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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
NEILAINE RAMOS ROCHA
A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA NO BRASIL:
o pensamento inovador de Eugênio Gudin.
MARINGÁ
2008
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ii
NEILAINE RAMOS ROCHA
A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA NO BRASIL:
o pensamento inovador de Eugênio Gudin.
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em História da
Universidade Estadual de Maringá como
requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em História.
Maringá
2008
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iii
NEILAINE RAMOS ROCHA
A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA NO BRASIL: o
pensamento inovador de Eugênio Gudin.
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em História da
Universidade Estadual de Maringá
UEM, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em História.
Área de Concentração: História da Idéias
e Instituições
Orientador: Prof. Moacir José da Silva
Maringá
2008
iv
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca Central - UEM, Maringá – PR., Brasil)
Rocha, Neilaine Ramos
R672e A economia política clássica no Brasil : o pensamento
inovador de Eugênio Gudin / Neilaine Ramos Rocha. --
Maringá : [s.n.], 2008.
152 f.
Orientador : Prof. Dr. Moacir José da Silva.
Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de
Maringá, Programa de Pós-Graduação em História, área de
concentração: Política, Movimentos Populacionais e Sociais,
2008.
1. Gudin, Eugênio, 1886-1986. 2. Economia política
clássica. 3. Inovação. 4. História do Brasil. I.
Universidade Estadual de Maringá. Programa de Pós-Graduação
em História. II. Título.
CDD 21.ed. 981
v
NEILAINE RAMOS ROCHA
A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA NO BRASIL:
o pensamento inovador de Eugênio Gudin.
COMISSÃO JULGADORA
_______________________________
_______________________________
_______________________________
Maringá,_______de________________de 2008
vi
À todos os que professam a humildade
intelectual, os limites do conhecimento, o
ápice da ciência...
vii
“Quando perdemos o direito de sermos
diferentes, perdemos o privilégio de
sermos livres” Charles Evans Hughes
viii
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a Deus pelo dom da vida e pela sede que me
deu pelo conhecimento.
Para não cometer a injustiça de não acrescentar algum nome, pois
foram muitos, decidi agradecer de modo geral a meus amigos que, de uma forma ou
de outra, contribuíram com sua amizade e com sugestões efetivas para a realização
deste trabalho, gostaria de expressar minha alegria por tê-los por perto.
Minha profunda gratidão aos meus pais e minha irmã que ao longo
dessa caminhada acreditaram em mim e me apoiaram. Com paciência me
encorajaram a dar o melhor de mim nesse trabalho tão importante em minha história
de vida.
Agradeço a mestres que com tanta dedicação me incentivaram na
carreira acadêmica como o professor Itamar Flávio da Silveira, que também se
mostrou mais que um referencial nessa caminhada, um amigo.
Sou grata pela excelência profissional do meu orientador, o Professor
Doutor Moacir José da Silva que, ao longo do processo de elaboração dessa
dissertação, conferiu, com paciência e respeito ao meu trabalho, contribuições
preciosas para a sua finalização.
Agradeço ao Programa de Mestrado do Departamento de História da
Universidade Estadual de Maringá
Agradeço a todos, pois com certeza sozinha eu não teria feito este
trabalho.
ix
ROCHA, Neilaine Ramos. A Economia Política Clássica no Brasil: o pensamento inovador de
Eugênio Gudin. Maringá, 2008, 152p. Dissertação (Mestrado em História)
Departamento de História, Universidade Estadual de Maringá.
RESUMO
Esta pesquisa é sobre o pensamento de Eugênio Gudin como um scholar
brasileiro da economia política clássica. Este trabalho focaliza o lado inovador do
seu pensamento sobre a problemática econômica e política da sociedade brasileira.
Esta dissertação apresenta os resultados de uma pesquisa através de cinco
capítulos principais: No primeiro capítulo, apresentamos uma revisão bibliográfica
acerca da literatura especializada sobre Gudin; nele o mostrados diversos
enfoques sobre ele e apresentados um estudo biobibliográfico do autor. No segundo
capítulo são apresentados os pressupostos teóricos que conferem identidade
intelectual e fundamento para esta pesquisa. O aporte teórico essencial deste
trabalho é a escola austríaca de economia. No terceiro capítulo, buscou-se analisar
as idéias econômicas de Gudin sobre as diversas formas de intervencionismo na
economia brasileira. O Quarto capítulo trata das idéias políticas de Gudin e seu
conceito de democracia. No último capítulo analisamos três pontos essenciais: 1) a
contextualização de Gudin como um scholar da Economia Política Clássica em sua
versão austríaca; 2) a sua contribuição para a economia política no Brasil e; 3) os
limites dos estudos historiográficos que consideraram Gudin um autor conservador.
Palavras chave: Eugênio Gudin; Economia Política Clássica; Inovação;
História do Brasil.
x
ROCHA, Neilaine Ramos. The Classical Political Economy the innovative
thinking of Eugenio Gudin. Maringa, 2008, 152p. Dissertation (History master’s
degree) - Department of History, State University of Maringá.
ABSTRACT
This research is about the innovative thinking of Eugenio Gudin as a
Brazilian scholar of the classical political economy. This work focuses his innovative
thinking on the economic and political problems of Brazilian society. This dissertation
presents the results of a research through five main chapters: In the first chapter we
present a literature review of the specialist literature on Gudin, there are shown
approaches to Gudin and presented a biographical and bibliographical study of him.
The second chapter presents the theoretical assumptions that give identity and
intellectual background for this search. The essential theoretical contribution to this
work came of Austrian school of economics. In the third chapter, we analyze the
economic ideas of Gudin on the various forms of interventionism in the Brazilian
economy. The fourth chapter deals with the ideas and policies of Gudin its concept of
democracy. In the last chapter we analyze three essential points: 1) the
contextualization of Gudin as a scholar of the Classical Political Economy in its
version Austrian, 2) its contribution to the economy policy in Brazil and, 3) the
limitations of the historiographical studies that admits Gudin as an author
conservative.
Key - words: Eugênio Gudin; Classical Political Economy; Innovation;
History of Brazil.
11
SUMÁRIO
Agradecimentos..........................................................................................................vii
Resumo......................................................................................................................viii
Abstract......................................................................................................................viii
Introdução...................................................................................................................14
1. CAPÍTULO I – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ........................................................ 18
1.1 Introdução .................................................................................................... 18
1.2 à guisa de uma biobliografia de Gudin ......................................................... 18
1.3 Gudin e as vertentes da literatura: nota preliminar ....................................... 23
1.4 O enfoque marxista sobre Gudin ................................................................. 25
1.5 O enfoque desenvolvimentista sobre Gudin ................................................. 28
1.6 O enfoque do marxismo revisado sobre Gudin ............................................ 29
1.7 O enfoque Austríaco sobre Gudin ................................................................ 32
1.8 Conclusão .................................................................................................... 32
2. Capítulo I I - APORTE TEÓRICO ....................................................................... 34
2.1 Introdução .................................................................................................... 34
2.2 Preâmbulo do cerne da escola austríaca ..................................................... 34
2.3 Caracterização conceitual sobre a origem da Economia Política ................. 35
2.4 Principais Ramificações Ulteriores da Economia Política pos-ricardiana ..... 38
2.5 A concepção austríaca da dinâmica das instituições ................................... 40
2.6 o aspecto inovador Liberdade ...................................................................... 44
2.7 O anti-racionalismo austríaco ....................................................................... 46
2.8 O conceito de progresso à despeito do positivismo ..................................... 47
2.9 A abordagem anti-intervencionista austríaca ............................................... 50
2.10 Conclusão ................................................................................................. 52
3. CAPÍTULO III – GUDIN E A PROBLEMÁTICA ECONÔMICA DO BRASIL ........ 53
3.1 Introdução .................................................................................................... 53
3.2 A oposição de Gudin ao nacional desenvolvimentismo: aspectos teórico-
conceituais ............................................................................................................. 53
12
3.3 Gudin X Simonsen: a formalização da contraposição entre liberalismo e
desenvolvimentismo .............................................................................................. 61
3.4 A análise econômica de Gudin concernente ao Governo de JK .................. 70
3.5 O Desenvolvimento Econômico sob a Égide do Estado .............................. 74
3.6 Castelo Branco e a ortodoxia liberal............................................................. 86
3.7 Costa e Silva e o desenvolvimentismo de Delfim Netto ............................... 90
3.8 Intervencionismo e inflação no brasil ......................................................... 100
3.9 Conclusão .................................................................................................. 108
4. CAPITULO IV - Gudin e a problemática política do Brasil .............................. 109
4.1 Introdução .................................................................................................. 109
4.2 O cenário político e a questão da democracia ........................................... 109
4.3 A democracia, na visão de Eugênio Gudin, após o Golpe militar de 1964. 117
4.4 O governo de Castelo Branco e a Constituição de 1967............................ 124
4.5 Conclusão .................................................................................................. 128
5. CAPÍTULO V – GUDIN: A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA BRASILEIRA DO
SÉCULO XX ............................................................................................................ 130
5.1 Introdução .................................................................................................. 130
5.2 Eugênio Gudin como economista político Clássico .................................... 130
5.3 A contribuição de Gudin para a economia política clássica ....................... 136
5.4 A Contraposição de Gudin ao Conservadorismo ....................................... 140
5.5 A Crença no poder das mudanças ............................................................. 142
5.6 A Ótica conservadora do Intervencionismo ................................................ 144
5.7 Limites do conservadorismo imputado a Gudin pela historiografia ............ 146
6. CONCLUSÃO ................................................................................................... 147
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 149
7.1 Livros .......................................................................................................... 149
7.2 Periódicos .................................................................................................. 151
7.3 Documentos Eletrônicos ............................................................................ 152
13
INTRODUÇÃO
Este estudo busca resgatar as idéias de Eugênio Gudin, economista
político brasileiro, contestado no final de sua vida e muitas vezes não compreendido
na atualidade. Inúmeros termos foram ligados a sua figura. Analisado sob várias
perspectivas, inúmeros preconceitos políticos ainda circundam sua imagem
apagando sua real contribuição para o desenvolvimento das idéias nos campos
político e econômico no Brasil.
As idéias contidas no campo teórico são diversas, possuindo cada uma
suas peculiaridades. Essas vertentes se multiplicam à medida que o conturbado
século XX caminha. A crise no capitalismo em 1929 cria a necessidade de novas
explicações, novas regras para se alcançar o desenvolvimento econômico de
determinada nação.
A problemática deste trabalho é entender o modo como o escrito
Gudiniano perfilou e ao mesmo tempo expressou o quadro geral da História das
Idéias e das próprias relações humanas no Brasil, observando a visão que ele tinha
da sociedade brasileira e de seus problemas, buscando identificá-los sob a ótica da
economia política clássica.
O presente trabalho analisa as idéias de Gudin, particularmente seus
artigos jornalísticos, publicados no Jornal O Globo. Esse momento é tido como um
momento de crises políticas e econômicas, crise das instituições democráticas,
período de transição de democracia a ditadura no Brasil. Uma conjuntura fértil para
se analisar as idéias de Gudin, visto esses dois momentos distintos que se fundem
14
na História, moldando os rumos da nação. De crítico, Gudin passa a ser defensor do
Estado e assim torna-se importante a observação de suas idéias em seu discurso,
pois elas expressam como o liberalismo se insere nas ações e reflexões da História
do Brasil no período em questão.
Os últimos anos do governo de Juscelino Kubitschek e os anos seguintes
até 1964 retratam a força das idéias desenvolvimentistas ; naquele contexto, Gudin
se coloca como crítico contundente do Estado. Porém, com a “revolução” de 1964,
com o golpe militar, Gudin passa a defender essa ão e a acreditar nesse Estado
que, para ele, iria reorientar a economia do país. Isso pode se observar
principalmente nos primeiros anos de ditadura, com Castelo Branco. Porém, até
1969, período em que se encerra o governo de Costa e Silva, o descontentamento
de Gudin com a “revolução” se torna nítido.
Como informa a historiografia, a população brasileira viveu uma
experiência democrática entre os anos de 1946 e 1964; o fim da ditadura do Estado
Novo e a vitória das democracias na II Guerra Mundial marcaram esse período.
Entre 1964 e 1970, a América Latina presenciou mudanças drásticas em sua
estrutura política. No Brasil o projeto político nacional-desenvolvimentista criou uma
conjuntura de crises nos sistemas político e econômico. Foi assim que em abril de
1964 se instalou no Brasil uma ditadura militar que controlou o poder por vinte e um
anos. Os militares interferiam em muitas esferas da sociedade, rompendo com
liberdades em prol do estabelecimento de um regime autoritário.
Dessa forma, no contexto de dois cosmos institucionais antagônicos, tem
inserção as análises de Eugênio Gudin, imprescindíveis para a compreensão do
processo histórico que se deu a partir da visão de uma das matrizes teóricas mais
relevantes do século XX do pensamento brasileiro. Observar como se comporta as
15
idéias liberais frente a um regime autoritário, é entender como se constituíram essas
idéias no Brasil, e possivelmente não haja outra figura mais relevante para se captar
essas informações que Eugênio Gudin. Ele foi criticado, odiado, elogiado,
homenageado, contudo, respeitado até pelos seus críticos, devido seu valor para a
História das Idéias no Brasil enquanto um representante da Economia Política
Clássica.
O raciocínio econômico de Gudin pautava-se por princípios clássicos que
se fundamentavam na idéia de que a economia capitalista tenderia a um equilíbrio
dinâmico entre oferta e demanda, em condições de liberdade econômica.
Esta pesquisa buscou observar a originalidade de Eugênio Gudin, que
traz como principal contribuição, a defesa das idéias e soluções liberais para a falta
de desenvolvimento econômico no Brasil. Esse resgate dos princípios clássicos do
liberalismo para explicar a conjuntura brasileira se expressa nos seus artigos
jornalísticos, fonte primordial para a existência desse trabalho.
A principal fonte utilizada tem o caráter de literatura, discurso escrito com
uma intencionalidade, revelando, portanto, a forma das idéias do autor. A produção
literária se torna uma fonte histórica porque expressa elementos da sociedade que a
criou. O autor, a obra e o público para quem ela foi produzida, possuem sua
historicidade. O autor é um ser histórico que vive e é influenciado por elementos de
seu tempo que serão norteadores de sua obra.
Torna-se então importante mapear o pensamento de Eugênio Gudin para
se observar a contribuição de suas idéias para a formação da história das idéias no
Brasil, tratando seu discurso como uma possibilidade interpretativa da história
brasileira.
16
Esta pesquisa, em suma, é uma retomada do pensamento de Eugênio
Gudin sob a ótica de ter sito ele um scholar brasileiro da economia política clássica
apresentando uma interpretação inovadora da problemática econômica e política da
sociedade brasileira. Neste sentido, ele é desenvolvido através de cinco seções que
se distribuem da seguinte maneira
No primeiro capítulo, é feita uma revisão bibliográfica acerca da literatura
especializada sobre Gudin; nele são retomados diversos enfoques sobre Gudin e
apresentado um estudo biobibliográfico do autor ora em voga.
No segundo capítulo são apresentados os pressupostos teóricos que
conferem identidade intelectual e fundamento para esta pesquisa. O aporte teórico
desta pesquisa é apresentado enriquecido por uma digressão sobre os seus
fundamentos.
No terceiro capítulo, buscou-se analisar as idéias econômicas de Gudin
especialmente nos anos que vão de 1958 a 1964, fins dos anos JK até o Golpe
Militar, onde se visualiza Gudin como um opositor assumido do Estado e de sua
forma de gerir a nação.
O Quarto capítulo trata das idéias políticas de Gudin; aqui é retomada a
crise política e econômica do governo de Goulart. Nesse contexto Gudin abre mão
de seu liberalismo democrático e apóia o Golpe, não só apóia como também justifica
e defende por alguns anos a nova realidade. Neste capítulo, é examinado o conceito
de democracia de Gudin e sua estreita relação com seu pensamento liberal clássico
Por fim no quinto capítulo três pontos são analisados, a contextualização
de Gudin como scholar da Economia Política Clássica, a sua contribuição para a
economia política no Brasil e, por fim, os limites da imputação de conservador a
Gudin por parte da historiografia analisada.
17
Ao final encontra-se a conclusão da pesquisa acerca da
representatividade de Gudin como economista político e quando ao aspecto
inovador de seu pensamento em contraposição a grande parte dos estudos
historiográficos sobre ele.
18
1. CAPÍTULO I – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
1.1 INTRODUÇÃO
Neste capítulo é inicialmente assinalada a singularidade biobibliográfica
de Gudin que vem procedida pela retomada da trajetória da historiografia acerca de
suas idéias; a literatura relativa a Gudin é aqui revisitada a partir de quatro de suas
subtendências essenciais; a saber: os enfoques oriundos das fontes interpretativas
do marxismo, do desenvolvimentismo, do marxismo revisado e da escola austríaca
de pensamento.
1.2 À GUISA DE UMA BIOBLIOGRAFIA DE GUDIN
Eugênio Gudin Filho nasceu no Rio de Janeiro em 12 de julho de 1986;
sua trajetória como economista teve início com experiência prática com a iniciativa
privada, trabalhou como engenheiro civil desde 1905 e se envolveu com a economia
desde a década de 1920, quando publicava seus primeiros artigos sobre temas
econômicos. Por quase trinta anos foi diretor geral da Great Western of Brazil
Railway, uma companhia inglesa que construía ferrovias no Brasil.
Na profissão de engenheiro, teve seu nome relacionado à construção
da grande barragem do Ceará em 1911, atuou como diretor da
Pernambuco Tramways ande Power e da Great Western Railway and
Co. Em função da gestão de negócio de grande vulto, fez freqüentes
viagens à França e Inglaterra, recebendo assim forte influência da
vida cultural européia, cujos desdobramentos seriam sentidos em
sua vida pública posterior. Em sua longa trajetória, Gudin foi
professor de economia, engenheiro, homem de empresa e ocupou
vários cargos públicos... (ABRAHÃO, 1995, p.119)
A crise de 1929 fez com que os economistas rediscutissem o
capitalismo, os estudos acerca dessa ciência se intensificaram, várias teorias e
19
linhas explicativas surgiram e nesse momento Gudin surge no cenário da discussão
das idéias econômicas e políticas do contexto nacional com maior representação,
pois o contexto proporcionava mais abertura para a própria discussão da economia.
Havia ele (Gudin) atingido a plena maturidade intelectual, quando
seu espírito se voltou para os problemas econômicos,
dramaticamente postos em foco pela crise de 1929-33. As graves
repercussões que ela teve durante a década de 30, levantaram em
todas as consciências sérias dúvidas quanto ao valor dos meios
tentados para debelá-la. Impôs-se assim ao mundo inteiro o dever de
uma revisão das teorias econômicas até então aceitas. (Carneiro in
KAFKA, 1979, p. 4)
Borges (1956) mostra que Gudin relatou, em uma aula inaugural em
1956, que se tornou economista devido a sua vocação humanista.
O que me encaminhou para a rota difícil, complexa e nao raro árida,
do estudo de Ciências Econômicas, foi um sentido de espírito público
e de dever cívico muito mais do que de vocação. Porque eu sentia,
30 anos atrás, quando comecei a enveredar pelo estudo deste
ramo de conhecimenos humanos, que era preciso que alguns
brasileiros se dedicassem, seriamente ao estudo de uma matéria que
tão grande influência e tantas repercurssões podia ter sobre o padrão
de vida, ainda tão lamentavelmente baixo, do povo brasileiro. Foi
esse sentimento de solidariedade humana que me orientou para os
estudos econômicos . O meu caso aliás não é singular. Para citar
outro exemplo, em plano muito mais elevado, mencionarei a
referência que se encontra na biografia do grande Alfred Marshall,
escrita por Lord Keynes. (...) Marshal, refer Keynes, foi elevado aos
estudos econômicos pelo generoso impulso para colaborar na
grande tarefa de aliviar a miséria e a degradação das classes na
Inglaterra. (Gudin 1956, Apud: Borges, 1996, p. 252)
A produção intelectual de Gudin se apresentou principalmente em
forma de artigos jornalísitcos, sua ligação com o jornal lhe deu essa abertura. Os
artigos do economista revelam que o mesmo ocupou uma posição de formador de
opinião, transparecendo o caráter didático de seus artigos, Gudin busca passar para
20
seus leitores, de forma simplificada, noções de economia e a explicação teórica de
suas idéias. Essas idéias rompem discussões acadêmicas, atingem leitores muitas
vezes leigos, mas que enxergavam essas como possíveis soluções para os
problemas de ordem política e econômica do Brasil.
Também foi autor de obras clássicas para o entendimento da economia
no Brasil. Sua obra “Princípios de Economia Monetária” (1943) contempla, em dois
volumes, teorias que serviram de base para as Escolas de economia no Brasil.
É preciso salientar que dois grandes economistas influenciaram as idéias
de Gudin, Viner (1972) e Haberler (1976), seus coetâneos que marcaram fortemente
suas idéias. Tanto Jacob Viner e Gottfried Haberler estavam em constante contato
com Gudin, sempre participavam de conferências, palestras do IBRE
1
(Instituto
Brasileiro de Economia) ou da FGV (Fundação Getúlio Vargas) de então.
Bielschowsky aponta as características das obras daqueles que influenciaram
diretamente a Gudin:
São consideradas grandes obras de reavaliação e sustentação do
princípio clássico da divisão internacional do trabalho. Procuram os
autores preservá-lo, levando em conta a existência de ciclos
econômicos e procedendo a uma discussão sistemática da validade
do livre-cambismo frente a argumentos protecionistas...
“(BIELSCHOWSKY 1995, p.41)
Jacob Viner (1972) foi um importante economista da Escola de
Chicago, seus principais trabalhos aboradavam as questões de história do
pensamento econômico e teoria do comércio internacional, foi crítico de Keynes e
1
É uma instituição filiada a FGV, que nasceu em 1951, que tinha como função estudar os números
da economia brasileira e fornecer estatísticas. Gudin teve grande participação em sua concepção.
Para esclarecimento ver: LOUREIRO, Maria Rita. Os economistas no Governo. Rio de Janeiro: FGV,
1997.
21
forneceu subsídios teóricos para Gudin nas questões acerca da inflação, por ter ele
formação econômica filiada ao monetarismo.
O primeiro contato de Gudin com Haberler (1976) ocorreu quando o
mesmo representou o Brasil na Conferência de Bretton Woods
2
, em visita a Harvard,
quando pesquisava acerca do curso de economia para estabelecer critérios para a
fundamentação da organização do ensino em economia no Brasil.
Haberler teve uma formação voltada para os princípios da Escola
Autríaca de economia, monetarista e pesquisador do comércio internacional; muitas
de suas idéias são encontradas e citadas por Gudin, especialmente no que concerne
ao tema da inflação.
A solução ideal ainda é a inflação nula ou quase nula e nunca será
demais repetir que esta solução, embora politicamente muito difícil, é
sempre economicamente possível e de interesse geral, sejam quais
forem os interesses de grupos especiais. (HABERLER, 1976, p.124)
Sendo assim tanto Haberler quanto Viner influenciaram as idéias de
Gudin, e também contribuiram para a implantação do primeiro curso de Economia
enquanto ciência formal no Brasil. Gudin era membro da Sociedade Brasileira de
Economia Política que planejava uma escola de economia no Rio de Janeiro, que foi
então criada em 1938, a primeira escola privada de economia brasileira a Faculdade
de Ciências Econômicas e Administrativas, da qual Gudin era professor da disciplina
de Moeda e Crédito. Mais tarde Gudin participou da fundação do Núcleo de
Economia da FGV (Fundação Getúlio Vargas), na qual foi professor. Outras
instituições de ensino e pesquisa também contaram com sua participação, que
2
A Conferência de Bretton Woods também conhecida como Conferência Monetária e financeira das
Nações Unidas, ocorreu em julho de 1944, em Breetton Woods, New Hampishire, EUA. A partir dessa
conferência foram criadas as instituições financeiras, que tinha um caráter internacional: o Banco
Mundial e o FMI (Fundo Monetário Internacional), esse no qual Gudin foi representante entre 1951 e
1954. Ver ABREU. Marcelo de Paiva. Contribuições de Eugênio Gudin ao Pensamento Econômico
Brasileiro. Literatura Econômica, 1984.
22
também se expressou na dia através das revistas Conjuntura Econômica e
Digesto Econômico que tiveram a contribuição direta de Gudin para suas
concepções editoriais.
O Instituto Brasileiro de Economia, dirigido por Gudin ao longo de
quase toda a década de 1950, consolidou duas conceituadas
publicações na área de economia, a revista Conjuntura Econômica e
a Revista Brasileira de Economia, que se transformaram em núcleos
de influência dos liberais. Criado a partir da iniciativa de Gudin, o
Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da FGV, tinha o objetivo de
assumir o papel de uma instituição de pesquisa capaz de ralizar
análises e projeções que orientassem a elaboração da política
econômica. A proposição maior do IBRE era a de atuar como
formulador de metodologias...(ABRAHÃO, 1995, p.125)
Ao longo de sua trajetória, ocupou um cargo público de grande
responsabilidade, quando fora Ministro da Fazenda em 1954, no governo de Café
Filho. Nos meses que ficou no poder combateu a forte crise cambial, instaurando a
Instrução 113 da Sumoc
3
(Superintendência da Moeda e Crédito), o que possibilitou
maior abertura cambial, facilitando os investimentos de empresas estrangeiras.
Eessa medida será futuramente importante para algumas ações que o governo JK
tomaria no âmbito da política externa. É importante que nos poucos meses que
Gudin esteve de fato em um cargo no governo, implantou ações que convergiam
com suas idéias e com a Economia Política Clássica.
Ao longo da trajetória de sua vida, Gudin, o engenheiro, o empresário,
o professor, o jornalista ou economista, foi sempre um pensador scholar da
economia política clássica, fato que cingiu, em cada um dos seus momentos
inelectuais, a marca da busca da liberdade para o mercado, apontando em cada
questão específica, nos escritos e ações, suas concepções clássicas da Economia
Política.
3
Para aprofundamento da questão ver: BIELSCHOWSKY, Ricardo. Pensamento econômico
brasileiro: o ciclo ideológico do desenvolvimentismo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1995.
23
1.3 GUDIN E AS VERTENTES DA LITERATURA: NOTA PRELIMINAR
Eugênio Gudin, homem de seu tempo, logrou notoriedade histórica,
política e acadêmica; suas idéias e escritos se cristalizaram em grande parte da
historiografia, da literatura jornalística e da mídia em geral. Autor controverso, Gudin
deu origem a diferentes correntes historiográficas interpretativas de seu
pensamento. Para um autor polêmico e influente, não é senão mister assinalar as
principais idéias e concepções acerca do seu significado, o que aqui far-se-á
situando-o, à luz da matriz interpretativa que consubstancia a identidade intelectual
desta pesquisa, nas polêmicas, debates, posições políticas e predições econômicas
que compuseram o arcabouço teórico hodiernamente reunido sob os auspícios do
nome Eugênio Gudin.
Nos idos da década de 1950 e 1960, no Brasil, as divergências acerca
dos rumos da economia passaram por uma fase de intensa agitação. Uma miríade
de concepções e idéias entrou em conflito: desenvolvimentismo, socialismo e
liberalismo. Foi nesse momento que o economista Eugenio Gudin teve inserção
ocupando um lugar ímpar de líder intelectual e scholar da economia política clássica
no Brasil. As medidas políticas, o seu cabedal intelectual, formado pela sua
proximidade com a Escola Austríaca de Economia, guindaram o nome de Gudin a
um marco da história do pensamento; como aponta Abrahão:
A história da vida intelectual e profissional do professor Eugenio
Gudin se confunde com a história do pensamento liberal no Brasil,
tanto em função de sua imensa e ativa participação na vida política
24
brasileira, como no fato de que em seus 100 anos de vida, grande
parte deles foi dedicada às reflexões acerca dos problemas
brasileiros (...) (ABRAHÃO, 1999.p.49).
Pensador polêmico, coerente e profundo Gudin considerava-se um
partícipe incondicional das causas de seu país; entretanto, suas idéias econômicas e
políticas, seu modo original de tematizar a problemática sócio-econômica brasileira
rendeu-lhe durante muitos anos um grande rol de críticas contrabalanceadas apenas
pelos elogios intelectuais que gradualmente foram engendrados pelo desenrolar da
história. Somente no final da década de 1980 que o economista voltara a ser
estudado de forma mais recorrente para, finalmente na década de 1990, ter suas
idéias retomadas positivamente e legitimadas pelo novo contexto marcado pelo
cenário político democrático, um cenário mundial em que as idéias vinculadas à livre
iniciativa eram percebidas como mais vantajosas para a economia.
O momento econômico do final do século XX oportunizou o ressurgimento
das idéias de Gudin à medida que elas demonstraram o tom uníssono da coerência
e da fidelidade do economista aos seus princípios filosóficos que sobreviveram à
hostilidade social e a condições históricas adversas. Nem mesmo certa dose de
redenção pela história, retirou a economia política de Gudin do alvo das críticas e
análises por parte da historiografia e da literatura em geral.
É, pois, de acordo com seus feitos, escritos e contexto que ora Gudin é
revisitado e focalizado a partir de três das principais vertentes historiográficas que o
estudaram: a vertente marxista, como para Dreifus e Gorender; a
desenvolvimentista, expressada especialmente em Guido Mantega e; uma das mais
recentes, que tem como base e fundamentos, um marxismo revisado, como nos
trabalhos de Cinthia Abraão e Maria Angélica Borges, que figuram dentre os últimos
trabalhos sobre as idéias Gudinianas.
25
1.4 O ENFOQUE MARXISTA SOBRE GUDIN
No fulcro da interpretação marxista dos escritos de Gudin esta a noção
indistinta de que ele teria sido o grande líder intelectual que, representando os
empresários, se uniu com as forças armadas para então construir uma espécie de
justificativa ideológica para o golpe de 1964; nem mesmo as pechas ideológicas que
lhe foram imputadas, subtraíram-lhe a sua relevância de ter sido um grande scholar
e portador de idéias que influenciaram outros pensadores e que, inclusive, fizeram
escola.
