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cultura e do sujeito. Por se tratar de temas relacionados à origem, poderiam apenas ser
abordados a posteriori. E foi isso o que foi empreendido por Freud ao construir o mito
do assassinato do pai da horda primeva, apresentado em “Totem e Tabu” e utilizou a
tragédia de Édipo escrita por Sófocles (430
a.C.) em diversos artigos.
Com o mito do assassinato do pai da horda primeva
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, Freud apresenta uma
narrativa que abarca o momento de ruptura entre o estado natural e a ordem cultural,
propondo que uma vez que esta se instaura é impossível voltar atrás, senão se
submeter à lei que ela impõe, pois garante a constituição do sujeito. Essa submissão,
segundo Freud, é marcada pela renúncia da satisfação de impulsos, que inaugura o
desejo, marca essencial do sujeito. É a partir do momento em que o membro do grupo
ou da horda primeva abre mão da sua satisfação que, segundo Freud, uma falta se
instaura, fundando, assim, o desejo, e o sujeito surge então como efeito da cultura,
tributário dela. Constitui-se, nesse sentido, um pacto simbólico, ou seja, a submissão a
uma lei que regula as relações na cultura em prol da garantia de seu estatuto de sujeito.
Assim, Freud acredita que o sujeito, por se submeter à cultura pelo medo da
morte, se alia ao pacto por interesses narcísicos, e não pelo bem da cultura. Tais
postulados são propostos por Freud principalmente em 1930 (1929).
O ponto principal apontado por Freud no mito apresentado em “Totem e Tabu”
(1913[1912-13/]1996:144-9) é o assassinato do macho mais velho da horda pelos
outros membros, cansados das proibições impostas por aquele: proibição de manter
relações sexuais com as fêmeas do grupo, as quais ele detinha, e a expulsão do
membro quando este atinge determinada idade. Entretanto, sua morte causou um
sentimento de culpa entre os membros, pois juntamente ao ódio investido ao pai,
encontrava-se o amor. O fato que levaria à uma legitimação de todas ações e
articulam, lógica análoga às leis da linguagem. Saussure em Curso de lingüística geral (2001), isolou as
regras pelas quais os fenômenos lingüísticos se articulam. Ambos reduzem o fenômeno a um elemento
central: para Lévi-Strauss são os mitemas (equações mínimas as quais podemos chegar com a análise
estrutural do mito) e para Saussure é o algoritmo s/S (elemento mínimo do fenômeno lingüístico).
Nenhuma destas teorias está distante do que Freud empreendeu, como vimos (Cf. acima, p. 41) em
1900. Freud propôs que o sonho deveria ser compreendido a partir de seu conteúdo latente, ou seja,
através da lógica que o constituía. Dessa forma, ele pode postular os mecanismos pelos quais o
inconsciente atua, propondo de se assentam em leis que, de acordo com Lacan, são análogas às leis da
linguagem. Diante desta base teórica, Freud pôde construir o mito do assassinato do pai primevo
apreendendo sua estrutura e tomar o mito de Édipo também em sua estrutura.
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Este mito foi construído por Freud a partir de uma compilação de estudos antropológicos, sociológicos
e psicanalíticos.