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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
DAYSE GOMES SOUSA DE OLIVEIRA
A HISTÓRIA DA TERAPIA COMUNITÁRIA NA
ATENÇÃO BÁSICA EM JOÃO PESSOA/PB:
UMA FERRAMENTA DE CUIDADO
JOÃO PESSOA - PB
2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
DAYSE GOMES SOUSA DE OLIVEIRA
A HISTÓRIA DA TERAPIA COMUNITÁRIA NA
ATENÇÃO BÁSICA EM JOÃO PESSOA/PB:
UMA FERRAMENTA DE CUIDADO
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Enfermagem do Centro de
Ciências da Saúde da Universidade Federal
da Paraíba, inserida na Linha de Pesquisa
Políticas e Práticas em Sde e Enfermagem,
como requisito para a obtenção do título de
Mestre em Enfermagem, na Área de
Enfermagem na Atenção à Saúde.
ORIENTADORA: PROFª. DRª. MARIA DJAIR DIAS
JOÃO PESSOA - PB
2008
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DAYSE GOMES SOUSA DE OLIVEIRA
A HISTÓRIA DA TERAPIA COMUNITÁRIA NA
ATENÇÃO BÁSICA EM JOÃO PESSOA/PB:
UMA FERRAMENTA DE CUIDADO
Aprovada em: ____/___________/ 2008.
BANCA EXAMINADORA:
____________________________________________________
Profª. Drª. Maria Djair Dias – Orientadora/UFPB
____________________________________________________
Profª. Drª. Maria de Oliveira Ferreira Filha – Membro/UFPB
____________________________________________________
Profª. Drª. Lenilde Duarte Sá – Membro/UFPB
____________________________________________________
Profº. Dr. Francisco Arnoldo Nunes de Miranda – Membro/UFRN
3
A Saulo Filho, Saulo, Zila, Carlos e Carlos Junior,
dedico este trabalho como forma de gratidão.
Amo vocês!!!
4
AGRADECIMENTOS
AGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOS
AGRADECIMENTOS
Se eu tivesse mil anos de viver não teria tempo de agradecer..., seu
grande amor, amparo e proteção ò Cristo para comigo.
Ao meu filho, Saulo Brito de Oliveira Filho, por ser minha inspiração e
motivação.
Ao meu querido esposo, Saulo Brito de Oliveira, por suas palavras e
gestos demonstrando alegria e bondade que me cativam, reforçando nosso
amor e a presença de Deus em nossas vidas.
Aos meus pais, Carlos Luis de Sousa e Zila Gomes de Sousa, que me
ensinaram com amor, do mundo o mar agitado enfrentar, mostrando que
sempre a bonança em Cristo devo encontrar.
Ao meu iro, Carlos Luis de Sousa Junior, pela paciência e apoio,
sendo presença forte e constante ao meu lado.
Aos irmãos da Primeira Igreja Batista de João Pessoa, pelas palavras
de incentivo, me acompanhando em oração.
Aos meus colaboradores, pelos vínculos afetivos formados,
compreensão e participação neste estudo.
À Professora Drª. Maria Djair Dias por de forma prudente e bia
guiar-me cientificamente, por isso sou grata.
Aos Professores Drª. Maria Filha, Drª. Lenilde Duarte e Dr.
Francisco Arnoldo, pelas valiosas contribuições para a concretização deste
trabalho.
À Professora Solange Fátima Geraldo da Costa, por sua lição de
coragem, que enfrentando as diversidades da vida, resiste com bravura,
compartilhando experiências, sempre com atitudes de carinho.
5
À Profª. Drª. Wilma Dias Fontes, pelos momentos compartilhados,
sempre com sinceridade a nos receber com um sorriso nos lábios.
Aos Professores Doutores César e Ana Tereza, por fazerem parte do
meu universo, não como cometas que um dia passaram por minha vida, mas
por serem estrelas que brilham, e tornam-se referência na minha caminhada
profissional.
Ao Dr. Sérgio, e grupo GEPAIE pela oportunidade e apoio nestes
anos.
À minha amiga Luciana Dantas pelo forte laço de amizade que
construímos nesses dois anos.
As minhas amigas Bernadete Moreira e Alecsandra Tomaz por me
entenderem e ajudarem em momentos difíceis.
As minhas amigas Márcia Bicalho e Rejane pela presteza, amizade e
competência na correção deste trabalho.
A todos os docentes do Curso de Mestrado, que contribuíram para a
minha formação.
À Luzinete, Ivan, Maria e Luciene, funcionários do Programa de Pós-
graduação em Enfermagem, pela disponibilidade na condução de suas
atividades.
À minha turma, por partilhar momentos tão especiais.
Aos funcionários da Biblioteca, e demais funcionários da Instituição
pela presteza e atenção em atender-nos.
Enfim, a todos que ajudaram de forma direta ou indireta para a
conclusão deste trabalho e do Mestrado.
Deus a todos abençoe!
6
“Ainda que eu conheça todos os
mistérios e toda a ciência, se eu
não tiver amor, nada serei”.
(I Coríntios 13.2)
7
OLIVEIRA, Dayse Gomes Sousa de. A história da Terapia Comunitária na
atenção básica em João Pessoa - PB: uma ferramenta de cuidado. 2008. 174
p. Dissertação (Mestrado) Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da
Paraíba.
RESUMO
RESUMORESUMO
RESUMO
A Terapia Comunitária constitui-se uma prática de efeito terapêutico, na área da
saúde, que visa à prevenção e ao atendimento a grupos heterogêneos, de
organização informal, que emergiu de pessoas expostas ao sofrimento, buscando
alternativas para enfrentar problemas. Através desta pesquisa, objetivou-se
estudar a implantação da Terapia Comunitária, como uma ferramenta que vem
contribuir para a organização das práticas de saúde na atenção básica no
Município de João Pessoa - PB. Para isso, foi empregado o método da História
Oral Temática, fazendo-se uso da técnica de entrevista para a coleta de dados,
realizada em João Pessoa - PB - com onze colaboradores. Os resultados desta
investigação evidenciaram os seguintes eixos temáticos: Terapia Comunitária: o
sentido da história; Terapia Comunitária: promovendo mudanças, superação e
crescimento; Contribuições para o SUS e a Saúde Mental em busca da
integralidade na Atenção Básica e Desafios apontados. Com base nesses eixos
temáticos, observou-se que a Terapia Comunitária disponibiliza um espaço de
escuta para a comunidade, proporciona a melhora da auto-estima, o
estabelecimento e o fortalecimento de vínculos, promove a resiliência, favorece
um processo de superação e de crescimento dos profissionais e da comunidade,
contribui para a formação de um profissional mais humanizado, para a realização
de práticas mais acolhedoras e integralizadas nos serviços de saúde e estimula o
envolvimento multiprofissional da rede de atenção básica em Saúde Mental. Como
desafios apresentados pelos colaboradores, destacaram-se a falta de espaço
físico e de divulgação, a identificação e o compromisso dos profissionais em
relação à Terapia Comunitária, bem como a descrença e a participação da
comunidade. Os resultados desta pesquisa contribuem no sentido de aprofundar e
ampliar os conhecimentos sobre os benefícios que a Terapia Comunitária vem
trazendo para a melhoria da qualidade de vida das pessoas da comunidade, uma
vez que vem ganhando força no enfrentamento das dores do cotidiano das
pessoas e tem contribuído para a organização das ações de saúde na Atenção
Básica no Município de João Pessoa - PB.
Palavras-chave: Saúde. Terapia. Atenção Básica.
8
OLIVEIRA, Dayse Gomes Sousa de. The history of community therapy in the
basic attention in João Pessoa PB: a tool of care. 2008. 174 p. Dissertation
(Master Degree) Health Sciences Center, Universidade Federal da Paraíba.
ABSTRACT
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACT
The Community Therapy consists in a practice of therapeutic effect, in the health
area, that has as aim the prevention and the attending of heterogeneous groups, of
informal organization, that emerged from people exposed to suffering, seeking
alternatives to face problems. Through this research, it was objectified to study the
implantation of the Community Therapy as a tool that contributes to the
organization of health practices in the basic attention in the municipal district of
João Pessoa PB. For this, the method of Thematic Oral History was applied,
making use of the technique of interview for the data collection, made in João
Pessoa PB with eleven collaborators. The results of this investigation
evidenced the following thematic axis: Community Therapy: the meaning of the
history; Community Therapy: promoting changes, overcoming and growth;
Contributions for the SUS and the mental health in search of the integrality in the
Basic Attention and the Challenges appointed. Based on these thematic axis, it
was observed that the Community Therapy makes available a space of listening for
the community, provides the improvement of the self-esteem, the establishing and
the strengthening of bonds, promotes the resilience, favors a process of
overcoming and of growth of the professionals and of the community, contributes
to the formation of a more humanized professional, to the realization of more
sheltering and integrating practices in the health services and stimulates the multi-
professional involvement in the network of basic attention and mental health. As
challenges presented by the collaborators, the lack of physical space and of
divulgation, the identification and commitment of the professionals in regard to the
Community therapy, as well as the disbelief and the participation of the community,
were emphasized. The results of this research contribute in the sense of
deepening and amplifying the knowledge about the benefits that the Community
Therapy has been bringing to the improvement of the quality of life of the people of
the community, once that it is gaining strength in the confronting of everyday pains
of the people and has contributed to the organization of the health actions in the
Basic Attention in the municipal district of João Pessoa – PB.
Key-words: Health. Therapy. Basic Attention.
9
OLIVEIRA, Dayse Gomes Sousa de. La historia de la terapia comunitaria en la
atención básica en João Pessoa - PB: una herramienta de cuidado. 2008. 174
p. Disertación (Maestría) Centro de Ciencias de Salud, Universidad Federal de
Paraíba.
RESUMEN
RESUMENRESUMEN
RESUMEN
La Terapia Comunitaria constituye una práctica de efecto terapéutico, en el área
de la salud, que visa la prevención en la atención a grupos heterogéneos, de
organización informal, que emergió de personas expuestas a sufrimiento,
buscando alternativas para enfrentar problemas. A través de este estudio, con el
objetivo de estudiar la implantación de la Terapia Comunitaria para la organización
de prácticas de salud en la atención básica en el municipio de João Pessoa - PB.
Para eso, fue empleado el método de Historia Oral Temática, haciendo uso de la
técnica de entrevista para la colecta de datos, realizada en João Pessoa - PB -
con once colaboradores. Los resultados de esta investigación evidenciaron los
siguientes ejes temáticos: Terapia Comunitaria: el sentido de la historia; Terapia
Comunitaria: promoviendo cambios, superación y crecimiento; Contribuciones
para el SUS y la salud mental buscando integrar la Atención Básica y los Desafíos
apuntados. Con base en esos ejes temáticos, se observó que la Terapia
Comunitaria dispone de un espacio de escucha para la comunidad, proporciona la
mejora de auto-estima, el establecimiento y el fortalecimiento de vínculos,
promueve la resiliencia, favorece un proceso de superación y de crecimiento de
los profesionales y de la comunidad, contribuye para la formación de un
profesional más humanizado, para la realización de prácticas más acogedoras e
integrales en los servicios de salud y estimula el envolvimiento multiprofesional de
la red de atención básica en salud mental. Como desafíos presentados por los
colaboradores, se han destacado la falta de espacio físico y de divulgación, la
identificación y el compromiso de los profesionales en relación a Terapia
Comunitaria, bien como la descreencia y la participación de la comunidad. Los
resultados de esta investigación contribuyen en el sentido de profundizar y ampliar
los conocimientos sobre los beneficios que la Terapia Comunitaria viene trayendo
para mejorar la calidad de vida de las personas de la comunidad, una vez que
viene ganando fuerza en el enfrentamiento de los dolores del cotidiano de las
personas y ha contribuido para la organización de las acciones de salud en
Atención Básica en el municipio de João Pessoa - PB.
Palabras-clave: Salud. Terapia. Atención Básica.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
LISTA DE ILUSTRAÇÕESLISTA DE ILUSTRAÇÕES
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1: Ponta do Seixas...........................................................................
FIGURA 2: Prof. Dr. Adalberto de Paula Barreto...........................................
FIGURA 3: Cartão feito por um menino do Projeto 4 Varas...........................
FIGURA 4: Antiga sede do PSF Ambulantes.................................................
FIGURA 5: Dinâmica......................................................................................
FIGURA 6: Professoras Maria Djair e Maria Filha fazendo o acolhimento
rodas de TC....................................................................................................
FIGURA 7:
Professoras Maria Djair e Maria Filha realizando o
encerramento de uma roda de TC..................................................................
FIGURA 8: Professoras Maria Djair e Maria Filha em um m
omento de
confraternização com a comunidade..............................................................
37
43
45
138
139
140
141
141
11
LISTA DE
LISTA DE LISTA DE
LISTA DE ABREVIAÇÕES
ABREVIAÇÕESABREVIAÇÕES
ABREVIAÇÕES
ABRATECOM – Associação Brasileira de Terapia Comunitária
ACS – Agente Comunitária de Saúde
AVC – Acidente Vascular Cerebral
AVAI – Anos Vida Ajustados por Incapacitação
CAIS – Centro de Atenção Integral à Saúde
CAPS – Centro de Atenção Psicossocial
CCS – Centro de Ciências da Saúde
CDC – Conselho Deliberativo Científico
CEP – Comissão de Ética em Pesquisa
CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNRS – Comissão Nacional de Reforma Sanitária
CNS – Conferência Nacional de Saúde
CTA – Centro de Testagem e Aconselhamento
DAS – Departamento de Atenção à Saúde
DGSP – Diretoria Geral de Saúde Pública
DESPP – Departamento de Enfermagem de Saúde Pública e Psiquiatria
ESF – Estratégia Saúde da Família
EPS – Educação Permanente em Saúde
GEPAIE – Grupo de Estudo e Pesquisa em Administração e Informática em
Enfermagem
GEPSS – Grupo de Estudos e Pesquisa Saúde e Sociedade
IBDPH – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Pessoa Humana
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MISC – Movimento Integrado em Saúde Comunitária
MS – Ministério da Saúde
NOAS – Norma Operacional à Saúde
NOB – Norma Operacional Básica
OMS – Organização Mundial de Saúde
12
OPAS – Organização Pan-Americana da Saúde
PSF – Programa Saúde da Família
SESP – Serviço Especial de Saúde Pública
SUDS – Sistema Unificado Descentralizado de Saúde
SMS – Secretaria Municipal de Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
UFC – Universidade Federal do Ceará
UFPB – Universidade Federal da Paraíba
UNIPÊ – Centro Universitário de João Pessoa
UPHG – Unidades Psiquiátricas em Hospitais Gerais
USF – Unidade de Saúde da Família
13
SUMÁRIO
SUMÁRIOSUMÁRIO
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ACERCA DA TEMÁTICA..........................
2 REVISÃO DA LITERATURA......................................................................
15
16
25
2.1 POLÍTICAS DE SAÚDE: fragmentos da história......................................
26
2.2 A MUNICIPALIZAÇÃO DA SAÚDE EM JOÃO PESSOA - PB.................
37
2.3 A TERAPIA COMUNITÁRIA: origem e interface com a
Saúde
Mental.............................................................................................................
43
3 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA...............................................................
3.1 CONHECENDO O MÉTODO – HISTÓRIA ORAL....................................
3.2 CENÁRIO DA INVESTIGAÇÃO E COLABORADORES..........................
3.3 TÉCNICA DE PRODUÇÃO DO MATERIAL EMPÍRICO..........................
3.4 TRAJETÓRIA DA PESQUISA DE CAMPO..............................................
3.5 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS....................................................................
4 TECENDO OS FIOS DA HISTÓRIA: AS NARRATIVAS
DOS
COLABORADORES......................................................................................
5 AS HISTÓRIAS INTERPRETADAS...........................................................
5.1 TERAPIA COMUNITÁRIA: o sentido da hisria......................................
5.2 TERAPIA COMUNITÁRIA: promovendo mudanças
, superação e
crescimento.....................................................................................................
5.3 CONTRIBUIÇÕES PARA O SUS E A SAÚDE MENTAL EM BUSCA
DA INTEGRALIDADE NA ATENÇÃO BÁSICA..............................................
5.4 DESAFIOS APONTADOS........................................................................
52
53
53
54
55
58
59
135
136
144
148
152
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................
REFERÊNCIAS..............................................................................................
ANDICES
APÊNDICE A – FICHA TÉCNICA
158
161
14
APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO
APÊNDICE C – CARTA DE CESSÃO
ANEXO
ANEXO A – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA
15
1 INTRODUÇÃO
1 INTRODUÇÃO1 INTRODUÇÃO
1 INTRODUÇÃO
16
1.1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DA TEMÁTICA
As políticas de saúde no Brasil, no Século XX, iniciam-se para enfrentar o
quadro sanitário existente no País. Em particular, na década de 1970, constatava-
se a permanência de graves problemas de saúde na população. De um lado,
atribuía-se essa situação às más condições de vida da população de baixa renda,
e, de outro, ao insuficiente desenvolvimento das medidas de Saúde blica e de
saneamento básico (BRASIL, 2005a).
É oportuno destacar que, no final do Século XX e no início deste, houve
consideráveis influências nas condições de vida e na Saúde Mental das pessoas,
principalmente nos países onde uma deterioração progressiva da qualidade de
vida. Como conseqüência, houve um aumento considerável da violência
doméstica e social, do desemprego e do subemprego, do trabalho infantil, da
fome, da pobreza, da dependência às drogas, do abandono à criança e ao idoso,
da prostituição infantil, da desesperança nos jovens e nos adultos, bem como
transtornos psíquicos e emocionais (OPAS/OMS, 1997).
No que diz respeito aos transtornos psiquiátricos, um estudo realizado por
Mari (1992) apontava a presença freqüente desse problema na comunidade e,
desde então, vem se observando que tem aumentado gradativamente na
população feminina, principalmente na de estrato de baixa renda.
Nesse contexto, a Organização Pan-americana da Saúde - OPAS - e a
Organização Mundial de Saúde OMS (1997) - assinalam que a falta de uma
política de inserção social mais abrangente, o desemprego, a falta de moradia, de
saúde, problemas relacionados à educação e à aceitação social podem ser
considerados como principais fatores de desajustes e desequilíbrios e,
conseqüentemente, desencadeadores de transtornos e de sofrimentos psíquicos.
Essa realidade tende a ser agravada, como mostra o relatório de 2001 da
OMS/OPAS sobre a saúde no mundo, segundo o qual, no ano 2000, os
transtornos mentais e neurológicos foram responsáveis por 12% do total de
anos/vida ajustados por incapacitação (AVAI), perdidos em virtude das doenças
17
incapacitantes, sendo que apenas uma minoria recebe tratamento adequado e,
até o ano 2020, essas doenças terão crescido cerca de 15%.
Vale salientar que, no cenário brasileiro e, em particular, no Estado da
Paraíba, o aumento da ocorrência dos transtornos mentais está associado a sérios
problemas que a população vem enfrentando, como, por exemplo, péssimas
condições econômicas e sociais, reveladas, entre outros indicadores, pelos
consideráveis índices de desemprego e pela violência. Segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2008), em abril de 2004, na Paraíba, a
taxa de desemprego foi de 11,5%. Em 2007, essa taxa foi de 9,3%, com boa parte
dessas pessoas recebendo entre um e dois salários mínimos.
Esses dados apresentam uma dura realidade, que contribui para o aumento
dos números de violência, de transtornos mentais e de depressão, uma vez que
toda essa situação gera nas pessoas desconforto e, por vezes, desespero, por
falta de condições, de oportunidades e de apoio familiar, o que acaba por
favorecer a marginalização, o aumento da exclusão de pessoas da sociedade e o
aparecimento de doenças que são provenientes de desajustes e de desequilíbrios,
desencadeando transtornos mentais.
Minayo (2001) destaca que um número expressivo dos serviços de saúde
não orienta a população para enfrentar os problemas, as crises, o sofrimento
emocional e mostrar a importância das relações na vida de cada indivíduo e da
comunidade.
Nessa perspectiva, as políticas públicas devem gerar ações que garantam
a saúde e não somente o atendimento às doenças. Isso exige que o cuidado seja
planejado, a fim de diminuir os riscos desses transtornos, erradicar suas causas e
tratar e recuperar os danos.
Para atender a essa população, no atual modelo de saúde preconizado
pelo Sistema Único de Saúde (SUS), os serviços de saúde passaram por um
processo de revisão no modelo assistencial, adotando uma conformação em cuja
base há um conjunto de Unidades Básicas de Saúde que priorizam aspectos
preventivos da saúde e atendem às características da atenção primária (CECÍLIO,
1997).
18
No ano de 2008, as ações relativas à atenção básica têm se concentrado
no processo de expansão da Estratégia Saúde da Família (ESF), incentivada pelo
Ministério da Saúde (MS). Vale ressaltar que o termo Programa Saúde da Família
(PSF) foi substituído por Estratégia Saúde da Família, pois programa é um termo
que apontava para uma atividade com início, desenvolvimento e finalização, e a
ESF tem como propósito a reorganização da atenção primária, que não prevê um
tempo para finalizar.
Então, a ESF é, notoriamente, uma ação de promoção da saúde e de
prevenção de doenças (MARQUES; MENDES, 2002). Ela caracteriza-se pelo
desenvolvimento de ações que são orientadas pelos princípios da universalidade,
da eqüidade e da integralidade, criados pelo SUS.
A ESF foi implantada no Brasil desde 1994 e tem o objetivo de substituir o
modelo tradicional de assistência à saúde, trabalhando dentro de uma nova lógica,
com maior capacidade de ão para atender às necessidades de saúde da
população de sua área de abrangência (FREITAS, 2008). Nesse sentido, de
acordo com Carvalho (2006, p.16),
a dimensão da integralidade em saúde não é única. A acepção
consensual é de que signifique o tudo. Costumo dizer que a
integralidade tem duas dimensões: a vertical e a horizontal. A vertical
inclui a visão do ser humano como um todo, único e indivisível. A
horizontal é a dimensão da ação de saúde em todos os campos e níveis.
Tudo, sob todos os aspectos. O ser humano como um todo: bio-psico-
social. O bio-psico, incluindo órgãos e sistemas de maneira integrada e
não-dicotomizada. A atuação da saúde em todas as áreas: promoção,
proteção e recuperação. Em todos os níveis: do primário ao quaternário.
Igualmente, a Política Nacional de Saúde Mental, pautada na Lei Federal
10.216, de 06 de abril de 2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das
pessoas portadoras de transtornos mentais, também redireciona o modelo
assistencial em Saúde Mental, prevê que suas ações tenham como cerne e fio
condutor a humanização, de maneira que o usuário do sistema consiga usufruir de
forma universal, integral e sistêmica sem nenhuma restrição (BRASIL, 2008).
Essa lei prevê, ainda, a criação de mecanismos que promovam a inversão
da cultura hospitalocêntrica, através da substituição da internação pela atenção
em serviços comunitários em base territorial que atuam em rede. Essa rede é
19
composta pelos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), pelos Ambulatórios,
pela Atenção Básica, pelos Serviços Residenciais Terapêuticos, pelos Centros de
Convivência e Cultura, entre outros.
No campo da Saúde Mental, estão sendo desenvolvidas experiências
exitosas por parte das equipes da ESF, em diversos Municípios brasileiros. De
acordo com Delgado (2007), essas ações não se completarão enquanto o
componente de Saúde Mental na ESF e na atenção básica continuar tão frágil.
As equipes de Saúde da Família precisam estar se preparando para
promover a Saúde Mental no contexto geral da saúde, prevenir o adoecimento
mental, identificando situações e fatores de risco, aos quais a população está
exposta e que provocam sofrimento, como também, responder, de modo
satisfatório, às necessidades de saúde dos seus usuários (PINHEIRO; MATTOS,
2001).
Dentre as ações definidas pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de
João Pessoa - PB - para reorganizar sua rede de atenção à saúde, a estratégia
referente à Saúde da Família constitui o eixo norteador para a organização da
atenção básica. A implantação da ESF, na referida cidade, ocorreu em duas
etapas: começou no ano de 2000, com sete equipes, e, em 2004, esse número foi
ampliado para 180 equipes, permanecendo assim até então. Essa ampliação teve
por objetivo a expansão da cobertura territorial e populacional das ações básicas
de saúde.
Antes se tinha uma rede de cuidado para a atenção básica ainda muito
incipiente. Porém, com essa ampliação, houve uma expansão da rede de
cuidados para a comunidade e, conseqüentemente, o aumento da demanda de
cuidados passou a ser bem diversificado, assistindo os usuários no campo do
sofrimento emocional, devido às dores sicas, entre outros. Percebeu-se, então,
que a população atendida precisava falar do cotidiano e dos problemas que
afetam a saúde, pois muitos dos problemas relatados pelos pacientes traziam
conseqüências além da questão biológica. Essa procura, por parte da população,
gerou dificuldades para que os profissionais da ESF atendessem à demanda das
pessoas em situação de sofrimento emocional e dessem respostas satisfatórias
20
(resolutivas) para a população. Portanto, sentiram a necessidade de mais uma
ferramenta para diversificar a prática no trabalho comunitário.
Nessa direção, os gestores municipais de saúde, buscando fortalecer ões
que possam garantir o cuidado integral aos portadores de transtornos mentais, na
atenção básica, iniciam o processo de formação de profissionais da saúde em
Terapia Comunitária, como um dispositivo para a promoção da saúde e a
prevenção do transtorno mental. Essa é considerada por Barreto (2008) como um
espaço de acolhimento, onde se procura, partilhar experiências de vida e
sabedorias de maneira circular e horizontal. Portanto, constitui-se um espaço de
escuta, de reflexão e de troca de aprendizagem, na busca de soluções para os
conflitos pessoais e familiares apresentados pelos participantes, que são
incentivados pelo terapeuta a partilhar com o grupo alguma questão ou dificuldade
que os estejam incomodando no momento.
Nesse contexto, a Terapia Comunitária vem se consolidando como uma
prática integrativa, que deve se constituir como uma estratégia includente e
cidadã, a fim de favorecer mudanças das práticas de saúde e desenvolver ações
terapêuticas por meio da construção de saberes (científico/popular), que
proporcionam o equilíbrio físico e mental dos usuários. Essa ferramenta funciona,
portanto, como fomentadora de cidadania, de redes sociais solidárias e de
identidade cultural da comunidade (BARRETO, 2008).
A superação dos desafios, reflexo das discussões no campo da saúde
coletiva, aponta para a necessidade de se implantarem estratégias operacionais e
tecnologias do cuidado, nos diferentes níveis de gestão, que ampliem a
participação de setores sociais comprometidos com a melhoria da qualidade de
vida da população brasileira.
Convém registrar que parte da demanda dos serviços ambulatoriais e de
atenção básica é constituída por pessoas com problemas que não conseguem ser
classificados como uma doença específica (BRASIL, 2005b), e elas passam a
somatizar a depressão, o estresse, as neoplasias, as dores de coluna, as
gastrites, dentre outros males, que vêm como sinais do sofrimento emocional ou
psíquico mostrados pelo corpo, razão pela qual buscam a terapêutica
21
medicamentosa como uma válvula de escape, na tentativa de resolver esses
problemas.
que se enfatizar que o uso de mecanismos e de estratégias que
busquem respostas satisfatórias para se enfrentar o sofrimento e fortalecer os
vínculos de solidariedade entre as pessoas é de extrema relevância, para que se
encontrem soluções para os problemas vivenciados coletivamente. Para isso, vem
sendo implementada, na rede de cuidados básicos, a Terapia Comunitária (TC),
um tratamento empregado para que se possa diminuir o uso indiscriminado de
medicamentos e desenvolver ações que respeitam as experiências dos usuários
dos serviços,
contribuindo para a melhoria de sua saúde e o alívio de suas
inquietações cotidianas, como também de famílias e da comunidade.
Camarotti (2007a) afirma a TC não foi estruturada por meio de uma
concepção teórica, mas emergiu da atitude das pessoas expostas ao sofrimento,
buscando alternativas para enfrentar seus problemas, realizando parcerias entre
elas, demonstrando solidariedade de pessoa para pessoa ou de grupo para grupo.
O criador dessa tecnologia do cuidado foi o Professor Dr. Adalberto de
Paula Barreto, sertanejo da cidade de Canindé, no interior do Estado do Ceará,
que sonha com um mundo construído com base na inclusão social, no respeito e
na solidariedade (BARRETO, 2008). Ele é Professor da Universidade Federal do
Ceará e pertencente ao Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de
Medicina. A TC nasceu com o projeto quatro varas, que buscava a inclusão social
dessas pessoas de menor poder aquisitivo, sofridas e excluídas.
A Terapia Comunitária vem ocupando um lugar fundamental como uma
tecnologia de cuidado, em que as relações são fundamentais para a produção do
cuidado. Na perspectiva de Boff (2004, p.13), o cuidado, enquanto “princípio
inspirador de um novo paradigma de convivialidade”, deve estar voltado para a
preocupação com o outro, enxergando mais profundamente seu sentido e
essência, atendendo as suas necessidades, ao mesmo tempo em que potencializa
dimensões profundas do ser humano.
Waldow (2001, p. 17) considera que cuidar não se limita a restabelecer a
saúde a partir da realização de um curativo para tratar uma ferida ou do alívio de
22
uma dor que gera desconforto. “Procura ir além, tentando captar o sentido mais
amplo: o cuidado como uma forma de expressão, de relacionamento com o outro
ser e com o mundo, enfim, como uma forma de viver plenamente”. Isso significa
que o cuidado, no âmbito da saúde, não deve se restringir a uma ação técnica, no
sentido de se fazerem procedimentos, mas atender às necessidades do ser
paciente, garantindo o seu bem-estar físico, mental e espiritual. Entretanto, para
que estratégias como a TC dêem certo, é necessário que a comunidade participe
do cuidar com o apoio de ações do poder público. No tocante à equipe que faz
saúde coletiva, espera-se o uso máximo de conhecimentos e de ações com base
técnica e apoio na legislação. Dos usuários, espera-se iniciativa e mobilização de
recursos políticos, culturais e comunitários.
Outro ponto importante a destacar é que a TC propiciará a redução de
agravos e de danos, pois respeita a competência das pessoas e promove a
construção de redes sociais utilizando-se de meios para que elas exponham o que
sentem, evitando que as doenças se somatizem no corpo. Assim, a população
atendida precisa falar do cotidiano e dos problemas que lhe afetam a saúde. Além
disso, na rede de serviços municipais, faltam espaços adequados de escuta do
sofrimento dessas pessoas e que proporcionem o estabelecimento e o
fortalecimento de vínculos tão desejados pela equipe de Saúde da Família. Essa é
a estratégia forte que a TC traz.
Considerando a relevância da TC para a formação dos profissionais que
atuam na ESF e o impacto que ela está causando no campo da Saúde Mental dos
usuários, evidencia-se que essa tecnologia de cuidado contribui com a construção
e a ampliação do conhecimento, principalmente na área de saúde comunitária, a
fim de que se revelem resultados de ações práticas desenvolvidas por enfermeiras
e outros profissionais da saúde para serem utilizadas no enfrentamento dos
problemas que afetam a Saúde Mental da população (FERREIRA FILHA; DIAS,
2007).
Vale ressaltar que essa tecnologia vem sendo desenvolvida há,
aproximadamente, 21 anos, a princípio, no Estado do Ceará e, posteriormente, em
todo o cenário brasileiro. Na Paraíba, teve início a partir de 2005, com resultados
23
positivos, como destacam os estudos desenvolvidos por Guimarães (2006) e
Holanda (2006).
Logo, é inegável a contribuição dessa ferramenta como veículo de
mudança para a saúde dos usuários assistidos na ESF e para as famílias e a
comunidade. Por outro lado, a história da implantação da TC, no cenário
paraibano, não foi, até o momento, disseminada na comunidade por meio de
produção de trabalho científico. Enquanto conhecedora da imporncia da TC para
melhorar a qualidade de vida da população assistida pela referida estratégia,
como fisioterapeuta e discente do Programa de Pós-graduação em Enfermagem
do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba, direcionei o
meu projeto de dissertação para a referida temática, cujo objeto de investigação é
a Terapia Comunitária, como uma ferramenta para a mudança das práticas de
saúde no Município de João Pessoa – PB.
Cumpre assinalar que esta investigação é um subprojeto do projeto
intitulado A TERAPIA COMUNITÁRIA NO CONTEXTO DO SISTEMA ÚNICO DE
SAÚDE - SUS - do Grupo de Estudos e Pesquisa Saúde e Sociedade (GEPSS),
em articulação com o Programa de Pós-graduação Strictu Sensu em Enfermagem,
do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba PPGENf /
CCS / UFPB.
Assim sendo, diante das considerações apresentadas, algumas questões
me inquietaram: Como foi o processo de implantação da Terapia Comunitária no
Município de João Pessoa - PB? Qual a importância da Terapia Cominitária e
como ela tem contribuído para o projeto político de organização das ações de
saúde na atenção básica no Município de João Pessoa? Quais foram os desafios
encontrados no processo de implantação e operacionalização da TC relacionados
às necessidades do projeto político de reorganização da atenção básica no
Município de João Pessoa?
Então, com base nessas indagações, traçaram-se para este estudo os
seguintes objetivos:
24
Objetivo geral:
Conhecer o processo de implantação da Terapia Comunitária e sua
importância para a organização da demanda de cuidados de saúde na rede de
serviços básicos no Município de João Pessoa/PB, na perspectiva da
integralidade.
Objetivos específicos:
Revelar a história da implantação da Terapia Comunitária no
Município de João Pessoa – PB;
Investigar a importância da Terapia Comunitária para o projeto
político de organização das ações de saúde na atenção básica;
Verificar como a Terapia Comunitária tem contribuído para a
organização das ações de saúde da atenção básica no Município de
João Pessoa;
Identificar os desafios encontrados no processo de implantação e
operacionalização da TC relacionados às necessidades do projeto
político de reorganização da atenção básica no Município de João
Pessoa.
Nessa perspectiva, buscou-se subsidiar e oferecer elementos de
estratégias para a implantação da TC em outros Municípios brasileiros, contribuir
para o aprofundamento e a ampliação dos conhecimentos sobre as possibilidades
que a Terapia Comunitária vem trazendo, enquanto ferramenta de mudança,
proporcionando a melhoria da qualidade de vida das pessoas e da comunidade,
bem como, para a construção do conhecimento da Enfermagem e das demais
áreas da saúde, cooperando para a consolidação da Terapia Comunitária no SUS,
como opção de cuidado ao sofrimento das pessoas.
25
2 REFERENCIAL
2 REFERENCIAL 2 REFERENCIAL
2 REFERENCIAL
TEÓRICO
TEÓRICOTEÓRICO
TEÓRICO
26
2.1 AS POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL: fragmentos da história
No Século XV, por volta de 1500, o Brasil foi descoberto, fato que coincidiu
com o nascimento da medicina moderna no mundo. Nesse período, as doenças
eram encaradas pelos nativos (índios) como castigo ou provação, cujas causas
eles reconheciam como reflexo da ação de um ser sobrenatural, astros, agentes
climáticos, força de uma praga ou feitiço, o que os fazia recorrer, pela forte
concepção mística, aos pajés para exorcizar os maus espíritos ou utilizar plantas e
substâncias diversas no tratamento das enfermidades (BRASIL, 2005a).
Certamente, os colonizadores (portugueses) não apoiavam essa forma de
atendimento, até porque eles tinham como um de seus objetivos converter os
indígenas ao Cristianismo e, para isso, seria necessário neutralizar a influência do
pajé. Dessa maneira, os padres jesuítas tiveram um papel importante na
assistência aos doentes, levando medicamentos e alimentos aos pacientes. Com
a progressão da colonização, houve a substituição da assistência médica jesuítica
pelos físicos, como eram conhecidos os médicos da época, e pelos cirurgiões-
barbeiros (BRASIL, 2005a).
Na época do Brasil-colônia, a prática médica era baseada em
conhecimentos tradicionais, e não, “científicos”. Havia serviços de saúde,
organizados precariamente, que se preocupavam com as doenças pestilenciais,
sobretudo a varíola e a febre amarela.
a partir do Século XIX, é que se estruturam ações visando à promoção
da saúde, antes mesmo da ocorncia das doenças, procurando intervir na
sociedade de maneira global. Essas ações podem ser entendidas como
“propostas para dificultar ou impedir o aparecimento da doença, enfrentando as
suas causas, contra tudo que, na sociedade, pode interferir no bem-estar físico e
moral” (BRASIL, 2005a, p.13).
De acordo com Nunes (2006, p. 20), nessa época, houve a fixação de
alguns princípios sicos que se tornariam parte integrante do movimento
sanitário:
27
a saúde das pessoas como um assunto de interesse societário e a
obrigação da sociedade de proteger e assegurar a saúde de seus
membros; que as condições sociais e econômicas têm um impacto
crucial sobre a saúde e doença e estas devem ser estudadas
cientificamente e que as medidas a serem tomadas para a proteção da
saúde são tanto sociais como médicas.
Nesse momento, assumia-se o caráter social da medicina e da doença,
emergindo a denominada Medicina Social. Em 1808, com a chegada da família
real ao Brasil, adotaram-se os conceitos de Polícia Médica aplicados na
Alemanha. Essa concepção propunha a intervenção nas condições de vida e na
saúde da população, com o propósito de vigiar e controlar o aparecimento de
epidemias. Tratava-se de um controle-profilaxia, de vigilância da cidade.
Também em 1808, D. João VI atribui à Fisicatura as ações voltadas para os
problemas de higiene do meio urbano, que esboça a idéia de uma Política
Sanitária da cidade. A concepção adotada sobre as causas das doenças baseava-
se na teoria miasmática, em que se considerava que o ar era o principal causador
de doenças, pois carregava gases pestilenciais oriundos de matéria orgânica em
putrefação. Outra causa seria a circulação das pessoas e de mercadorias nos
portos. As ações de profilaxia das moléstias transmissíveis consistiam,
fundamentalmente, na fiscalização rigorosa das embarcações que poderiam trazer
a peste ou outras moléstias epidêmicas. Além disso, com a vinda da família Real
para o Brasil, nesse mesmo ano, houve a necessidade de uma maior organização
para o governo, que já buscava controlar as epidemias (BRASIL, 2005a).
Em 1849, foi criada a Junta Central de Saúde Pública, a qual incorporou os
estabelecimentos de Inspeção de Saúde dos Portos do Rio de Janeiro e do
Instituto Vacínico. No ano de 1897, foram criados os Institutos Manguinhos, Adolfo
Lutz e Butantã para pesquisa, produção de vacinas e controle de doenças. Com a
Proclamação da República, em 1889, as Juntas e Inspetorias de Higiene foram
substituídas pelos Serviços Sanitários Estaduais, os quais eram bastante
desorganizados, favorecendo a ocorrência de novas epidemias no Brasil.
