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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA – UEPG
EMANUELI PEREIRA
A MODELAGEM MATEMÁTICA E SUAS IMPLICAÇÕES
PARA O DESENVOLVIMENTO DA CRIATIVIDADE
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Educação, da Universidade Estadual de
Ponta Grossa UEPG, como pré-
requisito parcial para a obtenção do
título de Mestre em Educação, tendo
como orientador o Professor Dr.
Dionísio Burak.
Ponta Grossa, PR
2008
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2
3
Ao meu amor Elissandro, esposo querido,
companheiro em todos os momentos.
Dedico.
4
AGRADECIMENTOS
A Deus, que tantas vezes recorri e sempre fui atendida, ao me dar força, saúde e
inspiração durante o desenvolvimento deste trabalho.
Ao Professor Dionísio pelos ensinamentos e orientações e, principalmente pela
confiança em mim depositada.
Aos Professores Cleyton, Célia e Ademir pela disponibilidade em participar da banca e
pelas valiosas contribuições para com o trabalho.
Aos professores do programa por oportunizarem discussões e reflexões que
contribuíram com este trabalho.
Aos colegas de turma pelas discussões e trocas de experiências. Em especial à Bettina
e à Sabrina companheiras de viagens.
Ao amigo Tiago pelas contribuições prestadas e principalmente pelo incentivo.
Aos meus pais Edivaldo e Marilus que sempre valorizaram os meus esforços e a minha
dedicação. E ao meu irmão Acácio.
Ao meu irmão Emiliano pela recepção em sua casa e pela atenção quando eu estava em
Ponta Grossa.
5
A alegria não chega apenas no encontro do
achado, mas faz parte do processo da
busca.
Paulo Freire
6
SUMÁRIO
RESUMO..............................................................................................................................7
ABSTRACT..........................................................................................................................8
INTRODUÇÃO....................................................................................................................9
CAPÍTULO I......................................................................................................................15
ENSINO DA MATEMÁTICA, MODELAGEM E CRIATIVIDADE .........................15
1.1 ENSINO DA MATEMÁTICA.................................................................................15
1.2 CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO ........................................18
1.3 MODELAGEM MATEMÁTICA .................................................................................20
1.4 CRIATIVIDADE...........................................................................................................26
1.4.1 CARACTERÍSTICAS DO PENSAMENTO CRIATIVO ..........................................................30
1.4.2 INIBIDORES DA CRIATIVIDADE.....................................................................................33
1.4.3 A CRIATIVIDADE E A EDUCAÇÃO .................................................................................37
1.4.4 CRIATIVIDADE EM MATEMÁTICA.................................................................................44
CAPÍTULO II ....................................................................................................................48
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E ANÁLISES ...........................................48
2.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................................................................48
2.1.1 DOS PROCEDIMENTOS ..................................................................................................50
2.1.2 DOS TRABALHOS SELECIONADOS ................................................................................51
2.1.3 DOS ASPECTOS DE CRIATIVIDADE................................................................................53
2.2 DESCRIÇÕES E ANÁLISES .......................................................................................55
2.2.1 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘MODELAGEM MATEMÁTICA: UMA
PERSPECTIVA PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA NO ENSINO MÉDIO’ TEMA: QUADRA DE
ESPORTES
.............................................................................................................................55
2.2.2 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘MODELAGEM MATEMÁTICA NO
CONTEXTO DO ENSINO MÉDIO: POSSIBILIDADE DE RELAÇÃO DA MATEMÁTICA COM O
COTIDIANO’ – TEMA: CULTURA DA SOJA
.............................................................................65
2.2.3 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘A PRODUÇÃO DE DISCUSSÕES
REFLEXIVAS EM UM AMBIENTE DE MODELAGEM MATEMÁTICA’ – TEMA: FATURA DE ÁGUA
.............................................................................................................................................70
2.2.4 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘MODELAGEM MATEMÁTICA NO
CÁRCERE’ – TEMA: CONSTRUÇÃO CIVIL
..............................................................................80
CONSIDERAÇÕES E PERSPECTIVAS DE CONTINUDADE DA
INVESTIGAÇÃO ..............................................................................................................89
REFERÊNCIAS...............................................................................................................100
7
A MODELAGEM MATEMÁTICA E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O
DESENVOLVIMENTO DA CRIATIVIDADE
RESUMO
As discussões acerca da criatividade em âmbito escolar e mais particularmente o interesse
em estudar a criatividade em atividades de Modelagem Matemática, ensejaram a
elaboração desta investigação. Assim, centrou-se no estudo da criatividade em aplicações
de Modelagem Matemática em sala de aula. A questão norteadora da pesquisa é
: os
trabalhos desenvolvidos por meio da Modelagem Matemática, na perspectiva da
Educação Matemática adotada, favorecem o desenvolvimento da criatividade? Em função
da questão principal e outras questões norteadoras da investigação os seguintes objetivos se
fazem presentes: identificar e analisar aspectos relativos à criatividade presentes em
atividades que utilizaram a Modelagem Matemática como metodologia de ensino e de
investigação, descritas em algumas dissertações desenvolvidas em Programas de Pós-
Graduação de universidades brasileiras e produzir indicadores sobre a relação Modelagem
Matemática e Criatividade. A pesquisa foi desenvolvida numa abordagem qualitativa com
análise de trabalhos acadêmicos (dissertações) orientados por Barbosa, Burak e Caldeira,
autores que, segundo Klüber (2007), harmonizam-se em vários aspectos em relação à
Modelagem Matemática, que leva em conta além da Matemática, outras áreas do
conhecimento. Caracteriza-se como um estudo bibliográfico ou documental, com
delineamento de pesquisa metaanalítica que, para Fiorentini e Lorenzato (2006), constitui-
se numa revisão sistemática de outras pesquisas, visando realizar uma avaliação crítica das
mesmas e/ou produzir novos resultados ou sínteses a partir do confronto desses estudos,
transcendendo aqueles anteriormente obtidos.
Com o intuito de abordar a criatividade em
seus vários aspectos, identificados nas descrições das dissertações selecionadas, foram
listados descritores provenientes da literatura, que se configuram como fatores que
remetem à criatividade. Ao final da investigação destacamos como resultados que
a
liberdade de ação dos estudantes e a tarefa na perspectiva heurística, dentre outras, são
fundamentais para possibilitar o desenvolvimento da criatividade em sala de aula numa
atividade de Modelagem Matemática. Esses aspectos dependem em grande parte da
postura adotada pelo professor durante o desenvolvimento da atividade. Salienta-se ainda
que a Modelagem Matemática, ao abordar situações da realidade dos estudantes, pode
despertar maior interesse pela Matemática e, conseqüentemente, proporcionar o
desenvolvimento de habilidades relacionadas à criatividade em Matemática.
Palavras-chave: Educação Matemática, Ensino-Aprendizagem, Modelagem Matemática,
Criatividade.
8
THE MATHEMATICAL MODELING AND ITS IMPLICATIONS FOR
THE DEVELOPMENT OF THE CREATIVITY
ABSTRACT
The discussions around the criativity in the schoolar scope and particularly the interest in
studying the criativity into Mathematical Modeling tasks encouraged the elaboration of the
present investigation. Therefore, this research focused on the study of the criativity into
Mathematical Modeling applications inside classroom. The question around research is:
Do the tasks developed through Mathematical Modeling in the perspective Maths
Education adopted favor the criativity’s development? In function of main question and
other around this investigation, the following aims get presents: identify and analise
aspects relating to the criativity present in tasks made use in Mathematical Modeling as a
learning methodology and investigation described in some papers developed in Brazilian
universities Post-Graduation Programs, and produce indicators about Mathematical
Modeling relation and Criativity. The present research was developed into a qualitative
approach through the analysis of academics researches (papers) advised by Barbosa,
Burak, and Caldeira, writers that according to Klüber (2007), are harmonyzed in many
aspects in relation to Mathematical Modeling, that take part beyond Mathematics itself and
other knowledge areas. It characterizes as a bibliographic or documental study with an
outline from meta analytic research. According to Fiorentini and Lorenzato (2006) it
constitutes a sistematic review from other researches that carries out a critic evalluation
and produces new results or synthesis up to these studies confront beyond those scored.
Through the sense to approach the criativity in its various aspects, it was identified in the
selected papers descriptions describers from literature that drawn how factors refer to the
criativity. On the final of the investigation it was pointed out how the results as the
student’s freedom of action and the task in the heuristic perspective beyond other, are
fundamentals in order to possibility the criativity development inside classroom in a
Mathematical Modeling task. These aspects depend on great part of attitude adopted by the
teacher during the task. Furthermore, the Mathematical Modeling in approaching situations
from student’s reality may arouse major interest by Mathematics and as a concequence
supplying the abilities development related to the criativity in Mathematics.
Key-words: Mathematic Education, Teaching Learning Process, Mathematical Modeling,
Criativity.
9
INTRODUÇÃO
Atualmente as pesquisas em Educação Matemática têm enfatizado aspectos, que
não somente os relativos à Matemática, considerados importantes para o seu ensino.
Fiorentini e Lorenzato (2006) explicitam que a Educação Matemática “caracteriza-se como
uma práxis que envolve o domínio do conteúdo específico (a matemática) e o domínio de
idéias e processos pedagógicos relativos à transmissão/assimilação e/ou à
apropriação/construção do saber matemático escolar” (p. 5). Assim, depreende-se o caráter
social, psicológico, filosófico e histórico do ensino da Matemática.
Kilpatrick (1996, p. 118) afirma que “enquanto a Educação Matemática for uma
Ciência, ela será uma Ciência Humana. Se for vista como campo acadêmico mais do que
uma disciplina, será um campo que repousa numa variedade de outras disciplinas [...] das
Ciências Sociais”. Da mesma forma Wain (1978), citado por Rius (1989), salienta que a
Educação Matemática é sustentada, por uma parte, da matemática e, por outra, dos
diversos aspectos teóricos que se ocupa a Educação.
Nesse sentido, entendemos a Educação Matemática fundamentada nas Ciências
Humanas e Sociais, interdisciplinar pois, conforme Rius (1989), estabelece relações entre
áreas do conhecimento como a Filosofia, a Psicologia, a Sociologia e a Matemática, entre
outras. Logo, o educador matemático deve estar atento às diferentes áreas que compõem a
Educação Matemática não podendo, no processo, considerar apenas a Matemática.
Fiorentini e Lorenzato (2006) relacionam a Educação Matemática, além dessas
citadas, com a História, a Antropologia, a Semiótica, a Economia e a Epistemologia, para
eles áreas que também prestam sua colaboração. Os autores argumentam que é uma área de
“inúmeros e complexos saberes, na qual apenas o conhecimento da Matemática e a
10
experiência de magistério não garantem competência a qualquer profissional que nela
trabalhe” (p. 5).
Em conseqüência disso é importante considerar, no ensino da Matemática, fatores
que possam contribuir para a formação intelectual e social do educando, isto é, desenvolver
habilidades que o permitam agir ativamente na sociedade. A criatividade é uma dessas
habilidades que deve ser levada em consideração na formação dos estudantes. Essa
afirmação encontra respaldo nos Parâmetros Curriculares Nacionais (Ensino Fundamental),
que inferem:
[...] a Matemática pode dar contribuição à formação do cidadão ao desenvolver
metodologias que enfatizem a construção de estratégias, a comprovação e
justificativa de resultados, a criatividade, a iniciativa pessoal, o trabalho
coletivo e a autonomia advinda da confiança na própria capacidade para
enfrentar desafios (BRASIL, 2001, p. 27) (grifo nosso).
Sobre a formação do estudante, os Parâmetros Curriculares Nacionais (Ensino
Médio) salientam que a Matemática pode contribuir para:
[...] formar no aluno a capacidade de resolver problemas genuínos, gerando
hábitos de investigação, proporcionando confiança e desprendimento para
analisar e enfrentar situações novas, propiciando a formação de uma visão ampla
e científica da realidade, a percepção da beleza e da harmonia, o
desenvolvimento da criatividade e o de outras capacidades pessoais (BRASIL,
1999, p. 82) (grifo nosso).
Pode-se apontar inicialmente que os Parâmetros Curriculares Nacionais colocam
como elemento na formação dos estudantes o desenvolvimento da criatividade. Assim, é
fundamental que as escolas e os professores propiciem atividades que possam colaborar
para o desenvolvimento do potencial criativo. Outro aspecto importante que também
consta nesse documento é o desenvolvimento de metodologias que enfatizem criação de
estratégias, trabalho coletivo, autonomia, hábitos investigativos, entre outras habilidades.
Na concepção de Educação Matemática, que acolhe várias áreas das Ciências
Humanas para contribuir no processo ensino-aprendizagem, é que alguns pesquisadores
entendem a Modelagem Matemática. Essa metodologia para o ensino da matemática busca
11
dar significado ao conteúdo matemático aprendido em sala de aula e relacionar com a
Matemática presente no dia-a-dia, bem como tornar o ensino da Matemática mais
dinâmico. Deve-se acrescentar ainda que os conteúdos matemáticos abordados durante a
aplicação da Modelagem Matemática surgem das necessidades de resolução das situações
decorrentes do desenvolvimento da atividade.
Klüber (2007) analisou pesquisas de autores que trabalham com a Modelagem
Matemática. Para ele, os que têm uma preocupação maior com a Educação Básica são:
Barbosa, Burak e Caldeira. Além de entenderem que a Modelagem Matemática deve
centrar-se na pesquisa, na investigação e na descoberta, Barbosa (2001, 2004), Burak
(1992, 1998, 2004) e Caldeira (2004, 2007), salientam que esta deve partir de situações do
cotidiano e/ou do interesse dos estudantes.
Nesta dissertação, o nível escolar que se tem por objeto é a Educação Básica, na
qual a preocupação maior é com o processo e com a construção do conhecimento pelo
estudante, além dos diferentes aspectos que se fazem presentes e que não podem ser
compreendidos, exclusivamente, no âmbito da Matemática, sejam eles de ordem pessoal,
pedagógica, psicológica, social e outras. Em razão desses aspectos, os autores escolhidos
foram aqueles que têm produzido trabalhos no âmbito da Educação Básica. Além disso,
foram aqueles em que os trabalhos apresentam descrições sobre a dinâmica do
desenvolvimento da Modelagem Matemática. Pode-se então, ensejar a hipótese de que uma
forma de trabalho mais livre, mais dinâmico e mais significativo para o estudante, como o
proposto na metodologia de ensino fazendo uso da Modelagem Matemática na visão dos
autores citados, possa favorecer o desenvolvimento de aspectos relacionados com a
criatividade no ensino de Matemática.
Como existem trabalhos em que constam descrições de aplicações de Modelagem
Matemática em sala de aula, orientados e desenvolvidos pelos autores citados e, optou-
12
se por analisar essas descrições buscando evidenciar aspectos que propiciaram o
desenvolvimento do potencial criativo dos estudantes no decorrer da atividade de
Modelagem.
Dessa forma, esta investigação tem como objetivos: identificar e analisar aspectos
relativos à criatividade presentes em situações de ensino que utilizaram a Modelagem
Matemática como metodologia de trabalho e de investigação, descritas em algumas
dissertações desenvolvidas em Programas de Pós-Graduação de universidades brasileiras e
produzir indicadores sobre a relação Modelagem Matemática e Criatividade.
A questão central a ser respondida é: os trabalhos desenvolvidos por meio da
Modelagem Matemática, na perspectiva da Educação Matemática adotada, favorecem o
desenvolvimento da criatividade?
Outras questões norteadoras da investigação permitem manter o foco e os
objetivos propostos. São elas:
a Modelagem Matemática em si propicia o desenvolvimento
da criatividade? O que evidenciam os trabalhos acadêmicos acerca do espaço para o
desenvolvimento da criatividade no ensino da Matemática e sobre o papel da Modelagem
Matemática na abertura desse espaço? Qual o papel do professor e dos alunos nas
manifestações criativas, conforme relatos nos trabalhos acadêmicos de Modelagem? O que
os trabalhos acadêmicos evidenciam sobre o papel do ambiente no desenvolvimento da
criatividade?
O delineamento investigativo, em função da questão principal e dos objetivos
eleitos, centrou-se na metaanálise. Essa forma de delinear uma investigação contribui para
conhecer aspectos distintos das produções científicas. Nesse caso, particularmente, optou-
se por analisar quatro dissertações.
A fim de atender aos objetivos de pesquisa, organizamos o trabalho da seguinte
forma:
13
No primeiro capítulo são apresentados aspectos do ensino da Matemática e a
construção do conhecimento matemático. São apresentadas também as perspectivas de
Modelagem Matemática, como metodologias para o ensino da Matemática, que dão
sentido à Matemática escolar e do cotidiano. Os autores escolhidos para fundamentar o
entendimento de modelagem adotado são os seguintes: Burak, Barbosa e Caldeira.
Discutem-se as questões referentes à criatividade. É salientada a sua importância na vida
das pessoas, tanto em âmbito escolar quanto no dia-a-dia. São explicitados fatores que
visam abranger a criatividade em vários aspectos como, por exemplo, quanto à pessoa, ao
produto, ao processo e ao ambiente. As características do pensamento criativo também são
mencionadas. Um item é dedicado a abordar especificamente a Criatividade e a Educação,
no qual se faz uma analogia entre a criatividade e a construção do conhecimento, embasada
nos autores que tratam do assunto. É destacada a ação que o professor exerce, a qual pode
inibir ou favorecer a criatividade de seus alunos. São apresentadas algumas sugestões que
visam favorecer o desenvolvimento do potencial criador dos estudantes. Finalmente,
explana-se sobre aspectos relacionados à criatividade em Matemática.
O segundo capítulo aborda a metodologia utilizada para a pesquisa. É apresentada
a problemática e justifica-se a opção pela pesquisa metaanalítica. São tratados os critérios
de seleção para escolha dos trabalhos acadêmicos e mencionadas as dissertações
escolhidas. São elencados aspectos fundamentais de criatividade, abordados no capítulo I,
e, a partir disso, formulados quadros que contém os descritores que possibilitam conduzir
as análises para esses aspectos nos trabalhos de Modelagem selecionados. Apresentam-se
também as descrições dos trabalhos de Modelagem Matemática que constam nas quatro
dissertações escolhidas. Com base nos descritores formulados, são feitas análises em cada
descrição. Identifica-se nas descrições o que pode caracterizar criatividade e procura-se
justificar cada aspecto levantado.
14
O trabalho é finalizado com as considerações sobre as análises feitas no segundo
capítulo. Retorna-se aos objetivos e questões de pesquisa, procurando evidenciar o
atendimento dos objetivos e as respostas às questões levantadas. E, por fim, é elaborado
um quadro síntese sobre a relação entre criatividade e Modelagem Matemática e
explicitam-se as contribuições desta pesquisa para o processo ensino-aprendizagem de
Matemática e as perspectivas de continuidade do trabalho.
15
CAPÍTULO I
ENSINO DA MATEMÁTICA, MODELAGEM E CRIATIVIDADE
1.1 ENSINO DA MATEMÁTICA
A forma de conceber a Educação Matemática traz também implicações para a
forma de conceber o ensino e aprendizagem da Matemática. Alguns estudos de
Schliemann, Carraher e Carraher (1998) salientam que “a aprendizagem de matemática na
sala de aula é um momento de interação entre a matemática organizada pela comunidade
científica, ou seja, a matemática formal, e a matemática como atividade humana, [...]
porque o que interessa nessa situação é a aprendizagem do aluno” (p. 12).
Com isso, depreende-se que a matemática escolar deve se constituir num
momento de interação entre a Matemática científica e a Matemática do cotidiano dos
estudantes.
Delval (1998) também vem corroborar com esse ponto de vista. Para o autor, a
escola deveria partir dos problemas suscitados pelo estudante, capacitando-se para oferecer
soluções que tenham significados para ele. O autor exemplifica falando de alunos que têm
dificuldades no aprendizado escolar de Matemática, mas que se mostram capazes de, em
situações do cotidiano, fazer complexos cálculos exigidos pelas atividades que
desempenham.
Skovsmose (2007, p. 60) cita que “a aprendizagem pode estar associada com
escolas, sendo elas um importante lugar para aprender. Mas, muita aprendizagem ocorre
fora da escola. A aprendizagem é parte da vida diária. A aprendizagem ocorre em empresas
e em locais de trabalho”. Nesse sentido, o autor coloca que é preciso considerar o papel da
Educação Matemática como tendo lugar em locais formais e informais.
16
Outra forma de conceber o processo ensino-aprendizagem é aquele em que o
professor se preocupa apenas com a Matemática em si, ao exigir quase que exclusivamente
dos alunos a formalização e o rigor matemático
1
e, dessa forma, distancia a Matemática
enquanto Ciência da Matemática Escolar. Nessa visão, o professor acaba por adotar uma
prática que, conforme Lins (2005), volta-se para aspectos internalistas da Matemática, que
é teórica e abstrata, prioriza as estruturas matemáticas e não abre espaço para outros
aspectos, é unidimensional. Dessa forma, não tem nenhuma familiaridade com a
Matemática do dia-a-dia, o que desencadeia um processo de estranhamento entre essas
duas Matemáticas.
Concordamos com Medeiros (2005) quando ela argumenta que a Matemática, da
forma que vem sendo trabalhada em sala de aula, traz a idéia do edifício pronto, da obra
acabada, na qual a busca das soluções não é vivida com o aluno, sob o peso de uma
aparente clareza da exposição lógica e organização de seus termos. A autora complementa
expondo que:
A tão citada clareza da Matemática é aparente porque, do ponto de vista
psicológico, ela pode ser evidente para quem a constrói, mas não para quem
apenas acompanha a exposição do raciocínio alheio. A clareza não é imediata
sem um trabalho pessoal do aluno, sem o exercício sistemático do pensar (p.19).
O aluno não participará da construção do conhecimento matemático se o professor
apenas expuser os conteúdos de forma impessoal e sem contextualização. Em muitos
casos, os alunos não conseguem acompanhar o raciocínio do professor e isso pode causar
desinteresse pela Matemática, indisciplina durante as aulas, baixa estima dos estudantes,
desistência, entre outras conseqüências. E surgem sentimentos do tipo: “nunca conseguirei
1
Não quero menosprezar a formalidade e o rigor matemático. Concordo que esses devem ser apresentados
aos estudantes, mas não exigido de maneira inflexível. Um exemplo seria descontar pontos em uma avaliação
pelo fato do aluno não ter colocado adequadamente um mbolo de igualdade. O professor deve analisar
outros aspectos e acompanhar o raciocínio do aluno. O papel do professor é ajudar a corrigir equívocos de
maneira a potencializar a aprendizagem dos seus alunos.
17
entender Matemática”, “não sou inteligente o suficiente para isso”, “a Matemática é muito
difícil, e é para poucos”, que são comuns entre os estudantes.
No ensino da Matemática é comum observar aulas em que o aluno não é
convidado a questionar e refletir sobre o conteúdo que é trabalhado. O professor se limita a
explicar o conteúdo, mostrar alguns exemplos e solicitar aos alunos que resolvam longas e
repetitivas listas de exercícios que, em muitos casos, mudam apenas os números. Esse tipo
de atividade pode inibir o desenvolvimento da autonomia, de uma visão mais crítica e, em
conseqüência, a criatividade dos alunos, bem como, pode contribuir para a apatia e o
desinteresse com relação à Matemática já que, dificilmente, têm oportunidade de refletir ou
questionar.
É possível que o indivíduo se limite a aprender enunciados de maneira mecânica
(o que representa apenas uma atividade motora de nível muito elementar), sem
uma construção pessoal e sem que os conceitos a que esses enunciados se
referem tenham ligação com outras idéias espontâneas do sujeito.
