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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TURISMO
MESTRADO EM TURISMO
Pablo Guilherme Espíndola
A METODOLOGIA DE PROJETO NO ENSINO SUPERIOR DE TURISMO:
Uma alternativa para o desenvolvimento de comportamentos e habilidades empreendedoras
Caxias do Sul
2008
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2
PABLO GUILHERME ESPÍNDOLA
A METODOLOGIA DE PROJETO NO ENSINO SUPERIOR DE TURISMO:
UMA ALTERNATIVA PARA O DESENVOLVIMENTO DE COMPORTAMENTOS
E HABILIDADES EMPREENDEDORAS
Dissertação submetida à banca examinadora designada pelo Colegiado
do Programa de Pós-Graduação em Turismo da Universidade de
Caxias do Sul, como parte dos requisitos necessários para a obtenção
do título de Mestre em Turismo.
Orientador: Dr. José Carlos Köche
Caxias do Sul
2008
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3
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Universidade de Caxias do Sul
UCS - BICE - Processamento Técnico
E77m Espíndola, Pablo Guilherme
A metodologia de projeto no ensino superior de turismo: uma
alternativa para o desenvolvimento de comportamentos e
habilidades empreendedoras / Pablo Guilherme Espíndola. -- 2008.
286 f. : il. ; 30 cm.
Dissertação (Mestrado) – Universidade de Caxias do Sul,
Programa de Pós-Graduação em Turismo, 2008.
“Orientação: Prof. Dr. José Carlos Köche”
1. Turismo – Ensino Superior. 2. Empreendedorismo.
3. Metodologia de projeto. I. Título.
CDU :379.85:378
Índice para o catálogo sistemático:
1. Turismo – Ensino superior 379.85:378
2. Empreendedorismo 65.012.2
3. Metodologia de projeto 001.8
Catalogação na fonte elaborada pela bibliotecária
Márcia Servi Gonçalves – CRB 10/1500
4
“A Metodologia de Projeto no Ensino Superior de Turismo:
Uma alternativa para o desenvolvimento de comportamentos e
habilidades empreendedoras”
Pablo Guilherme Espíndola
Dissertação de Mestrado submetida à Banca Examinadora designada
pelo Colegiado do Programa de Pós-Graduação em Turismo da
Universaidade de Caxias do Sul, como parte dos requisitos necessários
para a obtenção do título de Mestre em Turismo, Área de
Concentração: Desenvolvimento Regional do Turismo.
Caxias do Sul, 17 de setembro de 2008.
Banca Examinadora:
Prof. Dr. José Carlos Köche (Orientador)
Universidade de Caxias do Sul
Prof. Dr. Eric Dorion
Universidade de Caxias do Sul
Profa. Dra. Márcia Maria Cappellano dos Santos
Universidade de Caxias do Sul
Profa. Dra. Maria Cecília Damas Gaeta
Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – São Paulo
5
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, Francisco Espíndola e Maria de
Lourdes, pelas angústias e preocupações que
passaram por minha causa, por muitas vezes
se privarem de tantas coisas para que eu
pudesse estudar, e pelo amor, carinho e
estímulo que me ofereceram.
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço, em primeiro lugar, a Deus, por ter me dado vida, saúde e energia para
enfrentar todos os desafios que se apresentam.
Ao Dr. José Carlos Köche, que teve a indulgente paciência de me orientar e me
conduzir nesta jornada de estudo.
Aos meus pais, pelo apoio e confiança no meu sucesso.
A minha irmã Daniela, pela sua paciência e pela prestimosa ajuda que me ofereceu.
Ao meu irmão que, mesmo de longe, sempre esteve torcendo por mim e
financeiramente também me ajudou a cursar o mestrado.
A minha avó Elvira Virginia e ao seu plantel de santos que de alguma forma me
ajudaram a concluir este trabalho cansativo, mas gratificante.
Aos meus colegas de mestrado, em especial ao Gilberto Rosa, que mais do que
colega, foi meu fiel amigo e parceiro de trabalho, e que me proporcionou uma
inesquecível experiência profissional que trouxe colaborações para esta pesquisa. E
ao meu grande colega Gilmar Silveira que, além de me oferecer acolhida em seu
apartamento em Caxias do Sul, foi companheiro de estudos, pesquisas e festas.
Aos professores do mestrado em Turismo que também tiveram sua parcela de
contribuição neste trabalho.
E agradeço também a todos os que direta ou indiretamente contribuíram para a
realização desta pesquisa.
7
Não nada como um sonho para criar o
futuro.
Victor Hugo
A verdadeira viagem da descoberta
consiste em não buscar novas paisagens,
mas sim em ter novos olhos.
Marcel Proust
A maior condenação a que todos estamos
sujeitos no futuro será por omissão,
porque meios para se fazer coisas
lindas e impossíveis existem.
Amyr Klink
8
RESUMO
Este trabalho pretende contribuir para o debate em torno de alguns dos
atuais desafios enfrentados pelas instituições de ensino superior, os quais dizem
respeito à necessidade de oferecer metodologias mais adequadas à atual sociedade
do conhecimento, e à busca pela formação do egresso com um perfil mais
compatível à realidade dinâmica, complexa, competitiva e caracterizada também por
as constantes transformações e incertezas. Os referidos desafios levantados foram
colocados dentro do âmbito do curso superior de Turismo, sendo que a metodologia
de projeto e as características do perfil dos indivíduos empreendedores foram os
objetos de estudo oferecidos como sugestiva resposta aos desafios mencionados.
Como problema central foi investigada, neste trabalho, a possibilidade de a
metodologia de projeto favorecer e criar condições para que os alunos dos cursos
superiores de Turismo desenvolvam comportamentos e habilidades
empreendedoras, como também, se a formação empreendedora atende ao perfil dos
bacharéis em turismo indicado nas Diretrizes Curriculares deste curso. A partir da
revisão da literatura que levantou o estado da arte e análise documental sobre a
metodologia de projeto e sobre o empreendedorismo, os resultados revelaram que
fortes evidências de que a metodologia de projeto proporciona condições plenas
para os alunos desenvolverem semelhantes comportamentos e habilidades
identificadas nos indivíduos empreendedores e que estas vem ao encontro do perfil
traçado pelas Diretrizes Curriculares do bacharelado em Turismo.
Palavras-chave: turismo, metodologia de projeto, empreendedorismo.
9
ABSTRACT
This work intends to contribute to the debate over some of the current
challenges faced by universities, which concern the necessity to offer methodologies
more suitable to our present society of knowledge, and to form professionals with a
profile more compatible with the dynamic, complex, and competitive reality, also
characterized by constant changes and uncertainties. Such challenges were
analyzed within the scope of Tourism College, in which the methodology of project
and the characteristics of the profile of the entrepreneurial individuals were the object
of study offered as a suggestive answer to the challenges previously mentioned. This
work investigated, as a central problem, the possibility of the methodology of project
to favor and create conditions for the Tourism College students to develop
entrepreneurial behaviors and abilities, as well as, to assure that the entrepreneurial
education corresponds to the profile of the graduate students of Tourism indicated in
the Curricular Directives of this course. From the revision of the Literature about
Entrepreneurship, and the documentary analysis about the methodology of project,
the results revealed that there is strong evidence that the methodology of project
provides full conditions for the students to develop behaviors and abilities similar to
the ones identified in the entrepreneurial individuals, and that these characteristics
meet the profile designed by the Curricular Directives of the Tourism College.
Key-words: tourism, methodology of project, entrepreneurship.
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................................13
1 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA METODOLOGIA DE
PROJETO ..................................................................................................................21
1.1 Os Projetos na Vida do Homem, sua Origem, Evolução e o seu Uso na
Educação ...................................................................................................................21
1.2 A Corrente Pragmatista ......................................................................................31
1.3 A Escola Nova.....................................................................................................32
2 AS TRANSFORMAÇÕES DA SOCIEDADE E OS PARADIGMAS DA CIÊNCIA ..39
2.1 A Crise do Paradigma Newtoniano-Cartesiano ...................................................39
2.2 Rompendo com o Paradigma Newtoniano-Cartesiano .......................................44
2.3 Paradigmas Inovadores .......................................................................................49
2.3.1 A Abordagem Sistêmica ...................................................................................51
2.3.2 A Abordagem Progressista ...............................................................................55
2.3.3 Abordagem do Ensino com Pesquisa ..............................................................60
2.4 A Integração entre as Abordagens ......................................................................65
3 A METODOLOGIA DE PROJETO .........................................................................69
3.1 Uma prévia da metodologia de projeto ...............................................................69
3.2 Explorando algumas definições contemporâneas ..............................................71
3.2.1 Fernando Hernández .......................................................................................72
3.2.2 Marilda Behrens ...............................................................................................74
3.2.3 Jean Pierre Boutinet .........................................................................................76
3.2.4 Luiza Cortesão .................................................................................................81
3.2.5 Hilda Magalhães ...............................................................................................84
3.2.6 Dácio Moura e Eduardo Barbosa .....................................................................89
3.3 A Re-significação da metodologia de projeto ......................................................93
4 ASPECTOS PONTUAIS E BASILARES DA METODOLOGIA DE PROJETO ......97
4.1 As etapas de um projeto .....................................................................................97
4.2 O papel do aluno ...............................................................................................109
4.3 O papel do professor .........................................................................................111
4.4 Como ficam os conteúdos? ...............................................................................115
4.5 Ênfase no ensino ou na aprendizagem? ...........................................................117
4.6 Levantando os benefícios do trabalho com a metodologia de projeto ..............120
4.7 Dificuldades e críticas ........................................................................................129
5 O EMPREENDEDORISMO ..................................................................................139
5.1 A evolução do empreendedorismo e as diferentes concepções de empreendedor
..................................................................................................................................139
5.2 Um conceito referencial de empreendedor para este trabalho .........................147
5.3 O empreendedor social .....................................................................................157
5.4 Referenciais teóricos da viabilidade da educação empreendedora ..................167
5.5 Indícios para o desenvolvimento das características empreendedoras ............180
5.6 Habilidades e comportamentos empreendedores .............................................189
11
6 OS ELEMENTOS DE CONVERGÊNCIA ENTRE A METODOLOGIA DE PROJETO
E O EMPREENDEDORISMO .................................................................................221
7 O PERFIL E AS COMPETÊNCIAS DO BACHAREL EM TURISMO ...................241
7.1 O surgimento e o constante desenvolvimento dos cursos Superiores de Turismo
no Brasil ..................................................................................................................241
7.2 As Diretrizes Curriculares Nacionais .................................................................247
7.3 As Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Turismo .....251
7.4 Refletindo sobre as competências ...................................................................258
7.5 O perfil sugerido do bacharel em Turismo na visão dos especialistas da área.264
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................271
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................275
12
LISTA DOS QUADROS
Quadro 01: Fases do projeto – segundo Leite, Burnier e Nogueira ..........................98
Quadro 02: Fases do projeto – segundo Moura e Barbosa ......................................99
Quadro 03: Fases do projeto – segundo Hernández, Almeida & Junior e Behrens ..99
Quadro 04: Diferença de empreendedorismo privado e empreendedorismo social
..................................................................................................................................161
Quadro 05: Cursos com habilitação na área de empreendedorismo ......................170
Quadro 06: Número de Teses e Dissertações sobre empreendedorismo publicadas
no Brasil de 1987 a 2006 ........................................................................................172
Quadro 07: Principais temas de pesquisas realizadas com a temática do
empreendedorismo .................................................................................................173
Quadro 08: Etapas para o ensino do empreendedorismo ......................................187
Quadro 09: Diferenças entre o ensino tradicional e o ensino empreendedor .........188
Quadro 10: Características dos empreendedores de sucesso – EMPRETEC .......197
Quadro 11: Características dos empreendedores de sucesso Pesquisa brasileira
..................................................................................................................................198
Quadro 12: Características dos empreendedores bem sucedidos Pesquisa
Internacional ............................................................................................................199
Quadro 13: Características dos empreendedores – Comportamentalistas ............202
Quadro 14: Características dos empreendedores mais citadas pelos pesquisadores
.................................................................................................................................204
Quadro 15: Relações das características empreendedoras entre as pesquisas dos
quadros 10,11,12,13 e 14 .......................................................................................206
Quadro 16: Características do empreendedor social ..............................................208
Quadro 17: Equiparação entre as características empreendedoras .......................210
Quadro 18: Características empreendedoras presentes apenas em uma pesquisa
..................................................................................................................................211
Quadro 19: Descrição das características empreendedoras ..................................215
Quadro 20: Similaridade entre o sujeito que projeta e o empreendedor .................223
Quadro 21: Comparações entre a metodologia de projeto e a educação
empreendedora .......................................................................................................227
Quadro 22: Comparativos entre as fases da metodologia de projeto e a educação
empreendedora........................................................................................................228
Quadro 23: Características desenvolvidas pelos alunos mediante a utilização da
metodologia de projeto ............................................................................................231
Quadro 24: Principais competências e habilidades exigidas pelo mercado turístico
..................................................................................................................................268
13
INTRODUÇÃO
Num mundo em permanente evolução, recheado de imprevistos, incertezas,
transformações e complexidades, em grande parte fruto dos avanços dos processos
de comunicação, globalização e tecnologia, as mudanças se fazem presente cada
dia mais na vida das pessoas.
As constantes transformações e mudanças impõem ao trabalhador a
necessidade de desenvolver novos estilos de comportamento, novas capacidades
de criar, inovar, identificar oportunidades, de agir com ousadia e flexibilidade. Tais
requisitos se acentuam ainda mais nos dias de hoje, diante da falta do pleno
emprego, da estabilidade e da segurança no trabalho. Boa parte destas habilidades
e competências que são exigidas, principalmente, pelo mercado de trabalho, estão
presentes nos indivíduos com perfil empreendedor, ou seja, naqueles indivíduos que
costumam ver a inovação e a mudança de forma positiva, como oportunidade e não
como ameaça, que assumem riscos e não têm medo de transformar seus sonhos
em realidade, ocasião em que lhes é possibilitado desenvolver e acentuar várias das
habilidades e competências reclamadas. Portanto, neste contexto cambiante e
repleto de exigências, torna-se adequado incentivar o desenvolvimento de
habilidades e comportamentos empreendedores, tarefa essa que pode ser
desempenhada pelas instituições de ensino superior, haja vista que um dos seus
propósitos é garantir a todos seus estudantes as condições básicas para a inserção
no mundo do trabalho, juntamente com o incentivo à pesquisa, à produção e à
socialização do conhecimento. Somado a isso, as instituições de ensino superior
devem se comprometer com a formação do aluno cidadão, aquele que, segundo
Magalhães (2004), é capaz de interferir de forma direta nos problemas comunitários,
colaborando assim, para amenizar e resolver os problemas da sociedade a que
pertence. Essa formação, por sinal, representa um dos grandes desafios das
universidades, tendo em vista, conforme Magalhães (2004), que elas não criam
condições para que os alunos transformem a realidade, e na melhor das hipóteses,
contribui para que o aluno desenvolva seu espírito crítico.
O que se percebe é que o ensino superior está sendo chamado a enfrentar
as novas exigências de qualificação impostas pelo mundo globalizado, devendo
estar atento também aos seus compromissos sociais. Assim sendo, as mudanças
que ocorrem no mundo repercutem no ensino e exigem novas posturas e busca de
14
metodologias adequadas que possibilitem ao futuro profissional transitar, dentro do
possível, com segurança em um ambiente complexo e, sobretudo incerto.
Concomitantemente, estas mesmas preocupações se farão presentes em cada
curso inserido nas universidades, que por sua vez, tem desafios próprios respectivos
a sua área e ao seu grau de desenvolvimento.
No que tange ao curso superior de Turismo, a formação profissional não é
tão recente, mas ainda se encontra em desenvolvimento. Evidencia-se na
publicação acadêmica deste curso que é atual a necessidade de se pensar na
introdução de mudanças nos métodos e nos processos de ensino-aprendizagem
mais condizentes com a realidade dinâmica, competitiva, cambiante, como também,
que não é muito significativo o número de pesquisas referentes à preocupação com
a formação do bacharel em turismo.
Quando se pensa na formação de pesquisadores e pensadores do
fenômeno do turismo, não se pode negligenciar as exigências do mercado, pois é no
entorno do trabalho que direta ou indiretamente gira a vida de muitas pessoas, e é
visando uma ocupação profissional que muitas pessoas buscam uma formação
superior. Deste modo, o incentivo ao desenvolvimento do espírito empreendedor,
perfil exigido pelo mercado, também será relevante ao futuro bacharel em Turismo, o
qual algumas pesquisas feitas por especialistas da área vêm confirmando esta
constatação.
No entanto, a formação empreendedora além de ser incipiente no ensino
superior, de representar uma moderna proposta de perfil do bacharel em turismo,
pressupõe romper com a educação tradicional baseada quase que exclusivamente
na transmissão de conhecimento, e que ainda hoje predomina em muitas
universidades. Em realidade, a formação empreendedora, segundo seus
pesquisadores, exige uma metodologia que valorize a aprendizagem pró-ativa do
educando, entre outras condições, e também se comenta que carece de novas
propostas metodológicas. Pode-se acrescentar também que as pesquisas
relacionadas à educação empreendedora ainda são bastante rudimentares no país,
e muito mais escassas em convergência com a área do turismo.
Conforme esses levantamentos, o que se investiga com esta pesquisa são
assuntos carentes e pertinentes de estudos e investigações, e dizem respeito as
exigências profissionais, acadêmicas e sociais deste mundo moderno, atribuídas aos
egressos dos cursos superiores. Mais exatamente, a investigação gira em torno de
15
uma re-interpretada metodologia de ensino conhecida como Metodologia de Projeto,
e sobre as habilidades e os comportamentos empreendedores, nos quais ambas
temáticas, depois de discutidas e analisadas integram-se com a área do turismo, em
especial, a questão da formação do turismólogo. Trata-se, portanto, de assuntos
referentes a mudanças nos métodos e nos processos de ensino-aprendizagem,
apresentados por uma atualizada, contextualizada e ainda pouco utilizada
metodologia, e da questão relativa ao perfil do bacharel em turismo, norteadas pela
formação empreendedora.
Como problemas envolvendo estes objetos de estudo, esta pesquisa busca
saber se:
Dentro do bacharelado de Turismo, seja nas disciplinas obrigatórias ou
eletivas de empreendedorismo pode-se considerar a introdução da Metodologia
de Projeto como uma proposta de aprendizagem com a qual os alunos possam
desenvolver comportamentos e habilidades empreendedoras.
Também se pretende saber até que ponto as implicações da Metodologia de
Projeto, juntamente com o propósito educacional anunciado (formar indivíduos
empreendedores), estão de acordo com o perfil profissional do bacharel em
Turismo indicado nas Diretrizes Curriculares do referido curso.
Estando as indagações situadas num contexto educacional, as análises e
discussões sobre os temas tiveram como principais referencias teóricos os autores
que dissertaram sobre os respectivos temas através de uma abordagem
educacional. Neste caso, dentro do Empreendedorismo, Fernando Dolabela e Louis
Jacques Filion, por se destacarem como os autores que mais contribuíram para a
disseminação da formação empreendedora no ensino superior, foram os principais
autores que serviram como base teórica. Desde a historicidade do
empreendedorismo, e também, do conceito referencial de empreendedor utilizado na
pesquisa, da questão do empreendedorismo social, do desenvolvimento das
habilidades empreendedoras, do apontamento de algumas habilidades e
comportamentos empreendedores, entre outros, os autores citados deram
significativas contribuições, cujos demais pesquisadores utilizados vieram
complementar e referenciar os estudos dos mesmos.
16
Assim como o empreendedorismo não se trata de um assunto que diz
respeito diretamente a educação, ou seja, não procede e nem é tema comum dos
cursos da área da educação, o fenômeno do turismo acompanha esta
desconformidade. No entanto, preocupações relativas à educação também se
fizeram presentes entre alguns especialistas em turismo e neste caso, os trabalhos
de Marília Ansarah e Luiz Gonzaga Trigo representaram as principais bases teóricas
da congruência que se fez da formação do bacharel em turismo exigida pelo
mercado, pela academia do turismo, e pelas Diretrizes Curriculares do curso em
questão, com a formação empreendedora.
Tratando-se de um tema concernente à educação, a metodologia de projeto
teve como marco teórico, além das idéias de John Dewey, idealizador desta
metodologia, a contribuição dos principais estudiosos contemporâneos como:
Fernando Hernández, Marilda Behrens, Jean Boutinet, Luiza Cortesão, Hilda
Magalhães, Dácio Moura e Eduardo Barbosa, cujas obras se complementaram entre
si, colaborando para enriquecer, esclarecer, aprofundar e apresentar diferentes
olhares sobre este tema, porém não de forma antagônica e sim, mais condizentes
com as realidades teórico-práticas de cada autor. Foi a partir das idéias destes
autores citados que se estabeleceu a espinha dorsal sobre a qual o trabalho foi
desenvolvido. Mas também dentro de cada um dos temas citados, outros autores
tiveram uma presença constante na pesquisa e suas idéias, quando não embasaram
as teorias de alguns dos autores referenciais, contribuíram de forma significativa
para fundamentar esta pesquisa. Entre eles pode-se citar: Gisele dos Santos, José
Dornelas, Nilbo Nogueira, Paulo Freire e Pedro Demo.
Como objetivo geral se pretende apresentar um referencial teórico,
fundamentado na metodologia de projeto e nos estudos sobre empreendedorismo,
de modo que seja possível referenciar práticas pedagógicas voltadas ao
desenvolvimento de comportamentos e habilidades empreendedoras.
Em termos de objetivo específico, pretende-se mostrar que o
desenvolvimento do espírito empreendedor dos alunos e a metodologia de projeto
são pertinentes de serem desenvolvidos nos cursos de Turismo, pela possibilidade
de serem atendidas algumas das exigências de formação descritas nas Diretrizes
Curriculares do Bacharelado em Turismo.
Para atingir os objetivos levantados, este trabalho fez uso da pesquisa
qualitativa focada num estudo descritivo sobre a metodologia de projeto, na medida
17
em que procurou descrever e analisar a possibilidade dos alunos desenvolverem
comportamentos e habilidades empreendedores através da metodologia em
questão. Da mesma forma, via pesquisa qualitativo-descritiva, procurou-se levantar
informações referentes ao empreendedorismo, seus conceitos, a viabilidade da
educação empreendedora, os comportamentos e as habilidades empreendedoras.
Levanta-se nesta pesquisa a hipótese-plausível de que: é possível favorecer
o desenvolvimento de comportamentos e habilidades empreendedoras através da
metodologia de projeto, e que este propósito de formação vem ao encontro do perfil
traçado pelas Diretrizes Curriculares do Bacharelado em Turismo. De acordo com
Köche (1997, p. 111), as hipóteses-plausíveis “são as que se inter-relacionam com
as teorias existentes de forma consistente, coerente e lógica”. O mesmo autor
depois complementa dizendo que “as hipóteses-plausíveis são produto ou dedução
lógica do conhecimento corroborado e acumulado pela ciência ou de modificações
introduzidas nas teorias existentes quando falseadas” (1997, p. 111).
As coletas de dados foram feitas via pesquisas bibliográficas, documentais e
pela internet. Segundo Köche (1997, p. 122), “a pesquisa bibliográfica é a que se
desenvolve tentando explicitar um problema, utilizando o conhecimento disponível a
partir das teorias publicadas em livros ou obras congêneres”.
Salienta-se que não se pretende demonstrar e esmiuçar como os alunos irão
desenvolver os comportamentos e as habilidades empreendedoras, através da
metodologia de projeto, mas sim, se coteja mostrar em que medida os objetos de
estudo se aproximam, de modo que seja possível atender aos objetivos
apresentados.
Para demonstrar isso, o trabalho ficou dividido em sete capítulos.
Os dois primeiros capítulos tratam de explicitar os referencias
epistemológico-teóricos e metodológicos que dão sustentação científica ao trabalho
com a metodologia de projeto. A diferença é que no segundo capítulo se trabalha
com a re-significação que houve dessa metodologia, no século XXI, cujas
transformações vieram colaborar para o florescimento de três teorias que hoje
fundamentam à metodologia de projeto.
No primeiro capítulo aborda-se desde a origem da palavra “projeto”, da
utilização da mesma na vida do homem, até o seu uso no contexto educacional, que
foi apresentado de forma evolutiva, no qual foi dado destaque aos precursores da
metodologia. E posteriormente, explicita a Corrente Pragmatista e a Escola Nova,
18
que fundamentaram e conferiram os pressupostos epistemológico-teóricos da
metodologia de projeto.
No segundo capítulo, são apresentadas as transformações da sociedade e a
mudança dos paradigmas da ciência que vieram atingir a educação, e,
consequentemente incitaram alguns educadores a re-significar a metodologia de
projeto. A abordagem sistêmica, a abordagem progressista e a abordagem do
ensino com pesquisa, teorias que acompanharam o novo paradigma da ciência,
alicerçando assim, uma prática pedagógica compatível com as mudanças
paradigmáticas da ciência, são exploradas em função de estas serem utilizadas hoje
como pressupostos teóricos que fundamentam a metodologia de projeto.
O terceiro capítulo inicia resgatando as significações mais atuais atribuídas à
palavra “projeto”, especialmente aquelas que vão ao encontro da metodologia que
se utiliza do nome “projeto”, haja vista que o termo tem diferentes entendimentos e
configurações. Deste exercício delineia-se uma idéia da caracterização da
metodologia de projeto. Logo em seguida, são apresentadas seis definições da
metodologia em questão, feita por estudiosos do assunto, ocasião em que se
evidenciou a maneira pela qual a metodologia é utilizada na educação e se pode
aprofundar ainda mais o tema. O referido capítulo é encerrado com a apresentação
dos principais pontos da metodologia de projeto que foram re-significados, levando
em conta as definições desta, conforme o entendimento dos autores utilizados no
mesmo.
No quarto capítulo, vários temas que esclarecem melhor o funcionamento da
metodologia como, suas etapas, as tarefas exigidas ao aluno e ao professor, a
questão dos conteúdos didáticos, a ênfase na aprendizagem, são explicados.
Também é dedicado um subcapítulo especial para apontar os principais benefícios
proporcionados pela metodologia de projeto, no qual foi evidenciado o
desenvolvimento das habilidades e competências que a referida metodologia
favorece ao educando que a vivencia. No final desse capítulo, identificam-se as
dificuldades e críticas que costumam ser feitas à metodologia de projeto, juntamente
com algumas sugestões para contornar as dificuldades apontadas.
O capítulo cinco trata do empreendedorismo. Inicialmente aborda-se a
evolução deste tema e suas diferentes concepções, para, logo em seguida, assinalar
e explorar a concepção que é utilizada como referência neste trabalho. O
empreendedor social é tema particular de um subcapítulo, no qual sua explanação
19
justifica-se pelo propósito de conferir um foco à concepção de empreendedor que foi
escolhida. Pois, a partir da concepção selecionada, se a mesma vier a ser colocada
em prática pelos alunos, diversificadas e provavelmente inadequadas utilizações ao
contexto acadêmico podem ocorrer, e também corre-se o risco de o uso prático da
concepção ser conflitante com a proposta formativa e metodológica do professor.
Dois subcapítulos tratam das questões concernentes à educação empreendedora.
Um deles foca a viabilidade da formação empreendedora e o outro apresenta alguns
indícios de como têm se desenvolvido as características empreendedoras, mediante
a explanação de algumas experiências práticas. Foi deixada para o final deste
capítulo a apresentação de seis pesquisas de épocas, enfoques e autores diferentes
que listaram as principais habilidades e comportamentos identificados nos indivíduos
empreendedores.
O sexto capítulo trata de integrar os dois principais objetos de estudo desta
pesquisa, visando, essencialmente, responder a primeira indagação levantada nesta
pesquisa. Portanto, num mesmo capítulo, é analisada e discutida objetivamente a
possibilidade de a metodologia de projeto criar condições para que os alunos
venham a desenvolver comportamentos e habilidades empreendedoras, entre outras
convergências que existem entre os temas em questão.
O último capítulo inicia apresentando um panorama geral sobre o surgimento
e o desenvolvimento dos cursos superiores de Turismo no Brasil, no qual se
evidenciam os principais desafios, dificuldades e necessidades impostos às
instituições de ensino superior, no que diz respeito à formação do bacharel. Dois
subcapítulos abordam as Diretrizes Curriculares: o primeiro foca as Diretrizes
nacionais válidas para todos os cursos superiores, e o segundo focaliza as Diretrizes
do curso de Graduação em Turismo. Nessas ocasiões se percebe uma abertura,
amparada pela lei das Diretrizes, que favorece a introdução de práticas inovadoras
dos educadores, que garante mais flexibilidade às instituições de ensino superior na
elaboração das suas propostas curriculares, e valoriza o desenvolvimento de uma
série de competências e habilidades idênticas às que são encontradas nos
indivíduos empreendedores. Na seqüência, é feita uma reflexão sobre a relevância
do desenvolvimento de competências na formação do bacharel. E por fim, para
validar e reforçar os indícios encontrados nas Diretrizes mencionadas, de que o
desenvolvimento do espírito empreendedor dos alunos do curso superior de Turismo
é pertinente, buscou-se encontrar evidências, de parte de docentes, pesquisadores
20
e especialistas em turismo e do próprio mercado de turismo, de que uma formação
empreendedora tem compatibilidade e vai ao encontro com o perfil do egresso
visado, seja pelos especialistas citados, como pelo mercado de turismo.
21
1 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA METODOLOGIA DE
PROJETO
1.1 Os Projetos na Vida do Homem, sua Origem, Evolução e o seu Uso na
Educação
A palavra “projeto” tem uma larga utilização, quer na linguagem corrente,
quer nas linguagens científica e filosófica. Ela aparece em inúmeras atividades
humanas, de modo que é bastante freqüente ouvirmos falar de projeto. Fala-se de
projeto de pesquisa, projeto de vida, projeto pedagógico, projeto de lei, projeto
arquitetônico, projeto econômico, projeto social, projeto político, entre outros. Vários
são, portanto, os contextos onde a palavra projeto é empregada. Ratificando essa
evidência, Boutinet (2002) menciona que hoje existe até um entusiasmo em torno
das condutas por projeto. São condutas que buscam dar sentido à ação que
antecipam, sejam elas vinda de indivíduos isolados, de grupos ou de conjuntos
sociais mais amplos. Cada vez mais, busca-se hoje, segundo Boutinet (2002),
antecipar-se aos fatos e conduzir as ações com eficácia. Em razão disso, justifica
esse autor, “esboça-se então o projeto, que se torna uma necessidade para todos”
(2002, p. 27). Mas o amplo uso do termo, que é possível verificar atualmente, e sua
valorização, não foram características dessa palavra, principalmente em seu
primórdio.
Ao fazer uma reconstrução histórica da palavra projeto, Boutinet (2002)
salienta que os gregos e latinos ignoravam em seu vocabulário o sentido que
corresponde à concepção moderna do termo. Ele surge, de maneira regular, no
decorrer do século XV, na França, sob a forma de pouget e project, mas com
conotações arquitetônicas e um nculo com a etimologia latina do verbo projicio. De
acordo com Machado (2004, p. 2) “Etimologicamente, a palavra projeto deriva do
latim projectus”, que significa lançar para frente, expulsar.
Como foi destacado, a origem da palavra projeto passa pela arte da
construção e da apropriação do espaço, ou seja, pela arquitetura. Uma cuidadosa
apreensão das atividades e exigências ligadas tradicionalmente à arquitetura
oferece ao leitor um singelo entendimento do que designava o termo “projeto”.
Segundo Boutinet (2002), o termo “projeto”, vinculado à arquitetura, alude e revela a
importância da dimensão espacial em toda atividade de antecipação, implica um
acordo permanente entre teoria e prática, exprime um trabalho de imaginação,
22
criação, e sobretudo de realização, e também manifesta a realização de uma idéia
planejada, de um ideal.
A palavra “projeto”, conforme Boutinet (2002, p. 34), “apenas se impõe em
seu sentido preciso atual, em meados de nosso século, após ter tido um uso
flutuante até o século XIX”. Algumas características, contudo, de acordo com
Machado (2004), podem ser consideradas gerais à idéia de projeto, pois se fizeram
presentes em grande parte quando esse termo foi utilizado. São os ingredientes
principais que não podem faltar à concepção de projeto. Um deles diz respeito à
referência ao futuro. Machado exemplifica dizendo que,
um projeto significa sempre a antecipação de uma ação, envolvendo uma
referência ao futuro. Distingue-se, no entanto, de uma previsão, de uma
simples visão prospectiva ou de uma conjectura, que são muitas vezes,
efetivamente, representações antecipadoras, mas que não dizem respeito,
de modo algum, a um futuro que está sendo gestado, de uma realidade que
está sendo construída. Não existe propriamente projeto quando são
enunciados acontecimentos susceptíveis de ocorrer, ou previsões sobre
evoluções possíveis do real, passíveis de serem consideradas na
elaboração das estratégias dos agentes, ou ainda, quando se sonha com
algo ou se vislumbra uma imagem cuja realidade não depende do agente
(2004, p. 5).
Entende-se a partir desta idéia que o projeto é um futuro que ainda está por
ser feito, algo a concretizar, a realizar, a transformar, deixando de ser uma simples
representação do futuro. A segunda característica fala da abertura para o novo.
Trata-se, nas palavras de Machado, de uma “abertura para o desconhecido, para o
não-determinado, para o universo das possibilidades, da imaginação, da criação”
(2004, p. 6). Diante desse entendimento, nega-se uma visão determinística do real,
pois se o futuro está determinado, não é possível fazer projetos. E por fim, outra
característica citada é o caráter indelegável da ação projetada. Isto quer dizer que
um projeto envolve uma ação a ser realizada pelo sujeito que projeta,
individualmente ou coletivamente. Significa que não se pode ter projetos pelos
outros. Machado exemplifica a situação: “Por mais bem intencionado que esteja, um
pai não pode ter projetos pelo filho; quando tal ocorre, isso em geral é motivo de
infelicidade de pelo menos um dos dois, quando não de ambos” (2004, p. 7).
É difícil imaginarmos que o homem consiga viver e evoluir sem ter projetos
pessoais, profissionais e coletivos. Sem uma visão de futuro, o homem fica reduzido
23
a um mero espectador da história, como se fosse um objeto, um ser passivo perante
os acontecimentos incapaz de intervir no mundo. A importância da visão de futuro é
ressaltada por Luck quando esta autora diz que, “Um sentido de futuro orienta todas
as realizações humanas e lhes impulso e direcionamento. É a partir dele que a
espécie humana se torna empreendedora e constrói a civilização” (2003, p. 56). Por
isso se pode dizer que, “um dos símbolos de evolução do ser humano e de uma
sociedade é a sua capacidade de planejar, pensar adiante, prever seu futuro para
melhorá-lo. Em outras palavras, sua capacidade de projetar” (ALMEIDA; FONSECA
JR. 2000, p. 64). Dentro desta perspectiva, é possível entender que a atividade de
fazer projetos é natural e intencional do ser humano. Por meio dela, o homem busca
a solução de problemas e desenvolve um processo de construção de conhecimento
para alterar a realidade presente, em prol de outra sonhada e desejada. Quem
explora bem a questão do projeto como algo imanente do ser humano é Machado.
Para este autor, o ser humano o vive sem projeto. Isso fica evidente quando
Machado escreve.
Cada ser humano, ao nascer, é lançado no mundo, como um jato de vida.
Paulatinamente, constitui-se como pessoa, na medida em que desenvolve a
capacidade de antecipar ações, de eleger continuamente metas a partir de
um quadro de valores historicamente situado, e de lançar-se em busca das
mesmas, vivendo, assim, a própria vida como um projeto (2004, p. 2).
Machado ressalta esta sua idéia afirmando que, “a capacidade de elaborar projetos
pode ser identificada como característica mais verdadeira humana; somente o
homem é capaz não só de projetar como também de viver sua própria vida como um
projeto” (2001, p. 35). A vida passa então a ser identificada como um contínuo
projeto onde o ser humano vai atrás de desejos, sonhos, conquistas, ilusões,
necessidades, visando realizar seus projetos pessoais e também coletivos. Estes
fatores acabam servindo como fatores impulsionadores do ato de projetar.
Projetam, portanto, todos os que estão vivos, todos os que antecipam
cursos de ação, os que concebem transformações de situações existentes
em outras imaginadas e preferidas, elegendo metas a serem perseguidas,
tanto em termos pessoais quanto em termos coletivos (MACHADO, 2004, p.
1).
24
Nogueira (2005a, p. 76) fala que o projeto é, “uma irrealidade que vai se
tornando real, conforme começa ganhar corpo a partir da realização de ações e,
conseqüentemente, as articulações destas”. Palavras como real, realização, ação e
articulação, começam a se destacar dentro da concepção de projeto. Uma outra
idéia que aglutina algumas destas palavras e leva em consideração os fatores que
impulsionam os projeto espõe que,
não existem projectos desligados da acção. Há, evidentemente, muitas
antecipações de acontecimentos futuros, como os sonhos, os desejos ou os
planos abstractos que são apenas, na melhor das hipóteses, anteprojectos
que se converterão em projetos quando tiverem sido aceites promulgados
como programas vigentes. O projecto é uma acção prestes a ser
empreendida. Uma possibilidade vislumbrada o é projecto até que se lhe
uma ordem de marcha, ainda que diferida (MARINA, apud NOGUEIRA,
2005a, p. 77).
A origem e a evolução do termo “projeto”, no que concerne à educação,
acompanha em alguns aspectos as características mencionadas sobre a palavra
“projeto”. Da mesma forma, conforme Boutinet (2002), principalmente a partir da
década de 1990, o termo projeto tem sido uma constante no domínio da educação.
Emprega-se a palavra para falar de projeto educativo, projeto pedagógico, projeto
curricular, projeto tecnológico, pedagogia do projeto, metodologia de projeto, projeto
de pesquisa, entre outros. É uma verdadeira proliferação do uso desse termo no
campo educativo. Embora apresentem significados distintos quando aplicados, todos
têm em comum a característica de serem um projeto. Boutinet comenta sobre essa
difusão da palavra: “Frequentemente, a literatura sobre o projeto no campo
educacional essa impressão de inconsistência, de utilização mal controlada de
um termo escolhido por suas virtudes mágicas” (2002, p. 180). É provável que
“virtudes mágicas” esteja se referindo ao fato dos projetos iniciarem por um
pensamento, por uma idéia, isto é, algo não concreto, para depois se realizar
fisicamente.
Como principal fonte de estudo histórico da palavra “projeto”, no contexto
educacional, destaca-se o artigo: The projet method: its vocational education origin
and international development, publicado, em 1997, pelo professor de educação
Michael Knoll, da Universidade de Bayreuth, da Alemanha.
25
De acordo com o estudo de Knoll (1997), em 1577 foi fundada em Roma a
Accademia di San Luca onde os arquitetos começaram a se profissionalizar, pois
antes eles eram vistos como simples artesãos. A partir de 1596, a Accademia
passou a promover competições complementares às aulas, visando envolver os
alunos em tarefas desafiadoras estimulando o desenvolvimento da criatividade. Com
tarefas, prazos, julgamento de estrutura semelhante às competições arquitetônicas
modernas, as da Accademia baseavam-se em desenhos puramente hipotéticos. A
denominação a que estes recebiam, progetti, marca a aparição do termo “projeto” no
contexto educacional, apesar de ainda não o caracterizar propriamente como
método de ensino. A partir do modelo italiano, em 1671, a Académi Royale d’
Architecture permitiu aos arquitetos franceses importante contribuição à evolução da
idéia de projeto ao colocar como foco da formação dos arquitetos a aprendizagem
por projetos. Mas foi em 1763 que se estabeleceu o projeto como método de
ensino academicamente respeitado. No entanto, o ensino por projeto ainda era
designado para nomear os desenhos dos alunos que participavam de competições
acadêmicas e que gradativamente foram conjugadas ao progresso por mérito
acadêmico.
no século XIX, a aprendizagem por projetos é transportada da arquitetura
para o ensino de engenharia, e da Europa para a América, sofrendo grande
influência na forma de utilização e nas justificativas teóricas. Buscava-se a formação
do engenheiro que aliasse teoria e prática, permitindo ir do projeto à construção e
englobando o ato completo da criação. Neste tipo de formação, idealizado por
Stillman H. Robinson, gastava-se muito tempo ao estudo e à pesquisa e também
conflitava com a formação do engenheiro científico valorizada em outras instituições.
Diante disso, Robinson ficou numa situação de isolamento. Professores da
Universidade de Washington propuseram superá-lo e adotaram como solução
deslocar o treinamento em habilidades manuais para o nível secundário, onde os
alunos trabalhavam em oficinas de carpintaria, tornearia, forja, fundição e
maquinaria. Primeiro, realizavam uma série de instruções de como lidar com as
ferramentas técnicas. Depois, ao fim de cada unidade de ensino e ano escolar,
realizavam, de modo contextualizado, projetos independentes. Esse ciclo de
formação, resumido no lema da “instrução à construção”, culminava ao final do
terceiro ano em um projeto de graduação. Esse treinamento manual ganhou apoio e
26
credibilidade em todos os Estados Unidos e foi estendido a toda educação básica e
escola secundária, na década de 1890.
Nesse contexto, no final do século XIX e início do século XX, ganhava força
um forte movimento reformista que se opunha ao treinamento manual baseado nas
exigências do trabalho e do estudo, reclamava atenção para as capacidades e
interesse dos alunos, exigia importância às diferenças individuais, entre outras
questões. Esse movimento ativista ficou conhecido como Escola Nova. John Dewey,
importante filósofo e maior representante do pragmatismo na educação norte-
americana, foi o principal expoente desse movimento nos Estados Unidos. Seguindo
seus ideais filosóficos e influenciado pelas idéias da Escola Nova, Dewey passou a
defender o treinamento baseado nos interesses e na experiência da criança, com
igual valorização da criatividade e das habilidades técnicas e a adequação do
trabalho aos níveis do desenvolvimento da criança. Esses eram alguns dos pontos
de partida do método por projetos que Dewey, de forma experimental, começou a
introduzir nas escolas dos Estados Unidos no início do século XX, sendo visto como
um método de educação progressista. Portanto, com Dewey, o método por projeto
ganha outra amplitude e conotação, pois atende às exigências de uma nova
psicologia educacional segundo a qual as crianças, ao invés de aguardarem
passivamente os conteúdos, deveriam ser envolvidas em situações de
aprendizagem aplicada, para desenvolverem a iniciativa, a criatividade e a
capacidade de julgamento. É a partir dessas idéias que o método por projeto
começa a se disseminar entre os professores americanos.
Tanto a Escola Nova como a Corrente Filosófica Pragmatista ganharão um
destaque especial nos subcapítulos seguintes em função da importância
epistemológica que proporcionaram ao método de projeto nos seus primórdios.
Dentre os estudos mais aprofundados referentes a John Dewey,
especialmente no que se refere à sua contribuição para o método de projeto,
destaca-se o livro: Introdução ao Estudo da Nova Escola, de Lourenço Filho,
publicado no final da década de 1970. Segundo Lourenço Filho (1978), Dewey
valorizou consideravelmente a experiência anterior por que cada indivíduo tenha
passado e considerou que a educação tem uma função social e deve promover o
sujeito de forma integrada. Para ele, os projetos tinham papel fundamental nas
comunidades em miniatura - forma pela qual Dewey via as escolas -, para
estabelecer alguns princípios, tais como: da real experiência anterior, da prova final,
27
da eficácia social e o de que o pensamento se origina de situações-problema. A
particularidade do método de projeto está na exigência da solução de um problema
como fonte de desafio e desenvolvimento de habilidades construtivas. Dewey o
aceitava a educação pela instrução e propunha a educação pela ação. Criticava
severamente a educação tradicional
1
, principalmente no que se refere à ênfase dada
ao intelectualismo
2
e à memorização. Utilizando a próprias palavras de Dewey, “o
ideal não é acumulação de conhecimento, mas o desenvolvimento de capacidades.
[...] Aprender envolve um processo ativo de assimilação orgânica, iniciado
internamente (1978, p. 46).
Tendo o conceito de experiência como fator central de seus pressupostos,
Dewey conclui que educação é vida, não preparação para a vida. Concebe a escola
como espaço de produção e reflexão de experiências relevantes de vida social, que
permite o desenvolvimento de uma cidadania plena.
Dewey, influenciado pela corrente filosófica pragmatista, entendia que
esforço e disciplina são produtos do interesse, ou seja, o interesse não se contrapõe
ao esforço, e é com base nos interesses que a experiência toma um valor educativo.
Desse pressuposto geral que afirma a inter-relação entre interesse e esforço é que
decorreram alguns princípios que merecem ser ressaltados, tendo em vista que os
mesmos foram realçados e usados por John Dewey na concepção do método de
projeto. De uma forma bem didática, Haidt (1995, p. 213) os esboça:
A aprendizagem deve realizar-se através da atividade própria do educando;
O trabalho educativo deve adequar-se aos níveis de desenvolvimento do aluno;
A educação não é uma mera preparação para uma vida futura, mas é a própria
vida. Vida e educação tornam-se a mesma coisa. Por isso, a ação de educar
deve estar intimamente relacionada com as atividades da vida real;
O pensamento é considerado um instrumento de adaptação ou ajustamento
individual. Isto significa que o pensamento se origina de uma situação
problemática e decorre da necessidade de ajustamento do homem ao ambiente
físico ou ao meio social e cultural em que vive;
É preciso considerar o o valor prático de nossos atos, mas a sua eficácia
na vida social. Nós agimos no meio social fazendo parte de vários grupos, dos
1
A educação tradicional é descrita com maiores detalhes no subcapítulo 5.5.
2
Intelectualismo: Tendência de uma pessoa a dar primazia à inteligência e às faculdades intelectuais,
sacrificando as emoções e os instintos; racionalidade (Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia, 2001, p. 1630).
28
quais somos membros. Por isso, é preciso aprender a cooperar e agir em
comunidade, somando esforços e tendo em vista o bem comum.
Apesar de Dewey ter sido o grande idealizador do método do projeto, foi seu
discípulo e filósofo da educação, William Kilpatrick, que deu um encaminhamento
metodológico, sistematizou-o e colaborou significativamente para a popularização do
método. Isto ocorreu em 1918, ano em que o método de projeto propagou-se
amplamente pelos Estados Unidos. Kilpatrick, aproveitando da análise do
pensamento feita por Dewey, imaginou uma forma concreta de ensinar (NÉRICI,
1981).
Em seu livro The Project Method, Kilpatrick (1918, apud KNOLL, 1997),
apóia o conceito de projeto de Dewey, defendendo que as crianças adquiram
experiência e conhecimento pela resolução de problemas práticos, em situações
sociais. Mas Kilpatrick foi ainda mais fortemente influenciado pela psicologia da
aprendizagem de Edward L Thorndike a qual atribui maior chance de repetição a
uma ação baseada numa inclinação que busca satisfação do que a uma ação
importuna realizada sob coação. Com esta influência Kilpatrick procurou fazer uma
utilização mais ampla do termo “projeto” e propôs o conceito de projeto como ato
intencional sincero do estudante. Kilpatrick classificava como projeto qualquer
atividade desse tipo. Por esta razão Kilpatrick opunha seu conceito de projeto à
noção de tarefa que era vista como simples trabalho insosso. Não vinculava o
projeto a matérias ou áreas específicas, como treinamento manual ou ocupações
construtivas. Ele também dividiu os projetos em quatro fases: intenção, preparação,
execução e apreciação.
O conceito de projetos de Kilpatrick despertou a resistência de muitos
educadores, em função da exagerada abertura deste conceito amplo de projeto que
nem mesmo a ação direta do aluno exigia. Por exemplo, na apresentação de uma
peça de teatro por alunos, também os da platéia, desde que se envolvessem
sinceramente, eram considerados executantes do projeto. Da mesma forma, o fato
de definir o projeto como um empreendimento apenas do aluno, e não uma iniciativa
conjunta de professor e alunos, não foi bem aceito. Um dos críticos de Kilpatrick foi o
próprio Dewey. Este (apud LOURENÇO FILHO, 1978) centrou sua crítica em dois
aspectos: o aceitava o projeto como empreendimento apenas do aluno,
ressaltando a importância da iniciativa conjunta de professor e aluno; não admitia a
29
idéia vaga de atividade intencional, valorizando o planejamento e o papel do
professor no direcionamento das ações dos alunos.
Com esta visão distinta de Kilpatrick, Dewey juntava-se ao clamor pelo
retorno ao conceito tradicional de atividade construtiva e enfatizava ser o projeto
apenas um entre muitos todos de ensino, e não a única saída para a confusão
educacional reinante, como julgava Kilpatrick. O movimento crítico teve grande efeito
negativo na popularidade do método e gerou um progressivo arrefecimento no uso
do conceito amplo, no início da década de 1930. Tempo depois o próprio Kilpatrick
terminou fazendo profunda crítica e admitindo o engano de associar a noção
provocativa e ambígua de “ato intencional” à abordagem tradicional de projeto.
Foi na década de 1930, de acordo com a pesquisa histórica de Higino
(2002), que o método do projeto chegou ao Brasil, sendo introduzido a partir do
Movimento da Escola Nova. Anísio Teixeira e Lourenço Filho foram os principais
responsáveis pela disseminação das propostas pedagógicas de Dewey e Kilpatrick.
É importante mencionar que a intenção de transformar o aluno de objeto em
um sujeito ativo da sua própria formação, como propõem o método de projeto, é
mais ou menos contemporânea aos esforços despendidos em contextos diferentes
por educadores defensores da Escola Nova, primeiramente C. Freinet, e, depois,
também M. Montessori, O. Decroly e A. S. Makarenko. Esses educadores
valorizavam a liberdade da criança, suas necessidades de atividades, em suma, a
escola ligada à vida (BOUTINET, 2002).
Como foi destacado anteriormente, o método do projeto caiu em desuso,
pois, diferentemente de Dewey e Kilpatrick, os pedagogos da Escola Nova quase
não recorreram ao conceito de projeto. Outras propostas foram mais utilizadas, entre
elas, cita-se como exemplo, a metodologia por resolução de problema. É importante
deixar claro que esta metodologia, conforme Nérici (1981, p. 129), “consiste em
colocar o educando em uma situação problemática, para que ele sugestões de
solução, com base em estudos anteriormente efetuados”. Ela se limita a tratar de
questões predominantemente intelectuais. Inclusive a própria situação problemática
pode ser inventada pelo professor. Enquanto o método por projeto, de acordo com
Haidt (1995, p. 213), “se processa a partir de um problema concreto e se efetiva na
busca de soluções práticas”. Ressalta-se, portanto no projeto a necessidade de
existir uma situação de vida real e a ação dos alunos para resolvê-lo.
30
Knoll (1997) registra que o método de projeto experimentou notável
revalorização na década de 1970, especialmente nos Estados Unidos e nas regiões
central e norte da Europa. Também nos anos 80, com o auge do construtivismo
3
e
com outras mudanças que impactaram na educação, o método do projeto despertou
ainda mais interesse. Quem relata as mudanças que repercutiram na educação é
Fernando Hernández. Este professor salienta que,
nos anos 80, dois fenômenos se destacam por sua influência na educação
escolar. O impacto da denominada revolução cognitiva na forma de
entender o ensino e a aprendizagem e as mudanças nas concepções sobre
conhecimento e o saber derivado das novas tecnologias de
armazenamento, tratamento e distribuição da informação (1998, p. 71).
Hernández ainda acrescenta alguns aspectos relacionados à educação que
estavam sendo valorizados na época e que, por sua vez, vieram favorecer mais a
inserção dos projetos nas escolas. Um dos aspectos, diz o autor, “tem a ver com a
importância que se ao contexto de aprendizagem e a situar os conteúdos em
relação à cultura na qual se deverá utilizar. O que levou também a estabelecer a
importância de ‘situar’ o que se ensina para facilitar a aprendizagem” (1998, p. 72).
Outro aspecto é fruto da pesquisa sociocultural que declarava que a
aprendizagem era favorecida pela interação dos alunos com a comunidade e não
entre os alunos (HERNÁNDEZ, 1998).
Não pretendendo estender a lista de acontecimentos que impactaram na
educação, mas mencionando fatos ocorridos na década seguinte de 1990,
Hernández (1998) citou a influência das mudanças na noção de inteligência, em
particular a noção do psicólogo americano Howard Gardner de Inteligências
Múltiplas. Nesta teoria, o autor defende uma visão pluralista da mente, de forma que
cada pessoa é um sujeito ímpar e tem forças cognitivas diferentes, aprende de
3
“Corrente educacional apoiada no princípio de que o conhecimento não é ensinado, mas sim estimulado a partir
de experiências que desenvolvem diferentes inteligências. É o nome pelo qual se tornou conhecida a linha
pedagógica que propõe que o aluno participe ativamente de seu aprendizado, mediante a experimentação,
pesquisa em grupo, estimulo à dúvida, uso de habilidades operatórias diferentes, desenvolvimento do raciocínio
e outros procedimentos. Rejeita a apresentação de conhecimentos prontos ao aluno, e o termo construtivismo
indica que uma pessoa aprende de maneira significativa quando torna parte de forma direta na construção do
conhecimento que adquire. Enfatiza a importância do erro não como um tropeço, mas como verdadeiro
trampolim na rota da aprendizagem e condena a rigidez do discurso do professor, as avaliações padronizadas e a
utilização de material didático estranho ao universo pessoal do aluno” (ANTUNES, 2001, p. 98).
31
forma e estilo diferentes de outros sujeitos e afirma que todas as inteligências
poderão e deverão ser desenvolvidas (GARDNER, 1995).
Levando em considerações os acontecimentos mencionados, mas ciente
que eles não esgotam as mudanças, as contestações e os modismos que ocorreram
nos anos 80 e 90, Hernández percebeu que
o conteúdo das disciplinas necessita ser configurado e apresentado por
meio de uma variedade de linguagens (verbal, escrita, gráfica, audiovisual)
para abrir aos estudantes os processos de pensamento de ordem superior
necessários para que compreendam e apliquem o conhecimento a outras
realidades. Mediante essa conexão, podem vislumbrar relações conceituais
entre as matérias curriculares e ter a oportunidade de transferir a outros
contextos. Dessa maneira a aprendizagem não se contempla como uma
seqüência de passos para alcançar uma meta na qual se acumula
informação, mas sim como um processo complexo mediante o qual o
conhecimento se rodeia e situa para aprendê-lo (1998, p. 72).
Essa percepção das novas necessidades educacionais, das mudanças nas
concepções sobre o conhecimento, na maneira de ensinar e de aprender, da
importância da contextualização dos conteúdos, como também, da conexão entre
eles e da aproximação da escola com a comunidade não conflitaram
4
com a
proposta do trabalho por projetos. Em suma, são novas realidades e contextos que
foram influenciando diversos autores a re-interpretar
5
o método de projeto.
1.2 A Corrente Pragmatista
É Importante discorrer brevemente sobre a escola filosófica conhecida como
Pragmatismo tendo em vista a grande influência que ela teve nas idéias do
idealizador dos projetos na educação que foi John Dewey. Busca-se com isso
identificar os pressupostos filosóficos da educação por projetos.
O pragmatismo é de origem norte-americana, tendo surgido no fim do século
XIX. Charles Sanders Pierce (cultor de estudos lógicos) e William James (psicólogo)
foram os seus criadores (LOURENÇO FILHO, 1978).
Conforme Lourenço Filho (1978, p. 236), “o pragmatismo se caracteriza
como uma filosofia geral da ação, fundada no exame da experiência humana”. Ela é
4
No capítulo sobre a metodologia de projeto essas colocações ficarão evidenciadas.
5
Os principais fatores responsáveis pela re-interpretação do método por projeto serão explorados com maiores
detalhes no capítulo 2.
32
identificada pela descrença no determinismo e pela crença de que a ação do
homem pode alterar os limites da condição humana. Dava, portanto, grande valor ao
estudo da ação, da experiência, como também, dos impulsos e motivos das ações
do homem.
Os pragmáticos “admitem que o conhecimento não é jamais gratuito, mas
sempre interessado nos fins a quem possa conduzir, só por eles podendo ser aferido
ou validado (LOURENÇO FILHO, 1978, p. 236). Dentro deste entendimento
também, é dito pelos pragmáticos que os pensamentos não se formam isolados da
ação. É preciso agir para pensar, e o próprio pensamento é uma ação reduzida.
Deslocando essas idéias para a educação, encontramos nas palavras de Lourenço
Filho uma relevante colaboração.
A conseqüência mais ampla do pensamento pragmático na educação, é que
as atividades da aprendizagem não deverão desligar o plano da ação do
plano do pensamento. Agir e pensar, formular idéias e operar em
consonância com elas, são duas fases de um mesmo processo que não
deve ser fracionado. [...] Uma situação completa de aprendizagem exigirá
sempre uma concepção, um planejamento, uma execução e apreciação
final dos resultados da ação (1978, p. 238).
Tem-se um dos princípios que nortearam o método do projeto. Diante do
entendimento de que o pensamento se origina de uma ação, o ponto de partida para
a educação será uma ação problemática. A partir de um problema, o educando
aprenderá fazendo, vivenciando, tomando atitudes diante dos fatos, construindo
conceitos e novas informações, ou seja, o aluno estará envolvido em uma
experiência educativa em que o processo de construção do conhecimento estará
integrado às práticas vividas oriundas de um problema que tenta resolver. Também
pode-se perceber que educar requer passar por algumas etapas que vão desde a
concepção de um projeto, por exemplo, até a sua conclusão.
1.3 A Escola Nova
Da mesma forma que o movimento pragmatista, a Escola Nova também é
responsável por muitos princípios que foram utilizados no desenvolvimento do
método por projeto. Vale, portanto, fazer uma breve introdução sobre o respectivo
33
movimento com o intuito de identificar alguns pressupostos teóricos do método de
projeto.
A Escola Nova destacou-se por sua reação à educação tradicional baseada
na transmissão de conteúdos descontextualizados, sem significado para a vida dos
alunos. Esse movimento, que representou um esforço de renovação educacional
segundo Haidt (1995, p. 29), “tinha por base os estudos realizados pelas ciências do
comportamento que vinham se afirmando”. De acordo com Lourenço Filho, a Escola
Nova,
não se refere a um tipo de escola, ou sistema didático determinado, mas
a todo um conjunto de princípios tendentes a rever as formas tradicionais do
ensino. Inicialmente, esses princípios derivam de uma nova compreensão
de necessidades da infância, inspirada em conclusões de estudos da
biologia e da psicologia. Mas alargaram-se depois, relacionando-se com
outros muitos numerosos, relativos às funções da escola em face de novas
exigências, derivadas de mudanças da vida social (1978, p. 17).
Ainda comentando sobre o surgimento da Escola Nova, datado no final do século
XIX, Haidt (1995) diz que o contexto histórico-social deste movimento foi marcado
por transformações na vida econômica, política e social, tanto na Europa, de onde
surgiu, como também nos Estados Unidos, país no qual a Escola Nova se propagou
logo em seguida e de se espalhou para os demais países do continente
americano. Era uma época em que,
a industrialização intensificava-se, deslocando do campo para as cidades
um grande contingente de população que engrossava as fileiras das classes
operárias emergente; a burguesia industrial firmava-se e difundiam-se as
idéias liberais. Com o aumento da clientela escolar, os serviços públicos de
educação expandiram-se. Aumentava a consciência dos objetivos sociais
da escola e o ensino passava a ser visto como um instrumento de
construção política e social. Daí a necessidade de rever os fundamentos e
as formas de organização da ação educativa (HAIDT, 1995, p. 30).
Como principais precursores destacam-se os educadores Ovide Decroly e
Celestin Freinet, na França, Maria Montessoury, na Itália, John Dewey e seu
discípulo Willian Kilpatrick, nos Estados Unidos. Na obra de Lourenço Filho (1978)
34
aparece referência a Rousseau como o ideário do movimento da Escola Nova.
Também é feita alusão aos educadores do século XVIII, como o suíço Johann
Pestalozzi e o alemão Friedrich Fröbel, que apontaram a necessidade de uma
educação voltada para os interesses e necessidades infantis. Desses e de outros
autores foram resgatados e valorizados alguns princípios que se fizeram presentes
na metodologia de projeto.
Para entender um pouco mais as concepções referentes à Escola Nova, se
dará destaque aos ideários de Dewey sobre a educação, e que conseqüentemente
os postulava em defesa a este movimento, e paralelamente, utilizou-os na
formulação do método por projeto.
No final do século XIX e início do século XX, na Europa e nos Estados
Unidos, acentuavam-se os conflitos sociais em decorrência das sucessivas crises
econômicas. Dewey entendia que a educação era a alavanca principal para o
desenvolvimento cultural da sociedade.
De acordo com os estudos de Galiani (2004, p. 61), a intenção de Dewey
“era que a escola criasse condições para que todos, indistintamente de sua classe
social, participassem de modo eficaz na vida social”. Caberia então às escolas o
papel de diminuir as diferenças sociais através de uma oportunidade a todos.
No entendimento de Dewey, “a educação nos moldes tradicionais [...] foi
utilizada como um meio para diferenciar os indivíduos e de reproduzir as
iniqüidades” (apud, GALIANI, 2004, p. 62). A escola, com o objetivo de formar mão-
de-obra qualificada para as indústrias, representava na época um espaço de
preparação, formação e controle. Havia uma extrema valorização dos conteúdos e
um sistema rígido de disciplina. No entendimento de muitos educadores defensores
da Escola Nova, entre eles Dewey, “a democracia necessitava de um sistema
educacional que fosse além da memorização de fatos e da passividade” (GALIANI,
2004, p. 62). Não se admitia mais o ensino onde o educador exerce uma ação
formadora e modeladora do aluno, considerando-o como um objeto, e que este
passivamente anotava as explicações do professor.
Na educação tradicional, o aluno recebia tudo pronto e não era incentivado a
problematizar e muito menos questionar e tampouco fazer relação do que aprendia
com o que conhecia. Visando alterar esta situação, Dewey propunha uma
educação ativa onde a ênfase era dada aos “métodos ativos de ensino-
aprendizagem, à liberdade da criança, ao interesse do educando, aos trabalhos em
35
grupo e a prática de trabalhos manuais na escola” (apud, GILIANI, 2004, p. 63).
Visava-se, portanto, o ensino centrado no sujeito, levando em consideração os
interesses dos alunos e provocando experiências de aprendizagem. Explorando um
pouco mais esta questão referente ao educando, Behrens menciona que,
os princípios da Escola Nova recomendam respeito à personalidade do
educando, às diferenças individuais e valoriza a unicidade do indivíduo.
Apregoa que cada aluno precisa se desenvolver segundo suas próprias
capacidades e recursos em função da sua ação e esforço individual (2005,
p. 46).
Embora o aluno seja visto em sua individualidade, a Escola Nova valoriza os
trabalhos de grupo. Quanto ao professor, este atuava mais como um facilitador de
aprendizagem, devendo auxiliar o desenvolvimento do aluno.
A Escola Nova, pelas propostas de Dewey era visivelmente marcada pela
valorização da democracia e pela crença na mudança social via educação.
Por fim, novamente se fará uso da praticidade didática para apresentar, em
forma de lista, os principais pressupostos pedagógicos e princípios didáticos
preconizados pelo movimento da Escola Nova. Esta lista foi feita por Haidt (1995, p.
31).
A pedagogia e a didática devem desprender-se do empirismo e da rotina,
adotando uma atitude crítica e dinâmica de investigação e reflexão constantes,
no sentido de aprimorar sua prática, tanto no que concerne a seus fins como a
seus meios.
O processo pedagógico e o trabalho didático devem basear-se nos estudos
realizados pelas ciências do comportamento, aplicando na prática as
contribuições da Biologia, da Sociologia e, principalmente, da Psicologia.
A educação, em geral, e o ensino, em particular, devem respeitar as diferenças
individuais e os estágios do desenvolvimento infantil, em seus aspectos físico,
cognitivo, afetivo e social.
A aprendizagem é um processo dinâmico, que depende da atividade mental do
educando e que se por meio da mobilização de seus esquemas de
pensamento. Por isso, o ensino deve apelar para a atividade mental do aluno,
levando-o a observar, manipular, perguntar, experimentar, trabalhar, construir,
36
pensar e resolver situações problemáticas. Enquanto na escola tradicional a
atitude do aluno era de imobilidade, passividade e receptividade, na Escola
Nova sua atitude é de participação ativa e dinâmica. A Escola Nova preconiza
o uso de métodos ativos de ensino-aprendizagem.
O ensino deve concentrar-se no educando, preocupando-se mais em
desenvolver seus processos mentais de pensamento (observação, proposição
e comprovação de hipóteses, espírito crítico, capacidade de analisar e julgar
etc.) do que acumular conhecimentos memorizados e sem ligação com a
realidade do aluno. É através da ativação dos processos mentais que o
educando chega à auto-estruturação de conhecimentos significativos.
Para realizar um trabalho mais efetivo, a escola deve adaptar-se à comunidade
e levar em conta as condições de vida social e cultural dos alunos, pois o
desenvolvimento humano é influenciado por fatores ambientais e sociais.
Apesar de as intenções dos educadores que defendiam a Escola Nova
serem boas, segundo Behrens
o ideário escolanovista foi difundido junto aos educadores, mas cabe
ressaltar que os pressupostos da Escola Nova foram incorporados pelas
escolas experimentais ou em escolas muito bem equipadas destinadas à
elite. Na realidade houve dificuldade de implementação dessa tendência em
larga escala nas instituições de ensino pela falta de equipamento,
laboratório e, principalmente, pela falta de preparo do professor para
assumir a nova postura. Embora no interior da escola continuasse a
proclamação dos procedimentos escolanovistas e democráticos, os
professores, em geral, não abdicavam do ensino tradicional (2005, p. 47).
Outra ressalva que se faz à Escola Nova é que mesmo havendo uma preocupação
com a inserção do aluno no processo de aprendizagem, houve “uma falta de
atenção aos conteúdos dos currículos escolares, comprometendo, assim, a
formação cidadã e democrática de caráter universal” (SANTOS, 2006, p. 24). Isto
que dizer que, na prática dos professores, prevaleceu uma preocupação de como
aplicar o método ativo, em detrimento aos conteúdos escolares. Explorando um
pouco mais essa questão, esta mesma autora diz que a nova postura dos alunos em
sala de aula, na qual o educando emitia opiniões, conhecimentos próprios e
manifestava gostos e preferências para trabalhar com certos conteúdos, fez com
que os professores levassem essas questões ao extremo. O resultado é que os
37
professores deixaram de se preocupar com o conhecimento científico a ser
divulgado e desenvolvido na escola (SANTOS, 2006).
38
39
2 AS TRANSFORMAÇÕES DA SOCIEDADE E OS PARADIGMAS DA CIÊNCIA
Ainda que se tenha comentado brevemente sobre algumas mudanças
ocorridas na década de 1980 e no início dos anos 90 e suas implicações no método
de projeto, a ênfase maior foi dada sobre os precursores do método, como também,
ao movimento escolanovista e à corrente pragmatista que os fundamentaram. O que
se percebe agora no século XXI é uma re-interpretação do método por projeto
causado pelas transformações da sociedade e pela mudança dos paradigmas da
ciência que vieram atingir a educação.
Para compreender melhor as novas necessidades deste século que
incitaram os educadores a re-significar o método por projeto, foi dado um destaque
maior aos trabalhos de duas pesquisadoras brasileiras, Marilda Behrens (2005,
2006) e Gisele dos Santos (2006). Pretendendo mostrar a culminância do método de
projeto na educação contemporânea, como também, fundamentá-lo dentro do novo
paradigma da ciência, essas pesquisadoras, primeiramente, julgaram necessário
entender as origens das mudanças. Dessa forma, a seqüência das temáticas
tratadas neste capítulo, seguiram a lógica de raciocínio das pesquisadoras, assim
como, suas obras foram as principais referências utilizadas.
2.1 A Crise do Paradigma Newtoniano-Cartesiano
O paradigma newtoniano cartesiano originou-se a partir da rejeição das
concepções aristotélicas
6
de ciência que perdurava mais de dois séculos. Tais
objeções foram feitas principalmente por Galileu e Bacon, os quais introduziram a
experimentação científica que modificou significamente a compreensão e concepção
teórica de mundo, de ciência, de verdade, de conhecimento e método (KÖCHE,
2000).
Bacon preocupou-se com a eficácia da investigação cienfica. Exigia uma
observação sistemática e experimental da natureza. Seu novo caminho de fazer
ciência era o da indução experimental. No entanto, seus experimentos não tinham
controle quantitativo e de mensuração. Foi Galileu que introduziu a matemática e a
geometria como linguagens da ciência reconhecendo a relevância do teste
6
Segundo Köche “A ciência aristotélica descreve os fenômenos utilizando conceitos que contêm suas
características empíricas. Não pressupõe uma relação quantitativa entre as propriedades dos fenômenos. É
antimatemática, pois os fatos qualitativos apenas podem ser determinados pela experiência e pela percepção
sensível e não por uma abstração geométrica” (1997, p. 47).
40
quantitativo-experimental para avaliar a veracidade das hipóteses e estipular a
chamada verdade científica. Desta forma, “o critério da verdade, para Galileu,
passaria a ser o da correspondência entre o contdo dos enunciados e a evidência
dos fatos, avaliada pelo método científico experimental(KÖCHE, 2000, p. 39). Ainda
conforme este autor, ao homem competiria, com sua razão, teorizar e construir a
interpretão matetica do real e à natureza caberia responder se concordava ou
o com o modelo sugerido” (2000, p. 40). Por essa mudança radical na forma de
produzir e justificar o conhecimento científico, Galileu foi o principal responsável pela
revolução científica moderna (KÖCHE, 1997). Com relação à visão de universo,
conforme Köche (1997, p. 52), Galileu o interpretava como um “mundo aberto,
mecânico, determinista, geométrico e quantitativo”.
Os pressupostos científicos enunciados por Galileu, conforme Behrens
(2005), influenciaram mais tarde René Descartes, que apresentou em seu livro
“Discurso do Método algumas questões que fundamentaram a verdade científica
até o século XX. Behrens sintetiza as principais idéias de Descartes.
Jamais acolher alguma coisa como verdade sem evidências concretas;
dividir cada um dos conceitos em tantas parcelas quanto possível para
resolvê-las; partir da ordem dos conceitos mais simples para os mais
complexos para conduzir degrau a degrau o conhecimento e buscar em
toda parte enumerações o completas e revisões gerais, que provocasse a
certeza de nada omitir (2005, p. 19).
Este pensamento cartesiano levou a comunidade cienfica a uma mentalidade
reducionista e a possuir uma visão fragmentada da realidade.
Junto com Galileu e Descartes, outros matemáticos e engenheiros como
Copérnico, Kepler e Newton consolidaram uma concepção mecanicista e determinista
do universo (KÖCHE, 1997). A ciência moderna que eles inauguraram, segundo
Köche,
parte do princípio de que o universo teve um grande engenheiro e arquiteto -
Deus - que o criou como uma máquina perfeita, dotada de leis precisas que
comandam seus movimentos, que podem ser descobertas utilizando-se
procedimentos experimentais e matemáticos (2000, p. 41).
41
O procedimento do experimento cienfico – o método científico, começou a ser
adotado pelo homem como modelo de acesso à realidade. Tal modelo “estipula
critérios para julgar quando esse acesso é realmente alcançado e quando o”
(KÖCHE, 2000, p. 42). Para Newton, toda hipótese deveria ser extraída da experiência
pela indução, sem haver, portanto, interferência da especulão hipotética. O método
experimental é considerado então, o ideal para submeter à prova as hipóteses
científicas. (KÖCHE, 2000). A física newtoniana começou a proporcionar um
conhecimento confirmado, inquestionável, fundamentado nos fatos e o na
subjetividade humana, e que funcionava com um espelho fiel da realidade. Este
paradigma newtoniano “impregnado pelo indutivismo e empirismo, gerou uma cega
confiabilidade na ciência, sem dúvida alguma, sustentada na certeza e exatio dos
resultados das teorias obtidas por um procedimento julgado perfeito” (KÖCHE, 1997 p.
57). Esse novo paradigma depois passou a ser racionalmente justificado por Kant que,
na sua Crítica da razão pura (1787), fundamentou a crença neste método cienfico-
experimental indutivo de fazer ciência. Ao não se admitir outras formas válidas de se
atingir o saber, exceto por este todo, o dogmatismo se faz presente dentro deste
paradigma. Outra característica era que o progresso passou a ser feito com base na
acumulão das certezas estabelecidas pela ciência. Como diz che (1997, p. 58), “o
crescimento da ciência seria acumulativo, através da superposição de verdades
demonstradas pelas provas fatuais geradas pelas observões particulares e pelos
experimentos”.
A aceitação deste método, durante três séculos, teve grande sucesso a ponto
de este passar “a ser o modelo ideal que deveria ser copiado por todas as outras áreas
de conhecimento” (KÖCHE, 1997, p. 57).
Fundamentada nos pressupostos do pensamento newtoniano-cartesiano, a
educação foi contaminada pelos pensamentos racionais, fragmentados e
reducionistas. De uma forma geral, as práticas pedagógicas, influenciadas por uma
visão conservadora, caracterizaram-se pela reprodução do conhecimento, onde se
dava ênfase na repetição, na memorização e na cópia (BEHRENS, 2005).
Falando de forma mais direta sobre os impactos nas universidades, Behrens
aponta que
42
a forte influencia do pensamento newtoniano-cartesiano fragmentou o saber
e repartiu o todo, dividiu os cursos em disciplinas estanques, em períodos e
séries. Levou as universidades a se organizarem dividindo a Ciência em
centros, departamentos, divisões e seções (2005, p. 22).
Repercutindo os impactos na educação, Gisele dos Santos colabora dizendo que a
fragmentação do conhecimento,
levou docentes e alunos a considerarem o conhecimento repassado como
verdade. Dessa forma, os professores utilizavam metodologias que se
fundamentavam na cópia e na imitação como práticas. A memorização dos
conteúdos apresentados se tornou imprescindível ao aprendizado, por isso
a necessidade de realizar atividades repetidas e, na maioria das vezes, sem
qualquer significado ao estudante (2006, p. 16).
