R
R
E
E
C
C
O
O
N
N
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S
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T
R
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U
Ç
Ç
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O
O
“Como poderia mudar?”
O que poderia fazer de
forma diferente?
O que considero
pedagogicamente
diferente?
O que tenho de fazer
para introduzir essas
mudanças
?
3
3
.
.
C
C
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O
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N
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F
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O
N
N
T
T
O
O
“Quais são as causas?”
Pressupostos, valores,
crenças?
De onde procedem?
Que práticas sociais
expressam?
O que é que mantém as
minhas teorias?
O que limita as minhas
teorias?
Que conexões há entre o
pessoal e o social?
Servem a que interesses?
106
Diante do exposto, e em sintonia com as propostas de Alarcão (2005) e Smyth
(1991), percebemos a necessidade de um constante questionamento dos docentes sobre suas
práticas, a fim de que possam reconhecer as limitações da sua atuação e se reconhecerem
como agentes potencialmente capazes de modificar as situações de trabalho nas quais estão
imersos.
Colocar em destaque essas questões requer, segundo Pimenta (2002, p. 22), a
superação de alguns equívocos nos processos de formação de professores, tais como: o
praticismo”, onde a prática sem reflexão teórica, seria determinante para a construção dos
saberes docentes. Para a autora, essa visão é reducionista, pois desconsidera o papel da teoria
dotando os sujeitos de variados pontos de análise, no sentido de compreender de forma mais
ampla o contexto que está inserido; o individualismo”, pois a reflexão seria centrada em
torno do próprio sujeito, reduzindo a reflexão a uma perspectiva individual, faltando a
inclusão da dimensão institucional e social; uma “hegemonia autoritária” na qual basta
apenas o processo de reflexão para a resolução de todas as dificuldades colocadas pela prática.
Assim, esse aspecto também é problemático, pois desconsidera o contexto mais amplo no qual
o profissional está inserido; e, por último, o “modismo podendo gerar uma apropriação
acrítica e uma banalização no enfoque da reflexão.
Zeichner (2002) destaca, sobre esse tópico, que o movimento da prática reflexiva tem
contribuído para o debate sobre a participação mais ativa dos professores na elaboração dos
propósitos do seu trabalho, e que o processo de aprender e ensinar continua ao longo de toda a
carreira profissional. Entretanto, o autor enfatiza que essa abordagem não avança no que diz
respeito à discussão sobre a hegemonia teórica da produção universitária na prática
pedagógica dos professores, pois ignora que as teorias são produzidas por meio de práticas e
que as práticas trazem no seu contexto compromissos teóricos. Teríamos, segundo ele, a
versão reflexiva da racionalidade técnica. Outra crítica que o autor levanta e que foi apontada
por Pimenta (2002), diz respeito ao viés individualista explícito na discussão sobre o
professor reflexivo, onde o contexto de trabalho do professor é visto como algo dado, sem
uma análise mais aprofundada dos aspectos estruturais da sociedade.
Como Zeichner e Pimenta, entendo que o trabalho do professor não pode ser
desarticulado do contexto mais amplo da sociedade, para que possamos compreender as reais
dificuldades advindas da prática em articulação com os condicionantes estruturais, na busca
de soluções conjuntas para a melhoria do trabalho docente e mais especificamente dos
objetivos educacionais.
107
Vale ressaltar também que a formação de professores para a docência online, tendo
como base a reflexão, precisa incorporar propostas onde essas discussões coletivas,
sintonizadas com os dilemas docentes, superem uma visão meramente individualista da
prática pedagógica. Os dilemas surgem na própria dinâmica da prática docente, desafiando os
professores a tomarem decisões entre o que sabem e o que não sabem, entre o que planejaram
e as reais possibilidades de execução, entre o que experimentaram anteriormente e o desafio
de implementar inovações.
Isto posto, a discussão sobre os dilemas docentes torna-se um elemento
imprescindível na formação, por exigir um processo de reflexão na sua identificação, e
também por desafiá-los a encontrar formas de enfrentamento. Nessa perspectiva, as propostas
de formação que lançam mão dos diferentes ambientes de aprendizagem, presentes no
ciberespaço, podem contribuir de forma efetiva com o debate entre os profissionais, por
possibilitar a discussão coletiva em rede, bem como promover uma rotatividade de funções, e
desenvolver a autonomia do docente na construção de novos saberes.
5.3 PROFESSOR-PESQUISADOR: EM BUSCA DA MELHORIA DA PRÁTICA
No contexto da formação profissional docente, além da reflexão, a pesquisa tem
papel fundamental, pois é através dela que o professor entende melhor e redimensiona seu
cotidiano de trabalho. A dimensão da pesquisa, no processo de formação, contribui com a
elaboração de novos questionamentos e a constante necessidade de saber e compreender, de
forma mais ampla, os fenômenos vivenciados. Igualmente colabora com a criação de novas
estratégias para o enfrentamento das problemáticas colocadas pela prática, de forma mais
eficaz.
Nesse sentido, pesquisar é questionar, inquietar-se, problematizar a própria realidade
em que se está inserido, na busca constante de novas alternativas que irão se transformar em
novas práticas, portanto, novos pontos de partida para outras indagações. Essa
retroalimentação permanente é indispensável no processo reflexivo, se estamos tratando de
profissionais em constante processo de atualização, aprendendo sempre, criativos e flexíveis
no ensinar, fazendo com que o processo educacional seja fluido, sinergético e produtivo.
Assim, a pesquisa, no contexto contemporâneo é imprescindível para a ampliação dos
conhecimentos de que se dispõe. As propostas de educação pautadas na comunicação de
massa e na racionalidade técnica, pouco podem contribuir com mudanças significativas na
108
reflexão sobre a prática docente, pois não desafiam o professor a investigar sua prática,
centrando-se apenas na pedagogia da transmissão.
Freire (1996, p.28) salienta, que “não ensino sem pesquisa e pesquisa sem
ensino”. Para ele, estas categorias estão imbricadas, pois na itinerância do ensino, nos
deparamos em um constante processo de busca e questionamento. Nesse sentido, a dinâmica
da pesquisa possibilita a constatação, intervenção e conseqüentemente transformação nos
processos de ensinar/aprender.
Nesse contexto, é fundamental que o professor questione as problemáticas
vivenciadas no seu contexto de trabalho, elaborando questões que serão compreendidas com o
auxílio da teoria, tornando-se uma nova prática que tra novas indagações, e
conseqüentemente necessitará de novas atualizações. Logo, a prática tem um papel
fundamental nessa dinâmica, pois é a partir dela que as questões vão emergindo e
configurando o processo de pesquisa. De forma correlata, a teoria atrelada à prática funciona
como uma lente de aumento, para que se possa fazer uma leitura mais ampla da prática
profissional.
Em suas investigações sobre essa temática, Zeichner (2002) denuncia a divisão entre
o professor-pesquisador e o pesquisador-acadêmico. Se por um lado os acadêmicos
consideram as pesquisas dos professores como menores ou triviais, por outro, os professores
não se sentem contemplados nas produções acadêmicas, pois a própria linguagem utilizada
nas produções faz sentido para os pesquisadores de determinada comunidade científica.
Além disso, os professores com freqüência são descritos na pesquisa acadêmica de forma
negativa, gerando uma rejeição em relação a esees estudos. “Provavelmente, como grupo,
professores não são mais sexistas, mais racistas, e mais incompetentes do que os
pesquisadores acadêmicos” ressalta Zeichner (2002, p.211).
Contra essa lógica, o autor recomenda que nas propostas de formação de professores,
os docentes sejam tratados como profissionais que pensam e têm autonomia sobre o seu
trabalho, tomando decisões frente à utilização dos novos conhecimentos na sua prática,
rompendo com a perspectiva de treinamento de habilidades ou receituário de técnicas.
Assim, pesquisar a própria prática na educação online é tomá-la como ponto de
partida, observando as problemáticas, necessidades e indagações que emergem nesse cenário
sociotécnico. Isso não significa a supremacia da prática sobre a teoria, haja vista que é através
da teoria que iremos apreender as sinalizações que vão sendo postas, na busca de novas
alternativas. É nessa trama que vai se configurando o professor e a pesquisadora, rompendo
com a milenar dicotomia entre fazer e pensar, e compreendendo, de forma mais complexa, o
109
processo pedagógico. Essa reflexão é fundamental nas discussões sobre a formação de
professores no contexto da cibercultura, onde as propostas precisam articular as dimensões
teóricas, pedagógicas e tecnológicas. Não basta apenas o “domínio” técnico da máquina, ou
simplesmente saber trabalhar com editores de texto e conhecer alguns softwares. É necessário
estar imerso na cultura digital, compreender o potencial das TIC para a criação de novos
espaços de aprendizagem.
Dessa forma, a participação ativa no Curso de Tutores da UFBA, nos desafiou a
dialogar com os sujeitos, compreender e vivenciar com eles os sentidos, significados, dilemas
e as inquietações na itinerância docente ao longo do curso. É nessa acepção que concordamos
com Santos (2005) quando refere que a pesquisa e prática docente em educação online devem
partir da concepção de estratégia, e não apenas de programa. Em sua definição sobre
estratégia, Morin (2003, p.192) a considera como “a arte de utilizar as informações que
aparecem na ação, de integrá-las, de formular esquemas de ação e de estar apto para reunir o
máximo de certezas para enfrentar a incerteza”.
Diante do exposto e em sintonia com a importância da articulação entre a pesquisa e
a prática pedagógica, é que a noção de planejamento como estratégia foi se configurando
nesse cenário, pois na dialógica entre os docentes do curso, as ações foram sendo organizadas
e reorganizadas, num constante movimento de ação e reflexão sobre a prática docente,
contrapondo-se à noção fechada de programa que concebe o planejamento como uma
seqüência fixa e estruturada, não deixando brechas para a emergência das problemáticas
geradas na prática pedagógica e, conseqüentemente, para a construção de novos saberes.
Nessa lógica, precisamos investir em espaços coletivos para a reflexão entre os
docentes, superando as perspectivas de trabalho individualizado, o que dificulta a análise
crítica sobre a própria prática, impedindo o confronto de idéias e de experiências. André
(2006) também evidencia esse aspecto:
Faz parte do desenvolvimento social do indivíduo aprender a conviver e a
trabalhar com o outro; aprender a ouvir e a se fazer ouvir, expressar opiniões
próprias e acolher pensamentos e opiniões divergentes. Ora, essas
habilidades e comportamentos poderão vir a ser desenvolvidos ou
aperfeiçoados na medida em que existirem situações concretas para seu
exercício. (ANDRÉ, 2006, p.223)
Pertinente a essa discussão é o desenvolvimento de propostas de educação que
agregam as tecnologias da informação e da comunicação na formação de professores, de
forma estruturante, potencializando um trabalho mais colaborativo, estimulando a pluralidade
de idéias e um olhar mais crítico sobre a realidade.
110
Nesse sentido, a questão da pesquisa ocupa um lugar de destaque no debate
contemporâneo sobre formação de professores, pois possibilita o envolvimento dos
participantes na busca de soluções para o coletivo envolvido, além de proporcionar o
desenvolvimento de intervenções para uma melhor compreensão da situação de trabalho. Essa
perspectiva de formação contrapõe-se à visão de um profissional como simples reprodutor e
executor de conhecimentos, a exemplo das propostas de formação de professores na
modalidade à distância, onde a gica da transmissão e da disposição linear do conhecimento
separa emissão e recepção, não desafiando os docentes a pesquisarem e construírem novos
conhecimentos.
5.4 SABERES DOCENTES: SITUANDO A TEMÁTICA
As pesquisas sobre os saberes docentes estão inseridas nas discussões sobre a
profissionalização do ensino, tanto na América do Norte quanto na Europa e América Latina,
tendo em vista as constantes críticas, as pesquisas divulgadas sobre o trabalho docente, em
relação ao despreparo do professor nas tarefas relacionadas ao ensino. Essas pesquisas de
âmbito internacional têm destacado a importância de se dar voz ao professor, como forma de
resgatar a articulação entre o eu pessoal e o eu profissional. Assim, os saberes docentes
passam a ser considerados como um dos principais focos de investigação sobre a formação,
pois não dá mais para separar a prática pedagógica da vida dos professores.
Borges e Tardif (2001) destacam que a gênese desse tema de pesquisa é muito
recente, reportando-se ao seu pequeno desenvolvimento nas décadas do pós-guerra (1940-
1950), onde as discussões assentavam-se nos aspectos psicológicos e psicopedagógicos, com
destaque para os estudos voltados para o aluno, e relegando o papel do professor a apenas
uma variável secundária, que influenciava a aprendizagem discente através do seu
comportamento. Dessa forma, as pesquisas que se debruçavam sobre essa temática, tinham
como foco estudar a eficiência do ensino, associada principalmente a certos traços da
personalidade do professor (amigo, acolhedor, companheiro, entusiasta etc). Para Gauthier et
al (1998,p. 45 ):
Entretanto, nada provava que os traços apontados pelos informantes, fossem
eles alunos, professores de universidade ou outros professores,
correspondiam realmente a um melhor ensino em classe, visto que nenhum
desses estudos media a eficácia dos comportamentos do professor sobre os
alunos. Tudo era baseado na opinião.
111
Analisando esses estudos, percebemos que uma das grandes lacunas desse enfoque
foi não investigar a dinâmica do trabalho docente no contexto da sala de aula, com todas as
suas problemáticas e potencialidades. Ou seja, as pesquisas se limitavam a “uma espécie de
representação ideal do professor, sem examinar o próprio processo de ensino em contexto
real” Dunkin e Biddle (1974, apud GAUTHIER et al, 1998 ).
Nessa análise histórica, Borges e Tardif (2001) destacam as décadas subseqüentes
(1960-1970), como importantes na ampliação dessa temática de pesquisa, porém assentadas
ainda nos mesmos pressupostos dominantes do “processo-produto”. O objetivo desse tipo de
pesquisa era colocar em evidência aqueles comportamentos estáveis do professor que podiam
levar ao aprimoramento do rendimento dos alunos.
Gauthier et al (1998, p.54) ilustram claramente como esse processo ocorria:
Muitas variáveis de tipo “processo foram assim correlacionadas com os
“produtos” do ensino. Por exemplo, as instruções dadas pelo professor ou as
perguntas por ele feitas, o caráter direto ou indireto do ensino, a freqüência
dos exemplos utilizados, o tempo concedido aos alunos para responderem às
perguntas, etc. Da mesma forma, as variáveis de tipo “produto” então
estudadas foram ora o desempenho dos alunos em testes padronizados, ora a
rapidez de aprendizagem, ora a motivação para aprender, ora o grau de
ansiedade, etc.
Essa linha de pesquisa apresenta uma concepção reducionista e instrumental do
processo de ensino e aprendizagem. Traz como foco que o bom ensino é causa suficiente da
boa aprendizagem. Percebe-se aí, uma lógica linear entre essas categorias, deixando de lado
todo processo de complexidade vivenciado na sala de aula.
Contra essa gica, Borges e Tardif (2001) destacam que na década de 1980-1990,
nos Estados Unidos, o movimento de profissionalização docente advertia, entre outras pautas,
para a necessidade de se construir um repertório de conhecimentos profissionais para o
ensino.
No Brasil, o debate tomou fôlego a partir da promulgação da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (9394/96), que permitiu a implementação de políticas públicas a
exemplo do Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF), os
Parâmetros Curriculares Nacionais e principalmente a Formação em Nível Superior dos
Profissionais da Educação Básica. Essas reformas trouxeram como prioridade a discussão
sobre os saberes docentes, reconhecendo o professor como um profissional que se confronta
constantemente com situações complexas e singulares e que precisa dominar certos saberes no
seu campo de trabalho (BORGES & TARDIF, 2001).
112
Tardif, Lessard e Gauthier (1998, apud BORGES, 2004) reconhecem as diferenças
entre o contexto de trabalho dos professores no Brasil e nos outros países, e consideram que
os princípios que regem as transformações em relação à formação de professores são os
mesmos, variando apenas os estágios de evolução. Entre estes princípios teríamos: conceber o
ensino como uma atividade profissional apoiada sobre um sólido repertório de
conhecimentos; conceber a docência na perspectiva do prátcticien reflexif
25
, reconhecer que
os professores são capazes de refletir sobre sua prática e produzirem saberes específicos no
interior do seu trabalho; estabelecer normas de acesso e de regulamentação da profissão;
encarar a prática profissional como um lócus de formação e também de produção de saberes,
buscando elevar a formação intelectual do docente através da formação universitária, bem
como estabelecer vínculos com a realidade educacional.
O estudo de Fiorentini (1998) deixa claro o crescente investimento de pesquisadores
brasileiros quanto ao estudo dos saberes docentes. Para ele, até bem pouco tempo, o foco das
perspectivas de formação de professores, bem como os processos seletivos, estavam pautados
no conhecimento que o docente tinha da sua disciplina. As discussões sobre a prática docente
eram pouco valorizadas. Para o autor, a década de 90 foi fértil para a busca de novos enfoques
e paradigmas sobre essa temática.
Contribuindo para a reflexão dessa questão, principalmente em relação ao princípio
que explicita sobre a importância da prática profissional se constituir como um novo lócus de
produção de saberes, voa (1995), ao esboçar uma análise da profissão docente, destaca a
importância da construção de um corpo de conhecimentos e técnicas visando uma maior
delimitação em relação à especificidade do saber docente. Nessa mesma via, é que se tem
investido em pesquisas onde o foco de estudos passa a ser a prática docente, a qual é vista
como um espaço de edificação dos saberes.
Para adentrar na questão dos saberes docentes, torna-se necessário discorrer sobre o
significado dos termos saber e conhecimento, largamente utilizados nesse estudo. Para
Fiorentini (1998), nem mesmo os filósofos possuem uma posição e diferenciação clara sobre
esses conceitos. Assim, o autor traz os significados dos termos, porém alertando que não se
trata de uma diferenciação tão rígida. Segundo o autor:
[...] “conhecimento” aproximar-se-ia mais com a produção científica
sistematizada e acumulada historicamente com regras mais vigorosas de
validação tradicionalmente aceitas pela academia; o “saber”, por outro lado,
25
Prático reflexivo.
113
representaria um modo de conhecer/saber mais dinâmico, menos
sistematizado ou rigoroso e mais articulado a outras formas de saberes
relativos à prática não possuindo normas rígidas formais de validação.
(FIORENTINI, 1998, p.312).
Charlot (2000, p.60) assevera que para pensarmos sobre a temática dos “saberes”
precisamos compreender o homem enquanto sujeito de saber que se confronta com a
pluralidade das relações que ele mantém com o mundo. Assim, a aquisição dos saberes
asseguraria certo domínio sobre o mundo, possibilitando uma maior comunicação com os
outros homens, e conseqüentemente sua partilha, tornando-o mais independente e seguro.
Concordando com Charlot (2000), compreendemos que o conceito de saber está
estritamente ligado à noção de relação. Uma relação com o mundo, com os homens e consigo
mesmo. Dessa forma, rejeita-se uma concepção de saber pautada unicamente nos pressupostos
da filosofia clássica, que define a essência do homem apenas pela razão, excluindo as
emoções, paixões etc. Charlot (2000, p.60) destaca sobre esse tópico: “trata-se na verdade de
cortar todos os vínculos do sujeito com o mundo, para conservar apenas um: a relação do
sujeito enquanto razão com o saber enquanto idéia”. As pesquisas sobre o ensino que tinham
como foco essa concepção reduziam o saber a “processos mentais (representações, crenças,
imagens, processamento de informações, esquemas etc.), cujo suporte é a atividade cognitiva
do indivíduo (TARDIF, 2002).
Contrapondo-se a essa lógica, é que destaco o conceito de saberes apresentado por
Tardif (2002, p.36), por apresentar as dimensões teórica e prática da docência, afirmando que
o saber docente é plural, formado por um amálgama, mais ou menos coerente, de saberes
científicos oriundos da formação profissional, dos saberes das disciplinas, dos currículos e
saberes da experiência.
Em sintonia com a teoria de Tardif, compreendo o saber docente como o
conhecimento do professor relativo às dimensões do seu saber, saber-fazer, e ser. Essas
dimensões estão enraizadas na experiência, história de vida, formação profissional, e
principalmente na sua edificação a partir das necessidades e dos desafios que emergem no
cotidiano do trabalho, junto a seus pares. Portanto, é um saber que extrapola uma concepção
meramente cognitivista da formação, e inclui, na sua construção, a idéia de uma
aprendizagem progressiva ao longo de uma carreira.
Nota-se então, que a posse de um saber específico é de fundamental importância nas
profissões e, em especial, no magistério, pois o professor não é um simples técnico ou artesão
do ensino e sim um profissional que possui um repertório de saberes construídos no seu
contexto de trabalho.
114
5.5 SABERES DOCENTES: ENFOQUES E ABORDAGENS
A obra de Tardif (2002) intitulada Saberes Docentes e Formação Profissional, e de
forma mais particular o capítulo: “Os professores diante do saber: esboço de uma
problemática do saber docente” pode ser considerado como uma fonte inspiradora de
pesquisas na área do ensino. Tomando como base a sociologia do trabalho e fundamentando
seus estudos na epistemologia da prática, o autor relaciona o saber ao ambiente de trabalho,
afirmando a importância da observação desses condicionantes, compreendendo o que os
professores fazem, pensam e dizem na construção dos saberes. Nessa lógica, é que precisamos
compreender a dinâmica do ensino atrelada a situações concretas de trabalho, e em sintonia
com as propostas institucionais e as demandas da sociedade.
Nesse processo de reflexão, constatamos na obra de Freire (1996) Pedagogia da
Autonomia, alguns saberes indispensáveis à docência, independente da opção política do
profissional. São saberes éticos, estéticos, políticos, pedagógicos que nos inspiram a pensar a
formação enquanto prática essencialmente humana que não pode ser reduzida a simples
rituais de treinamentos, minimizando a criatividade do ser humano no exercício da docência.
O autor, então, destaca como aspecto fundamental na prática educativa, a constante relação
que precisa ser estabelecida entre teoria e prática, evitando-se assim discursos no vazio ou a
edificação do ativismo.
É nesse sentido que, repensando a formação a partir da análise da prática pedagógica,
podemos reconhecer na complexidade da docência, a construção feita pelo professor de uma
série de estratégias e de procedimentos de ensino, pelos quais ele vai paulatinamente
construindo o seu “saber docente” e singularizando o seu trabalho. Entretanto, é preciso
compreender que esses saberes não estão isolados num ambiente educativo, e sim constituem
um saber social. Por ser social, ele é partilhado por um grupo de professores que tem uma
formação comum e são apreendidos ao longo de uma socialização profissional aonde é
constantemente modificado e ressignificado. Assim, as pesquisas sobre os saberes docentes
precisam estar situadas nas articulações entre o individual e o social (TARDIF, 2002).
Para Monteiro (2001), as pesquisas que têm investigado esse conhecimento tácito,
elaborado e mobilizado durante a ação pelos professores e, também, por qualquer outro
profissional prático, possibilitaram o desenvolvimento de uma epistemologia da prática que
abre perspectivas muito promissoras aos estudos do campo educacional. A autora indica
também que esses estudos estão em sintonia com aqueles que têm como pressuposto a idéia
de que uma das origens das dificuldades encontradas no campo educacional é a
115
desqualificação e a incompetência dos professores, e que se voltam para a questão da
profissionalização, buscando compreender sua especificidade e constituição através dos
processos de socialização, identificando nos saberes os aspectos que melhor podem definir a
identidade e autonomia profissional.
Ancorado na idéia de que os saberes docentes são plurais e envolvem uma
diversidade de conhecimentos e de saber fazer, é que Tardif (2002) identifica quatro fontes de
origem dos mesmos: os saberes da formação profissional (das ciências da educação e da
ideologia educacional), os saberes disciplinares, os saberes curriculares e os saberes da
experiência.
Os saberes da formação profissional são transmitidos aos docentes pelas instituições
de formação de professores, através da formação inicial ou continuada, gerando uma divisão
entre os que produzem e os que executam. Esses saberes também podem se manifestar nos
saberes pedagógicos que fornecem um arcabouço ideológico à profissão, a exemplo da Escola
Nova.
Na mesma perspectiva tratada anteriormente, os saberes disciplinares são oferecidos
pela instituição universitária que seleciona diversas disciplinas
provenientes dos diversos
campos do conhecimento e que são oferecidos nos diferentes cursos das universidades sob a
forma de disciplina, a exemplo da matemática, química, literatura etc. Os saberes curriculares
correspondem aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos, a partir dos quais a instituição
educativa categoriza e apresenta os saberes sociais selecionados da cultura erudita, sob a
forma de objetivos, conteúdos e métodos, os quais os professores devem aprender e aplicar.
Por último, mas não menos importante, estão os saberes da experiência que são
saberes específicos do trabalho cotidiano do professor. São esses saberes canalizadores de
todos os outros, saberes da formação profissional, saberes disciplinares e saberes curriculares,
porém retraduzidos e validados nos desafios cotidianos da prática docente. Refletindo nessa
perspectiva, percebemos que os saberes da experiência representam o centro através do qual
os docentes tencionam os saberes que lhes são exteriores na sua formação, com os saberes que
emergem no contexto de sua prática.
É mais uma vez Tardif (2002) quem reconhece os saberes docentes como elementos
fundamentais na constituição da prática pedagógica, e que é através da mobilização e
articulação entre estes diferentes saberes que o fazer docente vai sendo tecido. Entretanto,
percebemos uma clara desvalorização do saber produzido pelos professores no seu contexto
de trabalho, no qual o destaque fica a cargo dos saberes da formação profissional, dos saberes
disciplinares e dos saberes curriculares, que são incorporados à prática docente, sem serem
116
por esta produzidos e formalizados. Essa tendência, segundo o autor, gera uma relação de
exterioridade dos professores em relação aos saberes, pois os mesmos são vistos como
executores dos saberes produzidos por outras instâncias. Nesse sentido, é que os docentes
produzem os saberes experienciais para dominar e compreender melhor a sua prática, criando
e improvisando novas soluções num contexto de diversas interações.
Como forma de garantir o cumprimento dessas finalidades, principalmente na
questão dos docentes transformarem sua relação com os saberes, faz-se necessário que os
mesmos percebam que são autores e produtores de saberes. Daí a importância dos cursos de
formação inicial e continuada inserirem nos seus currículos, perspectivas de pesquisas sobre
essa temática, além de abrirem espaço para a colaboração entre os docentes, gerando assim
um enriquecimento mútuo na troca de experiências.
Em suas investigações sobre essa questão, Tardif (2002) ressalta que os saberes da
experiência permitem aos professores uma reintrepretação dos outros saberes, a partir das
reais necessidades de sua prática, descartando o que ele considera inútil e retraduzindo o que
lhe serve na dinâmica do trabalho. Percebe-se então, que os saberes da experiência trazem
como característica fundamental a retradução e o polimento dos demais saberes, a partir das
certezas construídas pelos docentes.
Estudando a formação por meio da abordagem experiencial, Josso (2004) destaca
três modalidades de elaboração da experiência. A primeira “ter experiência” diz respeito
às vivências de situações e acontecimentos que se tornaram significativos, porém sem termos
provocado. O “fazer experiência” relaciona-se às vivências de situações e acontecimentos que
nós próprios provocamos. E o “pensar sobre as experiências” diz respeito a um conjunto de
vivências que foram sucessivamente trabalhadas para se tornarem experiências. Daí, a
importância de um trabalho reflexivo sobre o que se passou e que foi observado, percebido e
sentido nos percursos de formação. Além disso, para a autora,
[...] aprender pela experiência é ser capaz de resolver problemas dos quais se
pode ignorar que tenham formulação e soluções teóricas. A aprendizagem
experiencial é utilizada, evidentemente, no sentido de capacidade para
resolver problemas, mas acompanhada de uma formulação teórica e/ou de
uma simbolização (JOSSO, 2004, p. 39).
Nota-se então, que para o compartilhamento e análise das experiências, no contexto
coletivo do trabalho, os docentes precisam de uma sólida formação teórica, para perceber as
relações mais complexas da prática, bem como refletir criticamente sobre a mesma. Na visão
de Fiorentini (1998, p. 319),
O saber do professor, portanto, não reside em saber aplicar o conhecimento
117
teórico ou científico, mas sim, saber negá-lo, isto é, não aplicar pura e
simplesmente este conhecimento, mas transformá-lo em saber complexo e
articulado ao contexto em que ele é trabalhado/produzido. Mas convém
lembrar mais uma vez: só negamos algo que conhecemos profundamente.
Essa perspectiva de formação, que visa dotar os professores de instrumentos
intelectuais, a fim de desenvolver sua análise reflexiva sobre a experiência docente, contribui
para a aprendizagem da interpretação e compreensão das problemáticas educacionais e da
realidade social de forma ampla.
Contribuindo com a reflexão dessa questão, com destaque para a importância da
existência de um repertório de conhecimentos sobre o ensino, no processo da
profissionalização docente, Gauthier et.al (1998) denunciam a ausência de uma formalização
dos saberes pelos docentes, e a desarticulação dos saberes produzidos pelo meio acadêmico
com as reais necessidades da docência. Os autores se referem ao ensino como um ofício
universal, uma profissão, que possui uma longa história, e afirmam que sabemos muito pouco
sobre os fenômenos que lhe são inerentes. Destacam ainda a importância das pesquisas
desenvolvidas na sala de aula, nos últimos anos, definirem um repertório de conhecimentos
para a prática pedagógica, contribuindo para que “o docente se conheça como docente”
(GAUTHIER et al, 1998, p.18).
