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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
CLARITA EVELINE MORAES VARELLA
ESPIRITUALIDADE E INTEIREZA DO SER: UM PROCESSO DE
AUTOFORMAÇÃO NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA.
Porto Alegre
2009
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CLARITA EVELINE MORAES VARELLA
ESPIRITUALIDADE E INTEIREZA DO SER: UM PROCESSO DE
AUTOFORMAÇÃO NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA.
Dissertação apresentada como requisito para obtenção
do grau de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação
da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul.
Orientadora: Profa. Dra. Leda Lísia Franciosi Portal.
Porto Alegre
2009
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CLARITA EVELINE MORAES VARELLA
ESPIRITUALIDADE E INTEIREZA DO SER: UM PROCESSO DE
AUTOFORMAÇÃO NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA.
Dissertação apresentada como requisito para obtenção
do grau de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação
da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul.
Aprovada em 21 de janeiro de 2009.
BANCA EXAMINADORA:
___________________________________
Orientadora: Profa. Dra. Leda Lísia Franciosi Portal
______________________________________
Prof. Dr. Juan José Mouriño Mosquera
________________________________________
Profa. Dra. Maria Inês Côrte
RESUMO
Para o desenvolvimento da presente pesquisa foi delimitado um objetivo geral que
visou identificar as experiências formadoras de mestres e doutor que desenvolveram pesquisas
no âmbito da Dimensão Espiritual e da Inteireza do Ser no Programa de Pós-Gradução em
Educação da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul (PUCRS). Foram elencados como objetivos específicos: a)identificar, nas narrativas de
histórias de vida dos sujeitos entrevistados, relatos que, pela força de significação, foram
incorporados como experiências formadoras, sob o ângulo da aprendizagem; b) analisar como
as experiências formadoras se exteriorizaram durante o processo de formação dos
entrevistados; c) analisar como as experiências formadoras se desvelaram em suas próprias
pesquisas científicas, dissertações e tese. As questões norteadoras da pesquisa foram
propostas com a intenção de compreender se o processo individual e subjetivo de
autoformação aproxima o sujeito-pesquisador de quem é, e se suas experiências fundadoras
hologramaram o rumo de suas pesquisas científicas. A seleção dos cinco (5) sujeitos de
pesquisa foi por critério intencional: (4) dissertações e (1) tese, estruturadas a partir dos
estudos do Grupo de Pesquisa - Educação para a Inteireza: um (re)descobrir-se. Numa
abordagem qualitativa, a entrevista semiestruturada foi o instrumento de coleta de dados,
submetidos à análise textual discursiva de Moraes (2007), tendo respaldo teórico na
abordagem biográfica de formação de Josso (2004). Sua teorização implicou interlocução
empírica e teórica, e correspondeu às compreensões do pesquisador e dos pesquisados,
emergindo do estudo o seguinte enunciado - A ação traz intrinsecamente a consciência
potencial de experiências fundadoras do processo subjetivo que aproximam o sujeito de quem
é na investigação científica, respondendo ao problema que a pesquisa se propôs investigar: -
Como experiências formadoras de mestres e doutores se desvelam na investigação científica.
Palavras-chave:
Espiritualidade – inteireza do ser – experiências formadoras – autoformação.
ABSTRACT
For the development of this research a general aim was determinate to identify the
formative experiences of master and doctors who developed the search under the soul and
Spiritual Dimension of Being in a post-graduation Program in Education, Faculty of
Education of the Catholic University Rio Grande do Sul (PUCRS). Specific objectives were
listed as: a) identify, in the narratives of life stories of the subjects interviewed, reports that,
by virtue of meaning, were incorporated as training experiences, from the perspective of
learning, b) to analyze how the experience was educational for the training process of the
intervieweers c) examine how the experience was unveiled in forming its own scientific
research, dissertations and thesis. The guiding questions of the research were proposed with
the intention to understand the individual and subjective process of self-researcher
approaching the subject of who is, and if their experiences founding holograms the course of
their studies. The selection of five (5) subject to search was intentional criterion: (4) and
dissertations (1) thesis, structured from the studies of the Research Group - Education for the
whole: a (re) discover themselves. A qualitative approach, the interview was the semi-data
collection instrument, subjected to textual analysis discursive by Moraes (2007), and
theoretical support in the biographical approach of training Josso (2004). His theory implied
interlocution empirical and theoretical, and up to understandings of the researcher and
researched, emerging from the study follows - The action brings the intrinsically aware of the
potential of experience founding subjective process to bring the subject of who is in scientific
research, responding the problem that the search itself investigate: - How to experience
training of teachers and doctors are unveiling in scientific research.
Keywords:
Spirituality - wholeness of being - formative experiences - self.
Para ser grande, sê inteiro,
nada teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa,
põe quanto és,
no mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda brilha,
porque alta vive.
Fernando Pessoa
SENTIMENTO DE GRATIDÃO
É com profundo sentimento de gratidão que expresso em palavras minha reverência,
primeiramente à vida, dádiva divina, valendo-me da canção de Violeta Parra:
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me ha dado el sonido e el abecedário
con él las palavras que pienso y declaro
madre, amigo, hermano y luz alumbrando
la ruta del alma del que estoy amando ...
Sou grata a todas as pessoas que me inspiraram e iluminaram com suas presenças
minha vida. Agradeço de coração a coração todos aqueles que contribuíram
significativamente para que eu estivesse aqui hoje.
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me dio el corazón que agita su marco
quando miro el fundo del cérebro humano
quando miro el bueno tan lejos del malo
quando miro el fundo de tus ojos claros...
Abençoadas sejam as pessoas que fazem parte da minha vida; cada uma a sua maneira,
representa um elo singular. A singularidade de cada um é um pedaço da minha própria alma
que necessito escutar, compreender e integrar.
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me ha dado el oido que em todo su ancho
grava noche y dia grillos y canarios
martillos,turbinas,ladridos, chuvascos
y la voz tan tierna de mi bien amado...
Na caminhada em direção a mim mesmo segui por onde me levaram os meus próprios
passos, desenhando os pés na areia intocada, assumindo a autoria de cada pegada durante a
trajetória. A trilha a ser seguida sempre esteve onde deveria estar, o primeiro passo
desencadeou uma série de acontecimentos e em cada curva do caminho encontrei uma pessoa
que estava a minha espera.
Gracias a la vida que me há dado tanto
me há dado la marcha de mis pies cansados
com elos anduve ciudades, montañas y llanos
y la casa tuya tu calle y tu pátio...
Em cada encontro houve um pacto recíproco de confiança e no enlace das mãos seguia
uma mensagem de otimismo e perseverança que pretendo agora retribuir com a apresentação
da presente pesquisa Espiritualidade e inteireza do ser, um processo de autoformação na
investigação científica, principalmente no que ela representou para mim, ciente dos diferentes
olhares e compreensões.
Assim, é com profundo sentimento de gratidão que indistintamente bendigo a todos
que estiveram e continuam ao meu lado e dou graças por ter cumprido esta etapa de formação
do Mestrado no Programa de Pós Graduação da Faculdade de Educação da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS
Gracias a La vida que me há dado tanto
me há dado la risa e me há dado el llanto
asi yo distingo dichas de quebrantos
los dos materiales que formam mi canto
y el canto de ustedes que es el mismo canto
y el canto de todos que es mi próprio canto
Gracias a la vida.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES:
Figura 1 - Caligrafia Sanka Ketsujitsu: As flores caem e os frutos se formam......................69
SUMÁRIO
1 PONTO DE PARTIDA: INTERAÇÕES EM SI, DA LETRA FRIA DA LEI À
INTEIREZA DO SER E À ESPIRITUALIDADE - CONTEXTUALIZAÇÃO
DA PESQUISA. ..................................................................................................................... 10
2 CAMINHO PERCORRIDO: ENCONTROS ENTRE SUJEITO -PESQUISADOR E
SUJEITOS DA PESQUISA - PASSOS DA ABORDAGEM METODOLÓGICA. ........ 19
3 A DINÂMICA DA ESPIRAL: O OLHAR DO PESQUISADOR E A VISÃO
DOS TEÓRICOS ENTRELAÇADOS COM AS FALAS DOS SUJEITOS
INVESTIGADOS. ................................................................................................................. 26
3.1 A AÇÃO TRAZ INTRINSECAMENTE A CONSCIÊNCIA POTENCIAL DE
EXPERIÊNCIAS FUNDADORAS DO PROCESSO SUBJETIVO QUE APROXIMAM O
SUJEITO DE QUEM É NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA. ............................................ 28
4 PONTO DE CHEGADA: EXPERIENCIANDO A PRÓPRIA PESQUISA -
CONSIDERAÇÕES QUE NÃO SÃO FINAIS................................................................... 65
REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 70
ANEXO A - Termo de Consentimento Informado................................................................. 74
ANEXO B - Instrumento de Pesquisa: Entrevista Semiestruturada ....................................... 75
10
1 PONTO DE PARTIDA: INTERAÇÕES EM SI, DA LETRA FRIA DA LEI Á
INTEIREZA DO SER E ESPIRITUALIDADE - CONTEXTUALIZAÇÃO DA
PESQUISA.
O lidador jurídico assim ao mesmo tempo reflexivo e intuitivo somente
concilia o Direito legislado com a vida vivida porque antes disso se concilia
consigo próprio.
Carlos Ayres Brito, Ministro do STF.
Ao iniciar este trabalho de pesquisa, antes de buscar as respostas no outro, não poderia
deixar de olhar para mim. Para compreender o que me orientou até onde estou e me localizar
no espaço/ tempo do aqui-agora, reexaminei o pressupostos das minhas escolhas em um
processo autorreflexivo, com um olhar retrospectivo e prospectivo da minha trajetória
pessoal-profissional, buscando evidenciar as práticas formativas, aprendizagens e
experiências de vida.
A dinâmica desse processo visou identificar na minha trajetória de formação vivências
que se transformaram em experiências fundadoras e que pudessem desvelar pelo meu próprio
itinerário se existia certa coerência interna com a pesquisa ora desenvolvida. Na busca de
sentido no itinerário da minha singular caminhada, articulei os ciclos da minha vida, refiz os
laços comigo mesma em ligação com o outro e o meio, numa pluralidade de registros
autônomos e interdependentes.
Nesse processo autointerpretativo crítico de tomada de consciência da relatividade
social, histórica e cultural dos meus referenciais constitutivos da dimensão cognitiva da minha
subjetividade, busquei o fio condutor que orientou a minha formação originária, graduação
em Direito (1988- PUCRS), a especialização em Ciências Penais (2005 PUCRS) e que me
trouxe até a formação no curso de Mestrado em Educação do Programa de Pós-Gradução da
Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
11
Para melhor esclarecer esse fio condutor que me guiou até aqui, transcrevo parte do
excerto do memorial por mim apresentado durante o processo de seleção de ingresso no
Programa:
Ingressei na faculdade de Direito da PUCRS no ano de 1983. Durante o curso foi se
delineando meu caminho profissional, resultado da formação humanista.Foi muito
gratificante que no ano da minha formatura, em 1988, com o advento da
Constituição, foram erigidos a garantias constitucionais princípios protetivos dos
acusados que sempre nortearam a minha instrução acadêmica.
Iniciei a advocacia dedicando grande parte do trabalho a assistência judiciária
gratuita na área de direito de família.Em 1994 assumi uma função pública de
assessora jurídica que exerci por 10 anos e atualmente presto consultoria jurídica.
Paralelamente a minha carreira profissional, tenho atividades que desenvolvem a
minha sensibilidade e criatividade, tendo no ano de 1996 lançado um livro de
poesias: Palavras Mágicas, que na época fez parte de uma coletânea poética.
Cumpre transcrever mais um trecho, para maior esclarecimento:
Durante a minha trajetória de vida sempre desenvolvi alguma forma de arte,
atualmente me dedico à vivificação floral japonesa, a ikebana. A técnica floral que
aplico é da Academia Sanguetsu, idealizada no Japão por Mokiti Okada que nos
idos da década de 40 ensinava que o contato com uma obra de arte desperta a
sensibilidade e proporciona a elevação espiritual. Tenho um entendimento sobre a
espiritualidade neste sentido, compreendo de uma forma abrangente que diz
respeito a tudo, como uma forma integradora de olhar o mundo e refletir sobre o
significado de tudo que nos envolve.
Foi durante o curso de Especialização em Ciências Penais, ao conhecer o novo
paradigma da transdisciplinaridade, que vislumbrei a possibilidade de integrar
esta maneira diferente de olhar e vivenciar a realidade com sensibilidade e
criatividade na atividade profissional.
O excerto do memorial acima transcrito retrata muito aquilo que eu sou. Credito a essa
minha maneira de ser e ver o mundo a determinação de buscar a educação continuada como
autoformação, e isso fez com que estivesse numa posição de abertura e total entrega ao
universo. Conforme a visão quântica de Lima (2006), a minha realidade interna criou a
externa e as ondas de possibilidades se converteram em objetos reais. Foi quando, dentre as
múltiplas possibilidades e distintas probabilidades, na procura de informações a respeito de
mestrado em ensino superior via internet, selecionei o Programa de Pós-Graduação desta
Faculdade e me deparei com a disciplina oferecida - Seminários Avançados de Ensino ( SAE)
- Espiritualidade: desafio da inteireza do ser para além do profissional, e de imediato fiz a
matrícula como aluna especial.
Esse semestre que cursei a disciplina como aluna especial, foi muito gratificante,
porque encontrei amparo acadêmico para o entendimento que tinha da dimensão espiritual. O
12
aprofundamento do estudo sobre espiritualidade e inteireza do ser, em especial a leitura de
Wolman (2001) foi muito significativa, pois o autor sustenta que a consciência espiritual é
inerente ao ser humano, afirma que a espiritualidade não é uma consciência etérea e
sobrenatural, relegada a outro nível ou plano de existência, os reflexos têm implicações na
vida diária, ao fato de estar vivo, permeiam a nossa percepção do mundo em um contexto
maior de significado.
No semestre seguinte, em 2007, estava matriculada como aluna regular aprovada na
seleção do curso de formação do Mestrado no referido Programa. Foi quando comecei a fazer
parte do Grupo de pesquisa Educação para a Inteireza: um (re)descobrir-se. Este grupo de
pesquisa é originário dos Seminários Avançados de Ensino (SAEs) oferecidos no
PPGE/PUCRS, em nível de Mestrado e Doutorado que desde 1999 segue aprofundando
estudos sobre Espiritualidade e suas implicações no campo da Educação.
O grupo foi criado em 2002, com o objetivo de aprofundar estudos sobre a existência
e a importância da Inteligência Espiritual na constituição da Inteireza do Ser, numa proposta
de desvelar referenciais que delineiem assim novos rumos para a Educação. Desde então vem
desenvolvendo pesquisas, tendo eu participado da pesquisa denominada - O Despertar da
Inteireza: um pensar ousado, uma prática integrada para a importância e significado da vida
humana na gestão educacional de pessoas (2006-2008), contemplada com bolsa
FAPERS/CNPq. Participei da pesquisa realizada em sua segunda etapa na UNIRITTER
(2007), uma das três Universidades (PUCRS,UNIRITTER, UFRGS) em que o projeto foi
desenvolvido. Neste ano estão realizando a pesquisa na UFRGS.
Pessoalmente, analisando minha trajetória, percebo que as transformações em mim
ocorridas até então foram formativas, as tomadas de decisão no âmbito individual são
resultantes de uma ação socioambiental que concomitantemente numa circularidade
repercute no ambiente social. Depois de quase de vinte anos, resolvi voltar a estudar e a
escolha de cursar a Especialização em Ciências Penais no programa de Pós Graduação da
Faculdade de Direito da PUCRS foi uma retomada do fio condutor de estudo do processo
penal que havia deixado perdido desde a época de minha graduação em 1988. Hoje ao olhar
para trás, resta claro que esta retomada dos estudos, aos 40 anos de idade, ocorreu justamente
numa fase de profundo questionamento do sentido que estava dando a minha vida, tanto
profissional, como pessoal. Foi um momento importante de fortalecimento dos meus
13
referenciais existenciais e tomada de decisão de que, daquele momento em diante iria buscar,
por meio da formação, minha autoformação com realização pessoal e consequente
aperfeiçoamento profissional.
Durante o transcurso da especialização, em decorrência das leituras realizadas sobre o
pensamento complexo de Morin (2000) e transdisciplinaridade, em especial Nicolescu (1999),
percebi que era possível integrar a minha maneira de ser e vivenciar a realidade com
sensibilidade e criatividade na atividade profissional como um todo que se abre ao sagrado.
Nessa direção Nicolescu (1999, p.74) defende que: “A realidade engloba o sujeito, o objeto e
o sagrado”. O sagrado entendido como presença do ser no mundo, origem última de nossos
valores e que concilia a ciência e a consciência.
A transdisciplinaridade abre um espaço de diálogo entre os diferentes saberes que se
no cruzamento do plano vertical e horizontal, retoma o sentido da verticalidade do ser
humano no mundo que até então era olhado sob a dimensão horizontal, tendo dele sido
excluído o espírito e o mundo divino, intercruzando as tradições de sabedoria do oriente com
a ciência contemporânea do ocidente. Os desafios dos tempos atuais exigem do profissional
não apenas o conhecimento sólido do conteúdo da área em que é especialista, mas um
repensar de sua concepção de educação e de aprendizagem, seu sistema de valores, visão de
mundo e modo de viver. Neste sentido a chancela do Ministro do Supremo Tribunal Federal
Ayres Brito (2007,
p.75):
Por outro modo de dizer as coisas, sem afetividade a andar de braços dados com a
inteligibilidade não se chega ao ponto ômega da consciência e já não se tem a
garantia da efetividade do Direito-justo.Quer o Direito-justo a desatar dos
comandos adjetivos ou processuais ( sobretudo as chamadas garantias
constitucionais do processo), quer o Direito-justo a desabrochar dos preceitos
substantivos ou materiais ( especialmente os rotulados de “direitos fundamentais”
pelas próprias Constituições positivas). Esse o caminho para se fazer da melhor
regração em tese a melhor experiência cotidiana. Para relacionar por modo holístico
( unitário portanto) o dever-ser do Direito legislado e o ser das concretas decisões
judiciais.