O conhecimento, ao ser dividido e fragmentado isolou, o homem das
emoções, uma vez que, a razão era valorizada e desta as emoções não faziam
parte. Era a separação do racional com o emocional. Cabia às escolas o
desenvolvimento único da razão enquanto as emoções foram designadas como
responsabilidade das famílias. Razão e sentimento eram coisas separadas, assim
como corpo e mente. Dessa forma, em nome do racionalismo, as escolas deixaram
de contemplar sentimentos como: a solidariedade, a humanidade, a sensibilidade, o
afeto, o amor e o espírito de ajuda mútua (BEHRENS, 2005).
Sobre essas separações, Cardoso comenta. “Em resumo, o paradigma
cartesiano-newtoniano orienta o saber e a ação propriamente pela razão e pela
experimentação, revelando assim o culto do intelecto e o exílio do coração” (1995, p.
31).
Essa frieza da racionalidade e da objetividade científica foi bastante
questionada por autores como Paulo Freire, Fritjof Capra, Boaventura dos Santos,
entre outros. Moraes exprimiu suas críticas de forma contundente. “Precisamos fugir
do modelo cartesiano-newtoniano fechado, fragmentado, autoritário, desconectado
do contexto, que concebe o sistema educacional e o ser humano como máquinas
que reagem a estímulos externos” (1997, p. 54). Esses aspectos apontados,
juntamente com a grande evolução que estava ocorrendo no interior da própria
física, onde se descobrem fatos que contradizem as idéias newtonianas e começam
43
a aparecer novas pesquisas e teorias, foram fatores que colaboraram para a crise do
paradigma newtoniano-cartesiano no final do século XIX. Entre as teorias contrárias
ao dogmatismo e a certeza da ciência, pode-se apontar como uma das pioneiras,
conforme Köche (1997), as teorias
7
do francês Pierre Duhem. Também são
destacadas naquele final de século as teorias de Poisson, Laplace, Àmpere, a ótica
de Young e Fresnel, a termodinâmica, a eletricidade e o atomismo.
É importante destacar no encerramento desta sessão que o paradigma
newtoniano-cartesiano, na visão de Cardoso (1995, p. 31), “não se caracterizou
como um erro de percurso histórico, mas uma trajetória necessária ao processo
evolutivo do pensamento humano”. A partir dos referencias desse paradigma, a
ciência legitimou a sua eficiência operatória e o seu poder em manipular o mundo
mediante a técnica, que por sua vez, serviu de base para o crescimento das
indústrias e para a revolução industrial.
Valendo da colaboração de alguns autores
8
que trataram sobre a questão do
termo paradigma, Santos compilou algumas concepções e disse que, “os
paradigmas funcionam como filtros para entender as mudanças do mundo e como
fios condutores para os homens atuarem no universo e, por sua vez, buscarem sua
manutenção ou sua transformação” (2006, p. 19). Isso reflete, em certo ponto, a
colocação de Assmann que disse que, “todo paradigma tem um caráter histórico
relativo ao tipo de perguntas que a humanidade é capaz de se colocar-se na época
histórica em questão” (1998, p. 91).
Importante ressaltar que neste processo de transição sempre uma
resistência de cientistas e intelectuais devido à contestação e a derrubada de alguns
pilares de sustentação dos seus pensamentos. Manifestações de repúdio sobre as
7
De uma forma geral e bem resumida, pode-se dizer que as teorias de Duhem estão “relacionadas à rejeição da
indução e do método newtoniano, à negação do caráter essencialista das teorias físicas, à não aceitação do
experimento crucial, à inversão da base epistemológica, ao continuísmo histórico na evolução da ciência e ao
holismo teórico” (KÖCHE, 2000, p. 56).
8
Para Thomas Kuhn um paradigma é “a constelação de crenças, valores e técnicas partilhadas pelos membros de
uma comunidade científica” (1994, p. 225).
Para Maria Cândida Moraes “paradigma refere-se a modelo, padrões compartilhados que permitem a explicação
de certos aspectos da realidade” (1997, p. 31).
Fritjof Capra define paradigma como “uma constelação de concepções, de valores, de percepções e de práticas
compartilhados por uma comunidade, que forma a uma visão particular da realidade, a qual constitui a base
da maneira como a comunidade se organiza” (2004, p. 25).
Para Edgar Morin “um paradigma comporta um certo número de relações lógicas, bem precisas, entre conceitos;
noções básicas que governam todo o discurso (1996, p. 287).
Clodoaldo Cardoso entende o conceito de paradigma “como um modelo de pensar e ser capaz de engendrar
determinadas teorias e linhas de pensamento dando certa homogeneidade a um modo de o homem ser no mundo,
nos diversos momentos históricos” (1995, p. 17).
44
novas concepções que surgem são, portanto, normais e fazem partes das
turbulências que ocorrem nos momentos de transição. Certo também é que as
transformações vão influenciar significativamente a sociedade e a educação.
2.2 Rompendo com o Paradigma Newtoniano-Cartesiano
De acordo com Behrens, “a ruptura de um paradigma decorre da existência
de um conjunto de problemas, para os quais os pressupostos vigentes na ciência
não conseguem soluções” (2005, p. 29). No começo do século XX, inicia-se um
processo de novas soluções, novos debates, novas idéias, novas buscas, com base
em novos fundamentos e conceitos. São pensamentos diferentes que começam a
aparecer, decorrentes da insatisfação dos modelos newtoniano-cartesiano de
explicação. O que estava ocorrendo era uma transformação no processo e na
maneira de compreender o mundo (MORAES, 1997). Isto muito se deve a revolução
epistemológica que modificou a forma de compreender a ciência a partir da forma de
como ela é feita. E como mencionado, o físico e epistemólogo Pierre Duhem foi
um dos primeiros a denunciar a ruptura com o método newtoniano ao questionar os
fundamentos epistemológicos do positivismo newtoniano. Com seus trabalhos
científicos Duhem retira os fundamentos que permitiam aceitar racionalmente a física
como a ciência possuidora do verdadeiro conhecimento do real. Boa parte dos
estudos de Duhem “concentrou-se nos elementos constituintes do processo da
produção científica, isto é, na análise do que é feito quando o cientista investiga e
constrói a solução de um problema” (KÖCHE, 2000, p. 224). A epistemologia de
Duhem apontou a falibilidade da ciência física e mostrou que a racionalidade
científica não se sustenta mais no método científico. “Isso, contudo, não fundamenta
uma postura cética em relação à ciência, mas uma postura não dogmática, uma
postura falibilista, oposta ao realismo simplista e ingênuo dos séculos XVIII e XIX”
(KÖCHE, 2000, p. 213). Trata-se de uma reação de rejeição aos fundamentos
epistemológicos que sustentavam o positivismo indutivista do paradigma newtoniano
que se orientava por critérios abstratos e apriorísticos. Conforme o estudo de Köche,
ao contrário dos indutivistas, que erroneamente pensavam acessar os fatos
sem intermediação das teorias, para Duhem deve-se buscar construir esses
referenciais teóricos, para que possam auxiliar na delimitação precisa do
problema investigado, na construção das hipóteses, instrumentos e
procedimentos de observação e interpretação dos dados (2000, p. 228).
45
Entende-se deste modo que a teoria é a condição prévia e orientadora para
a realização de um teste experimental. Ou como diz Köche (2000, p. 212), “A teoria
impregna todo o processo de investigação, pondo por terra a pretensão objetivista
da ciência newtoniana calcada na concepção do método científico”.
A partir dessa contribuição de Duhem e de outros epistemólogos, a ruptura
do paradigma newtoniano começa ocorrer sendo posteriormente rejeitado também
por outras teorias inovadoras da ciência.
Para Moraes (1997), a partir de 1900, com advento da mecânica quântica
introduzida por Max Planck, levantou-se uma série de questões concernentes aos
problemas estritamentes físicos e também os relacionados ao método das ciências
naturais exatas, à natureza da matéria e aos problemas de natureza epistemológica.
Mas foi Einstein, em 1905, quem deu a principal contribuição para uma nova
concepção de ciência a partir das suas teorias da relatividade restrita e da
relatividade geral. Aliados à teoria quântica e da relatividade, que provocaram
grande impacto na ciência, outros estudos, desenvolvidos nas três primeiras
décadas do século XX, trouxeram relevantes contribuições. Podem-se destacar, de
acordo com Köche (1997, p. 59), algumas teorias como, “o principio da
complementaridade de Bohr (1913), o novo modelo de átomo idealizado por
Schrödinger (1926), o princípio da incerteza de Heisenberg (1927)”. Com esses
cientistas e tantos outros, “quebrou-se o mito da objetividade pura, isenta de
influencias das idéias pessoais dos pesquisadores. Demonstrou-se que, mais do que
uma simples descrição da realidade, a ciência é a proposta de uma interpretação”
(KÖCHE, 1997, p. 60).
Detalhando de uma forma resumida algumas dessas contribuições, pode-se
dizer que com a teoria da relatividade de Einstein, os conceitos tradicionais de
espaço e de tempo absoluto foram contestados. O Mundo passou a ser concebido
em termos de movimento, fluxo de energia e processo de mudança. Da física
quântica ficou o entendimento de que o universo é uma totalidade indivisa onde
existe uma teia de conexões que conectam suas partes. Da mecânica quântica ficou
comprovado que o ato de observação altera a natureza do objeto. Isso significa que
o conhecimento do objeto depende do que ocorre dentro do sujeito, o que levou os
cientistas a crerem que cada indivíduo organiza sua própria experiência. A
constatação anterior feita pelas experiências de Neils Bohr levou outro pesquisador,
o físico alemão Heisenberger, a formular o princípio de indeterminação, que afirma
46
que no universo quântico, os fenômenos são probabilísticos, não podendo
estabelecer neles uma relação determinista de causalidade (MORAES, 1997).
Nos domínios da química e a da biologia o cientista russo IIya Prigogine
trouxe uma grande contribuição, a partir da década de 1970, através da sua teoria
das estruturas dissipativas e pelo princípio da ordem por meio das flutuações. Além
de pluralista, sua teoria trouxe a percepção de que,
em vez da eternidade, temos a história, no lugar do mecanicismo, temos a
interpretação, a interconexão, a espontaneidade e a auto-organização. [...]
Em vez da “ordem” no universo, temos a “desordem crescente, a
criatividade e o acidente. No lugar da estabilidade e do determinismo,
encontramos a instabilidade, as flutuações e as bifurcações (MORAES,
1997, p. 68).
De significativa contribuição para a construção de um novo paradigma da
ciência também aparece o pensamento sistêmico influenciado pelos pressupostos
da física quântica. Este pensamento tem uma concepção basicamente holística e
conforme Cardoso (1995, p. 49), “baseia-se num princípio fundamental simples:
todos os fenômenos do universo estão intrinsecamente relacionados”. Em outras
palavras, este mesmo autor escreve. “O todo está em cada uma das partes e, ao
mesmo tempo, o todo é quantitativamente diferente do que a soma das partes”
(1995, p. 49). E de acordo com Behrens (2005, p. 33), “o grande impacto do
pensamento sistêmico foi o de que as propriedades das partes podem ser
entendidas apenas a partir da organização do todo”.
Portanto, a partir dessas teorias, o mundo passa a ser concebido em termos
de “conexão, inter-relações, teias, movimentos, fluxo de energia, em redes
interconectadas, e em constante processo de mudança e transformação”
(BEHRENS, 2005, p. 34). O que tem em comum essas teorias é a superação do
pensamento mecanicista e a valorização do pensamento sistêmico e contextualizado
que priorize o todo. E o desafio comum, a busca pela superação da reprodução para
a produção do conhecimento.
O que vai se observar no final do século XX é a evolução da sociedade de
produção de massa para a designada sociedade do conhecimento. Esta, pela sua
47
importância atual que repercutirá também na educação e pela influência causada na
vida de grande parte da população global, merece uma breve explanação.
Alvin Toffler foi o criador da expressão sociedade do conhecimento. Este
autor em seu livro, “A terceira onda”, identificou três grandes mudanças econômicas
vividas pelo homem. A primeira vivenciada no século XIX foi à revolução agrícola; a
segunda, do século XX, a revolução industrial; a terceira, deste século XXI, a
revolução do conhecimento. Em nossa era, o conhecimento, segundo Toffler (1995),
tornou-se o recurso essencial da economia. Isso, porém não significa que os fatores
clássicos de produção como terras, máquinas, energias desapareceram, mas sim
que se tornaram secundários. Na sociedade do conhecimento os ativos intangíveis
como o capital humano
9
ganham importância. O conhecimento assume importância
do principal recurso econômico e a riqueza construída pela sociedade passa a ser
produto do conhecimento.
O conhecimento é caracterizado pela capacidade de agir. Quando uma
pessoa sentido a uma informação, conseguindo aplicá-la, ele a transforma em
conhecimento. Dentro deste entendimento, a diferença entre informação e
conhecimento está nas pessoas porque estas possuem experiências, valores,
crenças, competências que as ajudam a discernir e julgar o uso apropriado da
informação. A informação que pode ser encontrada em diversos objetos como
jornais, revistas, livros, cds, torna-se inútil sem o conhecimento do ser humano para
aplicá-la de forma produtiva e significativa. O conhecimento também se caracteriza
por ser dinâmico, porque está sempre em constante mutação, por ser humanístico
porque ele está nas pessoas e por ser contextual, pois deve ser aplicado conforme o
contexto, não sendo necessariamente aplicado em qualquer momento.
No entanto, esta nova forma de capital sofre defasagem com muita rapidez
em função da incrível velocidade com que o conhecimento e a tecnologia se tornam
obsoletos, sem falar na ininterrupta quantidade de informações que são produzidas
diariamente. Em vista disso é dado ainda mais valor ao aprendizado contínuo, e fica
fácil identificar a sociedade do conhecimento como grande produtora e usuária de
informações. De acordo com Behrens (2005), torna-se impossível o ser humano
absorver e assimilar todas as informações produzidas.
9
O Capital humano segundo Dolabela, “diz respeito ao desenvolvimento das potencialidades humanas. Na nossa
época, significa a capacidade de gerar conhecimento, inovar, transformar conhecimento em riqueza” (2003, p.
49).
48
Outra característica da sociedade do conhecimento comentada por Toffler
(1995), é a desmassificação da produção, da distribuição, da diversão, da educação,
pelo predomínio da diversificação. A individualidade passa a ser estimulada, isto é, a
massificação cede lugar à personalização.
É preciso que se ressalte que a sociedade do conhecimento é conseqüência
dos avanços das tecnologias, da informática, das redes de comunicação interativas,
da explosão de informações, que por sua vez, tem provocado uma grande mudança
na relação das pessoas com o saber afetando assim as bases culturais da
humanidade (BEHRENS, 2005). Levando em consideração a questão dos avanços
tecnológicos e ratificando a importância do conhecimento, Machado diz que, “Com a
emergência das novas tecnologias informacionais, o conhecimento passou a ocupar
o centro das atenções, tornando-se o principal fator de produção” (2001, p. 15).
Dentro deste contexto, fica cil perceber que a visão newtoniana-cartesiana
não dava mais conta de atender as exigências da sociedade do conhecimento. Por
esta razão é que foi necessário buscar, nas teorias lançadas a partir do século XX,
novas abordagens, novas concepções para fazer frente às transformações sociais.
que se dizer, de acordo com Silva, Raymundo e Behrens (2002, p. 90)
que, “embora os cientistas proponham a superação do paradigma newtoniano-
cartesiano desde o início do século XX, [...] nas últimas cadas do século XX a
educação apresenta um forte movimento de mudança”. Isso tudo levou a um
profundo repensar na sociedade e na educação. Profissionais de várias áreas
passaram a buscar a influência de um novo paradigma no processo educativo, nas
propostas pedagógicas, no fazer do docente e nas obrigações dos alunos. O que se
visava, conforme Santos (1997, p. 18), era “um novo modelo educacional, capaz de
gerar novos ambientes de aprendizagem, que deixasse de ver o conhecimento de
uma perspectiva fragmentada, estática, e o reconhecesse como um processo em
construção”.
De uma forma geral, sem fazer maiores aprofundamentos, mas levando em
consideração as idéias presentes nas teorias apresentadas, Santos aponta alguns
norteamentos para a educação do século XXI.
A prática docente com visão inovadora precisa contemplar o espírito crítico
frente à realidade circundante e com preparo para atuar como profissional
ético e cidadão consciente, que tem como missão maior a busca da
49
transformação da sociedade. [...] Professores e alunos, na realidade,
precisam ultrapassar a reprodução do conhecimento, bem como as
metodologias mecanicistas e fragmentadas, utilizadas ainda no processo de
ensino, para que juntos, possam produzir um conhecimento mais
significativo. [...] A escola precisa oferecer um ambiente significativo, um
lugar rico em recursos e atividades educativas que conduzam à
aprendizagem efetiva (2006, p. 32).
Vê-se, portanto, que no início do século XXI são exigidos novos caminhos para a
educação, assim como se buscam referenciais teórico-práticos que subsidiem
metodologias inovadoras que dêem conta da realidade dinâmica, complexa e
cambiante do mundo em que vivemos.
O que será abordado na seqüência segue o raciocínio das pesquisadoras
Marilda Behrens e Gisele dos Santos. Está se preparando o terreno para introduzir o
método por projetos numa versão 2.1, ou melhor, do século XXI. Este, por sua vez,
no entendimento das pesquisadoras, permanece relevante para ser utilizado no
ensino, pois foi re-significado tomando como base as teorias que visaram
acompanhar o novo paradigma científico. São estas teorias, apresentadas na
seqüência, que hoje são utilizadas como pressupostos teóricos para fundamentar a
metodologia de projeto.
2.3 Paradigmas Inovadores
Com o advento da sociedade do conhecimento surgiram visões inovadoras
que foram representadas por um novo paradigma na ciência. Várias denominações
foram dadas ao novo paradigma. De acordo com Behrens (2005, p. 54), “Cardoso
(1995) o denominou ‘holístico’, Prigogine (1986) e Capra (1996) ‘sistêmico’; Moraes
(1997), Boaventura Santos (1989) e Pimentel (1993), ‘paradigma emergente’ “. A
própria autora em questão, numa obra publica em 2006, passou a adotar a
denominação de ‘paradigma da complexidade’, ao invés de paradigma emergente
como havia chamado inicialmente. Esta modificação serviu apenas para reforçar os
princípios e referenciais teóricos e práticos que foram propostos no paradigma
emergente. Mas de acordo com Behrens (2006), foi Edgar Morin o primeiro a utilizar
o termo complexidade. Em 2002, a partir da obra Ciências para a vida sustentável,
Capra também adotou o mesmo termo. Independente da denominação os
paradigmas inovadores “são fortemente enfocados na visão da totalidade, de
interconexão, de inter-relacionamento, na superação da visão fragmentada do
50
universo e na busca da reaproximação das partes para reconstruir o todo”
(BEHRENS, 2006, p. 19). Isto tudo representa mudanças que afetam a educação
em geral, impelindo que as universidades e as escolas ultrapassem o paradigma
conservador baseado na transmissão e na repetição, e exigindo “uma formação
docente e discente que supere a visão linear e torne-se mais integradora, crítica e
participativa” (BEHRENS, 2006, p. 20). Como conseqüência, será cada vez mais
incentivada a produção do conhecimento onde o envolvimento do aluno no processo
educativo sefundamental. Na visão de Behrens, “a exigência de tornar o sujeito
cognoscente valoriza a reflexão, a ação, a curiosidade, o espírito crítico, a incerteza,
a provisoriedade, o questionamento (2005, p. 55). Nesta perspectiva a ação
pedagógica não pode conceber o conhecimento como inquestionável e sim como
relativo e provisório. Para isso é essencial estimular a investigação, a busca de
informações, o manejamento crítico e reflexivo dos dados, a capacidade de
sistematizar o conhecimento, de inovar e agir com criatividade frente às novas
informações.
Fica entendido que o paradigma inovador, que acompanha a sociedade do
conhecimento, vai exigir consideráveis mudanças. Acrescentado outros detalhes que
dizem respeito às mudanças dignas do paradigma inovador, Behrens diz que com a
mudança paradigmática,
almejam-se ambientes educativos que superem a função de oferecer
aprendizagens não baseadas em fatos ou habilidades e que busquem um
estado de conexão com a vida, respeitando a diversidade na unidade,
impregnando os alunos com a experiência de ser, de pertencer e de cuidar
do universo, sendo sensível, tendo compaixão com seus semelhantes e
consigo próprio (2006, p. 26).
Além da multiplicidade de denominações que o paradigma inovador recebeu,
ele também engloba diferentes pressupostos de variadas abordagens. Behrens e
Santos selecionaram a Abordagem Sistêmica, a Abordagem Progressista e o Ensino
com Pesquisa como propostas que alicerçam uma prática pedagógica compatível
com as mudanças paradigmáticas da ciência.
51
2.3.1 A Abordagem Sistêmica
Primeiramente, é preciso registrar, conforme Cardoso (1995, p. 11), “que o
paradigma holístico não é uma determinada corrente filosófica, e sim um modelo
abrangente de pensar e viver a realidade, podendo ser desenvolvido por diferentes
caminhos”. Portanto, a abordagem sistêmica não é propriedade de uma única
corrente educacional. De acordo com Behrens (2005, p. 58), “a dimensão que se
pretende com uma perspectiva sistêmica ou holística é que o homem recupere a
visão do todo. Que se sinta pleno, vivendo dentro da sociedade como um cidadão do
mundo”. E nesta recuperação do todo visa-se considerar também a intuição, a
emoção e o sentimento e não apenas a razão. Tudo isto representa um esforço para
superar aquela visão fragmentada do saber, das disciplinas. Com isso, é possível
vislumbrar os fundamentos de uma educação sistêmica. Para Cardoso, (1995, p. 51)
educar holisticamente é “estimular no aluno o desenvolvimento harmonioso das
dimensões da totalidade pessoal: física, intelectual, emocional e espiritual”. Quem
também compartilha e acrescenta outras considerações a este entendimento é
Moraes. Para ela, o paradigma sistêmico
é um modelo educacional que busca o desenvolvimento da capacidade de
autoconstrução, da autoconsciência, baseada na compreensão de sua
própria natureza humana e espiritual que essempre em construção, mas
em interação com o outro e com o mundo da natureza” (MORAES, 1997, p.
207).
Vê-se desta colocação que o paradigma sistêmico reconhece as realidades externa
(humana), e a interna (espiritual) do homem, tudo isto numa mesma realidade, como
se fossem dois lados de uma mesma moeda. Nada mais natural presumir que,
dentro deste paradigma, o professor, o aluno, a escola, a metodologia e a avaliação
têm papéis diferenciados em relação ao paradigma anterior.
Espera-se, na concepção deste paradigma, que o professor procure
métodos diferenciados para ensinar seus alunos. Que procure caminhos que
respeitem a aprendizagem dos educandos. Que opte por uma metodologia que leve
52
em consideração um ensino centrado na aprendizagem das competências
10
,
habilidades
11
e aptidões
12
dos alunos e vise à produção do conhecimento (SANTOS,
2006). Para atingir esses propósitos, é necessário que o professor visualize o aluno
como um ser pleno e com potencialidades para se desenvolver completamente.
Neste entendimento, como diz Magalhães,
o professor como transmissor de conhecimento desaparece dando lugar á
figura do mediador. A negação da imagem do professor como mero
repassador de informações, já presente em Dewey, em Anísio Teixeira e em
Paulo Freire, é retomada no paradigma emergente, que parte do princípio
de que, na era da Internet, o professor não é a única e nem a mais
importante fonte do conhecimento (2004, p. 22).
Complementando este pensamento, Magalhães (2004) menciona que ao docente
cabe articular as experiências dos alunos para que estes reflitam sobre os
conteúdos e tornem-se ativos no processo de aprendizado. Esta postura do
professor deve ser mais valorizada do que o tradicional papel de transmissor de
informações. Desta forma, a atuação do professor torna-se fundamental na
superação da fragmentação, quando ele busca ultrapassar a reprodução para a
produção do conhecimento.
O que também colabora para esse propósito é o educador instigar seus
alunos para utilizarem os dois lados do cérebro. Segundo Behrens (2005), ainda
hoje se predomina, na educação em geral, o estímulo do lado esquerdo do cérebro,
aquele responsável pela racionalização e memorização. Enquanto o lado direito,
responsável pela intuição, sensibilidade, criatividade, estética, sentimento é muito
pouco contemplado na prática pedagógica. Possibilitar que o aluno cresça como um
todo também é desenvolver os dois lados do cérebro. Educar dentro destas
perspectivas é
10
Competência: Está associado à estrutura resultante do desenvolvimento harmônico de um conjunto de
habilidades e que caracterizam, por exemplo, uma função/profissão específica: ser arquiteto, médico ou
professor de química. As habilidades devem ser desenvolvidas na busca das competências (MORETTO, 1999).
11
Habilidade: Está associado ao saber-fazer, algo específico. Estará sempre associado a uma ação, ou física ou
mental, indicadora de uma capacidade adquirida por alguém. Assim, identificar variáveis, compreender
fenômenos, relacionar informações, analisar situações-problema, sintetizar, julgar, correlacionar e manipular são
exemplos de habilidades (MORETTO, 1999).
12
Aptidão: Disposição inata ou adquirida (Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia, 2001, p. 264).
53
acreditar que os alunos são capazes, que têm emoções, que têm
capacidade, que são inventivos e que, principalmente, são capazes de
estabelecer relações dialógicas nas quais possam realizar um trabalho
coletivo, participativo, criativo e transformador na construção de um mundo
melhor (BEHRENS, 2005, p. 68).
Para esta mesma autora, incentivar os alunos para que executem ações que visem
transformar a realidade envolve desenvolver uma formação de jovens para a
indignação e a inconformidade frente às injustiças sociais. Também é colaborar para
formar cidadãos éticos, críticos e construtores de uma sociedade justa e igualitária.
E comprometer-se com essa formação representa, para Behrens, o maior desafio
educacional do paradigma sistêmico.
Mas a partir do entendimento de que o aluno é um ser complexo, único,
competente, valioso, que vive coletivamente, que tem talento, criatividade e
potencialidades, o desafio não fica complicado de ser superado. A percepção de que
o estudante precisa ser estimulado a desenvolver todas as suas capacidades é a
condição primordial. Complementando e reforçando essas idéias sobre o aluno,
Moraes (1997, p. 138) diz que o estudante “é um ser original, singular, diferente e
único. É um ser de relações, contextualizado, alguém que está no mundo e com o
mundo, cuja realidade lhe será revelada mediante sua construção ativa”.
Para convergir com essa percepção sobre o aluno, de acordo com Santos
(2006), a metodologia deve ser baseada em um trabalho conjunto entre docentes e
discentes, deve proporcionar uma prática pedagógica crítica, reflexiva, produtiva,
estruturada por ações onde os alunos busquem sua autonomia. Deve também
facilitar o encontro entre a teoria e a prática. Magalhães (2004) ainda acrescenta a
importância de diminuir o excesso das aulas expositivas e intensificar a imersão dos
estudantes na comunidade. Behrens chega a sugerir que, a partir da opção por uma
metodologia sistêmica “é importante propor projetos criativos e transformadores que
ultrapassem o ensino e provoquem a aprendizagem significativa
13
(2005, p.67).
Pode-se dizer, em outras palavras, que a educação pela lógica da abordagem
13
“Entendemos que aprendizagem significativa é aquela que envolve o aluno como pessoa, como um todo
(idéias, sentimentos, cultura, valores, sociedade, profissão). Ela se quando: o que se propõe para aprender se
relaciona com o universo de conhecimento, experiência e vivências do aprendiz (MASETTO, 2003, p. 43).
54
sistêmica deve estimular o aluno a aprender a aprender
14
para que eles
desenvolvam todas as suas potencialidades.
Com relação às escolas e universidades o que é dito apenas reforça as
colocações anteriores atribuídas aos docentes e aos alunos, ou seja, “para atender a
uma visão complexa, integradora ou holística, precisam passar a ser um centro que
leve a transformação da sociedade” (BEHRENS, 2006, p. 22). Os estabelecimentos
de ensino deixam de ser as únicas instituições com acesso à informação e à
produção do conhecimento, porém ainda cumprem o papel principal na
escolarização dos indivíduos. Mas no que cabe à escolarização dos alunos, é
importante que as escolas ofereçam oportunidades para repensar a prática docente
com a finalidade de propor metodologias inovadoras. Abre-se assim, oportunidade
para que as escolas
extrapolem o espaço da sala de aula, ocupando de modo mais assíduo não
apenas os laboratórios e os espaços sociais da escola, como também os
disponíveis na comunidade, realizando atividades colaborativas em que as
experiências sejam vivenciadas individualmente e em grupo, atividades que
privilegiem a dinâmica de projetos, que invistam o aluno de
responsabilidades reais ante o seu aprendizado e o mundo que o cerca
(MAGALHÃES, 2004, p. 23).
No que tange à avaliação, esta tem por objetivo considerar todo o percurso
percorrido pelo aluno, seu crescimento gradativo, a superação dos erros durante os
processos de aprendizagem, seus limites e suas qualidades. Ela está a serviço da
produção do conhecimento de forma que o aluno possa perceber seus avanços
durante os trabalhos desenvolvidos.
14
Aprender a aprender é possibilitar que a ação pedagógica leve os alunos a desenvolverem as competências
necessárias a uma aprendizagem autônoma e criativa e que seja contínuo, em função das constantes
transformações do mundo contemporâneo. Essa percepção aparece inserida num dos quatro pilares propostos no
relatório de educação para o século XXI da UNESCO. O respectivo pilar é conhecido como aprender a conhecer
(DELORS, 1999). Outra contribuição atribuída ao aprender a aprender foi feita por Moraes ao escrever: “com
todas as transformações que estão ocorrendo no mundo, mais do que nunca é preciso aprender a viver com a
incerteza. Para tanto, necessitamos desenvolver em nossos ambientes de aprendizagem a autonomia de nossas
crianças e também de nossos professores, levando-os a aprender a aprender. Isso significa ter condição de
refletir, analisar e tomar consciência do que sabemos, dispormo-nos a mudar os conceitos e os conhecimentos
que possuímos, seja para processar novas informações, seja para substituir conceitos cultivados no passado e
adquirir novos conhecimentos” (1997, p. 144).
55
Fica evidente dentro desta abordagem sistêmica, a valorização da produção
do conhecimento e a colocação do indivíduo como sujeito ativo no seu processo de
aprendizagem, no qual este pode usar o conhecimento em benefício de sua vida e
de seus semelhantes.
2.3.2 A Abordagem Progressista
Entre os autores que deram significativas contribuições à abordagem
progressista, pode-se destacar, segundo Santos (2006), Henry Giroux, Moacir
Gadotti, Georges Snyders e Paulo Freire. Aqui no Brasil, conforme Behrens (2005),
o principal precursor foi Paulo Freire. A partir de suas obras, contando também com
a interpretação delas por outros autores é que a abordagem progressista é
explorada.
O termo progressista foi utilizado inicialmente pelo pedagogo francês
Georges Snyders em 1974, “para propor uma postura pedagógica que, partindo de
uma análise crítica das realidades sociais, afirmassem o compromisso e as
finalidades sócio-políticas da educação” (BEHRENS, 2005, p. 72). Tal abordagem
vai se caracterizar por ser uma proposta inovadora na educação e por ser um
processo de busca de transformação social. Para isso ocorrer, a prática pedagógica
precisa ser crítica, reflexiva e transformadora. Da mesma forma, Paulo Freire vai
procurar consolidar, através da educação, caminhos para a transformação da
sociedade a partir da realidade social do aluno, onde toda ação educativa visará
promover o aluno como sujeito e não como um instrumento de ajuste à sociedade.
O homem, conforme Paulo Freire (1987), é um indivíduo que constrói a sua
própria história, isso significa também que ele é o sujeito de sua própria educação. O
paradigma progressista está alicerçado justamente nesta perspectiva de que o
indivíduo é um ser elaborador e criador do seu conhecimento. Levando isso em
consideração, “a educação para ser válida, deve levar em conta necessariamente
tanto a vocação ontológica do homem (vocação de ser sujeito) quanto as condições
nas quais ele vive (contexto)” (MIZUKAMI, 1986, p. 86). Esta vocação ontológica do
homem, ligada ao contexto em que ele vive, ressalta o entendimento de que o
homem se constrói e torna-se sujeito quando, integrado em seu contexto, reflete
sobre ele e com ele se compromete. Reforçando isso nas palavras de Paulo Freire;
“O homem chega a ser sujeito por uma reflexão sobre sua situação, sobre seu
ambiente concreto. Quanto mais refletir sobre a realidade, [...] mais emerge,
56
plenamente consciente, comprometido, pronto a intervir na realidade para mudá-la”
(1980, p. 35). Nada mais importante do que promover uma educação que
desenvolva a conscientização do homem e sua atitude crítica. Até porque, segundo
Paulo Freire (1980), o desenvolvimento do conhecimento do homem está ligado
diretamente ao seu processo de conscientização. Por essa razão Paulo Freire
(1980, p. 40) afirma que é preciso fazer “desta conscientização o primeiro objetivo
de toda a educação: antes de tudo provocar uma atitude crítica, de reflexão, que
comprometa a ação”. Sem essa práxis o homem não poderá participar ativamente
da transformação da realidade. Entenda-se por práxis “reflexão e ação dos homens
sobre o mundo para transformá-lo” (FREIRE, 1987, p. 38). É através da práxis que o
homem se tornará um sujeito progressista, criará a sua história e se fará um ser
histórico-social. Para Paulo Freire (1987), uma ação sem reflexão se converte em
ativismo e a ação pela ação, ao minimizar a reflexão, nega a práxis, impedindo o
diálogo e sem o diálogo é impossível democratizar a educação.
Compilando algumas das idéias expostas, Behrens (2005, p. 77) faz a
seguinte síntese: “A abordagem progressista visa à produção do conhecimento e
provoca a reflexão crítica na e para a ação. Questiona a realidade circundante e
abre espaços para democratizar o saber”. Trata-se de uma educação voltada a uma
aproximação crítica da realidade que procura desvelar a realidade e penetrar na
essência do objeto que se pretende analisar para depois intervir.
A partir da consciência que se tem da realidade é que se busca o
conteúdo programático da educação que, portanto, não é imposto. Ele deve surgir
das necessidades imediatas da comunidade onde vai interferir, depois de se ter
dialogado e ouvido a mesma. Evidencia-se um ensino centrado na realidade social
que vai levar professores e alunos a refletirem e analisarem os problemas
relacionados com o meio social da comunidade em que vivem, tendo em vista a
ação coletiva frente aos problemas (BEHRENS, 2005). Fica caracterizado nesta
abordagem progressista que sua metodologia, como ressaltado, proporciona a
participação do sujeito da aprendizagem no processo de produção do seu
conhecimento e esta exige uma postura dialógica.
Deixando mais claro a questão da postura dialógica pode-se dizer, conforme
Paulo Freire (1987), que esta compreende o diálogo como um processo que se
em uma relação horizontal entre os agentes dialogantes, fundado em uma matriz
crítica e geradora de criticidade. Seus elementos constitutivos são a ação e a
57
reflexão. Neste sentido, a educação dialógica não é um encontro de dois sujeitos
que buscam o significado das coisas, mas uma relação que se consolida na práxis
social transformadora. Por essa razão, o diálogo implica na transformação da
realidade. E a ação educativa dialógica deve se dar a partir da leitura de mundo dos
educandos. Ressalta-se também que dialogicidade é ter uma postura dialógica
aberta, curiosa, indagadora e não passiva, enquanto fala ou enquanto ouve, a ação
dialógica sempre se dará na relação com e entre os homens, através de sua ação
sobre o mundo. A dialogicidade torna-se então o elemento indispensável e
mobilizador de todo processo educativo.
Muitas situações vivenciais de grupo, em forma de debate, também
caracterizam esta educação dialógica, conscientizadora, ativa e crítica. Conforme
comenta Behrens (2005, p. 76), “a tendência é ultrapassar o processo pedagógico
que se reduz ao treinamento técnico, e possibilita uma ação integrada, calcada no
diálogo e no trabalho coletivo”.
Aqui o professor aprende junto com o aluno, aprende educando. Esta
compreensão parte do entendimento de Paulo Freire que diz, “quem ensina aprende
ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (1996, p. 23). Portanto, afirma
Paulo Freire (1987, p. 68), “o educador não é o que apenas educa, mas o que,
enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado,
também educa”. Pode-se acrescentar ainda a este pensamento a afirmação de
Paulo Freire que diz: a educação autêntica, repitamos, não se faz de A para B ou
de A sobre B, mas de A com B, mediatizados pelo mundo” (1987, p. 84). Percebe-se
um respeito pelo educando, um tratamento horizontal dado aos alunos. Como diz
Behrens (2005, p. 74), “o educador progressista respeita os alunos e acredita que
são capazes de construir suas próprias histórias, a fazer escolhas e trilhar caminhos
reflexivos, críticos e criativos”. Desta forma, o educador será um organizador da
aprendizagem que não vai impor suas idéias e concepções, mas sim, vai estar a
serviço do aluno, pois sabe que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as
possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p.
47).
Dentro desta perspectiva, cabe ao professor incitar o aluno, com os
materiais oferecidos pelo professor, para que ele produza a compreensão do objeto
de estudo em lugar de receber pronto do educador. Agir desta forma é bem diferente
do que depositar, transferir, transmitir conteúdos e conhecimentos aos alunos como
58
se eles fossem vasilhas que devem ser enchidas pelo professor. O educador que
age desta forma acaba fazendo meros depósitos na cabeça dos alunos que
recebem pacientemente, memorizam e repetem. “Eis a concepção ‘bancária’ da
educação, em que a única margem da ação que se oferece aos educandos é a de
receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los” (FREIRE, 1987, p. 58). Nesta
visão “bancária” da educação, os indivíduos são vistos como seres de adaptação,
sem consciência crítica que os impossibilitam intervirem no mundo para transformá-
lo. Estimula-se assim a ingenuidade, a passividade e se inibe o poder criador do
sujeito.
A concepção da educação oposta à concepção bancária é chamada por
Paulo Freire (1987), de educação problematizadora. Esta concepção tem no diálogo
entre educador e educando sua principal característica. O que predomina, portanto é
o diálogo que deve propiciar um constante ato de desvelamento da realidade, uma
busca a emersão das consciências dos alunos, da qual resulte a inserção crítica na
realidade. Como diz Paulo Freire (1987), a educação problematizadora é de caráter
autenticamente reflexivo e que oferece a oportunidade para que os educandos
possam tornar-se pessoas de iniciativa, de responsabilidade, de compromisso, de
determinação, que sejam capazes de aplicar às novas situações os conhecimentos
adquiridos, que sejam críticos e reflexivos antes de qualquer iniciativa. “A educação
problematizadora se faz, assim, um esforço permanente do qual os homens vão
percebendo, criticamente, como estão sendo no mundo com que e em que se
acham” (Paulo Freire, 1987, p. 72). Fica claro dentro da educação problematizadora
o rompimento com a polarização entre professor e alunos, que ocorre na educação
bancária, assim como, predomina um diálogo que leve o aluno a ter consciência de
que não está no mundo, e sim, com o mundo, buscando transformar a realidade.
Reforçando as diferenças entre as concepções de educação mencionadas Paulo
Freire diz que,
enquanto, na concepção “bancária” o educador vai “enchendo” os
educandos de falso saber, que o os conteúdos impostos, na prática
problematizadora, vão os educandos desenvolvendo o seu poder de
captação e de compreensão do mundo que lhes aparece, em suas relações
com ele, não mais como uma realidade estática, mas como uma realidade
em transformação e processo (1987, p. 71).
59
Continuando ainda a evidenciar as diferenças, na sentença a seguir, Paulo Freire
inicia falando da educação bancária e, por conseqüência, a segunda refere-se a
problematizadora.
A primeira “assistencializa”; a segunda, criticiza. A primeira, na medida em
que, servindo à dominação, inibe a criatividade e [...] a “domestica”, nega os
homens a sua vocação ontológica e histórica de humanizar-se. A segunda,
na medida em que, servindo à libertação se funda na criatividade e estimula
a reflexão e a ação verdadeiras dos homens sobre a realidade, responde à
sua vocação, como seres que não podem autenticar-se fora da busca e da
transformação criadora (1987, p. 72).
Percebe-se o grande antagonismo entre as concepções educacionais expostas. Mas
as diferença não param por aqui. Para acentuá-las e também encerrando as
distinções, ressalta-se que a educação problematizadora considera os homens
como seres em devir, inacabados, incompletos, em constante evolução, assim como
a realidade. E de acordo com Paulo Freire (1980, p. 81), “O caráter inacabado dos
homens e o caráter evolutivo da realidade exigem que a educação seja uma
atividade contínua. A educação é, deste modo, continuamente refeita pela práxis”.
Como mediador do conhecimento e através do diálogo, o professor vai se
engajar com o aluno no ato de conhecer, evitando com isso o autoritarismo. Em sua
atuação, o educador irá se empenhar pela democratização da sociedade e instruirá
seus alunos para se inserirem no meio social com consciência crítica. O professor,
além do conhecimento técnico, mostra-se comprometido politicamente com as
transformações sociais. Age como um ser transformador, consciente e crítico.
Ainda que se tenha referido direta e indiretamente alguma palavras sobre
o aluno, salienta-se nesta abordagem progressista sua participação ativa na
educação, uma relação dialógica e de parceria com o professor, a qualidade de ser
um ser inacabado que precisa educar-se permanentemente, que aprende pela sua
própria ação transformadora sobre o mundo, e por fim, um sujeito de práxis.
Para tornar viável essa educação progressista, é essencial que a escola
trabalhe criticamente com os fatos, com a realidade e com o conhecimento. Ela deve
permitir a crítica do mundo. Isso necessita ser feito sempre de forma democrática e
com diálogo, respeitando o aluno. Além do mais, valendo-se das idéias de Paulo
Freire, Mizukami cita que a escola deve ser “um local onde seja possível o
60
crescimento mútuo, do professor e dos alunos, no processo de conscientização”
(1986, p. 95). Outra relevante contribuição que vem acrescer este tema sobre a
escola progressista foi feita por Behrens quando ela diz.
Uma escola progressista precisa estabelecer um clima de troca, de diálogo,
de inter-relação, de transformação, de enriquecimento mútuo, em que tudo
é relacional, transitório, indeterminado e está sempre em processo.
Caracteriza-se por ser uma instituição libertadora, democrática, dialógica e
crítica. Apresenta-se como local de problematização para a compreensão
do real, no qual se defende a importância dos conteúdos abertos às
realidades sociais (2005, p. 72).
E para finalizar esta abordagem, resta mencionar que a avaliação, como diz Santos,
caracteriza-se por ser “contínua, processual e transformadora, permite momentos de
auto-avaliação e de avaliação grupal [...] torna-se processo de relação de parcerias
em que todos são responsáveis pelo sucesso (2006, p. 39). Haverá uma
preocupação com cada aluno em si, mas com o processo da sua aprendizagem e
não com produtos desta. Por isto, como fala Mizukami (1986, p. 102), “qualquer
processo formal de notas, exames etc. deixa de ter sentido em tal abordagem”.
2.3.3 Abordagem do Ensino com Pesquisa
De acordo com Santos (2006), o ensino com pesquisa tem sido apresentado
por importantes educadores brasileiros como Maria Isabel Cunha, Marilda Aparecida
Behrens e Pedro Demo. Para descrever esta abordagem, se dará destaque ao
trabalho de Behrens (2005) e de Demo (2000).
De uma maneira geral, esta abordagem entende que o conhecimento é
acessível a todos, onde as verdades não são mais vistas como prontas e acabadas,
o que permite a descoberta de novos conhecimentos, superando com isso a
reprodução do conhecimento. Considera-se também que a pesquisa promove a
autonomia intelectual (SANTOS, 2006).
Partindo da idéia de que o que melhor distingue a educação escolar e
universitária é a instrumentação pela pesquisa, é que o educador Pedro Demo vem
defender a valorização da educação pela pesquisa na educação superior.
Logo no início de seu trabalho, Demo (2000, p. 5) aponta quatro
pressupostos referentes à proposta de educar pela pesquisa. São eles:
61
a convicção de que a educação pela pesquisa é a especificidade mais própria
da educação escolar e acadêmica;
o reconhecimento de que o questionamento reconstrutivo com qualidade formal
e política é o cerne do processo de pesquisa;
a necessidade de fazer da pesquisa atitude cotidiana no professor e no aluno;
e a definição de educação como processo de formação da competência
histórica humana.
Explorando esses pressupostos, Demo vai dar uma maior consistência à abordagem
do ensino com pesquisa.
Inicialmente, Demo (2000) reconhece que a família, a roda de amigos, as
reuniões em bares, os ambientes de trabalho, os clubes, etc. também são lugares
educativos. Entretanto, em todos estes lugares e todos os agentes que educam
nesses espaços utilizam outros expedientes que não são pertinentes da pesquisa.
Para Demo (2000, p. 1), “o critério diferencial da pesquisa é o questionamento
reconstrutivo, que engloba teoria e prática, qualidade formal e política, inovação e
ética”.
Questionamento reconstrutivo é o espírito que acompanha a pesquisa. Por
questionamento, atribui-se a condição do “sujeito competente, no sentido de ser
capaz de, tomando consciência crítica, formular e executar projeto próprio de vida e
de contexto histórico. Não significa apenas criticar, mas com base na crítica, intervir
alternativamente” (DEMO, 2000, p. 10). Por reconstrução, atribui-se o conhecimento
inovador e sempre renovado. Este oferece a base da consciência crítica e serve
como alavanca da intervenção inovadora. Mas, alerta Demo (2000), o conhecimento
não precisa ser totalmente novo. O que não pode é ser mera reprodução, cópia ou
imitação. O importante é “ser reconstruído, o que significa dizer que inclui
interpretação própria, formulação pessoal, elaboração trabalhada, saber pensar,
aprender a aprender” (DEMO, 2000, p. 11).
A partir deste entendimento da pesquisa que a distingue bem de outras
aproximações da realidade que são feitas sem consciência crítica, é preciso levar
em consideração duas barreiras a serem ultrapassadas para disseminar o ensino
com pesquisa. Quem descreve a primeira é Behrens.
62
Cabe ressaltar a necessidade de re-dimensionar o significado de pesquisa,
pois os alunos estão acostumados, em sua grande maioria, a realizar
trabalhos de pesquisa simplesmente compilando os conteúdos de vários
livros didáticos ou acessando a rede informatizada imprimindo as
informações disponíveis na internet (2005, p. 85).
A outra barreira diz respeito à importância de superar a visão de que a pesquisa é
um trabalho específico de mestres e doutores, um produto sofisticado, uma atividade
especial de um grupo de intelectuais. A pesquisa precisa ser internalizada como
atitude cotidiana, isto quer dizer, inseri-lá como um instrumento metodológico para
todos os níveis de ensino. Cotidianizar a pesquisa, segundo Demo (2000, p. 10),
“representa sobretudo a maneira consciente e contributiva de andar na vida, todo o
dia, toda hora”. É viver cultivando a consciência crítica, sabendo intervir na realidade
com base na capacidade questionadora.
Como condição essencial para transpor os obstáculos mencionados, é
fundamental, segundo Demo (2000, p. 2), “que o profissional da educação seja
pesquisador, ou seja, maneje a pesquisa como princípio científico e educativo e a
tenha como atitude cotidiana”. Não se pretende fazer do educador um pesquisador
profissional, mas um profissional da educação pela pesquisa, que encare a realidade
de maneira crítica e questionadora fazendo dessa postura seu hábito cotidiano. É a
partir daí que o professor terá condições de promover o processo de pesquisa no
aluno (DEMO, 2000).
Outra consideração importante feito por Demo (2000, p. 6) é apontar que “a
base da educação é a pesquisa, não a aula, ou o ambiente de socialização, ou a
ambiência física, ou o mero contato entre professor e aluno”. É preciso que ocorra o
questionamento reconstrutivo (pesquisa) para promover a formação do sujeito
crítico, criativo, autônomo e cidadão, que sabe intervir na realidade, pois como fala
Demo (2000, p.7), “onde não aparece o questionamento reconstrutivo, não emerge a
propriedade educativa escolar”.
Novamente a figura do professor torna-se essencial para incitar que o aluno
avance com autonomia, se exprima com propriedade, tome iniciativa, participe com
responsabilidade, aprenda a produzir conhecimento, atributos esses fundamentais
para haver um questionamento reconstrutivo. E promover isso passa pela
compreensão de que o aluno não é um sujeito subalterno, não é uma tábua rasa que
comparece a aula somente para escutar, tomar nota, engolir ensinamentos, fazer
63
provas e passar de ano (DEMO, 2000). De forma objetiva e clara, Behrens reforça e
acrescenta informações sobre o papel do aluno dentro da abordagem do ensino com
pesquisa. Ela escreve que o aluno,
deverá tornar-se um sujeito no processo, um questionador, um investigador,
deverá ter raciocínio lógico, agir com criatividade, ter capacidade produtiva,
saber viver com cidadania, com ética e adquirir autonomia para ler e refletir
criticamente ao aprender a produzir conhecimento. No processo educativo,
apresenta-se atuando, argumentando, problematizando e, ao realizar
trabalhos individuais e coletivos, busca consenso nas suas discussões
(BEHRENS, 2005, p. 84).
O aluno, então, deixa de ser um objeto de ensino para torna-se parceiro de trabalho
do professor. Neste caso, o educador deve apresentar-se como um orientador e
parceiro dos trabalhos dos alunos, como se fosse um orquestrador da construção do
conhecimento. Nesta função de mediador e colaborador, que transcende a posição
de instrutor, o professor precisa agir com um articulador crítico e criativo do processo
pedagógico e incentivar o aluno a aprender a aprender. Conforme Behrens (2005, p.
87), “no processo de aprender a aprender, o questionamento é incentivado para
buscar as possíveis soluções, que são atribuições delegadas à classe como um
todo”. Deste modo, é permitido que o aluno torne-se o co-responsável pela sua
própria aprendizagem, como também, estimula os alunos a serem
problematizadores. Trata-se de um processo de aprender avesso a copiar
diretamente, a reproduzir um texto, a memorizar e decorar. De acordo com Demo
(2000, p. 29), são coisas do aprender a aprender: “contraler, reelaborando a
argumentação; refazer com linguagem própria, interpretando com autonomia,
reescrever criticamente; elaborar texto próprio, experiência própria; formular
proposta e contraproposta”. Importante para estimular esse aprender a aprender é
incentivar os alunos a escreverem suas percepções e opiniões sobre a realidade
estudada, a redigirem o que pretendem fazer, aguçando assim sua reflexão,
interpretação e desenvolvendo sua linguagem própria. Formular e elaborar também
devem ser tarefas incentivadas para que os alunos superem a recepção passiva do
conhecimento, o que os fazem passarem a participar como sujeitos capazes de
propor e contrapropor. “Assim, uma coisa é ler, tomando conhecimento do que está
64
no livro. Outra coisa é elaborar o que se leu, imprimindo interpretação própria pelo
menos” (DEMO, 2000, p. 28).
Além do que foi mencionado, é importante que o professor “se interesse
por cada aluno, busque conhecer suas motivações e seus contextos culturais,
estabeleça com ele um relacionamento de confiança mútua tranqüila, sem decair em
abusos e democratismos” (DEMO, 2000, p. 17).
Vislumbra-se, dentro do que foi dito, uma metodologia que busca
ultrapassar o ensino livresco e conservador baseado predominantemente em aulas
expositivas de reprodução do conhecimento. Para Behrens (2005, p. 84), “A
metodologia do ensino com pesquisa assenta-se na busca da produção do
conhecimento pelos alunos e pelos professores, com autonomia, com criticidade e
com criatividade”. Seu objetivo é buscar uma educação questionadora e
reconstrutiva onde a teoria e a prática são concebidas como uma unidade
indissolúvel.
Outra contribuição de Behrens dado a este tópico menciona que
a metodologia do ensino com pesquisa pode criar um ambiente inovador e
participativo na escola e na sala de aula, pois torna-se necessário reduzir
espaços de aula expositiva para pesquisar, buscando informações,
acessando recursos informatizados e literatura para instrumentalizar a
elaboração de textos e a construção de projetos (2005, p. 91).
Destaca-se também o estímulo dado ao trabalho de equipe para aprimorar a
participação conjunta dos alunos e igualmente com o professor. Entretanto, “é
importante buscar o equilíbrio entre trabalho individual e coletivo compondo
jeitosamente o sujeito consciente com o sujeito solidário” (DEMO, 2000, p. 18).
Dentro desta metodologia, a avaliação do aluno é feita pelo desempenho
geral e não por momentos pontuais que exigem memorização e cópia, como ocorre
em muitas provas. Como fala Behrens (2005, p. 91), “não se trata de ‘dar notas’,
mas de responsabilizar o aluno durante o processo, sem a desagradável surpresa,
no final do período, com a reprovação”. A se pode aplicar a prova teórica, em
alguns momentos, mas essa será apenas uma forma de avaliar o aluno como um
todo.
65
A avaliação vai se caracterizar por apresentar-se contínua, processual e
participativa. Todo o dia verifica-se a participação e a produtividade do aluno,
deixando claro ao aluno que ele está sendo avaliado pelo seu desempenho global.
Ressalta-se, segundo Demo (2000), que a avaliação deve ocorrer sob a forma de
acompanhamento orientativo. Para isto, diz este autor, “o ideal seria ter de cada
aluno uma ficha [...] na qual se faz o acompanhamento circunstanciado de sua
evolução. O desempenho em termos de questionamento reconstrutivo, teórico e
prático é fulcro central da avaliação” (DEMO, 2000, p. 99).
Para atender as exigências do ensino com pesquisa, a escola precisa
propiciar um ambiente onde seus professores e alunos possam construir projetos em
conjunto que culminem com a produção de conhecimento. Para isto, é mister a
escola oferecer espaços onde se estimule a criatividade, a participação, a produção
de novos conhecimentos, o acesso à informação eletrônica e todo e qualquer
recurso que venha auxiliar a pesquisa (BEHRENS, 2000). E por fim, Demo
considera fundamental que a escola se preocupe em oferecer um “ambiente
positivo, para se conseguir no aluno participação ativa, presença dinâmica, interação
envolvente, comunicação fácil, motivação à flor da pele” (2000, p. 15).
2.4 A Integração entre as Abordagens
Encerrando este capítulo, que apresentou as transformações da sociedade e
as abordagens que acompanharam o paradigma científico inovador, vindo estas a
servir como fundamento para as metodologias inovadoras, cabe agora como
fechamento acompanhar as idéias de Behrens (2005), (2006) e Santos (2004),
(2006), que irão propor a integração das três abordagens para embasar o uso da
metodologia de projeto.
Foi visto que o paradigma inovador na ciência propõe que o homem seja
visto como um ser indiviso, fato que provoca no ensino uma mudança de eixo
orientador, como também, instiga os professores a buscarem uma prática
pedagógica que supere a fragmentação e a reprodução do conhecimento. Ressalta-
se que esta prática deve valorizar a reflexão, a ação, a curiosidade, o espírito crítico,
a incerteza, a provisoriedade, o questionamento dos alunos (BEHRENS, 2005).
Trata-se de uma ação pedagógica que busca tornar o aluno sujeito e produtor do
seu próprio conhecimento, sendo este processo feito de forma autônoma, criativa,
com criticidade e espírito investigativo.
66
Isto posto, conforme Behrens (2005), para alicerçar uma prática pedagógica
compatível com as mudanças ocorridas na sociedade do conhecimento, esta autora
acredita na aliança
15
entre as abordagens pedagógicas, como se formassem uma
teia, com a visão sistêmica, com a abordagem progressista e com o ensino com
pesquisa. Para Behrens (2005) essas três abordagens estão conectadas, em função
de seus pressupostos epistemológicos e posturas metodológicas. Elas se
completam e podem dar conta dos desafios da sociedade moderna. Nas palavras de
Behrens (2005, p. 56), “a aliança ou teia proposta nas três abordagens permite uma
aproximação de pressupostos significativos, cada uma em sua dimensão”.
Foi em sua caminhada acadêmica que Behrens percebeu que a mudança da
prática pedagógica dos professores depende do entendimento sobre os paradigmas
da ciência, principalmente o paradigma emergente. Neste sentido, diz Behrens,
além da reflexão sobre os paradigmas que acompanham a prática docente,
os professores precisam encontrar uma metodologia que venha atender os
paradigmas inovadores. Com esse desafio posto, acredita-se que seja
pertinente a opção dos docentes pela Metodologia da Aprendizagem por
projetos (2006, p. 9).
Da mesma forma, Gisele dos Santos, na sua dissertação defendida em 2004
e, posteriormente, em de sua obra publicada em 2006, seguiu os passos de Behrens
e consentiu com a junção das três abordagens. “Atendendo à proposição de aliança
entre a visão holística, a abordagem progressista e o ensino com pesquisa, o
professor preocupado com uma ação docente mais participativa pode propor a
metodologia de aprendizagem por projetos” (SANTOS, 2004, p. 30). Mas antes
disso, Santos também entende que o professor precisa ter um conhecimento dos
referencias teóricos do paradigma inovador e da função das três abordagens na qual
15
É válido esclarecer que esta aliança proposta por Behrens é fruto de suas pesquisas sobre a prática pedagógica
que fez junto a professores universitários. Foi pela vontade de auxiliar os professores no processo de transição de
uma atuação docente conservadora para uma prática pedagógica inovadora que, a autora aprofundou sua
pesquisa sobre os paradigmas da ciência. Suas pesquisas procuravam subsidiar os docentes para atuar na
universidade e tentar acompanhar as expectativas da revolução ocasionada pela sociedade do conhecimento.
Mais precisamente, foi em sua tese de doutorado que Behrens propôs a aliança entre as abordagens.
Posteriormente, seu processo de investigação teve continuidade com sua experiência docente no mestrado em
Educação da PUC-PR. Todos os conhecimentos referentes a esta temática os quais Behrens foi adquirindo, mais
tarde a levaram a publicar as duas obras (2005), (2006), que esta pesquisa faz uso.
67
a visão sistêmica ou holística promove o envolvimento do aluno em todo o
processo. A abordagem progressista, por sua vez, apresenta-se como
mediadora, proporcionando a participação do grupo, buscando uma
transformação. O ensino com pesquisa, como instrumento para a produção
do conhecimento (2004, p. 29).
E reforçando o que Behrens propõe, Santos (2006, p. 45) afirma que, “é justamente
essa aliança, essa teia entre a visão holística, a abordagem progressista e o ensino
com pesquisa que forma os pressupostos teóricos da metodologia de ensino por
projetos”.
Para Santos (2006, p.44), “a junção das três abordagens apresenta-se como
uma proposta criativa, crítica e transformadora, com o intuito de ultrapassar a
reprodução em busca da produção do conhecimento”. Pode-se acrescentar que as
propostas metodológicas advindas desta aliança devem ser também significativas e
desafiadoras para os alunos.
Também é preciso, conforme Behrens (2005), juntar essas abordagens à
importância de se utilizar a tecnologia como recurso no auxílio da produção do
conhecimento, contanto que os recursos da informática não sejam o fim da
aprendizagem e sim os meios para se produzir conhecimento.
Por fim, ao desenvolver o projeto metodológico próprio, Behrens (2005),
sugere que o professor tenha conhecimento dos referenciais teóricos e práticos do
paradigma inovador e que, atualmente, apontam para uma junção das três
abordagens metodológicas, onde a metodologia de projeto aparece como um dos
caminhos para se construir uma prática pedagógica que seja compatível com a
realidade atual.
68
69
3 A METODOLOGIA DE PROJETO
3.1 Uma prévia da metodologia de projeto
Antes de abordar a metodologia de projeto, convém resgatar as
significações mais atuais atribuídas à palavra projeto, e especificamente aquelas
que vão ao encontro da metodologia que se utiliza do nome “projeto”. Tal
preocupação é pertinente pelo fato de que, segundo Behrens (2006, p. 33), “o termo
‘projeto’ tem diferentes entendimentos e configurações”.
Iniciamos dizendo, conforme Boutinet, “que não projeto senão através de
uma materialização da intenção que, ao se realizar, deixa de existir como tal” (2002,
p. 27). Assim, este intento essencialmente humano, como é o caso da intenção, é
destacado como uma condição para a existência de um projeto, sendo que este vai
se culminar na sua realização.
Outras ações fundamentalmente humanas permeiam a noção de projetos e
logo a seguir elas serão evidenciadas. O importante a destacar sobre o comentário
anterior de Boutinet é que, “projecto não é apenas intenção; é também acção, acção
que deve trazer um valor acrescentado à situação presente e que se concretiza no
futuro” (CORTESÃO et al, 2002, p. 25). podemos perceber que o projeto passa
de uma intenção à ação. Mas antes mesmo da intenção, no seu nascedouro o
projeto, como destaca Nogueira (2005a), é antecedido por sonhos, vontades,
desejos, ilusões, necessidades, fatores esses responsáveis por incitar o ato de
projetar. Isto permite afirmar que “o projeto representa nossos anseios, indicando o
lugar de chegada, ainda que este se mostre em dimensões aparentemente
impossíveis e dentro de uma imprecisa extensão e amplitude temporal” (RISSO,
2005, p. 49). Trabalhando um pouco mais as idéias levantadas, é válido apontarmos
que o projeto exprime um ideal, o qual exigirá uma estratégia para concretizá-lo,
uma proposta planejada de intervenção para tornar real o sonho, o desejo
intencionado. Através do projeto o homem vai procurar trazer para si um futuro
desejado, o que confere ao ato de projetar uma conotação ambiciosa. Mas
exatamente por delinear ações a desenvolver no futuro, é que os projetos trazem
consigo certa dose de incerteza e manifestam um espírito de aventura. Este atributo
de correr riscos representa uma das razões pela qual o projeto obriga o sujeito a
pensar ponderadamente nas suas ações. Em outras palavras, “o projeto implica
projetar reflexivamente nossos sonhos e esperanças, dimensão inalienável do ser
70
humano” (RISSO, 2005, p. 55). Isto quer dizer que ações automáticas, impensadas,
não dizem respeito à ação de projetar. Contribuindo com estas percepções,
Machado fala que, “a realização do que se projeta exige certo nível de organização,
de planejamento das ações. Não bastam a vontade e o improviso. É preciso
estabelecer metas intermediárias, articular objetivos parciais” (2004, p. 15). Em vista
destas questões, o ato de projetar vai mobilizar energias, competências, habilidades,
atitudes, conhecimentos e todo tipo de esforço do sujeito que projeta. Boutinet
(2005) também tem essa mesma leitura, pois escreve que o projeto mobiliza
energias em torno de uma questão, vindo a dar sentido e motivação ao
comportamento do indivíduo que passa a agir na expectativa de concretizar o que
projetou. Pode-se dizer por isso que “todo projeto é uma atividade eminentemente
instrutiva” (BARBOSA; MOURA, 2007, p. 19).
Levando em consideração o que foi dito sobre projeto, mas trazendo
outros detalhes referentes ao termo, é dito que projeto
é geralmente algo que se situa na interface da expectativa e de intervenção.
[...] Projecto é assim o resultado da tensão decorrente da necessidade do
problema surgido, do desejo existente e da previsão, estruturação
antecipada da acção. É como que um comprometimento entre a reflexão
necessária e a acção desejada. É a tentação de se lançar na aventura, de
correr o risco, de tentar se expor, de passar da situação protegida do
espectador, ou daquele que se contenta com sonhos seus, à posição
vulnerável que resulta de ser actor, com o risco de ver as suas idéias
traduzidas em propostas, em acções, efeitos, resultados, de, apesar do
pudor, ver os outros tendo acesso às suas idéias e criticando as suas
realizações (CORTESÃO, et al., 1993, p. 81).
Pelo que foi dito, é possível descrever sucintamente que o ato de projetar
refere-se a todos os indivíduos que não têm receio de correr riscos, que desejam
conceber cursos de ação planejada, que acreditam que podem intervir na realidade
para transformar sonhos, desejos, necessidades, em algo concreto.
Intenção, idéia, desígnio, desejo, sonho, planejamento, futuro, realização,
ação, meta, foram algumas das palavras destacadas ao se explorar a concepção de
projeto. Grande parte delas, de forma muito parecida como foram apresentadas, se
farão presentes na exposição da metodologia de projeto, mas desde é possível
delinear uma idéia da caracterização da metodologia de projetos. Reunindo algumas
das palavras pode-se dizer que: Quando se projeta visa-se o futuro e este emerge
71
de um sonho, de um desejo, de uma idéia que se pretende realizar. A primeira
manifestação deste sonho ocorre através de uma intenção que deverá ser
explicitada. Explicitar o desígnio é traçar as estratégias de ação, e também analisar
minuciosamente a situação, atividades que dizem respeito a planejamento. Isto
manifesta o caráter operatório do ato de projetar, da mesma forma que esta ão
pressupõe acreditar que o homem pode intervir no curso da história para realizar
suas metas, o que implica também ter ousadia e correr riscos. Fundamental,
portanto, é que a pessoa tenha oportunidade de sonhar, imaginar uma ação, traçar
um plano para torná-lo real, condição esta que dará, ao indivíduo, sentido às suas
ações e que favorecerá a dedicação do mesmo na concretização do seu desejo.
Fica evidente perceber que se trata de uma atividade que solicita ação, que projetar
significa ter meta e que esta vai exigir uma organização coerente da ação de forma
que seja possível transformar um sonho em uma realização concreta.
3.2 Explorando algumas definições contemporâneas
O que será abordado a seguir são seis definições da metodologia de projeto
feita por estudiosos no assunto e que, por conseguinte, denotam a maneira pela
qual o projeto é utilizado na educação. A partir destas definições, alguns aspectos
procedentes da metodologia ganharão observações de acordo com a exposição do
tema pelo autor. O que se pretende é mostrar as concepções atribuídas por alguns
dos principais pesquisadores contemporâneos da metodologia em questão, de forma
que o leitor possa ter um entendimento mais variado, ainda que as distinções entre
as definições não sejam muito significativas. De qualquer forma, uma definição
acaba complementando a outra e desse jeito o assunto ganha um leque maior de
profundidade e explanação.
Chama-se atenção também para o fato de que existirão diferentes nomes
dados à metodologia de projeto, expediente este que pôde ser observado nos
capítulos anteriores, mas se trata de algo pelo qual se entende que, não
compromete o entendimento do tema. Portanto, verificar-se-á que alguns autores a
denominam de Metodologia de Projeto, outros de, Metodologia dos Projetos.
Também vai aparecer Método por Projetos, Trabalho por Projetos e Projeto de
Trabalho. E por fim, fala-se também em Aprendizagem por meio de Projeto,
Pedagogia dos Projetos, Método de Projeto e Ensino por Projeto.
72
Ainda que exista uma considerável diferença na definição de metodologia
16
e pedagogia
17
, pela maneira que os autores dissertaram sobre a atividade através
de projeto, se perceberá a convergência na dinâmica da aplicação, seja ela, da
metodologia ou da pedagogia dos projetos. Alguns autores, como Moura e Barbosa
(2007), afirmam que o fato de deixar bem demarcado os conceitos de pedagogia e
metodologia ao se produzir trabalhos com projeto, torna os trabalhos mais seguros e
eficientes. Hernández repudia o uso do termo método nas atividades educativas
que se utiliza de projetos. Tal rejeição é atribuída ao fato de que “entre os docentes,
quando se fala de ‘método’ em relação à prática escolar, ao que se costuma fazer
referência é à aplicação de uma fórmula, de uma série de regras” (1998b, p. 75).
Apesar dessas advertências não se percebe, pelo menos nos autores consultados
nesta pesquisa, a idéia de que, ao fazer uso de atividades de projeto, o educador
estará pré-determinando o que vai ocorrer em sala de aula, ou que o
desenvolvimento do projeto ocorrerá de uma maneira absolutamente linear e
previsível. Por esta razão, levando em consideração também a dinâmica em que o
assunto é tratado pelos autores, não se percebe distorções para o entendimento
quando se usa o termo “projeto” procedido ou sucedido pelas diferentes palavras
ilustradas anteriormente. Em suma; a idéia sobre a educação por projetos não é
prejudicada em seu entendimento em função do nome que vem acompanhada a
palavra “projeto”.
3.2.1 Fernando Hernández
O professor espanhol Fernando Hernández já publicou vários artigos e livros
a respeito da metodologia de projeto, sendo por isto considerado mundialmente
como um dos grandes colaboradores e incentivadores dessa metodologia. Seus
estudos questionam os métodos de ensino de muitas escolas e concluem que o
currículo escolar deveria ser organizado por meio de projetos. Para o autor, é
possível ensinar tudo por meio de projetos, bastando que haja uma dúvida e que a
partir desta se inicie uma pesquisa e se busque informações sobre a questão
indagada. Pode-se presumir com isso a idéia de que o projeto refere-se a “um
16
Metodologia, no que diz respeito à educação, é o conjunto de procedimentos didáticos, expressos pelos
métodos e técnicas de ensino que visam levar a bom termo a ação didática, que é alcançar os objetivos do
ensino” (NÉRICI, 1981, p. 54).
17
Pedagogia “é o estudo sistemático da educação. É a reflexão sobre as doutrinas e os sistemas de educação. [...]
pode ser conceituada como a ciência e a arte da educação” (HAIDT, 1995, p. 13).
73
percurso através de um tema-problema que favoreça a análise, a interpretação e a
crítica” (HERNÁNDEZ, 1998c, p. 33).
A definição de Hernández da metodologia por projeto é apresentada como
uma forma que,
está vinculada à perspectiva do conhecimento globalizado. [...] Essa
modalidade de articulação dos conhecimentos escolares é uma forma de
organizar a atividade de ensino e aprendizagem, que implica considerar que
tais conhecimentos não se ordenam, para sua compreensão, de uma forma
rígida, nem em função de algumas referências disciplinares
preestabelecidas ou de uma homogeneização dos alunos (1998a, p. 61).
Com isso, deseja-se propor a formação de indivíduos com uma visão global da
realidade, que busquem estabelecer conexões entre os fenômenos, o que abre
caminho para que os alunos questionem a idéia de verdade única. Desta forma,
conforme Hernández,
a função do projeto é favorecer a criação de estratégias de organização dos
conhecimentos escolares em relação a: 1) o tratamento da informação, e 2)
a relação entre os diferentes conteúdos em torno de problemas ou
hipóteses que facilitem aos alunos a construção de seus conhecimentos, a
transformação da informação procedente dos diferentes saberes
disciplinares em conhecimento próprio (1998a, p. 61).
Com os projetos pretende-se então, dar um sentido ao conhecimento que o aluno
vai construir a partir das estratégias que usará para pesquisar os problemas
lançados em sala de aula.
Por conta do que já foi exposto, segundo Hernández (1998b, p. 61) os
projetos podem permitir:
a) Aproximar-se da identidade dos alunos e favorecer a construção da
subjetividade, longe de um prisma paternalista, gerencial ou psicologista, o que
implica considerar que a função da Escola não é apenas ensinar conteúdos, nem
vincular a instrução com a aprendizagem;
b) Revisar a organização do currículo por disciplinas e a maneira de situá-lo
no tempo e no espaço escolar. O que torna necessária a proposta de um currículo
74
que não seja uma representação do conhecimento fragmentada, distanciada dos
problemas que os alunos vivem e necessitam responder em suas vidas, mas sim,
solução e continuidade;
c) Levar em conta o que acontece fora da Escola, nas transformações
sociais e nos saberes, a enorme produção de informação que caracteriza a
sociedade atual, e aprender a dialogar de uma maneira crítica com todos esses
fenômenos.
Outro aspecto destacado por Hernández (1998a) é que, nesta concepção,
não um todo a seguir, mas uma série de condições a respeitar, sendo que o
primeiro passo é determinar um assunto a investigar. Este pode ser escolhido
partindo de uma sugestão do professor ou dos alunos.
O que vimos até o momento reflete em vários pontos as novas exigências do
paradigma inovador. Dentre eles, pode-se destacar a valorização: do pensamento
global, da pesquisa, da produção do conhecimento, da aceitação da subjetividade,
da utilização dos espaços fora da escola, do estudo de temas condizentes com a
realidade do aluno, do diálogo crítico frente aos assuntos estudados e da objeção ao
conhecimento fragmentado.
É importante mencionar a seguinte consideração de Hernández. “A
aprendizagem baseada em projetos de trabalho é utilizada, na atualidade, em todos
os níveis de ensino: Fundamental e Médio, Ensino Superior, formação inicial,
permanente...”(1998b, p. 89). É bastante provável que esta afirmação se refira à
realidade da Espanha, mas aqui no Brasil também se verifica o uso desta
metodologia em todos os níveis citados. A diferença pode estar na disseminação
desta metodologia, pois, aqui no país, muitos professores desconhecem a
metodologia, ou quando a utilizam, de acordo com Nogueira (2005b), não sabem
utilizar corretamente. Mas também existem práticas exitosas que fazem uso
adequado desta proposta de trabalho.
3.2.2 Marilda Behrens
Outra pesquisadora que também se dedicou ao estudo da metodologia de
projeto, colaborando com algumas publicações, e que vem fazendo uso da mesma
em sua prática profissional como educadora é a professora Marilda Behrens. Sua
concepção sobre projetos é entendida como um método de trabalho que se define a
partir da resolução de um problema em que um grupo de trabalho vai se organizar
75
para estudar, planejar e implementar ações em prol da resolução do problema. Em
vista disto, “o projeto tem a função de canalizar energias para investigar possíveis
respostas para um determinado problema” (BEHRENS, 2006, p. 35). E segundo
Behrens, a metodologia de projeto “ao partir de problemas, exige uma investigação
que pode propiciar a visão do todo” (2006, p. 43). A postura dos alunos vai favorecer
a concepção da realidade como um fato problemático que é preciso intervir para
resolver. Tem-se a mesma caracterização da abordagem progressista que, ao ser
crítica, envolve processos de mudanças e de transformações. Além do mais,
conforme Santos (2006, p. 52), “quando os alunos são estimulados a resolver
situações-problema, interessam-se mais pelo assunto em questão, participam de
forma intensa na busca de novas informações sobre o conteúdo”. O que se busca
com esta metodologia é uma aprendizagem significativa, que tenha sentido para os
alunos, que oportunize uma aprendizagem em tempo real e diversificada e, acima de
tudo, “que o aluno aprenda a aprender a resolver problemas que possam auxiliá-los
para enfrentar a vida” (BEHRENS, 2006, p. 55).