Para Dreifus (1981), Gudin foi um representante dos interesses dos
empresários e com idéias influentes ao ponto de levá-lo a ter um cargo
administrativo de relevância, no governo de Café Filho, por ocasião da ocupação do
cargo de Ministro das Finanças. Ele focaliza a ressonância que tiveram as idéias do
economista no período e ressalta seu papel de líder ideológico. Em sua construção
teórica e partindo do conceito de luta de classes, Dreifus (1981) se vale de um
conceito de Gramsci ao apontar Gudin como um intelectual orgânico, que seria um
defensor de sua classe social, um representante, um porta-voz de interesses de uma
classe em específico.
De acordo com a interpretação marxista, para o tecno-empresário
Eugênio Gudin, o mentor ideológico de toda uma geração de economistas, dentre os
quais figuraram Octávio Gouveia Bulhões, Roberto de Oliveira Campos, Mario
Henrique Simonsen e Antonio Delfim Netto, o mote do foco econômico essencial
seriam as inovações organizacionais e técnicas que não estavam sendo introduzidas
pelas corporações multinacionais. Nesta interpretação, os valores inovacionistas
26
eram disseminados e persistentemente apurados pelos então intelectuais orgânicos
empresariais através de seminários e conferências para as ‘elites’ na Escola
Superior de Guerra, nas associações comerciais e industriais, nos clubes sociais de
prestígio, em centros culturais e, finalmente, através da criação de organizações de
ações que se tornaram os focos de suas atividades ideológicas. (DREIFUS, 1981,
p.74).
Por outro lado, Dreifus (1981) ainda assinala o exercício da presidência
de Eugênio Gudin do IBRE (Instituto Brasileiro de Economia) e a vice-presidência da
FGV (Fundação Getúlio Vargas), como cargos importantes que demonstravam como
se organizavam as forças, consideradas por ele, reacionárias em instituições ligadas
ao aparelho ideológico liberal.
Os interesses multinacionais, bem como os associados a eles, estavam
fortemente representados na estrutura dos think-tanks técnicos do início da década
de sessenta. Em 1962, a maioria dos tecno-empresários retromencionados, assim
como os técnicos do IBRE e da FGV, teria constituído parte da estrutura política dos
aparelhos ideológicos dos interesses das multinacionais e dos a eles associados em
sua campanha contra a convergência de classe populista, ou então fariam parte, de
várias maneiras, da ação política organizada da burguesia para derrubar o Regime
em 1964. (DREIFUS, 1981, p.77)
“Esses oficiais militares partilhavam de um alto grau de congruência
de valores com os tecno-empresários; muitos desses últimos eram
conferencistas assíduos na ESG (Escola Superior de Guerra), para
onde levavam seus próprios valores desenvolvimentistas. Entre eles
deve-se citar Lucas Lopes, Roberto Campos, Eugênio Gudin e
Octávio Gouveia de Bulhões.” (DREIFUS, 1981, p.78).
27
Da citação anterior, são corolários os termos da associação, feita por
Dreifus (1981) de Gudin com as idéias desenvolvimentistas. Cabe observar, no
entanto, que o fato de alguns dos seguidores de Gudin, em determinados
momentos, muitos dos quais munidos de cargos na esfera federal, expressarem
idéias desenvolvimentistas, não significaria que tratava-se de desenvolvimentistas,
propriamente ditos. Gudin acreditava na liberdade econômica e que ela faria, da
força dos mecanismos de mercado, a melhor forma de promoção do
desenvolvimento. O apoio de Gudin ao Golpe de 1964 trouxe a noção, notadamente
incondizente com seus escritos, de que ele confirmaria o princípio
desenvolvimentista de um Estado forte e intervencionista. Do exame mais de perto
dos escritos de Gudin, naturalmente infere-se com clareza meridiana que ele não
deixou, por um só momento, de acreditar que o desenvolvimento decorreria da ação
da iniciativa privada chancelada pela liberdade econômica.
Para Dreifus (1981), Gudin com sua teoria do poder moderador, teria sido
o criador do mito que sustentaria ideologicamente a existência do Estado Militar.
“Contudo, e apesar da evidência histórica, o mito do papel moderador proporcionou
a racionalização para o controle militar autoritário do sistema político depois de
1964” p.82
Segundo Oliveira (2003), que também partilha da visão teórica marxista
acerca de Gudin, o período de 1964 a 1990 correspondeu a uma época de intensa
intervenção política no Brasil, e nesse contexto Eugênio Gudin teria sido um dos
“patriarcas do liberal-autoritarismo brasileiro” (p.193). De acordo com a historiografia
marxista, Gudin é repensado dentro da lógica da luta de classes e considerado o
líder ideológico da classe burguesa.
28
Em contraposição à interpretação marxista, a Escola Austríaca não
concebe as idéias de Gudin como sendo em defesa de uma classe, suas idéias
expressariam princípios que fariam com que a sociedade caminhasse para um
estado de maior liberdade para o desenvolvimento do mercado. O grupo que
debateu diretamente com Gudin se constituiu de empresários, muitos dos quais
envolvidos com a própria iniciativa privada, e não com um interesse de classe
específica, mas de indivíduos como agentes da economia. Na oposição Austríaca ao
marxismo, o que existiu foi um interesse individual de Gudin de expressar suas
idéias, interesse de solucionar o problema de falta da liberdade econômica atuando
no estímulo ao desenvolvimento econômico do Brasil.
1.5 O ENFOQUE DESENVOLVIMENTISTA SOBRE GUDIN
Existe um assentimento na literatura quanto a afirmar que Gudin era um
importante expoente de idéias. Guido Mantega (1995) e Ricardo Bielschowsky
(1995), representantes das idéias desenvolvimentistas, apontavam que Gudin
compartilhava das idéias monetaristas neoclássicas, e consideravam-no como
scholar da corrente liberal sendo, pois, um dos mais representativos devido ao seu
rigor e profundeza de análise de cuja circunspecção englobava todo o escopo do
que era o liberalismo no Brasil. Porém, de acordo com o enfoque
desenvolvimentista, o liberalismo de Gudin era fundamentalmente uma repetição do
liberalismo clássico europeu aplicado no contexto brasileiro.
Os escritos de Gudin desvelam sua desenvoltura sobre todas as grandes
questões de economia e a política brasileira, problematizando-as com coerência e
vivacidade; nesta concepção desenvolvimentista, ele foi o pico economista
neoliberal, levado a reinterpretar os grandes enunciados das teorias liberais à luz da
29
problemática econômica revelada pela depressão cíclica do período entre as duas
grandes guerras. Seu significado não foi senão um esforço de recuperação do
princípio fundamental da economia clássica, isto é, uma defesa qualificada do
princípio da não-intervenção estatal na economia, através de uma rica
problematização analítica de sua aplicação ao caso dos países subdesenvolvidos.
(BIELSCHOWSKY, 1995, p.40-41).
Como forma de contraposição à concepção desenvolvimentista acerca de
Gudin, a Escola Austríaca trouxe elementos para uma oposição à noção indistinta de
que Eugênio Gudin teria meramente reproduzido e aplicado as idéias do liberalismo
clássico no Brasil. Embasado no liberalismo clássico, o economista acrescentou-lhe
elementos novos ao lado de todo um arcabouço teórico original e orientado para a
realidade brasileira. A grande discussão e critica por parte da historiografia de cunho
desenvolvimentista acerca das idéias Gudinianas acreditava que elas não se
aplicavam ao contexto brasileiro.
1.6 O ENFOQUE DO MARXISMO REVISADO SOBRE GUDIN
O final do século XX conheceu um fenômeno teórico que se
autodenominou de marxismo revisado
4
; trata-se de uma concepção que assinalava a
idéia de que o socialismo implantado na prática era algo diferente do que foi
apregoado pela teoria, o que seria então o marxismo revisado. Tributária natural do
marxismo, esta concepção foi marcada pelo reaquecimento das idéias de Marx,
apesar da queda do sistema socialista na maioria dos países.
4
O termo indica a grande influência das idéias e métodos marxistas de conceber a História. Parte desses
historiadores rompeu com o aspecto determinista do materialismo histórico em suas análises, porém adaptaram o
mesmo a seus novos conceitos e métodos. Para maior esclarecimento ver. HOBSBAWN, Eric. Sobre História:
ensaios. São Paulo: Companhia das letras, 1998.
30
Dentre o rol de escritos filiados à matriz interpretativa do marxismo
revisado, dois deles, datados do final do século XX, lograram perfilar da
historiografia mais recente concernente ao pensamento Eugênio Gudin. O primeiro
destes trabalhos Borges (1996), acentua em sua análise tratar-se de uma versão
cabocla do liberalismo, buscando em Gudin uma idiossincrasia do liberalismo
brasileiro e repensando a validade de suas idéias no contexto do final do século XXl.
Sob a égide dessa fonte interpretativa, enfatiza-se também a concepção de
“capitalismo naturalista”, que seria a defesa de Gudin do capitalismo enquanto um
sistema natural de produção, independente do contexto, sendo esta a explicação
para o tom consonante de seus argumentos ao longo de várias décadas. Diz Borges
que:
O autor em tela abraça o estudo da economia para compreender as
crises vividas pelo capitalismo e, a partir daí, propor a inserção
brasileira na economia internacional, segundo uma lógica de
equilíbrio que respeita a Lei das vantagens comparativas...
(BORGES, 1996, p.22)
O segundo trabalho que ganhou relevância acerca de Gudin, e ainda
dentro da visão do marxismo revisado, pertence a Abrahão (1998); que revisitou as
reflexões e opiniões de Gudin acerca da condução da política econômica brasileira
nos anos que o de 1940 a 1960. Em suma, em Abrahão (1998) a figura de
Eugenio Gudin representa a cristalização das idéias liberais. Referindo-se a Gudin,
Abrahão (1998) expõe:
Frente ao desafio de conhecer o papel do pensamento econômico
liberal no Brasil, surgiu a necessidade de destacar a atuação e as
proposições do principal protagonista da corrente liberal, que pode
ser tomado como uma espécie de guardião deste ideário a nível
nacional... (p.7).
31
Essa perspectiva interpretativa, mesmo sendo de influência de uma nova
esquerda, inspirada no chamado “marxismo revisado”, aponta, à despeito da
discordância de Gudin, a contemporaneidade das suas idéias. Essa ótica
historiográfica constrói o caminho das idéias de modo a formular a crítica, não
das idéias liberais, como também do próprio sistema econômico atual que vigora em
grande parte do mundo que seria, para ela, o sistema capitalista carregado de
contradições estruturais.
Ademais, a ressonância de suas idéias faz-se visível, ainda hoje, na
proximidade da virada do século XX, quando o momento histórico
tem privilegiado as posturas liberais que por muito tempo foram
vistas com desconfiança no País. (ABRAHÃO, In: DANTAS, 1999,
p.58)
Não escapou a essa linha interpretativa, portanto, que o novo cenário
histórico, marcado pela queda do muro de Berlim e pela desestruturação do regime
socialista em vários países soviéticos, representou um novo ambiente para o campo
das idéias, dando espaço para o renascimento das correntes liberais, mediante uma
espécie de absolvição da história. A conjuntura do pós-socialismo se expressa na
historiografia e no pensamento econômico que registram uma retomada de Gudin.
As idéias de Gudin, aceitas ou o, foram analisadas ao longo dos anos,
pois representavam grande importância para o entendimento da História das Idéias
no Brasil. Estudiosos liberais, intervencionistas, esquerda e direita reconheceram a
relevância da figura de Gudin no cenário das idéias e o através do
pensamento, mas também se observou a ressonância que suas idéias tiveram na
ação de outros homens.
32
1.7 O ENFOQUE AUSTRÍACO SOBRE GUDIN
O enfoque da Escola Austríaca, o mesmo adotado por esta pesquisa, não
concebeu Gudin como uma defesa da classe burguesa, nem mesmo como uma
mera repetição de idéias européias. Antes de tudo, ele, Gudin é examinado partindo
do ponto de que o trata-se de um homem de seu tempo, tomado por preocupações
intelectuais com questões econômicas e políticas que lhes foram coevas,
preocupações essas que o levaram a ter contato com as idéias liberais e a ver nelas
as soluções para problemas sociais, econômicos e políticos da nação. Em suma, o
enfoque austríaco enfatiza a contribuição de Gudin para a História das idéias a
medida que constrói elementos teóricos que caracterizam o liberalismo da economia
política clássica, a concepção da qual ele foi scholar no Brasil.
1.8 CONCLUSÃO
Revisitado, de acordo com o que foi exposto anteriormente, através da
pesquisa de quatro enfoques diferentes e parcialmente divergentes entre si,
precedidos de um balanço biobibliográfico de Gudin, observou-se o assentimento
recorrente na literatura sobre a relevância de Gudin como scholar do pensamento
liberal no Brasil. É forçoso, no entanto, concluir que Gudin foi controverso e
relembrado sob as mais diferentes óticas de pensamento.
No próximo capitulo, serão tematizados o fundamento teórico desta
pesquisa e sua identidade intelectual. Esta pesquisa não é senão uma aplicação de
um conjunto de conceitos e pressupostos, agregados sob a égide de uma linha de
pesquisa internacional denominada de como Escola Austríaca, para a explicação de
Eugenio Gudin como um scholar da economia política clássica no Brasil.
33
34
2. CAPÍTULO I I - APORTE TEÓRICO
2.1 INTRODUÇÃO
Esta seção versa sobre o modo como se pode interpretar a história das
relações humanas, a partir de sua expressão intelectual. Gudin, neste trabalho, é
concebido como expressão de um confronto de grupos e interesses, em busca de
afirmarem seus valores como sendo os mais vantajosos para a sociedade, o
confronto se dá também entre as idéias. Aqui, são apresentados os principais
interlocutores que deram razão de ser a este trabalho, bem como seu fundamento
literário e identidade intelectual, mostrando que a metodologia proposta fornece
instrumentos consolidados para a análise das idéias; os pressupostos e concepções
gerais desta metodologia reúnem-se sob a denominação de Escola Austríaca, o
fundamento essencial deste trabalho e tema desta seção, a qual é retomada sob
diferentes aspectos que vão desde a sua origem, passando pela sua caracterização
conceitual e ramificações teóricas até chegar ao cerne filosófico do seu pensamento.
2.2 PREÂMBULO DO CERNE DA ESCOLA AUSTRÍACA
Os interesses individuais imbricados pelo rol de condições quase que
infinitas, se agrupam, ora divergem, ora convergem, e adquirem finalmente a forma
de pensamento humano. É como em consonância com esses interesses que o
homem opta pela adoção de determinadas idéias, buscando a melhor solução para
as suas questões. O indivíduo na busca de seus objetivos pessoais utiliza um
grande volume de conhecimento. A escolha desse conhecimento, dessas idéias, é
fundamentalmente individual.
35
Em face do exposto, Gudin não se apropria de um ideário somente
porque faz parte de uma determinada classe, ou segmento social, mas também
porque essas idéias faziam sentido em seu contexto, respondiam suas questões
pessoais, dentro de um rol de condições gerais.
A sociedade, essa era sua questão principal, seus estudos partem de
uma questão pessoal, porém se direciona para uma outra, a social, o que se
evidencia mormente quando suas discussões se concentram na explicação dos
problemas brasileiros. Gudin disserta acerca das instituições políticas e econômicas
do país, e se insere nesse debate concernente ao melhor caminho, a melhor idéia,
que levaria o Brasil ao desenvolvimento. Tendo em vista essas questões, torna-se
imprescindível um método de análise que tenha suas raízes nas idéias da Escola
Austríaca, de cujo um dos mais importantes representantes no século XX foi Hayek.
2.3 CARACTERIZAÇÃO CONCEITUAL SOBRE A ORIGEM DA ECONOMIA
POLÍTICA
A economia política clássica é uma forma de conceber a economia, esse
pensamento surgiu nos séculos XVIII e XIX com Adam Smith (1983), David Ricardo
(1983) e John Stuart Mill (1983) e se tornaram hegemônicos em suas teorias até
final do século XIX, principalmente nos países anglo-saxões. Adam Smith, o maior
representante dessa escola, no século XVIII, assinala que a riqueza das nações
tinha sua origem na troca. O mercado livre, a liberdade de comércio e de troca
possibilitaria o maior acúmulo de riqueza. Adam Smith se opunha a idéia fisiocrata
de que a riqueza estaria ligada a atividade agrícola e também não compartilhou do
protecionismo nacionalista do sistema mercantilista, elementos estes definidos pelo
seu contexto. A partir dessas duas críticas, Smith constrói sua análise acerca da
economia intimamente ligada com a política.
36
Na visão de Adam Smith o indivíduo é valorizado por ser capaz de tomar
suas próprias decisões, baseado nos seus interesses, agindo com sua consciência.
É a junção dos interesses individuais que determinam o caminho da sociedade, não
uma intencionalidade programada, mas o egoísmo espontâneo elegeria o melhor
caminho para o desenvolvimento dessa sociedade.
Smith (1983) mostra os princípios básicos da teoria da política econômica
clássica. Essa obra aponta que a credibilidade dada à eficiência do mercado, que
funciona orientado pelo sistema de preços, é uma das bases dessa teoria, o Estado
quando limita a liberdade dos indivíduos não possibilita o desenvolvimento natural
das relações de mercado e corrompe a eficiência que o mesmo teria. Por isso o
intervencionismo foi uma dos temas mais discutidos na obra de Smith e de outros
economistas políticos. Assim Smith salienta as qualidades do sistema do mercado
livre, sistema esse que não era senão uma ordem espontânea, eficiente, pois
conseguiria alocar da melhor maneira os recursos produtivos da sociedade. A busca
pelo interesse individual possibilita as trocas, a interação de mercadorias e serviços.
Tendo em vista essa interação de indivíduos, a propensão para troca
favorece o estabelecimento do sistema de divisão do trabalho, outro cerne da teoria
da economia política, elaborado por Adam Smith. Ao expor uma fábrica de alfinetes,
Smith exemplifica ser mais produtivo quando o processo de produção é dividido,
cada trabalhador ficaria responsável por cada parte da fabricação do determinado
produto, isso resultaria em um maior empenho para a realização dessa tarefa em um
menor tempo. Esse exemplo se aplicaria a todo o mercado internacional, pois
quando uma nação propõe fazer tudo que ela necessita para sua sobrevivência, ela
produz menos e com menor qualidade, porém a mesma concentrada em uma
atividade pode se beneficiar da troca com outras nações, ou indivíduos.
37
A divisão do trabalho estaria ligada a propensão que o homem tem a
troca, que gera a riqueza. A troca ocorre dentro do sistema de divisão de trabalho
onde cada um pode escolher o que produzir e como produzir, o que trocar e como
trocar, essa realidade funciona em um sistema onde essas ações sejam livres. A
riqueza assim surge naturalmente da troca, não é uma decisão, não é um plano, é
baseada na escolha individual, onde cada indivíduo através de suas peculiaridades
possui necessidades diferentes.
Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro
que esperamos nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelo
seu próprio interesse. Dirigimo-nos não à sua humanidade, mas à
sua auto-estima, e nunca lhes falamos das nossas próprias
necessidades, mas das vantagens que advirão para eles. (SMITH,
1983, p.50)
Sendo assim para que o sistema de mercado seja eficiente a liberdade
torna-se elemento essencial, porém para Adam Smith o Estado limitava essa
liberdade, seu papel deveria ser reavaliado, na obra Riqueza das Nações, ele expõe
as três funções básicas nas quais a presença do exercício da autoridade política é
necessária: a tarefa de estabelecer segurança interna e externa; a provisão de bens
públicos e a administração normativa da justiça. O Estado tem a função de
possibilitar o ambiente de liberdade para o mercado, sendo assim Smith não
desconsidera a importância do governo, mas observa que quando o mesmo não
pratica suas funções primordiais, ele obstaculiza o desenvolvimento natural do
mercado.
38
2.4 PRINCIPAIS RAMIFICAÇÕES ULTERIORES DA ECONOMIA POLÍTICA
POS-RICARDIANA
Principalmente no fim do século XIX a economia política volta a ser
discutida, nos mais diferentes contextos, surgem então os chamados neoclássicos,
uma escola que tem como principais representantes o austríaco Carl Menger (1987),
Jevons (1987) e o Léon Walras (1983); posteriormente outros nomes vão se
destacar como: Alfred Marshall (1982), Wicksell (1986), Pareto (1984). Essa escola
se dividiu em tendências que em determinados pontos se divergiam; as três escolas
oriundas da escola neoclássica foram: escola Walrasiana, a escola de Chicago e a
escola Austríaca.
Desse grupo a Escola Austríaca representada por Friedrich August von
Hayek (1983), a partir da década de 1920, se desta com um caráter de resgatar a
teoria da economia política clássica, baseada nos princípios de Adam Smith. Nesse
contexto as diferenças entre a economia política clássica e as teorias da escola
neoclássica vão ganhando notória visibilidade teórica.
A teoria neoclássica tem como base a idéia de que a economia tem
seu ponto de equilíbrio, esse é previsível, através de estudos de sistemas de
equações, através da matemática se encontra a resposta lógica para os problemas
da economia. Trata-se de uma questão prática e racional, a teoria neoclássica parte
do pressuposto de que a estabilidade depende da racionalidade.
Por outro lado para a economia política clássica, a história age de
forma a possibilitar o ambiente de instabilidade e estabilidade, os resultados são
imprevistos não existe o equilíbrio racional. Nesse ponto se observa a demarcação
da diferença entre a economia política clássica e o pensamento neoclássico. A
primeira prevê o inesperado que não pode ser anteriormente medido ou
39
equacionado, pois é influenciado pela história, pelas inúmeras dimensões do caráter
humano que constitui a sociedade de indivíduos, pela sua ação inesperada. Porém o
neoclássico concebe a economia como uma equação lógica, por isso tem em seu
destino o equilíbrio. Esse equilíbrio seria resultado de estudos, de planejamento e
execução; portanto o Estado tem maior papel na busca do equilíbrio econômico. A
fórmula é dada pela economia e o Estado aplica essa equação através da sua ação.
Esse fato propicia o surgimento de teorias que justificam a intervenção do Estado na
economia, como é o caso do keynesianismo e, no Brasil, do estruturalismo
desenvolvimentista. O ideário da Economia Política foi criticado e rediscutido
principalmente por outras formas de análise da economia como: marxismo, escola
keynisiana e escola neoclássica.
Leon Walras (1983)
5
foi um economista que demarcou a diferença
entre a escola neoclássica e o pensamento da economia política, quando este
analisa e contesta Adam Smith e o seu conceito de economia política.
Primeiramente Walras acredita ser a economia política clássica, pois se baseia nos
clássicos como Adam Smith, Ricardo, uma teoria que não possui consistência
cientifica.
Portanto, se a Economia Política fosse o que diz A. Smith e se não
passasse disso, seria seguramente um estudo muito interessante,
mas não seria uma ciência propriamente dita. Dessa maneira, é
preciso afirmá-lo: a Economia Política é coisa diferente do que A.
Smith diz. Ante de proporcionar ao povo um rendimento abundante e
antes de ocupar-se em fornecer ao Estado um rendimento suficiente,
o economista busca e descobre verdades puramente científicas...
(WALRAS, 1983, p.8)
5
Um aprofundamento acerca das teorias de Leon Walras, ver. WALRAS, Leon. Compêndio dos elementos de
Economia Política Pura. São Paulo: Abril cultural, 1983.
40
Para Walras a ciência observa, expõe e explica, o que A. Smith
teria feito seria aconselhar ou apontar a direção, o que dava a sua teoria um aspecto
de arte e não ciência. A Economia Política Pura e aplicada, esta sujeita a
matemática e por isso se considera ciência. Tudo se explica a partir dos números,
como a questão dos preços.
Assim age quando enuncia, por exemplo, que o valor das coisas
tende a aumentar quando a quantidade procurada aumenta, ou
quando a quantidade oferecida diminui e que esse valor tende a
diminuir nos dois casos contrários; que a taxa de juros cai em uma
sociedade progressiva; que o imposto lançado sobre a renda
fundiária, fica inteiramente a cargo do proprietário das terras, sem
afetar o preço dos gêneros. Em todos esses casos e em muitos
outros o economista faz ciência pura... (WALRAS, 1983, p.8)
Assim o pensamento da Economia Política Clássica é fortemente
criticado se ramificando em novas concepções quanto a economia; com isso
inúmeros intelectuais se distanciaram dos pressupostos clássicos do liberalismo.
2.5 A CONCEPÇÃO AUSTRÍACA DA DINÂMICA DAS INSTITUIÇÕES
Auguste Von Hayek nasceu em Viena em 1899, seus estudos trouxeram
contribuições importantes para os ramos da psicologia, teoria do direito e economia.
Em 1974 ganhou o premio Nobel por seu trabalho acerca da teoria da moeda e
flutuações econômicas. Foi um dos expoentes da Escola Austríaca, considerado um
dos principais liberais do século XX, por trazer novas análises para as idéias liberais.
As idéias de Hayek assumem suma importância por servirem como um contraponto
teórico ao crescimento socialista, que propunha um modelo econômico pré-
planejado.
41
Para Hayek (1983), as instituições são resultados da inter-relação de
ações e intenções individuais convergentes. As instituições não são previamente
elaboradas, não podem ser simplesmente planejadas, uma rejeição do
racionalismo cartesiano
6
, que vê nas ões dos homens o sentido inato para as
escolhas. Sendo assim a razão pressupunha o planejamento, porém acredita-se
nessa teoria que, as ações individuais o mais benéficas à sociedade que a ação
racional, planejada de certos grupos.
Observa-se que o individualismo não se restringe ao hedonismo, mas vai
além, quando se entende que esse individualismo está alicerçado no anteparo
moral, existindo uma razão de ser, um objetivo social. O indivíduo descobre seus
reais interesses, esse processo é social, as inter-relações influenciam no processo
de formação do interesse individual. O conhecimento então é captado pelo indivíduo
de forma intensa, quando esse é submetido às regras do mercado, competição que
os leva ao aperfeiçoamento e a aquisição individual de conhecimento.
Em realidade, o conhecimento consciente, que orienta as ões do
indivíduo, constitui apenas uma parte das condições que lhe permitem alcançar seus
fins.
Em primeiro lugar, sabemos que a própria mente do homem é
produto da civilização na qual ele cresceu quase sem se dar conta da
experiência que a formou experiência da qual se utiliza e que esta
incorporada nos hábitos, convenções, linguagem e princípios morais
que a constituem... (Hayek, 1983, p.21-22).
6
O racionalismo cartesiano constitui na teoria de René Descartes, filósofo do Séc.XVI, onde o mesmo
institui a dúvida como ponto de partida da análise racional, algo só é real se for provado e tudo tem
uma prévia explicação sendo as conseqüências de uma reação imutáveis, predeterminadas pela
razão.
42
Estes conhecimentos se desenvolvem na busca de respostas individuais,
elas não são coletivas, partem do indivíduo, porém, podem ser convergentes. Mas
nunca existirá um único conhecimento, uma idéia em comum para toda a sociedade,
a distinção das idéias mostra claramente o caráter individual dos elementos
componentes da sociedade e o conflito dessas idéias reflete o conflito dos interesses
individuais, que muitas vezes convergentes se tornam interesses de grupos
distintos.
Nesse momento observa-se um elemento importante para o entendimento
do objeto desta pesquisa. Nos debates as idéias se desenvolvem, pois possuem
objetivos e soluções diferentes. No caso de Gudin, suas idéias se desenvolvem em
constante debate, conflito de idéias, demonstrando que no Brasil durante o período
estudado, havia um intenso conflito de interesses, que expressavam diferentes
soluções para os problemas brasileiros, fossem eles políticos, econômicos ou
sociais. Analisar as idéias nesse momento nos traz a possibilidade de entender a
ação dos homens, que vão optar por determinadas atitudes que expressarão a
solução vencedora, a idéia que triunfará, revelando-se mais vantajosa para a
sociedade ao longo do tempo.
O conhecimento existe apenas enquanto conhecimento individual.
Falar do conhecimento da sociedade como um todo não é mais que
uma metáfora. A soma dos conhecimentos de todos os indivíduos
não existe, em parte alguma, como um todo integrado. O grande
problema está em descobrir de que modo todos podemos aproveitar
esse conhecimento, que se encontra disperso, na forma de idéias
separadas, parciais e, às vezes, conflitantes, nas mentes de todos os
homens... (HAYEK, 1983, p.22).
43
Ainda sobre o conhecimento é importante salientar que o mesmo não se
restringe ao científico, mas também se constata como conhecimento toda forma de
vivência, experiência e hábitos que foram se caracterizando conforme o passar dos
tempos e se adaptando as necessidades do presente perfazendo uma miríade de
tipologias de conhecimentos que podem ser uníssonos, ambíguos, etc., tão
diversificado quanto e tão humano quanto os interesses que lhe dão razão de ser.
Sendo assim esse conhecimento se preserva através de sua transmissão, o que se
de três formas principais: através da vivência, do tempo e da troca de
informações entre pessoas de uma mesma geração. Esse conhecimento, essas
idéias possuem razão de ser quando são relacionados aos problemas que os
indivíduos de uma sociedade enfrentam, muitas vezes em situações semelhantes.
Sendo assim o conhecimento ou idéia a ser acatada seria a que se mostrasse mais
eficiente, no entendimento da sociedade, na resolução do problema.
Nesse momento observamos a figura de Eugênio Gudin como um porta-
voz de um grupo segmentado, fazendo parte de um segmento minoritário desse
grande grupo, o economista buscou mostrar que suas idéias eram vantajosas, que
seu conhecimento era capaz de resolver problemas da sociedade brasileira como
um todo.
Através desse método, entende-se a História, observando que os homens
selecionam regras cada vez mais aprimoradas, para que haja melhores soluções de
problemas, do qual resulta a maior produção de riqueza. Dentro desse contexto de
busca por regras ideais, as instituições são formadas, ou destruídas, ao longo de um
processo de amplo debate de idéias.
44
2.6 O ASPECTO INOVADOR LIBERDADE
A liberdade se torna essencial, pois se acredita que nenhum homem por
si consegue ter todas as respostas para os problemas da sociedade, mas a
liberdade fornece opções que se fundem, muitas vezes, delineando as instituições e
o futuro delas, possibilitando a existência do inesperado, do surpreendente.
