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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO
Maria Almerinda de Souza Matos
Cidadania, Diversidade e Educação Inclusiva: um diálogo entre a teoria e a
prática na rede pública municipal de Manaus.
Porto Alegre
2008
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MARIA ALMERINDA DE SOUZA MATOS
Cidadania, Diversidade e Educação Inclusiva: um diálogo entre a teoria e a
prática na rede pública municipal de Manaus.
Tese de Doutorado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Educação da Faculdade
de Educação da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, como requisito parcial para
obtenção do título de Doutora em Educação.
Orientadora:
Profª Drª Nalú Farenzena
Porto Alegre-RS
2008
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MARIA ALMERINDA DE SOUZA MATOS
Cidadania, Diversidade e Educação Inclusiva: um diálogo entre a
teoria e a prática na rede pública municipal de Manaus.
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Faculdade de Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como para
obtenção do título de Doutora em Educação.
Aprovada em ____ de _________ de 2008
__________________________________________________________
Profª. Drª. Nalú Farenzena - Orientadora
Prof. Drª Arminda Rachel Botelho Mourão
Prof. Drª Esther S. W. Beyer
Prof. Drª Malvina do Amaral Dorneles
Prof. Drª Maria Alcione Munhóz
Em memória:
Ao Prof. Dr.Hugo Otto Beyer, talvez eu não tenha dimensão da perda. Foi
tão surpreendente que não chegou ao meu entendimento. Ele será meu
eterno mestre na vida e na educação inclusiva. Ele deixou legado ético.
AGRADECIMENTOS
A Deus, em primeiro lugar fonte de todo amor e fortaleza, pelas nçãos
derramadas em minha vida, que sempre me amparou e se faz presença
constante.
A Ivone e Adão Figueira de Matos (in memorian) por me presentearem com a
vida.
A Priscilla Matos Lopes e Cassius Matos Lopes por conferir a ela o maior
sentido.
À minha orientadora Professora Dra. Nalú Farenzena, que participou da
banca de qualificação e aceitou trilhar comigo até o último momento dessa
jornada, pela atenção, competência, carinho e generosidade ao orientar
esse estudo.
À Diretora, Pedagogas, Coordenadoras, professores da escola pesquisada
e as Coordenadoras Pedagógicas dos Distritos Educacionais da SEMED,
pela contribuição significativa.
A Profª Drª Arminda Rachel Mourão, pela interlocução competente.
Às “pessoas especiais” com quem convivi por terem me proporcionado
aprender um pouco sobre a diversidade humana, apesar de todas as
dificuldades impostas pelas desigualdades sociais e pela opressão que
nos cercam, compreenderam o sentido da luta: o valor da transformação
da sociedade.
A Mariângela, Sônia e Aldicea, representando todos os amigos e, alunos, ex-
alunos do NEPPD que com afeto constrram o meu desejo de escrever e
colaboraram na realização desse estudo.
A Educadora Especial Rosimeri Rosa Frazzon, pelo afeto e amizade que nos
unem.
Ao amigo Emir, pelo incentivo e apoio no dia a dia.
A Josy-UFAM, pela formatação, organizão e pelo apoio e disponibilidade em
auxiliar no encaminhamento desse trabalho.
Aos colegas Marquezan e Francisco, que colaboraram para que o caminho
fosse menos árduo.
A minha amiga-ir de todas as horasOsmarina Guimaes Lima”.
A minha prima Gorete pelos momentos partilhados em Porto Alegre
A Kátia e Arielle pelo apoio continuado.
A essas pessoas e outras que ficaram no anominato, mas que de uma
maneira ou de outra concorreram para que o objetivo fosse alcançado, os
melhores agradecimentos
.
RESUMO
Esta pesquisa investiga como a Rede de Ensino Municipal de Manaus tem buscado
garantir a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos com necessidades
educacionais especiais, prevendo formas de acompanhamento do processo escolar
que respeitem as possibilidades de expressão do potencial dos mesmos à luz de
princípios que orientam a inclusão como uma temática que historicamente faz-se
fortemente presente e que vamos definindo através das práticas no cotidiano
escolar. A partir de uma dimensão dialética, pensamos uma educação inclusiva
como movimento histórico e na especificidade de Manaus. Conceitos centrais do
trabalho são os de cidadania, inclusão e exclusão e inclusão escolar; para sua
discussão apoiamo-nos em referências da literatura cientifica e da legislação e
normas brasileiras e internacionais. Não podemos falar em educação especial sem
pensar na educação de todos. O paradigma da inclusão serve de parâmetro à
gestão educacional e para a efetivação de projetos político pedagógicos que
privilegiem o respeito à diferença, numa transformação histórica para os processos
de exclusão, presentes na educação brasileira. Nesse contexto, o problema de
nossa pesquisa está centrado nas condições escolares e de atuação dos
professores e coordenadores pedagógicos na implementação de uma proposta
educacional no paradigma da inclusão. Nosso objetivo consiste, pois, em discutir o
percurso, e os percalços, que conduzem das intenções à prática escolar. Na
pesquisa de campo realizada em uma escola municipal de Manaus, entre março de
2005 e novembro de 2006, entrevistamos diretora, professores, coordenadores
pedagógicos, técnicos do Centro Municipal de Educação Especial e da Secretaria
Municipal de Educação, pais e alunos, quando levantamos informações acerca da
operacionalização do processo de inclusão do educando com necessidades
educacionais especiais. Docentes e coordenadores pedagógicos (pedagogas)
conceberam a educação inclusiva sob diferentes enfoques, com definições que ora
se aproximam dos princípios de integração, ora se referiam à orientação inclusiva.
Verificamos, com base na análise dos dados, as dificuldades de implementar uma
Proposta Inclusiva na Rede Municipal de Manaus, evidenciando a gravidade da
situação pela falta de formação especializada e de apoio técnico no trabalho com
alunos inseridos nas classes regulares.
PALAVRAS-CHAVE: Inclusão Escolar. Educação Especial. Políticas Públicas de
Educação. Educação no município de Manaus.
ABSTRACT
This research investigates as the Net of Municipal Education of Manaus/AM
has searched to guarantee the learning and the development of the pupils with
educational necessities special, foreseeing forms of accompaniment of the
pertaining to school process that respect the possibilities of expression of the
potential of the same ones to the light of principles that guide the inclusion as
a thematic one that historically it becomes strong present and that we go
defining through the practical ones in the daily pertaining to school. From a
dimension dialectic, we think an inclusive education considering the education
as references for the analysis, deal with the subjects of the citizenship,
inclusion and exclusion and pertaining to school inclusion, support ourselves,
for such, in references of scientific literature and of the Brazilian and
international legislation and norms. We cannot speak in special education
without thinking about the education of all. The paradigm of the inclusion
serves of parameter to the educational management and for the efetivação of
pedagogical projects politician that privilege the respect to the difference, in a
historical transformation for the exclusion processes, gifts in the Brazilian
education. In this context, the problem of our research is centered in the
pertaining to school conditions and of performance of the professors and
pedagogical coordinators in the implementation of a proposal educational in
the paradigm of the inclusion. Our objective consists, therefore, in arguing the
passage, and the profits that lead of the intentions to the practical pertaining to
school. In the research of field carried through in a municipal school of
Manaus/AM, between março/2005 and November of 2006, we interview
pedagogical director, professors, coordinators, technician of the Municipal
Center of Special Education and of the Municipal Secretary of Education,
parents and pupils, when we raise information concerning the
operacionalização of the process of inclusion of educating with educational
necessities special. Pedagogical professors and Coordinators (Pedagogas)
had conceived the inclusive education under different approaches, with
definitions that however if approach to the integration principles, however if
they related to the inclusive orientation. We verify, on the basis of the analysis
of the data, the difficulties to implement a Proposal Inclusive in the Municipal
Net of Manaus being evidenced the gravity of the situation for the lack of
specialized formation and support technician in the work with inserted pupils in
the regular classrooms.
WORDS KEYS: Inclusive Education. Special Education. Public politics of
Education. Education in the city of Manaus - Brazil.
Sumário
1. INTRODUZINDO O ESTUDO...........................................................................................9
2. EDUCAÇÃO INCLUSIVA: CONTORNOS CONCEITUAIS E LEGAIS. .................28
2.1 CIDADANIA, E EXCLUSÕES.........................................................................................28
2.2 DIVERSIDADES...............................................................................................................35
2.3 COMEÇANDO A FALAR DA INCLUSÃO ....................................................................40
2.4 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: MÚLTIPLAS LEITURAS E DIFERENTES
SIGNIFICADOS ......................................................................................................................43
2.5 UM OLHAR SOBRE DOCUMENTOS INTERNACIONAIS E LEGISLAÇÃO............63
2.5.1 DOCUMENTOS OU NORMATIVAS INTERNACIONAIS ........................................66
2.5.2 LEGISLAÇÃO E NORMAS BRASILEIRAS...............................................................71
3. CAMINHOS DA PESQUISA E CONTEXTOS DE INVESTIGAÇÃO .......................84
3.1 ABORDAGEM DA PESQUISA .......................................................................................84
3.2 MANAUS/AMAZONAS –LOCUS DA PESQUISA ........................................................90
3.3 SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO E CULTURA – SEMED......................96
3.3.1 A organização dos ciclos de formação na rede municipal de Manaus. .........................108
3.3.2 A educação inclusiva na rede municipal de ensino de Manaus.....................................112
3.4 ESCOLA MUNICIPAL SEMPRE VIVA........................................................................123
3.4.1 PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO........................................................................126
3.4.2 O COTIDIANO DA COLETA DE DADOS ................................................................130
3.4.3 SUJEITOS INVESTIGADOS.......................................................................................136
4. DA EXCLUSÃO À INCLUSÃO: (CON) VIVENDO COM A MUDANÇA...............139
4.1 FAMÍLIA E INCLUSÃO ESCOLAR..............................................................................139
4.2 INCLUSÃO, E PREPARAÇÃO DA ESCOLA...............................................................156
4.3 FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL ..........................................164
4.4 ASPECTOS DA ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DA ESCOLA ........................170
4.4.1 Matrículas suplementares ..............................................................................................170
4.4.2 Número excessivo de alunos x impossibilidade de atendimento individualizado.........171
4.4.3 Número excessivo de alunos x generalização dos conhecimentos................................173
4.4.4 Número excessivo de alunos x sentimentos de frustração e desânimo .........................173
4.5 FAMÍLIA, ESCOLA E SERVIÇO PÚBLICO MUNICIPAIS DE ATENDIMENTO ...177
4.5.1 Falta de contato: pais - escola........................................................................................177
4.5.2 Indiferença dos pais x serviço público municipal de atendimento................................178
4.5.3 Escola x serviços públicos de atendimento ...................................................................180
4.6 INCLUSÃO ESCOLAR: CURRÍCULO E ADAPTAÇÕES CURRICULARES ...........187
5.CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................196
6.REFERÊNCIAS.................................................................................................................212
9
1. INTRODUZINDO O ESTUDO
Paixão, persistência e otimismo são palavras que fazem parte da nossa vida e
são inerentes à trajetória acadêmica e profissional que temos percorrido desde
1977. Assim, essas palavras se interligam na nossa escolha pela educação dos
excluídos, sobretudo das pessoas com deficiência, de forma consciente, corajosa,
certo de que novos desafios sempre virão. Nossa Monografia, intitulada
“Psicomotricidade: a contribuição para educação especial” (Universidade Federal de
Santa Maria 1980), a Dissertação de Mestrado “Escola Especial: nem sempre um
processo segregador” (Universidade Federal do Amazonas, 1996) e, agora, estes
estudos, explicitam esta opção educacional.
A prática pedagógica que temos desenvolvido ao longo dos anos abrange a
Educação Infantil, o Ensino Fundamental e a Educação Superior, numa busca
incansável de criar, trocar experiências, revitalizar, transformar e ir além, em outras
palavras, a busca incessante de viver a educação de forma integral, plena e real.
Nossos trabalhos misturam teorias e práticas de tal forma na nossa vida, que
se complementam e se consubstanciam num jeito próprio que temos de pensar e de
fazer educação. A convivência com as pessoas excluídas da sociedade e,
sobretudo, da escola, tem nos conduzido e estimulado a afirmar que a inclusão
escolar, como conseqüência da transformação das nossas escolas, significa um
caminho para que se garanta o direito incondicional à escolarização de todos.
Como instituição social produtora do conhecimento, a escola tem desvirtuado
seu papel, utilizando controles perversos que preparam, treinam pessoas para
serem excluídas e, em conseqüência, vivenciarem a marginalização social,
econômica e política. Trata-se, no geral, de pessoas que compõem as chamadas
minorias sociais, dentre as quais estão as pessoas com deficiência. Segundo a
Organização Mundial de Saúde (1989), mais de 500 milhões de pessoas, ou 10% da
10
população mundial total, tem algum tipo de deficiência. No Brasil, segundo a OMS,
existem 20 milhões de pessoas com deficiência (mais de 10% da população).
O Censo realizado em 2000 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) e divulgado em 2002 revela que existem 24,5 milhões de brasileiros
portadores de algum tipo de deficiência. O critério, utilizado pela primeira vez nesse
levantamento, foi o da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade
e Saúde (CIF), recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Conforme
esse conceito, 14,5% da população brasileira apresenta alguma deficiência física,
mental, visual ou auditiva.
Na maioria dos países, pelo menos uma em cada 10 pessoas tem um
impedimento físico, mental ou sensorial, e pelo menos 25% da população geral não
é adversamente atingida pela presença das deficiências. De acordo com essa
mesma organização, os números indicados acima mostram, com considerável
eloqüência, a dimensão do problema e seu alcance universal e evidenciam o bem
conhecido impacto desse fenômeno sobre qualquer sociedade. Acrescente-se que
muitas dessas pessoas vivem em condições deploráveis, devido à presença de
barreiras físicas e sociais que impedem sua integração e plena participação na
comunidade.
De acordo com a realidade brasileira, no que diz respeito à área da Educação
Especial, pode-se afirmar que um dos temas mais pertinentes na atualidade refere-
se à Inclusão Escolar de Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais.
Partindo do cruzamento destes cenários, surge uma questão inevitável num
momento em que existe a busca de uma política voltada para a Inclusão escolar:
A Rede Municipal de Educação de Manaus tem buscado garantir a
aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos com necessidades educacionais
especiais, prevendo formas de acompanhamento do processo ensino-aprendizagem
que respeitem as possibilidades de expressão do potencial de cada aluno?
Ressaltamos que o interesse por esse Sistema de Ensino relaciona-se ao nosso
trabalho junto à Universidade Federal do Amazonas.
O Sistema de Ensino, como nos fala Mazzotta, (1998, p. 43-58) deve definir
diretrizes para uma:
11
[...] organização abrangente (autonomia financeira administrativa e
didática) de modo a incluir o atendimento de alunos portadores de
deficiências nos serviços comuns e se necessário com recursos especiais;
orientar as escolas sobre procedimentos didáticos e administrativos para
favorecer a integração de alunos portadores de deficiências nas classes
comuns; reconhecer a realidade dos serviços e auxílios de educação
especial como recursos que apoiam e suplementam a educação escolar
regular
O ser humano deve constituir-se em centro das atenções das ciências sociais,
ao analisarem os diversos cenários que se configuram no seu horizonte. As
mudanças que o mundo vem sofrendo com extrema velocidade representam um
aspecto fundamental a ser considerado: desemprego estrutural, desenvolvimento
desigual e exclusão são apenas algumas das contingências cada vez mais
presentes na vida do cidadão e das nações.
Partindo desse contexto, surgiu o interesse de conhecer a realidade do
processo de inclusão educacional das pessoas com necessidades educacionais
especiais na cidade de Manaus. Nessa direção, a partir deste estudo foram
investigados aspectos peculiares a este processo, tais como: a) legislação e
políticas; b) formação de professores; c) dificuldades e recursos encontrados nos
processos de inclusão; d) prática docente.
Em linhas gerais, os pontos apresentados refletem preocupações,
relacionadas às demandas existentes na realidade de nosso país. Neste sentido,
acredita-se que a pesquisa tenha sido pertinente às atuais questões e/ou lacunas de
pesquisa na área da Educação Especial, especialmente na cidade de Manaus e
também nos 62 municípios do Estado do Amazonas. A sua temática reflete uma
realidade, e preocupação idêntica na comunidade regional, tornando relevante
abordar os parâmetros necessários à reorganização das instituições de ensino para
ultrapassar as barreiras que impedem o processo inclusivo.
Falar de inclusão é falar de diversidade, é falar de uma escola que não
somente esteja preparada para aceitar as diferenças, mas também seja capaz de se
transformar numa escola de todos e para todos. Porém, se refletirmos e encararmos
o processo de inclusão que vigora no Brasil, constataremos que as leis oferecem
12
garantias para a efetivação do direito à educação, mas carecem de uma estrutura
que as retirem do papel e as coloquem nas práticas institucionais. Cabe lembrar que
o movimento pela inclusão da pessoa com deficiência é mundial e foi explicitado em
1990, na Resolução 45.191 da Organização das Nações Unidas (ONU): a
Assembléia Geral solicita ao Secretário Geral uma mudança no foco do Programa
da ONU sobre a deficiência, passando da conscientização para a ação, com o
propósito de se concluir com êxito uma sociedade para todos por volta do ano 2010.
Vários documentos internacionais defendem o princípio da inclusão escolar: a
Convenção dos Direitos da Criança das Nações Unidas, de 1989; a Conferência
Mundial sobre a Educação para Todos, realizada em Jomtiem, Tailândia, em 1990,
para responder às necessidades educativas fundamentais; o Regulamento das
Nações Unidas para a Igualdade de Oportunidades dos Deficientes, datado de 1993;
a Declaração de Salamanca, de 1994.
Conforme Santos (2001), um estudo da Organização das Nações Unidas para
a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), realizado em 63 países, em 1995, sobre
o desenvolvimento da educação de pessoas com necessidades especiais, revelou
que a inclusão constituí uma idéia crucial nas políticas de muitos países e ainda um
dos desafios árduos jamais postos ao mundo inteiro. Estima-se que se recuse a
centenas de milhões de crianças e jovens o acesso à educação, mesmo a mais
elementar, negando-lhes a possibilidade de virem a ser membros ativos e
independentes em suas comunidades, em suas sociedades e em suas culturas.
Em relação à inclusão escolar, a Declaração de Salamanca (1994) diz que:
O principio fundamental da escola inclusiva é o de que todas as crianças
devem aprender juntas, sempre que possível, independentemente de
quaisquer dificuldades ou diferenças que elas possam ter. Escolas
Inclusivas devem reconhecer e responder às necessidades diversas de
seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem e
assegurando uma educação de qualidade a todos através de um currículo
apropriado, arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso de
recursos e parceria com as comunidades.
O Congresso Internacional de Educação Especial (ISEC) realizado em
Manchester, na Inglaterra, no ano 2000, confirmou que, a despeito das enormes
diferenças nas atitudes, culturas e recursos, um consenso a ser seguido. No
13
tocante ao oferecimento de educação para todos, diversos países representados no
Congresso, dentre eles o Brasil, estão tentando mudar suas políticas e práticas para
assegurar que todas as crianças tenham acesso à educação.
Não se pode esquecer, ratificando a idéia de Mittler (2001), que a educação
inclusiva só começa com uma radical reforma da escola, com a mudança do sistema
existente e repensando-se inteiramente o currículo, para se alcançar as
necessidades de todas as crianças. Para esse autor, a inclusão não significa
transferir o aluno da escola especial para a escola regular, pois ela representa uma
mudança na mente e nos valores para as escolas e para a sociedade em geral,
porque subjacente à sua filosofia está a celebração da diversidade.
Nós educadores e educadoras de um mundo que se planetarizou, estamos
frente a um grande desafio: transformar o processo educativo em um território no
qual o conhecimento não seja pensado para dominar o outro, mas, sim, para criar
espaços de solidariedade. Entendemos que seria um grande avanço, para o fazer
pedagógico, se conseguíssemos fazer algo semelhante ao que sugere Maturana
(1995) quando alerta para a necessidade de que, para vivermos em sociedade,
que recuperar a confiança das crianças nos adultos. Para ele, essa seria, na
verdade, a grande senão a maior demonstração de inteligência que poderíamos
dar. Contudo, isso seria possível através de uma inteligência orientada pelo amor
e pela solidariedade. Esta seria uma boa pista para nós, educadores e educadoras,
começarmos a pensar um conhecimento que reconheça o outro na sua diferença.
Boaventura Santos (1990, p. 30) denomina este conhecimento, que
reconhece, de solidariedade. Para ele,
Estamos tão habituados a conceber o conhecimento como um
princípio de ordem sobre as coisas e sobre os outros que é difícil
imaginar uma forma de conhecimento que funcione como princípio de
solidariedade. No entanto tal dificuldade é um desafio que deve ser
enfrentado. Sabemos nós, hoje, o que aconteceu às alternativas
propostas pela teoria crítica moderna, o nos podemos contentar
com um pensamento de alternativa. Necessitamos de um pensamento
alternativo de alternativas.
14
A prática da solidariedade está vinculada, entre outros fatores, ao
reconhecimento, à aceitação e à defesa do direito do outro ao exercício de seus
desejos e vontades. Enfim, o direito à diferença. A construção de espaços de
solidariedade está diretamente ligada à idéia de diversidade cultural que, por sua
vez, é inseparável do exercício da tolerância. Assim, a construção de um
conhecimento que reconheça e não discrimine o/a diferente enfrentaria duas outras
grandes dificuldades, que, para Boaventura Santos, seriam o silêncio e a
indiferença.
O silêncio a que se refere Boaventura Santos está diretamente
relacionado/condicionado ao processo moderno de hegemonia do conhecimento-
regulação, que foi exercido como principal forma de dominação e, até mesmo, de
aniquilação cultural de diversos povos, etnias e culturas durante o processo de
colonialismo ocidental. Essa forma de relação de dominação colonialista levou à
produção de silêncios que tornaram impronunciáveis subjetividades e diversidades
culturais de vários grupos sociais e, até mesmo, de povos inteiros, aniquilando, com
isto, seus saberes e conhecimentos. Segundo Boaventura Santos, “não nos
esqueçamos que sob a capa dos valores universais autorizados pela razão foi de
fato imposta a razão de uma ‘raça’ de um sexo e de uma classe social” (SANTOS,
1990, p. 30).
A questão que se coloca ao processo educativo, neste momento de transição
paradigmática em que vivemos, é: como estabelecer espaços de convivência entre
os/as diferentes quando muitas dessas diferenças foram anuladas/silenciadas ou,
até mesmo, eliminadas? As questões da igualdade e da diferença têm sido
discutidas por vários autores, entre eles, Boaventura Santos, que nos traz muitas
contribuições para refletirmos sobre o multiculturalismo tão presente na sociedade
que vivemos. Nesse contexto, encontramos uma expressão que complementa nosso
pensamento: “[...] temos o direito a ser diferentes sempre que a igualdade nos
descaracteriza”. (SANTOS, 1990, p. 53).
A diferença pode ser sinônimo de diversidade, mas jamais de desigualdade,
no sentido em que nesse estudo nos referimos. A educação deveria ter como sua
principal tarefa a construção de pessoas que vissem qualquer outra pessoa como
alguém que deve ser respeitado em suas diferenças e individualidades. Para tanto, a
15
tolerância para com esse outro constitui-se condição necessária. Estaríamos
também, desta forma, fugindo da armadilha, ou da imprudência, de não reconhecer
que existem muitas formas explícitas ou implícitas de preconceitos geradores da
exclusão. Deveria, sim, haver profundo cuidado por tudo o que diz respeito ao outro,
como legítimo outro na convivência com os demais, como nos ensina Maturana
(2002, p. 12): “uma criança que cresce no respeito por si mesma pode aprender
qualquer coisa e adquirir qualquer habilidade se o desejar”, em outras palavras “[...]
a educação se na biologia do amor, os valores, a espiritualidade, a justiça, etc;
não precisam ser ensinadas de maneira especial, pois são vividos a partir dali”.
(MATURANA, 2002, p. 19).
Acreditamos que as idéias de Maturana acima apresentadas vem referendar
nossa crença na pertinência e importância do exercício da tolerância na educação
em geral e, em particular, com pessoas com necessidades educacionais especiais.
Segundo Coll (1996), não devemos confundir necessidades específicas de
aprendizagem com necessidades educacionais especiais. Todos os alunos, segundo
o autor, têm necessidades específicas de aprendizagem. em relação às
necessidades educacionais especiais, o especial deve centrar-se na ação
pedagógica a se utilizar, para atender as demandas educacionais do aluno.
De outra forma, é justamente a existência das diferenças que, como ensina
Arendt (1997), permitem-nos dizer que cada ser humano é diferente do outro, é
único em sua diversidade. Isso exigirá, também, uma postura/ação por parte da
escola que respeite essa característica. Deve-se superar dicotomias, como o normal
x anormal, deficiente x não deficiente, capaz x incapaz, educação x educação
especial, pois não existem dois mundos e todo o indivíduo, quer deficiente, quer não,
é único e especial em toda a sua essência, pois, “[...] toda pessoa é uma
individualidade singular, diferente e distinta das outras, mas nunca está encerrada
em si mesma. Toda pessoa se encontra a si mesma como membro de uma
comunidade de pessoas”.(ABBAGNANO, 1995, p.167).
Entender e aceitar as particularidades de todas as pessoas como direito à
singularidade passa por um profundo desejo de conhecer o ser humano. O próximo
e s mesmos; os conceitos, pré-conceitos e preconceitos que formamos dos
16
outros e de nós mesmos, das diferenças, que podem ser representadas como
vantagens ou desvantagens para os outros e para nós mesmos e que somente
serão transformados em aspectos positivos da diversidade humana quando
apagarmos da nossa mente a idéia de normalidade associada ao ideal de uma
perfeição e uma homogeneidade que nunca existiram e talvez nunca existirão.
Como bem lembra Candau (2000, p. 42), a “verdadeira educação consiste
não em ensinar a pensar como também em aprender a pensar sobre o que se
pensa”.
Se entendermos os mitos que criamos para nos defender dos falsos perigos
do afastamento da norma, talvez aprendamos a enxergar a beleza e a riqueza que a
sábia natureza disseminou entre seus filhos e que faz deste nosso mundo o lugar
mais maravilhoso, imperfeito e cheio de diferenças.
Enquanto os educadores e a sociedade como um todo não forem capazes de
diferenciar mitos de realidade, enquanto estes alunos não saírem da invisibilidade e
não forem distinguidas as suas necessidades, enquanto os dispositivos que visam a
constituir políticas educacionais continuarem apenas “falando” deste aluno como
alvo da inclusão sem pensar em estratégias reais de inclusão, enquanto não for
permitido a este aluno se auto-reconhecer e se aceitar como diferente, enquanto não
aumentar a produção científica, a sua inclusão não será possível (PÉREZ, 1992).
As necessidades educacionais especiais dos alunos, advindas de suas
deficiências, não deveriam ser por si mesmas, de acordo com Costa, “[...] impeditivo
para o ingresso e permanência na escola regular, desde que essa estivesse
equipada com os recursos didático-pedagógicos específicos e profissionais
capacitados para lidar com a diversidade dos alunos” (2001, p. 13), atuando na
perspectiva da educação democrática, com possibilidades de autonomia para todos
os alunos.
A educação em uma democracia deve formar cidadãos ativos e prontos a
lutar pelas igualdades sociais.
[...] a educação é então uma das ferramentas essenciais para proporcionar
à infância os conhecimentos e habilidades básicas que permite não
17
somente aumentar sua produtividade e romper com o círculo da pobreza,
mas também adquirir valores de equidade, tolerância, solidariedade e
cidadania. (MINUNJIN, 1999, p. 72)
Essa deve ser a luta constante dos educadores bem intencionados que,
apesar das pressões ao contrário, levantam suas vozes na defesa de uma
sociedade com possibilidades e direitos iguais para todos. Nesse sentido Costa nos
orienta que:
[...] a urgência de uma educação democrática e emancipadora parece
constituir-se como alternativa para a superação da diferença significativa
como obstáculo para o acesso e permanência na escola regular dos
educandos com deficiência e na possibilidade de se pensar uma
sociedade justa e humana. (2001, p. 91)
É chegada a hora da metamorfose educacional, quando os conflitos e
resistências sejam superados e se perceba a dimensão de saberes que a
diversidade tem a oferecer.
Foi diante deste quadro e destes ideais que se deu a escolha da temática
deste estudo, que está relacionada com toda a nossa concepção de vida, opção
acadêmica e profissional. Tendo atuado inicialmente junto a instituições
especializadas (APAE-Júlio de Castilho-RS/APAE e o Leopoldo-RS) privadas e
posteriormente em órgão oficial estadual (CETRID-SEDUC-Amazonas),
direcionados às pessoas com deficiência, foi-nos possível formular as questões e
analisar se a rede Municipal de Educação de Manaus têm buscado garantir a
aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos com necessidades educacionais
especiais, prevendo formas de acompanhamento do processo escolar que respeitem
as possibilidades de expressão do potencial de cada aluno, compreendendo o
estado de segregação e discriminação em que se encontra ainda hoje uma parcela
considerável dos nossos alunos.
Pela vivência acadêmica e profissional pudemos entender que as medidas
governamentais para as pessoas excluídas, apesar de muitas vezes adequadas no
seu discurso, não conseguem, na prática, reverter, ou ao menos minimizar, a
situação educacional dessas pessoas.
18
Como integrante da administração pública estadual de órgãos voltados para o
atendimento às pessoas com deficiência durante as décadas de 1980 -1990, e, hoje,
como professora universitária e pesquisadora, necessitávamos compreender as
concepções que os professores têm construído sobre educação inclusiva
proveniente de uma política educacional do Município de Manaus, que, ao nosso
ver, tem tido dificuldade em proporcionar às pessoas com qualquer tipo de
deficiência o acesso a bens públicos básicos como as escolas.
A tarefa foi árdua e desafiadora, pois estudar, identificar, contextualizar,
compreender e apontar questões/possibilidades que visem uma reorientação da
política educacional do Município de Manaus, na perspectiva da educação inclusiva,
implica avaliar órgãos públicos como a Secretaria Municipal de Educação como um
todo, o que, por sua vez, também implica analisar o nosso próprio papel como
educadora.
Torna-se importante ressaltar que o enfrentamento de mais este desafio
contribuiu para estimular e consolidar mudanças de concepções e posturas que
foram sendo construídas nos últimos quatro anos de nossa vida profissional e
acadêmica.
A inclusão escolar, especificamente, no Brasil, tem sido compreendida pelos
órgãos públicos e pela sociedade em geral como uma responsabilidade de pessoas,
instituições especializadas e políticas de educação direcionadas especificamente às
pessoas com deficiência.
Esta compreensão tem respaldo legal e institucional, sobretudo na Lei Nº.
9.394/96, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB); no
Decreto Nº. 3.298/99, que regulamenta a Lei 7.853/89, que dispõe sobre a Política
Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência; na Lei Nº.
10.172/01, que aprova o Plano Nacional de Educação e na Resolução CNE/CEB Nº.
2, de 11 de setembro de 2001, que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Especial na Educação Básica.
Com efeito, parece-nos que todos esses aparatos legais/institucionais
referentes à implementação da inclusão escolar e algumas questões conceituais,
chocam-se com a Constituição Federal de 1988, que garante a todos o direito à
19
educação e ao acesso à escola sem discriminações e adjetivações à educação.
Alguns teóricos do nosso país defendem a inclusão escolar total, incondicional para
“todos”, como conseqüência da transformação do ensino regular. A concepção
teórica que norteia os trabalhos dos que defendem a inclusão total traz para as
discussões questões conceituais importantes, como a identidade, a diferença e
diversidade, que são inerentes aos princípios fundamentais para a transformação da
escola brasileira.
É necessário esclarecer que, neste trabalho, estamos nos referindo à pessoa
ou aluno com deficiência, incluindo as diferentes deficiências orgânicas: mental,
sensorial e física. Embora sejam deficiências de naturezas diferentes e que implicam
em atendimentos e recursos peculiares, ao nos referirmos ao aluno com deficiência
não estamos especificando-a, exceto se a situação em análise o exigir.
Não é nosso objetivo discutir a questão terminológica: pessoa deficiente,
especial, portadoras de deficiência, pessoas portadoras de necessidades especiais,
pois consideramos que esta foi amplamente estudada em trabalhos como o de
Bueno (1993), Jannuzzi (1992), Sassaki (1997) e Beyer (2005). Também
consideramos, que essa questão perde sua relevância quando pretendemos discutir
outros problemas que vão além do significado dos termos.
Atualmente, os termos “aluno portador de deficiência”, “aluno com deficiência
ou ainda “aluno com necessidades educativas especiais”, “aluno com necessidades
educacionais especiais” são usados como sinônimos, substituindo o que
tradicionalmente se denominou de “aluno especial” ou “aluno excepcional”. Esta
mudança de termos é significativa, na medida em que passamos a ter um outro
olhar diante dessa pessoa, vendo-a na sua totalidade e o na sua deficiência. Da
mesma forma, é significativa a mudança de perspectiva no atendimento escolar
quando se percebe o aluno com deficiência como sujeito ativo e construtor de
conhecimento. Desse modo, “[...] a ênfase desloca-se do aluno e centra-se na
escola, na sua competência para atender a este aluno que exige atenção mais
específica e maiores recursos educacionais do que o necessário para os colegas de
sua idade [...]”. (MARCHESI; MARTIN, 1995, p. 11 -12).
20
A discussão deste trabalho também está centrada no trabalho pedagógico
das professoras junto aos alunos com deficiência. Enfim, nosso estudo ênfase à
(in) competência da escola e não dos alunos. Estamos também de acordo com
Carvalho (1996) de que a denominação “aluno com necessidades educativas
especiais” é muito abrangente por englobar grupos heterogêneos nos quais se
encontram os alunos com deficiências reais e com deficiências circunstanciais, como
denomina Mantoan (1994).
Neste estudo, usamos o termo “aluno com deficiência” ao nos referirmos
apenas aos sujeitos cujas deficiências são orgânicas. O problema de nossa
pesquisa está centrado, portanto, nas condições do atendimento ao aluno com
deficiência na rede de ensino municipal de Manaus. Mais especificamente, nas
condições de atuação dos profissionais para realizar o trabalho pedagógico com
alunos com deficiência nas salas de ensino regular. Assim, levantamos algumas
questões:
Qual a proposta da Secretaria Municipal de Educação para o apoio às ações
dos professores que têm em suas classes alunos com necessidades
educacionais especiais?
Como os diretores de escolas, coordenadores e professores podem
contribuir para o processo de inclusão escolar, considerando a realidade local,
as expectativas da comunidade escolar e o referencial teórico adotado neste
estudo?
Que alternativa de atuação profissional, teórica e socialmente relevante,
pode ser apontada para o professor que atua com educandos com
necessidades educacionais especiais na Rede Pública Municipal de Ensino
Fundamental de Manaus?
Nosso objetivo consistiu, portanto, em analisar se a Rede de Ensino Municipal
de Educação de Manaus tem buscado garantir a aprendizagem e o desenvolvimento
dos alunos com necessidades educacionais especiais, prevendo formas de
acompanhamento do processo escolar que respeitem as possibilidades de
expressão do potencial dos mesmos. À luz de princípios que orientam a inclusão
como verdadeira inovação educacional, buscamos neste trabalho:
21
identificar na literatura os referenciais teóricos e legais que norteiam o
debate contemporâneo acerca da diversidade, exclusão social e educação
inclusiva;
contextualizar a realidade sócio-econômica e geopolítica em que a rede
municipal de educação investigada está inserida;
compreender as concepções que os professores têm construído sobre
educação inclusiva, relacionando-as à formação, às práticas docentes dos
mesmos e à dinâmica de funcionamento das escolas públicas municipais de
Manaus;
apontar questões/possibilidades que visem uma reorientação da política
educacional do município de Manaus, na perspectiva da educação inclusiva.
Acreditamos, como nos ensinou Paulo Freire, que é preciso “pensar a prática
enquanto a melhor maneira de aperfeiçoar a prática. Pensar a prática através do que
se vai reconhecendo a teoria nela embutida”. (1993, p. 14). Buscando um
aprofundamento do tema e [...] “vivendo a tensão dialética entre teoria e prática”
(FREIRE, 1993, p. 14) buscamos encontrar algumas alternativas que viabilizem a
melhoria do trabalho pedagógico para a escolarização de todos os alunos nas
escolas municipais de Manaus.
A amplitude que desejávamos alcançar, investigando o processo de inclusão
escolar da rede de ensino municipal para compreender sua história e prática, teve
como fonte de referência os trabalhos desenvolvidos e as discussões realizadas no
decorrer dos encontros e reuniões proporcionados pelo Núcleo de Estudos e
Pesquisa em Psicopedagogia Diferencial (NEPPD), da Faculdade de Educação da
Universidade Federal do Amazonas, sob nossa coordenação. Sobre esse trabalho
pedagógico, Beyer (2005, p. 76) propõe que,
[...] o desafio é construir e pôr em prática no ambiente escolar uma
pedagogia que consiga ser comum ou válida para todos os alunos da
classe escolar, porém capaz de atender os alunos cujas situações pessoais
e características de aprendizagem requeiram uma pedagogia diferenciada.
Tudo isto sem demarcações, preconceitos ou atitudes nutridoras dos
indesejados estigmas. Ao contrário, pondo em andamento, na comunidade
escolar, uma conscientização crescente dos direitos de cada um.
22
Nesse sentido Mantoan (1998, p. 03) nos leciona que a educação inclusiva
constitui:
[...] uma verdadeira transformação da escola, de tal modo que o aluno
tenha a oportunidade de aprender, mas na condição de que sejam
respeitadas as suas peculiaridades, necessidades e interesses, a sua
autonomia intelectual, o ritmo e suas
condições de assimilação dos
conteúdos curriculares
.
Apesar de importantes, os estudos mais recentes realizados em cursos de
pós-graduação nas diversas universidades brasileiras sobre a inclusão escolar ainda
são, em sua maioria, localizados em escolas/instituições especializadas, formação
de professores ou pessoas com alguma deficiência. Estudos de propostas inclusivas
de redes de ensino público são menos encontrados.
No que se refere à Educação Especial, Garcia (1999) nos informa que, a
pesquisa etnográfica tem sido utilizada, dentre outros, no estudo de aspectos da
inclusão de alunos com necessidades especiais na escola regular. A observação
participante em campo tem se revelado uma ferramenta importante para a avaliação
da política de educação inclusiva. Esses trabalhos utilizam uma variedade de
referencias teóricos e metodológicos, que incluem conhecimentos provindos de
várias áreas do conhecimento. Alguns estudam a inserção de um único aluno na
sala de aula regular (ARIAS; AZEVEDO, 1998; BATISTA, 2002; FARIA, 1999;
MILLIONI; PAULA; PINHO 2003), outros enfocam uma ou mais escolas ou salas de
aula (BERALDO, 1999; CARVALHO, 2001; JESUS; CAETANO; AGUIAR,
MARCIANO, 2002; MARQUES; MATTOS, 2000; PICCHI, 1999; SILVA, 2003;
TARTUCI, 2001) e poucos avaliam a política inclusiva em contextos mais amplos
como um ou mais municípios ou estados (BITES, 2003; LAUAND, 2000; KASSAR,
2006). Alguns estudos abordam a percepção das famílias de alunos com
necessidades especiais. (apud SANCHEZ 1995, CHACON, 1995; MELLO;
LAPLANE, 2004; PAIVA, 1999).
Nesse contexto, é inegável o pioneirismo e a produção do conhecimento no
assunto, oferecida pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Psicopedagogia
Diferencia l - NEPPD - UFAM nos últimos dez anos. Tecendo considerações sobre o
23
papel da Universidade e o que a diferencia das demais instituições de ensino,
convém assinalar que ela tem por função conservar os ensinamentos nos diversos
campos do conhecimento e propiciar o progresso em sua área de atuação através
do incentivo à pesquisa. È importante dizer que o NEPPD funciona na Faculdade de
Educação da Universidade Federal do Amazonas, mais especificamente no
Departamento de Teorias e Fundamentos, congrega um trabalho multidisciplinar e
interdepartamental, e estuda os aspectos teóricos-práticos relativos às Pesquisas
em Psicopedagogia e Educação Especial.
O núcleo foi fundo a partir da preocupação de um grupo de professores com a
necessidade crescente de melhor qualificar os futuros pedagogos para o exercício
do ensino e pesquisa nas áreas de psicopedagogia e educação especial, ainda
incipiente em nosso meio; busca assegurar condições que viabilizem uma análise
mais cuidadosa e efetiva dos diferentes casos e situações, procurando a adoção de
medidas que respondam com adequação e pertinência à natureza do atendimento
demandado pelas características do alunado que apresenta dificuldades no
processo ensino-aprendizagem, portador ou não de transtornos/distúrbios ou
deficiências.
O NEPPD é responsável pelo aprofundamento de estudos e pesquisas sobre
dificuldades de aprendizagem e educação especial de alunos da educação básica.
Conta com um número efetivo de alunos da graduação e de pós-graduação,
bolsistas e voluntários. Promove palestras, cursos, oficinas, seminários,
assessoramentos e intercâmbios, realizando avaliação pedagógica,
psicopedagógica e psicomotora de alunos encaminhados por escolas públicas e
ONG`s.
A experiência mostra que a linha que marca a fronteira entre o saber e o
saber fazer é nue e para encontrá-la é preciso muito diálogo, muita disposição
para a troca de conhecimentos e experiências de vida. Somente assim é possível
enxergá-la e transportá-la com segurança. O NEPPD/FACED/UFAM tornou-se um
referencial para o curso de Pedagogia (graduação) e Psicopedagogia (lato-sensu)
preparando o educador/pedagogo para entender como o aluno constrói o
conhecimento, compreender como os relacionamentos da Escola e da família
afetam o aluno no seu ser e também para ampliar estudos e pesquisas pedagógicas
24
no âmbito da educação básica com vistas a analisar o processo de acesso e
permanência dos alunos com necessidades educacionais especiais.
Embora o NEPPD represente referência e avanço nas discussões e ações a
respeito da educação para a diversidade, ainda é necessário continuar ampliando a
investigação sobre propostas escolares inclusivas nas redes de ensino do
Amazonas, para se contribuir efetivamente com reflexões e análises que venham a
reafirmar o caráter transformador da educação para todos em escolas regulares.
Em referência ao quadro teórico da presente investigação, ressaltamos que, a
pesquisa qualitativa possui defensores de um mínimo de estruturação prévia
impostas ao estudo, assim como defensores de uma estruturação em grau maior.
Este estudo planejou uma estrutura que não pretendeu ser apriorística no sentido
mais estrito; embora parta de alguns referenciais e categorias, abre a possibilidade
de ampliação e enriquecimentos com o desenvolvimento do aprofundamento teórico
e com o embate empírico com documentos e pessoas.
Todo o quadro de referencial teórico é condicionado por pressupostos
epistemológicos, constituindo-se em “filtro para enxergar a realidade, sugerindo
perguntas e indicando possibilidades [...]. O problema reflete a teoria” (LUNA, 1991,
p. 31). Enquanto decorrência do problema a metodologia deve ser coerente com a
teoria, ao passo que o problema se explica devidamente em relação ao
referencial teórico que o originou.
Para saber situar cada fato em seu contexto ou totalidade condicionante,
emerge a dialética enquanto abordagem a ser usada no âmbito educacional. À
diferença das abordagens empírico-analíticas, a dialética considera a parte dentro
do todo e do contexto, considera as múltiplas determinações que rodeiam o objeto
em análise. (GAMBOA, 1991).
Frigotto (1991) aponta alguns passos e momentos que podem ajudar a
estudar de forma mais apropriada o problema objeto desta pesquisa em contexto
dialético.
Inicialmente, é sugerida a definição de uma problemática, mais que problema,
devendo aparecer de imediato a postura e o “inventário” provisório do investigador.
25
Em segundo lugar, deve haver um resgate crítico do conhecimento produzido sobre
a problemática e investigar a realidade com uma postura teórica desde o início. O
passo sucessivo é a definição de um método de organização para análise e
exposição, discutindo as categorias que permitem organizar e analisar o material. A
análise de dados, quarto momento, representa o esforço do pesquisador em
estabelecer conexões, mediações e contradições dos fatos que representam a
problemática pesquisada. Finalmente, o último momento é a síntese da
investigação, exposição orgânica e coerente das múltiplas determinações que
explicam a problemática. Ressalta-se, contudo, a fronteira tênue entre os cinco
passos enunciados, superado pelo dinamismo da realidade investigativa.
O quadro teórico básico que percorreu a pesquisa foi composto por duas
categorias, elementos confrontados com o empírico, tornando-se categorias de
análise da realidade em construção,
a) A primeira categoria é “exclusão”; conforme evidenciado no referencial
teórico, encontra um leque amplo de interpretações, nos mais diversos
enfoques filosóficos. Introduzir esta categoria no quadro teórico inicial não
significa, pois, partir de um conceito pronto, mas de uma construção em
processo ao longo do estudo e no embate do empírico com o teórico.
Trata-se, de acordo com Grzybowsky, de “desenvolver competências na
produção de categorias analíticas teoricamente fundamentadas, que
resgatem as práticas educativas em sua historicidade e complexidade”
(1989, p. 16).
b) A segunda categoria é “inclusão”, a literatura recente é repleta de
aprofundamentos de inclusão enquanto categoria central na perspectiva
da construção de uma cultura dos Direitos Humanos. Uma definição inicial
que é adotada neste estudo foi plantada pela Disabled Peoples
International, uma organização não-governamental criada por líderes com
deficiência, quando em seu livreto Declaração e Princípios, de 1981,
definiu o conceito de equiparação de oportunidades (apud DRIEDGER;
ENNS, 1987, p. 02 - 03):
O processo mediante o qual os sistemas gerais da sociedade, tais como
o meio-físico, a habitação e o transporte, os serviços sociais e de saúde,
26
as oportunidades de educação e de trabalho e a vida cultural e social,
incluídas as instalações esportivas e de recreação, são feitos acessíveis
para todos. Isto inclui a remoção de barreiras que impedem a plena
participação das pessoas deficientes em todas as áreas, permitindo-lhes
assim alcançar uma qualidade de vida igual às de outras pessoas.
Essa construção e essa qualificação teórica o fundamentais para a
caminhada de uma sociedade inclusiva. Da mesma forma, a evolução da pesquisa
deixou espaço aberto para o encontro e o assumir de categorias que contribuam
para a interpretação da problemática estabelecida. Para alcançar os objetivos
propostos por este estudo, dividimos o presente trabalho em cinco momentos e
estabeleceremos em todos eles um diálogo permanente entre pensar/fazer
educação. Esses momentos são descritos a seguir.
Introduzindo o estudo, situamos o nosso envolvimento pessoal, acadêmico e
profissional com o tema em questão e a discussão que nos propusemos a fazer.
O segundo momento intitula-se “Educação Inclusiva: repensando políticas,
culturas e práticas na escola pública”. Nessa parte do trabalho elaboramos uma
reflexão acerca da cidadania, exclusão social, diversidade e educação inclusiva.
Os aspectos legais da educação inclusiva no âmbito internacional e nacional,
as políticas públicas e uma breve descrição da história da educação especial no
Estado do Amazonas são apresentados neste trabalho.
Caminhos da pesquisa e contexto da investigação constituem o terceiro
momento, no qual descrevemos o contexto da pesquisa de campo e a
caracterização dos sujeitos; tecemos, ainda, algumas considerações sobre o lócus
da pesquisa, o sistema educacional público do Município de Manaus.
É nessa parte da tese que analisamos os dados coletados em campo,
oriundos da política educacional direcionado às pessoas com necessidades
educacionais especiais, confrontando-a com a prática pedagógica através das falas
de professores, coordenadores e diretora entrevistados. Para isso, utilizamos
trechos de entrevistas mantendo a forma coloquial de suas falas no intuito de
assegurar a fidelidade desses depoimentos. Ainda no terceiro momento, discutimos
alguns temas levantados a partir da análise dos depoimentos da professoras com a
27
intenção de caracterizar aspectos teórico-pedagógicos de desenvolvimento e
aprendizagem relativos a uma proposta de inclusão escolar.
Dedicamos o quarto momento “Da exclusão à inclusão: (con) vivendo com a
mudança” a uma retomada do objetivo geral do estudo, numa tentativa de auto-
avaliação do trabalho realizado. Apresentamos sugestões, oriundas da análise,
quanto às implicações educacionais que visem uma reorientação da política
educacional do Município de Manaus, na perspectiva da educação inclusiva.
Com este trabalho, esperamos, dentro dos limites a que nos propusemos,
trazer contribuições àqueles que estão envolvidos em trabalhos dessa natureza,
especialmente aos professores da rede municipal de Manaus que possibilitaram a
realização dessa pesquisa.
28
2. EDUCAÇÃO INCLUSIVA: CONTORNOS CONCEITUAIS E LEGAIS
Nesta parte do trabalho procuraremos expor algumas delimitações em termos
de conceitos, normas e situações mais diretamente implicados na discussão da
educação inclusiva. Serão discutidos os conceitos de cidadania, exclusão,
diversidade, inclusão e educação inclusiva, pontuadas por comenrios a respeito de
circunstâncias conjunturais ou estruturais que potencializam ou limitam a efetivação
da cidadania, da inclusão e do respeito à diversidade.
Contemplamos também uma exposição de documentos internacionais e
legislação e normas brasileiras que auxiliam na delimitação do direito à educação e
das condições institucionais de atendimento educacional às pessoas com
deficiência.
Entendemos que essas aproximações constituem-se em andaimes que
fornecem um apoio para a análise das ações empreendidas na Rede Municipal de
Ensino de Manaus no sentido da inclusão escolar.
2.1 CIDADANIA, E EXCLUSÕES
Falar do direito à educação da pessoa com necessidades educacionais
especiais é falar de um conflito histórico e inerente à sociedade capitalista, que é o
conflito da exclusão social. Nesse estudo, pretende-se analisar o direito à educação
da pessoa deficiente no paradoxo dessa exclusão.
Pode-se afirmar que o sistema capitalista é excludente em sua raiz, dada a
exploração do trabalho humano e a apropriação dos bens produzidos coletivamente
por uma determinada classe social, detentora do controle dos meios de produção ou
29
da circulação do capital. Para sustentar-se no poder e perpetuar a exploração, essa
classe cria mecanismos políticos, jurídicos e ideológicos que lhe asseguram esse
lugar e que instauram ou perpetuam desigualdades.
O problema das desigualdades sociais no Brasil é gravíssimo. Todos sabem,
não se trata de fenômeno recente. Ao contrário, surgiu e foi se agravando em meio
ao processo de formação e consolidação do país, durante os últimos séculos. A tal
ponto, que alguns se aventuram a afirmar tratar-se de elemento intrínseco à
sociedade brasileira. Transparece como problema insolúvel, porque inscrito em
nossa própria “natureza”.
Entretanto, tal perspectiva, que sugere a inexorabilidade de nossas
desigualdades sociais, serve apenas para ocultar o fato de que o país jamais adotou
políticas destinadas a combater, de maneira consistente, esse problema. Para isso
contribui o ambiente de totalitarismo econômico dos últimos anos, em que a razão
economicista prepondera sobre todas as demais. Ambiente em que aqueles que se
aventuram a discordar do pensamento dominante e buscam alternativas em favor da
redução das desigualdades sociais são prontamente tachados de inimigos da pátria,
de irresponsáveis, que ameaçam por em risco a estabilidade econômica e levar o
país à bancarrota.
Com um olhar macro, vemos a desigualdade mundial, não uma alegoria, mas
a realidade que separa os países em ricos, em desenvolvimento e miseráveis. Mais
próxima, encontramos também a desigualdade nacional. Identificamos também a
subdivisão da desigualdade, formando duas vertentes, a desigualdade regional e a
desigualdade social.
O Estado de São Paulo, o Estado mais desenvolvido da Federação, é o
melhor exemplo de desigualdade regional: ocupa menos de 3% do território nacional
e, com 22% da população brasileira, produz e concentra 35% a 36% do Produto
Interno Bruto (PIB) brasileiro. Enquanto isso, os Estados das Regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste somados, ocupam uma área correspondente a 82.5% do
território nacional, concentram 42.5% da população brasileira e produzem apenas
26% do PIB nacional. Isso mostra que o Brasil é um país completamente torto. A
30
realidade, porém, é tão fantástica que passa despercebida. A convivência nos
habitua a não enxergar o cotidiano.