Junto com os alunos, o professor vai propor a formulação do problema cuja
temática deve ser retirada da realidade e, conforme Behrens (2006, p. 61) os
problemas “devem levar em conta as vivências, os interesses e as possibilidades de
realizar experiências significativas”. Haverá, portanto, a vinculação das atividades
escolares com a vida real onde serão dadas aos alunos oportunidades de refletirem
sobre sua realidade, de fazerem pesquisa, fazerem planejamento com o propósito
de transformar uma idéia em realidade. Ou como diz Behrens “o projeto permite ao
aluno a vivência do ato criador, pois não indica certezas absolutas e nem respostas
programadas” (2006, p. 42).
Outra consideração feita por esta Behrens (2006) é que, na medida em que
o trabalho por projeto envolve a pesquisa, a investigação, esta permite levar o aluno
a aprender a aprender, a produzir conhecimento próprio com autonomia e espírito
critico, permite envolver múltiplas atividades, sejam manuais, intelectuais, artísticas,
estéticas ou sociais.
Também ocorre a promoção do desenvolvimento das relações pessoais e
interpessoais, tendo em vista a “possibilidade de realizar atividades individuais
aliadas às coletivas” (BEHRENS, 2006, p. 44). Sobre isso, a autora complementa
com uma relevante característica do método por projeto. “A proposição de atividades
76
individuais e coletivas exige a formação dos alunos para iniciativa de trabalhar com
espírito de grupo, de colaboração e de cooperação” (2006, p. 44).
Reforçando algumas considerações e acrescentando outra, Behrens diz que
a metodologia por projetos “permite aos alunos acessar diferenciadas maneiras de
aprender, especialmente de aprender a aprender [...] enfoca a aprendizagem
significativa e o conhecimento em constante transformação” (2006, p. 43).
Com relação às fases
18
do projeto, Behrens expõe um exemplo no seu livro,
mas enfatiza que elas são apenas sugestões para que o professor possa construir
sua própria proposta. De modo algum as fases devem ser entendidas como receitas
prontas, como uma trajetória fixa. O ideal é que o professor discuta e negocie com
seus alunos para que o processo ocorra de uma forma consensual, e que permita o
envolvimento dos educandos.
As contribuições de Behrens aqui apresentadas reforçam a congruência da
metodologia de projeto em relação aos paradigmas inovadores que se fazem
presentes na atual sociedade do conhecimento, como também, se aproximam
bastante dos norteamentos para a educação do século XIX apontados por Santos
neste trabalho. Nas palavras de Behrens,
a proposição de Metodologia de Projetos readquire pertinência neste início
de século quando abre possibilidades para que o professor possa
desenvolver a prática educativa tendo como princípios: a complexidade, a
visão de totalidade, a conexão das diversas áreas do conhecimento, o
espírito crítico e reflexivo, a busca da formação para a cidadania e a
recuperação do posicionamento ético (2006, p. 41).
3.2.3 Jean Pierre Boutinet
O próximo pesquisador, Jean Pierre Boutinet, foi um dos que mais contribuiu
no sentido de mostrar o percurso histórico dos projetos e também na descrição das
diferentes formas de pensar os projetos na educação. Não é possível extrair, do
principal
19
trabalho sobre projetos deste autor, uma concepção objetiva da
metodologia em questão. Por outro lado, sua pormenorizada obra sobre projetos e
seus usos em vários âmbitos, inclusive o educacional, permite dizer que Boutinet
(2002), define projeto sob o ponto de vista metodológico como sinônimo de desígnio,
18
As fases que envolvem os projetos serão mais bem detalhadas dentro do capítulo 4.
19
Antropologia do Projeto. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.
77
intenção, finalidade, objetivo, alvo, planejamento e programa. Essa gama de
palavras estará presente na pratica do trabalho de projetos, o que torna plausível
admitir uma aproximação da idéia de projeto de Boutinet esboçada pelas referidas
palavras, em relação à definição de projeto apresentada no subcapítulo 3.1. Dessa
forma é possível inferir que a percepção de Boutinet sobre a metodologia de projeto
é de cunho pragmático.
Boutinet (2002) também considera o projeto como uma maneira de colocar o
aluno em posição de pensar por si mesmo, de buscar informações, de colher dados,
de discutir idéias, emitir e testar hipóteses, de motivar energias em torno de uma
questão. Com isso, o aluno consegue ver sentido nos seus comportamentos e nas
suas atitudes, pois ele irá agir na expectativa de realizar suas intenções
manifestadas numa idéia, num sonho. E quando o aluno, através de suas ações
norteadas pelo projeto, consegue atingir sua(s) meta(s), isto significa que o seu
projeto e toda a gama de conhecimentos, habilidades, comportamentos e atitudes,
que foram mobilizadas para realizar o projeto, obtiveram êxito. Pelo menos, a maior
parte das ações, e não necessariamente todas elas, foram exitosas. Sobre esta
questão, Boutinet diz: “o êxito do projeto se materializa na realização que concretiza
o que estava anunciado, na satisfação das aspirações dos atores. Esse êxito é um
poderoso elemento motivacional e estimula na busca da ação” (2002, p. 263).
Falando-se mais diretamente sobre uma das habilidades que o projeto suscita, a
criatividade é uma que vai ser mencionada por vários autores. Com Boutinet, isso
não vai ser diferente. O autor chega a mencionar que “uma das razões que
encorajam a pedagogia do projeto vem da necessidade de quebrar o quadro
coercitivo dos programas escolares para suscitar uma certa criatividade” (2002, p.
180).
Através do projeto, procura-se trazer, para o sujeito que projeta, o futuro
desejado. No entanto, Boutinet adverte queo projeto não pode incidir sobre o longo
prazo demasiadamente conjuntural e também não pode limitar-se ao curto prazo
demasiadamente imediato” (2002, p. 77). Entende-se com isso que a percepção do
horizonte temporal é um importante parâmetro da motivação que, de acordo com a
percepção da pessoa, pode induzir à fuga, no caso dos projetos com horizonte
temporal muito distante, ou até levar à resignação, quando o horizonte temporal é
curto demais, o que se revela constrangedor para as adaptações imediatas
(BOUTINET, 2002).
78
Boutinet (2002, p. 234) descreve quatro premissas básicas sem as quais
não poderia haver procedimento por projeto.
a) A unicidade da elaboração e da realização. O autor explica que o que é
projetado é destinado a oscilar continuamente entre uma meta a ser
perseguida e uma programação a ser realizada. Não se pode separar o
projeto-alvo do projeto-programação. uma unidade que liga a instância
que elabora e a instância que executa, não separação entre essas duas
instâncias, mas simplesmente uma gestão dos desvios entre as atividades de
concepção e as de realização. Dotar-se de um projeto é, no mesmo
movimento, buscar construí-lo e querer realizá-lo. Neste sentido, estamos
diante de um fato inédito que integra a concepção e a execução na mesma
figura, integração de dois tempos certamente diferentes, contrastados, mas
que reencontram sua unidade através do autor ou dos autores do projeto.
b) A singularidade de uma situação a ser ordenada. Esta se relaciona ao caráter
idiossincrático de qualquer projeto. Este pretende ser sempre uma resposta
inédita que um ator singular a uma situação singular em si mesma. O
projeto se encontra estreitamente ligado às categorias do particular e do
singular: projeto particularizado que um grupo cultural procura estabelecer
para si mesmo, projeto singularizado esboçado por um individuo.
c) A gestão da complexidade e da incerteza. Os ambientes atuais onde devem
ser inscritos os projetos o, antes de mais nada, ambientes complexos. Ora,
o procedimento por projeto se mostra a ferramenta apropriada para gerir a
complexidade e a incerteza. Uma situação simplificada demais não necessita
recorrer ao projeto. Uma ação a ser gerida, cujos resultados são evidentes ou
esperados, não implica o recurso ao projeto. Este último é destinado a
administrar a indeterminação de uma situação problemática feita da
interdependência de vários parâmetros, exigindo que tal situação não seja
impropriamente simplificada, mas ao contrário, tomada em toda a sua
complexidade. Deste ponto de vista, o procedimento de projeto se assemelha
a uma metodologia da proposição e da resolução de problema.
d) A exploração de oportunidades em um ambiente aberto. O projeto pode
ser concebido em um ambiente aberto, capaz de ser explorado e modificado.
Implica, portanto, um novo olhar voltado para esse ambiente a fim de
descobrir nele, ao menos uma indeterminação parcial. algo a fazer, há
79
algo a ordenar, mudar aquilo que somente poderá ser feito, ordenado ou
mudado por uma ação deliberada que deve ser antecipada o melhor possível.
Todo projeto pressupõe uma visão otimista, graças à qual se pensa poder
trazer uma mudança relativa a um dado estado de coisas, mudança que não
poderia acontecer sem a ação do autor. Lançar-se em um projeto é, portanto,
julgar que, contra todos os determinismos, realizações são possíveis e, de
qualquer forma, realizações sensivelmente diferentes de tudo o que pôde ser
feito até então.
Na visão de Boutinet esses são os principais pressupostos em que se funda
qualquer metodologia de projeto. Constatam-se novos aspectos relacionados à
metodologia, da mesma forma que se reforçam algumas atribuições enunciadas
sobre projetos, como é a questão da negação da visão determinada da realidade e
da paridade com uma proposta de resolução de problemas. Outro tema, como a
necessidade da extrapolação do ambiente fechado da sala de aula para realizar
projetos, também foi abordada aqui. Porém, o assunto foi ilustrado como condição
necessária para localizar oportunidades onde se possam realizar mudanças. A
questão do ineditismo apareceu dentro dos pressupostos mencionados, mas o seu
sentido fica ainda mais evidenciado nesta colocação de Boutinet. “Cada projeto
pretende justamente confrontar-se com um problema que se pretende único, que
deve ser resolvido de forma inédita” (2002, p. 230). No momento que o autor
destaca a originalidade da solução de um problema, ele aponta o feitio que o
trabalho por projeto começa a revelar.
Para resolvê-lo, a gestão de projeto constituirá uma organização ad hoc:
reúne-se um grupo para concretizar e implantar uma inovação, depois este
grupo é dispersado, uma vez que o trabalho é realizado, ou que desponta a
oportunidade de uma outra inovação julgada mais importante (BOUTINET,
2002, p. 231).
Nesta última citação, é notória a importância da participação coletiva para a
realização do projeto. Mas a informação diferenciada que Boutinet traz sobre isso é
que “qualquer projeto, ao mais pessoal, é fundado na lógica da interação” (2002,
p. 257). Da mesma forma, “a ação coletiva não difere da ação individual a não ser
porque, através da pluralidade de atores em jogo, ela implica uma negociação
80
permanente” (BOUTINET, 2002, p. 255). Desenvolvendo um pouco mais essa idéia
Boutinet diz que,
todos os projetos coletivos que se apresentam para ser decifrados mostram
o papel central e determinante, mas não exclusivo, de um ator individual ou
de um pequeno grupo de atores individuais que desempenham o papel de
catalisador. Esse ator individual, eventualmente investido de uma
autoridade carismática, explorará as expectativas sociais preexistentes
dentro de uma organização. Desse encontro, ou melhor, dessa conjunção,
nascerá o coletivo da ação (2002, p. 256).
Essas colocações levaram Boutinet a afirmar, a razão pela qual, “deve-se
reconhecer que qualquer projeto individual é de natureza essencialmente social”
(2002, p. 256), e que por isso, “não há projeto que, de uma maneira ou de outra, não
busque ser partilhado” (2002, p. 231). Valendo-se dessas contribuições, a atividade
de trabalhar com projetos desponta também como uma ação de antecipação do
indivíduo, estando esta comprometida com outros indivíduos e que para se realizar
exige a ação conjunta dos atores envolvidos no projeto.
Com relação às fases inerentes de um projeto, Boutinet as delimita em dois
momentos, sendo que estes deverão ser articulados. Uma ocorre no início, e a outra
ocorre no final do projeto. Neste caso, fazem parte da fase inicial, - o diagnóstico da
situação pedagógica, momento efetuado pelo professor e pelos alunos – negociação
de um objetivo de ação, e – determinação dos meios e programação para realizar os
objetivos. Na fase final são feitos, o planejamento das atividades, realização do
projeto e seu controle, e avaliação final do projeto.
Destaca-se por fim que, na sua obra principal sobre projetos, Boutinet foi
incisivo na demonstração da importância da utilização da prática dos projetos na
vida do homem. Sem a intenção de explorar maiores detalhes, neste momento,
exemplificam-se duas citações sobre a questão aludida. “Hoje mais do que ontem,
cada um de nós se acha impelido a elaborar projetos pessoais” (2002, p. 97). “Em
uma sociedade cujo futuro previsível mostra-se um tanto obstruído, solicita-se aos
indivíduos e os grupos, em diferentes lugares, que façam projeto” (2002, p. 273).
A partir desta contribuição de Boutinet, entre outras percepções, a questão
da valorização da produção do conhecimento feita pelo próprio aluno, que se torna
um sujeito ativo na sua aprendizagem, e o fato de acreditar que os alunos são
81
capazes de realizar projetos os quais também os levam a desenvolver
conhecimentos, habilidades, comportamentos, atitudes, são pontos que vão ao
encontro de propostas educacionais condizentes com os paradigmas inovadores da
ciência.
3.2.4 Luiza Cortesão
Luiza Cortesão, uma educadora portuguesa, é outra autora que se destaca
pelo interesse e pela produção a respeito da metodologia de projeto. Junto com
outros dois autores, Carlinda Leite e José Augusto Pacheco, publicou uma
importante e referenciada obra
20
sobre a temática discutida neste capítulo. Esta
obra, juntamente com um capítulo que Cortesão escreveu em um livro
21
, que trata
sobre o trabalho com projeto, representam as duas principais fontes de onde foram
tiradas as contribuições da autora para esta pesquisa.
Diferente de Boutinet, a autora portuguesa apresenta de forma objetiva e
gradual o entendimento que tem a respeito do trabalho com projeto. Cortesão et al.
(2002, p. 24) afirma que
um projecto é um estudo em profundidade, um plano de acção sobre uma
situação, sobre um problema ou um tema. [...] o projecto envolve uma
articulação entre intenções e acções, entre teoria e prática, organizada num
plano que estrutura essas acções.
Uma leitura do que foi dito acima permite inferir que o projeto não se limita a
manifestar uma intenção. Se caracteriza também pelo planejamento organizado das
ações e propriamente, pela ação ativa das pessoas que procuram resolver um
problema ou um determinado tema. E para ficar mais completa essa idéia Cortesão
et al. (2002, p. 25) comenta que “o projecto não é apenas intenção, nem apenas
plano, nem apenas acção e produto, mas que é sim, o conjunto de todas essas
dimensões”. Por outro lado, existem momentos específicos que caracterizam o fato
de a pessoa estar desenvolvendo projetos. Cortesão et al. deixa mais claro que
momentos precisos seriam esses. “Só quando passam à acção, só quando analisam
e fazem o balanço do que estão a realizar, quando reorientam, se necessário, as
actividades planeadas e mobilizam os recursos é que estão a desenvolver projectos
20
Trabalhar por projectos em educação: uma inovação interessante? Porto: Porto Editora, 2002.
21
Trabalho de Projecto 2. Leituras comentadas. 3. ed. Porto: Afrontamento, 1993.
82
(2002, p. 26). Portanto, estar inserido numa atividade de projetos não é o mesmo
que estar fazendo, desenvolvendo o projeto. As ações e seus correlatos efeitos que
também implicam ações tornam-se o referencial desta prática educativa. Em razão
disso, não faz sentido algum conceber um formoso projeto no papel e depois não o
desenvolver, isto é, colocar em ação as intenções que foram expostas no papel.
Aos poucos a definição inicial do trabalho por projeto começa a ganhar mais
consistência. Neste momento é possível acrescentar outros detalhes na
concepção de projetos e dizer, segundo Cortesão et al, que “um projeto pressupõe,
portanto, a clarificação das intenções que o orientam e que o justificam, a concepção
do plano que o organiza, a acção que o irá concretizar e que permite produzir efeitos
que melhorem a situação presente que esteve na origem” (2002, p. 25).
A questão referente a melhorar a situação presente é de considerável
importância quando se trabalha com projeto, pois essencialmente esta prática visa
transformar a realidade. Ela convida os alunos a refletirem sobre questões
importantes da vida real e da sociedade e a intervirem em problemas identificados
no contexto social em que vive o aluno. Esta idéia é exposta com certa freqüência
no trabalho de Cortesão et al., e a seguinte frase serve como exemplo:
De facto, sendo um projecto uma idéia para uma transformação de uma
determinada realidade ou de um problema e a concretização dessa idéia,
ou, como diziam os professores [...] um ideal muito querido a concretizar”,
ele deve conduzir a essa transformação da situação ou do problema (2002,
p. 26).
Fundamental para proceder as mudanças na realidade é entender que o
projeto é uma tarefa definida e realizada em grupo, que vai implicar adesão
individual e empenho coletivo durante todas as fases que o projeto demanda . Sem
esta conscientização a realização do projeto fica bastante comprometida, pois
sozinho o indivíduo pouco pode transformar. Mais uma vez, se aproveita das
considerações anteriores para incrementar a concepção do trabalho com projetos
nas palavras de Cortesão et al.,
83
um projecto é, por definição, um trabalho colectivo, com que se procura
intervir no contexto educativo e/ou social e/ou resolver um problema. O
“prêmio” será, sobretudo, conseguir um bom produto, [...] uma boa
intervenção que seja útil e interessante para todos. assim se poderá
oferecer um clima genuinamente gratificante de trabalho, contribuir para que
os alunos cresçam como cidadãos, através da euforia de perceberem a
utilidade e complementaridade dos saberes que vão adquirindo e de terem
contribuído, com o seu esforço, para descobrir, para melhorar algo no
contexto social e/ou educativo em que vivem, de forma a sentirem-se
actores sociais intervenientes e significantes. É no reconhecimento da
importância da criação deste clima que talvez esteja a justificação da
importância de trabalhar por projetos (2002, p. 53).
Observa-se que trabalhar com projetos “representa um desejo efectivo de produção
de mudança e traduz uma forma distinta de orientação de uma acção à qual se
afectam recursos e em torno da qual mobilizam actores” (CORTESÃO et al., 2002, p.
37). E quando se parte em busca de transformações significantes, será necessário
que os alunos desenvolvam capacidades pessoais de pesquisa, de analisar a
realidade de forma interdisciplinar
22
, como também se favorece a construção de
conhecimentos por parte dos alunos. Isto fica bem explicitado na sentença de
Cortesão: “O trabalho de projecto é uma actividade de índole investigativa através
da qual se consegue produzir conhecimento (1993, p. 86). Também se pode
acrescentar que “é uma área privilegiada de construção e vivência da
interdisciplinaridade que trabalha situações da vida quotidiana dos alunos”
(CORTESÃO et al., 2002, p. 33). Estes são alguns dos elementos pelos quais
Cortesão et al. (2002, p. 48) garante que o trabalho por projeto leva à “aprendizagem
de saberes integrados e problematizados que tornam possível a aprendizagem
significativa”.
Destaca-se por fim que o trabalho por projetos “está associado a
concepções de formação e educação que não se coadunam com a uniformização e
que o se esgotam na instrução e acumulação de conhecimentos” (CORTESÃO et
al., 2002, p. 23). Isto quer dizer que os conteúdos não estão predeterminados, até
porque eles partem de um desafio, o qual, para ser resolvido, exige a incorporação
de novos conteúdos por parte dos alunos. Pensando assim, o conhecimento deixa
de ser algo estático e passa a ser entendido como um processo de construção
22
Interdisciplinar vem de interdisciplinaridade e esta palavra “refere-se aquilo que é comum a duas ou mais
disciplinas ou campos de conhecimento. [...] ocorre quando existe troca e cooperação entre profissionais
envolvidos, ou entre as áreas envolvidas [...] Não existe uma mera superposição de interesses, mas uma
verdadeira interação e um compartilhamento de idéias, opiniões e explicações” (ARAÚJO, 2003, p. 21).
84
humana, servindo assim como um instrumento para a compreensão e transformação
da realidade.
Ao invés de mencionar as idéias acima levantadas sobre o trabalho com
projetos e sua pertinência para a utilização na educação contemporânea,
caracterizada pela sociedade do conhecimento, desta vez será destacada a
disparidade em relação à educação amparada pelo pensamento cartesiano.
Ficou bastante marcado que o trabalho com projetos não visa à reprodução
do conhecimento, não dá ênfase à repetição e tampouco valoriza a memorização e a
cópia. Muito pelo contrário, através dos projetos verificou-se que o aluno é
estimulado a construir o seu conhecimento, a produzir fatos sociais, a refletir sobre
questões importantes da vida real e da sociedade.
Atividades repetidas e que, na maioria das vezes, não têm significado algum
ao estudante, também foram descartadas pela proposta dos projetos, que “as
actividades são organizadas em função das experiências, motivações, expectativas
e interesses dos alunos” (CORTESÃO, et al., 2002, p. 36).
Pensamentos fragmentados e reducionistas também são refutados por uma
prática que busca pensamentos que valorizem a construção e a vivência da
interdisciplinaridade.
3.2.5 Hilda Magalhães
O trabalho
23
de Hilda Magalhães se destaca pelo abrangente alcance que a
autora expõe sobre os trabalhos pedagógicos organizados através da metodologia
de projeto. Na opinião da autora, o trabalho de projetos oferece uma real
possibilidade de concretizar transformações na sociedade, na universidade e nos
discentes.
Sua definição sobre a metodologia de projeto se aproxima em parte do
entendimento que foi dado pelo espanhol Fernando Hernández. O que se salienta
na contribuição de Magalhães é a ênfase dada à questão da formação para a
cidadania e ao papel da universidade frente aos dramas sociais. Isto não significa
que esses assuntos não tenham sidos explorados por outros autores quando
trataram da metodologia de projeto. No entanto, o vínculo desta metodologia aos
temas mencionados aparece visivelmente como foco do trabalho de Magalhães.
23
A Pedagogia do Êxito. Petrópolis: Vozes, 2004.
85
Ressalta-se ainda que os temas explorados pela autora voltarão a ser destacados
no subcapítulo 5.3 referente ao empreendedorismo social, razão pela qual se reforça
a pertinência da abordagem do trabalho de Magalhães, denominado a Pedagogia do
Êxito.
Da concepção de projetos de Hernández é mantida a compreensão de que
trabalhar com projeto
é uma forma de organizar a atividade de ensino e aprendizagem, que
implica considerar que tais conhecimentos não se ordenam, para sua
compreensão, de uma forma rígida, nem em função de algumas referências
disciplinares preestabelecidas ou de uma homogeneização dos alunos
(1998a, p. 61).
Mas, este autor considera que a função principal dos projetos é,
favorecer a criação de estratégias de organização dos conhecimentos
escolares em relação ao tratamento da informação e a relação entre os
diferentes conteúdos em torno de problemas ou hipóteses que facilitem aos
alunos a construção de seus conhecimentos (HERNÁNDEZ, 1998a, p. 61).
No entanto, para Magalhães, a função dos trabalhos com projetos vai além da idéia
de criar um ambiente de aprendizado a partir da organização dos conhecimentos em
torno de problemas ou hipóteses que possam facilitar aos alunos à construção do
conhecimento. No entendimento da autora os projetos “devem necessariamente ter
uma aplicabilidade direta e imediata na comunidade” (2004, p. 124), Esta questão é
de grande importância para Magalhães e por isso ela faz questão de detalhar mais,
ao mencionar que, para o educador o espanhol
o importante é o tratamento das informações, enquanto para nós o que é
essencial é a intervenção com êxito do aluno na comunidade, porque os
projetos de resultado visam não apenas desenvolver no aluno as
habilidades que o possibilitem a pensar em termo de inter-relações, mas
também formar o aluno-cidadão capaz o apenas de criticar, mas também
de transformar a realidade em que vive (2004, p. 124).
86
A partir dessas colocações se verifica a diferença de propósito do trabalho com
projetos entre os autores citados, ou melhor, se desponta a maior abrangência,
em termos de resultados, que Magalhães visualiza ao se fazer uso dos projetos. Tal
prática, como pode ser observado, é denominada de Projeto de Resultado
24
. Este é
“caracterizado pela ação direta de alunos nos problemas comunitários”
(MAGALHÃES, 2004, p. 15). Especificando um pouco mais, a autora comenta que,
o projeto de resultado consiste na proposição de soluções concretas aos
problemas da comunidade e tem como principal efeito pedagógico
desenvolver no aluno a auto-estima e a capacidade de transformar a
realidade em que vive, dando-lhe a certeza de que pode fazer”, de que é
capaz de assumir a sua cota de responsabilidade pelo bem-estar da
comunidade. [...] os projetos devem prever atividades de pequeno porte,
mas que proporcionem resultados imediatos e visíveis tanto para a
comunidade quanto para o aluno. Com tais projetos se espera desenvolver
no universitário a capacidade de ação em conjunto (com os colegas e a
comunidade) e, sobretudo, oportunizar a ele a experiência de transformar,
com suas ações a realidade em que vive (2004, p. 15).
Levando em consideração as definições sobre a metodologia de projeto
exploradas nesta obra, como também, o conteúdo discutido sobre as concepções
dos diferentes autores, é factível valer-se da respectiva metodologia e apresentar
proposições como as que foram detalhadas por Magalhães.
Em termos de etapas, Magalhães esclarece que os projetos devem iniciar
pela “triagem das necessidades e prioridades da comunidade assistida. Deve ser
realizada uma pesquisa de campo, de modo a evidenciar os problemas e prioridades
da comunidade” (2004, p. 124). Depois disso,
os alunos devem retornar à academia para buscar subsídios sobre o tema,
momento em que o aluno aprenderá, seja através de aulas expositivas, de
pesquisa bibliográfica, participação em eventos científicos e outros, o que
julgar necessário conhecer para, em seguida, planejar uma ação junto a
comunidade, visando solucionar ou amenizar os problemas detectados.
Essa parte deve resultar em algum trabalho escrito (monografia, relatório,
etc.), que propicie o aluno organizar os dados pesquisados. Concluída essa
parte, cabe aos alunos traçarem uma linha de ação, definindo metas e um
cronograma de aplicação do plano de trabalho junto à comunidade
(MAGALHÃES, 2004, p. 125)
.
24
Projeto de Resultado significa uma nova denominação que a Metodologia de Projetos recebe. Mas esse nome é
utilizado apenas por Hilda Magalhães.
87
As etapas sucintamente descritas pela autora representaram pequenos
acréscimos em relação ao que foi comentado sobre este item, ainda que não se
tenha explanado sobre as mesmas. O que chama atenção é o envolvimento com a
comunidade, que é convidada a participar do projeto. Chamar as pessoas é até uma
ação elementar, que se pretende intervir nos problemas da comunidade, mas ao
mesmo tempo, também tem seu grau de complexidade e dificuldade. Afinal de
contas, mobilizar a comunidade, dar oportunidade para todos opinarem, organizar as
ações das pessoas envolvidas, saber lidar com as divergências e possíveis
resistências ou má vontade de participar, são alguns dos obstáculos que devem ser
considerados. Em função dessas dificuldades, Magalhães diz que “aprender a
concretizar parcerias é tão importante nessa pedagogia quanto o êxito do projeto em
si” (2004, p. 128). E a parceria deve ocorrer entre todas as pessoas envolvidas no
projeto, como alunos, professores, administração da instituição de ensino, a
comunidade, órgãos públicos e privados.
Percebe-se facilmente que extrapolar o espaço da sala de aula é condição
fundamental para se trabalhar com a metodologia de projeto. Isso se verifica
facilmente pelo fato de a comunidade estar localizada fora do espaço acadêmico.
Além da necessidade de se fazer parcerias com pessoas o inseridas na
universidade, através do trabalho com projetos, se pretende colaborar na formação
do aluno-cidadão. E segundo Magalhães,
a universidade deve compreender que não se constrói o cidadão numa sala
de aula. O cidadão deve ser construído na cidade, que é o verdadeiro
laboratório da cidadania. Deve ser construído não na teoria, mas na prática,
pois é o “fazer” a argamassa para a construção do cidadão (2004, p. 9).
Esta questão da formação do aluno-cidadão representa para Magalhães o
maior desafio da universidade. Na opinião da autora,
o cidadão que sai da universidade hoje é, via de regra, incapaz da ação,
seja no nível individual, seja no nível coletivo. Não exercitou na escola sua
capacidade de transformação (mesmo que fosse transformar a própria
escola), não conhece a realidade que vive e não consegue se articular em
88
grupo. A universidade como se vê, cria pseudocidadãos, pessoas
angustiadas diante de uma realidade que percebida injusta, mas que não
consegue modificar. Acaba se transformando, assim, numa espécie de
rebelde sem causa, e, impotente, acaba se isolando na inércia que alimenta
o ciclo de injustiças e diferenças sociais (2004, p. 9).
Está se falando de um tema que diz respeito basicamente à formação do
aluno, mas despertar a consciência da cidadania, a crença de que o aluno pode
transformar a realidade, que ele é capaz de perceber que com planejamento,
organização, engajamento, ações coletivas é possível amenizar e resolver
problemas comunitários, isto também representa uma grande preocupação da
metodologia de projeto. Como diz Magalhães,
a consciência de cidadania que se espera criar, a partir dos projetos de
resultado, é a consciência do “eu posso mudar, que na verdade, para
configurar uma situação de êxito, deve ser reconhecido pelo indivíduo
sempre como um “nós podemos mudar” a realidade, basta que
“trabalhemos juntos” (2004, p. 127).
Quando Magalhães fala dos projetos de resultados, ela está se referindo,
portanto, a realizar atividades que sejam viáveis de os alunos realizarem e que não
se resume à utopia. Serão projetos que apresentam propostas concretas de ações e
que possam surtir resultados imediatos para a comunidade. A autora insiste nesta
questão, também porque entende que a universidade
não cria no aluno as condições para transformar a realidade em que vive.
Na melhor das hipóteses, contribui para que seu aluno desenvolva o espírito
critico, entretanto a história recente brasileira nos mostra que a crítica
desacompanhada de ação é inócua, geradora de angústia e frustração
(2004, p. 99).
Outros comentários referentes às universidades, os quais vêm reforçar a
pertinência das preocupações levantadas, assim como, alentam para as
necessidades de proporcionar metodologias que levem os alunos a pesquisarem,
refletirem, planejarem, agirem e intervirem, como é o caso da metodologia de
89
projeto, merecem ser apontados. Na visão de Magalhães, a universidade, “além de
não atuar na amenização dos dramas sociais, ainda adestra o jovem que nela
ingressa, para, ao invés de trabalhar com e para o povo, justamente dele se
destaque, assumindo um papel na sociedade elitizada e elitizante” (2004, p. 99). E
por fim, a autora coloca que a universidade “não pode se dar o luxo de ficar alheia
aos problemas da comunidade a que pertence. Ao contrário, deve levar o seu aluno
a interferir de forma direta nessas questões, buscando resultados concretos para os
problemas da comunidade em que vivem” (2004, p. 9).
As contribuições de Magalhães sobre a metodologia de projeto se
aproximaram principalmente da abordagem progressista. Basicamente pelo fato de
esta centrar o ensino na realidade social, por exigir uma prática pedagógica crítica,
reflexiva, comprometida com a ação, por buscar uma transformação social e que
incentiva, portanto, o individuo a intervir na realidade para mudá-la, preocupações
essas que foram levantas por Magalhães.
Resgata-se que na abordagem sistêmica foi mencionado que a universidade
precisa ser um centro que leve à transformação da universidade, exatamente como
advertiu Magalhães. Também foi dito que educar dentro da perspectiva sistêmica é
acreditar que os alunos “são capazes de estabelecer relações dialógicas nas quais
possam realizar um trabalho coletivo, participativo, criativo e transformador na
construção de um mundo melhor” (BEHRENS, 2005, p. 68). Ainda pode-se
acrescentar, em termos de paridades, que a educação sistêmica pretende colaborar
para formar cidadãos éticos, críticos e construtores de uma sociedade justa e
igualitária. Estes são pequenos exemplos que se somam aos anteriores
mencionados e que servem para mostrar, novamente, a fundamentação da
metodologia de projeto nas abordagens que acompanharam o paradigma científico,
como foi o caso da abordagem progressista e a sistêmica.
3.2.6 Dácio Moura e Eduardo Barbosa
Dácio Moura e Eduardo Barbosa escreveram um dos livros
25
mais recentes
que abordam a temática principal deste capítulo 3. Também é deles a mais nova
denominação
26
dada ao trabalho com projeto na educação. Pela primeira vez pode-
25
Trabalhando com projetos: planejamento e gestão de projetos educacionais. Petrópolis: Vozes, 2007. (Livro
escrito a partir da experiência, de muitos anos, dos autores no trabalho com projetos na área educacional)
26
A denominação dos autores recebe o nome de: Projetos de trabalho (ou de aprendizagem).
90
se encontrar, numa obra que diz respeito aos projetos no âmbito escolar, uma
vinculação com o empreendedorismo. Pequenos detalhes, em nível de acréscimo,
na concepção da metodologia de projeto dos autores, juntamente com a
apresentação de um modelo das etapas do projeto, representam elementos que
justificam a apreciação do trabalho de Moura
27
e Barbosa
28
nesta dissertação.
Inicialmente os autores destacam que o desenvolvimento de atividades
baseadas em projetos tem se tornado uma prática cada vez mais comum em todos
os setores da atividade humana. Moura e Barbosa depois comentam que
o futuro de muitas organizações humanas talvez da maioria delas
depende da capacidade de conceber, planejar, executar, acompanhar e
avaliar atividades orientadas para projetos. Esta previsão fundamenta-se no
fato de que os processos e métodos envolvidos no trabalho com projetos
fornecem a estrutura, o foco, a flexibilidade e o controle adequados para a
realização de mudanças, dentro de prazos e recursos limitados, com
melhores resultados. Sistemas educacionais
29
, independentemente de seu
porte ou complexidade, podem se beneficiar muito com a prática de
atividades baseadas em projetos (2007, p. 19).
Esta passagem reforça a relevância do uso do trabalho com projetos sendo
assim, uma estratégia pedagógica digna de ser discutida e oferecida na educação
do século XXI.
Em seu livro, Moura e Barbosa fizeram uma classificação, com sua
respectiva conceituação, de cinco tipos de projetos que ocorrem na área
educacional. O denominado Projeto de Trabalho, de acordo com a concepção dada,
se aproxima das definições exemplificadas nesta pesquisa. Conforme os autores, os
Projetos de Trabalho “são projetos desenvolvidos por alunos em uma (ou mais)
disciplina (s), no contexto escolar, sob orientação de professor, e têm por objetivo a
aprendizagem de conceitos e desenvolvimento de competências e habilidades
específicas” (2007, p. 28). Com base no que foi escrito, é possível confirmar o
27
A propósito dos dois autores, eles se apresentam como especialistas que atuam nas diversas instâncias do
trabalho com projetos, desde a fase de concepção até o encerramento. Tanto o título do livro e seu conteúdo,
quanto o foco do campo de atuação, demonstram uma linha de abordagem mais próximo da administração pela
preocupação de oferecer conhecimentos para o planejamento e execução de projetos. Mas o que é colocado no
livro destina-se a educação.
28
Idem.
29
Os autores manifestam que estão se referindo a um conjunto formado por pessoas (educadores, educandos
etc.), conteúdos, processos, materiais, métodos, infra-estrutura e diretrizes, organizados e articulados em
determinado contexto para cumprir finalidades especificas de formação humana.
91
aproveitamento do trabalho com projetos em uma disciplina, fato que, desde já,
ratifica a validade de usar a metodologia de projeto para se trabalhar, por exemplo,
com o empreendedorismo
30
, como poderia ser também para outro objeto de estudo.
De forma visível aparece o propósito do trabalho com projeto de desenvolver
competências e habilidades. Uma especificação de quais competências e
habilidades seriam essas é comentado mais adiante pelos autores, quando eles
manifestam entender que há
uma estreita relação entre o trabalho com projetos e uma formação ampla
de competências, não somente as gerenciais, necessárias neste tipo de
empreendimento, mas também outras igualmente importantes como:
promoção do trabalho cooperativo, articulação do trabalho em rede,
estímulo ao empreendedorismo, realização de aprendizagem
contextualizada e significativa, capacitação para identificar, equacionar e
resolver problemas relevantes, estímulo à criatividade, comunicação etc.
(MOURA; BARBOSA, 2007, p. 31). [grifo do autor].
Na citação acima aparece, claramente, pela primeira vez, a possibilidade de o
trabalho com projetos estimular o empreendedorismo. Pode-se adiantar que as
competências e habilidades apontadas como: capacidade de resolver problemas,
criatividade, comunicação, também são qualidades que dizem respeito ao
empreendedor. Da mesma forma, muitas outras
31
competências e habilidades são
desenvolvidas a partir do trabalho com a metodologia de projeto.
Com relação ao nascimento dos projetos, nas definições anteriores
prevaleceu o surgimento descrito a partir de problemas. Moura e Barbosa ampliaram
esta visão dizendo que “os projetos nascem a partir de problemas, necessidades,
oportunidades e desafios de um indivíduo, coletividade ou instituição” (2007, p. 64).
Esta visão, portanto, amplia as possibilidades para se iniciar um trabalho de projetos
com os alunos, sendo aceito então, um projeto originado através de uma
oportunidade identificada, característica que por sinal é muito freqüente de ser
encontrada entre os empreendedores. Mas independentemente da forma pela qual o
projeto pode surgir, Moura e Barbosa (2007) reconhecem também que os projetos
dos alunos devem estar conectados a situações reais relativas ao contexto e à vida.
30
O capítulo 5 trata, especificamente, a respeito do empreendedorismo.
31
As competências e habilidades favoráveis de serem desenvolvidas pelos alunos através da metodologia de
projetos são apresentadas no subcapítulo 4.6.
92
Nada, por conseguinte, de situações hipotéticas, até porque, não se consegue
desenvolver habilidades e competências trabalhando em cima de idéias que não
levem à ação e à concretização do que foi planejado. Quando, de fato, se realizam
projetos, segundo Moura e Barbosa (2007, p. 19), “todos os envolvidos se
enriquecem com as experiências vividas, obtendo novos conhecimentos e novas
habilidades”.
Alguns apontamentos de Moura e Barbosa referentes às diretrizes dos
Projetos de Trabalho acrescentam outros detalhes sobre o trabalho desenvolvido
através da metodologia de projeto e também demonstram a paridade, em relação às
considerações que já foram apresentadas. As mesmas foram expostas em forma de
tópico, o que pode facilitar a assimilação (2007, p. 219).
realização de projetos de trabalho por grupo de alunos com o número de
participantes definido criteriosamente para cada experiência;
a forma de escolha dos temas dos projetos, oferecendo liberdade para os
alunos, com negociações entre alunos e professores para considerar múltiplos
interesses e objetivos;
uso de múltiplos recursos no desenvolvimento dos projetos incluindo aqueles
que os próprios alunos podem providenciar junto a outras fontes, como a
comunidade em geral;
definição de um período de tempo limite para a concretização do projeto, como
fator importante no seu desenvolvimento e concretização;
socialização dos resultados dos projetos em diversos níveis de comunicação,
como a própria sala de aula, a escola e a comunidade, incluindo a
apresentação dos resultados pelos autores.
Um dos temas que mais ganhou destaque no livro de Moura e Barbosa foi a
apresentação de um modelo de planejamento de projeto chamado pelos autores de
Skopos
32
. Tal modelo é o que mais se aproxima do famoso Plano de Negócios
33
utilizado pelos empreendedores, em função das etapas que os constituem. Ele
apresenta três componentes estruturais básicos: Escopo, Plano de Ação, Plano de
Controle e Avaliação. Este modelo baseia-se na idéia de que a condição
32
Este modelo será apresentado no próximo capítulo.
33
“O Plano de Negócio é, antes de tudo, o processo de validação de uma idéia, que o empreendedor realiza
através do planejamento detalhado da empresa. Ao prepará-lo, terá elementos para decidir se deve ou não abrir a
empresa que imaginou, lançar um novo produto que concebeu, proceder a uma expansão, etc.” (FILION, L;
DOLABELA, F. 2000c, p. 164).
93
indispensável para o êxito do projeto, depende da clareza de entendimento sobre
tudo o que deve ser feito.
Este último conceito a respeito do trabalho com projetos, por se mostrar
bastante condizente com as concepções da metodologia de projeto, que foram
expostas anteriormente, vai acompanhar conseqüentemente a conexão que a
referida metodologia possui com as três abordagens que se fundamentam no
paradigma científico inovador, como também, com as novas exigências da educação
do século XXI. O grande diferencial da contribuição de Moura e Barbosa ocorreu
fundamentalmente pelo ingresso, ainda que sutil, do empreendedorismo no tema
discutido neste capítulo. De igual forma, a concepção do trabalho com projeto e suas
correlatas análises, a visão mais abrangente da forma pela qual se pode originar os
projetos e a proposta de um modelo de planejamento do projeto, também foram
colaborações pelas quais se mostrou mais evidente a relação que pode haver entre
a utilização da metodologia de projeto e seu uso numa disciplina de
empreendedorismo, que vise levar os alunos a desenvolverem comportamentos e
habilidades empreendedoras.
3.3 A Re-significação da metodologia de projeto
Perante as concepções contemporâneas da metodologia de projeto, não se
observa que houve contestações em relação à idéia inicial que John Dewey
concebeu ao trabalho com projetos, no inicio de século XX. O que ocorreu na
verdade foi uma re-interpretação ocasionada em função das transformações da
sociedade e da mudança dos paradigmas da ciência. Em vista disso, alguns autores,
como os citados neste trabalho, expandiram um pouco mais o entendimento sobre a
metodologia, ou como no caso de Hernández, que também propôs que o currículo
escolar deveria ser organizado por meio de projetos.
Levando em consideração apenas as menções relativas à concepção de
metodologia de projeto, é possível dizer, com base num apanhado geral das
definições dos diferentes autores que a referida metodologia consiste num método
de trabalho coletivo que se define a partir de um problema, necessidade,
oportunidade ou desafio, comum a um grupo de pessoas que vai se organizar,
pesquisar, traçar planos de ação, visando alcançar resultados concretos que
resolvam ou amenizem a situação originária do projeto. Dentro dessa definição que
aglutinou as visões contemporâneas da metodologia de projeto, se percebe a
94
valorização do planejamento, do trabalho coletivo, da definição de uma situação-
problema como fonte de desafio para o desenvolvimento de habilidades e
principalmente da valorização da ação. O cerne desses elementos que fazem parte
de uma definição contemporânea da metodologia de projeto estavam presentes nas
idéias de Dewey sobre uma educação por projeto, porém não foi descrita assim.
Behrens procurou deixar claro em sua obra, que “a proposição de atuar na
docência por meio de projetos não se trata de inovação na prática pedagógica”
(2006, p. 35), consideração esta que ficou implícita neste trabalho. O que a autora
traz de valor, sobre o comentário anterior, é a afirmação de que “a proposta de
Dewey continua sendo atual e relevante até os nossos dias” (2006, p. 36). E isto se
deve, exatamente, por alguns autores terem re-significado o método de projeto.
Segundo Behrens, o trabalho com projeto “numa proposta relativamente
recente no processo pedagógico, aparece com o sentido de uma prática pedagógica
crítica, reflexiva e problematizadora
34
” (2006, p. 33). Isto reforça o que foi dito
anteriormente, pois evidencia que, “nas últimas décadas, a proposta foi se
desenvolvendo e se reinventando, se reconstruindo e, hoje, aparece reescrita por
outros autores” (BEHRENS, 2006, p. 37). Será, portanto, a partir de uma re-
significação da metodologia de projeto que,
se abrem possibilidades para que o professor possa desenvolver a prática
educativa tendo como princípios: a complexidade
35
, a visão de totalidade, a
conexão das diversas áreas do conhecimento, o espírito crítico reflexivo, a
busca da formação para a cidadania e a recuperação do posicionamento
ético (BEHRENS, 2006, p. 41).
A próxima citação de Behrens sintetiza muito bem as idéias até o momento
apresentadas. “Na realidade, não se trata de aplicar a proposta de Dewey, mas
de acrescentar, superar e reinventar essa metodologia apresentando um enfoque
complexo, global, crítico e reflexivo” (2006, p. 37).
A re-significação da metodologia de projeto, segundo Hernández (1998) e
Leite (1996) vai estar ligada diretamente à re-significação dos espaços e tempos
34
A palavra problematizadora nesta frase deve ser entendida conforme o conceito que Paulo Freire atribuiu a
educação problematizadora, visto no subcapítulo 2.3.2.
35
Neste contexto, a palavra complexidade deve ser interpretada pelo conceito de paradigma inovador, como
visto no subcapítulo 2.3.
95
escolares, dos papéis dos discentes e docentes no processo de ensino e
aprendizagem, como também, vai refletir sobre o real papel dos estabelecimentos de
ensino na sociedade. A Educadora Lúcia Leite traduz algumas dessas
considerações com a seguinte colocação:
A Pedagogia de Projetos visa à re-significação desse espaço escolar,
transformando-o em um espaço vivo de interações, aberto ao real e às suas
múltiplas dimensões. O trabalho com projetos traz uma nova perspectiva
para entendermos o processo de ensino/ aprendizagem. Aprender deixa de
ser um simples ato de memorização e ensinar não significa mais repassar
conteúdos prontos. Nessa postura, todo conhecimento é construído em
estreita relação com o contexto em que é utilizado, sendo, por isso mesmo,
impossível separar os aspectos cognitivos, emocionais e sociais presentes
nesse processo (1996, p. 26).
Explorar alguns destes aspectos, entre outros, é o objetivo do próximo
capítulo.
96
97
4 ASPECTOS PONTUAIS E BASILARES DA METODOLOGIA DE PROJETO
Ao se trabalhar com as concepções da metodologia de projeto de vários
autores, acabou-se abordando alguns assuntos que fugiram um pouco do escopo
principal do capítulo que era justamente, tratar do conceito da metodologia que faz
uso de projeto. Mas ao mesmo tempo em que houve uma extrapolação do foco do
capítulo, esses comentários adicionais serviram também para se ampliar o leque do
entendimento sobre o tema, na visão dos principais estudiosos contemporâneos que
se dedicam ao estudo da metodologia de projeto. Neste capítulo, alguns temas que
começaram a ser abordados, sem grandes detalhes, e outros ainda não
mencionados serão melhor explorados, acrescidos por outros autores, de modo que
o leitor tenha um entendimento mais completo do assunto.
4.1 As etapas de um projeto
Conforme visto anteriormente, quando se propõe trabalhar com projetos há,
inerente a esta prática educativa, a realização de um sonho, de um desejo, de um
desafio, de uma necessidade a qual se pretende realizar. E para que o objetivo de
solucionar um determinado desafio seja alcançado,
o uso dos projetos como estratégia pedagógica não pode ser realizada
aleatória ou improvisadamente. Apesar de visar atender ao interesse dos
alunos, que se efetivá-lo de forma organizada, para que se torne
instrumento confiável na obtenção dos resultados desejados. Nesse
diapasão, uma lógica de passos ou de etapas a serem dados, para que
os próprios alunos se sintam confiantes e seguros (PIRES, 2006, p. 93).
Portanto, o sucesso de um projeto depende também da organização que os alunos e
o professor terão antes, durante e após o término do projeto.
De acordo com Santos (2004, p. 39), “essa metodologia tem sido aplicada
muito mais no ensino fundamental, com poucas experiências na educação superior”.
Mas independentemente do nível de ensino, os modelos utilizados mantêm uma
lógica de sistematização onde predominam três grandes etapas que são: a
problematização, o desenvolvimento e a avaliação. As diferenciações dos modelos
ocorrem de acordo com a precisão dos detalhes que cada autor julga necessário
98
utilizar em seu exemplar. Dos vários tipos pesquisados, verificou-se que existe muita
repetição e estas decorrem, principalmente, do fato de terem sido inspiradas no
modelo dos mesmos autores. Sete modelos foram os que mais serviram de exemplo
para outros autores apresentarem as etapas da proposta da organização do trabalho
por projeto. Fora destes, não existem grandes diferenças em outros que possam ser
identificadas. São exatamente os sete
36
modelos inspiradores dos demais, que são
apresentados nos quadros 01, 02 e 03. A partir deles, o leitor poderá visualizar
praticamente todas as etapas que pode haver num trabalho com projetos. E mais
adiante serão especificadas três etapas que são as mais comuns de se encontrarem
em qualquer trabalho com projeto e por esta razão, se entende que o as mais
importantes.
Optou-se então por não fazer uso de um único modelo e deste detalhar suas
etapas. A intenção principal é oferecer sugestões, de modo que fique claro que não
existe uma trajetória fixa ou uma receita pronta das etapas de um projeto.
Como diz Behrens (2006, p. 59), “cada professor, de acordo com sua
realidade, pode e deve ampliar, complementar, reelaborar ou adaptar a proposta”.
Não esquecendo que esta também leva em consideração as proposições dos
alunos, ou seja, implica diálogos, negociação e consenso entre os envolvidos no
projeto. Entenda-se, portanto, que as fases apresentadas podem ser ampliadas ou
adaptadas.
LÚCIA LEITE SUZANA BURNIER NILBO NOGUEIRA
Problematização
Problematização Sonhos, utopias, desejos e
necessidades
Desenvolvimento
Desenvolvimento Planejamento
Síntese
Sistematização ou síntese Execução e realização
Avaliação Depuração
Apresentação e exposição
Avaliação e críticas
Quadro 01: Fases do projeto – segundo Leite, Burnier e Nogueira
Fonte: adaptado de Leite (1996) Fonte: adaptado de Burnier (2001) Fonte: adaptado de Nogueira (2005a)
36
Embora cada um dos sete modelos apresentados tenham sido identificados como de autoria dos seus
respectivos autores, não se garante que nenhum modelo criado não tenha sido inspirado em algum deles. Ou seja,
que houve reprodução entre eles. os trabalhos que fazem uso de um desses modelos, m o cuidado de citar a
referência. E ainda na ausência da referência, se percebe facilmente a cópia perfeita originada de um modelo
existente, cuja publicação corresponde a algum ano anterior a obra.
99
Dácio Moura & Eduardo Barbosa
Escopo
Definição do tema ou situação geradora
Justificativa
Objetivo específico
Resultados esperados
Abrangência
Plano de Ação
Atividades e tarefas
Estimativa de recursos/custos
Prazos
Cronograma
Plano de monitoramento
Planilha de procedimentos de monitoramento
Planilha de procedimentos de avaliação
Quadro 02: Fases do projeto – segundo Moura e Barbosa
Fonte: adaptado de Moura & Barbosa (2006).
Fernando Hernández
Fernando Almeida e
Fernando Fonseca Junior
Marilda Behrens
A escolha do tema Identificação do problema Discussão do projeto
A atividade do docente após
a escolha do tema
Levantamento de hipóteses e
soluções
Problematização
A atividade dos alunos após
a escolha do projeto
Mapeamento do aporte
científico necessário
Contextualização
A busca das fontes de
informação
Seleção de parceiros Aulas expositivas
exploratórias
O índice como estratégia de
aprendizagem
Definição de um produto
(gincanas, atividades sociais
de assistência, entre outros)
Pesquisa individual
Realizar um dossiê de síntese
dos aspectos tratados no
projeto
Documentação e registro Produção individual
Avaliação Método de acompanhamento
e avaliação
Discussão crítica
Publicação e divulgação Produção coletiva
Produção final
Avaliação e aprendizagem
processual
Quadro 03: Fases do projeto – segundo Hernández, Almeida & Junior e Behrens
Fonte: adapt. de Hernández (1998a) Fonte: adapt. de Almeida e Junior (2000) Fonte: adapt. de Behrens (2006)
100
Iniciando pelas etapas comuns a toda e qualquer metodologia de projeto, a
primeira que se destaca é a problematização. Ela se caracteriza por ser o momento
gerador, desencadeador do projeto, isto é, quando surge a grande questão que
resultará no projeto. A propósito do tema escolhido, conforme Leite,
alguns profissionais defendem a posição de que o projeto deve partir
necessariamente, dos alunos, pois, se não, ele seria imposto. Outros
defendem a idéia de que os temas devem ser propostos pelo professor, de
acordo com a sua intenção educativa, pois de outra forma, se cairia em uma
postura espontaneísta (1996, p. 31).
Contanto que o projeto seja de interesse de todos que estarão envolvidos no
trabalho, a escolha é digna de ser considerada. Em outras palavras, admite-se a
hipótese da escolha de o tema partir dos alunos e esta depender da aprovação
do professor, ao qual caberá a tarefa de analisar e verificar a relevância do tema, se
este pode provocar mudanças de atitudes nos alunos, se é possível tratá-lo de forma
globalizada, se propiciará novos conhecimentos e se de fato atende a todos os
anseios e necessidade dos participantes (NOGUEIRA, 2005b). A educadora Adriana
Gandin (2004) adverte também que o professor deve estar atento para que o tema
escolhido esteja em sintonia com o Projeto Político Pedagógico
37
da instituição, com
os objetivos da disciplina que fará uso da metodologia de projeto, e com a realidade
não só dos alunos, mas também da comunidade e do contexto geral que os cercam.
Em decorrência do que foi dito anteriormente, uma escolha imposta pelo professor
deve ser descartada, pois neste caso não se estimula a curiosidade, as dúvidas, a
reflexão dos alunos. Ao dar liberdade para os alunos pesquisarem e elaborarem
perguntas que tenham significado para eles, os alunos começam a se sentirem
mobilizados e interessados em conhecer melhor o tema (BEHRENS, 2006). Uma
valiosa contribuição a essa questão e que se vale, logicamente, da experiência com
a metodologia de projeto, é expressa nas seguintes palavras.
37
O Projeto Político Pedagógico “organiza e consolida a programação das atividades acadêmicas de ensino,
pesquisa e extensão, dos cursos de graduação, especialização e pós-graduação, bem como orienta a política de
contratação de docente e funcionários, [...]. Especificamente em relação ao ensino de graduação, o projeto
pedagógico é a organização interna da Instituição de ensino superior que define os perfis dos profissionais que
pretende formar, explicitando sua marca, sua missão, sua visão de sociedade e de ensino superior” (MASETTO,
2003, p. 60).
101
Quando o aprendiz é desafiado a questionar, quando ele se perturba e
necessita pensar para expressar suas dúvidas, quando lhe é permitido
formular questões que tenham significado para ele, emergindo de sua
história de vida, de seus interesses, seus valores e condições pessoais,
passa a desenvolver a competência para formular e equacionar problemas.
Quem consegue formular com clareza um problema, a ser resolvido,
começa a aprender a definir as direções de sua atividade (FAGUNDES,
MAÇADA e SATO, 1999, p. 16).
Neste momento de desafio, é que surge então a grande questão ou questões que
serão trabalhadas pelos alunos. E para Behrens (2006, p. 61), “a qualidade da
indagação determina o sucesso inicial do envolvimento dos alunos”. Isto quer dizer
que todo o desenvolvimento do projeto depende deste passo, que deve levar em
conta “as vivencias, os interesses e as possibilidades de realizar experiências
significativas” (BEHRENS, 2006, p. 61). Por estas razões a problematização é
considerada por Garcia,
um momento de extrema importância para assegurar que todos os alunos
se envolvam com o desenvolvimento do projeto, e por isso, demanda que
se criem e se proporcionem situações e recursos que instiguem ao máximo
a curiosidade dos estudantes em torno do significado e abrangência do
tema (1999, p. 41).
A problematização é também uma ocasião onde os alunos vão expressar
suas idéias, crenças e conhecimentos prévios sobre o tema escolhido. Com bases
nisso, vão lançar hipóteses explicativas sobre o tema e, nesta ocasião, o professor
precisa orientar muito bem os alunos.
Segundo Garcia (1999, p. 41), “o grau de aprofundamento e complexidade
dos conteúdos que serão trabalhados no projeto estão intimamente relacionados à
consistência e significação da problematização”. Da mesma forma, o nível de ensino
do aluno e a qualidade da mediação do professor também interferem nestas
questões.
E com relação aos temas que deverão ser trabalhados numa mesma turma,
de acordo com os autores pesquisados nesta pesquisa, pode-se trabalhar com um
único tema para todos os alunos, ou um único tema onde cada grupo trabalha com
uma particularidade, e também existe a possibilidade de se trabalhar com vários
102
temas. Tudo dependerá das características, dos interesses, da heterogeneidade do
grupo e das possibilidades do professor.
Encerrando esta primeira etapa, pode-se resumir que, “é fundamental que se
assegure, através da problematização, vontade e necessidade de estudar e
pesquisar para esclarecer as dúvidas e questões suscitadas” (GARCIA, 1999, p. 41).
E como lembra bem Amaral (2001, p. 4) “um trabalho com projetos não se limita a
um simples estudo de um tema: sua característica principal é a resolução de
problemas ligados ao tema”.
A segunda etapa que aparece presente em todos os trabalhos com projetos
é conhecida como desenvolvimento. Esta fase muitas vezes aparece dividida em
pequenas etapas e, por conseguinte, recebe diferentes nomes como: planejamento,
execução e realização, levantamento de hipóteses e soluções, plano de ação,
mapeamento de aporte científico, pesquisa individual e coletiva, entre outros.
A etapa do desenvolvimento é uma conseqüência natural da fase anterior
que vai gerar a necessidade de se planejar ações estratégicas para se alcançar os
objetivos propostos. Por esta razão, é fundamental “desafiar os alunos no sentido de
buscarem as fontes de informações necessárias para apresentar possíveis soluções
para o problema” (BEHRENS, 2006, p. 63). Visando atender esse desafio, que
exigirá plena participação dos alunos, seja no planejamento, seja na execução,
podem ser planejadas e desenvolvidas pelos alunos diferentes estratégias como:
excursões, entrevistas, debates, pesquisas bibliográficas, pesquisas de campo,
levantamento de dados estatísticos, entre outras (AMARAL, 2001).
Moura e Barbosa são os autores que me melhor
38
detalham o momento do
planejamento que está inserido na etapa do desenvolvimento. Esta importante etapa
merece, de fato, uma atenção mais pormenorizada. Várias argumentações ratificam
esta necessidade como, por exemplo, a importância de vencer a inércia do
planejamento tendo em visto que, segundo Moura e Barbosa,
de um modo geral, muitas resistências para a elaboração de planos,
qualquer que seja o empreendimento a ser executado. As vezes, considera-
38
Não apenas a etapa do planejamento como as demais que fazem parte do desenvolvimento foram bem
detalhadas por Moura e Barbosa, mas no que tange a questão do planejamento, nenhum autor ofereceu uma
precisa e sistematizada colaboração quanto os autores citados, que, diga-se de passagem, são especialistas e
consultores em planejamento, acompanhamento e avaliação de projetos voltados à educação.
103
se que dedicar algum tempo ou espaço à elaboração de um plano é perda
de tempo. Na verdade, perde-se tempo e muito quando não
planejamento. Esta dificuldade parece ter raízes na própria cultura que
normalmente preferência ao improviso, sempre acreditando que “no final
tudo dá certo” (2007, p. 95).
Reforçando esta idéia, mas agora especificamente dentro de um contexto
acadêmico, Nogueira comenta que o planejamento,
muitas vezes é encarado, por alguns professores, como algo
desnecessário. Embora despenda-se um pouco de tempo para realizar o
planejamento, esse tempo é recuperado posteriormente na fase de
execução, que não será mais realizada de forma desestruturada (2005b,
p. 79).
Se existe essa desconsideração em relação ao planejamento por parte de alguns
professores, o que dizer então dos alunos que costumam seguir os exemplos dos
seus mestres? E, destacando a importância do planejamento para os discentes,
Nogueira escreve a seguinte frase.
Para os alunos o ato de planejar é também uma aprendizagem e uma forma
de possibilitar sua autonomia em traçar planos e projetos. É preciso fazer os
alunos entenderem e aprenderem que o ato de planejar não significa que
colocamos uma camisa-de-força no projeto, que tudo terá de ser
exatamente conforme pensado e sonhado inicialmente. Nesse processo de
aprendizagem em planejamento, eles precisam compreender sua
importância e necessidade, porém entendendo o conceito de flexibilidade e
maleabilidade (2005b, p. 79).
O favorecimento ao desenvolvimento da autonomia é uma das qualidades que fica
evidenciada no ato de planejar, mas outras também são beneficiadas e ganharão
destaque no subcapítulo 4.6 especialmente dedicado às vantagens provindas do uso
da metodologia de projeto.
Em projetos que envolvem recursos financeiros, condição esta que não pode
ser ignorada mesmo em projetos escolares, o planejamento também tem uma
importância considerável. Isso se explica porque
104
os custos necessários para a correção de erros durante a execução de um
projeto aumentam exponencialmente à medida que o projeto desenvolve.
Para um projeto que se encontra ainda na fase de planejamento, a correção
de erro não traz grandes prejuízos e pode evitar conseqüência piores no
futuro (MOURA e BARBOSA, 2007, p. 96).
Não se pode esquecer também que uma das principais tarefas, se não for a
principal, executadas pelos empreendedores, é a elaboração do Plano de Negócio,
que resumidamente trata de um planejamento detalhado de algo que se vai fazer.
Portanto, nada mais conveniente para os propósitos desta dissertação do que
reforçar uma etapa da metodologia de projeto, a qual estimula o desenvolvimento de
habilidades condizentes com as desenvolvidas pelos empreendedores.
Como foi frisado anteriormente, da problematização decorre o
desenvolvimento, etapa esta que Moura e Barbosa denominam de Plano de Ação. A
condição para que o plano de ação tenha êxito, segundo Moura e Barbosa, é que
sua elaboração resulte de uma “definição clara e precisa da situação geradora do
projeto, da justificativa, dos objetivos, dos resultados esperados e da abrangência do
projeto – elementos que constituem o Escopo
39
do Projeto” (2007, p. 94).
Após a elaboração do escopo, etapa essa que foi apresentada como
problematização, Moura e Barbosa (2007, p. 95), listam uma rie de perguntas que
devem ser respondidas na intenção de se elaborar o plano de ação.
Quais atividades serão necessárias para alcançar os objetivos e resultados
esperados?
Quando acontecerá cada atividade?
Quais serão os responsáveis por sua execução?
Quanto custará cada atividade?
Qual a melhor seqüência para a realização das atividades?
Quais são as atividades críticas do projeto?
Quais os produtos que serão gerados com a realização das atividades?
Quais recursos serão necessários?
Colocadas essas questões norteadoras, Moura e Barbosa apresentam em seguida
sua definição de Plano de Ação.
39
“O escopo expressa a extensão ou amplitude do projeto (em termos do que se pretende realizar, abarcar ou
abranger), estabelece seu ‘raio de ação’ ou ‘cobertura’, definindo, portanto, seus limites. O escopo é, em síntese,
a alma do projeto, porque expressa sua essência e identidade” (MOURA e BARBOSA, 2007, p. 47).
105
O Plano de Ação é um documento que apresenta, de forma estruturada, os
procedimentos e recursos que serão mobilizados para a execução daquilo
que foi expresso no escopo do projeto, em especial a realização de seus
objetivos e resultados esperados (2007, p. 95).
Nesta definição, a execução não faz parte da etapa mencionada. O que prevalece é
unicamente a realização do planejamento. Isto manifesta o posicionamento dos
autores, pois neste trabalho, tanto o planejamento, quanto a execução, que será
vista na seqüência, fazem parte da etapa do desenvolvimento. Os mesmos autores
complementam com outras palavras a definição anteriormente exposta. “O Plano de
Ação especifica atividades, tarefas e recursos, logicamente encadeados no tempo,
tendo em vista a realização eficiente e efetiva dos objetivos e resultados esperados”
(2007, p. 95). Em linhas gerais, o que se tem com um plano de ação é um roteiro de
viagem do caminho que se percorrido e que não deve ser confundido com um
plano de vôo que tem uma programação rígida. Nogueira manifesta o mesmo
entendimento dizendo que, “é importante mencionar que um planejamento pode ser
alterado no decorrer de sua execução, pois ajustes são necessários ao bom
funcionamento e andamento de um processo” (2005a, p. 86). Visando demonstrar
essa perspectiva processual do planejamento, Moura e Barbosa (2007, p. 97), listam
alguns aspectos que devem ser levados em conta na hora da elaboração do plano
de ação.
Planos de ação são de natureza dinâmica e estáticas. Significa que todo
plano pode (e muitas vezes, deve) sofrer mudanças ao longo da execução do
projeto.
Planejamento é um processo criativo. As atividades baseadas em projetos
lidam com o desenvolvimento de processos, atividades e soluções novas. Por
tal motivo, não se pode prever tudo com antecipação. Eventualmente, um novo
conjunto de informações, durante o desenvolvimento do projeto, implica alterar
decisões tomadas recentemente.
Para ser efetivo, o Plano de Ação deve ser usado, revisado e mantido
atualizado constantemente. Parece óbvio, mas é raro encontrarmos equipes
que se preocupam com revisões e atualizações constantes dos projetos que
desenvolvem.
106
A próxima referência trata das etapas de planejamento que Moura e Barbosa (2007,
p. 98) elaboraram e neste trabalho são apresentadas como sugestões a serem
seguidas.
Definição de ações, atividades e tarefas: nesta etapa o identificadas e
claramente especificadas todas as atividades e tarefas que deverão ser
conduzidas e levadas a bom temo para que o projeto apresente os
resultados esperados;
Planejamento de recursos: consiste na definição dos recursos (pessoas,
equipamentos, materiais, etc.) e quanto de cada recurso será necessário
para a realizar as atividades previstas no projeto;
Seqüenciamento de atividades: identificação das interdependências entre
as diversas atividades e tarefas do projeto. Todas as atividades são listadas
em sua lógica, juntamente com as atividades que antecedem (devem ser
executadas antes) e que sucedem (devem ser executadas depois);
Estimativa de duração das atividades: previsão de quanto tempo será
gasto na execução de cada atividade no projeto;
Estimativa de custo: consiste na previsão dos recursos financeiros que
serão necessários para completar todas as atividades do projeto;
Desenvolvimento do cronograma: é feito com base na análise da
seqüência de atividades, duração e necessidade de recursos para criar um
escalonamento lógico e organizado para todo o projeto;
Plano de Ação: o principal produto do processo de planejamento é o Plano
de Ação do projeto. É o documento formal, contendo todas as informações
necessárias para gerenciar, controlar, monitorar e avaliar o projeto.
E por fim, Moura e Barbosa (2007) citam outras questões importantes que devem
ser consideradas, tendo em vista que são elementos que dão suporte ao processo
de planejamento do projeto como, por exemplo, os dados históricos sobre a área de
abrangência do projeto, as restrições que pode haver em vários âmbitos, mas
principalmente o que diz respeito às limitações orçamentárias e aos riscos
envolvidos.
Também faz parte do desenvolvimento, a etapa da execução do projeto, ou
seja, a fase de realizar, de colocar em prática tudo o que foi planejado. É o momento
mais trabalhoso do projeto, de múltiplas interações, onde as ações planejadas
107
começam a ganhar corpo e forma. O que era antes um desejo começa a se
concretizar fazendo com que o irreal passe a ter vida. Através de suas ações os
alunos vão perceber que seus sonhos, vontades e necessidades podem ser
realizados (NOGUEIRA, 2005b). E conforme os educandos vão enfrentando os
desafios, superando as dificuldades eles, “potencializarão, se o todo, pelo menos
boa parte do seu espectro de competências” (NOGUEIRA, 2005b, 83).
Deste modo, é compreensível que essa fase seja considera a mais
trabalhosa, razão pela qual
o professor deve estar atento à motivação dos alunos, e a todo momento
envolver cada um deles, de tal forma a deixá-los ativos no processo, pois a
motivação que é intrínseca surgirá enquanto o sujeito estiver ativo na
ação e no meio (NOGUEIRA, 2005b, p. 84).
A última etapa presente em quase todos os trabalhos com projeto é a da
avaliação. Esta etapa aparece por último apenas para fins de explicação e para
facilitar a compreensão da estrutura de um trabalho com projeto visto que, “a
avaliação da aprendizagem não terá uma fase específica, pois será proposta a todo
momento de maneira contínua e acompanhará todo o processo do projeto. Portanto,
não se restringe a momentos finais de aprendizagem” (BEHRENS, 2006, p. 71).
Deste modo, a avaliação denominada somativa, que é realizada somente no final do
processo, não é a que vai ser utilizada nos projetos, que os educandos devem ser
avaliados do início ao final do projeto. No entanto, é preciso deixar isso bem claro
para o aluno, comunicando, antes de iniciar o trabalho com projeto, de que forma ele
será avaliado, o que será exigido dele. Também se deve abrir espaço para que “os
alunos se manifestem e discutam a avaliação, buscando consenso sobre os critérios
que deverão ser propostos com clareza e transparência” (BEHRENS, 2006, p. 71).
A base da avaliação será a participação do aluno em todas as fases do
trabalho de modo que, os conhecimentos adquiridos, os procedimentos utilizados, as
atitudes incorporadas, os comportamentos manifestados serão todos considerados
como itens de avaliação, juntamente com a resolução da problemática que deu
origem ao projeto (AMARAL, 2001). Essa proposta de avaliação possibilita
intervenções por parte do professor que deverá estar atento aos avanços e
108
dificuldades dos seus alunos. É esperado que o professor faça um verdadeiro
trabalho de orientação e facilitação dos processos educacionais, seja através de
questionamento, promovendo discussões, trocando idéias, opinando, enfim,
oferecendo auxílio, agindo assim, como um parceiro do educando. Desta forma o
professor consegue comparar os resultados alcançados em relação aos resultados
esperados, analisar como o conhecimento foi sendo construído, as atitudes
incorporadas e os comportamentos desenvolvidos. Trata-se, portanto, de uma
avaliação qualitativa com foco na aprendizagem do aluno e não simplesmente de
atribuição de notas, ou seja, “interessa saber o valor da atividade para a formação
do aluno, as competências desenvolvidas, e não apenas dados técnicos do projeto”
(MAGALHÃES, 2004, p. 126).
E para dar conta desta incumbência pedagógica Nogueira (2005a) sugere ao
professor as Fichas de Observação
40
como modelo de instrumento de avaliação
ressaltando também, “o quanto se faz necessário dar um feedback ao educando
para que ele perceba o que errou e como pode melhorar” (SANTOS, 2006, p. 66).
Esses feedback serão bastante úteis como parâmetro para o planejamento e re-
planejamento das atividades, e, como foi destacado, para o educando fazer uma
auto-avaliação e reflexões de suas ações e do aprendizado que ele vem
construindo.
Mas o principal procedimento didático, na opinião de educadores como
Hernández, Nogueira, Behrens entre outros, que auxilia a avaliação do professor e
colabora principalmente para a auto-avaliação dos alunos é o uso do portfólio.
Segundo Behrens,
entende-se portfólio como procedimento metodológico que permite envolver
atividades didáticas de auto-avaliação que documentam aspectos
multidimensionais do que os alunos aprenderam. O portfólio propicia a
apresentação de atividades realizadas de maneira contínua, sistematizada,
coletando registros variados, em momentos diversos. A auto-avaliação fica
facilitada porque o aluno organiza suas produções e assim tem
oportunidade de avaliar sua aprendizagem (2006, p. 105).
40
Trata-se de uma ficha elaborada manualmente pelo professor para cada aluno e serve para que o educador
possa relatar as observações referentes ao engajamento de cada aluno durante as etapas do projeto, e
principalmente os itens de avaliação enunciados (NOGUEIRA, 2005a).
109
Havendo, portanto, a necessidade de o aluno selecionar e ordenar as evidências de
seus passos, de seus avanços e dificuldades, enfim, de sua aprendizagem durante
as fases do projeto, de fato se favorece ao aluno fazer uma reflexão sobre os
saberes adquiridos, sobre as experiências vividas, registrar suas percepções e seus
sentimentos, ações essas ligadas à auto-avaliação.
Acrescenta-se à definição exposta o fato de que, segundo Hernández
(1998b, p. 99), “a utilização do portfólio como recurso de avaliação é baseada na
idéia da natureza evolutiva do processo de aprendizagem”. Da mesma forma que
“na metodologia de projetos, a avaliação visa ao processo, ao crescimento gradativo
do aluno, é contínua, transformadora” (SANTOS, 2006, p. 66).
Reforçar-se por fim que a etapa da avaliação não deve se restringir a um
único momento e sim passar por todo o processo, sendo necessário que o professor
também disponibilize tempo para que os alunos possam refletir e tomarem nota da
sua evolução. E como fala Behrens (2006, p. 109), “mesmo não elegendo o portfólio,
a avaliação precisa ser proposta de maneira contínua, gradual, sistêmica durante o
projeto”.
Também é de Behrens a última frase deste subcapítulo, pois esta vai ao
encontro da idéia do que se pretendeu passar a respeito das etapas do projeto. A
autora comenta que,
as fases são apresentadas como possibilidades e não se tratam de
receituário, regras ou regulamentos que precisam ser rigorosamente
cumpridos. A ordem das fases também pode ser alterada de acordo com as
necessidades de cada projeto. (2006, p. 72).
O importante é entender que não existe uma rie de passos sistematizados a
seguir, mas algumas condições que se fazem necessárias para a implementação.
4.2 O papel do aluno
Por meio do trabalho com projeto, o aluno tem uma participação ativa no seu
processo de aprendizagem. Ou como diz Santos (2006, p. 57), “o aluno se torna o
principal agente de aprendizagem, responsável pelo seu próprio sucesso,
privilegiando uma aprendizagem por descoberta pessoal do aluno e por informação
110
vinda do professor”. O aluno deixa de ser aquele receptor passivo frente ao
conhecimento e acaba sendo o protagonista do seu aprendizado “transformando-se
em sujeito de seu conhecimento e, por conseguinte, em sujeito de sua formação”
(RISSO, 2005, p. 60).
Como foi visto anteriormente, o aluno é chamado a desenvolver uma
atividade real e relevante que tenha começo, meio e fim. Seu envolvimento ao longo
do projeto é uma característica chave do trabalho com projeto, desde a escolha do
tema e do objetivo do projeto, até a concretização do que foi proposto. Como afirma
Arfwedson (in LEITE, MALPIQUE e SANTOS, 1993, p. 20), “os alunos têm que
assumir, total ou parcialmente, uma série de funções docentes tradicionais
relacionadas com a formulação e delimitação da matéria, escolha de literatura e
selecção de métodos de trabalho”. São numerosas as atividades que estimulam a
autonomia do educando, como também, as situações que favorecem o trabalho em
equipe para se adquirir conhecimentos e conseguir alcançar o propósito almejado.