Entretanto, nas décadas de 1890 e 1900, o Rio de Janeiro e as principais cidades
do país continuaram a ser vitimadas por diversas doenças fatais na época, como:
varíola, febre amarela, peste bubônica, febre tifóide e cólera (BRASIL, 2005a).
28
Diante disso, os médicos higienistas passaram a receber incentivos do
governo federal para ocupar cargos importantes na administração pública. Em
contrapartida, esses profissionais tinham que estabelecer estratégias para o
saneamento das áreas atingidas pelas epidemias, cujo combate ficou sob a
responsabilidade do médico sanitarista Oswaldo Cruz que, em 1903, combateu a
febre amarela no Rio de Janeiro e dirigiu a Diretoria Geral de Saúde Pública
(DGSP), criada em 1904 (BRASIL, 2005a).
É oportuno destacar que, na década de 1920, quem necessitasse de
assistência médica era obrigado a comprar serviços de profissionais liberais.
Aqueles que não tinham condição financeira procuravam a medicina popular,
exercida por leigos e curandeiros, ou recorriam às Santas Casas de Misericórdia,
destinadas ao tratamento de pobres e/ou indigentes (PAIM, 2003).
Em 1923, as ações de Saúde Pública foram vinculadas ao Ministério da
Justiça, incluindo-se como responsabilidade do Estado, além do controle das
endemias e epidemias, a fiscalização de alimentos, o controle dos portos e
fronteiras. Ainda em 1923, foi criado o Departamento Nacional de Saúde Pública,
cujas funções englobavam a higiene infantil, a industrial e profissional, a
propaganda sanitária, a saúde dos portos e o combate às endemias rurais
(FONTINELE JÚNIOR, 2003).
Em 1942, foi criado o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), cujo
objetivo fundamental era proporcionar apoio médico-sanitário às regiões de
produção de materiais estratégicos para o Brasil, durante o período da II Guerra
Mundial. Também nessa época, a maioria dos hospitais públicos do País foi
construída.
Sendo assim, em torno desse contexto, durante a década de 1970, o Brasil
apresentava um modelo hegemônico médico assistencial-privatista, centrado na
“demanda espontânea”, predominantemente curativo, reforçando a atitude dos
indivíduos de procurarem os serviços de saúde quando se sentiam doentes
(PAIM, 2003). Dessa forma, não proporcionava um atendimento integral nem ao
paciente nem à comunidade porque não se comprometia com o impacto sobre o
nível de saúde da população.
29
Em 1976, foi criado o Programa de Interiorização das Ações de Saúde
(PIASS), dirigido por técnicos comprometidos com a proposta do “movimento
sanitário”, que estava surgindo. Nesse momento, começou a se organizar o
Movimento Sanitário, que buscava conciliar a produção do conhecimento e a
prática política, ao mesmo tempo em que ampliava seu campo de ão,
envolvendo-se com organizações da sociedade civil nas suas demandas pela
democratização do País (FONTINELE JÚNIOR, 2003).
Foi nesse período em que as idéias da medicina social penetraram nos
meios acadêmicos brasileiros. Sua abordagem contrapunha-se à “concepção
positivista de uma ciência universal, empírica, atemporal e isenta de valores”, uma
abordagem médico-social fundada na percepção do caráter político da área da
saúde (ESCOREL, 1998).
A partir de 1978, é acordada na Conferência Mundial de Saúde de Alma-
Ata, promovida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), uma proposta
internacional de priorização da atenção e dos cuidados primários de saúde, além
de ser reafirmada a idéia de que a se saúde constitui como um dos direitos
fundamentais do homem, sob a responsabilidade política dos governos, e
reconhece-se a sua determinação intersetorial.
O primeiro marco desse movimento ocorreu em 1979, no I Simpósio
Nacional de Política de Saúde. Essa proposta, que se chamava, na época, de
Sistema Único de Saúde, contemplava diversos conceitos advindos de
experiências bem sucedidas em outros países, como a universalização do direito à
saúde, racionalização e integralidade das ações, democratização e participação
popular, bem como algumas experiências de atenção primária e de extensão de
cobertura desenvolvidas no país, como o Programa de Interiorização das Ações
de Saúde e Saneamento – PIASS (FONTINELE JÚNIOR, 2003).
Na década de 1980, os movimentos sociais intensificam-se, e uma maior
discussão foi possível sobre os novos rumos que deveriam tomar o sistema de
saúde. Dessa forma, com o aumento da consciência sanitária no País, foi
possível, por meio do movimento denominado de Reforma Sanitária, desenvolver-
se uma série de tentativas para a reestruturação da Saúde. Posteriormente,
30
quando esse movimento ganhou força, foi realizado, em março de 1986, um dos
principais eventos político-sanitários do Brasil: a Conferência Nacional de
Saúde (CNS) em Brasília (FONTINELE JÚNIOR, 2003).
Essa Conferência foi considerada como um divisor de águas no Movimento
Sanitário e caracterizou-se por três aspectos principais, quais sejam: o conceito
abrangente de saúde, vista não apenas como ausência da doença, mas como
resultado das condições de moradia, alimentação, renda, emprego, dentre outros;
saúde vista como um direito de cidadania e dever do Estado e a instituição de um
Sistema Único de Saúde. Com uma ampla participação, a CNS se constituiu no
maior fórum de debates sobre a situação de saúde do Brasil, e seu relatório serviu
de base para a proposta de reestruturação do sistema de saúde existente que,
posteriormente, viria a ser defendida na Constituinte (FONTINELE JÚNIOR, 2003).
Em julho de 1987, foi criado o Sistema Unificado Descentralizado de Saúde
(SUDS), que incorporou os principais princípios da Reforma Sanitária:
universalização, eqüidade, integralidade, descentralização, hierarquização e
participação popular. O SUDS foi implantando ao mesmo tempo em que se
instalava a Comissão Nacional de Reforma Sanitária (CNRS) e se constituía,
assim, em uma estratégia que reorientava as políticas de saúde e reorganizava os
serviços, enquanto se desenvolviam os trabalhos da Constituinte e a elaboração
da legislação ordinária para o setor (CORDEIRO, 2004).
É oportuno destacar que, ainda em 1987, no campo da Saúde Mental, foi
realizada a I Conferência Nacional de Saúde Mental, durante a qual foram
debatidos os temas referentes aos direitos, deveres e legislação do doente mental,
à reforma sanitária e à reorganização da assistência à Saúde Mental.
Em 1988, a Assembléia Nacional Constituinte aprovou a nova Constituição
Brasileira, incluindo, pela primeira vez, uma seção sobre a Saúde, expressa nos
artigos 196 a 200. É oportuno ressaltar que essa Constituição não apenas
introduziu um novo modelo para a organização do setor da Saúde, mas também
permitiu consolidar décadas de avaliações e debates a respeito do assunto.
Mediante essa nova Constituição, a saúde passou a ser um direito de todo
cidadão e dever do Estado. Essa seção sobre Saúde incorporou, em grande
31
parte, os conceitos e as propostas da Conferência Nacional de Saúde,
podendo-se dizer que, na essência, a Constituição adotou a proposta da Reforma
Sanitária e do SUS (PAIM, 2003).
Em 1990, foram aprovadas a Lei 8.080, que regulamenta o SUS, e a Lei
8.142, que regula a participação da comunidade na gestão do SUS e disciplina a
transferência de recursos financeiros intergovernamentais para a área da Saúde.
De acordo com o artigo 4º da Lei Federal 8.080/90, o Sistema Único de Saúde
é o conjunto de ações e serviços de saúde prestados por órgãos e
instituições Públicas Federais, Estaduais e Municipais, da Administração
direta e indireta e das Fundações mantidas pelo Poder Público... e,
complementarmente... pela iniciativa privada.
Com relação ao processo de construção do SUS, pode-se dizer que
apresentou elevado impacto não somente pela substituição de um modelo que
não atendia às necessidades da população, mas também porque foi por meio dele
que se deu o início efetivo da participação da sociedade brasileira na
determinação de seus destinos vinculados ao Setor da Saúde.
Como princípios doutrinários do SUS, têm-se a universalidade, a eqüidade
e a integralidade. A universalidade diz respeito às ações e aos serviços serem
acessíveis a todas as pessoas, independentemente de sexo, raça, renda,
ocupação, ou outras características sociais ou pessoais.
O princípio da eqüidade é aquele em que todo cidadão é igual perante o
Sistema Único de Saúde e deve ser atendido e acolhido conforme as suas
necessidades, respeitando as diferenças, pois os serviços de saúde devem
considerar que, em cada população, existem grupos que vivem de forma diferente,
tendo, por isso, problemas específicos. Assim, os serviços de saúde devem
trabalhar em cima dessas diferenças, ou seja, o SUS não pode oferecer o mesmo
atendimento a todas as pessoas, da mesma maneira, em todos os lugares.
A integralidade significa considerar a pessoa como um todo, devendo as
ações de saúde procurarem atender a todas as suas necessidades. Dessa forma,
as ações de saúde devem ser combinadas e voltadas concomitantemente para a
prevenção, promoção, cura e reabilitação.
32
O SUS é organizado segundo as seguintes diretrizes: a hierarquização, a
participação popular e a descentralização. A hierarquização diz respeito ao
acesso da população à rede, que deve se dar por meio dos serviços de nível
primário de atenção, que precisam estar qualificados para atender e resolver os
principais problemas que nos serviços de saúde. Os que não forem resolvidos
nesse nível deverão ser referenciados para os serviços de maior complexidade.
Há, ainda, a participação popular, que é a participação dos indivíduos
garantida constitucionalmente, através de entidades representativas. Nesse
sentido, a população poderá participar do processo de formulação das políticas de
saúde e do controle de sua execução, em todos os níveis, desde o federal até o
local. O controle sobre o SUS é exercido pela população através da participação
nos Conselhos de Saúde (nacional, estaduais e municipais) e nas Conferências de
Saúde.
A descentralização é uma redistribuição das responsabilidades das ações
de serviços entre os vários níveis de governo, garantindo ao SUS estar apto,
dentro do limite de sua complexidade, a resolver os problemas de saúde em cada
nível de assistência. Deve, também, enfrentar os problemas relacionados ao
impacto coletivo sobre a saúde, partindo da idéia de que os serviços de saúde
devem se responsabilizar pela vida dos cidadãos de sua área ou território de
abrangência.
Nessa conjuntura, o SUS objetiva prestar assistência às pessoas, por
intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, através da
realização integrada de ações assistenciais e atividades preventivas, que também
se estendem para o campo de atenção à Saúde Mental. A política de Saúde
Mental do SUS segue as determinações da lei 10.216/2001, referendada pela III
Conferência Nacional de Saúde Mental e conferências nacionais de saúde
(BRASIL, 2007).
Nesse momento, vale ressaltar que, com o processo de implantação do
SUS, no cenário brasileiro, intensifica-se o processo de reversão do modelo de
assistência hospitalocêntrico, para o comunitário. O modelo hospitalocêntrico
enfoca o indivíduo e a cura, enquanto o modelo comunitário, que tem como base a
33
comunidade, valoriza o coletivo, ou seja, enfoca a pessoa, a família e os grupos
sociais, buscando a promoção da saúde e a prevenção do adoecimento. Essa
transição foi fortemente marcada pelos Movimentos da Reforma Sanitária e da
Reforma Psiquiátrica (CAVALHERI, 2002; LUISI, 2006).
Não obstante, é oportuno destacar que o processo de Reforma Psiquiátrica,
que surgiu na década de 1970, na política de Saúde Mental brasileira, dentro do
movimento sanitarista, tendo como foco a busca pelos direitos humanos, construiu
sua história a partir da crítica à medicalização da loucura e ao modelo da
psiquiatria biomédica, dentro de um contexto de superação da violência asilar. De
acordo com Amarante (1995, p. 91), no Brasil, o movimento de Reforma
Psiquiátrica é um movimento de cunho político, social e econômico. Sendo assim,
pode-se entender essa Reforma como um
processo histórico de formulação crítica e prática que tem como
objetivos e estratégias o questionamento e a elaboração de propostas
de transformação do modelo clássico e do paradigma da psiquiatria. No
Brasil, a reforma psiquiátrica é um processo que surge mais concreta e
principalmente a partir da conjuntura da redemocratização, em fins da
década de 1970, fundado não apenas na crítica conjuntural ao
subsistema nacional de Sde Mental, mas também, e principalmente,
na crítica estrutural ao saber e às instituições psiquiátricas clássicas, no
bojo de toda a movimentação político-social que caracteriza esta mesma
conjuntura de redemocratização.
Esse movimento social pelos direitos dos pacientes psiquiátricos no Brasil
foi desencadeado a partir das denúncias de violência nos manicômios, levando a
uma crise no modelo centrado no hospital psiquiátrico. Assim, surgiram as
primeiras propostas e ações para a reorientação da assistência, com mudanças
nas políticas governamentais e nos serviços de saúde, que proporcionaram uma
base importante para a construção de um novo modelo de cuidado no âmbito da
Saúde Mental (AMARANTE, 1995). Considerando esse contexto, pode-se dizer
que, com o advento da Reforma Psiquiátrica, os serviços de Saúde Mental não-
hospitalares tornaram-se uma necessidade, para auxiliar na promoção da saúde.
Vale destacar que a rede de serviços de Saúde Mental, bem como a rede
de serviços de saúde como um todo, organizam-se com base na lógica da
complexidade tecnológica e de custos. Na rede de serviços de saúde, coexistem
serviços de alta e média complexidade e de atenção básica que, respectivamente,
34
dizem respeito ao nível terciário, secundário e primário. No que se refere ao
campo da Saúde Mental, existem, na alta complexidade, os hospitais psiquiátricos,
os serviços de urgência e emergência em hospitais gerais; na média
complexidade, ambulatórios, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Unidades
Psiquiátricas em Hospitais Gerais (UPHG) e Serviços Residenciais Terapêuticos
(SRTs), enquanto que, na atenção básica, têm-se as Unidades de Saúde da
Família (USF).
Nos serviços de alta e média complexidade, priorizam-se o tratamento e a
reabilitação em relação à pessoa em situação de sofrimento psíquico, ou seja,
aquela que padece de algum transtorno mental. A promoção da saúde e a
prevenção do adoecimento não são ações estratégicas específicas desses
serviços, restando, então, a preocupação com essa temática pelas Unidades de
Saúde da Família.
Neste momento, é oportuno assinalar que a Estratégia de Saúde da Família
(ESF) que, inicialmente, tinha o nome de Programa de Saúde da Família (PSF), foi
criada no ano de 1994 pelo Ministério da Saúde do Brasil. Baseado em
observações de experiências advindas de outros países como Cuba, China,
Inglaterra e Canadá, surge com o intuito de reorganizar o modelo de assistência à
saúde, imprimindo uma nova dinâmica de atuação nas unidades básicas de
saúde, tendo a família como núcleo social.
Funcionando de maneira adequada, as unidades básicas do programa são
capazes de resolver grande parte dos problemas de saúde que afetam a
comunidade, prestando atendimento de qualidade, prevenindo doenças, evitando
internações desnecessárias e, o mais importante, melhorando a qualidade de vida
da população.
Nesse ínterim, a concepção de saúde passou a não mais comportar um
olhar fragmentado do sujeito, sob a ótica da doença, mas também incluiu o social
como um determinante a mais nesse processo. As grandes desigualdades sociais
existentes no Brasil demonstram um modelo econômico excludente, que
compromete o acesso à educação, o laser, a assistência à saúde e determina o
processo saúde-doença da maioria dos brasileiros. Portanto, as políticas públicas
35
devem desenvolver ações que garantam a saúde, e não centralizem a assistência
somente à doença, direcionando o cuidado para diminuir os riscos, erradicar as
causas, bem como tratar e recuperar os danos.
Portanto, Almeida et al. (2001, p.15) explicita que o Estado deve
contemplar, de alguma maneira, os interesses do conjunto da população que o
compõe”, fazendo uso não só da “coerção”, mas procurando também utilizar-se do
“consenso”, para atender às reivindicações e aos valores dos diferentes grupos e
estratos sociais.
Uma vez que o Estado deve contemplar esses interesses da população, um
dos desafios colocados diante dos gestores é a inclusão da Saúde Mental na
Atenção Básica, que se caracteriza por um conjunto de ações de saúde, no âmbito
individual e coletivo, respeitando o indivíduo, na sua complexidade, integralidade
bem como na sua inserção sócio-cultural, criando vínculos, humanizando a
assistência, buscando a prevenção de agravos e a promoção e proteção da saúde
(BRASIL, 2007).
Outro fato a ser destacado é que, em janeiro de 2001, o Ministério da
Saúde, apoiado pela Comissão Intergestores Tripartite, instituiu a Norma
Operacional à Saúde (NOAS-SUS), em substituição às Normas Operacionais
Básicas (NOBs). A publicação da NOAS-SUS 01/2001 foi instituída pela Portaria
MS/GM 95, de 26 de janeiro de 2001, cujo objetivo principal era “promover
maior eqüidade na alocação de recursos e no acesso da população às ações e
serviços de saúde em todos os níveis de atenção” (CONASEMS, 2006).
Os instrumentos legais que propiciaram a nova organização do sistema de
saúde são as Normas Operacionais Básicas (NOBs), editadas entre os anos de
1991 e 1996, e, como o próprio nome diz, vêm normatizar as letras da Lei. Elas
regulam as relações entre os gestores do sistema de saúde, entre os Municípios,
Estados e o Governo Federal. Nesse ensejo, evidencia-se também um Pacto pela
Saúde firmado entre os gestores do SUS, em suas três dimensões: pela Vida, em
defesa do SUS e de Gestão. Esse documento apresenta mudanças significativas
para a execução do SUS, dentre as quais se ressaltam: a substituição do atual
processo de habilitação pela adesão solidária aos Termos de Compromisso de
36
gestão; a regionalização soliria e cooperativa como eixo estruturante do
processo de descentralização; a integração das rias formas de repasse dos
recursos federais; e a unificação dos vários pactos hoje existentes (BRASIL,
2004).
Dessa maneira, o Município passa a ter “condições de articular o conjunto
das propostas, programas e estratégias que vêm sendo definidas no nível federal
e em vários estados, para desencadear, em seu âmbito, um processo de
reorientação do “modelo assistencial do SUS que não signifique a mera
reprodução do “modelo médico-assistencial privativista”, subordinando o “modelo
sanitarista” (TEIXEIRA; PAIM; VILABÔAS, 2002, p.26-27).
As discussões e os debates sobre as questões que envolvem a Saúde
Mental no Brasil têm apontado caminhos para a amplião das diversas formas de
atuação, bem como demonstram que é possível para o poder público criar
assistência substitutiva, por meio da reorientação do modelo assistencial, a partir
da atenção básica, produzindo assim uma nova dinâmica de atuação das
unidades básicas, dividindo responsabilidades entre os serviços de saúde e a
população.
Por fim as ações de Saúde Mental na atenção básica apontam para um
novo desenho do cuidado à saúde, através da instrumentalizão dos
profissionais com ferramentas de cuidado, como a Terapia Comunitária (TC), que
possibilita um atendimento integral ao paciente e organiza as ações da Saúde da
Atenção Básica.
37
2.2 A MUNICIPALIZAÇÃO DA SAÚDE EM JOÃO PESSOA – PB
JOÃO PESSOA (ACRÓSTICO)
J.ovem senhora aos 421 anos
O.stenta com orgulho sua
bandeira
A.terceira capital mais antiga
brasileira
O.nde o sol nasce primeiro
P.assado de glória
E. marco na história
S.ua gente brava e hospitaleira
S.erve de exemplo ecológico
O.vacionada a segunda capital
mais verde do mundo
A.tlântico mar azul banha suas
praias...
"Homenagem a minha cidade".
Autor: Jamaveira (2006)
FIGURA 1: Ponta do Seixas
Fonte: www.skyscrapercity.com (2008).
João Pessoa, capital do Estado da Paraíba, é conhecida como "a cidade
onde o sol nasce primeiro", devido ao fato de, nesse Município, estar localizada a
Ponta do Seixas (FIGURA 1), que é o ponto mais oriental das Américas. A cidade
também é notável pela exuberante beleza de suas praias e pelo clima tropical,
agradável para turistas.
O Município de João Pessoa tem uma área geográfica de 210,80 Km
2
e
uma população de aproximadamente 674.762 mil habitantes (IBGE, 2008). Está
localizado na porção mais oriental da Paraíba, limitando-se, ao norte, com o
Município de Cabedelo, pelo Rio Jaguaribe; ao sul, com o Município do Conde,
pelo Rio Gramame; a leste, com o Oceano Atlântico; e a Oeste, com os Municípios
de Bayeux, pelo Rio Sanhauá, e Santa Rita, pelo Rio Mumbaba.
No campo da economia, suas principais fontes são o comércio e a indústria.
Sob esse prisma, consideram-se também como atividades importantes do
Município a pesca, a extração de caju e de coco (JOÃO PESSOA, 2006). Em
virtude dessas atividades, anualmente, muitos sertanejos, em busca de melhores
38
condições de vida, aventuram-se, indo para a capital. Isso contribui para a
formação diversificada da nossa cultura, bem como para renúncia ou perda das
raízes por parte deles. Outro fator a destacar é que muitos dos que se aventuram
se depararam com uma dura realidade vivida em todo o cenário nacional: a falta
de emprego.
Sabe-se que ninguém vive sem um meio de sobrevivência, pois é
necessário colocar comida na mesa todos os dias. Considerando essa realidade,
Barreto (2008, p.160-161) assevera: “As portas das fábricas e das empresas
raramente aceitam os excluídos, nem os recebem: nunca vagas. E a razão
para isso é simples: eles não possuem qualificação profissional”. E nessa
conjuntura, muitas vezes, em atitude de desespero, as pessoas partem para o
crime, o que gera a violência. A respeito do assunto, Barreto (2008, p.161) ainda
acrescenta: “a fome tem pressa e a barriga não pode esperar. [...] a tensão
emocional provocada pela insegurança constante e violência urbana fragilizam a
saúde do corpo e da mente”.
Contudo, em busca de melhorar as condições de vida da população, a
Prefeitura Municipal de João Pessoa PB, em seu projeto político, vem
procurando priorizar a participação popular e a democratização de espaços
públicos de gestão e atenção, inclusive no campo da saúde. Nesse ensejo, a
Secretaria Municipal de Saúde (SMS), que é ligada diretamente à Prefeitura de
João Pessoa e tem por responsabilidade a gestão plena do Sistema Único de
Saúde (SUS), no âmbito municipal, além das ações e dos serviços de saúde
oferecidos ao Município, é responsável ainda pela formulação e implantação de
políticas, programas e projetos que visem à promoção de uma saúde de qualidade
para o usuário do SUS (JOÃO PESSOA, 2006).
Na gestão (2005-2008), a Secretaria Municipal de Saúde tem como plano
estratégico a construção da atenção integral e humanizada, fundamentada na
organização de uma rede de cuidados progressivos em saúde (JOÃO PESSOA,
2006). Nessa perspectiva, no cenário brasileiro, uma política de humanização
da atenção e da gestão do SUS (humanizaSUS), que preconiza uma nova relação
entre os usuários e os profissionais de saúde, contribui para que haja um trabalho
39
mais coletivo, mais acolhedor e ágil e procura respeitar a diversidade, oferecendo
um tratamento igualitário a todos, sem distinção de raça, cor, origem, condição
social ou orientação sexual. Nesse contexto, faz necessário destacar que
as políticas de Saúde Mental representam uma preocupação séria dos
gestores em viabilizar serviços capazes de atender às demandas da
população. As ações no campo da Saúde Mental embora mereçam
avanço constante na direção de ampliar os serviços de atendimento à
população como um todo, têm buscado transformar, substancialmente,
essa realidade, no que se refere a oferecer eqüidade nos serviços de
atendimento à Saúde Mental (LUISI, 2006, p.133).
Desse modo, a gestão municipal tenta vencer um desafio em seu projeto
político: o de priorizar a participação popular e democratizar os espaços públicos
de gestão e atenção. Para tanto, a Secretaria Municipal de Saúde vem
promovendo movimentos, como oficinas de reflexão, abrindo espaço para o
debate com os trabalhadores, os diversos setores e a sociedade civil, objetivando
buscar uma construção coletiva do projeto de saúde do Município, levando-se em
consideração as necessidades da população e subsidiando as tomadas de
decisões.
Vale ressaltar que, de acordo com Campos (2005, p. 11), “há muito que se
criticar e muito que se aprender com a tradição da Saúde Pública. Todo
pensamento comprometido com algum tipo de prática (política, clínica, sanitária,
profissional) está obrigado a reconstruir depois de desconstruir”, que a Saúde é
um campo comprometido com a prática, e, para tanto, os achados científicos têm
repercussão quase que imediata sobre os modos como se lida com a saúde e com
a doença.
Os serviços que produzimos, tais como consultas, assistência, cuidado,
aulas, pesquisas e programas, não podem ser caracterizados como mercadoria,
pois têm dupla face: de um lado, um valor de uso (capacidade potencial de
atender a necessidades sociais) e, de outro, funciona como o papel de controle
social. Através desse duplo caráter, explica-se a produção de bens e de serviços
em serviços públicos (CAMPOS, 2005).
É oportuno destacar que, ao se observar, historicamente, a formação dos
diferentes profissionais de saúde, percebe-se que eles são formados para o
atendimento de doenças no estrito contexto biológico. Por essa razão, muitos
40
deles têm dificuldades em considerar fatores emocionais, culturais e sociais como
parte integrante do atendimento do indivíduo. Na gestão (2005-2008), a SMS
adotou como plano estratégico a construção da atenção integral e humanizada e a
educação permanente em saúde (EPS), com o propósito de viabilizar a
transformação, que consiste num movimento de mudança das práticas de saúde,
através do comprometimento de gestores, trabalhadores, instituições formadoras,
usuários do SUS e movimentos sociais que atuam na identificação de problemas e
na cooperação para resolvê-los, visando à integralidade da Atenção e à
reestruturação do SUS municipal, inclusive no campo da Saúde Mental.
Nessa conjuntura, o Município de João Pessoa, seguindo as definições
atuais do SUS, por meio do Pacto pela Saúde, assume o termo de compromisso
de gestão, com o objetivo de pactuar e formalizar a assunção das
responsabilidades e das atribuições inerentes à esfera municipal, na condução do
processo permanente de aprimoramento e consolidação do Sistema Único de
Saúde. Dentro dessa pactuação, o Município institucionalizou a Terapia
Comunitária (TC), como estratégia de organização da Atenção Básica, por ser
uma ferramenta que potencializa a transformação de práticas e, portanto, um
modelo de saúde pautado na perspectiva do conceito de integralidade e da defesa
da vida.
Nessa direção, os gestores municipais de saúde, buscando fortalecer ações
que possam garantir o cuidado integral aos portadores de transtornos mentais na
atenção básica, iniciam o processo de formação de profissionais da saúde em
Terapia Comunitária, como um dispositivo para a promoção da saúde e a
prevenção do transtorno mental. A TC é considerada um espaço de escuta, de
reflexão e de troca de aprendizagem, de que a comunidade participa ativamente,
deslocando o foco do atendimento individual para o coletivo. Para Guimarães et al.
(2007, p. 350), a “Terapia Comunitária é uma atividade de prevenção de
sofrimento psíquico, que possibilita a partilha de experiências de vida e
sabedorias”.
De acordo com Camarotti et al. (2007b), a Terapia Comunitária vem se
inserindo na atenção básica, com o objetivo de tecer redes de atenção, cuidado,
41
prevenção e promoção de saúde e de viabilizar atendimento e encaminhamentos
aos centros especializados das situações graves de transtornos psíquicos,
estimulando o envolvimento multiprofissional da rede de atenção básica em Saúde
Mental. Para tanto, vem dando espaço às equipes de Saúde da Família para
utilizarem esse recurso como ferramenta em suas ações preventivas.
A TC está sendo realizada em diversas Unidades de Saúde da Família do
Município de João Pessoa. Isso pode ser evidenciado através dos dados
fornecidos pela Diretoria de Atenção à Saúde – DAS - (2008) da Secretaria
Municipal de Saúde de João Pessoa. Esses dados revelam que existe cerca de 76
rodas de Terapia Comunitária acontecendo em Unidades de Saúde da Família,
em Associações de bairro, Hospitais e nos CAPS. Vale salientar, ainda, que cerca
de 45.000 pessoas passaram por essas rodas, e os principais temas abordados
têm sido depressão, violência, insônia, medo e alcoolismo, comprovando que as
necessidades da população vão além da questão meramente biológica.
É oportuno destacar que uma das medidas que estão sendo tomadas para
disseminação dessa estratégia é a realização de cursos de formação de
terapeutas comunitários. A Secretaria Municipal de Saúde, em cooperação técnica
com o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Pessoa Humana (IBDPH) e com
a Universidade Federal da Paraíba (UFPB), através do Programa de Pós-
graduação em Enfermagem, promoveu, em 2007, o I Curso de Formação em
Terapia Comunitária. Nessa primeira turma, participaram 65 profissionais da
Estratégia Saúde da Família do Município de João Pessoa, sendo realizada,
ainda, concomitantemente, outra turma, com profissionais da Estratégia Saúde da
Família de Municípios circunvizinhos, a saber: Pedras de Fogo, Conde e São
Bento, todos pertencentes ao Estado da Paraíba.
Em 2008, a Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa ainda vem
promovendo Cursos de Formação em Terapia Comunitária, com o intuito de
ampliar, para toda a rede básica esse benefício. Nesse ensejo, por meio de
recursos financeiros do Projeto de Educação Permanente em Saúde do Ministério
da Saúde, ocorreu um novo curso de formação em Terapia Comunitária, dando
42
prosseguimento a esse processo com mais uma turma envolvendo sessenta e
cinco profissionais da ESF do Município de João Pessoa – PB.
Convém enfatizar que os Pólos Formadores de terapeutas comunitários, de
acordo com Luisi (2006, p.116), são “unidades que oferecem formação em TC,
segundo critérios estabelecidos pela Associação Brasileira de Terapia Comunitária
(ABRATECOM), através de seu Conselho Deliberativo Científico (CDC)”.
Ressalta-se que, simultaneamente, no cenário nacional, ainda em 2008, o
Ministério da Saúde, percebendo a importância dessa ferramenta de cuidado, por
meio da Secretaria de Atenção Básica, libera recursos para o desenvolvimento de
um projeto relacionado ao processo de formação dos terapeutas comunitários
envolvendo 100 Municípios, permitindo a nomeação de 15 Pólos, em distintos
locais do país. Destarte, representando o Estado da Paraíba, o Pólo formador
Movimento Integrado em Saúde Comunitária (MISC PB) faz parte desse projeto,
com a responsabilidade de formar mais uma turma de profissionais da equipe de
Saúde da Família. Desse modo, com o processo de expansão da estratégia, essa
turma contempla profissionais de seis Municípios do sertão paraibano,
percebendo-se, assim, que o campo de ação está sendo ampliado, com a abertura
de uma segunda turma, com setenta profissionais da ESF de seis Municípios do
sertão paraibano, em parceria com o Ministério da Saúde e a Universidade
Federal da Paraíba.
Com esses cursos de formação, espera-se ampliar o número de
profissionais capacitados na rede pública de saúde para atender às necessidades
da população, não só no campo da Saúde Mental, mas na saúde como um todo.
Diante do exposto, evidencia-se que, por meio de suas ações, a Secretaria
Municipal de Saúde busca constituir práticas de proximidade, de nculo, de
acolhimento e de responsabilização com o usuário do SUS de João Pessoa,
proporcionando-lhe uma melhor qualidade de vida.
43
2.3 TERAPIA COMUNITÁRIA: origem e interface com a Saúde Mental
A Terapia Comunitária (TC) foi criada, em 1986, pelo Prof. Dr. Adalberto de
Paula Barreto (FIGURA 2), na favela do Pirambu, em Fortaleza Ceará. Esse
Professor nasceu em Canindé - CE, é docente do curso de graduação e pós-
graduação do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal do Ceará – UFC, na cidade de Fortaleza – CE, e tem
formação em Medicina (Psiquiatra), Teologia, Filosofia e Antropologia (BARRETO,
2008).
O Dr. Adalberto já publicou inúmeras obras, dentre elas, destacam-se
“Terapia Comunitária: passo a passoe “O índio que vive em mim”, nas quais
deixa transparecer um homem sensível ao sofrimento do povo, de notável
inteligência e cultura, mas que não perdeu ou renegou suas raízes culturais.
FIGURA 2: Prof. Dr. Adalberto
de Paula Barreto
Fonte: http://www.4varas.com.br
De acordo com Barreto (2008, p. 35), “Terapia (do grego: therapeia)
significa acolher, ser caloroso, servir, atender”. A palavra “comunidade” quer dizer
conjunto de indivíduos que vivem em comum ou têm algo em comum. A TC reúne
44
pessoas com problemas afins, como, por exemplo, preocupações, sofrimentos
vivenciados no cotidiano e, por isso, procuram soluções para a superação dessas
dificuldades.
O vocábulo cotidiano significa aquilo que é habitual ao ser humano, o que
está presente na vivência do dia-a-dia, como os gestos, a linguagem, ou mesmo
as ações compreendidas como triviais que, para Nascimento (1995), podem vir a
ser julgados sem valor, entretanto, são influenciados e influenciam a cultura da
família, da vizinhança e da comunidade e, muitas vezes, encontram-se presentes
nos processos de cura e de adoecimento porque, no cotidiano, a vida das pessoas
é marcada por problemas e sofrimentos que acarretam danos à sua saúde física e
mental.
Sendo assim, a Terapia Comunitária é uma tecnologia de cuidado, que
aquece e fortalece as relações humanas, na construção de redes de apoio social.
Dividir os problemas ajuda a multiplicar esperanças, por isso, para quem participa
das rodas de Terapia Comunitária, a solidariedade é a principal ferramenta de
busca da felicidade, pois, por meio da mobilização coletiva, propõe-se a
valorização do potencial individual, contribuindo para a construção da cidadania.
Então, a TC é um instrumento de transformação, uma vez que cada participante
reorganiza seu discurso e ressignifica seu sofrimento, dando origem a uma nova
leitura dos elementos que o faziam sofrer (BARRETO, 2008).
Pode-se, pois, afirmar que a Terapia Comunitária é um espaço de
acolhimento, onde se partilham experiências de vida e sabedorias de maneira
circular e horizontal, pois, de acordo com Barreto (2008), na TC não existe a
diferença provocada pela verticalidade de uma instituição terapêutica entre
pacientes e terapeutas, mas sim, uma horizontalidade. Isso significa que cada
participante se torna terapeuta de si mesmo, a partir da escuta das histórias de
vida que são relatadas. Eles passam a ser co-responsáveis pela superação dos
desafios e despertam para a solidariedade e a partilha. Dessa maneira, o poder
fica diluído e circulante, proporcionando maior humanização das relações.
Essa forma horizontal e circular também pode ser observada no símbolo da
TC - uma teia de aranha. A teia representa a fonte de vida da aranha, o seu
45
vínculo vital. E simboliza não só a união, mas também algo que é essencial, assim
como essa estratégia o é para a comunidade (PROJETO 4 VARAS, 2008). Nas
rodas de Terapia Comunitária, as pessoas ficam dispostas em um formato de
círculo (uma roda), com o intuito de possibilitar a visualização e a integração dos
participantes entre si, como ilustra a figura 3 abaixo:
FIGURA 3: Cartão criado por um menino do Projeto 4 Varas
ilustrando a TC.
Fonte: http://www.4varas.com.br/atelier.htm, 2007.
A Terapia Comunitária pode ser realizada em qualquer espaço comunitário,
como igrejas, associações, escolas, unidades de saúde da família, hospitais, entre
outros. Para conduzir as rodas de TC, o terapeuta comunitário segue cinco fases,
quais sejam: o acolhimento, a escolha do tema, a contextualização, a
problematização e o encerramento (BARRETO, 2008).
O acolhimento é dirigido pelo co-terapeuta, que é responsável por
acomodar os participantes, dar-lhes as boas vindas e deixá-los à vontade. É
comum celebrar a vida cantando e, caso haja alguém fazendo aniversário na
semana ou no mês, esse momento é compartilhado e comemorado. Logo depois,
são apresentados os objetivos da Terapia Comunitária e as regras para o seu
desenvolvimento, que consistem em fazer silêncio, falar sobre a própria
experiência, respeitar a história de cada pessoa, não dar conselhos e não julgar.
A fase da escolha do tema é realizada pelo terapeuta comunirio, que
incentiva o grupo a falar sobre o que o está fazendo sofrer, utilizando estímulos,
46
como o provérbio “Quem guarda, azeda; quando azeda, estoura; e quando
estoura, fede”. Vale ressaltar que a escolha do tema ocorre por votação entre os
membros do grupo. Posteriormente, vem o momento da contextualização do tema,
quando o participante tem a oportunidade de falar acerca da sua preocupação. Em
seguida, tem-se a etapa da problematização, em que o terapeuta comunitário faz
uma pergunta-chave, à qual dá o nome de mote, para permitir a reflexão do grupo.
Em sua percepção sobre essa etapa, Ricarte (2005, p.36) comenta que, nesse
momento, “quem, pensava estar isolado em sua angústia percebe que muita gente
também já passou pela mesma dificuldade”.
Por fim, quando o terapeuta entende que a problematização atingiu seu
objetivo, realiza o encerramento, que se dá com rituais de agregação e conotação
positiva, com os participantes unidos, de mãos dadas, em uma relação de apoio e
de solidariedade, simbolizando a teia.
Para desenvolver tais fases, segundo Barreto (2008), a Terapia
Comunitária tem construído sua identidade, tomando por base cinco fundamentos
teóricos: o pensamento sistêmico, a teoria da comunicação, a pedagogia de Paulo
Freire, a antropologia cultural e a resiliência.
O pensamento sistêmico foi desenvolvido no final da década de 1930 pelo
biólogo Ludwig Von Bertalanffy, através da Teoria Geral dos Sistemas, buscando
compreender a interrelação existente entre as partes e o todo (BARRETO, 2008).
De acordo com Barreto (2008), o pensamento sistêmico diz que as crises e
os problemas podem ser entendidos e resolvidos quando os percebemos como
partes integradas de uma rede complexa, com ramificações, que interligam as
pessoas num todo, envolvendo a biologia (corpo), a psicologia (mente e emoções)
e a sociedade (contexto cultural). Esses aspectos estão interligados de tal modo
que cada parte influencia e interfere na outra. A abordagem sistêmica, por seu
turno, possibilita entender a pessoa na sua relação com a família, com a
sociedade, com seus valores e crenças, colaborando para a compreensão e a
transformação do indivíduo.
É importante registrar que, tendo
consciência da globalidade, aborda-se e
situa-se um problema sem perder de vista as várias partes do conjunto. Por isso
47
se faz necessário observar o contexto, ou seja, as “circunstâncias que estão
interligadas e dão sentido ao funcionamento do sistema” no qual o indivíduo se
insere (BARRETO, 2008). Igualmente, para se compreender como funciona a
sociedade e para entender o comportamento das pessoas e dos grupos sociais, é
preciso compreender o sistema como um todo.