O Amazonas, por exemplo, convive com uma capital pujante, desenvolvida,
cada vez mais moderna, dona de parque industrial multinacional, com uma
economia forte e detentora de metade da população estadual, enquanto o interior
míngua, solitário, desabitado e sem perspectivas.
A distorção é tamanha que Manaus, hoje, embora ocupando somente 0,7%
do território estadual, tem uma população entre 49% a 50% do total do Estado e
participa com cerca de 93% a 94% do PIB amazonense. Os 61 municípios do interior
do Amazonas, somados, ocupam área de 99,3% do território do Estado, com uma
população praticamente igual à de Manaus, mas produzindo apenas 6% a 7% do
PIB estadual. Não é necessário usar símbolos para mostrar o que não vemos: os
números são reais, da mesma forma que é real a possibilidade de alterá-los seja na
nação brasileira ou no Estado do Amazonas.
No Brasil, a palavra cidadania vem sendo usada em discursos políticos de
todos os matizes, com chavões cunhados ao sabor dos interesses de grupos à
direita ou à esquerda no processo político. A discussão perpassa o as classes
populares, mas também as classes dirigentes. Todos conclamam por mais
segurança, menos poluição, mais saúde, menos desemprego, mais educação e
habitação, menos discriminação sexual e desigualdade social.
Mas o que significa cidadania?
Para Covre (1995), ser cidadão significa ter direitos e deveres, ser súdito e
ser soberano. Para embasar este ponto de vista, a autora enfatiza que tal situação
está descrita na Carta de Direitos da Organização das Nações Unidas (ONU), de
1948, que tem suas bases nas Cartas de Direito dos Estados Unidos (1776) e da
Revolução Francesa (1789). Em termos de Brasil, o instrumento mais recente que
regula esta questão é a Constituição de 1988, que fixa um novo quadro normativo
dos direitos e deveres dos cidadãos. Todos esses documentos apontam as variáveis
necessárias ao conceito cidadania, entendida como usufruto de direitos civis,
políticos e sociais: todos são iguais perante a lei, sem discriminação de raça, credo,
condições físicas, sexo, e idade, todos têm domínio sobre seu corpo e sua vida,
31
todos têm direito à educação, saúde, habitação e lazer e a ter um trabalho que
garanta a sua subsistência; todos podem expressar-se livremente, militar em
partidos políticos e sindicatos, fomentar movimentos sociais, lutar por seus valores.
Em relação aos deveres, pode-se indicar que cabe ao cidadão: ter
responsabilidade em conjunto pela coletividade; cumprir as normas e propostas
elaboradas e decididas coletivamente; participar dos atos do governo, direta ou
indiretamente, ao votar, ao pressionar órgãos governamentais ou de governança
(em nível municipal, estadual, federal e mundial) e instituições privadas, por
intermédio de associações, movimentos sociais, assembléias ou individualmente.
Mediante o exercício pleno dos direitos e deveres, as pessoas podem ser
consideradas cidadãs, pois “só existe cidadania se houver a prática da reivindicação,
da apropriação dos espaços próprios e respeito ao espaço dos demais, dentro de
uma coalizão de poder” (COVRE, 1995, p. 10). Pode-se inferir, portanto, que a
construção de uma sociedade melhor, que restaure os danos causados, que
recupere o ambiente degradado e ofereça condições de um habitat humano e
saudável, passa, necessariamente, pela prática da cidadania plena e pela existência
de cidadãos plenos.
A condição de existir da cidadania não é um estado estático que se atingiu ou
se perdeu, e não há mais nada a fazer. Ao contrário, é um conceito dinâmico que se
constrói e se reconstrói contínua e dialeticamente. Os cidadãos, e eles, são os
agentes da existência desses direitos que pressupõem iguais deveres,
consubstanciando-se em sujeitos produtores de sua realidade, construtores de sua
história.
Ainda Covre (1995, p. 10) ressalta que, muitas vezes, “as pessoas tendem a
pensar em cidadania apenas em termos de direitos a receber, negligenciando o fato
de que elas próprias devem ser o agente da existência desses direitos”. Com isso,
constata-se que muitas pessoas acabam por relevar os direitos que lhes cabem,
sobretudo por terem comportamento omisso, negando que são, de alguma forma,
parte da situação degradante e caótica em que se encontram. É preciso entender
que, em vez de meros receptores, somos todos, sujeitos daquilo que podemos
conquistar.
32
A compreensão do conceito de cidadania implica conhecer os aspectos da
questão ligados aos direitos civis, políticos e sociais. Esses, devidamente
interligados, é que delimitarão o campo de responsabilidades dos agentes
individuais, sociais e organizacionais, reciprocamente.
Em linhas gerais, os direitos civis reportam-se ao direito de dispor do próprio
corpo, de sua locomoção, segurança, liberdade de expressão. Os direitos sociais
dizem respeito ao atendimento das necessidades básicas do ser humano
(alimentação, habitação, saúde, educação, etc.), enquanto os direitos políticos se
relacionam com a deliberação do homem sobre sua própria existência e seus
relacionamentos com outros homens em organismos de representação direta ou
indireta e seu direito de resistir à imposição dos poderes. Esses três conjuntos de
direitos, que compõem os direitos do cidadão, são dependentes da correlação de
forças econômicas e políticas para se efetivar.
Assim, o direito à vida, no sentido pleno, implica que os direitos de uns
precisam condizer com os direitos dos outros, a fim de que a condição de cidadania
seja uma realidade. A degradação moral, social, política e ambiental a que ora se
assiste, precisa ser enfrentada por meio do resgate da auto-estima, do sonho, do
respeito mútuo, da construção e reconstrução solidária, ou seja, do exercício pleno
da cidadania pela prática dos direitos civis, sociais e políticos. E, segundo Covre
(1995), é por meio da cidadania, entendida como categoria estratégica, que se
construirá uma sociedade melhor, justa, igualitária e livre. Enquanto a cidadania
esvaziada, consumista, avilta e degrada o ser humano e seu ambiente, a cidadania
plena (com base nos direitos e deveres) restaura a utopia de um mundo livre das
desigualdades, injustiças e degradações ambientais.
De tão abrangente utilização, cidadania também passou a ser objeto de
denominação de ministérios e de secretárias estaduais e municipais, todas na
direção do respeito à vida, aos direitos humanos e até mesmo no cumprimento do
mandamento constitucional que diz que todos o iguais perante a Lei (artigo da
Constituição) e, mais ainda, como mandamento fundamental da República,
conforme disposto no inciso II do artigo 1º da Constituição.
33
Se no texto legal e no discurso sobressai a afirmação de preservação da
igualdade, na prática, no dia-a-dia, esse preceito é esquecido, prevalecendo as
desigualdades gritantes que dominam as relações políticas, econômicas e sociais
entre os segmentos e forças que formam a sociedade brasileira. A compreensão
dessa afirmação se faz lembrando, dentre outros fatores, as desigualdades regionais
e as desigualdades sociais brasileiras, que “entortam” o conceito de cidadania, frutos
da inexistência de projetos distributivos de renda que representem uma marca
duradoura na “estabilidade inaceitável” de nossa histórica desigualdade (AINSCOW,
1998).
Num outro exemplo, o mesmo texto constitucional, em seu artigo 3º, inciso I,
também determina que a República Federativa do Brasil têm por objetivo principal a
construção de uma sociedade justa, livre e solidária. A organização federativa de
nosso país nos remete ao entendimento de que o alcance desse objetivo é tarefa de
todas as esferas governamentais: União, estados e municípios. No campo das
políticas sociais, e das educacionais que são as que mais interessam nessa tese, a
menção às relações intergovernamentais próprias de nosso federalismo é oportuna.
Isso porque todas as esferas de governo possuem responsabilidades para com a
oferta de políticas sociais, assim como a maior ou menor coordenação de ações
influencia fortemente o alcance e as (des) continuidades das políticas. De outra
parte, num país cujas desigualdades possuem um marcado corte regional, não
podemos esquecer o indispensável papel da União na promoção da equidade
regional.
Vivemos num país onde as desigualdades sociais levam o negro a ter menos
escolaridade, menor percentual de carteira de trabalho assinada, e onde o
preconceito contra o nortista e o nordestino enseja uma elite dominante do país a
confundir geografia com genética, a acreditar que o nascimento nas regiões Norte e
Nordeste produz brasileiros geneticamente menos competentes e menos aptos ao
aprendizado.
Para completar o quadro desse preconceito, resta tecer considerações a
respeito da mulher no Brasil, que também, sabidamente, com o mesmo grau de
capacitação tem remuneração inferior ao homem no mercado de trabalho. Daí
34
porque é preciso resgatar o verdadeiro sentido da palavra Cidadania, iniciando-se
um processo de correção do quadro de desigualdades.
Cidadania, na verdade, se reflete em igualdade de oportunidades na
educação, saúde, segurança, habitação e num item fundamental para se alcançar
tudo isso, que é o emprego. Isso tudo somado, pode-se dizer que dá cidadania, mais
do que isso, dá a dignidade humana.
A sociedade necessita de alternativas nos mais diversos campos da vida
humana. Necessita de gestos criativos e atitudes libertárias coletivas, capazes de
ultrapassar a visão fragmentada e encontrar sustentação num paradigma que
contemple a diversidade e a solidariedade, que dê significado à vida humana.
Neste contexto, educar implica conhecer, mas não um conhecer sinônimo de
sujeitar a realidade. Entende-se o conhecer como um entrar em comunhão com as
coisas e as pessoas mais próximas, que partilham os sonhos e as angústias,
socializando saberes e sentimentos. Nesse sentido, educar envolve compromisso
social, desenvolvimento de potencialidades e, em conseqüência, a apropriação e o
compartilhamento do saber social. Saber esse que permite uma melhor
compreensão da realidade, que caminha para a identificação de possíveis soluções
dos problemas situados na base das estruturas sociais que, infelizmente, o
injustas e excludentes.
É urgente que a educação caminhe com competência e responsabilidade
para assumir seu novo papel, articular o saber, colocando as pessoas, a natureza, o
planeta numa comunicação de aprendizagem, em que o conhecimento passe por
relacionamentos baseados na prática do respeito mútuo, do entendimento da
diversidade e da complexidade como parte integrante da própria natureza e da vida
humana. Uma educação que amplie os horizontes dos educadores e educadoras, do
seu papel social, através da qual competência e sensibilidade transformem a razão e
a emoção em prática pedagógica, mais que isso, em prática de solidariedade.
35
2.2 DIVERSIDADES
Um dos traços característicos do nosso tempo é o fenômeno da globalização,
cujas manifestações se estendem a todas as dimensões da vida humana: política,
economia, sociedade, cultura, educação... Mas, concomitantemente, nunca como
hoje as minorias, os grupos, as regiões ou as mais diminutas comunidades tiveram
tão grande visabilidade, afirmação e reconhecimento. A par de um movimento avas-
salador de homogeneização e normalização, outro se está processando, não menos
dinâmico, de defesa da diferença, da heterogenaidade e da diversidade.
No que se refere à diversidade, temos a refletir que, apesar do seu caráter
universal, conviver com a diversidade tem se mostrado um sério problema para a
espécie humana. Longe de representar riqueza, ela é geralmente percebida como
grave ameaça externa; fonte permanente de desconfiança, empecilho para a
realização dos nossos projetos. O “outro” é aquilo que nós não somos. Ele coloca
em xeque a nossa verdade, questiona os nossos valores, relativiza a nossa
identidade. É preciso desqualificá-lo.
Armas eficientes têm sido usadas no processo de desqualificação dos
“outros” ao longo da nossa história. O etnocentrismo, aquela visão de mundo que
nos autoriza a julgá-los a partir dos nossos valores, ou seja, a avaliar os seus modos
de ser, fazer a sentir a partir dos nossos modos de ser, parece ser a mãe de
sentimentos ou atitudes como o preconceito e a discriminação.
O preconceito, tributário do etnocentrismo, se forma a partir das
representações que construímos em relação aos outros, informados pelas nossas
referências. Segundo Silva (1996, p. 96), “preconceito é uma atitude negativa,
desfavorável para com um grupo ou seus componentes individuais”.
Por sua vez, a discriminação é o comportamento efetivo traduzido em ações
que põem em prática o preconceito e que nos levam a negar ao outro aquilo que
queremos para nós, ao excluí-lo das oportunidades que estão ao nosso alcance,
mas às quais ele não deve ter acesso.
Conceito e o exercício da diversidade é uma reivindicação recente e não tem
sido uma conquista fácil, embora venha se ampliando no sentido de abranger um
número cada vez maior de oprimidos. Os prejuízos advindos do desrespeito à
36
diversidade são difíceis de avaliar, na medida em que a negação do “outro” equivale
a uma repressão.
O exercício da alteridade seria o melhor meio para a superação da rigidez e
da intolerância diante do novo e do diferente. No dinamismo da alteridade, podemos
começar a aprender a sair das nossas convicções pra compreender as convicções
do “outro”. É na capacidade de sair de si para poder se ver com os olhos do outro
que a tolerância pode ser conquistada e mantida.
Com o exercício da alteridade, a construção de identidade e o confronto com
o diferente começam a acontecer de forma mais simples e natural, porque
passamos a entender que a evolução é um contínuo processo de construções e
desconstruções, de envolvimentos.
Com a prática desses fundamentos poderemos idealizar um mundo melhor
onde a educação estará centrada no aprendiz, abandonando-se os programas
rígidos, massificadores e castradores do brilho e da originalidade que emanam de
cada pessoa. Dessa forma, incentivar e incrementar o exercício da alteridade é a
melhor saída para evitarmos a exclusão que vem assolando a humanidade, com
conseqüências cada vez mais desastrosas.
Os tempos atuais, com os novos cenários que se descortinam, trazem
consigo os avanços tecnológicos e comunicacionais, facilitadores da vida em
sociedade e, ao mesmo tempo, exigentes em termos de novas posições valorativas
e éticas de todos. Os novos tempos são tempos de novos paradigmas que, para não
serem mal interpretados, precisam ser muito discutidos.
As pessoas são diferentes. É isso que as torna pessoas (persona, em grego)
- significando as diversas máscaras que o artista usava para representar
personagens dos tragédicos nos espetáculos teatrais e, portanto, singulares.
Únicas. As pessoas são criações especiais que guardam suas especificidades ao
longo da construção das próprias experiências de vida. Aliás, as experiências pelas
quais cada uma passa do seu jeito, de modo próprio, a partir de suas peculiaridades,
são únicas, portanto provêm, inclusive, da forma como cada um se aproxima do que
é novo. o elas que fazem com que a convivência e o relacionamento humano
sejam sempre diferentes e adquiram significados especiais.
37
É impossível conceber cultura, a síntese de tudo aquilo que um determinado
grupo de pessoas produz, pensa, realiza, articula, planeja, propõe, executa, constrói
como compreensão da vida nos seus aspectos existenciais internos e externos,
enquanto coletividade, sem considerar a presença dos elementos que igualmente se
constituem em diferenças. É na cultura, como locus do viver das sociedades
humanas, que as diferenças em todos os campos se evidenciam. E não poderia ser
de outro modo no que se refere à pluralidade educacional. O fundamental é
reconhecer que a diferença possibilita a identidade dos interlocutores.
A humanidade não é uma massa descaracterizada de peculiaridades,
exatamente porque se mantém uma função das diferenças. É na diferença, na não-
padronização, na não homogeneidade, que se podem criar alternativas novas, novos
processos, novas concepções de mundo, de vida, e esta é uma dimensão, por
excelência, humana. Quando o outro, o diferente, é contemplado em sua diferença,
e é reconhecido na sua possibilidade de ser diferente, o respeito à vida se resgata
na sua integralidade.
O investimento que a cultura humana veio fazendo ao longo dos últimos
séculos, na tentativa de superar esse desequilíbrio entre o homem, a natureza e
seus pares, tem no direito uma de suas mais consistentes formas de consolidação.
Na ótica de Severino (1994, p. 58) “É o investimento, via justiça, na construção da
cidadania, inspiração maior dos melhores esforços que se deve reconhecer aos
projetos das sociedades modernas”. Assim, a lei surge como mediadora dos direitos
e deveres atribuíveis a todas as pessoas, de forma a garantir a cada um o que lhe é
devido e a impedir que o mais forte oprima o mais fraco, inviabilizando-lhe o usufruto
de seus direitos.
Lemos na Declaração Universal dos Direitos da Criança:
Ι. A criança tem o direito à igualdade, sem distinção de raça, religião ou
nacionalidade.
Na sica Deveres e Direitos, de Toquinho e Elijas Andreato, do CD “Canção
dos direitos da criança”, este princípio é expresso assim:
Meninos e meninas,
Não olhem religião nem raça.
Chamem quem não tem mamãe,
38
Que o papai ta lá no céu.
E os que dormem lá na praça.
Meninos e meninas,
Não olhem religião nem cor.
Chamem os filhos do bombeiro,
Os dois gêmeos do padeiro
E na filhinha do doutor.
Outro fragmento da Declaração Universal dos Direitos da Criança afirma:
ΙΙ.
“A criança tem todo o direito de ser compreendida, deve se desenvolver em
condições de igualdade de oportunidades, com liberdade e dignidade”
.
Esse preceito pode ser ilustrado por outra música (Errar é humano) dos
mesmos autores:
Não, não é vergonha, não.
Ser da rua o mais gordinho,
Ter pernas tortas,
Ser baixinho
Ou grandalhão.
Não, não é vergonha, não.
Todos sempre têm algum defeito.
Não existe a perfeição.
As crianças vivenciam a pluralidade, bem como a diversidade. O grande
aprendizado que fazem é conviver aceitando a si mesmas e aos outros: pessoas
diferentes nas opiniões, aparência física, jeito de ser.
No âmbito da educação, a lógica da heterogeneidade traduz-se pelo
reconhecimento e aceitação das diferenças individuais entre os alunos. São
diferentes suas motivações, expectativas e interesses quando iniciam a
escolaridade, assim como são diferentes os seus conhecimentos, vivências e
experiências prévias.
E se as diferenças resultantes de características físicas, étnicas, culturais ou
socioeconômicas são imediatamente visíveis e evidentes, o mesmo não se poderá
afirmar das características cognitivas, ou seja, o estilo, o ritmo e os percursos
preferenciais de aprendizagem ou o tempo necessário para aprender e os modos
mais eficazes de o fazer.
39
A diversidade e a heterogeneidade da escola não advêm de se estar
implementando a escolarização de crianças e jovens com necessidades educativas
especiais em classes regulares, mas simplesmente do fato de que a própria
sociedade é heterogênea e multifacetada.
Os alunos ditos com necessidades educativas especiais são apenas um caso
no seio da diversidade da população escolar, embora sejam aquelas que carecem
de maior atenção e acompanhamento.
A classe homogênea, tão do agrado do professor num passado ainda recente,
em que os alunos realizavam as mesmas tarefas, da mesma maneira, ao mesmo
tempo e com os mesmos recursos didáticos, terá de ceder lugar à classe
heterogênea (que sempre foi), na qual alunos com as mais variadas e diversas
expectativas, competências e possibilidades o convivem, como são pretexto e
contexto da própria definição e organização do processo ensino-aprendizagem.
O ideal de “escola para todos”, acordado por Estados do mundo inteiro na
Conferência de Jomtiem (Tailândia, 1990), não pode ser entendido como redutor de
“todos na escola”. Se esse importante documento programático pretendia, em
primeiro lugar, alertar as autoridades mundiais para a necessidade de acabar com o
analfabetismo e com as gritantes discriminações em taxas de escolarização em
grupos de uma mesma sociedade (mulheres, minorias étnicas, pobres urbanos,
marginalizados...) e entre países desenvolvidos e países em vias de
desenvolvimento, deveria igualmente ser objeto de outra leitura, de vertente
pedagógica e organizativa, no sentido de que cada aluno encontre na escola os
recursos necessários e adequados à satisfação das suas necessidades educativas,
isto é, que a escola seja de fato para todos.
As conseqüências para a organização e gestão dos sistemas educativos e
das escolas em geral e para as práticas cotidianas da sala de aula em particular,
decorrentes dessa perspectiva de atenção à diversidade, têm sido objeto de
múltiplos estudos e reflexões. Segundo Wang (1995), para organizar a escola em
função da “atenção à diversidade é necessário responder a três questões
fundamentais:
40
-
como identificar as características pessoais e as diferenças individuais dos
alunos na aprendizagem?
-
Quais as exigências de um ensino eficaz?
-
Como realizar uma educação de qualidade no ambiente cotidiano da sala de
aula?
Segundo a mesma autora, existem ainda problemas sérios na caracterização
das diferenças individuais, bem como na obtenção e utilização da informação
necessária à tomada de decisões educativas.
Em educação, as mudanças produzem-se com lentidão, sobretudo quando se
trata de práticas de sala de aula.
A convivência e o respeito à diversidade nos remetem ao princípio e à
estratégia da inclusão.
2.3 COMEÇANDO A FALAR DA INCLUSÃO
A inclusão é hoje mais que uma proposta escolar, é uma proposta social.
Passa pela luta por uma escola para todos, passa pela importância de educar para a
pluralidade, para a convivência numa sociedade diversificada, na qual o encontro
das diferenças físicas, culturais, ideológicas, entre outras, é condição primeira para a
transformação de toda uma sociedade.
Como é sabido, as tendências atuais, em matéria de princípios, políticos e
práticas educativas, vão claramente no sentido da formação dessa escola para
todos, dessa escola inclusiva. Uma estrutura educativa de suporte social, que
receba a todos, que abrigue os alunos independentemente de suas diferenças e
condições físicas, sociais, étnicas, religiosas, lingüísticas, etc. Uma escola que apóie
as aprendizagens, promovendo uma educação diferenciada que responda às
necessidades individuais, desconstruindo as marcas institucionais segregadores.
41
Sobre a escola inclusiva, Beyer (2003, p. 34) nos esclarece que “o paradigma
e a política da educação inclusiva constituem-se como processos claramente
definidos na história da educação especial“ Ainda segundo esse autor, o Brasil, por
meio da LDB 9394/96, adotou a proposta de integração escolar preferencial de
alunos com necessidades educacionais especiais, o que vem sendo discutido,
ampliado e reformulado pelos segmentos sociais envolvidos, traduzindo-se nos
documentos complementares à Lei (Diretrizes, Decretos, Leis) e que representam
referenciais de estudo e prática, tanto nas redes de ensino públicas quanto privadas.
No entanto, ressalta ainda o referido autor,
O que se constata, porém, nesses últimos anos, na repercussão do
confronto entre a legislação educacional e estas realidades é o sentimento
de incompletude, para não dizer impotência, das redes de ensino em geral,
e das escolas e professores em particular, para fazer cumprir esta
proposta.
Esse quadro de angústia, incertezas, até mesmo inconsistência conceitual
sobre educação inclusiva por parte das escolas e de seus órgãos administrativos
centrais (públicas e particulares) é evidenciado, principalmente, pela prática dos
professores, que consideram-se despreparados e desamparados pela estrutura
escolar. Tal contingência motiva-nos cada vez mais a prosseguir o estudo, visto que
a realidade do sistema municipal de educação em Manaus propicia alguns
questionamentos e observações semelhantes os abordados por Beyer.
Lembrando as palavras combatentes de Mantoan (2003, p. 86):
[...] O desafio está posto e temos de reconhecer que a herança recebida da
prática científica da modernidade tornou-nos cegos à complexidade, às
diferenças, à multiplicidade, dentro e fora das escolas. É inegável também
o poder das idéias inclusivas para dar clareza a esse novo olhar viciado e
para virar as escolas do avesso!
Até bem pouco tempo atrás, a função da instituição escolar era basicamente
a de transmissão de conhecimento. Conhecimento sistematizado, organizado e, se
possível, priorizando a leitura dos sujeitos a partir das categorias cartesianas. Hoje,
a pós-modernidade coloca essa visão em xeque e afirma que é preciso tolerar as
diferenças, aprender a conviver com o novo e com a desordem, pois todo
42
desenvolvimento é constituído por momentos de confusão e de incompreensão, que
precisam ser suportados. É a partir desse desequilíbrio que se chega ao
crescimento.
Jung (1983) refere que, à medida que excluímos os outros, fazemos isto com
nós mesmos, uma vez que é a presença do outro que nos diz quem somos, como
somos. Quando excluímos, impedimos a possibilidade de incorporarmos as
diferenças e as discordâncias dentro de nós mesmos. A formação da diversidade
começa quando nos assumimos como pessoas diversas, aprendendo a todo
momento com a diversidade dos outros.
Ao trabalhar com crianças e jovens, rotulados de diferentes, parece-nos que o
novo paradigma remete à pergunta de como transformar a queixa num desafio,
buscando respostas eficientes que resultem em algo interessante, não do ponto
de vista da aprendizagem, mas, principalmente, do ponto de vista do
desenvolvimento global: cognitivo, psicomotor, emocional, social, cultural. Trabalhar
com o diferente é poder tolerar o não saber, é poder buscar alternativas, abrir
possibilidades para situações ainda não exploradas.
A proposta de uma escola diferenciada, de qualidade, representa uma grande
novidade no sistema educacional do país e exige das instituições e órgãos
responsáveis a definição de novas dinâmicas, concepções e mecanismos, tanto
para que estas escolas sejam de fato incorporadas e beneficiadas por sua inclusão
no sistema social, quanto para que sejam respeitadas em suas particularidades, ou
seja, “[...] todo conhecer depende da estrutura daquele que conhece [...]”.
(MATURANA, 1995, p. 76).
A aprendizagem, olhada sob esse ângulo, supõe um movimento circular
criativo e se caracteriza como mudança derivada das interações recíprocas entre
sujeito, conhecimento e ambiente. As mudanças são significativas segundo a ótica
de quem observa e vivencia o processo. Nesse processo de aprendizagem, o
sujeito-aprendiz é considerado um construtor, um ser único e ímpar, que busca a
sua auto-organização (auto poiésis) na interação com o meio e com o outro.
Atender às diferenças, atender às necessidades educacionais especiais,
ressignificar, mudar o olhar da escola, demanda a adaptação do contexto escolar
43
aos alunos e o o inverso. Isso significa tornar esse contexto múltiplo, rico de
experiências e possibilidades, pronto para viver, conviver com o diferente, rompendo
barreiras humanas e arquitetônicas, criando novos conceitos, dando novos sentidos,
resignificando a aprendizagem e, conseqüentemente, o desenvolvimento humano.
Acreditamos que a inclusão nos faça refletir como nos ensinam Maturana e
Varela (1995, p. 50), que a proposta maior da educação é pensarmos na
condição humana como uma natureza cuja evolução e realização está no
encontro do ser individual com sua natureza última que é ser social.
Portanto, se o desenvolvimento individual depende da interação social, a
própria formação, o próprio mundo de significados em que se existe, é
função do viver com os outros. A aceitação do outro é, então, o fundamento
para que o ser observador ou auto-consciente possa aceitar-se plenamente
a si mesmo.
Com base nessa reflexão dos autores, cremos que uma proposta de
educação inclusiva possa contribuir para a construção de uma sociedade mais
igualitária, mais solidária e, portanto, comprometida com seu propósito mais
significativo: humanizar.
Nesse item, transitamos da desigualdade e da exclusão, expressões concretas de nossa
cidadania incompleta, para a compreensão da diferença e da diversidade, e do respeito a elas,
como pilares do novo paradigma de uma sociedade e de uma escola inclusivas. Sobre essas
últimas se estende o próximo item, com o intuito de avançar na formulação do quadro teórico
necessário à discussão da inclusão/exclusão na rede de ensino de Manaus.
2.4 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: MÚLTIPLAS LEITURAS E DIFERENTES
SIGNIFICADOS
A presença das referências à educação escolar de alunos “com necessidades
educacionais especiais”, é fenômeno relativamente recente em nossas leis e
políticas educacionais. A historicidade da (não) inclusão evidencia que esta
atravessou diferentes fases em diversas épocas e culturas.
44
A idade antiga, na Grécia e em Roma, é considerada por Araújo (2002), como
um período acentuado de exclusão social porque as crianças que apresentavam
formação não tinham chance de convivência social, pois eram abandonadas pelas
famílias ou simplesmente eliminadas.
Na idade média, nos países europeus, as pessoas com deficiência ainda
foram colocadas à margem do convívio social por serem rotuladas como inválidas e
também por questões sobrenaturais, sendo, assim, perseguidas e mortas. Segundo
Foucault (1979, p. 53), essa possibilidade de reencontrar os mesmos registros
históricos e descobrir novos significados leva a uma atitude marcada por “[...]
inquietações de sentir sob essa atividade cotidiana e cinzenta poderes e perigos que
mal se imagina; inquietações de supor lutas, vitórias, ferimentos, dominações e
servidões [...]”.
Falar da inclusão é traduzir angústias e insatisfações de toda ordem, de maior
ou menor relevância, dependendo do grau de constrangimento imposto por barreiras
instituídas pela configuração de diferentes práticas sociais e pela formação cultural
dos diferentes segmentos que constroem suas relações, enquanto sujeitos ou
objetos de suas próprias histórias. Esse princípio permite afirmar que a inclusão
pode ser entendida pela exclusão social, ou seja, no contraponto de sua
intencionalidade.
O termo inclusão, segundo o Dicionário Aurélio, indica uma relação de
pertencimento. No Dicionário Houaiss, a inclusão é definida como estado daquilo ou
de quem está incluso, inserido, compreendido dentro de algo; significa ainda
introdução de alguém em um grupo e é sinônimo de abrangimento, envolvimento,
introdução, incorporação. s, seres humanos, estamos incluídos na sociedade por
uma relação de pertencimento, baseada no princípio de igualdade: algo que nos
aproxima que nos identifica como pessoas. Estamos incluídos nesta sociedade
humana pelo princípio da identidade, mas podemos ser excluídos pelo princípio da
diversidade sempre que a diversidade resulte em discriminação. reside a nossa
contradição. Temos de discutir a inclusão, porque uma sociedade excludente,
que dicotomiza identidade e diversidade.
45
Os termos “diversidade” e “igualdade” vêm sendo utilizados de muitas formas.
A igualdade corresponde a um princípio universal abstrato relativo ao ser humano
é o mesmo que “eqüidade”, justiça; igualdade moral, relação entre os indivíduos em
virtude da qual todos eles são portadores dos mesmos direitos fundamentais, que
provêm da humanidade e definem a dignidade da pessoa humana. (FERREIRA,
1994, p. 51).
A diversidade mostra como somos diferentes no aspecto físico, psicológico e
cultural. No entanto, a essas diversidades soma-se uma diferença negativa para a
maior parte da humanidade: a desigualdade social, termo que se refere também na
forma dicionarizada, ao que é parcial, injusto. Essa desigualdade, marcada por
diferenças de classe social e de poder econômico e político, associa-se, na visão
ingênua, às diversidades no aspecto físico, psicológico e cultural, levando à quebra
do princípio universal da igualdade entre os humanos. A proposta de inclusão de
todos como participantes da produção social, cultural e econômica enfatiza a
igualdade concreta entre os sujeitos, com o reconhecimento das diferenças no
aspecto físico, psicológico e cultural. A diversidade não se opõe à igualdade. “A
desigualdade socialmente construída é que se opõe à igualdade, pois supõe que
uns valem menos do que os outros”. (LIMA, 2006, p. 21).
O enfrentamento e a superação dessa contradição são tarefas cotidianas em
uma proposta de Educação Inclusiva. A partir da estruturação do modelo capitalista
mais contemporâneo (neoliberalismo) nas sociedades ditas modernas, através do
processo de globalização (desnacionalização), a regra passa a ser a concentração
ainda mais acentuada do capital por pequenos grupos. Na verdade dois pólos são
instituídos: os que detém o poder (capital) e os submetidos aos flagelos gerados por
esse poder (a grande maioria da população as conhecidas minorias sociais). O
sistema capitalista, sem pudor, sem regras, tem como estratégia a segregação, num
exercício constante de preconceitos, referendando a coação e a discriminação
social. Isso demonstra que a inclusão, até aqui adotada nas regulamentações
normativas, dificilmente ou parcialmente é exercitada na prática social.
Por outro lado, deve-se entender o poder, neste caso, não como algo detido,
não concebido como uma propriedade, mas como uma estratégia e um conjunto de
mecanismos, cujos efeitos de dominação não sejam atribuídos a uma apropriação.
46
Foucault (2000, p.29) explica a necessidade de se “[...] admitir que esse poder se
exerce mais do que possuí, que não é privilégio adquirido ou conservado da classe
dominante, mas o efeito conjunto de suas posições estratégias efeito manifesto e
às vezes reconduzido pela posição dos que são dominados”.
Falar de uma possível inclusão é provocar, numa dimensão contextual uma
insurreição “[...], sobretudo e acima de tudo contra os efeitos centralizadores de
poder que são vinculados à instituição e ao funcionamento de um discurso cienfico
no interior de uma sociedade como a nossa”. (FOUCAULT, 2000, p. 14).
Em função das complexidades e das diferentes dimensões que envolvem
distintas leituras e suas operatividades, a inclusão configura-se no interior de
processos contraditórios e, por isso, conflitantes. Esses podem ser
compreendidos no (contraponto desse) discurso, pela forma mais marginal da
organização humana, as sociedades restritivas, explicitadas e compreendidas de
uma forma mais apurada e transparente, em suas manifestações culturais, com suas
respectivas significações e conseqüentes determinações, como uma figura original
do poder, articulado por técnicas específicas de saber, de controle e de coerção.
Numa primeira ordem, a sedução do discurso de igualdade, de direito, de
diversidade como lócus e respeito às diferenças, independente de sexo, raça, credo
religioso, idade, deficiência; numa segunda ordem (contraponto), verdadeira em sua
materialidade, em suas manifestações no cotidiano, enquanto fato social, instiga a
seguinte interrogação: até que ponto esses mesmos indivíduos participam da
economia, da política, da educação, da saúde e das demais esferas da sociedade?
No caso brasileiro, uma terceira ordem, a herança histórica das
desigualdades regionais, que explicita um conjunto de outros elementos que,
quando analisados, reforçam a marginalidade social e outros mecanismos seletivos.
O desrespeito e a desinformação quanto aos direitos da cidadania das
crianças, adolescentes e adultos portadores de deficiências encontrados em leis,
decretos, estatutos o que conseguem é perpetuar o rótulo de que essas pessoas
não aprendem, são incapazes, improdutivas, tornando inútil qualquer investimento.
47
Assegurada pela Constituição Brasileira, a educação é um direito, que se
estende a todos os indivíduos. Porém, uma igualdade plena de direitos existe no
papel.
É flagrante que o mais dramático problema da cidadania no Brasil é que
não há consciência da igualdade básica entre todos nós. Os que são
mais iguais não tem essa consciência pelo lado do dever, e os que são
menos iguais, os que tem menos recurso para exercer a cidadania, o
tem consciência dessa igualdade pelo lado dos direitos. (KUPFER,
2000, p. 129)
Acreditamos, então, que a educação para a cidadania e na convivência
cidadã deva contemplar em seu seio a luta pela dignidade humana, ou seja, a luta
pelos direitos humanos. Assim contribuímos para que nosso educando exercite a
cidadania. Compreendendo por cidadão o indivíduo que:
Se eleva em dignidade e direitos por sobre as instituições e estruturas, por
sobre o próprio Estado que, sob licença, o governa. Cidadão é todo o
homem e toda mulher sem discriminação etária, igualado pela condição
humana, de onde emana todo o poder político, que somente no seu
interesse se justifica. (TELLES, 1999, p. 09)
Então, o fazer pedagógico que pretende contemplar a vivência e o horizonte
da cidadania deverá passar pela assimilação do conceito de cidadão, enquanto algo
universalizador: não são somente os alunos que deverão construir suas cidadanias,
mas o professor muito importante que o faça) deverá também entender-se
enquanto cidadão. A cidadania precisa ser vivenciada por todos os sujeitos
comprometidos com a práxis pedagógica.
Do mesmo modo, deve-se superar dicotomias, como o normal x anormal,
deficiente x não-deficiente, capaz x incapaz, educação x educação especial, pois
não existem dois mundos; todo o indivíduo, quer deficiente, quer não, é único e
especial em toda a sua essência. Em outras palavras, “toda pessoa é uma
individualidade singular, diferente e distinta das outras, mas nunca está encerrada
em si mesma. Toda pessoa se encontra a si mesma como membro de uma
comunidade de pessoas”. (ABBAGNANO,1995, p. 167).
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[...] idealmente, a pessoa deficiente se percebe como um ser humano
completo, que, na pior das hipóteses, fica excluído de uma área limitada
da vida social ou ocupacional. Não constituí um tipo ou categoria, mas é
antes um ser humano singular, da mesma forma que os não-deficientes.
(TELFORD; SAWEREY, 1985, p. 87)
Para Vygotsky (1988), os princípios do desenvolvimento humano são os
mesmos para todos os sujeitos. Todo o ser humano é educável. Todas as crianças
devem ser educadas. Na sua visão, a fragilidade da deficiência é também uma força
que move o sujeito para as suas realizações. Segundo Lima (2006) a deficiência faz
parte da subjetividade de muitas pessoas, que se constituem como sujeitos sociais,
com base, simultaneamente, na fragilidade e na força dessa condição e em suas
possibilidades educativas.
Compreender, entretanto, que a deficiência não é doença, por si só não
basta, é preciso conceber o indivíduo deficiente sem negligenciar o fenômeno
humano em sua estrutura essencial, criando-se, assim, uma nova concepção de
aprendizagem, a qual, segundo Wang (1995), constitui-se em uma aprendizagem
humana e significativa. Nesse sentido:
[...] O método genético experimental de Vygotsky situava as análises
dos processos de desenvolvimento na zona de desenvolvimento
potencial através da influência ativa do experimentador e da
aprendizagem ativa do sujeito. Sucede que a aprendizagem através da
influência era para Vygotsky o fator fundamental do desenvolvimento.
(PINCHON, 1995, p. 61)
No entender de Vygotsky (1997), os educandos com necessidades
educacionais especiais necessitam de uma educação voltada para a compensação
de suas deficiências, uma educação que possa proporcionar-lhes o máximo de
liberdade individual. Segundo Aranha e Martins (2001), esta liberdade individual
pressupõe um interesse coletivo no compromisso e cooperação.
Ao falarmos ou buscarmos a inclusão estaremos lutando pela aceitabilidade
social, ou seja, indivíduos dito normais e indivíduos rotulados como incapazes serão
vistos sob o mesmo prisma, concebidos como sujeitos de um único mundo, com as
49
mesmas oportunidades e respeito às diferenças individuais. Um novo espaço social
onde são resgatadas a auto-confiança e dignidade da pessoa humana.
Do ponto de vista de Fonseca:
A integração deve tornar-se instrumento de facilitação para a mudança
educacional permitindo que a escola regular seja o local legítimo para
satisfazer as necessidades educacionais de crianças que são diferentes.
Novas estratégias e novos modelos integrados de inovação, deverão
compensar os efeitos de condições sociais frustradas e desfavorecidas
e combater as categorizações e as rotulações inconseqüentes no plano
educacional. (1987, p. 92)
É parte desse movimento a promoção de uma mudança nos valores
tradicionais pelo esclarecimento dos diferentes pontos de vista, como bem assinala
Maturana: ninguém está em condições de julgar o ponto de vista do outro,
considerando o seu como base de padrão ou de critério.
Frente a esse desafio, professores estarão aptos a estabelecer um rumo, um
caminho a ser trilhado com ousadia e coragem, no qual o palco de grandes batalhas
não serão consultórios médicos, salas de aula ou sessões de psicologia, mas sim o
significado que damos à existência humana, pressupondo-se que por detrás de
tantos rótulos e preconceitos um ser digno de respeito e carente de
oportunidades que possam revelar seu verdadeiro potencial. Do ponto de vista de
Thurler (2001, p. 14),
A Educação Inclusiva é uma questão de direitos humanos e implica a
definição de políticas públicas, traduzidas nas ações institucionalmente
planejadas, implementadas e avaliadas. A concepção que orienta as
principais opiniões acerca da educação inclusiva é de que a escola é um
dos espaços de ação e de transformação, que conjuga a idéia de
políticas educacionais e políticas sociais amplas que garantam os
direitos da população.
Sant’Anna (1988) elabora uma análise que permanece atual. Ela acusa o
sistema brasileiro de ensino, dada a sua seletividade, como um dos agentes mais
eficazes da produção social da marginalidade. Ela afirma que o processo de
seletividade empreendido pelo sistema educacional brasileiro encontra suas causas
na maneira como a escola lida com os alunos das classes populares: linguagem,
50
normas, conteúdos e cartilhas escolares retratam os modos de vida da classe
dominante, sua forma de vestir, falar, de se relacionar com o outro.
Não se pode esquecer que são três décadas que vivemos acompanhando o
preconceito, a marginalização e a exclusão em todos os sentidos na escola. As
pessoas são estigmatizadas a priori por não se enquadrarem nos padrões
dominantes. A auto-estima é rebaixada, a autonomia anulada e a cidadania
comprometida. nesta constatação uma inversão total de valores, sendo esses
desnudados de princípios éticos e de justiça social.
Com efeito, numa sociedade como a brasileira, com altos índices de exclusão
e profundas disparidades regionais, em que o desenvolvimento econômico e social
tem se dado combinando ilhas de riqueza cercadas por oceanos de pobreza, o papel
do Estado na organização e financiamento de serviços sociais, prestados por redes
de atenção e proteção social, é de suma importância para a garantia das
necessidades de sobrevivência de ampla parcela da população.
Obviamente, dependendo da história pessoal e social de cada pessoa, as
reações são diferenciadas. Alguns indivíduos conseguem passar por situações
constrangedoras sem sofrer demasiadamente e encontram recursos internos e
externos para se reorganizarem e recomporem suas energias de forma
surpreendente. Outros se abatem e levam mais tempo para retomarem suas
vidas, porém alguns entram em quadros de profundo sofrimento e podem recolher-
se na solidão.
Nessa multiplicidade de características individuais, podemos observar
também que existem pessoas para quem basta um consolo e um abraço carinhoso
para reerguê-las. Entretanto, encontramos aqueles que exigem mais atenção. Enfim,
são inúmeras possibilidades que precisamos reconhecer e respeitar, considerando a
diversidade do ser humano. Quanto a isso, Sluzki (1997, p. 15-16) nos ensina:
De fato, o “apoio social” é a razão de ser de inúmeros grupos de
autogestão e auto-ajuda de pacientes e de familiares de pacientes que
sofrem de transtornos físicos ou emocionais crônicos: os programas
de hospitalização parcial, ou hospital-dia, contém, como um de seus
mais importantes componentes, a possibilidade de favorecer o
desenvolvimento e a consolidação de uma rede estável de relações
informais e a aprendizagem ou reaprendizagem das habilidades
51
necessárias para estabelecer, nutrir e manter relações sociais ativas;
a “integração social” é o objetivo de boa parte dos programas de
prevenção terciária para pacientes psiquiátricos crônicos.
Como se nota, o apoio mútuo entre pessoas e grupos representa o melhor
caminho para construir-se alternativas pessoais e sociais, que possam trazer bem-
estar para todos os atores envolvidos. A esse respeito, em seus estudos Frei Betto
(1997) alerta que, dentre os quase seis bilhões de pessoas no planeta, a metade
vive na faixa da pobreza e mais de oitocentos milhões de pessoas vivem com fome
crônica. Para esse autor, ignoram-se as conotações éticas do problema e o se
elabora um planejamento de inclusão das maiorias.
Pensamos, então, ser importante que se busquem ou se construam
categorias que possibilitem uma visão global e dialética dos problemas da exclusão
e da desigualdade social, como uma questão político-cultural, mas que se trabalha
também na singularidade das diferenças. Nessa perspectiva:
A exclusão é um processo complexo e multifacetado, uma configuração
de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É processo
sutil e dialético, pois existe em relação à inclusão como parte
constitutiva dela. o é uma coisa ou um estado, é processo que
envolve o homem por inteiro e suas relações com os outros. (SAWAIA,
2004, p. 09)
Acreditamos ser uma necessidade política trazer a problemática da exclusão
e o desafio da inclusão social das pessoas com necessidades especiais para a
educação, numa perspectiva multicultural, tomando-se como referência o próprio
multiculturalismo crítico, que enfatiza a necessidade dos educadores intervirem
criticamente nas relações de poder que organizam a diferença. E cabe acrescentar
que é a partir de representações que as políticas educacionais são construídas e
podem legitimar ou não as práticas de discriminação e segregação.
As necessidades educacionais especiais dos alunos, advindas de suas
deficiências, não deveriam ser, por si mesmas, de acordo com Costa (2001, p. 13),
“[...] impeditivo para o ingresso e permanência na escola regular, desde que essa
estivesse equipada com os recursos didático-pedagógicos específicos e
profissionais capacitados para lidar com a diversidade dos alunos”, atuando na
52
perspectiva da educação democrática, com possibilidades de autonomia para todos
os alunos.
É preciso afirmar a cidadania em cada ação, tendo clareza de que a cidadania
de uma escola inclusiva não se fará espontaneamente, pois, como bem afirma
Mazzotta (1996), o reconhecimento e o exercício do direito dos portadores de
deficiência à educação é, sem dúvida alguma, tarefa que cabe aos portadores de
deficiência, aos pais, aos educadores, aos administradores e aos políticos; em
outras palavras, é dever da sociedade, é dever de todos nós.
A inclusão (na escola, no trabalho, no lazer, nos serviços de saúde, etc.),
significa que a sociedade deve adaptar-se às necessidades da pessoa com
deficiência para que esta possa desenvolver-se em todos os aspectos da vida.
Entendemos que, se a educação é importante como fator de transformação para
todos os indivíduos, uma educação de qualidade, que atenda suas necessidades
educacionais especiais, torna-se ainda mais crucial para os indivíduos com
deficiência. Mittler (2003, p. 23) coloca muito apropriadamente que, “a rua de acesso
à inclusão não tem um fim porque ela é, em sua essência, mais um processo do que
um destino. A inclusão representa, de fato, uma mudança na mente e nos valores
para as escolas e para a sociedade como um todo”.
Nas últimas décadas, a instituição escolar vem sendo desafiada a conseguir
uma forma equilibrada que resulte numa resposta educativa diversificada, que seja
capaz de proporcionar uma cultura comum a todos os educandos sob sua
responsabilidade, respeitando suas especificidades e necessidades individuais,
reconhecendo que a resposta à diversidade se constituí em um dos fatores mais
importantes para conseguir um ensino de qualidade.
Atualmente, de uma maneira gradativa, no Município de Manaus, vem sendo
reconhecido que a inclusão, no ambiente comum de ensino, daqueles que são
comumente excluídos entre os quais se encontram aqueles que apresentam
necessidades educacionais especiais mais significativas e que, em geral, estão
entre os que constituem os maiores alvos de estigmas sociais de toda a ordem - é
essencial para a sua dignidade e para o exercício dos direitos humanos. Segundo os
53
documentos do MEC/SEESP (2001, p. 33), as chamadas necessidades
educacionais especiais são:
Um conceito amplo: em vez de focalizar a deficiência da pessoa, enfatiza o
ensino e a escola, bem como as formas e condições de aprendizagem, em
vez de procurar, no aluno, a origem do problema, define-se pelo tipo de
resposta educativa e de recursos e apoios que a escola deve proporcionar-
lhe para que obtenha sucesso escolar; por fim, em vez de pressupor que o
aluno deva ajustar-se a padrões de “normalidade” para aprender, aponta
para a escola o desafio de ajustar-se para atender à diversidade de seus
alunos.
Para Thoma (2000) a “educação inclusiva é um movimento que busca
repensar a escola para que deixe de ser a escola da homogeneidade e passe a ser
a escola da heterogeneidade, para que a escola da discriminação lugar à escola
aberta a todos”. Para Staimback e Stainback (1999, p. 21), “a educação inclusiva
pode ser definida como“ a prática da inclusão de todos – independentemente de seu
talento, deficiência, origem socioeconômica ou cultural – em escolas e salas de aula
provedoras, onde as necessidades desses alunos sejam satisfeitas”. Conforme
reforça Beyer (2005, p. 28-29):
[...] a primeira condição para a educação inclusiva não custa dinheiro:
ela exige uma nova forma de pensar. Precisamos entender que as
crianças são diferentes entre si. Elas são únicas em sua forma de
pensar e aprender. Todas as crianças, não apenas as que apresentam
alguma limitação ou deficiência, são especiais. Por isto, também é
errado exigir de diferentes crianças o mesmo desempenho e lidar com
elas de maneira uniforme. O ensino deve ser organizado de forma que
contemple as crianças em suas distintas capacidades.
Tais considerações nos levam a dizer que um aluno com deficiência pode não
aprender, não por sua incapacidade de aprender, mas pela incapacidade da escola
de ensiná-lo respeitando modo e o tempo de aprendizagem individual do aluno. Por
conta dessa falta de entendimento, a sociedade, como está, expulsa de seu meio
muitos de seus membros, e a muitos mais nega a entrada.
Fica patente, então, a necessidade de transformação da sociedade atual,
para uma sociedade inclusiva, de pessoas humanas e não de algumas pessoas, tão-
somente. Trata-se, pois, de uma transformação concreta, que ela tem de refletir
54
em nossas atitudes, em nossas ações, em nossas falas, e, acima de tudo, em nós
mesmos.
Nesse sentido, diz Lima (2006, p. 63) que “[...] a inclusão não é algo que se
fala, mas algo que se vive, intensa e conscientemente, contínua e tenazmente,
concreta e francamente. A inclusão é a participação de todos pelo todo, com todos”.
Dessa forma, a inclusão pressupõe, na prática, reconhecer no outro (pessoa com
deficiência ou não) o potencial para aprender e a capacidade de ser.
Lima (2006, p. 63 - 65) enfatiza: “[...] a inclusão não é uma mera teoria da
moda, mas uma atitude de vida; uma expressão de sociedade e cidadania; uma
compreensão de que todos os seres humanos são humanos sem distinção”. Ou
seja, “[...] não há inclusão se não houver transformação e não há inclusão plena se a
transformação não for contínua, consciente e concreta”.
Isso significa quebrar tabus em relação à pessoa com deficiência, implica em
pôr por terra barreiras atitudinais, pois a postura da sociedade humana, que ora
conhecemos, é excludente, desrespeitosa dos direitos de seus membros, subsiste
sob uma ótica de “normalidade” e não de uma ética de reconhecimento, de respeito
e observância das diferenças inerentes à humanidade.
É importante enfatizar o que diz Santos (2003, p. 15):
[...] o tema inclusão tem suscitado inúmeros debates sobre suas
vantagens e desvantagens, evidenciando posições polêmicas e
controversas entre educadores e especialistas. Encontramos, em um dos
extremos, posições que advogam a inclusão de todos os alunos,
independente de sua deficiência, em classes comuns, com a eliminação
dos serviços de apoio e recursos auxiliares; no outro extremo,
encontramos posições que vêem a inclusão como utópica e inviável em
nossa realidade educacional.
Beyer (2005, p. 06) diz que:
[...] entendo que estamos em um momento da história da educação do
aluno com deficiência, com dificuldades na aprendizagem ou com
histórico de fracasso escolar, que possivelmente significa uma virada de
página, um avanço sem retrocesso (o que não significa,
necessariamente, sucesso). Alguns podem interpretar este momento
histórico como o surgimento de um novo paradigma educacional, ou
como um movimento de reforma educacional, porém estamos
55
certamente diante de um movimento internacional de revisão de
pressupostos fundamentais da educação especial.
Os paradigmas de inclusão representam um recurso eficaz para alcançar
objetivos que resultem na consideração da pessoa e na garantia de expressão de
seus direitos. No documento do MEC subsidiário à Política de Inclusão (2005, p. 27)
encontramos:
[...] incluir pessoas com necessidades educacionais especiais na escola
regular pressupõe uma grande reforma no sistema educacional que implica
na flexibilização, ou adequação do currículo, com modificação das formas de
ensinar, avaliar, trabalhar com grupos em sala de aula e a criação de
estruturas físicas facilitadoras do ingresso e circulação de todas as pessoas.
A inclusão é a aceitação da diversidade em sala de aula, mas isso só ocorrerá
mediante sua reestruturação pedagógica e administrativa. O movimento atual da
educação inclusiva tem suas bases na formação integral do ser, mediante o pleno
exercício da cidadania dentro da diversidade social na qual estamos inseridos. Sua
proposta baseia-se na luta pela igualdade de oportunidades para as minorias, na
busca de seus direitos enquanto seres humanos e cidadãos. Nas palavras de Mader
(1997, p. 47):
[...] um novo paradigma está nascendo, um paradigma que considera a
diferença como algo inerente na relação entre os seres humanos. Cada vez
mais, a diversidade está sendo vista como algo natural. E a sociedade busca
se orientar para que cada membro, com sua singularidade possa usufruir do
bem coletivo [...] Inclusão é o termo que se encontrou para definir uma
sociedade que considera todos os seus membros como cidadãos legítimos.
