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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE MESTRADO ACADÊMICO EM POLÍTICAS
PÚBLICAS E SOCIEDADE
EVILÁSIO MARTINS VIEIRA
CATEGORIAS PARA A CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS DE LAZER NA REGIÃO DO CARIRI
CEARENSE: UMA PERSPECTIVA DIALÉTICA
Pesquisa Financiada pela Fundação Cearense de Apoio ao
Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP
FORTALEZA - CE
Junho, 2006
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EVILÁSIO MARTINS VIEIRA
CATEGORIAS PARA A CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS DE LAZER NA REGIÃO DO CARIRI
CEARENSE: UMA PERSPECTIVA DIALÉTICA
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Mestrado Acadêmico em
Políticas Públicas e Sociedade do Centro de
Ciências Sociais Aplicadas da Universidade
Estadual do Ceará, como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em Políticas
Públicas e Sociedade, sob a orientação do
Prof. Dr. Francisco Máuri de Carvalho
Freitas.
FORTALEZA – CEARÁ
Junho, 2006
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3
FICHA CATALOGRÁFICA
Vieira, Evilásio Martins. Categorias para a Construção de Políticas
Públicas de Lazer na Região do Cariri Cearense: uma perspectiva
dialética / Evilásio Martins Vieira. Fortaleza: UECE, 2006. 107 f.
Orientador (a): Prof. Dr. Francisco Máuri de Carvalho Freitas
Dissertação (Mestrado Políticas Públicas e
Sociedade) Universidade Estadual do Ceará,
Centro de Ciências Sociais e de Humanidades.
1. Política 2. Lazer 3. Título.
ii
4
Dissertação defendida e aprovada, com a nota “satisfatório” pela Banca Examinadora
constituída pelos Professores:
________________________________________________________
Prof. Dr. Francisco Máuri de Carvalho Freitas - UFES
Orientador - Presidente
__________________________________________
Profa. Dra. Zuleide Fernandes Queiroz - URCA
__________________________________________
Prof. Dr. Roberto José Siebra Maia - URCA
Centro de Ciências Sociais e Humanidades
Universidade Estadual do Ceará
Fortaleza, 01 de Junho de 2006
iii
5
DEDICATÓRIA
“Mais valia semear a peste ou envenenar as fontes
do que erguer uma fábrica no meio de uma
povoação rústica. Introduzam o trabalho de fábrica
e adeus alegria, saúde, liberdade; adeus a tudo o
que fez a vida bela e digna de ser vivida”
(LAFARGUE, 1977, p. 25).
iv
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente, ao meu confrade e orientador, Professor
Francisco Máuri de Carvalho Freitas, amigo e conselheiro de todas as horas, fiel e
rigoroso comunista, reconhecidamente o maior estudioso e praticante do marxismo na
área da Educação Física brasileira, a quem devo merecida reverência e reconhecimento
pela intrepidez diante da tarefa de orientação deste estudo em situação atípica.
Em especial, expresso minha gratidão à estimada Professora Susana
Vasconcelos Jimenez que, incentivando e estimulando a prática da pesquisa no campo
da ontologia marxiana, com seu espírito revolucionário, austeridade, sabedoria, ternura
e discernimento inequívoco, permitiu-me seguir o verdadeiro caminho para o socialismo
e a possibilidade de evoluir politicamente, condição inexorável à sobrevivência diante
da luta desigual contra o sistema capitalista e seus aliados.
Meus agradecimentos à professora Micheli Ortega Escobar, despertar
primeiro de meu crescimento intelectual e da minha formação política marxiana,
requisito indispensável à formação do ser humano e comunista, a quem devo uma
enorme gratidão.
.
v
7
Agradeço, também, aos colegas de trabalho do Curso de Educação Física
da Universidade Regional do Cariri URCA, Crato - Ceará, pelo estímulo à realização
desta pesquisa, em especial aos amigos e professores Lucas Vieira e Berilo Barroso que,
em condições adversas, valentemente permitiram meu afastamento para cursar as aulas
deste mestrado.
Ao meu colega de mestrado e amigo Solonildo pela sincera amizade,
companheirismo e guarida nos momentos difíceis dentro e fora da universidade.
Agradeço, particularmente, a minha esposa Elizabeth e aos meus filhos
Enza, Túlio e Tales pela paciência e compreensão diante da minha transitória
ausência em suas vidas.
Ao meu pai, Mestre Germino, in memorian, pela lealdade, coragem,
inteligência, amizade e pela educação com que conduziu as nossas vidas juntamente
com a minha mãe, Dona Rosa.
8
Enfim, meu singular cumprimento àquelas pessoas a quem esqueci de
agradecer e que certamente se envolveram de uma maneira ou de outra, no processo de
construção deste trabalho.
vi
9
"O intelectual verdadeiro, por tudo isso, sempre de ser
um homem revoltado e um revolucionário, pessimista,
cético e cínico: fora da lei” (ANDRADE, 1976, p. 516).
vii
10
RESUMO
A reflexão sobre elementos teóricos para a construção de políticas públicas
de lazer na região do cariri cearense, especialmente nos municípios de Crato, Juazeiro
do Norte e Barbalha, numa perspectiva dialética, constitui o objeto deste estudo.
Observa-se que o lazer não vem sendo fomentado adequadamente no país, daí a
necessidade de produção de conhecimento neste campo que considere as problemáticas
de fundo, ligadas diretamente à vida da classe operária e assuma a crítica como
fundamento de reconstrução da sociedade. Considerando o quadro de contradições, a
luta de classes e a crise estrutural do capital, constitui problema principal desta pesquisa
saber quais as categorias das políticas de desenvolvimento social na área do lazer para a
região do cariri que efetivamente contribuem para a utilização positiva e consciente do
tempo livre e o desenvolvimento cultural da classe operária. Nesse sentido, tem-se como
objetivo geral deste trabalho promover uma reflexão crítica sobre a questão das políticas
públicas de lazer e o modo como se articulam as múltiplas determinações em torno
desse fenômeno sócio-cultural e de modo mais específico, busca-se a explicitação de
elementos teóricos para a construção de políticas públicas de lazer nesta região, assim
como o estabelecimento do debate sobre os rumos que deve tomar no sul do Ceará,
esperando que a elucidação do problema possa contribuir efetivamente para o processo
de humanização da classe operária. Para tanto, privilegiou-se um referencial teórico que
apontasse para a superação do modo capitalista de produção, marcadamente desigual,
perverso e desumano, razão pela qual, tomou-se como teoria de base as principais teses
de Marx sobre o tempo livre. De acordo com Marx, na possibilidade da sociedade
comunista, as relações sociais não mais serão radicadas na centralidade do trabalho, mas
na centralidade do vadiar, do mandriar, no tempo livre. Quanto aos procedimentos
metodológicos, privilegiou-se a utilização do materialismo histórico dialético como
método de abordagem e de investigação do problema de pesquisa, entendendo que suas
categorias e leis, ao se apresentarem como reflexos das propriedades e relações reais e
do desenvolvimento do conhecimento e da sociedade, permitem uma leitura mais
adequada da realidade, o que exigiu uma aproximação com o real, através da
observação direta (sem interferir no processo), da realidade das políticas públicas de
lazer na Região do Cariri e na República Socialista de Cuba. De acordo com o ponto de
vista deste estudo, as categorias nas quais as políticas públicas de lazer devem assentar
seus alicerces são: a) Necessidades e liberdade da classe trabalhadora; b) Cultura para as
massas, c) Condições materiais objetivas para o desenvolvimento e prática do lazer; d)
Fontes de financiamento; e) Participação popular; f) Informação social; entendidas
como conceitos teóricos fundamentais para construção de políticas públicas para o setor,
voltadas para promoção do desenvolvimento social numa perspectiva dialética, não
obstante a contradição existente na relação capital e trabalho. Conclui-se, finalmente,
ser possível entabular propostas revolucionárias, materializadas, aqui, na proposição de
categorias que possibilitem o acesso ilimitado à classe operária à cultura de lazer
produzida e acumulada historicamente pela humanidade, apresentando contribuições
para uma ação concreta na realidade estudada, ainda que profunda e ontologicamente
marcada pelas relações de produção e exploração capitalista.
Palavras-chave: políticas públicas; lazer; capitalismo.
11
viii
ABSTRACT
The reflection about the theoretical elements for the creation of the public
politics of leisure in the region of Ceará, especially in the cities of Crato, Juazeiro do
Norte and Barbalha, in a dialectic perspective, appoint to the object of this research
paper. Notice that the leisure hasn’t been fomented properly in the Country, so the
necessity of production of knowledge in this area which consider the problematical
deeply, connected to the life of the working class and assume the criticism as foundation
of rebuilding of the society. Introductory clause the contradiction staff, the struggle for
classes and structural crisis of the paid capital, establish the principal problem of this
research, knowing which categories of politics of social development in the leisure area
to the Cariri region that effectively contribute to a positive utilization and conscious of
free time and the cultural development of the working class. In this sense, it has the
general goal of this abstract to promote a reflexible criticism about the public politics of
leisure and the way how they articulate the multiple determination around this cultural-
partner phenomenon and from a more specific manner, search the explicitation of
theoretical elements to build the public politics of leisure in this region, thus the
establishment of the debate of the course which it must be taken to the South of Ceará,
hoping that the elucidation of the problem may contribute effectively to a process of
humanization of the working class. So, it has been privileged the theoretical reference
which could point to a superable form of the Capitalism form of production, striking
unequal, wicked and inhuman, on account, which it has been taken as a theoretical of
bases the principal thesis of Mark about the free time. According to Marx, in the
possibility of the communist society, the social relations won’t be radicated in the
central of the work anymore, but in the central of the vagrancy, of the idler, in the free
time. In relation to the methodological procedures, it was privileged the utilization of
the dialectic historical materialism as a method of boarding and of the investigation of
the problem of researches, understanding that its categories and laws, introducing as
reflections of the proprietorship and real relations and of the development of the
knowledge and of the society, consenting a reading more suitable of the reality, which
required one approach with the real, through the direct observation (without
interferences in the process), of the reality of the public politics of the leisure in the
region of Cariri and in the Republic Socialist of Cuba. According to the point of view of
this research, the categories which the public politics of the leisure must seat their
foundation, which are: a)Necessities and freedom of the working class; b)Culture for the
masses; c)objective material conditions for the development and practice of the leisure;
d)Sources of financing; e)popular participation; f)Social information; understood as
theoretical concepts, which are fundamental for the construction of the public politics
for this sector, acquainted by the promotion of the social development in a perspective
dialectics, however in the existence of the contradiction in the capital and work relation.
To come to a conclusion, finally, it’s possible to board up the revolutionary offers,
materialized, here in the proposition of the categories which make possible the
unlimited access for the working class to the culture of leisure produced and
accumulated historically for the humanity, introducing the contributions to a concrete
12
action in the reality studied, even so intense and ontologically set by the relations of the
production and the Capitalist exploration.
Key-words: public politics; leisure; capitalism
ix
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...........................................................................................
11
CAPÍTULO I
O conceito de lazer em Sanches y Colaboradores ....................................
29
CAÍTULO II
As políticas públicas e a crise estrutural do capital .................................
54
CAPÍTULO III
Categorias para construção de políticas públicas de lazer numa
perspectiva dialética ....................................................................................
66
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................
87
REFERÊNCIAS .......................................................................................... 99
ANEXO ....................................................................................................... 104
13
x
INTRODUÇÃO
“A crítica não é paixão da cabeça, mas a cabeça da paixão. O
seu alvo é um inimigo que ela procura não refutar, mas destruir
[...]. A crítica já não é fim em si, mas apenas um meio. A
indignação é o seu modo fundamental de sentimento, e a
denúncia a sua principal ocupação” (MARX, 2003, p. 48).
O presente estudo insere-se na linha de pesquisa Democracia,
Associativismo e Políticas Públicas do Programa de Mestrado Acadêmico em Políticas
Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do Ceará, o qual se propõe formar
profissionais capazes de refletir, analisar e intervir criticamente no processo de
transformação da sociedade.
Convém, preliminarmente, fazer a delimitação do objeto de estudo desta
pesquisa. A reflexão sobre elementos teórico-metodológicos para a construção de
políticas públicas de lazer na Região do Cariri cearense, especialmente nos municípios
de Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, numa perspectiva dialética, constitui o objeto
deste estudo, assumindo, desde já, o desafio de examinar a questão no contexto de crise
sistêmica, prolongada, universal e estrutural do capital (MÉSZÁROS, 2002; 2003),
levando em consideração a conjuntura atual de franca decomposição do modelo
14
capitalista e da acelerada destruição das forças produtivas e do evidente fracasso das
políticas públicas ou sociais
1
de perfil neoliberal.
Na esteira da ontologia marxiana, tomar-se-á como teoria de base os
principais aspectos do materialismo histórico dialético, método de estudo e análise de
Marx sobre o pensamento, a natureza e a sociedade. Ou seja, o marxismo pode ser
compreendido em sua essência “como reflexão crítica e livre sobre todas as formas do
agir e do fazer humano” (CARVALHO, 2006, p. 1).
O trabalho
2
, compreendido por Marx (1998) como protoforma de toda a
práxis humana, como um complexo categorial pertencente ao mundo dos homens e em
permanente relação com a totalidade social, será a categoria a partir da qual se realizará
a análise e elucidação da problemática de pesquisa, trilhando por um caminho
efetivamente ontológico e não puramente epistemológico/gnosiológico, uma vez que a
determinação do ser social, conforme nos ensina Lukács (1978; 1979), é ontológica, isto
é, está ligada à afirmação do ser, do existente, do efetivamente reconhecido enquanto
tal, como o campo daquilo sobre o qual o saber se faz, tendo como prioritário que a base
da ontologia é a afirmação do ser.
Para Marx e Engels (1998), a totalidade social é o conjunto das relações
que os homens estabelecem entre si, na produção material, numa determinada fase da
história, a qual constitui a dimensão social fundante. A partir dela e de forma mediada
que assegura tanto a dependência ontológica quanto a especificidade própria e a
1
Neste trabalho não se faz distinção entre políticas “públicas” ou políticas “sociais” por entender que
ambas são “políticas” geradas pelo ideário liberal burguês. Quando se fala de políticas públicas ou
sociais, quer-se referir na verdade, ao que emana do governo (CARVALHO, 2006). Sendo assim, toda
política pública pode ser considerada, nesse sentido, ao mesmo tempo, política social.
2
Segundo Tonet (1997), baseado em Marx, o ato fundante da existência humana é o trabalho. Tanto
porque é por seu intermédio que se a passagem do ser natural ao ser social, quanto porque ele será
sempre a base a partir da qual se constrói a totalidade da realidade social. Como explicita Lukács (1979),
o trabalho, em seus elementos essenciais, é um composto de teleologia (finalidade consciente) e
causalidade (a natureza, com suas leis próprias). A articulação entre estes dois elementos é que origem
a uma realidade não mais natural, mas social.
15
autonomia relativa – surgem as outras esferas da atividade humana, a saber: a ciência, o
direito, a economia, a cultura, a educação, a política, etc (TONET, 1997).
Apesar da existência de inúmeros trabalhos que discutem a questão das
políticas públicas de esporte e lazer, nesta pesquisa optou-se por analisar a
problemática do lazer, separadamente do esporte, por entender que as práticas
esportivas constituem um dos interesses (físico-esportivos)
3
do lazer.
Dentro dos limites impostos pelo caráter desta dissertação, aborda-se a
questão do lazer, tomando-o como uma dimensão originada também da atividade prática
do homem que, no caso da sociabilidade capitalista, é complementada também pela
democracia e a cidadania
4
, considerados aqui valores de sustentação da ordem burguesa.
Mais do que um preceito constitucional, o acesso ao lazer é um direito a ser
garantido pelo Estado à população brasileira. Segundo o Artigo 217, item II, da
Constituição Federal de 1988, é dever do Estado o incentivo ao lazer como forma de
promoção social. Com efeito, o lazer passa a ser direito de todos, assegurado
praticamente em todas as Constituições Estaduais e Leis Orgânicas dos municípios do
território nacional, cabendo, portanto, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios
fixarem, respectivamente, normas de organização e funcionamento de políticas sociais
para o setor.
Observa-se que, mesmo constando como dispositivo legal, o lazer não vem
sendo fomentado adequadamente no país, embora o Ministério do Esporte, através da
Secretaria Nacional de Desenvolvimento de Esporte e de Lazer - SNDEL, timidamente,
venha desenvolvendo algumas ações, a exemplo do recente Programa Esporte e Lazer
3
No capitalismo, diferentemente daquilo dito por Dumazedier (1980) ao classificar o lazer em áreas de
interesse (físicos, práticos ou manuais, artísticos, intelectuais e sociais), o lazer ou é distrativo ou serve à
melhoria da capacidade produtiva da força de trabalho.
4
Sobre democracia e cidadania enquanto objetivações do ideário liberal-burguês existe uma vasta e
conhecida bibliografia, o que dispensa referências.
16
na Cidade (BRASIL, 2005, p. 11), que, objetivamente, não atendem às necessidades
básicas e à melhoria da qualidade de vida da população em geral, da forma preceituada
na Carta Magna.
Vê-se que, de um lado, tem predominado uma política de hierarquização de
necessidades sob a ótica do governo e não da realidade concreta, e do outro, a falta de
sistematização, a partir de discussões e de experiências concretas advindas de políticas
públicas inovadoras nessa área.
Ademais, a literatura existente sobre o lazer enquanto política pública
mostra que a organização e o funcionamento dos serviços promovidos pelas políticas
públicas de lazer ressentem-se de elementos teóricos claros que os orientem de forma
sistemática e segura. Os investimentos no setor merecem revisão, visto que a relação
custo/benefício deixa a desejar. Os procedimentos metodológicos e as técnicas de
trabalho utilizadas no setor, em grande parte, encontram-se indefinidas ou exigindo
redefinições e desenvolvimento.
Nessas políticas – muitas vezes iniciativas contingenciais – a força de
trabalho precisa ser formada em permanente processo de busca de novas experiências,
adaptação de novos métodos e técnicas, assim como as qualificações dos profissionais
que nele atuam ou atuarão necessitam ser mais bem definidas pelas escolas de formação
para integrar campos de trabalho ainda indefinidos, em crescimento ou embrionários.
Por sua vez, a infra-estrutura das práticas de lazer é também uma instância nova, “onde
a indústria de consumo do lazer, sob determinadas condições de desenvolvimento da
sociedade, provoca alterações nas práticas espontâneas consagradas pelo povo e até
mesmo seu desaparecimento” (SIQUEIRA, 1992, p. 63).
No Estado do Ceará, as poucas ações, isoladas, no campo do lazer são
privilégios das regiões mais habitadas e localizadas na área metropolitana de Fortaleza,
17
traduzidas por políticas, apenas, de eventos físico-esportivos esporádicos, de doação de
material esportivo ou de cessão de equipamentos específicos, sem, contudo, haver a
preocupação com um plano, em longo prazo, que leve em consideração as condições
materiais objetivas da classe operária, para a sua participação consciente.
Assim, a Secretaria do Esporte e Juventude SEJUV e a Secretaria de
Cultura SECULT, ao nível de Estado, oferecem eventos passageiros, elitistas,
discriminatórios e onerosos, sem reflexos sociais consistentes e permanentes,
reforçando as desigualdades sociais, a valorização do esporte de rendimento, a
banalização do lazer e a política clientelista de privilégios. Os projetos e eventos são
elaborados e decididos nos gabinetes, restringindo-se às Ruas de Lazer e às Vilas
Olímpicas, como oferta de atividades recreativas que divertem e relaxam, mas que são
planejadas e controladas por monitores designados pelos promotores do evento, sem o
envolvimento da comunidade na sua organização e sem a preocupação com a
continuidade necessária. Todavia, essas ações não atingem a totalidade dos municípios
cearenses, tampouco, aquelas regiões consideradas “em desenvolvimento”, como é o
caso da Região do Cariri, situada no sul do Estado.
Os programas e ações decorrentes das políticas públicas municipais para o
desenvolvimento do lazer, nesta região, demonstram que, além de eventuais, baseiam-se
numa dimensão utilitária de cunho assistencialista e compensatório - resumida em
investimentos específicos para os jogos estudantis municipais e para a promoção do
futebol profissional nos municípios, principalmente, em Crato, Barbalha e Juazeiro do
Norte - em detrimento de uma política pública de longo prazo para o setor ou a
priorização de programas mais freqüentes e diferenciados, apesar da existência nestes
municípios de órgãos da administração pública voltados para o incremento de atividades
nessa área, com estrutura de funcionamento, lotação de pessoal e profissional habilitado.
