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INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS NA AMANIA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
Programa Integrado de Pós-Graduação em Biologia Tropical e Recursos Naturais
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA, HISTÓRIA NATURAL E
CONSERVAÇÃO DA ARARAJUBA (Guarouba guarouba
PSITTACIDAE).
THIAGO ORSI LARANJEIRAS
Manaus, Amazonas
Maio, 2008
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THIAGO ORSI LARANJEIRAS
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA, HISTÓRIA NATURAL E
CONSERVAÇÃO DA ARARAJUBA (Guarouba guarouba
PSITTACIDAE).
ORIENTADOR: MARIO COHN-HAFT
Dissertação apresentada à Coordenação
do Programa de Pós-Graduação em Biologia
Tropical e Recursos Naturais, do convênio
INPA/UFAM, como parte dos requisitos para
obtenção do título de Mestre em Ciências
Biológicas, área de concentração em Ecologia.
Manaus, Amazonas
Maio, 2008
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ii
Sinopse:
Registros de ocorrência da ararajuba (
Guarouba guarouba
) foram levantados,
mapeados e analisados para verificar possíveis mudanças na área de ocorrência
da espécie, como também para gerar modelos de distribuição potencial.
Paralelamente, a espécie foi observada na região do Parque Nacional da
Amazônia, para melhor entender sua biologia e conservação. Aspectos da
sociabilidade, tamanho populacional, dieta e reprodução foram descritos e
comparados. Assim, novas informações sobre a biologia da ararajuba foram
obtidas, incluindo dados que corroboram e contradizem suspeitas anteriores.
Isso possibilitou inferências sobre a vulnerabilidade e conservação da ararajuba
e sugestões para direcionar novas pesquisas que poderão revelar outras
informações relevantes da história natural da espécie.
Palavras-chave:
Psittacidae, Amazônia, área de ocorrência, modelagem de
distribuição, bandos e sociabilidade, estimativas populacionais, dieta,
reprodução, conservação, espécie ameaçada.
L318 Laranjeiras, Thiago Orsi
Distribuição geográfica, história natural e conservação da
ararajuba (
Guarouba guarouba -
psittacidae
) / Thiago Orsi
Laranjeiras.--- Manaus : [s.n.], 2008.
114 f. : il.
Dissertação (mestrado)-- INPA/UFAM, Manaus, 2008
Orientador : Mário Cohn-Haft
Área de concentração : Ecologia
1.Psittacidae – Amazônia. 2. Modelagem de distribuição. 3.
Espécies ameaçadas de extinção. 4. Psittacidae – Conservação -
Amazônia. I. Título.
CDD 19. ed. 598.29811
iii
À saudade que nunca me abandona. Aos meus pais, Marisa e Joscé, pelo apoio
incondicional no quer que eu me metesse, e a todos aqueles e aquelas cuja minha
ausência durante meu mestrado lhes fez sentir. A estes, em que, nos momentos de
distração, eu pensava.
iv
Agradecimentos
O tema desta dissertação não seria o mesmo se não fosse pela iniciativa e
financiamento da World Parrot Trust, nas pessoas de Toa Kyle, Jaime Gilardi e Gleen
Reynolds. Agradeço ao Toa pela paciência e pelos ensinamentos em campo.
Agradeço ao meu orientador, Mario Cohn-Haft, pelas discussões, incentivo e
orientação, além da paciência com esse jovem passarólogo.
Minha sobrevivência em Manaus seria mais dificultosa se não fosse pela bolsa cedida
pelo CNPq, através do curso de ecologia do INPA. Agradeço à coordenada do curso, Dra.
Claudia Keller e as que tudo fazem na secretaria Beverly e Rosi.
Os trabalhos de campo também contaram com o apoio da Secretaria de
Desenvolvimento Sustentável do Amazonas, nas pessoas de Rita Mesquista, Domingos e Isac.
O financiamento da pesquisa foi possibilitado graças à intermediação da ALFA, nas pessoas
de Regina Luizão e Rosely.
Agradeço ao IBAMA pela concessão da licença para pesquisa com espécie ameaçada.
Ao Elisiário Soares e à Juliana Shiraiashi pelo atendimento durante a avaliação da solicitação
da licença. Em Itaituba, agradeço ao chefe do Parque Nacional da Amazônia, Márcio Ferla, e
aos funcionários do escritório do IBAMA nessa cidade, Sales, Rafael, Henrique, Pereira e
Judite, que sempre que podiam ajudavam.
Pela amizade, pelo apoio, ensinamentos, boas conversas, história, estórias e distração
agradeço aos vigilantes do Parque Nacional da Amazônia: Gilberto, Adelson, Enoque, Assis,
Isaque, Eliélsio, Raimundo, Walmir, Walterlino, Xavier, Carlão. Ao Gilberto e sua esposa,
pela acomodação em sua casa em Itaituba e pelas inúmeras informações essenciais para a
realização desta pesquisa.
Pelo transporte e auxílio no deslocamento em campo agradeço às cooperativas de
transporte Itaibu e Buburé. Agradeço também aos caminhoneiros que vivem na
transamazônica (Noé).
As atividades da pesquisa em áreas remotas da transamazônica seriam impossíveis se
não fosse pela hospitalidade dos “colonheiros” e trabalhadores da região: Seu Sebastião,
Gilberto, Júnior, Gaúcho, Dona Franscisca, Pingo e Seu Raimundo.
Pelo fornecimento de informações sobre registros da ararajuba, agradeço ao Alexandre
Aleixo, ao Luís Fábio Silveira, ao José Maria Cardoso da Silva, ao Marcos Raposo, ao Toa
Kyle, ao Ivo Rohling, ao Sidnei Melo Dantas, a Cynthia Schuck Paim, a Renata Melo
Valente, ao Wandler Camargo, ao Lucke Parry e ao Mario Cohn-Haft. Ao Bruce Nelson, ao
v
Ralph Trancoso e à Cathy, agradeço pela ajuda na obtenção e tratamento das camadas
ambientais.
Os itens consumidos pela ararajuba foram identificados graças à ajuda da Maria de
Fatima Figueiredo Melo e da Fernanda Antunes Carvalho. Agradeço a elas por relevarem a
falta de informações associadas aos itens.
Pelas criteriosas e pertinentes sugestões na avaliação do plano desta dissertação e na
minha aula de qualificação, agradeço ao Dr. Jeff. Poudos, ao Dr. Marcos Raposo, ao Dr. José
Maria Cardoso da Silva, ao Dr. Jansen Zuannon, ao Dr. Wilson Spironello e ao Dr. Bruce
Nelson. Esta dissertação também contou com os pertinentes, estimulantes e interessantes
comentários, correções e sugestões do Dr. Renato Cintra, Dr. Mauro Galetti, Dr. Luís Fábio
Silveira, da Dra. Marina Anciães e do Dr. Alexandre Aleixo.
Também agradeço às discussões, sugestões e indicações dos colegas Ângela Midori,
Gonçalo Ferraz, Marcela Torres, Luciano Naka.
Agradeço à Jennifer Marion por ter trazido uma máquina fotográfica pra mim, com a
qual eu capturei imagens que não vou esquecer, incluindo algumas que ilustram esta
dissertação. Ao Alex Jahn por ter trazido meu computador. Agradeço também ao Toa Kyle,
que trouxe meu binóculo, o GPS, e outros equipamentos úteis no campo.
Pela convivência e pelas inúmeras discussões agradeço à turma da coleção de aves e à
turma da ornitologia do INPA: Alexandre Fernandes, Ângela Midori, Christian Andretti,
Cathy, Claudeir Vargas, Gisiane, Gonçalo Ferraz, Ingrid Macedo, Jefferson, Lucioano Naka,
Marcela Torres, Marcelo Brasa, Marconi, Marina Anciães, Sérgio Bogão, Sérgio Borges,
Thiago, Thiago Costa, e Viviane Deslandes.
Pelo apoio à minha estadia em Manaus e pela amizade, pela convivência e
familiaridade, agradeço aos co-moradores e irmãos: Márcio Pereira, Maria de Fátima e
Juliana Catu.
Pela eterna e “saudadosa encheção” eu não poderia deixar de agradecer aos amigos
Angelita, Claudeir e Marcela.
Por despertar o meu interesse pela ecologia, ciência e pela Amazônia agradeço ao
apadrinhamento, amadrinhamento e aconselhamento científico dos eternos orientadores e
amigos: Prof. Alberto Oleori, Profa. Adriana Rosa Carvalho, Prof. Ronaldo Angelini, Prof.
Carlos Eduardo Kadu e Profa. Anamaria Atchschin.
Pela amizade, companheirismo, coleguismo, festas, reuniões e tudo mais, agradeço aos
amigos, companheiros e colegas do curso de Ecologia do INPA: Ana Carla, Camila Carla,
Carlos Leandro, Daniel Munari, Fabiana Ferraz, Fernando Nando, Gabriela Asmus, Juliana
vi
Catu, Karina Núñez, Luiz Felipe, Manuela Jardim, Marcelo Brasa, Marilena Campus, Murilo
Sversut, Pedro Lobão, Shanna Bittencurt e Thiago Cardoso, Ricardo Forga, Daniel Bero,
Bruno, Julio, José Julio, Manô Borges, Sérgio Bogão.
Pela apoio, confidência e amizade agradeço aos amigos Catu, Pedro, Luiz, Nando,
Marcela, Claudeir e Ângela.
Agradeço à saudade sentida nesses dois anos, que foi proporcionada pela ausência dos
amigos de Goiânia: Vitor, Daniel, Ernna, Uélen, Paulo André, Estevão, Janaína, Daniela,
Murilo, Rudy, Rodolpho, Aninha, Rodrigo, Jennifer, Jade, Rafaella, Nárgila (que hoje
também está na Amazônia), Rosana, Priscila, Fernanda, Janinne, Virgínia, Carol, Juliana
Jujuba, Camila, Taís, Carrijo, Tatiana, Fausto, Thiago e Ludymilla. Aos quais também
agradeço por toda companhia e amizade nas curtas férias nessa cidade.
Pelo amor, carinho, saudade e confiança da minha mãe, Marisa, do meu pai, Joscé, da
minha irmã, Fernanda e do meu irmão, Daniel, agradeço hoje e sempre. Obrigado mermo!
Finalmente, agradeço também ao livro Ornitologia Brasileira do Helmut Sick, pela
belíssima capa que fez com que eu ainda em Goiânia decidisse colocar uma arara de gesso na
parede do meu quarto, que por pura previsão do futuro, é a ararajuba. Agradeço a essas
únicas, belíssimas, endêmicas, ameaçadas, carismáticas, divertidas e esplêndidas e, por que
não dizer, brasileiras, aves, pelo prazer em estudá-las, ouvi-las e tentar entendê-las.
vii
“Mais profundamente difíceis são as conclusões da teoria quântica, esmagadoramente
confirmadas pela evidência experimental com uma precisão assombrosamente convincente de
casas decimais, mas ainda tão estranhas à mente humana que até os físicos profissionais não
as compreendem nos seus pensamentos intuitivos.”
(Richard Dawkins – Desvendando o Arco Íris)
viii
Resumo
A ararajuba (Guarouba guarouba) é uma espécie de psitacídeo endêmica da
Amazônia brasileira e ameaçada de extinção. Poucos estudos têm sido feitos com essa espécie
na natureza, principalmente nos últimos anos. Este estudo visou descrever e analisar a
distribuição geográfica da ararajuba e levantar informações sobre sua biologia na região do
Parque Nacional da Amazônia (PNA), oeste do Pará, a fim de subsidiar medidas de proteção
da espécie. Levantei e analisei os registros de ocorrência da espécie por período de tempo e
modelei a distribuição. Também conduzi observações na região do PNA durante o ano de
2007. A área de ocorrência da ararajuba foi reduzida nos últimos anos em pelo menos 40%
em relação à distribuição original. Os modelos gerados evidenciaram importância da
vegetação e do clima na ocorrência da espécie. A ararajuba se limita a uma porção menos
úmida do bioma amazônico numa interface de relevo ondulado entre as planícies baixas e a
borda do planalto central. Na região do PNA, a ararajuba foi encontrada em grandes bandos
de tamanho variável, mas o número de indivíduos que pernoitem juntos permanece o mesmo
ao longo dos dias. Localmente, a espécie é comum e fiel aos sítios reprodutivos e alimentares.
A população estimada para a região é de pelo menos 484 indivíduos. A dieta é diversificada,
mas não oportunista. Todos os ninhos encontrados estavam em áreas abertas sujeitas à alta
perturbação humana. Não encontrei evidência de dependência quanto à espécie arbórea ou à
estrutura da árvore necessária para nidificação. Os ninhos continuaram sendo usados como
dormitório durante o período não-reprodutivo. Há indício de baixa taxa reprodutiva associada
ao complexo sistema social e reprodutivo, em que possivelmente apenas o casal dos grandes
bandos é reprodutivamente ativo, e à suposta preferência por pastagens recém-formadas e
vegetação secundária. A ararajuba ainda sofre de perseguição para venda ilegal e pelo
desmatamento contínuo. A distribuição coincide com o “arco do desmatamento”, o que põe
em sérios riscos o futuro da espécie. Iniciativas de procura por populações na porção oeste da
distribuição foram endossadas pelas previsões da modelagem e novas pesquisas deverão focar
na sociabilidade e preferências de habitat para melhor entender a vulnerabilidade desse
emblemático psitacídeo brasileiro.
Palavras-chave: psittacidae, ocorrência, sociabilidade, status populacional, preferências
alimentares, biologia reprodutiva, vulnerabilidade.
ix
Abstract
The Golden Parakeet (Guarouba guarouba) is an endangered species of psittacid endemic to
the Brazilian Amazon. Only a few studies of the species have been conducted in the wild,
mostly in the last few years. The objectives of this study were to describe and analyze the
geographic distribution of the species and gather information on its biology in the region of
Amazonia National Park (PNA), in western Pará, to provide information relevant to
conservation of the species. I gathered and analyzed records of occurrence by time period and
modeled distribution. I also observed the species in the region of the PNA during 2007. The
area of occurrence is currently 60% of the original distribution. Distribution models
demonstrated the importance of vegetation and climate in determining occurrence. The
Golden Parakeet is limited to the driest portion of the Amazonian biome, in hilly terrain at the
border of lowlands and the Brazilian shield. In the PNA, the parakeet was encountered in
groups of variable size, but the number of individuals roosting together in dormitories was
constant over time. Locally, the species was common and showed fidelity to reproductive and
foraging sites. Total population estimated for the region of study is at least 484 individuals.
Diet is varied, but not opportunistic. All nests encountered were in open areas subject to
considerable human disturbance. Nesting trees were of several species and variable structure,
representing no particular specialization. Nest cavities continued to be used as dormitories
during the non-reproductive season. The species probably has a low reproductive rate,
considering its complex social system and nest site requirements. The parakeet continues to
suffer from trapping for the illegal pet trade, and deforestation. Its distribution coincides with
the colonization frontier (“arc of deforestation”), which places its future in serious risk. The
importance of searching for additional populations in the western part of its range is
reinforced by predictive modeling, and future research should also focus on the social
behavior and habitat preferences to better understand the vulnerability of this emblematic
Brazilian parrot.
Key-words: endangered species, potential distribution, flock size, diet, reproduction, status of
population, conservation.
x
Súmario
Agradecimentos ......................................................................................................................... iv
Resumo .................................................................................................................................... viii
Abstract ...................................................................................................................................... ix
Súmario ....................................................................................................................................... x
Lista de Tabelas ........................................................................................................................ xii
Lista de Figuras ....................................................................................................................... xiii
Introdução Geral ......................................................................................................................... 1
Objetivos ..................................................................................................................................... 5
Capítulo 1 – Análise da distribuição geográfica da ararajuba (Guarouba guarouba
Psittacidae). ................................................................................................................................ 6
Resumo ................................................................................................................................... 6
Introdução ............................................................................................................................... 7
Métodos .................................................................................................................................. 8
Delimitação da área de ocorrência conhecida total, histórica e atual. ................................. 9
Busca por populações no sudeste do Amazonas ............................................................... 10
Modelagem da distribuição geográfica potencial.............................................................. 11
Resultados ............................................................................................................................. 13
Área de ocorrência total, histórica e atual ......................................................................... 15
A ararajuba no sudeste do Amazonas, registros incertos de presença e ausências ........... 16
Modelagem da distribuição potencial ............................................................................... 17
Discussão .............................................................................................................................. 20
Área de ocorrência histórica e atual .................................................................................. 20
Registros incertos de presença, ausências de evidências e evidências de ausência. ......... 21
Modelagem da distribuição potencial ............................................................................... 22
Áreas protegidas, cenários futuros e conservação ............................................................. 24
Referências ............................................................................................................................ 25
Apêndice A. .......................................................................................................................... 29
Apêndice B. .......................................................................................................................... 35
Capítulo 2 – História natural e conservação da ararajuba (Guarouba guarouba – Psittacidae)
no Parque Nacional da Amazônia e vizinhança, Pará .............................................................. 37
Resumo ................................................................................................................................. 37
Introdução ............................................................................................................................. 38
Área de Estudo ...................................................................................................................... 40
Métodos ................................................................................................................................ 42
Padrões de agrupamento ................................................................................................... 43
Amostragens – índice de abundância e densidade ............................................................ 44
Probabilidades de detecção e de ocupação ........................................................................ 46
Tamanho populacional mínimo e estimativas populacionais ............................................ 47
Descrição dos recursos alimentares utilizados e comportamento alimentar ..................... 48
xi
Biologia reprodutiva .......................................................................................................... 49
Resultados ............................................................................................................................. 50
Padrões de Agrupamento .................................................................................................. 50
Padrões populacionais ....................................................................................................... 56
Uso dos Recursos Alimentares .......................................................................................... 61
Biologia reprodutiva .......................................................................................................... 67
Interações com outras aves e outros animais .................................................................... 76
Discussão .............................................................................................................................. 77
Padrões de agrupamento ................................................................................................... 78
Padrões Populacionais ....................................................................................................... 83
Uso dos Recursos Alimentares .......................................................................................... 89
Biologia reprodutiva .......................................................................................................... 94
Interações com outras aves e outros animais .................................................................. 100
Conservação: ameaças, implicações e recomendações ................................................... 100
Referências .......................................................................................................................... 103
Apêndice C. ........................................................................................................................ 109
Conclusões .............................................................................................................................. 110
Referências Bibliográficas ...................................................................................................... 112
xii
Lista de Tabelas
Capítulo I (Artigo 1)
Tabela 1. Valores de AUC e contribuição relativa de cada variável utilizada para as
modelagens da distribuição potencial da ararajuba com base nos 3 tipos de base de dados. A –
Dados das localidades de todos os registros confirmados. B – Dados das localidades dos
registros distantes de rios. C – Localidades de todos os registros confirmados mais os
registros incertos.
Capítulo 2 (Artigo 2)
Tabela 2. Categorias temporais e espaciais em que o tamanho dos bandos e o índice de
abundância da ararajuba foram comparados.
Tabela 3. Tamanho médio do bando e desvio padrão para outras 15 espécies de psitacídeos,
na região do Parque Nacional da Amazônia.
Tabela 4. Registros de presença e ausência da ararajuba (Guarouba guarouba) nos trechos de
4km delimitados.
Tabela 5. Números de registros de bandos e indivíduos de psitacídeos nas amostragens nos 7
transectos de 12 km percorridos na região do Parque Nacional da Amazônia.
Tabela 6. Valores totais e relativos (por hora) de contatos em termos de bandos e de
indivíduos para espécies de psitacídeos, considerando todas as amostragens, ao longo do
estudo na região do Parque Nacional da Amazônia (lista em ordem decrescente de indivíduos
registrados).
Tabela 7. Itens de espécies arbóreas consumidos pela ararajuba (Guarouba guarouba) na
região do Parque Nacional da Amazônia.
Tabela 8. Valores máximos, médios e mínimos das características das árvores utilizadas
como ninho ou dormitório (n=14), ou exploradas e supostamente utilizadas como tal (n=4),
pelos bandos da ararajuba na região do Parque Nacional da Amazônia. (N* é o número de
árvores para as quais as características foram estimadas).
xiii
Lista de Figuras
Capítulo I (Artigo 1)
Figura 1. Trechos da transamazônica (BR-230) percorridos na expedição de procura por
populações da Guarouba guarouba no sudeste do Amazonas.
Figura 2. Distribuição de todas as localidades de registros publicados ou não da Guarouba
guarouba, mais as localidades de registros incertos de presença e trechos e localidades em que
expedições e pesquisas não detectaram a espécie.
Figura 3. Área de ocorrência da ararajuba (Guarouba guarouba) de acordo com os períodos
discriminados. Em A, pela técnica do Mínimo Polígono Convexo (MPC); em B, pela técnica
do “Polígono-Alfa” adaptada (PALFA).
Figura 4. Área de ocorrência da ararajuba para os últimos 20 anos, sobreposta ao “arco do
desmatamento” na Amazônia.
Figura 5. Mapas resultantes da modelagem da distribuição potencial da ararajuba. A –
modelagem com todas as localidades de registros confirmados; B – modelagem com apenas
as localidades de registros distantes de rios; C – modelagem com todas as localidades de
registros confirmados mais as de registros incertos de presença.
Figura 6. Distribuição das localidades de registros Guarouba guarouba em função de duas
variáveis ambientais. A – vegetação; B – Amplitude da temperatura média mensal.
Capítulo II (Artigo 2)
Figura 7. Localização do Parque Nacional da Amazônia (PNA) e da transamazônica (BR-
230) no canto inferior direito à margem esquerda do Rio Tapajós, aonde o estudo com a
ararajuba foi realizado. Os trechos mais escuros na transamazônica mostram o
posicionamento (os números correspondem à numeração dos quilômetros) e o comprimento
dos transectos delimitados para as amostragens populacionais. As setas indicam a localização
das bases de visitação e vigilância do PNA.
Figura 8. Trecho da transamazônica (BR-230) dentro do Parque Nacional da Amazônia
Figura 9. Distribuição do número de contatos por tamanho de bandos encontrados da
ararajuba na região do Parque Nacional da Amazônia.
Figura 10. Quantidade de juvenis em relação ao tamanho do bando da ararajuba (Guarouba
guarouba).
Figura 11. Variabilidade no tamanho dos bandos da ararajuba registrados ao longo do dia.
xiv
Figura 12. Variação no tamanho dos bandos da ararajuba de acordo com as épocas do ano, na
região do Parque Nacional da Amazônia.
Figura 13. Variação no tamanho dos bandos da ararajuba de acordo com a época reprodutiva.
Figura 14. Variação no tamanho dos bandos da ararajuba em relação às porções da área de
estudo.
Figura 15. Índice de abundância (ind/km) da ararajuba obtida em cada amostragem nos
diferentes transectos da transamazônica.
Figura 16. Localização dos bandos de ararajuba registrados no Transecto entre Itaituba-PA e
Jacareacanga-PA (TIJ) em 2005 (pontos cinzas) e em 2007 (pontos pretos).
Figura 17. Localização dos bandos, clãs e dormitórios da Guarouba guarouba na região do
Parque Nacional da Amazônia (PNA). Cada número indica a localidade em que um ou mais
bandos ou dormitórios foram localizados e diferenciados de acordo com o Apêndice C. Em
‘A’, a porção central e norte do Parque Nacional da Amazônia; Em ‘B’, a porção sul do PNA;
Em ´C’, porção fora do PNA ao sul; e em D, porção ao norte de Jacareacanga-PA.
Figura 18. Número de registros de alimentação da ararajuba por mês para cada item
alimentar, comparado com os meses de floração e frutificação do murici (Byrsonima sp.1;
barras horizontais alaranjadas e vermelhas, respectivamente), na região do Parque Nacional da
Amazônia. Barras horizontais cinzas representam os períodos de amostragem no campo. Os
registros no mês de fevereiro foram feitos por funcionários do PNA.
Figura 19. Distribuição dos registros de alimentação da Guarouba guarouba ao longo do dia
(ver texto), na região do PNA.
Figura 20. Postura pedinte do juvenil de ararajuba nos sítios alimentares
Figura 21. Evento de alimentação de juvenil de ararajuba nos sítios alimentares.
Figura 22. Distribuição dos sítios reprodutivos (ninhos – N) e dormitórios (D) da ararajubas,
e de árvores supostamente utilizadas como tal (S), localizados na região do Parque Nacional
da Amazônia.
Figura 23. Exemplos de árvores utilizadas como ninho ou dormitório pela ararajuba
Figura 24. Socialização da ararajuba nos arredores dos sítios reprodutivos.
Figura 25. Interação entre a ararajuba (Guarouba guarouba) e a araracanga (Ara macao) em
uma árvore utilizadas como dormitório por ambas as espécies.
1
Introdução Geral
A ararajuba (Guarouba guarouba) é uma espécie de psitacídeo (família de aves que
inclui papagaios, araras, periquitos) de porte médio, endêmica da Amazônia brasileira,
descrita no século XVIII por Gmelin (1788). De situação taxonômica confusa, foi
classificada dentro de alguns gêneros (Aratinga, Conurus, Psittacus Collar, 1997; Sick,
1997; Juniper e Parr 1998), mas fatores ecológicos, comportamentais e morfológicos indicam
que a espécie deve ser incluída em um gênero exclusivo (Sick, 1997; Juniper e Parr, 1998).
Atualmente, com base em caracteres genéticos moleculares, é mais associada
filogeneticamente com o maracanã-nobre, Diopsittaca nobilis (Tavares et al., 2004). Por
ser encontrada no Brasil e por ter o corpo dourado e as rêmiges verdes, um padrão de
coloração único e que coincide com as cores da bandeira brasileira, a ararajuba é uma boa
alternativa para símbolo nacional (Sick, 1997).
Esse emblemático psitacídeo é considerado ameaçado de extinção desde 1981 e é
listado na IUCN Red List, na situação de em perigo (BirdLife International, 2007). Essa
classificação é justificada pela pequena população mínima estimada (menos de 2.500
indivíduos), que aparentemente é nômade ao longo dos rios, e pela perda de habitat e pela
extensiva captura para o tráfico ilegal de animais silvestres (BirdLife International, 2007).
Isso faz da ararajuba um dos poucos psitacídeos e aves ameaçadas na Amazônia (Galetti et
al., 2002; Marini e Garcia, 2005; BirdLife International, 2007). De fato, a família Psittacidae
possui o maior número de espécies ameaçadas dentro da classe das Aves (Juniper e Parr,
1998). Características, como grande tamanho corporal, dieta que inclui pequena diversidade
de itens alimentares, alta especificidade de habitat, distribuição geográfica restrita e baixa taxa
de crescimento populacional são associadas ao risco de extinção em psitacídeos (Galetti et al.,
2002) e talvez sejam relevantes no caso da ararajuba.
O desmatamento intensivo e a fragmentação florestal tanto no leste como no sul da
Amazônia são as principais ameaças à sobrevivência da ararajuba (Juniper e Parr, 1998), cuja
distribuição coincide com o “Arco do Desmatamento” (Olmos 2005). Na porção leste (oeste
do Maranhão e leste do Pará) a caça para o tráfico de animais põe sérios riscos à sua
conservação, e na porção sul (oeste do Pará), a construção de rodovias, como a
transamazônica (BR-230) e a Cuiabá-Santarém (BR-163), proporciona a expansão das cidades
e estabelecimentos de novas frentes de colonização, destruindo boa parte de seu habitat
natural (Juniper e Parr, 1998; BirdLife International, 2007; Kyle, 2005). Mesmo nas novas
2
localidades de registro da espécie (norte de Rondônia e do Mato Grosso), o desmatamento é
intenso e pouco sobra da floresta nativa. Assim, a situação da ararajuba na natureza está longe
de ser considerada segura (Silveira e Belmonte, 2005).
Não obstante, poucos estudos têm sido feitos com essa espécie na natureza, sobretudo
nos últimos anos. Silveira & Belmonte (2005) reportaram hábitos e comportamento
reprodutivo de um único ninho no leste do Pará, e Kyle (2005) relatou aspectos gerais da
presença de populações e alimentação mais ao oeste deste estado, na região da rodovia
transamazônica e no Parque Nacional da Amazônia e na Floresta Nacional do Tapajós. Antes
disso, apenas Oren e Novaes (1986) estudaram a ararajuba, produzindo informações básicas
da distribuição, alimentação, reprodução e ameaças. As poucas informações biológicas sobre
a espécie estão sintetizadas em compilações de espécies ameaçadas (BirdLife International,
2007) e em discussões gerais sobre psitacídeos (Collar, 1997; Sick, 1997; Juniper e Parr,
1998). Outras informações publicadas consistem nos registros de novas localidades (veja
Oren e Willis, 1981; Yamashita e França, 1991; Lo, 1995) ou em aspectos genéticos de
indivíduos cativos (Albertani et al., 1997; Tavares et al., 2004).
Nem mesmo a distribuição geográfica da espécie é bem descrita ou compreendida. Na
região entre o médio rio Tocantins e Xingu (centro-sul do estado do Pará), Oren e Novaes
(1986) desconhecem o motivo pelo qual a ararajuba não foi encontrada em várias semanas de
observações, apesar da continuidade da floresta. Além disso, os novos registros que
expandiram a área de ocorrência conhecida (Yamashita e França, 1991; Lo, 1995) deixaram
um vazio incompreendido na distribuição. Assim, para um melhor entendimento, o
mapeamento e a análise dos registros são essenciais, uma vez que permitem fazer associações
com fenômenos temporais ou espaciais. O simples agrupamento dos registros em polígonos
permite inferir sobre alterações temporais e conseqüentemente sobre suas causas (veja, por
exemplo, Nunes, 2003; Nunes, 2007; Tobias e Brightsmith, 2007). Refinadas plotagens destes
em função de variáveis ambientais, por meio de modelagens computadorizadas, podem
elucidar elementos relevantes (Phillips, 2006).
Informações biológicas também são escassas. A estimativa da população global da
espécie, a partir da qual foi definido o status atual da ararajuba, é indireta e oriunda de
extrapolação de dados não derivados de estudo sistemático (BirdLife International, 2007).
Além disso, embora existam citações de números referentes ao tamanho dos bandos (Oren e
Novas, 1986; Oren e Parker, 1997; Pacheco e Olmos, 2005), os padrões de agrupamento não
são definidos, nem espacialmente nem temporalmente. Os deslocamentos sazonais, embora
citados, não são entendidos nem previstos (Juniper e Parr, 1998), da mesma forma que não há
3
informações sobre relações interespecíficas de competição, repartição de nicho ou
substituição geográfica, em escala local ou regional, ou intraespecíficas de acordo com o
período reprodutivo. Sem a precisão de tais números e a previsão dos movimentos ou de
ocupação, tanto o estudo como o manejo e a proteção de um psitacídeo na natureza tornam-se
subjetivos e impraticáveis (Pizo et al., 1995; Pizo, 2002).
Quanto à alimentação, vários itens (das flores aos frutos e sementes) de diferentes
espécies, como açaí (Euterpe spp.), caju (Anacardium spp.), murici (Byrsonima crassifolia) e
anani (Symphonia globulifera), dentre outras, são citados como parte da dieta da ararajuba, o
que evidencia pouca especialização alimentar (Collar, 1997; Juniper e Parr, 1998; Sick, 1997).