(DELVAL,
1998, p. 157)
Assim, concordamos com Delval, quando explicita que:
O sujeito pode repetir uma fórmula, uma lei ou um conceito em toda sua
exatidão e não ser capaz de entender absolutamente nada de seu significado. Esse
tipo de aprendizado terá pouquíssima utilidade, porque o sujeito não será capaz
de aplicá-lo a situações reais fora da escola e das situações de prova. O indivíduo
que desenvolve a capacidade de pensar e de encontrar soluções para os
problemas é aquele que realmente aprende a aprender e que pode buscar seus
próprios conhecimentos. (DELVAL, 1998, p. 163)
Por outro lado, um professor que orienta a sua prática pedagógica, em uma visão
de Educação Matemática alicerçada não somente pela Matemática, mas pelas diversas
áreas citadas anteriormente, promove uma formação mais abrangente para o estudante.
Torna-o mais reflexivo, capaz de perceber uma situação sob várias perspectivas, mais
crítico e, dessa forma, capacita-o a agir ativamente na sociedade e contribuir para o
desenvolvimento dessa mesma sociedade.
18
Com essa visão de prática em sala de aula, o professor proporcionará um ensino
diferenciado, preocupando-se com a formação do estudante como cidadão consciente e
participante. Adotapráticas de respeito ao educando, respeito aos conhecimentos que ele
possui, às suas experiências de vida, às suas dúvidas e questionamentos, às suas opiniões e
vontades, sempre em uma perspectiva crítica.
Nas aulas de Matemática, o professor dará oportunidade e tempo para os alunos
pensarem e discutirem soluções para determinados problemas. Intervirá quando necessário
e de maneira positiva, ao fazer comentários que os levem a refletir e a pensar de maneira
diferente. Por agir dessa forma, o professor criará um clima de confiança e respeito em sala
de aula, ajudará os alunos a terem mais interesse e autoconfiança em Matemática. Em
conseqüência disso, o professor pode contribuir para o desenvolvimento do potencial
criativo de seus alunos, que é um dos focos desta dissertação e que será aprofundado no
capítulo que trata da criatividade.
1.2 CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO
A Educação Matemática, constituída por diversas áreas do conhecimento,
considera todos os fatores que são importantes para um desenvolvimento individual e
social do estudante. Nesse sentido, ela tende a colocar a Matemática a serviço da
Educação, ou seja, a Matemática como um meio de inserção social, servindo de
instrumento para exercer a cidadania de maneira plena. Isso vai ao encontro de uma das
propostas contidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais que “a compreensão da
Matemática é essencial para o cidadão agir como consumidor prudente ou tomar decisões
em sua vida pessoal e profissional” (BRASIL 1999, p. 80). Dessa forma, abordaremos
neste item a construção do conhecimento matemático do educando de acordo com o que
pressupõe a Educação Matemática.
19
Uma visão que melhor explicaria a construção do conhecimento matemático, por
parte dos estudantes, é o construtivismo denominado piagetiano, inspirado na teoria de
Jean Piaget. Segundo Monereo (1998), nesse tipo de construtivismo “o mecanismo que
favorece a construção, a assimilação-acomodação de esquemas cognitivos, é individual, e
os métodos instrucionais que podem beneficiar a ação desse mecanismo são a exploração e
o descobrimento do entorno físico” (p. 38).
Chiarottino (1980) destaca que, na teoria de Piaget, um esquema é aquilo que é
generalizável numa determinada ão. A autora salienta que a construção de esquemas se
explicaria pelo processo de adaptação, com seus dois pólos complementares: assimilação e
acomodação. A assimilação consiste em uma incorporação dos objetos aos esquemas de
ação do sujeito. Os esquemas são passíveis de modificação, e essa modificação é chamada
de acomodação dos esquemas. Dessa forma, “a aprendizagem implica em qualquer
situação, uma estruturação no sentido de uma assimilação do dado aos esquemas ou às
estruturas mentais, ou seja, à uma atividade dos sujeitos” (p. 94).
Ainda para a autora, a inteligência “se constrói a partir da troca do organismo com
o meio através das ações do indivíduo. Isso significa que a ação é o centro do processo e
que o fator social ou educativo se constitui numa condição do desenvolvimento” (p. 95).
Ainda, nessa mesma perspectiva, Delval (1998) explicita que os sujeitos fazem um
trabalho pessoal e criativo na construção do conhecimento e, portanto, sua aprendizagem
está longe de ser uma mera repetição do que lhes é transmitido.
A fim de complementar o dito anterior destaca-se que
[...] uma situação de aprendizagem é tanto mais produtiva quanto o sujeito é
ativo (ser ativo cognitivamente não se reduz, bem entendido, a uma manipulação
qualquer; pode haver atividade mental sem manipulação, assim como haver
passividade com manipulação) e que ela lhe fornece a ocasião de encontros
possíveis mais apropriados em função do nível de seus esquemas com o real
físico e com um interlocutor (INHELDER, 1977 apud BECKER, 1993, p. 26).
20
Delval (2001, p. 79) assinala que “o construtivismo é uma posição epistemológica
e psicológica e que não se trata de uma concepção educacional [...]. O construtivismo
explica como se formam os conhecimentos, enquanto a educação é uma prática social que
busca formar indivíduos que possam desenvolver-se e adaptar-se à sociedade que lhes
coube viver”. O autor salienta ainda que:
[...] o construtivismo ajuda-nos a entender o que acontece no interior do sujeito
quando elabora novos conhecimentos. Por isso, pode ser uma teoria útil para
explicar os efeitos que as práticas educacionais têm, mas não pode prescrever de
nenhuma maneira o que se deve fazer, o que depende de ocasiões sociais. Pode
ajudar-nos a compreender por que os sujeitos não entendem algumas coisas ou
entendem de maneira diferente de como tentamos ensiná-las. O que propõe é que
o sujeito precisa construir seus conhecimentos e que não podemos dá-los já
construídos (p.79).
Com base nessas reflexões do ensino da Matemática na perspectiva da Educação
Matemática assumida, com vistas à construção do conhecimento matemático por parte do
aluno é que apresentamos a Modelagem Matemática, como uma metodologia para o ensino
da Matemática.
1.3 MODELAGEM MATEMÁTICA
Sabe-se que a Matemática está presente em muitas situações do dia-a-dia, como
por exemplo, num planejamento financeiro familiar, em compras num supermercado, no
ato de cozinhar, entre outros. Skovsmose (2007, p. 213) ressalta que “não podemos pensar
sobre nós mesmos como seres sociais, sem operar com matemática”. Porém, o autor
argumenta que “a tradição matemática escolar nos impede de ver a matemática em
operação em situações do cotidiano, apenas porque não tanta matemática escolar nessas
situações. Nenhuma simples equação é resolvida”. Assim, é comum ver muitas pessoas
que não percebem a Matemática em seus afazeres diários.
21
Dessa forma, expomos dois fatores importantes a observar no ensino da
Matemática, citados por Lins (2005): 1º) o distanciamento entre a Matemática da sala de
aula e a que está presente na vida das pessoas e; 2º) a aprendizagem da Matemática seguida
de suas aplicações.
A preocupação de Lins (2005) com o distanciamento entre a Matemática escolar e
a do cotidiano se constitui em preocupação dos educadores matemáticos faz alguns anos.
Essa preocupação manifestada tem ensejado estudos e pesquisas em relação a
metodologias para o ensino da Matemática. Entre as várias tendências metodológicas
surgidas a partir dessa preocupação destaca-se, entre outras, a Modelagem Matemática.
Neste trabalho, a Modelagem Matemática é entendida como uma metodologia
para o ensino da Matemática que vem dar significado à Matemática escolar e à do
cotidiano dos alunos. E, ainda, os conteúdos matemáticos abordados surgem das
necessidades de resolução das situações decorrentes do desenvolvimento da atividade.
Serão expostos os autores que abordam a Modelagem
2
em uma perspectiva
voltada para a Educação Básica. De acordo com Klüber (2007), são eles: Burak, Barbosa e
Caldeira.
Klüber (2007) salienta que a Modelagem Matemática, nas concepções de Barbosa,
Burak e Caldeira, tende a romper com uma visão de cunho positivista encontrada de
maneira mais acentuada em outros autores. Isso porque se volta “para aspectos
qualitativos, como a multiplicidade de respostas, as expectativas e valores dos sujeitos
(axiologia)” (p.102).
Assim sendo, Burak (1992, p. 62) define a Modelagem Matemática como “um
conjunto de procedimentos cujo objetivo é construir um paralelo para tentar explicar,
2
Usaremos Modelagem para designar Modelagem Matemática
22
matematicamente, os fenômenos presentes no cotidiano do ser humano, ajudando-o a fazer
predições e a tomar decisões”.
Na visão de Burak, dois princípios são importantes para Modelagem: 1) que o
tema trabalhado parta do interesse dos estudantes e; 2) que os dados coletados sejam
provenientes do ambiente em que se localiza o interesse do grupo ou dos grupos. Esses
princípios têm suas raízes nas Ciências Humanas e Sociais, principalmente pela influência
do método etnográfico. E, nessa forma de conceber, aceita a pluralidade de respostas e os
diferentes encaminhamentos que possam surgir no decorrer do processo.
Para Barbosa (2004, p. 3), a Modelagem Matemática “é um ambiente de
aprendizagem no qual os alunos são convidados a problematizar e investigar, por meio da
matemática, situações com referência na realidade”. Dessa forma, o autor associa o
ambiente de Modelagem com problematização e investigação. O primeiro refere-se ao ato
de criar perguntas e/ou problemas e, o segundo, à busca, seleção, organização e
manipulação de informações e reflexão sobre elas. As atividades não são separadas, mas
articuladas no processo de envolvimento dos alunos. Nela, podem-se levantar questões e
realizar investigações que atingem o âmbito do conhecimento reflexivo.
O professor pode ajudar o aluno perceber a importância da Matemática na sua
vida, na sociedade, e não encará-la como algo fora de seu contexto, que nunca conseguirá
entender. Cabe ao professor a tarefa de criar um ambiente propício para aprendizagem em
Matemática. Sobre isso, Skovsmose (2007, p. 203) salienta que “ensinar matemática
significa oferecer o melhor ambiente possível para essas construções (aqui ambiente deve
ser tomado amplamente, incluindo, também, as práticas comunicativas entre professor e
estudantes e todos os outros aspectos relevantes que possam facilitar construções)”.
Caldeira (2004) argumenta que o foco central da Modelagem está na pesquisa.
Para o autor, “os alunos serão os pesquisadores matemáticos, eles buscarão os problemas
23
para pesquisarem, e estes poderão vir de situações reais (de fato, os problemas devem vir
dessas situações)” (p. 3). Assim, neste processo a curiosidade e o desafio servem de
motivação para aprender Matemática.
Observa-se nas visões de Barbosa, Burak e Caldeira, que a Modelagem
Matemática centra-se na pesquisa, na investigação e na descoberta. Assim, é possível
afirmar que a aplicação da Modelagem em sala de aula, de acordo com a visão desses
autores, sugere uma atividade heurística, isto é, não se tem de antemão um caminho pré-
estabelecido a ser seguido. Nesse caso, é necessário que o grupo, o professor junto com os
estudantes, esteja disposto a pesquisar, com a adoção de uma postura investigativa e de
descobertas.
Nas pesquisas de Educação Matemática, outros autores, que não somente da linha
de Modelagem Matemática, chamam a atenção para importância da investigação e
aprendizagem em Matemática. Dentre esses autores, salientamos Braumann citado por
Ponte, Brocardo e Oliveira (2006, p. 19), os quais inferem que:
Aprender Matemática não é simplesmente compreender a Matemática já feita,
mas ser capaz de fazer investigação de natureza matemática (ao nível adequado a
cada grau de ensino). assim se pode verdadeiramente perceber o que é a
Matemática e sua utilidade na compreensão do mundo e na intervenção sobre o
mundo. assim se pode realmente dominar os conhecimentos adquiridos.
assim se pode ser inundado pela paixão “detetivesca” indispensável à verdadeira
fruição da Matemática. Aprender Matemática sem forte intervenção da sua faceta
investigativa é como tentar aprender a andar de bicicleta vendo os outros andar e
recebendo informação sobre como o conseguem. Isso não chega. Para
verdadeiramente aprender é preciso montar a bicicleta e andar, fazendo erros e
aprendendo com eles.
Barbosa (2004) enfatiza que, apesar das situações terem origem em outros campos
que não a Matemática, os alunos são convidados a usarem idéias, conceitos, algoritmos da
Matemática para abordá-las. Além de aplicarem conhecimentos adquiridos. Assim, a
Modelagem torna-se uma oportunidade para os alunos indagarem situações por meio da
Matemática sem procedimentos fixados e com possibilidades diversas de encaminhamento.
24
Dessa forma, “os conceitos e idéias matemáticas exploradas dependem do
encaminhamento que se sabe à medida que os alunos desenvolvem a atividade”
(BARBOSA, 2001, p. 5).
Percebe-se com isso que a Modelagem tem uma natureza “aberta” e, para Barbosa
(2001), isso impossibilita garantir a presença de um modelo matemático propriamente dito
na abordagem dos alunos. Eles podem desenvolver encaminhamentos que não passem pela
construção de um modelo matemático. Caldeira (2007) também explicita que não é
necessária a presença de um modelo do objeto no final do processo, pois o objetivo
principal não é chegar ao modelo. Para o autor, “o que importa é o processo que o
professor e estudante percorrem para alcançar uma situação de tomada de decisão ou
compreensão do objeto estudado, claro, fazendo uso da matemática” (p. 83).
Burak (2004) propõe etapas que se constituem em encaminhamentos para fins
didáticos:
1) escolha do tema: os estudantes podem sugerir temas de seu interesse, que
tenham curiosidade, ou ainda, alguma situação-problema da escola, da comunidade em que
vivem, entre outros;
2) pesquisa exploratória: nessa etapa o grupo deverá coletar dados e outras
informações necessárias para o desenvolvimento do trabalho, aprofundando-se sobre o
tema escolhido;
3) levantamento dos problemas: com as informações obtidas na etapa anterior, o
grupo formulará os problemas, de acordo com seus interesses;
4) resolução do problema e desenvolvimento da matemática relacionada ao tema:
para resolver os problemas levantados serão necessários conteúdos matemáticos, assim o
professor ajudará os alunos a rever conceitos e conteúdos estudados anteriormente ou
construir novos conteúdos;
25
5) análise crítica das soluções: a última etapa visa à análise crítica das soluções
encontradas. Os estudantes poderão confrontar os resultados obtidos com a realidade e
verificar se existe coerência com o que foi estudado e, neste caso, o professor tem a
oportunidade de discutir e aprofundar-se acerca das estruturas internas da Matemática.
Na perspectiva proposta por Burak (2004), o professor compartilha o processo de
ensino e, na medida em que faz isso, os educandos também se tornam co-responsáveis por
sua aprendizagem.
A partir do que foi abordado sobre Modelagem Matemática, compreende-se a
consonância com a Educação Matemática, preocupada não somente com a Matemática mas
com outros ramos do conhecimento, que visam a formação intelectual, social e cultural do
estudante. Assim teremos, de acordo com Caldeira (2004), uma aprendizagem da
Matemática partindo da realidade do aluno contextualizado sócio e culturalmente, que
proporciona múltiplas alternativas que o levem a desenvolver o pensamento lógico, a
criatividade, a aprender os conceitos e a construir estruturas matemáticas, enfatizando não
o conceito matemático, mas usando-os na compreensão da dinâmica da realidade social,
histórica e cultural. Para o autor:
A interação dos conhecimentos adquiridos pelos alunos em sua vivência, em
consonância com a ação educativa da escola, num processo contínuo e dinâmico
de elaborar e sistematizar e, acompanhada da discussão das implicações sociais,
proporcionarão aos alunos as condições para a sua atuação crítica no dia-a-dia.
(p. 1)
Como se pode notar pelos trabalhos de Barbosa (2001 e 2004), Burak (1992, 1998
e 2004) e Caldeira (2004 e 2007), essa perspectiva adotada pode favorecer, intuitivamente,
a criatividade. Por isso, o estudo sobre a criatividade ganha relevância nesta dissertação.
26
1.4 CRIATIVIDADE
Estimular a criatividade envolve não apenas estimular o indivíduo, mas também
afetar seu ambiente social e as pessoas que nele vivem. Se aqueles que
circundam o indivíduo não valorizam a criatividade, não oferecem o ambiente de
apoio necessário, não aceitam o trabalho criativo quando este é apresentado,
então é possível que os esforços criativos do indivíduo encontrem obstáculos
sérios, senão intransponíveis. (STEIN, 1974 apud ALENCAR; GALVÃO, 2007,
p. 109)
A criatividade é uma expressão bastante usada em diferentes contextos: na
família, na escola, no local de trabalho, entre outros. Sabe-se de sua importância na vida de
qualquer pessoa. Em nosso cotidiano, ter atitudes criativas frente às diversas situações
pode fazer a diferença. No trabalho, na escola, ou em qualquer outro ambiente, podemos
usar da criatividade para resolver problemas e propor novas idéias. Csikszentmihalyi
(1988, 1999), citado por Fleith (2005), sugere que a questão mais importante em
criatividade é ‘onde está a criatividade’ e não ‘o que é a criatividade’.
Virgolim (2007) descreve que os pesquisadores do assunto concordam que a
criatividade é de difícil definição. Segundo a autora as pesquisas sobre o assunto têm
enfocado as seguintes categorias: (a) a pessoa refere-se às características cognitivas,
qualidades emocionais e de personalidade, experiências ao longo da vida; (b) o produto
avalia-se se este é novo, tem valor e utilidade social e causa impacto; (c) o processo, diz
respeito às etapas do desenvolvimento de um produto criativo e; (d) o ambiente, elementos
ambientais envolvidos na promoção ou inibição de habilidades criativas, como fatores de
ordem física, social, cultural, etc. (FELDHUSEN e GOH, 1995 apud GONTIJO, 2007).
Halpern (1996), citado por Virgolim (2007, p. 22), acentua que “a criatividade não
é uma característica única que as pessoas têm ou não têm, mas um conjunto de processos
que acontecem em um contexto, envolvendo novidade em pelo menos um dos processos
que conduzem a resultados criativos”. Já Amabile (1996), citada pela mesma autora,
27
salienta que a definição conceitual de criatividade envolve dois elementos: 1º) que a
resposta ou produto seja algo novo, valioso, correto e útil para tarefa em questão e, 2º) a
tarefa deve ser heurística e não algorítmica; esta é quando o caminho para solução está
claro e bem estabelecido. Já a heurística é quando não se tem um caminho de solução claro
e prontamente identificável, os algoritmos devem ser desenvolvidos. Segundo Alencar e
Fleith (2003) é importante ressaltar aspectos como a originalidade e adequação de
respostas, ou seja, a tarefa deve possibilitar vários caminhos para solução dos problemas.
Torrance (1976) define pensamento criativo como o processo de perceber lacunas
ou elementos faltantes perturbadores, formar idéias ou hipóteses a respeito deles, testar
essas hipóteses e comunicar os resultados, possivelmente modificando e retestando as
hipóteses. Conceitos como curiosidade, imaginação, descoberta, inovação e invenção são
proeminentes nas discussões sobre significado de criatividade.
Nessa perspectiva é necessário destacar o que Torrance (1976) chama de
capacidades envolvidas no pensamento criativo. Essas capacidades dizem respeito a tomar
consciência de problemas, pensar possíveis soluções e submetê-las a prova. Se essas
capacidades permanecem não desenvolvidas ou o paralisadas, a possibilidade de alguém
enfrentar problemas da vida torna-se, também, limitada. Assim, para o autor, é possível
afirmar que a criatividade de uma pessoa é um valioso recurso para enfrentar as situações
distintas na vida cotidiana.
A criatividade é percebida por Urban e Jellen (1996), citados por Virgolim (2007,
p. 24), como um “processo não linear, multidimensional, que acontece parcial e
simultaneamente, dependente de variáveis de personalidade, como a motivação, assim
como de condições ambientais, tais como recursos materiais e obstáculos sociais”. Dessa
forma, o estudo de criatividade deve pautar-se no indivíduo, no seu trabalho e nos fatores
28
ambientais e sociais em que estão inseridos. Assim, esta pesquisa destaca aspectos internos
e externos ao indivíduo, que podem ser facilitadores ou inibidores da criatividade.
Segundo Lima (1998), a criatividade está ligada ao desenvolvimento cognitivo.
Para o autor, deve-se conciliar o diretivismo e o espontaneísmo. O primeiro refere-se aos
dados objetivos do desenvolvimento cognitivo (níveis, fases de desenvolvimento) e o
segundo refere-se à liberdade de escolha da solução. O resultado é invenção ou descoberta,
que para Lima pode ser original ou reproduzida, mas sempre autêntica do ponto de vista do
educando. Entende-se que a construção do conhecimento dá-se pela interação do sujeito
com o objeto. De forma análoga, entendemos que o desenvolvimento da criatividade é
possível por meio da participação ativa do indivíduo interagindo com a situação ou
problema.
O ambiente também exerce papel fundamental nesse desenvolvimento. Amabile
(2001), citada por Fleith e Alencar (2005, p. 2), salienta a importância de um “ambiente
social que favoreça o desenvolvimento de motivações, atitudes e habilidades e que crie
oportunidades de aprendizagem criativa e envolvimento com tarefas desafiadoras”. Nesse
sentido, compreendemos que a criatividade, assim como a construção do conhecimento, se
dá na interação que o sujeito estabelece com o seu ambiente.
Em concordância com o dito anterior, Alencar (2002) enumera três aspectos
fundamentais para o desenvolvimento da criatividade. O primeiro refere-se às
características próprias do indivíduo, o segundo às características do ambiente social e o
terceiro diz respeito ao uso de técnicas para estimular a criatividade:
1) preparação do indivíduo: entendida como a bagagem de conhecimento que o
indivíduo possui, sua dedicação, esforço, envolvimento com o trabalho e, ainda, a
persistência nas ações que deseja desenvolver. Segundo D’Ambrósio (2005), indivíduos se
destacam entre seus pares e atingem seu potencial de criatividade porque conhecem;
29
2) características do ambiente social: caracteriza-se como um ambiente que
favorece o indivíduo no uso de sua criatividade, um ambiente em que ele encontre apoio
ou, ao menos, respeito para com suas idéias, para que não seja alvo de críticas destrutivas
que possam bloquear a criatividade;
3) técnicas adequadas: considera-se técnicas adequadas aquela que podem
contribuir para o desenvolvimento da criatividade, um exemplo é a técnica Brainstorm
(tempestade de idéias).
Nas últimas décadas observa-se que vêm ocorrendo rápidas mudanças, tais como
tecnológicas, ambientais, entre outras, as quais, muitas vezes, são imprevisíveis. Assim,
apenas a aquisição de conhecimento pode tornar-se insuficiente ou inadequada para fazer
frente às necessidades tanto cotidianas como outras.
Por isso, faz-se necessário o desenvolvimento e a aquisição de outros
componentes que, neste trabalho, estão dirigidos para a criatividade que permite, inclusive,
mobilizar de diferentes maneiras os conhecimentos adquiridos. Entendemos ainda que a
escola e, mais particularmente, a sala de aula, além de ser um espaço de socialização e
produção do conhecimento, pode tornar-se efetivamente um ambiente propício ao
desenvolvimento da criatividade. Com isso, de acordo com Alencar (2002), o ensino terá
novos desafios, pois, além de ensinar, é preciso preparar o educando para questionar,
refletir, mudar e criar. Já que, para a autora, os indivíduos que fazem uso de suas
habilidades criativas, buscando a melhor solução dentre outras soluções para determinado
problema, acabam por se destacar entre os demais.