Explorando um pouco mais essas idéias, referente ao papel dos alunos, Hernández
comenta que
esse envolvimento dos estudantes na busca da informação tem uma série
de efeitos que se relacionam com a intenção educativa dos Projetos. Em
primeiro lugar, faz com que assumam como próprio o tema, e que
aprendam a situar-se diante da informação a partir de suas próprias
possibilidades e recursos. Mas também lhes leva a envolver outras pessoas
na busca de informação, o que significa considerar que não se aprende
na escola, e que aprender é um ato comunicativo, que necessitam da
informação que os outros trazem. Mas, sobretudo, descobrem que eles
também têm uma responsabilidade na sua própria aprendizagem, que não
podem esperar passivamente que o professor tenha todas as respostas e
lhes ofereça todas as soluções, especialmente porque, como foi dito, o
educador é um facilitador e, com freqüência, um estudante a mais (1998b,
p. 75).
Com isso, “o aluno passa a educar-se e a cumprir, com responsabilidade,
compromissos pessoais firmados com o grupo e com o professor” (BEHRENS, 2006,
p. 53). E quanto mais o aluno estiver à frente das atividades, maior deverá ser a sua
aprendizagem e o desenvolvimento de suas competências e habilidades.
111
Trazendo outra colaboração referente ao trabalho coletivo, perspectiva essa
que sempre está associada ao trabalho com projetos e por isso merece um pouco
mais de atenção, Arfwedson comenta que
o facto de os estudantes em grupo assumirem, conjuntamente, a
responsabilidade pela sua própria formação e desenvolvimento não significa
apenas que lhes é dada a oportunidade de desenvolverem a sua própria
aptidão em matéria de iniciativa, capacidade de combinação, busca de
factos e inovação de raciocínio. Significa também que, em grande medida,
eles assumem o comando, e talvez reforcem a chamada socialização. A
pressão no seio de um grupo, no sentido da implantação de normas
comuns, torna-se forte. As possibilidades de sustentar pontos de vista e
comportamentos divergentes, pessoais, podem muitas vezes, diminuir à
medida que aumentam as exigências quanto à capacidade de colaboração
e de compromisso no sentido dos objetivos do grupo (IN LEITE,
MALPIQUE, SANTOS, 1993, p. 23).
Fica caracterizado, dentro deste posicionamento, que os alunos são co-
responsáveis pelo trabalho e pelas escolhas ao longo do desenvolvimento do
projeto, o que faz a cooperação ganhar destaque no trabalho com projeto, como
também, o desempenho pessoal de cada aluno, visto que, este influencia o
desempenho de todo o grupo.
4.3 O papel do professor
As condições prévias para ocorrer um projeto é que os alunos tenham um
sonho
41
, um desejo
42
, identifiquem uma necessidade, uma oportunidade que
evidencie algo a fazer, algo a mudar na realidade em que vivem. Neste sentido, a
primeira tarefa do professor é dar oportunidade para os alunos sonharem,
imaginarem e manifestarem seus desejos, como também, incentivar os alunos a
investigar, refletir e problematizar sobre a sua realidade social em busca de desafios
e problemas onde possam realizar mudanças concretas em benefício de sua
comunidade. Sobre esta questão o comentário do professor Nilson Machado é bem
claro.
41
Ainda que esta ação seja feita de forma individual, em sala de aula, os sonhos serão norteados a terem uma
conotação social, visando beneficiar a comunidade, a realidade onde o aluno vive. Exemplos de projetos são
apresentados no capítulo 6.
42
Da mesma forma os desejos deverão ter uma conotação social, questão que será aprofundada no subcapítulo
5.3.
112
Como professores, cabe-nos a tarefa de fazer com que os alunos tenham
vontades, sejam capazes de sonhar, que são condições prévias à
construção de qualquer projeto. Compete a nós, ainda, estimular projetos,
semear valores que lhes dão sustentação. Cabe-nos pôr em discussão e
argumentar sobre o que vale e o que não vale, mas não nos compete
decidir sobre quais projetos são adequados para outra pessoa, ou, no limite,
ter projetos por ela (2004, p. 90).
Depois de identificada à problemática do projeto é essencial haver
engajamento, cumplicidade e participação da turma para o trabalho com projeto
funcionar. Para que isso ocorra a atividade seguinte do professor é integrar o grupo,
pois enquanto o grupo não estiver entrosado e comprometido, fica muito complicado
desenvolver o projeto. Importante também nesse momento é que o professor
ressalte aos jovens a importância do trabalho em equipe na busca da resolução do
problema, o que fará com que os alunos se dêem conta da importância e da
possibilidade de aprender com seus colegas. Até porque, assim como na vida, no
trabalho com projetos, os alunos não receberão as informações prontas,
estruturadas e originadas através apenas do professor. O professor deve deixar bem
claro para os alunos que ele não será a única fonte de conhecimento. Como diz
Magalhães,
o indivíduo é bombardeado de informações a todo o momento e através de
diversas formas. Cabe ao docente, mais do que transmitir o saber, articular
experiências em que o aluno reflita sobre suas relações com o mundo e o
conhecimento, assumindo o papel ativo no processo de ensino-
aprendizagem (2004, p. 22).
Portanto, o professor não deve se considerar o único que ensina. Este deve se
manter com uma postura aberta ao diálogo, a trocar idéias, saber escutar e
principalmente, não ter medo do desconhecido, de conhecimentos que não possui,
visto que os projetos e seus temas são dinâmicos e irregulares. Ou como diz
Almeida e Fonseca Jr. (2000, p. 92), “o professor terá de se livrar do desejo de tudo
saber, de tudo antecipar, de tudo controlar. Terá de estar disposto a transferir parte
significativa da condução do processo para os alunos. Terá de estar disposto, enfim,
a aprender”. Outro comentário pertinente que vem a acrescentar à idéia anterior foi
exposto da seguinte forma por Santos: “o ensino por projetos exige que o professor
113
tenha comprometimento constante com a busca de conhecimento, pois o aluno
requer auxílio em forma de sugestões” (2004, p. 38). Vale dizer também que “o
projeto não é do professor nem do aluno e sim de ambos, portanto, o professor pode
também opinar sobre sua trajetória” (NOGUEIRA, 2005b, p. 41). Mas além de
opinar, o professor vai investigar e com isso, aprenderá junto com o aluno. Isso nada
mais é do que adotar uma atitude de parceria e co-responsabilidade com os alunos.
Manifestando essa prática participativa, investigadora e de estudo que se exige do
professor, Hernández descreve essas atividades do professor da seguinte forma.
Estudar e atualizar as informações em torno do tema ou problema do qual
se ocupa o Projeto, com o critério de que aquelas apresentem novidades,
proponham perguntas, sugiram paradoxos, de forma que permita ao aluno ir
criando novos conhecimentos (1998a, p. 69).
De igual importância é o professor ter clareza das competências que deseja
que os alunos desenvolvam e dos conhecimentos necessários para isso, ou seja,
que saiba criar as condições para que o projeto caminhe, que garanta o acesso às
informações, a participação de todos e um clima de cooperação e engajamento. Por
esta razão, como foi destacado, “o professor deve estar atento à motivação dos
alunos, e a todo momento envolver cada um deles, de tal forma a deixá-los ativos no
processo” (NOGUEIRA, 2005b, p. 84).
Percebe-se com facilidade que o professor passa a ser compreendido como
um motivador, um co-produtor do conhecimento. Sua função, no contexto da
metodologia de projeto, não é unicamente a de transmitir pura e simplesmente os
conteúdos de uma determinada disciplina. Conforme a professora Analise da Silva,
o professor ocupa, nessa concepção de educação, o lugar do sujeito da
intervenção que visa explorar as situações problematizadoras, introduzir
novas informações, instrumentalizar os alunos para que elaborem conceitos
e construam uma responsabilidade individual, interpessoal e coletiva (2001,
p. 11).
A postura do professor se assemelha mais à de um orientador de estudos, daquele
que cria condições e situações de aprendizagem para que o aluno possa construir
114
seu conhecimento com autonomia. Além disso, de acordo com Leite e Santos (2004,
p. 5), no que tange à investigação dos alunos, o docente “vigia o rigor, orienta o
método, critica os instrumentos de recolha de dados, questiona generalizações
apressadas e intervenções empiristas e simplificadoras, apóia o tratamento dos
dados colhidos”.
Nogueira se preocupa em deixar bem evidente a questão sobre o papel
imprescindível do professor de orientar e facilitar a aprendizagem do aluno ao dizer
que
fica nítida sua função de mediador e facilitador, pois é ele quem “gerencia” o
processo, oferecendo meios, questionando sobre possibilidades,
incentivando o aprofundamento, oferecendo auxílio quando necessário,
vibrando com os alunos diante das novas descobertas e até mesmo
“direcionando” (no bom sentido da palavra) para aquele caminho que sua
experiência julga ser o mais pertinente para o dado momento (2005b, p. 78).
Isso também quer dizer que os professores deverão acompanhar a elaboração, a
implementação, a avaliação dos projetos e, muito importante, procurar não definir as
ações dos alunos. Tanto o acompanhamento como o auxílio aos alunos devem ser
constantes, no sentido de propor perguntas que estimulem o pensamento e a
reflexão.
Por fim, percebe-se que o trabalho do professor é desafiante, pois
desacomoda os educadores impelindo-os a repensarem suas práticas até então
desenvolvidas e que sejam capazes de redimensionarem suas atividades. Também
é importante o professor estar ciente de que, ao fazer uso da metodologia de
projeto, ele realizará um trabalho que exige disponibilidade, facilidade de
relacionamento, flexibilidade na tomada de decisões, atuação como parceiro do
aluno e igualmente como aprendiz. O importante é que se estabeleça uma
autoridade democrática, estabeleça um enfoque globalizador e uma postura
interdisciplinar, que respeite os saberes dos sujeitos, que incite constantemente a
curiosidade dos alunos, que proporcione autonomia aos educandos, a cooperação, a
harmonia, incentive o olhar crítico, a indagação, etc. Embora todos estes fatores
sejam preocupações que qualquer professor deve levar em consideração,
115
independente da metodologia que ele utilize, no trabalho com projeto, estas são
condições elementares para o sucesso desta metodologia.
4.4 Como ficam os conteúdos?
Ao fazer uso da metodologia de projeto, o professor deve estar ciente de que
os conteúdos não estão predeterminados, pois se da oportunidade para que os
alunos explorem sua realidade social em busca de um problema a resolver. Os
conteúdos resultarão, portanto, de um processo aberto, dialógico com as situações
da vida real e consistirá em algo que há para fazer e não em algo que está
estabelecido para ser feito. Vai prevalecer uma perspectiva sistêmica do
conhecimento, com um enfoque social onde haverá articulação dos saberes
escolares e dos saberes sociais (CORTESÃO, LEITE, PACHECO, 2002).
É importante esclarecer que o desenvolvimento de projetos, com objetivo de
resolver questões relevantes para o grupo, vai gerar a necessidade dos alunos se
defrontarem com os conteúdos de várias disciplinas. Em função disso, o conteúdo
disciplinar continua sendo importante, mas não deve ser considerado um fim, e sim
um meio para se alcançar os objetivos estipulados pelos projetos. A idéia não é
questionar a importância dos conteúdos, mas a sua forma de tratamento. Esta
preocupação procede, de acordo com Nogueira, porque
os conteúdos ainda são, na sua maioria, tratados apenas de forma
conceitual, ou seja, o professor detém o conhecimento e, desta forma,
transmite-o ditando e escrevendo no quadro negro todo seu repertório de
saberes, muitas vezes de forma absolutamente descontextualizada do
cotidiano do aluno. Assim, o sujeito que passivamente fica sentado nas
cadeiras enfileiradas recebe uma “grande solução” para resolver um
problema que ele nunca teve (2005a, p. 17).
Resulta do comentário acima a idéia de não poder deixar de lado os interesses dos
alunos, como também, o se pode prescindir do conhecimento acumulado e
organizado nas disciplinas, contanto que elas façam, através do professor, a
conexão dos seus conteúdos com a realidade atual. Nogueira continua explanando
sobre esta questão, acrescentando agora outros detalhes.
116
É claro que muitos conteúdos devem e podem ser tratados de forma
conceitual. Esta não é a questão. O que não concebemos é que em sua
maioria eles são tratados apenas desta forma, conceitualmente, nunca
chegando nem próximo à forma procedimental
43
e é obvio ficando muito
aquém da forma atitudinal. Encarando desta maneira, o conteúdo
trabalhado de forma conceitual parece apenas ser tratado enquanto fim e
não como deveria ser, ou seja, enquanto meio. Meio para que o sujeito
aprendiz possa desenvolver capacidades, habilidades, gosto pelo processo
de aprender, etc. (2005a, p. 18).
Fica entendido que, em vez de se partir de um conteúdo, deve-se partir de um
desafio, o qual, para ser resolvido, exige que os alunos saiam da sua postura
passiva e se coloquem como sujeitos, situação esta que favorece o desenvolvimento
de várias competências.
Trazendo agora a contribuição de Silva, esta professora fala que
não se trata, portanto, de prever a assimilação de conteúdos conduzida pelo
professor para os alunos, mas sim de se dispor. [...] Nessa lógica, os
conteúdos a serem estudados derivam do problema, ou seja, na
problematização os conceitos já elaborados sobre a questão definirão os
procedimentos, os rumos a serem seguidos no Projeto para que esses
conceitos sejam reelaborados ou reafirmados e possam ser utilizados pela
analogia ou pela contraposição em outras situações da realidade vivida
(2001, p. 11).
Entende-se com isso que, através da metodologia de projeto, os alunos não entram
em contato com os conteúdos disciplinares a partir de conceitos abstratos,
desvinculados do contexto e esvaziados de sentido. Além do mais, ao se abrir uma
porta para a curiosidade do aluno deixando-o que ele investigue sua realidade atrás
de uma problematização, segundo Nogueira (2005b), coloca-se os educando diante
de ações e procedimentos que os deixam mais ativos em seu processo de formação
e construção de conhecimento, fato que torna uma maneira eficiente de possibilitar
43
“Os procedimentos expressam um saber fazer, que envolve tomar decisões e realizar uma série de ações, de
forma ordenada e não aleatória, para atingir uma meta. Os conteúdos procedimentais sempre estão presentes nos
projetos de ensino, pois realizar uma pesquisa, desenvolver um experimento, fazer um resumo, construir uma
maquete, são proposições de ações presentes nas salas de aula” (Secretaria de Educação Fundamental.
Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos parâmetros
curriculares nacionais. Brasília: MEC/SE, p. 76, 1998). Mesma citação que Nogueira fez em seu livro (2005a,
p. 18).
117
o desenvolvimento da criatividade, da liderança, do espírito de cooperação,
da tranqüilidade em aceitar desafios na resolução de problemas, e de
dezenas de outras capacidades esperadas desses indivíduos, quando
forem atuar mais ativamente nos diferentes segmentos sociais (NOGUEIRA,
2005b, p. 20).
Qualquer mudança
traz conseqüências na forma de selecionar e seqüenciar os conteúdos das
disciplinas. Esta costumava ser construída em etapas, de modo cumulativo,
em que um conteúdo deve ser “vencido” para outro ser “apresentado” ao
aluno. Os projetos de trabalho trazem nova concepção de seqüenciação,
fundada na dinâmica, no processo de “ir e vir”, em que os conteúdos vão
sendo tratados de forma mais abrangente e flexível, dependendo do
conhecimento prévio e da experiência cultural dos alunos (LEITE, 1996, p.
30).
De objeto do conteúdo o aluno passa a ser sujeito, na medida que se leva em
consideração as experiências, conhecimentos e interesses dos discentes.
Por fim, com o trabalho de projeto, os temas cotidianos e as vivências dos
alunos se destacam como ponto de partida para as aprendizagens, fato que um
novo sentido e significado para os conteúdos trabalhados em aula, pois da maneira
como costumam ser trabalhados os conteúdos, descontextualizados do meio em
que o aluno vive, sem gerar significações e atuações, pouco se mobiliza o aluno
para a aprendizagem.
4.5 Ênfase no ensino ou na aprendizagem ?
A concepção pedagógica que se tem sobre o modo de realizar o processo
de aprendizagem é a base para estabelecer os critérios que nortearão o fazer
docente em sala de aula. Quando se fala do trabalho com projeto, mesmo se
tratando de uma metodologia que, de acordo com vários autores entre eles Leite e
Santos (2004, p. 2), “inscreve-se numa concepção construtivista da aprendizagem”,
é possível encontrar exemplos de práticas caracterizadas por desenvolver um
ensino por projeto, processo esse que se diferencia de uma aprendizagem por
projeto. Em decorrência disso, é preciso fazer um paralelo entre ensino e
aprendizagem.
118
De acordo com Masetto (2003), os conceitos de ensino e aprendizagem
podem ser complementares e se integrarem, e justamente por isso, não os fazem
idênticos. Dissecando esta questão, Masetto escreve.
Quando pensamos em ensinar, as idéias associativas nos levam a instruir,
comunicar conhecimentos ou habilidades, fazer saber, mostrar, guiar,
orientar, dirigir. São ações próprias de um professor, que aparece como
agente principal e responsável pelo ensino. As atividades centralizam-se
nele, na sua pessoa, nas suas qualidades e habilidades. Ele é o centro do
processo (2003, p. 35).
Em contrapartida, ao se falar de aprender, salientam-se conceitos como:
apreensão, apropriação, descoberta, construção de conhecimento, ou como fala
Masetto,
buscar informações, rever a própria experiência, adquirir habilidades,
adaptar-se às mudanças, descobrir significado nos seres, nos fatos, nos
fenômenos e nos acontecimentos, modificar atitudes e comportamentos.
Todas as atividades que apontam para o aprendiz como agente principal e
responsável pela sua aprendizagem. Elas estão centradas no aprendiz
(aluno), em suas capacidades, possibilidades, necessidades, oportunidades
e condições para que aprenda (2003, p. 36).
Sendo processos distintos, a ênfase num ou noutro resultará numa prática
docente com diferentes conseqüências e atuações para os professores e também
para os alunos.
Com base em Fagundes et al. (1999) tem-se que no ensino, o professor
possui o controle total do trabalho, isto é, tudo parte dele e a ele deverá de uma
forma ou outra retornar. Nesta concepção o professor é o detentor absoluto do
saber. Somente ao professor cabe decidir como e com que qualidade o
conhecimento deve ser transmitido ao aluno. O aluno não tem oportunidade de
escolha, pois o lhe cabe tomar decisões. O trabalho de Maristela Silva ratifica e
acrescenta outros detalhes ao assunto. Conforme esta professora
119
quando nos referimos a ensinar por, as decisões são hierárquicas, uma vez
que as definições de regras, os direcionamentos dados às atividades são
impostos pelo sistema e o aluno apenas cumpre as determinações, sem
direito de opinar ou fazer opções. Espera-se um aluno submisso, num
contexto em que todas as decisões partem do professor. Ele é quem
controla o quê, quando e como o aluno deverá aprender e, ainda qual será
a qualidade desta aprendizagem, uma vez que ele acredita deter o
verdadeiro conhecimento, que deverá ser transmitido ao aluno aos poucos,
de forma linear e também hierarquizada (SILVA, M. 2003, p. 3).
Apesar dessas considerações que apresentam uma perspectiva ditatorial do ensino,
nenhum professor pode deixar de ensinar seus alunos. O ensino faz parte do ofício
do professor. Sempre haverá necessidade de explicar os conteúdos de modo que os
alunos possam entender e colocá-los em prática. Porém, o professor não pode se
limitar a explicar e transmitir informações. Seu compromisso também é com o
aprendizado do aluno e neste sentido o professor deve estar ciente que o ensino
se concretiza com o aprendizado do aluno, até porque, quem ensina, ensina algo a
alguém e o seu significado se completa com a aprendizagem. Portanto, o professor
não deve abandonar a preocupação com o saber formal e cienfico, contanto que
esta preocupação não seja, como diz Silva M., “uma prisão ou amarras da
inventividade, da criatividade, da emergência da novidade, da discussão, do
estabelecimento de relações” (2003, p. 4).
Na aprendizagem por projetos, segundo Fagundes et al. (1999), a
formulação das questões, a temática, são escolhidas pelo autor do projeto, pelo
sujeito que vai construir o conhecimento. Nesta perspectiva, o aluno não é uma
tábua rasa e se levam em conta suas concepções prévias, construídas durante sua
vida até o presente momento. É a partir destes, que o aluno vai interagir com o
desconhecido para se apropriar do conhecimento específico que é do seu interesse.
Em projetos de aprendizagem, as dúvidas são do próprio aluno, que surgem
enquanto ele “está em atividade num determinado contexto, em seu ambiente de
vida, ou numa situação enriquecida por desafios” (FAGUNDES et al., 1999, p. 16).
Em outras palavras, as dúvidas, as curiosidades dos alunos devem ter origem nos
interesses dos alunos, nas suas histórias de vida, em seu ambiente, nas suas
condições pessoais ou numa situação desafiadora.
Depois destas considerações e levando em conta o que foi explorado
sobre a metodologia de projeto pode-se concluir que a respectiva metodologia,
privilegia uma aprendizagem por descoberta pessoal em detrimento de um saber
120
adquirido por informação vinda do professor” (LEITE e SANTOS, 2004, p. 2) [grifo do
autor]. Isto quer dizer que a ênfase se na aprendizagem do aluno, no entanto,
não se deve excluir os procedimentos de ensino. Mas para isso, o ensinar não pode
se limitar a repassar os conteúdos prontos, a transmitir informações. Como diz Leite,
“ensina-se não pelas respostas dadas, mas principalmente pelas experiências
proporcionadas, pelos problemas criados, pela ação desencadeada” (1996, p. 27).
Por estas razões
o trabalho com projetos traz uma nova perspectiva para entendermos o
processo de ensino/aprendizagem. Aprender deixa de ser um simples ato
de memorização e ensinar não significa mais repassar conteúdos prontos.
Nessa postura, todo conhecimento é construído em estreita relação com o
contexto em que é utilizado, sendo por isso mesmo, impossível separar os
aspectos cognitivos, emocionais e sociais presentes nesse processo. A
formação dos alunos o pode ser pensada apenas como uma atividade
intelectual. É um processo global e complexo, onde conhecer e intervir no
real não se encontram dissociados. Aprende-se participando, vivenciando
sentimentos, tomando atitudes diante dos fatos, escolhendo procedimentos
para atingir determinados objetivos (LEITE, 1996, p. 27).
A principal conclusão é que o ensino-aprendizagem por projetos constitui-se de
elementos que favorecem a construção do conhecimento e que a metodologia de
projeto não é compatível com a transmissão de conteúdos preestabelecidos,
descontextualizados da realidade e das vivencias dos alunos.
4.6 Levantando os benefícios do trabalho com a metodologia de projeto
Conforme esta pesquisa foi analisando a metodologia de projeto, foram
aparecendo algumas qualidades no que tange ao favorecimento do desenvolvimento
de certas competências e habilidades pelos alunos. Também despontaram outros
benefícios que a respectiva metodologia proporciona em termos de melhora na
aprendizagem do aluno e no estímulo ao envolvimento real e benéfico do educando
perante sua comunidade, a partir de desafios, necessidades, problemas e
oportunidades identificadas pelos mesmos. Enfim, são situações que, além de
oferecerem uma aprendizagem significativa, levam os estudantes a se
comprometerem com os destinos da sociedade, realçando assim, a formação para a
cidadania participativa e para a aprendizagem ao longo da vida.
121
Recorrendo à literatura apropriada, este subcapítulo vai tratar de citar de
forma direta e acrescentar outras características da metodologia de projeto que
ainda não foram expostas claramente neste trabalho.
No primeiro momento será dado destaque às citações que mostram o
favorecimento do desenvolvimento de algumas competências e habilidades que, por
sua vez, também foram identificadas nos indivíduos empreendedores
44
.
Um dos trabalhos que mais contribuem neste intento é a dissertação de
Aquiles Maciel Pires
45
. Este autor destacou algumas competências que os alunos
devem adquirir ao trabalhar com a metodologia de projeto, entre elas “iniciativa
própria, criatividade, argumentação, capacidade de síntese, de análise e de tomada
de decisão” (PIRES, 2006, p. 91).
Em termos de livro
46
, o que foi organizado por Rosamaria Andrade também
é bastante significativo para um dos propósitos desta pesquisa, razão pela qual
ganhará mais destaque adiante. Por ora, se ressalta a percepção de Andrade de
que os trabalhos com projetos “incentivam a formulação e a resolução de problemas,
a interação, a inventividade, a investigação e a globalização” (2005, p. 15). No que
se refere à globalização, esta refere-se a levar o aluno a ter um olhar mais holístico
frente ao conhecimento de forma a interpretar o mundo, a realidade, a sociedade
além das disciplinas acadêmicas.
Semelhantes capacidades apreendidas pelos alunos, através do uso da
metodologia de projeto, aparecem em trabalhos que abordam a questão da
educação profissional
47
(nestes, o desenvolvimento de competências é assunto
indispensável de discussão). Dois exemplos comprovam a conformidade em relação
44
A descrição das competências e das habilidades empreendedoras serão tema principal do subcapítulo 5.6.
45
Neste seu trabalho de pesquisa, o autor procurou mostrar, com resultados práticos, a convergência que existe
entre a Educação Empreendedora, a Metodologia de Projetos e o Protagonismo Juvenil. Esta dissertação foi
defendida em 2006, período posterior ao início da investigação deste trabalho. Diga-se de passagem, que, até o
momento, foi o único trabalho acadêmico nacional que aproximou claramente os objetos de estudo desta
dissertação.
46
O empreendedorismo na escola. Neste livro são apresentadas diferentes formas de reflexão sobre o
empreendedorismo como fator de cidadania na sociedade contemporânea e na escola, bem como sua conexão
com as intervenções formadoras dentre a qual se destaca o trabalho com projeto. Em termos de livros até o
momento publicados, este lançado em 2005, continua sendo o pioneiro e único no país a evidenciar a sintonia do
trabalho com projetos, com o tema empreendedorismo. A publicação desta obra também é posterior à pesquisa
deste autor sobre os temas empreendedorismo e metodologia de projeto, iniciada no início de 2005, mais
exatamente dentro do curso de especialização: Docência em Turismo e Hotelaria para o Ensino Superior,
realizado no Senac-SP.
47
A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no seu artigo 39, concebe a educação profissional
como “integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia”, de modo a conduzir
“ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva” (Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm> Acesso em: 5 de maio de 2008.
122
às competências que foram citadas. O primeiro
48
, inicialmente afirma que “os
projetos encerram uma concepção que prioriza a aquisição de estratégias cognitivas
de nível superior” (GONÇALVES et al., 2004, p. 52). Logo em seguida, os autores
expõem uma rie de competências as quais o trabalho com projeto contribui para
que os alunos desenvolvam.
Iniciativa (porque são os alunos que vão dirigir suas tarefas de pesquisa);
criatividade (porque eles devem buscar os recursos teóricos e práticos que
faltam para resolver a situação proposta); diagnóstico de situações (porque
eles devem analisar e avaliar as estratégias de solução implementadas);
integração (porque devem sintetizar idéias, experiências e práticas); tomada
de decisões (porque devem decidir sobre o que é relevante e deve ser
incluído no projeto); e comunicação interpessoal (porque os argumentos, a
opinião e os pontos de vista de todos devem ser contrastados e
considerados) (GOLÇALVES et al., 2004, p. 52).
No segundo
49
exemplo Barbosa et al. (2003) menciona uma série de competências e
habilidades, as quais mais da metade dos alunos desenvolveram durante o curso,
sendo estas identificadas pelos professores do mesmo. Foram amplamente
destacadas a capacidade de resolver problemas, trabalhar em equipe, aprender a
aprender e a empreender, a criatividade, e a habilidade de análise. Outras
competências como a iniciativa, liderança, capacidade de planejamento e gestão
foram citadas como possíveis capacidades que também podem ser facilitadas pela
metodologia de projeto, porém não houve resultados expressivos, em termos de
desenvolvimento, comparando com as anteriormente citadas. Também foram
ressaltadas a independência, a responsabilidade e a autoconfiança, como valores
promovidos pela metodologia de projeto.
Os trabalhos desvinculados da questão do empreendedorismo e da
educação profissional e que têm foco exclusivo na metodologia de projeto, que por
sinal são a maioria, também citam idênticas competências e acrescentam algumas
outras que são favoráveis a serem desenvolvidas via metodologia de projeto. Um
48
O primeiro exemplo é extraído de um manual do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) que
contém os referenciais para a educação profissional que serve de base para a elaboração dos projetos
pedagógicos das diferentes unidades que integram o Sistema Senac.
49
O segundo exemplo cujo título do trabalho é: Inovações pedagógicas em educação profissional, é oriundo do
estudo sobre uma experiência de professores do curso de Eletrônica que resolveram verificar a efetividade do
método de projeto na formação de competências. Tal experiência ocorreu no ano de 2002, envolveu 42 alunos de
turmas do terceiro ano do curso de Eletrônica do Colégio Técnico/UFMG (Coltec).
123
dos maiores pesquisadores da metodologia de projeto, o espanhol Fernando
Hernández, valendo-se do trabalho
50
de Jane Henry escrito em 1994, reproduziu em
seu livro as idéias desta psicóloga referente às competências estimuladas pela
metodologia de projeto. Logo abaixo se observa que são ressaltadas similares
características que os autores já citados nesta seção, posteriormente vieram a
confirmar. Verifica-se com isso uma tendência consolidadora de certas
competências que a metodologia de projeto colabora para que os alunos
desenvolvam. Aprovando as idéias de Henry, o professor Hernández (1998b, p. 49)
diz que “os projetos podem contribuir para favorecer, nos estudantes, a aquisição de
capacidades relacionadas com:” e na seqüência ele reproduz as palavras da autora.
A autodireção: pois favorece as iniciativas para levar adiante, por si mesmo
e com outros, tarefas de pesquisa; a inventiva: mediante a utilização criativa
de recursos, métodos e explicações alternativas; a formulação e resolução
de problemas, diagnóstico de situações e o desenvolvimento de estratégias
analíticas e avaliativas; a integração, pois favorece a síntese de idéias,
experiências e informação de diferentes fontes e disciplinas; a tomada de
decisões, que será decidido o que é relevante e o que se vai incluir no
projeto; a comunicação interpessoal, posto que se deverá contrastar as
próprias opiniões e pontos de vistas com outros, e torna-se responsável por
elas, mediante a escrita ou outras formas de representação (HENRY apud
HERNÁNDEZ, 1998b, p. 49).
É pertinente colocar que essas mesmas idéias são exploradas no trabalho de
Andrade, e no final da citação destas capacidades, é feito o seguinte comentário.
“Essas competências, transferidas a problemas reais, contribuem para um melhor
conhecimento pessoal e contextual, favorecendo uma formação mais flexível e
completa além de uma postura empreendedora” (ANDRADE, 2005, p. 18).
Prosseguindo com outros exemplos advindos de trabalhos focalizados
essencialmente na metodologia de projeto, Nogueira os confere, além de outras
possibilidades,
como mecanismos que podem propiciar a autonomia, neste exato sentido
da palavra, ou seja, de que o aluno não fique à mercê da potência do
professor no ato de planejar suas ações, vontades e necessidades. Que
50
As idéias presentes no trabalho foram publicadas no livro: Teaching through projects. Londres: Koogan Page,
1994.
124
exerça sua independência de pensar, planejar e agir de forma livre, de
acordo com suas próprias concepções e opiniões. [...] Essa autonomia que
tende a propiciar o livre pensar e agir poderá desenvolver no aluno a
capacidade de, no futuro, continuar aprendendo, buscando soluções,
desenvolvendo novos conhecimentos, independente de ter um tutor
demonstrando os passos e os caminhos de um processo (2005b, p. 47).
Mais adiante, no mesmo trabalho, Nogueira sintetizou algumas das
vantagens decorrentes do uso da metodologia de projeto. Para este autor, esta
opção metodológica pode “auxiliar no desenvolvimento da autonomia, da
criatividade, das relações interpessoais e do espírito de cooperatividade, da
facilidade de aceitar desafios, resolver problemas, estabelecer conexões, etc”.
(2005b, p. 53).
Embora a próxima citação tenha aparecido neste trabalho, ela não pode
ficar de fora desta seção pela total pertinência com o presente assunto tratado.
Moura e Barbosa revelam que existe uma estreita relação entre o trabalho com
projetos e uma formação ampla de competências, tais como a
promoção do trabalho cooperativo, articulação do trabalho em rede,
estímulo ao empreendedorismo, realização de aprendizagem
contextualizada e significativa, capacitação para identificar, equacionar e
resolver problemas relevantes, estímulo à criatividade, comunicação etc.
(2007, p. 31).
Algumas competências e habilidades são adquiridas pelos alunos, através
da metodologia de projeto, porém outras são despertadas, isto é, acredita-se que
estão presentes nos indivíduos, mas se encontram adormecidas. A colocação de
Oliveira e Ventura aborda esta questão.
O trabalho com projetos potencializa habilidades muitas vezes aprisionadas
no cotidiano de aulas expositivas, no livro (ou apostila) didático, nas
avaliações por provas e exercícios. Os alunos aprendem a ser gestores,
comunicadores, construtores, pesquisadores, autônomos e responsáveis no
seu processo de aprendizagem (2005, p. 25).
125
Outra contribuição que cita algumas capacidades e também manifesta uma
aproximação com a idéia de que o aluno tem oportunidade de conhecer melhor suas
potencialidades internas e desenvolvê-las, foi escrita por Schlemmer.
A metodologia de projetos de aprendizagem baseados em problemas
poderá ser uma porta que permitirá: aproximar-se da identidade dos
estudantes; evidenciar e desenvolver talentos; favorecer o desenvolvimento
de concepções humanísticas; desenvolver a cooperação, comunicação,
autonomia, criatividade, senso crítico (2001, p. 16).
A próxima colaboração vem de Regina Scarpa, que em 2001 trabalhou como
coordenadora geral do Centro de Estudos e Documentação para ação Comunitária,
em São Paulo. Na entrevista concedida à Revista Nova Escola, ela garante que
trabalhar com projetos
significa dar aos alunos a oportunidade de aprender a fazer planejamentos
com o propósito de transformar uma idéia em realidade. Significa, ainda,
ensinar formas de elaborar cronogramas com objetivos parciais, nos quais o
trabalho em direção aos objetivos finais é avaliado permanentemente de
modo a corrigir erros de processo ou mesmo de planejamento. Alunos que
planejam e implementam projetos, aprendem a analisar dados, considerar
situações e tomar decisões (2001, p. 2).
Uma última citação das competências e habilidades que são promovidas e
que, algumas delas, concomitantemente, estão presentes em indivíduos
empreendedores, é retirada do comentário de Paula Correia.
Recorrendo à utilização do estudo por projectos centrados em problemas,
consegue-se fugir ao pré-fabricado, à artificialidade da escola, promovendo
simultaneamente o desenvolvimento do senso crítico, da dúvida sistemática,
da capacidade de auto e hetero-avaliação, do sentido de responsabilidade,
capacidade de iniciativa, de inovação, da cooperação e autogestão
(CORREIA in LEITE, MALPIQUE e SANTOS, 1993, p. 28).
126
Uma obra
51
que não trata exclusivamente da metodologia de projeto,
menciona algumas das mesmas competências e habilidades até agora
apresentadas. O apontamento que se faz desta obra se em virtude de o livro
compilar inúmeros métodos de ensino, de modo que o estudo representa uma
análise pontual e descompromissada de valorizar a metodologia de projeto em
relação aos outros métodos, assim como, não se preocupa em ressaltar suas
vantagens para que se faça uso desta em determinadas ocasiões. Portanto, mesmo
desvinculada destas preocupações, vai se perceber semelhantes capacidades que
se aproximam daquelas presentes nos empreendedores. Conforme Nérici (1981),
através dos projetos, se estimula a iniciativa, a autoconfiança, o senso de
responsabilidade, o pensamento criativo, a cooperação, a capacidade de
observação para melhor utilizar informes e instrumentos e também se procura
convencer o educando de que ele pode realizar seus propósitos, dando
oportunidade assim, para que os alunos comprovem suas idéias por meio da
aplicação das mesmas.
De acordo com o enunciado inicial desta seção, os benefícios provenientes
da utilização da metodologia de projeto vão além destas competências e habilidades
que foram apresentadas. Eles se estendem também para a aprendizagem do
discente e para a formação de alunos solidários, com visão global da realidade, com
espírito crítico-reflexivo e cientes de que são capazes de transformar a realidade em
que vivem.
Parte do que acima foi colocado aparece evidenciada no trabalho de
Hernández. Segundo este autor, é proposta do trabalho com projetos “formar
indivíduos com uma visão mais global da realidade, vincular a aprendizagem a
situações e problemas reais, trabalhar a partir da pluralidade e da diversidade,
preparar para aprender toda a vida...” (1998b, p. 49).
No que tange à questão do aprendizado, Simões (2005) diz que além de
proporcionar uma aprendizagem em tempo real e diversificada e favorecer a
construção da autonomia e da autodisciplina, o trabalho com projetos, pode tornar o
processo de aprendizagem mais dinâmico, significativo e interessante ao aluno,
deixando de existir a imposição dos conteúdos de maneira autoritária. A partir da
escolha do tema, o educando realiza pesquisas, investiga, registra dados, formula
51
Metodologia do ensino: uma introdução. São Paulo: Atlas, 1981.
127
hipóteses, tornando-se sujeito do seu próprio conhecimento. Em vista disso, como
foi bem percebido por Santos, “o aluno traz dúvidas, questões, observações,
afirmativas em relação ao que buscou; fica mais ousado para desafiar e mostrar seu
potencial na construção do conhecimento” (2006, p. 62). Compatibilizando com
essas idéias Hernández informa que “os projetos geram um alto grau de
autoconsciência e de significatividade nos alunos com respeito à sua própria
aprendizagem” (1998a, p. 72).
A pesquisa de Domingues deu grande destaque à questão do ensino-
aprendizagem através de projetos e, da mesma forma, a autora concluiu que a
“aprendizagem por projeto possibilita a apreensão daquilo que tem significado, pois
essa construção implica um ‘fazer contínuo’ que desperta interesse e possibilita
experiências” (2006, p. 42). Por esta razão, prossegue Domingues, “o ensino-
aprendizagem por projeto permite ao aluno interessar-se pelo trabalho escolar, ao
propor-lhe questões que possam conectá-lo com o mundo fora da escola” (2006, p.
45). E também porque “aproxima teoria e prática numa abordagem emancipatória,
favorecendo a contextualização e a flexibilidade dos conteúdos escolares”
(DOMINGUES, 2006, p. 68). Isso tudo, segundo Domingues, é o que possibilita com
que os alunos tenham “oportunidades de contribuir e sentir-se responsáveis pelo
desenvolvimento de novas capacidades” (2006, p. 49).
Considerando as vantagens levantadas, mas avançando em direção aos
efeitos na comunidade e no estímulo da cidadania, Magalhães comenta que a
metodologia de projeto “além de oportunizar a vivência da pesquisa, do ensino e da
extensão simultaneamente, revela-se um excelente instrumento não apenas para a
inserção da universidade nos problemas comunitários, mas para a construção da
cidadania” (2004, p. 137). Em outro momento esta autora volta a enfatizar essas
idéias, afirmando que “os seus benefícios extrapolam, em muito, as fronteiras da
universidade, porque alcançam o social [...] e, sobretudo de formar o cidadão na e
para a comunidade, colocando em prática o binômio ação-reflexão freireano” (2004,
p. 136).
Uma última colaboração de Magalhães, ao tema desta seção, valoriza ainda
mais algumas capacidades mencionadas e destaca o contraste que elas
representam ao que hoje prevalece em algumas instituições de ensino superior. Nas
palavras de Magalhães isso significa que,
128
se observarmos os pontos basilares da metodologia explicitada, veremos
que vão de encontro com o cotidiano do ensino superior que é oferecido nas
universidades brasileiras. O ensino por projeto de trabalho preza o aprender
a aprender, a criatividade e a autonomia, enquanto os currículos atuais
continuam a priorizar o acúmulo de conhecimento, a repetição de fórmulas e
a conformação aos modelos apresentados no material didático (2004, p.
45).
As duas próximas colocações conseguem reunir boa parte das idéias até o
momento ilustradas sobre as vantagens do trabalho com projeto. Referindo ao
aprender com projetos, os autores dizem que,
a compreensão desenvolve-se de forma natural e progressiva. Uma nova
relação dinâmica entre prática e teoria, entre o sensível e o inteligível, entre
saberes sociais e saberes escolares. Nesta perspectiva é o indivíduo que
constrói o seu próprio saber, ele tem um papel activo no processo de
aprendizagem, desenvolve-se, cresce na possibilidade de pôr à prova as
suas potencialidades, antecipa suas acções, projecta-se no futuro. Os
indivíduos tornam-se mais atentos, críticos, confiantes e exigentes em
relação a si, aos outros e à realidade envolvente, mais capazes de intervir
socialmente (LEITE, l; MALPIQUE, M; SANTOS, M. 1991, p. 81).
A citação de Correia expõe que,
além deste método contribuir para o acréscimo de informações ao nível
cognitivo, contribui também, e em larga medida, para auxiliar o aluno a
(re)descobrir, quer aquilo que tem dentro de si, quer aquilo que o rodeia.
Assim, o estudo por projecto centrado em problemas surge como uma
forma de levar o estudante a agir sobre a informação, integrá-la nos seus
conhecimentos anteriores, reestruturando-a, levando-o, também, a pensar
criticamente, trabalhar em equipa, resolver problemas, emitir juízos de valor,
comunicar, questionar e questionar-se de acordo com as suas experiências,
motivações e necessidades (CORREIA in LEITE, MALPIQUE e SANTOS,
1993, p. 28).
Foi deixada por último uma listagem que faz um apanhado de alguns dos
benefícios decorrentes do uso da metodologia de projeto e que acaba ratificando os
comentários ilustrados nesta seção. A listagem feita por Leite e Santos (2004, p. 7)
menciona, com verbos de ação, os seguintes benefícios da metodologia de projeto.
desenvolver capacidades investigativas;
129
compreender relações dialógicas entre teoria e prática;
desenvolver capacidades de trabalho em grupo e de compreensão das
dinâmicas grupais;
despertar e desenvolver características de criatividade;
experienciar metodologias de resolução de problemas;
desenvolver processos de autonomia individual e de grupo;
sensibilizar a contextualização social e interdisciplinar dos problemas
desenvolver relações de solidariedade e competências de participação social;
implicar os alunos numa metodologia de avaliação reguladora;
contribuir para a construção de novas relações entre professores e alunos,
alunos entre si, com a escola, com a comunidade.
Não se pode deixar de mencionar a paridade da metodologia de projeto em
relação às aprendizagens recomendadas pela UNESCO
52
, para a educação do
século XXI que são, aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e
aprender a conviver (DELORS, 1999). Autores como Behrens, M. (2006), Santos, G.
(2006), GARCIA, L. (2006), manifestam essa convergência em seus trabalhos. Esta
última autora declara que os alunos aprendem a aprender, procurando informações
e buscando solução de problemas. Aprendem a fazer, tomando decisões e
colocando em prática os projetos planejados. Aprendem a conviver, pois os projetos
sempre envolvem trabalhos colaborativos, decisões conjuntas, divisão de tarefas.
Aprender a ser, tornando-se capazes de elaborar e construir o seu próprio projeto de
vida (GARCIA, 2006).
4.7 Dificuldades e críticas
Ao longo das exposições a respeito da metodologia de projeto, muitos
questionamentos e críticas sobre a mesma podem ter acometido o leitor. Por maior
o esforço que seja feito, não se pode abordar todos eles, pois algum detalhe sempre
corre o risco de não ser explorado tendo em vista a múltipla formação e experiência
dos diferentes leitores que possam contemplar este trabalho. Ciente que haverá
muitas lacunas sobre o que se propõe a falar neste subcapítulo, mas tentando
abordar boa parte das questões desta seção, procurou-se compilar as dificuldades e
52
United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura).
130
críticas que apareceram com maior freqüência entre as obras consultadas nesta
pesquisa.
Desconsiderando algum atributo de peso em termos de maior ou menor
dificuldade, as citações que são feitas seguiram uma ordem aleatória, isto é, não
significam que elas apareceram de acordo com um grau de dificuldade crescente ou
decrescente. Outra observação que se faz é que as dificuldades e críticas que são
mencionadas acompanham breves contra-argumentos extraídos, grande parte,
deste mesmo trabalho. Justamente para não se tornar muito repetitivo é que eles
são sucintos, pois com base no que foi colocado ao longo desta pesquisa, se pode
identificar, em determinadas ocasiões, numeráveis contra-argumentos às críticas e
dificuldades apontadas.
Conforme o estudo de Santos, vários professores declaram que existem
fatores que inibem a prática da metodologia de projeto, como “o fato de os alunos
estarem acostumados a um modelo tradicional de ensino e apresentarem de início
certa resistência a uma forma nova de aprender” (2006, p. 67). Tal resistência está
bastante ligada à costumeira comodidade de o aluno receber do professor as
informações prontas e resumidas, como também, da tradicional maneira quantitativa
de avaliar, que exige essencialmente a capacidade de pia e de memorização do
discente. E numa proposta educativa com base na educação pela ação e pela
avaliação processual, como é a metodologia de projeto, é exigida uma postura
bastante ativa e participativa do aluno, o que acaba inicialmente ocasionando uma
relutância dos discentes em função da considerável diferença de atitude demandada
e igualmente, pela resistência natural que existe em processos de mudança. E
também como diz Domingues (IN LEITE, MALPIQUE e SANTOS, 1993, p. 24), “os
educandos que se vêem de repente entregues a si mesmos, depois de longos anos
de ensino tradicional, sentem-se um pouco desorientados”. Exatamente por essas
considerações é que antes mesmo de se iniciar um trabalho com projetos este deve
ser discutido e detalhado entre os professores e alunos. Esta preocupação é tão
importante que Behrens (2006) chega a incluí-la como uma fase
53
da metodologia de
projeto a qual denominou de Discussão do projeto. Nesta etapa a intenção é
explicitar bem a proposta do trabalho com projetos, dizer o que ela exige de cada
um, descrever como será feita a avaliação, abrir espaço para discussões, críticas,
53
Todas as fases da metodologia de projeto sugeridas por Behrens aparecem no quadro 03.
131
sugestões, de modo que as resistências dos alunos diminuam. Compartilhando
dessas idéias Domingues coloca que
enquanto o trabalho de projecto não for deveras um trabalho interdisciplinar,
enquanto não se definirem bem os papéis e, no melhor sentido, enquanto
não se contemplarem as horas necessárias nos horários para a sua
execução, os professores continuarão a deparar com rostos insatisfeitos e
palavras de revolta (IN LEITE, MALPIQUE e SANTOS, 1993, p. 26).
E de acordo com Santos depois que o aluno
entende o que é e como funciona a metodologia, isso se torna um fator de
facilitação. A flexibilidade da instituição também ajuda de forma significativa.
Além disso, o conhecimento prévio da metodologia pelo professor e
estudantes e dos recursos adequados para a realização das atividades é
imprescindível. Acrescentamos, por último, o fato de existir o desejo de
mudar. Sem o desejo de mudança, não se consegue utilizar uma
metodologia diferenciada (2006, p. 68).
Apenas para que fique claro, o desejo de mudar deve partir do professor, que vai
propor o trabalho com projetos, mas também é importante que o aluno esteja
disposto a mudar. Conforme descrito neste trabalho, isto pode ser facilitado pelo fato
das atividades serem organizadas em função das experiências, motivações,
expectativas e interesses dos alunos, como também a procedência dos conteúdos
se originarem dos desejos, sonhos, necessidades e oportunidades identificadas
pelos alunos. Mas mesmo diante disso, não se pode garantir a adesão imediata de
todos os alunos tendo em vista que, conforme descreve Behrens, alguns alunos
“mantêm suas convicções conservadoras, por comodidade, por não entenderem ou
por não gostarem da proposta” (2006, p. 127).
Com relação à escolha do tema do projeto partir dos próprios alunos, as
críticas que se fazem a respeito são devidas ao risco que se corre de não serem
tratados os assuntos necessários a uma educação relevante (PIRES, 2006). No
trabalho de Pires encontra-se uma crítica bem detalhada sobre isso.
132
Tal crítica é tão antiga quanto aguda, quando se pensa na própria
concepção do trabalho com projetos. Porém, percebe-se seu cunho
apologético, na defesa velada da linearidade curricular e de concepções
conteudistas de ensino. Reflete-se, também, na assertiva que há certa
demanda por “segurança” por parte dos professores e professoras, que
preferem organizar seus trabalhos escolares a partir dos índices dos livros-
texto; e, por parte das famílias, que esperam que o programa mínimo
necessário para que seus filhos e filhas façam vestibulares seja cumprido
pela escola. A crítica tem sua validade, e exige que se mantenha alerta e
zeloso em todo o processo de acompanhamento e avaliação. Mas, é
plausível argumentar que tal crítica mantém o foco na parte e o no todo
(PIRES, 2006, p. 96).
E justamente quando se criam condições para a interdisciplinaridade, como
é o caso da metodologia de projeto, se almeja levar os alunos a observarem as
conexões existentes entre as disciplinas e não exatamente a estudarem
isoladamente os aspectos pontuais de cada conteúdo, de modo que não seja
possível ver a interligação das matérias. Na realização dos trabalhos com projetos,
não existem maiores preocupações em respeitar rigorosamente a linearidade dos
conteúdos, até porque eles não estão pré-determinados. Ainda pode-se dizer que
não se trata de organizar projetos em detrimento dos conteúdos disciplinares, mas
antes, de gerar nos alunos a necessidade de aprendizagem através dos projetos, ou
como diz Leite, “o desenvolvimento de projetos, com o objetivo de resolver questões
relevantes para o grupo, vai gerar necessidade de aprendizagem; e nesse processo,
os alunos irão se defrontar com os conteúdos das diversas disciplinas” (1996, p. 29).
Mas há que se ressaltar que
por mais vantagens que possamos enxergar no projeto, ele ainda pode não
dar conta de tudo que precisamos, ou seja, alguns conteúdos necessários
ou aprofundamentos podem não emergir durante o processo de trabalho.
Neste sentido é o professor que deverá realizar um fechamento,
contribuindo com os tópicos que julgar relevantes e que não foram tratados
no projeto (NOGUEIRA, 200b, p. 69).
Também se comenta segundo Burnier (2001), sobre o foco dado
essencialmente no desenvolvimento de competências e da superficialidade das
informações acessadas pelos alunos sem a correta fundamentação científica.
Novamente aqui, cabe ao professor dar a orientação prévia sobre os procedimentos
da pesquisa e acompanhar atentamente os passos dos alunos, intervindo e
133
orientando sempre que julgar necessário, ou seja, quando perceber que “alguns
tópicos estão sendo tratados com superficialidade, que algumas investigações estão
incompletas, que algumas atividades planejadas pelos alunos podem ser mais
aprofundadas e melhor elaboradas, etc.” (NOGUEIRA, 2005b, p. 69). Além disso, o
professor deve dar conta da avaliação dos alunos que ocorre de forma processual,
ou seja, o todo tempo, do início ao final do projeto. Em virtude destas questões é
que Santos escreve um comentário ressaltando as dificuldades do trabalho docente.
“Utilizar a metodologia de ensino por projeto é um desafio. Esse trabalho é mais
difícil, porque o professor subsidia o estudante o tempo todo, acompanha o a
produção da atividade prática, mas também a produção escrita” (2006, p. 63).
Agregando a esta última citação, a exemplificação que Cortesão et al. colocou em
seu livro traz a opinião de alguns professores quanto às dificuldades com a
avaliação proferida pela metodologia de projeto.
É muito difícil avaliar um trabalho realizado colectivamente. Ou se avalia o
produto e não se discriminam as contribuições de cada um, ou se avalia o
modo como cada um trabalhou e destrói-se “por dentro” a equipa, cujos
elementos passam a competir em vez de colaborar (CORTESÃO et al.,
2002, p. 53).
Em vista dessas dificuldades é que foram sugeridas o uso das fichas de observação,
do portfólio, da auto-avaliação dos alunos, instrumentos esses que visam auxiliar e
ajudar bastante as tarefas de avaliação do professor e de auto-avaliação dos
próprios alunos.
Os problemas de relacionamento entre os alunos que estão trabalhando em
grupo e a falta de comprometimento e responsabilidade dos colegas com o trabalho
representam outras dificuldades identificadas pelos professores. Muitas vezes,
quando surgem conflitos, alguns alunos podem a ser isolados por membros do
próprio grupo. Nessas horas, o professor deve estar atento para intervir no sentido
de reforçar a importância do espírito de equipe e da necessidade do empenho
coletivo para o projeto ter êxito. Por outro lado, nem sempre os educadores estão
preparados para resolver os conflitos que surgem. O professor Risso explora um
pouco mais essas questões. Para ele,
134
gerir esses conflitos é um desafio para os professores e para os próprios
alunos. Em geral, embora citado, isso não é focado devidamente na escola,
fazendo parecer que se trata de questões pessoais, o que lava os grupos a
se desmembrarem, chegando-se ao isolamento de certos alunos,
postergando ou sumariamente inviabilizando o debate, a problematização, a
negociação como lugar de argumentação, avaliação e validação,
pressupondo conflitos, espaços de concessão e intercompreensão (2005, p.
57).
De acordo com Pires (2006), outro aspecto que recebe várias críticas é
quanto à satisfação dos participantes no projeto. Esclarecendo este ponto, Pires diz
que
se o tema a ser trabalhado ficar sujeito à escolha individual, o professor terá
tantos projetos em sala quanto alunos. Se for de escolha por grupos de
alunos, corre-se o risco do professor ter de administrar alunos que não
gostariam de trabalhar com o tema escolhido pelo grupo. Outra
possibilidade seria a do tema único por turma. Nesse caso, aumentaria
consideravelmente o número de alunos insatisfeitos o que acarretaria
dificuldades maiores para o professor ao nivelar o ritmo dos alunos durante
as etapas do desenvolvimento do projeto (2006, p. 96).
Este obstáculo da insatisfação começa a ser vencido ainda na apresentação que o
professor fará, da proposta de se trabalhar com projetos, e principalmente com a
mobilização para os alunos desenvolverem numerosas habilidades e competências
em beneficio próprio, mas também com a consciência de que seus esforços trarão
benefícios à comunidade em que vivem. Em outras palavras, os professores devem
fazer os alunos vislumbrarem que podem ser agentes transformadores da sua
realidade, devem chamar os alunos para enfrentarem um desafio real, para
resolverem ou amenizarem um problema da sua realidade enfim, despertar o
reconhecimento de que juntos os alunos podem mudar, podem causar
transformações que repercutirão significamente na vida deles e das outras pessoas.
Como diz Magalhães o trabalho com projeto
tem como principal efeito pedagógico desenvolver no aluno a auto-estima e
a capacidade de transformar a realidade em que vive, dando lhe a certeza
de que “pode fazer”, de que é capaz de assumir a sua cota de
responsabilidade pelo bem-estar da comunidade (2004, p. 15).
135
Entende-se que a metodologia de projeto implica um trabalho motivador para
o aluno pelo fato de ser desafiador, estar vinculado ao contexto da vida real do
discente, entre outras questões que foram apontadas. Mas, “se por um lado é
mais motivante, por constituir uma aprendizagem activa, torna-se, por outro lado, um
fardo, por exigir maior tempo de trabalho e entrega do educando” (DOMINGUES, IN
LEITE et al., 1993, p. 25). Outro exemplo ainda mais enfático foi dito por Arfwedson.
Segundo este autor, o trabalho com projeto
exige na prática mais tempo do que o ensino tradicional. [...] exige maiores
períodos de tempo consecutivos e, muitas vezes, uma maior intensidade de
trabalho por parte dos estudantes. O maior grau de auto-gestão maior
motivação, mas exige também outro tempo e empenhamento que o estudo
mais rotineiro não exige (in LEITE, MALPIQUE e SANTOS, 1993, p. 22).
A questão da dificuldade relacionada com o tempo também está ligada ao fato de
que a metodologia de projeto
disputa na sala de aula os tempos de desenvolvimento dos conteúdos do
plano de trabalho (construção de conceitos, conhecimentos, habilidades),
cedendo espaço para o tratamento da organização, da gestão dos projetos,
da orientação do trabalho de pesquisa bibliográfica e de campo de cada
projeto bem como dos recursos metodológicos aplicáveis a cada caso
(RISSO, 2005, p. 66).
De fato, esta exigência de um longo período de tempo requerida aos projetos é uma
questão a ser discutida com a coordenação pedagógica, com os professores e com
os alunos. Se todos quiserem realmente organizar um processo significativo de
aprendizagem através da metodologia de projeto, é muito provável que todos os
envolvidos encontrem a melhor forma de se organizarem para isso. Foi com base no
diálogo, na capacidade de saber ouvir, na capacidade de negociar, de saber
estabelecer relações, no desejo de querer mudar, que muitos projetos foram
realizados com êxito. Risso ainda acrescenta que não pode faltar flexibilização ao
cumprimento da grade escolar e dos planos de ensino, sendo que este último, na
visão deste autor, “ainda é demasiado regulado pelos fins formativos de cada
136
escola, regulação que deposita em alguns conhecimentos uma importância
inquestionável e que relega outros à marginalidade” (2005, p. 66).
E sobre a questão da maior sobrecarga de trabalho dos alunos Behrens faz
a seguinte leitura.
Acredita-se que esta colocação tem duas maneiras de ser analisadas: por
um lado, é bom que os alunos se sintam exigidos; por outro, precisam
avaliar se os professores não exageram na leitura e nas exigências de
produção de conhecimento. Na realidade, os alunos, de maneira geral,
acostumados a copiar e participar de aulas expositivas, sentem num
primeiro momento as exigências de participação no processo. No decorrer
do projeto, os alunos começam a perceber que as atividades propostas têm
pertinência e que o trabalho, embora apresente sobrecarga, converte-se em
aprendizagem (2006, p. 126).
Não se pode negar, conforme Cortesão et al. (2002), que a ligação entre a
intenção de se fazer algo e a realização não é tarefa simples e a recusa de ações
organizadas
conduz, muitas vezes, apenas à utopia e a concentração exclusiva na
organização ameaça a própria acção pela perda do sentido, tal como
acontece nos programas puramente tecnocráticos e nas concepções
uniformizantes de currículo, em que professores e alunos são estimulados a
cumprirem apenas o que outros prescrevem, mesmo que para eles tenha
pouco sentido. Estas devem ser também preocupações que nos orientam
quando pensamos qualquer projecto educativo e quando desenvolvemos
(CORTESÃO et al., 2002, p. 27).
Também é verdade, como comenta Behrens, “a realização de projetos ao longo da
aprendizagem pode assumir rotinas que pode torná-lo desinteressante e repetitivo”
(2006, p. 128). Mas isso pode ser contrabalançado pelo fato dos projetos trazerem
consigo uma dose de incerteza, de manifestarem um espírito de aventura, da
possibilidade de imprevistos, de se correr riscos, e da expectativa de êxito na
realização da meta estipulada, elementos esses que estimulam a ação, a
criatividade e despertam a atenção das pessoas que estão envolvidas com o projeto.
Muito pertinente é a indagação que Magalhães faz sobre a necessidade do
trabalho com projeto contar com a colaboração e ajuda não da instituição de
137
ensino, como também, das pessoas da comunidade e de possíveis parceiros da
iniciativa social e particular. Esta autora questiona,
até que ponto é possível motivar as parecerias com a comunidade e com os
demais órgãos públicos e privados. Mesmo dentro da própria universidade,
as parcerias o um desafio, atravancadas por uma estrutura administrativa
que divide, compartimentaliza, segrega e petrifica alunos e professores
(2004, p. 137).
A própria Magalhães é que sugere saídas para estas questões a começar pelo
reconhecimento da necessidade de aprender a concretizar parcerias. Outras
recomendações desta autora são para a necessidade de, em curto prazo,
repensar a administração da universidade, as formas de concepção de
pesquisa, ensino e extensão, para que tenhamos uma universidade mais
participativa. Do mesmo modo, é preciso repensar a grade curricular dos
cursos de graduação, objetivando criar espaços para a realização de
projetos de resultado, possibilitando a participação de todos os alunos neste
tipo de atividade, em pelo menos um projeto durante sua passagem pela
universidade (2004, p. 133).
Não restam dúvidas que dificuldades sempre vão aparecer e que elas não
são poucas. Para enfrentá-las, há necessidade de capacitar o professor para que ele
saiba conduzir o trabalho com projetos de forma exitosa. E, por conseguinte, que
consiga, em parceria com seus colegas de profissão e contando com o interesse dos
educandos, fazer com que esta metodologia alcance seus propósitos, dentre os
quais se destacam, a construção de um ambiente cooperativo dentro e fora da sala
de aula, para que as decisões coletivas e os compromissos assumidos garantam o
exercício e o estímulo da cidadania e da democracia. Que se resgate o sentido
social do trabalho acadêmico realizando transformações que proporcionem
resultados imediatos e visíveis na comunidade. Que incite o engajamento do aluno
em projetos sociais, assim como, que seja facilitado o desenvolvimento de
competências e habilidades dos estudantes, além de estimular o aprender a
aprender, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver. Enfim, que sejam
138
criadas condições no qual o aluno sinta prazer em estudar e construir um espaço
significativo de aprendizagem.
Um outro fechamento a esta seção reforça e acrescenta detalhes que visam
indicar medidas a serem levadas em consideração, para que o uso da metodologia
de projeto atinja seus objetivos educacionais.
Os benefícios do método, para serem potencializados, precisam de amplo
suporte, que abrange, dentre outros fatores: trabalho docente cooperativo,
organização flexível do currículo, disponibilidade de variadas fontes de
informação, disponibilidade de um mínimo de recursos necessários aos
projetos, desenvolvimento de trabalho discente coletivo, envolvimento
pessoal (do professor e aluno) com o projeto e a utilização de instrumentos
de avaliação formativos (BARBOSA, E; GONTIJO, A; SANTOS, F. 2003, p.
12).
139
5 O EMPREENDEDORISMO
5.1 A evolução do empreendedorismo e as diferentes concepções de empreendedor
O que se percebe em relação à bibliografia existente sobre
empreendedorismo é que esse campo de estudo
54
possui uma grande diversidade
conceitual. Filion (2000a) atribui esta variedade de concepções à existência de
diferentes correntes de pensamentos que pesquisaram o tema. No entanto, dentre
as diversas definições apresentadas, o campo do empreendedorismo pode ser
considerado como aquele que estuda o empreendedor. Uma das constatações deste
entendimento aparece nas palavras de Dolabela: “Empreendedorismo é um
neologismo derivado da livre tradução da palavra entrepreneurship e utilizado para
designar os estudos relativos ao empreendedor, seu perfil, suas origens, seu
sistema de atividades, seu universo de atuação” (1999, p. 43).
Com relação à palavra “empreendedor” ou entrepreneur”, conforme
Dornelas (2005), ela teria origem francesa e quer dizer aquele que assume riscos e
começa algo novo. Mas é possível verificar na literatura a existência de outras
definições do termo. De acordo com Filion (1998), os economistas, os quais seriam
os pioneiros no estudo do empreendedorismo, associaram o empreendedor à
inovação. Destacam-se nesta corrente três economistas que tiveram importante
papel para o desenvolvimento do empreendedorismo. São eles Cantillon, Say e
Schumpeter. Atribui-se ao irlandês, do século XVIII, chamado Richard Cantillon, o
primeiro uso do termo “empreendedor” no contexto empresarial. Para Cantillon
(apud Filion, 2000a, p. 17) “o empreendedor era aquele que comprava matéria-prima
por um preço certo para revendê-la a preço incerto”. Observa-se nesse conceito a
existência do risco assumido. A questão da inovação aparece no momento em que
ocorrer o lucro além do esperado, pois isso significa, no entendimento de Cantillon,
que o empreendedor havia inovado, isto é, fizera algo de novo e de diferente.
Como concepção inicial sobre o empreendedor, tanto a idéia de inovação,
quanto a de assumir risco, manifestam-se ainda hoje serem pertinentes e bastante
associadas à figura do empreendedor.
54
O empreendedorismo ainda não possui método próprio de pesquisa, seus objetos de estudo não apresentam
limites definidos, seus paradigmas continuam em fase de desenvolvimento e nenhum consenso foi alcançado
para considerar a construção teórica da disciplina. Deste modo, ele deve ser visto como um campo de estudo,
muito embora receba o nome de disciplina.
140
Um século depois, em 1803, o economista francês Jean Baptiste Say foi o
primeiro a definir as fronteiras entre o empreendedor aquele que assumia riscos -
do capitalista aquele que fornecia o capital. Por esta diferenciação estabelecida,
Say, no século XX, foi identificado como o pai
55
do empreendedorismo. Para este
economista, o empreendedor é aquele que (apud Drucker, 2003, p. 27), “transfere
recursos econômicos de um setor de produtividade mais baixa para um setor de
produtividade mais elevada e de maior rendimento”. Novamente trata-se de uma
visão centrada nos negócios. Aqui, o economista atribui ao empreendedor o fato de
gerar e produzir bens e, mais uma vez, aparece a questão de assumir riscos,
conseqüência da atividade de transferir recursos econômicos de um setor para
outro. Mas, segundo Filion (2000a), a consolidação do empreendedorismo ocorreu
por volta de 1911, graças ao economista austríaco Joseph Schumpeter que foi
responsável por associar definitivamente o empreendedor ao conceito de inovação e
também por vê-los claramente como promotores de mudanças. Para Schumpeter
(apud Dornelas, 2005, p. 39), “o empreendedor é aquele que destrói a ordem
econômica existente pela introdução de novos produtos e serviços, pela criação
de novas formas de organização ou pela exploração de novos recursos e
materiais” Esta concepção, apesar de ser uma das mais antigas, é uma das que
melhor descrevem o empreendedor, na opinião de Dornelas. Esta valoriza o aspecto
da criação de novos negócios e também o processo de inovação dentro de um
negócio existente. Por outro lado, trata-se de uma concepção bastante limitada,
cujo enfoque da figura do empreendedor é basicamente voltado para os negócios,
como se este fizesse parte exclusivamente da área administrativa.
Apesar destas valiosas colaborações dos economistas sobre o estudo do
empreendedorismo, segundo Filion (1998), os empreendedores aparecem muito
pouco mencionados nos modelos clássicos de desenvolvimento econômico. Uma
das críticas que se apontam aos economistas é a incapacidade para criarem uma
ciência do comportamento econômico dos empreendedores. “Os economistas
resistiram em aceitar modelos não-quantificáveis demonstrando claramente os
limites desta ciência para o empreendedorismo” (FILION, 1998, p. 3). Este fato foi
um dos elementos que levou o estudo do empreendedorismo a guinar para o
55
Esta identificação, de acordo com Dolabela (1999, p. 48), foi atribuída por um dos maiores pesquisadores
missioneiros e doutores da área, o canadense Louis Jacques Filion.
141
comportamentalismo em busca de conhecimentos mais aprofundados sobre o
comportamento do empreendedor (FILION, 1998).
Os comportamentalistas
56
dominaram a área do empreendedorismo desde
os anos 1970 até meados dos anos 1980. Esta corrente, comenta Dolabela (1999),
enfatizava aspectos atitudinais, como a criatividade e a intuição. Seus estudiosos
tentavam entender as razões que levam uma pessoa a empreender, queriam definir
as características dos empreendedores e pretendiam estabelecer cientificamente um
perfil psicológico do empreendedor. Mas os resultados obtidos das inúmeras
pesquisas não conseguiram estabelecer, até hoje, esse perfil buscado e nem chegar
a um consenso sobre as características empreendedoras. Além de alguns
resultados mostrarem-se diferenciados e também contraditórios, numerosas
variáveis concorrem na formação de um empreendedor, como a região de origem, o
nível de educação, a religião, a cultura, entre outros. Isso indica que as
características de uma região, de uma época, refletem na formação e no perfil do
empreendedor. Por outro lado, todas as pesquisas realizadas e todas as publicações
têm trazido grandes colaborações para o estudo do empreendedorismo. Como diz
Dolabela,
se ainda o podemos predizer o sucesso de uma pessoa, é possível, no
entanto apresentar-lhes as características mais comumente encontradas
nos empreendedores de sucesso, para que possa desenvolvê-las e
incorporá-las ao seu próprio repertório vivencial (1999, p. 49).
Dentre os comportamentalistas, o sociólogo Max Weber foi um dos primeiros
autores a mostrar interesse nos empreendedores. “Ele identificou o sistema de valor
como elemento fundamental da explicação do comportamento empreendedorial. Ele
via os empreendedores como inovadores, pessoa independente cujo papel como
líderes de negócio, exprimia uma fonte de autoridade formal” (FILION, 1998, p. 4).
Contudo, o psicólogo norte-americano David McClelland foi um dos que mais trouxe
colaborações para o empreendedorismo a partir de sua obra The Achieving Society
(1961). De acordo com Leite (2002), McClelland estudou os fatores que
impulsionavam os empreendedores a desenvolver seus empreendimentos e creditou
56
O mesmo que behavioristas ou cientistas do comportamento. Entre os pioneiros comportamentalistas que
investigaram o empreendedor se destacam os psicólogos, os psicanalistas e os sociólogos (FILION, 1998).
142
como motivo mais forte o desejo e a necessidade de realização. Em seus estudos
McClelland também mostrou que o ser humano é um produto social do meio em que
vive e que tende a reproduzir os modelos com os quais se ambientou. Desta forma,
segundo ele, quanto maior for o número de empreendedores e o valor dado às suas
atividades, maior será o exemplo dado aos jovens para que também aprendam e
absorvam as características empreendedoras. Em termos de concepção, McClelland
(apud Leite, 2002, p. 79), diz que o empreendedor é, ”alguém que exerce um certo
controle sobre os meios de distribuição e produz mais do que pode consumir, com o
objetivo de vendê-lo (ou trocá-lo) para obter uma renda individual (ou doméstica)”.
A partir destas colocações, é possível inferir que uma das principais
colaborações do psicólogo foi trazer a variável comportamental (identificada na
motivação de empreender pela realização) como uma característica presente nos
empreendedores. Esse fato permite inferir que os empreendedores são pessoas
voltadas à auto-realização, atributo que também está implícito no conceito de
empreendedor de McClelland. No entanto, a alta necessidade de realização se faz
presente, igualmente, em outros indivíduos que não são necessariamente
empreendedores. Há que se dizer também que nem todos empreendedores movem-
se pela auto-realização. Caso contrário, não haveria, por exemplo, o empreendedor
social
57
.
Quando McClelland expõe a importância do meio social na formação do
indivíduo, ele quer dizer que o empreendedorismo seria um fenômeno regional, na
medida em que os hábitos e a cultura de uma região influenciariam na formação da
pessoa. Tal leitura também é manifestada por Dolabela.
Várias pesquisas têm demonstrado que os empreendedores refletem as
características de período e de lugar em que vivem. Mesmo na era da
globalização, em que os empreendedores exercem influência além dos
limites de sua região, o referencial básico de seu relacionamento
permanece no âmbito regional (1999, p. 50).
Filion (1999), ao fazer a análise do perfil do empreendedor de várias partes do
mundo, também percebe o empreendedor como um ser social, produto do meio em
que vive (época e lugar). Por esta razão, segundo Filion (1999) é que existem
57
Assunto que é abordado no subcapítulo 5.3.
143
famílias mais empreendedoras do que outras, assim como cidades, regiões e
países. Este autor ainda comenta que para aprender a ser empreendedor é
fundamental a convivência com outros empreendedores.
Da mesma forma que esteve presente a relação com questões ligadas à
administração de empresas na concepção de empreendedor dos economicistas, a
concepção exemplificada da corrente comportamentalista converge para este
mesmo ponto, porém ela avançou para um campo antes não explorado.
Ao final da cada de 1980 o empreendedorismo se torna um tema de
estudos em muitas áreas do conhecimento. Esta alegação é confirmada por
Dolabela que diz:
Após a década de 1980, o empreendedorismo expandiu-se
consideravelmente e passou a interessar a várias ciências humanas e
gerenciais. Os primeiros doutores na área surgiram nessa mesma década e,
sendo provenientes de outras áreas, fizeram com que a pesquisa em
empreendedorismo tivesse um desenvolvimento singular, uma vez que cada
qual utilizava a cultura, a metodologia e a lógica de seu campo de estudo
original (1999, p. 50).
O empreendedorismo mostra, portanto, ser um campo de estudo efervescente em
termos de pesquisa e publicações. quase dez anos atrás, Filion escreveu que
“mais de mil publicações surgem anualmente no campo do empreendedorismo, em
mais de 50 conferências e 25 publicações especializadas” (1999, p. 5).
Como foi frisado, o empreendedor pode ser estudado, e, de fato o é, sob
diferentes enfoques das mais variadas áreas de conhecimento, como economia,
psicologia, administração, pedagogia entre outras. Como exemplo de uma
concepção de empreendedor surgida no final da década de 1980, escolheu-se uma
proferida por um expoente da área da administração
58
, Peter Drucker. No
entendimento de Drucker (2003)
59
, os empreendedores são aqueles que mudam ou
58
De acordo com Chiavenato (2000) a Administração obteve diversos enfoques e diferentes visões ao longo dos
anos, mas apesar dos diferentes tratamentos da Administração através do tempo, ela permanece como um
processo de planejar, organizar, dirigir e controlar o uso de recursos a fim de alcançar objetivos de uma
organização, funções essas que, resumidamente, são as principais responsabilidades do administrador. Entende-
se por organização, no contexto da administração, um grupo de indivíduos associados com um objetivo comum.
Exemplo: empresas, associações, órgãos do governo, podendo ser qualquer entidade pública ou privada.
59
As citações que são apresentas foram retiradas da obra publicada em 2003, porém, são as mesmas que vieram
a público na 1ª edição do livro no ano de 1986.