Não existe certeza na ação humana e é por esta razão que, para
fazer o melhor uso do nosso conhecimento individual, devemos
seguir as normas indicadas pela experiência como as mais
adequadas de um modo geral, embora não saibamos quais serão as
conseqüências de sua observância em casos específicos. (HAYEK,
1983, p.29)
A liberdade possibilita a existência de novas idéias e de sua expressão e
divulgação, essas idéias são a somatória de conceitos, hábitos e circunstâncias
vividas pelo indivíduo; vivência essa propiciada pela própria sociedade. E essa ação
de liberdade de vivência de novos conhecimentos fornece a possibilidade de
elaboração de novos conhecimentos e de novas idéias.
Embora às vezes possamos identificar os processos intelectuais que conduziram
a uma idéia nova, provavelmente nunca poderíamos reconstituir a seqüência e a
combinação das contribuições que não levaram à aquisição do conhecimento explícito;
provavelmente nunca poderíamos reconstituir os hábitos adequados e as aptidões que
foram empregadas, os meios e as oportunidades utilizadas e o ambiente peculiar dos atores
principais que permitiram aquele resultado. As nossas tentativas de compreender essa parte
do processo não podem ir além de mostrar, em modelos simplificados, as forças que nele
operam e de indicar o princípio geral e não o caráter específico das influências que atuam
no caso. Os homens sempre se preocupam apenas com o que sabem. Portanto, as
45
características que, durante o processo, não são conhecidas ao nível da consciência
costumam ser ignoradas e provavelmente nunca podem ser identificadas em detalhe.
(HAYEK, 1983, p.32-33).
Infere-se de Hayek (1983) que a razão o tem utilidade se não estiver
em um plano de liberdade, onde esta pode ser tida como possibilidade, o
conhecimento como sugestão, alternativa, não como determinação de um
agrupamento social. Assim uma sociedade não pode ser reformada em instantes,
pois se deve conhecer seu funcionamento, sabendo que esse conhecimento nem
sempre é totalmente correto, pois a civilização humana possui vida própria. O
controle e os planos não se ajustam a forças que são independentes das vontades
humanas do presente, o processo de estruturação da sociedade não se como
algo a se dominar, muitas vezes é inconsciente.
Outro fator a ser observado é o peso do interesse individual na
elaboração ou aquisição das idéias. Quando se analisa as idéias de Eugênio Gudin,
torna-se possível identificá-las com seus interesses individuais. Gudin sempre
estivera envolvido com a ão da iniciativa privada; vindo de família de
comerciantes, sua tradição sempre estivera ligada a idéia de que as trocas geram
riquezas. Cabe observar, que não se trata aqui de uma luta de classes, pois Gudin
não pretendeu defender interesses do empresariado, pois esse geralmente divergia
em seus interesses, mas pelo contrário o seu liberalismo respondia questões
individuais de Gudin que se legitimava e se fortalecia ao responder questões sociais.
Ele não milita para um grupo específico, mas defende interesses e propostas de
solução para determinados problemas sociais.
Gudin se destacou, pois se enquadrou na condição de pensador que por
sua posição social privilegiada logrou expressar com maior destaque suas idéias.
46
Como outros de seus coevos, Gudin e suas idéias se aliam ao seu tempo e espaço,
representando outras vozes não ouvidas, mas que afirmaram suas idéias
2.7 O ANTI-RACIONALISMO AUSTRÍACO
Hayek, por outro lado opõe-se ao racionalismo cartesiano, como sendo a
teoria que acredita ser a razão, ação do homem de pensar, elaborar sentido aos
seus conhecimentos como forma de expressão da verdade, ser inata. Sendo assim
só seriam legitimas as instituições baseadas na razão, na comprovação.
A partir disso, torna-se quase inevitável concluir que somente o que é
verdadeiro nesse sentido pode levar à ão eficaz e que, portanto,
tudo aquilo a que o homem deve suas realizações é produto de seu
raciocínio, assim concebido. Instituições e práticas que não tenham
sido criadas dessa maneira por acaso podem ser úteis. Essa se
tornou a atitude característica do construtivismo cartesiano, com seu
desprezo pela tradição, o costume e a história em geral. A razão do
homem, por si só, torná-lo-ia capaz de construir a sociedade em
novos moldes. (HAYEK, 1985, p.4).
Essa idéia racionalista conclui que as instituições, hábitos, costumes, etc.,
derivariam de algumas pessoas que, munidas de razão, elaborariam sistemas
perfeitos embasados em alguma forma de lógica ou razão. Essa seria a principal
teoria histórica contestada pela escola austríaca, que rompe com a visão de um
contrato social, previamente elaborado, planejado, encontrado em Hobbes (1979) e
Rousseau (1989). Essa teoria legitimava a existência das instituições e buscava
explicar sua dinâmica e formação, pautando-se na idéia de que se trata de um
resultado lógico e único da verdade expressada pela razão. Ainda na visão
racionalista, caberia salientar a não existência de possibilidades, a lógica traz a
noção do exato, do certo, de uma única alternativa que seria a racional. Os
47
problemas sociais existem, porém a solução para ele é sempre precisa, nunca
relativa e imprevisível.
O pressuposto básico da idéia de que o homem conseguiu dominar o
seu meio, sobretudo através da capacidade de dedução lógica, a
partir de premissas explícitas, é factualmente falso, e toda tentativa
de restringir as ações do homem ao que pudesse ser assim
justificado privá-lo-ia de muitos dos melhores instrumentos de
realização que tem estado ao seu alcance. Simplesmente não é
verdade que nossas ações devem sua eficácia apenas ou, sobretudo
ao conhecimento que somos capazes de verbalizar e que pode,
portanto, constituir as premissas explicitas de um silogismo. Muitas
instituições da sociedade que são condições indispensáveis para a
consecução de nossos objetivos conscientes resultam, na verdade,
de costumes, hábitos ou práticas que não foram inventados nem são
observados com vistas a qualquer propósito semelhante (HAYEK,
1985, p.5-6).
O que se tem na teoria da escola austríaca seria um “individualismo
metodológico subjetivo”, a História é explicada pela ação individual dos homens
sendo essa ação subjetiva, correspondendo à ação da sociedade que influencia nos
interesses desse indivíduo.
2.8 O CONCEITO DE PROGRESSO À DESPEITO DO POSITIVISMO
A escola austríaca, através de Hayek, concebe a História de forma linear,
porém não previsível. A teoria austríaca acredita ser evolutivo, o processo da
História, porém o conceito de progresso guarda nexo estreito com o âmbito das
mudanças, inovações, adaptações e não possui a conotação determinista das
tradicionais idéias positivistas de progresso, onde é possível prevê-lo e planejá-lo;
nele o planejamento se torna um mapa para a construção de um determinado fim.
48
Por outro lado, Hayek (1983) é cauteloso ao tratar do progresso e o descreve como
algo que faz com que a sociedade caminhe mesmo sem saber o caminho.
A história da civilização é a história de um progresso que, no breve
período de menos de oito mil anos, criou quase tudo aquilo que
consideramos característico da existência do homem. Depois de
abandonar a vida de caçador, a maioria dos nossos antepassados
diretos, no começo da era neolítica, começou a se dedicar à
agricultura e, em seguida, passou à vida urbana, isto talvez haja
menos de três mil anos, ou seja, cem gerações...(HAYEK, 1983,
p.39).
Não leis que determinam o caminho para o progresso para o
melhoramento da sociedade. Não é através da razão que se alcança o progresso;
nesse ponto o pensamento austríaco rompe com o paradigma moderno, cientificista,
positivista ou marxista, que na razão o poder de prescrever a fórmula para o
desenvolvimento da sociedade.
Quando falamos de progresso em relação às nossas realizações
pessoais ou de qualquer atividade humana organizada, entendemos um avanço em
direção a uma meta conhecida. Não é neste sentido que podemos chamar de
progresso a evolução social, pois ela não é realizada pela razão humana
empenhada em alcançar um fim certo por meios conhecidos. Seria mais correto
conceber o progresso como um processo de formação e modificação do intelecto
humano, um processo de adaptação e de aprendizado, no qual não somente as
possibilidades que conhecemos, mas também os nossos valores e desejos mudam
continuamente.
49
Como o progresso consiste na descoberta de fatos ainda não
conhecidos, suas conseqüências são necessariamente imprevisíveis.
Ele sempre leva ao desconhecido e o máximo que podemos esperar
é entender as forças que o torna possível. Porém, embora uma
compreensão geral do caráter desse processo de evolução
cumulativa seja indispensável à criação de condições favoráveis a
ele, nunca poderemos fazer previsões específicas mediante ao
conhecimento. (HAYEK,1983,p.40).
Hayek (1983) parte do pressuposto de que a ignorância humana, frente à
complexidade das relações da sociedade e de seus elementos, é incapaz de
elaborar regras que decifrem de forma clara e objetiva a sociedade. Para a teoria
austríaca essa dinâmica seria impossível, sendo o progresso algo não conquistado
pelo planejamento
Mesmo no campo em que é mais deliberada a procura de novos
conhecimentos, isto é, na ciência, ninguém pode prever quais serão as
conseqüências de sua investigação. De fato, cada vez mais o homem se conta
de que até a tentativa de fazer com que a ciência busque conhecimentos úteis isto é,
conhecimento cujo emprego futuro possa ser previsto provavelmente constitui um
obstáculo ao progresso.
O progresso, por sua própria natureza, não pode ser planejado.
Seria, talvez, justificável falar em planejar o progresso em um campo
determinado no qual pretendemos a solução de um problema
específico e nos encontramos perto de uma resposta. Mas
chegaríamos logo ao fim de nossos esforços se tivéssemos de nos
limitar a lutar por objetivos visíveis em dado momento e se novos
problemas não estivessem surgindo sempre. O que nos torna mais
sábios é a descoberta do desconhecido. (HAYEK, 1983, p.41).
50
2.9 A ABORDAGEM ANTI-INTERVENCIONISTA AUSTRÍACA
Importa reiterar que esta pesquisa não buscou fórmulas para se entender
a sociedade e suas idéias, mas entende as próprias leis como construtoras da
sociedade e como elemento gerado por essa mesma sociedade, em um trabalho
inconsciente, não planejado, que se dá no tempo e espaço sem predeterminações.
Contudo esse trabalho parte do pressuposto do pensamento da Escola
Austríaca, pensamento este que observa as idéias e instituições como fruto da ação
do homem, fruto de seus interesses individuais, que somados a outros interesses
congruentes de outros indivíduos formatam e dão razão de ser as idéias e as
instituições. Entendendo-se que as idéias são absorvidas, e apropriadas pelas
necessidades, pelos interesses individuais.
[Sobre as instituições]) Não as escolhemos conscientemente pelas
vantagens que nos trariam; mas elas se desenvolvem e sobrevivem
porque de fato, proporcionam vantagens aos grupos de pessoas que
as adotam... (BUTLER, 1978, p.20).
O presente trabalho é pautado pela noção geral de que a sociedade o
poderia ser manipulada conscientemente pelo Estado ou por qualquer outro grupo. A
idéia de que o progresso não pode ser planejado, formatado ou construído por
simples vontade do ser humano, foi um dos pontos principais que motivou esta
pesquisa.
Segundo Butler (1978) Hayek sustenta que as instituições sociais
possuem um “conhecimento” que se constituem de valores e regras tradicionais.
Esse “conhecimento” é acumulado com o tempo. Não se cria experiência, ela possui
uma dinâmica histórica natural, porém ao se tentar refazer a sociedade e suas
51
instituições, o abandono de toda tradição do “conhecimento”, acumulado com o
tempo. O conhecimento é a somatória de habilidades, hábitos, gestos, atitudes
elementos passados de geração a geração explicitando a experiência, constituindo o
conhecimento.
A evolução de um sistema social baseado na observância geral de
normas pelos indivíduos exige naturalmente que seja possível haver
uma melhora e mudança gradual das próprias normas, diz Hayek...
(BUTLER, 1978, p.35).
Criar as condições adequadas para o desenvolvimento da sociedade
torna-se algo possível, porém criar o desenvolvimento apenas pelo planejamento
executado destrói com leis naturais do desenvolvimento histórico social espontâneo.
O fato de que normas (...) existem e atuam sem ser explicitamente
conhecidas por aqueles que obedecem a elas aplica-se também a
muitas das normas que regem as ações dos homens, determinando
assim a ordem social espontânea... (HAYEK, 1985, p.45)
A espontaneidade da sociedade tem seu alicerce na liberdade que,
como mostra Hayek (1985), é um resultado da civilização e norteadora das regras
morais geradoras de uma ordem social.
Ordem, em relação à sociedade, significa, portanto, especialmente
que a ação individual é orientada por uma previsão eficaz; que os
indivíduos não só usam eficientemente seus conhecimentos, mas
também podem prever com um elevado grau de confiabilidade que
tipo de colaboração é lícito esperar dos outros. (HAYEK, 1983,
p.117).
52
A ação individual, as escolhas, as necessidades sociais determinam a
forma e a existência das instituições, moldando as transformações históricas. Sendo
assim as idéias, expressam essas escolhas, exprimem também o fator principal para
o entendimento da dinâmica da sociedade, podendo assim se extrair delas a História
das escolhas e ações dos homens e os caminhos que formatam as sociedades.
2.10 CONCLUSÃO
Vimos nesta seção o fundamento teórico-metodológico deste trabalho
que conduziu esta pesquisa de natureza qualitativa do nero da ciência pura. Em
linhas gerais, foi mostrada a identidade intelectual desta pesquisa nos termos de
revelar seu cunho circunspecto cingido por preciosos pressupostos que levam a
compreensão da história dos homens observando, nos móveis da ação humana, o
indelével matiz do jogo dos interesses individuais.
A próxima seção aborda a anatomia da análise econômica de Gudin,
acerca de inúmeros aspectos que lhe foram contemporâneos da história do Brasil.
53
3. CAPÍTULO III – GUDIN E A PROBLEMÁTICA ECONÔMICA DO BRASIL
3.1 INTRODUÇÃO
Neste capítulo é abordada a parte econômica da obra de Gudin, o modo
como ele concebeu a problemática econômica do Brasil coevo seu; nele, estarão
presentes questões essenciais para o entendimento de Gudin tais como sua
oposição ao nacional desenvolvimentismo e ao intervencionismo estatal de um
modo geral. Será apresentada a análise gudiniana de vários Governos brasileiros,
bem como a do grave problema da inflação.
3.2 A OPOSIÇÃO DE GUDIN AO NACIONAL DESENVOLVIMENTISMO:
ASPECTOS TEÓRICO-CONCEITUAIS
Uma economia baseada na agricultura, uma indústria nacional frágil e
quase inexistente, uma instabilidade monetária e um alto nível de pobreza social,
tais foram fatores que caracterizaram o Brasil como uma nação subdesenvolvida,
nas décadas de 1930. Essa situação dava margem a diferentes explicações e
possíveis soluções para os problemas nacionais que impediam o desenvolvimento.
Essas explicações se cristalizavam em idéias, teorias defendidas por grupos de
intelectuais que usavam de diferentes canais para exporem seus pensamentos.
Duas dessas idéias que dominaram o palco de discussões acerca do
subdesenvolvimento brasileiro fora o desenvolvimentismo e o liberalismo.
O desenvolvimentismo foi representado por intelectuais ligados a
instituições de estudos ou até mesmo a setores do Estado. O liberalismo, por seu
lado, foi representado principalmente por economistas ligados a FGV, dentre eles se
54
destacou Eugênio Gudin, considerado um dos maiores líderes do liberalismo no
Brasil.
O Brasil viveu mudanças significativas no campo político, institucional e
econômico principalmente a partir da década de 1930. Essas mudanças geraram
controvérsias doutrinárias sobre os novos rumos que a sociedade deveria seguir nos
campos político e econômico. Com isso, líderes intelectuais e intérpretes das
transformações, se destacaram a partir da década de 1930 e 1940. As discussões
que se levantavam o se limitavam a um cenário nacional, mas existiam
mundialmente e agora se consolidavam no Brasil. A controvérsia se dava pelo
debate entre desenvolvimentismo e liberalismo. Nesse contexto cabe assinalar que
o grande expoente das idéias desenvolvimentistas no Brasil era, na verdade, o
próprio Estado, esse se tornou o principal opositor de Gudin naquele debate
econômico.
Até 1937 o Brasil viveu uma política econômica conservadora que
tinha seus objetivos voltados à estabilidade monetária e uma economia voltada para
a agricultura. Porém dado as crises econômicas mundiais, a industrialização
nacional começa a ser discutida como uma forma moderna de manter-se
independente dos países mais fortes e isso geraria desenvolvimento e
independência econômica. Havia um descontentamento quanto aos rumos da
economia brasileira e iniciou-se o surgimento de propostas para se conter a falta de
modernidade na economia brasileira, buscando assim maneiras para a conquista do
progresso e o tão esperado desenvolvimento econômico do país.
Desde a década de 1920, vários cientistas sociais brasileiros
analisaram a História do país para detectarem as causas que provocaram o baixo
desenvolvimento do país. A busca pela modernidade era o alvo desses cientistas
55
que delegavam ao Estado a tarefa de trazer o esperado desenvolvimento para o
Brasil. Na década de 1940, por outro lado, Caio Prado Júnior
7
expressava o seu
descontentamento com o atraso brasileiro, e buscava no passado respostas para a
situação; diz ele:
Os problemas brasileiros de hoje, os fundamentais, pode-se dizer
que estavam definidos e postos em equação 150 anos. E é da
solução de muitos deles, para que nem sempre atentamos
devidamente, que depende a de outros em que hoje nos esforçamos
inutilmente. Um dos aspectos mais chocantes do Brasil e que alarma
qualquer observador de nossas coisas, é esta atonia econômica, e,
portanto, vital, em que mergulha a maior parte do território do país.
(1942, p.11-12)
Essa “atonia”, a falta de energia da economia brasileira faria com que o
Estado interviesse na economia. Assim se fortaleceu a idéia de que cabe ao Estado
a função de ser o promotor do desenvolvimento nacional. Desde o governo de
Getúlio Vargas, a partir de 1930, o Estado age com propostas voltadas para o
desenvolvimento nacional principalmente com incentivo à industrialização. O Estado
protege e decide os caminhos da economia brasileira. Observa-se que muitos
presidentes regeram suas políticas governamentais buscando o desenvolvimento
nacional, porém os governos mais marcantes, onde essas características se
visualizaram de forma cristalizada, foram os de Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros
e João Goulart. A política que ditou as ações governamentais desse período ficou
conhecida como nacional-desenvolvimentismo.
Por trás do termo nacional-desenvolvimentismo, concepções
fundamentadas pelos interlocutores do pensamento denominado de
desenvolvimentista, que foram teóricos deste e que acreditavam que o
7
Para maior detalhamento ver. JUNIOR, Caio Prado. Formação do Brasil contemporâneo. São Paulo:
Brasiliense,1942.
56
subdesenvolvimento do Brasil deveria ser combatido pelo Estado. Um dos
economistas que contribuiu , na década de 1950, com estudos sobre o novo modelo
econômico, contra o subdesenvolvimento da América foi o argentino Raul Prebisch
(1964).
Como reafirma GOMES (1967), Prebisch (1964)
8
atribuía o precário
desenvolvimento não da América Latina, mas do Terceiro Mundo como um todo,
às determinações do sistema capitalista, na sua globalidade. Conclui ele que as
relações de troca na periferia do mundo estavam declinando em relação ao centro e,
nesse sentido, o crescimento era muito lento nas regiões de Terceiro Mundo, bem
como na América Latina. Desse modo condenava a estrutura econômica mundial
pelo sucesso da Europa e principalmente o dos Estados Unidos, por entender que
essas regiões tinham a economia a seu favor, em detrimento dos países
dependentes que, por sua vez, eram os fornecedores de matéria-prima. Ou seja, era
a ordem mundial econômica global que mantinha essas regiões em um estado
contínuo de desenvolvimento dependente, segundo ele.
Os interlocutores da teoria do subdesenvolvimento procuraram
demonstrar que as relações de troca mundiais impunham aos países de Terceiro
Mundo um desenvolvimento dependente e desequilibrado. Para obter o equilíbrio, a
solução era encorajar a indústria local, impondo barreiras tarifárias contra as
importações. A substituição das importações foi conseguida principalmente pela
intervenção do Estado na economia, que passou a ser também um agente regulador
da instabilidade econômica e social. A prática do planejamento foi incorporada pelo
poder blico e tornou-se um componente paulatinamente mais necessário ao
Estado. Esse planejamento estava intimamente ligado a um projeto de planificação,
8
O pensamento e trajetória de Raul Prebish é exposta de forma clara na obra : BIELSCHOWSKY, Ricardo.
Pensamento econômico brasileiro: o ciclo ideológico de desenvolvimentismo. Rio de Janeiro: Contraponto,
1995.
57
um controle pré-determinado, ferramenta utilizada pelo governo para gerenciar o
Estado.
A política desenvolvimentista resultou de pesquisas da Comissão
Econômica para América Latina (CEPAL), que se refletiu no Brasil através de uma
grande parte dos intelectuais afirma MANTEGA (1987, p.12):
[Os intelectuais] desembocaram na industrialização como meta
prioritária para a situação brasileira naquele momento. Entretanto, a
liderança do movimento ficou nas mãos de um grupo de intelectuais
de centro esquerda denominado Grupo de Itatiaia... esse grupo se
transformaria no Instituo Superior de Estudos Brasileiros (ISEB)...
encarregado de discutir os grandes problemas nacionais e de auxiliar
na elaboração dos programas de governo. (MANTEGA, 1987,p.12)
O ISEB reuniu nas cadas de 1950 e de 1960 os participantes da
ideologia do desenvolvimento nacional. Suas diretrizes fundamentadas na CEPAL
indicavam políticas econômicas de cunho nacional desenvolvimentista. Um dos
representantes desse grupo na economia política desenvolvimentista foi Celso
Furtado, um dos ministros do governo de Juscelino Kubitschek. Celso Furtado
apresentou ativa participação na elaboração de projetos para os fins da
modernização. A instituição teve destacada atuação ao longo do governo JK como
centro elaborado da ideologia do desenvolvimento, promovendo cursos,
conferências, seminários e pesquisas.
As concepções do ISEB, no campo da Economia, tinham como influência
as idéias neoclássicas, as idéias dos economistas Keynes (1983) e List (1983). Os
princípios básicos do ISEB se baseavam na idéia de desenvolvimento econômico
ligado à idéia de progresso tecnológico que por sua vez resulta no acúmulo de
58
capital, com o aumento da produtividade do trabalho e nível de vida como aponta
RODRIGUEZ (1981).
A corrente neoclássica era uma vertente do liberalismo clássico que
objetivava um cientificismo para a economia política e assim procurava encontrar leis
e linguagens para a ciência que tomaria o lugar da denominada economia política.
Com esse pensamento os neoclássicos enquadraram a economia política como uma
forma de pensar, onde o contexto histórico não faria diferença, como se existisse
verdades que se adquiririam em qualquer época, como mostra Laurêncio
Nascimento de Jesus (1994).
Os pensadores da economia política smithiana, acreditavam que era
necessário o desenvolvimento das forças produtivas, essa idéia, consolidada
especialmente por Adam Smith (1983), era uma concepção histórica em prol do
desenvolvimento. Por outro lado, o pensamento estruturalista traz para a CEPAL a
influência da noção da existência de uma fórmula ideal para o desenvolvimento.
Outra influência que a CEPAL recebeu foi o pensamento nacionalista de
G. F. List (1983)
9
, fazendo com que as questões econômicas se centralizassem no
âmbito nacional. Para List a nação é o ponto inicial, para Adam Smith, riqueza não
provém da nação fechada, mas sim das que são abertas para o comércio. A CEPAL
englobou os ideais nacionalistas e seu discurso fixando-se em torno desta questão.
Note-se que a tese estruturalista, cepalina, teve como contribuição direta
a teoria de Keynes (1983) que acreditava que o desencadeamento da inflação se
dava devido à ruptura entre os desenvolvimentos da renda monetária e da renda
9
Fredrich List (1789-1846) foi um economista que defendeu o protencionsmo, baseado no
nacionalismo. Para ele empresas nacionais não conseguem se desenvolver em um contexto de
mercado externo, sendo necessária a tutela do Estado. Ver. LIST,F. Sistema Nacional de Economia
política. São Paulo: Abril Cultural, 1983.
59
real. O aumento da procura geraria o desenvolvimento da produção, o que
provocaria o aumento da renda real, aumentando assim a quantidade de moeda.
MAKSOUD (1986) aponta que as teses de Keynes (1983) substituem a idéia de
orçamento estatal equilibrado pela idéia de que as flutuações inerentes à economia
poderiam se salientar pela formação de um desequilíbrio orçamentário, de modo a
gerar déficits na recessão e superávits na inflação. Keynes rompe com a “Lei de
Say”
10
que aponta que o processo capitalista, naturalmente, faz com que a oferta
crie sua própria demanda. Sendo assim o problema central para a crise de 1929,
para Keynes (1983), seria a demanda efetiva que teria atingido um nível
inadequado. A solução para este problema seria a ação do Estado no sentido do
mesmo ampliar seus gastos como meio direto de estímulos de demanda, produção e
emprego, assegurando o pleno emprego dos fatores de produção; a respeito disso,
relembrava Maksoud:
O aumento total da demanda global seria um múltiplo
substancialmente grande do incremento no gasto do governo. Essa
teoria gerou o ‘keynesianismo’, que deixou os governos
completamente soltos para gastar mais e mais: financiados pelo
aumento da oferta de dinheiro ou por empréstimos, os déficits dão-
lhes condição de gastar sem ter de aumentar os tributos.... (1986,
p.113).
De acordo com as idéias desenvolvimentistas, a moeda se expande
passivamente, tendo sua origem na ordem estrutural, portanto, alterando-se, através
da ação do Estado. A realidade estrutural da inflação poderia ser combatida por
meio de um esforço para o crescimento econômico planejado.
10
Jean-Baptiste Say (1767-1832) foi um economista francês que elaborou a lei de Say”, onde o
mesmo defende que a oferta cria sua própria demanda e que não haveria maneira de existir crises de
super produção, sua teoria fora fortemente contestada nas teses de Keynes. Ver: ARAÙJO, Carlos
Roberto Viera. História do pensamento econômico. São Paulo: Atlas, 1995.
60
Essa teoria deu margem a criação de órgãos institucionais que facilitaria a
ação do Estado na economia da nação, como ocorreu na Conferência Internacional
Monetária de Bretton Woods
11
em 1944, que contou com a presença de
economistas reconhecidos de várias partes do mundo, incluindo Keynes e o
americano Harry Dexter Whiter. Essa conferência teve como objetivo remodelar as
regras para as relações econômicas internacionais de financiamento. Como
resultado delas, foram criados órgãos como o FMI (Fundo Monetário de
Investimento) e o Banco Mundial. Visualizava-se então a queda do padrão ouro e
uma nova ordem econômica mundial.
Em resumo, as concepções da CEPAL se refletem nos
desenvolvimentistas brasileiros que visam o progresso do Brasil e buscam como
principal meta a substituição do mecanismo do mercado, substituindo as
importações pelo incentivo da produção nacional, através de um sistema de
planificação dirigida, pelo esforço nacional para que se cumpram metas pré-
definidas. Como ocorreu no governo de JK, com o Plano de Metas.
Assim, o projeto nacional desenvolvimentista caracterizou-se por uma
política deliberada da CEPAL no sentido de estimular o processo de industrialização,
cujos projetistas, principalmente, para os países da América Latina, foram Raul
Prebisch (1985) e Celso Furtado (1985), entre outros.
Cabe agora observar-se como se perfilou o debate entre
desenvolvimentismo e liberalismo.
11
A Conferência de Bretton Woods também conhecida como Conferência Monetária e financeira das
Nações Unidas, ocorreu em julho de 1944, em Breetton Woods, New Hampishire, EUA. A partir dessa
conferência foram criadas as instituições financeiras, que tinha um caráter internacional: o Banco
Mundial e o FMI (Fundo Monetário Internacional), esse no qual Gudin foi representante entre 1951 e
1954. Ver ABREU. Marcelo de Paiva. Contribuições de Eugênio Gudin ao Pensamento Econômico
Brasileiro. Literatura Econômica, 1984.
61
3.3 GUDIN X SIMONSEN: A FORMALIZAÇÃO DA CONTRAPOSIÇÃO ENTRE
LIBERALISMO E DESENVOLVIMENTISMO
O debate entre as idéias liberais e desenvolvimentistas se expressa em
um momento marcante para a história das idéias no Brasil; muitas vezes citado pela
historiografia, ele se deu entre o empresário Roberto Simonsen (1978) e o
economista Eugênio Gudin (1978). A discussão se concentra na questão da
necessidade de incentivo estatal a industrialização no Brasil, sendo esse um dos
cernes da teoria cepalina, que acredita ser a industrialização o elemento essencial
ao desenvolvimento. No Brasil encontraram-se defensores, nos meios intelectuais e
empresariais, que teorizaram sobre a importância da industrialização para o
crescimento e independência da economia nacional. Porém, liberais como Eugênio
Gudin não favoráveis a intervenção estatal vão se posicionar, não contra a
industrialização, mas quanto ao caminho para que ela fosse encorajada.
Os desenvolvimentistas acreditavam que para se chegar à riqueza social
interna através da industrialização, era necessário passar pelas medidas
protecionistas, pelos motivos seguintes. Apontados por LIMA:
O protecionismo cerceia de alguma forma e por algum tempo a
permuta entre as nações, mas produz uma grande liberdade de
produção dentro do país que o adota. De fato, nos países que
abraçam o protecionismo, qualquer cidadão pode montar a indústria
que entender desde que repouse em sadio fundamento, certo de que
está livre do esmagamento proveniente dos dumpings (inundar o
mercado com produtos com preços abaixo do custo), ou manobras
de poderosos concorrentes estrangeiros. (LIMA, 1978,p.162)
Um dos defensores dessa idéia, o desenvolvimentista Roberto Simonsen
defende a ação do Estado para promover a industrialização desde a década de
62
1940. “A industrialização do país, sábia e cientificamente conduzida, com o melhor
aproveitamento de seus recursos naturais é o meio que a missão aponta para
alcançar o progresso desejado por todos.” (SIMONSEN, 1978, p. 26)
Esse projeto de planificação da economia brasileira expresso por
Simonsen na década de 1940 deu origem a um debate entre dirigismo econômico e
Liberalismo e teve como opositor à primeira concepção, o economista Eugênio
Gudin. Esse debate clássico, lembrado por grande parte da historiografia que trata
do período, sintetiza o grande confronto de idéias que norteava a agenda intelectual
nas décadas 1930 à 1980 .“...o surto de industrialização propiciou a ascensão dos
representantes dos interesses da classe, passando os mesmos a ter peso crescente
no centro das decisões políticas e econômicas ...” (SIMONSEN, 1977, p.7). Esses
representantes se destacam em órgãos governamentais como, por exemplo,
Conselho Federal de Comércio Exterior, Comissão de Política Industrial e Comércio,
Comissão de Planejamento. Esses órgãos eram compostos pelos chamados
“técnicos”, um corpo de especialistas que pesquisavam soluções para uma melhor
política econômica para o Brasil, eram políticos e conselheiros.