18
Apesar desses paradoxos, são identificados, ainda, no Cariri cearense,
demandas de estrutura física e alternativas para a possibilidade de prática de lazer, além
de uma considerável diversidade de recursos físicos e naturais que se configurem como
reconhecidos fatores favoráveis à prática do turismo de aventura e de diferentes
manifestações da cultura corporal
5
ligadas aos interesses físico-esportivos do lazer.
Em alguns países culturalmente desenvolvidos, como a República
Socialista de Cuba, o lazer tem sido tematizado e realizado como bem cultural, passivo
de ser oferecido a todos como um direito social. No Brasil, a idéia de que todos,
indistintamente, devam ter acesso às diversas práticas de lazer ainda não se apresenta
como um princípio efetivamente respeitado. Na verdade, tal compartilhamento chega a
manifestar-se sim, mas, apenas no plano do discurso ou da retórica, sem se efetivar
concretamente na esfera dos seus procedimentos.
Uma possibilidade explicativa para o entendimento desta questão pode ser
obtida através da compreensão do modelo de Estado adotado no Brasil. A lógica que
preside tanto a formulação, quanto a execução dos escassos programas e ações neste
campo, advém da concepção neoliberal de Estado
6
, traduzido num conjunto de políticas
pautadas fundamentalmente na “modernização” do Estado, no combate à inflação, na
abertura comercial, no fim das restrições ao capital estrangeiro, dentre outras
“recomendações” aos países capitalistas periféricos (OLÉIAS, 1999). Ou seja, a tese
5
Segundo o Coletivo de Autores (1992), integrante da cultura do homem e da mulher brasileiros, a
cultura corporal constitui-se como uma totalidade formada pela interação de distintas práticas sociais,
tais como a dança, o jogo, a ginástica, o esporte que, por sua vez, materializam-se, ganham forma,
através das práticas corporais. Enquanto práticas sociais refletem a atividade produtiva humana de buscar
respostas às suas necessidades.
6
Já existe uma farta literatura a respeito do conceito de Estado neoliberal como uma das últimas
manobras do sistema do capital contemporâneo, maquinado pelo pensamento dominante pouco mais
de cinqüenta anos. De todo modo, ver especificamente: ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo.
In: SADER, Emir & GENTILI, Pablo (Org.). Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado
democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998. p. 9-23. WAINWRIGHT, Hilary. Uma resposta ao
neoliberalismo: argumentos para uma nova esquerda. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.
19
central do liberalismo, velho e novo, continua sendo a mesma: "o menos de Estado e de
política possível".
Ora, diante do quadro caótico em que se encontram as políticas públicas e
frente à opção histórica do Estado neoliberal brasileiro de representar os interesses
históricos e imediatos das elites nacionais e internacionais, reconhece-se que,
academicamente, devem ser discutidas propostas contra-hegemônicas para o
estabelecimento de projetos distintos para o lazer comunitário. Compreende-se que o
questionamento de propostas elitistas e privadas apresentadas no âmbito do Estado, em
detrimento do público/social, é tarefa de quem está preocupado em estabelecer um novo
projeto histórico de sociedade.
Daí, a necessidade de produção de conhecimento no campo do lazer que
considere as problemáticas de fundo ligadas diretamente à vida da classe operária e
assuma a crítica como fundamento de reconstrução da sociedade.
Ademais, os poucos estudos na área limitam-se a analisar tais políticas em
seu sentido geral, desconsiderando as problemáticas de fundo ligadas diretamente à vida
da maioria da população brasileira que vive do trabalho. Tal desconsideração pode ser
facilmente avistada, por exemplo, em trabalhos como o de Stigger (1998, p. 85) que
trata de questões relacionadas a políticas sociais de esporte, lazer e participação popular
defendendo que essas intervenções se restrinjam a aspectos específicos da ação
governamental na área sem reconhecer o fundo estrutural da formação capitalista.
Afirma esse autor, não ver a necessidade de que “[...] sejam desenvolvidas questões
relativas à evidente desigualdade social brasileira e suas relações com o campo em
debate; penso (diz ele) que estas questões estão ligadas a aspectos estruturais que não
pretendo desenvolver aqui”.
20
Observa-se que trabalhos desse teor desvinculam suas análises das
estruturas, relações, contradições e tendências do modo capitalista de produção e da
necessária discussão de um novo o Projeto Histórico.
Com efeito, é neste quadro de contradições e limites que têm que ser
pensadas as políticas blicas de lazer para a Região do Cariri cearense. Por causa
disso, considera-se a problemática deste projeto uma questão extremamente complexa e
de difícil solução, justificando-se a tarefa de investigar elementos que contribuam para a
definição de políticas públicas para o setor do lazer que, efetivamente, possibilitem à
classe operária a participação e o usufruto consciente das suas práticas, reconhecendo
no quadro histórico de hoje a existência de condições mínimas para a satisfação das
necessidades das classes sociais despossuídas, não obstante as projeções de satisfação
das condições básicas humanas pelo sistema do capital, conforme assinala Mészáros
(
2003, p. 17) a esse respeito:
Independentemente das alegações da atual “globalização”, é impossível
existir universalidade no mundo social sem igualdade substantiva.
Evidentemente, portanto, o sistema do capital, em todas as suas formas
concebíveis ou historicamente conhecidas, é totalmente incompatível com as
suas próprias projeções ainda que distorcidas e estropiadas de
universalidade globalizante.
O sistema do capital vive, então, um eterno dilema: as promessas de
eficiência econômica com igualdade e proteção social são inviabilizadas pela
implementação de programas sociais que, segundo a lógica do capital, provocam uma
diminuição na atividade econômica. Pior ainda, para o capital, “as políticas públicas
podem ser consideradas também, do ponto de vista econômico, como estruturas
21
responsáveis pela crise atual, porque impeditiva de que os mecanismos de mercado
possam sanar efetivamente a economia” (HENRIQUE & DRAIBE, 1987, p. 11).
É preciso, portanto, analisar o quadro atual e o futuro das políticas públicas
de lazer a partir desses pressupostos, uma vez que o Brasil se tornou refém da nefasta
estratégia do capitalismo internacional, considerando que estes “planos” não têm
resolvido os reais problemas sociais deste país.
O desafio de propor elementos que facilitem a elaboração de políticas
públicas no campo do lazer para a Região do Cariri, desvinculadas da lógica oficial,
portanto, revestidas de um caráter dialético, configura-se como a melhor e mais
pretensiosa justificativa deste estudo.
Como se vê, pensar o lazer na perspectiva dos direitos sociais no atual
modo de produção capitalista pressupõe a compreensão de que os dilemas específicos
que os envolvem têm a sua gênese no ordenamento social e político. O propósito de
tratá-lo como prática social integrante do patrimônio cultural da humanidade exige a
construção de um projeto político que o contemple como bem cultural, cuja posse é
indissociável da melhoria da qualidade de vida de todos os brasileiros. Nesse sentido,
entende-se que o desenvolvimento de políticas públicas nessa área exige a reflexão
sobre parâmetros diferentes daqueles atualmente adotados pelo Estado capitalista para o
setor.
Considerando o quadro de contradições, a luta de classes e o contexto de
crise sistêmica e estrutural do capital, constitui problema principal desta pesquisa saber
quais as categorias das políticas de desenvolvimento social na área do lazer para a
região do Cariri cearense que efetivamente contribuem para a utilização positiva e
consciente do tempo livre e o desenvolvimento cultural da classe operária. Este é o
desafio do presente estudo.
22
A hipótese inicial de trabalho é a de que as características essenciais do
modo de produção capitalista classes sociais e propriedade privada presentes na
estrutura das políticas públicas de desenvolvimento estadual incidem, de maneira
negativa, sobre os processos sociais tendentes à melhoria da qualidade de vida da classe
trabalhadora e nas possibilidades de efetivo exercício da sua autonomia, da consciência
política, da organização social e da sua liberdade.
Do ponto de vista técnico-científico, esta pesquisa trabalhou com a hipótese
de que as categorias nas quais as políticas públicas do setor de lazer numa perspectiva
dialética devem assentar seus alicerces são: a) Necessidades e liberdade da classe
trabalhadora; b) Cultura para as massas, c) Condições materiais objetivas para o
desenvolvimento e prática do lazer; d) Participação popular; e) Fontes de financiamento.
Considera-se, entretanto, que o problema é complexo e que não é resultado
de um fator, pois se reconhecem variáveis políticas, econômicas, legais, culturais,
demográficas e ecológicas que afetam o ordenamento e funcionamento das políticas
voltadas para o desenvolvimento social da população. Por isso, a necessidade, também,
de descrever como o lazer tem sido tratado enquanto direito social legalmente instituído.
A atenção a essas variáveis pode resultar em ações efetivas que
conduzam as práticas de lazer na Região do Cariri a uma situação cada vez mais
próxima dos anseios e necessidades das massas caririenses. Daí, a necessidade de tratar,
neste estudo, das problemáticas que se manifestam simultaneamente com as questões
epistemológicas do conhecimento do lazer.
Considerando as delimitações do âmbito desta pesquisa, constitui objetivo
geral deste trabalho promover uma reflexão crítica sobre a questão das políticas públicas
de lazer e o modo como se articulam as múltiplas determinações em torno desse
23
fenômeno sócio-cultural, trilhando por um caminho analítico conforme a tradição
marxista.
De maneira mais específica, busca-se a explicitação de elementos teóricos
para a construção de políticas públicas de lazer para a Região do Cariri cearense,
visando o aprimoramento do setor e sua contribuição para o desenvolvimento sócio-
econômico da região, através da concepção e execução de diferentes programas,
identificando e fundamentando demandas e ofertas de desenvolvimento das diferentes
práticas de lazer nessa região, apresentando os efeitos culturais, econômicos e
educacionais decorrentes dos programas e ações voltadas para o campo do lazer nas
cidades de Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, reconhecendo que a proposição de
elementos teóricos para definição de políticas públicas setoriais em plena crise
estrutural do capital não pode se dar fora do marco da ontologia marxiana.
Constitui ainda objetivo desta pesquisa instalar o debate sobre os rumos que
deve tomar o fenômeno do lazer na Região do Cariri cearense, considerando a crise
sistêmica e estrutural do capital, as contradições e a luta de classes na região, esperando
que a elucidação do problema de pesquisa possa contribuir efetivamente para o processo
de humanização da classe operária.
Sendo a atividade política uma prática ontológico-social que encontra suas
explicações na própria prática do homem e na ão criadora da prática social coletiva,
tratar-se-á a problemática para além das suas características superficiais, simples e
gerais, dos seus determinantes cronológicos e quantificáveis e das suas relações causais
apenas explicadas pelos seus estágios anteriores.
Essa é uma questão que e no sentido de uma tomada de posição inicial, leva
à necessidade de ressaltar a importância de um projeto histórico socialista claro que
norteie toda a ação revolucionária, destacando-se a pesquisa no âmbito das políticas
24
públicas. Percebe-se isto, então, como o primeiro passo para proposição de elementos
para construção de políticas públicas para o setor do lazer, razão pela qual este trabalho
assume como base do seu marco teórico o projeto histórico marxista, o qual deve ser
considerado de modo orgânico no contexto de uma rigorosa crítica às relações sociais
próprias do modo de produção capitalista. A posição assumida significa, sem dúvida, a
rejeição radical de teorias sobre normas e valores para uma sociedade capitalista de
relações harmoniosas e solidárias - na qual seria possível a emancipação do indivíduo -
uma vez que essas teorias negam o caráter classista das relações sociais.
Longe da preocupação com a possibilidade de deixar de ser científico, o
presente estudo pela utilização de determinadas categorias e determinados
pressupostos histórica e socialmente elaborados no patamar do conhecimento mais
elevado à disposição – situa-se inequivocamente entre aqueles que apontam para a
necessidade de superação da atual forma sóciometábolica do sistema do capital,
conforme assevera Tonet (2004, p. 8):
A própria natureza do processo real exige que se busque hoje, mais do nunca,
as mediações entre cada fenômeno particular e o objetivo mais geral. Assim
sendo, em hipótese alguma se pode abrir mão desta conexão entre o momento
da particularidade e o momento da universalidade. Este é todo o esforço que
se exige do pesquisador. Em hipótese alguma, porém, se pode abrir mão
desta conexão entre o momento da particularidade e o momento da
universalidade.
Por isto, privilegiou-se uma teoria de base cujo referencial apontasse para a
necessidade de superação do atual modo capitalista de produção da existência,
marcadamente desigual, perverso e desumano.
A propósito, um estudo exploratório da literatura demonstra a inexistência
de trabalhos que particularizem a questão do lazer no contexto da crise estrutural do
25
capital, partindo de uma crítica contundente ao sistema do capital. Em verdade, há, sim,
uma vasta produção teórica a respeito que aborda a questão das políticas públicas de
esporte e do lazer sem consideração às contradições e limites do modo de produção
capitalista, avistadas, principalmente, em Marcellino (1987; 1996; 2001); Castellani
Filho (1996); Cavalcanti (1984); Brunhs (1991); Zaluar (1991); Guterres & Rodrigues
(1996); Linhales (1997); e Stigger (1998); Nerys Silva (1999); Oléias (1999);
Dumazedier (1980), nas quais se podem identificar conhecimentos, idéias, conceitos e
categorias no campo do esporte e lazer que não podem ser avaliados dentro de uma
perspectiva histórico-crítica e transformadora. Nestas proposições não subjaz um
projeto histórico de configuração anticapitalista. Os avanços qualitativos percebidos são
mais de ordem metodológica, ficando os princípios inalterados. Daí, o reconhecimento
da ausência de uma elaboração sistematizada adequada às necessidades históricas atuais
de transformação radical da sociedade. Todavia, tal constatação não significa, em
hipótese alguma, abandono ou desprezo pelas obras citadas. Mas, se utilizadas, serão
analisadas avaliando criticamente seus limites e possibilidades explicativas à luz do
marco teórico assumido nesta pesquisa.
Admitindo o trabalho como fundamento ou essência da formação humana
ou do processo de humanização, tomar-se-á como teoria de base as principais teses de
Marx sobre o tempo livre. De acordo com Marx, na possibilidade da sociedade
comunista, as relações sociais não mais serão radicadas na centralidade do trabalho, mas
na centralidade do vadiar, do mandriar, no tempo livre.
Para melhor compreensão do valor atribuído por Marx à questão do tempo
livre, segue-se o referencial teórico e a linha de raciocínio adotada por Lafargue (1977)
e Lefébvre (1967; 1999) para quem a sociedade do futuro deverá organizar-se não em
torno do trabalho, mas da preguiça e do supérfluo. O raciocínio ancora-se, também, nas
26
contribuições de Siqueira (1992) e Sanchez y Colaboradores (1997); cujas
interpretações, comentários e/ou proposituras aprofundam a análise do objeto à luz do
materialismo histórico dialético, situando-se no âmbito do objeto do referido estudo, o
que possibilitou retirar certos aspectos afins, coincidentes e importantes que, pela
relevância dos dados e por se apresentarem de forma constante, estável e subsistente,
indicam a presença de uma invariante e podem conduzir a generalizações que,
basicamente, assinalam a emergência de categorias nas problemáticas estudadas. É
preciso ressaltar a intenção deste trabalho de reunir evidências para a elaboração de
categorias que subsidiem a análise rigorosa das políticas públicas de lazer.
Ao longo da investigação tomou-se como referência alguns conceitos que,
pela sua riqueza teórica, permitiram uma leitura crítica da realidade, tendo claro,
entretanto, que “[...] todas as categorias são conceitos, mas, nem todos os conceitos são
categorias” (CHEPTULIN, 1982, p. 59), uma vez que estas (as categorias) refletem as
propriedades essenciais, universais e comuns a todos os objetos, e que o conceito se
refere às propriedades essenciais que caracterizam um grupo determinado de
fenômenos.
Como tal, analisaram-se conceitos como os de lazer, políticas públicas,
cultura, capital e capitalismo, democracia, cidadania, liberdade, necessidades, entre
outros, assim como o estabelecimento e análise de categorias filosóficas
7
e científicas
explicativas da teoria marxista, consideradas importantes para compreensão da
problemática de pesquisa, visto que estas expressam formas de existência que não são
dadas aleatoriamente.
7
Segundo Triviños (1987, p. 15-16), as categorias filosóficas representam um nível superior de conceitos,
de conhecimento teórico. O homem chegou a esse tipo de conhecimento observando a realidade, através
da prática desenvolvida cotidianamente durante séculos. Nesse sentido, as categorias são um resultado, o
produto de uma época, e sintetizam o saber de um período histórico. De igual forma, cada ciência tem
elaborado suas próprias categorias que a configuram como tal.
27
Nesse sentido, foram estabelecidas as seguintes categorias de análise: 1) O
conceito de lazer segundo Sánchez y Colaboradores; e 2) A políticas públicas e a crise
estrutural do capital. Com elas julga-se contribuir positivamente para a explicitação de
elementos teóricos indispensáveis à construção e sistematização de políticas sociais para
o setor do lazer na Região do Cariri cearense.
Na primeira categoria, analisou-se a questão do conceito de lazer, tomando
como base as proposições de Sánchez y Colaboradores (1997), entendendo ser de
fundamental importância a distinção de uma definição para o fenômeno do lazer numa
perspectiva dialética da atual realidade.
Considerada de cabal relevância para compreensão e elucidação da
problemática desta pesquisa, a segunda categoria, por seu turno, teve como objeto a
compreensão das relações que se estabelecem entre Estado capitalista e políticas
públicas, a partir da a noção de crise estrutural do capital.
Afirma-se, ao longo deste trabalho, que somente a perspectiva teórico-
metodológica marxista de pesquisa do real pode permitir a explicitação e a compreensão
dos fenômenos sociais em seu movimento contraditório de ser e aparecer e em sua
relação com a totalidade histórico-social da qual faz parte, uma vez que esta perspectiva
se constitui numa teoria capaz de expor os nexos fundamentais da realidade social e de
dar conta da multiplicidade das determinações contraditórias que a constituem.
Por essa razão, privilegiou-se a utilização do materialismo histórico
dialético como método de abordagem e de investigação do problema de pesquisa,
entendendo que suas categorias e leis, ao se apresentarem como reflexos das
propriedades, relações reais do desenvolvimento do conhecimento e da sociedade,
permitem uma leitura mais adequada da realidade.
28
Pode-se afirmar com Lukács (1979, p. 244), que a metodologia da
investigação é a reflexão sistemática sobre o método e os procedimentos; ou seja, a
utilização consciente dos princípios, categorias e leis da filosofia marxista no trabalho
de investigação da realidade, sendo indispensável para apreensão do real, “[...]
determinar o lugar que ocupa o fenômeno que tomara por objeto, no interior da
totalidade concreta de que faz objetivamente parte”.
Esta pesquisa constitui um trabalho de natureza teórica, de natureza
bibliográfica, com unidade de estudo delimitada, sem interferir no real e elege como
estratégia para condução das suas etapas metodológicas as contribuições de Kosik
(1976) para o trabalho de investigação em ciências sociais, bem como as referências
sobre o método materialista histórico-dialético encontradas na análise e investigação
científica realizadas por Marx (1997), e aqui escavadas em “O Dezoito Brumário de
Luis Bonaparte
8
”, obra que é reconhecida pelos pesquisadores marxistas como fonte
privilegiada para compreensão de estudos investigativos de caráter bibliográfico, uma
vez que particulariza a compreensão dos fundamentos da realidade elegendo a
totalidade como categoria medular. Todavia, para os desavisados, fica a advertência de
que não se trata de reduzir tal obra a simples manual de pesquisa bibliográfica.
Marx (1998b) assinalou que as formas fenomênicas se reproduzem
imediatamente por si mesmas, como formas correntes de pensamento, mas seu
fundamento oculto tem de ser descoberto somente pela ciência. Kosik (1976, p. 17),
parte desse conceito ao afirmar que “[...] se a aparência fenomênica e a essência das
coisas coincidissem diretamente, a ciência e a filosofia seriam inúteis”.
8
Nessa obra Marx (1997) demonstra como se procede a uma análise da questão política, explicitando
seus limites e possibilidades. Dias (2003), observa que a análise marxiana não deixa escapar o crise
política/crise econômica, a análise dos interesses a curto, médio e longo prazo, as formas das ideologias e
suas transformações no processo da luta política, entre outras questões.