Recentemente, na Floresta Nacional de Caxiuanã, têm-se associado a presença da ararajuba à
floração do anani, próxima aos rios (R. M. Valente, in litt.) e, no oeste do Pará, Kyle (2005)
relata muitos registros de alimentação da semente do murici. Entretanto, não informações
de variações regionais ou sazonais e nem de deslocamentos em função de alimento (Oren e
Novas, 1986, Juniper e Parr, 1998).
Mais complexo ainda parece ser o comportamento e a biologia reprodutiva.
Diferentemente da maioria dos outros psitacídeos, e especialmente das araras, as ararajubas
permanecem em grupo no período reprodutivo (Sick, 1997, Juniper e Parr, 1998). Uma
investigação inicial dos bandos na natureza sugere que estes são familiares, formados pelo
casal e por jovens de diferentes gerações (Reynolds, 2003), mas em cativeiro as aves
reproduzem-se comunitariamente, com mais de um casal em um mesmo ninho, criando vários
filhotes de fêmeas diferentes (Oren e Novas, 1986; Collar 1997; Juniper e Parr, 1998). Além
disso, paternidade extra-par (inseminação de uma fêmea por dois machos diferentes) foi
registrada em cativeiro (Albertani et al., 1997). À parte do comportamento reprodutivo, vários
aspectos, como a quantidade de ovos e filhotes na ninhada e o sucesso reprodutivo, além das
características físicas do ambiente e do ninho ainda permanecem incertos.
Por fim, todas as informações até então obtidas a cerca da ararajuba parecem
evidenciar complexidade espacial e temporal ainda muito mal conhecida nas suas interações
com o habitat. Assim, o estudo da ecologia e história natural da ararajuba é importante para
melhor entender sua ameaça de extinção. Esta dissertação visou, portanto, melhorar o
conhecimento sobre a distribuição geográfica, habitat, padrões de agrupamento, tamanho
populacional, dieta, biologia reprodutiva e comportamento da ararajuba, a fim de subsidiar a
conservação da espécie.
As informações acima mencionadas são essenciais para fundamentar estratégias de
conservação de qualquer espécie e planos de manejo, além de ser básicas para a compreensão
4
da biologia, das interações ecológicas e da susceptibilidade à extinção (Pizo, 2002; Galetti et
al., 2002; Valladares-Padua et al., 2003). As estimativas populacionais e o conhecimento dos
padrões de agrupamento (variação no tamanho dos bandos) procedem à definição do status de
uma espécie em uma região e identificam suas interações ecológicas e respostas à impactos
antrópicos (Nunes e Betini, 2002; Pizo, 2002). A avaliação dos recursos alimentares indica
quais itens são os mais importantes pra permanência das aves, em determinados períodos do
ano ou em diferentes localidades (Galetti, 2002). O sistema social e reprodutivo deve
influenciar nas taxas de crescimento populacional e na susceptibilidade a alterações
ambientais e conseqüentemente nos padrões de colonização e extinção local (Guedes e Seixas,
2002). É com esses dados, então, que planos de manejo melhor fundamentados poderão ser
feitos e as ações para conservação serão mais consistentes. Além disso, o estudo foi feito na
porção oeste da distribuição da ararajuba, que é a menos conhecida e considerada como a
região mais importante para a conservação dessa espécie e na qual a procura por novas
populações é relevante para a definição do seu status global (Oren e Novaes, 1986; Wege e
Long, 1995; Kyle, 2005; BirdLife International, 2007). É ainda uma região que ainda
apresenta extensões consideráveis de floresta contínua, com potencial para fornecer
informações da biologia da ararajuba sob menor efeito antrópico.
5
Objetivos
O objetivo geral desta dissertação foi descrever e analisar a distribuição geográfica da
ararajuba (Guarouba guarouba – Aves: Psittacidae) e levantar informações sobre seus
aspectos populacionais, alimentares, reprodutivos e comportamentais na região do Parque
Nacional da Amazônia (PNA), oeste do Pará, a fim de subsidiar a proteção da espécie.
Para alcançar esse propósito esta dissertação foi dividida em dois capítulos, cada um
com os respectivos objetivos específicos:
Capítulo I (Artigo 1) – Análise da distribuição geográfica da ararajuba (Guarouba guarouba
Psittacidae):
Descrever a distribuição de ocorrência conhecida da espécie;
Detectar possíveis mudanças na área de ocorrência ao longo do tempo;
Propor uma hipótese da distribuição potencial pela modelagem do nicho ecológico;
Verificar a presença da ararajuba na região sudeste do estado do Amazonas.
Capítulo II (Artigo 2) – História natural e conservação da ararajuba (Guarouba guarouba -
Psittacidae) na região do Parque Nacional da Amazônia, Pará.
Determinar possíveis padrões de agrupamento;
Estimar um índice de abundância, a densidade e o tamanho populacional para área de
estudo;
Verificar possíveis variações populacionais (índice de abundância) em função da
presença de outras espécies de psitacídeos, como em função da antropização;
Listar os itens consumidos pela a ararajuba e respectivas espécies vegetais;
Verificar possíveis associações entre a presença ou abundância da ararajuba em função da
fenologia de algumas espécies de plantas utilizadas em sua dieta;
Descrever aspectos reprodutivos e comportamentais.
Capítulo I (Artigo 1)
Formatado de acordo com as instruções da Revista Brasileira de Ornitologia
Análise da distribuição geográfica da ararajuba (
Guarouba guarouba
Psittacidae).
Thiago Orsi Laranjeiras
1
, Mario Cohn-Haft
2
1
Pós-graduação em ecologia, Instituto Nacional de Pesquisas na Amazônia, [email protected],
2
Instituto
Nacional de Pesquisa na Amazônia, Curadoria de Aves
Resumo
A ararajuba é uma espécie ameaçada de extinção e de biologia e distribuição
geográfica pouco conhecidas e compreendidas. Este trabalho visou determinar a distribuição
geográfica conhecida total, histórica e atual dessa espécie no intuito de verificar possíveis
alterações temporais e gerar modelos de distribuição geográfica potencial. Levantamos todos
os registros disponíveis na literatura, além de localidades de exemplares em coleções
nacionais e registros não-publicados de colegas. Analisamos a área de ocorrência por períodos
de tempo (antes e após 1987), e para a modelagem da distribuição usamos o software MaxEnt,
que considera variáveis ambientais (amplitude na variação da temperatura, índice de
intensidade e duração da estação seca, altitude e vegetação) para gerar previsões de condições
propícias de ocorrência. A ararajuba já foi registrada em cerca de 60 localidades, em cinco
estados brasileiros. Após 1987, observamos uma retração da área de ocorrência na porção
leste, provavelmente devido ao desmatamento, e uma expansão em direção a oeste, melhor
explicada pelo aumento do conhecimento do que por uma colonização. Atualmente, a área de
ocorrência compreende menos de 320 mil km
2
, o que equivale a menos de 60% da
considerada original. Na periferia oeste, a ocorrência da ararajuba ainda é incerta, onde
moradores relatam sua presença em algumas poucas localidades. Os modelos gerados
previram áreas com condições mais propícias de ocorrência fragmentadas, mas que inclui
regiões entre registros confirmados e aonde há registros incertos de presença da espécie.
Embora seja difícil identificar os fatores determinantes da distribuição potencial, os registros,
aparentemente, se enquadram em valores intermediários das variáveis consideradas. A
ararajuba se limita a uma porção menos úmida do bioma amazônico numa interface de relevo
ondulado entre as planícies baixas e a borda do planalto central. Essa distribuição coincide
com o “arco do desmatamento”, o que põe em sérios riscos o futuro desse endêmico e
emblemático psitacídeo brasileiro.
Palavras chave: espécie ameaçada, previsão de condições de ocorrência, perda de habitat,
conservação
7
Introdução
A distribuição geográfica de uma espécie é o resultado de uma complexa interação
entre a biologia do organismo e o seu ambiente ao longo de sua história evolutiva (Brown
1996). Assim, com o conhecimento da distribuição de uma espécie pode-se melhor identificar
os recursos necessários à sua sobrevivência, suas exigências e interações. Desse modo, saber
em quais áreas uma espécie ocorre é fundamental para estudos biogeográficos e um
requerimento básico para estudos ecológicos (Rushton et al. 2004), o que permite
compreender as histórias de vida das espécies, bem como subsidiar teorias sobra a história da
vida na terra (Brown 1996). Como exemplo disso, a distribuição geográfica da ararajuba
(Guarouba guarouba) foi utilizada por Haffer (1974) como subsídio para definir o refúgio de
Belém na Teoria dos Refúgios (Oren e Novaes 1986).
A ararajuba é uma espécie de psitacídeo ameaçada de extinção e de biologia e
distribuição geográfica pouco conhecidas e compreendidas (BirdLife International 2007).
Diferentes fontes delimitam diferentes áreas de ocorrência para a espécie (veja Oren e Novaes
1986, Collar, 1997, Juniper e Parr 1998, BirdLife International 2007). Na região entre o
médio rio Tocantins e Xingu (centro-sul do estado do Pará), Oren e Novaes (1986)
desconhecem o motivo pelo qual a ararajuba não foi encontrada em várias semanas de
observações, apesar da continuidade da floresta. Além disso, os novos registros que
expandiram a área de ocorrência (Yamashita e França 1991, Lo 1995) deixaram um vazio
incompreendido na distribuição (Collar 1997).
O mapeamento e a análise dos registros são essenciais por sua potencial contribuição
ao entendimento da distribuição real de uma espécie, e pelo auxílio no desenvolvimento de
pesquisas e ações de conservação (Peterson et al. 2001; Engler et al. 2004). A última
compilação de registros da ararajuba foi publicada há mais de 20 anos (Oren e Novaes 1986),
de modo que a atualização dessas informações deve identificar padrões de retração ou
expansão da área de ocorrência (veja, por exemplo, Nunes 2003, Nunes et al. 2007). Esses
padrões podem ser associados ao aumento do conhecimento ou ao desmatamento e destruição
do seu habitat na Amazônia, o que deve indicar aspectos sobre suas ameaças e conservação.
Além disso, deve ajudar a compreender a sua associação com o habitat, através da modelagem
do nicho ecológico, usando os registros de ocorrência associados a variáveis ambientais, em
escala geográfica (Peterson et al. 1999).
Nos últimos anos, uma série de aplicações geográficas foi desenvolvida (por exemplo,
Análises de Lacunas, Análises de Complementaridade), oferecendo novas possibilidades para
entender a distribuição das espécies e da biodiversidade (Jones et al. 1997, Peterson 2001,
8
Salem 2003). Uma das abordagens é a modelagem do nicho ecológico fundamental, que é um
determinante crítico da distribuição (Peterson 2001). Essa modelagem torna mais visível a
complexa interação entre a espécie e as múltiplas variáveis ambientais, em escala geográfica
(Peterson et al. 1999, Rushton et al. 2004) e, portanto, constitui uma importante técnica nas
áreas relacionadas à ecologia, biogeografia e biologia da conservação (Phillips et al. 2006).
Este trabalho visou determinar a distribuição geográfica conhecida histórica e atual da
ararajuba no intuito de verificar possíveis alterações em sua área de ocorrência e gerar
modelos de distribuição potencial. Enquanto que o conhecimento da distribuição histórica de
uma espécie é necessário para acessar as mudanças relativas à atual distribuição (Loiselle et
al. 2003), a previsão da ocorrência ou das regiões com condições favoráveis a essa ocorrência
é de uso para conservação e manejo de populações, principalmente para espécies ameaçadas
ou raras (Rushton et al. 2004, Phillips et al. 2006). Essas previsões não somente dizem onde
uma espécie pode ocorrer, direcionando buscas por populações da espécie, mas também diz
quais fatores estão envolvidos (Rushton et al. 2004) e, portanto, podem identificar áreas com
potencial para colonização ou reintrodução de populações (Engler et al. 2004). Além disso,
fornece novos pontos de vista sobre sua origem histórica e relação com outras espécies
(Peterson et al. 2002).
Métodos
Informações de ocorrência da ararajuba
Fizemos uma revisão detalhada sobre os registros de ocorrência da Guarouba
guarouba para obter o máximo de informações sobre a presença ou ausência, histórica e atual
da espécie (veja abaixo). Buscamos informações sobre todas as localidades de registros
disponíveis na literatura e de espécimes em museus nacionais (não necessariamente
publicadas), por meio de solicitações aos curadores das coleções (Apêndice A e
Agradecimentos). Também procuramos por localidades de registros não-publicados, por meio
de consultas a ornitólogos que possuem experiência com a espécie e por meio de solicitações
em fóruns eletrônicos de discussão de ornitologia (OrnitoBR).
Principalmente, mas não somente, para as informações de registros não-publicados,
consideramos como critérios na validação das ocorrências conjuntamente o tipo de registro
(visual, auditivo, espécime coletado, entrevistas com terceiros) e a quantidade de informações
associadas (tamanho do bando, evento alimentar, precisão da localidade, ambiente, indício de
nidificação), bem como fotos ou gravações. Por exemplo, registros localizados no centro de
uma cidade sem informações de autor do registro, data, ou documentação visual/auditiva não
9
foram considerados válidos. Já registros que foram acompanhados de descrição da localidade,
data, autor, detalhes sobre o tamanho ou comportamento do bando, ou uma fotografia, foram
validados (veja Apêndice A). Dessa forma, os registros que não perfizeram esses critérios,
bem como informações oriundas de entrevistas com moradores locais foram considerados
registros incertos. Outros registros incertos de presença foram obtidos, ao longo do ano de
2007, em entrevistas ocasionais durante o estudo da história natural da ararajuba na região do
Parque Nacional da Amazônia, margem esquerda do rio Tapajós, entre Itaituba e
Jacareacanga (veja Capítulo 2). Em caso de registros confirmados correspondentes em
diferentes publicações, consideramos apenas a que constava em data pretérita. No caso de
registros publicados correspondentes com espécimes em museus, consideramos apenas a
informação proveniente dos museus. Além disso, também anotamos as localidades em que a
espécie não foi detectada em inventários, expedições ou em pesquisas feitas na região, para o
mapeamento das ausências.
Delimitação da área de ocorrência conhecida total, histórica e atual.
Georreferenciamos e mapeamos os registros obtidos, com auxílio do programa
ArcGIS 9.0 (ESRI 2004), para análise e cálculos da área de ocorrência conhecida total,
histórica e atual. Os registros em locais próximos (distantes menos de 10 km) foram
agrupados em apenas uma localidade, considerando uma aproximação da área de vida de um
bando da espécie (veja Capítulo 2) e a resolução dos mapas temáticos ambientais (veja
abaixo), exceto aqueles referentes a diferentes períodos (veja abaixo). Definimos os limites da
área de ocorrência, em primeira instância, com base na técnica do Mínimo Polígono Convexo
(Gaston 1996), que consiste na delimitação do menor polígono que contenha todos os pontos
de ocorrência da espécie e que possua todos os vértices com ângulo interno inferior ou igual a
180º. Posteriormente, pelo fato dessa técnica ser sujeita a erros e vieses, principalmente em
distribuições irregulares (Standards and Petitions Working Group IUCN 2006), utilizamos a
técnica do “Polígono-Alfa” (ou α-hull, Burgman e Fox 2003). Essa técnica consiste na
triangulação das localidades de registro (conhecida como Triangulação de Delaunay, em qual
uma linha não pode interceptar a outra, de modo que a linha mais curta prevalece), e exclusão
das linhas que forem maiores do que a média de todas as linhas multiplicada por um
parâmetro alfa. Essa exclusão de linhas determina a forma do polígono e conseqüentemente a
área de ocorrência. O parâmetro alfa determina qual é a resolução do polígono estimado: um
alfa igual a zero determina a mais fina resolução, que é o conjunto de pontos discretos no
espaço; um alfa infinito determina uma resolução mais grosseira, que equivale ao polígono
10
convexo. Eu adotei o valor de alfa igual a 2 como sugerido por Burgman e Fox (2003) e por
Standards e and Petitions Working Group IUCN (2006). Entretanto, essa técnica pode deixar
pontos isolados, de modo a estimar uma área de ocorrência muito conservativa (Getz e
Wilmers 2004), que pode ignorar as diferenças de esforços amostrais entre as áreas. Desse
modo, adaptei a técnica, fazendo com que os pontos isolados fossem triangulados aos pontos
mais próximos (pelos lados mais curtos), de modo a incluí-los no polígono total. Para aplicar
a técnica aos diferentes períodos descriminados, considerei somente um limite de corte dos
lados, que foi obtido para a área de ocorrência total da ararajuba, como sugerido por
Standards e and Petitions Working Group IUCN (2006). Independentemente da técnica, o
conceito de área de ocorrência utilizado aqui não equivale ao conceito de área de ocupação,
que é uma menor área dentro da área de ocorrência que a espécie usualmente ocupa (IUCN
2001) . Os cálculos da área de ocupação são altamente influenciados pela a escala da análise
(IUCN 2001) e por isso não foram adotados aqui.
Consideramos registros históricos aqueles referentes a datas anteriores a 1987 e
registros atuais os posteriores a este ano. Discriminar como históricos os registros anteriores a
1987 deve-se ao fato de que próximo a esta data foram feitas as primeiras pesquisas com a
ararajuba e as primeiras publicações sobre sua ocorrência (Oren e Willis 1981, Oren e Novaes
1986). Para essa divisão também considerei o avanço do desmatamento e da antropização da
Amazônia ocorrente no final da década de 1970 e inicio da década de 1980 (Fearnside 2005).
Adicionalmente, é razoável considerar um período de pelo menos 20 anos (1987-2007) como
distribuição atual de uma espécie de psitacídeo (IUCN 2001, Nunes 2003, Tobias e
Brightsmith 2007), uma vez que podem sobreviver numa área mesmo que não estejam
reproduzindo, devido à, reconhecida, longevidade das espécies dessa família (Sick 1997).
Assim, pude investigar possíveis alterações na área de ocorrência da ararajuba ao longo do
tempo.
Busca por populações no sudeste do Amazonas
Em julho de 2006, realizamos uma expedição no intuito de localizar populações no
sudeste do estado do Amazonas. Essa região central do interflúvio Madeira-Tapajós
compreende um vazio na distribuição geográfica conhecida para a ararajuba, evidenciado
pelos registros confirmados de Rondônia (Floresta Nacional do Jamari) e oeste do Pará (Rio
Tapajós – veja Introdução). A expedição consistiu em percorrer a transamazônica de
Humaitá-AM até Jacareacanga-PA (veja Figura 1), além de um trecho de 150 km ao norte de
Apuí-AM (em direção a Novo Airipuanã-AM – AM-360) e outro trecho de 120 km ao norte
11
de Jacareacanga-PA (em direção a Itaituba). Com exceção do trecho entre Humaitá-AM e
Apuí-PA, todos foram percorridos de carro em velocidade média de 30 km/h para permitir
possíveis avistamentos diretos com bandos de ararajuba. As observações foram concentradas
nos horários de maior atividade dos psitacídeos (Roth 1984, Gilardi e Munn, 1998, Pizo 2002)
entre 6:00 e 10:00 e entre 15:00 e 18:00.
Figura 1. Trechos da transamazônica (BR-230) percorridos na expedição de procura por populações da
Guarouba guarouba
no sudeste do Amazonas.
Adicionalmente, entrevistamos moradores e trabalhadores da região no intuito de
verificar se a espécie é conhecida pelas pessoas, utilizando de uma foto em tamanho real da
ararajuba e de perguntas que podem fazer com que o entrevistado entre em contradição caso
esteja se referindo a outra espécie (tais como, sugerir diferente comportamento para a espécie
ou sugerir cores diferentes para a plumagem). Essas entrevistas foram de uso fundamental
uma vez que a ararajuba é uma espécie extremamente conspícua e de plumagem única, o que
desperta a curiosidade das pessoas e assim não passa facilmente despercebida. Além disso,
não detectar uma espécie em uma determinada localidade não significa que ela não esteja lá.
Por exemplo, possivelmente deixei de detectar bandos que sobrevoaram em silêncio os
trechos percorridos, devido ao alto ruído produzido pelo veículo.
Modelagem da distribuição geográfica potencial
Para a modelagem da distribuição geográfica potencial, as localidades de registros
foram agrupadas em três bases de dados diferenciadas, mas complementares: (a) registros
12
confirmados; (b) registros confirmados em localidades em “terra-firme”; e (c) registros
confirmados mais os registros incertos. Para a base “b” foram considerados apenas os
registros que não se referem a rios (veja Apêndice A) devido à possibilidade de que as
coordenadas geográficas refiram-se a corpos hídricos nos mapas de vegetação e altitude (veja
abaixo). Essa compilação teve o intuito de evitar que o modelo considere grandes massas de
água (como foz dos grandes rios) como locais com condições favoráveis à ocorrência da
espécie (no caso de limitarmos aos registros em “terra-firme”) e de dar mais pontos de
referência aos modelos (no caso de incluir os registros incertos).
A modelagem foi feita no Software MaxEnt 3.0.6 beta (Phillips et al. 2006). O
programa é baseado em um método de predições ou inferências a partir de informação
incompleta. Essa técnica apresenta vantagens sobre outras por incorporar variáveis
categóricas e por considerar apenas os registros de presença, além de produzir análises de
importância de cada variável para o modelo. O aplicativo foi utilizado com seus parâmetros
padrões. Para analisar o poder de previsão do modelo (valor da área sob a curva – AUC, da
sigla em inglês), o MaxEnt realiza cálculos baseados nas áreas previstas e nas localidades de
registros utilizadas para gerar e testar o modelo (definidas como dados de treino e dados de
teste, respectivamente – veja Phillips et al. 2006 para uma descrição mais detalhada do
cálculo do AUC). Nas modelagens com as bases de dados “a” e “b” (veja acima), as
localidades dos registros incertos foram utilizadas como dados de teste para verificar o poder
de previsão do modelo. Já para a base “c”, aquela que inclui também as localidades de
registros incertos, uma parcela de 25% das localidades escolhida aleatoriamente pelo
aplicativo foi utilizada como dados de teste.
Vegetação, amplitude na variação da temperatura, índice de intensidade e duração da
estação seca (Índice de Walsh – Walsh 1996) e altitudde foram as variáveis utilizadas nas
modelagens. A camada de altitude foi obtida da base de dados do WorldClim
(www.worldclim.org – Hijmans et al. 2005), em formato raster com resolução de 30
segundos (equivalente a 1km na altura da Linha do Equador), e a camada de vegetação foi
obtida da base de dados do Ministério do Meio Ambiente / IBAMA (www.mma.gov.br), em
formato shape em escala de 1:2.500.000. A camada do Índice de Walsh foi derivada dos
valores de pluviosidade obtidos também da base de dados do World Clim, em formato raster
com resolução de 10 minutos. O mesmo foi feito para obter a camada de amplitude na
variação da temperatura, que é resultado da subtração dos valores médios mensais de
temperatura máxima e mínima, também da base de dados da World Clim, em formato raster
com resolução de 30 segundos. A camada de vegetação em shape foi transformada em raster,
13
com composição de 64 tipos vegetacionais, diferenciados ao nível 5 da classificação
hierárquica de Veloso (1992) e de acordo com a tabela de dados disponível junto à camada de
vegetação. Todas as camadas (em raster) foram redefinidas para resolução de 0,008333 graus
(através da técnica de reamostragem “nearest”). Todas as camadas foram recortadas de acordo
com os limites da Amazônia Legal, de modo que toda a variação é limitada ao bioma
amazônico, e assim foram inseridas no software. O tratamento das imagens foi feito através
do ArcGis 9 e Global Mapper 6. Outras camadas como tipo de solo, geomorfologia, relevo e
precipitação foram excluídas dos modelos apresentados (ver Resultados) devido à baixa
contribuição às previsões; isso talvez se deva a uma forte correlação dessas variáveis com
vegetação e o índice de Walsh.
Resultados
Informações de ocorrência e distribuição geográfica dos registros
A ararajuba é registrada em cerca de 60 localidades (Apêndice A e Figura 2), em cinco
estados brasileiros. A maioria dos registros é de localidades no estado do Pará. Os registros se
distribuem na porção centro leste da Amazônia Brasileira, de oeste do estado do Maranhão à
margem leste do Rio Madeira, sempre ao sul do Rio Amazonas e ao norte dos estados de
Rondônia e Mato Grosso. Treze publicações incluem 25 localidades de registros visuais da
espécie; 32 espécimes depositados em três museus nacionais (Museu Nacional do Rio de
Janeiro – Museu Nacional, Museu Paraense Emílio Goeldi – MPEG, e Museu de Zoologia da
Universidade de São Paulo – MZUSP) foram coletados em 14 localidades (publicadas ou
não); registros não publicados (comunicações pessoais) de 10 autores compreendem 21
localidades e de observações pessoais nove (veja Apêndice A e Agradecimentos). Dois
registros (um espécime e um registro visual publicado) não puderam ser mapeados devido à
falta de informação da localidade precisa: o espécime (#28256) consta como comprado na
lista cedida pelo MPEG (Alexandre Aleixo, in litt. 2007) e refere para o Rio Gurupi (divisa
entre Pará e Maranhão), mas não possui informações detalhadas da localidade; o registro
visual publicado (Silva, 1993) indica a presença da espécie no centro da cidade de Santarém
(PA) sem mais informações e por isso não foi mapeado. Outros pontos de localidades
encontrados no mapa compilado por Oren e Novaes (1986) não foram considerados devido à
falta de informação precisa das localidades. Além disso, alguns registros tiveram suas
localidades definidas de forma aproximada de acordo com a descrição nas publicações ou
inferências baseadas em outros registros (veja, por exemplo, Oren e Novaes 1981). Algumas
14
publicações compilaram registros já publicados, tais como Collar et al. (1992), de modo que
foram considerados as informações das publicações originais. Duas outras compilações foram
feitas por Cynthia Schuck Paim (in litt. 2006) e por Luís Fábio Silveira (in litt. 2007) e da
mesma forma a maioria dos registros foram referenciados à respectiva publicação original.
Figura 2. Distribuição de todas as localidades de registros publicados ou não da
Guarouba gu arouba
, mais as
localidades de registros incertos de presença e trechos e localidades em que expedições e pesquisas não
detectaram a espécie.
Durante a expedição no sudeste do Amazonas em 2006, obtivemos sete registros
incertos de localidades de presença da ararajuba (Apêndice B). Outros 21 registros incertos
foram obtidos durante a pesquisa da espécie na região do Parque Nacional da Amazônia
(Apêndice B). A ararajuba é citada como presente na Estação Ecológica de Apiácas na página
da internet do Instituto Sócio Ambiental (www.socioambientel.org), mas não há informações
detalhadas da localidade nem sobre os autores e data do inventário, por isso uma localidade
aproximada na área dessa unidade de conservação foi considerada como registro incerto.
15
Área de ocorrência total, histórica e atual
De acordo com a técnica do mínimo polígono convexo, a distribuição dos registros
totaliza uma área de ocorrência total conhecida de 960 mil km
2
, mas excluindo as áreas
descontinuas entre registros pela técnica do “Polígono-Alfa” esse número fica reduzido a 530
mil km
2
. Até meados da década de 1980, a espécie era conhecida apenas para os estados do
Maranhão e do Pará, em 26 localidades (Oren e Willis 1981 e Oren e Novas 1986). No final
da década de 1980 e inicio da década de 1990, novos registros adicionaram à distribuição da
ararajuba localidades no norte dos estados do Mato Grosso e de Rondônia (Yamashita e
França 1991, Lo 1995), embora tenham deixado um vasto espaço entre essas localidades e o
oeste do Pará. E nos últimos anos, novas observações e evidências incluem uma porção do
sudeste do estado do Amazonas na área de ocorrência (Luke Parry, in litt. 2007). Por outro
lado, após 1987 não houve registros no extremo leste/nordeste da área.
Então, após 1987 houve uma houve uma expansão das regiões contempladas com
registros da ararajuba em 620 mil km
2
em direção a oeste e sul (pela técnica do “Polígono-
Alfa” a área de ocorrência expandiu em 242 mil km
2
ao sudoeste, 22 mil km
2
a noroeste e 28
km
2
a sudeste – total de expansão 292 mil km
2
) e uma retração de 86 mil km
2
na porção leste
(pelo “Polígono-Alfa” equivale a 82 mil km
2
no leste e 18 mil km
2
ao centro – total de
retração 100 mil km
2
). Portanto, para os últimos 20 anos os registros contemplam uma área de
825 mil km
2
(pela técnica do “Polígono-Alfa”, 380 mil km
2
). Se subtrairmos as áreas
desmatadas (total acumulado – INPE 2006) da área de ocorrência dos últimos 20 anos pela
técnica do “Polígono-Alfa”, a área contemplada se reduz a aproximados 320 mil km
2
, isto é
60% dos 530 mil km
2
totais (Figura 4).
Figura 3. Área de ocorrência da ararajuba (
Guarouba guarouba
) até e após 1987. Em A, pela técnica do Mínimo
Polígono Convexo (MPC); em B, pela técnica do “Polígono-Alfa” adaptada (PALFA).
16
Figura 4. Área de ocorrência da ararajuba nos últimos 20 anos, sobreposta ao “arco do desmatamento” na
Amazônia.
A ararajuba no sudeste do Amazonas, registros incertos de presença e ausências
Não tivemos sucesso em encontrar a ararajuba no sudeste do Amazonas. Nos mais de
1.300 quilômetros percorridos e quase 10 dias de observações e entrevistas, a espécie só foi
detectada já no estado do Pará, ao norte de Jacareacanga-PA. De modo geral, poucos
moradores relataram conhecer a ararajuba, mas, mesmo assim, apenas para localidades no
estado do Pará. De qualquer forma, ainda foram obtidos seis registros incertos da presença da
espécie para afluentes do rio Madeira e para localidades na transamazônica nas proximidades
de Jacareacanga (Figura 2). Os outros registros incertos obtidos (durante a pesquisa na região
do PNA) sugerem a presença da ararajuba em diversas localidades, principalmente
comunidades tanto ao norte de Itaituba, como ao sul, em vilas nas margens do rio Tapajós e
em seus afluentes esquerdos. Para a “rodovia transgarimpeira” (estrada endógena da BR-163)
a presença da ararajuba é ressaltada e com veemência, sugerindo alta abundância da espécie.
Os registros incertos são concentrados na porção oeste da distribuição da ararajuba, e estão
entre localidades de registros confirmados da espécie.
17
Por outro lado, diversos trabalhos e inventários feitos também nessa mesma porção da
distribuição não registraram a ararajuba (veja Figura 2). Para várias localidades da Floresta
Nacional do Tapajós a ararajuba não foi detectada (Henriques, 2003). Mario Cohn-Haft (com.
pess. 2007) nunca registrou a espécie no baixo e médio rios Madeira e Aripuanã, apesar de
esforços de dezenas de dias ao longo de vários anos. Roth (1984) não detectou a espécie no
alto Aripuanã. Na porção mais ao norte, Luís Fábio Silveira (in litt. 2007) também não
detectou a ararajuba em trechos do Rio Abacaxis. No início do século passado (1909), a
expedição de Snethlage não registrou a espécie entre os rios Tapajós e Xingu (Oren e Willis
1981). Mesmo para algumas localidades na região de Alta Floresta a espécie nunca foi vista
em vários anos de pesquisas e observações de aves (Zimmer et al. 1997). Na década de 80,
Oren e Novaes (1986) não encontraram a espécie no sudeste do estado do Pará (na Serra dos
Carajás nem em Gorotire, sudeste do estado).