Perseguindo essa orientação, o governo contava com o apoio
decisivo dos mais destacados líderes industriais, tais como Roberto
C. Simonsen e Euvaldo Lodi, seja no seio das associações
comerciais e industriais, seja nos órgãos colegiados de política
econômica ... esses ‘nadavam em favor da corrente’, ao contrário da
oposição liberal ou conservadora. (SIMONSEN, 1977, p.7)
Mas as idéias de Simonsen apontavam a real necessidade de
industrialização, os teóricos do subdesenvolvimento procuraram demonstrar que as
relações de troca mundiais impunham aos países de Terceiro Mundo um
desenvolvimento dependente e desequilibrado. Para obter o equilíbrio, a solução era
encorajar a indústria local, impondo barreiras tarifárias contra as importações. A
63
substituição das importações foi conseguida principalmente pela intervenção do
Estado na economia que, atuando inclusive como empresário, passou a ser também
um agente regulador da instabilidade econômica e social.
Roberto Simonsen defende a ação do Estado para promover a
industrialização desde a década de 1940, como se observa ele:
A industrialização do país, sábia e cientificamente conduzida, com o
melhor aproveitamento de seus recursos naturais é o meio que a
missão aponta para alcançar o progresso desejado por todos.
(SIMONSEN, 1978, p. 26)
Eugênio Gudin acreditava ser a indústria, necessária para o
desenvolvimento da nação, porém essa deveria estar atrelada a condição de ser
uma atividade produtiva viável, sem a proteção das pesadas tarifas aduaneiras e do
câmbio candente, e ela demonstraria dessa forma sua capacidade de competição no
mercado internacional, justificando-se, sendo assim ser incentivada.
Uma idéia combatida por Eugênio Gudin era a planificação da economia,
os desenvolvimentistas industrialistas acreditavam ser a planificação uma maneira
rápida e eficiente de ordenar a industrialização nacional, dando ao Estado essa
função de seu promotor. O “sucesso” dos planos qüinqüenais na União Soviética,
com o governo de Stalin é usado como exemplo de eficiência do planejamento.
A aura de cooperação entre Estados Unidos e a União Soviética, em
decorrência da guerra, facilitava a aceitação desse tipo de
argumentação, aparentemente convincente face ao sucesso,
conseguido pelo governo de Stalin na industrialização e na
mobilização de guerra... (SIMONSEN, 1977, p.11).
64
Sendo assim, dado as propostas diversas para o caminho que o Brasil
deveria traçar para o desenvolvimento econômico, o Conselho Nacional de Política
Industrial e Comércio, subordinado ao Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio,
em 1944, solicitou um estudo da situação em que se encontrava a economia
brasileira.
Por sua vez, Eugênio Gudin fica como relator da Comissão de
Planejamento, subordinada ao Conselho de Segurança Nacional. A análise de
Roberto Simonsen (1978) é repensada por Gudin que emite outro documento a
respeito das posições de Simonsen. O debate se deu com ambos os pareceres do
Conselho Nacional de Política Industrial e Comércio, esses foram ainda publicados
em 1945. Primeiramente Eugênio Gudin (1965) publica o artigo intitulado de
“Rumos da Política Econômica”, em resposta ao texto de Roberto Simonsen sob o
título de “O planejamento da Economia Brasileira”, que mereceu a tréplica de
Eugênio Gudin (1968), o que se deu em um documento final chamado de “Carta à
comissão de Planejamento”.
Observa-se então em um primeiro texto “A planificação da Economia
Brasileira”, de 1944, que expõe o posicionamento de Roberto Simonsen ao
Conselho, esse texto inicialmente não fora publicado. Neste texto, Simonsen mostra
a partir do estudo da renda nacional que a mesma se observa muito abaixo do ideal
que o necessário seria um aumento de quatro vezes o seu atual valor. Aponta ainda
que o Brasil possui sérios problemas quanto a concorrência mundial e que seria
necessário reduzir os riscos e custos da produção. A economia brasileira
demonstrava debilidade, pois dependia da importação de bens como petróleo e
carvão; possuíam uma forte carência de metais e apresentava uma indústria
obsoleta com baixa produtividade.
65
Simonsen conclui que as iniciativas privadas não possuem condições de
fazer a renda nacional crescer com rapidez e que esse setor é insuficiente. A
planificação seria a solução central, pois através dela poderia haver a cooperação
das classes produtoras, ensino, pesquisa tecnológica, formação profissional,
incremento da atividade agrícola, industrial e comercial. O Financiamento para o
planejamento viria através de empréstimos externos e emissão de papel moeda com
a fixação de juros.
Em resposta a esse texto, Eugênio Gudin em “Rumos da Política
Econômica” procura desmistificar a idéia de planejamento, apontando erros,
segundo sua visão, da análise de Simonsen.
Primeiramente Gudin aponta o conceito de Ary Torres Conselheiro do
Conselho sobre planejamento, que se alinha ao conceito de Simonsen:
Programa que seria a diretriz do Governo no fomento da economia,
seja pela concessão de favores às iniciativas particulares que se
entrosassem na estruturação delineada, seja pelo engajamento do
Estado naquelas outras atividades reconhecidamente necessárias...
previa também o tratamento a ser dado ao capital estrangeiro que
nos rodeiam, de modo a que servissem igualmente ao interesses de
seus portadores e do Brasil (GUDIN, IN: SIMONSEN, 1977, p.49-50)
A planificação deveria para Simonsen abranger os setores da agricultura,
transportes, a produção de energia, além da produção industrial, dentro de um
período determinado para atingir a renda necessária esperada. Sendo assim Gudin
mostra que para o conselheiro Ary Torres haveria necessidade de diversas
comissões para atender os diferentes setores.
Gudin não diverge dos seguintes objetivos mostrados por Simonsen:
mobilização dos combustíveis, reorganização dos transportes, modernização da
66
agricultura, incentivo a novas escolas de engenharias e ensino profissional e a tão
aguardada real industrialização do país; entretanto ele assinala sua discordância do
método demonstrado por Simonsen:
No tocante, porém, aos métodos a adotar, à analise da conjuntura
econômica que se quer remediar e aos princípios gerais que deve
obedecer a política econômica, não posso, como se verá deste
parecer, acompanhar a orientação do ilustre Relator do plano
econômico. ( GUDIN, IN: SIMONSEN, 1977, p.54).
Gudin expõe erros de cálculos nas equações de Simonsen quanto à
renda nacional e continua apontando de onde surgiria a “mística do Plano”. Gudin
busca na História visualizar a origem e a crise do capitalismo, observando a maior
potência mundial, Estados Unidos e conclui:
Não cabe assim à economia liberal a responsabilidade desses desastres.
Originariamente, a Grande Depressão foi o resultado de um fenômeno político: a
guerra mundial de 1914, que abalou profundamente o sistema que a Economia
Liberal havia construído em um século.
Subsidiariamente, incumbe a responsabilidade aos desacertos
praticados pelo grande, mas ainda inexperiente país devedor à
posição do maior país credor do mundo e de der da economia
mundial. (GUDIN, IN: SIMONSEN, 1977, p.67).
Gudin ainda sinaliza a política de New Deal, em 1933, quando o
presidente norte-americano Roosevelt, com práticas intervencionistas, trouxe
conseqüências como à desvalorização do dólar.
67
O intervencionismo se tornara uma espécie de mística, entre capitalismo e
dirigismo, como até mesmo Gudin observou em Stálin observou:
“... Stalin estava, pois coberto de razão, quando, em entrevista
concedida ao famoso escritor inglês H. G. Wells, dizia-lhe, a
propósito do New Deal americano, que é preciso saber-se o que se
quer: ou economia liberal, respeito ao capitalismo e incentivo à sua
aplicação, ou comunismo, capitalismo de Estado. Importa adotar um
ou outro sistema e não qualquer mistura dos dois.” (GUDIN, IN:
SIMONSEN, 1977, p.67-68).
Na “New Deal”, obras blicas do Estado para combater a depressão
visavam atingir a prosperidade a partir de um “Estado maior”, industrial e
intervencionista. Para Gudin era inconcebível uma ditadura econômica dentro de
uma democracia. Ele ainda critica Simonsen por usar o exemplo da planificação
soviética como bem sucedida, o critica por o observar a condição paupérrima de
vida do operariado russo quase “escravo”, e não visualiza os altos índices de
impostos pagos ao regime, situação essa que não poderia ser tida como exemplo
para o Brasil.
Outra crítica de Gudin seria quanto aos meios de financiamento para o
projeto de planificação. Na visão liberal não seria com empréstimos que o problema
seria resolvido, mas com a análise dos erros causadores dos problemas e a ação
seria de correção dos mesmos. Alguns grupos estariam sim é interessados em um
planejamento para a consolidação de seus interesses tais como os socialista-
comunistas, a burocracia e por outro lado interesses reacionários em geral. O plano
pode se servir de atalho a qualquer grupo para alcançar seus objetivos.
A emissão monetária também seria um grande erro, pois o Estado não
pode gerar capital, somente produção e troca geram capitais, a emissão de moeda
68
geraria um surto inflacionário; a inflação, na visão de Eugênio Gudin, um
monetarista, advém da emissão de papel moeda e títulos, efetuada para financiar e
cobrir o déficit público. Isso gera um aumento dos meios de pagamento no mercado,
enquanto a produção não se eleva. Assim o governo “fabrica” dinheiro como mostra
Maksoud (1986, p.9), sem o lastro correspondente para cobrir suas despesas invés
de diminuí-las. Tendo o Estado o poder de intervir de maneira direta na economia,
ele se torna mais que um administrador, um empresário.
Os desenvolvimentistas chamados também de estruturalistas,
acreditavam que a inflação era um resultado do projeto de desenvolvimento e que a
mesma não influenciava no processo. Sendo assim a inflação viria acompanhada
naturalmente do crescimento. Um ponto defendido pelos estruturalistas é de que a
inflação não pode ser controlada através de medidas monetárias e fiscais sem
provocar desemprego ou estagnação do crescimento devido à rigidez da oferta.
Para Gudin o Estado liberal tem a função de “estabelecer regras do jogo,
mas não pode jogar”; ele deve, entretanto, se preocupar com a economia.
... No Brasil nunca precisamos tanto de uma colaboração inteligente
e eficaz do Estado para o progresso de nossa economia como na
atual conjuntura, em que é premente a necessidade de uma série de
medidas legislativas e administrativas capazes de permitir e facilitar a
expansão e o progresso econômico do país. (GUDIN, IN:
SIMONSEN, 1977, p.84).
Em contrapartida, como resposta ao relatório de Eugênio Gudin, Roberto
Simonsen (1978) escreve “O planejamento da economia brasileira” que resgata seu
posicionamento inicial e critica o liberalismo mostrando que os princípios do mesmo
se mostrariam inválidos. Com tom de ironia, Simonsen critica Gudin por dar voz a
Stálin.
69
Outro ponto analisado por Simonsen é que as taxas aduaneiras têm
diminuído progressivamente no Brasil, com a desvalorização da moeda contribuindo
para isso. Para Simonsen a intervenção do Estado se impõe onde se mostra falha a
iniciativa privada e defende as medidas intervencionistas.
A regulamentação dos monopólios teve em mira encorajar e manter
a concorrência entre as pequenas empresas, no interesse dos
consumidores. A legislação trabalhista é uma intervenção para
proporcionar um melhor segurança na vida dos assalariados. A
fiscalizão dos gêneros alimentícios e dos medicamentos foi uma
forma de intervenção, objetivando a proteção para garantir a sua
conservação, a sua continuidade e o seu uso inteligente e eficiente.
Toda uma sucessão de serviços públicos foi criada em setores onde
a ausência de probabilidades de lucros não despertava a iniciativa
particular. (GUDIN, IN: SIMONSEN, 1977, p.182-183).
Por sua vez Eugênio Gudin (1978) em resposta e última consideração no
documento “Carta à Comissão de Planejamento”, o economista reafirma seu
posicionamento, dizendo não ser um adversário da indústria, mas um radical
defensor da liberdade econômica.
Em face do exposto, tem-se neste debate um material riquíssimo para se
compreender o debate que se estendera até meados das décadas de 1980 e que
sempre surge em pauta de discussões nos dias atuais, debate desenvolvimentista
(dirigismo) X liberalismo que se amolda a seu contexto, com diferentes situações,
mas com os mesmos princípios.
A História elegeu um vitorioso pró tempore para o debate, Roberto
Simonsen, pois as políticas governamentais das décadas de 1940 a 1980 se
orientaram por intervencionistas, protecionistas e fortemente planejadores.
Ocorre, pois, que o debate demonstra o que Hayek aponta quanto
ao interesse individual norteando as escolhas. Roberto Simonsen, um industrial, não
70
tinha no desenvolvimentismo apenas uma ideologia que lhe dava base teórica para
seu discurso, mas idéias para a solução de seus problemas individual, como
empresário nacionalista e monopolista. Como empresário industrial precisava ter o
apoio do Estado a esse setor novo, visto que a indústria nacional se mostrava frágil
frente à concorrência internacional, eram necessários privilégios, concessões e
apoio estatal. A teoria desenvolvimentista era útil para a realidade de Simonsen. A
idéia explicava e justificava seu interesse, mostrando que o mesmo poderia
convergir para o interesse comum, social.
3.4 A ANÁLISE ECONÔMICA DE GUDIN CONCERNENTE AO GOVERNO DE JK
É em um contexto de debate de idéias que o nacional
desenvolvimentismo se constitui num ideário base para as políticas do governo
Juscelino Kubitschek. Acreditava-se que ser o grande momento em que o Brasil
alcançaria o tão esperado desenvolvimento, as metas deste novo governo fariam
com que o Brasil obtivesse em cinco anos o desenvolvimento de cinqüenta anos, o
Estado faria em cinco anos o que a história não fez em quase quinhentos de vida
brasileira.
É necessário ter em conta que mesmo nessa fase final do período
democrático o quadro político geral continuava a ser o do populismo. Do ponto de
vista de uma política de desenvolvimento industrial nacional, como ponto de vista do
processo de democratização social e política, as reformas de estrutura
apresentavam-se como essenciais. Contudo, nenhum dos grupos dominantes se
mostrava capaz de oferecer os suportes indispensáveis a uma política de reformas,
71
ainda quando se pudesse admitir que alguns deles retirassem proveito dela. Todos
se voltaram para o Estado e, mais uma vez, as massas populares apareciam como a
grande força social capaz de proporcionar bases a essa política e ao próprio Estado.
(WEFFORT. 1980, p.77)
“Desenvolvimento” se tornou uma palavra mágica no qüinqüênio 1956-
1959, o otimismo tomava conta de toda a sociedade. Logo após sua posse,
Juscelino Kubitschek criou o Conselho de Desenvolvimento, primeiro órgão de
planejamento instituído no Brasil, para atuar de forma permanente. Deste conselho
nasceu o programa de Metas que constituía trinta objetivos básicos em cinco setores
da economia: energia, transporte, indústria de base, alimentação e educação, além
do maior projeto de todos, o da mudança da capital federal.
Por sua vez, Eugênio Gudin observava o desenvolvimento prefixado
através de planos ou metas como um mito que atrai a massa popular, que se
envolve crente no discurso manipulador e mistificado dos populistas.
Mas a mística do plano não é o produto da metafísica mais ou
menos manicômica desses sociólogos. Eles suprem o palavreado da
nebulosa ideológica. Mas em baixo, bem junto a terra, vários
grupos sociais e econômicos para os quais a mística do plano pode
constituir precioso instrumento para a vitória de suas doutrinas
políticas ou de seus interesses econômicos. (GUDIN, 1978, p.78)
Eugênio Gudin combateu a política econômica do Governo de JK nos
anos de 50 e 60. Nesse debate duas correntes se sobressaíram: a do próprio
Eugenio Gudin, os gudinianos, corrente essa constituída por Otavio Gouveia de
Bulhões, Bilac Pinto e outros e a segunda , o grupo desenvolvimentista, da qual,
entre outros, faziam parte Celso Furtado, Hélio Jaguaribe e Candido Mendes.
72
Foi frente a esta discussão que Gudin escreveu uma série de artigos
entre os anos de 1959 e 1964, que foram publicados no jornal O Globo. Esses
artigos foram análises que ele fez sobre os principais problemas econômicos do
Brasil no período em questão. A análise desses artigos traz a discussão do nacional
desenvolvimentismo a partir da ótica liberal, observando o dirigismo econômico de
Juscelino Kubitschek e João Goulart, destacando seus problemas e as
conseqüências que atingiram drasticamente o Brasil.
Em um período onde quase todos acreditavam e apostavam nas idéias
nacionalistas, Gudin, soergue-se contra o nacional desenvolvimentismo. Ele
procurava mostrar como a política econômica praticada por Juscelino Kubitschek
produzia seus efeitos colaterais como a inflação, que atingiu índices antes nunca
vividos na História brasileira. Gudin mostra o preço que custou para o Brasil as
políticas desenvolvimentistas; e numa perspectiva liberal mostra o quanto pode ser
danosa a intervenção do Estado na economia, principalmente quando este se
propõe a agir contra o desenvolvimento histórico e natural das forças produtivas.
Portanto, forçando um desenvolvimento artificial através da ação do Estado.
Nas décadas de 1950 e 1960, os debates econômicos passavam por uma
fase de intensa agitação. Em um momento de mudanças e de grande euforia pelas
idéias desenvolvimentistas, os liberais são taxados de pessimistas por apontarem os
erros da política governamental de seus opositores. É nesse momento que
economista Eugênio Gudin se insere como líder intelectual e propagador do ideário
liberal. A figura de Gudin, uma das matrizes do pensamento liberal brasileiro,
marcou a história desse pensamento.
A história da vida intelectual e profissional do professor Eugenio
Gudin se confunde com a história do pensamento liberal no Brasil,
tanto em função de sua imensa e ativa participação na vida política
brasileira, como no fato de que em seus 100 anos de vida, grande
73
parte deles foram dedicados às reflexões acerca dos problemas
brasileiros... (ABRAHÃO 1999.p.49).
O raciocínio econômico de Gudin pautava-se sobre os princípios clássicos
que se fundamentava na idéia de que a economia capitalista tendia a um equilíbrio
para máxima eficiência na medida em que os mecanismos de mercado
funcionassem livremente. Sua teoria econômica se ocupava com os problemas
brasileiros, considerando a dinâmica de países subdesenvolvidos.
O economista Roberto Campos (1994) expõe claramente características
marcantes que resumem o discurso existente nos artigos de Gudin aqui analisados.
“Pessoalmente sou imensamente grato a Eugenio Gudin, pela sua insone luta contra
três deformações de nossa mentalidade: o ‘pseudo-nacionalismo’, o ‘pseudo-
igualitarismo’ e o pseudo-liberalismo’.” (p.243)
Roberto Campos (1994) argumenta mostrando que o nacionalismo para
Gudin está além do discursso populista, mas se visualiza na prática, que o
igualitarismo não é algo concedido diretamente pelo Estado assegurando o sucesso;
mas este somente pode facilitar a todos o acesso aos meios que possam garanti-lo.
E por fim Gudin buscava desmistificar a idéia de um liberalismo que trabalha com o
intervencionismo estatal, sendo que a concentração de poder econômico no Estado
acaba por limitar a ação do mercado.
Fica claro, portanto, nesta pesquisa que Gudin não era contra o
crescimento ou desenvolvimento, ele apenas via outro caminho para esse
crescimento, via um caminho mais longo e mais árduo, que constituía na construção
de bases para que esse desenvolvimento ocorresse.
O governo JK, entre 1956 e 1960, praticamente inverteu as diretrizes
que haviam sido impressas pelo curto período da gestão Café Filho.
Pode-se dizer que Gudin, embora tenha permanecido no Ministério
74
por um curto período de tempo, expressou a tendência mais
conservadora assumida ao longo do interregno Café Filho. Suas
críticas se sustentavam no fato de que os alicerces para o
crescimento econômico não estavam constituídos, e não na oposição
ao crescimento em si. (ABRAHÃO,1998,p.198)
O governo de JK é lembrado pela História como um período de grandes
construções, de muitos investimentos em infra-estrutura sendo uma política de
desenvolvimento baseado na construção material. Gudin frente a essa realidade
acreditava ser a educação a base para o desenvolvimento; seria necessário um
incentivo para o desenvolvimento humano. As obras materiais seriam importantes,
porém a educação provocaria o incentivo para o avanço tecnológico, um
investimento na inteligência e essa vai ser base para grande parte de suas críticas
contra o governo JK.
3.5 O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO SOB A ÉGIDE DO ESTADO
O desenvolvimento deveria ocorrer, mas a via escolhida para se chegar a
esse destino era polêmica. Gudin acreditava que a iniciativa privada seria o meio
mais adequado para promover o desenvolvimento e praticar justiça econômica para
a população. Para ele o protecionismo estatal era um meio de conceder privilégios
para certos segmentos da economia em detrimento da sociedade como um todo. Na
medida em que se obstaculiza o livre curso da inversão de capital, com a aplicação
de normas restritivas e taxações, o estado premiava setores ineficientes e
penalizava os demais segmentos da economia que tinha a obrigação de arcar com
os ônus. Essa política intervencionista fundamentava a idéia de um desenvolvimento
rápido e visível, sendo comum o investimento no material e não no humano.
75
Frente a esse discurso, Gudin se posiciona frontalmente contra o governo
de Juscelino Kubitschek e os desenvolvimentistas do período que fomentavam a
idéia da presença estatal na economia, como meio para promover o
desenvolvimento. Um dos principais desenvolvimentistas criticado por Gudin,
chamado ironicamente de “romancista”, é o economista Celso Furtado, cepalino que
influenciou o governo de Juscelino Kubitschek, principalmente com o planejamento
que se consolida no “Plano de Metas”.
Em uma série de artigos de 1962, intitulados “Economia Política e
Literária”, Gudin faz críticas diretas ao economista Celso Furtado e ao
intervencionismo que ele defende. Para os desenvolvimentistas é mediante a ação
do Estado que se promove o desenvolvimento, pois o mercado não pode trazer o
progresso: o mercado é considerado débil e incapaz de controlar e suprir as
necessidades do país, por seu próprio mecanismo.
Gudin discute o planejamento, no contexto do modelo de governo
intervencionista. Neste período o planejamento é uma medida característica que a
CEPAL propõe para uma esquematização dos problemas nacional a serem
resolvidos. Gudin não descartou a necessidade de planos de trabalho. Deve-se
planejar para se orçar os recursos necessários para cobrir as demandas por parte
do Estado, porém é questionada a posição e a função do órgão planejador. Para
Gudin, a comissão de planejamento não pode servir de pretexto para que haja a
ação do Estado no campo da iniciativa privada.
Para Gudin, o Estado era ineficiente, não tinha condições de suprir todas
as necessidades do país. Mas tinha dever de agir em áreas como educação, saúde,
o incentivo a pesquisa e disseminação de técnicos agrícolas que estavam sob sua
responsabilidade.
76
Mas o que se observa no Estado desenvolvimentista é o desejo de
incentivar e implantar o processo de industrialização no Brasil. A indústria significava
o progresso e modernidade. O Estado intervém diretamente na economia para
promover a tão esperada industrialização. “O desenvolvimento... é o projeto de
superação do subdesenvolvimento através da industrialização integral, por meio de
planejamento e decidido apoio estatal.” (BIELSCHOWSKY, 1995, p.33)
No período de governo de JK, como mostra Carone (1985), o crescimento
que se deu nos setores industriais ligados a extração mineral, do cimento, vidro, da
siderurgia foi conseqüência do desenvolvimento das diversas usinas siderúrgicas,
das indústrias automobilísticas, resultantes também do crescimento urbano. O setor
industrial na década de 1960 cresce 35% em relação à década de 1950.
É nos fins da década de 1950 e começo de 1960 que
modernização e multiplicação das estradas de rodagem, num
momento em que a indústria automobilística é implantada no Brasil.
As estradas de asfalto facilitam a conquista dos mercados regionais
pelas grandes empresas, o que as torna mais poderosas e
concentradas... (1985, p, 56)
Porém a indústria brasileira ainda convivia em certos setores com
métodos primitivos e antiquados. Havia falta de mão-de-obra especializada e muitas
vezes a produção não alcançava a eficiência que permitiria a prática de preço baixo
e produto com boa qualidade.
Apesar de todos os problemas, a industrialização se configurava dentro
do plano de metas e o maior crescimento se dava no setor da indústria de base,
como mostra Hélio SILVA (1975, p.51):
... A produção de aço passou de 1365000 toneladas em 1955 à
2200000 toneladas em 1960 (...) As metas de produção de cimento,
77
álcalis, celulose, papel, chumbo, cobre(...) foram quase todas
alcançadas. A exportação de minérios de ferro (...) duplicou em 1955
à 1960... (SILVA, 1975, p.51)
Para Gudin o desenvolvimento industrial está na elevação da
produtividade, porém ele acredita que o instrumento de desenvolvimento industrial é
a livre movimentação das forças ativas de mercado. O economista previa uma
industrialização leve para o futuro, dependente de um progresso técnico na
agricultura. Para ele, foi necessária uma série de medidas, como crédito seletivo à
agricultura, políticas de estabilização econômica e controle da intervenção
governamental nos mecanismos de mercado, visando a elevação da produtividade.
Gudin critica a falta de articulação entre os setores da indústria e
agricultura, requisito importante para o desenvolvimento industrial.
Nos Estados Unidos a redução da população agrícola de mais de
50% a menos de 10% em 70 anos se processou por um enorme
aumento da produtividade per capita do trabalhador rural, o que
liberou dezenas de milhões de operários para as indústrias e os
serviços, enquanto que no Brasil, em que o Ministério da Agricultura
é inexistente como elemento de ajuda técnica ao agricultor em que a
melhoria da produtividade agrícola per capita tem sido insignificante,
a migração da mão-de-obra do campo para as cidades importa em
queda da produção agrícola. Donde a carência de feijão e farinha e a
facilidade com que até os favelados compram televisores no regime
das prestações e da inflação desabrida. (Gudin, 1965, p.427)
Gudin acreditava que o incentivo a indústria muitas vezes prejudicava a
agricultura, como se observa com Roberto CAMPOS:
A diferença é que Gudin insistia em que o processo industrializante
deveria observar as linhas de vantagens comparativas e deveria
caber principalmente ao setor privado, sem se relegar a agricultura à
posição de vaca leiteira para financiar a industrialização. E criticava a
78
combinação de tonas cambiais sobrevalorizadas (que privilegiava a
indústria). (1994, p.240).
O principal ponto defendido por Gudin é o conceito de riqueza, ligado as
idéias liberais de que a mesma provém da produtividade tanto a industrial como
agrícola. Por outro lado, os desenvolvimentistas acreditavam que a exportação de
produtos agrícolas significava uma posição humilhante de país subdesenvolvido, e
que a modernidade e o desenvolvimento só poderiam ocorrer com a industrialização
do país.
Todas as complexidades do problema do desenvolvimento
econômico de um país como o nosso, desprovido de educação e de
técnica, desaparecem diante de uma palavra-síntese e mágica-
industrialização.(GUDIN, 1965, p.200).
Gudin não crítica a existência da indústria, mas a forma com que esta
pode ser administrada, sustentada. O processo de industrialização criticado por ele é
aquele que nasce e se mantém por meio de subsídios do Estado. Por trás dessa
crítica está novamente o descontentamento com o intervencionismo, que cria
monopólios, impõe altas taxas aduaneiras de proteção, limitando a livre
concorrência, atingindo o consumidor que paga mais por produtos de baixa
qualidade.
Quem foi que estabeleceu tarifas aduaneiras não simplesmente
protecionistas (de 20% a 30%) e sim proibitivas (de 100%), de forma
a conceder o monopólio dissoluto no mercado interno aos produtores
e negociantes nacionais ou nacionalizados, que disso se
aproveitaram em conjunção com a demanda inflacionária para elevar
seus preços? Haverá escândalo maior do que obrigar o consumidor
nacional a pagar por um automóvel utilitário um preço duas ou três
79
vezes mais caro do que o que cobram “os mesmos fabricantes” em
outros países?(GUDIN, 1965, p.206)
Para que essa interferência do Estado na economia nacional ocorra de
fato são necessários mecanismos que são criados pelo próprio governo, numa
dessas ferramentas esta inserida na idéia do planejamento, metas estipuladas que
prevêem essa intervenção. Para Gudin esse fato é sempre desastroso; quando a
indústria ou qualquer outro setor se “desenvolve” fomentado pelo Estado esse
“desenvolvimento” não se realmente, pois o governo não cria, desloca
recursos. Gudin critica o governo de Juscelino Kubitschek por deslocar recursos
para fins desnecessários como Brasília enquanto outros setores careciam deles.
Ainda do mesmo gênero foi o programa de metas” do famoso Sr.
Kubitschek, em que se relacionaram as obras necessárias ao
surgimento de energia elétrica e aos transportes terrestres. Se ele
não tivesse praticado a loucura da construção de Brasília, não
tivesse caído na inflação desbragada estivesse apoiado seu ministro
Lucas Lopes, o programa de metas poderia ter sido executado com
proveito para o país.( GUDIN, 1965, p.448)
A crítica de Gudin es na tentativa do Estado se tornar mais que um
administrador, mas um empresário através da intervenção. Não acreditando que a
iniciativa privada traria riqueza para a nação e assim haveria o desenvolvimento. Ele
expõe que com o aumento da produtividade, aperfeiçoamento de novas técnicas,
com a livre concorrência, ausência do Estado diretamente na economia, o produto
final teria um menor preço sendo de maior acesso para o consumidor, sendo
possível o acesso a produtos antes inacessíveis, isso seria o desenvolvimento
centrado no cidadão que constitui a nação. Essa idéia da economia política já se
80
observava em suas gêneses com Voltaire
12
e Turgot
13
no século XVIII, que
visualizava a riqueza da nação no indivíduo, idéia essa que se cristaliza na obra de
Adam Smith, “A Riqueza das Nações”, onde mostra que a riqueza advém do
trabalho, da produção individual que traz benefícios para a nação, enriquecendo-a.