29
Vê-se que tais reflexões alertam para a profunda determinação filosófica e
ideológica do conceito de metodologia, trivialmente entendidas apenas como um
conjunto de métodos e técnicas, ou como soma de diferentes vias concretas utilizadas
para a coleta, processamento e análise do material empírico. Nunca é demais lembrar
que em Marx (1997), o método da investigação, da apropriação analítica do objeto e
da exposição das determinações fundamentais e das conexões do objeto singular com a
totalidade social de que faz parte.
Para Marx, do ponto de vista ontológico, conhecer significa desvelar e
reproduzir teoricamente o concreto real, no plano da consciência, como concreto
pensado. Nesse sentido, o procedimento de investigação e exposição é regido pela
lógica imanente ao objeto real, constituindo-se este último em critério de verdade do
método. Sem dúvida, o trato metodológico imprimido à presente investigação tem como
fundamento basilar a totalidade, compreendida como a categoria ineliminável do ser,
visto que o concreto real consiste em uma unidade de múltiplas determinações.
Daí que, para Kosik (1976), o método de investigação, numa perspectiva
dialética, deve compreender três graus: a) minuciosa apropriação da matéria, ou seja,
pleno domínio do material, nele incluído todos os detalhes históricos aplicáveis
disponíveis, b) análise de cada forma de desenvolvimento do próprio material; c)
investigação da coerência interna, isto é, determinação da unidade das várias formas de
desenvolvimento.
O procedimento metodológico próprio à teoria marxiana de pesquisa
consiste, senão, partir do empírico (os “fatos”), apanhar as suas relações com outros
conjuntos empíricos, investigar a sua gênese histórica e o seu desenvolvimento interno e
reconstruir, no plano do pensamento, todo este processo.
30
Esse circuito investigativo, recorrendo compulsoriamente à abstração,
retorna sempre ao seu ponto de partida e, a cada retorno compreende-o de modo cada
vez mais inclusivo e abrangente. Nessa perspectiva, os “fatos” a cada nova abordagem
se apresentam como produtos de relações históricas crescentemente complexas e
mediatizadas, podendo ser contextualizados de modo concreto e inseridos no
movimento maior que os engendra. A pesquisa, olhando por esse ângulo, procede por
aproximações sucessivas ao real, “[...] agarrando a história dos processos
simultaneamente às suas particularidades internas” (NETTO, 1998, p. XXX).
Em conformidade com aquilo que vem sendo exposto ao longo do presente
trabalho, ao delimitar as fronteiras desta pesquisa, definiu-se como unidade de estudo
(GRUPO DE METODOLOGIA DE LA INVESTIGACIÓN SOCIAL
DEPARTAMENTO DE COMUNISMO CIENTÍFICO, 1981) a concepção e práticas de
lazer oferecidas (ou não) pelos setores específicos das prefeituras de Crato, Juazeiro do
Norte e Barbalha à classe operária dessa região, observando o fenômeno sem nele
intervir para não comprometer o real aparente.
Nesta pesquisa utilizaram-se também alguns aspectos centrais da concepção
e metodologia para o desenvolvimento do lazer, observados (sem interferir no processo)
na República Socialista de Cuba pelo autor desta dissertação, durante o mês de junho do
ano de dois mil e um. Sob o olhar do materialismo histórico-dialético, pode-se dizer que
a experiência cubana (CUBA, 1998) de desenvolvimento do lazer tem tido influência
positiva naquela sociedade, não obstante o esporte e o lazer nesse país fiquem
integrados ao processo de educação da juventude (SÁNCHEZ Y COLABORADORES,
1997).
O sucesso da experiência cubana permite reconhecer elementos teóricos
fundamentais para elaboração de políticas públicas de fomento ao lazer, na perspectiva
31
defendida neste trabalho, denominada aqui de "dialética”. No entanto, deve ficar claro
que o objetivo da pesquisa não foi o de realizar um estudo comparativo entre as
experiências brasileira e cubana nesse campo, até porque o projeto histórico de
sociedade de cada um desses países tem características bastante diferenciadas, por
vezes, antagônicas.
CAPÍTULO I
O CONCEITO DE LAZER EM SÁNCHEZ Y COLABORADORES
“Uma nação é verdadeiramente rica quando em vez de
doze horas se trabalham seis” (MARX,
1985, p. 229
).
O conceito de lazer tem sido objeto de numerosas discussões que variam
conforme a concepção de mundo de seus interlocutores (sociólogos, psicólogos,
turismólogos, profissionais de Educação Física, entre outros estudiosos do ramo). Nesse
sentido, admite-se que o seu entendimento ainda guarda numerosas interrogações que
ainda não estão totalmente solucionadas.
Por ser uma categoria complexa, sempre, ao estudá-la, requere-se uma
análise de sua essência, conteúdo e, correspondentemente, da manifestação específica
de elementos interiores e formas concretas. Desse modo, analisá-la enquanto fenômeno
32
sócio-cultural constitui sempre um ambicioso projeto, principalmente quando se tem o
objetivo de reunir elementos teóricos que subsidiem a construção de políticas públicas
numa determinada perspectiva.
Conforme foi explicitado, neste trabalho se opta pelo entendimento de
lazer formulado por Marx, ou seja, como aquele tempo livre indispensável à plena
humanização dos trabalhadores e camponeses pobres, priorizando-se a consideração
sobre a relação capital versus trabalho que gera a servidão assalariada, condição sob a
qual se encontra o moderno escravo assalariado, definida como estado de submissão do
trabalhador urbano e rural à burguesia industrial, fundiária e financeira (CARVALHO,
2006, p. 3). Marx (2003) muito tempo atrás dizia que o reino da liberdade
começa quando o trabalho deixa de ser determinado por necessidade e por utilidade
exteriormente imposta. Isso, no atual modo de produção capitalista, não é possível,
embora tal não signifique a omissão à luta através de propostas contra-hegemônicas.
Não obstante a opção do conceito de lazer segundo Marx, lançou-se mão do
entendimento de lazer desenvolvido pelos pesquisadores cubanos Sánchez y
Colaboradores (1997), estudiosos do assunto, com os quais o autor desta dissertação
estudou, quando da sua visita àquele país para conhecimento da experiência cubana no
campo das políticas públicas para o setor, conceito que se encontra formulada na obra
destes autores, denominada Recreación: fundamentos teórico-metodológicos, cuja
interpretação foi traduzida e compilada com o objetivo de fundamentar a análise do
conceito de lazer desta pesquisa.
Para estes autores, a palavra lazer é hoje escutada em qualquer parte. Em
função da multiplicidade de formas e interesses que o mundo moderno pôde construir
do mesmo, cuja ampla variedade do seu conteúdo tem permitido a cada um identificá-lo
de diferente forma. Daí que, via de regra, o que para uns é lazer; para outros, não é. Por
33
exemplo, o cuidado com o jardim, para alguns resulta lazer; para outros, é trabalho. De
igual modo, muitas vezes, a palavra lazer, em seu conteúdo, se confunde também com a
de jogos. Sem dúvida, que a primeira opção é mais ampla que a segunda, ainda que do
ponto de vista dos seus fundamentos, o lazer para os adultos seja equivalente ao jogo
para as crianças.
De acordo com Huizinga (1980) e outros autores, pode-se estabelecer que
a inclinação, a opção, o desejo de uma pessoa por uma atividade recreativa de qualquer
natureza se enquadraria dentro das formas de jogos. Lazer é, por conseguinte, um termo
ao qual se atribuem muitos significados. Para uns, a palavra tem uma conotação
prazenteira; para outros é sinônimo de diversão, entretenimento ou descanso. Apesar
das diferentes conotações, é necessário precisar melhor o seu alcance, muito embora na
atualidade resulte difícil defini-lo.
De acordo com Sánchez y Colaboradores (op.cit., p. 4), uma análise do
conceito leva o pesquisador a buscar sua origem, o qual pode ser encontrado nos
primórdios do homem, com o surgimento de um determinado tempo para realizar
atividades que não tiveram relação direta com a produção; porém, não até o começo da
industrialização, quando as jornadas de trabalho eram demasiadas longas e se
realizavam em péssimas condições para a saúde.
Para estes teóricos, a função do lazer palavra que começou a usar-se
naquela época objetivava tão somente a regeneração das forças gastas no trabalho, ou
seja, a recriação das energias empregadas, de tal maneira que o homem se sentisse
restabelecido ou recuperado, em condições para reiniciar suas tarefas. Este propósito,
considerando a realidade atual, equivale a reduzir o homem a homo faber, ou seja, a
puro funcionário, que necessita de pausas de descanso tão indispensáveis para seguir
produzindo sem dificuldades.
34
Nos dias de hoje, conforme assinalam os autores, o significado do lazer se
tornou mais amplo. Vários teóricos utilizam diferentes termos para se referirem ao
tempo livre, a saber: “ócio” (do latim otiu) = vagar, descanso, repouso, preguiça;
“ociosidade” (do latim otiositate) = o vício de gastar tempo inutilmente, preguiça;
“descanso” = repouso, sossego, folga, vagar, pausa, apoio, demora; “lazer” (do latim
licere) = ócio, vagar.
Entretanto, conforme asseveram, o lazer pode ser considerado uma atitude
ou estado de ânimo para empreender novas atividades que impliquem experiências
enriquecedoras; “um sistema de vida para ocupar positivamente as horas livres e uma
fase importante do processo educativo total” (cf., p. 4). Mais à frente, ao longo deste
capítulo, apresentam-se outros enfoques conceituais do lazer, que este tem adotado
conotações de índole prática que o separa do conceito de tempo livre, o qual será
analisado em seu devido momento.
Na perspectiva de fundamentar um conceito de lazer, os autores citados
apresentam o entendimento de Dumazedier (1980), sociólogo francês que se dedicou ao
estudo do tempo livre e para quem o lazer se caracteriza como:
[...] um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre
vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se ou,
ainda, para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua
participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora, após livrar-se
ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais
(Dumazedier, 1980 apud SANCHEZ, 1997, p. 20).
Percebe-se que se trata de um conceito essencialmente descritivo, ainda
que popularmente conhecido como dos três “d”: descanso, diversão e desenvolvimento,
vazio do ponto de vista do conflito social, pois não revela a impossibilidade, no
35
capitalismo, do trabalhador repousar ou entregar-se de livre vontade à prática dos
esportes e desenvolver a sua formação desinteressada.
Em seguida, Sánchez y Colaboradores (op.cit.), apresentam o que segundo
eles representa um aceitável e completo entendimento conceitual para o fenômeno do
lazer, elaborado na Argentina, durante uma convenção realizada em 1967, a qual
pleiteiou o lazer como sendo:
Aquela atividade humana, livre, prazenteira, efetuada individual e
coletivamente, destinada a aperfeiçoar o homem, proporcionando-lhe
empregar seu tempo livre em ocupações espontâneas ou organizadas que lhe
permitem voltar ao mundo vital da natureza e a incorpora ao mundo criador
de cultura, que serve a sua integração comunitária e ao encontro de si próprio
e que proporciona, em última análise, a sua plenitude e a sua felicidade (apud
SÁNCHEZ Y COLABORADORES, 1997, p. 5).
Entretanto, apesar desses diversos conceitos serem tomados como ponto de
partida para análise do lazer, resta saber o que se entende mesmo por lazer e que
significado tem este para a classe operária, dentro do marco social capitalista. Em
verdade, muitas seriam as perguntas a respeito destas atividades, e as respostas seriam
igualmente variadas pela amplitude que encerra o conceito de lazer, o qual é tão amplo
quanto variado podem ser os interesses humanos. Não obstante a existência de tais
explicações reconhece-se que não há melhor termo para revelar a natureza e o conteúdo
da atividade de uma pessoa durante seu tempo livre.
Sendo assim, opta-se pela utilização do conceito de lazer de Sánchez y
Colaboradores (1997) por entender que este reflete melhor e com maior plenitude o
conteúdo desta classe de atividade humana durante o tempo livre. Daí a opção deste
trabalho de discutir o lazer de forma abrangente, sem especificar seus conteúdos.
36
Para os autores citados (op.cit., p. 6), o lazer representa em si um conjunto
de conceitos etimológicos: recreatio (latim), restabelecimento; recreation (francês),
diversão, descanso, troca de ações que excluem a atividade laboral. Nesse sentido, o
termo lazer, caracteriza não só os tipos determinados de atividade de uma pessoa
durante o tempo livre, senão o espaço em que estas se realizam. Por esta forma, indicam
que o lazer deve representar uma força ativa mediante a qual, longe de ser uma evasão
do trabalho, seja uma atividade para o desenvolvimento pleno do indivíduo. É sobre esta
base que conceituam o lazer como:
O conjunto de fenômenos e relações que surge no processo de
aproveitamento do tempo livre mediante as atividades terapêuticas,
profiláticas, cognoscitivas, desportivas ou artístico-culturais, sem que para
elas seja necessário uma compulsão externa e mediante as quais se obtém
felicidade, satisfação imediata e desenvolvimento da personalidade (cf. p. 7).
Nos termos destes autores, o fato de o indivíduo obter satisfação direta de
certas atividades faz com que grande parte destas sejam para ele formas de lazer, ainda
que este, essencialmente, seja a atitude que caracteriza a participação direta em
atividades que lhe dão alegria, satisfação e desenvolvimento pessoal.
Tendo subjacentes estas considerações, defendem que, do ponto de vista
técnico-operativo, o lazer é uma atividade cujo propósito é utilizar as horas de descanso
(tempo livre), no qual pode o homem aumentar seu valor como ser humano e como
membro da sua comunidade, ocupando este tempo com atividades criadoras e
motivantes, enriquecedoras dos domínios profissionais, cultural, artístico, desportivo e
social das pessoas.
Sumarizando o exposto até aqui, estes autores afirmam que todos, ou quase
todos, os estudiosos e promotores do lazer coincidem na afirmação de que lazer não é só
37
uma forma agradável de “passar o tempo”, mas o aproveitamento deste tempo de forma
positiva na sociedade, de maneira que contribua para o desenvolvimento da
personalidade do homem. Na verdade, para eles, o lazer está ligado à educação, auto-
educação, higiene física e psíquica, à diversão e à cultura em geral (cf. p. 8).
Como vem se observando ao longo deste texto, muitos têm sido os intentos
para definir cientificamente a base teórica do lazer. Os autores estudados reconhecem
que para fundamentar tal base, alguns psicólogos e sociólogos têm se utilizado da teoria
da necessidade humana de expressão própria e outros vêm se apoiando no campo
biológico, ou seja, nas características da estrutura anatômica e fisiológica do ser humano
e em suas inclinações e tendências.
Na opinião Sánchez y Colaboradores (op.cit. p. 7), entre as principais
características sócio-psicológicas do lazer, em todas as suas formas, encontram-se as
seguintes:
1. As pessoas realizam as atividades de lazer por elas mesmas, livres de qualquer
obrigação ou compulsão externa;
2. As atividades de lazer proporcionam às pessoas satisfação imediata;
3. O elemento essencial do lazer não está nos resultados, senão no desfrute através
da participação;
4. O lazer é uma forma de participação na qual o homem sente o que faz e faz o
que sente como expressão de uma necessidade que lhe satisfaz.
Por tudo que foi anteriormente exposto, observam que as tendências
humanas a certas formas de atividades estão influenciadas por sua preparação física e
mental, pelo nível de cultura, pela idade, pelo sexo, temperamento e que, naturalmente,
38
o meio ambiente entrará em contradição ou canalizará as formas, ajustes, de acordo com
o conceito social que se tenha do lazer. Daí que, segundo eles, as políticas públicas em
seus programas de lazer, em qualquer de suas formas, deveriam (e isto é impossível no
capitalismo) se caracterizar pela riqueza na variedade de formas e oportunidades que se
ofereçam, a fim de satisfazer os mais variados interesses.
O lazer, na ótica de Sanchez y Colaboradores, o é um fenômeno estático,
mas dinâmico e essencialmente dialético, que toma formas e adquire proporções
objetivas quando é realmente aplicado para as massas, para converter-se, então, em uma
influente força vital no desenvolvimento social. Mais uma vez, questionam-se, apenas e
tão somente, as possibilidades de sua efetivação para a classe operária em pleno
contexto do modo de produção capitalista.
Sempre de acordo com os autores estudados, detendo-se na relação
produção-consumo-reprodução, vê-se que no desenvolvimento das forças produtivas, no
devenir da humanidade, o consumo reprodutivo não se limita ao consumo de bens
materiais, senão e cada vez mais, ao consumo de bens espirituais ou culturais. Na
sociedade atual, a classe social pobre não consome o necessário materialmente para
sua existência; necessita, também, de forma crescente, ver televisão, praticar esporte, ir
a uma excursão, ler, etc.
Reafirmando o anteriormente dito e analisando-se as atividades que, em
algum momento, constituem uma forma de lazer, percebe-se que todas elas aparecem
como um “consumo socialmente determinado”, com a finalidade evidente de
reprodução. Assim, com base nessas idéias, pode-se afirmar que o lazer é o consumo
reprodutivo (dá-se na fase de consumo) de bens materiais e espirituais, determinado, em
última análise, pelo elemento produção, e que este consumo vai depender do grau de
desenvolvimento das forças produtivas e do caráter das relações de produção.
39
De acordo com essas teses, a análise do processo geral da reprodução
permite definir que o lazer é um fenômeno de consumo reprodutivo, ou seja, de
reprodução, daí ele ser um fenômeno sócio-cultural, representado por formas culturais
9
,
e que tem existência na comunidade humana, realizada por homens que vivem em
sociedade, regidos por leis do desenvolvimento social, conforme esclarece o
materialismo histórico pregado por Karl Marx.
Por esta forma, no marco do processo de produção, o lazer aparece como
um fenômeno de reprodução, caracterizado pelo consumo de bens culturais. Todavia, se
consideradas as fases que apresenta este processo, salta a vista - na medida em que se
reforça o último elo desse processo - o consumo reprodutivo mediante um lazer mais
integral e profilático, no qual a classe operária encontra representada a variedade de
interesses que geram os diversos setores de sua atividade principal. Ou seja,
aperfeiçoando-se o primeiro elo do processo - a reprodução - o operário tem a
possibilidade de utilizar positiva e criativamente seu tempo de reprodução, de lazer.
Considerado deste ponto de vista, este fazer permite que o operário se reencontre com o
trabalho produtivo em um estado sumamente favorável, superior, com uma estabilidade
psíquica e funcional de acordo com os requerimentos da vida em sociedade,
reconhecem os autores estudados.
Tendo como base os aspectos tratados anteriormente, Sánchez y
Colaboradores (op.cit.) afirmam ser possível, então, anunciar as características sócio-
políticas do lazer, analisadas a seguir, que o situam enquanto fenômeno sócio-cultural:
1. É um fenômeno de reprodução Ao caracterizar-se o lazer pelo consumo de
bens culturais, este se encontrará dentro da fase de consumo reprodutivo do
9
É necessário esclarecer que, com relação a este aspecto cultural, a denominação “formas culturais”,
utiliza-se em seu sentido amplo, referindo-se tanto às atividades da cultura artístico-literárias, quanto às
da cultura corporal, atividades, em suma, recreativas, que o homem consome para o seu desenvolvimento.
40
processo geral de produção, porque a realização de uma atividade de lazer
representa, para o operário, o consumo reprodutivo de atividades para o seu
desenvolvimento espiritual e cultural.
2. Depende do nível de desenvolvimento das forças produtivas e do caráter das
relações de produção Como se viu antes, para estes autores, o lazer, ao se
constituir num fenômeno que se realiza na fase de reprodução do processo geral
da produção, dependerá da solidez da base econômica, do grau de
desenvolvimento das forças produtivas que são as que determinam o grau de
desenvolvimento econômico que pode possuir uma determinada sociedade.
Posto que, na medida em que o grau de desenvolvimento seja maior, assim será,
conseqüentemente, o desenvolvimento que possuirá o lazer, sua versatilidade e
amplitude, já que, uma vez permitida uma determinada existência de tempo para
o lazer, ficam igualmente garantidas a produção de bens materiais e instalações
que são necessárias para o desenvolvimento e execução das atividades neste
setor. Por outro lado, a distribuição do tempo para o lazer (tempo livre) como
riqueza social para o acesso às suas atividades, será sempre determinada pelas
relações de produção, que são elas que determinam a possibilidade de
utilização desse tempo. Conforme assinalam os autores estudados, estas podem
ser de caráter capitalista, que se distinguem por seus meios de produção e a
propriedade privada, e as de caráter socialista, que se distinguem por seus meios
de produção e a propriedade social. Cada tipo de relação de produção impõe
normas para a distribuição do tempo livre na sociedade, que elas definem
tipos de formações econômico-sociais, não sendo igual a possibilidade de
disponibilidade de tempo livre que possui um indivíduo na sociedade capitalista
41
em relação à sociedade socialista, ainda que sejam países com igual nível de
desenvolvimento das forças produtivas. De acordo com estes estudiosos (op.cit.
p. 13), pesquisas sociais realizadas têm demonstrado que em países com igual
nível de desenvolvimento econômico, as relações de produção são diferentes
(capitalistas e socialistas). A disponibilidade de tempo se mostra com diferentes
matizes, embora nos países ditos socialistas a disponibilidade de tempo se
apresente quase igual e estável para os distintos grupos sociais. Segundo esses
autores, nos países capitalistas esta disponibilidade apresenta uma substancial
diferença entre classes sociais, convertendo-se em um elemento relevante para
distinguir as profundas contradições de classe desta sociedade.