O dito anterior vem ao encontro do proposto pelos Parâmetros Curriculares
Nacionais pois “o aluno deve se sentir desafiado pelo jogo do conhecimento. Deve adquirir
espírito de pesquisa e desenvolver a capacidade de raciocínio e autonomia” (BRASIL,
2002, p. 267). Desafio, espírito de pesquisa, capacidade de raciocínio e autonomia são
30
conceitos que estão diretamente relacionados com a criatividade, como mostraremos no
decorrer do texto, além de serem aspectos que extrapolam a produção e a construção do
conhecimento e, não menos importantes em se tratando da formação integral do educando.
Assim, pode-se afirmar que desenvolver o potencial criativo dos estudantes é um dos
objetivos do ensino e o professor deve perseguir esse objetivo.
1.4.1 CARACTERÍSTICAS DO PENSAMENTO CRIATIVO
As características do pensamento criativo têm em Guilford (1950, 1975) seu
principal referencial. Esse autor, citado por autores como Alencar (2002), Torre (2005) e
Virgolim (2007), em seu Modelo de Inteligência, sugere pelo menos oito habilidades que
estariam na base da criatividade: sensibilidade a problemas, fluência, flexibilidade,
elaboração, complexidade, redefinição e avaliação.
A sensibilidade a problemas é a habilidade de ver problemas “onde” outros não
vêem; a fluência é a abundância ou quantidade de idéias diferentes sobre o mesmo
assunto; a flexibilidade é a capacidade de alterar o pensamento ou conceber diferentes
tipos de respostas; a originalidade é a capacidade de produzir idéias incomuns; a
elaboração é a quantidade de detalhes presentes em uma idéia; a complexidade refere-se
ao número de idéias inter-relacionadas que o indivíduo pode manipular de uma vez; a
redefinição é a habilidade de efetuar mudanças na informação; e a avaliação é o processo
de decisão, julgamento e seleção de uma ou mais idéias dentre um grupo maior de idéias.
Essas habilidades referem-se ao pensamento divergente, ou seja, a capacidade de gerar
novas respostas com encaminhamentos diferentes dos usuais. Este tipo de pensamento
opõe-se ao pensamento convergente que se resume apenas em reproduzir um conteúdo
com a possibilidade de uma única resposta correta.
31
O pensamento convergente faz-se muito presente no ensino, em particular da
Matemática. Na resolução de problemas matemáticos, o professor ensina aos alunos uma
maneira de abordar tais problemas e eles acabam por reproduzir o algoritmo que lhes foi
ensinado, sem procurar outras formas de resolução. Isso pode ser um inibidor da
criatividade dos estudantes, por isso é necessária uma postura em que o professor
incentive-os a terem também pensamentos divergentes.
Um aspecto fundamental para o processo criativo é a quantidade de informações
que o indivíduo possui sobre determinada área. Quanto maior o conhecimento, maior será
a riqueza e, a qualidade de informações que poderá sugerir. Alencar (2002) ressalta a
importância de dar condições ao indivíduo para expandir seu campo de conhecimento, as
suas experiências, estimulando o seu desejo de conhecer.
Boden (1999, p. 102) destaca a importância das analogias no processo criativo, ela
afirma que “a maioria dos movimentos criativos na ciência inclui o reconhecimento de
uma nova analogia entre campos anteriormente não relacionados”. Para Tschimmel (2003),
trata-se de um processo mental de associação de idéias, que permite estabelecer relações
novas, incomuns entre objetos e situações. Para a autora, alguém que produz muitas
analogias desenvolve uma grande capacidade em encontrar soluções inovadoras.
Outro fator importante a que pesquisadores têm dado bastante atenção, é a análise
da personalidade de indivíduos que se destacaram por produções criativas em diversas
áreas. Alencar (2002) aponta traços de personalidade de tais indivíduos: a autonomia
(independência); a flexibilidade pessoal e a abertura à experiência, isso implica também
tolerância à ambigüidade e habilidade de receber informações conflitantes; a
autoconfiança, iniciativa e persistência; sensibilidade, espontaneidade e intuição;
sensibilidade emocional e a bagagem de conhecimento, que também é fundamental.
32
A criatividade exige tanto sensibilidade quanto independência. Em nossa cultura,
sensibilidade é definida como uma virtude feminina, enquanto independência é um valor
masculino. Torrance destaca que em seus estudos são observados exemplos de crianças
que sacrificam sua criatividade a fim de manter sua “masculinidade” ou “feminilidade”
(TORRANCE, 1976).
Um aspecto determinante para o processo criativo é a forma como o indivíduo
enfrenta situações. Exemplo disso é quando um indivíduo se dispõe a estar diante de
situações novas e imprevisíveis e também quando existe a disposição de enfrentar
obstáculos e superá-los. Os testes, realizados por Torrance (1976), voltaram-se para isso.
Ele observou em estudantes criativos, uma pessoa que encontra prazer em vencer
obstáculos. Observou ainda que eles tinham necessidade de provar seu valor pessoal e
apresentar suas idéias. Outra característica marcante na vida desses indivíduos notáveis é
sua capacidade de enfrentar fracassos e frustrações.
Dessa forma, é importante observar os traços de personalidade de tal forma que o
indivíduo faça pleno uso de suas habilidades criativas. Alencar (2002), valendo-se de Von
Oech (1986), apresenta uma descrição de tais traços. Von Oech sugere o aprimoramento de
habilidades distintas relativas a quatro papéis:
Explorador de idéias - Muitas vezes, diante de um problema a resposta não
aparece de imediato. Um bom explorador de idéias busca por novos fatos e informações,
adquirindo e utilizando a bagagem de conhecimentos em busca de novas respostas. Deve
aventurar-se por vários caminhos não trilhados e desconhecidos, prestando atenção em
detalhes que possam conter pistas para chegar à solução.
Artista de idéias - Em várias situações, para encontrar a solução, é necessária a
transformação de informações disponíveis, fazendo adaptações e alterações, acrescentando
o que estiver faltando, eliminado o que estiver sobrando.
33
Juiz de idéias - Esse papel deve ser desempenhado numa etapa mais avançada do
processo de buscar soluções criativas. É a etapa de avaliar e julgar as múltiplas idéias
produzidas, antes de decidir pela que se considera melhor.
Guerreiro - Muitas são as barreiras que dificultam o desenvolvimento da
criatividade tendo em vista que a mudança e a inovação são vistas como ameaçadoras.
Tem sido regra em muitos contextos, seja na escola, no lar ou outros lugares, a rejeição às
novas idéias. Portanto, para que uma idéia não “morra” é necessário lutar por ela e não se
deixar vencer pelos obstáculos, que são refletidos com freqüência nos comentários que a
sociedade faz para matar uma idéia.
Apresentadas nesta seção as características da criatividade, passaremos agora a
tratar dos fatores que podem inibir o seu desenvolvimento.
1.4.2 INIBIDORES DA CRIATIVIDADE
Existem diversos fatores que podem inibir o desenvolvimento da criatividade.
Trataremos a seguir aspectos que podem se constituir em barreiras internas e externas ao
indivíduo. Também serão descritas algumas dificuldades enfrentadas por professores no
sentido de favorecer o desenvolvimento da criatividade dos educandos.
Alencar (2002) aponta alguns conceitos errôneos sobre a criatividade: 1) acreditar
que a criatividade é um dom que poucos indivíduos possuem; 2) que consiste numa
inspiração; 3) que depende apenas de características do próprio indivíduo; 4) que é uma
questão de tudo ou nada, ou seja, alguns são criativos e outros não; 5) que se manifesta
apenas nos trabalhos e produções dos grandes talentos artísticos e nas novas propostas de
inventores e cientistas.
34
Essas crenças em relação à criatividade, citadas pela autora, podem constituir-se
inibidores do desenvolvimento da criatividade dos estudantes. O professor deve sempre
procurar desmitificar aqueles tipos de conceitos e mostrar que o potencial criativo não está
fora do alcance deles.
Outro aspecto a ser considerado é a valorização do trabalho criativo. Boden (1999,
p. 82-83) argumenta que “as combinações originais precisam ter algum tipo de valor, pois
chamar uma idéia de criativa é dizer que ela não é apenas nova, mas interessante”. A
autora destaca ainda que julgamentos de valor, na maioria dos casos, são relacionados à
cultura, pois o que está sendo valorizado por uma pessoa ou grupo social pode ou não ser
valorizado, elogiado, preservado ou promovido por outro.
No contexto educacional podem ocorrer casos em que o professor não valoriza as
idéias criativas dos alunos, chegando até a menosprezá-las. Um dos motivos dessas
atitudes é que, segundo Alencar (2002), os professores estão preocupados e pressionados a
transmitir o conteúdo curricular e não encontram o tempo necessário para ouvir as
indagações de seus alunos, para aproveitar suas idéias e valorizar seus pontos de vista.
Dessa forma, os alunos acabam por perceber que comportamentos que levam à exploração
e à descoberta não são muito bem aceitos por seus professores, mas sim comportamentos
que levam ao reprodutivismo, que gera o conformismo e a passividade. Isso pode
contribuir para formação de barreiras internas à expressão criativa e para uma visão
limitada dos próprios recursos e habilidades. Essas barreiras são construídas no decorrer da
vida escolar e adulta.
Dentre as barreiras internas, que dificultam o aprimoramento de habilidades,
Alencar (2002) salienta algumas: apatia, que pode ser traduzida por uma descrença ou
desinteresse de aproveitar as próprias idéias; a insegurança; o medo de parecer ridículo ou
ter sua idéia alvo de deboches ou críticas; o medo do fracasso; os sentimentos de
35
inferioridade, ou seja, o indivíduo cultiva o hábito de se perceber em termos negativos,
como incompetente e incapaz, sentimento muitas vezes reforçado no ambiente em que
vive; e o autoconceito negativo. Na sala de aula é possível observar estudantes que
apresentam barreiras emocionais. Nas aulas de Matemática muitos estudantes não
conseguem compreender os conteúdos por possuírem um pré-conceito com relação à
disciplina.
É importante considerar o autoconceito positivo que, segundo Alencar (2002), é
um aspecto relevante para o desenvolvimento e aproveitamento do potencial criador. A
maneira como cada indivíduo se percebe, as suas crenças e sentimentos a respeito de si
mesmo e de suas capacidades, são formadas durante os primeiros anos de vida, sofrendo
grande influência de seus primeiros agentes socializadores (pais e professores). O
autoconceito afeta a personalidade do indivíduo e pode tanto restringir como favorecer o
desenvolvimento de seu potencial.
De acordo com Alencar (2002), cada um faz o que acredita que pode fazer.
Assim, caso o indivíduo perceba-se como uma pessoa capaz e competente, procura agir de
forma congruente a essa auto-imagem. Se, ao contrário, percebe-se com uma pessoa
incapaz, age de forma a corresponder a essa auto-imagem.
Segundo Torrance (1976), é necessário, para o desenvolvimento do autoconceito,
assumir riscos. Ele explicita que “uma pessoa não pode saber do que é capaz a menos que
teste seus limites. Assumir riscos é também importante na aquisição de aptidões e
conhecimentos” (p. 92-93). Crianças e adolescentes, na maioria dos casos, estão dispostos
a fazer coisas novas, tentar maneiras diferentes, correr riscos. O que acontece é que, por
diversos motivos, pais e professores tolhem essa característica das crianças e adolescentes.
Ser professor não é uma tarefa cil, pois, ao mesmo tempo em que é preciso
impor limites, é preciso também incentivar os alunos a serem independentes para não se
36
tornarem pessoas apáticas que não fazem nada por si só. Dessa forma, o bom senso deve
ser usado para saber que atitudes tomar perante diferentes situações.
Outra questão importante de ser mencionada é a curiosidade, que está ligada
diretamente ao fato de assumir riscos. Torrance (1976, p. 93) ilustra isso de uma maneira
muito interessante:
Curiosidade não é bem tratada em nossa sociedade. Ensinamos que curiosidade
matou o gato” e referimo-nos como “mera curiosidade ociosa”. Tem sido minha
observação, porém, que o gato curioso testa seus limites com muito cuidado e
cautela, e retira-se com a maior rapidez de uma situação perigosa. Tem sido
também minha observação que a pessoa curiosa nunca está ociosa. É fato,
porém, que na maioria das salas de aulas a criança corre um risco calculado toda
vez que faz uma pergunta incomum ou apresenta uma nova idéia pelo medo de
ser ridicularizada por seus colegas ou talvez por seu professor.
Dar atenção ao aluno, não ridicularizar suas perguntas e não deixar que os colegas
o ridicularizem, incentivar e colocar-se aberto para responder as questões levantadas, são
atitudes que o professor deve ter, a fim de que os alunos permaneçam curiosos. Dessa
forma, poderá tornar-se uma pessoa que pesquisa e que busca o conhecimento de forma
autônoma.
Freire (1996) também defende que os alunos exerçam sua curiosidade, porém com
certos limites. Ele argumenta que
[...] o bom clima pedagógico-democrático é o em que o educando vai
aprendendo à custa de sua prática mesma que sua curiosidade como sua
liberdade deve estar sujeita a limites, mas em permanente exercício. Limites
eticamente assumidos por ele. Minha curiosidade não tem o direito de invadir a
privacidade do outro e expô-lo aos demais. (p. 95).
Existem também as chamadas barreiras culturais. Alencar (2002) enumera
algumas: pressões sociais com relação ao indivíduo que diverge da norma, tendo em vista
que o processo de socialização conduz à uniformidade de comportamento; medo do
fracasso, que a pessoa é socializada no sentido de considerar prioridade a busca da
segurança, evitando riscos; necessidade de ser aceito, isso é observado em situações nas
37
quais crianças e adolescentes deixam de demonstrar o que sabem ou propor uma idéia
original, por medo de sansões de seus pares ou agentes socializadores; expectativa com
relação ao papel sexual, a idéia de que alguns traços de personalidade devem pertencer à
pessoa do sexo feminino (por exemplo, espontaneidade, sensibilidade e intuição) e outros
ao sexo masculino (como curiosidade e independência) podem limitar o comportamento
exploratório e o desenvolvimento em determinadas direções.
Alencar (2002) descreve algumas dificuldades que os professores encontram no
sentido de incentivar a criatividade dos alunos e encorajá-los a fazer uso de suas
habilidades. São elas: conteúdo e extensão do programa curricular, sobrando pouco tempo
ao aluno para explorar novas formas de pensamento; visão tradicional do ensino, cabendo
ao professor transmitir as informações, com ajuda do livro-texto, aos alunos; ênfase
exagerada na disciplina e bom comportamento do aluno, tendo em vista que, em muitos
casos, é desejado pelo professor um aluno obediente e atento, que não questiona, não
critica, não sugere novas alternativas e novas abordagens; baixas expectativas do professor
com relação ao aluno, ou seja, pouca confiança na capacidade do aluno de ser responsável,
independente e criativo.
1.4.3 A CRIATIVIDADE E A EDUCAÇÃO
Como foi mencionado no início do capítulo, o desenvolvimento da criatividade,
assim como a construção do conhecimento, dá-se através da interação do sujeito com o
ambiente em que está inserido. Dessa forma considera-se o ambiente escolar fundamental
para o desenvolvimento do potencial criativo dos estudantes.
Sobre o ensino e a criatividade, Torre (2005, p. 160) ressalta que:
38
O ensino criativo é de natureza flexível e adaptativa, isto é, leva em
consideração as condições do contexto e organiza a ação atendendo às limitações
e às capacidades dos indivíduos. Um ensino criativo não está no
desenvolvimento linear do que foi planejado, mas sim na utilização do plano
como ponto de referência e guia. A flexibilidade é uma característica
fundamental da criatividade atribuída tanto à pessoa (pessoa flexível) como ao
produto (variações ou diversidades de categorias). O método flexível é aquele
que se adapta às pessoas e ao contexto.
Tendo em vista a importância da criatividade no âmbito educacional, destaca-se o
papel do educador para o seu desenvolvimento. É necessário que o professor leve em conta
os fatores referentes à criatividade em sua atuação docente. Primeiramente é importante o
conhecimento sobre as características da criatividade, os fatores que favorecem o potencial
criativo dos educandos para que então, ao atuar em sala de aula, possa ter uma postura com
vistas ao favorecimento da criatividade.
Gardner (1999, p. 151) salienta que
o estudo da criatividade é basicamente interdisciplinar; além de enraizado na
psicologia, o estudioso da criatividade deve estar informado sobre epistemologia
(a natureza do conhecimento em diferentes campos) e sobre sociologia (os
modos pelos quais especialistas em vários campos chegam aos julgamentos).
Destaca-se a importância do educador ter clareza da construção do conhecimento,
não ficando apenas em âmbito teórico, mas avançar na compreensão de como essa
construção ocorre na prática. Ghedin (2004, p. 60) refere-se à construção do conhecimento
como “um processo de significação e de sentido que vamos construindo coletivamente”, e
não apenas um conjunto de informações que vamos acumulando”. O professor deve
observar o comportamento dos alunos, se o que aprenderam faz sentido para eles, se eles
conseguem relacionar conteúdos, fazer interações, descobrir padrões, entre outros.
Para Gardner (1999, p. 151), “os indivíduos não são criativos (ou são não-
criativos) em geral; eles são criativos em campos especiais de realização, e é necessário
que adquiram especializações nesses campos antes de poderem executar trabalhos criativos
importantes”. A época da escola é o momento de conhecimento e descoberta de si próprio,
39
de seus talentos, seus gostos, e assim, de fazer a escolha profissional. Nesse sentido
destacamos a importância do professor na formação de cidadãos, de pessoas realizadas
profissionalmente, que possam vir a contribuir com a sociedade.
Torrance (1976) destaca que a educação em um regime democrático deve ajudar
indivíduos a desenvolver plenamente seus talentos. Porém, os educadores não devem
esperar receitas prontas para o desenvolvimento da criatividade pois, conforme Alencar
(2002), o processo de produção de idéias e de resolução criativa de problemas deve ser
vivenciado.
Segundo Torrance (1976), sabe-se muito tempo que é natural para o homem
aprender criativamente. Porém, em âmbito escolar, pensa-se que é mais prático ensinar por
autoridade. No caso da Matemática, ao exigir que os alunos façam os exercícios da mesma
forma que foi apresentado pelo professor para assim chegar à resposta correta, sem abrir
espaço para sugestões e questionamentos, enquadra-se no exemplo de aprender por
autoridade. O ensino da Matemática deve ser conduzido de tal forma que as capacidades de
pensamento criativo se tornem importantes para construção do conhecimento matemático.
Martindale (1999, p. 165) explicita que “as produções criativas tendem a ocorrer
em contextos sociais estruturados e não no isolamento. Uma idéia criativa é em geral
definida como original e, em certo sentido, útil ou apropriada para situação em que
ocorre”. Assim, nota-se a importância da comunicação em sala de aula para o
desenvolvimento da criatividade. A comunicação entre os alunos, o trabalho em grupo, a
cooperação, a interação professor-aluno, podem favorecer um “clima” criativo. Torre
(2005) destaca que a interação entre discente e docente pode constituir-se em estímulo
criativo, essa relação deve ser de confiança mútua, compreensão e clima positivo. O autor
afirma ainda que:
Quando existe tensão entre professores e alunos, quando a comunicação se dá em
uma direção, quando a frieza da transmissão da informação prevalece sobre a
40
aprendizagem, estamos nos afastando do ensino criativo. A relação positiva entre
as pessoas, pelo contrário, gera compromisso, apoio, superação. Esta é a cara da
criatividade que facilita a auto-realização (p. 162).
Ainda sobre a comunicação em sala de aula, Nicola (1999, p. 79) argumenta que é
importante “a presença de um professor flexível às inovações, capaz de auxiliar os alunos
para um trabalho independente e auto-orientado, bem como de estimular o trabalho em
grupo, favorecendo novos conhecimentos”. Ela finaliza afirmando que “ensinar é processo
de interação que implica, principalmente, no desenvolvimento de relações professor/aluno
e aluno/aluno”.
Quando o educador consegue fazer com que o aprender e o pensar sejam
importantes e valiosos, a escola torna-se um lugar desafiador e atrativo para os educandos.
O relacionamento criativo exige da parte do professor a disposição de enveredar por
caminhos não-trilhados, uma abertura à experiência (TORRANCE, 1976).
foi abordado, anteriormente, o autoconceito e foi salientado que autoconceito
negativo pode constituir-se numa barreira emocional, de forma a prejudicar o
desenvolvimento da criatividade. Sabe-se que os professores têm um papel importante na
formação do autoconceito de seus alunos e, conseqüentemente da personalidade de deles.
Alencar (2002) afirma que é possível ao professor efetuar mudanças no autoconceito de
seus alunos, sejam elas positivas ou negativas. Essas mudanças ocorrem de forma lenta, ao
longo do tempo. Atitudes simples fazem a diferença como, por exemplo, chamar o aluno
pelo nome, cumprimentá-lo amistosamente, elogiá-lo, tudo isso ajuda a criar um
sentimento de valor pessoal.
Uma estratégia muito usada por alguns professores, para controlar estudantes, é
fazer com que eles se sintam impotentes, influenciando-os coercivamente. Muitas vezes,
privam-lhes de suas defesas a fim de controlarem seu comportamento ou influenciá-los
para que adotem certos comportamentos e posturas. Isto é feito de diversas maneiras como
41
exigir que os alunos sempre apresentem razões para tudo que dizem ou fazem, criar o
máximo possível de incertezas, comunicar a idéia de que possuem mais informações sobre
o aluno do que ele mesmo (TORRANCE, 1976).
Porém, o professor realizará muito mais explorando forças positivas na
personalidade do que explorando fraquezas. Para Torrance (1976, p. 191), “uma das
características primárias do relacionamento criativo é a aceitação do pensamento como
atividade legítima”. O autor destaca que na escola tem-se a idéia de que se deve manter os
alunos ocupados fazendo alguma coisa, deixando-lhes pouco ou nenhum tempo para
pensar. Destaca ainda que, no relacionamento criativo, não é necessário que o professor
conserve os alunos ocupados falando. Eles podem tolerar períodos de silêncio porque
reconhecem que o indivíduo pode estar entregue a seus pensamentos.
Torrance (1976, p. 193, 194) explicita que o professor deve “ser um guia” e não
guiar como verbo transitivo no sentido de estímulo-resposta. “Tal papel destruiria a
criatividade do relacionamento. Pode-se ser um guia e, ainda assim, permitir que o
indivíduo inicie, proponha ou mesmo teste”. É permitido a esse guia expressar opiniões,
fazer julgamentos, dar informações.
Alencar (2002) sugere algumas características de um clima que propicie o
desenvolvimento da criatividade dos alunos em sala de aula: 1) dar chances aos alunos de
levantar questões, elaborar e testar hipóteses, discordar, propor interpretações alternativas,
avaliar criticamente fatos, conceitos, princípios, idéias. Respeitar as questões levantadas
independentemente de como forem apresentadas; 2) dar tempo aos alunos para pensar e
desenvolver suas idéias; 3) criar um ambiente de respeito e aceitação, tal que os alunos
possam compartilhar, desenvolver e aprender uns com os outros e com o professor; 4)
estimular nos alunos a habilidade de explorar conseqüências para acontecimentos
imaginários; 5) encorajar os alunos a refletir sobre o que eles gostariam de conhecer
42
melhor; 6) incentivar nos alunos a habilidade de pensar em possibilidades, fazer
julgamentos, sugerir modificações e aperfeiçoar suas idéias; 7) incentivar nos alunos um
desejo de arriscar, experimentar e manipular; 8) valorizar o trabalho do aluno, suas
contribuições e suas idéias; 9) permitir que os alunos sigam as diversas etapas do processo
criativo diante de um problema; 10) proteger o trabalho do aluno da crítica destrutiva e das
gozações dos colegas.