Modelagem da distribuição potencial
De modo geral, os modelos gerados com as três bases de dados, previram áreas com
condições mais propícias de ocorrência (isto é, maiores que 0.5) distribuídas em diferentes
interflúvios, mas concentradas ao sul do rio Amazonas (Figura 5). Outras áreas na margem
esquerda do rio Amazonas e mais ao norte (em Roraima e no Amapá) também foram
contempladas com condições mais propícias de ocorrência previstas, assim como áreas a oeste
do rio Madeira, na altura da divisa entre Rondônia e o Amazonas. Os modelos se ajustaram
bem aos dados, uma vez que um alto valor de AUC foi obtido tantos para os dados de treino
como para os dados de teste (Tabela 1). A vegetação foi a variável mais importante na
construção dos modelos, mas contribui com menos de 40%, um pouco mais em um dos
modelos, para determinar os resultados (Tabela 1 e Figura 6).
18
Figura 5. Mapas resultantes da modelagem da distribuição potencial da ararajuba. A – modelagem com todas as
localidades de registros confirmados; B – modelagem com apenas as localidades de registros distantes de rios; C
– modelagem com todas as localidades de registros mais as de registros incertos de presença.
19
Tabela 1. Valores de AUC e contribuição relativa de cada variável utilizada
para as modelagens da distribuição potencial da ararajuba com base nos 3
tipos de base de dados. A – Dados das localidades de todos os registros
confirmados. B – Dados das localidades dos registros distantes de rios. C
Localidades de todos os registros confirmados mais os registros incertos.
Base de Localidades
“a”
“b”
“c”
AUC
Treino
0,924
0,913
0,897
Teste
0,827
0,814
0,926
Variáveis
Vegetação
38,6
48,6
30,8
Amplitude na Temperatura
27,1
25,6
30,9
Índice de Walsh
22,5
23,3
28,5
Altitude
11,8
2,5
9,8
Figura 6. Distribuição das localidades de registros da
Guarouba guarouba
em função de duas variáveis
ambientais. A – vegetação; B – Amplitude da temperatura média mensal.
20
Assim, os modelos geraram resultados semelhantes. As poucas diferenças consistem
na continuidade e abrangência das áreas previstas e na contribuição relativa da altitude para
determinação dos resultados. No caso do modelo com todas as localidades, incluindo registros
incertos, as áreas com condições propícias de ocorrência prevista são mais amplas, assim
como no modelo com base apenas nos registros confirmados distantes de rios. De qualquer
forma, os mapas indicam que a ararajuba apresenta uma distribuição potencial que segue um
eixo leste-oeste. As previsões evitam as áreas mais centrais da Amazônia, região dos rios
Negro e Solimões e afluentes, e áreas mais periféricas ao sul, região dos afluentes e das
cabeceiras dos rios (Serra do Cachimbo, Serra do Carajás, como exemplos), como também ao
norte.
Discussão
Este trabalhou apresentou a mais atualizada e completa compilação dos registros da
ararajuba. Inclui novas localidades em que a espécie foi registrada nos últimos anos e também
o único registro confirmado da espécie no estado do Amazonas. O maior número de registros
no estado do Pará é condicionado ao maior esforço de pesquisas e trabalhos dedicados às
regiões deste estado. Além disso, traz informações de possíveis localidades de ocorrência da
espécie, de modo a ser referência para a procura de novas populações.
Área de ocorrência histórica e atual
O padrão de retração na porção leste da distribuição da ararajuba, após 1987, pode ser
explicado pelo aumento da área desmatada no Maranhão e no leste do Pará já nas décadas de
1970 e 1980 (Fearnside 2005). Isso fez com que a espécie não fosse mais registrada em
diversas localidades, de modo a já em meados da década de 1980 ser considerada
extremamente ameaçada em geral e extinta localmente nessa porção da distribuição (Oren e
Novaes 1986). Por outro lado, possivelmente não haja registros da ararajuba nessa região
devido à ausência de pesquisas nos últimos anos. Mesmo assim, não há evidência de que a
ararajuba sobreviva em locais completamente desflorestados (veja Capítulo 2), de modo que
essa retração deve ser considerada válida.
Já a expansão da área de ocorrência em direção a oeste e sul talvez seja mais bem
explicada pelo aumento de esforço de coletas e expedições em tais localidades do que por
uma expansão populacional ou colonização. A espécie pode não ter sido detectada nas poucas
expedições nessa região feitas anteriormente, devido à sua baixa densidade ou à sua complexa
ocorrência em menor escala (veja Capítulo 2). Além disso, não há qualquer evidência de
21
deslocamento populacional do oeste do Pará para essas regiões, mas não se pode confirmar
nenhuma das alternativas. De qualquer forma, é uma expansão proporcionada por registros
isolados, o que não significa que a espécie ocorra em toda a área de expansão. Além do mais,
ambos os registros estão nas regiões mais desmatadas na Amazônia atualmente, dentro do
“arco do desmatamento”, onde as projeções de preservação futuras são pessimistas (Fearnside
2005, Soares-Filho et al. 2006, Malhi et al. 2008).
Portanto, nos últimos 20 anos, os registros se limitam principalmente à porção central
e oeste do estado do Pará, na região do rio Tapajós e entre os baixos rios Xingu e Tocantins,
além da presença sazonal na região da Floresta Nacional de Caxiuanã. Registros recentes em
duas localidades no Maranhão (Reserva Biológica do Gurupi e Reserva Florestal do Grupo
Celulose Maranhão) e em outras três áreas no leste do Pará (Rio Capim, Reserva Florestal do
Grupo Agropalma e Represa do Tucuruí) demonstram a sobrevivência de populações nessa
porção da distribuição. Portanto, considerando a área de ocorrência total como original e a
ocorrência ainda incerta da ararajuba na porção oeste, a área de ocorrência da ararajuba foi
reduzida em pelo menos 40% nos últimos anos, compreendendo, no presente, provavelmente,
bem menos do que os 320 mil km
2.
Registros incertos de presença, ausências de evidências e evidências de ausência.
Embora nem todos os registros incertos de presença apresentem a mesma
confiabilidade, a maioria deles é para localidades situadas dentro das regiões de
descontinuidades entre os registros confirmados, o que os torna bastante prováveis.
Entretanto, inventários e expedições de diferentes durações feitas nas proximidades das
localidades em que há registros incertos de presença da espécie não detectaram a ararajuba.
Por exemplo, na Floresta Nacional do Tapajós, Henriques et al. (2003) não registrou a
ararajuba em diversas localidades, enquanto que Kyle (2005) detectou vários bandos ao longo
do rio Cupari, que é o limite oeste dessa unidade de conservação. Embora ausências de
evidência não signifiquem necessariamente evidências de ausência isso pode significar que a
ararajuba apresenta uma presença agrupada ou uma distribuição espacial não homogênea, de
modo a estar limitada, em uma escala regional, a trechos onde se encontram ou concentram-se
os recursos reprodutivos e alimentares necessários (veja Capítulo 2). Em outro sentido, pode
ser resultado de um comportamento social específico, que faz com que a espécie se mantenha
agrupada em locais que não necessariamente apresentam condições ótimas para sua
sobrevivência. Já para outras localidades, a ausência relatada da espécie pode corresponder
aos limites de ocorrência da ararajuba (baixo rio Aripuanã e baixo e médio rio Madeira).
22
De todo modo, todas essas informações evidenciam que a associação da ararajuba com
o ambiente em escala local, regional ou geográfica é bastante complexa e isso reflete na sua
distribuição e área de ocorrência. Oren e Novaes (1986) sugeriu que a espécie seria associada
à Floresta Ombrófila Submontana, mas vários dos registros conhecidos (por exemplo, na
Floresta Nacional de Caxiuanã) estão em localidades que não abrangem esse tipo de
vegetação (veja Figura 6). Essa relação com o ambiente, ou seja, o habitat, é muito usada para
projetar a distribuição das espécies. Entretanto, para a ararajuba a vegetação parece não ser a
única variável que caracteriza o seu habitat.
Modelagem da distribuição potencial
Os modelos previram condições mais propícias de ocorrências para algumas regiões
de descontinuidade entre registros confirmados e para algumas regiões periféricas, onde há
registros incertos da ocorrência da espécie. Boa parte da região sudeste do estado do
Amazonas é contemplada. Além disso, as regiões entre o baixo Tapajós e baixo Xingu, bem
como entre este último e o baixo Tocantins apresentam áreas com altas previsões. Os altos
valores de AUC calculados com base nos registros incertos, como dados de teste, tanto
corroboram a provável presença da espécie nesses locais, como validam o poder de previsão
do modelo.
O modelo com todos os registros confirmados apresentou uma maior contribuição
relativa da altitude, de modo que alguns corpos hídricos foram contemplados com condições
mais propícias de ocorrência previstas. Isso foi razoavelmente evitado pelo modelo com base
apenas nas localidades “distantes” de rios, no qual a influência da altitude é menor, sem que,
de modo geral, as áreas com condições mais propícias previstas mudem demasiadamente. As
regiões de descontinuidades entre registros continuam com condições propícias de ocorrência
previstas pra espécie e o modelo prevê mais áreas a leste do médio Rio Tapajós, na região do
Rio Jamanxim. Além disso, a região de Alta Floresta, que foi omitida do modelo com todos
os registros, é contemplada, embora seja com valores mais baixos de previsão.
Complementarmente, considerando o modelo com todos os registros confirmados mais os
registros incertos, as áreas com condições mais propícias de ocorrência são semelhantes.
Uma limitação do modelo é evidenciada pela previsão de condições propícias de
ocorrência da ararajuba em áreas nos estados de Roraima e Amapá, uma vez que não há
qualquer evidência ou registros incertos da presença da espécie nessas regiões. Essa limitação
poderia ser contornada pela incorporação de variáveis como barreiras geográficas, origens
históricas ou relações competitivas (Pulliam 2000). O mesmo vale para as áreas na margem
23
esquerda do Rio Amazonas. O Rio Amazonas certamente é uma forte barreira geográfica,
considerando a largura do rio e a presença de vastas áreas de ambientes (campos inundáveis e
várzea) teoricamente não utilizados pela espécie ao longo das margens. Assim, a ocorrência
da ararajuba ao norte do rio é muito pouco plausível (A. Aleixo, in litt. 2008). Desta forma,
desconsiderando essas áreas em que não há qualquer evidência da presença da ararajuba, os
modelos sugerem condições mais propícias de ocorrência para as regiões onde conhecemos a
espécie e onde esperamos que a espécie ocorra, com base na união dos registros em um
polígono, ou mesmo com base nos registros incertos.
Visualizando isoladamente cada variável utilizada nas modelagens, os modelos
resultantes parecem fazer sentido. Os registros são concentrados em uma faixa intermediária
de amplitude de variação média na temperatura (veja Figura 6). Similarmente, também em
uma posição intermediária quanto ao índice de Walsh. Quanto à vegetação, os registros
parecem se limitar à uma interface entre Floresta Ombrófila Submontana e Floresta Ombrófila
de Terras Baixas. O mesmo acontece para a altitude, no qual os registros se concentram em
uma área de interface entre as áreas mais baixas da Amazônia e áreas mais elevadas na borda
do Planalto Central. Nesse sentido, embora intuitivamente apenas a vegetação possa ser
importante para a ocorrência da ararajuba, as outras camadas utilizadas se não são importantes
diretamente podem estar associadas a outros fatores que estariam influenciando na presença
da espécie.
A ararajuba tem o costume de pernoitar em cavidades de árvores, e uma das
explicações para esse comportamento é o controle da temperatura (Collar 1997). Se isso é
válido, a ocupação da espécie pode ser associada às variações na temperatura local no
ambiente. Assim, maiores variações de temperatura (friagens) poderiam limitar a distribuição
da espécie ao sul e a oeste, enquanto que características associadas à vegetação poderiam
limitar a ocorrência da espécie ao norte. Além disso, a oeste e norte a espécie seria limitada
pelas barreiras geográficas formadas pelo rio Madeira e rio Amazonas.
Essas variáveis combinadas, portanto, ajudariam a explicar melhor a distribuição da
ararajuba. As áreas, no sudeste da Amazônia, com condições mais propícias de ocorrência
previstas nas modelagens podem ser visitadas, de modo que, caso se confirme a presença da
espécie, o modelo poderá ser ainda mais corroborado. Caso contrário, pode evidenciar que
outras variáveis e interações, ou mesmo o comportamento da ararajuba, devam ser mais
importantes para a manutenção de uma população em uma determinada região.
24
Áreas protegidas, cenários futuros e conservação
A ararajuba tem sua distribuição em um faixa central no leste da Amazônia,
sobreposta parcialmente com o “arco do desmatamento”. Com isso, nos últimos 20 anos, a
espécie parece ter perdido pelo menos 40% de terreno habitável. Em dois cenários futuros
projetados, com base na modelagem do desmatamento na Amazônia (Soares-Filho et al.
2006), a porção norte e leste da distribuição da ararajuba é devastada nos próximos 25 anos.
Se a ações governamentais não frearem os ritmos do desflorestamento, os limites sul e oeste
devem ser também devastados (cenário mais pessimista). Assim, as esperanças concentram-se
na região central da distribuição, principalmente ao longo do Rio Tapajós, e possivelmente até
o rio Xingu.
Essas sérias ameaças na porção leste devem nortear as ações conservacionistas. A
ararajuba é uma ave carismática e emblemática que pode ser bandeira para conservação dessa
região peculiar e que abriga vários outras espécies endêmicas em diferentes grupos
taxonômicos (Silva et al. 2005). Dessa forma, por garantir não somente a sua sobrevivência,
iniciativas de pesquisa e conservação com a espécie nessa região são necessárias, de modo
que não podemos tomar a população sobrevivendo atualmente como perdida. Essa
possibilidade pesa para a importância de brigar pela sobrevivência da espécie na porção leste.
Por outro lado, investir em pesquisas e na conservação das populações na porção oeste deve
garantir a perpetuação da ararajuba na natureza (Kyle 2005). Nos últimos anos, várias
unidades de conservação foram criadas nessa região.
A procura por novas populações no sul e no oeste da distribuição da ararajuba é uma
das medidas de conservação propostas pela BirdLife International (2007). Essa proposta de
ação é reiterada pelas altas condições de ocorrência previstas para essa região através da
modelagem da distribuição potencial. Embora não foi possível registrar a espécie diretamente
ao longo da transamazônica na expedição feita em julho de 2006, os registros incertos são
prováveis e podem revelar a existência de maiores populações sobrevivendo na região. Além
disso, alguns registros já confirmados evidenciam a sobrevivência da espécie nessa porção
(veja o registro no rio Maués). De qualquer forma, as iniciativas que visem explorar a região
na procura da espécie devem considerar as peculiares interações dos bandos em escala mais
localizada além das sugestões e indícios procedentes de entrevistas com moradores e
trabalhadores nativos.
Enfim, este trabalho resulta na mais atualizada compilação de registros da ararajuba e
na estimativa mais precisa da sua provável distribuição real, a qual aponta para áreas em que
buscas devem obter sucesso. As unidades de conservação na região oeste da sua distribuição
25
representam as maiores esperanças para a espécie, as quais devem garantir sua sobrevivência
em mais longo prazo. As mudanças temporais encontradas na área de ocorrência são
associadas a alterações ambientais antrópicas, por um lado, e provavelmente às diferenças nos
esforços de pesquisas na região, pelo outro. A uniformidade da área de ocorrência deve variar
ao longo do eixo leste-oeste da distribuição e a ocupação dos bandos em uma escala mais
localizada ainda é incerta, o que deve refletir aspectos como densidade populacional ou
comportamento social. Desta forma, as informações sobre sua história natural, tais como
comportamento, sociabilidade, recursos alimentares e biologia reprodutiva devem ajudar a
entender a associação da ararajuba com o ambiente, bem como ajudar a saber como proteger
esse emblemático psitacídeo brasileiro.
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29
Apêndice A.
Listagem de todos as 59 localidades de registros para a ararajuba (Guarouba
guarouba) ordenadas por unidade federativa brasileira, de leste para oeste e em ordem
cronológica. As coordenadas geográficas das localidades de registro foram omitidas para
proteger as populações atuais da espécie. Estas podem ser obtidas via solicitação ao autor ou à
curadoria da Coleção de Aves do Instituto Nacional de Pesquisas na Amazônia. *Data
aproximada; (1) Localidades excluídas da base de dados de registros em “terra-firme” veja
Métodos; (2) Localidades que não foram mapeadas.
Maranhão
1909 Serra do Pirocaua. Três espécimes depositados no MPEG (#06838, #06839, #
06840). Coletor: Lima, F.
1980 Drenagem do rio Pindaré (1). Registro visual. Referenciado por Silva (1989
Compilação feita por Cynthia Schuck Paim).
1983 Área do Gurupi. Registro visual. Referenciado por Silva (1989 Compilação feita
por Cynthia Schuck Paim).
1999 Fazenda Primavera do grupo Celulose Maranhão. Registros visuais ao longo dos
anos de 1998 e 1999, referenciados por Fabio Rohe (com. pess. 2008). Acompanhado de
informações do comportamento, ambientes utilizados, alimentação e quantidades de bandos e
indivíduos.
2001* - Reserva Biológica do Gurupi. Registros visuais referenciados por Carlos
Yamashita (in litt. 2008 – Compilação feita por Luís Fábio Silveira).
Pará
1903 Rio Maracanã, Santo Antônio da Prata (1). Um espécime depositado no MPEG
(#02646). Coletores: Schönmann, J./Rodrigues, R. S. Registro visual referenciado por
Senthlage (1914 – Compilação Cynthia Schuck Paim).
1906 Rio Gurupi (1). Registro visual referenciado por Hidasi (1973 Compilação feita
por Cynthia Schuck Paim).
1908 Estação experimental do Peixe-Boi (1). Um espécime depositado no MPEG
(#05886). Coletor: Martins, O. Registro de avistamento(s) referenciado por Snethlage (1914 –
Compilação feita por Cynthia Schuck Paim).
30
1909 Rio Xingu, Vitória (1). Um espécime depositado no MPEG (#06614). Coletor:
Snethlage, E.
1912 Margem Esquerda do Rio Tocantins, Arumatheua (1). Dois espécimes depositados
no Museu Nacional do Rio (#3443, #3444) e um no MPEG (#10273). Coletor: Lima, F.
Registro visual referenciado por Snethlage (1914 – Compilação Cynthia Schuck Paim).
1920 Rio Tocantins (1). Dois espécimes depositados no MZUSP (#11057, #11058).
Coletor: Lima, F.
1932 – Vizeu (1). Um espécime depositado no MPEG (#13938). Coletor: Lima, F.
1939 Rio Pracupi, margem direita do baixo Amazonas, Portel (1). Um espécime
depositado no MPEG (#28129). Coletor: Lasso.
1955 – Córrego Murucutum, Rio Gurupi, Camiranga (1). Quatro espécimes depositados no
Museu Nacional do Rio de Janeiro (#1461, #1462, #1482, #1487). Coletor: sem informação.
Registro visual referenciado por Aguierre e Aldrigui (1983 Compilação feita por Cynthia
Schuck Paim).
1959 Rodovia Belém-Brasília (BR-163) km-93. Oito espécimes depositados no MZUSP
(#43976, #43977, #43978, #43979, #43980, #43981, #43982, #43983). Coletor: Dente. Dois
espécimes depositados no MPEG, um em 1959 (#15586) e outro em 1962 (#28130). Coletor:
José Hidasi.
1962 Fordlândia, Margem direita do Rio Tapajós (1). Registro visual referenciado por
Silva (1989 Compilação feita por Cynthia Schuck Paim). Três espécimes depositados no
MZUSP, sendo um coletado em 1964 (#56313) e outros dois coletados em 1971 (#64772,
#64771). Coletor: Olalla.
1967 – Rio Gurupi (2). Um espécime comprado pelo MPEG (#28256).
1974 Transamazônica (BR-230) entre Altamria e Marabá (leste do Rio Xingu). Registro
visual referenciado por Oren e Willis (1981).
1974 – Altamira. Registro visual referenciado por Silva (1989 – Compilação Cynthia
Schuck Paim).
1974 – Transamazônica (BR-230) entre Altamira e Itaituba. Registros visuais em três
diferentes pontos referenciados por Oren e Willis (1981).
1974 – Itaituba. Registro visual referenciado por Silva (1989 – Compilação feita por
Cynthia Schuck Paim).
1974 Transamazônica (BR-230) km-186 a sudoeste de Itaituba. Registro visual
referenciado por Oren e Willis (1981).
31
1977 Sítio em Deus, km-24, Igarapé Pedral, afluente do Rio Guamá, Ourém (1). Um
espécime depositado no MPEG (#32083). Coletor: Moreira, M.
1978 Transamazônica (BR-230) km-60 a sudoeste de Itaituba, Base Uruá, Parque
Nacional da Amazônia. Registro visual referenciado por Oren e Willis (1981).
1978 – Transamazônica (BR-230) km-95 a sudoeste de Itaituba, Parque Nacional da
Amazônia. Registro visual referenciado por Oren e Willis (1981).
1980 Dezoito km a leste do rio Tocantis, Tucuruí. Registro visual referenciado por Oren
e Willis (1981).
1985 Porto do Buburé, rio Tapajós, Parque Nacional da Amazônia (1). Registro visual
referenciado por Oren e Parker (1997).
1989 Santarém (2). Registro visual referenciado por Silva (1993 Compilação feita por
Cynthia Schuck Paim).
1992 Vilarinho do Monte (1). Registro visual referenciado por Collar et al. (1992
Compilação Cynthia Schuck Paim).
1998 – Fazenda Caxauí, cerca de 100km a sudoeste de Paragominas. Registro visual
referenciado por A. Aleixo (in litt. 2007).
2002 Rio Capim (1). Registro visual referenciado por Kyle (in litt. 2007). Acompanhado
de informações do comportamento, ambientes utilizados, alimentação e quantidades de
bandos e indivíduos.
2002 Rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163), 239 km ao norte de Novo Progresso, Trairão.
Registro visual referenciado por Pacheco e Olmos (2005).
2004 Arredores do Rio Cupari, limites da Floresta Nacional do Tapajós. Registro visual
referenciado por Kyle (2005).
2005* Reserva Florestal Cia Pará Pigmentos, Ipixuna. Registro visual compilado por L.
F. Silveira (in litt. 2007).
2005 – Reserva Florestal do Grupo Agropalma, Tailândia. Registro visual referenciado por
Silveira e Belmonte (2005).
2005 20 km a sudoeste de Novo Progresso. Registro visual referenciado por A. Aleixo
(in litt. 2007).
2005 Transamazônica (BR-230), 145 km a sudoeste de Itaituba, Parque Nacional da
Amazônia. Registro visual referenciado por T. Kyle (in litt. 2006). Acompanhado de
informações do comportamento, ambientes utilizados, alimentação, nidificação e quantidades
de bandos e indivíduos.
32
2005 Transamazônica (BR-230), 162 km a sudoeste de Itaituba, Parque Nacional da
Amazônia. Registro visual referenciado por T. Kyle (in litt. 2006). Acompanhado de
informações do comportamento, ambientes utilizados, alimentação e quantidades de bandos e
indivíduos.
2005 Transamazônica (BR-230), 250 km a sudoeste de Itaituba. Registro visual
referenciado por T. Kyle (in litt. 2006). Acompanhado de informações do comportamento,
ambientes utilizados, alimentação e quantidades de bandos e indivíduos.
2005 Transamazônica (BR-230), 90 km ao norte de Jacareacanga. Registro visual
referenciado por T. Kyle (in litt. 2006). Acompanhado de informações do comportamento,
ambientes utilizados, alimentação e quantidades de bandos e indivíduos.
2006 Represa de Tucuruí, margem direita (1). Registro visual referenciado por S. M.
Dantas (in litt. 2006). Acompanhado de gravação da voz e de informações da quantidade de
indivíduos.
2006 Represa de Tucuruí, margem esquerda (1). Registro visual referenciado por S. M.
Dantas (in litt. 2006). Acompanhado de gravação da voz e de informações da quantidade de
indivíduos.
2006 Floresta Nacional de Caxiuanã (1). Registro visual referenciado por R. M. Valente
(in litt. 2006). Acompanhado de informações sobre alimentação e comportamento da espécie
e descrição do ambiente utilizado.
2006 Monte Carmelo, Prainha (1). Registro visual referenciado por I. Rohling (in litt.
2006). Acompanhado de fotografia, descrição do ambiente e de informações sobre o tamanho
e comportamento do bando.
2006 Transamazônica (BR-230), 50 km ao norte de Jacareacanga. Registro visual (obs.
pess.)
2007 Proximidades do Rio Pacajás, 100km a noroeste de Tucuruí, Portel. Registros
visuais referenciado por S. M. Dantas (in litt. 2008) em duas localidades distantes cerca de
20km. Acompanhados de informações do tamanho do bando e do ambiente.
2007 – Margem direita da volta grande do rio Xingu - Belo Monte. Registro visual
referenciado por S. M. Dantas (in litt. 2008). Acompanhado de gravação da voz e informações
sobre o ambiente e o tamanho do bando.
2007 Transamazônica (BR-230) 48 km a sudoeste de Itaituba. Registros visuais (obs.
pess.)
33
2007 Transamazônica (BR-230), base Uruá, Parque Nacional da Amazônia. Registros
visuais (obs. pess.)
2007 Transamazônica (BR-230) 110 km a sudoeste de Itaituba, Parque Nacional da
Amazônia. Registros visuais (obs. pess.).
2007 Transamazônica (BR-230) 130 km a sudoeste de Itaituba, Parque Nacional da
Amazônia. Registros visuais (obs. pess.).
2007 Transamazônica (BR-230) 185 km a sudoeste de Itaituba. Registros visuais (obs.
pess.)
2007 Transamazônica (BR-230) 200 km a sudoeste de Itaituba. Registros visuais (obs.
pess.)
2007 Transamazônica (BR-230) 245 km ao norte de Jacareacanga. Registros visuais
(obs. pess.).
2007 – Transamazônica (BR-230), 70 km ao norte de Jacareacanga. Registros visuais (obs.
pess.).
Mato Grosso
1991 – Alta Floresta. Registro visual referenciado por Lo (1995). Em 1995, registros
visuais referenciados por M. Cohn-Haft (com. pess. 2007).
Amazonas
2007 – Comunidade Laranjal, Rio Maués/Amana – Maués (1). Registro visual referenciado
por L. Parry (in litt. 2007). Acompanhado por descrição do ambiente, data precisa, foto e
informações sobre o comportamento do bando.
Rondônia
1989 Floresta Nacional do Jamari. Registro visual referenciado por Yamashita e França
(1991).
Referencias:
Aguierre, A. C e A. D. Aldrighi (1985) Catálogo de aves do Museu da Fauna I. IBDF.
Ministério dos Interiores.
34
Hidasi, J (1973) Catálogo de aves do Brasil, especialmente do Centro Oeste e da Amazônia.
Lista dos Exemplares existentes na coleção do Museu de Ornitologia. Cuiabá. Companhia
do Desenvolvimento do Estado do Mato Grosso. 91p.
Kyle, T (2005) Gold Rush - The search for Golden Conures in western Pará, Brazil.
PsittaScene 17:2-5.
Lo, V. K. (1995) Extensão da distribuição de Guaruba guarouba para o norte do Estado de
Mato Grosso, Amazônia Meridional (Psittaciformes: Psittacidae). Ararajuba 3:93-94.
Oren, D. C., e E. O. Willis. (1981) New Brazilian Records for the Golden Parakeet (Aratinga
guarouba). Auk 98:394-396.
Oren, D. C., e T. A. P. III (1997) Avifauna of the Tapajós National Park and Vicinity,
Amazonian Brazil. Ornithological Monographs 48:493-525.
Pacheco, J. F., e F. Olmos (2005) Birds of a latitudinal transect in the Tapajós-Xingu
interfluvium, eastern Brazilian Amazonia. Ararajuba 13:29-46.
Silveira, L. F., and F. J. Belmonte (2005) Comportamento reprodutivo e hábitos da Ararajuba,
Guarouba guarouba, no município de Tailândia, Pará. Ararajuba 13:89-93.
Snethlage, H. (1914). Catálogo de aves amazônicas contendo todas as espécies descritas e
mencionadas até 1913. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi 8: 1-530.
Yamashita, C., e J. T. França (1991) A range extension of the Golden Parakeet Aratinga
guarouba to Rondônia state, western Amazonia (Psittaciformes: Psittacidae). Ararajuba
2:91-92.
35
Apêndice B.
Registros incertos de presença da ararajuba (Guarouba guarouba) obtidos na
expedição no sudeste do Amazonas, em 2006, e durante a pesquisa da história natural da
espécie na região do Parque Nacional da Amazônia (PNA), em 2007.
Expedição entre Humaitá-AM e Jacareacanga-PA:
Rio Maracanã, 120km ao sul de Apuí-AM
Cachoeira do Monte Cristo, rio Sucunduri, ao sul da comunidade Terra Preta (Amazonas)
Transamazônica (BR-230) a oeste de Jacareacanga no estado do Pará.
Transamazônica (BR-230) ramal para a comunidade Vila Nova, leste de Sucunduri
(Amazonas).
Rio Acari, leste do AM-360 (Amazonas).
Rodovia AM-360, km-60, Igarapé Canadá (Amazonas)..
Entrevistas durante a pesquisa no PNA:
Comunidades ao norte do PNA
Pote
Mãe Maria
Boa Esperança
São Emanuel
Nova Arixi
Nova Conquista
Nova Fronteira
Nova Integração
Comunidades e sítios ao sul do PNA
Ilha da Montanha
Rio Amaná
Vila do Jatobal
Vila Penedo
Comunidades e outras localidades à margem direita do rio Tapajós
Vila Pimental
Cachoeiras do Jamanxim
Igarapé do Rato
36
Rio Crepori
Rio das Tropas
Comunidades ao longo da BR-163 e da rodovia “transgarimpeira” (vicinal a oeste da BR-
163)
Trairão
Comunidade do Caracol
Vila Jardim do Ouro (“transgarimpeira”), Rio Jamanxim
Comunidade São Chico (“transgarimpeira”)
Km100 (comunidade/vila na “transgarimpeira”)
Km 140 (comunidade/vila na “transgarimpeira”)
Comunidade do Creporizinho (“transagarimpeira”)
Comunidade do Creporizão (“transgarimpeira”)
Capítulo II (Artigo 2)
Formatado de acordo com as instruções da Revista Brasileira de Ornitologia
História natural e conservação da ararajuba (
Guarouba guarouba
Psittacidae) no Parque Nacional da Amazônia e vizinhança, Pará
Thiago Orsi Laranjeiras
1
, Mario Cohn-Haft
2
, Toa Kyle
3
1
Pós-graduação em ecologia, Instituto Nacional de Pesquisas na Amazônia, [email protected],
2
Instituto
Nacional de Pesquisa na Amazônia, Curadoria de Aves,
3
World Parrot Trust, USA
Resumo
A ararajuba é uma espécie endêmica da Amazônia brasileira, ameaçada de extinção e
de biologia pouco conhecida. Este trabalho visou melhorar o conhecimento sobre seu
comportamento, população, dieta, reprodução e habitat, a fim de subsidiar a conservação da
espécie. Conduzimos observações na região do Parque Nacional da Amazônia durante o ano
de 2007. A ararajuba foi encontrada em grandes bandos de tamanho variável, mas o número
de indivíduos pernoitando juntos permaneceu o mesmo ao longo dos dias. Registramos um
índice de abundância médio de 0.8 ind/km. Em comparação com outros psitacídeos a
ararajuba está entre as espécies mais registradas e é mais comum do que se supunha. Com
base nos padrões de ocupação e detecção foi estimado que a espécie ocupe praticamente toda
a transamazônica ao longo do rio Tapajós. As contagens em dormitórios e a localização de
bandos resultaram em uma estimativa de pelo menos 484 indivíduos sobrevivendo na região.