Como mostra Voltaire:
Não sei o que é mais útil a um Estado: um senhor empoado que
sabe a que horas o rei se levanta e se deita, com ares de grandeza
fazendo papel de escravo na anticâmera de um ministro ou
negociante que enriquece seu país, ordem a sucata e ao carro
sem sair de seu gabinete e contribui para a felicidade do mundo.
VOLTAIRE (1978, p.22):
Gudin, sendo um pensador liberal acredita que o intervencionismo limita
a liberdade do indivíduo de produzir para si, o que conseqüentemente não enriquece
a nação. O Estado deve dar condições para o desenvolvimento do mercado e não
travar o avanço delas. A riqueza somente é gerada pela iniciativa privada e é em
favor dessa que Gudin se expõe.
No setor privado, o que o Estado pode e deve fazer é criar as
condições propícias ao desenvolvimento e ao progresso. Por
exemplo: paz política e social, moeda estável que permita realizar
previsões e orçamentos sólidos por vários anos, estímulos à
poupança nacional como ao afluxo de capital estrangeiro, etc.
(GUDIN 1965, p.449)
12
François-Marie Arouet (1694-1778) conhecido com Voltaire, filosofo e historiador, iluminista
francês. Sistematizou sua teoria critica ao Antigo Regime, e aponta a necessidade de uma leis que
normatizem a ação desse Estado. Ver. VOLTAIRE, F. M. Cartas inglênsas; método da metafísica;
dicionário filosófico; o filósofo ignorante. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
13
Jacques Turgot (1727-1781) economista francês tem em usa obra a ligação das idéias fisiocrátas a
Economia política clássica inglesa. Defendeu o livre comércio e a interdependência entre as
classes.Ver. SMITH, Adam, et al. Economistas Políticos. São Paulo:Musa editora, 2001.
81
Porém esse Estado não age sem consentimento da sociedade, pelo
contrário, a própria população acredita na ação salvadora do Estado que sustenta
essa tese através de discursos populistas que dariam plenos poderes ao Estado
para que o mesmo interviesse na economia. O populismo é um nome historicamente
dado ao conjunto de práticas políticas que visam manipular massas através da
introdução destas no processo político, sendo tuteladas sob controle do Estado.
Desta forma, algumas reivindicações das massas eram atendidas, ao passo que
eram também amplamente manipuladas no jogo político. Os discursos
desenvolvimentistas, de cunho populista, pregavam a ampla participação do Estado
na economia, um exemplo seria a as indústrias estatais. Exemplos de indústrias
criadas pelo Estado foram a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) implantada na
cidade de Volta Redonda, além de outras como a Petrobrás, Eletrobrás. Indústrias
de base que surgiram no Brasil em um período desde Vargas, onde o Estado
promove grandes empreendimentos que se consolida com Juscelino Kubitschek. O
populismo fundamentava-se em idéias nacionalistas, o protecionismo a indústria
nacional, e outras medidas visavam a contenção do envio de capitais de lucro para o
exterior por empresas estrangeiras fixadas no país.
Frente ao discurso populista de JK e seus sucessores, até 1964,
difundiram a idéia de que aqueles anos seriam os melhores anos do avanço do
Brasil. Foi em um discurso eleitoral que, pressionado pela massa, JK afirmava estar
nos seus planos a constituição da nova capital. Assim a própria massa popular,
crente de que o Estado era habilitado para promover o desenvolvimento, delega a
ele a função de tirar do Brasil o título de subdesenvolvido.
É necessário ter em conta que, mesmo nessa fase final do período
democrático, o quadro político geral continuava sendo populismo [...]
Contudo, nenhum dos grupos dominantes se mostrava capaz de
oferecer os suportes indispensáveis a uma política de reformas,
82
ainda quando se possa admitir que alguns deles pudessem retirar
proveito dela. Todos se voltavam para o Estado e, mais uma vez, as
massas populares apareciam como a grande força social capaz de
proporcionar bases a essa política e ao próprio Estado. (WEFFORT,
1980, p.77)
Uma forte característica de governos populistas é promover obras que
possam ser vistas, como obras públicas. Assim, visualiza-se a busca pelo
desenvolvimento material. Neste ponto as críticas de Gudin se centralizam contra os
investimentos estatais direcionadas para obras desnecessárias e de grandes custos.
A construção de uma nova capital era um projeto antigo, inscrito na Constituição
republicana de 1891, mas que nenhum presidente se dispunha a realizar, para
Gudin não era o momento para essa construção, visto existir necessidades mais
urgentes a serem resolvidas.
Em Janeiro de 1956 estava o Brasil assoberbado pelos mais sérios
problemas: inflação, desequilíbrio de balanço de pagamentos,
desordem cambial, transportes marítimos em frangalhos, ferrovias
quase idem, correios e telégrafos mais que idem, etc, etc. o que fez o
governo? Largou tudo isso de mão e foi construir uma floresta de
palácios!. (GUDIN, 1965,p.327).
Juscelino Kubitschek promoveu seu grande feito material que deixou
marcado na história seu nome, a cidade de Brasília foi construída no centro do país,
em um lugar praticamente desértico. Em apenas um ano se fez o Palácio da
Alvorada, inaugurado em Junho de 1958, do mesmo ano o o Palácio do Planalto,
o Congresso Nacional, os edifícios, os edifícios dos ministérios e a Praça dos Três
Poderes.
83
Brasília assim, se tornou “a menina dos olhos de Juscelino”, uma cidade
projetada para ser a grande nova capital do Brasil. Através dela todos poderiam ver
o “desenvolvimento” que se materializava com Brasília. “Meta faraônica” como disse
Roberto Campos (1994 p. 313). Brasília foi uma meta ousada para o governo de
Juscelino. Quando alguém lhe perguntar de onde virão os recursos, JK dizia: “Eles
viram de minha cabeça”. (Veja, 25/08/76, p.31).
Na realidade os recursos teriam que surgir, pois os custos da obra eram
grandes. Os recursos surgiram então através de emissões de papel-moeda que
geravam, mais tarde, um dos maiores problemas econômicos do período, como
mostra Roberto Campos (1994). Nesse momento as críticas de Gudin se
materializam na realidade, não é somente a da defesa das idéias liberais que estão
em jogo, na realidade é o futuro das contas do Estado que preocupam o economista,
torna-se uma questão prática que mudaria a vida diária da população. Os altos
índices inflacionários, que marcaram décadas da História brasileira, nasceram de
políticas desenvolvimentistas.
As conseqüências inflacionárias seriam óbvias. Estima-se que a
construção de Brasília tenha custado entre 2,5 e 3 % do PIB da época, mas nunca
se chegou a uma avaliação completa dos custos, porque além de verbas
orçamentárias, foram usadas também contribuições da Caixa Econômica, de
autarquias, dos Institutos de Previdência, isso desviou somas destinadas
anteriormente à construção de habitações populares, e um empréstimo do Export
Import Bank. Frente a esses gastos do governo, levantaram-se muitas críticas as
ações do Estado, além de Gudin crítico contundente da criação de Brasília, outros
também se expressaram sobre o assunto como o escritor Gustavo Corção:
O escritor Gustavo Corção, um dos mais irritados críticos de Brasília,
lembrou-se de São Petesburgo, a atual Leningrado, cidade
84
construída sobre um pântano aos custos de 30000 vidas a fim de
sofisticar aos caprichosos do czar Pedro, o Grande. (VEJA 1976, p.
31-32).
Para Gudin, Brasília foi uma obra desnecessária, recursos que deveriam
ser empregados nas áreas de maior urgência, foram desviados para obras sem
funcionalidade. Observando que esses recursos não existiam até serem
expropriados da população de maneira violenta através da inflação.
O que poderíamos ter realizado em termos de saúde, de
alfabetização, de ensino de primário e médio, de estradas de
rolagem, etc. com as centenas de bilhões de cruzeiros
desperdiçados na construção, não perfeitamente desnecessária,
mas altamente danosa para o interesse nacional, de uma nova
cidade para a sede do governo. (GUDIN, 1965, p.98)
Eugênio Gudin acreditava que a meta ntese, a criação de Brasília, teria
atrapalhado o desenvolvimento e conclusão das principais metas do governo de
Juscelino Kubitschek. A criação de Brasília gerou necessidade de vias que ligassem
a nova capital a outros locais. Só para ligar Brasília ao resto do país, foi preciso
construir 69000 quilômetros de estradas. Juscelino Kubitschek mandou abrir a
Belém- Brasília corte em linha reta na selva, ligando dois vazios. O gasto previsto
para a construção e pavimentação de estradas era de 31,8 milhões de cruzeiros nos
cinco anos de governo, porém os custos atingiram 66 bilhões de cruzeiros. Nos
cinco anos de governo, Juscelino Kubitschek estabeleceu a construção de 12000
quilômetros de rodovias. Essas construções também estavam ligadas a necessidade
de pistas para a nascente indústria automobilística. (VEJA, 1976, p.31-32).
Para Eugênio Gudin, o nacional desenvolvimentismo apoiava sua idéia de
desenvolvimento nas obras materiais, pois eram visíveis, principalmente para o
eleitorado. Para ele a existência de Brasília não fez do Brasil mais desenvolvido.
85
Constata-se que para Gudin, o desenvolvimento real não estava contido
nas obras, estradas, no material que o país possuísse; o progresso se equaciona
com a somatória de dois fatores, o fator natural e o mais importante, o humano. Para
Gudin, o Brasil possuía grandes riquezas naturais, mas elas não eram
determinantes e por outro lado eram limitadas para servirem de fundamento para o
desenvolvimento.
Sendo assim, Gudin mostra exemplos de países que não possuíam
grandes riquezas naturais, no entanto pelo fator humano conquistaram o
desenvolvimento da nação, como era o caso da Alemanha. O fator preponderante
para o seu progresso, pós-guerra, além das ajudas dos Estados Unidos, foi o próprio
alemão. Os recursos naturais, quando existentes, somados a capacidade humana
resultam no desenvolvimento nacional. Quando o desenvolvimento se fundamenta
no fator humano, o investimento não está focalizado em obras de cimento, mas esta
na civilização e educação do homem, como enfatiza Gudin, ao mostrar que a
educação é um dos meios para se alcançar o desenvolvimento nacional.
Um país que tenha, durante vários anos, investido, eficientemente
boa parte de seus recursos em educação estará, certamente
preparando para a nova geração um futuro melhor, tanto econômica
como social e politicamente. ( GUDIN, 1965, p.87).
Até quando teremos de esperar pelo advento de um estadista que
compreenda que a educação e a saúde devem ter a primazia e a
maior cota de recursos no plano de desenvolvimento econômico do
País? (GUDIN, 1959, p.140)
A chave para o progresso para Gudin estava na educação, no fim da
corrupção estatal. Ele entendia que a resposta para o desenvolvimento é de se
tentar obter o maior proveito das disponibilidades para investir e de impor à
86
população o menor sacrifício compatível com o desenvolvimento. “O
subdesenvolvimento não é, pois, das coisas. É dos homens.” (GUDIN, 1965, p.85).
A falta de recursos do Estado não serviu de entrave para que o mesmo
investisse em obras como Brasília. A questão era que Gudin acreditava que o
Estado não tinha poder de criar recursos para suas ações, mas sim de deslocá-los.
Assim o prejuízo final de qualquer maneira afetaria a sociedade, duas situações
mostram isso: Primeiramente com o deslocamento de recursos para grandes obras
muitas vezes desnecessárias, outros setores mais urgentes como saúde e educação
não recebiam o investimento devido, prejudicando a população. Outro fato é o dano
que uma política inflacionária produz ao consumidor que perde seu poder de compra
frente à desvalorização do seu dinheiro. Todo o entusiasmo do desenvolvimento não
se sustenta frente às crises inflacionárias que resultaram em grandes conseqüências
pela busca do desenvolvimento material. E assim o resultado da soma de um Estado
altamente intervencionista com ações imediatistas, investimentos materiais caros e
inapropriados para a realidade econômica do país, causam o resultado de um dos
maiores problemas elaborados com as políticas desenvolvimentistas, a inflação.
3.6 CASTELO BRANCO E A ORTODOXIA LIBERAL
O governo militar se caracterizou pós-golpe, de forma a salientar o
intervencionismo estatal. A política econômica se comportou ao modo de privilegiar
os grandes investimentos, grande parte deles subsidiados pelo Fundo Monetário
Internacional, que se expressavam nas áreas de telecomunicações, construção de
estradas, ampliação do sistema de geração e distribuição de energia. Observa-se
uma maior abertura para o mercado externo. No âmbito da agricultura, aumenta-se o
investimento em forma de crédito, sendo que o Banco do Brasil torna-se um dos
87
maiores bancos rurais do mundo, que privilegiava a produção alimentícia destinada
a exportação. Nesse momento o Brasil torna-se o maior produtor mundial de soja.
A partir de 1968, a indústria automobilística e de eletrodomésticos se
destacam contribuíndo para o aumento do PIB, com o aumento da produção de
bens duráveis. Nesse período se nota a diminuição dos índices de desemprego
urbano. No governo de Castelo Branco (1964-1967), a política econômica se
focalizou no combate a inflação e na busca pela restauração da capacidade do
investimento público e privado.
Para isso o governo instituiu um plano de estabilização econômica o
Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG). O PAEG tinha como objetivos
principais: o combate a inflação, aumentar os investimentos e conseqüentemente o
emprego e corrigir a tendência ao desequilíbrio externo, tendo em vista o
desenvolvimento econômico nacional. Como resultados do PAEG observaram-se, o
saneamento das financas do estado, a recuperação da credibilidade nacional visto a
negociações internacionais, o aumento da capacidade de investimento do Estado, o
aumento da participação do Brasil no mercado internacional, com o estímulo a
exportação e o controle razoável dos altos índices de inflação. Esses foram
elementos que fomentaram um pequeno crescimento econômico nesse momento.
Porém cabe salientar que para os militares depois de três anos de plano, esses
ainda estavam insatisfeitos com os resultados, pois os índices de inflação
continuavam altos e ações para seu controle com o aumento da taxa de juros em
1966 representavam a rigidez da política monetária. Esse plano teve apoio do Fundo
Monetário Internacional, do Banco Mundial e do governo norte-americano e foi a
expressão do ideário da ortodoxia econômica militar.
88
Ainda em 1967, o discurso de Gudin mostra certo nível de satisfação ao
ver que a ortodoxia que estava no ministério da fazenda, caminhava na lógica de
diminuição dos gastos públicos a fim de conter os altos índices orçamentários.
Vinha eu clamando em artigos sucessivos pela necessidade de
despletorizar o setor público. E é com prazer agora que vejo, no
recente e belo artigo de Roberto Campos em O Globo, a
recomendação de ‘baixar o nível do dispêndio público..., cortar
investimentos,... Tudo mais é ilusão (Gudin, 1970, 338)
Gudin elogia as idéias de Roberto Campos que representava grande
parte do ideário de Gudin, grande parte da historiografia e o próprio Roberto
Campos (1994) assinalavam a influência que as idéias de Gudin tiveram em seu
modo de ver a economia e em suas práticas enquanto estava no ministério. Roberto
Campos foi o então ministro do planejamento do governo de Castelo Branco,
juntamente com Octávio Bulhões no ministério da fazenda, implementaram as idéias
liberais em praticas do governo, levando a se observar nessa fase uma política
econômica com base em idéias monetaristas e em um liberalismo ortodoxo.
Roberto Campos criou o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNH), o
salário-educação, o cruzeiro-novo, a indexação de preços na economia brasileira
através das ORTNs e também liberalizou a lei de remessas de lucros. Criou a lei das
sociedades anônimas, a lei do inquilinato, o FGTS, o Estatuto da terra e o Banco
central do Brasil. Foi o autor dos artigos econômicos da Constituição de 1967 para
ele a constituição de 67 seria então a que se apresentava menos inflacionista do
mundo. Após Joaquim Murtinho, Eugênio Gudin, Roberto Campos e Octávio
Bulhões foram os únicos liberais a assumirem cargos ministeriais ligados a
economia nacional até então.
89
Roberto Campos (1994), que fora fortemente influenciado por Hayek
(1983) e Schumpter (1982), fez parte da ortodoxia liberal e esteve a frente de muitas
das decisões na política econômica, mas se fixou no governo apenas no governo de
Castelo Branco, sendo essa linha substituída em 1967 por Delfim Neto e suas
práticas desenvolvimentistas.
Em artigo de 1967 se observa certo conformismo de Gudin, ao analisar o
governo de Castelo Branco de forma a concluir ter sido um bom governo, tendo em
vista a crise que o pais vivia em 1964, demonstrando sua opinião quanto as práticas
que a ortodoxia liberal estava implementando no governo.
As dívidas com o exterior foram reescalonadas e os novos
compromissos cumpridos à risca. No plano doméstico, a inflação
catastrófica de mais de 140% ao ano foi reduzida a um ritmo de 20
ou 30%. Não pode fazer tudo, mas fez muito. Restabeleceu assim a
ordem econômica. (GUDIN, 1970, p.81)
Em 1968 Gudin faz uma crítica ao Governo militar, pela sua ineficiência
em resolver o problema da inflação, que mesmo com a diminuição das taxas ainda
se visualizava a mesma como um problema crônico da economia brasileira. O
economista reconhecera a melhoria principalmente com a diminuição dos índices de
inflação, mas ainda acreditava ter sido possível eliminá-la.
Se eu fosse governo( o que para a felicidade geral da nação não é o
caso) teria adotado a outra opção. É de certa forma uma vergonha
para os governos da Revolução, em seu conjunto, não terem ao fim
de 4 anos eliminado a inflação. Mas não é por defesa dos brios da
Revolução que eu optaria pelo combate à Inflação e sim porque sua
excessiva persistência exerce um efeito de perigosa erosão não
sobre o Sistema Econômico, como sobre a Conjuntura Social e
Política do País.(GUDIN, 1970, p.342)
90
A contenção da inflação ocorreu com medidas que buscaram reduzir o
desequilibro orçamentário, reduzir a expansão monetária e creditaria e reprimiu
reajustes salariais. Entretanto cabe salientar que para os militares, depois de três
anos de plano, esses ainda estavam insatisfeitos com os resultados, pois os índices
de inflação continuavam altos e ações para seu controle como o aumento da taxa de
juros em 1966 representavam a rigidez da política monetária.
3.7 COSTA E SILVA E O DESENVOLVIMENTISMO DE DELFIM NETTO
Em março de 1967 as condições existentes, para permitir a obtenção de
resultados mais favoráveis nos campos da inflação e do desenvolvimento, não eram
mais favoráveis que no passado.
A economia encontrava-se deprimida e os níveis de demanda
bastante reduzidos. Primeiramente porque os investimentos privados
haviam declinado em razão da própria estagnação da economia. Os
salários reais, por outro lado, declinaram em razão da aplicação
inadequada do resíduo inflacionário às fórmulas de correção salarial
e o nível de emprego, apresentava-se mais reduzido que nos anos
anteriores, diminuindo ainda mais o volume da folha real de salários.
Finalmente, a demanda no interior apresentava-se bastante
deprimida em função das quedas no volume de produção ocorridos
ao longo do ano (Delfim Netto, 1968,p.7).
No governo de Artur da Costa e Silva, a partir de 1967 o foco da
política econômica passa do controle da inflação para o crescimento rápido da
economia. Ele rompe com a ortodoxia, que se orientava por uma política econômica
que programava medidas a longo prazo. Nesse momento se visualiza medidas que
91
possibilitam maior liberdade na política monetária, tendo em vista expansão de
moeda e crédito, justificada com o argumento de que a velocidade de renda da
moeda tende a declinar com a desaceleração da inflação. O combate a inflação
continua, mas se toma outras providências para esse controle. Rompendo com a
política ortodoxa do PAEG, a emissão nesse momento foi utilizada principalmente
para cobrir o déficit orçamentário.
O economista Delfim Neto, escolhido como ministro da fazenda é visto por
Gudin com grande expectativa, principalmente para que houvesse a resolução do
problema da inflação. Gudin expressa esperança na administração de Delfim Netto
visto que o mesmo acreditava ser a causa da inflação a emissão, sendo essa
intimamente relacionada proporcionalmente ao aumento dos preços. Gudin faz
alguns conselhos a Delfim; em um artigo datado de 10/02/69, ele expõe a
necessidade de se dar uma maior liberdade a iniciativa privada, tendo como
argumento o conceito de lucro.Para Gudin lucro não é a transferência de riqueza de
um para outro, mas é o resultado da iniciativa e investimento do empreendedor.
Citando Schumpter, diz que o empreendedor é o dinamizador do sistema
econômico.
O lucro é, ou se espera que seja, o resíduo de uma operação, que
por aumentar a produção favorece tanto a consumidores, como a
assalariados e a capitalistas, estes que pouparam para financiar o
investimento.Grave erro é o conceito do Lucro-confisco, que
importaria no enriquecimento de uns à custa do empobrecimento de
outros.Nada do que se contem neste artigo deve ser interpretado
como apoio, ou mesmo tolerância. (Gudin, 1970, p.313)
Havia um problema que para Gudin seria o maior problema da economia
do Brasil desde a década de 1950. Defensor árduo da política monetarista, o
92
economista não visualiza de início a mudança de rumo das práticas do governo, que
não priorizaria o combate a inflação; para Gudin, Costa e Silva seria um presidente
que atentaria de forma mais consistente ao problema dos altos índices de inflação.
No discurso de posse do presidente Costa e Silva, Gudin analisa a idéia
de inflação que o então presidente possui e mostra que o mesmo não concebe
desenvolvimento com inflação, pelo menos isso se visualizava no discurso. Gudin
ainda expõe que o combate a inflação poderia continuar no processo paralelo ao
desenvolvimento econômico da nação.
“Isso não quer dizer que o combate à inflação exija ou importe no
abandono do desenvolvimento econômico. Essa dicotomia, assim
expressa, não existe. Começa porque um Governo que esta
combatendo e debelando a inflação inspira confiança e
conseqüentemente estimula os investimentos de capitais privados,
estrangeiros e nacionais, sinônimo de desenvolvimento econômico.”
(Gudin, 1970, p. 336).
Gudin frisa a única maneira de conter a inflação sendo essa a ação de
sanear as contas do Estado, continuando com sua posição monetarista, o
economista repete sua fala tratando a inflação da mesma maneira que a via anos
anteriores, como já se observou no primeiro capitulo do presente trabalho.
“A política de combate à inflação exige, sim, superávit orçamentário
(com referência ao ‘grande orçamento’) como exige déficit e não
saldo do balanço de pagamentos. Por serem dois fatores
indispensáveis ao alívio da demanda monetária sobre mercadorias e
serviços.” (Gudin,1970 , p.336)
Delfim Neto, o então ministro da fazenda, o acreditava ser o
controle monetário, o agente que iria conter a inflação, sendo assim observa-se uma
93
medida que conotam uma influencia das tendências do pensamento estruturalista,
principalmente com o PED (Programa Estratégico de Desenvolvimento) em 1968.
Através do AI-5, de 1968, determinou-se o fechamento do congresso,
dando ao Estado poder de julgar e prender, restringindo liberdades individuais,
tornara-se mais fácil controlar as regras da economia nacional como declara o
Delfim Neto, em entrevista à Isto é dinheiro (2003): “Usei as condições dadas pelo
AI-5 para baixar um decreto-lei com praticamente toda a reforma tributária que eu
queria fazer e mais uma porção de medidas importantes.” (2003,p.1)
Quanto a isso Gudin se expõe de forma clara, criticando o excesso de
poder, que orientava e mudava as regras do mercado que para ele eram regras do
mercado e não do Estado. “O Ato nº5 pode muito, é verdade. Mas não pode tudo.
Pode revogar muitas leis. Mas não a ‘lei’ da Oferta e da Procura que, até nova
ordem, é a que regula os preços...” (GUDIN, 1970,p.305). O economista não acusa
diretamente o AI 5, mas quando esse influencia nos preços, permite a inflação, e
age de forma a dar liberdade de intervenção estatal na economia, o economista
levanta a possibilidade desse ser um abuso de poder.Ainda sobre o controle de
preços Gudin mostra que:
A idéia, ora em voga, de ‘tabelar preços em função de custos’ é
uma das maiores barbaridades que se podem perpetrar em teoria
econômica. Começa porque custo não é um ponto; é uma curva.
Essa curva começa pelos custos da empresa de maior produtividade
(isto é, de custos mais baixos); mas como sua produção não
vazão à demanda, entram no mercado outras empresas de custos
mais altos do que a primeira (a curva dos custos vai subindo) e por
fim outras de custos ainda mais elevadas, até que a curva
ascendente esbarre na curva da demanda... (GUDIN, 1970,p.309).
94
Gudin volta a criticar o poder de legislar e aponta o risco dos decretos
muitas vezes inesperados.
A liberdade de legislar por decreto não deve degenerar em Fúria
Legiferante. de ser usada com prudência e parcimônia. A lei do
Inquilinato, que acaba de ser promulgada, é a sétima de sua espécie
desde novembro de 1964! As ‘regras do jogo’ mudam por decisão
unilateral, do dia para a noite. (GUDIN, 1970,p.311).
Ele critica a existência de decretos leis que acaba por trazer uma
instabilidade enorme nas normas de contratos etc. Esse fato prejudica a iniciativa
privada.
Ninguém pretende que a legislação seja imutável. Mas isso não
colide com o fato de que a estabilidade da estrutura política, social e
econômica de um país haja de ser preservada. Sem o que, o
estrangeiro não aventura seus capitais e o nacional não se conforma
em assumir riscos ilimitados. O que seria o fim da iniciativa privada.
Decreto Lei, instrumento específico das ditaduras, é odioso por
não dar a menor oportunidade a quem quer que seja de levantar as
mais elementares_ e não raro Justas_ objeções. A insegurança que
daí advém é muito mais danosa para a economia do país do que o
mal que possa advir de um pequeno retardamento da providência.
(GUDIN, 1970, p.122).
A emissão de decretos-lei seria uma forma de intervencionismo, apontada
por Gudin, um dos poucos artigos que o economista denuncia esse fato, sendo que
esses decretos-lei influenciavam não somente em decisões quanto às finanças do
Estado, mas a economia nacional sendo um entrave para o desenvolvimento o
intervencionismo que nesse momento desarticulava a intenção de investimento da
iniciativa privada. Nesse momento Gudin fala de “ditadura disfarçada” ao observar o
grande grau de influência do governo nos rumos da economia.
95
Os anos de Delfim Neto no ministério da fazenda trouxeram uma maior
força a influência do pensamento desenvolvimentista, principalmente na questão de
se formatar o desenvolvimento de maneira rápida e intervencionista. Essa idéia é a
contradição das idéias de Gudin, e de seu liberalismo que acredita no processo, a
médio ou longo prazo, porém esse tipo de política monetarista não gera resultados
rápidos; sendo desconsiderado principalmente no governo de Costa e Silva, em um
artigo de 1969, Gudin expressa implicitamente a idéia da impaciência que
determinava caminhos mais curtos mas nem sempre mais seguros.
Outra manifestação da ‘Civilização da Impaciência’ é a de um
sentimento, mais ou menos indefinido, de que ‘tudo deve mudar’.
Essa forma de pensamento (se pensamento é) apresenta-se sob
várias gamas. Uma delas é a de simples ‘Negação’.
Acredito que o tempo, mas ele, venha corrigir os excessos.
(GUDIN, 1970, p.56-57)
Com isso em 1968 o Brasil viveu um aumento em suas taxas de
crescimento econômico principalmente no setor industrial, porém a eminência de
uma nova crise ainda era real, pois a inflação ainda era um problema real.
A política econômica nesse momento, visivelmente se comporta de
forma desenvolvimentista apoiada no capital internacional, as ações de expansão de
crédito e moeda, o incentivo a exportação e a indústria, foram fatores importantes
para a diminuição do desemprego, frente ao crescimento econômico mostrado por
índices esse período vai ser reafirmado por parte da historiografia por “milagre
econômico”. Entretanto cabe observar-se que esse crescimento econômico não se
visualizou em toda a sociedade mas em algumas camadas sociais Outro fator a se
96
frisar foi o endividamento externo que seria cobrado principalmente anos depois com
a crise mundial do petróleo, no início da década de 1970, que se tornara um grande
problema para a economia nacional.
Haja vista a tendência estruturalista de Delfim Neto, que via o crescimento
econômico como algo desvinculado da existência ou o da inflação, nesse
momento apesar de no discurso ser professado a necessidade de se combater a
inflação será relegada a segundo plano, principalmente para que os níveis de
desemprego não subissem. Gudin através de sua tese sobre o “pleno emprego”,
teoria essa outrora defendida, mostra que o desemprego é um fato do sistema
capitalista e ele sempre vai existir, quando o sistema não estiver inflacionado.
... não é possível chegar-se a um total aproveitamento dos fatores de
produção, sem inflação. Uma taxa mínima de desemprego e de
capacidade ociosa é indispensável no combate à inflação. A começar
porque em todos os países uma taxa de desemprego normal,
resultante não só dos empregados que se estão transferindo de uma
para outra ocupação, como porque a qualidade ou espécie do
trabalho oferecido não coincide com a do trabalho procurado. Pode
haver uma grande procura de mecânicos, eletricistas ou
contabilistas, que permanece insatisfeita por falta de oferta, como
pode haver excesso de disponibilidade de mão-de-obra
despreparada, para a qual não há procura. (GUDIN,1970, p. 343).
A inflação se apresentava, para Gudin, um grave problema, e sua
opinião não mudaria com o tempo, o economista ainda acreditava que o haveria
crescimento e desenvolvimento com inflação, expondo que as conseqüências da
inflação, eram percebidas ao longo dos anos e não imediatamente por isso se
aceitava a condição de inflação com altos índices de crescimento.