Com base no que foi descrito sobre criatividade é possível afirmar que o
comportamento criativo pode ser estimulado em sala de aula. Pesquisadores têm
desenvolvido algumas técnicas que visam contribuir para o estimulo da criatividade dos
participantes. Nessa perspectiva Fleith (2007) apresenta algumas dessas técnicas:
Tempestade de Idéias (OSBORN, 1993), Sinética (GORDON, 1971), Listagem de
Atributos (CRAWFORD, em DAVIS, 1992), Combinações Forçadas (SHALL-CROSS,
1981) e Exercícios Ligados ao Uso da Imaginação (ADAMS, 1986).
Na técnica Tempestade de Idéias os participantes são incentivados a comunicar
quaisquer idéias que venham à mente, sem medo de serem criticados. Essa técnica tem por
princípio libertar o indivíduo de fazer, prematuramente, julgamento crítico e avaliação, os
quais tendem a desacelerar a produção de idéias e reduzi-las.
A avaliação das idéias será usada numa etapa posterior, após o levantamento de
um grande número de idéias. Alencar (2002) argumenta que nessa técnica é necessário que
o indivíduo se sinta completamente livre para explorar os seus pensamentos e apresentar
suas idéias, por mais ridículas, inusitadas, inapropriadas e inconvencionais que possam
parecer à primeira vista. A autora sugere algumas regras a serem seguidas: 1) não criticar
ou avaliar nenhuma das idéias produzidas; 2) aceitar idéias “malucas” ou cheias de humor;
3) enfatizar a quantidade de idéias e; 4) combinar e aperfeiçoar idéias.
43
A Sinética é a conjunção de elementos diferentes e aparentemente irrelevantes.
Utiliza-se de metáforas e analogias para compreender melhor o problema. Ao tratar de
metáforas Fleith (2007, p. 145) argumenta que o seu uso “torna o pensamento mais
flexível, uma vez que elas nos levam a observar e analisar uma situação sob outras
perspectivas que não a usual, mantendo-nos abertos e receptivos a novas idéias”.
A Listagem de Atributos tem por princípio visualizar o problema por partes e não
atacá-lo como um todo. Para tal, foi desenvolvida uma lista de questões (listagem de
atributos) que favorece melhor visualização dos problemas, contando das seguintes
sugestões: o que pode ser aumentado ou diminuído nesse problema? Que atributo pode ser
modificado, substituído, eliminado, adaptado ou invertido? Pode-se combinar esse atributo
com outros? Tal atributo pode ser usado de outra maneira?
A técnica de Combinações Forçadas implica descobrir semelhanças ou pontos em
comum entre duas coisas que pareciam distantes. Para que essa técnica ocorra, é necessário
que os objetos a serem combinados sejam estranhos uns aos outros e sua aproximação
discreta, a fim de que a imaginação se veja obrigada a instituir uma ligação entre elas,
criando um conjunto em que os dois elementos estranhos possam conviver (RODARI em
FLEITH, 2007). A autora salienta que, nessa técnica, as palavras não estão presas ao seu
significado habitual, mas libertas dessa cadeia verbal promovendo, assim, o
desenvolvimento da flexibilidade e da originalidade.
Nos exercícios ligados ao uso da imaginação deve ser solicitado aos participantes
experimentar vários tipos de sensações, ao utilizar os sentidos. Exercícios de natureza
visual, auditiva (por exemplo, a gargalhada de alguém, som de carro), olfativas (cheiro de
frutas, etc), gustativa e sinestésica (sensação de extrema felicidade). Em seguida investiga
no aluno o grau de dificuldade para experienciar cada uma das imagens.
44
Todas essas técnicas podem ser aplicadas durante uma aula de Matemática. O
professor pode trabalhar com a imaginação dos alunos, um exemplo, sugerido por Gontijo
(2007), seria perguntar a eles o que aconteceria se a Matemática desaparecesse do mundo.
Esse autor apresenta vários exemplos, em sua tese, de como estimular a imaginação dos
estudantes nas aulas de Matemática. Alguns desses exemplos serão mencionados no
próximo item.
O uso de técnicas para estimular o potencial criativo é mais produtivo se for feita
em grupo. Como foi mencionado anteriormente, autores defendem a importância do
trabalho em grupo para o desenvolvimento da criatividade (Nicola, 1999; Martindale,
1999; Alencar, 2002, 2007; Fleith, 2007; Torre, 2005; entre outros).
Assim, quando o professor proporciona trabalhos em grupo, segundo os autores,
estará facilitando o desenvolvimento de atitudes e pensamento ligados à criatividade, haja
vista que, conforme Alencar (2002), quando um indivíduo está trabalhando em grupo
apresenta um maior número de idéias do que quando está sozinho. E ainda, que trocas
de idéias e sugestões que podem levar às variações e modificações das idéias originalmente
apresentadas, o que possibilita novas associações e novas possibilidades de pensamento.
1.4.4 CRIATIVIDADE EM MATEMÁTICA
No primeiro capítulo foi salientado que a Matemática está presente em muitas
situações que nos deparamos diariamente. A maioria das pessoas, em suas atividades do
cotidiano ou profissional, necessita de conhecimentos matemáticos para agir ativamente
perante as diversas situações. Os Parâmetros Curriculares Nacionais chamam a atenção
para isto: “a compreensão da Matemática é essencial para o cidadão agir como consumidor
prudente ou tomar decisões em sua vida pessoal e profissional” (BRASIL, 1999, p. 80).
45
Cabe aos professores, em suas práticas de ensino, às escolas, em seus projetos
pedagógicos e a todos os envolvidos com o ensino, possibilitarem aos estudantes
atividades que visem estimular o desenvolvimento da criatividade em matemática.
Gontijo (2007, p. 2) define a criatividade em Matemática como:
[...] a capacidade de apresentar inúmeras possibilidades de solução apropriadas
para uma situação-problema, de modo que estas focalizem aspectos distintos do
problema e/ou formas diferenciadas de solucioná-lo, especialmente formas
incomuns (originalidade), tanto em situações que requeiram a resolução e
elaboração de problemas como em situações que solicitem a classificação ou
organização de objetos e/ou elementos matemáticos em função de suas
propriedades e atributos, seja textualmente, numericamente, graficamente ou na
forma de uma seqüência de ações.
Nessa proposta de definição de criatividade em Matemática, destaca-se a
importância do professor incentivar os estudantes a abordarem os problemas matemáticos
de forma diferenciada das comuns e proporem soluções e encaminhamentos originais.
É fundamental que o professor esteja sempre com olhar crítico em sua postura em
sala de aula, sua forma de abordar os conteúdos e na metodologia utilizada. Para que assim
possa verificar se as aulas de matemática enfatizam a memorização e a reprodução do
conhecimento, ou se proporcionam o desenvolvimento da criatividade e a construção do
conhecimento.
Gontijo (2007) fez uma pesquisa com alunos da terceira série do Ensino Médio
com o objetivo de examinar as relações entre criatividade, criatividade em Matemática e
motivação em Matemática. Os resultados do estudo evidenciaram que existe relação entre
motivação em Matemática e criatividade Matemática. Para o autor “isso implica
construção de uma cultura de sucesso, de aprendizado e de prazer em relação à Matemática
para que produções criativas neste campo possam ocorrer com maior freqüência e
qualidade” (p. 115).
46
Como sugestões para as aulas de Matemática, Sternberg e Grigorenko (2004), em
Gontijo (2007, p. 5), propõem algumas estratégias que podem ser utilizadas para favorecer
o desenvolvimento da criatividade nesta área:
1) Encorajar os alunos a formularem uma pergunta nova, diferente, sobre um
problema de Matemática existente (ou redefinir o problema, reescrevê-lo, mudar a sua
perspectiva).
2) Incentivar os alunos a convencerem os colegas de que suas idéias sobre como
resolver problemas de Matemática estão certas.
3) Estimular a imaginação no campo matemático como, por exemplo, solicitando
aos alunos que proponham problemas com palavras, ou ainda, incentivando-os a
contemplarem quais seriam os efeitos sobre a sociedade se a Matemática subitamente
desaparecesse do cenário contemporâneo, ou quais seriam os efeitos sobre a sociedade se
todas as pessoas começassem a utilizar somente números romanos em qualquer cálculo
matemático.
4) Encorajar os alunos a considerarem um tipo de problema matemático que
sempre resolveram de determinada maneira e resolvê-lo de um modo diferente, ou ainda,
pedir aos alunos que inventem uma operação numérica e expliquem como ela funciona.
5) Propor a resolução de um problema com um método comum e, depois, solicitar
que desenvolvam um todo novo de modo que ele seja mais eficiente do que o comum,
estabelecendo comparações entre os métodos.
6) Estimular os alunos a imaginarem usos da Matemática em atividades que lhes
despertam interesse. Por exemplo, se os alunos manifestam interesse por um determinado
esporte pedir que inventem problemas matemáticos baseados neste esporte.
A fim de avaliar a criatividade em Matemática, Balka (1974), citado por Gontijo
(2007), estabeleceu alguns critérios ao indicar habilidades que podem servir de parâmetro
47
para o professor observar os estudantes e identificar tais habilidades, em atividades em sala
de aula. Estas habilidades constituem-se em indicativos de criatividade em Matemática:
1) habilidade para formular hipóteses matemáticas avaliando relações de causa e
efeito em situações matemáticas;
2) habilidade de considerar e avaliar idéias matemáticas não usuais, refletindo
sobre suas conseqüências em situações matemáticas;
3) habilidade para perceber problemas a partir de uma situação matemática e
formular questões que possam responder a esses problemas;
4) habilidade para elaborar subproblemas específicos a partir de um problema
matemático geral;
5) habilidade para buscar soluções para problemas matemáticos, rompendo com
um quadro mental estático;
6) habilidade de elaborar modelos para solucionar situações matemáticas.
Além dessas habilidades, que podem ser observadas em sala de aula pelo
professor no desenvolvimento das atividades, Gontijo (2007) aponta características de
Matemáticos famosos, considerados criativos, que também podem ser observadas nos
estudantes. Dentre essas características, destacamos algumas: 1) especulações sobre o que
aconteceria se fossem mudadas uma ou mais hipóteses de um problema; 2) imaginação de
caminhos ou relações existentes entre os objetos em consideração; 3) tendência para
especular aplicações incomuns para os resultados obtidos pela turma; 4) convicção de que
todo problema tem uma solução; 5) persistência em trabalhar com problemas
particularmente difíceis ou demonstrações; 6) tédio com a repetição ou trabalho com um
grande número de problemas que já dominam.
Feitas as considerações sobre a criatividade, passaremos a tratar sobre a
Metodologia desta investigação.
48
CAPÍTULO II
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E ANÁLISES
[...] os programas de pós-graduação devem abrir espaços para realizar pesquisas
metaanalíticas de suas produções, contribuindo assim para gerar conhecimentos
mais confiáveis na área da Educação (LAROCCA; ROSSO; SOUZA, 2005, p.
130).
2.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A Modelagem Matemática na concepção de Barbosa (2001, 2004), Burak (
1992,
1998, 2004
) e Caldeira (2004, 2007), parece ter muitos aspectos em comum com o que é
apresentado na literatura que trata da criatividade. Como foi explicitado no primeiro
capítulo, Torre (2005) sugere que um ensino criativo deve ser de natureza flexível e
adaptativa.
Barbosa, Burak e Caldeira pontuam que a Modelagem é uma metodologia
aberta, sem procedimentos fixados e com várias possibilidades de encaminhamentos. É
levado em consideração o ambiente, o contexto e os interesses do grupo. As etapas que
podem constituir o processo de Modelagem, sugeridas por Burak (1992), servem de apoio
ao professor, mas não é um processo rígido, o qual pode tomar outros rumos. Assim, pode-
se ensejar a hipótese de que o ensino da Matemática através da Modelagem Matemática
possa constituir-se em um ensino criativo.
Todavia, não se conhece trabalhos acadêmicos que mostrem esses aspectos da
criatividade contemplados na Modelagem Matemática, evidenciando uma comprovação
empírica dessa afirmação. Essa comprovação seria possível por meio da análise de
trabalhos que utilizaram a Modelagem Matemática como metodologia para o ensino de
Matemática.
49
Como esses trabalhos estão disponíveis em material impresso ou digital,
propusemo-nos a analisá-los buscando evidências de aspectos relativos à criatividade.
Assim, os objetivos deste trabalho são
identificar e analisar aspectos relativos à
criatividade presentes em atividades que utilizaram a Modelagem Matemática como
metodologia de trabalho e de investigação, descritas em algumas dissertações
desenvolvidas em Programas de Pós-Graduação de universidades brasileiras, bem como
produzir indicadores sobre a relação Modelagem Matemática e criatividade
.
Para fazer frente aos objetivos propostos, o delineamento da pesquisa buscou
pressupostos da pesquisa qualitativa que, para Bicudo (2006),
[...] engloba a idéia do subjetivo, passível de expor sensações e opiniões. O
significado atribuído a essa concepção de pesquisa também engloba noções a
respeito de percepções de diferenças e semelhanças de aspectos comparáveis de
experiências [...] (p. 106).
Nesse trabalho optou-se pela análise de dissertações, por entender que são
pesquisas que ensejam maior rigor em seus diferentes aspectos. De acordo com Severino
(1996), a dissertação de mestrado trata-se da “comunicação dos resultados de uma pesquisa
e de uma reflexão, que versa sobre um tema igualmente único e delimitado (...) servindo-se
de um raciocínio rigoroso, de acordo com as diretrizes lógicas do conhecimento humano”
(p. 119-120). Assim, este trabalho consiste em uma pesquisa bibliográfica.
Dentre os tipos de estudos bibliográficos ou documentais optou-se pela pesquisa
metaanalítica que, para
Fiorentini e Lorenzato (2006, p. 103), é “uma revisão sistemática
de outras pesquisas, visando realizar uma avaliação crítica das mesmas e/ou produzir
novos resultados ou sínteses a partir do confronto desses estudos, transcendendo aqueles
anteriormente obtidos”. Larocca, Rosso e Souza (2005, p. 119), destacam a importância
desse tipo de pesquisa. Os autores afirmam que
[...] pelas pesquisas metaanalíticas, a ciência busca sua coerência, debruçando-se
sobre aquilo mesmo que produz, não exclusivamente visando traçar o tradicional
estado da arte de determinado conhecimento, mas para que, utilizando-se de
procedimentos científicos qualitativos e/ou quantitativos, venha a conhecer
melhor a produção científica em seus vários aspectos.
50
Dessa forma, a partir das análises de outras produções científicas envolvendo a
Modelagem Matemática, pretende-se responder às questões de pesquisa e explicitar
contribuições para o processo ensino-aprendizagem em Matemática.
A questão norteadora da pesquisa é: o
s trabalhos desenvolvidos por meio da
Modelagem Matemática, na perspectiva da Educação Matemática proposta, favorecem o
desenvolvimento da criatividade?
A fim de responder as questões foram selecionadas
quatro dissertações de mestrado que constam relatos de trabalhos de Modelagem
Matemática desenvolvidos em sala de aula.
2.1.1 DOS PROCEDIMENTOS
Ao se buscar o material que trata da Modelagem na Educação Básica, observou-se
alguns aspectos: 1) A maior parte dos trabalhos examinados, via internet, como forma de
acesso, não constavam descrições de atividades e a dinâmica vivenciada em uma
experiência de Modelagem Matemática; 2) Muitos trabalhos que ofereciam uma descrição
do seu desenvolvimento foram não se referiam à Educação Básica; 3) No trabalho de
Klüber (2007) foram apontadas algumas formas de conceber Modelagem Matemática por
diversos autores analisados. Tais formas de conceber a Modelagem Matemática ensejaram
a questão principal e as norteadoras desse trabalho.
Em vista disso, optou-se por trabalhos acadêmicos que tivessem como foco a
Educação Básica, e contivessem descrições da dinâmica do desenvolvimento de uma
atividade de Modelagem Matemática em sala de aula e, ainda, tratassem o ensino e a
aprendizagem em um contexto mais amplo. Recaiu-se sobre três autores: Barbosa, Burak e
Caldeira.
Outro ponto considerado nos procedimentos iniciais foi qual tipo de trabalho
poderia refletir aspectos considerados importantes na investigação proposta: concepção de
51
ensino e de aprendizagem mais apropriadas para a Educação Básica, envolvimento dos
alunos nas experiências, e que contivesse as descrições que pudessem destacar elementos
de criatividade nessas práticas.
2.1.2 DOS TRABALHOS SELECIONADOS
Os trabalhos selecionados consistem em dissertações orientadas por Barbosa,
Burak e Caldeira, por entendermos que esses possibilitariam verificar os objetivos
propostos, bem como, responder às questões da investigação. Sendo:
1. Modelagem matemática no contexto do ensino dio: possibilidade de
relação da matemática com o cotidiano, autoria de Alzenir V. Ferreira Soistak,
Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa, PR, defendida
em 2006. O trabalho aborda uma aplicação de Modelagem Matemática em duas
primeiras ries do ensino médio, em um colégio agrícola, na cidade de Ponta
Grossa, PR. O tema escolhido pelas turmas foi ‘Cultura da Soja’.
2. Modelagem Matemática: uma perspectiva para o ensino de matemática
no ensino médio, autoria de Antonio Vamir Camilo, Mestrado em Educação da
Universidade do Contestado, Caçador, SC, defendida em 2002. O trabalho foi
realizado em contra turno com alunos voluntários do primeiro e segundo ano do
ensino médio, de um colégio estadual na cidade de Guarapuava, PR. O
pesquisador subdividiu em grupos os alunos, e para esta pesquisa foi selecionada
a descrição do trabalho de um grupo composto por quatro integrantes. O tema
escolhido por esse grupo foi ‘Quadra de Esportes’.
3. A produção de discussões reflexivas em um ambiente de Modelagem
Matemática, autoria de Marluce Alves Santos, Mestrado em Ensino, Filosofia e
História das Ciências, da Universidade Federal da Bahia e Universidade Estadual
52
de Feira de Santana, Feira de Santana, BA, defendida em 2007. O trabalho foi
realizado numa sexta série do ensino fundamental, de uma escola pública, no
município de Coração de Maria, BA. A pesquisadora sorteou para observação um
grupo composto por seis integrantes. O tema trabalhado foi ‘Fatura de Água’.
4. Modelagem Matemática no cárcere, autoria de Martha Joana Tedeschi
Gomes, Mestrado em Educação, da Universidade Federal do Paraná, PR,
defendida em 2005. A pesquisadora desenvolveu uma aplicação de Modelagem
Matemática com alunos detentos do Ensino Fundamental do 2º Segmento da
Penitenciária Estadual de Piraquara, de regime fechado e segurança máxima e na
Colônia Penal Agrícola, de regime semi-aberto, na cidade de Piraquara, PR. O
tema trabalhado foi ‘construção civil’.
É importante destacar que as dissertações analisadas não tinham o objetivo
explicito do aprimoramento de habilidades criativas por parte dos estudantes, mas sim o
propósito de aplicar a metodologia em sala de aula. Essa afirmação pode ser verificada
analisando os objetivos de cada uma das dissertações: O trabalho de Gomes (2005) teve
como objetivo “verificar a possibilidade de trabalhar a Modelagem Matemática junto aos
alunos detentos do Sistema Penitenciário do Paraná, na cidade de Curitiba e região
metropolitana” (p. viii). Santos (2007) descreve que a pesquisa teve por objetivo analisar a
produção de discussões reflexivas em um ambiente de Modelagem Matemática, a partir de
dados obtidos da observação e filmagem de um grupo de alunos de uma escola pública
secundária no município de Coração de Maria. Camilo (2002) explicita que o trabalho teve
por objetivo “refletir sobre o método da Modelagem Matemática, enquanto uma prática
que parte do interesse do educando, no propósito de verificar em que medida favorece a
aprendizagem da Matemática no Ensino Médio” (p. 6). E finalmente, Soistak (2005)
salienta que o objetivo foi “analisar a aplicação da Modelagem Matemática em situação de
53
sala de aula, ante a contextualização, a aplicabilidade e a compreensão dos conteúdos
matemáticos” (p. 13).
2.1.3 DOS ASPECTOS DE CRIATIVIDADE
Para análise dos relatos de trabalhos de Modelagem Matemática à luz da teoria da
criatividade formulamos indicadores, com base nos aspectos relativos à criatividade
extraídos do material dos autores que tratam sobre o tema. Foram elencadas palavras-
chave, que se constituem em indicadores de criatividade. Procurou-se abranger todos os
aspectos a serem considerados no que diz respeito à criatividade (a pessoa, o produto, o
processo e o ambiente), para então identificá-los nas descrições dos trabalhos de
Modelagem Matemática. Dessa forma, será elaborada uma análise detalhada buscando não
omitir aspectos importantes.
No quadro I estão expostos os aspectos de criatividade relativos à pessoa, isto é,
características do pensamento e habilidades. No quadro II a tarefa na perspectiva
heurística, que é um fator relativo ao processo criativo. No quadro III refere-se ao produto
criativo, o qual deve ser útil e valioso. No quadro IV estão descritas as características do
ambiente, a fim de proporcionar o desenvolvimento da criatividade.
Quadro I: Características da Pessoa Criativa
PESSOA
Tomar consciência de problemas.
Pensar em possíveis soluções.
Capacidades do Pensamento Criativo
(Torrance, 1976)
Submetê-las à prova.
Bagagem de conhecimento. (Alencar, 2002)
Dedicação, esforço e envolvimento com o trabalho. (Alencar, 2002)
Persistência nas ações que deseja desenvolver. (Alencar, 2002)
Sensibilidade a problemas: habilidade de ver problemas.
Fluência: a abundância ou quantidade de idéias diferentes sobre o mesmo assunto.
Flexibilidade: capacidade de alterar o pensamento ou conceber diferentes tipos de
respostas.
Habilidades do
pensamento
criativo
(Guilford 1950,
1975)
Originalidade: capacidade de gerar respostas que não são freqüentes ou que são
incomuns.
54
Elaboração: quantidade de detalhes presentes em uma idéia.
Complexidade: número de idéias inter-relacionadas que o indivíduo pode manipular
de uma só vez.
Redefinição: habilidade de efetuar mudanças na informação.
Avaliação: processo de decisão, julgamento e seleção de uma ou mais idéias dentre
um grupo maior de idéias.
Habilidade para formular hipóteses matemáticas avaliando relações de causa e efeito
em situações matemáticas.
Habilidade de considerar e avaliar idéias matemáticas não usuais, refletindo sobre
suas conseqüências em situações matemáticas.
Habilidade para perceber problemas a partir de uma situação matemática e formular
questões que possam responder a esses problemas.
Habilidade para elaborar subproblemas específicos a partir de um problema
matemático geral.
Habilidade para buscar soluções para problemas matemáticos, rompendo com um
quadro mental estático.
Criatividade em
Matemática
(Balka, 1974
apud Gontijo,
2007)
Habilidade de elaborar modelos para solucionar situações matemáticas.
Comunicação de idéias (capacidade de argumentação).
Curiosidade (Torrance, 1976).
Autoconceito Positivo (Alencar, 2002).