Uma sociedade em que há inclusão é uma sociedade em que existe justiça
social, em que cada membro tem seus direitos garantidos e em que sejam
aceitas as diferenças entre as pessoas como algo normal.
Almejamos uma educação na qual os alunos façam parte da vida escolar e
comunitária, em que a diversidade seja reconhecida e respeitada em todas as suas
dimensões, visando assim à efetivação da aprendizagem e promoção do sucesso
escolar de todos os alunos. Sobre a questão da educação inclusiva e seus
benefícios, Mantoan (1997, p. 08) assim se expressa:
56
[...] de certo que a inclusão se concilia com uma educação para todos e com
ensino especializado no aluno, mas não se consegue implantar uma opção
de inserção tão revolucionária sem enfrentar um desafio ainda maior: o que
recaí sobre o fator humano. Os recursos físicos e os meios materiais para a
efetivação de um processo escolar de qualidade cedem sua prioridade ao
desenvolvimento de novas atitudes e formas de interação, na escola, exigindo
mudanças no relacionamento pessoal e social e na maneira de se efetivar os
processos de ensino e aprendizagem: Inclusão!
No Simpósio intitulado “Deficiência Intelectual: Programas, Políticas e
Planejamento para o Futuro”, realizado pela ONU, o prof. Peter Mittler, da
Universidade de Manchester, Reino Unido, disse diante dos 275 participantes
internacionais: “Inclusão é a chave” (MITTLER, apud UNITED NATIONS, 1995, p.
02).
Segundo Cury (1987):
[…] considero que estamos vivendo um momento de transição
de uma cultura discriminatória com relação ao diferente para
uma cultura de inclusão, em que o diferente é aceito não por ser
diverso, mas porque o diverso enriquece. É esse o grande
desafio atual: construir uma nova cultura da inclusão, na qual o
acolhimento da diferença se faça no reconhecimento do outro
como igual, como parceiro, como par. Na educação, isso implica
a consciência de que, desde o ato educativo mais simples da
pré-escola, é preciso garantir aos portadores de necessidades
educacionais especiais um lugar garantido nas salas comuns
das escolas comuns
.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu pressuposto geral,
deixa claro que “[...] os seres humanos nascem livres e iguais”: [...] sem distinção
alguma, nomeadamente de cor, de sexo, de língua, de religião [...] de nascimento ou
de qualquer outra situação”. (BRASIL. Art. 2, 1995); “[...] todos são iguais perante a
lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei [...] (BRASIL, Art. 7, 1995);
“[...] toda a pessoa têm direito à educação. A educação é gratuita, pelo menos o
correspondente ao ensino elementar fundamental [...] (BRASIL, Art. 26, 1995).
Implicitamente os artigos enunciados invocam assegurar a todos, independente de
serem ou não pessoas com deficiência, os “mesmos direitos”: à liberdade, à
educação, ao acesso cultural e social e à livre participação na vida comunitária.
A “Declaração Mundial sobre Educação para Todos” (Jomtiem, Tailândia,
março de 1990), prescreve, “[...] a educação sica deve ser proporcionada a todas
as crianças, jovens e adultos. Para tanto é necessário universalizá-la e melhorar sua
57
qualidade, bem como tomar medidas efetivas para reduzir a desigualdade”, Art. 3º.
Declara também que as necessidades básicas de aprendizagem das pessoas
portadoras de deficiência requerem atenção especial: “É preciso tomar medidas que
garantam a igualdade de acesso à educação aos portadores de todo e qualquer tipo
de deficiência, como parte integrante do sistema educativo”. (art. 3º, 5).
A Declaração de Salamanca (1994) se reapropria dos princípios das
discussões e encaminhamentos da “Declaração Mundial sobre Educação para
Todos” (1990), e direciona para os propósitos específicos da atenção educacional
aos alunos com necessidades educacionais especiais. influência de uma
educação referenciada pelo modelo espanhol, totalmente diferente das condições
impostas aos demais países ditos em “desenvolvimento”, especialmente o Brasil, e,
mais especificamente, em Manaus, em que as estruturas das instituições escolares
ficam quase reduzidas a quadro, pincel, um professor, carteiras e sala de aula com
quarenta e oito ou mais alunos.
Na Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, os Estados–parte
reafirmaram que:
[...] as pessoas portadoras de deficiência detêm os
mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que
outras pessoas e que esses direitos, inclusive a de não ser
submetido à discriminação com base na deficiência,
emanam da dignidade e da igualdade que são inerentes a
todo o ser humano”.
Nesse sentido, é necessário garantir processos que possibilitem às pessoas,
a partir de suas condições humanas, o desenvolvimento de suas potencialidades,
encarando o aluno, com ou sem deficiência, como um ser que pensa, que deseja e
que também constrói independentemente das limitações impostas em sua natureza.
A propósito, Marquezan (2004, p. 38) nos diz:
[...] A Educação Inclusiva assume-se como respeitadora da cultura, da
capacidade e das possibilidades de evolução de todos os alunos.
Aposta na escola como comunidade educativa, defende um ambiente de
aprendizagem diferenciado e de qualidade para todos os alunos.
Reconhece as diferenças e trabalha com elas para o desenvolvimento e
dá-lhes um sentido. É um novo paradigma organizado em conformidade
58
com um conjunto de valores de respeito, solidariedade e qualidade para
todos.
Nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica
(Conselho Nacional de Educação, 2001):
[...] a construção de uma sociedade inclusiva é um processo de
fundamental importância para o desenvolvimento e a manutenção de
um Estado democrático. Entende-se por inclusão a garantia, a todos,
do acesso contínuo ao espaço comum da vida em sociedade,
sociedade essa que deve estar orientada por relações de acolhimento à
diversidade humana, de aceitação das diferenças individuais, de
esforço coletivo na equiparação de oportunidades de desenvolvimento,
com qualidade, em todas as dimensões da vida
.
Como parte integrante do processo de inclusão e contribuição essencial para
a determinação de seus rumos, encontra-se a inclusão educacional. Nesse sentido
Beyer (2005, p. 27) orienta que:
[...] educar é confrontar-se com a diversidade. O professor que
transite diariamente entre seus alunos conhece muito bem tal
diversidade. Dificilmente aceitaria qualquer premissa de
homogeneidade dos seus alunos, pois sabe que são diferentes entre
si, assim como não há ser humano igual ao outro.
A Declaração de Salamanca (1994) preceituou:
[...] todas as escolas deveriam acomodar todas as crianças,
independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais,
emocionais, lingüísticas ou outras. Deveriam incluir todas as crianças
deficientes e superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de
origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes a minorias
lingüísticas, étnicas, ou culturais e crianças de outros grupos em
desvantagem ou marginalizados. As escolas têm que encontrar a maneira de
educar com êxito todas as crianças, inclusive as que têm deficiência grave.
pela existência desses dispositivos normativos não se poderia negar a
qualquer aluno brasileiro o acesso a uma mesma sala de aula nas escolas
regulares. O conceito de escola inclusiva, de acordo com as Diretrizes Curriculares
59
Nacionais para a Educação Especial, implica em uma nova postura da escola
regular, que deve propor, no projeto político-pedagógico, no currículo, na
metodologia, na avaliação e nas estratégias de ensino, ações que favoreçam a
inclusão social e práticas educativas diferenciadas que atendam a todos os alunos.
Pois, numa escola inclusiva, a diversidade é valorizada, em detrimento da
homogeneidade.
Do ponto de vista de Werneck (2000, p. 16):
[...] o conceito de sociedade inclusiva exige revolução. Trata-se de uma
proposta política que pretende alterar a estrutura constitucional do Estado. Do
Estado de fora e do Estado de dentro, o estado interior de cada indivíduo. A
revolução a que nos referimos está apoiada na certeza de que ninguém
descansa de suas deficiências nem de seus talentos. Isso prova que a
sociedade não pode descansar também.
Isso nos levaria a crer que para a educação tornar-se “inclusiva” é necessário
a maturação dos educadores sobre qual postura educacional atinge as verdadeiras
perspectivas dessa proposta. Para isso devemos conhecer as necessidades de
nossa época, que exige mudanças nos propósitos educacionais, e não tempo
para omissões, é necessário aplicabilidade de propostas que proporcionem o direito
ao educando de adquirir conhecimentos, de conhecer suas capacidades e de
usufruí-las.
A Comissão Internacional sobre o Desenvolvimento da Educação, da
UNESCO, admite a necessidade de reforma na educação, levando à compreensão,
identificação e aplicação de quatro pilares de sustentação do processo educativo:
“Aprender a Conhecer”, adquirindo os instrumentos de compreensão de uma cultura
geral; “Aprender a Fazer”, adquirindo competências para poder atuar no contexto;
“Aprender a viver Junto”, saber trabalhar em equipe, perceber a interdependência;
“Aprender a Ser”, desenvolvendo a personalidade e autonomia.
Esses procedimentos poderiam contribuir para superar as dificuldades de
interação em nossos dias, que são as barreiras atitudinais, preconceituais,
descomprometimento com a vida social, individualismo, competivismo etc (MEC,
1998). Portanto, cada vez mais cabe à escola, muito mais do que a mera
60
transmissão de conteúdos ou a formação de mão de obra especializada,
proporcionar condições de apoio e instrução, atendendo às potencialidades
individuais de cada alunos e promovendo a sua integração com toda a comunidade.
Na interação indivíduo e meio, a qual na teoria histórico–cultural de Vygotsky
opera uma função recíproca, em que um influência o outro, fatores externos e
internos se inter-relacionam promovendo mudanças sobre o indivíduo. Essas
mudanças ocorrem na vivência. O ser humano, estimulado em atividades de contato
social, coopera, comunica-se, partilha, compreende o outro, ou seja, socializa-se.
Por conta disso, para falar da inclusão no campo escolar é necessário pensar
numa outra escola, sem discriminação, que não reforce os diferentes conflitos
históricos da sociedade, que o personifique o aluno como marca ou estigma,
diferenciando-o ou categorizando-o, como se fosse recuperável ou não, normal ou
anormal, mas como sujeito das suas próprias construções históricas.
A Constituição Federal de 1988 preza pelos princípios da cidadania, da
dignidade da pessoa humana, da não-discriminação, da igualdade, dentre outros. A
Inclusão da pessoa com deficiência encontra eco não nos princípios
constitucionais, como também em diversos outros preceitos da Lei Maior, que
autorizam/oportunizam sua concretização, merecendo pequenos retoques para que
se tenha primoroso sistema constitucional sobre a matéria.
Assim, para que o ordenamento jurídico oportunize mais fortemente a
inclusão, é necessário que se ajustem alguns preceitos constitucionais que conflitam
com uma inclusão extensiva. Um dos ajustes diz respeito ao inciso III do art. 206, o
qual enuncia que um dos deveres do Estado para com a educação é o “atendimento
educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na
rede regular de ensino” (grifo nosso). Entendemos que o termo “preferencialmente”
deveria ser eliminado, uma vez que se choca com a garantia da inclusão, pois a
rede regular de ensino haverá de receber toda e qualquer criança e adolescente,
independente de suas diferença ou dificuldade, de forma coativa e não optativa. De
acordo com Minto (2000, p. 09), “[...] preferencialmente pode ser o termo-chave para
que não se cumpra o artigo, pois quem dá primazia tem arbitrada legalmente a
porta de exceção”. Cabe observar que o termo “preferencialmente” é abolido no
61
Parecer 17/01 e na Resolução 2/01 do Conselho Nacional de Educação,
documentos que contém as diretrizes curriculares nacionais da educação especial
na educação básica.
A educação especial, segundo essas normas, deve ocorrer nas escolas
públicas e privadas da rede regular de ensino, com base nos princípios da escola
inclusiva. Essas escolas, portanto, além do acesso à matrícula, devem assegurar as
condições para o sucesso escolar de todos os alunos. Extraordinariamente, os
serviços de educação especial podem ser oferecidos em classes especiais, escolas
especiais, classes hospitalares e ambiente domiciliar.
Encontramos na Resolução CNE/CEB Nº. 02/01, em seu artigo “o
atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais deve ser
realizado em classes comuns do ensino regular, em qualquer etapa ou modalidade
da Educação Básica”.
É preciso ter em mente, contudo, que existência de normas não garante,
infelizmente, que os direitos estejam sendo assegurados no dia a dia. Inclusão,
como foi dito, não é simplesmente um fato, é um processo. Como todo o
processo, tem suas etapas e deve ser avaliado em todas elas, com responsabilidade
e com os olhos críticos, para a sua qualificação.
Na escola inclusiva deve haver uma postura consciente, crítica, significativa e
um processo interativo, longe dos papéis tradicionais entre professores e alunos. Os
professores aproximam-se dos alunos. Segundo Vygotski (1997), tornam-se
mediadores na construção de seus conhecimentos. Desta forma, os alunos passam
de simples receptores de conhecimento para autores de sua aprendizagem, na
busca da construção de significados e não da absorção de conceitos desconectados
da realidade vigente.
A proposta da educação inclusiva necessita do consenso entre pais,
professores e gestores, pois todos os alunos estão na condição de educandos, são
aprendizes de uma escola que deve ser de boa qualidade para todos. A escola
necessita ser integrada à sua comunidade. Para Costa (2001, p. 91):
62
[...] A urgência de uma educação democrática e emancipadora parece
constituir-se como alternativa para a superação da diferença
significativa como obstáculo para o acesso e permanência na escola
regular dos educandos com deficiência e na possibilidade de se pensar
uma sociedade justa e humana.
O pressuposto da inclusão é que a escola ofereça oportunidades de
aprendizagem a todos, indistintamente, respeitando a diversidade de sua clientela.
Essa intenção deve se explicitar no projeto pedagógico da escola, de modo que o
currículo proposto seja dinâmico e flexível, permitindo o ajuste do fazer pedagógico
às peculiaridades de cada aluno.
Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de
aprendizagem que lhe são próprios; os sistemas educativos devem ser projetados e
os programas aplicados de modo que tenham em vista toda a gama dessas
diferentes características e necessidades; as pessoas com necessidades educativas
especiais devem ter acesso às escolas comuns, que deverão integrá-las numa
pedagogia centrada na criança, capaz de atender suas necessidades.
(DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994).
Isto posto, pretende-se que a homogeneização lugar à individualização do
ensino, na qual os objetivos, as seqüência e ordenação de conteúdos, assim como o
processo de avaliação e a organização do trabalho escolar em tempos e espaços
diversificados, contemplem os diferentes ritmos e habilidades dos alunos,
favorecendo seu desenvolvimento e sua aprendizagem.
Ainscow (1998) diz que é preciso que o professor considere novas
possibilidades e estratégias, que esteja disposto a refletir criticamente sobre sua
ação, ultrapassando os perigos da concepção baseada na deficiência, e que
considere o aluno como uma rica fonte de experiências. O que, afinal, ele é, como
nos elucida Cavaco (1995), pois só pelo esclarecimento do porquê de nossas
práticas pedagógicas é que nossas incertezas e dificuldades podem reencontrar o
sentido do nosso trabalho.
Em termos de políticas educacionais, quando falamos em inclusão estamos
falando em resgatar a educação como direito de todos os cidadãos, direitos de todos
63
os alunos a uma educação de qualidade, sem nenhuma espécie de preconceito e
discriminação.
2.5 UM OLHAR SOBRE DOCUMENTOS INTERNACIONAIS E LEGISLAÇÃO
Historicamente, somente com o surgimento do estado moderno é que é
possível identificarmos um sistema de educação como parte da política pública dos
governos democráticos na Europa do século XIX (GIDDENS, 1992, p. 500). No
Brasil, desde o período colonial, passando pelo Império e pelo Estado republicano
até a década de 1970, constatamos um processo lento de incorporação das
camadas populares ao sistema educativo. Acelerar esse processo de incorporação e
efetiva permanência na escola exige não somente a redução das desigualdades
sociais, mas, sobretudo, erradicação da exclusão e abertura de novos espaços
sociais que somente a ação da cidadania plena poderá forjar.
Os documentos normativos e legais são alguns dos importantes instrumentos
que firmam fundamentos e instrumentos das políticas públicas educacionais.
O direito deve objetivar sempre a aplicação da justiça e a garantia das
liberdades fundamentais do homem para que possa conviver em harmonia com os
outros homens, é a base sobre a qual as modernas sociedades devem se organizar
e se desenvolver, portanto, o Direito deve existir, em função da sociedade, isto é, em
defesa da harmonia social para possibilitar o desenvolvimento individual e coletivo.
Daí a importância da constituição, dos códigos e das leis que constituem o direito,
pois eles tanto fixam as linhas gerais da organização social e da convivência
humana, quanto fornecem os subsídios essenciais para a solução dos conflitos
jurídicos que possam ocorrer nas vidas das organizações e dos indivíduos.
No Brasil, a principal fonte do direito é a Lei. Seguindo esse pressuposto, o
direito é uma ciência que estuda, “estabelece e sistematiza as normas necessárias
para assegurar o equilíbrio das funções do organismo social, a cujos membros são
coercitivamente impostas pelo poder público” (ARAÚJO, 1997, p. 365).
64
No relacionamento da Educação com o Direito, uma visão jurídica pode
comportar três direções: faculdade atribuída ao educando, norma que regula
comportamentos e ramo da Ciência do Direito.
Em primeiro lugar, a educação como prerrogativa concedida ao aluno,
destaca-se a educação proclamada como direito de todos. É nesse sentido que a
Constituição Federal de 1988 dispõe em seu artigo 205: “A educação, direito de
todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
A segunda direção do olhar jurídico alcança a educação como norma que
rege e disciplina comportamentos; são as diversas legislações educacionais
existentes, onde uma parte estrutura o funcionamento dos serviços educacionais e
outra define os direitos e deveres do aluno e do professor, especialmente nos
regimentos escolares e nos estatutos do magistério.
O estudo, tanto dessas normas como dos direitos atribuídos ao aluno e ao
professor, constituí uma terceira acepção do Direito. É o Direito Educacional,
qualificado como direito especializado e com considerável amplitude de leis,
decretos, portarias e institutos próprios. Dessa maneira concebido, o Direito
Educacional implica no seu reconhecimento como um ramo da ciência jurídica; é um
instrumento capaz de levar a educação a todos. Isto é, que “todos m o direito à
educação”, para a efetivação, individual e social, administrativa e judiciária da
educação.
O Direito-Dever da educação não é de caráter facultativo, mas de natureza
imperativa. De um lado, o indivíduo pode exigir que o Estado o eduque. De outro, o
Estado pode exigir que o indivíduo seja educado. Assim, como o direito à educação
é corolário do direito à vida, da mesma forma a educação é irrenunciável tanto
quanto o é a vida. Penso, com base em Motta (1997, p. 53):
É crime tentar suicidar-se. Deixar de educar-se é um suicídio moral. E isso
porque, sem desenvolver suas potencialidades, o ser humano impede a
eclosão de sua vida em toda a plenitude. Sem aprimorar suas
virtualidades espirituais, o indivíduo sufoca em si o que tem de mais
elevado, matando o que tem de humano para subsistir apenas como
65
animal. Continua como ser vivo conservando o gênero, mas perece como
homem, eliminando a diferença específica.
Um elemento essencial deve ser abordado ao tratarmos do campo do direito:
os direitos humanos. A garantia dos Direitos Humanos tem sido colocada nos
últimos anos, no cenário da discussão da Política de Inclusão Educacional, haja
vista que se pensar em direitos humanos implica, necessariamente, em se pautar
em uma noção de humano, de direito, de justiça, de um ideal de sociedade.
A ação educativa precisa ser repensada dentro desta visão de ser humano
em relação, pois dela advém uma ética, uma representação na sociedade que pode
fortalecer tanto a promoção quanto a violação dos direitos humanos. A ação
profissional do educador, pautada no respeito aos direitos humano como dimensão
ética, deve ter a capacidade de realizar um movimento de saída de si ao encontro do
outro. É na busca do diálogo com o outro que será possível o entendimento dos
direitos e uma intervenção humana.
Faz-se necessário compreender que o processo de interação social é
permanentemente conflituoso, concomitância entre processos de inclusão e de
exclusão, sendo os Direitos Humanos produto de uma correlação de forças sociais.
Uma nova dimensão precisa ser acrescentada, a das políticas públicas, como
mecanismo de ação do Estado na efetivação dos direitos de cidadania. De modo
geral, as políticas públicas são entendidas mais como ações de uma plataforma
governamental específica do que uma obrigação perene do Estado. Tendo em conta
os Direitos Humanos e os direitos de cidadania, é fundamental que se supere essa
concepção e se avance para a compreensão de Políticas Públicas como ações do
Estado na perspectiva de assegurar direitos coletivos e condições de exercício da
cidadania para todos e cada pessoa que vive no país.
Lembramos aqui a Convenção dos Direitos da Criança, cujos artigos são
regidos pelos quatro princípios fundamentais e incondicionais estabelecidos na
Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948):
1 Universalidade: Os Direitos Humanos são universais, ou seja, aplicam-se a todo o ser
humano sem distinção.
66
2 Responsabilidade: Todos temos o dever de proteger, cumprir e respeitar os Direitos
Humanos, e o Estado é responsável por garantir que esses direitos sejam assegurados
através de medidas legais.
3- Indivisibilidade: Todos os Direitos são interdependentes, existe uma complementaridade
dos Direitos, que não é hierárquica, e esses devem ser garantidos em sua totalidade pelo
Estado.
4- Participação: Como cidadãos, todos os seres humanos têm o direito de estar envolvidos no
processo de tomada de decisão sobre os Direitos Humanos. (SAVE THE CHILDREN
SUÉCIA, 2002)
Os Direitos Humanos são declarações de princípios que definem como as
pessoas devem se comportar na sociedade com relação a outras pessoas. Todas as
crianças e todos os jovens têm direitos iguais porque todos são seres humanos.
Esses direitos independem de sua raça, cor, religião, cultura, deficiência ou condão
pessoal e familiar.
Entendendo, pois, a educação e a educação de pessoas com deficiência
como direitos de cidadania e direitos humanos, pontuamos na seqüência normas e
legislação internacionais e brasileiras que dizem respeito mais diretamente à
educação inclusiva. Não pretendemos dar conta de todo o conjunto normativo,
relacionamos marcos que consideramos os mais relevantes e que recorrentemente
têm sido usados para justificar ou dar suporte às políticas públicas de educação
inclusiva.
2.5.1 Documentos ou Normativas Internacionais
O Brasil, enquanto país membro da ONU e signatário de documentos
orientadores no âmbito internacional, reconhece seus conteúdos e os tem observado
na elaboração das poticas públicas internas.
Declaração Universal dos Direitos Humanos
A Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948, proclamou a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, na qual é prescrito que "Todos os seres humanos
nascem livres e iguais, em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de
consciência, devem agir uns para com os outros em esrito de fraternidade." (Art.1°).
67
No seu Artigo 26, proclama que "toda pessoa tem direito à educação e esta
deve visar a plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do
homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância
e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos [...]".
De maneira geral, essa Declaração assegura às pessoas com deficiências os
mesmos direitos à liberdade, a uma vida digna, à educação fundamental, ao
desenvolvimento pessoal e social e à livre participação na vida da comunidade.
Inicialmente a atenção aos Direitos Humanos foi marcada pela tônica da
proteção geral e abstrata e mais recentemente passou-se a explicitar a pessoa como
sujeito de direitos, respeitado em suas peculiaridades e particularidades. Em outras
palavras, o respeito às diferenças remete para a construção de contextos sociais
inclusivos.
Declaração Mundial de Educação para todos
Em marco de 1990, em Jomtien, na Tailândia, ocorreu a Conferência Mundial
sobre Educação para Todos, onde proclamou-se a Declaração Mundial de Educação
para Todos: satisfação das necessidades básicas de aprendizagem. Nessa
Declaração, diversos países, entre eles o Brasil, reafirmam que:
A educação é um direito fundamental de todos, mulheres, e homens, de
todas as idades, no mundo inteiro.[...] a educação é um elemento que
pode contribuir para conquistar um mundo mais seguro, mais sadio, mais
próspero e ambientalmente mais puro, e que, ao mesmo tempo, favoreça
o progresso social, econômico e cultural, a tolerância e a cooperação
internacional.
No art. 3º, que trata da universalização do acesso à educação e promoção
da equidade, lê-se que:
“as necessidades sicas de aprendizagem das pessoas portadoras de
deficiências requerem atenção especial. É preciso tomar medidas que
garantam a igualdade de acesso à educação aos portadores de todo e
qualquer tipo de deficiência, como parte integrante do sistema educativo”.
68
O Brasil, ao assinar essa Declaração, assumiu o compromisso de erradicar o
analfabetismo e universalizar o Ensino Fundamental. Para isso, tem elaborado
instrumentos norteadores e documentos legais que apoiam a construção de sistemas
inclusivos.
Declaração de Salamanca
Em junho de 1994, em Salamanca, na Espanha, representantes de 92 países e
25 organizações internacionais realizaram a
Conferência Mundial sobre Necessidades
Educativas Especiais: Acesso e Qualidade, patrocinada pela UNESCO, discutindo a atenção
educacional às pessoas com Necessidades Educacionais Especiais - PNEE`s.
O Brasil não teve representante nessa Conferência, mas é signatário dessa
Declaração. Nela, reconhece-se que “todas as crianças, de ambos os sexos, tem
direito fundamental à educação e que a elas deve ser dada oportunidade de obter e
manter um nível aceitável de conhecimentos". Afirma-se também que os sistemas
educativos devem estar de acordo com as características e necessidades inerentes
de cada criança, abrangendo toda a gama de diversidades.
A Declaração de Salamanca, em relação à inclusão escolar, partiu do seguinte
pressuposto (1994, p. 05):
O princípio fundamental da escola inclusiva é o de que todas as criaas
devem aprender juntas, sempre que possível, independentemente de
quaisquer dificuldades ou diferenças que elas possam ter. Escolas inclusivas
devem reconhecer e responder às necessidades diversas de seus alunos,
acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando
uma educação de qualidade a todos através de um currículo apropriado,
arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso de recursos e parceria
com as comunidades.
A Declaração de Salamanca é um certo consenso em torno de uma política em
educação especial, culminou em um documento das Nações Unidas, intitulado
"Regras Padrões sobre Equalização de Oportunidades para Pessoas com
Deficiências", que proclama (p. 08):
. Toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a
oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem;
69
. Toda criança possui características, interesses, habilidades e
necessidades de aprendizagem que são únicas;
. Aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à
escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia
centrada na criança, capaz de satisfazer tais necessidades em;
. Escolas regulares que possuam tal orientão inclusiva constituem os
meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se
comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e
alcançando educação para todos; além disso, tais escolas provêem uma
educão efetiva à maioria das criaas e aprimoram a eficncia e, e em
última instância, o custo da eficia de todo o sistema educacional.
A Assembléia Geral das Nações Unidas sobre a Criança, analisou a situação
mundial da criança e estabeleceu metas a serem alcançadas, salientando que, até o
ano de 2015, todas as crianças devem ter acesso a um ensino primário de boa
qualidade, gratuito e obrigatório.
O pressuposto da inclusão é que a escola ofereça oportunidades de
aprendizagem a todos, indistintamente, respeitando a diversidade de seus alunos.
Essa intenção deve-se explicar no Projeto Pedagógico da escola, de modo que o
curculo proposto seja dinâmico e flexível, permitindo o ajuste do fazer pedagógico às
peculiaridades de cada aluno.
Isto posto, pretende-se que a homogeneização lugar à individualização do
ensino, na qual os objetivos, a seqüência e ordenação de conteúdos, o processo de
avaliação e a organização do trabalho escolar em tempos e espos diversificados
contemplem os diferentes ritmos e habilidades dos alunos, favorecendo seu
desenvolvimento e sua aprendizagem.
Convenção da Guatemala
A partir da Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas
de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, os Estados-parte
reafirmaram que "as pessoas portadoras de deficiências tem os mesmos direitos
humanos e liberdades fundamentais que outras pessoas e que estes direitos,
inclusive o de não ser submetido à discriminação com base na deficiência, emanam
da dignidade e da igualdade que são inerentes a todo ser humano" (2001).
70
No seu artigo I, a Convenção define que o termo deficiência "significa uma
restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita
a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada
ou agravada pelo ambiente econômico e social".
Também define que não constitui discriminação "a diferenciação ou preferência
adotada pelo Estado - Parte para promover a integração social ou desenvolvimento
pessoal dos portadores de deficiência, desde que a diferenciação ou preferência não
limite em si mesmo o direito à igualdade dessas pessoas e que elas não sejam
obrigadas a aceitar tal discriminação" (2001). O termo discriminante, para os efeitos
dessa Convenção, significa "toda a diferenciação, exclusão ou restrição baseada em
deficiência", que acaba por impedir ou anular os direitos das pessoas portadoras de
deficiências.
De outra parte, o documento ressalva que preferências, em termos de políticas
que focalizam as pessoas com deficiências, não são discriminação. Ou seja, ações
afirmativas voltadas à inclusão não comprometem, pelo contrário, promovem a
igualdade.
Carta para o Terceiro Milênio
Esta carta foi aprovada no dia 9 de setembro de 1999, em Londres, Grã-
Bretanha, pela Assembléia Governativa da REHABILITATION INTERNACIONAL.
Nessa Carta afirma-se que os direitos básicos são ainda rotineiramente negados a
segmentos da população mundial nos quais se encontram 600 milhões de pessoas
com deficiências.
Em seu texto, afirma que as políticas públicas devem ter por finalidade "buscar
um mundo onde as oportunidades iguais para pessoas com deficiência se tornem
uma conseqüência natural de políticas e leis sábias que apoiem o acesso a, e a plena
inclusão, em todos os aspectos da sociedade".
Entende ser este acesso referente à eliminação de todas as barreiras
ambientais, eletrônicas e principalmente atitudinais que se anteponham à plena
inclusão das pessoas com deficiências na vida comunitária. Salienta, ainda, a
71
necessidade da criação de políticas públicas que respeitem tanto a dignidade como a
diversidade existente na população em geral, prescrevendo que todas as nações
devam elaborar programas contínuos de acessibilidade, prevenção, intervenção e
reabilitação às pessoas com deficiências.
Conclui fazendo um apelo para que os países-membros apoiem a promulgação
de uma Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência para a sua inclusão em todos os espaços da vida em sociedade.
Declaração Internacional de Montreal sobre Inclusão
Aprovada em 5 de junho de 2001, pelo Congresso Internacional "Sociedade
Inclusiva", realizado em Montreal, Quebec, Canadá, declara ser o acesso igualitário a
todos os espaços da vida um pré-requisito para os direitos humanos universais e
liberdades fundamentais das pessoas. Apresenta como objetivo juntar, em parceria,
governos, trabalhadores e sociedade civil para desenvolverem políticas e práticas
inclusivas, afirmando que todos os setores da sociedade recebem benefícios da
inclusão. E conclui afirmando que: "O esforço rumo a uma sociedade inclusiva para
todos é a essência do desenvolvimento social sustentável" (2001).
2.5.2 Legislação e Normas Brasileiras
A sociedade brasileira tem elaborado dispositivos legais que orientam políticas
públicas de inclusão das pessoas com deficiência. Neste item, destacaremos
preceitos de documentos legais especificamente, ou indiretamente, relacionados à
educação escolar das pessoas com deficiências.
Constituição Federal
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 assumiu princípios
postos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e, em relação à educação,
afirma em seu art. 205:
72
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Em relação ao ensino, afirma que este será ministrado com base no principio
de "igualdade de condições para o acesso e permanência na escola", (Art. 206, I)
sendo um dos deveres do Estado a garantia de “atendimento educacional
especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de
ensino". (Art. 208, III).
Estatuto da Criança e do Adolescente
Sancionado pela Lei 8069 de 13 de julho de 1990, assegura em seu
Capítulo IV, do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer, no art. 53, que:
A criança e o adolescente tem direito à educação, visando o pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação
para o trabalho assegurando-se.
I- igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II- Direito de ser respeitado por seus educadores;
[...]
V - Acesso a escola pública e gratuita próxima de sua residência” .
Em seu Art. 54 enuncia os deveres do Estado para com a educação da criança
e do adolescente, entre os quais está assegurar: "ensino fundamental obrigatório e
gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria” (inciso I) e
“atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino" (inciso III). Segundo esse Estatuto
nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligencia ou
discriminação.
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
A LDB (Nº. 9394/96) em vigor foi editada oito anos depois da promulgação da
Constituição de 1988, após um longo período de discussões no Congresso Nacional,
permeada por reivindicações dos educadores que desejavam uma lei que atendesse
73
aos interesses da população brasileira, especialmente a mais pobre, e que
valorizasse o educador. Nas palavras de Cury (1987, p. 12),
Uma lei, quando discutida, põe em campo um embate de forças e traz,
portanto, consigo uma série de experiências e até mesmo de
esperanças válidas para todos os sujeitos interessados. Se aprovada,
gera adesão imediata nos que apostaram em tais experiências. Para os
que apostaram nestas, resta o caminho de uma crítica que se ofereça
como alternativa criadora sob a qual está posta a possibilidade de uma
mudança para o futuro a partir do presente.
De fato, é muito difícil uma lei que atenda os interesses de todos e a atual
LDB não é diferente, ela agrada a uns e desagrada a outros. Como diz Cury (idem,
p. 21) “não cabe o apedrejamento da lei da parte dos que viram suas experiências
frustradas. E os que propugnaram pelo texto que se tornou vitorioso não podem
idolatrá-lo”. A LDB não se encerra em si, pois ela não é tudo na Educação Escolar.
Antes dela, há que se considerar o capítulo da Educação da Constituição Federal de
1988.
Por outro lado, colocar os 92 artigos da Lei 9394/96 em prática é um
desafio para os governantes e para os educadores, que se deparam com uma lei
que abrange todas as etapas da Educação Básica e a Educação Superior.
Para os objetivos desta tese, transcrevemos oito artigos da LDB referentes a
aspectos macro e micro da educação nacional, por considerá-los mais relevantes,
visto que envolvem, além da vontade política dos governantes, aspectos sociais e
econômicos que vão além do âmbito da escola e atingem contextos mais amplos.
Art. O dever do Estado com a educação escolar será efetivado
mediante a garantia de:
I ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele
não tiveram acesso na idade própria;
[...]
III - atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com
necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV - Atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a
seis anos de idade;
[...]
VIII - atendimento ao educando no ensino fundamental público, por meio
de programas suplementares de material didático-escolar, transporte
alimentação e assistência a saúde;
74
IX - padrões mínimos de qualidades de ensino, definidos como a
variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao
desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.
Art. O acesso ao Ensino Fundamental é direito público subjetivo,
podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação
comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra
legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder
Público para exigi-lo.
§ 1º Compete aos Estados e aos Municípios, em regime de colaboração, e
com assistência da União:
I recensear a população em idade escolar para o ensino fundamental, e
os jovens e adultos que a ele não tiverem acesso;
II – fazer-lhes a chamada pública;
III – zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.
§2º - Em todas as esferas administrativas, o Poder Público assegurará em
primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatório, nos termos desse artigo,
contemplando em seguida os demais níveis e modalidades de ensino,
conforme as prioridades constitucionais e legais.
Art. 9º A União incumbir-se-á de:
I - elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os
estados, o Distrito Federal e os Municípios;
[...]
III prestar assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de
ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória, exercendo
sua função redistributiva e supletiva;
IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino
fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus
conteúdos mínimos, de modo assegurar formação básica comum;
V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação.
Art. 10. Os Estados incumbir-se-ão de:
I- organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais
dos seus sistemas de ensino;
II- definir, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do
ensino fundamental, as quais devem assegurar a distribuição
proporcional das responsabilidades, de acordo com a população a
ser atendida e os recursos financeiros disponíveis em cada uma
dessas esferas do Poder Público;
III- elaborar e executar políticas e planos educacionais, em
consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação,
integrando e coordenando as suas ações e as dos seus
Municípios;
[...]
Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos
seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais
da União e dos Estados;
II – exercer ação redistribuitiva em relação as suas escolas;
III – baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
IV – autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu
sistema de ensino;
75
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas e, com
prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros veis de
ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades
de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais
mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e
desenvolvimento do ensino.
Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas
comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
I- elaborar e executar sua proposta pedagógica;
II- administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros;
III- assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aulas
estabelecidas;
IV- velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente;
V- prover meios para a recuperação dos alunos de menor
rendimento;
VI- articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de
integração da sociedade com a escola;
VII- informar aos pais e responsáveis sobre a freqüência e o
rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua
proposta pedagógica;
[...]
Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:
I- participar da elaboração da proposta pedagógica do
estabelecimento de ensino;
II- elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta
pedagógica do estabelecimento de ensino;
III- zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV- estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor
rendimento;
[...]
VI- colocar as atividades de articulação da escola com as famílias e a
comunidade.
Art. 18: Os sistemas municipais de ensino compreendem:
I- as instituições de ensino fundamental, médio e educação infantil
mantidas pelo Poder Público Municipal;
II- as instituições de educação infantil criada e mantida pela iniciativa
privada;
III- os órgãos municipais de educação.
A LDB 9394/96, em seu capitulo V, que trata da Educação Especial, afirma em
seu art. 58 que ”Entende-se por Educação Especial, para os efeitos desta Lei, a
modalidade de Educação Escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de
ensino, para educandos portadores de necessidades especiais”.
Neste artigo fica especificado também que, quando necessário, haverá
serviços de apoio especializados na escola regular para atender as peculiaridades da
clientela da Educação Especial.
76
Conforme o art. 59, os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com
necessidades especiais:
I - Currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização,
específicos para atender as suas necessidades;
II - Terminalidade espefica para aqueles que não puderem atingir o
nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de
suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o
programa escolar para superdotados;
III - Professores com especialização adequada em nível médio ou
superior, para atendimento especializado, bem como professores do
ensino regular capacitados para a integração desses educandos em
classes comuns;
Nessa Lei descreve-se, como alternativa preferencial, a ampliação do
atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública
regular de ensino.
Fazendo-se uma análise geral dos artigos acima relacionados chega-se à
conclusão de que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 9394/96,
além de o ser inovadora, em termos do que seriam os desafios modernos da
educação, é uma lei que envolve muitos interesses orçamentários e interfere em
instituições públicas e privadas de grande relevância nacional como escolas e
universidades. Como diz Saviani (1997, p. 231) “não é a lei dos sonhos do educador
brasileiro porque, entre outras coisas, se atém a modelos didáticos totalmente
superados, perante as atuais tendências da aprendizagem”. Demo tem a mesma
opinião quando afirma que,
A LDB reflete uma letargia nacional no campo da educação que
impede de perceber o quanto as oportunidades de desenvolvimento
dependem da qualidade educativa da população. É difícil fugir da
constatação de que para a elite interessa, pelo menos em certa
medida, a ignorância da população, como tática de manutenção do
status quo. Essa percepção torna-se tanto mais complicada, porque
para uma parte da elite não poderia interessar o atraso, porque
este não lhe dá mais lucro. (1997, p. 67)
Apesar da LDB estabelecer atribuições à União, Estados e Municípios, sem
esquecer de atribuir responsabilidade à escola e aos docentes em relação à
qualidade do ensino, percebe-se um grande distanciamento entre a legalidade e a
prática, entre o ideal e o real. Demo (1997, p. 68) critica o sistema de ensino ao
afirmar que “o Brasil é um dos países mais atrasados do mundo em matéria de
77
educação. E a LDB não redime essa chaga; por mais que lance perspectiva
inovadora aqui e ali a educação continua terrivelmente obsoleta”.
É preciso, contudo, fazer uma análise crítica, num campo intermediário entre
apenas aceitar ou rejeitar a Lei, para não condená-la ou absolvê-la na sua
totalidade. Assim sendo, ela merece toda atenção, por tratar de assuntos decisivos
para educação, bem como para o desenvolvimento da economia e da sociedade.
Por outro lado, a Lei, por si , não resolve as mazelas da educação, é preciso
vontade política dos governantes, comprometimento dos professores e cobrança da
sociedade para que o sistema educacional brasileiro atinja seus objetivos de modo a
que as políticas públicas educacionais possam efetivar os direitos de cidadania e os
direitos humanos.
que pontuar, ainda, que pela primeira vez a Educação Especial tem suas
especificidades inseridas numa lei de diretrizes e bases brasileira; reforça-se, assim,
o direito à educação das pessoas com deficiência e a necessidade de provimento de
políticas públicas que ofereçam condições concretas ao exercício desse direito. Se
um panorama geral da Lei leva a caracterizá-la como pouco ousada no sentido da
transformação educacional, talvez o mesmo não se aplique a campos específicos,
como é o caso da Educação Especial.
Plano Nacional de Educação, Lei Nº 10.172 / 2001
A instalação da República do Brasil e o surgimento das primeiras idéias de
um plano que tratasse da educação para todo o território nacional aconteceram
simultaneamente. À medida que o quadro social, político e econômico, no início do
século XX, se desenhava num país com amplas perspectivas, a educação também
começa a se impor, encabeçada pelos Pioneiros da Educação Nova (década de 30),
como condição fundamental para o desenvolvimento do país. Eles propunham, por
meio de uma carta aberta à população, a reconstrução educacional de grande
alcance e de vastas proporções, um plano com sentido unitário e de bases
científicas.
O documento teve grande repercussão, resultando na inclusão de um artigo
específico sobre plano de educação na Constituição Brasileira de 16 de julho de
78
1934. Esse artigo declara ser competência da União fixar o plano nacional de
educação, compreendendo o ensino de todos os graus e ramos comuns e
especializados, assim como coordenar e fiscalizar a sua execução em todo o
território no país. Todas as Constituições posteriores, com exceção da década 1937,
incorporam, implícita ou explicitamente, a idéia de um Plano Nacional de Educação.
Com a Constituição Federal de 1988 ressurgiu a idéia de um plano nacional
de longo prazo, com força de lei, capaz de conferir estabilidade às iniciativas
governamentais na área da educação e, mais adiante, garantir o cumprimento dos
art. e 87, da Lei 9394/96 (LDB) que determinam, respectivamente, a
elaboração desse plano pela União, em colaboração com os entes federados, e seu
encaminhamento ao Congresso Nacional como plano decenal, no prazo de até um
ano da publicação da Lei (ou seja, até dezembro de 1997); esse plano deveria estar
em sintonia com a Declaração Mundial de Educação para Todos.
A Lei que aprova o Plano Nacional de Educação (2001-2010), de
10.172/01, foi aprovada em fevereiro de 2001 pelo Congresso Nacional. Sua
tramitação no Congresso Nacional estendeu-se por mais de três anos, congregando,
antes e durante o processo, intensos debates e movimentos propositivos no âmbito
governamental e da sociedade civil.
Não cabe aqui entrarmos nos meandros desse debate, apenas queremos
registrar o caráter “contestado” do texto do PNE. Como estamos fazendo com os
demais documentos, pontuamos na seqüência conteúdos do PNE considerados
relevantes para os objetivos dessa tese.
Objetivos e linhas gerais do Plano Nacional de Educação
Os objetivos declarados no PNE são:
- elevar o nível de escolaridade da população;
- melhorar a qualidade do ensino em todos os níveis;
- reduzir as desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à
permanência, com sucesso, na educação pública;
79
- democratizar a gestão do ensino público, nos estabelecimentos oficiais,
obedecendo aos princípios da participação dos profissionais da educação na
elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das
comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
O diagnostico geral do PNE contém apreciações que vale destacar aqui.
Considera que os recursos financeiros são limitados para responder ao
desafio de oferecer uma educação compatível, na extensão e na qualidade, impondo
novas medidas que precisam ser construídas para garantir os objetivos do PNE. No
entanto, a busca de saídas para atingir esses objetivos remete a considerar,
necessariamente, a questão educacional sob o ponto de vista social, econômico e
político.
Do ponto de vista social, é enfocada a condição de miséria da população,
aliada à falta de incentivo ao estudo básico, que faz com que as crianças e jovens
deixem de estudar. Como conseqüência, o Brasil é hoje um dos países da América
Latina com a maior taxa de analfabetos e semi-analfabetos. Sem estudo, os
brasileiros de classe baixa formam um grande exército de mão-de-obra
desqualificada, com direito de receber apenas um salário mínimo e sem condição e
possibilidade de ascensão social. Os poucos que conseguem terminar o ensino
médio, dificilmente ingressam na universidade. Com muito sacrifício uma minoria
sujeita-se a pagar seus cursos em instituições particulares, algumas delas sem a
devida qualidade. As principais razões dessas contradições, segundo o plano, estão
relacionadas ao ensino público que não prepara o aluno de forma eficiente para
concorrer de igual para igual com os da classe média e alta que freqüentam as
melhores escolas e, também, porque os jovens prematuramente ingressam no
mercado de trabalho para ajudar no sustento da família.
Com relação ao aspecto econômico, o diagnóstico aponta que a
degradação do Ensino Fundamental e Ensino Médio reflete-se na preparação da
mão de obra qualificada. Os recursos gastos no ensino pouco têm retorno, se for
considerada a alta taxa de evasão e repetência ainda existente no sistema de ensino
brasileiro, o que representa um altíssimo prejuízo para os cofres blicos. Outro
80
grande problema apontado é a má aplicação das verbas destinadas à educação,
que, além de não serem elevadas, ainda são desviadas para outros fins.
Sob o ponto de vista político, o analfabetismo acaba criando o analfabeto
político. Sem instrução, podem restringir-se as possibilidades de perceber a
realidade que o rodeia.
O PNE traz diagnósticos, objetivos e metas para a gestão e o financiamento
da educação, para as etapas e modalidades de ensino e para a formação e
valorização dos profissionais da educação. O texto refere a necessidade de que
objetivos e metas estabelecidos para a nação sejam desdobrados e especificados
nos planos estaduais e municipais articulados ao PNE.
No texto do Plano são apontadas cinco grandes prioridades: (1) garantia do
ensino fundamental obrigatório às crianças e adolescentes; (2) garantia de ensino
fundamental a todos os que nele não ingressaram ou que não o concluíram; (3)
ampliação do atendimento na educação infantil, no ensino médio e na educação
superior; (4) valorização dos profissionais da educação; (5) desenvolvimento de
sistemas de informação e avaliação.
Embora a Educação Especial esteja contemplada implicitamente em todas as
etapas e modalidades abrangidas pelo Plano, um item específico, detalhando um
diagnóstico, assim como objetivos e metas, sobre educação especial.
A educação especial no PNE
No item do diagnóstico, o texto lembra, primeiramente, o direito à educação
das pessoas com necessidades especiais e reforça o atendimento preferencial nas
escolas “regulares”. Na seqüência, são apresentadas estimativas e dados de
demanda, cobertura e condições de atendimento institucional na educação especial;
o quadro descrito revela a precariedade do atendimento, assim como o sério déficit
de cobertura e as próprias dificuldades de estimar esse déficit. É colocada também a
configuração do atendimento: predomínio do atendimento especializado em
detrimento da integração em classes comuns; mais de metade da matrícula em
instituições privadas, maior atendimento no ensino fundamental, seguido da
educação infantil.
81
Superar o déficit de atendimento é considerado como um desafio imenso para
os sistemas de ensino, para o qual devem concorrer várias ações, destacando-se: a
qualificação dos profissionais; a sensibilização dos alunos e da comunidade em
geral para a integração/inclusão; as adaptações curriculares e infra-estruturais; a
produção de materiais e equipamentos pedagógicos.
Considerando o diagnóstico e o desenvolvimento de ações, conforme
resumido acima, o Plano define diretrizes, objetivos e metas para a Educação
Especial.
Das diretrizes, cabe sublinhar o reforço a que a integração no ensino regular
das pessoas com necessidades especiais é uma diretriz constitucional e que a
mesma, embora estabelecida mais de uma cada, ainda não produziu
mudanças significativas na realidade escolar. As diretrizes para a política de
educação especial, resumidamente, são: o desenvolvimento de uma política de
acesso por parte da União, estados e municípios, envolvendo um âmbito social e um
âmbito educacional; atendimento em todas as etapas, modalidades e níveis do
ensino; presença forte da União no planejamento e direcionamento da expansão do
acesso; articulação e cooperação entre os setores da educação, saúde e assistência
social; a formação de recursos humanos qualificados para o atendimento. Cabe
realçar que entre as diretrizes admite-se a existência de escolas especiais quando
as necessidades dos alunos assim o indicarem”, assim como é apontada a
pertinência do apoio dos governos a organizações da sociedade civil de natureza
filantrópica que historicamente trabalham no atendimento educacional.
Enfim, o texto do Plano reforça a diretriz da inclusão/integração e o dever do
Estado para com a Educação Especial; contudo, seguindo a mesma linha da LDB,
também deixa muitas portas abertas para a educação especializada e para o apoio
público às instituições particulares.
Os objetivos e metas que são arrolados no Plano, em número de 28, seguem
essas diretrizes.
CORDE Coordenadoria para a Integração de Pessoa Portadora de
Deficiência
82
A Lei 7.853 de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre o apoio às pessoas
com deficiência, sua integração social e sobre a Coordenadoria para a Integração da
Pessoa Portadora de Deficiência.
Na área da educação dispõe sobre:
a) a inclusão, no sistema educacional, da Educação Especial, como
modalidade educativa que abranja a educação precoce, a educação básica,
a supletiva, a habilitação e reabilitação profissionais, com currículos, etapas
e exigências de diplomação próprios;
b) o oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial em
estabelecimentos públicos de ensino;
c) o acesso de alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos
demais educandos, inclusive material escolar, merenda escolar e bolsa de
estudo.
Programa de complementação ao atendimento educacional especializado
as pessoas portadoras de deficiência
A Lei 10.845, de 5 de março de 2004, institui o Programa de
Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras
de Deficiência, com o objetivo de garantir a universalização do atendimento
especializado aos portadores de deficiência cuja situação não permita a integração
em classes comuns; estabelece a progressiva inserção destes educandos nestas
classes do ensino regular.
Convenção interamericana para eliminação de todas as formas de
discriminação contra as pessoas com deficiência
Em 08 de outubro de 2001, o Brasil, através do Decreto Nº. 3952, promulgou a
Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, comprometendo-se a tomar medidas
de caráter legislativo, social, educacional, trabalhista ou de qualquer outra natureza,
83
para eliminar a discriminação contra as pessoas portadoras de deficiências e
proporcionar a sua plena integração à sociedade.
Salienta a importância da sensibilização da população, por meio de campanhas
de educação, destinadas a eliminar preconceitos, estereótipos e outras atitudes que
atentam contra o direito das pessoas de serem iguais. Acrescenta também a
necessidade de trabalhar prioritariamente nas áreas de prevenção, detecção,
intervenção precoce, tratamento, reabilitação, educação e formação ocupacional para
garantir o melhor nível de independência e qualidade de vida para as pessoas
portadoras de deficiências.
Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica
A Resolução CNE/CEB Nº. 02/2001 instituiu as Diretrizes Nacionais para a
Educação Especial na Educação Básica, que manifesta o compromisso do país com
"o desafio de construir coletivamente as condições para atender bem a diversidade de
seus alunos". Essa Resolução representa um avanço na perspectiva da
universalização do ensino e um marco da atenção à diversidade quando ratifica a
obrigatoriedade da matricula de todos os alunos nos sistemas de ensino.
Afirma que, dessa forma, "não é o aluno que tem que se adaptar à escola, mas
é ela que, consciente da sua função, coloca-se à disposição do aluno, tornando-se um
espaço inclusivo".
A proposão da política expressa nas Diretrizes traduz o conceito de escola
inclusiva centrando seu foco na discussão sobre a questão social e o projeto
pedagógico da escola.
84
3. CAMINHOS DA PESQUISA E CONTEXTOS DE INVESTIGAÇÃO
Nesta seção da tese, colocamos em evidência componentes da trajetória de
pesquisa que são os procedimentos e pressupostos metodológicos levados em
conta e algumas delimitações de contextos consideradas relevantes para a
compreensão das ações de educação inclusiva na rede municipal de ensino de
Manaus e na escola onde realizamos um estudo de caso.
Em termos de metodologia, procuramos esclarecer os delineamentos mais
gerais da abordagem adotada - a pesquisa qualitativa - assim como detalhar
técnicas, procedimentos e sujeitos que participam da investigação.