A inflação do ano 1 vai repercutir no desenvolvimento econômico dos
anos 3,4,5 ou mais. As recessões que tivemos de enfrentar em
97
princípios de 1965, e que contribuíram para a queda da taxa de
desenvolvimento nesses dois anos, são debitáveis aos Kubitscheks e
aos Goularts, que fizeram a inflação de 1957 a 1964. Não
portanto como procurar correlações ‘de ano a ano’, ou de um ano
para outro. (GUDIN, 1970, p.340).
O problema da inflação ainda continua sendo um dos maiores problemas
da economia brasileira para o autor e era abordado em vários artigos no período,
pois a causa da mesma advém da emissão de papel moeda ou expansão de crédito,
essas ações explicitam a intervenção do Estado na economia, demonstrando o
problema central para a falta de desenvolvimento nacional, na visão liberal. Nesse
aspecto o economista não abre mão de seus princípios monetaristas que o
acompanhou durante toda a sua trajetória intelectual; suas idéias influenciaram, de
certa forma, as ações que Roberto Campos e Bulhões tiveram em seus ministérios,
no início do regime, a medida que esses buscavam o controle orçamentário estatal.
O intervencionismo, portanto, voltava a ser criticado nos artigos de Gudin,
sendo que o mesmo gerava os frutos que representavam os problemas da economia
do Brasil, como foi o caso da inflação.
Por ser um Estado autoritário e centralizador, os anos que se seguiram o
governo militar, foram marcados de intenso intervencionismo. Apesar de Gudin
defender a existência do regime, explicando até a não existência da democracia, o
economista continuou crítico, e em vários artigos demonstrou seu descontentamento
com o regime principalmente por seu caráter de grande intervenção na economia,
isso se expressou no grande número de empresas estatais criadas nesse momento
como mostra Scantimburgo (1996).
Os cinco presidentes militares deixaram na atividade econômica a
herança de 667 órgãos dentre empresas, fundações, sociedades
98
civis e limitadas a verdadeiros tonéis de Danaides de déficits. O
Brasil perdia em número de empresas estatais para as nações
comunistas. Todo o petróleo, toda a geração de eletricidade, todos
os transportes ferroviários, todo o transporte metroviário nas capitais
de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, todas as comunicações,
toda a distribuição de água, a indústria aeronáutica, o transporte
marítimo, os portos, a maior percentagem da siderurgia, o subsolo,
as quedas d´água, o controle do tráfico aéreo, as tarifas dos serviços
públicos, a educação dirigida. O Estado estendeu seus rizomas até
mesmo dentro dos lares, pois foi burocratizada em grau elevadíssimo
a vida dos brasileiros.(SCANTIMBURGO, 1996, p.349).
A estatização se prolongou, portanto, por todo o período em que os
militares estiveram no poder, Gudin critica essa prática desde 1968, mas
principalmente ao longo da década de 1970 sua critica a estatização vai se atenuar.
A idéia de nacionalismo se alia e justifica a estatização e a intervenção.
Em um trecho de um artigo de 1968, onde Gudin escreve uma série de artigos sobre
o funcionamento da Petrobrás, mostrando o quão mal administrada a mesma estava
sendo, compara a ação do governo brasileiro com outros governos como o da
Argentina, com Juan Carlos Onganía, que criava facilidades para a entrada de
investimentos estrangeiros no país, e através de números aponta a eficiência dessa
pratica principalmente no setor petrolífero, onde a produção aumentou em mais de
100% de 1959 a 1965, quando que no Brasil nesse período a produção aumentou
em pouco mais de 20% , o caso do Japão também é observado por sua
preocupação em importar “know how”, para o aprimoramento da indústria petrolífera.
Sendo assim Gudin conclui:
Veja-se a diferença entre a mentalidade de um país progressista e
descomplexado e o nosso nacionalismo tacanho, em que tudo
parece girar em torno de espectros fantasmagóricos de ameaça à
Segurança Nacional!!
O pior é que as caraminholas dos nossos ‘nacionalistas’ causam um
dano imenso ao país. (Gudin, 1970, p.429)
99
Apesar desses apontamentos em forma de crítica, o economista ainda
defende a forma institucional do regime, suas críticas são quanto a forma não
quanto ao Estado, como conclui-se com Borges.
Gudin não faz uma análise profunda, de conteúdo, com relação à
política econômica da ditadura. Ele simplesmente comenta os pontos
de concordância e discordância em relação à execução técnica desta
política, principalmente a monetária. Neste sentido, ele repete o
comportamento analítico econômico; mais uma vez é a razão técnica
o parâmetro para o entendimento do que esta acontecendo, e não há
motivo__ nesta visão metodológica__ para içar o econômico ao todo
social. Portanto, a análise restringe-se ao comentário técnico e à
recusa em reconhecer outro caminho que não seja este...
(BORGES,1996, p.234).
Observa-se nos artigos analisados nesse período que Gudin não rompe
com seus pressupostos, aceita a existência de um Estado autoritário e ditador em
troca da garantia de liberdade econômica, e critica, pois, o mesmo Estado quando
age de forma intervencionista, planejadora, de forma a não praticar a teoria liberal
que é fornecer maior liberdade para o desenvolvimento da iniciativa privada. O
economista acredita ser imperfeito o sistema empresarial, mas constata ser o melhor
meio de geração de progresso e riqueza, citando Adam Smith(1983) e Milton
Friedman (1989). É importante observar o discurso de Gudin sempre buscando
ressaltar os valores da livre iniciativa e contraponto a uma economia controlada pelo
Estado.
100
3.8 INTERVENCIONISMO E INFLAÇÃO NO BRASIL
Grande parte dos artigos de Gudin se preocupou em tratar da questão da
inflação. De forma veemente, ele demonstrava a tese monetarista que apontava a
inflação como o grande mal” que impediria qualquer espécie de desenvolvimento
econômico a longo prazo. Frente a um projeto político de ordem estruturalista, onde
o que fomentaria a máquina administrativa seriam a emissão de papel moeda em
larga escala e o aumento do crédito, que desencadeava um processo inflacionário
crônico e desestabilizador da economia nacional, ele buscava demonstrar, através
da análise da teoria econômica monetarista, o quanto a tese estruturalista acerca da
inflação era inconsistente na prática e como essas ações governamentais baseadas
nesse ideário trariam sérias conseqüências para o sistema econômico brasileiro.
O Brasil sofreu um grave processo inflacionário que fez com que a
economia entrasse em crise que se consolida no ano de 1962 se agravando nas
vésperas do golpe de 1964. Altos índices inflacionários conviveram com altos
índices de crescimento da produção nacional, porém a inflação se tornou crônica
frente à desestabilização desse crescimento ao longo da década de 1960, o
crescimento se mostrava concentrado em determinados setores da economia, não
havendo distribuição de riqueza, os setores privilegiados eram escolhidos pelas
ações de proteção e subsídio do Estado intervencionista.
A inflação era um fenômeno real e tanto desenvolvimentistas quanto
liberais a observavam como fator de prejuízo para a sociedade. Visualiza-se assim
um debate ideológico, onde as duas teses se chocam, acerca da questão central:
causas e conseqüências da inflação. Colocando de um lado os desenvolvimentistas,
estruturalistas e de outros liberais, monetaristas.
101
O jornal se torna um dos palcos deste debate, e ao se analisar as críticas
ao Estado desenvolvimentista encontradas sucessivamente nos artigos de Gudin no
período que se acentuou as políticas desenvolvimentistas, 1958-1964, a forte crítica
e consideração acerca do posicionamento dos desenvolvimentistas mostram indícios
do que foi esse confronto de idéias.
As idéias estruturalistas se cristalizam em instituições de pesquisa e
estudos como a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina), no Brasil
ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros). Em diversos momentos essas
instituições tiveram intimamente ligadas a setores políticos do Estado Brasileiro. As
idéias que se divulgavam através dessas instituições defendiam a tese de que, a
moeda se expande passivamente, tendo sua origem de ordem estrutural, portanto,
alterando-se, através da ação do Estado, a realidade estrutural a inflação poderia
ser combatida por meio de um esforço para o crescimento econômico planejado.
Segundo Bielschowsky (1995) a economia agrária atrasada gerava, para
os estruturalistas, problemas como: a não expansão de exportações; um
crescimento de demanda lento; problemas de insuficiência dos serviços públicos,
por causa da inadequação do sistema tributário. Todos esses problemas resultariam
altos índices inflacionários, pois, com uma economia agrária cria-se uma situação de
estagnação em que forças do crescimento são obstruídas. Sendo assim somente
com o aumento da produtividade, através de uma economia industrial fomentada
pelo Estado, seriam geradas transformações na estrutura detendo as causas da
inflação. A solução para que o país vencesse o subdesenvolvimento estaria em um
planejamento de políticas de crescimento envolvendo transformações estruturais.
Observa-se, ainda, com Bielschowsky (1995) que o alvo desejado para
um país desenvolvido seria um sistema econômico independente de importações, o
102
que somente se alcança através de um grande esforço industrializante. A ação do
Estado para fomentar os estímulos industriais do Brasil foi uma realidade constante
que gerou um processo inflacionário inevitável. A necessidade de investimentos
públicos em áreas de infra-estrutura era essencial para o cumprimento dessa meta.
Cabe observar que a política desenvolvimentista é altamente
planificadora, onde o agente é o Estado, com analisa Sonia Mendonça:
Por seu intermédio integravam-se pela primeira vez no país, sob controle
do governo, as atividades do capital público e privado, mediante o estabelecimento
das prioridades de investimento e das estratégias adotadas e para dirigir os
recursos privados para estas últimas. Segundo alguns autores ocorria, neste
momento, uma ‘estatização formal’da economia que tinha por fundamento um
Estado importante produtor em setores estratégicos e controlador indireto de faixas
expressivas de decisão privada. A balança do poder alternava-se em favor do setor
público. (1994, p.91).
Tendo como controlador da economia nacional o Estado, a decisão de
compartilhar de uma política inflacionária foi do próprio governo que não visualizava
outra saída. Os recursos só poderiam surgir de empréstimo e emissão.
Para o Brasil, porém, país subdesenvolvido passando por um
rapidíssimo processo de industrialização, o desenvolvimento
inflacionário era praticamente a única alternativa (...) Isso porque a
inflação consistiu-se em uma válvula de escape para o
desenvolvimento do país, na medida que possibilitou o financiamento
do aumento das despesas e investimentos
governamentais...(PEREIRA, 1985, p.58).
103
Ao tratar do desenvolvimento econômico, imperativo nacional,
manifesta o Sr. Celso Furtado sua admiração pela eficácia do
marxismo-leninismo, ‘como meio de alcançar rápidas e profundas
transformações sociais, causa eficiente de um desenvolvimento
econômico etc..(GUDIN,1965, p.451).
Fica marcado o debate ideológico entre estruturalistas e liberais, na
análise de uma série de dez artigos de Eugênio Gudin intitulados: “Economia Política
e literária”, nos quais o mesmo critica diretamente um dos maiores planejadores da
política nacional desenvolvimentista e defensor das ações inflacionárias do Estado,
o então ministro do planejamento Celso Furtado. Gudin critica Furtado alegando que
as teorias do mesmo não tinham fundamentos na teoria analítica econômica e
estavam mais próximas da literatura.
O que a meu ver torna o Ministro Furtado inapto para as funções que
lhe foram confiadas, de Ministro da Economia, é de um lado o
excesso de imaginação que quase o leva a uma economia
romanceada e, de outro, a notória deficiência de sua vocação para a
Análise Econômica em geral e dos dados da economia brasileira, em
particular. (GUDIN, 1965, p.437).
Celso Furtado não acredita na existência e na utilidade de princípios
científicos fundamentais de Análise Econômica, ‘independentemente
de julgamentos de valor. De sorte que as teorias fundamentais do
valor, do capital, do consumo, dos salários, a geometria das curvas
de custo e de suprimento etc., todo esse arcabouço da Análise
Econômica fica condicionado ‘aos princípios de convivência social e
aos julgamentos de valor’. Os estudos econômicos passariam assim
a ter um caráter muito mais político, histórico e até literário e
opinativo, do que analítico... (GUDIN, 1965, p.423).
Furtado acreditava que ao se combater a inflação haveria a geração de
desemprego. Visto a essa alegação Gudin se posiciona mostrando que o trabalho
passava por problemas como mão-de-obra mal paga e sem qualificação, o emprego
104
não garantia prosperidade, pois esse emprego proporcionava ssimas condições
ao trabalhador.
Em seu discurso ao Conselho Interamericano Econômico e Social,
diz o ilustre Ministro Celso Furtado:
É uma ingenuidade pensar que para diminuir a inflação brasileira
bastaria controlar os gastos públicos e adotar uma atitude corajosa
para pôr a casa em ordem’. Visto o grande crescimento da população
urbana, essas providências dariam lugar, diz o ministro, a uma crise
de DESEMPREGO. (GUDIN, 1965, p.428).
Tal é o quadro do problema do desemprego no Brasil, com que não
parece estar familiarizado o ilustre ministro do Planejamento.
Fora isso não país que escape de algum desemprego, a que se
poderia chamar de estrutural, isto é, de excesso de um fator de
produção em relação aos demais. Nunca complementaridade
perfeita (...). No nosso caso, o desinteresse de todos os governos
para o problema da educação deu lugar a uma superabundância de
trabalhadores braçais a por de uma grave deficiência de operários
habilitados, desequilíbrio que o atual governo só faz agravar
elevando os salários dos primeiros muito mais do que dos segundos,
fazendo desaparecer o estímulo para a formação de operários.
(GUDIN, 1965, p.429).
Quando, portanto, o Sr. Celso Furtado recorre ao argumento e ao
espectro do desemprego como pretexto para não enfrentar a inflação
pelos únicos métodos capazes de dominá-la, esta praticando não
um erro de política, mas um erro de Análise Econômica. (GUDIN,
1965, p.430).
A tese defendida por Furtado mostra a necessidade de alta produtividade,
para que se diminuíssem os índices inflacionários com o aumento de bens de
consumo no mercado atendendo o aumento de demanda causado pela inflação.
Porém Gudin desmistifica a idéia defendida por Furtado, mostrando que a
produção, mesmo com o desenvolvimentismo, não cresceu mais que 5% ao ano, por
outro lado o dinheiro em média aumentou 50% em dois anos. Ele ainda aponta que
105
o crescimento da produção em outros países desenvolvidos, fica na média anual de
5%, no máximo 7%. Para se obter a qualidade, que faz com que a produção
aumente, requer tempo e condições adequadas. Assim o aumento da produção teria
que mais de 30% para deter a inflação, coisa essa impossível. Sendo assim o que
cessaria a inflação seria “redução do incremento da quantidade de dinheiro”. Para
ele qualquer aumento de produção, pode gerar um aumento de quantidade de
dinheiro. Para pagar a produção muitas vezes torna-se necessário meio de
pagamentos, sob forma de créditos bancários. Esse fato o gera a inflação, mas
tampouco geraria a desinflação. O economista acreditava que a restrição de créditos
bancários seria uma medida que colaboraria para o controle do processo
inflacionário.
Quanto ao papel do Estado, ficam claras as posições de Gudin ao criticar
a concepção de Estado planificador e centralizador, de Furtado. Para Gudin a
iniciativa privada pode contribuir paro o Estado na medida em que a mesma
consegue atrair novos recursos para a expansão e melhoramento de serviços, sem
a necessidade de recorrer-se para a emissão de papel moeda ou empréstimos.
Porém com a gravidade da inflação, ao longo dos anos que antecederam
o golpe militar, até mesmo os desenvolvimentistas reconheceram a necessidade de
se combater a mesma, frente à recessão econômica. Celso Furtado foi o então
ministro que em 1962 elabora o Plano Trienal, plano este desenvolvido para
amenizar a crise econômica através de medidas de controle da inflação. O período
do projeto nacional desenvolvimentismo teve seu auge e declínio. O auge se
compreende no que se expôs anteriormente, se deu a partir de 1955 com então
presidente da república Juscelino Kubitschek no poder. O projeto de industrialização;
106
plano de metas; altos índices de crescimento; inúmeras construções públicas;
predomínio da ideologia desenvolvimentista; apontavam a conjuntura do auge do
nacional desenvolvimentismo. Porém se inicia um surto inflacionário a partir de 1958
que se soma à crise de balanço de pagamentos. Observa-se também que com o
passar do tempo as reformas planificadoras não atingiram a melhoria de vida da
população, culminando em recessão econômica, como expõe Bielschowsky (1995):
...reconhecia-se cada vez mais que, salvo por uma reforma na
estrutura de propriedade rural e de uma alteração no padrão de
distribuição de renda, o desenvolvimento industrial não conseguiria
resolver, conforme se havia pensado, o problema do desemprego e
da pobreza da maioria da população e de vastas regiões do país. A
recessão econômica iniciada em 1963 ampliaria o pessimismo,
ajudando a minar a perspectiva desenvolvimentista tradicional e
aprofundando sua crise.(p.409-410).
um consenso entre as diferentes versões historiográficas que
analisam o período, quanto à crise econômica entre os anos de 1962-1964, que teria
se formatado com a quebra do dinamismo da acumulação do país que se observa
no início da década de 1960, quando declinou o volume dos investimentos
industriais como aponta Mendonça (1994).
... a crise econômica iniciada em 1962, com o registro da primeira
taxa de crescimento negativo do produto industrial, brasileiro,
inviabilizava o atendimento às demandas populares por mais
empregos e melhor qualidade de vida. No imediato pré-golpe de
1964 eclodiam os sintomas de uma crise que, a rigor, era de
consolidação e crescimento do capitalismo no país. (p.93)
A inflação seria uma das causas mais graves que causariam a crise
do desenvolvimentismo. “... o início da crise brasileira é marcado por
um processo de mudança das causas da inflação que antes se
definia essencial, ainda que não exclusivamente, como uma inflação
de custos.” (PEREIRA, 1985, p.145).
107
É importante salientar que a crise se deu devido a inúmeros fatores,
porém fica claro o destaque e peso que o fenômeno causado pelo processo
inflacionário causou na estrutura da economia do país. Surge então com o governo
João Goulart a tentativa de recuperar a dimensão planificadora do Estado e a crise,
através do Plano Trienal, desenvolvido pelo então ministro Celso Furtado. A
necessidade de uma reforma financeira era evidente no plano de Furtado, visto que
a inflação deveria ser detida.
... No exame da questão inflacionária, no Plano Trienal, Furtado fazia
uma segunda importante associação entre comércio exterior e
inflação, ou seja, dizia que as reformas cambiais de 1957 e 1961, ao
abolirem a receita fiscal proveniente das diferenças entre as taxas de
câmbio de exportações e importações, contribuíram em muito para a
ocorrência de déficits orçamentários federais e, conseqüentemente,
para a inflação. (BIELSCHOWSKY, 1995, p.418).
A pesar do Plano Trienal não ter sido executado, fica evidente que com a
crise econômica, a tese de que a inflação não acarretaria prejuízos para o
desenvolvimento, é vencida pela própria conjuntura e necessidades de reformas.
Visto a crise a CEPAL se formatou e mudou seu discurso em fins da década de
1960, seria o declínio significativo de teses importantes do desenvolvimentismo.
O pensamento cepalino__ que, além de ideologicamente afinado
com a corrente desenvolvimentista nacionalista, era seu principal
sustentáculo__ passava por importante reformulação analítica,
inspirada, em termos ideológicos, no reconhecimento de que a
industrialização não resolvia, por si só, o problema do desemprego e
da pobreza... (BIELSCHOWSKY, 1995, p.442).
Em suma a crise, ocasionada pela busca do desenvolvimento material,
evidenciou muito do que Gudin acreditava ao mostrar que a inflação, a instabilidade
108
monetária, era um grande obstáculo para o desenvolvimento e que a industrialização
fomentada pelo intervencionismo estatal não trouxe melhoria de vida para a
população. No entanto a crise econômica e política prepararam o palco brasileiro
para o golpe militar de 1964, que marcaria os próximos anos com o autoritarismo e
repressão. O Estado democrático nacional desenvolvimentista cria as condições
perfeitas para a queda da democracia. A crise econômica acarreta crise política, a
esquerda se articula rumores de um possível golpe de esquerda, mobiliza os
militares a tomarem o poder e suspender a democracia que ressurgiria apenas
décadas mais tarde.
3.9 CONCLUSÃO
Viu-se nesta seção a retomada da problematização da economia
brasileira sob o enfoque de Gudin como um economista político smithiano. Vimos os
contornos da sua análise econômica que trouxe clareza meridiana sobre a atuação
de muitos de seus influentes coevos que participaram de governos, sobre a política
econômica dos presidentes que lhe foram contemporâneos; outrossim, foi visto o
problema da inflação relacionado com diferentes pontos de vista sobre ela, bem
como foi resgatado o leitmotiv do debate desenvolvimento e estruturalismo
revisitando seus principais interlocutores.
No próximo capítulo, é focalizada a problematização propriamente política
de Gudin acerca de seu período.
109
4. CAPITULO IV - GUDIN E A PROBLEMÁTICA POLÍTICA DO BRASIL
4.1 INTRODUÇÃO
Este capítulo aborda especialmente o cenário político dos governos da
década de 1960 em estreita relação com a formulação dos conceitos e análise
política de Gudin acerca dos idos de então. À luz de um cenário eivado de
conturbações políticas, Gudin apresenta seus conceitos de democracia em relação
com suas concepções gerais. Aqui, pois, será apresentado em linhas gerais a
análise política de Gudin acerca da realidade brasileira, bem como será também
retomado os fundamentos do seu pensamento político.
4.2 O CENÁRIO POLÍTICO E A QUESTÃO DA DEMOCRACIA
um consenso de que o período de 1961 a 1964, em que João Goulart
esteve no poder, fora marcado como um período em que a luta de classes no Brasil
alcançou um de seus momentos mais intensos, dinâmicos e significativos. Gorender
compartilha da idéia que vigorou em grande parte do cenário acadêmico influenciado
pelas escritos marxistas, de que nunca houvera na história do Brasil um momento
mais propício para o acontecimento da revolução socialista.
Segundo penso, o período 1960-1964 marca o ponto mais alto dos
trabalhadores brasileiros neste século, até agora. O auge da luta de
classe, em que se pôs em xeque a estabilidade institucional da
ordem burguesa sob os aspectos do direito de propriedade e da força
coercitiva do Estado. Nos primeiros meses de 1964, esboçou-se uma
situação pré-revolucionária preventivo. A classe dominante e o
imperialismo tinham sobradas razões para agir antes que o caldo
entornasse.(GORENDER, 1987, p.66-67).
Gorender aponta que 1963 representou o ano em que PCB viveu um
momento de grande força, provavelmente nunca visto em sua história. Porém a
110
liderança do partido, aliando-se ao governo de Goulart, negligencia os aspectos de
seu do governo, que outrora a esquerda acreditava serem negativos. Havia uma
grande esperança no governo de João Goulart, visto acreditar-se que as reformas
de base: reforma agrária, reforma tributária, reformas fiscais e a implantação de uma
legislação antitruste, prometidas em sua campanha, seriam implantadas.
Trata-se de um movimento de organização de várias frentes de protestos,
que se aglutinaram em forma de frentes. Era um momento de unificação das forças
de esquerda.A diversidade de movimentos antiimperialistas e democráticos levou à
constituição da Frente de Mobilização Popular (FMP). Esta se tornou o centro de
encontro, debate e aglutinação de partidos políticos e frações partidárias, sindicatos
e organizações intersindicais, entidades setoriais de estudantes, mulheres,
profissionais liberais, etc.
A bandeira unificadora do movimento organizados e informais era a
luta pelas reforma de base. Não se chegou a um programa único
aprovado pelas várias correntes, porém havia pontos de consenso
reiterados. Falava-se em reformas econômicas, tributária,
administrativa, universitária, urbana. (GORENDER, 1987, p.50).
A falência do Plano Trienal, elaborado por Celso Furtado, que tinha como
objetivo principal diminuir a inflação e seus efeitos, sem interferir no
desenvolvimento nacional, apontou o agravamento das crises que o país vivia tanto
no campo econômico quanto político. O Plano significava um elemento que
fortaleceria a restauração do presidencialismo. Esse plano fora combatido pelo PCB
e CGT, pois não correspondia com o plano de reforma de base. Mas o aumento do
índice de inflação fora um dos elementos que deflagraram o fracasso do mesmo.
Neste contexto de crise estes movimentos políticos se articulavam de forma
crescente. Segundo Toledo (2004), o sindicalismo entre 1961-1963, alcançava um
111
de seus momentos de intensa atividade. Observa-se que enquanto de 1958 a 1960,
no governo de Juscelino Kubitschek, ocorreram cerca de 180 greves, no período de
1961 a 1963, com Goulart foram mais de 430 greves. Destaca-se o CGT (Comando
Geral dos Trabalhadores), criado em 1962, no IV Congresso Sindical Nacional dos
Trabalhadores, em o Paulo, com o propósito de organizar e dirigir os sindicatos
nacionais.
Os contatos entre os líderes da CGT e do PCB, sendo Prestes um delles,
com João Goulart eram constantes, havia um apoio mútuo durante todo o governo.
Ideologicamente ambos partilhavam das idéias do nacional-desenvolvimentismo.
Nesse momento o caráter populista do governo de Goulart se afirma em praticas
como essas. Tinha-se então uma hipótese de golpe de esquerda pacífico, através do
apoio de Goulart que representava uma elite progressista. Por outro lado, Leonel
Brizola, cunhado do presidente, propunha um golpe abertamente.
Porém as articulações de protestos também aconteceram na zona rural;
as Ligas Camponesas, institucionalizadas em 1955 como Sociedade Agrícola e
Pecuária de Plantadores de Pernambuco (SAPPP), mais tarde foram conhecidas
como ligas, marcavam os protestos de agricultores por reforma agrária. Esses
protestos se davam através de comícios, passeatas e manifestações.
Uma das reformas mais esperadas e reivindicadas pelos movimentos de
contestação, fora a reforma agrária. A reforma agrária foi uma das propostas mais
polêmicas, várias vezes os projetos eram barrados no congresso, a coesão
oposicionista das bancadas do PSD e da UDN chegava a 90%.
Outro elemento de agravamento da crise política fora os movimentos que
acontecera, no seio do poder militar, em 1963 sargentos da Aeronáutica e Marinha
se revoltaram, o motim fora controlado, porém em março de 1964 greves e
112
manifestações de marinheiros fizeram com que outros desobedecessem às ordens
do Ministro da Marinha de prender os revoltados haja vista a resistência no
cumprimento das ordens, o presidente escolheu exonerar do cargo o ministro e
substituí-lo por um dos três nomes apresentados pelos rebelados.
Na tentativa de um auto-golpe com a proposta de Estado de Sitio a
realidade era diferente, o próprio Prestes, afirma Jarbas Passarinho (2007), não
apoiara aquela ação no momento tendo dúvidas da aliança com o presidente. Porém
nesse momento, 1964 as forças que apoiavam o presidente buscavam uma maior
coesão e se mostravam de várias frentes. Goulart contava com o apoio do PCB, da
CGT e uma pequena, mas importante parte, do corpo militar.
Jarbas Passarinho, senador do regime militar em 1967, afirma que
anteriormente a esses eventos envolvendo elementos das Forças Armadas, existia
um forte movimento anti-golpista, porém vendo suas bases sendo atacadas,
disciplina e hierarquia, o golpe militar passa então a ser encarado como realidade e
como uma medida de contra-golpe. Para muitos, certas reformas culminariam a um
cenário propício a uma Revolução de cunho socialista, porém todas as propostas
mesmo vindas da esquerda eram sutis e não possuíam um caráter de destituir o
capitalismo no momento, porém dava aval a outras interpretações.
A luta pelas reformas de base não encerrava, por si mesma, caráter
revolucionário e muito menos socialista. Enquadrava-se nos limites
do regime burguês, porém o direcionava num sentido progressista
avançado. Continha, portanto, virtualidades que, se efetivadas, tanto
podiam fazer do Brasil um país capitalista de política independente e
democrático-popular, como podiam criar uma situação pré-
revolucionária e transbordar para o processo de transformação
socialista. (GORENDER, 1987, p.51)
113
Desde o parlamentarismo, Goulart, defendera a existência da reforma
agrária, na visão teórica do nacional-desenvolvimentismo, a reforma agrária tinha a
função de possibilitar ao capitalismo industrial o acesso a um nível superior de
desenvolvimento. Aumentando a produção agrícola e ampliando o mercado interno
para os bens industrializados.
Nos anos que antecederam o Golpe de 1964, o governo de Goulart fora
várias vezes acusado de organizar um futuro golpe esquerdista comunista. Em
março de 64, jornais noticiavam boatos de haverem articulações entre o PCB, CGT
e outras forças políticas nacionalistas, para uma preparação para um golpe. Esse
boato nunca fora confirmado, porém o perigo de uma revolução de cunho socialista
fora fomentado por diversos fatores antes expostos e somaram na equação que
levou ao resultado de 30 de março de 1964.
Quando o golpe militar aconteceu em 1964, acreditava-se ser temporário,
como medida de emergência; essa ação foi justificada no momento como um meio
de não se deixar a crise política se agravar com a suspensão de alguns direitos para
que ocorresse a organização e reestruturação do sistema político que entrava em
colapso no fim do governo de Goulart. Durante 20 anos de regime militar sucederam
se cinco diferentes governos todos empossados sem eleição popular. Os candidatos
eram submetidos ao crivo do Congresso que articulado aprovava o novo governo
Após a instauração do regime militar, através do golpe de março de 1964,
a estrutura política brasileira muda, se redireciona, a Revolução militar foi concebida
como uma reforma, que tinha como objetivo trazer ordem para o contexto de crise
política e econômica que o pais vivia nos últimos anos. Frente ao perigo real de um
Estado mais próximo as tendências comunistas, o que se acreditava do governo de
Goulart, a ão dos militares fora rápida e forte para impedir qualquer ameaça ao
114
Estado vigente. A democracia se tornava então um luxo para nações que detinham
condições para a mesma, e a alegação para a existência do regime autoritário vinha
da inadequação e despreparo da nação brasileira para o desenvolvimento e
funcionamento da democracia.
Nesse momento, grande parte dos intelectuais liberais se posicionou
defendendo a ação militar vendo nela uma solução para se cessar o avanço do
movimento ideológico marxista, que tomava vigor em grande parte da América
Latina, principalmente após a instauração do Regime comunista em Cuba, em 1959.