Em suas investigações, esses autores distinguem três enfoques relacionados às
profissões: ofícios sem saberes, saberes sem ofício e ofícios feitos de saberes. O primeiro
enfoque, ofício sem saberes, refere-se à falta de sistematização em relação ao ensino,
impossibilitando o seu processo de profissionalização. Dentre as discussões dessa categoria,
destaca-se o chavão de que para ensinar basta conhecer o conteúdo. Compreendemos que o
conhecimento do conteúdo é fundamental na atividade de ensino, porém reconhecemos que
reduzir essa atividade apenas a essa dimensão é, no mínimo, uma simplificação do debate. Em
relação ao segundo enfoque, os saberes sem ofício, o autor afirma que a formalização, por si
só, sem uma articulação com os componentes da realidade reduz o debate, e não contribui
com o processo de profissionalização do ensino, pois impede a constituição de um saber
pedagógico. No terceiro enfoque, o autor traz a categoria um ofício feito de saberes, evitando
cair na perspectiva de uma prática sem formalização, bem como numa formalização sem
prática. Gauthier (1998) então apresenta vários saberes que são mobilizados pelos professores
na sua prática: Disciplinar, Curricular, das Ciências da Educação, da Tradição Pedagógica;
Experiencial e o saber da Ação Pedagógica.
A partir das reflexões colocadas por Tardif e Gauthier et al, venho percebendo a
118
importância de se revelar, através das pesquisas sobre o ensino, os saberes da ação
pedagógica, já que eles são a pedra angular da identidade profissional docente. Refletindo
sobre a construção dessa identidade, Pimenta (2005, p.19) enfatiza que esta se dá a partir da
significação social da profissão; da construção constante dos significados
sociais da profissão; da revisão das tradições. Mas também da reafirmação
de práticas consagradas culturalmente e que permanecem significativas.
Práticas que resistem a inovações porque prenhes de saberes válidos às
necessidades da realidade. Do confronto entre as teorias e as práticas, da
análise sistemática das práticas à luz das teorias existentes, da construção de
novas teorias. Constroem-se também, pelo significado que cada professor,
enquanto ator e autor, confere à atividade docente no seu cotidiano a partir
de seus valores, de seu modo de situar-se no mundo, de sua história de vida,
de suas representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios, do
sentido que tem em sua vida o ser professor. Assim como a partir de sua rede
de relações com outros professores, nas escolas, nos sindicatos e em outros
agrupamentos (PIMENTA, 2005, p.19).
Como se pode notar pelo teor das reflexões apresentadas pela autora, a identidade
docente é relacional, pois para existir depende de algo externo, a saber, de outras identidades
que fornecem condições para a sua construção progressiva, situada historicamente. Nessa
perspectiva, a identidade também não é um dado estático e imutável, e sim um processo em
construção. Daí, a importância de se considerar o professor em sua própria formação,
reelaborando seus saberes em confronto com as práticas vivenciadas, suas experiências de
vida, e sua rede de relações.
Outra observação em relação a essa discussão, diz respeito à questão do tempo na
profissão, pois é no trabalho que aprendemos cotidianamente a dominar os saberes relativos à
nossa profissão. Sob esse ponto de vista, não podemos negligenciar a questão da trajetória de
vida do professor e seu processo de socialização enquanto discente. Passamos uma parcela
considerável de nossas vidas na escola, antes de sermos professores, e trazemos essa
representação do papel docente para as nossas práticas (TARDIF, 2002).
Os saberes também são temporais, por desenvolverem-se no âmbito de uma carreira,
ao longo de uma socialização profissional. Huberman (1992) identificou em suas pesquisas
algumas tendências no ciclo de vida pessoal e profissional dos professores que precisam ser
analisadas de forma processual. Teríamos então, a descoberta e exploração, no início da
carreira, passando para um sentimento confortável de estabilização, seguido por uma fase de
lamentações e desinvestimento. Esses elementos precisam ser analisados nos diferentes
percursos da profissão para uma compreensão mais abrangente sobre a construção dos saberes
docentes.
Borges (2004) assevera que os saberes docentes são plurais, heterogêneos e
119
compostos, moldados pelo e no trabalho. A pluralidade está pautada na concepção de que os
saberes são oriundos de fontes diversas, reunindo saberes diferentes e heterogêneos. São
também compostos, por fazerem a convergência da objetivação e precisão de um lado, e da
subjetividade e imprecisão do outro. A autora traz como exemplo a tarefa docente pautada
numa lista de conteúdos, num determinado programa, num determinado tipo de avaliação, em
sintonia com sua ação pedagógica em determinada área. Além dessa lógica externa, proposta
pelos programas, ela destaca o caráter subjetivo da ação docente, em sintonia com as escolhas,
os julgamentos e as percepções pessoais do profissional. É nesse sentido que esses saberes
não podem ser analisados de forma dissociada, e sim de forma amalgamada. Desse mesmo
modo, esse caráter plural, heterogêneo e composto foi incorporado no meu trabalho, pois na
análise do estudo foi imprescindível conceber a natureza e as diversas fontes.
Destarte, estaremos discutindo com mais acuidade os saberes docentes nos AVA, a
fim de compreendermos a natureza e edificação desses saberes, bem como os saberes
inerentes à prática pedagógica online, seus dilemas e possibilidades. É sobre essas temáticas
que nos debruçaremos no Capítulo 6.
120
SABERES DOCENTES E CIBERCULTURA
competência do professor deve deslocar-se no sentido de incentivar a
aprendizagem e o pensamento. O professor torna-se um animador da
inteligência coletiva dos grupos que estão a seu encargo. Sua atividade será centrada no
acompanhamento e na gestão das aprendizagens: o incitamento à troca de saberes, a
mediação relacional e simbólica, a pilotagem personalizada dos percursos de
aprendizagem. (Lévy, 1999:171)
A
121
6 SABERES DOCENTES E CIBERCULTURA
Neste capítulo, abordaremos a temática dos saberes docentes nos ambientes virtuais
de aprendizagem, buscando entender, a partir dos dados da pesquisa, a edificação desses
saberes, compreendendo a trajetória docente em propostas formativas na cibercultura e em
outros espaços. Assim, articularemos as discussões dos autores que pesquisam sobre a
temática dos saberes docentes, com os autores que discutem a educação online, além de
trazermos os depoimentos dos docentes relativos à descrição de seus percursos formativos.
Mapearemos também alguns saberes imprescindíveis ao docente online, a partir da
imersão no campo de pesquisa e da literatura disponível na área. Por fim, discutiremos os
principais dilemas do docente online no contexto do curso de tutores da UFBA, vivenciados
na lista de discussão do grupo.
Conforme panorâmica anterior, emergiram as seguintes noções subsunçoras na
reflexão sobre os “dados” da pesquisa: Natureza e origem dos saberes docentes, que
desdobraram-se em: saberes oriundos da experiência como discente online, saberes oriundos
da experiência online como professor e saberes oriundos das relações estabelecidas com os
pares; Saberes docentes na cibercultura, de forma mais específica: a mediação pedagógica,
a promoção da interatividade, a promoção da colaboração, processos virtualizantes e saberes
tecnológicos; e os Dilemas na docência online, a saber: a ambivalência entre a atenção
individual versus a atenção grupal, um dilema relativo à participação nos fóruns e, por último,
o dilema da leitura dos conteúdos versus a participação colaborativa na rede.
6.1 NATUREZA E ORIGEM DOS SABERES NA DOCÊNCIA ONLINE
As discussões sobre os saberes docentes que m desafiando os pesquisadores a se
debruçarem sobre essa questão, apesar de terem sido desenvolvidas exclusivamente em
contextos escolares, trazem elementos importantes para o estudo dessa temática no contexto
do ciberespaço, por este se configurar em um novo lócus educativo na contemporaneidade.
Nesse cenário, não se pode negar a articulação entre a pessoa do professor e seu
desenvolvimento profissional, bem como reconhecer a importância de algumas questões
emergentes nas pesquisas sobre o ensino. Dentre estas questões destacam-se: quais são os
conhecimentos, saberes, as habilidades etc., mobilizados diariamente pelos docentes em seu
contexto de trabalho? Qual a natureza desses saberes? Como esses saberes são construídos?
122
Essas questões são instigantes para quem pesquisa na área de formação de professores e, no
caso mais específico dessa pesquisa, os saberes docentes na educação online. Iremos nos deter
nesse tópico, sobre a natureza desses saberes e como eles são incorporados na prática docente,
a partir da literatura da área e dos depoimentos dos professores.
Pensar sobre a natureza do saber docente e na sua incorporação na prática
pedagógica requer a compreensão da dimensão social dos saberes, superando-se uma visão
meramente “mentalista” que reduz o saber a processos mentais, cujo suporte é somente a
atividade cognitiva do indivíduo. Essa abordagem tem sido alvo de inúmeras críticas, pois não
leva em conta o contexto de trabalho e toma as situações de ensino como previsíveis. Além do
cognitivismo, a tendência comportamentalista tem sido bastante criticada, por centrar seu
enfoque no processo-produto, acreditando que a eficácia do ensino está pautada no
comportamento dos professores eficientes, gerando impactos sobre o produto, a aprendizagem
dos alunos (GAUTHIER et al, 1998).
Nessa perspectiva, o conhecimento é algo externo ao professor, sendo que a
subjetividade e as interações em sala de aula são ignoradas. Contra essa lógica, Tardif (2002)
propõe uma abordagem social sobre o saber docente sem, contudo, descartar a dimensão
individual dos espaços cotidianos, ao compreender o que os professores pensam, fazem e
dizem. Para o autor, o saber é social, pois é partilhado por um grupo que possui uma formação
comum, apesar de algumas variações, gerando representações ou práticas específicas que
terão um significado maior numa situação coletiva de trabalho. É também social, por repousar
sobre um sistema que lhe dá legitimidade e orienta sua utilização, a exemplo da universidade.
Outro aspecto destacado pelo autor é em relação ao próprio objeto do saber, que se
refere a práticas sociais. A docência desenvolve-se num contexto com outros seres humanos,
em função de um projeto de educação, e numa situação complexa de interações entre
professores e alunos. Ainda sobre a dimensão social dos saberes docentes, é preciso
considerar a temporalidade dos mesmos, pois o que os professores ensinam, evolui com o
tempo e as mudanças sociais.
Um último aspecto que o autor nos alerta, é em relação ao contexto de socialização
social, considerando-se as diferentes fases da carreira docente onde o saber é adaptado,
modificado, tendo como dimensão principal o aprender a ensinar a partir do trabalho.
A dimensão social apresentada pelo autor é de suma importância neste estudo, pois
acreditamos que o saber docente não está resumido a um conjunto de conteúdos e métodos
definidos anteriormente, mas está relacionado a um processo que se desenvolve ao longo de
uma carreira, através da imersão no trabalho no qual, o docente vai interagir com outros
123
sujeitos, exercer uma tarefa complexa que é ensinar, a partir de definições institucionais num
determinado contexto social. Dessa forma, é preciso considerar a interface entre o individual e
o social.
Assim, considerando a natureza social dos saberes profissionais, a sua origem em
diferentes fontes e os modos de integração na prática docente, Tardif (2002) propõe um
modelo tipológico, a saber: os saberes pessoaisprovenientes da família e da educação de
forma ampla, que são integrados à prática docente pela história de vida e socialização
primária; os saberes da formação escolar”, oriundos da sua trajetória escolar, integrados à
vida do docente pela formação e pela socialização pré-profissional; os saberes provenientes
da formação profissional”, com objetivo de preparação para a vida profissional, tendo como
atividades de destaque a docência, os diversos cursos de aperfeiçoamento, portanto
incorporados à prática docente por instituições que visam a esse fim; Saberes provenientes
dos programas e livros didáticos” utilizados no cotidiano escolar como ferramentas de
trabalho; “Saberes oriundos da experiência na profissão”, em sintonia com os colegas, alunos
e integrados à profissão pela prática do trabalho e pela socialização profissional.
Concordamos com Borges (2004), quanto à vantagem da tipologia utilizada por
Tardif (2002), pois esta possibilita: uma maior abrangência sobre a diversidade de saberes e
permite um modelo construído, a partir de fontes indicadas pelos próprios docentes, evitando-
se, dessa forma, a utilização de critérios epistemológicos dissonantes e definidos pelo
pesquisador.
Nesse sentido, apesar da categorização apresentada pelo autor ter sido fruto de uma
ampla pesquisa que teve como referência básica a sala de aula padrão
26
, seguiremos algumas
de suas pistas para a compreensão da natureza dos saberes docentes no contexto digital, a
partir do diálogo com os atores sociais envolvidos no processo e da imersão no campo de
pesquisa.
Entretanto, diferentemente do contexto da sala de aula presencial, o cenário digital
requer, como apontamos anteriormente, pensar em outro modelo de comunicação e de
educação que apresenta como características principais a interatividade e a hipertextualidade,
que se desdobram em outros aspectos como a não-linearidade, a virtualização, o tempo real, a
multivocalidade e a simulação (BONILLA, 2005). Não estamos aqui negando a importância
desses elementos na sala de aula convencional, inclusive acreditamos que as tecnologias da
26
Um mestre que ensina sozinho em um local com um grupo de 30 alunos, cujas presenças são obrigatórias, e
realizando duas funções principais: ensinar conteúdos e gerenciar o funcionamento da classe (GAUTHIER et.
al, 1998)
124
informação e comunicação podem ampliar as possibilidades de trabalho na sala de aula
presencial, porém entendemos que o ciberespaço apresenta certas peculiaridades como a
usabilidade e manipulação instantânea da informação, difíceis de serem pensadas numa sala
de aula convencional como, por exemplo, a dinâmica interativa de um chat, aonde todos
conversam ao mesmo tempo, ou mesmo o encontro entre pessoas que estão geograficamente
separadas. Essas características são imprescindíveis na reflexão sobre os saberes do docente
online, pois é indispensável, no estudo dessa temática, a compreensão do contexto de trabalho
do professor, que o saber está relacionado com os condicionantes de sua prática, com sua
pessoa, experiência de vida, sua história profissional, com seus alunos etc.
Na análise das entrevistas dos sujeitos, pudemos observar que a natureza dos saberes
docentes precisa ser tratada de forma ampla, e que os saber da experiência é marcante na
prática do docente online. Inferimos assim que, através desse saber, articulado com a reflexão
crítica sobre a prática pedagógica é que esses profissionais vão tecendo a docência no
ciberespaço.
Percebi, ao longo das entrevistas, a singularidade da trajetória formativa de cada
professor, bem como observamos algumas congruências na formação, pois revelam aspectos
comuns, como participarem de uma mesma geração e de uma mesma profissão. Assim, para
uma melhor compreensão da natureza desses saberes, organizei alguns achados, de acordo
com o diálogo desses atores sociais, sem pretender fazer uma análise exaustiva e
minimamente detalhada dessas fontes. São eles: saberes oriundos da experiência como
discente online; saberes oriundos da prática pedagógica online e saberes oriundos das relações
estabelecidas com seus pares.
6.1.1 Saberes oriundos da experiência como discente online
Uma primeira natureza dos saberes, que observei nas entrevistas realizadas, foi em
relação à experiência que os professores tiveram como discente online. Uma das professoras
afirmou que essa experiência foi fundamental para a compreensão das potencialidades da
educação à distância. Vejamos o que ela disse:
27
Porque a disponibilidade que a gente tem
que ter como aluna à distância é muito maior. Você tem realmente que se dedicar muito F2.
Esse processo formativo como aluna online, influenciou sua forma de compreender a
dinâmica de trabalho dos docentes no contexto digital, ao vivenciar processos interativos:
27
Os trechos em itálico, neste capítulo representam algumas falas expressas pelos docentes nas entrevistas.
125
Na verdade a minha paixão por EAD começou como aluna que foi
justamente a proposta do mestrado, que era para ser um mestrado a distância
e a gente começou efetivamente a distância mais depois por não ter a
legislação que contemplasse ai acabou que a gente teve que ficar um bom
tempo lá em Porto Alegre. Mais a idéia era que fosse a distância. Eu peguei
professores maravilhosos não é. Exatamente o professor da disciplina era o
professor tutor, era ele que estava com a gente. Os professores da
universidade se dispuseram a participar desse projeto, um pioneiro do MEC
para os multiplicadores do NTE, e a gente deu muita sorte nesse sentido;
pegamos Lea Fagundes como professora, a gente pegou Margarete Axt e
Liane Tarouco, professores maravilhosos e eles realmente fizeram um
trabalho assim excelente, excelente mesmo. F2
Partindo da vivência como aluna em EAD, a professora se apóia na experiência para
justificar a sua implicação com a educação à distância. Percebemos também na fala da
docente, a importância das interações entre professores e alunos durante todo o processo
formativo. Assim, emerge uma concepção de ensino à distância pautada na interatividade, em
que a comunicação é produção conjunta da emissão e recepção. A professora também colocou
que essa experiência foi a que mais marcou a sua formação, referindo-se a outros cursos
pautados numa visão meramente instrumental e reativa. Vejamos:
Agora mesmo eu to passando por uma experiência que é um curso da UESB
de dias na Educação que tem um material assim fantástico, a gente ta
utilizando bastante aqui nos cursos do NTE esse material. Mais o
acompanhamento, a tutoria é muito ruim e isso ta fazendo com que a gente
fique desestimulada. Eu to me sentindo assim sabe aquela aluna tarefeira que
faz por obrigação, é para participar do fórum vai coloca uma
contribuição e pronto. F2
Percebemos na fala da professora uma forte crítica às propostas de educação
baseadas na interação reativa, nas quais o enfoque está centrado numa concepção mecanicista,
diferente da interação mútua aonde a ação vai retornando sobre a relação, transformando os
sujeitos envolvidos. Outro professor do curso salienta também a importância da interação na
sua experiência como aluno em cursos à distância, ressaltando que o acompanhamento do
professor é fundamental para o sucesso do trabalho. Na entrevista via chat, quando pedi que
relatasse o que mais tinha marcado sua experiência como discente online, o professor
colocou:
A tutoria... foi o acompanhamento do docente, sempre dirimindo as dúvidas
e a prontidão em responder aos questionamentos. Acho que isso foi o mais
marcante, os professores conseguiram demonstrar proximidade. F3
Outros professores salientaram experiências como discente online que procuram não
incorporar na sua prática pedagógica, por estas se fundamentarem numa visão comunicacional
126
um-um, onde a atuação do docente do curso resume-se apenas a tirar dúvida dos alunos
individualmente. Observemos a fala da professora:
Teve a experiência no SENAC Rio de Janeiro, onde eu fiz um curso sobre
competências profissionais, um curso de extensão também esse foi pior
porque as interfaces digitais nem eram utilizadas, o ambiente online era um
repositório de conteúdos e a gente recebia também um cd, o que tinha no CD
tinha no ambiente online, não tinha diferença nenhuma. E a gente
interagia com o professor, que era chamado de tutor numa relação de um
para um então não tinha conceito de turma, não tinha conceito de grupo, a
relação é de um pra um. Era auto-aprendizagem com tutoria reativa. Onde
esse professor fazia tirar dúvida caso tivesse a partir do material
instrucional. Então também foi péssimo no sentido que você não via
mudança na prática pedagógica. F1
Através da narrativa dessa professora, contatamos a denúncia da subutilização do
ambiente de aprendizagem do curso, com a mera função para a postagem de conteúdos
fechados, num site estático, desprovido de mecanismos de colaboração e interatividade. Sua
fala também explicita uma avaliação crítica em relação a essa perspectiva de formação à
distância, baseada nos pressupostos da instrumentalidade. Além disso, ela acrescenta que,
apesar da proposta acontecer no ciberespaço, com todas as potencialidades que o digital
agrega, a prática pedagógica continua inalterada. Essa reflexão sobre a experiência na
condição de aluno é fundamental no processo formativo, pois nos desafia a refletir sobre
novas perspectivas de trabalho na rede. Daí a importância de um sólido referencial teórico
sobre as questões observadas, visando uma compreensão mais ampliada da docência no
ciberespaço em sintonia com os pressupostos da cibercultura, que traz como essência
fundamental a colaboração em rede.
Para Branco (2003), a experiência do professor como aluno à distância é importante,
por permitir a vivência com novas formas de estudar, além de compreender as dificuldades e
facilidades do processo. É nesse sentido que muitas das representações sobre o ensino, o papel
dos professores e dos alunos provêm das suas experiências como aluno. Dessa forma,
concordamos com Nóvoa (1992), quando destaca que uma grande parte da competência
profissional dos professores tem raízes na sua história de vida e de formação.
Freire (1996) nos alerta que a experiência como aluno é de suma importância no
processo formativo, pois “minha experiência como discente é fundamental para a prática
docente que terei amanhã ou que estou tendo agora simultaneamente com aquela” (FREIRE,
1996, p.90). Assim, a vivência como aluno nos possibilita uma “volta ao passado”
fornecendo-nos subsídios para empreender uma reflexão, que tem como resultado o
reconhecimento e a utilização de um aprendizado pautado na experiência vivida.
127
Dando continuidade às minhas considerações em torno das experiências dos
professores como discentes online, outro ponto a destacar é o investimento em perspectivas
formativas, desde cursos de mestrado e doutorado, até cursos de aperfeiçoamento e de
especialização. Vejamos uma narrativa:
No mestrado eu comecei a me inquietar de como assim o uso das tecnologias
digitais podiam provocar novos arranjos curriculares, novos arranjos espaços
- temporais fazendo emergir quem sabe novas organizações do currículo.
eu comecei a estudar a teoria da cibercultura e do currículo e procurei ver na
prática como que o digital podia estruturar novas relações curriculares. Aí eu
fui estudar a árvore do conhecimento do Pierre Lévy na PUC de São Paulo e
chegando eu não encontrei o software alimentado pelos projetos de
pesquisa e nem pelas pessoas, o software ainda não estava inserido dentro de
um contexto formativo. F1
No caso dessa professora, quero chamar a atenção para a forma como ela, diante das
inquietações do campo de pesquisa, começou a estudar mais profundamente os fundamentos
da cibercultura e o potencial do digital nas práticas pedagógicas. Fica claro no seu depoimento
a articulação entre a pesquisa e a prática pedagógica, evidenciando também o papel da teoria
no cotidiano de trabalho. Essa perspectiva retrata mais uma vez as críticas feitas a uma
concepção de formação que tem como base a racionalidade técnica, através da qual o docente
é visto como um consumidor de saberes produzidos por especialistas. Assim, ressaltamos o
alerta de Lévy (1999), quanto à mutação contemporânea do saber, na qual a aprendizagem
constante se configura como uma marca dessa sociedade, levando-nos a recusar perspectivas
de formação de cunho tecnicista.
Os professores que entrevistei, de modo geral, enfatizam diversas experiências
pessoais decorrentes de cursos que vivenciaram antes de ingressar como docentes no curso de
tutores da UFBA. Por exemplo, para o professor F3, quando pedi que relatasse uma
experiência significativa como aluno, ele referiu: o
curso... "qualidade da educação básica"
oferecido pela UNESCO para os países da América Latina e Caribe”. Sua participação no
nesse foi fundamental para seu processo formativo, pela proximidade que os docentes
buscavam manter ao longo de todo o trabalho. Outro professor destaca o próprio curso de
Tutores da UFBA como fundamental na sua formação como docente online. Vejamos:
Como aluna a única experiência que eu tive foi o próprio curso de formação de
tutores em 2005. Eu pude acompanhar o curso como aluna e também
“integrante” da equipe. O curso tinha uma singularidade, ele não era mediado,
não tinha tutoria em 2005. Como não tinha tutoria, algumas pessoas assumiram
esse papel e tinha poucas intervenções da coordenação.
F4
Nessa outra fala, a professora ressalta a sua participação no curso em que hoje é
docente, como principal referência para sua atuação. A questão que se revela é que a lacuna
128
na tutoria do curso foi suprida por alguns colegas, emergindo a sua necessidade de
participação no processo. Esse fato foi colocado pela professora como fundamental na sua
formação, pois diante desse contexto e da mediação exercida pelos colegas, ela veio a
perceber o significado e a importância da atuação docente nas propostas de formação na
educação online. Para Freire (1996), a formação permanente de professores é fundamental
para a reflexão crítica sobre a prática, pois é pensando criticamente a prática docente de hoje
ou de ontem, que se pode melhorar a próxima.
De fato, as experiências provenientes da formação profissional tendo como destaque
os diversos cursos de aperfeiçoamento, configuram-se como uma das fontes das quais se
originam os saberes do docente online. Por esse motivo, acredito que esses saberes não podem
ser analisados de forma isolada dos demais, e sim articulados com os saberes da prática
docente e da imersão em diferentes espaços formativos.
6.1.2 Saberes oriundos da experiência online como professor
Outra natureza do saber docente que consegui perceber na fala dos professores
entrevistados foi a experiência como docente online, seja no próprio curso de tutores da
UFBA, seja em outras propostas formativas em EAD. A prática aqui é compreendida como o
próprio exercício da docência nos AVA.
É nesse sentido que a literatura sobre os saberes docentes tem apontado para a
importância dos saberes práticos ou experienciais, no contexto do trabalho. Esses saberes são
originados na prática cotidiana da profissão, e são por eles validados. É a partir desses saberes
que os docentes avaliam sua formação anterior, bem como as propostas de formação ao longo
da carreira. Cabe ressaltar que a aprendizagem pela experiência docente reflete uma
particularidade do trabalho, ficando confinada aos segredos da “sala de aula”. Para Gauthier et
al (1998, p.33), “os julgamentos realizados pelo professor são compostos de truques, de
estratagemas e de maneiras de fazer que apesar de testados, permanecem em segredo”. Daí a
necessidade de se tornar público esses saberes, transformando-os em saberes da ação
pedagógica, e contribuindo para o processo de profissionalização.
Imbernón (2005) traz uma contribuição nesse sentido, quando fala que na docência a
experiência dá ao professor condições para:
criar processos próprios, autônomos, de intervenções, em vez de buscar uma
instrumentação elaborada. Para tanto será necessário submeter o
129
conhecimento a uma crítica em função de seu valor prático, do grau de
conformidade com a realidade e analisando os pressupostos ideológicos em
que se baseia (IMBERNÓN, 2005, p. 71).
No contexto das práticas observadas nessa pesquisa, a prática pedagógica como fonte
de construção dos saberes na educação online foi destacada por uma das professoras, quando
a questionamos sobre a sua aprendizagem enquanto docente nos ambientes virtuais de
aprendizagem. Embora um pouco longo, vale nos debruçarmos sobre sua narrativa:
O fator que mais contribuiu com a minha aprendizagem como docente online
foi a prática. Não dá para separar teoria da prática porque a gente não
consegue desenvolver uma boa experiência na prática pedagógica se a gente
não tem um referencial teórico que sustente essa prática com epistemologia,
com a visão de conhecimento, de ciência, de tecnologia, comunicação. Então
eu penso que a gente precisa ter uma base teórica muito boa mais ao mesmo
tempo poder vivenciar essa teoria na prática. Por mais que você teorize sobre
o potencial de um fórum de discussão, você vai conseguir vivenciar o
potencial quando você é sujeito desse fórum. Tem que ta casado. Partir de
uma prática que não discute a teoria e não reflete sobre o seu próprio fazer,
quando você ta na prática e você na própria prática tem a ambiência de
refletir essa a prática, você também está teorizando. E se você ainda tem a
oportunidade de casar esta prática com pesquisas de outros pesquisadores da
ciência que ta produzida aí você consegue dar um salto. F1
Como se pode inferir pela citação acima, a experiência como docente é fundamental
na construção dos saberes na educação online. Assim, os saberes da experiência não são
saberes como os demais; são o núcleo através do qual o professor procura transformar as
relações de exterioridade com os saberes em relação à interioridade de sua prática. Contudo,
apesar de destacar os saberes da experiência na sua formação, a docente ressalta a importância
da teoria na edificação desses saberes, demonstrando seu papel fundamental na articulação
com a prática, servindo como referencial para o professor criticamente perceber as relações
mais complexas no seu cotidiano. Desse modo, refletir sobre a dimensão teórica e prática na
formação de professores requer, mais uma vez, ir ao encontro de Tardif (2002) que caracteriza
o saber docente como plural, formado pelo amálgama mais ou menos coerente de saberes
científicos, dos saberes das disciplinas, dos currículos e dos saberes da experiência.
Nessa mesma vertente, para os professores do curso observado, a educação online
requer, além dos conhecimentos teóricos da matéria, a construção de uma série de estratégias
que dinamizam processos interativos nas diferentes interfaces do ambiente de aprendizagem.