É imprescindível a abertura do pensamento linear para a superação da visão
fragmentária, compreensão da complexidade do mundo presente e a própria compreensão do
sentido da vida. A racionalidade reconheceu o homem como sujeito epistêmico, mas
renegou-o como sujeito empírico, em nome do rigor científico da ciência moderna. O
conhecimento objetivo não admite juízo de valor, por isso a dicotomia entre sujeito e objeto.
14
Porém, a distinção epistemológica é paradoxal, uma vez que o objeto de estudo é tão homem
quanto o sujeito; sendo assim, fez uso de metodologias de pesquisa de distanciamento ou de
aproximação.
A distinção dicotômica entre sujeito e objeto começou a ser questionada nas ciências
sociais, passando as ciências naturais quando o desenvolvimento do conhecimento
materialista desencadeou o avanço tecnológico desordenado usando a exploração da natureza
como veículo de exploração do próprio homem. A reação de conhecimento idealista
reconheceu a natureza com os estudos na área da Biologia, Microfísica e Astrofísica.
Foi nas Ciências Físico-Naturais, com a Mecânica Quântica que se deu o anúncio do
retorno do sujeito ao ficar demonstrado que o ato de conhecimento e o produto de
conhecimento eram inseparáveis.
Santos (2002, p.52), mais de duas décadas, ao abordar a questão de que todo
conhecimento científico é autoconhecimento afirmou: Os pressupostos metafísicos, os
sistemas de crenças, os juízos de valor não estão antes nem depois da explicação científica
da natureza ou da sociedade. São parte integrante dessa mesma explicação”. E sustentou
que: “A explicação científica dos fenómenos é autojustificação da ciência enquanto fenômeno
central de nossa contemporaneidade. A ciência é, assim, autobiográfica . Merece destaque a
transcrição seguinte do mesmo autor (2002, p.53):
Hoje sabemos ou suspeitamos que as nossas trajectórias de vida pessoais e coletivas
(enquanto comunidades científicas) e os valores, as crenças e os prejuízos que
transportam são a prova íntima do nosso conhecimento, sem o qual as nossas
investigações laboratoriais ou de arquivo, os nossos cálculos ou nossos trabalhos
de campo constituiriam um emaranhado de diligências absurdas sem fio nem
pavio. No entanto, este saber, suspeitado e insuspeitado, corre hoje
subterraneamente, clandestinamente, nos não ditos dos nossos trabalhos científicos.
Mais recentemente, Santos (2002), ampliou e aprofundou a questão. Quando aborda a
Epistemologia das estátuas quando olham os pés: a ciência e o direito na transição
paradigmática, sustenta que: “A ciência moderna não é a única explicação possível da
realidade. Nada de científico na razão que hoje nos leva a privilegiar uma forma de
conhecimento baseada na previsão e controlo dos fenômenos. No fundo trata-se de um juízo
de valor.” (SANTOS, 2002, p.84). Afirma que a distinção entre sujeito e objeto é fruto da
15
incapacidade de estabelecer relação com o outro, corresponde à ignorância e ao colonialismo,
por isso transforma-o em objeto.
Ressalta, o mesmo autor (2002,
p.83), que O saber enquanto solidariedade visa
substituir o objeto-para-o-sujeito pela reciprocidade entre os sujeitos”. Defende que o
caráter autobiográfico do conhecimento-emancipação é assumido como: um conhecimento
compreensivo e íntimo que não nos separe e antes nos una pessoalmente ao que estudamos.”
((SANTOS, 2002, p.84). Sustenta que os protagonistas da própria revolução científica tinham
consciência de que suas convicções pessoais mantinham coerência com os estudos que
desenvolviam, citando o próprio Descartes, onde o autor do Discurso do método, afirmou que
iria mostrar o caminho que seguiu, estando sua vida ali representada, tal qual um quadro em
exposição. Neste sentido, Freire (2007,
p.32
) corrobora, merecendo transcrição:
A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de
algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como
sinal de atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital. o
haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que nos e pacientemente
impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que
fazemos.
O caráter autobiográfico, autorreferencial do conhecimento que não separa, mas
unifica sujeito e objeto, é enfatizado também por Morin (1997,
p.19
):
Um livro importante revela-nos uma verdade ignorada, escondida, profunda, sem
forma que trazemos em nós, e causa-nos um duplo encantamento, o da descoberta
de uma verdade exterior a nós, e o da descoberta de nós mesmos em personagens
diferentes de nós.
A autoformação, sob este ponto de vista, tem relação com o conhecimento de si
próprio, para tanto há que deixar emergir o ser que responde à pergunta inquietante Quem
sou eu?
A essência está no silêncio profundo do ser, a caixa do tesouro pode estar trancada e a
chave que ora possuímos, por vezes não contém o segredo para abrir. Porém, cada um possui
em si mesmo a capacidade latente e, no momento certo, vai deixar emergir da quietude à
habilidade necessária para compreender a si mesmo e encontrar as respostas de suas
inquietações.
16
Pineau (1988) considera a autoformação numa perspectiva de autonomização
educativa, como a apropriação do próprio poder de formação que cada um tem de regular,
orientar e gerir seu processo educativo. No texto a Autoformação no decurso da vida afirma
que a autoformação é uma terceira força de formação dependente da heteroformação,
ação
dos outros e a do meio ambiente, a ecoformação. Seguindo por essa linha, o que mais se
coaduna com aquilo que por ora entendo como autoformação, ressalvada a consciência do ser
em construção no processo de aprendizagem e o momento em que me encontro aqui e agora é
o entendimento de Pineau (1988, p.77):
A autoformação nas suas fases últimas corresponde a uma dupla apropriação do
poder de formação; é tomar em mãos este poder - tonar-se sujeito. Mas é também
aplicá-lo a si mesmo: tonar-se objeto de formação para si mesmo. Esta dupla
operação desdobra o indivíduo num sujeito e num objeto de um tipo muito
particular, que podemos denominar de autorreferencial. Este desdobramento alarga,
clarifica e aumenta as capacidades de autonomização do interstício, do intervalo, da
interface entre a hetero e a ecoformação que é, a princípio, o indivíduo. Cria-se um
meio, um espaço próprio, que oferece ao sujeito uma distância mínima que lhe
permite tornar-se e ver-se como objeto específico entre os outros objetos,
diferenciar-se deles, refletir-se, emancipar-se e autonomizar-se: numa palavra,
autoformar-se.
Sob este aspecto, a autoformação é um aprendizado com significado, é significante
porque desperta o interesse não com o sentido egocentrado, é algo maior, o signo que
impulsiona e move tem relação com o sentido e propósito da vida e a própria essência do ser.
Neste sentido, cumpre transcrever as precisas palavras de Rogers (1997, p.322):
Por aprendizagem significativa entendo uma aprendizagem que é mais do que uma
acumulação de fatos. É uma aprendizagem que provoca uma modificação, quer seja
no comportamento do indivíduo, na orientação futura que escolhe ou nas suas
atitudes e personalidade. É uma aprendizagem penetrante, que não se limita a um
aumento de conhecimentos, mas que penetra profundamente todas as parcelas da
sua existência.
Para Galvani (2002) a autoformação é um processo paradoxal que se alimenta de suas
dependências, é constituída pela tomada de consciência e de retroação sobre as influências
heteroformativas e ecoformativas. Esse triplo movimento de tomada de consciência e de
tomada de poder da pessoa sobre sua formação parece ser a base de uma definição conceitual
da autoformação. Não é possível pensar a autoformação sem articular o acoplamento
interativo pessoa/meio ambiente e a tomada de consciência reflexiva. A autoformação se
declina então em três processos de retroação: retroação de si sobre si (subjetivação), retroação
17
sobre o meio ambiente social (socialização) e retroação sobre o meio ambiente físico
(ecologização).
Na busca por conhecimento, o encontro é consigo mesmo, autoformação, essa relação
com a dimensão do ser traz em profusão o questionamento da própria abordagem da vida: -
qual o sentido e a finalidade que se está dando à vida? - qual é a parcela de cada um na
produção e na construção significativa do conhecimento? A pergunta inquietante
relativamente ao meu próprio percurso de formação, é a autojustificação ao desenvolvimento
da pesquisa -
Espiritualidade e inteireza do ser: um processo de autoformação na
investigação científica.
Assim, ao reexaminar os pressupostos das minhas escolhas em um processo
autorreflexivo, com um olhar retrospectivo e prospectivo da minha trajetória pessoal-
profissional, evidenciadas as práticas formativas e aprendizagens, concomitantemente com a
contextualização do tema, usando a linguagem jurídica que me é peculiar transmutada para
educação, mas mantendo o mesmo sentido, busquei identificar todo e qualquer indício e
vestígio que torne possível evidenciar aprendizagens que tenham relação com a pesquisa -
Espiritualidade e inteireza do ser: um processo de autoformação na investigação científica.
Diante do exposto, acredito que, usando uma expressão do direito, existe certa
verossimilhança entre minha singular caminhada e a presente pesquisa que são bastantes para
justificar a questão problema:
- Como as experiências formadoras de mestres e doutores se desvelam na
investigação científica?
Para o desenvolvimento da pesquisa foi delimitado um objetivo geral que visou
identificar as experiências formadoras de mestres e doutor que desenvolveram pesquisas no
âmbito da dimensão espiritual e da inteireza do ser no Programa de Pós-Gradução da
Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUCRS).Considerando a questão problema e tendo como meta alcançar o objetivo geral
foram determinados os seguintes objetivos específicos:
18
a) identificar, nas narrativas de histórias de vida dos sujeitos entrevistados, relatos que pela
força de significação foram incorporados como experiências formadoras, sob o ângulo da
aprendizagem;
b) analisar como as experiências formadoras se exteriorizaram durante o processo de
formação dos entrevistados;
c) analisar como as experiências formadoras se desvelaram em suas próprias pesquisas
científicas, dissertações e tese.
Estabelecidos esses parâmetros, o caminho percorrido foi delineado pelas questões
norteadoras da pesquisa e seguiu os critérios da abordagem metodológica adotada a partir dos
encontros realizados entre o sujeito pesquisador e os sujeitos pesquisados que serão
examinados a seguir.
19
2 CAMINHO PERCORRIDO: ENCONTROS ENTRE SUJEITO PESQUISADOR E
SUJEITOS INVESTIGADOS - PASSOS DA ABORDAGEM METODOLÓGICA.
Para penetrar no mundo pessoal dos sujeitos investigados, mestres e doutor do
Programa de Pós-Gradução da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (PUCRS) e trabalhar no universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores, atitudes e comportamentos foi utilizada a abordagem da pesquisa
qualitativa.
De acordo com Minayo (2002), a pesquisa qualitativa se preocupa com o nível de
realidade que não pode ser quantificado, trabalha com o universo de significados, motivos,
aspirações e atitudes, correspondendo a um espaço mais profundo das relações e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Conforme Bogdan;
Biklen (1994), para uma maior compreensão do comportamento e experiência humana, a
pesquisa qualitativa busca entendimento na observação empírica de eventos concretos. Assim,
complementa Engers (1994, p. 66), a perspectiva é penetrar no mundo pessoal dos sujeitos,
buscando a compreensão, o significado particular da ação das pessoas”.
As questões norteadoras da pesquisa foram propostas com a intenção de compreender
se o processo individual e subjetivo de autoformação aproxima o sujeito- pesquisador de
quem é, e se suas experiências fundadoras hologramaram o rumo de suas pesquisas
científicas. A reflexão foi centrada no momento presente como uma forma de experienciar o
que foi vivido durante o processo de formação. Como parâmetro foram elencadas as seguintes
questões:
1. Quais fatos marcantes que, pela força de significação, influenciaram os rumos de sua vida?
2. Como esses fatos repercutiram em tomadas de decisão reveladoras de posições
existenciais?
3. Identifique o fio condutor de sua trajetória de vida que se manteve presente durante o
período de formação do mestrado/doutorado.
20
4. Durante a sua formação, quais as vivências que se transformaram em experiências
fundadoras sob o ângulo da aprendizagem?
5. Na sua trajetória de vida, que valores, referenciais, ideários, experiências fundadoras
demonstram certa coerência interna com o tema da pesquisa realizada no
mestrado/doutorado?
6. Por que escolheu trabalhar o tema espiritualidade/inteireza do ser?
7. Como experienciou este momento da entrevista, autorreflexão retrospectiva e prospectiva
da sua vida? Por quê?
8. Considera a reflexão como uma forma de experiência em si? Por quê?
9. Depois desta entrevista, da autorreflexão, da partilha, considera o tempo presente como
fonte de experiência? Por quê?
Na seleção dos sujeitos de pesquisa para investigação, foi usado o critério intencional,
sendo escolhidas cinco (5) pesquisas: (4) dissertações e (1) tese na área de educação do
PPGE/PUCRS, estruturadas por participantes do Grupo de Pesquisa - Educação para a
Inteireza: um (re)descobrir-se, nos eixos:
a) Inteligência Espiritual: Parte da reflexão inicial das noções de Inteligência e de
Espiritualidade como dimensões complementares tendo, como pano de fundo, a cultura de
separação, dualidade e fragmentação que descura a dimensão da unidade original e inerente
ao ser humano- Dimensão Espiritual;
b) Inteireza do Ser: Estuda elementos constitutivos da abordagem integral do ser humano que
auxiliam o autoconhecimento e propiciam a autoformação, reconhecendo em si o Ser de
Inteireza que todos têm o potencial de vir-a-ser.
Intencionalmente, dentre as pesquisas selecionadas nessas temáticas do Programa,
estão a primeira dissertação de mestrado e a primeira tese de doutorado:
21
1. Inteligência Espiritual Ampliada e Prática Docente Bem Sucedida:uma tessitura que revela
outros rumos para a Educação (2003);
2. O desenvolvimento do ser humano na sua inteireza: uma proposta educativa possível (
2005);
3. A educação como processo do traduzir-se: o (re)descobrir da inteireza do ser. (2005);
4. Desvelando o perfil de espiritualidade: elo propulsor para ampliação dos propósitos e
objetivos de vida (2006);
5. Educação continuada: um olhar para além do espelho, iluminando mente, corpo, coração e
espírito do docente da educação superior ( 2006).
Salienta-se que pelos títulos enumerados pode ser verificada a autoria das respectivas
dissertações e tese, porém para o desenvolvimento da presente pesquisa a identidade das
falas dos sujeitos pesquisados está salvaguardada em conformidade com o termo de
consentimento firmado entre as partes.
O instrumento de coleta de dados escolhido para buscar informações sobre as
vivências significativas incorporadas como experiências formadoras, analisar a maneira de
ser e estar no mundo e compreender o respectivo processo de autoformação dos sujeitos
investigados foi a entrevista semiestruturada, delineada pelas questões norteadoras da
pesquisa, visando alcançar os objetivos estabelecidos na pesquisa para compreensão da
questão problema. Os encontros entre sujeito-pesquisador e sujeitos da pesquisa ocorreram
de forma presencial e individual, em conformidade com o termo de consentimento assinado,
sendo as entrevistas gravadas, posteriormente transcritas e analisadas. A intenção de usar a
forma de entrevista foi no sentido de propiciar aos sujeitos investigados a reflexão centrada no
momento presente como uma forma de experienciar o que foi vivido durante a formação no
mestrado e doutorado
Especificamente, em decorrência da minha formação originária em Direito, tenho a
peculiaridade de não me atrelar à exegese tão somente, pois a mera interpretação da letra fria
da lei não é suficiente; é necessário utilizar a hermenêutica para determinar o sentido e o
22
alcance das expressões do Direito. Cumpre trazer o entendimento de Maximiliano (1961,
p.13) da hermenêutica no âmbito do direito: “Hermenêutica jurídica tem por objeto o estudo
e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das
expressões de direito”.
Como conseqüência, a metodologia escolhida para análise dos dados foi a análise
textual discursiva de Moraes (2007), uma vez que é uma opção de análise de pesquisas
qualitativas com enfoque hermenêutico.
No dizer de Moraes (2007), a interpretação na análise textual discursiva é no sentido
de uma construção ou reconstrução teórica com uma visão hermenêutica de ressignificação,
partindo da perspectiva dos sujeitos envolvidos na pesquisa, de compreensões sociais e
culturais em um movimento dialético entre o todo e as partes relativamente ao fenômeno que
investiga. Salienta que tal perspectiva pressupõe conhecimentos tácitos e teorias implícitas do
pesquisador que possibilitam o surgimento de teorias emergentes originadas das
manifestações dos sujeitos da pesquisa.
O processo de análise, de acordo com a metodologia da análise textual discursiva de
Moraes (2007), partiu dos materiais submetidos à análise. O material que compõe o corpus”
da pesquisa é o resultante das entrevistas dos sujeitos investigados que foram devidamente
transcritas e configuradas em documentos escritos. Procedeu-se à leitura, envolvendo a
própria subjetividade do pesquisador ao interpretar os textos, identificar e destacar
enunciados significativos em um processo denominado de unitarização. Seguiu-se para a
categorização que é a organização do material anteriormente classificado em unidades de
análise. As unidades de análise foram destacadas sob a perspectiva das questões norteadoras
da pesquisa que têm como objetivo identificar, nas narrativas de histórias de vida de mestres e
doutor entrevistados, relatos que, pela força de significação, foram incorporados como
experiências formadoras, sob o ângulo da aprendizagem; analisar como se exteriorizam
durante o processo de autoformação e compreender como se desvelam na pesquisa científica.
A unitarização e a categorização encaminham o metatexto. No metatexto foi descrita a
categoria que emergiu do objeto de estudo e resultou em um grande enunciado emergente,
seguido da teorização que é a interlocução empírica e teórica. Conforme expressa Moraes
(2007, p.166),A metodologia da Análise Textual Discursiva é um caminho do pensamento
do pesquisador”.
23
A análise textual discursiva é composta de descrições, interpretações e argumentos
integradores. O movimento recursivo entre esses elementos constitui a teorização da proposta
a partir da pesquisa e pela qual novas explicações e compreensões são construídas e
expressas. O descrever e o interpretar conjuntamente somam esforços para expressar a
compreensão do fenômeno investigado; conforme Demo (2001), a extensão se descreve e a
profundidade requer argumentação.
Os documentos que compõe o corpus da pesquisa estão repletos de significados
identificados pelo pesquisador, o que remete a pensar no que Morin (2005, p.82) afirma:
Cada indivíduo é uno, singular, irredutível. Contudo é ao mesmo tempo duplo, plural,
incontável e diverso”. A complexidade do ser humano permite reconhecer que ao mesmo
tempo em que é múltiplo pela diversidade de idéias, concepções e aprendizagens, cada pessoa
aprende, reage e responde ao mundo de forma diferenciada, faz parte de uma unidade.