3. Possui caráter superestrutural Para os autores estudados, o caráter
superestrutural que o lazer possui é explicado pelo fato de este ser um fenômeno
que se caracteriza pelo consumo de atividades culturais (utilizando a acepção
ampla de cultura) que se encontram na superestrutura da sociedade, marco de
realização das atividades recreativas do homem.
4. É portador de uma grande carga ideológica Do mesmo modo, reconhecem os
teóricos que toda superestrutura de uma sociedade se encontra sustentada por
uma ideologia, dado que as atividades que se realizam no tempo de lazer, tempo
livre, são manifestações culturais próprias da superestrutura social e nelas
originadas, portanto, eivadas de conteúdo ideológico, marcadas por uma
ideologia que sustenta um determinado sistema social e que lhe confere um lugar
importante nos problemas sociais atuais. Como fenômeno representativo da
mensagem ideológica que possuem as atividades de lazer, observa-se que a
42
sociedade burguesa tem desenvolvido - para se apropriar do tempo livre dos
trabalhadores - um sem número de mecanismos, entre os quais se destaca a
lucrativa indústria do lazer, “orientada pela ótica da sociedade de consumo e
dirigida à obtenção de maiores lucros, estímulo ao consumo e o acréscimo da
ideologia burguesa individualista” (cf. p. 13). Segundo estes autores, frente a
essas concepções burguesas se levantam as concepções marxistas, para as quais
o tempo livre - tempo de lazer como parte do tempo social desempenha um
papel determinante na formação da personalidade
10
. Em “Los Grundrisse”, Vol.
1, (Caderno IV), p. 352, Marx afirma que "com relação a toda a sociedade, a
criação de tempo disponível é também, pois, criação de tempo para a produção
científica, artística, etc.”.
5. Possui caráter de classe Para Sánchez y Colaboradores (1997.), se o lazer tem
uma relação direta com o caráter das relações de produção, o que implica a
distribuição do tempo livre, como riqueza de uma determinada formação
econômico-social, tem-se que, atendendo a essas premissas, o lazer represente
um caráter classista, pelo que cumprirá e dará solução aos problemas pleiteados
pela classe no poder. Na sociedade capitalista quem manda é a burguesia, classe
determinante nesta sociedade que possui os meios de poder e que, por
conseguinte, ditará as normas de utilização do tempo livre que lhes permite
seguir existindo como classe dominante. Na sociedade socialista, segundo este
autor, quem responde é a classe trabalhadora, classe no poder e para a qual o
mais importante é a satisfação das necessidades crescentes do homem, pelo que
10
Para não restarem dúvidas, convém ressaltar literalmente as categorias que Marx utiliza para referir-se a
esse tempo não aplicado ao trabalho produtivo: tempo disponível, tempo de não-trabalho, tempo livre. De
todas essas expressões, a que ele mais emprega é disposable time, sempre grafada desse modo, em inglês.
43
a utilização do tempo livre tem uma grande importância para o desenvolvimento
da personalidade e a formação do modo de vida da nova sociedade.
Ao se realizarem no tempo livre, as funções que ao lazer estão dadas
cumprir são aquelas inerentes às possibilidades de sua execução nesse tempo. Há muito,
Marx determinou as funções do tempo livre ao enunciar:
O tempo livre representa em si mesmo, tanto o ócio como o tempo para uma
atividade mais elevada; transforma naturalmente a quem o possui em outro
indivíduo de maior qualidade, com a qual regressa depois no processo direto
de produção [...] (apud SÁNCHEZ Y COLABORADORES, 1997, p. 13).
Com base nessas teses, distinguem-se, nos termos dos autores estudados,
dois elementos que, em essência, constituem a função do lazer, quais sejam:
1. A função de ócio – que complementa em grau significativo as funções de
reprodução das energias gastas no processo produtivo, composto por descensos
passivos e ativos, entretenimentos, relações familiares e amistosas que, de
acordo com as atuais interpretações, denomina-se de “reprodução”. De acordo
com estes autores (op.cit., p. 14), a reposição das energias físicas/psíquicas
consumidas no processo de reprodução é a função primeira que desempenha o
lazer. Entretanto, não se pode reduzir o lazer apenas à questão da recuperação
psicossomática do organismo. Conforme se viu antes, o lazer também tem uma
função de reprodução, diretamente relacionada com o grau de desenvolvimento
das forças produtivas, que têm um caráter de classe, determinado pelas relações
de produção.
44
2. A função “mais elevada” relacionada ao desenvolvimento pleno do homem,
com a revelação de sua capacidade de estudo e aprendizagem na criação e
consumo de valores espirituais. Segundo estes autores, é sumamente importante
a observação de Marx com relação ao fato de que o tempo livre é capaz de
transformar o homem numa personalidade altamente intelectual, o qual poderá
participar no processo de produção, não como apêndice deste, mas como seu
organizador e diretor. Assinalam (op.cit., p. 17) que a esta função superior que
cumpre o lazer através do tempo livre, dá-se o nome de autodesenvolvimento,
dado que é a possibilidade pessoal que tem cada indivíduo de criar condições
para a participação consciente, a formação de hábitos responsáveis de
participação em qualquer situação social. Segundo esses estudiosos do lazer, esta
função se dá plenamente no socialismo quando estão asseguradas as condições
sócio-econômicas básicas para toda a sociedade. Já, no capitalismo, a elite
dominante, a burguesia, que tem patrimônio, pode autodesenvolver-se através
das atividades de lazer, asseveram.
De acordo com Sánchez y Colaboradores (op.cit.), como todo fenômeno, o
lazer tem partes componentes, elementos que o formam, e para analisá-lo como
fenômeno sócio-cultural, é necessário distinguir quatro elementos que o caracterizam,
definem e lhes dão forma, sendo estes: a) o tempo de lazer, tempo livre; b) As
atividades do lazer; c) Necessidades de lazer; d) O espaço para o lazer. Neste trabalho,
apenas o primeiro elemento (o tempo livre) será analisado de maneira mais
aprofundada.
45
De acordo com estes autores, o tempo social é a forma de existência dos
fenômenos materiais fundamentais da sociedade (a atividade produtiva material da
classe que trabalha) que resultam numa condição necessária para o desenvolvimento e a
troca conseqüente das formações sócio-econômicas como processo histórico natural.
Desta determinação suficientemente ampla acentua somente a essência das variações
sociais localizadas no tempo.
Ele pode ser incluído em qualquer ciência social concreta. Os economistas
e sociólogos adotam distintos indicadores para uma caracterização essencial da
produção de bens materiais e espirituais, assim como para seu emprego. O tempo social,
ele sim, representa a magnitude do trabalho e a magnitude da atividade de lazer. A
atividade produtiva material dos homens, na qual descansa o fundamento material da
sociedade, a qual determina como se têm visto as formas de vida fora da produção.
Tanto assim que a estrutura do tempo social apresenta duas partes fundamentais
(naturalmente por isto se apresenta a estrutura do tempo social em duas partes
fundamentais): a) o tempo de trabalho; e b) o tempo de não-trabalho, que se encontra
fora da produção material. Uma análise ulterior da estrutura do tempo de não-trabalho
conduz os pesquisadores a extrair desse tempo o próprio tempo livre. O tempo livre,
portanto, é uma parte específica do tempo da sociedade, do tempo social.
Mas, o que é o tempo social? O que ele representa? Em geral, o tempo
humano pode ser dividido em tempo diretamente relacionado com a produção (tempo de
produção) e um tempo não relacionado diretamente com ela (tempo de reprodução).
Desde já, sustenta-se a unidade destes tempos, tanto porque se trata do homem e este
não se divide para uma e outra função, lembram os autores estudados. Produção e
reprodução são membros de uma totalidade, sendo a primeira o fator dominante, mas
que possuem uma relação intrínseca, ao contrário do que afirmam as teorias burguesas.
46
Esta pretensiosa separação não tem outra finalidade senão ocultar o fato de que o uso,
forma e conteúdo das atividades do tempo livre estão determinados pela forma de
participação no processo de produção. A dimensão do tempo de reprodução em geral
está em relação direta com o grau de desenvolvimento das forças produtivas: quanto
maior o grau de desenvolvimento destas, maior a quantidade de tempo diretamente
relacionado com a produção de que dispõe a sociedade.
Dessa consideração geral poder-se-ia deduzir também que, com o
desenvolvimento das forças produtivas, aumenta o tempo livre. Para chegar à essência
do tempo livre é necessário analisar as atividades destes dois tempos, especialmente as
características de obrigatoriedade e necessidade delas. À simples vista, as atividades do
tempo de produção apresentam um grau de obrigatoriedade e necessidade que vão
decrescendo nas atividades do tempo de reprodução que são denominadas utilitárias
(comer, dormir assear-se, etc.) que, todavia, têm um grau de execução obrigatória e
também certa flexibilidade no que diz respeito à oportunidade, duração e forma de
execução. Entretanto, dentro desse tempo de não-trabalho (reprodução) um setor de
atividades de reprodução que, pelo baixo grau de obrigatoriedade e pela ampla gama
delas, permite ao trabalhador optar por uma ou outra atividade, segundo seu interesse,
que se encontram condicionadas socialmente, ainda que se expressem individualmente.
Deve-se enfatizar, assinalam os estudiosos cubanos (op.cit.), que as
atividades antes mencionadas, as atividades de lazer, podem ser escolhidas livremente e
podem também não ser selecionadas, não se realizar, ainda que se subentenda que estas
são absolutamente necessárias à vida do homem, pelo que a sociedade deve contribuir
para condicionar os interesses na esfera das atividades do tempo livre. Senão, observe-
se:
47
A inter-relação existente entre as atividades de lazer, a possibilidade de opção
destas e a disponibilidade de um tempo para a sua realização, dadas como uma
unidade, é o que se denomina lazer. Porém, o tempo disponível socialmente
determinado para a realização de atividades de lazer, não é tempo de lazer,
senão quando se o certas condições sócio-econômicas que permitam
satisfazer em um nível básico as necessidades humanas vitais que
correspondem à sociedade específica. Sobre esta base se encontra sustentado o
princípio da opcionalidade de livre seleção das atividades do tempo livre. O
tempo de lazer e o tempo livre, mais que a existência de um tempo
cronológico, de um tempo em horas e minutos, é um problema da existência de
condições sócio-econômicas que permitam a realização, ou não, uma vez que
utilizar e desfrutar de atividades de lazer depende de outras questões (cf. p.
20).
Entretanto, é evidente que os milhões de desempregados e subempregados
que existem nos países capitalistas não possuem tempo livre, constituindo-se mentira
dizer que o têm. Como aduz Lefébvre (1999), na “Cidade do Capital” não lazer para
a classe operária.
Como se sabe, o conceito de tempo livre pleiteia numerosas interrogantes
ainda não solucionadas pela literatura que trata do assunto (a respeito), fato pelo qual
(pelo que), este trabalho de pesquisa, ao abordar esse conceito, o fará de forma teórica,
sem descartar outros entendimentos considerados objetivos, tanto do ponto de vista
teórico, quanto prático.
De acordo com Sánchez y Colaboradores (1997), a categoria tempo livre
deve ser entendida como:
Aquela parte do tempo de reprodução na qual o grau de obrigatoriedade das
atividades não é de necessidade, e em virtude de ter satisfeitas as
necessidades vitais humanas em nível básico, pode-se optar por quaisquer
destas atividades (cf.. p. 21).
Destaca-se aqui que a existência de um nível básico de satisfação das
necessidades humanas é a condição que permite realmente ao trabalhador optar e eleger
48
livremente as atividades a realizar durante o seu tempo livre. Segundo estes autores, isto
reforça o fato de que o tipo de atividades é selecionado pelo usuário de lazer, porém esta
é ofertada e condicionada socialmente.
Para fundamentar mais ainda o conceito de tempo livre, os autores citados
trazem uma interessante entendimento de tempo livre, elaborado por um destacado
sociólogo soviético, de nome B. Grushin, o qual afirma:
Por tempo livre, se entende, pois, aquela parte do tempo em que não se
trabalha e que resta depois de descontadas todas as inversões de tempo
utilitário (atividades domésticas, fisiológicas, de transporte, etc.), ou seja, o
tempo livre do cumprimento de diversas obrigações” (apud SÁNCHEZ Y
COLABORADORES, op.cit., p. 22).
Na esteira desse pensamento, citam, também outros dois renomados
sociólogos cubanos: Rolando Zamora e Maritza Garcia os quais conceituam
teoricamente o tempo livre como sendo: “Aquele tempo que a sociedade possui
estritamente para si, depois do seu trabalho, e de acordo com a função ou posição que
cada um ocupa”. Ou seja, do ponto de vista individual, o tempo livre se traduz em um
tempo de realização de atividades de opção não obrigatória, donde intervém sua própria
vontade, influenciada pelo desenvolvimento espiritual de cada pessoa, ainda que em
última instância estas atividades estejam socialmente condicionadas. Esta definição
embasa o conceito de lazer de Sánchez y Colaboradores (op.cit., p. 23) para quem:
O tempo livre é aquele que resta depois de descontadas a realização de um
conjunto de atividades biológicas ou socialmente admissíveis de inclusão,
próprias de um dia natural (trabalho, tarefas domésticas, necessidades
biofisiológicas, etc.).
49
Com isto estabelecem um conceito operacional ao afirmarem que o tempo
livre se expressa num universo de atividades de lazer concretas, que dentro de uma
propriedade comum, apresentam características diferenciadas.
Como se viu, o tempo livre é um dos elementos constituintes do lazer, além
do espaço, atividades e necessidades. Sem dúvida, pela sua importância, este trabalho
dedicará mais atenção e estudo dessa categoria do que aos outros aspectos do lazer. Esta
importância está dada, entre outros aspectos, pelo reconhecimento que dele têm os
autores das mais diversas tendências e ideologias.
Para os autores que embasam o conceito de lazer deste trabalho, quando se
estuda o tempo livre, encontra-se na literatura especializada um problema que não tem
sido de todo mencionado. É um problema etimológico. Os ingleses usam o termo
“leisure” e os franceses “loisir”. Não obstante a literatura em língua portuguesa ter
utilizado a palavra “lazer” para referir-se a esta atividade dentro do tempo livre, e ainda
que não é de todo feliz usá-la, não há no momento, outro caminho.
Muitos autores têm assinalado a estreita relação entre o tempo livre e o
lazer. Esta relação expressa, sobretudo, que o tempo livre é um dos elementos
necessários que constituem o lazer. Nos termos dos teóricos cubanos (op.cit., p. 24):
A estrutura e variedade das atividades do tempo livre de um povo expressam,
em última instância, seu vel de desenvolvimento sócio-cultural. Especial
atenção deve se prestar ao emprego do tempo livre das crianças e jovens,
uma vez que este incidirá de uma forma ou de outra na formação da
personalidade. A importância de uma adequada utilização deste tempo é mais
complexa também, que pode constituir um elemento regulador na
prevenção de condutas anti-sociais e delitivas.
50
Para eles, a qualidade de vida e a criação de um estilo de vida nas massas,
pressupõem, então, uma relação dialética entre a utilização adequada do tempo livre e a
saúde mental e física de cada pessoa que, por um lado, a realização adequada das
atividades físico-recretaivas fortalece a saúde e lhe prepara para o pleno desfrute da vida
e, por outro lado, uma boa saúde possibilita um maior e melhor aproveitamento do
tempo livre noutras esferas do lazer.
Para estes autores, sobre a base destes fundamentos é que resulta, de forma
objetiva e conveniente, a introdução de duas concepções: a) a cultura de tempo livre; e
b) formação e educação para o tempo livre.
a) A cultura de tempo livre Segundo assinalam, através do uso diversificado e
cultivado do tempo livre é possível perceber que os modelos da sociedade atual
se incorporam incessantemente à conduta e ao pensamento dos homens
contemporâneos. Para isso, é necessário criar e manter uma educação e uma
cultura de tempo livre nas massas e no Estado, que se fundamentem, antes de
tudo, nas funções mais importantes que deve cumprir o tempo livre neste
período histórico: o desenvolvimento das potencialidades e capacidades
criadoras dos homens e a conquista da mais ampla participação popular na
cultura e no lazer. Impulsionar uma cultura de tempo livre que se oponha ao
modelo de consumismo, demonstrando a capacidade criativa e os níveis de
participação popular do socialismo e a riqueza incalculável da criatividade
popular. Uma cultura popular do tempo livre baseada na antítese do
consumismo: na criação e participação. O tempo livre não é um setor secundário
e residual da sociedade como quer o conceito burguês (ademais, não é assim
nem no capitalismo), asseveram os autores em estudo. Na realidade, é a primeira
51
fronteira da luta ideológica, sobretudo com respeito à juventude: a cultura do
esbanjamento, da moda, da música evasiva, entre outras querelas. Deve-se, antes
de tudo, reafirmam estes teóricos, saber propor aos jovens uma cultura do tempo
livre que, incluindo os desejos do ter e do ser, se baseie na realização individual
plena de cada pessoa no socialismo, na conquista da mais alta liberdade já
alcançada na história, e na incorporação e sistematização desde a infância dos
modelos de conduta, o pensamento e a vida socialista. A formação de uma
cultura do tempo livre é a criação nas massas da capacidade de desfrutar plena e
diversificadamente das alternativas que a sociedade oferece. É a formação de
uma personalidade criativa, culta e sã, que conheça o mundo que lhe rodeia e sua
sociedade de forma mais ampla possível, e que encontre vias de realização de
expressão em campos diversos da sociedade.
b) Formação e educação para o tempo livre No tocante à questão da formação
para utilização do tempo de não-trabalho, os autores em tela afirmam ser esta a
característica mais importante das atividades do tempo livre, do ponto de vista
da formação do caráter, e que exercem uma ação formativa ou deformativa
indireta e facilitada pelo lazer. Segundo eles, ao contrário do ensino, as
atividades do tempo livre não transmitem conhecimentos em forma expositiva e
autoritária, senão modelam opiniões, influenciam sobre os critérios que têm as
pessoas sobre a sociedade, seus problemas e suas soluções, assim como
transmite de maneira emocional e recreativa a formação de conteúdos muito
mais diversos do que aquelas que se transmitem ao mesmo tempo no sistema de
ensino. Quer dizer, exercem uma ação formativa de índole psicológica e
sociológica que opera baseada na motivação e nas necessidades culturais e
52
recreativas das massas, em seus gostos e preferências, nos hábitos e tradições, na
relação entre si e entre as classes e os grupos sociais aos quais pertencem, seus
sistemas de valores e sua ética específica e, sobretudo, opera baseado na
voluntariedade, na “liberdade” de suas formas e conteúdos, “opostos” a
regulações, restrições, regulamentações e imposições que sejam exteriores a
própria atualidade. Mas, segundo estes autores, a formação não é exclusiva do
tempo livre. Nos seus termos, opera como um sistema no qual se incluem a
escola e o sistema nacional de ensino, a família, a educação ideológico-social
realizadas pelas organizações políticas, os modelos de relações sociais e os tipos
humanos que se transmitem de forma espontânea e planejada na consciência
social, etc. Ou seja, é um universo completo que interage e se condiciona
reciprocamente. Neste caso, não se pode pensar num conjunto de atividades de
tempo livre de índole formativa e diversificada, se não existe prévia e
paralelamente um esforço qualitativo, formativo e de ensino, a fim de lograr uma
educação para o tempo livre. Em outras palavras, significa dizer que a cultura de
tempo livre deve estar precedida e acompanhada de uma educação para o tempo
livre, uma vez que a formação para o tempo livre é uma parte fundamental da
formação integral do homem, pois no tempo livre se realizam, com grande
eficácia, a formação cultural, corporal, ideológica e coletiva. Nele se adquirem e
se assimilam rápida e fortemente os valores, as normas de vida, as opiniões e os
conhecimentos. Para Sánchez y Colaboradores, não existem meios tão eficazes
para formação integral como aqueles que proporcionam as atividades que se
realizam no tempo livre, nem métodos tão sutis, tão aceitáveis, como os que têm
as atividades de lazer bem feitas. Nos dias atuais, a discussão tem se ampliado a
respeito da capacidade formativa que tem o conteúdo do tempo livre para a
53
educação e para a formação da personalidade. A propósito, a influência
formativa do tempo livre é um fato comprovado cientificamente e posto em
prática desde muito tempo pelo sistema capitalista. Para os autores estudados, a
cultura de massas e a indústria recretivo-cultural capitalista tem a função
ideológica de reproduzir na classe trabalhadora os valores sociais que o
estabilidade ao sistema. E essa função estabilizadora começa pela infância.