144
transformam valores. São pessoas que estão simultaneamente criando novos tipos
de negócios e ampliando conceitos administrativos. É o agente da inovação. Quem
não se sente à vontade para inovar, diz Drucker, não fará isso em suas atividades
nas empresas, pois agir como empreendedor é questão de comportamento.
Este autor não descreve os empreendedores como assumidores de riscos.
Segundo Drucker, os empreendedores “procuram definir os riscos que têm que
incorrer e minimizá-los o quanto for possível” (2003, p. 196), e acrescenta dizendo
que os empreendedores não se concentram nos riscos e sim nas oportunidades.
Percebe-se nessas considerações tanto a influência da corrente economicista, pois
não deslocou o empreendedor do mundo das empresas, quanto a influência da
comportamentalista, ao destacar que o comportamento mostrará o empreendedor. A
única divergência que existe em relação às concepções anteriores, é a não
caracterização do empreendedor como indivíduo que assume riscos. Acredita-se
que sempre que alguém for empreender algo, independentemente do desafio que
represente, a pessoa está assumindo risco. Este pode ser alto, moderado ou
mínimo. O fato de um empreendedor fazer algum planejamento antes de
empreender reduz as chances do empreendimento não dar certo, porém o risco não
desaparece e sim, fica minimizado. Um outro apontamento sobre a questão de
correr risco, permite que se faça uma re-leitura da colocação de Drucker. Segundo
Dolabela “a literatura o diz que o empreendedor goste de riscos, nem que não
goste, mas apenas que ele os aceita como um dado inerente à sua atividade”
(2003a, p. 55). Com essa colocação, percebe-se que está em jogo a percepção do
risco e não a existência do risco, fator este que Drucker desconsiderou.
Abordando outra concepção de empreendedor, a opção foi pela escolha de
uma concepção bastante disseminada em muitos países, pois está escrita em um
dos livros
60
mais vendidos no mundo sobre empreendedorismo. Seu autor, o
americano Michael Gerber, definiu o empreendedor como sendo
o inovador, o grande estrategista, o criador de novos métodos para penetrar
ou criar novos mercados; é a personalidade criativa; sempre lidando melhor
com o desconhecido, perscrutando o futuro, transformando possibilidades
em probabilidades e caos em harmonia (1996, p. 43).
60
O Mito do Empreendedor. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. - A 1ª edição é do ano de 1986.
145
Não se percebe grandes acréscimos aos conceitos anteriormente citados, e o que
se destaca é a ênfase dada à inovação e à criatividade.
Exemplificando agora uma concepção elaborada mais recentemente e
também de uma obra
61
de referência a respeito do empreendedorismo, não tanto
pela sua ampla disseminação, mas pelo seu abrangente estudo, sendo um dos livros
mais completos sobre o tema, seus autores definem o empreendedor a partir da
descrição de empreendedorismo. Desta forma, segundo Hisrich e Peters,
empreendedorismo é o processo de criar algo novo com valor dedicando o
tempo e o esforço necessários, assumindo os riscos financeiros, psíquicos e
sociais correspondentes e recebendo as conseqüentes recompensas da
satisfação e independência econômica e pessoal (2004, p. 29).
Os comentários dos próprios autores exploram bem a concepção citada, razão pela
qual, se fará usos deles. Segundo Hisrich e Peters
essa definição enfatiza quatro aspectos básicos de ser um empreendedor,
não importando em que área. Primeiro, o empreendedorismo envolve o
processo de criação criar algo novo de valor. [...] Segundo, o
empreendedorismo exige a dedicação do tempo e do esforço necessários.
Somente aqueles que se dedicam a um empreendimento apreciam a
significativa quantidade de tempo e esforço exigida para criar algo novo e
torná-lo operacional. Assumir os riscos necessários é o terceiro aspecto do
empreendedorismo. [...] A parte final da definição envolve as recompensas
de ser um empreendedor. A mais importante dessas recompensas é a
independência, seguida da satisfação pessoal (2004, p. 30).
Em nível nacional, José Carlos de Assis Dornelas
62
, com base em
pesquisas
63
que procuravam apontar as características mais marcantes nos
empreendedores e levando em conta algumas premissas clássicas, (segundo este
autor, certas premissas sempre são utilizadas como referência nas definições sobre
61
Empreendedorismo. Porto Alegre: Artmed, 2004. - HISRICH, R.; PETERS, M.
62
Dornelas é um dos maiores especialistas brasileiros em empreendedorismo, atua como professor de
empreendedorismo em cursos de MBA na USP e como professor convidado em diversos programas no país e no
exterior. Também é conferencista e consultor de dezenas de empresas nacionais e multinacionais. publicou
cinco livros na área do empreendedorismo (www.josedornelas.com).
63
“Foram identificadas mais de 50 características atribuídas aos empreendedores em 25 artigos publicados em
periódicos internacionais e em livros de referência no período de 1972 a 2005” (DORNELAS, 2007, p. 1).
146
o empreendedor, como a iniciativa para criar um novo negócio e paixão pelo que faz,
- utiliza os recursos disponíveis de forma criativa, transformando o ambiente social e
econômico onde vive aceita assumir os riscos e a possibilidade de fracassar), este
professor acabou elaborando a sua concepção. Para Dornelas, “o empreendedor é
aquele que faz acontecer, se antecipa aos fatos e tem uma visão futura da
organização” (2007, p. 8).
Os conceitos sobre empreendedor não param por aqui, porém grande parte
deles continuam relacionados à área da administração. Apesar de o
empreendedorismo ter se originado das ciências econômicas, segundo Filion, os
autores pioneiros do campo, como Cantillon e Say, “não estavam interessados
somente na economia, mas também, nos aspectos gerenciais das empresas, no
desenvolvimento dos negócios e na gestão dos negócios” (1998, p. 2). Na verdade,
como bem observou Filion (1999), no começo do culo XIX aa segunda metade
do século XX, as ciências gerenciais não existiam e, basicamente por isso, Say e
Cantillon são considerados economistas. Caso contrário, a origem do
empreendedorismo poderia ser atribuída às ciências gerenciais. Justamente por esta
aproximação com a administração é que se pode entender a fácil penetração do
empreendedorismo nesta área e o número grande de administradores a estudarem
o “fenômeno” do empreendedorismo, denominação esta utilizada pelo administrador
Emanuel Leite.
Mas também houve o interesse de outras áreas sobre o tema e muitos
especialistas de diferentes áreas buscaram explicar o fenômeno. No entanto,
nenhum dos estudos ou autores pesquisados é conclusivo e completo, sendo que,
grande parte dos trabalhos foram baseados em estudos localizados e pontuais. Uma
boa síntese do que alguns especialistas de uma mesma área pensam sobre os
empreendedores foi feita por Dolabela. Ainda que possa haver divergências entre os
especialistas que têm a mesma formação, o que prevaleceu, segundo Dolabela, foi
uma congruência de idéias entre os pares.
Assim, os economistas associam os empreendedores à inovação e o seu
papel fundamental no desenvolvimento econômico. Os comportamentalistas
atribuem aos empreendedores as características de criatividade,
persistência, internalidade (capacidade de influenciar e controlar
comportamentos de outras pessoas). Engenheiros de produção vêem nos
empreendedores bons distribuidores e coordenadores de recursos.
147
Financistas definem o empreendedor como alguém capaz de calcular
riscos. Para os especialistas em gerenciamento, os empreendedores são
organizadores competentes e desembaraçados. Para o pessoal do
marketing, são pessoas que identificam oportunidades e se preocupam com
o consumidor (DOLABELA, 1999, p. 52).
Em vista desta multiplicidade de olhares sobre o empreendedor, Filion (1999)
ressalta que é fundamental não se limitar a uma abordagem unidimensional, pois as
diferentes abordagens não devem ser consideradas erradas, mas complementares.
Outro autor que faz essa mesma advertência é Dolabela (2003a), que alerta para a
ampliação da visão sobre o empreendedor, de modo que seu estudo seja
considerado de forma integrada e não fragmentada.
É preciso dizer que existe uma semelhança em cada área que estuda o
empreendedor e esta se deve pelo entendimento de que o empreendedorismo
sempre estará associado ao homem. É ele que ocupa o centro das atenções e a
partir daí, estudam-se suas ações, comportamentos, características, habilidades,
inovações, criações, realizações, e demais assuntos relativos ao empreendedor. Ou
como fala Santos, é o homem “que ‘faz’ o empreendedorismo, que inova, que
dinâmica ao processo, que compartilha conhecimentos, que gera novas idéias, que
supera desafios e usa a criatividade para resolver problemas” (2000, p. 100).
5.2 Um conceito referencial de empreendedor para este trabalho
Sem querer desconsiderar as ressalvas feitas por Filion e Dolabela, é
preciso, neste trabalho, fazer uso de um conceito claro e norteador sobre o
empreendedor, mesmo diante destas diversas óticas sobre o mesmo. Em outras
palavras, é necessário buscar uma concepção de empreendedor que sirva de
referencial para a formação empreendedora e que, ao mesmo tempo, se aproxime
da idéia concebida a respeito do que se entende por utilizar a metodologia de
projeto.
Entre tantos conceitos elaborados por pesquisadores que se preocuparam
em investigar o empreendedorismo, escolheu-se utilizar a concepção desenvolvida
pelo experiente professor de empreendedorismo chamado, Fernando Dolabela.
Primeiramente, por este educador ter ampliado o conceito de empreendedor para
além das fronteiras da administração, segundo, porque Dolabela, com muita
dedicação, paixão e trabalho, tem conseguido disseminar, desde 1996, o
148
empreendedorismo nas escolas de ensino fundamental e médio, e também, em
numerosas universidades do Brasil. Em termos de números, mais de quatrocentos
cursos universitários e de ensino médio do país aplicaram a metodologia
64
, criada
por Dolabela, para desenvolver o espírito empreendedor dos jovens. Esta
aproximação do empreendedorismo com a educação, que fez Dolabela, é de grande
valor para esta pesquisa, pois originou a publicação de alguns livros que têm trazido
significativas colaborações para este trabalho. Em terceiro lugar, conforme Filion
(apud Dolabela, 2000b), Dolabela é um dos precursores a introduzir o ensino de
empreendedorismo no Brasil, tendo participado das mais importantes conferências
sobre empreendedorismo em todo mundo e tendo conhecido a maioria dos
principais especialistas na área. E por último, se constata que na área do
empreendedorismo Dolabela publicou nove livros, sendo o autor brasileiro, até o
momento, que mais lançou obras sobre o assunto no país, razão pela qual, muitos
trabalhos nacionais que tratam do empreendedorismo usam esse autor como
principal referência.
Tendo em vista que a concepção de empreendedor que será utilizada neste
trabalho foi a criada por Dolabela, julga-se conveniente apresentar a forma pela qual
ela foi construída. Este autor, ciente da profusão de conceitos sobre empreendedor,
disse que optou por fazer uso de duas concepções, as quais entende que, de
alguma forma, contêm as demais. A primeira que Dolabela utilizou foi a de Jeffrey
Timmons feita em 1994. Para Timmons, o empreendedor (apud, Dolabela, 2003a, p.
23), “é alguém capaz de identificar, agarrar e aproveitar oportunidades. Para
transformá-las em negócio de sucesso, busca e gerencia recursos”. Visivelmente é
um conceito relacionado ao meio empresarial e que não destaca claramente as
questões tradicionalmente ligadas ao empreendedor como correr riscos, inovar e
promover mudanças. Mas presume-se que, durante o percurso do indivíduo, do
ponto de identificar uma oportunidade até conseguir aproveitá-la, ele deve ter
desenvolvido algumas das habilidades caracteristicamente identificadas nos
empreendedores. Esta leitura pode ser feita justamente pelo fato de o próprio
Dolabela ter mencionado que usou esse conceito porque, de alguma forma, contém
os demais. É importante ressaltar os acréscimos referidos ao empreendedor pelo
conceito de Timmons. Pode-se detectar a valorização da capacidade de identificar
64
A metodologia criada por Dolabela recebe o nome de “Oficina do Empreendedor”. Esta será explorada no
subcapítulo 5.5.
149
oportunidades, isto é, de constatar uma necessidade no ambiente; a capacidade de
conceber algum produto ou serviço a partir da oportunidade, de modo que, se
atenda à necessidade identificada e também a capacidade de buscar competências
e recursos, sejam eles, materiais, humanos, tecnológicos, financeiros e gerenciais
para conseguir aproveitar a oportunidade.
O segundo autor utilizado foi o canadense Louis Jacques Filion. Dolabela
um destaque especial às idéias deste autor, justificando que Filion descreve muito
bem como o empreendedor age, algo que, para quem quer aprender a desenvolver
e dinamizar o potencial empreendedor, como Dolabela, e que está envolvido em
projetos educacionais voltado ao empreendedorismo, traz consideráveis
contribuições. É preciso ressaltar também que o conceito de Filion, segundo o
próprio autor, se propõe a
pretender ser um denominador comum bastante abrangente, cobrindo um
espectro tão amplo quanto possível. Reflete as principais teorias da
literatura empreendedora [...] Tem-se por base também, um estudo de
aproximadamente 60 das definições mais comuns na literatura (FILION,
1999, p. 18).
Todo esse cuidado de Filion se deve à consciência que o autor tem sobre a ampla
variedade de pontos de vista usada para se estudar o empreendedorismo.
Segundo Filion “um empreendedor é uma pessoa que imagina, desenvolve e
realiza visões” (1999, p. 19). O termo “visão” para Filion (1999), denota a habilidade
da pessoa em definir e alcançar objetivos, sendo assim, uma imagem desejada de
uma situação futura. Desta concepção pode-se extrair que a capacidade de assumir
riscos e de criar, ou seja, começar algo novo, está presente, tendo em vista que o
empreendedor, no processo de realizar o que havia projetado, está correndo risco.
Provavelmente, seu tempo, seus recursos estavam em jogo durante o ato de
empreender. E, a partir do momento que for concretizada sua visão, ele terá criado
algo novo.
Como mencionado, não se tem o propósito de apresentar outras
definições de empreendedor. Caso isso fosse feito, com certeza, apareceriam outras
características detectadas em empreendedores, de acordo com a visão do
pesquisador. É importante ressalvar que de forma alguma serão desconsideradas
150
outras características empreendedoras que ainda não foram mencionadas. O
subcapítulo 5.6 tratará de identificar as habilidades e comportamentos
empreendedores que apareceram nos principais estudos que foram feitos com o
propósito de apontar aquelas que mais estão presentes nos empreendedores,
principalmente nos empreendedores de sucesso.
Resgatando as concepções anteriormente citadas, conclui-se que tanto a de
Timmons quanto a de Filion abordam o empreendedorismo através de um viés
administrativo. a concepção desenvolvida por Dolabela, segundo o autor (2003a),
corresponde ao esforço de ampliar esse quadro, uma vez que o mesmo não
encontrou um conceito construído ou inspirado fora do entorno da área
administrativa. Portanto, a partir das colaborações de Timmons, de Filion e da
própria experiência como pesquisador e professor de empreendedorismo, Dolabela
criou a sua concepção a qual chama de “Teoria Empreendedora dos Sonhos”. No
entendimento de Dolabela (2003a, p. 33), “o empreendedor é alguém que sonha e
busca transformar seu sonho em realidade”.
Em relação à concepção de empreendedor de Dolabela, mais
especificamente sobre a questão do sonhar, verifica-se que esta palavra havia
sido identificada como fator essencial para o empreendedor por Bernhoeft em 1996,
porém este autor não o utilizou diretamente na concepção de empreendedor. O que
Bernhoeft valorizou a respeito do termo é que
nenhum empreendedor chegará a lugar algum se não tiver sonhado antes
com o que deseja alcançar. O sonho é o primeiro passo de todo o
realizador. Mesmo em todo o seu processo de desenvolvimento ou
crescimento, não se deve abandoná-lo. O sonho é um combustível da maior
importância para a realização (1996, p. 25).
A utilização da palavra “sonho”, dentro de uma concepção de empreendedor, vai
aparecer posteriormente à concepção de Dolabela. Quem a utiliza é Luiz Martins ao
escrever que “empreendedor é aquele que transforma sonhos em ações e ações em
resultado” (2005, p. 59). Ainda que Martins não tenha referenciado em seu livro a
utilização de nenhuma obra de Dolabela, sua concepção trata de um conceito
semelhante ao de Dolabela, mas escrito com outras palavras. E, mesmo o
estando presente no conceito de empreendedor, a palavra “sonho” o deixou de
151
ser referenciada. Isto se percebe na recente obra de Duro e Bonavita, quando os
autores explicam o que é necessário para ser um empreendedor. Segundo estes
autores,
o pré-requisito básico do empreendedor é ter um sonho, precisamos
assumir nossa decisão de transformá-lo em realidade. [...] Depois de
tomada a decisão de seguir seu sonho, é preciso disciplina para planejar
suas ações e executá-las, visando a realização do sonho. Finalmente,
precisamos saber como vender para os outros o nosso sonho, a nossa idéia
(2006, p. 30).
Chama atenção que a palavra “sonhar” aparece sempre vinculada às
palavras “realização”, “resultado”, “realidade”, indicando assim que não basta
sonhar, é preciso concretizar o sonho. Como diz Marins,
no mundo empresarial e mesmo na vida pessoal de nada adianta o
sonho, como de nada adianta a ação, sem um resultado positivo. [...] Não
quero ser duro demais, mas o que importa no mundo de hoje é o resultado.
Sonhar e agir são coisas importantes. O resultado é essencial (2005, p. 60).
Voltando à concepção de empreendedor de Dolabela esta, diz o autor,
abrange todos os tipos de empreendedor o que atua na empresa, no
governo, no terceiro setor, seja na posição de empregado, seja na de
dirigente, autônomo ou proprietário, pois toma o empreendedor como uma
forma de ser, independentemente da área em que possa atuar (2003b, p.
38).
Algumas considerações podem ser feitas diante deste enunciado. Fica manifesto
que o leque de possíveis candidatos a empreendedor amplia-se significativamente,
podendo ser aplicado a todas as atividades, sejam elas empresariais ou não. Esta
percepção também é pertinente para outros estudiosos do empreendedorismo como
Hisrich e Peters. Conforme estes autores
152
o empreendedor em potencial pode ser hoje enfermeira, secretária,
trabalhador de linha de montagem, mecânico, vendedor, dona de casa,
gerente ou engenheiro. O empreendedor em potencial pode ser homem ou
mulher e de qualquer raça ou nacionalidade (2004, p. 77).
Em decorrência dessas idéias, Dolabela (2003a, p. 23) diz que, “você é, eu sou,
todos somos empreendedores [...] mas, para isso, é preciso querer realizar o
potencial empreendedor que todos têm”. Entende-se desta colocação que todas as
pessoas têm um potencial empreendedor latente e que algo é preciso fazer para
despertar esse potencial.
É importante colocar que, em 1985, Gifford Pinchot introduziu o conceito de
Intraempreendedor
65
como sendo o empreendedor dentro da empresa, ou seja,
neste meio o empreendedor recebe uma denominação diferente. Segundo Pinchot
(1989) um funcionário não precisa deixar a empresa onde trabalha para vivenciar as
emoções, riscos e gratificações que uma idéia ou sonho transformado em realidade
pode oferecer, exercendo assim seu empreendedorismo a favor da organização
para qual trabalha.
Cabe neste momento fazer algumas reflexões: O que seria potencial
empreendedor? O que de fato é preciso fazer para despertar este potencial
empreendedor? As respostas a essas indagações não são apresentadas
diretamente. É preciso examinar um pouco mais a concepção de Dolabela para se
chegar às respostas.
De acordo com a “Teoria Empreendedora dos Sonhos”, o conceito de
empreendedor contém dois movimentos: sonhar e buscar realizar o sonho. Com
relação ao sonho, Dolabela diz que se trata de um sonho estruturante, isto é “o
sonho que se sonha acordado, capaz de conduzir à auto-realização” (DOLABELA,
2003b, p. 38). Estas outras palavras do autor aperfeiçoam a mesma idéia; “é aquele
que estrutura, organizando e articulando sinergicamente desejos, visão de
mundo, valores, competências, preferências, auto-estima em um projeto de vida que
seja a auto-realização do sonhador” (2003a, p. 33). Fora dessa condição, o autor
considera “sonho periférico”, ou seja, “sonhos que, isoladamente ou em conjunto,
65
O intraempreendedor é um conceito relativamente novo no contexto das organizações, assim como na
literatura sobre organizações e especificamente pode ser entendido como “todos os ‘sonhadores que realizam’.
Aqueles que assumem a responsabilidade pela criação de inovações de qualquer espécie dentro de uma
organização. O intrapreneur (intraempreendedor em inglês) pode ser o criador ou o inventor, mas é sempre o
sonhador que concebe como transformar uma idéia em uma realidade lucrativa” (PINCHOT, 1989, p. xi).
153
não têm o potencial de fundamentar um projeto de vida ou de gerar a auto-
realização” (2003b, p.39). O sonho neste caso é visto como uma formulação
idealística, como uma fantasia, que não traz necessariamente o compromisso com a
realização.
Voltando para o sonho estruturante, segundo o autor, este assume
caráter estruturante quando contém energia que impulsione o indivíduo a
tentar realizar o seu sonho (2003b). A energia a que Dolabela se refere é a da
emoção. Para validar a importância dada à emoção, o autor utiliza pensamentos de
Maturana citados na obra Capital Social, escrita por Augusto de Franco. Segundo
Maturana (apud FRANCO, 2001) todas as ações humanas, seja qual for o espaço
operacional em que ocorram, fundamentam-se no emocional. Neste sentido
compreende-se que é a emoção gerada que vai buscar a realização, a disposição
para agir e realizar o sonho. Novamente fazendo uso das idéias de Maturana (apud
FRANCO, 2001) é dito que se quisermos entender as ações humanas, não devemos
olhar o movimento ou o ato como uma operação particular, mas sim a emoção que o
possibilita. Emocionar-se, portanto, é transportar-se para um estado em que a forma
de ver e sentir o mundo e perceber as próprias capacidades se transformam em
disposição para agir (DOLABELA, 2003b). Analisando essas colocações, é
possível presumirmos que o que desperta o potencial empreendedor é o sonho
estruturante. O que foi inferido fica mais evidenciado nas palavras de Dolabela, que
na verdade se trata de uma indagação. “É a emoção que traz à tona as
características empreendedoras inerentes à espécie humana, pois como assumir
características sem estar possuído pela emoção que as desencadeia?” (2003b, p.
59). Complementando esta idéia, o autor diz, “assim, o indivíduo deve colocar-se em
uma ‘situação empreendedora’ para que a emoção o instigue à busca e realização
dos sonhos e desejos e o conduza à construção do saber empreendedor” (2003b, p.
59). Pelos comentários feitos anteriormente, desta situação empreendedora a qual o
autor se refere, se entende como sonhar um sonho estruturante. É preciso se dizer
também que
a caminhada em direção ao sonho, ou a busca constante de realização do
sonho, é a fonte de geração e manutenção do nível emocional que ao
indivíduo a capacidade de persistir, de continuar apesar dos erros e
fracassos. A habilidade de tentar, aprender com os erros e, portanto,
154
evoluir, constitui-se a própria construção do saber-empreendedor
(DOLABELA, 2001, p. 73).
Em vista da possibilidade de muitas pessoas terem um sonho estruturante,
entende-se, mais claramente, porque Dolabela considera que todas as pessoas
podem ser empreendedoras e que empreendedor é uma forma de ser. Esta forma
de ser, de se comportar como empreendedor deverá, portanto, originar o
mencionado “potencial empreendedor”. O que deve ficar claro desde é que a
necessidade de aquisição de conhecimentos, de assumir comportamentos,
desenvolver habilidades nasce no momento em que a pessoa começa a caminhar
para a realização do sonho, tarefa que nem todo mundo se o trabalho de fazer,
pois exige esforço, dedicação, motivação, algumas privações, enfim, querer arcar
com as exigências necessárias para realizar o potencial empreendedor. Como
coloca Moraes, “sonhar todo mundo sonha, mas realizar o sonho não é tarefa fácil. É
por isso que muita gente desiste dos sonhos quando conhece o caminho que irá
percorrer e as grandes dificuldades que terá que vencer” (2000, p. 22). É justamente
neste momento desafiante entre o sonhar e realizar o sonho que entra a ação do
educador.
A tarefa pedagógica será, portanto, tentar estabelecer forte conexão entre o
sonho e a capacidade de iniciar e manter ações para realizá-lo. Ou seja,
sonhar e buscar realizar o sonho. Em outras palavras, o objetivo
pedagógico será desenvolver o ser capaz de sonhar, e também capaz de
buscar e construir o saber-ser, o saber-fazer e o saber-conviver necessários
à realização do sonho (DOLABELA, 2001, p. 69).
Com relação ao sonho estruturante, ainda é preciso destacar que, segundo
Dolabela (2003b), este pode ser transitório, tendo em vista o fato de ele ser
influenciado e determinado pelas constantes mutações do próprio indivíduo, e mais,
“enquanto dura (ou até ser substituído ou metamorfosear-se em outro), o sonho
estruturante significado à vida do indivíduo” (DOLABELA, 2003b, p. 41). Desta
questão que envolve o sonho estruturante fica entendido que o sonho gera a
emoção que estimula a vontade de saber o que é necessário para realiza-lo, que o
155
conteúdo a ser aprendido dependerá da natureza do sonho e que em todo este
processo nasce o saber empreender.
Ao entender o empreendedorismo como uma forma de ser, pois não é
excludente e não tem restrições instransponíveis, vislumbra-se a possibilidade de
estimular o desenvolvimento das habilidades empreendedoras mediante uma
metodologia. Esta visão ampla do empreendedorismo, que identifica o
empreendedor como uma forma de ser, também colabora para não vincular o
empreendedor exclusivamente às atividades de criação de empresas ou de geração
de auto-emprego. Esta desvinculação do conceito de empreendedor de uma
atividade específica, relacionando com uma forma de ser, ampliou-se na visão de
Dolabela para, “algo ligado ao estilo de vida, visão de mundo, protagonismo,
inovação, capacidade de produzir mudanças em si mesmo e no meio ambiente,
meios e formas de buscar a auto-realização, incluindo padrões de reação diante de
ambigüidades e incertezas” (2003b, p. 37). Trata-se de uma visão integrada e
complementar das que foram mencionadas até o momento, mas que não tem a
intenção de definir e encerrar o assunto.
Ainda que não se tenha explicitado o que significa empreender, com base no
que foi exposto até aqui, é possível presumir o significado da palavra. Para que
esta questão não deixe dúvidas, pode-se dizer que empreender trata exclusivamente
de uma ação humana, ou seja, tem natureza prática e humana incontestável. Dito
isto nas palavras de Dolabela, “Empreender é buscar, é uma ação, não é chegar”
(2003a, p. 80). Justamente por empreender implicar uma ação, é que o autor
destaca que, chegar a algum lugar, ou também, atingir um objetivo, não é
empreender. Em decorrência disso, é dito que, a partir da ação, é que nasce o saber
empreender do qual se pode entender que toda ação humana voltada à realização
de um sonho é empreendedora (DOLABELA, 2003). De fato, esta inferência está
correta; porém, explorando um pouco mais a palavra ‘empreender”, no contexto da
figura do empreendedor, encontraremos o respectivo significado. “Empreender tem a
ver com fazer diferente, antecipar-se aos fatos, implementar idéias, buscar
oportunidades e assumir riscos” (DORNELAS, 2005, p. 13). Neste entendimento, o
ato de empreender deixa de ser uma simples ação, mas ainda assim é viável a
qualquer pessoal. Outro exemplo que pode ser citado do diferencial de empreender
a partir da perspectiva do empreendedor foi mencionado por Timmons (apud
Dolabela, 2003a, p. 26). “Empreender é criar e construir algo de valor a partir de
156
praticamente nada. Isto é, o processo de criar ou aproveitar uma oportunidade e
persegui-la a despeito dos recursos limitados”. Apresentando uma visão que, de
certa forma, compila as que foram descritas, Dolabela expõe que
empreender é um processo essencialmente humano, com toda a carga que
isso representa: ações dominadas por emoção, desejos, sonhos, valores;
ousadia de enfrentar as incertezas e de construir a partir da ambigüidade e
no indefinido; consciência da inevitabilidade do erro em caminhos não
percorridos; rebeldia e inconformismo; crença na capacidade de mudar o
mundo; indignação diante de iniqüidades sociais. Empreender é,
principalmente, um processo de construção do futuro (2003b, p. 29).
Este entendimento foi mais além do que os anteriores apresentados, no sentido de
que o empreender envolveu relações com a realidade social, implicou preocupações
voltadas a modificar a realidade a partir de sonhos e desejos. Rebeldia,
inconformismo, ousadia, assumir riscos, também se destacam como novos
ingredientes que não haviam sido considerados. Por estas razões, a mencionada
concepção de Dolabela é muito importante, pois dinamizou o entendimento de
empreender, conceito este que, em muitos livros sobre empreendedorismo, estava
direcionado apenas dentro do âmbito empresarial relacionado a criar novos
negócios, produtos ou serviços, como se percebe em mais um exemplo:
“Empreender é um termo que está ligado à criação de novas empresas, [...] significa
inovar, buscar novas oportunidades de negócios, tendo sempre como alvo a
inovação e a criação de valor” (FIALHO et. al., 2006, p. 27). Não se pretende
desconsiderar percepções sobre empreender, como esta última citada, até porque
ela destaca a questão da inovação, da busca de novas oportunidades e da criação
de valor. Por outro lado, a idéia de empreender, neste trabalho, tem a ver com
modificar a realidade social e oferecer contribuições positivas à sociedade, foco este
que não costuma ser o primeiro objetivo quando os empreendedores criam
empresas com objetivos particulares. Neste último caso, ainda que o
empreendimento de interesse particular traga benefícios à comunidade, antes
mesmo disso, existe uma preocupação com o sucesso financeiro do
empreendimento, objetivo esse que não se aproxima dos propósitos sociais da
metodologia de projeto, que pretende amenizar ou resolver um problema social.
157
5.3 O empreendedor social
Na seção 5.1 ficaram constatadas algumas das diversas maneiras pelas
quais o termo “empreendedor” pode ser definido. Posteriormente foi apresentado o
conceito de empreendedor que este trabalho vai utilizar como referência para se
trabalhar com a formação empreendedora.
A idéia nesta seção é dar um foco à concepção de empreendedor escolhida,
de modo que fique mais condizente com a descrição de empreender que foi
mencionada, para que assim também se torne claro evidenciar, aos alunos, o
propósito principal das ações empreendedoras que eles vierem a realizar. Além
disso, também se pretende levantar informações sobre o tema deste subcapítulo
para oferecer, desde já, elementos que mostrem a congruência com os propósitos
sociais da metodologia de projeto.
Valendo do ponto de vista de Dolabela que diz ser o empreendedor alguém
que sonha e busca transformar seu sonho em realidade, pretende-se orientar este
sonho, no contexto acadêmico, para uma ação social, exatamente como faz o
empreendedor social. Fica estabelecido aqui o foco social das futuras ações dos
alunos e que, numa visão holística, tende a acarretar benefícios que poderão
repercutir positivamente no turismo do respectivo local onde as ações forem
realizadas.
Conforme Bornstein,
o termo “empreendedor social” se popularizou em anos recentes. As
principais universidades dos EUA oferecem cursos de empreendedorismo
social, e os jornalistas, filantropos e profissionais da área de
desenvolvimento frequentemente invocam o termo (2006, p. 15).
Na citação anterior, a época da difusão do empreendedorismo social é atribuída ao
final da década de 1990 e início de 2000, período este que também se aplica ao
contexto brasileiro, pois é a partir do século XXI que aparecem as primeiras
publicações nacionais utilizando o termo, assunto que por sinal, continua com
escassas publicações. E mais incipiente ainda, aqui no país, são os cursos voltados
ao empreendedorismo social.
Por empreendedor social, Bornstein entende como sendo indivíduos que têm
158
forças transformadoras: gente com novas idéias para enfrentar grandes
problemas, incansáveis em busca de seus ideais, homens e mulheres que
não aceitam um ‘”não” como resposta e que não desistirão até
disseminarem as suas idéias o mais amplamente possível (2006, p. 16).
Neste conceito não aparece evidenciada alguma diferença do empreendedor social
para outras definições que se atribuem à figura do empreendedor que não seja
caracterizado por social. Na obra de Neto e Froes (2002), a diferenciação que existe
aparece de forma mais evidente. Para estes autores, o empreendedor social pode
ser entendido como o indivíduo que traz aos problemas sociais a mesma imaginação
que o empreendedor do mundo dos negócios traz ao seu negócio. Ele busca
soluções inovadoras para os problemas sociais existentes e potenciais e os
considera os seus objetivos principais. Neste caso, o sonho do empreendedor social
é justamente resolver o problema social que identificou, por conta própria ou não.
Sua medida de sucesso será o impacto social causado pelas suas ações. Não
destoando desta concepção, porém chamando o empreendedor social de
empreendedor coletivo, Dolabela fala que este é o indivíduo, “que tem como sonho
promover o bem-estar da coletividade, a melhoria das condições de vida de todos”
(2003b, p. 47), enquanto o empreendedor social é caracterizado pelo autor como o
sujeito que resolve questões pontuais, mas o necessariamente ataca as causas
dos problemas (DOLABELA, 2003b, p. 48).
É importante que se entenda que o conceito de empreendedor de Dolabela
não foi alterado em sua concepção. Com o foco no social, o sonho está sendo
orientado para aquele âmbito, pois nada impede que uma ação social, visando
resolver ou amenizar um problema, tenha toda emoção e energia que o sonho
individual acarreta, ainda que determinado problema possa ter sido identificado por
terceiros. O que é necessário fazer nesse sentido é um trabalho acadêmico de
conscientização pelo cuidado, preservação e valorização do, próximo, da
comunidade e de seus patrimônios sociais, naturais e culturais, fato que difere de
ações voltadas a desencadear a busca para realizar sonhos de ordem individual,
que podem ou não, tender para outras perspectivas.
Em cursos de turismo, nos quais tanto o meio natural (representado pela
paisagem, clima, flora, fauna etc.), quanto o meio artificial, (constituído por recursos
históricos, culturais e religiosos, pelos meios de transporte, vias de acesso, meios de
159
hospedagem, e pelas demais infra-estruturas de apoio), são vitais para a promoção
do turismo, o cuidado para com os mesmos ganha significativa importância. Vale
ressaltar que a tarefa de conscientização, cuidado, preservação e valorização dos
pontos referidos, acrescida da preocupação com a melhoria das condições de vida
da população local, representam ocupações que despertam interesses dos
turismólogos, ocorrência que torna a respectiva tarefa mais fácil de ser estimulada
pelo professor, além de ser contextual. Isto vai ao encontro com a idéia defendida
por Barreto (1995) de que, para que se possa ter um turismo de qualidade é
necessário investir na melhora da sociedade como um todo, solucionando os
problemas de base, sejam eles de infra-estrutura habitacional e sanitária, de
melhoria na saúde, na alimentação, na educação, atendendo também as
necessidades de recreação da população, entre outros, ou seja, antes mesmo de
atrair turistas estrangeiros e nacionais para um determinado local, é imprescindível
dar conta destes problemas básicos da realidade de cada lugar. Como diz Barreto,
o turismo poderá continuar a crescer, mas isso não acontecerá apenas por
obra de uma inércia natural. Os turistas sentir-se-ão estimulados a circular,
somente depois de os países acabarem com as condições aviltantes de
miséria que provocam a violência (1995, p. 96).
A pertinência dessas preocupações para o curso de Turismo pode ser comprovada
no trabalho do professor Luiz Gonzaga Godoi Trigo (1998). Nos anexos de sua
obra
66
, Trigo fala a respeito do curso superior de Turismo da PUC-Campinas
67
e cita
que entre os principais objetivos deste curso consta que, “o mercado é fundamental,
mas não se pode ignorar a importância de valores éticos e sociais como ligados à
preservação do meio ambiente e dos recursos naturais, do patrimônio histórico e
artístico e das sociedades envolvidas no processo turístico” (TRIGO, 1998, p. 231).
Um outro objetivo a destacar é que
66
A Sociedade pós-industrial e o profissional em turismo. Campinas SP: Papirus, 1998.
67
O curso de Turismo da PUC-Campinas foi um dos pioneiros do país. Ele surgiu em 1974 e, de acordo com
Trigo, serviu de modelo para a criação de outros cursos de Turismo, sendo assim, bastante similar a vários cursos
de Turismo do Brasil (TRIGO, 1998).
160
os futuros profissionais precisam ter clara percepção da realidade social,
econômica e política na qual estão inseridos. O curso deve proporcionar aos
alunos a informação e a crítica das várias propostas de interpretação e
estudo da realidade. A pesquisa científica, as ações técnicas e políticas
decorrentes da atuação profissional, e a responsabilidade social não podem
ficar alijadas dos objetivos do curso, sob pena de se mergulhar em uma
proposta tecnicista e alienada (TRIGO, 1998, p. 231).
É importante ressaltar que o projeto pedagógico do curso de Turismo nasceu no
contexto do projeto institucional da PUC-Campinas, de forma que os objetivos do
curso de Turismo pautam-se pelo projeto institucional da universidade na qual é
manifestado que “os pressupostos básicos desse projeto evidenciam o compromisso
com a reconstrução da sociedade, visando corrigir as distorções a favor da imensa
maioria da população brasileira, desprovida do acesso igualitário às necessidades
básicas” (TRIGO, 1998, p. 227). Sobre a citação acima, Trigo faz o seguinte
comentário:
Sem querer substituir a tarefa do Estado nas questões sociais, a
universidade se co-responsabiliza por essa problemática nacional, tão grave
no início da década de 1990, mas sem esquecer seus deveres para com a
formação profissional e com os desafios contemporâneos (1998, p. 227).
Fica evidenciado, portanto, que não se pretende assumir responsabilidades
do Estado, mas é importante que a universidade colabore, dentro das suas
possibilidades, na amenização dos dramas sociais, pois como diz Magalhães, a
universidade “não pode se dar o luxo de ficar alheia aos problemas da comunidade a
que pertence. Ao contrário, deve levar o seu aluno a interferir de forma direta nessas
questões, buscando resultados concretos para os problemas da comunidade em que
vive” (2004, p. 9). E se for levando em conta o estudo
68
da pesquisadora Ângela
Denise da Cunha Lemos, da Universidade de Santa Cruz do Sul, se verifica que “o
real cliente da universidade não é o aluno, mas sim a sociedade onde esse aluno irá
exercer suas atividades” (LEMOS in NETO, A; MACIEL, L. 2002, p. 68). Em
decorrência do que foi dito, o interesse pelo bem coletivo, por participar de ações
68
Título do trabalho: A sociedade, as teorias educacionais, o ensino do turismo e o papel do bacharelado em
turismo. (in NETO, A; MACIEL, A. Currículo e formação profissional nos cursos de turismo, 2002).
161
solidárias em benefício da sociedade, são coerentes para serem apresentadas como
intenções basilares das propostas educacionais dos cursos superiores.
Foi necessário fugir um pouco da questão referente ao empreendedor social,
mas com a intenção de justificar a pertinência de envolver os alunos dos cursos de
Turismo
69
em ações que visem contribuir com a melhoria da realidade social em que
vivem.
Quando foi dito orientar o sonho, está se falando numa ação pedagógica
do professor em sala de aula. Isto quer dizer que o educador, responsável pela
disciplina de empreendedorismo, deverá nortear seus alunos para que os sonhos
sejam conduzidos em favor de ações sociais, que tragam assim, benefícios à
coletividade. O sonho, de início, seindividual na sua concepção, mas deverá ser
coletivo na sua finalidade, uma vez que deve necessariamente oferecer valor para a
comunidade. Além do mais, na sua realização, o sonho também será coletivo, pois
vai ser fruto da cooperação de vários alunos, sem descartar também a ajuda de
membros da comunidade.
Com o foco no social, as ações empreendedoras ficarão caracterizadas por
ambições bastante diferentes do empreendedorismo privado, principalmente por
dois aspectos citados por Neto e Froes (2002): O empreendedorismo social o
produz bens e serviços para vender, mas para solucionar problemas sociais; ele não
é direcionado para mercados, mas para segmentos populacionais em situações de
riscos. Portanto, o foco é nos problemas sociais, o objetivo a ser alcançado é a
solução ou a amenização do problema identificado e o escopo de atuação é a
comunidade ou a própria cidade em sua extensão territorial. O quadro 04 abaixo
resume muito bem as diferenças entre o empreendedorismo privado e o
empreendedorismo social:
Empreendedorismo Privado Empreendedorismo Social
1. é individual 1. é coletivo
2. produz bens e serviços para o
mercado
2. produz bens e serviços para a
comunidade
3. tem o foco no mercado 3. tem o foco na busca de soluções para
os problemas sociais
4. sua medida de desempenho é o lucro 4. sua medida de desempenho é o
impacto social
5. visa satisfazer necessidades dos 5. visa resgatar pessoas da situação de
69
Embora a participação dos alunos em projetos sociais se mostre coerente com os objetivos acadêmicos dos
cursos de Turismo, essa atividade também pode e deve ser proposta em outros cursos.
162
clientes e ampliar as potencialidades do
negócio
risco social e promovê-las.
Quadro 04: Diferença de empreendedorismo privado e empreendedorismo social
Fonte: Neto e Froes (2002, p. 11).
Evidenciam claramente as diferenças que resultam em duas lógicas distintas de
pensar. Enquanto no empreendedorismo privado prevalecem os objetivos do
negócio, no empreendedorismo social os objetivos dizem respeito à comunidade.
Em vista dessas pontuações, Neto e Froes dizem que
o empreendedor social deve ser alguém que gosta de, e que, sabe, “pensar
o social”, subordina o econômico ao humano, o individual ao coletivo e que
carrega consigo um grande “sonho de transformação da realidade atual”. É
movido a idéias transformadoras e assume uma atitude de inconformismo e
crítica diante de injustiças sociais existentes em sua região e no mundo
(2002, p. 34).
Estes o valores defendidos pela abordagem progressista, que por sua vez,
contempla os interesses da metodologia de projeto, de modo que a referida
metodologia pode ser uma opção adequada para o professor trabalhar com seus
alunos o processo de busca de transformação social.
Mesmo considerando as diferenças existentes, tanto o empreendedor social
quanto o privado, a partir do sonho que os instigam a agirem, têm as mesmas
possibilidades de desenvolverem e reforçarem suas habilidades empreendedoras e
consequentemente o seu potencial empreendedor. No caso do empreendedor
social, de acordo com Neto e Froes (2002), seu processo de empreendedorismo
social tem início com uma idéia que geralmente está associada a um ou mais
problemas sociais relevantes, e as habilidades empreendedoras deverão ser
desenvolvidas na busca de solução para os problemas identificados, ou seja, diante
da necessidade de gerar soluções eficientes e eficazes para os problemas. Um outro
pensamento que colabora com esta interpretação é que, segundo Lévesque,
os empreendedores sociais têm o mesmo desejo de pesquisar
oportunidades que os empreendedores capitalistas, a mesma preocupação
com a inovação, a mesma capacidade de mobilizar recursos para
transformar um sonho em realidade. Por outro lado, se distinguem
claramente por seu interesse pela justiça social (2004, p. 52).
163
Vale apontar também a consideração que dois britânicos fizeram num relatório sobre
o empreendedorismo social. Para Stephen Thake e Simom Zadek (1996, apud
LÉVESQUE, 2004, p. 52), “os indivíduos que trabalham pela melhoria social das
comunidades encontram com freqüência soluções inovadoras para os problemas
que enfrentam na comunidade, de outro lado, partilham diversas características com
os empreendedores comerciais
70
”. Isso quer dizer que, ao se oferecer condições
para os indivíduos desenvolverem suas competências empreendedoras, estas
poderão ser benéficas para o êxito, tanto de uma iniciativa privada, quanto de uma
iniciativa social. Esta paridade também vai aparecer em mudanças que os
empreendedores causam na sociedade em que vivem. Como diz Bornstein (2006),
os empreendedores sociais têm papel análogo na educação, assistência médica,
proteção ambiental, assistência a deficientes e em muitos outros campos, como
fizeram Henry Ford e Steven Jobs no mundo empresarial. “Ao receberem os carros e
computadores como bens de mercado de massa, ‘destruíram’ os padrões em suas
indústrias, abrindo caminho para saltos de produtividade e desencadeando
mudanças” (2006, p. 16). Ou seja, eles provocaram mudanças, trouxeram idéias
novas para resolver problemas e acabaram colaborando para mudar visões de
mundo e padrões de comportamento. Mas é, basicamente, a visão sobre o
empreendimento que está realizando, ou que se pretende fazer, o ingrediente maior
da diferença entre um empreendedor social e um privado. Uma percepção
semelhante a esta se encontra nas palavras de Bornstein: “No fim das contas, os
empreendedores sociais e comerciais são praticamente da mesma espécie. [...] A
diferença não está no temperamento nem na capacidade, mas na natureza das suas
visões” (2006, p. 297).
É pertinente, neste momento, apresentar a descrição de um empreendedor
social a respeito do que o motiva a participar de empreendimentos sociais. Para
Fábio Rosa
71
“um projeto faz sentido quando serve para tornar as pessoas mais
felizes e o meio ambiente mais respeitado e quando constitui a esperança de um
futuro melhor. Eis a alma dos meus projetos” (ROSA in BORNSTEIN, 2006, p. 297).
Percebe-se neste depoimento o foco no social, visão esta que o motiva a
70
Chama-se atenção que apareceu uma terceira denominação “empreendedor comercial” em oposição ao
empreendedor social. Anteriormente Neto e Froes chamaram de “empreendedor privado” e Lévesque de
“empreendedor capitalista”. Independente da denominação o entendimento que se tem é o mesmo.
71
Fábio Rosa é um dos exemplos de empreendedores sociais que Bornstein entrevistou e expôs a experiência
empreendedora no seu livro intitulado: Como mudar o mundo: empreendedores sociais e o poder das novas
idéia. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2006.
164
empreender, que por sua vez, representa a principal condição de diferenciação em
relação ao empreendedor privado. Ressalta-se que muito mais empreendedores
sociais como Fabio Rosa, estão engajados em empreendimentos sociais
colaborando assim, para melhorar a realidade da sua comunidade. Na verdade, este
tipo de gente sempre existiu, mas atualmente é que eles vêm chamando a atenção e
aumentando em números. Como diz Bornstein “os empreendedores sociais m um
profundo efeito sobre a sociedade, apesar de a sua função corretiva continuar pouco
compreendida e valorizada. Embora tenham sempre existido, a presença deles está
aumentando atualmente” (2006, p. 15). Este aumento e a ação empreendedora dos
indivíduos engajados em projetos sociais também são percebidos por Filion e
Dolabela. Os autores apontam que
é crescente o número de pessoas que desempenham papel empreendedor
nessa área, seja criando projetos, seja inovando na atividade, seja
aportando apoio a uma organização ou programa de cunho social em
saúde, educação, meio ambiente etc. (2000c, p. 27).
Conforme o que foi destacado, fica claro perceber que o empreendedor social
como diz Lévesque
é um líder que mobiliza recursos a partir de uma visão e de um projeto.
Desse ponto de vista, é um visionário e um inovador capaz de transformar
ameaças em oportunidades, problemas sociais em soluções, lançando mão
de forma empreendedora (2004, p. 52).
Também se pode entender que “o empreendedorismo social não se constitui de um
‘passe de mágicas’, mas de uma ação que requer, acima de tudo, a capacidade
coordenada das pessoas, mesmo que isso se inicie, primeiramente, por uma
pessoa” (OLIVEIRA, 2004, p. 16).
Pensa-se que um dos melhores lugares para se trabalhar questões sociais
que incentivem a coletividade, a solidariedade, a participação, o as instituições de
ensino, sejam elas escolas ou universidades. Um passo importante para
165
desenvolver essas atitudes e preocupações, mas que acima de tudo, leve à ação, é
oferecer propostas de ensino nas quais os alunos possam trabalhar em aula,
cientificamente, a realidade e depois colocar em prática suas idéias de intervenção.
Através de propostas didáticas que levem os alunos a agir, é possível oferecer
oportunidades para que os educandos vivenciem, na prática, os resultados de suas
ações e possam, com isso, averiguar que são capazes de fazer transformações na
sociedade. Norteados por uma proposta educacional e de forma consciente, os
alunos também poderão comprovar que o desenvolvimento de habilidades e de
comportamentos empreendedores tem grandes possibilidades de ajudar os próprios
educandos para que suas idéias se concretizem com sucesso na realização dos
objetivos traçados.
Muito embora os levantamentos sobre o tema deste subcapítulo sejam
balizadores para a disciplina de empreendedorismo, ainda assim, existem pequenas
diferenças de concepções que precisam ser esclarecidas. No entendimento de Neto
e Froes, empreendedorismo social é um “processo dinâmico pelo qual comunidades
e seus membros desenvolvem idéias, identificam oportunidades e realizam ações
empreendedoras locais” (2002, p. 114). Dentro desta concepção, os projetos de
empreendedorismo social devem ser realizados pela comunidade local e não por
terceiros. Quando outras pessoas visam solucionar problemas sociais que afetam
comunidades, segundo os autores, isso caracteriza os projetos sociais. Já para
Dolabela, são exatamente estes tipos de projetos que os empreendedores sociais
72
desenvolvem. Os projetos que buscam criar condições para que os membros das
comunidades sejam protagonistas do seu próprio desenvolvimento são executados
pelos empreendedores coletivos. No entanto, levando em conta o propósito da
disciplina de empreendedorismo
73
de levar os alunos a desenvolverem
comportamentos e habilidades empreendedoras, a condição para isso é que os
próprios educandos sejam os principais executores dos projetos e não os membros
da comunidade atendida. Evidentemente existe grande possibilidade de participação
das pessoas da comunidade nos projetos, podendo elas virem a executar algumas
ações em parceria com os alunos. Mas isso o vai prejudicar o propósito
72
Lembrando que para Dolabela, o empreendedor social, exatamente como entendem Neto e Froes, é chamado
de empreendedor coletivo.
73
Diversos propósitos educacionais podem ser trabalhados numa disciplina de empreendedorismo. Neste
trabalho, se entende que no curso superior de Turismo é bastante adequado que os alunos desenvolvam
comportamentos e habilidades empreendedoras.
166
educacional, até porque, como foi exposto, um dos objetivos da metodologia de
projeto e também do empreendedorismo social é resolver ou amenizar um
determinado problema, e neste intento, toda ajuda é bem vinda. Devido, portanto, a
todo esforço, engajamento, energia dispensada, entre outros valores que demandam
interesse e vontade dos alunos para atender a uma necessidade identificada,
juntamente com a possibilidade de os alunos desenvolverem habilidades e
comportamentos empreendedores através de suas ações, também será justo atribuir
aos alunos a condição de empreendedores sociais. Esta observação se justifica pelo
fato de que as ações exigidas na realização dos projetos serão feitas pelos alunos,
justamente como ocorre em projetos sociais
74
e não partirão da própria comunidade,
ocasião pela qual Neto e Froes atribuem aos seus protagonistas a denominação de
empreendedores sociais e Dolabela de empreendedores coletivos.
De acordo com o que foi colocado, é presumível pensar que os projetos
desencadeados pelos alunos se caracterizem por serem assistencialistas
75
, muito
embora não se exclua a participação comunitária. No que está sendo proposto aos
alunos, não se trabalha com o foco em despertar a consciência cidadã das pessoas
atendidas e necessariamente não se almeja atacar as causas dos problemas
comunitários, tendo em vista que isto é um processo muito mais complexo e que
exige uma formação mais direcionada à assistência social e também se trata de
ações de longo prazo. Apesar disso, não se deve despreza-los e seria muito cômodo
critica-los e esquecer-se de que algumas pessoas, ao final dos projetos, possam vir
a ter alguma carência, problema ou necessidade atendida. Em defesa dos trabalhos
com projetos dos alunos, o professor Risso afirma que “não se deve ser interpretado
como um braço assistencialista da sociedade. Antes, merece ser visto como lugar de
formação da cidadania e da profissionalização consciente, crítica, ética” (2005, p.
64). Acrescenta-se também a esta citação a possibilidade de os alunos
desenvolverem habilidades e comportamentos empreendedores, além de se
sentirem mais capazes de intervirem socialmente nos problemas comunitários.
Logicamente que combater os problemas em sua raiz é mais indicado para que o
mesmo não volte a ocorrer. Mas como menciona Dolabela, “o fato de eliminar
74
Nos projetos sociais são resolvidas questões pontuais e não necessariamente se atacam as causas dos
problemas, além dessas ações serem feitas por agentes que não precisam fazer parte da comunidade atendida.
75
Assistencialismo é a doutrina, sistema ou prática (individual, grupal, estatal, social) que preconiza e/ou
organiza e presta assistência a membros carentes ou necessitados de uma comunidade nacional ou mesmo
internacional, em detrimento de uma política que os tire da condição de carentes e necessitados (Instituto
Antônio Houaiss de Lexicografia, 2001, p. 323).
167
problemas prementes e atuar nos sintomas não torna o empreendedor social menos
importante” (2003b, p. 43).
Uma condição essencial para o êxito dos projetos é a utilização de uma
metodologia que favoreça a materialização de uma intenção, que se vale de
pesquisa, de planejamento, de organização, de estratégias de atuação, de ações
coletivas, de mobilização de conhecimentos e habilidades, em suma, que
proporcione condições para que os alunos realizem o que se propuserem resolver. E
como recomenda Oliveira, também é importante que se potencializem as “ações das
faculdades e universidades por intermédio de projetos de extensão na perspectiva
do empreendedorismo social” (2004, p. 18).
5.4 Referenciais teóricos da viabilidade da educação empreendedora
De posse das considerações anteriores sobre empreendedorismo, é
possível agora avançar para a questão da educação empreendedora. A importância
de apontar referenciais que possam validar o aprendizado do empreendedorismo
justifica-se, essencialmente, por ainda hoje existir a idéia de que ser empreendedor
é uma característica inata e que não pode ser aprendida. De fato, o empreendedor
inato existe; porém, de acordo com os pesquisadores estudados, verifica-se que
existe a possibilidade de qualquer pessoa desenvolver habilidades e
comportamentos empreendedores. Segundo Dornelas,
até alguns anos atrás, acreditava-se que o empreendedor era inato, que
nascia com um diferencial e era predestinado ao sucesso nos negócios.
Pessoas sem essas características eram desencorajadas a empreender. [...]
Hoje em dia, esse discurso mudou e, cada vez mais, acredita-se que o
processo empreendedor pode ser ensinado e entendido por qualquer
pessoa (2005, p. 40).
Contribuindo com esta mesma percepção, Dolabela fala que, “o espírito
empreendedor não é um ‘dom’ de poucos, mas uma característica comum a todos e,
portanto, pode ser desenvolvida” (2003a, p. 27). O que chama a atenção nesta frase
de Dolabela é que ele considera que todos os indivíduos têm dentro de si uma
capacidade empreendedora. Outro detalhe é que o autor fala em desenvolver
características empreendedoras. Foi num outro livro que Dolabela trabalhou melhor
168
esta questão. Segundo o autor, “ainda não existe resposta científica sobre se é
possível ensinar alguém a ser empreendedor. Mas sabe-se que é possível aprender
a -lo” (1999, p. 23). Portanto, segundo Dolabela (2004), as pessoas nascem com
condições de se tornarem empreendedoras, assim como todo mundo nasce com
potencial para andar, cantar, tocar um piano.
“O Veículo de sua aplicação pode ser uma disciplina (ou várias) inserida em
um curso de segundo ou terceiro graus” (1999, p. 23). Isto quer dizer que não há a
necessidade de ter a disciplina de empreendedorismo inserida no currículo escolar
para se estimular e criar condições de os alunos desenvolverem o seu potencial
empreendedor. Também não se manifesta restrições quanto a disciplina que poderá
trabalhar com o empreendedorismo. Por outro lado, pelo fato de o
empreendedorismo tratar de um campo novo de estudo, seria mais adequado haver
uma disciplina específica
76
de empreendedorismo, sendo esta ministrada por um
professor com conhecimento teórico e prático desta área.
Com relação à educação empreendedora, Dolabela comenta que esta se
refere a um processo de desenvolvimento e não de transmissão de conhecimento
como se caracteriza o ofício de ensinar. Da mesma forma, Filion pensa o tema
quando diz, “ao meu ver, não se pode ensinar empreendedorismo como se ensinam
outras matérias. Mas o empreendedorismo se aprende. É possível conceber
programas e cursos como sistemas de aprendizado adaptados à lógica desse
Campo de estudo(2000a, p. 25). Numa obra destinada a falar do todo CEFE
77
,
mais exatamente na parte em que são pontuados os relatos das experiências
universitárias da inserção desta metodologia, os autores dizem que,
vários são os estudos que comprovam que é possível ensinar os indivíduos
a agir e pensar por conta própria, o que pode ser transportado para o ensino
do empreendedorismo. Se é possível preparar o estudante para ser
empregado, e isso vem sendo feito anos nas instituições universitárias,
também é possível ensinar a ser empreendedor (PEREYRA, et al., 2003, p.
146).
76
Esta opção deve valer tanto para o ensino médio quanto para o universitário.
77
CEFE (Competência Econômica via Formação de Empreendedores) metodologia baseada no aprender
fazendo, cujas cinco etapas que a constituem se tratam de ferramentas que visam capacitar a pessoa para o
desenvolvimento de suas características empreendedoras.
169
Em toda a literatura pesquisada, apenas uma entende que nem todas as
pessoas possuem características próprias de empreendedores e questiona a
possibilidade de desenvolver as características empreendedoras na ausência
intrínseca delas. As palavras que manifestam este posicionamento são de autoria de
Fernando Garcia. Este autor diz, “há quem pense que os empreendedores podem
ser construídos. É preciso ter cautela com tal afirmação, pois isso é relativo. Se não
houver um propósito nem algumas características naturais presentes, não
poderemos desenvolver a qualidade empreendedora(2003, p. 35). Com relação à
preocupação em ter propósito, concorda-se com o comentário do autor. Possuir um
propósito está visivelmente presente na “Teoria Empreendedora dos Sonhos” de
Dolabela, já salientada neste trabalho. Também se constata a presença de um
propósito, dentro da metodologia de projeto. Por outro lado, diferentemente de
Garcia, acredita-se que é possível encontrar em todas as pessoas características
empreendedoras e, sendo assim, o aprendizado tende a ser viável a todos. Para
Garcia, conforme ele mesmo enfatiza, “o aprendizado efetivo do empreendedorismo
é possível quando se constrói com conteúdos existentes nos próprios alunos”
(2003, p. 25). Desta forma, quem não possuir determinadas características, não será
passível de desenvolver características empreendedoras.
Para o professor de empreendedorismo Stevenson
78
(2001) existem
pessoas que não conseguem ser empreendedoras. Ele cita que se alguém tiver
dificuldades de se comunicar com os demais, é muito difícil que se torne um
empreendedor. Entretanto assegura que se forem dadas certas condições a uma
pessoa, é possível ajudá-la a desenvolver novas habilidades. O básico é que essa
pessoa possua capacidade de comunicação, vontade de empreender e conheça o
terreno, no qual terá de se movimentar.
Merece atenção também a colocação de Spinelli Jr
79
tendo em vista o fato
deste representar a Babson College
80
que foi uma das pioneiras faculdades no
ensino de empreendedorismo nos Estados Unidos. Da mesma forma que
78
Howard H. Stevenson é um renomado especialista em gestão empreendedora da escola de administração de
empresas da Harvard University.
79
Stephen Spinelli Junior é considerado um dos maiores nomes de empreendedorismo na atualidade e no ano da
referida citação (2003) era diretor do Babson College.
80
O Babson College é uma faculdade de negócios localizada em Wellesley, MA, próxima à cidade de Boston
nos Estados Unidos. Foi fundada em 1919 e hoje é considerada a principal faculdade de negócios no mundo com
foco em empreendedorismo. Desde que a revista US News & World Report instituiu a lista de melhores
faculdades de negócios do país, 15 anos, o Babson College sempre aparece como melhor instituição para
formação de empreendedores.
170
Stevenson, o ex-diretor da Babson, Spinelli entende ser possível ensinar as pessoas
a serem empreendedores, mas isso o quer dizer que possa ser aplicado a todos.
E o maior desafio com relação ao ensino para Spinelli é fazer a integração da teoria
com a prática, o que manifesta uma preocupação com questões pedagógicas (na
dimensão do pensamento) e metodológicas (na dimensão da ação).
Muitos empreendedores pensam que empreendedorismo não pode ser
ensinado e me desafiam com a questão. Eu sempre respondo com uma
pergunta: vocês aprenderam algo com os anos em que foram
Empreendedores? Invariavelmente a resposta é sim, aprendemos muito”.
Então, se pode ser aprendido, também pode ser ensinado! Isso não
significa, no entanto, que todos podem aprender a se tornar um
empreendedor a partir de uma sala de aula. O desafio, nesse sentido, é
juntar teoria (pensamento) e ação de uma maneira que os alunos absorvam
a experiência de empreendedores já testados (SPINELLI JR., 2003, p. 1).
Uma realidade do contexto brasileiro que corrobora com a validade da
educação empreendedora, mas que ao mesmo tempo, mostra que a área do
empreendedorismo tem muito que se expandir, fato que também se deve por se
tratar de um campo de estudo relativamente novo no meio acadêmico
81
é a
existência de 17 cursos com habilitação na área do empreendedorismo. Todos são
cursos autorizados pelo MEC e oferecidos tanto por universidades públicas como
privadas e por várias faculdades do país. Não foram considerados os cursos que
tem o empreendedorismo apenas como uma disciplina. Os mesmos podem ser
observados no quadro 05.
Curso / habilitação Instituição Cidade / UF
Administração Área Gestão do
Empreendedorismo
Universidade Metropolitana de
Santos – UNIMES
Santos – SP
Administração de Empresas com
Habilitação em
Empreendedorismo/Sucessão
Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul – PUCRS
Porto Alegre – RS
Administração (Ênfase em
Empreendedorismo e Gestão
Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais – PUC Minas
Belo Horizonte - MG
81
“No Brasil, pode-se dizer que o empreendedorismo está apenas começando [...]. O primeiro curso de que se
tem notícia na área surgiu em 1981, na Escola de Administração de Empresa da Fundação Getúlio Vargas, São
Paulo, por iniciativa do professor Ronald Degen e se chamava ‘Novos Negócios’. Era uma disciplina do CEAG
– Curso de Especialização em Administração para Graduados” (DOLABELA, 1999, p. 54).
171
Estratégica) (São Gabriel)
Curso Superior de Tecnologia em
Empreendedorismo
Instituto Superior Tupy - Ist-IST Joinville – SC
Curso Superior de \tecnologia em
Empreendedorismo Ênfase em
Gestão de Micro e Pequenas
Empresas
Centro Universitário de Jaraguá
do Sul – UNERJ
Jaraguá do Sul – SC
Curso Superior de Tecnologia em
Gestão de Pequenas e Médias
Empresas e Empreendedorismo
Centro Universitário de Brasília
UniCEUB
Brasília – DF
Empreendedorismo Faculdade Octógono – FOCO Santo André – SP
Empreendedorismo Universidade Presidente
Antônio Carlos - UNIPAC
Conselheiro Lafaiete
– MG
Empreendedorismo Faculdade Luterana Rui
Barbosa – FALURB
Marechal Candido
Rondon – PR
Empreendedorismo Faculdade Ideal – FACI Belém – PR
Empreendedorismo Faculdade Capivari – FUCAP Capivari de Baixo
SC
Empreendedorismo Universidade Presidente
Antônio Carlos – UNIPAC
Muriae – MG
Empreendedorismo e Negócios União das Faculdades dos
Grandes Lagos Unilago
UNILAGO
São José do Rio
Preto – SP
Empreendedorismo e Negócios Universidade Federal de Itajubá
– Unifei – UNIFEI
Itajubá – MG
Empreendedorismo e Negócios Faculdades Integradas de Três
Lagoas – AEMS
Três Lagoas – MS
Gestão de Negócios e
Empreendedorismo
Faneesp Faculdade Nacional
de Educação e Ensino Superior
do Paraná – FANEESP
Araucária – PR
Gestão e Empreendedorismo Universidade do Paraná – UFPR
Matinhos – PR
Quadro 05: Cursos com habilitação na área de empreendedorismo
Fonte: MEC (2008).
O professor Emanuel Leite mostra a disseminação dos cursos de
empreendedorismo quando coloca em sua obra, justamente na parte em que trata
sobre o “mito” do empreendedor inato. O autor escreve, “empreendedores nascem,
172
não são feitos, formados: se isto fosse verdadeiro, não estaríamos presenciando
esta explosão de cursos, em todos os níveis, graduação e pós-graduação, para
formarem empreendedores” (2002, p. 185). A intensidade do surgimento de cursos,
referida por Leite, abrange países de todos os cantos do mundo e não apenas o
Brasil. Utilizando as palavras do autor este escreve: “os cursos de preparação de
empreendedores estão sendo ministrados, desde os EUA até a China” (2002, p.
349). Também de forma clara e objetiva, Pereyra et al. ressalta a comprovação
mencionada. “Promover o empreendedorismo nas universidades vem sendo
discutido algum tempo, e muitas experiências estão acontecendo hoje no Brasil e
no mundo” (2003, p. 144).
Em termos de pesquisa acadêmica, através da consulta no site
82
da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), se pode
constatar que o número de teses e dissertações catalogadas sobre o tema
empreendedorismo vem crescendo a cada ano. Isto também são indícios de que aos
poucos o empreendedorismo vai ganhando mais interesse acadêmico, o que
resultará em mais reflexões e discussões a respeito deste fenômeno e de sua
importância e, por conseguinte, alguns mitos como a de que ser empreendedor é
uma condição exclusivamente inata, tende a cair por terra. Os resultados das
publicações acadêmicas são apresentados no quadro 06.
ANO Número de Teses/Dissertações
ANO
Número de Teses/Dissertações
1987 2 1997
17
1988 2 1998
18
1989 2 1999
30
1990 2 2000
52
1991 4 2001
52
1992 5 2002
104
1993 5 2003
133
1994 3 2004
143
1995 11 2005
168
1996 13 2006
170
Quadro 06: Número de Teses e Dissertações sobre empreendedorismo publicadas no Brasil de 1987
a 2006
Fonte: CAPES (2008).
82
www.capes.gov.br
173
Também se pode perceber uma diversificação do estudo do
empreendedorismo. Como realça Souza et al. (in SOUZA, E; GUIMARÃES, T., 2005,
p. 212), o ensino do tema “vem sendo desenvolvido por profissionais de diferentes
áreas do conhecimento e unidades acadêmicas”. Conforme o estudo de Ferreira Jr.
et al. (2005), a predominância está nos cursos de administração justamente pela
proximidade que esta área mantém com o empreendedorismo, desde os seus
primórdios. Aqui no Brasil, o ensino de empreendedorismo iniciou inserido dentro do
campo da administração como sub-área e recentemente vem sendo estudado como
campo específico de conhecimento. Também é possível verificar a inserção do
empreendedorismo nos cursos de Turismo, Hotelaria, Informática, Engenharia,
Contabilidade, Farmácia, entre outros. Pode-se confirmar esta penetração do
empreendedorismo e sua interdisciplinaridade nas várias áreas da atuação humana,
a partir do quadro 07 que mostra os principais temas de pesquisas realizadas com
essa temática, nos quais se chama atenção para a presença da educação
empreendedora.
PRINCIPAIS TEMAS DE PESQUISA
Características comportamentais de empreendedores
Características econômicas e demográficas de pequenos negócios
Empreendedorismo e pequenos negócios em países em desenvolvimento
Características gerenciais dos empreendedores
O processo empreendedor
Oportunidades de negócio
Desenvolvimento de negócios
Capital de risco e financiamento de pequenos negócios
Gerenciamento de negócios, recuperação e aquisição
Firmas de alta tecnologia
Estratégia e crescimento de empresas empreendedoras
Alianças estratégicas
Empreendedorismo em corporações ou intraempreendedorismo
Empresas familiares
Auto-emprego
Incubadoras e sistemas de apoio ao empreendedorismo
174
Sistemas de redes
Fatores influenciando criação e desenvolvimento de novos empreendimentos
Políticas governamentais e criação de novos empreendimentos
Mulheres, minorias, grupos étnicos e empreendedorismo
Educação empreendedora
Pesquisa empreendedora
Estudos culturais comparativos
Empreendedorismo e sociedade
Franquias
Quadro 07: Principais temas de pesquisas realizadas com a temática do empreendedorismo
Fonte: Filion (1999, p. 11).
Apesar da disseminação do empreendedorismo nas Instituições de Ensino
Superior, ainda muito trabalho para consolidá-lo e incorporá-lo aos currículos dos
cursos nestas instituições. Conforme o estudo de Souza e Guimarães,
as disciplinas são ofertadas nos cursos de graduação, sendo a maioria em
cursos de extensão e em nível de pós-graduação lato sensu, isto é, cursos
de especialização. Algumas disciplinas abordam o empreendedorismo como
tema central em seus planos e, em número maior de disciplinas, o tema
aparece apenas inserido como um tópico do conteúdo programático. A
grande parte das disciplinas é de natureza optativa e outras, em menor
número, são obrigatórias para a conclusão dos cursos (in SOUZA;
GUIMARÃES, 2005, p. 245).
Independentemente do curso, o conteúdo trabalhado em aula se repete com
bastante freqüência. Em geral, os cursos limitam-se a tratar sobre Plano de
Negócios e isto muito se deve à visão restrita de enxergar o empreendedorismo
como uma simples prática de negócios. Em países do primeiro mundo como
Canadá, Estados Unidos, Itália, entre outros, onde o ensino do empreendedorismo
está mais adiantado que no Brasil, não ocorre exclusivamente o predomínio do
uso do plano de negócios. O conceituado professor e pesquisador da área, o
canadense Louis Filion disse que, “há dez ou quinze anos, a educação
empreendedora centrava-se no plano de negócios. nos dias de hoje, o plano de
negócios é utilizado cada vez mais como etapa conclusiva” (2000a, p. 27).
175
Aqui no Brasil, esta mudança está ocorrendo de forma muito lenta. Tal
questão está sendo destacada em virtude de este trabalho considerar a hipótese de
os alunos virem a desenvolver habilidades e comportamentos empreendedores,
fugindo assim, do escopo tradicional do ensino do empreendedorismo, que é
baseado essencialmente em desenvolver planos de negócios. Esta ferramenta de
ensino citada é muito indicada para quem pretende abrir uma empresa, mas este
não é o objetivo principal dos cursos de Turismo. o desenvolvimento de
habilidades e comportamentos empreendedores é cogitado neste trabalho como
uma proposta que vai ao encontro do perfil profissional traçado pelas Diretrizes
Curriculares do Bacharelado de Turismo, sendo assim, mais coerente de ser
explorada neste curso.
Pertinente neste momento é apresentar os pensamentos de autores que
corroboram com a idéia da ampliação do estudo do empreendedorismo, validando
assim, a penetração deste fenômeno em várias áreas do conhecimento. Para Filion
“a expressão empreendedora não se aplica somente à prática dos negócios, mas a
todas as esferas das atividades humanas” (2000a, p. 35). Semelhante visão é
encontrada na pesquisa de Longen.
Embora muitas vezes a maioria dos conceitos, estudos e pesquisas
efetuados sobre empreendedores refiram-se a área de negócios, é
importante frisar que este deve ser vislumbrado em todos os ramos de
atividade humana como as artes, o esporte, a política, música entre outras
(LONGEN, 1997, p. 10).
A partir desta compreensão mais ampla da atividade empreendedora, não faz
sentido que o foco da educação seja exclusivamente relacionado a abrir empresas,
montar negócios, entre outros assuntos relacionados mais direcionados à área
administrativa. Esta perspectiva é defendida com as seguintes palavras de Filion:
“As demandas por educação e formação empreendedora não advêm somente das
pessoas que desejam se lançarem no mundo dos negócios por conta própria. Dizem
respeito igualmente a todas as áreas das ciências humanas e administrativas”
(2000a, p. 16). Percepção semelhante, aplicada ao ato de empreender, se encontra
nas palavras de Drucker. Segundo este autor,
176
empreender diz respeito a todas as atividades dos seres humanos. [...] E
sabemos que existe pouca diferença no espírito empreendedor, qualquer
que seja a esfera que atue. O empreendedor na educação e o
empreendedor em serviços de saúde – ambos têm sido campos férteis para
eles fazem praticamente as mesmas coisas, usam praticamente os
mesmos instrumentos, e enfrentam praticamente os mesmos problemas de
um empreendedor em uma empresa ou em um sindicato de trabalhadores
(DRUCKER, 2003, p. 36).
Faz-se mister que se reconheça a possibilidade de explorar outros enfoques,
diferentes aspectos sobre o empreendedorismo, como se vislumbra neste trabalho.
Maior exemplo prático que se pode dar a respeito do leque de possibilidades do
estudo e do desenvolvimento do empreendedorismo e que não faz uso do plano de
negócios, foi a experiência de Dolabela em Cuba. Neste país, este professor deu
palestras e cursos de empreendedorismo. Com relação a esta experiência o autor
comenta que “mesmo lá, onde a criação de empresas é proibida, eles querem incutir
o espírito empreendedor na sociedade. Hoje, não canto deste planeta em que
não se busque o espírito empreendedor” (DOLABELA, 2000a, p. 86). Ou como diz
Filion, “a necessidade de desenvolver programas, cursos e atividades de
treinamento sobre empreendedorismo parece crescer a cada ano em diversos
países” (2000b, p. 2). E o que se busca não é unicamente ensinar teorias e
conhecimentos que contribuam para o sucesso dos empreendimentos, mas também
se busca o aprimoramento do indivíduo visando a formação de empreendedores
bem sucedidos (BATISTA, 2004).
Considerando o empreendedorismo como um processo que pode ser
aprendido e, portanto, ensinado, Drucker montou em 1953 o curso de
Empreendedorismo e Inovação na New York University. A partir deste curso, muitos
outros começaram a surgir nos Estados Unidos. Portanto, para Drucker (2003)
qualquer indivíduo pode aprender e se comportar de forma empreendedora. A partir
deste entendimento, o pensamento de Dolabela vem bem ao encontro do que foi
dito:
A educação empreendedora deve reconhecer que todo ser humano tem
capacidade empreendedora. Este entendimento certamente é chocante e
polêmico, mas apenas meio século pensava-se o mesmo sobre o
administrador de empresas. Hoje ninguém duvida da eficácia de um MBA
(DOLABELA, 2003a, p. 128).