O mesmo autor, ao discorrer sobre a unidade plural da identidade pessoal, aduz que os
pais, os ascendentes estão presentes em cada ser, suas marcas estão nos genomas e a presença
dessa multiplicidade de seres está identificada no modo do comportamento pessoal, nos
hábitos mentais que sobrevivem além da morte da identidade. Sob o prisma da filosofia
oriental, cada ser, em sentido amplo, é um elo da corrente que une os antepassados e as
futuras gerações, formando uma existência individualizada no tempo, e em sentido restrito,
equivale a uma peça como a cunha, destinada a firmar a ligação entre os pais e os filhos.
Conforme ensinamento de Mokiti Okada (2003, p.109) representamos a síntese de centenas
ou milhares de antepassados e existimos na extremidade desse elo”. Assim, o ser humano
carrega uma multiplicidade de seres em si, sendo pontual a poesia de Fernando Pessoa:
...Como o panteísta se sente árvore e até a flor,
eu sinto-me vários seres.
Sinto-me viver vidas alheias, incompletamente,
como se o meu ser participasse de todos os homens, incompletamente de cada...
A realidade é multidimensional e multireferencial e os diferentes níveis o acessíveis
pela percepção: cada sujeito ressignifica de acordo com o que atribuiu em determinada
situação que experienciou e a multireferencialidade decorre das diferentes percepções.De
acordo com o percurso de vida, cada um faz a sua leitura do mundo, a partir de suas vivências,
características pessoais e sociais, fazendo com que situações, mesmo semelhantes tenham
24
significados diferenciados. Um dos depoimentos corrobora esse entendimento: eu sou esse
caldo de emoção, de razão, de espiritualidade, em todas as nossas áreas fogo, terra, ar e
água”.
Esclarece Randon (2000) que os níveis de realidade incluem a idéia de relatividade,
cada nível existe em si mesmo e abrange outra percepção que ilustra a mesma realidade sob
outro ponto de vista. Para compreender o outro e as complexas relações inseridas no contexto
a que pertence, seja social ou no próprio processo subjetivo de autoformação, é preciso
compreender a si mesmo. No âmbito do Direito, neste sentido o entendimento do Ministro
Ayres Brito (2007, p.71): “o lidador jurídico assim ao mesmo tempo reflexivo e intuitivo
somente concilia o Direito legislado com a vida vivida porque antes disso se concilia consigo
próprio.”
No diálogo com a realidade em que os sujeitos pesquisados estão inseridos, surge a
possibilidade de leitura e compreensão do livro que constitui suas vidas. Japiassu (1999, p.8)
sustenta que os saberes emergem de uma determinada cultura e afirma que: “ Para o homem,
o mundo é sua provocação, um lugar onde enfrenta desafios e testa experiências”. Para tanto,
torna-se imprescindível a abertura do pensamento linear, com a percepção do olhar que tudo
e na sua essência desvele um estado de espírito flexível, uma maneira de ser mais aberta,
capaz de apreender a complexidade, respeite o singular, ao mesmo tempo em que o insere em
seu todo. Segundo o mesmo autor (1976, p. 82), a compreensão do ser humano em sua
totalidade é fundamentalmente uma atitude de espírito, feita de curiosidade, de abertura,
de sentido da descoberta, de desejo de enriquecer-se com novos enfoques, de gosto pelas
combinações de perspectivas e de convicção levando ao desejo de superar os caminhos
batidos.”
Neste mesmo sentido complementa Juarroz (2000) ao afirmar que é impossível
compreender a menor das coisas sem ligá-la ao todo, pois para compreender uma voz é
preciso escutar todas as outras vozes. Os argumentos são fundamentados, tanto teórica como
empiricamente, numa construção de autonomia, capaz de manifestar a própria voz no
contexto de outras vozes.É um continuo vai-e-vem, entre idéias e retóricas, o pesquisador que
antes se fez observador, faz-se sujeito integrante do conjunto de materiais coletados e
absorvidos, numa fusão que não se sabe mais quem está falando.Tanto é assim que agora,
enquanto escrevo, digito as palavras e ordeno as frases, percebo na minha maneira de ser
25
similitudes ora com um, ora com outro, dentre os cinco entrevistados, ou por outro lado
reconheço em cada um aquilo que nos torna semelhantes.
Morin (2007, p.103) quando trata da ética de religação diz que “ O ser humano
percebe o outro como um eu simultaneamente diferente e igual a ele. O outro partilha assim
uma identidade comigo embora conservando sua diferença”.O pesquisador não é neutro ao
entrar em contato com seu objeto de pesquisa, pois carrega em si todo o saber que o constitui
como tal, pois é o pesquisador quem objetiva o estudo, na medida em que impregna-se do
tema direciona-o de acordo como seu olhar e os diferentes modos de leituras.
O seguinte trecho da fala de um dos sujeitos entrevistados a respeito do seu trabalho
confirma a impregnação entre o pesquisador e a própria pesquisa: foi um mergulho em mim
mesmo a partir das vivências dos outros, foi um processo de tu entender as pessoas como
inteiras e falta expressão pra dar conta da riqueza.” Sob este enfoque, o pesquisador não é
imparcial, cumpre ao sujeito-pesquisador, ao interpretar, justamente o papel de tecelão que ao
fiar vai entrelaçando os fios, buscando mediações e inclusões em si, tecendo relações para
sua própria tessitura.
Para a construção do metatexto foi necessário manter o olhar no foco da pesquisa e ao
mesmo tempo impregnado na visão do todo, como bem salienta um dos depoimentos:
depois da coleta de dados quando eu olhava aquilo tudo e agora o que eu faço com isso?
A gente tem uma idéia, mas ela é aproximada e as vezes uma aproximação pequena do que tu
tens pra fazer e de onde tu consegues chegar.” Assim, o seguinte enunciado emergiu como
uma grande categoria resultante da interpretação do teor das unidades de análise:
- A ação traz intrinsecamente a consciência potencial de experiências fundadoras do
processo subjetivo que aproximam o sujeito de quem é na investigação científica.
A construção do metatexto foi encaminhada a partir dessa grande categoria que
emergiu do objeto de estudo, sendo concomitantemente realizada a reconstrução teórica, o
processo de análise e de interpretação. A teorização implicou a interlocução empírica e
teórica, e corresponde às compreensões teóricas do pesquisador e dos sujeitos participantes
da pesquisa.
26
3 A DINÂMICA DA ESPIRAL: O OLHAR DO PESQUISADOR E A VISÃO DOS
TEÓRICOS ENTRELAÇADOS COM AS FALAS DOS SUJEITOS INVESTIGADOS.
Conforme Moraes (2005) no metatexto realiza-se a reconstrução teórica a partir do
processo de análise numa interlocução empírica e teórica das categorias emergentes. A
unitarização e a categorização encaminham o metatexto que por intermédio de argumentos
aglutinadores apresenta o argumento central. O primeiro passo do metatexto foi a descrição
da categoria que emergiu do objeto de estudo. O segundo, foi a interpretação e reconstrução
teórica a partir do processo de análise, ampliando teorias existentes ou construindo novas
visões avançando na compreensão do fenômeno investigado.
A teorização implica a interlocução empírica e teórica, uma vez que são formas de
validação da pesquisa. A teorização envolve teorias explicitamente assumidas ou de maneira
tácita correspondem a compreensões teóricas existentes por parte do pesquisador e dos
sujeitos participantes da pesquisa. O processo de análise textual discursiva é auto-organizado
na medida em que o pesquisador expressa suas construções sobre o fenômeno que investiga
integrando o comunicar com o aprender e o transformar.
A teorização emerge quando vai além dos olhares teóricos selecionados e
aprofundados na pesquisa do fenômeno, estabelecendo uma visão que tudo vê, tecendo pontes
e relações entre o próprio olhar do pesquisador, a visão dos teóricos entrelaçados com as falas
dos sujeitos investigados, vislumbrando o fenômeno investigado inserido na sua
autoformação. Assim, novas compreensões emergem da diferença de mundos dos sujeitos
pesquisados, do pesquisador e o referencial dos teóricos, numa dinâmica da espiral de
pensamentos.
As respostas dos sujeitos pesquisados que embasaram a categoria que resultou no
enunciado - A ação traz intrinsecamente a consciência potencial de experiências
fundadoras do processo subjetivo que aproximam o sujeito de quem é na investigação
científica - foram oriundas das questões da entrevista semiestruturada.
Salienta-se que a organização das idéias do pesquisador, dos interlocutores teóricos e
empíricos geraram novos conceitos que podem ter ficado implícitos nas entrelinhas do texto
para ser interpretados pelo leitor, pois não é possível explicitar todos os sentidos que se
27
imprimem na escrita, demonstrando assim a incompletude. Neste sentido, antes de passar para
a apresentação do enunciado emergente resultante da pesquisa que pretendeu responder à
pergunta Como experiências formadoras de mestres e doutores se desvelam na investigação
científica, deixo para apreciação a seguinte poesia de minha autoria, escrita em 1987, que
acredito condizente com o momento ora vivido e experienciado:
Superficialidade, profundidade;
o espelho d’água, o fundo do lago.
Impressões que se fundem,
realidades distintas.
O espelho da alma
quando se deixa ver,
reflete aquilo que somos,
deixa transparecer o que escondemos.
28
3.1. A AÇÃO TRAZ INTRINSECAMENTE A CONSCIÊNCIA POTENCIAL DE
EXPERIÊNCIAS FUNDADORAS DO PROCESSO SUBJETIVO QUE APROXIMAM O
SUJEITO DE QUEM É NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA.
A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes.
O que vemos não é o que vemos, senão o que somos.
Fernando Pessoa
No presente capítulo, propõe-se explicitar como o processo individual e subjetivo de
autoformação aproxima o sujeito-pesquisador de quem é ao analisar os relatos de vida de
cada um dos entrevistados, de maneira que seja possível vislumbrar - Como
experiências
formadoras de mestres e doutores se desvelam na investigação científica? Fazendo uso de
excertos das entrevistas dos sujeitos pesquisados numa dinâmica conjunta com o referencial
dos teóricos de uma maneira transdisciplinar, entendida a realidade conglobante entre o
sujeito, o objeto e o sagrado, foram intercruzados ensinamentos da filosofia oriental em um
processo de fusão com a perspectiva do pesquisador.
Na filosofia de Mokiti Okada (2003) existe um termo japonês izunome que significa
manter-se no centro, é simbolizado pela cruz equilibrada, a linha daijo representa o aspecto
horizontal da vida e a linha vertical shojo une o homem ao divino. Na presente pesquisa a
intenção foi de buscar o pensamento oriental e trazer para mente ocidental aquilo que é
universal, independente da tradição cultural ou religiosa, mantendo o espírito de izunome.
Revisitando experiências formadoras muito tempo antes de tornarem-se o que são
hoje e questionando qual o fio condutor que forma, conforma, reforma e transforma cada ser,
é possível entender a seqüência de fatos marcantes que pela força da significação
influenciaram os rumos singulares e plurais das vidas de mestres e doutor entrevistados, bem
como é uma forma de identificar onde cada um estava, onde está agora e para onde se
encaminha. A riqueza e diversidade das respostas dos sujeitos investigados alicerçaram o
enunciado emergente - A ação traz intrinsecamente a consciência potencial de
experiências fundadoras do processo subjetivo que aproximam o sujeito de quem é na
investigação científica - conforme passo a analisar.
29
Ressalta-se que as perguntas dirigidas aos cinco entrevistados constam do instrumento
de pesquisa em anexo. Cumpre esclarecer que o questionamento elencado na entrevista
semiestruturada está ancorado na abordagem biográfica de formação de Josso (2004,
p.47
):
A narrativa de formação dita “biografia educativa” (Dominicé, 1982,1984;
Josso,1986) permite, com efeito, trabalhar com um material narrativo constituído
por recordações consideradas pelos narradores como experiências significativas de
suas aprendizagens, da sua evolução nos itinerários socioculturais e das
representações que construíram de si mesmos e do seu ambiente humano e natural.
Frise-se que a visão retrospectiva é uma presença atenta no agora com a intenção de
extrair o que pode ter contribuído para sua própria formação e reconhecer os elos que deram
forma ao ser que hoje cada um é. Para tanto, é importante trazer o entendimento de
experiência formadora, da mesma autora (2004,
p.48
):
O conceito de experiência formadora implica uma articulação conscientemente
elaborada entre atividade, sensibilidade, afetividade e ideação. Articulação que se
objetiva numa representação e numa competência. É nesse ponto que convém
ficarmos atentos à importância da escala com a qual está relacionada a experiência
em questão.
Na entrevista, a disponibilidade de ouvir o outro para compreender o significado
profundo do que está sendo dito e o que subjaz àquilo que foi expressado pelo sujeito
investigado acrescenta, enriquece e transforma o sujeito pesquisador. Rogers (1983)
corrobora para a abordagem biográfica da formação de Josso, embora sob outro viés, quando
trata da abordagem centrada na pessoa e a questão da escuta ativa. O mesmo autor
esclarece que não na relação terapeuta-paciente, mas entre pais-filhos, professor-aluno, ou
em qualquer relação: este tipo de escuta ativa e sensível é extremamente raro em nossas
vidas. Pensamos estar ouvindo, mas muito raramente ouvimos e compreendemos
verdadeiramente com real empatia” (ROGERS, 1983, p.39).
Durante as entrevistas realizadas, a escuta desencadeou aprendizagens recíprocas. O
sujeito investigado quando se sente ouvido, acolhido, aceito e considerado, suas respostas
fluem e o fluxo de suas experiências internas propicia o crescimento tanto do entrevistado,
quanto do sujeito pesquisador, vez que esse movimento de partilha ocasiona transformações
em ambos. Conforme Rogers (1983, p.5), a escuta profunda é como ouvir a música das
estrelas , pois por trás da mensagem imediata de uma pessoa, qualquer que seja essa
30
mensagem , há o universal”. De acordo com o autor, aquilo que é pessoal é o que há de mais
geral, uma expressão íntima encontra eco nas mais diversas pessoas “ aquilo que há de único
e de mais pessoal em cada um de nós é o mesmo sentimento que, se fosse partilhado ou
expresso, falaria mais profundamente aos outros” (ROGERS, 1983, p31).
Assim, o autor sinaliza a perspectiva singular-plural que ancora a dialética do eu e do
nós presente nas narrativas de historia de vida, no sentido de vislumbrar o universal e o geral,
a história social a partir do singular e particular, da história individual. Neste sentido,
complementa Morin (2005, p. 75) ao afirmar: cada indivíduo vive e experimenta-se como
sujeito, essa unicidade singular é a coisa humana mais universalmente partilhada”.
Dentre os sujeitos pesquisados, um entrevistado antes de responder à primeira
pergunta (Quais fatos marcantes que, pela força de significação, influenciaram os rumos de
sua vida?) avalia o momento em que se encontra e afirma se tu me perguntasses isso um
tempo atrás, certamente seriam outros, porque a gente é como um rio, nunca é o
mesmo”.Este excerto em poucas palavras traz elementos capazes de descrever a ótica com
que este sujeito visualiza a vida, como um movimento contínuo. O teor dessa fala aborda
uma questão de fundo do filósofo grego Heráclito de que nada permanece estático, tudo flui
tal qual a água de um rio. Afirmava o filósofo que não se pode entrar duas vezes no mesmo
rio, na segunda a água não será a mesma e a própria pessoa estará diferente.
Os orientais abordam muito este aspecto. Merece citação o ensinamento da filosofia
de Mokiti Okada (2003, p.58) que diz Todas as coisas se movem. Tudo está em eterno
movimento. Nós não somos os mesmos de ontem, nem mesmo o que fomos cinco minutos
atrás; o mundo de ontem não é o mesmo de hoje.”
Damásio (2000) esclarece, sob o enfoque da neurobiologia, esta questão filosófica
quando aborda a questão do transitório e do permanente no fluxo da consciência. Explicita
que o self biográfico baseia-se no repositório de memórias de fatos significativos da
biografia individual, propicia continuidade e uma aparente permanência, enquanto o self
central é transitório, efêmero, renasce e continuamente é refeito, mas não muda, ao dispor
que:
31
Nossas atitudes e nossas escolhas são, em grande medida, conseqüência da
“ocorrência de individualidade” que os organismos preparam sob a inspiração de
cada momento. Não surpreende, pois, que possamos variar e vacilar, sucumbir à
vaidade e trair, ser maleáveis e volúveis. (DAMÁSIO, 2000p.288).
A seguinte fala de um dos sujeitos investigados expressa esse movimento: “me
considero uma pessoa flexível, tenho facilidade para me adaptar às mudanças, capacidade de
fazer as voltas junto com a mudança, me transformando, nunca parei”. A transitoriedade está
na natureza das coisas, Varela (2000) ao bordar a experiência do agora como base da análise
fenomenológica e a neurociência cognitiva afirma que a fonte principal do ato reflexivo é
tomar consciência da experiência temporal como fluxo imanente. La temporalidad
inmanente verdadera es la de las experiências vividas mismas. Aquí llegamos a lo que puede
percibirse correctamente como la segunda aporia de la temporalidad: la coexistencia de la
permanencia y el cambio.” (VARELA, 2000, p.344).
No mesmo sentido, Freire ( 2007, p.50) é bem categórico quando afirma na verdade,
o inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência vital. Onde vida, há
inacabamento.”
O aspecto da mudança, transformação e flexibilidade trazida por este sujeito
pesquisado específicamente vai permear todas as outras falas dos entrevistados, uma vez que
a incerteza é o alicerce do pensamento complexo, ora assumido de forma mais explícita, ora
mais sutilmente. Morin (2007, p.69) sentencia que estamos condenados ao pensamento
incerto, a um pensamento trespassado de furos, a um pensamento que não tem nenhum
fundamento absoluto de certeza”. Defende que sob certo aspecto a complexidade devido à
multidimensionalidade e solidariedade tem aspiração pela completude. Por outro lado afirma
que a complexidade tem a consciência de que não se pode escapar à incerteza.
O seguinte recorte da fala de um dos entrevistados retrata: “eu faço um rolo só, a
minha aula é assim, é o todo. Por outro lado quando eu penso nisso, quanto mais eu quero
focar, eu vejo o quanto o todo me toma, como eu o consigo ser essa coisa fragmentada.”
