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Universidade Estadual de Maringá
Centro de Ciências Exatas
Pós-Graduação em Física
Dissertação de Mestrado
Desenvolvimento de um Sistema Magnetoacústico
para o Estudo de Transição de Fase em Materiais
Magnetocalóricos
Wesley Szpak
Grupo de Estudos dos Fenômenos Fototérmicos
Maringá – PR – Brasil
Fevereiro de 2009
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Universidade Estadual de Maringá
Centro de Ciências Exatas
Pós-Graduação em Física
Dissertação de Mestrado
Desenvolvimento de um Sistema Magnetoacústico
para o Estudo de Transição de Fase em Materiais
Magnetocalóricos
Wesley Szpak
Orientador: Prof. Dr. Antonio Carlos Bento
Dissertação de Mestrado submetida a
Universidade Estadual de Maringá, Programa
de Pós-Graduação em Física, para a obtenção
do título de Mestre em Física.
Maringá – PR – Brasil
Fevereiro de 2009
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iii
O que for que fizerdes, trabalhai nisso de toda a alma
como para Jeová, e não como para homens, pois sabeis
que é de Jeová que recebereis a devida recompensa da
herança. Trabalhai como escravos para o Amo, Cristo.
Certamente, quem estiver fazendo o errado receberá de
volta o que fez de errado, e não há parcialidade.
Colossenses 3:23-25
iv
Agradecimentos
“Digno és, Jeová, sim, nosso Deus, de receber a glória, e a honra, e o poder, porque
criaste todas as coisas e porque elas existiram e foram criadas por tua vontade.”
Revelação 4:11.
Ao grandioso e soberano Deus Jeová, por ter criado todas as coisas e nos dado a
oportunidade de viver.
Ao meu pai Nilo Szpak pela confiança, apoio, compreensão, amor e incentivo em
todos os momentos de minha vida, e sobre tudo pelo excelente exemplo em todos os
sentidos.
A minha querida namorada Larissa Santana Lopes, pelo carinho, compreensão, apoio
e amor.
A toda a minha família, e a família da Larissa que me acompanharam nesta jornada.
Aos meus irmãos na fé, pela ajuda e apoio espiritual.
Aos meus amigos, pela compreensão da minha ausência e stress.
Ao Professor Dr. Antonio Carlos Bento, pela orientação, confiança, incentivo, tempo
dispensado e amizade.
Aos Professores Dr. César C. Colucci e Dr. Cleber Santiago Alves, pelo fornecimento
das amostras tão essenciais a este trabalho.
Ao Professor Dr. Antonio Medina Neto, pelas importantes discussões e opiniões.
Ao Doutor Élderi Nogueira da Silva in memorium, pela grande contribuição a minha
formação.
Aos meus colegas de classe e de laboratório, pelo valioso intercâmbio cultural e
compreensão de meus questionamentos.
Aos funcionários do departamento, em especial ao Márcio e o Jurandir da Mecânica,
ao Serginho da Eletrônica, e a Akiko da Secretaria.
As agencias de fomento CNPq e CAPES, pelo apoio financeiro.
E a você que está lendo este trabalho, os meus sinceros agradecimentos, MUITO
OBRIGADO!
v
Sumário
Resumo ...................................................................................................................
1
ABSTRACT ........................................................................................................... 2
Apresentação ......................................................................................................... 3
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico ..................................................................... 6
1.1. Histórico .................................................................................................. 6
1.2. Considerações Teóricas .......................................................................... 16
1.2.1. Eficiência de Resfriamento Magnético ......................................... 22
1.3. Métodos de Medida do Efeito Magnetocalórico ..................................... 24
1.3.1. Medidas Diretas ............................................................................ 25
1.3.2. Medidas Indiretas através da Magnetização ................................. 26
1.3.3. Medidas Indiretas através da Capacidade Térmica ....................... 27
1.3.4. Medidas Indiretas através da Resistividade .................................. 27
1.4. Materiais Magnetocalóricos .................................................................... 28
1.4.1 Critério de seleção para refrigerantes magnéticos ......................... 30
1.4.2 Comparação entre os diferentes materiais magnetocalóricos ........ 31
1.5. Ciclos Termomagnéticos .........................................................................
36
1.5.1. Ciclo de Brayton ........................................................................... 38
1.5.2. Ciclo de Ericsson .......................................................................... 41
1.6. Referências Bibliográficas ...................................................................... 45
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico ............................................................................ 47
2.1. Histórico .................................................................................................. 47
2.2. O Efeito Fotoacústico ............................................................................. 49
2.3. Absorção Óptica e Difusão Térmica ....................................................... 51
2.4. As Técnicas Fototérmicas e suas Aplicações .......................................... 52
2.5. Modelo RG para a Difusão Térmica ....................................................... 54
2.6. Perfil de Profundidade ............................................................................ 58
2.7. Célula Fotoacústica Aberta (OPC) .......................................................... 59
2.8. Montagem Experimental ......................................................................... 61
2.9. Referências Bibliográficas ...................................................................... 64
Capítulo 3. Detecção acústica do Efeito Magnetocalórico .................................
65
vi
3.1. Nova Técnica de Detecção Acústica para o EMC .................................. 65
3.1.1. Metodologia experimental ............................................................ 65
3.1.2. Resultados experimentais .............................................................. 68
3.2. Método Termoacústico para Medida do EMC sem contato ....................
72
3.2.1. Cálculo de
T
Total ..................................................................... 73
3.2.2. Configuração Experimental .......................................................... 74
3.2.3. Prova do princípio ......................................................................... 76
3.2.4. Calibração do Sistema e Resultados Obtidos ................................ 78
3.3. Referências Bibliográficas ...................................................................... 81
Capítulo 4. Montagem do experimento ............................................................... 82
4.1. Considerações Preliminares do Ducto Sonoro ........................................ 82
4.2. Sistema de Variação de Temperatura ......................................................
84
4.3. Sistemas de Variação de Campo Magnético ........................................... 86
4.4. Primeiros Protótipos ................................................................................ 95
4.5. Célula Magnetoacústica Final ................................................................. 100
4.6. OPC com Variação de Temperatura ....................................................... 108
4.7. Referências Bibliográficas ...................................................................... 114
Capítulo 5. Resultados e Discussão ..................................................................... 116
5.1. Efeito Magnetocalórico em Gadolínio .................................................... 116
5.1.1. Resultados Magnetoacústicos em Gd ........................................... 118
5.1.2. Monitoramento da Temperatura de Curie do Gd via Fotoacústica
122
5.2. Efeito Magnetocalórico da liga Gd
5
Si
2
Ge
2
..............................................
132
5.2.1. Resultados Magnetoacústicos na liga Gd
5
Si
2
Ge
2
..........................
133
5.3. Efeito Magnetocalórico da liga Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
................................... 136
5.3.1. Resultados Magnetoacústicos no composto Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
...... 137
5.3. Referências Bibliográficas ...................................................................... 139
Capítulo 5. Conclusão e Perspectivas .................................................................. 140
Apêndice A. Projeto da Célula Magnetoacústica ............................................... 142
Apêndice B. Projeto da OPC com Variação de Temperatura .......................... 146
1
Resumo
Nesta dissertação de mestrado são apresentadas todas as etapas pertinentes a
construção de um aparato experimental capaz de detectar por via acústica, o efeito
magnetocalórico (EMC) de amostras tanto em volume quanto em pó. Tal experimento
fundamenta-se em princípios envolvidos na técnica fotoacústica e consiste em alocar
uma amostra magnetocalórica em uma câmara (célula) acústica fechada contendo um
gás. A aplicação de um campo magnético modulado sobre a amostra, provoca, através
do EMC, um aumento periódico em sua temperatura. Trata-se de uma técnica de medida
direta que não necessita de um sensor de temperatura em contato com a amostra e que
permite o estudo de materiais magnetocalóricos a baixos campos magnéticos. O
experimento magnetoacústico, como o denominamos, mostrou eficiência ao ser posto
sob teste em uma lâmina de gadolínio (Gd), revelando precisamente o valor da
temperatura de transição magnética. Ainda, foram testadas com medidas
magnetoacústicas amostras em dos compostos da família Gd-Si-Ge, a saber,
Gd
5
Si
2
Ge
2
tratada termicamente a 1300 ºC por 1 hora e Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
como fundida.
Os resultados mostram que o sistema desenvolvido capta precisamente temperaturas de
transição magnética, indicando, por meio da presença de histerese, a ordem da transição.
Além disso, a célula magnetoacústica proporcionou uma excelente sensibilidade com
relação a identificação de fases minoritárias. Paralelamente a construção do aparato
experimental magnetoacústico, apresentamos o desenvolvimento de uma célula
fotoacústica aberta (OPC) que permite a variação de temperatura do corpo de prova
entre -30 (243K) e 100 °C (373K). Por meio desta OPC e iluminação com diodo-laser
estudamos a influência da espessura da amostra e da freqüência de modulação do laser
na determinação da temperatura de Curie do Gd. Este estudo revelou que, no que se
refere à identificação da temperatura de transição, uma transferência de sensibilidade
do sinal para a fase quando tendemos ao regime termicamente grosso, seja aumentando
a espessura ou na variação de freqüência. A temperatura de Curie de 292 K foi obtida
tanto da fase quanto do sinal fotoacústico, estando em pleno acordo com o valor obtido
no método magnetoacústico, bem como os registrados na literatura.
2
ABSTRACT
This master thesis presents the stages of the development of a setup for detecting
the magnetocaloric effect (MCE) by acoustic way. Such experiment considers the
photoacoustic effect and consists in locating the sample (either powder or solid) inside a
tightly closed cell. When the magnetic field is modulated onto sample, the MCE effect
comes out producing a periodic signal due to temperature variation in the gas chamber.
This is a straightway measurement technique without the need of temperature sensor in
contact with sample, allowing studies under low magnetic fields. This Magnetoacoustic
experiment was tested using a Gd foil and it reveals itself very accurate in detecting the
temperature of a magnetic transition. Besides, were tested powder of compounds of the
Gs-Si-Ge family, such as Gd
5
Si
2
Ge
2
annealed at 1300 ºC for 1 hour and
Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
as prepared by melting. Tests showed the capability of the system in
detecting accurately the magnetic transition as well as the verification of its transition
order analyzing its hysteresis. Furthermore, the magnetocoustic cell presented a very
high sensibility when minor phases are present. Aside the magnetoacoustic experiment,
it was also performed experiments using a modified Open Photoacoustic Cell (OPC)
with capability for measurements in function of temperature in the range 243K to 373K,
by means of Peltier elements and using a diodo laser for heat generation. In these
experiments, the magnetoacoustic effect of the Gd was studied as a function of
modulation frequency and sample thickness. It was evaluated the capability of the
system for detecting accurate Curie temperature as well as the sensibility of the
photoacoustic signal versus photoacoustic phase. Results showed that in the thermally
thin range signal is more sensitive to Curie temperature whilst in the thermally thick
regime the phases are more accurate. In all cases, the temperature detected for magnetic
transition were in accordance with those found in the literature for the materials
discussed in this dissertation. Both phase and signal allowed the Curie temperature
about 292 K.
Apresentação 3
Apresentação
Em anos recentes tem havido uma crescente onda mundial de preocupação com o
meio ambiente. Devido a poluição ambiental, as perspectivas do amanhã são sombrias
para as gerações futuras, sendo que as conseqüências de décadas de poluição
irresponsável do homem são sentidas em nossos dias. Previsões catastróficas para o
futuro têm levado a comunidade científica mundial a buscar alternativas aos principais
processos da sociedade moderna que se constituem fontes de degradação ambiental. Um
desses processos é o moderno método de refrigeração.
Nos modernos refrigeradores comerciais são geralmente empregados os freons,
nome dado a gases compostos de cloro, flúor e carbono (os CFCs), ou hidrogênio, cloro,
flúor e carbono (os HCFCs). No entanto, em 1995 o americano Sherwood Rowland e o
mexicano Mario Molina foram agraciados com o Prêmio Nobel de Química justamente
por terem descoberto, em 1974, que tais gases destroem a camada de ozônio existente
na atmosfera, a qual protege todos os seres vivos da radiação ultravioleta provinda do
Sol. Desta forma, os freons constituem-se poluentes altamente nocivos ao meio
ambiente e, por conseqüência, ao ser humano.
Em 1987, diversos países já haviam se comprometido, assinado o Protocolo de
Montreal, em diminuir a poluição ambiental, posteriormente em 1998, a assinatura do
Protocolo de Kyoto levou esses países a se comprometerem a reduzir a emissão de
gases nocivos a atmosfera, incluindo os freons. Nesta conjuntura, a crescente
conscientização da sociedade em relação ao risco ambiental do uso dos freons tem
impulsionado a busca de métodos alternativos de refrigeração.
É neste contexto que a refrigeração magnética tem surgido como a alternativa
mais promissora, pois além de não utilizar substâncias nocivas também deverá ser mais
econômica. Este tipo de refrigeração fundamenta-se no chamado efeito magnetocalórico
(EMC). Trata-se da correspondente variação de temperatura sofrida por um material
magnético ao ser submetido a uma variação de campo magnético sob condições
adiabáticas. Esse fenômeno foi descoberto em 1881 pelo físico alemão Emil Warburg
(1846-1931), quando observou que uma amostra de ferro pode se aquecer ao ser
aproximada de um forte imã.
Apresentação 4
Somente cinco décadas após a descoberta de Warburg é que a história das
aplicações do EMC começou a se desenrolar. Em 1933, o físico William Giauque
(1895-1982) conseguiu atingir temperaturas extremamente baixas através do EMC. O
método proposto por Giauque se tornou um sucesso, sendo utilizado nos anos
posteriores nas pesquisas com criogênia por diversos laboratórios do mundo. Em 1976,
Brown detectou uma variação de dezenas de kelvin em uma amostra de Gd sob um ciclo
termomagnético com base no EMC. A partir daí, surgiu um crescente interesse, que
perdura até agora, na exploração comercial de materiais e métodos visando a
refrigeração magnética em temperaturas em torno da ambiente. Hoje, os dois maiores
obstáculos para a comercialização de refrigeradores magnéticos reside na busca por
materiais que apresentem um EMC tão grande quanto possível e que tenham baixo
custo, juntamente com os aspectos relacionados a fabricação dos componentes
magnéticos destes refrigeradores.
Tendo em vista este crescente interesse em pesquisas relacionadas ao estudo de
amostras magnetocalóricas, o objetivo principal desta dissertação de mestrado é a
construção de um aparato experimental capaz de detectar o EMC e possibilitar o estudo
de materiais, tanto em pó como em volume, que apresentem transição de fase magnética
em torno da temperatura ambiente. O sistema desenvolvido capta via acústica a variação
de temperatura sofrida pela amostra ao ser submetida a um campo magnético modulado,
trata-se de um método de medida direta sem sensor em contato com a amostra, técnica
esta fundamentada na fotoacústica.
No capítulo 1 desta dissertação nos concentramos em realizar uma revisão
bibliográfica dos principais aspectos envolvidos no efeito magnetocalórico (EMC),
incluindo a história dos primórdios do uso deste efeito para processos criogênicos, as
considerações teóricas envolvida para se explicar o EMC, os atuais métodos
empregados no estudo de amostras que apresentam este efeito, bem como, uma visão
geral dos materiais magnéticos pesquisados atualmente. Como último tópico deste
capítulo, apresentamos uma breve discussão do promissor emprego do EMC em
processos de refrigeração a temperatura ambiente, dando enfoque aos ciclos
termomagnéticos e discorrendo sobre alguns protótipos já construídos.
Conforme citado, o sistema que nos propomos em desenvolver baseia-se na
fotoacústica, por isso, no segundo capítulo desta dissertação realizamos uma curta
revisão dos aspectos históricos, teóricos e experimentais do efeito fotoacústico. Em
Apresentação 5
seguida, no capítulo 3, discorremos a respeito dos esforços apresentados na literatura
em unir a detecção do EMC com as técnicas fotoacústicas, através da proposta da
detecção acústica do EMC.
Como o objetivo deste trabalho é a construção de um aparato experimental capaz
de captar o EMC através de ondas acústicas, no capítulo 4 nos concentramos em
descrever as várias etapas envolvidas no projeto e construção da célula magnetoacústica
final. As etapas mencionadas incluem os primeiros protótipos da célula, e a
caracterização do eletroímã, que fornece o campo magnético constante, bem como da
bobina de Helmholtz, que é responsável pelo campo magnético alternado, o campo de
prova. Paralelamente a construção do experimento magnetoacústico é também
apresentado neste capítulo o projeto de uma célula fotoacústica aberta (OPC) que
permite a variação de temperatura da amostra, sendo possível assim, estudar
propriedades térmicas dos materiais magnetocalóricos (sólidos) em função da
temperatura via fotoacústica. O projeto completo e detalhado (desenho mecânico) tanto
da célula magnetoacústica final quanto da OPC com variação de temperatura são
apresentados nos apêndices A e B, respectivamente.
No capítulo 5 são analisadas medidas magnetoacústicas de uma amostra sólida de
Gd e de amostras em pó dos compostos da família Gd-Si-Ge, a saber, Gd
5
Si
2
Ge
2
tratada
termicamente a 1300 ºC por 1 hora e Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
como fundida. Aqui também
mostramos os resultados provenientes do uso da OPC com variação de temperatura,
identificando a transição de fase do Gd através da iteração luz-matéria.
Por fim, no capítulo 6 é apresentado a conclusão geral atingida através da análise
dos dados coletados, bem como as perspectivas de estudos futuros a serem realizados
como continuação deste trabalho.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 6
Capítulo 1
Efeito Magnetocalórico
Neste capítulo nos concentramos em realizar uma revisão bibliográfica dos
principais aspectos envolvidos no efeito magnetocalórico (EMC), incluindo a história
dos primórdios do uso deste efeito para processos criogênicos, as considerações teóricas
envolvida para se explicar o EMC, os atuais métodos empregados no estudo de
amostras que apresentam este efeito, bem como, uma visão geral dos materiais
magnéticos pesquisados atualmente. Como último tópico deste capítulo, apresentamos
uma breve discussão do promissor emprego do EMC em processos de refrigeração a
temperatura ambiente, dando enfoque aos ciclos termomagnéticos e discorrendo sobre
alguns protótipos já construídos.
1.1. Histórico
Segundo as leis da física o zero absoluto de temperatura nunca pode ser alcançado,
mas, em princípio, podemos nos aproximar dele arbitrariamente. Neste contexto, a
liquefação do oxigênio por Louis Cailletet em 1877 iniciou uma busca de temperaturas
cada vez mais baixa em laboratórios de todo o mundo
[1]
.
Figura 1.1. Aparato experimental de
Cailletet para liquefazer os gases.
Figura 1.2. Detalhe do liquefator.
Depois do êxito da liquefação do hélio em 1908, Kamerlingh-Onnes voltou a
tentar alcançar temperaturas mais baixas. O método empregado foi sempre o mesmo, a
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 7
saber, redução da pressão de vapor do hélio líquido empregando bombas mais
eficientes. Em cada tentativa se aproximava mais do limite que se pode alcançar com
este método. Como o hélio é a substância que tem os dados críticos mais baixos, a
liquefação dos gases havia terminado. Quando Kamerlingh-Onnes morreu, em 1926,
deixou a impressão de se ter dado o último passo possível para o zero absoluto.
Dois meses depois, em 9 de abril, surgiu na American Chemical Society
[2]
um
informe em que se descrevia um método de resfriamento totalmente novo. Seu autor era
um jovem rapaz chamado William Francis Giauque. Ele propunha alcançar
temperaturas inferiores a do hélio líquido mediante um método magnético chamado
desmagnetização adiabática. Porém, Peter Debye, independentemente, havia enviado
uma semana antes a mesma proposição ao Annalen der Physik
[3]
.
Figura 1.3. Kamerlingh-Onnes.
Figura 1.4. Ilustração de Kamerlingh-
Onnes trabalhando em seu laboratório.
Para entender o mecanismo que torna possível tal façanha, primeiramente se faz
necessário descrever alguns efeitos magnéticos e algo sobre a estrutura da matéria. É
preciso ter em mente que os spins eletrônicos são de interesse particular para o estudo
de fenômenos a baixas temperaturas.
Quando uma substância é submetida a um campo magnético, em uma temperatura
cujos spins estão desordenados, os spins tendem a se alinhar com o campo. O grau que a
substância se magnetiza, sob influência de um determinado campo, é denominada
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 8
susceptibilidade. O alinhamento dos spins devido ao campo compete com um
desordenamento devido à agitação térmica dos átomos, portanto, é mais fácil alinhar os
spins quando estas agitações térmicas são muito pequenas, ou seja, a baixas
temperaturas. Isto foi descoberto por Pierre Curie, o qual observou que a
susceptibilidade magnética é inversamente proporcional a temperatura absoluta. A esta
dependência dá-se o nome de Lei de Curie:
T
C
=
χ
1.1.1
em que T é a temperatura em Kelvin e C é uma constante conhecida como constante de
Curie. No entanto, nem todas as substâncias se comportam desta forma.
Existem alguns cristais, em particular os sais das terras-raras e os metais do grupo
do ferro, que têm uma estrutura cujos spins individuais estão muito isolados (pouco
interagentes) e, portanto, obedecem a lei de Curie. Um destes materiais é o sulfato de
gadolínio (
(
)
OHSOGd
2
2
42
8 ), que foi investigado por Kamerlingh-Onnes e Woltjer
em 1924. O objetivo principal do estudo realizado era descobrir se era possível
conseguir o alinhamento completo dos spins em uma temperatura tão baixa quanto 1K
empregando um campo magnético muito forte. Escolheram o sulfato de gadolínio
porque se sabia que este obedecia a lei de Curie inclusive em 1K. Não souberam
apreciar o significado completo dos resultados, os quais constituíram o ponto de partida
das considerações de Giauque e de Debye.
Figura 1.5. William Francis Giauque. Figura 1.6. Peter Debye.
Se uma substância obedece a lei de Curie, os spins devem estar em um estado de
desordem, apontando ao acaso em todas as direções, o que significa que sua entropia
ainda é alta. A 1K as vibrações térmicas dos átomos na rede cristalina do sulfato de
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 9
gadolínio praticamente cessaram e a entropia devida a elas é desprezivelmente pequena.
No entanto, o sistema de spins do sal está desordenado e não pode passar a um estado
de baixa entropia até que se alcance uma temperatura muito mais baixa. Por outro lado,
pode se forçar um estado de ordem a 1K no sistema de spins do sal submetendo-o a um
campo magnético elevado. A diminuição de entropia conseguida desse modo foi o que
Giauque e Debye propunham utilizar.
O princípio do resfriamento magnético seguiu os mesmos passos que da
liquefação do oxigênio por Cailletet, primeiro comprimindo o s e logo deixando
expandir-se. A única diferença é que em lugar de um gás se emprega um sal
paramagnético sob um campo magnético em vez da pressão. O melhor modo de se
explicar o método magnético é através de um gráfico que representa a entropia do sal
versus sua temperatura absoluta (figura 1.7).
Temperatura
Entropia
H
1
H
2
Figura 1.7. Aumento da entropia com a elevação da temperatura, sem a aplicação de
campo magnético (em preto) e com o campo (vermelha). O processo A-B é isotérmico
enquanto B-C é adiabático
[4]
.
As curvas desse gráfico deixam claro que o aumento da temperatura provoca
crescimento da entropia e que, ao contrário, a aplicação do campo ordena os íons
magnéticos, diminuindo a entropia.
O processo de resfriamento magnético começa no estado A, quando o sal é
colocado a certa temperatura (T
Q
), por exemplo, 1 K, o que pode ser feito através do
contato térmico com hélio líquido. Em seguida é aplicado um campo magnético para
diminuir a entropia do material, que evolui para o estado B. Isso é realizado mantendo a
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 10
temperatura do sal constante (processo isotérmico), no exemplo (T
Q
= 1 K) o material
deve permanecer em contato com o hélio líquido. Sem esse contato, a temperatura do
material aumentaria como acontece quando o gás é comprimido, em refrigeradores
convencionais. A redução de entropia reportada é devido a diminuição da entropia
magnética, pois a entropia relacionada com a temperatura do material permanece
inalterada no processo A-B. Até aqui o calor removido do sistema em um processo
reversível é
(
)
STSSTQ
QABQ
== .
1.2.1
Atingido o estado B, isola-se termicamente o sal (eliminando-se o contato) e
retira-se o campo magnético de forma adiabática, provocando uma redução na
temperatura do material. Sem qualquer variação na entropia, o sistema passa do estado
B para o estado C e atinge uma temperatura final (T
F
) menor do que a inicial (T
Q
). O
processo B-C é chamado de desmagnetização adiabática e a variação de temperatura
observada (
QFad
TTT = ) é conhecida como efeito magnetocalórico (EMC).
O EMC foi descoberto em 1881 pelo físico alemão Emil Warburg
[7]
(1846-1931),
quando percebeu que uma amostra de ferro pode se aquecer ao ser aproximada de um
forte ímã.
A proposta de Giauque e Debye do resfriamento magnético venceu o ponto morto
que havia impedido a aproximação ao zero absoluto durante cerca de vinte anos depois
da liquefação do hélio. Em teoria, o caminho para uma nova zona de “temperaturas
magnéticas” estava agora aberto, mas nada sabia se este caminho seria ou não
praticável. Sem saber que estiveram perto da solução do problema, Kamerlingh-Onnes e
Woltjer haviam preparado o material de trabalho mediante suas investigações com o
sulfato de gadolínio. Necessitava-se agora de quatro coisas que teriam que funcionar
bem ao mesmo tempo: uma temperatura inicial baixa; um imã potente; um interruptor
térmico; e sobre tudo, um isolamento térmico muito superior a dos empregados até
então.
Kamerlingh-Onnes havia demonstrado que era factível manter uma temperatura de
1K, ou ligeiramente inferior, durante muitas horas. O que realizou extraindo o vapor de
cima do hélio líquido em um vaso de Dewar pequeno. Este vaso estava rodeado por
outros que continham por sua vez hélio líquido em seu ponto de ebulição, hidrogênio
líquido e ar líquido. Para obter um campo magnético elevado teve de colocar o mais
perto possível dos pólos de um eletroímã potente. Por questões financeiras o eletroímã
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 11
foi substituído por um solenóide alimentado com uma corrente muito alta, que é uma
bobina isenta de núcleo, e eliminaram o calor produzido pela corrente elétrica (efeito
Joule) através de um fluxo de água.
O interruptor térmico é necessário para dissipar o calor de magnetização do sal
contido em hélio líquido a 1 K e logo após, isola-lo ao retirar do campo magnético. A
solução mais comumente empregada é a proposta por Dewar em sua demonstração do
vaso de vácuo. Dewar mostrou ao seu auditório seu vaso de duplas paredes, no qual o ar
líquido estava fervendo repousadamente porque se havia feito cuo no espaço
compreendido entre as paredes. Utilizando um vaso de vácuo empregou-se uma chave
através da qual se pode deixar entrar uma quantidade pequena de gás (hélio), e pela qual
se pode também efetuar vácuo, estabelecendo de novo o isolamento térmico.
Finalmente, é imperativo um bom isolamento térmico mediante um vácuo muito alto e a
adequada construção do criostato, em que se deve excluir toda radiação de calor no
espaço experimental por meio de superfícies refletoras.
Quando Giauque e Debye publicaram em 1926 seus primeiros informes sobre a
possibilidade de resfriamento magnético, Leiden havia deixado de ser o único
laboratório no mundo onde se dispunha de hélio líquido. Novos laboratórios de baixas
temperaturas começaram a estabelecer-se em vários países em todo mundo, havia
começado a corrida em busca de temperaturas inferiores a 1K. Transcorreram outros
sete anos até que se realizou com êxito o primeiro resfriamento magnético.
Giauque ganhou a corrida, e Debye, que era teórico, estava de todo modo à
margem nisto. Em 12 de abril de 1933, Giauque, em colaboração com MacDougall
[5]
,
informou sobre sua primeira série de três experimentos realizados na Universidade da
Califórnia. Havia empregado 61 g de sulfato de gadolínio (
(
)
OHSOGd
2
2
42
8 ) e
desmagnetizando sua amostra a uma temperatura inicial de 3,4 K, alcançando 0,53 K
em 19 de março. Animado pelo êxito inicial, melhorou o sistema de bombeamento de
hélio líquido do criostato e em 8 de abril desmagnetizou sua amostra desde 2 K e
conseguiu chegar a 0,34 K. No dia seguinte realizou um ensaio ainda melhor, partindo
de 1,5 K, que conduziu a uma temperatura final de 0,25 K, utilizando para isso uma
variação de campo magnético de 8000 G. As temperaturas foram determinadas
experimentalmente através da medida da susceptibilidade magnética da amostra e da
extrapolação da lei de Curie.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 12
O resfriamento magnético havia se tornado uma realidade e nestes primeiros
experimentos a temperatura mais baixa obtida com hélio líquido havia se reduzido a
outra três vezes menor.
Somente um mês mais tarde o laboratório de Leiden, chamado agora Laboratório
Kamerlingh-Onnes em homenagem ao seu fundador, informou sobre o primeiro
resfriamento, em que se alcançou uma temperatura de 0,27 K. O experimento de Leiden
havia sido realizado com fluoreto de cério (
3
CeF ), outro sal muito caro. Um ano depois,
o laboratório de baixas temperaturas estabelecido em Oxford começou seus trabalhos
sobre o resfriamento magnético, foi escolhido o alume de ferro e amônio. Outra
característica deste experimento era que pela primeira vez iria esfriar uma segunda
substância. Alguns anos depois começaram em Cambridge os experimentos de
desmagnetização, e depois da guerra um grande número de laboratórios de todo mundo
também inicializaram seus trabalhos neste campo. No principio se concedeu a máxima
importância à investigação dos sais empregados neste processo, gradualmente
aumentaram o número de substâncias que haviam atingido temperaturas magnéticas.
Nos anos 50 o resfriamento magnético havia se convertido em uma técnica corrente que
não apresentava grandes dificuldades, abrindo uma zona de temperaturas de milésimos
de graus acima do zero absoluto.
O tempo durante o qual seriam possíveis observações depende do acesso de calor
ao sal. Nos primeiros experimentos (1933), Giauque havia sido capaz de manter
temperaturas muito baixas durante várias horas. A importância deste acontecimento foi
manifesto quando no primeiro experimento realizado em Leiden, um mês mais tarde,
não foi possível manter a baixa temperatura mais que alguns minutos. Nos anos
seguintes se trabalhou muito nos vários laboratórios para aperfeiçoar o isolamento
térmico do sal, e foi possível reduzir o acesso de calor a
8
10
watts.