Ao se referir à Teoria da Comunicação, Barreto (2008) destaca que a
comunicação entre as pessoas é o elemento que une os indivíduos, a família e a
sociedade, pois é por meio da comunicação que se estabelecem os contatos entre
as pessoas e, consecutivamente, os vínculos. É também por meio dessa troca de
experiências que o grupo dita o caminho da cura.
Na Terapia Comunitária, a
palavra é o remédio para quem fala e para quem ouve. A partir do relato das
histórias de vida, cada participante dá suporte ao que sofre. A pessoa que foi
ajudada sente-se melhor, passa a vislumbrar uma solução para seus problemas, e
a que ajudou se sente valorizada por poder contribuir. É assim que se inicia uma
teia de relações sociais.
Nas rodas de TC, estimula-se a fala das pessoas sobre seus problemas,
suas inquietações, as perturbações cotidianas. Essas são estratégias que as
auxiliam a expressar algo que não foi dito, buscando uma compreensão dos sinais
ou sintomas, uma vez que grande parte do sofrimento humano decorre da
comunicação ou da falta dela. Assim, em resposta ao estresse, ao sofrimento, o
corpo apresenta sinais e sintomas.
É sabido que a queixa, o sofrimento e o sintoma o formas de
comunicação. Partindo desse entendimento, a Terapia Comunitária utiliza o ditado
popular Quando a boca cala, os órgãos falam, quando a boca fala, os órgãos
saram” (BARRETO, 2008; GUIMARÃES, 2006; HOLANDA, 2006), por entender
que esses sintomas são expressões do corpo, de uma dor subjetiva, de algo
inconsciente que precisa ser verbalizado. O corpo é a tela onde se projetam as
emoções, como entende Cairo (1999, p.26). Em relação às emoções negativas, a
autora afirma que elas são projetadas em forma de doenças, e essas
somatizações ocorrerão a curto ou a longo prazo. A infelicidade, o desgosto, a
48
raiva, a mágoa e os ressentimentos são sentimentos que, quando guardados por
muito tempo, vão originar as doenças mais graves.
A comunicação também é essencial ao ensino. Na pedagogia de Freire
(2000), o ato de ensinar consiste no exercício do diálogo, da troca, da
reciprocidade, em que a informação é compartilhada, e a educação tem mão dupla
- quem ensina aprende. E o aprender coletivamente gera uma dimica de
inclusão e de empoderamento. Para Libâneo (2005, p.34), “o diálogo engaja,
ativamente, ambos os sujeitos do ato de conhecer: educador-educando e
educando–educador”.
Freire (2000) também ressalta que, para haver uma aprendizagem efetiva,
é preciso que o educador - na TC será o terapeuta comunitário - faça associações
entre a teoria e a realidade (familiar, comunitária, escolar etc.), revelando que é
preciso haver um espaço de expressão dos problemas vivenciados pelo
educando, nos seus diversos contextos, uma vez que isso facilita a apreensão dos
novos saberes por parte do educando, que reconhece a informação, expressa-a e
correlaciona-a com a sua vivência.
Complementando o que foi dito, Campos (2005, p.35) afirma:
A educação em saúde, mais do que difundir informações, busca ampliar
a capacidade de análise e de intervenção das pessoas tanto sobre o
próprio contexto quanto sobre o seu modo de vida e sobre sua
subjetividade.
É assim que os indivíduos se tornam sujeitos da história, descobrindo
novos conhecimentos e novas formas de intervir na realidade, e não são meros
objetos, como afirma Barreto (2008). Sendo assim, com a educação centrada no
sujeito, haverá a humanização do processo educativo, maior assimilação de
conhecimentos e a transformação das relações sociais.
Para Freire (2000), o educador deve ter o seguinte perfil: respeito aos
saberes do educando, bom senso, humildade, tolerância, disponibilidade para o
diálogo, saber escutar e querer bem aos educandos, dentre outros. Barreto (2008,
p. 280) afirma que esse perfil “aproxima a função do educador da função do
terapeuta comunitário e convida ambos a um contínuo fazer e refazer, agir e
refletir”. Refere, ainda, que a função do terapeuta comunitário é de suscitar a
49
capacidade terapêutica do próprio grupo. Então, o precisa ser um especialista,
pode ser uma pessoa da própria comunidade, um profissional de saúde, da
educação ou de outros campos do saber. Sua atuação deve estar voltada para o
crescimento humano e coletivo, estimulando os laços afetivos entre as pessoas, a
fim de provocar-lhes a vontade de sempre construir vínculos ou relações que
confiram segurança e pertença, pois a riqueza do grupo não está fora, mas dentro
dele mesmo. Sendo assim, a Terapia Comunitária é um espaço que possibilita ao
terapeuta comunitário crescer com o grupo e fomentar a descoberta dos recursos
individuais e comunitários.
O vínculo é um laço, uma relação, uma forte ligação. É, ainda, tudo aquilo
que liga os homens entre si e suas crenças, seus valores; é, enfim, a cultura que
lhe confere identidade, inclusão e sentido de pertença. Barreto (2008) identifica
três tipos de vínculo: os saudáveis, os fracos e os de risco. Os saudáveis são
aqueles que nos ligam aos outros de maneira positiva e reforçam o sentimento de
pertença no grupo. Os frágeis são aqueles que nos deixam desconfortáveis, e os
de risco o os que deterioram a nossa qualidade de vida, que nos separam uns
dos outros, como a intriga e a ausência de diálogo. A Terapia Comunitária
possibilita o fortalecimento dos vínculos saudáveis entre o indivíduo, o grupo de
TC, a família, os amigos, a comunidade e os profissionais de saúde, permitindo a
construção de uma potente teia de relacionamentos que favorecem a
transformação social.
De acordo com Barreto (2008), para que haja a transformação social, é
necessário considerar o conhecimento científico e o saber popular. O “saber
científico” e o “saber popular” são formas de saber que admitem uma perspectiva
complementar, sem que seja necessário romper com a tradição ou negar as
contribuições da ciência moderna. No saber popular, tem-se a influência da
cultura.
A cultura é “uma rede de símbolos e significados elaborados pelos seres
humanos, abrangendo estruturas e significados pelos quais os indivíduos dão
forma às suas experiências” (DIAS, 2002, p. 192). Nessa perspectiva, sob o ponto
de vista da antropologia cultural, entende-se que esses significados que os
50
indivíduos atribuem a seu comportamento são relevantes para a vida cotidiana,
para seus desafios, suas alegrias, hábitos, valores e crenças, uma vez que,
especificamente, os valores e as crenças são fatores importantes na formação da
identidade do indivíduo e do grupo, contribuindo para a diversidade cultural, pois,
através dela, amplia-se a visão de mundo e abrem-se caminhos para o respeito às
diferenças (alteridade), fazendo o indivíduo enxergar além daquilo que vivencia
habitualmente e valorizar novas experiências, novos conhecimentos. Sob esse
prisma, Laplantine (1995, p.21) alerta em seus estudos que “presos a uma única
cultura, somos não apenas cegos à dos outros, mas míopes quando se trata da
nossa”.
Seguindo esse pensamento, Barreto (2008, p.53) destaca que, na TC, o
bom terapeuta comunitário é aquele que consegue lidar com a diferença, pois a
riqueza está nela, uma vez que “cada um é rico naquilo que o outro é pobre”.
Portanto é importante reconhecer, respeitar e entender a multiplicidade, a
diversidade e conviver com pessoas e culturas diferentes. Isso possibilita ao
indivíduo não só agregar novos valores e saberes (técnicos e populares), mas
também construir sua cidadania.
Como último fundamento da TC a comentar, tem-se a resiliência, termo que
significa a capacidade dos indivíduos, das famílias e das comunidades de
superarem as dificuldades contextuais. De acordo com Wlash (2005, p.4), a
resiliência é “um processo ativo de resistência, reestruturação e crescimento em
resposta à crise”. Barreto (2008, p.128) concebe as crises como “transtornos e
desorganizações que acontecem em determinados períodos da vida de pessoas,
famílias, grupos sociais, instituições e da sociedade”. É importante destacar que a
crise pode ser uma oportunidade de aprendizado, bem como crescimento pessoal,
familiar e comunitário, visto que algumas situações de sofrimento podem
possibilitar o desenvolvimento das relações com outras pessoas, favorecendo a
recuperação e o fortalecimento de cada indivíduo.
Portanto, a TC é um espaço de promoção da resiliência, tendo em vista
que, com a partilha de experiências de vida, os indivíduos reforçam a auto-estima
(opinião que cada um tem de si) e fortalecem os vínculos. E nutrir a auto-estima é
51
importante, visto que, de acordo com Barreto (2007), as síndromes relativas ao
abandono, à insegurança e à baixa auto-estima constituem um quadro
preocupante em escala nacional, porquanto tais sentimentos são estímulos para a
violência e a divisão no seio de uma sociedade, pelos medos e as ões
irracionais que podem ocasionar.
De acordo com as observações de Ricarte (2005, p.34), a Terapia
Comunitária “permite à comunidade buscar nela mesma as soluções para
problemas que, isoladamente, a pessoa, sua família e o poder blico o foram
capazes de sanar”.
Então, considerando que as rias experiências em Saúde Mental
desenvolvidas na organização dos serviços, em conjunto com os princípios da
Reforma Psiquiátrica e do SUS, apontam para a necessidade de construção de
novas práticas e a viabilidade da implantação de uma rede integrada de serviços,
a TC é, certamente, uma ferramenta de cuidado que se faz necessária no campo
da Saúde Mental, na medida em que proporciona um espaço de escuta, promove
o acolhimento, valoriza a experiência pessoal, reconhece a competência dos
indivíduos, encoraja e estimula a capacidade de aprendizado das pessoas,
favorece a reintegração social por meio da interação entre o indivíduo e seu
ambiente, reforça a auto-estima e fortalece os vínculos, contribuindo, portanto,
para a promoção da saúde, a prevenção de transtornos mentais e a melhora da
qualidade de vida do indivíduo, o que vai refletir na comunidade.
52
3 TRAJETÓRIA
3 TRAJETÓRIA3 TRAJETÓRIA
3 TRAJETÓRIA
METODOLÓGICA
METODOLÓGICAMETODOLÓGICA
METODOLÓGICA
53
3.1 CONHECENDO O MÉTODO – HISTÓRIA ORAL
Para estudar a implantação da Terapia Comunitária como organizadora das
práticas de saúde na atenção básica, optou-se pela abordagem qualitativa. Para
valorizar esse universo, escolheu-se como caminho metodológico a História Oral.
De acordo com os estudos de Bom Meihy e de Holanda (2007, p.18), a
História Oral é uma prática de apreensão de narrativas, feita através do uso de
meios eletrônicos e destinada a: recolher testemunhos, promover análises de
processos sociais do presente e facilitar o conhecimento do meio imediato”. Para
Ichikawa e Santos (2006, p.182), é a “história do tempo presente, pois implica a
percepção do passado como algo que tem continuidade hoje, e cujo processo
histórico não está acabado”.
Segundo Bom Meihy (2005), dependendo do conteúdo, a História Oral pode
ser classificada em: História Oral de Vida, Tradição Oral e História Oral
Temática (grifo nosso).
Este estudo ancorou-se na História Oral Temática, porque ela se
compromete com o esclarecimento ou a opinião do entrevistador sobre algum
evento definido, buscando a verdade de quem presenciou um acontecimento ou
tenha dele alguma versão que seja discutível.
3.2 CENÁRIO DA INVESTIGAÇÃO E COLABORADORES
A pesquisa foi realizada nos locais de trabalho dos colaboradores, que são
trabalhadores da saúde ligados à Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e à
Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de João Pessoa PB/ Distritos Sanitários,
no período de 25 de março a 12 de agosto de 2008.
Foram colaboradores da pesquisa as pessoas que aceitaram participar do
estudo, conforme disposto no termo de consentimento livre e esclarecido
54
(Apêndice B) e na carta de cessão (Apêndice C), atendendo à Resolução 196/96
do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 1996).
No método da História Oral, a seleção dos colaboradores depende da
formação de uma colônia, ou seja, uma coletividade que tem objetivos em comum.
A partir da identificação dessa colônia, forma-se uma rede, que corresponde a
uma subdivisão da colônia. Para Bom Meihy (2005, p.177), a colônia “é sempre o
grupo amplo, da qual a rede é a espécie ou parte menor”, ou seja, a rede é uma
subdivisão da colônia, que visa estabelecer parâmetros para decidir sobre quem
deve ser entrevistado ou não.
A escolha dos colaboradores foi feita com base nas relações estabelecidas
na colônia, que foi formada por todos os profissionais ligados ao Projeto de
Terapia Comunitária, no Município de João Pessoa PB, e a rede foi constituída
por onze colaboradores, que detiveram as informações necessárias ao
atendimento dos objetivos deste estudo.
Quanto ao número de onze participantes da investigação, considera-se
relevante, pois, nessa modalidade de investigação, o importante não é o
quantitativo de participantes inseridos no estudo, mas a qualidade com que o
fenômeno ocorre (COSTA; VALLE, 2000).
Para considerar a entrevista como sendo a de ponto zero, deve-se
identificar um colaborador que tenha mais conhecimento sobre a temática. No
âmbito desta pesquisa, foi considerado ponto zero a entrevista da colaboradora
Ana Vigarani, porque serviu de guia, orientando o andamento das demais
entrevistas (DIAS, 2006).
3.3 TÉCNICA DE PRODUÇÃO DO MATERIAL EMPÍRICO
Com base na História Oral, a técnica de coleta de material foi realizada
através de entrevista, com a utilização de um gravador. Whitaker e Veloso (2005,
p.25) afirmam que “as fontes orais demonstram que, em um momento coletivo, as
55
pessoas que estão presentes trazem consigo expectativas, razões, estados de
ânimo diversos”.
Na descrição de Ichikawa e de Santos (2006, p.193), há três elementos que
constituem a condição mínima da História Oral, a saber: “o entrevistador (que
pode ser mais de um), o entrevistado (que podem ser vários) e a aparelhagem de
gravação”.
O processo de entrevista, segundo as proposições de Bom Meihy (2005),
compõe-se de três etapas: a pré-entrevista, a entrevista propriamente dita e a
pós-entrevista. Essas etapas foram realizadas no período de março a julho de
2008.
A pré-entrevista, como refere Bom Meihy (2005), corresponde ao
momento em que se estabelece o primeiro contato com os colaboradores, para
que tomem conhecimento do projeto, dos seus objetivos e do tipo de técnica
utilizada para a construção do material empírico. Nesse processo, procurou-se
criar um clima de acolhimento e de solidariedade entre a pesquisadora e os
colaboradores.
3.4 TRAJETÓRIA DA PESQUISA DE CAMPO
Neste estudo, as entrevistas foram agendadas, de acordo com a
disponibilidade dos colaboradores, de quem foi solicitada autorização para o uso
do gravador e o seu comparecimento ao local no horário combinado (BOM
MEIHY, 2005). Cada um deles foi informado sobre os objetivos do estudo, suas
etapas e sobre a importância de sua participação, conforme disposto na Carta de
Cessão (Apêndice C) e no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice
B). Todos os colaboradores assinaram esses documentos em duas vias,
permitindo a publicação das informações e a utilização do nome civil. Assim, a
primeira entrevistada foi Ana Vigarani. Na realização da entrevista, procurou-se
criar um clima de aconchego, tranqüilidade e confiança capaz de deixá-la à
56
vontade para contar a sua história. Bom Meihy (2005) afirma que todos os projetos
de História Oral necessitam ser guiados por perguntas de corte, definidas como
questões que perpassam todas as entrevistas e que devem se relacionar com a
comunidade de destino, marcando a identidade do grupo analisado. As perguntas
de corte que guiam este estudo foram as seguintes:
1. Conte como vem se dando a implantação da Terapia Comunitária no
Município de João Pessoa – PB.
2. Qual é a importância da Terapia Comunitária no Projeto Político de
reorganização dos serviços de saúde da atenção básica no Município de
João Pessoa - PB?
3. Quais os desafios encontrados no processo de implantação e de
operacionalização da TC, para a inserção de novos saberes, visando à
transformação de práticas no cotidiano do SUS?
A pós-entrevista, segundo Bom Meihy (2005), segue a realização da
entrevista. Nessa etapa, foi comunicado aos colaboradores o andamento do
trabalho e explicado como se deu o processo de construção do documento, como
também agendados os demais encontros para a conferência do material.
Após a coleta do material, transformou-se todo o relato das entrevistas em
texto. Bom Meihy (2005) indica três fases para a análise do material e para a
construção do texto: a transcrição, a textualização e a transcriação.
No método da História Oral, após a realização da entrevista, o depoimento
oral foi submetido à fase de transcrição. Nesse momento, transcreveu-se o
material na íntegra, com todos os detalhes contidos na entrevista. Na moderna
História Oral, destina-se a dar visibilidade ao caso tematizado ou à história
narrada.
Na textualização, fase que segue a transcrição do material empírico, foram
suprimidas as perguntas de corte, e o texto passou a ter um caráter narrativo.
Nessa fase, iniciou-se a identificação do tom vital da entrevista, ou seja, o tema
que tem maior força expressiva no relato do colaborador, que é adotado como
57
epígrafe em cada narrativa. Portanto, o tom vital norteou a análise do material
empírico produzido fundamentado na literatura pertinente.
A transcriação é a fase em que se permite a interferência do pesquisador
no texto, na perspectiva de transcriar o material textualizado, em sua versão final,
o qual se compromete com a elaboração de um texto recriado em sua plenitude,
ordenando-se os depoimentos em parágrafos, retirando ou acrescentando
palavras ou frases, de acordo com as observações e as anotações realizadas no
caderno de campo. Para reproduzir o clima das sensações que compõem o texto,
foram empregados elementos de pontuação.
Ao final das três fases, o material foi encaminhado aos colaboradores do
projeto para que procedessem à conferência – que foi realizada no local de
trabalho de cada um deles - aplicando-se o princípio da flexibilização para as
negociações quanto a cortes e correções no texto. Esse processo contribuiu para
conhecê-los melhor, dirimir dúvidas e fortalecer o vínculo de amizade
estabelecido.
Convém que se registre que nenhum colaborador sugeriu a retirada de
algum trecho da sua entrevista. No entanto, dois deles solicitaram que fossem
acrescentadas algumas informações para complementar a leitura, sendo, pois,
prontamente atendidos. No geral, fizeram-se apenas correções quanto às palavras
que não foram compreendidas durante a transcrição.
O material empírico foi construído com base na entrevista com a utilização
do gravador e dos registros no caderno de campo, no qual, segundo Bom Meihy
(2005), registram-se as observações sobre o andamento do projeto, das
entrevistas específicas e as impressões do pesquisador ao longo do processo,
tornando-se um referencial para a finalização do trabalho.
A análise do material empírico baseou-se nos pressupostos adotados por
Bom Meihy (2005). Em seguida, construíram-se os eixos temáticos, com base no
tom vital das entrevistas, os quais guiaram o processo de discussão dialogada
com a literatura pertinente.
O arquivamento das entrevistas deste estudo foi feito em CD’s, sob a
guarda e a responsabilidade da pesquisadora.
58
3.5 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS
O estudo foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP),
do Centro de Ciências da Saúde (CCS), da Universidade Federal da Paraíba
(UFPB), em respeito à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que
dispõe sobre as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo
seres humanos. Após sua aprovação pelo CEP/ CCS/ UFPB, sob o número 0095,
no dia 02/03/2008 (Anexo A), iniciou-se a coleta de dados, observando-se os
aspectos éticos da pesquisa com seres humanos.
59
4
4 4
4
TECENDO OS FIOS DA HISTÓRIA:
TECENDO OS FIOS DA HISTÓRIA: TECENDO OS FIOS DA HISTÓRIA:
TECENDO OS FIOS DA HISTÓRIA:
AS NARRATIVAS
AS NARRATIVAS AS NARRATIVAS
AS NARRATIVAS DOS
DOS DOS
DOS
COLABORADORES
COLABORADORESCOLABORADORES
COLABORADORES
60
É uma catarinense alegre e disposta, sempre a mostrar um grande sorriso.
Atualmente, se encontra na assessoria da Diretoria de Atenção à Saúde - DAS -
do município de João Pessoa PB, como responsável pelo trabalho de
implantação da Terapia Comunitária. Participa da formação dos terapeutas
comunitários e os acompanha sempre com o seu jeito calmo e sereno de enfrentar
e resolver os desafios que surgem.
Muito gentilmente, ela narrou sua história, apresentada a seguir.
[
[[
[...
......
...]
]]
] a semente está lançada, e toda semente é esperança de um dia
a semente está lançada, e toda semente é esperança de um dia a semente está lançada, e toda semente é esperança de um dia
a semente está lançada, e toda semente é esperança de um dia colher
colher colher
colher
frutos.
frutos. frutos.
frutos. [...]
[...] [...]
[...] o processo já foi iniciado e ele
o processo foi iniciado e ele o processo foi iniciado e ele
o processo foi iniciado e ele está acontecendo
está acontecendoestá acontecendo
está acontecendo[
[[
[...
......
...]
]]
]
Sou Ana Vigarani. Trabalhei no Ceará, na Diocese de Crateús, antes de vir para
Paraíba.
Através da CNBB, que é a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, implantou-
se o trabalho da Pastoral da Criança. Inicialmente esse trabalho consistia em realizar a
pesagem, a celebração da palavra, entregar a multimistura. Mas, aos poucos, foi se
percebendo que também era importante dar a essas mães um pouco mais de
acompanhamento porque os problemas das crianças não se resolviam apenas com uma
multimistura e com pesagem, essa desnutrição tinha que ser vista dentro de um contexto
familiar.
O Professor Adalberto, mais ou menos em 1995, 96, começou com a implantação
da chamada Terapia Comunitária (TC). Estabeleceu-se um convênio entre a Universidade
61
Federal do Ceacom a CNBB, que tinha como representante, na pastoral da criança, a
Doutora Zilda Arns, que era irmã de Dom Paulo Evaristo.
Meu primeiro contato com o Professor Adalberto foi através deste convênio,
quando ele começou a implantar a TC e a fazer os primeiros treinamentos de líderes da
Pastoral da Criança em TC.
Como eu também trabalhava com a Pastoral da Criança, fui chamada para fazer
este treinamento. Éramos 50 ou 60 pessoas. Entre nós tinham outras pessoas, como eu,
que não eram líderes da Pastoral, mas davam um acompanhamento, uma assessoria à
Pastoral da Criança.
Esses líderes eram pessoas simples da comunidade, alguns tinham apenas o
primeiro grau, outros dominavam a escrita e a leitura, mas nem tinham o primeiro grau
completo, também tinham algumas Psicólogas, algumas pessoas com mais estudos que
davam essa contribuição. Então comecei a dar uma pequena assessoria a essas
lideranças em nível de Diocese, implantando a TC, realizando encontros mensalmente,
fazendo aprofundamentos e reflexões.
O curso era uma extensão universitária de 360 horas, que tinha uma parte teórica
e uma parte prática. Ele durou seis meses, foi de julho a dezembro e era feito em
módulos. Íamos para Morro Branco, nos fins de semana, de quinta a domingo. Lá, bem no
início, tinha ocas muito pobres, e todos dormiam em colchão, não tinha a estrutura que
tem hoje.
A partir desse treinamento, comecei a fazer um trabalho de acompanhamento às
mães e aos familiares, realizando as Terapias Comunitárias nos bairros em Crateús,
principalmente em grupos e num assentamento urbano, que foi muito bom.
Também realizei a TC para pessoas que eu acompanhava no “Centro Vida” que
tinha na cidade. As pessoas que participavam se apresentavam com problemas de
stress, depressão, nervosismos e muitos deles foram melhorando através da TC, que
serviu como instrumento de vida e equilíbrio pessoal.
Ainda em Fortaleza, em 1998, fiz o primeiro curso “Cuidando do Cuidador”, só que
naquela época não se chamava assim, se chamava o “Resgate da Auto-estima e Unidade
do Ser”, tinha praticamente o mesmo conteúdo, porém com outro nome.
No início de 1999, vim para a Paraíba. E ao chegar, fui identificando que aqui
também tinha o trabalho com a Pastoral da Criança. A Coordenadora Estadual da
Pastoral era a Aldenora, que me convidou para ajudar a implantar os treinamentos de TC
– Saúde Mental na Pastoral da Criança.
62
Quando cheguei à Paraíba, o primeiro trabalho que fiz não foi diretamente com a
TC, e sim, uma visita a todas as equipes nas cinco Dioceses da Paraíba, para trabalhar
com as coordenadoras paroquiais e diocesanas. Esse trabalho da auto-estima foi um
trabalho que reanimou muito a Pastoral, deu muita garra, alegria, muita vontade de
trabalhar. Quem trabalhava comigo nessa época era Ricardo, um dos terapeutas que era
massoterapeuta (massagista). Nós coordenávamos a Saúde Mental comunitária.
Então, depois que Adalberto já conhecia nosso compromisso e talento, nos
autorizou a sermos multiplicadores da TC. Penso que isso foi mais ou menos em 2001,
quando começamos a implantar, a fazer o primeiro treinamento de TC na Paraíba.
O que é estranho é que não encontramos nos arquivos da Arquidiocese registros
dos treinamentos, sei que foi mais ou menos em 2001 a 2003 que começamos esses
treinamentos. Foram treinados uns 30 terapeutas comunitários e uns 30
massoterapeutas, porque percebíamos a importância da massagem tanto para as
crianças como para as mães. Enquanto trabalhávamos a pesagem, era feita a massagem
com as crianças, além da orientação para as mães para que elas fizessem nas suas
crianças a fim de tirar o stress, os conflitos, ou seja, um instrumento completava muito o
outro. Foi um trabalho muito interessante, que fizemos durante uns três anos juntando as
duas coisas.
Fazia parte do treinamento três módulos teóricos que eram realizados de quarta a
domingo. Esses treinamentos eram acompanhados também com a intervisão, que,
naquela época, chamava-se supervisão, então todos os meses, durante uma manhã ou
uma tarde, nos encontrávamos para uma parte teórica através dos textos e uma parte
prática fazendo uma TC.
O importante era que, naquela época, todos os massagistas recebiam os mesmos
conteúdos teóricos dos terapeutas comunitários e os terapeutas recebiam os mesmos
conteúdos teóricos dos massagistas, que, depois, separávamos para a parte prática,
então quem era terapeuta comunitário ia fazer a terapia, quem era massagista ia treinar a
massagem. Foi uma experiência muito interessante, pois os conteúdos eram dados em
comum.
Na Pastoral da Criança, houve uma crise entre a instituição CNBB e a
Universidade do Ceará, à qual Adalberto pertencia. foi cortado totalmente a TC da
Pastoral da Criança, lamentavelmente, uma perda muito grande.
Saí da Pastoral da Criança, porque meu trabalho era específico da Saúde Mental,
não era para pesagem. Eu treinava os líderes, dava os cursinhos do manual novo, mas
63
meu trabalho era especialmente a TC, e como foi cortada... Ahoje, não tenho muita
clareza quanto aos motivos, eles não estão muito claros, mas se sabe que eram na área
financeira. Também porque começou a criar muita consciência entre as lideranças e acho
que a pastoral não tinha muito interesse para formar a consciência. Na minha concepção,
posso estar enganada, tinha mais interesse no trabalho rotineiro: de pesar a criança, de
ver quem estava desnutrida, fazer a multimistura, trazer as mães para fazer ou então
arranjavam a multimistura e a davam de presente, de fazer as celebrações da palavra,
algo que não levava a nenhuma mudança, ou seja, era um trabalho mais assistencialista
do que preventivo, participativo, enquanto que a TC ela leva a criar redes, vínculos, a
questionar e este era o nosso trabalho. Mas este trabalho começou a incomodar as
coordenadoras, de modo especial, a daqui, de João Pessoa, e a Estadual.
Nessa época, também tinha uma Psiquiatra, a Ieda, que era coordenadora de
Saúde Mental; ela trabalhava na Secretaria de Saúde do Estado e oferecia para as
equipes reciclagens, com o intuito de ressituar a Saúde Mental na Atenção Básica. Esses
encontros ocorreram em 2003 e eram realizados por uma equipe composta de vários
profissionais (médicos, psiquiatras, psicólogos, enfermeiras...) entre eles, estava a Maria
Filha. nos conhecemos porque fui convidada para trabalhar o resgate da auto-estima
junto a estes profissionais. Percebi então que Maria Filha tinha muito esse ideal, esse
interesse, ela sentia no coração muito isso, de fazer algo diferente, que era o que eu
vinha fazendo na Pastoral da Criança.
Foi nas conversas que Maria Filha começou a me conhecer e ir lá em casa, trouxe
a Maria Djair. E nessas conversas, eu disse: “olha, tem cursos em Fortaleza com
Adalberto, acho que são alternativas que valem a pena”.
Eu tinha tentado pela Pastoral fazer convênio com a UNIPÊ, com a Secretaria
de Saúde, mas a coordenadora estadual nunca deu muito apoio, não tinha este alcance
de trabalho. Então, Maria Filha e Djair perceberam que essa era uma alternativa válida,
dentro do trabalho delas na Universidade. Dei um folheto que tinha os cursos de Fortaleza
e elas foram fazer os cursos em 2004, e quando voltaram, começaram a fazer a TC lá em
Mangabeira.
Nesse período também, depois da ida delas, a Márcia, que era uma das
responsáveis por um dos Distritos, nos pediu para fazermos uma sensibilização nas
equipes do PSF do seu Distrito sobre TC. na Universidade, naquela Igreja redonda,
nós fizemos umas cinco ou seis terapias, com a presença média de 50 a 100 pessoas,
com as equipes do PSF, que foram convidadas para irem a esta sensibilização.
64
Daí foi fácil, quando nós iniciamos a primeira turma, já tinha muita gente
sensibilizada porque havia participado da TC. Também nos cursos de Pós-graduação, de
Especialização, de Mestrado, Maria Filha me convidava com outra companheira, a
Tereza, que é massoterapeuta, para trabalharmos juntas. As duas, Maria Filha e Maria
Djair, foram incansáveis no sentido de divulgação dentro da Universidade.
Quando foi no fim de 2006, tanto a Márcia, quanto Kalina e Lucineide, mais duas
pessoas de Pedras de Fogo, foram fazer o Cuidando do Cuidador em Fortaleza, que é
outro tipo de curso e quem ministra é Adalberto, e esta participação delas as colocou em
contato com o IBDPH, que é o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Pessoa Humana
do Estado de São Paulo. Parece que esse instituto tinha uma verba na época que era do
Ministério da Saúde, através da secretaria antidrogas, que podia ser aplicada em
treinamentos de terapeutas. Tanto Márcia como Lindinalva e Clevane, de Pedras de
Fogo, voltaram muito entusiasmadas e fecharam convênio abrangendo dois cursos, um
para João Pessoa e outro para os Municípios de Pedras de Fogo, Conde e São Bento.
Então Márcia, como a responsável pela Atenção Básica no Município, sensibilizou
Roseana, imagino isso, de forma que, em dezembro de 2006 e janeiro de 2007, já
estávamos realizando a seleção e o encaminhamento da primeira turma.
Eu tinha um convite para ir para Fortaleza, mas a partir disso, Márcia achou
melhor eu ficar aqui. E me convidou para que viesse fazer parte do grupo de implantação
da TC no Município. Na secretaria, meu trabalho específico é este, a implantação, o
acompanhamento e a formação dos terapeutas comunitários.
A primeira turma começou em janeiro 2007. Nessa turma, foram, ao todo,
selecionados 65 profissionais das equipes do PSF, porém houve a desistência de cinco
pessoas. Estamos hoje com 60 terapeutas. Hoje, a estrutura do treinamento de TC
consiste em quatro módulos, sendo 80h para a teoria, 80h para as vivências, 120h para a
realização da prática das Terapias e 80h de intervisão.
Daquele primeiro grupo da Pastoral da Criança, apenas uma terapeuta trabalha
com Terapia Comunitária, e esta está como Agente Comunitária de Saúde (ACS) do
Distrito Sanitário II.
A minha percepção é bastante limitada, mas institucionalmente sinto que falta uma
equipe para fazer essa leitura. que não temos este relatório por parte do IBDPH, a
secretaria poderia ter uma equipe, na qual eu poderia fazer parte, porque tenho essas
informações, para discutirmos isso. Talvez convidando alguns usuários, alguns
terapeutas, algumas pessoas das equipes que não participam da TC, alguém da gestão,
65
uma equipe mista, que pudesse fazer esta leitura para se perceber, através da análise
dos dados registrados, dos vários ângulos, dos vários olhares, qual é o impacto da TC
nas equipes, nas comunidades e no processo do SUS.
As equipes estão percebendo que elas precisam compreender o usuário dentro do
seu contexto, pois, é essa visão mais sistêmica que favorece a compreensão das
situações vividas pelos usuários.
Observo, nos relatórios que tenho feito e o material que me tem sido dado pelos
terapeutas, que mais entrosamento dentro da equipe de trabalho e que os usuários
estão estabelecendo vínculos mais sólidos com as equipes, ou seja, há muito mais uma
relação de confiança, de integração entre os usuários e as equipes.
Os terapeutas relatam que hoje são muito mais compreensíveis com os usuários,
misericordiosos e acolhedores, porque eles escutaram o sofrimento, e estão mais
sensíveis para este acolhimento.
Por parte dos usuários, há ainda resistência, nem todos aceitam bem. No relatório
do final do ano que fiz, foram realizadas aproximadamente 900 terapias pelos 60
terapeutas do Município e foram atendidos quase 15.000 usuários. Os grupos são em
média de 15 pessoas, a faixa etária que mais procura é dos 50 para cima, isto indica que
a procura é mais intensa nessa faixa etária em que se acentuam os problemas
emocionais, como o stress e outros.
Os usuários mais freqüentes da TC são de classes desfavorecidas, os mais
excluídos, os mais de periferia. A classe média, a classe alta tem seus psicólogos, tem
seus psiquiatras particulares, não querem ou não gostam de se expor, como requer a TC.
Quanto aos desafios, o primeiro, é com relação ao período de formação nos
módulos teóricos. Especialmente, nos dois primeiros, eles são para mexer com a
personalidade do terapeuta, para sua formação. Qual o perfil de terapeuta que queremos?
O terapeuta precisa ser uma pessoa que se trabalhe, goste de se conhecer, saiba da sua
dor e aprenda a administrar essa dor, esse sofrimento.
Tem muitas vivências de ordem prática, para mexer com os esquemas mentais,
para mexer com as energias, na linha da bioenergética, na linha do grande mestre Osho.
E as próprias Terapias, à medida são feitas, elas vão modificando, fazendo também
repensar a própria história de vida.
Então, muitos terapeutas conseguiram fazer isso, durante os módulos, durante as
vivências. Eles estão apaixonados e vivem intensamente este processo. Mas alguns
tiveram um processo mais lento, não tiveram este processo pessoal adequadamente.
66
Hoje eles não são tão ligados, tão apaixonados. Facilmente desmarcam, facilmente
deixam de fazer.
O segundo grande desafio é por parte dos próprios terapeutas, pois mesmo que
você selecione, com todo carinho, faça inscrição, que você tente selecionar dentro do
perfil, mesmo assim, há alguns terapeutas que não correspondem.
O terceiro desafio é que existem algumas equipes, mesmo de PSF, em que
médicos, enfermeiras ou alguns membros da equipe até ACS não se identificam com a
proposta. Eles não participam da TC. Dizem que não gostam, não estão sensibilizados
para o valor da terapia, para os efeitos que ela traz, criar vínculos construindo uma rede
de apoio social. Ela não é a única que vai gerar saúde na comunidade. Ela é um dos
instrumentos geradores de saúde, mas as equipes têm que se vincular com as ações
comunitárias, com outros grupos da comunidade para poderem fazer essa rede de
transformação.
Constatando esta resistência por parte das equipes, um dos pedidos dos
terapeutas comunitários é que se façam encontros de sensibilização, porque muitos não
perceberam ainda que ela está institucionalizada na saúde, na Atenção Básica. Alguns
ainda acham que é opção, se não quero, não faço e não vou. Na verdade eu penso que,
se sou funciorio ou profissional da Atenção Básica, hoje necessito compreender que
preciso apoiar os terapeutas, indicar a TC para os usuários e, de vez em quando, estar
presente, mesmo que não concorde muito com a proposta, mas se estou no trabalho, se
participo desta gestão, é preciso ter esta compreensão.
Acho que, em parte, os resultados da TC estão satisfazendo, porque a semente
está lançada, e toda semente é esperança de que um dia se torne uma árvore, que
frutos. Neste sentido, fico satisfeita porque o processo foi iniciado e ele vai acontecer
quer queira, quer não.
Fico insatisfeita, quando noto que há tantas coisas que necessitam ser feitas e que
nós não temos pessoas para fazer esta provocação. Talvez dependa um pouco de mim,
de Márcia, ou da gestão. Não me considero muito gestão, para me dar o direito de
provocar e fazer isto, sei que, na minha percepção, este lado me deixa um pouco
insatisfeita.
Institucionalmente há muito a desejar, não sei se foi publicado algum artigo, algum
pronunciamento, que isto está causando determinados efeitos. Agora, sinto que, a partir
dos terapeutas, das equipes, dos usuários, pelos materiais que estou vendo, das Terapias
67
que assisti, sempre um saldo positivo, lindos depoimentos das pessoas, de como
elas eram e como elas estão agora.
Para mim, o efeito concreto está acontecendo com o usuário. Apesar de muitos
usuários nem sempre se fazerem presentes. Há resistências... dificuldades de falar de si,
de ter um compromisso pontual de freqüência, daí a dificuldade de manter os grupos.
Sinto que estou no lugar certo fazendo o que gosto. No sentido de você perceber a
mudança nas pessoas, ouvir que elas viam de um jeito e estão vendo de outro, faziam de
um jeito e estão fazendo de outro, viviam de um jeito e estão vivendo de outro. Vo
percebe que está havendo mudanças, pequenas mudanças que se juntam fazendo a
diferença.
Estou associando muito o trabalho de acompanhar os terapeutas com a formação
de Cuidando do Cuidador, tenho visitado umas 25 unidades. Dá para perceber que o valor
da Atenção Básica, do PSF está na vida da equipe, na forma de como ela se relaciona, na
forma de como ela atende o usuário. Sinto que é necessária e exigente as visitas feitas,
às vezes é desgastante para mim, porque é muita solicitação, mas gosto de fazer porque
é muito prazeroso.
Constatou-se que a TC tem sido um instrumento válido de prevenção de Saúde
Mental na Atenção Básica, portanto a Gestão municipal liberou recursos financeiros.
Assim, em janeiro de 2008, deram-se início a seleção e o treinamento da segunda turma
com 65 profissionais de saúde. Esta turma participou de dois módulos teóricos, sendo
realizados três encontros de intervisão.
