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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
“Comunidades de professores” sob a ótica de
pesquisadores: análise de três casos típicos.
Silvia Gaia Zanetti
São Carlos
2008
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“Comunidades de professores” sob a ótica de
pesquisadores: análise de três casos típicos.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
“Comunidades de professores” sob a ótica de
pesquisadores: análise de três casos típicos.
Silvia Gaia Zanetti
Tese apresentada como requisito parcial à obtenção
do grau de Doutora em Educação, Curso de Pós-
Graduação em Educação, Universidade Federal de
São Carlos.
Orientadora: Prof. Dra. Maria da Graça Mizukami
São Carlos
2008
Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da
Biblioteca Comunitária/UFSCar
Z28cp
Zanetti, Silvia Gaia.
Comunidades de professores sob a ótica de
pesquisadores : análise de três casos típicos / Silvia Gaia
Zanetti. -- São Carlos : UFSCar, 2008.
200 f.
Tese (Doutorado) -- Universidade Federal de São Carlos,
2008.
1. Professores - formação. 2. Formação continuada.
3. Aprendizagem colaborativa. I. Título.
CDD: 370.71 (20
a
)
. - -.--
BANCA EXAMINADORA
Prof' I)(l Maria da Graça Nicoletti Mizukami
Prof' Dfl Mariná Holzmann Ribas
Prof' I)(l Myrtes Alonso
Prof' Dfl Aline Maria de Medeiros Rodrigues Reali
Prof' I)(l Regina Maria Simões Puccinelli Tancredi
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4
A três pessoas especiais
Meu marido, Sidnei Paulo Zanetti, e
Aos meus filhos, Paulo Henrique e Bruna, que foram meus
companheiros fiéis e incansáveis, propiciando-me segurança,
confiança, e momentos inesquecíveis de carinho e amor.
5
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais que sempre foram os maiores incentivadores do meu desenvolvimento
profissional e pessoal.
À minha orientadora, professora Doutora Maria da Graça Mizukami pela brilhante e
segura orientação do trabalho e pela amizade e confiança demonstrada.
Às professoras doutoras Suzanne Wilson, Universidade Estadual de Michigan – EUA e
Judith Warren Little, Universidade da Califórnia – EUA por receberem- -me e, tão
cordialmente, terem compartilhado experiências, conhecimento e horas de trabalho.
À Lee S. Shulman pela ajuda nos contatos com as professoras pesquisadoras e pela
sempre generosa acolhida.
Às professoras doutoras Sandra Crespo e Helen Featherstone da Universidade Estadual
de Michigan, e Pamela Grossman da Universidade de Stanford que gentilmente aceitaram
participar da pesquisa proposta disponibilizando-se a fornecer material, informações e
depoimentos.
Aos demais membros da minha família pela força e estímulo.
Às minhas colegas de doutorado pelas risadas e pelo apoio, em especial Ana Giust, Maria
Noemi Cesário, Marilene Cesário e Tércia Zavaglia.
6
RESUMO
“Comunidade” passou a ser um termo da “moda” no contexto educacional mundial. Surgiram
várias concepções, a saber: “Comunidades de Prática”, “Comunidades de Aprendizes”,
“Comunidades de Professores”, “Comunidades de Aprendizagem”, “Comunidades de
Aprendizagem Profissionais”. Essas concepções são, hoje, encontradas no universo das
pesquisas educacionais nos mais variados contextos e pressupostos. Antes de centrar a pesquisa
no objetivo proposto, fez-se necessário esclarecer e compreender mais profundamente as muitas
concepções de comunidades que são usadas hoje no campo educacional. A partir desse
esclarecimento, pode-se determinar que as “Comunidades de Professores” tornar-se-iam a
concepção de interesse para esse trabalho devido ao enfoque estar direcionado para a formação
contínua de professores. Nesta perspectiva e devido ao aspecto educacional desse trabalho,
procurou-se determinar a concepção de “Comunidades de Professores” dentro dos preceitos em
Educação. Atualmente, não há nenhuma formulação teórica de como uma comunidade deveria
supostamente funcionar dentro dos padrões educacionais. Não há critérios que permitam
distinguir entre uma comunidade de professores e um grupo de professores sentados numa sala
para um encontro. Sendo assim, ainda há pouca teoria para guiar uma tentativa de se criar
comunidade profissional, especialmente com professores. Nesse caminho, algumas concepções
parecem delinear um esforço de formação continuada em comunidades tendo a colaboração
como base para o processo ensino-aprendizagem. Diante das teorizações pertinentes, que elevam
e valorizam a criação de “Comunidades de Professores” como uma alternativa eficiente e de
sucesso para a formação continuada dos professores, propõe-se nessa pesquisa verificar, sob a
perspectiva dos envolvidos, como os orientadores/mediadores de projetos de pesquisa
colaborativa analisam processos de construção e consolidação dessas comunidades. Assim,
realizou-se uma pesquisa com abordagem qualitativa, em nível exploratório-descritivo,
utilizando a entrevista semi-estruturada para os orientadores/mediadores e análise de relatórios e
diário de campo dos projetos. O estudo envolveu três orientadoras/mediadoras, sendo duas do
Projeto Lucent para o Ensino da Matemática da Universidade Estadual de Michigan e uma, da
Universidade de Stanford. Ao analisar os dados coletados e os conceitos apreendidos, alguns dos
pressupostos básicos convalidaram-se como, por exemplo, a riqueza das “Comunidades de
Professores” como estratégia para a mudança e melhoria para os professores, para as instituições
e para todo contexto educacional.
PALAVRAS-CHAVE: Formação de professores, Comunidades de Professores, aprendizagem
colaborativa.
7
ABSTRACT
“Community” is one of the most up to date concepts in the educational context. There
are many conceptions such as: “Communities of Practice”, “Communities of Learners”,
“Communities of Teachers”, “Learning Communities”, “Professional Learning Communities”.
The conceptions presented coexist in the educational world. The language that emanates from
them is not mutually exclusive and they carry meanings that serve various purposes. The lines
among them are not perfectly drawn but general consensus can be established for each
community-based concept. After analysing each one of them, it was determined that
“Community of Teachers” would be the focused concept at this research as the central purpose
here is on service teacher education. Although there are many researches on “communities”,
there are no specific rules of how they should work, how to distinguish a “Community of
Teacher” from a group of teachers, how to stablish a professional community gathering teachers.
If communities are the solution to many issues involving the complex teaching and learning
process, conclusive answer, nobody has as we deal with a living science. But there are some
signs of promissing changes on the educational scenery. One of the most important feature of
a community-based programm is the ability of delineate an effort of on service teacher education
based on collaborative actions. Believing that community-based programms can make significant
contributions to teacher development, this research aims to analyse how researchers involved in
these programms as facilitators analyse the building and consolidation processes. In order to
understand better these kind of programms, a qualitative research was developed including three
facilitators and the analysis of project reports and papers written by the project coordinators.
Two of the cases studied here were from Michigan State University, part of the Lucent Project
for Math teaching, and one of them was from Stanford University. After analysing the collected
data, some evidences appeared reafirming that “Communities of Teachers” are potent strategy
for school, people and institutions change and improve.
KEY-WORDS: On service teacher education, “Communities of Teachers”, collaborative
learning process.
8
LISTA DE FIGURAS E QUADROS
TABELA 1. Os diversos conceitos de “comunidades” e suas
principais características................................................................................ 79
FIGURA 1. Um modelo integrado de capital social e comunidades de
aprendizagem profissionais............................................................................. 148
FIGURA 2. Modelo de interação e “comunidades de professores”.................................... 149
FIGURA 3. Modelo de formação de “Comunidades de Professores”................................ 160
9
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS E QUADROS...........................................................................................................8
CAPÍTULO I ..............................................................................................................................................19
EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES.................................................................................19
2. ACTIVE LEARNING – “APRENDIZAGEM ATIVA” ...................................................................24
3. AMBIENTES DE APRENDIZAGEM..............................................................................................26
3.1. Ambiente centrado no aluno ......................................................................................................27
3.2. Ambiente centrado no conhecimento..........................................................................................28
3.3. Ambiente centrado na avaliação .................................................................................................28
3.4. Ambientes centrados na comunidade..........................................................................................29
4. AVALIAÇÃO E FEEDBACK...........................................................................................................30
5. O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM E OS PROFESSORES..............................................31
6. PROFESSORES EXPERTS ...............................................................................................................33
7. O PROFISSIONAL PROFESSOR....................................................................................................38
7.1. Visão moral:................................................................................................................................38
7.2. Entendimento teórico:.................................................................................................................39
7.3. Habilidades práticas:...................................................................................................................40
7.4. Exercício do julgamento: ............................................................................................................41
7.5. Aprendizado pela experiência:....................................................................................................41
7.6. Comunidade profissional: ...........................................................................................................42
8. PROCESSO DE FORMAÇÃO ........................................................................................................43
9. FORMAÇÃO CONTÍNUA E AS NOVAS PRERROGATIVAS.....................................................50
10. A FORMAÇÃO E A PESQUISA....................................................................................................55
CAPÍTULO II.............................................................................................................................................62
10
COMUNIDADES E SUAS VERTENTES.................................................................................................62
1. O TERMO COMUNIDADE ..........................................................................................................62
2. CONCEITOS DE COMUNIDADES NA ÁREA EDUCACIONAL.............................................65
2.1. COMUNIDADES DE PRÁTICA...........................................................................................65
2.2. COMUNIDADES DE APRENDIZES .......................................................................................68
2.3. COMUNIDADES DE PROFESSORES.................................................................................71
2.4. COMUNIDADES PROFISSIONAIS.....................................................................................75
2.5. COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM ............................................................................77
2.6. COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM PROFISSIONAIS ..............................................78
3. COMUNIDADES DE PROFESSORES E O CONFLITO SÓCIO-COGNITIVO ........................82
4. AS COMUNIDADES E O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM ........................................85
5. TENSÃO ESSENCIAL DAS COMUNIDADES DE PROFESSORES............................................88
CAPÍTULO III............................................................................................................................................90
ANÁLISE DE TRÊS CASOS TÍPICOS DE COMUNIDADES DE PROFESSORES .............................90
1. CASOS MÚLTIPLOS ....................................................................................................................92
1.1. ESCOLHA DOS CASOS .......................................................................................................94
1.2. FONTES DE COLETA DE DADO............................................................................................95
1.3. TRIANGULAÇÃO.....................................................................................................................96
2. ESTUDO PROPOSTO ...................................................................................................................99
3. PORTRAYALS DO CASO 1 e DO CASO 2...............................................................................101
3.1. Determinando a Nomenclatura: ............................................................................................104
3.2. A função de cada participante no contexto do Projeto..........................................................104
3.3. Metolodologia dos Grupos de Estudo:..................................................................................105
3.4. Primeiro Ano do Projeto: ..........................................................................................................107
3.5. Segundo Ano do Projeto:......................................................................................................115
3.6. Terceiro Ano do Projeto:.......................................................................................................123
3.7. CONCLUSÕES GERAIS APONTADAS AO FINAL DO PROJETO................................129
4. PORTRAYAL DO CASO 3 .........................................................................................................133
4.1. Fundamentação teórica .........................................................................................................134
4.2. Dificuldades ..........................................................................................................................134
4.3. Recrutamento dos participantes: ...........................................................................................134
4.4. Primeiro Ano do Projeto:......................................................................................................135
4.5. Dezoito meses seguintes do Projeto:.....................................................................................138
11
4.6. CONCLUSÕES GERAIS APONTADAS AO FINAL DO PROJETO................................141
CAPÍTULO IV..........................................................................................................................................143
COMUNIDADES DE PROFESSORES:..................................................................................................143
UMA PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA ..........................................................................143
1. Grupo de Estudo x Comunidades..................................................................................................146
2. PSEUDO-COMUNIDADES ........................................................................................................157
3. A DIVERSIDADE E AS COMUNIDADES DE PROFESSORES..............................................162
4. AS COMUNIDADES E O PAPEL DOS ORIENTADORES/MEDIADORES...........................164
5. DIFICULDADES PARA “COMUNIDADES DE PROFESSORES”..........................................169
CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................................................178
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................................................185
DEWEY, J. Democracy and education. New York: Macmillan,1916......................................................187
HORD, S.M. Professional learning communities: what are they and why are they important? SEDL,
vol. 6, n1. ..............................................................................................................................................188
SCHNEIDER, Barbara. Building a scientific community: the need for replication. 2004......................190
APÊNDICES.............................................................................................................................................194
APÊNDICE A – Roteiro de Entrevista Caso 1.........................................................................................195
APÊNDICE B – Roteiro de Entrevista Caso 2 .........................................................................................197
APÊNDICE C – Roteiro de Entrevista Caso 3 .........................................................................................199
12
INTRODUÇÃO
Durante a pesquisa de dissertação de mestrado (GAIA, 2003), surpreendemo-nos ao
verificar que os professores participantes reconheciam as suas próprias necessidades e
demonstravam vontade de aprender com os colegas, compartilhando experiências práticas,
descobrindo novos caminhos, participando de atividades de formação contínua. Além disso,
esses professores sinalizaram carências ligadas diretamente à constituição de suas Bases de
Conhecimento, diferenciando-se das reclamações mais comuns ligadas à situação do sistema
educacional brasileiro.
Diante dos resultados encontrados e à luz das teorizações de Shulman, concluímos,
naquela época, que o conhecimento do professor está voltado para os contextos em que é
utilizado. Por isso, a idéia de aprender pela experiência, pela auto-monitoração e pelo
intercâmbio entre colegas através de uma comunidade de professores que comunguem do mesmo
ideal e estejam dispostos a mudar pareceu-nos como uma nova maneira de se proporcionar
formação continuada aos professores.
O processo das comunidades é caracterizado pela reflexão, atividade e colaboração e
requer certa comunhão de cultura escolar e comunitária que forneça a estrutura necessária para o
seu desenvolvimento. Apesar dos altos níveis de risco de imprevisibilidade para todos os
participantes e do trabalho árduo e complexo, Shulman(1998) apresenta a “Comunidade de
Professores”como um meio de os professores terem a chance de aprofundar-se sobre o conteúdo
específico, dividindo, compartilhando e aprendendo não só através da reflexão de seu próprio
trabalho, mas também com o trabalho de seus colegas.
13
Pareceu-nos então que “Comunidade de Professores” apresentava-se como uma proposta
de formação contínua. O interesse de investigar tal concepção mais a fundo, levou-nos a
elaborar um projeto de pesquisa de doutorado.
A fim de tentar compreender melhor a razão que transformou “Comunidade de
Professores” num termo tão em voga na área educacional, buscamos entender melhor os
caminhos da Educação. Dois comitês americanos, Comission on Behavioral and Social Sciences
e Education of the National Research Council
1
, elaboraram um relatório publicado com o título
“How people learn”(1999). Nesse trabalho, encontramos as conclusões que esses comitês
obtiveram ao elaborar uma análise crítica entre descobertas feitas pela pesquisa educacional e a
prática atual nas salas de aula, apontando caminhos reveladores. Em mais de trezentas páginas,
os membros do comitê sinalizam para relações inovadoras entre os aprendizes e o processo de
aprendizagem, os professores e o ensino, e as direções futuras para uma Ciência Educacional.
Sendo assim, apresentamos no nosso primeiro capítulo, EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE
PROFESSORES, as concepções trabalhadas no livro citado, pois ele fundamenta as bases de
“Comunidades de Professores”.
Ao encararmos os professores como profissionais do conhecimento, vemos no professor,
um profissional cuja ação sempre acaba recaindo numa palavra complexa por si só, abrangente e
muito significativa: conhecimento.
As pesquisas na área educacional avançam a passos largos percorrendo diversos
momentos que levaram da escola tradicional para a escola nova, e esperando chegar na prática na
escola do novo século marcada por ações, transformações, progresso e desenvolvimento,
garantindo ao ensino uma interação simultânea e alternativa do conhecimento.
Pesquisas e estudos são realizados anualmente no mundo todo proporcionando melhor
entendimento de como as pessoas aprendem dentro e fora da escola, como elas conhecem o
mundo, quais os melhores ambientes educacionais, qual a importância do conhecimento prévio,
entre outros. Além disso, a epistemologia, apresentando-se como teoria do conhecimento por
excelência e como análise privilegiada do ato de conhecer, firmou-se no campo das ciências.
1
Comissão das Ciências Sociais e Comportamental e Conselho de Pesquisa Nacional de Educação.
14
“A escola está desafiada a mudar a lógica da construção do conhecimento, pois a
aprendizagem agora ocupa toda a nossa vida” (GADOTTI, 2000, p.9).
Quando o professor passa a visualizar, vivenciar o processo ensino-aprendizagem a partir
da visão do aprendiz, como um aprendiz, ele passa a ter uma visão mais ampliada das questões
que envolvem tal processo. Criam-se verdadeiras práxis educacionais entre idéias e
experiências, prática com reflexão e pesquisa, ajudando os professores a ultrapassar seus
próprios limites respeitando as perspectivas de seus alunos. Sendo assim, exige-se, atualmente,
que esse profissional realize seu trabalho num nível de complexidade tamanho que o professor
deixou seu posto de educador para atingir a situação de educador-aprendiz.
“Uma boa instituição de ensino deve ser tão educativa para seus professores quanto é para
seus alunos, criando as mesmas condições para ambos.” (SHULMAN, 1997, p.32)
O relatório aponta que o professor enquanto aprendiz deve ser um agente ativo no
processo, um agente participante, pois vem aos programas não só com conhecimento prévio de
mundo, mas também de sua prática, de suas necessidades, crenças ou noções errôneas que
subjetivamente interferem na sua prática. Necessitam, portanto, desenvolver a habilidade de
examinar essas crenças, confrontá-las com o conhecimento pedagógico geral e gerar variações,
adaptações no decorrer de sua formação. Por isso, o aprendizado torna-se mais atrativo através
dos experimentos e da investigação, do diálogo e do questionamento, na busca do
amadurecimento profissional, o caminho da expertise.
Ser profissional significa ser mais do que alguém que faz bem alguma coisa ou ganha
muito dinheiro fazendo algo, significa estar fornecendo um serviço absolutamente indispensável.
As novas perspectivas do profissional professor tornam-se prerrogativas do processo
ensino-aprendizagem. Por isso, o professor precisa de uma comunidade profissional para
monitorar qualidade e conhecimento agregado. Criar uma comunidade de pessoas
comprometidas, a fim de que possam responsavelmente servir às necessidades sociais. E é
através dos processos de formação que o professor propõe-se a estudar, a aprender e a
desenvolver a sua base de conhecimento, conseqüentemente, sua competência profissional.
15
Perante tais prerrogativas, vislumbra-se hoje uma tendência de formação continuada que
procura destacar o professor enquanto um ser social psicológico, oferecendo atividades
cognitivas como oportunidades de desenvolver uma reflexão metacognitiva, dentro do seu
contexto, particular e específico, tentando evitar a solidão da sala de aula e derrubar as paredes
que separam o professor de iniciativas que resultem em mudanças de conceitos, posturas, e
atitudes. A pesquisa com professores identifica-se com a pesquisa colaborativa e promove a
melhora do desenvolvimento profissional por meio de oportunidades para a reflexão sobre a
prática, críticas partilhadas e mudanças apoiadas.
Diante desse quadro apresentado pelo relatório “How people learn” (2003), conseguimos
entender o quanto suas teorizações valorizam os passos apontados por tais pesquisadores e
estudiosos.
Após compreendermos melhor o significado de comunidades no contexto educacional,
partimos para o entendimento de “Comunidade de Professores”.
Assim, no segundo capítulo, COMUNIDADES E SUAS VERTENTES, tratamos da
concepção “comunidades” tentando esclarecer e determinar alguns parâmetros que norteiam essa
noção dentro do contexto educacional.
A partir de concepções de pesquisa colaborativa, surgem os conceitos de comunidades
enquanto oportunidade para professores e pesquisadores aprofundarem, compartilharem e
desenvolverem conhecimento através da reflexão do trabalho prático, da revisão teórica e da
comunhão de saberes. Há uma promoção de processos formativos enquanto ocorre a
investigação. Nesse processo, a colaboração deve incluir diálogo (CLARK et al, 1996),
planejamento, ensino, interação com alunos, e rotina burocrática partilhados, interação professor-
professor e professor-pesquisador (JOHN-STEINER, WEBER & MINNIS,1998). De acordo
com Dewey (1989), é de grande importância a reflexão dos professores sobre suas práticas bem
como a integração de suas observações às teorias de ensino e aprendizagem emergentes.
Os conceitos de comunidades no campo educacional variam efetivamente. Atualmente,
pode-se encontrar trabalhos e projetos que trabalham com a concepção de comunidades, mas
com diferentes denominações. Destacamos as “Comunidades de Prática”, “Comunidades de
Aprendizes”, “Comunidades de Professores”, “Comunidades de Aprendizagem”, “Comunidades
16
Profissionais” e “Comunidades de Aprendizagem Profissionais”. Diante desse leque de
concepções, sentimos a necessidade de entender mais aprofundadamente cada um desses termos
para que, enfim, pudéssemos confirmar que as “Comunidades de Professores” continuariam a ser
o enfoque central da pesquisa.
Uma comunidade pode oferecer uma oportunidade para observar, conhecer e refletir
sobre o processo ensino-aprendizagem. Um fator importante que a rotina das escolas quase
nunca propicia. Nas comunidades, o professor tem a chance de validar idéias ao ter que expor e
explicar seus pensamentos para um grupo. Essa é uma grande oportunidade de crescimento
profissional que propicia a exposição desses professores, que já têm experiência em sala de aula,
a vários conceitos e teorias, com o benefício de revisar questões pedagógicas e políticas. Essas
oportunidades tendem a fazer com que o professor seja mais receptivo à exploração teórica e ao
entendimento de sua relevância e valor para o processo ensino-aprendizagem.
As comunidades apresentam-se como microcosmos de coletivos sociais maiores cujo eixo
está na tensão entre os direitos e as responsabilidades do participante. Para uma comunidade ser
mantida, os participantes precisam exercitar a expressão honesta e sincera de suas idéias, sem
temer a censura ou o ridículo. Numa “Comunidade de Professores”, a responsabilidade está
ligada a aprendizagem a partir dos outros professores, contribuindo para com as discussões em
grupos, pressionando os colegas a explicitarem seus pensamentos, fortalecendo o crescimento
intelectual do grupo, clareando idéias, provendo oportunidades para um aprendizado coletivo.
(GROSSMAN et al, 2001).
Ao pensar numa comunidade enquanto formação continuada há de se delinear os
princípios e preceitos que devem reger essa prática. Entre tantos termos e conceitos, o de
“Comunidade de Professores” parece ser o que mais se aproxima das teorizações destacadas no
Capítulo I.
Ao propor a compreensão do fenômeno “Comunidade de Professores” dentro da área
educacional, buscamos entender esse fenômeno complexo, porém moderno e atual, a fim de
compreender melhor enquanto processo de formação continuada de professores, considerando o
que se sabe sobre processos colaborativos de aprendizagem de professores, base de
conhecimento, expertise, e demais questões relacionadas.
17
No terceiro capítulo, ANÁLISE DE TRÊS CASOS TÍPICOS DE “COMUNIDADES
DE PROFESSORES”, buscamos elucidar como profissionais envolvidos em projetos de
pesquisa colaborativa (leia-se pesquisadores/mediadores/orientadores) analisam processos
de construção e consolidação de “Comunidade de Professores”. Com tal objetivo em mente,
realizamos estudo com participantes de três grupos de pesquisa caracterizados como casos
típicos (STAKE, 2006). Ou seja, casos que iniciaram suas atividades de pesquisa com o
propósito explícito de construir e compreender melhor “Comunidades de Professores”.
Na busca de projetos de pesquisa típicos de comunidades de professores, grupos norte-
americanos destacaram-se. Dentre os projetos de pesquisa que envolvem as comunidades de
professores nos Estados Unidos, consideramos as conduzidas pelo grupo de pesquisadores
liderados por Pamela Grossman, Sandra Crespo e Helen Featherstone que desenvolveram
projetos de construção e consolidação de comunidades enquanto “Comunidades de Professores
contando com suporte financeiro das agências norte-americanas de fomento à pesquisa e que
possibilitaram acesso aos processos desenvolvidos, aos dados obtidos e aos relatórios científicos.
A compreensão de uma questão que envolve análise da percepção de sujeitos, os atores
sociais, é apreendida, nesse estudo, por meio de uma investigação de natureza qualitativa, tendo
dentre os inúmeros caminhos que a pesquisa de natureza qualitativa pode seguir, optou-se pelo
estudo de casos múltiplos (STAKE, 2006), cada um deles constituído por uma “Comunidade de
Professores”.
Num estudo de casos múltiplos, o primeiro passo é descobrir o que cada caso,
individualmente, faz ou fez – sua atividade, sua função e funcionalidade, analisando relatórios
elaborados pelos participantes, entrevistar envolvidos, etc.
Após cada finalização de portrayal (um retrato de cada caso), as entrevistas com as
orientadoras/mediadoras dos casos eram realizadas.
Ao verificar as respostas obtidas e dos dados obtidos através da pesquisa realizada, vimos
a importância da reflexão sobre as COMUNIDADES DE PROFESSORES: UMA
PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA, no quarto capítulo. Onde procuramos
identificar e analisar momentos de constituição, desenvolvimento, consolidação e de tomada de
decisão das comunidades, discutir a forma como os processos de negociação entre os
18
participantes acontece, analisar ocorrências de conflitos entre os participantes, entre as lideranças
constituídas e emergentes, observando como se caracterizam e, finalmente, detectar possíveis
impactos nas práticas pedagógicas, sob a ótica dos sujeitos.
19
CAPÍTULO I
EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Após a Conferência de Massachusetts, há mais de 40 anos atrás, Jerome Bruner(1960)
escreveu no seu clássico, “The Process of Education”- O Processo de Educação - as conclusões
que os educadores chegaram naquele momento: era necessário um novo investimento no
desenvolvimento de currículos e um maior esforço no desenvolvimento da ciência da
aprendizagem.
Até então, vingava uma concepção de que o problema da educação seria solucionado
simplesmente pela resolução dos problemas de aprendizagem que se aplicavam aos diversos e
diferentes métodos divulgados. Hoje, porém, entende-se que há uma diferença entre
compreender os problemas do ensino e os problemas de aprendizagem. Essa diferença fica mais
evidente a partir do momento que se compreende a diferença entre saber para si e saber a fim de
poder ensinar esse conhecimento a alguém. Reconhecendo a complexidade desses dois
20
processos que acabam delineando a fina distinção entre aprendizagem e ensino, pode-se
estabelecer que uma completa separação seria inviável, uma vez que a ação e o pensamento
constituem duas faces de um mesmo processo.
Pesquisas e estudos são realizados anualmente no mundo todo, conferindo avanços
relevantes: melhor entendimento sobre o processo de aprendizagem das pessoas tanto dentro
quanto fora da escola, como elas conhecem o mundo, quais os melhores ambientes educacionais,
qual a importância do conhecimento prévio, entre outros. Além disso, fazendo corpo com a
filosofia e a psicologia, a epistemologia vem validando as novas tecnologias que surgiram ao
decorrer dos anos e hoje são valiosas ferramentas que contribuem para a Educação,
configurando-se contribuição imprescindível para a realização de um re-enquadramento
científico com a dimensão que a renovação exige.
Quanto maiores os avanços da ciência, maior a consciência das limitações do Homem e
da dificuldade em controlar os avanços obrigando a fazer opções de mudança, o que implica que
se tenha consciência dos fundamentos teóricos e dos valores que orientam essa mudança.
Deste modo, a educação está diretamente ligada às alterações profundas que sofreram e
sofrem as sociedades modernas: por um lado, mudanças no plano científico e tecnológico,
demográfico e econômico, sócio-cultural e político; e, por outro, mudanças a um nível filosófico
que passam pelo emergir de uma nova visão do Homem e da sociedade.
“Compreende-se, portanto, que a educação não se reduz simplesmente à transmissão e
à assimilação disciplinar de informações especializadas. Pois, o processo educativo
consiste basicamente na criação e no desenvolvimento de contextos educativos.
Contextos em que as pessoas em relação ativam as interações entre seus respectivos
contextos culturais”
(FLEURI, 2001).
A educação é um objeto de pesquisa inacessível ao conhecimento absoluto, é um objeto
em construção, pois quanto mais se conhece sobre os seus processos tanto maiores são as
possibilidades de reconhecer que não há como constituir uma verdade absoluta, terminada.
O ser humano não é uma máquina projetada para receber informações e reproduzi-las
quando requisitadas. Trata-se de um sistema complexo não só quanto à aquisição de um
conhecimento através de um conjunto de processo mentais, como: atenção, percepção, memória,
21
raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e discurso, como também do mecanismo que utiliza
para captar, utilizar e transferir tal conhecimento.
Embora a teoria de Piaget (Teoria Construtivista) tenha enfatizado os aspectos individuais
no desenvolvimento cognitivo, as interações sociais foram reconhecidas e incorporadas a partir
do momento que interferem e afetam o desenvolvimento cognitivo individual ( Teoria Sócio-
Construtivista).
Um dos objetivos postos para a educação é o de educar homens que sejam capazes de
fazer coisas novas, não simplesmente de repetir o que outras gerações fizeram – homens que
sejam criativos, inventivos e descobridores; pela formação de mentes críticas que possam
verificar, checar antes de aceitar o que lhes é oferecido. Para isso, o homem precisa fugir dos
slogans, das opiniões coletivas, tendências de pensamentos já feitas. Surge a necessidade de se
resistir individualmente, de criticar, de distinguir entre o que está provado e o que não está. Por
isso, espera-se que os aprendizes alcancem o entendimento de que é necessário também
descobrir por si próprios, por iniciativas próprias, espontâneas, a partir do material
disponibilizado na escola, da vivência do dia-a-dia, para que possam detectar o quê é resultado
de uma primeira e imatura idéia e o quê é consistente.
“Construir conhecimento novo no marco de uma teoria científica é algo muito diferente
de aplicar um dogma, é realizar um trabalho crítico permanente para detectar lacunas ou
contradições, é apoiar-se no saber já elaborado para penetrar em domínios inexplorados”
(LERNER, 1998, p.110).
O relatório “How people learn” (Como as pessoas aprendem, 1999, tradução nossa)
apresenta uma visão extremamente crítica e importante para a área educacional. Ao aprofundar
em questões que envolvem o aprendiz e o processo de aprendizagem, o professor e o processo de
ensino, o relatório apresenta uma perspectiva cognitivista/construtivista, onde o conhecimento
está ligado a um mecanismo de assimilação intelectual que estabelece uma rede, cada vez mais
densa, de coordenações entre os esquemas que a definem e se aplicam. Em termos de
inteligência refletida, essa assimilação passa a significar dedução que se organiza e aplica a uma
experiência ora concebida ora extrínseca. “A assimilação e acomodação são aspectos
22
permanentes do trabalho de inteligência, vale dizer que estão presentes em todos os estágios de
desenvolvimento intelectual”, afirma RICHMOND (1981, p.128).
A experiência autêntica e a construção dedutiva ao se ajustarem determinam o
pensamento do sujeito assegurando o meio propício para a elaboração da razão. Por conseguinte,
observa-se que o pensamento reproduz o processo de evolução da inteligência sensório-motora e
da estrutura do universo prático inicial. O desenvolvimento da razão, esboçado no nível
sensório-motor, segue os mesmos padrões levando-se em conta a vida social e a reflexão.
À medida que a inteligência se desenvolve, os processos cognitivos passam a incluir mais
formas abstratas de representação.
“Cada passo à frente no desenvolvimento intelectual exige a aplicação do que já é
compreendido ao que não é compreendido, seguido por um ato de ajustamento no qual o
conhecido é modificado pelo desconhecido. A aplicação de experiência passada ao
presente é assimilação. O ajuste dessa experiência pra levar em conta o presente é
acomodação. A concordância entre esses dois atos é expressa em inteligência adaptada.
Todavia, pode-se ver que cada passo à frente só pode ocorrer com uma perda de
equilíbrio,e,por isso, o desenvolvimento intelectual é um processo de restabelecimento de
equilíbrio perturbado entre assimilação e acomodação”
( RICHMOND, 1981, p.129).
Todas as experiências novas precisam estar relacionadas com experiências que o aprendiz
já compreenda, isto é, toda aprendizagem nova precisa estar embasada num conhecimento já
adquirido. Assim uma experiência passa a ser significativa a partir do momento que é
assimilada.
Ao conscientizar-se dessas necessidades do desenvolvimento intelectual, espera-se que o
aprendiz comece a refletir sobre como faz as coisas, sobre como aprende. A metacognição traz
uma visão de que as estratégias metacognitivas potencializam a aprendizagem, desenvolvendo
um papel importante no entendimento de como lidar com a informação recebida juntamente com
o pensamento. Estudos (Brown,1978, Flavell & Wellman,1977, Bereiter &
Scardamalia,1989,etc) demonstram que o conhecimento prévio é determinante da performance
do aprendiz principalmente quando inclui conhecimento sobre aprendizado, auto-conhecimento
fraquezas e potencialidades, auto-regulamentação – planejamento, monitoramento, correção de
erros quando necessários. A metacognição também refere-se à habilidade de refletir sobre a
23
própria performance. Assim, o aprendiz, mais do que nunca, é percebido como co-protagonista
do processo ensino-aprendizagem.
“A educação, no século XX, tornou-se permanente e social. É verdade, existem ainda
muitos desníveis entre regiões e países, entre o Norte e o Sul, entre países periféricos e
hegemônicos, entre países globalizadores e globalizados. Entretanto, há idéias
universalmente difundidas, entre elas a de que não há idade para se educar, de que a
educação se estende pela vida e que ela não é neutra”(
GADOTTI, 2000, p.4).
O relatório “How people learn” (1999) apresenta três aspectos que são destacados,
principalmente, devido ao suporte científico que os embasam e a forte influência que têm sobre o
processo ensino-aprendizagem:
a) Hoje em dia, não se pode mais entender os aprendizes como um quadro
branco, preparado para ser preenchido. Eles chegam às instituições
educacionais possuindo pré-concepções do mundo. Se essa realidade for
ignorada, corre-se o risco de que as novas concepções e informações não se
tornem um aprendizado de fato, podendo tornar-se matéria de prova a ser
decorada e esquecida;
b) A fim de desenvolver competência numa determinada área do conhecimento,
os aprendizes devem ter uma base fortalecida do conhecimento prévio,
entender fatos e idéias no contexto determinado e conseguir organizar o
conhecimento de forma a facilitar sua aplicação;
c) Uma tendência metacognitiva pode auxiliar o aprendiz a ter o controle de seu
próprio aprendizado através da definição de objetivos e monitoramento de seu
progresso.
Assim, alguns aspectos do processo ensino-aprendizagem ficam evidentes. Entre eles, a
necessidade de os professores centrarem o processo ensino-aprendizagem no aluno, trabalhando
a partir do seu conhecimento prévio, estando atento às habilidades e atitudes que os alunos
trazem com eles. Além disso, a importância de se ensinar cada conteúdo em profundidade,
24
fornecendo exemplos a fim de fortalecer o conhecimento trabalhado, prestando atenção no quê,
como e o porquê de se estar ensinando tal conteúdo, com clareza quanto às competências a serem
atingidas. As habilidades metacognitivas ao serem integradas ao currículo numa variedade de
áreas de conhecimento permitiriam ao aluno otimizar o desenvolvimento do pensamento formal
a partir do informal, assegurando um aprendizado mais duradouro. E, finalmente, deve-se
lembrar que o conhecimento deve estar voltado para o contexto em que é utilizado, sendo que a
tendência de um ensino centrado na comunidade que está reunida para aprender requer a
determinação de normas dentro do ambiente onde ocorre aprendizagem assim como precisa
estabelecer conexões com o mundo a fim de fortalecer os valores do aprendizado. Compreender
o processo de aprender e transferir um conhecimento é essencial para entender como as pessoas
desenvolvem importantes competências. Os educadores esperam que seus alunos sejam capazes
de transferir o que aprenderam de um problema para outro, de um ano escolar para o próximo, da
escola para casa e da escola para o local de trabalho. Para tanto, um dos objetivos da educação
deveria ser o de tornar cada aprendiz num expert
2
para a vida.