Foram obtidos 84 registros de alimentação de itens de 11 espécies arbóreas, mas não se trata
de uma dieta oportunista. Não encontrei indícios de deslocamentos em função da alimentação
nem nomadismo na área de estudo ao contrário do suposto. Quatorze dormitórios (sendo oito
ninhos) foram localizados em áreas abertas sujeitas à alta perturbação humana, mas não há
evidência de especialização quanto à espécie arbórea ou à estrutura da árvore necessária para
nidificação. Os ninhos continuaram sendo usados como dormitório durante o período não-
reprodutivo. A taxa média de juvenis nos clãs (menos de 1:7) evidencia baixa taxa
reprodutiva. Caso se confirme o seu sistema social e reprodutivo, no qual apenas um casal em
cada clã é reprodutivamente ativo, as estimativas de tamanho populacional deverão ser
reconsideradas. A ararajuba ainda sofre de perseguição para venda ilegal e pelo desmatamento
contínuo. Novas pesquisas deverão focar na sua suposta associação com ambientes alterados e
nos aspectos reprodutivos dos clãs para entender melhor a vulnerabilidade da espécie.
Palavras-chave: espécie ameaçada, comportamento, estimativa populacional, hábitos
alimentares e reprodutivos, vulnerabilidade.
38
Introdução
A ararajuba (Guarouba guarouba) é uma espécie de psitacídeo de porte médio,
endêmica da Amazônia brasileira. Atualmente, é considerada ameaçada de extinção, na
situação de em perigo (BirdLife International 2007). Essa classificação é justificada pela
pequena população mínima estimada (menos de 2.500 indivíduos), “que é nômade ao longo
dos rios”, e pela perda de habitat e pela extensiva captura para o tráfico ilegal de animais
silvestres (BirdLife International 2007).
O desmatamento intensivo e a fragmentação florestal tanto no leste como no sul da
Amazônia são as principais ameaças à sobrevivência da ararajuba (Juniper e Parr 1998), cuja
distribuição coincide com o “Arco do Desmatamento” (Olmos 2005). Na porção leste (oeste
do Maranhão e leste do Pará) a caça para o tráfico de animais põe sérios riscos à sua
conservação, e na porção sul (oeste do Pará), a construção de rodovias, como a
transamazônica (BR-230) e a Cuiabá-Santarém (BR-163), proporciona a expansão das cidades
e estabelecimentos de novas frentes de colonização, destruindo boa parte de seu habitat
natural (Juniper e Parr 1998, Kyle 2005, BirdLife International 2007). Assim, a situação da
ararajuba na natureza está longe de ser considerada segura (Silveira e Belmonte 2005).
Não obstante, poucos estudos têm sido feitos com essa espécie na natureza, sobretudo
nos últimos anos. Silveira e Belmonte (2005) reportaram hábitos e comportamento
reprodutivo de um único ninho no leste do Pará, e Kyle (2005) relatou aspectos gerais da
presença de populações e alimentação mais ao oeste deste estado, na região da rodovia
transamazônica e no Parque Nacional da Amazônia e na Floresta Nacional do Tapajós. Antes
disso, apenas Oren e Novaes (1986) estudaram a ararajuba, produzindo informações básicas
da distribuição, alimentação, reprodução e ameaças. As poucas informações biológicas sobre
a espécie estão sintetizadas em compilações de espécies ameaçadas (BirdLife International
2007) e em discussões gerais sobre psitacídeos (Collar 1997; Sick 1997; Juniper e Parr 1998).
Outras informações publicadas consistem nos registros de novas localidades (veja Oren e
Willis 1981, Yamashita e França 1991, Lo 1995) ou em aspectos genéticos de indivíduos
cativos (Albertani et al. 1997, Tavares et al. 2004).
A estimativa da população global da espécie, a partir da qual foi definido o status atual
da ararajuba, é indireta e oriunda de extrapolação de dados não derivados de estudo
sistemático (BirdLife International 2007). Além disso, embora existam citações de números
referentes ao tamanho dos bandos (Oren e Novas 1986, Oren e Parker 1997, Pacheco e Olmos
2005), os padrões de agrupamento não são definidos, nem espacialmente nem temporalmente.
Os deslocamentos sazonais, embora citados, não são entendidos nem previsíveis (Juniper e
39
Parr 1998). Também não há informações sobre relações interespecíficas de competição,
repartição de nicho ou substituição geográfica, em escala local ou regional, ou intra-
específicas. Sem a precisão de tais números e a previsão dos movimentos ou de ocupação,
tanto o estudo como o manejo e a proteção de um psitacídeo na natureza tornam-se subjetivos
e impraticáveis (Pizo et al. 1995, Pizo 2002).
Quanto à alimentação, vários itens (das flores aos frutos e sementes) de diferentes
espécies, como açaí (Euterpe spp.), caju (Anacardium spp.), murici (Byrsonima crassifolia) e
anani (Symphonia globulifera), dentre outras, são citados como parte da dieta da ararajuba, o
que evidencia pouca especialização alimentar (Collar 1997, Sick 1997, Juniper e Parr 1998).
Recentemente, na Floresta Nacional de Caxiuanã, têm-se associado a presença da ararajuba à
floração do anani, próxima aos rios (R. M. Valente, in litt. 2006) e, no oeste do Pará, Kyle
(2005) relata muitos registros de alimentação da semente do murici. Entretanto, não há
informações de variações regionais ou sazonais e nem de deslocamentos em função de
alimento (Oren e Novas 1986, Juniper e Parr 1998).
Mais complexo ainda parece ser o comportamento e as relações reprodutivas.
Diferentemente da maioria dos outros psitacídeos, e especialmente das araras, as ararajubas
permanecem em grupo no período reprodutivo (Sick 1997, Juniper e Parr 1998). Uma
investigação inicial dos bandos na natureza sugere que estes são familiares, formados pelo
casal e por jovens de diferentes gerações (Reynolds 2003), mas em cativeiro as aves
reproduzem-se comunitariamente, com mais de um casal em um mesmo ninho, criando vários
filhotes de fêmeas diferentes (Oren e Novas 1986, Collar 1997, Juniper e Parr 1998). Além
disso, paternidade extra-par (inseminação de uma fêmea por dois machos diferentes) já foi
registrada em cativeiro (Albertani et al. 1997). Outros aspectos da reprodução, como a
quantidade de ovos e filhotes na ninhada e o sucesso reprodutivo, além das características
físicas do ambiente e do ninho ainda permanecem incertos.
Todas as informações disponíveis sobre a ararajuba parecem evidenciar complexidade
espacial e temporal ainda muito mal conhecida nas suas interações com o habitat. O estudo da
ecologia e história natural de qualquer espécie é importante para entender e tentar reverter sua
ameaça (Valladares-Padua et al. 2003). As estimativas populacionais e o conhecimento dos
padrões de agrupamento (variação no tamanho dos bandos) procedem à definição do status da
espécie na região e identificam suas interações ecológicas e respostas a impactos antrópicos
(Nunes e Betini 2002, Pizo 2002). A descrição dos recursos alimentares indica quais itens são
os mais importantes pra sobrevivência dessas aves, em determinados períodos do ano ou em
diferentes localidades (Galetti 2002), permitindo prever a ocorrência local da espécie e
40
facilitando o seu manejo. Conhecer o sistema social e reprodutivo é importante para
determinar as taxas de crescimento populacional e sua susceptibilidade a alterações
ambientais e conseqüentemente os padrões de colonização e extinção local (Guedes e Seixas
2002). Com o conhecimento do comportamento facilita-se o estudo da espécie em campo e
proporciona melhorias das condições de indivíduos em cativeiro (Valladares-Padua et al.
2003). Desta forma, este trabalho teve como objetivo entender o habitat, descrever os padrões
de agrupamento, estimar o tamanho populacional e descrever a dieta, a biologia reprodutiva e
comportamento da ararajuba, a fim de subsidiar a conservação da espécie, como também para
melhor compreender sua biologia e sua susceptibilidade à extinção.
Área de Estudo
Este estudo foi conduzido na região do Parque Nacional da Amazônia (PNA),
município de Itaituba, no estado do Pará, e em áreas vizinhas tanto ao norte como ao sul do
parque, à margem esquerda do rio Tapajós (4,56º S, 56,30º W). A rodovia transamazônica
(BR-230), que atravessa a porção leste do parque do km-53 ao km-165, margeando o rio
Tapajós, incluindo ramais associados, foi a principal via de acesso às áreas amostrais e
observacionais (Figura 7). A largura da estrada varia de menos de 10 a 40 metros em
diferentes trechos. O PNA conta com duas bases de vigilância e visitação, ambas ao lado da
transamazônica: a base “Tracoá” localiza-se na entrada da unidade, no km-53; e a base
“Uruá” encontra-se no km-65 (veja Figura 7). Nas proximidades dessas duas bases existem
diversas trilhas de diferentes comprimentos. Externamente ao sul da reserva, existem
comunidades, fazendas e sítios, além de acampamentos de garimpeiros e de funcionários de
manutenção da estrada.
41
Figura 7. Localização do Parque Nacional da Amazônia (PNA) e da transamazônica (BR-230), no canto inferior
direito, à margem esquerda do Rio Tapajós, aonde o estudo com a ararajuba foi realizado. Os trechos mais
escuros na transamazônica mostram o posicionamento (os números correspondem à numeração dos quilômetros)
e o comprimento dos transectos delimitados para as amostragens populacionais. As setas indicam a localização
das bases de visitação e vigilância do PNA.
Os tipos de vegetação predominantes na área de estudo se enquadram como floresta
ombrófila densa submontana e de terras baixas, em um relevo levemente ondulado e com as
maiores árvores atingindo altura de 50 metros (RADAM-Brasil 1975 apud Oren e Parker
1997). Ao longo da transamazônica, a vegetação é secundária e apresenta alto grau de
mortalidade de árvores (observações pessoais – Figura 8). Na porção norte, fora do parque,
encontram-se pastagens ao longo da estrada, que se estendem por pelo menos dois km até a
borda da mata contínua. Dentro do PNA, a floresta é contínua e quase sempre bem próxima à
estrada. Na porção sul, fora dos limites do parque, enquanto em alguns trechos a mata ainda
encontra-se ao lado da estrada, em outros pode distar até dois km. O clima é quente úmido,
com três a cinco meses secos. A precipitação média anual varia de 1800 a 2300mm (Moraes
et al. 2005).
42
Figura 8. Trecho da transamazônica (BR-230) dentro do Parque Nacional da Amazônia
Métodos
As observações da ararajuba foram realizadas sob três diferentes abordagens: procura
e localização de bandos, amostragens populacionais e observações focais (em sítios
reprodutivos ou alimentares). Dentro disso, anotamos o tamanho, comportamento e as rotas
dos bandos, contamos indivíduos em trechos predeterminados, descrevemos o uso dos
recursos alimentares e caracterizamos sítios reprodutivos e dormitórios. Para estes fins,
coletamos os dados tanto de forma sistemática como de forma oportunista visando obter o
máximo de informações sobre a espécie na natureza.
Procuramos localizar bandos principalmente ao longo da transamazônica, e em trilhas
existentes nas proximidades das bases do PNA, aonde percorremos a pé, de bicicleta ou de
moto trechos de distâncias variáveis em busca de sinais auditivos ou visuais da ararajuba. Esta
abordagem visou explorar a área no intuito de detectar possíveis locais preferenciais dos
bandos, como sítios alimentares, poleiros e rotas de deslocamento, bem como para tentar
associar a presença da ararajuba a algum ambiente. Assim, uma vez encontrado um bando,
este era acompanhado até que fosse perdido de vista.
As amostragens populacionais compreenderam a contagem tanto da ararajuba como de
outros psitacídeos em diferentes trechos da transamazônica (veja abaixo). No percurso de ida
fizemos a contagem de indivíduos de espécies de psitacídeos e no percurso de volta,
procuramos por eventos alimentares nas proximidades da estrada.
43
Conduzimos observações focais nos sítios alimentares ou reprodutivos localizados.
Para tal, nós chegávamos ao local no inicio da manhã ou da tarde, antes da chegada das aves
(no caso de sítios alimentares). De um ponto com ampla visibilidade da localidade, nós
anotávamos em um caderno de campo o horário e a descrição de cada atividade dos
indivíduos e dos bandos, tais como descolamentos entre árvores, números de indivíduos no
bando, presença de juvenis, reação à presença de outras espécies, manutenção da plumagem,
alimentação de juvenis, vocalização e aspectos de interação entre os indivíduos. Usamos
binóculos 10x40 e luneta 10-30x50 para as observações (veja abaixo).
Complementarmente entrevistamos moradores e trabalhadores da região no intuito de
obtermos indicações do conhecimento local da ararajuba. Anotamos as sugestões de
localidades de presença da espécie (sítios alimentares e reprodutivos), itens alimentares
consumidos em outras épocas do ano e informações da presença da espécie em anos
anteriores. Também anotamos informações sobre a utilização da espécie como animal de
estimação e como caça e relatos sobre ataques a plantações.
Padrões de agrupamento
Em relação aos padrões de agrupamento da ararajuba adaptamos dois termos com base
nas minhas observações (veja Resultados): clã e bando. O termo clã é definido como o
conjunto de indivíduos que pernoitam agrupados na mesma árvore (dormitório) ao longo dos
dias. Um clã seria composto por indivíduos provavelmente aparentados, liderados por um ou
mais casais, no qual as outras aves seriam juvenis de diferentes gerações (Reynolds 2003). O
termo bando seria simplesmente o conjunto de ararajubas visualizado em uma ocasião
qualquer, sem referência ao contexto da observação. Assim, a visualização das ararajubas em
bando pode se referir a um clã, parte de um clã, a um agrupamento de clãs ou de partes de
clãs. Adequar esses termos teve o intuito de facilitar a compreensão dos padrões de
agrupamento da espécie uma vez que o termo bando é utilizado por diferentes autores para
diferentes situações sem referência clara à unidade social (por exemplo, usa-se bando para as
centenas de indivíduos deixando um dormitório, mas não para as dezenas destes freqüentando
um sítio alimentar – veja Pizo 2002).
Com base nessas adequações, consideramos todos os contatos com bandos durante o
período de estudo para descrever e determinar possíveis padrões de agrupamento. Um contato
era registrado assim que um bando fosse visualizado e o número de indivíduos pudesse ser
contado. Assim que perdia-se o contato visual com o bando, devido ao seu deslocamento, a
próxima visualização de um bando de tamanho diferente era considerada um novo registro.
44
Caso um bando contado se dividisse, anotavam-se mais dois registros considerando o novo
número de indivíduos de cada bando, e o horário em questão, e caso o bando fosse
acompanhado por várias horas, um novo registro era validado a cada 100 minutos,
considerando os diferentes blocos de horário (veja abaixo). Também contamos a quantidade
de juvenis dentro dos bandos, que puderam ser identificados devido à sua plumagem,
comportamento e vocalização diferenciada.
Desta forma, cada registro foi considerado independente, embora em uma mesma
localidade os registros pudessem ser condicionados ao tamanho original do bando (por
exemplo, um bando de 16 ararajubas se dividido não resultaria nunca em dois bandos de 10
indivíduos). Assim, os valores encontrados para o tamanho dos bandos foram comparados
através de análises de variância (ANOVA), com auxílio do software Systat 10.0 (SPSS 2000),
em função dos períodos do dia e das épocas do ano e, também, entre as localidades. Para tal, o
período diurno foi dividido oito blocos de horário, a cada 100 minutos, iniciando às 05:20 h e
com fim às 18:40 h. O ano foi dividido em quatro épocas, considerando o regime de chuvas e
em três, considerando o período reprodutivo da espécie (Tabela 2 – veja Resultados). Já as
localidades foram categorizadas de acordo com a região relativa à escala do estudo,
considerando os limites do PNA e a distância de perturbação humana (Tabela 2).
Adicionalmente, efetuei uma regressão simples para verificar se houve correlação entre a
quantidade de juvenis encontrados em cada bando e o tamanho total dos bandos.
Tabela 2. Categorias temporais e espaciais em que o tamanho dos bandos e a índice de
abundância da ararajuba foram comparados.
Porção
Trechos da BR-230
Época
Meses
Período
Meses
Norte
km-40 até km-85
chuvosa
jan a mar
Reprodutivo
nov a mar
Centro
km-85 até km-150
fim da chuvosa
abr a jun
Pós-reprodutivo
abr a mai
Sul
km-150-350
seca
jul a set
Nào-reprodutivo
Jun a out
fim da seca
out a dez
Amostragens – índice de abundância e densidade
Para as amostragens populacionais, optamos pelo método de transecto de área fixa
(Nunes e Betini 2002). Sete transectos de 12 quilômetros foram delimitados ao longo da
transamazônica tanto dentro como fora do PNA (Figura 7). O método consistiu em percorrer
os transectos de 12 km (ou T12), em uma bicicleta, com velocidade média entre 6 e 8 km/h, e
registrando todos os indivíduos visualizados e/ou escutados em cada lado do caminho.
Percorremos um transecto por dia, a uma taxa de seis a oito km/h, entre 6:00 e 9:00hs, período
45
de maior atividade dos psitacídeos (Roth 1984, Gilardi e Munn, 1998, Pizo 2002). A duração
de cada amostragem foi de aproximadamente duas horas. A amostragem de todos os sete
transectos foi feita em sete dias, não necessariamente consecutivos. Isso foi feito em três
ocasiões durante a pesquisa, de acordo com os períodos em que o ano foi dividido: uma vez
no fim da época chuvosa, outra na época seca e a terceira no início da época chuvosa (veja
Tabela 2). Adicionalmente, reamostramos três dos sete transectos (054-066, 068-080, 194-
206) em dois dos períodos discriminados (fim da época chuvosa e época seca). Assim, 27
amostragens foram realizadas durante o estudo.
A distribuição e o espaçamento, de no mínimo de dois km, entre os transectos seguem
motivos logísticos. Os transectos ao norte localizam-se nas proximidades das bases “Uruá” e
“Tracoá”. Fizemos um acampamento entre os transectos na porção central. Na porção sul fora
do PNA, ficamos hospedados em sítios de agricultores ou acampamentos de funcionários de
manutenção da estrada localizados nos limites dos transectos.
Para determinar o comprimento dos transectos levamos em consideração as
amostragens pilotos. Em janeiro de 2007 percorremos à pé trechos de 6 km (partes dos
transectos 040-052, 054-066, 068-080), também ao longo da transamazônica, a uma taxa de
3km/hora. Entretanto, o baixo registro de bandos de quaisquer espécies de psitacídeos fez com
esse método fosse considerado insatisfatório. Em março, realizamos amostragens em trechos
de 8km (partes dos transectos 040-052, 054-066, 068-080, 180-192 e 194-206), percorridos
em bicicleta, a uma velocidade variando de 6 a 10km/hora. Nesse caso, embora os encontros
com espécies de psitacídeos tenham sido bem maiores do que nos trechos de 6km percorridos
a pé, o tempo de observações nas amostragens foi bem menor. Assim, optamos pelos
transectos de 12km.
A opção por transectos de área fixa foi feita a posteriori. Consideramos uma largura
de dois km para cada lado da estrada, de modo que a área de cada transecto ficou equivalente
a 48 km
2
. Para determinar essa área levei em consideração os registros de bandos diferentes
em localidades próximas e a localização de diversos dormitórios de diferentes indivíduos que
distam entre um e seis km (veja Resultados – Biologia Reprodutiva). Além disso, não foi
possível a aplicação do método de distância variável (Buckland 1993), devido a baixo número
de contatos e possivelmente pelo viés causado pelos registros restritos às bordas da estrada.
Portanto, a opção pelo método de área fixa, é uma alternativa conservadora, uma vez que não
há como garantir que todos os indivíduos nessa área de 48 km
2
sejam registrados.
Portanto, as amostragens nos T12 resultaram em taxas de encontro com as aves (ou
índice de índice de abundância) e em estimativas de densidade. As distâncias dos registros
46
não foram consideradas e, de modo a evitar duplas contagens dos mesmos indivíduos, as aves
em sobrevôo com mesmo sentido em que o transecto é percorrido foram ignoradas. Para as
estimativas de densidade, a área é fixa e o número de indivíduos contatados foi fracionado por
essa área. Desse modo, as taxas de encontro foram expressas em indivíduos (ou bandos) por
quilômetro percorrido (ind/km ou ban/km) ou por hora (ind/h ou ban/h) e a estimativa de
densidade em indivíduos por área amostrada (ind/km
2
). Para verificar possíveis diferenças
espaciais ou temporais no índice de abundância, o teste não-paramétrico de Kruskal-Wallis foi
utilizado.
Em maio, conduzimos uma amostragem ao longo da transamazônica desde o inicio do
PNA, próximo a Itaituba, até a cidade de Jacareacanga (ainda no Pará, 340 km ao sul). Este
transecto (TIJ – Transecto entre Itaituba e Jacareacanga) foi conduzido a uma velocidade
média de 25 a 30 km/hora, no período de 6:00 às 10:00 e de 15:30 às 18:00 h, durante 3 dias.
Da mesma maneira que nos T12, registramos todos os indivíduos identificados em cada lado
do caminho, de modo que os resultados também foram expressos em ind/km ou ban/km. Essa
atividade teve o intuito de repetir a mesma amostragem feita em 2005 por T.K.
Simultaneamente à amostragem populacional da ararajuba, registramos os contatos
com outras espécies de psitacídeos ao longo dos transectos. Isso foi feito para comparar o
índice de abundância entre as espécies não ameaçadas de psitacídeo e a ararajuba. Além disso,
para também poder identificar possíveis relações entre algumas dessas espécies com a
ararajuba quanto à presença, exclusão ou abundância, tanto espacialmente, como
temporalmente. Uma atenção especial foi dedicada a Diopsittaca nobilis, em função dessa
espécie ser a mais aparentada filogeneticamente a ararajuba (Tavares et al. 2004) e pela
suspeita de que possa ocorrer uma substituição geográfica entre estas espécies, uma vez que
suas distribuições têm limites próximos nas regiões periféricas sul e leste da Amazônia (veja,
por exemplo, Juniper e Parr 1998).
Probabilidades de detecção e de ocupação
A não detecção de uma espécie em um local não significa que ela esteja ausente, ao
menos que a probabilidade de detecção seja 1 (Mackenzie et al. 2002). O método para estimar
a taxa de ocupação quando essa detecção é menor do que 1 é baseada na modelagem da
probabilidade de detecção. Essa modelagem usa os padrões de detecção e não detecção,
oriundos de repetidas amostragens em uma série de localidades, e com base na máxima
verossimilhança estima os valores de probabilidade de detecção e ocupação que melhor se
ajustam a esses padrões. A utilização desse método exige que a espécie não seja falsamente
47
detectada e que os locais de amostragens não sejam abandonados nem ocupados após o início
da amostragem.
Desta forma, para estimar os valores de detecção e ocupação da ararajuba na região
estudada, os sete transectos de 12 km foram particionados em trechos de quatro km, de modo
que apenas os trechos iniciais e finais de cada transecto foram considerados. Supusemos,
portanto, que os trechos são independentes entre si. Isso significa que um mesmo bando da
ararajuba não pode ocupar mais de um trecho. Para cada amostragem em um trecho atribuí o
valor de 1, se registramos pelo menos um bando ou um indivíduo da ararajuba, e 0 se não
detectamos a espécie. Supusemos também que a área de ocupação de cada trecho equivale a
16 km
2
e que a probabilidade de detecção é chance de encontrar um bando da espécie nas
proximidades da estrada, quando ela pode estar em qualquer lugar distante da rodovia nessa
área de 16 km
2
. Os cálculos foram feitos no software Presence 2.1 (Hines 2006).
O método ainda incorpora informações perdidas, de modo que permite que alguns
trechos não amostrados em todas as ocasiões sejam incluídos na modelagem. Nesse sentido,
para alguns trechos em alguns transectos, além das três ocasiões em que amostramos todos,
incluimos os dados das reamostragens (veja acima) e as amostragens pilotos (janeiro e
março). Desta forma, 14 trechos foram considerados em sete ocasiões.
Com o intuito de extrapolar os valores para a região, o TIJ também foi particionado
em trechos de quatro km, totalizando 43 trechos válidos, intercalados. Desse modo, com base
nos valores de ocupação e detecção obtidos pelas sete ocasiões de amostragens nos trechos
dos T12, tem-se uma estimativa dos trechos que a espécie ocorre em toda a área da
transamazônica considerada no TIJ.
Tamanho populacional mínimo e estimativas populacionais
O tamanho populacional mínimo da população da ararajuba na região foi acessado de
diferentes formas. Em um primeiro momento, consideramos os registros obtidos no TIJ. Em
seguida, consideramos a contagem de indivíduos nos dormitórios conhecidos. Outra
estimativa foi obtida com base na soma dos bandos para os quais se conhecia os dormitórios
mais os bandos para os quais não o localizei, mas que foi possível de diferenciar uns dos
outros.
Para o último caso, para ter certeza de que um bando encontrado em uma localidade
não é o mesmo que de outra localidade consideramos os seguintes critérios determinados a
posteriori: (a) distância, assumindo que as ararajubas possuem áreas preferenciais, e
permanecem relativamente limitadas a alguns trechos da rodovia (veja resultados); (b) direção
48
do vôo, de modo que os registros obtidos no mesmo dia foram diferenciados de acordo com a
direção do deslocamento; e (c) tamanho do bando, uma vez que freqüentemente os clãs
permanecem agrupados na maior parte do dia, embora possam se separar em algumas
ocasiões (veja Resultados). Consideramos todos esses critérios em conjunto para estabelecer
se um bando que vi em determinado local é diferente de outro que vi em outra localidade. Por
exemplo, consideramos dois registros como referentes a dois bandos diferentes porque os vi
em uma mesmo dia seguindo direções contrárias, além de apresentarem tamanhos diferentes e
estarem a oito km de distância um do outro. Por outro lado, as observações de dois bandos,
um de 16 e outro de 19, em diferentes dias, em localidades próximas (menos de quatro km) e
em direções que davam a entender um poderia usar a mesma localidade do outro, não permite
dizer que ali existem 35 indivíduos, mas sim que existem pelo menos 19.
Para as estimativas de tamanho populacional para a área de estudo e para a região da
área de estudo, consideramos os valores de densidade obtidos com as amostragens e as
probabilidades de ocupação e detecção. O método mais aceito para estimativa do tamanho da
população de uma espécie abundante e comum em censos é com base na extrapolação da
densidade em relação à área estimada de ocupação (Bibby et al. 2000, Tobias e Brightsmith
2007). Extrapolamos a estimativa da densidade para toda a área que provavelmente é ocupada
por bandos da espécie, com base na distância da transamazônica ao rio Tapajós e com base
nos registros diretos da espécie. Essa área equivale a 4.000 km
2
em um trecho de 200 km (isto
é, do km-40 até o km-240) na transamazônica com 20 km de largura. Em segunda instância,
fizemos uma extrapolação para a região mais ampla da área de estudo, com base nos registros
incertos de presença da espécie, em localidades próximas, obtidos nas entrevistas com
moradores e trabalhadores locais. Nesse caso, a área considerada é de 10 mil km
2
, equivalente
a um trecho de 340 km no Rio Tapajós (isto é, do limite norte do PNA até a cidade de
Jacareacanga) com uma largura de 30 km.
Descrição dos recursos alimentares utilizados e comportamento alimentar
A descrição da dieta da ararajuba foi realizada por meio de observação direta, sempre
que um bando ou indivíduo foi visto alimentando-se ao longo dos trechos na transamazônica e
nos ramais ou trilhas, considerando também as observações não sistematizadas (veja acima).
O método utilizado consistiu em registros de alimentação (ou Feeding-Bouts, veja Galetti
2002). Nesse método, cada registro é a observação das aves se alimentando em um indivíduo
da planta consumida. Por exemplo, se um bando de 8 indivíduos de ararajuba foi visto
alimentando-se em uma bacabeira (Oenocarpus bacaba) foi anotado um registro, mas se uma
49
ou mais ararajubas voarem para outra bacabeira, anotou-se outro registro, embora a espécie
consumida seja a mesma. Assim, cada registro conteve: horário e data; localidade
georreferenciada; espécie vegetal utilizada; recurso consumido (fruto, flor, broto ou semente);
tempo de utilização do recurso; e quantidade de indivíduos no bando. Caso a espécie vegetal
não fosse identificada no momento da observação, coletamos amostras dos frutos caídos para
identificação posterior. Para os registros realizados durante as amostragens populacionais, não
foi considerado o tempo de utilização do recurso. Nesses casos, a espécie vegetal consumida
foi identificada ou teve amostras coletadas posteriormente. A identificação dos itens foi
auxiliada pela curadoria da Carpoteca do Instituto Nacional de Pesquisas na Amazônia.
Devido ao fato de recentemente a ararajuba ter sido vista comendo murici (Byrsonima
sp.) com freqüência (v. Introdução), esta espécie foi monitorada para caracterização
fenológica, com o objetivo de associar a presença ou abundância da ararajuba à sua
frutificação. Em cada transecto, tentamos acompanhar o maior número de indivíduos visíveis
à partir da estrada.
Para descrever o comportamento alimentar da espécie, assim que um bando era
registrado em alguma árvore com frutos ou flores, tentava-se verificar comportamentos de
vigilância, alimentação de juvenis, agressividade entre indivíduos ou entre bandos, tempo de
alimentação e manipulação dos itens, deslocamento entre árvores. Isso foi feito para
determinar quais são os hábitos mais destacáveis dos indivíduos e dos bandos quando em
alimentação.
Biologia reprodutiva
Entrevistas com moradores e trabalhadores da região foram conduzidas para localizar
sítios reprodutivos e dormitórios (potenciais ninhos) da espécie ao longo da área de estudo.
Uma vez que a espécie é extremamente conspícua, essa foi a melhor alternativa para localizar
os ninhos na região. Além disso, caso um bando fosse visto nos últimos minutos do dia, a
direção do seu deslocamento era determinada, de modo que permitiria seguir o bando até o
seu sítio reprodutivo.
A caracterização do sítio reprodutivo foi feita de acordo com os termos e
procedimentos descritos em Guedes e Seixas (2002). Cada árvore localizada era
georreferenciada e descrita quanto à sua condição (viva ou morta), altura, diâmetro na altura
do peito (DAP), presença de galhos, quantidade de cavidades, e localização da cavidade. Da
mesma forma, o ambiente em seu arredor era descrito, quanto a presença de vegetação,
50
distância da mata e sujeição à perturbação humana. Em escala regional, os ninhos em
conjunto foram classificados quanto à distribuição espacial.
Para descrever os hábitos e comportamento reprodutivo da espécie, observações focais
foram conduzidas nos sítios localizados. Para tal, nós nos posicionávamos a uma distância de
cerca de 30 metros do ninho. O tempo de observação foi bastante variável de modo que em
alguns ninhos permanecemos apenas duas horas ou menos, principalmente no final e no início
do dia, enquanto em outros as observações duraram o dia todo, em algumas ocasiões. Nessas
observações, buscamos anotar os comportamentos destacáveis dos indivíduos nos bandos,
como vigilância, agressividade, reação a presença de outros bandos e outras espécies,
alimentação de juvenis, cuidados com a plumagem e socialização.