Pensamento analógico.
Autonomia.
Espírito de pesquisa.
Disponibilidade para enfrentar situações novas (Alencar, 2002). Desejo de assumir riscos (Torrance,
1976).
Motivação.
Quadro II: Característica do Processo Criativo
PROCESSO
Tarefa na perspectiva heurística.
Quadro III: Características do Produto Criativo
PRODUTO
Produto: valioso, útil.
Quadro IV: Características do Ambiente Criativo
AMBIENTE
Características do ambiente social.
Encontra apoio e respeito com suas idéias.
Uso de técnicas adequadas.
O professor incentiva a comunicação entre os estudantes e o trabalho em grupo (Alencar, 2002).
Favorecimento da autonomia e liberdade de ação dos estudantes.
Motivação externa.
55
2.2 DESCRIÇÕES E ANÁLISES
Neste item trazemos as descrições dos trabalhos de Modelagem Matemática e
uma análise dos textos. A fim de destacar os dados empíricos e as análises, as descrições
contidas nas dissertações selecionadas serão apresentadas com fonte em tamanho dez e
negrito, enquanto que as análises estão em tamanho doze.
2.2.1 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘MODELAGEM
MATEMÁTICA: UMA PERSPECTIVA PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA NO
ENSINO MÉDIO’ – TEMA: QUADRA DE ESPORTES
Camilo (2002) desenvolveu o trabalho em contra turno com alunos do ensino
médio do Colégio Estadual Carneiro Martins, em Guarapuava PR. Salienta-se que o
pesquisador foi professor da turma durante o trabalho desenvolvido.
Primeiramente foi solicitado aos alunos que sugerissem temas para a atividade. Os
temas sugeridos foram: bicicleta, gêneros alimentícios, cesta básica, embalagens, água e
esgoto, transporte coletivo, pecuária, bovinocultura, suinocultura, ovinocultura,
jardinagem, agricultura familiar, horta, culinária, pavimentação, quadra de esportes, roda
de capoeira.
Formaram-se grupos e cada grupo escolheu um tema.
A seguir serão apresentados dados empíricos que mostram o desenvolvimento do
trabalho de um grupo composto por quatro integrantes, que freqüentavam a e séries
do ensino médio, dois dos integrantes eram repetentes e um deles estava em dependência
em Matemática. O tema escolhido foi “Quadra de Esportes”. “Os alunos do grupo
caracterizavam-se pela participação como atletas” (CAMILO, 2002, p. 64).
56
“As discussões iniciais do grupo giravam em torno dos esportes praticados no colégio (...)
Alegavam alguns que não era possível desenvolver qualquer esporte (...), devido à existência de um
grande número de aulas de Educação Física” (CAMILO, 2002, p. 64-65) (sic).
Os alunos alegaram que o tamanho do ginásio era reduzido, porém uma aluna discordou. O
grupo chegou ao consenso que para tirar a dúvida bastava medi-lo e confrontar com as medidas
oficiais. Também argumentaram que o ideal era ter um novo ginásio ou, ao menos, outra quadra
esportiva. A partir das discussões ocorreram questionamentos, tais como: Qual o local ideal para
construção da nova quadra esportiva? O único local seria o pátio do colégio? Qual o tamanho do pátio
do colégio? No pátio, é possível construir uma quadra com medidas oficiais? (CAMILO, 2002)
Os dados empíricos permitem inferir que os estudantes tomaram consciência do
problema e levantaram hipóteses com a finalidade de achar uma solução para prática de
esportes do colégio. Isso evidencia a sensibilidade a problemas, que é a primeira habilidade
do pensamento criativo, descrito por Guilford (1950, 1975). Além disso, o professor
oportunizou e incentivou para que os alunos expusessem suas idéias a respeito do tema
escolhido, o que também se constitui num aspecto importante para o desenvolvimento da
criatividade em sala de aula.
O grupo decidiu “levantar informações referentes ao tipo de esportes praticados em quadras
oficiais e constatar a existência de tais quadras na cidade. Assim, dentro desse contexto, surgiu a idéia
da tomada das medidas da quadra de esportes do Colégio e a elaboração de uma maquete” (CAMILO,
2002, p.65).
O relato denota que, inicialmente, o grupo pensou em providências que poderiam
tomar a fim de responder as hipóteses levantadas, o que remete às capacidades do
pensamento criativo, que uma delas é pensar em possíveis soluções para resolver
problemas. Além do mais, os estudantes puderam sugerir livremente alternativas para
encontrar soluções para os questionamentos levantados, o que favorece a autonomia e
liberdade de ação deles.
Os alunos discutiram sobre o que é maquete e constataram que “através da maquete é
possível visualizar o projeto como um todo, em todos os seus detalhes e particularidades.” O professor
57
relata que “a partir daí, a idéia da construção da maquete entusiasmou ainda mais os elementos do
grupo” (CAMILO, 2002, p.65).
Nas descrições consta que, com o surgimento da idéia de construção de uma
maquete os estudantes trocaram opiniões sobre o assunto e decidiram colocar em prática
suas idéias. Isso se refere às capacidades do pensamento criativo, que seria submeter à
prova, ou seja, colocar em prática as diversas sugestões. Também se destaca o entusiasmo
dos estudantes para construção da maquete, e o entusiasmo para realização de uma
atividade é um fator importante para superar as dificuldades que surgirão e ter persistências
nas ações. Além disso, o entusiasmo dos estudantes com relação à atividade desenvolvida
pode ser decorrente da motivação que o tema proporcionou a eles.
“No início do trabalho de medição, um dos elementos do grupo mostrou-se surpreso e disse
que ainda não conhecia o instrumento de medida chamado trena. Após algumas explicações sobre a
finalidade e utilização dos instrumentos de medidas, os alunos iniciaram a tomada de medidas
utilizando a trena, visto que a unidade de medida era o metro. Ao iniciarem a medição, notamos que
estavam tomando as medidas incorretamente. O aluno que segurava na extremidade de origem da
trena não localizara o ponto zero [...] As medidas foram refeitas e anotadas num rascunho, o qual
continha um desenho rudimentar da planta baixa da quadra” (CAMILO, 2002, p. 66).
O autor relata que, durante a medição, foi despertada a curiosidade de outros
alunos que estavam no ginásio, sendo que alguns acompanharam a tomada de algumas
medidas e fizeram várias perguntas.
“Após tomar as medidas da quadra, do ginásio e do pátio, o
grupo continuou anotando outras medidas, pois estavam gostando de trabalhar com os instrumentos
de medidas, o que parecia ser muito divertido. Por exemplo, mediram a altura e a largura das travas
existentes no ginásio, a altura e largura da rede de vôlei, a tabela de cesta de basquete, etc” (CAMILO,
2002, p. 67).
“No momento em que mediam a cesta de basquete (aro), um dos componentes perguntou:
como se tira a medida desse aro? Várias opiniões surgiram. Uns diziam que era necessário medir o
comprimento do aro, outro disse que deveria medir o raio. Chegaram a conclusão de que o modo
mais fácil era tomar a medida do diâmetro. A partir do diâmetro se poderia calcular o raio e o
58
comprimento da circunferência, assim como a área do circulo. Enquanto se media o diâmetro do aro
um dos alunos exclamou: o acredito ser tão grande este aro. Um segundo aluno falou: se o aro é tão
grande, porque você não consegue fazer nenhum ponto no jogo de basquete? Uma das alunas
justificou: mas a bola também é grande” (p. 68). Então o professor lançou o seguinte questionamento:
“Qual a diferença entre a área do círculo (aro) e a área do círculo máximo da bola de basquete?”
É
descrito que
“houve um certo silêncio e logo um aluno perguntou: Como medir o diâmetro da bola de
basquete? Naquele momento, percebemos a preocupação dos alunos, pois ficaram pensativos.
Decidiram que essa questão seria analisada mais à frente” (CAMILO, 2002, p. 68-69).
O autor relata que “várias opiniões surgiram” (p. 68) para resolver o problema da
medida da cesta de basquete, isso lembra a técnica “tempestade de idéias” e a fluência.
Mas não é possível afirmar que houve a utilização da técnica “tempestade de idéias”, tendo
em vista que a descrição não deixa evidente e, possivelmente não tinham a intenção
explícita de utilizar essa técnica. Como também não é possível afirmar que houve a
fluência, uma vez que não consta nas descrições o registro das idéias apresentadas por cada
um dos alunos.
Apesar de na descrição não ficar claro como os alunos chegaram à conclusão de
que o modo mais fácil era tomar a medida do diâmetro, pode-se destacar também a
habilidade de considerar e avaliar idéias matemáticas refletindo sobre suas conseqüências
(Gontijo, 2007). A avaliação e a bagagem de conhecimento também são observadas.
Subentende-se que foram os próprios alunos que chegaram à conclusão, para isso tiveram
que recorrer a conhecimentos que teriam adquirido anteriormente, como definições de
diâmetro, raio, comprimento da circunferência e, ainda, lembrar as formas de cálculo
dessas grandezas. Considerando o quadro I, o item Criatividade em Matemática (p. 49-50),
habilidade para formular hipóteses matemáticas avaliando relações de causa e efeito em
situações matemáticas, os dados empíricos nos permitem inferir que os estudantes
formularam hipóteses a respeito do cálculo da cesta de basquete, é claro que de maneira
59
simples, mas o diálogo entre os estudantes e suas indagações conduziram o professor a
lançar um questionamento, com o qual os alunos ficaram pensativos. Nisso surgiu outra
questão que seria o primeiro passo para resolver o problema: “como medir a bola de
basquete?” Isso nos remete a dois aspectos de Criatividade em Matemática: habilidade para
perceber problemas a partir de uma situação matemática e formular questões que possam
responder a esses problemas; e a habilidade para elaborar subproblemas específicos a partir
de um problema matemático geral.
Após terminarem as medidas, os alunos analisaram e confirmaram que aquela quadra não
tinha as medidas oficiais. Efetuaram os lculos e constataram não ser possível construir uma quadra
de esportes com as medidas oficiais no pátio do colégio, pois a área do tio era menor que o espaço
ocupado pelo ginásio atual (CAMILO, 2002).
Nesse excerto, nota-se a habilidade para buscar soluções para problemas
matemáticos, rompendo com um quadro mental estático. Segundo o autor, a partir dos
dados que coletaram de seu ambiente cotidiano os estudantes fizeram constatações
importantes, que respondiam às questões formuladas no início do trabalho. Esses dados nos
permitem inferir que eles romperam com o quadro mental estático, pois as informações que
necessitavam não estavam dadas de antemão e puderam utilizar conhecimentos que,
possivelmente, tinham aprendido em sala de aula, em suas realidades, para chegar às
respostas das questões que eles mesmos formularam. A bagagem de conhecimento também
foi essencial nesta etapa. Além do mais, isso demonstra que eles submeteram à prova os
problemas levantados.
Quando os alunos estavam medindo, outros alunos da quinta série ficaram curiosos, queriam
saber o que estavam fazendo. Os componentes do grupo deram explicações. Sobre isso, o professor
comenta que “aquele momento foi muito gratificante, ao presenciar a curiosidade daqueles pequenos e
o entusiasmo daquele grupo socializando o conhecimento recém adquirido” (CAMILO, 2002, p.70).
Apesar da comunicação de idéias entre os estudantes estar presente em todas as
etapas, isto é o trabalho em grupo, esse trecho permite inferir que aconteceu uma
60
comunicação um pouco diferente. Os estudantes mais velhos explicaram o que estavam
fazendo, como relata o próprio professor, socializaram o conhecimento com os estudantes
mais novos. O fato de que os estudantes da quinta série interessaram-se pela atividade e,
ainda, o comentário do professor de que “aquele momento foi muito gratificante, ao
presenciar [...] o entusiasmo daquele grupo socializando o conhecimento recém adquirido”
(p. 70), relaciona-se com o autoconceito. É possível inferir pelas declarações que os
estudantes melhoram seus autoconceitos, ao perceberem pessoas interessadas em seus
trabalhos e dispostas a ouvir suas explicações. Dessa forma eles puderam verificar que
estavam fazendo algo importante. Além de encontrarem apoio e respeito com suas idéias,
os estudantes encontraram interesse por suas idéias.
“Concluídas as medições, o grupo passou ao trabalho de organização e representação das
medidas, assim como a discutir a elaboração da maquete da quadra de esporte do Colégio” (CAMILO,
2002, p. 70).
Surgiu a idéia de visitar um local onde houvesse uma maquete e, também, de conhecer e
conversar com quem constrói maquetes. Decidiram visitar a Universidade, onde tem uma maquete.
Conversaram com a pessoa responsável, a qual “fez rias sugestões aos alunos, a respeito dos
materiais que poderiam utilizar. Demonstrou como usar escalas, explicando a utilização do
escalímetro. Salientou aos alunos que a construção de maquetes é um trabalho interessante e
gratificante, mas que requer dedicação e muita paciência, pois muitos problemas surgem e precisam
ser resolvidos” (CAMILO, 2002, p. 70-71).
De posse das informações e de alguns materiais e com as medidas verificadas, o grupo voltou
ao ginásio de esportes para visualizar outros detalhes. “Um aluno do grupo, utilizando-se de uma
cartolina, elaborou o desenho da quadra de esportes. O grupo resolveu que o desenho deveria ser
melhorado. Então decidiram fazer uso do computador e utilizando o sistema Auto Cad, refizeram a
planta baixa da quadra. Na seqüência, plotaram-na numa escala de 1:50 servindo ela como ponto de
partida para construção da maquete” (CAMILO, 2002, p. 72-73). “Após várias tentativas, erros,
sugestões, os alunos concluíram que deveriam pesquisar outras alternativas de materiais para que
fosse dado prosseguimento à construção da maquete” (CAMILO, 2002, p. 73).
61
O relato do autor de que “após várias tentativas, erros, sugestões [...]” (CAMILO,
2002, p. 73) indica que os estudantes podem ter se valido das habilidades do pensamento
criativo, descritas por Guilford (1950, 1975), tais como: a fluência, a flexibilidade, a
redefinição, a complexidade e a avaliação. Entretanto, não é possível afirmar com certeza
que houve manifestações de fluência, flexibilidade, redefinição, complexidade e avaliação
por parte dos estudantes pois, como já foi mencionado anteriormente, não consta nas
descrições um registro sistemático das idéias apresentadas pelos estudantes.
“A cada dia que passava o grupo enfrentava novos desafios, novos problemas e discutiam
alternativas tais como: como construir as paredes do ginásio? E o teto? A grande dificuldade que
grupo encontrou foi no momento de construir a cobertura do ginásio, visto que é de forma
arredondada, ou seja, aproximada a um semicírculo” (CAMILO, 2002, p. 73).
Nos dados empíricos observa-se que a persistência nas ações para chegar ao
objetivo que era a construção da maquete foi fundamental, pois, conforme o relato: “a cada
dia que passava o grupo enfrentava novos desafios, novos problemas [...]” (p. 73).
Provavelmente, para resolver esses problemas que surgiam, os estudantes valeram-se das
capacidades do pensamento criativo, descritas por Torrance (1976): tomar consciência de
problemas, pensar em possíveis soluções e submetê-las à prova. Observa-se que os alunos
tinham autonomia e liberdade para levantar problemas, propor soluções e colocar as idéias
à prova, com relação ao trabalho que estavam desenvolvendo. Além de enfrentarem
situações que, provavelmente, nunca tinham enfrentado antes.
“Após várias discussões e sugestões apresentadas, assim como a mediação do pesquisador,
parece que os alunos começaram a relacionar de uma forma mais lógica o tipo de material, tamanho,
formas, utilização, etc. Acredito que isso ocorreu devido à compreensão de escalas, sendo que as idéias
continuavam clareando, pois o grupo mostrava-se atento a muitos detalhes e pormenores. Estavam
empenhados na resolução e discussão de vários problemas que iam aparecendo, desde um simples
modo de se cortar o papel até a aparência final do produto acabado. Enfim, após o estudo de vários
detalhes e resolução de muitos problemas, o grupo conseguiu chegar ao final da construção da
62
maquete, inclusive com a construção de tabelas de basquete, traves de futebol de salão, rede de
voleibol, etc., assim como a pintura das paredes internas e externas da maquete” (CAMILO, 2002, p.
74).
A descrição evidencia que durante a construção da maquete houve
comprometimento, por parte dos alunos, no desempenho das atividades. O relato do
professor de que “estavam empenhados na resolução e discussão de vários problemas que
iam aparecendo, desde um simples modo de se cortar o papel até a aparência final do
produto acabado” (CAMILO, 2002, p. 74), denota que os estudantes dedicaram-se para que
cada detalhe da maquete ficasse bom. A dedicação é um aspecto necessário para
desenvolver a criatividade. Possivelmente, quando concluíram a maquete, viram que
tinham desempenhado um bom trabalho, com todos os detalhes da quadra original. O fato
de concluírem a maquete em todos os seus detalhes, conforme a descrição do autor, pode
ensejar a formação do autoconceito positivo dos estudantes.
“Após a maquete concluída, ela ficou em exposição, e pudemos observar que despertou
grande curiosidade por parte dos professores e outros alunos do colégio. Os elementos do grupo
fizeram apresentação da maquete em suas turmas, relatando alguns detalhes da construção, assim
como da experiência vivida no projeto” (CAMILO, 2002, p. 74).
O resultado físico, que foi a maquete, nesta atividade de Modelagem Matemática
trouxe reconhecimento do trabalho em âmbito escolar. Professores e alunos interessaram-
se pela atividade que o grupo desempenhou. A maquete foi o produto e a manifestação da
criatividade por parte dos estudantes.
Uma das questões levantadas foi a respeito do piso da quadra, que precisava ser substituído.
Decidiram fazer orçamento de um novo piso, mas necessitavam de algumas informações: cálculo das
quantidades de material, custo dos materiais e mão-de-obra. O autor relata que aproveitaram para
“explorar com os alunos vários conteúdos matemáticos. Para o desenvolvimento desses conteúdos
utilizamos em grande parte o conhecimento prévio que os alunos manifestavam, ou seja, utilizando
relatos de fatos, curiosidades, experiências do cotidiano, etc. Estavam empenhados na resolução e
63
discussão de vários problemas que iam aparecendo, desde um simples modo de se cortar o papel até a
aparência final do produto acabado” (CAMILO, 2002, p. 75).
“No momento em que o grupo discutia as estratégias para a construção da maquete da
quadra de esportes (ginásio), um dos elementos mostrava-se interessado em confeccionar as
miniaturas, em madeira, das colunas de sustentação do ginásio. perceberam que precisavam de
mais algumas medidas, pois, na ocasião da medição anterior, as atenções do grupo estavam mais
voltadas para os detalhes internos do ginásio. O grupo retornou ao ginásio para medir as colunas e no
momento em que estavam medindo observaram suas formas, identificando-as como prismas
irregulares. A partir do interesse que os alunos demonstraram pela forma das colunas, passamos a
desenvolver os conteúdos da área da superfície total e volume. (...) Os alunos utilizaram-se da
miniatura da coluna confeccionada em cartolina para determinar o modelo matemático para o cálculo
da área da superfície total. Recortaram as arestas do sólido (...), planificando-o, encontraram dois
trapézios semelhantes e três retângulos e um quadrado” (Estavam empenhados na resolução e
discussão de vários problemas que iam aparecendo, desde um simples modo de se cortar o papel até a
aparência final do produto acabado” (CAMILO, 2002, p. 76).
Consta no relato que encontraram o
modelo matemático e fizeram os cálculos para comprovação empírica.
“Após a conclusão dos cálculos referentes à área da superfície total de uma das colunas que
dão sustentação ao ginásio, o grupo passou a direcionar esforços para o cálculo do volume” (p. 79). O
professor iniciou com o estudo do volume do paralelepípedo retângulo, utilizando como modelo caixas
de papelão trazidas pelos alunos. Após a compreensão pelos alunos do volume do paralelepípedo
retângulo, passamos ao desenvolvimento do modelo matemático para o cálculo do volume de uma das
colunas de sustentação do ginásio de esportes. (...) No intuito de facilitar a compreensão do processo de
Modelagem, sugerimos aos alunos que dividissem em duas partes a miniatura da coluna em madeira.
(...) Imediatamente os alunos reconheceram os prismas resultantes e passaram a calcular seus
volumes” (CAMILO, 2002, p. 79-80). Encontraram o modelo matemático e fizeram o cálculo do
volume da coluna com a comprovação do modelo empírico.
Destaca-se, principalmente, nesse excerto a habilidade de elaborar modelo para
solucionar situações matemáticas, do Quadro I: Características da Pessoa Criativa, pois o
grupo elaborou um modelo para calcular a área total da coluna de sustentação do ginásio.
64
O professor observa que “os alunos mostraram-se interessados e participaram
intensamente, contribuindo com muitas idéias na abordagem da construção do modelo (CAMILO,
2002, p. 82). Relata que para medida do diâmetro da bola de basquete fizeram várias tentativas de
diferentes maneiras e por fim calcularam a média aritmética dos valores encontrados.
Segundo
Camilo (2002) o tema quadra de esportes proporcionou a abordagem de diversos conteúdos
matemáticos: sistemas lineares, matrizes, determinantes, geometria analítica, geometria
plana e espacial.
As capacidades do pensamento criativo, descritas por Torrance (1976), são
utilizadas em praticamente todos os momentos do trabalho. A cada etapa os estudantes
precisavam resolver problemas que surgiam, assim, eles tomavam consciência dos
problemas, pensavam em soluções e colocavam em prova.
Outro aspecto a ser considerado é que o trabalho foi desenvolvido em grupo e esse
é fator importante para o favorecimento da criatividade em sala de aula. Os estudantes
puderam formular problemas, colocar suas idéias e sugestões para resolução e ainda
tinham autonomia e liberdade para propor idéias, soluções para problemas, etc. O professor
teve o papel de mediador do grupo, fazendo intervenções quando necessário era, alguém
experiente com quem os alunos poderiam contar.
É importante destacar que a tarefa desenvolvida pelos estudantes, ou seja, os
modos que procederam e encaminharam os processos de resolução, foram heurísticos pois
o professor não estabeleceu nada de antemão e deixou que a atividade fluísse livremente,
conforme os questionamentos e as necessidades que surgiam. Esse é outro fator que
permite a manifestação da criatividade.
65
2.2.2 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘MODELAGEM
MATEMÁTICA NO CONTEXTO DO ENSINO MÉDIO: POSSIBILIDADE DE
RELAÇÃO DA MATEMÁTICA COM O COTIDIANO’ TEMA: CULTURA DA
SOJA
Soistak (2006) descreve uma aplicação de Modelagem Matemática na primeira
série do ensino médio de um colégio agrícola na cidade de Ponta Grossa, PR. O trabalho
foi desenvolvido em uma turma regular, em duas aulas semanais, em que a pesquisadora
atuava como professora regente da disciplina de Matemática. A turma era composta por
trinta e seis alunos, com faixa etária entre 14 e 16 anos.
A pesquisadora iniciou o trabalho com uma conversa com os alunos, falou da
importância da Matemática no dia a dia e na escola, em seguida propôs a Modelagem
Matemática como uma metodologia alternativa que torna o ensino da Matemática mais
dinâmico e atrativo, e comentou sobre a forma de encaminhamento do trabalho durante a
aplicação dessa metodologia
. Inicialmente “[...] Os alunos se entusiasmaram com a possibilidade
de aprender Matemática de modo mais relacionado com seu cotidiano” (SOISTAK, p. 67).