No que diz respeito aos contextos, o texto abrange: um panorama da cidade
de Manaus; uma caracterização de aspectos organizacionais e de políticas levadas
a cabo pela Secretaria Municipal de Educação de Manaus; uma descrição da Escola
pesquisada, com ênfase para seu projeto político–pedagógico e peculiaridades do
trabalho de campo realizado e dos sujeitos que interagiram nesse trabalho.
3.1 ABORDAGEM DA PESQUISA
Para abordar a situação-problema descrita optamos por realizar uma
metodologia que tornasse possível uma aproximação com a realidade do nosso
objeto se a Rede de Ensino Municipal de Manaus tem buscado garantir a
aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos com necessidades educacionais
especiais, prevendo formas de acompanhamento do processo escolar que respeitem
as possibilidades de expressão do potencial dos mesmos. A metodologia qualitativa
em educação tem possibilitado estudos mais dinâmicos e abrangentes, pois
considera o “ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como
seu principal instrumento na coleta e análise dos dados”. (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p.
11)
O método dialético fundamentou a pesquisa por propiciar uma interação do
todo, visando a que nenhuma parte do processo fosse deixada de lado. Assim,
85
levou-se em consideração a realidade dos professores, pedagogas, coordenadores,
e diretora em relação ao ensino dos educandos com necessidades educacionais
especiais, num ir e vir, analisando historicamente e criticamente a formação dos
professores.
É importante lembrar que “[...] a dialética é a ciência da destruição de toda a
fixidez, de todo o ser aqui, a negação de toda a determinação, a evanescência de
toda a certeza no movimento incessante do devir, da evolução para a abolição”
(BROHN, 1979, p. 58). Assim, o método dialético é percebido como a análise dos
aspectos contrários existentes num determinado problema a ser estudado, de forma
a apropriar-se dos fenômenos que compreendem esse problema e que se
encontram ligados entre si. Dessa forma não como ver as partes como fatos
isolados, mas sim seu todo, pois é justamente isso que se quer, uma visão de
conjunto. Busca-se, pois, a compreensão do movimento, da contradição, do conflito
e da totalidade para que se compreenda a estruturação esperada com essa
pesquisa.
A pesquisa de campo foi realizada durante o período de agosto/2005 a
setembro/2006 numa Escola Municipal que será identificada nesse trabalho pelo
Codinome “Escola Municipal Sempre Viva”. A centralização da pesquisa em apenas
uma escola pareceu a mais adequada à natureza do estudo desenvolvido, segundo
a Banca no Exame de Qualificação do Projeto de Tese, permitindo, muito mais do
que a quantificação de achados, o aprofundamento da questão a ser investigada.
Apesar da direção da escola ter facilitado o contato com a equipe e com o
corpo docente, em decorrência da Coordenadora Pedagógica da Escola da Equipe
da SEMED fazer parte do cleo de Estudos e Pesquisas em Psicopedagogia da
UFAM, era visível a desconfiança preliminar apresentada pela Diretora e pela
Coordenadora Pedagógica, atitude perfeitamente compreensível pois, embora não
se possa negar o valor de algumas pesquisas, também é verdade como diz WARDE
(1987, p. 2), que: “[...] do lado da Universidade, alimenta-se o pré-conceito de que
as redes de ensino estão nas mãos de profissionais que não compreendem em
profundidade e criticamente a educação [...]”.
86
Scoz (1994) enfatiza que as escolas públicas, as únicas a abrirem suas portas
para os pesquisadores, transformam-se no maior alvo das críticas sobre a situação
da educação brasileira, sem receber, em contrapartida, retorno significativo das
pesquisas, que raramente oferecem alternativas viáveis de ação. Eis por que era
fundamental estabelecer um clima de confiança, de modo que as pedagogas, e os
professores não se sentissem manipulados e seus depoimentos fluíssem com
autenticidade.
Este cuidado foi produtivo; as pedagogas, inicialmente inibidas, foram ficando
mais à vontade, chegando a pedir sugestões de trabalho pedagógico voltado para o
educando com necessidades educacionais especiais.
Os educandos, a princípio, reagiram à minha presença com agitação e
curiosidade, mas, passado o primeiro impacto, acostumaram-se com a minha
presença.
E assim se deu a pesquisa. Durante as observações realizadas em sala de
aula, as professoras mostraram atividades e avaliações bimestrais dos educandos
apontados com necessidades educacionais especiais, material que, unido às
entrevistas e observações, formaram o corpo específico do trabalho.
Consideramos o estudo de caso adequado ao trabalho em questão porque
permite “aprender e retratar a visão pessoal dos seus participantes”. (ANDRÉ, 1995,
p. 29), pesquisados e também a do pesquisador, a respeito do objeto de estudo, no
nosso caso, a verificação (conhecimento) da Proposta da Secretaria Municipal de
Educação para o apoio das ações dos professores que tem em suas classes alunos
com necessidades educacionais especiais da escola selecionada.
Nesta pesquisa não partimos de hipóteses prévias diante do problema a ser
investigado. Procuramos “captar a realidade como ela realmente é e não como
gostaríamos que fosse” (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 22). Porém, as reflexões sobre o
nosso objeto de estudo a partir das reflexões da nossa prática levou-nos a levantar
algumas questões, aqui colocadas, as quais procuramos investigar nesta
pesquisa.
87
Entendemos que essa opção metodológica pode contribuir para o avanço na
maneira de entender a realidade vivida pelo pesquisador. Investigações desta
natureza, segundo André e Ludke (1986), possibilitam a busca, a descoberta e a
interpretação dos fatos, valorizam a indução e levam em conta os componentes de
uma situação em suas interações e influências.
Aceitamos também uma das exigências da investigação qualitativa, a qual
preconiza que o mundo seja examinado com a idéia de que nada é trivial e que tudo
tem potencial para constituir uma pista, para então estabelecer uma compreensão
mais esclarecedora do objeto de estudo. (BOGDAN; BIKLEN, 1994).
Por suas peculiaridades, este estudo exigiu a participação dos técnicos da
SEMED/Secretaria Municipal de Educação e Cultura, do CMEE/Centro Municipal de
Educação Especial, do Conselho Municipal de Educação, da diretora,
coordenadores e professores e alunos da Escola Municipal Sempre Viva.
Todos os órgãos, escolas e pessoas que participaram deste estudo
constituíram peças imprescindíveis para a execução desta investigação, pois foram
estudadas as dimensões institucional, pedagógica (prioritária) e sociopolítica, todas
envolvendo o cotidiano das salas de aula analisadas.
Assim como André (1986), entendemos que a dimensão institucional ou
organizacional envolve os aspectos referentes ao contexto da prática escolar; a
dimensão instrucional ou pedagógica abrange as situações de ensino nas quais se
o encontro professor-aluno-conhecimento e a dimensão sociopolítica cultural
refere-se aos determinantes macro e estruturais da prática educativa.
Para realização da pesquisa, houve o apoio e a aceitação da nossa proposta
de estudo pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura/SEMED, pelo Centro
Municipal de Educação Especial/CMEE e especificamente pela Escola Sempre Viva,
que desde o início dos trabalhos compreenderam que se tratava de uma
investigação que pretendia, se possível, contribuir para a reorientação das políticas
educacionais em Manaus, no que se refere à atenção à diversidade dos alunos, e,
conseqüentemente, à escola para todos.
88
A delimitação do estudo se efetivou quando fomos a campo a Rede Escolar
Municipal de Manaus -, em abril de 2005, e demos início à coleta dos dados de
forma mais sistemática em agosto de 2005. Nesta fase de decisão, procuramos
selecionar os dados necessários para responder às questões que pretendemos
investigar nesta pesquisa, de modo a possibilitar a compreensão e interpretação do
fenômeno estudado. (LUDKE; ANDRÉ, 1986).
Foi selecionada para a investigação a Escola Municipal Sempre Viva,
caracterizada pela coordenadora do CMEE e também pela coordenadora
pedagógica como Escola de Referência que estava sendo acompanhada, apoiada e
avaliada sistematicamente, segundo as orientações do CMEE/SEMED.
Essa escola está localizada em setor urbano da cidade e atende a alunos
com necessidades educacionais especiais, prioritariamente pessoas com alguma
deficiência, em turmas da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e da Educação
de Jovens e Adultos. o priorizamos nenhuma série ou turno, apenas nos
limitamos às indicações e/ou sugestões da própria escola.
Esta escolha deu-se de modo intencional, ou seja, selecionamos uma escola
da rede municipal de Manaus que tinha “representatividade qualitativa”
(THIOLLENT, 1994, p. 62). Escolhemos a escola em função da relevância de seu
trabalho junto à comunidade e a partir de informações coletadas por membros da
equipe de pesquisadores do cleo de Estudos e Pesquisas em Psicopedagogia
Diferencial da FACED/UFAM.
Consideramos a instituição como tendo “representatividade qualitativa” pois a
escola atendia alunos com dificuldade de aprendizagem e alunos com deficiência,
tendo, por isso, uma experiência mais sistematizada e significativa.
Além disso, a escola trabalhava com a inserção escolar do aluno com
deficiência há mais de um ano letivo, e também possuía em seus quadros funcionais
professoras que assumiam pela primeira vez este tipo de trabalho na rede municipal.
No decorrer da coleta dos dados, almejou-se obter informações variadas do
campo, e, para isso, alguns instrumentos de investigação foram selecionados para
auxiliar na coleta dos dados. Afinal, há que se considerar que na pesquisa qualitativa
89
não espaço para quebras, informações isoladas, mas apenas a idéia de um
processo sucessivo, em que uma informação leva a outra, sendo que a mesma “[...]
se desenvolve em interação dinâmica retroalimentando-se, reformulando-se
constantemente de maneira que, por exemplo, a Coleta dos Dados num instante
deixa de ser tal e é Análise de Dados, e esta, em seguida, é veículo para nova
busca de informações”. (TRIVIÑOS, 1987, p. 137)
Essa é a visão que se perseguiu e, para tanto, escolheram-se os seguintes
instrumentos para auxiliar na pesquisa: análise documental, observação livre e
entrevista semi-estruturada; Ludke (1986) destaca a importância dos documentos no
decorrer da investigação, visto que os pesquisadores conseguem extrair o máximo
de informação.
A observação livre, por sua vez, veio no auxílio de destacar, pontuar algo que
se encontrava no todo (realidade) do que se estava observando, necessitando a
pessoa pesquisadora estar atenta ao decorrer dessa realidade. Para sua realização,
tinham-se algumas pré-categorias a serem observadas naquele momento:
metodologia e conteúdos pedagógicos a serem ensinados, o ambiente, a relação
professor-aluno e avaliação; enquanto se observava sistematicamente, registrava-se
o que estava sendo observado (RUDIO, 2003). Isso foi constante no decorrer das
observações que iniciaram no segundo semestre de 2005, tendo sua continuidade
no primeiro e segundo semestre de 2006.
Assim, enquanto as observações e registros iam se concretizando, no
segundo semestre de 2005 ocorreram as entrevistas semi-estruturadas, as quais
possuíam alguns questionamentos básicos estruturados que tinham afinidade com a
pesquisa e que permitiam uma abertura no seu andamento, de forma a não obter
respostas fechadas e restritas. Nesse momento todos os sujeitos participantes foram
entrevistados na tentativa de vislumbrar a compreensão que cada um possuía dessa
área do conhecimento, bem como suas expectativas em relação à mesma.
90
3.2 MANAUS/AMAZONAS – LOCUS DA PESQUISA
A região que escolhemos para estudar ainda causa bastante expectativa para
muitas pessoas que não a conhecem:
A Amania é o maior ser vivente que jamais se viu. Uma enormidade de
massa viva, nascendo e morrendo continuamente, nutrindo-se de ares,
águas e terra. Mas, sobretudo, de si mesma, numa autofagia em que se
desfaz e refaz, enquanto se multiplica e se diversifica em miríades de
vegetais e animais. De dia, aspira carbono e expira oxigênio. De noite,
inverte o ciclo. Dia e noite, sua e exsuda, extrai da atmosfera o nitrogênio
de que se nutre numa interação contínua de seu folhame com o ar e com o
sol. (RIBEIRO, 1995, p.147)
A idéia passada pela autora mostra-nos uma perspectiva real de uma
Amazônia imaginária. Ela é tudo que afirma Ribeiro, e muito mais, quando é
considerada a maior região geográfica do Brasil e possui as maiores fauna e flora
do planeta. Manaus, capital do maior Estado da Região, tem uma especificidade
diferente das outras realidades brasileiras. A cidade de Manaus teve sua origem no
ano de 1669, quando foi construída a fortaleza de São José da Barra. Em 1833, o
povoamento que se formou em redor da fortaleza foi elevado à categoria de Vila e,
em 1848, foi chamada de Cidade da Barra do Rio Negro, a qual, em 1865, passou a
chamar-se de Manaus, em função da tribo indígena Manaós, que aqui vivia.
O município de Manaus, com uma área de 10.769 km2, limita-se com os
municípios do Rio Preto da Eva, Amatari, Careiro, Iranduba, Novo Airão e Presidente
Figueiredo. Situa-se à margem esquerda do Rio Negro, a 18 quilômetros da foz do
rio Amazonas, sendo cortada por uma infinidade de igarapés.
Para entendermos a realidade Amazônica, faz-se necessário descrever,
mesmo que de forma sucinta, alguns aspectos do seu desenvolvimento. O
Amazonas passou por três surtos econômicos: o mercantilismo e o comércio
colonial, caracterizado pela extração e comércio das drogas do sertão; o
mercantilismo de exportação e comércio de matérias primas, caracterizado pela
economia da borracha, e o mercantilismo industrial-financeiro, implantado com a
Zona Franca de Manaus.
91
No primeiro surto econômico, o elemento humano envolvido quase que
exclusivamente foi o indígena, os conflitos existentes eram entre colonos e religiosos
no controle da mão-de-obra indígena.
Silva (1989) informa que “O controle da mão-de-obra indígena, fonte de toda
riqueza da Amazônia, era o motivo central dos conflitos (p.118). Os nativos, por
conhecerem as drogas do sertão e a região, eram fornecedores da o-de-obra,
entretanto eles não aceitavam a exploração dos colonizadores. Salazar, em sua tese
doutoral “O novo proletariado industrial de Manaus e as transformações sociais
possíveis”, expõe como o processo de colonização e exploração dos indígenas foi
desencadeado:
O elemento nativo que preponderava no início das drogas do sertão, foi
aos poucos, sendo dizimado, na medida em que não se sujeitaria aos
grilhões, dando origem aos mestiços, fruto de relações pacíficas ou
violentas dos arrivistas. (SALAZAR, 1992, p. 15)
Os índios da tribo de Mura, desde a colonização/exploração, entravam em
atritos com os colonizadores. O governo português, à época, ordenou que todos os
indígenas deveriam ser castigados severamente por não aceitarem a submissão ao
homem branco, sendo feita então uma guerra permanente contra os mesmos.
A constituição da família amazonense se deu em função da necessidade de
povoamento. Os portugueses que se casassem com as índias eram favorecidos e
privilegiados com as terras na beira do rio para se estabelecerem.
No segundo surto, logo nos primórdios da fase econômica da borracha, a
mão-de-obra utilizada era a do silvícola. Posteriormente, o desenvolvimento e
apogeu desse surto passam a contar com uma massa de flagelados advindos do
Nordeste. Mais de trezentos mil nordestinos aportaram em Manaus nesse período,
afirma Teixeira (1980, p. 52):
A população que se transferiu do Nordeste para a Amazônia é resultante
da condição de ser uma população periférica excedente, gerada pelo
movimento desigual e contraditório do regime capitalista de produção. A
condição de ser excedente se justifica a partir do fato de que essa
92
população vivia relativamente à margem do mercado, sendo inclusive
forçada a abandonar suas atividades produtivas tradicionais.
Nessa segunda fase, a partir de 1890, com o apogeu da borracha, Manaus
passa a ser uma cidade, no seio da floresta, aparelhada com ruas ricamente
pavimentadas, praças e jardins, redes de iluminação pública, de água de esgoto.
Obras pomposas como o Teatro Amazonas, o Prédio da Alfândega, o Palácio da
Justiça, entre outras, davam ares modernos e civilizados à cidade. A realidade, no
tocante aos nativos, no entanto, era outra. Ribeiro aponta que:
A exploração dos seringais não deixaria lugar, porém, para estilos tribais da
vida. Em pouco tempo, aquelas populações foram compulsoriamente
aliciadas para a produção de borracha e para os trabalhos ligados à
navegação fluvial. Foram o índio-remo, o índio-pilôto, o índio-bússola que
descobriam os seringais e os vinculavam aos portos através do
emaranhado de canais de rios que constituíam a Amazônia [...]. Para o
índio, o seringal e toda a indústria extrativa tem representado a morte pela
negação de tudo que ele necessita para viver: ocupa-lhe as terras, dissocia
sua família, dispersando os homens e tomando as mulheres [...]. Enfim,
submete o índio ao regime de exploração, ao qual nenhum povo poderia
sobreviver. (apud SALAZAR, 1992, p. 56-57)
A partir de 1890, os processos migratórios foram intensificados e a população
de Manaus dobrou, passando de 50.300 a 106.399 habitantes. Intensifica-se
também a junção do nordestino com o nativo dando origem ao índio branco, o
elemento “caboclo”; nas afirmações de Oliveira (1987, p. 77), o caboclo é índio.
Transfigurado pelo contato com o branco. Ele se diferencia dos grupos
tribais [...] porquanto se constitui para o branco numa população indígena
pacífica, desmoralizada, atada às formas de trabalho imposto pela
civilização é o índio integrado na periferia da sociedade.
O terceiro surto se com a implantação da Zona Franca de Manaus (ZFM a
seguir). Essa foi instituída com o Decreto-Lei nº. 288 de 23 de fevereiro de 1967, que
visava criar no interior da Amazônia Ocidental um centro comercial, industrial e
agropecuário, com uma área de 10.000 Km quadrados, o que corresponde à cidade
de Manaus e seus arredores. O referido decreto concebia a ZFM como uma área de
livre comércio de importações e exportações, com incentivos fiscais especiais,
estabelecidos com a finalidade de criar no interior da Amazônia um centro industrial,
comercial e agropecuário que permitisse o seu desenvolvimento em face dos fatores
93
locais e da grande distância que se encontram os centros consumidores de seus
produtos.
A implantação da ZFM teve reflexos na demografia regional; intensificou-se a
migração da população do interior para Manaus. No entender de Salazar:
O fato é que, por caminhos nada ortodoxos, Amazonas entrou na fase do
grande capital industrial, e o caboclo, ainda que, com aquele jeito de índio,
encontra-se diante do grande mundo civilizado, que agora, com apenas
uma arma para lutar, vender sua própria força de trabalho. (SALAZAR,
1992, p. 90)
O resultado do processo migratório levou Manaus a concentrar hoje mais da
metade da população do estado, atraindo o fluxo migratório que envolveu o povo do
interior do Amazonas e de outras regiões do país para a Zona Franca de Manaus.
O Estado do Amazonas eslocalizado espacialmente na Região Amazônica,
que ocupa uma área de 3.581.180 Km quadrados, ou seja, 42% do território
nacional, integrando, além do Amazonas, os estados do Pará, Acre, Rondônia,
Roraima e Amapá. O Amazonas faz parte também da chamada Região Amazônica,
que envolve a imensa área ocupada pela floresta equatorial que extrapola a região
norte, invadindo Mato Grosso, Goiás e Maranhão. Esse Estado tem características
espaciais diferenciadas, possuindo uma imensa extensão territorial de difícil acesso.
O Amazonas ocupa área de 1.549.586 Km2, ou seja, 40,7% do espaço da região
norte e 18,4% do território brasileiro.
Ao se pensar as proporções em termos sul-americanos, a Amazônia
Continental, com seus 6,5 milhões de Km quadrados, ocupa dois quintos da sua
superfície, que representa um terço da reserva mundial de floresta, sendo também
responsável por um quinto de disponibilidade mundial de água doce.
A Amazônia é caracterizada por contrastes: imensidão territorial com a
exuberante floresta equatorial, somada a um grande volume de água e, por outro
lado, a densidade demográfica é baixíssima, nela vivem menos de 10 milhões de
habitantes.
94
O principal componente da população humana do Amazonas é o caboclo, que
é, como nos referimos, um descendente direto ou indireto dos primitivos
habitantes do estado, os indígenas.
A população amazonense está distribuída em 62 municípios, localizados
irregularmente ao longo dos 10 grandes rios que passam pelo estado e mais de
quarenta e dois povos indígenas, diferentemente distribuídos nas cercanias dos
vários municípios do estado, sendo que as mais conhecidas e mais numerosas são:
Tikuna, Tukano, Sateré-Mawé, Mura e Ianomâmi.
O fluxo migratório ocasionado pela atração e pelo imaginário que se criava
em torno do “Eldorado,” Zona Franca, estimulado pelo próprio setor público e pela
mídia, trouxe pra Manaus indígenas e caboclos, os quais, não estando preparados
para se inserir na sociedade capitalista, foram lançados no submundo das periferias
da cidade, vivenciando então a miséria, a violência, a delinqüência juvenil e a
prostituição, entre outras conseqüências danosas desse processo.
Do ponto de vista cultural, a população de Manaus foi influenciada por vários
tipos de culturas: indígenas, caboclos, portugueses, judeus, turcos, e, com a
implantação da ZFM, a partir de 1967, a influência dos sulistas se fez presente.
Observa-se então que, na realidade manauara, convivem grupos diversos, os
brancos, não-brancos, nacionais e estrangeiros, caboclos e índios destribalizados,
cada qual com bagagens e conteúdo culturais historicamente diferenciados.
Manaus, por ser uma cidade portuária, comporta uma influência muito grande
de várias etnias. É comum na cidade, dependendo do local, a visão de palafitas,
que, normalmente, são armadas na beira dos rios e igarapés, por onde transitam
caboclos, ribeirinhos, indígenas e nordestinos.
É também comum, tanto na capital quanto nos interiores do Amazonas, a
dança folclórica dos bois bumbás, vista como uma dança que exibe toda uma
sexualidade; além disso, o festival das tribos apresenta as tradições e costumes e a
cultura de cada tribo. Nos bairros periféricos, encontramos algumas casas (taperas)
indígenas onde os índios destribalizados mantêm as suas tradições e as suas
culturas, que se manifestam, por exemplo, nos pratos típicos e nas danças.
95
O percentual de indígenas residentes em Manaus é de 26,97% de índios
Sateré-Maué, 16,17% de Ticuna, 7,96% de Tucanos e 5% das demais etnias. É
comum na extensão do Rio Negro encontrar índios e caboclos da região
normalmente servindo de transportadores de mercadorias (peixes, bananas,
cupuaçu, pupunhas e outras frutas regionais) trazidas do interior do Amazonas para
os mercados que, normalmente, se situam nas cercanias do rio.
A cidade, por um lado, possui um pólo eletrônico, no distrito industrial que é
comandado por pessoas oriundas de outras regiões. Gerentes, diretores, técnicos
qualificados etc., que se constituem na população usuária dos grandes mercados e
Shoppings Centers. Por outro lado, nos mercados situados ao longo da margem
urbana do Rio Negro encontramos os caboclos, os indígenas e os ribeirinhos
consumidores dos gêneros alimentícios produzidos na região.
Com a migração, a cidade se transfigurou, o nativo perdeu as suas tradições
e costumes, e o manauara passou a valorizar muito mais o que vem de fora do seu
estado. Apesar de tudo isto, Manaus ainda preserva fortes traços de cultura nativa.
Em suas esquinas, várias bancas com pratos típicos da região, demonstrando a
permanência do substrato cultural mais nativo.
Numa cidade onde se encontra a maior variedade de etnias de todo o
território brasileiro, a inserção do indígena no mundo de trabalho é quase nula,
particularmente nas funções que exigem uma relação direta com o público. O traço
indígena apenas lhe assegura colocações nas funções subalternas e menos
exigentes de qualificação. Na ótica de Ramos (2003), ser indígena é sinônimo de ser
preguiçoso e indolente e, por esta razão, muitos manauaras, de origem indígena,
sempre que as situações lhes exigem, procuram negar a sua condição de índio.
As características de Manaus, aqui referidas, têm como objetivo situar os
sujeitos da pesquisa no
locus
onde se produz o fenômeno social aqui investigado.
Situar não somente os sujeitos, porém todo o contexto sócio-histórico e cultural
dessa complexa realidade, multifacetada e extremamente marcada por contradições
que refletem a presença do modelo capitalista nos diversos modos de produção que
se constroem no espaço-tempo investigado, cujas relações de poder manifestam-se
96
nos diversos segmentos sociais e que, no caso investigado, refere-se à rede pública
municipal de ensino de Manaus.
3.3 SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO E CULTURA – SEMED
A história da Secretaria Municipal de Educação e Cultura tem suas origens
nos idos de 1979, quando o Governador do Estado, Sr. Danilo Duarte de Mattos
Areosa, repassa para o Município de Manaus, por meio de Decreto, todos os
professores das escolas isoladas. Nesse período, a Prefeitura atendia as localidades
de Ariaú, Catalão, Caldeirão, Cacau-Pirêra, Iranduba, Colônia Antonio Aleixo, as
estradas Manaus-Caracaraí (hoje BR – 174) na altura do quilômetro 32 e AM-010 ao
longo do quilômetro 180, entre outras.
A Lei Nº. 1.094 de 21 de outubro de 1970, dispõe sobre a organização da
Administração Municipal, estabelecendo diretrizes para a reforma administrativa, em
seu Art. 16 cria a Secretaria de Desenvolvimento Comunitário/SEDECO, que
cuidava da Educação e Ensino, Cultura - Letras e Artes, Assistência Social,
Abastecimento, Saúde, Promoção-Desporto e Turismo, Administração de Bairros e
Distritos e o Corpo de Bombeiros. Toda a reforma administrativa, iniciada por esta
Lei, foi realizada por etapas e tinha a orientação, coordenação e supervisão das
providências a cargo do Secretário de Coordenação e Planejamento.
A Lei Nº. 1.175 de 03/05/74 altera a Lei anterior e modifica a estrutura
administrativa da Prefeitura, criando a Secretaria da Educação, da Cultura e do Bem
Estar Social/ SEBEM. A SBEM cuidava da Educação e Ensino, Cultura Letras e
Artes, Assistência Social e Saúde, Ação Preventiva e Vigilância Sanitária.
A Lei Nº. 1.240 de 20 de novembro de1975, dá nova redação aos artigos 13 e
16 da Lei . 1.094 de 21/10/1970 com redação dada pela Lei . 1.175 de
03/05/1974, criando a Secretaria Municipal de Educação e Cultura/SEMEC, devendo
essa cuidar da Educação e Ensino, Cultura, Letras e Artes e do Desporto. Nessa
época reestruturou-se a administração do Município e todas as Secretarias passam
a denominar-se Secretaria Municipal. Cada Secretaria, assim como o Gabinete do
Prefeito, receberam consultoria Jurídica, composta dos servidores da Procuradoria
97
Geral, sendo dirigidas por um procurador ou advogado. Cabia ao Prefeito
estabelecer, mediante Decreto, a competência, o funcionamento das unidades e as
atribuições dos servidores dos órgãos a que esta lei se referia.
Como a SEMEC vinha estruturando-se e possuía um grande número de
professores leigos, houve a necessidade de promover cursos de capacitação e
atualização a esses profissionais.
Faz-se importante registrar que em 1974 implantou-se na Escola Abílio Nery a
primeira turma de Série do Grau do Município, com todos os professores
qualificados. O Projeto de implantação de 5ª a 8ª Série no Município de Manaus foi
elaborado por quatro cnicos contratados para esse fim e coordenados por uma
professora técnica da SEMEC.
Em 1979 a SEMEC possuía 54 escolas na zona rodoviária, 65 na zona
ribeirinha e 9 suburbanas, totalizando 128 escolas, atendendo o Ensino de 1* Grau
nas seguintes modalidades: Pré-Escolar; Alfabetização; Educação Integrada,
Alfabetização de Adultos , com um total de 16.991 alunos.
Na década de 1980 a então SEMEC passou por algumas transformações,
ampliando seu atendimento escolar, resultado do intenso crescimento populacional
da cidade de Manaus, causado pela criação da Zona Franca. Nesse período,
ressalta-se que teve início a qualificação dos professores por meio do Projeto
LOGOS II.
Em 1985, a Prefeitura sofre nova estruturação por meio da Lei Nº. 1.762 de
12 de julho de 1985. Essa década caracterizou-se pelo Programa Novas
Metodologias, dando ênfase aos Projetos Espiral e Meu Filho, este destinado à
crianças em situação de risco social.
Com o restabelecimento da democracia, a eleição direta para Prefeito
acontece em 1985, sendo eleito o Sr. Manoel Henriques Ribeiro para o período de
01/01/85 a 31/12/88.
Em 1986 a SEMEC contava com 57.044 alunos, nas modalidades de Pré-
Escolar, a 8ª Série e Supletivo. Em junho de 1988 o então Governador
98
Amazonino Mendes decreta a Intervenção no Município por 180 dias, nomeando um
interventor.
Em 1989, com a administração do Prefeito Athur Virgílio Neto, foi
reestruturada novamente a Prefeitura e por meio da Lei 2000, de 28/01/1989, a
Secretaria passa a chamar-se Secretaria Municipal de Educação (SEMED). Nesta
administração é elaborado o primeiro Plano de Carreira e Vencimentos e um Novo
Plano de Trabalho que não chega a ser efetivado.
Essa gestão foi marcada também pelo Projeto Brigada da Alfabetização
destinado a jovens e adultos e fundamentado nas ideais de Paulo Freire.
Em 1993, novamente sob a administração do Sr. Amazonino Mendes, a
SEMED caracterizou-se por uma reestruturação administrativa interna, a elaboração
e a implantação do Plano de Carreira e Vencimentos pela Lei Nº. 188 de 12/05/1993.
Nessa administração extinguiram-se os Projetos Espiral e Meu Filho.
No período de 1989 a 1992 a SEMED atendeu as modalidades de Pré-
escolar, Alfabetização, Supletivo e Educação Especial, atingindo um crescimento
médio anual de 40% de matrículas. Em relação à Educação Especial, as matrículas
aconteceram somente nos anos de 1991 e 1992, sendo 246 e 234, respectivamente.
Durante os anos seguintes, a política de Manaus passa por um momento de
transição administrativa, quando o Prefeito Amazonino Mendes candidata-se ao
Governo do Estado assumindo a Prefeitura o Sr. Carlos Eduardo de Souza Braga
(1995 -1996). Ao final de 1996 a Secretaria incentivou a criação do Conselho
Municipal de Educação CME, através da Lei Municipal Nº. 377, que tem como
objetivo definir as políticas educacionais no Município.
De 1993 a 1996 a SEMED atendeu alunos da Pré-escola, Alfabetização,
Supletivo, Educação Especial, assumindo a educação de a rie a partir de
1994. A Educação Especial inicia o ano de 1993 atendendo 97 alunos e, alcança em
1996, o total de 693 matrículas.
Em 1997, o Sr. Alfredo Nascimento assume a Prefeitura de Manaus,
mantendo no cargo a Secretária e a Subsecretária de Educação do Município. Essa
gestão trouxe avanços no que concerne às questões pedagógicas do Sistema
99
Municipal de Ensino. A SEMED passou por importantes transformações que deram
novo direcionamento às práticas do ensino-aprendizagem, principalmente, com a
gestão democrática. Neste ano a Secretaria incentivou a implantação da União dos
Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME, uma organização não-governamental
que tem o compromisso no âmbito nacional e estadual de desenvolver estratégias
decisivas em prol da melhoria da qualidade e a universalização da escola pública,
dando suporte técnico aos secretários municipais de educação, tendo como primeira
presidente eleita a secretária de Manaus, Profª Vera Lúcia Marques Edwards.
Construiu-se ainda a proposta curricular denominada Programa de
Redimensionamento da Educação sica do Município de Manaus PRORED. Ao
mesmo tempo, foram feitos investimentos na infra-estrutura das escolas,
implantando-se o Programa de Gestão Educacional/PGE, em 1999, que deu as
bases para Plano Estratégico da Secretaria/PES, em 2001.
Em 2001, mantém-se na Prefeitura por meio da reeleição, o Sr. Alfredo
Nascimento. Permanecendo na administração da Secretaria as mesmas dirigentes.
A Secretaria passa então a denominar-se Secretaria Municipal de Educação e
Cultura por passar a cuidar da cultura na rede municipal de ensino com intuito de
mostrar à sociedade o que se tem de valores da terra. uma nova reestruturação
da administração do Poder Executivo Municipal, por meio da Lei Nº. 590 de 13 de
março de 2001 que, cria quatro Distritos Educacionais - Leste, Sul, Oeste e Norte -
na estrutura da Secretaria Municipal de Educação e Cultura com o objetivo de
descentralizar as atividades pedagógicas, administrativas e financeiras da rede
municipal de ensino [..]” (Capítulo IV, art.9º ); é implantado novo Plano de Carreira,
Cargos e Remuneração, aprovado pela Lei . 591 de 23 de março de 2001; é
criado o Centro de Formação Permanente CFP -, que é voltado para o estudo e
pesquisa educacional e coordena o processo de formação inicial (graduação em
pedagogia e licenciaturas plenas) e continuada dos educadores da Rede Municipal
de Ensino; é criado também o Centro Municipal de Educação Especial CMEE -,
composto por equipe multiprofissional com psicólogos, assistentes sociais,
pedagogos, psicopedagogos e fonoaudiólogos, que realizam avaliação diagnóstica,
com apoio psicológico a pais e alunos; é instituído Centro Municipal de Educação de
Jovens e Adultos –CEMEJA-, que atenderá alunos de a série por meio de
100
metodologia específica; Centros Municipais de Educação Infantil CMEIs - que têm
a finalidade de oferecer atendimento integral à crianças de 3 a 6 anos de idade.
Nos anos mais recentes a SEMED desenvolve projetos pedagógicos
específicos para atender à Rede Municipal de Ensino, tais como os pontuados a
seguir.
Projeto de Aceleração da Aprendizagem: Um Compromisso Social, tem
como objetivo regularizar o fluxo escolar dos alunos das séries iniciais do
Ensino Fundamental.
Projeto de Avaliação Educacional PAE, - tem como objetivo oportunizar
um sistema de avaliação mais coerente, eficiente e justo, garantindo aos
discentes da rede municipal de ensino uma formação global.
Projeto Classe Básica do Ensino Fundamental: tem como objetivo
proporcionar, em caráter facultativo, o ingresso no Ensino Fundamental a
partir dos seis anos de idade, oportunizando o desenvolvimento integral do
educando num período letivo flexível de dois anos.
Plantão Escolar: desenvolve ações interdisciplinares, visando reduzir o
abandono dos alunos nas escolas municipais.
Projeto Circo-Escola de Arte Popular: propicia às crianças e adolescentes
das escolas municipais, atividades circenses que desenvolvem a
sensibilidades, a percepção, a reflexão e a imaginação nas diversas
modalidades da área de artes.
Projeto Aluno Escritor: projeto que desenvolve nas crianças e jovens o
gosto pela leitura e pela criação de textos literários, tornando-os críticos,
criativos, conscientes e produtivos, valorizando seu desenvolvimento
intelectual e cultural. Mantêm convênio com o Programa Nacional de
Incentivo à Leitura PROLER/Biblioteca Nacional/Ministério da
Cultura/Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil- FNLIJ. A Secretaria
desenvolve anualmente um concurso valorizando a produção dos alunos
da rede municipal de ensino.
101
Projeto Escola Ativa: programa desenvolvido pelo FUNDESCOLA,
financiado pelo Banco Mundial e Ministério da Educação, que visa
propiciar uma nova prática pedagógica baseada na aprendizagem grupal,
priorizando as classes multisseriadas em escolas municipais da zona rural.
Programa de Alfabetização de Adultos: implantado desde 1999 na
Secretaria em parceria com o Programa Saúde da Família/PSF, da
Secretaria Municipal de Saúde, tendo como meta a alfabetização de
adultos da Cidade de Manaus.
Programa Família Social: projeto vinculado a Política Municipal de Atenção
Integral à Criança e Adolescente, foi instituído em 2000, tendo como
objetivo o acolhimento (em espaço domiciliar) de crianças de 2 a 5 anos
que estejam em situação de risco pessoal e social. Conta com uma
Assistente Maternal e um professor itinerante que orientações
pedagógicas.
PROINFO Programa Nacional de Informática na Educação, coordenado
pela Secretaria de Educação a Distância SEED/MEC, tem como objetivo
implantar a informática educativa nas escolas da rede pública de ensino
de forma descentralizada nos Núcleos de Tecnologias Educacionais –
NTEs - em parceria com os Estados e Municípios. O NTE da Secretaria
possuí uma equipe de multiplicadores especialistas em informática
educativa, assessorados por um grupo de suporte técnico e administrativo
que apoio às escolas municipais que possuem Laboratório de
Informática, capacitando professores, pedagogos e diretores.
Projeto Oficinas Pedagógicas, desenvolvido pela Secretaria em parceria
com a Universidade do Amazonas UFAM - e a empresa internacional
RAYTHEON, que tem o objetivo de oferecer a formação continuada aos
professores da rede municipal de ensino.
Programa Saúde do Escolar, que proporciona à comunidade escolar, por
meio da saúde, serviços preventivos na área médica, odontológica e
oftalmológica bem como a melhoria da qualidade de vida. É desenvolvido
na rede municipal de ensino desde 1997, tendo 96 escolas com Agente de
102
Saúde Escolar, 28 escolas com consultório odontológico e uma unidade
móvel.
Agência UGA-UGA, é uma Organização Não-Governamental, sem fins
lucrativos. Foi oficialmente constituída em abril de 2000. O trabalho iniciou
em agosto de 1997, como Projeto Jornal na Escola, financiado pela
Prefeitura Municipal de Manaus/Secretaria Municipal de Educação, em
parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância - UNICEF. Tinha
como objetivo produzir um jornal por jovens e para jovens, baseando-se
na filosofia do protagonismo juvenil. As produções desta Agência são
distribuídas e trabalhadas em sala de aula, alcançando em torno de 37 mil
alunos da rede municipal de ensino de Manaus e do Estado do Amazonas,
sendo referência na Região Norte.
A SEMED desenvolve também um trabalho voltado para as questões
ambientais - Agenda Ambiental Escolar -, que é um plano de
desenvolvimento que identifica os problemas e as soluções da escola, a
fim de minimizar os impactos que afetam o ambiente escolar decorrentes
da interação do homem com o meio.
A SEMED mantêm vínculo com os dois conselhos municipais de controle
social da área da educação existentes em 2006:
Conselho Municipal de Alimentação Escolar CMAE - criado em 1997, é
um órgão fiscalizador, com autonomia administrativa, que tem como
objetivo o acompanhamento e a fiscalização da aplicação dos recursos
federais do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Este
Conselho zela pela qualidade dos produtos em todos os níveis, desde a
aquisição até a distribuição, observando sempre boas práticas higiênicas e
sanitárias. O CMAE é composto por sete membros efetivos e sete
suplentes, tendo representação da SEMED, do Poder Legislativo, da
Associação de Pais, Mestres e Comunitários APMCs -, do Sindicato dos
Trabalhadores em Educação do Estado do Amazonas e de
Representantes do Conselho Municipal da Criança e do Adolescente.
103
Conselho Municipal de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização
do Magistério (FUNDEF), tem como função acompanhar e controlar a
repartição, transferência e aplicação dos recursos do FUNDEF e
supervisionar o censo escolar anual. O Conselho é composto por
representantes da SEMED, professores, diretores das escolas públicas do
Ensino Fundamental, de pais de alunos e de representantes do Conselho
Municipal de Educação. Com a instituição do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação sica e de Valorização dos Profissionais
da Educação (FUNDEB), o conselho do FUNDEF é extinto, criando-se o
conselho do FUNDEB.
De 1997 a 2001 a SEMED atendeu cerca de 2.098 alunos da Educação
Especial, alcançando uma média de matrícula anual de 500 alunos.
A criação do Programa de Gestão Educacional (PGE) em 1999, veio
favorecer a ação do Governo Municipal para elevar o padrão de Gestão Escolar,
garantindo o acesso e a permanência dos alunos na Rede Municipal de Ensino, bem
como o sucesso do seu aprendizado, tornando-os capazes de enfrentar a vida no
futuro, cientes de sua cidadania.
Na administração que enfatiza o “Social Levado a Sério”, a SEMED se
compromete com o processo de mudanças que vem ocorrendo em nosso país e na
sociedade em geral, fazendo investimentos em diversos setores da educação,
promovendo modificações nas estruturas físicas das escolas da rede, na
qualificação dos recursos humanos e na assistência aos alunos. Na gestão da Profª
Vera Lúcia Edwards teve início a construção da sede própria da Secretaria Municipal
de Educação e Cultura. Dessa forma, a Secretaria busca rever o modelo vigente de
gestão da escola pública e reverter a deteriorização do ensino sico como garantia
da relação de sustentabilidade com a sociedade.
A partir desses pressupostos, o Programa de Gestão Educacional se firma em
quatro eixos norteadores: Gestão Participativa, Infra-Estrutura, Sistema de
Monitoramento e Avaliação e Formação e Valorização dos Profissionais da
104
Educação, que redimensionam as diretrizes políticas da educação para a rede
municipal de ensino.
Esse modelo de Gestão se efetiva a partir de uma concepção de educação
que a Escola como forma política de ação cultural, perspectivada no seu
cotidiano, que se constituí de uma territorialidade espacial e cultural, nas quais se
exprimem as relações pedagógicas subjetivas e intersubjetivas, provedoras de
mobilização em dimensões pessoais, simbólicas e políticas. Ou seja, esse modelo
está centrado na própria escola, que passa a ser vista como uma organização
dotada de autonomia e capaz de ressignificar seu espaço. A escola, ao ser colocada
no centro de ações político-pedagógicas, torna-se um lugar estratégico de
entrosamento entre concepção e ação, reflexão e prática, superando a visão
dicotômica e fragmentada da realidade.
Os mecanismos adotados para a concretização desse modelo foram
objetivados na 1ª Conferência Municipal de Educação, que ocorreu em três etapas,
conforme se pontua a seguir.
1ª Etapa
: Gestão Participativa na Escola, dia 27/10/2001.
Tema: Gestão Participativa em Debate: realizada no seio da escola
envolvendo toda a comunidade escolar na qual se discutiu sua atual conjuntura e a
definição de propostas a serem encaminhadas para a próxima etapa.
2ª Etapa
: Pré-Conferência, dias 19 e 20/11/01.
Tema: Escola Participativa: Conjunturas e Perspectivas. Essa etapa, realizada
em cada Distrito Educacional e Zona Rural, constituiu-se a partir do debate feito na
escola, ocorrendo a consolidação das perspectivas discutidas pela comunidade
escolar.
3ª Etapa
: A Conferência, dias 28, 29 e 30/11/01.
Tema: Gestão Participativa na Educação: Conquistas e Desafios. A última
etapa consolidou as propostas da II etapa, levando-as à aprovação em plenária e,
posteriormente, à elaboração do Relatório Final.
105
A realização da Conferência Municipal de Educação-CME, aprovada pelo
Conselho Municipal de Educação por meio da resolução 07/2001, foi um marco na
administração da Prefeitura Municipal de Manaus, pois ali pais, alunos, comunitários,
professores, diretores, técnicos do sistema público de ensino e sociedade civil
construíram coletivamente uma proposta de trabalho que aponta para uma
concepção de escola participativa, ativa, democrática, autônoma e consciente de
sua função social e seu papel na formação da cidadania.
Dia 05 de abril de 2002 a Profª Vera Lúcia Marques Edwards
descompatibiliza-se do cargo de Secretária, assumindo o mesmo a Profª Terezinha
Ruiz de Oliveira, dando continuidade ao trabalho que vinha sendo desenvolvido.
Em 2005 é empossado como Prefeito de Manaus, o economista Sr. Serafim
Fernandes Corrêa, assumindo a SEMED o Prof. da Universidade Federal do
Amazonas José Danta Cyrino Júnior e como Subsecretário o Prof. Dr. rgio
Augusto Freire de Souza também da UFAM; como Coordenadora de Geso
Educacional a Srª. Lúcia da Silva Maia.
Nessa gestão, a Secretaria Municipal de Educação ressignifica a própria
concepção de assessoramento pedagógico nas escolas municipais, organiza os
inúmeros projetos realizados pelas escolas por eixos temáticos (Linguagem e
Comunicação, Interação Escola/Família/Comunidade, Educação Ambiental e
Tecnologias Interativas em Educação), e constituí a Equipe Escolar formada pelos
professores e gestores, pelos subcoordenadores de eixos temáticos, bem como
pelos articuladores de tecnologias interativas e coordenadores pedagógicos.
Essa organização pedagógica se com base na concepção de educação
adotada pela SEMED, fundamentada, segundo documento de 2006, numa
perspectiva progressista em que se destaca a Pedagogia Progressista Libertadora e
Pedagogia Progressista Crítica-Social dos Conteúdos.
Com a criação dos Distritos Educacionais (DIED`s) em 2001, atualmente
denominados de Gerência Distrital, a Secretaria Municipal de Educação e Cultura
descentraliza as ações para atender de forma mais efetiva as demandas das
escolas, contribuindo para a qualificação das ações pedagógicas e,
conseqüentemente, do processo de ensino e aprendizagem.
106
O sonho de uma escola pública fortalecida por meio da problematização
permanente das práticas implementadas toma vigor no final de 2005. Foi quando a
política de gestão da SEMED se voltou para pensar estratégias de intervenção que
pudessem contribuir na construção de um processo educativo satisfatório aos
interesses de uma sociedade justa e democrática, cujo o foco é o aluno na sua
aprendizagem. De modo geral e sucinto, a orientação pedagógica mais geral da
secretaria busca:
favorecer a aprendizagem dos alunos matriculados na Rede Municipal de
Ensino por meio da ressignificação do assessoramento pedagógico e do
redimensionamento dos projetos escolares, oferecendo subsídios que
contribuam para a eficiência e organização das ões pedagógicas,
implementadas pelas escolas;
orientar a prática pedagógica acompanhando seu desenvolvimento nas
escolas, visando contribuir para a garantia dos direitos fundamentais de
escolarização do educando por meio de registros e avaliação de
resultados;
subsidiar a construção e/ou redimensionamento de instrumentos de
gestão educacional: Projeto Político-Pedagógico, Planejamento de Ensino
e Avaliação Escolar.
Acredita-se que a contínua elaboração e reelaboração do pensamento
pedagógico são relevantes para a ampliação da capacidade de perceber diferentes
alternativas para os problemas da comunidade escolar. Por isso, a implantação e
implementação de uma Proposta de Assessoramento e a atuação de assessores
pedagógicos na concretização do Projeto Político-Pedagógico de cada escola,
previsto nas Diretrizes da Política Educacional do Município (Diretriz Nº. 01, Linha de
ação Nº. 05), passa a se constituir, em condição imprescindível, à consolidação da
busca da excelência do ensino público municipal. (SEMED, 2006).
Na mesma perspectivas, os documentos da SEMED trazem a compreensão
de que a escola deverá buscar sua autonomia e competência como espaço de
decisão que trabalhe na direção de que as crianças e os jovens aprendam, que
diminua a repetência, desenvolvendo nos alunos capacidades intelectuais, afetivas e
107
sociais que lhes permitam assimilar plenamente os conhecimentos acumulados. Ou
seja, ao invés de mera transmissora de conteúdos, esta escola teria como função
social ensinar o aluno a pensar, ensinar as formas de acesso e apropriação do
conhecimento elaborado.
No contexto atual, a maioria dos funcionários públicos municipais possui um
contrato temporário. A contratação não segue critérios cnicos, nem exigência
de aderência entre a formação profissional e a disciplina que um professor pode
ministrar. A precariedade desse sistema de contratação abertura para a adoção
de critérios políticos, como por exemplo, ser apresentado por alguém influente. No
momento, o concurso público municipal na área da educação busca minimizar as
dificuldades do quadro de pessoal, em relação ao preenchimento dos cargos de
acordo com as necessidades e adequação da formação profissional, mas ainda há
muito o que fazer.
Todo funcionamento dos órgãos blicos é marcado por um cenário de
conflitos políticos entre dois grupos que se alternam, mais de vinte anos, no
poder. Além da Secretaria Municipal de Educação, todos os coordenadores de
serviços e diretores de escolas também são indicados ao cargo de sua filiação
partidária. Para se manterem no cargo, devem demonstrar subserviência e
obediência ao grupo político da situação. Dessa maneira, parece haver uma
tendência de embelezamento dos relatórios das atividades realizadas pelas escolas
e um artificialismo de algumas ações, pois a preocupação central é com a criação de
uma “boa imagemda SEMED e da prefeitura Municipal de Manaus. Esse contexto
multifacetado, que circunda a problemática investigada, caracteriza o desafio de
compreender a efetividade do trabalho do sistema municipal de educação, no que se
refere à garantia de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos com necessidades
educacionais especiais.
O que vem se verificando na legislação nacional e do Município de Manaus é
a reiteração do princípio do atendimento dos alunos com necessidades educacionais
especiais preferencialmente na rede regular de ensino e, pelo menos em tese, a
preservação do contínuo de serviços especiais, paralelos ou integrados ao ensino
comum. Todavia, tanto em quantidade como em qualidade, é insuficiente para
atender aos seus direitos de acesso e permanência no ensino.
108
Na nossa concepção, após constatações feitas, torna-se perceptível, então,
que, por mais que aconteçam interferências nas escolas municipais (inclusivas),
mesmo com o intuito de apóia-las, tudo poderá permanecer inalterado no pensar, no
refletir, no planejar, no executar e no avaliar o processo escolar. E, sem essas
alterações, como concretizar a inclusão escolar?
3.3.1 A organização dos ciclos de formação na rede municipal de Manaus
A partir de 2004, A Secretaria Municipal de Educação e Cultura / Manaus /AM
reorganizou sua estrutura pedagógica do Ensino Fundamental em nove anos de
duração, passando a trabalhar com ciclos de formação humana, nos anos iniciais,
tendo como objetivo principal garantir um processo de aprendizagem que leve em
consideração as idades de formação, os interesses e características próprias de
cada fase de desenvolvimento humano: aos 6, 7 e 8 anos é a fase da infância; 9 e
10 anos a fase da pré-adolescência.
A idéia de incluir alunos de 6 anos no ensino fundamental tem um caráter
social, pois os setores populares têm dificuldades de permanecer na escola. Então,
quanto antes eles forem incluídos na escola formal, melhor, porque às vezes
precisam sair muito cedo para sobreviver. E tem um caráter pedagógico, que
flexibiliza os tempos escolares, no caso do Município de Manaus 600 dias letivos no
Ciclo Básico, com 2. 400 horas, e 400 dias letivos, com 1.600 horas, no Ciclo,
permitindo ao professor desenvolver um trabalho mais individualizado e
aprofundado, possibilitando-o conhecer cada educando que está em sala de aula,
com um currículo que atenda às expectativas e necessidades das crianças. É a
partir dessa premissa que em cada fase de crescimento o aluno possui
características que devem ser respeitadas e cada criança tem um ritmo próprio de
aprendizagem.
O mais importante neste novo fazer, segundo a SEMED (2004), é a
possibilidade de, por meio desta mudança:
[...] podermos trabalhar com uma educação que parte dos educandos e
não dos conteúdos, discutirmos a real função da escola que é a de fazer as
109
crianças aprenderem conhecimentos que serão úteis a sua vida,
desenvolvê-los em todas as dimensões e utilizar uma avaliação que
realmente mostre o caminho percorrido pelas crianças na construção do
conhecimento, que seja inclusiva e que trate o erro como possibilidade de
superação. (2004, p. 02)
A implantação do Ciclo Básico e do Ciclo de Formação constitui-se num
instrumento fundamental para potencializar o desenvolvimento sócio-cultural dos
alunos, solidificando uma formação sica que abrirá possibilidades de níveis de
desenvolvimento mais complexos.
Nesse sentido, a educação básica nos primeiros ciclos de formação deve
estar a serviço do processo de formação global do aluno, visando sua interação com
a realidade, de forma crítica e dinâmica. Para que isso aconteça é preciso que os
alunos possam compreender sua realidade, situando-se nela e desenvolvendo as
habilidades e capacidades que lhes auxiliem nesse processo.
A partir dessa compreensão, vislumbra-se uma concepção de homem como
ser social que pensa, raciocina, deduz e abstraí, assim, como alguém que
sente,emociona-se, deseja, imagina e sensibiliza-se.
