A ação e o discurso são circundados pela teia de atos e palavras de outros
homens. Pelo fato de que se movimenta sempre “entre” e “em relação a outros seres
atuantes” (ARENDT, 2001, p. 203), os homens agem e recebem influência das ações
alheias. A ação atua sobre os que também são capazes de agir, e a reação, mesmo sendo
uma resposta, é sempre uma nova ação com poder próprio de atingir e afetar os outros.
Para Arendt (2001), o menor dos atos, nas circunstâncias mais limitadas, se converte em
reação em cadeia, pois basta um ato ou uma palavra para mudar todo um conjunto.
A ação e o discurso ocorrem entre os homens, na medida em que a eles são
dirigidos e, através dos discursos, os homens se revelam e demonstram suas concepções
e interesses. Esses interesses movem os homens em suas ações e por isso mesmo,
constituem o elemento que os relaciona e interliga. Segundo Arendt (2001), ação e
discurso referem-se à mediação dos diversos grupos sociais, sendo que as palavras e
atos, além de revelar quem fala e age, referem-se a alguma realidade mundana e
objetiva.
Como esta revelação do sujeito é parte integrante de todo intercurso, até
mesmo do mais objetivo, a mediação física e mundana, juntamente com os
seus interesses, é revestida, por assim dizer, sobrelevada por outra mediação
inteiramente diferente, constituída de atos e palavras, cuja origem se deve
unicamente ao fato de que os homens agem e falam diretamente uns com os
outros. Esta segunda mediação subjetiva não é tangível, pois não há objetos
tangíveis em que se possa materializar: o processo de agir e falar não produz
esse tipo de resultado. Mas, a despeito de toda a sua intangibilidade, esta
mediação é tão real quanto o mundo das coisas (ARENDT, 2001, p.195).
A ação, que define o homem como ser político, ou o livre-agir político, como
prefere Sodré (2006), é respaldado pela ética
12
(SODRÉ, 2006). A ética, nesse caso,
refere-se à reflexão sobre a relação entre indivíduo e comunidade, relacionada à
organização que visa o bem comum. Enquanto a ética antiga
13
diz respeito às virtudes
nos modos humanos, a política diz respeito ao governo da polis, ou seja, o controle e a
participação dos cidadãos nos meios cabíveis com o propósito de atingir o bem comum.
12
“Por um lado, a ética consiste em estratégias normativas, para o controle e o ajustamento do agir à
idealidade da polis; por outro, num nível muito mais complexo, em sinalizações para o limite (a morte)
inerente a toda forma de poder já construída e cristalizada. É que, no agir, no comandar uma ação
essencial (arkhein, em grego; agere, em latim), capaz de dar vida a uma nova forma, está a liberdade do
grupo” (SODRÉ, 2006, p.133).
13
Sodré discute a ética a partir do sentido grego (“vinculada ao desejo ancestral de equilíbrio
comunitário”) (2006, p.132), passando pela concepção ética moderna, relacionada a deontologia,
confundindo-se com a moral, até a ética relacionada ao universal, uma vez que trata de questões
relacionadas ao bem e ao mal, ao justo e ao injusto, “mistérios a ser sondados por todos os agrupamentos
humanos”. Mas, segundo esse autor, mesmo com todas as mudanças no conceito, a ética está sempre
relacionada à idéia de organização para o bem comum.