Observemos então o que eles dizem, por exemplo, sobre as estratégias utilizadas nos fóruns
de discussão:
Comentar sempre que possível para que percebam a importância da
contribuição das postagens para o grupo e provocar a reflexão, sempre
130
questionando e pedindo que se pense em outras abordagens que não ficaram
evidente nas postagens inicias. F3
Fazer com que ele lesse a postagem do colega anterior. F4
A gente literalmente explica para o aluno que a participação pode se dar
comentando uma mensagem do colega, questionando o colega, trazendo uma
dúvida para compartilhar com um colega, e com a professora, socializar
outras leituras, outros links. F1
Uma estratégia que eu uso muito é tratar o aluno pelo nome. F1
E sempre trazer novidades por que tem gente que abre o fórum com um
enunciado e fica naquele enunciado o tempo todo. F1
A gente sempre tem um questionamento principal. A partir do
questionamento principal ai eu espero um pouco para ver o que as pessoas
respondem a partir daquilo ali. F2
Para esses professores, o fundamental na docência, nos ambientes de aprendizagem,
é a participação ativa dos alunos durante todo o processo. Participar nesse cenário não é
apenas postar uma mensagem no fórum do curso, e sim refletir, debater, trazer contribuições,
enfim, vivenciar todo o potencial interativo e hipertextual aberto pelo digital. Daí, uma série
de estratégias construídas no âmbito da prática docente com o objetivo de instigar o debate
plural de idéias. Esses saberes não são frutos de receitas prescritas por instâncias superiores e
externas aos professores, e sim frutos da reflexão crítica sobre a prática pedagógica,
adquiridos no espaço da docência, na tentativa de superação dos desafios do cotidiano. Para
Tardif (2002),
No exercício cotidiano de sua função, os condicionantes aparecem
relacionados a situações concretas que não são passíveis de definições
acabadas e que exigem improvisação e habilidade pessoal, bem como a
capacidade de enfrentar situações mais ou menos transitórias e variáveis.
(TARDIF, 2002, p.49)
Assim, percebemos ao longo das entrevistas que cada professor se refere à sua
aprendizagem docente, utilizando diferentes critérios, muitas vezes se reportando a suas
características pessoais e resgatando também os saberes profissionais. Vejamos outra opinião
sobre esse assunto:
Na verdade a gente vai aprendendo. A experiência no presencial contribui
bastante. Quem começa no online tem uma visão diferente do que quem já
teve a experiência de professor do presencial. O que eu levei para o online
foi o que eu já tinha no presencial. E claro que hoje eu fazendo uma
avaliação da minha primeira turma online, pra agora, nossa!a gente cresce
muito, a gente vai aprendendo como interagir, como questionar, como fazer
as perguntas para que as pessoas pensem, não dá resposta. F3
131
Eu acho que essa aprendizagem é muito intuitiva, vai muito da vontade de
fazer um trabalho bem feito. Que é uma coisa que eu tenho muito. Fazer
sempre o melhor, sempre o melhor às vezes isso até me estressa muito, mais
eu gosto muito. F2
No depoimento desse professor, notamos que embora considere a experiência do
ensino presencial como importante nas práticas pedagógicas online, ele destaca a sua
aprendizagem e o seu crescimento como docente, a partir de sua imersão no trabalho,
interagindo, questionando, enfim, vivenciando a dinâmica da cibercultura.
Mais adiante, a professora ressalta que sua aprendizagem é muito intuitiva, se
reportando à sua maneira de trabalhar. Apesar de ressaltar características pessoais, percebi
que os mesmos estão entrelaçados com outros saberes, e do gostar daquilo que faz.
Analisando a literatura sobre os saberes docentes, verificamos que essas constatações
corroboram com algumas reflexões feitas por Tardif (2002) quanto à questão do tempo:
Se uma pessoa ensina durante trinta anos, ela não faz simplesmente alguma
coisa, ela faz também alguma coisa de si mesma: sua identidade carrega as
marcas de sua própria atividade, e uma boa parte de sua existência é
caracterizada por sua atuação profissional. Em suma, com o passar do
tempo, ele vai-se tornando – aos seus próprios olhos e aos olhos dos outros –
um professor, com sua cultura, seu ethos, suas idéias, suas funções, seus
interesses, etc. (TARDIF, 2002, p.56-57)
Dessa forma
,
podemos inferir que o tempo é um fator fundamental para a construção
dos saberes do professor, que o trabalho remete à sua aprendizagem e ao domínio
progressivo dos saberes da sua profissão. Nesse sentido, a dimensão temporal do trabalho vai
exigindo cada vez mais do trabalhador conhecimentos, atitudes e habilidades que podem
ser adquiridas em contato com as situações de trabalho. É nessa perspectiva que o exercício
da docência, no contexto da cibercultura, requer a imersão do sujeito nesse cenário,
compreendendo a dinâmica do digital e as potencialidades abertas pelo mesmo.
6.1.3 Saberes oriundos das relações estabelecidas com os pares
Outra natureza de saber identificada nas entrevistas com os docentes foi aquelas
oriundas da troca com alunos, colegas, professores, que vem proporcionando a aprendizagem
de muitos saberes, entre eles, a condução do chat, estratégias de trabalho para dinamizar a
participação nos fóruns, propostas de trabalho com blogs, dinâmicas de trabalho com
webquest, escrita colaborativa nos wiks, debates nas listas de discussão, entre outros. Nesse
sentido, as narrativas feitas pelos docentes estão em sintonia com a literatura na área,
destacando que os saberes docentes são originados de diferentes fontes, e adquiridos na
132
socialização profissional e até pré-profissional. Assim falou o professor F2, em relação à
observação da prática de dois colegas:
Na primeira turma eu aprendi com F1 assim horrores, aproveitei peguei um
monte do jeito que ela fazia. Nessa turma eu já não tive tanta condição de
observar, acho que o tempo foi muito curto. Aprendi com F3 também, ele
tem um carisma muito legal. Eu procuro aprender com os outros sempre.
Notamos, com esse exemplo, que a construção dos saberes docentes na educação
online passa também pela troca com os pares, presença inegável na nossa formação. É nesse
sentido que Barbosa (2006) nos alerta para a observação das ações cotidianas que instituem
modos próprios de aprendência que são/foram construídos ao longo da carreira. Para ela, a
formação não se instaura em um lugar, mais se configura numa combinação dialética e
evolutiva.
Essa reflexão nos remete a pensar a formação num permanente processo de troca
com os colegas, refletindo e interpretando os modelos apresentados pelo outro, a partir de sua
imersão nas práticas pedagógicas no ciberespaço. Esse aspecto é fundamental na itinerância
formativa, para que possamos promover novos espaços de troca de saberes entre os docentes.
O cenário digital traz um grande potencial para a discussão coletiva, por possibilitar o
encontro de pessoas dispersas geograficamente em sintonia com suas reais necessidades. A
interatividade também ganha destaque nesse cenário, abrindo inúmeras perspectivas de troca e
construção de saberes entre os sujeitos envolvidos.
Outros professores também recuperaram a troca com colegas do curso, como
referência para algumas posturas adotadas na sua prática pedagógica online. Isso pôde e
observado no caso do professor F3 que relatou sua forma de conduzir o chat, destacando as
orientações de duas docentes do curso de tutores.
Gosto de seguir duas orientações que estão dando muito certo. Assimilei de
duas professoras características que considero fundamental para que os chats
não se tornem um bate-papo desorganizado. Um é sobre o acolhimento que
encurta as distâncias do curso online, pois é um momento de afetividade
importante para grupo e que depois potencializa outras atividades
assíncronas. Gosto de evidenciar a chegada... com humor, fazendo a pessoa
ser percebida pelos demais no grupo. Esse é um ponto. O outro é permitir
que dentro do grupo aconteça a conversa paralela... a depender do
interesse...em determinado aspecto da discussão permitir que pequenos sub-
grupos de 3 ou quatro pessoas travem suas discussões. F3
Um dos principais aspectos que podemos observar nessa narrativa é a influência de
colegas de profissão na prática docente do professor, socializando experiências em relação à
133
condução dos chats. O discurso do professor demonstra que as orientações partilhadas com as
colegas do curso estão possibilitando um maior aproveitamento dessa interface na melhoria da
sua prática. Assim, a fala do docente indica que o discurso do “outro” foi, de fato, apreendido
e ressignificado, uma vez que vislumbramos sua satisfação na mediação dos chats. Um último
ponto que ressaltamos, é que o docente percebe que a dinâmica do digital abre inúmeras
perspectivas de diálogo entre os sujeitos envolvidos no processo e que a comunicação todos-
todos possibilita uma maior horizontalidade nas dinâmicas desencadeadas.
Outro ponto enfatizado por uma das professoras nesse contexto foi o retorno dos
alunos. Vejamos o que ela disse quando lhe perguntei sobre a origem de seus saberes na
educação online.
O retorno dos alunos. Você não vai perguntar: e você ta gostando ou não
do curso. No presencial você pode fazer isso. No online mostra que você ta
mais inseguro do que nunca. Cria estratégias e as horas e horas no MSN
discutindo com eles conteúdos diversos, e até mesmo organização de estudo
que eles não tinham, alguns. Não tinham organização de estudo, alguns,
apesar de ser professores de 30 anos, não tinham organização de estudo. F4
Para esse professor, a interação é fundamental para a avaliação e o andamento das
atividades na dinâmica da prática pedagógica. Analisando sua fala, percebi também o
destaque nas interações via chat, para a discussão dos conteúdos do curso e a participação dos
alunos, servindo como um termômetro para a tomada de novas decisões. A utilização dessa
interface é fundamental para a criação de vínculos com o grupo, pois possibilita a
comunicação síncrona enviando e recebendo mensagens de forma imediata.
É fato que essa interface permite a vivência plena da bidirecionalidade e hibridização
Silva (2002) entre professores e alunos, e sob esse aspecto concordamos com Freire (1996)
quando afirma que não há docência sem discência; logo, o ensino não se reduz à transferência
de conhecimento e sim à geração de possibilidades para a sua criação. O autor ainda
acrescenta que, apesar das diferenças entre educador e educando, “quem forma se forma, se
forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado” (FREIRE,
1996, p.23). É nessa perspectiva ampla de formação, que nem o aluno e nem o professor
podem ser reduzidos à condição de objeto. Daí a importância da utilização de diferentes
interfaces interativas que permitam a abertura ao confronto de idéias entre docentes e
discentes.
Em sintonia com as discussões sobre formação e de forma mais específica a literatura
sobre os saberes docentes, a qual vem sinalizando que muitas das experiências significativas,
134
que contribuem para a formação do professor, estão vinculadas a pessoas ou grupos que
marcam essa itinerância (MACEDO, 2004), podemos inferir que a forma como os docentes
vão aprendendo a ensinar, pode estar ligada também à maneira de ensinar de um colega, de
um professor, podendo ser referência na sua prática ou mesmo servindo de um exemplo a ser
negado.
Nesse sentido, a natureza e edificação dos saberes docentes na educação online
advêm do amálgama de diferentes espaços formativos, tais como evidenciamos anteriormente:
sua experiência como discente em cursos de formação continuada, sua história de vida, seus
pares, sua experiência como docente online e outros lócus formativos.
6.2 OS SABERES DOS DOCENTES NOS AVA
Na Educação online, a pesquisa sobre os saberes docentes torna-se uma pauta
emergente, pois a vivência de propostas de formação de professores, nesse contexto, requer a
construção de saberes em sintonia com os pressupostos da cibercultura. É nesse cenário que o
professor se defronta com uma série de novos desafios na profissão, a partir das
peculiaridades do meio digital que permitem o trabalho com diferentes sujeitos, dispersos
geograficamente, além da configuração não-linear da informação que favorece percursos
singulares. São decorrentes disso algumas questões instigadoras em que se deparam os
docentes nesse cenário: como desafiar os sujeitos que se encontram distantes geograficamente
a interagirem com os colegas? Como desenvolver trabalhos em grupo que promovam
colaboração? Que estratégias buscar para o maior dinamismo e participação nas diferentes
interfaces disponíveis no ciberespaço? Destaco a seguir, o fórum e chat que foram as
principais interfaces da ação docente dos professores do PROGED no curso de tutores 2007.1,
requerendo destes a construção de novos saberes até então não vivenciadas no ensino
presencial.
6.2.1 As interfaces digitais fórum e chat – principal lócus da ação docente no AVA
As interfaces disponíveis nos ambientes virtuais de aprendizagem, por seu formato
digital, estimulam de certa maneira um comportamento hipertextual, interativo e virtualizante,
seja por parte dos professores, seja por parte dos alunos. Neste trabalho busco refletir sobre o
135
potencial de algumas interfaces, pois é através destas que professores e alunos vão tecendo a
itinerância educativa no contexto da cibercultura.
A utilização do termo interface representa as diversas funcionalidades oferecidas nos
diversos ambientes de aprendizagem da rede como os chats, fóruns, blogs entre outros.
Para
Johnson (2001), o termo interface está relacionado à informática e à cibercultura, como
dispositivo para o encontro de duas ou mais faces em atitude comunicacional, caracterizando-
se como um objeto virtual do ciberespaço.
Na perspectiva interativa, percebemos, nas interfaces digitais, presentes no
ciberespaço, abordagens ncronas e assíncronas. As abordagens síncronas se caracterizam,
principalmente, pelas trocas ocorridas em tempo real, nas quais os sujeitos vivenciam o
mesmo instante de conexão; as mensagens são visualizadas e estão disponíveis para a
intervenção imediata. Já nas abordagens assíncronas, as mensagens podem ser acessadas em
momentos diferentes, independendo da presença dos sujeitos. Conseqüentemente, o acesso às
informações disponibilizadas nas mensagens pode ocorrer dias depois da postagem, a
depender do interesse e disponibilidade das pessoas envolvidas.
Para Britto (2003), apesar do potencial das abordagens síncronas se centrarem na
interação em tempo real, estas apresentam como limitação a compatibilidade de horário, as
questões relativas aos empecilhos tecnológicos, além da dificuldade de disponibilização de
tempo integral do professor para as interações. Para o autor, as abordagens assíncronas, por
não requererem a presença dos sujeitos no mesmo instante, flexibilizam a interação entre os
participantes.
Destacamos a opinião de Romani e Rocha (2001, apud BRITTO, 2003), que
mencionam alguns pontos que podem interferir na efetividade dos mecanismos baseados nas
interfaces assíncronas: tempo de resposta – é necessário que as questões ou colocações
pontuadas pelos discentes sejam respondidas logo, evitando-se a desmotivação dos sujeitos;
sobrecarga do professor o docente pode ser bombardeado por uma série de questões, e ser
incapaz de responder a todas, causando demora no envio de respostas aos alunos; motivação
do aluno é importante desenvolver estratégias de intervenção que estimulem o aluno a
colaborar com os colegas e com o docente; sistematização de questões deve ser uma pauta
constante durante todo o trabalho, para evitar a desmotivação dos alunos; sistematização das
respostas é preciso que o docente responda com clareza às dúvidas levantadas pelo
educando, demonstrando apoio em todo o processo de ensino e aprendizagem.
Neste trabalho, ressaltamos duas interfaces utilizadas no meio digital, que foram
lócus para o desenvolvimento da mobilização dos saberes docentes no curso de tutores da
136
UFBA: o fórum e o chat. Nos ambientes virtuais de aprendizagem, os fóruns são as interfaces
mais utilizadas para a interação e troca de saberes entre os alunos, podendo ser considerada
um espaço fundamental para a “aula online.
O fórum é uma interface assíncrona realizada por meio de um quadro de mensagens,
direcionadas a pessoas que sejam habilitadas ao seu acesso. As mensagens são estruturadas de
forma hierárquica, apresentando os assuntos em destaque. Apesar dessa hierarquia, o fórum
traz o potencial do meio digital, por permitir dinâmicas hipertextuais e agregação de várias
mídias. Além disso, a digitalização permite que as intervenções nas mensagens sejam dadas
no mesmo campo textual, dinamizando assim as discussões das temáticas.
As mensagens armazenadas no fórum, diferentemente das listas de discussão, ficam
hospedadas em campos específicos, a exemplo dos cursos em AVA. Podemos encontrar nesse
espaço um cabeçalho onde ficam registrados os nomes dos autores e a discussão em pauta,
facilitando a interação com os demais sujeitos do curso.
A utilização dos fóruns nos AVA tem como objetivo maior a abertura à discussão de
determinadas temáticas pertinentes ao curso. Este possibilita uma reflexão mais aprofundada
sobre o tema em estudo, haja vista que os questionamentos disponibilizados geram debate
entre os participantes, reflexão sobre a temática, leituras mais aprofundadas e contribuição
com sínteses mais elaboradas, possibilitando ao estudante um tempo maior para reflexão e
posterior postagem. As contribuições disponibilizadas pelos colegas podem ser acessadas a
qualquer momento, permitindo o debate plural de idéias e a crítica coletiva do grupo. Os
docentes podem acompanhar o desenvolvimento de cada aluno e intervir nas mensagens,
dando orientações e propondo novas discussões. Frente ao exposto, cabe observar algumas
discussões travadas no “Fórum: O papel da tutoria”:
Questionamento inicial do fórum:
Falamos, neste módulo, sobre a função do tutor e suas várias competências.
Ser tutor é muito mais do que acompanhar as atividades dos alunos, não é
verdade? Além das competências analisadas, quais outras, você considera
importantes para o tutor (professor EAD)? Reflita sobre estas questões e
socialize a sua opinião neste fórum. A sua contribuição é muito importante.
F1
Contribuição de uma cursista:
Ao refletir sobre a função do tutor em EAD, penso que em primeiro lugar, o
domínio do AVA e suas ferramentas, a chamada competência técnica é
fundamental.
137
Entretanto, creio que as competências relacionais são essenciais na tutoria.
Perceber e sentir desmotivação, dificuldades, aprendizagem, possibilidades,
eis aí um dos maiores desafios de um tutor!
Orientar o grupo de forma democrática, esclarecer, acompanhar sem
conduzir e respeitar o ritmo e as diferenças individuais e ainda ser ágil nas
reflexões às questões, dúvidas e necessidades de informações que surgem
entre o grupo não é uma tarefa tão simples.
A vídeo-aula3 sobre tutoria oportunizou uma reflexão acerca da minha
atuação como tutora. Fiquei rindo de como acreditamos mesmo!!! que
estamos exercendo um comportamento proativo, mediador, autor,
provocador de situações de aprendizagem. Diante da fala de F1 realmente
percebemos que o comportamento reativo de tutoria é muito freqüente em
cursos EAD, onde se convoca especialistas que não precisam produzir
conteúdo, apenas tirar as dúvidas dos cursistas por tel, e-mail e chamar
atenção para datas e prazos para postagem de atividades e contribuição no
fórum. Nesse contexto, não se pode reconhecer esse tutor como professor
com competências para provocar contexto de aprendizagem.
Enfim, o tutor é um professor somente quando atua na condição de mediador
de conhecimento, significados, tanto sob o aspecto individual quanto
coletivo. PC - 38
PC - 38,
Você tem razão. Se o tutor lida diretamente com a mediação do
conhecimento, interfere na Zona de Desenvolvimento Proximal (Vygotsky)
dos alunos através de questionamentos, de provocações, que não ocorreriam
de forma espontânea, então ele é um PROFESSOR.
Nesse sentido, será que o termo TUTOR é adequado? Será que o conteúdo
ideológico que o termo carrega não atrapalha a compreensão da sua função
nos cursos a distância?
Bjs, F2
Oi, F2
Acredito que não atrapalha, porém não representa a grande responsabilidade
desta função. Pesquisando sobre o assunto busquei o significado da palavra
tutor, o qual significa protetor do menor é considerar o sujeito da educação
um sujeito passivo, dependente do outro que o tutora, protege-o, que decide
o que fazer, quando e como. O ideal seria Orientador, que significa que
aponta o Oriente, onde surge o Sol, alguém que indica caminhos, rumos,
fazendo com que a pessoa se situe, reconheça o lugar em que se encontra
para prosseguir a caminhada. Este termo se aplica muito bem neste curso,
considerando a nossa interação constante. PC-41
No decorrer dos fóruns, pude constatar através das interações desencadeadas entre
docentes e alunos, a busca constante de diálogo sobre as temáticas do curso. Percebemos na
fala da aluna PC 38, uma reflexão mais aprofundada sobre a questão da tutoria, demonstrando
138
consistência teórica sobre a temática, bem como resgatando as discussões disponibilizadas no
vídeo-aula sobre o tema. Percebemos também a intervenção consistente do professor
formador, buscando estratégias para instigar o debate plural de idéias. Nessa trama dialógica,
observamos na participação da cursista PC 41, investindo em pesquisa sobre o tema em
discussão e contribuindo com o crescimento do grupo.
Estou convencida de que a utilização dos fóruns em ambientes virtuais de
aprendizagem traz a possibilidade de uma reflexão e aprofundamento maior em determinada
temática, contribuindo para uma intervenção de melhor qualidade no debate do grupo, ao
mesmo tempo em que permite a abertura para a análise dos pares e a criação de vínculos
afetivos entre os participantes.
No contexto do curso de tutores, o fórum foi o principal lócus de construção coletiva
do conhecimento, possibilitando o encontro entre diferentes sujeitos e abrindo espaço para o
debate plural sobre diferentes temáticas emergentes no processo.
Outra interface bastante utilizada na prática pedagógica do curso foram os chats ou
sala de bate-papo. Diferentemente do fórum, o chat traz como principal característica a
comunicação síncrona, ou seja, a possibilidade de podermos interagir no mesmo momento,
enviando mensagens e recebendo comentários de forma imediata. Apesar de o chat apresentar
algumas características semelhantes, a exemplo de conversas entre amigos e colegas, é o seu
formato digital que vai modificar a dinâmica comunicacional.
Marcuschi (2005, p. 47) ressalta alguns aspectos básicos enfocados nesse gênero, que
poderiam ser elencados da seguinte maneira: a) o produções escritas no formato de diálogo
caracterizando-se principalmente pela rapidez de envio de contribuições dos sujeitos
participantes do processo, podendo ocasionar muita confusão a depender do número de
participantes. b) São produções síncronas, porém o autor alerta que a sincronia pode não
ocorrer, devido à demora de envio de mensagens dos colegas, ou dos próprios participantes
que estão interagindo com muitas pessoas ao mesmo tempo. c) As contribuições são, em
geral, curtas, escritas em poucas linhas, podendo chegar a textos maiores; trazem como
característica fundamental os turnos quando observamos a comunicação em andamento. O
autor, porém, faz um alerta ao afirmar que nem sempre as seqüências dispostas estão
ordenadas e pareadas de acordo com o diálogo dos pares. d) A possibilidade de operar
comandos e praticar ações que nem sempre são bilaterais, quando, por exemplo, se seleciona
alguém para a conversa e esta pessoa interage com outras, sem que possamos controlar. Esse
aspecto faz com que o chat se diferencie de uma conversação face a face.
Esse potencial oportunizado pelo chat, de “conversarmos online”, contribui com a
139
interação nos cursos à distância, por proporcionar o esclarecimento de dúvidas, discussões,
criação de vínculos afetivos, entre outros. Diferentemente dos bate-papos abertos, os chats
educacionais são realizados com pessoas conhecidas e os tópicos da discussão previamente
definidos. Vejamos um exemplo de um dos chats que aconteceu no curso de tutores, relativo
ao planejamento do TCC:
F2 21:09:48 Vi que começaram a criar o módulo.
PC 33 21:09:58 Oi PC 39
F2 21:10:47 Quais as dificuldades que vcs estão tendo?
PC 43 21:11:06 Acho q o livro do módulo I, está completo, q ainda n viu, dê
uma olhadinha e veja se precisa mais de alguma coisa
PC 43 21:12:13 PC 33 , olhei várias sugestões, mas n estou lembrada qua a
sua, foi sobre a estrutura do ambiente?
PC 27 21:13:05 estou tendo problemas, a página só fica querendo abrir e
não consigo participar da conversa.
PC 28 21:13:24 Oi, desculpem. Cheguei atrasada, mas cheguei. Onde
estamos?
F2 21:13:25 Oi PC 28
PC 33 21:13:28 PC 39 me disse que tb está com problemas pra acessar
F2 21:14:09 PC 28. O ambiente de vcs deu um probleminha. Pedi para abrir
outro ambiente igualzinho. Não vão senti a diferença.
PC 39 21:14:16 estou tentando entrar
PC 43 21:14:26 Isso mesmo...rs... tenho aqui todas impressa... só faltava seu
nome nesta...rs Gostei sim da sua sugestão e a parte de ambientação foi
usada.
PC 39 21:14:29 mas não vejo o que estão dizendo
PC 27 21:15:02 estamos num encontro do curso de formação de tutores da
UFBA
F2 21:15:23 Vcs tem material suficiente. Agora é só colocar em prática.
PC 33 21:16:22 Tava esperando o modulo ficar completo pra poder pensar
melhor nas provocações dos fóruns e chats...
F2 21:16:48 Vcs farão um tópico de planejamento e outro de avaliação? É
isso. Serão dois módulos.
PC 43 21:17:00 Dei uma pequena arrumada, seguindo a proposta do TCC,
tudo está em criação... Veja o livro do Módulo I, caso tenha q acrescentar
mais alguma coisa.
PC 27 21:17:02 PC 28 , será preciso outros sites para os hipertextos?
140
F2 21:17:22 Depois que o módulo ficar pronto é mais fácil pensar as
atividades mesmo PC 33.
PC 43 21:17:44 Poderemos inserir links nos textos, não F2 é ?
F2 21:18:01 Exato PC 43.
Percebemos no desenrolar do chat, uma rede de relações travadas entre os
participantes, com o propósito de discutir e tirar dúvidas em relação ao TCC. A comunicação
desencadeada retratou interações diversas entre aluno-aluno, alunos-professores, dinamizando
vários hipertextos. Assim, os chats, contribuíram para a criação de vínculos afetivos entre os
sujeitos envolvidos, bem como para dialogar sobre as temáticas do curso e o esclarecimento
de dúvidas.
Para Marcuschi (2005), nos chats com propósitos educacionais, dificilmente
acontecem as conversas paralelas ou reservadas, pois os programas disponibilizados não
contam com recursos desse tipo. Geralmente o tempo da discussão é delimitado a, no
máximo, 90 minutos com um número reduzido de participantes.
Por seu formato digital, o chat permite também o armazenamento das discussões
para posterior leitura dos alunos que não participaram da seção ou mesmo uma posterior
análise da experiência, destacando os comentários que não foram compreendidos para um
futuro debate, ou mesmo o aprofundamento de alguma temática levantada.
O docente na mediação de chats tem um papel fundamental, pois precisa estar atento
aos alunos que não estão participando e buscar integrá-los, evitando atitudes coercitivas.
Importante também nesse processo é a atenção do professor na dinâmica de discussão do
grupo, buscando sempre analisar a qualidade da discussão, retornar ao objetivo pretendido e,
assim, traçar novas metodologias de trabalho (BRITTO, 2003).
Apesar de reconhecer a importância da condução dos chats com objetivos temáticos,
acreditamos que essa interface pode também assumir uma perspectiva mais flexível pela qual
as pessoas possam conversar de forma mais livre e construir laços afetivos, sem ter
necessariamente um centro estável. Assim, as diferentes propostas pedagógicas para a
utilização do chat na educação, vão depender das escolhas dos sujeitos envolvidos no
processo. O importante é que se busque sempre variar as metodologias de trabalho, para que
todos tenham a oportunidade de debater idéias e participar plenamente da cultura tecnológica.
Nessa lógica, a docência na cibercultura vivencia o desafio de compreender e
experimentar diferentes interfaces, que nascem com o movimento contemporâneo da
141
tecnologia, aprendendo com a não-linearidade do meio digital e a abertura a múltiplas
manipulações proporcionadas pela comunicação interativa.
Em nossa pesquisa, percebemos que o chat contribuiu na construção de vínculos
afetivos entre os participantes, troca de saberes, além de possibilitar uma melhor articulação
de trabalho entre alunos/alunos, alunos/professores, e professores/professores. Nesse sentido,
tivemos três horários disponíveis em cada módulo, para que todos pudessem vivenciar o
potencial dessa interface síncrona. Além desses horários específicos, os docentes
incentivaram o encontro entre os grupos, principalmente para a construção da proposta de
TCC. Assim, o chat também se configurou como um lócus de docência na cibercultura.
6.2.2 Docência online: uma pluralidade de saberes
Nas entrevistas realizadas com os docentes, nos debates nos fóruns de discussão e
nos chats, os professores ao serem abordados sobre os saberes necessários para o exercício da
docência online, mencionaram uma diversidade de saberes relativos à sua prática pedagógica,
o que põe em evidência o caráter plural dos desses saberes.
Nessa perspectiva, concordamos com o conceito de saberes apresentados por Tardif
(2002) e Gauthier et al (1998) que tem como idéia central uma variedade de saberes que
englobam conhecimentos, habilidades e atitudes docentes que são mobilizados e construídos
na prática pedagógica. Entre os saberes destacados pelos docentes, podemos citar:
conhecimento relativo ao suporte tecnológico;
conhecimento do conteúdo da disciplina;
saberes relativos à gestão dos processos;
saberes relativos à promoção da colaboração;
saberes relativos à mediação pedagógica;
saber articular saberes;
saber incentivar e participar;
saber conduzir as discussões para um aprofundamento maior;
saber interagir com a turma ;
saber sobre as relações interpessoais e dialógicas;
saber problematizar as discussões nos fóruns e chats;
saber pensar e agir com rapidez;
saber dialogar com as novas demandas para a educação;
142
saber ser afetivo com os alunos nas discussões dos fóruns e chats.
A partir da análise dessa diversidade de saberes colocada pelos professores, fica mais
uma vez evidente que a noção de saberes está relacionada aos conhecimentos, competência,
saber-fazer, saber-ser, aos valores, atitudes, ao jeito pessoal de cada um trabalhar etc. Assim,
diante da pluralidade apresentada, e em acordo com pressupostos da cibercultura, análises e
estudos, é que buscamos agrupá-los em subcategorias: a mediação docente, a promoção da
interatividade e colaboração, a promoção da virtualização e os saberes tecnológicos.