Ao longo do estudo, os ninhos foram acompanhados de forma não sistemática.
Durante o período não-reprodutivo os ninhos foram acompanhados para verificar se as aves
continuavam usando a árvore como dormitório. Diferentes esforços de observação foram
dedicados em cada período e para cada ninho/dormitório (veja Resultados). De qualquer
modo, foi possível abordar as diferentes fases reprodutivas e descrever o período de
reprodução e o ciclo anual da espécie.
Resultados
Conduzimos aproximadamente 900 horas de observações na região do PNA, em quase
160 dias de campo distribuídos em oito meses do ano. Despendemos mais de 360 horas na
procura e localização dos bandos e seus locais preferenciais. Para as amostragens
populacionais, nós dedicamos mais de 290 horas. Nos sitos alimentares e reprodutivos,
conduzimos observações focais em mais de 250 horas.
Padrões de Agrupamento
As ararajubas foram encontradas isoladas, aos pares ou em bandos de 3 a 40
indivíduos em um total de 513 contatos. A média observada para o tamanho dos bandos é de
10,2 indivíduos, com um desvio padrão de 6,3. Bandos de cinco, seis e sete ararajubas foram
detectados mais freqüentemente (Figura 9), compreendendo mais de um quarto (29%) dos
contatos. Bandos de 3, 9 e 17 indivíduos também foram comuns. Vinte e um clãs foram
diferenciados durante a pesquisa, que podem referir a um mesmo conjunto de indivíduos em
diferentes épocas do ano. Não encontrei clãs com menos de quatro indivíduos nem com mais
de 20. A média do tamanho dos clãs é de 12,1 indivíduos, com mais de um terço deles com
mais de 15 ararajubas. Com as observações nos dormitórios e nos ninhos, notamos que os clãs
51
permaneciam com o mesmo número de indivíduos ao longo dos dias. Em alguns dormitórios,
percebemos uma mudança no tamanho do clã apenas de uma época do ano para outra, em
outros o tamanho permaneceu o mesmo.
Figura 9. Distribuição do número de contatos por tamanho de bando da ararajuba encontrados na região do
Parque Nacional da Amazônia.
Em relação a outros psitacídeos, a média do tamanho dos clãs da ararajuba ficou entre
as maiores, semelhante à de Aratinga leucophtalma (Tabela 3). A A. leucophtalma, assim
como Pionus menstruus, foi visualizada em bandos grandes, com mais de 40 indivíduos, mas
aves sozinhas não foram incomuns. Outras araras (Ara macao e Ara chloropterus) embora
tenham sido encontradas em bandos de até 12 indivíduos, foram contatadas mais
freqüentemente em bandos de dois a quatro aves. Já para Orthopsittaca manilata não foram
incomuns registros de bandos com mais de 10 aves, com grupos de até 30 indivíduos, embora
a média tenha sido de 5,6 aves. Os papagaios do gênero Amazona foram registrados
principalmente aos pares. No Rio Tapajós, localizamos um dormitório de A. farinosa e A.
amazonica, com mais de 250 indivíduos, de onde estes papagaios partiam em grandes bandos
mistos (mais de 30). Já para Deroptyus accipitrinus, bandos de três a seis indivíduos foram
mais típicos. Tamanhos de bando semelhantes também foram encontrados para periquitos
(gênero Brotogeris), embora estes tenham formado grandes agrupamentos (mais de 20 aves,
em algumas ocasiões). Pyrrhura perlata quase sempre foi registrada em bandos de cinco a
52
oito indivíduos. Gypopsitta vulturina foi encontrada principalmente aos pares, embora em
duas ocasiões registrei bandos de mais de 20 indivíduos.
Tabela 3. Tamanho médio, máximo e mínimo dos bandos (e desvio padrão)
de outras 15 espécies de psitacídeos, na região do Parque Nacional da
Amazônia.
Espécie
Média
DP
Máx
Mín
Ara ararauna
2.40
1.52
5
1
Ara macao
2.51
1.76
8
1
Ara chloropterus
2.40
1.06
12
1
Ara severus
3.75
1.71
6
2
Orthopsittaca manilata
5.62
6.47
30
1
Aratinga leucophtalma
10.88
15.41
75
1
Pyrrhura perlata
6.12
4.34
18
1
Brotogeris versicolorus
9.20
12.32
30
1
Brotogeris chrysoptera
3.00
2.38
40
1
Gypopsitta vulturina
1.75
0.71
22
1
Pionus menstruus
5.34
7.77
38
1
Amazona ochrocephala
2.69
2.25
9
1
Amazona amazonica
4.10
6.32
50
1
Amazona farinosa
2.86
5.38
30
1
Deroptyus accipitrinus
3.17
1.99
7
2
Detectamos entre um e quatro juvenis nos bandos de ararajuba em 35 contatos (Figura
10). Não houve qualquer relação entre o tamanho do bando e a quantidade de juvenis (p =
0.134). Bandos grandes (20 indivíduos ou mais) continham tanto um ou dois juvenis como
três ou quatro, da mesma forma que bandos pequenos. Assim, a taxa de juvenis por bando é,
em média, de um para cada sete indivíduos adultos ou juvenis.
Figura 10. Quantidade de juvenis em relação ao tamanho do bando da ararajuba (
Guarouba guarouba
).
53
Padrões temporais e espaciais de agrupamento.
Não houve diferença significativa do tamanho de bando em relação aos períodos do
dia (F = 1.4, p = 0.19). Em quase todos os horários do dia foram detectados bandos de quase
todos os tamanhos (Figura 11), mas bandos com mais de 20 indivíduos foram detectados
principalmente no meio da manhã (7:00 às 10:00).
Figura 11. Variabilidade no tamanho dos bandos da ararajuba registrados ao longo do dia.
Foi detectada variação significativa no tamanho dos bandos contatados em relação às
épocas do ano e ao período reprodutivo (respectivamente, p = 0.000; e p = 0.001 – Figura 12 e
13). Na época chuvosa (janeiro a março), a média (8 a 9 indivíduos) foi menor ficou do que
no fim da época chuvosa (abril a junho – 11 a 12 indivíduos). Na época seca e no início da
época chuvosa, a média no tamanho dos bandos foi semelhante (entre 9 e 11 indivíduos).
Durante o período reprodutivo, a média no tamanho dos bandos também foi menor (8 a 9
indivíduos), enquanto que no período pós-reprodutivo e não-reprodutivo, os bandos foram
encontrados com uma média de 10 a 12 indivíduos. Também houve variação na média do
tamanho dos bandos entre as porções da área de estudo consideradas (p = 0.000). Na porção
central, os bandos foram, em média, menores (7 a 8 ararajubas) do que na porção norte ou sul
(10 a 11 – Figura 14).
54
Figura 12. Variação no tamanho dos bandos da ararajuba de acordo com as épocas do ano, na região do Parque
Nacional da Amazônia.
Figura 13. Variação no tamanho dos bandos da ararajuba de acordo com a época reprodutiva.
55
Figura 14. Variação no tamanho dos bandos da ararajuba em relação às porções da área de estudo.
Padrões de agrupamento nos sítios reprodutivos e alimentares
Nas observações focais, em cada sítio reprodutivo acompanhado, notamos
agrupamentos e desagrupamentos do clã. No início do período reprodutivo, ao fim do dia,
observamos a formação de pares que realizam deslocamentos curtos para árvores próximas,
onde ficavam se acariciando e se bicando. No mês de janeiro, ao longo do dia, notamos que
parte do clã permanece na árvore ninho para a incubação. Em um clã de seis indivíduos,
vimos que apenas uma ararajuba permanecia no ninho. Para clãs maiores, detectamos que de
duas a quatro ararajubas podem permanecer dentro da árvore. Em todos os casos, o restante
do clã se afasta para obtenção de alimento, provavelmente permanecendo agrupado. Nesse
mesmo período, durante a manhã, voltam aos arredores do sítio duas ou três vezes para
alimentação dos indivíduos que ficaram dentro da árvore. Nos horários mais quentes do dia,
estes indivíduos (o bando que saiu para alimentação) pousam em uma árvore com sombra
para descansar e permanecem praticamente em silêncio. Em algumas ocasiões também, parte
do bando que saiu para buscar alimento pode voltar ao sítio reprodutivo, aparentemente,
apenas para verificar a situação do ninho. Em alguns sítios reprodutivos, notamos que parte
do clã pernoita em outra árvore próxima, na mesma área, ou distante uns 100 a 300 metros,
mas só se separam do restante do clã um pouco antes do sol se pôr e voltam aos arredores da
árvore-ninho imediatamente após o sol nascer. Após o primeiro vôo dos filhotes, vimos a
formação de bandos menores que realizam deslocamentos entre as árvores nos arredores do
56
sítio reprodutivo, mas voltam por variados motivos (socialização, interação com outros
bandos e com outros psitacídeos) à árvore onde o restante do clã se encontra.
Nos sítios alimentares observados, notamos também um padrão de agrupamento
diferenciado. Em algumas localidades, a impressão que tivemos foi de que os bandos se
hostilizavam, vocalizando freneticamente e ininterruptamente. Nessas ocasiões, os bandos não
se agrupavam, cada qual permanecendo em sua árvore de alimentação até que no fim da
manhã ou da tarde, cada bando pegava uma rota diferente, completamente contrária à do
outro. Por outro lado, em outros sítios, detectamos agrupamentos grandes de ararajubas se
alimentando em uma mesma árvore, que após se alimentarem formavam bandos distintos cada
qual seguindo seu rumo. Em locais com grande abundância do item alimentar, vimos
agrupamentos em deslocamentos curtos entre árvores, que em algumas vezes se separavam e
em outras não.
Padrões populacionais
Com as amostragens nos transectos, em mais de 80 horas de observação e mais de mil
km percorridos, obtivemos números sobre a abundância da ararajuba (índice), incluindo em
comparação a outros psitacídeos, além de valores sobre ocupação e detecção, densidade e
estimativas do tamanho populacional.
Índice de abundância
Registramos um índice de abundância para a ararajuba variando de zero a 3,58
indivíduos (ou 0,42 bandos) por km percorrido (Figura 15), com uma média de 0,87 ind/km
(ou 0,11 bandos/km) e com um alto desvio padrão (1,11 ind/km ou 0,11 ban/km). Em
números totais, os valores correspondem a 282 registros em termos de indivíduos ou 35 em
termos de bandos contatados. Adicionalmente, bandos de ararajuba foram registrados em dois
terços das amostragens (isto é, 18 das 27). O teste de Kruskal Wallis detectou variação no
índice de abundância em termos de ban/km entre os transectos (p = 0,023), mas não em
termos de ind/km (p = 0,055). O mesmo foi obtido com o teste considerando as porções da
área de estudo (p = 0,044 para ban/km; p = 0,093 para ind/km). Não foi possível verificar
variação temporal no índice de abundância com base nas amostragens.
57
Figura 15. Índice de abundância (ind/km) da ararajuba obtida em cada amostragem nos diferentes transectos da
transamazônica.
Em termos de densidade, de acordo com a área fixa estabelecida em 48 km
2
para cada
transecto, os valores para as amostragens variam de zero a 0,896 ind/ km
2
, com uma média
para todas as 27 amostragens (incluindo repetições), entre 0,145 e 0,290 ind/ km
2
.
Nos 340 quilômetros percorridos entre o Rio Tracoá (início do PNA) e Jacareacanga
(ou seja, no TIJ), registrei 107 indivíduos de oito bandos de ararajubas (Figura 16). Isso
resulta em uma média de um bando a cada 42,5km, ou um indivíduo a cada 3,1km (ou 0,31
ind/km).
58
Figura 16. Localização dos bandos de ararajuba registrados no Transecto entre Itaituba-PA e Jacareacanga-PA
(TIJ) em 2005 (pontos cinzas) e em 2007 (pontos pretos).
Probabilidades de detecção e ocupação
A probabilidade de ocupação que melhor se ajustou aos dados de presença e ausência
da ararajuba (Tabela 4) nos trechos foi de 1, o que significa que a espécie ocupa todos os
trechos considerados. De acordo com o modelo, a espécie não foi registrada em alguns
trechos (096-100, 118-122, 040-044), devido à baixa detecção que variou entre 0.23 a 0.46.
59
Tabela 4. Registros de presença e ausência
da ararajuba (
Guarouba guarouba
) nos
trechos de 4km delimitados
Ocasiões de Amostragens
Trechos
1
2
3
4
5
6
7
040-044
-
-
0
-
0
-
0
048-052
0
0
0
-
0
-
1
054-058
1
-
0
0
0
0
0
062-066
-
0
0
1
0
0
0
068-072
0
0
0
0
1
0
0
076-080
-
-
1
1
0
1
1
096-100
-
-
0
-
0
-
0
104-108
-
-
0
-
1
-
0
110-114
-
-
0
-
1
-
1
118-122
-
-
0
-
0
-
0
180-184
-
-
0
-
0
-
1
188-192
-
1
0
-
0
-
1
194-198
-
1
1
1
1
1
1
202-206
-
-
0
1
0
0
0
Comunidade de psitacídeos na região de estudo
Dezesseis espécies de psitacídeos foram registradas durante o estudo, inclusive dentro
das amostragens nos T12. Para toda a comunidade, 589 contatos com bandos (ou com 2932
indivíduos) foram obtidos. Os valores médios de índice de abundância da comunidade são de
aproximadamente 10 ban/h ou (54 ind/h) de qualquer espécie (Tabela 5).
Tabela 5. Números de registros de bandos e indivíduos de
psitacídeos nas amostragens nos 7 transectos de 12 km
percorridos na região do Parque Nacional da Amazônia.
Bandos
Indivíduos
ban/h
ind/h
Máximo
42
411
21
205.5
Mínimo
6
22
3
11
Médio
21
108
10.5
54
DP
11
84
5.5
42
Em relação aos números totais de contatos com bandos, a ararajuba estaria em uma
posição intermediária (Tabela 6). Mas em relação ao número total de contatos com
indivíduos, a espécie encontra-se entre as mais registradas, atrás apenas de Aratinga
leucophtalma, Pionus menstruus e Amazona amazonica. Não foi possível verificar se a
ararajuba tem sua abundância afetada pela presença ou abundância de outra espécie de
60
psitacídeo, uma vez que não houve variação detectável na índice de abundância da ararajuba
(ind/km – veja acima).
Tabela 6. Valores totais e relativos (por hora) de contatos em termos de
bandos e de indivíduos para espécies de psitacídeos, considerando todas as
amostragens, ao longo do estudo na região do Parque Nacional da
Amazônia (lista em ordem decrescente de indivíduos registrados).
Espécie
Bandos
Indivíduos
ban/h
ind/h
Aratinga leucophtalma
60
621
1.11
11.50
Pionus menstruus
103
578
1.91
10.70
Amazona amazonica
91
359
1.69
6.65
Guarouba guarouba
35
282
0.65
5.22
Brotogeris chrysoptera
76
283
1.41
5.24
Orthopsittaca manilata
37
220
0.69
4.07
Ara macao
53
133
0.98
2.46
Pyrrhura perlata
29
122
0.54
2.26
Amazona farinosa
30
92
0.56
1.70
Brotogeris versicolorus
5
46
0.09
0.85
Amazona ochrocephala
16
42
0.30
0.78
Deroptyus accipitrinus
14
41
0.26
0.76
Ara chloropterus
16
37
0.30
0.69
Gypopsitta vulturina
14
26
0.26
0.48
Ara severus
4
15
0.07
0.28
Ara ararauna
5
12
0.09
0.22
Tamanho populacional mínimo, localização dos bandos e extrapolação da densidade.
Com base no TIJ, o tamanho populacional mínimo da ararajuba estaria em torno de
107 aves. A soma dos indivíduos em dormitórios resultou em pelo menos 138 indivíduos em
11 dormitórios diferentes na região do estudo (Figura 17). Considerando como válidos os
critérios para diferenciar os bandos referentes a registros diferentes, a população mínima
estimada para a ararajuba em toda a margem esquerda do Rio Tapajós (algo como 4.000 km
2
)
ficaria entre 484 e 614 indivíduos de 46 a 58 bandos (Figura 17, Apêndice C).
Adicionalmente, considerando a divisão do TIJ em trechos de 4 km, se extrapolarmos a
probabilidade de ocupação dos trechos delimitados nos T12, tem-se uma ocupação de 43
trechos. Considerando que em cada trecho um clã independente viva e que a média no
tamanho dos clãs é de 10 a 15 aves (veja Padrões de Agrupamento), resulta em algo entre 430
a 645 indivíduos sobrevivendo na região. Com base na estimativa de densidade media, a
extrapolação para mesma área de quatro mil km
2
resulta em 580 a 1160 indivíduos.
61
Considerando a região de estudo o que equivale a 10 mil km
2
, a estimativa populacional
indica 1.450 a 2.900 indivíduos da ararajuba.
Figura 17. Localização dos bandos, clãs e dormitórios da
Guarouba guarouba
na região do Parque Nacional da
Amazônia (PNA). Cada número indica a localidade em que um ou mais bandos ou dormitórios foram localizados
e diferenciados de acordo com o Apêndice C. Em ‘A’, a porção central e norte do Parque Nacional da Amazônia;
Em ‘B’, a porção sul do PNA; Em ´C’, porção fora do PNA ao sul; e em D, porção ao norte de Jacareacanga-PA.
Uso dos Recursos Alimentares
Obtivemos 84 registros de alimentação da ararajuba em 11 espécies arbóreas (Tabela
7, Figura 18). Para um registro, não foi possível a identificação do item consumido nem da
espécie arbórea. Para outro, a identificação não é decisiva. Dois registros foram obtidos por
funcionários do PNA, em fevereiro. O murici (Byrsonima sp1 – Malpighiacae) foi a espécie
62
mais freqüente, com a maioria dos registros concentrados no mês de junho. Outras três
espécies tiveram seus itens consumidos em mais de 10 registros (Miconia sp; Byrsonima sp2;
Tapirira guianensis). Todas as outras espécies foram registradas apenas uma vez. Outro
registro foi obtido para a espécie se alimentando em plantação de arroz na margem direita do
rio Tapajós, mas não foi possível coletar informações detalhadas. Além disso, trabalhadores
do PNA relatam a alimentação em outros anos de Breu (Protium sp.– Burseraceae), Ingá
(Inga sp.– Leguminosae) e um item identificado como Tovomita sp.(Clusiaceae).
Tabela 7. Itens de espécies arbóreas consumidos pela ararajuba (
Guarouba guarouba
) na região do Parque
Nacional da Amazônia.
Família
Espécie
Item
Meses
NR
TAM
%
Tempo
Malpighiacae
Byrsonima
sp. 1
Semente/polpa
05-07
28
6-38
33.4
760
Byrsonima
sp. 2
Semente
02-06
19
5-19
22.6
340
Melastomataceae
Miconia
sp.
Fruto inteiro
11
15
6-17
17.8
274
Anacardiaceae
Tapirira guianensis
Fruto (casca?)
11-02
15
4-17
17.8
120
Myrtaceae
Não identificada
Fruto inteiro
07
1
15
1.2
24
Fabaceae
Erithrina
sp?
Flores/néctar
08
1
9
1.2
15
Leguminosae
Hymenaea
sp.
Flores/néctar
11
1
11
1.2
3
Fabaecae
Não identificada
Flores/brotos
12
1
11
1.2
5
Menispermaceae*
Abuta
sp.*
Polpa do fruto
03
1
23
1.2
6
Sapotaceae
Pouteria
sp.
Semente
03
1
25
1.2
6
Total
84
1
4-38
100
* Ainda em processo de identificação, pode ser Combretaceae.
1
Não foi possível a identificação do item
consumido em um registro. Dois registros foram feitos por funcionários do PNA no mês de fevereiro.
Figura 18. Número de registros de alimentação da ararajuba por mês para cada item alimentar,
comparado com os meses de floração e frutificação do murici (
Byrsonima
sp.1; barras horizontais alaranjadas e
vermelhas, respectivamente), na região do Parque Nacional da Amazônia. Barras horizontais cinzas representam
os períodos de amostragem no campo. Os registros no mês de fevereiro foram feitos por funcionários do PNA.
63
Em relação aos itens consumidos, o maior consumo foi de sementes, principalmente
por causa da Byrsonima spp. Para algumas espécies, o fruto inteiro foi consumido. Outros
itens consumidos foram flores, e provavelmente néctar, além da polpa e casca do fruto.
Não é possível dizer que a alimentação é diferente ao longo da área de estudo, uma vez
que a maioria dos registros foi obtida na porção norte. Obtivemos registros de alimentação do
Byrsonima spp em vários trechos da transamazônica em todas as porções consideradas. A
Tapirira guianensis foi consumida tanto na porção norte como na porção sul.
Sazonalidade e deslocamentos em função da alimentação
Embora haja registros de alimentação em quase todos os períodos do ano, não foi
possível coletar informações sistemáticas sobre a sazonalidade da alimentação da espécie.
Mesmo assim, os registros obtidos ao longo da estrada e nos arredores da base “Uruá”
oferecem indícios da variação na alimentação ao longo do ano (Figura 18). Nas proximidades
da base “Uruá”, os bandos foram observados praticamente em todos os períodos do ano,
utilizando os mesmos locais de alimentação. O mesmo também na porção sul, onde os bandos
podem ser vistos em vários horários do dia nos arredores do dormitório (veja Biologia
Reprodutiva), indicando a utilização de sítios alimentares próximos e habituais.
Da mesma forma, não foi possível associar a abundância ou presença da ararajuba à
frutificação do murici. Além disso, não há indício de variação do índice de abundância da
ararajuba ao longo do ano (veja Padrões Populacionais) e a fenologia do murici (Byrsonima
sp. 1) apresentou-se bastante sincrônica, com um pico de frutificação no mês de junho, em
todas as porções consideradas. Alguns indivíduos identificados como murici apresentaram
florescência nos meses de novembro e dezembro, indicando nova frutificação nos meses
posteriores, mas esses indivíduos não foram identificados em nível de espécie e, além disso,
não se restringiam a nenhuma porção em especial.
Por outro lado, há evidências de deslocamentos locais em função da alimentação.
Durante alguns dias, em diferentes períodos os bandos desapareceram dos arredores da base
“Uruá”. Principalmente para o período seco (entre julho e setembro) os bandos permanecem
distantes da estrada, o que tornou os registros de alimentação muito raros. Além disso, em
algumas ocasiões, observei bandos atravessando o Rio Tapajós, para buscar alimento
(Miconia sp) na margem esquerda. Estes bandos, no fim do dia, voltavam para seus locais de
pernoite na margem direita.
64
Hábitos, comportamento, vigilância e alimentação de juvenis
De modo geral, registramos as ararajubas se alimentando em quase todos os horários
do dia (Figura 19). A maioria dos registros de alimentação foi feito no meio da manhã e no
meio da tarde. Em dias chuvosos, foi possível registrar a ararajuba se alimentando entre 11:00
e 14:00h.
Figura 19. Distribuição dos registros de alimentação da
Guarouba guarouba
ao longo do dia (ver Discussão), na
região do PNA.
Em dias normais (sem chuva), vimos bandos em deslocamento para os sítios
alimentares após 50 ou mais minutos depois do amanhecer. Durante o período reprodutivo,
um pouco mais tarde. Nesse período, registramos deslocamentos entre os ninhos e,
provavelmente, os sítios alimentares quatro ou mais vezes durante o dia. Já na época não-
reprodutiva, notamos que as ararajubas podem permanecer nas proximidades do sítio
alimentar, principalmente no caso de bandos com dormitórios distantes. No fim da tarde, após
novas buscas por alimento, as ararajubas voltam aos arredores do ninho ou dormitório uns 20
a 60 minutos antes do sol se por. Da mesma forma, um pouco mais cedo, quando estão em
reprodução.
Em especial, principalmente durante a frutificação do murici, entre os meses de maio e
julho, notamos que os bandos chegavam mais cedo nos sítios alimentares (antes das 7:00hs).
Nessa época, principalmente em localidades onde se concentravam várias árvores do item, os
bandos permaneciam no sítio alimentar até poucos minutos antes do sol se por. Nisso,
65
deslocavam-se diretamente para a árvore dormitório, permanecendo poucos instantes do lado
de fora.
Em algumas oportunidades, constatamos que a direção do deslocamento do bando era
precisa mesmo à centenas de metros da árvore de alimentação. As árvores de alimentação, nos
arredores da base “Uruá” foram visitadas dia após dia até que os frutos estivessem esgotados,
o que variou de alguns poucos dias ou semanas. Enquanto alguns registros duraram menos de
10 minutos, em outros as ararajubas permanecerem na árvore alimentar por mais de uma hora.
Em uma ocasião, um indivíduo juvenil foi deixado pelo clã em um muricizeiro florido
(registro de alimentação das flores da Byrsonima sp. 1 em março). Esse indivíduo começou a
explorar a palatabilidade de algumas flores, mantendo algumas pétalas na ponta do bico.
Continuou nessa atividade por alguns minutos até que o restante do clã retornasse.
O comportamento dos juvenis nos sítios alimentares também foi bastante notável
(Figura 20). Os juvenis esmolam por comida praticamente o tempo todo e a vocalização que
emitem também é diferenciada, assim como sua postura. Nas observações focais, enquanto os
indivíduos adultos ou juvenis exploravam os galhos na procura de frutos, eu notava os juvenis
empoleirados com as penas eriçadas e as asas abertas, esperando por um indivíduo ir
alimentá-lo. Também notamos que os juvenis caminham pela árvore ou voam de galho em
galho seguindo os outros indivíduos sempre vocalizando tipicamente. Em algumas
oportunidades, vimos que o indivíduo “fornecedor” vai para um galho inclinado onde fica em
uma posição mais alta. Nisso, o juvenil segue esse indivíduo partindo de baixo até que a
regurgitação seja feita (Figura 21). A regurgitação dura poucos segundos e então o juvenil
alimentado se direciona para outro indivíduo que repete o comportamento. Não foi possível
diferenciar quantos nem quais indivíduos alimentavam os juvenis em cada bando. Alguns
indivíduos em algumas ocasiões, aparentemente, se recusavam a alimentar os juvenis,
permanecendo indiferentes à presença deles ao seu lado. Observamos a alimentação dos
juvenis acontecendo principalmente durante a frutificação do murici, e notamos que à medida
que os juvenis vão se desenvolvendo começam a explorar mais independentemente os frutos.
Mesmo assim, em novembro (supostamente seis meses após o primeiro vôo dos juvenis)
ainda observamos juvenis esmolando e eventos de alimentação.
66
Figura 20. Postura pedinte do juvenil de ararajuba nos sítios alimentares.
Figura 21. Evento de alimentação de juvenil de ararajuba nos sítios alimentares.
Evidente também foi a presença de sentinelas nas árvores de alimentação.
Aparentemente quanto maior o bando, mais sentinelas se posicionavam estrategicamente. Não
possuímos informações se são sempre os mesmos indivíduos que se posicionavam.
Entretanto, em diversos registros, principalmente durante os meses de novembro e dezembro,
não notamos sentinelas em posições típicas, de modo que o bando, provavelmente perdia
capacidade de detectar possíveis predadores. Contudo, aparentemente o alarde era dado assim
que qualquer indivíduo se sentisse ameaçado. Mesmo assim, aparentemente o alarde de
67
alguns indivíduos não resultava em deslocamento, de modo que o bando, aparentemente, não
se importava com a presença do observador nas proximidades da árvore. Além disso, em
várias ocasiões, notamos que a medida que o tempo passava nos eventos de alimentação a
maioria dos indivíduos paravam de comer e apenas ficavam observando ou cuidando da
plumagem enquanto outros permaneciam quebrando frutos e explorando os galhos.
De modo geral, os bandos nos sítios alimentares não permitiram aproximações e
voavam assim que se sentiam ameaçados, embora em algumas ocasiões, fomos capazes de
chegar bem próximo da árvore (menos de 4 metros das ararajubas), sem que os indivíduos
alardeassem. Os bandos que se espantavam deslocavam-se para outra árvore do mesmo item
na localidade ou apenas levantavam vôo, voltando em seguida para mesma árvore.
Foi também diferencial entre os bandos a reação à presença de outro bando nos sítios
alimentares. Enquanto em algumas localidades bandos diferentes eram fortemente
hostilizados, em outros locais os clãs se agrupavam e até mesmo deslocavam-se juntos entre
árvores do item, quando formaram os maiores agrupamentos. Em uma ocasião 41 indivíduos
pousaram em uma mesma árvore, mas moradores relatam agrupamentos de mais de 50
indivíduos durante a frutificação do murici.
De todos os itens usados pela ararajuba, para apenas três registramos outros
psitacídeos se alimentando. A Byrsonima sp.1 também foi consumida por Pionus menstruus e
a Miconia sp. e a Abuta sp. foram compartilhadas com Ara macao.
Biologia reprodutiva
Fizemos observações em 11 ninhos ou dormitórios diferentes, em mais de noventa
horas. Observamos apenas um ninho em janeiro e outros cinco em março e em maio. De
junho a agosto, acompanhamos seis dormitórios, como também em novembro e dezembro. O
esforço de observações foi diferente entre os ninhos e entre as épocas.
Localização e descrição de dormitórios e sítios reprodutivos
Na região do PNA, localizamos 14 árvores utilizadas pelos clãs de ararajuba como
ninho ou dormitórios. Das 14, pelo menos oito foram encontradas ativas como ninho. As
outras apenas como dormitórios, mas não possuímos informações mais precisas da utilização
dessas árvores durante o período reprodutivo. Um dos ninhos foi derrubado por traficantes
para a retirada de filhotes em fevereiro de 2007.
Apenas uma árvore (ninho ou dormitório) foi localizada dentro dos limites do PNA.
Esta se encontra em uma lagoa, de aproximados 100 metros de raio, originada após a
construção da transamazônica, devido à canalização de um igarapé. Não tive sucesso em
68
localizar outro possível ninho nas proximidades da base “Uruá”. Por vários dias tentamos
seguir um clã de 19 aves que partia do sítio alimentar em direção ao dormitório nos últimos
minutos do dia. Mas, aparentemente, o deslocamento do clã era de mais de três quilômetros, o
que impossibilitou o acompanhamento. Mesmo assim, é provável que ninho esteja localizado
em uma lagoa, semelhante ao do ninho conhecido, uma vez que a direção do clã apontava
para tais ambientes, que são comuns no PNA.
Outras duas árvores foram localizadas na porção norte da área de estudo, nos limites
do PNA, em uma clareira aberta para formação de roça de pequenos agricultores. Ambas
foram utilizadas provavelmente pelo mesmo clã (uma como ninho e outra como dormitório).
Essa localidade é cortada por uma pequena estrada (vicinal) que dá acesso a uma comunidade.
Já todas as outras 11 árvores foram localizadas na porção sul da área de estudo, externamente
aos limites do PNA. Esta região é caracterizada pela formação de diversas aberturas, para
pastagens ou roças, nas proximidades da rodovia, fazendo com que a mata diste de 100 a 1000
metros da estrada.
Outras árvores também foram exploradas por alguns bandos em diversas ocasiões e
provavelmente serviriam de dormitório alternativo ou mesmo ninho posteriormente. Uma
árvore, que foi explorada por um provável clã de seis ararajubas, estava a menos de cinco km
de distância do ninho encontrado dentro do parque. Já as outras três árvores localizam-se na
porção sul da região, distando poucas centenas de metros dos dormitórios conhecidos.