Pequenas quantidades de calor, de grande importância nestes experimentos,
proporcionavam uma estranha perturbação que preocupou durante muito tempo os
primeiros experimentadores. Frequentemente parecia que o calor penetrava na amostra
de sal através de alguma fonte desconhecida. O aquecimento era suficientemente grande
para impedir a exatidão dos resultados, portanto era necessário localizá-lo. O que era
desconcertante nesta perturbação é que se produzia espontaneamente e que em geral
parecia ser mais intensa durante o dia do que a noite. A pista final foi proporcionada
pelo fato de que o aquecimento parecia mais prejudicial quando estavam funcionando
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 13
na proximidade das bombas mecânicas do criostato. Esta pista foi seguida até os finos
fios de náilon, que sustentavam o sal suspenso para reduzir a condução de calor. Os
choques mecânicos e a maquinaria em movimento, que se produzia com mais
freqüência durante o dia, faziam vibrar os fios, e o calor produzido pelos fios ao vibrar
era suficiente para fraudar o experimento. A perturbação desapareceu quando se
empregaram suportes rígidos.
O limite final do resfriamento que se pode obter mediante a desmagnetização de
um sal paramagnético depende não somente da temperatura inicial e do campo
magnético empregando, mas sobre tudo das propriedades magnéticas do refrigerante.
Este limite está estabelecido pela brusca queda na curva da entropia em campo zero.
Esta queda se deve ao efeito mútuo dos spins a uma temperatura tão baixa que as
vibrações térmicas são demasiadamente débeis para impedir que os spins formem um
modelo ordenado. O problema é de novo muito similar ao do resfriamento de um gás
em uma máquina de expansão. Ali também, conforme se reduz a temperatura, as
interações das forças de coesão se tornam predominantes e o gás começa a liquefazer.
Isto significa necessariamente que se faz impossível conseguir um resfriamento maior
mediante a expansão de um gás.
A analogia entre o resfriamento por expansão e o magnético é ainda maior. Uma
máquina de expansão que empregue hidrogênio permitirá resfriar a temperaturas
inferiores a uma que utilize ar, porque o ponto de ebulição do hidrogênio é inferior ao
do ar. Podem-se obter temperaturas mais baixas ainda mediante uma máquina de hélio.
Com os sais paramagnéticos acontece o mesmo, a interação entre os spins acontece em
temperaturas diferentes para substâncias distintas. Por exemplo, a queda rápida de
entropia no sulfato de gadolínio acontece aproximadamente a 0,2 K, no alume de
ferro e amônio é a aproximadamente 0,05 K, e para o nitrato de magnésio e cério é de
aproximadamente 0,003 K. Este último valor pode ser tomado como o limite inferior do
resfriamento paramagnético.
A maioria das investigações de uma segunda substância, resfriada abaixo de 1 K
mediante a desmagnetização de um sal, foram efetuadas como continuação das
observações realizadas acima de 1 K. Como exemplo a forte anomalia apresentada pelo
hidrogênio sólido em seu calor específico. O resfriamento magnético proporcionou uma
possibilidade de seguir estudando este fenômeno a temperaturas muito mais baixas. De
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 14
forma análoga foi revelada uma supercondutividade em muitos outros metais, assim
como novas características do estranho comportamento do hélio líquido.
Em certo aspecto o resfriamento magnético conduziu a um fenômeno totalmente
novo: a orientação dos núcleos atômicos. O mesmo que acontece com os elétrons
acontecem com as partículas nucleares, os prótons e nêutrons também apresentam spins
que conferem um momento angular intrínseco aos núcleos atômicos. Era de se esperar
de outras observações e de considerações teóricas, que a radiação emitida por um núcleo
radioativo possa ser produzida em direções definidas com respeito a seu eixo de rotação.
Em condições normais os eixos dos spins dos núcleos isolados apontam
randomicamente em todas as direções, e não se observa nenhum efeito direcional na
radiação. Se, por outra parte, todos os eixos dos núcleos apontarem para a mesma
direção, então a radiação também será emitida em direções bem definidas. Este
alinhamento dos núcleos pode obter-se fazendo uso do efeito magnético do spin: seu
momento magnético. Devido ao tamanho das partículas nucleares seu momento
magnético é aproximadamente mil vezes menor que dos elétrons, e este fato acarreta
que seja muito mais difícil alinha-los, inclusive nas temperaturas mais baixas obtidas.
Apesar das grandes dificuldades experimentais inerentes a este método, ele tem
sido aplicado com algum êxito. A existência do paramagnetismo devido aos spins
nucleares foi descoberta em 1936 pelos físicos rusos, Shubnikov e Lazarev, que
trabalhavam em Kharkov. É evidente que com o êxito do resfriamento magnético por
meio dos spins dos elétrons seria possível um maior resfriamento mediante a
desmagnetização dos spins nucleares. Na verdade, a possibilidade do resfriamento
nuclear foi discutida pela primeira vez em meados dos anos trinta por Gorter (1934) em
Leiden e por Kurti e Simon (1935) em Oxford. Em princípio o método é muito simples,
não sendo mais que uma repetição do que se havia realizado com os spins dos
elétrons nos sais paramagnéticos, no entanto, a temperaturas mais baixas. Porém, sua
aplicação prática acarreta enormes dificuldades devido à baixa intensidade dos spins
nucleares. Além de resfriar a substância nuclear empregada até aproximadamente 0,01
K, por meio de um sal paramagnético desmagnetizado, também é preciso isolá-la
termicamente deste sal e desmagnetizar esta substância nuclear em um campo
magnético muito intenso.
Com os limitados meios disponíveis para a investigação ao final dos anos trinta
havia pouca esperança de se realizar um projeto tão ambicioso, mas ao final dos anos
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 15
quarenta as coisas começaram a apresentar um cenário mais esperançoso. Sir Francis
Simon realizou em Oxford grandes esforços para reunir o equipamento necessário e, em
união com Kurti e seus colaboradores, dedicou-se a árdua tarefa de preparar o
experimento. Posteriormente, em 1956, pouco antes de sua morte, Simon teve a
satisfação de ver o êxito de seu experimento. A temperatura registrada foi inferior a
0,000016 K.
Esta temperatura incrivelmente baixa só pode ser obtida durante um instante,
aproximadamente um minuto depois o refrigerante nuclear se havia aquecido de novo
até a temperatura que se havia iniciado a desmagnetização. Isto ocorreu devido à
estranha situação que a amostra tenha simultaneamente duas temperaturas distintas:
0,000016 K para os spins nucleares e 0,02 K para os elétrons e a rede. Logo, o
intercâmbio gradual de energia entre os spins e o resto da substância aquece de novo os
spins até a temperatura inicial. Pouco a pouco se havia esclarecido que, além das
grandes dificuldades previstas, no caminho do resfriamento nuclear ainda existiam
inumeráveis obstáculos.
Posteriormente ao trabalho de N. Kurti em 1956, o grupo de Lounasmaa, Helsinki,
desenvolveu um trabalho notável neste domínio, tendo aberto um novo campo de
investigação na área do magnetismo nuclear. Com as técnicas desenvolvidas
consegue-se reduzir a temperatura dos spins nucleares (não dos átomos) a valores da
ordem de picoKelvins, tendo-se descoberto, por exemplo, que o cobre se torna
antiferromagnético ao nível dos momentos nucleares para 75=<
N
TT nK (1983), e do
mesmo modo para a prata, com
560
T pK (1991). Até 2004, a temperatura mais baixa
obtida para um condensado de Bose-Einstein era de 450 pK. Esta façanha foi realizada
por Wolfgang Ketterle e colegas do MIT (A Leanhardt et al. 2003 Science 301 1513). A
mais baixa temperatura obtida foi de 250 pK, durante uma experiência de
ordenamento magnético nuclear no Laboratório de Baixas Temperaturas da
Universidade de Tecnologia de Helsinki.
Paralelamente ao desenvolvimento das técnicas criogênicas, a história dos
refrigeradores domésticos também se desenrolava
[6]
. As técnicas de resfriamento
evoluíram bastante até o século XIX, quando as primeiras máquinas térmicas foram
construídas. Em 1805, o inventor americano Oliver Evans (1755-1819) projetou a
primeira máquina por evaporação de éter, processo em que essa substância absorve
calor do material a ser resfriado e o dissipa no ambiente. A última grande inovação,
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 16
porém, veio em 1834, quando o americano Jacob Perkins (1766-1849) criou a máquina
a compressão de vapor, utilizando éter sulfúrico, técnica utilizada até hoje.
Os atuais refrigeradores comerciais funcionam com base na compressão e
descompressão de um s. O gás usado geralmente é o freon, nome dado a compostos
de cloro, flúor e carbono (os chamados CFCs) ou hidrogênio, cloro, flúor e carbono (os
HCFCs). No entanto, tais gases são apontados como os principais responsáveis pela
destruição da camada de ozônio, além de contribuir para o efeito estufa.
A crescente conscientização da sociedade em relação ao risco ambiental do uso
dos freons tem impulsionado a busca de métodos alternativos de refrigeração, e uma das
abordagens promissoras é a que se baseia no EMC. Além de dispensar o uso de gases
poluentes, a refrigeração magnética é produzida com menor perda de energia, atingindo
uma eficiência de 50 % a 60 %, enquanto os refrigeradores comerciais não ultrapassam
40 %.
Em 1976, G. V. Brown idealizou um refrigerador magnético usando como
refrigerante o gadolínio, capaz de funcionar na faixa de temperatura dos refrigeradores
comerciais. Com esse equipamento, a temperatura poderia ser reduzida de 319 K para
272 K. O trabalho de Brown deu o primeiro passo para a exploração comercial dessa
técnica.
1.2. Considerações Teóricas
Quando um material magnético é sujeito a uma mudança de campo magnético
IF
HHH =
(os subscritos F e I indicam as intensidades do campo magnético Final
e Inicial) permanecendo a pressão constante, dois processos diferentes podem ocorrer
no material magnético.
O primeiro é um processo isotérmico que ocorre quando impomos um campo
magnético a um material magnético que permanece em contato com o ambiente
(reservatório de calor) e, portanto, permanece a temperatura constante. A entropia deste
sólido magnético é então mudada por
(
)
(
)
T
HHHM
IF
TSTSTS )()( =
1.2.1
e
(
)
H
M
TS
é convencionalmente chamado de variação de entropia magnética.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 17
O segundo é um processo adiabático que ocorre quando o campo magnético é
modificado, mas o material está isolado do ambiente e, portanto, a entropia total do
sólido deve permanecer constante. A temperatura de um material magnético varia por
(
)
(
)
S
HHHad
IF
STSTTT )()( =
1.2.2
e
(
)
H
ad
TT
é convencionalmente chamado de variação de temperatura adiabática.
Neste processo de submeter um material magnético a uma mudança de campo
magnético externo, a entropia associada com os graus de liberdade magnéticos,
chamada entropia magnética
M
S
, sofre mudanças. Sob uma condição adiabática, ou
seja, a entropia total do sistema permanece constante,
M
S
deve ser compensada por
uma variação de mesma intensidade, mas oposta. Esta variação de entropia surge no
grau de agitação das moléculas do material, acarretando uma mudança em sua
temperatura. Tal mudança de temperatura,
ad
T , é frequentemente chamada de efeito
magnetocalórico.
Figura 1.8. Ilustração do EMC: um material magnético em contato com um termômetro
que indica um aumento na temperatura da amostra quando influenciada por um campo
magnético.
Para descrevermos estes dois processos matematicamente utilizamos a primeira lei
da termodinâmica para mudanças reversíveis em sistemas magnéticos:
MdHTdSMdHdQdU
=
=
,
1.2.3
onde foi desprezado qualquer trabalho mecânico.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 18
A relação de Maxwell obtida diretamente da energia interna representada na
equação 1.2.3 é:
HS
S
HSM
H
HST
=
),(),(
.
1.2.4
Introduzindo o calor específico a campo constante
(
)
H
TSTHTC =),(
podemos reescrever esta última como segue:
HHHS
T
M
HTC
T
T
S
T
T
M
T
H
T
=
=
),(
.
1.2.5
Por fim, a variação de temperatura em um processo isobárico e adiabático devido
à mudança do campo magnético pode ser integrada numericamente usando valores
experimentais ou predições teóricas da magnetização e do calor específico, e assim
chegamos a equação que descreve a variação de temperatura adiabática em termos de
parâmetros mensuráveis:
( )
dH
T
HTM
HTC
T
TT
H
H
H
H
H
ad
F
I
=
),(
),(
.
1.2.6
Se a magnetização e a entropia são ambas funções continuas da temperatura e do
campo magnético, então a mudança infinitesimal de entropia magnética em um
processo isobárico e isotérmico pode ser relacionada com a magnetização (M), a
intensidade do campo magnético (H), e a temperatura absoluta (T). Efetuando uma
transformação de Legendre definimos a energia livre através de
TSUF
=
.
Diferenciando esta última e usando a equação 1.2.3, obtemos a diferencial total:
MdHSdTdF
=
.
1.2.7
De 1.2.7 segue a relação de Maxwell
(
)
(
)
H
T
M
T
HTM
H
HTS
=
,
,
.
1.2.8
Integrando a equação 1.2.8 obtemos:
( )
=
F
I
H
H
H
H
M
dH
T
HTM
TS
),(
.
1.2.9
Ambas as equações 1.2.6 e 1.2.9, para
Had
TT
)( e
HM
TS
)(
respectivamente,
são dependentes da temperatura absoluta e da variação de campo magnético, como
conseqüência são usualmente estudadas e reportadas como função da temperatura em
um dado
H
, ou como funções de
H
para uma dada temperatura. O comportamento
de ambos os processos característicos do efeito magneto calórico são dependentes do
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 19
material, não podendo ser preditos facilmente de primeiros princípios e, portanto,
devem ser medidos experimentalmente.
É de suma importância esclarecer que ambas as equações 1.2.6 e 1.2.9 descrevem
e caracterizam o efeito magnetocalórico em termos de parâmetros mensuráveis em
laboratório, a saber, magnetização e o calor específico como funções da temperatura e
do campo magnético.
Para medidas experimentais da magnetização realizadas em intervalos discretos de
campo magnético e de temperatura,
HM
TS
)(
pode ser calculado aproximadamente
pela seguinte expressão:
( )
(
)
(
)
H
TT
HTMHTM
TS
i
ii
iiii
H
M
=
+
++
1
11
,,
1.2.10
em que
(
)
HTM
ii
,
11 ++
e
(
)
HTM
ii
, representam os valores da magnetização no campo H
e nas temperaturas
1+i
T e
i
T , respectivamente.
Por outro lado, a variação de entropia magnética pode ser obtida mais diretamente
através de medidas calorimétricas da dependência do calor específico com o campo
magnético como segue:
( )
(
)
(
)
Td
T
HTCHTC
TS
T
HM
=
0
12
,,
1.2.11
onde
(
)
2
,HTC
e
(
)
1
,HTC
são os valores do calor específico medidos sob os campos
2
H
e
1
H
, respectivamente.
Tendo em vista os dois processos que descrevem o efeito magnetocalórico, surge a
questão: em termos de aplicações tecnológicas, qual das duas descrições,
Had
TT
)(
ou
HM
TS
)(
, é mais conveniente para a caracterização de determinada amostra? A
resposta se encontra em um coeficiente chamado de capacidade de refrigeração que está
intimamente ligado com a eficiência de uma máquina térmica construída com esta
amostra. A capacidade de refrigeração (q) é uma característica intrínseca da substância
que pode ser usada como refrigerante em um refrigerador, e é caracterizada
diretamente pela mudança de entropia magnética do sólido como segue
dTTSq
T
T
HM
=
2
1
)(
,
1.2.12
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 20
a qual indica quanto calor pode ser transferido de uma fonte fria (
1
T
) para a fonte quente
(
2
T
) do refrigerador em um ciclo termodinâmico ideal. Logo, a capacidade de
refrigeração de determinado material nada mais é que a área debaixo da curva da
variação de entropia magnética em função da temperatura.
Portanto,
HM
TS
)(
, é frequentemente mais usada para caracterizar o efeito
magnetocalórico de determinada amostra, pois pode ser aplicado diretamente na
equação 1.2.12 e daí ser conhecido o poder de refrigeração do material.
Por sua vez, a variação de temperatura adiabática caracteriza indiretamente tanto
a capacidade de refrigeração quanto a diferença de temperatura da fonte fria e quente do
refrigerador (geralmente um amplo
Had
TT
)( corresponde a uma alta capacidade de
refrigeração do material e uma larga faixa de temperatura para o refrigerador). Esta
caracterização indireta é devida ao fato de que uma mudança na curva de
Had
TT
)(
acarreta em uma correspondente mudança na curva de
HM
TS
)(
, e vice versa, assim, é
possível comparar a capacidade de refrigeração de materiais diferentes também através
da curva de variação adiabática de temperatura, conforme indicado da figura 1.9.
Figura 1.9. Forma das curvas de (a)
HM
TS
)(
e (b)
Had
TT
)( , para duas amostras
diferentes, mostrando a estreita relação entre estas duas representações do EMC. Se a área
abaixo da curva de
Had
TT
)( aumenta então há um correspondente aumento na área de
HM
TS
)(
, consecutivamente sabemos qualitativamente que a capacidade de refrigeração
aumenta, por esse motivo se diz que o gráfico de
Had
TT
)( caracteriza q indiretamente
[8]
.
O comportamento do EMC convencional também pode ser caracterizado pelos
valores de
Tad
HT )( e/ou
TM
HS )(
como função de
H
para uma dada
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 21
temperatura, a qual é usualmente tomada no máximo EMC. Através do comportamento
destas funções notamos claramente que o EMC continua a aumentar com o respectivo
aumento de
H
, mas a razão com que varia é decrescente, isto é, o EMC específico
(
)
HdHTd
Tad
)( decresce. O comportamento universal observado em todos os
materiais ferromagnéticos magnetocalóricos é que o EMC específico
(
)
HdHTd
Tad
)( tem a maior intensidade para o mais baixo
H
, gradualmente
decrescendo com o aumento de
H
, isto indica que o EMC tem uma tendência de
saturar em campos magnéticos suficientemente elevados.
Ambas as equações que regem o EMC,
Had
TT
)( e
HM
TS
)(
, são
proporcionais a derivada da magnetização com respeito à temperatura, mantendo o
campo magnético constante (equações 1.2.6 e 1.2.9). Obviamente, o EMC é maior
quando
(
)
H
TM é grande, e ),( HTC é pequeno na mesma temperatura. Esta
condição é verdadeira para materiais paramagnéticos próximos a temperatura de zero
Kelvin, uma vez que a susceptibilidade magnética diverge e o calor específico tende a
zero. Esta é a razão porque a primeira realização da refrigeração magnética, por
Giauque, foi a baixas temperaturas. Porém, em altas temperaturas, como a ambiente, o
calor específico é geralmente elevado. Assim, nestas temperaturas devemos nos
concentrar em encontrar uma grande mudança na magnetização, para que o EMC seja
relevante.
Portanto, é de se esperar que qualquer material possa ter a maior variação tanto de
Had
TT
)( quanto
HM
TS
)(
quando sua magnetização muda rapidamente com a
temperatura, isto é, nas vizinhanças da temperatura de uma transição de fase magnética
ordem-desordem. O EMC decresce gradualmente tanto abaixo quanto acima da
temperatura de transição. Assim, um intenso EMC é esperado na região de uma
transição de fase magnética, e o efeito pode ser maximizado quando o parâmetro de
ordem da transição magnética muda intensamente dentro de um estreito intervalo de
temperatura. O que é verdade para transições de fase de primeira ordem.
A maioria das transições de fase magnética são de segunda ordem, por outro lado,
em uma visão aplicada o interesse em transições de primeira ordem está diretamente
relacionado com o fato de que aplicando um campo magnético relativamente pequeno
podemos induzir uma intensa mudança na entropia, devido ao fato de possuir uma certa
quantia de calor latente. No entanto, em qualquer transição de primeira ordem também
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 22
ocorre histerese (térmica ou magnética), a qual deveria ser suficientemente pequena
para aplicações.
É digno de nota que, embora a avaliação de
TM
HS )(
através de medidas da
magnetização usando a equação 1.2.10 tem sido usada como uma ferramenta para uma
rápida avaliação do potencial magnetocalórico dos materiais, uma comparação precisa
do EMC entre os materiais existentes pode ser realizada somente pela avaliação de
Had
TT
)( ao invés de
TM
HS )(
. Isto ocorre devido ao fato de a magnitude do calor
específico poder ser muito diferente de uma família de materiais magnetocalóricos para
outra, por exemplo, o calor específico das ligas baseadas em Gd é muito inferior ao dos
materiais manganitas
[12]
.
1.2.1. Eficiência de Resfriamento Magnético
No ano de 2000, Gschneider e Pecharsky
[8]
sugeriram um novo parâmetro para
caracterização de propriedades magnetocalóricas e determinação de um material
magnético satisfatório para trabalhar em um refrigerador magnético, o qual leva em
conta não somente o valor máximo do EMC (
Had
TT
)( e
HM
TS
)(
), mas também a
largura das curvas
Had
TT
)( e
HM
TS
)(
.
Propuseram que, no caso de um comportamento convencional do EMC, em que
somente uma transição de fase de ordenamento magnético, a eficiência na refrigeração
magnética de determinada amostra pode ser avaliada considerando a máxima magnitude
de
Had
TT
)( ou
HM
TS
)(
e sua largura a meio máximo (
FWHM
T
δ
, do inglês, full-
width at half maximum). Estabeleceram, portanto, o parâmetro que chamaram de
potência de resfriamento relativa (RCP, do inglês, relative cooling power), que é
expresso por:
(
)
FWHMHM
TTSSRCP
δ
.)(
= ,
1.2.13
este é o RCP baseado na variação de entropia magnética. Um exemplo é mostrado na
figura 1.10.
Similarmente, o produto da máxima variação de temperatura adiabática
Had
TT
)( e sua largura a meia altura
FWHM
T
δ
é expresso por:
(
)
FWHMHad
TTTTRCP
δ
. )(
=
1.2.14
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 23
o qual é chamado de RCP baseado na variação de temperatura adiabática. A dimensão
deste parâmetro é K
2
e não tem significado físico, mas pode ser útil em comparações
numéricas de diferentes materiais magnetocalóricos, especialmente quando não se tem
valores de
HM
TS
)(
disponíveis. Um grande valor de RCP(T) para uma mesma
variação de
H
geralmente indica um material melhor. O aumento de
H
frequentemente acarreta em um respectivo aumento dos máximos (
HM
TS
)(
e/ou
Had
TT
)( ) e de
FWHM
T
δ
.
Figura 1.10. Um exemplo da avaliação do
RCP(S)
baseado na dependência da variação
de entropia magnética pela temperatura para uma amostra de
305,025,07,0
MnOSrCaLa
[12]
.
Em seu trabalho, Gschneider e Pecharsky
[8]
discutem a validade deste parâmetro
em comparação com a capacidade de refrigeração (q) para dados de uma amostra de
gadolínio entre 276 e 315 K, sob uma variação de campo de 2 T (figura 1.11). O valor
da capacidade de refrigeração obtido é aproximadamente o valor de RCP(S)
multiplicado por 3/4, com uma diferença de menos de 2%.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 24
Figura 1.11. EMC no Gd. Em (a) temos o gráfico de
HM
TS
)(
no qual é indicado
M
S
máxima e
FWHM
T
δ
para o cálculo de RCP(S), já em (b) temos o gráfico de
Had
TT
)( no
qual é indicado
ad
T máxima e
FWHM
T
δ
para o cálculo de RCP(T)
[8]
.
1.3. Métodos de Medida do Efeito Magnetocalórico
O EMC pode ser medido por técnicas diretas ou calculado através da medida da
magnetização ou calor específico como função da temperatura e do campo magnético,
constituindo assim uma técnica indireta. As técnicas diretas e indiretas apresentam tanto
vantagens como desvantagens
[8,9]
.
As técnicas diretas fornecem uma medida do EMC sujeito ao processo de
mudança adiabática de temperatura. Desde que a temperatura seja medida diretamente,
não será necessário um processamento dos dados, está envolvida apenas a subtração de
dois números. No entanto, medidas diretas são frequentemente demoradas além de
apresentarem dificuldades no tocante a resolução de pequenos passos de incremento do
intervalo entre as temperaturas. A possibilidade de uma análise de erros é difícil, e o
erro estimado é frequentemente baseado na comparação entre dados medidos usando
algum material padrão. Se o aparato que realiza a medida direta não é calibrado
corretamente, ou se o material não é isolado apropriadamente, erros experimentais
consideráveis tornam-se inevitáveis, especialmente se o valor de
Had
TT
)( é grande
(>10 K). Além disso, o campo magnético por definição deve variar tão depressa quanto
o possível e isso pode causar muitos problemas.
Ao contrário da medida direta do EMC, a qual fornece somente a mudança
adiabática de temperatura, as técnicas indiretas permitem calcular tanto
Had
TT
)(
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 25
quanto
HM
TS
)(
a partir dos dados experimentais do calor específico, ou somente
HM
TS
)(
dos dados experimentais da magnetização. As técnicas indiretas fornecem
resultados praticamente em qualquer intervalo de temperatura. Contudo, exige um
considerável processamento dos dados experimentais antes do EMC ser calculado. Por
outro lado, as técnicas indiretas permitem uma apurada análise dos erros contanto que a
precisão dos dados experimentais (capacidade calorífica ou magnetização) seja
conhecida.
1.3.1. Medidas Diretas
A técnica de medida direta do EMC sempre envolve a medida da temperatura da
amostra (
I
T
e
F
T
) no campo magnético
I
H
e
F
H
(os subscritos I e F representam
Inicial e Final). A variação adiabática de temperatura é determinada como a diferença
(
)
(
)
S
IF
H
Iad
TTTT =
1.3.1
para um dado
I
T
e
H
. O EMC é usualmente medido enquanto se aplica o campo
magnético e o resultado é reportado como função da temperatura inicial para um dado
H
.
Medidas diretas do EMC podem ser realizadas usando contato (quando o sensor
de temperatura está em contato térmico com a amostra) e não usando contato (quando a
temperatura é medida sem o sensor estar em contato direto com a amostra). Durante a
medida da técnica direta geralmente se requer uma rápida mudança do campo
magnético, isto pode ser feito imobilizando a amostra enquanto o campo magnético
varia, ou por mover a amostra dentro e fora de um volume de campo magnético
uniforme. A precisão experimental das técnicas diretas depende dos erros na
termometria, erros no processo de submeter à amostra ao campo, a qualidade do
isolamento térmico da amostra (esta se torna uma fonte crítica de erros quando o EMC é
elevado e rompe com a condição adiabática), e a qualidade do circuito que elimina o
efeito da mudança do campo magnético no sensor de temperatura. Considerando todos
estes efeitos a precisão pode estar comprometida entre uma faixa de 5 a 10% de erros
[8,9]
.
Um dos métodos de medida direta sem contato é o termoacústico, proposto
primeiramente por Otowski
et al.
(1993)
[10]
e aprimorada posteriormente por Gopal
et
al.
em 1995
[11]
. Baseia-se na técnica fotoacústica e consiste em colocar a amostra que
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 26
apresente o EMC em uma câmara (célula) acústica fechada contendo um gás. Ao
aplicarmos um campo magnético sobre a amostra, através dos mecanismos já citados,
provocamos um aumento na sua temperatura (figura 1.12).
Figura 1.12. Sob influência de um campo magnético a amostra se aquece.
O calor liberado neste processo se difunde da amostra para o gás contido em suas
imediações, provocando uma pequena variação na temperatura deste gás e uma
conseqüente onda de pressão se forma. Retirando o campo magnético, a amostra esfria,
e repetindo este procedimento outra onda acústica se formará, se este processo é
efetuado rapidamente, podemos considerar que o ciclo é aproximadamente adiabático
(figura 1.13). Assim, utilizando um campo magnético alternado, produzimos ondas
acústicas que podem ser detectadas por um microfone de alta sensibilidade, e
amplificadas em um amplificador síncrono lock-in, o qual apresenta uma alta relação
sinal/ruído.
Figura 1.13. Utilizando um campo magnético alternado, produzimos ondas acústicas
que podem ser detectadas por um microfone de alta sensibilidade.
1.3.2. Medidas Indiretas através da Magnetização
Medidas experimentais da magnetização como função da temperatura e do campo
magnético, depois de uma integração numérica direta da equação 1.2.9, provê
HM
TS
)(
(equação 1.2.10) e seu erro experimental depende dos erros na temperatura,
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 27
momento magnético, e do campo magnético. Os erros acumulados em
HM
TS
)(
calculados dos dados da magnetização podem estar na faixa de 20 a 30%
[8,9]
.
1.3.3. Medidas Indiretas através da Capacidade Térmica
A medida da capacidade térmica a pressão constante como função da temperatura
em um campo magnético constante, ),( HTC provê a mais completa caracterização de
um material magnético sólido com respeito a seu efeito magnetocalórico, desde que a
entropia total de um sólido magnético possa ser calculada da capacidade calorífica como
+
=
T
HH
SdT
T
HTC
TS
0
,0
),(
)(
1.3.2
em que H é constante podendo ser
I
H
ou
F
H
,
H
S
,0
é a entropia na temperatura zero.
Em um sólido,
H
S
,0
é a mesma independente do campo magnético aplicado e, portanto,
pode ser desprezada.
Uma vez tendo estabelecido as funções da entropia total,
I
H
TS )(
e
F
H
TS )(
, o
cálculo tanto de
Had
TT
)( quanto de
HM
TS
)(
torna-se direto:
(
)
(
)
T
HH
H
M
IF
TSTSTS )()(
=
;
1.3.3
(
)
(
)
S
HH
H
ad
IF
STSTTT )()(
.
1.3.4
Geralmente, a precisão do EMC calculado da capacidade calorífica é muito
melhor do que das outras técnicas (direta ou indireta por magnetização) a baixas
temperaturas. Porém, próximo a temperatura ambiente, devido a acumulação de erros
experimentais nas funções de entropia total, os erros no EMC se tornam os mesmos que
antes, 20 a 30 %
[8,9]
.
1.3.4. Medidas Indiretas através da Resistividade
Em manganitas o EMC e o efeito magnetoresistivo colossal (CMR) são
observados na temperatura característica de uma transição de fase de ordenamento
magnético, isto é, a na temperatura de Curie, e este fato, evidentemente, sugere que
existe uma relação definida entre entropia magnética e resistividade
[12]
. Neste caso,
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 28
Xiong e co-autores
[13]
propuseram um novo método que permite avaliar a relação entre
a entropia magnética e a resistividade (
ρ
) de materiais manganitas através de:
(
)
=
H
H
HM
dH
T
TS
0
ln
)(
ρ
α
1.3.5
com gemu /72,21=
α
.
É claro da equação 1.3.5 que um grande valor de
α
acarreta numa maior
sensibilidade para a dependência de
HM
TS
)(
por
ρ
. Esta relação é válida somente
em um estreito intervalo de temperatura, onde a transição de fase magnética de
ordenamento ocorre. De forma geral, a equação 1.3.5 fornece um método alternativo
para a determinação da variação de entropia magnética em materiais manganitas através
da resistividade.
1.4. Materiais Magnetocalóricos
A refrigeração magnética foi empregada com grande sucesso em resfriamento
abaixo de 1 K usando sais paramagnéticos (
(
)
OHSOGd
2
2
42
8 ), como visto
anteriormente na recapitulação histórica do EMC, mas sua aplicação em temperaturas
em torno da ambiente ainda não estão comercialmente disponíveis. As limitações
tecnológicas para termos um refrigerador magnético em nossas casas não são mais um
problema de engenharia de refrigeração, mas sim de ciência dos materiais. Ainda não se
conhece um composto magnético barato e bom condutor térmico que seja eficiente em
uma grande faixa de temperatura ambiente (entre -20 ºC e 40 ºC).