2. ACTIVE LEARNING – “APRENDIZAGEM ATIVA”
As contribuições das pesquisas enfatizam a importância de ajudar as pessoas a assumirem
seu próprio aprendizado, a reconhecerem quando compreendem ou não um assunto e precisam
mais informações a respeito. Quando o sujeito não tem essa percepção, ocorre uma compreensão
ilusória. Ou seja, se o sujeito não é capaz de confrontar teorias com suas crenças intuitivas e
enraizadas, ele dificilmente poderá desenvolver o processo de consolidação de conhecimentos ou
mudanças de conceitos que geralmente são dificilmente negociadas e dão início a um processo
emocional e cognitivo. Os caminhos pelos quais as crenças deixam de existir são aqueles que
surgem a partir do momento que as bases racionais tomam conta das decisões (BACON, 1962).
Essas bases racionais estão intimamente ligadas à metacognição que procura tornar
características como a reflexão e a interação uma constante. O pensamento ativo, aquele que
conta com o comprometimento do aprendiz, pode ser considerado o grande aliado da
aprendizagem na luta contra a compreensão ilusória. Isto quer dizer que, ao aprender um
2
Hábeis, versados, conhecedores.
25
conteúdo, o aprendiz participa de maneira ativa sobre o que sabe e como sabe isso, contribuindo
sobre maneira para que não ocorra uma falsa percepção do aprendizado.
Assim, ao fornecer conhecimento que melhora significativamente a habilidade das
pessoas em tornarem-se aprendizes ativos (aqueles que procuram entender assuntos complexos e
são bem preparados para transferir o que aprenderam para novos problemas e situações), o
processo ensino-aprendizagem passa a reforçar a necessidade de se repensar no quê se está
ensinando, como é ensinado e como tal conhecimento é apreendido.
A educação tradicional tinha uma tendência de enfatizar a memorização e domínio de
textos. Porém, ao procurar desenvolver expertise
3
, se requer conhecimento bem organizado de
concepções, conceitos, princípios e procedimentos de questionamento. “Pesquisas sobre
expertise sugerem a importância de dar aos alunos experiência de aprendizagem que
especificamente eleve suas habilidades em reconhecer padrões significativos de informação
4
(DONOVAN et al, 2003, p. 36, tradução nossa).
Propostas de novas tendências de ensino convidam os alunos para uma variedade de
atividades diferenciadas para a construção da base de conhecimento com domínio de conteúdo.
Tais tendências envolvem tanto um conjunto de fatos como de princípios. Ao estar consciente
dos conhecimentos que possui, o aprendiz pode tornar-se um solucionador de problemas
independente e cuidadoso ao utilizar suas idéias para explorar seus próprios conhecimentos a fim
de desenvolver estratégias e discuti-las com os outros para checar se funcionam ou não.
Percorrendo esse caminho indicado pela ciência da educação, os alunos têm mais chances
de ultrapassar as noções errôneas que, muitas vezes, estão profundamente enraizadas e que
acabam interferindo no aprendizado, especialmente aquelas que foram firmadas pela vivência
pessoal do aluno. Em algumas tendências, essas noções errôneas são tidas como ponto de partida
do processo ensino-aprendizagem, pois a partir da contestação das crenças, os alunos encontram-
se mais capazes de desenvolver formas de resolver idéias conflitantes. Além disso, a discussão
3
Expertise trata muito mais do que um conjunto de habilidades gerais para resolução de problemas ou memória.
São fatores necessários para que se atinja um entendimento mais profundo e completo. De acordo com MILLER
&ROSE, expertise trata-se da “autoridade social atribuída a determinados agentes e formas de julgamento com base
no fato de alegarem terem o conhecimento de verdades especializadas e poderes extraordinários” (apud PARAÍSO,
2005, p.176).
4
“Research on expertise suggests the importance of providing students with learning experiences that specifically
enhance their abilities to recognize meaningful patterns of information”
26
sobre as possíveis crenças pode levar à construção de conhecimentos mais amplos e coerentes
com as novas concepções científicas. Quando isso acontece, dá-se uma grande colaboração à
ciência da educação. Pois, ao serem questionados sobre conceitos científicos, os alunos
despertam para aquelas noções que não dão conta do conhecimento real. Nesse processo, o
aluno acaba demonstrando o que realmente sabe e o que não sabe.
“Acima de tudo, a própria ciência de aprendizagem está começando a fornecer
conhecimento a fim de melhorar significantemente as habilidades das pessoas para que
estas possam se tornar aprendizes ativos, capazes de entender a complexa questão do
conteúdo e transferir o quê aprenderam em novas problematizações e em outros
contextos
5
” (DONOVAN et al, 2003, p. 13, tradução nossa).
Ou seja, há hoje uma nítida importância dada ao se repensar o quê é ensinado, como é
ensinado e, finalmente, como a aprendizagem ocorre. Essa reflexão sobre o processo ensino-
aprendizagem, enfatizando a questão de como as pessoas aprendem, resulta da não valorização
de um estudo profundo sobre técnicas de ensino, e parte para um conjunto de princípios que
envolvem a aprendizagem. Ao enfocar o processo de aprendizagem, professores e alunos têm
mais oportunidades de desenvolver habilidades baseadas numa base sólida de conhecimento que
ajudarão a entender porque, quando e como os conhecimentos prévios tornam-se relevantes e
suporte para novas situações.
3. AMBIENTES DE APRENDIZAGEM
Além dessas concepções sobre a aprendizagem, o relatório aponta importantes questões
sobre o design dos ambientes de aprendizagem. Questões que sugerem o valor de se repensar o
quê está sendo ensinado, como está sendo ensinado e como é apreendido e avaliado.
“A expressão ‘ambientes de aprendizagem’ é utilizada, principalmente, em projetos
educacionais fundamentados em uma concepção holística ou integrada, que visa à
5
“Overall, the new science of learning is beginning to provide knowledge to improve significantly people’s abilities
to become active learners who seek to understand complex subject matter and are better prepared to transfer what
they have learned to new problems and settings”.
27
educação do ser humano em todas as suas dimensões. Nesse caso, o ambiente de
aprendizagem serve para designar o conjunto de condições externas, incluindo a
totalidade de estratégias, metodologias e recursos colocados em disponibilidade para o
indivíduo, além do clima relacional, que influenciam e favorecem seu
desenvolvimento” (SEBRAE apud CARÊS, 2004, p.11).
O estudo dos ambientes e seu design procuram favorecer as experiências educacionais,
desconstruindo algumas concepções e incorporando propostas construtivistas/interacionistas
como modelos da aquisição de conhecimento.
Quatro perspectivas sobre o design dos ambientes de aprendizagem – centrado no aluno,
no conhecimento, na avaliação, e na comunidade – são apontadas pelo relatório (DONOVAN et
al, 2003).
3.1. Ambiente centrado no aluno
O ambiente centrado no aluno refere-se a um processo ensino-aprendizagem que
potencializa o conhecimento, as habilidades, as atitudes e crenças que os alunos trazem consigo.
Inclui, ainda, as práticas de ensino que buscam suscitar no aluno a capacidade de racionalizar os
problemas utilizando-se do conhecimento prévio, de discutir concepções e de provocar
discussões para que os alunos possam retomar ou redefinir idéias.
Quando o ambiente é centrado no aluno, ele é consistente com a visão de que os
aprendizes usam seu conhecimento prévio para construir um novo conhecimento, e o quê os
alunos sabem e acreditam no momento da aprendizagem acaba afetando a maneira como eles
interpretam as novas informações. Assim, um aprendizado eficiente deve começar a partir da
base de conhecimento dos alunos, o quê eles trazem para o ambiente de aprendizagem incluindo
suas práticas culturais e crenças e, principalmente, o conhecimento de conteúdo acadêmico.
No ambiente centrado no aluno, deixa-se que o aluno, por si só, trabalhe seu conteúdo
prévio e construa um novo conhecimento. Porém, sabe-se que “a habilidade dos experts” de
pensar e resolver problemas não se deve única e exclusivamente a um conjunto genérico de
“habilidades de pensamento” ou estratégias, mas, ao contrário, requer conhecimento bem
28
organizado que dê consistência ao planejamento e ao pensamento estratégico”
6
(DONOVAN et
al, 2003, p.136, tradução nossa).
3.2. Ambiente centrado no conhecimento
A perspectiva de ambiente centrado no conhecimento busca, essencialmente, a
necessidade de ajudar os alunos a se tornarem cientes e capazes por meio de um aprendizado que
busca entendimento e transferência de conhecimentos como conseqüência do processo ensino-
aprendizagem. Além disso, procura-se enfatizar as informações e as atividades que ajudem os
alunos a desenvolverem uma compreensão maior das disciplinas, ao invés de meramente decorar
dados tidos como importantes. Essa perspectiva preocupa-se em ajudar os alunos a tornarem-se
metacognitivos, que procuram compreender as novas informações utilizando-se de todos os
recursos possíveis, aprendem como fazer uso desses recursos ao conduzirem suas atividades, na
busca pela produtividade. Como toda perspectiva, a centrada no conhecimento tem o desafio de
encontrar o equilíbrio entre as atividades desenhadas a fim de promoverem entendimento e
aquelas desenhadas para promover a automatização do uso das habilidades necessárias para
tornarem-se efetivas.
3.3. Ambiente centrado na avaliação
As questões relacionadas à avaliação também representam uma importante perspectiva
quando se fala em ambientes de aprendizagem. Ressalta-se aqui a necessidade de se garantir o
feedback. Nem sempre os alunos têm oportunidades de receber dentro da sala de aula o feedback
de novas informações. Os professores devem cuidar para que as avaliações feitas durante e
depois da aula consigam vislumbrar os objetivos do processo ensino-aprendizagem, fugindo da
memorização mecânica de fato e fórmulas, objetivando melhorar o conhecimento.
6
“(...) the ability of experts to think and solve problems is not simply due to a generic set of “thinking skills” or
strategies but, instead, requires well-organized bodies of knowledge that support planning an strategic thinking.”
29
3.4. Ambientes centrados na comunidade
A quarta perspectiva envolve a conexão do ambiente de aprendizagem com as suas
comunidades: comunidade da sala de aula, comunidade escolar, as conexões entre a escola e a
comunidade.
Uma análise dos ambientes sob essa perspectiva inclui a preocupação entre a escola e a
comunidade na qual está inserida, visando à utilização dos conhecimentos apreendidos dentro da
escola e fora dela. É importante as escolas desenvolverem meios de ligar o processo ensino-
aprendizagem que ocorre dentro da sala de aula com os outros aspectos da vida do aprendiz. Um
ambiente-chave para o aprendizado é a família, pois trata de um sistema de interação que torna
significativa a exploração das relações interpessoais e das normas que regulam a vida. Além
disso, a família enquanto sistema aberto em interação com outros sistemas (escola, bairro,
comunidade profissional, etc.) representa o contexto no qual o indivíduo, o aluno, está inserido.
Na relação escola-família, os papéis devem ser respeitados, pois enquanto a família é
responsável pelo início do desenvolvimento educacional e social do indivíduo, a escola precisa
dar a esse indivíduo o respaldo para continuar tal desenvolvimento (DONOVAN et al, 2003).
Apesar de terem sido apresentadas individualmente, as perspectivas devem estar
alinhadas, pois todas têm potencial para se entrelaçarem e influenciarem mutuamente. Esse
alinhamento apresenta-se fundamental a fim de garantir a aceleração do processo ensino-
aprendizagem tanto dentro como fora das escolas.
Desenhar ambientes eficientes de aprendizagem inclui considerar os objetivos do
processo ensino-aprendizagem assim como os objetivos para os alunos. Esta comparação
destaca o fato de que há várias maneiras para se alcançar os objetivos determinados para a
aprendizagem e para as mudanças dos alunos ao longo do tempo. Os objetivos e propósitos têm
mudado com o avanço das pesquisas sobre aprendizagem eficiente e as ferramentas que os
alunos utilizam. Dada às mudanças da população de alunos, as ferramentas tecnológicas, as
demandas postas pela sociedade, um novo currículo emergiu juntamente com a aparição das
necessidades para novas tendências pedagógicas que sejam mais centradas no aluno e mais
sensíveis às questões culturais, tudo isso com o objetivo de promover um aprendizado eficiente.
O requisito para os professores encontrarem tamanha diversidade de desafios também ilustra a
30
razão pela qual a avaliação precisa ser uma ferramenta para ajudar os professores a determinarem
se eles conseguiram ou não atingir seus objetivos. A avaliação pode levar os professores a
delinear melhor o ensino a partir do aprendizado das necessidades individuais de aprendizagem
dos alunos e, ao mesmo tempo, informar os pais sobre o progresso dos estudantes.
O alinhamento entre as quatro perspectivas de ambientes educacionais deve existir, pois
todas apresentam potencial para mutuamente influenciarem-se. Sendo que a avaliação e o
feedback podem representar importante perspectivas determinadas pelo ambiente de ensino.
4. AVALIAÇÃO E FEEDBACK
Avaliação e feedback são cruciais para ajudar as pessoas a aprenderem quando estão de
acordo com os princípios de aprendizagem e entendimento que se vislumbra atualmente. Tanto
um quanto outro devem buscar uma boa instrução enquanto ensino, acontecer continuadamente
como parte do processo de ensino e fornecer informações aos professores, alunos e pais sobre os
níveis de conhecimento que os alunos alcançam.
O processo de avaliação deveria refletir a qualidade do pensamento do aluno assim como
o que especificamente ele sabe sobre o conteúdo. Para esse propósito, a avaliação deve
considerar as teorias cognitivas de performance. Frameworks que integram a cognição e o
contexto em avaliar conquistas científicas, por exemplo, descrevem a performance em termos do
conteúdo e processo considerando a natureza e extensão das atividades cognitivas observadas.
Os frameworks fornecem uma base para examinar o desempenho desenhado para avaliar razão,
entendimento e resolução de problemas complexos.
A natureza e os propósitos de uma avaliação, também, influenciam as atividades
cognitivas específicas que são expressas pelo estudante. Algumas tarefas de avaliação
enfatizam uma performance particular, tais como explanação, mas não enfatizam outras como
auto-monitoramento. O tipo e a qualidade das atividades cognitivas observadas numa avaliação
são funções das demandas de conteúdo e processo das tarefas envolvidas. Em atividades não
específicas, direções explícitas são minimizadas a fim de observar como os alunos generalizam e
dão cabo das habilidades apropriadas de resolução de problemas. Em termos de competência e
31
de demandas de conteúdo, deve-se buscar especificamente a profundidade de conhecimento e o
nível de raciocínio dos aprendizes. Assim, fica passível de avaliação o quanto o conteúdo
específico está conectado aos processos cognitivos destacados e à performance dos objetivos que
o professor tem em mente. Com objetivos articulados e um entendimento da correlação entre as
características das tarefas e as atividades cognitivas, as demandas de conteúdo e processo das
tarefas são alinhadas com aquilo que se era esperado da performance, tornando-se um feedback
relevante para o processo ensino-aprendizagem.
5. O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM E OS PROFESSORES
Os objetivos e as expectativas sobre a escolarização mudaram dramaticamente nas
últimas décadas. As novas tendências sugerem a necessidade de se repensar o processo ensino-
aprendizagem em sua totalidade: como os alunos aprendem e como devem ser avaliados, como
se dá uma aprendizagem efetiva e ativa, quais perspectivas de ambientes educacionais devem
ser consideradas, qual a base de conhecimento que a escola está construindo juntamente com
seus alunos, quanto os alunos já sabem e quais são esses conhecimentos prévios que os
aprendizes trazem para a sala de aula, qual a importância de se evidenciar as crenças e/ou
compreensões ilusórias do verdadeiro e profundo conhecimento, etc.
Dentre todos esses aspectos, um dos pontos mais relevantes apontado no relatório “How
people learn” (1999) é a concepção de que os professores são aprendizes e como tal devem
percorrer os aspectos considerados na aprendizagem em todo e qualquer processo de formação.
Quando o professor passa a visualizar, vivenciar o processo ensino-aprendizagem a partir
da visão do aprendiz, como um aprendiz, ele passa a ter uma visão mais ampliada das questões
que envolvem tal processo. Criam-se verdadeiras práxis educacionais entre idéias e
experiências, prática com reflexão e pesquisa, ajudando os professores a ultrapassar seus
próprios limites respeitando as perspectivas de seus alunos.
32
“Embora inúmeros fatores contribuam para a aprendizagem do aluno, novas pesquisas
identificam os professores como o fator mais importante para a melhora dos resultados dos
alunos
7
”(BOYD et al, 2005, p.156, tradução nossa).
As teorizações têm apontado o professor como o elemento central no processo ensino-
aprendizagem. Exige-se, atualmente, que esse profissional realize seu trabalho num nível de
complexidade tamanho que o professor deixou seu posto de educador para atingir a situação de
educador-aprendiz. Pois, ao terminar seu processo de formação inicial, o professor encontra, na
prática, situações divergentes que não lhe foram repassadas na Universidade, durante o curso de
formação.
Normalmente, os professores não vão buscar respostas nos referenciais teóricos
trabalhados na formação e acabam recorrendo à reflexão baseada em seu conhecimento teórico
prévio, mas também em suas crenças. Dificilmente, esses professores recorrem aos seus pares
em busca de soluções. A solidão da sala de aula é uma constante e até uma forma de proteção.
Quase sempre, os professores têm dificuldades em admitir falta de conhecimento, pois temem
tornarem-se vulneráveis frente aos colegas e administradores. Além disso, os professores estão
mais acostumados com situações que estão sempre no controle, frente a seus alunos. Assim,
“ajudar os professores a tornarem-se confortáveis com o papel de aprendizes é muito importante,
bem como dar oportunidades para que eles tornem-se experts em seu conteúdo”
8
(DONOVAN et
al, 2003, p.195, tradução nossa).
É evidente que somente o estudo de conteúdo e técnicas não é capaz de desenvolver uma
prática reflexiva competente, pois trabalhar atitudes passa a ser tão importante quanto trabalhar
conhecimentos.
“Se os professores devem preparar um grupo cada vez mais diverso de alunos para um
mundo do trabalho cada vez mais desafiador – para estruturar problemas, encontrar,
sintetizar e integrar informações; criar novas soluções; aprender por conta própria; e
trabalhar cooperativamente – esses alunos irão precisar substancialmente de mais
conhecimento e habilidades radicalmente diferentes que a maioria têm agora e a
7
“Although a number of factors contribute to student achievement, new research identifies teachers as one of the
most important contributors to improved the students outcomes”.
8
“Helping teachers become comfortable with the role o learner is very important. Providing them with access to
subject-matter expertise is also extremely important”.
33
maioria das escolas de educação desenvolve agora”
9
(NATIONAL, 1999, p.190,
tradução nossa).
De acordo com esse novo contexto, exige-se do professor muito mais do que o domínio
dos conteúdos de sua disciplina e das teorias pedagógicas, pede-se que esse professor conviva
num ambiente em constante mutação: mudam-se conceitos, idéias, teorias, e até conteúdos.
Além disso, espera-se que, esse mesmo professor seja capaz de lidar com a constante construção
de um conhecimento que já não é mais simplesmente conteúdo e técnica, trata-se de um
entendimento político, cultural, ético e social. Nesse momento, as atitudes tomam uma
importância igual ou até maior do que os conteúdos.
Nessa perspectiva moderna, não se permite pensar que professores sejam vistos como
trabalhadores cuja função seja a de desempenhar as diretivas traçadas por seus superiores, leia-se
direção e coordenação, que eram tidos como experts dentro da escola. Agora, espera-se que eles
mesmos, os professores, sejam os experts.
6. PROFESSORES EXPERTS
O professor enquanto aprendiz deve ser um agente ativo no processo, participante, pois
vem aos programas não só com conhecimento prévio de mundo, mas também de sua prática, de
suas necessidades. Vem ainda acompanhado de suas crenças ou noções errôneas que
subjetivamente interferem na sua prática porque influenciam tanto no que eles escolhem para
ensinar quanto na maneira que eles decidem fazê-lo. Assim como os alunos precisam aprender a
confrontar suas noções errôneas de conhecimento, os professores necessitam desenvolver a
habilidade de examinar essas crenças, confrontá-las com o conhecimento pedagógico geral e
transformá-las em variações, adaptações no decorrer de sua formação. Por isso, o aprendizado
torna-se mais atrativo através dos experimentos e da investigação, do diálogo e do
questionamento. Ao desenvolver pensamento reflexivo que permite pensamentos e ações de seu
9
If the teachers are to prepare an ever more diverse group of students for much more challenging work – for framing
problems, finding integrating and synthesizing information; creating new solutions; learning on their own; and
working cooperatively – they will need substantially more knowledge and radically different skills than most now
have and most schools of education now develop.
34
próprio eu, que explique o como e o porquê seu pensamento chegou a tal ponto, o professor
encontra na formação o caminho de amadurecimento profissional, o caminho da expertise.
“Ensinar em busca de solução de problemas, inovações e aplicação de conhecimento
requerem dos professores um conhecimento profundo e flexível do conteúdo a fim de
que os professores compreendam como representar idéias de maneira consistente para
organizar um processo de aprendizagem produtivo para alunos que apresentam
diferentes níveis e tipos de conhecimento prévio, avaliando como e o quê eles estão
aprendendo, além de procurar adaptar a instrução, o ensino, às diferente tendências de
aprendizagem
10
( DARLING-HAMMOND, 2000, p.167, tradução nossa).
Em todas as discussões que se vê o desejo de melhorar a performance dos alunos,
aumenta a demanda por professores de alta qualidade como resultado obrigatório das mudanças
demográficas e de algumas iniciativas políticas tais como redução do número de alunos em sala
de aula, instauração da aula preparo, etc.
Professores experts conhecem a estrutura do conhecimento de suas disciplinas. Este
conhecimento dá a eles guias cognitivos para ajudar nas tarefas que passam a seus alunos,
buscando seus progressos e as perguntas que utilizam para dar vida às suas aulas. Professores
experts são sensíveis aos aspectos do conteúdo que são especialmente difíceis e fáceis para os
alunos: eles sabem das barreiras conceituais que atrapalham o aprendizado, assim eles cuidam
para que os seus alunos não gerem noções errôneas. Desta forma, tanto o conhecimento prévio
do aluno quanto a base do conhecimento do conteúdo do professor tornam-se componentes
críticos do crescimento dos aprendizes. Domínio do conteúdo requer conhecimento bem
organizado de conceitos e procedimentos de questionamento. Tanto conhecimento do conteúdo
quanto conhecimento pedagógico são importantes para o professor expert porque o domínio de
conhecimento tem estruturas únicas e métodos que se associam a elas.
Na concepção de Shulman (1987, 1988), o bom ensino recai na capacidade do professor
em conhecer profundamente o que está ensinando e transformar esse conhecimento em formas
10
“Teaching for problem solving, invention, and application of knowledge requires teachers with deep and flexible
knowledge of subject matter who understand how to represent ideas in powerful ways can organize a productive
learning process for students who start with different levels and kinds of prior knowledge, assess how and what
students are learning, and adapt instruction to different learning approaches”
35
de atuação que sejam pedagogicamente eficazes e adaptáveis às variações de habilidades e de
repertórios apresentados pelos alunos.
Perguntas sobre o quê e quanto um professor deve saber permanecem sem solução, mas
uma constatação é certa: os professores precisam possuir uma base de conhecimento sobre a qual
será construída sua competência. Destacam-se, assim, as considerações de Shulman sobre a base
de conhecimento.
"Por base de conhecimento entende-se o conjunto de compreensões, conhecimentos,
habilidades e disposições necessários para atuação efetiva em situações específicas de
ensino e aprendizagem. Entre os fundamentos dessa base têm-se os diferentes tipos de
conhecimento que apóiam a tomada de decisões dos professores" ( SHULMAN in
MIZUKAMI, 2002 , pg. 67
, tradução nossa).
Um dos primeiros conhecimentos destacado por Shulman é o Conhecimento do Conteúdo
Específico que se refere aos assuntos da disciplina, às informações de fato, princípios
organizacionais, concepções centrais. Por exemplo: um indivíduo que possui um conhecimento
de conteúdo de biologia sabe sobre RNA e DNA, sobre as teorias da evolução e hereditariedade,
sobre ecossistemas e sistema nervoso. Tem ainda habilidade para identificar, definir e discutir
estas concepções separadamente. Um indivíduo com conhecimento de conteúdo pode identificar
relações entre as concepções num determinado campo, como também as relações de concepções
externas à disciplina.
Claramente, o conhecimento do conteúdo é integral ao aprendizado. O professor precisa
conhecer o conteúdo de sua disciplina para poder ensinar.
A questão do conhecimento do conteúdo foi deixada de lado durante muito tempo, a não
ser por duas exceções: os cursos que apresentavam aos professores um material específico a
respeito de um assunto particular, e os cursos de métodos ou de currículo e instrução nos quais os
professores eram apresentados aos métodos para ensinar seus conteúdos. E assim, os professores
aprendiam como ensinar os assuntos através de métodos mas não aprendiam sobre as causas,
motivos, razões desses assuntos. Ou seja, não aprendiam o conteúdo em si. (SHULMAN, 1987).
36
A falta de conhecimento de conteúdo dos professores pode tanto afetar o estilo do ensino,
quanto o material a ser ensinado. Inseguros, eles preferem aulas expositivas a dar chances às
perguntas dos alunos que poderiam levá-los a um território desconhecido (CARLSEN apud
SHULMAN et al, 1989).
Contudo, de um professor é pedido muito mais do que simplesmente ter conhecimento de
conteúdo. Requer-se a habilidade de transformá-lo. Para isso, precisa-se de Conhecimento
Pedagógico Geral, que é o conhecimento de alunos e ensino, de currículo e contexto, de
objetivos e propósitos, conhecimento de pedagogia. O Conhecimento Pedagógico Geral
“transcende o domínio de uma área específica e inclui os conhecimentos de objetivos, metas e
propósitos educacionais; de ensino e aprendizagem; de manejo de classe e interação com os
alunos; e de estratégias instrucionais; de como os alunos aprendem; de outros conteúdos; de
conhecimento curricular”(SHULMAN apud MIZUKAMI, 2002, p.67). Influenciado tanto pelo
conteúdo específico da disciplina quanto pelo conhecimento pedagógico, o conhecimento em si
surge e cresce quando os professores transformam seu conhecimento de conteúdo específico,
tendo em vista os propósitos de ensino (SHULMAN, 1986, 1987). Esse seria o Conhecimento
Pedagógico do Conteúdo, que se resume em “como ensinar uma matéria”. Para tal, o professor
necessita aprender a ensinar para poder ensinar.
A relação entre o conhecimento e a prática do professor torna-se vital, questão que se
relaciona com o problema prática-teoria. Ao aprofundar essa relação, evidencia-se que o
conhecimento de conteúdo é importante, pois o planejamento do professor baseia-se
particularmente no que ele sabe, no que ele conhece do assunto. Influencia também na escolha
do tipo de aula (expositiva, trabalho em grupos, etc.), no texto e exercícios selecionados, e
especialmente na maneira como ele, o professor, interage com seus alunos. Mas o conhecimento
de conteúdo somente, não é suficiente. Pois saber matemática, por exemplo, não é a mesma
coisa que saber ensinar matemática a uma diversidade de alunos em contextos particulares. Os
professores precisam ir além do conhecimento de sua disciplina, precisam saber sobre os
objetivos de se ensinar tal disciplina, as diferentes filosofias que envolvem o ensino. Outro
ponto relevante é que o contexto importa, sim, para o conhecimento do professor, isso quer dizer
que o conhecimento do professor tanto modela como é modelado pelo contexto ao qual está
exposto, no contexto em qual é utilizado, praticado. (SHULMAN,1997).
37
O Conhecimento Pedagógico do Conteúdo
“[...] inclui uma compreensão do que significa ensinar um tópico particular assim como
o conhecimento dos princípios e técnicas requeridos para tal. Contextualizados por
uma conceituação de conteúdo específico do ensino, professores têm conhecimento
sobre como ensinar a matéria, como os alunos aprendem a matéria ( quais são as
dificuldades de aprendizagem relativas especificamente à matéria, quais são as
capacidades desenvolvimentistas dos estudantes para adquirir conceitos particulares,
quais são as concepções errôneas mais comuns), como matérias curriculares são
organizadas na área e como tópicos particulares são incluídos no currículo”
(WILSON, SHULMAN & RICHERT in MIZUKAMI, 1993, pg. 34 , tradução
nossa).
O professor expert tem consciência e constrói uma base de conhecimento sólida capaz de
perceber características e padrões significativos de informações passíveis de serem organizadas
de tal forma que refletem um profundo conhecimento pedagógico de seu conteúdo. Além disso,
o expert é capaz de recompor conceitos e importantes aspectos de seu domínio, com facilidade,
pois possui um conhecimento flexível, adaptável às mais diversas situações.
A base de conhecimento de um professor expert não se equivale a uma lista de fatos e
fórmulas, ao contrário, seu conhecimento está organizado em conceitos e idéias que guiam seu
pensamento reflexivo, científico, sobre os assuntos, os conteúdos (DONOVAN et al, 2003).
Similarmente, os estudos sobre ensino concluíram que para ser considerado um expert é
preciso mais que um conjunto de métodos genéricos que podem ser aplicados em todos os
conteúdos.
Os professores precisam ser experts” tanto no conhecimento do conteúdo quanto no
ensino;
a) Os professores precisam desenvolver entendimento das teorias de conhecimento
(epistemologia) que servem de guia para os conteúdos das disciplinas que cada um
trabalha;
b) Professores precisam desenvolver um entendimento de pedagogia como uma
disciplina intelectual que reflete teorias do processo ensino-aprendizagem, incluindo
conhecimento de como as crenças culturais e as características pessoais dos
aprendizes influenciam a aprendizagem;
c) Professores são aprendizes e os princípios de aprendizagem e transferência de
conhecimento concebidos para os alunos servem também para os professores;
38
d) Os professores precisam de oportunidades para aprender como se dá o
desenvolvimento cognitivo das crianças e o desenvolvimento do pensamento das
crianças(epistemologia infantil) a fim de conhecer como práticas de ensino são
construídas sob o conhecimento prévio do aprendiz.
O Professor precisa desenvolver modelos para seu próprio desenvolvimento profissional,
baseados num aprendizado contínuo, ao invés de estar focado num modelo de aprendizado
moderno, fragmentado, a fim de ter frameworks para guiar seu planejamento curricular
(DONOVAN et al, 2003).
Professores experts acessam sua própria eficiência com a dos seus alunos. Eles refletem
sobre como uma turma específica se porta diante das atividades e modifica os planos de ensino
de acordo. Pensar sobre o ensinar não é uma atividade abstrata, trata-se de uma atividade
disciplinada, sistemática que busca o desenvolvimento profissional. Através da reflexão e
avaliação da prática, tanto sozinho como com a colaboração de colegas críticos, os professores
desenvolvem maneiras de mudar e melhorar suas práticas, assim como qualquer oportunidade de
ensino com feedback.
7. O PROFISSIONAL PROFESSOR
Pode-se perceber um movimento de profissionalização do ensino e suas conseqüências
para a questão do conhecimento dos professores na busca de um repertório de conhecimentos,
visando a garantir a legitimidade da profissão, havendo a partir daí uma ampliação tanto
quantitativa, quanto qualitativa. (TARDIF, 2000).
Ser profissional significa ser mais do que alguém que faz bem alguma coisa ou ganha
muito dinheiro fazendo algo, significa estar fornecendo um serviço absolutamente indispensável.
Todas as profissões são caracterizadas pelos seguintes atributos:
7.1. Visão moral:
39
O interesse nos aspectos morais e de caráter das profissões está se renovando. Embora os
aspectos morais do profissionalismo tenham sido aprendidos e repassados por gerações, poucas
vezes eles são vistos como um item de enfoque do currículo profissional. Todo e qualquer
serviço deveria ser marcado pelo desenvolvimento do entendimento moral para guiar a prática do
profissional.
Uma profissão é sempre uma forma de prática altamente complexa e habilitada, na qual
os agentes tendem a seguir um conhecimento criado, testado, elaborado, refutado, transformado e
reconstituído pelas instituições tidas como as detentoras do “saber”: as universidades, os
laboratórios, a Academia. Porém, na educação, muitas vezes encontra-se uma ruptura entre a
teoria e a prática.
7.2. Entendimento teórico:
A idéia de que o conhecimento profissional é determinado pela Academia cria as
condições para o problema pedagógico essencial da educação profissional: a relação entre teoria
e prática. Raramente vê-se alguém duvidar do valor das experiências vividas pelos alunos em
formação, o quê se vê é uma dúvida constante sobre o valor do estudo teórico. " Todo estudo ou
conteúdos tem dois aspectos: um para o cientista como um cientista, o outro para o professor
como professor. Esses dois aspectos não são de nenhuma forma opostos ou conflitantes. Mas eles
não são imediatamente idênticos"(DEWEY,1983,p.285). Essa diferença fundamental entre o
domínio de um conteúdo necessário para ensinar e o domínio do conteúdo por si só marca a
fundamentação da base do conhecimento.
Enquanto os professores precisam saber sobre seus conteúdos em sobreposição ao
conhecimento dos alunos da disciplina, professores também precisam entender seu conteúdo de
forma a promover o ensino. Na verdade, professores e alunos têm diferentes objetivos. Alunos
criam um novo conhecimento na disciplina, enquanto os professores ajudam os alunos a
adquirirem conhecimento dentro de sua área. Professores experts não somente sabem seu
conteúdo, mas também sabem coisas a respeito dele que fazem o ensino efetivo possível. O
40
domínio do conteúdo dos experts inclui o conhecimento de concepções, conexões entre
diferentes procedimentos, etc. Esta definição sugere a natureza multidimensional do domínio de
conteúdo do professor e a íntima relação entre a própria concepção de conhecimento e habilidade
computacional e o conhecimento pedagógico do professor, incluindo conhecimento curricular e
conhecimento das dificuldades do aluno. Ainda, os experts exibiram uma estrutura de hierarquia
mais refinada, sugerindo a importância entre profundidade e organização do conteúdo ao ensinar.
Esse tipo de pesquisa sugere algumas características do domínio de conteúdo dos professores que
influenciam o ensino, pois afeta tanto o conteúdo como o processo de ensino, influenciando o
quê os professores ensinam e como eles ensinam. Enquanto os professores podem aprender mais
sobre o conteúdo ao preparar uma aula, eles necessariamente precisam de conhecimento prévio
adequado para uma boa indução de aprendizagem.
7.3. Habilidades práticas:
Comumente, uma vez que o profissional alcança o campo da prática, ele passa pelo
processo de desvalorização da preparação teórica. Destacam-se, então, características universais
da educação profissional: forte ênfase no serviço sem muito trabalho em sala de aula, preparação
teórica substancial com conexões incertas com a prática do dia-a-dia, e, finalmente, experiências
práticas formais através de uma variedade de experiências supervisionadas. O discurso que os
alunos escutam é que tudo o que foi aprendido até ali pouco vale, pois é na prática que o
profissional aprenderá de verdade.
Embora o conhecimento de uma profissão seja elaborado pelos pesquisadores dentro da
Academia, ele não se torna profissional a menos que seja legalizado em seu devido “campo de
ação”, ou seja, na prática. Segundo Shulman(1989), enquanto a teoria é o fundamento da prática,
a prática profissional em si é o fim para qual toda a prática é direcionada. A prática, ou seja, a
aplicação do “saber” no devido campo de estudo é um elemento universal do aprendizado
profissional, por isso, em toda a preparação profissional existe uma concepção de experiência
supervisionada.