177
Aqui foi reforçada, mais uma vez, a idéia de que todo indivíduo possui
características empreendedoras. Elas estão na verdade, adormecidas e precisam
ser libertadas (DOLABELA, 2003a). O que é necessário pontuar, neste momento, é
que as características empreendedoras precisam ser desenvolvidas; caso contrário,
elas não irão se manifestar. Isso significa que não basta possuir características
empreendedoras; é preciso haver uma situação que instigue o desenvolvimento
delas, além é claro, do interesse e da vontade da pessoa em realizar o potencial
empreendedor que acredita que tem dentro de si. Em suma, a educação
empreendedora precisaria ter uma função mais ampla e liberar o potencial
empreendedor do educando para além da abertura de empresas e não apenas para
atender a objetivos de capacitação para a área empresarial (DOLABELA, 1999).
Nesta perspectiva mais ampla referente à educação empreendedora, de acordo com
Pires, “o que se busca é gerar atitudes e ações empreendedoras nos alunos,
características essas úteis a todos” (2006, p. 28). Trazendo diferentes argumentos e
reforçando outros que dizem respeito à necessidade de extrapolar a visão
administrativa do empreendedorismo, fazendo-o desgarrar-se de sua origem
econômico-empresarial, Silva, L. et al., apresenta a seguinte colocação:
A ação empreendedora não se restringe à criação de uma empresa, mas,
sobretudo, revela-se como um modo de agir no mundo, modificando-o.
Refere-se àquele que mesmo sem deixar a organização, promove a
inovação (intraempreendedor); tamm, àquele que ousa nas suas práticas
íntimas e cotidianas; e àquele que interfere nas práticas sociais,
abrandando a exclusão, o infortúnio. O empreendedorismo como “estilo de
vida”, independente do seu campo de ão, contribui para o
desenvolvimento da sociedade em todos os sentidos (2003, p. 5).
São necessárias mais pesquisas e estudos para afirmar que o empreendedorismo
pode dar toda essa contribuição para a sociedade, mas não se pode negar que é
bastante válido incentivar uma formação que propicie ações transformadoras,
inovadoras, interventoras, criativas e ousadas, como se propõe a educação
empreendedora. E a partir desta, espera-se que haja reflexos positivos na sociedade
como um todo. Uma citação mais comedida como a de Dolabela seria mais
prudente. “Tudo indica ser ele, o empreendedor, a fagulha capaz de disparar não
178
o processo de desenvolvimento econômico, mas principalmente humano e social”
(DOLABELA, 2001, p. 63).
Apesar de a preocupação principal deste subcapítulo ter sido com a
apresentação de referências que demonstrem a viabilidade da educação
empreendedora, também é importante mencionar alguns fatores inibidores do
desenvolvimento do potencial empreendedor. A partir do conhecimento dos
empecilhos, permite-se compreender melhor os seus entraves para buscar, de forma
mais adequada, caminhos para desenvolver a cultura empreendedora no país.
Falando especificamente ao Brasil
83
, Filion (2000a) apontou seis
obstáculos
84
: autoconfiança (para o autor, os brasileiros se quiserem entrar na
sociedade empreendedora precisam melhorar sua autoconfiança); falta de confiança
que existe entre os brasileiros (o brasileiro não confia em brasileiro, na visão de
Filion); desenvolver abordagens próprias ao Brasil (os modelos organizacionais e
sociais o primeiramente culturais e por essa razão, diz Filion, os modelos
brasileiros não virão dos Estados Unidos nem da Europa, mas do Brasil, ou seja,
identificadas com as características culturais); disciplina (ela se torna a condição da
superação dos três primeiros obstáculos); necessidade de compartilhamento (se não
souberem partilhar, alerta Filion, todo mundo perde, pois as diferenças de riquezas
acabam por justificar o roubo e a violência nas camadas mais pobres); e burocracia
(a burocracia, na opinião de Filion está ligada aos cinco obstáculos anteriores e, em
parte, é conseqüência deles). E como principal meio para vencer esses obstáculos,
Filion destacou a educação superior, principalmente por ser a universidade a
principal formadora de opinião e multiplicadora do saber, condições essas
essenciais para a criação de uma cultura empreendedora.
Referindo-se ao ambiente mais hostil para o empreendedorismo, Dolabela
apontou a família, como o mais forte, e a escola como reforçadora dessa. No
entendimento de Dolabela (2005, p. 13) “ambas são inibidoras do potencial
empreendedor. E a essa inibição opera já quando a criança está no útero. A biologia
nos define como uma espécie capaz de empreender. Mas a cultura é que define
tudo e acaba com tudo”.
83
Os pensamentos de Filion foram apresentados no Seminário Internacional – A Universidade Formando
Empreendedores que foi promovido pelo Instituto Euvaldo Lodi (IEL) em Brasília no ano de 1999 e
posteriormente resultou no livro: Empreendedorismo: Ciência, Técnica e Arte, publicado em 2000.
84
Filion faz uma pequena observação em relação aos obstáculos: “Na verdade, não acredito que sejam tão
particulares ao Brasil, pois são encontrados também em todos os países latinos, inclusive na província de
Québec. Esses obstáculos existiam na Europa e nos Estados Unidos no início do século” (FILION, 2000a, p. 34).
179
Outros três fatores, numa ótica mais empresarial, que inibem o surgimento
de novos empreendedores foram citados por Degen. São eles, a imagem social, a
disposição para assumir riscos e o capital social. Sobre o primeiro fator mencionado
comenta Degen:
A realidade é que todo empreendedor que deseja ter sucesso precisa estar
disposto a, no início, desenvolver ele mesmo todas as atividades na sua
empresa. É preciso fazer compras, atender pessoalmente a clientes e
fornecedores, vender, entregar, fazer contabilidade e, eventualmente, até
limpeza. [...] Porém, muitos pensam que, após terem atingido uma boa
posição como empregados, as tarefas necessárias para iniciar um novo
negócio vão prejudicar a sua imagem social. Por este motivo acabam
preferindo permanecer no “conforto” do emprego (1989, p. 11).
Em relação à questão do risco Degen comenta que, “nem todas as pessoas têm a
mesma disposição para assumir riscos. Muitos precisam de uma vida regrada,
horários certos, salário garantido no fim do mês e assim por diante” (1989, p. 11). E
o capital social diz respeito “aos valores e idéias que sublinarmente nos foram
incutidos por nossos pais, professores, amigos e outros que influenciaram na nossa
formação intelectual e que, inconscientemente, orientam nossas vidas” (DEGEN,
1989, p. 12). Como exemplo desta questão Degen cita que
um pai, engenheiro de uma grande empresa, pode, [...] despertar nos filhos
o ideal de seguir a mesma carreira, devido à natural admiração que têm por
ele. Dificilmente vão considerar a opção de serem empreendedores, pois o
sucesso, para eles, está ligado ao desenvolvimento de suas carreiras como
engenheiros em grandes empresas (1989, p. 12).
Percebe-se que não são poucos os obstáculos a serem superados e que eles estão
presentes em vários âmbitos, desde o familiar e o pessoal, até o social. Para quem
pretende colaborar na formação de novos empreendedores, desenha-se uma
situação bastante desafiadora que requer muita dedicação, convicção, preparo e
vontade para estimular o potencial empreendedor. São desafios ponderáveis, mas
não insuperáveis.
180
E por fim, em se tratando de levantar obstáculos que acabam dificultando o
desenvolvimento de empreendedores, é preciso considerar também o principal meio
de formação dos alunos que são as universidades. No parecer de Dolabela (2000a,
p. 86) “no caso do empreendedorismo, as nossas universidades têm ainda que
superar desafios internos para poder concentrar as suas energias na formação de
pessoas com tais características”. Um pensamento semelhante a este foi escrito por
Leite. “O modelo organizacional em que assenta hoje o ensino universitário brasileiro
está, em nossa opinião, esgotado. É preciso (re)institucionalizar e (re)inventar o
ensino superior brasileiro, baseado no empreendedorismo” (2002, p. 543).
5.5 Indícios para o desenvolvimento das características empreendedoras
No subcapítulo anterior, a preocupação de apresentar aportes teóricos que
conferem validade para a promoção da educação empreendedora, acabou
levantando algumas formas que contribuem para nortear o processo do aprendizado
empreendedor. O que deve ficar bem claro sobre a educação empreendedora é que
o objetivo da educação empreendedora é criar situações de aprendizado
(DOLABELA, 2003a). Esta condição entende-se como básica porque será a partir de
situações criadas que se pretende despertar as características empreendedoras.
Este entendimento leva a um outro ponto fundamental. Através de um processo,
basicamente pró-ativo, é que se visa adquirir habilidades e desenvolver
comportamentos empreendedores. Portanto, o maior responsável pelo aprendizado
empreendedor é o próprio aluno. Em razão disso, o auto-aprendizado é um dos
pontos basilares para qualquer metodologia que pretende fazer com que as pessoas
desenvolvam características empreendedoras. Utilizando-se da literatura para
comprovar o que foi dito, Dolabela escreve: “o saber empreendedor é construído a
partir da ação e da reflexão sobre ela” (2003b, p. 80). O mesmo autor depois
ressalta, “o ‘ensino’ para o desenvolvimento do saber empreendedor não é
constituído pela transferência de conhecimentos, mas pela indução à prática
(2003b, p. 92). Filion confirma este pensamento dizendo que o caminho do futuro
empreendedor “implica que o aluno deve desenvolver uma relação pró-ativa com o
aprendizado” (2000a, p. 38). Tais colocações levam a crer que uma proposta
didática para o desenvolvimento das características empreendedoras deve levar os
alunos a agir, a realizar atividades práticas, fato que irá resultar essencialmente
numa aprendizagem ativa, ou seja, aquela que leva o educando a aprender por si,
181
via prática. Numa situação desta, isto é, na educação empreendedora, cabe ao
professor criar condições para que o aluno possa desenvolver sua capacidade
empreendedora. O educador passará a orientar, apoiar e estimular o aluno em sua
busca da construção do saber empreendedor. Segundo Dolabela (2003b, p. 103), “a
ênfase no auto-aprendizado não diminui o âmbito de ação do professor. Pelo
contrário, aumenta sua importância, já que cabe a ele ampliar as referências e
fontes de aprendizado e redefinir o próprio conceito de saber”. Mudam, portanto, as
estratégias de aquisição de conhecimento que o professor vai propor ao aluno. De
um transmissor de conhecimento, o educador passará a ser um orientador de
estudos, o qual cria situações de aprendizagem.
Duas outras considerações relatadas na literatura a partir de experiências
práticas merecem ser destacadas. A primeira aponta que a educação
empreendedora deve extrapolar os limites da sala de aula, pois fica muito limitado
neste espaço o desenvolvimento das habilidades empreendedoras e, também,
porque a interação do aluno com o ambiente externo é muito rico em termos de
conhecimentos e aprendizado. O professor Dolabela, especializado na educação
empreendedora, é que fala: “a conexão do aluno com o mundo exterior à sala de
aula precisa ser intensa e direta” (1999, p. 102). A outra consideração afirma que,
“para haver efetividade didática na área de empreendedorismo, é essencial que o
aprendizado seja insistentemente contextualizado” (1999, p. 114). Isso quer dizer
que os conteúdos trabalhados, que as ações de aprendizagem propostas, devam
fazer parte da vida do aluno na qual este possa ver a importância do que aprende,
conseguindo assim, dar significado aos conteúdos. Em outras palavras como diz,
Martins et al., também se referindo às condições adequadas para a promoção de
uma educação empreendedora,
a aquisição de conhecimento e habilidades não pode acontecer de forma
isolada e descontextualizada. A falta de contato do conhecimento com a
realidade faz com que se produzam verdadeiros mosaicos de informações,
de conhecimentos paralelos, desagregados uns dos outros e, até mesmo,
antagônicos (2001, p. 4).
Em decorrência destas considerações, fica claro perceber que a educação
empreendedora deve seguir uma metodologia própria, bastante diferente da utilizada
182
no ensino tradicional. Esta percepção é claramente exposta nas palavras de Luiz
Fernando Garcia que diz: “A formação do empreendedor não deve ser pensada nos
mesmos termos da educação tradicional” (2000, p. 119). E conforme Dolabela
(2003a, p.44), “o empreendedorismo não é conhecimento que se aprenda como
geografia ou matemática nem que se ensine de forma tradicional”. Isto pode ser
comprovado numa pesquisa
85
realizada junto a várias Instituições de Ensino
Superior que oferecem o estudo de empreendedorismo em seus currículos. Com
base nas leituras dos dados apurados, os pesquisadores Souza e Guimarães (in
SOUZA; GUIMARÃES, 2005, p. 244) disseram que “o programa de
empreendedorismo é visto como mais amplo do que ‘ensinar’, posto que inclui
outras atividades
86
”, além das aulas expositivas que predominam no ensino
tradicional.
Cabe neste momento fazer uma consideração mais pormenorizada sobre a
abordagem tradicional de ensino, em relação a algumas características pontuais que
já foram citadas nesta pesquisa. Conforme Mizukami, na educação tradicional
a ênfase é dada às situações de sala de aula, onde os alunos são
“instruídos” e “ensinados” pelo professor. Comumente, pois, subordina-se a
educação à instrução, considerando a aprendizagem do aluno como um fim
em si mesmo: os conteúdos e as informações têm de ser adquiridos, os
modelos imitados (1986, p. 13).
No que tange a relação professor-aluno, Mizukami comenta que ela é vertical, sendo
que o professor é quem “detém o poder decisório quanto à metodologia, conteúdo,
avaliação, forma de interação na aula etc. Ao professor compete informar e conduzir
seus alunos em direção a objetivos que lhes são externos” (1986, p. 14). E com
relação à metodologia, esta se caracteriza enfaticamente pelas aulas expositivas e
pelas demonstrações que o professor realiza nas aulas. Predomina, portanto, a
85
O estudo descreve um mapa do ensino de empreendedorismo em Instituições de Ensino Superior (IES)
brasileiras, participantes do Projeto de Ensino Universitário de Empreendedorismo (PEUE), promovido pelo
Núcleo nacional do Instituto Euvaldo Lodi (IEL) e pelo SEBRAE Nacional. Ao todo participaram da pesquisa 58
(IES) públicas e 78 (IES) privadas, no período de 1998 a 2001, em 16 unidades da Federação: DF. PE, PA, MG,
RN, PR, AL, MA, AM, CE, BA, MT, ES, RJ,GO e PB.
86
Essas outras atividades se referem às utilizadas na Oficina do Empreendedor (metodologia de ensino de
empreendedorismo criada pelo professor Dolabela).
183
transmissão de informações e conhecimentos de forma que o aluno receba tudo
pronto e também não é incentivado à problematização. Nas palavras de Mizukami,
o professor traz o conteúdo pronto e o aluno se limita, passivamente, a
escutá-lo. O ponto fundamental desse processo será o produto da
aprendizagem. A reprodução dos conteúdos feita pelo aluno, de forma
automática e sem variações, na maioria das vezes, é considerada como um
poderoso indicador de que houve aprendizagem e de que, portanto, o
produto está assegurado. A didática tradicional quase que poderia ser
resumida, pois em “dar a lição” e em tomar a lição”. São reprimidos
frequentemente os elementos da vida emocional ou afetiva por se julgarem
impeditivos de uma boa e útil direção do trabalho de ensino (1986, p. 15).
Pode-se constatar que no ensino tradicional a ênfase não é colocada no
aluno, mas na intervenção do professor que exigirá do aluno basicamente a
capacidade de acumular e armazenar informações que transmitiu ao aluno,
processo esse que Paulo Freire chamou de “educação bancária”, ou seja, uma
educação que se caracteriza por “depositar”, no aluno, conhecimentos, informações,
dados, fatos etc.
Como defendem Dolabela (2003a) e Filion (2000a), não se pode ensinar
empreendedorismo como se ensinam tradicionalmente as outras matérias. Por esta
razão é necessário estruturar programas e cursos de empreendedorismo dentro da
lógica desse campo de estudo. Deve-se levar em conta a maneira pela qual o
empreendedor aprende. Mas também não se pode relegar completamente as
práticas características do ensino tradicional para o desenvolvimento da educação
empreendedora. Numa citação de Dolabela aparece uma consideração sobre a
educação tradicional. Segundo o autor, “os livros e a educação formal são uma das
fontes de aprendizado, não a única” (2003a, p. 125). Dolabela não desconsiderou
completamente a educação tradicional, mas apenas ressaltou que ela não é a única
que pode ser utilizada.
Como visto anteriormente no ensino tradicional, os conteúdos trabalhados
em aula são bastante valorizados e de fato devem ser, porém na educação
empreendedora, conforme Souza (2001) deve-se buscar desenvolver os predicados
próprios dos empreendedores, de forma que se deve dar ênfase tanto aos
conteúdos a serem trabalhados como na forma de aprendê-los. Esse entendimento
está exposto no seguinte comentário.
184
A formação empreendedora baseia-se no desenvolvimento do
autoconhecimento com ênfase na perseverança, na imaginação, na
criatividade, associadas à inovação. Dessa forma, passa a ser importante
não o conteúdo do que se aprende, mas, sobretudo, como é aprendido,
em outras palavras, o padrão de ensino e aprendizado estabelecido
(SOUZA, E. L. 2001, p. 243).
É importante ressaltar que a busca pelo autoconhecimento, perseverança,
imaginação, inovação e criatividade são características primordiais para serem
estimuladas na formação de alunos empreendedores, no entanto, elas não são as
únicas características dos empreendedores, como se pode ver no próximo
subcapítulo.
Todavia, ainda não se possui uma teoria consolidada a respeito do tema e
pelo menos aqui no Brasil, o empreendedorismo é um campo de estudo emergente.
Em decorrência disso, o empreendedorismo, como argumenta Souza et al. (in
SOUZA, E; GUIMARÃES, T., 2005, p. 204), “busca, em especial, uma metodologia
para o desenvolvimento desta competência, que, mais do que a aquisição de
conhecimentos, envolve o aprender a aprender, a ser, a fazer e, principalmente, a
conviver”.
Em nível acadêmico, a Oficina do Empreendedor, metodologia criada por
Dolabela que visa oferecer condições para que os jovens e adultos do ensino médio
e universitário desenvolvam as competências empreendedoras, é a mais
reconhecida e aplicada nacionalmente. Esta chegou às salas de aula de algumas
universidades em 1996, e até hoje tem sido disseminada. De acordo com a última
pesquisa feita na internet
87
, tal metodologia atingiu mais de quatrocentos
estabelecimentos de ensino superior em 24 estados. Este número de
estabelecimentos ainda é irrisório diante da grande quantidade de universidades e
faculdades que existem no país, fato que comprova a ampla possibilidade de
expansão, não só da educação empreendedora, como também, da criação de novas
abordagens e metodologias para tratar do referido campo de estudo. Embora os
resultados da aplicação desta metodologia tenham sido satisfatórios ao
desenvolvimento do espírito-empreendedor dos jovens, sugere-se, como comenta
Souza et al. (in SOUZA, E; GUIMARÃES, T., 2005, p. 214), “a realização de mais
pesquisas sobre métodos, técnicas de ensino e recursos didáticos utilizados nas IES
87
Site: (www.dolabela.com.br) realizada no dia 20/05/2008.
185
com o intuito de verificar a eficácia do ensino do empreendedorismo”. Não é objetivo
desta pesquisa explorar minuciosamente a metodologia da Oficina do
Empreendedor, no entanto, é válido apontar suas concepções principais, tendo em
vista que o propósito desta também almeja desenvolver habilidades
empreendedoras. Visa-se com isso, então, observar um modelo de procedimento de
como promover o desenvolvimento das características empreendedoras.
Objetivamente falando, segundo seu criador, “a oficina apresenta um processo de
aprendizado, e não de ensino. Ela induz ao contínuo aprender a aprender, que leva
o aluno a proceder como faz o empreendedor na vida real: fazendo, errando,
corrigindo rumos, criando” (DOLABELA, 1999, p. 21). Conforme pontuado neste
trabalho, não pode haver uma bipartição entre ensino e aprendizagem. Embora
sendo processos distintos, eles são complementares. Esta última citação de
Dolabela que leva em conta a maneira pela qual o empreendedor aprende, vai ao
encontro da idéia de como Filion percebe o aprendizado dos empreendedores. E
pela adequação com o intento desta sessão e também com os objetivos desta
pesquisa, merece aqui ser destacado. Para Filion
os empreendedores podem ser considerados pessoas que definem projetos
e identificam o que precisam aprender para realizá-los. Usando isso como
ponto de partida, os empreendedores são pessoas que devem continuar a
aprender para ajustarem-se às atividades de seus ofícios, estando em
constante evolução, e não apenas pessoas que definem suas necessidades
de aprendizado. Os empreendedores devem não só definir o que precisam
fazer, mas também o que têm de aprender para serem capazes de fazê-lo
(1999, p. 10).
Deste comentário ressalta-se a importância do ato de projetar, sendo este um ensejo
para o desenvolvimento de habilidades empreendedoras. Manifesta-se uma
autonomia no aprendizado e uma necessidade de aprender a aprender, pois
enquanto continuarem a aprender, os empreendedores têm condições para agirem
de maneira empreendedora. O importante, como fala Filion, é entender que “os
empreendedores aprendem a partir do que fazem e uma vez que a natureza do que
fazem muda, eles também precisam mudar” (1999, p. 18). Trata-se, portanto de um
processo de aprendizado que acontece de maneira gradual e contínua, a partir das
experiências vivenciadas no cotidiano, resolvendo problemas, tomando decisões,
186
analisando e refletindo sobre cada situação. Acrescentando outras formas pela qual
o empreendedor aprende, Gibb (1992 apud FERREIRA JR. S. et al. 2001, p. 66)
destaca que estes aprendem: “solucionando problemas, fazendo sob pressão,
interagindo com os pares e outras pessoas, aproveitando oportunidades, copiando
de outros empreendedores, pelos próprios erros e através de feedbacks dos
clientes”. Percebe-se claramente uma maneira pró-ativa de aprender.
Voltando à Oficina do Empreendedor, o principal objetivo desta metodologia
é formar empreendedores e não empresa. Como esclarece Dolabela “ter empresa é
uma das infindáveis formas de se empreender” (2004, p. 14). E com relação ao
desenvolvimento de empreendedores, tal processo ocorre quando o indivíduo
concebe um sonho, projeta a imagem de um futuro aonde deseja chegar, ou onde
deseja estar, ou ser e depois ele vai buscar a realização do sonho. Será,
exatamente, na caminhada em busca da realização do sonho, que o indivíduo fará
emergir suas habilidades empreendedoras, justamente diante da necessidade que
terá de adquirir conhecimentos para concretizá-lo. O nascimento e a intensidade do
caráter empreendedor produzirão a necessidade do saber em suas várias formas;
saber conhecer, saber fazer, saber ser e saber conviver (DOLABELA, 1999).
Conclui-se que a principal tarefa pedagógica do professor é estabelecer uma forte
conexão entre o sonho e a capacidade de iniciar e manter ações para realizá-lo. No
que tange à prática didática, esta se utiliza de jogos, estudos de casos, estudos de
biografias, depoimento de empreendedores, teatro popular, sempre visando eliminar
a aula expositiva. A forma de seminário é priorizada em relação à exposição teórica.
São citadas, por último, algumas considerações sugeridas ao professor da Oficina
do Empreendedor na qual se pode verificar a clara intenção de preparar o educando
para que este assuma a responsabilidade pelo seu próprio processo de
aprendizagem, como também se percebe as ações motivadoras, desafiadoras e
inovadoras do professor para com seus alunos e em relação a sua prática docente.
De acordo com DOLABELA (1999, p. 24), sugere-se que o professor
não dê respostas. O empreendedor é alguém que aprende sozinho. Habilita-se
a fazer perguntas;
não se sinta responsável por apresentar soluções. Este é o papel do aluno
pré-empreendedor;
187
abandone o paternalismo nas relações com os alunos. Estes devem buscar
sozinhos os conhecimentos de que necessitam. É assim que faz o
empreendedor real na vida real;
elimine as pressões do conformismo. Incentive autonomia e a liderança entre
os estudantes;
encoraje os alunos a definir seus problemas, situações e visões;
crie oportunidades para que os alunos transformem suas idéias em ação.
Estimule sua habilidade de canalizar energia para os objetivos;
não se considere um professor, alguém que vai ensinar a ser empreendedor,
mas somente um Organizador da Oficina do Empreendedor, alguém que vai
criar as condições necessárias para o aluno aprender sozinho a ser
empreendedor.
Ações semelhantes de parte do professor, responsável pela disciplina de
empreendedorismo, também são apontadas por Filion. Suas considerações são
frutos das reflexões que fez frente aos estudos realizados na área da educação para
empreendedores. Resumidamente elas são apresentadas no quadro 08 a seguir.
ETAPAS PARA O ENSINO
EMPREENDEDOR
COMENTÁRIOS
Eliminar a pressão em relação ao
conformismo
O papel do professor deverá, de preferência,
consistir em respeitar, sustentar, reforçar as
características pessoais, os elementos de
diferenciação de cada um.
Reforçar a autonomia e a liderança dos
estudantes
O estudante tem necessidade de ser
reforçado no seu encaminhamento e de
desenvolver um modelo que lhe seja
próprio; o seu.
Levar o estudante a definir por si mesmo
situações, problemas e visões
Fornecer ao estudante trabalhos e
exercícios para que seja levado a efetuar
por si mesmos um encaminhamento. É
necessário habituá-los a trabalhar sobre
suas próprias idéias: fornecer exercícios
para ajudá-los na estruturação de seus
pensamentos, para tornar realistas e
realizáveis os seus sonhos.
Habituar o estudante a identificar aquilo que
lhe interessa, motivá-lo a aprender
Aprender a questionar para conceber,
aprender a aprender tornam-se aqui
elementos fundamentais no processo de
educação empreendedora, porque é
necessário que o aluno tome consciência
daquilo que lhe interessa.
Os empreendedores são pessoas que
devem ficar bem informadas sobre o que se
188
Ser aberto à realidade circundante
passa ao seu redor. Eles devem ser
formados pelo estudo da história, para
compreender os contextos e aí compreender
o seu, mas também para pensar em termos
de cenários e alternativas para o futuro.
Gerar ocasiões para levar o estudante a agir
O empreendedor é uma pessoa prática que
arma as ações concretas. Acontece que o
ensino permanece teórico e não chega a
obter esse tipo de espírito. Variando as
estratégias pedagógicas, permitindo aos
estudantes desempenharem um papel pró-
ativo em relação à sua própria
aprendizagem, não apenas o tira da
passividade, mas cria condições para que
eles tornem consciência de seus próprios
meios, de seus talentos. Desenvolve-se o
reflexo de imaginar o que seria feito e fazê-
lo em seguida.
Tornar-se um docente empreendedor
Mostrar iniciativa, sustentar as iniciativas.
Instrumentalizar-se dentro destas idéias e
tentar manter uma energia, um dinamismo
com o qual os alunos poderão identificar-se.
Quadro 08: Etapas para o ensino do empreendedorismo
Fonte: (FILION, L. 1991 apud OLIVEIRA NETO, H. 2000, p. 1254).
Juntando as colaborações acima de Filion e de Dolabela, entende-se que a
educação empreendedora deverá estar pautada por ações incentivadoras do
professor, que visará com que o aluno continue progredindo nos estudos e tenha
uma participação ativa no aprendizado. Ela também deve ser orientadora, no sentido
de facilitar o processo de aprendizagem do aluno para que ele possa construir o seu
próprio conhecimento. O professor também tem a função de servir como fonte de
inspiração aos seus alunos, de modo que seus atos e seus discursos, dentro do
possível, sejam entusiastas, criativos, inovadores, ousados e desafiadores. Por
todas essas considerações é adequado afirmar que a educação empreendedora se
trata preferencialmente de um procedimento de aprendizagem e que se diferencia
bastante da educação tradicional que foi descrita anteriormente. Um paralelo entre
as principais diferenças do ensino tradicional e do ensino requisitado na educação
empreendedora, mostrado no quadro 09, resume de forma bem clara as principais
discrepâncias entre elas.
Ensino Tradicional Ensino Empreendedor
Maior enfoque no conteúdo Maior enfoque no processo
Conduzido e dominado pelo professor Conduzido pelo participante
Instrutor é mestre em dar o Instrutor como facilitador
189
conhecimento
Ênfase no saber o que Ênfase no saber como e saber quem
Participante recebe passivamente o
conhecimento
Participante gerando o conhecimento
Aulas intensamente programadas Aulas flexíveis
Objetivos do aprendizado são impostos Negociação dos objetivos do
aprendizado
Evita-se o erro Aprende-se com o erro
Ênfase na teoria Ênfase na prática
Foco no assunto Foco na multidisciplinaridade
Quadro 09: Diferenças entre o ensino tradicional e o ensino empreendedor
Fonte: (GIBB, A. 1993 apud COSTA, R. et al. 2003, p. 2).
Se os elementos essenciais na formação do empreendedor, como diz Dolabela, “é
focalizar mais o auto-aprendizado do que transferência de conhecimentos” (2003a,
p. 44), o processo convencional de repassar informação, como ocorre no ensino
tradicional, entre outras ações indicadas no quadro 09, não se mostram compatíveis
com o ensino empreendedor, muito embora não se deva excluí-lo completamente.
Conforme Dolabela quando se trata da educação empreendedora,
nesta área, quem gera o conhecimento é o aluno. Ele utiliza conhecimentos
dominados para gerar novo conhecimento. Qual o conhecimento gerado
pelo aluno? A concepção de uma idéia, a identificação de uma
oportunidade, a verificação da validade da idéia e o planejamento para a
transformação da idéia em uma realidade bem-sucedida. Essas fases
representam o conhecimento novo (2003a, p. 125).
5.6 Habilidades e comportamentos empreendedores
Nas seções que antecederam este subcapítulo ficou manifestada a
existência de várias concepções a respeito de quem é o empreendedor, de modo
que, ainda não existe um consenso quanto a uma única definição do termo. Da
190
mesma forma, para se definir as características
88
empreendedoras serão
encontradas várias habilidades e comportamentos
89
.
Apesar das variadas concepções do empreendedor, no subcapítulo 5.2 se
estabeleceu uma concepção modelo, pelas razões explicitadas. Desta vez, na
apresentação das características empreendedoras será feito uso de seis estudos
90
referentes a este assunto. O conjunto destas pesquisas visa abranger diferentes
âmbitos, épocas e enfoques. No entanto, com exceção ao último estudo mostrado
no quadro 16, o modelo de empreendedor, do qual as habilidades e os
comportamentos foram identificados, está essencialmente vinculado àquele que teve
a iniciativa de criar ou aproveitar uma oportunidade de negócio de forma inovadora,
criativa e diferenciada. Trata-se de um modelo estilo empresarial, criador de novos
negócios e que se aproxima visivelmente da ciência da administração, procedência
esta da maioria das publicações e estudos sobre o empreendedorismo.
Tratando-se das características empreendedoras, inicialmente deve-se dizer
que, de parte dos estudiosos do empreendedorismo, conforme Dolabela (2000b),
existe hoje muita concordância quanto à presença de um conjunto de características
comuns aos empreendedores, mas de forma alguma se estabeleceu algum
consenso. As concepções diferentes são atribuídas principalmente em função da
atividade que o empreendedor executa, da abordagem da pesquisa, como também,
do lugar e da época em que se estudou o empreendedor. Da Re leva em
consideração esses pontos e destaca a questão comportamental do empreendedor.
Segundo seus estudos,
ser empreendedor é uma forma comportamental e varia conforme o
contexto em que este está inserido, o período e o lugar em que o humano
vive. Em alguns ambientes determinadas competências são mais
determinantes que outras. Entretanto algumas delas se mostram com um
diferencial invariável para o empreendedor (DA RE, 2003, p. 71).
88
Traço, propriedade ou qualidade distintiva fundamental (Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia, 2001, p.
616).
89
Procedimento de alguém face a estímulos sociais ou a sentimentos e necessidades íntimos ou uma combinação
de ambos; reação de um indivíduo, de um grupo ou de uma espécie ao complexo de fatores que compõem o seu
meio ambiente (Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia, 2001, p. 777).
90
Não apenas nos seis estudos que se fazem referência, como também em muitos outros, as qualidades
empreendedoras costumam ser chamadas de características empreendedoras, ou também como habilidades,
comportamentos e atitudes. Mas as pesquisas não distinguem, das qualidades empreendedoras, quais seriam
consideradas como habilidades, quais seriam consideradas como comportamentos e quais seriam considerados
como atitude.
191
Portanto, mais uma vez é mostrado que o empreendedor reflete as características
do lugar e da época em que vive, indicando tratar-se de um fenômeno regional,
razão pela qual existem regiões, cidades, países, mais ou menos empreendedores
do que outros. Entendendo desta mesma forma, na conclusão de sua tese, Morales
afirma que “fatores ambientais como cultura, ambiente familiar e a educação, dentre
outros, seriam responsáveis pela formação de ‘traços empreendedores’, que
esses seriam traços moldados pelo ambiente” (2004, p. 91). Ainda é possível
acrescentar outros fatores determinantes da diversidade das características que
serão encontradas nos empreendedores. Desta vez é Búrigo Filho quem traz
adicionais contribuições.
Pela constante evolução de estudos do empreendedorismo, bem como o
mutante comportamento empreendedor que assim o é, em função da
dinâmica constante do meio ambiente empresarial, faz com que algumas
características estejam mais acentuadas em empreendedores, (segundo o
país, cultura, economia etc...) e menos em outros, fazendo com que eles se
absorvam determinados comportamentos conforme a necessidade que o
meio lhes impõe (2004, p. 59).
Observa-se que o ambiente empresarial aparece como um fator que colabora para a
variedade de comportamento que o empreendedor vai manifestar, mas este será
dosado também pelos aspectos como região, cultura, economia, entre outros. A
contribuição da psicóloga Vera Pati
91
reforça as idéias apresentadas até o momento.
“É o contato com o meio ambiente da família, da escola, de amigos, do trabalho, da
sociedade, enfim, que vai possibilitando o desenvolvimento de alguns talentos
92
e
características de personalidade e bloqueando ou enfraquecendo outros” (PATI in
PEREIRA e SANTOS, 1995, p. 45). Chama-se atenção que, da mesma forma que
os fatores culturais, familiares, educacionais colaboram para a formação de
indivíduos empreendedores, estes mesmos são os maiores inibidores do potencial
empreendedor. Considerando a educação um elemento significativo na formação de
empreendedores e entendendo ser importante não para o individuo, como
91
Vera Pati é graduada e mestra em psicologia pela PUC-SP. No ano desta citação (1995) trabalhava como
professora convidada do Curso Formação de Empreendedores da FIA (Fundação Instituto de Administração),
entidade conveniada à FEA/USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de
São Paulo).
92
De acordo com Pati, “por talento, entende-se todo tipo de capacidade da mente” (in PEREIRA e SANTOS,
1995, p. 45).
192
também para a sociedade e o país, Filion, Dolabela
93
, Dornelas, Degen, entre outros
pesquisadores apóiam e incentivam a educação empreendedora em todos os níveis
de ensino.
Em vista das colocações pertinentes aos fatores influenciadores da
variedade de características presentes nos empreendedores, se presume, de acordo
com Dolabela, que “o perfil do empreendedor (fatores do comportamento e atitudes
94
que contribuem para o sucesso) pode variar de lugar para lugar” (1999, p. 68). Por
outro lado, como diz Morales, “os empreendedores não podem ser diferenciados das
demais pessoas por traços constitucionais, que não estudos que comprovem
de forma consistente que o empreendedorismo tenha origem genética” (2004, p. 91).
Por esta razão, Dolabela diz: “Uma coisa é certa: a tese de que o empreendedor é
fruto de herança genética não é mais relevante nos meios cienficos” (1999, p. 68).
Descartando a questão dos genes, grande parte dos pesquisadores entende que
determinados comportamentos são o que acabam identificando algumas pessoas
como sendo empreendedoras. Isto pode ser verificado nas palavras de Leite. “A
revisão da literatura sobre empreendedorismo, efetuada para elaboração deste
trabalho, sugere que existem diferenças, no tocante às características
comportamentais, entre empreendedores e não empreendedores” (LEITE, 2002, p.
300). Entre os vários autores consultados pode-se citar Peter Drucker, o qual dizia
que agir como empreendedor é questão de comportamento. Neste caso,
determinadas reações e atitudes tomadas, mediante algum estímulo interno e ou
externo, são o que acabam caracterizando uma pessoa como sendo
empreendedora. Em outras palavras, “o que é demonstrado em diversas pesquisas
empíricas é a existência de um conjunto de atitudes comuns aos empreendedores
de sucesso
95
, que permite concluir que atitudes empreendedoras e não
93
Em sua obra: Pedagogia Empreendedora (2003), este autor descreve a metodologia de ensino de
empreendedorismo dirigida à educação sica, que, segundo o autor, vai da educação infantil até o nível médio
(4 a 17 anos). Portanto, além da educação de segundo e terceiro graus referida por Dolabela, o
empreendedorismo atinge assim todos os níveis de ensino.
94
Por atitude pode-se entender, segundo Leite (2002, p. 95) “uma maneira organizada e coerente de pensar,
sentir e reagir em relação as pessoas, grupos, questões sociais, ou mais genericamente, a qualquer acontecimento
ocorrido em nosso meio circundante”.
95
A palavra “sucesso” traz consigo diferentes interpretações, portanto ela é relativa. Nas fontes consultadas
neste trabalho, apenas Filion atribui uma noção mais específica (dentro do contexto do empreendedorismo).
Como a interpretação de Filion trata de uma observação referente aos indivíduos criadores de novos negócios,
modelo este de empreendedor utilizado na maioria dos estudos sobre as características empreendedoras, a
interpretação de sucesso de Filion é que serve de referência. Conforme Filion (1999), define-se o empreendedor
de sucesso como aquele que conseguiu permanecer com o seu negócio por cinco anos. Embora sendo uma
consideração simples, ela faz bastante sentido pelos grandes riscos e desafios de criar e manter um negócio, o
193
propriamente um perfil
96
empreendedor” (SALIM, et al., 2004, p. 3). Dentro desta
lógica, é fundamental que determinado estímulo, que desencadeia ações da pessoa,
seja significativo a ela, a ponto de levá-la a desenvolver vários comportamentos
empreendedores. Em vista disso, “o processo comportamental se iniciaria então com
a ocorrência de um evento
97
e seria concluído com a execução de uma ação”
(LONGEN, 1997, p. 88).
Neste momento é pertinente resgatar algumas idéias mencionadas no
subcapítulo 5.2. Segundo Dolabela,
os comportamentos empreendedores pesquisados pertencem ao repertório
do ser humano. Não são excepcionais. Podem estar culturalmente
entorpecidos, cercados por obstáculos, mas não mortos. Assim, é postulado
da Teoria Empreendedora dos Sonhos que eles podem ser despertados
pela emoção gerada na busca de realização do sonho. É a emoção que traz
à tona as características empreendedoras inerentes à espécie humana
(2003a, p. 41).
O que Longen chamou de evento, Dolabela identifica como o sonho, o qual entende
ser o principal elemento responsável por iniciar o processo de despertar e
desenvolver as características empreendedoras, além de ser uma faculdade do ser
humano, o que torna possível todas as pessoas, se quiserem, a agir de forma
empreendedora. Mas este mesmo autor alerta que “nada garante que por
assumir comportamentos alguém se torne empreendedor.[...] é preciso conhecer as
circunstâncias que os geram” (2003a, p. 40). É justamente neste momento que o
sonho ganha destaque e se percebe claramente porque Dolabela atribui grande
valor a ele. Ressaltando o que foi dito, “a busca da realização do sonho é o motor
que gera emoção em intensidade suficiente para instalar os comportamentos do ser
empreendedor” (DOLABELA, 2003a, p. 40). Isto também significa que o
que leva a crer que a pessoa agiu e vem atuando com bastante competência frente às adversidades e aos
obstáculos inerentes da ação empreendedora. Este período de tempo estabelecido (5 anos) é utilizado tendo
como referência países como Estados Unidos e Canadá, e por isso também tem uma certa relatividade. Aqui no
Brasil, por exemplo, de acordo com a última pesquisa do Sebrae publicada em 2004, a taxa de mortalidade das
Micro e Pequenas Empresas revelam que 59,9% não sobrevivem além dos 4 anos (SEBRAE, 2004). Levando
isso em consideração, o empreendedor de sucesso deve ser entendido como aquele que consegue permanecer
com seu negócio, por um período superior a mortalidade da maioria das empresas do seu país.
96
Quando se fala em perfil, neste trabalho, está se referindo, como diz Salim et al, a “um conjunto de
características pessoais que o indivíduo possui” (2004, p. 3).
97
O evento “é representado por qualquer acontecimento interno ou externo ao indivíduo com potencial para lhe
produzir um estímulo e, por conseguinte, influenciar o seu comportamento” (LONGEN, 1997, p. 50).
194
empreendedor o pode ser construído, mas apenas motivado a construir-se, pois
de onde surgirá o engajamento, a energia, a disposição de realizar um sonho sendo
este uma imposição?
Como foi dito no começo, muitos autores convergem em relação às várias
características empreendedoras. Mas afinal, qual seriam as habilidades e os
comportamentos presentes nos empreendedores de sucesso? Antes mesmo de
responder esta questão é válido colocar uma outra indagação formulada por
Dolabela e a respectiva resposta dada pelo autor:
Mas por que essa preocupação em identificar o perfil do empreendedor de
sucesso? Para que possamos aprender a agir, adotando comportamentos e
atitudes adequadas. É importante termos consciência, entretanto, de que
ainda não se pode estabelecer uma relação absoluta de causa e efeito. Ou
seja, não se pode afirmar que uma pessoa dotada de tais características irá
necessariamente alcançar o sucesso como empreendedor. O que se pode
dizer é que, se determinada pessoa apresenta as características e aptidões
mais comumente encontradas nos empreendedores, mais chances terá de
ser bem-sucedida. [...] Sem conotações determinísticas, tais características
têm contribuído para a identificação e compreensão de comportamentos
que podem levar o empreendedor ao sucesso, servindo de base ao para o
ensino (2000b, 36).
Deste entendimento se percebe que o perfil de um empreendedor de sucesso deve
servir de parâmetro no desenvolvimento e no aperfeiçoamento das características
empreendedoras até porque, segundo Dolabela, “as pesquisas indicam ser
indispensáveis à presença de alguns comportamentos e competências para o
sucesso empreendedor” (2003a, p. 38). Por esta mesma razão, Aiub escreve em
seu trabalho que “deve-se estudar quais habilidades e conhecimentos o
necessários para se obter empreendimentos bem sucedidos, pois eles podem ser
desenvolvidos, educados e adquiridos” (2002, p. 53). Portanto, como se pretende
estimular o desenvolvimento de futuros empreendedores, nada mais adequado do
que se orientar pelos comportamentos empreendedores, mas não como um padrão
único a ser seguido, pois, de acordo com Leite, “empreendedores não podem ser
standarizados, nem reduzidos a modelos mecânicos” (2002, p. 319).
Conhecendo as características do empreendedor bem sucedido, o
educando pode fazer comparações e refletir sobre aquelas encontradas nele e
aquelas que precisa desenvolver.
195
O primeiro estudo a ser apresentado sobre as características
empreendedoras é resultado de um programa de capacitação empreendedora que é
considerado um dos melhores do mundo (BÚRIGO, 2004). Este é conhecido pelo
nome de EMPRETEC. De acordo com Búrigo Filho, o Empretec se trata de um
treinamento comportamental “através de um processo de imersão em curto período
de tempo
98
, cujo objetivo é o fortalecimento das características e comportamentos
empreendedores mais relevantes para o sucesso empresarial” (2004, p. 29). O
programa foi implantado no Brasil em 1990 pela ONU
99
em parceria com o Sebrae
100
e está presente em todos os estados brasileiros.
As raízes do Empretec estão na Universidade de Harvard, com os estudos
de McClelland, fundamentados na psicologia motivacional. Segundo Venturi (2003) o
que chama atenção no trabalho de McClelland é a variável comportamental que o
mesmo introduziu no processo de capacitação para a formação de empreendedores.
Este pesquisador, na década de 1960, identificou um elemento psicológico crítico
nos empresários de sucesso, denominado de “motivação da realização” ou “impulso
para melhorar” Para McClelland, a motivação era a principal condição para as
pessoas atingirem o sucesso, razão pela qual, assinalava que é possível treinar
pessoas para que se tornem empreendedoras, desde que a necessidade de
realização seja trabalhada para a construção de comportamentos empreendedores.
A partir deste pensamento, no início dos anos 60,
McClelland desenvolveu a metodologia AMT Achievement Motivation
Training”, que buscava treinar comportamentos nos empreendedores. A
metodologia do AMT baseou-se em estudos práticos que se demonstraram
comprovados para a mudança de comportamento, com conteúdos extraídos
de literaturas de psicologia de aprendizagem e mudanças de atitudes. O
AMT possibilitou a construção de uma série de treinamentos
comportamentais, inclusive do EMPRETEC, aplicado em diversos países
(BÚRIGO FILHO, 2004, p. 71).
98
“Normalmente com carga horária de oito a nove horas diárias, durante nove dias consecutivos, iniciando
normalmente em um sábado estendendo-se até o domingo da semana seguinte” (BÚRIGO FILHO, 2004, p. 87).
99
Organização das Nações Unidas.
100
Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.
196
Mas segundo Pereyra et al. (2003), apesar da importância da metodologia AMT, não
foi essencialmente esta que contribui para a criação do Empretec. Conforme Pereyra
et al., o professor
McClelland, após diversas utilizações do AMT, começou a questionar a
importância da necessidade de realização como o único fator crítico no
âmbito do desenvolvimento empresarial. A razão era que as pessoas
treinadas se sentiam motivadas a iniciar suas empresas. Porém, elas
necessitavam de uma série de outras qualidades, como necessidade de
poder e necessidade de associação, para administrar com sucesso, manter
e expandir seus negócios (2003, p. 50).
A necessidade de poder é caracterizada pela vontade de influenciar outras pessoas.
“Ela não somente tem necessidade de estar no topo de pirâmide do poder. A
necessidade para convencer outros de suas opiniões ou para proporcionar-lhes o
experimento de fortes emoções, é também necessidade de influenciar” (LEITE,
2002, p. 85). E a necessidade de associação expressa a preocupação em
estabelecer, manter ou restabelecer relações sólidas de amizade com outros
indivíduos. É a necessidade de estar próximo a outras pessoas e relacionar-se
interpessoalmente (LEITE, 2002).
A partir de 1982 e até 1984, a Usaid (agência para o desenvolvimento
internacional dos Estados Unidos), a MSI (organização Management Systems
International fundada pelo próprio McClelland) e a McBeer & Company (empresa
de consultoria de McClelland), realizaram um estudo mais abrangente do
comportamento, envolvendo países da América Latina (Equador), África (Malawi) e
Ásia (Índia), a fim de identificar as características que eram chaves para o sucesso
do empreendedor, como também, criar meios mais eficazes de estímulo ao
desenvolvimento dos comportamentos empreendedores. Esta pesquisa, conforme
Cooley (1991, apud VENTURI 2003, p. 68) “foi reconhecida pela Fundação Nacional
de Ciências dos EUA e outros como um dos poucos esforços sérios para promover
uma base empírica para determinar os comportamentos específicos associados com
empreendedores de sucesso”. O resultado do trabalho foi a indicação de dez
101
características empresariais necessárias para se obter êxito nos negócios.
101
Na verdade, pode-se identificar 15 características. No quadro 10 é possível observar que, nas de número 1, 3,
8, 9, e 10 aparecem mais de uma.
197
O Sebrae, em parceria com a ONU, no ano de 1990, adaptou as
características
102
do comportamento empreendedor ao programa Empretec. O
quadro 10 apresenta as características presentes nos empreendedores de sucesso
e que, no programa Empretec, o participante deverá desenvolver a o final do
curso. Espera-se posteriormente que estas características sejam utilizadas para o
êxito dos empreendimentos dos empretecos.
103
1. Busca de oportunidades e iniciativa
2. Correr riscos calculados
3. Exigência de qualidade e eficiência
4. Persistência
5. Comprometimento
6. Busca de informações
7. Estabelecimento de metas
8. Planejamento e monitoramento sistemáticos
9. Persuasão e rede de contatos
10. Independência e autoconfiança
Quadro 10: Características dos empreendedores de sucesso – EMPRETEC
Fonte: Adaptado de Búrigo Filho (2004).
É importante colocar que, muito embora estas características sejam oriundas
de estudos referentes aos empreendedores privados
104
, elas também podem estar
presentes em outras pessoas e o desenvolvimento destas precisa ser entendido
como benéfico para ações que vão além da criação de empresas. Este pensamento
também pode ser observado no seguinte comentário de Pereyra et al.:
as características identificadas por McClelland em sua pesquisa não
serviram somente para identificar empresários de sucesso, mas também
para identificar pessoas empreendedoras. Qualquer pessoa que desenvolva
estas características, nos mais distintos âmbitos de sua vida, estará
seguramente obtendo melhores resultados e desfrutando melhor do que faz
(2003, p. 130).
O próximo estudo é estritamente de âmbito nacional e foi retirado de um
livro
105
do professor Dornelas. Trata-se de uma pesquisa que foi desenvolvida ao
102
As características, apesar de estarem numeradas, não respeitam nenhuma ordem para serem desenvolvidas.
103
Nome atribuído aos egressos do programa Empretec.
104
O entendimento desta palavra está de acordo com o que foi esclarecido no subcapítulo 5.3.
105
Empreendedorismo na prática: mitos e verdades do empreendedor de sucesso. DORNELAS, J. C. 2007.
198
longo de mais de quatro anos, a partir de 1999, e aplicado via testes de perfil
empreendedor a milhares de brasileiros que estavam acessando o site:
www.planodenegocios.com.br
106
, no intuito de fazer uso desta ferramenta
107
de
gestão para a criação ou para o desenvolvimento de novas estratégias do seu
empreendimento.
O resultado foi a identificação de um conjunto de 16 características
108
que
costumam estar presentes nos empreendedores de sucesso, mas o significam
que todas elas sempre façam parte do perfil do empreendedor. Ressalta-se que ao
apresentar as características, Dornelas não quis fornecer uma receita de sucesso,
com todas as características que farão um empreendedor ter êxito em seu negócio,
mas sim apresentar aquelas mais comumente encontradas nos empreendedores de
sucesso. As características mais freqüentemente encontradas podem ser
observadas no quadro 11.
1. São visionários
2. Sabem tomar decisões
3. São indivíduos que fazem a diferença
4. Sabem explorar ao máximo as oportunidades
5. São determinados e dinâmicos
6. São dedicados
7. São otimistas e apaixonados pelo que fazem
8. São independentes e constroem seu próprio destino
9. Ficam ricos
10. São líderes e formadores de equipes
11. São bem relacionados
12. São organizados
13. Planejam, planejam, planejam
14. Possuem conhecimento
15. Assumem riscos calculados
16. Criam valor para a sociedade
Quadro 11: Características dos empreendedores de sucesso – Pesquisa brasileira
Fonte: Dornelas (2007, p. 5).
106
Tanto o site, quanto o teste do perfil empreendedor foram criados pelo professor José Carlos Assis Dornelas.
107
A ferramenta de gestão que se refere é o Plano de Negócio.
108
Na verdade, pode-se identificar 20 características, pois nas de número 5, 7, 8 e 10 aparecem mais de uma.
199
Em comparação com o quadro 10, se observa que determinadas características
como: autoconfiança, busca de informações, comprometimento, persistência,
exigência de eficiência, exigência de qualidade, iniciativa, persuasão,
estabelecimento de metas e monitoramento sistemático, não foram identificadas na
pesquisa realizada no Brasil. E um total de cinco (correr riscos calculados,
independência, planejamento, busca de oportunidade e rede de contato = são bem
relacionados) se repetiram. Se for feita uma análise pontual, esta última pesquisa do
quadro 11 acrescentou outras 15 características em relação às do programa
Empretec. Elas são: ter visão, tomar decisões, fazer a diferença, ser determinado,
dinâmico, dedicado, otimista, ter paixão pelo que faz, construir o destino, ficar rico,
ter liderança, trabalhar em equipe, ser organizado, ter conhecimento e criar valor
para a sociedade. Por outro lado, presume-se que algumas características, entre
elas: tomar decisões, fazer a diferença, ter paixão pelo que faz, criar valor para a
sociedade, são inerentes ao percurso da obtenção do êxito do negócio do
empreendedor de sucesso, de modo que, apesar de não aparecerem na listagem do
quadro 10, necessariamente não precisariam ser interpretadas como acréscimos.
Fica registrado que se pode observar nos empreendedores uma diversidade de
habilidades e comportamentos e também, que o âmbito e a época do estudo podem
ser considerados como elementos que acabam gerando algumas diferenças de
resultados.
O terceiro estudo representa uma compilação de pesquisas bibliográficas
internacionais, realizadas entre 2000 e 2004 e apontou 10 características comuns
aos empreendedores bem sucedidos. O resultado foi demonstrado no livro de Salim
et al. e a pesquisa foi intitulada como: “Os dez mandamentos dos empresários bem-
sucedidos”. No entendimento dos autores, tais características, por serem essenciais
ao sucesso do empreendedor, foram designadas como mandamentos para que
outros que pretenderem obter sucesso empresarial sigam o exemplo. O quadro 12
apresenta as 10 características mais presentes nos empreendedores de sucesso.
1. Assumir riscos
2. Identificar oportunidades
3. Conhecimento
4. Organização
200
5. Tomar decisões
6. Liderança
7. Dinamismo
8. Independência
9. Otimismo
10. Tino empresarial
Quadro 12: Características dos empreendedores bem sucedidos – Pesquisa Internacional
Fonte: Salim et al. (2004, p. 5).
Em relação à pesquisa do quadro 11, apenas a décima característica (tino
empresarial) é que se diferencia, e por conseqüência, as demais são idênticas.
Evidencia-se com isso uma grande compatibilidade com a pesquisa brasileira
podendo até ser considerada como total compatibilidade, pois, segundo os autores,
por tino empresarial deve-se entender como a reunião de boa parte das outras
características, não se consolidando assim como alguma habilidade ou
comportamento diferenciado dos outros. Portanto, nesta comparação entre os
quadros citados, não houve acréscimos de habilidades ou comportamentos e sim, a
ratificação delas.
E com relação ao quadro 10, é possível identificar que seis
109
características
como: otimismo, liderança, conhecimento, tomar decisões, organização e dinamismo
não fazem parte do rol daquelas ligadas aos empreendedores de sucesso segundo
as pesquisas da Usaid, MSI e da McBeer & Company, que por sua vez, estão
presentes no programa Empretec. É procedente fazer o mesmo raciocínio
utilizado dizendo que possuir conhecimento e tomar decisões são características
praticamente inerentes à atividade de empreender e, portanto, necessariamente não
precisam ser consideradas como ausentes na pesquisa apresentada no quadro 10.
E por sua vez, as características de correr riscos calculados, independência e a
identificação de oportunidade, ganham ainda mais destaque por fazerem parte dos
três estudos. Ficou de fora deste último estudo, mostrado no quadro 12, um total de
doze características que apareceram na primeira pesquisa. Elas são: rede de
contato, busca de informações, comprometimento, persistência, exigência de
qualidade, exigência de eficiência, planejamento, iniciativa, persuasão,
estabelecimento de metas, monitoramento sistemático e autoconfiança.
109
Sem considerar o tino empresarial, seguindo a explicação enunciada nesta mesma página.
201
A congruência entre os estudos apresentados nos quadros 12 e 11 pode ter
ocorrido em função de uma maior proximidade da época em que as pesquisas foram
realizadas, o que reforça a idéia que o empreendedorismo é influenciado pela
época. Reitera-se que o último estudo acabou validando as habilidades e os
comportamentos que o quadro 11 acrescentou em relação ao quadro 10, mas de
modo algum se pode desconsiderar as dessemelhantes características presentes no
quadro 10, até porque o Empretec, que faz uso delas, continua obtendo excelentes
resultados
110
em relação ao seu objetivo principal, que é reforçar e estimular a
capacidade empreendedora das pessoas para que elas obtenham sucesso com
suas empresas.
Os três estudos que foram abordados tiveram como ponto comum a
preocupação de orientar suas pesquisas com base nas observações dos
comportamentos e das habilidades dos empreendedores de sucesso, ideal que
também é perseguido pela educação empreendedora, ou seja, nesta se busca a
forma de aprender do empreendedor bem-sucedido.
Valendo dos posicionamentos de Filion (1999) e Dolabela (1999), estes
autores concordam que é pouco provável que uma pessoa possa ter todas as
características dos empreendedores de sucesso completamente desenvolvidas. Mas
é possível afirmar, que, de maneira geral, o empreendedor as utiliza em momentos
distintos e que, ele se tornará cada vez mais capacitado no uso das características,
na medida em que busque aprimorá-las cada vez mais de uma maneira contínua,
prática, contextualizada e significativa.
Também é importante destacar a conclusão a que chegou Venturi na sua
pesquisa quando afirmou que, “apesar do comportamento empreendedor não ser a
única razão de sucesso empresarial, é indubitavelmente um fator a ser considerado
e respeitado” (VENTURI, 2003, p. 95). Valorizando essa mesma questão
comportamental e justificando a importância dela, Dolabela comenta que
110
Numa pesquisa nacional realizada pelo Sebrae/MG em 2005, junto a cerca de 600 entrevistados que
participaram do Empretec, foi revelado que o participante tem afastado de forma significativa o perigo de quebra
do seu negócio. E geralmente também tem aumentado o faturamento do seu negócio após o programa. Os
resultados indicam que houve um crescimento médio de 64% no faturamento. A pesquisa, também mostrou um
alto índice de aceitação do programa. Mais de 50% dos entrevistados afirmaram que suas expectativas foram
superadas. E, somados os itens superou/atendeu às expectativas, o índice de satisfação chega a 97,7%.
(http://www.sebraemg.com.br
– acesso em 30 de maio de 2008).
202
um dos campos centrais da pesquisa na área do Empreendedorismo
concentra-se no estudo do ser humano e dos comportamentos que podem
conduzir ao sucesso. Por outro lado, o conjunto que compõem o
instrumental necessário ao empreendedor de sucesso o Know-how
tecnológico e o domínio de ferramentas gerenciais – é visto como uma
conseqüência do processo de aprendizado de alguém capaz de atitudes
definidoras de novos contextos: o empreendedor. Em outras palavras, o
indivíduo dotado de pré-requisitos necessários ao bom desempenho como
empreendedor saberá aprender o que for necessário para a criação,
desenvolvimento e a realização de sua visão (2000b, p. 37).
Este comentário mostra a importância e a pertinência de se preocupar com o
estímulo ao desenvolvimento de comportamentos e habilidades empreendedoras,
foco que esta pesquisa sugere que seja trabalhado nas disciplinas de
empreendedorismo do curso Superior de Turismo, sendo que a visão a ser realizada
deve ser orientada em favor de ações sociais.
O quarto estudo é oriundo estritamente dos pesquisadores que primeiro se
preocuparam em definir as principais características dos empreendedores. Está se
falando dos comportamentalistas, que dominaram o campo do empreendedorismo
por 20 anos, até o início dos anos 1980. Muito embora as pesquisas destes
cientistas, conforme Filion (1999), tenham produzido resultados variados, fato que
impossibilitou traçar um perfil psicológico científico do empreendedor, foi possível
listar as características mais comuns atribuídas aos empreendedores. Estas,
evidenciadas na década de 1970 e 1980, constam no trabalho de Filion (1999), as
quais o autor conferiu o seguinte título: Características mais freqüentes atribuídas
aos empreendedores pelos Comportamentalistas. As mesmas podem ser
observadas no quadro 13.
1
Independência 13
Criatividade
2
Otimismo 14
Necessidade de realização
3
Autoconfiança 15
Sensibilidade a outros
4
Liderança 16
Energia
5
Riscos moderados 17
Autoconsciência
6
Iniciativa 18
Agressividade
7
Flexibilidade 19
Dinheiro como medida de
desempenho
8
Orientação para resultados 20
Tolerância à ambigüidade e a
incerteza
203
9
Capacidade de aprendizagem 21
Tendência a confiar nas pessoas
10
Inovação 22
Originalidade
11
Habilidade de conduzir situações 23
Envolvimento a longo prazo
12
Habilidade na utilização de
recursos
24
Tenacidade
Quadro 13: Características dos empreendedores – Comportamentalistas
Fonte: Filion (1999, p. 9).
O que chama atenção primeiramente é a grande quantidade de
características identificadas, sendo que 75% delas (as correspondestes aos
números 7 até o 24) não apareceram nas pesquisas que foram apresentadas
anteriormente, e que por sinal, ocorreram num período posterior a esta do quadro
13. Mais uma vez, a questão da época e do âmbito da pesquisa impactou nos
resultados. Da mesma forma, a operacionalidade e os tipos de atividades
executadas pelos empreendedores nas décadas de 1970 e 1980 não são
exatamente as mesmas das cadas de 1990 em diante, condição esta que
repercute nos comportamentos e nas habilidades identificadas.
Uma possível interpretação desta considerável diferença de porcentagem
das características empreendedoras em relação às pesquisas anteriores é que esta
última não deixou claro que utilizou empreendedores de sucesso como modelo de
observação. Por outro lado, não se garante que se isso fosse feito os resultados
seriam mais parecidos com as outras pesquisas. Mas como houve uma maior
proximidade entre as características mencionadas nas três primeiras pesquisas, que
tiveram como modelo o empreendedor de sucesso, poderia haver uma maior
compatibilidade entre esses quatro estudos também.
Outro detalhe é que as características listadas no quadro 13 foram
predominantemente observadas de empreendedores norte-americanos cujo estudo
sobre o empreendedorismo estava inserido em algumas universidades
111
desde a
década de 1940, enquanto no Brasil, como foi visto, apenas em meados de 1980
é que o empreendedorismo entrou na universidade. E como foi dito que o
empreendedorismo reflete as características do lugar, da época, da cultura, da
economia, é coerente encontrar diferenças nos resultados, tendo em vista que, pelo
menos, o quadro 11 levou em consideração os empreendedores brasileiros, e o
111
Segundo Souza (2006), em 1967 havia dez universidades americanas que ofereciam cursos na área de
empreendedorismo e em 1998 já havia mais de mil.
204
quadro 10 contou com o estudo sobre empreendedores de países como Equador,
Malawi e Índia.
Também é valido reforçar que não existe um padrão único a ser seguido,
mas é importante ter conhecimento das características empreendedoras, pois de
alguma forma elas foram importantes na vida dos empreendedores e, uma vez elas
desenvolvidas, podem igualmente beneficiar as pessoas em vários âmbitos de suas
vidas.
Em toda a bibliografia consultada neste trabalho, a pesquisa
112
mais
completa e ao mesmo tempo mais recente sobre as características dos
empreendedores foi feita por cinco pesquisadores brasileiros. Tal estudo teve por
objetivo identificar o que os autores e pesquisadores da área citavam como as
características mais marcantes dos empreendedores. Foram identificadas 50
características atribuídas aos empreendedores em 25 artigos publicados em
periódicos internacionais e em livros de referência nacionais e internacionais no
período de 1972 a 2005.
O quadro 14 apresenta todas as 50 características coletadas na pesquisa e
ao lado direito de cada uma delas é mostrada a quantidade de vezes que elas foram
citadas. As características de número 5, 8, 16, 18, 23, 24, 25, 29, 31, 32, 33, 37, 39,
42, 43, 46, 47, 48, 49 e 50, que estão grifadas, representam aquelas que não
haviam aparecido nas quatro pesquisas anteriores. Chama atenção que 50% destas
“novas” características (que não haviam aparecido antes), mais exatamente as de
número: 33, 37, 39, 42, 43, 46, 47, 48, 49 e 50, foram citadas apenas uma vez entre
os autores consultados na respectiva pesquisa. Isto pode ser considerado como
uma interpretação muito particular e bastante passiva de questionamento, pois não
foi notificada por outros autores.
Características
Características
1 Correr riscos calculados 15
26
Persuasão 2
2 Independência/autonomia 10
27
Visionário 2
3 Necessidade de realizão 9 28
Flexibilidade a mudanças 2
4 Capacidade de inovar 9 29
Competitividade 2
5 Poder de autocontrole 8 30
Agressividade 2
6 Criatividade 8 31
Servir de inspiração a outros 2
112
A coleta de dados foi realizada em julho de 2005. E a pesquisa pode ser encontrada no livro: Gestão em
empreendedorismo, de Marianne Hoeltgebaum, e Denise Del Prá Netto Machado (2005), p. 143-168.
205
7 Autoconfiança 7 32
Capacidade de percepção
2
8 Responsabilidade 6 33
Pró-atividade 1
9 Tolerância a incertezas 5 34
Dedicação 1
10
Determinação 5 35
Trabalho em equipe 1
11
Capacidade de liderança 5 36
Capacidade de planejar 1
12
Energia 5 37
Estrategista 1
13
Estabelecimento de metas 5 38
Motivação pessoal 1
14
Identificação de oportunidade
4 39
Lidar com erros 1
15
Rede de contatos 4 40
Conhecimento técnico 1
16
Ambição 4 41
Agregação de valor/impacto 1
17
Iniciativa 4 42
Auto-avaliação 1
18
Motivação por dinheiro 4 43
Desejo de produção 1
19
Busca de informações 3 44
Exigência de eficiência 1
20
Comprometimento 3 45
Exigência de qualidade 1
21
Persistência 3 46
Pensamento analítico 1
22
Otimismo 3 47
Ser pragmático 1
23
Necessidade de poder 3 48
Busca de reconhecimento 1
24
Facilidade de comunicação 2 49
Necessidade de segurança 1
25
Realização de Feedback 2 50
Habilidade de vender 1
Quadro 14: Características dos empreendedores mais citadas pelos pesquisadores
Fonte: Adaptado de: Walter, Silvana et al (2005, in HOELTGEBAUM, 2005, p. 158)
José Carlos de Assis Dornelas, autor este mencionado neste trabalho, foi
um dos pesquisadores deste quinto estudo. Num de seus livros
113
, este professor
apresentou, em forma de gráfico, apenas as 23 características mais citadas, mas
deixou claro que compilou a pesquisa, isto é, que citou somente as mais
mencionadas. E na interpretação sobre o gráfico Dornelas disse que
pode-se notar, então, que não há muita variação no que dizem os autores e
pesquisadores do tema sobre as características do empreendedor ao longo
das últimas décadas, apesar de algumas serem mais citadas que outras e
de haver uma quantidade expressiva de características. Por isso também
existem várias definições sobre o que é ser empreendedor (2007, p. 3).
113
Empreendedorismo na prática: mitos e verdades do empreendedor de sucesso. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.
206
Esta percepção de não haver muita variação faz mais sentido quando se leva em
consideração as 23 características mais citadas, ou seja, aquelas que foram
mencionadas no mínimo três vezes, pois de 1972 a 2005 três cadas e
consideráveis mudanças sociais, culturais, econômicas entre outras que poderiam
implicar na identificação de muitas outras características. Mas de fato houve
acréscimos e outras 27 características (as de número 24 a 50) foram citadas no
trabalho original que foi publicado em 2005. Talvez pelo fato de estas não terem sido
muito mencionadas, este montante não foi representativo para Dornelas.
Ao se fazer uma comparação com as outras quatro pesquisas, verifica-se
uma compatibilidade acima de 50% entre as características dos quadros
anteriormente apresentados, leitura essa que considera que, ao menos entre duas
pesquisas haja uma característica comum. O quadro 15 mostra a relação das cinco
pesquisas. Ficaram de fora as características dos quadros, 10, 11, 12 e 13 que não
apareceram no quadro 14.
CARACTERÍSTICAS
Quadro
10
Quadro
11
Quadro
12
Quadro
13
Quadro
14
1 Correr riscos calculados X X X X X
2 Independência X X X X X
3 Identificação de oportunidades X X X X
4 Capacidade de liderança X X X X
5 Otimismo X X X X
6 Iniciativa X X X
7 Rede de contatos X X X
8 Capacidade de planejar X X X
9 Autoconfiança X X X
10
Conhecimento técnico X X X
11
Determinação X X
12
Busca de informações X X
13
Comprometimento X X
14
Persistência X X
15
Exigência de eficiência X X
16
Exigência de qualidade X X
17
Persuasão X X
18
Dedicação X X
19
Estabelecimento de metas X X
20
Motivação pessoal X X
21
Trabalho em equipe X X
22
Flexibilidade a mudanças X X
207
23
Visionário X X
24
Inovação X X
25
Criatividade X X
26
Energia X X
27
Agregação de valor/impacto X X
28
Necessidade de realização X X
29
Tolerância a incertezas X X
30
Agressividade X X
Nº de caract. compatíveis 14 14 6 13
Total de caract. Identificadas 15 20 10 24
Relação 93% 70% 60% 54%
Quadro 15: Relações das características empreendedoras entre as pesquisas dos quadros
10,11,12,13 e 14
Fonte: elaborado pelo autor.
A maior compatibilidade que existiu ocorreu com as presentes no quadro 10,
com 93%. Entende-se que quanto menor for o número de características listadas,
como é o caso do quadro 12 (que ao todo constam 10) maiores são as chances de
haver compatibilidade com as do quadro 14. Mas a intenção principal foi apurar a
convergência das características para identificar aquelas que foram as que mais
apareceram. É importante frisar que as pesquisas anteriores a esta quinta não
divulgaram a quantidade de vezes que determinada característica apareceu.
Observa-se que as características, correr riscos calculados e independência
estiveram presentes em todos os cinco estudos. Em seguida, com quatro aparições,
estão: identificação de oportunidades, capacidade de liderança e otimismo. As
características iniciativa, rede de contato, capacidade de planejar, autoconfiança e
conhecimento técnico, estiveram presentes em três pesquisas. E as do número 11
até o 30 apareceram todas duas vezes.
Como se pode ver, na pesquisa mostrada no quadro 14, o universo de
características identificadas nos empreendedores atingiu a marca de 50, sendo que,
30 delas, que correspondem a uma porcentagem de 60%, se repetiram em pelo
menos uma pesquisa que havia sido mostrada. Por esta razão, como diz Dornelas,
longe de ser uma regra rígida, o que se encontra na literatura e nos estudos
mais profundos sobre o tema nem sempre leva o leitor a uma conclusão
única, com um perfil típico e imutável. Na verdade, existem várias
características que estão muito presentes nos empreendedores, mas que
também podem estar presentes em pessoas que não empreendem (2007,
p. XVII).
208
Contudo, percebe-se que na literatura se assume que “as pessoas que possuem as
mesmas características que os empreendedores terão uma alta tendência ou
potencial de desenvolver ações empreendedoras, mais que as pessoas que não
possuem tais características” (LANCHAMAN, apud MORALES, 2004, p. 36).
Ao trabalhar com as habilidades e os comportamentos dos empreendedores
de forma intencional, isto é, através de uma metodologia apropriada que vise criar
condições para o desenvolvimento delas, acredita-se que estarão sendo dado aos
indivíduos condições para que os educandos reforcem e desenvolvam o seu
potencial empreendedor.
A pesquisa que foi deixada por último apresenta as habilidades e os
comportamentos identificados nos empreendedores sociais. O propósito de
apresentar este estudo é para evidenciar como as características encontradas nos
empreendedores privados
114
são semelhantes às desenvolvidas pelos
empreendedores sociais, que por sua vez, também são benéficas para o êxito das
causas sociais em que estes empreendedores costumam estar envolvidos.
Tal pesquisa encontra-se no artigo publicado em 2004 pelo professor Edson
Oliveira
115
. Esta foi feita com base na catalogação de várias pesquisas nacionais e
internacionais que trataram sobre o empreendedorismo social e na entrevista com
empreendedores sociais brasileiros. Também foi feito um estudo descritivo de oito
organizações, segundo o autor, consideradas típicas e exemplares
116
em relação ao
conceito e prática do empreendedorismo social. O resultado da pesquisa de Oliveira
pode ser observado no quadro 16.
CARACTERÍSTICAS QUADRO
CARACTERÍSTICAS QUADRO
1 Identificar oportunidades 10,11,12,14
16
Comunicativo 11
2 Visão 11 – 14
17
Equilibrado 13 – 14
3 Iniciativa 10 -13- 14
18
Saber negociar 11
4 Apaixonado 11 -13- 14
19
Saber usar forças latentes 11-13-14
5 Persistente 10 – 14
20
Solidário 13
6 Determinado 11 – 14
21
Competência gerencial 12
7 Trabalho em equipe 11 – 14
22
Habilidoso 13
114
Modelo este de empreendedor seguido pelas pesquisas anteriores.
115
Edson Oliveira é mestre e doutor em Serviço Social. Atualmente trabalha como professor do curso de Serviço
Social da Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná), e nesta mesma área leciona na Ulbra
(Universidade Luterana Brasileira) no Centro Universitário de Palmas-TO.
116
Entre elas o autor destacou a Academia Social de Recife-CE, o Comitê de Democratização da Informática
CID do Rio de Janeiro e a Ashoka de São Paulo.
209
8 Correr riscos calculados 10 a 14
23
Responsável 14
9 Liderança 11,12,13,14
24
Estrategista 14
10
Criativo 13 – 14
25
Capacidade de percepção 14
11
Inovador 13 – 14
26
Pragmático 14
12
Inteligente 11 -12- 14
27
Consciente
13
Comprometido 10 - 14
28
Crítico
14
Objetivo 13 – 14
29
Inconformado c/ injustiça
15
Flexível 11
30
Ético
Quadro 16: Características do empreendedor social
Fonte: Adaptado de Oliveira
117
(2004, p. 14).
Ao comentar sobre as características mostradas neste quadro, o professor
Oliveira diz que: “os dados podem sinalizar um super-homem, ou uma super-mulher,
mas de fato, se refletirmos, os indicadores o são tão excepcionais, pois essas
características são necessárias e qualquer área em que se queira fazer a diferença
e ir além do trivial” (2004, p. 14). Este mesmo raciocínio pode ser feito em relação às
características encontradas nos empreendedores privados. Não é demais reforçar a
impossibilidade de uma única pessoa possuir todas as características
desenvolvidas, mas se acredita ser possível criar condições para que os educandos
desenvolvam e potencializem a maior parte delas, pois assim faz o empreendedor
quando age na busca da realização da sua visão.