O metal gadolínio (elemento lantanídeo), por exemplo, tem EMC máximo em
torno de 21 ºC, e foi usado em alguns protótipos de refrigerador. Ao se aplicar 2 tesla
de campo magnético a 1 kg de Gd consegue-se uma alteração de temperatura de 5,6 ºC,
em um processo adiabático. Em um processo isotérmico, pode-se fazer com que ele
troque com o reservatório térmico cerca de 360 calorias. O gadolínio e suas ligas com
outros metais seriam um excelente material para refrigeradores domésticos se não
fossem tão caros: um quilo do metal 99,9 % puro pode custar US$ 6.500
[6]
. O preço,
porém, não é o único obstáculo. Metais lantanídeos oxidam com facilidade, alterando
seu potencial magnetocalórico.
Tendo em vista as dificuldades envolvidas no uso do Gd, as pesquisas no campo
de resfriamento magnético estão focadas na descoberta de novos materiais que sejam
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 29
baratos e que apresentem um grande EMC. Nessa busca, um acontecimento notável
ocorreu em 1997, quando Gschneider e Pecharsky descobriram um efeito
magnetocalórico gigante (EMCG) na liga Gd
5
Si
2
Ge
2
, sendo duas vezes maior do que no
Gd. Esta liga permite não somente uma melhora na eficiência em refrigeradores
magnéticos em larga escala, mas também abre as portas para pequenas aplicações, tais
como ar condicionado de casas e carros
[12]
. No entanto, a temperatura de Curie desta
liga é aproximadamente 276 K, a qual é bem inferior a do Gd (294 K), tornando difícil a
utilização desta liga em refrigeradores magnéticos a temperatura ambiente. Neste
contexto, muito esforço tem sido dispensado na busca de outros materiais que
apresentem EMCG, especialmente materiais sem a presença de elementos terras-raras.
Estão sendo estudados também compostos de lantanídeos, diferentes dos baseados
em gadolínio-silício-germânio, com semimetais ou metais de transição, como lantânio-
ferro-cobalto-silício e lantânio-ferro-silício-hidrogênio, entre outros. Todas essas
combinações apresentam, em certo grau, os problemas mencionados acima, porém, são
um pouco mais baratas. Um quilo desses compostos custa em média US$ 1.300, com
exceção do Gd-Si-Ge, que se aproxima do preço do Gd puro (os valores podem cair nas
compras em grande escala, mas a proporção entre os preços pouco mudaria)
[6]
.
Outra classe de compostos em estudo é a dos semimetais e metais de transição
sem lantanídeos, como níquel-manganês-gálio, também com preço dio de US$
1.300/kg. Em torno de 27 ºC, temperatura com máximo EMC para estes compostos, 1
kg de Ni-Mn-Ga é capaz de retirar até 452 calorias de um reservatório térmico. Em
contrapartida, essa excelente eficiência é limitada a apenas 2 ºC em torno da
temperatura de máximo EMC, reduzindo drasticamente o poder de resfriamento relativo
(RCP). Alguns compostos, como o manganês-arsênio-antimônio (cerca de US$
2.600/kg), são tóxicos demais para uso doméstico.
Um material que atrai a atenção de pesquisadores são as manganitas, ou óxidos de
manganês. Essas substâncias têm interessantes propriedades, como a capacidade de se
tornarem condutoras ou isolantes dependendo de estarem ou não sob ação de um campo
magnético. Sua principal vantagem é o baixo custo (cerca de US$ 130/kg), além de
pouco reagir com o oxigênio do ambiente, pois são óxidos. Seu poder de
resfriamento, contudo, é cerca de metade do obtido para Gd puro, além de possuírem
baixa condutividade térmica
[6,12]
.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 30
No tocante a eficiência, temperatura de Curie do material e seu custo, Mário Reis
(2005)
[6]
apresentou um gráfico qualitativo que resume as características de alguns
materiais que têm sido estudados recentemente (figura 1.14). Porém, Reis não informou
a estequiometria das amostras, muito menos indicou a variação de campo magnético
aplicado nas amostras, tratando-se, portanto, apenas um gráfico ilustrativo, não sendo
possível uma real comparação dos materiais.
Figura 1.14. Gráfico que resume as características de alguns materiais que têm sido
estudados recentemente. O RCP versus temperatura de Curie é apresentado em classes
de materiais diferentes, agrupados por uma escala qualitativa comparativa de custo
[6]
.
1.4.1 Critério de seleção para refrigerantes magnéticos
Conforme o exposto acima, se descobriram muitos materiais magnéticos que
apresentam um EMC consideravelmente alto e num amplo intervalo de temperaturas.
No entanto, em termos de aplicações em refrigeradores, o material não basta apenas
apresentar uma alta variação de entropia magnética, ou um alto RCP. Existem outros
requisitos que fazem de um material magnético um bom candidato a ser utilizado como
substância refrigerante.
Em termos de análises teóricas e da natureza magnetocalórica dos materiais
existentes, o critério para seleção de um refrigerante magnético é dado pelas seguintes
características
[8,12]
:
Possuir um EMC tão grande quanto possível, sobre uma ampla faixa de
temperatura permitindo altos valores de capacidade refrigerativa e amplos
intervalos de temperatura de trabalho;
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 31
Apresentar uma pequena entropia de rede, isto é, uma alta temperatura de
Debye;
Mínima histerese térmica (isto está relacionado com a reversibilidade do EMC
de um refrigerante magnético) e mínima histerese magnética (o que está
relacionado a eficiência de um refrigerante magnético), permitindo assim, uma
alta freqüência de operação e, consecutivamente, grande capacidade
refrigerativa;
Ter baixo calor específico e alta condutividade térmica, assegurando uma grande
variação de temperatura e uma rápida transferência de calor, efetivando as trocas
térmicas;
Alta resistividade elétrica minimizando as perdas por correntes de Foucault;
Alta estabilidade química e um processo simples de síntese da amostra;
Boas propriedades mecânicas que facilitem o processo de manufatura;
Baixo custo do material e da fabricação, viabilizando a produção comercial;
Não ser tóxico para uso doméstico, caso contrário deixaria de ser uma tecnologia
limpa e amigável ao ambiente e, portanto, deixaria de ser uma opção aos atuais
refrigeradores comerciais a base de compressão e descompressão de um gás.
Além dessas características, o material magnético a ser utilizado comercialmente
deverá ter as seguintes propriedades em adição as anteriores
[15]
:
Possuir transição estrutural de primeira ordem;
Conter um dos elementos da série dos lantanídeos, provavelmente o Gd, e ter
50% ou mais de átomos magnéticos, diminuindo a massa de inatividade térmica
do sólido;
Seja ferromagnético para minimizar perdas de entropia interna no realinhamento
dos spins em ferrimagnéticos, anti-ferromagnéticos, spin glasses, etc;
Ter alta densidade gravimétrica, sendo capaz de obter o máximo efeito num
pequeno volume;
Provavelmente será um material cristalino, não nanoestrutural ou amorfo.
1.4.2 Comparação entre os diferentes materiais magnetocalóricos
Dentre os vários materiais magnéticos pesquisados atualmente em busca do
material ideal, os mais promissores são constantemente estudados em todo o mundo.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 32
Neste contexto, Ekkes Brück
[14]
publicou em 2005 um artigo de revisão onde
sumarizou algumas das ligas mais relevantes, incluindo os compostos baseados em
Gd
5
(Si,Ge)
4
, La(Fe,Si)
13
, MnAs, Ni-Mn-Ga, Fe
2
P, mantendo sempre a comparação com
o Gd. Alguns dos resultados são apresentados nas figuras 1.15 e 1.16.
(a)
(b)
Figura 1.15. Variação de entropia magnética para (a) diferentes amostras de Gd
5
Si
2
Ge
2
e de
Gd
5
Si
2
Ge
1,9
Fe
0,1
e (b) para diferentes amostras baseadas em LaFe
13
. Em ambos os gráficos a
amostra foi submetida uma variação de campo magnético de 2 T
[14]
.
(a)
(b)
Figura 1.16. Variação de entropia magnética para (a) amostras de MnAs, MnAsSb e duas ligas
de NiMnGa e (b) para diferentes compostos do tipo Fe
2
P. Em ambos os gráficos a variação de
campo magnético é de 2 T
[14]
.
Um resumo do EMC das diversas amostras é apresentado na figura 1.17. Embora,
esses materiais apresentem boas características, ainda não está claro qual material será
empregado comercialmente em refrigeradores.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 33
Figura 1.17. Gráfico que resume a variação de entropia magnética para diversos
materiais sob variação de campo magnético é de 2 T
[14]
.
Outro artigo de revisão é o de Manh-Huong Phan e Seong-Cho Yu (2007)
[12]
que
compara rios materiais destacando sempre as magnetitas. Para esta comparação entre
materiais magnetocalóricos, os autores apresentam nas figuras 1.18 e 1.19 a
dependência da variação de entropia magnética e a potência de resfriamento relativa
RCP(S) na temperatura de Curie. Através das figuras 1.18 e 1.19 nota-se que as ligas
Gd
5
(Si
x
Ge
1-x
)
4
(
10
x ) são as mais promissoras para refrigeração magnética ativa
(RMA) em temperaturas abaixo da ambiente, pois o maior EMC é alcançado no
intervalo de temperatura de 250-290 K. Embora a variação da relação de Si/Ge permita
a variação da localização do pico do EMC em um largo intervalo de temperatura de 20–
330 K, a intensidade do EMC diminui fortemente no intervalo de temperatura ambiente
(figura 1.18).
No intervalo de temperatura de 290-320 K, que é aplicável para RMA ambiente,
os materiais MnAs
1-x
Sb
x
(
4,00
x ) mostram o maior valor do EMC, mas possui um
RCP(S) relativamente pequeno (veja Figura1.19). Além disso, estes materiais possuem
sérios problemas de histerese térmica e magnética, os quais são prejudiciais na RMA.
Este último aspecto é um desafio adicional para refrigerantes magnéticos que mostram
efeitos magnetocalórico gigante, devido à transição estrutural/magnética de primeira-
ordem.
Das figuras 1.18 e 1.19 vê-se que os materiais MnFeP
1-x
As
x
( 65,025,0
x ) são
os candidatos mais promissores para aplicações a temperatura ambiente da RMA,
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 34
apresentando um intenso e reversível EMC em temperaturas de ordenamento magnética
relativamente altas. Variando a relação de P/As entre 3/2 e 1/2 é possível mudar a
temperatura de Curie deste material num intervalo de 200 a 350 K, sem perda de EMC
gigante. Os problemas decorrentes de histerese térmica e magnética são menos
preocupantes nas ligas MnFeP
1-x
As
x
do que em Gd
5
(Si
x
Ge
1-x
)
4
e MnAs
1-x
Sb
x
, no
entanto, o descarte de As e/ou P no meio-ambiente é de séria preocupação nos materiais
MnFeP
1-x
As
x
, e isto pode conduzir a custos extra no processo de manufatura.
Figura 1.18. Variação de entropia magnética,
HM
TS
)(
, em função da temperatura de
Curie para uma variação de campo magnético de 5 T em materiais magnetocalóricos
candidatos a refrigeração magnética no intervalo tanto abaixo quanto na própria
temperatura ambiente. A composição dos materiais são MnAs
1-x
Sb
x
(x=0; 0,1; 0,15;
0,25; 0,3), La(Fe
1-x
Co
x
)
11,2
Si
1,8
(x=0; 0,02; 0,07; 0,08), La
0,7
Ca
0,3-x
Sr
x
MnO
3
(x = 0,05;
0,10; 0,15; 0,25), Gd
5
(Si
x
Ge
1-x
)
4
(x =0,43; 0,50; 0,515; 1) e MnFeP
1-x
As
x
(x = 0,45;
0,50; 0,55; 0,65)
[12]
.
Do ponto de vista comercial, acredita-se que os materiais magnéticos compostos
de 3d metais de transição são mais adequado que as terras-raras. Vários materiais
magnetocalóricos que apresentam grandes EMC e RCP(S) foram descobertos, mas
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 35
levando em conta todas as exigências (seção 1.4.1) para um material magnetocalórico, o
Gd ainda é o melhor refrigerante magnético para RMA a temperatura ambiente. Essa é a
razão de o Gd ser o principal material usado atualmente em protótipos de refrigeradores
magnéticos à temperatura ambiente, embora seu custo seja muito alto.
Figura 1.19. Potência de resfriamento relativa, RCP(S), em função da temperatura de
Curie para uma variação de campo magnético de 5 T em materiais magnetocalóricos
candidatos a refrigeração magnética no intervalo tanto abaixo quanto na própria
temperatura ambiente. A composição dos materiais são MnAs
1-x
Sb
x
(x=0; 0,1; 0,15;
0,25; 0,3), La(Fe
1-x
Co
x
)
11,2
Si
1,8
(x=0; 0,02; 0,07; 0,08), La
0,7
Ca
0,3-x
Sr
x
MnO
3
(x = 0,05;
0,10; 0,15; 0,25), Gd
5
(Si
x
Ge
1-x
)
4
(x =0,43; 0,50; 0,515; 1) e MnFeP
1-x
As
x
(x = 0,45;
0,50; 0,55; 0,65)
[12]
.
Os materiais magnetocalóricos baseados em óxidos de manganês podem ser
promissores candidatos para RMA, porque eles apresentam um EMC com intensidade
comparável ao do Gd e de outros materiais candidatos a refrigerante magnéticos. Uma
desvantagem deste tipo de material é o fato de apresentar uma pequena variação de
temperatura de adiabática,
Had
TT
)( , devido ao calor específico relativamente alto.
Isto pode limitar o uso das manganitas na RMA. Porém, acredita-se que esta dificuldade
será superada pelo rápido desenvolvimento da tecnologia de resfriamento magnético
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 36
que se tem hoje. É interessante notar que, quando comparada com Gd e outros materiais
candidatos, as manganitas são mais fáceis de preparar e exibem uma maior estabilidade
química, bem como uma maior resistividade. Além disso, as manganitas possuem
histerese térmica e magnética muito inferior a qualquer outra liga baseada nas terras-
raras e nos 3d metais de transição. A temperatura do EMC máximo pode ser modificada
facilmente num grande intervalo de temperatura de 100-375 K, o que é benéfico para
RMA em várias temperaturas. Além disso, os materiais manganitas são os mais baratos
entre os refrigerantes magnéticos existentes
[14]
. Segundo Manh-Huong Phan e Seong-
Cho Yu, estas características superiores fazem das manganitas o tipo de material mais
promissor para o futuro da refrigeração magnética.
1.5. Ciclos Termomagnéticos
Tendo em vista o exposto nas seções precedentes, se faz necessário uma breve
discussão de como podemos empregar os materiais magnéticos no processo de
refrigeração em si, o qual recebe o nome de refrigeração magnética.
O aquecimento e resfriamento de um material magnético em resposta a um campo
magnético são similares ao aquecimento e resfriamento de gases sujeitos a compressão
adiabática e expansão. Desde modo, a refrigeração magnética opera pela
magnetização/desmagnetização de um material magnético. Desde que o refrigerante seja
um sólido (como em formas de esferas ou placas finas), a transferência de calor é
realizada por meio de um fluido (condutor e não poluente) como água, água com
anticongelante, ou dependendo da temperatura de operação, por intermédio de gases
inertes
[8]
.
Podemos entender mais facilmente o ciclo magnético de refrigeração observando a
ilustração esquemática da figura 1.20. As cores verde e amarelo representam o material
magnético magnetizado e desmagnetizado, respectivamente. Inicialmente, os spins,
representados por flechas, estão desalinhados. Com a aplicação do campo magnético, os
spins são alinhados na direção do campo e ocorre o aquecimento do material magnético
(EMC). O calor gerado no material é então transferido para o ambiente até que o
material atingia a temperatura inicial. Em seguida, o campo magnético é retirado, os
spins desalinham-se e um resfriamento do material magnético abaixo da temperatura
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 37
de partida do ciclo. O sistema a ser refrigerado fornece calor ao material até que este
restabeleça novamente a temperatura inicial e então se reinicia o ciclo.
Figura 1.20. Representação esquemática de um ciclo de refrigeração magnético, no qual
ocorre o transporte de calor do sistema para o ambiente. O lado esquerdo descreve o
material em baixo campo magnético e o lado direito a alto campo
[14]
.
A idéia de ciclo termomagnético é de suma importância quando se deseja atingir
maiores variações de temperaturas durante o resfriamento. O Gd, por exemplo,
consegue uma variação de temperatura de no máximo 5
o
C, sob 2 T de campo
magnético, sendo essa faixa de temperatura insuficiente para aplicações comerciais ou
domiciliares. Por esse motivo, tornam-se necessários os ciclos térmicos onde se faz
necessário a utilização de regeneradores. O regenerador é um dispositivo térmico que
serve para receber e fornecer calor de uma matriz (material magnético) durante o
processo, aumentando o desempenho térmico e viabilizando o ciclo.
Similarmente a refrigeração convencional, o ciclo de refrigeração magnético é
apresentado por meio de ciclos termodinâmicos. Os ciclos termodinâmicos comumente
utilizados na refrigeração magnética são: ciclo magnético de Stirling; ciclo magnético
de Ericsson; ciclo magnético de Brayton
[16]
. Destes, os ciclos de Ericsson e de Brayton
são os melhores aplicáveis na refrigeração magnética na faixa de temperatura ambiente,
e por isso, daremos ênfase a esses dois ciclos.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 38
1.5.1. Ciclo de Brayton
O Ciclo de Brayton, proposto por George Brayton (1830-1892), consiste em dois
processos a campo magnético constante (isocampo), com o material magnético
funcionando como regenerador e sendo também a substância refrigerante. Este é o
princípio dos regeneradores magnéticos ativos (AMR, do inglês, Active Regenerator
Magnetic). A figura 1.21 ilustra o ciclo termodinâmico de Brayton, onde o ciclo é
fechado em duas curvas de entropia magnética pela temperatura, sendo uma a campo
0
H (essencialmente nulo) e a outra a um campo
1
H
não nulo, com a temperatura da
fonte quente representada por
H
T
e da fonte fria por
C
T .
Figura 1.21. Ciclo magnético de Brayton
[16]
.
Durante o processo de resfriamento isocampo
BA
o refrigerante magnético
cede calor na quantia referente a área compreendida entre A-B-1-4 na figura 1.21.
Durante o outro processo isocampo
DC
o refrigerante magnético absorve calor na
proporção da área D-C-1-4. Por outro lado, não existe fluxo de calor com o ambiente
durante os processos de magnetização adiabática
AD
e na desmagnetização
adiabática
CB
[16]
.
Mario Reis apresentou uma ilustração esquemática de fácil entendimento para o
ciclo de Brayton
[6]
, a qual é mostrada na figura 1.22. Nessa figura estão esquematizadas
as quatro etapas básicas de funcionamento do AMR num processo reciprocativo. Nesse
esquema há uma câmara porosa entre dois radiadores, onde se alocam pedaços de
material magnético que servirão como refrigerante e regenerador.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 39
Figura 1.22. Os quatro processos do AMR, baseado no ciclo de Brayton. Esse método
usa dois processos isocampos e dois adiabáticos, em que o material magnético funciona
como regenerador, além de ser também a substância refrigerante. Entre os dois
radiadores (interno e externo), existe uma câmara com pedaços de material magnético,
em uma de cujas extremidades está a temperatura baixa, aproximadamente igual à do
volume que se quer resfriar, e outra à temperatura ambiente
[6]
.
O primeiro estágio é um processo adiabático, onde o material é submetido a um
campo magnético externo, que aumenta sua temperatura em quantidade proporcional a
seu efeito magnetocalórico. A extremidade mais quente, próxima ao radiador externo,
ficará com temperatura superior à ambiente.
A segunda etapa consiste em passar um fluido, que estava no radiador interno,
através do material magnético. O fluido troca calor com o material magnético e entra no
radiador externo com temperatura superior à ambiente, enquanto o material magnético
se resfria.
Na terceira fase, acontece novamente um processo adiabático, no qual o campo
magnético, até então sempre presente sobre o material magnético, é removido,
baixando-lhe ainda mais a temperatura em quantidade proporcional ao seu efeito
magnetocalórico. A esta altura, a extremidade à esquerda do material magnético estará a
temperatura inferior à do volume a ser resfriado.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 40
No quarto e último estágio deste ciclo, o fluido sairá do radiador externo, à
temperatura ambiente, e fluirá através do material magnético, cedendo-lhe calor e
alcançando o radiador interno a temperatura mais baixa do que a do volume a ser
resfriado. Agora, este fluido recebe calor do volume frio, reduzindo ainda mais a
temperatura e fechando o ciclo termomagnético.
Recentemente, em 1998, Carl Zimm e colegas, da Astronautics Corporation of
America e do Laboratório Ames, EUA, projetaram uma máquina AMR utilizando
bobinas supercondutoras de NbTi e 3 kg de esferas de Gd, com diâmetro entre 0,15-0,30
mm, que são depositadas em dois compartimentos. Água com anticongelante é usado
como fluido de transferência de calor. Com 5 tesla de campo magnético, esse protótipo
conseguiu reduzir em 11 ºC a temperatura do sistema, podendo gerar até 600 W de
potência de resfriamento com eficiência de aproximadamente 60 % do ciclo de Carnot.
Este refrigerador pode ainda gerar 200 W de potência de resfriamento sob um campo
magnético de 1,5 T. Com ciclos termomagnéticos durando 6 segundos, o qual é
composto por 1 s em cada processo de magnetização/desmagnetização e um tempo de
fluxo de calor de 2 s em cada direção, esse AMR pode funcionar durante 18 meses, sem
necessidade de muitos reparos
[6,9,16]
.
Posteriormente, em setembro de 2001, os mesmos pesquisadores construíram um
protótipo bastante similar, um pouco menor que o primeiro, mas usando ímãs
permanentes de Nd-Fe-B. Trata-se de um dispositivo rotatório com um imã permanente
em formato de “C” (figura 1.23). Esse dispositivo, cujo refrigerante era composto de
partículas esféricas de Gd, conseguiu reduzir a temperatura de 25 ºC para 5 ºC, obtendo
uma potência de resfriamento de 95 W, funcionando numa freqüência de 4 Hz, e foi
patenteado em 2003
[6,9,16]
.
O desenvolvimento desses protótipos vai além das fronteiras norte-americanas. A
Toshiba, em 2000, desenvolveu um refrigerador magnético utilizando 2 kg de Gd, 1
tesla de campo magnético, fornecido por ímãs permanentes de Nd-Fe-B, e água com um
determinado anticongelante, conseguindo reduzir a temperatura de 28 ºC para -1 ºC.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 41
Figura 1.23. Refrigerador magnético rotatório da Astronautics Corporation of América
(direita) e um esquema representando o mecanismo (esquerda)
[16]
.
1.5.2. Ciclo de Ericsson
O ciclo de Ericsson, proposto pelo engenheiro sueco John Ericsson (1803- 1889),
consiste em duas etapas isotérmicas e duas isocampo, utilizando, por exemplo, um
fluido a base de sal paramagnético como regenerador. Este é o princípio dos
regeneradores magnéticos passivos (PMR, do inglês Passive Magnetic Regenerator). As
figuras 1.24 e 1.25 ilustram o ciclo termodinâmico de Ericsson, onde o ciclo é fechado
em duas curvas de entropia magnética pela temperatura, sendo uma a campo magnético
nulo
0
H e a outra a um campo
1
H
maior que zero.
Figura 1.24. Ciclo magnético Ericsson
[16]
.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 42
Figura 1.25. Princípio de funcionamento do ciclo magnético Ericsson
[16]
.
Na figura 1.25 são esquematizados as etapas do funcionamento do PMR. O fluido
que funciona como regenerador fica contido numa coluna que o material magnético
percorre durante todo o ciclo. O fluido regenerativo cede calor ao meio externo nas
extremidades da coluna. A extremidade superior é a região quente, onde
transferência de calor ao meio externo, e a inferior a região fria, que resfria o meio
externo. Segundo essa ilustração, temos
[6,16]
:
Processo I Magnetização isotérmica (
BA
no ciclo). Inicialmente o
material magnético, imerso no fluido, está no topo da coluna e, conseqüentemente,
em equilíbrio térmico com o ambiente. O primeiro estágio desse ciclo é um
processo isotérmico, onde o campo magnético aumenta de
0
H para
1
H
. Nesse
processo ocorre uma transferência de calor, dada por
(
)
BAAB
SSTQ =
1
, do
refrigerante magnético para o fluido regenerador, ocasionando num aumento de
temperatura no fluido contido na região superior da coluna. O fluido regenerador,
por sua vez, cederá este calor ao ambiente externo;
Processo II Resfriamento isocampo ( CB
no ciclo). Sob o campo
magnético constante
1
H
, o material magnético juntamente com a fonte de campo
magnético se movem para extremidade inferior da coluna e, consecutivamente, ao
longo do percurso ocorre uma transferência de calor de
=
B
C
S
S
BC
TdSQ
do
refrigerante para o fluido regenerador. Ao atingir a parte inferior da coluna, o
fluido estará em equilíbrio térmico com o volume a ser refrigerado.;
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 43
Processo III Desmagnetização isotérmica (
DC
no ciclo). Neste
momento o campo magnético
1
H
é removido, retornando para
0
H . Assim, o
refrigerante magnético absorve o calor
(
)
CDCD
SSTQ
=
0
do fluido regenerador
contido na parte inferior da coluna, dessa forma, a temperatura do fluido diminui.
O fluido regenerador, por sua vez, receberá calor do volume a ser resfriado,
baixando-lhe a temperatura. A quantidade de calor removida neste estágio é
proporcional ao efeito magnetocalórico do material utilizado;
Processo IV Aquecimento isocampo ( AD
no ciclo). Sob o campo
constante
0
H , o refrigerante magnético e a fonte de campo magnético se movem
de volta ao topo da coluna. Durante este percurso, o refrigerante absorve o calor
=
A
D
S
S
DA
TdSQ
do fluido regenerador e, ao chegar ao topo da coluna, que esta em
equilíbrio térmico com o ambiente, o ciclo se fecha.
Sucessivos ciclos, como o descrito acima, podem reduzir a temperatura de um
determinado volume até o valor desejado. A figura 1.26 nos mostra em detalhes os
quatro processos do regenerador magnético passivo
[6]
.
Figura 1.26. Os quatro processos do PMR que usa, em cada ciclo, dois processos
isotérmicos e dois isocampos. Baseado no ciclo de Ericsson, esse método usa um fluido
contido em uma coluna que atua como regenerador. Nesta ilustração, a parte direita do
fluido está em contato térmico com o ambiente, enquanto a parte esquerda está em
contato térmico com o volume que se deseja resfriar
[6]
.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 44
O primeiro protótipo de refrigerador magnético para funcionar à temperatura
ambiente foi desenvolvido em 1976 por Gerald Brown, da Nasa (figura 1.27). Sua
máquina funcionou baseada no ciclo PMR, onde, no estágio isotérmico, 7 tesla de
campo magnético foram aplicados sobre 160 gramas de Gd em forma de placas de 1mm
de espessura, imersos em uma coluna vertical contendo 400 ml de fluido (80% água e
20% álcool). Após 50 ciclos, a temperatura no topo da coluna chegou a 46
o
C, enquanto
a temperatura na base da coluna atingiu -1
o
C. Estava provado que se pode ter um
refrigerador magnético à temperatura ambiente. O protótipo, porém, ainda era inviável
para uso doméstico, porque usava um eletroímã caro e difícil de transportar.
Figura 1.27. A esquerda temos um diagrama esquemático do ciclo regenerativo de Brown, no
qual uma coleção de placas paralelas de Gd é magnetizado sob uma coluna preenchida de
fluido (a) e então se move, juntamente com o campo, para o fundo da coluna (b) em seguida
anula-se o campo magnético (c), por fim, o material volta novamente ao topo sem o campo
magnético aplicado (d) fechando o ciclo. A direita temos a representação do ciclo do
refrigerador de Brown, o qual diverge do processo isotérmico ideal do
ciclo magnético de Ericsson
[16]
.
Em 1987, Lance Kirol, no Laboratório Nacional de Engenharia de Idaho, EUA,
desenvolveu outro protótipo de refrigerador magnético. Sua máquina do tipo PMR
contava com 270 gramas de Gd, submetidos a 1 tesla fornecido por ímãs permanentes
de neodímio-ferro-boro. Após quatro ciclos, esse protótipo estabeleceu 11
o
C de
diferença de temperatura entre os extremos do fluido regenerador.
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 45
1.6. Referências Bibliográficas
1. K. Mendelssohn; “The quest for absolut zero (the meaning of low temperature
physics)”. Mc Graw-Hill, Nova York (1966).
2. W.F. Giauque. J. Am. Chem. Soc. 49:1864-70 (1927).
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8. K. A. Gschneidner Jr. e V. K. Pecharsky; “Magnetocaloric Materials”. Annu. Rev.
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Publishing Bristol and Philadelphia (2003).
10. W. Otowski, C. Gloreux, R. Hofman, J. Thoen; “New acoustic detection technique
for a magnetocaloric effect”. Thermochimica Acta, 218, 123-133 (1993).
11. B. R. Gopal, R. Chahine, M. Folddeaki, T. K. Bose; “Noncontact thermoacoustic
method to measure the magnetocaloric effect”. Review of Scientific Instruments,
66(1), 232-238 (1995).
12. Manh-Huong Phan, Seong-Cho Yu; “Review of the magnetocaloric effect in
manganite materials”. Journal of Magnetism and Magnetic Materials, 308, 325-340
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13. C.M. Xiong, J.R. Sun, Y.F. Chen, B.G. Shen, J. Du, Y.X. Li, IEEE Trans. Magn. 41
(2005) 122.
14. E. Brück; “Developments in magnetocaloric refrigeration”. J. Phys. D: Appl. Phys.,
38, R381-R391 (2005).
15. K. A. Gschneidner Jr., V. K. Pecharsky, e A. O. Tsokol; “Recent developments im
magnetocaloric materials”. Rep. Prog. Phys., 68, 1479-1539 (2005).
Capítulo 1. Efeito Magnetocalórico 46
16. B. F. Yu, Q. Gao, B. Zhang, X. Z. Meng, Z. Chen; “Review on research of room
temperature magnetic refrigeration”. International Journal of Refrigeration, 26, 622-
636 (2003).
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 47
Capítulo 2
Efeito Fotoacústico
2.1. Histórico
Alexander Graham Bell nasceu na Escócia em 1847. O pai de Alexander era um
acadêmico de Edimburgo, cidade onde estudou, assim como em Londres. Seu pai
inventou um método para as pessoas surdas se comunicarem (Linguagem visual) e
ensinava-o em Edimburgo. O filho aprendeu esse método e também o ministrou na
mesma cidade. Mais tarde, após ter emigrado para os Estados Unidos da América, em
Boston, Alexander fundou uma escola e nela lecionava fisiologia vocal. Decorria o ano
de 1865 quando lhe surgiu a idéia da transmissão da voz por ondas elétricas, mas apenas
registrou a patente do telefone em 1876. No ano seguinte formou a empresa "Bell
Telephone Company". As suas invenções são de grande importância e vieram contribuir
para um rápido desenvolvimento de muitas ansiedades da humanidade.