41
A prática ao servir como um veículo maior para testar a validade e a eficácia da teoria,
tanto pelo aprendizado de uma profissão como pelo desenvolvimento de teorias mais gerais,
atinge ponto importante. Pois, a prática é um recurso significante da evidência no qual o
desenvolvimento de uma nova teoria pode ser baseado. Assim como a teoria é um recurso
significante de evidência no qual as experiências práticas vividas devem contrapostas,
verificadas. “Experiência por si só não é suficiente. É o raciocínio e ação subseqüente associada
com a experiência que determina seu valor no processo de aprendizagem
11
” (JOHNSTON, 1994,
p.207, tradução nossa).
7.4. Exercício do julgamento:
Shulman considera julgamento o conjunto de processos de raciocínio, intuição, decisão,
discernimento, que alguém utiliza quando precisa tomar a melhor decisão ou estimativa sobre o
quê virá a seguir. É o exercício do julgamento que todo aluno faz antes de passar da teoria para
prática, incorporando tanto os elementos técnicos como morais, negociando entre o geral e o
específico, entre o ideal e o plausível.
O ensino usa de protótipos, mas quando o aluno passa para a prática, inevitavelmente,
encontra, no mundo real, fatos que não se encaixam nesses protótipos. Na verdade, a
responsabilidade de desenvolver um profissional não recai simplesmente na aplicação imediata
do que foi aprendido, mas sim de transformar, adaptar, sintetizar, criticar e inventar para que
possa mover-se do conhecimento teórico e baseado na pesquisa para o tipo de conhecimento
prático necessário para o trabalho profissional. O julgamento é a marca do que o profissional
faz.
7.5. Aprendizado pela experiência:
11
“Experience alone is not enough. It is the thought and subsequent action associated with the experience which
determines its value in the learning process”.
42
Nem todas as experiências são significativas e educativas. Para tal, precisam ser
avaliadas conscientemente sabendo-se que o professor que passa por uma experiência é
influenciado por suas crenças, disposições, conceitos, presunções, e capacidades que trazem com
eles (DEWEY,1983).
Experiência é o que se tem quando se consegue ser pensativo, atencioso sobre as
conseqüências de uma colisão entre teoria e prática frente ao inesperado. A experiência é o
resultado do encontro entre uma situação incerta que leva a um ato de julgamento e,
conseqüentemente a uma ação e suas conseqüências. Sendo assim, o desafio mais formidável
para qualquer um não é aplicar o conhecimento teórico, mas sim aprender através da experiência,
afirma Shulman ( 1987, 1989).
Aprender através da experiência requer tanto o conhecimento sistemático, centrado em
protótipos, típico da Academia, como também daquele mais ativo, solto, resultado da prática. O
verdadeiro profissional precisa aprender a lidar com o imprevisível e a refletir sobre suas ações.
Ele incorpora as conseqüências de suas ações em seu crescimento de conhecimento, o qual inclui
combinações únicas de princípios teóricos, morais, práticos e uma coleção de aprendizados
ocorridos pela experiência.
7.6. Comunidade profissional:
As novas perspectivas do profissional professor tornam-se parte integrante do processo
ensino-aprendizagem. Por isso, o professor precisa de uma comunidade profissional para
monitorar qualidade e conhecimento agregado. Criar uma comunidade de pessoas
comprometidas, a fim de que possam responsavelmente servir às necessidades sociais, é
essencial para na consolidação de uma profissão. Assim, Shulman acredita que o professor deve
sentir-se, antes de tudo, um profissional. E como qualquer outro, ele deve identificar sua
profissão como um conjunto de circunstâncias de entendimento profundo, prática complexa,
conduta ética e aprendizado muito bem elaborado.
“Os professores são a chave para se melhorar o ensino nas escolas. Mas para que os
professores possam ensinar de uma forma consistente com as novas teorias de aprendizagem,
43
muitas oportunidades de aprendizagem especificamente para os professores são necessárias
12
(DONOVAN et al, 2003, p.203, tradução nossa).
Se o desejável são professores aprendizes, experts e profissionais, todo e qualquer
processo de formação profissional deve considerar certas perspectivas.
“O professor é elemento central no processo que pode tornar a mudança em realidade.
Por isso, precisa desenvolver uma grande capacidade de auto-formação. Organização
coletiva, como forma de encontrar respostas a essas questões, pode ser uma das
maneiras mais interessantes e dinâmicas de os professores ampliarem o seu arsenal de
conhecimento e as possibilidades de sucesso no seu trabalho pedagógico. No espaço
da escola, a troca de experiências entre os educadores pode ser um dos momentos mais
importantes na formação do professor”
(NÓVOA, 1992, p.121).
“A extensão e a qualidade da formação de professores está diretamente ligada à eficiência
dos professores, talvez muito mais agora que antigamente
13
” (DARLING-HAMMOND, 2000,
p.166, tradução nossa). Atualmente, há necessidade de uma nova visão em relação ao processo
de formação de professores. A partir do conhecimento de como as pessoas aprendem, não
somente as crianças e os alunos, mas o ser humano (ênfase na cognição, com aprendizagem
visando o aprendizado por uma compreensão profunda do ser humano como um todo). Os mais
significativos princípios a respeito de como as pessoas aprendem devem pavimentar o caminho
da formação dos professores, tanto no sentido de que esses possam compreender como funciona
o processo da aprendizagem para melhores resultados alcançar com seus alunos, como também
para os educadores de professores entenderem como seus aprendizes (os próprios professores)
melhor assimilam o processo ensino-aprendizagem.
8. PROCESSO DE FORMAÇÃO
12
“Teachers are key to enhancing learning in schools. In order to teach in a manner consistent with new theories of
learning, extensive learning opportunities for teachers are required”.
13
(...) the extent and quality of teacher education matter for teachers’ effectiveness, perhaps now
even more than before.
44
No final dos anos 70 e início da década de 1980, o processo de formação carregava a
“marca empresarial: preparação de recursos humanos para a educação dentro da ótica tecnicista
que imperava no pensamento oficial” (FREITAS, 2004, p.91).
Nos anos 80, há uma evolução do movimento de formação dos educadores na busca da
superação de algumas dicotomias: professores e especialistas, pedagogia e licenciaturas,
especialistas e generalistas. Nessa época, construiu-se a concepção de profissional de educação,
num luta clara contra a degradação da profissão da docência.
Na década de 90, a perspectiva da prática reflexiva, com ênfase na prática de sala de aula,
deu margem a certo detrimento do contexto como um todo. Houve uma preocupação excessiva
com a qualidade da instrução e do conteúdo.
Hoje em dia, a escola trabalha com um grupo cada vez mais diversificado de alunos, por
isso espera-se que os professores dêem conta dessa diversidade. A tendência geral é a de
preparar os professores para trabalharem efetivamente numa vasta diversidade de situações e
contextos. Programas que envolvem professores capazes de conduzirem seus próprios
questionamentos através de estudo de casos, pesquisa-ação, desenvolvimento de portifólios
estruturados a partir da prática. Defini-se como professor profissional aquele que aprende a
partir do ensino. O ponto da formação de professores é o de desenvolver a capacidade de
questionamento sistemático e sensitivo como parte do aprendizado e os efeitos do ensinar.
Diferentes modelos e designs deveriam ser desenvolvidos em busca do desenvolvimento
profissional como garantia da capacitação e expertise.
As pesquisas sobre formação de professores devem comprometer-se com o objetivo de
melhorar o processo de escolarização, especificando que a formação não se trata de um processo
generalizado.A pesquisa-ação como processo de formação pode levar à uma pesquisa
interessante, frutífera e significante com o potencial de potencializar teoria e prática. Ao passar
um tempo devotando-se à aprendizagem, à reflexão e ao feedback em sua prática como
professores, os professores podem passar a entender suas fraquezas, suas compreensões ilusórias,
quanto ao ensino. Resumidamente, nem sempre os professores têm consciência do que não
conhecem profundamente. Assim, um processo de formação que busque os caminhos ditos os
mais acessíveis pelas pesquisas terá mais chance de resultar em melhoras práticas na sala de aula.
45
O programa de formação deve procurar buscar a compreensão de que todo
comportamento que professores avaliam as situações que vivenciam através de suas próprias
lentes culturais que operam inconscientemente e passam a simbolizar a maneira como as coisas
são, simplesmente. A partir do momento que os professores conseguem desenvolver consciência
dessas perspectivas próprias, eles passam a entender a linha que separa as suas convicções das
convicções de seus aprendizes. Desenvolver tal habilidade passa a ser uma das principais tarefas
do processo de formação (DELPIT, 1995).
Aos professores devem ser dadas as melhores oportunidades para serem bem informados,
eficientes e que sirvam de inspiração para liderança em sala de aula. As mudanças de agenda
sobre formação de professores buscam estabelecer uma base de conhecimento mais sólida e a
profissionalização do trabalho dos professores. “Muitos educadores de professores aceitam e até
abraçam a idéia de que nós deveríamos ser capazes de demonstrar – com evidência sólida – que a
formação de professores tem efeitos positivos em como os professores ensinam e no quê e como
os alunos devem aprender
14
” (COCHRAN-SMITH, 2001, p. 263, tradução nossa).
Entendendo a complexidade do que se espera de um professor na nova conjuntura, é
preciso promover oportunidades de aprendizagem para os professores cujas prioridades sejam a
de apoiar a colaboração entre os professores, aumentar a comunicação e conexão, promover
networks, construir liderança, investir pesadamente em novas pedagogias, engajar a prática de
repensar as práticas pedagógicas de ensinar, aprender. Aprender a ser professor inclui não só um
processo de estudo teórico, mas também uma prática reflexiva competente.
“Em vez de receitas, o desafio está em pensar em uma formação integral, não limitada
à mera transferência de conteúdos, métodos e técnicas, mas, sim, orientada
fundamentalmente àquilo que se pede que os docentes alcancem com seus alunos:
aprender a pensar, a refletir criticamente, a identificar e resolver problemas, a
investigar, a aprender, a ensinar. Este seria, portanto, o significado dos termos
educação e formação, concebidos diferentemente de capacitação e treinamento”
(MIZUKAMI et al., 2002, p.42).
14
“Many teacher educators accept and even embrace the idea that we should be able to demonstrate – with solid
evidence – that teacher education has positive effects on how teachers teach and on what and how much students
learn.”
46
A maioria das reclamações expressas por professores que passam por programas de
formação continuada (GAIA, 2003) vem de encontro aos princípios decorridos. Pois,
freqüentemente, os programas de desenvolvimento profissional não estão centrados nos
professores; ao invés de perguntar aos docentes que tipo de ajuda eles precisam, os programas
determinam previamente temas, workshops e palestras. Muitas vezes, novas técnicas e métodos
são apresentados superficialmente, sem conexões das estruturas das atividades com o conteúdo
ou currículo que está sendo trabalhado. Outro ponto interessante é a expectativa de mudança da
prática do professor como único objetivo de tais programas, sendo que os mesmos negligenciam
a necessidade de desenvolver nos participantes a capacidade de julgar os efeitos positivos e
negativos dessas mudanças. E por fim, as atividades quase que, invariavelmente, são conduzidas
solitariamente: o professor e sua sala de aula. Não se fornece a oportunidade do professor
manter contato nem com colegas nem com os seus orientadores quando da prática das novas
técnicas ou métodos aprendidos, acaba se tornando um reforço à falta de se centrar o processo
ensino-aprendizagem num ato comunitário.
As vozes que demonstram pouca satisfação vêm dos próprios professores que esperam
redesenhar o processo de formação de professores com o intuito de fortalecer a base de
conhecimento, sua conexão tanto com a prática como a teoria, e sua capacidade de apoiar o
desenvolvimento de um ensino vitorioso.
E é através dos processos de formação que o professor propõe-se a estudar, a aprender e a
desenvolver a sua base de conhecimento, conseqüentemente, sua competência profissional.
Evidencia-se assim que “uma contribuição importante do processo de formação de
professores é o desenvolvimento das habilidades dos professores em examinar o ensino sob a
perspectiva dos aprendizes que trazem experiências e estruturas de referências para a sala de
aula
15
” (DARLING-HAMMOND, 2000, p.166, tradução nossa).
15
“An important contribution of teacher education is its development of teachers’ abilities to examine teaching from
the perspectives of learners who bring diverse experiences and frames of references to the classroom”.
47
Por isso, o aprendizado torna-se mais atrativo através dos experimentos e da investigação,
do diálogo e do questionamento. Ao desenvolver pensamento reflexivo, o professor desenvolve
pensamentos e ações de seu próprio eu, fortalecendo-o como profissional e expert.
“A formação de professores é a área de conhecimento, investigação e de propostas
teóricas que, no âmbito da didática e da organização escolar, estuda os processos
através dos quais os professores – em formação ou em exercício – se implicam
individualmente ou em equipe, em experiências de aprendizagem através das quais
adquirem ou melhoram os seus conhecimentos, competências e disposições, e que lhes
permite intervir profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, do currículo e da
escola, com o objetivo de melhorar a qualidade da educação que os alunos recebem”
(GARCIA, 1999, p.26).
Muitas vezes, os professores fecham a porta da sala de aula e experimentam uma solidão
pedagógica. Para muitos, os produtos do processo de ensino-aprendizagem não são passíveis de
troca, discussão, crítica e/ou construção. Na verdade, a responsabilidade de desenvolver um
profissional não recai simplesmente na aplicação imediata do que foi aprendido, mas sim na
capacidade de transformar, adaptar, sintetizar, criticar e inventar, para que haja a movimentação
do conhecimento teórico para o prático.
Da realidade encontrada, dos princípios descritos e suas implicações com o processo
ensino-aprendizagem, vê-se a necessidade de mudar o status do ensino de um processo
particular, resultado da solidão pedagógica, para um processo comunitário. Para que o Ensino
possa ser transformado (do particular para o público), três estratégias são sugeridas (DONOVAN
et al, 2003).:
A primeira é que o ensino precisa ser conectado com as disciplinas. Daí a
necessidade do professor possuir uma base de conhecimento sólida e expertise em
relação ao conteúdo que trabalha.
A segunda estratégia ilustra que se o processo ensino-aprendizagem deve ser de
propriedade comunitária, ele precisa ser visível através de artefatos que capturem
sua riqueza e complexidade. Esses artefatos são os produtos do processo de
ensino-aprendizagem e por isso são passíveis de troca, discussão, crítica e
construção. Assim, tem-se que fornecer algum tipo de documentação e
48
transformação para isso tornar-se possível. Shulman e colaboradores (1998)
propõem que os professores documentem seu trabalho e, como os demais
profissionais (por exemplo: arquitetos, engenheiros), tenham um portifólio de sua
vida profissional. Dessa forma, cada vez que um professor tiver que criar ou
organizar um programa de curso ou disciplina, ele estará engajando-se num ato
teórico. Assim, o portifólio passa a ser justamente o elo de ligação entre a
pedagogia e o conteúdo no processo ensino-aprendizagem. Ou seja, o portifólio
trata de idéias particulares de ensino, em uma área, para um determinado grupo de
alunos na sala de aula, mas que, posteriormente, podem vir a se tornar guia para
outro colega que, ao ler e analisar a prática do professor autor do portifólio, queira
adaptar as idéias. Para Shulman, um caso escrito pelo professor é um ato
supremo de reflexão, uma tentativa de capturar um pedaço extenso do seu ato de
ensinar e do aprendizado do aluno, pedaço esse que, ao ser transformado em texto
narrativo, poderá ser examinado, observado e analisado.
Se algo é uma propriedade comunitária e tem valor, isso significa que será
julgado, criticado. Dessa forma, a terceira estratégia estipula que o processo de
ensino-aprendizagem deve seguir os passos de qualquer pesquisa que é valorizada
pela Academia, e assim precisa de artefatos que devem ser criados e preservados
para que possam ser julgados pelas comunidades em geral. Ao elaborarem a
documentação de seu trabalho, após intensa reflexão, o professor deveria validar
seu portifólio contando com dois comentários de um colega ou de um aluno. Essa
prática tem o propósito de manter registros como resultado de um trabalho em
grupo. Os professores ao elaborarem a documentação de seu trabalho, após
intensa atividade de reflexão e colaboração, registrando avanços e idéias, novas
concepções podem e devem ser asseguradas, legitimadas e fomentadas dentro de
uma comunidade que valorize tais experiências e crie muitas oportunidades para
que o aprendizado aconteça com sucesso e prazer. Tais comunidades criam
estruturas participativas que reduzem a intensidade de trabalho necessário e levam
ao ensino-aprendizagem. (SHULMAN, 1998).
49
Além das estratégias, os próprios ambientes de aprendizagem ao serem confrontados com
o processo de formação de professores, demonstram alguns caminhos a seguir.
No ambiente centrado no aluno, vê-se uma tentativa de construir e fortalecer o
aprendizado através dos interesses e necessidades dos aprendizes. Um dos grandes problemas
dos métodos utilizados para a formação contínua dos professores: a maioria é delineada por
membros das Secretarias de Educação ou do Ministério da Educação, sem ao menos equivaler
professores das mesmas disciplinas ou das mesmas séries, não conseguindo assim, atingir as
necessidades dos professores. Aqui as diferenças não são benéficas, acabam sendo obstáculos
para o desenvolvimento profissional. Uma forma de lidar com essa questão seria reunir os
professores em grupos de interesse em tópicos ou projetos específicos. As novas tecnologias
acabam facilitando essas oportunidades a partir da internet, por exemplo.
Ao focar o ambiente centrado no conhecimento, especificamente visando um processo de
formação de professores, vê-se um ambiente que gera oportunidades para o professor aprender
incluindo um foco no conhecimento pedagógico do conteúdo (SHULMAN, 1986, 1987). Porém,
grande parte das tentativas de formação não consegue atingir esse objetivo, pois freqüentemente
trabalham a pedagogia geral, enfatizando métodos e técnicas, ao invés de trabalharem uma
pedagogia integrada com os diversos conteúdos das várias disciplinas. “Por exemplo, o
conhecimento ensinado por professores para professores e fornecido pelos consultores
normalmente não é embasado na pesquisa sobre o processo ensino-aprendizagem” (BARONE et
al., 1996). Assim, dificilmente os professores conseguem desenvolver um conhecimento
pedagógico do conteúdo que exige que o profissional consiga transformar seu conhecimento de
conteúdo específico tendo em vista os propósitos do ensino, contextualizado. Se já é difícil um
professor assumir a necessidade de repensar o quê sabe a respeito de seu conteúdo, pior aceitar
que não consegue utilizar seu repertório pedagógico para facilitar o aprendizado de seus alunos.
Assim, todo processo de formação deve procurar visar um processo de raciocínio pedagógico
claro que ajude o professor a usar seus conhecimentos em processos de ensino.
Ambientes que são centrados na avaliação fornecem oportunidades para os aprendizes
testarem o quê sabem e conhecem, tentando coisas novas e recebendo um retorno. Tais
oportunidades são importantes para o aprendizado do professor porque se ele quer testar novas
idéias, tem que experimentar com seus alunos e ver o que acontece. O retorno vem dos alunos
50
que nem sempre contribuem espontaneamente e sinceramente com o processo de feedback. Ideal
seria se o professor pudesse implementar novas idéias com a colaboração de seus colegas,
obtendo resposta e contribuições deles a respeito dos erros e acertos.
Esses ambientes alinhados são tidos como de aprendizagem colaborativa que buscam a
produção coletiva dos conhecimentos, resultado da interação do grupo. Através da negociação e
colaboração, a dinâmica do ambiente torna-se flexível e propício para relacionamentos e
construções significativas (CARÊS, 2004).
Para que formação de professores e programas de desenvolvimento profissional estejam
alinhados com os princípios do ensino, eles precisam preparar os professores para pensar sobre o
ensino como uma construção na base de conhecimento existente e os pré-conceitos de seus
alunos, a fim de ensinar habilidades para planejar e trabalhar com entendimentos já existentes,e
continuadamente avaliar o progresso dos alunos na busca do objetivo de entendimento profundo,
enraizado, reflexivo. Os programas precisam fornecer para seus alunos a oportunidade de
desenvolver a reflexão por conta própria facilitando aos aprendizes o processo de transferência
de conhecimento para as áreas correlatas. Esses programas precisam preparar os professores a
ficarem cientes das habilidades metacognitivas e como utilizá-las no processo de ensino. Eles
ainda precisam transportar o modelo de professor para o de aprendiz que continuadamente
desenvolve expertise, que é flexível, que se adapta. Estas são implicações que as instituições e
os programas formadores de desenvolvimento profissional deveriam priorizar.
9. FORMAÇÃO CONTÍNUA E AS NOVAS PRERROGATIVAS
Antes de analisar o processo de formação em si, há de se fazer um retrospecto sobre os
termos e as concepções em torno das iniciativas de educação do professor após o término do
curso de formação inicial.
Na década de 1980, o termo reciclagem adotado pelo meio educacional levou à
“proposição e a implementação de cursos rápidos e descontextualizados, somados a palestras e
encontros esporádicos que tomam parcelas muito reduzidas do amplo universo que envolve o
ensino, abordando-o de forma superficial” (MARIN, 1995, p.12).
51
O treinamento enquanto sinônimo de apto, capaz de determinada tarefa, e a capacitação,
tornar capaz, habilitar, foram e continuam sendo usados no processo educacional. Apesar da
possibilidade de uso esporádico, como para suprir uma necessidade relativa ao aperfeiçoamento
de certas habilidades, o termo não engloba, por exemplo, um processo de formação que vise
educar e ampliar os horizontes de qualquer professor.
Apesar de possuir um significado mais próximo do desejável, o termo aperfeiçoamento
também encontra algumas barreiras, pois evoca a condição de completar ou acabar o que estava
incompleto, adquirir maior grau de instrução, tornar perfeito ou mais perfeito, emendar os
próprios defeitos, definições encontradas no Dicionário Aurélio. Novas noções são importantes,
mas não o suficiente.
Finalmente, os termos formação continuada, educação permanente e educação continuada
“podem ser colocados no mesmo bloco, pois há similaridade entre eles, na medida em que se
manifestam a partir de outro eixo para a formação de professores, para a pesquisa em educação,
para os compromissos institucionais educacionais e dos profissionais que atuam em todas essas
áreas” (MARIN, 1995, p.17). Essa concepção inclui o aspecto de processo prolongado e
contínuo, por toda a vida, que surge das necessidades apresentadas por seus participantes, sem
interrupções, como parte do cotidiano, no local de trabalho, “uma verdadeira prática social de
educação mobilizadora de todas as possibilidades e de todos os saberes profissionais”. (MARIN,
1995, p.18).
“A formação contínua constitui processo privilegiado de interface das instituições
formadoras com o profissional em exercício, permitindo o tratamento dos aspectos
teóricos epistemológicos da formação em articulação com seus problemas concretos,
valorizando os processos de produção de conhecimentos construídos no trabalho
docente, pelo envolvimento com a investigação e a pesquisa no campo da educação e
sua área específica” (FREITAS, 2004, p.112)
.
Assim, muitas vezes, o processo de formação docente não poderia chamado de processo
de formação continuada, pois acontece por meio de workshops esporádicos, enfatizando assuntos
descontextualizados, e, freqüentemente, estão longe das necessidades percebidas pelos
professores.
52
Trabalhos sobre formação continuada têm demonstrado as dificuldades de mudança nas
concepções e práticas educacionais desses profissionais em seu cotidiano escolar. Isso ocorre
porque, na maioria das vezes, o planejamento do processo consiste na oferta de informações,
conteúdos, técnicas e métodos como meios de se conquistar mudanças no modo de pensar e agir
que deveriam refletir na sala de aula.
“As limitações dessa concepção têm sido tratadas pela pesquisa e literatura em
psicologia social, que chamam a atenção para o fato de que esses profissionais
são pessoas integradas a grupos sociais de referência nos quais se gestam
concepções de educação, de modos de ser, que se constituem em representações e
valores que filtram os conhecimentos que lhes chegam. Os conhecimentos
adquirem sentido ou não, são aceitos ou não, incorporados ou não, em função de
complexos processos não apenas cognitivos, mas, sócio-afetivo e culturais”
(GATTI, 2003, p.192).
Ao considerar os professores como seres essencialmente intelectuais, tais programas
acabam não atingindo suas metas porque não consegue articular mudanças cognitivas sem a
compreensão de que “sua centralização apenas nos aspectos cognitivos individuais esbarra nas
representações sociais e na cultura de grupos”(GATTI, 2003, p.192). Dessa visão simplista,
ocorrem as questões que demandam de processo sem bons resultados de formação, acabam se
tornando treinamentos, capacitações e/ou aperfeiçoamentos, mas não formação continuada, pois
não corroboram a concepção sociopsicológica
16
de que o professor é um ser humano envolvido
em relação sociais, culturais além de comportamentais e conceituais. Programas de educação
continuada devem considerar as condições sociopsicológicas além das cognitivas a fim de
garantir um processo formativo capaz de articular mudanças efetivas no dia-a-dia do professor.
Os Princípios e Diretrizes divulgados pelo Ministério da Educação definiram questões
norteadoras do processo de formação continuada:
A formação continuada é exigência da atividade profissional no mundo
atual;
16
Para mais informações sobre psicologia social, consultar DUBAR, 2000; SCHIBE,1995; LÁSZLÓ, ROGERS,
2002; GUARESCHI, JOVCHELOVITCH, 1995.
53
A formação continuada deve ter como referência a prática docente e o
conhecimento teórico;
A formação continuada vai além da oferta de cursos de atualização ou
treinamento;
A formação para ser continuada deve integrar-se no dia-a-dia da escola;
A formação continuada é componente essencial da profissionalização
docente.
Nos Referenciais para formação de professores da Secretaria de Educação Fundamental
(1999), a formação continuada é tida como
...necessidade intrínseca para os profissionais da educação escolar e faz parte de um
processo permanente de desenvolvimento profissional que deve ser assegurado a todos.
A formação continuada deve propiciar atualizações, aprofundamento das temáticas
educacionais e apoiar-se numa reflexão sobre a prática educativa, promovendo um
processo constante de auto-avaliação que oriente a construção contínua de
competências profissionais. Porém, um processo de reflexão exige predisposição a um
questionamento crítico da intervenção educativa e uma análise da prática na
perspectiva de seus pressupostos. Isso supõe que a formação continuada estenda-se às
capacidades e atitudes e problematize os valores e as concepções de cada professor e
da equipe.
A perspectiva de formação continuada que aqui se propõe está intimamente ligada à
existência dos projetos educativos nas escolas de educação básica (de educação
infantil, ensino fundamental, educação de jovens e adultos) e pode acontecer tanto no
trabalho sistemático dentro da escola quanto fora dela, mas sempre com repercussão
em suas atividades. A formação continuada feita na própria escola acontece na
reflexão compartilhada com toda a equipe, nas tomadas de decisão, na criação de
grupos de estudo, na supervisão e orientação pedagógica, na assessoria de profissionais
especialmente contratados, etc. Outras formas, tais como programas desenvolvidos
com várias escolas, intercâmbios, cursos, palestras, seminários, são importantes meios
de atualização, de troca e de ampliação do universo cultural e profissional das equipes.
Entretanto, não devem perder de vista a ligação com as questões e demandas dos
professores sobre seu trabalho.
As secretarias de educação têm papel fundamental na organização e promoção da
formação continuada, uma vez que são elas que possibilitam acompanhamento
sistemático às equipes escolares, fixam as diretrizes gerais do trabalho, promovem
assessorias, eventos de atualização e programas de formação. Mas é decisivo o papel
formador do trabalho cotidiano das equipes técnicas junto às escolas, seja como
dinamizadoras ou orientadoras, para manter viva a discussão dos projetos educativos,
para avaliar o trabalho dos educadores, fazer chegar às escolas materiais e propostas
inovadoras. É esse trabalho contínuo dos técnicos que possibilita o conhecimento da
realidade das escolas e permite que os programas de formação continuada sejam
significativos e orientados pelas demandas das escolas e por uma análise de suas
questões.
54
É muito importante verificar que as leis que regem o sistema educacional do Brasil tratem
continuamente desta formação continuada com um discurso que ventila a necessidade de
continuar a formação docente, não como um ajuste da formação inicial, mas como uma
continuidade de vida. Porém, em todas essas falas não se concretizam meios e orçamentos que
garantam atingir o vislumbrado. Pior ainda, esses referenciais designam aos técnicos das
Secretarias de Educação, o papel das equipes técnicas que são as “orientadoras”,
“dinamizadoras”, dos programas de formação continuada que chegam às escolas. Se a falta da
participação dos professores na concepção e orientação do processo de formação continuada é
uma das questões priorizadas pelas teorizações, como podem as Secretarias, órgãos
governamentais responsáveis pela Educação enquanto processo, tirar essa essência dos
professores e passar para os técnicos que, em muitos casos, nunca freqüentaram a sala de aula?
E se esses técnicos são ou foram professores, como podem eles decidir sobre um processo de
formação que engloba contexto e diversidade cultural tão distante da sua realidade?
Constata-se aí a perversidade do discurso do processo de formação que acaba
descontextualizando-o, esquecendo-se das particularidades que os sistemas de ensino e as
próprias escolas exercem no seu contexto particular; enfeitando-o de maneira surreal com
conceitos tidos como “da moda”, usados de maneira equivocada; desconectando o professor
como autor da construção da sua base de conhecimento; e desvinculando-o do real, destruindo
oportunidades de resultados frutíferos. “(...) os discursos sobre as funções docentes na escola
atual, funções tão variadas, complexas e exigentes que originam sentimentos de impotência e
frustração nos profissionais, sobretudo quando confrontam o muito que se pede com pouco que
se dá para desempenharem essas funções” (ESTRELA, 2001, p.34).
“Enquanto as falhas do programas de formação inicial e contínua têm sérias
conseqüências no quão bem os professores estão preparados para ensinar, eles também
podem afetar, significativamente, o aprendizado dos professores por toda a vida e o seu
55
desenvolvimento como profissionais”
17
(DONOVAN et al, 2003, p.204,
tradução nossa).
Vislumbra-se hoje uma tendência de formação continuada que procura destacar o
professor enquanto um ser social psicológico, oferecendo atividades cognitivas como
oportunidades de desenvolver uma reflexão metacognitiva, dentro do seu contexto, particular e
específico, tentando evitar a solidão da sala de aula e derrubar as paredes que separam os
professores de qualquer iniciativa que resulte em mudanças de conceitos, posturas, e atitudes.
“A solidão histórica da sala de aula está sendo substituída rapidamente pelas
comunidades de prática e pesquisa na prática
18
”, acredita LYTLE (2000, p.177).
10. A FORMAÇÃO E A PESQUISA
O campo da pesquisa educacional precisa tornar-se mais integrada em focar e desenhar
junto campos relevantes para colaborações interdisciplinares. Para esse fim, alguns mecanismos
são necessários através do apoio a treinamento interdisciplinar para os alunos e cientistas que
queriam trabalhar juntos. É importante expandir a pesquisa de forma que pesquisadores e
educadores possam trabalhar juntos em questões básicas e aplicadas. Enquanto campos tais
como neurociência e ciência cognitiva fizeram avanços importantes através da união de esforços,
pesquisadores tiveram que aprender as metodologias e técnicas de cada disciplina antes que
estudos de uma nova pesquisa pudessem ser conduzidos.
“[...] pesquisadores perguntam quanto um professor sabe, conhece e não como
tal conhecimento está organizado, justificado ou foi validado. Tanto as
variáveis dependentes quanto independentes desses estudos estão limitadas
pelo mesmo estreitamento operacional: o conhecimento do professor tem sido
tipicamente definido pelo que as avaliações demonstram. Conseqüentemente, a
pesquisa feita dentro dessa tradição falhou, pois não conseguir promover
insights no conhecimento dos alunos e professores de maneira tal que o
17
“While the flaws of preservice and inservice programs have serious consequences for how well teachers are
prepared to begin teaching, they may also significantly affect teachers’ lifelong learning and development as
professionals”.
18
“The historic isolation of teaching is rapidly being replaced by communities of practice and research on practice”.
56
conhecimento fosse desenvolvido, enriquecido e usado em salas de
aula”
19
(WILSON, SHULMAN & RICHERT, 1987, P.107).
Muito do trabalho necessário para ligar a pesquisa com a prática está enfocado na
educação e no desenvolvimento profissional dos professores, no currículo, nas ferramentas de
avaliação, nas metodologias de ensino, e nas políticas que definem o ambiente no qual o
aprendizado irá acontecer. Estas são áreas que os professores que estão em sala de aula têm bom
conhecimento e experiência. Mas, a articulação de pesquisa e prática é recomendada para
capitalizar novos sistemas de informação e comunicação com objetivo de conectar cientistas e
professores de diversas disciplinas.
Inicialmente, a ciência estava mais preocupada com o professor enquanto objeto de
pesquisa. O desempenho do professor era foco de análises. A idéia central era de que se novas
técnicas fossem apreendidas pelo professor, conseqüentemente, ele melhoraria sua prática e, com
certeza, o desempenho de seus alunos. As novidades que funcionavam ou não dentro da sala de
aula estavam relacionadas a comportamento, domínio de classe, resultados afirmativos em
provas e testes absolutamente tecnicistas,etc. Os processos instrucionais não faziam parte do
foco central das pesquisas dos anos 70. O melhor método de ensino estava relacionado com a
melhora da aprendizagem dos alunos.
Esse tipo de pesquisa sobre os professores raramente surtiam efeitos na prática. Pois,
nem sempre os professores que participavam de projetos, eram informados a respeitos dos
resultados das análises elaboradas pelo pesquisador. Por outro lado, havia uma reclamação por
parte dos pesquisadores pela falta do uso por parte dos professores das considerações apontadas
pelas pesquisas.
Muitas variáveis influem no trabalho do professor: processo cognitivo, contexto social,
entre outros. A nova tendência no processo de investigação sobre o ensino passa a observar a
percepção, reflexão, resolução de problemas, tomada de decisão, relacionamentos entre idéias e
19
[…]researches ask how much a teacher knows (how many such propositions) and not how that knowledge is
organized, justified, or validated. Both the independent and dependent variables of these studies are limited by the
same narrow operationism: teacher knowledge and student knowledge have been typically defined by what the
achievement tests measure. Consequently, research done in this tradition has failed to provide insight into the
character of the knowledge held by students and teachers and the ways in which that knowledge is developed,
enriched and used in classrooms.
57
construção de significados dos professores. Surgem as pesquisas interpretativas valorizando a
procura de significados e de leis explicativas e a interação entre ensino e aprendizagem. Nesse
momento, evidencia-se a necessidade de romper a falta de comunicação entre os campos da
pesquisa e da prática e de estabelecer relação entre as atividades de pesquisa e de ensino.
Procura-se evidenciar caminhos que permitam o avanço da teoria e da prática, beneficiando
professores e alunos e modificando a relação entre universidades e escolas, entre pesquisadores e
professores. A intenção passa a ser a de combinar esforços para que os pesquisadores enfoque
sua atenção nas questões que são centrais para a educação, para dar mais segurança ao rigor e à
consistência quanto aos processos que envolvem o ensino e a aprendizagem.
Acredita-se em parcerias que permitam que as perspectivas e o conhecimento dos
professores sejam gravados, trazendo consciência à pesquisa sobre as necessidades e dinâmica
do ambiente da sala de aula. As ligações entre pesquisa e prática deveriam, rotineiramente, fluir
em ambas as direções. Pois os insights dos pesquisadores ajudam a moldar o entendimento dos
práticos e os insights dos práticos ajudam a moldar a agenda de pesquisa e os insights dos
pesquisadores.