A proximidade atribuída entre o empreendedorismo social e o privado,
colocado anteriormente, também é manifestada nas palavras de Oliveira. Este autor,
referindo-se ao seu estudo sobre o empreendedorismo social, escreveu que, “essa
amostra nos possibilita perceber que certa similitude quanto à compreensão da
origem e estreitamento do empreendedorismo social com a lógica empresarial”
(2004, p. 12).
E para deixar mais claro que ambos os empreendedores, o social e o
privado, desenvolvem praticamente as mesmas características, pode-se verificar no
quadro 16 que as características de número 1 até o 26 haviam aparecido nas
cinco pesquisas anteriores. Isto significa que 86,6% das 30 características dos
empreendedores sociais haviam sido mencionadas. As de número 1 até 13, além
117
Oliveira dividiu seu quadro em quatro partes, ao qual colocou os seguintes nomes: Conhecimentos –
Habilidades Competências Posturas. Nesta configuração, algumas características se repetiram em quadros
diferentes como, por exemplo, ter visão (colocada no quadro habilidades) e ser visionário (colocada no quadro
competências). Em vista disto, o quadro 16 apresenta menos características do que o original, além de ter uma
configuração diferente.
210
de serem encontradas nos respectivos quadros identificados ao lado, também
podem ser vistas no quadro 15, que reúne as habilidades e os comportamentos que
se repetiram, em relação ao quadro 14. As de número 14 até o 26 se encontram em
quadros específicos, conforme a indicação ao lado direito da característica e,
portanto, não aparecem no quadro 15. As últimas quatro restantes; consciente,
crítico, inconformado com as injustiças sociais e ético, representaram aquelas
identificadas apenas nos empreendedores sociais e, portanto, tratam-se das
características acrescentadas por este sexto estudo.
Chama a atenção que a compatibilidade de 9 características do quadro 16,
em relação às dos outros quadros, ocorre por afinidade e não especificamente pela
semelhança da palavra. O quadro 17 apresenta, ao lado esquerdo, como a
característica aparece no quadro 16, e, no lado direito, foram colocadas algumas
palavras com certo grau de equivalência e que se encontram nas outras pesquisas.
Apaixonado
Motivação pessoal, energia
Inteligente Conhecimento técnico, pensamento analítico
Equilibrado Poder de autocontrole, tolerância a incertezas
Objetivo Orientação para resultado, estabelecimento de metas
Flexível Dinâmico, flexibilidade a mudanças
Saber negociar Habilidade de vender, comunicação, autoconfiança
Saber usar forças latentes
Autoconsciência, pró-atividade, competitividade, autoconfiança
Competência gerencial Tino empresarial
Habilidoso
Habilidade na utilização de recursos e para conduzir situações
Quadro 17: Equiparação entre as características empreendedoras
Fonte: elaborado pelo autor.
Com esta última pesquisa, ao total foram identificadas, em diferentes
empreendedores, 73 características distintas
118
, o que corresponde a uma
quantidade considerável de habilidades e comportamentos, mas que de modo
algum, encerra e abrange todas as características possíveis de serem encontradas
nos empreendedores. Deste total, 33 se repetiram entre algumas pesquisas. Por
sua vez, 40 apareceram em apenas uma pesquisa. Nota-se que nos quadros 13 e
14 um maior número de características que não foram encontradas nas outras
118
Não está sendo considerada a somatória das características de cada um dos 6 quadros apresentados e sim a
citação de uma diferente característica. A diferença diz respeito mais à forma diferenciada como elas foram
citadas nas pesquisas, pois seria viável juntar em uma característica, outras semelhantes, como por exemplo,
juntar a característica comprometimento com determinação, ou persistência com tenacidade, entre outras.
211
pesquisas. E a coincidência entre as pesquisas dos quadros 13 e 14 é que estas são
procedentes dos estudos mais antigos, desde a década de 1970. Na realidade, a
pesquisa do quadro 14 é a mais recente, porém seu estudo abrangeu a década de
1970. Tudo leva a crer que determinadas características deveriam ser consideradas
diferencias para aquela época, e por sua vez, seriam bastante valorizadas dentro do
contexto daquele momento. Com o passar do tempo, mais precisamente a partir da
década de 1990 até os primeiros anos do século XXI, período em que ocorreram as
outras 4 pesquisas, as características em questão não se fizeram mais presentes ou
não ficaram muito em evidência, razão pela qual, não foram mais notificadas,
mostrando assim, que os empreendedores não agem e reagem de maneira idêntica
em todos os lugares e muito menos em épocas diferentes. Por outro lado, nada
impede que alguma característica identificada em pesquisas mais antigas volte a ser
destacada, isto é, manifestada, com freqüência, nos empreendedores nos dias de
hoje.
Da mesma forma que foi criado um quadro que apresentou as
características que se repetiram (quadro 15), desta vez, no quadro 18, pode ser
observado as que apareceram em apenas uma pesquisa.
Características Quadro 10 Características Quadro 14
Monitoramento sistemático
Responsabilidade
Características Quadro 11
Poder de autocontrole
Fazem a diferença
Ambição
Ficam ricos
Necessidade de poder
Construir o próprio destino
Motivação por dinheiro
Características Quadro 12
Facilidade de comunicação
Tino empresarial Realização de feedback
Características Quadro 13
Capacidade de percepção
Capacidade de aprendizagem Auto-avaliação
Tenacidade Desejo de produção
Originalidade Pensamento analítico
Habilidade para conduzir situações Ser pragmático
Envolvimento a longo prazo Busca de reconhecimento
Habilidade na utilização de recursos Necessidade de segurança
Sensibilidade aos outros Habilidade de vender
Tendência a confiar nas pessoas Competitividade
212
Orientação para resultados Servir de inspiração a outros
Autoconsciência Lidar com erros
Dinheiro como medida de desempenho Estrategista
Características Quadro 16
Pró-atividade
Crítico
Consciente
Ético
Inconformado c/ injustiça social
Quadro 18: Características empreendedoras presentes apenas em uma pesquisa
Fonte: elaborado pelo autor.
Como se trataram de estudos realizados e observados em diversos lugares,
épocas, contextos, culturas, com enfoques diferentes, além de serem oriundas de
alguns dos estudos mais amplos realizados sobre os empreendedores, era
previsível haver essa quantidade grande de características, sejam elas procedentes
de uma única pesquisa ou mesmo as que se repetiram em mais de um estudo como
as que aparecem no quadro 15. Outras duas considerações cujas idéias também
constam no texto deste trabalho, mas ainda não foram citadas, merecem ser
enfatizadas. Uma delas, escrita por Dolabela, diz que
as pesquisas indicam ser indispensável a presença de alguns
comportamentos e competências para o sucesso empreendedor. Ao listá-
los, temos a impressão de estar construindo um super-homem. É inegável,
também, a sensação de que tais características podem definir pessoas de
sucesso em outras atividades que não as de uma empresa (2003a, p. 38).
O fato é que, de acordo com o propósito do empreendedor, este acaba
desenvolvendo e acentuando algumas características a partir do momento em que
decide correr os riscos de empreender, em que se compromete a fazer uso de todo
potencial empreendedor que possui, como também, a desenvolver outras
habilidades necessárias ao desafio imposto, e principalmente, durante a jornada em
busca da realização da sua visão. E a obtenção do êxito levará muito em conta os
comportamentos adotados e as habilidades desenvolvidas e utilizadas, não
importando se o objetivo seja abrir uma empresa ou ajudar numa causa social.
213
Uma condição essencial para despertar o espírito empreendedor é entender,
como dizem muitos estudiosos do assunto, que as características empreendedoras
são passíveis de capacitação em todos os indivíduos que se dispõem a aprimorar e
desenvolver suas potencialidades empreendedoras. Como diz Pati,
o que dificulta ou mesmo impede nossa mudança é a crença de que não
mudaremos; de que características que o permanentes e impossíveis
de serem alteradas; de que, infelizmente, temos de conviver com nossas
lacunas e nossos aspectos ruins; e de que, no máximo, nós e os outros
precisamos aprender a suportá-los (in PEREIRA e SANTOS, 1995, p. 44).
Portanto, num contexto acadêmico onde se visa fazer com que os alunos
desenvolvam habilidades e tenham comportamentos empreendedores, é importante
frisar que
somos um “produto” em constante estado de aperfeiçoamento. Se hoje
somos o que somos, amanhã seremos o que quisermos ser. Algumas
características nossas não podem ser radicalmente alteradas, mas poderão
variar em grau de desenvolvimento, em qualidade, em importância e no
espaço que ocupam em nossas vidas (PATI in PEREIRA e SANTOS, 1995,
p. 43).
Diante desta colocação, mas considerando agora no âmbito educacional, pode-se
presumir que, dentro de um ambiente escolar adequado, de um correto estímulo e
valorização das habilidades e dos comportamentos empreendedores, pode-se
vislumbrar o favorecimento para a formação de alunos interessados em desenvolver
o seu potencial empreendedor. É prudente ressalvar que, embora muitos indivíduos
tenham condições de serem o que quiserem ser, isto não pode ser interpretado
como se fosse um fato concreto e que está imunizado aos percalços da vida e às
disparidades da formação da pessoa. Cada indivíduo vive numa diferente realidade,
tem uma educação que varia bastante conforme as condições, os valores e crenças
da família, entre outros fatores que são capazes de inibir, dificultar e até censurar o
que a pessoa quiser ser.
Um outro importante conselho que se pode dar ao educando ao abordar as
características dos empreendedores é para que ele
214
não encare o perfil do empreendedor bem sucedido como um padrão que
evita se conhecer para não se sentir mal consigo mesmo, nem como objeto
de redução de sua auto-estima. Use-o exclusivamente para descobrir para
onde direcionar seu processo de desenvolvimento o que precisa ser
aperfeiçoado onde e o que precisa trabalhar em si mesmo para ser o
empreendedor que espera ser (PATI in PEREIRA e SANTOS, 1995, p. 45).
Conforme manifestado, ao todo foram identificadas em diferentes
indivíduos empreendedores 73 características distintas. Das seis pesquisas de onde
elas procederam, apenas metade
119
delas preocuparam-se em descrever como as
características são definidas a partir da observação das ações e dos
comportamentos dos empreendedores.
De acordo com Filion (2004), uma das maneiras de levar os estudantes a se
familiarizarem com as características empreendedoras é trazer empreendedores
para dentro da sala de aula para que os alunos possam dialogar pessoalmente com
eles, permitindo também que estes narrem suas experiências empreendedoras.
Também é aconselhável apresentar biografias e histórias
120
de empreendedores,
assim como solicitar aos educandos que entrevistem empreendedores da sua
comunidade. A partir destas atividades, os educandos vão assimilando
teoricamente, mas de maneira interessante e detalhada, várias características, para
depois as colocarem em prática. Estas considerações foram feitas para demonstrar
algumas das maneiras mais adequadas e também explicitadas para se trabalhar, ou
melhor, para apresentar em teoria as características empreendedoras. Na
impossibilidade de seguir estas sugestões, mas para não deixar de descrever as
características empreendedoras, o quadro 19 mostra sinteticamente a descrição de
algumas
121
delas, conforme apareceram nas pesquisas utilizadas neste trabalho, as
quais se enfatizam que não ofereceram maiores detalhamentos e dizem respeito,
essencialmente, aos empreendedores privados. Também é importante deixar claro
119
As características dos quadros 10, 11 e 12 foram descritas nas respectivas pesquisas.
120
Três livros nacionais nos quais os empreendedores contam suas histórias são indicados para o propósito
descrito. Eles são: Empreendedores Brasileiros (Francisco Britto e Luiz Wever), - A Vez do Sonho (Fernando
Dolabela) e - Como fazer uma empresa dar certo em um país incerto: conselhos e lições de 51 dos
empreendedores mais bem-sucedidos do Brasil (Instituto Empreender Endeavor).
121
Não foi possível descrever cada uma das 73 distintas características encontradas em diferentes
empreendedores, pois em apenas 3 pesquisas, do total de 6 de onde elas são procedentes, trataram de descrevê-
las. Numa tentativa de descrever o maior número possível das 73 características, buscou-se em outros estudos a
descrição delas. Em função do uso de diferentes pesquisas para a elaboração do quadro 19, se verifica, na
descrição de algumas características, a presença de outras características.
215
que, de acordo com a pesquisa, uma mesma característica pode ser descrita de
maneira diferente, porém não de maneira contraditória.
No intuito de iniciar os procedimentos para que os alunos desenvolvam
comportamentos e habilidades empreendedoras, não se considera adequado
apresentar aos estudantes as descrições das características empreendedoras
conforme elas aparecem no quadro 19, e sim, de acordo com as atividades
anteriormente citadas. Mas se isto for feito, é importante advertir os alunos de que o
essencial, ao tomar conhecimentos das descrições das características, é captar a
idéia descrita sobre elas, pois elas podem se adequar a cada propósito estabelecido,
não sendo necessário elas serem desenvolvidas exatamente como estão descritas.
São visionários
Eles têm a visão de como será o futuro para o seu negócio e sua
vida, e o mais importante, têm a habilidade de implementar seus
sonhos.
Sabem tomar decisões
Eles não se sentem inseguros, sabem tomar as decisões corretas
na hora certa, principalmente nos momentos de adversidade,
sendo um fator chave para o seu sucesso. Tomar decisões
acertadas é um processo que exige o levantamento de
informações, análise fria da situação, avaliação das alternativas e
escolha da solução mais adequada.
São determinados
Eles implementam suas ações com total comprometimento.
Atropelam as adversidades, ultrapassando os obstáculos, com
uma vontade ímpar de “fazer acontecer”.
São dinâmicos
Nunca se acomodam para não perder a capacidade de fazer com
que simples idéias se concretizem em negócios efetivos. Manter-
se sempre dinâmicos e cultivar um certo inconformismo diante
da rotina é um de seus lemas preferidos.
Assumem riscos
calculados
Talvez essa seja a característica mais conhecida dos
empreendedores. Mas o verdadeiro empreendedor é aquele que
assume riscos calculados e sabe gerenciar o risco, avaliando as
reais chances de sucesso. Assumir riscos tem relação com
desafios, de tentar um novo empreendimento, de buscar, por si
só, os melhores caminhos, é ter autodeterminação.
Identificam oportunidades
Ficar atento e perceber, no momento certo, as oportunidades que
o mercado oferece e reunir as condições propícias para a
realização de um bom negócio é outra marca importante do
empreendedor bem sucedido. Ele é um indivíduo curioso e
atento às informações, pois sabe que suas chances melhoram
quando seu conhecimento aumenta.
São otimistas
Esta é uma característica das pessoas que enxergam o sucesso,
em vez de imaginar o fracasso. Capaz de enfrentar obstáculos, o
empreendedor sabe olhar além e acima das dificuldades.
Eles querem estar à frente das mudanças e ser donos do próprio
216
São independentes e
constroem seu próprio
destino
destino. Querem ser independentes, em vez de empregados;
querem criar algo novo e determinar seus próprios passos, abrir
seus próprios caminhos, ser seu próprio patrão e gerar empregos.
Autoconfiança
São extremamente autoconfiantes, acreditando nas suas
competências e capacidades. Mantêm seu ponto de vista, mesmo
diante da oposição ou de resultados inicialmente desanimadores.
Expressam confiança na sua própria capacidade de completar
uma tarefa difícil ou de enfrentar um desafio.
Possuem conhecimento
São sedentos pelo saber e aprendem continuamente, pois sabem
que, quanto maior o domínio sobre um ramo de negócio, maior é
a sua chance de êxito. Esse conhecimento pode vir da
experiência prática, de informações obtidas em publicações
especializadas, em cursos ou mesmo de conselhos de pessoas
que montaram empreendimentos semelhantes.
São líderes
Liderar é saber definir objetivos, orientar tarefas, combinar
métodos, estimular as pessoas no rumo das metas traçadas e
favorecer relações equilibradas dentro da equipe de trabalho, em
torno do empreendimento. Sabem valorizar, estimular e
recompensar o esforço da sua equipe, formando um time em
torno de si.
São formadores de equipe
Sabem que, para obter êxito e sucesso, dependem de uma equipe
de profissionais competentes. Não são lobos solitários, do tipo
superindependentes. Tem uma rara habilidade de despertar o
herói que existe dentro das pessoas que eles atraem para o
empreendimento, dando responsabilidades e dividindo os
méritos por suas realizações. Sabem ainda recrutar as melhores
cabeças para assessorá-los nos campos em que não detêm maior
conhecimento.
São organizados
Os empreendedores sabem obter e alocar os recursos materiais,
humanos, tecnológicos e financeiros de forma racional,
procurando o melhor desempenho para o negócio.
São dedicados
Eles se dedicam 24 horas por dia, sete dias por semana, ao seu
próprio negócio. Comprometem o relacionamento com amigos,
com a família e até mesmo com a própria saúde. São
trabalhadores exemplares, encontrando energia para continuar,
mesmo quando encontram problemas pela frente.
São planejadores
Os empreendedores de sucesso planejam cada passo de seu
negócio, desde o primeiro rascunho do plano de negócios até a
apresentação do plano a investidores, definição das estratégias
de marketing do negócio etc., sempre tendo como base a forte
visão de negócio que possuem.
São bem relacionados
(rede de contato)
Os empreendedores sabem construir uma rede de contato que os
auxiliam no ambiente externo da empresa, junto a clientes,
fornecedores e entidades de classe.
São indivíduos que fazem
a diferença
Os empreendedores transformam algo de difícil definição, uma
idéia abstrata, em algo concreto, que funciona, transformando o
que é possível em realidade. Sabem agregar valor aos serviços e
produtos que coloca no mercado.
Eles adoram o seu trabalho. E é esse amor ao que fazem o
217
Motivação pessoal
(apaixonados pelo que
fazem)
principal combustível que os mantém cada vez mais animados e
autodeterminados, tornando-os os melhores vendedores de seus
produtos e serviços, pois sabem, como ninguém como fazê-los.
Agregam valores
Os empreendedores utilizam seu capital intelectual para criar
valor para a sociedade, através da geração de emprego,
dinamizando a economia e inovando, sempre usando sua
criatividade em busca de soluções para melhorar a vida das
pessoas.
Têm iniciativa
Os empreendedores fazem as coisas antes de solicitado ou
forçado pelas circunstâncias.
Persistência / tenacidade
A persistência é considerado o “fôlego extra” que se apresenta
nas pessoas que permanecem na busca do objetivo, enquanto
outros não conseguem manter-se no caminho. Os
empreendedores agem repetidamente ou mudam de estratégia,
para enfrentar um desafio ou superar um obstáculo.
Exigência de eficiência
Encontram maneiras de fazer coisas melhor, mais rápido, ou
mais barato; agem de maneira a fazer coisas que satisfazem ou
excedem padrões de excelência.
Buscam informações
Dedica-se pessoalmente a obter informações de clientes,
fornecedores e concorrentes; investiga pessoalmente como
fabricar um produto ou fornecer um serviço; consulta
especialista para obter assessoria técnica ou comercial.
Estabelecem metas
Estabelecem metas e objetivos que são desafiantes e que têm
significado pessoal; definem metas de longo prazo, claras e
específicas; estabelecem objetivos de curto prazo mensuráveis.
Não agem ao acaso, portanto, antes de dispenderem esforços,
estabelecem muito claramente onde, quando e de que modo
querem alcançar suas metas.
Monitoramento
sistemático
Constantemente revisam seus planos, levando em conta os
resultados obtidos e as mudanças circunstanciais, mantêm
registros financeiros e os utilizam para tomar decisões.
Exigência de qualidade
Desenvolvem ou utilizam procedimentos para assegurar que o
trabalho seja terminado a tempo, ou que o trabalho atenda
padrões de qualidade previamente combinados.
Ficam ricos / motivação
por dinheiro / dinheiro
como medida de
desempenho
Ficar rico não é o principal objetivo dos empreendedores. Eles
acreditam que o dinheiro é conseqüência do sucesso dos
negócios. Aceitam o dinheiro como uma das medidas do seu
desempenho.
São comprometidos /
envolvimento a longo
prazo
Fazem sacrifícios pessoais ou despendem um esforço
extraordinário para completar uma tarefa; colaboram com os
empregados ou se colocam no lugar deles, se necessário, para
terminar um trabalho; esmeram-se em manter os clientes
satisfeitos e colocam em primeiro lugar a boa vontade a longo
prazo, acima do lucro a curto prazo.
Persuasão
Utilizam estratégias deliberadas para influenciar ou persuadir os
outros; utiliza pessoas-chaves como agentes para atingir seus
próprios objetivos; tem habilidade de convencer os outros a
respeito da pertinência de uma idéia.
Colocam-se em situações onde são pessoalmente responsáveis
218
São responsáveis
pelo sucesso ou fracasso das operações, pois gostam de tomar
iniciativa na resolução de problemas. Assumem totalmente a
responsabilidade de seus empreendimentos no qual são
moralmente, legalmente e mentalmente responsáveis.
Tolerância a incertezas
A incerteza é um componente inerente a todo empreendimento.
Neste ambiente os empreendedores defrontam-se com atividades
indefinidas, incertas que mudam continuamente e o tempo nunca
parece ser o suficiente. Os empreendedores vislumbram as
adversidades com naturalidade, como apenas um obstáculo a
mais, a ser transporto.
Poder de autocontrole
Os empreendedores pensam que o sucesso ou fracasso de seu
empreendimento não será governado pelos fatos, sorte ou
alguma influencia externa. Acreditam que os resultados de suas
realizações dependem de seu próprio controle e influencia, por
isso gostam de ter controle sobre as atividades que executam.
Realização de feedback
Os empreendedores tem um insaciável desejo por saber quão
bem estão desempenhando. Pois, sabem que, precisam usar
ativamente de feedback. Buscar e usar feedback é um hábito
essencial para poder aprender com os erros e aprender a lidar
com o inesperado. Por esta razão também, os bons
empreendedores são frequentemente descritos como excelentes
ouvintes e de rápida aprendizagem.
São criativos
O empreendedor usa um raciocínio alternativo para sair de
dificuldades ou até mesmo para aumentar os lucros. Se um
problema não pode ser resolvido de uma maneira o
empreendedor encontra uma solução alternativa. A criatividade
do empreendedor é fruto também da sua curiosidade, da sua
constante busca de informações, da sua intuição, da sua
flexibilidade, da habilidade que tem de gerar um grande número
de idéias. O oposto a criatividade é a rigidez. Os
empreendedores não são rígidos em termos de pensamentos e
irritam-se com pessoas que digam “fazemos isto desta forma,
porque sempre se fez assim”.
Agressividade
O empreendedor a utiliza, de forma bem conduzida e moderada,
para destruir os obstáculos que os impedem de atingir suas
metas. Ela aparece quando eles estão motivados, quando são
competitivos, quando continuam na luta apesar do cansaço ou da
frustração, quando se reerguem das cinzas e começam tudo de
novo e em outras tantas ocasiões. Quanto mais a agressividade
for bem conduzida, mais facilmente o empreendedor conseguirá
energia suficiente para enfrentar as dificuldades.
Sabem lidar com erros
Os empreendedores permitem a aprendizagem através do
erro/acerto, identificando as necessidades de clientes e
transformando-as em oportunidades de negócios, o que
possibilita ao empreendedor aprender com seus erros e corrigi-
los com alternativas criativas, sem que haja dificuldade na
tomada de decisão.
Necessidade de realização
Trabalham com a expectativa de alcançar os mais elevados
níveis de realização e também são dirigidos internamente pelo
forte desejo de exceder contra os próprios limites.
219
Energia e entusiasmo
Empreendedores são, na sua maioria, dedicados, dispostos e
prontos a trabalharem. Podem trabalhar por períodos longos e
contínuos de tempo enquanto constroem seus negócios.
Apresentam com isso uma força visivelmente superior aos
demais, para trabalhar e cumprir com as tarefas necessárias para
atingir seus objetivos.
Orientação para resultados
Procuram atividades que demonstrem progressos orientados por
objetivos. Possuem um sentido de urgência infinita para o
desenvolvimento de suas idéias. A inatividade faz com que se
sintam tensos e pacientes.
Aprender a aprender /
capacidade de
aprendizagem
O empreendedor preocupa-se em aprender a aprender, porque
sabe que no seu dia-a dia será submetido a situações que exigem
a constante apreensão de conhecimentos que não estão nos
livros.
Habilidade de vender /
negociar
O empreendedor adquire com a experiência a habilidade de
negociar, entre outras coisas, a compra de matéria prima e a
venda do produto ou serviço.
São estrategistas
Eles formulam estratégias após terem analisados
cuidadosamente todos os fatores que possam influenciar o seu
empreendimento. Eles buscam informações antes de definir as
metas e escolher as estratégias, procurando avaliá-las enquanto
as executam para ver se estão dando certo ou não.
Autoconsciência
Os empreendedores em geral têm uma grande consciência de
suas forças e fraquezas, e da competitividade, conservando um
senso de perspectiva e otimismo.
Necessidade de poder
122
Os empreendedores são guiados pela sede de realização e
criação, ao invés da, sede de status e poder. Ironicamente suas
realizações, quando bem sucedidas lhes esse status e poder.
Mas, é importante reconhecer que status e poder são o resultado
de suas atividades e não as necessidades que os impulsionam e
motivam.
Tino empresarial
O que muita gente acredita ser um “sexto sentido”, intuição, faro
empresarial, típico de gente bem-sucedida nos negócios é, na
maioria das vezes, a soma de todas as qualidades descritas aqui.
Se o empreendedor reúne a maior parte dessas características
terá grande chance de ter êxito.
Quadro 19: Descrição das características empreendedoras
Fonte: Acúrio e Andrade (2005), Búrigo Filho (2004), Dornelas (2007), Fialho et al. (2006), Garcia, L. F.
(2000), Leite, E. (2002), Pati (1995), Ray (1993 in TONELLI, 1997), Salim et al. (2004), Timmons (1985 in
LONGEN, 1997), Timmons (1994) e Hornaday (1982, in DOLABELA, 2000b).
Dentro de um curso de Turismo, a seleção, ou melhor, a sugestão das
habilidades empreendedoras a serem desenvolvidas deve levar em conta os
propósitos de formação da própria disciplina de empreendedorismo, procurando
122
Esta característica apareceu, primeiramente, nos estudos de David MacClelland desenvolvidos a partir da
década de 1960. Neste trabalho, esta característica se encontra presente na pesquisa de Walter, Silvana, et al.
(2005) - (quadro 14), da qual o estudo coletou informações a partir do ano de 1972. Mais recentemente, em
meados da década de 1980, a característica de necessidade de poder foi revista e seu entendimento foi alterado
conforme aparece descrita no quadro 19.
220
desenvolver também, algumas características que são encontradas nas Diretrizes
Curriculares do respectivo curso, as que estejam de acordo com o perfil buscado
pelo mercado turístico
123
e que estejam coadunadas com o Projeto Político
Pedagógico da instituição de ensino. São tantos os interesses que são levados em
consideração que é possível elencar uma extensa lista de habilidades a serem
desenvolvidas. No entanto, a disciplina de empreendedorismo não é a única que
pode possibilitar que os alunos desenvolvam as características que as referências
citadas
124
venham a indicar, e mesmo que quisesse, não teria condições. Portanto,
não cabe a ela tentar desenvolver todas as habilidades que possam ser elencadas.
O que pode ser feito é procurar identificar, dentre os referenciais citados, as
habilidades que são comuns para assim enfatizar o desenvolvimento das que são
semelhantes, cuidando, contudo, para não se listar uma ampla relação de
habilidades que inviabilizaria e tornaria utópico o desenvolvimento delas. Outra
atenção que se deve ter e que influencia tanto as propostas educacionais, quanto as
necessidades e exigências do mercado de trabalho, é a realidade contextual onde
estão localizados os cursos e seus estudantes, que muda bastante conforme a
região, o estado, a cidade, o bairro em que estão situados. São fatores de âmbitos
sociais, políticos, econômicos, culturais e naturais que acabam impactando nos
referenciais de onde se procura selecionar as habilidades empreendedoras. Em
virtude dos cenários diversificados e repletos de múltiplas interferências, se evita
esboçar uma sugestão de habilidades e comportamentos empreendedores a serem
desenvolvidos pelos alunos.
123
Conforme pesquisa de Marília Ansarah o bacharel em turismo pode trabalhar em vários segmentos do
mercado como: hospedagem, transportes, agenciamentos, alimentação, lazer, eventos, hospitalidade, órgãos
oficiais, consultorias, marketing, magistério, pesquisas, entre outros ramos de conhecimento humano (2002, p.
42).
124
Os referenciais citados se relacionam a: disciplina de Empreendedorismo, as Diretrizes Curriculares do cursos
de Turismo, o perfil exigido pelo mercado de trabalho turístico e o perfil encontrado no Projeto Político
Pedagógico do curso.
221
6 OS ELEMENTOS DE CONVERGÊNCIA ENTRE A METODOLOGIA DE
PROJETO E O EMPREENDEDORISMO
De acordo com a bibliografia consultada, a metodologia de projeto pode ser
trabalhada dentro de uma disciplina específica
125
. Também é possível fazer uso da
mesma em um semestre letivo, de forma que todas as disciplinas estejam
essencialmente envolvidas nos projetos dos alunos. Outra opção é organizar todo o
currículo acadêmico do curso fazendo uso desta metodologia.
Pelos desafios, mudanças e exigências que a utilização da metodologia de
projeto demanda à instituição de ensino, aos professores e também aos educandos,
inicialmente é mais prudente sugerir a utilização desta metodologia em uma
disciplina específica, sem esquecer de levar em conta, para este propósito, as
recomendações colocadas no subcapítulo 4.7
126
.
Fazendo uma analogia com o vocabulário teatral, o curso de Turismo pode
ser entendido como a casa de teatro onde a peça é apresentada, e a disciplina de
Empreendedorismo configura-se como o cenário do espetáculo. A metodologia de
projeto seria a trama da peça e, por sua vez, a principal responsável para que os
atores, representados pelos alunos, consigam desempenhar seus papéis da melhor
forma possível, ou seja, que desenvolvam habilidades e comportamentos
empreendedores.
Seguindo a analogia estabelecida, ao iniciar este trabalho pela apresentação
da trama (metodologia de projeto), pode-se vislumbrar, de posse do conhecimento
desta e posteriormente com a leitura dos capítulos subseqüentes, a viabilidade de os
atores (alunos do curso de Turismo) virem a desenvolver seus papéis (habilidades e
comportamentos empreendedores) dentro do cenário especificado (disciplina de
empreendedorismo). Além de apresentar algumas características a serem
desenvolvidas pelos atores (características empreendedoras), também foi abordada
a configuração do cenário elaborado pelo cenógrafo (o professor). Está se falando
que o cenário foi montado com base na trama e visando oferecer condições para
que os atores (alunos) tenham condições de desempenhar seus papéis, isto é,
125
No Ensino Superior, nas poucas experiências da utilização da metodologia de projeto, predominou a
ocorrência do uso a partir de uma única disciplina, ainda que outras disciplinas do curso tenham colaborado com
os projetos.
126
Subcapítulo que tratou das dificuldades e das críticas que são feitas à metodologia de projeto, no qual também
se ofereceu algumas sugestões para lidar com as dificuldades que podem ocorrer ao optar por fazer uso desta
metodologia.
222
sonhar, desenvolver e utilizar determinadas características para que possam realizar
com sucesso o sonho, sendo este voltado a algum problema social. Trata-se,
portanto, de um cenário idêntico à realidade, com toda sua complexidade,
diversidade de paisagens, de pessoas e também em constante transformação.
Neste momento de integração da metodologia de projeto com o
empreendedorismo, esta analogia pretendeu reforçar e também situar o papel
destes dois objetos de estudo, nesta pesquisa, e de seus elementos
complementares, como o curso de turismo e outros temas presentes dentro do
empreendedorismo.
O que até aqui foi explorado, nesta pesquisa, foi no sentido de oferecer
informações sobre a metodologia de projeto e sobre o empreendedorismo, no intuito
de verificar a correspondência da utilização da referida metodologia para que os
alunos, do curso Superior de Turismo
127
, desenvolvam habilidades e
comportamentos empreendedores dentro da disciplina de empreendedorismo. Tal
propósito, que pôde ser vislumbrado com a leitura dos capítulos anteriores, mas
de forma separada, agora será explorado concomitantemente e mais objetivamente.
Ao compilar algumas palavras intrínsecas ao ato de projetar, pode-se
destacar: ação, concretização, realização, idéias, sonhos, desejos, necessidades,
anseios, futuro, entre outras. Selecionando algumas dessas palavras e valendo do
entendimento dos autores utilizados neste trabalho, é possível dizer que a pessoa
que projeta, parte de um sonho que, por sua vez, vai implicar numerosas ações para
que este possa ser realizado. Semelhante entendimento foi apresentado sobre a
concepção referencial de empreendedor desta pesquisa, que diz ser o
empreendedor aquele que sonha e busca transformar seu sonho em realidade.
Colocando as principais palavras ressaltadas destes dois entendimentos em um
mesmo plano, conforme o quadro 20, se visualiza a similaridade do percurso a ser
trilhado pela pessoa que projeta e por quem se comporta como um empreendedor,
ou seja, desde o nascedouro a a etapa final de ambas situações.
Consequentemente, também é conferido, uma compatibilidade entre as concepções.
127
Não são todos os cursos Superiores de Turismo em que consta, de forma obrigatória ou eletiva, a disciplina de
empreendedorismo. No estado do Rio Grande do Sul, dentre as 16 instituições de Ensino Superior que oferecem
o curso de graduação em Turismo, seja ele de bacharelado ou tecnólogo, conforme consulta na internet ocorrida
em 03/06/2008 no site de cada instituição, 9 delas (CESF, Faccat, FACEBG, Feevale, PUC-RS, UCPel,
Unilasalle, Univates e UPF) têm na grade curricular do curso de Turismo a disciplina de empreendedorismo.
223
Nascedouro Exigência Objetivo
Projetar/Empreendedor = sonhar ação realizar o sonho
Quadro 20: Similaridade entre o sujeito que projeta e o empreendedor
Fonte: elaborado pelo autor.
Logicamente que, inerente à idéia de projetar, estão presentes outras maneiras de
se originar um projeto, da mesma forma que se pode explorar outras exigências
intrínsecas à ação de projetar. Por outro lado, é perfeitamente aceitável optar por
algumas palavras, como as que foram utilizadas para designar o ato de projetar.
O que fica evidente com a análise comparativa feita é a compatibilidade da
ação de projetar, derivada da palavra “projeto”, da qual a metodologia estudada
nesta pesquisa toma como nome e conseqüentemente se vale da sua apreensão
para caracterizar a proposta educativa, com a concepção da palavra empreendedor,
mais especificamente do conceito tomado como referência neste trabalho.
Outras análises comparativas, as quais se detêm ainda nos elementos
constitutivos da metodologia de projeto e nas características do empreendedorismo,
evidenciam a correspondência existente. Conforme foi visto, a atividade de fazer
projetos é natural do ser humano e por isso foi também identificada como uma
característica verdadeiramente humana, pois se entende que o homem é capaz
de projetar e de realizar o que projetou. Enquanto que empreender, igualmente, trata
exclusivamente de uma ação humana e segundo alguns autores, o espírito
empreendedor é uma característica comum a todos, razão pela qual é inerente à
espécie humana, mas precisa ser despertada, isto é desenvolvida. Caso contrário,
como diz, de forma figurada, Souza Neto “ ‘morre na casca’, mesmo tendo perfil para
empreender” (2003, p. 44). Por conseguinte, só o homem é apto para empreender.
Tanto o ato de projetar como o de empreender, além de terem semelhantes
fatores impulsionadores como, por exemplo, sonhos, desejos, vontades, referem-se
ao futuro. É essa visão de futuro que possibilita à pessoa que projeta e ao indivíduo
que empreende um direcionamento e orienta as ações necessárias para a
realização do propósito originado, seja no sonho, seja no desejo do indivíduo.
Uma significativa e talvez a mais importante de todas as paridades diz
respeito à palavra ação. Sem ação não é possível realizar projetos e muito menos
se tornar empreendedor, portanto a referida palavra sempre estará presente quando
se falar de ambas as situações. Vale dizer também, segundo Dolabela (2003a, p.
80), que “empreender é buscar, é uma ação, não é chegar”, assim como Cortesão et
224
al. (2002) diz que só quando passam a agir é que os indivíduos podem se considerar
realizando um projeto, o que significa entender, que na ausência de ação, não se
concebe a atividade de realizar projetos, e nem de empreender. Deste entendimento
é que se pontuou que não existem projetos desligados da ação e que empreender
tem natureza prática incontestável, pois é da ação que nasce o saber empreender.
Falando diretamente agora na metodologia de projeto, esta foi apontada
como uma prática pedagógica comprometida com a ação, em que se valoriza o
aprender fazendo. Também na educação empreendedora a indução à prática, à
ação, é o ponto chave para que o aluno desenvolva comportamentos e habilidades
empreendedoras, razão pela qual o foco desta é dado na aprendizagem ativa do
aluno. Nas conclusões do estudo de Pires esta correlação aparece muito bem
explicitada.
Este estudo mostrou que a técnica principal usada nos cursos de formação
empreendedora é a do aprender fazendo, o que levou a considerar a
possibilidade de ser essa a razão para a adoção da Pedagogia/Metodologia
de Projetos como ferramenta pedagógica da Educação Empreendedora
(PIRES, 2006, p. 165).
Mas as semelhanças não param por aí, e em outras pesquisas também se percebe
a ligação que fazem entre os trabalhos por projetos e o empreendedorismo.
Segundo Martins et al.,
a proposta do trabalho por projetos está vinculada à perspectiva do
conhecimento globalizado, essa característica remete para o enfoque
empreendedor, o apenas no sentido restrito de montar um negócio
próprio, mas, acima de tudo, na acepção de possibilitar ao aluno localizar-se
e empreender-se a si próprio, na economia e na sociedade em permanente
transformação (2001, p. 2).
Pode-se vincular ao conhecimento global, enfoque educacional destacado na
metodologia de projeto e pertinente também numa formação empreendedora, outros
elementos educacionais que são valorizados em comum como, a importância da
contextualização dos conteúdos, de levar em conta o que acontece fora da sala de
aula, isto é, de extrapolar os muros da escola promovendo assim o contato direto
225
dos alunos com a realidade, de procurar levar os educandos a aprender a resolver
problemas, a questionar e não aceitar determinismos, e acreditar que realizações
são possíveis, o que os tornam mais confiantes de que são capazes de intervir na
realidade para transformá-la.
Aprender a concretizar parcerias, trabalhar em equipe, transformar idéias em
realidade, como também, desenvolver outras habilidades e ainda, através do
incentivo à auto-avaliação, levar o educando a se conhecer melhor, são outros
pontos para os quais convergem a metodologia de projeto e uma educação
empreendedora, sendo que ambas também buscam uma aprendizagem significativa
para o aluno na qual este se torna o principal responsável pelo seu aprendizado.
É importante frisar que, ao partir da concepção de empreendedor que este
trabalho utilizou como modelo, juntamente com o foco no social que foi dado à
referida concepção, fundamentos estes sugeridos para a formação empreendedora
na disciplina de empreendedorismo, acentuou-se ainda mais a aproximação que
naturalmente existe entre a metodologia de projeto e o empreendedorismo. Isto
porque o foco no empreendedorismo social orienta os educandos a atuarem na
comunidade visando resolver ou amenizar um problema social, da mesma forma que
a metodologia de projeto propõe que os educandos intervenham na realidade na
tentativa de resolver um problema identificado por eles. Resgatando o que foi dito
neste trabalho, a ação de empreender também manifesta rebeldia, inconformismo,
indignação diante das iniqüidades sociais, mas acima de tudo, a crença na
capacidade de melhorar a realidade e por isso, tem a ver com a modificação da
realidade social de forma que se possa oferecer contribuições positivas à sociedade.
E como foram frisadas no capítulo sobre a metodologia de projeto, estas são ações
e objetivos que grande parte dos autores que estudam a metodologia em questão
considera essenciais quando se trabalha com projetos, pois esta prática visa
transformar a realidade e instigar os alunos a melhorarem a situação presente de
uma determinada comunidade, ainda que se atinja apenas um problema específico.
Seja então empreendendo ou participando de projetos, os indivíduos estarão
mobilizando habilidades, competências, conhecimentos, atitudes, energias em prol
da realização de um sonho, de uma meta, de um objetivo e independente de qual for
o propósito, ambas as ações trazem consigo uma dose de incerteza e manifestam
riscos assumidos.
226
O fato é que, para os alunos desenvolverem habilidades e comportamentos
empreendedores, é essencial haver uma situação que instigue os estudantes a agir,
de modo que eles possam desenvolver as características empreendedoras. E de
acordo com Dolabela, o sonho estruturante representa o principal elemento
motivador capaz de conduzir os indivíduos a desenvolverem seu espírito
empreendedor. Isto incita os professores a mobilizar e criar condições para que os
alunos possam agir com base nos seus conhecimentos em busca da realização dos
seus sonhos. Para isso é fundamental levar em conta os interesses dos estudantes,
suas motivações, expectativas (ingredientes que podem ser extraídos a partir dos
fatores impulsionadores do ato de empreender), condições essas fundamentais para
que as ações dos alunos sejam significativas, o que permitirá aos alunos verem
sentido nos seus comportamentos e nas suas atitudes. De certa forma, estas
considerações tratam de preocupações que, igualmente, estão presentes desde os
primórdios da metodologia de projeto, através das idéias de John Dewey, que
propunha a educação pela ação, que dava importância aos interesses dos alunos,
que entendia que esforço e disciplina são produtos do interesse, e neste sentido
caberia ao professor facilitar e incentivar a aprendizagem ativa do aluno na qual a
solução de um problema era a principal fonte de desafio e de desenvolvimento das
habilidades dos alunos. Portanto, uma ação problemática era o ponto de partida da
educação por projetos do qual o aprender fazendo, vivenciando, experimentado,
tomando atitudes, era a principal forma pela qual os alunos aprendiam.
Verifica-se também que, na metodologia de projeto, o êxito ou a maior
premiação para os alunos, além do fato de terem contribuído para melhorar algo no
contexto social, está na possibilidade do desenvolvimento de várias habilidades e
competências. Semelhantes recompensas se constatam quando se foca a formação
empreendedora para ações sociais, lembrando que, mesmo visando resolver ou
amenizar um problema social, da mesma forma se desenvolvem idênticas
habilidades e comportamentos que estão presentes nos empreendedores privados.
O quadro 21 organiza de maneira simétrica algumas dimensões de ordem
educacional que foram destacadas neste capítulo, acrescentando outras, de
maneira que se possa visualizar facilmente as convergências que existem entre a
metodologia de projeto e uma educação empreendedora.
227
Dimensões Metodologia de Projeto Educação Empreendedora
Elementos
mobilizadores
Sonhos, desejos, vontades,
anseios, necessidades,...
Sonhos, desejos, vontades,
anseios, necessidades,...
Objetivos Aprender a resolver problemas,
a transformar uma idéia em
realidade;
Desenvolver habilidades,
competências, o espírito crítico-
reflexivo, a cidadania;
Proporcionar uma visão global
da realidade
Criar condições para despertar
as características
empreendedoras e para o
desenvolvimento de habilidades
e comportamentos
empreendedores
Aluno
Autônomo, protagonista, sujeito
ativo na aprendizagem
Autônomo, protagonista, sujeito
ativo na aprendizagem
Professor Orientador, facilitador, parceiro
do aluno, criador das condições
para o desenvolvimento dos
projetos
Orientador, facilitador e
incentivador, criador das
condições para a formação
empreendedora
Prática pedagógica Comprometida com a ação
crítica, reflexiva e
problematizadora
Comprometida com a ação
Reflexiva e
problematizadora
Currículo
Flexível, interdisciplinar Flexível, interdisciplinar
Conteúdos
Não estão pré-determinados
Derivam do problema/desafio,...
a resolver
Derivam do problema/desafio,...
a resolver, da natureza do
sonho
Tempo e espaço
escolar
Reorganização do tempo e dos
espaços de aprendizagem
Reorganização dos espaços de
aprendizagem
Conhecimento/
aprendizagem
Contextualizado
Significativo
Aprendizagem ativa
Ênfase na aprendizagem
Contextualizado
Significativo
Aprendizagem ativa
Ênfase na aprendizagem
Avaliação
Processual, auto-avaliação Processual, auto-avaliação
Êxito Se verifica na concretização do
projeto, no desenvolvimento de
determinadas competências e
na melhora produzida no
contexto social
Se verifica na realização do
sonho, no desenvolvimento do
espírito empreendedor e nos
impactos positivos trazidos a
sociedade
Quadro 21: Comparações entre a metodologia de projeto e a educação empreendedora
Fonte: elaborado pelo autor.
228
Problematização, desenvolvimento e avaliação podem ser destacadas como
as fases mais comuns presentes nos trabalhos por projetos e dentro delas ainda é
possível encontrar outras sub-fases. E se forem organizados em fases os momentos
presentes numa educação empreendedora, pode se constatar uma mesma lógica de
passos que estão presentes na metodologia de projeto. Esta paridade pode ser
observada no quadro 22, na qual foram selecionadas as sub-fases da metodologia
de projeto que se equiparam às supostas fases da educação empreendedora, sendo
que da forma em que as fases e sub-fases foram colocadas, é possível seguir a
ordenação estabelecida para atingir os propósitos educacionais, sejam eles da
metodologia de projeto ou da educação empreendedora.
Fases Metodologia de Projeto Educação Empreendedora
Início
Problematização, oportunidades,
desafios
Sonho
Identificação de oportunidade
Meio
Pesquisas
Planejamento
Execução
Acompanhamento
Plano de negócios
Pesquisas
Implementação
Monitoramento
Fim
Sistematização e avaliação do
projeto e auto-avaliação
Avaliação do empreendimento e auto-
avaliação
Quadro 22: Comparativos entre as fases da metodologia de projeto e a educação empreendedora
Fonte: adaptado de Pires (2006).
Em linhas gerais, é a idéia sica do projeto, isto é, a meta, o sonho, que determina
e justifica as fases do projeto, sendo que estas exigem bastante organização,
planejamento, o estabelecimento de metas intermediárias, articulação de objetivos
parciais das ações para que a idéia inicial seja realizada com êxito. Este mesmo
raciocínio também se aplica aos cuidados que o aluno pré-empreendedor deve ter
para obter sucesso nos seus empreendimentos. Como dizem Filion e Dolabela, “ser
empreendedor é também saber definir projetos e realizá-los. Para isso, convém se
habituar a dividir seus planos em etapas, que deverão ser realizados gradualmente,
passo a passo” (2000c, p. 23). Portanto, dentro de uma lógica sistemática que
manifesta o esboço de um possível roteiro a seguir em uma educação
empreendedora, como a que está apresentada no quadro 22, mais uma vez se
percebe a paridade que esta pesquisa vem demonstrando.
229
Com base nesta última constatação, mas levando em consideração também
as anteriores manifestações que demonstram a equivalência da metodologia de
projeto com a educação empreendedora, é presumível seguir unicamente as etapas
presentes na metodologia de projeto (lado esquerdo do quadro 22) para se atingir os
objetivos da formação empreendedora, que estão descritas no quadro 21. A
seguinte colocação de Filion, oriunda da observação de diferentes experiências
relacionadas ao desenvolvimento do potencial empreendedor na educação de
jovens do ensino fundamental e médio, corrobora com esta constatação. Para Filion,
o importante, em todos os casos, era a capacidade de incluir, no sistema
escolar, o hábito de conceber e implementar projetos. Trata-se de uma
atividade fundamental hoje em dia para aqueles que pretendem se preparar
para se integrar ao mercado de trabalho e em especial para aprender a
prática empreendedora (2004, p. 11). [grifo do autor].
Sem receio de ser repetitivo, mas objetivando firmar o propósito deste
capítulo, que, por sinal, é o ponto chave desta pesquisa, se buscam idéias
apresentadas por Moura e Barbosa e por Filion, das quais, as menções sobre o
empreendedorismo e sobre o trabalho com projetos aparecem num mesmo
contexto. Moura e Barbosa (2007) percebem que existe uma relação estreita entre o
trabalho com projetos e uma formação ampla de competências entre as quais se
destaca o estímulo ao empreendedorismo. E Filion (1999) diz que os
empreendedores podem ser considerados como pessoas que definem projetos e
que identificam o que precisam aprender para poder realizá-los.
Inéditas citações de autores referenciados neste trabalho ainda podem ser
acrescentadas com semelhante intento demonstrado no parágrafo anterior. Desta
vez, é proposto um exercício de simulação, cujo entendimento tem como pré-
requisito o conhecimento sobre o que foi explorado com relação aos dois
principais objetos de estudo desta pesquisa. Tomando como exemplo duas citações
de Leite e Santos, o que se propõe é que no primeiro exemplo se substitua a palavra
projectar por empreender e no segundo exemplo se faça o mesmo com a palavra
projecto por empreendedor.
exemplo: “Projectar é dar forma nova e mais ordenada as acções com
uma finalidade desejada e previsível. É ligar sonho e imaginação sem fronteiras aos
230
condicionamentos do real” (LEITE, SANTOS, 2004, p. 7). Tal sentença e seus
significados conferem com o que foi visto sobre projetos. O ponto interessante é
que, ao proceder de acordo com a simulação orientada, a mesma sentença também
pode ser válida para descrever a ação de empreender, pois os elementos presentes
na frase, assim como, a própria construção da mesma tem bastante afinidade
quando está se falando na ação de empreender.
exemplo: “Ao integrar o desejo e a utopia, o projecto estimula o sonho e o
empenhamento, a afirmação de expectativas, o ir além de si próprio” (LEITE,
SANTOS, 2004, p. 4). Vale aqui o mesmo raciocínio feito no primeiro exemplo, no
qual neste caso, ao trocar a palavra projecto por empreendedor, ainda que fuja da
mesma classe gramatical, se percebe que a palavra empreendedor se encaixa
perfeitamente na referida sentença, sem perder qualquer sentido do que se pode
atribuir à figura do empreendedor.
O quadro 23 que será apresentado a seguir é procedente de várias
características que apareceram citadas neste trabalho, sendo que todas elas foram
retiradas unicamente dos capítulos
128
que trataram da metodologia de projeto. Isto
quer dizer que o quadro 23 compilou as habilidades, competências,
comportamentos, atitudes, que foram citadas pelos autores estudiosos desta
metodologia, seja de forma pontual, ou no decorrer de um pensamento. Tomou-se o
cuidado para extrair as características ditas como favoráveis a serem desenvolvidas
pelos alunos que virão a ter uma experiência com a metodologia de projeto, assim
como, aquelas confirmadas por professores que verificaram em sua prática docente,
orientada pelo uso da respectiva metodologia, o desenvolvimento de certas
características pelos alunos. Neste mesmo quadro 23, ao lado das 27 características
identificadas, foram marcadas aquelas que também estiveram presentes em cada
um dos seis estudos apresentados no subcapítulo 5.6. O objetivo desta
demonstração é evidenciar que, mesmo não visando a uma formação
empreendedora dos alunos, o fato de estes participarem de uma experiência com a
metodologia de projeto, por si , proporciona o desenvolvimento de várias
características empreendedoras. As características foram listadas seguindo a maior
quantidade presente de cada uma delas em diferentes estudos, adotando assim
uma ordem decrescente.
128
Grande parte das características foram retiradas do capítulo 4.6.
231
CARACTERÍSTICAS
Quadro
10
Quadro
11
Quadro
12
Quadro
13
Quadro
14
Quadro
16
1 Aceitar desafios/correr riscos
X X X X X X
2 Independência/autonomia
X X X X X
3 Liderança
X X X X X
4 Iniciativa
X X X X
5 Otimismo
X X X X
6 Trabalho em equipe/cooperação/integração
X X X
7 Autoconfiança
X X X
8 Planejamento/elaboração de cronogramas
X X X
9 Criatividade
X X X
10
Inovação
X X X
11
Concretizar parcerias/rede de contato
X X X
12
Busca de informação/investigação/pesquisa
X X
13
Tomada de decisão
X X
14
Responsabilidade
X X
15
Comunicação
X X
16
Argumentação/persuasão
X X
17
Autodisciplina
X X
18
Capacidade de observação/percepção
X X
19
Solidário
X X
20
Organizado
X X
21
Pró-atividade
X
22
Aprende a definir as direções da sua vida
X
23
Senso crítico
X
24
Auto-avaliação
X
25
Capacidade de síntese e análise
X
26
Aprender a aprender
X
27
Ético
X
Quadro 23: Características desenvolvidas pelos alunos mediante a utilização da metodologia de
projeto
Fonte: elaborado pelo autor.
Ao apresentar estas 27 características, o significa que todas elas sejam
desenvolvidas pelos alunos durante a experiência que tiverem com a metodologia de
projeto. Mas o nível de desafio do problema a ser resolvido, a correta explicação da
metodologia, de seus objetivos, da orientação, do feedback, entre outras
responsabilidades do professor, juntamente com o tempo destinado para a
realização do projeto e o engajamento dos alunos, influenciarão significativamente
no número de características que os estudantes venham a desenvolver. Da mesma
forma que não se pode limitar a estas 27 características como sendo as únicas
passíveis de serem desenvolvidas.
232
que se dizer que três características, bastante enfatizadas pelos
estudiosos da metodologia de projeto, não foram colocadas no quadro 23, pois elas
não apareceram citadas diretamente em nenhum dos seis estudos
129
. Elas são:
capacidade de resolver problemas, de pesquisar e de fazer diagnóstico de
situações. Por outro lado, de alguma forma, todas dizem respeito às habilidades
desenvolvidas pelos empreendedores em sua jornada rumo à realização de seu
sonho, ou estão intrinsecamente ligadas a alguma outra característica
empreendedora. Lembrando também que as seis pesquisas não abrangem todas as
possíveis características de serem identificadas nos empreendedores, pois muitas
outras pesquisas também foram realizadas com esta finalidade. O professor Ray,
por exemplo, entre as seis habilidades que constatou nos empreendedores,
destacou a: resolução de problemas, a qual descreve que é
a habilidade de saber como utilizar sistematicamente operações mentais
para encontrar respostas, enfrentar os desafios e superar obstáculos. Cabe
ao empreendedor a tarefa de encontrar o melhor estilo que lhe proporcione
a forma ideal de revolucionar e gerar soluções inovadoras (apud, MACEDO,
2003, p. 17).
a habilidade de pesquisar se trata de uma condição sica para o empreendedor
elaborar o seu Plano de Negócio, e mesmo para aquele que o fizer uso desta
ferramenta de gestão, também precisará buscar informações, colher dados, seja
para identificar oportunidades, tomar decisões com segurança, para planejar com
embasamento, visando assim obter sucesso na realização do seu empreendimento.
E a habilidade de fazer diagnóstico está muito ligada à capacidade de percepção e
observação, de ter pensamento analítico, habilidades que estão presentes entre as
seis pesquisas que foram apresentadas no subcapítulo 5.6. Analisando essas três
características que ficaram de fora do quadro 23, dentro da perspectiva
empreendedora que foi destacada, torna-se plausível afirmar que todas aquelas que
estão presentes nos capítulos deste trabalho concernentes à metodologia de projeto,
fazem parte também do rol das habilidades e dos comportamentos empreendedores.
Isto evidencia, mais uma vez, a viabilidade da utilização da metodologia de projeto
para que os alunos desenvolvam habilidades e comportamentos empreendedores.
129
Quadros 10, 11, 12, 13, 14 e 16 apresentados no subcapítulo 5.6.
233
Das 27 características apresentadas no quadro 23, apenas as últimas 7,
correspondentes aos meros 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27, estiveram presentes em
apenas um dos estudos. O restante delas aparece em mais de uma pesquisa,
manifestando assim que a maior quantidade das características listadas (74%)
costuma estar presentes em diferentes pesquisas sobre os empreendedores, o que
por sua vez, confirma a adequação da utilização da metodologia de projeto para que
os alunos desenvolvam características empreendedoras. No entanto, entende-se
que a partir do momento que se faça uso intencionalmente desta metodologia para
que os alunos desenvolvam determinadas habilidades e comportamentos
empreendedores, outras características podem ser desenvolvidas além destas 27
apresentadas. A própria maneira como é feito o procedimento de avaliação, dentro
da metodologia de projeto, isto é, de forma contínua, gradual, qualitativa, apoiada ou
não pelo uso do portfólio, e oferecendo tempo para o aluno refletir sobre seus
passos, sobre os seus aprendizados, colabora bastante para que o educando
desperte e desenvolva conscientemente as habilidades e os comportamentos
empreendedores. Evidentemente que, para isso, o professor, responsável pela
disciplina de empreendedorismo, precisa apresentar as características
empreendedoras, de modo que os alunos tenham uma orientação sobre aquelas
que se sugere que eles desenvolvam durante a realização dos projetos.
Diferentemente do programa Empretec e de outros que se baseiam na
metodologia do CEFE
130
, que trabalham essencialmente com um número fixo de
comportamentos e habilidades a serem desenvolvidos pelos participantes, na
disciplina de empreendedorismo pode-se apresentar várias características aos
alunos e determinar um número mínimo a serem desenvolvidas, não havendo
necessidade de especificá-las, isto é, de definir aquelas que seriam obrigatórias para
a formação do aluno empreendedor.
O que será apresentado a seguir se trata de depoimentos de alunos e
professores, de diferentes escolas e níveis de ensino, que tiveram uma experiência
prática com a metodologia de projeto. Mais do que reforçar as habilidades e
competências desenvolvidas pelos alunos, através das narrações se oportuniza
130
As características empreendedoras trabalhadas pelo método CEFE, seguem basicamente os estudos de David
McClelland, e por sua vez, são muito semelhantes àquelas presentes no programa Empretec. A diferença
basicamente é que no Empretec são listadas 4 características a mais. Elas são: Iniciativa, Independência,
Persuasão e Correr Riscos Calculados. É muito provável que estas 4 características também sejam desenvolvidas
pelos indivíduos participantes de programas que fazem uso da metodologia do CEFE, no entanto, de acordo com
o livro de Pereyra et al.(2003), elas não aparecem mencionadas.
234
conhecer a “voz” dos protagonistas e não, unicamente, dos autores e pesquisadores
da metodologia de projeto como até então predominou neste trabalho. Além de ser
possível observar a citação do desenvolvimento de algumas características
empreendedoras, através dos relatos, percebe-se, principalmente, a presença dos
propósitos formativos das três abordagens (Sistêmica, Progressista e da Educação
pela Pesquisa) que servem de fundamento para a metodologia de projeto.
Projeto: Alternativas Sustentáveis – realizado em 2002
Escola: Colégio Engº Juarez Wanderley - São José dos Campos –SP
Série: alunos da 2ª e 3ª série do ensino médio
Fonte: ACÚRIO, Marina R.B. (coord.); ANDRADE, Rosamaria C. (org). 2005.
Depoimentos de alunos
“Somos constantemente estimulados a pensar de maneira sistêmica, isto é, a
ver que a realidade é construída por meio de diversas variáveis que se
combinam para tal construção. Essa visão faz com que aquilo que se iniciou
como um trabalho escolar se torne prática inerente ao nosso cotidiano, nós a
realizamos com prazer e acreditamos que, ao deixarmos o colégio, ela não
ficará perdida; ao contrário, estará eternamente presente em nossas vidas”
Fábio Luiz Alves de Andrade, 2ª série. (p. 98).
“Nosso ambiente escolar não é um espaço no qual cada um aprende e vive
solitariamente. Ao longo de nossos estudos, passamos a perceber que sempre
precisamos do outro e que este possui uma importância muito maior do que
aparenta. As disciplinas se relacionam para resolver um problema matemático,
necessito saber interpretar um enunciado; para entender as relações do
homem com o ambiente, preciso compreender quais são suas necessidades
e isso nos ajuda a analisar tudo como algo interligado, dependente, que
somado nos dará a verdadeira realidade. Além disso, aprendemos a utilizar
nossa criatividade para resolver problemas, sem medo de não ser capaz”
Paula Salles Gória, 2ª série (p. 99).
“É magnífico conviver com idéias muitas vezes simples, mas que transformam
sua realidade. Minha perspectiva de mundo enriqueceu-se demasiadamente
com o projeto e fez acender aquela chama de revolução, a qual cresce a cada
instante e não se pode conter. Luto para difundir e construir o que para mim
representa mais que um ideal; representa a solução de problemas
considerados crônicos” Jenifer Botossi, 2ª série. (p. 99).
“Nunca me preocupei muito com o meio ambiente, mas, a partir dos trabalhos
desenvolvidos na escola, minha percepção sistêmica do planeta foi aguçada.
Agora faço meus próprios projetos para minimizar os danos à natureza”
Bruna Gonçalves da Silva, 3ª série (p. 99).
235
“O Alternativas Sustentáveis, na procura de soluções para diminuir a
degradação ambiental na sociedade atual, forma em s, alunos envolvidos,
um profundo senso de responsabilidade e cidadania, o qual nos tornará
profissionais e pessoas mais críticas e preocupadas com o meio em que
vivemos. No projeto, desenvolvemos nossas habilidades e aprendemos a
concretizar idéias que reduzem os impactos do atual padrão de consumo sobre
os recursos naturais. Além disso, ficamos aptos a propor soluções viáveis aos
problemas socioambientais que permeiam nossa sociedade” Viviane Cristina
dos Santos, 2ª série (p. 100).
“Participar do projeto de recuperação do Ribeirão Vidoca é mais do que um
trabalho, é a realização de um sonho de mudar o pensamento da sociedade e
ajudar a natureza através das minhas atitudes. É uma atividade muito
gratificante e proporciona não o alcance de nossos objetivos, como também
o nosso crescimento, tanto em relação ao conhecimento acadêmico quanto ao
crescimento social, adquirindo sabedoria e experiência de vida” Lívia Regina
Brandeburski, 3ª série (p. 101).
“O que parecia ser mais um trabalho de escola apresentou-se aos meus olhos
como uma nova perspectiva de planejamento, realizações, metas, etc. Todos
os objetivos, embora parcialmente atingidos através do trabalho teórico
desenvolvido, realçam a dinamicidade que nas relações cotidianas e nas
ações de cunho sustentável. Crescem em meu espírito cidadão uma razão
consciente e uma emoção mobilizadora em que, no enlace desses elementos
paradoxos, cria-se uma nova concepção sistêmica diante de um mundo
mecanicista eficientemente influenciador” Ângela Tavares de Paiva, série (p.
101).
“Estar participando do reflorestamento do Ribeiro Vidoca é extremamente
gratificante, pois é um trabalho que está desenvolvendo-me e fazendo-me
descobrir minhas habilidades” Aline Bernardes Moreira, 3ª série (p. 102).
Depoimento de professor
“A participação como professor deste projeto é muito gratificante, pois a
dimensão ‘conteudista’ é extrapolada. O aluno se apropria do conhecimento
para cooperar com outras pessoas, criando possibilidades de melhoria de vida,
garantindo a sustentabilidade do planeta” Wellington Nunes Souza (p. 98).
Projeto: Parlamento de Jovens: Solidariedade e tolerância entre os jovens
Série: alunos dos últimos anos escolares com idades entre 15 e 18 anos
Fonte: CORTESÃO, L; LEITE, C; PACHECO, J. 2002.
Depoimento de alunos
“A maior parte das vezes ficamos quietos perante o que está mal, mas em
conjunto temos vontade de agir” (p. 73).
“Sentimos como está nas nossas mãos mudar tanta coisa” (p. 73).
236
“Descobrimos uma realidade que desconhecíamos e que nos chocou” (p. 73).
Depoimento de professor
“Interagiram os saberes adquiridos com as análises críticas realizadas, o que
os levou a questionarem as suas atitudes” (p. 73).
Projeto: Rio Tamanduateí – realizado de 1997 a 2000
Escola: Centro Paula de Souza - Instituição do governo do Estado de São Paulo
que administra escolas técnicas
Fonte: RISSO, Antônio Luís, 2005.
Depoimento da professora Doroti Q K Toyahara
“Pudemos verificar, nos resultados apresentados, o entrosamento do estudante
nas questões que envolviam o enfrentamento de situações-problema; a
vivência dos saber-fazer relacionados, tanto com o conhecimento como com a
tecnologia e com os problemas sociais; também uma reflexão sobre a
preservação do meio e valores como ser cidadão, ser responsável, ser
cooperativo e ser justo” (p. 79).
Depoimento da professora Julia Falivene Alves (coordenadora geral dos projetos no
Centro Paula de Souza)
“podemos dizer que esses professores e alunos, além de estarem criando
condições para a implementação da pesquisa, estão eles mesmos exercitando
suas competências como pesquisadores e também na área do planejamento,
da gestão, da comunicação, da articulação de grupos, das ações de
solidariedade etc., aprimorando-se como profissionais ou futuros profissionais e
cidadãos cooperativos, críticos, criativos e empreendedores....” Julia Falivene
Alves (p. 82). [grifo do autor]. - Professora responsável por disciplina e
coordenadora geral dos projetos no Centro Paula de Souza
Depoimentos de alunos da Escola Técnica Estadual Presidente Vargas - SP
“A minha visão de mundo foi, além de modificada, ampliada. Através das
oportunidades e conhecimentos adquiridos, pude aprender a mudar o ângulo
de que vejo o mundo, tanto para as coisas que devemos melhorar, como fome,
miséria etc. quanto para as coisas boas, como a ajuda a assistência ao
próximo e a união entre as pessoas. Assim, desse ângulo, o projeto acordou-
me para um mundo que sempre esteve aqui, mas que nunca parei para
pensar” V.S.T. (p. 83). - aluno da 1ª série
“A ai eu não tinha praticado essa metodologia, mas com o trabalho fui
obrigada a me lançar e correr atrás de tudo o que precisava, e não esperando
237
aquilo que invariavelmente seria ditado ou escrito em lousa pelo professor,
como acontece com a matéria normal” R.R.M.D (p. 83). – aluno da 2ª série
Depoimento do aluno Escola Técnica Estadual Dr. Adail Nunes da Silva - SP
“Trabalhar no projeto me mostrou o como é importante pararmos para
observar as coisas corriqueiras do nosso dia-a-dia que passam
desapercebidas, que as coisas não ocorrem em torno de uma só cidade, que
na elaboração de alguns produtos, muitas pessoas e lugares estão
envolvidos, e que certos hábitos e atitudes não são eternos, as pessoas
mudam e consequentemente seus pensamentos, ideologias e hábitos
também” A.R.F (p. 83). - aluno da 2ª série
Por fim, se apresentam indicações e exemplos reais de temas de projetos que
podem ser feitos e que foram desenvolvidos a partir da metodologia em questão. A
idéia com isso é demonstrar, o que provavelmente o leitor tenha percebido, as
diversas possibilidades de temas que podem ser trabalhados a partir da metodologia
de projeto. Lembrando sempre que os temas devem ser do interesse dos alunos e
que estes estejam vinculados à realidade da comunidade em que estudam, em que
moram, que por sinal, se diferencia bastante de lugar para lugar.
“O projeto pode priorizar, por exemplo, o reflorestamento de áreas públicas,
trabalhos de jardinagens, calçamento de ruas, formação de quintais (plantas
mais adequadas, planejamento do espaço), etc. A importância imediata de
tal projeto para a comunidade reside na elevação da qualidade de vida. O
paisagismo traz benefícios diretos no âmbito da saúde, sobretudo no
combate às doenças transmissíveis por mosquitos, torna mais agradável o
ambiente e menos desumana a cidade. Mesmo no contexto econômico
temos ganho, postos que cidades atrativas acabam atraindo não apenas
moradores, mas também investimentos. Do lado do aluno, o projeto, por dar
visibilidade à ação, torna-se uma realização concreta da capacidade de ação
do aluno, no exercício da cidadania, o que significa que o aluno passa a
aprender a ser cidadão na prática e não apenas na teoria” (MAGALHÃES,
2004, p. 128).
“Projetos sociais que diminuam a fome são prioridades nas cidades de
países de terceiro mundo e a universidade não deve manter-se alheia a
essas demandas. Do mesmo modo, projetos ligados à saúde pública, que
podem ser desenvolvidos com a participação dos mais diferentes cursos,
são de extrema importância para a economia do país. Alguns projetos
exigem evidentemente a parceria de gestores públicos, mas outros, como
por exemplo projetos que visem criar na comunidade hábitos de práticas de
esporte, que interessariam diretamente aos cursos de Educação Física, são
de execução relativamente simples e barata e podem contribuir efetivamente
238
para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos” (MAGALHÃES, 2004, p.
132).
“Projetos envolvendo frentes de produção em comunidades carentes têm
amplo alcance no combate à violência e na melhoria da qualidade de vida,
com a promoção de feiras, mercados, enfim, são uma atividade lucrativa (e,
mais do que uma atividade, uma esperança) para os excluídos pela
globalização. Propiciam, assim, uma sociedade menos tensa em suas
relações sociais e portanto mais próxima da igualdade” (MAGALHÃES,
2004, p. 132).
“Há também uma infinidade de projetos voltados para questões de interesse
social tais como: preservação do meio ambiente (educação ambiental),
conservação e uso de energia, formação do conceito de cidadania,
desenvolvimento sustentado etc.” (MOURA e BARBOSA, 2007, p. 23).
“Que problemas estariam afligindo a comunidade e para os quais
poderíamos encontrar soluções? Essas foram algumas perguntas que
nortearam a primeira discussão entre o grupo e, através das quais, depois
de inúmeras reflees e argumentações, os estudantes decidiram
consensualmente por despoluir o Ribeiro Vidoca (afluente do Rio Paraíba do
Sul que corta a cidade de São José dos Campos) [...] A proposta de
despoluir o Ribeiro Vidoca, aos nossos olhos, era extremamente ousada,
principalmente em se tratando de um projeto de adolescentes de 15 anos.
No entanto, por mais que nossa perspectiva de realidade nos tornasse
descrentes do alcance dos objetivos finais, incentivamos a meta dos alunos”
(ACÚRIO e ANDRADE, 2005, p. 63).
“Um dos projetos, iniciado no ano de 2004, foi idealizado por duas alunas
que apresentaram a proposta de ampliar a arborização urbana da cidade de
São José dos Campos. Mais uma proposta ousada que foi incentivada pela
escola. [...] Marcamos juntos uma visita à Secretaria de Meio Ambiente. [...]
Explicamos nossos objetivos e fomos agraciados com uma proposta muito
interessante: participar do projeto de arborização de um novo bairro – Jardim
São José II que estava sendo construído na cidade, criado em função em
função do deslocamento de moradores de três favelas desapropriadas”
(ACÚRIO e ANDRADE, 2005, p. 92).
“Projeto Rua de Lazer: expressão usada para referir-se a um conjunto de
atividades recreativas, artísticas e esportivas. A rua de lazer pode ser
realizada no espaço da instituição, em via pública, praça ou local aberto. É
um evento em que jovens, crianças, adultos e idosos participam das
atividades de forma espontânea e descontraída, buscando a educação pelo
e para o lazer. Visa despertar o interesse pelo lazer ativo e comunitário, criar
espaços de solidariedade e cidadania na comunidade, proporcionar
atividades esportivas, recreativas e artísticas à comunidade” (ACÚRIO e
ANDRADE, 2005, p. 223).
239
“Projeto: Os problemas relacionados ao lixo da comunidade. Tal problema
identificado, segundo os alunos, os professores e a direção da escola São
Jorge, dificultava até o bom funcionamento da escola que tinha o seu quintal
constantemente poluído pelo lixo local, não havia fossas nas casas e muito
menos coleta de lixo na comunidade. O desafio de trabalhar com o lixo na
comunidade inteira superou as nossas expectativas: o problema não era
apenas de ordem educacional, alcançava um grau de profundidade política e
sócio ambiental” (CAVALCANTE, 2004, p. 183).
“Projecto Fundação para o desenvolvimento da Zona Histórica do Porto:
uma experiência de desenvolvimento local e sustentável. A partir da análise
da problemática do desenvolvimento, na disciplina de IDES (Introdução ao
Desenvolvimento Econômico e Social) foi nascendo, entre alunos e
professora da disciplina, a idéia de fazer um estudo de caso, uma
investigação sobre uma experiência concreta de desenvolvimento de uma
zona degradada da cidade do Porto, que proporciona-se aos alunos um
contato directo com a realidade envolvente” (QUEIRÓS, IRENE in
CORTESÃO et al, 2002, p. 79).
Foram deixadas por último duas importantes considerações que atingem um dos
objetivos desta pesquisa e que, portanto, vem encerrar este capítulo, confirmando e
ratificando toda construção teórica desenvolvida até aqui. A primeira citação trata de
um relato que demonstra como, até um simples projeto executados pelos alunos é
capaz de favorecer o desenvolvimento de ações empreendedoras.
Os alunos de uma classe deviam escolher um projeto capaz de provocar um
impacto em seu meio. Os jovens decidiram plantar 100 árvores num parque
do seu município. Eles mesmos ficaram incumbidos de coordenar todas as
ações junto às autoridades municipais para a realização do projeto. Foi
possível constatar o impacto dessa experiência no desenvolvimento da
confiança em si, no desembaraço, na liderança e no knowhow quanto a
concepção e a implementação da gestão de um projeto. E, como se sabe,
aprendizagem da gestão de projetos requer, primordialmente, ações
empreendedoras (FILION, 2004, p. 10).
A segunda citação toca mais especificamente na questão do favorecimento ao
desenvolvimento de habilidades e de mudanças de comportamentos que a prática
da metodologia de projeto proporciona aos seus protagonistas. Segundo Martins,
240
a concepção de pedagogia investigativa que corresponde ao ensino por
projetos na escola tem sido destinada a levar os alunos não a buscar
informações, mas também a adquirir habilidades, mudar comportamentos, a
ver coisas de maneiras diferente, a construir seu conhecimento de forma
prazerosa e transformadora, pela constante integração, cooperação e
criatividade, tendo em vista a construção do cidadão competente e
produtivo (apud BEHRENS, 2006, p.47).