Este aspecto remete ao desejo de inteireza salientado por Roger (1983) quando aborda a
complexidade e as características das pessoas do futuro:
32
Estas pessoas não gostam de viver num mundo dividido em compartimentos
corpo e mente, saúde e doença, intelecto e sensação, ciência e senso comum,
indivíduo e grupo, sanidade e insanidade, trabalho e lazer. Lutam pela totalidade da
vida , onde o pensamento, o sentimento, a energia física, a energia psíquica, a
energia térmica, estejam integrados à experiência. (ROGERS, 1983, p.130).
O pensamento complexo surgiu na lacuna do pensamento simplificador, integra o
modo simples de pensar sem fragmentar, mutilar, reduzir, controlar e pretender dominar o
real de forma unidimensional. Por muito tempo, o conhecimento científico seguiu o
paradigma da simplificação dissipando a aparente complexidade dos fenômenos, porém, ao
pretender revelar a ordem simples, desintegrou a complexidade do real. Distinto do
pensamento disjuntivo que separa, isola e oculta, o pensamento complexo pretende articular,
aspirando ao conhecimento multidimensional, reconhecendo a incompletude e a incerteza. O
depoimento seguinte assim retrata:
Para dar aula eu não consigo fazer os meus planos de aula hoje eu vou sentar e
fazer meus planos de aula a25 de outubro, não consigo, eu tenho que a cada
dia que eu volto, repensar, encaminhar, o consigo fazer igual, a matéria é a
mesma , a disciplina é a mesma, mas os alunos são diferentes. Não sou criativa
para arrumar minha casa, para desenhar, para o lado artístico, o desenvolvi
ainda, mas eu gosto de ser criativa quando escrevo e quando eu dou aula.
Descartes ao separar o sujeito pensante ( filosofia) do objeto ( ciência) e evidenciar o
pensamento disjuntivo promoveu grandes progressos no conhecimento científico e na
reflexão filosófica, mas isolou a Física, a Biologia e a Ciência do homem. O pensamento
simplificador não concebe a conjunção do uno e do múltiplo, ou unifica anulando a
diversidade, ou sobrepõe a diversidade sem conceber a unidade. É incapaz de conceber a
complexidade da realidade antropossocial em sua microdimensão ( ser individual) e na
macrodimensão ( humanidade planetária).
A idéia de complexidade estava presente na dialética de Hegel, quando introduzia a
contradição e a transformação na identidade. No século XIX, na microfísica e na macrofísica,
na relação complexa entre observador e o observado, e mais ainda relativamente à partícula
elementar que ora aparece como corpúsculo, ora como onda a complexidade já se fazia
presente. Entretanto, somente com a cibernética a complexidade foi admitida na ciência, na
relação com os fenômenos de auto-organização. O teorema de Gödel demonstra que num
sistema formalizado de lógica matemática existe uma proposição que é indecidida e que o
33
torna incerto. correspondência entre a perspectiva da teoria do sistema aberto e o sistema
cognitivo pela proposição indecidida do referido teorema.
A dualidade sujeito e objeto marcou a ciência ocidental, entretanto existe objeto
em relação a um sujeito, e um sujeito em relação a um meio ambiente objetivo, são
indissociáveis mas livres, constitutivos um do outro, porém não resultam numa via
unificadora e harmoniosa, pois não escapam à incerteza generalizada porque, assim como na
microfísica o observador perturba o objeto, o objeto perturba a percepção do observador. É
uma concepção aberta da relação complexa do caráter insuficiente e incompleto, desprovida
de um princípio de decidibilidade tanto do sujeito, quanto do objeto. A complexidade não é
apenas um fenômeno quantitativo relativamente as interações e interferências entre um
número muito grande de unidades de um sistema auto-organizador que desafiam as
possibilidades de cálculo, mas tem relação com o acaso, a incerteza, com certa mistura de
ordem e desordem. Neste sentido o teor do depoimento deste entrevistado:
Não consigo ficar no quadradinho, no linear, eu não consigo ficar reta. Para
algumas coisas eu me considero conservadora, mas, por outro lado, eu gosto muito
do inusitado, do diferente; por exemplo, eu não gosto de sapato do senso comum, eu
gosto de sapato diferenciado, cada um tem seu estilo, não sigo o padrão.
O pensamento complexo pretende resgatar a idéia da unidade complexa mais além do
reducionismo e do holismo, liga o pensamento analítico-reducionista e o pensamento da
globalidade numa dialetização, não destrói alternativas clássicas, não oferece solução monista
como se fosse essência da verdade, mas os termos alternativos tornam-se antagônicos,
contraditórios e ao mesmo tempo complementares numa visão mais ampla e aberta.
O pensamento simplificador tem como base duas operações gicas: a disjunção e a redução.
Os princípios do pensamento complexo são de disjunção, de conjunção e de implicação. O
princípio hologramático vai além do reducionismo que as partes e do holismo que
o todo. Para Morin (2007), um todo é mais do que a soma das partes que o constituem; o todo
é menor do que a soma das partes e é ao mesmo tempo mais e menos do que a soma das
partes.
A própria idéia hologramática está ligada à idéia recursiva. O princípio da recursão
organizacional rompe com a idéia linear de causa/efeito, tudo o que é produzido(efeito) volta-
se sobre o que produz (causa) num ciclo autoconstitutivo,auto-organizador e autoprodutor que
34
está ligada, em parte, à idéia dialógica. O sistema auto-eco-organizador tem sua
individualidade autônoma e dependente das trocas e relações com o exterior, o meio ambiente
está em seu interior, abarca em si o ambiente externo.O princípio da auto-eco-organização
tem valor hologramático.O princípio dialógico mantém a dualidade na unidade, associa dois
termos ao mesmo tempo complementares e antagônicos
A existência do sujeito está ligada ao princípio de incompletude, o ser humano não se
reduz à singularidade morfológica ou psicológica, mas um entrelaçamento de componentes
múltiplos, além de um caráter existencial que leva em si a fragilidade e a incerteza da vida, da
própria existência entre o nascimento e a morte. A noção de sujeito associa noções
antagônicas, não é possível pensar o sujeito sem ambivalências, incompletudes, incertezas e
insuficiências. Morin (2006) afirma que é ilusória a noção de estabilidade da identidade,
porque conforme o humor, paixão, temos uma multiplicidade de personalidades. Outra
característica do sujeito humano, está ligada à linguagem e à cultura, sendo a consciência de si
inseparável da autorreferência e da reflexão. A noção de sujeito tem sentido num
ecossistema ( natural, social, familiar, etc.), mais amplamente num mundo aberto ( que o
conhecimento não pode preencher) e deve ser integrada num metassistema, uma teoria em
que o sujeito e o objeto possam integrar-se um ao outro. A seguinte fala retrata este aspecto:
Não tem como separar, a professora, a mãe , a filha; eu não consigo, e talvez esse
seja um problema, porque, de certa forma, a gente foi criada para focar e eu fiz um
esforço pra desfocar, a vida organizada é mais fácil, isso eu lido com a professora
de português, isso com a de matemática, isso é no banco, na escola, no comércio
.
Outra preliminar a ser enfrentada diz respeito à transdisciplinaridade, foi levantada de
forma expressa por alguns sujeitos investigados, porém está implícita em todos os
depoimentos dos entrevistados. Nicolescu (1999) dispõe que a finalidade da
transdisciplinaridade é a compreensão do mundo presente, da complexidade, defende que
qualquer disciplina pode ser animada pela atitude transdisciplinar, a metodologia permanece o
que é, mas é fecundada pelo espírito transdisciplinar: “Na base de todas as disciplinas, há um
olhar transdisciplinar que lhes sentido sentido. Pois nas profundezas de cada
disciplina encontra-se o sem-fundo daquilo que liga o sujeito e o objeto transdisiciplinares”
(NICOLESCU,1999,p.125). O mesmo autor defende que:
35
A transdisciplinaridade, como o prefixo “trans” indica, diz respeito àquilo que está
ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de
qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, para o qual
um dos imperativos é a unidade do conhecimento (NICOLESCU,1999,p.46).
No seguinte excerto, o entrevistado assim expressa:
Não consigo viver no paradigma, não consigo ter a mesa que eu trabalho
organizada porque é naquela mistura de papel, no desorganizado que eu me
encontro, na minha casa eu não consigo ter as coisas arrumadinhas na prateleira,
eu tenho que estar no meio do todo para poder estar trabalhando.
Um dos precursores no estudo da interdisciplinaridade no Brasil, Japiassu (1976),
defende a necessidade e a urgência na promoção do desenvolvimento no ensino e na pesquisa
de um espírito transdisciplinar ou, pelo menos, de valorização dos conhecimentos
interdisciplinares para uma reforma do pensamento e da educação. Segundo o autor, a
interdisciplinaridade é algo a ser vivido, enquanto atitude de espírito:
A interdisciplinaridade é fundamentalmente uma atitude de espírito, feita de
curiosidade, de abertura, de sentido da descoberta, de desejo de enriquecer-se com
novos enfoques, de gosto pelas combinações de perspectivas e de convicção
levando ao desejo de superar os caminhos já batidos. (JAPIASSU,1976, p. 82 ).
Sob este enfoque, a transdisciplinaridade é, simultaneamente, um corpus de
pensamento, um estado de espírito, uma maneira de ser, uma visão e atitude em uma
experiência vivida. Outro sujeito investigado enfatiza que:
Não foi à toa que eu fui para transdisciplinaridade: é que eu sou uma pessoa que
está sempre enfiando uma coisa dentro da outra, eu relaciono a minha aula de
metodologia de pesquisa com alguma coisa que eu vivenciei na meditação da yoga
e tem a ver com algo do meu dia- a- dia, por exemplo o meu aquecedor de
passagem que estragou etc.
Japiassu (1999) sustenta que os saberes emergem de uma determinada cultura e a
abertura de espírito permite tomar consciência da relatividade destes saberes: “ Para o
homem, o mundo é sua provocação, um lugar onde enfrenta desafios e testa experiências. Por
isso, em seu processo de aprendizagem, deve exigir que seja dada tanta importância à
compreensão quanto à produção do saber” (JAPIASSU, 1999, p.8). Segue neste sentido a
fala do seguinte entrevistado:
36
Eu saí do sistema, a escola está atrelada a políticas e eu ficava tolhida de criar. Eu
sempre fui uma professora totalmente diferente do tradicional eu nunca quis ser
tradicional, queria ser o diferente, marcar a diferença, propor experiências novas,
nunca tive medo de mudança, na minha vida foram várias mudanças. Isso também é
uma característica, esse valor de mudança é muito forte.
Ultrapassadas essas questões de fundo preliminares, transformação, mudança,
inacabamento, incompletude, incerteza, complexidade e transdisciplinaridade, passo à análise
e interpretação das respostas que emergiram da primeira questão da entrevista semi-
estruturada, constante do instrumento de pesquisa em anexo. Um dos entrevistados não elenca
fatos significativos que tenham influenciado os rumos de sua vida, considera marcante a
influência da família como um todo “no percurso da vida, de certa forma a gente traz aqueles
valores de onde a gente foi criado, aquilo que foi se ratificando ou se retificando na medida
das experiências”.
Analisando os depoimentos verifica-se que a maioria dos entrevistados tem a mãe
como uma referência forte e definidora. No seguinte excerto do depoimento de um dos
sujeitos investigados o entrevistado afirma que tem uma alma de pesquisador e atribui essa
característica à influência materna que, enquanto educadora, incentivava os filhos irem em
busca de respostas:
Sempre corri muito atrás de respostas que me dissessem quem eu sou e o que eu
estou fazendo aqui, qual é o meu papel nesse filme; sempre acreditei, antes por uma
religiosidade imposta familiar, a questão católica, que todo mundo tinha uma
missão e então eu achava que ninguém passava em branco, ninguém passava sem
deixar uma marca, ninguém conseguia ter uma neutralidade, isso não importava se
ia repercutir num oscar, no lançamento de um livro ou para tua vizinha do lado e,
no meu caso, para um grupo de alunos. Essa inquietação é uma herança materna.
Um dos sujeitos investigados tem a mãe e o pai como referências, declara que a figura
paterna tem uma forte influência em virtude do fato de sua origem ser humilde e ter vencido
na vida como empresário sem ter completado o ensino fundamental. Aponta, como uma
característica significativa do pai, a força vital, enfatiza que ele passou por um câncer e
conseguiu superar”. Por outro lado, afirma que tem a mãe como modelo, certinha,
organizada e acredita que esses dois lados são complementares:
37
Eu tenho o jeito empreendedor do meu pai de crescer, batalhar, acreditar, vencer o
impossível. Junto com isso tem o outro lado da minha mãe, de fazer correto,
adequado, bonito, perfeito, com valores, ética, moral, respeito ao outro, de cumprir
a palavra, do horário, estas questões sempre estiveram muito presente na minha
vida.
Com mais ênfase do que os demais entrevistados, outro sujeito investigado aponta a
maternidade como fator marcante em sua vida.Considera a maternidade uma questão muito
significativa na relação com o filho, assim afirmando:
Isso sempre foi uma coisa importante quando eu olhava pra minha vida e dizia - o
que eu vim fazer aqui ? Dizia tenho plena certeza que eu vim pra ser mãe, mas eu
não vim pra ser aquela e que é uma abnegada, se desvencilha da sua própria
vida pra viver a vida do filho, o é essa a minha idéia de mãe, mas sem dúvida
filho é uma coisa que modifica toda a existência da gente não tem como tu ser a
mesma depois de ser mãe.
Este sujeito investigado faz uma relação entre a maternidade e o ser professor na
experiência que tem ao trabalhar com ensino médio, por entender que nessa faixa etária a
relação é de crescimento mútuo:
o professor caminha junto, de certa forma orienta, segura as
pontas faz a rede de proteção, está ali pra fazer esse papel. Tenho experiências com alunos que
pelas tantas do nada, eles estão me contando a vida, pedindo orientação”.
Outro entrevistado, enfatiza o período da gravidez, relata que durante o primeiro ano
da pedagogia engravidou, declara que “a gravidez deu uma segurança maior, mais facilidade
pra aprender, foi quando eu desabrochei”. Os demais sujeitos da pesquisa elencaram fatos
ocorridos na infância, adolescência e na maturidade como significativos. Como bem salienta
um entrevistado no seguinte excerto “teria que começar pra te responder isso voltando um
pouco no tempo”. A fala deste sujeito pesquisado retrata o que Josso (2004) defende quando
aborda a questão da importância de observar o valor atribuído ao que é vivido na continuidade
temporal de perceber que algumas vivências têm uma intensidade maior, para tanto se exige
um certo trabalho reflexivo sobre o que se passou e sobre o que foi observado, percebido
e sentido.” (JOSSO , 2004, p.48).
Este entrevistado em seu depoimento relata que quando era adolescente fazia parte de
um grupo de voluntários que prestavam assistência aos jovens. Disse que considera este fato
significativo porque sentia-se muito bem sendo útil de alguma forma, merecendo destaque a
expressão que usou isso me gratificava muito, me enchia a alma”. A riqueza de trabalhar
38
com narrativas de histórias de vida é perceber a singularidade da trajetória de cada sujeito
investigado que, ao mesmo tempo, se torna plural ao observar que todos os investigados, de
alguma maneira, apontaram a questão da opção religiosa e a espiritualidade como fato
significativo.Determinado entrevistado enfatiza que a busca pela espiritualidade diante da
opção familiar pela religião católica foi o primeiro fato marcante, ainda na adolescência:
Eu não conseguia conceber o catolicismo como um final em si, ficavam muitas
lacunas, muitas coisas sem respostas, isso me incomodava demais e a minha e
dava essa abertura, então eu circulei pelo espiritismo, umbanda, as religiões
orientais, sempre na procura disso.
Outro sujeito investigado, esclarece que quando era adolescente morava em uma
cidade do interior e costumava ir à missa aos domingos por dois fatores:
Para cumprir aquele ritual e o outro para buscar alguma resposta, como a gente diz
conversar com Deus, mas que na verdade estava conversando comigo
mesmo.Muitas vezes eu ia na igreja, e não encontrava a resposta, eu saía com uma
falta e dizia – tem mais alguma coisa e não conseguia identificar.
Acrescenta, este entrevistado, que depois a vida tomou outro rumo, cidade grande,
outros compromissos, perdeu aqueles hábitos que tinha e foi construindo outros, mas chegou
um tempo que começou a pensar “eu ando tão afastada de tudo, parecia que eu estava me
afastando de crenças de alguns valores, eu dizia – eu tenho que voltar a assistir a missa, mas
comecei a perceber que não era aquele hábito de ir a igreja, sentia que faltava alguma
coisa” Na narrativa de outro entrevistado a espiritualidade aparece mais tardiamente, afirma
que não foi educada para essa interioridade, teve momentos de religiosidade, mas não um
aprofundamento, pelo menos na minha educação eu não tive isso”.Esclarece que o seu
despertar foi mais recente, há 10 ou 15 anos atrás:
Comecei a perceber mais essa força interior e parti para essa busca, era uma
autoeducação, foi realmente através de leituras e os livros vinham, as
oportunidades de participar de grupos apareciam, eu abri espaço pra participar de
grupos de estudo para conhecimento de filosofias. Atualmente eu participo de um
grupo de estudo espírita, nunca deixei de ler, ter contato, buscar pessoas.Esse
conhecimento para melhor entendimento do todo, por mais que a gente estude ainda
entende muito pouco.
Um dos sujeitos investigados de uma forma integradora e aberta salienta hoje se tu
me perguntares qual é a minha religião? Eu te digo não sei. Eu tenho maior respeito por
39
todas elas, eu não tenho nada contra, tudo que é para o bem - que venha”. Outro
entrevistado em seu depoimento demonstra que ainda não se encontrou:
Estou com um pouco de dificuldade, eu sou católica, que a religião católica não
responde as coisas como eu gostaria, como eu acredito. Trabalhei em escola
católica, em rede evangélica, mas hoje eu estou sem âncora, o budismo talvez tenha
alguma coisa, mas eu tenho que estudar mais.Hoje eu não tenho muita crença, eu
estou sem um amparo religioso que responda pra onde a gente vai.