A concepção de conhecimento é que ele resulta de um processo interativo, na
proporção em que o sujeito se relaciona com o objeto, modificando-o e sendo por
ele cognitivamente modificado. É a partir dessas interações (organismo-meio físico e
social) que o indivíduo constrói formas cada vez mais elaboradas de adaptar sua
inteligência à complexidade do mundo que o rodeia.
Com respaldo, então, nessas concepções de escola, de homem e de
conhecimento é que se delineia a organização do ensino em ciclo no Município de
Manaus. Esta organização tem, ainda, apoio em um conjunto de pressupostos de
origem psicopedagógica, antropológica, filosófica e sociológica sendo, por
conseguinte, marcada fundamentalmente por uma concepção sociointeracionista
que subsidia o redimensionamento das práticas pedagógicas.
Desse modo, na Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Manaus, a
organização do ensino em ciclos inspira-se em alguns postulados dessa concepção,
destacando-se entre eles:
110
processo de desenvolvimento intrinsecamente ligado á aprendizagem,
sendo inclusive modificado por ela;
a indissociabilidade dos aspectos intelectuais, afetivos e psicomotores no
processo de aprender;
as crianças com ritmos diferentes de desenvolvimento têm necessidade
que a escola possibilite tempos e ritmos mais flexíveis no processo de
apropriação do conhecimento;
conhecimento como resultado da interação entre pessoas:
educador/educando;
a inteligência como construção histórica;
a autonomia como objeto do processo educativo;
a escola como criadora de situações que conduzam a criança a reinventar
e redescobrir a construção do conhecimento. (SEMED, 2004).
A proposta Pedagógica da Organização do Ensino Fundamental em ciclos de
Formação Humana do Município de Manaus faz a opção pela concepção histórico-
cultural de aprendizagem, também chamada cio-histórica ou sociointeracionista.
Esta é uma concepção relativamente jovem, embora traga também uma carga
conceitual que a liga a diferentes momentos da tradição filosóficas, desde a
antiguidade.
Esta concepção, na sua origem, tem preocupação a compreensão de como
as interações sociais agem na formação das funções psicológicas superiores. Estas
não são consideradas uma determinação biológica. São resultado de um processo
histórico e social. As interações sociais vividas por cada criança são, dessa forma,
determinantes no desenvolvimento dessas funções.
Portanto, a partir desse ponto de vista, há diferenças na formação do que se
chama normalmente de inteligência, entre uma criança que vive em um meio social
intelectualmente rico e outra que vive em um meio social intelectualmente pobre. Ser
mais ou menos capaz de acompanhar as atividades escolares deixa de ser visto
111
como uma determinação da natureza, e passa a ser visto como uma determinação
social.
Nesta perspectiva a criança (sujeito) e o conhecimento (objeto), se relacionam
através da interação do social. Não há, portanto, uma relação direta do
conhecimento (como algo abstrato) com a criança. Isso equivale a afirmar que o
conhecimento o existe sozinho. Existe sempre impregnado em algo humano (um
ser humano como o livro, um espelho, o meio social). Na educação escolar, o
professor passa a ter a função de mediador entre o conhecimento historicamente
acumulado e o aluno. Ser mediador, no entanto, implica em também ter se
apropriado desse conhecimento.
A ação educativa que permite aos alunos dar saltos na aprendizagem e no
desenvolvimento é a ão sobre o que o aluno consegue fazer com a ajuda do
outro, para que consiga fazê-lo sozinho. Utilizar o tempo que o aluno está na escola
para exercitar com ele aquilo que ele sabe, sem desafiá-lo a algo novo, equivale a
fazê-lo perder tempo, uma vez que a repetição do mesmo nada acrescenta ao
conhecimento já apropriado ou elaborado até aquele momento. Tentar forçar o aluno
a trabalhar questões com as quais não tenha nenhuma familiaridade, além de
causar rejeição, traz a dificuldade inerente a trabalhar com algo totalmente estranho.
No âmbito desta concepção de aprendizagem, o processo pedagógico passa
a ter um sentido ético mais marcado do que em muitas outras concepções. As
concepções que permitiam a classificação das crianças e dos jovens em capazes e
incapazes de aprender podiam muitas vezes levar a escola a remeter à natureza a
responsabilidade pelo fracasso escolar. A concepção histórico-cultural, ao contrário,
à medida que considera todos capazes de aprender e compreender que as relações
e interações sociais estabelecidas pelas crianças e pelos jovens são fatores de
apropriação do conhecimento, traz consigo a consciência da responsabilidade ética
da escola com a aprendizagem de todos, uma vez que ela é interlocutora
privilegiada nas interações sociais dos alunos. De todos os alunos.
112
3.3.2 A educação inclusiva na rede municipal de ensino de Manaus.
Na década de 1980, importantes movimentos em favor dos direitos civis
provocaram iniciativas em torno da integração da pessoa com necessidades
especiais na sociedade.
Na prática, o rompimento com os modelos segregadores (ruptura essa não
tão efetiva) resultou em iniciativas voltadas à integração no âmbito escolar.
O Município de Manaus confirma essa tendência, na medida em que
iniciativas integracionistas aqui desenvolvidas, desde o início da Educação
Especial, através da Secretaria Municipal de Educação e Cultura - SEMED, foram
sendo priorizadas.
Este movimento foi desencadeado de forma mais consistente a partir de
1990, com a reformulação da rede municipal de ensino, que garantiu a efetivação da
política de integração da pessoa com necessidades especiais, na rede comum de
escolarização, a partir da deflagração da matrícula compulsória, estabelecida no
plano para a campanha de matrícula escolar da Secretaria Municipal de Educação
(1990 -1994).
Em 1991 foi implantada a Educação Especial na rede municipal de Ensino,
amparada pela Lei Nº. 050 de 04/01/91 e, no mesmo ano, foi criado o cleo de
Educação Especial, que tem por objetivo coordenar, orientar, acompanhar, controlar
e avaliar a execução de Programas de Educação Especial.
Em 1997, houve a criação do SADEM (Serviço de Avaliação Diagnóstica da
Educação Especial do Município), composto por equipe multidisciplinar de oito (08)
profissionais para a realização de avaliação diagnóstica dos alunos da Rede
Municipal de Ensino.
Em Manaus, embora a SEMED tenha iniciado o atendimento aos alunos com
necessidades educacionais especiais em 1990, das perto de 400 escolas
municipais, segundo a Profª Therezinha Ruiz (Ex-sub secretária de educação,
113
atualmente deputada estadual, 2006) somente 32 (trinta e duas) têm classes de
atendimento regular, o que representa menos de 10% do total.
Segundo a sub-secretária (2006), o SADEM foi transformado no Centro
Municipal de Educação Especial (CMEE) ampliando o atendimento para os alunos
das escolas estaduais,das escolas particulares, das comunidades e dos programas
sociais de Manaus e de outros municípios.
O CMEE ampliou atendimentos desenvolvidos, constando de: avaliação
psicopedagógica, orientação familiar aos pais, exame audiométrico, visitas
domiciliares, palestras aos pais, encaminhamento para profissionais da área de
saúde (neuropediatra, oftalmologia, odontologia, pediatra e outros), apoio
psicológico e outros.
[...] ainda falta muito para que a educação especial atinja o nível de
qualidade que o seu público-alvo exige. Não podemos esquecer que a
promoção da educação inclusiva é fundamentada no princípio da
universalização do acesso à educação e na atenção à diversidade, e
requer uma filosofia de educação de qualidade para todos. (Therezinha
Ruiz, ex-secretária municipal de Educação, 2006)
O projeto do CMEE iniciado em 2004 com o Processo Licitário Nº. 85/04, no
valor de R$ 3, 4 milhões, foi inaugurado no dia 20 de julho de 2007. Construído
numa área de 5.271 m², é formado por quatro pavilhões: Educacional, Clínico, de
Recreação e Oficina de Trabalho. A obra é resultante de um investimento da
Prefeitura de Manaus.
Reúne uma escola especial com 20 salas de aula climatizadas, ludoteca, o
complexo oferece serviços de orientação familiar e diversas modalidades de
atendimento específicos. Duas piscinas adaptadas e uma quadra de esportes
também fazem parte da estrutura.
O Complexo atende alunos com necessidades educacionais especiais
efetivamente matriculados na rede municipal de ensino. Aos estudantes é oferecido
atendimento clínico e pedagógico especializados.
114
A equipe do Complexo é formada por especialistas das áreas de Educação,
Assistência Social, Terapia Ocupacional, Psicologia, Psicopedagogia,
Fonoaudiologia, Fisioterapia, dicos e Odontólogos. O objetivo do trabalho
desenvolvido é oferecer condições para o desenvolvimento das potencialidades das
pessoas com necessidades educacionais especiais, buscando o pleno exercício da
cidadania,com sua inclusão na sociedade.
Da clientela do Complexo de Educação Especial André Vidal de Araújo fazem
parte todas as pessoas que tenham necessidades educacionais especiais, da rede
municipal de ensino, como: deficiente visuais e cegos; deficientes auditivos e surdos;
deficientes mentais; portadores de deficiências múltiplas; deficientes físicos,
portadores de distúrbio de comportamento; pessoas com altas habilidades,
paralisado cerebral.
A Política Nacional da Inclusão das pessoas com necessidades especiais na
rede regular de ensino sinaliza para a transformação dos sistemas de ensino em
sistemas inclusivos, garantindo o acesso universal à escolaridade básica e à
satisfação do processo de aprendizagem para todos os cidadãos.
Atendendo à Política Nacional, a principal meta do Complexo Municipal de
Educação Especial André Vidal de Araújo é a realização de ações que possam
desenvolver as potencialidades das pessoas com necessidades especiais e a sua
inclusão na sociedade.
Entre as metas do Complexo também está a inclusão da família no processo
de atendimento às crianças, adolescentes e adultos com necessidades especiais e a
sensibilização da sociedade.
Os serviços que são oferecidos no Complexo são:
Núcleo de Formação e Monitoramento; Assessoramento às escolas
inclusivas; Promoção e realização de cursos específicos; Implementação e
acompanhamento as escolas de referência.
Núcleo Clínico; Avaliação e Diagnóstico; Desenvolvimento de Projetos de
Estimulação Essencial de zero a 3 anos; Estimulação de aprendizagem de
4 a 6 anos; Atendimentos específicos; Fonoterapia; Psicológico;
115
Psicopedagógico; Terapia Ocupacional; Assistência Social para crianças e
famílias; Atendimento médico-clínico e neurologista; Atendimento
odontológico; Avaliação audiométrica.
Núcleo Pedagógico; Ensino Fundamental (1ª a série); EJA Especial;
Educação Física adaptada, esporte e lazer.
Núcleo de Oficinas Profissionalizantes; Oficinas Pedagógicas com
adolescentes acima de 14 anos; oficinas de trabalho para estudantes
acima de 14 anos.
Além destes serviços o Complexo oferece oportunidade para os indivíduos
com necessidades especiais que tiverem condições de trabalho e sem escolaridade,
que são as salas de convivência.
Os pais também têm oportunidade de receber cursos profissionalizantes
através do projeto “Incluindo os pais nas escolas”.
O Complexo pretende também desenvolver projetos nas escolas da rede
municipal de ensino detectando crianças com altas habilidades e trabalhando o
potencial existente, em parceria com outras instituições. (SEMED, 2007).
Atualmente, em razão de todos os fatores histórico-sociais anteriormente
considerados, ainda existem modalidades de atendimento às diversidades que
assumem um caráter segregacionista, a exemplo do Complexo Municipal de
Educação Especial.
Isto tende a ser superado na medida em que a escola discuta coletiva e
permanentemente a prática pedagógica adotada, refletindo sobre as diferentes
formas do fazer educacional que levam ao êxito ou ao fracasso coletivo dos alunos,
e busque alterá-la a partir das discussões teóricas acerca do que fundamenta a
aprendizagem. Disto resultaa sua reorganização a partir de um Projeto Político-
Pedagógico, importante marco teórico e referencial de orientação ao trabalho
educacional, que implique na mudança de olhar e de lógica que percebe a diferença
enquanto deficiência.
116
Considera-se sua transitoriedade, tendo em vista a falta de sustentação desta
modalidade de atendimento frente à concepção teórico-metodológico da Proposta
Pedagógica da Organização Fundamental em Ciclos de Formação da Secretaria
Municipal de Educação e Cultura (2004) do Município de Manaus e referenciada
neste documento. Pressupostos estes ainda não materializados na prática
pedagógica da escola que foi pesquisada para a elaboração desta tese.
A interlocução entre os sujeitos que compõem o Complexo de Educação
Especial deve ser um fórum privilegiado de discussão, onde se possam repetir
angústias, comemorar os sucessos, mas principalmente estudar e aprofundar
alternativas de trabalho educativo. A reflexão conjunta sobre o trabalho desenvolvido
pelo Complexo e pela escola deve estabelecer um diálogo de co-autoria onde
possam interagir sujeitos concretos que lidem com seus limites e possibilidades.
No nosso entendimento, a constituição do Complexo de Educação Especial
enquanto espaço de produção e investigação de alternativas pedagógicas significa a
reflexão conjunta sobre as situações vividas no trabalho pedagógico, desvelando
posições pessoais e profissionais, despertando discussões, redimensionando-se
questões e pressuposições iniciais, percebendo as dificuldades e as possibilidades
de investimento.
Para legitimar a criação do Complexo, a Secretaria Municipal de Educação
tem a seu favor vários argumentos; entre eles o próprio conteúdo da legislação e
normas brasileiras e a Declaração de Salamanca.
Em entrevista, alguns profissionais do Complexo de Educação Especial
declararam desconhecer documentos ou projetos com atribuições de apoio à
inclusão. A formação dos técnicos que compõem o Complexo parece-nos muito
heterogênea. Os pedagogos, psicólogos, fonoaudólogos, fisioterapeutas e
coordenadores são todos graduados, apesar de alguns serem mais qualificados
(especialistas) e outros, apenas recém-formados. Quanto à formação dos
professores, intérpretes e instrutores, a situação é ainda mais heterogênea.
Enquanto os professores de apoio têm formação de nível médio, os intérpretes, além
do ensino médio possuem curso em Língua Brasileira de Sinais LIBRAS. Não
tivemos acesso a nenhum documento com atribuições dos Instrutores de Língua de
117
Sinais, dos técnicos, dos professores e também da operacionalização da escola
inclusiva em termos de transferência de recursos e de serviços de apoio
especializados para o ensino regular.
A Coordenadora do Complexo de Educação Especial, em entrevista, colocou
que o Complexo de Educação Especial acompanha o trabalho que vem sendo
desenvolvido nas escolas municipais. Trata-se, a nosso ver, de um trabalho
assistemático e distanciado da realidade, tanto em relação às equipes que compõem
o complexo, quanto às escolas municipais.
Segundo a Coordenadora (2006), a SEMED tem oferecido diversos cursos de
capacitação para professores, coordenadores e profissionais do Complexo de
Educação Especial, desse modo, a formação continuada de muitos dos técnicos da
SEMED fica, então, segundo eles, resumida à participação em palestras, encontros,
seminários, embora eles próprios considerem que essas atividades sejam breves e
sem aprofundamento. Talvez, em função disso, um dos técnicos tenha afirmado de
modo tão categórico que “a formação a gente tem conseguido com muito sacrifício e
de forma independente”.
Esta afirmação teve a anuência dos três pedagogos da escola pesquisada,
que acrescentaram, em entrevista (2006), que o município não condições para
uma boa formação, não fornece materiais, os livros são adquiridos por conta própria.
Segundo eles, a SEMED, apesar dos esforços, fornece cursos quando pode e
quando quer.
Foi ainda referido pelo grupo, nessa mesma entrevista (2006), que as
discussões na escola pesquisada a respeito das fundamentações teóricas têm
acontecido por iniciativa dos próprios técnicos da escola. Nenhuma orientação a
respeito do assunto lhes foi repassada ou até mesmo qualquer tipo de material
sobre o assunto. O ponto positivo apontado por eles é que, apesar de tudo, um
crescimento pessoal entre os componentes dos setores, pois, juntos, estão
construindo conhecimentos importantes para serem discutidos nas escolas.
Diante dessas colocações, questionamos sobre as atribuições dos pedagogos
do Complexo da Educação Especial: como cumpri-las? Quem as define? Houve
118
participação de todos os seus componentes no momento da elaboração? Estando
distante do dia-a-dia das escolas, é possível realizar um trabalho de apoio efetivo?
A dinâmica de trabalho dos pedagogos em 2005-2006, assim como dos
outros profissionais graduados que compõem a SEMED, não nos foi repassada.
Conforme informação de uma coordenadora pedagógica, anteriormente o
coordenador da escola ia aa sede (SEMED) tratar pessoalmente dos problemas
da sua escola. Posteriormente, a SEMED passou a atender vários coordenadores
juntos, para que eles se conhecessem e pudessem se integrar e trocar idéias.
Tanto no Centro Municipal de Educação Especial (2005/2006), como na sede
(SEMED), o trabalho realizado pelo CMEE, na opinião de alguns, ocorria em
conformidade com as necessidades detectadas pelas escolas. Na maioria, as
solicitações eram de ciclos de estudos, estudo de caso, encontro com pais e
professores.
Ajuizamos que a SEMED faz mudanças e adota novas atitudes quando
percebe que entraves para o funcionamento do CMEE, pois este setor é
considerado essencial para a operacionalização de toda a Proposta de Inclusão
Escolar, ou seja, é o seu fio condutor. Temos, contudo, de considerar no momento
as seguintes questões: até quando se possível trabalhar com uma prática
inconsistente, lábil, que é operacionalizada de forma cambiante e muitas vezes
equivocada? Como avaliar práticas tão inconstantes?
Talvez como justificativa, os assessores da SEMED afirmem que quatro anos
é muito pouco tempo para consolidar qualquer trabalho. Para eles, em se tratando
de ações que envolvem mudanças de paradigmas, é necessário rever atitudes que
englobam a sensibilização, o convencimento da sociedade e a mobilização das
estruturas escolares.
Segundo os coordenadores pedagógicos das equipes da SEMED, nas visitas
às escolas cobranças, sobretudo dos pedagogos, sobre a elaboração do Projeto
Político-Pedagógico, apesar de eles não estarem presentes de forma sistemática
nas escolas para poder arcar com mais esta tarefa. Em entrevista realizada em
novembro de 2006, um dos coordenadores que compõe a SEMED, assim se
pronunciou: “[...] A escola o quer assumir a inclusão, inclusive os coordenadores,
119
diretores. A gente percebe que não querem fazer nada pela inclusão. As pessoas
não querem mudar. Os coordenadores estão deixando o pedagogo da equipe fazer
o Projeto Político-Pedagógico da escola. O trabalho está muito misturado. Perdeu-se
até a questão da inclusão”.
Entretanto, consta como uma das atribuições dos pedagogos da SEMED a
sua participação na elaboração do Projeto Político-Pedagógico das escolas e o
apoio às atividades pedagógicas. O que nos conduz a refletir sobre até que ponto há
um trabalho articulado e integrado entre SEMED/CMEE e as escolas municipais,
apesar do segundo ser submetido às orientações e diretrizes do primeiro.
Em 2006, nas respostas a um questionário por nós aplicado à Coordenadora
do CMEE a respeito da atuação dos técnicos da SEMED/CMEE nas escolas
municipais, levantamos que:
o CMEE faz atendimento mensal e/ou quinzenal à escola, para realizar
palestras, debates, entrevistas com os pais, professores e alunos;
a equipe de apoio orienta e propõe metas de trabalho para cada aluno
e/ou sugere atividades adaptadas ao professor.
Em contrapartida, dos 10 professores da escola pesquisada, questionados
por nós em 2006, sobre o apoio efetivo da SEMED às salas de aula, apenas dois
afirmaram que recebem apoio, os restantes manifestaram-se negativamente,
utilizando-se de vários argumentos, tais como:
[...] A equipe só pede relatório dos alunos.
[...] O trabalho não tem seqüência.
[...] Até hoje não recebi apoio por parte deles, nada que pudesse enriquecer mais as minhas
aulas.
[...] Na teoria, tivemos bastante visitas, mas na prática pedagógica, não.
Podemos perceber, com alguns desses depoimentos, que enquanto os
diretores e coordenadores, implicitamente, parecem enaltecer a forma de atuar dos
técnicos da SEMED, por meio de palestras, cursos, debates e mini-cursos, os
professores, ao contrário e em grande maioria, parecem que gostariam de receber
outro tipo de suporte que pudesse lhes beneficiar diretamente, no dia-a-dia escolar.
120
A pedagoga da escola, em entrevista (2005/2006), alerta-nos quanto ao fato
da SEMED não assumir pedagogicamente uma linha de trabalho em conjunto com
CMEE e as escolas, pois, segundo a pedagoga, alguns professores adotam a teoria
piagetiana, outros adotam os pressupostos socionteracionistas. No nosso entender,
esse fato leva os professores da escola e os profissionais do CMEE à insegurança e
ao choque de referenciais teóricos.
Aquilatamos ser difícil conceber uma possível proposta de inclusão escolar, a
ser institucionalizada em uma rede municipal, que não tenha sido idealizada em
acordo com os referenciais teóricos que regem todos os princípios educacionais da
própria rede. Conforme as pedagogas (2006) da escola pesquisada, esta
discordância é um grande entrave para que o CMEE possa atuar nas escolas com
mais eficiência.
Alguns autores defendem a atuação dos serviços de apoio direcionados para
os alunos com necessidades especiais, apesar de formas diferenciadas. Para
Carvalho (1998):
[...] Pensar na inclusão dos alunos com necessidades educacionais
especiais nas classes regulares sem lhes oferecer ajuda e apoio, bem
como a seus professores e familiares, parece-me o mesmo que inseri-los
seja como número de matrícula, seja como mais uma carteira na sala de
aula. Dizendo de outro modo, pensar na inclusão sem que haja a
integração psicossocial e pedagógica entre todos os alunos é uma forma
requintada e perversa, embora habilmente mascarada, de segregação e de
exclusão, apesar de estarem juntos, fisicamente e apenas.
Segundo Mittler (1999) uma lei na Inglaterra, de 1993, que começou a
vigorar em 1994, segundo a qual “toda escola deve ter um coordenador para
necessidades especiais”. Segundo este autor, hoje inclusive uma agência do
governo incumbida do treinamento desse pessoal. Apesar das controvérsias em
relação á relevância que tem sido colocada no papel desempenhado pelo
coordenador para necessidades especiais nas escolas regulares, Mittler acredita
que esta ação representa uma base para construir algo.
Stainback e Stainback (1999) asseveram que,
[...] A natureza exata das habilidades do aluno determina quais serão os
dispositivos de apoio mais adequados para ele. Por exemplo, um aluno
com paralisia cerebral pode não ter facilidade para indicar opções em um
121
quadro de comunicação não-eletrônico ou capacidade física para
pressionar teclas do computador. Vários dispositivos de apoio foram
desenvolvidos para ajudar essas pessoas.
Mantoam (2000) assim se posiciona a respeito do apoio ao professor por
meio dos profissionais itinerantes:
[...] Não concordamos com esse suporte a alunos e professores com
dificuldades, porque apagam incêndios, agem sobre os sintomas, oferecem
soluções particularizadas, locais, mas não vão a fundo no problema e suas
causas. Os serviços itinerantes, de apoio o solicitam o professor, no
sentido de que se mobilize, de que reveja sua prática. Sua existência não
obriga o professor a assumir a responsabilidade pela aprendizagem de
todos os alunos, pois já existe um especialista para atender aos casos mais
difíceis, que são os que justamente fazem o professor evoluir, na maneira
de proceder com a turma toda. Porque se um aluno não vai bem, seja ele
uma pessoa com ou sem deficiência, o problema precisa ser analisado não
apenas com relação às reações dessa ou de outra criança, mas ao grupo
como um todo, ao ensino que está sendo ministrado, para que os alunos
possam aprender, naquele grupo. (p. 31)
Nem sempre os apoios à escola se traduzem por iniciativas que conduzem à
inclusão. É preciso, então, estar atento ao que os serviços propõem e ao que, de
fato, acontece na prática.
Para Mantoan (2001e), o ideal para apoiar o professor de sala de aula, e, em
conseqüência, todos os seus alunos, é criar o que ela denominou “Centros de
Aprimoramento do Professor”, como os que foram criados em alguns municípios
do Estado de São Paulo. Mantoan argumenta que esses centros representam um
espaço que os professores e toda a comunidade escolar possam utilizar com o
objetivo de questionar e realimentar coletivamente o conhecimento pedagógico e
praticar uma auto-formação, além de servir aos alunos e a todos os interessados
pela discussão dos problemas educacionais.
Isso não significa que não se valorizem os cursos, oficinas e outros eventos
de atualização e de aperfeiçoamento que são dados por diversas instituições
públicas e/ou privadas, mediante as reivindicações dos professores. Apenas
destacamos, como Mantoan (2001e), a necessidade de criar um espaço educacional
acolhedor e democrático que trabalhe em intensa cooperação com as escolas,
aberto às propostas inovadoras.
122
Mantoan (2001d) ainda nos alerta que o atendimento educacional
especializado, garantido na Constituição, não pode faltar, pois,
[...] é imprescindível que se ponham à disposição de alunos que têm
necessidades específicas, recursos como o sistema Braille para cegos, as
próteses de todos os tipos para garantir maior e melhor acessibilidade aos
deficientes físicos e sensoriais, técnicas e instrumental de mobilidade e de
comunicação alternativa/aumentativa, conhecimento da Língua de Sinais e
outros. (p. 05)
Entendemos que uma proposta institucional conseqüente deveria ser
integrada e articulada com toda a política do Município de Manaus voltada para as
pessoas com necessidades educacionais especiais e não ser operacionalizada de
forma fragmentada e justaposta, como constatamos.
Para Organização Mundial de Saúde OMS, quanto à questão do apoio,
também que considerar o que atualmente é denominado “situação de deficiência”.
Para a OMS, essa situação consiste na interação entre as características e
condições das pessoas com deficiência e as características e condições que o meio
em que esta pessoa se insere lhe oferece como espaço de vida e de atração. Assim,
sendo, que se pensar não apenas em um apoio á criança nas suas dificuldades,
mas avaliar em que medida estas dificuldades estão sendo potencializadas ou
diminuídas em razão do meio escolar em que o aluno se encontra.
A nosso ver, esta avaliação sugerida pela OMS não tem ocorrido na
Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Manaus.
As Diretrizes do Trabalho da SEMED/ CMEE e o cronograma atualizado para
2007, como constatamos, demonstram que haverá continuidade do trabalho que
vem sendo realizado até então.
O “novo” Cronograma de Trabalho, em síntese, previa como ações para o ano
de 2007, o que ocorre, ou seja; acompanhamento institucional; ciclo de estudos
com coordenadores e professores de recursos das escolas municipais; reunião de
equipe; encontro pedagógico; palestras nas escolas; planejamento.
123
Entendemos que essas ações, além de não representarem novidades, não
conseguirão estimular a SEMED/CMEE a atuar com autonomia e em função de suas
peculiaridades, para transformar seus objetivos e práticas escolares e, em
conseqüência, tornarem-se abertas às diferenças.
3.4 ESCOLA MUNICIPAL SEMPRE VIVA
A Escola Municipal Sempre Viva, mantida pela Prefeitura Municipal de
Manaus, através da Secretaria Municipal de Educação e Cultura, localiza-se na
Zona Oeste de Manaus. Seu prédio foi reformado em 1994/1995, conta com dois
pavimentos, sendo que no andar superior ficam as salas de aula, as quais são
utilizadas nos três turnos, com 30 turmas de a série; no andar inferior estão as
dependências administrativas e de apoio.
A escola possui biblioteca, sala de professores, sala de técnicos, secretaria,
diretoria, cozinha, refeitório, banheiros, laboratório de computação e depósitos.
Possuí ainda um pátio coberto destinado a atividades estudantis e comunitárias.
As salas de aula possuem em média 6,00 x 7,00m, onde são atendidos de 35
a 45 alunos, o que em alguns casos chega a caracterizar um início de superlotação,
uma vez que a demanda de alunos é sempre crescente.
Em um anexo, denominado de “Anexo 1”, “situado a 200 metros da escola, na
Rua Belo Horizonte, nas dependências de uma Associação dos Moradores,
funcionam 14 turmas em 7 salas de aula, em dois turnos, atendendo crianças na
faixa etária de 5 a 7 anos na Educação Infantil e primeira rie do Ensino
Fundamental.
Em outro anexo, a comunidade cede para a escola 03 salas de aula extras,
localizadas no prédio conhecido como “Casa da Comunidade”, “Anexo 2”, onde
funcionam 03 turmas de ensino fundamental; nesse espaço também são
desenvolvidas as atividades do Centro de Artes da escola, o qual atende cerca de
300 crianças por ano na área de artes (dança, teatro e música).
124
Quanto à estrutura do prédio da instituição de ensino pesquisada, verificou-se
que tem dois pisos, fazendo com que as escadas sejam um fator de limitação aos
alunos com necessidades especiais. Quaresma (2002) citava na sua dissertação
de mestrado que os principais problemas das instituições de ensino o: acesso,
circulação e a falta de adaptações quanto aos sanitários, e dizia mais: que os
obstáculos arquitetônicos interferiam diretamente na qualidade de vida dos
deficientes.
Machado (1993) afirma que é a escada a barreira mais importante. Isso se
verifica na maioria das escolas, visto que seguem o mesmo modelo arquitetônico. É
importante ressaltar que são poucas as limitações encontradas dentro da escola ao
compararmos com que o deficiente enfrenta fora da instituição de ensino,
principalmente em bairros de periferia, onde está situada a escola pesquisada, e a
infra-estrutura ainda é precária.
Na escola pesquisada não foi encontrada rampa de acesso secundário, (salas
de aula, banheiro, refeitório e áreas de recreação) também não existe adaptação
nos sanitários.
O que se pode ver é que existe uma lei que estabelece normas e critérios
para que se promova o acesso às pessoas com deficiências ou com mobilidade
reduzida e estas não estão sendo cumpridas, gerando ainda mais exclusão.
Segundo Weber (1996) o professor de uma classe regular não é capaz de
responder às necessidades de todos os alunos. A inclusão exige que o professor
seja constantemente apoiado.
Neste contexto as dificuldades encontradas na escola foram:
falta de preparo do corpo docente;
dificuldades de adaptações da estrutura física pela falta de recursos e
pelo número reduzido de educandos com necessidades especiais;
desconhecimento das especificidades de cada caso e dificuldade
material de trabalhar com o diferente;
125
A Escola Municipal Sempre Viva, como tantas outras nos bairros de classe
baixa de Manaus, é uma escola que nasceu de um desejo popular de melhoria de
condições de vida da Comunidade da Compensa II. Foi inaugurada no dia 24 de
março de 1985 nas dependências da Associação dos Moradores da Compensa II, e
instituída legalmente pela Lei Nº. 1.862 de 12 de novembro de 1986. Inicialmente em
três turnos, atendendo crianças na faixa etária de sete a quatorze anos, cursando as
quatro primeiras ries do Primeiro Grau e adultos na faixa etária de 15 (quinze)
anos em diante cursando o PEB Programa de Educação Básica. A escola era de
madeira e cobertura de telhas de alumínio, possuía as seguintes dependências: uma
sala de professores, três salas de aula, uma cantina, dois banheiros e um pátio.
Nos anos de 1987, 1988 e 1989 a escola contou com mais duas salas de
aulas cedidas pela Profª Nôemia Santana do Nascimento, residente próxima à
escola, que constituíram um Núcleo Anexo pelo “Projeto Espiral”.
Ainda funcionando nas dependências da Associação dos Moradores da
Compensa II, no ano de 1995, devido à grande demanda de alunos, a escola
funcionou em quatro turnos.
Em 1991, devido ao crescimento do Bairro da Compensa II, os funcionários
da escola, juntamente com o Diretor, iniciaram uma luta para a aquisição de um
terreno próximo à Associação. Através da força política e da união dos membros da
comunidade foi conquistado o espaço para a construção do novo prédio da Escola.
O novo prédio foi construído no ano de 1993 e inaugurado no dia 11 de junho
de 1994. Uma nova escola, com dez salas de aula, biblioteca, refeitório, secretaria,
sala de professores, banheiros para alunos e funcionários, depósitos para material
administrativo, material de limpeza e para merenda escolar. A Direção da Escola
continuou com o mesmo diretor até o dia 23 de março de 1996.
Posteriormente assumiu uma nova direção, cuja administração foi marcada
pelo envolvimento participativo com a comunidade; baseando-se na “função social
da escola,” buscou, integramente com a equipe técnica e professores, alternativas
que fizessem da escola parte indivisível da comunidade, tendo realizado em sua
administração vários projetos conjuntos com: o “Centro de Artes Experimental”, que
atende a inúmeras crianças na área de música, dança e teatro; Projetos Ambientais
126
como o Projeto Bodozol e o Projeto Eco-Lixo, através do qual a escola busca, com
base em uma filosofia própria dos projetos, formar cidadãos críticos e conscientes,
preparados para as possíveis situações sócio-ambientais de seu meio. Também, a
parte esportiva foi redimensionada e expandida na visão participativa, o que levou a
escola, através de seus alunos, à conquista de diversos títulos, como: bi-campeã de
Jogos Psico-Especiais, dois anos vice-campeã de futebol de campo das
Municipíadas, campeã da Gincana Cultural das Municipíadas, vice camp do
Projeto Conheça o Amazonas, 1º Lugar em dança no Concurso do Ministério Público
“ECA”.
Em 1998 a escola aderiu ao PDE Plano de Desenvolvimento da Escola,
política do MEC/FNDE, o que trouxe uma nova visão de quebra de paradigmas
educacionais antigos e formação de novos, mais adaptados e eficientes,
considerando o momento político pedagógico sob o aspecto da visão conjuntural
brasileira.
Também houve preocupação com a aquisição de instrumental técnico
pedagógico, passando a escola a possuir projetor de slides, TV - Escola, PROINFO -
(Laboratório de Computação), Episcópio, Sistema de som interno, etc.
Na administração atual, segundo a comunidade escolar, houve um avanço no
que diz respeito às relações humanas e ambiente de trabalho, caracterizando maior
estabilidade nas relações pessoais dos funcionários através da qualificação em
Programas de Qualidade 5S e treinamento em informática básica administrativa,
como início da fase de buscas de Gestão de Qualidade Total (GQT).
3.4.1 Projeto Político Pedagógico
Segundo o Projeto Político Pedagógico da Escola (1999), o Projeto pretende
se tornar “projeto instituinte”, e todo projeto instituinte tem validade política uma
vez que considere a realidade que está instituída, para então, de forma
democrática, participativa e multicultural, a partir do construído e, de forma
dialética, alcançar um patamar de visão e desempenho atualizado com a
necessidade de qualidade educacional que a era conjuntural tecnológica exige.
127
Assim, se por um lado, configura-se a formação educacional enquanto
processo político-social, também procura-se contemplar o aspecto pessoal
dessa formação, pois, considerando determinadas situações de risco para
o educando, oferecidas em sua própria comunidade, surge a necessidade
de se realizar atividades educacionais complementares objetivando
principalmente o reforço do caráter psicológico dessa formação, nos
aspectos da valorização da auto-estima e do protagonismo social infanto-
juvenil. (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO)
Ainda segundo o referido Documento, a gestão escolar, que tem sido
participativa e democrática, revelou-se fundamental para todo o processo em vista,
assim como a formação profissional dos professores, para os quais, anualmente,
deverão ser previstos treinamento em serviço e capacitações em áreas espeficas.
A Escola está localizada em um bairro residencial de classe social menos
favorecida, onde são inúmeros os problemas sociais vigentes que interferem na
atuação da escola no que diz respeito ao rendimento escolar e à participação da
família no processo educacional.
Entendemos que a instituição escolar não pode e nem deve ficar alheia aos
problemas sociais da comunidade onde está inserida, principalmente quando estes
problemas interferem diretamente na qualidade do ensino na escola. Entretanto,
apenas o trabalho técnico-pedagógico dos orientadores educacionais, dos
professores e da direção da escola não é capaz de transformar toda uma visão de
mundo, estruturada culturalmente em princípios e valores segundo os quais a
formação acadêmica é secundária, mas a parceria real com a comunidade pode dar
continuidade a uma nova visão de mundo, a médio e a longo prazo, já iniciada, mais
adequada aos tempos atuais, a partir da preparação das novas gerações e da
conscientização dos adultos para a necessidade de envolvimento nos trabalhos de
cunho comunitário.
De seu Projeto Político Pedagógico (1999), a Direção da escola adotou
princípios básicos, que segundo a atual Diretora tem norteado toda a atuação da
instituição, são eles:
Priorização dos clientes do ensino fundamental, segundo os preceitos da
legislação educacional vigente;
Atuação, enquanto agência educacional, visando a preparação dos alunos
para o exercício da “cidadania constante” (exercida, independentemente
da idade buscando eliminar o paradigma de que cidadão é somente a
pessoa maior de idade); centralização da atuação da escola para a
128
minimização dos problemas sociais da comunidade; envolvimento da
comunidade, através da Associação de Pais e Mestres e Comunitários,
buscando a atuação em parceria com instituições locais e externas;
manutenção do atendimento à criança e ao adolescente em situação de
risco no sentido de valorizar a sua auto-estima, através de atividades
artísticas; estímulo à lideranças estudantis e comunitárias a tornarem-se
protagonistas de seu próprio desenvolvimento social; estabelecimento na
escola, como padrão, a visão didático-pedagógica de caráter
construtivista, assim como a transversalidade, interdisciplinaridade e o
sistema de avaliação e promoção continuada; promoção da valorização da
cultura nacional e universal através de atividades e programas que
busquem o conhecimento da diversidade cultural dos alunos; trabalhar em
parceria com a comunidade dando apoio técnico pedagógico aos anexos 1
e 2, que trabalham com educação infantil e artes.
Dessa forma, na ótica da Diretora, a escola busca redimensionar a sua função
social, a fim de criar condições para que os alunos possam desenvolver
satisfatoriamente as suas potencialidades, construindo instrumentos próprios de
compreensão da realidade e buscando a participação nas relações sociais, políticas
e culturais de seu meio.
Cabe comentarmos que a visão de escola – empresa está cunhada no Projeto
Pedagógico; por exemplo, os alunos são chamados de “clientes”, busca-se a
parceria com a comunidade para que essa execute funções que seriam de
responsabilidade do poder público. Transparece no documento, de fato, um
ecletismo em termos propositivos, o que é uma marca presente em muitas
instituições.
Segundo a Coordenadora Pedagógica do turno matutino, justifica-se o Projeto
Político Pedagógico pela necessidade de sistematizar, organizar e planejar
estratégias, traçando metas, visando a minimização de problemas relacionados à:
Considerável índice de evasão escolar e repetência; baixa produtividade
na modalidade de ensino denominada EJA – Educação de Jovens e
Adultos; pouca participação dos pais no processo educacional de seus
filhos; situações de risco para jovens e crianças na comunidade; baixo
índice de qualificação dos funcionários de serviços gerais e
administrativos.
Neste contexto, segundo o referido documento (1999), são encaminhados as
qualidades e circunstâncias de:
129
1. Opção pela visão educacional construtivista; 2. Desenvolvimento de
atividades em parceria com a comunidade; 3. Manutenção de atividades
educacionais artísticas voltadas para a valorização da auto-estima; 4.
Redimensionamento da visão de futuro enquanto instituição voltada para a
formação de cidadãos; 5. Atuação preventiva contra problemas sociais que
afetem a infância e a juventude; 6. Gestão participativa de processos; 7.
Necessidade de direcionamento para maior envolvimento do corpo docente
e discente nas atividades educacionais; 8. Qualificação e atualização
constante do corpo docente, nas correntes psicopedagógicas que
satisfaçam as necessidades e ideais da escola; 9. Necessidade de
acompanhamento de alunos com dificuldade de aprendizagem,
caracterizados por necessitarem de cuidados especiais; 10. Urgência de
atendimento específico para a área de educação ambiental; 11. Reforço
das situações que evidenciem o protagonismo infanto-juvenil na escola e
na comunidade.
Assim, a fim de que se tenha uma visão globalizada do ato de educar, a
própria escola vem procurando capacitar seus professores no sentido de orientá-los
para a promoção de uma educação integral e humanizada, proporcionando
elementos para:
C
onhecimento dos processos de desenvolvimento humano; conhecimento
dos processos de aprendizagem; compreensão das influências do
ambiente sócio-econômico-cultural sobre o educando; compreensão e
sensibilidade para as diferenças individuais dos educandos; habilidade em
se fazer entender clara e eficazmente; habilidade de trabalhar
cooperativamente e interdisciplinaramente; interesses em trabalhar com
crianças e adolescentes em função de suas necessidades; auto
valorização pessoal e valorização da auto-estima do educando.
(PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, 1999)
Segundo o Projeto Político Pedagógico (1999) a escola pesquisada concorda
com a seguinte abordagem:
[...] A eficácia do processo educativo centra-se no professor: seus
conhecimentos, suas habilidades, e suas atitudes em relação ao aluno a
quem deve motivar. Torna-se, pois, de vital importância promover, antes
de mais nada, o desenvolvimento do professor, orientá-lo e assisti-lo na
promoção de um ambiente escolar e processo educativo significativos
para o educando”. (PROJETO POLITICO PEDAGÓGICO)
A Pedagoga do turno matutino acrescenta que mudanças curriculares,
inovação de métodos e técnicas de ensino ou do próprio currículo não tornarão por
si o processo de ensino-aprendizagem repentinamente eficaz. É preciso todo um
compromisso com a atualização dos profissionais da área do magistério. Continua,
130
dizendo que isso vem sendo feito na escola de maneira satisfatória, inclusive
através da alocação de recursos próprios.
A Diretora acrescenta que “a nossa visão política fundamental é a de que a
escola possui o papel social de agência provedora de mudanças estruturais sociais,
e de fato, como profissionais da educação nos consideramos capazes de promover
mudanças”.
A Diretora pondera ainda que “[...] O real ideal político adotado por nossa
escola a partir do ano de 1997, o qual temos tentado fazer cumprir no decorrer de
nossa prática educativa, relaciona-se com uma visão que vem complementar nossos
ideais em termos de ação real que enfatiza”.
Nesse sentido, a Pedagoga enfatiza:
[...] A corrente pedagógica adotada na escola em nível organizacional
é a corrente Progressista Libertária, mesclada por particularidades da
corrente Crítico Social dos conteúdos, ainda que tenhamos
professores que primam por correntes mais tradicionais.
Quanto aos pressupostos psicológicos, continua dizendo, “[...] adotamos a
visão de Jean Piaget e Vygotsky, sendo que participamos da visão esquemática da
aprendizagem, onde o indivíduo é visto de forma dinâmica continuada, com seus
esquemas de compreensão e ação, os quais, são tidos como estruturas próprias
para o ato de conhecer”. Para ela, “o corpo docente da Escola Sempre Viva concluiu
que a aprendizagem é fruto da realidade histórico-social, ou seja, o processo de
desenvolvimento é a apropriação ativa do conhecimento disponível na sociedade,
sendo educação um produto da interação social e da cultura”.
3.4.2 O Cotidiano da Coleta de Dados
No decorrer dos nossos estudos, como instrumentos de coleta de dados,
utilizamos concomitantemente a observação, entrevistas, análise de documentos
primários e secundários, informações resultantes de reuniões, encontros, seminários
e conversas informais.
131
A fase de coleta dos dados preencheu o semestre de 2005, estendendo-se
até o final de setembro de 2006. A revisão da literatura, pela sua relevância e
também pela mudança de orientador, acompanhou todas as etapas do
desenvolvimento deste estudo: a elaboração da fundamentação teórica e
metodológica, a seleção e caracterização da escola, a análise dos documentos, a
realização da coleta dos dados na escola e nos diversos órgãos vinculados à
Secretaria Municipal de Educação e Cultura, a transcrição dos dados coletados, a
análise e interpretação final dos dados e a redação final da tese realizados no tempo
programado.
Utilizamos vários espaços da escola para coleta dos dados, entre os quais
destacamos, além das salas de aula, a sala da Diretora, orientação e coordenação
pedagógica, a secretaria, as salas dos professores, a cantina, os corredores e o
pátio de recreação.
Para investigação das salas de aula fizemos observações, registramos
informações de reuniões e de conversas informais, fichas e relatórios de
observações dos professores. Esta parte do estudo preencheu o calendário de abril
a dezembro de 2005, nos períodos matutino e vespertino, em conformidade com o
horário de funcionamento da escola e com o cronograma de trabalho previamente
estabelecido.
A observação em sala de aula foi de caráter “participante mas com a
pretensão de não provocar muitas alterações no comportamento dos alunos
observados. Foram realizadas de uma a quatro observações em cada sala de aula,
conforme as necessidades pontuadas por nossos estudos. Além disso, fizemos,
anteriormente, vários contatos/articulações com pessoas na própria escola e com a
Pedagoga Distrital responsável pela escola que faz parte do Núcleo de Pesquisa em
Psicopedagogia da FACED/UFAM, para que as observações ocorressem a
contento.
As entrevistas continham questões abertas e foram elaborados em dois
modelos: um direcionado aos professores, a respeito da política de inclusão escolar
da rede municipal e, principalmente, das especificidades da inclusão em suas salas
de aula. A outra entrevista foi destinada à Diretora e às coordenadora pedagógicas
132
da Escola, com questões amplas também a respeito das possibilidades da proposta
de inclusão escolar na rede municipal e, sobretudo, a respeito do processo de
inclusão na sua escola.
Foram também enviados questionário para o Conselho Municipal de
Educação, que não nos deu retorno e para a direção do CMEE (Centro Municipal de
Educação Especial) que, do total de 10 questões, respondeu, após muita insistência,
às questões 5, 8 e 9 . Esse fato contribuiu para estimular a continuidade dos nossos
estudos e espelhou uma situação bastante representativa. As entrevistas e também
as conversas informais com servidores da SEMED permitiram coletar dados
fundamentais quanto às concepções que estão sendo construídas a respeito da
inclusão escolar e da operacionalização desta, bem como as articulações que estão
sendo feitas pelo CMEE para que a inclusão possa ser devidamente implantada na
Rede Municipal de Educação de Manaus.
A análise documental extrapolou o espaço escolar e coletamos dados na
SEMED, no CMEE, CEE/AM. Nesse locais, analisamos documentos primários (leis,
regulamentos, decretos, normas, diretrizes e pareceres), buscando compreender a
trajetória dos serviços de educação especial no Município de Manaus, as
concepções, conceitos e respaldos legais e institucionais que legitimam a inclusão
escolar na rede municipal de Manaus.
O planejamento de toda a pesquisa foi redelineado sempre que necessário,
ao longo de toda a investigação. Os dados colhidos, com freqüência, mudaram o
que foi traçado inicialmente, exigindo novas buscas. Assim, todas as questões mais
específicas resultaram do processo da coleta de dados e o foram definidas a
priori.
Os dados quantitativos também foram incluídos em nosso estudo, pois
entendemos, assim como Bogdan e Biklen (1994), que eles fornecem informações
descritivas relativas a uma população servida por um programa educacional em
particular, e, conforme constatamos, abrem novos caminhos a explorar e suscitam
novas questões.
Efetuamos os registros de campo por meio de notas e gravações em meio
magnético, de conformidade com as situações de coletas surgidas. O conteúdo dos
133
registros incluiu uma parte descritiva e uma parte reflexiva, pois achamos
imprescindível ampliar as descrições daquilo que observamos. Registramos também
aspectos subjetivos, surgidos ao longo do processo de recolhimento de dados.
As entrevistas foram, na sua maioria, realizadas individualmente, algumas em
duplas, quando as professoras trabalhavam na mesma turma, dividindo as
disciplinas. Além da entrevista coletiva realizada com a equipe do CMEE da
SEMED, entrevistamos a diretora, as coordenadoras pedagógicas (3) e as
pedagogas. Com as pedagogas as entrevistas foram bastante longas, com mais de
duas horas de gravação. Como as demais entrevistas, a maioria das pessoas
entrevistadas o se limitava a responder às nossas perguntas e a conversa fluía.
Muitas professoras fizeram longos relatos de suas experiências, falando das
dificuldades gerais do trabalho e como percebiam as possibilidades da inclusão
escolar dos alunos com necessidades educacionais especiais.
O roteiro que utilizamos nessas entrevistas continha questões relacionadas
ao que pretendíamos investigar e aos objetivos do nosso estudo. Mas essas
questões foram sendo revistas e redefinidas enquanto dialogávamos com os sujeitos
e levantávamos as dificuldades da implantação da Inclusão Escolar, principalmente
quando entrevistamos as professoras envolvidas diretamente com este trabalho.
Enfatizamos, conforme recomendam Bogdan e Biklen (1994), a especulação,
os sentimentos, os problemas, as idéias, os palpites e impressões, entre outros.
Com todas as entrevistas transcritas, procedemos à leitura e à reeleitura
destas, momento em que nos “transportamos” a Manaus, procurando mergulhar
novamente no contexto em que se deu a pesquisa de campo. Ao mesmo tempo,
procuramos nos distanciar dessa realidade, de modo a ter um olhar mais crítico
sobre as peculiaridades do nosso objeto de estudo.
Como relatou Pimentel (1994), quando estávamos em campo, também
sentíamos uma perplexidade que nos estimulava e levava à ação, durante as
entrevistas e diante das discussões. Posteriormente, diante da riqueza de todo o
material coletado para a pesquisa, a perplexidade nos deixava, às vezes, paralisada.
“O que fazer? “Por onde começar?”. Em alguns momentos foi importante a (re)
leitura de trabalhos, relatos de processos de pesquisas, dissertações, teses, de
134
modo a melhor compreendermos essa metodologia que escolhemos e, aos poucos,
irmos nos assegurando de que se aprende a pesquisar pesquisando.
A partir desse vasto material fomos levantando termos indicadores das
categorias de análise para darmos prosseguimento ao trabalho. Foi, de fato, o
momento mais rico e também o mais difícil desse aprendizado. Eram tantos temas
possíveis de serem discutidos e tão interessantes que, em muitos momentos, nos
levavam a querer abarcá-los. Mas, diante do limite do tempo, dos prazos e,
principalmente, das nossas próprias limitações nesse estudo, tivemos que nos
contentar com a versão que apresentamos.
Das salas de aula selecionadas estudamos os seus planejamentos,
currículos, planos de aula, atividades de sala de aula, recursos didático-
pedagógicos, formação do professor, perfil do aluno, formas de avaliação, critérios
para promoção, tempo e espaço escolar e relacionamentos envolvendo aluno,
professor e escola, entre outros.
Buscamos também documentos e/ou informações relativas á organização, à
estrutura e ao funcionamento das escolas da SEMED, objetivando o conhecimento
mais detalhado e contextualizado da construção do cotidiano escolar.
Procuramos nos documentos secundários (publicações técnicas, artigos de
jornal, periódicos, estatísticas, regimentos, arquivos escolares e atividades dos
alunos), informações que acreditávamos importantes para ampliar conhecimentos
das práticas educativas observadas em sala de aula, facilitando assim a nossa
reflexão, interpretação e análise.
Empenhamo-nos em entender como a solidariedade, a cooperação e o senso
de justiça estão sendo desenvolvidos no contexto escolar, pois concebemos a ética
e a moral como imprescindíveis em qualquer processo de inclusão.
Foram levantados dados sobre legislação federal, estadual e municipal a
respeito da educação e especificamente sobre a educação especial e a inclusão
escolar, bem como sobre as recomendações internacionais e nacionais referentes à
educação de pessoas com necessidades educacionais especiais no ensino regular.
135
O trabalho de campo foi, portanto, realizado de forma sistemática e
prolongada, pois, segundo André (1995), assim se torna possível a interação
constante entre o pesquisador e o objeto a ser pesquisado e a reconstrução dos
processos e das relações que configuram a experiência escolar diária.
No decorrer do tratamento dos dados procuramos organizar as transcrições
das entrevistas, as notas de campo, as análises documentais, bem como outros
materiais acumulados.
Fizemos a análise dos dados durante toda a coleta, bem como no seu final,
pois no nosso entender, a reflexão imediata sobre o que se constata é fundamental
para o estudo. Para garantir a fidedignidade dos dados, procuramos fazer revisão
contínua de todo o material coletado, no decorrer da pesquisa.
Os dados colhidos foram analisados à luz do entendimento da inclusão
escolar, segundo novas abordagens teórico-metodológicas que norteiam as grandes
inovações educacionais do momento, como a abertura das escolas à diversidades,
paradigmas educacionais e emergentes e novas concepções que estão na base de
uma escola para todos.