Entretanto, não temos informações definitivas sobre a utilização dessas árvores como ninho
ou dormitório.
Assim, os sítios reprodutivos parecem ter uma distribuição agrupada em escala
regional (Figura 22). Na porção sul, pelo menos quatro dormitórios estavam localizados
dentro de um raio de menos de um km. De modo geral, todos os ninhos e dormitórios
conhecidos estavam isolados da mata contínua em maior ou menor grau, pela presença de
água ou pela presença de pastagem ou vegetação secundária ainda baixa. De acordo com a
classificação sugeria por Guedes e Seixas (2002), os ninhos estariam em ambiente aberto,
sujeitos a perturbação média a alta.
69
Figura 22. Distribuição dos sítios reprodutivos (ninhos – N) e dormitórios (D) da ararajubas, e de árvores
supostamente utilizadas como tal (S), localizados na região do Parque Nacional da Amazônia.
Das 14 árvores, apenas duas ainda estavam vivas. Para uma delas constatamos que
vários galhos estavam ocos quando uma Ara macao entrou por uma cavidade e saiu por outra
(veja abaixo em Competição intra e interespecíficas nos sítios reprodutivos). Para a outra
árvore viva, as ararajubas pernoitavam em um galho quebrado e aparentemente morto da
árvore. Considerando as outras quatro árvores que não temos confirmação sobre o uso como
dormitório ou ninho, apenas uma estava viva, e mesmo assim as ararajubas exploravam um
galho quebrado.
Em termos de espécies arbóreas, não foi encontrada nenhum indício de seleção,
embora apenas sete das 14 árvores tenham sido identificadas. Quatro foram identificadas com
Itauba (Mezilaurus itauba – Lauraceae), uma como Amarelão (Aspidosperma vargasii
Apocynaceae), uma como Ipê Branco (Tabebuia roseoalba – Bignoniaceae)e outra como
Muiricatiara (Astronium lecointei – Anacardiaceae). Entre as árvores que foram exploradas
pelas ararajubas, mas não consistiam de ninhos confirmados, apenas uma foi identificada, e
como Amarelão.
Estruturalmente, as árvores (ninho ou dormitório) encontradas também variaram
(Tabela 8, Figura 23), embora de modo geral sejam árvores grandes com mais de 110 cm de
diâmetro na altura do peito. As cavidades foram encontradas tanto em galhos (Figura 23A)
como no tronco da árvore (Figura 23B). Enquanto algumas árvores não apresentavam mais
70
galhos, umas apresentavam ramos associados e outros galhos que é onde, provavelmente,
estava o local de posição dos ovos. Alguns ninhos apresentavam cavidades a menos de 15
metros do solo, algumas ainda mais baixas. Algumas árvores apresentam apenas uma entrada,
enquanto outras várias. Em diâmetro também os valores são variáveis, embora aparentemente
entradas mais diminutas (menos de 15cm) foram mais comuns (Figura 23C).
Tabela 8. Valores máximos, médios e mínimos das características das
árvores utilizadas como ninho ou dormitório (n=14), ou exploradas e
supostamente utilizadas como tal (n=4), pelos bandos da ararajuba na
região do Parque Nacional da Amazônia. (N* é o número de árvores para as
quais as características foram estimadas).
Máximo
Médio
Mínimo
N*
Altura da Árvore
40
25
16
13
Número de Entradas
6
2
1
12
Altura da 1ª Entrada
26
17
8
12
Diâmetro na Altura do Peito
1.5
1.1
0.5
11
Distância da Mata
300
80
20
18
Figura 23. Exemplos de árvores utilizadas como ninho ou dormitório pela ararajuba
Não temos informações sobre a estrutura interna das cavidades nos ninhos
encontrados. Com base nas observações e na quantidade de indivíduos que pernoitam junto
(até 20), imaginamos que as cavidades são amplas e profundas, contínuas entre os galhos e
71
conectando as entradas. Para o ninho que foi derrubado em fevereiro de 2007, a cavidade era
profunda tanto nos galhos como no tronco e apresentava uma camada terrosa.
Período reprodutivo
As observações sugerem que o período reprodutivo da ararajuba na área deste estudo
teria inicio no fim de novembro e fim em meados de maio. Visitamos alguns sítios
reprodutivos em meados de novembro de 2007 e não detectamos atividade reprodutiva. Nos
últimos dias do mesmo mês alguns moradores relataram muita atividade das ararajubas nos
arredores de um dos dormitórios, mesmo nos horários mais quentes do dia, o que evidenciou
o início da reprodução pelo menos para alguns clãs. Nos primeiros dias de dezembro,
confirmamos a atividade em três dos ninhos conhecidos, em período de incubação,
provavelmente.
Em janeiro (2007), em um dos ninhos, as ararajubas apresentavam o mesmo
comportamento que em dezembro do mesmo ano. Uma ou duas das seis aves do clã
permaneciam dentro da cavidade, enquanto o restante do clã deslocava-se para a mata
contínua em busca de alimento. Como nenhum dos dois indivíduos apresentava plumagem
característica de juvenis, acreditamos que se tratava do período de incubação.
No início de março, aparentemente, acontecia o mesmo, quando alguns indivíduos
ainda permaneciam durante o dia dentro do ninho. Só que nesse período, esses indivíduos já
ficavam mais tempo na entrada da cavidade. Isso pôde indicar ovos eclodidos, mas não
filhotes já em fase de vôo, uma vez que quando o restante do clã voltava, a maioria dos
indivíduos adentrava. Já no final de março, observamos alguns juvenis sendo alimentados nos
galhos da árvore ninho, enquanto que alguns indivíduos ainda entravam na árvore. No mesmo
período, alguns indivíduos com plumagem característica de juvenis já se deslocavam entre as
árvores nos arredores do ninho, mas, aparentemente não acompanhava o clã na busca por
alimento.
De meados de maio até meados de agosto, embora o clã permanecesse boa parte do dia
nos arredores do sítio reprodutivo (veja Hábitos, comportamentos e atividades diárias durante
a reprodução), não detectamos nenhum indivíduo que se mantivesse na árvore ninho ou
mesmo nas proximidades, de modo que todo o clã se deslocava para os sítios alimentares.
Ainda nesses meses, nos sítios alimentares detectamos a presença dos juvenis nos bandos, que
esmolavam por comida, mas eram incapazes de alimentar por conta própria (quebrar os
frutos). Por outro lado, em outros sitos reprodutivos, o clã só aparecia nos arredores do
ninho/dormitório no fim do dia e logo ao amanhecer deslocavam-se para árvores mais
72
distantes. Também em meados de agosto, em diversas ocasiões observamos alguns bandos
explorando as cavidades e os galhos de árvores secas, em vários horários do dia (veja abaixo).
Em novembro, ainda observamos juvenis esmolando por comida, embora a maioria dos
indivíduos já, aparentemente, era capaz de se alimentar sozinho. Em novembro também,
observamos várias vezes pares de ararajubas deslocando-se sem os outros indivíduos do clã
(veja Padrões de Agrupamento).
Hábitos, comportamentos e atividades diárias durante a reprodução
Em alguns sítios reprodutivos, notamos que todo o clã pernoitava junto aos filhotes.
Em outros, somente alguns indivíduos permaneciam dentro da cavidade, enquanto o restante
do clã se deslocava para pernoitar dentro de outra árvore próxima. Em dois dos ninhos
acompanhados, enquanto no início da reprodução somente alguns indivíduos pernoitavam no
ninho (seis em um deles e sete no outro, variando entre os dias), no fim do período
reprodutivo, os outros indivíduos não se deslocavam para outra árvore, e todo o clã (20 aves
para o primeiro e 17 para o segundo) dormia junto aos filhotes
Os clãs acompanhados no fim do período reprodutivo permaneceram utilizando a
árvore como dormitório. Apenas um dormitório foi abandonado pelo clã. Mesmo assim, foi
somente depois de setembro, meses depois do fim da reprodução, quando o ambiente ao redor
da árvore foi queimado. Além disso, esse clã passou a ocupar outra árvore na mesma
localidade. Nesse período não-reprodutivo, para um dos clãs acompanhados, as ararajubas
permaneciam nas proximidades nos horários mais quentes do dia, mas não chegavam a pousar
na árvore dormitório.
Também observamos uma série de atividades e comportamentos diários que devo
destacar para os clãs de ararajuba durante a reprodução. Notável são as brincadeiras entre os
indivíduos, supostamente juvenis, durante as primeiras e últimas horas do dia. De modo geral,
o clã se reúne em uma árvore seca, aonde se formam grupos de três ou mais indivíduos que se
bicam, trocam carícias e se penduram. Geralmente dois indivíduos começam a se perseguir
voando e caminhando de galho em galho, até que investem em bicadas mútuas, sempre
vocalizando. Nisso, outro indivíduo pode se aproximar e interagir. Então, os indivíduos se
dependuram e mesmo quando se soltam continuam se bicando e vocalizando até que assumem
controle da queda, tomam vôo e voltam para os galhos da árvore (veja Figura 24A). Às vezes,
assim que o par ou o trio se solta, outros indivíduos posicionam-se no mesmo poleiro, e
interagem da mesma forma. Parece ser uma atividade muito difundida entre os membros do
clã, tanto que em algumas ocasiões os indivíduos formavam “fila” em frente aos ramos de
73
uma epífita, nas quais os indivíduos se interagiam (veja Figura 24B). Do momento que
começam a se perseguir até o momento em que voltam aos galhos após se soltarem passam-se
algumas dezenas de segundos, mas a interação como um todo pode durar dezenas de minutos.
Em outras árvores, também notamos que os indivíduos brincam de explorar as cavidades de
árvores mortas, se escondendo e caminhando pelos galhos, sempre vocalizando.
Figura 24. Socialização da ararajuba nos arredores dos sítios reprodutivos.
Enquanto essas brincadeiras acontecem, outros indivíduos (supostamente os mais
velhos ou o casal) se posicionam perifericamente nos galhos, aonde se dedicam a arrumar a
plumagem e, aparentemente, vigiar os arredores. Esses indivíduos pouco vocalizam durante
esses momentos, mas podem se agrupar aos pares quando arrumam suas plumagens
mutuamente. Aparentemente, são esses indivíduos também os responsáveis pelo
deslocamento do clã para outras árvores. Nesse momento, começam a vocalizar mais
intensamente, de modo que em instantes todo o clã está vocalizando tipicamente. Então, esses
indivíduos alçam vôo em direção a outra árvore, seguidos quase que instantaneamente pelo
restante do clã. Esse tipo de preparação para o deslocamento, precedida da decisão de
deslocar-se, foi muito mais perceptível quando o clã voa em direção aos sítios alimentares.
Durante os horários mais quentes do dia, o clã permanecia à sombra de uma árvore
alta. Nesses momentos, vi que, embora o clã fique silencioso, alguns indivíduos interagem
trocando carícias e se perseguindo ao longo dos galhos. Quando vocalizavam, quase sempre
eram os juvenis, esmolando tipicamente por comida. Ficavam por várias horas nessas árvores,
74
geralmente das 11:00 às 15:00h, principalmente no período em que os juvenis já alcançaram
vôo.
No período de incubação, vimos freqüentemente vôos pareados, em que o suposto
casal desloca-se para outra árvore a fim de trocar carícias e eventualmente copular. Vimos
apenas uma cópula durante a pesquisa. Em janeiro, um clã de seis ararajubas preparava-se
para pernoitar em seu ninho, quando dois indivíduos deslocaram-se para outra árvore seca
próxima, aonde após carícias e brincadeiras típicas copularam por não mais do que um
minuto. Em seguida, os outros indivíduos do clã também deslocaram para essa árvore,
misturando-se ao casal. Interagiram por alguns momentos, e então, aos poucos o clã voltou
para a árvore ninho, até que apenas um indivíduo permanecesse do lado de fora. Esse
permaneceu silencioso até que sob a luz bem baixa direcionasse para dentro do ninho. A
reprodução para esse clã já estava em fase de incubação.
Outro comportamento destacável foi a exploração de árvores, supostamente, para
seleção de novos sítios reprodutivos ou de pernoite. Nesse caso, o bando ficava praticamente
em silêncio e não havia contatos físicos constantes entre os indivíduos. Em uma ocasião, para
um bando de três aves, enquanto um indivíduo posicionava-se em uma posição alta em um
galho e o segundo permanecia quieto em uma das cavidades, outro indivíduo percorria toda
superfície da árvore, aparentemente analisando cada centímetro dos galhos. Este “explorador”
às vezes vocalizava ou voava em direção aos outros indivíduos ou para outros galhos. Em
outra ocasião, para um bando de seis, enquanto quatro permaneciam em uma árvore com
folhas sem muita interação, dois deles exploravam um galho quebrado em uma árvore viva
apresentando, aparentemente, o mesmo comportamento. Essas atividades duraram até dezenas
de minutos e aconteceu em diversos horários do dia e também variavelmente ao longo do
período reprodutivo.
Competição intra e interespecífica por sítios reprodutivos
Observamos alguns comportamentos associados à competição por sítios reprodutivos,
tanto entre clãs da espécie (competição intraespecífica) como em relação a outras araras e
psitacídeos (competição interespecífica). Alguns clãs da ararajuba foram hostis à presença de
outros bandos nos arredores do ninho ou dormitório. Esses eventos ocorreram principalmente
durante as atividades de manutenção e limpeza da plumagem e sociabilidade (brincadeiras),
tanto no início como no fim do dia. Embora não houvesse ataques ou contatos físicos diretos,
a vocalização do clã “nativo” era incessante e bastante forte, sobretudo quando o bando
invasor pousava na árvore ninho. Caso o bando invasor não voasse e se distanciasse dos
75
arredores, parte do clã nativo se deslocava para a árvore invadida, expulsando o bando
invasor. Em alguns casos, somente duas ou três ararajubas participavam da expulsão,
enquanto o restante do clã permanecia nas atividades de limpeza e manutenção da plumagem
e brincadeiras. Em outros casos, principalmente quando o bando invasor não se intimidava, o
restante do clã aos poucos se deslocava até que os invasores deixassem a localidade. Nos dias
em que aconteciam esses eventos de invasão e expulsão de clãs, as ararajubas do clã nativo
mantinham-se nas proximidades do ninho na maior parte do dia, distanciando-se por períodos
mais curtos para buscar alimento. O mesmo acontecia nos dias imediatamente posteriores em
que o bando nativo voava entre as árvores nos arredores do ninho, sempre vocalizando forte,
um comportamento aparentemente de demarcar território. Por outro lado, em outros
dormitórios observados, não havia hostilidade. Os indivíduos de diferentes clãs pousavam
juntos na mesma árvore e até exploravam a cavidade (dormitório) do outro clã, sem que este
se incomodasse, ou deslocavam-se juntos para socializar.
Interespecificamente, a ararajuba foi eficiente em expulsar dos arredores do ninho Ara
ararauna, Orthopsittaca manilata e Amazona amazonica. Esses eventos também ocorreram
principalmente durante as atividades de manutenção e limpeza da plumagem e sociabilidade.
A reação à presença dessas espécies foi bastante semelhante à reação aos bandos co-
específicos hostilizados, sem ataque ou contato físico direto. Outras espécies de psitacídeos
foram ignoradas e não despertaram reação hostil no clã nativo das ararajubas. Bandos e pares
de Deroptyus accipitrinus, Pyrrhura perlata, como Pionus menstruus permaneciam nos
arredores do ninho, mas não eram molestados.
Ara macao, a araracanga, foi a única espécie que vimos expulsar a ararajuba do sítio
de nidificação, mesmo de dentro das cavidades. Em quatro ocasiões, em sítios reprodutivos
diferentes, as ararajubas distanciaram-se do ninho quando bandos de A. macao foram em
direção à árvore em que estavam. Entretanto, as araracangas não exploravam as cavidades,
permanecendo na árvore ninho apenas por alguns minutos, permitindo a volta das ararajubas.
Mas mais destacável foi no momento em que um clã de ararajubas já se preparava para dormir
quando um par da araracanga entrou por um dos galhos, fazendo com que todo o clã das
ararajubas deixasse a árvore. Então, as ararajubas empoleiraram-se nos galhos do dormitório,
até que o indivíduo da Ara macao saísse por outro galho (demonstrando que a cavidade é
interligada entre os galhos da árvore). Esse momento foi marcado com bastante vocalização
de ambas as espécies, e fez com que o clã das ararajubas deslocasse para outro dormitório na
mesma localidade. Este dormitório foi utilizado em outras ocasiões por parte desse clã em
períodos anteriores. Nesse dia, as araracangas dormiram em um galho da mesma árvore do
76
ninho das ararajubas, mas nunca utilizado por elas (Figura 25). Nos dias posteriores, as
ararajubas voltaram para o dormitório usual, mas ficaram mais tempo nas proximidades do
ninho, durante o dia. Além disso, durante esses dias, ambas as espécies passaram a pernoitar
nessa árvore, sem maiores interações diretas.
Figura 25. Interação entre a ararajuba (
Guarouba guarouba
) e a Araracanga (
Ara macao
) em uma árvore
utilizadas como dormitório por ambas as espécies.
Tamanho da ninhada e sucesso reprodutivo
Durante o estudo, não foi possível acessar as cavidades dos ninhos observados.
Entretanto, com a derrubada de um dos ninhos por traficantes, inspecionamos o interior da
árvore e detectamos dois ovos (já eclodidos). Esse ninho era utilizado por um clã de seis
ararajubas. Adicionalmente, considerando que para alguns ninhos, vimos que até quatro
indivíduos podem permanecer dentro da árvore para incubação, é de se esperar vários ovos
(mais de três), dependendo, provavelmente, do tamanho do clã.
Interações com outras aves e outros animais
77
Notamos que diversas atividades da ararajuba foram associadas com outras espécies
animais. Nos sítios reprodutivos, algumas espécies de falconiformes não foram toleradas. Em
uma ocasião, assim que um indivíduo de Leucopteris albicolis apareceu nos arredores da
árvore ninho, as ararajubas se assustaram e cinco indivíduos de um clã de seis voaram em
direções aleatórios, talvez pra despistar o local da árvore. Em seguida, foram em direção ao
gavião, vocalizando intensamente, até que o afastassem, voltando à árvore ninho.
Por outro lado, vimos que Falco rufigularis expulsava os bandos de ararajubas das
árvores secas nos arredores do ninho. Nessas ocasiões, assim que um bando de ararajuba
pousava em uma árvore seca para limpar penas ou brincar, o falcão vocalizava e voava em
direção ao bando, fazendo com que as ararajubas voassem rapidamente, dando rasantes, em
silêncio, formando um bando mais coeso. Então, as araras distanciavam-se para pousar em
outra árvore seca. Se o falcão voltasse a atacar, as ararajubas levantam vôo novamente do
mesmo modo e se distanciavam ainda mais.
Já contra tucanos (Ramphastos tucanus e Ramphastos vitellinus), não vimos reação
hostil das ararajubas. Em outro sitio reprodutivo, um casal de Pteroglossus inscripitus
nidificava em árvore bastante próxima à árvore-ninho das ararajubas, onde não notamos
reações agressivas de nenhuma das partes.
Nos sítios alimentares, notamos reação de defesa das ararajubas em função da
presença de gaviões, falcões e urubus. Nesses casos, vimos que a ararajuba se deslocava
evitando o contato com essas espécies. Em alguns dias, observamos que as ararajubas se
assustavam e levantavam vôo vocalizando intensamente assim que percebiam a presença de
indivíduos de Cathartes melambrotos, Sarcoramphos papa ou Elanoides forficatus.
Contra espécies de pica-paus percebemos que as ararajubas foram indiferentes. Em
diversas ocasiões observamos indivíduos de Campephilus rubricolis ou Melanerpes
cruentatus tamborilando na árvore ninho/dormitório das ararajubas mesmo quando o clã
estava na árvore. O mesmo observei em relação a outros passeriformes, como andorinhas,
Tityra semifasciata (espécie que também usou cavidades de árvores nas mesmas localidades
que a ararajubas), Nasica longirostris e Donacobius atricapillus.
Discussão
Este estudo trouxe novas informações sobre a biologia da ararajuba, incluindo dados
que corroboram e contradizem suspeitas anteriores. Um novo ponto de vista foi levantando
sobre a sociabilidade e agrupamento da ararajuba. Os números obtidos referentes à população
78
da espécie de diferentes formas proporcionam um melhor entendimento sobre sua situação
atual. Os registros alimentares permitiram inferir sobre especialização alimentar e
deslocamentos sazonais em função do alimento. A localização e o acompanhamento dos
ninhos e dormitórios revelaram novos indícios sobre seu comportamento e interações com o
habitat e outras espécies. Nesse sentido, foi possível discutir aspectos sobre sua
vulnerabilidade e conservação e sugerir e direcionar novas pesquisas que deverão revelar
outras informações relevantes de sua história natural.
Padrões de agrupamento
A média do tamanho dos bandos encontrados neste estudo é semelhante ao valor
encontrado por Oren e Novaes (1986) para o conjunto de suas observações em várias porções
da distribuição da ararajuba. Entretanto, o valor que encontramos pode estar enviesado devido
à ausência de independência dos registros (contatos com o mesmo clã em diferentes horários
do dia ou em diferentes dias). Se considerarmos o tamanho dos clãs diferenciados, a média é
maior, indicando uma maior sociabilidade entre os indivíduos da espécie, bem diferente de
outras araras e de vários outros psitacídeos (Sick 1997, Juniper e Parr 1998).
Embora nós não tenhamos informações diretas sobre as relações de parentescos dos
indivíduos de nenhum dos clãs da área de estudo, o termo clã tornou-se útil uma vez que o
número de indivíduos pernoitando na mesma árvore permanece o mesmo dia após dia,
durante um mesmo período, e principalmente porque não há registros para a espécie de
grandes dormitórios coletivos ou comunais. A mudança no tamanho de alguns clãs em
diferentes épocas pode ser explicada pela formação de novos clãs ou pela morte de
indivíduos, ou ainda pelo recrutamento de filhotes. Para vários outros psitacídeos é comum o
hábito de pernoitar em grandes congregações (veja Yamashita 1987, Chapman 1989, Juniper
e Parr 1998, Vaughan et al. 2005), de modo que tais dormitórios coletivos são locais de
pernoite freqüentados por dezenas ou centenas de indivíduos que passam a maior parte do dia
separados. Complementarmente, para a ararajuba, as observações focais de alguns clãs
demonstram que os indivíduos quase sempre permanecem juntos ao longo do dia, chegando a
hostilizar outros clãs, mas podendo se separar ou agrupar em função de diversos fatores.
O maior número de registro de bandos de cinco a sete indivíduos poderia ser explicado
pela formação de grupos compostos por um casal e seus filhotes, um grupo familiar. Isso tem
sido sugerido por Carlos Yamashita para a espécie (veja Reynolds 2003) e é um padrão
comum para outros psitacídeos, como Pyrrhura spp., principalmente para espécies de
pequeno porte, que apresentam maiores ninhadas (Pizo 2002). Em relação ao grande tamanho
79
dos clãs (mais de 12 indivíduos), uma explicação plausível seria a presença de mais de um
casal (talvez dois ou três) e seus respectivos filhotes. Isso pode ser fundamentado pelas
observações em cativeiro, em que vários indivíduos usam um mesmo ninho e chocam uma
grande quantidade de ovos (Oren e Novaes 1986). Ou, por outro lado, pode ser devido à
presença dos juvenis de gerações anteriores que permanecem no clã familiar por vários anos.
Reynolds (2003) relata que os indivíduos jovens não apresentam fertilidade antes do quinto
ano. Contudo, não há informações diretas da natureza.
De modo geral, os números relativos ao tamanho dos bandos para outras espécies de
psitacídeos encontrados nesse estudo estão de acordo com os descritos na literatura (Roth,
1984, Gilardi e Munn 1998, Pizo 2002). Embora várias espécies de psitacídeos neotropicais
ainda sejam pouco conhecidas, ainda não há precedentes sobre espécies em que seus
indivíduos compõem grupos com mais de 15 indivíduos que permanecem unidos ao longo do
dia e pernoitam em uma única cavidade de árvore no período não-reprodutivo (Collar 1997,
Sick 1997, Juniper e Parr 1998). Algumas espécies já foram encontradas pernoitando em
cavidades de árvores, outras formam grandes colônias e agrupamentos em barreiros, mas não
se trata de indivíduos aparentados que permanecem junto durante todo o ano (veja Collar
1997, Kristosch 1997, Juniper e Parr 1998, Burger e Gochfeld 2005, Vaughan et al. 2005,
Masello et al. 2006).
Como não foram localizados dormitórios com menos de quatro aves, ararajubas
visualizadas sozinhas foram consideradas debandadas ou perdidas. Mesmo porque foram
apenas nove contatos com indivíduos isolados. Uma das ocasiões correspondeu a um
momento em que um dos indivíduos de um clã em período reprodutivo voltava
provavelmente do sitio de alimentação e pousava na árvore-ninho, como uma sentinela que
verificava as condições ou vigiava a área. Em outras ocasiões, uma ararajuba estava pousada e
vocalizava pouco e tipicamente a intervalos irregulares como se estivesse perdida.
Aparentemente, estava à espera do seu bando ou à procura da rota de volta para os locais de
alimentação ou para o dormitório, voando em direções errantes ou mudando a direção do vôo
uma ou mais vezes.
Não foi incomum a visualização de ararajubas aos pares, embora nós não tenhamos
localizado nenhum ninho ou dormitório de apenas duas aves. Isso pode ser explicado pela
formação de casais dentro dos clãs/bandos, em que tais aves podem realizar deslocamentos no
intuito de acasalar ou também na defesa de território. Isso porque tais registros foram mais
comuns durante as semanas antecedentes ao período de incubação e ao longo do período
reprodutivo (novembro a abril, n=18). Além disso, na visualização de bandos grandes, em
80
diversas ocasiões, foi notável a formação de pares voando mais proximamente ou mesmo
liderando o restante do bando, às vezes partindo de um poleiro antes dos outros indivíduos.
Esse comportamento já fora constatado por Oren e Novaes (1986) bem como por Silveira e
Belmonte (2005), que também o atribui à formação de casais.
Uma vez que os juvenis apresentam um comportamento diferenciado, principalmente
nos sítios alimentares (veja Uso dos Recursos Alimentares), eles são extremamente notáveis
dentro dos bandos. Entretanto, os valores encontrados para a quantidade de juvenis em relação
ao tamanho dos bandos podem estar enviesados. Nos sítios alimentares, os juvenis só podem
ser contados quando os bandos estão pousados, mas isso dificulta a contagem de todo o
bando. Além do mais, esses números não se referem aos clãs em si, de modo que os três
juvenis encontrados em bandos de cinco e sete ararajubas possam fazer parte de um clã maior
(isso porque esses registros foram feitos em um sítio alimentar onde vários bandos estavam
presentes). De qualquer forma, a baixa taxa de juvenis em relação à quantidade de indivíduos
maduros ou juvenis evidencia uma ninhada de tamanho pequeno e conseqüentemente uma
baixa taxa de crescimento populacional. Além disso, pode ser mais um indício da presença
dentro dos bandos de indivíduos não reprodutivos, uma vez que se fosse mais de um casal em
cada clã, era de se esperar um maior número de juvenis.
Padrões temporais de agrupamento
Os grandes agrupamentos encontrados no meio da manhã podem ser explicados pelos
registros em sítios alimentares, que são mais freqüentados nesses horários (veja Uso dos
Recursos Alimentares). Nos sítios alimentares é comum a reunião de dois ou mais bandos de
uma espécie de psitacídeo, dependendo da abundância do item em frutificação (Gilardi e
Munn 1998, Pizo 2002). Mesmo assim, não há um padrão circadiano geral, claro, bem
definido, e regulado para bandos de ararajuba. Ararajubas de clãs pequenos (com menos de
seis indivíduos) podem ser vistos durante todo o dia com a mesma quantidade de indivíduos,
assim como clãs de 12 ou 20. Além disso, como já mencionado as ararajubas não possuem o
hábito de pernoitar em grandes concentrações em dormitórios coletivos, o que seria uma
causa básica na variação no tamanho dos bandos em outros psitacídeos (Rocha et al. 1988,
Chapman et al. 1989; Gilardi e Munn 1998). Por outro lado, as observações focais
demonstram que os clãs podem se separar e se agrupar em função das diferentes atividades ao
longo do dia, mas não obrigatoriamente.
Embora a ANOVA tenha indicado variação significativa no tamanho dos bandos entre
os períodos do ano, a magnitude dessa diferença é mínima, de um ou não mais que dois
81
indivíduos. Essa pequena diferença poderia ser explicada pelos registros mais numerosos de
ararajubas em pares ou isoladas, formados no intuito de se acasalar ou de verificação do sítio
reprodutivo (veja acima) durante o período reprodutivo (que também corresponde em parte à
época chuvosa). Mesmo assim, independente da época ou do período reprodutivo, as
ararajubas permanecem em bandos grandes (mais de oito indivíduos).
Padrões espaciais de agrupamento
Houve variação no tamanho dos bandos da ararajuba em relação às porções da área do
estudo. Embora essa diferença não seja numericamente expressiva, ou seja, bandos médios de
oito a nove indivíduos contra bandos de 10 a 11, pode indicar algum padrão. Na porção sul
concentra-se a maioria dos dormitórios conhecidos, onde estes estão em pastagens nas
proximidades da mata (veja Resultados – Biologia Reprodutiva). Possivelmente, nessas
localidades, os clãs possam ser maiores em função da alta disponibilidade de locais para
reproduzir. Já na porção norte, onde foi dedicado o maior esforço de observação, a grande
quantidade de registros de agrupamentos em sítios alimentares pode ter influenciando no
número médio do tamanho dos bandos. Já para a porção central, não temos muitos
dormitórios conhecidos e o esforço amostral nessa região é menor, o que pode resultar em
mais registros de bandos menores separados dos seus clãs ao longo do dia.
Algumas espécies de psitacídeos apresentam alta variação espacial no tamanho do
bando, que pode ser associada à densidade populacional (Pizo 2002). Na escala deste estudo,
os registros da ararajuba demonstram alta variabilidade no tamanho dos bandos, o que
dificulta a detecção de padrões. Na porção sul, onde aparentemente há uma concentração de
bandos (e possivelmente uma maior densidade – veja Padrões Populacionais), têm-se registros
de bandos maiores, mas mesmo nessas localidades há uma alta variabilidade.
Kyle (2005) inferiu sobre o grau de antropização em relação ao tamanho dos bandos,
de modo que em localidades mais antropizadas os bandos estariam mais susceptíveis à caça
para o tráfico e a alimentação da população. Na área do meu estudo, não fui capaz de detectar
qualquer influência geral da antropização no tamanho dos bandos. A porção sul, externa ao
parque, apresenta a maior quantidade de pessoas, e a porção central é exatamente a mais
distante das vilas e fazendas. Contudo, em escala geográfica, os bandos na porção leste da
distribuição da ararajuba (a mais alterada e antropizada – veja Capítulo 1) seriam menores do
que os bandos na porção oeste (Kyle 2005). Na represa de Tucuruí (PA – porção leste) tem-se
observado bandos de até 15 indivíduos (Sidnei Melo Dantas, in litt. 2008). No município de
Tailândia-PA, também na porção leste, os bandos encontrados foram de seis e de 12 (Silveira
82
e Belmonte 2005). Em Paragominas-PA, na mesma região, T. Kyle (com. pess. 2007)
encontrou três bandos de quatro, cinco e 10 indivíduos. Já na BR-163 (porção oeste), Olmos e
Pacheco (2005) encontram um bando de 18 indivíduos. Nossos registros neste estudo referem
a bandos grandes (mais de 20). Embora devemos considerar uma maior variabilidade para
essas localidades, para esse caso, pode haver uma grande influência do sucesso reprodutivo
entre as duas regiões, o que influenciaria no tamanho do bando. Na região do Rio Capim
(leste do Pará), os ninhos conhecidos são anualmente escalados para retirada de filhotes (T.