68
É prestativa, alegre, extrovertida, dinâmica, gosta de conversar e de
interagir com as pessoas. É a representante da Diretoria de Atenção à Saúde
(DAS). É uma líder. Seu envolvimento, vontade e capacidade de enfrentamento
tem sido determinante na história de implantação da TC, principalmente no
município de João Pessoa - PB.
Portanto, veja-se a história da Terapia Comunitária contada por ela.
A
A A
A Terapia Comuniria
Terapia ComunitáriaTerapia Comuniria
Terapia Comunitária
é
é é
é significativamente importante porque as
significativamente importante porque as significativamente importante porque as
significativamente importante porque as
pessoas podem falar,
pessoas podem falar, pessoas podem falar,
pessoas podem falar, ouvir e serem ouvidas
ouvir e serem ouvidasouvir e serem ouvidas
ouvir e serem ouvidas [
[ [
[...
......
...]
]]
]
Conheci a Terapia Comunitária (TC) quando estava fazendo a especialização em
Saúde da Família, no NESC através de uma roda de Terapia Comunitária que as
Professoras Maria Filha e Maria Djair fizeram.
Particularmente, gosto muito de dividir aquilo que sei, que acho interessante e que
pode ajudar outras pessoas. Então, quando fui dar umas aulas sobre Saúde Mental para
uma formação de auxiliar de enfermagem convidei Maria Filha e Maria Djair para fazerem
uma roda conosco.
Também quando assumi essa gestão em 2005 como Diretora do Distrito Sanitário
(DS) IV, conversei com elas para mostrarem, o que era TC para os profissionais e assim
foi feito.
69
Fizemos quatro rodas de TC que aconteceram na capela da UFPB. Todos os
trabalhadores de saúde do DS IV foram convidados a participar, mas estiveram presentes
uma média de 70 a 80 trabalhadores em cada roda de TC.
O objetivo desses encontros era mostrar para os trabalhadores de saúde do DS IV
o que era a TC na tentativa de conseguirmos trazer uma formação aqui para João Pessoa
- PB.
Passamos dois anos (2005 a 2007) com o desejo de trazermos a formação da
Terapia Comunitária para João Pessoa - PB, porém não tínhamos um meio. Muitas
pessoas encantadas, muitos profissionais queriam fazer a formação para levar para suas
equipes para ter como ferramenta de trabalho, mas não foi possível.
Então, no final de novembro de 2006, também pela influência das Professoras
Maria Filha e Maria Djair, algumas Diretoras de Distrito foram fazer uma formação em
“Cuidando do Cuidador”, com Adalberto Barreto em Morro Branco, Fortaleza - CE. O
meu primeiro contato com ele, pessoalmente, foi nesse curso. Foi bastante interessante.
Nesta ocasião, tivemos a participação de 64 pessoas, entre elas tinham umas
pessoas do IBDPH, Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Pessoa Humana de São
Paulo, que eram envolvidas com a formação da TC, principalmente Selma uma
enfermeira.
Na época o IBDPH tinha um convênio com a Secretaria anti-drogas do Ministério
da Segurança e estava com recursos para fazer a formação em Município. Eu e outras
colegas tivemos um papel fundamental por conhecer, por achar interessante. Na época,
eu, Adriene, Lucineide, Célia e várias pessoas que estavam em cargos da gestão
conhecemos a TC e nos apaixonamos. Na verdade é apaixonante!
Então quando surgiu a possibilidade, de parte desse recurso vir através do IBDPH
e através da Secretaria anti-drogas lá de Brasília, conversamos com a secretária de
saúde e rapidamente ela entendeu a importância da Terapia Comunitária como
ferramenta institucionalizada de trabalho do dia-a-dia do trabalhador de saúde e topou na
hora entrar com a contrapartida.
Conversamos, mostramos interesse e a partir daí pactuamos que João Pessoa
entraria com um convenio de parceria técnica, uma contribuição no sentido de fornecer a
hospedagem, a alimentação e as passagens dos Professores. Enquanto que o IBPDH
entraria com a hora aula para os Professores. Fechamos esse apoio técnico para o
Município de João Pessoa - PB e também para o Município de Pedras de Fogo - PB,
70
Conde - PB e o Bento - PB assim trouxemos para a primeira formação em Terapia
Comunitária.
Lógico que para s era importantíssimo que as Professoras Maria Filha e Maria
Djair estivessem envolvidas nessa formação, já que no decorrer do processo elas tiveram
um papel fundamental, estruturante, como até hoje estão tendo.
Assim conseguimos formar a primeira turma da Terapia Comunitária. Iniciamos
com 65 pessoas e terminamos com 62. Fiz questão de participar da formação nesta
primeira turma, mesmo já estando em outro cargo, aqui na Diretoria de Atenção à Saúde.
Foi muito interessante!
Sabia que encontros de TC aconteciam em Mangabeira como um projeto de
extensão, mas devido à questão do trabalho nunca tinha oportunidade de ir. E a partir da
formação comecei a participar das rodas de TC.
A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) teve uma participação estruturante ela
tem ido presencialmente a alguns momentos na formação, tem participado dos
resultados. A secretária foi ao segundo módulo, foi no encerramento e entende que é um
processo importante.
Quando ela perguntou quais os projetos importantes que queríamos desenvolver
com parte dos recursos enviados pelo Ministério da Saúde pela portaria da educação
permanente de saúde no ano passado (2007).
Acho que a Terapia Comunitária ela tem uma importância fundamental nesse
processo de reorganização do SUS, e especificamente aqui no projeto da gestão Ricardo
Coutinho e Roseana Meira. No sentido de que esta gestão vem tentando mudar práticas
de trabalho dos profissionais e fazer com que o processo de trabalho da equipe de Saúde
da Família venha atender a necessidade do usuário.
A Terapia Comunitária entra como mais uma ferramenta que possibilita esse
contato, essa aproximação, esse vínculo e principalmente a aproximação da necessidade
do usuário. Nela você tem a oportunidade de chegar mais perto da dificuldade, da dor, do
sentimento do usuário, pois ela é uma ferramenta extremamente importante, de
tecnologia leve que trabalha muito com a subjetividade do usuário.
A Terapia Comunitária está institucionalizada aqui em João Pessoa - PB. Hoje, o
trabalhador ele é liberado da sua carga horária para a formação e dentro dela está a roda
da TC.
O encontro da TC não é uma coisa que ele precise fazer fora do seu horário de
trabalho é um instrumento, uma ferramenta de trabalho que hoje ele tem, muitas vezes
71
acontece fora do horário de trabalho, mas por necessidade da população e não porque a
gestão não quer que se use o horário. Pelo contrário a gestão quer e estimula que eles
aconteçam. É tanto que estamos na segunda formação.
Passei no mestrado recentemente e quero estudar a mudança de prática do
profissional que fez a formação da TC. Porque durante os oito meses de formação da
primeira turma, ocorreram vários depoimentos de colegas no sentido de que a partir da
formação da Terapia Comunitária, no seu ato de trabalho, na produção do trabalho em
saúde, eles são mais atenciosos, humanos, passaram a enxergar mais as dificuldades e o
usuário como um todo no seu contexto social e familiar.
Percebemos que a TC além de fazer essa mudança de prática no trabalhador, de
aproximar, criar vínculos entre os trabalhadores e os usuários e entre os próprios
usuários, ela também modifica a prática de trabalho do trabalhador nesse processo.
Agora estamos fazendo uma coleta de dados através de questionário distribuído
para as equipes, para que elas possam falar o que isso tem representado e esse dado
com certeza vai ser bem interessante para que possamos analisar um pouco como é que
está.
Temos médicos na rede que prescrevem e indicam a TC em algumas situações
que eles acham importante a TC. Eles estimulam os usuários a participarem, mesmo
sendo profissionais que nunca nem participaram, mas escutam comentários, relatos dos
próprios usuários.
Na grande maioria são pessoas que a partir da formação elas incorporam mesmo,
se sentem extremamente importantes, começam a fazer e não param mais.
Dentro da primeira turma tivemos algumas pessoas que se, desestimularam não
entendemos muito bem o porquê, mas é um processo que mexe muito com o interior de
cada um, não é uma formação, uma qualificação como outra qualquer, que só é técnico.
Durante a formação você mexe muito com o seu eu, o seu subjetivo, as coisas que
estão guardadas dentro de você. E muitas vezes você entra em contato com dores,
dificuldades, sentimentos que estavam guardados muito tempo, isso talvez, mova as
pessoas a não quererem continuar.
Vejo isso como um desafio de tentar trabalhar o sentimento dessas pessoas, para
que elas possam superar as dificuldades e possam continuar fazendo a Terapia
Comunitária.
Outro desafio é o espaço físico para a realização da TC. Temos dificuldades em
várias unidades, porque são casas alugadas, nos bairros de periferia. Nunca encontramos
72
casa para alugar com o tamanho que seja compatível com a necessidade do trabalho da
equipe. Hoje temos 16 unidades novas, inauguradas recentemente, que não tem essa
dificuldade e também estão sendo feitas algumas reformas nas unidades que tem prédio
próprio.
Temos em torno de 70 equipes que estão lotadas, trabalhando em locais
adequados. Mas ao todo são 180 equipes, então é um investimento muito grande a se
fazer. As equipes procuram espaços, de associações, de igrejas. O espaço da igreja é
complicado porque, às vezes, é uma igreja evangélica onde algumas pessoas que são de
outra religião não querem ir, se for uma igreja católica pessoas que são protestantes ou
de outras religiões não querem ir, enfim o espaço físico hoje também representa um
desafio. Não tem prejudicado para acontecer, mas tem sido uma dificuldade.
Esperamos em breve, construirmos ocas próximas às equipes para as práticas, a
fim de termos um local mais adequado. É um projeto que temos e espero que possamos
conseguir fazer isso.
A pouca divulgação também é um desafio, procuramos fazer isso através dos
próprios profissionais, já existe certa divulgação, mas abertamente para a população
realmente é difícil.
Na verdade essa gestão gasta poucos recursos para divulgar. Ela prefere gastar
os recursos para efetivar as obras; é tanto que agora estamos começando a desenvolver
um projeto, com o Pró-jovem. São 3000 estudantes, que muito tempo deixaram de
estudar e que hoje recebem recursos para estudar. Estamos montando um projeto porque
eles precisam desenvolver ações comunitárias, então eles passarão a ser informantes de
saúde. Vamos passar algumas informações, e uma delas é sobre a TC, o que é, e onde
ela acontece.
Acho que outra dificuldade que podemos apresentar é que, hoje conseguimos
esse recurso junto a essa portaria da Educação permanente em saúde, mas, por
exemplo, para uma terceira turma ainda não temos uma fonte onde buscar esse recurso é
preciso sabemos que é uma qualificação relativamente cara, porque precisamos ficar
afastados. Nos módulos presenciais toda a turma precisa ficar em um hotel e isso é o que
encarece mais a formação, mas sabemos a importância disso.
Os resultados aagora desde a implantação, considero satisfatório. Tivemos até
dezembro do ano passado (2007) cerca de 15000 pessoas que passaram pelas rodas da
Terapia Comunitária e temos em torno de 36 grupos funcionando.
73
Temos notícias sobre inúmeros relatos de usuários que deixaram de usar
medicação controlada depois que entraram na TC, era preciso ter uma pesquisa. Acho
que a TC veio contribuir dando o apoio que essa população e os próprios trabalhadores
precisam. O trabalhador da Saúde da Família quando ele tem responsabilidade, tem
vinculo com a população ele quer ser o salvador da pátria, quer resolver todos os
problemas. Digo isso porque fiquei cinco anos no Saúde da Família, e tem momentos que
você pega a sua feira para dividir com o outro, enfim queremos ser o salvador da pátria
por tantos problemas, dificuldades e dores que convivemos no dia-a-dia.
Com a TC vo tem a compreensão, de que não pode ser o salvador da pátria,
não pode ter aquele sentimento de que resolve tudo, pelo contrário, você desmistifica isso
em grupo, você utiliza o grupo, para que juntos possam encontrar saída. Acho que ela
contribui por todos esses motivos.
Falando no lugar de terapeuta em formação, de intervisora em formação e de
todas as terapias que participei, acho muito interessante. Faço TC num Hospital onde
trabalho no sábado com os usuários internados e os acompanhantes. É muito
interessante porque quando chego ao plantão, que passo nas enfermarias, vejo os
usuários de uma forma e eles me vêem de outra. A Terapia Comunitária acontece por
volta das 14:00h. No final da tarde quando volto nas enfermarias, a nossa relação, o
olhar, o falar é completamente diferente. Com uma hora e meia, duas horas no máximo
que você passou ali, mas foram duas horas onde você ouviu e possibilitou que as
pessoas falassem dos seus sentimentos, isso é muito difícil.
O mais importante da TC, além de você estar ali é a possibilidade de falar do seu
eu, dos seus sentimentos, das suas dificuldades, e ouvir de outras pessoas que elas
passaram por problemas semelhantes ao seu e como foi que elas resolveram. Você não
está dizendo à pessoa que ela faça desse jeito, mas apenas está dizendo para ela olha,
“eu passei por esta dor, por este sofrimento e no meu caso foi resolvido desse jeito”.
Também é importante quando você faz o ritual final de agregação que você
valoriza a participação de cada um que ali está. O terapeuta ele tem a função, de
valorizar, tentar olhar de todas aquelas falas o que foi importante. Quando a pessoa
resignifica todo aquele sofrimento e ver que tem saída volta com aquele sentimento de
força. Não participei até hoje de nenhuma Terapia Comunitária, onde alguém dissesse:
“Não, não serviu de nada”. Mesmo aquelas pessoas que ficam caladas, como
aconteceram já várias vezes, de uma, duas, três, quatro vezes caladas, mas estão lá e de
74
repente à pessoa começa a falar e dizer olha, “realmente isso tem mexido comigo, tem
modificado...”.
Acho que a importância da TC é realmente isso trabalhar com o subjetivo, a
emoção, as dificuldades das pessoas onde elas podem falar, se ouvir e serem ouvidas. A
partir daí ela passa a ser compreendida e olhada de outra forma.
A relação do grupo de trabalho muda completamente isso acontece com os
próprios trabalhadores que participam você vê, às vezes, os trabalhadores com
dificuldades de relacionamento em várias situações e passam a compreender porque ele
é daquele jeito. A partir daí todo o grupo toda a relação de trabalho melhora isso tem
acontecido em vários locais de trabalho.
75
Mulher decidida, forte, de visão ampliada; sempre defendendo aquilo em
que acredita. Como gestora da Saúde do município de João Pessoa – PB, enfatiza
a importância da Terapia Comunitária para a Atenção Básica, de modo especial
para a Saúde Mental e deixa transparecer claramente que, não apóia, como
tem se mostrado confiante nessa ferramenta - a Terapia Comuniria.
[...]
[...] [...]
[...] tenho visto a TC como uma possibilidade importante [...] onde tem
tenho visto a TC como uma possibilidade importante [...] onde tem tenho visto a TC como uma possibilidade importante [...] onde tem
tenho visto a TC como uma possibilidade importante [...] onde tem
essas rodas se percebe uma maior interação
essas rodas se percebe uma maior interaçãoessas rodas se percebe uma maior interação
essas rodas se percebe uma maior interação entre as pe
entre as pe entre as pe
entre as pessoas e o forta
ssoas e o fortassoas e o forta
ssoas e o fortalecimento
lecimento lecimento
lecimento
de vínculos nas equipes e na comunidade
de vínculos nas equipes e na comunidadede vínculos nas equipes e na comunidade
de vínculos nas equipes e na comunidade [
[ [
[...
......
...]
]]
]
Soube da existência da Terapia Comunitária, através de uma conversa com a
Diretora de Atenção à Saúde, que fez o CUIDANDO DO CUIDADOR. Nessa formação, o
Professor Adalberto apresentou o IBDPH, que é o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento
da Pessoa Humana, que estava articulando com o grupo de Terapia Comunitária para
fazer uma formação aqui (João Pessoa - PB).
Quando retornaram da formação, o pessoal veio conversar e discutir um pouco o
que era a Terapia Comunitária. Estávamos num momento de discussão de como levar
com maior significância a Saúde Mental dentro da Atenção Básica que era uma coisa
difícil. Porque existia e ainda existe por parte da maioria dos profissionais, certo receio de
lidar com o sofrimento mental, por ser algo que eles não tiveram como parte da formação.
Foi aí que conversamos sobre a possibilidade de trazer esse instrumento que é a
Terapia Comunitária para que começássemos a ter maior capacidade de discussão com
76
as equipes de Saúde da Família com relação à questão da Saúde Mental. Assim, o
primeiro olhar de interesse foi por conta da Saúde Mental que nos fez mais sensível ao
dispositivo da Terapia.
Fizemos a primeira turma de formação, que foi dada através de uma cooperação
técnica com o IBDPH e foi coordenada por Selma, juntamente com o pessoal da
Universidade Federal da Paraíba (UFPB), com o qual fizemos uma parceria importante.
Nesse momento, foi quando conheci pessoalmente o Adalberto. Então conversamos, e
ele apresentou a Terapia como instrumento importante do qual poderíamos estar nos
apropriando dentro da Gestão.
Como Gestão, tivemos vários cargos de direção envolvidos nessa formação da
primeira turma de terapeutas. Durante a formação os profissionais ficaram longe do
trabalho, porque o Adalberto tem um pouco dessa metodologia para evitar interrupção na
Terapia Comunitária. Selecionamos pessoas de cargos chaves, que atuariam bem, como
facilitadores para implantar a Terapia Comunitária para o restante da rede. Dando
continuidade ao processo já fizemos mais uma turma de formação em 2008.
Estou muito otimista com essa implantação. um envolvimento de todos os
segmentos dentro da gestão, tem odontólogo, enfermeiros, participando, médico, técnico,
comunidade, agente comunitário de saúde. Já temos dentro da rede 125 terapeutas
formados e 73 grupos em funcionamento aagora, espalhados por todos os Distritos
Sanitários com uma média de 15 pessoas participando em cada grupo. Isso é um
quantitativo importante na rede.
A Terapia Comunitária tem tido aos nossos olhos muita importância porque
percebemos facilmente que onde tem essas rodas, tem ocorrido uma interação, um
aumento do vinculo entre a própria equipe, equipe/comunidade, comunidade/equipe.
Acho que um dos grandes problemas de instabilidade que temos nas Unidades e
na rede como um todo, é devido ao não vínculo construído, pois quando não temos a
construção de vínculos, nos desobrigamos da responsabilidade com o outro, e nem
enxergamos muitas vezes o outro, o problema é do outro. Mas com o processo de
construção de vinculo passamos a estar sensíveis ao outro e a termos mecanismos de
co-responsabilização importante para a construção de uma rede de saúde que trabalha
com humanização.
Visitei um desses grupos que está acontecendo no Distrito Sanitário III na área
do Valentina e observei que até os apoiadores técnicos, que são profissionais que
77
trabalham como facilitadores dentro das equipes de Saúde da Família para resolução de
problemas e conflitos, eles também têm se envolvido na Terapia Comunitária.
Estamos vendo que a comunidade tem aderido fortemente a Terapia
Comunitária, pois acham nela um espaço importante para discutir seus problemas.
Problemas, estes, que interferem diretamente no bem estar e na saúde, pois muitas
vezes, a utilização de antidepressivos é alta. Por exemplo: tem pessoas que precisam de
um medicamento, porque tem uma dependência, enquanto outros passam a ser
dependentes de medicamentos por causa de algum sofrimento mental gerados pelos
conflitos e problemas do dia-a-dia, acreditamos que a TC poder ajudar.
Não temos ainda dados que nos mostrem que a redução desse consumo de
medicamentos, seja impacto ou não da Terapia Comunitária. Mas o que temos observado
é que, as pessoas têm se utilizado da Terapia Comunitária como forma de construir
possibilidades até de defesa para enfrentamento de seus problemas.
A hospitalização na Saúde Mental é o segmento hospitalar que se tem o maior
gasto na Gestão atual. A internação psiquiátrica possui a maior diária, e muitas vezes,
a internação errônea de pessoas, devido o alcoolismo, depressão e outras intercorrências
que não deveriam ser internadas. E o paciente, muitas vezes, passa um mês internado.
Então, acho que isso, é um desserviço para com a saúde porque quando se traz a pessoa
trancafiada, dificilmente ela vai estar resolvendo o seu problema. Portanto, é nesse
sentido, que eu acho que temos que trabalhar com outros instrumentos para nos
capacitarmos a fim de intervir melhor na questão da Saúde Mental.
Assim, entendo que o grande desafio é realmente termos a capacidade de
ampliar mais essa formação de terapeutas comunitários. Para tanto negociamos recursos
para a Terapia Comunitária e estamos ampliando a formatação.
Outro desafio é que realmente os grupos não percam ou saiam do seu objetivo,
tornem-se grupos religiosos ou grupos de auto-ajuda, pois não é essa intenção, mas que
eles tenham a capacidade de estar avaliando para dar continuidade às discussões
realmente dos problemas que a comunidade traz.
Esperamos que este debate seja ampliado, para que a Saúde Mental seja uma
responsabilidade desde a Atenção Básica porque assim, iremos diminuir o número de
internações, o consumo de medicamentos, e proporcionarmos um acompanhamento ao
paciente e não simplesmente só encaminhá-lo como normalmente o é feito.
A Terapia Comunitária é mais um instrumento, para estarmos efetivamente
construindo uma prática mais integrada, uma prática que seja complementar as outras
78
práticas mais tradicionais, já fortemente instituídas. Acho que temos que lançar mão de
várias práticas que nos possibilitem dar respostas a muitas necessidades que o usuário
tem e que não é só a consulta e o exame que com certeza vai resolver.
Estamos apostando também em outras práticas como: “João Pessoa Vida
Saudável”, que é a prática dos esportes nas praças, na Homeopatia, Acupuntura e
também fitoterapia, enfim outras práticas complementares que achamos importante e que
é necessário incentivarmos dentro desse conceito ampliado de saúde, dentro dessa
perspectiva de construção de um cuidado que tem a integralidade e a defesa da vida
como seu anseio maior.
79
Enfermeira da ESF, mulher de fibra, determinada, batalhadora e alegre. Fez
parte da história da Terapia Comunitária como participante das primeiras rodas no
PSF- Ambulante - Mangabeira. Na sua fala ressaltou o orgulho em fazer parte
dessa teia, do seu processo de implantação da Terapia Comunitária no município
de João Pessoa - PB.
A TC me ajudou a perceber que
A TC me ajudou a perceber queA TC me ajudou a perceber que
A TC me ajudou a perceber que a cada história existe uma outra
a cada história existe uma outra a cada história existe uma outra
a cada história existe uma outra
história...
história...história...
história...
é um novo olhar....
é um novo olhar....é um novo olhar....
é um novo olhar....
Fico feliz, pois me sinto parte dessa implantação. Há mais ou menos um ou dois
anos nossa Unidade de Saúde da Família Ambulantes, era isolada. Hoje, é uma Unidade
Integrada. Nessa época, já tínhamos um convênio com a Universidade Federal, em que
Unidades de Saúde do PSF recebiam para estágio alunos da Graduação de Enfermagem.
Então, as Professoras Maria Djair e Maria Filha trouxeram a proposta para a nossa equipe
para desenvolver a Terapia Comunitária (TC), pois elas faziam a formação de terapeutas
comunitárias lá em Fortaleza com Professor Adalberto Barreto.
E como havia um desejo da equipe de trazer algum projeto que fosse saciar
as necessidades dos usuários, pois percebíamos nas consultas que eles tinham queixas
emocionais (psicossomáticas), casou certinho a necessidade da nossa equipe de fazer
esse trabalho diferenciado com a proposta de Maria Djair e Maria Filha.
80
Com isso, elas vinham acompanhar os alunos e fazer esse trabalho com a
comunidade. Os alunos também participavam. E para vivenciar esta experiência, foram
vindo alunos do Mestrado e de outras disciplinas.
Começamos esse projeto em julho de 2004, aqui na Unidade de Saúde do
Ambulantes. Também levamos a divulgação deste projeto para outros Estados. Isso
começou a ser divulgado através da imprensa e do boca-a-boca, para outras unidades,
outras equipes, fazendo com que colegas e outros profissionais tivessem interesse.
Assim, no ano passado (2007), houve o interesse do Município em institucionalizar. E
ocorreu a formação de novos terapeutas.
O meu primeiro contato com o Professor Adalberto foi na Dissertação de
Mestrado da aluna Viviane Rolim, em que ele foi convidado para fazer parte da banca.
Depois disso, participei de uma sensibilização que ele veio fazer com os alunos da
Especialização em Saúde Mental. Anteriormente meu contato era através de
informações de Maria Djair e Maria Filha e do material que lia sobre TC, inclusive um livro
dele.
Percebemos que esta estratégia vem trazendo um resultado positivo não só para
nós profissionais, mas principalmente para os usuários, pois temos observado que têm
surgido mudanças.
Vejo a importância dessa institucionalização da TC como uma prática do
Município de Jo Pessoa que vem a somar, pois possibilita um conhecimento maior, um
vínculo com o usuário. Quando estamos no nosso consultório, temos pouco tempo para
conversar, para ouvir. Primeiro, por conta do número de usuários, pois a demanda é muito
grande. E quando esse usuário entra na sala para falar sobre a queixa, ficamos com certo
receio de estar ouvindo, porque os que ficam do lado de fora ficam reclamando. Mas, com
a TC, passamos a ter outro olhar através daquela queixa.
Por exemplo, se for uma dor de cabeça, não vamos só ver aquela queixa, iremos
buscar o que esta ocasionando aquela dor de cabeça. E a TC tem favorecido essa
percepção para que possamos olhar com outro olhar a fim de nos aproximarmos mais e
descobrirmos realmente o que é que está ocasionando. Isto tem facilitado muito o nosso
cuidado com os usuários.
Nós, do Ambulantes, temos um grupo praticamente fechado porque são pessoas
que vêm acompanhando desde o início. Mas também temos aquelas pessoas que vêm
eventualmente, aquelas que encontramos no consultório, que está com algum problema.
Encaminhamos essas pessoas para fazer a TC, algumas continuam vindo, mas outras
81
não, porque, de certa forma, ou conseguiram resolver seu problema ou porque não
tiveram afinidade. Encontramos também pessoas que não gostam de se expor, não têm
essa prática e terminam se afastando, muitas vezes, porque não entenderam a proposta
da TC.
Na TC, além de discutirmos o problema que aquela pessoa traz, realizamos
discussões para problemas da comunidade, para necessidades da comunidade, como por
exemplo, teve alguns encontros de TC em que pessoas falaram que estavam tendo
dificuldades na educação dos filhos, e outras pessoas também compartilharam dessa
dificuldade. Então, trouxemos um profissional da área para falar sobre educação de filhos.
Neste momento, quem trabalhou este tema com os usuários através de textos e
discussões foi Maria Filha, Maria Djair e mais duas pessoas da comunidade.
Também aconteceu um caso na comunidade de óbito, por uso de
anabolizantes, e uma pessoa da comunidade trouxe essa preocupação. Por conta disso,
trouxemos um profissional da área para falar sobre o uso de drogas, e fizemos encontros
anuais com oficinas diversas para os jovens.
E assim, de acordo com a demanda que chega, percebemos um problema que
não seja só individual, que seja do coletivo, procuramos trazer pessoas para falar e
também desenvolver ações que possam ajudar no sentido de resolver ou minimizar os
problemas.
Outro exemplo disso foi quanto aos idosos que sabíamos que viviam em casa
trancados, sem sair, alguns com problemas de depressão, por problemas de saúde ou
porque os filhos não os acompanham para ir a algumas festividades. Então, na TC, foram
relatadas essas queixas. Através disso, conseguimos realizar ações que trouxessem
esses idosos para fazer passeios, atividades manuais e encontros anuais.
Hoje, um grupo de idosos que já foi formado, parte dele participa em cantos, pois
desejam fazer parte de um coral, e a outra parte dele tem outras pessoas que mostraram
o desejo de fazerem parte de um grupo teatral. Tem também aqueles que gostam muito
de festas e tem o São João. Estamos fazendo agora ensaios da quadrilha com eles.
Tudo isso, porque percebemos as necessidades deles de estarem saindo de dentro de
casa porque ficavam em casa cuidando dos netos, a família usando inclusive do dinheiro
deles, e eles ficavam naquela tristeza e angústia. Então, eles foram saindo de pouquinho
e hoje estão nesse movimento.
Temos dificuldades em relação às mulheres mais jovens. Houve um encontro
que falou sobre violência e assim trouxemos umas pessoas para falarem sobre violência
82
doméstica, resultando posteriormente em alguns encaminhamentos de denúncias contra
o companheiro.
Então, é assim, a TC tem a finalidade de melhorar a auto-estima e buscar formas
de resolver o problema, mas, como é comunitário, não deixamos que fique no
individual, mas que esses problemas sejam resolvidos em nível coletivo.
Não temos um grupo formado de mulheres, mas tivemos alguns
encaminhamentos, pois algumas mulheres vieram com queixas em relação a cuidados
com o filho, à violência doméstica da criança e do adolescente. Para isso, trouxemos o
conselho tutelar da criança e do adolescente para uma reunião com essas mães.
Fazíamos encontros com gestantes, elas traziam dúvidas relacionadas com a
gestação, mas que muitas vezes tinham a ver com problemas familiares, mas quando
passamos para cá, suspendemos porque tivemos problemas com a falta de espaço físico
para desenvolver a TC.
No Ambulantes, eu e Kátia, que é agente de saúde, realizamos a TC em dias
fixos, nas terças-feiras. conseguimos um espaço que é numa Igreja que foi recém-
construída. Nas quintas-feiras, acontecia com uma outra dupla, que era Verônica e Izan
Marques. Mas foi suspenso porque além de Verônica ser transferida para outra unidade e
Izan Marques ficar só, houve coincidência justamente com o dia em que um dos grupos
de idosos está fazendo ensaios da quadrilha, e a Igreja está fazendo uma reforma. Acho
que há mais ou menos um mês não estamos fazendo a TC.
Outra dupla de terapeutas que temos é Áurea e Miriam, elas fazem TC de
quinze em quinze dias lá na comunidade delas. Somos quatro unidades.
Nos relatos dos benefícios, o que mais me chamou a atenção é de uma senhora,
de idade, que era recém-chegada aqui na nossa comunidade. Ela morava no Roger,
mas estava aqui na casa de uma filha. Ela se desentendeu com o marido porque não
gostava do bairro onde morava, mas o esposo não quis sair do bairro e ela começou a
entrar em depressão. E por conta da divulgação que tinha sido feita na comunidade e na
televisão, a filha soube que tínhamos esse tipo de trabalho. A princípio, esta senhora
vinha com a filha, mas hoje, ela vem sozinha, não tem mais depressão. Faz parte do
grupo de idosos, não precisa mais de acompanhamento e o toma mais medicação para
a depressão.
Outro caso é de uma senhora da nossa comunidade, que tem vários problemas
de saúde e usava muitos medicamentos. Nos relatos dela durante a TC, num desses dias,
relatou o quanto se sentia bem quando vinha para a TC, que inclusive as dores dela
83
desapareciam e os medicamentos que vinha tomando em excesso os médicos já tinham
reduzido. Então, são coisas assim que observamos que é gratificante.
Tem um caso, bem interessante, de uma usuária nossa, que era daquelas que
vinham todos os dias na unidade. Ela era daquelas que chegava a perturbar porque
víamos que ela não tinha problema. Particularmente, eu tinha certa rejeição porque ela
era bastante pegajosa, mas quando ela começou a vir para a TC e a contar a sua historia
de vida, foi que percebi qual era a sua carência, era uma carência afetiva. Ela hoje
passou a ser nossa parceira, vem nas festividades para nos ajudar. não vem com
freqüência para tratamento de doença, vem apenas com o marido, que é uma pessoa
de idade, que é doente. Ele não vem para a TC porque é evangélico, tentou até proibi-la
de vir. Mas tivemos uma conversa em que mostramos para ele a preocupação dela nos
encontros com ele e com a doença. E até hoje ele não vem para a TC, mas aceitou que
ela viesse.
Então, percebemos que podemos conhecer melhor as pessoas e tirar aqueles
preconceitos que existem em relação a alguns usuários, que vêm frequentemente, que
termina incomodando. As mudanças, os benefícios não são só para o usuário, mas
também para os profissionais, pois se tornam mais sensíveis na escuta e passam a tratar
de forma diferente, porque começam a perceber que aquele incômodo, aquela queixa
daquela dor, daquela gastrite, não é uma coisa só física, é também emocional.
Com relação à questão do paradigma do paciente vir pegar o medicamento,
percebemos, sem dúvida, que as pessoas que vêm para a TC de uma forma sistemática,
elas reduziram, sim, o uso dos medicamentos. Porém, não posso dizer que isso mudou
num número elevado, porque até agora não tenho conhecimento de trabalhos que foram
feitos em cima disso, então não posso afirmar e comprovar a proporção dessa mudança,
só pela observação.
Infelizmente nós ainda temos certa resistência dos outros profissionais, por isso
que a integralidade não se torna uma coisa efetiva. Não sabemos dizer o porquê da não
participação desses profissionais nas TC e da não indicação deles. E como não foi feito
nenhum levantamento, nem estudo, e nas reuniões, quando discutimos isso, eles não
relatam o porquê que não participam, não indicam, então não temos como avaliar.
Nós que estamos fazendo a formação, enfermeiros, agentes de saúde, temos
buscado realmente essa integralidade. Claro que têm alguns profissionais que não são da
área da enfermagem, que reconhecem a TC como sendo importante, mas acho que,
84
talvez, por não vivenciarem a formação ou as vivências da TC, ainda não a incorporaram
como sendo uma estratégia de integralidade.
Nosso maior desafio tem sido a conquista de um espaço ideal, porque, quando
trazemos um grupo para falar de sua intimidade, emoções, conflitos pessoais e familiares,
precisamos de um espaço adequado. Nem por isso deixamos de realizar os encontros,
mas, até agora, não conseguimos esse espaço.
Outro desafio é com relação à adesão dos outros profissionais, que também não
temos conseguido. Na minha vivência, percebo que quem mais adere são os agentes
comunitários de saúde, talvez porque tenhamos um contato maior com eles, por ser
supervisora ou por estar algumas vezes cobrando a presença. Isso porque vai ajudá-los
nas visitas, pois mesmo eles indo à residência das pessoas, ainda assim não conseguem
observar algumas coisas que estão naquele ambiente, e isto é um relato deles que,
quando passaram a viver mais a TC, facilitou e muito a adesão deles, por parte dos
usuários. Perceberam que facilitou a visita domiciliar, para entrarem na casa,
conversarem mais e identificarem problemas que antes não identificavam.
Um dos entraves que encontramos é em relação à adesão dos médicos e
odontólogos e de outras categorias. O que eles alegam é a falta do tempo, porque, nas
unidades, o técnico de enfermagem ele tem uma série de atribuições, então quando ele a
deixa para participar da TC, vem uma queixa, embora aqui, nessa unidade integrada,
fizéssemos um acordo de fazer uma escala para cada encontro de TC.
Tem alguns que participam, que gostam, mais não com muita freqüência. Muitos
deles, não conseguimos trazer de jeito nenhum. E como a Terapia é um encontro que
você não é obrigado, seria o ideal que você viesse por livre e espontânea vontade. Temos
deixado que eles se sensibilizem, porque sensibilização houve, mas que toque neles
para que venham participar.
Com relação à formação, não tive nenhuma dificuldade, muito pelo contrário,
tudo contribuiu para que eu pudesse viver essa experiência. Com relação à família, meu
filho e meu esposo sempre me deram apoio. Precisamos nos ausentar de casa pelo
menos três ou quatro dias, mas nunca tive problema em me ausentar.
Fui de coração aberto, e isto facilitou muito. Fiz as vivências integralmente, não
tive restrição, nem dificuldade. Os locais que foram realizados esses módulos da TC
foram bastante agradáveis, com exceção de um que fomos, que era um tipo de convento,
mas para mim, não houve dificuldades.
85
Para mim, foram momentos muito intensos, em que passei a me conhecer
melhor, e me conhecendo melhor, passei a agir de uma forma diferente. Eu estava com
problemas em casa, no casamento. Não conseguia superar e até hoje eu não superei,
porque me deixei levar pelas circunstâncias, mas hoje sou outra Socorro. Hoje resgatei a
Socorro que eu era antes de casar, a Socorro Sousa.
E assim foi muito bom, recomendo para todo mundo, quem puder ter essa
experiência, viver essa experiência, vá. Quando eu chegava, repassava para a minha
equipe cada módulo, assim de uma forma gratificante, sempre dando força a quem
quisesse e pudesse ir. Talvez, a única dificuldade foi de termos no mínimo 50 encontros
de TC para ter a formação fechada. Por essas questões que falei, de falta de espaço
físico e de participação e ajuda dos profissionais para convidar as pessoas para a TC,
tivemos alguns atropelos e não conseguimos realizar todas as TCs nas quartas-feiras.
Acho que, quanto à divulgação, precisa de um maior investimento, isso em nível
local, enquanto profissionais, na comunidade, através dos agentes de saúde, no
atendimento diário porque praticamente quem convida somos nós, que estamos fazendo
a formação, e algum colega que gosta e que se identifica. Isso tem sido discutido e levado
para os encontros de intervisão da TC. Temos solicitado, inclusive, que a gestão criasse
um mecanismo de divulgação maior. Foram feitos alguns cartazes para serem colocados
em pontos estratégicos, mas deveria ter ido à imprensa, divulgar, falar sobre.
E até assim, trabalhos que foram feitos, como esse que voestá fazendo,
que possam ser divulgados com mais estímulo, mais força, para que as pessoas possam
ver, porque ainda tem pessoas, mesmo da nossa área, que não conhecem e que têm
resistência de participar por falta de conhecimento do que seja a TC.
Fico feliz deste trabalho ter iniciado na nossa comunidade. Então, isso pra mim
me enriquece e me deixa muito gratificada. E mais do que isso, de hoje ser terapeuta,
porque, na época, eu acolhia a dupla de terapeuta, que era Maria Filha e Djair que, muitas
vezes, me convidaram para fazer parte em alguns encontros de TC, sendo co-terapeuta,
e hoje, com a formação, eu me sinto preparada, claro que preciso melhorar, mas
percebo o quanto melhorei.
A cada momento, percebo que sempre daquela história existe uma história por
trás, e hoje consigo perceber isso. O que eu aprendi e do meu reencontro comigo mesma,
isso sem dúvida, me deixa assim, muito feliz, muito lisonjeada, muito orgulhosa, é um
orgulho legal.
86
É uma nordestina, enfermeira e professora que tem muito orgulho de suas
raízes. Isso contribui de maneira significativa para o seu jeito diferente e inovador
de fazer sempre. Na sua fala considera a Terapia Comunitária como ferramenta
importante de transformação.