No princípio, as teorias envolvendo a colaboração enquanto forma de aprendizagem
tentavam compreender como os indivíduos trabalham em grupo, refletindo as tendências
marcadas pela psicologia cognitiva dos anos 70 e início dos anos 80. O objetivo inicial era
estabelecer se aprender colaborativamente ou cooperativamente era mais eficiente do que
aprender sozinho, enfatizando em quais circunstâncias. As pesquisas procuravam controlar
algumas variáveis como o tamanho e a composição do grupo, a natureza da formação do grupo e
seus propósitos, etc. Constatou-se que essas variáveis interagem de uma maneira que dificulta
estabelecer as ligações casuais entre as condições e os efeitos da colaboração. Assim,
recentemente, os estudos passaram o foco à explicação do papel de tais variáveis durante o
processo de interação ao invés de enfocarem como se estabelecem parâmetros para colaboração
efetiva. Esta mudança que orientou a pesquisa mais para o processo demarcou novos modelos de
interações e análises, fez-se necessária a distinção entre cooperação e colaboração, e entre
aprendizagem e resolução de problemas. Apesar de tratar-se de um debate complexo, optou-se
aqui pela concepção de que cooperação é o processo que ocorre a partir da divisão de tarefas
entre os participantes, sendo que cada pessoa fica responsável por uma parte da resolução do
58
problema proposto. Já por colaboração entende-se um engajamento mútuo dos participantes do
grupo num esforço coordenado e único de solucionar o problema proposto.
“Cooperação e colaboração não diferem em termos de que se a tarefa é ou não
distribuída, mas pelo caminho pelo qual ele é dividido: em cooperação, a tarefa é
dividida (hierarquicamente) em sub-tarefas independentes; em colaboração, processos
cognitivos podem ser divididos (heterarquicamente) em camadas em cooperação, a
coordenação só é necessária quando há a reunião dos resultados parciais, enquanto a
colaboração é uma atividade sincronizada de uma tentativa contínua em construir e
manter uma concepção compartilhada de um problema”
20
(DILLEBOURG, BLAYE &
O’MALLEY, 1996, p.190-191, tradução nossa).
Pesquisas colaborativas acontecem reunindo pesquisadores acadêmicos e profissionais da
escola. Elas diferem-se da pesquisa dos professores, pois avança sob a perspectiva do professor
enquanto pesquisador da sua prática. Refere-se a considerações sobre a pesquisa do prático. A
pesquisa dos professores não tem resultado em grandes descobertas cientificas, mas tem
colaborado significativamente com a compreensão por parte desses professores do quão é
importante ser ativo no processo de aprendizagem, mesmo quando o propulsor do processo tenha
sido uma observação sua sobre a própria prática.
A pesquisa com professores identifica-se com a pesquisa colaborativa e promove a
melhora do desenvolvimento profissional por meio de oportunidades para a reflexão sobre a
prática, críticas partilhadas e mudanças apoiadas. Consegue, muitas vezes, validar o saber
adquirido pelo prático através da teorização.
Colaboração deve incluir diálogo (CLARK et al, 1996), planejamento, ensino, interação
com alunos, e rotina burocrática partilhados , interação professor-professor e professor-
pesquisador (JOHN-STEINER, WEBER & MINNIS,1998). De acordo com Dewey (1989), é de
grande importância a reflexão dos professores sobre suas práticas bem como a integração de suas
observações às teorias de ensino e aprendizagem emergentes na época.
Espera-se que a pesquisa colaborativa represente uma série de esforços para combinar a
força da comunidade científica com os insights e a sabedoria frutos da prática em sala de aula. A
20
Cooperation and collaboration do not differ in terms of whether or not the task is distributed, but by virtue of the
way in which it is divided: in cooperation, the task is split(hierarchically) into independent subtasks; in
collaboration, cognitive processes may be (heterarchically) divided into intertwined layers. In cooperation,
coordination is only required when assembling partial results, while collaboration is a synchronous activity that is
the result of a continued attempt to construct and maintain a shared conception of a problem.
59
proposta é que os pesquisadores e os práticos, no caso, os professores, trabalhem juntos em busca
da identificação de importantes questões que envolvem a Educação enquanto ciência e prática
profissional.
A pesquisa colaborativa não afeta somente os professores, não serve apenas para os
pesquisadores, mas sim procura promover mudanças e trazer benefícios a todos, tanto
professores quanto pesquisadores.
Um dos caminhos inevitáveis da pesquisa qualitativa sobre o ensino, seria o da pesquisa
em colaboração. “[...] entretanto, para serem realizadas a maior parte delas enfrentou
resistências e questionamentos, sobretudo quanto ao rigor e à legitimidade de se colocar
professores e pesquisadores em situação de igualdade no processo de pesquisa” (BUENO, 2003,
p.13)
Esta combinação proposta entre expertise e professores enquanto companheiros, colegas,
ainda acontece raramente. Mais efetivamente, esforços sistemáticos para reformar a educação
são necessários que mais parcerias dessas sejam postas em prática. Pesquisa e desenvolvimento
têm conseguido importantes conquistas para a Educação e devem servir de incentivo de novas
parcerias. Recomenda-se, assim, o desenvolvimento de pesquisa que possa ser conduzida por
cientistas, pesquisadores, experts e professores para investigar os benefícios potenciais da
aprendizagem colaborativa dentro da sala de aula e os problemas precisam ser endereçados ao
dia-a-dia de sala de aula.
O processo de formação assume, assim, um novo perfil que será adotado nesse trabalho.
Em primeiro lugar, entende-se, então, que a formação deve se dar através de um processo
contínuo, de aprendizagem permanente, de construção e acúmulo de conhecimentos, por mais
que seja dividido teoricamente em etapas definidas em formação inicial e contínua. Além disso,
não há de se pensar num processo de formação que busque, unicamente, a soluções de problemas
emergentes. Parece natural que, na prática, algumas situações divergentes apareçam e que
nenhuma teoria dê conta de resolvê-las. São situações que acabam fugindo dos referenciais
teóricos trabalhados em cursos e/ou seminários. São situações que exigem do professor uma
ação que, certamente, será resultado de uma reflexão embasada no conhecimento teórico que o
docente domina, como também em suas crenças e experiências de vida. Aí se coloca em prática
60
o conhecimento profissional do professor. Quando o docente desenvolve uma reflexão acerca de
um assunto ou situação, ele acaba questionando ou legitimando seus conhecimentos teóricos,
despertando sua expertise.
O processo de formação que se busca é o resultado de uma formação profissional
advinda da formação inicial que certamente é fundamental, mas não suficiente; do exercício da
docência mais a aprendizagem ao longo da vida, aprendizagem esta que vem tanto de dentro
como fora do ambiente de sala de aula.
O sucesso de um processo ensino-aprendizagem de professores requer esforços
coordenados e contínuos que iniciam na formação inicial e persistem por toda a carreira na busca
incessante de aprimoramento enquanto profissional. Criar oportunidades para construção de uma
base de conhecimento sólida representa um dos grandes desafios de qualquer processo de
formação. Num modelo de construção colaborativa do conhecimento, prevê-se o fim do
isolamento dos professores, em busca de diálogo, conversa, apoio entre pesquisadores e
professores em troca de experiências e idéias fortalecendo uma parceria entre as pessoas num
esforço coletivo de um objetivo comum: o desenvolvimento pessoal e profissional do docente.
Quando os professores trabalham colaborativamente em problemas ou projetos, aprendendo pelo
insight, um dos outros, e clareando seus próprios pensamentos através da articulação e
argumentação, há um processo de interação.
“Nesse processo, cada um oferece o que sabe e, estando aberto para ouvir e analisar
posições diferentes das suas, adquire outras formas de ver o mundo, de se ver nele e de
compreender seu papel no exercício profissional” (MIZUKAMI et al, 2002, p.43).
A partir de concepções de pesquisa colaborativa, surgem os conceitos de comunidades
enquanto oportunidade para professores e pesquisadores aprofundar, compartilhar e desenvolver
conhecimento através da reflexão do trabalho prático, da revisão teórica e da comunhão de
saberes. Há uma promoção de processos formativos enquanto ocorre a investigação.
61
62
CAPÍTULO II
COMUNIDADES E SUAS VERTENTES
1. O TERMO COMUNIDADE
Se procurar o termo em qualquer dicionário de língua portuguesa, encontra-se o termo
comunidade definido como “associação de pessoas que tem o mesmo objetivo”, “qualidade ou
estado do que é comum”, “paridade”, “comunhão”.
Longe das áreas científicas, o termo comunidade é utilizado há muito tempo para
expressar um grupo de pessoas que moravam perto, que se reuniam em prol de um objetivo, etc.
O termo “comunidade” é uma construção sociológica que evoluiu, com o passar do tempo, de
um sentido quase familiar para integrar um conjunto maior. (TÖNIES, 1995; BOTTOMORE,
1989; WEBER, 1987). Com o advento da modernidade e da urbanização, principalmente, as
comunidades rurais passaram a desaparecer, cedendo espaço para as grandes cidades
(Oldenburg, 1999; Rheingold, 1996). Com isso, a idéia de comunidade passa de articular uma
ligação determinada por laços de parentesco para agrupar uma idéia de sociedade.
A associação entre comunidade e os aspectos religiosos, culturais e às tradições
filosóficas dá-se no valor que indivíduos despertam para um bem comum trabalhando juntos.
63
As comunidades tradicionais foram construídas em engajamento pessoal e ativo em
grupos organizados, onde as pessoas saíam ou entravam numa comunidade por interesse e não
pela associação ou objetivo comum. A atual interação generalizada entre as pessoas tem
despertado o interesse dos estudiosos, pois há algo de novo a ser investigado: a interação coletiva
que pode ser compreendida dentro de certa lógica, dentro de certos padrões, de acordo com
certos princípios.
Com o advento da tecnologia e sua influência na sociedade e na vida cotidiana, as pessoas
também passaram a buscar novas formas de conectar-se, estabelecer relações e formar
comunidades. Muitos autores optaram por definir as novas comunidades, surgidas na internet,
como comunidades virtuais. “As comunidades virtuais são agregados sociais que surgem da
Rede [Internet], quando uma quantidade suficiente de gente leva adiante essas discussões
públicas durante um tempo suficiente, com suficientes sentimentos humanos, para formar redes
de relações pessoais no espaço cibernético” (RHEINGOLD, 1996, p. 20).
Devido ao aspecto educacional desse trabalho, procurou-se determinar a concepção de
comunidade dentro dos preceitos da Ciência da Educação. Nas últimas duas décadas, o termo
comunidade caiu na “moda”. E como todo termo da “moda”, o seu significado pode perder o
sentido conforme vai sendo utilizado para descrever inúmeras ações.
A preocupação com uma definição do termo começou no início dos anos 90 com Judith
Warren Little e Milbrey McLaughlin (1993) que alertaram os educadores sobre o empréstimo de
noções de comunidade vindos da sociologia e antropologia que estavam sendo aplicadas
diretamente nas escolas. De acordo com Westheimer, “os pesquisadores poderiam beneficiar-se
de um processo mais definido de definição de comunidade baseado em pesquisa empírica
21
(apud GROSSMAN et al, 2001, p.943, tradução nossa).
Tendo comunidade como um grupo de pessoas que são socialmente interdependentes,
que participam juntos em uma discussão e numa tomada de decisão, que compartilham certas
práticas que tanto definem a comunidade como surgem dela (BELLAH et al, 1985), surge a
concepção de que comunidade exige tempo, a escrita de uma história comum e uma narrativa
constitutiva de grupo.
21
“Researchers could benefit from a stronger conceptualization of communities based in empirical research”.
64
Por enquanto, grupos de pessoas tornam-se comunidade: comunidades de práticas,
comunidades epistemológicas, comunidades de discurso, comunidades de aprendizagem, entre
outros.
Não há nenhuma uma única formulação teórica de como uma comunidade deveria
supostamente funcionar dentro dos padrões educacionais. Porém, já há critérios que permitem
distinguir entre uma comunidade de professores e um grupo de professores sentados numa sala
para um encontro. Há, ainda, pouco senso sobre como os professores determinam as ligações de
comunidade, lutam para mantê-las, trabalham com os inevitáveis conflitos de relações sociais, e
formam as estruturas necessárias para sustentar as relações com o passar do tempo.
(GROSSMAN, 2001)
Um dos primeiros teóricos a unir o conceito de se construir uma comunidade às questões
do profissionalismo foi Wiliam J. Goode (1957). Goode observou que os membros de uma
mesma profissão compartilham um senso de identidade e valores comuns, compartilham a
mesma lista de definições em relação aos membros e não-membros, possuem uma linguagem
comum, e controlam a reprodução do grupo através de procedimentos de seleção e socialização.
Para ele uma comunidade profissional é uma comunidade contida num grupo que existe dentro
de limites estruturais e contam com o apoio da grande sociedade.
Dependendo da série, da disciplina, do conhecimento prévio, do tipo de alunos, os
professores variam no seu entendimento dos objetivos do processo ensino-aprendizagem, os
propósitos da educação, a estrutura do currículo, o papel das provas, e quase sobre tudo que
envolve o processo ensino-aprendizagem. Ao contrário de outras profissões, a educação não foi
capaz de forjar uma linguagem comum de normas e valores, e praticamente toda e qualquer
questão significante na educação permanece na controvérsia. Na verdade, a questão do
profissionalismo da educação acaba interferindo diretamente em qualquer tentativa de se criar
uma comunidade baseada numa visão profissional coletiva para o ensino.
Nesse caminho, algumas concepções parecem delinear qualquer esforço de formação
continuada em comunidades. A colaboração aparece como a fundação do aprendizado no futuro.
Transformar e transferir conhecimentos entre colegas levanta insegurança naqueles que estão
acostumados a dominar aquilo que vem ensinando há anos, mas amplia horizontes. Ao
65
desenvolver a colaboração, o desejo de compartilhar programas e atividades despertam o
desenvolvimento de outro tipo de aprendizagem: aquela que resulta de conquistas coletivas.
O desenvolver de uma comunidade busca um caminho de compartilhar e colaborar
.
2. CONCEITOS DE COMUNIDADES NA ÁREA EDUCACIONAL
2.1. COMUNIDADES DE PRÁTICA
Etienne Wenger and Jane Lave ao usarem a expressão “comunidades de prática”,
estabeleceram a concepção de que todo e qualquer aprendizado é, na sua essência, resultado de
um fenômeno social, e a educação é vista como processo de formação de identidade.
No livro Communitites of practice: learning, meaning, and identity (1998), Wenger
afirma que as comunidades de prática acontecem em todos os lugares: em casa, no trabalho, na
escola, durante o lazer, etc…e que elas fazem parte da vida do dia-a-dia.
Ele afirma:
“nós, seres humanos, estamso constantemente enganjados em busca de realizações de todos os
tipos, desde com a intenção de assegura nossa sobrevivência física até a busca da maioria de
nossos prazeres mais mundanos. Assim que definimos essas realizações e nos engajamos de
conseguí-las juntos, nós interagimos como os outros e com o mundo e nós sintonizamos nossos
relacionamentos uns com os outros e com o mundo. Em outras palavras, nós aprendemos (..)
Desse aprendizado coletivo resultam-se práticas que refletem tanto nossa busca pelas realiza;cões
como nossas relações sociais. Estas práticas são ainda a propriedade de um tipo de comunidade
criada através do tempo pela sustentação da busca de realizações conjuntas
22
”(p.45, tradução
nossa).
22
we, human beings, are constantly engaged in the pursuit of enterprises of all kinds, from ensuring our physical
survival to seeking the most lofty pleasures. As we define these enterprises and engage in their pursuit together, we
interact with each other and with the world and we tune our relations with each other and with the world
accordingly. In other words, we learn. (…) This collective learning results in practices that reflect both the pursuit
of our enterprises and the attendant social relations. These practices are thus the property of a kind of community
created over time by the sustained pursuit of a shared enterprise.”
66
Na concepção de Wenger, comunidades de prática não são sinônimo para grupo, time,
network ou reunião. Trata-se do contexto onde as pessoas podem desenvolver o senso comum
através de uma participação conjunta (mutual engagement). Em outras palavras, os participantes
de uma comunidade de prática unem-se em torno de ações, negociando significados e manteno
relações interpessoais com a finalidade de cumprir com suas obrigações, ou seja, fazer o que elas
estão lá para fazer. Sendo assim, estar envolvido numa mesma situação acaba tornando-se um
fator central na definição e negociação de um propósito.
No caso citado como exemplo no livro supracitado, os funcionários de uma empresa são
membros de uma comunidade de prática pelo fato de estarem na mesma situação, convivendo e
mantendo relações interpessoais a fim de transformar o ambiente de trabalho num local mais
agradável para todos.
Nesse contexto, o processo ensino-aprendizagem não é um objetivo por si só, nem uma
atividade da comunidade, pela razão de que “...o que aprendemos não é um conteúdo estático
mas um processo de engajamento e participação no desenvolvimento e na prática contínua
23
(WENGER,1998, p. 58). Os participantes não se envolvem em comunidades de prática para
aprender. Elas estão lá por causa do trabalho, do lazer, estão lá para compartilhar maneiras de
fazer as coisas. Ou melhor, as pessoas aprendem por serem participantes ativos das comunidades
de prática e vão, aos poucos, construindo identidade em relação à essas comunidades. Assim, as
pessoas aprendem tornando-se participativas, em busca de uma identidade; pertencendo à
comunidade; fazendo, praticando, vivendo sua prática; e experimentando em busca de novos
sentidos. “Aprender é uma questão de engajamento e contribuição para a prática
24
”( WENGER,
1998, p.8).
Como membros, as pessoas não precisam necessariamente compartilhar valores, mas sim
práticas, pois as atividades que os membros desempenham juntos não podem ser facilmente
traduzidas por colaboração, poder, processo de informação. AS relações interpessoais são muito
mais complexas, que misturam poder e dependência, prazer e dor, sucesso e fracsso, alianças e
competições, atração e repugnância, amizade e ódio, assim por diante. Ou seja, os
23
“…what they learn is not a static subject matter but the very process of being engaged in, and participating in
developing, and ongoing practice”
24
“Learning is an issue of engaging in and contributing to the practice.”
67
participantes de comunidades de prática mantêm relações interpessoais sem perder suas
identidades. Eles compartilharam tarefas, atividades, a rotina, palavras, instrumentos, maneiras
de fazer as coisas, gestos, ações, mas não compartilharam, obrigatoriamente, os mesmo valores.
A prática de uma comunidade de aprendizagem dentro de “Comunidades de Prática”
pode ser rica e complexa de forma a conquistar uma educação completa que incorpora relações e
interesses sociais como ingredientes básicos para o processo ensino-aprendizgem a fim de
maximizar a participação dos membros Os professores e os livros tornam-se fontes para o
processo ensino-aprendizagem que busca uma conquista socialmente significativa. Ou seja, a
prática é um processo de aprendizagem interativa que permite que novos participantes venham a
fazer parte de uma comunidade já existente e que os participantes mais antigos acabam
desempenhando o papel de educadores. Com essa interação entre experiência e a produção de
competência, as comunidades não só são contextos de novas aprendizagens, mas também de
transformação de conhecimento.
Sendo assim, as comunidades de aprendizagem tornam-se funcionais e conectadas com o
mundo de formas significativasm não podendo ser isolada ou somente dependente de si mesmas.
As comunidades precisam usar o mundo ao seu redor como fonte de aprendizagem assim como
devem tornar-se fonte de aprendizagem para o mundo.
Centralizados dentro do contexto escolar, os alunos estariam conectados na busca de uma
ação socialmente significativa que envolveria a aproximação a um conteúdo específico.
De acordo com essa concepção, os alunos numa sala de aula, na maioria dos casos,
formam uma comunidade de prática porque compartilham as mesmas condições (ambiente,
contexto, etc) e repertório comum de ações, palavras, gestos, postura. Sentir-se incluído é
importante na realidade da sala de aula, por isso os participantes negociam uns com os outros e
mantêm relações mútuas organizadas para fazer o que estão lá para fazer, e para receber novatos
partilhando experiência e competência.
Os alunos estão lá dia após dia, convivendo a mesma rotina, e negociando sua
convivência dentro de comunidade e da comunidade com o que a cerca. Eles estão lá, reunidos
numa sala de aula, teoricamente para aprender conteúdo específicos, mas nesse processo
68
desenvolvem práticas de convivência, sobrevivência e aprendizado pessoal, ou seja, de formação
de identidade.
Essa mesma sala de aula que forma uma comunidade de prática pode ou não formar uma
comunidade de aprendizagem. Diz-se isso porque por terem como objetivo principal o processo
ensino-aprendizagem, nem sempre essas comunidades acabam gerando conhecimento. Muitas
vezes, vê-se simples repetição de informações. Por isso, o que se sugere é que a prática dessas
comunidades de aprendizagem incorporarem relações e interesses sociais a fim de preconizar o
processo de educação como um processo de formação de identidade onde professores e livros
didáticos são tidos como fonte de informação e não responsáveis únicos pela transmissão de
conhecimento. Assim, alunos e professores, mesmo não compartilhando a mesma identidade,
ao contrário, remodelam suas identidades a partir do compartilhamento de ações que envolve o
aprendizado de um conteúdo, mas não se limita a essa ação. Os alunos como membros de uma
comunidade de prática buscam uma ação conjunta que pode ser, inclusive, o simples fato de
passar de ano. Para que esse não se torne o objetivo de muitas salas de aula, é preciso, de acordo
com essa concepção, trabalhar a prática para que haja realmente uma comunidade de
aprendizagem.
2.2. COMUNIDADES DE APRENDIZES
“Quanto mais alto o objetivo da construção de comunidade, maior o senso de
partilha entre o tutor e o tutoriado
25
”( BRUNER, 1972, p.39).
Brown e Campione (1994) são os precursores da expressão “community of learners”,
traduzindo, “comunidades de aprendizes”. De acordo com os pesquisadores as teorias
construtivistas sobre o processo ensino-aprendizagem indicam que as crianças, os alunos
aprendem melhor quando “constroem” conhecimento, como participantes ativos do processo.
Assim como indica Dewey que as crianças aprendem melhor quando descobrem por si mesmas.
Vygotsky (1978) também demonstra em seus estudos, que existe uma distância entre os níveis de
compreensão que os alunos atingem na educação formal, de transmissão de conhecimento, e o
25
“The higher goal of tutoring is the “building of community”, where both the tutor and tutee get a better sense of
what it is to share”.
69
nível que os alunos podem atingir se incorporados num processo de colaboração com os pessoas
e instrumentos eficientes.
A partir dessa elaboração teórica, Brown e Campione propõem as comunidades de
aprendizes, onde os alunos deixam de ser agentes passivos e incorporam o papel de professores e
pesquisadores. O modelo sugere um processo ensino-aprendizagem recíproco entre os
envolvidos, e é desenhado a fim de encorajar expertise compartilhada. Ou seja, todos os
envolvidos na comunidade são experts responsáveis por compartilhar seu conhecimento com os
outros. Assim, todos na comunidade desempenham o papel de professor, aprendiz e
pesquisador, adotam um discurso próprio que inclui um sistema comum de significados, crenças
e atividades tanto implícita quanto explicitamente fortalecendo a base de conhecimento de todos
os envolvidos.
Outro aspecto interessante das comunidades de aprendizes está relacionado com o papel
professor que deixa de ser o único responsável pelo processo ensino-aprendizagem, assumindo a
função de facilitador, a pessoa responsável por guiar o processo, mas tendo a sensibilidade de
perceber quando intervir, quando deixar a pesquisa fluir, prevendo instrumentos que ajudam
e/ou prejudicam, etc. O professor deixa de ser o único responsável, mas tem imensa
responsabilidade pelo processo como um todo pois cabe a ele desenhar, incentivar e orientar o
processo da “descoberta”.
As características essenciais de uma comunidade de aprendizes seriam:
- a responsabilidade individual caminha junto com a necessidade de se compartilhar
expertise, aumentando a diversidade;
- há um procedimento familiar, uma rotina que se estabelece e deve ser seguida;
- torna-se uma comunidade de discurso, entendo aqui, um discurso comum e próprio de
cada comunidade;
- a colaboração ocorre entre alunos de diferentes idades, ou seja, um aluno da sexta série
pode ser tutor de uma aluno de quarta ou quinta série, assim ambos exercitam procedimentos de
ensino-aprendizagem.
70
- ocorre negociação e apropriação de idéias;
A aprendizagem em uma comunidade que segue os preceitos de Brown e Campione
ocorre de acordo com o assunto, a(s) disciplina(s), dependendo do grupo envolvido e do
propósito que sempre é pré-definido. Lembrando sempre que o aluno é o responsável final pelo
seu processo de aprendizagem assim como responsável parcial pela definição de seu currículo.
Para alcançar tal objetivo, os membros de uma comunidade de aprendizes participam de
atividades que facilitam a reciprocidade, a troca de informações, a cooperação em grupo,
interações presenciais e diálogo que envolve negociação e apropriação de conceitos, idéias e
conhecimento.
Um assunto, dentro de uma comunidade de aprendizes, iniciaria com a instrução de
“benchmark lessons”. São lições que têm dois propósitos. Primeiro o de criar a fundamentação,
uma base de conhecimento compartilhada entre todos os alunos, de tal forma que os alunos
possam explicitar tudo o que sabem sobre as espécies em extinção. O conhecimento prévio deles
inclui tanto suas concepções corretas quanto as incorretas, assim como suas teorias e
entendimento teórico sobre o assunto. Ao explorar o que os alunos conhecem individualmente,
constrói-se uma perspectiva comum. Assim, todos os alunos começam, mais ou menos, do
mesmo ponto de partida. O segundo propósito é ajudar os alunos a entenderem já no começo da
unidade onde eles precisam chegar, explicitando-se o objetivo, as expectativas.
Numa segunda fase, formam-se grupos de pesquisas. Dividindo a questão em muitos
aspectos, cada grupo passa a investigar um ponto específico, tornando-se expert nesse assunto.
Dessa forma, os alunos têm a oportunidade – através de investigação, leitura, escrita, entrevista e
aprendizagem ativa – de conhecer mais profundamente uma parte de uma problema maior.
O papel do professor é o de planejar todo esse trabalho para que cada grupo desenvolva
um conhecimento que é essencial para o fechamento de todo o projeto. As informações devem
encaixar como um quebra-cabeça na próxima fase da aprendizagem, para que se possa concluir a
tarefa geral que, geralmente, é a mais complicada.
Durante o trabalho em grupo, os alunos desenvolveram suas investigações, consultando a
internet, unindo informações, conversando com experts, lendo sobre o assunto, aprendendo uns
com os outros. O professor monitora o trabalho dos grupos e periodicamente coloca todos os
71
alunos juntos a fim de que os membros de grupos diferentes falem uns com os outros para
verificar o que está sendo feito, de tal forma que não fiquem totalmente desavisados do que está
acontecendo no resto da comunidade.
Até o final da pesquisa, cada grupo acaba preparando, essencialmente, um texto completo
sobre sua especialidade – em algumas desses grupos, eles realmente compõem juntos o seu texto.
Neste ponto, um ou mais membros de cada grupo dos grupos especialistas unem-se num
novo grupo, cuja responsabilidade é solucionar um problema que só poderá ser resolvido através
da síntese de todos os grupos. Nesta fase, os alunos passam o tempo ensinando uns aos outros.
Eles se revezam, literalmente, para ensinar suas idéias aos outros, e começam refletir sobre um
novo problema proposto pelo professor. Finalmente, há uma exibição pública, uma
demonstração, da solução do problema maior, posto desde o início da comunidade.
Refletindo sobre todo o processo, há de se questionar o quanto os alunos aprenderam.
Quando foram tomados cuidados para assegurar que os alunos realmente estavam tornando-se
experts nos grupos de pesquisa, cada aluno teve algo importante para contribuir com o problema
maior. Esses aprendizes melhoraram em leitura, ciência e nas áreas que fazem parte do estudo.
Na maioria das vezes, há um desenvolvimento acadêmico e social importante.
Em uma comunidade de aprendizes sob esse modelo, o professor submete os alunos na
aquisição precisa do tipo de entendimento e conhecimento que os alunos sejam capazes de
contribuir para o grupo maior e para a comunidade (SHULMAN, 1997).
2.3. COMUNIDADES DE PROFESSORES
“Há um futuro para o processo de formação de professores. A visão desse futuro
inclui um crescimento da base de conhecimento de como os alunos aprendem.
Este conhecimento espalhará amplamente para os programas de desenvolvimento
profissional do professor
26
” (BERRY, 2005, p. 272).
26
“There is a future for teacher education. The vision for this future includes a growing knowledge base of how
students learn. This knowledge will spread widely to teacher education and professional development programs.
72
A partir da concepção de Brown e Campione, surgiu uma questão: “Como professores
formados no modelo tradicional podem construir “comunidades de aprendizes” em suas salas de
aula?”
Pensando em suprir os professores com a experiência prática de comunidades, surgiram
as primeiras teorizações sobre “Comunidades de Professores”.
Dentro de comunidades, as atividades, a reflexão e a colaboração devem ser legitimadas,
fortalecidas e fomentadas, a fim de desenvolver coleguismo e compreensão mútua partindo do
princípio básico de que todo professor é um eterno aprendiz do seu conteúdo, da sua disciplina.
As comunidades envolvem normas que reforçam a colaboração e a aprendizagem. No
mínimo, seis princípios distintos aparecem para caracterizar um aprendizado efetivo e
substancial no modelo de “Comunidade de Professores”.
Para SHULMAN (1996, 1997), os seis princípios que parecem caracterizar as condições
para um aprendizado autêntico e duradouro no modelo de comunidade de aprendizes são:
conteúdo; aprendizado ativo; pensamento reflexivo e prático; colaboração; paixão, interesse; e
comunidade ou cultura.
Estas idéias foram originalmente estimuladas por Jerome Bruner na Associação de Pesquisa
Educacional Americana, em 1994. Esses princípios estão embasados nos princípios
estabelecidos por Bown e Campione, nas “Comunidades de Aprendizagens”. De acordo com
estes princípios, um aprendizado autêntico e duradouro ocorre quando:
O conteúdo da disciplina a ser aprendido é essencial e o pivô da disciplina ou
interdisciplina sob estudo, e pode produzir novos entendimentos e/ou servem como base
para aprender futuros conteúdos, processos e dispositivos;
O aluno é um agente ativo no processo, não passivo, parte de um auditório, um cliente ou
um colecionador de informações. O aprendizado torna-se mais ativo através de
experimentos e investigação, assim como através da escrita, do diálogo e dos
questionamentos.
A tarefa do participante não é só a de se comportar devidamente e pensar, mas também a
de ter um pensamento reflexivo que permita pensamentos e ações que permite reavaliar
73
seus pensamentos e ações reflexivamente e analisar como e o porquê seus pensamentos
chegaram a certas conclusões ou falharam em alcançar outros fins. Nesse processo, a
metacognição – consciência de como e o porquê alguém aprende certas coisas de uma
maneira particular – é a chave de um aprendizado profundo.
Há colaboração entre os alunos. Eles podem trabalhar juntos de diversas formas,
orientando o aprendizado uns dos outros, visando complementar o conhecimento uns dos
outros. Colaboração é um casamento de insuficiências, não exclusivamente cooperação
numa forma particular de interação social. Porém, sempre há desafios intelectuais
difíceis que são quase impossíveis de serem solucionados sozinhos, mas mais facilmente
solucionáveis na companhia de outros.
Professores e alunos compartilham uma paixão pelo material, estão emocionalmente
comprometidos às idéias, processos e atividades, por isso, o trabalho deve estar
conectado com os objetivos atuais e futuros de cada um dos participantes.
E, finalmente, os processos de atividade, reflexão e colaboração são assegurados,
fomentados e legitimados dentro de uma comunidade ou cultura que valida tais
experiências e cria várias oportunidades para que o aprendizado ocorra com prazer e
alcance sucesso.
Ao observar o processo ensino-aprendizagem que acontece numa comunidade de
aprendizes, surgiram experiências envolvendo professores. Da mesma forma que os alunos, os
professores passaram pelas “benchmark lessons”. Na comunidade desenvolvida por
SHULMAN (1997), nas primeiras duas semanas, todos os participantes foram expostos a
leituras, palestras e discussões sobre o processo de formação de professores, adquirindo, assim,
uma base de conhecimento comum respeito do assunto. O objetivo da experiência era de, ao final
do curso, criar propostas para a reforma do processo de formação de professores.
Os professores participantes dividiram-se em grupos de pesquisa, nos quais eles
aprofundaram seus conhecimentos em um aspecto particular incluído na temática de formação de
professores. Depois, eles compartilharam expertise em novos grupos, grupos maiores.
Constatou-se que cada um dos participantes foi capaz de ensinar a seus colegas o que haviam
74
aprendido profundamente, numa comunidade de aprendizes. E o grupo maior elaborou
propostas contundentes para a questão da formação.
A partir daí, vislumbrou-se que professores podem aprender e melhorar o ensino através
de comunidades.
Percebe-se que tais comunidades criam estruturas participativas que reduzem a
intensidade do trabalho das atividades necessárias para engajar a maioria das práticas
intimidadoras que, muitas vezes, levam ao ensino e aprendizagem. Salas de aula e escolas que
são caracterizadas pela atividade, reflexão e colaboração em comunidades de aprendizagem são
inerentemente incertas, complexas e exigentes. Tanto o ensino como a aprendizagem em certos
contextos, demanda altos níveis de risco e imprevisibilidade para os participantes. Tanto os
alunos como os professores precisam de uma escola e uma cultura de comunidade que suporte,
fomente e compense tais níveis de risco.
O modelo de comunidades de aprendizagem sugere que enquanto fizer sentido olhar para as
estruturas, olhar para as questões essenciais e para tópicos gerais, não se pode acreditar que
alguém pode aprender tudo que está previsto nos currículos. É preciso estar preparado para um
mundo onde pessoas diferentes acabam aprendendo coisas diferentes em profundidade. Além
disso, ao desenvolverem a capacidade de colaborar um com o outro, há possibilidades dos
problemas serem resolvidos, pois os problemas, muitas vezes, transcendem o quê um indivíduo
pode fazer sozinho.
“Há de se entender o caráter rico, ambíguo e multifacetado da concepção de comunidade,
tanto em referência aos aprendizes quanto aos professores. Num sentido mais profundo,
eu concordo com a educadora, Deborah Meier, de Nova York, que escreveu que a
essência da aprendizagem é falar, e a essência de ensinar é ouvir. Talvez, as comunidades
de aprendizes e comunidades de professores são, na verdade, a mesma coisa quando você
consegue entendê-las totalmente
27
” (SHULMAN, 1997, p.8).
Assim como nas comunidades de aprendizes, nas comunidades de professores há valores
que são compartilhados por todos os membros: discurso próprio, busca conjunta pelo
27
The ambiguity and the multi-faceted character of the concept of community, both in reference to learners and
teachers. In a deep sense, I agree with the educator in New York, Deborah Meier, who wrote that the essence of
learning is telling, and the essence of teaching is listening. Thus, perhaps communities of learners and communities
of teachers are actually the same thing, when come to understand them fully.”
75
desenvolvimento da base de conhecimento de todos os envolvidos a partir de um sistema de
significados, crenças e atividades comum, propósito nítido e compartilhado por todos.
Não há uma única realidade que acompanhe as “Comunidades de Professores”. Elas
diferenciam-se pelas disciplinas, pelo nível de atuação e/ou pelo contexto escolar, por exemplo.
Cada comunidade de professores possui suas próprias características e seguem as diversidades de
contexto. Sendo o conteúdo a ser aprendido pivô do processo ensino-aprendizagem, a série, o
currículo e o contexto que os membros da comunidade trabalham são determinantes para a
construção dessa comunidade. Concebendo o ensino enquanto uma profissão, há de se
considerar os múltiplos contextos que envolvem contexto nacional, estadual, municipal e de cada
instituição, de cada escola.