Nosso referencial teórico foi multirreferenciado, apesar de termos nos estudos
desenvolvidos pelo Prof. Hugo Otto Beyer o exemplo de como decidir, pensar e
fazer a inclusão escolar na rede regular de ensino.
Um mundo inclusivo é um mundo no qual todas as pessoas tenham as
mesmas oportunidades de ser e de estar na sociedade, de forma participativa, e
onde as relações entre o acesso às oportunidades e às características individuais
não estejam marcadas por interesses econômicos. Que sejam, sim, marcadas pela
igualdade de valor entre as pessoas.
Sob essa ótica, o debate deve ser generalizado, para nele incluir e considerar
todas as minorias (das quais os indivíduos com necessidades especiais fazem
parte). E a escola é um espaço social privilegiado para essas discussões, por suas
funções políticas, entre outras.
Entendemos que a nossa experiência profissional na rede estadual de
Manaus, especificamente como Chefe do Centro de Triagem e Diagnóstico da
136
Educação Especial/CETRIDE de 1981 a 1990 e professora da FACED/UFAM desde
o ano de 1990, Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa em
Psicopedagogia, contou positivamente na realização do trabalho, facilitando, como
nos afirma Rummel (1972), a compreensão de certos mecanismos administrativos, a
determinação dos melhores espaços de pesquisa, assim como a decodificação de
certos padrões culturais do grupo estudado.
3.4.3 Sujeitos Investigados
Os sujeitos desta pesquisa o as professoras que trabalham com alunos
com deficiência inseridos nas salas de aula do ensino regular na Escola
selecionada, a Diretora, a Coordenadora Pedagógica da escola, Pedagogas, e,
ainda, a equipe do CMEE/SEMED que coordena e acompanha a educação especial
na rede municipal de ensino.
a) As equipes
De modo geral, fazem parte do quadro funcional das escolas municipais de
Manaus, um diretor, pedagogo, secretária, administrativos, auxiliar de serviços
gerais, agente de saúde, merendeiras, auxiliar operacional, professores em sala de
aula, professores de educação física, professores/equipe escolar.
A direção das escolas da rede municipal de Manaus, é composta por um
diretor, é eleita por Processo Seletivo para Diretor/PROSED desde o ano de 2005,
com mandato de quatro anos. Os cnicos, orientadores e supervisores, são
concursados para este cargo. Tem ocorrido, entretanto, em algumas escolas, deste
cargo ser ocupado por profissionais da própria escola que concluam o curso de
pedagogia.
Todavia, mudanças na legislação da rede estão limitando o quadro de
técnicos, de acordo como total de alunos da escola. Essa mudança tem causado
descontentamento na escola pesquisada, ao se encontrar sem pessoal suficiente
para dar suporte ao trabalho pedagógico das professoras.
137
Isto decorre do fato de que a maioria dos profissionais do magistério trabalha
em mais de uma instituição, o que os impede de ir à mesma escola em diferentes
turnos.
Desse modo, nem todas as escolas possuem seu quadro completo em todos
os turnos.
b) As professoras
O quadro docente da escola pesquisada é formado por 40 professores, sendo
10 professores em sala de aula no turno matutino (manhã), 14 no turno vespertino
(tarde), 14 no turno noturno, dois professores de educação física no turno vespertino
e um professor/técnico no turno noturno. Todos os professores possuem curso de
Graduação completo.
No que diz respeito aos cursos de capacitação específica na área da
educação especial, de pouca duração, dentre o total de professoras entrevistadas,
cinco delas afirmaram nunca ter feito curso nessa área. Porém, a maioria, ou seja,
35 professoras afirmou ter algum curso promovido pelo CMEE/SEMED. Estes
cursos constam de cursos de capacitação docente para implantação do Programa
de Educação Inclusiva: direito à diversidade e/ou outros cursos feitos anteriormente
sobre uma área específica de deficiência-auditiva e mental.
Em relação ao tempo de experiência na área da educação, constatamos que
25 professoras atuam no magistério do Ensino Fundamental mais de dez anos.
Entre as demais, apenas duas estavam iniciando na carreira e as outras tinham
entre quatro a seis anos de trabalho escolar.
Com experiência na área da educação especial, uma diversidade: um
grupo de cinco professoras trabalha mais de cinco anos com aluno com
deficiência: uma professora trabalhou em instituição especializada e teve dois anos
de experiência com aluno integrado à sala de aula na rede municipal; quatro
professoras atuavam em classes especiais da rede municipal, as outras
atendiam alunos com dificuldade de aprendizagem na rede municipal.
138
c) Os alunos
Os alunos da escola selecionada, na sua maioria, moram no próprio bairro ou
em bairros próximos e pertencem a famílias de baixa renda. Os alunos com
necessidades educacionais especiais que estão freqüentando as aulas nas turmas
regulares são bem aceitos socialmente por todos: colegas, professores e
funcionários da escola. A escola mantém uma sala especial com 06 alunos (07 a 11
anos) e uma sala de recursos com 15 alunos (07 a 12 anos).
Na escola observada nesta pesquisa, o número de alunos com deficiência
atendidos não aumentou, do ano de 2005 para o início de 2006, e sim diminuiu com
a evasão de dois alunos.
139
4. DA EXCLUSÃO À INCLUSÃO: (CON)VIVENDO COM A MUDANÇA
Este capítulo trata, mais detalhadamente, da organização e análise dos
depoimentos colhidos juntos aos profissionais da Escola Sempre Viva, relativos ao
tema da inclusão. Para fins de sistematização, os depoimentos e nosso diálogo com
os mesmos, foram agrupados em seções: família e inclusão escolar; preparação da
escola para a inclusão; formação de professores; aspectos da estrutura e
funcionamento da escola; família, escola e serviço público municipal de atendimento;
currículo e adaptações curriculares.
Ao longo do texto não nos abstivemos a descrever o que foi ouvido e
observado, mas buscamos, propositadamente, um diálogo que aponta alternativas
para a superação de situações problemáticas que foram detectadas.
4.1 FAMÍLIA E INCLUSÃO ESCOLAR
Segundo Lima (1997), o eixo epistemológico que sustenta o processo de
escolarização é resultante da articulação entre desenvolvimento, aprendizagem,
socialização e formação da personalidade. Esse elo, segundo a autora, constitui-se
no atual desafio que a educação escolar enfrenta em todo o mundo. Existe uma
relação dialética entre a vida na escola e fora dela, porém, com algumas diferenças,
salienta a autora (1997). Enquanto no aprendizado da vida cotidiana os significados
são inerentes às práticas sociais e culturais, no aprendizado escolar o mesmo não
ocorre, pois o seu significado está presente no contato que é estabelecido com a
história das idéias, o conhecimento científico-cultural e o complexo processo de
desenvolvimento.
As abordagens inatistas, baseadas em premissas das filosofias racionalistas e
idealistas, definem que as capacidades sicas do ser humano encontram-se
praticamente prontas no momento do nascimento, ou ainda, potencialmente
determinadas, dependendo, apenas, do amadurecimento para se manifestar.
140
Enfatizam aspectos maturacionais e hereditários como fundamentais na
constituição do sujeito e do processo de conhecimento. O desenvolvimento assim
concebido é um pré-requisito para o aprendizado. O processo educativo está
vinculado quase que inteiramente às capacidades mentais e o desenvolvimento é
visto retrospectivamente. (REGO, 1995).
Considerando o aprendizado como processo puramente externo, segundo
Vygotsky (1988), esta abordagem se utilizará somente dos avanços do
desenvolvimento em vez de fornecer o impulso necessário para que modifique o seu
percurso. O desempenho no aprendizado escolar, conseqüentemente, deixa de ser
assumido pela escola. A criança será aquele sujeito que tem ou não as disposições
inatas para o aprendizado. Nesse contexto, o problema de aprendizado escolar é
visto como distúrbio inerente ao sujeito, em virtude de seus fatores maturacionais e
hereditários. O distúrbio se relaciona à disfunção do sistema nervoso central, sem
que haja uma vinculação direta com as condições deficientes ou ambientais.
(CAMPOS, 1997).
Em contrapartida, a concepção ambientalista inspirada na filosofia empirista e
positivista, atribui unicamente ao ambiente a constituição do sujeito. Privilegia a
experiência do ambiente no aprendizado escolar como a fonte primordial de
conhecimento e formação de hábitos comportamentais. As características individuais
são determinadas por fatores externos ao indivíduo. Aqui desenvolvimento e
aprendizagem se confundem e ocorrem simultaneamente. (REGO, 1995)
Vygotsky (1988), discutindo essa posição, coloca que o aprendizado escolar é
visto, basicamente, como uma organização de hábitos de conduta e tendências
comportamentais adquiridas. Portanto, o desenvolvimento é considerado como uma
acumulação de todas as respostas possíveis.
A abordagem ambientalista o aluno de forma passiva e o professor como
único responsável pela transmissão do saber. O professor, detentor onipotente do
saber, conduz o processo de aprendizagem de forma autoritária. Dessa maneira, a
escola entende que o aprendizado escolar se dará conforme as condições externas,
ou seja, ambientais (REGO, 1995). Nessa ótica, as manifestações de
comportamentos de alunos com supostos problemas de aprendizagem são
141
atribuídas a uma causa única – ao ambiente familiar ou social. Essas queixas
reportam-se diretamente ao comportamento do aluno, como aquele que não se
adapta à instituição escolar, através da nomeação de “aluno problema”, atrelando o
sistema a causas familiares ou socioeconômicas. Essa nomenclatura muitas vezes
acaba por estigmatizar o aluno.
Na visão sóciointeracionista, as atividades do aprendizado escolar são
sistemáticas e têm uma intencionalidade deliberada, um compromisso explícito,
historicamente comprometido em tornar acessível o conhecimento formal organizado
pela cultura. As crianças à medida que são encorajadas a adquirir conceitos
científicos nas atividades propostas pela escola, estão modificando sua relação
cognitiva com o mundo. Por conseqüência, o aprender modifica o desenvolver.
(REGO,1995).
Concordamos com Wallon e Vygotsky, que consideram o papel do outro
intimamente relacionado ao aprendizado. Neste incorporação, por intermédio da
linguagem, do acervo cultural do grupo ao qual pertence. O professor e todas as
pessoas da escola, na ótica sociointeracionista, o protagonistas do aprendizado.
Existe, para eles, uma construção mútua e dinâmica do conhecimento. Para esses
autores, é na interação do sujeito com o meio que acontece o desenvolvimento e a
aprendizagem. Incluímos nesse protagonismo do aprendizado a família, principal
grupo de convivência que passa a compartilhar (ou não) com a escola as atenções
da criança.
Nessa perspectiva, o desenvolvimento é entendido como determinado pelos
processos biológicos e sustentado pelas interações sociais com os adultos ou outras
crianças, nas dimensões intrapessoais e interpessoais - o aprendizado escolar.
Dentre os diferentes lugares sociais em que a aprendizagem ocorre,
destacamos a família, que é em geral o primeiro local social em que o sujeito está
inserido. Desde o início da vida o ser humano é constituído como um ser social,
biológico, histórico (WALLON, 1979): é na família que aprende a conviver com os
outros para que, mais tarde, possa fazer parte dos diferentes lugares sociais.
Segundo Reis (1988, p. 99) “é na família, mediadora entre o indivíduo e a
sociedade, que aprendemos a perceber o mundo e a nos situarmos nele. É a
142
formadora da nossa primeira identidade social. É o primeiro “nós” a quem nós
aprendemos a nos referir”.
Fernandes (1991) argumenta afirmando que “a origem do problema da
aprendizagemo se encontra na estrutura individual. O sintoma se ancora em uma
rede particular de vínculos familiares que se interiorizam com uma também particular
estrutura individual”; nesse contexto, por detrás do não aprender detecta-se uma
complexa rede de interações que poderia servir de explicação do porquê do
processo ensino aprendizagem ter vindo a se constituir em um problema.
Prado (1996) acrescenta que a família não somente é o berço da cultura e a
base da sociedade futura, mas também o centro da vida social. A educação bem
sucedida da criança na família é que vai servir de apoio a sua criatividade e ao seu
comportamento produtivo quando for adulto.
A família tem sido a influência mais poderosa para o desenvolvimento da
personalidade e do caráter das pessoas. O dever da família com o processo de
escolaridade e a importância da sua presença no contexto escolar é publicamente
reconhecido na legislação nacional e nas diretrizes do Ministério da Educação
aprovadas no decorrer dos anos 1990, como nos exemplos pontuados a seguir:
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90), nos artigos 4º e 55º;
Política Nacional de Educação Especial, que adota, entre suas diretrizes
gerais: adotar mecanismos que oportunizem a participação efetiva da
família no desenvolvimento global dos alunos; conscientizar e
comprometer os segmentos sociais, a comunidade escolar, a família e o
próprio portador de necessidades especiais, na defesa de seus direitos e
deveres. Entre seus objetivos específicos, temos: envolvimento familiar e
da comunidade no processo de desenvolvimento da personalidade do
educando;
Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9394/96), artigos 1º, 2º, e
12º;
143
Plano Nacional de Educação (aprovado pela Lei Nº. 10.17/2001), que
define como uma de suas diretrizes a implantação de conselhos escolares
e outras formas de participação da comunidade escolar (composta
também pela família) e local na melhoria do funcionamento das
instituições de educação e no enriquecimento das oportunidades
educativas e dos recursos pedagógicos.
Conforme Buscaglia (1993), não é preciso que os pais sejam perfeitos, eles
apenas devem ser atentos, sensíveis e humanos. Ainda na ótica de Buscaglia
(1993), a criança com deficiência precisa ser educada com as mesmas tarefas, de
acordo com suas possibilidades, para que desenvolva o senso de responsabilidade
e aprenda a “querer o que faz e não a fazer o que quer”.
Um dos fatores que consideravelmente pode estar colaborando para a
inclusão da pessoa com necessidades educacionais especiais é a própria família.
Porém Glat (1995), no seu estudo sobre o papel da família do portador de
deficiência, ressalta que muitos profissionais e estudiosos ligados à área da
educação especial desconsideram-na:
A família, quando não ignorada, é considerada parte da clientela e vista
também sob a luz da patologia. Este enfoque se reflete na literatura, onde a
ênfase da abordagem, como já mencionado, é a problemática vivida pelos
familiares (o papel da família na inclusão do deficiente), embora reconhecido,
é geralmente relegado a um segundo plano; a família pode no máximo, ser
devidamente orientada, auxiliar e incentivar a integração do deficiente, mas
nunca ser a vanguarda deste processo. Acreditamos que a família grupo
social primário - é o fator determinante para a denotação e manutenção ou,
ao contrário, para o impedimento do processo de inclusão. É justamente
pelos profissionais subestimarem a importância da dinâmica familiar que a
inserção social das pessoas com necessidades educacionais especiais na
comunidade, via de regra, não se realiza. (p. 113)
Desta forma, entendemos que a família pode ser a propulsora e/ou
facilitadora do processo de inclusão dos educandos com necessidades educacionais
especiais, o que é reforçado por Correia:
A inclusão enquanto um processo dinâmico na vida de todo ser humano
inicia-se na concepção, pelo fato de ser um individuo desejado ou não ao
nível familiar passando posteriormente pelos outros níveis o escolar, o
144
profissional. Esse processo como considero, inicia-se na família, as
relações de seus membros entre si e destes para com a sociedade são de
fundamental importância para qualquer pessoa, especificamente para o
deficiente, pois seu maior grau de inclusão estará condicionado à maneira
como a deficiência é vivida pela família e a forma como a pessoa deficiente
internaliza e vive, nesse drama, o papel da pessoa deficiente. (CORREIA,
UFMT, V Encontro de Psicologia do pantanal – CEUC – UFMS, 1996)
Entendemos com essa fala que a inclusão é um processo, e como todo
processo ele é constituído, e se em nível familiar essa deficiência for acolhida, e a
pessoa com deficiência ocupar um lugar na dinâmica dessa família, pode-se
conseguir com isso sua inclusão numa esfera maior – a sociedade.
Nesse sentido, buscando Phueschel (1993), compreendemos que “se alguém
está convencido de que a vida humana tem valor infinito, então terá de reconhecer
que a inviolabilidade da vida jamais será ameaçada pela presença de defeitos físicos
ou mentais” (p. 59). Diante do exposto, o mais importante, ao trabalharmos com a
família, é valorizá-la enquanto espaço de produção de identidade social básica de
qualquer criança, tendo em vista a sua formação como ser humano. Também é
necessário que se desenvolva a tolerância pela diversidade humana, isto é, que
sejamos capazes de primeiramente enxergar as diferenças étnico-culturais da
sociedade em que vivemos e que aprendamos a respeitar politicamente essas
diferenças.
Portanto, cada vez mais cabe à escola, muito mais do que a mera
transmissão de conteúdos ou a formação de mão-de-obra especializada, que neste
contexto a tornaria ainda mais excludente, proporcionar condições de apoio e
instrução, atendendo às potencialidades individuais de cada aluno e promovendo a
sua inclusão com toda a comunidade.
Vivemos um momento histórico-científico em que uma situação deve ser
compreendida a partir do entendimento da complexidade dessa mesma situação. De
dobra em dobra, o homem inventa a si mesmo. Os diferentes níveis de
compreensão resultam da integração harmoniosa do conhecimento de diferentes
níveis de percepção. Sendo a realidade sendo múltipla e complexa, os níveis de
compreensão são múltiplos e complexos. (NICOLESCU, 1999, p.73).
145
Diante deste pensamento, a noção de conhecimento científico fica eivada do
entendimento de que uma rede de concepções e de modelos, na qual nenhuma
parte é mais importante que a outra. Vale dizer que não poderíamos priorizar, ou até
mesmo culpar o universo de aprendizagem de uma criança, que é sua família, ela
mesma, sua escola, sua cidade.
É a família o ambiente naturalmente responsável pela garantia de
pertencimento social e promoção da individualização do sujeito. O processo de
aprendizagem faz parte dessa individualização. A aprendizagem realizada no
contexto familiar nos faz, ao mesmo tempo, pertencentes, pois compartilhamos
relações com todo o grupo familiar, e autônomo, cria em nós uma necessidade de
autonomia e individualidade, que vão definir o como e o quando vamos utilizar o que
é aprendido. Essa criação de autonomia e individualidade é a base de nossa própria
identidade.
Muitas crianças que apresentam queixa de mau rendimento escolar,
“encontram-se impedidas de desempenho intelectual satisfatório, devido a
problemáticas emocionais, muitas vezes relacionadas a conflitos familiares não
explicitados” (SOUZA, 1995, p. 02); a elaboração desses conflitos (familiares e/ou
individuais) propiciam a melhoria no rendimento escolar.
Como educadores pretendemos entender a teia dinâmica em que os
acontecimentos e seus diferentes entendimentos são compartilhados: a estrutura
pessoal da criança, a dinâmica familiar, seu ambiente afetivo, a condição sócio-
econômica e cultural, os recursos de que dispõe sua cidade e como a criança se
constrói inserida em relações de saberes e poderes. O sintoma da dificuldade de
aprendizagem aqui é compreendido como parte da formação da estrutura do todo.
(CAPRA, 1997). Logo, a dificuldade de uma pessoa em aprender tem de ser vista a
partir do conceito e do contexto de inteireza.
Portanto, se os valores éticos de uma sociedade se situam no interior de uma
visão mais ampla da realidade, como o cientista irá encontrá-lo em sua estreita
especialidade? Somente uma concepção de globalidade do real pode levá-lo à
consciência de que, em primeiro lugar, ele é um ser humano, depois um cientista.
146
Para isso, o exercício interdisciplinar e transdisciplinar poderá favorecer o resgate da
ética na ciência. (CARDOSO, 1995, p. 82)
Sendo a família este componente basal da formação do indivíduo,
determinados aspectos da sua dinâmica devem ser observados na formação e/ou na
manutenção de uma dificuldade de aprendizagem. Um primeiro aspecto dessa
dinâmica familiar a ser abordado é a adaptação do indivíduo ao ciclo vital. Através
desse tempo do ciclo vital, o sistema emocional, que é gerado pela família, se move
seguindo os seus costumes relacionais, que influenciam diretamente nas formas de
se relacionar com a aprendizagem e nas expectativas desse sistema sobre os
membros mais jovens.
O movimento do sistema familiar dentro do seu ciclo vital, somado ao pado
de aprendizagem desse grupo, é o que vai dar origem a narrativas sobre projetos de
vida, carreiras, sucesso e insucesso. O significado que cada sistema familiar às
transformações que ocorrem ao longo do tempo marca a possibilidade deste grupo
em adquirir novos conhecimentos e uma identidade própria aos indivíduos,
possibilitando sua diferenciação.
Mesmo antes de nascer, a criança é depositária de expectativas de toda a
família e, ao nascer, essas expectativas se transformam em missões ditadas por
este mesmo sistema. Crescer contrariando essas expectativas e missões pode ser
visto como perigoso e sentido pela família como ameaçador ou como uma
deslealdade. Nessa linha de raciocínio “toda criança precisa ter o consentimento dos
pais, ainda que inconsciente, para crescer”. (POLITY, 2001, p. 41)
Assim como os valores éticos, orais e culturais, a relação com o saber
também vem inscrita na história familiar, determinando a aprendizagem, ou a
dificuldade desta, em seus membros. Sabemos que, para aprender, uma pessoa
necessita estar em condições de fazer um investimento pessoal em direção ao
conhecimento. Esse investimento está diretamente relacionado aos recursos
pessoais mesclados com as possibilidades sócio-afetivas.
Vale dizer que a aprendizagem vai acontecendo à medida que a criança vai
construindo uma série de significados que são resultados das interações que ela faz
e continua fazendo em seu contexto sócio-afetivo. Apesar do contexto histórico -
147
social apontar a necessidade de se compreender, respeitar e aproveitar as
diferenças como enriquecedoras do nosso contexto, muitas famílias e escolas ainda
vivem e ressignificam as diferenças como problema.
A diferença ainda assusta e intimida, ao invés de provocar mudanças,
reflexões e desenvolvimento. Pichon, (1995) nos ensina que família é “a estrutura
social básica” e o primeiro cleo de construção do sujeito. Diante desse enfoque,
fica fácil estabelecer a importância, que os educadores as escolas tem dado à
família de seus aprendizes. Como estrutura básica, a família tem papel determinante
no desempenho do papel aprendiz de uma criança.
Entendemos família como um núcleo ímpar, criador de uma cultura própria e
com leis, regras, mitos, ritos e crenças peculiares. Cada pessoa que compõe uma
família, além de compartilhar esses mesmos ideais e comportamento, tem suas
próprias emoções e suas diferentes significações do cotidiano doméstico. Esses
diferentes universos se entrelaçam e vão formando um jeito de viver e conviver que,
ao mesmo tempo em que conta, omite seus dramas, suas dores e seus sabores.
A estrutura familiar é um conjunto invisível de exigências funcionais que
organiza as maneiras pelas quais os membros da família interagem. Uma família é
um sistema que opera através de padrões e transações repetidas, estabelece
padrões de como, quando e com quem se relaciona e estes padrões reforçam o
sistema. (MINUCHIN, 1990, p. 57).
O ambiente familiar não é o único fator facilitador da aprendizagem, mas
desempenha, sem dúvida alguma, um papel, influenciando o comportamento da
sociabilidade e da motivação, o ambiente familiar desenvolve no sujeito sua relação
com o saber e suas características como aluno. Um ambiente familiar que contribui
positivamente no processo de aprendizagem de seus membros, além de recursos
materiais, oferece segurança, calma, e inclui adultos com disponibilidade para
interagir com as crianças, ou seja, capazes de funcionar como mediadores entre
elas e os estímulos.
Para Maturano (1999), é através de seu envolvimento que os pais fornecem
recursos emocionais essenciais ao desenvolvimento de um senso de competência.
Esse envolvimento se traduz em atitudes de assistência ao desenvolvimento da
148
criança, de encorajamento e reconhecimento aos seus esforços de autonomia,
exigindo que esta resolva seus problemas, mas mantendo-se disponíveis para
assistência, caso precise, e para promoção de atividades sociais e culturais
enriquecedoras.
Segundo Louro (2003), a própria escola produz diferenças. Desde o início da
sua história a escola exerceu uma ação distintiva fora e dentro dela. Fora separando
os que tinham dos que a ela não tinha acesso, e dentro através de classificação e
hierarquizações. A escola que nos foi legada pela sociedade ocidental moderna
começa por separar adultos de crianças, católicos de protestantes. Ela também se
faz diferente para os ricos e para os pobres. E ela imediatamente, separou os
meninos das meninas (LOURO, 2003, p. 57). Na medida em que foi requisitada e
conquistada por aqueles aos quais não havia sido dado o acesso, a escola teve que
mudar, mesmo assim, as diferenças continuaram a existir e serem produzidas.
A escola dita o que cada um pode ou não fazer. Desta forma sutil, produz o
aprendizado de uma postura que culmina na constituição de identidades
escolarizadas. Nesse processo, os sujeitos o são receptores passivos, eles se
envolvem e são envolvidos, respondendo reagindo, recusando ou aceitando-o
inteiramente, de acordo com a modalidade de aprendizagem que herdou de sua
família.
As pessoas têm diferentes saberes e interesses, necessidades, habilidades,
competências, contextos sócio-emocionais, história e potencial e essas diferenças
produzem, ao longo da vida do aprendiz, a singularidade de cada um. Compreender
que existem as diferenças entre as pessoas faz parte da formação do educador. Se
a escola responde às necessidades proeminentes do contexto em que ela está
inserida e muda sua prática e seu pensar para atender o papel social, ela continua
cumprindo a sua função formadora e continua sendo escola.
A aprendizagem acontece em um movimento de construção e reconstrução
de nós mesmos, do outro, da realidade que nos circunda e do próprio conhecimento.
Tentar trabalhar em uma dessas instâncias isoladamente é ineficaz, pois iria
dividir o que é indivisível.
149
O ser cognoscente é o autor de sua própria aprendizagem e, por isso, autor
de si mesmo. Para que essa construção realmente ocorra, nossas crianças
necessitam que os adultos que as atendem, em especial seus pais e, em seguida (e
não menos importante) seus professores, saibam colocar-se no papel de pais e de
professores, exercer sua autoridade, dar o afeto necessário e, principalmente,
separar seus próprios conflitos existenciais dos conflitos de seus filhos e educandos.
Nós, educadores e pais, precisamos entender que ser diferente não tem a
conotação de deslealdade para com planos que, embora tenham sido traçados, não
foram consultados, pois aqueles que não conseguem se adequar ficam à margem,
rotulados e sofrendo as conseqüências de uma identidade formada em cima de uma
dificuldade (no início ligada apenas a aprendizagem, mais tarde a todos os aspectos
da vida). A demanda pode se tornar insuportável para esse indivíduo, promovendo
um fechamento ainda maior como opção a uma exposição a questões que este não
consegue de forma alguma dar respostas.
Para Ajuriaguerra e Marcelli (1986), as crianças pertencentes às famílias
onde uma total ausência de organização (os adultos a alimentam quando se
lembram, aparecem e desaparecem sem razão, amam ou se batem alternadamente,
não diferenciam fome/saciedade, presença/ausência, limpo/sujo, falta/satisfação,
amor/ódio) poderão sofrer um esvaziamento da utilização dos processos mentais, ao
perceberem a completa impotência para modificar ou esperar modificações em seu
ambiente.
Se nem sempre é possível modificar a curto prazo certas referências do
mundo exterior e, muito especialmente, as atitudes e os métodos dos adultos que
compõem o mundo da criança, algumas oportunidades de ensino que favoreçam a
descoberta e a relação da criança com os objetos que a rodeiam poderão levá-la a
superar esse tipo de dificuldade. Cabe à escola organizar uma rotina de trabalho que
auxilie os alunos a perceberem os limites que os circundam. A existência de um
vínculo positivo entre o professor e o aluno também facilitará a identificação com o
objeto do conhecimento.
a) Perdas Familiares
150
Dentre os antecedentes que podem vincular-se diretamente às dificuldades
de aprendizagem, a coordenadora pedagógica C. destaca os relacionados a perdas,
afastamento ausência de familiares ou de pessoas que convivem com a criança.
COORDENADORA PEDAGÓGICA C: Separação de pais (...) E se a mãe vai trabalhar, é
outro problema, porque aí, eles tinham a mãe o dia inteiro, principalmente os pequenos da
série. Quando eles passam a não ter a mãe, então eles estão perdidos. Realmente para
eles, é um problema seríssimo (...).
A seguir, analisa as conseqüências do afastamento familiar na aprendizagem
dos alunos: “Aparecem os mais variados. Eles podem ficar agressivos, apáticos e
para eles acabou, isso não é o mais importante. A aprendizagem passa a ser uma
coisa secundária (...)”.
Embora o afastamento ou a ausência dos pais exerça uma grande influência
na aprendizagem dos alunos convém observar que esses fatores o devem ser
considerados isoladamente.
PROFESSORA B: Então, vai ver que essas crianças estão com problema, os pais são
separados, o pai bate na mãe (...) mas às vezes não é (...) a K., que os pais estão
separados teve uma melhora (...) ao mesmo tempo olho para o J. que tem pai e mãe
casados e ganha tudo do avô e está lá com essa dificuldade (...).
Para refletir sobre os fatos que provocam mudanças significativas na vida da
criança como, por exemplo a separação materna, Ferreira (1994) questiona os
resultados de alguns estudos que apontam para as vantagens e desvantagens da
criação de crianças em creches e orfanatos e que polemizam os efeitos perniciosos
da separação ou privação da mãe, pois não há consenso desta ser a principal causa
de alguns distúrbios apresentados pelas crianças. Alguns autores sugerem que o
atraso observado no desenvolvimento cognitivo e na linguagem dessas crianças
deve-se muito mais à privação geral de estímulos do que à separação ou privação
da mãe.
Essas observações parecem mostrar que os chamados “problemas
familiares” não podem ser entendidos de forma isolada, mas dentro de um contexto
mais amplo, envolvendo a própria organização da sociedade.
b) Agressividade nas relações familiares
151
As Coordenadoras Pedagógicas referem-se à influência dos obstáculos sócio-
afetivos na aprendizagem dos alunos, enfatizando a qualidade do relacionamento
entre a criança e a família.
COORDENADORA PEDAGÓGICA A: Há coisas que acontecem e que a gente nem sempre
está sabendo, mas que interferem na psique da criança. Ela pára realmente, ela bloqueia o
aprendizado (...) O pai bate na mãe, põe as crianças para fora! Tem criança que passa a
madrugada na rua, na chuva, e o pai não deixa entrar. Então, essas agressões que ela
sofre, depois vão refletir na escola.
COORDENADORA PEDAGÓGICA B: (...) os problemas sociais de uma família (...) claro,
influem demais no rendimento. Então, você pode pegar uma criança que está bem hoje e
amanhã por um problema na família ela parece que esqueceu, parece que ela se perdeu,
não quer saber de mais nada.
Mais adiante, a
COORDENADORA PEDAGÓGICA A.
localiza os problemas de
relacionamento mais freqüentes: “Muita briga em casa. E neste ano, principalmente,
pais desempregados. Deve dar um problema sério na cabeça deles”.
Crianças vítimas de maus-tratos ou obrigadas a conviver com a instabilidade
profissional e emocional dos pais, com o alcoolismo e a violência, terão, quase
sempre, dificuldade para desenvolver um sentimento de identidade estável e
satisfatório. Acabam duvidando de si próprias e deixam de possuir um sentimento
positivo de auto-estima. Por subestimarem suas potencialidades, não conseguem
resolver as tarefas propostas. A dificuldade e o fracasso em suas realizações
provocam o imediato abandono e o retraimento. Como não esperam nada de bom
dos adultos, não procuram comunicar-se com eles para explicarem sua vivência
interna. Assim, as capacidades de comunicação, tornam-se, em geral, mais
empobrecidas, interferindo no processo ensino-aprendizagem.
De acordo com Bleger (1984), toda a conduta com objetos inanimados faz-se
em função de pautas de condutas assimiladas na relação interpessoal, e todo o
objeto tem ou contém “cristalizada” uma quantidade de vínculos humanos. A relação
com as coisas é sempre um derivado das relações com as pessoas. Assim, os
vínculos negativos que a criança desenvolve com os adultos a sua volta certamente
interferirão no seu vínculo com o objeto do conhecimento.
c) Superproteção
152
Ainda que algumas professoras apontem com mais freqüência a indiferença
dos pais e a desorganização das famílias como obstáculos à aprendizagem,
também aquelas que se referem ao excesso de cuidados que algumas mães
dispensam aos filhos:
PROFESSORA D: Eu acho que a mãe ajuda muito. Deixou essa criança muito dependente
(...) Eu conversei com ela e ela também chegou à conclusão que “mimou” demais, que
ficou muito em cima e acabou limitando essa criança.
Quando os pais são superindulgentes ou exercem um excessivo controle das
atividades dos filhos, podem gerar comportamentos caracterizados por baixo limiar
de tolerância à frustração, dificultando o desenvolvimento afetivo, cognitivo e
psicomotor. A capacidade de pensar e de resolver problemas também podem inibir -
se. Essas crianças tendem a apresentar precário desejo de autonomia, falta de
espírito de iniciativa e escassa criatividade.
No entanto, Pain (1985) evidencia em seus estudos que para algumas
crianças com dificuldades iniciais na aprendizagem, a superproteção pode ser
salutar e que muitas crianças superprotegidas apresentam uma curiosidade mais
aguçada para tentar descobrir o mundo.
Assim, a superproteção pode ser responsabilizada pelos problemas de
aprendizagem depois de examinadas as circunstâncias em que ela está ocorrendo.
Em algumas relações familiares, a superproteção é, para a mãe, uma questão de
vida ou morte. Isso pode se dar, por exemplo, devido à perda de um outro filho.
Nesses casos, ao perceber a angústia da e, a criança pode se submeter à
superproteção, que se transforma num obstáculo para que a aprendizagem se
desenvolva.
d) Falta de contato com materiais gráficos
A falta de contato das famílias com materiais gráficos foi apontada como
obstáculo social à aprendizagem da leitura e da escrita.
153
PROFESSORA B: O problema social aparece com freqüência. O pai e a mãe não sabem
ler, nunca viram um jornal dentro de casa e se viram, estava embrulhando carne do açougue
ou sapato do sapateiro. Eles nunca viram o pai lendo, mostram o caderno para a mãe e ela
não entende nada daquilo. Pra ela são os desenhos, por isso não trocas. Então, esse
problema é social. Quando a família não tem contato com a escrita pesa bastante (...).
COORDENADORA PEDAGÓGICA B: As crianças têm problemas porque a casa delas não
é um ambiente letrado. Elas não vêem ninguém escrevendo, a escrita não é valorizada.
Então, não tem lista telefônica, a mãe não lê um livro, a mãe não escreve uma carta. (...). A
parte escrita é muito pobre, talvez por isso ela não valorize o que ela tinha que aprender
(...).
PROFESSORA C: (...) o fato é que com a leitura eles não trabalham (...) é muita televisão
(...) livrinho de leitura ninguém se preocupa em comprar. No aniversário é brinquedo, sabe?
Livro de leitura é bobagem. Contar historinha acho que nem se usa mais isso! (...).
foi comentada a importância das crianças terem contato, desde pequenas,
com comentários de jornais, faturas de contas a pagar, instruções para o uso de
aparelhos, listas telefônicas, materiais que, embora não sejam dirigidos a elas,
informam-nas sobre o valor social da palavra.
Se, além disso, elas têm acesso a livros de histórias, periódicos, papel e lápis,
etc., podem mimetizar os adultos como se também fossem leitoras ou escritoras.
Tudo isso aumenta a compreensão sobre o essencial das práticas sociais ligadas à
escrita, facilitando a aprendizagem.
O fato de algumas crianças não terem ou não terem tido a oportunidade de
contato com materiais gráficos priva-as da possibilidade de terem mais elementos
para trabalhar cognitivamente com a linguagem escrita e impõe mais uma vez à
escola e aos profissionais que nela atuam uma tarefa inadiável: construir um espaço
privilegiado e único, capaz de oferecer aos alunos materiais de escrita, livros de
histórias, textos e objetos portadores de textos, fazendo que reconheçam o valor
social da escrita.
Uma professora enfatizou a importância de se interagir com as crianças,
desde pequenas, através da fala:
PROFESSORA D: Mesmo quando eram bebezinhos e a mãe pegava um livrinho de
histórias, eles sentiam aquele carinho, aquela emoção que vinha de um papel escrito. Ah!
isso pra mim é o mais forte! Também ele quer pegar um papel, descobrir e entender aquilo
que está escrito.
154
Segundo Vygotsky (1988), alguns estudos demonstraram que a função social
da fala já é aparente durante o primeiro ano, isto é, na fase pré-intelectual do
desenvolvimento da fala. Reações bastante definidas à voz humana foram
observadas no início da terceira semana de vida e a primeira reação
especificamente social à voz já durante o segundo mês.
A criança consegue internalizar os meios de adaptação social disponíveis
através dos signos, constituindo-se a fala humana o mais importante comportamento
de uso dos signos ao longo do desenvolvimento da criança. Por meio da fala, ela
supera as limitações do seu ambiente e se prepara para a atividade futura: planeja,
ordena e controla o próprio comportamento e o dos outros.
Outra referência importante do depoimento da PROFESSORA refere-se à
introdução de uma terceira instância pela qual a aprendizagem poderá circular. O
encontro num “terceiro objeto”, através do olhar de alguém com o qual a criança tem
uma forte ligação afetiva, despertará a sua curiosidade. Um adulto capaz de olhar a
criança e captar o seu olhar, para colocá-lo, com interesse, em outro objeto,
certamente se constituirá, para ela, num forte modelo de aprendizagem.
Importante também é o papel da imitação na aprendizagem, pois à medida
que a criança imita os mais velhos em suas atividades culturalmente padronizadas,
ensaia os primeiros passos de seu próprio desenvolvimento intelectual. Eis por que
o hábito de ler também faça parte da vida do professor, que ele é a figura de
referência da criança.
e) Falta de estímulo
A estimulação ou a motivação para aprender devem ser compreendidas na
relação entre os aspectos afetivos e cognitivos do indivíduo, ambos dependentes do
meio social. Assim, as crianças provenientes de contextos familiares que não
conseguem valorizar a aprendizagem escolar tendem, na maioria das vezes, a não
investir energia suficiente para aprender.
155
PROF. A: Se o pai e a mãe, que são tão importantes pra eles, sobrevivem sem ler e
escrever, eles não tem ambição de querer subir na vida e de alcançar um outro status. E
vão se acomodando: repetem, repetem, repetem o ano. Então você tem que lutar com o
social, essa herança que eles não tiveram. Eles não tem estímulo, não vêem significado,
estão aprendendo uma coisa, que nem o pai, nem a mãe, que são tão importantes para
eles, sabem (...).
Assim, um dos trabalhos mais importantes do professor junto ao aluno é o de
lidar com suas motivações. Entretanto, não se trata apenas de elogiar ou incentivar
seu desempenho, mas de oferecer-lhe oportunidades de vivenciar o prazer gerado
pelo sentimento de competência pessoal e segurança para vencer desafios
intelectuais.
f) Pobreza
Nos depoimentos, a pobreza dos alunos aparece como um forte determinante
das dificuldades no processo ensino-aprendizagem.
Sem querer negar que grande parte do fracasso de alguns alunos pode estar
relacionado à pobreza material a que estão submetidos, é importante estar atento
para que a baixa renda das famílias o seja utilizada como justificativa para o
insucesso escolar das crianças, eximindo a escola, - sua organização didático-
pedagógica, seus agentes, e suas condições internas de qualquer
responsabilidade.
As próprias professoras, às vezes, percebem a existência de mecanismos
seletivos na escola e reagem com grande inquietação, tentando buscar saídas,
apesar dos limites impostos pelas condições estruturais que enfrentam.
PROFESSORA B: Eu não sei mas, acho que de repente a escola tende a privilegiar certos
alunos. Aqueles que conseguem tudo, eles já têm meio caminho andado (...) Algumas
pessoas dizem: “é assim mesmo, você não conseguir levar todo mundo”, mas eu tenho uma
preocupação de atingir essas crianças, de realmente conseguir desenvolver um pouco do
potencial que elas têm (...).
Outras vezes, ao se referirem aos problemas de aprendizagem, tendem a
desviar o foco de atenção dos alunos para si mesmas, compreendendo a própria
responsabilidade frente a essa questão.
156
PROFESSORA B:
(...) Isso me deixa triste, me incomoda porque parece que é culpa minha
(...) (...) não sei se sou eu que estou tomando pouca leitura, ou se estou dando pouco
exercício. Então, (...) às vezes eu me culpo por não ter tempo de estar pesquisando (...) e
como eu gostaria de estar podendo ler (...) de estar podendo ter uma visão ampla (...) Eu
acho que tenho uma visão, mas ela é pouca, é restrita (...).
A percepção da importância da aprendizagem e do desenvolvimento do
aluno, aliada a um certo grau de discernimento quanto à precariedade do
atendimento que a escola às crianças pobres (incluindo-se as dificuldades que
dizem respeito mais diretamente ao seu próprio preparo), apresenta, sem dúvida,
um avanço nas reflexões das professoras no que diz respeito ao seu papel, e ao da
instituição escolar na aprendizagem dos alunos.
4.2 INCLUSÃO, E PREPARAÇÃO DA ESCOLA
A escola tem um papel essencial no processo de inclusão dos educandos
com necessidades especiais na sociedade, podemos dizer ainda que a escola é a
principal porta de acesso para a formação da cidadania. Buscaglia (1993),
postulando sobre a inclusão do aluno especial, coloca que nenhuma criança pode
adentrar ao ensino regular se o professor não estiver inteirado de suas
características específicas e a professora Mantoan (2000, p. 94) nos diz:
Acreditamos que ao incluir um aluno com deficiência na escola estamos
exigindo da instituição novos posicionamentos diante dos processos de
ensino e de aprendizagem, à luz de concepções e práticas pedagógicas
mais evoluídas e uma mudança de atitude face à avaliação dos alunos, à
promoção por séries e níveis de ensino mais avançados.
Dessa forma, os professores que atuarão diretamente com o educando com
necessidades especiais necessitam de todo um conhecimento, tanto de aspectos
legais como de aspectos teóricos e metodológicos, para saberem atuar com uma
pedagogia diferenciada no dia-a-dia em sala de aula. O depoimento da pedagoga
revela o entendimento de movimentos necessários à inclusão:
PEDAGOGA:
Ainda não temos uma proposta definida pela Secretária Municipal de
Educação, mas desenvolvemos nossas atividades de acordo com a LDB, Nº. 9394/96,
leituras de artigos e pela participação de algumas professoras em congressos, seminários e
cursos sobre educação especial
.
157
Referindo-se ao aspecto legal da formação do educador que irá atuar com
alunos com necessidades especiais a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, 9394/96, art. 59 inciso III, coloca entre as exigências para o atendimento o
que foi referido pela Pedagoga.
PEDAGOGA:
Professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para
atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a
integração desses educandos nas classes comuns
.
Ainda sobre a formação de professores na Declaração de Salamanca estão
prescitos procedimentos para a inclusão:
[...] assegurar que, num contexto de mudança sistemática, os programas
de formação do professorado, tanto inicial como contínua, estejam
voltados para atender às necessidades educacionais especiais nas
escolas; [...] incutir em todos os professores uma orientação positiva sobre
a deficiência que permita entender o que se pode conseguir nas escolas
com serviços locais de apoio. Os conhecimentos e as aptidões requeridas
são basicamente os mesmos de uma boa pedagogia, isto é, a capacidade
de avaliar as necessidades especiais, de adaptar o conteúdo do programa
de estudos, de recorrer a ajuda da tecnologia, de individualizar os
processos pedagógicos para atender um maior número de aptidões.
E mais, nas Diretrizes Nacionais para a Educação, lê-se que:
Atenção especial deverá ser dispensada à preparação de todos os
professores para que exerçam sua autonomia e apliquem suas
competências na adaptação de programas de estudos e da pedagogia, a
fim de atender às necessidades dos alunos e para que colaborem com os
especialistas e com os pais.
No tocante ao Estado do Amazonas, o Conselho Estadual de Educação, na
Resolução Nº. 041/98, estabelece, em seu artigo 6º, como exigência para a
formação do docente que irá atuar junto ao educando com necessidades especiais,
conforme determinações previstas nos artigos 58 a 60 da Lei 9394/96, os seguintes
critérios:
I – nas classes, escolas ou serviços especializados, professores com
especialização adequada em nível médio ou superior; II nas classes de
ensino regular que possuam educandos com necessidades especiais,
professores capacitados para a integração dessa clientela nas classes
comuns. Parágrafo Único Os sistemas de Ensino deverão firmar
158
Convênios com Instituições Superiores, e/ou Órgãos especializados na
realização de cursos de capacitação e especialização dos professores e
exercício na modalidade de Educação Especial.
A Resolução Nº. 02/01 da Câmara de Educação sica, do Conselho
Nacional de Educação (CNE/CEB), estabelece no parágrafo 2º do art. 18 que:
São considerados professores especializados em educação especial
aqueles que desenvolverem competências para identificar as
necessidades educacionais especiais para definir, implementar, liderar e
apoiar a implementação de estratégias de flexibilização, adaptação
curricular, procedimento didáticos pedagógicos e práticas alternativas,
adequados ao atendimento das mesmas, bem como trabalhar em equipe,
assistindo o professor de classe comum nas práticas que são necessárias
para promover a inclusão dos alunos com necessidades educacionais
especiais.
Embora as recomendações legais desemboquem em um discurso que se
aproxima do ideal, a realidade da escola investigada é bem diferente, conforme as
palavras da professora A, ao ser indagada sobre o processo de preparação de sua
escola para a inclusão de um aluno com necessidades especiais.
PROFESSORA A
:
não houve preparação. Aceitamos a criança como experiência dois
anos e estamos tentando com boa vontade e esforço, associado ao apoio da família e dos
profissionais que acompanham a criança. Ainda estamos estudando as possíveis
adequações para continuar atendendo essa criança. O processo é lento, pois não dispomos
de profissionais (professores) devidamente habilitados para atuar nessa área
(psicopedagoga).
Outros professores se manifestam como transcrito a seguir:
PROFESSORA B:
Recebemos informações de como trabalhar com as crianças, com os
pais e com o aluno deficiente, no sentido de efetivar a inclusão. Sempre que precisávamos,
a coordenação da escola nos orientava como proceder com o aluno em determinadas
atividades e situações do dia-a-dia.
PROFESSORA C
:
Houve reunião com os pais, alunos e professores com o objetivo de
prepará-los para receberem os alunos sem assombro.
Segundo professora C (psicopedagoga) a preparação para o recebimento do aluno
deficiente se resumiu apenas a um “Trabalho com os pais das crianças da turma,
professores e toda a equipe envolvida com aquelas crianças. Fizemos leituras sobre o
assunto e o trabalho foi bom”.
O processo de preparação de sua escola para acolhida dos alunos com
necessidades especiais foi normal, de acordo com as palavras transcritas abaixo:
159
PROFESSORA D
:
A coordenação da escola participou aos professores que a escola iria
receber crianças deficientes e na primeira reunião de pais comunicou a eles que estaríamos
trabalhando com alunos deficientes e participamos de leituras sobre o assunto da inclusão
(professora da Educação Infantil).
Nos depoimentos dos professores, em nenhum momento se verbaliza
referência às recomendações legais para a atuação junto ao educando com
necessidades especiais. O que fica bem claro é uma atuação calcada no empirismo,
no qual prevalece a boa vontade, o bom senso e até uma certa pitada de loteria,
como se a situação de ensino-aprendizagem fosse um jogo, no qual o educando
especial estaria sujeito a ter seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social atrelado
à sensibilidade de seu professor.
Segundo Fonseca (1995, p. 107):
A Educação Especial o pode continuar a ser refúgio dos professores
menos qualificados. Para a Educação Especial deverão ser recrutados os
professores e os técnicos mais competentes científica e pedagogicamente,
na medida em que lhes vão ser exigidas capacidades para dar resposta a
complexas necessidades, nomeadamente as seguintes: diagnóstico;
planejamento curricular; metodologia pedagógica; competência técnica na
utilização de vários processos de informação; administração; consulta, que
lida com problemas educacionais, ocupacionais, vocacionais, sociais e
pessoais; envolvimento pessoal e tolerância; relações públicas, a fim de
trabalhar em grupo com as autoridades e serviços e atender aos pais, etc.
(p. 107)
A capacitação e conscientização do professor sobre a relevância de seu papel
no processo de inclusão dos educandos especiais, junto aos seus pares ditos
normais, influencia o sucesso ou o fracasso do desenvolvimento desse aluno, até
porque para que se efetive um trabalho de qualidade é preciso o conhecimento das
teorias de desenvolvimento e aprendizagem, às quais se possa recorrer para uma
adequação curricular que supra as dificuldades, que poderão ocorrer ao longo do
processo educativo.
Escrevendo sobre a capacitação dos professores para atuarem junto aos
educandos com necessidades especiais Goffredo coloca que:
Tanto na educação infantil quanto na educação fundamental, a meta
principal é satisfazer as necessidades específicas de aprendizagem de cada
criança, incentivando a criança a aprender e desenvolver seu potencial, a
160
partir de sua realidade particular. Isso requer por parte dos professores,
maior sensibilidade e pensamento crítico a respeito de sua prática
pedagógica. Esta prática pedagógica deve ter como objetivo a autonomia
intelectual, moral e social de seus alunos. Assim, os cursos de formação de
professores devem ter como finalidade, no que se refere aos futuros
professores, a criação de uma consciência crítica sobre a realidade que eles
vão trabalhar. (1992, p. 68)
O número de alunos em sala de aula tem sido um desafio para o docente,
tornando-se obstáculos a um atendimento mais individualizado aos educandos com
necessidades especiais.
A professora A ressalta que:
PROFESSORA A:
A escola neste caso tem se organizado para proporcionar melhores
condições de trabalho ao professor, através de turmas reduzidas para desenvolver
atividades juntamente com os alunos portadores de deficiência e os ditos normais
(pedagoga).
Entretanto, nem sempre a demanda que a escola atende e o espaço físico
que possui permite estas adaptações. A escola pesquisada apresenta uma estrutura
inadequada ao trânsito e permanência dos alunos com deficiência física; difícil
acesso, principalmente ao aluno cadeirante, ainda é uma realidade. A escola não
apresenta instalações sanitárias compatíveis, rampas, piso anti-derrapante. A
Instituição tem se esforçado e, por iniciativa da Secretaria, tem realizado
adaptações, mas esta não é uma realidade que predomina. Apesar da escola ainda
não se encontrar totalmente equipada para tal necessidade, a gestora, pedagogos,
docentes, pais e comunitários todos estão envolvidos em prol dessas mudanças.
Na escola pesquisada o acesso e permanência do aluno com deficiência
física acontece da seguinte forma:
PEDAGOGA:
Procuramos transformar a escola em um ambiente de inclusão,
desenvolvendo um trabalho de conscientização, entre docentes, pedagogos, discentes, pais
e comunitários, pois mudando a maneira de pensar das pessoas podemos acolher melhor
todos os estudantes até mesmo os dito normais (pedagoga).
Outras apreciações foram colocadas:
PROFESSORA C:
A escola os recebe bem, prepara os alunos, conscientizando-os a não
discriminá-los, a fazer sentir-se bem, apesar de não termos instalações e equipamentos
adequados, mas os nossos alunos tem o nosso afeto e confiança, isto faz com que eles
tenham acesso e permanência na escola.
161
PROFESSORA D
:
A escola não recrimina o aluno, mas a escola não está preparada para
receber um portador de deficiência física, falta adequar portas e banheiros e etc.
(supervisora).
PROFESSORA C
:
Garantir o acesso e a permanência do portador de deficiência na escola
é um fator primordial. A escola necessita de estrutura física adequada e recursos didáticos.
(professora da 1ª série).
PROFESSORA D
:
[
acesso e permanência] significa ter instalações e equipamentos
adequados para o deficiente, principalmente o físico, tratar a criança com respeito, carinho e
dignidade
(professora da 2ª série).
PROFESSORA C: [acesso e a permanência do aluno] acontece dentro de suas limitações
que não são poucas, proporcionando assim um ambiente dinâmico e acolhedor, com
assessoramento do macro sistema.
Nos relatos percebemos que para garantir o acesso e a permanência do
aluno com necessidades educacionais especiais é necessário que todos estejam
envolvidos em um trabalho de conscientização para que não haja discriminação,
criando condições para os educandos permanecerem na escola, um desafio que
implica mudanças de concepções, envolvendo toda comunidade escolar. Outro fator
importante é que tenhamos um ambiente favorável, com instalações e equipamentos
adequados, bons relacionamentos entre os discentes e os profissionais envolvidos
todos precisam sentir que são aceitos.