A conversa fluiu entre choro e risos, por mais de uma hora, num clima de
muita cordialidade. Portanto, conheça-se a história da TC, narrada por essa
colaboradora.
[...] cada um tem uma riqueza, dado ênfase a essa riqueza, o que era
[...] cada um tem uma riqueza, dado ênfase a essa riqueza, o que era [...] cada um tem uma riqueza, dado ênfase a essa riqueza, o que era
[...] cada um tem uma riqueza, dado ênfase a essa riqueza, o que era
miséria e dor, se tra
miséria e dor, se tramiséria e dor, se tra
miséria e dor, se transforma em espaço de partilha e de conquista.
nsforma em espaço de partilha e de conquista.nsforma em espaço de partilha e de conquista.
nsforma em espaço de partilha e de conquista.
Eu, Maria Djair e Maria Filha, sempre procurávamos trabalhar em conjunto e nos
preocupávamos em como iríamos abordar a realidade sem mudar nosso campo de
atuação. Na época, não contávamos, nem tínhamos ferramentas pedagógicas poderosas
para que pudéssemos ter esta visão paradigmática, não digo totalizadora do homem, mas
que fosse uma visão integral e que pudéssemos trabalhar interdisciplinarmente.
Precisávamos romper isso, e dentro da academia isso me inquietava.
Então, Maria Filha, descobriu a Terapia Comunitária (TC) em Fortaleza, e foi
com Maria Djair fazer a formação. Não pude ir porque meu ex-marido havia morrido e eu
estava impossibilitada de ir.
87
Quando elas retornaram, me chamaram para fazer TC. Consideramos a
implantação da TC como sendo extra-oficial. As TC aqui em João Pessoa começaram a
ser feitas no bairro de Mangabeira IV na Unidade de Saúde da Família Ambulantes.
Nos primeiros dias fui com elas, pois depois da capacitação elas tinham que
fazer as Terapias. Fiz muito o papel de co-terapeuta e a TC me encantou porque comecei
a perceber que era um instrumento pedagógico bem diferente, não em termos de
academia, mas da própria população.
Ali potencializávamos a vivência, a experiência, a resiliência. Trabalhar com a
resiliência humana, “eu não sou um pobre coitado”, então sou mais do que isso, tenho
potencialidades, pois sozinhos não somos nada. Notamos, por exemplo, a criação de
vínculos, isso foi fantástico, a criação de vínculos dentro da comunidade, com o serviço,
isso foi gritante, a resposta foi imediata. E ao mesmo tempo facilitador da construção de
uma rede psicosocial, que é importante, pois não trabalharmos isoladamente, precisamos
construir esta rede solidária.
Penso que esta prática foi constante, e que em uma articulação de Maria Filha
com Adalberto, pensando junto ao Município, por que temos um engajamento na questão
da política e da Saúde Mental no Município, que de Saúde Mental não tínhamos nada.
Esta questão fica um tanto quanto abstrata, estamos falando de Saúde Mental, mas o que
realmente integramos na Atenção Básica? Os CAPS estão aí, mas é um serviço mais da
média complexidade, onde o sujeito já adoeceu, então, dentro do campo da promoção da
Saúde Mental o que se tinha, dentro dos serviços das Unidades Básicas de Saúde?
Nada, não é.
Então, visualizamos esta ferramenta como uma possibilidade da construção de
uma política de Saúde Mental na Atenção sica. Percebendo a dimensão disso, foi-se
conversando com o Município e articulou-se um movimento para que fosse feito uma
capacitação com uma turma aqui.
Se queremos implementar esta política na Atenção Básica, devemos oferecer
capacitação as pessoas que de fazem parte. Mas levá-las a Fortaleza era um tanto
complicado, então, tínhamos que trazer a TC para cá, mas como?
Nestas articulações entre Secretaria, Maria Filha e Adalberto, se descobriu o
IBDPH (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Pessoa Humana) que firmou este
compromisso de criar a primeira turma de capacitação de terapeutas, da qual eu participei
e fui pioneira.
88
Penso que, a capacitação, me empoderou muito mais. Apesar que de tanto
assistir, vivenciar e participar das TC com Maria Filha e Maria Djair comecei a pegar o
manejo, porque ela não é um instrumento difícil de se fabricar, basta que você tenha boa
vontade, abertura e sensibilidade para querer se doar a este trabalho.
Para ser um terapeuta você não precisa de inteligência do outro mundo, basta
estar aberto a esta experiência. É simplesmente uma questão de doação. E isto é um
crescimento pessoal imenso, nos tornando seres amorosos, solidários, menos egoístas.
Passando a ser solidário por causa do outro porque a dor dele reflete em mim, então foi
outra coisa que comecei a compreender e a perceber a dor. Tem uma ressonância dentro
de mim também porque não um ser humano que não tenha passado pelo sofrimento.
Muitas vezes, quando falamos em dor, só queremos compreender a dor do ponto de vista
biológico, mas hoje em dia, por exemplo, uma dor biológica, a tecnologia é muito grande.
Então não tem porque uma pessoa ter dor física hoje, agora, a dor psíquica quem a não
tem?
Quando esta dor não encontra um espaço de partilha, de escuta, ela se torna
uma coisa triste, que é o sofrimento. Então, passa de dor para sofrimento, e dentro deste
sofrimento várias coisas podem acontecer. Como sujeito, como pessoa, você pode cair na
depressão, a sua auto-estima vai para baixo, então quem não tem dores? Na Terapia,
ao mesmo tempo que vorealiza a roda junto com os demais participantes, você sofre o
efeito dela. Isso nos torna muito iguais. Somos o espelho do outro. Acho que o ser
humano se acha muito diferente, do morador de Mangabeira IV ambulantes, mas não, a
condição humana vista sobre este prisma não tem diferença. A dor humana, o sofrimento
humano é partilhado, porque aquela criatura que mora numa casa de taipa ou dentro das
locas, como ser humano, ela não é diferente de mim. As suas dores e os seus
sofrimentos encontram ecos dentro de mim, dentro das minhas dores.
Na escolha do tema, as pessoas escolhem aquele que mais tocou o coração e
como Adalberto fala “agente reconhece no outro o que agente reconhece na gente”.
Então, quando elegemos um tema é porque esse tema, essa dor, esse sofrimento ele
encontra espaço em mim.
A TC é uma ferramenta poderosa na criação desta rede de solidariedade, onde
eu não estou mais . É um espaço onde se trabalha conseqüências futuras, se tenho
uma dor, um sofrimento psíquico que é constante, e eu não encontro um espaço para que
possa trabalhar isso, irei ter conseqüências, às vezes sérias, em alguns sujeitos, porque
89
tem pessoas, por exemplo, que reagem diante de uma dificuldade dando a volta por cima,
mas nem todo mundo é assim.
Quando trabalhamos o Cuidando do Cuidador em Cabedelo, e fomos fazer o
projeto, uma coisa que me chamou a atenção, foi à questão do sofrimento mental. Ainda
estamos naquele paradigma, eu separo mente e corpo. Na Atenção Básica o que é que
fazemos? Particularmente, cuidamos do ser humano apenas da cabeça para baixo.
Mesmo tendo o discurso de que o homem não é um corpo biológico, ele tem uma
mente, emoções, ele está inserido num determinado contexto social. Mas, para vermos
isso em ação, devemos compreender realmente que quebrar com os milênios deste
paradigma. Para quebrarmos com isso, temos que procurar outros caminhos que não são
conhecidos, para tanto precisamos nos lançar no escuro, mas isso não é tarefa fácil.
Sempre trabalhei junto com Maria Filha que é da Saúde Mental e Maria Djair que
é da Atenção a Saúde da Mulher, porque dentro Sde Coletiva, na Atenção Básica,
trabalhamos com paradigmas do processo saúde-doença, mas não vejo praticamente
ações nesse nível em Saúde Mental. Por exemplo, chega uma pessoa na Unidade de
Saúde da Família com algum problema ninguém sabe dar uma resposta. Fala-se do
acolhimento, mas acolher é o encaminhamento para consulta médica. Às vezes, as
pessoas chegam com a pressão alta, e a Enfermeira pergunta assim: “Mas, homem o que
foi, andou comendo sal?”. E quando pergunto assim: “Não tem sido fácil a sua vida
ultimamente não é minha flor?”, quantos olhos marejados de lágrimas, já vi!
Por detrás daquela subida de pressão tenho verificado que tem algo, tem uma
dor, não é o sal, a comida, o corpo biológico que está pedindo socorro, muitas
vezes é o corpo mental. Falamos tanto na ligação corpo-mente, mas nós temos medo de
fazer ou não enxergamos ou não compreendemos realmente. Porque quando
compreendemos nossa atitude muda. Pois, jamais vou fazer algo contrário ao que eu
compreendi.
Os projetos terapêuticos trabalhados ainda são a nível corporal, biológico. Não
estou acolhendo, nem ouvindo as dores dessas pessoas, o que torna o meu vinculo com
elas muito limitado. Penso que não podemos desconsiderar essa questão agravante, que
tem levado a transtornos mentais. Como vamos colocar na realidade ações práticas, da
Atenção Básica na questão da promoção a Saúde Mental?
Compreendo que, promover a saúde física e mental, ou seja, direcionar para um
novo paradigma é ofertar novas ferramentas tecnológicas. Não é trabalhar com “Dona
90
Lourdes” a questão do seu joelho, mas é trabalhar com ela a questão familiar, porque
isso aí gera sofrimento, dores e doenças.
Lembro que, estava havendo um curso de especialização em Sde Mental
onde andei dando umas aulas como facilitadora e Maria Filha me disse que Adalberto
Barreto, vinha. Foi a primeira vez que o vi. Ele era um sujeito bem típico nordestino, de
cabeça chata, pequenininho, com a cabeça quase enterrada nos ombros, mas quando ele
abriu a boca, fiquei maravilhada. Primeiro me identifiquei com ele pelas raízes, a forma
dele falar. Por ele ser um criador de um instrumento desses, com dois doutorados no
exterior, hoje, dentro da academia, você imagina logo, é uma pessoa cheia de pompas,
cheia de não me toques, sério. Mas chega aquele sujeito muito autêntico, simples. Eu
me apaixonei. Fiquei maravilhada com o jeito dele falar, de se expressar porque sou
sertaneja e tenho muito do linguajar dele. Quando estou junto do povão, me sinto a
vontade porque isso me direciona para as minhas raízes, então, essa identificação foi
muito forte.
Anteriormente, Maria Filha havia me passado um material de uma capacitação
de Adalberto, que ela fez em Fortaleza, nele tinha um breve histórico da vida dele. Aquilo
me encantou porque é um sujeito que está com um na realidade. Gosto de
problematizar as coisas dentro da realidade e procurar o conhecimento como forma de
dar respostas o que é bem diferente do movimento onde vamos buscar apenas
resultados.
Depois fui dizer: “Professor muito obrigada pelo que o ouvi dizer, que eu posso
ser quem sou”, porque muitas vezes, determinados espaços sociais colocam você em
uma fôrma, e eu não sou uma pessoa de fôrma, sou o que eu sou, com isso não quero
dizer que “Pau que nasce torto, não tem jeito e morre torto”. Agora se sou sertaneja, não
quero perder essas raízes nunca, sem essas raízes vou ser o que? Então a partir daí
compreendi melhor, o meu jeito de ser, a facilidade que tenho de me aproximar das
pessoas porque elas entendem o meu linguajar e eu entendo o linguajar delas, e não
devo ter vergonha. É isso que eu digo, ser o que se é.
Não devo me submeter a nenhuma cirurgia plástica dentro das minhas raízes, as
minhas raízes são essas. E aonde eu for, elas vão comigo. Quando faço a TC aquelas
expressões de raiz vão surgindo naturalmente no meu mote, antes eu decorava aquelas
expressões que estavam dentro de mim. Hoje flui sem nenhuma dificuldade.
91
Hoje, no Município de João Pessoa - PB politicamente, podemos dizer que não
uma política formada, mas um esboço bastante significativo de uma política,
depois de tantos anos, de tantas governanças sem um projeto político na área da saúde.
Acredito que projeto político é um processo, e esse projeto como um processo
vai tomando uma forma. Então, penso que uma das primeiras ações, foi redirecionar a
questão da organização da Atenção Básica. Mas que paradigma nos norteia? Nossos
discursos estão apontando o tempo inteiro para o rompimento de um modelo médico
assistencial onde você só visualiza a doença, só trabalha a doença, o corpo doente, você
não vê o outro.
Lembro que quando estava fazendo o meu curso, em Jo Pessoa - PB
existia 60 espaços onde se fazia a TC. Quando você introduz algo, não pode ser de
goela abaixo, esse instrumento, essa mudança tem que se concretizar na vida. São 60
espaços onde estão se trabalhando os sentimentos das pessoas, que não é uma coisa
fácil.
Para fazer um trabalho, você tem que estar envolvido com a equipe, porque o
trabalho é em equipe, o trabalho não é um trabalho aonde cada um vai para suas
caixinhas e fica fazendo suas coisas. Porque se não for assim, não quebramos essa visão
de um trabalho multidisciplinar, e não passa disso aí, porque multidisciplinar é ter o
médico, o enfermeiro, o dentista e é a mesma coisa de morar a família toda em uma
casa, mas ninguém se comunicar, ninguém trocar nada, cada um tem a sua vida
independente e solitária, girando em torno de si próprio.
Como eu posso falar daquilo que eu experêncio, dentro da comunidade onde
tenho tido uma ligação maior, sei de pessoas que saem do sofrimento e daquele
marasmo que era a sua vida de uma forma tão rápida, um desabrochar lindo. Elas não
sabiam mais o que fazer da vida, se revelaram, já estão até com pequenos negócios, que
é uma coisa que Adalberto coloca muito, quer dizer é trazer a resiliência dessas pessoas,
é criar uma rede solidária para que essas pessoas compreendam a situação social de
vida, a miséria que passam e o que é que elas podem fazer de diferente para melhorar
sua vida.
Esse é o espaço resiliente, “eu tenho potencialidades”. Qual a nossa
potencialidade enquanto comunidade? Porque cada um tem uma riqueza, se dermos
ênfase a essa riqueza, esse espaço, que era de miséria e de dor eu o transformo, num
espaço de partilhas, de conquista. Notamos, por exemplo, que pessoas que eram difíceis
o acesso a elas, foram pessoas que criaram vínculos com a equipe, e se a equipe
92
passasse por uma dificuldade, logo ele dizia: “estamos aqui, o que podemos fazer para
contribuir?”.
Então, se cria esse vínculo entre serviço e comunidade e a equipe sabe que
pode contar a qualquer momento com essas pessoas. A criação de vinculo, o
desabrochar do potencial dessas pessoas, que se encontravam com depressão e
emergiram diante daquele quadro.
A TC é um instrumento que realmente trabalha essa promoção, promovendo a
vida, mudando a qualidade de vida, porque muitas vezes achamos que mudar a qualidade
de vida é tirar aquelas pessoas dali e botar num lugar bem chique, talvez elas nem
saibam viver dessa forma. Eu digo por que moro ali perto do lixão do Roger e quando
tiraram aquelas famílias dali e as botaram num prediozinho, todo mundo disse: “Oh,
venderam tudinho”! eu disse: “Minha gente, essas pessoas viviam dentro do lixo, de
repente voas tira e as colocam num outro espaço, elas não sabem nem o que é que
estão fazendo ali.
Tem que ter cuidado com esses tipos de pensamentos, de atitudes. Penso que o
Município está certíssimo. Não é coisa fácil, mas acho que é importantíssimo. E espero
que continue, porque é um processo, as coisas vão ser cogitadas, mas nada es
acabado, espero que a TC venha para ficar.
Essa questão dos desafios fica mais clara para quem está sofrendo o processo
pedagógico. O sujeito que está se capacitando, ele está motivado é o que temos visto.
Mas, acho que um dos primeiros desafios é justamente fazer com que as equipes
compreendam esse movimento, a importância da Saúde Mental ter essas ações políticas.
E a partir da visão de saúde e doença que cada membro vai ter, acho que está se
colocando em prática a afirmação de um paradigma ou a quebra dele.
Elas dizem assim: ”A equipe não adere”, acho que não é nem a adesão da
equipe, é esse choque de visão, porque que se acho que a TC é uma coisa boba, é uma
coisa a mais, esmexendo com a minha visão de saúde-doença, e transformá-la não é
tarefa fácil.
Acho que esse desafio, não tem a ver com a equipe que está lá, com o
profissional que está lá, mas acho que tem a ver com o processo de formação, com o
processo de gestão, com o processo aqui de sujeitos que estão sendo formados. Se
prestarmos atenção tudo vinha de cima para baixo, a política de saúde ela descia de cima
para baixo.
93
A TC é um instrumento que leva um tempo de ressonância porque vai se
implantando, se firmando, criando esse vínculo e vínculo não é uma coisa para já. Criação
de vínculo, abertura, confiança, são coisas que vamos conquistando. Mas, penso assim
as pessoas que participam, são pessoas assíduas, que não faltam, principalmente o
pessoal idoso, até se arrumam, porque é um espaço que eles encontram, sabe-se que
impressão do idoso na nossa sociedade é essa: “Ele não vale mais nada porque não
trabalha, não faz nada”, e a cultura nossa é aquela que logo o escanteia.
A TC é um espaço onde cabem todos, tenho tido assim experiências de
crianças, que avotam no problema e dizem por que estão votando. Então, é um espaço
que acolhe do velho as crianças e eles maravilham você.
Agora, estou com uma colega que esfazendo TC ali na igrejinha. Na primeira
vez, ela tentou fazer, e não foi ninguém. Aí na segunda veio duas pessoas. Ontem não foi
ninguém. Quer dizer, no início é difícil. Você tem que divulgar, porque a equipe ela tem
alguns sujeitos, algumas pessoas da comunidade que tem uma ligação maior, mas
realmente toda a equipe tem que se envolver, divulgando, chamando.
Um dos maiores desafios do SUS é a participação da própria comunidade,
porque as pessoas sempre foram excluídas do problema, então vou em uma Unidade
de Saúde ou atentar para um convite de uma equipe se tiver alguma coisa que me atraia,
comida, festa. Mas falar de problema? A população nunca foi chamada para nada, nunca
foi perguntado nada a ela, ela nunca foi convidada a participar de nada.
Hoje trazemos do espaço do serviço essa oferta para a comunidade, antes nem
isso,e de repente, queremos que a população adira a TC quase que num passe de
mágica. Em alguns espaços a questão é não desistir, é continuar, porque uma hora, isso
começa a vingar. Quando a equipe tem um envolvimento maior, observamos que, esse
retorno é mais rápido, quando a equipe não tem muito esse envolvimento, não acontece.
Quando comecei a fazer TC com uma colega, ela me pediu que a ajudasse, pois
estava sozinha, fazíamos na APAE ali nos Bancários. No primeiro dia que cheguei lá,
tinha três mães, mas pense que TC gostosa. Essas mães estavam ali fazendo a consulta
com os filhos, depois elas multiplicaram para outras es, então o grupo começou a
crescer para oito, nove pessoas, um espetáculo.
Um outro desafio é o espaço, muitas vezes a Unidade não tem o espaço
necessário. E, às vezes, quando não se tem um vinculo uma rede de apoio construída,
ficamos peregrinando atrás de um espaço. Mas penso que os recursos da comunidade
são muito ricos, basta irmos atrás e trabalharmos isso.
94
Se quisermos fazer integralidade no SUS, temos que construir uma rede de
qualidade, o serviço sem uma rede de apoio não é nada, isso obriga as equipes, no
sentido de abrir os olhos, não podemos trabalhar isoladamente, sozinhos, temos que
construir uma rede de apoio. Temos ONGs, Casa da Cidadania, associações de
juventude, pastorais, igrejas.
Quando falamos em cuidado integral na integralidade, temos que entender o
SUS como um processo, o SUS não é algo totalmente acabado não, é algo que está em
construção. Aliás, não existe nada acabado, uma vida que encerrou, exalou o último
suspiro, esta vida aqui está encerrada, porque ela não tem capacidade de um passo mais
a frente. Mas todas as coisas na nossa própria vida, o SUS, a TC, política são etapas
processuais.
A TC é um espaço que tenho para falar das minhas coisas, para passar uma
tarde diferente, para aliviar, para ouvir as outras pessoas, para ajudar, para crescer, para
mudar “Eu mudei, eu estou mudando, eu não sou mais aquela”. O contato que tenho com
as pessoas que não são da minha convivência, do meu espaço acadêmico é um, meu
espaço de TC é outro. Então, agradeço demais a essas pessoas, sofridas e inocentes,
porque contribuíram para o meu desenvolvimento pessoal e para reforçar a minha linha
de trabalho na minha vida. Olhar para aquelas pessoas simples, que não tem um rei
dentro delas, nos ajuda a descobrir e redescobrir as raízes. Sou grata a essas pessoas
pela rica oportunidade de aprendizagem, porque determinadas histórias de vida de outras
pessoas da comunidade se refletem dentro da minha própria história.
95
É psicóloga, vinda do Estado de o Paulo – SP, e aqui encontrou a
Terapia Comunitária como uma nova possibilidade no caminho do cuidar.
[
[[
[...
......
...]
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] você consegue dial
você consegue dialvocê consegue dial
você consegue dialogar com a subjetividade do outro
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ogar com a subjetividade do outro [
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] não vai
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não vai
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focar só na doença, e sim o que es
só na doença, e sim o que es só na doença, e sim o que es
só na doença, e sim o que está por traz disso
por traz disso por traz disso
por traz disso [
[ [
[...
......
...]
]]
]
Vim de outra cidade e cheguei à gestão em julho de 2006. Eu era coordenadora
do Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) e trabalhava na parte de atenção à DST
e AIDS do Município de João Pessoa. Nessa mesma época, fui convidada para estar à
frente do Distrito Sanitário IV.
Acho que, em janeiro de 2007, ouvi, pela primeira vez, falar em Terapia
Comunitária (TC). Começamos aqui pela Secretaria, trabalhando na Diretoria de Atenção
à Saúde (DAS), com a proposta da implantação da TC. Inicialmente divulgamos a
proposta, abrimos as inscrições, foi um número muito grande de inscritos. Por ser
psicóloga, fui solicitada para fazer as entrevistas com as pessoas para traçar o perfil e
visualizar minimamente as pessoas que davam conta para ser terapeuta comunitário.
Passamos o dia entrevistando, afunilando esse número. Na primeira turma, acho que
ficaram umas 65 pessoas.
A proposta foi implantada como política pública, aqui pela Secretaria de Saúde de
João Pessoa. Nós, diretoras de Distrito, não passamos por esse processo de seleção
para ser terapeuta, isso porque, já tínhamos uma vaga garantida.
Conheci Adalberto pessoalmente em Fortaleza, no IV módulo, que foi o último
módulo. Foi bem interessante conhecer a proposta, participar, passar um dia no “Projeto
96
Quatro Varas”, conhecer como foi o nascimento de tudo há mais de 20 anos, como é que
foi e agora em que estrutura está.
Percebo, como uma das principais importâncias da Terapia Comunitária para o
Projeto Político, essa interlocução, essa rede de conversas, de comunicação que a TC é
capaz de fazer. Hoje, no Município de João Pessoa, estão acontecendo vários
movimentos interessantes, em relação a esta rede de diálogos, de saber o que a Atenção
Básica está conseguindo.
Temos ainda um déficit muito grande em relação à nossa rede de Saúde Mental
do Município de João Pessoa, mas a TC preenche uma parte desta lacuna, dessa rede
substitutiva, ela proporciona a escuta, acima de tudo, da história do dia-a-dia, da
subjetividade do ser humano.
A TC vai muito ao ponto de pessoas com baixa auto-estima. Por estar na
comunidade, por ter sido iniciada numa favela em Fortaleza, ela tem história. É uma
estratégia que pode proporcionar relação da sociedade com os profissionais, da Saúde
Mental, da subjetividade, é uma rede mesmo. Ela faz ressurgir problemas que, muitas
vezes, estavam ali, e quando colocamos para fora, diminui a depressão, a busca por
consultas psiquiátricas, muitas coisas ela consegue diminuir ou prevenir. A TC é uma
forma de prevenir internações, busca por CAPS. Ela consegue fazer um atendimento
mais no sentido da prevenção para que nós não tenhamos um CAPS cheio de gente ou
uma necessidade de consultas psiquiátricas exorbitantes, com uso de medicação
controlada e receituário azul. Essa busca que muita gente, às vezes, faz, porque elas não
conhecem a TC, então não colocam para fora e procuram o caminho da medicalização.
Vejo como primordial na TC isso de fazer com que o profissional, principalmente
da Atenção Básica e do PSF, que são muitos, são 180 Unidades de Saúde da Família em
João Pessoa - PB, ele consiga colocar em prática essa relação direta com o usuário, com
a usuária. De ouvir o outro lado, escutar suas subjetividades e não tratar só a doença ou a
queixa que vem nos consultórios.
Quando médicas (que são poucas terapeutas comunitárias hoje no Município
de João Pessoa PB), a enfermeira e a dentista, conseguem sentar em roda e passar
uma hora e dez, uma hora e vinte minutos, ouvindo os problemas... Elas entram em
contato com a sua subjetividade e com a subjetividade do usuário, da usuária. “Ah!...
Aquela usuária vem todo dia aqui”... Ela pode estar carente, pode estar com problemas, a
casa dela pode estar com tudo muito ruim e ela todo dia tem que sair para a Unidade
buscar algum serviço. Neste momento, é quando você consegue dialogar com a
97
subjetividade do outro, vai fazendo o segmento, vai ampliando o seu horizonte em relação
à doença do outro, não vai focar só a doença, e sim, o que está por traz disso.
Claro que visualizamos algumas mudanças, o profissional passa a fazer um olhar
diferenciado com o usuário, com a usuária. O médico, muitas vezes, prescrevia um
exame, uma consulta, uma medicação, mas não tinha esse olhar. O que vinha por traz
dessa gastrite, o que vinha provocando esse estresse, essa ansiedade, o que estava por
traz dessa luta.
Notoriamente se percebe que esse profissional ou as pessoas que passaram por
uma formação em TC - falo dos profissionais que atuam na Atenção Básica - eles
mudaram o seu ponto de vista, eles passaram a olhar o usuário e verem outras coisas
além daquele corpo que traz a queixa. Com relação à auto-estima, as pessoas que
buscam a TC, que fazem uso desses encontros, elas hoje se percebem no mundo, muitas
vezes estavam por estar, não se observavam, não se sentiam, não se olhavam no
espelho durante o dia, não se cuidavam, vimos muito isso.
Publiquei um trabalho num Encontro que ocorreu em Porto Alegre - RS, num
Congresso de Terapia Comunitária, em outubro do ano passado (2007), sobre os
acompanhantes, os cuidadores dos usuários internos de um Hospital aqui de João
Pessoa. O Hospital cuidava do interno, e ninguém cuidava do acompanhante. O
acompanhante ele está ali. Ele sofre muito, pois está geralmente acompanhando uma
pessoa da família, um ente querido, uma pessoa próxima. Nesse Hospital, tinha muita
gente com câncer, então, muitas vezes, essa pessoa sabia da possibilidade da morte
daquela pessoa, e o sofrimento era muito grande, então fizemos a TC com essas pessoas
que eram cuidadores dos pacientes internos, os acompanhantes.
Estes acompanhantes não tinham essa válvula, esse espaço de dizer assim: “tô
mau, tô péssimo!”, como muitas vezes eu ouvi: “eu não posso chorar na frente dele ou na
frente dela, tenho que sair para chorar, mas tenho que ser forte na frente dela...”.O
Hospital só visualizava, cuidava do interno, e o acompanhante do interno? Ele também
sofre, também tem dores, por conta da própria internação desse paciente, desse familiar.
A TC consegue fazer com que percebamos que o que está sendo colocado o é
aquilo que é verbalizado, se dermos um espaço, virão outras coisas, traumas,
problemas familiares, coisas do cotidiano, que dificultam e podem trazer uma doença no
final das contas. Uma gastrite não é uma gastrite, ela está instalada, mas por conta de
outras coisas, da mesma forma, um câncer, um AVC, uma pressão alta. Então... essas
pessoas começaram a colocar, viram que melhoravam, e traziam mais gente, convidavam
98
mais pessoas, porque sabiam que sentiam algum resultado, alguma coisa mudava. De
pessoas virem... vamos dizer assim... desarrumadas, desajeitas no primeiro dia. Na
segunda ou terceira reunião, a coisa já mudava, até o aspecto físico, a forma, a postura, o
olhar... já tinha brilho, o que antes não tinha.
Lembro de uma mulher que sempre vinha com roupas escuras, pretas. Ela estava
num processo talvez de... início de depressão. Na primeira vez, ela veio não acreditando
na TC. No entanto, ocorreu que, na terceira ou na quarta sessão, essa mulher veio
maquiada, com roupas de cores. Os próprios usuários, as próprias pessoas que estavam
participando da TC perceberam a mudança que foi assim drástica, positivamente falando.
Ela tava com outro aspecto, se sentia gente, tinha um outro olhar diante da vida, então
assim... com três encontros...
No curso de formação, tive uma dificuldade, não sei dizer o que me marcou mais,
mas no que tive maior dificuldade foi num módulo que trabalhava a coisa mais técnica da
psicose, o uso dos termos mais técnicos... não sei se porque achei muito pouco tempo...
se para quatro dias foi muita informação. Tive dificuldade com isso, porque não gosto de
tachar nada, de carimbar... e para mim, foi uma dificuldade. Os outros módulos não.
O primeiro módulo é aquele de mexer com a subjetividade, de se trabalhar
internamente com as coisas que estavam guardadas. Pela minha própria história da
Psicologia e por ser psicóloga clínica, por gostar também do social, assim como eu,
algumas pessoas tiveram dificuldades, até por se conhecerem... Muitos estavam
guardando suas coisas.
Foi interessante para mim, como uma coisa nova, mas, para algumas pessoas,
ocorreram mudanças assim bem... drásticas, positivamente falando. Algumas pessoas
mudaram assim a forma do cabelo, no outro módulo, já estavam outra pessoa, porque se
viram de outra forma e sentiram a necessidade de mudar. Eu não tive nenhuma mudança,
comecei e saí com as mesmas posturas.
Para mim, foi um encontro com uma teoria, com uma proposta, com uma
estratégia, de mexer com a subjetividade das pessoas de uma forma que não
necessariamente precisaria de uma graduação em Psicologia, porque passei por tantos
processos de trabalho interno da terapia individual minha, da própria graduação, mas de
uma coisa mais popular, mais comunitária. Para mim, foi muito positivo este encontro com
a TC.
Teve um módulo em que discutimos muito sobre os motes, a cultura, o diálogo, a
comunicação, a relação de comunicação, foi bem interessante. Numa intervisão, vimos
99
também histórias de vida, contos, piadas. Até numa das vivências, trabalhamos um pouco
os Chakras, e o meu da garganta era bem complicado. Eu tinha uma dificuldade com
músicas... de cantar, não sabia, não tinha jeito de colocar o povo para cantar. Eu sou
mais de aplicar uma dinâmica, alguma coisa, mas cantar mesmo eu tinha dificuldade.
Esse módulo ele proporcionou essa coisa do conto, da cultura popular, da
aproximação mesmo com o dia-a-dia da usuária, da pessoa que esta ali, da forma de
falar, foi bem interessante para mim, me aproximou mais da comunicação mesmo. Porque
acho que estou me comunicando de uma forma, mas o outro pode não estar entendendo
e de que forma eu posso me aproximar dessa necessidade. E na TC precisa muito disso,
dessa conversa.
Maria Djair e Maria Filha, as meninas, elas têm muito essa coisa de conseguir se
aproximar da conversa, quer seja da zona rural, seja de qualquer forma. Se elas sentem
que a pessoa é da zona rural, elas falam e têm outro discurso, outro diálogo, o e
colocam as palavras que as pessoas realmente entendem. Isto é muito interessante, acho
que não para o terapeuta comunitário, mas para qualquer pessoa, para qualquer
profissional.
Tenho um exemplo na pele com relação a isso. Quando fazia atendimento
psicológico individual num Hospital, atendia uma pessoa que estava fazendo tratamento
de quimioterapia, e aí, nesse tratamento, perguntei:
“Ah! Como você está no tratamento?”
E ela respondeu:
“Ah! O que eu não gosto é do pé ligeiro”.
Fiquei com uma interrogação em relação ao que era “pé ligeiro”. Lembrei da
supervisão, e “pé ligeiro” nada mais era do que diarréia. Quando vinha a diarréia, ela
corria para o banheiro, e o “pé ligeiro” era correr para o banheiro. Então... se a pessoa
não soubesse mais ou menos o que era, o diálogo seria muito difícil. Trago esse exemplo,
porque, no dia-a-dia, falamos português, mas muitas vezes não somos entendidos. Então
esse exemplo foi bem interessante para mim!
A TC é mais uma ferramenta importantíssima para aplicar com os profissionais e
com os usuários, só que... eu tinha muitas atividades como diretora. Coloquei, então, uma
meta que, até dezembro de 2007, eu terminaria. Ao todo são 50 encontros de TC para
concluir a formação na primeira parte.
E coloquei uma meta: começamos em fevereiro de 2007, e em dezembro tinha
que alcançar os 50 encontros e consegui. A dificuldade foi grande, com toda a correria,
100
mas fiz 51encontros. Hoje, estamos quase no meio do ano e tem pessoas que não
concluíram ainda; já concluí desde o ano passado, mesmo como diretora. O que me
ajudou mais e fez concluir foi porque fiz os encontros de TC no terceiro turno no Hospital.
Trabalhava os três turnos, foi bem complicado..., ficava manhã e tarde no Distrito e à noite
eu fazia a TC. Fiz porque foi uma coisa que eu coloquei como meta.
A saúde ela nunca é para amanhã ou para depois, ela sempre é para ontem. As
pessoas necessitam de sde sempre para o agora, nunca para esperar, então é
difícil. Ainda estou sentindo o desafio de continuar.
Hoje, estou em outro impasse: visualizo momentos em que eu possa atuar não
como Diretora daquele serviço, mas como terapeuta comunitária, é um desafio que estou
tendo que implantar. Nesse pximo mês, possivelmente iremos inaugurar o serviço, que
é um Centro de Atenção à Saúde no CAIS. Assim que inaugurar o serviço, vou montar
dias de TC, para os profissionais e para os usuários que buscam esse serviço.
Os profissionais eles sentem a necessidade de procurar espaços para a realização
da TC, porque, muitas vezes, a Unidade de Saúde da Família não dá, é muito pequena,
não tem possibilidade, tem Unidades que têm estrutura, mas têm outras que não a têm. Aí
geralmente procuramos Igrejas, grupos de AA ou a casa de alguém. Inicialmente era uma
dificuldade, claro que cada dupla nas suas atitudes, na sua busca de concluir o serviço,
de fazer a TC, de ser terapeuta comunitário, cada um montou a sua estratégia.
O desafio é de continuar. Tivemos a primeira turma, agora temos a segunda
turma, ela já está no segundo módulo e parece que com mais 65 pessoas. É permanecer,
é dar continuidade, porque senão você é engolido pelo serviço, pela agenda, pela
demanda e não faz esse olhar de terapeuta.
Como estávamos recentemente discutindo na especialização, tem as tecnologias
que colocamos em prática, tem tecnologias duras e tem as tecnologias leves, que pode
ser uma roda de TC, que, muitas vezes, somos capturados pelas tecnologias duras,
pela agenda ou pelo protocolo... ,são coisas, ferramentas que temos que nos
aproximarmos delas, mas não podemos nos deixar sermos capturados por elas.
Sempre devemos estar pensando no ser humano como um todo. Um usuário não
pode estar batendo na sua porta, procurando uma receita de um receituário azul, de uma
medicação controlada psicotrópica, não. Por que não convidar essa pessoa para montar
um grupo de TC? E esta pessoa ser inserida nesse grupo... Então, é sempre estar
fazendo esta lembrança, estar atuando como terapeuta comunitário. Fazer com que as
pessoas se conheçam, acima de tudo, que não se fixem num problema, e não, se
101
segurem, se apeguem a ele, e o segurem para o resto da vida, porque ele pode ter outros
horizontes, outros olhares, então é um desafio.
Têm alguns profissionais que se sobressaem. No Distrito Sanitário IV, têm
profissionais que vestiram a camisa, tem exemplos no Distrito Sanitário V que são
extraordinários, a médica, a enfermeira. Eles colocam como parte do projeto terapêutico
desse usuário, dessa usuária a TC, não só a medicação, o encaminhamento ou o exame,
mas a TC, fazendo parte desse projeto terapêutico, dessa necessidade de saúde.
Têm profissionais que colocam isso, têm outros não, que não conseguem. Quando
estão de férias, não fazem, e acabam quebrando o nculo, o ritmo dos encontros
semanais. Então, tem pessoas que não fazem... colocam como uma obrigação no serviço,
tem uns assim, mas tem outros não, que vestiram a camisa e são terapeutas comunitários
24 horas, de coração.
Hoje, em João Pessoa, nos serviços de Saúde, todo mundo sabe o que é a TC.
Mas acho que a Secretaria de Saúde precisa ampliar para outras Secretarias. Se
aproximar da Secretaria da Educação, da Secretaria de Ação Social. Outras secretarias
precisam conhecer essa ferramenta, fazer a TC, que é o que estou propondo, no serviço
e numa escola no grupo de pais. No dia da reunião de pais dessa escola, fazemos a TC.
Então, ampliar esse olhar para outras Secretarias, claro que, na Secretaria de
Saúde, nem todos os PSF’s tem um terapeuta comunitário ainda, porque estamos na
segunda turma de formação, mas claro que vai ser ampliado. Precisamos fazer esse
olhar. A Secretaria de Educação, acho que deveria trabalhar a violência com
adolescentes, a droga, o aborto, a gravidez indesejada, todas essas temáticas pximas a
essa faixa etária poderiam ser colocadas através da Terapia Comunitária.
Nessa segunda turma, me parece, que já tem pessoas convidadas de outras
Secretarias, não sei se estão mesmo atuando, mas quando fizemos a lista da entrevista,
ampliamos, colocamos uma ou duas vagas por Secretaria, a Educação parece estar no
meio, a Ação Social. Então, existe uma ou duas pessoas, para começarmos a semear,
vamos dizer assim, a plantar essa curiosidade ou esse gosto, ou essa necessidade de
aproximação com a TC em outras Secretarias.
A TC está dando certo na Secretaria de Saúde, ela está em muitos momentos
preenchendo um vácuo que existe na rede de Saúde Mental do Município, que é muito
pequena para esta estrutura de cidade, para este Município, para esta Capital. Está se
fazendo um CAPS, daqui a dois ou três meses, vamos inaugurar outro CAPS. se
inaugurou um CAPS infantil, existe uma residência terapêutica com sete mulheres, que
102
passaram mais de vinte anos no Juliano Moreira, e hoje elas se encontram numa
residência terapêutica no Distrito IV. Alguns serviços já estão sendo feitos, mas, claro,
que muito ainda precisa ser feito.