Confessamos que esta foi uma tarefa um tanto difícil, pois à medida que os
professores iam falando de seus saberes, cada vez mais íamos percebendo um grande
amálgama em sintonia com os condicionantes do seu trabalho na rede. Alguns professores até
se surpreenderam quando questionamos sobre os saberes mobilizados na sua prática no AVA
dizendo:...pergunta difícil.... F3, ou mesmo colocando que esta questão não é fundamental ao
docente online. No que diz respeito, a saber...talvez esse não seja o ponto central para
docência online....não que esteja dizendo que seja dispensável...mas acredito no processo
permanente de aprendizagem F3. Sensibilidade mais sensações do que saberes F4.
Assim, percebemos que alguns dos docentes ainda não tinham parado para refletir
sobre essa questão, ou mesmo não tinham entendido claramente as perguntas colocadas. No
entanto, assim que compreendiam a dimensão da discussão, começavam a falar com muito
entusiasmo sobre suas práticas e saberes no contexto da cibercultura.
É em torno desse debate que pretendemos compreender os saberes que os professores
vivenciam na prática docente online, pois em toda a dinâmica do curso, foram se delineando
estratégias, atividades, situações, problemas e desafios, permeados de constantes reflexões e
pesquisa sobre o cotidiano pedagógico, que teceram a docência.
6.2.2.1 Saberes da mediação pedagógica
No contexto contemporâneo, a atividade docente precisa ser vista no sentido de
superação de uma educação “bancária”, na qual o professor é apenas o narrador e sujeito do
processo, para uma perspectiva pautada na mediação. É nessa dinâmica que Freire (1987)
critica as práticas pedagógicas fundamentadas numa concepção de educação como ato de
depositar, aonde o educador conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo
narrado, e aponta para dinâmicas pedagógicas baseadas na dialogicidade, em que professores
e alunos, apesar das diferenças nos papéis, não podem ser concebidos como objetos um do
143
outro.
Destacamos também a opinião de Veiga (2004) que ressalta a importância do
professor como mediador nas situações de ensino, quando produz e orienta diferentes
estratégias de aprendizagem necessárias para que os alunos aprendam. Isto facilita a
sistematização dos processos de produção do conhecimento, além de dinamizar as situações
de coordenação e problematização, nas quais os educandos vão paulatinamente organizando e
justificando suas idéias.
Diante dessas reflexões, vale escutar o chamado de Vygotsky (1999) que traz o
conceito de “Zona de Desenvolvimento Proximal”, definido pela distância entre o nível de
desenvolvimento real, no qual o sujeito resolve determinado problema sem ajuda e o nível de
desenvolvimento potencial, aonde se faz necessária a ajuda de um adulto e/ou a colaboração
de um companheiro para a resolução do problema. Nessa lógica, a mediação se destaca
também como uma atividade na observação atenta às dúvidas e dificuldades que vão surgindo
no processo, a fim de contribuir com intervenções que favoreçam o desenvolvimento dos
educandos no avanço da sua aprendizagem. Uma das professoras entrevistadas também
destaca este aspecto:
Saber mediar, eu acho fundamental, e mediar mesmo no sentido de tentar
aproveitar o que esse aluno sabe, partir desse saber que o aluno sabe e
tentar pensar como é que eu vou deslocar essa aprendizagem para um saber
potencial. E eu vou ter que criar zonas de desenvolvimento proximal,
situações de aprendizagem que faça a transição. Então saber fazer essa
mediação, problematizando, criando situações concretas para mobilizar
competências concretas. Como mobilizar competências de conversar de
forma dialógica se eu não faço mediações valorizando aquilo o que o aluno
faz, ao mesmo tempo desafiando, criticando, provocando novas reflexões.
Então fazer esse deslocamento, mediar esse deslocamento não é muito fácil.
F1.
Na fala da professora, fica evidente a importância da mediação docente, na atuação
da Zona de Desenvolvimento Proximal, levando em conta as competências atuais do sujeito
ajudando-o a avançar, através de novos desafios e problematizações. É essa a sinergia e o
dinamismo que o cenário digital potencializa práticas docentes que podem articular mediações
personalizadas e, ao mesmo tempo, coletivas na rede, tendo em vista que as interfaces
digitais, a exemplo do fórum de discussão, permitem o acesso à participação dos alunos,
favorecendo as adequadas intervenções. Vejamos um exemplo dessas características no
“Fórum: Fuxicando sobre a produção de conteúdos em EAD”.
Mediação mais personalizada
Olá pessoal! Vamos fuxicar!
Qual a importância do planejamento para a produção de conteúdos para
144
EAD?
O planejamento para a produção de conteúdos para EAD tem uma função e
um papel importantíssimos. Os conteúdos são terrenos que possibilitam aos
alunos a construção e interpretação da vida social de forma crítica, assim,
precisam ser pensados e repensados. Não vale improviso! O planejamento
cria metas, direciona o trabalho, busca conhecimento. Traz a possibilidade
da escolha do caminho a percorrer, não devendo ser rígido, mudar quando
necessário (essa flexibilidade é bem evidenciada no planejamento para
EAD). Ele é fundamental em qualquer ação que busque alcançar os objetivos
propostos!
Os conteúdos de aprendizagem para EAD precisam ter um tratamento
diferenciado do ponto de vista da linguagem?
Logo de início é importante levar em consideração que os conteúdos de
aprendizagem para EAD são produzidos para alunos que não estarão frente a
frente com o professor, sendo assim, devem permitir uma leitura sem
problemas. A linguagem deve ser precisa, exata e limpa. Também deve
haver uma preocupação com a atração que os conteúdos vão exercer sobre os
leitores/aprendentes. Essa linguagem precisa favorecer o aluno durante todo
o percurso em EAD, oportunizar o desenvolvimento da criatividade, da
intuição, da investigação, da resolução de problemas e do desenvolvimento
do senso crítico.
Bjs a todos! PC 70
Oi PC 70,
O planejamento educacional e os conteúdos são fundamentais ao processo
educacional num curso a distância, pois, devem promover a aprendizagem
de maneira contextualizada, observando e atendendo as demandas dos
alunos sem perder a objetividade e sempre, primando pela flexibilidade.
Como vemos nas discussões sobre planejamento e conteúdos em EAD, é a
ação conjunta e compartilhada com a equipe de suporte e com os alunos, que
possibiltarão a ressiginifcação dos conteúdos e a definição de novas
estratégias de promoção da aprendizagem colaborativamente e
interativamente.
Quando pensamos em planejamento educacional em EAD e nos conteúdos,
que papel tem a atividade nesse contexto? Como adequar um objeto de
aprendizagem na elaboração dos conteúdos em EAD? Como possibilitar a
convergência de mídias?
Vamos discutir? Bjs F 4
Mediação coletiva
Olá grupo laranja! Vocês estão fazendo ótimas sínteses sobre os elementos
de um planejamento. Isso demonstra que para vocês quero mesmo é de
extrema importância. Concordo plenamente. Entretanto, tenho notado que
pouca gente valoriza e entende a importância do planejar. Pessoal, pesquiso
educação online 7 anos. Tenho feito alguns trabalhos inclusive na cena
corporativa e o que observo, muitas vezes é o seguinte: As instituições
querem o conteúdo X ou Y e pronto. Muitas vezes pergunto? Vocês já
fizeram o planejamento? A resposta a maioria das vezes é não. Para quê ?
Perguntam os "clientes". Pois é pessoal. Quem vai utilizar este recurso?
Como estas pessoas aprendem? Que competências deseja mobilizar? Como
acompanharemos a aprendizagem? São perguntas que faço sempre muitas
vezes por ai.. Muito dinheiro é jogado fora, inclusive dinheiro público, com
esse tipo de ação. Por que será?F1
145
Nas discussões entre PC 70 e F4, percebe-se uma intervenção mais personalizada da
professora F4, quando contribui com a discussão sobre planejamento em EAD, trazendo
como elemento fundamental a articulação do trabalho em equipe da coordenação com os
alunos, na busca de novas estratégias de trabalho. Fica evidente, na fala da docente, sua
concepção de planejamento como uma obra aberta, em sintonia com a não-linearidade do
digital. Assim, além de contribuir com a reflexão da aluna, ela traz novas problematizações
para instigar o debate.
Na mediação da professora F1, o destaque é para uma abordagem mais coletiva,
elogiando a participação do grupo no debate, e socializando experiências que tem vivenciado
em diferentes instituições que não definem o planejamento e as formas de acompanhamento
aos alunos. A intervenção dessa professora, focalizando o descompasso entre a
implementação de cursos à distância e a falta de planejamento e reflexão sobre os objetivos do
ensino, ressalta inúmeras proposta de Educação à Distância, que acreditam ser apenas a
disponibilização de conteúdos o suficiente para o sucesso do trabalho. A professora termina
sua mediação, desafiando o grupo a pensar sobre diferentes questões.
Fontana (2005), ao discutir sobre a temática da mediação pedagógica apoiada nas
idéias de Vygotsky, afirma que os conceitos espontâneos e os conceitos sistematizados estão
em constante articulação e transformação. Para ela, diante de um conceito sistematizado
desconhecido, o sujeito passa a significá-lo aproximando-o de outros signos conhecidos e
internalizados. Em relação aos conceitos espontâneos, a autora destaca que estes podem
favorecer a aproximação ao conceito sistematizado, criando uma série de estruturas
fundamentais para a evolução dos conceitos mais elementares. É nesse cenário, que a
mediação docente torna-se fundamental, ao promover situações de aprendizagem que
favoreçam o desenvolvimento de novas habilidades.
Maheu (2000) assinala que a mediação, além de inserir-se no âmbito da prática
pedagógica, tendo o professor como mediador, abrange também a dimensão sociopolítica,
num mundo que reclama por transformações e justiça social. Neste contexto o professor, na
sua arte de ensinar, media essas relações mais amplas, assim como as relações que se fazem
presentes no cotidiano do magistério, naquilo que tem de mais essencial: a relação entre os
alunos e os objetos de conhecimento.
Para a autora, a mediação do professor deverá incluir três aspectos fundamentais: o
domínio do saber, o saber didático (que organiza e possibilita a aprendizagem) e o saber
sensível e lúdico, que faz do educador para além do sujeito político, um artista, um criador.
146
Na educação online essa preocupação com a mediação se torna mais evidente, pois a
separação física educador – educando vem exigindo novos arranjos pedagógicas com a
utilização das tecnologias da informação e comunicação, que não mais se baseiam em
contatos pessoais em sala de aula, mas em atividades docentes indiretas, pautadas nas
tecnologias da informação e da comunicação, através de e-mail, chat, fórum etc, num diálogo
permanente, na troca de experiências, na orientação das dificuldades individuais dos alunos,
bem como na construção de situações problemas e desafios que suscitem a discussão do
grupo, tendo como foco principal as diversas interfaces envolvidas. Analisemos o depoimento
de uma das professoras do curso:
Todo fórum eu mandava e-mail para o grupo dizendo: Oh! A gente vai
começar uma nova discussão, uma nova etapa. Espero que todo mundo
discuta mais. Olha! Eu o sou o foco, tem muita gente aqui para discutir.
Você viu o que o colega disse? Tanto que foi evoluindo essa discussão ao
longo do processo. F4
Para essa professora, as mediações por e-mail
28
foram fundamentais na orientação
dos alunos, incentivando-os a participar mais ativamente das discussões nos fóruns, e não
esperando somente pelas postagens da docente, no entanto interagindo com os colegas. Nessa
dinâmica, o e-mail possibilitou então, uma interação professor-aluno, aluno-professor, de
forma simultânea, encurtando o tempo de recebimento das mensagens. Dessa forma, a
mediação mantida ao longo do processo contribuiu com um maior entendimento dos alunos a
respeito do funcionamento no fórum, desencadeando assim processos de maior participação e
intervenção nos debates. Essa declaração ilustra também que o fórum, para a professora, é um
espaço de aprendizagem que vai se instituindo a partir da dialógica dos sujeitos envolvidos no
processo. Prestemos a atenção em um dos diálogos travados entre os alunos, que ilustra a
preocupação da professora, no “Fórum: Fuxicando sobre a produção de conteúdos para
EAD”.
Olá GRUPO Vermelho e F4,
Quanto aos questionamentos em planejamento, a estratégia é uma forma
criativa de atingir os objetivos, sua importância é primordial na EAD pelo
fato de ser um curso a distância a necessidade de fomentar no aluno o desejo
de freqüentar o curso, estabelecendo tempo e rotina.
Quanto ao planejameneto, reconhecido como caminho a ser percorrido para
atingir objetivos na EAD é preciso que o tutor tenha claro os objetivos do
curso a distância para que medie o aluno, alimente suas idéias, questione
suas opiniões para que ele avance e não perca o foco. O planejamento
28
O e-mail ou correio eletrônico é um dos serviços mais utilizados na internet, pois permite o envio de
mensagens entre os usuários, de forma assíncrona.
147
adequado precisa além de metas, objetivos e estratégias.É preciso ser
flexível, ajustado de acordo com a sua clientela,o perfil dos aprendentes, os
objetivos da EAD, estabelecendo uma relação onde tutor e aprendentes
opinem e questionem retroalimentando as discussões. PC 85
Olá PC 85,
Tenho acompanhado suas reflexões, gostando muito de seus enfoques,
concordando sempre com eles. Permita-me, contudo, essas questões:
- Considerando que esse curso é como um caleidoscópio e que além dos
textos, a provocação é aprendermos uns com os outros também (colegas,
tutores, autores, materiais complementares, links, videos, chats, fóruns, etc),
o que acha de comentar as reflexões dos colegas que estão postando neste
fórum? Você considera que esta é também uma forma de aprender? Como
você avalia esta dimensão? Creio fortemente que é nesse fuxico que também
tecemos a rede. Concorda? Parabéns, PC 85, pelas contribuições bem
elaboradas que tem apresentado aqui. Espero suas ponderações, com certeza
valiosas, sobre meus questionamentos a você hoje. Abs. PC 67
Olá . PC 67,
Adorei suas colocações isso me entusiasma a participar mais.
O aprender é realmente uma troca, e tem sempre alguém dando opiniões
significativas para o crescimento da aprendizagem.
No entanto é preciso também está atento, e ter consenso nas opiniões para
que não iniba os aprendentes, pois mesmo o curso sendo a distância é
possível que o aprendente sinta-se fortalecido e confiante para a troca - troca.
Valeu colega a força. PC 85
Masetto (2000, p.145) menciona algumas características fundamentais na mediação
pedagógica. Essas características não podem ser compreendidas como receitas prescritivas
para serem aplicadas no contexto de trabalho, e sim como saberes, frutos de pesquisas neste
campo do conhecimento, visando contribuir com a discussão sobre a temática Entre eles,
podem citar:
a) o diálogo permanente de acordo com o momento;
b) a troca de experiências;
c) o debate de dúvidas, questões e problemas;
d) apresentação de perguntas orientadoras;
e) orientação nas carências e dificuldades técnicas ou de conhecimento, quando o
aprendiz não consegue encaminhá-las sozinho;
f) garantir a dinâmica do processo de aprendizagem;
g) propor situações problema e desafios;
h) desencadear e incentivar reflexões;
148
i) criar intercâmbio entre a aprendizagem e a sociedade real onde nos encontramos,
nos mais diferentes aspectos;
j) colaborar para estabelecer conexões entre o conhecimento adquirido e novos
conceitos;
k) colocar o aprendiz frente a frente com questões éticas, sociais, profissionais, por
vezes conflitivas;
l) colaborar para desenvolver crítica com relação à quantidade e à validade das
informações obtidas;
m) cooperar para que o aprendiz use e comande as novas tecnologias para suas
aprendizagens e não seja comandado por elas ou por quem as tenha programado;
n) colaborar para que se aprenda a comunicar conhecimentos seja por meio de
meios convencionais, seja por meio de novas tecnologias.
Percebemos, com base no exposto, que a mediação pedagógica é de fundamental
importância nas atividades didáticas, tanto presenciais quanto à distância, pois instigam o
educando a desenvolver a autoria de sua aprendizagem para alcançar seus objetivos. Refletir
sobre a mediação docente acarreta numa preocupação forte em desconstruir perseptivas
educacionais centradas na auto-aprendizagem, como muitos cursos de educação à distância,
que simplesmente disponibilizam conteúdos nos ambientes de aprendizagem, tendo como
foco apenas os materiais e os recursos tecnológicos. Geralmente, esses materiais estão
estruturados de forma linear, cabendo ao professor apenas a execução e administração desses
conteúdos, que são disponibilizados por outros especialistas.
Nesse enfoque, o grande desafio do professor, na mediação pedagógica em
ambientes virtuais de aprendizagem e também fora dela, é dar conta do estilo digital de
aprendizagem ou estilo interativo, passando a “disponibilizar ao aluno autoria, participação,
manipulação, co-autoria e informações as mais variadas possíveis, facilitando permutas,
associações, formulações e modificações na mensagem” (SILVA, 2003, p.55). É dessa forma,
que disponibilizar em sala de aula, significa:
Oferecer múltiplas informações (em imagens, sons, textos etc.)
utilizando ou não tecnologias digitais, mas sabendo que estas,
utilizadas de modo interativo, potencializam consideravelmente
ações que resultam em conhecimento.
Ensejar (oferecer ocasião de...) e urdir (dispor entrelaçados os
fios da teia, enredar) múltiplos percursos para conexões e
expressões com o que os alunos possam contar no ato de
manipular as informações e percorrer percursos arquitetados.
149
Estimular os alunos a contribuir com novas informações e a criar
e oferecer mais e melhores percursos, participando como co-
autores do processo (SILVA, 2003, p.55).
A partir do referido por esse autor, fica clara a importância da mediação no contexto
da cibercultura, ao disponibilizar informações diversas e buscar desenvolver atitudes docentes
que permitam ao educando co-autoria. Essa questão de incentivar a co-autoria fica evidente na
fala de uma das professoras do curso, quando descreve suas estratégias pedagógicas para
trabalhar nos fóruns. Vejamos suas palavras:
A gente sempre tem um questionamento principal. E a partir do
questionamento principal, eu espero um pouco para ver o que as pessoas
respondem. Eu não intervenho de cara. Eu vejo uma, duas, três, quatro
contribuições. O movimento como é que eles estão. Se eles estão jogando a
resposta direta para o questionamento principal ou se eles começam a
discutir entre eles, a interagir. A partir daí é que eu lanço outros
questionamentos, sempre enfatizando o primeiro questionamento e puxando
como uma rede para outras questões. F2
O depoimento dessa professora, focalizando sua forma de mediar as discussões nos
fóruns, revela a importância que a mesma destaca no desenvolvimento de co-autoria do
estudante, observando de forma cautelosa a interação entre eles, e lançando novos desafios
para o debate. Este aspecto é fundamental para a superação de uma educação pautada na
instrumentalidade, em prol de uma educação aberta à partilha de sentidos e dos discursos dos
sujeitos.
Ampliando a discussão sobre a mediação docente em ambientes informatizados,
Valente (2000) destaca a abordagem pautada no “estar junto virtual”, tendo como
característica fundamental as interações entre os professores e alunos, bem como o
acompanhamento do docente, no sentido de auxiliar o estudante e desafiá-lo na construção de
novos conhecimentos. Dessa forma, a rede passa a ser utilizada para colocar em prática as
interações entre os sujeitos.
Diante dessa abordagem, as atividades disponibilizadas pelos docentes nos fóruns de
discussão do curso de tutores da UFBA procuraram sempre incentivar os alunos a debaterem
sobres as temáticas propostas, trocar experiências com os colegas, trazer novas informações,
participando como co-autores do processo. É o que podemos observar no debate do fórum a
seguir:
150
Reflexão de um professor colaborador sobre as provocações do Fórum:
Penso que estamos num momento decisivo na construção de projetos e ações
que refletiram no futuro da EAD no Brasil. Sabemos que a
educação, para
dar realmente certo, depende de um projeto político abrangente e
compromissado de fato com a formação de uma sociedade mais justa para
todos. No entanto, chega um momento em que é preciso idéias e atitudes que
corroborem essa preocupação com a educação. Nesse sentido, a EAD pode,
e creio que será uma aliada poderosa no processo de disseminação de cultura
e conhecimento. Vencendo barreiras geográficas e temporais a EAD pode
chegar onde o aluno está, superando uma dificuldade real, que é a dimensão
continental do nosso país, além da falta de estruturas físicas que possam
contemplar a demanda existente, principalmente no que diz respeito ao
ensino superior e a pós-graduação. Muito ainda está por ser feito. Mas
acredito que é caminhando que se faz o caminho. PC 30
Oi PC 30,
Na semana passada o governo federal lançou o Plano de Desenvolvimento
da Educação (PDE) que traz alguns avanços. Está longe de ser o ideal para a
melhoria da qualidade da educação no Brasil, mas como você diz
caminhando que se faz o caminho". A sociedade precisa se mobilizar para
que seja colocada em prática o que está no papel. Ontem foi divulgada a
pesquisa sobre o nível da educação no Brasil. O país ficou com a nota 3,8.
Os países desenvolvidos chegam a 6, 7 na média. A capital com o pior índice
foi Salvador e o segundo pior índice no interior do Brasil foi Maiquinique,
cidadezinha próximo à Vitória da Conquista. Nesse contexto, a Educação a
Distância pode ser uma aliada na conquista de uma educação melhor, mas,
para isso, é preciso percebermos e valorizarmos as peculiaridades da EAD e
Fórum da atividade I do Módulo I: Possibilidades e limitações para a EAD
N
o mundo inteiro se registra um crescimento quantitativo substancial em educação e treinamento,
todavia as desigualdades se mantêm intoleráveis, nacional e internacionalmente. Acompanhado
deste crescimento numérico tem-se uma população que se expande a níve
is alarmantes, agravando
ainda mais estas diferenças. A UNESCO (1997) aponta a existência de cerca de 900 milhões de
analfabetos adultos no mundo e aproximadamente 130 milhões de crianças entre 6 e 11 anos fora da
escola.
Aliado às dificuldades de acesso à educação básica e superior, levanta-
se a questão da formação
permanente de profissionais em todas as áreas. A demanda de formão é cada vez maior, visto a
velocidade com que novos conhecimentos e tecnologias estão sendo adicionados ao cotidiano. Pela
pri
meira vez na História, a maioria das competências adquiridas por uma pessoa no início do seu
percurso profissional estará obsoleta no fim de sua carreira (VY, 1999 p.157).
A EAD não pode ser considerada como a panacéia para os males da educação mundial. Moran,
Masetto e Behrens (2000) advertem que as dificuldades do ensino presencial não serão resolvidas
com a pura transposição para
o virtual. Entretanto, a EAD vem a colaborar no desenvolvimento de
alternativas que visem a superação do panorama atual.
Com base nestes indicativos, analise as possibilidades e limitações da Educação a Distância no
contexto em que vivemos. A EAD pode ser compreendida como um caminho para democratização
do ensino? Qual é a sua opinião sobre a EAD diante dos problemas da educ
ação no Brasil?
Quais são seus limites e possibilidades?
151
não vesti-la com uma capa do presencial. O que vocês acham disso tudo? A
opinião de cada um é importante para a construção coletiva. F2
Com base nesse depoimento, evidenciamos a mediação pedagógica de uma das
formadoras do curso, quando disponibiliza no fórum temático do módulo algumas reflexões
importantes sobre as demandas de formação e problematiza sobre o papel da EAD nesse
cenário, instigando os alunos a refletirem sobre essa temática.
Diante da resposta da cursista, a formadora contribui com o debate trazendo novas
informações e desafiando o grupo a refletir sobre a questão. Sob esse prisma concordamos
com o conceito de Masetto (2000), quando destaca a importância das atitudes docentes que
busca, estimular a participação ativa dos alunos no processo formativo. Entretanto,
gostaríamos de ressaltar que essa mediação, apesar de ser necessária e fundamental, não pode
ser tão “intensa”, podendo gerar situações de inibição na participação dos alunos.
Compreendemos que, no contexto digital, o aluno não é mais um sujeito passivo e
acomodado, e sim um sujeito de ação que sozinho, com o docente ou com os colegas vai
aprendendo e mudando seu comportamento, colaborando com a aprendizagem dos demais
sujeitos e também percebendo o grupo como um elemento fundamental na sua aprendizagem.
Nas propostas formativas nos ambientes virtuais de aprendizagem, outra questão
fundamental que precisa ser desenvolvida nos processos de mediação docente, são as
orientações e sistematizações vivenciadas durante o processo, principalmente no início do
curso, em que os alunos estão se familiarizando com a dinâmica. A seguir temos o exemplo
de um dos fóruns abertos pelos docentes, buscando retratar este aspecto:
Olá pessoal do grupo vermelho!
Sejam bem-vindos ao nosso curso. Sabemos que o tempo será curto, mas,
com certeza, também será rico, produtivo e divertido. Para isso, segue
algumas orientações importantes para essa caminhada
...
Edição do perfil o perfil é uma das ferramentas que possibilitam a
construção da interação no ambiente virtual, é onde saberemos um pouco
mais de vocês e poderemos identificá-los por meio das fotos. Por isso, é
importante a sua atualização. (Campanha contra a carinha amarela no
perfil).
O manual do cursista é o documento fundamental para o cursista, nele
estão todas as informações necessárias ao desenvolvimento do curso,
principalmente sobre a avaliação do cursista e do curso. Por isso, leiam
atentamente. Recomendo que imprimam para que fique sempre a mão em
caso de dúvidas.
Atividades obrigatórias o curso está distribuído em etapas, sendo que
todas possuem atividades que devem ser cumpridas num determinado prazo
152
(os Chats e os Fóruns). Por isso, recomendamos que estejam atentos aos
prazos especificados no manual, no caso dos Fóruns (lembrem que vocês
devem responder ao tópico com o meu nome) e os acordados com o
professor-tutor, no caso dos chats.
Interação e participação a interação na construção da aprendizagem
durante o curso é axial, é por meio das trocas que estabelecemos um diálogo
com o colega, com o professor-tutor, com a equipe e encurtamos as
distâncias. Sendo assim, participem ativamente das atividades buscando
sempre comentar e complementar a opinião dos outros e assim, com certeza,
construiremos um ambiente colaborativo e interativo.
Horários do Chats
Como foi possível observarmos na apresentação do curso, o chat se
configura como uma atividade obrigatória que tem como proposta discutir
teorias, conceitos e tirar dúvidas sobre os assuntos abordados em cada etapa.
Com o objetivo de promovermos um clima de discussão agradável e
mantermos um diálogo mais tranqüilo entre os participantes do grupo,
sugerimos que cada chat conte com a participação de 10 cursistas. Para isso,
vamos disponibilizar para escolha três horários diferentes de chat, em turnos
diferentes, para contemplarmos as mais diferentes situações.
Por isso, solicitamos a todos e todas do grupo que informe qual o horário de
sua preferência até a sexta-feira, para dar tempo de fazermos qualquer tipo
de alteração ou remanejamento de horários e pessoas.
Segue as sugestões de horários:
Segunda 30/04 11:00h às 12:00h
Terça 01/05 - 21:00h às 22:00h (feriado);
Quarta 02/05 - 15:00 às 16:00h
Será um prazer encontrar vocês.
Beijos F4
No fórum acima, o professor procura acolher, aconchegar e orientar os cursistas em
relação à proposta do curso, estabelecendo os objetivos comuns para a aprendizagem e
negociando com o grupo as diretrizes desde o início. Dessa forma, professores bem
preparados para exercer a mediação à distância são essenciais. Nas palavras de Lévy (1998), a
competência do docente deve deslocar-se no sentido de incentivar a aprendizagem e o
pensamento: o professor torna-se o animador da inteligência coletiva dos grupos que estão ao
seu encargo. Sua atividade será centrada no acompanhamento e na gestão das aprendizagens:
o incitamento à troca de saberes, a mediação relacional e simbólica e o acompanhamento
personalizado dos percursos de aprendizagem.
153
6.2.2.2 Saberes interativos
As discussões sobre interatividade têm se tornado destaque nas publicações sobre
cibercultura, e conseqüentemente na educação online, uma vez que é de fundamental
importância no desenvolvimento de práticas docentes que visam potencializar atividades
colaborativas na rede, bem como romper com propostas educacionais centradas na figura do
professor como narrador de conteúdos, que nega o ato de conhecer como um processo de
busca e descoberta. Esses pressupostos vão de encontro à perspectiva interativa aberta pelo
meio digital que permite intervenção e manipulação na mensagem.
É nesse sentido que a ação pedagógica que procura refletir sobre a interatividade,
como elemento fundamental no contexto online, requer considerações sobre a mudança do
modelo clássico de comunicação, em que a emissão, a recepção e a mensagem encontram-se
dispostas de forma hierárquica e dicotômica. Sob esse enfoque é que a participação e a
intervenção possibilitam ao sujeito a autoria e co-autoria, na medida em que ele pode dispor
de conteúdos manipuláveis para criação. Para isso, faz-se necessário vivenciar a
reversibilidade entre emissão e recepção, superando a difusão da mensagem em mão única,
dissolvendo-se fronteiras e permitindo aos sujeitos autoria nas suas ações. Essa dinâmica é de
fundamental importância para que as pessoas possam navegar de forma livre, construindo
narrativas em sintonia com a sua itinerância.
Nessa lógica, baseando-se nos princípios da mobilidade dos centros destacada por
Lévy (1993), não existe um chefe, professor permanente do saber, mas uma circularidade de
informações e trocas visando ao alcance dos objetivos que podem ser de todo o grupo ou
apenas de um grupo restrito de pessoas ou até mesmo de uma única pessoa. Assim, as
contribuições que vão circulando refletem a expressão das individualidades, percepções e
racionalidades e contribuem para a constituição rizomática dos saberes em constante
metamorfose.