As mudanças legais para favorecer a inclusão escolar significaram de fato,
um respaldo importante a esta linha de atuação. Contudo, a nova regulamentação
não produz, direta ou necessariamente, modificações relevantes na prática docente
ou nas condições das escolas. Em geral, pode-se afirmar que as mudanças
legislativas pressupõem, por um lado, um reconhecimento do que já está sendo feito
de forma isolada ou dispersa no sistema educacional e, por outro, o estabelecimento
de uma estrutura mais ampla, que orienta e impulsiona em uma determinada direção
as atuações dos diferentes agentes educacionais.
No entanto, a educação dos alunos com necessidades educacionais
especiais na escola regular não é um assunto que possa ser resolvido apenas
através de formulações legais. É, além disso e, principalmente, um objetivo que
deve ser abordado sob todos as perspectivas, não somente as que têm relação com
o sistema educacional, mas também com a sociedade como um todo. A inclusão,
162
assim entendida, é um longo e laborioso processo que exige um esforço sustentado
para que todos os fatores que estão em ação contribuam positivamente no resultado
global.
O trato com o educando especial não é tarefa cil tendo em vista as
particulares que cada deficiência apresenta, portanto é imprescindível a interação do
educador, no que se refere às várias deficiências e síndromes existentes; para uma
prática pedagógica baseada na naturalidade e na eficiência é essencial uma
formação sólida e uma atuação consciente “o professor precisa ter capacidade de
conviver com os diferentes, superando os preconceitos em relação às minorias. Tem
de estar sempre preparado para adaptar-se às novas situações que surgirão no
interior da sala de aula”. (GOFFREDO, 1992, p. 68).
Porém, não podemos vendar os olhos para a realidade das escolas regulares,
pois é verdade que muitos professores não se sentem totalmente preparados para
trabalhar com alunos especiais, como foi possível constatar na fala da professora F,
quando indagada sobre sua experiência e se sentia capacitada para atuar junto aos
educandos com necessidades especiais.
PROFESSORA F
:
Bom, trabalhei durante 5 meses com uma criança especial, foi um
processo difícil, pois não obtinha informações claras sobre o problema que ela apresentava.
Seria preciso toda uma preparação para realizar o trabalho e obter êxito.
Outro depoimento é do professor G (Ensino Fundamental).
PROFESSOR G
:
Trabalhei dois anos com duas crianças portadoras de necessidades
especiais, uma com síndrome de down e outra com disfunções motoras. Creio que ainda
tenho muitas coisas a conhecer, as informações que hoje possuo não me proporcionam
segurança para atuar junto ao portador de deficiência, principalmente na educação, pois não
conheço metodologias ou trabalhos nessa área.
A professora H, 33 anos, (ensino fundamental) ao referir-se a sua experiência
e capacitação para atuar junto ao educando com necessidades educacionais
especiais expressa que:
PROFESSORA H
:
Não tive nenhuma participação efetiva de sala de aula como professora
de turma, mas trabalhei algumas disciplinas extra curriculares com crianças portadoras de
necessidades especiais. Apesar de ter um certo conhecimento e uma experiência que
163
considero mínima não me sinto totalmente despreparada, considero sim que preciso buscar
mais conhecimentos, pois a escola precisa de pessoas que tenham um referencial teórico
para desenvolver a prática
.
Segundo a professora I, 27 anos, (educação infantil) a sua experiência se
configura no dia a dia com um educando deficiente mental.
PROFESSORA I
:
...acompanhamento de um aluno portador da síndrome de Down, quando
este fez parte da minha turma no ano de 2005, agora troco informações e procuro passar
para a professora atual as minhas descobertas. Nos primeiros dias de contato com “M” eu
simplesmente fiquei desnorteada, pois nunca havia tido contato com nenhuma criança
portadora de tal síndrome, e nenhuma formação na área de educação especial. Depois
desse desconforto inicial, procurei ler sobre o tema e conversar com os pais de M para
obter mais informações que pudessem contribuir para conduzir minha prática educativa em
relação a essa criança
.
Para a professora C, 41 anos, psicopedagoga qualquer professor é capaz de
trabalhar com o aluno deficiente.
PROFESSORA C: Capacidade todos nós temos. Não aprimorei a habilidade de atuação
com crianças portadoras de necessidades especiais; Ainda não fiz cursos específicos da
área. Minha experiência é pouqssima. Apenas um ano comecei a manter um contato
direto com uma criança com Síndrome de Down, quando da entrada dela na escola.
Por outro lado a professora B, 35 anos, (psicopedagoga) coloca que:
PROFESSORA B: ...trabalhamos com crianças com Síndrome de Down/déficit de
atenção/problemas de coordenação motora... não gosto de trabalhar nessa área. Exige
muito de toda a equipe
.
O professor nem sempre tem conhecimento do desenvolvimento global do
aluno, noção das suas potencialidades, aonde ele vai e o que pode exigir dele,
essa realidade tende a causar insegurança. O professor G coloca o que segue:
PROFESSOR G
:
é importante observar essa criança, conversar com a mãe. Se for o caso
conversar com o médico, ou pedir para a mãe um laudo e procurar informações. A criança
vai contribuir para o desenvolvimento profissional do professor. É um desafio.
Os depoimentos dos professores e a colocação da professor G fortalecem
mais ainda nossa convicção de que as recomendações legais sobre a formação do
professor que trabalha com educandos portadores de necessidades especiais ainda
164
estão muito distantes do discurso proferido nos vários documentos que norteiam a
educação a ser oferecida a esses alunos.
4.3 FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL
São inúmeros os fatores apontados pelas professoras da escola pesquisada
que têm dificultado o trabalho com alunos com necessidades especiais, entre eles a
falta de formação e desenvolvimento profissional, de orientação, de estrutura e
condições de funcionamento da Escola.
A falta de conhecimentos teóricos consistentes é um dos fatores que leva as
professoras a encontrarem dificuldades de “criar” estratégias de ensino adequadas
aos objetivos traçados, fazendo-as procurar respostas prontas para suas dúvidas.
Outro componente que interfere na capacidade criativa das professoras relaciona-se
às influências que sofreram por parte do sistema escolar de ensino durante muitos
anos. Os programas de ensino, sobretudo os da Rede Pública Municipal,
restringiram-se durante muito tempo apenas em oferecer “receitas” para os
professores, transformando-os em meros reprodutores de atividades elaboradas por
outros, destituindo-os do seu saber, reforçando a dicotomia entre o fazer e o pensar.
Trata-se, então, de repensar as diretrizes dos órgãos centrais da administração,
para que permitam o acesso a conhecimentos teóricos e ofereçam oportunidades de
reflexão sobre a prática.
As próprias professoras têm a percepção da precariedade de sua formação:
PROFESSORA A
:
(...) às vezes eu culpo o magistério por não ter me dado informações (...)
eu acho que tenho uma visão, mas ela é pouca, é restrita (...)”. Não é novidade para
ninguém que os cursos de formação do magistério em geral, e de 1º grau, em particular, não
preparam adequadamente os professores, nem lhes permite acesso a qualquer
conhecimento teórico mais consistente. É natural, portanto, que muitos alimentem
expectativas irreais, e façam exigências que os alunos dificilmente terão condições de
cumprir.
Por outro lado, os cursos de formação de magistério geralmente oferecem
uma absorção pouco crítica e apressada de algumas teorias, rapidamente
transformadas em modismos pedagógicos, fazendo com que os professores
implantem em sua prática fórmulas rígidas, desvinculadas da realidade da sala de
165
aula, ou adotem, por vezes, uma atitude espontaneísta, como se os alunos, por si
sós, tivessem condições de progredir.
A Professora A ressalta a importância de fazer um curso universitário, mais
especificamente, o curso de Pedagogia, para obtenção de conhecimentos que a
auxiliem em sua prática:
PROFESSORA A: (...) experiência de vida eu acho que conta também. Mas a formação, a
gente não pode jogar fora, a gente precisa ter. Então eu vejo a minha colega (PROF. C). Eu
estou formada mais tempo e eu vejo ela se desenvolvendo muito mais do que eu. É
uma coisa que machuca a gente. Não é inveja da pessoa, mas uma coisa assim: eu poderia
estar recebendo a mesma informação (...) eu poderia estar trabalhando desse jeito (...) por
que não tive essa idéia? eu fico pensando. Aí, eu chego à resposta: é por causa da
faculdade (...).
O fato de fazer faculdade provavelmente permite a aquisição de
conhecimentos e de certas habilidades profissionais que podem favorecer uma visão
mais integrada da educação. No entanto, nem todos os cursos universitários podem
proporcionar um nível de conhecimentos satisfatórios, sobretudos aqueles ligados às
Ciências Humanas que se expandiram indiscriminadamente nos últimos anos e
mostram-se afetados em sua qualidade. Mesmo uma reformulação nos cursos de
Magistério ou de Pedagogia refletiria em resultados positivos na prática dos
profissionais apenas a médio ou a longo prazo. O que resta então às escolas,
enquanto espaço de relativa autonomia, é procurar criar mecanismos internos,
investindo em propostas de trabalho dentro dos âmbitos e que lhes compete atuar,
oferecendo aos professores orientações que possam beneficiar o seu
desenvolvimento profissional.
As próprias universidades podem auxiliar a escola, oferecendo ao educadores
a oportunidade de acesso a conhecimentos teóricos mais consistentes e atualizados
se for estabelecido um canal de articulação entre a Universidade e a Rede Municipal
de Ensino, de modo a aproximar docentes do ensino superior e professores do
ensino básico. Essa aproximação favorecerá também o próprio trabalho da
Universidade, proporcionando-lhe condições do aprofundamento do conhecimento
técnico, administrativo e político do sistema de ensino para, a partir daí, oferecer
proposições mais corretas e viáveis. Além do mais, em vista dos graves problemas
166
da educação brasileira, não se justifica o distanciamento entre a produção
acadêmica e a realidade concretamente enfrentada nas escolas.
Para que as teorias sejam, de fato, instrumento de trabalho e não apenas
referências estereotipadas, modelos nos quais os alunos devem ser encaixados,
deve existir um interlocutor capaz de auxiliar os professores a fazerem a passagem
entre a teoria e prática num movimento vivo e contínuo de ir e vir , na busca de
alternativas compatíveis com a realidade.
Justamente por ser fundamental contrabalançar teoria e prática, também é
preciso observar os inúmeros empecilhos que dificultam a busca do conhecimento.
A quantidade, diversidade e natureza das tarefas desempenhadas pelos docentes
na rotina diária – a preparação e correção das atividades, a preocupação com
medidas disciplinares, a extensão da jornada a que são freqüentemente submetidos
acabam impedindo-os, muitas vezes, de conseguir sozinhos o nível de
concentração necessário à reflexão e à investigação teórica mais profunda.
PROFESSOR D
:
(...) Como eu gostaria de estar tendo tempo de poder ler (...). que
minha vida é corrida (...).
PROFESSOR B
:
(...) Não é o tempo que prejudica, como a situação financeira da gente.
(...) Se eu não precisasse trabalhar eu estaria cursando uma pós-graduação, mas eu preciso
trabalhar, eu não tenho tempo, eu não tenho tempo de fazer à noite e nem acho justo
abandonar meus filhos
.
Para Patto (1997), a insatisfação das professoras com a situação em que
vivem, tanto profissionalmente quanto na condição de mulheres, torna elas
especialmente receptivas a propostas, nas quais possam falar de suas frustrações,
representações e desejos. Se, para além da aquisição de conhecimentos técnicos,
forem orientadas por uma visão complexa do mundo e por questões relativas à
escola, podem transformar-se em sujeitos de um processo no qual suas
contradições sejam explicitadas, passando a elaborar novas sínteses para a
superação da maneira cotidiana de pensar e de atuar na realidade social. Dessa
forma, criam-se condições para uma superação das relações cotidianas alienantes e
alienadas.
167
Como se vê, é imprescindível a ampliação cada vez maior dos espaços de
trabalho com grupos de educadores, para que expressem não suas capacidades
teóricas, mas também seus sentimentos, ideologias e inquietações.
Algumas vezes, as professoras têm necessidade de receber orientações,
inclusive a respeito da estrutura e funcionamento administrativo da escola.
Tal cuidado evitaria uma série de desgastes e preocupações que ocupam o
docente em prejuízo da dimensão pedagógica. As professoras também queixam-se
de falta de orientações e de trocas de experiências para que possam trabalhar com
educandos com necessidades especiais.
PROFESSOR A
:
No início (...) eu senti falta de um apoio maior por parte da coordenação
para poder passar para gente o que a gente poderia dar. Eu acho que ficou muito solto,
porque para as professoras que estão mais tempo é fácil, mas pra gente, pra mim que
nunca tive experiência com alunos especiais ficou
mais difícil.
PROFESSOR B:
Ah, eu acho que o professor deveria ter mais orientação, porque às vezes,
você se sente perdida como eu me senti e não tinha onde me apoiar (...). Precisa ter mais
troca de idéias (...). A gente se fala muito pouco, o contato com os colegas é muito pouco.
Eu acho que a gente deveria ter mais contato, mais trocas de experiências. Todo dia eu
tenho uma coisa nova pra contar (...).
Diante desses fatos, é de fundamental importância o papel do Coordenador
Pedagógico, para proporcionar aos professores espaço para a realização de um
trabalho coletivo de revisão da própria prática, através de grupos de estudos ou de
grupos de formação. Mesmo enfrentando muitos problemas por desinformação,
algumas vezes as professoras hesitam em recorrer às coordenações pedagógicas
na busca de orientação:
PROFESSOR B
:
Olha, eu deveria perguntar para a Pedagoga não é? Mas, talvez por um
problema meu, não pergunto. Eu não quero, eu não queria perguntar, parece que eu
queria saber. É uma coisa assim que a gente vive dentro da gente. Às vezes, eu quero
explicação e não pergunto sabe? Eu não sei se é por vergonha de aprender, eu não sei se é
para não incomodar (...).
Não fica claro se a professora não busca explicações, porque lhe é penoso
enfrentar o próprio desconhecimento ou porque existe um vínculo insatisfatório na
sua relação profissional com a Coordenadora Pedagógica.
168
No primeiro caso, seria de fundamental importância um trabalho junto às
professoras para desmistificar a crença de que elas devem possuir um saber
absoluto. Se compreenderem que a onipotência e a impotência são duas faces da
mesma moeda e que, sendo assim, o saber não está apenas no professor ou no
aluno, mas na relação ou no meio do caminho entre os dois, talvez as professoras
sintam-se mais à vontade para esclarecer suas dúvidas e possam compreender que
a aprendizagem do aluno não depende exclusivamente delas.
No segundo caso, fica evidente a necessidade de um espaço na escola para
que os educadores possam avaliar se a relação profissional que estabelecem entre
si estaria facilitando ou impedindo um avanço no processo pedagógico-profissional.
A necessidade de uma interação satisfatória entre os educadores que atuam
na escola evidencia-se nos depoimentos transcritos a seguir:
PROFESSORA A
:
A Coordenadora no ano passado, dava uma assistência fora de série
mesmo, pena que no ano passado eu não tive nenhuma classe fixa. Eu era substituta. Mas
eu acompanhava, eu via, ela não parava, estava sempre enfiada nas classes (...). Então, eu
acho que isso faz falta.
A Coordenadora Pedagógica, por sua vez, explica como ela entende a
atuação de uma CP (Coordenadoria Pedagógica).
COORDENADORA A: Eu encaro o trabalho da C.P. como um trabalho de apoio ao
professor. Então, eu me sentia como uma pessoa disposta para o que fosse preciso para
ajudar as professoras, subsidiando, dando assistência quando um aluno tinha problemas,
seja de ordem cognitiva, afetiva, motora ou disciplinar. Porque tem CP que se recusa a
chamar a atenção de crianças, se recusa a atender um aluno, se recusa a atender uma
mãe, porque ela acha que não é obrigação dela, ela é do administrativo. Eu acho que não,
porque o trabalho do CP, também é e deve ser por : de conversar com a criança, procurar
saber o que está acontecendo, chamar a mãe, assistir às aulas, porque eu acho que não
tem jeito de você ser uma C.P. de controle remoto, ficar na sua sala e não saber o que está
acontecendo nas salas de aula.
COORDENADORA B: (...) O trabalho das Coordenadoras Pedagógicas é junto às crianças,
aos professores, aos pais, à equipe. Você tem que fazer um trabalho conjunto (...). Acredito
que a CP é muito burocrática, que vive escrevendo projetos e não vai para a vida prática,
não ajuda. Entendo o trabalho da CP como um trabalho de ajuda, de uma pessoa que está
na escola para observar o pedagógico, para fazer intervenções pedagógicas (...).
Os depoimentos mostram ser imprescindível que as coordenadoras
estabeleçam um contato próximo com as professoras e com o trabalho realizado em
169
salas de aula, para poderem estabelecer uma relação de confiança. Só assim
poderão observar as lacunas existentes entre o que é narrado pelas professoras e o
que de fato acontece em sala de aula.
Ao mesmo tempo, o fato das coordenadoras não estarem diretamente
envolvidas na relação ensino/aprendizagem e de terem condições de manter um
certo distanciamento dessa relação poderá levá-las a identificar, com maior clareza,
algumas situações que passam despercebidas das professoras. Nesse momento, é
importante que as professoras tenham a oportunidade de falar sobre o que estão
fazendo, tornando consciente aquilo que, na maioria das vezes, é vivido
intuitivamente.
Para que tudo isso seja possível as coordenadoras necessitam de
orientações para atuar como mediadoras competentes nas discussões, nos grupos
de estudos, nas reflexões e nas trocas de experiências de trabalho, pois, talvez por
falta de conhecimento, encontram dificuldade para exercer uma liderança
competente que leve as professoras a recorrerem a elas para esclarecerem suas
dúvidas.
COORDENADORA PEDAGÓGICA B
:
A escola gostaria de receber sugestões (...) nós
estamos abertos para receber (...) a gente é humilde o bastante para saber que tem que
aprender. Está todo mundo aqui para aprender. Então, a gente não acha que é uma
vergonha dizer que não sabe (...). Seria muito bom receber outras experiências que têm
havido por aí, que a gente não toma conhecimento (...).
Mais adiante, quando se refere aos subsídios que gostaria de receber para
trabalhar com alunos com necessidades especiais, faz os seguintes comentários:
COORDENADORA PEDAGÓGICA B: Às vezes pode ser uma coisa tão simples que a
gente nem pensaria que aquilo poderia ajudar o aluno. Então, o que vocês tivessem, o que
alguém pudesse mandar a gente está aberto para receber (...). O que aparece a gente
passa, tenta mostrar. Talvez a gente esteja falhando em alguma coisa que possa estar
ainda nos nossos olhos e a gente não está vendo. Tem coisas que não conseguimos checar
no aluno, não conseguimos alcançar nossos objetivos, não sei por que (...). Quando você
faz o Normal, quando você faz Pedagogia você o aluno ”normal”, entre aspas, porque a
gente acha que é difícil falar o que é “normal”, mas não aquele aluno com problema.
Convém ressaltar que por vezes as Coordenadoras Pedagógicos solicitam
sugestões não porque adotam uma postura comodista ou descomprometida com o
170
ensino, mas porque estão cientes da complexidade das questões que envolvem os
educandos com necessidades educacionais especiais.
O fato da Coordenadora demonstrar percepção do próprio desconhecimento
e, ao mesmo tempo, estar acessível para aceitar sugestões, talvez possa facilitar a
implantação de alternativas de trabalho para atender a essas questões.
O grupo de estudos na escola é a via de acesso apontada pela Coordenadora
pedagógica B na realização de um trabalho dessa natureza:
COORDENADORA PEDAGÓGICA B
:
Nós tivemos um grupo de estudos aqui. Então, eu
acho que deveria ser por esse caminho. A princípio aproveitar esse grupo de estudo. Sabe
por quê? Nesse grupo de estudos há troca. Se você só manda uma apostila, você não vê os
dados de volta. No grupo de estudos eu mostro o resultado! É uma coisa assim bem
movimentada, que não fica fixa: só aquilo e acabou, e agora, o que eu faço?
Novamente percebe-se o desejo de um tipo de trabalho que privilegie os
pequenos grupos e ofereça a possibilidade de refletir conjuntamente, de trocar
experiências, de rever constantemente a prática.
4.4 ASPECTOS DA ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DA ESCOLA
Alguns fatores relacionados à estrutura e às condições de funcionamento da
escola também são apontados pelas professoras como empecilhos para o
desenvolvimento do trabalho.
4.4.1 Matrículas suplementares
A Professora A, por exemplo, menciona as matrículas suplementares como
uma medida que atrapalha o andamento da classe:
PROFESSORA A: Até semana passada eu estava recebendo alunos. São crianças vindo,
vindo, vindo. Não tem fim, entende? A gente tem que fazer das “tripas coração” (...).
O desabafo procede, pois se é verdade que não se pode negar a garantia de
acesso à escola, também é verdade que as matrículas suplementares tendem a
agravar as penosas condições de trabalho enfrentadas em sala de aula, uma vez
171
que o professor também deve lidar com o processo de adaptação pelo qual esses
alunos necessariamente passam até criarem vínculos com o novo ambiente escolar.
Além disso, se essas crianças apresentam dificuldades para aprender, o andamento
do trabalho em sala de aula torna-se ainda mais difícil, com prejuízo não do
grupo, mas também do aluno que chega.
O fato das matrículas suplementares serem uma realidade já previsível é mais
um motivo para que a escola incentive um trabalho menos linear e estereotipado, e
que abra mão da pretensão de igualar todos os alunos, segundo a falsa noção de
que os pontos de partida da aprendizagem escolar devem ser iguais.
4.4.2 Número excessivo de alunos x impossibilidade de atendimento
individualizado
A impossibilidade de um atendimento mais individualizado aos alunos devido
à superlotação das classes é freqüentemente apontada pelas professoras como um
obstáculo à realização de um trabalho qualitativo.
PROFESSORA B:
Então quando eu vejo as dificuldades eu tento, sabe? Mas é difícil
porque você tem 42 alunos (...). Enquanto você está com um, o outro está virando tudo.
Já fez o dele, já cansou daquilo, já quer fazer outra coisa. Então esse trabalho é muito difícil
(...).
PROFESSORA C: (...) Numa classe de trinta e poucos alunos não para você fazer,
porque você perde muito tempo. Enquanto você está aqui nessa fileira abaixada, o outro
está conversando outra coisa que não tem nada a ver, e o outro, já está comendo
biscoitinho na mochila. Essa é a realidade, é o nosso dia-a-dia mesmo. É o fator de ter
muita criança na sala. E eles me requisitarem o tempo inteiro. De você tentar fazer um
trabalho individual com cada um (...), passar de carteira em carteira e você não conseguir
dar continuidade. Às vezes eu fico nervosa porque um me chama de cá, outro me chama de
lá (...).
As observações realizadas nas salas de aula mostraram que as tentativas de
atender os alunos com mais dificuldades resultam em tumulto e ansiedade nos
alunos e na professora, mesmo para as mais experientes e competentes em manter
sua figura de autoridade, como é o caso da Professora C.
A situação se agrava na série, em primeiro lugar, porque os alunos nessa
faixa etária solicitam constantemente a presença da professora; em segundo lugar,
172
porque, acostumados às propostas mais descontraídas e diversificadas da pré-
escola, os alunos tendem a se dispersar facilmente, quando submetidos a um
sistema mais formal de ensino.
COORDENADORA PEDAGÓGICA A
:
É muito difícil porque muito trabalho.
Principalmente nas séries, você tem que ficar muito no atendimento individual. Isso nem
sempre é possível. não é possível com o aluno que rende bem, imagina com aquele que
tem mais problemas. Por mais que o professor se esforce, se interesse, esse aluno
precisaria de mais atenção, que não é possível dar, por condições físicas mesmo, numa
sala grande (...).
Faltam condições de oferecer à criança, inclusive, certos subsídios básicos
para seu trabalho, como, por exemplo, esclarecimentos a respeito da atividade que
está sendo solicitada.
PROFESSORA B:
Às vezes, você está propondo uma atividade e a criança não está te
compreendendo e você não pode estar ali do lado dela, você não pode dar um atendimento
pra ela, pra aquela dificuldade dela naquele momento que às vezes era o que ela
precisava: que o professor percebesse aquela dificuldade ali naquela hora que está dando
aquilo e fosse lá e ajudasse.
Isso faz com que as dúvidas dos alunos passem despercebidas, impedindo as
professoras de selecionar procedimentos adequados à realização das tarefas e,
conseqüentemente, a resolução de dificuldades iniciais, impossibilitando um avanço
na aprendizagem.
Cientes disso, mas cerceadas pelas condições de trabalho, as professoras
pouco podem fazer, além de detectar os problemas mais gritantes.
PROFESSORA D
:
Então, às vezes, é uma coisa super fácil de você chegar perto da criança
e fazer com ela. Esclarecer pra ela: Olha, é assim e tal. Faz sozinha agora. Então você
que quando você vai, chega e faz com ela, ela até consegue. Mas se ela ficar perdida lá (...)
porque às vezes a criança não diz “Eu não estou entendendo nada!” Ela finge que está
fazendo, mesmo que não esteja entendendo. Mas o professor com 38 ou mais crianças é
difícil (...). Você consegue localizar alguns que estão com maior dificuldade, ir e ajudar,
outros não. Outros passam sabe? Porque você acha que está fazendo (...).
COORDENADORA PEDAGÓGICA A: Você não tem como detectar. Você não pode ir fundo
porque seu trabalho ali é limitado. Então, você teria que dar um aprofundamento no caso. E
às vezes, muita criança passa batido. Porque a gente não tem tempo, condições, uma
pessoa certa que faça esse acompanhamento e que cheguem à causa pra poder ajudar o
aluno (...).
O fato das professoras conseguirem localizar somente os alunos com
problemas mais evidentes coloca em risco os demais que também necessitam de
ajuda. Além disso, nem sempre os sintomas mais evidentes o mais graves. Por
173
exemplo, uma criança dispersa tem mais chances de ser percebida do que uma
criança que não aprende porque tem medo de aprender, pois a última, na maioria
das vezes, não pertuba e é muito mais fácil de ser controlada.
4.4.3 Número excessivo de alunos x generalização dos conhecimentos
A superlotação das classes também leva as professoras a adotarem
mecanismos que diminuem ainda mais o contato com os alunos: generalização dos
conhecimentos, condução apressada e superficial das atividades, correção coletiva
e impessoal das tarefas.
PROFESSORA D
:
A maior dificuldade em atingir essas crianças é aquilo que eu estava
falando pra você, de ter que tratar tudo muito no geral, sabe e não conhecer as
particularidades de cada educando. Porque, por exemplo, eu trabalhava numa pré-escola
que a gente tinha, o quê, 10 crianças dentro de uma sala. Eram turmas pequenas porque as
salas eram pequenas, então, a gente não tinha muita criança. Nossa! Mas, assim (...) você
conhecia aquele aluno, sabe? Tudo dele você conhecia (...). Então, a maior dificuldade é
essa. Acho que é você não poder lidar com todas as crianças. Às vezes você não consegue
tratar eles com individualidade, sabe? Às vezes você acaba generalizando tudo porque você
não pode fazer um trabalho mais individualizado. Com 38 crianças, não dá, é muito difícil
(...).
PROFESSORA B
:
Eles lêem em conjunto (...). Você até percebe que uns vão pela onda
dos outros (...) aí eu olho para a boca de alguns e estão falando outras sílabas,
pronunciando outras sílabas bem baixinho (...).
A leitura coletiva é um exemplo de atividade mecanizada. Mas outros. Na
avaliação das tarefas, as professoras utilizam freqüentemente o sistema de auto-
correção, de modo que não é possível saber como cada aluno trabalha e por que
desenvolve determinadas hipóteses em sua aprendizagem.
4.4.4 Número excessivo de alunos x sentimentos de frustração e desânimo
Ao perceberem que não estão conseguindo obter resultados positivos com os
educandos com necessidades especiais, ou seja, que apresentam problemas de
aprendizagem as professoras assim se manifestaram:
PROFESSORA A
:
É não poder dar um atendimento individual. Porque a gente quer, mas
não dá, você não pode deixar os outros! E os outros também te dão um retorno maior, não
é? Estão também está você, sua emoção de estar produzindo, de estar colhendo frutos.
Os adiantados te dão uma recompensa e eles sempre fracassam. Às vezes, eles
174
conseguem uma palavra, amanhã não lembram mais. Então você volta a ensinar. No dia
seguinte eles lembram. Daí dois dias esquecem. Isso é um desânimo! (...).
Quando esta situação se repete por muitas vezes, é natural que o professor
adquira um sentimento de inoperância, que certamente o levará a deixar de investir
energia nesse tipo de trabalho. Assim como ocorre com o aprender, no ensinar o
prazer e a motivação caminham lado a lado, alimentados por experiências de
resultados positivos. Na ausência destes, instala-se um círculo vicioso. A professora
não consegue atender individualmente aos alunos com necessidades especiais e,
diante disso, desanima, mobiliza-se cada vez menos para fazê-lo e as
dificuldades aumentarem.
Essa situação torna-se ainda mais grave quando lembramos que se fala tanto
no processo de construção do conhecimento, no importante papel da interação na
aprendizagem e, fundamentalmente, na presença do professor como mediador
competente entre o aluno e o conhecimento.
4.4.5 Algumas alternativas apontadas pelas professoras para o excesso de
alunos
Professoras e Coordenadoras Pedagógicas apontam a diminuição do número
de alunos por classe e a contratação de professores auxiliares como algumas
alternativas de trabalho que facilitariam o atendimento individualizado junto aos
alunos com necessidades educacionais especiais.
PROFESSORA A.:
(...) ou se diminui o número de alunos para poder dar um atendimento
maior, mais individual, ou se põe uma ajudante
na classe (...).
PROFESSORA C:
Eu acho que alguém deveria se unir com a escola, porque nós não
temos nenhum auxiliar na sala de aula (...). Eu acho que se tivesse outra pessoa que
ajudasse a arrumar outras atividades pra elas fora do horário da aula, eu acho que ajudaria
muito! Paralelamente às propostas que visam um investimento na competência da
professora, é urgente que algumas questões sejam repensadas. Se os educandos
necessitam de atendimento mais individualizado, essa forma de trabalho deve ser
encontrada
.
Não se trata de abraçar uma postura conservadora e elitista, desvinculada do
contexto social em que vivemos, simplesmente diminuindo o número de alunos por
classe, em detrimento dos benefícios da educação a todos indistintamente. Trata-se
de assumir que a concepção de educação como objeto de democratização terá
175
sentido quando os alunos das escolas públicas brasileiras tiverem acesso a um
atendimento com a mesma qualidade do oferecido às crianças das classes
privilegiadas. As escolas freqüentadas por essas crianças, com certeza, têm
procurado inúmeras alternativas de trabalho que possibilitam um atendimento
individualizado. Ao receber atenção diferenciada, os alunos sentem-se mais
confiantes e, logo no início do trabalho, apresentam indícios de um certo avanço na
aprendizagem.
PROFESSORA B:
o fato deles saberem que estão tendo um espaço, um tempo, que a
escola está se dedicando mais a eles que eles tem uma chance maior (...) eles sobem
alguns degraus (...).
Apesar desse avanço inicial demonstrar o ganho que este trabalho com
uma pedagogia diferenciada significa para os alunos com problemas para aprender,
apenas reuni-los em pequenos grupos não basta, sendo necessário estar atento a
todas as manifestações da criança que possam ajudar a compreender suas
dificuldades.
PROFESSORA A
:
Eu acho que antes de tudo essas crianças precisam ser ouvidas.
Precisam ser tratadas como uma criança que está ali e tem coisas pra dar e que tem muito
pra contar (...). Principalmente essas que têm problemas (...). Aquelas que têm maiores
dificuldades são exatamente aquelas que ficam no cantinho, não se arriscam pra nada. Eu
acho que é assim (...). É assim que eu me sinto às vezes: - eu não conheço bem ele. Eu
conheço algumas coisas dele. Então é essa coisa de conhecer mesmo esse aluno, saber
mais dele e sobre ele; conversar mais com ele, não pra conversar com um ou outro,
manter um diálogo com eles. Às vezes é muito difícil. Então é essa coisa de atingir mesmo
as crianças, né? Cada um como pessoa, diferente da outra (...).
PROFESSORA C
:
Eles precisam de um acompanhamento individual, isto porque você
precisa descobrir onde elas estão precisando de ajuda. O quê? Onde? Qual é o ponto? e
tem que ser individual, não há outra forma (...).
Para atingir “aquele pontinho” ao qual a Professora C se refere, para
descobrir onde as crianças estão precisando de ajuda, para conhecê-las, é
necessário haver um tipo de escuta capaz de compreender a história das relações
da criança com o objeto do conhecimento: suas estratégias de pensamento, sua
representação do estudo, bem como a representação da família. Sobretudo, é
necessário entender que os problemas para aprender o são produtos apenas de
dificuldades cognitivas, mas também de aspectos afetivos. Assim, a utilização de
materiais diversificados permite criar situações em que os aspectos cognitivos, os
conflitos e o próprio vínculo com o objeto do conhecimento sejam trabalhados.
176
Essa maneira de atuar pode ainda ajudar os alunos a se sentirem mais
valorizados, fazendo-os colocar energia em tarefas intelectuais, despertando o
sentimento de competência e de segurança para resolver problemas e levando-os a
descobrir o prazer de aprender.
Ao mesmo tempo, não se pode relegar somente às professoras a tarefa de
escolher as estratégias de ensino mais adequadas para suas práticas de trabalho.
Pela precariedade de sua formação e pelas próprias condições de vida a que se são
submetidas, as docentes, na maioria das vezes, o dispõem de espaço e tempo
para ter acesso a conhecimentos teóricos que lhes possibilitem propor as
alternativas de trabalho mais adequadas.
Esta questão traz à tona a importância do coordenador pedagógico como
sistematizador das diversas áreas do conhecimento, seja como articulador desses
conhecimentos frente aos problemas concretos vividos pelas professoras no seu
cotidiano, seja como mediador, junto a elas, dos pressupostos teóricos e das
diretrizes práticas. É imprescindível que as professoras sejam orientadas, para que
possam localizar e trabalhar com estratégias de ensino diversificadas, apresentando
situações pautadas na própria vivência da criança, utilizando materiais que lhe
ofereçam a oportunidade de identificar, por exemplo, a escrita e de relacioná-la com
o cotidiano,oportunizando, assim, o entendimento do seu valor social.
Para tanto, é fundamental que as Coordenadoras Pedagógicas sejam
extremamente cuidadosas ao abalar a crença das professoras nos seus
conhecimentos. O “novo” pode significar uma ameaça à identidade, ao “eu”,
tornando as professoras resistentes aos novos conhecimentos. Com essa
compreensão, as coordenadoras também compreenderão as possíveis resistências
dos professores não como uma afronta pessoal, mas como desejo de proteger o
próprio “ego” (o conhecimento que “eu” domino, o jeito como consigo “me”
encontrar).
As novas idéias, portanto, devem ser introduzidas devagar e, durante esse
processo, os professores devem poder trabalhar por substituição ou justaposição de
conhecimentos.
177
4.5. FAMÍLIA, ESCOLA E SERVIÇOS PÚBLICOS MUNICIPAIS DE ATENDIMENTO
Outro aspecto que aflorou nas entrevistas diz respeito à relação das famílias
com a escola e das famílias e da escola com serviços públicos municipais.
4.5.1 Falta de contato: pais - escola
A falta de contato com os pais dos alunos que apresentam dificuldades para
aprender foi apontada pelas professoras como empecilho para que suas dificuldades
sejam solucionadas.
PROFESSORA A
:
(...) eu quis conversar com a mãe porque fiquei preocupada, eu chamo a
mãe e essa mãe não vem. Eu já tinha chamado ela (...).
Quando a criança apresenta uma necessidade educacional especial, a forma
como a família reage pode agravar ou ajudar na potencialização do seu processo
ensino-aprendizagem. Além disso, o contato com as famílias pode trazer
informações sobre os fatores que interferem na aprendizagem e apontar os
caminhos mais adequados para ajudar a criança. Também torna possível orientar os
pais para que compreendam a enorme influência das relações familiares no
desenvolvimento dos filhos.
A falta de contato com as famílias torna-se ainda mais grave quando
necessidade de encaminhar os alunos para profissionais especializados fora da
escola, pois as crianças dependem dos pais, muitas vezes ausentes, ou resistentes
ao atendimento extra-escolar.
PROFESSORA C
:
As mães não tomaram providências ainda, nenhuma! (...) A mãe do J.,
eu chamei e ela não veio ainda, nunca vi a cara dela. A mãe do M.P. nunca apareceu (...). A
mãe do F. é essa que veio e falou pra mim que ele não tem problema nenhum.
COORDENADORA PEDAGICA A
:
Eles o vêem problemas, sabe? Não acham que é
muito sério, mesmo falando que a criança apresenta limitações, que está com rendimento
baixo.
Por vezes, os pais não comparecem à escola e resistem à idéia de que seus
filhos apresentem problemas para aprender, simplesmente porqueo acreditam na
escola. Como pudemos observar anteriormente, nem sempre os professores sabem
178
explicar com clareza o que está acontecendo com o aluno. Desse modo, é natural
que os pais duvidem da opinião da escola. A existência de um trabalho que ofereça
conhecimentos para que os educadores possam compreender o processo de
aprendizagem dos alunos e diagnosticar com precisão problemas dele decorrentes
permitirá que estabeleçam um diálogo firme e seguro com os pais, contribuindo para
que esses confiem na orientação da escola.
4.5.2 Indiferença dos pais x serviço público municipal de atendimento
As coordenadoras pedagógicas apontam outros empecilhos para
encaminhamentos.
COORDENADORA PEDAGÓGICA B
:
A gente se comunica com os pais para ver se tem
convênio, se dá para levar a criança, se a gente pode encaminhar para fazer um tratamento.
Quando não há vaga perto de casa, eles não levam, nem se importam (...).
COORDENADORA PEDAGÓGICA A
:
Se o tratamento for muito longo eles desistem no
meio. Se for muito longe o lugar onde eles têm que ir, também desistem porque não têm
dinheiro para o transporte (...).
COORDENADORA PEDAGÓGICA A
:
Um dos casos mais problemáticos é o de uma
menina que é a quarta vez que está na série. nós encaminhamos para o posto da
Prefeitura. A mãe foi até lá, daí marcaram para outro dia. Ela voltou para a entrevista, mas
agora, como não tem mais vaga, mandaram para o Complexo Municipal de Educação
Especial. Ela veio pra mim outro dia e falou: - Olha, eu vou levar porque a N. precisa, eu sei
que ela precisa, mas será que não tem um lugar mais próximo? (...). Então veja que tortura
deve ser pra essa mãe saber que a filha precisa, que até existe tratamento, mas que é uma
epopéia! Essa menina já está há 5 anos pra lá e pra cá (...).
A avaliação dessa aluna demonstrou que ela está bastante defasada em
relação à classe e apresenta algumas dificuldades de aprendizagem (troca de letras
na fala, escrita ilevel) que vêm se manifestando muito tempo. Além disso, a
idade cronológica (13 anos) é bastante avançada para freqüentar uma sala de
série.
Alunos com esse histórico escolar vivenciam freqüentemente a sensação de
fracasso. Sentem-se diferentes dos outros, com reduzidas chances de poder atuar
de acordo com o potencial que possuem. Portanto, na maioria das vezes, suas
dificuldades não estão relacionadas apenas ao conteúdo escolar, mas ao
comprometimento do vínculo com o objeto do conhecimento.
179
A falta de condições reais para cumprir o compromisso de tratar esses alunos
como indivíduos particulares, com direito à diferença, acaba mantendo o fracasso
que os leva à perda total de interesse pela aprendizagem.
Enquanto a escola não tiver condições de lidar com a problemática desses
alunos e de propor um trabalho psicopedagógico com a garantia de que evoluam no
processo ensino-aprendizagem, depoimentos como o da coordenadora pedagógica
C ainda serão o retrato da nossa realidade.
COORDENADORA PEDAGÓGICA C:
Eles estão esperando que alguma coisa aconteça.
Eles estão na sorte, jogados, à deriva, esperando! Porque eles não saem sozinhos. Eles
precisam de ajuda! (...). É uma criança com 5 anos de reprovação. Mas eu acredito
piamente que se houvesse um tratamento firme ela teria condições de ter ido pra frente.
Embora os depoimentos não indiquem isso, pesquisas têm demonstrado que
o desejo que os filhos estudem e tenham sucesso na aprendizagem escolar está
sempre presente nos depoimentos dos pais de alunos. (PATTO, 1990)
Por isso, se analisada com cuidado, percebemos que a aparente indiferença
das famílias pode ser na verdade, uma reação às dificuldades sócio-econômicas e
às precárias condições de atendimento dos serviços públicos.
COORDENADORA PEDAGÓGICA A:
Eu sei que para agendar a primeira consulta demora
mais ou menos um mês (...). Alguns postos até atendem, mas depende de haver vaga no
momento (...). Também tem isso: mesmo que consiga a vaga, depois acaba não tendo
constância. Por conta de concursos de admissão e greves, o tratamento não fica freqüente
(...). Em resumo, a criança vai ficar um longo tempo sem tratamento (...).
De fato, as famílias que aceitam e procuram atendimento o, na maioria das
vezes, submetidas a uma longa espera até conseguir uma entrevista.
Quando finalmente conseguem a vaga, têm de enfrentar outros entraves que
provocam irregularidades nos atendimentos. Dentro desse quadro, a interrupção e
abandono do tratamento é provocado muito mais pela precariedade do atendimento
que pelo desinteresse dos pais.
180
4.5.3 Escola x serviços públicos de atendimento
Outro fator que impede o sucesso do atendimento é a falta de contato entre
os profissionais que atendem os alunos e os profissionais que atuam na escola:
COORDENADORA PEDAGICA D
:
Nós o temos outros dados de tratamento dos
alunos, nós não recebemos. São os pais que tratam diretamente, ou o aluno é que nos vem
informar (...).
COORDENADORA PEDAGÓGICA E
:
As psicólogas têm muito pouco contato com a
escola. Eu exigia muito delas: telefonava, pedia relatório. O que elas mais queriam era saber
da escola (...) mas elas não dão retorno. Às vezes a gente insistia porque acho que a falha
também está (...). Porque uma vez que você encaminha, elas têm um trabalho para ser
feito e nós um trabalho para ser feito aqui (...). Então eu vou falar! Algumas vinham
conversar comigo e passavam muito pouco. Não davam retorno à professora. queriam
saber, saber, saber! Eu acho que isso é uma outra falha nos atendimentos (...).
A troca de informações entre os profissionais que atuam junto aos alunos é
imprescindível. Para os que trabalham nos postos de saúde, porque os dados
fornecidos pela escola podem complementar e precisar melhor o diagnóstico. Para
os que atuam na escola, porque podem rever seu trabalho, contribuindo para o
sucesso dos alunos na aprendizagem.
A comunicação entre os dois campos de atuação também ajuda o profissional
dos postos de saúde a delimitar seu papel com mais clareza, diminuindo o risco de
patologizar os problemas de aprendizagem ou de propor intervenções inúteis e
prejudiciais. os professores, ao perceberem melhor a natureza do trabalho
desenvolvido fora da escola, podem reavaliar as falhas no ensino que oferecem aos
alunos.
Um outro empecilho relacionado à estrutura e funcionamento dos serviços
prestados, principalmente nos postos de saúde, refere-se à primeira triagem dos
alunos encaminhados para diagnóstico.
COORDENADORA PEDAGÓGICA A
:
Agora nos postos de saúde, antes de encaminhar
para o psicólogo, parece-me que a política é encaminhar para o médico pediatra para ele
“ver”. Quem faz a primeira triagem é o médico pediatra (...). Várias vezes os alunos foram
encaminhados para os médicos e eles disseram que não tem nada a fazer (...). Com
freqüência os médicos dos postos de saúde dizem que fisicamente os alunos que vêm
apresentando problemas de aprendizagem não têm nada e não encaminham para outros
profissionais (...).
181
Com respeito à repercussão desse tipo de atendimento junto às famílias dos
alunos, são estes os comentários da mesma coordenadora pedagógica.
COORDENADORA PEDAGÓGICA A
:
Alguns dizem que já foram ao posto e que o médico
disse que não tem nada. Então, às vezes, fica difícil porque nós como educadores não
temos condição de contradizer um diagnóstico médico. Se o médico disse para a mãe que a
criança não tem nada, como você vai fazer ela mudar de opinião?(...).
A formação dos médicos pediatras nem sempre os capacita a entender o
processo ensino-aprendizagem e o contexto onde o aluno está inserido. Isso os
leva, muitas vezes, a afirmar que a criança não tem nada, desestimulando os pais a
tomarem qualquer providência para socorrer os filhos em dificuldades. Outras vezes
a formação organicista e a falta de conhecimento da multiplicidade de fatores que
interferem na aprendizagem resultam na adoção de uma linha medicamentosa de
tratamento como a única saída para resolver os problemas de aprendizagem dos
alunos.
Assim, mais uma vez, as crianças perdem a oportunidade de ter solucionados
os seus problemas, correndo ainda o risco de tê-los agravados.
PROFESSORA D:
O psicólogo eu acho muito longe, distante. Tentei trabalhar com
psicóloga duas vezes. Uma vez ela encaminhou um aluno meu para fazer terapia de grupo
(...). Houve uma melhora pequena, mas no ginásio era uma coisa bárbara aquele menino,
tanto que ele saiu da escola. Depois uma outra aluna foi encaminhada para psicóloga. Ela
examinou a vida da aluna, entrevistou familiares, mas não deu certo. Me contou os dramas
da menina, eu fiquei arrasada mas não ajudou, sabe?
COORDENADORA PEDAGÓGICA B:
O que a gente por é uma coisa tão assim por
cima (...) (...). Não é só a psicologia, sabe? A experiência que a gente tem, daquele dia-a-dia
que você tem nas salas de aula, tem que se unir à psicologia. É isso. Eu fiz pedagogia, não
faria psicologia, faria psicopedagogia, que eu acho que vai alcançar mais a prática.
Na avaliação dos docentes, os atendimentos psicológicos realizados na rede
municipal de educação e saúde parecem o resolver os problemas de
aprendizagem dos alunos. As professoras apontam a necessidade de
conhecimentos que levem os profissionais da área da saúde a uma atuação que
inclua fenômenos psicológicos, psicomotores e pedagógicos envolvidos na
aprendizagem, considerados a partir da realidade escolar.
182
Embora o material reunido na análise dos dados comporte várias
possibilidades de síntese, serão destacados alguns aspectos gerais, relacionados a
algumas alternativas de ação que poderão ser aprofundadas ou sistematizadas em
estudos posteriores.
No enunciado das professoras e das coordenadoras pedagógicas,
evidenciou-se a necessidade de capacitar esses profissionais para que
compreendem com mais clareza o processo de aprendizagem dos alunos e possam
caracterizar o que de fato se configura com uma necessidade educacional especial.
A falta dessa precisão cnica e teórica tem feito com que os problemas de
aprendizagem sejam confundidos com dificuldades normais do processo de
desenvolvimento da criança; com padrões culturais e lingüísticos diferentes dos
valores pela escola; com questões isoladas que, por si só, pouco significam. As reais
dificuldades deixam de ser apontadas por o serem detectadas, ou por estarem
escamoteadas em atividades que impedem o raciocínio profundo e,
conseqüentemente, a manifestação dos problemas existentes.
É dramático constatar que o número de alunos com reais problemas de
aprendizagem é bem maior do que se poderia esperar. Justamente por não terem
tido suas dificuldades iniciais prontamente atendidas, desenvolveram vínculos
negativos com o objeto do conhecimento e passaram, efetivamente, a ter problemas
para aprender.
As falhas na estrutura e funcionamento da escola também desfavorecem o
trabalho dos professores e os impedem de detectar prontamente as dificuldades dos
alunos e ajudá-los a superá-las.
Com respeito os caminhos encontrados pelos profissionais da escola para
tentar resolver os problemas dos alunos, observou-se que, na maioria das vezes,
prendem-se à mudança de desempenho, ainda acabam inibindo ou prejudicando a
aprendizagem.
Quando os alunos são encaminhados para o serviço municipal de saúde para
atendimento, a situação não é menos dramática. A precariedade desses serviços e a
inadequação de muitos de seus profissionais fazem com que os problemas de
183
aprendizagem ou passem despercebidos, ou sejam tratados por uma linha
medicamentosa de tratamento, como se as causa orgânicas fossem as únicas
existentes. Um agravante, em razão de um dado cultural fortemente arraigado entre
nós, é o fato do médico deter sempre a última palavra. A falta de uma política de
inclusão por parte dos serviços de administração pública desfavorece a aproximação
entre os profissionais da escola e da saúde, revertendo-se tal situação em prejuízo
para os alunos com problemas de aprendizagem. As professoras e coordenadoras
colocam, em evidência, problemas referentes à estrutura e funcionamento da escola,
aos serviços públicos municipais de atendimento e a sua própria formação
profissional. Neste último caso, mostram-se inseguras de suas crenças, inquietas
com o próprio desempenho, culpadas pelo mau desenvolvimento dos alunos, mas
não desistem de acertar e de tirar os alunos do sofrimento em que se encontram por
não conseguirem aprender.
É importante que esse movimento seja captado e inserido numa proposta de
trabalho direcionada para o investimento na competência profissional dos
educadores, capacitando-os não para perceber as dificuldades decorrentes do
processo educativo, mas para interferir nelas, a partir da escolha consciente de uma
teoria de ensino-aprendizagem, a fim de que possam, também conscientemente,
selecionar as estratégias de ensino que julgarem mais adequadas.
Isso, no entanto, não basta. Também é preciso que sejam tomadas
providências quanto à estrutura e condições de funcionamento da escola. Além da
abertura permanente de espaços para encontros entre grupos de educadores, existe
a necessidade da presença de um interlocutor competente, com conhecimentos
psicopedagógicos, capaz de requalificar e revalorizar os educadores e de analisar
sem preconceitos a precariedade de formação, e a alienação da qual se tornam
vítimas quando as escolas públicas fazem com que se sintam percorrendo um
caminho que não os leva a lugar algum.
Assim, os professores necessitam de ter um espaço de confiança, onde seja
possível realizar um trabalho que também leve em conta as angústias e defesas que
acompanham qualquer processo de mudança.
184
Como diz Patto (1991), não se trata apenas de “polir arestas”, ou tentar
melhorar o trabalho dos professores, privilegiando técnicas de “relações humanas
conciliadoras”. Tampouco de assumir uma atitude tolerante, passiva, sem
convicções e, por isso mesmo, ineficaz. Ao contrário, ao abrir um espaço para que
os conflitos e insatisfações latentes venham à tona, permite-se que esses
sentimentos sejam nomeados e compreendidos em sua dimensão histórica.
Redimensionam-se, dessa forma, as relações de forças existentes, para que os
objetivos e aspirações sociais sejam transformados em educadores.
Existe ainda uma reestruturação das condições de trabalho em sala de aula.
Nas classes de série, dada a complexidade do processo de alfabetização,
algumas crianças poderão evoluir mais lentamente e exigir mais o apoio do
professor. À medida que a escola se padroniza, massifica o ensino e deixa de
oferecer condições de funcionamento para que o aluno seja percebido em sua
individualidade e desenvolva suas potencialidades cognitivas.
Assim, o trabalho em pequenos grupos de alunos permitiria que sejam
compreendidos em seus percalços e avaliados dentro de suas próprias evoluções,
evitando que dificuldades iniciais passassem despercebidas e fossem criados
vínculos negativos com o objeto do conhecimento, causando problemas de
aprendizagem que a escola, por si só, não tem condições de resolver.
Não é possível ignorar que os problemas de aprendizagem existem e atacam,
ainda que em porcentagem menor do que se tem apresentado, crianças de todos os
segmentos da população, o que justifica todo o esforço na busca de alternativas
de ação para tentar solucioná-las.
Na escola municipal de Manaus, esses problemas tendem a assumir maiores
proporções porque decorrem, em grande parte, da falta de condições de
atendimento das dificuldades iniciais, que acabam se acentuando e evoluindo para a
instalação de problemas mais sérios.