Nesse contexto, Eugênio Gudin mantém seu discurso com a mesma base
liberal que tinha desde as décadas de 1920, 1930, 1940 e 1950, continuava a
defender o combate a políticas inflacionárias, e a intervenção do Estado como
também expõe Borges (1996), ao falar de Gudin.
...É como se desenhássemos um círculo com os seus textos e
reencontrássemos sempre o mesmo ponto de partida, de percurso e
de chegada. Decorre disto uma defesa uniforme do capitalismo
encaixável em qualquer período, inspirada no século XIX, no mundo
regido pela Inglaterra. Estamos diante de um modelo_ um tipo ideal_
que molda todo o seu pensar. (BORGES, 1996, p.240).
Para Gudin a iminência de uma revolução socialista era real, o “perigo era
real”. Os Estados marxistas, na concepção de Gudin, não reconhecem o estado de
direito e suas atribuições para a organização das instituições, não reconhecem o
Direito Internacional, mas se utilizam do mesmo quando ele lhes convém.
Gudin constata no comunismo em Cuba as pretensões de se instaurar em
toda a América Latina. Para Gudin a sociedade brasileira era fundada em princípios
cristãos e democráticos e não seria de forma conivente que esta iria aceitar um
Estado comunista no Brasil.
115
Foi na crista de uma onda de confusão, de balbúrdia e de anarquia
como essa que João Goulart e seus cúmplices tentaram cinco
anos levar-nos ao caos pré-comunista. Quanto aos verdadeiros
desígnios de Goulart e deu seu grupo, ninguém sabe exatamente
quais eram __ e é possível que eles também não soubessem__, mas
é bem certo que em poucos meses estaríamos perfeitamente
integrados no mais autêntico Fidel Castrismo. (GUDIN, 1970, p.51).
Sendo assim, o economista em questão se posiciona como um dos
invocadores da revolução, e seu instrumento para essa ação era a imprensa, seus
artigos jornalísticos, e diz isso com suas palavras.
Numa idade em que as aspirações não existem, digo pois, sem
falsa modéstia, que não me arrependo um instante da violenta
campanha jornalística com que nos anos de 62,63 e 64 procurei
conclamar as Forças Armadas à Revolução que ora comemora seu
5º aniversário. (GUDIN, 1970, p.106).
Em um de seus artigos, em 1969, Gudin faz uma retrospectiva de seus
artigos e do que eles apontavam antes do regime militar.
... Em artigos que se prolongaram de 1962 a março de 1964, procurei
alertar a Nação, em linguagem contundente e angustiada, para o
abismo em que ela se projetava. Exemplo: em 3 de janeiro de 1964,
eu escrevi:
Temos tido governantes inertes e governos incapazes, que pecaram
largamente por omissão, deixando de aproveitar belas oportunidades
para agira em beneficio do país. Mas nunca tivemos, de meu
conhecimento, na república ou no império, um governo tão
encarniçadamente decidido a destruir, desmoralizar e até prostituir
tudo quanto neste país existe de organizado.. (GUDIN, 1970, p.108)
116
Assim seus artigos, que refletem seu discurso, ganham um “tom”
diferente, Gudin não se mais como um oponente, ou adversário, como muitas
vezes se posicionava ao criticar os governos desenvolvimentistas, agora Gudin se
coloca como uma figura de “conselheiro” que adverte seus companheiros, como
observa Maria Angélica Borges (1996).
No trecho a seguir, de um artigo de março de1968, observa-se
claramente o conceito que Gudin tinha do Golpe de 1964 e sua utilidade.
A Revolução de 1964 foi uma medida de salvação pública,
promovida pela avalanche da opinião do país e apoiada nas Forças
Armadas, contra a subversão de poderes e valores humanos, contra
o solapamento sistemático da hierarquia, contra o caos econômico e
financeiro e contra a desordem social. O objetivo primacial da
Revolução foi portanto o da restauração da Ordem, ordem social,
ordem militar, ordem econômica. (GUDIN,1970, p.84).
Grande parte da historiografia defende a tese de que Gudin fora um
dos grandes intelectuais da revolução militar, como se visualiza com Carneiro.
Foi Eugênio Gudin um dos mais destacados pregadores da
revolução de 31 de março de 1964. Os artigos que escreveu sobre a
situação em que se achava então o país exerceram forte influência
na opinião pública, alarmada com a desordem que dia a dia se
acentuava. Os índices de uma inflação galopante e a indisciplina
generalizada levaram-no a apoiar a instituição de um governo
militar... (CARNEIRO IN KAFKA, 1979, p.15-16)
Após o golpe militar há o rompimento com a democracia, sendo Gudin um
liberal, que tem como um dos pilares de sua teoria a democracia, como esse tratará
essa questão torna-se um elemento importante para que possa ser analisado o
ideário Gudiniano frente a essa situação que aparentemente pode ser vista como
contraditória.
117
O conceito de democracia em Gudin guardava estreita relação com a
idéia de liberdade e de causa de longo prazo: “... Um Estado democrático tem,
portanto, a liberdade dos cidadãos como causa final, não podendo ter em vista outro
objetivo mais nobre que a garantia e a manutenção das liberdades e franquias dos
cidadãos.” (TORRES, 1949, p.9)
4.3 A DEMOCRACIA, NA VISÃO DE EUGÊNIO GUDIN, APÓS O GOLPE MILITAR
DE 1964.
No contexto do militarismo uma frase vai ser focalizada de forma
contundente, “ordem e progresso”. A democracia vai se perder nesse contexto onde
o controle ganhara uma maior importância, demonstrando o antigo duelo da ordem e
do progresso, e nesse momento a ordem vence, pela realidade que demonstrava a
desordem, sendo privilegiada pela idéia de que sem ordem não haveria o progresso
e nem a conquista da democracia através da razão.
Nos primeiros tempos do liberalismo, quando os parlamentos se
abriam, após a vitória dos governos legítimos contra Napoleão, dois
partidos principais se formaram: o da ordem e o do progresso. De um
lado os que achavam indispensável a defesa dos princípios
tradicionais da autoridade, do poder legítimo, da religião de nossos
país e outras coisas no gênero. Eram pessoas que mostraram os
horrores da revolução e da anarquia. De outro lado havia os que
falavam na liberdade, na razão, nos direitos do homem e coisas
semelhantes. Havia naturalmente posições intermediárias e casos
semelhantes ao de Augusto Conte, que pretendia conciliar o
progresso com a ordem: o progresso é o desenvolvimento da ordem,
a ordem por base e o progresso por fim, etc. (TORRES, 1947, p.14)
118
Primeiramente, é importante salientar que Gudin traz às suas análises um
fator inovador para seu contexto, seu liberalismo era tido como um liberalismo
“tupiniquim”, pois partiria das idéias clássicas de Adam Smith (1983), mas explicava
a realidade peculiar do Brasil. Sendo assim, ele sempre em suas análises tinha o
cuidado de não comparar o Brasil a realidades diferentes, como de países que
possuíam pré-condições para o estabelecimento e sucesso das instituições
liberais.Com isso ele acreditava ser o Brasil um país despreparado para o
desenvolvimento bem sucedido da democracia, e isso o economista mostra em
vários artigos, após 1964.
A crise econômica que o Brasil vivia no momento não escondia, ou
deixava de forma secundária, os problemas da estrutura política, ao contrário todos
os outros problemas e crises advinham da mesma fonte, problemas políticos. Em
seus artigos Gudin utilizava a História para defender a tese de que, no período
imperial o Brasil não possuía uma educação política, sendo assim necessitava de
um poder moderador que controlasse os demais poderes.
na República a partir de 1889 se visualizou uma oligarquia que
governou o país durante 40 anos, tendo em vista o vasto território brasileiro e a falta
de educação política, esse sistema resolveu seu problemas e se constata na visão
do economista, que nenhum presidente deixou de exercer seu mandato, visto seus
objetivos, Gudin acreditava que o regime não fora falho.
Ao salientar a falta de educação para o estabelecimento da democracia
no Brasil, Gudin esboçava ser a demagogia, o voto emocional e a pobreza fatores
que destruíam a possibilidade da existência bem sucedida da democracia, fatores
esses disseminados pela mídia, principalmente a televisão, que multiplicava os
efeitos da demagogia.
119
E nesse contexto, cabe salientar a posição de Gudin de criticar os meios
de comunicação enquanto aparelho ideológico para insuflar os jovens ao protesto.
O economista descreve o desrespeito e desordem, a grande liberdade que obtinha a
presente geração. Comenta hábitos que existiam quando o mesmo era jovem e
aponta as diferenças, de forma que se pode observar a normal indignação e choque
de gerações. “Parece-me, entretanto que seja qual for o tipo de civilização, de
prevalecer o princípio geral de educação de que a liberdade do indivíduo o pode
invadir os limites da ordem social.” (GUDIN, 1970, p.42).
Ainda expõe o movimento de aparelhos de informação na luta ideológica
no momento, principalmente teatro.
Tudo isso contribui para propagar e generalizar o descontentamento
das massas, largamente explorado pela demagogia. O “efeito de
demonstração” deu lugar assim a um “efeito de demolição”. Todos
são contra, sem que ninguém apresente qualquer sugestão
construtiva digna de exame.” (GUDIN, 1970,p.43).
Em uma seqüência de artigos se observa a crítica de Gudin a juventude
revolucionária que marcou as décadas de 1960 e 1970 através de atos de
contestação da ordem. Inflamados pelo discurso marxista e apoiados também pela
chamada “Igreja Nova” que contestava as ações repressivas do Estado militar.
Ao tratar da desorganizada educação que concedia maior liberdade para
os jovens, ele se posiciona apontando o erro de não se impor limites a essa
juventude que de forma imoral, para o mesmo, extrapolavam em seus direitos
atingindo os direitos de outros. A crítica marcava essa geração, que para Gudin não
tinha um plano ou idéias que serviriam como solução para os problemas criticados.
120
Outro setor criticado pelo autor foi o movimento de contestação do regime
que surge no seio da Igreja Católica, Scott Mainwaring comenta o contexto desse
movimento apontando uma grande força vinda da igreja católica, através de várias
frentes, que vão apoiar diretamente a esquerda nesse período é o caso da JUC
(Juventude Universitária Católica).
Em 1960, a JUC estava ativamente envolvida com a esquerda brasileira.
Os católicos progressistas se inseriam no mesmo contexto histórico que o restante
da esquerda e, apesar de suas críticas aos grupos leninistas, mantinha-se em
constante contato com as organizações de esquerda e por elas eram influenciadas.
Os católicos exerceram influência sobre o movimento estudantil e sobre vários
movimentos pela educação e cultura populares. Também foram importantes na
organização dos camponeses a algumas associações de bairros. Nesses anos, em
menores proporções, a esquerda católica competia com os dois partidos
comunistas, o PCB e o PC do B. Sobre esse envolvimento da igreja com a
esquerda, escreve Gudin, apontando a influência do marxismo no catolicismo:
E fico a perguntar perplexo: se os padres descem dos altares para vir
formar partidos políticos na rua ou instigar guerrilheiros nas
montanhas, como é o caso desse padre belga que anda por ai
blasfemando (Fidel Castro de batina, como o chamou Teóphilo de
Andrade), a quem vai caber, dora em diante, a missão de suprir a
preciosíssima assistência espiritual de que tanto precisam os
homens? (GUDIN, 1970,p.45).
Em alguns artigos Gudin ataca diretamente um influente clérigo do
movimento contestador da igreja, Dom Hélder.
121
O que tudo decorre do fato de querer Dom Hélder abordar questões
de caráter econômico com argumentos de origem religiosa ou
emocional, com o resultado de incidir na doutrina que eu tenho
chamado de ‘comunismo com Deus Nosso Senhor’, tal como a prega
o padre Lebret e outros. (GUDIN, 1970, p.185-186).
Para ele a contestação, os protestos estavam fora de hora, o momento de
protesto fora o momento em que Kubitschek levantava Brasília desviando recursos
que seriam importantes para sanar a miséria do povo brasileiro.
A pergunta que cabe dirigir então aos congressistas, aos homens
públicos do Brasil, ao clero, e a todos os que não gritaram contra o
crime de Brasília, é a do que se poderia ter feito, neste país de
penúria e subdesenvolvimento, em termos de habitação, de escolas,
de hospitais, de alimentação e de outras formas de alívio à miséria,
com cinco mil bilhões de cruzeiros. (GUDIN, 1970, p.367)
Sendo grande parte dessas contestações, direcionadas a critica do poder
autoritário e não democrático do regime militar, se observa como um dos temas
principais dos artigos de Gudin, nesses anos de regime, a insistência em dissertar-
se acerca da democracia, como visto um dos pilares da teoria liberal. Sendo
assim ele utiliza-se da História e defende a necessidade da existência e
funcionamento do poder Moderador.
Gudin aponta que ao fim, as Forças Armadas, fora a grande herdeira do
poder Moderador. E essa deveria intervir em momentos de existência de casos de
salvação pública, como os de 1930, 1945, 1954 e 1964.
A mudança de forma de governo, de monárquico para republicano
não tivera, como não podia ter, o efeito mágico de melhorar
subitamente os costumes e a educação política. A República não
podia, portanto dispensar, nas horas de crise, o recurso ao Poder
Moderador. Mas com o desaparecimento do monarca, a quem
122
poderia passar o exercício desse poder? As forças armadas ou ao
Poder Judiciário, únicos que se devem conservar alheios às lutas
políticas. (GUDIN, 1970, p.69).
Para o sucesso da Democracia haveria de se ter pré-condições para a
consolidação desse sistema, a educação, conhecimento e habilidade com elementos
da ciência política seriam essenciais. No Brasil mesmo após a proclamação da
República, o poder não estava no voto, as oligarquias demonstravam que de fato a
Democracia não existia enquanto prática. Aponta ainda que ao longo da história, no
Brasil, se visualiza inúmeras tentativas frustradas, ao longo de dez anos de 1954 a
1964 quatro presidentes foram expulsos ou renunciaram demonstrando o caos
político do país.
...o grande problema político dos países da América Latina reside na
incapacidade e na inexperiência para o pleno exercício do sistema
democrático. A falta de ideologias definidas dos partidos, o caráter
mais personalista do que público das divergências e dos debates,
fazem com que as disputas, agravadas pelas paixões e os
interesses, conduzam por vezes esses países a situações que põem
em perigo a ordem pública civil e militar... (GUDIN, 1970, p.67).
Gudin denuncia a falta de investimento na educação, no Brasil, e o que
isso acarreta para a nação em termos de desenvolvimento intelectual da sociedade,
elemento essencial para o fortalecimento das instituições democráticas. É o que o
mesmo chama de “educação política”.
O economista compara as duas realidades distintas, períodos de
governos democráticos e o contexto que o regime militar estava desenhando em
seus dias. Comenta a experiência democrática que o Brasil vivenciou:
Essa experiência foi a princípio desastrosa e por fim catastrófica. Na
ordem política desaparecera a dignidade e com ela a autoridade do
123
Governo; no setor militar a subversão da hierarquia. O naufrágio da
ordem econômica caracterizava-se, externamente, pelo
endividamento e pela falência; internamente por uma inflação
galopante. Na ordem moral quebrou-se toda a tradição brasileira,
pela desmoralização dos próprios presidentes da República, cujos
sinais exteriores de enriquecimento, ao deixarem o poder, eram
evidentes. (GUDIN, 1970, p.80).
A democracia apesar de ser um dos pilares da teoria liberal, se torna
dentro do discurso de Gudin um elemento a ser agregado, mas não o principal, o fim
era o desenvolvimento nacional, os meios poderiam passar pela democracia ou não.
O importante para ele era que os meios estivessem norteados pelo ideário da
liberdade de comércio, que desenvolveria a riqueza em toda a nação, para um único
propósito, o desenvolvimento do Brasil uma nação subdesenvolvida, pobre e com
uma economia frágil, na visão de Gudin. Para o economista o desenvolvimento não
dependia da democracia, com ela o Brasil não havia conquistado o avanço, portanto
sacrificá-la não impediria o cumprimento do fim desejado. É importante salientar que
o conceito de liberdade nesse momento ganha uma conotação carregada por seu
contexto.
Essa concepção de liberdade entende que a democracia só pode ter
sucesso se for com base na liberdade maior, que seria a liberdade econômica.
Ora, Locke sabiamente sustentou seu argumento liberal no respeito à
propriedade privada. Dede Burke, os Pais da Pátria americanos,
Tocqueville e Weber, até Aron e Hannah Arendt, para só citar alguns
entre os mais eminentes pensadores políticos, sabemos que toda
‘revolução’ democrática conduz a um democratismo populista e à
geração de uma nova aristocracia, isto é, de uma Nomenklatura
burocrática, se não estabelecer em sólidas bases morais e legais os
fundamentos sociais e econômicos que ‘institucionalizem a liberdade’
e firmem o direito de propriedade privada... (PENNA, 1994, p.82).
124
A liberdade estava sendo ameaçada por um perigo real, como fora
observado aqui. A liberdade aqui ganha um conceito de Regime de Estado de
Direito, por mais que o Brasil, para Gudin, estivesse longe de ser um país com um
Estado Liberal de fato, sua base constitucional era pautada na segurança da
propriedade privada, dando vida e ação a livre iniciativa base para uma sociedade
liberal. O perigo de uma revolução socialista ameaçava a base dessa sociedade, era
essa a liberdade mais estimada por Gudin, pois sem essa liberdade para ele não
haveria possibilidade de desenvolvimento nacional. A democracia expressava
liberdade, porém nesse contexto a liberdade mais necessária era o direito de
propriedade privada, a liberdade de “ter”. A democracia sempre fora defendida por
Gudin, porém no momento a necessidade de medidas extremas era a única forma
de defender a liberdade ainda existente, pois sem ela não haveria outras liberdades,
a liberdade econômica se tornava essencial.
Não pode haver liberdades civis nem democracia onde o governo é
economicamente onipotente. Capitalismo, diz muito bem o articulista,
é apenas o nome de um sistema de liberdade econômica. Em regime
predominantemente socialista, não pode haver liberdade econômica,
nem liberdade política. (GUDIN, 1970, p.19).
4.4 O GOVERNO DE CASTELO BRANCO E A CONSTITUIÇÃO DE 1967
Gudin se coloca com um defensor e conselheiro do regime militar, porém
em nenhum outro momento acreditava veementemente naquele regime, tanto como
durante o governo de Castelo Branco e interpreta a constituição de 1967, como
legitimadora desse novo momento. Em seus artigos, ele explicitamente elogia
125
Castelo Branco, mostrando a necessidade dos militares no poder, para recuperar o
respeito do Estado e salvar as instituições em crise, alegando ser essa medida
temporariamente necessária. O governo de Castelo Branco foi eficaz para Gudin,
pois:
As dívidas com o exterior foram reescalonadas e os novos
compromissos cumpridos à risca. No plano doméstico, a inflação
catastrófica de mais de 140% ao ano foi reduzida a um ritmo de 20
ou 30%. Não pode fazer tudo, mas fez muito. Restabeleceu assim a
ordem econômica.” (GUDIN, 1970, p.81)
Seremos tão cegos, tão obtusos ou tão incapazes para não ver onde
nos levou a chamada “democracia intergral”, praticada de 1956 a
1964? É a isso que queremos voltar? Queremos outro Kubitschek,
outro João Goulart ou outro Ademar de Barros legitimamente eleito e
reeleito no maior estado do país? (GUDIN, 1970, p.98).
Gudin enfatiza a não existência no regime em questão desvio ilícito
de capital, apontando o não enriquecimento dos governantes,
diferentemente do que acontecera com João Goulart. “... não se
aponta no Brasil um só militar enriquecido no Poder. Não há aqui um
Perón, um Rojas Pinilla, um Perez Jimenez e
outros.”(GUDIN,1970,p.108).
A nova constituição e os Atos Institucionais preservaram e
legitimaram o governo militar, suas propostas e objetivos cercearam direitos e
principalmente coagiram a contestação. A constituição de 1967 tem como principais
medidas, além da centralização do poder Executivo, a militarização do Estado dando
grande poder as Forças Armadas, estabelecer a pena de morte para crimes de
segurança nacional, proibir a existência do direito de greves etc. Fica claro que
nesse período a constituição foi paralelamente acompanhada por decretos,
chamados Atos Institucionais, que foram freqüentes no regime militar.
Após o ato institucional nº2, ficara proibida a existência de partidos. O
Brasil outrora vivera uma realidade de pluripartidarismo, onde se observava
126
diferentes partidos em grande parte do território nacional que defendiam distintas
ideologias, esses partidos se desenvolveram ao longo da década de 1950.
O presidente Castelo Branco governou de 1965 a 1967 reorganizou o
sistema partidário existindo assim dois únicos partidos: Aliança Renovadora
Nacional (ARENA) e Movimento Democrático Brasileiro (MDB) que representava a
oposição.
Tinha o novo presidente o culto da democracia. Procurou de todos
os modos governar com a colaboração de um congresso, eivado de
grave vício de origem. Tendo a eleição para governadores por
sufrágio direto demonstrado, em outubro de 1965, que persistia o
domínio eleitoreiro dos partidos ‘carcomidos’, PSD e PTB de
Kubitschek e de Goulart, a pressão militar, oriunda dos redutos da
revolução, forçou a promulgação de um Ato Institucional nº2, que
conferia ao presidente poderes excepcionais, de cassação de
mandatos e outros. (GUDIN,1970, p.109)
Gudin continua expondo que o governo teve grandes dificuldades com o
congresso, sendo assim necessária a promulgação, em 1968, de um Ato
Institucional nº5 que colocava em recesso o Congresso Nacional e aumentou os
poderes do Estado para a cassação de mandatos.
A constituição de 1967 legitimava o regime militar e aumentava o controle
hierárquico do poder Executivo sobre o Legislativo e o Judiciário. Para Gudin a nova
constituição se tornava uma arma contra a oposição que ameaçaria a ordem, que
segundo ele era necessária para o desenvolvimento do Brasil. A nova constituição
instituía a eleição indireta para presidente, medida essa defendida por Gudin.
Existe, além do mais, um argumento de senso comum em favor da
eleição indireta: a necessidade de delegar a outros, mais preparados,
as tarefas humanas que exigem especiais conhecimentos,
experiência e sabedoria. Se temos uma pessoa enferma, delegamos
a um médico o tratamento; se queremos fazer uma estrada ou uma
ponte chamamos um engenheiro; se queremos organizar o ensino
127
recorremos a um grupo dos maiores mestres. Entretanto, quando se
trata da tarefa, muito mais delicada, de escolher um homem com os
extraordinários predicados necessários à difícil missão de Presidente
da República, julgamos que ela pode ser entregue ao homem da rua,
que em sua grande maioria é, por culpa nossa e de nossos
antepassados, lamentavelmente despreparado. Despreparado para
escolher, como, para resistir às pressões da demagogia, da
corrupção e da emoção. (1970, p.72).
Esta citação se remete ao comentário da medida que fora incluída na
nova constituição art.74, que declarava legítima a eleição indireta do Presidente da
República. Um ponto interessante é o comentário que Gudin faz acerca do art.10: “a
faculdade de intervenção federal nos Estados que adotarem medidas ou executarem
planos econômicos ou financeiros em contrário às diretrizes estabelecidas pela
União” (GUDIN, 1970, p.74)
Acerca disso Gudin argumenta ser necessária a intervenção da União nos
estados para o bem da União e para que o Brasil se desenvolvesse em um mesmo
sentido. Esse seria um tipo de intervenção necessária. Apesar de aprovar grande
parte da nova constituição Gudin, sempre alertava para o perigo de se dar excessivo
poder econômico ao Estado, a intervenção excessiva sempre impedia a maior
liberdade econômica, condição essencial para o desenvolvimento nacional.
Haveria também algumas restrições a sugerir: conquanto seja
necessário dar grande autoridade ao Executivo em matéria
econômica e financeira, parece-me que o projeto foi longe demais
conferindo ao Presidente a faculdade de expedir ‘Decretos leis’
(sempre perigosos) sobre economia e finanças públicas,
indiscriminadamente. Enquanto que a iniciativa do Executivo em
matéria econômico-financeira é uma providência salutar e a rápida
tramitação no Congresso também o é, a expedição ‘indiscriminada’
de decretos-lei parece-me uma evidente demasia.
É que o decreto-lei, instrumento específico das ditaduras, é odioso
por não dar a menor oportunidade a quem quer que seja de levantar
as mais elementares__ e não raro justas__objeções. A insegurança
que daí advém é muito mais danosa para a economia do país do que
o mal que possa advir de um pequeno retardamento da providência.
É um caso em que ‘a poda’ se impõe. (GUDIN, 1970, p.77).
128
É importante observar que Gudin criticava a falta de liberdade individual
na constituição proposta, sendo que os direitos individuais não poderiam ficar
condicionados a expedições de leis ordinárias e elementos como a inviolabilidade do
domicílio deveria ser preservada independente de qualquer legislação. Ele ainda
apontava a necessidade de se ter uma economia livre, pois isso seria preliminar
para a democracia, tão desejada no momento.
Isto tem, preliminarmente, um sentido político, da maior relevância,
porque onde o Estado é onipotente em matéria econômica, ele
também o é em matéria política; no Estado Leviathan, não lugar
para as liberdades políticas nem para a democracia.
A nova constituição dava maior espaço para a iniciativa privada,
sendo assim fora criticada por bacharéis e literatos que defendiam a
constituição de 1946. ( GUDIN,1970,p.74)
Desse modo, Gudin acreditava que a primeira constituição feita para ser
cumprida no Brasil foi a constituição organizada no governo do Presidente Castelo
Branco em 1967. Aqui novamente ele assinala a necessidade de se tratar os
problemas políticos do Brasil, pois a autoridade acarretava responsabilidade. Apesar
de apoiador, Gudin nunca deixa de ser crítico do Estado apontando sempre os
problemas na ação do governo, independente de a quem ele pertencesse.
4.5 CONCLUSÃO
Neste capítulo foram mostradas as inferências desta pesquisa sobre a
problemática política brasileira segundo Gudin; viu-se, ainda, o cenário dos
129
movimentos políticos e, de acordo com isso, como Gudin, ao mostrar sua deferência
ao Golpe Militar, desvela a flexibilidade de suas concepções sem, no entanto, abrir
mão do seu pressuposto fundamental, a liberdade.
No próximo capítulo encontrar-se-á a abordagem da obra de Gudin
focalizando sua natureza de ser uma expressão da economia política clássica e,
como tal, de um pensamento anti-conservador e inovador.
130
5. CAPÍTULO V – GUDIN: A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA BRASILEIRA DO
SÉCULO XX
5.1 INTRODUÇÃO
Grande parte das análises produzidas pela historiografia acerca de Gudin
caracterizam-no como um economista conservador. Esse termo sempre estivera
associado até mesmo com o liberalismo de Gudin. Porém a análise feita nesse
trabalho, com base nos fundamentos teórico-metodológicos expostos, leva-nos a
estabelecer uma reflexão divergente de grande parte das abordagens até então
realizadas acerca do tema. Sendo assim cabe agora resgatar o conceito de
conservadorismo, bem como de contextualizá-lo em Gudin. Esta retomada histórica
tem em vista fundamentar as afirmativas do presente trabalho quanto a
caracterização de Gudin como representante da economia política clássica e
aquilatar suas contribuições inovadoras no pensamento econômico no Brasil
5.2 EUGÊNIO GUDIN COMO ECONOMISTA POLÍTICO CLÁSSICO
Tendo em vista as características da teoria da Economia Política
clássica, podemos então apontar Eugênio Gudin, o foco de nossa pesquisa, como
um dos representantes dessa teoria. Os fundamentos clássicos do liberalismo
sempre estiveram presentes em suas análises acerca da economia brasileira.
O caráter clássico de Gudin é identificado em dois momentos de suas
análises: quando ele assinala sua crença na mão invisível do mercado, que seria a
questão da subjetividade da economia guiada pelo mercado, negando as correntes
neoclássicas que buscam a objetividade científica; e quando o mesmo concebe as
inter-relações entre a economia e política.
131
A “mão invisível” foi um termo criado por Adam Smith em sua obra “A
Riqueza das nações”. Esse termo expressa os fundamentos do conceito de
Economia política Clássica, encontrada nos clássicos e em Gudin. Existe uma ordem
no mercado, que movimenta os interesses divergentes e comuns dos indivíduos de
determinada sociedade, mas essa ordem é subjetiva, não se materializa, não pode
ser prevista nem controlada por teorias ou planos, ela simplesmente existe, como
um produto da subjetividade humana, algo invisível, mas existente, que seria a força
do mercado.
Gudin acredita na força do mercado, na “mão invisível”, na
possibilidade de que o mercado tem de, em condições de liberdade, propiciar uma
alocação de recursos eficientemente que distribua a riqueza naturalmente. Sua forte
critica ao Estado intervencionista e planejador demonstra que o mesmo acreditava
no poder da ordem econômica que o mercado poderia gerar e que esse processo
não seria hábil se houvesse a oposição do Estado.
O economista visualiza a ação de planejar, na concepção do
desenvolvimentismo, uma ação que cerceia as ações humanas. O planejamento que
impunha determinadas condições, tarefas ou caminhos, estipulando metas e regras,
que buscavam projetar o futuro desenvolvimento para o país, era norteado pela idéia
de que elementos complexos da vida social, como a economia poderia ser
simplesmente quantitativamente medida e previsível. Isso não tira o caráter do
economista de se fundamentar na economia analítica, pelo contrário Gudin expõe a
necessidade de se seguir princípios básicos da economia, aponta que o era uma
questão meramente de contexto, mas existia leis da economia que são
inquestionáveis e de profunda importância para se compreender o próprio mercado,
e são essas leis que fundamentam a crença da política econômica nesse mercado.
132
De sorte que as teorias fundamentais do valor, do capital, do
consumo, dos salários, a geometria das curvas de custo e de
suprimento etc., todo esse arcabouço da Análise Econômica fica
condicionado ‘aos princípios de convivência social e aos julgamentos
de valor’. Os estudos econômicos passariam assim a ter um caráter
muito mais político, histórico e até literário e opinativo, do que
analítico. O que teria a vantagem de poderem os problemas
econômicos ser abordados sem o conhecimento da Ciência
Econômica... (GUDIN, 1965, p.423)
Assim a economia teria uma função para Gudin, a função de através de
suas teorias auxiliarem a política, para que uma oriente a outra em busca de que o
processo natural do mercado aconteça. Gudin não tem um plano, ou simplesmente
uma solução, não tem uma estratégia com início, meio e fim, na sua visão de
economista político, o liberalismo clássico não possui um plano ou projeto, mas seus
princípios se fundamentam na economia. Essa fornece elementos para se
compreender que a complexidade do ser humano só permite ao mesmo fazer
estimativas, através dos estudos da ação do homem e sua ressonância, estimativas
que acreditam ser a liberdade da iniciativa privada, o melhor caminho para o
desenvolvimento.