103
É psicóloga, hoje diretora do CAPS Gutemberg Botelho; em sua história
relata que vem se mostrando satisfeita com os resultados da Terapia Comunitária
enquanto ferramenta de cuidar que possibilita o trabalho com um número
considerável de participantes. No CAPS, essa tem sido uma experiência bastante
significativa na escuta qualificada dos usuários.
[...]
[...][...]
[...]
se coloca
se colocase coloca
se colocar em u
r em ur em u
r em uma roda
ma rodama roda
ma roda de
de de
de Terapia Comunitária
Terapia ComunitáriaTerapia Comunitária
Terapia Comunitária,
,,
, é se colo
é se colo é se colo
é se colocar de
car de car de
car de igual
igual igual
igual
para igual
para igual para igual
para igual com o outro
com o outro com o outro
com o outro [
[[
[..
....
...
..
.]
]]
]
Interessei-me pela Terapia Comunitária quando fiz uma especialização em Saúde
Mental em 2005 na UFPB com Maria Filha e Djair. Elas vinham fazendo Terapia
Comunitária numa determinada comunidade e sempre me convidavam para ir participar.
Mas, por uma coisa ou por outra, por falta de oportunidade nunca fui. Ai nesse curso de
Especialização tivemos a oportunidade de termos uma aula, um encontro com o Professor
Adalberto. Ele nos falou um pouco do surgimento e da história da Terapia Comunitária.
Isto aumentou, ainda mais, meu interesse pela história da Terapia Comunitária.
Pois, entendi que este poderia ser um instrumento para trabalharmos as questões leves,
com um número muito maior de pessoas, na questão da Saúde Mental da comunidade,
direcionando para uma escuta mais qualificada que pode dar muito bons resultados.
Então, no ano passado (2007) quando a Secretaria de Saúde do Município de
João Pessoa - PB ofereceu o curso para a formação da primeira turma de terapeutas
comunitários não perdi a oportunidade e me inscrevi. O curso se de forma que depois
104
do primeiro módulo os alunos começam a praticar a Terapia Comunitária nos seus
devidos locais de trabalho. Então começamos a fazê-la e não paramos mais.
No decorrer dos módulos fui concretizando e ficando ciente de que de fato a
Terapia Comunitária era uma coisa legal que poderia ter seus resultados alcançados.
Hoje, dentro do modelo de atenção que o Ministério da Saúde preconiza
sabemos que precisamos estar discutindo a questão da Saúde Mental junto a Atenção
Básica levando a mensagem que a Saúde Mental é problema de todo mundo. As coisas
começam a aparecer lá na Atenção Básica e ela tem condições de começar a direcionar e
ajudar na resolução de algumas delas.
se a importância da Terapia Comunitária no processo de reorganização
porque à medida que ela vai acontecendo nas comunidades e que se têm pessoas da
Atenção Básica atreladas a isso, as coisas começam a eclodir de forma que elas
começam a ser trabalhadas, minimizadas e direcionadas.
A Terapia Comunitária é um instrumento excelente, que podemos estar
utilizando, pois atinge um número relativamente grande de pessoas. Já chegamos a fazer
uma roda com 40 pessoas. Então, é legal porque numa roda de Terapia Comunitária
quando trabalhamos um determinado mote, imaginamos que estamos trabalhando uma
situação problema para uma pessoa e na verdade, na maioria das vezes, grande parte do
grupo se identifica e vai trabalhando junto a sua problemática.
Aqui no CAPS estamos sempre avaliando nossa conduta, pois é uma prática do
serviço sempre estarmos fazendo rodas de discussão com nossos usuários e com a
equipe técnica. Elas acontecem sistematicamente toda quinta-feira com a equipe técnica
e com os usuários temos vários grupos operativos onde discutimos algumas coisas da
nossa prática. E como a Terapia Comunitária passou a fazer parte do cronograma de
atividades e serviços ela também está sendo avaliada pelos usuários. A medida que
vamos abrindo as rodas de discussões, vamos avaliando e aí é muito freqüente você
ouvir a fala das pessoas.
No caso, especialmente, de quem trabalha com doente mental, sabe-se que a
esquizofrenia, por exemplo, é uma doença que compromete muito a questão da
afetividade. E a Terapia Comunitária oportuniza isso, à medida que as pessoas começam
a freqüentar as rodas, elas começam a fortalecer os vínculos, e vão fazendo novos
vínculos, e à medida que vão fazendo novos vínculos, vão abrindo algumas defesas que
eram muito difíceis.
105
Então, um dos benefícios que se percebe e que foi avaliado pelo próprio grupo
que participa é que: a Terapia Comunitária fortalece vínculos afetivos.
Além de que, por exemplo, depois que as pessoas começam a freqüentar a
Terapia Comunitária, percebe-se claramente a redução no uso do benzodiazepinico, isso
porque na Terapia Comunitária as pessoas fazem um processo de identificação e
trabalham suas questões interiores de maneira que espontaneamente elas começam a
depender menos desse medicamento. E na nossa avaliação esses dois pontos têm uma
importância tremenda.
Temos algumas historias que precisavam serem registradas, porque são
experiências fantásticas de pacientes difíceis de interagir com qualquer tipo de grupo de
outra natureza que tinham aqui. Usuários que costumavam estar presentes em outras
atividades de uma forma apática, não muito participativa, e quando se identificaram com a
Terapia Comunitária, muitas vezes, surpreenderam com a postura, a fala, a participação
ativa. Passaram a compartilhar sua história, sua experiência, falar de como superou, de
como tem convivido com aquilo, participar de uma maneira, que para nós que temos
convivido... Esse processo tem sido surpreendente e muito gratificante.
Assim quando termina a Terapia Comunitária, e vamos avaliar como foi, quando
contamos para os colegas de trabalho, ficam todos sem acreditar. Isso porque a nossa
clientela é de doentes mentais graves, que tem grave sofrimento mental. Então, se já é
surpreendente você participar de uma roda com pessoas diagnosticadas sem transtorno
mental, imagina uma roda como essa. Às vezes é um desafio, porque tem dia que não dá,
o cara começa a falar: “Não porque eu com problemas em casa, porque o cachorro
da vizinha esta latindo muito, mas subi no de jabuticaba, e comecei a chupar
jabuticaba, a lâmpada está acesa, não, a lâmpada não está acesa. Eu acho que a
lâmpada está apagada. Mas aí o portão lá de fora está fechado....”
Então tem hora que precisa ter paciência, habilidade de costurar, de retomar as
coisas, e tem um determinado usuário aqui que quando ele começa a falar se agente
tenta interromper ele diz: a senhora não disse... olha a lei do silêncio, estou falando, por
favor, não me interrompa”.
E não insista, porque naquele momento ele pode se irritar, e temos que
pensar que caminho vamos trilhar, para conseguirmos trazê-lo de volta, para esse meio.
Mas são assim, dificuldades que vão surgindo e não temos receita de bolo pronta, vamos
tentando descobrir estratégias para continuar e no fim tem dado muito certo.
106
A Terapia Comunitária na verdade remete a algumas discussões que são
profundas. Quando você se coloca numa roda, está sugerindo que ali você está se
colocando de igual para igual. O doutor, ele perde um pouco esse espaço para se
juntar àquela comunidade, aquele grupo de pessoas, e isso sabemos que boa parte da
sociedade e dos profissionais de saúde ainda tem resistência. E hoje o que tentamos é
uma quebra de paradigmas, dentro de uma visão muito mais sanitarista, mas as pessoas
ainda resistem muito a este tipo de coisa.
Na Terapia Comunitária trabalhamos em duplas de terapeutas e algumas delas
têm enfrentado muita dificuldade, por exemplo, de conseguir alguma estratégia para atrair
a comunidade para os encontros. Escutamos relatos de duplas que vão fazer a Terapia
Comunitária, quando chegam lá, tem duas ou três pessoas, aí não tem condição, e
acabam abrindo uma roda de conversa. Particularmente aqui no CAPS eu e meu parceiro,
não temos dificuldade, até porque temos uma clientela que vem ao serviço
sistematicamente e temos um espaço físico adequado. Os profissionais são acessíveis,
tem respeito, tem entendimento, tem crédito com a Terapia Comunitária.
Mas, quem faz roda de Terapia Comunitária em unidades de PSF que são
pequenas e não comportam ficam tentando encontrar locais na comunidade para
fazerem, mas nem sempre têm disponibilidade, pois há dificuldade de horário.
Tenho escutado relatos de outras duplas, que também um dos problemas é que
a equipe não escuta, não participa, não colabora, não a devida importância, não o
devido feedback. Esse não é o meu relato, aqui no CAPS particularmente nem toda a
equipe participa da Terapia Comunitária, normalmente além de mim e de Junior (minha
dupla) na roda, ainda participa um técnico ou dois, pois temos uma demanda muito
grande na casa e as pessoas estão sempre ocupadas, mas assim mesmo, nas reuniões
sistemáticas as pessoas elas dão muito feedback, muito atenção elas estão sempre
convidando o usuário e o familiar a participar, aí as vezes vem crianças, porque a Terapia
Comunitária é aberta a quem quiser participar. É uma roda bem diversificada.
Ainda são poucos Terapeutas Comunitários inclusive em formação, mas acho
que a perspectiva é de evoluir, é de crescer enquanto grupo de terapeutas comunitários.
Não foi a toa que criamos uma Associação dos Terapeutas Comunitários da
Paraíba, ainda é uma coisa muito nova, uma prática nova, recente, sabemos que
historicamente ainda é muito nova no PSF, mas acho que a perspectiva é de que a coisa
cresça, agora com o incentivo do Ministério da Saúde que está disponibilizando verbas
para a formação de terapeutas comunitários.
107
tínhamos a ABRATECOM que é a associação nacional dos terapeutas
comunitários. Mas havia uma discussão política de um grupo que tinha claramente o que
era que queria o grupo da primeira turma de terapeutas comunitários, da qual eu fazia
parte, começamos a discutir a necessidade de fundar uma Associação para poder estar
divulgando, fomentando discussões, dando novos cursos, formando novas pessoas,
apresentando projetos para vários Municípios. A partir dessa discussão criou-se essa
Associação.
Quanto à divulgação acho que podíamos fazê-la melhor, não sei exatamente
como, mas ainda temos muitas pessoas que não têm conhecimento da Terapia
Comunitária, inclusive profissionais de saúde. De vez em quando, converso muito com
colegas, profissionais de saúde de outras secretárias, de outras esferas, do Estado,
funcionários federais que não tem conhecimento do que seja. Então acho que poderíamos
melhorar nesse sentido.
O que mudou em mim? Essa pergunta sempre é feita nos módulos do curso e
até me sinto meio esquisita porque as pessoas fazem cada depoimento, “porque eu era
uma outra pessoa, porque eu me modifiquei, porque...”. Não ocorreram grandes
mudanças na minha forma de ser não. Assim, o que mudou lógico, eu ampliei e adquiri
mais conhecimento, mas... Sandra e Sandra profissional tinham mais ou menos essa
forma de pensar. A história de que tinha gente que precisava trilhar alguns caminhos, que
não era o que vinha fazendo daquela maneira, da atenção individualizada, da atenção
com o foco na doença. Isso é uma questão que venho carregando no meu saber
muito tempo.
Na verdade, a Terapia Comunitária veio corroborar com a minha forma de
pensar, com esse novo olhar, veio me fortalecer interiormente, me oportunizando ter
certeza do que pensava, do que queria pensar, porque se quer pensar e nem sempre
pode. Ela me instrumentalizou, é um instrumento a mais que hoje me empoderei para que
pudesse estar utilizando na minha prática, no meu dia-a-dia. De fato colaborou com isso,
não houve uma grande transformação, não, não diria que era uma pessoa antes e que
depois da Terapia Comunitária sou uma nova mulher, uma nova profissional. Não, não
diria isso, diria que estou feliz de poder participar, de poder contribuir com este novo
olhar, com esta nova forma... Talvez tenha ficado mais feliz ainda, porque fiquei aliviada
de poder colocar em prática uma coisa que gostaria de fazer e não sabia como. Isso
talvez tenha me dado certo alento.
108
É paulistano, homem de comedidas palavras. Em seu discurso, destaca
mudanças em relação à área de Saúde Mental, com a chegada da Terapia
Comunitária.
A Terapia Comunitária é um espaço de diálogo, onde se fala do que dói e
A Terapia Comunitária é um espaço de diálogo, onde se fala do que dói e A Terapia Comunitária é um espaço de diálogo, onde se fala do que dói e
A Terapia Comunitária é um espaço de diálogo, onde se fala do que dói e
das coisas boas [...] é possível conversar com respeito e ética sobre as questões
das coisas boas [...] é possível conversar com respeito e ética sobre as questões das coisas boas [...] é possível conversar com respeito e ética sobre as questões
das coisas boas [...] é possível conversar com respeito e ética sobre as questões
da nossa vida.
da nossa vida. da nossa vida.
da nossa vida.
Sou de São Paulo, de São José dos Campos. Foi lá que fiz minha formação como
terapeuta comunitário e que conheci Adalberto. Ele deu o primeiro e o último módulos.
Terminado minha formação fui para Fortaleza - CE, onde conheci o pessoal daqui de
João Pessoa - PB.
Vim, como colaborador, fazer parte do primeiro módulo do primeiro grupo daqui
(João Pessoa - PB), no ano passado (2007). Eles estavam fazendo a formação e me
convidaram para assumir a coordenação de Saúde Mental. Agora, no segundo módulo,
fiquei mais próximo desse grupo. Sinto que ainda têm-se algumas dificuldades, mas o
mais importante é tentar estar cobrindo toda a rede.
Foi grande o número de pessoas que buscaram fazer inscrições para esse
segundo curso. Entre os profissionais tem uma repercussão, um interesse em se
apropriar dessa ferramenta, só isso já me faz um bem significante.
Tem pessoas que vinham fazendo, que vinham participando como co-
terapeutas, como auxiliares nos grupos existentes. Acho que essa é uma mudança
cultural bastante significativa. Nos grupos que existem sabemos que as pessoas têm uma
109
boa aceitação, elas participam, aderem ao serviço e às vezes não conseguem aderência,
mas é problema dos terapeutas. Terapeuta que falta, que não vai, é mais um problema do
terapeuta do que da própria comunidade.
O primeiro momento foi para fazer com que as pessoas entendessem o que era o
processo. Acho que como em outros grupos, às vezes, se tem certa resistência dentro da
própria equipe, por o entender, então não encaminham, e às vezes até não acreditam
muito.
O que me chama mais atenção é essa possibilidade do trabalho na comunidade,
de discutir os problemas da comunidade, criar uma identidade, uma identificação, dar um
corpo social e não só, uma forma especificamente voltada para a Terapia Comunitária,
para uma psicoterapia. Às vezes, fica um grupo meio de desabafo, sinto que ainda não
tem a compreensão.
Aqui, em João Pessoa - PB, é mais difícil até porque, sinto que ainda tem muito
preconceito em relação à Saúde Mental. Outro dia, não consegui pegar um táxi porque
estava em frente ao Juliano Moreira, depois que passaram vários consegui pegar um,
perguntei ao motorista: “Tem algum problema?Ele disse: “É, agente não gosta muito de
parar aqui...” A Residência Terapêutica não conseguia aluguel, porque quando as
pessoas sabiam para que era a Residência Terapêutica, diziam: “Não, não vou alugar”.
Aqui tem uma resistência sim, e uma falta de entendimento dos trabalhadores, da
comunidade. Acho que esse é um dos desafios, fazer entender que a idéia principal da
Terapia Comunitária aqui em João Pessoa é fazer a prevenção. Até para poder juntar, no
primeiro momento a TC, a linha de cuidado em Saúde Mental com as pessoas que estão
usando medicação sem critério muito tempo ou que entraram em crise só por falta de
um apoio, de uma conversa.
Uma das questões é, acho que ainda não conseguimos medir isso, de ter grupos
específicos, com a questão da desmedicalização. Essa seria uma possibilidade de
estarmos construindo. Mas às vezes, ainda temos uma dificuldade de diálogo da
formação com a política de Saúde Mental. Aliás, que ainda são coisas separadas. Na
prática ainda não conseguimos juntar.
A Terapia Comunitária tem uma linha de trabalho dentro da Secretaria, mas ainda
não está amarrada com Saúde Mental. Tem quem diga assim como uma benção: “É uma
ação de Saúde Mental”, “Ta bom é uma ação, mas ela não está pactuada”. Não
conseguimos mapear, criar fluxos de pessoas que estão indo para a Terapia Comunitária,
quantos deixam de ir para a consulta psiquiátrica, ou quantos estão nos ambulatórios e
110
estão sendo referenciados para os grupos de Terapia Comunitária. Temos essa
preocupação, de tentar identificar os grupos de TC e estabelecer as referências e as
áreas de cobertura.
Digamos que se discutia o conceito de crise. A crise depende do profissional que
está diante desta crise, se ele consegue fazer o vinculo, se consegue ter escuta, se
consegue ter troca, porque muitas vezes você não precisa nem de medicação, se você
tem vinculo com a pessoa, você consegue controlar isso sem precisar de uma internação,
ou medicação. Então, a Terapia Comunitária neste sentido, acho que vai criar mesmo
uma desconstrução, “Olha é possível falar dessas coisas”.
Isso é a Atenção Básica, antes de se instalar algum transtorno, ou quando a
possibilidade de conviver com o usuário que tem o transtorno mental, desmistificar.
Os usuários com transtorno ainda são muito discriminados. encontrei cárcere
privado, por falta de absoluta disponibilidade, nem era caso para que estivesse em
cárcere, mas é que ninguém sabe como conversar, não sabe distinguir muito bem. Não
sei se tem aquela coisa de achar que tudo é retardo, tudo é loucura, coloca tudo num
saco só, num pacote e exclui.
Mas é preciso você ter um contexto seguro para estar dividindo essas coisas. E
muitas vezes, é isso que chega para as especialidades, para os CAPS, questões porque
ninguém escutou a pessoa.
Se alguém tivesse falado, ela não precisaria estar ali. Enquanto que esse
encaminhamento, muitas vezes, gera sofrimento. Quer dizer que sou louco, quer dizer
que tenho problemas, estão me encaminhando para um psiquiatra...” ou “Eu to num
CAPS”.
Por isso o mais importante da Terapia Comunitária é a possibilidade das pessoas
falarem. A Terapia Comunitária é um espaço onde através do diálogo, alguém fala do
que dói, fala das coisas que são boas, é possível conversar com respeito com ética, sobre
as coisas, as questões da nossa vida. Não é preciso ficar falando de futebol, de
novela.
Vejo que a Terapia Comunitária pode ser esta porta de entrada do sistema, na
questão da atenção em Saúde Mental de ter essa escuta. “Olha tem uma pessoa aqui que
trouxe um sofrimento, está pedindo medicação, não esta conseguindo dormir, porque está
muito ansioso”.
111
Conquanto que esta escuta seja feita pela Terapia Comunitária e não que
imediatamente se encaminhe para uma especialidade. Seria a base, não é a porta de
entrada, mas é uma possibilidade de escuta qualificada.
Nos meus grupos todo mundo relatava que tinha melhora, às vezes, até porque o
marido bebia, chegava em casa e brigava. A mulher não sofria mais com isso. Porque ela
deixava o jantar e como tinha feito amizades, fez uma amiga no grupo, ia assistir novela
com a amiga. Aí quando marido chegava, comia, dormia. Depois é que ela chegava.
Tinha muito transtorno obsessivo, de dona de casa que ficava limpando a casa dez vezes,
tinha que estar tudo no lugar, de conseguir relaxar, conseguir achar outras atividades.
Discute-se na Terapia, essa ampliação de relações, de contatos, de vínculos. O
vinculo de amizade, de manutenção do vinculo social, sinto que os meus grupos se
identificavam mesmo. As pessoas começaram a sair juntas. As solteiras marcavam para
sair. Faziam programas, viagens.
Não tenho muita clareza sobre os grupos esporádicos, o terapeuta que fica
rodando. Tem um sentido claro, é interessante, mas se ele não estiver fixado empobrece.
Nos grupos que deixei de fazer quando vim para cá, colegas que foram me substituir
tinham sempre essa preocupação de estar na área, de ter uma convivência ali com essas
pessoas. Porque senão chega uma hora que a Terapia pode ficar meio empobrecida.
A partir desse momento que se investe é o comprometimento com a comunidade,
com o seu grupo. Tem que estar presente.
Sinto que estamos no icio, de estarmos na comunidade, de nos
comprometermos com a comunidade e a partir daí estarmos ampliando. Isso foi uma das
coisas que me fez não assumir nenhum grupo aqui. Pois, é uma questão de vinculo, de
poder ampliar, gerar expectativa.
O primeiro desafio é a questão do próprio terapeuta se empoderar desse
momento, dessa ferramenta. O que escutamos das pessoas que ainda estão em
formação é essa insegurança de não ser da área, se só pudesse ser terapeuta quem
fosse Psicólogo. Mas acho que esse desafio cada um tem que responder para si.
Outro desafio é como se tem em Quatro Varas. Você chega ali e percebe que
tomou corpo, a favela não é mais a mesma, a construção da Unidade de Saúde, a
Fitoterapia, o próprio Espaço da Terapia Comunitária, ela irradiou uma série de ações
dentro da comunidade.
O terapeuta está no ambiente, mas tem um monte de coisas acontecendo na
comunidade. Trazer esse olhar mais ampliado, fazer com que as pessoas entendam que
112
o processo saúde-doença faz parte desse ambiente em que elas vivem, trazer essa
reflexão, ampliar isto, porque senão corre-se o risco de ficar em cima dos sintomas.
“Ah, tenho insônia, porque meu filho usa drogasou o marido que esdesempregado e
tem a questão do apoio das pessoas, naquele momento que ela levou um tiro, “Ah
porque eu já passei por isso...”, “olha é só você acreditar...”
Uma coisa de tapinha nas costas é interessante claro, precisa desse apoio, mas
tem que ter alguma coisa um pouco mais concreta, tem que se voltar para outra ação.
Temos uma situação de desemprego no Brasil, o que vamos fazer com isso? Que outras
respostas poderemos dar?
Um exemplo é um Hospital Psiquiátrico em Campinas, que algumas pessoas se
reuniram e fizeram uma horta comunitária e que gera renda para todo mundo. Então, tem
que ampliar e não ficar só achando, que é naquele momento da TC. Quando se tem o
comprometimento do terapeuta ele faz a Terapia Comunitária em qualquer lugar. Nessa
segunda turma de formação tem pessoas fazendo em baixo de uma árvore, na frente da
Unidade da Ilha do Bispo.
Agora, quando o terapeuta não está muito seguro tudo atrapalha, “Ah porque não
tem isso...”, “Porque equipe não apóia...”. AÌ tem um monte de justificativas. Claro que
precisa um mínimo de condições, mas isso se quiser você acha. Acha na Igreja, Centro
Comunitário, de baixo da árvore, na casa de alguém, algum canto você vai conseguir
esse espaço.
Um dos desafios da gestão é o suporte da TC, que é a rede substitutiva. Esses
preconceitos que ainda encontramos aqui, não é culpa da população. Temos em João
Pessoa - PB. 572 leitos psiquiátricos porque a política dizia que a solução era a
internação psiquiátrica de longa permanência.
Se gasta com essas internações porque você não consegue fazer a rede
substitutiva rapidamente. Que é um trabalho mais humanizado, mais integrado do
território.
Ainda não conseguimos mostrar esse outro modelo para a população, os casos
ainda são novos, muita gente não sabe direito o que significa o que é que se trabalha,
muitos profissionais mesmo da área não tem esse conhecimento.
Outro desafio dessa gestão é conseguir implantar imediatamente os serviços
básicos da Sde Mental. Temos um CAPS tipo 2, um CAPS tipo 3 que atende 24h. Um
CAPS infantil, e estamos fazendo um pronto atendimento e um CAPS de álcool e drogas.
Ainda fica faltando um número maior de CAPS tipo 3 e mais Residências Terapêuticas.
113
abrimos uma Residência Terapêutica e pelo número de moradores que temos no
Hospital pode se abrir mais.
Acredito que todos esses serviços, vão entrando em contato com a comunidade e
vão mudando a mentalidade. No primeiro ano da Residência, do CAPS, a comunidade se
reuniu e foi contra, vai trazer um monte de loucos...
Quando o serviço é instalado, se justifica ter essa rede de serviços e um apoio
ambulatorial. Porque muitas vezes, aconteceu do terapeuta comunitário ter a
necessidade de fazer um encaminhamento e aí tem complicações, tem espera, tem
dificuldades. O pronto atendimento é para tentar dar uma cobertura para os casos mais
de crise.
Mais um desafio, é dar um suporte a Terapia Comunitária, porque ela é a Atenção
Básica. E em algum momento ela vai precisar ser referenciada e a nossa rede ainda é
frágil.
Quando o terapeuta consegue sensibilizar as pessoas, não conheço, é a minoria
das pessoas que tem contato com a Terapia Comunitária e falam: “Não, eu não quero”.
Quando as pessoas entendem, quando vê o que esta acontecendo, tem uma
possibilidade de preensão maior, porque ficam dizendo: “Ah, vou contar os meus
problemas no meio de todo mundo?”.
Essa é uma resistência talvez da comunidade. Mas conforme as pessoas têm
contato e percebem qual é a dinâmica, isso que vemos é o mais importante.
De fato assim, as pessoas não querem e preferem seguir outro rumo.
“Eu vou para a Igreja, fique na Igreja”. Na Igreja você está bem, consegue
resolver, aí é mais uma questão de preferência.
A Terapia Comunitária e a Psicologia podiam se encaixar melhor. Porque acredito
que a Terapia precisa ter algumas ferramentas, da Psicologia, minimamente para bater o
olho e saber se aquela pessoa tem um transtorno, um retardo, não que o rótulo seja
importante, mas você pode estar lidando com uma pessoa que está em delírio e não
saber lidar, não saber identificar.
Não tem problema se tiver delirando, um delírio de qualquer ordem, mas se estiver
ambientado, acolhido, acho que a pessoa tem que ser livre. Ela está implicando com todo
mundo, às vezes não aceita medicação, não quer estar na família. para nós
acompanharmos.
114
Poderíamos melhorar algumas discussões. Acho que fazer uma discussão
também quanto ao uso de álcool e drogas. Existem muitos mitos e muito preconceito em
relação a isso.
Acho que a política que defendemos mais de 20 anos é colocada pelo
Ministério da Saúde, quanto à redução de danos, o terapeuta pode entender melhor o que
é isso, que estamos falando. Muitas vezes, ainda estamos interpretando mal, como se
fosse uma forma de incentivo ou de manutenção do uso indevido de drogas.
Algumas políticas de Saúde Mental poderiam ser mais específicas, assim
enriqueceriam o terapeuta comunitário, para que eles estivessem mais próximos do
CAPS, saberem como o CAPS funciona, poderem ter este vinculo de encaminhamento.
Fazer essa ponte da Atenção Básica com a Atenção Secundária e o CAPS. Acho que tem
coisas que podem ser trabalhadas, poderiam estar melhor.
Tem uma experiência que vivi na Ilha do Bispo. Fomos fazer um planejamento da
Saúde da Família, alinhado ao cuidado em Saúde Mental. Quando fomos buscar o
registro dos usuários de medicação psicotrópica, dividimos a maioria de medicações...
Não estou dizendo o diagnóstico estou dizendo a medicação, medicação para depressão
e transtorno, a intermediária ou nerolépticos, anticonvulsivantes e depois a medicação
mais antipsicótica que era a minoria.
imediatamente quando batemos o olho nisso, deu para separar o que é para
CAPS e Atenção Básica, deu uma clareada para a equipe. Dos psicóticos,
conseguimos medicar um que estava sem cobertura, e imediatamente fizemos à visita,
todos os outros partimos para a linha da Terapia Comunitária.
Um dos apoiadores do Distrito IV está fazendo a formação de TC. Tem um grupo
na Unidade e todas essas pessoas que estão ali, principalmente os transtornos, estão
sendo indicados para passar pela Terapia Comunitária.
O próximo passo é estar aprofundando um pouco mais, conhecendo as pessoas, o
trabalho, sabendo da necessidade de medicação. Além disso, é muito interessante
porque clareia o que estamos falando. De terapeutas comprometidos, daqueles que
fazem em baixo da árvore, então vamos conseguir enxergar bem alguns descritores mais
firmes.
Com certeza são pessoas que estavam usando uma medicação sem cobertura
nenhuma e agora tem a medicação, mas elas estão sendo ouvidas estão podendo falar e
com certeza isso melhora a qualidade de vida, a prevenção de crises e a prevenção de
internação.
115
A Terapia Comunitária mudou muito a minha vida. Porque o Psicólogo tem muito a
coisa do SETTING, do lugar, da relação de poder das pessoas, de você ter o
conhecimento e o outro não ter. E a Terapia Comunitária ampliou meu conceito do que é
comunidade, trabalhou muito mais em mim a questão de humildade, de escuta, minha
escuta mudou.
Tive mais benefícios pessoais até do que profissionais, o que melhorei
profissionalmente é porque melhorei enquanto pessoa. Quanto a minha formação,
aumentei o contato com os colegas, ACS, técnicos de enfermagem, eles tinham uma
percepção, uma sacação de coisas da vida que tinham vivido e eu tinha em teoria.
Tenho outra forma de me colocar na roda, outra forma de me colocar
terapeuticamente e de fato assim a minha vida pessoal mudou em vários aspectos como
vejo que a vida das pessoas muda, os primeiros a mudar são os terapeutas, colegas
assim que ataram casamentos, relações doentias, enrolada com família, com pai, mãe,
filho, e eles resolveram. “Ah! Eu não falo com o meu filho há muito tempo”.
Na outra intervisão você ouve, “Nós conseguimos conversar”.
As pessoas buscam de fato essas mudanças, então acho que a mudança maior é
a pessoal mesmo.
116
É uma nutricionista, decidida, comunicativa e atenciosa. Sua fala expressa
a importância da Terapia Comunitária para a inserção do usuário nesse processo
de construção de uma saúde de qualidade. Conheça-se, agora, sua história.
[...]
[...][...]
[...] A TC me ajudou a me colocar como ser
A TC me ajudou a me colocar como ser A TC me ajudou a me colocar como ser
A TC me ajudou a me colocar como ser
humano
humanohumano
humano de
de de
de modo
modo modo
modo mais igual,
mais igual, mais igual,
mais igual,
menos prepotente, menos dono
menos prepotente, menos donomenos prepotente, menos dono
menos prepotente, menos dono do saber, enfim, menos egoísta
do saber, enfim, menos egoísta do saber, enfim, menos egoísta
do saber, enfim, menos egoísta [
[ [
[...
......
...]
]]
]
“Acho que o processo de implantação da Terapia Comunitária (TC) de João
Pessoa - PB está se dando de forma bastante positiva. A Terapia Comunitária vem suprir
uma lacuna que existia dentro do processo de organização da Atenção Básica no sentido
de que pode estar possibilitando a aproximação do usuário com as equipes de Saúde da
Família.
Tínhamos uma dificuldade muito grande na prática, de consolidarmos essa
aproximação, para que pudéssemos estabelecer vínculo manter relações mais solidárias
com os nossos usuários e a TC dá conta dessa aproximação. Porque todos nós somos
iguais na roda de TC, temos problemas, temos experiências a contar um para o outro, e
acho que é um salto de qualidade que a gestão municipal está dando com esse processo
de implantação da TC, todos nós só temos a ganhar nesse processo.
Eu tinha escutado falar da TC, porque no Distrito Sanitário III tinha algumas
experiências. Na verdade acho que foi o primeiro, não sei se podemos chamar, mais o
primeiro pólo dentro do Município, a primeira experiência de TC foi no Distrito Sanitário III.
117
Fomos assistir uma TC no Distrito Sanitário III, através de alguns colegas que
faziam parte da Terapia, depois participamos da formação do Cuidando do Cuidador
dentro do projeto Quatro Varas em Morro Branco, na Oca dos Índios onde tivemos a
possibilidade de conhecer Adalberto, que é o criador da Terapia Comunitária.
Então, foi uma experiência muito positiva e realmente é uma coisa apaixonante,
porque percebemos o quanto de possibilidades poderemos estar criando para efetivar
realmente esse princípio do SUS que é a questão da participação popular, da população
se sentir inserida no processo de trabalho das equipes de Saúde da Família, se sentir co-
participante, da organização desse processo de trabalho.
A Terapia Comunitária ela abre muitas possibilidades de inserção do usuário
nesse processo de construção de uma saúde de qualidade, resolutiva, de uma gestão
democrática.
estamos na segunda turma de formação, participei da primeira. Temos um
carinho muito grande quando vamos fazer a seleção porque tentamos fazer com que o
processo seja o mais democrático possível, e ao mesmo tempo tentamos captar as
pessoas que consideramos ter perfil.
Acho que no momento de implantação precisamos dar respostas, não só porque é
um projeto bonito, que hoje o Ministério da Saúde está encampando, não só por isso, mas
porque realmente acreditamos que ele vem dar uma eficácia, uma efetividade na questão
do sofrimento mental.
Procuramos sempre, está captando as pessoas, que enxergam com o olhar bem
apurado para os usuários no sentido de que elas realmente queiram fazer a terapia
porque tem o perfil, porque gostam de cuidar das pessoas. Pois, acima de tudo, quem é
terapeuta comunitário tem que se sentir bem cuidando das pessoas.
A Terapia Comunitária vem sendo adotada como uma política pública de gestão
municipal. Acho que, ela reorganiza o processo da Atenção Básica na medida em que os
profissionais estão inseridos nesse processo, estão mais próximos das necessidades de
saúde da população, do usuário e acabam percebendo que não é uma necessidade
biológica, mas é uma necessidade de ser escutado, de estabelecer vínculo com aquela
equipe, de falar das coisas do seu cotidiano, dos problemas que ela enfrenta no dia-a-dia
e assim ajuda a equipe a ampliar a visão de saúde. Porque se percebe que uma equipe
da Atenção sica não trata do biológico, do procedimento, da cura da doença em si,
mas se compromete.
118
Reorganiza o processo de trabalho na medida em que compromete os
profissionais com a solução dos problemas de vida daquele usuário que é vinculado
aquele serviço. Precisamos ampliar nosso leque de atuação não ficar no biológico,
devemos promover a intersetorialidade, buscar parcerias com as organizações não
governamentais, enfim, para que possamos estar ampliando, e na prática estar efetivando
um conceito muito mais amplo de saúde do que só meramente a ausência de doença.
Então, acho que reorganiza sim, e aponta caminhos para onde possamos trilhar
em busca dessa saúde de qualidade, resolutiva, que seja comprometida realmente com
as necessidades de saúde do usuário, cidadão no Município de João Pessoa - PB.
Um dos desafios é de se desnudar da concepção fragmentada de saúde, do que
se pensa sobre o que é saúde, que não é uma coisa simplista, e guiar o processo de
trabalho baseado em uma concepção mais ampliada da saúde.
Outro desafio que esses terapeutas comunitários em formação estão tendo é de
trazer os outros profissionais que ainda não estão nesse processo para conhecer o
projeto, conseguir ganhar esses outros profissionais para que eles possam estar
entendendo a proposta e sendo aliados.
Também é um desafio fazer com que a comunidade participe e venha fazer parte
desses encontros, acredite nesse movimento, por isso acho que tem que ser uma coisa
com muita seriedade, pois é uma experiência, é um processo, portanto temos que passar
muita credibilidade, muito respeito, para que o processo se fortaleça, cresça e dê certo.
A Terapia é uma ferramenta de saúde pública. está comprovada a eficácia, os
princípios, as diretrizes, dessa ferramenta, dessa estratégia. Sabe-se que muitas pessoas
ainda não têm condições de acesso, ao serviço de Saúde Mental, ainda tem muita coisa
para se construir nesse aspecto.
A questão da desospitalização está aí, precisamos dar alternativas, para que
essas pessoas tenham acesso. Acho que a Terapia consegue fazer isso, ela é um espaço
complementar, e nós não estamos tirando os méritos da Medicina curativa, do ponto de
vista de Saúde Mental, é algo a mais que temos a ofertar.
Na verdade com a TC evitamos que o adoecimento mental chegue ao ponto que
precise estar tomando medicamentos. Acho que, com a questão da modernidade, foi se
deixando de lado práticas que eram comuns em outras gerações, de se estar
conversando, escutando, estabelecendo encontros solidários entre as pessoas, mas a TC
veio resgatar tudo isso. Então é um desfio para as pessoas que estão se formando, para
a própria gestão, para a sociedade, de estarmos criando esses espaços, fortalecendo,
119
formando, ampliando e divulgando cada vez mais para que possamos estar inserindo as
pessoas que acreditam ainda nos seres humanos.
Os locais de reunião, também acho que ainda são um desafio, porque fica uma
coisa meio que espontâneo, dos profissionais. Os profissionais conversam com as igrejas,
porque muitas vezes a própria unidade de saúde da família ela não tem ainda uma
estrutura física adequada para que se possa ter um encontro mais proveitoso, e possa
estar convidando, ampliando esse grupo.
Então, fica uma coisa assim meio espontânea, tem alguns problemas nesse
sentido, mas de modo geral temos conseguido conversar com essas outras organizações
e conseguido a resposta positiva, quando falamos e dizemos o que é, as igrejas sempre
estão disponíveis, as associações também, tudo o que venha somar e ajudar a
comunidade, as pessoas de certa maneira estão abertas.
Nós, do Distrito Sanitário V, não temos encontrado problemas em relação a termos
locais para realizar as terapias, estamos indo nas escolas, ontem mesmo fui fazer uma
TC numa Escola Estadual próxima ao Espaço Cultural à Escola José Vieira, a diretora foi
muito receptiva, muito legal.
As pessoas relataram ontem quando saímos que gostaram muito.
“Hoje não vou tomar remédio para dormir”. Isso é muito gratificante.
Quer dizer, você percebe que as pessoas estão precisando, muitas vezes de
serem escutadas, falarem um pouco da sua vida, do que angustia, do que inquieta. E
saímos muito felizes, de um encontro como esse, não é que tenhamos um o espírito que
nós tratamos alguém, não, saímos com a sensação que aprendemos muito, trouxemos
experiências e compartilhamos o saber, para resolvermos nossas coisas. Assim, se
estabelece uma troca, um compartilhar de vida. É muito legal.
Com relação à divulgação da Terapia acho que temos um longo caminho a trilhar,
precisamos ocupar até a mídia mesmo... As pessoas que estão na linha de frente,
precisam falar um pouco do que tem sido feito no Município de João Pessoa - PB , acho
que divulgar os lugares para que as pessoas possam ir, dizer o que é divulgar na
impressa como um todo, precisamos fazer este trabalho de divulgação com mais
potência, acho que traria bons resultados.