Colocar em reflexão essas questões, não descarta o reconhecimento de que o papel
do professor é fundamental, ao dispor de um maior conhecimento acerca de algumas
temáticas de estudo, dominar os conhecimentos curriculares, das ciências da educação e,
principalmente, os saberes da ão pedagógica. Contudo, as dinâmicas pedagógicas no
contexto digital perdem sua estabilidade, possibilitando aos sujeitos envolvidos diferentes
atuações ao longo do processo. Assim, em relação a determinadas temáticas propostas para a
discussão, o destaque pode ser de um aluno que conhece mais profundamente aquele
conteúdo sem, contudo, descaracterizar os saberes profissionais do docente.
154
Na visão de Silva (2002), a formulação de problemas, sistematização de
experiências, a coordenação de equipes de trabalho e o constante diálogo com os educandos
são desafios à docência. O autor também acrescenta:
O professor seria então aquele que oferece possibilidades de aprendizagem
disponibilizando conexões para recorrências e experimentações que ele tece
com os alunos. Ele mobiliza articulações entre os diversos campos de
conhecimento tomados como rede inter/transdisciplinar e, ao mesmo tempo,
estimula a participação criativa dos alunos, considerando suas disposições
sensoriais, motoras, afetivas, cognitivas, culturais, intuitivas, etc. (SILVA,
2002, p.74).
Do mesmo modo, o professor precisa se posicionar não como um detentor todo
poderoso do conhecimento e sim como um aprendiz que oriente o aluno diante das múltiplas
possibilidades de acesso ao saber. Muda-se também a dinâmica da sala de aula, presencial ou
online, onde o enfoque no trabalho em grupo é fundamental para se buscar e negociar as
diversas alternativas sobre os conhecimentos em pauta.
Refletir sobre essa temática requer o alerta para a questão das diferenças
desencadeadas na promoção do diálogo e na confrontação coletiva do conhecimento. Dessa
forma, o professor não as elimina em favor de uma unidade e também não dilui as
diversidades numa única unidade. É nessa trama que as dinâmicas de trabalho desencadeadas
precisam estar abertas à pluralidade de vozes que vão construindo a comunidade de
aprendizagem na construção da co-autoria. Esse enfoque traz consigo a visão de uma sala de
aula democrática, presencial ou à distância, em que se reconhece e valoriza o aluno em sua
inteligência e posicionamento sociocultural (SILVA, 2002).
No âmbito dessa discussão, o rompimento com a perspectiva da transmissão é uma
pauta emergente, visto que na concepção educacional pautada na centralização da fala do
professor, o aluno não participa como co-autor no processo de elaboração da mensagem,
resumindo-se apenas a um objeto submisso diante de um conhecimento que lhe é transmitido
como absoluto, inquestionável, inatingível. Os professores formadores do curso se preocupam
com essa situação, como pode ser constatado nos trechos abaixo de um dos chats do curso:
21:42:18 [F1] Por que vocês decidiram fazer este curso online? Qual o interesse de
vocês pela EAD?
21:42:19 [PC8] Será possível???Negroponte disse que espera conseguir colocar seu
computador nas mãos de 1 bilhão de crianças com idades entre 6 e 16 anos
em países em desenvolvimento, com a produção chegando a 400 mil
unidades por mês no final deste ano, para um total de 3 milhões na primeira
leva de produção. Li
155
21:42:39 [PC9] Aí, não nesse momento, discordo. O mesmo vinho compartilhado
com amigos tem outro gosto. "Alegria só pode goza o máximo, se um outro
também se alegre" (Mark Twain)
21:43:37 [PC8] Li isto num conteúdo da UOL hoje e creio que se for possível
encurtaremos a distância entre incluídos e excluídos.
21:44:14 [PC9] Eu simplesmente queria conhecer a EAD. Antes pensava mal da
EAD, sem conhecê-la. Isso uma postura que não aceito em pessoas.
Conhecer é o mínimo. Por outro lado, reconheço que esse país, em termos
de tamanho, preciso caminhos específicos para superar a distância.
21:44:18 [F1] P8, este tema dos computadores para as crianças será um campo de
pesquisa vivo para nós que estamos na docência da Informática na
Educação. Seremos sujeitos dessa história. Temos que pensar nas atividades
que desenvolveremos com os professores, pensar na formação dos mesmos.
21:45:14 [P9] Acho que as crianças (algumas crianças) não largam mais o
computador. Precisamos aceitar isso e trabalhar com isso. O mundo mudou.
É um fato. Ele sempre mudará!
21:49:54 [F1] Seu exemplo P8 mostra que as metodologias podem ser
compartilhadas sim. A pedagogia da reflexão é fundamental. Você já leu
Paulo Freire?
Na dinâmica de interação desencadeada nesse chat, percebemos que a comunicação
estabelecida é uma produção conjunta dos alunos e do professor, permeada por discussões de
temáticas diversas; ao mesmo tempo fluem laços de afinidade que impulsionam a
aprendizagem. Outro aspecto registrado diz respeito à dinâmica não-linear e ligeira das
participações, favorecendo uma polifonia de idéias. Essas características evidenciadas no chat
ressaltam o potencial do digital que abre a possibilidade de manipulação e adentramento na
mensagem, liberando o pólo da emissão e criando espaço para a interatividade.
Nessa lógica, em particular, temos que estar atentos às formas de interação
desenvolvidas nos diferentes ambientes de aprendizagem, que não basta enviar e receber
mensagens, dar feedback e observar as dinâmicas individuais. O desafio posto aos sujeitos
envolvidos é estarem abertos a processos recursivos aonde as interações se caracterizam,
especialmente, por sua construção dinâmica, contínua e contextualizada (PRIMO, 2007).
Os docentes e alunos do curso de tutores estavam alertas para essa perspectiva de
interação, como pode ser observado no debate do fórum “Fuxicando sobre a produção de
conteúdos para a EAD do Módulo II do curso”.
O trabalho com projetos de aprendizagem é fantástico e corrobora para a
aprendizagem significativa. Uma vez que os alunos se constituem como
autores participantes em todo o desenvolvimento do projeto, discutem as
problemáticas, descrevem, registram investigam e produzem resultados.
Através das dúvidas temporárias e certezas provisórias estimula a busca no
sentido de encontrar repostas para as indagações. Infelizmente essa
156
metodologia ainda é bastante mida nas instituições de ensino.
abraç@o PC 3.
Oi, PC 3, Por que você acha que nas escolas a perspectiva de planejamento
por projetos é tão tímida? PP
Oi PP, acho que não fui clara o suficiente. Me refiro a metodologia de
projetos de aprendizagem, e não ao planejamento por projetos, uma vez que
no projeto de aprendizagem há diferenças quanto ao papel do aluno e do
professor. Nessa concepção a construção da aprendizagem é algo que
acontece quando o aluno é ativo, quando está interessado no que está
fazendo, ou seja a aprendizagem, para ser bem sucedida, decorre daquilo que
o aluno faz, não de algo que o professor faz nele, para ele ou por ele, sendo
assim a aprendizagem acontece quando os alunos se envolvem em "projetos
de aprendizagem", de sua própria escolha.
A pedagogia de projetos de aprendizagem está atrelada o uso da tecnologia
digital (computador conectado) por constituir um espaço efetivo para:
interação, aprendizagem colaborativa, disseminação e divulgação dos
resultados.
Por isso que nessa perspectiva essa metodologia ainda está engatinhando.Na
na nossa realidade já tem-se algumas experiências através das capacitações
em informática educativa desenvolvidas pelos Núcleos de Tecnologia.
abraços.
Oi PC 3,
Entendi sua colocação, porém acredito que é preciso articular a proposta do
aluno com a proposta da escola. Afinal, temos conteúdos importantíssimos
que são necessários ao repertório sócio cultural dos nossos alunos. Se a gente
consegue, com você colocou atrelar isso a dinâmica da rede, com certeza a
interação, aprendizagem colaborativa e autonomia do estudante vai ser
potencializada. PP
PC3 e PP a interação de vocês ta muito boa! Concordo com PP quando toca
na questão da convergência de interesses. Os projetos de aprendizagem não
podem ficar desconectados dos demais projetos da escola. O projeto político
pedagógico é a estratégia global da escola\comunidade, que para alcançar
seus objetivos mais amplos (aprendizagem dos alunos), não existirá sem
projetos de aprendizagem que ponham na prática sua filosofia, política e
metas. É importante fazer ai convergência! Vamos intensificar mais este
debate. Vamos lá grupo laranja? Beijos F1.
Na dinâmica de interação desencadeada na discussão do fórum, ressalta-se que, tanto
os alunos quanto os formadores têm como pressuposto a interação dialógica. As questões são
levantadas e percebe-se sua evolução contextualizada através do relato de experiências e
saberes. É essa abertura ao contestar, ao discordar que difere uma interação mútua de uma
interação reativa, onde o debate não tem lugar. Concordamos então com Primo (2007, p.116),
que a “interação mútua é ação conjunta, muito mais que mero movimento ou reação
determinada”.
157
Por conseguinte, o grande desafio do trabalho docente nos ambiente online é
oportunizar processos de aprendizagem, colaboração, cidadania e, notadamente, de
participação. Participar nesse cenário é muito mais do que escolher entre duas opções, mas
adentrar e modificar a mensagem tornando-se co-autor da proposta. Portanto, outra questão
que devemos ficar atentos é sobre a colaboração nos ambientes de aprendizagem que nos
permitirá a vivência de uma inteligência coletiva. O professor passa a estimular os alunos,
facilitando a troca de informações e a construção do conhecimento, a partir do debate e da
crítica, ao virtualizar e atualizar simultaneamente problemáticas emergentes do contexto
educativo e social.
6.2.2.3 Propostas de colaboração
O estilo digital de trabalho na rede aponta para a necessidade cada vez mais
freqüente de trabalhos em grupo, o que vem incidindo no desenvolvimento de vários
softwares que viabilizam esse projeto. O groupware destaca-se nesse cenário como “uma
tecnologia computacional para o apoio ao trabalho de grupos de indivíduos (CAMPOS et al.,
2003). Nesse processo de reflexão, constata-se que não é a tecnologia que vai promover a
interação e cooperação entre os membros do grupo, porém esse artefato tecnológico oferece
melhor suporte “a processos de comunicação, cooperação, compartilhamento de informações,
resolução de problemas, negociação e tomada de decisões” (CAMPOS, et al., 2003).
Para Okada (2003), a dinâmica colaborativa contribui para a construção de um
conhecimento mais significativo, porque desenvolve processos interativos e habilidades intra
e interpessoais. Entretanto, apesar do potencial desse trabalho, a autora reconhece a
importância do estudo individual, através de leituras, reflexões e sínteses no processo de
construção do conhecimento.
Nesse contexto, a autora difere o trabalho cooperativo do trabalho colaborativo, em
relação aos objetivos e intenções. Para ela, o foco do trabalho cooperativo centra-se em um
objetivo comum, articulado por todo o grupo, diferenciando-se assim de propostas
individualistas e competitivas. Na perspectiva da colaboração, não necessariamente um
único propósito definido para o grupo e todos podem interagir e contribuir com o outro. A
incerteza, complexidade, crítica e autocrítica são aspectos destacados pela autora na
itinerência desse tipo de aprendizagem (OKADA, 2003).
158
Em relação à diferenciação desses dois conceitos, Alves (2003) ressalta a questão da
comunicação, inferindo que nos processos colaborativos o trabalho em grupo está pautado
numa comunicação bidirecional contínua, desencadeando a construção do conhecimento, de
forma conjunta e negociada. Em relação ao processo cooperativo, a autora assevera que a
comunicação pode ser unidirecional, quando algum aluno se destaca explicando as idéias aos
colegas, e também pode assumir o aspecto multidirecional, quando o grupo toma decisões e
busca alternativas.
Percebemos, na contribuição das duas autoras, que apesar dos diferentes focos de
análise, a colaboração se destaca por possibilitar uma maior interação entre os grupos, sem
necessariamente ter um objetivo comum estabelecido. Em relação à cooperação, o processo
comunicacional pode sofrer variações, tendo como foco os objetivos estabelecidos pelo
movimento do grupo, podendo ter uma maior centralização em um dos membros, ou mesmo a
partir de uma discussão conjunta de todos. Entendemos que nas propostas de trabalho nos
ambientes virtuais de aprendizagem, os dois enfoque são importantes, por possibilitarem a
construção conjunta entre os participantes.
Na visão de Kenski (2003), o trabalho colaborativo contribui para o aprender junto,
respeitando o pensamento alheio, a convivência com a diferença e, sobretudo, a busca de
soluções que servirão para todo o coletivo. A autora ressalta também que em comunidades
virtuais os seus membros, além de serem responsáveis pelo seu aprendizado, devem
igualmente contribuir com o desenvolvimento de todo o grupo. Logo, pensar a docência nesse
contexto, requer uma constante troca de interações, cujo foco principal está no crescimento
conjunto dos sujeitos envolvidos.
No curso de tutores da UFBA, o enfoque dado ao trabalho colaborativo esteve
presente em todo o processo, tendo o papel da mediação docente como fundamental no
incentivo ao compartilhamento e à produção coletiva. Vejamos alguns trechos do fórum:
“Fuxicando sobre a produção de conteúdos para a EAD do Módulo II”.
Oi PC 73,
Estou gostando muito da sua interação com as postagens dos demais
cursistas. O planejamento como você mesmo colocou na resposta a PC 67 é
fundamental em nossas vidas. Quanto as diferentes formas de se planejar no
ensino presencial e a distância. Quando você apresenta o planejamento em
EAD como um planejamento aberto, quais são as suas possibilidades? Abs,
F4
Oi F4 e colegas
159
Quanto às possibilidades de um planejamento aberto em EAD, penso que ele
nos possibilita maior abertura ao diálogo e participação dos envolvidos no
processo. Cada participante pode trazer suas experiências e vivencias reais
sobre o assunto e também leituras ou um problema a ser discutido,
agregando valores, desta forma possibilitando ampliar a construção do
conhecimento.
O que mais vocês poderiam agregar a esta minha fala inicial? PC 73
Olá PC 73, F4 e colegas,
Acredito que esse caráter de abertura é fundamental no planejamento em
EAD e no Ensino presencial. Morin traz um conceito precioso que é a "
estratégia". Ele afirma que a estratégia pode modificar o roteiro de ações
previstas, em função das novas informações que vão chegando pelo
caminho. Isso é fundamental em qualquer curso, pois incorpora o acaso e
nos possibilita criar e inventar novas possibilidades. Já a noção do programa,
está pautada numa seqüência de ações predeterminadas que só pode se
realizar num ambiente com poucas eventualidades e desordens. PP
Olá PP,
Bem-vinda ao nosso fórum. Espero que goste e sinta-se a vontade no nosso
grupo. Quanto a importância do planejamento ele é essencial em qualquer
circunstância em nossas vidas e, principalmente, no contexto educacional.
Quanto à importância da estratégia e a sua diferenciação do
programa definido por Morin e citada por F1 no módulo 3, acredito que elas
se complementam, sendo a estratégia fundamental num curso a distância,
pois permite ressignificar, adequar, alterar, ou seja, flexibilizar as ações por
ter um caráter não linear.
De acordo com as suas observações, como construir um planejamento
educacional em EAD?Como desenvolver estratégias de interatividade em
um curso de EAD online? Bjs,F4
Oi colegas,
Acredito que na construção de um planejamento em EAD, temos que ter
clareza primeira dos nossos objetivos com o curso e buscar conhecer o perfil
e expectativas dos alunos. A partir daí, é que selecionaremos os conteúdos e
as interfaces de mediação. Para a promoção da interatividade, o desenho
didático ajuda muito, além é claro da participação e intervenção das pessoas.
Ambiente nenhum garante isso. O que garante são as pessoas que habitam
este ambiente e a concepção de educação implícita. PP
Nas discussões travadas nesse fórum, observamos a participação ativa dos alunos e
professores no debate sobre planejamento em EAD, trazendo importantes reflexões para o
grupo. Percebemos, durante o seu desenvolvimento, o incentivo à colaboração na mediação
feita pela professora, com a utilização de diversos questionamentos, para que os alunos
pudessem contribuir com as colocações dos demais colegas, na construção sinergética de
práticas e conhecimentos para além da simples somas das partes. O professor faz da sala de
aula um ambiente que tem como princípio o exercício da participação que prepara o sujeito
para a ação na confrontação coletiva (SILVA, 2002).
Na visão de Dias (2001), é fundamental na constituição de propostas baseadas no
160
desenvolvimento de processos colaborativos, a criação de uma cultura de participação nas
atividades de seus membros. Daí, a necessidade de todos os sujeitos envolvidos no processo
formativo partilharem e construírem novos conhecimentos. Sob esse prisma, na organização e
no funcionamento de uma comunidade de aprendizagem, os membros precisam interagir de
tal forma que o êxito pessoal de um corresponda ao sucesso também do outro, superando-se
uma visão de simples aglomerado das contribuições pessoais, para um trabalho conjunto em
rede.
Isso significa, segundo Alves (2003) inspirando-se em Almenara e Espinosa, que a
atividade colaborativa pressupõe,
1) a formação/ promoção de grupos heterogêneos, evitando-se sempre que
for possível agruparem-se os sujeitos reiteradamente com pessoas com as
quais ele(a) mantém vínculos sociais; 2) a busca do alcance dos objetivos
pessoais e do coletivo; 3) a interdependência não hierarquizada entre os
membros do grupo como forma de incentivo a um genuíno aprendizado.
[s/p]
Concebido dessa maneira, o trabalho colaborativo retrata um aspecto fundamental a
ser desenvolvido nas propostas de educação online, pois contribui para a construção conjunta
do conhecimento, bem como dinamiza processos de bidirecionalidade, nos quais a
comunicação é vista a partir da articulação entre emissão-recepção, em que a informação não
é mais movimento de mão única. Essa comunicação faz com que o professor, Silva (2002,p.
191) “disponibilize estados potenciais do conhecimento de modo que o aluno conhece se
atuar e dialogar no sentido de imersão, navegação, exploração, conversação e modificação”.
Este processo pode fortalecer a estruturação e elaboração de sucessivas reconstruções que
fornecem suporte para a organização do sujeito enquanto agente em transformação. Diante
disso, desenvolve-se um processo de dialogicidade, na qual professores e alunos vão tecendo
a construção de novos conhecimentos que são reconstruídos a cada nova contribuição.
Sendo assim, as propostas de produção colaborativa precisam ser compreendidas
como:
[...] um processo que envolve múltiplas interações no sentido de entender o
que o outro sugere, refletir, propor desafios e construir respostas
colaborativamente. É muito impressionante ver um trabalho tão grande sem
que haja reunião presencial e que funciona como se houvesse. As trocas de
idéias, as discordâncias e, depois, concordâncias, utilizam-se do virtual para
virem à “baila”, fato que exige esforço pessoal e empenho colaborativo a
cada um dos membros envolvidos (PRATA-LINHARES, 2004, s/p).
Essa nova lógica, pautada no trabalho colaborativo, tem desafiado propostas de
educação online ancoradas numa comunicação todos-todos, aonde alunos e professores
possam criar e compartilhar conhecimento. Daí a importância de espaços que potencializem
161
processos colaborativos, para que as pessoas possam intervir na mensagem, reconstruindo-a e
modificando-a, tornando-se todos os co-autores.
Nesse contexto, podemos perceber uma tendência que retrata novas funções para o
formador, na perspectiva de dinamizar e acompanhar os aprendizes no processo. É preciso
promover discussões nas diferentes interfaces do ambiente de aprendizagem, visando o
principal objetivo do aprendizado colaborativo que é o “aprender juntos”.
Palloff e Pratt (2002, p.141-158) indicam algumas dinâmicas para promover a
aprendizagem colaborativa em ambientes de aprendizagem. Insistimos, mais uma vez, que
essas dinâmicas não esgotam a criação de estratégias de trabalho utilizadas pelos docentes no
seu cotidiano, porém são importantes para pensamos processos colaborativos no ciberespaço.
Destacam os autores a importância de lançar estratégias que favoreçam o desenvolvimento de:
objetivos comuns para os participantes, foco nos resultados perseguidos pelo grupo,
estabelecimento e concordância relacionada a normas, valores e comportamentos
comunitários, trabalho em equipe, figuras docentes como orientadoras/animadoras da
comunidade, aprendizagem colaborativa, entre outros.
Quanto à formulação dos objetivos comuns para a aprendizagem, os autores
ressaltam que a projeção desses objetivos é um componente fundamental para promover a
colaboração. Assim o professor pode usar uma variedade de dinâmicas para conduzir o
trabalho como, por exemplo, negociar as diretrizes do curso, socializar as apresentações
pessoais e expectativas. Vejamos como as apresentações pessoais e o levantamento das
expectativas foram estimulados durante o Curso de Tutores da UFBA:
Olá turma!
Iniciamos nosso curso no último dia 24 ecomeçamos a discutir o primeiro
módulo da etapa 1 sem nos apresentarmos direito. Como não participei do
primeiro encontro presencial, quero conhecer mais intimamente vocês.
Vamos falar um pouco sobre nós?
Alguns colegas estavam com problemas de acesso, senhas. Agora tudo já foi
resolvido. Vamos nessa? Eu começo!
Sou a professora F1. Podem me chamar de F1!
Neste curso discutiremos aspectos fundamentais da EAD os seus desafios
para a prática educativa e a gestão escolar na cibercultura. Este é o tema que
vem me inquietando deste a minha pesquisa de mestrado. Espero
compartilhar com vocês minhas inquietações, experiências formativas e
pesquisas. Além disso, aprender com todos e todas novas estratégias para a
materialização da nossa ação docente na cibercultura.
162
Além disso, espero fazer amigos ! Adoro viajar, conhecer novas culturas,
pessoas, etnométodos. Sou natural de Salvador Bahia. Morei ai 30 anos da
minha vida. Sou completamente implicada com a cultura baiana em especial
a afro-brasileira. Adoro festas, rituais, comidas de azeite, alegria! A natureza
para mim é a expressão mais concreta da existência de Deus! Adoro sol,
praia, verde.
Hoje tenho 33 anos de idade e espero um dia conhecer o mundo todo
presencialmente. Hoje vou me virando com a internet. Atualmente, moro no
Rio de Janeiro. Já aprendi a gostar da "cidade maravilha purgatório da beleza
e do caos". Este curso online será mais um espaço fecundo de convivência
colaborativa. Estou feliz pelo nosso encontro online que com certeza será
com muita presença!
Que tal agora se apresentar para os colegas? Fale de você, da sua vida, da
sua experiência profissional e principalmente das suas expectativas sobre o
nosso curso.
Palavra franqueada. Espero vocês! F 1
No fórum acima, pudemos perceber o incentivo às apresentações pessoais e, em
especial, a socialização das expectativas sobre o curso. As apresentações são importantíssimas
por potencializarem encontros e autorias coletivas, a partir da alquimia de afinidades. Em
relação à socialização das expectativas do curso, esse aspecto é fundamental para o professor
poder verificar se ou não congruência nas mesmas podendo, a partir daí, estabelecer novos
direcionamentos à proposta. Para Palloff e Pratt (2002), “quanto mais as expectativas
convergirem mais provavelmente teremos, como resultado, um processo de aprendizagem
colaborativa”.
Outro aspecto importante a considerar em relação a dinâmicas utilizadas para a
promoção da colaboração no ambiente de aprendizagem, diz respeito ao estímulo à troca de
experiências da vida real. Assim, as problematizações relacionadas com o cotidiano facilitam
a participação nos debates, cuja maioria pode vivenciar. Vejamos um exemplo no “Fórum:
Possibilidades e limites para EAD”.
PC 8, você fez ótimos destaques.
Pesquisas já demonstraram a importância da EAD para a formação
profissional em nosso país e em outros lugares do mundo. Nosso território é
imenso, as desigualdades são profundas. A EAD pode ir longe, pode chegar
em locais que nunca tiveram acesso à informação e ao conhecimento mais
global.
Além disso, a EAD pode potencializar o ensino/educação presencial.
Podemos utilizar as tecnologias, incentivar a auto-aprendizagem, a
aprendizagem colaborativa.
O que acham disso tudo? Alguém teve outra experiência de EAD?
Vamos relatar aqui? Beijos F1
163
F1, Achei muito interessante sua posição em relação a EAD diante do
questionamento levantado por PC 12 quando ela trata dos laços de
afetividade entre prof.online x aluno virtual. Finalizei no mês de março deste
ano uma Especialização em Educação Inclusiva pela UCB/IESDE
(Unificado de Feira) e achei enriquecedor; muito material disponível, vídeo-
conferências e livros didáticos para todas as disciplinas do curso,além de
termos uma tutora formada em Pedagogia pela UEFS ,Pós-Graduada em
Psicopedagogia ,profa. de Universidade e outros cursos e com noções de
Metodologia do Trabalho Científico -o que é de suma importância que o
tutor saiba,além de ter que ser bem eclético através de conhecimentos
acadêmicos globalizados,entende?Pena que meu tempo para ler todo o
material foi exíguo.
F1,fiz esse relato para registrar o meu apoio ao ensino à distância;a única
ressalva que faço é a de que o TUTOR esteja bem preparado em muitas
áreas do conhecimento e que ame e abarque essa causa com toda força e
coragem. Um abraço carinhoso de sua aluna que muito lhe admira, PC 23
Oi F1 e colegas
Eu tive oportunidade de fazer alguns cursos na modalidade à distância,
alguns pelo e-proinfo e diga-se de passagem deixaram a desejar quanto a
interatividade. o tutor praticamente inexistente . Agora tenho uma
experiência que para mim considero como exitosa, fiz através da escola 2000
por hora da Fundação Airton Sena - EAC (Experiência de aprendizagem
colaborativa) tendo como mediador o Educardo Chaves, foi fantástica, não
era em um ambiente virtual, mas através de lista de discussão. Onde
recebíamos a cada semana um bloco de questões e a partir daí gerava-se as
discussões. Eu mesma me sentia o máximo, uma simples professora de
Jacobina- Ba,estar interagindo com doutores e escritores do nosso gigantesco
Brasil Não é enriquecedor?
bjs PC 3
Através dos questionamentos levantados pela docente, solicitando aos alunos que
socializem suas experiências de EAD, podemos observar o quanto o estudante se sente à
vontade para compartilhar as suas vivências. Este aspecto é fundamental em cursos online,
uma vez que a discussão sobre a vida cotidiana facilita a construção dos sentidos,
contribuindo assim com seu processo de aprendizagem. Numa abordagem colaborativa, esse
compartilhamento de experiências gera novos problemas e interesses para a discussão do
grupo.
Dessa forma, uma proposta pedagógica em ambientes de aprendizagem,
fundamentada nos princípios da colaboração, requer um desenho didático aonde o trabalho em
grupo, o papel do professor, a divisão de tarefas, a rotatividade de papéis, a construção
colaborativa de textos e a proposta avaliativa sejam elementos essenciais para o sucesso do
curso. Daí a importância de, no início do trabalho, se fazer o levantamento das expectativas
do grupo, observando suas motivações e seus interesses e, ao longo do processo, reorganizar a
164
estrutura de trabalho em sintonia com as reais necessidades dos educandos. Esses aspectos
retratam a construção de propostas pedagógicas e comunicacionais em sintonia com as
demandas dos educandos.
6.2.2.4 Saberes virtualizantes
A organização de propostas educativas pautadas na mediação, interatividade e na
colaboração prevê uma dinâmica pedagógica baseada em processos virtualizantes. Lemos
et.all (1999) destacam sobre esse tópico que as novas tecnologias, em sintonia com a
educação, reconfigurariam o papel de professores e alunos como agentes de virtualização,
questionando, problematizando e resolvendo questões, mesmo que temporárias. Além disso,
para o autor, uma das maiores problemáticas da educação atualmente é a ênfase dada à
perspectiva da atualização e não nos processos virtualizantes. Um exemplo bastante
significativo apresentado pelo autor, retrata as respostas prontas, cultivadas nos diferentes
espaços educativos, tendo como foco o “passar de ano” e o vestibular. Assim, as propostas
educativas trabalham com uma visão estática de aprendizagem, na qual se conhece
anteriormente a resposta possível.
Nesse sentido, urge introduzir a distinção entre possível e virtual que Lévy (1996, p.
15-16) inspirando-se em Deleuze revela.
O possível está todo constituído, mas permanece no limbo. O possível se
realizará sem que nada mude em sua determinação nem em sua natureza. É
um real fantasmático, latente. O possível é exatamente como o real: lhe
falta a existência. A realização de um possível não é uma criação, no sentido
pleno do termo, pois a criação implica também a produção inovadora de uma
idéia ou de uma forma. A diferença entre o possível e real é, portanto,
puramente lógica. Já o virtual não se opõe ao real, mas sim ao atual.
Contrariamente ao possível, estático e já constituído, o virtual é como o
complexo problemático, o de tendências e de forças que acompanha uma
situação, um acontecimento, um objeto, ou uma entidade qualquer, e que
chama um processo de resolução: a atualização (LÉVY, 1996, p. 15-16).
Contra a lógica, pautada unicamente no “possível”, é ainda Lévy (1996) quem nos
instiga a pensar o processo de virtualização como movimento inverso de atualização:
Virtualizar uma entidade qualquer consiste em descobrir uma questão geral à
qual ela se relaciona, em fazer mutar a entidade em direção a essa
interrogação e em redefinir a atualidade de partida como resposta a uma
questão particular (LÉVY, 1996, p.18).
