Renato Ramos Martini Álvaro Vieira Pinto: massas, democracia e nacionalismo na realidade nacional 45
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Estes pensadores alertavam para a oligarquização da política que o modelo
de 1891 nos estava legando:
Estavam, acima de tudo, desiludidos com a República, não por ela ter
arruinado a influência das oligarquias, mas, ao contrário, por ter permitido que
essa influencia se prolongasse indefinidamente no quadro das transações
regionais. Aspirando a organização da nação pelo poder, reagiram contra
“oligarquização” das instituições.(PECAUT, 1990, p.21).
Ademais, criticavam a constituição de 1891, enquanto obra ficcional, incapaz
de colocar no mesmo compasso realidade e teoria
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Alberto Torres, em 1914 já denuncia a artificialidade da nova ordenação
política. Em “O problema nacional brasileiro: introdução a um programa de
organização nacional”, publicado naquele ano, consta uma crítica áspera da
separação entre a política e a vida social. Para o autor:
A separação da política e da vida social atingiu em nossa Pátria, o
máximo da distância. A força de alheação da realidade a política chegou ao
cúmulo do absurdo, constituindo em meio de nossa nacionalidade nova,
onde todos os elementos se propunham a impulsionar e fomentar um surto
social robusto e progressivo, uma classe artificial, verdadeira superfetação,
ingênua e francamente estranha a todos os interesses, onde, quase sempre
e com maior boa fé, o brilho das fórmulas e o calor das imagens não
passam de pretextos para as lutas de conquista e a conservação de
posições. (TORRES, 1933, p.182).
Também Oliveira Vianna, Azevedo Amaral e Francisco Campos, criticavam a
inadequação das instâncias jurídico-políticas com a realidade do país. Basta nesse
caso, lembrar que Campos como teórico da Constituição de 1937 pretendia colocar
no mesmo compasso o “país legal” e o “país real”. (MEDEIROS, 1978).
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É interessante que o alerta para que a constituição americana não fosse transplantadas para a
realidade de povos que não tivessem interesses comuns e laços vicerais de coesão já tivesse sido
dado por Alexis de Tocqueville em 1840 com a publicação da Segunda parte da Democracia na
América: “Quando se examina a Constituição dos Estados Unidos, a mais perfeita de todas as
Constituições federais conhecidas, causa admiração, entretanto, a imensidão de conhecimentos
diversos e de discernimento que ela supõe naqueles que ela rege. O governo da união repousa
quase todo em ficções legais. A união é uma nação ideal que só existe, por assim dizer, nos espíritos,
e da qual só a inteligência descobre a extensão e os limites. (...) Tudo é convencional e artificial
nesse tipo de governo, e só pode convir a um povo a muito tempo habituado a dirigir, por si só, seus
negócios e no qual a ciência política desceu até os derradeiros extratos da sociedade (...). A
Constituição dos Estado Unidos assemelha-se a essas belas criações da indústria humana, que
cobrem de glória e bens os que a inventam, mas restam estéreis em outras mãos. (...) O pacto federal
não poderia ter existência longa se não encontrasse nos povos a que se aplica certo número de
condições que lhes tornem fácil a vida comum, simplificando a tarefa do governo. Desse modo, o
sistema federal não tem somente necessidade de boas leis para ser bem sucedido, é preciso ainda
que as circunstâncias o favoreça. Todos os povos que vimos confederar-se tinha um certo número de
interesses comuns, que formavam como que laços intelectuais de associação”. (TOCQUEVILLE,
1973, p. 217,218)