Desde criança os operários dos países capitalistas estão absorvendo
inconscientemente e assimilando em menor ou maior grau as bases ideológicas
que se transmitem de maneira incessante pela escola, mídia em geral, pela
indústria cultural de massas e pelas políticas públicas de lazer pensadas pelos
Estados capitalistas. Segundo estes autores, não se pode, então, subestimar o
papel formativo e deformativo do conteúdo do tempo livre, pois se assim se
fizer, estar-se-á subestimando a tendência educativa que caracteriza as
sociedades contemporâneas nas condições da revolução cientifica e tecnológica,
a interpenetração sócio-cultural e a enorme complexidade de conhecimentos,
valores e normas que deve assimilar o trabalhador, atualmente, para poder ter
uma função criativa e uma participação social de acordo com as exigências
atuais. As formações culturais, físicas, ideológicas e criativas que se realizam no
tempo livre são profundas e influem, portanto, intensamente no pensamento e na
estrutura da personalidade. A formação do tempo livre prepara as novas
gerações para o futuro; desperta a ânsia de conhecimentos para campos
impossíveis de acessar pelos sistemas educativos formais; incentiva o uso e o
desenvolvimento da reflexão e análise diante de situações novas e motivantes;
canaliza as energias vitais para criação, participação social, o cultivo das
potencialidades e capacidades individuais; não tem fronteira de tempo ou
54
espaço: pode se realizar em casa, na rua, nas instalações específicas, na escola,
em toda a sociedade. Este tempo pode ser levado a cabo, também, por múltiplos
meios: livros, filmes, vídeos, obras artísticas, programa de televisão, rádio,
através de práticas esportivas, entretenimentos, passatempos, conversação,
grupos de participação e criação e pelo clima espiritual de toda a sociedade.
Enfim, para estes teóricos cubanos estudiosos do fenômeno do lazer, a formação
para o tempo livre é a formação para a complexidade da vida contemporânea, o
despertar do caráter social e do pensamento das crianças, jovens e adultos. Como
tal, é função de toda a sociedade e não de alguns de seus membros, ainda que
nela confluam cinco fatores essenciais: a escola, a família, os meios de difusão,
as organizações sociais e políticas e a oferta estatal para o tempo livre. Mais
ainda, o processo formativo é permanente e não tem fronteiras de idade, exerce
sua principal ação no trabalho com as crianças, desde a mais tenra idade, e com
os jovens. A formação deve começar com o descobrimento infantil do mundo e
da sociedade, no qual começa a transmitir os valores, as normas, os gostos e as
atitudes. Neste complexo processo, as famílias e os círculos infantis m um
papel de primeira ordem: mostrar às crianças que na sociedade e na natureza
existem infinitos modos de realizar atividades satisfatórias, pondo essas crianças
em contato com a cultura, o exercício físico sistemático e competitivo, o
descobrimento da natureza, da vida animal e vegetal e suas combinações;
incentivá-las a se realizar como ser humano no trabalho recreativo, na criação e
participação cultural, física e recreativa. As artes, os esportes, o exercício físico
sistemático como forma de lutar contra o sedentarismo nos adultos, os
passatempos instrutivos, o hábito de leitura, ou seja, a cultura para o tempo livre
começa nos primeiros anos da vida, e não mais tarde.
55
Entretanto, ainda que se aceite o caráter contraditório do papel do lazer
numa sociedade capitalista, pensa-se que isto não pode virar uma panacéia mitigada que
poderia agir como contraponto às influências anteriormente exercidas sobre as crianças
pela família, escola, igreja, etc. O lazer não é e nem nunca será, no marco do modo de
produção capitalista, a salvação da formação plena dos trabalhadores, fato apenas
possível na hipótese da sociedade socialista.
Os fundamentos conceituais do lazer aqui arrolados tentam concebê-lo,
portanto, a partir dos dispositivos estruturais que a sociedade contemporânea apresenta,
ou seja, consideram a divisão da sociedade em classes e procuram destacar como se
manifesta o lazer e o consumo cultural das elites.
Enfim, o intuito deste capítulo foi, na verdade, buscar a estreita relação do
conceito de lazer com o trabalho, o tempo livre, a sua presença ao longo da história da
humanidade, com o caráter de classe e a influência que o Estado capitalista tem como
um dos seus principais elementos definidores.
56
II CAPÍTULO
AS POLÍTICAS PÚBLICAS E A CRISE ESTRUTURAL DO CAPITAL
“O capitalismo gera o seu próprio coveiro” (MARX &
ENGELS, 1998, p. 20).
Neste capítulo serão analisadas, ainda que brevemente, as relações que se
estabelecem entre o momento de crise estrutural, sistêmica e prolongada que atravessa o
sistema do capital e o ideário das políticas ditas públicas engendradas pelos Estados
nacionais periféricos. Desse modo, constitui-se propósito desta etapa examinar o grau
de correspondência que entre Estado capitalista e política social na perspectiva de
compreender o papel das políticas públicas de lazer na ordem do capital em aguda crise.
57
Mészáros (2002, p. 795), em seu livro intitulado “Para Além do Capital”
tem afirmado com singular propriedade que, “[...] em termos simples e gerais, uma crise
estrutural afeta a totalidade de um complexo social em todas as relações com suas partes
constituintes ou subcomplexos, como também a outros complexos aos quais é
articulada”
.
Assegura também que, diferentemente, uma crise não-estrutural afeta
apenas algumas partes dessa totalidade, e assim, não importa o grau de severidade em
relação às partes afetadas, ou seja, não pode pôr em risco a sobrevivência contínua da
estrutura global. Ora, sendo o desenvolvimento da totalidade o momento predominante
em relação ao desenvolvimento de cada uma das partes, pode-se afirmar, com
Mészáros, que a direção – positiva ou negativa – que a totalidade toma é um dos
critérios mais importantes para aferir o caráter de ascenso ou decadência de uma forma
de sociabilidade.
É bem sabido que a existência social depende de leis que regulem as
relações entre o homem e a natureza. Sem tais leis sociais seria impossível a própria
existência terrena. Pois, como acontece com toda totalidade, o modo de produção
capitalista também é regulado por um conjunto de leis básicas, entre as quais a lei da
crise. Por esta forma, quando a totalidade entra em processo de exaustão, crise final e
ruptura, as suas leis básicas começam a se debilitar até desaparecerem ou serem
negadas, dando lugar a uma outra totalidade com novas leis que a regulam. A lei da
crise capitalista foi elaborada pela primeira vez por Karl Marx em sua obra clássica “O
Capital” e continua atual até os dias de hoje. Para Marx (1957/58, p. 282):
Em agudas contradições, crises, convulsões, evidencia-se a crescente
inadequação do desenvolvimento produtivo da sociedade às relações de
produção em vigor. A violenta aniquilação do capital (nas crises), não por
58
circunstâncias alheias a ele, mas como condição de sua autoconservação, é a
forma mais contundente de aviso para que ele desapareça e lugar a um
estágio superior de produção social [...]. Estas contradições m como
resultado cataclismos, crises, nos quais, a suspensão momentânea de trabalho
e a destruição de grande parte do capital, o fazem voltar violentamente ao
ponto no qual é incapaz de empregar plenamente os seus poderes produtivos
sem cometer suicídio. No entanto, estas regulares e recorrentes catástrofes
têm como resultado a sua repetição em uma escala maior e, por último, à
derrubada violenta do Capital.
Nessa perspectiva, não se torna necessário registrar numa série estatística
todas as crises cíclicas vividas pelo capitalismo para se concluir que elas vêm à tona não
por mera probabilidade, mas por força de uma lei social que pode ser considerada ainda
a materialização de uma etapa superior de desenvolvimento do sistema de contradições
do capital numa etapa avançada das forças produtivas (e destrutivas) do trabalho social
estranhado.
No entanto, por outro lado, autores como Popper (1987) e outros que
negam a existência de leis sociais, jamais conseguiram explicar porque as crises cíclicas
do capitalismo se repetem com certa regularidade. Entretanto, é de bom alvitre advertir
que deve ser descartada qualquer aproximação com o determinismo, conforme explica
Tonet (2003, p. 203):
Não vai nenhum determinismo porque, à diferença das leis da natureza, as
leis do capitalismo são oriundas de atos humanos e, portanto, são de caráter
histórico-social e não natural. Enquanto permanecerem vigentes os atos que
lhe dão origem, nenhum outro ato jurídico, político, ético, etc. poderá
controlar essa lógica.
Tomando como base a lei da crise e os efeitos dela resultantes, Mészáros
(2002, p. 795) tem afirmando que se assiste, na atualidade, a uma exacerbação da
composição orgânica do capital, acompanhada da desaceleração persistente da
59
produtividade, aumento do desemprego, queda dos salários e das pequenas rendas,
alargamento da capacidade ociosa de todas as economias do mundo, gerando uma
profunda e igualmente crônica contradição entre uma imensa capacidade física da
produção e uma insuficiente capacidade de consumo que jogou as taxas médias de lucro
para baixo e fez aparecer a primeira crise sistêmica e estrutural do capitalismo em toda a
sua existência, revelando a danosa vulnerabilidade do sistema do capital que agora não
vive mais uma crise cíclica, pouco comentado, mas uma irremediável crise que abala
profundamente sua base de sustentação.
Para alguns autores marxistas que tomam como base a análise dos
próprios fundamentos do sistema do capital, podem-se compreender os limites
ontológicos das políticas públicas engendradas pelo Estado. Tendo como referência
principal “O Capital” de Marx, Mészáros apresenta importantes elementos sobre a
irreformabilidade do capital e a necessidade de sua superação socialista.
Para ele, a crise estrutural do sistema capitalista, decorrente das
contradições e limites que encerra, aprofunda-se incessantemente, revelando-se na
recessão prolongada, nos tremendos desajustes sociais, na superinflação, na corrupção
generalizada do controle político do sistema do capital, na fome e na miséria que se
ostentam em toda parte, no abismo que separa os países ricos da imensa maioria das
nações, na degradação da sociedade capitalista. Como o próprio Mészáros tem afirmado
em seus textos, uma crise que atinge o epicentro do sistema, os Estados Unidos da
América - EUA, e que tem dimensões catastróficas para a lógica do capital, pois este (o
sistema do capital) hoje busca refúgio seguro financiando as economias norte-
americanas, cujo déficit público atinge proporções incontroláveis.
Marx (1980) prenunciava muito tempo atrás ser impossível superar as
contradições do capital, mesmo que uma só, sem que se institua uma alternativa radical
60
ao modo de controle do metabolismo social do capital. Uma alternativa, bem lembra
Mészáros (2002), com base na igualdade substantiva, sob a completa ausência de
relações alicerçadas no modo atual de produção capitalista.
Não obstante a tese da irreformabilidade do capital apregoada por Marx e
as políticas públicas fazem parte dessa tentativa de resolver os limites e contradições do
capital pela via das reformas - insiste-se no propósito de reunir elementos teóricos
necessários à construção de políticas blicas para o lazer numa perspectiva dialética,
em plena crise estrutural do capital.
Dado o caráter materialista histórico dialético imprimido a este trabalho,
expõe-se, em rápidas pinceladas, a concepção marxiana acerca da natureza do Estado
capitalista e de suas transformações, visando, por esta forma, compreender as relações
entre a crise estrutural do capital e as políticas públicas de lazer.
Para Marx (2004) quanto mais forte é o Estado, quanto mais político é um
país, tanto menos ele está disposto a compreender a razão das taras sociais (males) e a
compreender-lhes o princípio geral que é, precisamente, a própria organização da
sociedade, ou seja, a formação social fundada num dado modo de produção. E isso
historicamente tem se verificado de várias formas, sob diferentes Estados: liberal,
fascista, nazista, etc. A existência do Estado e a existência da escravidão são
inseparáveis.
Mas, a dominação (poder) a que Marx se refere, não provém do Estado,
mas é transferida para o Estado pela sociedade civil através de suas classes e frações de
classes dominantes, para que, em nome dela, este poder, à distância dessas mesmas
categorias dominantes, exerça o poder sobre o conjunto.
De acordo com Marx (2003), a finalidade do Estado é garantir o interesse
comum, mas este é concebido como o conjunto dos interesses dos indivíduos
61
proprietários. Assim, o Estado é caracterizado por Marx, nessa obra, como "comunidade
ilusória" (cf. p. 27).
Se por um lado o Estado exerce funções sociais gerais, se aparece como
representante do interesse comum, por outro, se apresenta assim na medida em que
faz valer os interesses comuns de uma classe. O Estado se constitui como uma dupla
determinação: exerce funções sociais gerais - resultante da divisão do trabalho - mas as
exerce sob uma forma despótica, autoritária, sob a forma do domínio de uma classe
sobre outra; em resumo sob a forma de Estado (MARX, 1998a).
Do ponto de vista do pensamento liberal burguês a respeito do Estado, as
políticas públicas “políticas de bem estar social” (será se elas existiram já que no
capitalismo não é permitido o tal “bem estar social” para a classe trabalhadora?) são, via
de regra, consideradas como resultado da luta dos trabalhadores por direitos sociais,
intensificado no segundo pós-guerra mundial, nos países de capitalismo avançado. De
acordo com este raciocínio, a maioria das economias capitalistas experimentou, após a
segunda guerra mundial, um crescimento econômico sem precedentes, aliado à
expansão de programas e sistemas de bem estar social.
Nesse sentido, Oléias (1999), defende que o Estado passou a ter um papel
crescente na regulamentação do trabalho assalariado, atuando mais diretamente na
formulação e implementação dos padrões de proteção social do trabalhador. O Estado
assume, nesse sentido, a responsabilidade pelo bem estar dos “cidadãos” em áreas
como: previdência social, saúde, habitação, assistência à criança, transporte, emprego e
educação. Daí, o conceito de política pública social compreender as intervenções do
Estado voltadas ao atendimento da população como um todo, não apenas a uma classe
ou grupo social.
62
Diante de tais afirmações, Carvalho (2006, p. 21) indaga de modo
veemente: “Políticas públicas de bem estar social: onde e quais são? Estado protegendo
o trabalho? Onde, qual?” Para este autor, tal afirmação caminha na contramão do
marxismo.
Com efeito, a invenção das políticas públicas de bem estar social,
maquinadas pelo ideário liberal burguês, não passou de uma tentativa de negação da
possibilidade da sociedade comunista. Suas projeções de solução dos problemas sociais
falharam. Daí, a procedência do questionamento de Carvalho (op.cit.,, p. 18): “[...]
onde o tal “Estado de bem estar social” prosperou para além da pífia crítica e grosseira
retórica anticomunista”?
Segundo Henrique & Draibe (1987) e para a maioria dos analistas ocorreu
uma parceria bem sucedida entre a política social e a política econômica, sustentada por
um “consenso” acerca do estímulo econômico conjugado com segurança e justiça
sociais.
Entretanto, conforme assinala Silva (1999, p. 85):
Depois da desestruturação, tanto do Estado de bem estar social dos países
ricos, quanto do desenvolvimentismo no terceiro mundo, a trajetória das
políticas liberalizantes, demarcadas pelas forças de mercado, tornou-se social
e politicamente explosiva pela indiscutível e visível ruptura da coesão social
em todos os níveis e regiões.
No curso dessa relação nem sempre feliz, Draibe (2001, p. 2), reitera o
argumento de que os governos contemporâneos se tornaram prisioneiros (ou
coniventes?) do difícil dilema entre a nova política econômica e a política de proteção
social, independentemente de suas orientações político-partidárias. Ou seja, os
63
governos, sob a forte pressão financeira internacional, teriam optado radicalmente por
um lado da balança - o do ajustamento econômico e fiscal.
Ao fazê-lo, teriam dado significativos passos em direção ao
desmantelamento do antigo Estado de Bem-Estar Social, porque o discurso e a prática
neoliberais são no sentido de declarar o Estado como mínimo, de modo que este não
participe de outras funções além daquelas previamente entendidas como indispensáveis,
a exemplo da segurança das pessoas e da administração da justiça.
Para esta autora, principalmente no campo das políticas de educação, saúde
e assistência social, os últimos quinze anos registram um já expressivo volume de
alterações e inflexões nos diferentes programas, afetando desde concepções até
financiamento, organização, modo de operação e estilo de gestão, conforme afirma:
Projetados para o conjunto das áreas sociais, os resultados registram
significativa mudança nos objetivos, eixos e orientações, mesmo quando nem
todos os novos contornos das políticas tenham sido suficientemente
redesenhados (op.cit., p. 3).
Contudo, não é isto que vem ocorrendo nos países centrais e periféricos ao
longo da história do capitalismo. Em linhas gerais, observa-se que as políticas
redistributivas implementadas por essas nações não priorizam os gravíssimos problemas
sociais que assolam as massas em todo mundo e, pelo contrário, aumentam e
aprofundam ainda mais a “exclusão” das massas dos bens socialmente produzidos, a
marginalização social, o desemprego, a miséria, a fome e outros aspectos dramáticos
que estão presentes no cotidiano daqueles que vivem do trabalho ou não.
Em seus aspectos intrínsecos, as atuais políticas públicas defendidas pelo
Estado, assim como em outros momentos, revestem-se de um caráter de atendimento
massificado, conforme se vem denunciando neste trabalho. Buscam, através do discurso
da melhoria da qualidade de vida, melhores dias para a população, ocultando, conforme
64
revela Silva (1999), entraves na sua trajetória, uma vez que estas são incapazes de
resolver
o fracasso de suas estratégias e problemas decorrentes de sua implantação, tais
como:
[...] o agravamento da pobreza e da miséria resultante da crescente
desigualdade de padrão de vida entre os países desenvolvidos e os
subdesenvolvidos; crise ecológica mundial; o desemprego estrutural;
desordenado crescimento demográfico; concentração de renda, da riqueza,
dos saberes e da terra (cf. p. 84-5).
Os efeitos decorrentes da adoção de políticas estatais sob a lógica do capital
têm aparecido com freqüência, tanto na literatura como nos meios de difusão nacional e
internacional. Em recente artigo sobre a questão, intitulado “Gato por Lebre” Bava
(2002, p. 2) revela que as políticas públicas do “Consenso de Washington”,
compreendidas como a mais legítima tentativa de negação da sociedade comunista:
[...] têm levado os países que as adotam a situações de crise social, de
violência crescente e de desorganização produtiva, o que inclui a
desorganização do funcionamento do mercado. Têm levado também cidadãos
de numerosos países a se mobilizarem e a questionarem de formas cada vez
mais radicais as estruturas de poder que impõem a repartição da riqueza e da
propriedade em suas sociedades e na escala planetária. Sucedem-se
manifestações que vem ganhando amplitude e repercussão mundial e têm
transformado recentemente cada reunião do Fundo Monetário Internacional,
da Organização Mundial do Comércio e de outros órgãos de regulação da
economia internacional em verdadeiros campos de batalha, onde milhares de
manifestantes tomam as ruas e se opõem às suas políticas. Não é para menos.
Os mais recentes relatórios mundiais produzidos pelas Nações Unidas dão
conta de um processo acelerado de ampliação da pobreza e da desigualdade.
Se em 1960 a diferença entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres do
planeta era de 30 para 1; hoje essa diferença atinge a assustadora proporção
de 90 para 1. Em numerosos países houve uma regressão da renda familiar e
um aumento da pobreza absoluta, sendo o continente africano o mais afetado
por essa tendência.
65
Os duros indicadores de pobreza e desigualdade apontam para os severos
limites das políticas sociais, que esbarram, aqui, em fenômenos estruturais de secular
duração, agravados nos anos recentes pelo desemprego, pela instabilidade do trabalho e
pela redução da renda das famílias, decorrentes, em última análise, da profunda crise
estrutural do capital que assola os estados nacionais.