Chegava a passar noites em claro, imerso nas delicadas investigações, quer na
eletricidade, quer no campo da navegação aérea. Na verdade, para trabalhar à sua
vontade, a partir da meia-noite, altura em que a mente atingia a máxima lucidez.
Liberto de interrupções, ele podia entregar-se de alma e coração às experiências
científicas e às invenções, que constituíam a paixão da sua vida. Nunca se deitava antes
das quatro da madrugada, dedicando a tarde aos compromissos sociais e negócios, e
aproveitava a noite para a leitura e trabalho.
Em 1880, Alexander Graham Bell
[1]
descobriu que selênio e outros sólidos,
colados na forma de um diafragma na extremidade de um tubo, produziam um som
audível quando iluminado pela luz do sol modulada. Graham Bell atribuiu corretamente
tal fenômeno ao processo de absorção de luz, que aquecia o material e provocava sua
dilatação térmica. Sucessivas dilatações produziam vibrações no ar dentro do tubo,
gerando som. Com este experimento, além de mostrar ser possível “ouvira luz do sol
usando o seu “fotofone”, Graham Bell forneceu a base para a atual espectroscopia
fotoacústica. As limitações práticas da época fizeram com que o efeito fosse
considerado como sendo apenas uma curiosidade científica, somente redescoberta cerca
de 100 anos mais tarde. Os trabalhos iniciais sobre este efeito em sólidos, publicados
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 48
nos anos 70, foram a base teórica que deu início ao rápido desenvolvimento e aplicação
da espectroscopia fotoacústica.
Figura 2.1. Fotofone inventado por Graham Bell.
Este notável pesquisador dedicou a sua vida à ciência, sendo reconhecido pelas
principais sociedades científicas da Europa. Inventar exige imaginação e Graham Bell
era dotado dessa faculdade num grau mais que notável. Com sua perspectiva, apoiada
pelos enormes conhecimentos científicos, e sua mente criativa, Bell estava sempre
mergulhado em profundas análises, perspectivando coisas novas. Viajava muito por
todo o mundo, proferindo conferências sobre o telefone, o gramofone, a eletricidade, o
hélio, o rádio e a navegação aérea. Morreu no Canadá em 1922.
A partir de 1938, com o uso de microfones, o efeito foi utilizado para o estudo de
gases na região do infravermelho
[2]
. O interesse principal era detectar traços de
poluentes em gases, mas também se utilizava a medida da fase do sinal fotoacústico
para se obter informações sobre a taxa de transferência de energia entre os modos
vibracionais e translacionais das moléculas gasosas. Nesta época conseguia-se detectar
2
CO
em
2
N
abaixo de ppm (partes por milhão). A partir de 1950, os aparelhos
comerciais fotoacústicos cederam lugar aos de cromatografia gasosa e ao espectrômetro
infravermelho, sendo utilizado apenas nas medidas de processos de relaxação. Na
década de 70, com o uso de lasers, a espectroscopia fotoacústica em gases ganhou um
novo impulso, possibilitando a detecção de traços de poluentes até 0,1 ppb (parte por
bilhão).
Apesar da utilização do efeito fotoacústico em gases ter sido realizada desde a
década de 40, sua aplicação em sólidos só ocorreu a partir de 1973. Deste ano em diante
houve um grande desenvolvimento experimental e teórico, ampliando seu campo de
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 49
aplicação e diversificando as técnicas de medidas. É neste contexto que surgiram os
diversos outros esquemas de detecção do efeito, os quais hoje constituem parte da
ciência fototérmica, que é a nomenclatura moderna para esses efeitos.
Parker
[3]
, Rosencwaig e Gersho
[4,5]
propuseram um modelo padrão de célula
fotoacústica para amostras sólidas, desenvolveram a teoria que descreve o fenômeno
fotoacústico e através dos experimentos demonstraram que o mecanismo básico
responsável pelo surgimento do efeito fotoacústico era o fluxo periódico de calor entre a
superfície da amostra e o gás contido na célula fotoacústica. Hoje em dia a análise
Fototérmica é composta por um extenso conjunto de técnicas, que consistem na
conversão da energia luminosa em calor. Embora existam várias técnicas fototérmicas,
cada uma delas apresenta uma característica própria, obtendo-se assim uma técnica mais
adequada pela sensibilidade em relação à propriedade particular que se deseja obter.
No Brasil, o efeito fotoacústico foi introduzido em 1977, no instituto de Física da
UNICAMP, onde esta técnica foi muito usada até por volta dos anos 2000 na pesquisa
fundamental e aplicada.
2.2. O Efeito Fotoacústico
O efeito fotoacústico é obtido em uma célula que é constituída por um recipiente
fechado, preenchido por um gás (em geral o ar), no qual existe uma janela de vidro que
permite a entrada de luz. Um feixe de luz modulada atravessa a janela, atinge a amostra
e por ela é absorvida. O efeito fotoacústico ocorre sempre que a luz aquece um material
de forma periódica: a cada pulso de luz surge um pequeno aquecimento, ou seja, por um
processo de dês-excitação não radiativo, a radiação absorvida é transformada em
energia térmica. A mudança de temperatura da amostra ocasiona, por sua vez, uma
variação de pressão na câmara acústica. No entanto, somente uma pequena camada de
gás responde termicamente às variações de temperatura na superfície do material (figura
2.2).
Uma expansão ou contração do gás gera uma variação de pressão na célula
fotoacústica que pode ser captada mediante o uso de um microfone de alta sensibilidade.
A quantidade de calor depositada no material é proporcional à variação de pressão na
célula. Isto implica em dizer que a intensidade do sinal acústico é conseqüência dessa
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 50
alteração de pressão, e está diretamente relacionada com a quantidade de luz absorvida
pela amostra.
Figura 2.2. Processo de produção do efeito fotoacústico.
Para a produção do sinal fotoacústico, em uma amostra sólida, coexistem alguns
mecanismos básicos
[6,7]
(figura 2.3): o da difusão térmica; com expansão térmica, para
amostras livres; e difusão com expansão termoelástica, se a amostra é presa pelas
bordas.
Figura 2.3. Mecanismos para a produção do efeito fotoacústico.
No primeiro processo, existe um fluxo térmico desde a amostra até o gás
circundante, provocando neste uma variação da temperatura com a mesma freqüência de
modulação da luz incidente. No entanto, apenas uma fina camada de gás, nas
vizinhanças da amostra, é que responde térmicamente às flutuações de temperatura da
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 51
amostra. Esta camada irá sofrer um processo cíclico de expansão/contração funcionando
como um pistão vibratório sobre o resto da coluna de gás, gerando assim o sinal
fotoacústico. Este sinal é detectado por um microfone alojado em uma câmara
conectada à célula fotoacústica. Esta explanação teórica para o fenômeno é devida a
Rosencwaig e Gersho, e é referida como modelo do pistão térmico.
No segundo processo, a vibração mecânica, devida a expansão e contração da
própria amostra, se somam à vibração daquela fina camada de gás, atuando sobre o resto
da coluna de gás como um pistão. Este modelo, proposto por McDonald e Wetsel é
também conhecido como modelo do pistão composto.
O terceiro mecanismo de geração do sinal é o da flexão termoelástica. Este
fenômeno surge quando temos uma amostra presa em suas extremidades. A luz
incidente é focalizada e gera um gradiente de temperatura perpendicular à sua face de
maior dimensão. Devido a este gradiente, a expansão térmica será dependente da
profundidade e coordenada radial, flexionando a amostra. Esta flexão periódica faz com
que a superfície da amostra produza um segundo sinal puramente acústico. Este
mecanismo foi proposto originalmente por Rousset, Lepoutre e Bertrand.
2.3. Absorção Óptica e Difusão Térmica
Quando um feixe de luz incide em um material nem sempre é totalmente
absorvido em sua superfície. A luz incidente penetra no material e gradativamente é
absorvida pelas moléculas, o que provoca um decréscimo na intensidade do feixe, o
qual irá diminuir exponencialmente. A distância da penetração do feixe de luz no
material, até onde sua intensidade reduz-se à
(
)
e1
, caracteriza a absorção óptica. O
parâmetro que mede essa absorção é chamado comprimento de absorção óptica
β
l e
especifica o caráter óptico do material.
Após a absorção, ocorrem processos de transferência da energia térmica, que é
gerada nos pontos da amostra onde a luz penetrou. A transmissão da energia térmica
para o resto da amostra, através da condução, caracteriza a difusão térmica.
A difusão térmica num dado material é monitorada, mediante a medida da
velocidade com que o calor se propaga neste meio. A propriedade térmica medida é a
difusividade térmica (
α
), que descreve processos transientes ou periódicos de
transmissão de calor. Um outro parâmetro relacionado com a difusão térmica é a
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 52
condutividade térmica, que descreve processos estacionários, dando o fluxo de calor em
função do gradiente de temperatura experimentado pelo material.
Quando o calor é gerado em um dado ponto da amostra, ele se propaga para
outros pontos, que sofrem uma elevação e subseqüente queda na temperatura. Devido ao
caráter periódico da absorção, somente os pontos da amostra dentro do comprimento de
absorção
β
l geram calor, também de forma periódica. De acordo com a freqüência de
modulação da luz,
π
ω
2/
=
f , a difusão do calor para um ponto da amostra, será na
forma de ciclos. A amplitude dos ciclos da oscilação térmica, sentida em um ponto
adjacente ao ponto de geração de calor, está vinculada com a distância entre esses
pontos (características da amostra), e com a freqüência de modulação.
De modo semelhante ao comprimento de absorção óptica
β
l , define-se o
comprimento de difusão térmica
µ
, como sendo o ponto da amostra onde a magnitude
da oscilação térmica se atenua a (1/e). Esse comprimento de difusão térmica é o
parâmetro utilizado na análise da transmissão periódica de calor. É expresso por
(
)
2/1
2
ωαµ
= e indica o ponto de atenuação da oscilação térmica.
2.4. As Técnicas Fototérmicas e suas Aplicações
A espectroscopia fototérmica constitui uma classe de técnicas espectroscópicas de
alta sensibilidade utilizadas para a medida da absorbância e das propriedades termo-
ópticas de uma amostra
[6-9]
. Tais técnicas têm como base o aumento da temperatura da
amostra induzido pela absorção de luz. A luz absorvida por um meio, o perdida por
emissões subseqüentes, resulta na geração do calor. Como conseqüência, ocorrem
mudanças na temperatura e em todas as propriedades da amostra que dela dependem,
sendo as diversas técnicas fototérmicas classificadas em função da propriedade medida.
Desta forma, como ocorre um aumento na temperatura, é possível medir simplesmente
sua variação (calorimetria) ou a emissão no infravermelho, como em Radiometria
Fototérmica. O aquecimento local pode gerar também uma variação na pressão, base da
espectroscopia fotoacústica, onde é medida uma onda acústica. A densidade do meio
também sofre alteração em função do aumento na temperatura, as quais podem ser
detectadas por variações no índice de refração. Este é o caso mais geral em fototermia, e
constitui a base de técnicas como Lente Térmica e Deflexão Fototérmica.
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 53
As técnicas fototérmicas são consideradas metodologias ultra-sensíveis, ideais
para a determinação de traços e medidas de absorbâncias muito baixas. Em fototermia, a
absorbância de uma amostra é medida indiretamente, o que confere aos métodos
fototérmicos maior sensibilidade do que aqueles tradicionais por transmitância. A
principal razão para isso esta no fato de um efeito fototérmico amplificar o sinal óptico
medido. Assim, a absorbância de uma amostra pode não ser detectável por transmitância
(ou sua detecção se tornar inviável pelo ruído), enquanto que o efeito do calor gerado no
meio é facilmente observado por alterações nas propriedades termo-ópticas da amostra.
Uma vez que a quantidade de calor depende da luz absorvida, a medida dos
efeitos produzidos no meio depende da absorbância e de outras propriedades do meio,
como por exemplo, a difusividade térmica. Outra vantagem reside na dependência do
sinal fototérmico da potência da fonte de excitação, o que não ocorre em transmitância.
Por esta razão, os lasers são as fontes de luz normalmente utilizadas, especialmente os
que apresentam um perfil Gaussiano de intensidades.
A sensibilidade, e principalmente a possibilidade de diversos arranjos
experimentais, fazem das técnicas fototérmicas uma excelente alternativa para o estudo
de propriedades da matéria. As propriedades sicas de uma amostra que podem ser
medidas com as técnicas fototérmicas são:
•Absorção óptica (
β
dado em
1
cm );
•Eficiência de emissão de luz (em %);
•Difusividade térmica (
α
em
2
cm /s);
•Condutividade térmica (k em W/cmK);
•Calor específico (
p
c em J/gK);
A Espectroscopia Fotoacústica (PAS) tem sido amplamente utilizada não só na
Física, como também na Química, Biologia, Medicina e Engenharia. Isto porque esta
técnica possui algumas vantagens, sobre a espectroscopia convencional (de transmissão,
reflexão e espalhamento). Uma destas diferenças (ou vantagens), é que a espectroscopia
fotoacústica é uma medida direta da absorção (mede apenas a radiação absorvida que
relaxa na forma de calor), de forma que a luz transmitida, refletida ou espalhada não
interfere nas medidas. Assim, a técnica fotoacústica pode ser aplicada no estudo de
materiais opacos, pouco absorvedores, géis, na forma de ou amorfos, que são
materiais em que a espectroscopia óptica convencional não é adequada. Por outro lado,
esta técnica, na maioria dos casos, não exige uma preparação rigorosa da amostra. Mais
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 54
ainda: por ser uma técnica não destrutiva, permite o acompanhamento da mesma
amostra quando submetida a diversos tratamentos químicos, térmicos, físicos, etc.
Entre outras aplicações, as técnicas fotoacústicas são empregadas na
caracterização das propriedades térmicas da matéria, particularmente o da medida de
difusividade térmica, efusividade térmica e do tempo de relaxação não radiativo. A
difusividade (bem como a efusividade) térmica é um parâmetro que uma medida de
como o calor se propaga na amostra e tem um valor único para cada material, daí sua
importância. Ela também tem a capacidade única de permitir a análise do perfil de
profundidade dos componentes absorvedores da amostra. Isto porque a espessura
atingida na amostra depende da difusividade térmica da mesma e da freqüência de
modulação da luz empregada na geração do sinal fotoacústico.
Os espectros de absorção fotoacústica fornecem elementos importantes no estudo
das bandas de energia de um dado elemento, uma vez que permite a atribuição das
transições óticas envolvidas. Ademais, pode oferecer algumas informações acerca do
estado de coordenação de um dado íon alojado em uma matriz bem como de seu estado
de oxidação. Empregando o método da separação do espectro na fase do sinal
fotoacústico, podemos caracterizar e distinguir dois (ou mais) centros absorvedores
presentes em uma mesma matriz.
Outra importante vantagem da espectroscopia fotoacústica consiste no fato de que
esta é uma técnica não destrutiva e que, sobretudo, permite a realização de estudos em
sistemas biológicos “in vivo” de forma não invasiva
[9]
, como por exemplo, estudos da
propagação de substâncias através da pele humana.
2.5. Modelo RG para a Difusão Térmica
O modelo padrão que descreve quantitativamente a técnica fotoacústica (Sinal
Fotoacústico - PA), em amostras sólidas, foi proposto por Rosencwaig e Gersho (RG)
[4,5]
. A configuração unidimensional padrão da célula fotoacústica é visualizada na
figura 2.4. A luz modulada proveniente de uma fonte passa pela janela e pela câmara de
gás e é absorvida pela amostra. Isto provoca uma variação periódica na temperatura da
amostra, na mesma freqüência da modulação da luz incidente. Como citado, somente
uma fina camada de gás próxima à superfície da amostra responde termicamente às
flutuações de temperatura na amostra, a qual sofre um processo clico de expansão e
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 55
contração funcionando como um pistão vibratório (modelo do pistão térmico
[5]
). Este
efeito se propaga sobre o resto da coluna de gás e um microfone capacitivo capta as
conseqüentes flutuações de pressão, transformando essas variações em um sinal
denominado de sinal fotoacústico.
Luz Modulada
Microfone
Suporte
Amostra
Gás
Janela
-
l
g
0
l
s
l l
s g
+
x>0
Figura 2.4. Geometria da célula fotoacústica convencional.
É costume em teses e dissertações referentes à fotoacústica definir uma tabela
contendo alguns parâmetros comumente utilizados para facilitar o entendimento das
equações existentes, portanto manteremos este padrão apresentando estes parâmetros na
tabela 2.1.
Tabela 2.1. Parâmetros fototérmicos usuais. O subscrito “i” designa o meio
considerado: a amostra (s); o suporte (b) e o gás (g).
Parâmetros Denominação Unidade
i
l
Espessura do meio cm
i
k
Condutividade térmica W/cm K
i
ρ
Densidade de massa
3
/cmg
i
c
Calor específico J/g K
iiii
ck
ρα
=
Difusividade térmica
scm /
2
(
)
2/1
2
ii
a
αω
=
Coeficiente de difusão térmica
1
cm
ii
a1=
µ
Comprimento de difusão térmica cm
(
)
ii
aj+= 1
σ
Coeficiente complexo de difusão térmica
1
cm
i
β
Coeficiente de absorção óptico
1
cm
iiii
Cke
ρ
=
Efusividade
KcmWs
22/1
/
β
l
Comprimento de absorção óptica da amostra cm
η
Eficiência de conversão luz-calor -
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 56
De acordo com o modelo RG, a flutuação de pressão dentro da câmara é
determinada pela distribuição de temperatura no sistema gás-amostra-suporte.
Assumindo uma radiação modulada senoidalmente com a freqüência angular f
π
ω
2
=
,
e com intensidade incidente na amostra dada por:
(
)
(
)
tItI
ω
cos1
0
+=
.
2.5.1
A amostra absorve a luz incidente segundo a lei de Beer:
(
)
(
)
x
etItxI
β
=,
.
2.5.2
Sendo
β
o coeficiente de absorção óptica da amostra para um determinado
comprimento de onda da radiação incidente e “
0
I ” o fluxo de luz monocromática
incidente, Rosencwaig e Gersho
[5]
resolveram a equação de difusão térmica para os três
meios da figura 2.4.
A equação que descreve a difusão térmica, para o caso unidimensional é da forma:
0),(
),(1),(
2
2
=+
txF
t
txT
x
txT
α
.
2.5.3
Sendo que
x
txI
k
txF
=
),(1
),( , representa o termo de fonte de calor.
Neste modelo, o sistema de equações diferencias acopladas para cada meio é
escrito como segue.
Gás,
0 xl
g
:
0
),(
1
),(
2
2
=
t
txT
x
txT
g
g
g
α
.
2.5.4
Amostra,
s
lx 0 :
( )
0cos1
2
),(1),(
0
2
2
=+
te
k
I
t
txT
x
txT
x
s
s
s
s
ωη
β
α
β
.
2.5.5
Suporte,
bss
llxl + :
0
),(1),(
2
2
=
t
txT
x
txT
b
b
b
α
.
2.5.6
Conforme observado nas equações 2.4 e 2.6, para o gás e o suporte, não temos o
termo ),( txF , porque o modelo RG considera que não absorção da radiação
incidente pelo gás nem pelo suporte.
As condições de contorno de Rosencwaig Gersho, para a continuidade do fluxo
de calor e temperatura na interface são:
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 57
nm
TT =
dx
dT
k
dx
dT
k
n
n
m
m
=
2.5.7
Sendo que
m
e
n
são meios adjacentes.
Aplicando as condições de contorno dadas, a solução estacionária na forma
completa para a temperatura na superfície da amostra é dada por:
( )
(
)
(
)
(
)
(
)
(
)
( )( ) ( )( )
++
+++
=
ll
lll
sss
s
ss
sss
ebgebg
erbebrebr
k
I
σσ
βσσ
σβ
β
θ
.1.1.1.1
..2.1.1.1.1
2
)0(
22
0
.
2.5.8
Com os parâmetros de acoplamento
ss
bb
ak
ak
b =
,
ss
gg
ak
ak
g =
e
( )
s
s
a
jr
2
1
β
= .
Visto que a principal fonte do sinal fotoacústico é a transferência periódica de
calor do sólido para o gás (em x=0), a temperatura no gás oscila no tempo e depende da
distância à interface amostra-gás, este processo periódico de difusão produz uma
variação periódica da temperatura dada pela solução para
),( txT
g
é
tj
x
g
eetxT
g
ω
σ
θ
=
)0(),( .
2.5.9
Temos que a temperatura no gás atenua-se rapidamente para zero conforme se
aumenta a distância da superfície do sólido. Essa oscilação rmica sentida em uma
camada de gás de espessura
g
x
πµ
2= , fora da qual nenhum efeito ocorre sobre o gás.
Assumimos que a coluna de gás na câmara responde às ações do pistão de forma
adiabática, a pressão exercida pela onda acústica dentro da célula, devido ao movimento
periódico do pistão, pode ser calculada a partir da lei do gás adiabático. O resultado é
dado por:
tj
gg
e
Tl
P
p
ω
σ
θ
γ
δ
0
0
)0(
=
.
2.5.10
Tendo como sinal PA a parte não temporal de p
δ
, com
0
P e
0
T sendo
respectivamente, a pressão e a temperatura ambiente, o parâmetro
vp
cc=
γ
é a razão
entre os calores específicos a pressão e volume constantes e )0(
θ
dado pela equação
2.5.8.
Rosencwaig Gersho obtiveram a expressão para as flutuações de temperatura na
amostra, a qual é muito complicada para o tratamento de um caso geral. Tendo-se em
vista tais dificuldades, fez-se necessário especificar algumas condições especiais, para
um tratamento sico mais compreensivo. Uma vez que as magnitudes dos parâmetros
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 58
térmicos
s
µ
,
β
l e l, estejam delimitadas, as expressões dadas são simplificadas
consideravelmente. Portanto, os casos limites que comumente são analisados na
fotoacústica são agrupados de acordo com a opacidade térmica e óptica da amostra
[5]
.
Especificando o mecanismo de geração do sinal, é possível ajustar parâmetros em
função da amplitude do sinal ou fase do sinal e obter parâmetros físicos do material
como difusividade térmica, coeficiente de absorção óptica, tempo de relaxação, etc.
2.6. Perfil de Profundidade
Conforme mencionado anteriormente, de modo semelhante ao comprimento de
absorção óptica, define-se o comprimento de difusão térmica
s
µ
. Sendo
s
l a espessura
da amostra, o parâmetro térmico
s
µ
classifica as amostras em duas categorias de
espessura térmica.
ss
l<<
µ
Amostra termicamente grossa
ss
l>>
µ
Amostra termicamente fina
Uma amostra se diz termicamente grossa quando sua espessura
s
l é maior do que
g
πµ
2 , de maneira que as propriedades térmicas do suporte não interferem no sinal
fotoacústico. E é termicamente fina quando
ss
l>>
µ
, a ponto da atenuação da oscilação
térmica ser desprezível para o calor gerado em qualquer ponto da amostra.
No efeito fotoacústico, apenas a luz modulada absorvida dentro de uma
profundidade
s
µ
na amostra contribui significativamente para a oscilação de
temperatura na interface com o gás. Uma conseqüência importante disso é que mesmo
uma amostra opaca pode ter seu espectro resolvido, desde que
β
µ
l
s
< . Caso contrário à
amostra se diz saturada, o que indica que toda luz absorvida gera sinal. Para se
contornar a saturação, pode-se diminuir a dimensão (l) da amostra (de maneira que ela
deixe de ser opaca), ou aumentar a freqüência de modulação (para reduzir
s
µ
).
Devido à dependência do comprimento de difusão com a freqüência de
modulação, é possível efetuar um perfil de profundidade de uma amostra, selecionando
o sinal de camadas cada vez mais superficiais com o aumento de
ω
.
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 59
A oscilação térmica em um ponto do material é percebida em outro ponto
dentro do comprimento de difusão térmica
ω
α
µ
2
=
s
.
2.6.1
Em baixas freqüências
s
µ
é maior, e conforme a amostra pode-se penetrar em
duas ou mais camadas do material (figura 2.5). Aumentando a freqüência,
s
µ
diminui,
assim, permitindo selecionar o sinal de camadas cada vez mais superficiais,
aumentando-se a freqüência de modulação
ω
. Se a amostra tiver duas camadas com
espectro distintos, é possível variando
ω
, obter o espectro composto e o espectro
isolado da camada superior, no entanto o espectro isolado da camada inferior não é
possível
[11]
.
Camada 1
Camada 2
Luz modulada
f
1
f
2
f
3
f
4
l
1
l
2
L
Figura 2.5. Perfil de profundidade por variação de freqüência, com
4321
ffff >>> .
Temos que
s
µ
é a espessura a partir do ponto de incidência da radiação na
amostra, o qual gera sinal. Para encontrar a espessura da camada 2, basta calcular
S
Ll
µ
=
2
, definindo L a espessura total da amostra conforme figura 2.5.
2.7. Célula Fotoacústica Aberta (OPC)
Nessa técnica, proposta por Perondi e Miranda
[11]
,o sinal fotoacústico é detectado
por um microfone de eletreto de volume mínimo
[12]
, sendo um sistema de detecção
barato e compacto. A amostra a ser analisada (material absorvedor sólido) é fixada
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 60
diretamente sobre um microfone comercial de eletreto, de modo que a amostra em
conjunto com o microfone forme a célula fotoacústica
[11]
conforme figura 2.6.
Luz modulada
Amostra
Câmara de Ar
Microfone de Eletreto
Figura 2.6. Representação esquemática de uma célula fotoacústica aberta (OPC).
O modelo teórico para esta célula aberta, segue o mesmo descrito por Rosencwaig
Gersho, para se determinar às flutuações periódicas da pressão na célula, resolvem-se
as equações de difusão térmica acopladas. A expressão geral para o sinal fotoacústico
no modelo RG na configuração de iluminação traseira, em que a absorção ocorre na
superfície da amostra, resultam em:
( )
( )
ss
tj
sg
gs
lsenh
e
fkTl
IP
p
σπ
ααγ
δ
π
ω
=
2
0
2/1
00
2
.
2.7.1
Para uma amostra termicamente fina (TF),
ss
l>>
µ
, a equação se reduz a:
(
)
( )
4
3
2/3
0
2/3
2/1
00
2
π
ω
π
ααγ
δ
tj
ssg
sg
e
fklTl
IP
p
.
2.7.2
Isto implica que a amplitude do sinal fotoacústico decresce com
2/3
f quando se
aumenta a freqüência de modulação.
Para o caso termicamente grosso (TG),
ss
l<<
µ
, a amplitude de oscilação da
temperatura na interface amostra-gás se reduz à equação:
(
)
ss
altj
s
s
sg
gs
e
f
l
fkTl
IP
p
2
2/1
0
2/1
00
exp
π
ω
α
π
π
ααγ
δ
.
2.7.3
Mostrando que, para uma amostra termicamente grossa, a amplitude do sinal
fotoacústico (S) decresce exponencialmente com
2/1
f .
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 61
(
)
fb
f
A
S = exp
2.7.4
em que
s
s
l
b
α
π
2
= .
2.7.5
Neste caso, a difusividade térmica
s
α
pode ser obtida do ajuste do coeficiente b na
expressão do sinal fotoacústico (equação 2.7.4).
2.8. Métodos Experimentais
Após a exposição de algumas considerações teóricas sobre o efeito fotoacústico,
passamos a discutir o arranjo experimental das principais técnicas fotoacústicas. Na
figura 2.7 temos uma representação esquemática do experimento de espectroscopia
fotoacústica.
Figura 2.7. Representação esquemática da espectroscopia fotoacústica (PAS)
[9]
.
Para realizar o experimento de espectroscopia fotoacústica necessitamos de uma
fonte de radiação que emita radiação em várias freqüências, desde ultravioleta até
infravermelho, como por exemplo, uma lâmpada de Xenônio. Esta radiação é separada e
selecionada por um monocromador através de uma grade de difração. Para maior
seletividade do comprimento de onda desejado, a radiação que emana do
monocromador é incidida sobre filtros ópticos, que elimina ordens superiores da
difração proveniente da grade de difração.
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 62
Após este processo a radiação esta selecionada segunda somente um comprimento
de onda “puro” e pronta para ser modulada. O modulador mecânico chopper se
encarrega de modular em pulsos de freqüência fixa esta radiação, a freqüência fixa de
modulação permanece a mesma para todos os comprimentos de onda. Quando
necessário, direcionamos, através de espelhos, os pulsos de radiação monocromática até
a amostra que deverá estar posicionada sobre a célula fotoacústica.
Os pulsos periódicos de luz, quando incididos sobre a amostra, geram um pequeno
aquecimento na mesma, estas ondas de calor se propagam através dela até o gás contido
na célula fotoacústica, surge pequenas ondas de pressão neste gás, estas ondas sonoras
estão confinadas na célula e são captadas pelo microfone que por sua vez gera o sinal
fotoacústico o enviando para um amplificador síncrono lock-in. O lock-in esta
conectado ao chopper através de seu canal de referência externa, portanto o chopper lhe
informa a freqüência de modulação dos pulsos, e com esta informação o lock-in fornece
a fase entre os pulsos de luz e do sinal gerado pelo microfone. O computador, através do
software, é responsável por gerenciar todo o processo, arquivar o sinal, a fase e o
comprimento de onda correspondente, além de informar ao usuário os atuais dados, e
dar-lhe total controle sobre o experimento.
A principal propriedade da amostra medida por este experimento é a absorção
óptica (dado em cm
-1
).
Outro experimento realizado amiúde dentro das técnicas fotoacústicas é a
varredura de freqüência. A representação esquemática do experimento de varredura de
freqüência é mostrada na figura 2.8.
Figura 2.8. Representação esquemática do experimento de varredura de freqüência.
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 63
A estrutura deste experimento é praticamente a mesma do anterior, mudando
apenas o sistema fornecedor da radiação que será modulada em pulsos que não são mais
fixos em uma freqüência, agora a luz é fornecida por um laser cuja radiação é altamente
monocromática e coerente, ou através de uma lâmpada que fornece luz policromática.
Porém se faz necessário ressaltar que a diferença entre os experimentos é marcante. No
primeiro o comprimento de onda é variável e a freqüência de modulação é fixa,
enquanto que neste último o comprimento de onda é fixo e a freqüência de modulação é
variável.
A principal propriedade da amostra medida por este experimento, quando se usa a
célula aberta, é a difusividade térmica (dado em cm
2
/s). Este arranjo experimental
também é utilizado para determinar o perfil de profundidade.
Ainda há uma outra técnica, até então não mencionada, chamada técnica da
diferença de fase dos dois feixes (figura 2.9). Trata-se de um método simples para medir
a difusividade térmica de amostras muito absorvedoras, a partir da medida das fases dos
sinais fotoacústicos devidos a dois feixes de luz modulada, com incidência em sentidos
opostos, ou seja, sinal frontal e sinal traseiro.