241
7 O PERFIL E AS COMPETÊNCIAS DO BACHAREL EM TURISMO
7.1 O surgimento e o constante desenvolvimento dos cursos Superiores de Turismo
no Brasil
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases - LBD, a educação superior é
ministrada nas Instituições de Ensino Superior IES, públicas ou privadas, e
abrange os cursos de graduação (formação de profissionais: bacharelado e
tecnólogo), s-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado), lato sensu
(especialização e aperfeiçoamento), extensão
131
e seqüenciais
132
.
Os cursos de graduação em Turismo podem conferir títulos de bacharel
133
ou tecnólogo
134
conforme o tempo de duração, de dois a cinco anos.
O curso de Bacharelado em Turismo será oferecido aos candidatos que
tenham concluído o ensino médio, permitindo-lhes a continuidade dos
estudos nos cursos de pós-graduação lato e stricto sensu. Terá como
finalidade o preparo das pessoas para atuarem no planejamento, gestão,
pesquisa e docência da área de turismo, tendo como foco o turismo como
fenômeno econômico e social.
O curso de Tecnologia em Turismo será oferecido aos candidatos que
tenham concluído o ensino médio e terá como finalidade o preparo de
pessoas para atuarem no mercado de turismo, tendo como foco principal a
prestação dos serviços de atendimento ao turista e a operacionalização de
equipamentos turísticos (ANSARAH, 2002, p. 52).
Estas referências, regulamentadas pelo MEC - Ministério da Educação e
Cultura -, foram postadas para que o leitor tenha uma percepção básica dos âmbitos
em que se encontra a educação superior em Turismo. Pode-se acrescentar ainda
que o MEC, ministério de onde partem as orientações formais sobre os cursos
131
Curso de extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos em cada caso pelas
instituições de ensino art. 44, IV, Lei nº 9.394/1996 (www. mec.gov.br/sesu).
132
Cursos seqüenciais por campo de saber, de diferentes níveis de abrangência, abertos a candidatos que
atendam aos requisitos estabelecidos pelas instituições de ensino, desde que tenham concluído o ensino médio ou
equivalente. Não são uma graduação, mas voltados para quem pretende obter qualificações profissionais
específicas em curto período de tempo art. 44, I, Lei nº 9.394/1996 (www. mec.gov.br/sesu).
133
Os cursos de bacharelado o cursos regulares e regulados pela Secretaria de Ensino Superior do Ministério
da Educação, visando a formar profissionais para o mercado e empreendedores em determinadas áreas, com
carga horária mínima de 2.400 horas. Esses cursos procuram equilibrar a teoria com a prática, com formação
humanística e desenvolvendo a iniciação científica em pesquisa (ANSARAH, 2002, p. 80).
134
Os tecnólogos são cursos de formação tecnológica que envolvem cursos superiores regulares inseridos no
ensino profissionalizante, necessitando de reconhecimento da Secretaria Estadual de Ensino Médio e
Tecnológico – Semtec, com carga horária mínima de 1.600 horas (ANSARAH, 2002, p. 80).
242
superiores no Brasil, reúne secretarias especiais, com destaque para a SESu
Secretaria de Ensino Superior - que é responsável por planejar, orientar, coordenar
e supervisionar o processo de formulação e implementação da política nacional de
educação superior.
O primeiro curso superior de turismo não é tão recente, pois surgiu há quase
quarenta anos, a partir do Parecer 35/71 do Ministério da Educação, feito pelo
relator Conselheiro Roberto Siqueira Santos e aprovado em 28 de janeiro de 1971.
Esse Parecer deu base à Resolução s/nº de 28/1/1971, do Conselho Federal de
Educação, que fixou o conteúdo mínimo e a duração do curso (ANSARAH, 2002).
O primeiro curso universitário de turismo no país, de acordo com Rejowski
(1996), não surgiu na forma de uma disciplina dentro de cursos preexistentes, tais
como economia, geografia ou administração, e tampouco como uma extensão de
outros cursos como, administração hoteleira, ocasiões estas em que surgiram os
cursos de Turismo na Europa ocidental e na América do Norte. Foi uma instituição
particular, a Faculdade de Turismo do Morumbi (atual Universidade Anhembi
Morumbi), localizada na cidade de São Paulo, que abriu, com autonomia própria e
por iniciativa isolada de seus fundadores, o primeiro curso no Brasil em 1971.
Conforme o depoimento colhido por Caturegli, a idéia do primeiro curso surgiu
assim:
[...] fizemos uma pesquisa para verificar o interesse que um curso técnico
de turismo despertaria. O resultado foi o de que havia um enorme
contingente de interessados, mas todos haviam terminado o curso
colegial. Havia, também, a explosão de cursos novos, as mulheres estavam
voltando aos bancos universitários, após terem criados os filhos etc. Foi
nesse momento que tivemos a idéia de um curso superior de turismo, após
perceber que o público tinha interesse nesse vel (apud Rejowski, 1996, p.
62).
Naquela época, em 1971, viva-se a ditadura militar. Sob o governo dos
militares, conforme Trigo (1998, p. 221), “esperava-se dos cursos superiores um
certo pragmatismo, o aumento do número de vagas e a formação sistemática de
profissionais de alto nível para o mercado de trabalho”. Pode-se complementar
dizendo que durante o regime militar eram “bem-vistos aqueles cursos que
promovam o avanço tecnológico, uma visão otimista do momento político, a
243
esperança no sucesso do modelo econômico e uma visão superficial do
funcionamento da sociedade” (BARRETTO, M. et al., 2004, p. 54). Esta era, portanto
a realidade política que influenciava os ditames para a criação do primeiro e dos
subseqüentes cursos de Turismos que surgiram na década de 1970.
Domingo Hernandez Peña foi quem elaborou o primeiro currículo do curso, o
qual tomou como base os currículos das escolas européias e os adaptou à realidade
brasileira (TRIGO, 1998).
Os curso desta área que apareceram na década de 1970 concentraram-se
nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Somados à faculdade de Hotelaria,
nessa década foram criados um total de dez cursos. A procura pelo curso nos cinco
primeiros anos foi muito grande, especialmente em São Paulo, fato que fez com que
fossem criados outros cursos nesta cidade pelos novos empresários da educação,
que começaram a ver a educação como um bom negócio (TRIGO, 1998).
Destaca-se que no ano de 1978, a Embratur, então Empresa Brasileira de
Turismo (hoje Instituto Brasileiro de Turismo) solicitou à Escola de Comunicação e
Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP) que discutisse a estrutura
curricular dos cursos de Turismo junto com os outros cursos da mesma área
existentes no país. A ECA organizou então um seminário sobre o tema que resultou
na geração de duas vertentes. A primeira defendia uma linha filosófica do turismo,
voltada à pesquisa e ao planejamento. A segunda, defendia um conjunto de
disciplinas voltadas para o mercado de trabalho. Destas vertentes surgiram as
demais estruturas curriculares dos diversos cursos no Brasil (ANSARAH, 2002).
Conseqüentemente, também foram diferentes as concepções de turismo que
influenciaram o estudo do turismo nas instituições de ensino. Falando a esse
respeito, Barretto et al. (2004, p. 79) diz que “é preciso estabelecer suas bases
conceituais, pois delas dependerá toda a organização da grade curricular e das
práticas de ensino que deverão ser implementadas no processo pedagógico do
curso”.
Muito embora o turismo disponha de várias concepções oriundas de autores
de distintas áreas do conhecimento, para acompanhar a bi-divisão estabelecida,
também estão sendo apresentadas duas concepções de turismo que orientaram as
propostas pedagógicas das instituições superior de ensino. Em realidade, o que se
fez foi pegar duas concepções que se aproximam, cada uma delas, das vertentes
244
citadas, não sendo propriamente as mesmas que nortearam as propostas
pedagógicas dos cursos.
Margarita Barretto (1995), (2004) entende que o turismo é um fenômeno
social complexo e diversificado, que consiste no deslocamento voluntário de
pessoas do seu local de residência para outro, que se realiza dentro do tempo livre
das pessoas e que não deve ter nenhuma finalidade lucrativa. A partir daí, deve-se
estudar o turismo como um fenômeno social complexo que tem múltiplos atores e
múltiplos olhares a pesquisá-lo. Trata-se, portanto, de uma concepção que se
aproxima da primeira vertente destacada. A segunda concepção escolhida vem do
órgão oficial do turismo mundial, a Organização Mundial do Turismo OMT, a qual
no ano de 1994 apontou que “O turismo compreende as atividades que realizam as
pessoas durante suas viagens e estadas em lugares diferentes ao seu entorno
habitual, por um período consecutivo inferior a um ano, com finalidade de lazer,
negócios ou outras” (OMT, 2001, p. 38). Esta é uma definição que privilegia as
atividades oriundas das viagens que, de certa forma, ênfase na relação cliente-
consumo que ocorre durante o processo da viagem. Desta forma, o turismo acaba
representando um conjunto de atividades produtivas que envolvem questões
econômicas, comerciais e de prestações de serviços e que, por sua vez, vão ao
encontro da segunda vertente, que é mais voltada ao mercado de trabalho.
A década de 1980 foi marcada pela estagnação de oferta dos cursos em
virtude dos problemas econômicos do país. na década de 1990, multiplicaram-se
no Brasil os cursos superiores em Turismo. Um estudo realizado por Teixeira (2001)
aponta que, em dez anos o número de cursos em nível superior de Turismo cresceu
900%, nos quais mais de 90% foram ofertados por instituições privadas. Entretanto,
como menciona Reis, “o aumento numérico nem sempre foi acompanhado por
aumento na qualidade dos cursos” (2003, p. 140). Este fato representa um dos
grandes e atuais desafios para as instituições de ensino superior, isto é, equilibrar a
questão da quantidade versus qualidade.
Como relata Fornari (2006, p. 40), “o ensino superior em turismo no Brasil
passou por várias e significativas modificações ao longo desses anos, não para
acompanhar o desenvolvimento da própria atividade turística, mas também para
atender às necessidades do mercado de trabalho”, que desde a década de 1970, até
os dias de hoje, manifesta estar carente de profissionais qualificados. que se
dizer também que apesar dos cursos superiores em turismo serem reconhecidos
245
oficialmente pelos órgãos oficiais de educação, a profissão de turismólogo não é
regulamentada. Alguns estudiosos da área como Trigo (2000), Ansarah (2002)
atribuem essa questão pela ampla e complexa área que abrange o fenômeno do
turismo, o que resulta na multiplicidade de possibilidades de atuação do turismólogo
dificultando assim em colocá-lo em parâmetros profissionais restritivos.
Apesar de quase quatro décadas de criação, o curso de Turismo ainda
encontra-se, conforme Ansarah (2002), em plena fase de desenvolvimento. E com
passar do tempo, os cursos superiores de Turismo vêm inserindo, timidamente,
novas propostas curriculares, utilizando diferentes métodos de ensino e
acrescentando, seja em forma de conteúdo a ser trabalhado numa disciplina, e
também como matéria espefica, o estudo sobre o empreendedorismo.
No decorrer deste sétimo capítulo, percebe-se que a partir da lei das
Diretrizes Curriculares Nacionais, abre-se caminho para inovações que facilitam as
práticas inovadoras dos educadores, como também, valorizam-se uma série de
habilidades e competências bastante idênticas às que foram identificadas nos
indivíduos empreendedores.
De uma forma geral, segundo Ansarah, “a educação superior em turismo
deve proporcionar um conjunto de ‘ferramentas’ para a interpretação e a evolução
de novos conhecimentos, possibilitando ao aluno desenvolver sua capacidade
evolutiva crítica” (2002, p. 19). Neste sentido, o desafio posto às instituições
educacionais é direcionar os estudos para (ANSARAH, 2002, p. 21):
a formação de recursos humanos para o mercado de trabalho;
estimular e despertar a preocupação com a pesquisa e a investigação;
fornecer maior embasamento cultural e humanístico;
preparar os profissionais para novas tecnologias e novos equipamentos.
Se- tratam de preocupações que procuram abranger os interesses do mercado de
trabalho, da academia
135
, da sociedade e do próprio educando, o que se entende
serem adequadas para se almejar no ensino superior. Esta é uma orientação que
deve ser vista de forma equilibrada, de modo que se procure contrabalançar a
trajetória de formação dos graduandos que, segundo vários autores como Ansarah
(2002), Shigunov Neto (2002), Trigo (1998), esteve focada quase que
135
Em realidade, não existe propriamente a academia do Turismo, mas, no geral, a palavra academia aparece em
muitas obras para manifestar um suposto local onde estariam concentrados os principais mestres e doutores
consagrados na área de Turismo sendo que, as idéias procedentes dos renomados especialistas são atribuídas à
academia.
246
exclusivamente na preparação de profissionais para abastecer o mercado de
trabalho. Apesar disso, conforme o trabalho de Caroline Gaio e Larissa Fernandes
(2006) pouca adequação entre o que é proposto nos cursos de Turismo e as
reais necessidades do mercado de trabalho. Segundo as autoras,
parte da dificuldade em adequar a formação do profissional ao mercado
reside no fato de que o turismo é caracterizado como uma atividade
multidisciplinar, ou seja, depende de uma série de disciplinas e
conhecimentos, que constituirão seu corpo teórico e sua prática, o que
levou a uma sobrecarga nas matrizes curriculares dos cursos da área (GAIO
C.; FERNANDES, L., 2006, p. 11).
Essa questão reflete o caráter interdisciplinar do turismo, cujos cursos apresentam
várias disciplinas que se complementam, pois o turismo não constitui um corpo de
conhecimento independente, mas por vezes, muitas grades curriculares deixam de
ter consistência, o que acaba ocasionando a formação de um profissional sem
profundidade em nenhuma das áreas do turismo, o que resulta em dificuldades na
inserção ao mercado de trabalho.
Em termos de conhecimentos sicos a serem trabalhados nos cursos de
Turismo, o professor Trigo, embora não tenha sido muito detalhista, veio ratificar,
através do seu pensamento, o dinamismo dos conteúdos pertinentes ao campo do
Turismo, ao escrever que “a educação para esses setores exige uma tríplice
vertente de conhecimentos: cultura geral, representada pela formação humanística,
habilidade de gestão e o conhecimento técnico específico” (2000, p. 248). E nesta
mesma obra, numa outra oportunidade, este autor também disse que o “Turismo se
aprende na escola e na prática, um campo não exclui o outro e ambos se
complementam” (2000, p. 249), pensamento este que manifesta a importância de
proporcionar uma educação teórica e prática, não dando assim, predominância de
uma em detrimento a outra.
E um outro fator preponderante na educação em turismo, como escreve
Ansarah, é o de “proporcionar a base para seus estudantes tornarem-se cidadãos
bem informados e motivados que procuram soluções para os problemas da
sociedade e aceitam suas responsabilidades sociais” (2002, p. 28). Neste sentido,
continua Ansarah, é muito importante que os projetos pedagógicos dos cursos
247
contemplem e preparem os alunos para compreenderem a sociedade fazendo-os
refletirem os fatos e dados, condicionando-os a julgarem e a intervirem quando
oportuno, de forma solidária, justa e democrática (2002).
7.2 As Diretrizes Curriculares Nacionais
Desde a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
4.024/61, incumbia ao Conselho Federal de Educação a fixação de currículos
mínimos dos cursos de graduação válidos para todo o país. Os objetivos da fixação
de um currículo mínimo implicavam na uniformização dos cursos em instituições
diferentes, fixando inclusive disciplinas e carga horária, restringindo as
possibilidades de inovação por parte da instituição.
Conforme visto anteriormente, foi a resolução s/de 28 de janeiro de 1971
que fixou o conteúdo e a duração do curso superior de turismo. O currículo
estabelecido naquela ocasião vigorou até 1978, quando houve o citado seminário
organizado pela ECA, que acabou alterando novamente o currículo e a carga horária
do curso e que ficou em vigor até 1997.
A lei 9.131, de 24/11/95, conferiu à Câmara de Educação Superior do
Conselho Nacional de Educação a atribuição da elaboração do projeto de Diretrizes
Curriculares Nacionais – DCN, que orienta os cursos de graduação para o envio das
propostas pela Secretaria de Educação Superior do Ministério ao CNE
136
, tal como
viria a estabelecer o inciso VII do art. da nova LDB sob a lei nº 9.394/96, que foi
promulgada em 20 de dezembro de 1996, sancionada pelo presidente Fernando
Henrique Cardoso e publicada no Diário Oficial da União em 23 de dezembro de
1996, estabeleceu a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
No exercício daquela competência, a CNE/CES, em 3/12/97, aprovou o
Parecer 776/97, objetivando servir de orientação para as Diretrizes Curriculares
dos Cursos de Graduação, no qual estabeleceu que as DCN devem se constituir em
orientações para a elaboração dos currículos; ser respeitadas por todas as IES; e
assegurar a flexibilidade e a qualidade da formação oferecida aos estudantes. Além
disso, essas Diretrizes devem observar os seguintes princípios:
136
Conselho Nacional de Educação.
248
1. Assegurar às instituições de ensino superior ampla liberdade na composição
da carga horária a ser cumprida para a integralização dos currículos, assim como
na especificação das unidades de estudo a serem ministradas;
2. Indicar os tópicos ou campos de estudos e demais experiências de ensino-
aprendizagem que comporão os currículos, evitando ao máximo a fixação de
conteúdos específicos com cargas horárias pré-determinadas, os quais não
poderão exceder 50% da carga horária total dos cursos;
3. Evitar o prolongamento desnecessário da duração dos cursos de graduação;
4. Incentivar uma sólida formação geral, necessária para que o futuro graduado
possa a vir a superar os desafios de renovadas condições de exercício
profissional e de produção do conhecimento, permitindo variados tipos de
formação e habilidades diferenciadas em um mesmo programa;
5. Estimular práticas de estudos independentes, visando uma progressiva
autonomia profissional e intelectual do aluno;
6. Encorajar o reconhecimento de conhecimentos, habilidades e competências
adquiridas fora do ambiente escolar, inclusive as que se refiram à experiência
profissional julgada relevante para a área de formação considerada;
7. Fortalecer a articulação da teoria com a prática, valorizando a pesquisa
individual e coletiva, assim como os estágios e a participação em atividades de
extensão, as quais poderão ser incluídas como parte da carga horária;
8. Incluir orientações para a condução de avaliações periódicas que utilizem
instrumentos variados e sirvam para informar a docentes e discentes a cerca do
desenvolvimento das atividades didáticas.
Percebe-se que houve significativas alterações na educação superior, que,
de Currículos Mínimos passou às Diretrizes Curriculares amplas, mais generalistas,
com uma diversificação de percursos, e não tão especializadas e de trajetórias
unificadas, como pretendiam os currículos mínimos, e que agora serão adequadas a
cada curso, segundo as peculiaridades locais da região e dos alunos.
Visando sistematizar a estrutura curricular para os cursos de graduação, a
SESu/MEC publicou o Edital nº 4/97, que convocou as Instituições de Ensino
Superior para que, realizassem ampla discussão com a sociedade científica, ordens
e associações profissionais, associações de classe, setor produtivo e outros setores
envolvidos, encaminhassem propostas para a elaboração das Diretrizes Curriculares
dos cursos de graduação, a serem sistematizadas pelas Comissões de Especialistas
249
de Ensino – CEE
137
, de cada área. Conforme consta no Parecer CES/CNE nº
146/2002, deste procedimento resultaram ricas e ponderáveis contribuições da
sociedade, das universidades, das faculdades, de organizações profissionais, de
organizações docentes e discentes, enfim, da comunidade acadêmica e científica e
da ampla participação dos setores públicos e privados. As sugestões apresentadas
que, através das CEEs, resultaram em propostas, foram encaminhadas para a
análise do Conselho Nacional de Educação. Tais propostas foram denominadas
‘Modelo de Enquadramento das Propostas de Diretrizes Curriculares’, e foram,
posteriormente, submetidas à apreciação de consultores ad hoc em cada área de
conhecimento. Neste modelo constam propostas para os cursos superiores de
Turismo e Hotelaria, além do perfil profissional, competências e habilidades, duração
do curso, estágios e conceituação de cursos de tecnologia e de bacharelado em
turismo e hotelaria (ANSARAH, 2002).
No que consta no Parecer CNE/CES 67/2003, a intenção com essas
mudanças era garantir a flexibilidade, a criatividade e a responsabilidade das
instituições de ensino superior ao elaborarem suas propostas curriculares, por curso,
de forma a melhor atender às necessidades diferenciais de suas clientelas e às
peculiaridades das regiões nas quais se inserem.
Em 1998 foi elaborado por Ansarah o Manual de Orientação para Avaliação
in locodas Condições de Autorização dos Cursos de Turismo e Hotelaria porque,
até aquele momento, era o ‘Manual de Administração’ que era utilizado pelos
consultores ad hoc, sendo que a área de Turismo e Hotelaria apresenta
particularidades diferentes e tem corpo próprio em relação à área de Administração.
A comissão de especialistas em Turismo foi criada pelo CEE-
Tur
138
/SESu/MEC, Diário Oficial 1518, de 14/06/2000, tendo como primeiros
membros os bacharéis doutores Luiz Gonzaga Godoi Trigo, Miguel Bahl e Mirian
Rejowski. Em 2000, a Comissão de Especialistas em turismo revisou o Manual de
Orientação para Avaliação in locodas Condições de Autorização dos Cursos de
Turismo e Hotelaria. No ano seguinte, também foi feita uma revisão deste
(ANSARAH, 2002).
137
As Comissões de Especialistas de Ensino (CEEs) são constituídas por docentes de alto nível de formação
acadêmica, com experiência profissional e reconhecida atuação no ensino de graduação, que assessoram a SESu
na análise dos processos de autorização e reconhecimento de cursos e credenciamento de instituições
(SHIGUNOV NETO, A.; MACIEL, L. S. B., 2002, p.36).
138
CEETur: Comissão de Especialistas de Ensino de Turismo.
250
De acordo com o Manual de Orientação para Verificação IN LOCO das
condições de reconhecimento dos cursos de Turismo e Hotelaria, no relatório
fornecido pela IES/curso deve-se observar as justificativas que substanciam as
habilitações dentre as habilidades a seguir (MEC - CEETur/SESu/MEC, 2001, p. 6):
Comunicação e expressão: deverá ser capaz de estabelecer comunicação
interpessoal, de se expressar corretamente nos documentos técnicos específicos
e de interpretar a realidade;
Raciocínio lógico, crítico e analítico: deverá ser capaz de operar com valores,
formulações matemáticas, alem de estabelecer relações formais causais entre
fenômenos. O graduando deverá também ser capaz de expressar-se de modo
crítico e criativo frente aos diferentes contextos organizacionais e sociais;
Visão sistêmica e estratégica: deverá demonstrar a compreensão do todo, de
modo integrado e sistêmico, bem como suas relações com o ambiente externo;
Criatividade e iniciativa: deverá ser capaz de propor e implementar modelos
de gestão, inovar e demonstrar um espírito empreendedor;
Negociação: deverá ser capaz de demonstrar atitudes flexíveis e de
adaptação à terceiros e as situações diversas;
Tomada de decisão: deverá ser capaz de influenciar o comportamento do
grupo com empatia e equidade visando interesses interpessoais e institucionais;
Trabalho em equipe: deverá ser capaz de atuar de forma interativa em prol de
objetivos comuns e compreender a importância da complementaridade das ações
coletivas.
De acordo com o que foi explicitado no subcapítulo 5.6, se reconhece facilmente que
todas as habilidades listadas acima se evidenciaram nas pesquisas sobre as
principais características identificadas nos empreendedores. Agora elas estão
presentes também no documento anteriormente referenciado, que é de fundamental
importância para o reconhecimento dos cursos de Turismo, enfatizando que se trata
de um documento que contou com a participação de especialistas conceituados na
área. Em decorrência disto, pode se presumir que haverá incentivo e aprovação de
cursos que se proponham fazer com que seus alunos desenvolvam essas
habilidades, justamente como é a proposta de uma formação empreendedora, que
procura possibilitar aos educandos desenvolver certas habilidades e
comportamentos empreendedores.
251
Outro detalhe é que as habilidades presentes no documento citado também
podem servir de referência para os professores da disciplina de empreendedorismo
verificarem aquelas que são comuns, em relação aos referenciais sugeridos
139
. Tem-
se, portanto, mais uma fonte que pode ser usada como parâmetro de seleção das
habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos. Ressaltando que, na disciplina de
empreendedorismo, não se pretende trabalhar com uma ambiciosa e extensa lista
de habilidades, devendo ser observado também a realidade contextual onde estão
localizados os cursos e seus estudantes, verificando e respeitando assim, as reais
possibilidades de formação.
7.3 As Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Turismo
Nos termos do art. da Lei nº 9.131, de 24 de novembro de 1995, a
Ministra de Estado da Educação Interina, homologou o Parecer nº 146/2002, da
Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, que aprovou os
Projetos de Resoluções que instituem as Diretrizes Curriculares Nacionais para os
cursos de graduação em Direito, Ciências Econômicas, Administração, Ciências
Contábeis, Turismo, Hotelaria, Secretariado Executivo, Música e Dança, Teatro e
Design
140
. Mais objetivamente se pode dizer que a Diretriz Curricular Nacional do
curso de Turismo foi aprovada em 3 de abril de 2002, sob o Parecer CNE/CES
146, publicado no Diário Oficial da União em 13 de maio de 2002, no qual o referido
curso foi enquadrado dentro das diretrizes que contemplam as Ciências Sociais
aplicadas que consideram os cursos anteriormente citados.
Ressalta-se que as Diretrizes Curriculares para os cursos de graduação
possuem duas partes, a primeira deverá ser seguida por todas as áreas e a segunda
é composta por orientações específicas para cada área compreendida no
documento, considerando as particularidades de cada curso. Portanto, para todo e
qualquer curso de graduação, as Diretrizes Curriculares Nacionais recomendam:
conferir maior autonomia às instituições de ensino superior na definição dos
currículos de seus cursos, a partir da explicitação das competências e das
habilidades que se deseja desenvolver, através da organização de um modelo
139
Os referenciais sugeridos são: a disciplina de Empreendedorismo, as Diretrizes Curriculares do cursos de
Turismo, o perfil exigido pelo mercado de trabalho turístico e o perfil encontrado no Projeto Político Pedagógico
do curso.
140
Conforme consta dos Processos nºs 23001.000074/2002-10 e 23001. 000303/2001-15 (DOU, seção 1, 90
de 13/05/2002, p. 21).
252
pedagógico capaz de adaptar-se à dinâmica das demandas da sociedade, em
que a graduação passa a constituir-se numa etapa de formação inicial no
processo contínuo da educação permanente;
propor uma carga horária mínima em horas que permita a flexibilização do
tempo de duração do curso de acordo com a disponibilidade e esforço do aluno;
otimizar a estruturação modular dos cursos, com vistas a permitir um melhor
aproveitamento dos conteúdos ministrados, bem como a ampliação da
diversidade da organização dos cursos, integrando a oferta de cursos
seqüenciais, previstos no inciso I do art. 44 da LDB;
contemplar orientações para as atividades de estágio e demais atividades que
integrem o saber acadêmico à prática profissional, incentivando o
reconhecimento de habilidades e competências adquiridas fora do âmbito
escolar; e
contribuir para a inovação e a qualidade do projeto pedagógico do ensino de
graduação, norteando os instrumentos de avaliação.
Em relação aos dois principais objetos de estudo desta pesquisa que trata
de uma metodologia ainda incipiente na maioria dos cursos superiores, e neste
caso, por que não dizer inovadora, como é a metodologia de projeto, e da incitação
dada ao desenvolvimento de habilidades e comportamentos empreendedores,
chamam atenção certas recomendações que colaboram com a inserção dos
referidos objetos de estudos nas IES. Neste sentido o que se destaca é a autonomia
e também o incentivo dado as IES na definição dos currículos e na inovação dos
projetos pedagógicos, juntamente com o estímulo ao desenvolvimento de
competências e habilidades e que também podem ser desenvolvidos fora do
ambiente escolar.
Constam nas Diretrizes Curriculares do curso de Turismo como tópicos
específicos e devidamente ilustrados os seguintes itens: o projeto pedagógico, o
perfil desejado do formando, as competências e habilidades, os conteúdos
curriculares, a organização curricular, o estágio curricular supervisionado, as
atividades complementares, o sistema de avaliação e o trabalho de conclusão de
curso. Dentre os itens citados; O perfil desejado do formando e Competências e
Habilidades são os que atendem diretamente ao exercício de verificação de
compatibilidade entre a formação empreendedora e a formação do turismólogo.
253
Justamente por isso, é que somente, os mencionados itens é que serão analisados
a seguir.
Com relação ao perfil desejado, de acordo com o Parecer CNE/CES
146/2002, p. 17,
o curso de graduação em turismo deverá oportunizar a formação de um
profissional apto a atuar em um mercado altamente competitivo e em
constante transformação, cujas opções possuem um impacto profundo na
vida social, econômica e no meio ambiente, exigindo uma formação ao
mesmo tempo generalista, no sentido tanto do conhecimento geral, das
ciências humanas, sociais, políticas e econômicas, como também de uma
formação especializada, constituída de conhecimentos específicos,
sobretudo nas áreas culturais, históricas, ambientais, antropológicas, de
Inventário do Patrimônio Histórico e Cultural, bem como o agenciamento,
organização e gerenciamento de eventos e a administração do fluxo
turístico.
Evidencia-se deste Parecer um profissional que tenha uma formação generalista e
particularizada, com conhecimentos necessários ao exercício de suas funções, que
tenha capacidade de planejamento e de gestão, e que acima de tudo estejam aptos
a enfrentar o competitivo, exigente e diversificado mercado de trabalho turístico.
Referindo-se às Diretrizes Curriculares do curso de Turismo, Shigunov Neto
et al. (2002, p. 45) diz que as mesmas apresentam “ainda que de forma resumida, o
perfil desejado dos bacharéis em turismo, levando em consideração o projeto
pedagógico e a proposta curricular dos cursos”. Após essa consideração os autores
relatam o seguinte trecho da Diretriz mencionada que toca na questão do perfil.
(...) internalização de valores de responsabilidade social, justiça e ética
profissional; formação humanística e visão global que o habilitem a
compreender o meio social, em seus aspectos políticos, econômico e
cultural, onde está inserido e a tomar decisões em um mundo diversificado
e interdependente; formação técnica e científica para atuar no planejamento
e na gestão de empresas turísticas; competência para empreender,
capacidade de compreensão da necessidade do continuo aperfeiçoamento
profissional e do desenvolvimento da autoconfiança; capacidade para a
resolução de problemas macro e micropertinentes à prestação de serviços
turísticos; capacidade para planejar, organizar, implantar e gerir programas
de desenvolvimento turístico de destinações e empreendimentos turísticos;
capacidade de atuação nos diversos setores do mercado turístico;
competência para implantar resoluções alternativas e inovadoras, bem
254
como a capacidade crítica, reflexiva e criativa; interesse e estímulo para o
desenvolvimento na área da docência e pesquisa (SHIGUNOV NETO et al.
2002, p. 45).
Novamente aqui se observa a aspiração pela formação de alunos com um perfil
abrangente, generalista e ambicioso. Deixando um pouco de lado a crítica que pode
ser feita sobre esse amplo perfil, o que chama atenção é a menção de várias
habilidades que foram identificadas
141
nos indivíduos empreendedores como:
competência para empreender, desenvolvimento da autoconfiança, capacidade para
a resolução de problemas, capacidade para planejar, organizar, implantar e gerir,
competência para implantar resoluções alternativas e inovadoras, capacidade crítica
e criativa.
Ao estudar o perfil pretendido ao bacharel em turismo, Da Re (2003, p. 39)
chega à seguinte conclusão: “Para que o egresso dos cursos superiores em turismo
tenha esse perfil desejado é necessário que sua formação seja empreendedora”. E
num outro trabalho esta mesma autora, ainda refletindo sobre o perfil em questão,
comentou que
para que haja a construção desse novo perfil, caberá aos cursos de turismo
construir um projeto pedagógico flexível e inovador, que enseje espaços
para que o aluno desenvolva essa visão empreendedora da atividade. Onde
haja estímulo à construção de competências, coerentes com a realidade do
desenvolvimento turístico no Brasil, respeitando as características regionais
e consoantes às tendências globais, ou seja, o pensar globalmente e agir no
âmbito local (DA RE, 2002, p. 13).
Estas considerações além de confirmar a adequação da formação empreendedora
em relação ao perfil proposto nas Diretrizes Curriculares do Curso de Turismo, ainda
apresentam evidências das quais se pode presumir que uma metodologia, como a
dos projetos que, se caracteriza por ser flexível, inovadora, que estimula o
desenvolvimento de competências e ocorre a partir de ações dos alunos no âmbito
local onde moram, venha a colaborar diretamente na formação do perfil indicado na
Diretriz Curricular referida. Além do mais, diz respeito às preocupações da
metodologia de projeto, cuidados similares que foram indicados no perfil
141
Ver subcapítulo 5.6.
255
apresentado nas Diretrizes Curriculares do curso de Turismo como: uma
preocupação com a responsabilidade social, com a formação humanística, com a
visão global que habilite os alunos a compreenderem o meio social, com o
desenvolvimento da capacidade crítica, reflexiva e criativa.
Goulart, Balderramas, Heubel e Xavier foram outros autores que também
falaram a respeito do perfil do egresso do curso de Turismo e, assim como Shigunov
neto et al. (2002), listaram algumas características apontadas nas Diretrizes
Curriculares. Os professores citados, em artigo publicado em conjunto, escreveram
que “a educação em Turismo deve se pautar em atitudes e procedimentos,
apontados pelo MEC, que caracterizam o perfil do profissional. São eles (GOULART,
et al., 2003, p. 278):
aprender a aprender
ampla formação cultural – conhecer/saber
ser criativo e inovador
entender todas as funções – conhecimento teórico e prático
ser líder e capaz de tomar decisões
espírito de participação – parceria/compartilhar
conhecimentos tecnológicos atualizados
profundo conhecimento de Relações Públicas
conhecimento de vários idiomas
busca permanente de produtividade e da competitividade
ter visão estratégica
ter comprometimento com o negócio
Desta vez aparecem outras habilidades presentes nos empreendedores que ainda
não haviam sido citadas como: aprender a aprender, a liderança, a capacidade de
tomar decisões, o espírito de participação, o desejo de produtividade, a
competitividade, a visão estratégica e o comprometimento com o negócio. Reforça-
se com isso a pertinência do estímulo à formação empreendedora nos cursos de
Turismo, tendo em vista a paridade desta formação com o perfil estabelecido nas
Diretrizes Curriculares do curso de Turismo.
Uma das questões mais polêmicas presente nas Diretrizes Curriculares diz
respeito ao item intitulado; Competências e Habilidades. Tal contestação ocorre
basicamente pelo fato de o documento mencionado não distinguir o que se refere à
256
competência e a habilidade, e também porque existe uma divisão entre alguns
estudiosos do turismo sobre a relevância do desenvolvimento de competências na
formação do bacharel em turismo. Mas antes de tratar destes assuntos polêmicos,
que serão temas do próximo subcapítulo, serão apresentadas as competências e
habilidades listadas nas Diretrizes Curriculares do curso de Turismo.
Conforme o Parecer do MEC, (CES/CNE 146/2002, p. 18) o curso de
graduação em Turismo deve possibilitar formação profissional que revele, pelo
menos, as seguintes competências e habilidades”: [grifo do autor].
I. compreensão das políticas nacionais e regionais sobre turismo;
II. utilização de metodologia adequada para planejamento das ações turísticas,
abrangendo projetos, planos e programas, com os eventos locais, regionais e
internacionais;
III. positiva contribuição na elaboração dos planos municipais e estaduais do
turismo;
IV. domínio das cnicas indispensáveis ao planejamento e à operacionalização do
Inventário Turístico, detectando áreas de novos negócios e de novos campos
turísticos e de permutas culturais;
V. domínio e técnicas de planejamento e operacionalização de estudos de
viabilidade econômico-financeira para os empreendimentos e projetos turísticos;
VI. adequada aplicação da legislação pertinente;
VII. planejamento e execução de projetos e programas estratégicos relacionados
com empreendimentos turísticos e seu gerenciamento;
VIII. intervenção positiva no mercado turístico com sua inserção em espaços novos,
emergentes ou inventariados;
IX. classificação, sobre critérios prévios e adequados, de estabelecimentos
prestadores de serviços turísticos, incluindo meios de hospedagens,
transportadoras, agencias de turismo, empresas promotoras de eventos e outras
áreas, postas com segurança à disposição do mercado turístico e de sua
expansão;
X. domínio de técnicas relacionadas com a seleção e avaliação de informações
geográficas, históricas, artísticas, esportivas, recreativas e de entretenimento,
folclóricas, artesanais, gastronômicas, religiosas, políticas e outros traços
culturais, como diversas formas de manifestação da comunidade humana;
257
XI. domínio de métodos e técnicas indispensáveis ao estudo dos diferentes
mercados turísticos, identificando os prioritários, inclusive para efeito de oferta
adequada a cada perfil do turista;
XII. comunicação interpessoal, intercultural e expressão correta e precisa sobre
aspectos técnicos específicos e da interpretação da realidade das organizações
e dos traços culturais de cada comunidade ou segmento social;
XIII. utilização de recursos turísticos como forma de educar, orientar, assessorar,
planejar e administrar a satisfação das necessidades dos turistas e das
empresas, instituições publicas ou privadas, e dos demais segmentos
populacionais;
XIV. domínio de diferentes idiomas que ensejam a satisfação do turista em sua
intervenção nos traços culturais de uma comunidade ainda não conhecida;
XV. habilidade no manejo com a informática e com outros recursos tecnológicos;
XVI. integração nas ações de equipes interdisciplinares e multidisciplinares,
interagindo criativamente face aos diferentes contextos organizacionais e sociais;
XVII. compreensão da complexidade do mundo globalizado e das sociedades pós-
industriais, onde os setores de turismo e entretenimento encontram ambientes
propícios para se desenvolverem;
XVIII. profunda vivencia e conhecimento das relações humanas, de relações públicas,
das articulações interpessoais, com posturas estratégicas do êxito de qualquer
evento turístico;
XIX. conhecimentos específicos e adequado desempenho técnico-profissional, com
humanismo, simplicidade, segurança, empatia e ética.
Com relação a essa lista apresentada, existe uma concordância entre muitos
estudiosos do turismo. A observação quase consensual é que tal lista de
competências e habilidades é bastante ampla e ambiciosa e este extenso leque de
habilidades esperadas do bacharel em Turismo faz parecer que a intenção é a de
formar um super profissional, do qual se duvida que possa haver reais possibilidades
de formação. Mas independente desta ousada proposta de formação, que será
discutida no subcapítulo seguinte, o que se verifica na lista apresentada é,
novamente, a presença de várias habilidades identificadas nos indivíduos
empreendedores das quais se podem destacar; a capacidade de planejamento, de
elaborar e executar projetos, a identificação de novos negócios, a busca de
informações, a gestão de empreendimentos turísticos, a visão estratégica e as
258
interações criativas. Em geral estas habilidades e competências selecionadas se
fazem bastantes relevantes na gestão de empreendimentos e projetos, realçando
que a habilidade de gestão, segundo Trigo (2000), deve ser valorizada como um dos
três pilares de conhecimento necessário ao bacharel em turismo, que por sinal, são
conhecimentos que estão sempre presentes quando se trata de uma formação
empreendedora.
Portanto, ao se verificar nas Diretrizes Curriculares do curso de Turismo o
perfil do bacharel em turismo, como também as competências e habilidades
exigidas, pode-se dizer que tanto o desenvolvimento do espírito empreendedor dos
alunos, quanto a utilização da metodologia de projeto, atendem em muitos aspectos,
conforme mostrado anteriormente, às recomendações e às exigências que constam
no documento mencionado.
7.4 Refletindo sobre as competências
De acordo com os estudos de Degrazia (2005) e da professora Da Re
(2002), a noção de competências não é nova, contudo seu uso no contexto
universitário tem se tornado cada vez mais freqüente desde a cada de 1990,
quando as Diretrizes Curriculares Nacionais elaboradas pelo MEC, elencou uma
série de competências e habilidades a serem desenvolvidas pelos estudantes
universitários, de acordo com cada curso. Mas essa valorização pelo
desenvolvimento das competências também é decorrente da vontade, de parte de
alguns pensadores, de mudar o paradigma predominante no ensino de transmissão
de conhecimentos, propondo uma nova forma de ensinar apoiada no saber-fazer do
aluno e no desenvolvimento pessoal do educando. De igual maneira, se pode dizer
que as razões para esta mudança de enfoque estão na consolidação da sociedade
do conhecimento, que vem alterando a forma e a quantidade de como se dissemina
e acessa o conhecimento, que é produzido ininterruptamente. Em função disso,
como comenta Silva, Z. (2002), as instituições de ensino não podem mais ser
consideradas como únicos bancos de conhecimentos e precisam ajudar os alunos a
criarem estratégias para conviver com a quantidade e velocidade das informações.
Portanto, sua função não deveria se pautar pela quantidade de ensino, mas pela
qualidade da aprendizagem que, por sua vez, implica na utilização de novos
modelos educacionais que valorizem o aprendizado contínuo, como é o caso da
educação por competências. Neste momento, vale ressaltar alguns aspectos,
259
apontados por Da Re (2002), que são comuns nas discussões que ocorrem sobre a
questão da competência. De acordo com esta autora,
o conceito de competência é indissociável do conceito de desenvolvimento
e está intrinsecamente relacionado ao de formação contínua. [...] As
competências são aprendidas ao longo da vida, assim as experiências
vividas podem constituir-se em ocasiões de aprendizagem. O papel da
experiência no desenvolvimento é algo indiscutível;
O conceito de competência está relacionado ao indivíduo e não à empresa.
O referencial de competências é o indivíduo e não as tarefas. Contudo,
algumas empresas e instituições de ensino usam o conceito visando às
práticas do posto e não ao desenvolvimento do trabalhador (DA RE, 2002,
p. 9).
Desta citação, primeiramente se confirmou que a exigência deste mundo globalizado
de aprender continuamente ao longo da vida, está de fato relacionada e pode ser
atendida através da aprendizagem por competência. E posteriormente se identificou
no indivíduo e em seu benefício o foco do desenvolvimento das competências.
Em termos de conceito, o mais utilizado pelos educadores é o definido pelo
educador Phillipe Perrenoud. Este disse que “competência em educação é a
faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos como saberes,
habilidades e informações para solucionar com pertinência e eficácia uma série de
situações” (2000, p. 13). Nesse sentido, educar para competências é ajudar o aluno
a adquirir e desenvolver as condições, os recursos que deverão ser mobilizados
para resolver situações e problemas complexos. E de modo geral, de acordo com
Silva, Z. (2002) a noção de competências além de mobilizar saberes adquiridos pela
educação formal, também mobiliza os saberes de senso comum e os saberes de
experiência. Em outras palavras, exige o domínio de conhecimentos, cuja
mobilização, permitirá que os alunos desenvolvam respostas criativas, inéditas e
eficazes para a resolução dos problemas. A questão da mobilização de
conhecimentos é muito importante de ser enfatizada, pois de acordo com Perrenoud
(1999) existe um mal-entendido em acreditar que, ao desenvolver competências,
desiste-se de trabalhar com conteúdos, conhecimentos e disciplinas. Para
Perrenoud, “a abordagem por competências não rejeita nem os conteúdos, nem as
disciplinas” (1999, p. 15). E como o próprio autor comenta,
260
quase que a totalidade das ações humanas exige algum tipo de
conhecimento, às vezes superficial, outras vezes aprofundado, oriundo da
experiência pessoal, do senso comum, da cultura partilhada em um círculo
de especialistas ou da pesquisa tecnológica ou científica (PERRENOUD,
1999, p. 7).
Levando em conta o que já foi analisado, somado a esta citação anterior, entende-se
que uma competência permite a mobilização de conhecimentos para que se possa
enfrentar uma determinada situação, cujo grau de desafio ou dificuldade do
problema, mobilizará conhecimentos superficiais ou mais elaborados e profundos,
que podem vir a exigir a aquisição ou não de mais conhecimento. Acrescenta-se,
segundo Silva, Z. (2002), que habilidades, valores e atitudes também se articulam
com os conhecimentos na busca de soluções para a resolução de uma situação.
Como era de se esperar, de acordo com Perrenoud (1999) constroem-se
as competências exercitando-se em situações complexas, portanto,
para desenvolver competências é preciso, antes de tudo, trabalhar por
resolução de problemas e por projetos, propor tarefas complexas e desafios
que incitem os alunos a mobilizar seus conhecimentos e, em certa medida,
contemplá-los. Isso pressupõe uma pedagogia ativa, cooperativa, aberta
para a cidade ou para o bairro, seja na zona urbana ou rural (2000, p. 20).
Desta forma, ao se propor desenvolver competências, seja em que curso for, além
de se propor metodologias ativas, voltada à ação dos educandos, no aprender
fazendo, o desafio também passa, necessariamente, por redefinir a postura do
professor dentro e fora de sala de aula, exigindo dele um papel de orientador e
mediador da aprendizagem, da construção e da descoberta do conhecimento pelos
alunos. Acrescentando outros elementos a esta importante questão levantada,
Degrazia comenta que
o processo de ensino e aprendizagem por competências pressupõe um
sujeito-professor com uma nova postura: um profissional reflexivo que
analise suas próprias práticas de ensino constantemente. Este professor
deve embasar sua didática na prática-teoria-prática, para estimular ao
estudante-pesquisador para visualizar a prática e compreender a
importância das teorias na consolidação destas práticas ou na reconstrução
de uma nova prática (2005, p. 5).
261
No entanto, de nada adianta exigir mudanças do professor se não ocorrer,
como fala Degrazia, “importantes transformações nas estruturas institucionais, nos
programas, nas didáticas, na forma de avaliação, no funcionamento das classes e
nos estabelecimentos, no ofício de professor e no ofício de aluno” (2002, p. 5).
Trata-se de semelhantes preocupações que se fazem presentes quando se pretende
fazer uso da metodologia de projeto, cujas sugestões para enfrentar as dificuldades
foram levantadas no subcapítulo 4.7.
Com relação à crítica que se faz ao amplo perfil que se espera do bacharel
em turismo e às numerosas competências estabelecidas nas Diretrizes Curriculares
do curso de Turismo, concorda-se com os especialistas da área que elas são
pertinentes. Por outro lado, não se pode ignorar de vez o desenvolvimento de
competências, pois como foi mencionado, o trabalho com competências visa o
desenvolvimento do indivíduo, exige o domínio de conhecimentos, pressupõe
operações mentais, capacidades de usar as habilidades, emprego de atitudes
adequadas à realização de tarefas, a aquisição de conhecimentos, proporciona
também a capacidade de resolver problemas e de aprender a aprender. E como foi
visto no subcapítulo 7.1, desde o surgimento do primeiro curso de Turismo, até os
dias de hoje, sempre houve uma preocupação da formação do bacharel em turismo
para inserí-los no mercado de trabalho, que por sua vez, manifesta exigir certas
competências
142
. Portanto, paralelamente ao desenvolvimento do indivíduo,
juntamente com todos aqueles benefícios educacionais proporcionado ao educando,
também se estará formando para o mercado de trabalho, caso o curso esteja, de
fato, atento às exigências deste, procurando assim, criar condições para que os
alunos desenvolvam as competências requeridas pelo mercado.
De certa forma as Diretrizes Curriculares do curso de Turismo procuraram
atender as exigências do mercado e também propor uma educação voltada ao
desenvolvimento de conhecimentos, capacidades e habilidades que possibilitasse a
formação de cidadãos mais participativos na sociedade, mas o resultado foi um perfil
polivalente, repleto de competências e de audaciosa capacidade de formação.
Sugere-se que o mais adequado, ao invés de elencar várias competências,
seria que os responsáveis pelos cursos pudessem analisá-las, ou melhor, identificar
dentro do contexto local, no âmbito social, cultural, político e econômico, aquelas
142
O subcapítulo 7.5 apresenta algumas competências exigidas pelo mercado ao egresso do curso superior de
Turismo.
262
que mais se adequariam à realidade do estudante, para assim, mediante uma
compatibilidade contextual, serem selecionadas, cuidando para que não haja abusos
em termos de pretensões formativas. Em relação às competências exemplificadas
nas Diretrizes Curriculares, a idéia é tomá-las como orientação, mas sem ter
preocupação de proporcionar o desenvolvimento de todas as que constam no
documento. Ressaltando que o documento apontou que os cursos de graduação de
Turismo deveriam possibilitar a formação de um profissional que revele pelo menos
as competências e habilidades descritas, as quais foram apontadas como sendo
numerosas e ambiciosas. Destaca-se por último o comentário que Gaio e Fernandes
(2006) fizeram a respeito desta questão, o qual veio ao encontro com o que foi
sugerido acima e também indicou que providências o MEC deveria tomar. Para
estas professoras “as habilidades e competências propostas devem ser
estabelecidas de acordo com as reais possibilidades de formação, o que leva à
necessidade de uma revisão, por parte do MEC, das diretrizes que norteiam os
cursos superiores na área” (2006, p. 11).
Outra crítica que se faz sobre as competências foi apontada principalmente
pelas respectivas pesquisadoras e professoras de Turismo, Margarita Barretto
(2004), Elizabete Tamanini (2004), Maria Ivonete Peixer da Silva (2004), as quais,
através da publicação do livro: Discutindo o Ensino Universitário de Turismo,
analisaram, entre outros assuntos, a relevância do desenvolvimento das
competências no curso superior de Turismo. As autoras alegam que o paradigma
educacional fundado na concepção de uma formação de competências interessa
atender unicamente o mercado de trabalho, e também questionam a real
necessidade da utilização de conteúdos para o desenvolvimento das competências,
de modo que, os conteúdos, as teorias, o conhecimento venham a ser deixados de
lado. Outro questionamento que fazem é sobre quais competências caberia à
universidade desenvolver e a quem interessaria essas competências. De certa forma
as respostas a todas essas pertinentes questões levantadas encontram-se ao longo
do corpo do texto deste mesmo subcapítulo. Para reforçar algumas das
considerações que servem como resposta se fará uma crítica sobre a seguinte
citação:
263
Quando a transmissão de conteúdos é substituída pelo desenvolvimento de
habilidades e competências, está-se privilegiando aqueles que dominam
os conteúdos, os que ingressam na universidade pré-qualificados, porque
provêm de uma família qualificada ou de uma escola primária qualificada
(BARRETTO, et al., 2004, p. 68).
De fato, o domínio de conhecimentos é fundamental para se trabalhar com as
competências, mas não se pode esquecer que também é necessário adquirir outros
conhecimentos, que é preciso buscar nos conteúdos e nas teorias as informações
necessárias para resolver determinada situação, ou seja, na busca da solução de
um problema, não se parte unicamente dos conhecimentos já dominados pelos
alunos. Da mesma forma, como frisou Perrenoud (1999), não se pretende substituir
a transmissão de conteúdos pelo desenvolvimento de competências, que será
necessária a mobilização e a aquisição de conteúdos para se trabalhar com
competências. A ressalva que se faz é quanto à ampla listagem de competências
pretendidas na formação do bacharel em turismo e ao foco dado em competências
que visam unicamente às práticas do posto exigidas pelo mercado de trabalho.
Ainda que o trabalho com competência se aproxime mais dos propósitos
defendidos pela vertente voltada ao mercado de trabalho, também são requeridas
certas competências para se fazer pesquisas e planejamentos, conforme defende a
vertente da linha mais filosófica do turismo. Também é intenção desta vertente,
segundo Barretto et al., trabalhar com “conhecimentos, capacidades e habilidades
para possibilitar a atuação do sujeito na realidade imediata, [...] sempre contribuindo
para a construção da humanização, que passa pela criação de um mundo mais
inclusivo, justo e igualitário” (2004, p. 73). Da mesma forma, nesta mesma pesquisa
se procurou mostrar que através da metodologia de projeto, podem-se criar
condições para que os estudantes desenvolvam certas habilidades e
comportamentos que venham trazer benefícios para a sociedade em que vivem.
Por fim, se entende que a relação competência versus habilidade não seria,
pelo menos nos cursos de Turismo, um assunto primordial a ser aprofundado e que
a falta de um maior detalhamento sobre suas diferenças, nas Diretrizes Curriculares,
fosse trazer algum problema na formação do estudante. O que se pode dizer,
conforme exemplificado neste trabalho, é que de acordo com Moretto (1999), as
habilidades estão associadas ao saber-fazer: ação física ou mental que indica a
capacidade adquirida. Assim, identificar variáveis, compreender, compreender
264
fenômenos, relacionar informações, analisar situações-problema, sintetizar,
correlacionar e manipular são exemplos de habilidades. as competências são um
conjunto de habilidades harmonicamente desenvolvidas e que caracterizam, por
exemplo, uma função/profissão específica como: ser arquiteto, médico ou professor
de química. As habilidades devem ser desenvolvidas na busca das competências.
Mesmo com essa definição o assunto não fica encerrado, pois os termos estão
bastante correlacionados. Resolver problemas, por exemplo,
é uma competência que envolve diferentes habilidades, tais como: acessar
informações, fazer comparações, selecionar e interpretar informações, entre
outras. O acesso à informação, por sua vez, tomado como resultado em si
mesmo, pode ser visto também como competência. Dependendo do
contexto no qual é considerada, uma competência pode ser uma habilidade
e vice-versa (SILVA, Zilá, 2002, p. 1).
Diante disso, para a tarefa educativa, será muito mais produtivo descrever e
organizar as competências que devem ser estimuladas e desenvolvidas pelos
alunos do que estabelecer uma distinção entre o sentido de competências e
habilidades (SILVA, Z. 2002).
7.5 O perfil sugerido do bacharel em Turismo na visão dos especialistas da área
Da mesma forma que foi possível encontrar indícios de que o
desenvolvimento do espírito empreendedor dos alunos do curso de graduação em
Turismo é pertinente, sendo esta leitura decorrente da análise feita sobre as
Diretrizes Curriculares do referido curso, também é possível encontrar evidências,
algumas delas bem pontuais, de parte de docentes, pesquisadores e especialistas
em Turismo e do próprio mercado de turismo, de que uma formação empreendedora
tem compatibilidade e vai ao encontro do perfil do egresso visado, seja pelos
especialistas da área, ou pelo mercado de turismo.
Conforme enunciado na introdução desta pesquisa, toda sua construção
provém da análise bibliográfica e documental, de modo que, tanto o parecer dos
especialistas em Turismo, quanto o do mercado turístico, em relação ao
favorecimento e ao desenvolvimento das habilidades e dos comportamentos
265
empreendedores, serão retirados das próprias obras e das pesquisas dos autores
consultados.
O professor Luiz Gonzaga Godoi Trigo, que foi um dos elaboradores do -
Manual de Orientação para Verificação IN LOCO das condições de
reconhecimento dos cursos de Turismo e Hotelaria - apontou em sua obra: A
Sociedade Pós-Industrial e o profissional em Turismo, que o bacharel em turismo
precisa de algumas habilidades fundamentais para se tornar um profissional
qualificado, como iniciativa, determinação, criatividade, persistência, autoconfiança,
conhecimentos cnicos, além do aspecto vocacional (1998). Como todas as
habilidades citadas se tratam das mesmas que foram identificadas em muitos
indivíduos empreendedores, seria possível mencionar, conforme o entendimento de
Trigo, que o profissional em Turismo precisa ter comportamentos e desenvolver
habilidades empreendedoras. Também é nesta mesma obra que Trigo disse que os
currículos dos cursos de Turismo necessitariam não estar apenas focados aos
conteúdos, mas ao desenvolvimento de competências, e, dentro destas
competências, o autor destacou a capacidade de pensar e expressar-se de maneira
clara, resolver problemas e tomar decisões. Novamente aqui aparecem outras
características empreendedoras que reforçam ainda mais a pertinência da formação
empreendedora dentro dos cursos de Turismo.
Outro professor que colaborou na elaboração do importante e referencial
documento para o reconhecimento dos cursos de Turismo, citado anteriormente, foi
Miguel Bahl. Na sua obra: Turismo: enfoques teóricos e práticos; observa-se que a
importância dada à formação empreendedora ficou claramente manifestada a partir
da seguinte citação: “a formação de empreendedores com visão de planejamento e
sustentabilidade do sistema turístico é imprescindível nos cursos de bacharelado em
Turismo” (BAHL, 2003, p. 122). Neste exemplo, o foco dado ao empreendedorismo
está bastante vinculado a uma conotação administrativa, mas como foi indicado
neste trabalho, a formação empreendedora não se limita às preocupações
administrativas, porém conta de algumas responsabilidades notoriamente
atribuídas á área da administração.
Semelhante percepção da importância de assuntos ligados à área referida
para a formação dos bacharéis de turismo foi destacada por Ansarah, que escreveu
que “a educação turística, dada a sua característica de prestação de serviços, deve
basear-se também em princípios empresariais” (2002, p. 27).
266
Boa parte das considerações exemplificadas de Trigo e Bahl aparecem
reunidas na seguinte citação de Da Re, na qual também se pode observar alguns
acréscimos feitos pela autora sobre o que se espera da formação do turismólogo.
A formação do bacharel em turismo deve contemplar as relações entre o
conhecimento teórico e as exigências da prática cotidiana da profissão.
Deve ainda proporcionar o desenvolvimento de competências que gere
atributos de raciocínio e expressão lógicos, de comunicação oral, escrita,
simbólica, interpessoal e grupal, de autonomia, de iniciativa, de criatividade,
de cooperação, de solução de problemas e tomada de decisões. A
capacidade empreendedora, seja para administrar o trabalho autônomo,
formal ou informal, seja para aplicá-la em empresas de diferentes portes,
com iniciativa e autonomia, passa a ser esperada na formação desses
profissionais (DA RE, 2002, p. 13).
A fim de melhor capacitar os estudantes dos cursos superiores e bacharéis
em Turismo, a professora Doris Ruschmann apresentou no seu livro: Turismo no
Brasil: análises e tendências, entre outros assuntos, alguns aspectos referentes à
estruturação e ao planejamento da carreira do citado bacharel. Na conclusão do
capítulo concernente ao tema anunciado, esta autora apontou que, “será inútil
investir tempo e dinheiro na estruturação da carreira se o estudante não tiver
determinação, criatividade, visão, disposição para inovar, persistência e confiança
em si mesmo e nas suas idéias” (2002, p. 17). Neste sentido, a formação
empreendedora se apresenta bastante adequada para dar conta do
desenvolvimento destas características.
Refletindo sobre o fenômeno do turismo no Brasil, Moesch, entre alguns
assuntos abordados, comenta que os cursos superiores de Turismo deveriam estar
atentos com a formação de
profissionais portadores de espírito crítico, capacidade analítica, inovadora,
transformadora; profissionais criativos, dotados de equilíbrio entre razão e
sensibilidade, comprometidos com o aprimoramento dos seus saberes,
conscientes dos seus direitos e deveres, um cidadão-profissional-solidário
(in CASTROGIOVANNI; GASTAL, 2003, p. 35).
267
Desta vez se verifica não a presença de habilidades empreendedoras, como
também, outras preocupações com o perfil formado, que vão ao encontro da
proposta formativa da metodologia de projeto que, da mesma forma, procura
desenvolver alunos com espírito crítico, comprometidos com seu aprendizado e
estimulando sempre os alunos a agirem como cidadãos solidários.
A respeito da metodologia de projeto, o estudo de Araújo, C. (2003)
intitulado: Ensino do Turismo no Brasil, analisou a educação para o turismo em nível
superior no qual foi dado destaque para a aprendizagem por projeto. Conforme a
autora, o fato de esta forma de aprendizagem valorizar a problematização e
incentivar o desenvolvimento do pensamento criativo, questionador e crítico, faz com
que tal metodologia seja pertinente para ser utilizada na educação superior em
Turismo. E também, de acordo com a autora (2003, p. 157) “a maior das virtudes
desse método talvez esteja relacionado ao fato de fazer com que os alunos se
tornem independentes e possam conduzir seu processo de aprendizagem”.
Antes de apresentar o perfil exigido pelo mercado turístico, segundo a
pesquisa dos docentes, pesquisadores e especialistas em Turismo, é importante
mencionar a conclusão do recente estudo
143
da professora Ana Maria D’Alberto. Na
conclusão da sua pesquisa, a autora escreveu que os professores foram
“praticamente unânimes em afirmar que consideram importante o ensino do
empreendedorismo para a formação do turismólogo e haver relação entre o ensino
do empreendedorismo e o melhor desempenho do mesmo” (2005, p. 186). Mesmo
se tratando de uma pesquisa regional, não se pode ignorar esse resultado
encontrado, até porque, este também vem ao encontro do que pensam os autores
que anteriormente foram citados.
De acordo com Tomazzoni, “a falta de profissionais qualificados para
atuação no setor é um dos fatores que dificultam o desenvolvimento do turismo”
(2007, p. 205). Por sua vez, a qualificação profissional, no parecer da Organização
Mundial do Turismo – OMT, é uma das principais razões que contribui com a
143
O Estudo de D’Alberto, ocorrido entre 2004 e 2005, fez parte da sua dissertação de mestrado em
Administração, cuja pesquisa exploratória com enfoques qualitativos e quantitativos, buscou estudar o ensino do
empreendedorismo nos cursos de graduação em turismo do estado de Santa Catarina, Brasil, em instituições de
ensino superior públicas e privadas. Procurou-se identificar quais cursos apresentam o enfoque do
empreendedorismo em sua grade curricular. Utilizou-se como instrumento de coleta de dados um questionário
com questões abertas e fechadas. Os sujeitos deste estudo foram os coordenadores dos cursos de turismo e os
professores das IES que oferecem a disciplina ou que tem disciplina com enfoque em empreendedorismo nos
cursos de turismo, totalizando, neste caso, 26 profissionais pertencentes às mesmas.
268
melhoria da qualidade dos serviços turísticos. Em vista disso, é a partir de um ensino
de qualidade que se poderá possibilitar o desenvolvimento do setor do turismo,
assim como, garantir a inserção dos egressos do curso de Turismo no mercado de
trabalho, que por sua vez, é altamente responsável pela expansão deste setor. Por
conta disso, é imprescindível estar atento a exigências deste mercado altamente
competitivo, dinâmico e diversificado.
Ansarah (2002), Da Re (2002), Lemos (2002) e Shigunov Neto (2002)
foram os autores consultados que apontaram em suas obras as principais
características do perfil exigido pelo mercado turístico. Suas observações foram
feitas de um modo abrangente, ou seja, não são procedentes do estudo de uma
determinada área de atuação do setor de turismo e tampouco são oriundas da
realidade de uma específica região. Embora com essas ressalvas, às quais se
podem acrescentar a questão da dinâmica do mercado e da especificidade de cada
lugar, é possível ter uma noção geral das competências e habilidades exigidas pelo
mercado turístico. As mesmas são apresentadas no quadro 24.
1
Ser criativo e inovador
15
Ser orientado por resultado
2
Ser líder
16
Saber liderar pessoas e conseguir
motivá-las
3
Ter capacidade de tomar decisões
17
Ter determinação
4
Saber buscar informações
18
Aprender a aprender
5
Ter visão estratégica
19
Ter ampla formação cultural
6
Ter comprometimento com o negócio
20
Ter forte visão generalista
7
Possuir espírito empreendedor
21
Ser curioso e um pesquisador nato
8
Saber resolver problemas
22
Ter domínio de vários idiomas
9
Ser flexível para lidar o tempo todo com
as contingências
23
Dominar tecnicamente os assuntos de
sua área
10
Buscar permanentemente a
produtividade e a competitividade
24
Entender todas as funções –
conhecimento teórico e prático
11
Ter confiança em si mesmo e nas suas
idéias
25
Possuir profundos conhecimentos de
relações públicas
12
Ter fortes habilidades de inter-
relacionamento pessoal
26
Ter forte visão ética e de
responsabilidade social
13
Ter forte visão da qualidade dos
produtos, serviços que venha gerenciar
27
Adquirir informações tecnológicas
atualizadas
269
14
Saber trabalhar com projetos com visão
multidisciplinar
28
Possuir capacidade de trabalho, espírito
e participação comunitária
Quadro 24: Principais competências e habilidades exigidas pelo mercado turístico
Fonte: Ansarah (2002, p. 41, 60, 61), Da Re (2002, p. 13), Lemos (2002, p. 96, 97), Shigunov Neto
(2002, p. 52, 53).
As mesmas críticas relacionadas à extensa lista de competências e
habilidades apresentadas nas Diretrizes Curriculares do curso de Turismo,
juntamente com a sugestão da maneira de proceder na seleção daquelas a serem
desenvolvidas na disciplina de empreendedorismo, para assim se obter um
adequado aproveitamento, também são válidas neste caso. Mas a intenção desta foi
evidenciar a grande quantidade de características que são desejadas pelo mercado
turístico e que, ao mesmo tempo, são identificadas nos indivíduos empreendedores,
em especial as 18 primeiras.
É imprescindível reconhecer que a formação para o mercado é importante,
mas não se pode ignorar a importância de valores éticos e sociais ligados à
preservação do meio ambiente, do patrimônio histórico, artístico e cultural e se
atentar para as condições de vidas das populações locais, pois como fala Barretto et
al. “o turismo deve propiciar a melhoria das condições de vida das comunidades
receptoras e não apenas a de um setor empresarial” (2004, p. 82). Portanto, é
preciso haver uma preocupação com o desenvolvimento social em conjunto com o
desenvolvimento da própria atividade turística, conciliando assim os interesses das
comunidades locais com os do trade
144
turístico. Por esta razão, como diz Trigo
(2000, p. 251) “é importante que os docentes e alunos participem de alguns projetos
em sua comunidade e em sua região”, ocasião em que os discentes, através de uma
metodologia como a do projeto, podem colaborar de forma organizada, planejada e
significativa, com melhorias da sua comunidade. E nesta oportunidade desafiante,
como foi visto ao longo deste trabalho, há grandes possibilidades de os alunos
virem a desenvolver comportamentos e habilidades empreendedoras, sendo a
metodologia de projeto o caminho a seguir, que fornece orientações gerais para se
chegar a um fim determinado, e a disciplina de empreendedorismo o veículo que
será necessário para percorrer os caminhos.
144
Considera-se trade, o grupo de profissionais envolvidos com o turismo. Proprietários, gestores,
colaboradores de agências, operadoras, hotéis, e etc.
270
271
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por conta das transformações atuais decorrentes das novas tecnologias e da
globalização, as instituições de ensino superior enfrentam hoje vários desafios.
Novas exigências vêm sendo impostas ao ensino superior, a destacar: a busca por
um perfil do egresso cujas competências e habilidades assemelham-se àquelas
identificadas nos indivíduos empreendedores, e também à busca de metodologias
mais condizentes com a atual realidade dinâmica, competitiva, cambiante e
complexa. Levadas estas questões para o âmbito do curso superior de Turismo, se
procurou saber se uma metodologia compatível com a atual realidade, como a
metodologia de projeto, favorece e cria condições para que os alunos deste curso
venham a desenvolver comportamentos e habilidades empreendedoras, mais
especificamente dentro da disciplina de empreendedorismo.
O presente estudo, desenvolvido a partir da análise da literatura bibliográfica
e da pesquisa documental, demonstra que fortes evidências de que a
metodologia de ensino-aprendizagem que faz uso do trabalho com projetos está
sistematizada de tal forma que proporciona condições plenas para que os alunos
venham a desenvolver seu espírito empreendedor. Tal constatação se mostrou
bastante evidente em virtude de uma série de compatibilidades que existem entre a
metodologia de projeto e uma educação empreendedora como: os objetivos
educacionais, seus aspectos mobilizadores, as exigências quanto à postura do
professor e do aluno, os norteamentos das práticas pedagógicas, a proposta de
currículo, a flexibilidade dos conteúdos, do tempo e do espaço escolar e os critérios
de avaliação.
Outro elemento que reforça essa paridade foi demonstrado a partir da
totalidade das competências e habilidades elencadas nos capítulos referente à
Metodologia de Projeto e que, igualmente, puderam ser encontradas nos indivíduos
empreendedores, conforme o relato das seis pesquisas apresentadas no capítulo
sobre o empreendedorismo. Portanto, o desenvolvimento de certas competências e
habilidades são naturalmente favorecidas por meio da Metodologia de Projeto.
Também foi verificado que a Metodologia de Projeto procura proporcionar
uma nova forma de pensar e agir sobre a realidade, visando um envolvimento
responsável, consciente, solidário e cidadão do aluno frente à sua comunidade.
272
Semelhante preocupação também tende a ocorrer numa formação empreendedora
quando se orienta o aluno a realizar um sonho, um desejo, a atender uma
necessidade, em prol da sua comunidade. Neste caso, o foco das ações dos alunos
na realidade social buscando transformá-la e melhorá-la, condiz exatamente com os
objetivos das ações dos empreendedores sociais, cujas habilidades e
comportamentos que venham a desenvolver o os mesmos daqueles
empreendedores de sucesso da iniciativa privada.
Salienta-se que as questões referentes aos problemas comunitários,
juntamente com o desenvolvimento de certas habilidades e comportamentos
empreendedores, os quais foram vistos nesta pesquisa, coadunam-se com os
interesses dos cursos de Turismo e vão ao encontro do perfil do bacharel em
Turismo proposto nas Diretrizes Curriculares do respectivo curso. A partir desta
correlação, foi dado conta do objetivo específico deste estudo, o qual pretendeu
mostrar que o desenvolvimento do espírito empreendedor dos alunos e a
Metodologia de Projeto são pertinentes de serem desenvolvidos e utilizados nos
cursos superiores de Turismo pela possibilidade de atender algumas exigências de
formação descritas nas Diretrizes Curriculares do curso em questão. Além do mais,
de parte de conceituados professores especialistas na área do Turismo, como
também, da leitura que os mesmos fizeram sobre as exigências do mercado de
trabalho do Turismo, novamente se pode perceber a pertinência do desenvolvimento
do espírito empreendedor dos alunos e da utilização da Metodologia de Projeto.
Mas para que todas as considerações anteriores fossem feitas de forma
consistente e embasadas, foi necessário resgatar a origem e os pressupostos
teóricos da metodologia estudada e posteriormente esclarecer as bases atuais - a
abordagem sistêmica, a abordagem progressista e a abordagem do ensino pela
pesquisa - que servem de alicerce para a prática da aprendizagem por projeto e, por
sua vez, demonstram que podem dar conta dos desafios da contemporânea
sociedade, dita como a do Conhecimento. Deste modo, foi possível visualizar uma
proposta de aprendizagem, criativa, desafiadora, ousada, crítica, reflexiva e
transformadora, capaz de mobilizar nos alunos todas essas correspondentes
características. Como resultado, com base nos relatos de professores e alunos,
também se testemunhou a formação de educandos mais pró-ativos, autônomos,
confiantes, capazes de resolver problemas, de aprender a aprender, de intervir com
planejamento, organização e responsabilidade na realidade em que vivem, de
273
trabalhar em equipe, entre outras, que também os levam a serem conscientes de
que podem contribuir para melhorar a sociedade, e que são os condutores do seu
próprio destino.
Com relação ao empreendedorismo, principalmente por se tratar de um
campo de estudo novo e ainda pouco discutido nos cursos superiores de Turismo,
também foi preciso mostrar a evolução deste fenômeno e apresentar as concepções
mais atuais. Para esta pesquisa se fez uso de um conceito que procurou ampliar a
abrangência do seu entendimento para qualquer área onde o indivíduo possa
concretizar um determinado sonho. Isto quer dizer que o empreendedor foi visto
como aquele capaz de sonhar e de buscar transformar o seu sonho em realidade.
Neste sentido, sonhar foi considerado um pressuposto do empreendedor, mas o que
configura o empreendedor é a complementação com a ação e conseqüentemente o
despertar do seu espírito empreendedor. Portanto, como dizem os autores desta
área que foram consultados, é da ação que nasce o empreendedor e é durante a
jornada em busca da concretização do sonho que se formará o empreendedor de
sucesso, ocasião que possibilita o indivíduo libertar o empreendedor que existe
dentro de si.
Diante dessas colocações, devidamente detalhadas neste trabalho, mostrou-
se que, seja empreendendo por conta própria ou participando de projetos
coletivamente, o aluno estará mobilizando habilidades, conhecimentos, atitudes,
competências, comportamentos.
Outros aspectos pontuais e basilares, tanto da Metodologia de Projeto
quanto do Empreendedorismo foram discutidos, inclusive as dificuldades de se
trabalhar com os mesmos no ensino superior. Entretanto, nenhum obstáculo
apresentado mostrou-se intransponível e inviável de ser enfrentado, desde que haja
vontade, dedicação, adequado preparo e interesse para se conhecer mais a fundo
cada um dos objetos de estudo desta pesquisa que, de modo algum, esgotou por
completo os temas estudados.
O que se procurou oferecer através da análise da viabilidade de integração
da Metodologia de Projeto com o desenvolvimento de habilidades e comportamentos
empreendedores, acima de tudo, foi uma aprendizagem realmente significativa,
pertinente e instigante para os alunos do curso superior de Turismo e que, por
conseguinte, venha colaborar para o desenvolvimento do setor do turismo e trazer
também incontáveis benefícios para a sociedade. Acredita-se que através da
274
referida correlação seja dada uma rica oportunidade para incentivar a formação de
alunos capazes de sonharem mais, de ousarem mais, de inovarem mais, de
realizarem mais, formando assim, indivíduos mais sensíveis aos problemas que
afligem a comunidade a que pertencem e com amplas condições de encontrarem
soluções inovadoras para resolver ou, ao menos, amenizar os problemas.
Em termos de limitações, lamenta-se não ter encontrado no ensino superior
alguma experiência em andamento que tenha feito uso da utilização da Metodologia
de Projeto visando o despertar do espírito empreendedor dos alunos, de modo que,
pudesse ser observado e comprovado in loco o desenvolvimento de habilidades e
comportamentos empreendedores conforme poderia ser proposto.
Muito carente é o número de pesquisas e obras referente ao
empreendedorismo social, mais exatamente àqueles indivíduos que despertam o
seu espírito empreendedor e acabam colocando toda paixão, determinação, vontade
e entusiasmo na realização de projetos em benefício da sua comunidade e que, por
sua vez, têm contribuído significamente na melhoria das condições de vida de
muitas pessoas. Em vista disso, fica como sugestão um estudo mais aprofundado
sobre o empreendedor social, para futuras pesquisas.
275
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