Sou uma pessoa que tenho certa facilidade de me colocar no lugar do outro, isso é
uma coisa que é da minha história, e está dentro de mim, mas isso ficou muito mais
aguçado com a Terapia Comunitária. Ela me trouxe mais perspicácia, sensibilidade para
me colocar ainda mais no lugar do outro, entender o outro, de me sentir um ser humano
120
dependente do outro, de não pensar sempre no que vai ser a minha vida, não pensar a
minha vida como uma coisa individual, mas me fazer pensar como uma pessoa que está
inserida dentro de um contexto sócio, econômico e cultural e que para estar bem, as
outras pessoas também precisam estar bem.
Acho que nos solidarizamos e nos colocamos como sendo da espécie humana de
uma forma mais igual, de uma forma menos prepotente, menos dono do saber, enfim,
menos egoístas... Um ser humano mais solidário, mais próximo do outro, que se percebe
dependente do bem estar do outro.
Os benefícios da Terapia Comunitária para a comunidade são a possibilidade de
resgatar a auto-estima, de se perceber um ser humano potente capaz de lutar pelos seus
direitos e de se perceber inteligente. O conhecimento ele não é fruto de uma determinada
parcela da população, na verdade, fomos à academia e que freqüentamos uma
Universidade, temos um saber, mas acho que é um saber que é produzido pela própria
sociedade.
E de certa maneira, sistematizamos esse saber que é produzido na sociedade,
acho que a comunidade se sente co-participante da produção desse conhecimento.
Quando pessoas simples colocam coisas que não aprendemos na academia, e eles
percebem que estamos aprendendo com eles, se estabelece uma troca. Acho que essa é
a grande... sacada da Terapia Comunitária, quando você coloca as pessoas, no sentido
de que elas se vejam como pessoas que tem uma importância dentro da sociedade, que
tem um saber e que tem uma contribuição importante, tão importante quanto qualquer
outra pessoa. E isso elas relatam, elas apreendem que conseguem falar, já conseguem
se posicionar, conseguem dizer não para coisas que elas antes não tinham coragem,
que elas se sentiam maltratadas, feridas e não conseguiam falar daquilo que machucava
e trazia sofrimento. Isto tem sido uma constante nos nossos encontros, como as pessoas
colocam isso, demonstram o bem que a Terapia Comunitária vem fazendo.
121
Mulher calma, serena de bem com a vida. É médica e sua fala destaca a
importância da TC como uma ferramenta que possibilita um cuidado integral,
humanizado e de qualidade gerando mudanças, inclusive pessoais.
Passei a me conhecer mais e também a me posicionar
Passei a me conhecer mais e também a me posicionar Passei a me conhecer mais e também a me posicionar
Passei a me conhecer mais e também a me posicionar [...]
[...] [...]
[...] não sou “a”
não sou “a” não sou “a”
não sou “a”
salvadora do mundo
salvadora do mundosalvadora do mundo
salvadora do mundo,
,,
, sou como as outras pessoas.
sou como as outras pessoas. sou como as outras pessoas.
sou como as outras pessoas.
Compreendo essa implantação como um grande movimento de reorientação das
práticas de saúde que estão se dando principalmente na atenção básica, motivadas por
um envolvimento da Secretaria de Saúde com o projeto de Terapia Comunitária. Este
projeto era desenvolvido aqui pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) através
das Professoras Doutoras Maria Filha e Maria Djair que juntas com a Irmã Ana o
desenvolviam no Distrito III em Mangabeira.
A primeira vez que ouvi falar em Terapia Comunitária foi em 2003 quando estava
em Camaragibe PE na Coordenação da Atenção Básica. Trabalhei nessa cidade de
1994 a 2004.
Nessa cidade tinha uma médica que fazia a formação de terapeuta, ela viajava
para Fortaleza - CE para fazer os módulos, juntamente com um Psicólogo. A própria
formação da Terapia é bem interessante, você se torna terapeuta enquanto está se
formando. E ela tinha a oportunidade de realizar encontros na comunidade com a própria
equipe e esses encontros deram uma revirada na forma de atuar da equipe.
122
A segunda vez que ouvi falar foi aqui em João Pessoa - PB. Quando em 2006
nós enquanto gestão, eu, Lucineide, Márcia Rique, Adriene e Celinha fomos em grupo na
Universidade conversar com as Professoras (Maria Filha e Maria Djair) buscando um
esclarecimento no sentido de: que conhecimento era possível para alavancar várias
questões que estavam travadas na área de Saúde Mental tanto por dentro das práticas
das equipes como também da gestão.
Na época foi oportunizado aos diretores do Distrito Sanitário aqui de João Pessoa
- PB que fossem até Fortaleza para ter uma formação em Cuidando do Cuidador com o
Professor Adalberto Barreto. Nesse momento foi feito uma aproximação com o IBPDH
que se mostrou disponível em promover a formação de uma turma de terapeutas
comunitários aqui em João Pessoa - PB. Aí o Município formalizou a proposta que teve a
possibilidade de formar 60 terapeutas.
Tenho o privilégio de ser uma dessas pessoas que está em formação e de para
cá, confesso que tenho mudado dia após dia não somente minha prática, mas também o
modo como respiro e como sou na vida. É praticamente essa a minha aproximação com a
TC.
O que mudou é que sou outra pessoa após a TC, eu me colocava no mundo como
se tivesse vindo aqui para ser santa, ser perfeita, ser impecável. Não admitia que tivesse
nenhuma falha mediante quase nada e entendi de onde é que vinham muitas dessas
posições que tinha diante de mim e da minha posição na vida depois da formação de
terapeuta comunitário. Passei a me conhecer mais e também a me posicionar não sou “a”
salvadora do mundo sou como as outras pessoas.
A maior importância da Terapia Comunitária, no meu ponto de vista, está
focalizada na medida em que o projeto político da Secretaria de Saúde visa construir um
cuidado com a saúde das pessoas de forma integral, humanizada e de qualidade. Esse
cuidado ele ultrapassa toda a lógica de somente organizar as práticas dos profissionais
com boas condições de trabalho. Assim o Município vem desenvolvendo um modo de
organizar essas práticas, para firmar algumas diretrizes buscando a horizontalização.
Esse cuidado que vem sendo perseguido, demanda um jeito novo de cuidar das
pessoas, se fazendo necessária uma revisão de posturas e de atitudes dos profissionais.
Na dimensão desse cuidado que se busca alcançar, precisa se construir um re-olhar para
a prática, para os conteúdos trazidos e para a formação dos profissionais que estão no
mercado. Para que eles possam ser capazes de criar nculos, de criar uma co-
responsabilização, entre pessoas da comunidade, equipes, profissionais e gestores, além
123
de atuar numa perspectiva onde seja possível avançar na intersetorialidade e pensar
numa rede social operando de forma harmônica com o serviço e com a comunidade.
A meu ver a Terapia Comunitária faz emergir em cada contexto todo esse
potencial, que muitas vezes, es latente ou adormecido, mas que é possível de se
resgatar. Para as pessoas terem outros pontos de conexão com o mundo, além de terem
lócus de reduzir sofrimento, inércia ou acomodação porque a Terapia traz a tona
potencialidades.
para dizer que o que tem mudado com relação ao atendimento da comunidade
é que as equipes que tem terapeutas comunitários fazem a diferença na relação com os
usuários. Elas têm posturas mais acolhedoras, mais facilidade de mobilizar a população
para discutir questões relativas ao modo de vida, de conduzir determinadas ações
programáticas e de trabalhar questões mais coletivas.
Diferentemente de equipes que atuam de modo mais tradicional, com ações mais
fragmentadas, mais setoriais. Isso é uma diferença que é bem perceptiva nas equipes que
tem grupos de Terapia Comunitária.
Assim, para dizer que, uma das dimensões da integralidade, essa do cuidar,
olhando a pessoa como um ser em sua totalidade, diferentemente do olhar para uma
doença ou para um doente, nessa dimensão posso afirmar que o cuidado integral está
sendo iniciado.
Numa conversa que tive na semana passada com o Pr. Edmilsom da Igreja
Presbiteriana Independente do Geisel, um dos lugares que tenho grupo. Ele disse o
seguinte: “Oh, Drª. Fernanda aquela família que participou dos encontros está muito bem”.
Queria dizer que existe um reconhecimento de que foi fruto da Terapia, porque o
senhor veio a todos os encontros, com a mulher e os filhos. Em uma ocasião o tema que
foi apresentado pela esposa foi o escolhido, uma situação de dificuldade, de sofrimento.
Este tema foi trabalhado e ela ficou indo. Numa outra ocasião o tema foi apresentado por
um dos filhos do casal. E este tema também foi trabalhado no encontro.
Aí, segunda-feira da semana passada, fiquei muito feliz, quando soube que essa
família, após 8 meses, está muito bem. Esse pastor ficou muito empolgado. Fez até
divulgação da Terapia Comunitária e de que tinha parceria conosco em um jornal, lá de
São Paulo, Ele levou uma cópia deste jornal para o Distrito, fez assim, uma manifestação
de que já está reconhecendo que a Terapia teve um efeito benéfico na pessoa, e neste
caso na família lá da comunidade.
124
Ainda tem também outro depoimento que achei bem interessante, foi em um
Hospital em Canguaretama no Rio Grande do Norte. Eu e Márcia, que era minha dupla,
fazíamos a Terapia todo o sábado à tarde. Foi uma experiência muito interessante,
porque tínhamos a oportunidade de pegar um grupo com pessoas mais ou menos fixas,
pessoas que estavam sempre presentes, eram os funcionários do Hospital e um grupo
que participava, na dependência de estar no Hospital no sábado, que eram os
acompanhantes dos internos e alguns internos.
Era muito bonito, porque tinham puérpuras com bebês de 0 dia, tinham idosos,
adolescentes, mulheres, homens. Era um grupo que tinha pessoas de 0 a mais de 80
anos. Lindo, lindo. Foi bem desafiador porque a cada encontro tínhamos que repensar
desde a dinâmica de acolhimento até a conotação positiva, que não sabíamos o que
iríamos encontrar. Antes, vínhamos mais ou menos ritualizada, de todo mundo ficar em
pé. percebemos que algumas pessoas não tinham condições de sair da cadeira ou se
levantar. Lembro a primeira vez que fizemos a dinâmica de aquecimento com todo mundo
sentado. Foi muito bom. Cada sábado era bem interessante.
Lembro que tinha Hozana, ela ia a todos os encontros. A primeira vez que ela foi,
o seu tema foi trabalhado, e ela ficou indo, ficamos satisfeitas porque se a pessoa volta, é
porque gostou. teve uma vez que ela não foi, mas no outro sábado foi dar uma
desculpa. Dizer que estava muito bem, tinha resolvido todos os problemas que havia
apresentado na TC e que estavam causando sofrimento. Ela faz TC até hoje e realmente
tem demonstrado nas conversas que escom outra postura diante da vida. Pelo menos
experiência individual, essa foi a que mais marcou, porque foi a primeira pessoa desse
Hospital que teve o tema trabalhado.
Um desafio que tenho como terapeuta é de me organizar do ponto de vista de
proteger uma agenda pessoal para garantir que não haja interrupção nos meus grupos.
Inclusive estou começando a fazer parte de outro grupo do Cristo nas terças, mas
estou torcendo, rezando, para não ter interrupção, porque administrar o tempo para mim
se constitui um grande desafio, pois faço muita coisa, então é um desafio pessoal.
Dificuldades quanto à formação, se eu não estiver enganada foi do segundo para
o terceiro módulo teórico. Sentimos que necessitava dar uma reformulada no conteúdo,
mas isso já foi superado.
Outro desafio que vejo, enquanto gestão é a necessidade de difundir a Terapia a
partir das próprias equipes. Entendo que é preciso fazer um esforço para que ela seja
125
mais difundida. Sinto que é preciso haver um investimento na divulgação a fim de que
ocorra mais adesão.
Também como desafio, podemos citar o local, para lhe dar um exemplo: o
grupo da Igreja Presbiteriana Independente do Geisel ocorria em uma área aberta, mas
devido às fortes chuvas no ano passado, ficou a critério da própria comunidade da Igreja,
na pessoa do Pastor fazer uma adequação, uma reforma. Segunda-feira quando estava
conversando com ele perguntei se tínhamos condições de retomar ele disse: “temos
uma sala para a Terapia, mas ainda falta um banheiro”. Fiquei frustrada porque tem
uma sala para Terapia, mas ainda falta um banheiro? Colocando como uma
dificuldade.
Então, outro caso é neste outro grupo que vou atuar a partir da próxima semana
junto com Lícia no Cristo. Ela está fazendo a segunda formação. temos um grupo
organizado pela vizinha dela, mas ainda falta definir o lugar, não sabe se vai ser na casa
dela ou se um Padre vai disponibilizar uma Igreja.
Por parte da gestão não consigo ver empecilho, porque se tem a liberação de
qualquer terapeuta no horário de trabalho. Tem-se por parte dos gestores municipais todo
um apoio a fim de que se apóie a iniciativa e um acompanhamento através das
intervisões por parte da Terapia Comunitária.
126
É uma mulher, alegre, decidida, comunicativa, batalhadora e de muita fé,
está sempre disposta a ajudar o próximo. Foi uma das primeiras integrantes das
rodas de Terapia Comunitária pela Pastoral da Criança. Eis o seu relato.
[
[[
[...
......
...]
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] a TC veio para abraçar esse público e cuidar desse povo de acordo
a TC veio para abraçar esse público e cuidar desse povo de acordo a TC veio para abraçar esse público e cuidar desse povo de acordo
a TC veio para abraçar esse público e cuidar desse povo de acordo
com as necessidades e a r
com as necessidades e a rcom as necessidades e a r
com as necessidades e a realidade das comunidades.
ealidade das comunidades.ealidade das comunidades.
ealidade das comunidades.
A implantação da Terapia Comunitária (TC) em João Pessoa PB - se deu
através de uma proposta de trabalho em nível nacional, da coordenação arquidiocesana
da Pastoral da Criança, e da necessidade de trabalharmos também, na comunidade, as
relações.
A Pastoral da Criança trabalhava com a questão da saúde, desde o idoso até
a segurança alimentar das crianças, dando maior ênfase à gestante e à criança. Mas
víamos a necessidade com relação à questão da depressão na família, dos hipertensos,
entre outras doenças que surgem através das relações das famílias.
Então, a TC veio aqui para João Pessoa, por meio de um projeto apresentado
pela Irmã Ana, que tinha desenvolvido esse trabalho na Pastoral do Ceará, e pela
Doutora Zilda Arns, que era a coordenadora geral aqui na arquidiocese na Paraíba.
A Irmã Ana, dentro desse projeto do Estado, com certeza, foi esse fio condutor
para trazer a TC para nossas comunidades. Ela foi se articulando, trazendo, mostrando
esse trabalho, que foi crescendo, e hoje está nessa rede. Agora tem até um projeto
aprovado para implantar a TC no SUS através dos PSF’s.
127
Como já tenho dez anos nesse trabalho de visitação às famílias da comunidade,
vendo de perto os problemas das pessoas da comunidade, nessa dinâmica de estar na
comunidade, fui uma das escolhidas da Pastoral da Criança para fazer um curso a fim de
implantar esse projeto aqui nas comunidades. Então foi implantada a TC nas
comunidades.
Nesse curso pela Pastoral da Criança, foi quando conheci o Professor Adalberto
em 2001/2002. Estivemos com ele durante uma semana em Fortaleza, fazendo quarto
módulo. Durante a formação, vimos o que é a TC, o que se pode e como se deve fazer a
TC, quem são esses agentes de transformação.
Toda a despesa foi por conta da Pastoral da Criança, e quem estava à frente
deste nosso trabalho era Irmã Ana. Também nos acompanhava nesse processo a Irmã
Cristina, Ricardo, de Campina Grande, e a Professora Ieda, da Universidade.
Após o curso, comecei a trabalhar mais de perto, reforçando essa relação entre
famílias, vendo a necessidade, promovendo a comunicação e resgatando a auto-estima
não só da família, mas também do indivíduo para melhor trabalhar e conviver no ambiente
em que vivem.
Na minha experiência de quatro anos e meio fazendo TC com os pacientes,
percebi que quem estava sendo atendidas no posto eram sempre as mesmas pessoas da
comunidade, pacientes do SUS.
Sabemos que essa população é carente em muitos aspectos. E a TC veio
abraçar esse público e cuidar desse povo de acordo com as necessidades e a realidade
das comunidades. Então, é muito importante para a população essa nova proposta,
trazendo a TC para a rede municipal. Isso foi a melhor coisa do mundo. Porque a TC
surgiu nas comunidades da necessidade, vendo as questões das relações, do modo de
viver daquelas famílias, das relações sociais, das relações pais e filhos e dos laços
afetivos. Chamo isso de uma dádiva, porque a TC ela veio para acolher. Ela é calorosa,
ela tem a questão do ir buscar, do cuidar. E só ela tem essa sensibilização, essa
capacidade de se descobrir um jeito melhor, para conduzir a vida nesses laços afetivos ou
dolorosos, seja como for.
Para mim, a grande importância da TC é que, hoje, ela está favorecendo uma
grande descoberta na valorização e na conquista do ser humano em suas relações
sociais, sendo ele seu próprio agente de transformação, para melhorar a sua qualidade de
vida nas relações de um modo geral.
128
Quando um médico ou enfermeira passa um medicamento para uma pessoa, ela
toma aquele remédio, mas está lá naquela relação, naquele modo de viver, naquela
família, passando por alguns problemas, às vezes, esse remédio não vai servir. Mas, a
partir do momento que ela se trabalha e que vive esse ambiente de se descobrir, ela tem
força, e passa a viver melhor.
Vejo que a TC veio no momento certo, estava na hora da Secretaria abraçar
esta causa. Porque, para mim, era para ser assim, aqui é o médico, aqui é o enfermeiro,
aqui é o odontólogo, aqui é o terapeuta comunitário. Falo do terapeuta que está lá, porque
é o papel dele, ele é o acolhedor, ele cuida, zela, tem aquele calor humano e está lá para
conduzir o grupo. Não é milagre, o grupo descobre caminhos, laços, meios, condições de
fazer a sua dinâmica, de refletir e fazer a sua reflexão, para descobrir que ele tem esse
potencial, de se valorizar, nesse sentido de: “eu posso, eu consigo”. Ele mesmo a
solução do problema.
Agora estou na segunda turma de formação de terapeutas pela Secretaria de
Saúde. Sou uma pessoa muito dinâmica e estou sempre me preparando para ajudar na
promoção humana, do outro. A própria Pastoral da Criança tem o lema: “Eu vim para que
todos tenham vida e vida em abundância”, mas essa abundância em todos os sentidos do
ser humano, e aí a TC também é um complemento.
A minha experiência como terapeuta não mudou muito, mas o que a TC vem a
acrescentar no meu trabalho e que me deixa cada vez mais feliz, é saber que esse projeto
que nós trabalhávamos com a Pastoral da Criança também está sendo implantado no
SUS, além de que outras pessoas estão tendo esse prazer de conhecer a TC de perto.
Adalberto fez algumas mudanças na TC, mas são coisas que não faz muita diferença na
forma de conduzir a TC e nos resultados com os pacientes.
Nosso primeiro grupo na Pastoral da Criança tinha as mesmas expectativas que
tenho hoje, junto a esse trabalho da Secretaria, a de atender a comunidade, de ir em
busca e cuidar dessas pessoas. Mas nas relações afetivas sociedade-família, são iguais,
porque tem gente que tem sofrimentos, dores e depressão, na classe baixa, média e alta.
Houve algumas pessoas que fizeram o curso, trabalharam com algumas TCs e
se afastaram. Eu dei continuidade, permaneci e ainda fui convidada para fazê-la em
outras comunidades. Eu colocava a sacolinha na mão e ia-me embora para as
comunidades, mesmo sem ter muito apoio da Pastoral da Criança. Mas sempre estava ali,
com o bastão na mão, sem deixar a peteca cair.
129
Acredito que, em parte, algumas daquelas pessoas do primeiro grupo de
formação desistiram porque a Pastoral deixou de lado esse trabalho. E todos nós somos
seres humanos, temos nossos fracassos, nossas dúvidas. Não é porque ela é terapeuta
que fez, que a gente tem que balançar também para isso. Olha, eu cuido, estou cuidando
do meu corpo, mas preciso também de alguém que cuide de mim, cuidador também
precisa ser cuidado.
Vou dar um testemunho bem interessante. Mandaram um ofício para a Unidade
de Saúde para informar sobre a primeira turma de formação de terapeutas da Secretaria.
Quando fiquei sabendo, eu estava de férias e estava no segundo módulo do curso. Aí,
fiquei triste e fui lá aperrear Fernanda. Ela disse: “Não, Eulina, você não pode entrar mais
porque já está no segundo módulo”. Quando chegou agora para essa turma, disseram:
“Não, Eulina, votem a formação, não precisa”. Eu disse: “Não, eu preciso, eu quero
ver as novas experiências através da Secretaria”. Porque nós precisamos nos reciclar
para partimos para algum tipo de realidade diferente. Aí, de repente, minha alegria
aumentou, quando Irmã Ana disse: “Eulina vai participar”.
Eu queria fazer essa reciclagem. Bem que não é uma reciclagem, é um
aprendizado a mais, porque estamos aprendendo todo dia, o aprender ele é constante, é
hoje, é amanhã, é eterno, porque tem as experiências, tem as pessoas com outras
culturas. Nós trabalhamos com a cultura da nossa comunidade, nessa relação sociedade-
cultura e religião, seja como for, no modo de viver, em tudo, estamos o tempo todo ali em
contato com essas diferenças.
Uma das grandes dificuldades é a descrença do nosso povo, as pessoas ... elas
estão com tantos laços feridos, magoados, desacreditados, tantos sofrimentos nas
famílias, digo isso porque desde 94 que sou ACS. Geralmente visito 250 famílias por mês,
mas, no momento ,estou com 160 famílias.
Então, tenho muito presente esse modo de viver do nosso povo. Meu medo
também, que eu não me excluo disso, é que hoje curamos uma dor e amanhã outra vem
e arrebenta. O sistema do tempo nos oferece uma mudança de vida constante. Isso é
como um barco, a água vai e leva.
A Pastoral da Criança fazia a TC em cima da mística, do que era a mística de ,
trabalhava a questão empírica trazendo esse resgate da fé cristã diante do testemunho de
Jesus e como ele viveu. Já na Secretaria de Saúde, é um pouco diferente, não traz muito
a questão mística, mas também não perde nunca esse vínculo da fé das pessoas.
130
A TC é essa teia de aranha, um vai ajudando o outro, e cada um vai percebendo
que um fio tão fininho tem uma força muito grande, mas é preciso que todos os fios
estejam interligados, pois, a partir do momento que um desses fios se quebra, a tendência
dessa teia é que os outros fios também se desmanchem. E foi o que aconteceu com a
Pastoral da Criança: nós perdemos esse referencial.
Irmã Ana dependia de pessoas que faziam coisas da forma que não era para
ser, e foi o que aconteceu, algumas pessoas da Pastoral da Criança tiveram problemas
em relação à coordenação, então foi colocado isso, e foi desvinculando,
desestimulando.
A Secretaria vai formar esse monte de terapeutas, mas precisa dar esse suporte,
o tempo todo, estar ali presente, refletindo, vendo o que deu certo, o que não deu, dando
continuidade, abrindo grupos, porque não é fácil fazer TC na comunidade, tem pessoas
que acham que é assim, coloca uma placa ali, “Hoje tem Terapia Comunitária na
comunidade”, tem pessoas que dizem: “Mas o que é Terapia?”, “Olha, eu não vou deixar
a minha novela para ir para uma Terapia”.
O grande desafio da TC, na nossa comunidade de pessoas carentes, é a
sensibilização, a conscientização de que a TC está lá para fortalecer este laço, para dizer
“Olha, estou aqui, porque nós vamos nos dar as mãos”, porque Salvador da Pátria
ninguém é. As pessoas não acreditam mais, até por causa do nosso sistema político-
sócio-econômico, que já nos deixa muita coisa a desejar.
Quando eu trabalhava no Rangel, tinha uma menina chamada Eunice, ela nunca
deu um depoimento na TC, ela não falava nada, tinha gente que contava os seus
sofrimentos, as suas dores, suas angústias, mas ela não falava. Após três anos fazendo a
TC, ela disse assim: “Eu nunca falei nessa TC, mas eu queria falar hoje, posso?” Eu
disse: “Pode, é direito”.
Ela disse que nunca contou para alguém da TC a respeito do problema dela,
mas ela tinha mudado 80% do que vivia. Porque a mudança dentro da casa dela estava
nela, não era no filho, nem no esposo, e sim, nela. Disse que a vida dela mudou muito, a
partir da mudança dela, e que agora podia falar “Agora eu sei que eu posso, porque até aí
eu não sabia que tinha essa força dentro de mim, que eu poderia mudar a minha história
de vida como indivíduo”. Que eu podia ser um indivíduo dentro da sociedade e da família
e que poderia contribuir com as mudanças que estavam ao meu redor.
131
Isso ficou na história, nós até mandamos um filme gravado em fita e a lista de
freqüência para a Coordenação Nacional da Pastoral da Criança, porque todos os meses
eles pediam toda a documentação, registro, histórico e, para mim, foi gratificante.
Quanto à questão dos profissionais, nem posso dizer se existe ainda alguma
barreira, mas sei que existe sim, algum pé atrás, em relação à TC. Primeiro porque não
acreditam, não aceitam, acham que não precisam, que quem precisa é aquele pobre
que ta lá, que o marido bebe, que faz bagunça. Ele não, não quer expor a sua dor, sua
mágoa, porque tem uma vida social mais ou menos e o precisa. Mas, as relações
afetivas e os sofrimentos estão em qualquer lugar. E isso dificulta essa relação, esse
entrosamento entre o trabalho do terapeuta junto às comunidades, a TC e aos
profissionais.
A outra realidade da nossa comunidade população-paciente é a questão do
espaço, do tempo e também de não acreditar não em quem vai fazer, mas no sistema
como um todo, porque tudo para eles agora é invenção, pelo fato de dizer assim: “Eu não
acredito em nada que é daquele posto de saúde porque eu nunca cheguei lá para ser
atendido”. Eles fazem essa relação. “Ah, isso é para ganhar tempo, porque eles
querem viver brincando, não querem trabalhar”. Eles dizem que as enfermeiras e as
médicas só ganham dinheiro e não fazem nada. Nós que estamos lá dentro é que
sabemos que não é assim, é muito trabalho.
Fui do PACS. Na época, não tínhamos PSF. O PACS e a Secretaria nos
acompanhavam. Era muito difícil, hoje não, qualquer problema nós estamos no posto,
tem médico, tem tudo, nós temos um facilitador dentro que está nos apoiando, cada
unidade agora tem um apoiador. Temos nos Distritos esses elos, essas correntes em que
estamos engajados e que nos fortalece nesse trabalho.
Para mim, outro desafio é o espaço. Porque, muitas vezes, não encontramos
espaço na comunidade, tem igrejas que perguntam se é trabalho do SUS e dizem assim:
“se é de Igreja aceitamos, se não é, se é da Secretaria, então quem tem que resolver é
ela, que é política”. Mas, tem comunidades que tem espaço na unidade de saúde, nas
associações, nos grupos de mulheres.
no Cristo, por exemplo, nós não temos essa dificuldade de não ter espaço. O
que dificulta o nosso trabalho é o horário, os profissionais que estão envolvidos na TC têm
que aceitar que aquele profissional que está envolvido precisa sair naquela hora para
fazer a TC. Principalmente se for também uma ACS, o pessoal não acredita muito, porque
132
é uma ACS, uma pessoa simples, que não tem curso superior, mas, para os outros, não
tem problema.
Quanto à questão do paciente ir no posto buscar o remédio, mudou um
pouco, não muito, porque se sabe que antigamente os postos de saúde a finalidade era
muito mais a questão do médico, da farmácia e do paciente.
Hoje, ainda está muito forte a questão da medicalização na vida do paciente. É
tanto que, em alguns PSFs, as farmácias nunca têm remédio porque ele chega hoje e
logo é distribuído. Se o paciente chega morrendo com uma dor de cabeça, precisamos ir
mais perto desse paciente, conversar com ele. O que será que aconteceu com esse
paciente? De onde vem essa dor de cabeça? Por que ele está com dor de cabeça? Mas o
profissional diz: “Ah ta com dor de cabeça? Vá tomar um Anador (remédio), vá para casa,
se deite que a dor de cabeça passa”. Talvez, com a conversa, o paciente não precise
tomar tanta Dipirona, só que muitos profissionais não olham nem para o paciente.
A TC ainda tem um longo caminho a seguir, quanto à divulgação, porque ainda é
um trabalho novo, as pessoas ainda não a conhecem muito. Vai ter que ter muita
divulgação, sensibilização, comunicação e informação a fim de conseguirmos trazer isso
para as comunidades com mais afinidade.
A primeira TC que eu fiz foi na Igreja de São Francisco, no Rangel. Eu fui meio
nervosa, ainda como aluna, mas o tempo é quem nos fortalece em tudo. Até Irmã Ana e o
pessoal estava presente. Eu fiz uma dinâmica para acolher, e o impacto sempre é muito
grande, as pessoas que vêm sempre com o pé atrás saem assim com uma coisa nova.
A TC não lhe resposta de imediato, nós nunca vemos a mudança assim, ela
vai acontecendo de forma silenciosa, mas dá resultado. Na TC a regra geral é que
ninguém deve dar conselhos, nós conduzimos alguns passos que quem es na TC,
possa pensar e dizer Ah eu acho que é por aqui”. Nós temos regras na TC,
contextualização, discussão, depoimentos, o mote-chave, mas para mim, tudo isso são
passos, que todo profissional segue, a essência da TC é o participante com aquilo que ele
foi e o que foi que ele fez para mudar.
A TC, para mim, foi muito importante, porque vim de uma família pobre, do
interior, me tiraram da companhia da minha mãe com seis anos. Fui uma pessoa criada
em colégio de freiras (orfanato), sem pai e mãe. Com 18 anos, vim para João Pessoa,
trazida pelas freiras. Estudei nas Lourdinas, terminei o segundo grau no período da
noite, depois fui morar com umas freiras em pequenas comunidades da Ordem do Jesus
Crucificado do Ceará, lá no Castelo Branco.
133
Acho que meu sonho era formar uma família, porque minha mãe se separou do
meu pai. Ela lavava roupa para nos sustentar. Meu irmão mais velho foi morar com uma
tia minha, e minha mãe ficou com as meninas. Mas, como eu era a mais nova, me
colocou no colégio das freiras. Para mim, isso foi uma angústia, porque eu cresci sem
saber o que era amor de mãe e de pai.
Terminei o segundo grau, fiz o curso de Contabilidade, continuei meus estudos,
fui fazendo os dois cursos, mas o meu sonho era casar. Casei, que, com o tempo, o
meu marido começou a me dar muito trabalho, começou a beber muito e a minha vida
foi um verdadeiro inferno.
Foi através das TCs, contando as minhas dores, meus sofrimentos, minhas
angústias, que eu fui me fortalecendo e fui levantando a cabeça e acreditando que eu era
um ser humano, que eu tinha vida própria, que eu podia muito bem sair de tudo disso.
foi quando consegui forças para acreditar que eu podia me transformar, o era o meu
ex-marido, não era ninguém, nem meus filhos, a não ser eu mesma.
A TC me fez outra pessoa, outro ser, capaz de sentir não só os meus problemas
em condições de resolver, mas também de estar mais pximo do outro e de ver de perto
o do outro, não que eu vou chegar e dizer vou resolver o seu problema”, nunca, mas
vou mostrar que o outro é capaz, que ele tem essa força, esse poder de ser o agente,
condutor e ator de mudar a sua própria história de vida, porque eu tive essa capacidade.
Essa foi a transformação que senti com esse trabalho, e com a força das
pessoas que estavam fazendo a TC, fui aprendendo a não conviver com esse sofrimento
e me libertar. Então, quando meu ex-marido tentou matar minha filha com um facão, tive
coragem de denunciá-lo, na delegacia da mulher, mas ele fugiu.
Com três meses que eu havia feito a denúncia, ele entrou lá em casa bêbado e
tocou fogo no quarto que eu havia comprado para as meninas que estavam no colégio.
Eu estava tomando banho e senti um cheiro de coisa queimando, os vizinhos correram e
apagaram o fogo. Sabe o que eu fiz? Olhei para as camas queimadas, troquei de roupa,
fechei a porta, e disse: “quando voltar, eu ajeito isso”.
Fui para o Rangel fazer a TC, e a fiz como se nada tivesse acontecido. Quando
terminei, fiquei conversando e falei a respeito do ocorrido. Os participantes disseram: “eu
não acredito que tu estás fazendo TC com um problemão desses”. Hoje, sou o homem e
a mulher dentro de casa, trabalho como Agente de Saúde no PSF, na Pastoral da Criança
e no Projeto Sal da Terra e sou muito feliz. meu ex-marido teve dois infartos, mas
134
continua bebendo, a família dele é toda contra mim, enfrentei uma barreira enorme em
relação à mãe dele, pois ela fazia de tudo para me atingir.
Hoje, minhas filhas não têm nenhum problema, mas elas tiveram que fazer
tratamento psicológico. Tem uma que já está terminando a Faculdade e trabalha no
escritório geral da Fábrica BRASTEX; a outra tem quatorze anos e está fazendo o
primeiro científico; meu filho também trabalha, é casado e tem três filhos. quem me
acompanhou, me curou e me deixou de pé foram os meus trabalhos da TC e da Pastoral.
135
5
5 5
5
AS HISTÓRIAS E SEUS
AS HISTÓRIAS E SEUS AS HISTÓRIAS E SEUS
AS HISTÓRIAS E SEUS
SIGNIFICADOS
SIGNIFICADOSSIGNIFICADOS
SIGNIFICADOS
136
Este capítulo traz a análise empírica das onze entrevistas com os
colaboradores, para melhor compreender, através de suas falas, suas
experiências e concepções a respeito da Terapia Comunitária. Para tanto,
identificaram-se eixos temáticos a partir do tom vital dessas entrevistas, da leitura
e do estudo do material produzido. Os tons vitais foram organizados, de acordo
com os temas evidenciados, procurando atender aos objetivos propostos pelo
estudo.
Nessa perspectiva, extraíram-se das narrativas os seguintes eixos
temáticos: 1. Terapia Comunitária: o sentido da história; 2. Terapia Comunitária:
promovendo mudanças, superação e crescimento; 3. Contribuições para o SUS e
a Saúde Mental em busca da Integralidade na Atenção Básica e 4. Apontando
desafios.
5.1 TERAPIA COMUNITÁRIA: o sentido da hisria
A história é uma seqüência de fatos que marcaram um período. Para
algumas pessoas, esses fatos são difíceis de serem lembrados e relatados;
para outras, são prazerosos, visto que, por trás do relato de uma história, faz-se
presente a experiência de vida de cada um, com suas marcas, memórias,
sentimentos etc. Isso é evidente quando, em uma entrevista, observam-se
reações de choro, de alegria, através do sorriso, ou mesmo o silêncio, em alguns
momentos. Corroborando com esse pensamento, a colaboradora Maria do
Socorro ressalta:
A cada momento percebo que sempre daquela história
existe uma outra história por trás e hoje consigo perceber
isso [...]. (Maria do Socorro)
O registro da história é importante porque condições de para se
entender o processo de transformação que ocorre nas comunidades e com as
populações como um todo, com o passar dos anos, além de ser um veículo
137
importante para estabelecer relações entre passado, presente e futuro (BOM
MEIRY; HOLANDA, 2007). Sabe-se que nada permanece estático. As coisas, as
sociedades, os comportamentos se modificam com o tempo.
Hobsbawm (1998, p. 22) assevera que o passado é “uma dimensão
permanente da consciência humana, um componente inevitável das instituições,
dos valores e outros padrões da sociedade humana”. Complementando esse
raciocínio, Bom Meiry (2005) destaca que a presença do passado, no presente
das pessoas, é a razão de ser da história oral. Dessa maneira, ela implica uma
percepção do passado como algo que tem continuidade hoje, por isso ela é
reconhecida como “história viva”.
Assim, com o intuito de resgatar essa “história viva”, procurou-se saber dos
colaboradores, de acordo com a vivência e as experiências de cada um, como
ocorreu a implantação da Terapia Comunitária no Município de João Pessoa - PB
- para compor e apresentar essa história.
Na leitura das narrativas, evidencia-se que Ana Vigarani foi o ponto-chave
para a chegada da TC a João Pessoa, como relata a colaboradora Eulina:
A Irmã Ana, dentro desse projeto do Estado, com certeza
foi esse fio condutor para trazer a TC para nossas
comunidades. Ela foi se articulando, trazendo, mostrando
esse trabalho, que foi crescendo, e hoje está nessa rede...
(Eulina)
É oportuno abalizar que Ana Vigarani foi quem estimulou as Professoras
Dras. Maria Filha e Maria Djair a fazerem cursos com o Professor Adalberto
Barreto em Fortaleza - CE. Quando voltaram de lá, elas “foram incansáveis no
sentido de divulgação dentro da Universidade”, conforme relata Ana Vigarani.
Confirmando essa assertiva, Márcia Rique inicia a sua fala, dizendo:
Conheci a Terapia Comunitária (TC) quando estava fazendo
a especialização em Saúde da Família, no NESC, através
de uma roda de Terapia Comunitária que as Professoras
Maria Filha e Maria Djair fizeram. (Márcia Rique)
Por meio da divulgação e da iniciativa dessas professoras, houve, no ano
de 2004, a interação entre a Universidade Federal da Paraíba UFPB, a Terapia
Comunitária e o Município de João Pessoa, visto que havia um Projeto de
138
Extensão do Curso de Enfermagem da UFPB sendo desenvolvido por elas no
bairro de Mangabeira, na Unidade do PSF Ambulantes, como expressa a fala de
Maria do Socorro, que acompanhou toda essa trajetória:
[...] já tínhamos um convênio com a Universidade Federal
em que Unidades de Saúde do PSF recebiam para estágio
alunos da Graduação de Enfermagem. Então, as
Professoras Maria Djair e Maria Filha trouxeram a proposta
para desenvolvermos a Terapia Comunitária [...]. (Maria do
Socorro)
A figura 4 registra, de forma histórica, a antiga fachada da Unidade de
Saúde do PFS Ambulantes, onde o projeto de extensão, desenvolvido pela UFPB,
sobre Terapia Comunitária iniciou em João Pessoa. Vale destacar que, hoje, essa
Unidade de Saúde está em outra sede, integrada com mais quatro Unidades de
Saúde.
É oportuno abalizar que, para conduzir as rodas de TC, o terapeuta
comunitário segue cinco
fases, a saber: o acolhimento, a escolha do tema, a
contextualização, a problematização e o encerramento (BARRETO, 2008), como
mencionado no referencial teórico.