Através da aplicação de absorvedores de superfície, como pintura metálica ou uso
de folhas de alumínio extremamente finas, também se pode estudar amostras
opticamente transparentes, tais como vidros e polímeros. O método dos dois feixes, para
o cálculo de difusividade térmica pelo efeito fotoacústico, foi introduzido por Pessoa Jr.
[13]
e também é aplicável em amostras não necessariamente termicamente grossas.
Figura 2.9. Representação esquemática para a técnica dos dois feixes
[7]
.
Capítulo 2. Efeito Fotoacústico 64
2.9. Referências Bibliográficas
1. A. G. Bell; “Production of Sound by Light”. Am. J. Sci., 20, 305-324 (1880).
2. M. L. Veingerov; Dolkl. Akad. Nauk SSSR, 19, 687 (1938).
3. J. G. Parker; “Optical absorption in glas: investigation using an acoustic technique”.
Appl. Opt., 12, 2974-2977 (1973).
4. A. Rosencwaig e A. Gersho; “Photoacoustic Effect with Solids: A Theoretical
Treatment”. Science, 190, 556-557 (1975).
5. A. Rosencwaig, A. Gersho; “Theory of the Photoacoustic Effect With Solids”.
Journal of Applied Physics, 47 (1), 64 (1976).
6. A. C. Bento; “Caracterização de propriedades ópticas e térmicas de materiais por
espectroscopia fotoacústica”. Tese de doutoramento apresentada ao IFGW-
UNICAMP (1990).
7. E. Nogueira da Silva; “Aplicação de métodos fototérmicos para análise de
propriedades ópticas e térmicas de polímeros impregnados, pastilhas metálicas e de
revestimentos acrílicos”. Tese de doutoramento apresentada à Universidade Estadual
de Maringá, Maringá (2005).
8. M. E. S. Gugliotti; “Novas aplicações de técnicas fototérmicas para o estudo de
interfaces”. Tese de doutoramento. Universidade de São Paulo Instituto de
Química, São Paulo (2001).
9. F. Pedrochi; “Estudo de sistemas biológicos ‘in vitro’ e ‘in vivo’ utilizando a
espectroscopia fotoacústica”. Dissertação (mestrado) Universidade Estadual de
Maringá, Maringá (2004).
10. L. Olenka, A. N. Medina, M. L. Baesso, A. C. Bento; “Monitoring the depth
penetration of dyes in poly films using a two-layer based photoacoustic model”.
Brazilian Journal of Physics, 32 (2B), 516-522 (2002).
11. L. F. Perondi, L. C. M. Miranda; “Minimal-volume photoacoustic cell measurement
thermal diffusivity: effect of thermoelastic sample bending”. J. Appl. Phys. 62 (7),
2955-2959 (1987).
12. M. D. da Silva, I. N. Bandeira, L. C. M. Miranda; “Open-cell photoacoustic
radiation detector”. J. Phys. E: Sci. Instrum, 20, 1476-1478 (1987).
13. O. Pessoa Jr, C. L. César, N. A. Patel, H. Vargas; “Two beam photoacoustic phase
measurements of thermal diffusivity of solids”. J. Appl. Phys. 59 (4), 1316-1318 (1986).
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 65
Capítulo 3
Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico
3.1. Nova Técnica de Detecção Acústica para o EMC
Em 1993, W. Otowski, C. Glorieux, R. Hofman e J. Thoen da Bélgica,
propuseram, na revista Thermochimica Acta, uma nova técnica de detecção para o efeito
magnetocalórico via acústica
[1]
. O novo método se baseia na técnica fotoacústica, e
permitiu uma detecção rápida de pequenas variações periódicas de temperatura
induzidas por uma pequena variação periódica e adiabática de campo magnético
imposto a um material magnético.
Os autores passam a explicar:
Técnicas de medida padrão para o efeito magnetocalórico usam um largo passo,
isto é, uma grande variação de campo magnético, ou campos pulsados e a detecção da
temperatura é realizada com um sensor (um termopar ou um termistor) em contato com
a amostra. Na nova técnica de detecção semelhante à fotoacústica que desenvolvemos,
não precisamos de um sensor em contato direto com a amostra. Nosso método permite
uma rápida detecção de pequenas variações periódicas de temperatura induzidas por
uma pequena variação periódica de campo magnético. O uso de uma variação
periódica de campo oferece a vantagem de usar um amplificador síncrono Lock-in na
detecção resultando em um substancial aumento na razão sinal-ruído. Também é
possível medir o efeito em função do campo magnético por sobrepor ao campo
modulado um campo externo estático. Além disso, nosso método pode ser usado para
obter informações a respeito da equação de estado magnética.
3.1.1. Metodologia experimental
Na configuração experimental (figuras 3.1 e 3.2) a amostra é posicionada em uma
pequena célula gasosa, a qual é sujeita a um campo magnético periódico na forma:
[
]
tjBBB
ω
exp
10
+= ,
3.1.1
com
0
B sendo a intensidade do campo magnético estático e
1
B
(
0
B<< ) a amplitude da
variação harmônica do campo magnético modulado. O campo modulado, paralelo a
0
B ,
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 66
é obtido com uma corrente alternada fluindo em uma bobina (não mostrada na figuras
3.1 e 3.2), cuja freqüência usada foi da ordem de dezenas de Hertz. A amostra é
colocada de forma que o contato térmico com as paredes do porta amostra seja muito
fraco e a troca de calor ocorra principalmente com o gás (ar) que preenche a célula. A
modulação harmônica do campo magnético origem a uma correspondente variação
de temperatura da amostra, resultando em uma onda térmica decaindo
exponencialmente no gás circundante a amostra. No entanto, pode ser verificado que a
perda de calor da amostra para o gás é muito pequena no intervalo de tempo de um
período da variação de campo, assim, podemos assumir que estamos lidando com uma
situação aproximadamente adiabática. A onda térmica no gás causa uma mudança
periódica de pressão na célula, a qual pode ser detectada com um microfone de alta
sensibilidade conectado na parede do porta amostra.
Figura 3.1. Diagrama esquemático do porta amostra e da amostra (SAMPLE)
[1]
.
O controle de temperatura do sistema é provido por meio de um fluxo de água,
com temperatura controlada, através de uma cavidade helicoidal na parede externa do
porta amostra. A temperatura constante do sistema é medida por um sensor de
temperatura em contato com a parede interna da célula.
Na figura 3.2 temos uma visão esquemática de todo o arranjo experimental. O
sinal provindo do microfone é amplificado por um Lock-in conectado a um computador,
o qual se encarrega de controlar os instrumentos e arquivar os resultados.
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 67
Para chegarmos a uma expressão para o sinal acústico gerado pelo campo
magnético modulado dado na equação 3.1.1, podemos começar considerando o termo
do trabalho magnético dBBMdW )(
0
= . Obtemos então o seguinte resultado para a
potência:
[ ] [ ]
tjPtjBMBi
dt
dB
BMdtdWtP
ωωω
expexp)()()(
0010
==
==
.
3.1.2
Figura 3.2. Visão esquemática do arranjo experimental completo
[1]
.
Se usarmos agora a teoria de Rosencwaig – Gersho (1976) da fotoacústica para um
aquecimento homogêneo da amostra obtemos:
BB
C
BMB
Ci
P
ρωρ
θ
)(
010
0
==
,
3.1.3
para a amplitude da variação de temperatura na superfície da amostra (com densidade
ρ
e capacidade térmica
B
C
). A amplitude R do sinal acústico detectado pelo microfone
é proporcional a
0
θ
e é dado por:
0
0
00
2
θ
θ
γµ
systcm
g
g
ff
Tl
p
R == ,
3.1.4
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 68
em que
cm
f depende das características do microfone e da célula que por sua vez
depende de
ω
e
T
,
0
p
e
0
T
são respectivamente a pressão de equilíbrio e a temperatura
do gás da célula,
vp
CC /=
γ
é a razão entre a capacidade térmica a pressão e volume
constantes do gás,
g
µ
é o comprimento de difusão térmica no gás e
g
l a distância da
superfície da amostra até a parede do porta amostra. Em princípio podemos calcular o
fator de proporcionalidade
syst
f , mas na prática é muito mais conveniente obtê-lo por
meio de um procedimento de calibração.
3.1.2. Resultados experimentais
Foram realizadas uma série de medidas para uma amostra de gadolínio próximo a
seu ponto de Curie ( CT
c
o
9,20= ). A amostra tem dimensões de 0,25 mm X 5 mm X 9
mm e um grau de pureza acima de 99,9%. Os dados obtidos da amplitude do sinal do
microfone R em função da temperatura foram repetidos para uma série de valores do
campo magnético estático
0
B . Foi escolhido, para a amplitude
1
B
do campo magnético
modulado, um valor de 1,1 mT. Este valor é aproximadamente sete vezes mais baixo do
que o menor valor de
0
B (8 mT).
O valor de R foi convertido em
0
θ
por meio de uma calibração que permite a
determinação do fator
syst
f na equação 3.1.4 como função da temperatura. Desde que a
amostra seja um condutor, a potência de aquecimento resistivo pode ser obtida através
da aplicação de uma corrente alternada na amostra. Para isto, quatro finos fios de cobre
foram conectados nas bordas da amostra. Medindo a corrente e a voltagem na amostra
juntamente com a correspondente amplitude R do sinal acústico é possível se determinar
o fator
syst
f .
Na figura 3.3 vemos o valor de
0
θ
em função da temperatura para várias escolhas
de
0
B . Conforme observado no gráfico, a técnica apresentada permite a detecção de
baixíssimas variações de temperatura. A resolução de temperatura na configuração
apresentada é da ordem de K
µ
5 , compatível com usualmente observado em
fotoacústica ( KT
6
10
).
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 69
Figura 3.3. Amplitude da variação adiabática de temperatura
0
θ
em função da
temperatura induzida por uma modulação harmônica de campo com amplitude
1,1
1
=B
mT para uma amostra de gadolínio próximo ao ponto de Curie ( KT
c
294 ) em
diferentes valores de campo magnético estático
0
B (23 mT a 180 mT)
[1]
.
Na figura 3.4 temos os dados de
0
θ
para rias isotermas tanto acima como
abaixo de
c
T em função do campo magnético estático
0
B .
Para uma dada escolha de
1
B
(
0
B<< ) segue-se da equação 3.1.3 que
0
θ
é
proporcional a magnetização M (induzida pelo campo estático
0
B ), e inversamente
proporcional ao produto da capacidade térmica
B
C
e a densidade
ρ
, a qual podemos
assumir ser independente do campo e da temperatura, para pequenas variações de
temperatura. No entanto, a magnetização e a capacidade térmica são ambas funções de
T
e
0
B
. Os dados tanto acima como abaixo de
c
T
estão qualitativamente de acordo
com a equação 3.1.3, no sentido que as isotermas )(
00
B
θ
também começam do zero e
não de um valor correspondente com a magnetização espontânea )(
TM
s
. Os autores
acreditam que isto é conseqüência da natureza policristalina da amostra utilizada,
resultando numa magnetização espontânea média nula.
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 70
(a)
(b)
Figura 3.4. Gráfico da variação de temperatura
0
θ
em função do campo magnético
estático
0
B (0 a 280 mT) para várias isotermas acima (a) e abaixo (b) da temperatura de
Curie ( CT
c
o
9,20 ) para o gadolínio
[1]
.
As dependências de
M
e
B
C
em termos da temperatura e do campo magnético
podem ser expressas em termos de leis de potências relacionadas com determinados
expoentes críticos. Para a dependência do campo magnético ao longo de uma isoterma
crítica, temos:
(
)
δ
1
, mBBTM
c
=
;
3.1.5
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 71
(
)
0
, CaBBTC
cB
+=
βδα
,
3.1.6
em que
0
C é a capacidade térmica não-magnética de fundo, a e m são amplitudes
críticas,
δ
é o expoente crítico descrevendo a forma da isoterma crítica de M(B),
β
é o
expoente crítico que descreve a forma da curva de magnetização espontânea (B=0)
abaixo do ponto de Curie,
α
é o expoente característico para a capacidade térmica
anômala. A dependência com a temperatura da capacidade térmica a campo zero é dada
por:
( )
0
C
T
TT
ATC
c
c
B
+
=
±
α
,
3.1.7
em que os sinais + e - indicam respectivamente acima e abaixo da temperatura crítica.
Uma outra quantidade relevante aqui é a susceptibilidade isotérmica a campo zero que
tem a seguinte expressão para a lei de potência:
γ
χ
±
Γ=
=
c
c
T
T
T
TT
B
M
.
3.1.8
Valores exatos de diferentes expoentes críticos dependem das classes universais
do ponto crítico investigado. De uma revisão dos valores experimentais feitos por
Chowdhury (1986)
[2]
segue que para o gadolínio alguns valores, para os expoentes
críticos, concordam com resultados teóricos da classe universal de Ising, enquanto
outros valores concordam com os resultados teóricos da classe universal de Heisenberg.
Valores teóricos para alguns expoentes críticos são apresentados na tabela 3.1 para estas
duas classes universais.
Expoente Modelo de Ising Modelo de Heisenberg
α
α
+
+
0
0
,
,
1
1
1
1
0
0
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
2
2
-
-
0
0
,
,
1
1
1
1
6
6
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
2
2
β
β
+
+
0
0
,
,
3
3
2
2
5
5
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
2
2
+
+
0
0
,
,
3
3
6
6
5
5
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
2
2
γ
γ
+
+
1
1
,
,
2
2
4
4
1
1
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
2
2
+
+
1
1
,
,
3
3
8
8
7
7
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
4
4
δ
δ
+
+
4
4
,
,
8
8
1
1
6
6
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
3
3
+
+
4
4
,
,
7
7
9
9
7
7
±
±
0
0
,
,
0
0
0
0
3
3
Tabela 3.1 Valores teóricos para alguns expoentes críticos
[1]
.
Com base nos resultados experimentais de (T
C
- T)/T
C
> 10-3, Chowdhury et al.
[2]
encontraram valores de α e β concordando com o modelo de Heisenberg. No entanto,
não excluíram a possibilidade de uma mudança para outra classe universal para
temperaturas mais reduzidas.
Trabalhando com as equações 3.1.3, 3.1.5, 3.1.6, 3.1.7 e 3.1.8, os autores
[1]
tentaram, através de uma série de aproximações, obter esses expoentes críticos com base
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 72
nos dados obtidos pela nova técnica proposta. Porém, devido as sucessivas
aproximações realizadas os valores dos expoentes críticos encontrados, num
conveniente processo de ajuste dos gráficos das figuras 3.3 e 3.4, não foram conclusivos
com respeito a classe universal (Ising ou Heisenberg) a qual pertence os respectivos
expoentes do gadolínio. Ainda mais, em alguns casos os expoentes críticos obtidos não
concordavam com a literatura existente, na qual o gadolínio já foi exaustivamente
estudado. Portanto, os autores não souberam direcionar e interpretar corretamente os
dados obtidos na nova técnica, tendo por mérito apenas a proposta da nova técnica de
detecção acústica para o efeito magnetocalórico, deixando a correta interpretação para
trabalhos posteriores.
3.2. Método Termoacústico para Medida do EMC sem contato
Após a proposta inovadora da técnica de detecção do efeito magnetocalórico
(EMC) via acústica por Otowski e demais co-autores
[1]
, em 1994 B. R. Gopal, R.
Chahine, M. Földeàki, e T. K. Bose do Canadá, baseados nesta nova técnica,
desenvolveram o método termoacústico para a medida do efeito com ausência de
sensores em contato com a amostra
[3]
. Os autores explicam as diferenças:
Métodos convencionais de medir (de forma direta) o valor da variação
adiabática de temperatura usam intensos campos pulsados ou uma rampa de campo
(com uma típica taxa de aumento de 1 T/s) e a medida da variação de temperatura é
realizada mediante o uso de um termômetro em contato com a amostra. Outros métodos
freqüentes evitam o problema do grande valor da indutância associada com altos
campos eletromagnéticos (a qual impede que o aumento do campo ocorra rapidamente)
e passam a transladar a amostra ao longo de um imã supercondutor que provê os altos
campos magnéticos necessários. Para prover um aumento de campo aproximadamente
adiabático, o mecanismo de transporte da amostra teria de ser extremamente rápido
bem como complexo. Neste caso, novamente, a variação de temperatura é detectada
com um sensor em contato com a amostra. Portanto, a dificuldade reside em manter
uma situação adiabática aproximadamente ideal devido as restrições na razão de
rampa do campo. Adicionalmente a isto, problemas referentes a perda de calor
devido ao contato do sensor. O método de detecção termoacústico, primeiramente
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 73
proposto por Otowski e co-autores, evita grande parte destes problemas devido a sua
natureza de detecção de variações de temperatura sem contato.
O método usa um campo magnético alternado para medir a variação infinitesimal
de temperatura (
T
δ
) induzida no material devido a um pequeno campo variando
periodicamente (200 G neste caso), o qual será referido daqui em diante como campo
modulado, superposto a um campo magnético estático de intensidade diferente. Esta
configuração foi previamente adotada por Otowski e co-autores para obter os expoentes
críticos do gadolínio. Seu trabalho não foi orientado para o cálculo do EMC (
T
) a
partir da variação periódica de temperatura (
T
δ
) devido ao campo modulado, então
Gopal e co-autores desenvolveram a base teórica para o cálculo de
T
. Decidiram
calcular
T
total, devido à variação de campo constate desde zero, através do sinal de
resposta, o fator de calibração e os dados de magnetização da amostra. Enfatizamos
novamente que
T
δ
significa a variação de temperatura produzida por um campo
magnético da forma
(
)
tjHH
ωδ
exp+
e
T
é a variação de temperatura associada com
a variação do campo magnético estático de zero a
H
.
3.2.1. Cálculo de
T
Total
Se
T
δ
é medido, e os dados de magnetização são conhecidos, bem como o calor
específico em função do campo, então o EMC total pode ser calculado através de:
( )
==
H H
PH
HP
H
T
M
C
T
HTT
0 0
,
,
δδ
.
3.2.1
Para materiais ferromagnéticos simples, a teoria de campo molecular oferece um
caminho mais fácil para o cálculo. Para este propósito, a equação deve ser escrita
assumindo magnetização constante ao invés do campo constante. Da expressão geral da
energia,
(
)
THTHM
HdMdMHdTCdWdUdQ
,,1
== .
3.2.2
Aqui H é o campo aplicado e
1
H
o interno, ou campo molecular. Na teoria de Weiss,
MH
λ
=
1
, sendo
λ
o campo molecular constante e M a magnetização. Substituindo,
obtemos
(
)
THTHM
dMMHdTCdQ
,,
λ
+= .
3.2.3
Para uma variação adiabática, 0
=
dQ , e
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 74
TH
M
TH
dM
C
MH
dT
,
,
λ
+
=
.
3.2.4
Abaixo da temperatura de transição ferromagnética,
MH
λ
<<
e consequentemente H
pode ser desprezado. Se assumimos que
λ
não depende do campo externo, e dentro da
faixa do efeito magnetocalórico, sua dependência com a temperatura é desprezível, a
equação pode ser integrada, dando
(
)
22
,0,
2
TTH
MM
C
T
M
=
λ
,
3.2.5
em que
TH
M
,
é a magnetização medida e
T
M
,0
a magnetização espontânea na
temperatura
T
. Como
M
C
depende somente de
T
e não de
M
, a integração fica
justificada.
Na região paramagnética,
HM
TH
χ
=
,
, onde
χ
é a susceptibilidade
paramagnética independente do campo e
H
o campo externo aplicado. Neste caso, como
não existe magnetização espontânea,
M
C
M
T
TH
2
1
2
,
χ
= . 3.2.6
As equações 3.2.5 e 3.2.6 mostram que, tanto para a região ferromagnética quanto
para a paramagnética, o EMC total é uma função linear do quadrado da magnetização
em uma dada temperatura. Consequentemente,
2
MT
δδ
não dependeria do valor da
magnetização contanto que o modelo de Weiss seja válido ou então seja uma
aproximação suficientemente boa. Se convertermos a medida de HT
δδ
em
2
MT
δδ
para
S
MM
, um valor constante seria obtido. Com base em medidas magnéticas
independentes, e sabendo o valor
S
M
, esta transformação é de fácil execução. A
constante obtida é a inclinação da reta
T
versus
2
M
. Agora, desenhamos uma reta
com a inclinação calculada para o ponto
(
)
0
2
=
S
MT
e temos o valor de
T
para
qualquer valor de
2
M
desejado. O valor obtido
(
)
2
MT
pode então ser transformado
em
(
)
HT
usando a curva de magnetização.
3.2.2. Configuração Experimental
A figura 3.5 mostra o esquema do aparato experimental. A célula de medida com a
amostra sob investigação é colocada entre as faces dos pólos de um eletroímã capaz de
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 75
produzir campos magnéticos de até 4500 G. A bobina responsável pelo campo
magnético modulado de prova é inserida sobre o pólo do campo d.c., garantindo assim
que os campos estejam em paralelo. As bobinas são alimentadas por uma corrente a.c.
em forma de onda quadrada. O sinal para o campo modulado é recebido da saída de
referência TTL do amplificador lock-in. Estas bobinas são capazes de produzir um
campo modulado de aproximadamente 250 G com uma corrente de 1 A modulada na
freqüência de 4Hz. Foi preciso cuidado para manter a indutância das bobinas baixa o
suficiente para que não houvesse distorção significante da forma de onda quadrada. A
célula está envolvida por uma capa com temperatura controlada por um fluido provendo
uma estabilidade de ±0,1 K. A temperatura da célula foi medida por um termistor
localizado em sua parede.
Figura 3.5. Representação esquemática da configuração experimental
[3]
.
A amostra, com dimensões aproximadamente igual a 12 mm X 4 mm X 0,5 mm,
localiza-se dentro da célula a qual é feita com uma tubulação metálica de paredes finas
com 9 mm de diâmetro e 40 mm de comprimento (figura 3.6). O porta amostra foi feito
de Teflon
®
e colocado dentro da célula. A célula é fechada, mas tem um orifício de 1,5
mm de diâmetro para o ducto da sonda do microfone. A sonda do microfone consiste
em um ducto e um microfone capacitivo, mantendo o microfone fora da influência do
campo magnético modulado. O sistema célula sonda do microfone” está fechado e
preenchido por um gás, neste caso o ar.
Um microfone capacitivo Hewlett-Packard (HP35222A) foi modificado para
trabalhar como uma sonda incluindo o microfone completo juntamente com um pré-
amplificador em um invólucro metálico. Um microfone do tipo capacitivo é menos
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 76
influenciado por campos magnéticos do que o do tipo indutivo, por isso foi o escolhido.
O tubo da sonda é conectado ao microfone através de uma câmara de formato cônico
localizada imediatamente a frente do diafragma, conforme apresentado na figura 3.6 C.
Um amplificador lock-in modelo SR850 DSP da Stanford Research System foi usado na
detecção do sinal.
Figura 3.6. Representação esquemática da célula de medida e do microfone no método
termoacústico: (A) a célula; (B) o porta amostra; (C) o microfone
[3]
.
3.2.3. Prova do principio
Para se confiar nas medias de propriedades termo-magnéticas obtidas pelo método
termoacústico, deve ser verificado que o sinal medido realmente é resultado do EMC e é
uma função linear do calor gerado na amostra. Para conferir se a resposta da célula e da
eletrônica associada é uma função linear, a amostra magnética foi substituída por um
resistor de 10 colocado na câmara da célula. Foram feitas conexões elétricas pela base
de Teflon
®
. Quando uma corrente alternada passa através do resistor o calor dissipado
gera ondas térmicas dentro da célula. Se a quantidade de calor for pequena o suficiente,
as ondas de pressão podem ser consideradas semelhantes às produzidas pelo EMC.
A figura 3.7 mostra a voltagem de resposta da saída do pré-amplificador para
diferentes níveis de potência dissipada no resistor. O segundo harmônico apresentou
magnitude uma ordem abaixo do fundamental. Sob as condições de teste, com a célula
na temperatura de 25
o
C, os gráficos da figura 3.7 mostram que o sistema é capaz de
detectar níveis de potência tão baixo quanto 320
µW. Portanto, a resposta do sistema é
linear até 130 mW, que é um valor superestimado em relação a potência dissipada no
EMC.
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 77
Em seguida, uma amostra de gadolínio foi colocada na célula e um campo
alternado foi aplicado sobre ela. O amplificador lock-in detectou uma voltagem
proporcional à variação de campo. Neste momento, é preciso verificar se a resposta
realmente é devido ao EMC, pois o aquecimento devido a correntes de Foucault, perdas
por histerese, ou vibrações magnetostrictivas também podem induzir mudanças de
pressão dentro da célula.
Figura 3.7. Voltagem de resposta detectada pelo amplificador lock-in em função da
potência de aquecimento elétrico dissipada no resistor na freqüência de 4.00 Hz e com
a temperatura da célula mantida em 25
o
C. O suplemento mostra a resposta até 4 mW
em uma escala ampliada
[3]
.
Para verificar se o aquecimento devido a correntes de Foucault tem influenciado o
sinal medido, uma amostra de cobre foi usada em lugar de gadolínio sob o mesmo
campo modulado de 200 G, e nenhum sinal foi detectado.
O ferro tem uma grande perda por histerese, mas não apresenta EMC a
temperatura ambiente. Sob teste, uma amostra de ferro sujeita as mesmas condições que
o gadolínio não produziu sinal, o que elimina a possibilidade de contribuições devido a
efeitos de perda por histerese.
A magnetostricção de uma amostra acontece na mesma direção do campo. Como a
amostra na célula é orientada apresentando a menor área superficial na direção do
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 78
campo, a mudança no volume de gás devido a qualquer vibração magnetostrictiva é
desprezível. Além disso, a magnetostricção desaparece no ponto de Curie. Se realmente
houvesse contribuições significantes de efeitos magnetostrictivo para o sinal de resposta
longe do ponto de Curie, não haveria nenhum cume agudamente definido no sinal de
resposta do Gd, conforme foi observado. Estes testes confirmaram o fato que a resposta
do Gd realmente é do EMC.
3.2.4. Calibração do Sistema e Resultados Obtidos
A fim de calibrar o sistema foi escolhida uma amostra de gadolínio comercial de
99,9% de pureza, pois seus dados termomagnéticos são bem documentados na
literatura. A amostra usada, com dimensões de 12 mm X 4 mm X 0,5 mm, foi
submetida a um campo de 200 G modulado a 4 Hz sobreposto ao campo estático, cujos
valores aplicados foram de 2500, 3000, 3500, 4000 e 4500. A resposta em voltagem
v
foi registrada para estes cinco campos estáticos no intervalo de temperatura de 282-
305 K.
A resposta da voltagem
v
detectada pelo amplificador lock-in está correlacionada
com a magnitude de variação de temperatura
T
δ
na superfície da amostra na forma:
vFT
system
=
δ
,
3.2.7
em que
system
F é a constante de calibração.
Utilizando dados de magnetização, medidos em um magnetometro MPMS
2
SQUID, e dados presentes na literatura do calor específico a campo zero para uma
amostra de gadolínio, a calibração foi realizada com base na equação
H
T
M
C
T
T
PH
HP
δδ
,
,
= . O resultado obtido por este processo foi:
( )
mVmK
T
F
system
/
15.2730051.01
079.5
= .
3.2.8
Gopal mediu o EMC para o Gd (figura 3.8) e para as ligas
2,88,91
DyGd (figura
3.9) e
1,109,89
ErGd (figura 3.10). Estas duas últimas foram preparadas com materiais
comerciais de 99,9% de pureza em um forno a arco. Nas figuras 3.8(a), 3.9(a) e 3.10(a)
temos a dependência experimental com temperatura da variação temperatura T
δ
causada pelo campo magnético modulado de 200 G em um campo magnético externo de
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 79
2500, 3000, 3500, 4000 e 4500 G , variação esta medida pelo método termoacústico na
região da temperatura de Curie.
(a)
(b)
Figura 3.8. Resultados obtidos para uma amostra de Gd: (a) variação de temperatura
devido ao campo modulado de 200 G para diferentes valores do campo estático; (b)
EMC para cinco passos de campo estático começando do zero
[3]
.
(a)
(b)
Figura 3.9. Resultados obtidos para a liga Gd-Dy: (a) variação de temperatura devido ao
campo modulado de 200 G para diferentes valores do campo estático; (b) EMC para
cinco passos de campo estático começando do zero
[3]
.
Os baixos valores de
T
δ
para altos H estão relacionados com o decréscimo de
TM
com o aumento do campo magnético. As figuras 3.8(b), 3.9(b) e 3.10(b)
representam o EMC total
(
)
TT
em diferentes campos magnéticos que foram
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 80
determinados a partir dos dados da magnetização, do calor específico e dos dados de
T
δ
.
(a)
(b)
Figura 3.10. Resultados obtidos para a liga Gd-Er: (a) variação de temperatura devido
ao campo modulado de 200 G para diferentes valores do campo estático; (b) EMC para
cinco passos de campo estático começando do zero
[3]
.
Infelizmente, não existem dados de
T
a baixos campos na literatura. O menor
valor reportado para o Gd até a publicação do trabalho de Gopal e co-autores era de 1 T
[5]
. No entanto, os resultados atingidos pelos autores concordam qualitativamente com
os valores reportados. A temperatura de Curie obtida para a amostra de gadolínio foi de
292 K, a qual também concorda com o valor registrado na literatura. Para a amostra de
2,88,91
DyGd o valor da temperatura de Curie encontrada através dos dados de
T
foi de
280 K, e para a
1,109,89
ErGd de 275 K.
Conforme observado, no processo de calibração da célula, Otowski e co-autores,
utilizaram uma amostra eletricamente aquecida e estimaram a variação de temperatura
usando dados de capacidade térmica e densidade da amostra. Gopal e co-autores não
seguiram este mesmo caminho, optando por outro procedimento para determinar o fator
de calibração como uma função da temperatura da célula. Eles explicam:
Primeiramente, desde que as amostras usadas no processo de calibração sejam
razoavelmente boas condutoras elétricas, torna-se extremamente difícil fazer bons
contatos elétricos reproduzíveis (mantendo a resistência da junção pelo menos uma
ordem de grandeza abaixo do que a resistência da amostra) para prover uma potência
Capítulo 3. Detecção Acústica do Efeito Magnetocalórico 81
de aquecimento precisamente controlada. Segundo, sempre existe o problema da
condução de calor nos fios conectados. Por estas razões, decidimos calibrar a célula
usando os dados de capacidade térmica e
TM
da amostra.
A técnica foi testada em regiões limitadas de temperatura (cerca de 260 a 305 K) e
campos magnéticos (ditados pela limitação do equipamento usado), existindo uma clara
possibilidade de sua adaptação para trabalhar em baixas temperaturas e altos campos
magnéticos. Em tal tentativa, ressalta os autores, deve-se considerar que o conjunto
célula-sonda teria de ser preenchido com gás hélio, evitando assim, problemas
referentes ao resfriamento do sistema. Outro ponto a ser considerado é que o microfone
teria de ser colocado em uma temperatura constante independentemente da temperatura
da célula. Neste caso, haveria indubitavelmente um grande gradiente de temperatura
(consequentemente da densidade) no gás entre a célula e o microfone. Estes aspectos
ainda estão atualmente debaixo de considerações e especulações.