Primeiramente, com base no dado empírico, percebe-se a disponibilidade da
professora de trabalhar com os estudantes de uma maneira diferente da tradicional. A
Modelagem Matemática, como uma metodologia para o ensino da Matemática, exige do
professor essa disponibilidade pois, muitas vezes, professores e alunos deparam-se com
situações novas e, conseqüentemente, exige também maior dedicação do grupo para com a
atividade. Essa disponibilidade e desejo de enfrentar situações novas do professor incentiva
os alunos a também se disporem a enfrentar tais situações, isso contribui para o
desenvolvimento da criatividade dos alunos e do próprio professor.
Após a explanação de como seria o trabalho, os temas foram levantados, sendo a maioria
deles relacionados com a Agropecuária. Houve exposição dos temas, com muitas discussões entre os
alunos, a votação ficou para aula seguinte. O tema escolhido foi a cultura da soja, os alunos dividiram-
66
se em seis grupos para coletar os dados que considerariam relevantes sobre o assunto (SOISTAK,
2006).
Nesse trecho é possível notar que os alunos são incentivados a comunicarem suas
idéias sobre o que gostariam de trabalhar em sala de aula. O professor dá liberdade aos
estudantes de explanar e discutir, para assim escolherem o tema. Isso contribui para o
desenvolvimento da autonomia dos alunos.
Segundo a autora, na fase da coleta de dados, alguns grupos sentiram dificuldades, alegaram
falta de tempo, e que o tema era muito amplo e não sabiam o que fazer. Então aconteceu mais uma
conversa entre alunos e professor e foram enumerados alguns pontos que poderiam ser pesquisados:
área a ser plantada, tipos de semente, investimento e lucro (SOISTAK, 2006).
Na data marcada os grupos fizeram a exposição do que haviam pesquisado, com isso
surgiram várias dúvidas e questionamentos. “Houve infelizmente alguns alunos que ficaram apáticos
não participando das apresentações”. Os temas abordados sobre o assunto foram: importância da
análise do solo para o correto plantio da soja; variedades, aumento da produção e sobre o valor
nutricional do grão; gráfico da margem de lucro, perda e custo da safra; tabela com variação do preço
em dólar dos principais produtos derivados da soja (óleo, farelo e grão) no intervalo de 1992 a 2004;
principais regiões que cultivam a soja e insumos utilizados nessa cultura; fórmula do cálculo para
perdas em hectares. Cada grupo apresentou um tema (SOISTAK, 2006, p. 68).
Nos dois parágrafos anteriores percebe-se que os alunos não estão acostumados
com esta forma de encaminhamento das aulas, já que exige da parte deles uma participação
ativa. Observa-se que a Modelagem ao proporcionar uma participação mais direta e uma
mudança na dinâmica da sala de aula pode, de início, ensejar situações de participação e
envolvimento dos alunos de uma forma a que eles não estão habituados, desenvolvendo
uma apatia inicial, superada com o desenvolvimento do trabalho. Assim, foi necessário
novamente o incentivo do professor, para que então os estudantes fossem pesquisar os
temas relacionados à soja. Nesta etapa, foi muito importante o papel do professor para que
os alunos não desanimassem e persistissem nas ações propostas no inicio. A persistência
nas ações consiste num aspecto fundamental para produção criadora.
67
A autora afirma que durante a apresentação de um grupo os próprios alunos
levantaram o problema de saber analisar a variação de preços e das quantidades produzidas que ali
estavam apresentadas de modo mais prático, por porcentagem. Assim houve a necessidade de
aprofundar o assunto de porcentagem e regra de três, completando esses conteúdos com os exercícios
propostos pela apostila”. Aproveitaram para fazer uma análise da cotação do dólar em relação a
outras moedas
(SOISTAK, 2006, p. 68).
“Ainda desse grupo retiramos a seguinte afirmação: a produtividade média nas lavouras
brasileiras se mantém em 800 kg/ha. Interpretando tal afirmação e de modo intuitivo chegamos a
conclusão que conforme a área plantada varia, os grãos colhidos também variam. Começamos então o
conteúdo matemático sobre funções estabelecendo a noção de função, o conceito, a lei de formação e o
gráfico representado por essa função em particular”. Encontraram a lei matemática que associa grãos
e área: y = 800x. Fizeram o gráfico dessa função. Dando continuidade ao assunto de funções,
estudaram funções lineares e quadráticas, relacionando com tema (SOISTAK, p. 69).
Os dados empíricos indicam que a partir de uma situação real os alunos
perceberam problemas matemáticos. Então foi necessário que o grupo aprofundasse
conceitos matemáticos para solucionar a questão levantada. Em seguida, interpretaram a
informação de que “a produtividade média nas lavouras brasileiras se mantém em 800
kg/ha”, em termos matemáticos. Encontraram o modelo matemático para tal afirmação e,
ainda, estudaram o conteúdo de funções partindo do conceito, até a expressão analítica.
Assim, destacam-se dois itens do quadro I: Características da Pessoa Criativa, Criatividade
em Matemática: habilidade para perceber problemas a partir de uma situação matemática e
formular questões que possam responder a esses problemas e habilidade de elaborar
modelos matemáticos.
A autora explicita que
“a etapa da análise crítica dos resultados permitiu aos alunos
desenvolverem sua criticidade e analisarem a validade dos conteúdos matemáticos com a realidade em
questão”.
Salienta ainda que “como as conclusões e análises demoraram um pouco para acontecer,
alguns alunos [...] propuseram que o professor retornasse aos conteúdos e exercícios da apostila em
68
todas as aulas e que a metodologia da Modelagem Matemática fosse abandonada alegando muito
trabalho e que tinham que pensar muito nas aulas de Matemática” (SOISTAK, 2006, p. 70).
O relatado anteriormente, por mais que pareça algo negativo, que os alunos não
estavam gostando da nova metodologia, pode-se analisar de maneira positiva. Os alunos
alegaram muito trabalho e excessivo esforço mental, o que mostra que a aula de
Matemática conduzida da forma tradicional deixa os alunos acostumados a não refletirem
sobre o que estão fazendo, e sim apenas a reproduzirem os exercícios, conforme as “dicas
do professor. Quando se deparam com uma forma diferente de participação nas aulas em
que necessitam pesquisar, propor idéias, participar ativamente como sujeito do processo
ensino-aprendizagem, manifestam certa rejeição. O que mostra que a Modelagem
Matemática, ao romper com a visão linear de currículo, enseja procedimentos mais
reflexivos por parte do professor e dos estudantes.
A professora conversou com os alunos sobre a oportunidade de aprendizagem diferenciada
da Matemática proporcionada pela Modelagem Matemática e a possibilidade de plantação de soja
numa área de doze alqueires no colégio, isso “despertou novamente o interesse desses alunos que
haviam se desmotivado por algum tempo. Pois que iriam plantar soja no colégio, eles poderiam
relacionar os conteúdos aprendidos na sala, não na Matemática, mas também em outras disciplinas
com a prática que lhes estava sendo proporcionada” (SOISTAK, p. 70).
Observa-se na descrição anterior que, provavelmente, foi despertado o interesse
dos alunos com relação à atividade de Modelagem pelo fato deles poderem relacionar os
conhecimentos escolares com atividades do cotidiano. Possivelmente os estudantes
sentiram-se motivados, em virtude da cultura de soja fazer parte do dia-a-dia deles.
Os alunos solicitaram que os grupos fossem subdivididos pois, com três participantes,
haveria maior entrosamento e participação para realização do trabalho. A seguir, foi proposta a
seguinte situação “fazer o levantamento do que precisa e de quanto precisa para plantar soja numa
área limitada por 2 km de perímetro” (SOISTAK, p. 70). “Esse questionamento fez com que os grupos
tivessem que encontrar a área que seria plantada para poderem calcular a quantidade de sementes e as
69
dúvidas e discussões surgidas nos grupos foram muito importantes para despertar um interesse maior
em se envolver e resolver a situação problema” (SOISTAK, p. 70).
Foi possível infeir que a professora lançou uma situação-problema para que os
alunos encontrassem a solução. Possivelmente, eles utilizaram as capacidades do
pensamento criativo, descritas por Torrance (1976): tomaram consciência do problema,
pensaram em soluções e submeteram à provas. Outro fator importante é que ao deparar-se
com uma situação real, à qual tinham que propor soluções, os estudantes sentiram-se mais
motivados e com maior interesse pelo problema. Isso pode ter contribuído para que se
dedicassem e se envolvessem mais com o trabalho.
“Os próprios alunos sentiram a necessidade de conhecer melhor as medidas agrárias e sobre
esse assunto realizaram uma nova coleta de informações. Durante a explanação da coleta de
informações o professor questionou junto a eles como surgiram os sistemas de medidas e como fazer
para realizar tais medidas, bem como foram levantadas todas as relações existentes entre as medidas
oficiais (metro e seus derivados) e arbitrárias (litro, braças, palmos,...)” (SOISTAK, p.71). “O
envolvimento da falia de alguns alunos foi necessária e muito bem vinda, pois muitos pais
originários de regiões agrícolas conhecem as medidas usadas na agricultura como braça, alqueire, litro
e os alunos questionaram em casa e trouxeram as respostas para discussão e análise em grupo”
(SOISTAK, p. 71). A equipe teve que esclarecer algumas dúvidas com o técnico agrícola do colégio e
com a agrônoma e também professora da disciplina de horticultura sobre o plantio.
Esse trecho comprova o dito anteriormente. Pela descrição, pode-se admitir que
houve a dedicação, o esforço e o envolvimento dos estudantes no trabalho, tendo em vista
que eles próprios consideraram necessário pesquisar mais sobre o assunto, questionar a
família e outros profissionais da área.
Durante o processo de Modelagem ocorreu um contratempo, pois “a área que seria cedida
para plantação foi embargada e a plantação não foi executada” (SOISTAK, p. 71). Porém, a
pesquisadora relata que “a aplicação da Modelagem Matemática fez com que os alunos continuassem
seus cálculos e chegassem as conclusões, validações e análises críticas dos seus resultados, mesmo o
havendo a prática da plantação do soja” (SOISTAK, p. 71).
70
Com relação à atividade de forma geral, destaca-se que nas passagens em que os
estudantes manifestaram sua opinião de que não estavam gostando da forma de ensino o
professor não ignora essas reclamações mas, ao contrário, conversa com os estudantes e
argumenta sobre a “oportunidade de aprendizagem da Matemática proporcionada pela
Modelagem Matemática”. Isso demonstra a postura dialógica do professor que, conforme
Torrance (1976), desempenha o papel de “ser um guia” e não guiar como verbo transitivo
no sentido de estímulo-resposta.
Salienta-se que o grupo utilizou processos heurísticos para desempenhar a
atividade, pois a professora não estabeleceu modelos prontos para os alunos seguirem. Pelo
contrário, todos os participantes (estudantes e professor) tiveram que colaborar para
levantar os problemas e buscar as soluções, os quais não tinham de antemão. O papel do
professor foi fundamental para incentivar os estudantes a prosseguirem na atividade.
2.2.3 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘A PRODUÇÃO DE
DISCUSSÕES REFLEXIVAS EM UM AMBIENTE DE MODELAGEM
MATEMÁTICA’ – TEMA: FATURA DE ÁGUA
Neste trabalho de Modelagem Matemática a pesquisadora acompanhou as
disciplinas de Metodologia e Estágio Supervisionado II e III, de um curso de licenciatura
em Matemática. Todos os alunos deveriam realizar uma atividade de Modelagem nas
turmas em que lecionavam, assim, ela escolheu uma determinada professora para
acompanhar as aulas, nas quais seriam desenvolvidas atividades de Modelagem. A
professora lecionava numa escola pública no município Coração de Maria, BA, que
apresentava várias dificuldades como lousa gasta, cadeiras quebradas, entre outras. A
turma escolhida foi uma série do Ensino Fundamental com faixa etária entre 12 e 13
anos. Como a escola conduzia um projeto de Meio Ambiente, fazia-se necessário que o
trabalho fosse voltado para esse assunto, logo, a professora escolheu o tema “fatura de
71
água”. A coleta dos dados deu-se através da observação da pesquisadora, com anotações e
filmagem de um grupo de seis alunos (equipe sorteada para pesquisa) em sala de aula
executando o trabalho proposto pelo professor. A pesquisadora não participou das
atividades desenvolvidas na equipe.
Inicialmente a professora solicitou aos alunos que trouxessem uma fatura de água de suas
casas, que seria analisada junto com a fatura da residência da professora e da escola. A professora
inicia a aula indagando aos alunos sobre a fatura de água: se eles sabem como é feita, o que pagam e
por que pagam, etc. Então a professora propôs a seguinte atividade: agora, cada um vai olhar, em
equipe, a fatura da conta de água, e destacar três itens que mais chamaram a atenção de vocês. Depois
disto, cada um vai colocar no quadro o que cada equipe destacou” (SANTOS, 2007, p. 61).
“Após algum tempo, a professora solicitou que as equipes apresentassem os seus resultados.
Cada uma delas dirigiu-se à lousa e escreveu três itens de interesse que desejava explorar. Como
resultado as equipes listaram os respectivos aspectos abaixo:
Equipe 1: qualidade de água, hidrômetro, não quitamento de débitos
anteriores;
Equipe 2: consumo de água, média mensal, barra de cálculo e itens;
Equipe 3: período do consumo, vencimento, total a pagar;
Equipe 4: leitura e consumo dos últimos meses, unidade do consumo,
inscrição e matrícula;
Equipe 5: especificação do consumo de água, parâmetros, consumo;
Equipe 6: parâmetro, hidrômetro, localização;
Equipe 7: unidade de consumo, hidrômetro, informação de pagamento de
conta, multas e juros.” (SANTOS, 2007, p. 62)
A partir da análise desses dados empíricos supõe-se que a professora utilizou a
técnica “tempestade de idéias” para iniciar a atividade na classe. Os estudantes tiveram que
levantar os aspectos que mais chamavam atenção sobre a fatura de água para que depois
fossem estudados. A professora incentivou os alunos a comunicarem suas idéias,
debaterem o tema em equipe, favorecendo dessa forma o desenvolvimento da autonomia e
72
liberdade de ação dos estudantes. Todos esses aspectos constituem-se facilitadores do
desenvolvimento da criatividade dos envolvidos com o trabalho.
“Após a listagem dos aspectos acima, a professora selecionou os itens mais reincidentes e
colocou-os em ordem de importância para a turma, estabelecendo o seguinte: primeiro, o consumo;
segundo, parâmetros; e terceiro, hidrômetro. Na seqüencia, a professora pede para a turma analisar a
conta de água e, em seguida, apresenta a fatura do consumo mensal de água de sua própria residência
e a da escola. A seguir, a professora apresenta a próxima tarefa: Vamos começar a atividade com a
escolha, em cada equipe, de um colega para verificar o seu consumo em casa durante uma semana, de
amanhã [quinta-feira] até a próxima semana, na quarta-feira. Vamos também escolher um colega da
equipe para verificar o consumo da escola” (SANTOS, 2007, p. 62).
Logo os alunos iniciam um diálogo a fim de se organizarem para cumprir a tarefa. Do grupo
5 (grupo sorteado), fica um aluno para verificar o consumo da casa e outro da escola. “Neste momento,
a professora se aproxima do grupo, e convida a todos para ir à área externa da escola, onde se localiza
o hidrômetro. Ela iria mostrar e explicar o funcionamento deste equipamento aos alunos. Uma vez que
todos estão reunidos no local onde o hidrômetro da escola estava instalado, ela inicia uma explicação
sobre o mesmo”. A professora retorna com a turma para sala de aula e explica como os alunos deverão
anotar o consumo da casa e da escola (SANTOS, 2007, p. 63).
Na aula seguinte, a professora solicitou aos estudantes que colocassem no quadro os valores
coletados desconsiderando da equipe 1 e 7, que tiveram problemas na coleta, conforme o quadro a
seguir, apresentada pela residência da equipe 5:
“Após as anotações dos alunos na lousa, a professora solicitou que eles observassem o que
estava escrito, para iniciar as discussões referentes à fatura da conta de água e como esta era feita. Ela
73
explicou o que aconteceu com as equipe 1 e 7, o que não atrapalharia a continuidade do trabalho. A
seguir a professora foi ao quadro e solicitou aos alunos de cada equipe que dissessem quantas pessoas
moravam nas residências pesquisadas, e anotou-o ao lado das leituras de consumo de cada equipe, com
o propósito de comparar a quantidade de pessoas com o valor do seu consumo. Como resposta, a
professora ouviu primeiramente que na casa pesquisada pelo grupo 4 moravam 3 pessoas, no grupo 5
moravam 2 pessoas, no grupo 6 eram 4 pessoas morando na casa e, no grupo 2, eram 3 os moradores”
(SANTOS, 2007, p. 68).
“Após anotar na lousa o consumo da semana e a quantidade de pessoas da casa de cada
equipe, a professora voltou a atenção da turma para o item consumo, mais particularmente para o
modo como a fatura da conta de água era feita. Inicialmente a professora questiona se os alunos
sabiam como era feita a conta de água. Todos respondem que não o sabiam e continuam ouvindo os
outros questionamentos e considerações da professora. Nem todos, porém, tinham o mesmo
comportamento. Dois alunos desta equipe mantinham uma conversa sobre outros interesses”
(SANTOS, 2007, p. 68).
A professora chama a atenção dos alunos para as tabelas que as equipes
registraram no quadro, a fim de comparar os resultados das residências de cada equipe.
“Para este fim, ela começa a desenvolver o cálculo na lousa, lembrando para os alunos o que explicou
sobre o hidrômetro na primeira aula. Neste momento, todos os alunos das equipes estavam atentos,
pois o hidrômetro estava na mão da professora, e em seguida ela permite que ele passe de mão em mão
para exame” (p. 68). Primeiramente a professora reforça a idéia de como a EMBASA
3
desenvolve o
cálculo, ou seja, a fatura da conta de água, para que os alunos façam da mesma forma. “Para explicar
como os lculos eram desenvolvidos, a professora organiza a operação na lousa, descrevendo devagar
e de forma enfática cada passo. A equipe 5 (a que estava sendo observada) mantinha-se atenta”
(SANTOS, 2007, p. 69).
O relato do parágrafo anterior pode significar que a professora explicou aos
estudantes como fazia o cálculo da fatura de água para que fizessem da mesma forma. Essa
descrição de ‘faça conforme o modelo’ remete ao ensino tradicional da Matemática, a
diferença é que, neste caso, o grupo estava abordando uma situação real, contextualizada.
3
Empresa Baiana de Saneamento
74
Essa postura da professora, possivelmente, não se constitui em facilitadora da criatividade
dos estudantes, tendo em vista que eles estão realizando uma tarefa algorítmica e não
heurística, conforme Amabile (1996) em Virgolim (2007).
“Os alunos da equipe 5 faziam os cálculos juntos, ajudando uns aos outros. Mais
particularmente, a aluna Mariana
4
se destacou na habilidade de realizar cálculos matemáticos, e
sempre se disponibilizava a auxiliar os colegas. A professora percorria a sala, verificando a execução
dos cálculos pelas equipes” (SANTOS, 2007, p. 69). “Após auxiliar as colegas da própria equipe,
Mariana foi chamada pela equipe 4 para explicar como era realizada a operação de subtrair. Quando
ela acabou a explicação de como os cálculos eram desenvolvidos, passou a observar os resultados das
outras equipes, notando que os valores eram diferentes do seu” (SANTOS, 2007, p. 70).
Consta no relato que os integrantes da equipe 5 travaram discussões acerca dos valores
encontrados sobre o consumo de água e a diferença de resultados encontrados comparando com as
outras equipes. (SANTOS, 2007).
Novamente a descrição sugere um trabalho em grupo e a comunicação entre os
estudantes sobre o cálculo da fatura de água. O trabalho realizado em equipe pode ser um
facilitador do potencial criativo.
“Ao tempo que a equipe comentava sobre os resultados encontrados, a professora solicitou
aos alunos que disponibilizassem os cálculos encontrados em equipe no quadro. Mariana estava com
receio de ir ao quadro devido às conjecturas levantadas internamente, em equipe. Todas as equipes,
menos a 3, pois era a conta de água da escola, se dirigem ao quadro para anotar os valores
encontrados”. Em seguida a professora começa a estabelecer relações entre consumo de água e
quantidade de pessoas que moram na residência (SANTOS, 2007, p. 71).
“Após a análise da conta de água da casa da aluna da equipe 5, a professora começou a
analisar a conta de água da escola com o cálculo da equipe 3. Ela aponta que o valor neste mês foi
muito alto em relação aos meses anteriores, e enfatiza que os alunos estão desperdiçando água. Com a
tabela de tarifas em mãos ela explica aos alunos que a escola gastou 24 m
3, conforme a fatura em suas
mãos. Aproveita o momento e explica que para o consumidor doméstico o consumo de água custa
R$0,91 por m
3 , e para a escola o m3 custa R$3,20. Após a explicação, ela solicita que todos peguem a
4
Nome fictício, segundo a autora.
75
tabela de tarifa e vejam as diferenças entre os valores. Neste momento, o aluno da equipe 2, Felipe,
questiona quanto à diferença entre o valor cobrado para conta de casa e de prédio público. Em
seguida, a professora chama a atenção para a pergunta desse aluno, demonstrando que sua fala era
importante para o que estavam estudando” (SANTOS, 2007, p. 72).
A professora propôs como tarefa analisar os cálculos relativos ao consumo de água da casa onde a
leitura do consumo no hidrômetro foi realizada, e solicitou para todos que descobrissem uma forma de evitar o
desperdício
(SANTOS, 2007).
Na aula seguinte a professora criou um problema, extraído de um livro didático
oferecido pela professora de português, que continha uma reportagem de jornal intitulada
“Economia de água, não desperdice”. Nessa reportagem constava uma tabela em que
estavam descritas as atividades domésticas, o tempo e a quantidade de litros de água
consumidos e, ainda, sugestões para economizar água.
“A professora apresentou para os
alunos, escrevendo na lousa, a situação de uma família inspirada pela reportagem, cujo valor do
salário mínimo, no ano de 2006, era de R$ 350,00, e perguntou para todos quanto era necessário
economizar, no caso economia de água, e pagar todas as despesas na casa daquela família criada com
um salário real” (SANTOS, 2007, p. 74).
Os dados no quadro foram colocados da seguinte forma:
“Verônica - para lavar a louça levou 30 minutos
Sandra - levou 30 minutos regando o jardim
Tadeu - quando foi lavar o carro levou 1 hora ou 60 minutos
Orlando - ficou 45 minutos lavando a calçada” (SANTOS, 2007, p. 75)
Após escrever na lousa o problema, a professora solicitou que colocassem a reportagem na
carteira para começar a desenvolver os cálculos. E falou o seguinte: “agora que eu coloquei esta
situação, vocês vão pegar as duas tabelas [texto ‘Economia de água: não desperdice!’ e tabela de
tarifas]. Vocês vão calcular quanto de água foi gasto nesta residência, aqui são os meus quatro filhos
desperdiçando água o tempo todo. Então, eu quero saber de vocês se este comportamento que eles têm, no
final de 30 dias, está de acordo com as tabelas. E qual é o valor que eles vão pagar?”( SANTOS, 2007)
Pela descrição pode-se inferir que a professora não deu oportunidade aos alunos
de criarem problemas. A fala: agora que eu coloquei esta situação, vocês vão pegar as
76
duas tabelas [...], evidencia que foi a própria docente que criou a família fictícia e
apontou quanto tempo cada membro da família tinha consumido água. Em seguida ela
explicitou exatamente o que os estudantes deviam calcular e como eles deviam fazer, com
base numa situação já posta. Essa postura da professora pode não ter oportunizado o
desenvolvimento de habilidades relacionadas à criatividade como, por exemplo, a
sensibilidade a problemas e conseqüentemente, as outras habilidades do pensamento
criativo, descritas por Guilford (1950, 1975).