Precisamos então pensar na virtualização, a partir de outro enfoque de atualização
que supere o simples campo do possível, para uma concepção que inclua, na sua dinâmica, a
165
recursividade e a dialética nos processos de questionamento, gerando novas soluções e,
portanto, novas problemáticas.
Essa conceituação nos faz refletir sobre as propostas de educação que ainda
trabalham com modelos congelados e constituídos, onde se conhece de antemão todo o
percurso a ser trilhado, tendo no par sim/não ou certo/errado, as respostas formatadas. Temos,
dessa forma, um campo de possível extremamente fechado, que poda a imaginação e a
criatividade.
Se a virtualização for bloqueada, a alienação se instala, os fins não podem
mais ser reinstituídos, nem a heterogênese cumprida: maquinações vivas,
abertas, em devir, transformam-se de súbito em mecanismos mortos. Se for
cortada a atualização, as idéias, os fins, os problemas tornam-se bruscamente
estéreis, incapazes de resultar na ação inventiva. A inibição da
potencialização conduz infalivelmente ao sufocamento, ao esgotamento, à
extinção dos processos vivos. Se for impedida a realização, enfim, os
processos perdem sua base, seu suporte, seu ponto de apoio, eles se
desencarnam. Todas as transformações são necessárias e complementares
umas das outras. (LÉVY, 1996, p. 140-141)
Por alienação estamos compreendendo aquele estado em que as pessoas se tornam
estranhas a si mesmas e ao seu contexto, não podendo interferir e nem justificar as suas ações.
Colocar em reflexão essas questões revela uma preocupação forte em desconstruir
paulatinamente a idéia de uma educação de caráter universalista e hegemônico que traz como
fundamento maior a institucionalização da escola única. Esta escola, diferentemente das
demais formas de educação praticadas em outras sociedades humanas, exclui do contexto
educativo a diversidade cultural de seus grupos.
São bastante notórias as propostas de trabalho que não consideram o contexto e a
participação ativa dos educandos, e ainda desconsideram as suas diferenças. Temos então um
processo educativo pautado na resolução de exercícios mecânicos e na centralização da fala
do professor, sem uma maior compreensão das finalidades educativas. Daí, o enfoque dado
apenas aos processos de atualização, onde o “possível” destaca-se como matriz principal,
deixando de lado propostas virtualizantes.
Os cursos de educação à distância que utilizam os ambientes virtuais de
aprendizagem tendem a seguir essa mesma perspectiva da atualização. Assim sendo, o aluno
se diante de propostas de trabalho, nas quais a informação e a instrumentalização se
destacam, em detrimento aos processos de interação, criatividade e colaboração. Os docentes
precisam estar atentos a essas questões, pois as propostas desenvolvidas nos ambientes
virtuais, tanto podem ser fechadas e formatadas anteriormente, como no caso de se limitar
números as opções de respostas a determinadas questões, quanto também pode estar
166
instigando processos de virtualização entre os participantes, abrindo diferentes percursos de
navegação e criação.
Vejamos como a metáfora do fuxico, utilizada para abrir o fórum de discussão do
Módulo II do Curso de Tutores da UFBA, instigou a vivência de propostas virtualizantes e
coletivas entre os alunos.
A partir de agora vamos "fuxicar". É isso mesmo!
Que é fuxicar? Ah! Fuxicar é falar da vida, nossa e dos outros, é dialogar
com alguém sobre um tema ou assunto qualquer. Fuxicar também é a arte de fazer
peças de costura a partir de retalhos de pano. Colchas, bolsas, roupas em geral
são produzidas por artesãs do Brasil, principalmente as nordestinas, a cerca de
pelo menos 150 anos. Hoje esta arte inclusive vem sendo copiada por estilistas
do mundo inteiro.
Figura 13 - Fuxico
Por que trazer esta metáfora para nosso fórum de discussão, nesta segunda
etapa do curso? Antes de qualquer coisa o fuxico é
uma arte, e como tal, precisamos colocar mais cor, formas em nossos
debates científicos. Vimos no conteúdo da etapa 2 o conceito de estratégia em Edgar Morin. O autor
nos ensinou que
estratégia é a arte de lidar com a incerteza. Vamos vivenciar um pouco de arte
em nossos debates. Além disso o fuxico é uma
prática de comunicação. Vamos experimentar um jeito ético e estético de
comunicação. Deixemos as intrigas para as senhoras fuxiqueiras e vamos
ao debate livre e plural de idéias. Idéias de quem ensina, aprende e fez gestão
democrática na escola pública no nosso país.
Ficou com vontade de fuxicar?
Então pegue linha e agulha e um retalho de pano e
167
venha fuxicar em nosso fóruns de grupos específicos.
1. Qual a importância do planejamento para a produção de conteúdos para EAD?
2. Os conteúdos de aprendizagem para EAD precisam ter um tratamento
diferenciado do ponto de vista da linguagem?
3. Quais as vantagens do hipertexto eletrônico frente ao hipertexto no material
impresso?
4. Como criar conteúdos interativos para educação online?
Observamos no fórum acima, a criativa utilização da metáfora do fuxico, para a
discussão sobre o planejamento de conteúdos em EAD, dando abertura às dinâmicas de
virtualização. As questões delineadas inicialmente e utilizadas como “pré-textos”, abrem
espaço para a discussão ampla da temática, dando chance à expansão do conhecimento, da
criação, da ludicidade e da imaginação, além de possibilitar uma multiplicidade de
argumentos sobre as questões postas, gerando processos recursivos de atualização e
virtualização.
Percebemos, no desenvolvimento desse fórum, uma participação mais efetiva e
criativa dos alunos, diante dos desafios da problematização, utilizando cores diversas, e
sempre se reportando à metáfora do fuxico no processo de interação com o grupo e nas
reflexões sobre o planejamento em EAD.
Maheu (2000) destaca, sobre esse tópico, a importância do saber sensível, de caráter
artístico. Para ela, é esse saber que faz da mediação didática uma mediação com arte, posto
que criativa, livre de ditames e autoridades exógenas ao processo de ensino/aprendizagem.
Aqui, a curiosidade é um elemento fundamental na prática educativa, haja vista que é
responsável pelo processo de inquietação, questionamento e reflexão crítica sobre a produção
do conhecimento.
Colocar em questão tais pressupostos nos remete a uma forte preocupação na
superação de uma curiosidade domesticada que gera uma memorização mecânica e
passividade no processo educativo, por não permitir uma atitude dialógica e aberta. Essa
abertura, no entanto, não exclui processos explicativos nos quais o docente fala sobre o
objeto, no entanto evitando-se o jogo de vai e vem de perguntas e respostas esterelizantes.
Este aspecto também foi observado no decorrer do curso, como podemos perceber na
discussão do fórum por um dos docentes.
168
O planejamento em nossas escolas está deixando a desejar e muito. Pois
muitas vezes esses o feitos esquecendo que quando planejamos temos que
pensar no outro, ou seja, na nossa clientela e que esta é bastante heterogenia.
Estes são o alvo do nosso planejamento, e muitas vezes nos esquecemos.
Essa preocupação em relação ao planejamento não é restrita apenas ao EAD,
pois ele faz parte do nosso dia-a-dia. O que seria das nossas vidas sem ele?
Será que alcançaríamos nossas metas, nossos objetivos? PC 56
Oi PC 56!
Vc tocou num ponto crucial..."para quem e por quê planejamos"?
Todas as vezes que este questionamento esta claro todo o resto fica bem
mais fácil.
Abraços PC 56 F3
Outra interação que retrata esse aspecto:
Como nosso colega PC 55 já colocou o planejamento é de fundamental
importância em todos os momentos da nossa vida. Sabemos que qualquer
atitude que tomamos, por menor que seja esta, obterá melhor êxito se for
cuidadosamente planejada. Em educação, não consigo imaginar a existência
de qualquer atividade sem que haja um planejamento prévio, até a compra de
um lápis deve ser planejada para evitar problemas posteriores. Na EAD, por
ter uma estrutura diferente do presencial, por apresentar um caráter não
linear e por depender fundamentalmente da autonomia do educando, o
planejamento deve ser ainda mais cuidadoso. Temos que analisar que curso
oferecer, os conteúdos a serem abordados, a forma como estes serão
abordados, os links que os cursistas poderão fazer, o como tornar o curso
atrativo para que não haja alto índice de evasão, etc. Todas essas coisas e
tantas outras mais deverão ser diagnosticadas, avaliadas, enfim planejadas. A
estrutura da EAD exige uma organização em todos os detalhes. É
importante ressaltar também que o planejamento deve ser flexível, no
decorrer do processo sempre ocorrem imprevistos que demandam uma
revisão do que já está previamente estabelecido, temos que está sempre
revendo o que foi planejado e, sempre que necessário, está aberto a
mudanças. PC 48
Isso mesmo PC 48 planejamento "Total"... Planejamento uma necessidade
constante. Importante visualizarmos o planejamento como uma previsão de
ações, no entanto que não passe de "previsão" para que não se torne uma
camisa de força. Sabendo sempre que na execução as ações e os
procedimentos podem mudar. Grande abraço. F 3
Nota-se, nas discussões travadas no fórum acima, que no momento da mediação
faltou ao docente expressar, uma maior reflexão teórica sobre a questão das diferenças em
sala de aula, bem como trazer outras questões sobre a dinâmica do planejamento na escola
tendo em vista a diversidade. Observamos que a resposta do professor, bem como seus
questionamentos, não fazem com que a aluna e os demais colegas avancem na discussão sobre
a temática proposta. No segundo diálogo sobre o planejamento travado com a
PC 48
ressaltamos também a falta de maior aprofundamento na temática levantada pela cursista,
169
retomando suas colocações e promovendo novos processos de virtualização. Apesar de
reconhecermos que o professor não é o dono da verdade, e que precise superar a perspectiva
da transmissão, destacamos a importância de intervenções teóricas consistentes no processo,
gerando novos processos de virtualização.
Acreditamos que a virtualização da educação não está ligada diretamente à
implementação das tecnologias da informação e comunicação, pois propostas educativas que
proporcionem aos alunos elementos com os quais possam atuar como sujeitos criadores do
seu processo de aprendizagem, dinamizam esse aspecto. Para Lemos et.al. (1999) o processo
educativo, independente do uso das tecnologias, deveria ser virtualizante por natureza. O
autor então questiona: Não é básico de toda e qualquer experiência educacional a
virtualização dos assuntos de uma determinada matéria? Não é objetivo de professores e
alunos extrapolar os limites da certeza e ouvir outras vozes? Não devemos, enquanto
professores, fazer com que nossos alunos problematizem questões e busquem de modo
permanente ou temporário, atualizar essas questões em respostas que comprovem o alcance de
uma determinada idéia sobre o assunto?
Dessa forma, é que o ensino com ou sem tecnologias é virtualizante por natureza, por
instigar o debate plural, a curiosidade, a não-linearidade, a experimentação, o tempo real e os
processos interativos. Entretanto, a implementação das tecnologias digitais nos desafia a
pensar mais intensamente nessas dinâmicas, a partir da configuração do meio digital, que
possibilita processos não-lineares, adentramento e modificação na mensagem.
Com a inserção de ambientes virtuais de aprendizagem em propostas de formação de
professores, essa questão precisa ser repensada, pois as tecnologias podem ser utilizadas, tanto
na perspectiva de criação de atividades com limitação de números de respostas através da
implementação de alguns softwares e hipertextos fechados, quanto podem proporcionar aos
educandos a navegação por diferentes percursos.
Silva (2002, p.195), sinaliza que devemos incluir um mecanismo que ajude o usuário
a não se perder, mas que ao mesmo tempo não o impeça de perder-se. Nesse processo, o autor
nos alerta que no jogo de perder-se e não se perder, precisamos ter cuidado com a sinelética
que facilita os acessos aos dados e enredos disponibilizados pelo professor. O autor também
destaca a importância para com o cuidado com a informação satisfatória e ao entendimento de
cada aluno sobre o que propõe o professor, não o impedindo de adentrar o labirinto.
A discussão desses conceitos no âmbito educacional são de fundamental importância
para a construção de uma educação pautada em propostas virtualizantes. Assim, não podemos
pensar em atividades educativas engessadas, em programas rígidos que não dialogam e
170
questionem as problemáticas postas pelo contexto. O papel do professor nesse cenário seria o
de um agente de virtualização, na medida em que trabalharia na perspectiva da alteridade,
pleiteando o acontecimento e as emergências e desenvolvendo, de forma criativa, novas
questões e atualizações num movimento contínuo do virtual para o atual e do atual para o
virtual.
Para Braga e Pinho (1998, s/p),
O que se procura questionar, não é a virtualização do aluno, mas um ensino
mais virtualizante, pois entende-se que, se toda forma de aprendizado pode
ser virtualizante, a virtualização deveria estar nos princípios básicos das
instituições de ensino. E, para isto, não necessariamente precisa-se utilizar
novas tecnologias, embora seja inegável o seu valor como facilitadora do
processo de virtualização. (BRAGA & PINHO, 1988)
Nesse sentido é que o ensino contemporâneo precisa contemplar também processos
de virtualização, onde as problematizações devem instigar o educando na busca de
atualizações, assim como o levantamento de novas questões. Essa dinâmica faz com que os
processos educativos transformem-se continuamente, a depender das interações e discussões
entre os participantes. Um exemplo claro dessa vivência são os fóruns de discussão nos
ambientes virtuais de aprendizagem. As problematizações colocadas pelos docentes
desencadeiam uma série de debates e questionamentos, fazendo com que os sujeitos reflitam
sobre as discussões, ressignifiquem suas falas e proponham novas problemáticas.
Para Palloff e Pratt (2002), o professor tem um papel fundamental nesse cenário,
facilitando o diálogo, porém sem dominá-lo. A elaboração de perguntas inteligentes, bem
como a divisão de responsabilidades na facilitação das discussões precisa ser uma pauta
desenvolvida durante todo o processo. O trecho a seguir, é um exemplo de como a aluna do
Curso de Tutores da UFBA compreendeu a importância da virtualização na itinerância do
curso, instigando o grupo para o debate.
Olá, todos vermelhinhos (incluindo a super F4)!!!
Lendo todas as nossas intervenções nesse Fuxico vermelho vejo que
estamos tecendo um colcha com recortes muito interessantes, plena de cores
e com muitos e diversos olhares que nos enriquecem. Que bacana estar
participando dessa construção! Quantas aprendizagens estamos construindo
com todos! A interatividade proporcionada, as trocas, o compartilhamento,
as dúvidas, as concordâncias e discordâncias, tudo muito rico! É mesmo uma
experiência extraordinária o modelo todos-todos que estamos vivenciando e
que nos prepara para as futuras tutorias. Como é diferente do modelo um-
todos (lembram-se do bocão naquela figura lá no Módulo 3 que vimos?), não
é mesmo?
171
Contudo, na mediação em nossas interações, tem algumas provocações da
F4 que não nos aprofundamos e creio que valeria a pena investirmos um
pouco mais nelas:
O que podemos fazer para ampliar e incorporar as características positivas de
hipertexto eletrônico no texto impresso e vice-versa?
Como tornar o hipertexto individual e coletivo ao mesmo tempo?
Como despertar a autoria no texto impresso?
Os conteúdos em EAD podem despertar a necessidade de interação?
Quais os elementos o hipertexto deve conter para despertar essa necessidade
da aprendizagem colaborativa?
Sobre a primeira questão, vi uma experiência interessante de EaD por
material impresso planejado como hipertexto: todo o texto promovia
diálogos com o aluno, problematizando os conteúdos. Os links eram em
boxes na própria página ou remetiam a leituras complementares trazidas nos
anexos dos módulos. Além disso, indicavam sites e outras leituras para os
alunos acessarem.
Tenho certeza que teremos muitas outras contribuições sobre essas
provocações da F4 que poderão nos enriquecer a todos. Fico curiosa para
apreciá-las !!! Bjs. PC 67
Essa mensagem ilustra a boa reflexão e questionamento que a PC 67 faz sobre as
discussões que estão sendo travadas ao longo do fórum, resgatando as lacunas observadas
através de novas questões, socializando sua experiência e estimulando os outros colegas a
trabalharem com ela. Esse novo núcleo de debate proposto pela aluna desafia a busca de
novas atualizações, logo de novas virtualizações, porquanto abrem um leque de possibilidades
para a expansão de novos conhecimentos, novas criações e imaginações.
6.2.2.5 Saberes tecnológicos
A questão relativa à implementação das tecnologias da informação e comunicação na
prática docente vem gerando uma série de pesquisas sobre essa temática, principalmente em
relação à vivência de propostas pautadas na educação online. Nesse sentido, é de fundamental
importância que o docente participe intensamente de propostas de formação no contexto
digital, para que possa utilizá-los de forma crítica e criativa na sua prática pedagógica.
Contribuindo para a reflexão dessa questão, Demo (2003) ressalta a importância de
professores bem preparados para a utilização dessas tecnologias, pois não adianta contar com
toda uma estrutura tecnológica de ponta, se os profissionais não souberem transformá-los em
172
meios para a aprendizagem dos alunos. Dessa forma, o autor sugere que a proposta
pedagógica desses cursos de formação inclua o manejo crítico e criativo da nova mídia, dando
conta de duas tarefas principais: saber usar e criar programas e procedimentos.
Perrenoud (2000) destaca sobre este tópico, que a formação para o uso das novas
tecnologias precisa incluir:
[... ] o julgamento, o senso crítico, o pensamento hipotético e dedutivo, as
faculdades de observação e de pesquisa, a imaginação, a capacidade de
memorizar e classificar, a leitura e a análise de textos e de imagens, a
representação de redes, de procedimentos e de estratégias de comunicação
(PERRENOUD, 2000, p.128).
Essas questões remetem à importância de se superar esta visão meramente
instrumental e de usuário da informação, para um patamar estruturante, onde as TIC
possibilitam trocas, acesso a diferentes conteúdos digitalizados, bem como a diferentes
interfaces digitais que facilitam a comunicação, reduzindo-se as fronteiras entre o virtual e o
presencial.
Destaco também a opinião de Bonilla (2005), que nos alerta para a importância de
um trabalho formativo que contemple os processos de produção do conhecimento, em
detrimento à simples execução de atividades técnicas. Nesse processo, a autora afirma que
propostas pautadas em palestras, cursos rápidos e treinamentos, visam à execução das
mesmas tarefas, sem maior reflexão sobre o processo.
Nessa perspectiva, a relação que os professores mantêm com esses saberes, é de
transmissores, de portadores, ou de objetos de saber, não mais de produtores de um saber ou
de saberes que poderiam impor como instância de legitimação social de sua função, e como
espaço de verdade de sua prática (TARDIF, 2002).
O desafio então é pensar em propostas de formação onde os professores possam
pesquisar a sua própria prática, investigando, problematizando, refletindo e buscando soluções
conjuntas para sua reestruturação. Isso retrata a importância de se considerar os saberes
experienciais que são construídos na prática cotidiana e na experiência, como forma de
transformar as relações de exterioridade com os saberes, em relações de interioridade com a
própria prática.
Sendo assim, os papéis do professor se multiplicam, pois diante da demanda de
formação permanente que caracteriza a sociedade contemporânea, o trabalho docente se vê
desafiado a novas exigências, capacidade de “adaptação”, e bastante criatividade. Do mesmo
modo, o professor precisa aprender a trabalhar com tecnologias mais sofisticadas e
tecnologias mais simples, com internet de banda larga e com conexão lenta, com software
173
livre e software proprietário. Cada vez mais ele será solicitado a participar de cursos ou
módulos de trabalho que lhe exigirão conhecimentos específicos sobre as tecnologias digitais.
Nesse sentido, a flexibilidade é um aspecto fundamental para que se possa escolher as
melhores soluções em cada contexto (MORAN, 2003).
Entretanto, ao pensarmos na formação do professor para o uso das tecnologias,
sabemos que não é necessário que o docente se torne um especialista em informática ou em
programação. Contudo, é essencial a vivência de uma cultura tecnológica básica para o
manejo das tecnologias. É claro que esse manejo, de forma alguma garante uma eficiente
aplicação no contexto pedagógico, no entanto torna a sua utilização mais presumível
(PERRENOUD, 2000). Atentemos para o que disse uma das professoras do curso sobre essa
questão:
Eu penso assim, você não precisa dominar um saber técnico de um
informata, mais você tem que dominar o uso dos dispositivos até para você
se inspirar em metodologias. Digamos que eu tenha muita metodologia de
portifólio como dispositivo de avaliação. O portifólio é esse lugar onde a
gente compartilha nossas melhores produções e que você pode convidar o
outro para avaliar e co-avaliar, e se auto avaliar. Digamos que eu tenha essa
clareza metodológica no campo da didática. Se eu não sei utilizar as
interfaces, que podem fazer essa teoria tomar corpo na prática, a gente tem
dificuldades. F1
Sobre essa mesma questão outro docente do curso coloca:
É importante o docente ter uma boa capacidade de lidar com as tecnologias
utilizadas no curso. F3
Através da fala desses professores, percebemos a relevância atribuída ao “domínio
tecnológico” para a utilização das tecnologias da informação e comunicação na sua prática
docente, sobretudo, no intuito de contribuir para a criação de propostas inovadoras de trabalho
no contexto digital. Para esses dois sujeitos, o saber tecnológico é de suma importância no
âmbito da docência. Entretanto, é preciso estar atento para o fato de que a utilização desse
saber deve estar conectada com propostas didáticas que vão sendo construídas
paulatinamente, à medida que o sujeito é desafiado a utilizá-lo de acordo a suas reais
necessidades postas pela prática.
No horizonte de pensar a formação do educador para inserir as TIC nas propostas
curriculares, Bonilla e Picanço (2005) sinalizam que é preciso uma superação radical, no
sentido de acreditar que os cursos instrumentais de informática formatados linearmente
possam dar conta da vivência plena da cultura tecnológica. Para as autoras, a familiarização
vai acontecendo à proporção que os sujeitos vão interagindo com esses recursos, “futucando”,
de acordo com seus interesses e necessidades. As autoras ressaltam que os programas de
174
formação de professores que se baseiam na perspectiva linear do conhecimento, estão
pautados numa imposição externa às vivências dos sujeitos, definindo trajetos “melhores” e
“mais rápidos”, tirando-os da possibilidade de construção de seu próprio caminho na
construção do conhecimento.
O conhecimento tecnológico, como já vimos, é vital para o docente online, e está na
base de seus saberes. Isto se revelou, ao longo do processo, particularmente na etapa IV,
aonde os cursistas foram autores de um módulo sobre gestão no ambiente Moodle, e
precisaram solicitar a ajuda aos docentes. Vejamos uma discussão no “Fórum sobre TCC”:
Olá, F2!!! Preciso de sua ajuda. Como não pude contribuir muito com a
construção no ambiente experimental e ele já está quase pronto, pedi que os
colegas me sugerissem como poderia ajudar nessa altura do campeonato e a
colega Núbia arrumou-me uma tarefa legal, mas o estou sabendo com
executá-la. Ele pediu-me que eu criasse os hiperlinks e o glossário no seu
módulo 2, mas o módulo já está lá, com os textos. Como faço isso se o texto
está lá? Porque sei mexer nas ferramentas quando aparece esta caixa (esta
que estou escrevendo agora), mas lá, quando clicamos em ativar edição não
encontrei opção de editar o texto. pra me dar essa forcinha? Me responde
ainda hoje. Quero dedicar meus próximos dias com esta tarefa. Abraço PC
26
PC 26, Não tem dificuldade. Para editar os links no livro você precisa seguir
as seguintes orientações:
1-Acesse o livro que deseja fazer os links
2-Clique em ativar a edição do livro (do lado superior direito)
3-Escolha a parte do livro que quer inserir os links - clique no ícone de editar
(mãozinha)
4-Selecione a palavra que vs quer fazer o link
5-clique no ícone "inserir link web"
6-Abrirá uma janela para vc digitar o site que será feito o link ou se for um
texto, por exemplo, clique em procurar / arquivo / enviar e faça o link para o
arquivo desejado.
7 – Salve
Qualquer dúvida estou a disposição.
Abraço, F2
F2, Compreendi e já coloquei em prática a criação dos hiperlinks. Mas não
consigo fazer o glossário. Dá pra me explicar? Ah, quando for colocar as
definições no glossário, precisa colocar a fonte de onde foi retirada?
Obrigada pela explicação. PC 26
PC 26, Agora que vi a sua solicitação, mas percebi que foi inserido um
glossário no curso experimental. Se ainda precisar de ajuda é só falar.
Bjs, F2
No diálogo estabelecido entre a docente e a aluna, percebemos a importância da
professora ter conhecimento relativo à inserção das interfaces digitais no ambiente de
aprendizagem, orientando e tirando dúvidas. Dessa forma, o “Fórum da IV Etapa” foi
175
disponibilizado como espaço para a interação dos alunos e professores, visando à articulação
de todo o trabalho coletivo, assim como servindo de espaço para eventuais dúvidas em relação
à atividade ao longo do processo. Ressaltamos, mais uma vez, a importância desse saber, por
crer que a contribuição da professora é fundamental na colaboração com o desenvolvimento
do processo. Entretanto, a gica do digital com sua dinâmica não-linear, nos desafia a pensar
que a real aprendizagem no manuseio dessas interfaces se à medida que os sujeitos são
desafiados a mexer, futucar e descobrirem novas possibilidades com o uso das TIC.
Trazemos outro exemplo em relação à construção do TCC, em que a professora
ressalta a importância do planejamento para a realização do módulo, agregando, além do
conhecimento tecnológico, o incentivo ao trabalho colaborativo do grupo.
Olá PC 11 querida!
Olá pessoal!
PC 11 as suas dúvidas são também de muitos colegas. Vamos nos comunicar
sempre por aqui. Assim, poderemos dialogar num grupão.
Bem, todo trabalho de grupo deve começar pelo planejamento "estratégico"
desse grupo. Criar papéis, dividir tarefas, avaliar processo...Cumprir
cronograma!
Muitas pessoas estão preocupadas com os colegas ausentes. A preocupação é
importante mesmo. Afinal, sem produção individual não temos trabalho de
grupo. Isso significa que se um componente do grupo falta, some ou não
cumpre seu papel , todos são prejudicados. Contudo, o podemos ficar
parados esperando os colegas que ainda não se manifestaram.
Trabalhem
com as pessoas que estão disponíveis. Tudo isso será avaliado por nós. O
processo é muito importante, assim como o produto criado pelo grupo.
Por falar em processo...Todo o debate do grupo seja síncrona ou assíncrono
deve acontecer no curso experimental de cada grupo. O que isso quer dizer?
Eu, professora, estou entrando em todos os cursos, estou acompanhando o
movimento de vocês , exatamente para acompanhar a produção. Não adianta
apenas avaliar o produto final. Temos que acompanhar o desenvolvimento,
as estratégias, quem produzir colaborativamente, quem lidera...enfim...todos
estes critérios são avaliativos e agregam valor para o grupo como um todo.
O chat (comunicação síncrona) do moodle às vezes não funciona. Por este
motivo, podem se comunicar via msn, ou outra interface de chat qualquer.
Usem a vontade o chat do meu site. Peço apenas para gravarem as memórias
das reuniões e disponibilizarem no curso experimental de vocês. Quaquer
dúvida técnica, perguntem aqui que eu ajudo. Não esqueçam é claro de
estudar o manual do moodle para professores disponibilizado aqui na etapa
4.
Sobre a natureza da produção...
176
Pelo pouco tempo que temos não dará tempo para a produção (autoria) de
textos. Claro, que isso não impede que os grupos criem textos de autoria
(seja individuais ou coletivos). Notei que em nosso grupo, muita gente já
tem artigos e textos de autoria produzidos em outros contextos formativos.
Podem usar no módulo de vocês sem problemas. Contudo, não se preocupem
com isso neste momento. O módulo produzido pelo grupo pode ser criado a
partir de textos disponibilizados e também encontrados na Internet (em
períodicos, Bibliotecas virtuais). Cuidem apenas das citações e bibliografias.
Cada grupo dever criar um módulo de conteúdo, criar uma atividade
para fórum e um desafio para chat. Este é o desenho básico.
Obviamente, o moodle não tem limite e a criatividade de vocês também não.
Outros conteúdos podem ser digitalizados e incluídos (vídeos, áudio, etc) e
outras interfaces do moodle também podem ser agregadas (diários, wikis,
etc). Entretanto, fica claro aqui que o "mais agregado" não será elemento
diferencial na avaliação. Nosso curso não é de moodle e nem de desenho
didático especificamente. O objetivo geral do nosso curso é discutir a tutoria.
Como não entendemos a tutoria sem autoria, criamos esta atividade de grupo
como um exercício incentivador. Um ponta pé para começar a produzir.
Com certeza os interessados procurarão doravante outras experiências
formativas.
Sobre planejamento...
Pessoal, estou notando que os grupos, na sua maioria, começaram o trabalho
na produção do módulo de conteúdos sem fazer o planejamento. Vamos
criar o planejamento e depois criar o conteúdo e as atividades? Pensem
nisso. Estou aqui no fórum geral "conversando sobre TCC" e também
espiando as áreas experimentais. Contem comigo e mão na massa!
beijão F1
Como se vê, não basta montar programas de formação para a implementação das TIC
no contexto educacional, baseando-se apenas no conhecimento instrucional e rápido de como
operar com estes equipamentos, a fim de garantir a utilização plena desses artefatos. A gica
da cibercultura requer projetos de formação que insiram, nas suas propostas, perspectivas de
compartilhamento, integração, colaboração e a participação integrada entre os sujeitos e as
instituições.