3.3. Referências Bibliográficas
1. W. Otowski, C. Gloreux, R. Hofman, J. Thoen; “New acoustic detection technique
for a magnetocaloric effect”. Thermochimica Acta, 218, 123-133 (1993).
2. A. R. Chowdhury, G. S. Collins, and C. Hohenemser, 1986. “Static universality
class implied by the critical exponents of Gd”. Phys. Rev. B, 33: 6231-6234.
3. B. R. Gopal, R. Chahine, M. Folddeaki, T. K. Bose; “Noncontact thermoacoustic
method to measure the magnetocaloric effect”. Review of Scientific Instruments,
66(1), 232-238 (1995).
4. A. M. Tishin, Y. I. Spichkin; “The Magnetocaloric Effect and its Applications”,
Series in Condensed Matter Physics, IOP Publishing Ltd, Institute of Physics
Publishing Bristol and Philadelphia (2003).
5. S. M. Benford and G. V. Brown, J. Appl. Phys. 52, 2110 (1981).
Capítulo 4. Montagem do Experimento 82
Capítulo 4
Montagem do Experimento
Como o objetivo deste trabalho é a construção de um aparato experimental capaz
de captar o EMC através de ondas acústicas, no presente capítulo nos concentramos em
discorrer sobre as várias etapas envolvidas no projeto e construção da célula
magnetoacústica final. As etapas mencionadas incluem os primeiros protótipos da
célula, e a caracterização do eletroímã, que fornece o campo magnético constante, bem
como da bobina de Helmholtz, que é responsável pelo campo magnético alternado, o
campo de prova.
Apresentamos também o projeto de uma célula fotoacústica aberta que permite a
variação de temperatura da amostra, sendo possível assim, estudar propriedades
térmicas dos materiais magnetocalóricos (sólidos) em função da temperatura.
4.1. Considerações Preliminares do Ducto Sonoro
O primeiro aspecto a ser pesquisado é o sistema de condução das ondas sonoras
até o microfone. A célula magnetoacústica deve possuir um ducto longo o suficiente
para que o microfone não seja influenciado pelos campos magnéticos
[1,2]
. Portanto,
primeiramente nos concentramos em descobrir um ducto que além de longo não
apresentasse características magnéticas.
Após análise de alguns possíveis ductos, optamos pelo capilar vítreo de um
termômetro de mercúrio, este foi cortado e limpo. Porém, restavam dúvidas sobre a
condução sonora dentro do capilar. Como poderíamos testar sua eficácia no que se
refere a condução sonora? A fim de respondermos a esta pergunta projetamos e
construímos um protótipo (figura 4.1), o qual consiste em quatro partes: o ducto de
vidro; uma ponteira suporte onde a amostra é posicionada horizontalmente sobre um
furo em forma de “L” que direciona a câmara acústica ao ducto; um suporte ao
microfone que o direciona diretamente a outra extremidade do ducto; e o sistema de
polarização do microfone juntamente com sua conecção ao amplificador síncrono.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 83
Figura 4.1. Ilustração esquemática do protótipo construído para testar a condução
sonora do ducto capilar.
Usamos o protótipo (figura 4.2) em um experimento fotoacústico de varredura
de freqüência convencional, pois, conforme mencionado no capítulo 2, a ordem de
magnitude da onda sonora produzida pelo efeito fotoacústico é a mesma do EMC
[1,2]
.
Esse experimento geralmente permite a obtenção da difusividade térmica da amostra
analisada
[3-5]
, porém para tal objetivo é necessário calibrar a célula e obter a curva de
resposta da mesma. Como este não é o projeto final, não tivemos a pretensão de
trabalhar na curva de resposta da célula. Mas a intenção deste experimento foi
descobrir se o ducto conduziria a onda sonora gerada pelo efeito fotoacústico e se a
célula apresentava alguma freqüência de ressonância de Helmholtz, constituindo-se
assim uma análise qualitativa.
Usando uma amostra padrão de alumínio com espessura de 60 micrometros e um
laser de estado sólido (
nm532
λ
), realizamos uma varredura de freqüência na faixa
de 6 Hz até cerca de 400 Hz, faixa esta que é mais que suficiente para realizar o
experimento magnetoacústico proposto, que abrangerá algumas dezenas de Hertz
[1,2]
.
Realizado o experimento, notamos claramente a viabilidade do ducto, pois não
apresentou nenhuma freqüência de ressonância e um rendimento maior que o esperado
para a condução sonora, fornecendo um sinal da ordem de miliVolts no amplificador
lock-in.
Concluída essa etapa do plano de trabalho, demos atenção ao estudo do sistema de
variação de temperatura do experimento.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 84
Figura 4.2. Foto da célula protótipo construída para testar a condução sonora em um
ducto capilar vítreo de termômetro
.
4.2. Sistema de Variação de Temperatura
Do capítulo 1, já sabemos que o EMC é dependente de duas variáveis:
temperatura e campo magnético
[6,7]
. Na literatura corrente, em experimentos de
detecção via acústica do EMC
[1,2]
, o controle de temperatura é realizado por um
processo de circulação de água. Todavia, este procedimento nos pareceu um tanto
quanto inviável, devido aos fatos de a passagem de água provocar ruídos sonoros
indesejáveis e instabilidade na temperatura da amostra, juntamente com outros
inconvenientes de projeto da célula. Portanto, decidimos abandonar esse meio de
variação de temperatura e o substituímos por um elemento Peltier.
As pastilhas termoelétricas operam utilizando o efeito Peltier, a teoria de que
um efeito aquecedor ou refrigerador quando uma corrente elétrica passa por dois
condutores
[8]
. A voltagem aplicada aos pólos de dois materiais distintos cria uma
diferença de temperatura. Graças a essa diferença, o resfriamento Peltier fará o calor
mover de um lado ao outro. Uma típica pastilha de Peltier conterá uma série de
elementos semicondutores do tipo-p e tipo-n, agrupados como pares (figura 4.3), que
agirão como condutores dissimilares.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 85
Figura 4.3. Uma típica pastilha Peltier contém uma série de elementos semicondutores
do tipo-p e tipo-n
[8]
.
Essa série de elementos é soldada entre duas placas cerâmicas, eletricamente em
série e termicamente em paralelo. Quando uma corrente continua passa por um ou mais
pares de elementos de tipo-n a tipo-p, uma redução na temperatura da junta ("lado
frio") resultando em uma absorção do calor do ambiente. Este calor é transferido pela
pastilha por transporte de elétrons e emitido no outro lado ("quente") via elétrons que
movem do alto para baixo (figura 4.4). A capacidade de bombeamento de calor é
proporcional à corrente e o número de pares de elementos tipo-n e tipo-p. Ao
invertermos a corrente, invertemos também o sentido de transferência de calor e é
possível aquecer, ao invés de resfriar, a parte superior da pastilha.
Figura 4.4. Quando uma corrente continua passa por um ou mais pares de elementos de
tipo-n a tipo-p, há uma redução na temperatura da junta ("lado frio"). Este calor é
transferido pela pastilha por transporte de elétrons e emitido no outro lado ("quente")
[8]
.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 86
O elemento Peltier apresenta inúmeras vantagens ao sistema que nos propomos a
construir. Ele permite uma variação total de temperatura de aproximadamente 67 K,
podendo tanto aumentar quanto diminuir a temperatura, tendo como referência a
temperatura de sua base, além de apresentar alta resolução na temperatura e ser muito
estável.
4.3. Sistemas de Variação de Campo Magnético
Sendo o campo magnético outra variável de relevância no EMC, necessitamos de
um sistema capaz de fornecer tal campo. Segundo os recursos disponíveis, utilizamos
um eletroímã de núcleo de ferro (figura 4.5) para gerar o campo magnético constante.
Um aspecto de fundamental importância é a caracterização do campo fornecido por este
eletroímã. A calibração foi realizada através de uma fonte de alta potência e um
gaussímetro que mediu a intensidade do campo magnético gerado segundo a corrente
fornecida pela fonte. Com a ponteira do gaussímetro localizada justamente a meia
distância dos pólos do eletroímã, obtemos a curva de calibração do eletroímã, a qual não
foi linear com a corrente, conforme vemos na figura 4.6. Nesta figura vemos em detalhe
uma seta em azul, que indica a mudança de escala no gaussímetro, e uma seta vermelha,
indicando um aquecimento no eletroímã.
Figura 4.5. Eletroímã que será responsável pelo fornecimento do campo magnético
constante no experimento magnetoacústico final.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 87
Do gráfico da corrente pela voltagem (figura 4.7), notamos uma mudança no
regime linear a partir de uma corrente de 6 A, indicando que a resistência nas bobinas
aumentou devido ao aquecimento causado pela dissipação de energia através do efeito
Joule. Este fato foi comprovado por um sensor de temperatura em contato com a
carcaça do eletroímã que indicou um crescente aumento na temperatura a partir de 6 A.
Portanto, o eletroímã é capaz de fornecer com segurança e por um tempo razoavelmente
longo um campo magnético de aproximadamente 1800 G.
-1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
2200
troca de escala (10X)
Começou a aquecer em 6,20 A
Campo Magnético (G)
Corrente (A)
Figura 4.6. Curva de calibração do eletroímã.
-2 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32
-1
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
troca de escala (10X)
Começou a aquecer em 16,92 V
Corrente (A)
Voltagem (V)
Figura 4.7. Corrente elétrica versus voltagem aplicada no eletroímã, indicando uma
mudança de comportamento a partir de 16,92 V.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 88
Tendo o comportamento do eletroímã em função da corrente elétrica, nos
concentramos em estudar a uniformidade do campo magnético por este fornecido.
Utilizando transladores, locomovemos o eletroímã deixando a ponteira do gaussímetro
fixa, assim, colecionamos dados da intensidade do campo magnético em função da
posição do gaussímetro em relação aos próprios pólos do eletroímã. Os resultados são
mostrados nas figuras 4.8.
-2 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32
1600
1650
1700
1750
1800
1850
1900
1950
2000
2050
2100
i=3,8 A
i=6,5 A
i=10 A
Campo Magnético (G)
Distância Horizontal (mm)
Figura 4.8. Uniformidade do campo magnético do eletroímã em função da distância
horizontal entre os pólos.
Da figura 4.8 nota-se que nas proximidades da região central dos pólos, o campo
magnético praticamente não varia em um intervalo de aproximadamente 8 mm, em
baixa corrente, e 6 mm em alta corrente. Tendo em mente que é de suma importância
que o campo magnético permaneça inalterado ao longo da amostra, estabelecemos a
distância de 6 mm, em torno do centro dos pólos, como máxima variação de espaço sem
que o campo magnético varie.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 89
Na figura 4.9 vê-se que o campo magnético permanece inalterado na altura que
compreende a região central dos pólos, cerca de 8 mm em torno do centro. Portanto, fica
evidente que esse eletroíé adequado para fornecer o campo magnético constante ao
experimento proposto, pois seu campo varia muito pouco nas dimensões em que a
amostra será posicionada, podendo assim ser desprezado esta variação.
-3 0 3 6 9 12 15 18 21 24 27 30 33 36 39
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
1000
1100
1200
1300
1400
1500
1600
1700
1800
1900
Campo Magnético (G)
Distância Vertical (mm)
i=0 A
i=3,8 A
i=6,5 A
Figura 4.9. Uniformidade do campo magnético do eletroímã em função da altura entre
os pólos, com a ponteira do gaussímetro posicionado no meio dos pólos.
Em seguida, construímos uma bobina de Helmholtz enrolando 1650 voltas de fio
em um carretel de estanho. Para a realização do experimento é fundamental termos o
campo estático e o de prova em paralelo sobre a amostra. Assim, é imperativo um ajuste
nos pólos do eletroímã para que as bobinas sejam inseridas sobre eles.
Após a construção das bobinas, construímos novos pólos para o eletroímã que se
ajustassem a sobreposição das bobinas (figura 4.10). Portanto, faz-se necessário
analisarmos a influência desta mudança no campo magnético fornecido pelo eletroímã.
Comparando os dados obtidos antes e depois da inserção da bobina, com os novos
Capítulo 4. Montagem do Experimento 90
pólos, construímos o gráfico da figura 4.11, onde vemos claramente que não houve
discrepâncias entre os dados. Portanto, o campo magnético permaneceu inalterado
frente os novos pólos. Extrapolamos esta afirmação a uniformidade do campo
magnético entre os pólos do eletroímã.
Figura 4.10. Foto do sistema de fornecimento de campo magnético estático/alternado, o
qual consiste na bobina de helmholtz inserida nos pólos do eletroímã.
-1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
-200
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
2200
Campo Magnético (G)
Corrente elétrica (A)
Dados com as bobinas sobrepostas
Dados sem as bobinas sobrepostas
Figura 4.11. Comparação entre o campo magnético do eletroímã com os pólos originais
e com os novos pólos, aos quais introduzimos a bobina de Helmholtz.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 91
Em posse dos dados atuais, ajustamos a curva com um polinômio de grau quatro, e
apresentamos o resultado na figura 4.12. O polinômio ajustado é dado por:
432
39193,052741,1217777,14877166,81270210,82)( iiiiiB ++=
.
4.2.1
-1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
2200
Campo Magnético (G)
Corrente elétrica (A)
Medida do campo magnético
Ajuste polinomial de grau 4
Figura 4.12. Ajuste da curva de calibração do eletroímã com um polinômio de grau
quatro.
Após o término da caracterização do campo magnético constante, consideramos a
caracterização do campo magnético modulado. Para que a bobina forneça um campo
magnético modulado, com freqüência controlada, foi necessário a construção de um
dispositivo eletrônico que transformasse a corrente contínua, fornecida por uma fonte,
em corrente alternada (caixa cinza na figura 4.10). A freqüência de modulação é
fornecida pela saída TTL do lock-in e conectada ao dispositivo através de um cabo
BNC. Dessa forma é possível o controle da freqüência da corrente que passa pela
bobina através do controle da freqüência da oscilação interna do lock-in.
Utilizando um gaussímetro comercial e um osciloscópio obtemos a forma de onda
do campo, em Gauss, para 3 configurações, são elas:
1. Corrente no eletroímã 0 A e 9 V na fonte da bobina;
2. Corrente no eletroímã 0 A e 19 V na fonte da bobina;
3. Corrente no eletroímã 9 A e 19 V na fonte da bobina.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 92
Realizamos o processo para as freqüências 10 Hz, 20 Hz, 30 Hz e 245 Hz. Os
resultados são apresentados nas figuras 4.13, 4.14, 4.15 e 4.16.
-0,1 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 1,1
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
2200
2400
2600
2800
3000
3200
3400
3600
3800
4000
Campo Magnético (G)
Tempo (s)
Dc=0A, Ac=9V
Dc=0A, Ac=19V
Dc=9A, Ac=19V
Figura 4.13. Forma de onda do campo magnético, em Gauss, modulado em 10 Hz.
-0,1 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 1,1
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
2200
2400
2600
2800
3000
3200
3400
Campo Magnético (G)
Tempo (s)
Dc=0A, Ac=9V
Dc=0A, Ac=19V
Dc=9A, Ac=19V
Figura 4.14. Forma de onda do campo magnético, em Gauss, modulado em 20 Hz.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 93
-0,1 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 1,1
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
2200
2400
2600
2800
3000
3200
3400
Campo Magnético (G)
Tempo (s)
Dc=0A, Ac=9V
Dc=0A, Ac=19V
Dc=9A, Ac=19V
Figura 4.15. Forma de onda do campo magnético, em Gauss, modulado em 30 Hz.
0,00 0,02 0,04 0,06 0,08 0,10 0,12
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
2000
2200
2400
Campo Magnético (G)
Tempo (s)
Dc=0A, Ac=9V
Dc=0A, Ac=19V
Dc=9A, Ac=19V
Figura 4.16. Forma de onda do campo magnético, em Gauss, modulado em 245 Hz.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 94
Observamos, através da figura 4.16, que na freqüência de 245 Hz o campo
magnético teve uma amplitude de aproximadamente 40 G.
Por fim, analisamos a influência da freqüência na amplitude do campo magnético
modulado. O resultado é apresentado na figura 4.17, onde apresentamos o gráfico, em
escala linear, da variação de campo pela freqüência. Na figura 4.18, temos o mesmo
resultado apresentado em escala logarítmica.
-20 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220 240 260
-50
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
500
550
600
650
700
750
800
850
δ
B (G)
Freqüência (Hz)
Dc=0A, Ac=9V
Dc=0A, Ac=19V
Dc=9A, Ac=19V
Figura 4.17. Gráfico, em escala linear, da amplitude do campo magnético modulado
pela freqüência de modulação.
10 100
10
100
1000
δ
B (G)
Freqüência (Hz)
Dc=0A, Ac=9V
Dc=0A, Ac=19V
Dc=9A, Ac=19V
Figura 4.18. Gráfico, em escala logarítmica, da amplitude do campo magnético
modulado pela freqüência de modulação.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 95
Da figura 4.18 vemos um decaimento linear da amplitude do campo magnético
modulado pela freqüência de modulação, quando exposto em escala logarítmica,
indicando assim, uma tendência de decaimento do tipo
B
fA
. (A e B são constante
positivas) para a amplitude do campo modulado da figura 4.17.
4.4. Primeiros Protótipos
Tendo definido o sistema de variação de temperatura da amostra, o ducto sonoro,
e o sistema de variação de campo magnético, projetamos os primeiros protótipos da
célula magnetoacústica, na qual intencionamos captar o sinal traseiro da amostra em
analogia com a célula fotoacústica aberta (OPC)
[3-5]
. A primeira tentativa está
representada esquematicamente na figura 4.19.
Figura 4.19. Representação esquemática do primeiro protótipo da célula
magnetoacústica (a esquerda), juntamente com a foto das peças construídas (a direita).
O desenho, em escala 2:1, da ponteira suporte da amostra e do suporte do
microfone, foram submetidos a construção na oficina mecânica do departamento de
física da Universidade Estadual de Maringá. No entanto, o calor dissipado pela
ponteira suporte da amostra não foi suficiente para a estabilização da temperatura do
elemento Peltier. Assim, abandonamos este primeiro protótipo sem nem terminarmos
sua montagem.
Na tentativa seguinte, incluímos uma ponteira suporte da amostra que permitisse o
escoamento do calor transferido pelo elemento Peltier, através de um dissipador de
alumínio. A idéia permaneceu a mesma da representação contida na figura 4.19. A
Capítulo 4. Montagem do Experimento 96
figura 4.20 mostra fotos deste protótipo montado, na qual se destaca a posição do
elemento Peltier, do dissipador de calor e do suporte do microfone. O suporte mecânico
da célula é fornecido por um cilindro vazado conectado ao ducto capilar. Na confecção
desta célula, utilizamos uma pastilha termoelétrica modelo SH 1.4-15-10 da Melcor
Thermal Solutions. O microfone empregado foi o Sennheiser KE 4-211-2.
Figura 4.20. A esquerda temos a foto do segundo protótipo da célula magnetoacústica, na
qual indicamos as principais partes, e a direita temos a foto da ponteira suporte da amostra.
A montagem experimental para os primeiros testes com o protótipo da célula
apresentado acima, está esquematizado na figura 4.21. Os equipamentos utilizados
nessa montagem incluem um amplificador Lock-in (modelo SR830 da STANDFORD
RESEARCH SYSTEMS), duas fontes de corrente contínua, uma para o eletroímã (HP-
IB DC Power Supplies, modelo 6653A) e outra destinada a bobina de Helmholtz
(SORENSEN L Series Laboratory DC Power, modelo LM 18-10, não mostrada na
figura 4.21). No tocante ao controle de temperatura do elemento Peltier, usamos um
contolador de temperatura próprio para pastilhas termoelétricas (Melcor Thermal
Solutions, modelo MTTC-1410).
Para realizarmos um primeiro teste, uma amostra de Gd com pureza de
aproximadamente 99,9% foi preparada. Esta amostra foi cortada na forma de um
retângulo de 10 X 12 mm com espessura de 0,728 mm e depois polida. Utilizando graxa
de vácuo, vedamos a câmara acústica com a amostra posicionada sob o furo do
elemento Peltier. No intuito de confirmarmos a vedação acústica da célula, incidimos
um laser sobre a amostra, gerando assim o efeito fotoacústico, e por meio de um sinal
estável no amplificador lock-in concluímos que não havia vazamento de pressão na
célula. Em seguida, a ponteira suporte da amostra foi inserida entre os pólos do
eletroímã. Devido ao caráter experimental de primeiras tentativas, a amostra de Gd foi
Suporte do
microfone
Dissipador
de alumínio
Elemento Peltier
Capítulo 4. Montagem do Experimento 97
presa com fita adesiva, evitando assim o deslocamento da amostra quando submetida ao
campo magnético.
Figura 4.21. Representação esquemática do experimento magnetoacústico. Em detalhe a
amostra (em vermelho) sobre o elemento Peltier do segundo protótipo da célula
magnetoacústica.
Realizamos o experimento variando a temperatura num intervalo de 10 a 40
o
C,
pois sabemos que a temperatura de Curie do elemento lantanídeo Gd é em torno de 20
o
C. Foram empregadas duas configurações de campo magnético constante, a saber, 530
G (
Ai 0
=
no eletroímã) e 2000 G ( Ai 9
=
no eletroímã), as mesmas anteriormente
caracterizadas na seção precedente (figura 4.13). Na bobina de Helmholtz o campo foi
modulado em 10 Hz, com uma variação de campo correspondo a aproximadamente 750
G (19V).
Para confirmar a validade da medida do EMC, preparamos outras duas amostras,
uma de cobre, cujo diâmetro é de 10 mm e espessura de 0,080 mm, e outra de grafite
carbomec de 10 mm de diâmetro e 0,604 mm de espessura, as quais forma submetidas
as mesmas condições descritas anteriormente.
Os resultados do sinal magnetoacústico, captado pelo amplificador lock-in, em
função da temperatura da amostra, são vistos na figura 4.22. Vê-se claramente que o
sinal gerado pelo EMC na amostra de Gd é ximo em torno de 19
o
C, conforme o
esperado. As amostras de cobre e grafite não geraram absolutamente nenhum sinal
Capítulo 4. Montagem do Experimento 98
quando submetidas aos campos magnéticos e a variação de temperatura, confirmando
assim, que o sinal gerado na amostra de Gd não prove de vibrações da célula ou de
qualquer outro fator do sistema, mas sim de efeitos relacionados com o próprio material
magnético, possivelmente o EMC.
Conforme explanado no capítulo 1, o comportamento universal observado em
todos os materiais ferromagnéticos magnetocalóricos é que o EMC específico
(
)
HdHTd
Tad
)( tem a maior intensidade para os mais baixos campos magnéticos,
gradualmente decrescendo com o aumento da intensidade do campo
[6,7]
. Quando
submetemos a amostra de Gd a um campo magnético constante de aproximadamente 4
vezes mais intenso, notamos que o sinal acústico captado no experimento na
temperatura de Curie diminuiu consideravelmente (figura 4.22). Logo, concluímos que
o sinal acústico gerado pela amostra é devido ao EMC, estando em conformidade com a
teoria do efeito.
5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
0,0000
0,0001
0,0002
0,0003
0,0004
0,0005
0,0006
0,0007
0,0008
Sinal (V)
Temperatura (
o
C)
Gd (Dc=0A, Ac=19V)
Gd (Dc=9A, Ac=19V)
Cu (Dc=9A, Ac=19V)
Grafite (Dc=9A, Ac=19V)
Figura 4.22. Gráfico do sinal gerado pelo EMC de uma amostra de Gd com espessura
de 0,728 mm. Primeiro sinal magnetoacústico medido com o segundo protótipo,
através de um campo magnético modulado em 10Hz.
A figura 4.23 mostra a fase do sinal magnetoacústico em relação ao campo de
prova. Neste gráfico confirmamos o fato de o sinal medido das amostras não magnéticas
serem apenas mero ruído, pois a fase não apresentou padrão algum. Já não podemos
afirmar o mesmo para amostra de Gd, pois a fase permaneceu constante nos dois
Capítulo 4. Montagem do Experimento 99
campos magnéticos empregados. Dessa forma, fica provado que é possível o estudo via
acústica do EMC através do sistema experimental já descrito.
No entanto, a configuração do segundo protótipo apresenta algumas desvantagens
que prejudicam a confiabilidade das medidas. A princípio, a temperatura de Curie da
amostra de Gd não deveria variar por causa da aplicação do campo magnético mais
elevado. O gráfico do sinal indica uma variação de aproximadamente 1
o
C, dessa forma,
concluímos que o sistema de variação de temperatura não apresentou estabilidade
suficiente. Esta instabilidade provém do fato de a amostra estar em contato com o
elemento Peltier em uma de suas faces, e na outra, em contato com o ambiente, levando
a uma temperatura não homogênea na amostra, sujeita as variações de temperatura do
ambiente.
5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
-120
-100
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
100
120
140
Gd (Dc=0A, Ac=19V)
Gd (Dc=9A, Ac=19V)
Cu (Dc=9A, Ac=19V)
Grafite (Dc=9A, Ac=19V)
Fase (rad)
Temperatura (
o
C)
Figura 4.23. Gráfico da fase do EMC de uma amostra de Gd com espessura de 0,728
mm. Primeiro sinal magnetoacústico medido com o segundo protótipo, através de um
campo magnético modulado em 10Hz.
Dos dados contidos na literatura sabe-se que a curva do EMC do Gd apresenta
certa simetria em torno da temperatura de Curie
[7]
, o que não é observamos na figura
4.22. Ao realizarmos o experimento em temperatura inferiores a 10
o
C, notamos que o
sinal acústico medido pelo lock-in, ao invés de se anular conforme era esperado, volta a
aumentar. Isto ocorreu porque a amostra se torna ferromagnética em temperaturas
inferiores a de Curie e, portanto, o campo magnético gera vibrações mecânicas na
Capítulo 4. Montagem do Experimento 100
própria amostra. As vibrações mecânicas periódicas, por sua vez, levam a uma variação
periódica na pressão interna da célula, dessa forma, gerando um sinal acústico cada vez
mais intenso conforme a amostra se torna mais ferromagnética. Este fato foi confirmado
através da incidência rasante de um laser sobre a superfície da amostra, o feixe
projetado em uma parede distante movia-se na freqüência do campo magnético de
prova, sendo que a fita adesiva não pôde impedir este movimento. Portanto, o EMC
captado a baixo da temperatura de transição magnética foi camuflado pela vibração
mecânica da amostra.
As dificuldades descritas acima, juntamente com o fato de que este segundo
protótipo permite apenas a análise de amostras sólidas, nos fizeram abandonar o projeto
de uma célula com configuração semelhante a OPC.
4.5. Célula Magnetoacústica Final
A metalurgia do pó, também chamada sinterização, é o ramo da indústria
metalúrgica que se dedica a produção de peças a partir de pós metálicos e não metálicos.
Sempre que houver necessidade de se produzir grandes quantidades de peças, de formas
complexas, sempre haverá espaço para a metalurgia do pó. Este é o caso das futuras
aplicações comerciais de amostras magnetocalóricas em refrigeradores magnéticos. A
metalurgia do pó baseia-se na prensagem de pós em moldes metálicos e consolidação da
peça por aquecimento controlado, resultando em um produto com a forma desejada,
bom acabamento de superfície, composição química e propriedades mecânicas
controladas
[5]
.
Tendo em vista que as amostras magnetocalóricas atualmente pesquisadas
precisarão da metalurgia do para se transformar em peças de um refrigerador, as
amostras produzidas são geralmente moídas. Assim, projetamos uma nova célula
acústica que seja capaz de medir o EMC também em materiais em pó. A ilustração
contida na figura 4.24 contém as principais partes que compõem a célula final.
As quatro partes principais que compõem a câmara acústica são:
SUPORTE DO MICROFONE responsável por fixar o microfone e seu cabo
de conexão, não permitindo vazamento de pressão. Esse componente
também é responsável por fazer a conexão entre o ducto sonoro e o
microfone, sem vazamentos;
Capítulo 4. Montagem do Experimento 101
DUCTO SONORO trata-se do meio pelo qual as ondas sonoras serão
transmitidas da amostra até o microfone. O ducto desempenha um papel
fundamental, manter o microfone longe o suficiente das linhas de campo
magnético, uma vez que o microfone é influenciado por campo magnético;
CONETOR DOS TUBOS peça que realiza a conexão entre o ducto sonoro e o
porta-amostra não permitindo qualquer vazamento de pressão. No conector
dos tubos existe um parafuso não magnético extravasador de pressão, através
do qual é possível sempre garantir a mesma pressão inicial na câmara
acústica e, ao mesmo tempo, permitindo a vedação quando apertado;
PORTA-AMOSTRA tubo cilíndrico de vidro com uma de suas extremidades
fechada, onde se deposita a amostra em estudo.
Figura 4.24. Ilustração da célula magnetoacústica final, apresentada em corte
transversal.
O desenho mecânico do projeto fina da célula magnetoacústica é apresentado no
apêndice A. O suporte do microfone e o conector dos tubos foram confeccionados em
MICROFONE
FIO DO
MICROFONE
DUCTO
SONORO
PARAFUSO
EXTRAVASADOR
DE PRESSÃO
CONECTOR DOS TUBOS
PORTA AMOSTRA
AMOSTRA
SUPORTE DO
MICROFONE
Capítulo 4. Montagem do Experimento 102
acrílico, o ducto e o porta-amostra são de vidro. O parafuso extravasador de pressão é
de latão, assim como as porcas de vedação (não mostradas na figura 4.24) contidas em
todas as conexões.
As figuras 4.25 e 4.26 mostram fotos do suporte do microfone e do conector dos
tubos, onde se destaca o sistema de vedação através de o’rings. Este sistema é composto
pelo o’ring, por uma arruela de pressão feita de Teflon e pela porca de vedação.
Figura 4.25. Foto dos componentes do suporte do microfone a esquerda, e a direita o
suporte montado.
Figura 4.26. A esquerda temos a foto das partes que compõem o conector dos tubos, e a
direita o conector montado.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 103
No que se refere ao sistema de variação de temperatura da amostra, a pastilha
termoelétrica se localiza sob o porta-amostra, em contato com seu fundo. O dissipador
de calor para o elemento Peltier foi projetado de acordo com suas dimensões, de tal
forma a permitir ser inserido entre os pólos do eletroímã. No dissipador também existe
um simples sistema que prende os fios do elemento Peltier e do sensor de temperatura
(PT-1000) do controlador (figura 4.27).
Para garantir que toda amostra possuiuma temperatura projetamos também
uma pequena peça de alumínio que se localiza na parte superior do elemento Peltier.
