duplo de aço cromado, senti o coração bater apressado de euforia.” (FONSECA, 1993a,
p. 62)
A arma do crime, o carro, é equipada especialmente para a função que lhe é mais
atribuída: o assassinato de pessoas pelas noites. E o personagem-narrador não sai com um
destino definido, mas com uma intenção que não nos é relatada diretamente: “Saí, como
sempre sem saber para onde ir, tinha que ser uma rua deserta, nesta cidade que tem mais
gente do que moscas.” (1993a, p. 62). E, como exposto acima, o criminoso também não
escolhe suas vítimas: “Homem ou mulher? Realmente não fazia grande diferença, mas não
aparecia ninguém em condições, comecei a ficar tenso, isso sempre acontecia, eu até
gostava, o alívio era maior.” (1993a, p. 62).
A palavra “sempre”, da citação acima, nos indica que atropelar pessoas fazia parte
do cotidiano do personagem-narrador, e que este era experiente nesta atividade, pois, além
de possuir um carro todo equipado, também tinha uma metodologia para atropelar suas
vítimas: “havia árvores na calçada, de vinte em vinte metros, um interessante problema a
exigir uma dose de perícia. Apaguei as luzes do carro e acelerei.” (1993a, p. 62).
O atropelamento nos é descrito friamente, com detalhes; e, após ter finalizado, o
assassino se mostra indiferente diante do que acabou de fazer, orgulhoso da potência de seu
carro: “Motor bom, o meu, ia de zero a cem quilômetros em nove segundos. Ainda deu para
ver que o corpo todo desengonçado da mulher havia ido parar, colorido de sangue, em cima
de um muro, desses baixinhos de casa de subúrbio” (FONSECA, 1993a, p. 62). Após o
assassinato, o narrador volta para casa, mais calmo, e, examinando o automóvel na
garagem, relata-nos não só sobre o orgulho que tem de seu carro, mas do orgulho de si
mesmo, dizendo-nos: “Poucas pessoas, no mundo inteiro, igualavam a minha habilidade no
uso daquelas máquinas” (FONSECA, 1993a, p. 63).