Neste cenário o combate à pobreza e a famigerada “exclusão social”
aparecem hoje, curiosamente, como um tema central na agenda, tanto dos setores
“progressistas”, quanto dos setores conservadores. Daí, este autor questionar como é
possível que políticas focalizadas e compensatórias dirigidas pretensamente às massas
mais despossuídas, tais como os programas de renda mínima, micro-crédito,
desenvolvimento local, sejam hoje adotadas, tanto por governos ditos “progressistas”,
quanto pelas agências do sistema financeiro internacional, a exemplo do Banco
Interamericano de Desenvolvimento - BID e o Banco Mundial. Quais as razões para
essa aparente convergência de propósitos?
É fácil observar que a crise das práticas de intervenção social dos Estados
capitalistas nas condições de crise profunda e estrutural por que passam os países e o
sistema do capital - nacional e internacional - vêm se consubstanciando no profundo
abismo existente entre o discurso demagógico/reacionário liberal e a concretização das
projeções do sistema do capital de proteção social, via democratização do acesso e da
participação das pessoas ao patrimônio produzido pela humanidade, a qualidade de vida
e ao espaço público.
De acordo com Bava (op.cit., p. 2), vive-se hoje, mais do que nunca, uma
contradição em termos, visto que:
66
Da parte dos setores conservadores, estas políticas, na sua essência, buscam
garantir a estabilidade política e a governabilidade em países onde a
desigualdade social e a pobreza absoluta atingem hoje limites sem
precedentes, afetam o funcionamento dos mercados e geram crises sociais
que ameaçam o status quo. Da parte dos setores progressistas a adoção dessas
mesmas políticas expressa a dificuldade de formulações estratégicas,
expressa a força do pensamento hegemônico associada à crise de paradigmas
de mudança social. Na falta de referências históricas contemporâneas que
inspirem projetos de ruptura com a ordem instituída e apontem para a
construção de sociedades solidárias, resta no horizonte utópico o mundo das
reformas, o propósito de melhorar o que está sem, no entanto, questionar
os fundamentos da crise atual. Essa situação é conseqüência de um particular
momento histórico em que nossas sociedades vivem o impacto da crise, mas
ainda não são capazes de formular estratégias de ação, nem de engendrar as
novas articulações e alianças que lhes permitam tomar a ofensiva (cf. p. 2).
Os Estados nacionais, portanto, enfrentam hoje problemas derivados da
crise estrutural do capital fundamentalmente pelo aspecto financeiro. Porque pressão,
corte, alteração na condição de acesso, corrupção, entre outros males, são reflexos da
“bem sucedida” relação entre as políticas públicas e a crise estrutural do capital.
Enfrentam também, os Estados nacionais, dificuldades específicas, que
envolvem o questionamento, não apenas da estrutura atual dos programas sociais, mas
também da sua finalidade. As restrições às políticas públicas – cortes nos gastos,
redução nos benefícios, alterações na condição de acesso, etc. fariam parte de uma
lógica imposta. Ademais, a reduzida valorização das políticas sociais no âmbito das
políticas de governo determina que sejam alocados cada vez menos recursos para a
implementação de programas sociais.
Diante dessas constatações, pergunta-se: existem mesmo políticas públicas?
Se existem, por que elas não solucionam os reais problemas sociais? Não seriam elas
políticas de Estado ao invés de políticas públicas? Estariam elas, efetivamente,
promovendo equidade social? As políticas públicas ou sociais, como queiram, não
seriam, per si, formas de dominação e de controle social? “Não estariam as políticas dos
67
governos, que se sucedem sucessivamente sem cessar, [...], reproduzindo com outros
ornamentos as relações de produção hegemônicas”? (CARVALHO, 1999, p. 3).
Em outro texto (CARVALHO, 2006, p. 1), reforça a tese da
impossibilidade das políticas públicas genuinamente populares, ao afirmar:
Ora, quando se fala de Políticas Públicas, as pessoas parecem querer referir-
se tanto ao que é relativo ou pertencente a um povo, a uma coletividade,
quanto ao que é relativo ou pertencente ao governo de determinado país
(Estado, cidade etc.), quando, de verdade, estão a se referir ao que emana do
governo. Se isto for verdade e se neste país o governo não governa para
todos, mas para uma classe social ou fração dessa classe, os banqueiros
associados aos agiotas internacionais, então é perfeitamente plausível dizer
não: não políticas públicas mas políticas encomendadas e implementadas
pelo Estado para iludir e enganar o “povo” com as palavras igualdade,
liberdade e democracia.
O que parece claro é que as pretensões do Estado burguês com as tais
políticas públicas buscam sempre corrigir as taras sociais - no sentido colocado por
Marx (2004) nas “Glosas Críticas Marginais” geradas pela contradição imanente ao
modo de produção capitalista, ludibriando a população com promessas de resgate da
cidadania, educação e a solidariedade.
68
CAPÍTULO III
CATEGORIAS PARA A CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE
LAZER NUMA PERSPECTIVA DIALÉTICA
“O trabalho não é a satisfação de uma necessidade,
mas apenas um meio para satisfazer outras
necessidades” (MARX, 2003, p. 114).
Explicitou-se, antes, que as necessidades de emancipação da classe operária
da Região do Cariri cearense exigem a definição de políticas públicas setoriais que
promovam o desenvolvimento social, motivo pelo qual este trabalho articula estudos
69
com a finalidade de contribuir com elementos teóricos para formulação de políticas
sociais de lazer para essa região.
Afirma-se, todavia, que apesar da impossibilidade de desenvolvimento
social sem que se superem as contradições insolúveis do modo de produção capitalista,
insiste-se na proposição de elementos teóricos definidores de uma política pública de
lazer de feições dialéticas para a Região do Cariri.
De acordo com o ponto de vista deste estudo, e apoiado nas evidências
caririenses de mais absoluta, completa e efetiva inexistência de políticas públicas
sociais, bem diante do olhar da experiência cubana (CUBA, 1998) com o fomento do
lazer, as categorias nas quais as políticas públicas de lazer devem assentar seus alicerces
são: a) Necessidades e liberdade da classe trabalhadora; b) Cultura para as massas, c)
Condições materiais objetivas para o desenvolvimento e prática do lazer; d) Fontes de
financiamento; e) Participação das massas; f) Comunicação social; entendidas como
conceitos teóricos fundamentais para explicitação do sentido político, histórico, social e
educacional das políticas públicas de lazer na Região do Cariri.
O conteúdo dessas categorias, examinado à luz do materialismo histórico e
dialético, contém aspectos fundamentais para a construção de políticas blicas para o
setor, voltadas para promoção do desenvolvimento social numa perspectiva dialética,
não obstante a contradição existente na relação capital e trabalho.
Sendo assim, o objetivo deste capítulo é revelar como se encontra o estado
da arte, ou seja, o nível de desenvolvimento destas categorias na Região do cariri
cearense.
Como primeira categoria vê-se a questão das Necessidades e liberdade da
classe trabalhadora. O seu conteúdo inicial é a relação que se estabelece entre
necessidades humanas e a questão da liberdade da classe operária.
70
Uma verdade eterna e inquestionável é a existência do trabalho na vida dos
homens com finalidades de transformação da natureza e de si mesmos através de e em
determinadas atividades. Enquanto existirem seres humanos, eles hão de construir
casas, fabricar roupas, produzir alimentos e muitas outras coisas, hão de educar os
filhos, escrever livros, discutir assuntos, construir jardins, compor música e tanto mais.
Esta é uma verdade banal e evidente. Entretanto, o que não é evidente é o “dispêndio de
força de trabalho” sem que se leve em consideração o conteúdo, a vontade e as
necessidades e liberdade dos envolvidos, tornando-se o trabalho num princípio abstrato
que domina e regula as relações sociais.
É verdade, também, que nas antigas sociedades agrárias havia todas as
formas possíveis de dominação e de dependência pessoal, mas não existia uma ditadura
do trabalho. O trabalho não era um princípio de coerção social. Cada atividade tinha o
seu tempo e o seu lugar próprios; não existia uma forma geral e abstrata de atividade. O
homem ainda não vendia a sua força de trabalho. Isso vem acontecer no moderno
modo de produção capitalista, com a sua finalidade autotélica de transformação
permanente de energia humana em dinheiro, onde se criou esse domínio particular,
abstraído de qualquer conteúdo, que leva o nome de esfera do trabalho - a esfera da
atividade não autônoma, incondicional, não relacional, robotizante, separada do restante
contexto social e obedecendo a uma abstrata racionalidade finalista de mais-valia,
independente das necessidades.
Para Lafargue (1977, p.26) o trabalho dos trabalhadores não cessa nunca.
Quanto mais trabalham, mais cantarolam seus algozes: “Trabalhem, trabalhem,
proletários, para aumentar a fortuna social e as vossas misérias individuais; trabalhem,
trabalhem, para que, tornando-vos mais pobres, tenham mais razão para trabalhar e para
serem miseráveis. Eis a lei inexorável da produção capitalista”.
71
Nesta esfera, separada da vida, o tempo deixa de ser tempo vivido e
vivenciado, torna-se simples matéria-prima que tem de ser aperfeiçoada: “tempo é
dinheiro”. No local de trabalho, apenas pode ser gasta energia abstrata. A vida fica lá
fora - ou porventura em parte nenhuma, porque a cadência do trabalho rege
interiormente todas as coisas. Na esfera do trabalho não conta aquilo que se faz, mas
sim o que fazer, enquanto tal, pois o trabalho é um fim em si mesmo justamente na
medida em que traz consigo a valorização do capital-dinheiro - a infinita multiplicação
do dinheiro por intermédio do dinheiro. O trabalho é a forma de atividade própria desta
absurda finalidade autotélica. É por isso, e não por quaisquer razões objetivas, que os
produtos são todos eles produzidos como mercadorias. sob a forma de mercadoria
representam a abstração dinheiro, cujo conteúdo é a abstração trabalho. Nisto consiste o
mecanismo da engrenagem social autonomizada em que se mantém aprisionada a
humanidade moderna. Tal como Marx afirmou (2003, p. 114):
O trabalhador, portanto, se sente em si fora do trabalho; no trabalho sente-
se fora de si. está à sua vontade quando não trabalha, quando trabalha não
está no seu domínio. Assim, o seu trabalho não é voluntário, mas imposto; é
trabalho forçado. Não constitui a satisfação de uma necessidade, mas apenas
um meio de satisfazer outras necessidades. A estranheza do trabalho ressalta
claramente do fato de se fugir dele como da peste, logo que não exista
nenhuma coerção material ou de outro tipo.
Vê-se que, no capitalismo, o útil para os trabalhadores é o estritamente
necessário à conservação da vida biológica ou ao atendimento às suas necessidades
básicas; eis que útil é tudo aquilo necessário à sobrevivência do trabalhador enquanto
animal de carga. O restante, ou seja, tudo o que foi por ele produzido é desnecessário ou
inútil, sendo apenas útil ao capitalista.
72
Na esteira desse pensamento, no Livro Primeiro de “O Capital”, Marx
(1980) novamente lembra que o processo de trabalho é a atividade dirigida com o fim
de criar valores de uso, cuja finalidade é o atendimento às necessidades humanas úteis e
necessárias; é condição natural e eterna da vida humana, sendo comum a todas as
formas de vida social.
Em “Os Manuscritos Econômico-Filosóficos de 1844”, ele identifica a
verdadeira dimensão que o trabalho assumiu para os homens, em sua maioria, na
sociedade capitalista. Tomou a forma do trabalho alienado, constatando que o trabalho
“não constitui a satisfação de uma necessidade, mas apenas um meio de satisfazer outras
necessidades” (MARX, 2003, p. 114).
Para Marx, o trabalho tornou-se apenas um meio de sobrevivência, de
manutenção da existência humana, e a não realização do reino da liberdade. A alienação
do trabalhador em sua vida produtiva se reflete nas suas relações sociais com os outros
homens e com a sociedade em geral. O conceito fundamental para a compreensão do
homem em sua relação concreta de vida é a liberdade. O entendimento do significado
do trabalho para os seres humanos e o conceito de alienação ligado ao próprio trabalho
remetem ao conceito de liberdade.
Em “A Ideologia Alemã”, enfatizando a condição histórica dos homens,
Marx e Engels (1998b) afirmam que os homens devem estar em condições de viver para
poder fazer história e, para viver, devem trabalhar e ter os meios que permitam a
produção da própria vida material, condição fundamental de toda a história.
Daí o propósito de refletir com Marx a respeito do lugar do trabalho na
existência humana como o modo de ser do homem como ser histórico, que, através de
sua história, sua práxis, faz acontecer sua própria existência, por meio da produção e
reprodução material e espiritual, que se num determinado tempo e lugar e, portanto,
73
condicionada pela realidade social e econômica desenvolvida pelo processo histórico
dos homens, objetivando a continuidade da vida humana, sua permanência e plenitude.
A distinção entre o reino da necessidade e o reino da liberdade é
fundamental para a discussão desenvolvida a seguir e constitui o ponto central da
reflexão, uma vez que o significado que o trabalho tem para homens e mulheres, numa
dada organização social, estará comprometido com a racionalidade econômica que os
direciona. Mao Tsé-Tung (2003, p. 145) assinala que “a história da humanidade é a
história do contínuo desenvolvimento, do reino da necessidade para o reino da
liberdade. Esse processo não tem fim. Numa sociedade, enquanto existirem classes não
pode ter fim”.
Marx divide o conceito geral de trabalho em dois planos. O primeiro é
chamado de reino da necessidade: compreende o que é necessário para a sobrevivência
dos homens e corresponde à produção e reprodução material. O segundo, chamado por
Marx do reino da liberdade, é a práxis existencial que vai além da produção e
reprodução material, expressando, ao mesmo tempo, a necessidade de integração desses
dois planos, observando que:
O reino da liberdade começa, de fato, onde cessa o trabalho que é
determinado pela necessidade e por objetivos externos; por conseqüência, em
virtude da sua natureza, encontra-se fora da esfera da produção material
propriamente dita (...) A liberdade neste campo pode consistir no fato de a
humanidade socializada, os produtores associados, regularem racionalmente
o intercâmbio com a natureza, submetendo-a ao seu comum controle, em vez
de serem governados por ela como por um poder cego, e cumprindo a sua
tarefa com o menor dispêndio de energia possível e em condições tais que
sejam próprias e dignas de seres humanos. (...) o desenvolvimento da
potencialidade humana com fim em si mesma, o verdadeiro reino da
liberdade que, no entanto, pode florescer tendo como base o reino da
necessidade. A redução do dia de trabalho é a sua condição prévia
fundamental (MARX, 2003, p. 114).
74
Na verdade, usurpa o capitalista o tempo que deveria atender às
necessidades metabólicas do crescimento, do desenvolvimento, à saúde e o lazer do
trabalhador. E a condição fundamental desse desenvolvimento humano é a redução da
jornada de trabalho.
Portanto, o reino da liberdade acontece quando o homem está livre da
necessidade imediata da existência, podendo se tornar livre para suas possibilidades,
suas potencialidades. Além do urgente e das necessidades, há, também, práxis, trabalho
a desenvolver; seu caráter se transforma.
Para Marx, a divisão da sociedade em classes e a apropriação dos meios de
produção pela classe dominante reduzem o fazer acontecer da existência apenas para a
dimensão da necessidade, para a maioria dos homens.
A necessidade do dinheiro constitui a verdadeira necessidade criada pelo
capitalismo, levando o operário a esquecer necessidades fundamentais como a própria
necessidade de ar fresco e atividade física. Posto que na sociedade capitalista,
comandada pelo capital especulativo, assevera Marx (2003, p. 151-2):
[...] quanto menos cada um comer, beber, comprar livros, for ao teatro ou ao
baile, ao bar, quanto menos cada um pensar, amar, teorizar, cantar, pintar,
poetar, etc., tanto mais poupará, tanto maior será seu tesouro, que nem a traça
e a ferrugem roerão, o seu capital. Quanto menos cada um for, quanto menos
cada um expressar a sua vida, tanto mais terá, tanto maior será a sua vida
alienada e maior será a poupança da sua vida alienada.
A separação da produção e reprodução, ou seja, do reino da necessidade, ao
reino da liberdade, que confere plenitude à existência, faz com que a dimensão
econômica, ou a racionalidade econômica, absorva o todo existencial em seu interior e
objetifica a práxis livre da existência.
75
A superação dessa divisão entre produção e reprodução do todo existencial,
através da possibilidade de descobrir a plenitude do ser na existência dos homens,
constitui a condição para que seja devolvida a existência seu trabalho próprio e para que
o trabalho, liberto da alienação e coisificação, se torne novamente aquilo que é em sua
essência: a realização efetiva, plena e livre do homem em seu mundo histórico. Ao lado
da efetivação da atividade de trabalho como uma "necessidade para satisfazer outras
necessidades", como afirma Marx, o trabalhador busca sua realização e valorização
pessoal, se sente útil.
Antunes (1999), na proposta de construção de uma nova sociedade, a
realização da "vida cheia de sentido" tanto dentro quanto fora da esfera do trabalho,
através de uma nova organização societária que responda às necessidades humanas, no
lugar da valorização constante do capital, uma sociedade que o salto para além do
capital, por meio da transformação do trabalho em atividade livre, e que, em
contraposição ao trabalho fetichizado, estranhado e abstrato, se realize a sociedade do
trabalho concreto, com a produção de coisas úteis, mudando o reino da necessidade, em
que se encontram os trabalhadores, para o reino da liberdade.
Sendo assim, é preciso: “[...] atacar a moral e as teorias sociais do
capitalismo; demolir, nas cabeças da classe chamada à ação, os preconceitos semeados
pela classe reinante; proclamar, no rosto dos hipócritas de todas as morais, que a terra
deixará de ser o vale de lágrimas do trabalho” (LAFARGUE, 1977, p. 26).
Sem dúvidas, são muitas as razões pelas quais deve ser enaltecida a
relevância do conceito de necessidade de liberdade para a classe trabalhadora na
formulação e gestão das políticas sociais, destacando-se entre estas, as de que: a) ela é a
categoria que melhor explica a dinâmica das relações de poder nas sociedades
capitalistas; b) ela está na base da questão social, que suscita respostas políticas; c) é ela
76
que, uma vez retrabalhada, do ponto de vista socialista, poderá constituir um
contraponto problermatizador à atual hegemonia das políticas sociais
neoliberais/neoconservadoras e contribuir para a formação de uma “cultura de
oposição” no seio do próprio capitalismo (PEREIRA, 2000, p. 185).
O complexo dessa construção social, ou seja, a garantia plena de todos
esses direitos, deve abranger também as questões relacionadas ao lazer, enquanto bem
cultural que todos têm direito de usufruir, reconhecendo ser necessária a reflexão
primeira sobre as repercussões que têm tido as políticas públicas nessa área frente às
demandas sociais no Ceará, Estado da Federação ainda não satisfeito nos níveis básicos
de nutrição, assistência médica, moradia e do próprio trabalho, entre outros direitos
essenciais do homem.
Constatações como estas servem de contraponto às orientações contidas nos
ordenamentos legais para desenvolvimento esportivo no nosso país, identificadas, por
exemplo, no discurso de posse do ex-Ministro do Esporte, Agnelo Queiroz, auto-
intitulado “comunista” por ser filiado Partido Comunista do Brasil:
O esporte será neste Governo um poderoso instrumento de inclusão social,
sobretudo para o universo de 32 milhões de crianças e adolescentes, de zero a
dezessete anos de idade, que vivem hoje em situação de pobreza absoluta, ou
seja, cuja renda mensal não chega a meio salário mínimo por pessoa
(QUEIROZ, 2003a, p. 1).
Segundo tal compreensão fato que causa espécie por se tratar de um
parlamentar dito “comunista”, todavia, vazado pelas ilusões pequeno-burguesas - o
esporte ofereceria chances iguais a todos e promoveria a ascensão social, legitimando o
modelo piramidal de estratificação social do sistema capitalista que está evidente na
estrutura desportiva brasileira e é efetivada no ensino do esporte. Certamente, neste
77
país, “a classe que vive do trabalho”, dificilmente poderá, sequer, participar da
construção de tal modelo esportivo, considerando o profundo abismo entre as suas
possibilidades sociais e suas reais necessidades.
A propósito, a tese é a de que países como Cuba, por exemplo, consegue
resultados positivos no esporte e no lazer comunitário porque resolveu, ainda que
parcialmente, o problema da liberdade e da satisfação das necessidades humanas básicas
da população, referência fundamental para o sucesso de qualquer sistema nacional de
esporte e lazer. Fora desse marco, qualquer tentativa de reconstrução do modelo atual,
está fadada ao infortúnio.