6.3 OS DILEMAS DOS DOCENTES ONLINE
Os dilemas fazem parte do cotidiano dos professores, e abrem inúmeras
possibilidades de reflexão sobre a prática pedagógica, transformando-se em desafios para a
profissão. Na interação com os docentes do curso, desencadeadas na lista de discussão do
grupo, fomos percebendo a emergência de uma série de dilemas vivenciados pelos professores
na sua prática, bem como o compartilhamento de experiências e reflexões sobre as mesmas.
Para dar conta desse assunto, focalizamos o estudo no potencial dessas listas, bem como na
177
reflexão sobre a importância dos dilemas como instrumento de análise e melhoria da prática,
mapeando os mais significativos, e tentando compreender seus significados, juntamente com
os sujeitos da pesquisa. Iniciaremos esta discussão, explicitando o potencial comunicacional
das listas e, posteriormente, refletiremos sobre a questão dos dilemas no contexto do curso.
6.3.1 As listas de discussão potencializando a emergência dos dilemas docentes
O grande potencial dessa interface está centrado na possibilidade do envio de
mensagens eletrônicas a um único endereço que, automaticamente, é repassado a um grupo de
endereços eletrônicos cadastrados no servidor. Essa dinâmica permite que o grupo se
comunique e tire suas dúvidas com todos os membros na comunidade. Dessa forma, a lista
traz como característica peculiar do meio digital a possibilidade de troca de mensagens pelos
usuários e o acesso ao ambiente, a partir de seus interesses. Esta interface se caracteriza
também por promover uma comunicação assíncrona.
Santos (2003) traz como aspecto importante da lista de discussão, a sua socialização
via correio eletrônico, o necessitando do acesso a um ambiente específico para seu envio e
recebimento. Essa característica da lista faz com que a comunicação seja mais dinâmica,
tendo em vista que a maioria das pessoas acessa sua caixa de e-mail diariamente. A autora
ressalta ainda que, apesar desse potencial, não se deve eleger uma interface como melhor do
que a outra, pois é a dinâmica comunicacional de cada usuário que vai definir as melhores
possibilidades.
Sobre esse tópico, Britto (2003) salienta que as listas podem ser livres ou moderadas,
afirmando que, com a moderação, as mensagens estão sujeitas à análise e aprovação de uma
pessoa que decidirá pela sua posterior disponibilização para o grupo ou não. Para ele, com a
moderação, evita-se a sobrecarga de mensagens na caixa postal dos participantes, gerando
assim um transtorno no recebimento das mensagens. O autor ressalta que uma alternativa
simples é deixar a lista sem restrições, definindo algumas normas de conduta na sua
utilização.
Assumimos nesta investigação que não concordamos com o papel de vigilância dos
moderadores nas listas de discussão, por acreditar que os conteúdos compartilhados pelos seus
membros devem ser acessados por todos do grupo, independente da sua aceitação ou não
pelos mesmos. É o próprio movimento do grupo que vai definir a pertinência ou não da
circulação das mensagens.
Por outro lado, corroboramos com as reflexões colocadas por Bonilla e Picanço
178
(2005) sobre a utilização da lista de discussão, enfatizando o potencial da dinâmica de
interação entre os sujeitos, além da troca de saberes entre seus membros. Diferente das listas
de discussão com moderadores vigilantes, a vivência apresentada pelas autoras retrata uma
dinâmica que “flui de dentro para fora e não o inverso, sendo o coletivo de saberes constituído
na e pela diversidade de opiniões (...)” (BONILLA & PICANÇO 2005, p.228). Nesse
contexto, os sujeitos têm a oportunidade de vivenciar a cultura tecnológica através do debate
plural de suas idéias.
No decorrer do curso, a lista de discussão foi fundamental na promoção do trabalho
interativo entre os docentes, abrindo espaço para o planejamento das atividades, envio de
relatórios, discussão sobre a prática pedagógica e, acima de tudo, possibilitando um trabalho
colaborativo através de uma comunicação bidirecional, onde todos podiam participar e
intervir nos processos de construção e reconstrução das mensagens.
6.3.2 Os dilemas docentes e a não-linearidade da “aula online
Os professores, de modo geral, vivenciam situações complexas no seu contexto de
trabalho, tendo que tomar decisões sobre a melhor atividade a desenvolver, como estimular os
alunos a participarem das “aulas”, dos trabalhos em grupo, das leituras etc. No contexto da
educação à distância, essas situações se ampliam e diversificam, pois sem a presença da figura
física do aluno na sala de aula, a participação ativa nas diferentes interfaces digitais é que
sinaliza sua “presença”, via ambiente virtual de aprendizagem.
Sendo assim, muitos professores esperam encontrar receitas de como agir em cada
situação. Na visão de Zabalza (2003), as receitas não dão conta da ação pedagógica, visto que
o ensino se move em um contexto de incerteza, e a tomada de cada decisão está atrelada a
uma série de variáveis específicas daquele momento que o docente precisa decodificar.
Assim, não existem protocolos prontos e nem receituários que poderão guiar as ações
desencadeadas entre alunos e professores. Essa situação se torna ainda mais complexa no
contexto digital, que se configura de forma hipertextual, possibilitando diferentes arranjos
interativos.
Doyle (1986, apud TARDIF, 2005) indica seis categorias sobre os eventos que
acontecem em sala de aula. Acreditamos que esses mesmos eventos estão presentes no
trabalho pedagógico desenvolvido na educação online, pelo seu caráter recursivo, dinâmico e
não-linear marcado por uma forte complexidade. São eles: a multiplicidade, a imediatez, a
rapidez, a imprevisibilidade, a visibilidade, e a historicidade.
179
Em relação à multiplicidade, o autor destaca a ocorrência de diversos eventos ao
mesmo tempo ou num período curto de tempo. Esse aspecto é facilmente percebido, por
exemplo, no contexto de interações nos chats, onde não existe uma centralização na fala dos
sujeitos, permitindo diferentes dinâmicas comunicacionais. Nesse sentido, todos podem se
comunicar com todos sem a preocupação com a atenção dos outros participantes.
A imediatez é outro evento que está em sintonia com a dinâmica interativa da
educação online, pois não se tem de antemão como prever as ocorrências no movimento do
grupo, necessitando-se de adaptações e estratégias imediatas. É o caso, por exemplo, de uma
série de temáticas e dúvidas que vão emergindo durante o processo de interações via rede e
que o docente e equipe responsável precisam intervir de forma rápida. São geralmente
questões em relação à navegabilidade do ambiente, dúvidas em relação à utilização das
diferentes interfaces do grupo, que precisam ser solucionadas em um curto intervalo de
tempo.
No caso da rapidez dos acontecimentos durante a aula, além da sucessão,
encadeamento e fluência, esta pode ser observada nas interações via chat, o que exige do
docente uma atenção constante nas diferentes interações que estão acontecendo
simultaneamente, bem como sua constante intervenção. Nesse enfoque, exige-se que os
docentes sejam capazes de fazer uma leitura da trama das interações, tanto no sentido de
perceber o desenvolvimento das discussões desencadeadas, bem como incentivar novas
discussões.
Um quarto evento que se configura nesse cenário é a imprevisibilidade, cujas ações
imprevistas e inesperadas fazem parte de todo o processo. Assim, não se quer negar a
importância do planejamento na prática pedagógica, e sim refletir sobre a importância de sua
abertura durante o processo. Esse enfoque traz consigo a noção de estratégia desenvolvida por
Moran (2003), que coloca em questão a importância da instabilidade, improvisação, erros e
situações aleatórias, necessárias para a tomada de novas decisões e reflexões.
a visibilidade exprime o fato da aula ser um espaço público, desenvolvida na
presença dos alunos. Pensar sobre a dimensão pública da aula, nos remete a duas
características principais: seu caráter fechado para o exterior e, ao mesmo tempo, aberto para
o interior. Esses aspectos são típicos do trabalho docente, pois as interações do grupo são
abertas a todos os sujeitos envolvidos, mas as temáticas não devem avançar para as outras
classes. No tocante à educação online no contexto do curso observado, essa visibilidade se
configura de outra forma, a partir da não-linearidade do contexto digital que possibilita maior
abertura das discussões. Um exemplo claro desse aspecto foram as interações que surgiram
180
nos fóruns temáticos, os quais podiam ser acessados, a partir de qualquer ponto, por todos os
outros membros dos grupos. Assim, todas as discussões desencadeadas pelos grupos
específicos estavam “abertas” aos demais sujeitos do curso sem, contudo, contemplar a
postagem de mensagens. Outro exemplo de abertura foram os fóruns de interação e tira
dúvidas presentes no curso, aonde todos podiam interagir com todos sobre as mais diferentes
temáticas. Cabe ressaltar, que se o docente ou outro aluno interagisse de forma
individualizada nas diferentes interfaces, essas interações iam se configurando como um
aspecto coletivo e social, pelo seu caráter de abertura.
O último evento refere-se à historicidade. Esse aspecto significa que as interações
desencadeadas por alunos e professores vão se constituindo dentro de uma trama temporal
diária, semanal, anual onde os acontecimentos vão adquirindo sentidos que condicionam
ações seguintes. No cenário do curso observado, esse aspecto se fez presente, tanto em relação
à gestão do grupo quanto em relação aos conteúdos trabalhados. Como a maioria dos
estudantes que se inscreveram no curso ainda não conhecia a dinâmica de funcionamento de
um ambiente virtual de aprendizagem, foram muitas as orientações dos docentes,
principalmente em relação à explicação sobre o objetivo de cada fórum, chat, e demais
interfaces disponíveis. No mesmo sentido, os conteúdos trabalhados nas diferentes fases do
curso, foram de suma importância para reflexões teóricas e práticas sobre a EAD, bem como o
desenvolvimento de trabalho de TCC.
Refletir sobre essas questões, nos leva a reconhecer a complexidade da prática
pedagógica, cujo professor precisa tomar decisões entre o que planejou e as condições postas,
bem como entre as experiências anteriores e os novos desafios da profissão. Nessa trama é
que os dilemas aparecem com maior ou menor intensidade, a depender da singularidade de
cada um. Sabemos que os docentes que estão no início da carreira o mais propícios à
vivência de situações dilemáticas do que outros com mais experiência.
É mais uma vez Zabalza (2003) que alerta que os dilemas não podem ser concebidos
como grandes esquemas conceituais, e sim como situações concretas vivenciadas no contexto
da sala de aula. Em geral, no planejamento das atividades didáticas, temos clareza dos nossos
objetivos e finalidades. Entretanto, quando essas ações são postas em prática, a coerência
entre pensamento e ação é quebrada, requerendo dos profissionais soluções mais imediatas.
Nesse contexto, podemos reconhecer a importância de os programas de formação de
professores incluírem nas suas pautas de discussão a questão dos dilemas, pois estes
possibilitam a reflexão e a pesquisa sobre a prática docente, bem como a construção de novos
saberes. A convergência em torno deste ponto conduz, por sua vez, à elaboração de duas
181
perguntas que podem ser traduzidas nos seguintes termos:
Quais os dilemas vivenciados pelos professores no contexto do curso de tutores da
UFBA 2007.1?
Como os docentes enfrentaram esses dilemas?
6.3.3 Alguns dilemas do docente online
Muitos foram os dilemas socializados pelos professores nas discussões via lista, que
serviram de objeto de reflexão e de pesquisa ao longo do curso. A partir dessas interações e da
colaboração entre eles, percebemos a importância do grupo se colocar diante de determinada
situação dilemática trazida pelo colega, bem como perceber suas formas de enfrentamento. A
maneira como cada um enfrenta as situações problemáticas, vivenciadas na prática, vai
depender de sua experiência, formação etc. Entretanto, durante as discussões dos dilemas
sobre os desafios enfrentados no curso, percebemos a importância da reflexão compartilhada
entre os professores, no sentido de tentar compreender as situações postas e buscar soluções
conjuntas.
Os dilemas que apareceram nas discussões via lista foram basicamente três:
a) Um dilema que registrava a ambivalência entre a atenção individual versus a
atenção grupal nos chats. Dar mais atenção a um aluno implicava diminuir a
orientação aos demais.
b) Um dilema relativo à cobrança da professora em relação à qualidade das
participações nos fóruns, versus a análise do desenvolvimento no curso.
c) O terceiro dilema mais didático, relativo à leitura dos conteúdos do curso, versus
participação consistente nas discussões nos fóruns. Uma boa participação nas
discussões nos fóruns e chats passam também pelas leituras disponibilizadas no
ambiente.
6.3.3.1 Dilema 1: atenção individual versus atenção grupal nos chats
Se analisarmos as mensagens que circularam na lista, podemos observar claramente
que se trata de um conflito vivenciado pelo professor em um dos chats do curso. Vejamos:
F1 e meninas,
182
Nesta etapa tenho alguns cursistas no grupo que não acessam seus e-mails
pessoais e muito menos o ambiente. Existem ainda aqueles que fazem
comentários sobre interatividade, construções coletivas, elogiam as
postagens de outros cursistas e quando observo o histórico de acesso nem se
quer passaram perto. Uma outra durante o chat desta semana solicitou uma
conversa particular pq ninguém a cumprimentou na entrada do chat, fazendo
queixa que as conversas eram muito desorganizadas, isso ela havia chegado
com quase 30min de atraso. Detalhe tive que perder quase 15 minutos
tentando convencê-la a voltar ao chat. Por curiosidade ao acessar seu perfil
notei que era uma pessoa com experiência em EAD e com mais de 20 anos
na área de educação. Abraços a todos e desculpem pelo desabafo. F3
Contribuição da professora F1
F3, costumo explicar que a linguagem no chat pode assumir vários
formatos. A conversa paralela é permitida, coisa que raramente acontece
num encontro face a face. Mostro que o papo não é centrado na fala do
professor apenas. Com o tempo as pessoas vão se acostumando. Algumas
nunca aceitam experimentar outras possibilidades, uma pena. Penso que
este nosso espaço é mesmo para compartilharmos nossos dilemas e
etnométodos. Assim, agente aprende mais. Sobre esta história de ninguém
falar com ela na entrada... Eu procuro prestar atenção na entrada e sempre
acolho, desejo boa noite. Tem gente que fala só comigo. Daí num tão de
brincadeira eu falo que na sala tem mais gente... e por ai vai... F1
Contribuição da professora F2
F3
Acho importante esses desabafos. Somos uma equipe e temos que contar
com o apoio uns dos outros. São as nossa observações, intuições, sensações,
dúvidas e certezas que nos fazem compreender melhor os percursos da
EAD. Perfis como o que você colocou geralmente encontramos nos cursos
a distância. O problema é quando esse é o perfil do grupo e não de pessoas
isoladas. As pessoas estão se acostumando com a dinâmica do chat.
Abraço, F2
Percebemos nesse dilema colocado pelo professor, que a dinâmica do chat era nova
para a aluna, e a mesma não compreendeu o caráter não-linear e simultâneo do bate-papo,
sentindo-se isolada da discussão do grupo. Sabemos que nas interações via rede, não mais
uma centralidade fixa, podendo destacar-se ora o aluno, ora o professor, ora os materiais
disponíveis no curso, reconfigurando assim novos papéis para os sujeitos envolvidos.
É nessa perspectiva que concordamos com Bonilla (2005), quando traz uma reflexão
sobre os chats, afirmando que a multivocalidade não é propícia para o aprofundamento de
temáticas específicas, que envolvam todos os sujeitos. Assim, esta ferramenta reflete
dinâmicas de conversa entre os vários participantes que vão criando seus próprios caminhos
dentro do chat. A autora destaca ainda que o importante mesmo seja a possibilidade de todos
terem acesso ao tema de conversa dos colegas, podendo saltar de um subgrupo para outro.
183
Sabemos que para o aluno que não vivencia essa lógica hipertextual, o chat se torna
muito confuso, por querer acompanhar todas as discussões que estão sendo travadas
simultaneamente. Nesse sentido, vale destacar a importância da socialização dos saberes da
experiência expressa pela professora F1, quando ressalta a importância do “tempo” na
formação e sugere maior atenção à entrada do chat, ressalta o valor do acolhimento e
incentivo às interações entre os colegas, minimizando a centralização no professor. É também
a professora F2 quem destaca a questão do tempo, como aspecto importante na compreensão
e vivência de uma nova cultura digital. Essa dimensão temporal é de suma importância no
trabalho com a formação de professores, haja vista que a inserção nessa nova cultura requer
propostas formativas que incluam em suas pautas a reflexão de que os saberes são temporais,
porquanto são construídos progressivamente ao longo de uma carreira. Chamou também
minha atenção a fala da professora F2 sobre a importância do compartilhamento dos dilemas
em equipe, na construção de uma proposta melhor de EAD. Pressuponho que esta percepção é
fruto de um processo reflexivo sobre o caráter colaborativo da docência.
6.3.3.2 Dilema 2: cobranças da professora versus respostas dos alunos
Outro dilema explicitado por uma das professoras nas interações via lista, foi em
relação à resposta de uma das suas alunas ao seu e-mail, cobrando maior participação no
curso. Observemos o desabafo docente e a rede de discussão com seus colegas:
Pessoal,
Dêem uma olhada no e-mail abaixo. Mais uma participante que não
compreendeu a dinâmica do curso. Passei e-mail para todos os cursistas que
tinham feito apenas uma postagem no fórum da primeira etapa (caso dessa
cursista).
Bjs,F2
F2,
Não entendi o seu "puxão de orelha" p/ mim, pois tenho participado sim das
atividades, inclusive tenho feito muitas das leituras complementares que são
sugeridas. Em relação ao fórum fiz sim algumas participações, talvez até
poucas, mas consistentes. Não acho interessante estar ocupando os e-mails
dos cursistas com colocações repetitivas, p/ dizer q estou participando.
Afinal estamos buscando qualidade e não quantidade como vc mesma
colocou. Além do mais tenho informado a vc, através do diário, pelo q sei
vcs têm acesso, dos compromissos q já tinha agendado a mais de 6 meses.
Estive em S.P. a semana passada por 4 dias e esta semana em Recife por
mais 4 dias, desta vez participando de um dos encontros presenciais do curso
à distância promovido pelo CENPEC, cheguei hoje, praticamente agora, e
estou acessando os e-mails. Agora estou sim desanimada. Acho entediante
abrir mais de 100 e-mails, onde muitos são repetitivos, mensagens... e ainda
184
ocupam a minha caixa, como se tivesse esses e-mail p/ receber. Já
coloquei isso e acho que deveríamos receber os e-mails apenas do nosso
grupo. Outro esclarecimento é q participei do chat e se vc observou tive
uma participação razoável em QUANTIDADE E QUALIDADE.
Atenciosamente, PC 42
Contribuição do colega
F2
o que é isso? Não sabia que vc era tão má...rsrsr
Brincadeiras a parte achei que eu tivesse o "privilégios" desse tipo....as
vezes penso que estamos falando uma linguagem incompreensível. Ou será a
pessoa vive fragilizada com outras situações? Tive um problema parecido
com uma cursista que trabalha em um NTE. Se sente excluída, não gosta dos
chats e não entende o curso. Vamos encarar essa galera como desafios. F3
A professora F2 volta a se colocar
Oi colegas,
Temos que saber lidar com todos os perfis. O respeito à individualidade é
fundamental. Passei um e-mail para a cursista me desculpando e dizendo que
a minha intenção foi de incentivá-la e mostrar a importância das interações.
Ela também se retratou e desculpou-se por ter sido "rude" (palavras dela).
A cursista postou uma mensagem no fórum do meu grupo (já respondi) e no
fórum Reflexões e dúvidas sobre EAD com o mesmo discurso do e-mail. F1,
vc poderia postar uma mensagem nesse último fórum? F2
Contribuição de outra colega
Sobre a cursista F2, eu faria o mesmo que você. me deparei com isso
várias vezes no online. Sabem porque? Nós tutores que gostamos de
interatividade, muitas vezes valorizamos mais a aprendizagem colaborativa,
as troca de mensagens, os alunos que comentam as mensagens uns dos
outros. É sobre isso tudo que nos deparamos e investimos na mediação.
Contudo, não podemos esquecer da auto-aprendizagem própria da EAD.
Muitos alunos estão estudando muito mesmo, fazendo suas reflexões.
que se eles não participam dos fóruns não temos como avaliar sua
aprendizagem. Equilibrar a auto-aprendizagem com a colaboração é um
grande desafio para nós. O silêncio virtual me incomoda muito também.
Afinal nosso curso é ONLINE e não EAD tradicional onde aluno fica
calado estudando sozinho. Beijos, F1
O dilema colocado pela professora é vital para a discussão sobre as dinâmicas de
trabalho nos ambientes virtuais de aprendizagem. Se o aluno não interage com os colegas nas
discussões sobre as temáticas do curso, fica difícil o docente acompanhar seu
desenvolvimento ao longo do trabalho. Já colocamos que a interatividade pressupõe processos
recursivos aonde a contribuição de um vai interferindo na mensagem do outro, mobilizando
experiências passadas, crenças culturais, esquemas cognitivos etc. Assim, sem a compreensão
e vivência desses pressupostos, cairemos numa visão de EAD meramente instrumental,
185
baseada somente nos processos de auto-aprendizagem, subutilizando o potencial digital dos
ambientes de aprendizagem.
A professora F2, consciente disso, busca incentivar maior participação da aluna,
utilizando-se de um chamado via e-mail. Entretanto, observamos o embate da aluna,
argumentando sobre a forma como participa e sobre o excesso de informações sem
consistência em sua caixa de mensagem. Refletindo mais uma vez sobre o ocorrido, a docente
procura se retratar e compreende que precisa estar mais atenta às individualidades dos
educandos. Imbuída num espírito colaborativo, a formadora F1 traz novas reflexões sobre a
educação na cibercultura, partilhando do mesmo dilema e reconhecendo a importância de se
equilibrar estudos individuais com dinâmicas colaborativas na rede.
Percebemos que os dilemas vivenciados pelas docentes são bem pertinentes no
contexto da EAD, pois a questão da participação e intervenção na mensagem do colega é
essencial nas propostas que têm como base a interação e a colaboração.
Considerei esse um dos dilemas mais conflituosos que apareceram na lista. Todos os
docentes manifestaram apoio à colega, sensibilizados com a situação posta, e trazendo sua
contribuição. Vejamos outros desdobramentos dessa discussão, agora feito por uma das
componentes da coordenação do curso junto aos professores:
Oi Pessoal,
Esta situação reflete um questionamento que sempre me faço: Como fica o
aluno que tem o perfil mais introspectivo? Aquele que é naturalmente e por
personalidade, calado? Será que este aluno tem que se 'forçar' a participar
intensamente? Por outro lado, como podemos avaliar a aprendizagem de um
aluno 'calado' na educação online? Fico me lembrando das minhas
experiências como 'aluna'... eu sempre fui muito calada, muito pouco
participativa, mas isso nunca significou desinteresse ou falta de
aprendizagem. Mas, a que ponto os 'professores' que me conheceram,
realmente me conheceram? E o fato deles não terem me 'conhecido' diminui
o meu mérito? Quantas vezes minha postura 'calada' foi mal interpretada
por colegas e professores? E quantas vezes eu tive que me esforçar, vencer
meus limites para atender aos critérios mínimos de um curso... Acho que o
bom senso de F2 caiu muito bem no caso da PC 42. Temos que respeitar as
individualidades. Mas o dilema permanece... Como 'perceber' um aluno
'calado' na educação online? Como explicar o modelo de um curso online
como o nosso? Até quanto podemos flexibilizar? Reflexões... bjs, CC
Uma das professoras reflete sobre o dilema
CC seus questionamentos são importantes e nós em nosso curso/desenho
temos respostas.Pessoal, temos que debater bastante entre nós estes e outros
dilemas.A nossa avaliação contempla tanto os calados quando os mais
falantes...Por que? O cálculo da média é feito pelas participações nos chats
(um pelo menos) , pela participação nos fóruns das etapas e pelo TCC. Os
alunos que falam pouco precisam pelo menos participar dessas tarefas.
186
Óbvio que avaliação não se resume a isso. Avaliar é mais que calcular notas
para certificar. Entretanto, quando os alunos calados sente-se prejudicados é
pelo foto de terem notas mais baixas que os mais falantes/participantes. Nós
não exigimos muito. Apenas incentivamos que participem mais.Agora
pessoal a educação online não é EAD. Sei que temos que respeitar as
diferenças. Contudo, isso não impede de mobilizarmos novos saberes e
novas competências. Os tímidos podem deixar de ser tímidos...Os mais
falantes, podem aprender a escutar mais e falar menos.Lembram da teoria
das inteligências múltiplas. Claro que temos que valorizar as características
da inteligência mais desenvolvida. Contudo, temos a obrigação como
educadores de ajudar nossos alunos a desenvolver outras inteligências. Ler e
escrever, intervir nas mensagens do colega, criticar a professora. Enfim, tudo
isso são competências que temos que mobilizar!!!!Pessoal, o conteúdo de um
curso online não é apenas os módulos e vídeos que disponibilizamos. O
conteúdo do curso é construído prioritariamente pelo debates destes. Os
conteúdos são apenas "PRé-textos". Quanto mais participação e intervenção
nas mensagens uns dos outros melhor para todo o coletivo que deseja
aprender. Simplesmente acessar os conteúdos e ficam estudando sozinho...O
pior é que tem gente que apenas "suga" os debates coletivos, não devolvendo
ao grupo seus sentidos. Tirar o grupo e não retornar ao grupo é algo
construído pela tradição da educação bancária. Dialógica é fundamental e
pode ser construída com uma PRática pedagógica alegre, politizada e
respeitosa. O que não podemos é violar os limites de cada singularidade.
Temos que respeitar as pessoas pela sua diferença!Vamos falar mais sobre
isso. O tema é instigante e é um dilema coletivo dos docentes online. F1
Beijos
Olá
F1
e colegas,
Sobre esta questão dos alunos tímidos, acho que poderíamos incentivar a
escrita no diário de bordo. Andei dando uma olhada e tem reflexões bem
interessantes. Acho que as pessoas se soltam mais, pois sabem que não
estão tão "expostas" como nos fóruns e chats.Não quero com isso dizer que o
diário é melhor do que o chat e o fórum. Todas as interfaces têm seu
potencial que deve ser estimulado.Temos que compreender também que este
curso pode ser o primeiro curso de muita gente. Não é cil ir se colocando
nos fóruns e chats. Acredito que nosso papel tem que ser o de incentivar a
participação e intervenção de todos, mostrando o diferencial de uma
educação que prioriza a comunicação todos-todos. Beijos,
PP
PP, VC lembrou de uma interface ótima. Com certeza escrever e refletir no
blog é ótimo. Se o objetivo é produzir textos a partir da reflexão, ok!
Entretanto, nosso desafio não é só o da autoria individual. Precisamos ajudar
os alunos a se comunicarem, dialogarem. Falar com o outro, do outro e de si
mesmo. PP, sua dica é valiosa até porque, falar de si e escrever na
individualidade pode ser um caminho para a escrita coletiva. Quem sabe?
Para nós que pesquisamos esta modalidade , pode ser uma hipótese a validar
ou o.Pessoal, observe se quem faz escrita no diário vai participando mais
dos fóruns coletivos. Na minha pesquisa de doutorado não pensei nisso
porque o diário do AVA que usei era coletiva. Meus colaboradores
refletiam no diário pessoal e recebiam comentários dos colegas. Não
trabalhei com interface um-um e nem um-todos. Já utilizei todos-todos.Na
prática não incentivo muito o uso do diário do moodle porque geralmente o
cursista espera um comentário do prof. Num curso online muito interativo
não temos tempo para acompanhar os debates gerais e os individuais.
187
Contudo, temos que incentivar a reflexão nos diários para auto-estudo,
reflexão, autoria.Estes dias m notado que tem gente que não escreve tanto
porque sentem-se menos autores. Pois é...sintomático. Nós professores não
fomos educadores para a autoria. Tem gente se intimidando , por exemplo,
com a minha aluna PC9 . Tenho refletido muito sobre isso estes dias. Tenho
que incentivar os demais alunos e não apagar a luz da PC 9 ! Vamos pensar
nisso! Beijos F1
Percebemos, no desenrolar das discussões, que as situações “dilemáticas”
impulsionam a busca de novas alternativas, e novas formas de reflexão sobre a prática, bem
como propiciam uma aprendizagem significativa diante das problemáticas colocadas pelo
contexto do trabalho. Concordamos então com Zabalza (2003) sobre a importância de se
incorporar mecanismos (reflexão, intercâmbio de experiências e debates com colegas
documentação, avaliação, pesquisa etc) que possibilitem aos docentes conhecerem, de forma
mais profunda, com quais tipos de fatos costumam se preocupar, e de que forma costumam
enfrentá-los. No caso dessa pesquisa, a lista de discussão foi fundamental na socialização dos
dilemas pelos professores, pois nesta os processos são fluídos, abrem espaço para a
participação de todos.