Gudin parte do princípio da economia para observar a política, por mais
que analisa conceitos referentes às duas dimensões, política e economia, ele
sempre as vê atreladas. Esse caráter é visível em grande parte de suas discussões.
As idéias de Gudin ao longo do tempo mostraram ser reflexos do seu
contexto, como um homem do seu tempo o economista trabalhou as questões que
circundavam seu cotidiano, assim como outros economistas em outros momentos na
História. Eram as questões de seu presente que o faziam refletir sobre os problemas
nacionais, e isso foi marca em toda sua trajetória como economista, professor e
133
homem público. Em momentos de crise econômica seus artigos buscavam
explicações para os fatos de seu presente, como ocorreu principalmente entre 1962
e 1964, período pelo qual, os altos índices de inflação fez com que vários de seus
artigos dissertassem acerca do problema, e nessas análises mostrava suas crenças
no mercado e apontava como conseqüência de políticas de um Estado
intervencionista, corroborando assim para a inflação.
Observa-se que em momento de crise política, 1963-1964, seus artigos
tratavam de assuntos concernentes a política, o conceito de democracia era
apresentado (visto o Brasil viver um golpe militar em uma conjuntura de possível
revolução social), eram questões políticas que estavam em pauta. Porém até
mesmo quando Gudin trata da questão política sempre a mesma esta ligada com a
economia, a necessidade de um Estado forte naquele momento impedindo uma
possível revolução de cunho socialista, preservava a existência da propriedade
privada. Mesmo falando de conceitos da política, Gudin a via interligada com a
economia, e esse aspecto é percebido ao longo dos artigos e escritos do
economista. Era seu contexto que ditava seus pensamentos, que buscavam decifrar
os acontecimentos, e a base para que ocorresse essa tentativa de entendimento de
seu presente eram os fundamentos da Economia política.
A essência dos artigos de Gudin se constitui na tentativa de mostrar o
caráter restritivo e limitador do Estado, para o desenvolvimento natural do mercado.
Nesse ponto reside a base para o entendimento da Economia Política em Gudin.
Para que o mercado funcionasse de forma eficiente promovendo o desenvolvimento
era necessária a liberdade, ou seja, essa liberdade tão discutida e requerida por
Gudin e de outros tantos liberais era o elemento que faltaria para que o sistema
gerasse resultados positivos, porém isso dependeria diretamente do Estado, do
134
campo político. Por isso os artigos de Gudin são direcionados para um público alvo,
o próprio Estado, seus governantes, é deles que ele requer a liberdade e critica a
falta da mesma, a liberdade é pré-requisito para o funcionamento de sua teoria.
O alvo é o Estado, um exemplo é a própria a FGV (Fundação Getúlio
Vargas), uma instituição que tem como base dos fundamentos de sua escola de
economia, elementos da Economia Política, foi criada para preparar os futuros
possíveis governantes ou assessores de ministérios, pessoas que se preparavam
para ocuparem cargos públicos ou privados de relevância nacional, na prática isso
realmente aconteceu. Essa característica institucional advém dessa ligação da
economia com a política, uma dependendo da outra para que de fato o sistema
liberal funcione.
Gudin dialogou com o Estado, em toda sua trajetória de idéias, como
opositor, no caso de JK ou até mesmo conselheiro e apoiador como foi com Castelo
Branco, seu discurso tinha um: alvo o Estado. Ele acreditava ser o Estado um
representante de interesses de grupos que não atendiam aos interesses de toda a
sociedade, por simplesmente ser impossível essa tarefa. A complexidade da
sociedade com seus diferentes indivíduos, com interesses divergentes apontam uma
tarefa impossível, a aglutinação dos interesses comuns em um único grupo de
pessoas que representariam a sociedade. O Estado é importante e tem sua função,
porém no âmago de sua teoria Gudin discute com o governo por ser ele limitado
para fazer as transformações que acreditava poder fazer.
Hayek (1983) cristaliza esse princípio existente na Economia Política;
para ele as circunstâncias em que um indivíduo vive levam o mesmo, de forma
inconsciente, a ter determinadas ações que colaboram para o seu bem estar. Sendo
assim a racionalidade que o mesmo aplica para pensar seu contexto não é
135
cartesiana, exata, perfeita, pois nenhum indivíduo possui todas as informações ou
conhecimento que possibilite o mesmo planejar e predeterminar os fatos. Seu
conhecimento é limitado, sendo a confiança no inesperado sua opção mais
coerente.
Tendo em vista a sociedade ser composta por inúmeros indivíduos com
um complexo universo de sentimentos, características, ambições diferentes, torna-se
impossível alguém ou até mesmo um grupo deter o conhecimento que explicaria ou
manipularia as ações desses indivíduos.
Não um universo de informações que possa prever o controle das
relações sociais, que possa avaliar a necessidade dos indivíduos, suas carências e
desejos. Um determinado grupo no controle do Estado não têm condições de
determinar o que a sociedade necessita ou não, isso é revelado pela própria
sociedade, pela busca individual que ocorre quando esses indivíduos estão em
condições de liberdade para seu desenvolvimento. Quem valoriza determinado
caminho a seguir, quem escolhe determinada ação é o individuo, e a soma dessas
ações convergentes ou não expressam a vontade comum e seleciona as melhores
direções que possibilitem o bem estar da maioria.
O erro característico dos racionalistas construtivistas a esse
respeito é tenderem a fundamentar sua argumentação no que foi
chamada de ilusão sinótica, ou seja, na ficção de que todos os fatos
relevantes são conhecidos por alguma mente e que é possível
construir, a partir desse conhecimento dos fatos particulares, uma
ordem social desejável. Às vezes essa ilusão é expressa com
tocante ingenuidade pelos entusiastas de uma sociedade
deliberadamente planejada, como ocorre quando um deles sonha
com o desenvolvimento da arte do pensamento simultâneo: a
capacidade de considerar ao mesmo tempo um número imenso de
fenômenos correlatos e de compor num único quadro os atributos
qualitativos e quantitativos desses fenômenos... (HAYEK, 1985, p.8)
136
Desta forma, os fundamentos da Economia Política estiveram presentes
em toda a trajetória das idéias de Gudin no período analisado, demonstrando seus
fundamentos e sua coerência ao tratar de diferentes assuntos, porém com a mesma
base argumentativa. Com isso observa-se que Gudin foi um representante da
Economia Política Clássica, no Brasil principalmente na segunda metade do século
XX. Por preservar os princípios do liberalismo clássico e por aplicá-lo em seu
contexto de forma a mostrar que sua teoria era global, que não se tratava de apenas
um projeto político econômico, mas uma ótica sobre o desenvolvimento econômico
da sociedade e das ações do homem.
5.3 A CONTRIBUIÇÃO DE GUDIN PARA A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA
A depressão que abateu a economia brasileira na década de 1930
criou uma nova realidade. Até esse momento, o Estado não intervia diretamente,
mas apenas garantia a operação do mercado. Com essa nova conjuntura houve um
aumento do interesse privado de controlar ou influenciar as ões do Estado que
agora acumulava mais uma tarefa, a de administrar a economia nacional. O rumo
que o governo deveria tomar beneficiaria determinados setores e interesses da
economia. Por trás desses interesses, grupos de economistas, empresários e
intelectuais se formavam e munidos de suas teorias, buscavam o apoio estatal para
a implantação de suas idéias. Nesse cenário surge à chamada tecnocracia, técnicos
no poder, seria uma nova forma de organização da sociedade, se admitia que a
economia pudesse passar a ser dirigida por técnicos através de teorias da
137
economia. Assim Gudin conseguiu influenciar economistas, que quando no poder,
puseram em prática as suas idéias liberais.
Um economista contemporâneo a Gudin que não somente foi
influenciado por Gudin, mas juntamente com ele, consolidou as idéias liberais no
Brasil fora Octávio Gouvêa de Bulhões. Desde 1926 estava ocupando cargos
administrativos no governo, mas se destacou no ministério da Fazenda nos
governos de Café Filho em 1954 e Castelo Branco 1964. Nesses dois momentos
Bulhões implantou em grande parte de suas medidas, ações que se fundamentavam
no ideário liberal de Gudin, como uma política monetária equilibrada e controle da
inflação suas grandes preocupações.
Ao falar de Gudin, para a revista Digesto Econômico, Bulhões diz que o
economista se dedicou ao ensino de Economia no Brasil sendo um dos
responsáveis pelos seus avanços, mas como grande lição Gudin deixara suas idéias
acerca do perigo da inflação. “A lição de Gudin sobre os subsídios deve ser
rememorada. O desconhecimento do custo inflacionário dos subsídios, muito
superior ao de sua supressão, conduz à insistência em mantê-los.” (DIGESTO
ECONÔMICO, 1986, p.6)
Alexandre Kafka (1979) foi assessor de Gudin quando esse fora
ministro da Fazenda em 1954. Kafka participou do IBRE (instituto Brasileiro de
Economia) que reunia economistas ligados a FGV que teve como fundador Gudin.
Kafka foi representante do Brasil no FMI por mais de três décadas iniciadas em
1949.
Alexandre Kafka concordou com grande parte dos economistas brasileiros
acreditando que Gudin fora o grande responsável pela modernização dos estudos
em Economia no Brasil. Pois o mesmo buscou em outras partes do mundo
138
influências que poderiam enriquecer e dar solidificação ao ensino em Economia.
Gudin foi um dos fundadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV), uma das mais
tradicionais universidades de economia que formou muitos dos economistas que
ocuparam e ocupam cargos importantes no governo e em setores de destaque na
economia brasileira.
A contribuição de Eugênio Gudin para o ensino moderno da
economia em nosso país tem sido múltipla e decisiva. Cabe
mencionar, em primeiro lugar, sua contribuição como professor da
Faculdade de Economia da (atual) Universidade Federal do Rio de
Janeiro e como autor, especialmente do livro sobre economia
monetária. Foi um dos primeiro livros de ciência econômica moderna
publicada no Brasil e, além de refletir o desenvolvimento científico
em outros países, trouxe contribuições teóricas e institucionais
originais. (KAFKA, DIGESTO ECONOMICO, 1986, p.19)
Outra contribuição de Gudin assinalada por Kafka se visualiza na
prática que o economista teve de conselheiro da economia brasileira, estando em
algum cargo blico ou não, a luta contra a inflação através de medidas ou de seus
artigos que criticavam as ações intervencionistas do Estado. Gudin sempre se
posicionara de forma ortodoxa e com o passar dos anos a influência do mesmo
sobre a economia nacional aumentou principalmente na década de 1980, quando
medidas contra a inflação começam a ser pensadas de forma mais contundente.
Eugênio Gudin teve uma contribuição tanto de conselheiro quanto de
executor para a economia nacional, mas talvez sua função principal
tenha sido como crítico que se impôs à opinião pública do país, e
através dela à política governamental. (KAFKA, DIGESTO
ECONOMICO, 1986, p.19)
Kafka também assinala o grande aporte que Gudin forneceu no quadro
internacional, em que teve importância destacada quando fora delegado brasileiro
139
na conferência de Breeton Woods, revelando-se posteriormente também um grande
negociador internacional, amenizando o problema da dívida externa que o país
ostentava na época. Nesse ponto Gudin influencia diretamente Kafka que ocupou
um dos cargos mais importantes para a política econômica internacional no Brasil,
representante do país no FMI (Fundo Monetário Internacional), Kafka demonstra em
suas ações elementos de influência Gudiniana.
Um dos economistas liberais de maior destaque apontado pela
historiografia também foi fortemente influenciado por Gudin, Roberto Campos foi um
dos mais relevantes discípulos das idéias Gudinianas, e isso foi demonstrado
quando Campos ocupou o Ministério do Planejamento em 1964 onde teve como
principal ação a contenção da inflação através da diminuição dos gastos públicos.
Para Ignácil Rangel, Gudin teria influenciado diretamente a elaboração da
Instrução 70 da Sumoc
14
de Oswaldo Aranha que elliminava o câmbio
subvencionado com um sistema de taxas múltiplas, facilitando assim as exportações
brasileiras, desencorajando as importações protegendo a indústria e a balança
comercial.
Sendo assim esses economistas que estavam intimamente ligados com a
vida política do Brasil foram uma amostra do grupo de economistas que fora criado a
partir da FGV
15
, uma instituição que salientou a história da Política Econômica no
Brasil e teve como um dos fundadores do curso de Economia o próprio Gudin.
A instituição que nasceu em 1944 no Rio de Janeiro fez da Economia
uma ciência respeitada no Brasil. Tendo como professores Eugênio Gudin, Octávio
Bulhões e Mario Henrique Simonsen a Fundação Getúlio Vargas (FGV) se tornou
14
Para aprofundamento da questão ver. BIELSCHOWSKY, Ricardo. Pensamento econômico
brasileiro: o ciclo ideológico do desenvolvimentismo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1995.
15
Para detalhamento sobre a Fundação Getúlio Vargas e sua ressonância no cenário político do Brasil, ver.
LOUREIRO, Maria Rita. Os economistas no Governo. Rio de Janeiro: FGV, 1997.
140
referência nacional para pesquisas, medição de índices, números da economia
nacional e formação de quadro profissional para a setor administrativo público e
privado. A fundação tinha muitos dos princípios que norteavam as idéias de Gudin,
principios ortodoxos que se preocupavam com o controle das contas públicas,
estabilidade de preços, respeito pelos contratos e propriedade privada e liberdade
de mercado.
A FGV se tornou referência para o Estado principalmente após o golpe
militar, quando vários de seus alunos e professores assumiram cargos de
responsabilidades que determinaram os rumos da economia nacional. Ações como:
a criação do Banco Central, a instituição da correção monetária, a diminuição de
crédito ações que contribuíram para a diminuição da inflação demonstravam os
princípios da FGV. Outro economista que esteve no cenário político foi Mario
Henrique Simonsen que assumiu ministérios na década de 1970 e chegou a ser
conselheiro do presidente Fernando Henrique Cardoso. A FGV portanto formou
vários ministros, assessores, administradores que ocuparam cargos em grandes
empresas públicas e privadas, importantes economistas. Uma escola que se tornou
um centro de debate sobre os problemas nacionais; nela, Gudin teve sua grande
contribuição para a sua formação e desenvolvimento.
5.4 A CONTRAPOSIÇÃO DE GUDIN AO CONSERVADORISMO
Observa-se em Hayek (1983) o conceito de conservadorismo, pois o
mesmo representa uma escola de pensamento da qual também fez parte Gudin, e
não por essa razão, mas também por ser Hayek um dos mais relevantes
estudiosos das questões filosóficas e conceituais do liberalismo. Na sua obra Hayek
(1983) focaliza as incompatibilidades entre o termo conservadorismo e as idéias do
liberalismo clássico, expondo então o seu conceito de conservadorismo.
141
Para Hayek o conservadorismo não oferece nenhum objetivo
alternativo, a primeira faceta desse conceito aponta que o
conservador tende a optar pela situação presente, não acreditando
em mudanças. “... o verdadeiro conservadorismo é uma atitude
legítima, provavelmente necessária, e com certeza bastante
difundida, de oposição a mudanças drásticas.” (HAYEK, 1983,
p.467).
Historicamente até o surgimento do socialismo, o oposto ao liberalismo
era o conservadorismo. O liberalismo surge de revoluções no pensamento, no modo
de conceber a economia e a política, sua gênese teve base na mudança. O
conservadorismo por sua vez, avesso a mudança, trabalha no sentido de barrar os
desdobramentos indesejáveis, muitas vezes naturais.
O sentido de estagnação também faz parte do conceito de
conservadorismo, que seria conservar algo existente. O liberalismo pretende
tomar um caminho, avançar e não estagnar, e para que isso aconteça os obstáculos
a essa evolução espontânea precisam ser tirados, pois sua defesa se pauta no
caminho natural da sociedade e do mercado. Nesse sentido reside uma grande
confusão acerca de Gudin, o mesmo trabalha, através de seu discurso, no sentido
de barrar as forças revolucionárias socialistas que ganhavam expressão no Brasil,
no início da década de 1960, portanto sua ação não fora de conservar algo que
existia, mas ter condições para que as mudanças continuassem ou pudessem de
fato existir. Sem a liberdade econômica não seria possível obter a evolução
espontânea do mercado que geraria o desenvolvimento.
Hayek ainda aponta que algumas instituições antigas não o
descartadas pelos liberais, só pelo fato de serem antigas, mas como no caso dos
Estados Unidos, essas instituições possuem uma razão de ser coerente aos
princípios da Economia Política clássica; igualmente, para Gudin era importante a
conservação do direito de propriedade privada, instituição necessária para a
evolução do mercado.
142
5.5 A CRENÇA NO PODER DAS MUDANÇAS
Outro elemento existente no conservador e que não se encontra no liberal
é o fato de que o liberalismo pressupõe a existência de coragem para se acreditar
nas mudanças não planejadas e de certa forma imprevisíveis. Na medida em que o
mercado funciona sob a influência da cadeia de valores e interesses de diferentes
indivíduos que formam a sociedade, o mesmo está alheio a mudanças que muitas
vezes o podem ser quantificadas por ser espontâneas, a certeza que se tem é
que o aumento de capital com um mecanismo eficiente de distribuição de
riqueza, porém não se tem um projeto para isso e sim acredita-se em determinadas
ações.
Com isso, chegamos ao primeiro ponto no qual as atitudes liberais e
conservadoras diferem radicalmente. Como muitas vezes os
escritores conservadores reconheceram, uma das principais
características da atitude conservadora é o medo da mudança, uma
desconfiança tímida em relação ao novo enquanto tal, ao passo que
a posição liberal se baseia na coragem e na confiança, na disposição
de permitir que as transformações sigam seu curso, mesmo quando
não podemos prever aonde nos levarão. (HAYEK, p.469).
Os conservadores tendem a utilizar os poderes do governo para
impedir as mudanças ou limitar seu âmbito, a medida de impor regras e planos que
ditam a vida econômica, aponta a busca de racionalizar o desenvolvimento, o que
acorreu nos governos desenvolvimentistas tanto no momento democrático quanto
após o golpe militar. Gudin ressalta o caráter do liberalismo clássico de ser um
143
pensamento que não se apresenta como uma ideologia, pois não tem um plano ou
projeto.
O chamado ‘capitalismo’ não é ideologia e muito menos mística.
Nunca foi planejado. Cresceu e se desenvolveu à medida das
necessidades, formando sistema através de uma longa série de
instituições, como preços de mercado, sistema bancário, letra de
câmbio, sociedade anônima, venda a prestações etc.
Do ponto de vista ideológico, tudo o que se pode dizer é que o
capitalismo tem conotações históricas e lógicas com a Democracia.
Ambos se filiam ao liberalismo, um pelo lado econômico, outra pelo
lado político. Sem liberdade não há livre iniciativa, nem, portanto
capitalismo. Sem liberdade não evidentemente democracia. No
Estado economicamente onipotente não lugar para as liberdades
políticas.” (GUDIN, 1970, p.49).
O conservador carece de ordem, de regras que aponte o caminho ou a
maneira. Não acreditam que o inesperado movimento do mercado e seus reflexos
podem trazer a ordem, não acreditam nas forças espontâneas. Sendo necessário
um grupo ou individuo que determine o caminho que a sociedade deve trilhar, sendo
assim o Estado o único munido de possibilidade racional para pensar as escolhas de
toda a sociedade.
Em última análise, a posição conservadora baseia-se no princípio de
que, em qualquer sociedade, indivíduos reconhecidamente
superiores, cujos valores, padrões e posições, sua herança espiritual,
precisariam ser protegidos, e que deveriam exercer maior influência
nos assuntos públicos do que os demais. Obviamente, o liberal não
nega que existam pessoas superiores; ele não é um defensor do
igualitarismo. O que ele nega é que qualquer um possa ter a
autoridade de decidir quem são essas pessoas superiores. Enquanto
os conservadores tendem a defender uma determinada hierarquia
estabelecida e pretendem que a autoridade proteja o status daqueles
que eles prezam, os liberais acreditam que não haja respeito por
valores estabelecidos que justifique o recurso ao privilégio ou ao
monopólio ou qualquer poder coercitivo do Estado para proteger
estas pessoas das forças da transformação econômica. (HAYEK,
1983, p.472)
144
5.6 A ÓTICA CONSERVADORA DO INTERVENCIONISMO
Uma das idéias principais existentes nos escritos de Gudin fora sua
discussão acerca do intervencionismo, o economista acredita que esse excesso de
autoridade dada ao Estado, que privilegia certos setores da economia, muitas vezes
não beneficia toda a sociedade. Por outro lado a iniciativa privada é movida por seus
interesses e por isso conhece bem suas necessidades, portanto detém o
conhecimento para fazer as mudanças para seu bem estar, o novo estaria intrínseco
ao caráter humano, as possibilidades aumentam, visto cada individuo buscar suprir
suas necessidades.
Este contraste se manifesta mais claramente nas diferentes atitudes
de ambas as tradições em relação ao avanço do conhecimento.
Embora o liberal não considere toda a mudança um progresso, ele
encarava o avanço do conhecimento como uma das metas principais
do esforço humano e confia em que lhe proporcione uma solução
gradual para os problemas e dificuldades que esperamos poder
resolver. Sem preferir o novo apenas por ser novo, o liberal está
consciente de que é da essência da realização humana produzir o
novo; e está preparado para conviver com o novo conhecimento,
goste ou não de seus efeitos imediatos. (HAYEK, 1983, p.474)
Tendo em vista o conceito de conservadorismo em Hayek, as idéias
desenvolvimentistas se encaixam mais a esse conceito do que as idéias liberais,
pois o desenvolvimentismo tributava ao Estado ser um grupo que detinha o
conhecimento o suficiente para decidir o melhor para uma sociedade.
O liberalismo concebe a realidade de não ter respostas para todas as
coisas e não busca explicações para todos os problemas sociais. A própria teoria se
145
baseia na idéia de que as instituições humanas o demasiadamente complexas,
para serem explicadas e entendidas através de uma serie de teorias e equações,
por isso as ações desse sistema liberal muitas vezes são invisíveis, como a
chamada “mão invisível do mercado”, pode-se compreender seus resultados, mas
não mapear seu processo, por ser espontâneo e natural.
Além disso, o liberal não se recusa a buscar o apoio de quaisquer
hábitos ou instituições não racionais que se revelaram válidos. O
liberal difere do conservador na disposição de aceitar esta ignorância
e de admitir que sabemos muito pouco, sem reivindicar uma
autoridade de origem supranatural do conhecimento sempre que sua
razão falhar. Deve-se admitir que o liberal, em alguns casos, é
fundamentalmente um cético - mas aparentemente é necessário
certo grau de desconfiança para deixar que os outros busquem sua
felicidade à sua maneira e para defender com coerência esta
tolerância, que é uma característica essencial do liberalismo.
(HAYEK, 1983, p. 476)
Sendo assim o liberal não impõe uma ideologia, não
militância por uma causa, sim uma defesa liberdade, uma
busca a oportunidade e possibilidade de funcionamento eficiente do
mercado. “... A tarefa do filósofo político é influenciar a opinião
pública e não organizar o povo para a ação...” (HAYEK, 1983, p.482)
Partindo do pressuposto conceitual de Hayek acerca do
conservadorismo, é importante observar-se a visão da historiografia acerca de
Gudin, que concebe o mesmo como um conservador, e como a conclusão do
presente trabalho possibilitou uma ótica divergente a respeito das idéias do
economista. Alguns pontos nas idéias de Gudin deram margem para que a
historiografia apontasse-o como conservador.
146
5.7 LIMITES DO CONSERVADORISMO IMPUTADO A GUDIN PELA
HISTORIOGRAFIA
Uma obra que fora muito lida nos últimos anos, de Elio Gaspari, “A
Ditadura derrotada”, aponta Gudin como conservador, por se aliar aos governantes
do Estado militar, após o Golpe de 1964. Gaspari considera Gudin reacionário, por
ser um dos intelectuais que vão justificar e apoiar o Golpe, buscando impedir uma
possível Revolução de cunho socialista, assim ele seria um conservador por buscar
manter a ordem que estava sendo ameaçada.
Como esta pesquisa demonstrou, existia uma razão maior para o apoio
de Gudin ao golpe de 1964 pois ele seria a possibilidade das idéias liberais
continuarem tendo a garantia de que instituições tão importantes como o direito de
acumular bens, iriam sobreviver àquela situação de crise política. A questão não era
ser contra as mudanças, mas era a permanência e sobrevivência de seus princípios.
O conservadorismo muitas vezes não possui princípios sólidos. O
conservadorismo pode muitas vezes representar um conceito útil e
prático, mas não nos proporciona nenhum princípio orientador capaz
de influenciar a evolução futura. (HAYEK, 1983, p.482).
Ainda sobre a questão do apoio de Gudin ao golpe de 1964, Caio
Navaro Toledo
16
em um artigo conceitua Gudin, como um economista “arqui-
conservador”, que demonstrou isso apoiando o governo militar.
Outro elemento que fez Gudin ser conhecido como conservador foram
suas idéias contra o processo de industrialização que se dava em fins da década de
1940, esse projeto, pautado no nacional-desenvolvimentismo, tinha como o promotor
dessa ação o Estado. Gudin não fora contra a industrialização, como o presente
16
O artigo recupera figuras que se destacaram no governo militar e como esses apoiaram as ações
desse governo. Artigo on-line, ver:<http://www.cfh.ufsc.br/~lastro/sociologia/memorial/espectros.htm>
147
trabalho apontou nos capítulos anteriores, mas era contra a maneira com que
estava se desenvolvendo essa indústria nacional. Um exemplo dessa concepção se
encontra em Ricardo Bielschowsky (1995)
17
, onde o mesmo afirma que Eugênio
Gudin foi o mais importante economista conservador brasileiro, e remete ao mesmo
o caráter de conservador por ser contrário a industrialização.
Outra obra de relevância para a historiografia das idéias se constitui na
obra de Guido Mantega (1987), onde o mesmo classifica Gudin como um pensador
conservador e liberal, também por sua oposição a industrialização. Mantega
descreve que o liberalismo de Gudin, que para ele era o expoente do liberalismo no
Brasil, não tinha nada de inovador, mas eram as mesmas questões colocadas a
séculos atrás, por outros liberais. Nessa perspectiva o caráter clássico da Economia
Política de Gudin é confundido como sendo algo antigo, então antiquado e
conservador.
Esses foram exemplos de apontamentos da historiografia que
conceberam Gudin como um conservador. Porém com base no fundamento teórico
e metodológico da presente pesquisa, se conclui que Gudin não era um
conservador, pois acreditava na teoria da Política Econômica Clássica, e através das
observações de Hayek, essa teoria é incompatível com o conservadorismo, pois
esse anularia a razão de ser, atinge os principais cernes do ideário liberal.
6. CONCLUSÃO
17
Para maior aprofundamento ver . BIELSCHOWSKY, Ricardo. Pensamento econômico brasileiro: o
ciclo ideológico do desenvolvimentismo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1995. A obra é considerada
uma das referências mais citadas na atualidade para a análise de questões acerca da história do
pensamento econômico no Brasil.
148
Como corolário do que foi exposto, este trabalho conclui sobre dois
pontos fundamentais; vejamo-los:
Primeiramente, a pesquisa concluiu que Gudin foi a própria economia
política clássica no Brasil do século XX e, como tal, ele ofereceu uma interpretação
da história brasileira analisando a economia enquanto algo inseparável da política, e
vice e versa. Nesta historicização das idéias de Gudin, portanto, foi possível
visualizar agrupamentos sociais confrontando-se em razão da defesa de seus
interesses. A anatomia econômico-política deste confronto é o próprio desenrolar da
história humana; para a sua aquilatação, sob a égide da Economia Política Clássica,
no momento de sua terceira geração pós-ricardiana, representada pela Escola
Austríaca, a obra de Gudin figura como completo manancial de pesquisa histórica.
O segundo ponto desta pesquisa foi a identificação dos limites da
imputação, feita pela historiografia, de uma espécie de conservadorismo aos escritos
de Gudin. Baseado especialmente no quinto capítulo, esta pesquisa reafirma a tese
de que um pensamento afeito a mudanças globais, a liberdade e a acontecimentos
incomensuráveis e imprevisíveis, não se coaduna em nem em um ínfimo com uma
concepção conservadora da história.
149
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
7.1 LIVROS
ABRAHÃO, C.M.S; DANTAS, J. A. M.; REIS, G. A . Gudin, Bulhões, Furtado:
matrizes do pensamento econômico brasileiro. Maringá: Eduem, 1999.
ABREU. Marcelo de Paiva. Contribuições de Eugênio Gudin ao Pensamento
Econômico Brasileiro. Literatura Econômica, 1984
BIELSCHOWSKY, Ricardo. Pensamento econômico brasileiro: o ciclo ideológico
do desenvolvimentismo. 2.ed. Rio de Janeiro: Contraponto, 1995.
BORGES, Maria Angélica. Eugenio Gudin: capitalismo e neoliberalismo. SP,
Bienal/Educ,1996.
BUTLER, Eamom. A contribuição de Hayek às idéias políticas e econômicas de
nosso tempo. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, Ed. Nórdica, 1987.
CAMPOS, Roberto. A lanterna na popa: memórias. Rio de Janeiro: Topbooks,
1994.
CARONE, Edgard. A república liberal: instituições e classes sociais ( 1945-1964).
São Paulo: Difel, 1985.
CONSELHO NACIONAL DE ECONOMIA, Exposição geral da situação
econômica do Brasil 1961. Rio de Janeiro: IBGE, 1962.
COUTO, Ronaldo Costa. História indiscreta da ditadura e da abertura. Brasil:
1964-1985. 3ºed. Rio de Janeiro: Record, 1999.
DELFIM NETTO, Antonio. Análise do comportamento recente da economia
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