Uma segunda categoria analítica é a Cultura para as Massas. Como diz
Siqueira (1992, p. 64): as relações entre o popular e o erudito estão em íntima
dependência das condições históricas de exercício da hegemonia das diferentes classes
sociais. Por isso, a necessidade de fazer a leitura das condições entre ambos a partir das
condições históricas dadas no entrave da correlação das forças que determinam as
possibilidades da prática da liberdade e autonomia individual e coletiva. Para este autor,
experiências práticas têm demonstrado que:
A cultura não se forma a partir de elementos esparsos e desagregados, senão,
como um todo dominante, o que pode ser percebido, facilmente, na própria
escolha que fazem os grupos participantes nas práticas de lazer, pois, embora
pertencendo à classe trabalhadora mais despossuída de bens básicos, não
fogem à “moda” imposta pela cultura hegemônica (cf. p. 64).
Para o autor, é necessário, por meio de programas institucionais de caráter
eminentemente social, desenvolver os conteúdos do lazer enquanto conhecimento que
possa ser sistematizado numa prática diferente da que prevalece na cultura hegemônica
burguesa. Todavia, isto não deve significar o abandono daquilo que foi construído pelas
78
classes dominantes e que podem servir de suporte para a prática social da classe
trabalhadora e a elevação do seu nível cultural, pois, conforme sublinha Carvalho (2006,
p. 26): “a possibilidade de acesso à produção cultural desta sociedade que ignora a
produção cultural de outras sociedades, não significa necessariamente uma concepção
revolucionária da cultura ou do lazer enquanto faceta desta cultura”.
O processo de massificação de certas atividades de lazer, em expansão
contínua e que impede o livre curso de expressões capazes de ampliar o patrimônio
cultural de lazer das massas, exige que, na formulação de políticas para o setor, sejam
reconhecidos os elementos de dominação cultural que contêm as práticas hegemônicas
de lazer. O conceito cultura de massas” requer, portanto, uma análise mais profunda,
porque seu conteúdo, como alerta Siqueira (1992, p. 64), “[...] é elaborado numa base
conceitual técnico-quantitativa que busca diluir o conjunto das relações que constituem
objetivamente o homem num agregado historicamente indeterminado: as massas”.
Por exemplo, analisando a Lei Pelé, Lei nº 9.615 de 24/03/98, vê-se que seu
objetivo principal é a tentativa de legitimação do esporte institucionalizado como
prática universalizada e como uma cultura acessível a todas as massas, facilmente
observável mais uma vez nas palavras do ex-Ministro Agnelo Queiroz:
Quero incentivar e trabalhar com o desporto de rendimento, de competição,
vértice de uma pirâmide cuja base, para ser ampliada, necessita dos
resultados favoráveis dos melhores atletas do desporto brasileiro, em suas
várias modalidades. [...] O esporte de rendimento é a alavanca para o
incremento do desporto educacional e de participação, além de facilitar,
sobremaneira, a realização dos programas de inclusão social que iremos
desenvolver (QUEIROZ, 2003b, p. 2).
Afirmações desse porte se prestam, sobretudo, para ratificar que o
desenvolvimento esportivo no Brasil foi planejado e estruturado historicamente pelas
79
classes dominantes, segundo uma ótica elitista e comercial. Segundo Betti (1991), o
modelo piramidal de “democratização" do esporte imprime uma concepção tradicional
largamente difundida no Brasil, visão que põe o esporte de alto rendimento como o
ápice da pirâmide, onde apenas poucos indivíduos, dotados de qualidades excepcionais
poderão chegar, embora predomine o discurso oficial de que todos têm direito ao acesso
ao esporte e ao lazer ou que poderão se tornar campeões do dia para a noite.
O lazer, sob as suas mais diversas manifestações e conteúdos, enquanto
significativo fenômeno sócio-cultural, não pode continuar sendo utilizado como veículo
de reprodução dos valores dominantes que pouco têm contribuído para o
desenvolvimento do homem, na perspectiva da construção de uma sociedade socialista,
não obstante a vigência do atual modo de produção capitalista. Para isso, é necessário o
real engajamento na promoção de ações concretas para integrar o movimento político de
construção de uma “cultura para as massas”, conforme Siqueira (1992, p. 65),
reconhecendo imprescindível para a proposição de elementos e conteúdos para essa
nova cultura, uma acurada reflexão sobre os conceitos de “cidadania”, alienação,
possibilidade, realidade, necessidades, liberdade e sociedade de classes.
Assim sendo, as políticas para o setor devem identificar demandas sociais
de lazer através de mecanismos de participação popular, que possam ser convertidas em
produtos para os usuários, incluindo as práticas corporais que não são consideradas
esporte formal, mas que são demandas reais da população que, quando atendidas, vão
materializando, legitimando e consolidando a nova política de apoio e desenvolvimento
do lazer.
De acordo com Sánchez y Colaboradores (1997), a cultura de massas e a
indústria recretivo-cultural capitalista tem a função ideológica de reproduzir na classe
trabalhadora os valores sociais que dão estabilidade ao sistema. E essa função
80
estabilizadora começa pela infância. Desde criança os indivíduos dos países capitalistas
estão absorvendo inconscientemente e assimilando em menor ou maior grau as bases
ideológicas que se transmitem de maneira incessante pela escola, dia em geral, pela
indústria cultural de massas e pelas políticas públicas de lazer pensadas pelos Estados
capitalistas.
Admite-se, portanto, que definir um projeto cultural e educativo para as
massas, como um dos pilares das políticas públicas de lazer no contexto de crise
profunda e estrutural do capital significa, em última instância, defender também a
possibilidade de resgatar ontologicamente práticas que possam, de um lado, contribuir
efetivamente para o desenvolvimento da consciência crítica e, de outro, constituir
formas efetivas de resistência que neutralizem processos negativos de massificação
cultural, na perspectiva da superação da cultura “de” massas (ESCOBAR, 1997) para
construção, tanto técnica quanto teórica, de uma nova concepção: a de “cultura para as
massas” (SIQUEIRA, 1992). Mao Tsé-Tung, (2003, p. 147), dizia muito tempo
atrás que “a existência social dos homens determina o seu pensamento. Uma vez
dominadas pelas massas, as idéias corretas que caracterizam a classe avançada tornam-
se uma força material, capaz de transformar a sociedade e o mundo”
Como conceito indispensável dentro das políticas públicas que objetivam
promover socialmente demandas no campo do lazer, deve ser construído o de
Condições Materiais Objetivas para a Prática do Lazer. Categoria fundamental para a
sobrevivência e sucesso do setor, onde se agrupam as questões relacionadas às
instalações físicas, materiais e implementos, bem como aquelas que dizem respeito à
recuperação e crescimento das condições materiais objetivas diretamente vinculadas ao
incremento da prática de atividades massivas de lazer.
81
No estudo dessas condições, fez-se necessária a análise de outros aspectos
da região, como os de: a) adequação do modelo e da infra-estrutura física e
administrativa de esporte e lazer às necessidades da população; b) manutenção de um
diagnóstico permanentemente atualizado com relação à infra-estrutura para prática de
atividades de lazer na região; c) implantação de equipamentos e instalações para estas
atividades, especialmente nos municípios selecionados, com carência deste tipo de
empreendimento e investimentos; e d) implementação da prática de atividades físicas e
recreativas para todos os setores da população, considerando que, após a promulgação
da Lei Pelé, passou a ser obrigação dos Estados, Distrito Federal e dos Municípios
fixarem, respectivamente, normas de organização e funcionamento das políticas
públicas de esporte e lazer.
Entretanto, apesar de serem identificadas demandas, instalações, recursos
financeiros, materiais, técnicos e força de trabalho nesse campo, uma enorme
diversidade recursos naturais, configurando-se em reconhecido fator favorável à prática
social de lazer e de diferentes manifestações da cultura corporal no campo do turismo e
dos esportes de aventura observou-se que não preocupação com a necessidade de
uma estrutura adequada ao usufruto dessas práticas na região.
A Constituição do Estado do Ceará (1989, p. 176) afirma, verbis: “É dever
do Estado fomentar e apoiar práticas desportivas formais e não formais, em suas
diversas manifestações, educação física, desporto, lazer e recreação, como direito de
todos” (Art. 238), obrigando-se, inclusive, a criar e manter instalações esportivas e
recreativas para as populações (Art. 239).
Em que pese tal legalidade, no Ceará, não existem políticas voltadas para a
recuperação, reforma, e construções de novas instalações enquanto elementos
fundamentais para o desenvolvimento do lazer público. Contrariamente, o espaço é
82
manipulado para aprofundar as diferenças sociais entre as classes: o espaço que une e
separa os homens, porque seus construtores não se desvinculam da ideologia dominante
quando o concebem (SANTOS, 1982). Os equipamentos e instalações esportivas e de
lazer existentes nas grandes cidades do Estado, ou são de domínio privado e atendem a
interesses das classes sociais mais favorecidas, ou são construções para perpetuar o
nome de administradores - marcos de passagem pelo poder ou, ainda, formas de
garantir a manutenção desse poder. Geralmente, são modelos de construção submetidos
a regras que procuram, no modo de produção e nas relações de classes, as suas
possibilidades atuais.
Para finalizar esta categoria, é preciso ressaltar que mais que a garantia do
espaço e do tempo para a prática do lazer, as condições materiais objetivas para a sua
prática jamais devem ser tomadas como benesse patronal, mas como conquista da luta
dos trabalhadores.
O desdobramento analítico da categoria anterior exigiu o reconhecimento
de que no processo de formulação de políticas públicas sociais - também aquelas
voltadas para o incremento do lazer é basilar o estabelecimento das fontes de
financiamento que assegurem os recursos orçamentários para tais projetos e garantam as
condições materiais objetivas para sua efetivação.
A contradição entre capital versus trabalho se expressa nesta categoria à
medida que não se constitui prioridade do Estado o financiamento da promoção do lazer
para o escravo assalariado por conta do “alto custo do processo transformador”.
Sendo assim, sua presença tem um peso fundamental no desenvolvimento
de qualquer política pública social, requerendo-se atenção especial ao esquema de
financiamento, uma vez que dele dependem a implantação, implementação dos
programas e ações planejadas.
83
É importante identificar as formas de financiamento e a possibilidade
efetiva de funcionamento com equilíbrio suficiente para prover a prática de lazer em
todas as suas dimensões para as massas operárias desprovidas de condições de acesso
aos direitos fundamentais e satisfação das necessidades humanas básicas. Portanto,
deve-se observar se a política para o setor, delineada para o município, “[...] consegue
prover o lazer com equidade, se o financiamento contempla os segmentos
historicamente marginalizados pelo gênero, etnia, idade ou por necessidades especiais e
deficiências” (BRASIL, 2005, p. 10).
Do ponto de vista deste trabalho, alguns elementos devem ser priorizados
pelos gestores municipais no processo de viabilização da captação e controle de
recursos para sustentação financeira das políticas públicas, a saber: a) viabilizar a
obtenção de recursos que possibilitem o desenvolvimento de atividades de lazer
efetivamente populares; b) promover e coordenar a obtenção de recursos nacionais e
internacionais para o financiamento de planos e programas relativos ao
desenvolvimento do setor na perspectiva da classe trabalhadora; c) identificar, cadastrar
e manter contatos sistemáticos com organismos e instituições de âmbito nacional ou
internacional, sem fins lucrativos, que possam induzir ou viabilizar a captação de
recursos; d) controle público de aplicação de recursos em programas, projetos e
atividades, tendo em vista a elaboração definitiva de política de desenvolvimento do
lazer para a Região do Cariri cearense, particularmente, na área de conurbação
investigada.
Conforme anunciado um pouco antes, é de bom alvitre lembrar que não
constitui prioridade para o Estado burguês financiar propostas revolucionárias, ainda
que desejáveis e necessárias à maioria da população, pois o processo transformador
delas decorrente poderia acarretar custos incalculáveis, conseqüências ou seqüelas
84
inaceitáveis dos diversos tipos, pondo em perigo a preciosa e “estável” realidade
capitalista (CARVALHO, 2006).
Vê-se a Participação Popular como outra categoria teórica fundamental e
indispensável à construção de políticas públicas de lazer numa perspectiva dialética.
Participação popular que deve traduzir, em última instância, afirmação de uma possível,
histórica e necessária cultura revolucionária de participação, para possibilitar à classe
operária o aumento do poder de decisão, controle e gestão das políticas públicas de
lazer, arrancados na luta de classes, não obstante o reconhecimento de que o Estado
opressor dificulta os níveis de participação do povo.
Participação das massas no planejamento e na realização de programas,
projetos e ações na área, tendo em vista que a afirmação de uma nova cultura deve
afirmar-se, também, pelo acesso das massas ao campo da produção cultural da
sociedade no sentido mais abrangente. Nesse sentido, buscou-se o conceito explicativo
de ações como as de promoção de eventos de lazer voltados aos anseios e necessidades
da comunidade operária regional, valorizando especialmente o envolvimento de todos
os segmentos sociais dos municípios demandantes na organização, planejamento e
participação em atividades de lazer; na promoção de programas e ações que envolvam o
maior número de pessoas da comunidade; na implementação de ações de lazer
construídas com a participação da classe trabalhadora, através de uma gestão
participativa e controle social; e na democratização do acesso das massas aos bens e
serviços na área de lazer, com implantação de programas e projetos que garantam a
melhoria da qualidade de vida da classe operária da região. Esse controle, no entanto,
deve ser realizado de forma organizada, com a participação das entidades
representativas dos interesses das massas trabalhadoras (e desempregadas) da sociedade
civil organizada.
85
Elegendo a questão do incentivo à criação de uma cultura de participação
das massas na decisão e definição das ações e na formulação dos ordenamentos legais
como ponto de partida e de chegada das políticas setoriais que objetivam proporcionar o
desenvolvimento social em toda a Região do Cariri cearense, reconhece-se que o
“orçamento participativo” pode se configurar em instrumento político das classes menos
favorecidas para discussão de questões relacionadas à utilização e posse do espaço
urbano, do investimento e distribuição racional de recursos disponíveis para as políticas
públicas, impulsionando um processo de crescimento e fortalecimento político das
massas organizadas, “[...] no sentido de efetivamente democratizar as relações na
cidade, instalando o controle social na esfera pública, consolidando a participação
popular” (GUTTERRES & RODRIGUES, 1996, p. 73).
Considera-se que uma política social de perfil dialético, dificilmente poderá
se materializar sem a instalação de um processo gradual de ampliação do poder dos
segmentos da sociedade mobilizados como demandantes de tais políticas, ou sem a
consolidação de canais de representação desses interesses no interior do Estado e
Municípios. Linhales (1997, p. 382), informa que estas são, indubitavelmente,
alternativas viáveis e necessárias ao processo de construção do lazer como um direito e
como política social, muito embora não sejam poucos os discursos que tentam passar a
idéia de que a “participação popular” tem sido proposta por parte dos órgãos
governamentais da sociedade. Em trabalho publicado num dos principais periódicos da
área, Gohn (2000, p.15), afirma que “[...] as políticas públicas têm enfocado a
participação dos cidadãos em questões relativas a bens e serviços”. É importante ficar
alerta a certas generalizações, vez que essas abordagens acabam por mascarar os
conflitos de classe, especialmente nas formas de elaboração dos diagnósticos e nas
formas de consideração e explicação dos dados da realidade. É preciso banir o discurso
86
que coloca o Estado como incentivador de tais ações, “[...] mesmo porque a análise
marxista do Estado nos propicia o conhecimento de que ‘ele’, representado pelo
governo, é um mecanismo de defesa e guarda necessário ao continuar da supremacia
econômica e espiritual de uma classe sobre a outra” (CARVALHO, 1999, p. 9).
Reflexões dessa natureza indicam que uma das características das políticas públicas de
lazer hegemônicas é a de se fazer pensar que, efetivamente, incentivam e criam canais
para a participação popular na definição, no planejamento, na realização de programas,
projetos e ações desenvolvidas no setor.
Mas, é preciso ressaltar que para efetivação de uma gestão de caráter
“democrático”, é de fundamental importância a construção de uma política de relação e
articulação entre os diversos setores afins ao lazer - educação, cultura, desenvolvimento
econômico, saúde e outros e a realização de planejamento estratégicos e participativos
que partam do princípio da intersetorialidade, construídos com base nos interesses
históricos e imediatos da classe trabalhadora.
A questão da comunicação e informação dos serviços de lazer à classe
operária é o conteúdo da última categoria analisada, denominada de Informação Social,
cuja definição fora construída com o apoio dos pesquisadores cubanos à época da visita
do autor desta dissertação àquele país. Ela diz respeito às possibilidades de massificação
da informação das atividades de lazer e a veiculação de conteúdo crítico com vistas à
educação política dos trabalhadores e à edificação da consciência comunista.
A utilização da comunicação social como informação de massa, como
forma de manipular, de criar e moldar modos de vida, de pensamento, de sentimentos,
de acordo com os fatos, é muito antiga. Parece particularmente adequado, para a
abordagem do tema, lembrar Marx (1998b), notadamente quando ele postulava que as
idéias dominantes no mundo são sempre as idéias da classe dominante porque esta
87
possui o poder espiritual e material. É muito claro que essa classe ou fração de classe
sempre utiliza mil maneiras possíveis à generalidade dos meios de comunicação social
com função ordenadora de uma lógica de reprodução e ampliação do capital, com uma
carga muito acentuada de elementos facilitadores de alienação dos trabalhadores.
Como não é função exclusiva dessa classe a utilização desses meios,
entende-se que o papel dos meios de informação social para o êxito das políticas
públicas de lazer também será o de informar as massas, combatendo a desigualdade de
acesso e à exclusão social, na perspectiva de inculcar uma nova consciência política que
contribua para o desenvolvimento pleno das pessoas da região do cariri cearense, no
sentido de uma nova cultura de lazer para as massas.
Esta categoria apresenta, pois, algumas reflexões a respeito da questão
informação social, destacando a sua importância para o sucesso da gestão e usufruto das
ações de lazer por parte da classe operária. Razão pela qual o presente estudo considera
de relevância basilar para o desenvolvimento positivo das políticas públicas o devido
reconhecimento do princípio da publicidade orientada enquanto marco orientador do
trabalho de mobilização das massas, uma vez que atinge um maior número de pessoas
com mensagens e motivações.
Afirma-se ser a circulação de informações, condição essencial para registro
e divulgação das diversas iniciativas nessa área, inclusive constituindo-se em fator de
impedimento da invasão cultural de modelos estrangeiros de usufruto de atividades
desenvolvidas no tempo livre.
Diferentes meios de comunicação social de massa podem ser utilizados
pelo setor de lazer das prefeituras, indo desde o jornal, revistas, panfletos, rádios, entre
outros. O extraordinário avanço das tecnologias da informação também pode se
constituir num poderoso instrumento para o exercício da aprendizagem política de
88
participação, expandindo e fortalecendo as oportunidades de participação nos programas
e ações de lazer apontando caminhos possíveis para que a comunidade caririense possa
revolucionar a si própria como coletividade. Nesse contexto, a informação social é
apresentada como peça de apoio e, ao mesmo tempo, alavanca dos processos sociais na
área do lazer. Por esta forma, entende-se que o incremento de políticas públicas sociais
não pode mais ser realizado independentemente das novas tecnologias de difusão e de
transmissão da informação, possibilitando, inclusive, a educação política da classe
trabalhadora como arma indispensável ao desenvolvimento da sociedade socialista,
direcionada à edificação da consciência comunista.
O desenvolvimento das categorias sinteticamente analisadas permite aferir
que a construção de políticas públicas de lazer que efetivamente visem contribuir para o
incremento da autonomia e da liberdade das massas no Cariri cearense não pode
desconsiderar os elementos teóricos fundamentais como os aqui, dialeticamente,
arrolados.
89
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“O trabalhador se sente à vontade no seu tempo
de folga, porque o seu trabalho não é voluntário, é
imposto, é trabalho forçado” ( MARX, 2003, p. 114).
Para Siqueira (1992), o debate teórico-metodológico sobre as políticas
públicas lazer numa perspectiva dialética é ainda recente no meio intelectual científico e
na sociedade brasileira, exigindo uma relativa concentração de esforços no campo
teórico.
Pela análise da investigação crítica das concepções relativas ao lazer, no
contexto dos sistemas sócio-econômicos existentes no mundo contemporâneo
elaboradas por Sánchez & Colaboradores (1997), viu-se que o lazer enquanto prática
social concreta desenvolvida no tempo não diretamente ligado ao processo produtivo,
em sua multiciplicidade de formas culturais, artísticas, recreativas e esportivas, deveria
90
ser compreendido para além da função reprodutora; mas, sobretudo como um
instrumento capaz de, de no exercício de suas formas objetivas, contribuir para a
elevação do nível de conhecimento e participação daqueles para quem está voltado.