6.3.3.3 Dilema 3: leitura dos conteúdos versus participação efetiva nos fóruns de discussão
O cotidiano de um ambiente de aprendizagem faz emergir diferentes conflitos, por
configurar-se no principal lócus de discussão sobre as temáticas do curso. Foi assim em
relação à questão da leitura, que se constituiu num dos dilemas cheios de dificuldades e
incertezas quanto aos procedimentos que deveriam ser adotados. As mensagens que
circularam na lista explicitam as inquietações dos docentes quanto a essa questão:
Oi gente,
Tenho a impressão F1 que o problema da leitura é um desafio do aluno
contemporâneo. Nossos alunos nas salas presenciais pouco lêem. O
problema é que os alunos não leitores no curso online evidenciam sua
fragilidade, que fica um pouco escamoteada no ensino presencial. Acho que
essa discussão também dá caldo (rs). beijos, CC
Estou vivenciando a mesma situação F2, alguns cursistas não se dispõem
para interagir nos Fóruns e tentam justificar a falta de participação pq se
sentem intimidados... Já nos chats ficam a vontade, infelizmente identifiquei
um problema grave, eles não lêem o material do curso, acham que os chats
são conversas sem nenhum direcionamento. Um problema.F3
Meninas,
Esse é um grande desafio. Assim como F1, tenho percebido que alguns
alunos não participam mais dos fóruns por serem mais introvertidos ou se
188
sentirem intimidados por outro cursistas que "escrevem muito". Tenho dois
alunos que só participam dos chats e nunca dos fóruns. Apesar do meu
incentivo e explicação sobre as atividades obrigatórias, ainda não consegui
reverter essa situação. Hoje dei uma olhada no relatório de cada participante
e tb percebi que eles participam dos chats e algumas vezes dos fóruns sem
ler os módulos. O que fazer? O problema da falta de leitura é grave. Abraço,
F2
Questão de prova" F2, muitos dos cursistas se manifestam com críticas de
uma forma geral....à educação, política, ao ambiente de trabalho, a prática
profissional...no entanto não se dispõe a uma leitura nem mesmo superficial
do material do curso. Pior, ainda existem aqueles que dizem: "li isso ou
aquilo", quando verifico o acesso ele nem passou por perto...rsrsrsrs è
Brincadeira? F3
Oi pessoal,
Acho que esta questão da interação nos fóruns passa por uma questão da
vivência na cibercultura que requer uma outra atitude do aluno que é a de se
colocar e intervir na mensagem. No presencial é fácil, ficamos calados e o
grupo toma a frente e faz o trabalho. Na educação online precisamos
sintetizar as nossas reflexões, escrever e nos colocar de forma mais visível. È
um novo desafio para o educando e para nós educadores.Quanto ao chat, os
referenciais vivenciados geralmente são de que esta interface é utilizada
para bater papo, sem nenhuma utilidade pedagógica. Que tal em um próximo
encontro aprofundarmos teoricamente as potencialidades das interfaces? PP
Concordo com vc PP. Mas perceba que estamos nos deparando com um
problema anterior a questão da interatividade, o professor que não se
apropriou dos conteúdos, temáticas e discussões do curso por completa falta
de leitura. Daí pergunto: nosso curso online é capaz de resolver este
problema? Abraços, F3
Oi F3, Entendo e acho que a síntese no opine seria fundamental, pois ele
precisaria opinar sobre o conteúdo do módulo. PP
Oi PP, Muito interessante a idéia do 'opine'. Lembro-me que em uma das
reuniões de coordenação isso chegou a ser cogitado, no entanto chagamos a
conclusão de que isso poderia compromenter a manifestação dos cursistas
caso eles soubessem que seriam avaliados pelas suas opiniões, tlv se
limitassem e não se manifestassem criticamente. Mas acho que vale a pena
sim retomar essa discussão. F3
É Pessoal ...na sala de aula presencial tem a " escuta da aula do prof". Na
EAD tem que estudo dos conteúdos. Quem não faz leitura é como se não
estivesse participado da aula. O que acham disso pessoal? Claro que a
participação nas interfaces é fundamental. Não tem aula online sem debate
também. Agora para ter debate de qualidade, problematização, tematização e
produção têm que fazer leitura. F1
PP, o opine tem esse objetivo também. Repare que muitos fazem ótimas
sínteses dos módulos porque leram. Noto que com a vídeo-aula os destaques
conceituais são ótimos. Muita gente vai na mosca em muitas questões.
Muitos alunos tanto nos chats, quanto nos fóruns fazem bem mais
referências aos vídeos que nos módulos. Por que será ? F1
189
Obrigado F1 fico mais tranqüilo pq percebo que não são características de
um ou outro grupo... Chegar a uma situação num chat de ficar sendo
'argüido' sobre o curso...conceitos etc... Detalhe percebi que a maioria não
havia lido nada da etapa do curso. Abraços. F3
F3, alguns alunos iniciantes no online acham que chat é "aula expositiva".
Por isso é bom logo no primeiro chat , explicar o que é um chat? Qual a sua
dinâmica. Agora a pouco falei para uns alunos que estavam calados no chat
o seguinte: chat não é televisão, não é para assistir. Chat não é mídia de
massa. O pólo da emissão ta liberado e a qualidade depende sempre a
participação de todos. Claro que se alguém quer tirar dúvida eu acabo dando
explicações, cito exemplos. Isso até instiga a galera para mais debates. O que
não pode é virar um jogo de perguntas e respostas. O legal é que os alunos
aprendem e resignificam as suas transposições iniciais. Afinal eles sempre
vão esperar aquilo que historicamente vivem no presencial. F1
A imagem vai na veia! O texto escrito tem que processar mais. Vc tocou no
ponto fundamental. Somos da mídia de massa (TV e sala de aula expositiva
estão no mesmo paradigma comunicacional). O importante é articularmos as
mídias de massa (para não perdermos terreno) com as mídias interativas
(para fazermos cultura digital). Precisamos melhor a qualidade das imagens
do texto, os links. Paty, assim que acabar este curso vamos atualizar os
módulos? Principalmente na forma! Tenho links novos de vídeos,
animações... O módulo tem que seduzir mais e mais os leitores.Beijos F4
Olá F1, F2 e F3, Tenho sentido isso na pele, não sei mais o que fazer, tenho
enviado e-mails, postado nos fóruns, discutido nos chats, mas... As
discussões dos fóruns são superficiais e quando propomos novas questões as
discussões eles não lêem, pois se limitam a postar a sua mensagem e
responder a do colega, achando que a interação se somente nesse
movimento, isso foi fortíssimo na etapa, na segunda tem melhorado
bastante, nossa amiga PC 67, tem assumido por livre e espontânea vontade
a mediação de algumas discussões e chamado atenção do grupo para isso,
confesso que tem me auxiliado, pois o grupo ao conversar com um colega
pensa ter cumprido as exigências de interação, infelizmente. Ainda sobre as
leitura, penso, assim como F3, que eles acreditam que como no chat as
discussões são mais rápidas e diversificadas eles podem burlar a leitura e
ficarem baseados no achismos e nas conversas sem foco, já nos fóruns não.
Se observarmos, muitos já opinaram sobre os módulos 3 e 4, porém não
conseguiram postar mensagens, pois a medida que as discussões vão
crescendo eles são levados a saírem do achismos e discutirem teoria,
sim, fica tudo mais difícil, eles ainda não conseguem avançar nas críticas e
aos elogios a EAD, se limitam a discussão sobre o acesso, o custo, aos
baixos salários dos trabalhadores em educação, etc.Eles não se deram ao
trabalho de ler o manual do cursista, acredito também que esse é um dos
motivos das dificuldades apresentadas na compreensão da estrutura
e dinâmica do curso.Estamos sendo chamados a esgotarmos e reinventarmos
as estratégias de interação. Esse é nosso grande desafio, além da difícil
missão de reverter a noção de EAD como uma modalidade de ensino fácil e
rápida. Infelizmente ainda não superamos isso, essa turma prova que ainda
temos muito a fazer. Um beijão a todos, F4
Os dilemas sobre a questão da leitura vão sendo evidenciados, pelo fato de os
professores perceberem algumas participações sem consistência teórica nos fóruns e nos
190
chats. Como a dinâmica do curso requer a efetiva interação nessas interfaces, na qual os
alunos vão contribuindo com suas reflexões acerca da temática, fica evidente a fragilidade
conceitual na dinâmica comunicacional. Da emergência na discussão da lista de uma série
de estratégias de trabalho que busquem incentivar a leitura dos módulos, bem como esclarecer
para os discentes o potencial das interfaces digitais. Essas reflexões entre os professores são
fundamentais para os docentes compreenderem de forma mais ampliada sua prática.
Para Zabalza (2004), a reflexão tem um papel fundamental para que possamos sair de
um terreno de certezas para um terreno de tomada de decisões, de debate, de insegurança, de
criação. O autor ainda nos alerta para a importância dos dilemas, no que diz respeito a formas
de identificação e enfrentamento, combinando com a dimensão do conhecimento e a
dimensão das características pessoais de cada um.
Finalizo aqui as minhas análises e discussões com os “dados” que se revelaram nesse
estudo. A seguir, faço as minhas considerações finais, sempre provisórias, retomando as
questões que nortearam esta pesquisa.
191
TECENDO-SE CONSIDERAÇÕES NESTA OBRA EM ABERTO
formação de bons professores tem a ver, acima de tudo, com
a formação de pessoas capazes de evoluir, de aprender de acordo
com a experiência, refletindo sobre o que gostariam de fazer, sobre
o que realmente fizeram e sobre os resultados de tudo isso
(PERRENOUD).
A
192
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS DE UMA OBRA ABERTA
As instituições educacionais contemporâneas, frente às constantes transformações
que vêm ocorrendo na nossa sociedade, principalmente no que concerne à presença das
tecnologias da informação e comunicação, têm sido desafiadas a repensar sobre suas práticas.
Dentre essas modificações, podemos citar as questões econômicas e culturais, que se
desdobram em novas formas de apreensão espaço temporal, no surgimento de novos postos de
trabalho, na crise do conhecimento, na digitalização da informação e na emergência da
cibercultura.
Esse movimento contemporâneo vem se configurando, principalmente, pela
importância atribuída ao papel da informação, que passa a ser basilar na geração de novos
conhecimentos. Destaco, nesse contexto, o suporte digital estruturado em linguagem binária 0
e 1, que vem permitindo uma maior manipulação nas mensagens. Deste modo, a plasticidade
da informação e a possibilidade de trabalharmos em rede, a partir de qualquer ponto, trazem
como características fundamentais do cenário digital, a não-linearidade das informações,
bidirecionalidade e a acessibilidade em diferentes espaços geográficos.
Em sintonia com a dinâmica do digital, observamos o constante crescimento da
cibercultura que, com o pólo de emissão aberto, vem potencializando o desenvolvimento de
novas formas de convivência, de comunicação e de práticas, juntamente com a expansão do
ciberespaço. Diante do exposto, percebemos a emergência da educação online que traz, em
seu cerne, a comunicação todos-todos e a participação e intervenção dos sujeitos na
modificação da mensagem.
Vivenciando esse cenário, tenho participado de algumas experiências formativas em
Educação online que, apesar de utilizar diferentes ambientes de aprendizagem com várias
interfaces que possibilitam uma comunicação mais interativa, continuam pautados em práticas
pedagógicas baseadas numa educação “bancária”, cujo principal fundamento é a perspectiva
instrumental que reduz o sujeito a condição de objeto. Isto devido à sua lógica meramente
seqüencial e reprodutiva, subutilizando todo o potencial interativo, hipertextual e virtual do
digital. Por outro lado, vivenciei também algumas propostas formativas, nas quais a
perspectiva de comunicação estava assentada numa modalidade mais interativa, com
mensagens dispostas em constante processo de mutação, com territórios abertos à navegação e
a co-criação dos sujeitos envolvidos.
193
Diante dessas experiências, surgiram diversas inquietações em relação às diferentes
atuações docentes no ciberespaço, que foram tecendo minha itinerância em relação a essa
temática, desde o curso de especialização, e se configurando nos seguintes questionamentos
ao longo dos últimos anos: Como os saberes da experiência vivenciados em diferentes
espaços de aprendizagem podem contribuir para a prática docente online? Que tipos de
saberes os professores lançam mão na sua ação educacional nos ambientes de aprendizagem?
Como esses saberes são construídos no contexto da cibercultura?
Respaldada nesses questionamentos, configurei esta pesquisa: Saberes Docentes em
Ambientes Virtuais de Aprendizagem, que traz como principal objetivo compreender a
natureza e a origem dos saberes docentes nos AVA, em sintonia com a nossa imersão no
Curso de Tutores da UFBA 2007.1. Nosso interesse esteve voltado para as narrativas de
quatro docentes sobre suas práticas, bem como a observação das suas atuações ao longo do
curso.
Considerando que o objeto de estudo “Saberes Docentes” requer do pesquisador uma
concepção de ciência que incorpore as pautas humanas com toda a sua singularidade e
subjetividade, vivenciei de forma intensa o campo de pesquisa, dialogando com os sujeitos na
lista de discussão e no MSN, nas entrevistas, nos encontros informais em restaurantes e nos
intervalos dos encontros presenciais, observando as problemáticas que foram emergindo, e as
soluções encontradas, bem como participando ativamente das discussões travadas nas
diferentes interfaces do ambiente de aprendizagem, de modo a compreender os sentidos e
significados da docência numa sala de aula online, caracterizada, em especial, pela
multidimensionalidade, simultaneidade e imprevisibilidade.
Na tentativa de compreender a temática central do trabalho sobre a questão dos
saberes docentes no contexto da cibercultura, construí um debate complexo entre a teoria e a
empiria, subsidiada em três categorias da análise. Uma primeira categoria que se revelou logo
de início foi a questão da natureza e origemdos saberes na docência online; a segunda, em
sintonia com os pressupostos da cibercultura, revelou alguns saberes que foram emergindo no
campo da pesquisa; a terceira explicitou os dilemas vivenciados pelo docente online ao
longo do curso.
Quanto a primeira categoria, concernente à natureza e construção desses saberes,
consegui identificar que os saberes da experiência como aluno, em diferentes cursos online, é
de fundamental importância para a compreensão do trabalho docente nos ambientes virtuais
de aprendizagem. Os sujeitos da pesquisa colocaram em evidência, através de suas narrativas,
tanto experiências bem-sucedidas, em que os pressupostos da interatividade estiveram
194
presentes, como também relataram experiências de subutilização dos processos educativos
nesses ambientes. Criticaram, de forma substancial, as propostas fundamentadas numa
comunicação um-um, que não trabalhava o conceito de grupo, de turma e de colaboração. Para
eles, o papel do professor nesse modelo de comunicação reduzia a mensagem a uma
perspectiva meramente reativa de envio e recebimento.
As experiências como aluno online, relatadas pelos docentes, revelou uma reflexão
crítica sobre as práticas vivenciadas, rejeitando enfoques pautados numa perspectiva de
causalidade linear, na lógica do estímulo-resposta, e elogiando as propostas de trabalho que se
centraram numa interação mútua, caracterizada particularmente pela sua continuidade,
dinamicidade e contextualização.
Junto com o aprendizado pela experiência como aluno, a prática pedagógica em
propostas de educação online revelou-se fundamental para a construção de saberes nesse
contexto. Os professores afirmaram que essa aprendizagem acontece de forma contínua,
através da imersão na cibercultura, aonde eles vão construindo seu saber-fazer, diante dos
desafios que são postos pela docência.
Alguns professores também enfatizaram a importância da articulação teórica e
prática nesse processo, destacando que sem uma base teórica sólida no exercício cotidiano da
prática, a reflexão fica comprometida. Quando solicitei que falassem sobre algumas
estratégias de trabalho utilizadas na mediação dos fóruns, os professores destacaram uma série
de procedimentos que requereram deles, improvisação e habilidade pessoal, buscando
dinamizar as discussões.
A questão do gostar de ensinar à distância e de buscar sempre fazer um trabalho bem
feito, também foi revelada pelos docentes e observada por nós no desenrolar do curso, através
da atenção dispensada aos alunos, da criatividade nas mediações, na relação afetiva com os
educandos e colegas de trabalho, na atenção ao registro das participações, na disponibilização
de enunciados novos para os fóruns, espera do movimento do grupo para intervir, emissão de
e-mails individuais aos alunos etc. Essa marca pessoal, articulada às experiências anteriores
como discente e docente, vem enfatizar as singularidades pessoais com os aspectos
profissionais, tão difundidos nas recentes pesquisas sobre o ensino.
Ainda sobre a natureza dos saberes docentes, as relações estabelecidas com os pares
se revelaram como fundamentais na aprendizagem do docente online. Percebi que o contato e
a troca com colegas, professores mais experientes e grupos, são contribuições essenciais nessa
itinerância formativa, tanto na perspectiva de bons exemplos que possam ser ressignificados
quanto nas práticas que necessitam ser superadas.
195
Nesse sentido, ao refletir sobre a construção dos saberes docentes em ambientes
virtuais de aprendizagem, percebe-se que esses saberes não estão enraizados na “memória”
como destaca Tardif (2002), nas suas pesquisas com os professores da educação básica,
quando se referem às experiências pré-profissionais como a família, a escola primária,
secundária ou mesmo à formação inicial na universidade. Constatei que as construções desses
saberes são oriundas de experiências na formação continuada em educação online, relativas
aos cursos de extensão, aperfeiçoamento, especialização, mestrado e doutorado. Assim, a
construção desses saberes requer a imersão dos docentes no contexto da cibercultura,
aprendendo com o movimento não-linear do hipertexto, saltando de um nó a outro, intervindo,
modificando produzindo e colaborando.
Buscando identificar que saberes os professores destacam como fundamentais para
sua atuação nos ambientes virtuais de aprendizagem, percebi uma diversidade de saberes que,
em articulação com os pressupostos da cibercultura, foram assim agrupados:
Figura 14 – Saberes docentes em AVA destacados na pesquisa
Na configuração dos saberes que emergiram na dialógica entre empiria e teoria, os
docentes entrevistados foram unânimes em valorizar a mediação pedagógica. Para eles, é
fundamental que o docente faça intervenções que favoreçam o desenvolvimento dos
educandos no avanço das aprendizagens. Essas intervenções precisam levar em conta as
competências atuais dos educandos, fazendo-os avançar com a ajuda necessária. Daí a
importância da mediação, principalmente no contexto da educação online, pois a separação
física entre educador e educando requer novas estratégias de trabalho com a presença das
tecnologias da informação e comunicação.
MEDIAÇÃO
PEDAGÓGICA
VIRTUALIZAÇÃO
INTERATIVIDADE
COLABORAÇÃO
TECNOLÓGICOS
196
Nas observações, ao longo do curso, fui percebendo uma série de estratégias
didáticas utilizadas para o desenvolvimento da autoria do aluno. Assim, a elaboração de
perguntas orientadoras, o diálogo permanente com os estudantes, a disponibilização de
múltiplas informações, foi se configurando como aspectos fundamentais na prática
pedagógica. Além disso, percebi também que o docente precisa ter “domínio” do conteúdo,
para que possa fazer as intervenções necessárias e consistentes no processo pedagógico. Isso
não quer dizer que ele é o “dono da verdade” e que não pode estar aberto a aprender com o
outro. Logo, a articulação do saber disciplinar aos outros saberes que mobilizam é de
fundamental importância na mediação pedagógica.
Outro saber que se revelou de forma muito intensa, articulado à mediação
pedagógica, é relativo à interação. Pude observar, no desenrolar do curso, que a questão da
interatividade requer outro olhar sobre o papel do professor, pois apesar de reconhecer que ele
possui um conhecimento mais sistematizado, sabendo articular melhor os saberes
disciplinares, curriculares e pedagógicos, o estilo digital potencializa perspectivas de trabalho
mais interativas, minimizando a centralidade na atuação do docente, haja vista que os sujeitos,
diante de conteúdos manipuláveis, podem atuar de diferentes maneiras ao longo do processo,
ora destacando-se o aluno, ora destacando-se o professor, ora destacando-se o grupo,
explicitando assim o movimento de diferentes centros. Com base nisso, observamos nos
fóruns disponibilizados no curso uma circularidade de contribuições e de experiências, que
foram tecendo a rede de saberes entre os participantes.
Em sintonia com os saberes interativos, verifiquei que os saberes colaborativos são
indispensáveis ao docente online, por possibilitarem uma aprendizagem conjunta e a
articulação de todo o grupo, contribuindo para a construção de uma cultura da participação.
Assim, constatei diversas estratégias de trabalho, visando o compartilhado de conhecimentos.
Entre elas podemos citar: a construção de objetivos comuns para a aprendizagem, o incentivo
às apresentações pessoais e a explicitação das expectativas em relação ao curso, as trocas e
experiências da vida real e, em especial, o trabalho do TCC, que permitiu aos estudantes
organizarem e montarem uma proposta de curso no ambiente Moodle, sem nenhuma reunião
presencial.
Percebo então que a imersão dos professores no contexto da cibercultura,
vivenciando processos colaborativos em diferentes espaços de aprendizagem, como reuniões
online no MSN, criação de seus próprios blogs e sites, participação ativa em listas de
discussão, potencializam a construção desse saber.
Outro saber que esteve presente em todos os processos de discussão dos grupos,
197
tanto nos fóruns como nos chats, diz respeito aos processos virtualizantes. Esse saber é de
fundamental importância no contexto da educação, pois permite a superação de visões
educativas assentadas numa concepção estática de aprendizagem, e nos desafia na construção
de uma perspectiva de trabalho mais criativa, em que as problemáticas e os questionamentos
permitam o desdobramento de novas soluções e, conseqüentemente, novos questionamentos,
num processo recursivo ao longo da proposta.
Constatei nas minhas observações, bem como nas entrevistas, que todos os docentes
do curso trabalharam nessa linha. Entretanto, notei que em alguns poucos momentos, nas
discussões dos fóruns, esse aspecto foi banalizado por alguns docentes, porque os mesmos
respondiam aos questionamentos dos cursistas com outros questionamentos, não contribuindo
para o avanço da aprendizagem. Volto a destacar a importância de intervenções teóricas
consistentes e o levantamento de novas problematizações.
No que tange aos saberes tecnológicos levantados pelos docentes, todos os
professores foram unânimes em afirmar que este saber é imprescindível no desenvolvimento
de propostas educativas na rede. Percebi, nas narrativas docentes, que o “domínio” desse
saber requer um trabalho constante com as tecnologias da informação e comunicação,
articulando discussões teóricas e pedagógicas. Assim, a construção desse saber requer a
imersão na cultura tecnológica, e o delineamento de propostas pessoais e coletivas que os
desafiem a futucar nesses recursos. Esse processo requer tempo e contrapõe-se a propostas de
trabalho formatadas anteriormente, que tiram dos sujeitos a possibilidade de irem
construindo sua itinerância, de acordo com suas necessidades.
Na análise desse conjunto de saberes, observados na prática dos docentes e por eles
narrados, percebi que meus achados vão ao encontro da idéia de que os saberes são plurais,
amalgamados, complementares e temporais (TARDIF, 2002).
Os saberes são plurais, pois têm origem em diversas fontes. Os docentes revelaram as
experiências como discente, as experiências com a prática pedagógica online, a troca com os
colegas e suas experiências pessoais como fontes importantíssimas na edificação de seus
saberes.
São saberes amalgamados, haja vista que formam um todo, um conjunto, que são
mobilizados na prática docente. É importante ressaltar que esse amálgama é bastante
dinâmico e está sujeito a várias modificações ao longo do trabalho docente, sendo
constantemente transformado, readaptado, de acordo a complexidade colocada pela prática.
São também complementares, já que um depende do outro, de acordo com a utilidade
e a situação que o professor possa lhe atribuir. Isso deixa claro que não existe um saber mais
198
importante do que outro, porquanto na complexidade da docência precisamos desse conjunto
para atuar. Assim, a mediação pedagógica, a colaboração, a interatividade, a virtualização e os
saberes tecnológicos, entre os demais, se complementaram ao longo do processo, e não se
sobrepõe um ao outro.
Por último, apreendi que os saberes são temporais, são construções que vão se
formando ao longo da experiência com a prática docente. Da importância de o professor se
familiarizar com seu ambiente de trabalho, e ir aprendendo com os saberes necessários à
realização de suas tarefas. Essa perspectiva, segundo Tardif (2002), contrapõe-se a uma
concepção de formação baseada na racionalidade técnica, que propõe uma resolução
instrumental de problemas baseados na aplicação de um conhecimento científico indiscutível.
Esse aspecto temporal foi observado ao longo do curso, no qual encontrei professores com
uma experiência mais alargada na docência online, como também docentes vivenciando pela
primeira vez essa docência. Percebi que a professora iniciante não participava plenamente da
lista de discussão dos professores, e sentia-se muito “confusa”, como ela própria afirmou nos
chats com o seu grupo de alunos. Isso evidencia uma falta de imersão na cultura digital, tendo
em vista que nos chats emergem uma multiplicidade de vozes que vão saltando de um ponto a
outro, e que não para o professor acompanhar todas as discussões. Observei ainda que os
professores mais experientes demonstraram maior familiaridade com o trabalho, discorrendo
fluentemente sobre seus saberes, e contribuindo com o crescimento do grupo.
Passo então a terceira categoria que retrata os dilemas vivenciados pelos docentes ao
longo do curso. Para compreender os dilemas, conflitos, aberturas e dificuldades vivenciadas
pelo docente, participei ativamente das reuniões online no MSN, bem como da lista de
discussão do grupo, dentre outros espaços. Inicialmente percebi que as tecnologias da
informação e comunicação, potencializam um trabalho mais interativo entre os sujeitos, que
podem debater de forma plural suas idéias, intervindo no movimento do grupo, a partir de
diferentes localizações geográficas.
Constatei que a lista abriu outro lócus para o compartilhamento de dilemas, na busca
de soluções conjuntas para os desafios da prática docente. A grande lacuna que foi se
revelando, através das discussões entre os professores, foi em relação à dificuldade de alguns
alunos de participarem ativamente das discussões nos fóruns e chats. Evidenciei então a
complexidade da docência, caracterizada pela multiplicidade, dinamismo, rapidez,
imprevisibilidade, visibilidade e historicidade (DOYLE, 1998 apud TARDIF, 2005). Assim,
os dilemas e as dificuldades discutidos no desenvolvimento do curso foram fluindo de modo
natural, e constituindo-se como problemáticas comuns aos professores, que os impulsionavam
199
a refletir sobre o seu trabalho, sugerindo novas estratégias e adentrando no terreno da criação.
Daí a importância dos cursos de formação de professores ao garantirem espaço para a troca de
experiência entre os docentes, constituindo-se como espaços de aprendizagem.
Com essa pesquisa, observei que existem saberes específicos ao docente online,
partilhados pelos professores do curso. Que a construção desses saberes requer a imersão dos
sujeitos na cultura digital, produzindo, modificando, compartilhando e colaborando. Que os
saberes do docente online têm origem em fontes diversas, dentre estas, na formação
continuada, na prática pedagógica e na troca com os pares. Foi possível identificar também,
que a prática pedagógica é o principal lócus de construção desses saberes, pois é na
complexidade da docência que vamos construindo e modificando os mesmos. Que é de
fundamental importância os cursos de formação de professores abrirem espaço para o
compartilhamento dos saberes entre os professores jovens e os mais experientes, entre os
colegas de trabalho, entre diferentes instituições, reconhecendo que também nesses espaços,
eles vão aprendendo os saberes da docência.
Diante do que foi analisado nesse estudo, ressalto que o docente online é produtor de
saberes e, portanto, é imprescindível mais investimento em pesquisas nessa área, com o
objetivo de conferir um estatuto de conhecimento dos saberes do docente online que, em
sintonia com os professores do ambiente presencial, possuem saberes temporais, plurais,
complementares e personalizados, numa constante articulação entre o pessoal e o profissional.
Registra-se ainda minha intenção de continuar investindo em pesquisas dessa
natureza, bem como na divulgação de seus resultados. Vou encerrar com um trecho da música
de Ivan Lins que diz:
Daquilo que eu sei
Nem tudo me deu clareza
Nem tudo foi permitido
Nem tudo me deu certeza...
Daquilo que eu sei
Nem tudo foi proibido
Nem tudo me foi possível
Nem tudo foi concebido...
Não fechei os olhos
Não tapei os ouvidos Cheirei, toquei, provei
Ah Eu! Usei todos os sentidos
Só não lavei as mãos
E é por isso que eu me sinto
Cada vez mais limpo!
Cada vez mais limpo!
Cada vez mais limpo!
“Daquilo que eu sei’ (Ivan Lins e Vitor Martins)
200
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208
ANEXO
ANEXO A – Entrevista
Entrevista
Nome completo______________________________________________________
Idade
Formação __________________________________________________________
Atividade profissional_________________________________________________
Área de atuação ______________________________________________________
Tempo de atuação como professor online __________________________________
Bloco 1 – Saberes da Experiência
1) Experiências anteriores como discente online. Fale dos aspectos que mais te marcaram na
atuação dos docentes do curso.
2) Como foi a sua primeira experiência como docente online? Quais os desafios e
possibilidades?
3) Você acha que a sua atuação como docente no ensino presencial contribui para o seu fazer
pedagógico nos ambientes de aprendizagem?
Bloco 2 - Saberes da Educação online
4) Quais os fatores que você considera que tenham contribuído para a sua aprendizagem
como docente online?
5) Para você quais os saberes que um professor online deve ter?
6) Como o contexto digital vem possibilitando uma transformação nas práticas pedagógicas
em educação?
Bloco 3 – Saberes pedagógicos
7) Quais as estratégias de trabalho você utiliza nos fóruns? E nos chats?
8) Como você avalia em ambientes virtuais de aprendizagem?Você acredita que as rubricas
fazem com que os alunos reflitam sobre o percurso de aprendizagem?
9) Quais os principais dilemas e dificuldades vivenciados por você no curso de tutores
2007?E quais as principais potencialidades deste curso?
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