Kyle com. pess. 2007), enquanto que na porção leste, essa atividade criminosa não parece ser
difundida, embora, um dos ninhos conhecidos na região de estudo fora derrubado para
retirada de filhotes. Nessa ocasião, um clã de seis ararajubas foi supostamente reduzido para
quatro. Assim, parece ter sim uma influência indireta da antropização no tamanho dos bandos
da ararajuba, entretanto é difícil detectar padrões gerais, uma vez que outros fatores, como
concentração de itens alimentares, oferta de recursos reprodutivos, estariam misturando os
números.
Padrões de agrupamento nos sítios reprodutivos e alimentares
Os bandos da ararajuba se separam e se agrupam em função da alimentação, do
acasalamento ou do comportamento de vigilância e defesa de território reprodutivo.
Entretanto, os clãs permanecem com o mesmo tamanho na maior parte do dia e
principalmente durante o pernoite. Nesse sentido, a impressão que surge é que há uma
subdivisão do clã de acordo com as atividades de cada um, de forma que o tamanho do clã
permanece o mesmo com o passar dos dias, durante o período reprodutivo.
Implicações dos padrões de agrupamento para amostragens populacionais
Conhecer o tamanho dos bandos das espécies tem importância para estimativas
populacionais, estudos de demografia, organização social e ecologia (Pizo 2002). As
ararajubas foram encontradas em grandes clãs de até 20 indivíduos. De acordo com as
observações, amostragens populacionais para esta espécies serão mais representativas e
realísticas ser forem feitas preferencialmente na alvorada, período das 05:40 às 07:00 h
quando os bandos refletem com mais precisão os tamanhos dos clãs.
Possíveis causas da alta sociabilidade (grandes clãs)
A ararajuba é uma espécie relativamente de pequeno porte, o que teoricamente
produziria maiores ninhadas, das quais sairiam mais filhotes que aumentariam o tamanho do
clã (Reynolds 2003). Indivíduos que vivem em bandos grandes são capazes de utilizar com
83
mais eficiência os recursos alimentares por diminuírem o tempo com a vigilância contra
predação (Westcott e Cockburn 1988). Se isso é válido, as ararajubas que vivem em grandes
clãs têm maiores probabilidades de sobrevivência e reprodução. Isso pode ser corroborado
pelas observações focais em campo onde bandos defendem ativamente os sítios reprodutivos,
esquivam-se de potenciais predadores (gaviões e falcões) e apresentam sentinelas nos sítios
alimentares. É ainda uma espécie que ocorre nas regiões menos chuvosas da Amazônia (veja
Capítulo 1), o que também pode influenciar na sociabilidade da espécie (Cannon 1984, Pizo
2002). Além disso, é mais aparentada a Diopsittaca nobilis (Tavares et al. 2004), uma espécie
de áreas abertas e mais secas da América do Sul, onde ocorre em grandes bandos (Juniper e
Parr 1998).
De qualquer forma é uma sociabilidade bastante peculiar. Ao longo do dia os clãs
podem formar agrupamentos nos sítios alimentares ou se separarem em bandos menores da
defesa e vigilância do sítio reprodutivo. Embora haja formação de pares, provavelmente
casais, durante o período reprodutivo, o clã permanece agrupado durante todo o ano.
Aparentemente, há uma influência antrópica no tamanho dos clãs, mas isso pode ser
mascarado por outros fatores, como disponibilidade de sítios reprodutivos. Desta forma,
talvez o principal fator para a variação no tamanho dos clãs e bandos da espécie seria a idade.
Teoricamente, quanto mais velho o casal líder do clã mais indivíduos o clã teria. A formação
de um novo clã seria ocasionada pela formação de um novo casal mais o fato de o dormitório
do clã não suportar mais indivíduos. As observações de dois clãs na região de estudo podem
corroborar essa possibilidade. Nesse caso, 12 indivíduos foram observados em bando em
vários horários do dia, mas no fim da tarde, metade do bando se deslocava do dormitório dos
outros para outra árvore aproximadamente uns 400 metros distância. Mas isso precisa ser
confirmado com acompanhamento dos clãs e análises de parentesco entre os indivíduos.
Padrões Populacionais
De modo geral, as amostragens populacionais revelaram uma abundância real da
ararajuba difícil de ser obtida com clareza. Mesmo assim, os resultados obtidos com a
aplicação dos diferentes métodos foram condizentes e permitiram estimar uma população da
espécie na região de forma razoável e conservadora. Desse modo, juntamente com as
informações sobre o comportamento, alimentação e reprodução, foi possível inferir sobre o
status atual da ararajuba e sua vulnerabilidade.
84
Índice de abundância, detecção e ocupação
Os números obtidos com as amostragens nos T12 indicam que há uma alta
variabilidade no índice de abundância detectável da ararajuba. Se verificarmos as amostragens
de um mesmo transecto repetidas em um mesmo período, a detecção oscila de 0 a 14
indivíduos (veja transecto 054-066, no início da época chuvosa) ou de 15 a 38 (transecto 194-
206, no mesmo período). Isso denota que ao percorrer 12 quilômetros ao longo da
transamazônica pode-se não registrar a espécie, bem como detectar 20 ou mais indivíduos em
dois ou mais bandos. Isso, provavelmente deve-se à baixa detectabilidade do método (veja
abaixo) proporcionada pelo fato da espécie ser gregária, ou também devido, possivelmente, à
sua baixa densidade. Assim, a impressão que fica, considerando a fidelidade das araras e
outros psitacídeos às suas rotas e locais preferenciais, bem como sua grande área de vida
(Oren e Novas 1986, Collar 1997, Juniper e Parr, 1998), é que se não se cruza a rota do
bando, ou o sitio alimentar ou a região de dormitório naquele determinado momento, não se
registra os indivíduos.
As poucas amostragens ao longo do estudo não permitiram estabelecer variações
sazonais na abundância da ararajuba. Mesmo assim, as observações focais indicam que os
bandos possuem áreas preferenciais, sobretudo nas proximidades do dormitório (veja Biologia
Reprodutiva). Desse modo, pode-se dizer que um clã seja sedentário, possuindo,
possivelmente, uma área de vida relativamente limitada, de modo a se restringir à área ao
redor de um trecho da rodovia, sendo substituído por outro em outro trecho. Nessas áreas as
ararajubas podem ser vistas em vários horários do dia e praticamente o ano todo. Isso é válido
principalmente para regiões que ainda encontram-se preservadas, que é o caso deste estudo
(veja abaixo). Assim, considerando a escala das amostragens (grandes trechos bem
distanciados), é de se esperar que a abundância não deva variar ao longo das épocas do ano.
Desse modo, mesmo que os bandos possam desaparecer localmente, especialmente dos sítios
alimentares (veja Uso dos Recursos Alimentares), durantes alguns dias em determinados
períodos, não há evidências de que a espécie, na região, realize deslocamentos populacionais
extensos.
Foi detectada variação na abundância da ararajuba entre as porções de estudo. Apesar
do limitado poder de comparação devido a alta variabilidade, nota-se que na porção fora do
PNA ao sul do parque (Transectos 180-192 e 194-206) registrei mais bandos e indivíduos em
algumas das amostragens. Já na região norte, externamente ao PNA (Transecto 040-052),
todas as amostragens resultaram em apenas um contato com um bando. Os registros na porção
sul podem ser explicados pela presença dos dormitórios/ninhos (veja acima). Já a ausência de
85
registros na porção mais ao norte pode-se dever ao fato que a mata nesse trecho encontra-se
bem distante da rodovia. Desta forma, nota-se uma variação espacial de fato, que pode
evidenciar diferenças na distribuição dos recursos reprodutivos, bem como,
conseqüentemente, evidenciar o padrão de distribuição espacial heterogênea da espécie, além
do efeito do grau de antropização da área.
Além disso, embora os padrões de presença e ausência tenham resultado em uma
estimativa de ocupação para todos os trechos amostrados, mesmo onde a ararajuba não foi
detectada, certamente a ocupação deve variar ao longo da área de estudo, uma vez que em
alguns trechos (076-080 e 194-198) a espécie foi registrada em quase, se não, em todas as
ocasiões. Nesses trechos encontram-se os dormitórios e ninhos conhecidos e sítios
alimentares. Do outro lado, possivelmente a alta antropização nos trechos 040-044 e 048-052
não permitiu o registro da ararajuba nas proximidades da estrada.
Assim, com uma abordagem que considere a presença do dormitório e o grau de
antropização, pode-se obter mais detalhes sobre o que determina a presença da ararajuba em
uma localidade. Para os nossos dados não foi possível aplicar a modelagem com essas
variáveis devido ao baixo número de amostragens. De qualquer forma, acredito que a
ocupação e a ocorrência da ararajuba estão associadas à distribuição dos seus recursos
alimentares e reprodutivos, uma vez que são altamente fiéis e sedentárias a essas áreas. A
maioria dos psitacídeos, sobretudo araras, tem sua presença associada à distribuição dos sítios
alimentares, bem como aos locais de pernoite e nidificação (por exemplo, Anodorhynchus
hyacinthinus, Anodorhynchus leari, Cyanopsitta spixii, Orthopsittaca manilata [Juniper e Parr
1998]).
Portanto, conhecer o que é importante para a ararajuba tanto em termos alimentares
como reprodutivos será essencial para entender os padrões populacionais da espécie tanto em
escala local, como em escala regional. Além disso, novas iniciativas de estimar a detecção e
ocupação devem revelar se a espécie é associada a ambientes em regeneração ou levemente
alterados, como proximidades de estrada, ou se isso é apenas efeito da maior detectabilidade
nesses ambientes.
Em relação ao TIJ, o mesmo número de bandos foi encontrado por T. Kyle (in litt.
2006) para a mesma transecção no ano de 2005 (Figura 16), embora o número total de
indivíduos encontrado por ele tenha sido menor (n=87). Essa diferença no número de
indivíduos não pode ser considerada como aumento populacional, uma vez que, embora
alguns registros tenham sido feitos nas mesmas localidades, a maioria deles foram para
diferentes trechos da transamazônica, o que sugere bandos diferentes e evidencia uma
86
variação natural proveniente do método. Adicionalmente, o tamanho do bando é o mesmo
para aqueles encontrados na mesma localidade. Assim, pode-se dizer que a probabilidade de
detecção do método foi bastante baixa. Considerando as amostragens nos T12 e também a
localização de diversos registros de bandos ao longo do estudo na porção mais ao norte,
dentro do PNA, veremos que vários bandos não foram detectados. De qualquer forma, o mais
importante desta amostragem foi ter evidências de bandos em várias alturas da rodovia, tanto
pelos registros diretos como indiretos, através de entrevistas com moradores.
Comunidade de psitacídeos na região de estudo
Estudos desenhados para descrever a abundância de psitacídeos são poucos (veja
Galetti 1997, Gilardi e Munn 1998, Guix et al. 1999, Marsden et al. 2000, Karubian et al.
2002, Renton 2002) e não há precedentes para a Amazônia brasileira. Além disso, foram
realizados sob diferente metodologias, o que dificulta comparações. Mesmo assim, os valores
de índice de abundância são razoavelmente semelhantes, o que pode atestar a fiabilidade do
método utilizado no atual estudo para comparações entre espécies, mesmo que a detecção
entre as espécies seja diferente. Por exemplo, Forpus sp. ou Touit sp. são espécies muito
menos conspícuas e, por isso, podem passar despercebidas. Já araras, periquitos ou maitacas
são mais chamativas. De qualquer forma, a ararajuba apresentou uma abundância detectável
semelhante à de espécies comuns, que possuem extensas distribuições geográficas e não se
encontram ameaçadas. Assim, diferentemente do acreditado (Juniper e Parr 1998), a ararajuba
parece não ser rara, não pelo menos nessa região. Em Tucuruí, leste do Pará, a ararajuba é
relatada como relativamente comum (S. M. Dantas, in litt. 2008), assim como na Floresta
Nacional de Caxiuanã (R. M. Valente, in litt. 2006).
As amostragens também não deixaram nenhuma evidência de substituição local ou
competição entre a ararajuba com qualquer outra espécie de psitacídeo. Além disso,
Diopsittaca nobilis, a espécie mais aparentada a ararajuba (Tavares et al. 2004), não foi
detectada em nenhuma oportunidade. A. Aleixo (in litt. 2007) registrou simpatria dessa
espécie com a ararajuba na região do Rio Jamanxim, município de Novo Progresso-PA.
Silveira (2006) também constatou simpatria das espécies no município de Tailândia-PA.
Esses registros corroboram uma ausência de substituição geográfica entre as duas espécies.
Embora, certamente uma comunidade de psitacídeos seja estruturada em função da não
sobreposição dos nichos (alimentares, reprodutivos, tanto espaciais como temporais) entre as
espécies (Roth 1984, Galetti 1997, Gilardi e Munn 1998), ainda não há evidência de que a
87
ararajuba tenha uma distribuição local ou mesmo geográfica (veja Capítulo 1) limitada pela
presença de outras espécies.
Dormitórios, localização dos bandos e tamanho populacional mínimo
Com o transecto entre Itaituba e Jacareacanga (TIJ), o tamanho populacional mínimo
da ararajuba estaria em torno de 105 aves. Considerando como diferentes os bandos
localizados em diferentes localidades entre 2005 e 2007, tem-se algo como 150 aves, o que
ainda representa um número bastante baixo, principalmente para a região “quente” da
distribuição da espécie (BirdLife International 2007). Da mesma forma, a soma dos
indivíduos nos dormitórios resultou também em um número muito baixo (138 indivíduos em
11 dormitórios), além de ser aquém dos valores já obtidos pelas amostragens no TIJ.
Entretanto, durante o estudo, para vários bandos registrados em várias localidades
desconhecemos a localização dos seus dormitórios. Desse modo, uma alternativa mais
condizente foi somar os indivíduos dos clãs que reconhecemos como diferente dos outros
clãs, mesmo que não saibamos a localidade do seu dormitório. A população estimada com
essa soma (484 a 614 aves) foi semelhante à obtida com a extrapolação dos padrões de
ocupação (416 a 645 aves). F. Rohe (com. pess. 2008) estimou entre 59 e 114 indivíduos, para
uma área de aproximadamente 20 km
2
, sobrevivendo na região leste da distribuição da
espécie, no Maranhão, onde a ararajuba é tida como extinta. Ao longo do Rio Cupari, afluente
esquerdo do Tapajós, Kyle (2005) detectou 39 indivíduos de quatro bandos em 40km
percorridos.
Dessa forma, os números aqui obtidos são razoáveis e podem ainda ser considerados
conservadores. Além disso, ao longo do estudo, foi constatado que à medida que passamos
mais dias em campo e conhecemos melhor uma porção da região, registramos mais a espécie
e reconhecemos mais os clãs. De qualquer forma, se existem aproximadamente 500
indivíduos apenas ao longo da rodovia, pode ser, por um lado, que existam muitas vezes mais
na região como um todo. Entretanto, por outro lado, pode ser que todos os bandos da região
sejam concentrados ao longo da rodovia, onde se encontram os ambientes preferenciais.
Desse modo, as estimativas e extrapolações para uma região mais ampla devem ser
interpretadas com a devida cautela.
Extrapolação da densidade para área de estudo e para região
A estimativa de densidade encontrada neste estudo é menor que a estimativa de
densidade que foi utilizada pela BirdLife International (2007) para toda a distribuição da
ararajuba (entre 0.9 e 2.5 ind/ km
2
). Os valores da BirdLife extrapolados para toda a margem
88
esquerda do Rio Tapajós (4.000 km
2
), região que é ocupada por bandos da espécie em
praticamente toda extensão, resulta nas estimativas entre 3.600 e 10.000 indivíduos. Contudo,
a estimativa de densidade da BirdLife é proveniente de dados reconhecidos como de baixa
qualidade e por isso perde fiabilidade. A extrapolação com base na nossa estimativas de
densidade é um tanto mais conservadora e também mais próxima dos valores encontrados
para uma população mínima com base na localização dos bandos na área de estudo. O mesmo
se considerarmos a região mais ampla da área de estudo.
Estimativas para toda a distribuição e considerações sobre status e tendência populacional
Uma primeira forma conservadora de estimar a quantidade de indivíduos da ararajuba
que existe na natureza seria a de simplesmente somar os bandos nas localidades de registros,
mais as estimativas mínimas disponíveis para algumas localidades, mais nossa estimativa para
a região do presente estudo (veja, por exemplo, Tobias e Brightsmith 2007). Considerando
apenas os registros posteriores a 1987 (veja Capítulo 1) e para cada localidade um bando
médio de 10 ararajubas, temos 15 registros recentes que totalizam aproximadamente 150 aves.
Somado aos valores da nossa região, e ao número mínimo de ararajubas (n=54) encontrado
por F. Rohe (com. pess. 2008), para uma localidade no oeste do Maranhão a estimativa
resultante fica entre 1.554 e 3.104 aves. C. Yamashita (Reynolds 2003) estimou a população
total da ararajuba no início desta década em pelo menos 2.000 indivíduos, não mais do que
3.000. Não há informações sobre a procedência desta estimativa. Entretanto, para várias
localidades (por exemplo, Floresta Nacional de Caxiuanã, Represa de Tucuruí, Rio Cupari) os
registros referem-se à presença de vários bandos (R.M. Valente, S. M. Dantas, com. pess,
Kyle 2005). Desse modo, essa estimativa ainda pode ser considerada conservadora.
Existem outras formas de estimar o tamanho populacional total da ararajuba na
natureza baseados na extrapolação da densidade. Entretanto não sabemos se a ararajuba ocupa
toda a distribuição de ocorrência e as estimativas de área de ocupação estão sujeitas a vieses
de escala (IUCN 2001). Desse modo, evitei fazer extrapolações desse tipo, de modo a não
permitir interpretações equivocadas.
Dois fatores de cautela e incertos são importantes e devem ser levados em
consideração: o sistema social e reprodutivo e a associação com ambientes alterados.
Possivelmente as ararajubas se agrupam em clãs, supostamente familiares, formados pelo
casal reprodutivo e pelos seus descendentes (filhotes e juvenis imaturos) de diferentes
gerações (veja Padrões de agrupamento, Reynolds 2003). Como a média no tamanho dos clãs
fica entre 10 a 15 indivíduos é de se esperar que mais de 85% dos indivíduos não estejam
89
ativamente reproduzindo (isto é, apenas dois indivíduos reproduzem entre os 10 a 15). De
acordo com a Red List criteria (IUCN, 2001) uma espécie pode ser considerada em perigo de
extinção quando possui menos de 2.500 indivíduos reprodutivamente ativos. Desta forma, a
ararajuba ainda deve ser considerada em perigo, uma vez que menos de 460 indivíduos
estariam ativamente reproduzindo, de acordo com a estimativa entre 1.554 e 3.104. Da
população mínima estimada para a região do PNA, a população reprodutiva não seria maior
que 92 indivíduos.
O outro fator seria associado à tendência da espécie ser mais abundante em ambientes
levemente alterados (novas pastagens com abundância de árvores mortas ainda em pé). A alta
concentração de bandos encontrada nesses ambientes, inicialmente, pode indicar que a espécie
seja favorecida por essas alterações, de modo que nesses locais a população estaria
aumentando. Se isso é válido, esses ambientes funcionariam como fontes populacionais.
Entretanto, tais condições são instáveis. As árvores mortas são mais suscetíveis ao vento e à
derrubada pelo homem. Além disso, a vegetação ao redor das árvores é manejada e
freqüentemente queimada. Um dos dormitórios conhecidos ao sul da área de estudo foi
queimado de um ano para o outro (obs. pess.). Outra árvore usada como ninho da ararajuba
foi derrubada durante o período reprodutivo para retirada dos filhotes para venda ilegal, aonde
um clã de seis aves foi reduzido para quatro. Dois dormitórios ativos durante quase todo o
período do estudo foram abandonados provavelmente devido à queimada da vegetação
circundante. Adicionalmente, várias são as evidências da ação de traficantes na região
(escadas nas árvores, indivíduos cativos nas comunidades). Desse modo, com o passar do
tempo esses locais já não apresentam abundância das árvores úteis para a ararajuba, além de
encontrarem-se cada vez mais distantes da mata contínua, o que faria com que os bandos
tivessem de deslocar cada vez mais para encontrar alimento. Assim, a população estaria em
queda, de modo que esses ambientes funcionariam como sumidouros populacionais, para
aonde os bandos de várias regiões seriam atraídos pela inicial disponibilidade de sítios de
nidificação e falsas boas condições de proteção contra predação. Esses bandos não
apresentariam o sucesso reprodutivo esperado e, pelo contrário, perderia indivíduos devido à
morte acidental ou pela ação humana. Portanto, a situação da ararajuba na natureza ainda deve
ser considerada como insegura (Silveira e Belmonte 2005).
Uso dos Recursos Alimentares
Os registros de alimentação e as observações focais nos sítios alimentares em
diferentes períodos do ano permitiram melhor entender as necessidades alimentares da
90
ararajuba. Também possibilitou inferir em aspectos sobre deslocamentos populacionais
associados a alimentação, de modo a contradizer suspeitas anteriores. Além disso, foi possível
descrever aspectos do comportamento dos indivíduos durante a alimentação. Com isso, novas
idéias associadas ao comportamento social e à população da ararajuba na região foram
levantadas.
Preferências alimentares e especialização
O maior registro das espécies de murici (Byrsonima spp) não deve ser interpretado
como uma tendência ou a uma maior necessidade da ararajuba ao item. Essas duas espécies,
assim como a Tapirira guianensis aparentemente são bem abundantes ao longo da estrada, e
por isso fui capaz de registrar a ararajuba se alimentando dos frutos da espécie em várias
ocasiões. Isso também explica o maior consumo de sementes. Os poucos registros de itens
diferentes (flores, néctar, polpa) dão indicio da utilização mais diversificada dos recursos
alimentares, o que pode evidenciar necessidades nutricionais diferenciadas em diferentes
períodos do ano. Outras araras são mais especializadas no uso dos recursos alimentares, de
modo que são limitados pelo recurso (por exemplo, Anodorhynchus hyacinthinus, Cyanopsitta
spixii, Orthopsittaca manilata – [Juniper e Parr 1998]). Mas, de qualquer forma, esse não é
um fator associado com o risco de extinção em psitacídeos neotropicais (Galeti et al. 2002).
Embora tenhamos visto a ararajuba se alimentando de arroz, não há queixas nem
relatos por moradores ou fazendeiros da espécie atacando plantações. Na região do estudo,
portanto, a espécie não parece ter problemas com perseguição por supostos ataques. Outros
psitacídeos, principalmente algumas espécies ameaçadas, são mais relatadas em ataques a
plantações de milho e outros itens (por exemplo, Anodorhynchus leari [IBAMA, 2006]).
Não foi possível verificar se a alimentação é diferente ao longo da área de estudo.
Entretanto, alguns dos itens consumidos não correspondem aos itens conhecidos como dieta
da ararajuba (Oren e Novaes 1986, Collar 1997, Juniper e Parr 1998). Sick (1997) relata que
os cocos do Açai (Euterpe sp) são os itens preferidos pela espécie. Na área de estudo, não
obtivemos registro algum da ararajuba alimentando-se de açai, bem como moradores e
trabalhadores da região dizem nunca terem visto a espécie se alimentando dos cocos dessa
palmeira. C. Yamashita (in litt. 2008) sugere que o item mais importante para a ararajuba seja
Croton matourensis (Euphorbiaceae).
Como sugerido por Kyle (2005), o murici (Byrsonima sp.1) apresentou ser importante
item alimentar no período de crescimento dos filhotes (fim de maio a início de julho). Nesses
meses, foram obtidas várias observações de vários bandos se alimentado do item, bem como a
91
maior concentração de indivíduos e bandos numa mesma localidade. Mesmo assim,
aparentemente a espécie não depende do murici em outras épocas do ano.
Embora a dieta pareça diversificada evidenciando pouca especialização alimentar, as
aves parecem apresentar preferência por alguns itens em detrimento de outros. No mês de
julho e agosto, uma árvore localmente conhecida como Morototó (Schefflera morototoni
Araliaceae) frutificava ao longo da transamazônica (obs. pess.) e serviu de alimento para
dezenas de espécies frugívoras (Ramphastidae, Contigidae, Cracidae, Thraupidae) incluindo
psitacídeos (Pionus menstruus, Aratinga leucophtalma). Entretanto, não encontramos
evidência nem registramos a utilização do item pelos bandos de ararajuba. Oren e Willis
(1981) relata a alimentação de Bacaba (Oenocarpus bacaba) pela ararajuba na região do
PNA, mas nos meses de outubro a dezembro, durante a frutificação do item, não obtivemos
registros alimentares para a ararajuba. Nesses meses, fizemos vários registros de alimentação
da bacaba por parte de outras araras (Ara macao e Ara chloropterus) além de Aratinga
leucohphtalma, que freqüentavam assiduamente as mesmas bacabeiras dia após dia. Dessa
forma, a ararajuba não pode ser considerada uma espécie oportunista, embora não seja
especializada em nenhum item.
A maioria dos itens listados como dieta da espécie na literatura refere-se a espécies de
vegetação secundária (Protium, Oenocarpus, Tetragastris, Cecropia) ou manejadas pelo
homem, como milho, arroz, manga, murici (veja Oren e Novaes 1986, Collar 1997, Juniper e
Parr 1998). O mesmo ocorre para este estudo, embora tenhamos evidencia de alguns itens de
floresta primária. Desta forma, a dieta da espécie na mata contínua ainda permanece
desconhecida, o que dificulta o reconhecimento dos recursos necessários e, por conseqüência,
o seu manejo em ambiente natural. Desse modo, pesquisas futuras deverão focar o uso dos
recursos alimentares na mata contínua.
Sazonalidade e deslocamentos em função da alimentação
Não há evidências de que haja deslocamentos sazonais na escala do estudo em função
da frutificação ou floração de itens. Os bandos podem ser encontrados nas mesmas
localidades e são fiéis aos seus dormitórios ao longo de todo o ano. Por outro lado,
deslocamentos, em uma menor escala, são prováveis e foram evidenciados pela a ausência
local dos bandos durante alguns dias nos locais de alimentação. Os deslocamentos observados
de alguns bandos entre as duas margens do rio Tapajós podem ser explicados, pela falta de
alimento na margem oeste, uma vez que apresenta maior grau de desmatamento ao longo do
92
rio proporcionado pela expansão das vilas (Pimental e São Luiz do Tapajós), abertura de roças
e pastagens.
Assim, se existem deslocamentos sazonais em função da alimentação, este não foi
detectado na escala do estudo. Os possíveis padrões sugeridos por Juniper e Parr (1998)
podem se tratar de deslocamentos locais. Uma falsa tendência pode surgir em entrevistas
como moradores, que sugerem que os bandos da espécie desaparecem em determinadas
épocas. Isso por que a espécie é freqüentemente vista alimentando-se do murici, que é
cultivado nas proximidades das casas e nas comunidades para alimentação humana, de modo
que na época em que o item não está em frutificação, a ararajuba simplesmente não aparece
nos arredores das vilas e, conseqüentemente, não é notada pelas pessoas. Isso pode fazer com
que os moradores imaginem que os bandos se deslocam pra locais distantes.
Também não há qualquer evidência de nomadismo da espécie nessa região, ao
contrário do que sugere a BirdLife International (2007). Talvez, esse comportamento seja
mais notável na porção leste da distribuição da espécie, aonde os bandos teriam mais
dificuldade de encontrar alimento nos fragmentos florestais em algumas épocas, de modo a
fazerem deslocamentos mais extensos. Além disso, os registros alimentares da ararajuba para
diferentes espécies em diferentes períodos do ano (veja Figura 18) também indicam que a
espécie não faz deslocamentos sazonais e sim utiliza de outros itens pra suprir suas
necessidades energéticas.
Hábitos, comportamento, vigilância e alimentação de juvenis
O maior número de registros obtido no meio da manhã pode ser explicado pelo maior
esforço de observações nesses horários. Mesmo assim, provavelmente, são nesses os horários
que a espécie prefere se alimentar, o que é normal para outras araras e psitacídeos (Pizo
2002), e também porque os registros obtidos ao meio dia foram em dias chuvosos. Nos dias
chuvosos, notamos que os bandos permaneciam nos arredores do dormitório ou mesmo dentro
da cavidade até que a chuva acabasse.
Aparentemente, os clãs possuem rotas habituais e diretas entre o sítio reprodutivo e os
sítios alimentares, como constatado por Oren e Novaes (1986). Os deslocamentos diretos
observados neste estudo devem envolver aspectos de aprendizagem por parte dos indivíduos
do bando. Além disso, dentro dos sítios alimentares os bandos deslocam-se freqüentemente
entre as árvores e moradores relatam a utilização das mesmas árvores nos anos anteriores. A
observação do juvenil deixado sozinho em um muricizeiro florido também evidencia aspectos
de aprendizagem. Além disso, uma explicação para a suposta permanência dos juvenis e
93
juvenis dentro do clã seria a aprendizagem tanto em termos de alimentação como de
reprodução (Reynolds 2003). Após o primeiro vôo, os juvenis ainda são incapazes de quebrar
os frutos e de se alimentar sozinhos (T. Kyle, com. pess. 2007).
Os grandes agrupamentos da ararajuba (mais de 20 indivíduos) foram observados nos
sítios alimentares (veja Padrões de Agrupamento). Oren e Novaes (1986) como F. Rohe (com.
pess. 2008) relatam bandos de mais de 50 indivíduos, mas de acordo com as observações
neste estudo estes devem ser agrupamentos em sítios alimentares e não se referem a um clã
em especial.
Não foi possível verificar quantitativamente competição no uso dos recursos
alimentares entre a ararajuba e outros psitacídeos. A utilização do murici por bandos de
Pionus menstruus não deve ser impactante para a ararajuba, uma vez que o item é
amplamente disponível e em algumas árvores o fruto amadurece e cai sem que seja utilizado.
Entretanto, dois itens foram compartilhados com Ara macao. Em relação à Abuta sp.não deve
haver competição, uma vez que provavelmente enquanto a Ara macao come a semente a
ararajuba deve comer a polpa devido ao grande tamanho da semente. Já para o Hymenea sp,
ambas comem as flores ou os brotos. Ara macao também interagiu em diversas ocasiões nos
sítios reprodutivos e talvez seja a espécie mais associada à ararajuba. Desta forma, estudos
que visem estudar a sobreposição de nicho entre as duas espécies podem ser usais para
esclarecer o uso dos recursos da ararajuba.
Por fim, a dieta da espécie é bem diversificada, mesmo assim não pode ser
considerada uma espécie oportunista. Tem suas preferências alimentares e basicamente deve
ter diferentes dietas em diferentes localidades. Não apresenta uma especialização alimentar
como outras araras e suas escolhas e preferências devem ser associadas à aprendizagem.