2.4. COMUNIDADES PROFISSIONAIS
Goode (1957) foi um dos primeiros teóricos a propor um conceito diferenciado à
expressão “Comunidade Profissional” ou “Comunidade de uma Profissão”. Ele destacou que
cada profissão reúne socialmente uma comunidade. Não tem necessariamente um local físico,
entretanto seus membros estão interligados por um senso de identidade, compartilhando valores,
uma linguagem comum e responsabilidades. Goode define a “Comunidade Profissional” como
uma organização que controla a admissão de novos membros, espera um alto padrão
comportamental que é estabelecido pela lei, obtém salários mais altos, possui o monopólio de
habilidades específicas e tem uma relação com o cliente que escolhe e avalia o profissional pelo
serviço recebido.
Há uma tendência de pesquisadores tentarem demonstrar que os professores estão em
busca dessas definições apontadas por Goode, principalmente à busca por prestígio e bom
pagamento. Sendo assim, a partir da essência descrita por Goode, uma ocupação começa com
um movimento ao profissionalismo quando assume ser comunidade. Como comunidade
profissional, os professores acabariam assumindo algumas características importantes: seus
membros estão interligados com um senso de identidade; uma vez membro de uma comunidade,
poucos deixam a profissão, sendo assim, ela acaba adquirindo status contínuo, permanente; seus
76
membros compartilham valores; os papéis são comuns aos membros; dentro da área de ação, os
membros utilizam uma linguagem própria, compreendida apenas parcialmente por não-membros;
o poder da comunidade está acima dos seus membros; seus limites, socialmente falando, são
razoavelmente explícitos e há certo controle no processo de seleção de novos membros ( Goode,
1957, p.194). Ao tomar senso de profissionalismo, a educação passa a encarar o trabalho como
de uma comunidade profissional, enraizado numa base de conhecimento especializada e técnica
que serve de orientação para que seus membros consigam compreender e atender às necessidades
de seus clientes. Além disso, há uma identidade coletiva muito bem estabelecida através do
comprometimento profissional e uma autonomia profissional conseguida através do controle
sobre a prática e os padrões profissionais estabelecidos. Seu trabalho está vinculado a uma base
de conhecimento especializada e técnica, busca o desenvolvimento da prática profissional
incentivando novas maneiras de pensar e raciocinar coletivamente. Há negociação social , assim
como regulamentação das interações e normas de grupo, além de desejo de engajar na crítica a
fim de um entendimento coletivo melhor e mais amplo.
“Comunidades Profissionais” aparecem mais próximas das “Comunidades de Prática” em
pelo menos um pressuposto: ocorre entre pessoas que compartilham uma base de conhecimento
técnica e especializada. Elas tentam decifrar maneiras de pensar e raciocinar coletivamente e
através de interações interpessoais. Entretanto, as “Comunidades Profissionais” não estão
preocupadas apenas na sobrevivência ou melhoria do ambiente de trabalho, por exemplo. Nessa
concepção, os profissionais reúnem-se a fim de ir ao encontro das necessidades dos clientes. Os
membros compreendem que a crítica pode ser frutífera para o entendimento e para a
aprendizagem individual e coletiva. Aqui, o objetivo principal está relacionado com a melhora
da prática profissional.
Uma “Comunidade Profissional” pode ser definida como a reunião de profissionais que
entendem que juntos podem validar valores, assegurando respeito e melhores salários. Seus
membros procuram encontrar juntos caminhos para preservar, apoiar e melhorar a prática
profissional.
Trazendo essa concepção para o campo educacional, fica fácil entender a razão que
muitos projetos carregam a palavra profissional em seus títulos. Tornou-se senso comum como
os professores têm que lutar para a aceitação do magistério como uma profissão e não uma
77
ocupação. Trazer o aspecto profissional para o processo ensino-aprendizagem tornou-se
desafiador, mas crucial para o futuro dos professores. Porém, há de se entender que não há como
entender a profissão de professor apenas baseada no conhecimento especializado e técnico. Os
aspectos profissionais que envolvem a prática de um professor diferem de acordo com o
contexto: disciplina, nível escolar, população de aluno, escola pública ou particular, contexto
escolar, políticas públicas, etc. Por outro lado, os professores apresentam uma consideração
central: a necessidade do cliente, ou seja, o resultado dos alunos. Comprometimento com o
aprendizado coletivo torna-se um aspecto essencial para qualquer comunidade de professores.
Como resultado de anos de prática tradicional, onde os professores passam a maior parte de seu
tempo vivendo uma solidão pedagógica, oferecer múltiplos corredores de participação para os
professores torna-se uma motivação a mais em busca de mudanças significativas no contexto
educacional.
2.5. COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM
A expressão “Comunidades de Aprendizagem” há muito tempo está sendo usada
conjuntamente com outras concepções.
De acordo com Wenger (1998), uma Comunidade de Aprendizagem seria
verdadeiramente funcional e conectada com o mundo de diversas formas, especialmente porque
incorpora relações sociais e interesses como ingredientes essenciais da aprendizagem a fim de
maximizar o engajamento de seus membros. A aprendizagem envolve uma interação entre
experiência e competência. O processo de educação é entendido como um processo de formação
de identidade, tornando-se um processo de desenvolvimento mútuo entre comunidades e
indivíduos que vão além de uma mera socialização.
Aqui há um esforço de validar a negociação de significados ao invés de mecanismos de
informação, transmissão e aquisição. Assim professores e materiais instrucionais tornam-se
fontes para a aprendizagem, assim como ensino e aprendizagem interagem ao tornarem-se fontes
estruturais para cada um. O ensino estruturado em comunidades acaba sendo fonte para a prática
e como oportunidades de aprendizado ainda mais amplas que vão além do espaço físico de uma
78
sala de aula. Dessa forma, uma comunidade de aprendizagem não pode estar isolada. Passa a
usar o mundo em como fonte de aprendizagem e pode ser uma fonte de aprendizagem para o
mundo.
Uma sala de aula ao formar uma comunidade de aprendizagem, torna-se um ambiente
orquestrado para FOSTER aprendizado significativo baseado na colaboração. Como membros,
os participantes de uma comunidade de aprendizagem aprendem pelo simples fato de fazerem
parte, pertencerem. O que aprendem passa a fazer parte de suas identidades pela prática e pela
experiência.
2.6. COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM PROFISSIONAIS
Existem, atualmente, muitos pesquisadores que trabalham com essa concepção (Stoll and
Louis, 2007; Mitchell and Sackney, 2000; Toole and Louis, 2002; King and Newmann, 2001;
Talbert and McLaughlin, 1994, 2001; Hargreaves, 1994, 2002, 2003, 2004, 2006). Porém os
princípios norteadores de cada idéia variam consideravelmente. O cenário que está se
apresentando é que “Comunidades de Aprendizagem Profissionais” podem ser usadas em um
enorme número de práticas que apóiam o aprendizado profissional e engajam alunos e/ou
professores e/ou administradores e/ou diretores e/ou funcionários das instituições escolares, etc.
A questão está nas diversas formas que esses conceitos estão sendo formalizados teoricamente.
Como exemplo, se um projeto de “Comunidade de Aprendizagem Profissional” baseia-se
teoricamente nas noções apresentadas por Talbert e McLaughlin, a força motriz das atividades
deve vir dos dados coletados sobre o desempenho dos alunos. Em outros casos, vê-se
comunidades virtuais (Jackson and Temperley, 2007; Stoll, RobertsonButler-Kisber, Sklar,
Wittingham, 2007) desenvolvendo-se vertiginosamente.
Independente do embasamento teórico, as “Comunidades de Aprendizagem
Profissionais” reúnem, basicamente, um grupo de profissionais (base especializada e técnica) em
relações sociais que envolvem atividades reflexivas e colaborativas com o intuito de melhorar o
desempenho do ambiente escolar.
79
As comunidades de Aprendizagem Profissionais são vistas como uma estratégia em
potencial para a mudança e a melhoria da escola. Inicialmente, as teorias demonstram cinco
atributos como essenciais: liderança colaborativa e compartilhada, criatividade coletiva, valores e
visão compartilhados, condições de colaboração e disponibilidade de abrir a prática pessoal para
o grupo ( HORD, 1997 ).
Outra concepção aceita é que as comunidades de aprendizagem profissionais têm a
capacidade de promover e sustentar a aprendizagem dos profissionais envolvidos dentro da
escola com um propósito coletivo de melhoria da aprendizagem do aluno. Esse, sim, se torna um
objetivo quase que indispensável para a prática das comunidades de aprendizagem profissional: o
objetivo claro e direcionado de melhorar a aprendizagem do aluno.
A fim de enfatizar essas propostas de comunidades, elaboramos um quadro distinguindo
as diferenças mais significativas dos conceitos mais utilizados, hoje, no campo da pesquisa
educacional.
A caracterização proposta evidencia os membros que compõe a proposta; a força motriz,
ou seja, o pivô gerador de todo o processo; os objetivos que iluminam o planejamento das ações;
o enfoque, o propósito central de cada conceito; como ocorre o processo de aprendizagem no
entendimento de cada um dos teóricos que trabalham com o conceito; a liderança, como é
desempenhada e por quem; e finalmente o local onde acontece. Esses pontos foram escolhidos
por serem os principais identificadores de cada um dos conceitos, assim como proporcionam
uma visão geral de como as “comunidades” vêm sendo compreendidas e utilizadas.
80
Membros Ponto de
partida
Objetivos Enfoque Processo de
aprendizagem
Liderança Local
COM. DE
PRÁTICA
Colegas
Local de
trabalho,
questões do
dia-a-dia
Sobrevivência e
melhoria do ambiente
de trabalho
Convivência
diária de
colegas de
trabalho
Acontece
naturalmente
Não há um
orientador/mediador
específico, a liderança
acontece naturalmente
Local de trabalho
COM. DE
APRENDIZES
Alunos
Temas
relacionados
ao conteúdo
específico
Ampliação de
conhecimento
Processo
ensino-
aprendizagem
voltado para a
visão dos
alunos
Há colaboração e
empreendimento
compartilhado
Professor é o
orientador / mediador
Sala de aula/
algumas vezes inclui
alunos de diferentes
séries escolares
COM. DE
PROFESSORES
Professores
Conhecimento
do conteúdo
específico
Melhoria da base de
conhecimento
Formação de
professores
Há colaboração e
objetivo comum
Orientador/
mediador ( muitas
vezes, há um
pesquisador de fora da
instituição)
Própria escola
Professores
e pessoal de
supervisão,
direção, etc.
Dados sobre o
desempenho
dos alunos
Elevação dos índices
de desempenho dos
alunos nas disciplinas
Resultados
dos alunos
Há colaboração e
empreendimento
compartilhado
Orientador /
Coordenador
Liderança
compartilhada
Própria escola
COM. DE
APRENDIZAGEM
PROFISSIONAL
Talbert and
McLaughlin
Stoll and Louis
Professores,
orientadores,
diretores,
funcionários
da
instituição
Organização
escolar
Melhoria da
aprendizagem e
resultados dos alunos.
Preocupação com a
vida profissional dos
professores
Toda
organização
escolar
Há colaboração
entre os diversos
profissionais
focados na melhoria
da escola enquanto
instituição
Orientador /
Mediador
Própria escola
Tabela 1: Os diversos conceitos de “comunidades”e suas principais características.
81
Diante das concepções apresentadas, posicionamos este trabalho de pesquisa nas
“Comunidades de Professores” como uma proposta de formação continuada de professores.
Escolhemos as “Comunidades de Professores” por serem a única proposta que enfoca sua
atenção no desenvolvimento, único e exclusivo dos professores, de base de conhecimento. As
modificações, as evoluções que acontecem na instituição escolar envolvida no processo assim
como o melhor desempenho dos alunos aparecem como conseqüências naturais desencadeadas
pelos resultados obtidos nessa modalidade de ação colaborativa. Como a intenção sempre foi a
de vislumbrar uma opção de formação contínua para professores, resolvemos aprofundar
conhecimento nesse conceito.
Como foi destacado no capítulo de referencial teórico, as “Comunidades de Professores”
estão embasadas na premissa de que se as mudanças no processo aprendizagem prevêem que os
professores mudem sua forma de ensinar, então eles deveriam ser expostos às essas modificações
enquanto aprendizes. Apesar de baseada nos princípios das “Comunidades de Aprendizes”, não
se pode afirmar que a diferença está somente no fato dessas terem sido concebidas para os
alunos, enquanto as “Comunidades de Professores”foram elaboradas para professores. Na
realidade, as “Comunidades de Professores” tornaram-se mais do que uma versão das
“Comunidades de Aprendizes” para professores.
A comunidade reunida sob essa concepção assume de maneira séria e profissional, que o
ensino é uma profissão de aprendizagem (Darling-Hammond & Sykes, 1999) e que professores
são eternos aprendizes de seus conteúdos específicos. Os processos de atividades, reflexão e
colaboração são gerados pelo conteúdo específico e sustentado, legitimado e alimentado dentro
da comunidade. Mesmo cientes de que uma “Comunidade de Professores” diferencia-se de
outra, devido a aspectos como conteúdo, nível escolar dos alunos, etc., os membros passam a
compartilhar linguagem, crenças e atividades comuns. Eles participam de um mesmo objetivo (a
melhora do aprendizado dos alunos ou da base de conhecimento, por exemplo) e valores
(companheirismo, compreensão mútua).
Uma “Comunidade de Professores” visualiza contextos múltiplos nos quais os
professores trabalham, procurando um contínuo desenvolvimento intelectual em relação ao
conteúdo do currículo escolar que envolve professores enquanto aprendizes.
82
Acredita-se que ao trabalhar para a melhoria da base de conhecimento dos professores,
muitos benefícios acabam acontecendo simultaneamente como melhora da auto-estima e do
profissionalismo, melhor entendimento do conteúdo específico e conseqüentemente do
desempenho dos alunos, conscientização da necessidade de relações e conexões no ambiente de
trabalho, entre outros.
3. COMUNIDADES DE PROFESSORES E O CONFLITO SÓCIO-
COGNITIVO
Ao pensar numa comunidade enquanto formação continuada, há de se delinear os
princípios e preceitos que devem reger essa prática. Entre tantos termos e conceitos, o de
comunidade de professores parece ser o que mais se aproxima das teorizações destacadas pela
Ciência da Educação, exploradas no Capítulo I.
O processo das comunidades de professores que se vislumbra nesse trabalho é
caracterizado pela reflexão, atividade colaborativa, trabalho árduo e complexo, envolvendo alto
risco de imprevisibilidade. Além disso, a cultura escolar e comunitária precisa fornecer a
estrutura necessária para o seu entendimento e comprometimento.
SHULMAN (1997) acredita que os professores necessitam estar em comunidade onde
possam colaborar uns com os outros, investigando, discutindo, explorando como membros de um
comunidade de aprendizagem. Nessas comunidades, os professores têm a chance de aprofundar-
se sobre um aspecto, e dividir, compartilhar e aprender não só através da reflexão de seu próprio
trabalho, mas também com o trabalho de seus colegas.
“Evidências de pesquisa indicam que a maioria das atividades de desenvolvimento
profissional de professores (atividades de formação) que tiveram sucesso foram aquelas
83
desenvolvidas a longo prazo e que encorajaram a implementação de comunidades de
aprendizagem de professores
28
” (DONOVAN et al, 2003, p.204).
“A capacidade de entendermos uns aos outros não é inata, é desenvolvida através de
estudo, reflexão, experiências orientadas e questionamento
29
” (DARLING-HAMMOND, 2000,
p. 171).
Uma das primeiras lições a ser aprendida a respeito das comunidades de professores é que
algumas pessoas conhecem o que outras não sabem e que o conhecimento do coletivo sempre
ultrapassa o individual. Embora esse fator possa ser de senso comum, os professores passam a
maior parte de suas vidas profissionais em situações onde eles caracterizam-se como autoridade
máxima do saber pois seu conhecimento do conteúdo tipicamente são superiores a de seus alunos
(GROSSMAN et al, 2001).
Aprender com os colegas requer tanto uma troca de perspectiva quanto o
desenvolvimento da habilidade de escutar o outro. Além disso, requer um esforço de formular
pensamentos em resposta ao conteúdo intelectual desafiador. Esse movimento é denominado por
alguns estudiosos como conflito sócio-cognitivo.
“O conflito sócio-cognitivo é gerador de progresso sobretudo quando os participantes da
situação fornecem argumentos em defesa das suas respectivas posições e quando a
oposição de centralizações ou pontos de vista provoca uma dinâmica interativa de busca
de acordo, de coordenação das diferenças no marco de um enfoque superador”
(CASTORINA et al, 1998, p.111).
O conflito sócio-cognitivo é produtivo para o progresso do conhecimento. Num grupo,
pensamentos contraditórios apresentam-se simultaneamente a partir de indivíduos diferentes.
Existem interações muito mais produtivas que outras. As mais produtivas acontecem entre
indivíduos que se encontram em níveis próximos de desenvolvimento. Pois, quando a diferença
de nível é demasiadamente diferente, aquele menos preparado tende a ignorar o conflito ou não
compreender onde o mesmo está localizado, impedindo assim, um crescimento individual.
A partir do momento que os participantes conseguem estabelecer um nível próximo de
entendimento teórico, mais facilmente a interação alcançará a produtividade, pois cada indivíduo
28
Research evidence indicates that the most successful teacher professional development activities are those that are
extended over time and encourage the development of teachers’ learning communities.
29
“The capacity to understand another is not innate; it is developed through study, reflection, guided experience, and
inquiry.”
84
vê-se obrigado a levar em consideração as ações ou posições dos colegas e a tentar coordená-las
com as próprias. A partir desses esforços, torna-se possível reorganizar as idéias presentes no
grupo e empreender o caminho para a superação do conflito. Nem sempre essa superação resulta
numa resposta comum e unânime, mas garante uma dinâmica interativa eficaz para incrementar o
conhecimento dos participantes.
É necessário, então, criar, nos participantes, a compreensão de que é importante eles
deixarem, um pouco, de lado sua perspectiva e opinião para tentar entender a opinião e a
perspectiva do outro. As discussões devem priorizar questões de conteúdo com discussões,
debates, desafiando-se um ao outro de maneira saudável.
Ao assumirem compromisso ativo no andamento da colaboração cognitiva, os
participantes assumem responsabilidade sob o desenvolvimento profissional de seus colegas.
Normalmente, os professores expressam tal responsabilidade em relação aos seus alunos. Passar
a assumir essa obrigação perante o crescimento profissional dos colegas é inerente à maturidade
de membros de uma comunidade de professores que entendem que todas as mudanças resultam
de empenho individual e coletivo. Nesse sentido, apesar de que cada membro é um indivíduo
único, articula-se uma identidade de grupo com determinação de normas próprias que garantam
interação. O desenvolvimento de senso de responsabilidade comunal ajuda no entendimento das
diferenças que gera a habilidade de usar a diversidade para ampliar o conhecimento do grupo
como um todo a partir da regulamentação de normas e comportamento.
“Comunidades de professores” deveriam ser reconhecidas pela evidência de interações
positivas entre seus membros (GROSSMAN et al, 2001).
A noção de que a sabedoria e o conhecimento coletivos de um grupo ultrapassam os
conhecimentos individuais é um aspecto da concepção denominada “distributed cognition” -
idéia desenvolvida por Ann Brown et al.(1993), que indica o movimento no qual os indivíduos
ao trazerem diferentes aspectos do conteúdo para um grupo, compartilha-os coletivamente.
GROSSMAN et al (2001) propõe ainda o movimento de “distributed cognition” para “cognition
distributed”, onde há uma rotação e redistribuição dos papéis epistemológicos a fim de que os
professores, dentro de uma comunidade profissional, possam manter a atenção em dois enfoques:
aprendizagem coletiva e mudança individual dentro de um grupo social.
85
Ao contrário da simbologia do quebra-cabeça, numa comunidade, as peças não têm
contornos que se encaixam perfeitamente umas nas outras. São mais como imagens que se
transformam numa menor mudança de perspectiva.
A questão do quebra-cabeça epistemológico não é encerra em como os pedaços se
encaixam, mas como as diferentes posições fazem a discussão mais complexa e contextualizada.
O objetivo não é resolver um quebra-cabeça pré-existente, mas o de desconstruir noções de
forma e conteúdo e construir novas concepções.
4. AS COMUNIDADES E O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
Outro aspecto a considerar a respeito de uma “Comunidade de professores” é que o
aprendizado coletivo do grupo é necessário, mas não suficiente. Há também a necessidade do
aprendizado individual. Isso porque, na estrutura social existente do processo de escolarização,
os professores retornam à suas respectivas salas de aula individualmente e não coletivamente.
Dada essa realidade, que provavelmente persistirá por um futuro próximo, o coletivo precisa
servir como um terreno de desenvolvimento de novas maneiras de pensar e agir, de aprender a
escutar, e, ainda, de tentar novas maneiras de conhecer.
As comunidades encontram uma série de impedimentos vocacionais, estruturais e
culturais. Um desses impedimentos é a cultura escolar que está posta. Existe uma convicção de
o local para aperfeiçoamento e aprofundamento do conhecimento do conteúdo da disciplina só
pode ser fora da escola, e no tempo livre. Dentro da rotina escolar que os professores vivenciam,
quase nunca há um horário de encontro de professores a não ser pequenos intervalos: hora do
recreio, antes ou depois das aulas. E quando há um momento de reunião de professores, esse
período é utilizado para resolver problemas corriqueiros do dia-a-dia da escola, dos alunos e da
administração.
Os esforços de formação, historicamente, têm acontecido fora da escola, ou seja, os
professores saem da escola e vão até um instituto ou um centro educacional para participar de
cursos, seminários e/ou palestras. Esses encontros sugerem que o aprendizado é uma atividade
86
isolada, no período livre do professor, contrapondo-se ao fato de o aprendizado fazer parte da
vida profissional. Num nível prático, essas experiências são vistas como opcionais e assim,
muitos dos que precisariam de oportunidades de formação continuada quase nunca são
voluntários.
Além disso, há, comprovadamente, pouca mudança prática quando o professor é retirado
do seu local de trabalho, e, isoladamente, faz um aprofundamento teórico. Esses modelos de
formação chegam a afetar os indivíduos, mas dificilmente mudam o local de trabalho de uma
maneira significativa. (SEYMOUR SARASON, 1990)
Dentro das comunidades profissionais, a aprendizagem coletiva do grupo é necessária
mais não, suficiente. Na estrutura social da escolarização existente, os professores retornam às
suas respectivas salas de aula individualmente, não coletivamente. A partir desta perspectiva,
não se pode somente esperar que os professores desempenhem o mesmo papel intelectual.
Espera-se que as comunidades mantenham tanto a aprendizagem coletiva quanto a mudança
individual dentro de um grupo social.
“A construção de comunidade requer negociação social incluindo a regulamentação de
interações sociais e normas de grupo. Para formar uma comunidade, entretanto membros
precisam começa a assumir responsabilidades. Isto requer novas formas de participação
em relação à liderança
30
”(GROSSMAN et al, 2001, p.979)
A partir do momento que a discussão começa a ser distribuída entre os indivíduos, assim
como a liderança, apresenta-se aí um indicativo de igualdade e maturidade do grupo.
As comunidades são microcosmos de coletivos sociais maiores cujo eixo está na tensão
entre os direitos e as responsabilidades do participante. Para uma comunidade ser mantida, os
participantes precisam desenvolver a expressão honesta e sincera de suas opiniões e idéias, sem
temer a censura ou o ridículo. Mas as comunidades genuínas também requerem responsabilidade
de seus participantes. Numa “Comunidade de Professores”, a responsabilidade está ligada a
30
The construction of community requires ongoing social negotiation including the regulation of social interactions
and group norms. For a community to form, however, members must begin to take on this responsibility
themselves. This requires new forms of participation in leadership.
87
aprendizagem a partir dos outros professores, contribuindo para com as discussões em grupos,
pressionando os colegas a explicitarem seus pensamentos, fortalecendo o crescimento intelectual
do grupo, clareando idéias, provendo oportunidades para um aprendizado coletivo.
(GROSSMAN et al, 2001).
A comunidade pode criar um clima de coleguismo que só é visto entre estudantes em sala
de aula. Esse clima de colaboração enfatiza o valor da participação de colegas na vida
profissional e pode criar uma rede de suporte e comprometimento ao coleguismo quando esses
professores-aprendizes voltam a sua rotina de sala de aula. Pode-se, então, esperar que os
professores que tenham experimentado a experiência de participar de comunidades consigam
retornar a sua rotina com um profissionalismo muito mais colaborativo que antes.
A comunidade pode oferecer uma oportunidade para observar, conhecer e refletir sobre
no processo de ensinar dos outros participantes, coisa que a rotina das escolas quase nunca
propicia.
Nas comunidades, o professor tem a chance de validar idéias ao ter que expor e explicar
para o grupo. Essa é uma grande oportunidade de crescimento profissional. Além disso,
propiciam oportunidades de expor esses professores, que já têm experiência em sala de aula, a
vários conceitos e teorias com o benefício de elucidar problemas da prática passada, ou ainda,
revisar questões pedagógicas e políticas. Essas oportunidades tendem a fazer com que o
professor seja mais receptivo a explorar a teoria, e entender sua relevância e valor para o
processo ensino-aprendizagem.
“Enquanto esta visão de comunidade parece utópica, nós acreditamos que é exatamente
este tipo de trabalho que os professores devem exigir de seus alunos se suas aulas estiveram
baseadas nas comunidades de aprendizes. (...)As escolas não podem se tornar um local
interessante para as crianças antes de tornarem-se locais interessantes para os adultos
31
(GROSSMAN et al, 2001, p.980, tradução nossa).
31
“While this vision of community may seem utopian, we believe that it is exactly the kind of work that teachers
must require of students if classrooms are to become “communities of learners”. (…)Schools cannot become
exciting places for children until they first become exciting places for adults.”
88
5. TENSÃO ESSENCIAL DAS COMUNIDADES DE PROFESSORES
Como visto, a “Comunidade de Professores”, enquanto comunidade profissional, difere em
pontos essenciais de outras formas de comunidade na vida social. A comunidade profissional de
professores busca múltiplos contextos nos quais os professores trabalham. Contextos nacionais,
estaduais, distrital e escolar, todos influenciam nas definições da profissão e do papel dos
professores dentro dessa profissão.
Mas, a “Comunidade de professores” que se propõe nesse trabalho, precisa se preocupar
com sua clientela. Para um grupo de professores surgir enquanto uma comunidade profissional,
o bem-estar dos participantes deve ser central. De acordo com este critério, nem todos os
encontros de professores se caracterizam como uma comunidade profissional.
A melhora da prática profissional é a razão mais comum para a formação de
comunidades de professores e constitui a tensão essencial dessas.
Muitas vezes, os professores reúnem-se para estudar novo currículo, novas tendências, e
padrões em busca da melhora da prática e do aprendizado dos alunos. Porém, antes de
preocupar-se com novas técnicas pedagógicas ou novas formas de trabalho de grupo, deveria
atender o desenvolvimento intelectual contínuo dos professores nas disciplinas do currículo
escolar. Este aspecto da comunidade de professores assume que os professores são estudantes
eternos de suas disciplinas que precisam continuar crescendo em conhecimento, mantendo
contato com as mudanças em suas disciplinas. Esta visão – professor aprendiz - é central.
Os dois aspectos do desenvolvimento – um que enfoca a atenção dos professores na
melhora do aprendizado dos alunos, o outro que enfoca o professor como um aluno de sua
disciplina – nem sempre se combinam harmoniosamente. Algumas práticas que se preocupam
quase que exclusivamente em ajudar professores a aprendem técnicas pedagógicas para
implementação imediata, outras clamam renovar os professores, entretanto, na prática,
concentrando-se no conteúdo da disciplina.
No âmago da questão está um contraste entre a promessa de aplicabilidade direta e um
objetivo mais distante de renovação intelectual. O desafio de se criar uma comunidade no local
89
de trabalho está em alcançar ambos os objetivos simultaneamente: manter um foco nos alunos
enquanto cria as estruturas para os professores se engajarem como alunos das disciplinas que
ensinam. Este último objetivo, em contraste com o primeiro, não tem uma tradição escolar
fortificada.
Estes dois focos do aprendizado dos professores devem ser priorizados em qualquer
tentativa de sucesso de criar e sustentar uma comunidade intelectual de professores no local de
trabalho. Comunidades de professores devem, igualmente, preocupar-se com o aprendizado dos
alunos e com o aprendizado dos professores. Os dois focos são essenciais para o processo
ensino-aprendizagem. Ambos representam ingredientes essenciais para o desenvolvimento
profissional, e mantê-los trata-se de um processo dinâmico.
Essa tensão essencial não é do tipo criado pelo esticar de corda entre dois pontos fixos.
Mas uma tensão criada pelos movimentos de personalidades, identidades e desejos humanos. O
foco duplo do processo ensino-aprendizado do professor pode ser assegurado numa tensão
produtiva.
O entendimento das questões epistemológicas é importante não só como ganho pessoal
dos professores, mas também enquanto conhecimento significativo dentro da sala de aula.
Um dos desafios da “Comunidade de Professores” é a necessidade de negociar a tensão
essencial, ou seja, a tensão entre o desenvolvimento profissional, visando o aprendizado de
novas práticas pedagógicas, e o aprofundamento do conhecimento do conteúdo das disciplinas
que os professores trabalham.
90
CAPÍTULO III
ANÁLISE DE TRÊS CASOS TÍPICOS DE COMUNIDADES DE
PROFESSORES
Diante das teorizações pertinentes, que elevam e valorizam a criação de comunidades de
professores como uma alternativa eficiente e de sucesso para a formação continuada dos
professores, propõe-se nessa pesquisa verificar, sob a perspectiva dos envolvidos, o seguinte
problema:
Como pesquisadores/mediadores/orientadores que participaram de projetos típicos
de “Comunidades de Professores” analisam a construção e consolidação de tais
comunidades?
91
O objetivo geral da pesquisa é:
Analisar processos de construção e consolidação de “comunidades de professores”
sob a ótica de pesquisadores/mediadores/orientadores que participaram de projetos típicos
de “Comunidades de Professores”.
Os objetivos específicos derivados do objetivo geral são:
1. Identificar e caracterizar diferentes abordagens de “comunidades” na área
educacional e a concepção dessas abordagens por parte dos
pesquisadores/mediadores/orientadores que trabalharam com casos típicos de
“Comunidades de Professores”;
2. Identificar e analisar momentos de constituição, desenvolvimento e consolidação
de casos típicos de “Comunidades de Professores”;
3. Analisar o papel dos pesquisadores/mediadores/orientadores e seus
procedimentos;
4. Discutir trabalhos de cooperação frente aos trabalhos de colaboração;
5. Compreender diferentes tipos de inserção e formas de comprometimento dos
participantes da comunidade com o projeto e suas decorrências;
6. Analisar ocorrências de conflitos entre os participantes, entre as lideranças
constituídas e emergentes, observando como se caracterizam.
7. Analisar aprendizagens decorrentes da participação em diferentes momentos das
comunidades; constatando aspectos das aprendizagens individuais e coletivas.
92
Este estudo será realizado com participantes de três grupos de pesquisa caracterizadas
como pesquisas colaborativas, em suas diversas denominações. Cada um dos grupos constitui
um estudo de caso.
A compreensão de uma questão que envolve análise da percepção de sujeitos, os atores
sociais, é apreendida, nesse estudo, por meio de uma investigação de natureza qualitativa.
Dentre os inúmeros caminhos que a pesquisa de natureza qualitativa pode seguir, optou-se pelo
estudo de casos múltiplos (STAKE, 2006), cada um deles constituído por uma concepção que
corresponde às “Comunidades de Professores”.
Pesquisas qualitativas concebem a realidade percebida através de fatores sociais,
culturais, situacionais e contextuais tanto pelas pessoas de dentro quanto fora do caso. Espera-se
uma interatividade de funções e contextos descritos quando possível.
Num estudo qualitativo de casos múltiplos, o pesquisador examina as diferentes
atividades em diferentes contextos procurando por correlações. Quando há repetições de
correlações entre os casos, evidenciam-se algumas das interatividades do caso, ou seja,
identificam-se formas nas quais a atividade do caso interage com seu contexto.
“O pesquisador de casos múltiplos analisa como a situação de cada um dos diferentes
locais influencia o programa ou o fenômeno. Os pesquisadores da área procuram acontecimentos
ordinários para cada caso
32
” (STAKE, 2006, p.29).
1. CASOS MÚLTIPLOS
Um estudo de casos múltiplos começa com o reconhecimento de conceitos ou idéias que
ligam os casos juntos numa tentativa de conseguir as melhores explicações de um fenômeno.
32
“The multicase researcher tries to tease out how the situation at each of several different sites influences program
activity or the phenomena”. Researches in the field seek the ordinary happenings for each case.
93
Uma razão importante para utilizar a metodologia dos casos múltiplos é examinar como o
programa ou fenômeno em questão acontece em diferentes contextos. Isto, geralmente, quer
dizer que tanto os casos típicos como atípicos, deveriam ser selecionados. Inclusive, a seleção
dos casos é uma das partes mais decisivas de tal estudo, pois quando os casos são selecionados
cuidadosamente, o design do estudo pode incorporar uma diversidade de contextos.
Um dos primeiros enfoques num estudo de casos múltiplos é a caracterização do
programa ou fenômeno. Portanto, uma das principais tarefas do pesquisador é mostrar como o
programa ou fenômeno acontece em diferentes contextos. Quanto mais qualitativo for o aspecto
da pesquisa, mas ênfase será dada à experiência das pessoas dentro do programa ou em
decorrência do fenômeno.
Num estudo de casos múltiplos, o fenômeno é identificado e os casos tornam-se
oportunidades para estudá-los. Por se tratar de uma pesquisa qualitativa, uma amostra
significativa de casos deve ser selecionada, uma amostra desenhada especificamente para tal
estudo. Essa seleção constituirá uma variedade de oportunidades criativas para um estudo
intenso das questões devem incluem não somente os tópicos do problema central, mas também
as ponderações potenciais e latentes da pesquisa (STAKE, 2006).
Num estudo de casos múltiplos, o primeiro passo é descobrir o que cada caso,
individualmente, faz ou fez – sua atividade, sua função e funcionalidade. O pesquisador deve
observar a atividade se possível, analisar relatórios elaborados pelos participantes, entrevistar
envolvidos, etc. A descrição e a interpretação constituem atividades que fazem parte de estudo de
casos. Sendo que o ponto central de um estudo de casos múltiplos é a capacidade de colocá-los
numa mesma perspectiva, num só contexto.
Cada caso sofre influência do contexto no qual está inserido. Assim os contextos
precisam ser estudados e descritos, mesmo que não haja evidência de este possa estar
influenciando o fenômeno em questão. Pessoal envolvido (qualificação, interesse, participação
voluntária ou involuntária), contexto, micro-políticas e cultura escolar, orçamento e contexto
econômico são pontos que determinam as peculiaridades de cada caso. Por isso, a escolha dos
94
casos é um importante. “Entender o fenômeno crítico depende na boa escolha dos casos
33
(STAKE, 2006, p.23).
1.1. ESCOLHA DOS CASOS
Numa análise de casos múltiplos, um caso é de interesse porque ele pertence a uma
coleção particular de casos. Ou seja, esse caso compartilhar condições e características comuns a
outros casos. Por isso, quando se efetiva um estudo de caso, por mais que o pesquisador não
deseje fazer um estudo comparativo, o caso selecionado é estudado com atenção aos outros casos
existentes sobre o fenômeno. Esse grupo ou categoria de casos relativos a um fenômeno, é
considerado comoquintain
34
(STAKE,2006). Um quintain é um objeto ou fenômeno ou
condição a ser estudado. Num estudo de casos múltiplos, a pesquisa começa com a
determinação do quintain que se resume no alvo coletivo da pesquisa. O quintain é o guarda-
chuva que concentra todo o estudo das similaridades e diferenças dos casos para entender melhor
o fenômeno ou programa em questão. Normalmente, ao objetivar o quintain, consegue-se
reconhecer o conceito de ligação, a conexão entre os casos. Cada um deles pode ter uma relação
diferenciada a respeito do quintain.