“A seguir, foi ao quadro e explicou como cada cálculo era desenvolvido, depois de ter
passado em cada equipe e ter verificado como estava sendo feita a atividade, e se tinham alguma
dificuldade. A questão principal percebida nesta situação era que Joana
5
queria calcular o consumo de
água da família que criou, durante um mês, pois é o tempo entre uma fatura de conta de água e outra,
para o pagamento da mesma, e solicitou aos alunos que seguissem a tabela. Seguindo as especificações
conforme a tabela residencial e pública, Joana propôs como questão para os alunos calcular o valor a
ser pago do consumo de água daquela família durante um mês. Como na tabela também é informado o
valor da taxa de prédio público, decidiu por solicitar aos alunos que calculassem o valor a ser pago
pela escola” (p. 75). “Não questionamentos entre os alunos. Então, como todos estão olhando para o
quadro, ela continuou a explicação, escrevendo no quadro e expondo para os alunos como desenvolvia
a atividade. Como o tempo da aula havia terminado, a professora preferiu deixar o restante da
atividade para a aula seguinte” (SANTOS, 2007, p. 76).
As descrições ensejam que a professora manteve-se a frente em todos os
momentos da atividade. Visto que, ela criou a situação, decidiu o que os alunos deveriam
fazer e mostrou como fazer para que, então, eles chegassem a resposta por ela desejada.
Essa forma de procedimento adotado pela professora corrobora e reafirma a algorítmica
que alunos estavam desenvolvendo, e não heurística, pois não tinham que pesquisar nada e
muito menos descobrir, somente fazer os cálculos de maneira correta. Além disso, pela
leitura do relato, a professora não oportunizou a liberdade para os estudantes pudessem
5
Nome fictício da professora, segundo a autora
77
propor situações não favorecendo, dessa forma, a autonomia e ainda não incentivou o
espírito de pesquisa.
Segundo Santos (2007), na aula seguinte a professora escreve no quadro o modelo para
cálculo da conta de água, conforme a tabela abaixo:
Tendo em vista a família criada e a tabela que constava na reportagem “Economia de água,
não desperdice”, a professora escreveu as seguintes questões no quadro:
Verônica- Para lavar a louça levou 30 minutos. Logo, 117 litros a 30 minutos são 234 litros
consumidos;
Sandra- Levou 30 minutos regando o jardim. 186 litros a 30 minutos representam 558 litros
consumidos;
Tadeu- Lavou o carro em 1 hora, ou seja, 60 minutos. 560 litros a 60 minutos computam
1.120 litros consumidos;
Orlando - Ficou 45 minutos lavando a calçada. 279 litros a 45 minutos totalizam 837 litros
consumidos.
A professora somou o consumo de água de todos da família, perfazendo um total de 2479
litros. O valor precisava ser expresso em metros cúbicos, a professora explicando no quadro,
transformou o valor, encontrando 82,47 metros bicos. Voltou a tabela anterior e explicou que se
enquadraria na etapa 8. Chegaram ao valor de 98,56, somando todas as etapas verificaram o total de
R$207,51 a pagar em um mês da fatura de água, pela família criada pela professora inspirada na
reportagem (SANTOS, 2007).
Pela descrição apresentada pode-se inferir o mesmo procedimento adotado pela
professora: apresenta a tabela, faz os cálculos no quadro, transforma litros em metros
78
cúbicos e chega à resposta. Possivelmente os estudantes apenas prestaram atenção e
tentaram acompanhar o raciocínio da professora, não tiveram que empreender nenhum
esforço para colaborar na atividade, nem desenvolver os cálculos matemáticos. Muitas das
habilidades relacionadas à criatividade, que poderiam ser exploradas deixaram de ser,
tendo em vista que os alunos ficaram numa situação de passividade, como meros ouvintes.
A seguir, a professora começou a questionar os alunos perguntando: Quantas pessoas tem
esta família? [família criada]. São quatro pessoas participando da situação, ainda tem o Pai e a Mãe.
Então, nesta família que estamos fazendo como hipótese tem 6 pessoas. O que fazer para economizar e
pagar menos?” (SANTOS, 2007, p. 79).
Nilza
6
falou: pede empréstimo para pagar”, outra aluna exclamou: molhar a planta um
dia”. A professora argumentou perguntando se a matemática que eles estudam ajuda a se
endividarem, complementou ainda: tem de economizar água, porque um dia a água vai acabar”.
Nilza argumentou ainda: Professora, um salário mínimo não para quase nada em casa. Ainda
tem que pagar este valor de água que a senhora calculou no quadro. Tem que pegar empréstimo”. A
professora solicitou que cada equipe desse sugestões sobre a condição de seis ou quatro pessoas
passarem o mês com o salário mínimo. Segundo a pesquisadora: “As equipes buscavam uma forma de
solucionar um problema criado, ajustando-o a situações reais que eram o seu parâmetro. Após o tempo
dedicado pela professora para a socialização das equipes, ela solicitou aos alunos que dessem a sua
resposta” (SANTOS, 2007, p. 81).
A professora tomou as sugestões da equipe 4 e escreveu no quadro:
Luz R$ 15,00
2 k feijão R$ 2,80
2 k arroz R$ 3,00
1k açúcar R$ 1,10
Sal R$ 0,50
1k de macarrão R$ 1,50
Óleo R$ 2,80
Gás R$ 33,00 = Total R$ 79,79
6
Nome fictício da aluna, segundo a autora
79
A professora falou que com essa quantidade de comida não para uma família passar o
mês e fez as seguintes relações: se a família gastou 207,51 em água e 79,79 em comida, sobrou 72,70. A
professora sugeriu aos estudantes que analisassem a fatura de água, que deveria ser economizada
(SANTOS, 2007).
Quando a professora solicitou que cada equipe considerasse a possibilidade de
seis ou quatro pessoas passarem o mês com o salário mínimo, observa-se uma tentativa de
instigar os estudantes para resolver um problema que é real em muitas famílias brasileiras.
Assim, possivelmente, eles valeram-se das capacidades básicas do pensamento criativo
descrito por Torrance (1976), que é tomar consciência de problemas, pensar em possíveis
soluções e submetê-las à prova. A equipe 4 apresentou uma lista com as necessidades
básicas para a família e calculou o total a ser gasto expondo, dessa forma, uma possível
solução para o problema. Porém, essa postura adotada pela professora durou pouco tempo
pois, em seguida, retomou o processo centralizador ao falar que a quantidade de comida
não dá para a família passar o mês, fazer o cálculo do dinheiro que vai sobrar considerando
a fatura de água e as outras despesas, e afirmar que a solução é economizar água. O que,
provavelmente, não contribuiu para que os alunos a fizessem uma reflexão sobre a
situação-problema. Ela poderia ter questionado mais os alunos sobre a quantidade de
comida e a fatura de água, para que eles próprios chegassem à conclusão.
Na aula seguinte a professora chamou atenção dos alunos para tabela da EMBASA, e disse
que se gastar até 10m³, paga-se 9,10 em residência, e exclamou: vejam bem, o que eu quis mostrar a
vocês foi que vocês podem saber como pagar a conta de água, e para que, sabendo como se paga, entender
por que a conta de água é importante, e como podemos economizá-la. O que vocês acharam da
atividade?” (SANTOS, 2007, p. 86).
Sobre a pergunta da professora, do que eles acharam da atividade, surgiram vários
comentários: professora, eu quis aprender porque eu estou ensinando aos meninos de da rua a fazer
contas. E porque eu vou agora verificar o se está certo o valor da conta de água, mas se tem alguém
desperdiçando água, pois não quero morrer de fome”. “Sabe, pró, foi muito importante estas aulas,
porque eu entendi o quanto eu posso ajudar em casa com as despesas. Eu não ligava muito para isso”.
80
Eu adoro brincar na água, acho que agora vou esperar chover”. “Não sei, não. Acho que não tem muita
gente que saiba que é assim que faz os cálculos para saber quanto vai pagar de água” (SANTOS, 2007, p.
86).
Pela fala dos alunos, percebe-se que eles adquiriram certa consciência ambiental
quanto à economia de água. E também, possivelmente, tenha contribuído para um melhor
entendimento sobre o cálculo da fatura de água. Esses são conhecimentos importantes para
a vida deles. Todavia, durante toda a atividade, a professora explorou poucas as
capacidades de levantarem problemas, proporem idéias e soluções, enfim, de colaborarem
com a aula mais ativamente. Em poucos momentos ela deu liberdade para que isso
ocorresse, dessa forma, não contribuiu para o desenvolvimento da autonomia dos
estudantes.
As descrições realizadas ressaltam que a maioria das tarefas que os estudantes
desempenharam foi algorítmica e não heurística, isto é, estava tudo pré-estabelecido, o
caminho que deveriam seguir e a resposta que deveriam encontrar. Houve momentos em
que a professora deixou de estimular as habilidades do pensamento criativo, tais como
fluência, flexibilidade, avaliação, entre outras, descritas por Guilford (1950, 1975), nos
estudantes. Assim, nessa aplicação de Modelagem Matemática em sala de aula, houve
pouco estimulo do potencial criativo dos estudantes.
2.2.4 DESCRIÇÃO E ANÁLISES SOBRE A DISSERTAÇÃO ‘MODELAGEM
MATEMÁTICA NO CÁRCERE’ – TEMA: CONSTRUÇÃO CIVIL
Nessa pesquisa a autora Martha Joana Tedeschi Gomes desenvolveu uma
aplicação de Modelagem Matemática com alunos detentos do Ensino Fundamental do
Segmento da Penitenciária Estadual de Piraquara, de regime fechado e segurança máxima,
e na Colônia Penal Agrícola, de regime semi-aberto, na cidade de Piraquara, PR. A autora
81
atuou como docente na aplicação da Modelagem. Ela justifica o tema abordado para
realização da atividade explicitando que “a ação pedagógica, na perspectiva da Modelagem
Matemática, foi desenvolvida sobre a construção civil, tendo em vista que um terço da
população carcerária hoje existente no Estado do Paraná advém desta profissão” (GOMES,
2005, p. 8).
Segundo a autora, “os sujeitos desta pesquisa constituem-se em 05 (cinco) alunos
detentos do Ensino Fundamental do 2º segmento da Penitenciária Estadual de Piraquara, de
regime fechado e de segurança máxima; e de 01 (um) aluno detento da Colônia Penal
Agrícola, de regime semiaberto” (GOMES, 2005, p. 16). Dessa forma, foram apresentados
seis trabalhos produzidos pelos estudantes durante a realização das atividades.
Conforme o relato, a pesquisadora salienta que
“ao iniciar o ano letivo propus aos
alunos uma forma diferenciada de trabalho. Falei da minha intenção de verificar os saberes relativos à
Matemática por eles adquiridos na sua vida profissional e cotidiana, na área da construção civil. A
princípio sentiram-se inseguros e curiosos. A pergunta mais ouvida foi: como vamos fazer?(GOMES,
2005, p. 26).
Primeiramente, para que a docente pudesse conhecer o grupo, solicitou que os
alunos respondessem um questionário com informações pessoais, idade, escolaridade,
familiares, experiência profissional, entre outras. Em seguida entregou a cada um dos
estudantes uma cópia das leis que regem o zoneamento de Curitiba e normas de CREA-PR.
Juntos começaram a leitura que, segundo ela, foi
“diversas vezes interrompida para solicitar
esclarecimentos sobre o significado de alguma palavra por eles não compreendida. Entretanto, percebi
a matemática inserida em vários aspectos da regulamentação, em especial os conteúdos de geometria,
que lhes pareciam familiares, pelos comentários que faziam de como costumavam proceder em seus
antigos ambientes de trabalho com relação ao que ali estava escrito. Estes comentários me causavam
surpresa, pois eu não havia iniciado o conteúdo da referida disciplina para o segundo segmento do
ensino fundamental” (GOMES, 2005, p. 26).
82
A pesquisadora continua relatando: deixei-os à vontade para trocarem idéias e, em
seguida, distribui a cada um o seguinte material: papel sulfite, lápis preto, lápis de cor, borracha e
régua. Propus a seguinte atividade: projetar uma residência unifamiliar de a 70 (setenta) metros
quadrados em conformidade com as leis estudadas. Para que os alunos pudessem trabalhar com
tranqüilidade não fixei prazo para a entrega do projeto. Apenas salientei que o mesmo deveria ser
executado durante o período de nossas aulas. Durante o tempo que levou para a execução deste
trabalho não emiti opinião ou ofereci qualquer tipo de explicação, e, quando solicitada, limitava-me a
responder-lhes de forma evasiva e algumas frases prontas como: está bom! Que bom você conseguiu!
em frente! Continue! Em alguns momentos sentia-os inseguros, e como não obtiveram junto ao
professor respostas para as suas inquietações, notei no início, e posteriormente, por meio da
consolidação da integração que houve no grupo, que a troca de opiniões e esclarecimentos de dúvidas
era uma constante entre eles. Finalmente após 15 (quinze) horas de aula e depois de recorrerem às
anotações das aulas da disciplina e Educação Artística, para escolherem as cores que melhor gostariam
de pintar suas casas, entregaram-me orgulhosos os seus modelos” (GOMES, 2005, p. 26 e 27).
Esse relato da pesquisadora denota que ela deu total liberdade aos estudantes para
desenvolverem a atividade, até ausentando-se em dar explicações sobre o conteúdo
matemático e outras informações. Fato que consta na declaração “durante o tempo que
levou para a execução deste trabalho não emiti opinião ou ofereci qualquer tipo de
explicação e, quando solicitada, limitava-me a responder-lhes de forma evasiva e algumas
frases prontas como: está bom! Que bom você conseguiu! em frente! Continue!”
(GOMES, 2005, p. 26). Ela apenas os incentivava a continuarem desenvolvendo os
projetos das casas. Esssa forma de proceder da professora pode ter favorecido a autonomia
e liberdade dos estudantes para produzirem os projetos e, ainda, precisarem recorrer aos
conhecimentos escolares e da experiência cotidiana. A postura adotada pela professora foi
o primeiro passo para que a criatividade dos estudantes fluísse livremente. Além disso, a
tarefa que desempenharam foi integralmente heurística, tendo em vista que eles não tinham
modelo pronto para seguir e precisavam criar a planta da casa, obedecendo às normas
legais. Outro fator importante é que, em conseqüência da postura que a professora assumiu
83
durante a realização da atividade, os estudantes necessitaram trocar idéias com os outros
colegas sobre o projeto e a comunicação é um aspecto essencial para o desenvolvimento da
criatividade.
O relato de que os estudantes entregaram orgulhosos os seus modelos remete ao
autoconceito, o qual deve ter melhorado com relação às próprias potencialidades.
Provavelmente eles perceberam que são capazes de criar algo útil e valioso. Além disso, é
possível que muitos deles nunca tinham feito uma planta de casa, assim, foi uma
experiência nova e diferente que eles enfrentaram.
Em Gomes (2005) constam as plantas das casas e as anotações originais de como
iriam construir a casa, os materiais e as ferramentas necessárias, entre outras informações,
produzidas pelos seis estudantes selecionados e as considerações sobre cada trabalho da
pesquisadora. Essas considerações serão descritas a seguir:
1º Trabalho
O aluno “escolheu para executar seu trabalho um terreno de metragem mínima estipulada
de 12x30 o que totaliza 360 metros quadrados, e, sobre ele projetou uma residência unifamiliar 8x9m o
que totaliza 72 metros quadrados. Nota-se em seu trabalho que o mesmo possui noções intuitivas de
estética e desenho. Utiliza entes geométricos como ponto, reta, plano, paralelismo, perpendicularismo e
figuras geométricas tais como o retângulo, quadrado, triângulo, semi-circunferência. Entretanto
percebe-se que o consegue fazer a relação entre medida linear e de área, pois estipula para sua casa
70 m², a desenha com 72 e a declara com área total de 69 m². Em seu trabalho percebe-se a noção
do tridimensional, pois assim escreve ao se referir à parte da frente e de fundos da casa: “como ela tem
8m vou colocar uma viga de 10 x10cm a cada 2m na vertical. e na horizontal vou colocar duas
amarrações de 10 x10x10 cm. E as sapatas vão ser de 30cmx30cm e vão ficar com 80 cm de
profundidade”. Sugere possuir conhecimentos básicos sobre o sistema métrico decimal. Em sua lista de
ferramentas encontram-se, entre outras, a mangueira de nível, régua, esquadro, e o metro dando
margem à dedução que o mesmo possui algum conhecimento sobre ângulos” (GOMES, 2005, p. 37)
(sic).
84
2º Trabalho
Apresenta “um projeto em um terreno de 340 metros quadrados, medindo 17 x 20 m, onde
projetou uma residência de 70 metros quadrados com metragem 7x10m, dentro das normas estudadas.
Seu trabalho sugere que o mesmo possui noção de área total e área útil de uma casa, sendo esta
apresentada com 66,90 metros quadrados, o que não representa a realidade em termos de metragem
total, entretanto, em seu projeto verifica-se que o mesmo considerou as medidas internas para efetuar
o cálculo, e, apesar de ter utilizado medidas exageradas para representar a espessura das paredes, as
identifica de forma clara em seu desenho. Apresenta noções de ponto, reta, plano, paralelismo,
perpendicularismo, como também, de figuras geométricas como retângulo, quadrado, triângulo e
circunferência. A utilização de proporcionalidade e intuição evidencia-se quando escreve como fazer a
massa para reboque 1 ou 2 sacos de cimento, 3 sacos de massa fina, 6 carrinhos de areia e água,
misturar tudo e deixar descansar, a massa gorda e a massa magra + cimento e - cimento”. E declara
“aprendi um pouco olhando os pedreiros, quando mais jovem trabalhei de servente de pedreiro”.
Demonstra saber utilizar corretamente as ferramentas destinadas a aferir, quando as descreve ao fazer
o “afundamento” da casa, entre elas encontra-se o esquadro, o que leva a crer que possui alguma
noção de ângulo” (GOMES, 2005, p. 43) (sic).
3º Trabalho
“O aluno declara ter projetado uma residência com área útil de 43,35 metros quadrados.
Utiliza figuras geométricas como o retângulo, quadrado e triângulo, entes geométricos como ponto,
reta, plano perpendicularismo e paralelismo. Apresenta domínio de conhecimento ao trabalhar com
números decimais. Possui noções básicas de profundidade representada pelo desenho da parte frontal
da casa e no corte vertical das sapatas fincadas no subsolo. O entendimento que o mesmo tem sobre
volume manifesta-se quando o mesmo calcula o volume de uma sapata “30cm x 30cm e 1,5m de
profundidade”.Este aluno possui firmeza nos cálculos que envolvem operações com multiplicação,
evidenciados na forma como os representa, e possui também domínio na utilização de operações com
números decimais e inteiros. A compreensão sobre proporcionalidade apresenta-se com a observação
“p/cada de concreto gastei 3 carrinhos de areia + 2 carrinhos de pedra e 1 saco de cimento”. Em sua
relação de ferramentas necessárias para a construção utiliza, para aferir o esquadro, o metro, a trena,
85
e a mangueira de nível, dando a entender que possui noções sobre ângulos. Declara “através do tempo
que venho trabalhando em minha vida, consegui adquirir algumas experiências básicas e também práticas
nas quais estou usando para construir a minha casa que é de 43,35 m², em um terreno 12mx30m=um total
de 360m2 trabalhando na Prefeitura da cidade de São José dos Campos, São Paulo, aprendias seguintes
profissões, Eletricista instalador, encanador, e também no Dpto. De obras como auxiliar de topógrafo e na
área de desenho tec. Onde aprendi alguns conhecimentos básicos de desenho (croqui). Apesar de fazer
aproximadamente uns 17 anos atrás, acredito que nada mudou tanto. Nos cálculos de concreto usei os
conhecimentos que aprendi trabalhando junto de meu irmão um pouco depois, trabalhando de ajudante
de pedreiro na construção civil. E como alguns cálculos numéricos, em que aprendi na série até nos
anos 80 em que saída escola e só estou voltando agora” (GOMES, 2005, p. 51) (sic).
4º Trabalho
“Este projeto contempla uma casa de oito cômodos localizada em um terreno de 25 X 16 m e
segundo seu autor possui 63,24 m², o que não corresponde com a realidade do desenho que é de 6,20 X
10,20m, executado dentro das normas, conforme representação na planta. Quando descreve a parte da
frente e dos fundos da casa apresenta algum entendimento referente à construção civil adquirido na
prática cotidiana quando descreve: como ela tem 10m vou colocar uma viga de 10cm X 10 cm a cada
2,5m na vertical” e declara “tenho algumas noções básicas, pois já ajudei a construir algumas casas” pois
as representou na planta. Este aluno não possui firmeza de conhecimento ao executar as quatro
operações sicas. Entre as ferramentas de aferir conhece o esquadro, o metro, a mangueira de nível e
o plumo de corda. Utiliza em seu desenho figuras como retângulo, quadrado e triângulo, assim como
ponto, reta e plano, paralelismo, perpendicularismo, segmento de reta” (GOMES, 2005, p. 59) (sic).
5º Trabalho
O estudante declara: “quando eu comesei, eu tinha 12 anos de idade e comesei de servente,
Pedreiro e pude observar quando o pedreiro fazia a construção e a forma em que ele fazia e foi assim em
que eu aprendi fazer uma casa quer dizer a proximadamente. o sico, sempre, Comesando pelo o
fundamento, fazendo as valetas, e deixando bem no nível serto, a valete tem 30 cm de largura e 60 de
altura depois começo a sentar as primeiras fiadas de tijolos, mas antes de tudo isso, temos que tirar o
esquadrejamento do local em que vamos construir e temos que usar o nível que é a mangueira com água,
86
o esquadro e depois de começar a levantar as paredes são usado o nível, plumo. Linha. Depois das paredes
erguidas para fazer a lage vai escora de bracatinga ou senão tesoura para depois por os Etrnite ou telha.
Depois vai a massa nas parede ou reboco que nós usamos a régua de alumínio, mas antes para fazer o
pizo nós temos que deixai o chão bem perelhinho para não ficar o pizo torto e a casa tem que estar tudo no
esquadro para que quando for por os azulejos para dar serto em todos os cantos para não precizar de
cortar muito azulejo, eu só escrevi o básico do que eu mas o menos sei fazer...” (GOMES, 2005, p. 67).
Segundo a autora, “utiliza em seu projeto figuras como o retângulo, o quadrado e o
triângulo. O tridimensional é representado pelo conhecimento adquirido no cotidiano quando expressa
a medida da sapata “30cmX30cm e 1,5 m de profundidade”. Entre as ferramentas de aferição declara
conhecer o esquadro, o metro, o plumo de nível e a trena, porém não apresenta conhecimento
suficiente na operacionalização das quatro operações básicas” (GOMES, 2005, p. 67) (sic).