Possuem sítios alimentares que são freqüentados praticamente em todos os períodos do ano e
são defendidos contra a invasão de bandos não reconhecidos. Não há evidência de
deslocamentos populacionais extensos em função da alimentação, embora em escala local isso
possa ocorrer. Um vazio ainda existe em relação aos itens alimentares consumidos durante os
meses mais secos do ano e em relação aos itens consumidos em ambientes primários. Além
disso, não há informações sobre a importância nutricional de cada item. Desta forma, embora
seja difícil analisar a dieta da espécie em mata contínua, mais informações são necessárias
para prever deslocamentos locais e interação entre clãs, além de determinar se a espécie é
mesmo beneficiada por vegetações em crescimento secundário.
94
Biologia reprodutiva
O acompanhamento dos ninhos neste estudo ofereceu novas informações que,
somadas às existentes, permitiu melhor entender os recursos reprodutivos utilizados pela
espécie. Alguns aspectos previamente suspeitados não foram corroborados. As observações
indicaram interações mais contundentes com outras espécies de psitacídeos. Portanto, abriu
caminho para novas pesquisas que devem confirmar as suspeitas aqui levantadas.
Localização e descrição de dormitórios e sítios reprodutivos
O padrão agrupado dos ninhos encontrados pode estar associado à disponibilidade de
locais de nidificação (árvores mortas – veja abaixo) que são numerosas em pastagens recém-
formadas. Em outro sentido, pode ser associado com a sociabilidade da espécie, de modo que
onde um clã se estabelece, outros tendem a se estabelecer. Isso tem sido evidenciado para
ninhos comunais de Myiopsitta monachus no pantanal, em uma menor escala, onde o
agrupamento dos ninhos tem vantagens em relação à detecção de predadores e à habilidade de
encontrar sítios alimentares (Burger e Gochfeld 2005). Entretanto, para a ararajuba alguns
clãs são hostis à presença de outros clãs nos arredores do ninho ou dormitório. Em outros
casos, os clãs são amigáveis e não há reação hostil perceptível. Talvez isso seja explicado pelo
grau de parentesco entre os clãs, em que clãs menos aparentados seriam mais hostis uns aos
outros.
A despeito da dificuldade de encontrar ninhos na mata contínua, todos os ninhos
localizavam-se em áreas abertas. Outros dois dormitórios encontrados mais ao sul na
transamazônica também estavam em ambientes abertos (Kyle 2005), assim como os
encontrados por Oren e Novaes (1986). O ninho encontrado por Silveira e Belmonte (2005),
situava-se em árvores isoladas da mata pela estrada. Outros dormitórios encontrados em
outras localidades também consistiam de árvores emergentes situadas na beira da estrada em
vegetação secundária. I. Rohling (in litt. 2006) encontrou pelo menos oito ararajubas
pernoitando em uma árvore morta emergente na localidade conhecida como Monte Carmelo,
nas proximidade do Rio Guajará, baixo Amazonas. Condição semelhante foi encontrada por
Yamashita e França (1991) na Floresta Nacional do Jamari, bem como por Kyle (2005) na
região do Rio Cupari, margem direita do Rio Tapajós. No leste do Pará, região do Rio Capim,
em Paragominas, Carlos Yamashita localizou 13 ninhos ativos, todos situados em pastagens e
distantes até três km dos fragmentos de mata (Reynolds 2003).
Embora moradores reportem a existência de ninhos e dormitórios localizados no
interior da mata (Oren e Novas 1986, Kyle 2005) não há registros confirmados muito menos
95
descrições detalhadas sobre esses ninhos. Essa possível tendência a nidificar em áreas abertas,
pode ser associada ao risco de predação no interior da mata, devido ao acesso mais fácil para
cobras e macacos (Oren e Novaes 1986). Além disso, em área aberta o clã teria mais
facilidade em localizar potenciais predadores nas proximidades. Por outro lado, ninhos em
áreas abertas são mais notáveis para outras aves, como tucanos e falconiformes, sobretudo
para uma espécie extremamente conspícua, o caso da ararajuba. Outra desvantagem seria o
risco de queda da árvore pelo vento (Reynolds 2003).
Entretanto, pode ser apenas uma falsa tendência uma vez que é mais difícil localizar
ninhos em ambientes florestados (Guedes e Seixas 2002). Mesmo assim, esse comportamento
pode ser resquício da sua origem junto à espécie que vive em áreas abertos (Diopsittaca
nobilis) ou mesmo uma característica geral aos psitacídeos, que tendem a nidificar em árvores
emergentes ou em áreas com visibilidade maior (Collar 1997). Na área de estudo, ninhos de
Ara macao e Ara ararauna também foram encontrados em ambientes semelhantes (obs.
pess.).
Aparentemente há uma escolha maior por árvores mortas. Oren e Novaes (1986)
relataram três árvores mortas e apenas uma viva. O ninho observado por Silveira e Belmonte
(2005) estava em uma árvore viva, mas situava-se em um galho quebrado. Também estavam
em árvores mortas os ninhos encontrados por C. Yamashita (Reynolds 2003, Toa Kyle, com.
pess. 2007). Essa tendência em nidificar e dormir em árvores mortas pode ser explicada pela
maior capacidade dessas árvores apresentarem melhores condições de formarem cavidades.
Além disso, são abundantes em áreas recém desmatadas, onde as árvores vivas perecem após
a queimada (obs. pess.). Em outro sentido, pode ser apenas resultado da competição por
cavidades (veja abaixo).
Em termos de espécie arbórea, estrutura da árvore e quantidade, altura e dispisição das
entradas, não encontramos nenhum indício de seleção. Também não pode-se corroborar a
tendência levantada por Oren e Novas (1986) em que os ninhos são encontrados em cavidades
altas (mais de 30 metros), apesar do ninho encontrado por Silveira e Belmonte (2005). As três
árvores mortas relatadas por Oren e Novas (1986) não foram identificadas, já a árvore viva foi
identificada como Tachí (Sclerobium sp.). Yamashita e França (1991) encontraram a espécie
utilizando uma Muiricatiara (Astronium lecointei) e o ninho encontrado por Silveira e
Belmonte (2005) estava em um Angelim (Dinizia exclesa). Assim, não há qualquer indicio
que corrobore a hipótese levantada por C. Yamashita (Silveira e Belmonte 2005) de que o
Angelim seja essencial para a ararajuba, não, pelo menos, na região deste estudo.
96
De modo geral então, embora características das árvores não sejam importantes
individualmente, acreditamos que os clãs devem considerar alguns aspectos na escolha do
ninho ou dormitório. Em primeiro lugar, a árvore deve estar em uma área mais aberta, ou estar
emergente do restante da vegetação, para que os indivíduos tenham uma ampla visão do
ambiente que os cerca. Se não apresentar galhos ou ramificações, outra árvore seca deve estar
nas proximidades, para servir de local de pouso e vigilância nos momentos de alimentação
dos juvenis e nos minutos antes de adentrarem para o pernoite. Outras árvores também devem
existir para servirem de local de arrumar penas e brincadeiras, além de descanso (Kyle 2005).
Internamente, a cavidade deve ser ampla de modo que permita acomodar os numerosos
indivíduos do clã e no período de incubação dar melhor acomodação e maior segurança aos
ovos. Nisso, o substrato também deve ser importante. Por fim, o ambiente não deve sofrer
perturbações antrópicas (queimadas, derrubada de árvores), sobretudo no início do período
reprodutivo, para que o clã não se sinta ameaçado (veja Comportamento). Brightsmith (2005)
tem encontrado para outras araras e psitacídeos uma maior especialização quanto à escolha da
árvore ninho, além da predominância por árvores vivas, pelo menos para Amazônia Peruana.
Período reprodutivo e ciclo anual
O período reprodutivo da ararajuba é descrito como de novembro a abril, às vezes um
pouco mais cedo ou até mais tarde (Oren e Novaes 1986, Collar 1997, Juniper e Parr 1998).
Na região leste da distribuição da espécie, Silveira e Belmonte (2005) observaram os
primeiros vôos de um dos filhotes no fim de janeiro e inicio de fevereiro, evidenciando que a
reprodução para tal clã pode ter se iniciado em meados de outubro, uma vez que o período de
incubação e de crescimento dos filhotes até o primeiro vôo seja de aproximados 100 dias
(Oren e Novaes 1986, T. Kyle com. pess. 2008). A impressão que surge, considerando
também as nossas observações, é que deve haver variação geográfica quanto ao início do
período reprodutivo, que pode ser regulado pelo início do período chuvoso (veja Roth 1984).
Na região do PNA, a época chuvosa tem início em dezembro (Moraes et al. 2005). Por outro
lado, pode ser apenas resultado de uma variação normal, na qual os clãs começam a se
reproduzir de acordo com características comportamentais ou outros aspectos locais.
Os nossos dados também evidenciam uma possível assincronia na ovopisição, eclosão
dos ovos e desenvolvimento dos filhotes. Oren e Novaes (1986) relatam por meio de
entrevistas com caçadores a existência no mesmo ninho de ovos e filhotes em diferentes
estágios de desenvolvimento. Assincronia na eclosão dos ovos e desenvolvimento de filhotes
é comum em psitacídeos e um fator crítico para o manejo e as técnicas de incremento
97
populacional por sua influência no sucesso reprodutivo (Stoleson e Beissinger 1997, Sigel et
al. 1999, Kuniy et al. 2006).
Assim, o ciclo anual da ararajuba na região pode ser dividido em várias partes, as
quais são associadas de uma maneira ou de outra à reprodução. De agosto a novembro as
ararajubas se dedicam à procura de sítios reprodutivos e à formação de casais. Após isso, o
período de incubação deve ir de novembro a janeiro, possivelmente de acordo com a
localidade geográfica e devido à suposta assincronia na postura dos ovos. Com os ovos
eclodidos, o período de crescimento dos filhotes pode ir até março ou abril. Após o primeiro
vôo dos filhotes pode-se definir um período de cuidado e segurança dos juvenis, que
permanecem nos arredores do ninho, de março a maio. Por fim, de maio a outubro (ou até
novembro), um período de aprendizagem dos juvenis (onde comer, o que comer, como
quebrar os frutos, etc), finalizando o ciclo.
Com um monitoramento futuro, mais detalhes devem ser obtidos sobre as diferentes
fases do período reprodutivo, bem como os períodos críticos e as datas chaves como eclosão
dos ovos e primeiro vôo dos filhotes. O acompanhamento dos dormitórios deve revelar se
existe mesmo uma diferença no início da reprodução entre localidades. A inspeção dos ninhos
é necessária para descobrir o estado de desenvolvimento dos filhotes em cada período, e,
conseqüentemente, determinar se existe assincronia na postura dos ovos. De qualquer forma,
as informações obtidas devem ajudar no estabelecimento dos cronogramas de futuras
pesquisas com a reprodução da espécie.
Hábitos, comportamentos e atividades diárias durante a reprodução
Durante o período reprodutivo, os clãs da ararajuba pernoitam junto aos filhotes. Nos
poucos ninhos que acompanhamos, aparentemente, é com o avanço do período reprodutivo
que todo o clã passa a pernoitar dentro da árvore. Silveira e Belmonte (2005) relataram que os
indivíduos adultos deslocavam-se para outra árvore e somente os filhotes permaneciam no
ninho. Os autores acima citados sugeriram que o tamanho já avantajado dos filhotes impedia
que todo o clã pudesse pernoitar na cavidade ninho, uma vez que já não seria grande o
suficiente para abrigar todo o grupo. Nesse sentido, as minhas observações vão de contra a
hipótese levantada por eles. Assim, uma explicação alternativa seria a termoregulação, que
também é uma das possíveis explicações para o fato de alguns psitacídeos pernoitarem dentro
de cavidades (Collar 1997, Burger e Gochfeld 2005). Outra possibilidade seria a própria
organização espacial dos indivíduos dentro do ninho, uma vez que durante o período de
incubação seria importante evitar movimentos bruscos (Reynolds 2003).
98
Destacamos diversas atividades e comportamentos diários para os clãs de ararajuba
durante a reprodução. De modo geral são atividades associadas à socialização dentro e entre
clãs, quase sempre caracterizadas por bastante vocalização, que consomem dezenas a centenas
de minutos no dia e conseqüentemente recursos energéticos. Nesse sentido, devem ser
importantes para a sobrevivência ou reprodução diferencial dos indivíduos, de modo que
compõem comportamentos selecionados ao longo do tempo evolutivo.
De modo geral, portanto, essas atividades e comportamentos parecem ser importantes
para a reprodução. A sociabilidade e brincadeiras devem ser resultantes de permanência de
juvenis de diferentes gerações, o que pode ser associado a uma reprodução cooperativa, que
deve aumentar o sucesso e o recrutamento de novos indivíduos (Reynolds 2003). Um
comportamento mais discreto dos supostos pais devem garantir a segurança do clã. Já a
exploração de árvores deve influenciar nas escolhas dos sítios reprodutivos visando também o
sucesso na reprodução.
Competição intra e interespecífica por sítios reprodutivos
A competição por sítios de nidificação é bem documentada para psitacídeos como
também para outras espécies que dependem de cavidades (Brightsmith 2005). A ararajuba,
desta forma não está fora das relações competitivas. Observamos comportamento de defesa de
território, tanto nos sítios reprodutivos como nos sítios alimentares. Uma plausível explicação
para a hostilidade diferencial entre clãs pode residir nas relações de parentesco entre eles, mas
não possuímos essas informações.
Aparentemente apenas a Ara macao tem mais importância para a ararajuba. Tanto A.
ararauna como O. manilata têm preferências de nidificar em palmeiras (Mauritia flexuosa
[Brightsmith 2005]) e aparentemente não são competidores fortes em relação a ararajuba. A
mesma preferência tem sido noticiada para A. amazonica (Bonadie e Bacon 2000), mas na
área de estudo, a espécie foi vista explorando várias árvores secas de modo que possa ser uma
competidora mais importante. Por outro lado, em algumas ocasiões os pares e bandos dessa
espécie não foram expulsos, o que pode ser explicado pelas diferenças no período
reprodutivo, em que A. amazonica reproduz-se no período seco (Bonadia e Bacon 2000). Já a
Ara macao reproduz-se principalmente em cavidades de árvores vivas e de novembro a abril
(Vaughan 2003, Brightsmith 2005) e talvez por isso seja a principal competidora para a
ararajuba, fazendo com que os bandos de ararajuba tenham de se contentar com árvores
mortas não escolhidas pela araracanga, possivelmente mais suscetíveis e mais instáveis
(Vaughan 2003).
99
Tamanho da ninhada, sucesso reprodutivo e tendências
Pelo acompanhamento dos ninhos, obtive um indicativo do tamanho da ninhada pela
quantidade de indivíduos que ficam dentro da cavidade. Contudo, não posso dizer se todos os
ovos são postos por uma mesma fêmea, fertilizados pelo mesmo macho ou não (Albertani et
al. 1997), ou se são postos por mais de um casal (Oren e Novaes, 1986). Além disso, não
temos certeza se os indivíduos que permanecem dentro do ninho estão de fato incubando um
ovo cada um, e se estão, ainda podem ser juvenis “helpers”(Reynolds 2003).
Outra evidência do tamanho da ninhada é a quantidade de juvenis dentro dos bandos
(veja Padrões de Agrupamento). Na maioria dos clãs observados durante o período pós-
reprodutivo, o número de juvenis era de dois indivíduos, entre um e quatro. Mas em vários
registros não fomos capazes de detectar juvenis. Na porção leste da distribuição da ararajuba,
Reynolds (2003) relata bandos compostos somente por indivíduos adultos. Isso pode ser
evidência de baixo sucesso reprodutivo, procedente da predação, ou conseqüência da
pilhagem por traficantes de animais silvestres, ou ainda devido à mortalidade natural de
filhotes ou mesmo devido à infertilidade de casais novos (Reynolds 2003). De qualquer
forma, essa é uma informação essencial para entender a dinâmica populacional e necessita ser
verificada. Os números que existem são para aves em cativeiro (sujeitas a condições
diferenciadas) ou provenientes de terceiros (caçadores ou mateiros). Oren e Novaes (1986)
noticiam dois a noves ovos e filhotes em diferentes estágios de desenvolvimento através de
relatos de caçadores. Para cativeiro, os números também são bem maiores (Oren e Novaes
1986, Sick 1997).
Assim, a biologia reprodutiva da ararajuba também é bastante peculiar e merece
maiores investigações. É a única espécie, ou umas das poucas, que continua usando o ninho
como dormitório durante o período não-reprodutivo, onde os clãs pernoitam em conjuntos de
até 20 indivíduos. Aparentemente são fiéis aos sítios reprodutivos ano após ano. Da mesma
forma, de modo geral, preferem nidificar em árvores isoladas da vegetação, que apresentam
amplas cavidades, mas parece não haver uma grande seleção quanto a estrutura da árvore em
si. Durante a reprodução, os indivíduos dentro dos clãs são extremamente sociais e talvez essa
sociabilidade possa explicar uma suposta concentração de sítios reprodutivos em algumas
localidades, embora alguns clãs sejam hostis a presença de outros. Apresentam um ciclo anual
bastante condicionado às diferentes fases reprodutivas, as quais devem iniciar em períodos
diferentes em função da localidade ou mesmo em função da sociabilidade. Há evidência de
assincronia tanto na postura, eclosão e desenvolvimento dos filhotes e um baixo sucesso
reprodutivo. Provavelmente compete com outras espécies, principalmente com a Ara macao,
100
pela escolha dos sítios reprodutivos. Entretanto, ainda faltam informações essenciais para
inferências consistentes sobre tendências populacionais. Ainda não sabemos se é uma
reprodução cooperativa ou comunal, o que limita a compreensão da sua suscetibilidade à
extinção.
Interações com outras aves e outros animais
A ararajuba apresentou reação diferenciada à diferentes espécies de aves e outros
animais. Silveira e Belmonte (2005) observaram em várias vezes a reação de defesa não
somente contra falconiformes, mas também contra urubus, tucanos e outros psitacídeos. A
interação com Falco rufigularis talvez seja explicada pelo competição por locais de
nidificação, uma vez que espécie também utiliza de cavidades em árvore mortas para se
reproduzir (Sick 1997). A indiferença à presença de pica-paus e passeriformes talvez seja
explicada pela utilização diferenciada das cavidades de árvores. Além disso, pica-paus são
conhecidos como perfuradores/escavadores primários, que disponibilizam cavidades para
várias outras espécies dependentes desse tipo de local para nidificação (Sick 1997), de modo
que a interação possa não ser antagônica.
A ausência de reação de defesa contra tucanos foi inesperada. Tanto Oren e Novaes
(1986) como Silveira e Belmonte (2005) relataram reação da ararajuba à presença dessas aves
nos sítios reprodutivos. Além disso, um morador relatou ter visto um ninho da ararajuba ser
predado por tucano mais ao sul da região do estudo. Assim, uma plausível explicação para
essas observações é que a árvore em que encontrava-se o ninho da ararajuba, nos casos
observados neste estudo, não permitia que uma ave do porte de um tucano entrasse para
predar os ovos ou filhotes (Oren e Novaes 1986). Assim, todas essas interações devem ser
consideradas no planejamento de manejo futuro da ararajuba.
Conservação: ameaças, implicações e recomendações
A BirdLife International (2007) considera a destruição do habitat e a caça como as
principais ameaças à ararajuba. Essas ameaças seriam as responsáveis pela diminuição da sua
área de ocorrência e conseqüentemente a diminuição da sua população reprodutiva mínima
estimada. Com isso, por ter menos de 2.500 indivíduos ativamente reprodutivos na natureza
em uma área de ocorrência de aproximadamente 100 mil km2 a ararajuba é considerada em
perigo.
101
A caça para o tráfico de animais silvestres é uma das principais ameaças a diversas
espécies de psitacídeo (Collar 1997, Snyder et al. 2000, Galleti et al. 2002). A ararajuba, por
sua beleza e raridade, ainda sofre com essa perseguição, sobretudo na porção leste da
distribuição. Kyle (com. pess. 2007) relata a venda indiscriminada de filhotes por menos de
R$30, além de diversos indivíduos domesticados pelas pessoas, na região do rio Capim
(Paragominas – PA). Para a Reserva Biológica de Gurupi e arredores (MA), C. Yamashita (in
litt. 2008) tem relatado a caça tanto para alimento como para venda ilegal. Silveira (2006)
reporta a captura de filhotes em diversas localidades no município de Tailândia (PA). Essa
atividade ilícita torna ainda mais ameaçada a já vulnerável população da espécie sobrevivente
nessa região altamente devastada.
Na porção oeste da distribuição a caça para o tráfico até então não tem sido detectada e
não é alarmante como na porção leste (Kyle 2005). Entretanto, na região do Parque Nacional
da Amazônia, encontramos evidências de traficantes e de animais capturados para servir de
pets. Uma árvore ninho foi derrubada durante o período reprodutivo para a retirada dos
filhotes. Nessa ocasião, um clã de seis ararajubas foi reduzido para quatro. Os moradores da
vila onde se encontrava a árvore relutaram a fornecer informações sobre os responsáveis. Em
2006, um vigilante do Parque Nacional da Amazônia encontrou um indivíduo da espécie
severamente maltratado, e utilizado como mascote da seleção brasileira de futebol, em um bar
na periferia da cidade de Itaituba. Ainda esse ano, outros moradores da transamazônica
relataram que possuíam indivíduos cativos da espécie e que em diversas vezes outras pessoas
lhe ofereciam dinheiro em troca do animal. Além disso, algumas árvores na beira da estrada
apresentam escadas para que possam ser escaladas para a retirada de filhotes. Desta forma,
parece ser uma atividade que vem crescendo juntamente com o aumento do desmatamento e
da população humana nessa região.
Embora o impacto dessas atividades nas populações da espécie nunca foi estimado,
acredito, que pelo menos para região do Parque Nacional da Amazônia, não seja alarmante.
De qualquer forma, atividades de educação ambiental e fiscalização tanto em nível local como
em nível regional devem diminuir essa atividade criminosa na região. Em 2005, algumas
palestras foram conduzidas nas comunidades próximas à transamazônica (Kyle 2005) e
aparentemente surgiram resultados. Alguns moradores relatam nunca mais pegar a espécie
para criar nem deixar que outras pessoas capturem. Recentemente, foi fundada a Associação
dos Amigos do Parque Nacional da Amazônia (a AMIPARNA), que também tem conduzido
palestras e atividades educativas nas comunidades nos arredores de Itaituba, que tem
auxiliado na conscientização da população quanto à raridade e vulnerabilidade da ararajuba.
102
Dessa forma, a caça para o tráfico, pelo menos na região deve ser mitigada nos próximos
anos.
Mesmo assim, a principal ameaça à sobrevivência da ararajuba na natureza é a
destruição da Amazônia (Juniper e Parr 1998, BirdLife International 2007). A área de
ocorrência da espécie foi reduzida em pelo menos 40%, provavelmente devido ao
desmatamento nas porções leste e sul, o “arco do desmatamento” (veja Capítulo 1). Por outro
lado, nos últimos anos, diversas unidades de conservação foram criadas na porção central,
principalmente entre os rios Tapajós e Xingu. Embora sejam consideradas “reservas de papel”
(Torres e Figueiredo 2005) essas unidades de conservação devem retardar o desmatamento e
proteger grandes áreas que possivelmente são ocupadas pela ararajuba. Além disso, juntam-se
a outras unidades implementadas aonde a espécie ocorre. Assim, se essa é uma medida para
garantir a sobrevivência da espécie, o que falta é garantir a proteção dessas áreas, o que não é
uma tarefa fácil, considerando o descaso do governo e o tamanho das áreas (Torres e
Figueiredo 2005).
Entretanto, o efeito da destruição ambiental nas populações da ararajuba não é simples
e direto. Alterações na vegetação não necessariamente excluem a espécie do local, assim
como áreas preservadas não necessariamente abrigam bandos de ararajuba. A ocupação do
espaço pela ararajuba parece ser bastante complexa, o que dificulta a identificação dos
mecanismos pelos quais a alteração ambiental ameaça suas populações. O entendimento
desses mecanismos é essencial para determinar quais medidas mais diretas devem ser tomadas
para garantir a sobrevivência da espécie.
Diferentemente das outras espécies ameaçadas de psitacídeos, a ararajuba não
apresenta algumas características básicas associadas ao risco de extinção, como grande
tamanho corporal, distribuição geográfica restrita e, teoricamente, alta especificidade de
habitat (Galetti et al. 2002). Não é dependente de nenhum item alimentar, nem de nenhuma
árvore como sitio reprodutivo. Apresenta um comportamento que de modo geral maximiza a
sobrevivência dos indivíduos e a sua longevidade (veja Covas e Griesser 2007). Esses fatores
não podem explicar as ameaças à espécie. Desse modo, uma alternativa como principal fator
que a torne suscetível à extinção seria seu complexo e peculiar sistema social e reprodutivo,
que ainda carece de definições. Uma das possibilidades indica que mais de 85% dos
indivíduos não são ativamente reprodutivos. Isso resulta em uma baixa taxa de reprodutiva,
que é uma das principais características associadas ao risco de extinção (Galetti et al. 2002).
Essa suposta baixa taxa de crescimento populacional pode ser agravada por outro fator que
tem sido negligenciado. A ararajuba aparentemente tem sido associada à ambientes alterados
103
e à áreas de vegetação em crescimento secundário (C. Yamashita, in litt. 2008; veja também
Oren e Novaes 1986, Pacheco e Olmos 2005), mas como vimos (veja Padrões Populacionais),
possivelmente o que nos faria pensar que a espécie seria beneficiada pela alteração ambiental,
na verdade, à torna muito mais vulnerável.
Considerando essas incertezas sobre tais aspectos biológicos, novas pesquisas devem
focar na análise nos aspectos comportamentais e reprodutivos, bem como na relação com
ambientes alterados. A análise do parentesco dentro dos clãs e do comportamento dos
indivíduos durante a reprodução deverá revelar se a espécie realmente apresenta uma taxa tão
baixa de indivíduos ativamente reprodutivos. As estimativas de sucesso reprodutivo devem
revelar quais são as tendências populacionais em curto e médio prazo, além de possibilitar
inferências em suas causas. Adicionalmente, verificar se a espécie evita grandes áreas de mata
contínua irá nos dizer se estimativas de densidade podem ser extrapoladas para região não
amostradas e principalmente se a espécie é realmente protegida por unidades de conservação.
Essas são informações que devem determinar o status da população na natureza e inferir na
suscetibilidade da espécie às ameaças futuras tanto em curto como em médio e longo prazo.
Portanto, para garantir a sobrevivência desse emblemático e endêmico psitacídeo
brasileiro, novas informações devem ser buscadas e a proteção de fato dos locais de
ocorrência deve ser priorizada. Essas informações são de difícil acesso, mas são essenciais
para entendermos a real situação da espécie na natureza. As unidades de conservação não
necessariamente protegem a espécie, o que torna bastante complicada a proteção dos locais
preferências para os bandos. Mesmo assim, a ararajuba, pela mesma beleza e carisma que a
coloca em risco, pode ser utilizada como espécie-bandeira especialmente para a porção leste,
uma região bastante peculiar e que abriga diversos endemismos em diversos táxons, mas que
não possui áreas de conservação representativas (Silva et al. 2005). A educação e
conscientização ambiental devem auxiliar no papel de proteger a espécie em áreas não
oficialmente protegidas além de diminuir os impactos da perseguição para o tráfico de
animais silvestres. Somente assim será possível proteger a espécie.
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109
Apêndice C.
Contagem dos indivíduos e bandos localizados e diferenciados de acordo com a Figura 17.
Porção
Localidade
Máx Ind.
Mín Ind.
Máx Bandos
Mín Bandos
Dormitório
A
1
30
12
3
1
2
2
33
33
3
3
0
3
64
31
5
2
0
4
71
36
6
3
0
5
39
39
4
4
0
6
13
13
3
3
0
7
17
17
1
1
1
8
6
6
1
1
0
Total A
273
187
26
18
4
B
9
21
21
2
2
0
10
22
22
2
2
0
11
20
11
3
2
0
12
22
12
2
1
0
Total B
85
66
9
7
0
C
13
19
19
3
3
0
14
12
12
2
2
2
15
52
52
4
4
4
16
30
15
2
1
1
17
19
19
1
1
1
Total C
132
117
12
11
8
D
18
28
18
3
2
0
19
15
15
1
1
0
20
19
19
2
2
1
21
33
33
2
2
1
22
29
29
3
3
0
Total D
124
114
11
10
2
Total Geral
614
484
58
46
13
110
Conclusões
i. A ararajuba possui uma distribuição de ocorrência ao sul do rio Amazonas e a leste do
rio Madeira. Novos registros confirmados e incertos demonstram a presença de populações da
ararajuba na porção oeste da distribuição, apesar da ocorrência variável em escala local e no
tempo.
ii. A conhecida área de ocorrência da espécie modificou-se ao longo dos anos. Uma
modificação causada pelo aumento do desmatamento na porção leste. Não foi possível
determinar a causa do aumento na área na porção oeste.
iii. A modelagem da distribuição potencial previu que a ararajuba ocorre numa região de
interface das terras baixas da Amazônia com a borda do Planalto Central, evitando áreas mais
úmidas da Amazônia central.
iv. A principal esperança para a sobrevivência da espécie concentra-se na porção central
da sua distribuição, ao longo do médio rio Tapajós e, possivelmente até o médio rio Xingu e
também entre os baixos rio Xingu e Tocantins.
v. A ararajuba na região do Parque Nacional da Amazônia vive em grandes clãs que
permanecem unidos em vários horários do dia e pernoitam em conjunto ao longo dos dias nas
mesmas localidades. Nos sítios alimentares podem ser vistos os maiores agrupamentos, com
mais de 40 indivíduos. O hábito de pernoitar em grandes agrupamentos, que é comum em
várias espécies de psitacídeos, não foi observado para a espécie e não determina a variação no
tamanho dos bandos.
vi. A abundância (índice) detectável da ararajuba foi muito variável, mas evidenciou
possíveis diferenças espaciais, provavelmente associadas a distribuição dos recursos
reprodutivos. A espécie ocupa praticamente todos os trechos da rodovia transamazônica,
dentro do Parque Nacional da Amazônia e até a cidade de Jacareacanga-PA. Ao contrário do
que se pensava, a espécie é comum onde ocorre. Embora seja vista em áreas recém-
desmatadas, não sabemos se a espécie é realmente beneficiada por alterações na vegetação.
vii. A dieta da ararajuba é diversificada na região do PNA, mas não oportunista. Não
evidências de deslocamentos populacionais extensos em função da alimentação, embora em
escala local os bandos possam desaparecer durante dias em alguns períodos.
viii. Todos os ninhos e dormitórios da ararajuba encontrados na região estavam em áreas
abertas e sujeitas a perturbação humana e a maioria estavam em árvores mortas, mas
aparentemente não há seleção quanto à estrutura da árvore necessária para nidificação. Os clãs
111
permanecem nas proximidades do ninho ao longo do dia durante o período reprodutivo;
podem defender o sítio contra invasão de bandos co-específicos ou de outras espécies e
utilizam os ninhos como dormitórios após o fim da reprodução. Assim, aparentemente são
fiéis aos seus territórios.
ix. Não definição quanto ao seu sistema reprodutivo (comunal ou cooperativo,
monogâmico ou não) e esse pode ser um aspecto muito importante para sua sobrevivência e
sua conservação.
112
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