Quais são os critérios para escolher os casos?
Primeiramente, que ele faça parte do quintain desejado.
Após examinar inúmeras manifestações do fenômeno, devem ser considerados aqueles
que são mais acessíveis ao pesquisador, no sentido de ter acesso à relatórios, artigos escritos a
respeito da experiência e contato com os organizadores da pesquisa em questão. A escolha de
casos típicos de ocorrência do fenômeno é relevante e até pode ser considerado mais propício.
Porém, é preferível escolher casos com fácil acessibilidade mesmo sendo atípicos do que
considerar casos típicos, somente, e não conseguir acesso aos dados fundamentais para um
estudo de casos múltiplos.
O pesquisador deve questionar-se a respeito de questões-chave quando da escolha dos
casos:
33
“Understanding the critical phenomena depends on choosing the cases well”.
34
Não haverá uma tradução da expressão quintain por falta de uma expressão na língua portuguesa que consiga
expressar seu significado em sua magnitude.
95
O caso é relevante para o quintain?
Os casos fornecem diversidade entre contextos?
Os casos fornecem boas oportunidades para aprender sobre complexidade e
contextos?
“Equilíbrio e variedade são importantes, relevância ao quintain e às oportunidades de
aprendizagem é normalmente de importância maior
35
” (STAKE, 2006, p.26, tradução nossa).
Se o pesquisador não conseguir observar uma série de acontecimentos ordinários no
estudo dos casos, então deve consegui-los entrevistando as pessoas que viram ou vivenciaram o
fenômeno, ou tentando descobrir através de documentos que relatam a experiência.
1.2. FONTES DE COLETA DE DADO
Tanto em estudos de caso como de casos múltiplos, as fontes de coleta de dados mais
comuns são: observação, entrevista, gerenciamento de dados, categorização e análise. O
pesquisador precisa documentar tanto os dados ordinários quanto incomuns.
Porém alguns cuidados devem ser tomados com a categorização. Algumas vezes a
categorização começa, muito cedo, a reduzir o complexo fenômeno em simples categorias. Às
vezes, a complexidade do caso pode ter que ser reduzida àquilo que pode ser compreendido pelo
pesquisador. Há uma negociação entre as partes e as questões a serem estudadas profundamente,
deixando o restante para menções breves.
Já com as entrevistas, os cuidados devem focar o fenômeno encontrado no caso. A
entrevista deve ser menos sobre o entrevistado e mais sobre o caso. É claro que a maneira como
o entrevistado vê o caso operando é conhecimento essencial. E o pesquisador precisa conhecer
um pouco do entrevistado para entender suas interpretações. Mas, nem um nem outro pode
abalar as concepções relativas ao fenômeno.
35
“Balance and variety are important; relevance to the quintain and opportunity to learn are usually of greater
importance”.
96
Além disso, o pesquisador precisa ter certeza acerca dos pontos relatados pelo
entrevistado. Assim, checagem juntos aos participantes
36
é uma técnica vital para o campo da
pesquisa. Após a conclusão das considerações a respeito do fenômeno, o pesquisador deve
checar com o entrevistado e/ou sujeito se as considerações estão corretas e de acordo com o que
foi dito. Esta técnica não só colabora para que não haja concepções errôneas no trabalho, mas
também fornece mais dados para o estudo contribuindo para a revisão e a melhora de
interpretação do registro.
Uma das questões mais efetivas para a entrevista é a “probe-based
37
(STAKE, 2006),
ou seja, utilizar materiais como textos, vídeos, e outros artefatos como sondagem para instigar
comentários e interpretação por parte do entrevistado. Os materiais de sondagem dão enfoque e
âmbito aos tópicos de interesse, assim como motivam a participação.
Após a coleta dos dados, um sistema de documentação e armazenamento é necessário.
Um bom plano organizacional para estudo de caso é essencial, mas não deve ser limitado.
1.3. TRIANGULAÇÃO
Pesquisas sociais lidam com muitas impressões – a dos pesquisadores e dos envolvidos.
Impressões podem ser dados relevantes, mas um bom pesquisador quer assegurar o quê está
vendo ou escutando, deve ter certeza de que não está simplificando a situação.
O processo de conseguir assegurar concepções e interpretações é conhecido como
triangulação (STAKE, 2006). A triangulação prevê que cada descoberta importante precisa ter,
no mínimo, três ou mais confirmações a fim de assegurar que significados importantes não estão
sendo desconsiderados. Cada interpretação precisa ser assegurada por dados que são apoiados
pelo referencial teórico a fim de evitar concepções errôneas a respeito do fenômeno que está
sendo estudado.
As percepções estão sujeitas às diferentes interpretações, por isso deve-se registrar tais
percepções com precisão e correção. O que parece ser real para uma pessoa pode não ser para
36
STAKE denomina de “member checking”( 2006)
37
Entendido como materiais de sondagem.
97
outra, e é necessário que estas múltiplas realidades sejam reconhecidas. É um processo que
procura minimizar o risco de um possível entendimento errôneo. Triangulação é um processo de
repetição, de recolhimento de dados e revisão crítica do que está sendo dito. Triangulação é um
esforço para assegurar que a informação e as interpretações obtidas sejam corretas. Espera-se
que a triangulação leve à confirmação do que foi observado, como foi observada pelo
pesquisador e como poderia ser observada por pessoas diferentes.
A triangulação pode acontecer de diversas formas:
Encontrar formas de utilizar múltiplos observadores do mesmo fenômeno;
Usar uma segunda ou terceira perspectiva ou até mais ( visão de outros
relacionados com o fenômeno);
Usar mais que um método de pesquisa (por exemplo: revisão documental e
entrevista);
Checar cuidadosamente para decidir o quanto a generalização da descrição total
confirma-se. Questiona-se:
As conclusões generalizadas se confirmam quando confrontadas com outro tempo
e espaço?
As conclusões a respeito da interação dos indivíduos neste grupo pertenceriam a
outros grupos ou seriam validadas por uma população?
No processo de construção de conhecimento, discordâncias acontecem freqüentemente.
Elas são pertinentes, pois é impossível que ocorra duas interpretações iguais realizadas por dois
observadores diferentes. Porém, essas discordâncias devem ocorrer entre fatos periféricos e não
em relação aos pontos mais importantes do fenômeno. Se ocorrer uma divergência sobre um
ponto importante da análise, as duas posições devem ser registradas.
A triangulação tem colaborado com esse processo porque trata de um procedimento de
uso de percepções múltiplas para clarificar significado e de verificação da repetição de uma
98
observação ou interpretação. Serve também para clarear significados pela identificação de
caminhos diversos de análise de casos.
Pesquisador qualitativo está interessado na diversidade de percepção e até mesmo em
realidades múltiplas vivenciadas pelas pessoas. E a triangulação ajuda a identificar essas
realidades. A triangulação é um processo importante na análise de um caso escolhido, mas não é
suficiente quando se opta pelo estudo de casos múltiplos. Além do processo de triangulação,
deve-se cruzar os dados relativos aos casos (“cross-case analysis) escolhidos numa análise
como esta. A análise entre casos torna-se passo vital num estudo de casos múltiplos.
1.4 ANÁLISE ENTRE CASOS
38
A análise desenvolve um trabalho dialético. Os temas originam-se com as pessoas
planejando o estudo do quintain. As descobertas originam-se com as pessoas estudando os
casos. Como se tratam de forças independentes, mas não diferentes, tanto os temas como as
descobertas são impulsos para a análise. Os temas preservam as principais questões da pesquisa,
enquanto as descobertas preservam certas atividades inerentes aos casos que compõem o estudo.
Dessa forma, os complexos significados do quintain são compreendidos diferentemente e melhor
por causa das atividades e contextos específicos de cada caso.
Ao cruzar esses dados que compõem a análise de cada caso, o pesquisador tem mais
compreensão do todo para redigir afirmações a respeito do quintain.
Pesquisadores trabalham para entender um programa ou explicar um fenômeno que
aparece em vários casos estudados. Algumas das mais notáveis diferenças entre os casos podem
ser identificadas, mas, dificilmente, se consegue um total entendimento do quintain sem uma
cuidadosa revisão dos detalhes dos casos. Esse é o trabalho maior. Após essa revisão, o
pesquisador processa o cruzamento das descobertas e dos temas envolvidos para finalizar a
análise do fenômeno.
38
STAKE denomina de CROSS-ANALYSIS
99
2. ESTUDO PROPOSTO
Neste trabalho, propõe-se como quintain a compreensão do fenômeno “Comunidades de
Professores” dentro da área educacional. Busca-se entender esse fenômeno complexo, porém
moderno e atual, a fim de conhecer mais profundamente enquanto processo de formação
continuada de professores, considerando o que se sabe sobre processos colaborativos de
aprendizagem de professores, base de conhecimento, expertise, e demais questões relacionadas.
É possível reconhecer uma grande quantidade de casos que envolvem estudos de
“comunidades práticas”, “comunidades profissionais”, “comunidades de aprendizagem”, etc.,
mas ao centrar interesse na teorização proposta, o número de casos diminui. Como se trata de
uma amostra representativa do todo, acredita-se que três casos coerentes com o referencial
teórico apresentado trazem à tona importantes oportunidades de aprendizagem a respeito das
“Comunidades de Professores”.
Considerando as recomendações de um estudo de casos múltiplos, prevê-se a realização
do estudo com três comunidades constituídas a partir de projetos de pesquisadores de
Universidades americanas, de forma a se poder apreender e analisar os processos explicitados
nos objetivos. Os requisitos utilizados para a definição dessas comunidades foram os preceitos
teóricos relativos ao quintain, respeitando a diversidade de contextos e a complexidade de cada
caso.
Dentre todos os projetos de pesquisa colaborativa conhecidos, foram passíveis de
separação alguns com características típicas acerca das comunidades de professores.
No Brasil, ainda não há registros sistemáticos, publicados, de projetos de pesquisa
realizados especificamente com o objetivo de construir uma teorização sobre as comunidades de
professores conforme entendida teoricamente nesse trabalho. Existem, sim, projetos
caracterizados como sendo de pesquisa colaborativa e que acabaram consolidando práticas de
“comunidades de professores”. Entre esses projetos, pode-se citar, por exemplo, aqueles
desenvolvidos no Programa ensino Público da FAPESP (por exemplo: UFSCar, GEPEC-
Unicamp, USP, UNESP – Araraquara). Visando o quintain proposto nesse trabalho, esses grupos
caracterizam-se como casos atípicos, pois iniciaram suas atividades sem qualquer objetivo
100
específico de teorizar sobre “comunidades de professores”, mas ao basearem-se em referencial
teórico similar ao apresentado aqui para as comunidades de professores, descobriram-se
praticando comunidades. Mesmo sendo uma possibilidade rica de pesquisa, os casos atípicos
não foram incluídos nesse trabalho. Num próximo momento, um estudo de casos múltiplos
contemplando os casos típicos em relação aos atípicos certamente renderiam uma pesquisa
interessante e importante para o estudo de comunidades na área educacional.
Na busca de projetos de pesquisa típicos de comunidades de professores, grupos norte-
americanos destacaram-se. Em função dos critérios expostos, foi necessária a escolha dessas
comunidades norte-americanas uma vez que a produção teórica dessa temática tem sido uma
vertente relevante no cenário educacional mundial. Dentre os projetos de pesquisa que envolvem
as comunidades de professores nos Estados Unidos, destacam-se as conduzidas pelo grupo de
pesquisadores liderados por Pamela Grossman, Sandra Crespo e Helen Featherstone. Sendo
que todas já desenvolveram projetos de construção e consolidação de comunidades enquanto
“comunidades de professores” contando com suporte financeiro das agências norte-americanas
de fomento à pesquisa.
Assim, três casos norte-americanos foram escolhidos para a composição desse estudo de
casos múltiplos.
Considerando a necessidade essencial de ter acesso a esses casos particulares, iniciou-se
um processo de contato com as pesquisadoras norte-americanas a fim de consolidar a proposta.
Diante do interesse e aceite das pesquisadoras Suzanne Wilson da Universidade de Michigan e
Judith Warren Little da Universidade da Califórnia, consolidaram-se os três casos que compõe o
quintain desse trabalho.
Determinou-se para a coleta de dados, a análise documental incluindo projetos, relatórios,
artigos publicados, etc.; e entrevistas com os orientadoras/mediadoras das comunidades, com
roteiro derivado dos objetivos e da teoria existente (APÊNDICES I, II e III).
Com o objetivo de mostrar como o fenômeno em questão acontece, STAKE (2006)
propõe a constituição de um portrayal para cada um dos casos escolhidos. Cada portrayal deve
incluir detalhes sobre o contexto no qual o fenômeno aconteceu. Nos casos propostos, cada
portrayal demonstrará o motivo da existência do projeto, as pessoas envolvidas, a caracterização
101
do projeto como um todo, o contexto histórico, as perspectivas e os resultados apontados em
relatórios. Após cada conclusão de portrayal, passou-se às entrevistas com as
orientadoras/mediadores responsáveis por cada grupo pesquisado.
Torna-se interessante registrar que todos os casos apresentados nesse estudo,
encontravam-se, na época da pesquisa, finalizados enquanto projetos. Esse critério foi utilizado
na perspectiva de que ao terminar as atividades e ocorrido um importante distanciamento, as
orientadoras/mediadoras pudessem fornecer, nas entrevistas, uma reflexão ainda mais profunda
sobre o fenômeno que essa pesquisa pretende elucidar teoricamente.
Após cada finalização de portrayal, as entrevistas com as orientadoras/mediadoras dos
casos eram realizadas. Assim, há um roteiro de entrevista diferenciado para cada uma das
entrevistas. Esse fato justifica-se, pois, mesmo sendo projetos sobre um mesmo fenômeno, cada
caso apresenta particularidades. Além disso, ao terminar a leitura de relatórios e artigos
publicados a partir dos projetos, questionamentos diferenciados surgiram a fim de que fosse
possível a elucidação de todos os aspectos necessários para a compreensão do quintain proposto.
3. PORTRAYALS DO CASO 1 e DO CASO 2
39
Título: ProjetoLucent de Comunidades de Práticas
Local: Estado de Michigan – Estados Unidos
Orientadora/Mediadora:
CASO 1 : Professora Doutora Sandra Crespo
Universidade Estadual de Michigan (MSU).
Na análise documental desse caso foram considerados os seguintes documentos de
circulação restrita:
39
Os CASOS 1 e 2 terão seus portrayals apresentados conjuntamente pois fazem parte do mesmo projeto,diga-se,
objetivos, estrutura, instituição financiadora,etc. Além disso, todos os detalhes apresentados nesse portrayal foram
retirados dos relatórios entregues para a Fundação Lucent após o término de cada ano de projeto.
102
Transcrições dos encontros do primeiro ano – 157 páginas;
Diário de bordo da pesquisadora – 75 páginas;
Transcrições dos encontros do segundo ano – 203 páginas;
Diário de bordo da pesquisadora – 90 páginas;
Relatório com transcrições parciais do terceiro ano – 319 páginas;
CASO 2: Professora Doutora Helen Featherston
Universidade Estadual de Michigan (MSU).
Na análise documental desse caso foram considerados os seguintes documentos de
circulação restrita:
Transcrições dos quatro anos de encontro da pesquisadora com o grupo – 614
páginas;
Diário de bordo da pesquisadora de todos os anos do projeto – 256 páginas.
Em ambos os casos, caso 1 e 2 , fizeram parte da análise documental os relatórios
enviados anualmente para a Fundação Lucent.
A Fundação Lucent busca prioritariamente o desenvolvimento da educação matemática e
científica assim como o desenvolvimento da juventude. Por isso, a fundação financia projetos na
área de educação, serviços relacionados à saúde e diversidade cultural. Enriquecer o
desenvolvimento profissional do professor é um dos objetivos claros da Fundação que financia
iniciativas que buscam novas tendências para o ensino de matemática e ciência.
O Projeto que configura o CASO 1 e o CASO 2 dessa tese foi financiado pela Fundação
Lucent dos Estados Unidos por três anos consecutivos por objetivar a formação de grupos de
estudo em quatro escolas da região urbana buscando melhorar a capacidade de pensar o ensino
de matemática, compreendendo mais o pensamento lógico matemático das crianças, através de
novas tendências. O projeto objetivou ainda começar a trabalhar com professores dessas escolas
que estivessem interessados em questões relacionadas à formação de professores.
103
Jane Boyd e Judy Thompson participaram como elo de ligação do projeto; professores da
MSU
40
ligados ao programa de formação de professores; David Carroll, coordenador do projeto;
Helen Featherstone e Sandra Crespo, investigadoras principais; Ifran Muzaffar e Betty Cheah,
dois doutorandos participantes do projeto; Perry Lanier, Yanping Fang e Lisa Keller , três
pessoas da universidade que contribuíram com tempo para o projeto.
Antes de expor a função das pessoas envolvidas no projeto, faz-se necessário definir
alguns fatos relacionados à formação de professores nos Estados Unidos. Inicialmente é
importante destacar que as regras variam de estado para estado assim como de universidade para
universidade. Como a Universidade Estadual de Michigan (MSU) é objeto de pesquisa, o
entendimento do processo de formação dessa instituição torna-se fundamental. Na MSU, o
aluno que quer ser professor da escola fundamental ao ensino médio tem nos dois primeiros anos
de universidade duas matérias básicas: “Princípios do Processo Ensino-Aprendizagem” e
“Diversidade e poder” ( currículo, gênero, políticas públicas, etc.). A partir do terceiro ano, ele
passa a acompanhar uma disciplina por área, considerando literatura em geral. No quarto ano,
ele passa a aprofundar-se especificamente numa disciplina. No quinto ano, ele inicia o estágio
como professor numa escola do nível que ele está se formando, durante um ano inteiro. Os
estagiários ficam nas escolas de segunda a quinta-feira e, na sexta-feira, vêm para a
Universidade para concluir duas disciplinas: “Responsabilidade Profissional”, sendo que as
turmas são divididas por contexto (escolas rurais ou urbanas, fundamentais ou secundárias, etc.),
“Matéria específica” ( aprofundamento teórico do conhecimento de conteúdo nas disciplinas:
matemática, ciência, literatura,etc.). Nesse estágio, as escolas são selecionadas previamente, e
durante todo o ano, o professor da sala de aula torna-se o “Collaborating Teacher” (CTs), ou
seja, o “Professor Colaborador” ; e o aluno que está estagiando torna-se o “AlunoTE. Como
mediadores do estágio estão os “Field Structurers ou Liasions” que são professores aposentados,
alunos graduados de mestrado ou doutorado que tornam-se responsáveis por relatórios mensais
sobre o andamento do estágio. Esses relatórios vão para os professores universitários de cada
matéria específica que não se espera que vão até às escolas. Ou melhor, espera-se que os
mediadores façam a interlocução entre Universidade e Escolas, por isso raramente um professor
universitário vai às salas de aula ou tem contato direto com os CTs. Somente quando ocorrem
40
Michigan State University, Universidade Estadual de Michigan
104
problemas sérios nos estágios, os professores da universidade acabam indo até às escolas para
definir a situação.
3.1. Determinando a Nomenclatura:
MSU será utilizado para a Universidade Estadual de Michigan.
Como Professores Colaboradores têm uma definição totalmente estabelecida em
português e na cultura educacional brasileira para designar os professores que são contratados
das Universidades, o termo CTs será utilizado para denominar os professores que no sistema da
MSU recebem estagiários em suas salas de aula. Novamente, os CTs são professores das escolas
que aceitam receber estagiários por todo um ano letivo.
Denominam-se “mediadores” os profissionais que fazem o trabalho de interlocução entre
a Universidade e os CTs.
E para Professores Universitários estabelece-se, para esse contexto, o entendimento mais
aprofundado de professores que trabalham na formação de professores.
3.2. A função de cada participante no contexto do Projeto
O trabalho dos mediadores ficou determinado pelas seguintes tarefas:
supervisionar o trabalho dos estagiários no programa de certificação (alunos do
curso universitário de formação de professores que estavam completando um ano
de estágio numa escola fundamental);
visitar os estagiários nessas escolas pelo menos uma vez por semana;
observar o ensino formalmente em intervalos regulares;
reunir-se com os CTs;
105
coordenar um grupo de estudo na escola para os estagiários que eles
supervisavam;
manter contato próximo com os professores das escolas;
participar de dois dias no Instituto de Verão Perry Lanier que introduziram os
professores aos Parâmetros definidos pelo Conselho Nacional dos Professores de
Matemática
41
e às novas idéias sobre o ensino de matemática e interesses em
geral dos grupos de estudo que Thompson e Boyd lançaram nas escolas.
Sandra Crespo e Helen Featherstone não estiveram nas escolas durante o ano 1999-2000.
Elas começaram suas atividades em agosto (início do ano letivo), conversando com os
professores sobre grupos de estudo e recrutando interessados em participar. Na metade do
outono, os grupos de estudo foram lançados em todas as escolas e em dezembro, todos os grupos
estavam se encontrando regularmente
42
.
3.3. Metolodologia dos Grupos de Estudo:
A estrutura de um encontro de grupo de estudo utilizado no projeto é similar ao proposto
por Simon’s (1994), “learning cycles”, ou seja, “ciclos de aprendizagem” para a educação da
matemática. Neste caso, os grupos de estudo tiveram quatro ciclos de aprendizagem –
Resolução, Proposição, Interpretação e Reflexão. “Nosso modelo cria oportunidades para os
professores participantes explorarem a matemática juntos, aprender com o relato da prática de
cada um, e aprender sobre o pensamento matemático dos alunos considerando diferentes níveis:
41
Para maiores detalhes, acessar www.standards.ntcm.org
42
Estações do ano nos Estados Unidos, estado de Michigan:
Primavera: 21 de março Verão: 21 de junho
Outono: 23 de setembro Inverno: 22 de dezembro
106
da primeira a quinta série do ensino fundamental
43
” (CRESPO & FEATHERSTONE, 2006, p.98,
tradução nossa).
As duas primeiras fases ocorrem quando os professores juntos resolvem um problema
matemático específico e discutem e analisam suas soluções e as maneiras de propor o problema
para os alunos. Os professores exploram maneiras de adaptar o problema e utilizá-lo em todas as
séries, considerando o conteúdo e o processo matemático que os alunos podem aprender a partir
da aula proposta.
As fases de interpretação e reflexão ocorrem depois que os professores tentaram a versão
deles do problema em suas próprias salas de aula e vêm, para o encontro do grupo, preparados
para compartilhar estórias de suas salas com insights vindos do pensamento dos alunos e suas
práticas de ensino.
Para uma elaboração mais profunda, no ciclo de resolução, os professores têm oportunidades
de engajar-se em fazer a matemática. Este trabalho fornece a eles oportunidades de explorar e
discutir suas próprias teorias e soluções matemáticas para provar ou refutar a identidades e
expansão de seus conhecimentos e crenças sobre um conteúdo específico da matemática e sobre
os métodos para aprender matemática, e avaliar o potencial do problema para apoiar o
aprendizado do aluno. O ciclo da proposição fornece aos professores a oportunidade para
explorar a demanda de problemas de maneira contextual, matemática e lingüística, antecipar-se e
preparar-se para as dificuldades dos alunos, e elaborar versões do mesmo problema para
experimentar com os alunos em diferentes séries. No ciclo da interpretação os professores
exploram o trabalho matemático dos alunos nas diversas séries, identificam insights sobre o
trabalho matemático dos alunos e seu entendimento, e desenvolvem quadros analíticos para
interpretar o ensino e a aprendizagem dos alunos. O ciclo da reflexão, por sua vez, fornece aos
professores a oportunidade de explorar o que eles e seus alunos aprenderam, identificando as
práticas eficientes e os aspectos decorrentes dessa prática (fatos a serem examinados ou
mudados). Além disso, possibilita o mapeamento de um plano possível para o que vem a seguir
e para a investigação sobre a sua maneira de ensinar e sobre a aprendizagem de seus alunos.
43
Our model creates opportunities for the teacher participants to explore mathematics together, to learn from each
other’s stories of practice, and to learn about students’ mathematical thinking across the elementary grades.
107
Além da estrutura do grupo de estudos, os organizadores apontam algumas características
específicas desse modelo:
a. School-based”: o grupo de estudo está centrado na escola, ou seja, os professores
participantes são da mesma escola. De acordo com os organizadores, esse ponto é
importante porque promove a realização de comunidades de práticas entre colegas que
por compartilharem o ambiente de trabalho têm mais chance de apoiar o esforço de cada
um em ensinar diferentemente, além da possibilidade de eles continuarem ajudando uns
aos outros mesmo após o fim do projeto.
b. Cross-grade”: os participantes são professores de diversas séries do ensino fundamental
(lembrando que o ensino fundamental nos Estados Unidos corresponde do primeiro ao
sexto período). Esta característica, novamente de acordo com os organizadores, cria
oportunidades para os professores pensarem sobre como o pensamento matemático se
desenvolve no decorrer das séries, além de proporcionar uma visão de como professores
de diferentes séries e seus alunos podem participar de uma mesma tarefa, como a
resolução de um problema matemático adaptado para cada nível.
c. Problem-based”: as discussões sobre matemática, o trabalho dos alunos e a pedagogia
são desenhadas cuidadosamente para desafiar e ampliar o entendimento matemático dos
professores enquanto possibilidades de adaptações dos problemas são oferecidas.
d. Focused on participant-generated artifacts: há um foco específico nos fatos
vivenciados pelos participantes que trazem para o grupo de estudo relatos de suas práticas
de suas próprias salas de aula que se tornam objeto de discussão do grupo. Este fator
possibilita aos professores aprenderem mais sobre seus alunos, e como sua prática e a de
seus colegas podem se tornar questão para discussão (CRESPO & FEATRERSTONE,
2006, p. 98-99, tradução nossa).
3.4. Primeiro Ano do Projeto:
3.4.1. Atividades desempenhadas pelo pessoal do Projeto:
108
De setembro a Junho, o pessoal envolvido reuniu-se a cada 15 dias por duas horas para
discutir sobre o que estava acontecendo nos quatro grupos de professores. Nesses encontros, eles
compartilhavam problemas matemáticos e outras tarefas que os líderes do grupo tinham usado
com sucesso, discutiam as implicações relevantes para a pesquisa (o grupo leu um número de
artigos sobre desenvolvimento profissional durante a preparação para estes encontros),
examinaram relatórios transcritos do encontro dos grupos e consideraram o que estavam
aprendendo. Nesses encontros, continuamente, eles avaliavam o progresso do projeto
considerando os próximos passos.
“Logo ficou claro que embora todos nós percebêssemos sinais de progresso tanto na
prática dos professores em sala de aula e no que estava acontecendo nos grupos de
professores, nenhum de nós sentiu que os professores estavam preparados para
redirecionar sua atenção, passar de sua própria prática do ensino da matemática para as
tarefas de introduzir os aspectos relacionados aos estagiários envolvendo questões sobre
novas maneiras de pensar o ensino da matemática”.
Algumas dificuldades ocorreram e acabaram atrasando esse movimento (da prática dos
professores para as questões que envolviam os estagiários). Além disso, em retrospecto, os
organizadores do projeto parecem ter percebido que em qualquer grupo em que os professores
estejam trabalhando seriamente nos desafios de desenvolver nova pedagogia no ensino da
matemática, esses professores gostariam de evidenciar sua própria prática, na sua escola e em sua
sala de aula pelo menos no primeiro ano. Após essa conclusão, decidiu-se que a criação do grupo
sobre formação de professores entre as escolas envolvidas não se concretizaria até agosto de
2001. Porém, durante o verão, houve um encontro entre as escolas que enfocou o planejamento
das atividades, vislumbrou mudanças para o novo ano escolar, mas também buscou chamar a
atenção dos participantes para algumas questões sobre como trabalhar com os estagiários. Criou-
se um grupo virtual com os participantes das quatro escolas a fim de continuar as conversas entre
os grupos de estudo das escolas e assim facilitar a transição na direção de pensar sobre os
objetivos de formação de professores.
3.4.2. Atividades Específicas dos Grupos de Estudo:
109
Quatro grupos de estudo foram formados com professores de quatro escolas do ensino
fundamental (no sistema educacional brasileiro, essas escolas compreendem do 1 ao 6 período).
Cada grupo era composto de sete a quinze professores representando todas as séries, e
encontrava-se regularmente há cada duas, três ou quatro semanas, dependendo das preferências
dos professores de cada grupo. Os encontros duravam algo em torno de uma hora e meia a duas
horas e meia, tanto durante o horário escolar quanto depois do horário escolar. Os professores
participantes foram recrutados de maneira diversificada, refletindo diferenças de contextos entre
as escolas. Por exemplo: na escola 4, a diretora convidou o líder do grupo Lucent para usar três
horas de um dia designado para o desenvolvimento profissional agendado para um workshop que
enfocou o ensino da matemática a fim de fornecer alguma idéia sobre o que eles poderiam estar
fazendo se eles resolvessem unir-se ao grupo Lucent. Aí, os professores tiveram uma semana
para decidir se queriam ou não inscrever-se no projeto. Nove dos doze professores da Escola
decidiram unir-se ao grupo.
Em outra escola, o líder do grupo de estudo fez uma breve apresentação no encontro de
professores. Os professores pareciam interessados, mas nas semanas seguintes, somente três
professores haviam se inscrito. O líder conversou com os professores para entender o motivo do
baixo número de inscrições e descobriu que os professores não queriam encontrar-se após o
horário escolar. Então novo convite foi feito, mas desta vez para encontros durante o horário
escolar, e nove professores concordaram em participar. Nessa escola, o processo de recrutamento
de professores demorou um semestre inteiro.
Quanto aos encontros entre as escolas, dois foram realizados durante o verão, perto do
início do ano letivo (o ano letivo nos Estados Unidos das escolas fundamentais começa a partir
do Dia do Trabalho que é comemorado na primeira segunda-feira de setembro). No primeiro
encontro, somente duas escolas participaram. No segundo encontro, professores das quatro
escolas se fizeram presentes.
Além disso, os coordenadores do projeto conduziram encontros com os líderes dos
grupos de estudo, assistentes graduados, coordenador do projeto, e diretor do projeto há cada
duas semanas durante o ano acadêmico de 2000-2001. Nesses encontros, foram discutidas as
implicações da pesquisa para o trabalho de cada um, buscando planejar e discutir as atividades de
coleta e análise de dados do projeto, a fim de considerar o que eles estavam aprendendo.
110
Os encontros de todos os quatro grupos de estudo foram documentamos. Foram feitas
gravações com posterior transcrição, resumos narrativos de alguns dos encontros foram escritos,
e observações foram realizadas nos momentos que os professores participantes estavam em sala
de aula, sendo que algumas dessas aulas também foram gravadas.
3.4.3. Realizações:
Uma proposta de pesquisa foi feita para um dos simpósios interativos no encontro anual
da AERA, “American Educational Research Association” (Associação da Pesquisa Educacional
Americana). O título da proposta foi: “Studying School-Based Mathematics Teacher Study
Groups: What are participants learning and how can we tell
44
?”
O simpósio caracterizou-se em quatro artigos:
a. “Doing mathematics and Analyzing Student Work: problem-solving discourse as a
professional learning experience
45
”.
b. “A teacher study group as a setting for collective learning: developing group
intersubjectivity
46
”.
c. “Shifting identities toward mathematics and math teaching: where is the evidence?
47
d. “Study group leadership: learning in and through practice
48
.
3.4.4. Resultados apontados:
Os professores mostraram comprometimento com seu desenvolvimento profissional e com a
perspectiva de melhorar o seu ensino de matemática ao continuarem a participar nos grupos de
44
Estudando Grupos de Estudos de Professores de Matemática nas bases escolares: o que os participantes estão
aprendendo e como eles estão relatando isso?
45
“Estudando matemática e analisando o trabalho dos alunos: resolução de problemas como uma experiência de
aprendizado profissional”.
46
“Grupo de estudo de professores como possibilidade de aprendizagem coletiva: desenvolvendo grupo
intersubjetividade”.
47
“Mudando perspectivas de matemática e o ensino de matemática: onde está a evidência?”
48
“Liderança em grupos de estudo: aprendendo na e através da prática.”
111
estudo em sua escola. Todos os professores comprometeram-se com mais um ano em seus
respectivos grupos de estudo. Considerando o tempo envolvido nos projetos, as demandas no
tempo dos professores e a pressão que professores de três escolas estavam sofrendo para ensinar
matemática enfatizando as habilidades computacionais ao invés de solução de problemas, as
decisões dos professores em continuar com o projeto foram avaliadas como um sinal de seu
comprometimento com seu próprio aprendizado e com os objetivos do projeto, e como um sinal
que eles acreditavam que estavam aprendendo.
Os professores afirmaram que gostaram de aprender uns com os outros e apreciaram
conhecer o que estava acontecendo nas outras séries. Eles também afirmaram que a sistemática
de resolver juntos os problemas matemáticos antes de trabalhar com esses problemas em suas
salas de aula, para depois reportar para o grupo de estudo o que havia acontecido e o que eles
aprenderam com a experiência, estava valendo à pena.
Os professores começaram a traçar um movimento de levar para a sala de aula o que
estavam “aprendendo” no grupo de estudos, como, por exemplo, as perguntas investigativas.
Além disso, em todas as escolas, os professores deram aos alunos, pelo menos um dos
problemas matemáticos que eles trabalharam no grupo de estudo, para que os alunos praticassem
nas salas de aula. Os professores também trabalharam a fim de adaptar o problema às diversas
idades quando necessário. Por exemplo, todos os quatro grupos trabalharam numa versão do
seguinte problema:
Manuel e Ana comeram uma pizza, cada um comeu metade. Manuel disse que comeu
mais que Ana. Ana diz que eles comeram a mesma coisa. Explique com palavras ou
desenhos como cada um deles poderia estar correto.
Nas quatros escolas, os professores da primeira a quinta séries apresentaram uma versão
deste problema a seus alunos e depois conversaram com o grupo sobre o que as crianças fizeram
ou disseram, como foi a discussão, o que foi diferente e o que as crianças pensaram sobre o
problema. Muitos professores trouxeram os trabalhos das crianças com eles, permitindo que o
112
grupo pudesse considerar a maneira como os alunos estão pensando matemática nas diversas
séries.
3.4.5. Resultados alcançados considerando a formação de professores
Os professores se demonstraram estar muito interessados em aprender mais sobre o programa
de preparação de professores na Universidade e seus papéis como mentores dos alunos
estagiários.
3.4.6. Barreiras encontradas:
3.4.6.1. Dificuldades em recrutar professores
:
Começar os grupos de estudos nas quatro escolas foi desafiador. Embora os diretores nas
quatro escolas tenham assegurado que os professores gostariam e teriam condições de se
encontrar regularmente em grupos de estudo depois do horário escolar, eles fizeram isso sem
consultá-los. Os professores, de fato, tinham pouco tempo – por exemplo, muitos deles tinham
professores estagiários em suas salas e precisam planejar as aulas com os estagiários após o
horário escolar – e em duas das escolas, provou-se impossível recrutar professores para um
grupo de estudo com encontros previstos após o horário escolar. Os diretores e o pessoal do
Projeto resolveram essa dificuldade de maneiras diversas, respondendo às diferenças de
contexto.
Em uma das escolas, a diretora exigiu que todos os professores fizessem parte do grupo de
estudo. A pedido dos professores, ela permitiu que eles usassem o tempo que já havia sido
programado para as reuniões semanais dos funcionários da escola;
Em duas das escolas, os professores não participariam se o grupo se encontrasse após o
horário escolar. Nessas duas escolas, professores substitutos foram necessários para permitir que
os professores fossem aos encontros. Uma dessas escolas está sofrendo pressão do Distrito
(corresponderia ao Núcleo de Ensino) ara ter os encontros após o horário escolar, pois o Distrito
está preocupado com os efeitos de ter os professores fora de suas salas. Esses professores estão
113
elaborando um documento tentando argumentar que o tempo que eles têm passado nos grupos de
estudos não tem sido tempo perdido.