6º Trabalho
O aluno relata como adquiriu o conhecimento relativo à construção civil por meio da
experiência com o cotidiano e intuição: “casa 06 por 10 feita na prática de um pedreiro com uma mínima
de escolaridade (...) Primeiramente ele faz a planta da casa item. fincar as estacas em todos os cantos
esticar a linha no ponto onde vai ser feita a valeta, não esqueça de fazer a valeta, mais ou menos 40 cm
fora da linha, isso que dizer que a valeta vai ser 40 cm de largura. Depois das valetas feita, faça um
buraco de mais ou menos 1,50 de metro em cada canto da planta, depois estique as linhas repartindo as
pessas da casa, faça a valeta 40cm da linha para fora (...) ( a masseira) Pegue 4 tabuas, coloque-as no
chão em forma de uma caixa- e pregue os 4 cantos, esta feita a masseira. Como preparar a massa (...)
coloque três carrinhos de areia e puche etoda num canto, deichando um espaço para o cal. Logo em
seguida coloque dois saco de cal no espaço que sobrou e coloque água para queimar o cal, em seguida
pegue um saco de cimento coloque do lado, depois do cal queimado, misture tudo com a areia, depois
deiche um espaço para ir misturando cimento depois base e a mais ou menos a massa, quando você achar
que esta adequada para assentar tijolos comesse a fazer. Comessando a parede (...) acentar tijolos de
atravessados, umas quatro carreiras. Logo após comesse a parede, acentanto tijolos de comprido seguindo
a linha (...) Depois da parede feita com na media 2,50 do metro, faça as cacharias em todos os lugares
onde foi feito os buracos de 1,50 do metro. Depois de todas as caixarias feita faça o concreto para enche-
las. Como fazer o concreto, coloque três carrinhos de areis na masseira, dois carrinhos e meio de pedra
87
britada , um saco de cimento e misture com água é encher as caixarias (...) Depois de secar o concreto
tire todas as tábuas (....)” (GOMES, 2005, p. 74 e 75) (sic).
Conforme a autora, “Este aluno ao confeccionar sua planta em um terreno medindo 12X30m
não evidenciou conhecimento no que tange ao entendimento das normas estudadas no que se refere ao
alinhamento e recuo. Utilizando em seu desenho apenas retângulos e os entes geométricos ponto, reta,
plano, paralelismo, perpendicularismo. Em sua lista de ferramentas apresentou o prumo, o metro,
trena e o esquadro, porém o apresentou nenhuma das quatro operações sicas que evidenciasse a
prática de seu manuseio” (GOMES, 2005, p. 75).
Ressaltam-se nos trabalhos produzidos pelos estudantes a habilidade de elaborar
modelos para solucionar situações, a qual foi necessária para a confecção do desenho, bem
como a habilidade para elaborar subproblemas específicos a partir de um problema geral,
tendo em vista que a tarefa deveria ser executada em partes e observando os detalhes. Em
Gomes (2005) constam seis projetos de residência que foram desenvolvidos pelos
estudantes, com o registro das idéias produzidas por eles, a forma como procederam até o
produto final, em razão disso é possível afirmar que houve elaboração, pela quantidade de
detalhes que continham os projetos.
Conforme mencionado, a tarefa que os estudantes desempenharam foi do tipo
heurística. Para confecção das plantas os estudantes necessitaram recorrer a conhecimentos
matemáticos, os quais foram descritos pela pesquisadora, e também a conhecimentos de
experiências do dia-a-dia, como evidenciam os relatos: aprendi um pouco olhando os
pedreiros, quando mais jovem trabalhei de servente de pedreiro, entre outros. Essas
combinações de conhecimentos que necessitaram fazer a fim de produzir a planta da casa,
possivelmente, estimularam suas criatividades. Isso remete à complexidade, habilidade do
pensamento criativo, que é o número de idéias inter-relacionadas que o indivíduo pode
manipular de uma só vez.
É fundamental observar que o fato do tema da Modelagem ser relacionado à
construção civil, e que a própria docente e pesquisadora afirma que um terço da população
88
carcerária provém dessa profissão, pode ter gerado maior motivação nos estudantes para
realização da atividade. Salienta-se que a motivação é aspecto importante para a produção
criadora.
Não se pode esquecer que cada estudante apresentou suas particularidades, uns
tinham mais domínio da Matemática, outros nem tanto, alguns conseguiram executar
dentro das normas, outros não o conseguiram. Porém, observa-se que a experiência
cotidiana foi uma constante em todos os trabalhos. Isso leva a inferir que um importante
objetivo da Modelagem Matemática foi cumprido: dar significado à Matemática escolar a
partir da Matemática do cotidiano. E, apesar das diferenças em relação ao domínio do
conteúdo matemático, provavelmente os estudantes melhoraram suas habilidades
relacionadas à criatividade.
89
CONSIDERAÇÕES E PERSPECTIVAS DE CONTINUDADE DA
INVESTIGAÇÃO
Esta seção contempla algumas das considerações relativas aos aspectos
identificados e depreendidos de cada trabalho, a partir das leituras dos trabalhos de
Modelagem Matemática escolhidos para constituírem o material de análise.
Como já salientado no capítulo dois, os trabalhos analisados não tinham objetivo
explicito do aprimoramento de habilidades criativas por parte dos estudantes, mas sim o
propósito de aplicar a metodologia em sala de aula. Entretanto, foi possível identificar nas
descrições dos trabalhos alguns dos aspectos relacionados à criatividade. A seguir serão
feitas considerações sobre cada um dos trabalhos analisados.
Na primeira aplicação de Modelagem Matemática, quadra de esportes, observa-
se a liberdade de ação dos estudantes em todos os momentos da atividade e, ainda, a tarefa
que desempenharam foi em uma perspectiva heurística, tendo em vista que todo o grupo
colaborou para levantar os problemas e encontrar as soluções e não somente o professor
ficou com essa responsabilidade. Salienta-se que os estudantes e o professor, juntos,
decidiam o encaminhamento a ser dado no desenvolvimento da atividade. Conforme o
relato, o grupo decidiu: “levantar informações referentes ao tipo de esportes praticados em
quadras oficiais e constatar a existência de tais quadras na cidade. Assim, dentro desse
contexto, surgiu a idéia da tomada das medidas da quadra de esportes do Colégio e a
elaboração de uma maquete” (p.65).
Nessa atividade de Modelagem notou-se pelas descrições que as capacidades do
pensamento criativo (segundo Torrance (1976), são tomar consciência de problemas,
pensar em possíveis soluções e submetê-las à prova) estiveram presentes durante todo
desenvolvimento do trabalho. Quanto aos aspectos fundamentais para produção criadora,
propostos por Alencar (2002), a bagagem de conhecimento foi fundamental para
90
desenvolver o trabalho e, quando os estudantes não sabiam como fazer, o professor
auxiliava com explicações sobre o conteúdo matemático e até mesmo recorriam a outros
profissionais. As descrições denotam que os estudantes comprometeram-se com o trabalho,
dedicaram-se e persistiram nas ações para se chegar ao resultado final.
Sobre a criatividade em Matemática, notou-se a habilidade para formular
hipóteses matemáticas avaliando relações de causa e efeito, a habilidade para perceber
problemas a partir de uma situação matemática e formular questões que possam responder
a esses problemas, a habilidade para buscar soluções para problemas matemáticos e
habilidade para solucionar situações matemáticas.
O interesse de outras pessoas em relação à atividade que estavam desenvolvendo
foi observado explicitamente em dois momentos. Primeiro, quando os integrantes da
equipe estavam medindo a quadra de esportes, é relatado que os alunos da quinta série
ficaram curiosos, e os componentes do grupo deram explicações sobre o que estavam
fazendo. O pesquisador conta que “aquele momento foi muito gratificante, ao presenciar a
curiosidade daqueles pequenos e o entusiasmo daquele grupo socializando o conhecimento
recém adquirido” (p.70). O segundo momento foi quando a maquete estava concluída e
ficou exposta, consta na descrição que “após a maquete concluída, ela ficou em exposição,
e pudemos observar que despertou grande curiosidade por parte dos professores e outros
alunos do colégio. Os elementos do grupo fizeram apresentação da maquete em suas
turmas, relatando alguns detalhes da construção, assim como da experiência vivida no
projeto” (p.74). Os dois momentos da atividade comprovam o interesse e a admiração de
professores e estudantes pelo trabalho do grupo, o que deve ter favorecido o autoconceito
dos estudantes.
91
A comunicação de idéias
7
no grupo, o espírito de pesquisa, também teve grande
destaque no desenvolvimento da atividade, além disso, enfrentaram situações novas e
diferentes para chegar à construção da maquete que foi o produto final do trabalho, o qual
chamou a atenção da comunidade escolar. Outro fator a ser considerado é a motivação que,
possivelmente, o tema gerou para o desenvolvimento da atividade.
Na segunda descrição do trabalho de Modelagem Matemática, cultura da soja, a
liberdade de ação dos estudantes e o favorecimento da autonomia dos mesmo foi evidente,
pois tiveram que levantar os problemas, propor idéias, pesquisar e buscar soluções. A
atividade que desempenharam foi heurística, de descobertas, tendo em vista que não
tinham modelos prontos para seguir. Na descrição desse trabalho de Modelagem, consta
que “houve exposição dos temas, com muitas discussões entre os estudantes”, isso denota
que foi proporcionada liberdade aos alunos para participarem da atividade.
As capacidades básicas do pensamento criativo, descritas por Torrance (1976),
evidenciaram-se nas descrições. O papel de incentivador do professor foi fundamental para
que os estudantes se dedicassem e se envolvessem com o trabalho, tendo em vista que era
uma situação nova a qual não estavam acostumados.
Com relação à criatividade em Matemática, identificou-se a habilidade para
perceber problemas a partir de uma situação matemática e formular questões que possam
responder a esses problemas, também a habilidade de elaborar modelos para solucionar
situações matemáticas.
Essa segunda descrição, cultura da soja, em comparação com a primeira, quadra
de esportes, apresenta uma quantidade menor de elementos identificadores da criatividade.
Possivelmente isso é justificado pelo fato da primeira descrição ter sido feita através da
observação de um grupo de quatro alunos que desenvolveram a atividade, enquanto que na
7
A comunicação de idéias referida nesse trabalho de Modelagem, como também nos demais, diz respeito aos
diálogos entre os estudantes e o trabalho em grupo proporcionado pelo professor. E não à capacidade de
argumentação dos estudantes, visto que as descrições não permitem tal constatação.
92
segunda, a pesquisadora observou a turma toda, composta por trinta e seis alunos. Assim,
no primeiro caso a descrição está mais detalhada, o que permitiu identificar mais
elementos.
No início do terceiro trabalho de Modelagem Matemática, fatura de água, os
estudantes são convidados a participar ativamente da aula, a professora coordena uma
técnica que pode estimular a criatividade, a tempestade de idéias, e incentiva a
comunicação dos estudantes. No decorrer do trabalho a docente continua incentivando a
comunicação entre os grupos, porém não lhes liberdade para proporem idéias e
situações-problemas, ela mesma o faz, além disso, ela explica exatamente como devem
proceder para resolverem tais problemas. Essa postura da professora levou ao
desenvolvimento de uma tarefa algorítmica por parte dos estudantes já que tudo estava pré-
estabelecido: os problemas e a forma de chegar à solução. Não foram identificados outros
elementos que podem denotar criatividade. Assim, depreende-se que essa atividade de
Modelagem Matemática estimulou poucas capacidades relacionadas à criatividade dos
estudantes.
Conforme explicitado no inicio da descrição desse terceiro trabalho, fatura da
água, quem aplicou a atividade de Modelagem Matemática na turma foi uma professora
que estava cursando licenciatura em Matemática e não a pesquisadora. O pouco
favorecimento da criatividade dos estudantes durante a atividade pode ser justificado pelo
fato da professora não ter muitos conhecimentos sobre a Modelagem Matemática e a
Educação Matemática.
Isso chama a atenção para a importância do professor de Matemática ter
conhecimento das áreas que compõe a Educação Matemática, para que assim, possa
conduzir a aula de forma a favorecer as diferentes habilidades dos estudantes. O que parece
confirmar o dito de Fiorentini e Lorenzato (2006) de que a Educação Matemática é uma
93
área de “inúmeros e complexos saberes, na qual apenas o conhecimento da matemática e a
experiência de magistério não garantem competência a qualquer profissional que nela
trabalhe” (p. 5).
Na quarta aplicação de Modelagem Matemática, construção civil, nota-se que a
professora proporcionou total liberdade aos estudantes para desenvolverem a atividade, a
qual foi integralmente heurística. Observou-se que a comunicação entre eles esteve
presente no decorrer da atividade e, ainda, os estudantes precisaram recorrer a
conhecimentos escolares e do cotidiano. O trecho a seguir mostra a liberdade que a
professora proporcionou aos estudantes, o que acarretou o desenvolvimento de uma
atividade em que a descoberta esteve presente e a criatividade foi necessária: “deixei-os à
vontade para trocarem idéias. [...] Durante o tempo que levou para a execução deste
trabalho não emiti opinião ou ofereci qualquer tipo de explicação e, quando solicitada,
limitava-me a responder-lhes de forma evasiva e algumas frases prontas como: está bom!
Que bom você conseguiu! Vá em frente! Continue!” (p. 26 e 27).
Das habilidades do pensamento criativo, descritas por Guilford (1950, 1975),
identificou-se a elaboração e a complexidade, bem como a habilidade para elaborar
subproblemas específicos a partir de um problema matemático geral e a habilidade para
elaborar modelos para solucionar situações matemáticas nas descrições dos projetos
elaborados pelos estudantes. A atividade que os estudantes desenvolveram e que, pode-se
supor, nunca tinham realizado, resultou num projeto de casa que, segundo a autora,
entregaram “orgulhosos”. Isso permite inferir que essa atividade de Modelagem
Matemática melhorou o autoconceito desses estudantes.
Com base nas análises das descrições dos trabalhos de Modelagem Matemática,
salienta-se que nos trabalhos (quadra de esportes, cultura da soja e construção civil) em
que o professor proporcionou liberdade de ação, de propor idéias e problemas aos
94
estudantes foi possível a identificação de vários aspectos relacionados à criatividade. E
também as tarefas que os estudantes desempenharam nesses mesmos trabalhos foram do
tipo heurístico, por não terem um modelo claro e bem estabelecido para seguir. Enquanto
que na aplicação de Modelagem (fatura de água) em que o professor não proporcionou a
liberdade de ação dos estudantes, houve poucos aspectos identificados, relativos à
criatividade e, ainda, a tarefa que os alunos desempenharam foi na perspectiva algorítmica,
que consiste em seguir regras estabelecidas previamente. Assim, pode-se afirmar que a
liberdade constitui o primeiro passo para o desenvolvimento da criatividade.
A Modelagem Matemática pode possibilitar o desenvolvimento de tarefas na
perspectiva heurística, tendo em vista que não é estabelecido um único caminho para
resolução dos problemas. Cada grupo pode propor diferentes caminhos e soluções para um
mesmo tema. Assim, a Modelagem caracteriza-se como uma atividade aberta, passível de
adequações conforme o contexto.
Dessa forma, depreende-se que a liberdade de ação dos estudantes e a tarefa na
perspectiva heurística são pontos-chave para a promoção da criatividade em sala de aula.
Além disso, uma está diretamente ligada à outra numa relação de reciprocidade, isto é,
quanto mais liberdade o educando tiver para desenvolver a atividade, maior é a chance de
essa atividade ser heurística, e vice-versa. Esses dois aspectos dependem em grande parte
da postura adotada pelo professor durante o desenvolvimento do trabalho.
Salienta-se ainda, que a Modelagem Matemática pode influenciar positivamente a
motivação dos estudantes em relação à Matemática. A abordagem de situações da
realidade dos alunos pode despertar maior interesse pela Matemática e, conseqüentemente,
maior motivação nessa área. O fato dos estudantes participarem ativamente da ação,
propondo problemas e soluções, também pode se constituir num agente motivador. É
importante salientar que a postura do professor na sala de aula, em que proporciona
95
liberdade aos estudantes e os incentiva para realização das tarefas, é essencial para
motivação em Matemática.
Após a análise geral das descrições dos trabalhos de Modelagem Matemática,
retornamos a questão principal dessa dissertação: os trabalhos desenvolvidos por meio da
Modelagem Matemática, na perspectiva da Educação Matemática adotada, favorecem o
desenvolvimento da criatividade?
Essa questão foi respondida ao longo do trabalho, pois,
mesmo que os trabalhos não tivessem por objetivo a promoção de habilidades relacionadas
à criatividade, foram identificadas várias manifestações de criatividade.
Com relação à questão: a Modelagem Matemática em si propicia o
desenvolvimento da criatividade?
Salienta-se que a Modelagem Matemática em si não
propicia o desenvolvimento da criatividade dos estudantes. Para que a criatividade se
manifeste é fundamental levar em conta vários aspectos como a disponibilidade do
professor em favorecer a atividade, seus conhecimentos sobre a Educação Matemática e a
Modelagem Matemática. A postura do professor em sala de aula é um fator extremamente
relevante para proporcionar o desenvolvimento da criatividade dos estudantes através da
Modelagem. Ele precisa conduzir a atividade de forma a dar liberdade aos educandos e
incentivá-los para que prossigam no trabalho.
A terceira questão de pesquisa: o que evidenciam os trabalhos acadêmicos acerca
do espaço para o desenvolvimento da criatividade no ensino da Matemática e sobre o papel
da Modelagem Matemática na abertura desse espaço? Quando Torre (2005) trata do ensino
criativo, ele explicita que deve ser de natureza flexível e adaptativa. A Modelagem
Matemática, ao romper com o ensino tradicional da Matemática, é uma metodologia de
natureza flexível e adaptativa. Barbosa (2001, 2004), Burak (1992, 1998, 2004) e Caldeira
(2004) pontuam que essa metodologia é aberta, sem procedimentos fixados e com várias
possibilidades de encaminhamentos. É levado em consideração o ambiente, o contexto e os
96
interesses do grupo. Assim é possível afirmar que o ensino da Matemática através da
Modelagem Matemática, na concepção adotada, pode constituir-se em um ensino criativo,
abrindo espaço para o desenvolvimento da criatividade.
Sobre a quarta questão: “qual o papel do professor e dos alunos nas manifestações
criativas, conforme relatos nos trabalhos acadêmicos de Modelagem?”, salienta-se que
ambos, estudantes e professor, devem participar ativamente na realização das atividades,
caso o professor determine todas as tarefas e os caminhos para realizá-las, os estudantes
deixariam de estimular muitas das habilidades relacionadas à criatividade.
Em relação à última questão: “o que os trabalhos acadêmicos evidenciam sobre o
papel do ambiente no desenvolvimento da criatividade?”, é importante destacar que deve
ser um ambiente em que os estudantes participem ativamente do trabalho de Modelagem,
exista o diálogo entre estudantes e professor, em que ambos devem falar e ouvir, e haja
respeito e apoio com as idéias apresentadas.
A fim de explicitar as relações entre a criatividade e a Modelagem Matemática, é
apresentado a seguir, um quadro síntese que relaciona aspectos trabalhados em atividades
desenvolvidas por meio da Modelagem Matemática que contribuem para o
desenvolvimento da criatividade. Atendendo, dessa forma, o objetivo da investigação
‘produzir indicadores sobre a relação Modelagem Matemática e Criatividade’.
1) A Modelagem Matemática propicia a criatividade quando...
a) ao organizar trabalhos em grupos, proporciona a interação entre os estudantes,
estimulando a colaboração entre eles, a independência e a autonomia para resolver
problemas e tomar decisões;
b) envolve situações da realidade em que o grupo poderá estabelecer relações com
a Matemática que talvez aparentemente não sejam perceptíveis. Para isso terá que utilizar
97
as características do pensamento criativo, tais como: a fluência, a originalidade, a
complexidade, entre outras;
c) as atividades representam interesses dos estudantes, mais que do professor,
causando maior motivação e envolvimento para realização das tarefas;
d) os modos de proceder e encaminhar a atividade são heurísticos, isto é, não se
têm de antemão modelos prontos a serem seguidos.
2) O professor e os estudantes desenvolvem a sua criatividade em
Matemática nas situações de Modelagem quando....
a) necessitam levantar questões sobre o tema, pensar nas soluções e colocá-las em
prova.
b) ambos colaboram para estabelecer relações entre a Matemática e a situação
estudada e ainda, proponham modelos matemáticos (equações, gráficos, tabelas, e outras
formas) para representar tais situações;
c) empenham esforços a fim de utilizar os conhecimentos matemáticos que mais
sejam adequados a determinadas situações;
d) para resolver determinada questão ou situação-problema, precisam pesquisar
conteúdos matemáticos ou envolver conhecimentos de outras áreas do conhecimento.
3) Para que a criatividade em Matemática se manifeste é necessário que as
relações entre estudantes e entre estudantes e professores sejam....
a) de colaboração e participação ativa no desenvolvimento da atividade;
b) de apoio e respeito às idéias de todos os participantes;
c) dialógica, isto é, o professor deve ouvir as idéias e opiniões dos estudantes e
vice-versa.
4) Para que a criatividade se manifeste numa atividade de Modelagem
Matemática o professor pode...
98
a) incentivar os estudantes para contribuírem com a realização da atividade e não
chamar todas as responsabilidades para si;
b) proporcionar liberdade aos estudantes para propor idéias, levantar questões, e,
incentivá-los a participar ativamente do trabalho;
c) enfrentar situações novas, desconhecidas e ir à busca de novos conhecimentos
que se façam necessários para realização da atividade;
d) trabalhar com temas de interesses do grupo ou dos grupos;
e) Compartilhar o processo de ensino, isto é, favorecer o debate e a discussão
sobre os assuntos de interesses dos estudantes;
f) identificar, pelas discussões, temas de interesses dos estudantes, contribuindo
para levantar situações envolvendo: atividades econômicas do município, da região,
serviços prestados (hospitais, postos de saúde, telefonia, entre outros) ou temas atuais:
eleições, eventos esportivos, científicos, culturais e alimentando e organizando essas
discussões.
g) levantar novas hipóteses sobre a situação estudada, isto é, considerar uma
situação sob vários ângulos, de forma a fazer com que os estudantes possam observar tal
situação sob diversos aspectos.
5) Os estudantes fazem uso das habilidades do pensamento criativo quando...
a) são incentivados a levantar questões e propor idéias;
b) a partir de uma atividade, necessitam fazer julgamentos, avaliar situações,
considerar várias idéias a fim de tomar decisões, entre outras.
As análises das descrições realizadas dos trabalhos de Modelagem Matemática
apontam perspectivas de continuidade do trabalho com o aprofundamento de alguns
aspectos mencionados e observados, entretanto não aprofundados nessa investigação. Entre
esses aspectos encontra-se o relacionado à postura do professor a ser adotada, ao trabalhar
99
a Modelagem, de forma a possibilitar o desvelar de fatores criativos e aprofundar a
investigação sobre a criatividade nos trabalhos com a Modelagem, independentemente da
perspectiva de ciência adotada. Salienta-se ainda que, é importante desenvolver uma
atividade de Modelagem Matemática em sala de aula, com o intuito de pesquisar os
diversos aspectos relacionados à criatividade, através da observação das atitudes, diálogos
e outras manifestações dos estudantes. Ainda, essa experiência trará outras contribuições
na forma de coleta de dados, uma vez que precisaria maneiras diferenciadas para captação
de idéias de cada aluno e do grupo, o que poderia permitir a identificação de aspectos que
não foram identificados nesses trabalhos.
Salientamos que esta pesquisa trouxe algumas contribuições acerca da
manifestação da criatividade em atividades de Modelagem Matemática, ao apontar alguns
aspectos necessários para o desenvolvimento da criatividade dos estudantes e favorecidos
pela Modelagem. Porém, foram levantadas perspectivas que necessitam de novos estudos e
aprofundamentos. Assim, além de se constituir num ponto de chegada, este trabalho
representa também um ponto de partida às novas pesquisas sobre a criatividade e a
Modelagem Matemática.
100
REFERÊNCIAS
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criatividade em sala de aula. 9. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
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