A análise dos dados da pesquisa mostra que alguns alunos, sobretudo os
multi-repetentes, não estão conseguindo aprender, embora o apresentem
“anormalidades” ou “lesões”. Esses alunos revelam uma defasagem em relação à
própria idade e ao grupo classe e, na maioria das vezes, desenvolveram vínculos
185
negativos com o objeto do conhecimento, apresentado um processo de
aprendizagem escolar lento ou paralisado. Ao se perceberem impotentes diante
desse quadro, muitas professoras tornam-se indiferentes e passam a encarar os
alunos quase como um “resíduo natural, mantido ano a ano, integrado ao
cotidiano da escola. As que procuram agir acabam utilizando alternativas
inadequadas e insatisfatórias. Com isso, a dificuldade desses alunos tende a se
agravar fazendo com que acabem desistindo de aprender, o que aumenta os já altos
índices de fracasso escolar.
Esse desperdício de potencialidades representa também um desperdício
financeiro, pois os alunos da escola pública representam um alto custo para o poder
público, onerando-o ainda mais quando repetem o ano escolar.
Por outro lado, esses alunos contribuem ainda para reforçar os efeitos de uma
dramática pirâmide educacional que se estreita cada vez mais ao chegar às últimas
séries.
Estudos realizados por Madeira (1992) demonstram que o formato de nossa
pirâmide educacional decorre não da evasão, como se pensava, mas do
elevadíssimo número de repetência nas séries iniciais. O fato da garantia de acesso
ao ensino fundamental para a grande maioria da população ser, hoje, uma realidade,
permite afirmar que o problema enfrentado pelo sistema educacional é, sobretudo,
de qualidade e não de quantidade.
Madeira vê, como medida alternativa para reverter esse quadro, o
levantamento da vida escolar desses alunos, a fim de que se avalie, em
profundidade, suas dificuldades, e se encontre uma intervenção adequada para
resolvê-las.
Acredito que virar as costas para essa questão seria atuar duplamente em
sentido contrário à tão propalada democratização do acesso à aprendizagem
escolar, porque, deixando de oferecer às crianças das classes populares a
oportunidade de um atendimento que atenda as suas peculiaridades, singularidades,
mais uma vez as colocamos em desigualdade de direitos se comparadas às
crianças das classes privilegiadas. A conseqüência é que as primeiras ficam
186
marginalizadas dentro da própria instituição escolar, sofrendo os mesmos efeitos da
segregação de outras minorias sociais.
A Educação Especial, em sua perspectiva atual, reconhece os efeitos nocivos
da rotulação ou da patologização dos problemas de aprendizagem, fato já por
demais discutido nos meios educacionais. Entretanto, justamente por enxergar o
fenômeno educativo em sua totalidade, percebe que o temor da rotulação também
induz, com freqüência, a um poder arbitrário e a uma proposta de trabalho ineficaz,
que reforça ou agrava as limitações dos alunos, distanciando-os, cada vez mais, da
chance de permanecerem no ensino regular.
A Educação Especial numa perspectiva da Educação Inclusiva também sabe
que os problemas educacionais e de aprendizagem muitas vezes são decorrentes
da organização e forma de desenvolvimento social. O próprio movimento da história
mostra isso e, mesmo que não tivéssemos sensibilidade para percebê-lo,
quantidade de estudos e pesquisas críticas que surgiram nos últimos anos serviriam
para nos alertar sobre o caos em que se encontra a educação em grande parte
devido a posturas ingênuas e acríticas.
Entretanto, a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva
também não desconhece que, apesar da Educação sofrer a determinação da
sociedade, exerce sobre ela alguns influxos, podendo auxiliá-la em seu processo de
transformação. E é esse movimento que ela deseja realizar.
Assim, é necessário uma atuação em âmbito mais amplo, no nível político
mais geral, oferecendo melhores condições de existência para a sociedade, e no
seu cotidiano, no dia-a-dia, seja modificando a estrutura das instituições educativas,
seja criando espaços de trabalho que comportem, por exemplo, as contribuições
como a da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, de modo que
tenhamos a chance de presenciar uma verdadeira transformação.
187
4.6 INCLUSÃO ESCOLAR: CURRÍCULO E ADAPTAÇÕES CURRICULARES
As novas tecnologias da informação e comunicação e a crescente diversidade
humana nas sociedades mais urbanizadas têm sido fatores geradores de mudanças
em todos os domínios sociais.
Cardoso (2004) refere que a diversidade humana nas escolas é ainda
percepcionada de modo problemático, etnocêntrico e assimilacionista. Problemático
porque os alunos diferentes sobretudo os pertencentes a minorias étnicas - são
freqüentemente associados a comportamentos desviantes, escapando as formas
consolidadas de controle; a sua presença em sala de aula e o seu direito ao sucesso
educativo, coloca em questão as estratégias de ensino consolidadas em contextos
escolares monoculturais. Etnocêntrico porque predomina a dificuldade em
percepcionar o aluno culturalmente diferente de acordo com referências da sua
cultura. Conseqüentemente, assimilacionista porque a gestão do currículo é
orientada para a exclusiva assimilação de conhecimentos, atitudes e valores da
cultura dominante, ignorando os principais traços identitários dos alunos, cultural e
etnicamente diferentes.
As mudanças para práticas docentes de resistência a estas atitudes são
ideológicas e, por isso, lentas. Implicam processos institucionais e pessoais
estruturados que coloquem em questão práticas anteriores orientadas para
contextos monoculturais. Tais processos implicam em: a) conscientização acerca
das relações de si próprio com outros diferentes; b) o desenvolvimento de atitudes
de análise e reflexão acerca das mudanças sociais e do seu papel na promoção de
mais e melhores oportunidades de aprendizagem para todos os alunos.
O currículo compreendido como flexível abrange uma proposta de conteúdos
a partir da realidade de cada instituição, no exercício de sua autonomia, onde os
elementos curriculares adquirirão novas formas, ou seja, os conteúdos não serão
memorizados, mas apreendidos compreensivamente; a relação professor-aluno será
a de parceiros; as metodologias serão variadas e ativas; a avaliação não será a
cobrança da falta ou o reforço do comportamento obediente, mas a análise do
processo, dos alcances e da reorganização das ações. Nesse enfoque, o
entendimento de currículo será o de um conjunto de atividades intencionalmente
188
desenvolvidas para o processo formativo, mediadas pelo professor e pelo aluno. Por
esses motivos, o currículo será um trabalho de criação coletiva, introduzindo a
participação e projetos, em que o professor e o aluno se incluam como atores,
desenvolvendo a capacidade de negociar e ser solidário.
Na flexibilização dos currículos, evidencia-se a importância de buscar e de
permanentemente construir-se uma estrutura curricular que possa permitir incorporar
outras formas de aprendizagem e formação presentes na realidade social. Um outro
aspecto a considerar é que, na perspectiva da coerência com o processo de
flexibilização da estrutura curricular, compreende-se que os componentes devem
possibilitar, de modo pleno, que o aluno busque a própria direção nesse processo
formativo, como também considere as idiossincrasias e interesses específicos dos
alunos, ao mesmo tempo em que respeite suas possibilidades intelectuais e sociais,
além das relativas ao tempo. Nesta perspectiva, a estrutura curricular não deve ser
compreendida como uma espécie de “forma” rígida, impondo ao aluno a obediência
de se seguir um caminho pré-estabelecido, mas possibilitar ao aluno escolher
efetivamente seu caminho e percorrê-lo no ritmo que lhe seja possível.
A flexibilidade dos currículos pode ser vista como uma superação da lógica
tradicional dos currículos, para um processo que estimula a curiosidade, a busca de
solução de problemas, o despertar do interesse e, a criatividade enfim.
Espera-se que a diversidade de componentes curriculares, que está contida
em tal estrutura, permita viabilizar o processo curricular. Por sua vez, baseado nessa
idéia de flexibilidade e diversidade curricular e tendo como exemplo a educação
especial, González (2002) estabelece um currículo que contenha as seguintes
características: a) contemple as necessidades educativas dos alunos; b) atenção
à diversidade na aula; c) estimule a heterogeneidade; d) favoreça a individualização
e a socialização do ensino; e) potencialize processos de colaboração reflexiva entre
os profissionais; f) desenvolva intervenções pedagógicas para os alunos com
necessidades educativas especiais em uma dimensão mais cognitiva; g) adeque e
adapte o currículo às necessidades dos alunos.
O que mais chama a atenção nesses fatores é a intervensão pedagógica aos
alunos com necessidades especiais. Entre os elementos a considerar na elaboração
189
de programações conceituadas a partir de um projeto curricular, as necessidades
educativas dos alunos ocupam um lugar central. Por essa razão, um currículo não
deve limitar-se a possibilitar a intervenção das necessidades educativas especiais
dos alunos como adaptações do mesmo, mas deve incluir, também, orientações,
procedimentos e propostas concretas para efetuar essas adaptações.
Essa pluralidade de situações demonstra a elevada complexidade do projeto
de um currículo coerente com a diversidade de necessidades dos alunos. Por isso,
na hora de planejar o currículo, deve-se levar em conta algumas variáveis referentes
àquele que planeja, as suas concepções e, valores e, quanto aos alunos, as
limitações administrativas, recursos e outros. (González, 2002).
No âmbito metodológico, González (2002, p. 145), aponta que a resposta à
diversidade deve considerar os pontos a seguir destacados:
Aceitar a diversidade como uma condição inata aos seres humanos.
Existem diferenças entre aceitar teoricamente a diversidade e transformar
a forma de ensinar para adequá-la às diferenças dos alunos.
Refletir sobre o papel desempenhado pelos professores no processo de
formular respostas aos alunos. O professor deve assumir que a sua
função não é transmitir conhecimentos, mas possibilitar que os alunos
tenham acesso a eles.
Considerar que a metodologia que se põe em prática deve ser
suficientemente flexível para não impedir nem dificultar adaptações ou
inovações posteriores.
Reconhecer que a metodologia é um elemento dinamizador da prática
docente e que, portanto, deve permanecer aberta tanto ao programa
curricular da escola como ao da aula.
Procurar que as decisões sobre a metodologia sejam fruto de um
consenso que deve surgir do próprio debate, evitando, assim, as
desconexões entre tais decisões e a prática real.
190
Traduzir os princípios metodológicos e didáticos em decisões concretas,
assumidas por todos, e com uma delimitação clara de responsabilidades.
Como se vê, o currículo deve se constituir num primeiro domínio de atenção à
diversidade, pelo qual deve se ajustar e adequar a oferta educativa às
características dos indivíduos, reservando às escolas e aos professores a tarefa de
concretizar as intenções educativas de forma genérica, flexível e aberta por meio de
programas curriculares da escola, dos planos de aula e das medidas de adaptação e
diversificação curriculares. Por outro lado, ainda que diversidade não seja
oficialmente definida, antes de se planejar um currículo, é preciso considerar as
necessidades dos alunos que Mittler (2003, p. 146) lembra: ao planejar, os
professores devem estabelecer expectativas altas e criar oportunidades para todos
os alunos aprenderem com sucesso, incluindo meninos e meninas, alunos com
necessidades educacionais especiais, alunos com deficiência, alunos de todos os
níveis sociais e culturais, alunos de grupos étnicos diferentes, inclusive os viajantes,
os refugiados e aqueles que procuram asilo político e também os que são oriundos
de grupos lingüísticos diversos.
Portanto, a atenção às necessidades dos alunos pode afetar
fundamentalmente os elementos sicos do currículo, como sejam: objetivos,
conteúdos, metodologia e avaliação. Em González (2002, p. 155), encontramos que
os programas da escola deverão:
a) concordar quanto ao processo de identificação e avaliação das
necessidades educativas especiais;
b) contemplar propostas curriculares diversificadas que considerem as
diferenças individuais dos alunos;
c) realizar mudanças na estrutura organizativa da escola que permitam uma
organização baseada em agrupamentos flexíveis;
d) programar, em seus aspectos gerais, as funções dos professores de apoio
e dos especialistas, que possam interferir de maneira estável, bem como o
mapa relacional com os professores orientadores.
191
Outro aspecto a considerar é que a avaliação dos alunos com necessidades
educacionais especiais precisa estar incorporada ao processo de ensino-
aprendizagem para compreender as reações, situações dos alunos, aspectos de sua
evolução e dificuldades que possam encontrar. Nesta linha de pensamento, uma
avaliação curricular deve ser efetuada ao longo de um continuum. González (2002,
p. 194), propõem que a avaliação curricular contemple os procedimentos a seguir
citados.
a) Avaliação curricular ordinária: realizada por professores.
b) Avaliação curricular assessorada: os professores necessitam assessoria
de outros profissionais internos (equipe técnica) ou externos à escola, mas
continuam sendo eles os que realizam a avaliação.
c) Avaliação curricular compartilhada: nesse caso, o projeto e a realização da
avaliação são feitos conjuntamente por orientadores, especialistas,
professores etc.
d) Avaliação psicopedagógica: é mais específica, embora também seja
necessária a colaboração do professor orientador.
e) Avaliação multidisciplinar: nesse último nível, amplia-se o campo dos
profissionais que intervêm na avaliação, e incluem-se outras disciplinas
não educativas nem psicológicas, como a medicina.
Um olhar sobre esses fatores deixa claro que a avaliação deve ser entendida
de forma ampla, como atitude de responsabilidade da instituição, dos professores e
dos alunos acerca do processo formativo. É necessário, no entanto, considerar que
as formas de avaliação podem ser diferentes. Assim, toda a informação
sistematizada permitirá refletir sobre quais devem ser as proposições das escolas,
dos professores, dos pais, dos próprios alunos, no momento de criar processos
sistematizados de ensino-aprendizagem que oferecem respostas adequadas à
diversidade. Contudo, a emergência de uma análise mais apropriada dessas
questões se faz no sentir no contexto da educação, levando à compreensão de que,
para realizar um ensino de qualidade, é necessário superar muitas barreiras que
impedem a organização do trabalho pedagógico.
192
Quando perguntadas sobre qual é o conceito de currículo que elas têm no
processo de inclusão educacional, as professoras da escola pesquisada
responderam o que segue.
PROFESSORA A:
para mim currículo é quando eu organizo as minhas situações para uma
melhor elaboração das minhas aulas.
PROFESSORA B: na minha opinião, currículo é quando eu elaboro o que vai ser dado
durante o ano letivo.
PROFESSORA C
:
currículo é um programa de estudo que toda a escola deve ter para
ajudar os professores a elaborar suas aulas.
PROFESSORA D:
currículo para mim é um guia sobre o que, quando e como vou ensinar e
avaliar.
PROFESSORA E:
o currículo serve, em parte, para preparar o que eu vou aos meus
aluno para não ficar com aulas sem motivação.
PROFESSORA F:
toda a escola tem que ter um currículo para que seus professores não
fiquem sem uma preparação na sua aulas.
Se o fenômeno da aprendizagem é conceituado como fenômeno que se
realiza nas relações que estabelecemos com os saberes, o conhecimento e as
pessoas, na sala de aula essa constatação se transforma numa realidade
extremamente significativa. Na qualidade das relações estabelecidas na aula com os
conhecimentos, os professores e os alunos podem fazer desse cenário um lugar
qualificador dos processos de formação.
Ao entrar em sala de aula, o aluno não deixa suas referências individuais e
socioculturais nos corredores da escola, ele traz consigo sua bagagem de valores e
crenças, com os quais vai se desenvolvendo se modificando, se aperfeiçoando.
Cabe ao professor, na edificação da sala de aula, dialogar autenticamente com essa
diferença, criar meios de mobilizá-las para implementar o aprendizado, no qual o
princípio didático fundamental é se aproximar o máximo possível das cosmovisões
dos alunos, não para aceitá-las passivamente, mas trabalhar ativamente com elas,
com todos os recursos que a educação contemporânea pode fornecer para
educarmos na diversidade. Afinal, a riqueza humana é a sua diversidade e a
educação, principalmente, não pode desprezá-la, mas potencializá-la, ética e
193
politicamente, cada vez mais, através dos seus recursos pedagógicos comunicantes
e relacionais.
As manifestações de dificuldades de aprendizagem na escola apresentam-se
continuamente, desde situações leves e transitórias que podem se resolver
espontaneamente no decorrer do fazer pedagógico até situações mais graves e
constantes que requerem o uso de ferramentas adequadas para a sua solução.
Atender a essa gama de dificuldades não quer dizer construir um novo currículo,
mas ter, sim, uma flexibilidade curricular, uma dinamicidade de currículo, passível de
ampliação, dando respostas educacionais necessárias para atender todos os
educandos.
Inserir os alunos com necessidades especiais na vida regular de ensino
constituí o primeiro passo para o processo de inclusão. Formada a diversidade da
população escolar, instala-se o grande desafio: respeito às diferenças individuais
contidas em diversificados contextos escolares e múltiplas possibilidades de sala de
aula, ou seja, estamos tratando de adaptações curriculares.
De acordo com González (2002), adaptação curricular é um projeto e uma
ação de melhoria, em primeiro lugar, do próprio currículo, objetivando ajustar a
programação curricular às condições do aluno, isto é, as suas habilidades e
competências no processo ensino-aprendizagem, assim como dos professores e da
escola em sua totalidade.
As adaptações curriculares relacionam-se com afirmações conceituais que
fundamentam a necessidade de um currículo comum em geral, como resposta
curricular à diversidade e respeito às diferenças individuais. Essas adaptações
podem ser consideradas como a resposta adequada ao conceito de necessidades
educacionais especiais e ao reconhecimento, numa sociedade democrática, dos
princípios de igualdade e diversidade. Seu ponto de partida encontra-se num único
âmbito curricular: o currículo comum a todos os alunos. Currículo no qual a
intervenção educativa deixa de estar centrada nas diferenças para se radicar na
capacidade de aprendizagem do aluno incluso a partir de suas características
individuais bem como na capacidade das instituições educativas para responder às
necessidades dos alunos.
Quando questionadas sobre qual seria para elas um currículo que realmente
atendesse as crianças com necessidades educativas especiais, as pedagogas da
escola manifestaram-se como segue.
194
PEDAGOGA A: Para mim o currículo deve atender as várias situações dos alunos,
devemos sempre levar em conta que cada criança é uma realidade.
PEDAGOGA B: O currículo deve ser feito levando em consideração as necessidades dos
alunos e deve ser sempre refeito o quanto for necessário.
PEDAGOGA C: Devemos levar em consideração sempre a realidade de cada aluno e suas
necessidades na hora de elaborarmos o currículo.
PEDAGOGA D: Ao meu ver um currículo para funcionar bem, deve-se levar em conta a
realidade do aluno seu dia-a-dia e aceitar as diferenças.
Se a resistência à presença do aluno com necessidades educacionais
especiais é uma realidade nas escolas, também se pode afirmar que está
acompanhada pela ocultação desse aluno, uma e outra variando tanto em suas
manifestações como em sua intensidade.
dificuldades e desafios que as pedagogas entrevistadas apontam como
benefícios do processo de inclusão, pois as levam a buscar novos conhecimentos,
novas estratégias de ensino, novos caminhos.
Observa-se nas falas das pedagogas uma tentativa de romper com padrões
pautados na incapacidade do aluno com deficiência encaminhando possibilidades
de (re)significar a aprendizagem.
Quando questionadas sobre o que elas acham das adaptações curriculares,
as pedagogas responderam o que é citado abaixo.
PEDAGOGA A:
As adaptações farão sempre parte de um currículo, todas as vezes que for
necessário mexer no currículo, isto deve ser feito
.
PEDAGOGA B:
As adaptações deverão ser feitas todas as vezes que os alunos precisarem dessas
adaptações, só no decorrer do ano letivo e que podemos conhecer as verdadeiras necessidades de
nossos alunos.
PEDAGOGA C
:
A aprendizagem dos alunos, es vinculada ao currículo, este deve ser
organizado para orientar o professor e suas ações.
PEDAGOGA D:
O currículo deve levar em conta o que o aluno deve aprender e nele deve
constar qual a melhor forma para isso acontecer.
Nos depoimentos das pedagogas, quanto às questões que se referem à prática
pedagógica e à avaliação do desempenho do aluno com necessidades educacionais
195
especiais na escola, o que se evidencia é a incompatibilidade entre o que é pretendido pela
escola e padronizado no seu currículo e o que é desejável e posvel para os alunos.
Partindo do princípio de que o educando deficiente tem condições de acompanhar, o
professor instaura outros modos de interlocução, centrados no entendimento de que, por não
poderem os alunos percorrer sozinhos o caminho do aprendizado, as adaptações
curriculares, são fundamentais para a promão do seu desenvolvimento.
Nas considerões das pedagogas, verificamos uma dificuldade referente às
perspectivas conceitual e filosófica de educação, que regem o currículo pareceu-nos não
perceberem que mais do que programas, lista de conteúdos e de atividades, o currículo é o
desenvolvimento de formas de pensar, de perceber o mundo, de viver.
Implica na preparação do individuo para a sociedade existente, para posições de
donio ou de submissão, para a acessão de posições criticas ou alienantes em relão à
realidade, para a vivência plena ou apenas parcial da cidadania.
196
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa pesquisa foi desenvolvida em uma escola da rede pública municipal de
ensino de Manaus no Estado do Amazonas com o objetivo de analisar se o Sistema
Municipal de Educação de Manaus tem buscado garantir a aprendizagem e o
desenvolvimento dos alunos com necessidades educacionais especiais, prevendo
formas de acompanhamento do processo escolar que respeitem as possibilidades
de expressão do potencial dos mesmos, conforme previsto na nova Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional.
Os resultados da pesquisa indicaram que a escola pesquisada não têm um
projeto específico de inclusão, o que acarreta dificuldades em vários aspectos da
prática educativa, como rigidez curricular, metodológica e avaliativa, bem como falta
de esclarecimento sobre as necessidades educacionais especiais.
Outra dificuldade observada foi a falta de instrumental demonstrada pelos
professores da rede municipal de ensino para o atendimento de alunos com
necessidades educativas especiais.
Constatou-se que, de modo geral, a concepção de aluno vigente na escola
tende à homogeneização, o que é incompatível com a inclusão.
Ainda é creditada ao aluno com necessidades especiais a responsabilidade
por seu aprendizado nas classes regulares de ensino. Pôde-se concluir que a
implementação da inclusão requer o preparo das escolas e dos profissionais da
educação para esta nova realidade.
Estes resultados explicitam alguns pontos pertinentes para avaliarmos o
processo de incluo na escola. São eles: o conhecimento interdisciplinar
necessário ao processo de inclusão; a flexibilização de métodos, currículos e dos
processos avaliativos; as expectativas geradas pelas representações que circulam
no interior da escola em relação aos alunos com necessidades diferenciadas de
aprendizagem; a possível modificação da forma racional e hegemônica de
197
compreensão da infância; as concepções de ensino-aprendizagem centradas em
conteúdos acadêmicos e a possível incorporação de processos relacionados a
valores e atitudes. Esses pontos parecem nos indicar algumas direções que se
constituem desafios pedagógicos permanentes para assegurar condições mínimas
de acolhimento à criança com necessidades educacionais especiais em espaços
escolares que se pretendem inclusivos.
A escola, contudo, reflete os valores e atitudes de nossa sociedade como um
todo. É preciso entender a inclusão como um movimento da própria sociedade,
como apelo identitário que revela a tentativa de individuação de indivíduos e grupos
que foram excluídos da esfera política, que tiveram sua “diferença” circunscrita à
esfera privada. Assim, o desafio pedagógico em relação ao processo de inclusão
modifica-se e requer revisões, apontando a necessidade de formas democráticas de
participação, a fim de que o sentido simbólico da inclusão direcione novas práticas
discursivas e sociais. Requer, portanto, o sentido de luta pela participação, de
organização social e política.
Desta perspectiva podemos afirmar que o significado da inclusão é múltiplo e
contraditório, origina-se desse apelo plural das múltiplas vozes desejantes de
participação, e, no entanto, confronta-se com uma sociedade massificada, na qual
os homens encontram-se cada vez mais no entorno de si próprios. A falta de tempo,
a luta diária pela sobrevivência nos moldes que nossa sociedade exige, o cansaço, a
fugacidade dos encontros, colocam barreiras aos valores e atitudes que a inclusão
procura despertar.
A inclusão, portanto, requer uma revolução de paradigmas. Não significa
apenas colocar pessoas “diferentes” no ensino regular. Significa não mais conceber
as necessidades especiais como imutáveis ou incapacitantes. Significa, ademais,
rever o papel da escola e conscientizá-la de que sua responsabilidade é educar a
todos, sem discriminação.
Logicamente, isso exige uma reviravolta estrutural na sociedade como um
todo.
O conceito de inclusão parte de outro paradigma no qual a deficiência não é
responsabilidade exclusiva de seu portador. Cabe à sociedade modificar-se para
198
propiciar uma inserção de quaisquer indivíduos, independentemente de suas
necessidades.
Nossa pesquisa constatou que a escola está despreparada. Foram ouvidos
depoimentos em que professores e outros profissionais manifestaram-se
contrariamente à inclusão, visto não terem apoio governamental nem um estudo
prévio para a implantação da proposta; outras vezes, as entrevistas demonstraram
que a inclusão atualmente parte mais da iniciativa própria de alguns professores do
que de um projeto coletivo e integrado.
Apesar de compreendermos que todas as pessoas e organizações
governamentais ou não-governamentais têm não só o dever de denunciar a situação
de exclusão escolar em que se encontra uma grande parcela da nossa sociedade,
mas também o direito de sugerir medidas que possam reverter essa situação,
consideramos que qualquer proposta educacional nesse sentido deve ser assumida
pela própria escola, amparada por políticas educacionais articuladas com esse fim.
Para s, a escola regular seleciona alunos, discrimina os que não se enquadram
nas suas exigências e, em conseqüência, os exclui. É preciso, na verdade,
desvincular ou desmistificar a inclusão escolar como uma incumbência de
especialistas externos ao ensino regular
No decorrer do nosso estudo, o que constatamos é a fragilidade de uma
Proposta de Inclusão Escolar na rede municipal de Manaus para pessoas com
necessidades educacionais especiais (NEE), elaborada e gerenciada pelo CMEE.
Este órgão acredita que o sucesso da inclusão será alcançado muito mais por uma
questão de tempo do que por ações pontuais das escolas, visando à transformação
de suas práticas.
Esse modo de pensar e de fazer a inclusão, no qual o ensino especial adentra
o ensino regular com diretrizes, orientações e adaptações de toda ordem, é parte de
uma concepção que predomina não na educação escolar no Município de
Manaus, mas, praticamente, em todo o país.
Skliar (2001, p. 17) afirma que “a escola inclusiva parece mais um novo
enfoque da educação especial e não da educação no geral. O movimento acontece
para a escola regular e não desde a escola regular”.
199
Acompanhando toda a trajetória histórica da SEMED/CMEE, desde os anos
1980, constatamos que o fato do CMEE - atualmente Complexo Municipal de
Educação Especial André Vidal de Araújo - assumir a inclusão escolar no Município
é entendido por esse órgão como um avanço, uma ação pioneira e inovadora que
serve de modelo para o Brasil.
A SEMED/CMEE se baseia nas recomendações da Declaração de
Salamanca que, textualmente, admite e orienta a inclusão escolar, por meio da
educação especial. Essa idéia parece-nos aprovada e acatada não pela
SEMED/CMEE, como também por diversas instituições públicas e privadas do país
e do exterior envolvidas com a educação especial.
O princípio que orienta a Estrutura de Ação de Educação Especial, citado na
Declaração, implica que as escolas acolham todas as crianças, independentemente
de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas e outras,
pois tais condições geram uma variedade de desafios aos sistemas escolares.
Assim, o termo necessidades educacionais especiais refere-se a todas aquelas
crianças ou jovens cujas necessidades se originam em função de deficiências ou
dificuldades de aprendizagem.
Apesar de esta Estrutura de Ação se compor de várias seções, dentre as
quais o “novo pensar em educação especial”, a própria Declaração continua
estimulando a dicotomização ensino especial e ensino regular e não a
complementação/fusão desses dois sistemas, dado que admite a possibilidade,
mesmo que em casos atípicos, de o aluno freqüentar o ensino especial e não
integrar-se no ensino regular. Nesse sentido, o texto da Declaração é explícito:
O encaminhamento de crianças a escolas especiais ou a classes especiais
ou a sessões especiais dentro da escola em caráter permanente deveriam
constituir exceções a ser recomendado somente naqueles casos
infreqüentes, onde fique claramente demonstrado que a educação na classe
regular seja incapaz de atender às necessidades educacionais ou sociais da
criança, ou quando sejam requisitados em nome do bem-estar da criança ou
de outras crianças
.
A estrutura organizacional do MEC, assim como a estrutura organizacional da
Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Manaus acompanham a
200
dicotomização entre ensino regular e ensino especial. Não percebemos entre as
Secretarias do MEC ou entre a SEMED/CMEE um trabalho articulado e integrado
em favor de todos os alunos. Assim como a Secretaria Nacional de Educação
Especial SEESP/MEC discute a inclusão escolar em escala nacional e de forma
isolada das outras Secretarias, a SEMED/CMEE, seguindo essa mesma linha,
discute a inclusão escolar regionalmente e de forma isolada.
O que constatamos novamente neste estudo foi a transposição dos serviços
oferecidos pelo ensino especial para o ensino regular. Os profissionais, os recursos,
métodos, técnicas de educação especial foram transferidos para as escolas
regulares, as salas especiais tornaram-se sala de recursos, como se o aluno fosse
adaptado ao ensino regular por meio do ensino especial.
Consideramos que, valorizando as diferenças e efetuando mudança na
estrutura rígida e seletiva das escolas, poderemos levá-las ao aprimoramento das
suas práticas sem a interferência do ensino especial. Esse aprimoramento aboliria,
em definitivo, o termo “adaptação” no interior das escolas e salas de aula. As
inovações beneficiariam a todos e, portanto, não haveria mais a necessidade de
adequar planejamentos, currículos, conteúdos, avaliações, objetivos e, até mesmo,
critérios de promoção e retenção de alunos. Desse modo, as escolas, amparadas
em políticas educacionais, conseguiriam romper com o modelo pedagógico
organizacional conservador que as domina e deflagariam um verdadeiro combate à
discriminação e à exclusão.
Nesse sentido, as afirmações de Mantoan (2001) devem ser lembradas:
Acreditamos que o aprimoramento da qualidade do ensino regular e a
adição de princípios educacionais válidos para todos os alunos resultarão
naturalmente na inclusão escolar dos deficientes. Em conseqüência, a
educação especial adquirirá uma nova significação. Tornar-se-á uma
modalidade de ensino destinada não apenas a um grupo exclusivo de
alunos, o dos deficientes, mas especializada no aluno e dedicada à
pesquisa e ao desenvolvimento de novas maneiras de se ensinar,
adequada à heterogeneidade dos aprendizes e compatível com os ideais
democráticos de uma educação para todos.
Entendemos que a organização do ensino em ciclos, sustentada na
progressão continuada, é medida de intervenção pedagógica que aposta na inclusão
201
dos alunos. Ao atuarem no plano organizacional do ensino e proporem novas ações
pedagógicas, varias das políticas vigentes buscam o respaldo de pesquisas que têm
apontado para o potencial transformador dessas propostas no sentido de melhorar a
qualidade do processo ensino-aprendizagem.
Mas não basta às políticas reformistas apenas se apropriar de elaborações
teóricas progressistas, para que sejam coroadas de êxito. Para que sua
implementação saia das intenções e se traduza em ações, que realmente garantam
a melhoria da qualidade de ensino e o enfrentamento do fracasso escolar, e não
simplesmente melhore os índices oficiais de repetência e evasão escolar é preciso
uma mudança qualitativa no trabalho educacional no interior das escolas. E isso não
é possível implementar por decreto. Requer um envolvimento de todos os
profissionais da educação, alunos e pais, na reorganização do espaço e do tempo
da escola, assim como que sejam garantidas condições de trabalho para os
professores e condições de permanência e de estudo para os alunos.
Moreira (1996, p. 137), baseando-se em Sacristán para analisar a
implementação de inovações educacionais, nos diz que “a cultura instituída e
expressa pelas práticas cotidianas não pode ser modificada com ações de curto
prazo, com reestruturações bruscas e abrangentes, que, muitas vezes, produzem
apenas movimento e confusão, mas poucas mudanças substantivas”.
O investimento precisa ser em ltiplas direções, tendo o objetivo de
fortalecer a capacidade da escola em inovar, em buscar alternativas aos problemas
que enfrenta.
A construção de uma escola que verdadeiramente eduque todas as crianças
e jovens, superando não os efeitos perversos das retenções e evasões, mas que
lhes assegure o acesso crítico ao mundo dos conhecimentos, e o desenvolvimento
de uma consciência cidadã que lhes permita enfrentar os desafios do mundo
contemporâneo, demanda de condições para desenvolver novas práticas de aula, de
gestão, de trabalho dos professores e dos alunos, incluindo formas coletivas,
currículos interdisciplinares, riqueza de material e de experiências, entre tantas
outras (ALMEIDA et al, 2001).
202
Hoje o Ensino Fundamental está praticamente assegurado a todas as
crianças e jovens em nosso país. No entanto, a abertura da escola não veio
acompanhada de transformações capazes de alterar suas formas de organização e
funcionamento, de assegurar condições de trabalho, salário e formação de
professores, conduzindo a mudanças qualitativas. A permanência na escola graças
apenas à ausência de reprovação ao longo do ensino fundamental não está
assegurando aos alunos uma aprendizagem efetiva.
As propostas neoliberais defendem ajustes nas políticas para a correção do
fluxo e o fim das perdas de investimentos com reprovação e evasão escolar, e
acabam acenando com a responsabilização dos indivíduos pela exclusão. Assim, a
marginalização, exclusão, miséria, precariedade de vida, negação de direitos deixam
de ser vistas como decorrências do sistema, que por natureza pressupõe a exclusão
de contingentes cada vez maiores de pessoas.
Nas palavras de Stainback e Stainback (1999, p. 31), a inclusão tem servido
de pretexto para validar a prestação de serviços de educação especial, porque ainda
não foi assumida como “um novo paradigma de pensamento e de ação, no sentido
de incluir todos os indivíduos em uma sociedade na qual a diversidade está se
tornando mais norma do que exceção”.
De fato, propostas/projetos elaborados distantes da realidade das escolas
geram práticas de homogeneização e padronização, que fazem parte de uma visão
mecanicista e reducionista de escola, diametralmente opostas aos ideais inclusivos
de educação.
Como ressaltou Almeida (2001, p. 65): “[...] Até que ponto esse projeto
educacional não representa um refinamento da exclusão, na medida em que pode
estar viabilizando uma escolaridade de menor qualidade aos alunos vitimados
pela exclusão? [...] Estamos vivendo a inclusão excludente?”
Vale ressaltar, também, que não existe motivação suficiente para mudanças
na escola vigente, pois, na escola pesquisada, os alunos com dificuldade de
aprendizagem e deficiência mental são apoiados de imediato pelas coordenadoras
pedagógicas dos distritos e também do CMEE e os alunos surdos ou cegos são
socorridos pelos professores de apoio, intérpretes e instrutores. Sendo assim, que
203
razões fariam os professores mudar em suas práticas? Por outro lado, qual o desafio
que as nossas escolas e professores recebem para mudar? E se eles não mudam,
como podemos acreditar que haverá inclusão?
Ao transferir o aluno egresso de classes especiais e escolas especiais para o
ensino regular, a SEMED/CMEE provocou no meio educacional regular inquietação
e insegurança com suas invenções. Esses sentimentos denunciam e legitimam os
mecanismos seletivos e excludentes que o ensino regular vem desenvolvendo ao
longo da história. A propósito, o ensino regular do município de Manaus aceita, com
passividade, todas as diretrizes e orientações advindas da SEMED/CMEE, talvez
porque não queira se responsabilizar pelas inovações como a inclusão, por se sentir
incapaz de pensar e realizar um ensino para todos, diferente do que comumente
ministra.
A inclusão, como nos esclarece Mantoan (2000, p. 86), “[..] é um conceito que
emerge da complexidade, dado que a interação entre as diferenças humanas, o
contato e o compartilhamento dessas singularidades compõem a sua idéia matriz”.
Na Declaração de Salamanca (1994, p. 61):
[...] Inclusão e participação são essenciais à dignidade humana e ao gozo
do execício dos direitos humanos. No campo da educação, tal se reflete no
desenvolvimento de estratégias que procuram proporcionar uma
equalização genuína de oportunidades. A experiência em muitos países
demonstra que a integração de crianças e jovens com necessidades
educacionais especiais é mais eficazmente alcançada em escolas
inclusivas que servem a todas as crianças de uma comunidade.
Citamos na seqüência formulações presentes em documentos do MEC
relativos à inclusão, nos quais se destaca o reforço à inclusão escolar e a
compreensão de que essa exige mudanças societárias.
[...] A implementação de políticas inclusivas que pretendam ser efetivas e
duradouras deve incidir sobre a rede de relações que se materializa através
das instituições que as práticas discriminatórias que elas produzem
extrapolam, em muito, os muros e regulamentos dos territórios
organizacionais que as evidenciam. (MEC/SEESP, 2005, p.8)
[...] No Brasil a educação inclusiva assume espaço central no debate acerca
da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação da lógica
da exclusão. À luz dos referenciais para a construção de sistemas
204
educacionais inclusivos, a organização de escolas e classes especiais
passa a ser repensada, implicando uma mudança estrutural e cultural da
escola comum para que receba todos os alunos, atenda suas
especificidades e promova a melhoria da qualidade da educação,
configurando-se em respostas às diferentes situações que levam à exclusão
escolar e social. (MEC/SEESP, 2007, p.3)
Nas práticas, entretanto, não constatamos essas ações conjuntas entre
CMEE e os outros órgãos da SEMED.
A Diretora da escola pesquisada foi categórica ao enfocar o processo de
inclusão escola.
DIRETORA
:
Penso que está engatinhando, se tem muito que fazer, precisa-se fazer muito,
está na primeira fase. Não é impossível, mas temos uma longa estrada pela frente. Uma vez
que a sociedade está perdendo seus valores universais, valores morais e éticos. Estamos
realizando projeto “Escola Limpa”, neste caso o limpo está relacionado não ao aspecto
da limpeza como também em outros aspectos, por exemplo, o respeito, a forma de tratar o
outro, a postura, enfim trabalhando os valores que a família não conseguiu trabalhar. (2006)
Já a Pedagoga afirma que:
PEDAGOGA B:
[...] Eu vou falar daquilo que eu li, sobre inclusão escolar, são os alunos
oriundos da educação especial que foram inclusos no ensino regular. Tem alunos inclusos
sim. No horário da manhã ao todo tem seis inclusos. Não têm nenhuma deficiência, com
dificuldade de aprendizagem precisam de acompanhamento. Recebem alunos dos outros
(escolas). De manhã eles estão no ensino regular, no outro horário na sala de recurso.
Apesar da interferência do CMEE nas escolas regulares, como já afirmamos o
ensino regular continua sem alterações. Ao nosso ver, a Proposta do CMEE não
conseguiu ressignificar as práticas pedagógicas desenvolvidas no dia-a-dia das
escolas na perspectiva da educação inclusiva como parte de uma política municipal
que almeja a transformação escolar e, conseqüentemente, a escola para todos.
Percebemos que foi estabelecido implicitamente um jogo de interesses entre
o ensino regular e o especial. O primeiro, para o mudar, aceita as influências do
especial, e este, para manter suas diretrizes, seu poder, se ilude com a aceitação do
ensino regular.
205
Mantoan (2000) esclarece a respeito desse tipo de jogo, afirmando que a
educação especial se protege, ao mostrar-se temerosa por uma mudança radical da
escola, apoderando-se da inclusão como assunto de sua competência. Por outro
lado, o ensino regular se omite em relação à inclusão, para evitar uma revisão geral
de suas práticas e a sua transformação, entendendo que a inclusão é um problema
do ensino especial e reforçando o interesse deste de encampar a inclusão.
No momento atual da Proposta do CMEE, seria necessário que o ensino
regular fosse estimulado a tomar as rédeas daquilo que lhe é próprio a inclusão
escolar. Eis um grande desafio que não constatamos neste estudo!
Em nenhum momento percebemos a pretensão do CMEE de rever sua
atuação neste sentido. Não registramos, também, em documento ou entrevistas,
nenhuma intenção do CMEE de avaliar as possibilidades de uma Proposta Inclusiva
com o ensino regular.
mais de 20 anos (desde 1981), período que chegamos em Manaus e
assumimos a Coordenação do Centro de Triagem e Diagnóstico da Educação
Especial da Seduc, estamos ouvindo de todos os chefes dos núcleos da educação
especial, inclusive do atual, que o ensino especial é necessário como forma de apoio
ao ensino regular e não como gerenciador de programas/projetos. Chegou o
momento, então, de demonstrar, na prática, esta forma de pensar, que entendemos
como a mais sensata e como demonstração de maturidade, responsabilidade e
compromisso real do CMEE para com todos os alunos, independentemente de
serem pessoas com necessidades especiais ou não.
As escolas do ensino municipal regular, então, mediante todas as
oportunidades que lhes seriam oferecidas com a Proposta de Inclusão, amparadas
de políticas públicas articuladas com este objetivo, teriam de buscar meios próprios
de acolher a todos os alunos, segundo a sua própria realidade, o seu contexto e o
seu compromisso com toda a comunidade.
Pensamos que o CMEE/SEMED não pode continuar atuando de forma
desconectada da realidade social, como se o problema dos excluídos fosse apenas
relacionado coma deficiência do aluno. Apesar de a deficiência agravar, em muitas
206
situações, a exclusão escolar, é preciso que se entenda que os maiores problemas
das escolas regulares residem na desconsideração da diversidade de seus alunos.
Assim como a Profª Maria Antonieta Brito de Castro em seus estudos
realizados em Natal/RN, citada por Mantoan (2001), s também concluímos em
nossos estudos que os professores têm evidenciado dificuldades para trabalhar com
os alunos em geral, não apenas com aqueles com deficiência, dadas as precárias
condições do trabalho e de formação docente. Verificamos, assim, como a
pesquisadora citada, que os professores, em sua maioria, necessitam de mais
conhecimentos do que possuem para desenvolver uma prática de ensino que
considere as diferenças em sala de aula e o uma capacitação especializada nas
deficiências, como propõem, no geral, a lei e as políticas educacionais brasileiras.
muito se vem denunciando o descaso das autoridades competentes com a
educação brasileira. Também é comum atribuir-se a baixa qualidade do ensino à
inadequada formação do professor. Essa interpretação, no entanto, é reducionista,
pois focaliza um lado do problema e as respostas do sistema a esse problema
têm sido promover cursos de capacitação para os profissionais da educação.
Contudo, esta estratégia não ataca outros problemas como os baixos salários, a
ausência de adequado plano de carreira, a rotatividade de professores nas escolas
públicas, nem dá conta de garantir espaço suficiente para a reflexão da ação
pedagógica, coletiva e/ou individual. O que se requer é uma jornada de trabalho que
possibilite ao professor e outros profissionais da educação poderem articular o
estudo, ao repensar e resignificar sua prática, o que não se por meio somente da
oferta de capacitação esporádica.
As ações dos sistemas públicos de ensino deverão pautar-se em
conhecimento sobre: a situação funcional dos seus profissionais, sua formação
acadêmica e se tiveram alguma formação em educação especial; as concepções de
ensino/aprendizagem que adotam; as representações sociais que têm sobre alunos
com necessidades educacionais especiais.
Os sistemas de ensino devem construir instrumentos que possam identificar e
caracterizar com clareza e precisão sua população escolar, bem como aquela que
ainda não teve acesso à escola, de tal forma que essas informações possam
207
evidenciar suas reais necessidades educacionais especiais, permitindo elaborar um
planejamento educacional capaz de atendê-las.
Conforme Bueno (1993), para que a educação especial se insira efetivamente
na democratização do ensino, é necessário que ela se incorpore não na luta pela
melhoria da qualidade da escola blica, como também nos movimentos que
buscam a extensão dos direitos de cidadania à população em geral.
Para não continuar ferindo os preceitos constitucionais, o CMEE deveria
transformar-se em um setor de educação responsável pela articulação e integração
com outros órgãos públicos e/ou privados nos encaminhamentos de alunos em
geral, com e sem deficiência, para os mais diversos atendimentos especializados.
Outra condição importante para o desenvolvimento da educação é garantir
incentivo aos profissionais para que desenvolvam pesquisas, ou seja, para que
possam freqüentar cursos de graduação e pós-graduação sem serem onerados ou
prejudicados em sua vida funcional.
O setor (CMEE) poderia ainda dedicar-se à pesquisas na área educacional,
iluminando cada vez mais os caminhos da inclusão escolar.
Os nossos estudos, através dos documentos da SEMED e do CMEE, assim
como do Projeto Político Pedagógico da escola pesquisada, levam à afirmação de
que a Perspectiva de uma Proposta Inclusiva no Município de Manaus faz parte de
uma trama que foi tecida, envolvendo, desde o seu início, assessorias, cursos,
palestras, documentos, serviços de apoio institucional, remoção de barreiras
arquitetônicas e recursos tanto regionais quanto nacionais.
Verificamos que tudo foi minuciosamente planejado e realizado pelo CMEE,
sem que este se apercebesse que o usual é as escolas criarem suas próprias táticas
para assimilarem uma estratégia de inovação, apesar de todo o contorno formal e
engessado existente ao redor. Nessa perspectiva, transformar a cultura das escolas
regulares, mesmo daquelas que aderiram à inclusão, em nome de uma “estratégia”
de inovação escolar, não parece ter dado certo até então.
Para que o atendimento no Ensino Fundamental propicie um avanço
significativo na educação dos alunos com necessidades especiais, independente do
208
modelo de atendimento adotado (seja numa proposta mais radicalmente inclusiva,
seja numa linha de manutenção de apoios especializados), faz-se também
necessário que as prefeituras articulem e maximizem o trabalho conjunto das
diversas secretarias. (MAZZOTTA, 1996; JANNUZZI, 2001)
A respeito da estratégia de inovação, Arroyo (2000) lembra-nos da tradição
político-pedagógica brasileira, que divide o sistema escolar entre os que decidem, os
que pensam e os que fazem a educação. O pensar é sempre iniciativa de um grupo
“iluminado”, que prescreve como as instituições sociais têm de se renovar e se
atualizar.
[...] É um estilo que acredita que a inovação pode vir do alto, de
fora das instituições escolares, feita e pensada para elas e para seus
profissionais, para que estes troquem por novos, como trocam de
camisa ou blusa, velhas fórmulas, currículos, processos e práticas.
(ARROYO, 2000, p.14)
Em relação às perspectivas de uma Proposta de Inclusão do CMEE
consideramos que a estratégia mais contundente está em propor uma mudança no
ensino regular pela intercessão com o ensino especial, o que repete o velho chavão
de que “o que é bom para os deficientes é ainda melhor para os normais”. Já a tática
adotada pela escola pesquisada foi receber os alunos excluídos acatando a
Proposta, sem responsabilizar-se pelo desenvolvimento e aprendizagem qualitativa
desses alunos.
Uma contribuição possível deste estudo, a nosso ver, foi a de desvelar
algumas estratégias e táticas que envolveram as perspectivas de uma Proposta
Inclusiva estudada, para retirar desses encontros e desencontros o que pode ser um
caminho mais direto para que a inclusão escolar se concretize na rede municipal de
ensino de Manaus.
A nova denominação conferida às escolas que receberam os alunos com
NEE, “Escola Inclusiva de Referência”, conduz-nos a reafirmar a nossa cultura
escolar, cujas práticas são repetidas no estilo oficial: inovar por amostragens.
O processo de implementação da inclusão desenvolvida pela SEMED/CMEE
seguiu o estilo “ver para crer” (ARROYO, 2000), em que se acredita que a escola
209
mudará quando os professores tiverem experiências exemplares a seguir, em
função de modelos, via consenso e adesão. Mais um equívoco, a nosso ver, que a
elaboração da Proposta do CMEE consolida!
Nesse sentido, o professor, por sua vez, ao esforçar-se para corresponder ao
perfil que lhe é imposto, sofre um processo de intensificação de seu trabalho, expõe-
se a situações de estresse quando não consegue responder às demandas que dele
se esperam, atingindo sua auto-estima e assumindo uma constante culpabilidade
frente ao fracasso.
Perrenoud (2000, p. 59) diz:
[...] É inútil querer transmitir modelos que deram suas
provas, pensando que vão ser espontaneamente adotados
por todo ator informado e de boa vontade, sobretudo se ele
está em busca da solução racional para um problema
semelhante. Os caminhos da inovação são mais misteriosos,
menos racionais.
Na nossa opinião, quando os professores se reconhecem como sujeitos
culturais, mediadores e potencializadores da educação, toda essa postura tutelar do
Município em relação aos professores e às escolas poderá tornar-se desnecessária,
pois haveria, em conseqüência, uma nítida demonstração de que a inovação
educativa começou a ser tecida de dentro e não apenas de fora para dentro da
escola.
Sabe-se que não se melhora a qualidade de ensino considerando somente a
sala de aula e seus agentes ou um outro espaço isoladamente, mas que esta
melhoria depende de um conjunto articulado de mudanças que devem ser
sustentadas pelo poder público. As mudanças educacionais dependem dos sistemas
de ensino e da vontade política de seus gestores.
Verificamos que a rede pública municipal de Manaus ao conceber a inclusão
em suas diretrizes, projetos, orientações:
- cria um impasse entre o ensino especial e o ensino regular e continua
privilegiando a integração escolar;
210
- não denuncia a exclusão escolar resultante da organização pedagógica e
administrativa do ensino regular;
- neutraliza os desafios da inclusão, acomodando tanto o ensino regular como
o especial;
- não amplia o conceito de inclusão e restringe a inovação à inserção de
alunos com deficiência na escola regular e, assim mesmo, apenas os
deficientes mentais, auditivos e visuais;
- baseia-se na normalização e na fixação de identidades, pois trabalha com
tipos de alunos (especial/normal) e de professor (especializado e não
especializado) categorizados;
- utiliza estratégias que camuflam os verdadeiros objetivos das
propostas/projetos verdadeiramente inclusivos.
Isso ocorre na rede municipal porque o CMEE considera a inclusão como
uma inovação do ensino especial.
Se for rompida a atual situação do ensino no Município de Manaus que, em
nome da inclusão, criou três tipos de escolas a escola regular, a escola especial e
a escola considerada inclusiva (de referência, no nosso caso) -, teremos nesta e em
outras redes educacionais a possibilidade de construir uma modalidade única de
ensino que acolhetodos os alunos, desafiando a educação escolar a rever seus
saberes e fazer atuais.
Neste estudo focalizamos uma perspectiva de uma proposta de inclusão
escolar na rede municipal de Manaus para analisar sua operacionalização no
contexto em que foi idealizada e está sendo realizada, apontando questões e, ao
mesmo tempo, mostrando possibilidades de rever os seus direcionamentos numa
outra perspectiva teórico-paradigmática.
Não temos nenhuma proposta de inclusão que possa ser generalizada ou
multiplicada, pois ainda é incipiente, no entanto, é de consenso que esse processo é
de responsabilidade de toda a sociedade e, portanto, é preciso que a escola esteja
211
aberta para a “escuta”, favorecendo, assim, as trocas para a construção do processo
de inclusão escolar.
Entendemos que se faz necessário, ainda hoje, continuar investigando esta e
outras redes de ensino que se proclamam inclusivas ou em processo, para que haja
contribuição com reflexões e análises a respeito da inclusão, a fim de que esta não
continue sendo praticada no Brasil apenas como parte da política da educação
especial.
Concluímos que para o processo de inclusão escolar é preciso que haja uma
transformação no sistema de ensino que venha a beneficiar toda e qualquer pessoa,
levando em conta a especificidade do sujeito e não mais a sua deficiência e
limitações.
Nossa intenção, portanto, ao realizar este estudo, foi também oferecer aos
responsáveis pela educação das pessoas com necessidades educacionais especiais
no Município de Manaus referências que sugerem um repensar crítico sobre a
mesma.
Assim, ao apontarmos novas direções, novos rumos e posições sobre a
inclusão, quisemos puxar e tecer novas redes e descobrir novas tramas de
conhecimento para aprimorar uma possibilidade de uma proposta inclusiva.
Sabendo que a finalização de toda a trama será sempre provisória, pois temos muito
ainda a discutir, embora tenhamos dado passos importantes na luta pelo
reconhecimento das vozes historicamente silenciadas e excluídas. Não há, portanto,
como nos posicionarmos de forma favorável ou contrária à inclusão escolar, pois as
experiências tanto podem ser bem como mal sucedidas, dependendo da perspectiva
da qual se olha os sujeitos implicados nesse processo.
212
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