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Um dos efeitos da relação de dependência mantida com o objeto primário incide
sobre as bases daquilo que se tornará a fantasia da cena primitiva, provocando
alterações em sua organização. Nesse contexto o sujeito passaria, então, a atribuir a si
mesmo um lugar nas fantasias originárias, principalmente naquelas que sustentam a
cena primitiva, quando deveria excluir-se e retomar a posição infantil de impotência. A
criança deveria normalmente se excluir da cena, não podendo se introduzir na relação
amorosa do casal parental, inscrevendo, então, a dupla proibição do incesto e do
parricídio. Trata-se de um vivido conflituoso, portador de dor e de excitação, mas que é
capaz de abrir a via da curiosidade, das representações consoladoras do auto-erotismo.
Como pontua Chabert (2006), já nos estados limites, o lugar ativo não é atribuído ao
outro, ele é ocupado pelo sujeito que, assim, passa a ocupar o lugar central no cenário
das fantasias incestuosas.
Propomos, assim, em harmonia com as idéias de Chabert (1999 b), que o sujeito
bulímico parece apresentar uma dificuldade em assumir uma posição de passividade, de
espectador diante da cena primitiva – cena que se encontra na base do Complexo de
Édipo – tomando para si o papel de “atividade”, no sentido de fantasisticamente se
situar na cena como sujeito afirmativo e participante “ativo”. A fantasística edípica,
dessa maneira, tende a se tornar desorganizada e desorganizadora.
O sujeito mantém, assim, uma ligação com a mãe e uma ligação com o pai, de
forma a desconsiderar a ligação entre os dois, estando sempre ligado a somente um
deles, nunca ficando só diante da relação dos dois. Isso faz com que a configuração
edípica seja marcada por uma separação singular: amor por um dos genitores e ódio
pelo outro. Os pais, nesse caso, seriam diferenciados segundo sua qualidade positiva ou
negativa, e não segundo a sua identidade sexual. Dessa forma a diferença entre os sexos
não seria considerada. A triangulação ficaria, portanto, prejudicada, uma vez que a
relação se estabeleceria entre o sujeito e dois objetos, que neste caso (amado/odiado)
são um o duplo inverso do outro, constituindo na verdade um único objeto, e assim uma
relação dual, uma relação de dependência. (Chabert, 1999).
O pai parece esquecido como objeto pulsional, apreendido como a mãe,
havendo, assim, uma negligência de seu papel como representante dos interditos. Dessa
forma ele dificilmente dará sentido ao desejo edípico, não se constituindo como pólo
identificatório. Para a criança falta, então, um terceiro simbólico. Nesse contexto o
processo de interiorização do interdito não se realiza de forma consistente, como ocorre,
por exemplo, nos casos de neurose. Isso impede a possibilidade de elaborar e recalcar a