Dessa forma, o fundo do porta-amostra está em contato direto com o elemento Peltier e
na região imediatamente acima, em que existe amostra, o contato térmico com o Peltier
é realizado por esta peça de alumínio, evitando assim, um gradiente de temperatura na
amostra. Esta peça também tem a função de fixar o sensor de temperatura diretamente
sobre a pastilha termoelétrica, o que é realizado através de um franjo retangular na parte
inferior (figura 4.27).
Figura 4.27. A esquerda temos a foto do dissipador de calor da pastilha termoelétrica, e
a direita, fotos da peça responsável por homogeneizar a temperatura na amostra.
Na montagem da célula magnetoacústica empregamos uma pastilha termoelétrica
modelo CP 0.8-71-06L da Melcor Thermal Solutions. O microfone empregado foi o
Sennheiser KE 4-211-2. A figura 4.28 mostra uma foto do sistema completo
desmontado, incluindo vários porta-amostras, um pequeno funil para transferência de
Capítulo 4. Montagem do Experimento 104
amostras em para o porta-amostra, dois ductos sonoros diferentes, e a direita o
microfone juntamente com seu sistema de polarização (caixa cinza).
Figura 4.28. Foto das peças desmontadas do sistema que compõe a montagem
magnetoacústica.
Na figura 4.29 apresentamos o conjunto montado, onde vemos não a célula
acústica completa, mas também como se realiza o encaixe do porta-amostra com o
sistema de variação de temperatura da amostra. No intuito de melhorar o contato
térmico passamos pasta térmica em ambas as faces da pastilha termoelétrica, bem como
nas paredes internas da peça de alumínio responsável pela homogeneização da
temperatura na amostra.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 105
Figura 4.29. A esquerda temos a foto do conjunto montado, onde vemos a célula
acústica completa. A direita vemos fotos de como se realiza o encaixe do porta-amostra
com o sistema de variação de temperatura da amostra.
A fim de se caracterizar a célula acústica e analisar seu comportamento em função
do comprimento de dois tipos de ductos, realizamos um experimento fotoacústico de
varredura de freqüência incidindo um laser semicondutor ( nm532=
λ
da B&W TEK)
no fundo do porta-amostra, o qual continha carvão em pó. O laser é modulado por um
chopper modelo SR540, e o sinal foi analisado por um amplificador Lock-in modelo
SR830, ambos da STANDFORD RESEARCH SYSTEMS.
Sete ductos diferentes foram selecionados, sendo cinco deles tubos cilíndricos de
vidro com 6 mm de diâmetro externo e 3 mm interno (mesmos diâmetros do porta-
amostra), cujos comprimentos são de 10,7, 11,9, 18,8, 30,0 e 41,8 cm. Os outro dois
Capítulo 4. Montagem do Experimento 106
ductos são capilares vítreos de termômetros, conforme especificado no início deste
capítulo, com comprimento de 18,7 e 26,2 cm.
Os resultados obtidos para os dois ductos capilares são apresentados na figura
4.30, onde vemos que a amplitude do sinal fotoacústico praticamente não variou com o
comprimento do ducto. O sinal máximo foi detectado na freqüência de 5 Hz para
ambos, e como a potência do laser permaneceu constante em todas as freqüências,
concluímos que a melhor freqüência para qualquer um dos ductos capilares é justamente
em 5 Hz. Estes ductos não apresentaram nenhuma freqüência de ressonância, o que é
ideal no caso de realizarmos o experimento magnetoacústico com variação da
freqüência de modulação do campo magnético de prova.
-40 0 40 80 120 160 200 240 280 320 360 400 440
0,00000
0,00005
0,00010
0,00015
0,00020
0,00025
0,00030
Sinal (V)
Freqüência (Hz)
L=18,7 cm
L=26,2 cm
Figura 4.30. Sinal fotoacústico de uma amostra de carvão em pó em função da
freqüência de modulação do laser para os dois ductos capilares da célula
magnetoacústica.
No caso dos outro cinco ductos, o gráfico do sinal fotoacústico pela freqüência de
modulação do laser revelou varias freqüências de ressonância, conforme observado na
figura 4.31. O sinal máximo a baixas freqüências se deu aproximadamente em 10 Hz
para todos os comprimentos, sendo que a magnitude do sinal cai consideravelmente
com o aumento do comprimento do tubo. Assim, o melhor sinal a 10 Hz é o obtido com
o tubo de 10,7 cm de comprimento.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 107
Nas freqüências de ressonância percebemos que ocorre um aumento de sinal que
supera o sinal máximo a 10 Hz. No entanto, estas freqüências são muito altas quando
observadas pela óptica do campo magnético alternado produzido pelas bobinas de
Helmholtz, pois a variação de campo magnético em tais freqüências vai a zero devido a
auto-indutância das bobinas.
0 300 600 900 1200 1500 1800 2100 2400 2700
0,0000
0,0002
0,0004
0,0006
0,0008
Sinal (V)
Freência (Hz)
L=10,7 cm
L=11,9 cm
L=18,8 cm
L=30,0 cm
L=41,8 cm
Figura 4.31. Sinal fotoacústico de uma amostra de carvão em pó em função da
freqüência de modulação do laser para os cinco ductos cilíndricos de vidro, os quais
têm os mesmos diâmetros do porta-amostra da célula magnetoacústica.
Portanto, ao compararmos a intensidade do sinal fotoacústico em baixas
freqüências dos sete ductos, concluímos que o melhor ducto é o cilíndrico de vidro com
comprimento de 10,7 cm, pois seu sinal em 10 Hz foi de aproximadamente duas vezes
maior que o maior sinal em 5 Hz dos ductos capilares.
No entanto, para se usar este ducto é essencial saber se o campo magnético possui
intensidade suficiente para influenciar o microfone a distância de 10,7 cm dos pólos do
eletroímã. Através de um gaussímetro, medimos o campo magnético sentido nas
proximidades dos pólos do eletroímã, sendo que tanto o eletroímã quanto a bobina
foram submetidos as configurações de máximo campo. Neste procedimento, concluímos
que acima de aproximadamente 10 cm de distância vertical dos pólos a influência dos
campos magnéticos é desprezível, conforme pode ser observado na figura 4.32. Logo, o
Capítulo 4. Montagem do Experimento 108
ducto cilíndrico de vidro com comprimento de 10,7 cm pode ser empregado no
experimento magnetoacústico, sem que o microfone sofra influência dos campos
magnéticos que podemos gerar em nosso conjunto eletroímã/bobina.
4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32
-20
0
20
40
60
80
100
120
140
160
Campo Magnético (G)
Distância ao Centro dos Pólos do Eletroímã (cm)
Figura 4.32. Influência do campo magnético sentido nas proximidades dos pólos do
eletroímã na configuração de máximos campos.
Os resultados obtidos com o experimento magnetoacústico em várias amostras
magnetocalóricas serão abordados no próximo capítulo.
4.6. OPC com Variação de Temperatura
Em uma transição de fase, os parâmetros térmicos de determinada substância
sofrem alterações, e em uma transição de fase magnética não é diferente. Dessa forma,
se monitorarmos alguma propriedade térmica de uma amostra que apresente uma
transição de fase, em função de sua temperatura, é possível determinar a temperatura de
transição de fase e estudar sua influência neste parâmetro. Este tipo de estudo é
essencial em amostras magnetocalóricas, pois como visto na seção 2.4.1, em termos de
aplicações em refrigeradores, um material ideal não basta apenas apresentar uma alta
variação de entropia magnética, ou um alto RCP, mas também varias outras
características incluindo boas propriedades térmicas, viabilizando as trocas térmicas nos
regeneradores
[9-11]
.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 109
A técnica fotoacústica da célula aberta (OPC) permite a obtenção direta da
difusividade térmica de um material sólido. Em posse do valor da difusividade podemos
determinar a condutividade térmica indiretamente, através de dados do calor específico
e da densidade do material (
ρ
α
..ck
=
)
[3-5,11]
.
Neste contexto, projetamos uma célula fotoacústica aberta que permite a variação
de temperatura da amostra, no intuito de captarmos a transição de fase magnética dos
materiais magnetocalóricos através do monitoramento, via fotoacústica, da difusividade
térmica. Na figura 4.33 ilustramos esquematicamente a célula, detalhando seus
componentes. O projeto completo da célula é apresentado no apêndice B.
Figura 4.33. Ilustração esquemática da célula fotoacústica aberta que permite a
variação de temperatura da amostra por meio de um elemento Peltier.
Nesta célula empregamos uma pastilha termoelétrica modelo SH 1.0-125-06 da
Melcor Thermal Solutions, a qual possui um furo central com diâmetro de 3,6 mm. A
pastilha termoelétrica foi fixada sobre um dissipador de calor de alumínio adaptado as
necessidades da célula fotoacústica. Apesar de, neste caso, não desejarmos aplicar
PT
-
1000
+/
-
PELTIER
AMOSTRA
JANELA DE QUARTZO
PELTIER
DISSIPADOR
DE CALOR
MICROFONE
FIO DO MICROFONE
TAMPA ISOLANTE
DUCTO SONORO
Capítulo 4. Montagem do Experimento 110
campo magnético, o microfone deve localizar-se a certa distância da amostra devido a
sua variação de temperatura. O microfone utilizado foi o Sennheiser KE 4-211-2, o qual
possui uma membrana ultra-sensível não suportando grandes variações de temperatura,
de tal forma que quanto mais afastado da amostra e do elemento Peltier mais confiável
será seu desempenho. Assim, faz-se necessário o projeto de um ducto sonoro que foi
construído em Teflon.
O elemento Peltier atinge grandes variações de temperatura, e ao atingirmos
temperaturas abaixo da ambiente favorecemos a condensação de água sobre a amostra e
no próprio Peltier. Tendo em vista que esta condensação de água é altamente indesejada
em nosso sistema, projetamos uma tampa isolante térmica para evitar este problema.
Através da tampa isolante também se elimina o gradiente de temperatura dentro da
amostra, o qual surge devido ao fato de a amostra estar em contato com a pastilha
termoelétrica em uma de suas faces e com o ambiente em outra.
A tampa isolante foi construída em Teflon e se encaixa no elemento Peltier
exatamente sobre suas dimensões, sendo fixada através de dois parafusos de Teflon, não
mostrados na figura 4.33, e com graxa de vácuo sobre suas bordas, evitando um fluxo
de ar dentro da tampa. Justamente ao meio da tampa inserimos uma janela de quartzo,
permitindo assim que a luz do laser atinja a amostra fixada no elemento Peltier. Por fim,
a tampa isolante também desempenha o papel de fixar o sensor de temperatura (PT-
1000) do controlador de temperatura.
Na figura 4.34 apresentamos fotos, em dois ângulos de vista diferentes, da OPC
com variação de temperatura projetada, na qual é possível observar todas as partes
descritas anteriormente.
Para avaliarmos o sistema de variação de temperatura realizamos uma série de
testes que visavam monitorar as temperaturas do ambiente, do microfone e da pastilha
termoelétrica em comparação com a temperatura desejada, a ajustada no controlador de
temperatura. As temperaturas foram monitoradas em função do tempo para duas formas
de refrigerar o dissipador de alumínio, a saber, com água e gelo ou com um cooler.
A temperatura ambiente foi medida através de um termômetro de mercúrio. Um
pequeno orifício perto do microfone, na carcaça do ducto sonoro, permitiu a introdução
de um sensor de temperatura de um multímetro modelo 72-7725 da TENMA, cuja
temperatura medida é aproximadamente igual a do microfone. Para o controle da
Capítulo 4. Montagem do Experimento 111
temperatura da pastilha termoelétrica usamos um controlador modelo MTTC-1410 da
Melcor Thermal Solutions que utiliza um sensor de temperatura do tipo PT-1000.
Figura 4.34. Fotos da OPC com variação de temperatura projetada.
As figuras 4.35, 4.36 mostram os resultados no caso da refrigeração do dissipador
através de um cooler localizado logo a frente da célula, conforme indicado nas próprias
figuras.
-5 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60
-20
-10
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110
T (
o
C )
Tempo (min)
Ambiente
Microfone
Desejada
Real (PT-1000)
Figura 4.35. A esquerda temos o gráfico da temperatura em função do tempo para duas
temperaturas desejadas superestimadas. A direita temos uma ilustração de como foi
realizado os testes com o cooler.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 112
No primeiro teste (figura 4.35) as temperaturas desejadas foram superestimadas,
ou seja, o sistema de escoamento de calor não foi o suficiente para atingirmos as
temperaturas ajustadas no controlador de temperatura. Primeiramente ajustamos a 100
ºC, no entanto, atingimos apenas 80 ºC com pouca estabilidade. Numa inversão brusca
de temperatura ajustamos a -10 ºC, e atingimos aproximadamente 0 ºC, novamente com
alta flutuação. Por outro lado, após cerca de uma hora a diferença entre a temperatura do
microfone e a ambiente foi em torno de 5 ºC.
Assim, realizamos um segundo teste, mas sob as mesmas condições iniciais, no
qual as temperaturas ajustadas foram as máximas possíveis neste arranjo (0 ºC e 80 ºC).
O experimento se estendeu por um período de 160 minutos, mais que o dobro do tempo
do teste anterior (figura 4.36).
-20 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180
-10
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
T (
o
C )
Tempo (min)
Ambiente
Microfone
Desejada
Real (PT-1000)
Figura 4.36. A esquerda temos o gráfico da temperatura em função do tempo para as
duas temperaturas máximas atingíveis com o cooler. A direita esquematizamos como foi
realizado os testes com o cooler.
Analisando o gráfico da figura 4.36 percebemos que a resposta do sistema no
intervalo de temperatura de 0 a 80 ºC é excelente, contudo, a temperatura no microfone
variou aproximadamente 10 ºC, fato este que prejudica a resposta da célula. Logo,
realizamos testes similares substituindo o cooler, como sistema de refrigeração do
dissipador de calor, por dois recipientes contendo água e gelo localizados entre as aletas
do dissipador de alumínio. Os resultados são apresentados na figura 4.37.
Capítulo 4. Montagem do Experimento 113
No presente teste, foi possível atingir temperaturas inferiores a 0 ºC com
facilidade, mantendo a temperatura de -10 ºC por 30 minutos, com precisão de
aproximadamente 0,1 ºC. Porém, ao variarmos rapidamente a temperatura desejada para
100 ºC o sistema apresentou uma inércia térmica muito intensa, mesmo tendo
derretido o gelo existente nos recipientes. Esta inércia pode ser contornada por
realizarmos rampas entre as temperaturas desejadas e, de fato, ao realizarmos o
experimento com amostras magnetocalóricas as temperaturas administradas estarão
compreendidas em intervalos inferiores a 5 ºC.
Uma grande vantagem no arranjo da figura 4.37 é o fato da temperatura do
microfone permanecer constante durante todo o teste, que durou aproximadamente 1
hora. Entretanto, a desvantagem é a formação de uma fina camada de gotículas de água
condensadas sobre a janela de quartzo, impedindo assim, a luz laser de atingir a
amostra. A presença de um pequeno cooler ventilando a parte superior da janela de
quartzo é uma medida paliativa que pode ser empregada com sucesso.
-5 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65
-50
-40
-30
-20
-10
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110
120
T (
o
C )
Tempo (min)
Ambiente
Microfone
Desejada
Real (PT-1000)
Figura 4.37. A esquerda temos o gráfico da temperatura em função do tempo para duas
temperaturas desejadas. A direita esquematizamos como foi realizado os testes com dois
recipientes contendo água e gelo.
Portanto, para a OPC com variação de temperatura, no tocante ao sistema de
refrigeração da base do elemento Peltier, a melhor opção é uma combinação dos dois
Capítulo 4. Montagem do Experimento 114
arranjos estudados, contemplando um cooler para a tampa isolante juntamente com os
recipientes contendo água e gelo nas aletas do dissipador de alumínio.
Os resultados para algumas amostras, analisadas por meio da OPC com variação
de temperatura desenvolvida neste trabalho, serão parte do escopo do próximo capítulo.
4.7. Referências Bibliográficas
1. W. Otowski, C. Gloreux, R. Hofman, J. Thoen; “New acoustic detection technique
for a magnetocaloric effect”. Thermochimica Acta, 218, 123-133 (1993).
2. B. R. Gopal, R. Chahine, M. Folddeaki, T. K. Bose; “Noncontact thermoacoustic
method to measure the magnetocaloric effect”. Review of Scientific Instruments,
66(1), 232-238 (1995).
3. L. F. Perondi, L. C. M. Miranda; “Minimal-volume photoacoustic cell measurement
thermal diffusivity: effect of thermoelastic sample bending”. J. Appl. Phys. 62 (7),
2955-2959 (1987).
4. M. D. da Silva, I. N. Bandeira, L. C. M. Miranda; “Open-cell photoacoustic radiation
detector”. J. Phys. E: Sci. Instrum, 20, 1476-1478 (1987).
5. E. Nogueira da Silva; “Aplicação de métodos fototérmicos para análise de
propriedades ópticas e térmicas de polímeros impregnados, pastilhas metálicas e de
revestimentos acrílicos”. Tese de doutoramento apresentada à Universidade Estadual
de Maringá, Maringá (2005).
6. K. A. Gschneidner Jr. e V. K. Pecharsky; “Magnetocaloric Materials”. Annu. Rev.
Mater. Sci. 30;387-429 (2000).
7. A. M. Tishin, Y. I. Spichkin; “The Magnetocaloric Effect and its Applications”,
Series in Condensed Matter Physics, IOP Publishing Ltd, Institute of Physics
Publishing Bristol and Philadelphia (2003).
8. http://www.efeitopeltier.com.br/faqs.asp.
9. Manh-Huong Phan, Seong-Cho Yu; “Review of the magnetocaloric effect in
manganite materials”. Journal of Magnetism and Magnetic Materials, 308, 325-340
(2007).
10. K. A. Gschneidner Jr., V. K. Pecharsky, e A. O. Tsokol; “Recent developments im
magnetocaloric materials”. Rep. Prog. Phys., 68, 1479-1539 (2005).
Capítulo 4. Montagem do Experimento 115
11. C. Glorieux, J. Thoen, G. Bednarz, Mary Anne White, D. J. W. Geldart;
“Photoacoustic investigation of the temperature and magnetic-field dependence of
the specific-heat capacity and thermal conductivity near the Curie point of
gadolinium”. Physical Review B, 52, 12770-12778 (1995).
Capítulo 5. Resultados e Discussão 116
Capítulo 5
Resultados e Discussão
5.1. Efeito Magnetocalórico em Gadolínio
Como primeira amostra a ser estudada no experimento magnetoacústico,
escolhemos uma amostra sólida de Gadolínio, pois este material é considerado padrão
quando se trata de EMC, sendo exaustivamente estudado na literatura corrente.
Conforme mostrado na seção 1.4.2, a comparação entre diversos materiais
magnetocalóricos é sempre realizado com base no EMC do gadolínio
[1-3]
. Este material
é campeão em outro aspecto, ainda hoje ele é o principal material usado em protótipos
de refrigeradores magnéticos a temperatura ambiente, mesmo tendo um alto custo.
O gadolínio é a única terra-rara que se ordena magneticamente em temperatura
ambiente e é considerado freqüentemente como um material ferromagnético da classe
de Heisenberg. Sua transição de fase paramagnética-ferromagnética é uma
transformação de fase de segunda ordem
[4]
.
As propriedades magnéticas e térmicas do Gd continuam até hoje a chamar a
atenção. Um das características mais importantes de uma transição de fase magnética é
a obtenção exata da temperatura de ordenamento magnético. Porém, como Dan’kov et.
al.
[4]
mostram através de dados publicados, a determinação da temperatura de Curie, em
Gd aparenta ser sensivelmente dependente do método experimental, da história
magnética e térmica da amostra, e de sua pureza. Os autores
[4]
ilustram este fato através
de uma tabela (tabela 5.1) na qual são alistados valores da temperatura de Curie do Gd
em seis grupos diferentes de acordo com as técnicas experimentais usadas nos vários
estudos. A temperatura de Curie obtida em cada estudo varia de 289 a 295 K. Isto levou
os autores a realizar um profundo estudo sobre a influência tanto das diferentes técnicas
experimentais de obtenção da temperatura de Curie, como do grau de pureza da amostra
de Gd.
Dan’kov et. al. estudaram quatro amostras de Gd com os seguintes graus de
pureza: amostra 1 policristalina comercialmente preparada na Rússia, com 99,49 wt. %;
amostra 2 policristalina de alta pureza preparada pelo MPC (Ames Laboratory), com
99,99 wt. %; amostra 3 monocristalina de alta pureza preparada pelo MPC (Ames
Capítulo 5. Resultados e Discussão 117
Laboratory), com 99,98 wt. %; e amostra 4 policristalina de pureza comercial padrão
preparada por Peoples’ Republic of China, com 99,68 wt. %.
Tabela 5.1. Efeito da técnica experimental e da pureza do material na temperatura de
Curie do Gd
[4]
.
Técnica Experimental T
C
(K) Pureza
292 Não Conhecida
290±1 99,9 wt. %
Magnetização
289±2 99,9 wt. %
293±1 Não Conhecida
Susceptibilidade Magnética
290 99,9 wt. %
Espalhamento de Nêutrons 291 99,9 wt. %
295 99,99 wt. %
293 Não Conhecida
Efeito Magnetocalórico
292,25 99,99 wt. %
Fotoemissão 290 Não Conhecida
293 99,4 wt. %
293,5 Não Conhecida
Capacidade Calorífica
292,2 99,9 wt. %
Figura 5.1. O EMC do Gd em função da temperatura medida em um campo magnético
pulsado de 0 a 2 T para três amostras com graus de pureza diferentes
[4]
.
Na figura 5.1 Dan’kov et. al. reportaram a influência de impurezas no EMC do
Gd. O EMC foi medido de duas formas distintas, a saber, medida direta da variação de
temperatura adiabática, e calculada através de dados de capacidade específica, ambos
Capítulo 5. Resultados e Discussão 118
sob uma variação de campo magnético de 0-2 T. Nesta figura vemos claramente que o
grau de pureza do Gd influência diretamente em sua temperatura de Curie, assim como
o método de medida, no entanto, esta temperatura esta sempre em torno de 293 K,
sendo que os dados de amostras com maior grau de pureza indicam 294 K.
5.1.1. Resultados Magnetoacústicos em Gd
A amostra que disponibilizamos para realização do experimento magnetoacústico
é um Gd com pureza comercial, cuja porcentagem exata de pureza não conhecemos.
Esta amostra foi torneada na forma de um cilindro de 4 mm de altura e 2,9 mm de
diâmetro.
Em seguida, a amostra foi inserida no porta amostra do aparato experimental
estando inicialmente a temperatura ambiente. A figura 5.2 apresenta o sinal
magnetoacústico para a amostra de Gd submetida a um campo magnético de prova de
aproximadamente 1000 G modulado a 5 Hz para vários campos magnéticos constantes.
265 270 275 280 285 290 295 300 305 310 315 320 325 330 335
-0,00005
0,00000
0,00005
0,00010
0,00015
0,00020
0,00025
0,00030
0,00035
0,00040
0,00045
0,00050
0,00055
0,00060
0,00065
0,00070
0,00075
0,00080
Sinal (V)
Temperatura (K)
540 G
1370 G
1640 G
1760 G
1830 G
1890 G
Figura 5.2. Sinal magnetoacústico do Gd com campo magnético modulado a 5 Hz
(cerca de 1000 G), empregando na célula o ducto capilar vítreo de 18,7 cm.
Os dados foram obtidos com temperaturas crescentes e a cada temperatura
colecionamos os sinais para os vários campos constante, sendo que o software
desenvolvido para o experimento se encarregou de realizar uma média de 20 pontos em
Capítulo 5. Resultados e Discussão 119
cada medida. O tempo médio de estabilização de uma temperatura para outra foi de
cerca de 1 minuto.
Consideramos a temperatura de Curie da amostra de Gd medida como sendo a do
maior sinal, ou seja, a temperatura do pico da figura 5.2. Dessa forma, a temperatura de
transição de fase de nossa amostra é de 292 K, estando em conformidade com a
literatura. Esta temperatura indica que provavelmente a amostra apresenta uma pureza
relativamente baixa.
Na figura 5.3 mostramos a fase do sinal magnetoacústico, na qual, durante a
transição de fase, apresentou uma variação de aproximadamente 10 graus. Em ambas as
figuras 5.2 e 5.3 o ducto sonoro utilizado na célula magnetoacústica foi o capilar vítreo
com comprimento de 18,7 cm.
265 270 275 280 285 290 295 300 305 310 315 320 325 330 335
45
50
55
60
65
70
75
80
85
90
95
100
105
110
e ducto capilar pequeno.
Fase (grau)
Temperatura (K)
540 G
1370 G
1640 G
1760 G
1830 G
1890 G
Figura 5.3. Fase do sinal magnetoacústico do Gd em relação ao campo magnético
modulado em 5 Hz (cerca de 1000 G), empregando na célula o ducto capilar vítreo de
18,7 cm.
Em torno da região de transição de fase nota-se que primeiramente a magnitude do
sinal magnetoacústico se eleva ao alterarmos o campo constante de 540 para 1370 G,
em seguida gradativamente diminui com o aumento do campo magnético constante. O
que indica que a curva de
T
δ
X H apresenta um máximo, sendo T
δ
a variação de
temperatura na amostra devido ao campo magnético de prova e H o campo magnético
constante sobreposto, assim como é mostrado na curva do sinal ( T
αδ
sinal ) na figura
5.4. Nesta figura são apresentados seis pontos experimentais tomados na temperatura de
Capítulo 5. Resultados e Discussão 120
transição (292 K) e outros seis em 284 K, bem como, os ajustes hipotéticos desenhado a
mão livre.
0 1000 2000 3000 4000 5000
0,0000
0,0001
0,0002
0,0003
0,0004
0,0005
0,0006
0,0007
0,0008
Sinal (V)
H (G)
292 K
284 k
Figura 5.4. Gráfico do sinal magnetoacústico em função do campo magnético
constante, em uma amostra de Gd. O ajuste foi desenhado a mão livre e apenas ilustra o
comportamento esperado para estas curvas.
Em seguida, realizamos o experimento novamente, entretanto, trocamos o ducto
sonoro capilar pelo tubo cilíndrico de vidro de 10,7 cm de comprimento. Os resultados
foram exatamente os mesmos (figura 5.6), porém, obtemos um acréscimo na magnitude
do sinal e maior estabilidade na fase, conforme era esperado da seção 4.5.
230 240 250 260 270 280 290 300 310 320 330 340 350
360
0,0000
0,0002
0,0004
0,0006
0,0008
0,0010
0,0012
0,0014
Sinal (V)
Temperatura (
o
C)
540 G
1370 G
1640 G
1830 G
230 240 250 260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360
-200
-180
-160
-140
-120
-100
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
Fase (grau)
Temperatura (
o
C)
540 G
1370 G
1640 G
1830 G
Figura 5.6. Gráfico da fase (a direita) e do sinal (a esquerda) magnetoacústico de uma amostra de
Gd sob campo modulado de 5 Hz, para a célula com o tubo cilíndrico de vidro de 10,7 cm de
comprimento como ducto sonoro.
Da teoria do efeito magnetocalórico, discutida no capítulo 1 desta dissertação,
sabe-se que em uma transição de fase magnética de segunda ordem não a histerese
Capítulo 5. Resultados e Discussão 121
térmica. A fim de confirmarmos o fato de que a transição de fase do elemento terra-rara
gadolínio é de segunda ordem, a amostra de Gd foi submetida novamente ao
experimento magnetoacústico, sob as mesmas condições anteriores (ducto sonoro
capilar), agora, porém, com a temperatura variando nos dois sentidos, ou seja,
aquecendo e resfriando a amostra. Os resultados são mostrados nas figuras 5.7 e 5.8,
onde fica claro que a temperatura de transição de fase permaneceu a mesma, a saber,
292 K, em ambas os sentidos de variação de temperatura. Assim, novamente o
experimento magnetoacústico mostra sua eficácia, estando em plena concordância com
os resultados da literatura.
265 270 275 280 285 290 295 300 305 310 315 320 325 330 335 340 345 350
0,0000
0,0001
0,0002
0,0003
0,0004
0,0005
Sinal (V)
Temperatura (
o
C)
Temperatura Crescente
Temperatura Decrescente
Figura 5.7. Sinal magnetoacústico do Gd com campo magnético modulado a 5 Hz,
mostrando que tanto no aquecimento quanto no resfriamento da amostra sua
temperatura de transição de fase permaneceu a mesma, não havendo histerese térmica,
o que por sua vez caracteriza uma transição de segunda ordem.
Cabe ressaltar que a veracidade do experimento também foi verificada com outras
amostras não magnéticas, como por exemplo, vidro e carvão em pó. Nestes testes não
foram observados absolutamente nenhum sinal, o que prova que os sinais apresentados
anteriormente, e os posteriores, devem-se ao EMC e não a vibrações mecânicas do
sistema ou qualquer outro sinal de origem desconhecida.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 122
265270275280285290295300305310315320325330335340345350355
-100
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
100
120
140
160
Fase (grau)
Temperatura (
o
C)
Temperatura Crescente
Temperatura Decrescente
Figura 5.8. Fase magnetoacústica do Gd com campo magnético modulado a 5 Hz,
mostrando que durante a transição de fase magnética, tanto no aquecimento quanto no
resfriamento da amostra, a fase do sinal em relação a modulação do campo de prova
permaneceu constante.
5.1.2. Monitoramento da Temperatura de Curie do Gd via Fotoacústica
A OPC com variação de temperatura, descrita na seção 4.6, também foi
empregada na análise do elemento lantanídeo Gd. Para este fim, preparamos três
amostras planas diferentes a partir de um pedaço de gadolínio comercial. As amostras
foram cortadas num formato retangular de aproximadamente 10 X 12 mm
2
, com
espessuras de 0,144, 0,425 e 0,703 mm, sendo polidas logo em seguida. Tendo em vista
a natureza metálica das amostras, para garantirmos absorção óptica da luz laser,
pintamos suas superfícies com uma fina camada de tinta preta por meio de uma caneta
para transparências de retroprojetor.
A título de comparação, preparamos outras amostras que não apresentam transição
de fase magnética nem qualquer outra transição no intervalo de temperatura ambiente.
Destas amostras, destacamos aqui duas: uma de alumínio de 0,640 mm de espessura e
cerca de 1 mm de diâmetro; e uma amostra de grafite carbomec de 0,604 mm de
espessura com 1 mm de diâmetro.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 123
As amostras foram posicionadas sobre o elemento peltier da célula OPC com
variação de temperatura. Para garantir a vedação da câmara acústica, bem como
melhorarmos o contato térmico entre a amostra e a pastilha termoelétrica, espalhamos
uma mistura de pasta térmica com graxa de vácuo nas bordas das amostras, no entanto,
sempre tomando extremo cuidado para que esta pasta não avançasse ao furo do ducto
sonoro.