Na medida em que se aprofunda a análise, a diversidade de percepções dos sujeitos
pesquisados ao apontar os fatos marcantes que pela força de significação influenciaram os
rumos de suas vidas, singulariza a trajetória de cada um. Josso (2004) afirma com veemência
que por definição, a formação é experiencial ou então não é formação, mas a sua
incidência nas transformações da nossa subjetividade e das nossas identidades pode ser
mais ou menos significativa” ( JOSSO, 2004, p.48).Um dos entrevistados relaciona a
formação no mestrado como um novo rumo que assumiu em determinado momento de sua
vida, aponta o casamento, as duas filhas, o neto de 5 anos e a separação deste casamento de
25 anos como fatos marcantes de sua trajetória.
Chamam a atenção dois depoimentos que apontam entre outros fatos marcantes, os
primeiros anos escolares como significativos, porém para um dos entrevistados este marco
foi positivo, enquanto para outro foi negativo. Para este último, os primeiros anos escolares
foram muito marcantes, o processo de alfabetização foi deficiente passou para série
semialfabetizada, o aprender não era prazeroso, até a oitava série não gostava de estudar,
salienta que ia passando, sempre com as calças na mão”. Acredita que em função disso
frustrou a expectativa dos pais, perdeu a segurança de filha mais velha, ao passo que a irmã
mais nova que estudou em escola particular, conforme declara “minha irmã teve uma outra
trajetória de construção com o saber, totalmente diferente, sempre se destacando, e eu não
gostava de estudar, queria saber de namorar, o prazer era outro, não era a
aprendizagem”. Relata que até a série estudou em escola pública e considera que a relação
com o ensino teria sido diferente se tivesse a oportunidade de estudar em uma escola com
bons profissionais, ressalta que “podia até ter sido pública”.
O sujeito pesquisado que elenca a experiência nas séries iniciais como um fato
marcante positivamente que, pela força de significação influenciou os rumos de sua vida
atribui à mãe a expectativa positiva: “minha mãe, antes de eu entrar para escola, sempre me
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disse: o dia que tu aprenderes a ler e escrever e fores pra escola tu vais te apaixonar de tal
forma que tu nunca mais vais deixar de conhecer coisas”. Conforme relata, este entrevistado
acredita que, desde criança, reconhecia a importância do professor na formação, merecendo
transcrição o seguinte excerto:
Eu achava que ser professor era uma coisa tão importante, desde criança eu sempre
achei que ser professor era muito mais importante que ser um médico. Ser professor
era uma coisa para pessoas iluminadas, para pessoas importantíssimas.Mais tarde
eu dei nome a isso, vocacionadas, as pessoas me dizem que coisa antiga,mas é uma
coisa que eu acredito.É uma vocação, tu nasces com esta alma de professor, tu não
te tornas professor. Simone de Beauvoir diz que as mulheres não nascem mulheres,
se tornam mulheres, para mim os professores nascem professores, não se tornam
professores, tuo consegues fazer ninguém virar um professor, e hoje trabalhando
com educação e formação de professores eu sei disso.
Neste ponto é necessário retomar o objetivo da presente pesquisa que é identificar, nas
narrativas de histórias de vida de mestres e doutor, relatos, que pela força de significação,
foram incorporados como experiências formadoras, sob o ângulo da aprendizagem; analisar
como se exteriorizaram durante o processo de autoformação e compreender como se
desvelaram em sua pesquisa científica. O questionamento sobre quais fatos marcantes que
pela força de significação, influenciaram os rumos da vida do entrevistado sinaliza para
distinção entre vivência e experiência. Josso (2004, p.48) defende que algumas vivências,
pelo valor que se atribui ao que foi vivenciado, têm uma intensidade particular e por isso
atingem o status de experiência quando se impõem à nossa consciência e delas extraímos
as informações úteis às nossas transações conosco próprios e/ou com o nosso ambiente
humano e natural”. Já no âmbito da neurociência, Damásio (2000, p.225) usa a expressão
memória autobiográfica quando aborda a questão do self autobiográfico:
O self autobiográfico baseia-se na memória autobiográfica, que é constituída por
memórias implícitas de múltiplos exemplos de experiência individual do passado e
do futuro antevisto. Os aspectos invariáveis da biografia de um indivíduo formam
a base da memória autobiográfica. A memória autobiográfica cresce continuamente
com a experiência de vida, mas pode ser parcialmente remodelada para refletir
novas experiências.
Conforme se depreende dos extratos das narrativas, os sujeitos investigados descrevem
vivências diferenciadas na diversidade de cenários vivenciais, mas evidenciam
características comuns quando reconhecem o referencial familiar como marcante nos rumos
de suas vidas, seja na figura da mãe, do casal ou da entidade familiar como um todo, ou de
forma implícita quando fazem referência à gravidez e maternidade. Como explica Damásio
(2000, p.294): “Quando nos referimos ao self pensando na dignidade única de um ser
41
humano, pensando nos lugares e nas pessoas que moldaram nossas vidas e que afirmamos
nos pertencer e viver em nós, estamos falando em self autobiográfico”.
Josso (2006) quando aborda as figuras de ligação nos relatos de formação defende que
não há vida sem uma multiplicidade de ligações biopsicosociais, tão pouco haveria história se
não houvesse a constituição de ligações entre os acontecimentos materiais e psíquicos, tanto
na dimensão individual, quanto na coletiva. Afirma que, no sentido etimológico, não há grupo
humano sem mitologia fundadora de ligações com o cosmos precursoras dos elos sociais.
Um dos entrevistados em seu depoimento relata que ainda se mantém ligado às suas
professoras dos primeiros anos escolares. Todos os depoimentos dos sujeitos entrevistados
apontam os elos de parentesco, seja por relação consanguínea ou por afinidade. Aqui a
referência jurídica para distinguir que a consanguinidade aparece quando os entrevistados
citam como referência marcante em suas trajetórias os ascendentes e descendentes, os afins
quando se referem ao cônjuge. Neste ponto não posso deixar de intercruzar a questão dos elos
de parentesco com a tradição do oriente. A filosofia oriental, quando aborda a questão dos
elos de ligação, sustenta que, assim como na transmissão hereditária, a informação genética
perpassa inúmeras gerações, os elos espirituais ultrapassam a barreira do tempo e do espaço e
manifestam-se no presente em cada ser como consciência, pensamento, razão, sentimento e
vontade. Mokiti Okada (2003) em ensinamento esclarece que os elos espirituais são veículos
de transmissão de vibrações sutis, tanto positivas como negativas, não podendo ser rompidos
entre parentes consanguíneos. Afirma que o chefe de uma família mantém elos com
familiares, empregados, amigos; se presidir uma empresa privada mantém elos com todos os
funcionários, fornecedores, ou se exercer cargo público, prefeito, governador, presidente, os
elos espirituais são mantidos com todos os que estão sob sua administração. Salienta que o
caráter dos filhos sofre influência do caráter dos pais através dos elos espirituais. Ressalta
que cada ser está ligado por incontáveis elos espirituais, enfatiza a relação professor-aluno,
merecendo transcrição o seguinte:
Principalmente os educadores, se soubessem que seu caráter se reflete sobre os
alunos através dos elos espirituais, deveriam tornar-se pessoas dignas de exercer
essa profissão, procurando constantemente aperfeiçoar o próprio espírito.
(OKADA, 2003, p.79).
A filosofia oriental neste aspecto encontra respaldo tanto em Josso, quando a autora
descreve os laços biográficos, quanto em Damásio (2000) quando aborda a questão do self
42
biográfico. No processo de formação, Josso (2006) usa a figura do górdio para
representar os laços que não podem ser desatados que são os laços familiares e afetivos.
Relata que nas narrativas emergem elos de ligação mantidos com avós ou figura feminina ou
masculina mais velha. A autora salienta que os laços são tecidos com pessoas que estiveram
presentes durante a trajetória de vida, mas muitas vezes são mantidos com um ancestral
longínquo. Cabe aqui transcrever a poesia Antepassado, de Carlos Drummond de Andrade,
que tão bem retrata a questão dos elos de ligação:
Só te conheço de retrato,
não te conheço de verdade,
mas teu sangue bole em meu sangue
e sem saber te vivo em mim
e sem saber vou copiando
tuas imprevistas maneiras,
mais do que isso: teu fremente
modo de ser, enclausurado
entre ferros de conveniência
ou aranhóis de burguesia,
vou descobrindo o que me deste
sem saber que o davas, na líquida
transmissão de taras e dons,
vou te compreendendo, somente
de esmerilar em teu retrato
o que a pacatez de um retrato
ou o seu vago negativo,
nele implícito e reticente,
filtra de um homem; sua face
oculta de si mesmo; impulso
primitivo; paixão insone
e mais trevosas intenções
que jamais assumiram ato
nem mesmo sombra de palavra,
mas ficaram dentro de ti
cozinhadas em lenha surda.
Acabei descobrindo tudo
que teus papéis não confessaram
nem a memória de família
transmitiu como fato histórico
e agora te conheço mais
do que a mim próprio me conheço,
pois sou teu vaso e transcendência,
teu duende mal encarnado.
Refaço os gestos que o retrato
não pode ter, aqueles gestos
que ficaram em ti à espera
de tardia repetição,
e tão meus eles se tornaram,
tão aderentes ao meu ser
que suponho tu os copiaste
de mim antes que eu os fizesse,
e furtando-me a iniciativa,
meu ladrão, roubaste-me o espírito.
43
Verifica-se pela análise e interpretação dos depoimentos dos sujeitos entrevistados
que os elos de ligação referidos em suas experiências formadoras tiveram forte influência na
formação de suas idéias e crenças, inspiram a forma de se posicionar na vida relacional
cotidiana e nas escolhas que balizam seus itinerários, são exemplos de resiliência em virtude
de alguma dificuldade que enfrentaram ou inspiradores pela maneira de ser diante da vida.
A maioria dos entrevistados, ao responder à primeira pergunta, encaminharam o
segundo questionamento - Como esses fatos repercutiram em tomadas de decisão reveladoras
de posições existenciais? E visualizaram o fio condutor que os levou e se mantém na
formação que é a terceira questão. Alguns dos sujeitos adentraram na quinta questão que
inquiri sobre os valores, referenciais, ideários, experiências fundadoras que nas suas
trajetórias de vida demonstram certa coerência interna com o tema da pesquisa por eles
realizada no mestrado e doutorado e justificaram o porquê da escolha em trabalhar o tema
espiritualidade e inteireza do ser que é a pergunta seis (6) do instrumento de pesquisa,
entrevista semiestruturada em anexo .
Essa forma contínua de relatar presente nas falas dos sujeitos investigados é
característica da formação experiencial integrada à experiência existencial, de significação e
orientação no contexto de uma história de vida que, conforme Josso (2004, p.56), “coloca o
aprendente em interações consigo mesmo, com os outros, com o meio natural ou com as
coisas, num ou em vários registros”. Foram evidenciadas vivências significativas durante o
percurso de vida dos sujeitos pesquisados que são inerentes a sua formação e por isso são
experiências formadoras.
Na abordagem biográfica de formação de Josso (2004), as experiências formadoras
são assim consideradas pelo sujeito investigado ao recordar experiências significativas para
própria representação que tem de si mesmo e de suas aprendizagens. Neste sentido corrobora
Morin (2005) quando discorre sobre a identidade polimorfa, sustenta que cada um traz em si
todas as idades, afirma que a infância e adolescência não desaparecem na vida adulta e
declara que “Cada idade tem suas verdades, experiências e segredos.” (Morin ,2005 p.87).
Relativamente aos fatos marcantes foram identificados acontecimentos ocorridos na
adolescência, sendo citados pelos entrevistados vivências relativas ao trabalho voluntário e à
busca pela espiritualidade. Os sujeitos investigados também referiram como significativas as
44
experiências referentes à escolarização na infância. Um dos entrevistados enfatizou como fato
marcante a separação judicial que desencadeou a procura pela educação continuada ocorrida
na idade adulta. A questão da opção religiosa e a espiritualidade foi abordada tanto como fato
marcante na infância, quanto na adolescência e na idade adulta.
O sujeito investigado passa a ser autor quando narra sua vida em sua globalidade
temporal, incluindo no presente tanto os saberes adquiridos pelas marcas do passado, a
memória revisitada e o futuro atualizado até o momento da reflexão. Um dos sujeitos
investigados, em sua fala, declara que veio preparado para a entrevista “já sabia que eu ia ter
que entrar dentro de mim”. Afirma que o momento da entrevista foi e está sendo muito
gratificante, porque é sobre a sua própria história que está refletindo “grandes momentos da
minha vida passaram na minha frente, essa experiência que a gente está tendo, sem sombra
de dúvidas reaviva, reanima e reafirma minhas crenças pessoais”. Salienta que hoje tem
convicção que é autor da sua própria vida: “eu construo a minha vida, o passado foi e serve
para catapultar e o futuro é uma coisa que eu vou fazer no presente, até porque tem esse
nome ‘presente é o que tem que ser vivenciado, não cabe choro de tristeza, lástima, seja o
que for que aconteça, acontecendo é por que tu de alguma forma permitiu. Quando tu te
tornas autor, se apropria dessa autoria da tua existência tu vais compreender que és tu que
escreve a próxima página, és tu que é o autor da tua própria história, é fascinante e essa
descoberta mudou a minha vida para o resto dos meus dias.” Josso (2004.
p.60) enfatiza que:
O processo autorreflexivo, que obriga a um olhar retrospectivo e prospectivo, tem
de ser compreendido como uma atividade de autointerpretação crítica e de tomada
de consciência da relatividade social , histórica e cultural dos referenciais
interiorizados pelo sujeito e , por isso mesmo, constitutivos da dimensão cognitiva
de sua subjetividade.
Um dos sujeitos investigados comenta que quando estava fazendo à pesquisa do seu
trabalho a maioria dos entrevistados tinha o hábito de refletir em função de terapia ou de
prática de meditação, mas durante a entrevista disseram olha eu nunca tinha ordenado as
coisas da forma como eu ordenei contigo e realmente é o que está acontecendo comigo
agora”. Outro sujeito investigado assim se manifesta:“as pessoas não param para
pensar,mas isso faz parte da minha rotina, toda semana eu tenho terapia eu sempre paro
para pensar, esse momento contigo hoje é mais um momento pra eu resgatar a minha
história”. Considera o tempo presente como fonte de experiência: isso me ajuda reafirmar,
45
resgatar, o que eu ando pensando, o que eu ando vivendo e fico feliz de ver que tem gente que
continua assim pensando, refletindo, produzindo conhecimento para gente poder cada vez
mais socializar, então é uma experiência maravilhosa”. No seguinte excerto, o entrevistado
salienta sempre que tu tens oportunidade de falar sobre as tuas coisas é uma coisa boa,
sempre tu estás trabalhando, sempre tu estás aprendendo”. Damásio (2000,
p. 288), sob
outro enfoque, ressalta:
As mudanças que ocorrem no self autobiográfico ao longo da vida inteira de um
indivíduo se devem tanto à remodelação consciente e inconsciente do passado
vivido como a formulação e remodelação do futuro antevisto. As memórias dos
cenários que concebemos como desejos, aspirações, objetivos e obrigações atuam a
todo instante sobre o self. Sem dúvida elas também possuem um papel na
remodelação consciente e inconsciente do passado vivido e na criação da pessoa
que a cada momento imaginamos ser.
O seguinte excerto do depoimento deste entrevistado bem retrata a questão:
Tem pessoas que vivem do passado para explicar o presente, precisam trazer nas
costas aquele peso do passado, eu não sou assim, não trago coisa do passado junto
comigo, não fico buscando o passado trazendo para , chorando. Aproveito as
coisas boas que aconteceram, aquilo até posso resgatar, mas não carrego o mundo
nas costas. Tenho vivido muito o presente e tenho me dado muito presente tanto
materiais como afetivos de vida. Hoje eu faço aquilo que me dá prazer, não que eu
não esteja olhando para o outro, mas estou me presenteando mais com a atenção
voltada para mim, quem eu sou agora que desejos eu tenho, que vontades, o que eu
quero.
A atitude reflexiva capaz de intersubjetividade, entendida como capacidade de
centração sobre si e abertura ao outro, repousa na atenção consciente e caracteriza a arte de
viver denominada por Josso (2004) de busca de uma sabedoria de vida. A formação do ponto
de vista do sujeito, de acordo com a autora, é direcionada a um saber viver. Este saber viver
a própria existencialidade é o caminho da sabedoria. O conceito de sabedoria, para a autora,
resulta da análise e compreensão dos percursos de vida de pessoas comuns que buscam viver
sua existencialidade de forma plena e inteira, conscientes de suas contradições e fragilidades.
Para a autora, a prática de desenvolvimento da atenção consciente de si, dos outros e
com o meio natural, numa presença empática consigo e com o mundo, consciente da
complexidade das causas e condições, fundamenta a arte de viver. A própria reflexão não é
separada da experiência. Varela
(1996), ao propor a reflexão atenta e aberta como uma
prática de transformação derivada do método budista de exame da experiência como
46
contribuição importante de diálogo com as ciências cognitivas, afirma que la reflexión no
és solo acerca de la experiencia, sino que la reflexión es uma forma de experiencia em si y
esa forma reflexiva de experiencia puede lograrse mediante el estar plenamente” (
VARELA, 1996, p.93). Os sujeitos entrevistados avalizam o entendimento do autor, o excerto
do depoimento seguinte assim demonstra:
A reflexão é uma forma de experiência, é importante porque tem a experiência do
dia a dia, a relação com outro, com o meio, com tudo, contigo mesmo, é o momento
de fazer relações daquilo que eu vivi no dia e me avaliar, quando tu páras pra
pensar é outra experiência. A reflexão faz parte do processo de aprendizagem e
evolução do ser humano, pode ser mental ou assim como a gente está fazendo,
compartilhando, pensando sobre, daqui a pouco tu retomas uma ação do passado,
falar sobre aquilo, tomar consciência no ato de refletir é a primeira etapa para agir
diferente.
Outro sujeito investigado relata que tem como prática o tai chi, três (03) vezes por
semana “o meu professor é maravilhoso, ele tem toda a questão da filosofia oriental
permeando” . Além desta prática declara que diariamente tem o hábito de refletir sobre o dia
que vivenciou, depois que as crianças vão dormir e antes de responder os emails e trabalhar,
coloca uma sica e esse momento é especial. No seguinte excerto, o entrevistado afirma
que:
Sem vida a reflexão é uma forma de experiência. Na formação pedagógica tem
uma teoria do professor reflexivo e tem outro autor que fala bastante da reflexão na
ação. Não tem como não pensar, o teu tempo intelectual, mental e emocional é
reflexivo.