Sendo assim, que se revisar a compreensão reduzida do lazer apenas
como elemento de ocupação do tempo livre e de recuperação psicossomática dos
trabalhadores, bem como a utilização despotilizada e acrítica de instrumentos, técnicas e
métodos, ou seja, uma vivência dos conteúdos do lazer sem a sua necessária vinculação
aos valores sócio-culturais da comunidade, em seus vários níveis (SIQUEIRA, 1992).
Com efeito, o conceito lazer adotado, sob o ponto de vista sócio-cultural,
orienta-se pelos pressupostos apresentados por Marx com relação ao tempo livre,
através dos intérpretes selecionados nesta pesquisa, respeitadas aqui as diferenças
conceituais entre ambos, mas que propõem uma compreensão de lazer que considere a
redução da jornada de trabalho e a valorização do não-trabalho, defendendo que a
sociedade comunista deverá se organizar não mais em torno do trabalho, mas em torno
da preguiça e do supérfluo. Trabalhar sim! Mas apenas entre três e quatro horas por dia,
menos horas dedicadas ao trabalho e mais horas destinadas à preguiça, ao supérfluo, ao
mandriar.
Nesse sentido, o conceito de lazer deve ser entendido como tempo
indispensável à plena humanização dos trabalhadores e camponeses pobres, visto que
apenas no comunismo o trabalhador incorpora o mandriar e o “rega-bofecomo toque
final do seu livre desenvolvimento e do livre desenvolvimento de todos (CARVALHO,
2006, 13-4).
Sumarizando seu caráter epistemológico, Siqueira (1992) observa que a
relação com o trabalho, a sua presença ao longo da história da humanidade, o caráter de
classe e a influência que o Estado capitalista contemporâneo pode apresentar, colocam-
91
se teoricamente como os principais elementos definidores do lazer, reconhecidamente
indispensáveis ao planejamento, elaboração e execução das políticas públicas na área.
No tocante à questão da crise estrutural do capital e suas relações com as
políticas “públicas” (ou estatais?), Mészáros (2003) deixa bem clara a existência hoje de
uma crise profunda que afeta as estruturas sociais e de poder, ainda que se leve em
consideração as claras diferenças nacionais. Nunca como hoje, ressalta ele, foi tão
poderoso o controle dos países imperialistas sobre o mundo, mas nunca, também, como
hoje, foi tão incerto e perigoso o futuro da civilização. A aceleração inflacionária, a
desorganização do sistema financeiro internacional, as elevadas taxas de desemprego
tem imposto reordenamentos econômicos de grande significado e tem trazido consigo
profundas alterações tecnológicas, assim como redefinições dos papéis e ações das
instituições sociais e políticas em todo mundo.
Por isso que, na análise de Mészáros, a crise do capital que atualmente se
experimenta é, fundamentalmente uma crise estrutural e não mais crises cíclicas que
nem no passado, facilmente dribladas pelo sistema do capital. E não nada especial
em associar-se capital e crise. Pelo contrário, crises de intensidade e duração variadas
são o modo natural de existência do capital: fazem parte de sua “normalidade”, o
maneiras de progredir para além de suas barreiras imediatas e, desse modo, estender
com dinamismo cruel sua esfera de operação e dominação. Mészáros lembra bem que a
última coisa que o capital poderia desejar seria uma superação permanente de todas as
crises, mesmo que seus ideólogos e propagandistas freqüentemente sonhem com (ou
ainda, reivindiquem a realização de) exatamente isso.
Por esta forma, o capital não pode ter outro objetivo que não sua própria
auto-reprodução, à qual tudo, da natureza a todas as necessidades e aspirações humanas,
deve-se subordinar absolutamente. Quem acha que isso soa muito dramático, averigua
92
Mészáros, deveria olhar à sua volta, em todas as direções e se perguntar: “é possível
encontrar qualquer esfera de atividade ou qualquer conjunto de relações humanas não
afetadas pela crise” (MÉSZÁROS 2002, p. 800)?
Esta análise conjuntural da crise formulada por Mészáros revela a profunda
relação existente entre as aspirações de reformabilidade do capital e a implantação de
políticas públicas de lazer de caráter conservador e formal predominantes no Estado
brasileiro, o que leva a questionar repetidamente a existência de políticas públicas no
contexto do modo de produção capitalista consideradas, inequivocamente, suas
profundas contradições e limites. Ora, sendo as políticas públicas, políticas de Estado,
um Estado que representa os interesses do capital, como, então, considerar que estas
servem como instrumentos de desenvolvimento pleno, notadamente das massas
brasileiras?
É decisivo considerar que não como reformar, pouco a pouco o sistema
do capital, a partir de reformas e mediações políticas, pois não possibilidade de
“emancipação parcial e libertação gradual” no contexto da ordem do capital. Ou seja,
nem mesmo as políticas públicas estatais, portanto, capitalistas, do ponto de vista dos
elementos teóricos que privilegiam e nos moldes em que raramente são executadas -
sequer tocariam nas determinações causais do sistema e na sua ineliminável necessidade
de separação entre produção e controle.
Conforme afirma Tonet (2003, p. 203), “[...] a produção da desigualdade
social não é um defeito, mas algo que faz parte da natureza mais essencial desta matriz
geradora do capitalismo. O que, por sua vez, significa que é impossível construir, a
partir dela, uma autêntica comunidade humana, vale dizer, humanizar o capital”.
Neste sentido, Carvalho (1997, p. 80) alerta sobre as reais pretensões do
Estado burguês com as políticas públicas sociais na área do lazer, da educação física e
93
dos esportes, denominada como uma intervenção “branca” com o objetivo fundamental
de:
(1) enevoar o real com práticas desportivas distrativas e (2) impedir que o
operariado e seus aliados vejam com clareza o incremento da concentração
de riqueza num menor número de mãos, al pari com exacerbação num maior
número de lares e a fome drasticamente exercendo-se sobre milhões de
corpos.
Isso prova que as políticas ditas públicas ou sociais são na realidade uma
forma disfarçada de manter a mesma política voltada para os grandes empresários e
banqueiros. Na verdade, tais políticas apenas garantem os interesses capitalistas da
forma mais maquiada possível.
Na Região do Cariri cearense, a ausência de políticas públicas ou sociais,
como referência ao processo de desenvolvimento da sociedade, gera o mau uso de
recursos públicos e privados (pela falta de priorização) e a inoperância e
subdesenvolvimento da área (pela falta de direcionamento de suas ações políticas e
práticas) de quem dirige a coisa pública.
De igual modo, e ainda considerando o real papel das políticas sociais
reivindicado neste estudo, é possível concluir que a ausência de metas, programas e
projetos sistemáticos por parte do poder público municipal das cidades selecionadas têm
tornado problemática a satisfação das necessidades de lazer da classe operária carentes
da região e a participação destas nos processos e decisões políticas.
Tal como acontece nas sociedades de classes, na Região do Cariri cearense
as oportunidades e alternativas de práticas do lazer são maiores para a burguesia, porque
sua possibilidade de adequação ao trabalho é mais acentuada, pois essa classe dispõe de
mais tempo livre e suas condições sócio-econômicas permitem a prática de diferentes
94
tipos de atividades distrativas. para os trabalhadores, “aqueles que vivem do
trabalho”, quando empregados, existem limitações na esfera das necessidades básicas
humanas que impedem o desenvolvimento das poucas opções de lazer que lhes restam,
haja vista que: a) geralmente dispõem de pouco tempo livre, resultado da longa jornada
de trabalho (quando a jornada de trabalho é reduzida diminui também a sua
remuneração); b) não possuem condições favoráveis para o acesso de práticas de lazer
privado, nem tampouco a possibilidade de optar dentre as variedades disponíveis.
Motivo pelo qual, tanto as condições sócio-econômicas, quanto o tempo livre (este
último marcado pela não redução da jornada de trabalho), influenciam no
desenvolvimento do lazer.
Estas constatações contribuem para inferir que não há, ainda, na Região do
Cariri preocupação da parte da população, nem do poder público municipal, com vistas
ao desenvolvimento de uma cultura de consumo e usufruto dos bens do lazer, diferente
da hegemônica, incentivada, inclusive, pelos meios de comunicação de massa. Uma
nova cultura para as massas, de inspiração socialista e bases materialistas, que permita a
formação de uma consciência crítica a partir da apreensão de idéias e valores que
preservem a memória nacional, incentivem as formas de expressão popular, estimulem a
capacidade criativa – individual e coletiva – e promovam o acesso das massas ao campo
da produção cultural da sociedade. E tudo isso é possível se forem resolvidos os
pólos da contradição existente entre capital e trabalho.
Esta pesquisa, ainda que teórica, admite ser imprescindível a consideração à
questão das condições materiais objetivas para viabilização das políticas públicas para o
desenvolvimento do lazer, alertando para a necessidade da viabilização de meios
concretos para a recuperação ou adaptação das áreas livres de lazer das cidades de
Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha e toda região, em cooperação com a comunidade e
95
os governos locais, reforma e construção de instalações, inclusive democratizando o
acesso ao uso dos serviços de lazer, criando espaços e equipamentos
utilizando material
de baixo custo que atenda às necessidades lúdicas, artísticas, físico-esportivas e
intelectuais da população, especialmente àquela formada por crianças e adolescentes,
ampliando e melhorando o nível de participação popular, não só nas práticas corporais e
esportivas, mas na apropriação do significado destas manifestações culturais com vistas
ao desenvolvimento social.
Quanto à questão do financiamento, observa-se que as poucas ações de
lazer comunitário da região, não se constituem prioridade no orçamento dos municípios
estudados. Não há investimento no setor, tampouco estratégia para captação de recursos,
carecendo de vontade política e participação popular que alavanque a alocação de
recursos financeiros para o setor.
A participação das massas no âmbito da formulação de políticas públicas de
lazer é uma forma de partilhar responsabilidades no estabelecimento de prioridades para
o setor nas esferas públicas de poder. Porém, para se consolidar é fundamental a
constituição de espaços específicos de debate na cidade e no campo, a fim de qualificar
as políticas públicas, para melhor avaliá-las e fiscalizá-las. O Estado capitalista não tem
interesse na consolidação de reivindicações populares. Isto tem que ser arrancado à
força, pela luta política organizada da classe trabalhadora.
Neste trabalho verificou-se que os parcos meios de comunicação de massa,
à disposição do poder público municipal da região podem vir a converter-se no principal
instrumento de propaganda social, contribuindo para a eficiência do planejamento e
socialização da informação sobre os programas e ações no campo do lazer para o maior
número de pessoas. Por isso, este estudo sugere que seja dada atenção especial ao
aspecto da divulgação dos serviços oferecidos pelo poder público municipal, na área de
96
conurbação investigada, ampliando as oportunidades e o índice de participação das
massas nas atividades de lazer.
Viu-se, ainda, que as massas desprivilegiadas, no caso particular dessa
região, têm ou tiveram suas oportunidades reduzidas quanto à utilização do lazer, ao
contrário das mais ricas dessa região, que conseguem vivenciá-lo satisfatoriamente
graças ao fato de serem detentoras do capital.
A consideração das categorias e princípios norteadores arrolados no
Capítulo III deste trabalho é, então, condição fundamental para o desenvolvimento
social na área de lazer, devendo se constituir em elementos balizadores da reflexão dos
setores responsáveis pelo seu fomento de metas, programas, ações e atividades do setor
na Região do Cariri cearense.
A idéia inicial foi reunir considerações sobre cada uma delas, buscando
fundamentar, no plano geral, a discussão sobre a necessidade de (re)construção do
modelo atual de fomento ao lazer, reconhecendo os graves problemas que impedem o
desenvolvimento das práticas de lazer na região, traduzidas na luta de classes.
Não obstante seu caráter eventual, focalizado e compensatório, as poucas
ações no campo do lazer nesta região baseiam-se numa dimensão utilitária, em
detrimento de uma política pública de longo prazo para o setor ou a priorização de
programas sistemáticos mais freqüentes e diferenciados, não obstante a existência de
órgãos da administração pública, voltados para o incremento de atividades nessa área,
inclusive, com estrutura de funcionamento e lotação de profissionais habilitados.
Observa-se que, de um lado, tem predominado uma política de
hierarquização de práticas de lazer sob a ótica dos governos municipais locais e não da
realidade concreta
11
, de caráter marcadamente assistencialista e compensatório -
11
As “manifestações de cunho popular”, aquelas manifestações de esporte e lazer forjadas pelo povo e
que emergem da prática social dos trabalhadores e das camadas populares menos favorecidas
97
destacando que as mesmas ficam restritas não às necessidades sociais, mas na
manutenção do poder político - e, do outro, a falta de sistematização, a partir de
discussões e de experiências concretas advindas de políticas públicas inovadoras nessa
área.
Ressalta-se ainda um relevante paradoxo na região, traduzido no fato de
que, apesar da instalação de grandes empresas nacionais - e até franquias multinacionais
- e do crescimento econômico observado nos setores primário, secundário e terciário,
não existe no Cariri cearense a preocupação com a formulação de políticas públicas para
o desenvolvimento do lazer como forma de promoção social, o que reforça o
estabelecimento da hipótese de trabalho desta pesquisa. Isto reforça que a tese da
indissociabilidade entre desenvolvimento econômico e social para o progresso de uma
região, apresentada por Wallerstein (1999) em suas análises sobre reestruturação
capitalista e o sistema-mundo, apresenta-se como atual e irrefutável, uma vez que
afirma a impossibilidade do desenvolvimento de uma região ou país no seio de uma
economia polarizadora, marcada pela relação capital e trabalho. Ao mesmo tempo, serve
também para denunciar a inconsistência da afirmação de que a Região do Cariri
apresenta-se “em desenvolvimento", sem serem explicitadas nem consideradas as
estruturas, relações, contradições e tendências do modo de produção capitalista que, em
última análise, determinam o econômico, o político, o social e o educacional de toda
uma região ou país. Considerações que ratificam a hipótese segundo a qual o insucesso
das políticas públicas tem sido determinado pela divisão da sociedade atual em classes e
pela apropriação da propriedade privada, principal característica do sistema capitalista.
Se o lazer for aceito como fenômeno sócio-cultural é necessário também,
antes de qualquer coisa, reconhecê-lo como direito inalienável de todos os caririenses,
(GHIRALDELLI JÚNIOR, 1992, p. 33-4) não são priorizadas nas ínfimas ações oferecidas pelo poder
público regional.
98
questionando o seu domínio e acesso por apenas uma determinada classe social e
defendendo a sua apropriação pelas grandes massas. A rigor, significa afirmar a
imprescindibilidade de se evitar que as poucas práticas lazer da região continuem a ser
utilizadas como veículos de reprodução dos valores dominantes, senão como
instrumentos de crescimento humano das massas, na perspectiva de construção de uma
sociedade verdadeiramente socialista.
Esta deve ser a referência essencial para a formulação de políticas públicas
para o setor, num horizonte dialético, garantindo a universalização do lazer como direito
de cada um e dever do Estado opressor, promovendo a democratização da gestão e da
participação no lazer, não obstante a existência de uma correspondência direta entre a
crise estrutural do capital e as famigeradas políticas de proteção social promovidas pelo
neoliberalismo. Porque, como dito antes, não existem políticas públicas, políticas para o
povo, mas políticas estatais, encomendadas pelo especulativo capital financeiro
internacional e implementadas pelo Estado neoliberal para ludibriar o povo com as
palavras: igualdade, cidadania e liberdade.
No lastro dessas reflexões, toma-se como certo a necessidade de enfocar a
questão da avaliação das políticas públicas de lazer de cunho social, as quais devem ser
avaliadas para identificar experiências importantes que balizam a construção de tais
ordenamentos, inclusive para apontar novos elementos que devem ser incorporados, ou
outros que devem ser revistos e reconsiderados (BRASIL, 2005).
Mesmo aceitando o lazer como elemento importante para formação da
personalidade e a pressuposição da sua prática pela sociedade civil organizada
caririense para construção de uma política efetivamente pública que segmento aos
anseios e necessidades da totalidade social nessa região, à guisa de conclusão
provisória, dá-se como certo que na atual sociedade capitalista periférica, dependente, e
99
cada vez mais excludente, o discurso oficial sobre lazer para todos não vai além de puro
silogismo, não ultrapassando a fronteira da falácia.
Destarte, a compreensão do entendimento de lazer não pode dar-se fora do
marco do modo de produção capitalista, porque no capitalismo, o trabalho está
subordinado ao propósito de reproduzir e expandir o domínio material e intelectual da
burguesia. Isto porque, assinala Carvalho (2006, p. 10), baseado em Marx “[...] na
sociedade capitalista, hoje como ontem, tempo livre para uma classe, a classe
ociosa, enquanto que para a outra classe, a classe operária, sua vida inteira é
transformada em tempo de trabalho”.
Nem por isso, este trabalho deixará de apontar caminhos que levem à
construção de uma política pública no setor para as massas caririenses. E um dos
pressupostos deste audacioso processo deve dar-se, sem dúvida, através de discussão e
reflexão crítica e aberta sobre as possibilidades do lazer, não pelos poderes públicos
municipais constituídos, mas, sobretudo pela massa de intelectuais do ensino superior
da região.
Daí o objetivo desta pesquisa quanto à proposição e provocação do debate
sobre os rumos que o lazer deveria seguir na Região do Cariri, na perspectiva de
fornecer subsídios teóricos indicativos para formulação de políticas públicas de lazer
para os municípios do CRAJUBAR Crato, Juazeiro e Barbalha mesmo perante as
contradições fundamentais do sistema capitalista, em crise estrutural, entabulando, por
conseguinte, um contra-discurso ao ridículo doutrinário da classe dominante no tocante
ao lazer.
Ainda que tenha um caráter reprodutivista das relações sociais
ontologicamente estabelecidas, o lazer constitui-se, no modo de ver deste trabalho, num
bem sócio-cultural que deve ser estendido, disseminado, e apreendido também como
100
patrimônio da classe operária e não apenas da classe opressora. A formação de uma
cultura do tempo livre, a criação, nas massas, da capacidade de desfrutar plena e
diversificadamente das alternativas que a sociedade oferece, insere-se entre as
preocupações deste estudo.
Tendo como marco inicial para reorientação da estrutura administrativa de
políticas públicas de lazer, numa perspectiva progressista, os elementos propostos no
ANEXO I, traduzidos em programas sociais ampliados, com a participação comunitária
no campo da cultura lazer, do esporte, do meio ambiente, artes, etc., conclui-se,
finalmente, ser possível entabular propostas revolucionárias, materializadas aqui na
proposição de categorias que possibilitam o acesso ilimitado da classe operária à cultura
de lazer produzida e acumulada historicamente pela humanidade, apresentando
contribuições para uma ação concreta na realidade estudada, ainda que profunda e
ontologicamente marcada pelas relações de produção e exploração capitalista.
101
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106
107
AN E X O
108
ELEMENTOS PARA REORIENTAÇÃO DA ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A REGIÃO DO
CARIRI CEARENSE NA ÁREA DE ESPORTE E LAZER NUMA PERSPECTIVA PROGRESS
ÁREA DE
CONCENTRAÇÃO
PÚBLICO ALVO OBJETIVOS
PRIORITÁRIOS
EDUCAÇÃO DA
CULTURA CORPORAL
CRIANÇAS EM IDADE
PRÉ-ESCOLAR E
ESCOLAR
INICIAÇÃO AO
DESENVOLVIMENTO
DA CULTURA
CORPORAL
ESPORTIVA
PROGRAMAS PERMANENTES NA
NOS EQUIPAMENTOS DISPONÍVEIS NA
ÁREA;
PROGRAMAS INTEGRADOS COM A REDE
ESCOLAR PÚBLICA;
PROGRAMAS INTEGRADOS COM OUTRAS
ÁREAS SOCIAIS (cultura, saúde, meio ambiente,
etc). Exemplo: Criação de Centros de Convivência
Integrados.
EDUCAÇÃO
CORPORAL
ESPORTIVA
CRIANÇAS E
ADOLESCENTES EM
GERAL
INICIAÇÃO AO
TRABALHO
ESPORTIVO
ESCOLA DE ESPORTE;
TREINAMENTO INTEGRADO BÁSICO
PARTICIPAÇÃO
COMUNITÁRIA
POPULAÇÃO EM
GERAL
1. RECREACIONAIS
2. EDUCATIVOS
3. CULTURAIS
4. ARTÍSTICOS
PROGRAMAS PERMANENTES (recreacionais
educativos, artísticos e culturais);
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