Um laser semicondutor ( nm532=
λ
da B&W TEK) modulado em 25 Hz, por
meio de um chopper modelo SR540 (STANDFORD RESEARCH SYSTEMS), foi
direcionado perpendicularmente sobre a superfície do corpo de prova. O intervalo de
temperatura abrangido neste ensaio foi de 275 a 355 K, sendo que varremos a
temperatura nos dois sentidos, tanto aquecendo quanto resfriando a amostra. Neste
momento, empregamos a amostra de Gd com espessura de 0,144 mm. Os resultados
podem ser apreciados na figura 5.9, na qual é indicado através de flechas o sentido da
variação de temperatura, tanto para o Gd quanto para as amostras de alumínio e grafite
carbomec.
270 280 290 300 310 320 330 340 350 360
0,0000
0,0004
0,0008
0,0012
0,0016
0,0020
0,0024
Sinal (V)
Temperatura (K)
Gd
Gd
Al
Al
Grafite
Grafite
Figura 5.9. Sinal fotoacústico em função da temperatura de três amostras de naturezas
diferentes, cuja freqüência de modulação foi de 25 Hz. Aqui, vê-se claramente uma
brusca mudança no comportamento do sinal para o Gd (espessura de 0,144 mm),
indicando assim a transição de fase magnética.
Da figura 5.9 é claro que as amostras de alumínio e de grafite não apresentaram
variações bruscas em seu comportamento, mantendo apenas um sinal estável com um
Capítulo 5. Resultados e Discussão 124
leve aumento de intensidade em baixas temperaturas. no Gd vemos claramente uma
mudança na intensidade do sinal fotoacústico a partir de 294 K, apresentando um sinal
mínimo em 290 K, exatamente a região de transição paramagnético-ferromagnético do
Gd. Percebe-se também que, nos dados tanto para no aquecimento quanto no
resfriamento do Gd não houve diferença nas temperaturas onde o sinal foi influenciado,
portanto, confirmando o fato que a transição de fase é de segunda ordem, pois não
apresentou histerese térmica.
A figura 5.10 mostra a dependência da fase do sinal fotoacústico em função da
temperatura, e aqui, novamente, vemos que para os dados do Gd houve um indicativo
da mudança de comportamento, devido a transição de fase, justamente em torno de 292
K (aquecimento ou resfriamento). Já para os outros materiais a fase não apresentou
nenhum comportamento diferente em ambos os sentidos de variação de temperatura.
270 280 290 300 310 320 330 340 350 360
-50
-40
-30
-20
-10
Fase (grau)
Temperatura (K)
Gd
Gd
Al
Al
Grafite
Grafite
5.10. Fase fotoacústica em função da temperatura de três amostras de naturezas
diferentes, cuja freqüência de modulação foi de 25 Hz. Aqui, também vê-se claramente
uma brusca mudança no comportamento do sinal para o Gd (espessura de 0,144 mm),
indicando assim a transição de fase magnética.
Para definirmos exatamente a temperatura de transição propomos analisar o
gráfico de derivada do sinal fotoacústico e da fase pela temperatura. Na figura 5.11
mostramos os referidos gráficos para os dados nos quais a amostra de Gd apresentou
maior estabilidade, em comparação com a derivada dos dados de alumínio e do grafíte.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 125
Dessa forma, em conformidade com os resultados do experimento magnetoacústicos
apresentados na seção anterior, a temperatura de Curie do Gd, medida através da
interação luz-matéria com a OPC construída (seção 4.6), é de 292 K.
260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360
370
-0,00005
0,00000
0,00005
0,00010
0,00015
292 K
Temperatura (K)
δ Sinal / δ T
Gd
Al
Grafite
(a)
260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360 370
-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
292 K
δ Fase / δ T
Temperatura (K)
Gd
Al
Grafite
(b)
5.11. Gráfico da derivada do sinal (a) e da fase (b) fotoacústico em relação a temperatura versus
a própria temperatura, onde reconhecemos claramente que a temperatura de Curie do Gd é de
292 K.
Dessa forma, fica evidente, através dos testes com as amostras de alumínio e de
grafite, que a OPC com variação de temperatura não apresenta sinais espúrios oriundos
de vibrações ou de qualquer outra influência, de tal forma que a mudança no
comportamento dos dados captados em torno de 292 K para o Gd, pode ser
precisamente atribuída a transição de fase magnética do material. Ressaltamos também
que muitos outros testes, com outras amostras (cobre, filme PET), que não apresentam
transição de fase em torno da temperatura ambiente, foram executados e os resultados
obtidos foram exatamente os mesmos com as amostras de alumínio e grafite, por isso
não houve a necessidade de apresentá-los.
Tendo em vista a possibilidade de se obter a temperatura de Curie de materiais,
que apresentem transição de fase magnética em temperatura ambiente, tanto via sinal
fotoacústico como via fase, estudamos a influência da freqüência de modulação e da
espessura da amostra. O objetivo deste estudo é de sabermos em quais situações é mais
adequado o uso do sinal e em quais a fase é mais sensível.
O primeiro parâmetro a ser analisado é a freqüência de modulação do laser.
Realizamos novamente a varredura de temperatura, porém, utilizamos a amostra de Gd
Capítulo 5. Resultados e Discussão 126
com espessura de 0,425 mm colecionando os dados em função de três freqüências
diferentes, a saber: 15 Hz; 25 Hz; e 35 Hz (figuras 5.12 e 5.13).
260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360 370
0,0001
0,0002
0,0003
0,0004
0,0005
0,0006
0,0007
0,0008
0,0009
0,0010
0,0011
Sinal (V)
Temperatura (K)
15 Hz
15 Hz
25 Hz
25 Hz
35 Hz
35 Hz
5.12. Sinal fotoacústico em função da temperatura da amostra de Gd com espessura de
0,425 mm em três freqüências diferentes.
260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360 370
-30
-20
-10
0
10
20
30
40
50
60
70
Fase (grau)
Temperatura (K)
15 Hz
15 Hz
25 Hz
25 Hz
35 Hz
35 Hz
5.13. Fase fotoacústica em função da temperatura da amostra de Gd com espessura de
0,425 mm em três freqüências diferentes.
Os dados a 15 Hz com a amostra de Gd sendo aquecida apresentaram um desvio
considerável, o qual atribuímos a um possível vazamento de pressão da célula ou um
Capítulo 5. Resultados e Discussão 127
melhor acomodamento da amostra conforme ocorria uma dilatação térmica. Porém, vale
ressaltar que este desvio não é corriqueiro, tratando-se assim de um fato isolado que não
ocorreu nas demais medidas.
Apesar disso, ressaltamos que novamente detectamos a temperatura de transição
tanto via sinal como fase, e o valor obtido está de acordo com o anterior de 292 k.
Entretanto, observamos nos gráficos anteriores das figuras 5.12 e 5.13 uma tendência de
transferência de sensibilidade do sinal para a fase conforme aumentamos a freqüência
de modulação do laser, ou seja, quando nos afastamos do regime termicamente fino e
nos aproximamos de um regime termicamente grosso.
O procedimento anterior foi repedido para a amostra com espessura de 0,703 mm,
cujos resultados estão sumarizados nas figuras 5.14 e 5.15. Agora, com muito mais
nitidez é possível se observar que o sinal fotoacústico perde completamente a resolução
em 25 Hz, não sendo possível uma clara determinação da temperatura de Curie.
Contudo, a sensibilidade da fase, no tocante a detecção da temperatura de transição
magnética, é amplificada grandemente a partir de 25 Hz, confirmando a conclusão
atingida com a amostra de 0,425 mm de espessura.
270 280 290 300 310 320 330 340 350 360 370
0,00000
0,00005
0,00010
0,00015
0,00020
0,00025
0,00030
0,00035
0,00040
Sinal (V)
Temperatura (K)
15 Hz
15 Hz
25 Hz
25 Hz
30 Hz
30 Hz
5.14. Sinal fotoacústico em função da temperatura da amostra de Gd com espessura de
0,703 mm em três freqüências diferentes.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 128
270 280 290 300 310 320 330 340 350 360 370
-160
-140
-120
-100
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
100
Fase (grau)
Temperatura (K)
15 Hz
15 Hz
25 Hz
25 Hz
30 Hz
30 Hz
5.15. Fase fotoacústica em função da temperatura da amostra de Gd com espessura de
0,703 mm em três freqüências diferentes.
A seguir examinamos o comportamento do sinal e da fase em função da espessura
(representado por l
s
) da amostra mantendo fixa a freqüência de modulação do laser em
25 Hz. Contemplamos os resultados de tal procedimento nas figuras 5.16 e 5.17.
260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360 370
0,0000
0,0003
0,0006
0,0009
0,0012
0,0015
0,0018
0,0021
0,0024
0,0027
0,0030
0,0033
Sinal (V)
Temperatura (K)
l
s
=0,144 mm
l
s
=0,144 mm
l
s
=0,425 mm
l
s
=0,425 mm
l
s
=0,703 mm
l
s
=0,703 mm
5.16. Sinal fotoacústico em função da temperatura para três amostras de Gd com
espessuras diferentes, no qual a freqüência foi fixada em 25 Hz.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 129
260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360 370
-100
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
100
120
Fase (grau)
Temperatura (K)
l
s
=0,144 mm
l
s
=0,144 mm
l
s
=0,425 mm
l
s
=0,425 mm
l
s
=0,703 mm
l
s
=0,703 mm
5.17. Fase fotoacústica em função da temperatura para três amostras de Gd com
espessuras diferentes, na qual a freqüência foi fixada em 25 Hz.
Ao analisarmos o gráfico 5.16 percebe-se que a intensidade do sinal fotoacústico
diminui consideravelmente com o aumento da espessura da amostra, o que já era
esperado conforme a teoria do efeito fotoacústico (capítulo 2). Juntamente com o sinal,
a detecção da transição de fase magnética perde intensidade a ponto de não ser mais
possível a determinação da temperatura de Curie do material com precisão.
Por outro lado, a conclusão extraída da fase fotoacústica é justamente a oposta da
do sinal. Ou seja, com o aumento da espessura do corpo de prova torna-se mais evidente
a transição magnética, sendo que quanto mais finas as amostras mais imperceptível se
torna a transição.
Em 1995, Glorieux et. al.
[5]
publicaram um artigo no qual investigaram, via
fotoacústica, parâmetros térmicos do gadolínio próximo a sua temperatura de Curie. Os
autores apresentaram os resultados para a difusividade e a efusividade de uma amostra
de Gd. Na figura 5.18 nota-se que a curva de difusividade térmica do Gd em função da
temperatura apresenta características muito semelhantes aos sinais fotoacústicos
medidos na célula OPC com variação de temperatura (figura 5.16).
Capítulo 5. Resultados e Discussão 130
5.18. Difusividade térmica e efusividade em função da temperatura para uma mostra de
Gd, propriedades estas calculadas através da amplitude do sinal fotoacústico e
resultados da fase para diferentes freqüências de modulação. Pontos sólidos: 10 Hz,
triângulo aberto invertido: 15 Hz, quadrado sólido: 60 Hz, quadrado aberto: 120 Hz, e
triângulo aberto: 240 Hz.
Conforme explanado no capítulo 2, sendo
s
l a espessura da amostra, o parâmetro
térmico
s
µ
classifica as amostras em duas categorias de espessura térmica. Uma
amostra se diz termicamente grossa quando sua espessura
s
l é maior do que
s
πµ
2 , e é
termicamente fina quando
ss
l>>
µ
, a ponto da atenuação da oscilação térmica ser
desprezível para o calor gerado em qualquer ponto da amostra.
O comprimento de difusão térmico é dado por
f
s
.
π
α
µ
=
5.1.1
em que f é a freqüência de modulação do laser e
α
é a difusividade térmica.
Por meio da difusividade, extraída da figura 5.18, é possível uma estimativa da
espessura térmica de nossas amostras. Para isso, subestimamos o valor do comprimento
Capítulo 5. Resultados e Discussão 131
de difusão térmico por utilizar o menor valor da difusividade térmica do Gd durante a
transição de fase, ou seja, sm /10.3
26
α
.
Na tabela 5.2 sumarizamos o valor do comprimento de difusão térmica referente
as freqüências utilizadas nos ensaios anteriores, nela também apresentamos a
classificação da espessura térmica das amostras segundo o parâmetro
s
πµ
2 . Nota-se que
as amostras 1 e 2 com espessuras de 0,144 e 0,425 mm, respectivamente, são
termicamente finas em todas as freqüências utilizadas, a amostra 3 pode ser
considerada termicamente fina a 15 Hz, no entanto, em freqüências acima de 25 Hz ela
se encontra em uma região intermediaria entre termicamente fina e termicamente
grossa.
Tabela 5.2. Classificação da espessura térmica das amostras através da comparação do
comprimento de difusão térmico com a espessura das amostras
Classificação da espessura térmica
Freqüência
(Hz)
s
µ
(mm)
s
µπ
..2
(mm)
Amostra 1 com
l
s
=0,144 mm
Amostra 2 com
l
s
=0,425 mm
Amostra 1 com
l
s
=0,703 mm
15 0,252 1,585
Termicamente
fina
Termicamente
fina
Termicamente
fina
25 0,195 1,228
Termicamente
fina
Termicamente
fina
Intermediaria
30 0,178 1,119
Termicamente
fina
Termicamente
fina
Intermediaria
35 0,165 1,037
Termicamente
fina
Termicamente
fina
Intermediaria
Portanto, torna-se veraz a conclusão anterior de que ao tendermos ao regime
termicamente grosso a sensibilidade, frente a transição de fase magnética, se transfere
do sinal fotoacústico para a fase, pois ao se aumentar a freqüência de modulação do
laser ou a espessura da amostra aproxima-se do regime termicamente grosso.
As conclusões anteriores devem ser colocadas sobre teste também em outras
amostras magnetocalóricas, o que não foi possível realizar neste trabalho devido ao fato
de não possuirmos outro material magnetocalórico sólido.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 132
5.2. Efeito Magnetocalórico da liga Gd
5
Si
2
Ge
2
Desde a descoberta do efeito magnetocalórico gigante na liga Gd
5
Si
2
Ge
2
, por
Pecharsky e Gschneider Jr. (1997)
[6]
, uma grande quantia de trabalhos a respeito desta
liga tem sido publicada. A figura 5.19 mostra a medida da susceptibilidade ac em
função da temperatura, revelando duas transições magnéticas ao redor da temperatura
ambiente devido as duas fases presentes no composto Gd
5
Si
2
Ge
2
como fundido. Em
torno de 275 K temos uma transição magnética-estrutural de primeira ordem, com uma
das fases sólidas do composto passando de monoclínica-paramagnética para uma fase
ortorrômbica-ferromagnética. A outra transição se em torno de 300 K, consistindo
em uma transição de segunda ordem permanecendo ortorrômbica durante a transição.
Figura 5.19. Parte real da susceptibilidade magnética ac em função da temperatura para
o composto Gd
5
Si
2
Ge
2
como fundido
[7]
.
Na figura 5.20 (a) vemos a variação de entropia magnética calculada através de
dados de magnetização para a liga Gd
5
Si
2
Ge
2
em comparação com o Gd, para uma
variação de campo magnético de 0 a 5 T. Para os dois materiais, a figura 5.20 (b)
apresenta a variação adiabática de temperatura, calculada através de dados do calor
Capítulo 5. Resultados e Discussão 133
específico. Em ambos os gráficos é possível se perceber a influência sutil da transição
de fase de segunda ordem em torno de 300 K.
(a)
(b)
Figura 5.20. (a) Gráfico de
HM
TS
)(
e (b)
Had
TT
)( para o composto Gd
5
Si
2
Ge
2
como fundido comparado com os resultados do Gd metálico
[6]
.
Este composto é extremamente sensível ao modo de preparo e a pureza do Gd
utilizado, sendo que este último exerce considerável influência nas temperaturas de
transição
[8]
.
5.2.1. Resultados Magnetoacústicos na liga Gd
5
Si
2
Ge
2
Uma amostra de Gd
5
Si
2
Ge
2
foi gentilmente fornecida pelo prof. Dr César Colucci
Canesin do Departamento de Física da Universidade Estadual de Maringá. Esta amostra
recebeu um tratamento térmico em 1300 ºC por uma hora, sendo que a amostra
encontra-se em pó e seu preparo se deu a cerca de 4 anos atrás.
O resultado magnetoacústico é observado na figura 5.21, em que vemos a
presença das duas transições de fase magnética. A transição magnética-estrutural de
primeira ordem é observada na temperatura de aproximadamente 276 K, conforme
esperado dos dados presentes na literatura. No entanto, a transição magnética de
Capítulo 5. Resultados e Discussão 134
segunda ordem foi captada em torno de 292 K, um tanto quanto abaixo da temperatura
registrada de 300 K para o composto como fundido. Com isso concluímos que nossa
amostra não apresenta exatamente a mesma estrutura das como fundida relatadas na
literatura, sendo, provavelmente, influenciada por fatores tais como, impurezas no Gd
utilizado
[8]
, oxidação devido ao estoque a atmosfera ambiente durante seus quatro anos
de existência
[9]
, e devido ao tratamento térmico sofrido em seu preparo.
O tratamento térmico é empregado com o objetivo de eliminar fases minoritárias
que surgem durante a fusão da amostra e que fogem da estequiometria de interesse,
promovendo a homogeneização do material. No caso dos compostos da família
Gd
5
(Ge
1-x
Si
x
)
4
no intervalo de ~ 7,03,0
x , os quais devem ser formados através de
uma transformação peritética
[7]
, devemos tratá-los termicamente um pouco abaixo da
temperatura peritética. Segundo A. O. Pecharsky e colaboradores
[7]
, o tratamento a
1570 K (~1300 ºC) por 1 hora para compostos com 503,043,0
x é suficiente para
homogeneizá-los e torná-los monofásicos. Nossa amostra recebeu exatamente este
tratamento térmico, não obstante, a fase minoritária ainda está presente, conforme pode
ser visto claramente na figura 5.21.
240 250 260 270 280 290 300 310 320 330 340
0,00000
0,00005
0,00010
0,00015
0,00020
0,00025
0,00030
0,00035
Sinal (V)
Temperatura (K)
540 G
1370 G
1640 G
1760 G
1830 G
Figura 5.21. Sinal magnetoacústico para o composto Gd
5
Si
2
Ge
2
tratado a 1300 ºC por
1h, com campo modulado a 5 Hz .
Capítulo 5. Resultados e Discussão 135
No tocante a magnitude do sinal magnetoacústico, nota-se que em baixos campos
magnéticos a transição de segunda ordem não está presente, mas é dominante e, ao
passo que incrementamos a intensidade do campo magnético constante, gradativamente
a influência da transição de segunda ordem diminui dando lugar a um crescente sinal da
transição de primeira ordem. Dessa forma, em altos campos magnéticos, a amostra
apresentaria um sinal predominantemente de primeira ordem. Tendo em vista que o
EMC é corriqueiramente medido a altos campos magnéticos, aparentemente a fase
minoritária não estaria mais presente na amostra termicamente tratada. Aqui vemos uma
grande vantagem do aparato experimental magnetoacústico, o qual é capaz de analisar o
EMC a baixos campos magnéticos, revelando de forma mais precisa a existência ou não
de fases minoritárias, mesmo após um tratamento térmico ou após qualquer outro
processo que a amostra venha a sofrer.
A figura 5.22 apresenta a fase do sinal magnetoacústico, a qual permaneceu
aproximadamente constante na região de transição. Entretanto, na fase vemos uma leve
inclinação, o que provavelmente está ligada a variação de temperatura interna da célula,
indicando assim a necessidade de uma calibração, ou seja, para maior precisão nos
dados é preciso obter a resposta da própria célula em função da temperatura. Porém,
esta inclinação é muito sutil não afetando as conclusões anteriores.
240 260 280 300 320 340
-80
-60
-40
-20
0
20
40
60
80
100
120
Fase (grau)
Temperatura (K)
540 G
1370 G
1640 G
1760 G
1830 G
Figura 5.22. Fase magnetoacústica para o composto Gd
5
Si
2
Ge
2
tratado a 1300 ºC por
1h, com campo modulado a 5 Hz .
Capítulo 5. Resultados e Discussão 136
5.3. Efeito Magnetocalórico da liga Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
Outra liga da família Gd-Si-Ge que tem despertado interesse é a Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
,
possuindo características muito semelhantes a 5:2:2. Curvas típica da magnetização
deste material é apresentado na figura 5.23, em que três amostras são analisadas: como
fundida em tarugo; como fundida em pó; e tratado termicamente a 1100 ºC por 20
horas.
220230240250260270280290300310320330340350360
-1
0
1
2
3
4
5
6
7
8
emu
M (emu/g)
H = 200 Oe
Gd
5.09
Ge
2.03
Si
1.88
como fundida sólida
como fundida em
Temperatura (K)
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
tratado termicamente
(1100
o
C/ 20 h)
Figura 5.23. Curva de magnetização por temperatura de três amostras diferentes de
Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
[10]
.
Nas ligas como fundida sólida e como fundida em pó, a curva de magnetização
por temperatura denuncia a presença das duas transições de fase, tanto a transição
magnética-estrutural de primeira ordem como a de segunda ordem. na amostra
termicamente tratada não existe a presença da transição de segunda ordem.
Por meio da curva de magnetização da amostra como fundida pode-se obter as
temperaturas de transição através da derivada
dTdM / . Este processo é exemplificado
na figura 5.24, de tal modo que têm-se as temperaturas de transição de 270,5 e 303,5 k
para uma típica liga Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
como fundida.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 137
210 220 230 240 250 260 270 280 290 300 310 320 330 340 350 360
0
1
2
3
4
5
6
7
220 240 260 280 300 320 340 360
dM/dT
303,5 K
270,5 K
Temperatura (K)
M (emu/g)
Temperatura (K)
Figura 5.24. Curva de magnetização por temperatura, a campo magnético de 200 G,
para o composto Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
como fundido. Em detalhe a curva de
dTdM /
indicando as temperaturas de transição.
5.3.1. Resultados Magnetoacústicos no composto Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
Como última medida magnetoacústica a ser apresentada nesta dissertação de
mestrado, analisamos uma amostra de Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
. A amostra como fundida em
foi preparada pelo prof. Dr. Cleber Santiago Alves do Departamento de Engenharia
Mecânica da Universidade Estadual de Maringá, sendo que seu preparo se deu a cerca
de seis meses antes das análises magnetoacústicas.
O resultado do sinal é exposto na figuras 5.25, em que a temperatura da transição
magneto-estrutural de primeira ordem se dá em torno 270 K em conformidade com a
literatura. No tocante a transição de segunda ordem, o composto Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
apresentou uma temperatura de transição de 295 K, levemente abaixo da registrada na
literatura, assim como no caso da amostra 5:2:2. Todavia, este valor não tira o mérito do
experimento magnetoacústico, pois, novamente, a razão de tal valor reside na
sensibilidade da amostra frente ao seu método preparo e pureza dos materiais utilizados.
Capítulo 5. Resultados e Discussão 138
230 240 250 260 270 280 290 300 310 320 330 340 350
0,0000
0,0001
0,0002
0,0003
0,0004
0,0005
Sinal (V)
Temperatura (K)
540 G
1370 G
1640 G
1760 G
1830 G
Figura 5.25. Sinal magnetoacústico para o composto Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
como fundido,
com campo modulado a 5 Hz .
230 240 250 260 270 280 290 300 310 320 330 340 350
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
com campo modulado a 5 Hz
Fase (grau)
Temperatura (K)
540 G
1370 G
1640 G
1760 G
1830 G
Figura 5.26. Fase magnetoacústica para o composto Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
como fundido,
com campo modulado a 5 Hz .
Capítulo 5. Resultados e Discussão 139
5.3. Referências Bibliográficas
1. E. Brück; Developments in magnetocaloric refrigeration”. J. Phys. D: Appl. Phys.,
38, R381-R391 (2005).
2. B. F. Yu, Q. Gao, B. Zhang, X. Z. Meng, Z. Chen; “Review on research of room
temperature magnetic refrigeration”. International Journal of Refrigeration, 26, 622-
636 (2003).
3. K. A. Gschneidner Jr. e V. K. Pecharsky; “Magnetocaloric Materials”. Annu. Rev.
Mater. Sci. 30;387-429 (2000).
4. S. Yu. Dan’kov, A. M. Tishin, K. A. Gschneidner Jr., V. K. Pecharsky, “Magnetic
phase transitions and the magnetothermal properties of gadolinium”. Physical
Review B, 57, 3478-3490 (1998).
5. C. Glorieux, J. Thoen, G. Bednarz, M. A. White, D. J. W. Geldart; “Photoacoustic
investigation of the temperature and magnetic-field dependence of the specific-heat
capacity and thermal conductivity near the Curie point of gadolinium”. Physical
Review B, 52, 12770-12778 (1995).
6. V. K. Pecharsky e K. A. Gschneidner Jr.; “Giant magnetocaloric effect in
Gd
5
Si
2
Ge
2
”. Physical Review Letters, 78 (23); 4494-4497 (1997).
7. A. O. Pecharsky, K. A. Gschneidner Jr.
, V. K. Pecharsky, C. E. Schindler; “The
room temperature metastable/stable phase relationships in the pseudo-binary GdSi-
GdGe system”. J. Alloys Comp., 338, 126-135 (2002).
8. K. A. Gschneidner Jr. e V. K. Pecharsky; “Magnetic refrigeration materials”
(invited). J. Appl. Phys., 85 (8), 5365-5368 (1999).
9.
W. Wu, A. O. Tsokol, K. A. Gschneidner Jr., J. A. Sampaio;
Influence of
oxygen on the giant magnetocaloric effect of Gd
5
Si
1.95
Ge
2.05
”.
J. Alloys Comp., 403,
118-123 (2005).
10.
A. M. G. Carvalho; “Estudo de propriedades estruturais, magnéticas e
magnetocalóricas de compostos à base de Gd, Ge e Si”. Tese de Doutorado,
Universidade Estadual de Campinas, IFGW-UNICAMP (2006).
Capítulo 6. Conclusão e Perspectivas 140
Capítulo 6
Conclusão e Perspectivas
Nesta dissertação de mestrado foram apresentadas todas as etapas pertinentes a
construção de um aparato experimental capaz de detectar por via acústica o efeito
magnetocalórico (EMC) de amostras tanto em volume quanto em pó. O experimento
magnetoacústico, como denominou tal experimento, mostrou sua eficácia ao ser posto
sob teste em uma amostra de gadolínio em volume, revelando precisamente o valor da
temperatura de transição magnética. Além disso, ao realizar medidas magnetoacústicas
em ambos os sentidos de variação de temperatura, aquecimento e resfriamento,
observamos que a amostra de Gd não apresenta histerese térmica, confirmando o fato de
que se trata de uma transição de fase de segunda ordem. Dessa forma, o experimento
magnetoacústico é capaz de identificar a ordem da transição magnética de determinado
material.
Foram analisadas medidas magnetoacústicas de amostras em dos compostos da
família Gd-Si-Ge. No composto 5:2:2 tratado termicamente a 1300 ºC por 1 hora, a
transição magneto-estrutural de primeira ordem se deu exatamente em 276 K, conforme
registrado na literatura. Considerando que o tratamento térmico é empregado para
eliminar a transição de segunda ordem, quando medidas magnetoacústicas em baixos
campos magnéticos foram empregadas, observamos nitidamente a presença desta
transição fase minoritária em nossa amostra, cuja temperatura de transição foi de 292 K.
Este fato indica que a técnica magnetoacústica proporciona uma excelente sensibilidade
com relação a identificação de fases indesejadas, o que geralmente não é observada
quando medidas em altos campos magnéticas são empregadas. Para o composto
Gd
5,09
Si
2,03
Ge
1,88
como fundido em pó os resultados magnetoacústicos apresentaram boa
concordância com os previstos na literatura, tendo como temperatura de transição
magneto-estrutural 270 K e a transição de segunda ordem em torno de 295 k.
De forma geral, o experimento magnetoacústico mostrou eficácia, constituindo-se
como uma excelente alternativa ao estudo de materiais magnetocalóricos em
temperaturas em torno da ambiente, uma vez que sua montagem tem um custo
relativamente baixo se comparada aos métodos convencionais de estudo do EMC.
Trata-se de uma técnica que não necessita de um sensor de temperatura em contato com
Capítulo 6. Conclusão e Perspectivas 141
a amostra, sendo que o próprio ar contido na célula acústica desempenha este papel,
permitindo assim a aplicação do método tanto para amostras em quanto para as em
volume.
Paralelamente a construção do aparato experimental magnetoacústico,
desenvolvemos uma célula fotoacústica aberta (OPC) que permite a variação de
temperatura do corpo de prova. Por meio desta OPC estudamos a influência da
espessura da amostra e da freqüência de modulação do laser na determinação da
temperatura de Curie do Gd. Este estudo revelou que, no que se refere a identificação da
temperatura de transição, uma transferência de sensibilidade do sinal para a fase
quando tendemos ao regime termicamente grosso. A temperatura de Curie de 292 K foi
obtida tanto da fase quanto do sinal fotoacústico, estando em pleno acordo com o valor
obtido no método magnetoacústico. A técnica fotoacústica da OPC permite a
investigação apenas de amostras sólidas, e esta é a razão de termos analisado somente a
o material Gd.
Como trabalhos futuros no método magnetoacústico, a perspectiva de se
aperfeiçoar o sistema de campos magnéticos, bem como a de se determinar a constante
de proporcionalidade que permite converter a voltagem detectada no amplificador lock-
in em variação de temperatura. Isto permitiria não só a determinação do EMC de
determinado composto, mas também um estudo adicional frente às influências sobre ele
que podem surgir, tais como: pureza dos materiais envolvidos; tratamento térmico; taxa
de resfriamento; oxidação quando exposto a atmosfera ambiente e a líquidos; pressão
mecânica; metalurgia do visando a construção dos regeneradores; e etc. No que se
refere ao desenvolvimento teórico envolvido na sica do experimento magnetoacústica,
acreditamos que ainda está em aberto uma teoria capaz de determinar parâmetros
magneto-térmicos da amostra examinada, através do ajuste das curvas de variação de
temperatura devido ao campo magnético de prova.
No tocante a OPC, as perspectivas estão intimamente relacionadas a determinação
direta da difusividade térmica e indiretamente da condutividade rmica, em torno da
temperatura ambiente, para vários compostos em volume, analisando a influência dos
vários parâmetros citados também nestas propriedades. A determinação dessas
propriedades térmicas é de suma importância no caminho até a comercialização da
refrigeração magnética, pois são estas propriedades que viabilizam as trocas térmicas
nos regeneradores construídos a partir dos materiais magnetocalóricos.
Apêndice A. Projeto da Célula Magnetoacústica 142
Apêndice A
Projeto da Célula Magnetoacústica
Apêndice A. Projeto da Célula Magnetoacústica 143
Apêndice A. Projeto da Célula Magnetoacústica 144
Apêndice A. Projeto da Célula Magnetoacústica 145
Apêndice B. Projeto da OPC com Variação de Temperatura 146
Apêndice B
Projeto da OPC com Variação de Temperatura
Apêndice B. Projeto da OPC com Variação de Temperatura 147
Apêndice B. Projeto da OPC com Variação de Temperatura 148
Apêndice B. Projeto da OPC com Variação de Temperatura 149
Apêndice B. Projeto da OPC com Variação de Temperatura 150
Apêndice B. Projeto da OPC com Variação de Temperatura 151
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