Outro entrevistado afirma:
A reflexão é uma fonte de experiência no presente.Vou sair daqui diferente,
comecei, está acontecendo. Agora conversando contigo está me dando vontade
de estudar de novo quem sabe eu vou para o doutorado para dar continuidade.Tu
estás me fazendo pensar agora - eu vou começar a escrever no final das minhas
aulas as minhas atitudes, as atitudes dos meus alunos - vou começar a fazer isso. O
legal é poder perceber isso, porque tu vais fazendo as coisas, as coisas o se
encaminhando, assim como eu estou conversando contigo agora.
Todos os sujeitos investigados consideram o tempo presente como fonte de
experiência, um dos entrevistados enfatiza que tem consciência da fase em que se encontra,
em especial o momento em que seu único filho esta saindo de casa para passar uma
temporada no exterior:
47
Eu estou parindo de novo, esse cortar o cordão umbilical, empurrar o filhote para
fora do ninho é um período de me olhar. Essa semana especialmente eu estou
extremamente fragilizada, então tu me pegas numa época que eu estou falando
muito em mim, olhando muito pra mim, meu filho viajou terça-feira, hoje é sábado.
Afirma outro sujeito investigado:
Eu faço yoga, ainda hoje de manhã estava agradecendo, eu o abro mão desta
prática. O fato de tu vires aqui para mim é uma alegria imensa, eu acho fantástico a
gente poder parar e fazer essa troca, eu me emociono em ver que a gente está
construindo isso e está tendo esse espaço tão legal de poder trabalhar essas coisas
tão bonitas do nosso crescimento como seres humanos. É uma experiência, tudo é
um acréscimo, te conhecer, ver que tu também estás buscando, que a gente também
está somando nessa trajetória toda. O tempo presente é uma fonte de experiência
me fortalece tanto a busca, como a continuidade do trabalho e um novo ânimo
ver que a gente não está sozinha e se agora o solo não é tão fértil, no futuro
fatalmente essa semente brota .
Nesta perspectiva biográfica, um momento charneira de reconstrução no percurso
de vida relatado que permite compreender como a história articula-se como um processo de
formação a partir das lições das lembranças que articulam o presente ao passado e ao futuro.
Percebe-se nos depoimentos dos entrevistados experiências significativas que demonstram
nitidamente os “momentos charneira”, conforme esclarece Josso (2004,
p.64
):
Momentos ou acontecimentos charneira são aqueles que representam uma
passagem entre duas etapas da vida, um “divisor de águas”, poderíamos dizer .
Charneira é uma dobradiça, algo que, portanto, faz o papel de uma articulação. Esse
termo é utilizado tanto nas obras francesas quanto portuguesas sobre histórias de
vida, para designar os acontecimentos que separam, dividem e articulam as etapas
da vida.
O termo momentos ou acontecimentos charneira utilizado por Josso (2004) pode
ser entendido como um acontecimento que separa, divide e articula as etapas da vida. O
movimento de transposição de um momento significativo ou acontecimento charneira” tal
qual uma dobradiça, remete ao rito de passagem, no sentido usado nas tradições nativas de
sabedoria. Essas tradições usam a expressão “atravessar a porta dourada” quando se
referem às mudanças sentidas em um nível mais elevado de consciência, quando novos níveis
de compreensão e conhecimento são alcançados no presente e ajudam dar forma ao futuro,
simbolizando crescimento.
48
Os momentos ou acontecimentos charneira”, pela força da significação, demonstram
o entendimento existencial do sujeito na compreensão do mundo, sinalizam uma direção
epistemológica e desvelam caminhos a partir de então. Aquele sujeito investigado que
apontou os primeiros anos escolares como uma experiência negativa em seu depoimento
afirma que este fato, acontecimento charneira, desencadeou uma rie de problemas durante
sua escolaridade, conforme relata:
Eu tinha dificuldade com a produção escrita, o tinha autoconfiança pela
insegurança da alfabetização, não conseguia ler um texto, interpretar e escrever
com as minhas próprias palavras. Aprendi de uma forma diferente, estudava com a
minha mãe, era ela quem lia, interpretava e me explicava os textos.
Em seu depoimento, declara que a deficiência na alfabetização se refletiu na tomada
de decisão de seguir o magistério, depois pedagogia, especialização e o mestrado. Salienta
que a opção pela pedagogia foi porque era a coisa mais fácil pra passar no vestibular”.
Relata que fez pós-graduação em psicopedagogia, porque queria ajudar crianças com
dificuldades de aprendizagem, porém, ressalta que não concluiu o curso por não ter
apresentado a monografia em virtude da dificuldade que tinha com a produção textual. Para
enfrentar a dificuldade e insegurança de escrever declara que resolveu cursar a pós-
graduação em supervisão escolar em EAD. E afirma: eu sempre fui assim, aquilo que eu
não sei, eu me imponho desafios para me exigir fazer”.Iniciou o mestrado como aluna
especial porque tinha medo de fazer a prova, até que foi cobrada para regularizar sua situação
no Programa.Quando resolveu fazer a prova de seleção contratou uma professora particular de
português para aprender escrever, conforme relata:
Fiz tudo para prova do mestrado, eu tinha que estar segura, comecei a ter aula de
português para aprender a organizar e a expressar o meu pensamento com
começo, meio e fim. Foi um sofrimento, no dia da prova eu pensei o que eu estou
fazendo aqui? Por que eu estou fazendo isso comigo? Eu me preparei muito,
quando eu passei, foi a maior alegria da minha vida porque eu tinha passado com
as minhas próprias condições e empenho, todo o meu esforço.
Por outro lado, o sujeito investigado que teve os primeiros anos escolares como
experiência formadora positiva, a referência foi muito significativa afirma que: as pessoas
se admiram quando eu cito nome e sobrenome das minhas primeiras professoras, são
quarenta anos, eu fui alfabetizada por uma construtivista que em 1968 não fazia idéia do que
49
viria a ser o construtivismo”. Este entrevistado cita como experiência marcante o seu
primeiro dia de aula quando assumiu uma 2ª série em uma escola particular:
Quando um aluno se dirigiu a mim e me chamou de professora, aquele ‘professora’
me arrepiou e ali eu percebi que tinha nascido para aquilo, era isso que eu tinha
vindo fazer, e eu amo muito fazer. Hoje eu digo para as minhas alunas do 4° ano
normal: como é que a gente sabe se está no caminho certo? Eu digo esperem o
primeiro dia de aula, na sala de vocês, o no estágio, ou na prática, quando
assumirem uma sala de aula de vocês, quando ouvirem o primeiro aluno chamar
‘professora’ percebam se emociona; se emociona vocês estão no lugar certo, se
não, procurem outra coisa para fazer.
Para este entrevistado, o momento charneira foi propulsor de suas buscas eu passei o
resto da minha vida procurando eu queria ver de novo aquele brilho no olho dos
professores”. O referencial de suas primeiras professoras, aliado à busca pela
transcendência,o ser professor e a questão vocacional, foi entendido pelo entrevistado como
uma exceção e não uma regra. Durante sua vivência escolar em alguns professores identificou
o olhar das suas primeiras professoras. A idéia da própria pesquisa no mestrado partiu dessa
experiência, tanto que dedicou a dissertação às primeiras professoras da escola pública onde
estudou da 1ª. à 4ª séries.
O momento charneira de outro entrevistado foi a separação de um casamento de 25
anos. Considera a separação um fator que desencadeou a sua trajetória até a formação,
quando eu me separei, estava num período de busca interior, o fato da separação foi o
que impulsionou pra esse aprofundamento, eu li muito”. Quando soube que o Programa de
Pós Graduação em Educação oferecia disciplinas na linha da espiritualidade salienta eu disse
– é por aqui que eu vou, vou unir uma busca pessoal com o Mestrado”. Outro sujeito
entrevistado não cita um momento charneira, mas uma série de acontecimentos que fizeram
com que fosse em busca do mestrado, conforme relata:
Aconteceram algumas coisas, algumas boas outras desagradáveis na minha vida, eu
passei por um período de crise comigo mesmo eu dizia meu Deus parece que me
falta alguma coisa para eu me agarrar, a impressão que eu tinha é que tinha
perdido um pouco daquilo que eu era, eu fiquei meio perdida, fiquei me
questionando quem eu sou de novo? O mestrado foi um resgate de poder revigorar
a alma de poder me buscar de novo, estava me dando uma abertura de espírito, eu
costumo chamar de alma, uma abertura de alma, me ajudou demais e eu resgatei
nessa época, depois de tantos anos - eu voltei às raízes, me encontrei, identifiquei
bem o que é ir à igreja rezar e o que isso significava pra mim. Comecei a me
identificar e me estabilizei, eu comigo mesma, de me compreender melhor, aceitar
50
meus limites, - eu sempre digo para os meus alunos, se tu o te compreendes, não
te gostas tu não consegues gostar do outro
.
Enquanto outro entrevistado credita o seu encaminhamento para o mestrado em
Educação à experiência com os estagiários na escola técnica em que trabalha. Cita uma
passagem quando, ao corrigir o relatório de um aluno, considerou um prefixo como
inexistente na língua portuguesa, porém dizia respeito a um termo técnico, desde então
começou a se envolver mais com o fazer daqueles alunos e se apropriar daqueles
conhecimentos.
Pela análise dos excertos das entrevistas percebe-se que o momento charneira” de
cada um dos sujeitos investigados, seja o fato de uma separação, o momento de crise
existencial, o desafio de superar dificuldades de aprendizagem ou o referencial das primeiras
professoras, foram experiências significativas, de forte carga emocional que não cumpre
analisar, porém verifica-se que deixaram um registro que orientou suas trajetórias de vida
desde então. Tais episódios vivenciados pelos entrevistados geraram de alguma forma uma
intenção que provocou uma ação, movimento e resultou em um comportamento, por isso foi
uma experiência fundadora reorientadora de um projeto de vida.
Destaco aqui expressões usadas pelos sujeitos investigados extraídas dos excertos
acima transcritos, quais sejam:.“já estava num período de busca interior”; vou unir uma
busca pessoal com o Mestrado”;“
o mestrado foi um resgate de poder revigorar a alma de poder me
buscar de novo”;
“aquilo que eu não sei, eu me imponho desafios para me exigir fazer”;.eu
passei o resto da minha vida procurando”. O termo busca”, usado pelos entrevistados,
reflete o movimento da tomada de consciência ocasionado pela situação vivenciada que se
tornou um momento charneira” propulsor de uma experiência significativa e fundadora.
Esta tomada de consciência revela o eu dinâmico dos investigados, caracteriza conforme
Josso (2004, p.68) a posição existencial:
A posição existencial evidencia os posicionamentos do sujeito na sua maneira de
estar no mundo, de agir sobre ele, de gerir a sua vida e as suas relações com o
mundo , assim como a identificação das buscas que orientam uma vida.
Josso (2006) denomina de pescador” aquele que faz a ligação dos momentos e
situações recorrentes em um mesmo período ou distantes no tempo, mas semelhantes. Usa o
termo falcaças” para representar o ato de reunir os fios que se revelaram significativos do
51
ponto de vista da formação e transformação, e que permitem ver quais o os desafios. Pela
análise e interpretação dos depoimentos dos entrevistados foi possível vislumbrar o fio
condutor que liga as experiências, evidencia as práticas formativas referentes ao itinerário
escolar, profissional, ou se relaciona a outras aprendizagens, desafios enfrentados e valores
que orientaram as suas buscas.
Um dos sujeitos investigados identifica a disciplina como fio condutor, conforme
salienta “A questão da disciplina, de estar centrada naquilo, de determinação, de busca, é uma
coisa que eu trago desde a minha infância, tenho isso bem presente sempre”. Enquanto outro
entrevistado assim se expressa: “Eu colocaria uma palavra chave que é fé, eu acho que o fio
condutor é fé, para a igreja tem uma forma e em relação a aprendizagem é outra, é fé na vida,
na tua potencialidade, capacidade e na existência”.
A busca por crescimento pessoal foi outro aspecto identificado como fio condutor:
“considero como educação continuada não o curso, mas as experiências que tu tens nas
diversas situações, é um final de semana, um passeio, teatro, cinema, terapia, massagem,
trabalhar o corpo, o autoconhecimento e a busca por crescimento pessoal”. Salienta um dos
entrevistados que no mestrado foi possível retomar o fio condutor de sua vida, a questão da
transcendência e de ser professor, as aulas propiciaram a busca de respostas que estavam
deixadas de lado, adormecidas e concomitante com o aprofundamento do estudo do tema da
inteligência espiritual no grupo de pesquisa fez com que compreendesse que estava no lugar
certo.
Outro sujeito investigado faz uma relação entre o fio condutor do mestrado e do
doutorado, relata que começou pesquisando a resposta do aluno, o que ele tinha em relação ao
tipo de formação na escola e a partir disso foi buscar o que o professor pensava, faz muito
sentido, e eu caracterizo como a minha própria vida profissional, o meu amadurecimento, o
meu progresso no sentido da progressão da minha vida”. Para Josso (2004) cada pessoa na
procura de um saber viver a própria existencialidade, evidencia quatro eixos principais:
busca de felicidade; busca de si e de nós; busca de conhecimento ou do real e a busca de
sentido. As buscas podem aparecer em diferentes momentos, ser associadas entre si, em
grupos de duas ou três ou todas conjuntamente. A busca de sentido ou a busca do
conhecimento ou do real fundamentam a busca da felicidade e a busca do si e do nós.
52
O seguinte excerto da entrevista de um dos sujeitos confirma a assertiva da autora:
O mestrado valeu muito, foi um tempo fantástico de crescimento pessoal, de
confirmação dessas coisas todas que eu buscava, foi possível colocar isso numa
fundamentação melhor. Poder referendar isso dentro da própria academia com o
cuidado de ampliar e não prejudicar o espaço que tinha sido criado dentro da
instituição foi maravilhoso.
Esta outra fala também corrobora, vez que o sujeito entrevistado considera a formação
um período de transformação “não tem como tu trabalhares, fazer um mestrado e um
doutorado e sair a mesma”. Josso (2004) afirma que a busca da felicidade é fundadora do
estar-no-mundo e vai se tornando mais complexa no decorrer da vida, nos momentos de
escolha e nas tomadas de consciência ocasionadas pelas experiências de vida que tem
significado para a pessoa. É fundante das outras três, podendo cada uma das buscas estar no
centro da atenção ou associadas entre si em determinados períodos da vida. A mesma autora
(2004, p.95) sustenta que a busca de si é inseparável da relação com outrem, e afirma: Nós
não saberíamos viver, mesmo como eremitas, sem pertenças (reais ou simbólicas)”.
O seguinte excerto do depoimento deste entrevistado ressalta a importância do
sentimento de pertença, considera marcante o fato de ter participado dos Seminários
Avançados de Educação e do Grupo de Prática de Pesquisa:
A coisa mais gratificante foi encontrar as disciplinas, os grupos de pessoas afins
que também estão em busca, e ter um patamar, um espaço de troca. Foi uma coisa
muito forte e isso me impulsiona realmente para continuar essa caminhada. Toda
essa trajetória de busca, esse equilíbrio, essa harmonia no ser, para mim a
inteligência espiritual, a espiritualidade é o equilíbrio entre o emocional e o
racional.
Josso (2004) salienta que a busca do nós começa nas escolhas de amizades, grupos
afins, de um companheiro, na criação de uma família e no ingresso em associação de interesse
comum:
Em outras palavras, quando o nosso conhecimento de nós mesmos nos permite a
associarmo-nos aos outros com prazer e criatividade, experimentando o equilíbrio
entre o dar e o receber estamos disponíveis para a exploração além de nós mesmos,
estamos disponíveis para a vida (JOSSO, 2004, p. 96).
53
Os elos de pertença a determinados grupos foram referidos pelos sujeitos entrevistados
em relação a práticas como yoga, tai chi , meditação, estudo espiritual. Também foi citada a
terapia, apesar de não ser em grupo, entendo que se enquadra como um elo de pertença. E no
âmbito da formação acadêmica, a pertença ao Seminário Avançado de Educação e ao Grupo
de Prática de Pesquisa. Um dos sujeitos investigados com mais ênfase que os demais relata
que os encontros tanto do seminário como da prática de pesquisa realizavam-se
semanalmente, a turma era bem eclética tinham pessoas de diferentes origens de formação, da
medicina ao sacerdócio, praticamente todos eram orientandos da professora Leda Lísia e
mesmo aqueles que já tinham concluído o curso continuavam participando da pesquisa. Os
trabalhos eram realizados como laboratórios para as próprias pesquisas. O entrevistado afirma
que:
Esses espaços foram muito significativos, muito importantes, tanto para
construção, desconstrução e reconstrução da minha dissertação como para ter
certeza que era isso mesmo, não era inteligência intrapessoal, sete e meia
inteligências, mas inteligência espiritual.
A busca de si nunca está acabada. Conforme Josso (2004), são evidenciadas cinco
competências de base e interdependentes mobilizadas nas atividades correntes ou nos
momentos de escolha ou de dificuldades, quais sejam: habilidade, criatividade, avaliação,
comunicação e atenção consciente. No entendimento de Josso (2004), a busca de
conhecimento ou do real é uma procura orientada pelo desejo de se informar sobre e de se
apropriar dos saberes construídos, é apoiada nas fontes das ciências do humano, das
ciências da natureza e de saberes não científicos que orientam a procura do saber-amar, do
saber-pensar, do saber-fazer ou do saber-ser-sociocultural.