A quarta escola, por outro lado, tem seus encontros após o horário escolar e não passou por
tais dificuldades, talvez porque esta escola tenha uma relação de mais tempo com a universidade
(Michigan State) e tem feito parte das iniciativas de desenvolvimento profissional.
Depois que as escolas e os distritos concordaram em participar junto com os professores da
MSU neste Projeto – esforços foram reunidos para alinhar o ensino da matemática com os
padrões NCTM e outras reformas. Porém, uma nova Superintendente num dos dois distritos fez
uma mudança significativa no contexto do ensino da matemática: ela instituiu diretrizes que
determinavam quais os tópicos que os professores deveriam estar ensinando em cada nível, em
cada série e quais as habilidades que deveriam ser trabalhadas. Ela também instituiu um
programa de provas trimestrais em matemática e literatura. Ambos os professores e o pessoal
das Comunidades de Práticas viram esses testes como instrumentos para testar habilidade
computacional mais do que resolução de problemas. Nem as diretrizes nem os testes se
alinhavam bem aos NCTM ( National Principles and Standards for School Mathematics, 2000)
ou aos Parâmetros curriculares do estado de Michigan. Os professores dessas três escolas
encontravam-se, então, limitados a essas regras delimitando sua condição e desejo de tentar e
experimentar as idéias introduzidas nos grupos de estudo. Na quarta escola, a escolha de um
livro didático específico teve um efeito similar na habilidade dos professores em adotar uma
prática voltada a resolução de problemas.
Na quarta escola, os professores e o líder do grupo lutaram juntos para amenizar os efeitos
das diretrizes e das provas trimestrais. Ao compartilhar suas frustrações, os professores
chegaram a constatação que o ensino da matemática de acordo com os Parâmetros poderiam
ajudar os alunos nas provas trimestrais porque esse tipo de ensino ajuda a desenvolver nos alunos
estratégias para encarar problemas que não lhe são familiares. Além disso, neste grupo até
mesmo os professores que estavam mais preocupados com o desempenho de seus alunos nos
testes ficaram interessados em ver como crianças de idades diferentes encaram os problemas
matemáticos. Resolver um problema juntos, daí discutir o que aconteceu nas diferentes salas e
examinar o trabalho dos alunos, esses três procedimentos juntos acabaram tornando-se uma
forma de progressão em direção a novas formas de ensino da matemática. Ao final do ano, os
114
participantes desse grupo entusiasticamente queriam que os grupos de estudos continuassem no
próximo ano.
3.4.6.2. Participação e presença nos grupos de estudo
:
Uma das escolas passou por dificuldades, no começo, com respeito a presença dos
professores. Alguns professores chegaram atrasados e outros não apareciam. Essa questão foi
discutida em um dos encontros e todos concordaram em chegar no horário.
Outra escola teve pouca presença nos encontros entre as escolas neste verão. Somente dois
dos sete professores participantes decidiram comparecer a esses encontros. Essa questão foi
discutida no grupo de estudo e aqueles que decidiram não participar do encontro entre as escolas
afirmaram que não foram porque o encontro aconteceu muito próximo ao início do próximo ano
escolar. O fato desta escola ter sofrido várias mudanças (chegada de um novo diretor, novos
funcionários e mudança no layout da escola) também contribuiu para o estresse dos professores
na tentativa de estarem prontos para o início do novo ano escolar. Alguns dos professores
acharam que introduzir um novo livro didático ao invés do enviado pelo Distrito não resolveria
as necessidades desses professores de imediato.
Essas questões foram consideradas no planejamento do segundo ano de atividades do projeto.
O engajamento e a participação dos professores nos grupos de estudos foram questões
avaliadas. Nem todos os professores participaram ou contribuíram igualmente. Questionou-se a
participação dos professores nas conversas profissionais que deveriam resultar em aprendizado e
mudanças significativas nos métodos de ensino utilizados pelo professor. Na maioria dos
grupos, a participação dos professores nos grupos de estudo pode ser caracterizada como
“conversas amigáveis” sobre sua didática. A expectativa era que eles ultrapassassem a fase de
simplesmente compartilhar experiências e idéias, e alcançassem a fase de falar abertamente e
publicamente sobre sua prática. Na escola 4, provavelmente por causa da história da escola
como uma escola que visa o desenvolvimento profissional, os professores pareciam ser capazes
de falar mais abertamente sobre suas diferenças de métodos e técnicas de ensino.
115
3.4.7. Conclusões:
De acordo com os organizadores do Projeto, o primeiro objetivo foi alcançado com
sucesso, enquanto os mesmos consideraram prematuro o segundo objetivo.
Durante os encontros de Setembro a Junho, tornou-se claro que embora todos os
envolvidos estivessem vendo sinais importantes de progresso tanto na prática em sala de aula
desses professores e no que estava acontecendo nos grupos de professores, nenhum dos
envolvidos sentiu que esses professores estivessem prontos para mudar sua atenção: passando o
enfoque do seu próprio ensino de matemática para as questões relacionadas às novas maneiras de
pensamento sobre o ensino de matemática.
3.5. Segundo Ano do Projeto:
3.5.1. Objetivos:
O objetivo principal definiu-se em continuar o trabalho com os grupos de estudo nas
quatro escolas na região urbana a fim de melhorar a capacidade no ensino da matemática
buscando ajudar os professores nesses quatro grupos a continuar a pensar mais sobre o
pensamento matemático das crianças e sobre as novas tendências no ensino da matemática. Dar
continuidade à metodologia e estrutura para os grupos de estudo, tidas como eficientes no
tocante ao promover o aprendizado profissional do professor.
Começar a trabalhar o programa de formação com os professores dessas escolas passou a
ser um objetivo secundário. A perspectiva inicial foi reestruturada, e um método de engajamento
dos participantes dos grupos de estudos em várias atividades relacionadas com o programa de
Formação da MSU foi desenvolvido. Com essa participação, relatou-se um grande progresso
nos objetivos durante esse segundo ano de Projeto.
3.5.2. Atividades desempenhadas pelo pessoal do Projeto:
116
O pessoal do projeto engajou-se em atividades múltiplas de desenvolvimento profissional,
ensino e pesquisa associadas ao projeto. No outono, Jane Boyd, Judy Thompson, Helen
Featherstone e Sandra Crespo, com Irfan Muzaffar, Yanping Fan e Xiaohui Peng conduziram,
documentaram e começaram a analisar os grupos de estudo. Algumas das observações
preliminares do projeto com respeito às oportunidades dos professores em aprender em grupos
de professores culminaram com a elaboração de um modelo desses grupos de estudo de
professores. Uma análise das conversas geradas nos encontros e os movimentos, as atitudes do
coordenador do grupo (“facilitator”) ajudando ou impedindo as conversas paralelas, com um
olhar mais cuidadoso na identidade dos professores e como isso afetou o trabalho em tais grupos
culminou com a elaboração de um bem detalhado modelo para grupos de estudo de professores.
Além disso, gerou uma proposta para o “National Science Foundation Teacher Enhancement
Program” – Programa de Aperfeiçoamento de Professores da Fundação de Ciência Nacional, a
fim de estender o trabalho que estava sendo feito no Projeto Lucent.
3.5.3. Resultados apontados:
Em relação ao primeiro objetivo, o modelo de grupo de estudo tem mostrado grande
potencial para o aprendizado dos professores. Um dos principais enfoques do método para
os grupos de estudo é o de engajar os professores na exploração da matemática através de
problemas que desafiem ou aumentem o próprio entendimento deles do assunto. Isto requer
uma seleção cuidadosa dos problemas matemáticos de forma que sejam desafiadores mas
também acessíveis aos vários níveis de sofisticação matemática dos alunos. Além disso,
espera-se que os professores sejam capazes de adaptar os problemas às séries através do
conhecimento do espectro de habilidade dos alunos. A análise do trabalho matemático dos
alunos é também outro enfoque importante desses grupos de estudo de professores. Esse
método ao valorizar o quê os alunos dizem, fazem e/ou escrevem busca encorajar o
pensamento dos alunos. As conversas de grupo, entretanto, são estruturadas de tal forma que
os participantes primeiro discutam suas próprias técnicas e métodos de resolução de
problemas matemáticos, para então passar o enfoque para o trabalho do próprio aluno que
também resolveu os problemas propostos. Depois de tentar suas versões de problema nas
suas salas de aula, os professores vêm ao próximo encontro do grupo de estudo com amostras
117
do trabalho de seus alunos prontos para compartilhar, discutir, e aprender sobre o raciocínio
de seus alunos.
Todas as quatro escolas no projeto tiveram sucesso com esse método de grupo de estudo.
De acordo com os organizadores do Projeto, esta prática resultou em importantes resultados
de aprendizado para os professores participantes. Em todos os quatro grupos, os professores
apresentaram ganhos nas seguintes áreas:
Experimentar novas práticas de ensino:
Uma das maneiras que isso ocorreu foi quando os professores levaram para suas
salas adaptações dos problemas que eles fizeram nos grupos de estudo.
Tipicamente, esses problemas tendem a serem diferentes dos tipos de problemas
que os professores costumavam usar em suas aulas, e conseqüentemente, os
professores estão experimentando problemas que eles não haviam considerado em
levar a suas aulas inicialmente, especialmente nas séries iniciais do pré. Nessa
mesma linha, pode-se afirmar que os professores estão ganhando prática
planejando e fazendo adaptações aos problemas matemáticos de forma que fiquem
acessíveis para seus alunos. Isto é uma prática, que devido às restrições de tempo
e falta de confiança em seu entendimento matemático, os professores tendem a
evitar em sua prática. Outra maneira que isto foi observado é que os professores
levaram para suas salas um bom número de táticas sugeridas pelos outros
membros do grupo ou que surgiram das discussões e observações durante os
encontros.
Insights sobre o pensamento dos alunos das diversas séries:
Novamente, este resultado positivo de aprendizagem foi identificado pelos
professores como um grande benefício de participar dos grupos de estudo com
professores de séries diversas (cross-grades). Compartilhando e examinando o
trabalho dos alunos gerados em suas aulas com problemas que foram amplamente
discutidos e experimentados, os professores foram capazes de aprender a analisar
118
as idéias dos alunos não só da série que eles estão trabalhando, mas também das
outras séries. Foi surpreendente, por exemplo, para muitos professores das séries
mais avançadas que os alunos nas séries iniciais conseguissem resolver problemas
com pensamento matemático sofisticado quando o trabalho deles foi orientado e
os problemas foram cuidadosamente adaptados para o nível de habilidade deles.
Em uma das escolas, o grupo trabalhou com um problema de somas consecutivas.
Este problema pede para achar todas as maneiras de escrever as somas
consecutivas para os números de 1 a 25. Depois de trabalhar por mais de uma
hora nesse problema, todos, exceto um professor num grupo específico,
concluíram que este problema não seria apropriado para seus alunos. O professor
da primeira série não concordou com o grupo e começou a oferecer idéias sobre
como este problema poderia ser trabalho em sua sala de aula. Inesperadamente,
essa professora decidiu convidar todos os membros de seu grupo para ir à sua aula
e observar a aplicação de sua versão do problema e suas idéias. O grupo aceitou o
convite. Todos os participantes, inclusive os organizadores do Projeto, ficaram
surpresos pelo que observaram naquela sala de aula. Eles ficaram espantados de
ouvir um aluno do segundo período ou da primeira série afirmar que todos os
números ímpares têm somas consecutivas, e a partir daí desenvolver uma
estratégia na qual provou que eles encontraram todas as maneiras possíveis de
escrever as contas consecutivas para cada número usando cubos UNIFIX.
Professores abrindo suas portas para os colegas:
O exemplo anterior é um testemunho desse resultado. Os professores
desses grupos de estudo estavam aprendendo a usar suas salas como um local para
o seu próprio aprendizado assim como para o aprendizado dos outros, trazendo
artefatos para suas salas tais como o trabalho dos alunos, estórias ou narrativas de
eventos que ocorreram em suas salas. Eles convidaram os colegas para
observações reais de sua maneira de ensinar ou trouxeram aulas gravadas para os
encontros abrindo sua prática como objeto de discussão. Outro exemplo
vivenciado ocorreu no começo do ano passado em um dos grupos de professores.
119
O diretor da escola pediu para o grupo apresentar sobre o projeto Lucent numa das
reuniões da escola. Os professores decidiram que ao invés de apresentarem sobre
o projeto, eles decidiram envolver seus colegas no trabalho que eles fazem nos
encontros. Eles seguiram os passos do grupo de estudo, o formato típico de seus
encontros e apresentaram um problema matemático e depois discutiram o
raciocínio matemático envolvido no problema e as formas que os professores
poderiam usar para apresentar o problema para os alunos e o que os alunos
poderiam fazer ou pensar a respeito. Depois eles apresentaram exemplos do
trabalho de seus alunos das mais diversas séries que foram particularmente
surpreendentes e inspiradores. Os professores depois relataram que muitos de
seus colegas levaram o problema para as salas de aula e o recreio foi utilizado
para conversas sobre o que eles teriam feito com o problema em suas salas.
3.5.4. Resultados alcançados considerando a formação de professores:
Em relação ao segundo objetivo, a estratégia foi de espelhar o trabalho dos grupos de
estudo com os cursos TE 401-401, ou seja, os cursos do estágio. A intenção foi a de criar
oportunidades para que os estagiários e os CTs engajassem em atividades de ensino similares e
colaborassem com o aprendizado de cada um. Isto significa proporcionar aos professores
experimentarem os problemas com seus alunos quando os estagiários estivessem em suas salas
de aula. Por exemplo, os grupos de professores que trabalharam no problema dos triciclos e das
bicicletas.
O problema é o seguinte:
Um fabricante de bicicletas e triciclos utiliza o mesmo tamanho de rodas para ambos. A
fábrica recebeu a encomenda de 100 rodas, e queria usar todas essas rodas. Que
combinações de triciclos e bicicletas eles podem fazer? Que combinações não
funcionariam? Há padrões?
Os professores trabalharam nesse problema durante o encontro do grupo de estudo e os
estagiários trabalharam neste problema durante suas aulas. Cada um dos grupos usou técnicas e
120
estratégias diferentes para solucionar o problema e tiveram várias idéias sobre como eles
poderiam apresentar esse problema para os alunos. Por exemplo, os estagiários não conseguiram
imaginar que este problema poderia ser apresentado em qualquer nível de escolarização do
jardim à quinta série, mesmo que o número de rodas fossem trocados para 10 ou 20. No dia
seguinte, os estagiários puderam observar os CTs apresentando uma versão do problema para
uma quinta série. Os estagiários anotaram sobre as atitudes dos professores e coletaram os
trabalhos dos alunos a fim de elaborar um texto com as impressões que tiveram para serem
compartilhadas na próxima aula. Os insights que a experiência gerou para os estagiários e para
os professores do grupo de estudo foram inestimáveis. Depois de observarem seus CTs
implementarem uma lição sobre resolução de problema, os estagiários foram, então, instruídos
para planejar uma aula incluindo a resolução de problemas nas salas de seus CTs. Sendo assim,
haveria uma troca de papéis, dessa vez os CTs iriam observar os estagiários. Dessa forma, houve
colaboração no planejamento e na análise de todo o processo envolvendo o que aconteceu em
sala de aula, incluindo o trabalho dos alunos.
Na avaliação dos organizadores do Projeto, esta reestruturação do planejamento inicial
acabou sendo extremamente frutífera para todos os envolvidos. Este design forneceu as
seguintes oportunidades para os alunos em formação:
Observar práticas reais de ensino em verdadeiras escolas urbanas que estão mais
alinhadas com as idéias previstas pela reforma sobre o ensino e aprendizado da
matemática que são as idéias que a Universidade tipicamente adere e promove.
Mesmos os professores no Projeto que têm tendências mais conservadoras
concordaram em tentar maneiras menos típicas de resolver problemas nos grupos
de estudo em suas salas enquanto os estagiários estivessem em suas salas de aula.
Na opinião dos organizadores, isto acabou gerando uma melhora quanto ao
envolvimento dos professores mais conservadores.
As suposições dos estagiários sobre a habilidade dos alunos foram desafiadas pela
observação do desempenho deles. Pois os alunos conseguiram superar as
expectativas iniciais, especialmente nas primeiras séries do ensino fundamental
onde os estagiários têm pouca idéia sobre a capacidade das crianças em resolver
questões matemáticas.
121
Tornarem-se melhores observadores no campo, ou seja, nas salas de aula. Pois o
Projeto promoveu a oportunidade desses estagiários observarem aulas com o
conteúdo que eles haviam estudado e detalhado nas suas aulas.
Desenhar e implementar melhores aulas de resolução de problemas através da
oportunidade para os estagiários observarem os métodos utilizados pelos CTs
antes de eles mesmos terem que usar em suas aulas. Além disso, a partir do fato
de que os CTs também tiveram a chance de amplamente conhecer os problemas
matemáticos que os estagiários usariam em suas salas, eles seriam mais capazes
de melhor aconselhá-los considerando o planejamento e a implementação das
aulas em si.
3.5.5. Barreiras encontradas:
Diretrizes e as determinações do Distrito:
Depois que os distritos e as escolas concordaram em participar com o programa de
Formação de Professores da MSU neste Projeto Lucent, iniciou-se um esforço para
alinhar o ensino da matemática com os padrões NCTM e outras visões de reforma. Como
mencionado anteriormente, uma superintendente de um dos distritos promoveu uma
grande mudança no contexto do ensino da matemática: ela instituiu as diretrizes que
determinava quais os tópicos que deveriam ser ensinados em cada série e quais as
habilidades que deveriam ser trabalhadas. Ela também instituiu um programa de provas
trimestrais para matemática e literatura. Tantos os professores como o pessoal das
comunidades de práticas viram esses testes como um instrumento de avaliação de
habilidade computacional mais do que de resolução de problemas. Nem as diretrizes nem
as provas alinhavam-se bem com os NCTM, 2000, nem com os Parâmetros curriculares
de Michigan. Os professores nestas três escolas estavam restritos por tais guias e
conseqüentemente viram suas intenções de inovação e experiência assimiladas nos grupos
de estudo restritas também. Na quarta escola, a escolha de um livro didático teve um
efeito similar na capacidade dos professores adotarem uma prática de ensino baseada na
resolução de problemas.
122
Na escola 4, os professores e o líder do grupo batalharam juntos sobre os efeitos
das diretrizes e das provas trimestrais. O líder do grupo arranjou mais tempo para os
professores conversarem a respeito de suas frustrações com os testes e nestas conversas,
muitas vezes os professores consistentemente defenderam a idéia de que ensinar de
acordo com as Diretrizes realmente ajuda os alunos nas provas trimestrais porque ajuda
os alunos a desenvolverem estratégias para resolver problemas que não lhes são
familiares. Além disso, neste grupo até mesmo os professores que estavam mais
preocupados sobre os testes e sobre o tempo gasto na resolução dos problemas tirando
tempo do ensino e prática das habilidades que seriam testadas reconheceram que era
imensamente interessante ver como as crianças de diferentes idades encaravam um
problema matemático (por exemplo, o problema da pizza descrito anteriormente).
Resolvendo problemas juntos, discutindo sobre o que aconteceu nas diversas séries e
examinando o trabalho dos alunos, pareceu uma maneira de fazer com que algumas novas
considerações sobre o ensino da matemática fossem lentamente absorvidas.
Participação e presença nos grupos de estudo
:
A participação dos professores dentro dos grupos de estudo foi uma questão
relevante no processo. Nem todos os professores participaram ou contribuíram de
maneira igual. Isso é importante porque é através da participação nessas conversas
profissionais que o professor supostamente aprende e começa a pensar diferentemente
sobre seu ensino. Na maioria das vezes, as conversas entre os professores dos grupos
poderiam ser classificadas como conversas amigáveis sobre a prática de ensino. Mesmo
assim, eles deveriam ir além do fato de compartilhar idéias. Eles deveriam poder
direcionar questões aberta e publicamente sobre sua prática assim como não concordarem
um com outro. Na escola 4, provavelmente porque a história da escola como uma escola
de desenvolvimento profissional, os professores pareciam ser capazes de falar mais
abertamente sobre as diferenças sobre métodos e técnicas de ensino.
3.5.6. Conclusões:
123
O grupo dos coordenadores do projeto tinha a intenção de avançar as atividades dos
grupos de estudos para outras áreas de estudo. A essa altura, de acordo com o projeto original,
os grupos estariam começando a estudar outras matérias. Parecia razoável como extensão do
trabalho. Porém, o processo para estabelecer os grupos com enfoque no ensino da matemática
levou muito mais tempo que o antecipado. Entretanto, passos estão sendo tomados a fim de
disseminar nosso modelo de desenvolvimento profissional em outras áreas de conteúdo e para
outros grupos de orientadores de projeto da Universidade. A expectativa passou a ser a de criar
interesse nesta tendência em outros grupos ou indivíduos com expertise em outras matérias a fim
de assisti-los na elaboração de projeto e desenvolvimento de estratégias alternativas para a
criação de grupos de estudo de professores.
3.6. Terceiro Ano do Projeto:
3.6.1. Objetivos:
No terceiro ano do projeto, dois objetivos principais continuavam a ser explorados: primeiro,
o que busca construir capacidade no ensino da matemática em quatro escolas urbanas de nível
fundamental ( pré a quinta série) nas quais os estagiários do Programa de Certificação Elementar
fizeram observações como também assumiram aulas; segundo, o trabalho com os professores
destas escolas continuou buscando que eles re-pensassem as experiências que os estagiários
precisariam ter a fim de ensiná-los a ensinar matemática.
O grupo de organizadores acredita em ter alcançado importante progresso em ambos os
objetivos durante o terceiro ano de Projeto.
3.6.2. Atividades Específicas dos Grupos de Estudo:
No terceiro ano do projeto, as atividades dos grupos de estudos de professores enfocaram
dois objetivos principais; (a) melhorar o ensino através de investigações de currículo, práticas de
ensino e aprendizado dos alunos; e (b) continuar o trabalho de grupo de estudo e encontrar
maneiras de compartilhar e conectá-las com as comunidades escolares. Esse ano, todos os quatro
124
grupos continuaram a trabalhar na resolução de problemas usando o modelo descrito
anteriormente.
As investigações de um grupo de estudo sobre o uso dos desenhos (realizados pelos alunos
ao tentarem resolver problemas matemáticos) forneceu uma boa visão do trabalho expresso no
primeiro objetivo. Os professores em colaboração com os formadores de professores e
assistentes de graduação trabalhando naquele grupo selecionaram quatro problemas que
poderiam fornecer informação sobre as estratégias dos desenhos dos alunos. Um dos problemas
era o seguinte:
Dividindo um sanduíche
Mary comprou um sanduíche bem grande para dividir com suas amigas na hora do
almoço. Ela cortou o sanduíche em quatro pedaços assim cada uma poderia ter
seu pedaço. Quantos cortes ela teve que fazer?
Após apresentar o problema para seus alunos num formato de pesquisa, os professores
vieram para o próximo encontro com o trabalho de seus alunos, prontos para discutir o que
tinham descoberto. Os desenhos dos alunos variaram de um simples sanduíche colorido para
cenas completas de quatro pessoas numa mesa cortando um sanduíche. Os professores
analisaram que as semelhança e diferenças nos desenhos dos alunos nas diferentes séries
demonstraram que os alunos mais velhos tenderam a usar mais símbolos matemáticos e
operações matemáticas que os números dados no problema, assim como os alunos mais novos
tenderam a fazer desenhos que descreviam a situação. Nenhuma das estratégias mostrou-se ser
melhor que a outra. Na verdade, os melhores desenhos foram criados pelos alunos que se
preocuparam com a informação relevante para o problema e fizeram desenhos simples. Baseado
nessa descoberta, o grupo então iniciou discussões sobre como ajudar os alunos a entender a
diferença entre desenhar para propósitos artísticos e desenhar para resolver problemas.
Os grupos de professores trabalharam para descobrir maneiras de continuar o trabalho
deles buscando novos colegas para fazer parte. No final do ano escolar, todos os grupos de
estudo tinham feito um compromisso de tentar se encontrar, numa agenda a ser definida, no ano
seguinte.
125
3.6.3. Resultados alcançados considerando a formação de professores:
Este ano, continuou-se o trabalho de conectar o trabalho dos grupos de professores com
formação de professores especialmente com métodos de ensino de matemática para professores
de escolas fundamentais. Houve um compromisso tanto dos CTs como dos alunos estagiários
em resolver os mesmos problemas matemáticos nos seus contextos de forma que pudessem
refletir com os colegas sobre a matemática envolvida nos problemas e planejar aulas baseadas
nesses problemas. Isso significa que quando os professores mentores observavam os estagiários
ensinando uma lição que envolvia resolução de problemas para alunos do ensino fundamental, os
professores já tinham trabalhado esse problema com os colegas. O mesmo problema que os
estagiários estavam propondo para os alunos e que haviam discutido sobre o que os alunos
poderiam aprender com este tipo de problema. Ao mesmo tempo, significa que quando os
estagiários observaram seus professores mentores trabalhando um problema, eles já tinham
pensado sobre o que as crianças poderiam ter dificuldades, como eles poderiam resolver o
problema e o que eles poderiam aprender com o problema, tornando-se assim capazes de pensar
mais profundamente sobre o que eles observaram nesses estágios diferente dos estágios que
vinham para sala de aula sem participar do planejamento. Criando um contexto comum para
observar o ensino de cada um é uma inovação significante nos cursos de estágio que criam
oportunidades múltiplas para aprender a ensinar matemática. Considerando as reflexões feitas
pelos alunos estagiários depois de trabalhar com o problema “Triciclos e Bicicletas” e
observando como os CTs propuseram aquele problema para seus alunos, pode-se entender como
um estagiário aprendendo alguma coisa nova sobre a colocação de problemas pode estabelecer
diferenças culturais entre ele e as crianças de escolas urbanas.
Mrs. K. levou mais ou menos 5 minutos revisando a diferença entre triciclos e bicicletas e
questionando as crianças para certificar-se que elas estavam escutando. Eu fiquei surpresa com a
dificuldade das crianças em entender a quantidade de rodas que bicicletas e triciclos têm. Uma
menina chegou a dizer que uma bicicleta tem quatro rodas(ela provavelmente estava pensando nas
rodinhas), e um menino disse que a bicicleta tem três rodas. ( A palavra bicicleta é usada
geralmente para descrever um meio de transporte com rodas e pedais). Eu acho que tinha para
mim que crianças de primeira série já tinham andado de bicicleta pelo menos uma vez na vida,
mas isso nem sempre é verdade. E mesmo que tenham andado, isso não é a garantia de que
possam precisar a quantidade de rodas que triciclos e bicicletas têm.
Um dos pares da minha mesa criou uma produção com bicicletas somente, em triciclos. Esse foi o
único grupo a fazer isso. E Mrs. K. usou-os como exemplo e mostrou para toda a turma. Eu achei
126
esse trabalho como um exemplo de uma excelente resposta. Essa dupla achou uma estratégia para
achar rapidamente a soluço. Foi organizado em filas de cubos, que representavam os pneus das
bicicletas. Essa dupla criou uma situação que não foi discutida com o grupo previamente. Mrs. K.
nunca disse para seus alunos que eles poderiam resolver o problema levando em consideração
apenas bicicletas ou somente triciclos. Mas essa dupla foi capaz de descobrir que se fosse
resolvido dessa forma, considerando apenas bicicletas, não haveria desperdício de rodas, todas
seriam usadas.
Depois de observarem seus CTs dando aulas, os estagiários foram designados para dar
uma aula de solução de problema com os professores do grupo de estudo. As mesas foram então
viradas e os participantes ficaram observando os estagiários dando aula. Novamente, os alunos e
os professores foram capazes de colaborar na elaboração e na análise do que aconteceu na sala de
aula e no trabalho dos alunos. Esta maneira de trabalhar o curso de métodos matemáticos
baseado na experiência da prática tem se mostrado muito útil para todas as partes envolvidas.
Como foi discutido no relatório do ano passado, esse design tem fornecido oportunidades para os
alunos em formação de (a) observar nas escolas urbanas existentes as práticas de ensino que
estão alinhadas com as idéias da reforma sobre o ensino da matemática; (b) melhorar enquanto
observadores do pensamento das crianças porque eles agora tem oportunidades de observar aulas
baseadas nos problemas que eles resolveram e analisaram nas aulas de métodos e técnicas; (c)
planejar e ensinar melhor as lições com resoluções de problemas porque eles observaram um
professor experiente trabalhando um modelo de aula deste tipo antes de tentarem por si próprios;
(d) aprender mais com a crítica de seus professores mentores porque os CTs têm oportunidade de
aconselhar os estagiários sobre o planejamento e implementação de aulas que objetivam a
solução de problemas.
Outros educadores de professores, professores da MSU, souberam da diferença que o
trabalho com os grupos de estudo estava fazendo em relação à qualidade das experiências de
aprendizado que eram oferecidas para os estagiários. Durante os encontros de instrutores, por
exemplo, houve comentários sobre a diferença de motivação entre os estagiários que
participaram desse tipo de metodologia e os que não. A diferença está na motivação, no contato
mais próximo entre estagiários e CTs, e um sentimento de que a teoria não está tão distante assim
da prática.
127
3.6.4. Barreiras encontradas:
Demanda de tempo e comprometimento que este tipo de desenvolvimento
profissional requer.
O ano passado, o problema mais destacado foi o caso de professores que não
compareciam aos encontros.
Escola 1 e 2: encontros totalizando 3 horas e meia com professores substitutos em sala de
aula.
Escola 3: usaram o tempo designado para o desenvolvimento profissional mais 3 horas;
Escola 4: encontravam duas vezes por mês depois da aula por 1 hora e meia.
Os encontros na escola 4 tiveram muito mais problemas com presença que as outras
escolas e os motivos alegados foram: visita inesperada de membros da família, consulta médica
ou reuniões de trabalho. Uma maneira de endereçar este problema é apresentando aos
professores a opção de professores substitutos. Esta opção tem funcionado bem com outras
escolas, entretanto tem suas desvantagens. Primeiro, os professores ficam fora da sala durante
este tempo, e alguns professores e administradores relutaram com essa idéia. Segundo, embora
os encontros pudessem ser mais extensos, eles não podiam ocorrer com tanta freqüência, pois os
substitutos são contratados para meio expediente ou para o dia todo (lembrando que as escolas
nos Estados Unidos funcionam das 9 horas da manhã às 16 horas). Outro problema encontrado
foi que o número de professores participantes foi limitado, pois os administradores escolares
preocuparam-se com o fato de terem muitos professores substitutos na mesma escola ao mesmo
tempo. Entretanto, ao promover o encontro durante o horário escolar, os professores puderam
efetivamente observar uns aos outros durante o horário do encontro.
Provas trimestrais, Diretrizes e Livros Didáticos
128
Estes fatores continuam sendo um desafio para os grupos de estudo. Em três das quatro
escolas, a determinação das provas trimestrais continua a promover pressão em seguir um
currículo baseado em habilidades. Na Escola 4, a pressão foi para aumentar os resultados nas
provas, e tornou-se um desafio para os professores manter-se distantes das diretrizes distritais e
do livro didático. Os líderes do grupo Lucent responderam a esses impedimentos dando aos
professores tempo para conversarem sobre suas frustrações com as provas e pela tentativa de
criar normas de grupo que fossem flexíveis o suficiente para permitir que professores com pontos
de vistas diferentes considerando o espectro pedagógico pudessem participar confortavelmente
nas atividades de grupo. Além disso, muitos professores discutiram consistentemente sobre os
métodos e técnicas de ensino que estão de acordo com as Diretrizes que acabam realmente
ajudando os alunos nas provas porque dão ao aluno chances de desenvolver suas próprias
estratégias para resolver problemas que não lhe são familiares. E até mesmo os professores que
estavam muito preocupados com as provas e com o tempo gasto em resolução de problemas
tornaram-se muito interessados em descobrir como crianças de diferentes idades encaram um
problema matemático. Os líderes do grupo de estudo foram bem deliberativos escolhendo
problemas matemáticos que estavam relacionados com o conteúdo que os professores estavam
trabalhando – problemas que estavam relacionados com as provas trimestrais, por exemplo.
Ao final do ano, os participantes pediram entusiasticamente para continuar com os grupos
mesmo sabendo que o financiamento do projeto estava acabando.
3.6.5. Conclusões:
O modelo SPTIR mostrou-se ser eficiente, porém exigente, na busca pelo aprofundamento do
interesse dos professores e o entendimento da matemática, no pensamento matemático de seus
alunos, e desenvolvimento de novos métodos e técnicas para o ensino da matemática.
O modelo SPTIR pode ser usado de maneira eficiente tanto nos cursos de métodos e técnicas
quanto em grupos de estudo para professores experientes. Mais ainda, quando um instrutor de
estágio é também o líder do grupo de estudo e usa em ambos os contextos, os alunos de
formação de professores aprendem muito mais sobre a prática do que quando a teoria e a prática
não estão relacionadas dessa forma.
129
Houve trocas entre convidar ou exigir que os professores participassem nesta forma de
desenvolvimento profissional. Não houve nenhuma conclusão de que esse fato fizesse diferença
no final do Projeto.
Desenvolvimento profissional sustentável prospera em escolas com história e cultura de
desenvolvimento profissional. Ao término do Projeto, pode-se observar que a Escola 4 que
estava mais familiarizada com atividades de formação conseguiu encontrar menos barreiras que
as demais escolas.
A fim de obter um efeito sustentável na prática uma vez que não havia mais financiamento
para o projeto, o grupo de estudo, os professores e a Universidade podem precisar investigar
juntos como o ensino da matemática baseado na resolução de problemas pode também preparar
as crianças para as habilidades verificadas nas provas.
Como sobrou dinheiro do Projeto, o grupo organizador decidiu usá-lo para promover práticas
de grupos de estudo auto-sustentáveis. No quarto ano, os grupos de professores continuaram
sendo sustentados de diversas formas. Os professores do grupo de estudo passaram a ser CTs
contratados pela Universidade. Isto quer dizer que eles continuaram trabalhando com os
estagiários e puderam contar com os recursos do programa da Universidade. Além disso, os
organizadores continuaram a sustentar um encontro mensal e dois encontros entre escolas, um no
outono e outro na primavera. Esses encontros enfocaram a sustentabilidade e extensão das
atividades do grupo de estudo e a melhora das experiências dos alunos estagiários na prática.
3.7. CONCLUSÕES GERAIS APONTADAS AO FINAL DO PROJETO
3.7.1. No modelo de grupo de estudo usado, as coordenadoras acreditam que há uma via de
duas mãos entre as conversas que acontecem no grupo e a prática da sala de aula;
afirmando que as conversas que os professores mantinham no grupo de estudo sobre os
problemas matemáticos delineavam as experiências desses professores na prática.
Porém, as organizadoras apontam que os grupos de estudo como forma de
desenvolvimento profissional necessitam negociar múltiplos dilemas a fim de começar
e sustentar os grupos. Elas exemplificam como um dos dilemas o processo de seleção
130
dos professores que participariam dos grupos. Aqueles que foram obrigados a
participar exigiram um trabalho mais árduo por parte do “facilitator”, enquanto que os
professores que decidiram participar voluntariamente, acabavam sendo os professores
que menos precisavam de desenvolvimento profissional.
3.7.2. A escolha dos problemas matemáticos. De acordo com as coordenadoras, um bom
problema deve ser desafiador para todos os envolvidos, ou seja, os professores
participantes e os alunos em sala de aula. O problema não pode ser muito fácil, pois
assim as conversas dentro do grupo serão rapidamente abortadas e “as hierarquias
invisíveis de dentro do grupo serão fortalecidas”. Nem pode ser tão difícil porque ao
final do encontro poucos professores sairão sentindo que entende a matemática dos
problemas.