FIGURA 4:
Antiga sede do PSF Ambulantes
Fonte: Arquivo fotográfico do PSF Ambulantes.
139
As figuras 5 e 6 registram a fase do acolhimento, por meio do qual se cria
um clima para receber as pessoas como forma de acolhê-las. De acordo com Luisi
(2006, p.84), acolher significa receber bem, cuidar. É também
agasalhar a alma, é oferecer um sorriso, um aperto de mão. É procurar
saber e aprender o nome de cada um que veio participar. Acolher é
considerar o outro como gente. É também cantar parabéns para quem
está aniversariando naquele período. É aquecer o clima daquela
comunidade para que todos se envolvam e se aproximem uns dos
outros.
Segundo Barreto (2008), o acolhimento é composto de seis procedimentos:
dar as boas vindas; celebrar a vida dos aniversariantes do mês; falar do objetivo
da Terapia Comunitária; informar as regras; aquecer o grupo para trabalhar e
apresentar o terapeuta que vai dar continuidade à TC. No momento de
aquecimento, o co-terapeuta convida o grupo para fazer algum exercício ou
brincadeira (dinâmica), o que demonstra que a Terapia Comunitária proporciona
um espaço aconchegante e lúdico, contribuindo para o bem-estar da pessoa.
FIGURA 5:
Dinâmica
Fonte: Arquivo fotográfico do PSF Ambulantes.
140
A figura 7 se refere à etapa final da condução da roda, que é o
encerramento. Nessa etapa, costuma-se pedir a todos que fiquem em e
formem dois círculos: um maior e outro menor, em que ficam todas as pessoas
que falaram naquela TC - tanto as que apresentaram as suas dificuldades quanto
as que partilharam as suas experiências durante a problematização. De acordo
com Luisi (2006, p. 92-93),
o terapeuta procura criar um clima de afetividade e pede que se dêem as
mãos ou passem o braço um sobre o ombro dos outros, permanecendo
em um balanço suave. Após alguns segundos de silêncio, o terapeuta
conota positivamente, valorizando e agradecendo o esforço, a coragem
a determinação, a participação e a vontade de superar as dificuldades,
através de palavras que possam ajudar a favorecer e fortalecer a auto-
estima.
Nesse momento, o terapeuta pede aos participantes que reflitam e digam o
que estão levando consigo para casa ou que aprenderam durante a TC.
Posteriormente, as pessoas despedem-se ou se confraternizam, como se observa
na figura 8.
FIGURA 6:
Professoras Maria Djair e Maria Filha fazendo
o acolhimento – rodas de TC.
Fonte
:
Arquivo fotográfico do PSF Ambulantes.
141
Feita essa breve exposição, observa-se que o caminho estava aberto para
novas conquistas e parcerias. Em 2006, no ensejo de divulgar a TC, as discentes
da UFPB (Maria Djair e Maria Filha) influenciaram algumas Diretoras de Distrito a
fazerem uma formação em Cuidando do Cuidador em Fortaleza, como afirma
Márcia Rique:
FIGURA 8:
Professoras Maria Djair e Maria Filha em um
momento de confraternização com a comunidade.
Fonte: Arquivo fotográfico do PSF Ambulantes.
FIGURA 7:
Professoras Maria Djair e Maria Filha
realizando o encerramento de uma roda de TC.
Fonte: Arquivo fotográfico do PSF Ambulantes.
142
[...] no final de novembro de 2006, também pela influência
das Professoras Maria Filha e Maria Djair, algumas Diretoras
de Distrito foram fazer uma formação em Cuidando do
Cuidador [...] em Fortaleza. (Márcia Rique)
Essa participação no curso resultou em um contato e, posteriormente,
numa parceria com o Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Humano de São
Paulo (IBPDH). Esse instituto, na época, tinha uma verba que era do Ministério da
Saúde, através da secretaria antidrogas, que podia ser aplicada em treinamentos
de terapeutas. A respeito disso, relata Márcia Rique:
[...] quando surgiu esse meio, [...] conversamos com a
secretária e rapidamente ela entendeu a importância da
Terapia Comunitária como ferramenta institucionalizada de
trabalho do dia-a-dia do profissional de saúde. [...] a partir
daí, pactuamos [...] um convênio de parceria técnica, [...]
para o Município de João Pessoa e também para os
Municípios de Pedras de Fogo, Conde e São Bento. Assim,
trouxemos para a primeira formação em Terapia
Comunitária. (Márcia Rique)
Essa decisão se deveu ao fato de que, nessa época, a gestão por meio da
Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa (SMS) estava num momento de
discussão de como potencializar a Saúde Mental dentro da Atenção Básica em
João Pessoa – PB, pois, de acordo com Roseana Meira,
[...] existia e ainda existe, por parte da maioria dos
profissionais, certo receio de lidar com o sofrimento mental,
por ser algo que eles não tiveram como parte da formação.
[...] Assim, o primeiro olhar de interesse foi por conta da
Saúde Mental que nos fez mais sensível ao dispositivo da
Terapia. (Roseana)
Nessa direção, a Secretaria Municipal de Saúde de João Pessoa, por meio
de seus gestores, buscando fortalecer ações que possam garantir o cuidado
integral aos portadores de transtornos mentais na atenção básica, iniciam o
processo de formação de profissionais da saúde em Terapia Comunitária, como
dispositivo para a promoção da saúde e a prevenção do transtorno mental. Sendo
assim, na Paraíba, o processo de formação de terapeutas comunitários começou
em janeiro 2007. Concomitantemente formaram-se duas turmas, uma da qual
143
participaram 65 profissionais da Estratégia Saúde da Família do Município de João
Pessoa, e outra turma, com profissionais da Estratégia Saúde da Família de
Municípios circunvizinhos, a saber: Pedras de Fogo, Conde e São Bento, todos
pertencentes ao Estado da Paraíba. Sobre a turma de João Pessoa,
especificamente, Ana Vigarani declara:
Nessa turma, foram, ao todo, selecionados 65 profissionais
das equipes do PSF, [...] a estrutura do curso de formação
de TC consiste em quatro módulos, sendo 80h para a teoria,
80h para as vivências, 120h para a realização da prática das
Terapias e 80h de intervisão. (Ana Vigarani)
É oportuno destacar que a gestão tem se mostrado interessada e
cooperativa quanto ao processo de implantação da Terapia Comunitária, visto que
João Pessoa foi um dos primeiros Municípios a institucionalizá-la. Considerando
esse momento, em que vem ocorrendo a implantação dessa terapia, é de extrema
importância esse apoio por parte da gestão para que essa estratégia se consolide,
cada vez mais, no Município de João Pessoa. Isso se evidencia no relato de
Roseana Meira, que diz:
Estou muito otimista com essa implantação. [...] Como
Gestão, tivemos vários cargos de direção envolvidos nessa
formação da primeira turma de terapeutas. [...]
Selecionamos pessoas de cargos chaves, que atuariam bem
como facilitadores para implantar a Terapia Comunitária
para o restante da rede. (Roseana)
O processo de formação dos terapeutas comunitários pela SMS continua,
em 2008, com mais uma turma - envolvendo 65 profissionais da equipe da ESF do
Município de João Pessoa PB através de recursos financeiros do Projeto de
Educação Permanente em Saúde do Ministério da Saúde (MS). Também em
2008, o MS, liberou recursos para o desenvolvimento de um projeto relacionado
ao processo de formação dos terapeutas comunitários envolvendo 100 Municípios.
Representando a Paraíba, o Pólo formador (MISC PB) será responsável por
mais uma turma de profissionais da equipe da ESF de seis Municípios do sertão
paraibano. Esse breve relato histórico mostra que a TC é uma ferramenta de
cuidado, que vem se consolidando em João Pessoa.
144
5.2 TERAPIA COMUNITÁRIA: promovendo mudanças, superação e crescimento.
A Terapia Comunitária é um instrumento transformador. De acordo com
Barreto (2008), muitas coisas da natureza, para serem criadas, passam por um
processo de destruição e transformação. Ele assevera que, na TC, os obstáculos,
os traumas, as carências e os sofrimentos superados transformam-se em
sensibilidade e competência, o que induz às ações reparadoras de outros
sofrimentos.
Ponderando-se sobre os relatos dos colaboradores, verificou-se que
ocorreram significativas mudanças nos campos pessoal, profissional, comunitário
e de práticas no serviço de saúde. Em relação à mudança pessoal, as entrevistas
mostraram que houve mais sensibilização e capacitação dos colaboradores,
porque o processo de formação do terapeuta comunitário favorece um olhar para
dentro de si mesmo, com maior sensibilidade para se colocar no lugar do outro, o
que possibilita a tomada de consciência sobre si e sobre o outro e disposição para
refletir, gerando uma transformação de dentro para fora, a partir da escuta
partilhada das histórias de vida, como expressam os relatos a seguir:
[...] passei a me conhecer melhor, e me conhecendo melhor,
passei a agir de uma forma diferente. [...] hoje sou outra
Socorro. (Maria do Socorro)
Passando a ser solidário por causa do outro porque a dor
dele reflete em mim, então foi outra coisa que comecei a
compreender e a perceber [...] não um ser humano que
não tenha passado pelo sofrimento [...]. (Ana Maria)
A TC me fez outra pessoa, [...], capaz de sentir não os
meus problemas em condições de resolver, mas também de
estar mais próximo do outro [...] ter capacidade de mudar a
sua própria história. (Eulina)
Hoje tenho outra forma de me colocar na roda [...] a TC
mudou a minha vida pessoal em vários aspectos, como vejo
que a vida das pessoas mudou também, os primeiros a
mudar são os terapeutas [...]. (Lino)
145
Sou outra pessoa após a TC [...] Passei a me conhecer mais
e também a me posicionar. Não sou “a” salvadora do
mundo, sou como as outras pessoas. (Fernanda)
...participar das rodas de TC, permite um repensar sua
própria história de vida. (Ana Vigarani)
Nesses discursos, constatou-se, ainda, que alguns dos participantes
perceberam mudanças em sua vida profissional e na dos profissionais das
equipes de saúde que o terapeutas comunitários, refletindo na sua prática. É
oportuno destacar que, historicamente, os profissionais de saúde tiveram uma
formação voltada para o atendimento de doenças no estrito contexto biológico,
razão por que muitos deles têm dificuldades para considerar fatores emocionais,
culturais e sociais como parte integrante do atendimento ao indivíduo. Mas, com a
TC, os profissionais de saúde tornaram-se mais sensíveis à dor do outro, para
escutar o paciente, ter atitudes mais acolhedoras, passaram a ver o paciente de
forma mais integralizada, como expressam estes colaboradores:
Claro que visualizamos mudanças, quando falo, o
profissional passa a fazer um olhar diferenciado com o
usuário [...] eles mudaram o seu ponto de vista, passaram a
olhar o usuário e verem outras coisas além daquele corpo
que traz a queixa. (Ivoneide)
para dizer que o que tem mudado com relação ao
atendimento da comunidade é que as equipes que têm
terapeutas comunitários elas [...] têm posturas mais
acolhedoras, com facilidade de mobilizar a população para
discutir questões relativas ao modo de vida, de conduzir
determinadas ações programáticas e de trabalhar questões
mais coletivas. (Lino)
[...] os profissionais [...] se tornam mais sensíveis na escuta
e passam a tratar de forma diferente, porque começam a
perceber que aquele incômodo, aquela queixa, daquela dor
daquela gastrite não é uma coisa física é também
emocional. (Maria do Socorro)
A Terapia Comunitária consiste em uma tecnologia voltada para a criação de
uma teia de relação social, que favorece a troca de experiências e possibilita a
superação de dificuldades e sofrimentos do dia-a-dia das pessoas (BARRETO,
146
2008). Assim,
ela contribui para
o estabelecimento e o fortalecimento de vínculos
entre as pessoas, para a formação de redes de apoio social, mobilizando recursos
pessoais e culturais para melhorar-lhes a qualidade de vida e evitar a
desintegração social.
Como já enfatizado, a TC constitui-se como uma prática de efeito terapêutico,
que visa à prevenção, na área da saúde, e ao atendimento a grupos
heterogêneos, de organização informal, num contato face-a-face, que demonstra
um interesse comum, que é o alívio de seus sofrimentos e a busca do seu bem-
estar e da comunidade (FUKUI, 2007). Nos depoimentos, observou-se que a TC
favoreceu o estreitamento de vínculos saudáveis entre a equipe de profissionais
de saúde e a comunidade. Esses vínculos saudáveis devem ser entendidos, aqui,
como aqueles que nos ligam aos outros de maneira positiva e reforçam o
sentimento de pertença no grupo (BARRETO, 2008), como bem colocaram estas
colaboradoras:
À medida que as pessoas começam a freqüentar as rodas,
elas começam a fortalecer os seus vínculos [...] e à medida
que vão fazendo novos vínculos, vão abrindo algumas
defesas que eram muito difíceis. (Sandra)
[...] percebemos facilmente que onde tem essas rodas, tem
ocorrido uma interação, um aumento do vínculo entre a
própria equipe, equipe/comunidade, comunidade/equipe.
(Roseana)
É importante ressaltar que o vínculo é importante, não só porque favorece a
união do grupo, o engajamento e a participação das pessoas nas rodas de TC,
mas porque constrói relações mais solidárias. Antes da Terapia Comunitária, havia
muita dificuldade em se estabelecerem vínculos na prática profissional, como
relata Célia Maria:
Tínhamos uma dificuldade muito grande na prática de
consolidarmos essa aproximação, para que pudéssemos
estabelecer vínculo, manter relações mais solidárias com os
nossos usuários. (Célia Maria)
147
Vê-se, então, que as mudanças estão ocorrendo. De acordo com Eulina, a
TC não dá respostas de imediato, “as mudanças vão acontecendo de forma
silenciosa”.
Verificou-se, ainda, nos depoimentos dos colaboradores, que uma
melhora na auto-estima dos participantes das rodas de Terapia Comunitária. Boff
(2000, p.37) ressalta que a auto-estima é o sentimento, é a crença em si mesmo,
é a “capacidade de dar a volta por cima nas dificuldades quase insuperáveis, a
criatividade diante de situações de opressão coletiva que ameaçam o horizonte da
esperança”. Os colaboradores perceberam que as pessoas se tornaram mais
confiantes, mais decididas, passando a adotar outra postura em relação à vida,
como mostram estes discursos:
Os benefícios da Terapia Comunitária para a comunidade
são a possibilidade de resgatar a auto-estima, de se
perceber um ser humano potente, capaz de lutar pelos seus
direitos e de se perceber inteligente. (Célia Maria)
[...] potencializávamos a vivência, a experiência, a
resiliência. Trabalhar com a resiliência humana, “eu não sou
um pobre coitado”, então sou mais do que isso, tenho
potencialidades, pois sozinhos não somos nada. (Ana Maria)
É oportuno destacar que a resiliência é a capacidade que os indivíduos,
isoladamente ou com suas famílias e em comunidades, adquirem para superar as
dificuldades contextuais. Wlash (2005, p.4) afirma que ela é “um processo ativo de
resistência, reestruturação e crescimento em resposta à crise”. Portanto, a TC é
um espaço de promoção da resiliência, porquanto, com a partilha de experiências
de vida, os indivíduos reforçam a auto-estima (opinião que cada um tem de si) e
fortalecem os vínculos.
Pode-se, pois dizer que a Terapia Comunitária possibilita a transformação
ou a mudança de atitudes pessoais, profissionais e da comunidade, posto que
proporciona o estabelecimento e o fortalecimento de vínculos, a melhora da auto-
estima, promove a resiliência e contribui para práticas mais acolhedoras e
integralizadas nos serviços de saúde, levando os profissionais e a comunidade a
superar dificuldades e, conseqüentemente, a evoluir.
148
5.3 CONTRIBUIÇÕES PARA O SUS E A SAÚDE MENTAL EM BUSCA DA
INTEGRALIDADE NA ATENÇÃO BÁSICA.
Com a implantação do SUS, no cenário brasileiro, intensifica-se o processo
de reversão do modelo de assistência hospitalocêntrico, para o comunitário. O
modelo hospitalocêntrico enfoca o indivíduo e a cura, enquanto o modelo
comunitário, que tem como base a comunidade, valoriza o coletivo, buscando a
promoção da saúde e a prevenção do adoecimento. Essa transição foi fortemente
marcada pelos Movimentos da Reforma Sanitária e da Reforma Psiquiátrica
(CAVALHERI, 2002; LUISI, 2006).
Nessa perspectiva, como a cidade de João Pessoa está inserida nesse
contexto nacional, busca, por meio da TC, não capacitar seus profissionais de
saúde da ESF, para atuarem com pacientes portadores de transtorno mental,
visando proporcionar um instrumento de cuidado que, com outras práticas, amplie
a resposta do sistema de saúde para as necessidades dos usuários, mas também
favorecer um modelo de assistência comunitário. Com relação ao exposto, as
colaboradoras comentam:
A Terapia Comunitária é mais um instrumento, para
estarmos efetivamente construindo uma prática mais
integrada, uma prática que seja complementar às outras
práticas mais tradicionais, já fortemente instituídas. [...]
temos que lançar mão de várias práticas que nos
possibilitem dar respostas a muitas necessidades que o
usuário tem [...]. (Roseana)
A questão da desospitalização está aí. Precisamos dar
alternativas, para que essas pessoas tenham acesso. Acho
que a Terapia consegue fazer isso, ela é um espaço
complementar, e nós não estamos tirando os méritos da
Medicina curativa, do ponto de vista de Saúde Mental, é
algo a mais que temos a ofertar. (Célia Maria)
149
A Terapia Comunitária ela tem uma importância fundamental
nesse processo de reorganização do SUS, especificamente
aqui no projeto da gestão Ricardo Coutinho e Roseana
Meira. No sentido de que esta gestão vem tentando mudar
práticas de trabalho dos profissionais e fazer com que o
processo da equipe de Saúde da Família venha atender à
necessidade do usuário. (Márcia Rique)
A Terapia Comunitária é uma experiência que vem ocorrendo em
diversos estados brasileiros e em outros países. Destaque-se, aqui, que a gestão
municipal ampliou sua visão em relação a esse aspecto, uma vez que João
Pessoa foi um dos primeiros Municípios brasileiros a institucionalizar esse tipo de
terapia, cuja inserção na Atenção Básica de Saúde contribui para a organização
das ações de saúde no SUS e na Saúde Mental, dentro da atenção básica do
Município de João Pessoa, sendo reconhecida pelo Ministério da Saúde como
uma ferramenta de cuidado.
para perceber que o valor da Atenção Básica do PSF
está na vida da equipe, na forma de como ela se relaciona,
na forma de como ela atende o usuário. (Ana Vigarani)
[...] dentro do modelo de atenção que o Ministério da Saúde
preconiza, sabemos que precisamos estar discutindo a
questão da Saúde Mental junto à Atenção Básica, levando a
mensagem que a Saúde Mental é problema de todo mundo.
(Sandra)
A Terapia Comunitária é, pois, um instrumento valioso de intervenção
psicossocial na Saúde Pública, porquanto sua ação se volta para a promoção da
saúde e a prevenção do adoecimento. Tem como propósito perceber o homem e
seu sofrimento em rede relacional, ver além do sintoma, identificar não só a
extensão da patologia, mas também o potencial daquele que sofre, e fazer da
prevenção uma preocupação constante e uma tarefa de todos (BARRETO, 2008).
Essa ferramenta de cuidado vem se inserindo na atenção básica, com o
objetivo de tecer redes de atenção, de cuidado, de prevenção e de promoção de
saúde, e de viabilizar atendimento e encaminhamentos aos centros especializados
das situações graves de transtornos psíquicos, estimulando o envolvimento
multiprofissional da rede de atenção básica em Saúde Mental.
150
[...] com o processo de construção de vínculo, passamos a
estar sensíveis ao outro e a termos mecanismos de co-
responsabilização importante para a construção de uma
rede de saúde que trabalha com humanização. (Roseana)
É oportuno destacar que, no cenário brasileiro, uma política de
humanização da atenção e da gestão do SUS (humanizaSUS), que preconiza uma
nova relação entre os usuários e os profissionais de saúde, favorecendo um
trabalho mais coletivo, mais acolhedor e ágil, que busca respeitar a diversidade,
oferecendo um tratamento igualitário a todos. Sob essa perspectiva, Zampieri
(2001, p.75) enfoca que “a humanização tem como preocupação básica a
valorização do homem e busca o desenvolvimento de todas as potencialidades e
capacidades do indivíduo”. Com base nessa assertiva, pode-se dizer que a
Terapia Comunitária é um caminho que conduz à formação de um profissional
mais humanizado.
[...] nos solidarizamos e nos colocamos como sendo da
espécie humana de uma forma mais igual, de uma forma
menos prepotente, menos dono do saber, enfim, menos
egoístas... Um ser humano mais solidário, mais próximo do
outro, que se percebe dependente do bem-estar do outro.
(Célia Maria)
Contudo, é preciso compreender que o profissional não é o salvador da
pátria e, portanto, capaz de resolver toa espécie de problema que a ele se
apresente. Isso é desmistificado em grupo, quando, todos juntos, refletem sobre
possibilidades de buscar soluções no coletivo, de forma participativa e co-
responsável, num novo modelo de saúde comunitária, em que se devolve às
pessoas a capacidade de acreditar no seu potencial.
Não raras vezes, como já referido neste texto, devido à falta de um espaço
de escuta, os usuários passam a somatizar a depressão, o estresse, as
neoplasias, as dores de coluna, as gastrites, dentre outras, que se apresentam
como sinais do sofrimento emocional ou psíquico que está sendo vivenciado e que
o corpo expressa, razão por que buscam, muitas vezes, a terapêutica
medicamentosa como uma válvula de escape, na tentativa de resolver esses
problemas.
151
Na Terapia Comuniria, a palavra é o remédio para quem fala e para quem
ouve. Cada participante torna-se terapeuta de si mesmo, a partir da escuta das
histórias de vida que são relatadas, ou seja, cada um é co-responsável pela
superação dos desafios do dia-a-dia, despertando para a solidariedade e a
partilha. Assim, solidificam-se as redes sociais, a teia que une cada indivíduo da
comunidade, iniciando-se uma nova etapa, quando ele passa a ter recursos para o
encaminhamento e possível resolução dos seus problemas.
Os discursos de Célia Maria e de Roseana Meira trazem à tona a importância
da Terapia Comunitária como esse espaço de escuta para a comunidade:
Com a Terapia Comunitária, evitamos que o adoecimento
mental chegue ao ponto que precise estar tomando
medicamentos. Acho que, com a questão da modernidade,
foi se deixando de lado práticas que eram comuns em
outras gerações, de se estar conversando, escutando,
estabelecendo encontros solidários entre as pessoas, mas a
TC veio resgatar tudo isso. (Célia Maria)
Esperamos que este debate seja ampliado, para que a
Saúde Mental seja uma responsabilidade desde a Atenção
Básica porque, assim, iremos diminuir o número de
internações, o consumo de medicamentos e
proporcionarmos um acompanhamento ao paciente e não
simplesmente só encaminhá-lo, como normalmente o é feito.
(Roseana)
Em muitas das entrevistas, percebe-se que a TC é uma prática integrativa,
por ser uma ferramenta de cuidado que possibilita o atendimento às pessoas nas
suas várias dimensões, tanto biológica quanto emocional e social. De acordo com
Carvalho (2006, p.16),
a dimensão da integralidade em saúde não é única. A acepção
consensual é de que signifique o tudo. Costumo dizer que a
integralidade tem duas dimensões: a vertical e a horizontal. A vertical
inclui a visão do ser humano como um todo, único e indivisível. A
horizontal é a dimensão da ação de saúde em todos os campos e níveis.
Portanto, vale salientar que para a integralidade ser, efetivamente, posta
em prática, necessita da conscientização, do empenho e da participação de todos,
uma vez que uma rede de qualidade é composta pela integração de várias
pessoas: gestão, profissionais e comunidade.
152
Temos, portanto, um longo caminho a trilhar, mas a implantação da Terapia
Comunitária foi um grande passo de conquista e, como expressa a Professora
Ana Maria, da Universidade Federal da Paraíba – UFPB,
Se quisermos fazer integralidade no SUS, temos que
construir uma rede de qualidade [...] temos que entender o
SUS como um processo, o SUS não é algo totalmente
acabado, não, é algo que está em construção. [...], não
existe nada acabado, uma vida que encerrou, exalou o
último suspiro, esta vida aqui está encerrada, porque ela
não tem capacidade de um passo mais à frente. Mas todas
as coisas na nossa própria vida, o SUS, a TC, política são
etapas processuais. (Ana Maria)
Considerando as observações acima relatadas, evidencia-se que a TC vem
contribuindo para o fortalecimento das ações de saúde do SUS e da Saúde
Mental, em busca da integralidade na Atenção Básica, no Município de João
Pessoa, porque promove a quebra de paradigmas, disponibiliza um espaço de
escuta para a comunidade, estimula o envolvimento multiprofissional da rede de
atenção básica em Saúde Mental, capacita os profissionais para dispensarem um
atendimento mais acolhedor e integral, contribui para a formação de um
profissional mais humanizado, que busca atender às necessidades da população
e favorece uma melhor qualidade de vida para o indivíduo e a comunidade em que
ele se insere.
5.4 DESAFIOS APONTADOS
Todo processo em construção enfrenta desafios, e como a Terapia
Comunitária faz parte desse contexto, relacionaram-se algumas dificuldades, ou
melhor, desafios abordados nas falas das colaboradoras. O vocábulo desafio’,
como define o dicionário, pode ser entendido como uma provocação, mas, no foco
deste estudo, é algo que atrapalha o bom desenvolvimento de um processo, mas
que pode ser transposto.
153
Aponta-se, como um dos principais desafios, a falta de espaço físico
adequado, não como algo que impedisse a realização das rodas de TC, mas como
um fator que dificulta uma ação de qualidade por parte dos profissionais, pois, de
acordo com Barreto (2008), a TC pode ser realizada em qualquer lugar, até
debaixo de uma árvore.
Nunca encontramos casa para alugar com o tamanho que
seja compatível com a necessidade do trabalho da equipe.
(Márcia Rique)
Nosso maior desafio tem sido a conquista de um espaço
ideal [...]. Nem por isso deixamos de realizar os encontros,
mas até agora não conseguimos esse espaço. (Maria do
Socorro).
[...] quando não se tem um vínculo uma rede de apoio
construída, ficamos peregrinando atrás de um espaço. (Ana
Maria)
[...] ficam tentando encontrar locais na comunidade para
fazerem, mas nem sempre tem disponibilidade, pois
dificuldade de horário. (Sandra)
Outro desafio expresso em boa parte dos discursos foi a pouca divulgação
do trabalho de TC. Em relação a esse ponto, as colaboradoras se posicionaram da
seguinte forma:
A TC ainda tem um longo caminho a seguir, quanto à
divulgação, porque ainda é um trabalho novo, as pessoas
ainda não a conhecem muito. Vai ter que ter muita
divulgação, sensibilização, comunicação e informação a fim
de conseguirmos trazer isso para as comunidades com mais
afinidade. (Eulina)
Quanto à divulgação acho que podíamos divulgar melhor,
não sei exatamente como, mas ainda temos muitas pessoas
que não tem conhecimento da Terapia Comunitária,
inclusive profissionais de saúde. [...] acho que poderíamos
melhorar nesse sentido. (Sandra)
[...] quanto à divulgação, precisa de um maior investimento
isso em nível local, enquanto profissionais, na comunidade
através dos agentes de saúde, no atendimento diário porque
praticamente quem convida somos nós que estamos
154
fazendo a formação e algum colega que gosta e que se
identifica. (Maria do Socorro)
A pouca divulgação também é um desafio, procuramos fazer
isso através dos próprios profissionais, existe certa
divulgação, mas abertamente para a população realmente é
difícil. Na verdade essa gestão gasta poucos recursos para
divulgar, ela prefere gastar os recursos para efetivar as
obras [...]. (Márcia Rique)
É oportuno ressaltar que, para Barreto (2008), a função do terapeuta
comunitário é de suscitar a capacidade terapêutica do próprio grupo. Para isso,
não precisa ser um especialista, pode ser uma pessoa da própria comunidade, um
profissional de saúde, da educação, entre outros. Sua atuação deve estar voltada
para o crescimento humano e coletivo. Portanto, a Terapia Comunitária é um
espaço que possibilita ao terapeuta comunitário crescer com o grupo e fomentar a
descoberta dos recursos individuais e comunitários. Porém, nas leituras das
entrevistas, ficou evidente que algumas colaboradoras citam a não identificação
com a Terapia Comunitária e o descompromisso de profissionais como mais um
desafio. A esse respeito, Ana Vigarani refere:
Um grande desafio é por parte dos próprios terapeutas, pois
mesmo que você selecione, com todo carinho, faça
inscrição, que você tente selecionar dentro do perfil, mesmo
assim alguns terapeutas que não correspondem. (Ana
Vigarani)
Com a mesma linha de pensamento, têm-se as seguintes falas:
Outro desafio é com relação à adesão dos outros
profissionais que também não temos conseguido. (Maria do
Socorro)
[...] existem algumas equipes, mesmo de PSF, em que
médicos, enfermeiras ou alguns membros da equipe até
ACS não se identificam com a proposta. (Ana Vigarani)
...trazer os outros profissionais que ainda não estão nesse
processo para conhecer o projeto, conseguir ganhar esses
outros profissionais para que eles possam estar entendendo
a proposta e sendo aliados. (Célia Maria)
155
Vale destacar que, historicamente, os profissionais de saúde tiveram uma
formação voltada para o atendimento de doenças no estrito contexto biológico, o
que contribuiu para uma concepção fragmentada de saúde. Porém, com o
processo de construção do SUS, o desenvolvimento das ações de saúde passou a
ser orientado pelos seus princípios, quais sejam: o da universalidade, o da
eqüidade e o da integralidade.
Diante desse contexto, de acordo com a colaboradora Ana Maria, a quebra
de paradigmas é um dos pontos que favorecem a não adesão dos profissionais e
um desafio que não tem a ver com o comportamento da equipe ou do
profissional, mas também com o processo de formação dos profissionais e com o
processo de gestão, uma vez que tudo, todas as decisões vinham de cima para
baixo.
A equipe não adere, acho que não é nem a adesão da
equipe, é esse choque de visão, porque se acho que a TC é
uma coisa boba, é uma coisa a mais, está mexendo com a
minha visão de saúde-doença, e transformá-la não é tarefa
fácil. (Ana Maria)
Corroborando com Ana Maria, Célia Maria e Lino afirmam:
Um dos desafios é de se desnudar da concepção
fragmentada de saúde, do que se pensa sobre o que é
saúde, que não é uma coisa simplista, e guiar o processo de
trabalho baseado em uma concepção mais ampliada da
saúde. (Célia Maria)
O primeiro desafio é a questão do próprio terapeuta se
empoderar desse momento, dessa ferramenta. (Lino)
Vale ressaltar que, de acordo com Campos (2005, p. 11), “há muito que
se criticar e muito que se aprender com a tradição da Saúde Pública. Todo
pensamento comprometido com algum tipo de prática (política, clínica, sanitária,
profissional) está obrigado a reconstruir depois de desconstruir”. O Brasil, na
década de 1970, apresentava um modelo hegemônico: médico assistencial-
privatista, centrado na “demanda espontânea”, predominantemente curativo, que
reforçava a atitude dos indivíduos de procurar os serviços de saúde quando se
sentiam doentes (PAIM, 2003). Mas, com o processo de construção do SUS,
156
apresentou-se um elevado impacto, não somente por causa da substituição de um
modelo que não atendia às necessidades da população, mas também porque, foi
por meio dele, que se deu o início efetivo da participação da sociedade brasileira
na determinação de seus destinos vinculados ao Setor da Saúde. Isso contribuiu
para que a população não acreditasse mais em ações de saúde que não eram
eficazes para a sua realidade. Outros desafios citados por Eulina e por Célia Maria
foram com relação à descrença nos serviços que são oferecidos nos setores de
saúde e à participação da comunidade.
Uma das grandes dificuldades é a descrença do nosso
povo, as pessoas elas estão com tantos los feridos,
magoados, desacreditados, tantos sofrimentos nas famílias
[...]. (Eulina)
Também é um desafio fazer com que a comunidade
participe e venha fazer parte desses encontros, acredite
nesse movimento, por isso acho que tem que ser uma coisa
com muita seriedade, pois é uma experiência, é um
processo, portanto temos que passar muita credibilidade,
muito respeito, para que o processo se fortaleça, cresça e
dê certo. (Célia Maria)
Para o colaborador Lino,
a Terapia Comunitária tem uma linha de trabalho dentro da
Secretaria, mas ainda não está amarrada com a Saúde
Mental. (Lino)
Isso não condiz com o discurso de Roseana Meira, secretária de saúde do
Município de João Pessoa, uma vez que, de acordo com Márcia Rique e outras
colaboradoras, a TC está trabalhando em harmonia, em conjunto com a área de
Saúde Mental, inclusive mostrando resultados. As palavras de Ivoneide
corroboram com essa assertiva:
Temos ainda um déficit muito grande em relação à nossa
rede de Saúde Mental do Município de João Pessoa - PB,
mas a TC preenche uma parte desta lacuna, dessa rede
substitutiva, ela proporciona a escuta acima de tudo, da
história do dia-a-dia, da subjetividade do ser humano.
(Ivoneide)
157
No relato de Roseana Meira, ela expõe uma preocupação e, até mesmo,
um desejo como gestão:
Realmente os grupos não percam ou saiam do seu objetivo,
virem grupos religiosos ou grupos de auto-ajuda, pois o é
essa intenção, mas que eles tenham a capacidade de estar
avaliando para dar continuidade as discussões realmente
dos problemas que a comunidade traz. (Roseana)
Sabe-se que, para transpor esses desafios, a TC necessita de uma ação
entre gestão, profissionais e comunidade, pois, através dessa da ação dessa teia,
essa tecnologia de cuidado tenderá a crescer ainda mais.
Por fim, espera-se, com a identificação desses desafios, no que concerne à
TC, contribuir para a elucidação de outros estudos referentes a essa temática.
158
6
6 6
6 Considerações Finais
Considerações FinaisConsiderações Finais
Considerações Finais
159
Seja bem
“Seja bem“Seja bem
“Seja bem-
--
-vindo olê... lê, seja bem
vindo olê... lê, seja bemvindo olê... lê, seja bem
vindo olê... lê, seja bem-
--
-vindo ola... lá,
vindo ola... lá, vindo ola... lá,
vindo ola... lá,
paz e bem para você que veio participar...”.
paz e bem para você que veio participar...”.paz e bem para você que veio participar...”.
paz e bem para você que veio participar...”.
Com o interesse de conhecer a história da implantação da Terapia
Comunitária no Município de João Pessoa PB, escolheu-se investigar a sua
importância para o projeto político de organização das ações de saúde na atenção
básica, bem como suas contribuições e desafios.
Este estudo possibilitou conhecer a história da implantação sob as diversas
óticas dos colaboradores desta pesquisa e contribuiu, de maneira significativa,
para o crescimento pessoal e profissional, pois, em meio a risos e lágrimas, foi
possível vivenciar momentos de intensa aprendizagem.
Como já mencionado no início desta pesquisa, a Terapia Comunitária
constitui-se uma prática de efeito terapêutico, que visa à prevenção e ao
atendimento a grupos heterogêneos, de organização informal, que demonstram
um interesse comum para o alívio de seus sofrimentos e a busca de seu bem-
estar, o que contribui para uma melhor qualidade de vida. Sendo assim, auxilia na
construção de vínculos solidários, criando uma rede de apoio social e evitando a
desintegração social, porquanto a comunidade busca resolver os problemas que
estão ao alcance da coletividade (FUKUI, 2007).
Com respaldo no que foi exposto, pode-se afirmar que a Terapia
Comunitária veio fortalecer as ações de saúde na área de Saúde Mental, onde o
atendimento prestado ao usuário na atenção básica não estava suprindo as
necessidades da demanda. Contudo, vale salientar que a Terapia Comunitária não
se restringiu apenas à área de Saúde Mental, porque sua atuação hoje se amplia
no cenário da Saúde Comunitária (FERREIRA FILHA; DIAS, 2007).
Participaram desta pesquisa onze colaboradores que são envolvidos com a
Terapia Comunitária. Foram identificados na análise empírica elementos que
possibilitaram a construção dos seguintes eixos temáticos: Terapia Comunitária: o
sentido da história; Terapia Comunitária: promovendo mudanças, superação e
crescimento espaço de transformação, superação e crescimento; Contribuições
para o SUS e a Saúde Mental em busca da integralidade na Atenção Básica,
160
Contribuições para o SUS e para a Atenção Básica em busca da Integralidade e
Desafios apontados.
Nas narrativas, percebeu-se que a Terapia Comunitária se vem
consolidando, cada vez mais, como uma nova tecnologia de cuidado no SUS e na
Atenção Básica, o que favorece e desenvolve ações de promoção da saúde e
prevenção do sofrimento emocional. Também se constatou que ela vem se
constituindo uma ferramenta que cria espaços de escuta sensível, contribui para a
reflexão, gerando mudanças de atitudes que levam à transformação, em âmbito
pessoal, profissional, comunitário e de práticas nos serviços de saúde, promove a
melhora da auto-estima e a resiliência, a formação de vínculos entre os indivíduos
da comunidade e da comunidade com a equipe de saúde, contribui para práticas
mais acolhedoras e integralizadas nos serviços de saúde, favorecendo um
processo de superação e de crescimento dos profissionais e da comunidade,
contribuindo sobremaneira para a melhoria da qualidade de vida.
Dentre os desafios apresentados pelos colaboradores, destacaram-se a
falta de espaço físico e de divulgação, a identificação dos profissionais com a TC e
o compromisso com ela bem como a descrença e a participação da comunidade.
É oportuno destacar que, na perspectiva de Boff (2004, p. 13), o cuidado,
enquanto princípio inspirador de um novo paradigma de convivialidade”, deve
estar voltado para a preocupação com o outro, devendo, então enxergar, mais
profundamente, sua essência, atender as suas necessidades e, ao mesmo tempo,
potencializar dimensões profundas do ser humano. Logo, é inegável a contribuição
dessa ferramenta de cuidado para os profissionais de saúde, em especial, para o
fisioterapeuta e o enfermeiro, uma vez que o trabalho desses profissionais é
fundamental para as relações de cuidado.
Pelo exposto, espera-se, com este estudo, subsidiar e oferecer elementos
de estratégias para a implantação da TC em outros Municípios brasileiros e assim
contribuir para se ampliarem os conhecimentos e a disseminação desses
preceitos, ações e experiências aqui registrados sobre esse instrumento tão
importante, que é a Terapia Comunitária. Cooperando para a sua consolidação no
SUS, como uma possibilidade de cuidado ao sofrimento cotidiano das pessoas.
Referências
ReferênciasReferências
Referências
162
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