Este entrevistado confirma o entendimento da autora. Em seu depoimento salienta que
o referencial teórico trabalhado nas disciplinas da professora Leda Lísia proporcionou
segurança e possibilitou a compreensão de que o caminho que estava tomando na vida era o
mais adequado, principalmente na condução da relação com as pessoas, refletindo no âmbito
profissional com a própria equipe de trabalho. Afirma que o curso ajudou a fazer escolhas no
presente, deu mais segurança e coerência na sua vida, “consigo falar e agir de acordo com
aquilo que eu penso, antes eu tinha um discurso belíssimo, mas a minha prática era bem
distante, agora a coisa flui, é natural”. Josso (2004) afirma que muitas vezes a busca de
conhecimento ou do real está relacionada à busca de si e de nós, acompanhada da questão
54
egocentrada “quem sou eu?” Ou sob a forma antropocêntrica do sentido da vida, e
complementa:
Os saberes servem-nos a propósito de tudo, explícita ou implicitamente, para nos
confirmar uma opinião, para legitimar uma maneira de pensar, de fazer ou de nos
comportarmos, mas igualmente como fonte para as compreensões que
procurávamos a propósito de nós mesmos, as evoluções que sonhávamos, as
transformações das quais gostaríamos de participar. Para agirmos sobre nós, sobre
os outros ou sobre nossos contextos e situações de vida, servimo-nos dos saberes
que nos parecem indispensáveis para nossa progressão ou para nossa ação (JOSSO,
2004, p.97).
Para a autora, a busca de conhecimento ou do real surge nas narrativas de momento
de crise ou de efervescência, é a procura por informações que possam enriquecer o seu ponto
de vista, suas leituras, atitudes, comportamento, seu saber-fazer consigo mesmo e com o
outro. O processo de conhecimento não ocorre por adição e a integração de informações
novas ou de saber-penar exigem reajustamento em cadeia de todas as idéias que estão
associadas. Assim, a busca de conhecimento ou do real pode ocasionar profundas mudanças
na forma de condução da vida. Conforme Josso (2004) é no centro da busca de
conhecimento ou do real que a busca de sentido inicia:
Um grande número de narrativas conta como a busca de sentido se iniciou muito
cedo, com base, na maioria das vezes, em uma herança religiosa, em um
compromisso familiar e/ou ainda em razão de uma personalidade exemplar
anônima ou socialmente reconhecida. outras narrativas mostram a emergência
dessa busca na meia idade, quando o horizonte temporal se reduz, ou ainda devido
ao falecimento de um familiar ou ao aparecimento de uma doença grave (JOSSO,
2004, p.99).
Para Josso (2004) a busca de sentido pode ser orientada como busca de conhecimento,
análise, e interpretação de um fenômeno, situação ou acontecimento. Também pode ser
orientada para a pesquisa do significado particular de si mesmo ou do ser em relação com o
mundo. E ainda com caráter filosófico ou religioso, afirma a autora:
A busca de sentido gira em torno do sentido que pretendemos dar à nossa vida, à
comunidade à qual pertencemos, restrita ou ampliada, por meio de um conjunto de
escolhas pessoais e sociais, e pode mesmo prolongar-se, para além disso, por meio
da preocupação de inserir o sentido singular das nossas escolhas de vida numa
visão do devir humano que eu denomino então como busca da espiritualidade
(JOSSO, 2004, p.100).
55
Tendo como norte que a resposta não é definitiva diante da relatividade e
vulnerabilidade da certeza, considerando que o sujeito pesquisador é um ser em construção
em processo de autoformação e constante transformação, por ora e sob o ponto de vista
desenvolvido na presente pesquisa emergiu o seguinte enunciado - A ação traz
intrinsecamente a consciência potencial de experiências fundadoras do processo
subjetivo que aproximam o sujeito de quem é na investigação científica resultante da
análise e interpretação realizadas com respaldo teórico e empírico capaz de responder ao
problema de pesquisa - Como experiências formadoras de mestres e doutores se desvelam na
investigação científica? Vale aqui retomar os títulos das pesquisas desenvolvidas pelos
sujeitos investigados, dissertações e tese, salientando que, apesar dos trabalhos estarem
disponíveis na biblioteca da PUCRS, podendo ser identificados os autores, na presente
pesquisa foram salvaguardadas as identidade das falas:
- Inteligência Espiritual Ampliada e Prática Docente Bem Sucedida: uma tessitura que revela
outros rumos para a Educação (2003);
- O desenvolvimento do ser humano na sua inteireza: uma proposta educativa possível
( 2005);
- A educação como processo do traduzir-se: o (re)descobrir da inteireza do ser (2005);
- Desvelando o perfil de espiritualidade: elo propulsor para ampliação dos propósitos e
objetivos de vida (2006);
- Educação continuada: um olhar para além do espelho, iluminando mente, corpo, coração e
espírito do docente da educação superior ( 2006).
O enunciado emergente da análise e interpretação das entrevistas dos sujeitos
investigados A ação traz intrinsecamente a consciência potencial de experiências
fundadoras do processo subjetivo que aproximam o sujeito de quem é na investigação
científica tem apoio em Damásio (2000) quando defende que a consciência central é o
alicerce da consciência e a consciência ampliada vai além do aqui e agora da consciência
central, retrocede ao passado para buscar memórias até à medida que precisa para iluminar o
presente e avança para o futuro antevisto através das projeções.
56
Um dos entrevistados relata que tinha leituras de assuntos relacionados a
transcendência em virtude da busca que empreendeu durante toda sua trajetória de vida desde
a adolescência, conforme declara:
Estava dando nome a coisas que eu tinha presente, enquanto ser humano, a
solidariedade, generosidade, a maneira de olhar e enxergar não o que eu estou
vendo, mas muito mais, de permitir que as pessoas se aproximem e tu poder
acolher, te apropriar dos espaços, saber que quem se aproxima de ti não é por
coincidência, não existe acaso. Todas estas coisas eu tinha enquanto prática de
vida, eu fui dando nome, e fui vendo de que forma aprimorá-los nesse exercício
cotidiano.
Neste excerto outro sujeito pesquisado relata:
O tema foi latente, o me via buscando outro, tinha que ser alguma coisa que
realmente viesse de dentro e esse desejo pelo tema foi muito forte. Eu estava
buscando, era uma autoeducação, através de leituras e participação em grupos de
estudo.
O espectro de conhecimentos acessados é amplo, a consciência ampliada se expande
ao longo da vida com as experiências que cada indivíduo tem. Cumpre transcrever o seguinte
exemplo citado por Damásio (2000, p.252):
Em vez de apenas ter acesso ao fato de que está sentindo dor, você também pode
fazer um levantamento dos fatos relacionados ao local da dor ( cotovelo), ao que
causou ( tênis), quando a sentiu pela última vez ( três anos – ou será quatro?), quem
também sentiu uma dor assim recentemente ( sua tia Maria), o médico que ela
procurou ( o dr. Silva ou terá sido o dr. Castro?), o fato de que você não pode jogar
com o João amanhã.
Na consciência central, o sentido do self surge no sentimento sutil e fugaz de conhecer,
sendo construído de novo a cada pulso. Esclarece o autor que na consciência ampliada, o
sentido do self surge na exibição reiterada e consistente de algumas memórias pessoais,
objetos do passado que dão substrato a identidade à individualidade. No depoimento deste
entrevistado, pode-se aferir que a escolha do tema não foi aleatória, pois afirma que é
inerente a sua maneira de ser e ver o mundo. Salienta que é diferente de inventar uma
estória, isso já vem comigo, é uma história de vida, eu trouxe para dar forma acadêmica uma
realidade em que eu acredito intimamente”.
57
A consciência ampliada é conseqüência de duas contribuições capacitadoras, conforme
Damásio (2000, p.253):
Primeiro a capacidade de aprender e, com isso, guardar registros de uma infinidade
de experiências, conhecidas previamente graças à consciência central; segundo, a
capacidade de reativar esses registros de modo que, como objetos, eles também
possam gerar “ um sentido do self no ato de conhecer” e, assim, ser conhecidos.
O mesmo autor ressalta que a consciência ampliada é um pré-requisito da inteligência,
torna o organismo ciente de todo conhecimento possível, enquanto a inteligência é a
capacidade para manipular esses conhecimentos de tal forma que as respostas possam ser
planejadas e executadas. Salienta que a memória operacional e a atenção focalizada
contribuem para a consciência ampliada. Frisa que a consciência ampliada baseia-se na
consciência central para o seu desenvolvimento no decorrer do tempo e em cada momento.
Merece transcrição o exemplo citado pelo autor:
Como possuidor de consciência ampliada, você provavelmente está prestando
atenção a vários conteúdos mentais ao mesmo tempo: o texto impresso, as idéias
que ele evoca, as questões que ele suscita, talvez música ou algum ruído específico
em algum lugar da casa e em você mesmo, como conhecedor. Nem todos esses
conteúdos se destacam igualmente com o mesmo conteúdo de nitidez, mas todos se
encontram no palco e,em um momento ou outro, por muitos segundos, minutos, um
ou alguns deles vêm para a ribalta (DAMÁSIO, 2000, p258).
No exemplo citado, o autor conta do momento presente, porém um organismo
com consciência ampliada planeja comportamentos complexos de intervalos de tempo
maiores, de horas, dias, semanas e meses, Em outras palavras, o que uma pessoa faz deve
ter sentido não imediatamente, mas em contextos de maior escala” (DAMÁSIO, 2000
(p.259). A seguinte fala deste sujeito investigado assim retrata:
No mestrado, além de poder unir essa busca pessoal, escolhi um tema que pudesse
servir de alguma forma pra despertar outras pessoas, para poder trabalhar com
isso e mais adiante continuar acelerando esse trabalho, passar isso para outras
pessoas, em outros espaços.
Damásio (2000) afirma que em um estado neurologicamente normal nunca se está
totalmente destituído de consciência ampliada, a não ser quando se é um bebê de até um ano
de vida; neste caso, os objetos saem tão rapidamente como entraram na mente, pois a criança
possui apenas consciência central e self simples. O self simples conhece cada objeto
58
isoladamente, não relação entre os objetos no espaço ou no tempo, nem ligação entre o
objeto e as experiências passadas ou antevistas. A consciência ampliada mobiliza
internamente uma quantidade de conhecimento evocado em diferentes sistemas e modos
sensoriais e depois manipula esse conhecimento para solucionar problemas. Declara que
“Podemos avaliar a consciência ampliada julgando, em um indivíduo cuja consciência
central está intacta, o reconhecimento, a evocação, a memória operacional, a emoção e o
sentimento, o raciocínio e a tomada de decisão ao longo de grandes intervalos de tempo”
(DAMÁSIO, 2000, p. 259). Na memória do aqui-agora estão incluídas as memórias de
eventos antevistos que o autor denomina como memória do futuro” porque relacionada à
lembrança de planos para os próximos minutos, horas ou dias. O seguinte depoimento aborda
a “memória do futuro”:
Eu o tinha esse tipo de leitura. Quando decidi fazer o mestrado comecei a ler
algumas coisas e isso me chamou atenção e foi pra isso que eu enveredei, isso veio
junto com a vontade de poder fazer diferente, de poder ajudar a formar pessoas,
tanto os meus alunos como os outros que vêm; foi isso que me chamou atenção.
No repositório de registros da memória autobiográfica estão as memórias que
constituem a identidade e definem a individualidade, defende Damásio. A personalidade
depende de várias contribuições. Salienta o autor que os traços de personalidade
denominados como temperamento são identificados desde o nascimento, alguns são
transmitidos geneticamente e outros são moldados por fatores do desenvolvimento inicial.
Ressalta que as interações com o meio são registradas na memória autobiográfica e
constituem o alicerce do self autobiográfico e a individualidade. No mesmo sentido que
Damásio, sob outro ângulo corrobora Josso (2004, p.183):
Se tudo na vida contribui para nossa formação, isso provém, contudo, das
vivências que se tornaram fundadoras das nossas intenções, dos nossos
comportamentos , das nossas valorizações socioculturais, da maneira como nos
pensamos a nós mesmos e de pensarmos as realidades que vivemos ou com as
quais , mais ou menos, nos relacionamos.
Durante a análise e interpretação das entrevistas dos sujeitos investigados, foi possível
vislumbrar que os fatos apontados como significativos repercutiram em tomadas de decisão
que desencadearam os rumos de suas vidas. Percebe-se que o fio condutor que se mantém
durante suas trajetórias de vida tem origem nestas vivências elencadas. Assim o enunciado
59
emergente tem respaldo empírico nos excertos de depoimentos transcritos e amparo teórico
em Damásio (2000) quando ressalta que:
A idéia que cada um de nós forma de si mesmo, a imagem que aos poucos
construímos de quem somos física e mentalmente, ou de como nos inserimos na
sociedade, baseia-se na memória autobiográfica, em anos de experiência, e está
sujeita a contínua remodelação. Acredito que boa parte dessa construção ocorre de
forma inconsciente e que o mesmo pode ser dito da remodelação. Esses processos
conscientes e inconscientes, em qualquer proporção, são influenciados por todos os
tipos de fatores: traços de personalidade inatos e adquiridos, conhecimento, meio
social e cultural. O self autobiográfico que neste momento exibimos em nossa
mente é o produto final não de nossas inclinações inatas e experiências de vida
reais, mas também de reprocessamento de memórias dessas experiências, sob a
influência desses fatores (DAMÁSIO, 2000, p. 287).
Um dos sujeitos pesquisados salienta que acredita que o fato da pesquisa retratar sua
própria experiência foi decisivo para o bom desenvolvimento do trabalho:
Eu nunca sofri com o mestrado, nunca foi ruim, escrever foi uma delícia. Eu entrei
no mestrado grávida e saí grávida. Durante a formação nasceu um dos meus filhos
e quando defendi faltavam 10 dias pra nascer o outro, não tinha sacrifício, aquela
coisa das pessoas angustiadas, nervosas, com dor de cabeça, stressadas.
Neste sentido, Rogers (1997) sustenta que, no processo de tornar-se, cada um almeja
intencionalmente ou inconscientemente ser o que é, como uma necessidade premente de
buscar a si mesmo e tornar-se ele mesmo. Inicialmente se desvencilha dos papéis e derruba
as falsas máscaras que tem consciência de estar usando ao perceber que até então estava
sendo guiado por aquilo que deveria ser e não por aquilo que é. Para o autor é possível
observar um padrão de movimento:
O indivíduo se move em direção a ser, com conhecimento de causa e numa atitude
de aceitação, o processo que ele é de fato em profundidade. Afasta-se do que não é,
de ser uma fachada. o procura ser mais do que é, com todos os sentimentos de
insegurança e os mecanismos de defesa que isso implica. Não tenta ser menos do
que é, com os sentimentos implícitos de culpabilidade ou depreciação de si. Está
cada vez mais atento ao que se passa nas profundezas do seu ser fisiológico e
emocional e descobre-se cada vez mais inclinado a ser, com uma precisão e
profundidade maiores, aquilo que é da maneira mais verdadeira (ROGERS, 1997,
p.199).
Um dos componentes do caminho da autodireção presente no processo de tornar-se é
a abertura para sua própria experiência, afirma Rogers (1997). Na medida que cada um
60
reconhece e se dispõe a assumir sua experiência interna e externa de ser o que realmente é se
abre para o outro, aprecia a própria experiência, valoriza a si e ao outro por aquilo que ele é.
O autor usa o termo congruente” para expressar a consciência da atitude ou
sentimento que está sendo vivenciado no momento e torna uma pessoa inteira e unificada:
“qualquer atitude ou sentimento que estivesse vivenciando viria acompanhada da
consciência dessa atitude. Quando isso é verdade, sou naquele momento, uma pessoa
unificada e inteirada e é então que posso ser o que sou no mais íntimo de mim mesmo”
(ROGERS, 1997, p.59).
Em outra entrevista, o sujeito investigado esclarece que a idéia da inteireza vem do
construto da Universidade Holística de Brasília, UNIPAZ, quando cursou a formação holística
de base e tomou contato com uma literatura e conhecimento diferenciado, e percebeu que o
código de comportamento é comum e os valores são universais.
Rogers (1997), quando aborda a descoberta do eu na experiência, explicita o que
significa tornar-se o seu próprio eu. Aduz que ser o seu próprio eu significa encontrar a
unidade, a harmonia e a ordem subjacente que existe entre os próprios sentimentos e reações
reais no fluxo mutável da experiência.
Aceitar-se como um curso de tornar-se, e não como um produto acabado. Significa
que uma pessoa é um processo fluido, não uma entidade fixa, estática; um rio
corrente de mudanças , não um bloco de material sólido: uma constelação de
potencialidades continuamente mutáveis, não uma quantidade fixa de traços
(ROGERS, 1997, p.138).
No seguinte excerto, o sujeito entrevistado justifica a escolha do tema de sua pesquisa
como resultante de seu próprio questionamento:
A escolha do tema foi na busca de respostas dessa minha inquietação, própria do
ser humano, para onde vamos? Por que estamos aqui? Qual é o sentido e o
significado da vida? Eu buscava e ao mesmo tempo respondia com referenciais
teóricos, ciente de que todas as respostas ainda o estão dadas.Isso me ajudou na
gestão de pessoas e nas escolhas da minha vida pessoal.
Pelos excertos dos depoimentos se pode aferir que as vivências apontadas pelos
sujeitos pesquisados como fatos marcantes se transformaram em experiências fundantes de
61
suas aprendizagens e demonstram coerência com tema de pesquisa por eles desenvolvidos em
suas respectivas dissertações e tese e aproximam o sujeito pesquisador de quem realmente é.
Neste sentido, Josso (2004) alicerça o enunciado emergente A ação traz intrinsecamente a
consciência potencial de experiências fundadoras do processo subjetivo que aproximam o
sujeito de quem é na investigação científica:
A reflexão sobre as experiências fundadoras, ao contribuir para compreender o
processo de formação, evidencia o processo de conhecimento que correlativamente
se desenrolou por meio da integração, mais ou menos alcançada, de um conjunto de
conhecimentos que funcionam, a partir de então, como os pressupostos da ação e do
pensamento (JOSSO, 2004, p.182).
Tanto é assim que estes sujeitos investigados em seus depoimentos relatam que, após
a formação, aplicam naturalmente os estudos realizados nas respectivas pesquisas em suas
práticas diárias, tanto no ambiente acadêmico em sala de aula como em outras esferas de suas
vidas, o que vem reforçar a importância da pesquisa na revigoração do processo de ensino e
de aprendizagem nas distintas esferas de suas vidas.
No seguinte trecho de seu depoimento o entrevistado descreve como incorpora no seu
dia-a-dia o tema desenvolvido em sua pesquisa:
Depois da pesquisa pronta eu comecei a intensificar esse trabalho na sala de aula,
eu trago as dimensões, mostro a importância disso para a vida desses alunos que
estou ajudando a formar. Incorporei isso, a gente conversa sobre, trago leituras,
eles lêem, eu escrevi um texto incorporando isso na didática, então eu trabalho
esse texto com eles. Para algumas turmas eu apresentei os resultados da pesquisa
para eles verem que aplicar essas dimensões na prática o é algo assim do outro
mundo, são coisas simples mas tem que estar atento. Eu costumo trabalhar com eles
assim, - aqui está o teórico, e agora vamos na prática, se eu quero isso, como é
que tem que ser isso lá na sala de aula.
Em outra entrevista o sujeito pesquisado afirma que, onde quer que esteja, multiplica
a sua mensagem. Relata que, quando esteve à frente da coordenação pedagógica da educação
infantil do colégio onde trabalha, fez com que a diretriz a ser seguida fosse da construção da
identidade das crianças a partir da observação da inteligência espiritual. Essa orientação vem
sendo seguida mesmo depois de ter sido redirecionado para outra função larguei aquele
departamento com essa raiz”. Declara que atualmente ministra aulas de sociologia geral e
sem entrar na questão propriamente da inteligência espiritual, aborda na prática quando trata
de temáticas da própria disciplina, instigando os alunos a se reconhecerem como seres
62
espirituais. Afirma que o retorno dos alunos é percebido por suas próprias atitudes, por isso
considera que está fazendo sua parte e contribuindo de alguma forma na vida dos alunos. Cita
como os alunos costumam se referir às suas aulas “quando a gente chega na sua aula é uma
ilha, é um bálsamo, tudo que a sra. quer é que a gente se encontre”.
Um dos sujeitos investigados em seu depoimento comenta que recentemente fez uma
palestra e falou no perfil do profissional e salientou a importância de investir na inteireza, em
todas as dimensões, não adianta ter apenas o conhecimento técnico eu acredito numa
economia sustentável, mas para isso precisa ter pessoas inteiras que tenham a percepção das
relações como um todo”.
Outro entrevistado declara que continua sua busca, faz parte de em grupo de estudo e
em todas essas áreas procura referendar cada dia mais os conhecimentos e experiências
adquiridas durante a formação. Relata que é solicitado para trabalhar o tema da inteireza e
espiritualidade em seminários de formação de professores, além de ter um espaço no jornal de
sua cidade que oportuniza veicular o assunto em sua coluna semanal. Diante do meu
interesse em saber mais sobre essas publicações, disponibilizou um arquivo com os artigos já
veiculados, pelo que transcrevo alguns trechos:
A construção da inteireza inicia-se de dentro para fora e se expande à medida que a
conquistamos, em um processo de contaminação pelo exemplo de integridade e
confiabilidade, transformado em rastros luminosos que possam servir de farol na
conduta que encaminhe a níveis mais elevados de consciência de toda humanidade
em sua trajetória evolutiva ( INTEIREZA, veiculado em 07/05/2008).
Partindo do pressuposto de que já nascemos inteiros, completos, todo o processo
consiste em trazermos à tona o que temos dentro de nós. Ambientes afáveis que
estimulem o desenvolvimento integral - mente, corpo e espírito - são favorecedores
para o desabrochar da sabedoria interna de cada indivíduo. Nossa caminhada nesse
processo de construção do ser é individual, mas as aprendizagens ocorrem na
relação com os outros e com o ambiente ( ENSINAR E APRENDER, veiculado
em 30/04/2008).
A educação a que a escola se propõe deve estar focada no desenvolvimento físico,
racional, emocional e espiritual. Todos os atores são essenciais nesta engrenagem, e
descobrir a nossa tarefa é fundamental para que possamos nos realizar nesta jornada
( A ESCOLA, veiculado em Out/2007 ).
A descoberta do ser humano inteiro e sua inexorável interligação com todos e o
todo podem colocar a salvo o futuro da humanidade (A DESCOBERTA DO
SÉCULO XXI, veiculado em 20/05/2008).
63
Relata outro sujeito investigado que tem aplicado o conhecimento e a experiência que
adquiriu durante a formação em sala de aula:
Eu estou dando continuidade, não ficou isso na pesquisa, eu levei isso para a sala
de aula e os alunos gostam de escutar e conseguem refletir sobre o que eu estou
falando, sobre o que eles pensam.
Sob este aspecto corrobora Nóvoa (1992) quando aborda a ação e o saber dos
professores e questiona - Por que é que fazemos o que fazemos na sala de aula? Defende o
autor que a resposta evoca uma mistura de vontades, gostos, experiências e até acasos que
consolidaram gestos, rotinas e comportamentos com os quais cada um a sua maneira se
identifica. Salienta que:
A maneira como cada um de nós ensina está diretamente dependente daquilo que
somos como pessoa quando exercemos o ensino. Eis-nos de novo face à pessoa e ao
profissional, ao ser e ao ensinar. Aqui estamos . Nós e a profissão. E as opções que
cada um de nós tem de fazer como professor , as quais cruzam a nossa maneira de
ser com a nossa maneira de ensinar e desvendam na nossa maneira de ensinar a
nossa maneira de ser. É impossível separar o eu profissional do eu pessoal
(NÓVOA, 1992, p.17).
A citação de Nóvoa reafirma as considerações iniciais da contextualização da
pesquisa, é possível integrar na atividade profissional a minha maneira de ser e vivenciar a
realidade com sensibilidade e criatividade como um todo que se abre ao sagrado. Cumpre
salientar que este capítulo representa um quadro atual e experimental do momento em que
foi construído, não algo final e definitivo.
Considero que o referencial teórico dos autores citados durante o desenvolvimento da
pesquisa, analisados numa dinâmica conjunta com a interpretação dos excertos dos
depoimentos dos sujeitos investigados, em um processo de fusão com a perspectiva do
sujeito pesquisador de entender a realidade de uma maneira transdisciplinar, integrando
sujeito objeto sagrado, foi possível responder ao problema de pesquisa - Como
experiências formadoras de mestres e doutores se desvelam na investigação científica,
ancorada no enunciado emergente - A ação traz intrinsecamente a consciência potencial de
experiências fundadoras do processo subjetivo que aproximam o sujeito de quem é na
investigação científica. Assim, antes de passar para o capítulo - Ponto de chegada:
64
Experienciando a própria pesquisa considerações que não são finais, o poderia deixar de
citar Josso:
Eu aprendo com o que cria ou criou “experiência para mim, daí extraio ‘alguma
coisa’,algo que passo a guardar comigo, cuja evocação me pode permitir uma
retomada, uma reinterpretação e que serve de referencial para minha ação ou
pensamento (JOSSO, 2004, p.214).
65
4 PONTO DE CHEGADA: EXPERIENCIANDO A PRÓPRIA PESQUISA:
CONSIDERAÇÕES QUE NÃO SÃO FINAIS.
Experienciar o momento presente, estar aqui agora ciente do pulsar da energia vital
com a percepção de que ao mesmo tempo em que o intelecto organiza as idéias, digita as
frases no computador, o próprio organismo se autorregula internamente concomitantemente
com tudo que o cerca externamente em perfeita harmonia é muito gratificante. Enquanto
escrevo, as horas, os minutos ,os segundos se perdem em meio às voltas do relógio que não
para, a tarde se esvai, o sol segue seu percurso rumo ao poente, oferecendo de presente o seu
colorido, despedindo-se do dia com a promessa de um novo amanhecer, enquanto a natureza
agradece e a passarada em algazarra se prepara para adormecer.
Olho pela janela e percebo que a vida tem um ritmo preciso, enquanto permaneço aqui
pensando, tudo está em movimento e em constante transformação, a vida é um ciclo. Mesmo
no constante fluxo mutável da vida certos momentos em que é chegada a hora de dar o
ponto final. A última peça do quebra-cabeça foi colocada no lugar. É o momento de apreender
o quadro completo e olhar o conjunto de todas as peças. Depois do trabalho desenvolvido, da
pesquisa realizada, das conclusões alcançadas no capítulo anterior, percebo que as
considerações não são finais, mas um constante movimento, numa dinâmica recursiva que
retorna ao ponto inicial em forma de espiral, pois ao mesmo tempo que retoma o caminho já
trilhado abarca novas emergências que são ponto de partida para um novo percurso.
No momento da conclusão um movimento de entrega, de se deixar levar, tal qual
uma semente solta ao vento em busca de solo fértil para germinar. A semente carrega em si
toda a potencialidade da germinação, por mais sombrio e adverso que pareça o local o broto
sempre se volta em direção à luz buscando crescimento. E assim como emergiu da semente,
todo o desenvolvimento segue o ciclo para formar uma nova semente.
A riqueza do material trabalhado propiciou o aprendizado face a situações
educativas singulares ocorridas nas trajetórias de vida e formação dos sujeitos pesquisados.
O sujeito pesquisador não está imune, a partilha das vivências pelo sujeito investigado faz
com que saia transformado, experimentando e refletindo sobre a própria experiência.
66
A experimentação é um processo natural cada um a sua maneira é um receptor da
experiência. A experiência pode ser registrada, o experienciar é a própria sensação. Ao
chegar ao fim da presente pesquisa, questiono qual foi a aprendizagem que resultou com esta
experiência? A primeira lição foi a observação de si mesmo com a atenção consciente
concomitante com a tomada de consciência de perceber o próprio pensar e agir para entender
qual o propósito e o significado que orienta minha própria vida na relação e no contexto em
que se encontra no aqui-agora.
A atenção consciente, diferentemente do pensamento reflexivo, da introspecção, é
presencial na tentativa de unificar mente e corpo. O uso da expressão tentativa” é em razão
da dificuldade de acalmar a mente, eis que na maioria do tempo são inúmeras as conexões e
interrelações mentais que ocorrem ao mesmo tempo. Dentre as leituras que realizei durante a
formação para o desenvolvimento da pesquisa sobre atenção consciencialização, Varela
(1991) fez com que fosse buscar a prática da raja yoga. Essa nova perspectiva proporcionou
que eu despertasse para uma nova maneira de experienciar a vida no cotidiano. A minha
percepção ficou diferente, sinto quando não estou na minha presença, mas no piloto
automático. Acompanho o fluxo de pensamentos e com a atenção consciente direciono o
que interessa para o momento. Ainda são raros os momentos que a presença emerge de forma
constante, normalmente a percepção é justamente pela desatenção. Porém, quando o
pensamento está dissociado do corpo e se percebe que o piloto está no automático, esse é o
momento de buscar o centramento, mas de uma forma tranquila como quem contempla a
suave dança das nuvens soltas no vento sob o céu azul, e aos poucos o próprio ato de dar-se
conta faz com que a atenção se volte para si.
Ao assumir minha própria experiência de ser o que realmente eu sou, valorizo o outro
por aquilo que ele é. A abertura para própria experiência é um dos componentes do caminho
da autodireção, essa foi a segunda lição. Perceber a dinâmica do outro e as articulações
durante o processo de formação desencadeia um movimento recíproco no sujeito-pesquisador.
O outro desperta o olhar para si, a análise do percurso dos sujeitos investigados faz com que
o sujeito pesquisador interprete a sua própria trajetória tal qual o espelho, o outro reflete
aquilo que eu sou em essência.
Pela análise e interpretação das trajetórias de vida dos sujeitos investigados, foi
possível vislumbrar como cada um, ao seu tempo e à sua maneira, desenvolveu na formação
67
referências específicas de seu próprio interesse de conhecimento em virtude de experiências
passadas, motivos presentes, projetos futuros que se desvelaram na investigação científica em
suas dissertações e tese. Percebe-se que, durante a formação, houve um entrelaçamento entre
o interesse dos sujeitos investigados e o que o Programa de Pós-Graduação da Faculdade de
Educação ofereceu através do SAE e da PP que desenvolvem os temas: Inteireza do Ser e
Dimensão Espiritual, sendo possível compreender como cada um desenvolveu sua busca,
identificar a articulação entre o individual e o coletivo na tessitura do processo de
conhecimento e de autoformação.
O desvelamento de como, cada um, a sua maneira orientou suas escolhas, até mesmo
intuitivamente, evidenciou a intencionalidade dos sujeitos pesquisados. Durante a formação
de cada sujeito investigado, a tomada de consciência das experiências formadoras permite
desvelar o que potencialmente cada um traz, proporcionando a integração com o referencial
teórico oferecido pelo Programa. A epistemologia do sujeito emergiu das atribuições de
sentido do percurso de suas próprias vidas. Neste sentido, Josso ( 2004) vem embasar meu
entendimento:
A narrativa da história de formação de cada um, como criadora das condições de
uma objetivação das experiências formadoras, é a via de acesso ao processo de
formação de cada um por meio daquilo que lhe dá forma (JOSSO, 2004, p.134).
Outro questionamento que exsurge é até que ponto essa experiência foi formadora
para mim? Refletir sobre o que foi formador na minha vida me permite situar o que hoje
penso e faço e torna possível descobrir a origem do que eu sou hoje. A reflexão sobre o que
foi formador e o que orientou as escolhas dos sujeitos investigados, o que fez sentido em suas
vidas faz com que o sujeito pesquisador questione – o que aprendi com essa experiência?
Ao reavaliar experiências passadas e as experienciadas no presente, percebo que os
referenciais experienciais e teóricos são atributos únicos que singularizam a minha trajetória
de formação e desvelam o sentido atribuído à pesquisa realizada. Na minha trajetória de vida
ao identificar experiências formadoras, reconheço aprendizagens que esclareceram
questionamentos sobre a origem dos meus pressupostos constitutivos:
- essas experiências foram fundadoras a tal ponto que estruturam minha maneira de ser;
68
- alicerçam minhas idéias, pensamentos e se exteriorizam na maneira como me expresso;
- são propulsoras das intervenções que manifesto nas minhas relações e no contexto que me
cerca.
Os tópicos elencados são sinalizadores na busca de respostas, referenciais para
interpretação da realidade e compreensão da dinâmica do meu ser no mundo, releitura das
escolhas e uma forma de identificar um horizonte futuro. A tomada de consciência do
percurso de vida é propulsora do próprio processo de conhecimento e a reflexão sobre essa
dinâmica desencadeia o processo de aprendizagem.
Essa metodologia de identificar as experiências fundantes durante o percurso de vida
pode ser auxiliar em momentos de decisão e de escolhas, seja no âmbito pessoal, como
profissional, enquanto dimensões inseparáveis. No âmbito acadêmico, pode ser um
instrumento de verificação do fio condutor que conduz o sujeito durante a formação, um
processo que responda qual é a sua busca e quais são seus interesses de conhecimento. E uma
ferramenta a mais na metodologia de pesquisa no momento de escolha do tema que guarde
maior coerência com a trajetória de vida do pesquisador.
Essas considerações não são finais, ao encerrar este capítulo ponto de chegada, o
sentimento é de gratidão e reconhecimento da transitoriedade. A vida é feita de finalizações e
novos começos, do encerramento do velho para chegada do novo. A transitoriedade está na
natureza das coisas. A figura a seguir, caligrafia Sanka Ketsujitsu de Mokiti Okada (2005),
expressa esse momento, a tradução dos ideogramas é - As flores caem e os frutos se formam.
69
Figura 1 - Caligrafia Sanka Ketsujitsu: As flores caem e os frutos se formam.
70
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avaliar e expandir seu vel de consciência e energia espiritual. Rio de Janeiro: Ediouro,
2001.
73
ANEXOS:
74
ANEXO A - Termo de Consentimento Informado:
Senhor(a) Professor(a):
Gostaria de convidá-lo(a) para participar da presente pesquisa que visa identificar
experiências formadoras de mestres e doutores que desenvolveram estudos científicos no
âmbito da dimensão espiritual e inteireza do ser no Programa de Pós-Graduação da Faculdade
de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
É um convite para reexaminar os pressupostos das suas escolhas com um olhar
retrospectivo e prospectivo da sua trajetória de vida. A sua contribuição vai permitir
identificar, em sua narrativa, relatos que, pela força de significação, foram incorporados
como experiências formadoras, sob o ângulo da aprendizagem; analisar como se
exteriorizaram durante o processo de autoformação e compreender como se desvelaram na
pesquisa científica.
A participação é voluntária e pressupõe disponibilidade de tempo para realização de
uma entrevista semiestruturada que será gravada e posteriormente transcrita, salvaguardada a
sua identidade. A presente pesquisa é parte integrante da dissertação de Mestrado que
pretendo defender no final do ano, sob a orientação da professora Leda Lísia Franciosi Portal,
perante o Programa de Pós Graduação da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS.
Desde agradeço e assumo o compromisso de manter sigilo sobre sua identidade,
bem como apresentar os resultados da pesquisa por ocasião da conclusão da investigação.
Atenciosamente,
Clarita Eveline Moraes Varella
Consentimento:
Concordo em participar desta pesquisa, estando ciente de seus objetivos e de que a produção
intelectual será divulgada nos meios científicos, respeitado o anonimato.
Assinatura do participante
75
ANEXO B - Instrumento de Pesquisa: Entrevista Semiestruturada.
1. Quais fatos marcantes que, pela força de significação, influenciaram os rumos de sua vida?
2. Como esses fatos repercutiram em tomadas de decisão reveladoras de posições
existenciais?
3. Identifique o fio condutor de sua trajetória de vida que se manteve presente durante o
período de formação do mestrado/doutorado.
4. Durante a sua formação, quais as vivências que se transformaram em experiências
fundadoras sob o ângulo da aprendizagem?
5. Na sua trajetória de vida, que valores, referenciais, ideários, experiências fundadoras
demonstram certa coerência interna com o tema da pesquisa realizada no
mestrado/doutorado?
6. Por que escolheu trabalhar o tema espiritualidade/inteireza do ser?
7. Como experienciou este momento da entrevista, autorreflexão retrospectiva e prospectiva
da sua vida? Por quê?
8. Considera a reflexão como uma forma de experiência em si? Por quê?
9. Depois desta entrevista, da autorreflexão, da partilha, considera o tempo presente como
fonte de experiência? Por quê?
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
V293e
Varella, Clarita Eveline Moraes
Espiritualidade e inteireza do ser : um processo de
autoformação na investigação científica / Clarita Eveline
Moraes Varella. – Porto Alegre, 2009.
75 f.
Diss. (Mestrado) – Faculdade de Educação, PUCRS.
Orientador: Profa. Dra. Leda Lísia Franciosi Portal.
1. Educação. 2. Pesquisas Científicas. 3. Pesquisadores.
4. Espiritualidade. 5. Formação Profissional. I. Portal, Leda
Lísia Franciosi. II. Título.
CDD 370.71
Bibliotecária Responsável: Dênira Remedi – CRB 10/1779
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