3.7.3. Interessante apontar a vontade dos participantes em continuar nesse tipo de atividade
como desenvolvimento profissional.
3.7.4. Oportunidades de aprendizagem analisadas pelas organizadoras:
Explorar a matemática conjuntamente:
o As conversas sobre os problemas matemáticos geraram discussões
colaborativas de soluções e estratégias entre os participantes.
Oportunidades iguais surgiram quando os professores estavam
empenhados em adaptar os problemas para cada série do ensino
fundamental. Nesse caso, as organizadoras acharam que as conversas
dos professores sobre suas próprias exploração da matemática foram,
na verdade, mais colaborativas e exploratórias que as conversas que
surgiram após o uso do problema em sala de aula.
o Uma condição sine qua non para existir questionamento é que sejam
feitas perguntas a respeito do tópico em questão. Mas da onde devem
surgir essas perguntas? Quando um professor conta uma experiência,
ele ou ela faz algumas afirmações baseadas em sua vivência do dia-a-
dia. Ao ouvir tais afirmações, normalmente, os participantes começam
131
a questionar tais convicções, pois nem sempre compartilham da mesma
idéia. Porém, as normas de privacidade e respeito ao colega, muita
vezes, impedem que surjam tais questões. Assim, as conversas são
determinadas pelas regras da boa educação ao invés de serem
resultados de questões relevantes, mas que podem ser recebidas como
críticas. As organizadoras desse projeto entendem que ao trabalharem
o problema juntos, ajudando-se mutuamente, os professores perdem
um pouco esse medo de que suas perguntas sejam interpretadas como
crítica.
Compartilhando experiências da prática:
o De acordo com a análise das organizadoras, ao trabalharem o problema
matemático em sala de aula e reportar a seus colegas como foi sua aula, os
participantes estiveram expostos a múltiplas oportunidades de
aprendizado. Inicialmente porque ao contar sobre sua aula, o professor
compartilha estratégias e estórias de seus alunos e de sua própria prática,
introduzindo assim os colegas à sua sala de aula e à sua prática. Outro
benefício descrito é que o professor acaba levando para sala de aula muitas
das estratégias sugeridas ou descritas pelos colegas participantes do grupo
de estudo.
o Como nesse projeto, alguns professores trouxeram vídeo de suas aulas e
alguns realmente convidaram os colegas para observar suas aulas, muitos
aprenderam assistindo a prática do colega muito mais do que observaram a
fim de criticar. Essa atividade acabou resultando em mais tranqüilidade e
proximidade entre os participantes. Outro ponto importante foi que os
professores acabaram se sentindo à vontade para compartilhar essas
experiências com outros colegas que não faziam parte do grupo de estudo.
Assim, outros professores começaram a utilizar tais problemas em suas
salas de aula.
132
o Os professores que tinham estagiários em suas salas de aula começaram a
se sentirem confortáveis com a idéia de compartilhar suas estórias com os
estagiários. Eles começaram a experimentar os problemas nos dias que os
estagiários estavam em suas salas de aula, tornando possível para eles a
observação do processo de resolução dos problemas que eles haviam
resolvidos em suas aulas de métodos e técnicas. Com essas experiências,
os estagiários acabaram aprendendo muito mais sobre como propor um
problema para uma série específica. Além disso, desenvolveram
admiração pelo potencial do pensamento matemático das crianças.
o Essas colocações acabaram por refletir sobre importantes questões que
envolvem a preparação de futuro professores. A diferença cultural fala por
si. Nesse caso, a maioria dos novos professores são mulheres brancas do
subúrbio ou da área rural. Essas experiências fizeram as estagiárias
refletirem sobre as realidades e os conhecimentos que elas tinham como
universal, alertando-as para a necessidade de trazer todas as informações
necessárias para que as crianças consigam resolver o problema em si, sem
que falhem por que não tem conhecimento de uma noção básica. (Citam
exemplo de crianças que acreditava que bicicletas tinham 4 rodas,
provavelmente considerando as rodinhas; ainda, haviam crianças que não
tinham noção do que eram triciclos)
o Sendo assim, outra questão sobre a formação de professores para todas as
crianças é que a cultura generalizada ensina os futuros professores a
subestimar a inteligência da criança, particularmente as crianças que eles
irão ensinar nas escolas urbanas.
Insights sobre o pensamento das crianças nas diferentes séries:
o Os professores participantes desse projeto analisaram como o maior benefício
de sua participação o entendimento do pensamento das crianças das diversas
séries. Ao compartilharem experiências, os professores puderam vivenciar a
resolução do mesmo problema não somente por seus alunos da sua série, mas
133
também pelos alunos de seus colegas em séries diferentes. Muitos ficaram
surpresos que as crianças no primeiro período fossem capazes de elaborar
idéias matemáticas tão sofisticadas quando a tarefa estava adaptada ao seu
nível. As organizadoras concluem que essa concepção de incluir professores
de várias séries fornece aos participantes a oportunidade de compreender as
questões relacionadas à coerência e continuidade o currículo entre os períodos
do ensino fundamental.
4. PORTRAYAL DO CASO 3
Título: Projeto de Comunidades de Professores – Mc Donell Foundation
Local: Seattle - Estados Unidos
Orientadora/Mediadora: Professora Doutora Pamela Grossman
Stanford University
O projeto também contou com a participação dos professores doutores Samuel Wineburg
e Stephen Woolworth da Universidade de Washington.
Na análise documental desse caso foram consideradas as transcrições que totalizaram
1.300 páginas com observações feitas pelos pesquisadores. Documento de circulação restrita.
O objetivo central do projeto foi o desenvolver um projeto que possibilitasse a proposição
de um modelo de comunidade de professores no local de trabalho. O projeto contou com a
participação de vinte e dois (22) professores de inglês e de estudos sociais, além de uma
professora de educação especial, de uma escola urbana de high school”, correspondente ao
ensino médio do sistema educacional brasileiro. Os projetos tiveram a duração de dois anos e
meio, sendo que os encontros aconteciam duas vezes por mês. A proposta era que professores de
dois departamentos distintos (inglês e história) pudessem reunir-se com o intuito de explorar o
entendimento na área de humanas que levaria a um currículo interdisciplinar. Para tanto, os
membros do grupo leriam textos das áreas de história e inglês.
134
A idéia era a de efetuar mudanças não somente individual, mas também cultural quanto
ao ambiente de trabalho.
4.1. Fundamentação teórica
O projeto proposto, que aqui corresponde ao caso 3, procurou criar uma “comunidade de
professores aprendizes” numa escola de ensino médio na cidade de Seattle. Após revisar a
literatura sobre comunidades no contexto educacional, o modelo escolhido foi baseado nas
características estruturais de uma escola urbana de ensino médio (sistema de trabalho, horário de
aulas, recursos, etc.), organização departamental e características intelectuais de ambientes de
aprendizagem cooperativa apresentadas principalmente por Brown e Campione das comunidades
de aprendizes.
4.2. Dificuldades
Os orientadores do projeto não contavam com uma dificuldade que apareceu desde o
primeiro encontro: quão difícil mostrou ser trabalhar com um grupo de professores que já se
conheciam. O grupo que se formou já possuía uma história que acabou afetando a formação de
comunidade. Muitos professores tinham opiniões sobre seus colegas formadas através de
histórias e relatos contados pelos alunos, e não por terem tido a oportunidade de ver seus colegas
na prática. Outros já haviam trabalhados juntos em alguns projetos escolares. Resumidamente,
as tensões e conflitos do ambiente de trabalho acompanharam as reuniões do projeto desde o
início.
4.3. Recrutamento dos participantes:
Os professores dos departamentos de inglês e história foram convidados a participar do
projeto como voluntários. Porém um salário de 1.200 dólares ao ano oferecido funcionou como
135
um incentivo em alguns dos casos. Assim como o conselho dos chefes de departamento
funcionou como outro incentivo à participação. Ou seja, essa quase determinação dos chefes de
departamentos fez com que muitos professores que dificilmente procurariam atividades de
desenvolvimento profissional relacionado à natureza de entendimento na área de humanas.
Graças ao dinheiro recebido para o projeto, durante o dia de encontro, professores
substituídos foram contratados assim os participantes poderiam dedicar-se à leitura e reflexão.
Os encontros aconteciam durante um dia inteiro, uma vez ao mês. Esses eram complementados
com encontros após o horário escolar de quinze em quinze dias e por um encontro de verão de 5
dias.
4.4.
Primeiro Ano do Projeto:
4.4.1. Escala de encontros:
Os encontros aconteciam quinzenalmente durante o ano letivo das escolas americanas
que compreendem os meses de agosto a início de maio. Durante o verão, os encontros
aconteciam durante uma semana e duravam aproximadamente oito horas.
4.4.2. Interesse dos participantes:
O projeto teve desde o início o propósito de gerar oportunidade tanto para desenvolver um
currículo interdisciplinar nas ciências humanas quanto para ampliar discussões sobre história e
literatura. Nem todos os participantes vieram com interesse nos dois objetivos. Alguns estavam
interessados somente em desenvolver currículo, e outros estavam mais interessados em praticar
leitura enquanto grupo. Essa caracterizou-se como a tensão inicial do projeto que envolvia um
grupo diverso, confirmando a teorização de que comunidades profissionais de sucesso devem
oferecer corredores múltiplos de participação. Dada a diversidade de experiência, nível
educacional, história de vida dos participantes e interesses próprios, os orientadores/mediadores
passaram a maior parte do primeiro ano de projeto tentando equilibrar as diferentes agendas e
expectativas.
4.4.3. Metodologia aplicada
:
Os orientadores/mediadores acreditavam que antes de construir um currículo, seria
necessário que cada participante conhecesse seus colegas profissionalmente, ou melhor,
136
enquanto pensadores e aprendizes. Por isso, as atividades tinham que agregar conhecimentos
dos dois conteúdos, inglês e história. Para tanto, os pesquisadores desse projeto basearam-se no
modelo de clubes de livros. Nos primeiros encontros, foram realizadas leituras de pequenos
textos (poemas, por exemplo) em pequenos grupos. Assim como nos clubes de livros, os
participantes após a leitura do texto proposto iniciavam discussão sobre alguns itens pré-
programados ou não.
4.4.4. Participação e desempenho das atividades
:
No primeiro encontro, o grupo determinou que um dos objetivos de um currículo
interdisciplinar seria ensinar os alunos a ler criticamente. Porém, ao tentar elaborar o
entendimento sobre o que seria uma leitura crítica, o grupo não conseguiu chegar a um consenso
satisfatório. Então, os mediadores/orientadores planejaram a atividade do segundo dia inteiro de
encontro com o objetivo de tentar esclarecer o conceito de leitura crítica. Assim, os participantes
leram um conjuntos de textos que incluíam uma parte do conto vencedor do prêmio Pulitzer, “A
Midwife’s Tale” de Laurel Thatcher Ulrich (1991), uma parte do poema “Homage to Mistress
Bradstreet”de John Berryman, um poema de Anne Bradstreet de um poeta colonial, e finalmente
um capítulo de um livro didático de história americana sobre a vida das mulheres na época
colonial. E, a seguir, um pequeno trecho do livro “Textual Power” (Poder Textual, tradução
literal) de Robert Scholes (1985).
Entretanto, as discussões foram marcadas por significativos momentos de silêncio e
participações esporádicas, com os participantes convencidos que os orientadores/mediadores
tinham respostas específicas às questões propostas.
4.4.5. Dificuldades encontradas
:
Três meses após ter se inscrito para participar do projeto, os orientadores/mediadores
receberam uma ligação do participante Dave, professor de inglês experiente, com profundo
conhecimento de conteúdo e muito respeitado por sua dedicação para os alunos. Dave informava
que estava se desligando do projeto devido aos comentários feitos pelos professores participantes
mais jovens durante um exercício em pequenos grupos. Dave deixou claro que sua decisão não
estava relacionada com os pesquisadores. Ao contrário, a preocupação dele era a de perder a
paciência e fazer comentários que se arrependeria mais tarde. Dave acreditava ser melhor ficar
137
em sala de aula, numa preocupação clara com seus alunos, mas totalmente alheio ao
compromisso de aprendizagem de seus colegas. Após ficar meses afastado do projeto, Dave
retornou influenciado pelos colegas de departamento de inglês.
Os pesquisadores apontam as atitudes dos participantes como uma das maiores dificuldades
encontradas. Segundo relatam, entre o segundo e quinto mês de projeto, era difícil ignorar
incidentes como rolar os olhos, suspirar, entre outros. Além disso, o grupo estava subdividido
em múltiplas facções ou alianças. E os conflitos pré-existentes perduravam.
Outros problemas foram surgindo e chegavam aos pesquisadores em conversas particulares
por telefone ou pessoalmente, e assim eram tratadas paliativa e individualmente. Essa questão
tornou-se complicada, por isso, uma discussão em grupo foi planejada para o início do encontro
realizado durante as férias de verão.
Ao reunir um grupo de professores de duas disciplinas diferentes, os pesquisadores
encontraram uma dificuldade maior, pois enquanto os professores de inglês encaram crescimento
pessoal como uma meta a ser atingida, os professores de história apresentam vários objetivos
sem uma unificação essencial, por exemplo. Ao ensinar a língua, os professores de inglês podem
trabalhar temas diversos e a partir deles explorar a gramática. O mesmo não acontece com os
professores de estudos sociais que ficam mais presos aos conteúdos apresentados no livro
didático. Com a finalidade de discutir essa relação, os pesquisadores planejaram uma atividade
na qual pesquisas sobre o aprendizado dos alunos sobre história seriam compartilhadas. Assim
os participantes leram documentos de fonte primária (carta escrita por Solomon Stodddard em
1703 pedindo que os índios evitassem o confronto) sobre a Batalha de Lexington, como também
textos com análises de historiados e estudantes a respeito do fato. As atividades propostas
incluíam a preocupação em como os alunos deveriam lidar com a dificuldade da linguagem e da
escrita do inglês arcaico. A questão passou a ser: o grupo deveria ler a carta simplesmente como
um texto aberto a interpretações variadas ou uma como uma janela que ajuda a interpretar como
as pessoas no passado construíam sua realidade? Em poucos minutos, as perguntas foram
mudando: Qual a relação entre texto e seu contexto histórico?, Como se deve ler história?, Como
se deve ensinar a leitura de textos históricos?, etc. A discussão durou todo o encontro e nenhum
dos subgrupos com opiniões diversas queria sair de suas perspectivas para tentar entender a dos
colegas.
138
4.4.6. Resultados apontados:
Após o primeiro encontro que durou um dia inteiro, os pesquisadores encerraram as
atividades sem mesmo responder a nenhuma das duas questões que tinham planejado: O que
significa ler criticamente? e Por que ler criticamente dificulta a leitura para os alunos?
As considerações apontam para um resultado longe do esperado, discussões difíceis de
acontecer naturalmente, questão central sem ser abordada e um sentimento de impotência e
expectativa para um próximo encontro.
Todas essas dificuldades levaram os orientadores/mediadores a confrontar uma realidade:
faltava conhecimento e habilidade para lidar com os desafios de dinâmicas de grupo e com as
divergências sociais e emocionais. Se por um lado tentavam negar a liderança, evitando serem
vistos como experts, os que sabiam tudo e detinham as respostas, por outro negligenciaram a
necessidade de liderança de grupo.
Logo ao final das discussões sobre “The Sweeter the Juice”, os orientadores/mediadores
começaram a identificar contexto de debate, reconsideração de crenças, e um início de
envolvimento afetivo dos participantes enquanto membros de um grupo que demonstravam
sinais de aprendizado. Sinais que indicavam a capacidade do grupo de aprender a partir do
argumento de alguém, a escutar mais as diferentes opiniões e idéias, etc. Enfim, o grupo passou a
refletir como um todo.
4.5. Dezoito meses seguintes do Projeto:
4.5.1. Escala dos encontros:
Seguiram o mesmo cronograma. Encontros quinzenais durante o ano letivo, e nas férias
de verão, encontros de oito horas cada, durante uma semana.
4.5.2. Atividades desempenhadas:
Os encontros do segundo ano iniciam com a leitura de “The Organic Machine” (“A Máquina
Orgânica", tradução literal) de Richard White, 1995. Este livro narra a história do Rio Columbia
139
responsável pelo desenvolvimento do noroeste americano. Ao contrário de outros livros, nesse
caso, o protagonista da história é o próprio rio. E essa qualidade literária foi responsável pela
discussão inicial sobre como os participantes viam o uso de metáforas feito por White. “Shortly
thereafter, the conversation flowed from the story of a river to a river fo stories” (Rapidamente, a
conversa fluiu da história de um rio para um rio de histórias), declaram os pesquisadores.
Professores que haviam participado pouco até o momento passam a descrever como suas
próprias vidas foram modificadas com o desenvolvimento do Rio Columbia. O rio acabou
servindo de metáfora para o desenvolvimento como um grupo. Vários participantes
espontaneamente compararam a história do Columbia com o curso imprevisível do grupo ao
reunir-se, criar currículo, e aprender a ler livros.
4.5.3. Resultados apontados:
4.5.3.1. A evolução do grupo constituindo identidade
:
A discussão do livro “The Organic Machine”, com as comparações da história do rio com a
história do próprio grupo marca a constituição narrativa de memória de grupo. Ao sinalizar a
história que envolveu a constituição do grupo, os participantes explicitaram a emergência do
coletivo, o uso do nós enquanto protagonistas de uma história. Como demonstra o comentário
feito por Rhonda, uma das participantes: “A grande coisa sobre o Lee é que até agora nós
estávamos fazendo comentários individuais. Agora que o Lee resolveu intrometer-se, nós
teremos que respondê-lo e cair em cima dele
49
”.
A partir desse ponto, as discussões começaram a delinear um modelo de grupo onde o
conhecimento individual ajuda a construir um conhecimento mais amplo. Durante as discussões
sobre “The Organic Machine”, Dave, um dos participantes pensou em voz alta: “Eu tenho uma
pergunta para alguém que pode me responder no café, mais tarde, mas eu sempre quis saber
como se constrói uma represa?
50
”. Esse momento é marcado pelos orientadores/mediadores
como um marco, pois o participante que elaborou o questionamento, tido como inteligente,
49
“The great thing about Lee is that up to now we’ve all been sort of making our own individual comments. Now
Lee jumps in and now we’re all going to have to respond and jump on top of him”
50
“ I’ve got a question for somebody and you can tell me during the break, I’ve always been curious, how do you
build a dam?”
140
incisivo em suas interpretações e um pouco “ cabeça dura”, pela primeira vez, assume que não
sabe algo. Essa demonstração de “ignorância” é bem recebida pelo grupo que, coletivamente,
elabora uma resposta. Esse tipo de pergunta, que apresenta desconhecimento, começa a
acontecer somente agora, no segundo ano de projeto. No início, tais confissões de falta de
conhecimento não aconteciam, pois o grupo mantinha a norma de desempenhar entendimento e
de mascarar a ignorância. Outro ganho foi a participação de professores que desempenharam,
até então, o papel de espectadores. Mesmo não atingindo os objetivos de explorar as questões de
narrativa, estilo e epistemologia em livros históricos que o livro proporcionava, a discussão
social que aconteceu colaborou para a socialização do grupo. A construção de uma comunidade
requer a negociação social incluindo a regulamentação das interações sociais e normas de grupo.
Esse foi um passo definitivo durante esta última discussão.
4.5.3.2. Segundo seminário de verão
:
Para início das discussões, os orientadores/mediadores escolheram o texto “Good Scent from
a Strange Mountain” de Robert Olen Butler , de 1992. Esse texto foi escolhido após a sugestão
de uma das participantes, Mary. Logo, Mary assumiu a liderança das atividades sugerindo que o
grupo adotasse um roteiro de questões para a semana. Sendo assim, pela primeira vez, nem a
escolha do texto nem a liderança do grupo ficaram por conta dos orientadores/mediadores, e as
mudanças no grupo foram evidentes. Mary e Helen assumiram o trabalho de mediadoras das
discussões, algo inusitado no começo do projeto quando pareciam ouvintes e não participantes.
Nessa etapa, após 18 meses de discussões, os participantes começaram a fazer conexões entre as
leituras e o trabalho em sala de aula.
Agora, sim, há um senso de coletivo que foi manifestando-se lentamente. Neste ponto, 22%
das referências aconteceu como grupo com o uso de pronomes na primeira pessoa do plural (nós,
nosso, nossa), contra 5% do primeiro encontro. Registra-se então um aumento de 325% .
Durante as discussões nesse seminário de verão, os orientadores/mediadores começam a
sentir uma evolução do que eles chamam de pseudocomunidade para uma comunidade. Segundo
as anotações, os participantes passam a demonstrar responsabilidades pelo grupo. Os que ouvem
tem a responsabilidade de admitir suas próprias confusões em entender os demais, enquanto os
que falam tem a responsabilidade de clarificar suas idéias iniciais, criando assim um clima
141
convidativo de conversa. Os participantes começam a trocar e-mails entre eles e materiais.
Além disso, pela primeira vez, os participantes demonstram preocupação em entender as
diferenças disciplinares que os acompanharam durante todos os encontros. Os participantes,
enfim, despertam para a realidade de que ao possuírem conhecimento de conteúdo diferenciado,
suas manifestações e interpretações apresentam-se em formas diversas. Isso é analisado como
um processo de amadurecimento da comunidade.
4.6. CONCLUSÕES GERAIS APONTADAS AO FINAL DO PROJETO
4.6.1. O papel dos pesquisadores é algo a decifrar como melhor desempenhar. Enquanto
documentavam todo processo, gravando os encontros, marcando entrevistas
individuais com todos os participantes, coletando e selecionando materiais para o
projeto, os pesquisadores desempenharam papel de organizadores e líderes do projeto.
Mas enquanto co-participantes, os pesquisadores tiveram que ler livros, discutir
currículo e compartilhar suas próprias idéias com o grupo de aprendizes. Os esforços
para lidar com as questões de liderança ocasionalmente frustraram alguns membros
do grupo, que queriam que nós agíssemos mais como líder de grupo, iniciando as
atividades, dizendo se os comentários estavam certos ou não, etc. Conforme as
múltiplas atividades planejadas aconteciam, os participantes começaram a
compreender com maior clareza o propósito dos pesquisadores como um grupo.
4.6.2. Conforme o projeto foi chegando ao fim, os orientadores/mediadores conseguem
delinear um traçado de transformação de uma simples reunião de professores para
uma comunidade, passando pelo estágio de pseudocomunidade. Inicialmente, há uma
norma presente mas não verbalizada: todos concordam com as colocações, não há
oposições ou reclamações durante os encontros. A reclamações e observações eram
feitas na hora do café ou particularmente. Ocorreram formações de subgrupos e
pequenos grupos, e cada participante era tido como indivíduo único. A partir do
desenvolvimento progressivo de senso de responsabilidade comum em relação às
normas de interação, à intervenção dos líderes, e à regulamentação de normas de
comportamento, os participantes passam a ser sentir membros da comunidade
142
assumindo responsabilidade pelo crescimento e desenvolvimento de seus colegas.
Não são seres individuais, mas membros que podem ser substituídos, se necessário,
pois o coletivo passa a falar mais alto que o individual. Membros, nesse estágio,
aceitam a responsabilidade e as obrigações como membros de uma comunidade,
cobrando esclarecimentos sobre idéias e opiniões com o objetivo de articular
crescimento de conhecimento.
4.6.3. Na cultura escolar predominante nos dias de hoje, as diferenças são quase sempre
negadas, escondidas para supostamente formar uma única e dominante opinião. Com
esse pensamento, os professores iniciaram suas participações no projeto. Com o
passar do tempo, os orientadores/mediadores conseguiram observar que há uma certa
compreensão de que as diferenças de idéias e pensamento geram novos
conhecimentos. Ao desenvolver a habilidade de usar a diversidade como instrumento
para ampliação do conhecimento do grupo como um todo, os participantes começam
a demonstrar crescimento profissional.
4.6.4. Somente arranjos estruturais não conseguem ensinar as pessoas a interagirem
diferentemente. Comunidade exige novas formas de participação social e intelectual.
143
CAPÍTULO IV
COMUNIDADES DE PROFESSORES:
UMA PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA
Ao propor uma pesquisa com o objetivo central de compreender como profissionais
envolvidos em projetos de pesquisa colaborativa, mais especificamente os que desempenharam o
papel de orientadores/mediadores, analisam processos de construção e consolidação das
“comunidades de professores”, deparamo-nos com uma questão ampla que antecede o enfoque
central desse trabalho.
Ao tornar-se um conceito “da moda”, digamos assim, o termo comunidades acabou sendo
empregado em diversos projetos, artigos e trabalhos em geral. Surgiram “comunidades de
prática”, “comunidades de aprendizes”, “comunidades de professores”, “comunidades de
aprendizagem”, “comunidades profissionais” e “comunidades profissionais de aprendizagem”.
Todos esses termos, somente na área educacional, carregaram a nomenclatura, mas nem sempre,
seguem um referencial teórico específico.
144
Num dos livros mais recentes sobre comunidades, “Professional Learning Communities
(Stoll e Louis, 2007), já no primeiro capítulo, as organizadoras propõem questões para reflexão e
diálogo antes e depois da leitura do livro. As primeiras duas perguntas de cada seção suscitaram
questionamentos. As questões eram:
Qual é sua interpretação da expressão “comunidade profissional de aprendizagem”?
O que vem em sua mente quando alguém diz “nossa comunidade profissional de
aprendizagem”?
Após a leitura do livro, sua interpretação da expressão “comunidade profissional de
aprendizagem” mudou? Se mudou, por que mudou? Quais autores te desafiaram
mais?
Em quem você pensa agora quando diz “nossa comunidade profissional de
aprendizagem”?
Ao analisar cuidadosamente as questões acima, pareceu-nos que “comunidade
profissional de aprendizagem” ou qualquer outro conceito que inclui o termo comunidade, não
aparece no campo educacional como um conceito, mas sim como uma expressão, um termo que
qualquer pesquisador pode adicionar, subtrair, mudar, dar uma interpretação diferenciada, etc. É
possível existir um conceito meu, seu, deles ?
Este tipo de liberdade pode ser frutífero por um lado, mas perigoso, por outro. Quando se
fala em dados científicos, todo embasamento teórico precisa ser específico, claro, evidente. Nos
projetos de comunidades, parece-nos urgente que esses termos diferenciados centralizem-se em
definições específicas, forçando assim os pesquisadores a enfatizar e compreender
profundamente o conceito que eles trabalharão cada vez que propuserem um projeto, por
exemplo.
Existem algumas características típicas que envolvem os conceitos de comunidades, tais
como atividades colaborativas e cooperativas, desenvolvimento pessoal e/ou coletivo, linguagem
comum, indivíduos trabalhando juntos em um empreendimento comum, entendimento mútuo,
interações pessoais ou virtuais, coleguismo, liderança, etc.
145
Ao apresentarmos os casos 1 e 2 nesse estudo, vemos projetos denominados como
“Comunidades de Prática”. Essa denominação, porém, não acompanha o referencial teórico que
embasa o projeto. Observando as referências bibliográficas apresentadas na proposição do
projeto e de um artigo publicado (CRESPO & FEATHERSTONE, 2006) a respeito dos
resultados obtidos, as orientadoras/mediadoras fazem constar: GROSSMAN, WINEBURG &
WOOLWORTH (2001) e MCLAUGHLIN & TALBERT (2001). Diante das teorizações
expostas acima, podemos verificar uma falta de coerência conceitual no trabalho que apresentam
objetivos e procedimentos baseados na teorização das “Comunidades de Professores” (verificar
portrayals), mas denominação de “Comunidades de Prática” sem haver qualquer citação ou
referência ao trabalho de Wenger. Certamente, Wenger não poderia embasar o projeto
teoricamente, pois nos casos apresentados, as orientadoras/mediadoras construíram comunidades
a partir do financiamento recebido da Fundação Lucent. Não havia um histórico de encontro
rotineiro desses professores, nem um empreendimento compartilhado. Além disso, ao
acompanharmos os relatórios de atividades, vemos coerência teórica com as “Comunidades de
Professores”, pois os professores foram reunidos a partir do conhecimento do conteúdo
específico diferenciando-se, apenas, pelas séries que lecionavam. Ou seja, a força motriz da
comunidade era a melhoria do conteúdo específico, a matemática, do conhecimento pedagógico
do conteúdo, pois trabalhavam os problemas com os alunos e promoviam discussões acerca do
processo, enfim, através do modelo dos ciclos de aprendizagem, buscavam a melhoria da base de
conhecimento dos professores. Além disso, o projeto foi realizado na própria escola, tendo a
prática de cada professor como objeto de discussão coletiva. O intuito apontado nos relatórios
era que os professores pudessem, a partir dessa ação, aprender sobre seus alunos, e aprender a
analisar seus colegas e suas práticas. A própria orientadora/mediadora do caso 2, Featherston,
aponta tal confronto teórico, ao ser questionada sobre o título do projeto.
“Minha idéia era que não havia uma comunidade de prática no senso que Wenger usa
porque ele estava falando, na verdade, sobre pessoas que estão desempenhando sua
prática em uma comunidade. Mas os professores estão todos desempenhando suas
práticas em suas salas de aula e não estão realmente juntos durante a prática. Na verdade,
eles estão juntos quando estão conversando, discutindo suas práticas
51
”.
51
My idea was there wasn’t a Community of Practice in the sense that Wenger uses it because he was really talking
about people who are actually doing their practice in a community. But the teachers are all doing their teaching in
classrooms and they weren’t actually doing teaching together.
146
Assim, apesar da denominação “Comunidades de Práticas”, os casos 1 e 2 foram
selecionados pela prática de “Comunidade de Professores” que pudemos definir claramente após
o estudo de seus portrayals.
Quanto ao caso 3, tanto a denominação como a teorização correspondem às
“Comunidades de Professores”, tornando-o o caso mais típico dessa pesquisa.
Tendo o quadro de conceitos de comunidades explicitado e compreendido, passamos a
tentar entender as “Comunidades de Professores” partindo da análise dos dados obtidos sobre os
casos apresentados.
1. Grupo de Estudo x Comunidades
Uma das questões que suscitaram o nosso interesse já no início, a partir do estudo dos
portrayals, está voltada para o entendimento de como as comunidades apresentam-se diante das
concepções de grupo de estudo.
Durante todos os relatórios e artigos publicados relativos aos casos 1 e 2, há um
monopólio de referência ao grupo de estudo. Desconsiderando o título do projeto, torna-se
impossível encontrar o termo comunidade. Esse fato trouxe à tona uma questão que não havia se
concretizado anteriormente: se há uma diferenciação, qual seria entre grupo de estudo e
comunidades?
Analisando os procedimentos de atividades dos casos 1 e 2, o modelo de grupo de estudo
aparece quase como uma metodologia de trabalho. Já no caso 3, a metodologia utilizada,
segundo os próprios pesquisadores, trata-se do clube de leitura. Passamos então a indagar se as
atividades de uma “Comunidade de Professores” necessitavam de uma metodologia para serem
escolhidas e aplicadas. Em toda a teorização do processo de comunidades, não há um modelo de
método a ser seguido durante os encontros. E seria necessário? Acreditamos que um modelo de
ação torna-se indispensável para qualquer projeto de comunidade. Com o intuito de constituir
um grupo de professores que reflitam, discutam e renovem seus conhecimentos coletivamente,
há de se ter que desenhar atividades que gerem, motivem e desencadeiem tais ações. No caso 3,
Grossman aponta claramente para uma versão do modelo usado nos clubes de leitura. Ou seja,
147
os membros escolhem um livro, lêem individualmente e depois se encontram para discutir e
aprofundar os aspectos da leitura. Por isso, o procedimento de ação do caso 3 incluía a leitura de
textos que serviam de motivação para o início das discussões.
Nos casos 1 e 2, as orientadoras/mediadoras utilizavam a estrutura de grupo de estudo
proposto por Simon(1994), os “ciclos de aprendizagem” para a educação da matemática -
Resolução, Proposição, Interpretação e Reflexão. As duas primeiras fases ocorrem quando os
professores juntos resolvem um problema matemático específico e discutem e analisam suas
soluções e as maneiras de propor o problema para os alunos. Os professores exploram maneiras
de adaptar o problema e utilizá-lo em todas as séries, considerando o conteúdo e o processo
matemático que os alunos podem aprender a partir da aula proposta. Nas fases de interpretação e
reflexão, os professores tentam a versão deles do problema em suas próprias salas de aula e vêm,
para o encontro do grupo, preparados para compartilhar estórias de suas salas com insights
vindos do pensamento dos alunos e suas práticas de ensino.
De acordo com a teorização apresentada no projeto, este modelo fornece oportunidades
de explorar e discutir teorias e soluções matemáticas para provar ou refutar idéias, conhecimento
e crenças sobre um conteúdo específico da matemática e sobre os métodos para aprender
matemática. Outros benefícios apontados são as oportunidades de antecipar-se e preparar-se
para as dificuldades dos alunos, de elaborar versões do mesmo problema para experimentar com
os alunos em diferentes séries, identificando insights sobre o trabalho matemático dos alunos e
seu entendimento, e o de desenvolver quadros analíticos para interpretar o ensino e a
aprendizagem dos alunos. Por fim, ao refletir sobre o processo, os professores passam a
compreender melhor o quê e como aprenderam, identificando as práticas eficientes e os aspectos
decorrentes dessa prática sobre a aprendizagem de seus alunos.
Comparando esses fatores apontados com os propósitos de “Comunidade de
Professores”, podemos, claramente, estabelecer que nos dois casos o conteúdo da disciplina a ser
aprendido é essencial e o pivô da discussão; os membros são os professores dessa disciplina; o
objetivo principal é a melhoria dos três princípios que compõem a base de conhecimento
desejável para os professores, procurando, assim, alcançar o desenvolvimento profissional do
professor através da colaboração e a determinação de um empreendimento compartilhado; e está
situado na própria escola. Além disso, em ambos os processos, os alunos são reconhecidos como
148
agentes ativos no processo, por isso exigem do professor que desenvolva a reflexão sobre o
processo ensino-aprendizagem.
A única prerrogativa que não é citada especificamente no modelo de grupo de estudo está
em enfatizar a concepção de “Comunidades de Professores”, os processos de atividade, reflexão
e colaboração que são assegurados, fomentados e legitimados dentro de uma comunidade ou
cultura que valida tais experiências.
Embora muitas instituições e profissionais da área da Educação tenham maior liberdade
na definição de novos currículos e gozem de postura respaldada por pesquisas diversas, o que se
vê é uma estrutura do ensino, de modo generalizado, que ainda divide o conhecimento em
compartimentos estanques, privilegia a exposição de idéias ao invés da troca, mantém a rigidez
estrutural de tempo e modo de utilizá-lo. Esses fatores podem ser impeditivos da transformação
da cultura escolar
52
tradicional para uma renovada que cultue ambientes diferenciados.
Como vimos, o estudo dos ambientes e seu design procuram favorecer as experiências
educacionais, incorporando propostas construtivistas/interacionistas como modelos da aquisição
de conhecimento.
“Uma mensagem vinda da pesquisa é que os profissionais das instituições escolares
precisam aprender como perder tempo a fim de ganhar tempo. Cientes de que habilidade
de desenvolvimento em grupo e dos processos organizacionais é o primeiro passo de uma
mudança efetiva, eles deveriam estar tentando ajudar que a cultura escolar melhore o
entendimento e a responsabilidade sobre a sua própria cultura escolar
53
” (MULFORD,
2007, p.166)
Além dos desafios de superar o contexto da cultura escolar, ainda há questões a serem
consideradas a nível organizacional e até individual incluindo micropolíticas, diferenças entre a
regulamentação e implantação de políticas escolares, liderança, poder aquisitivo da escola,
autonomia profissional, etc.
52
O conceito de cultura escolar aparece sempre relacionado com um espaço destinado/privilegiado para transmissão
de conhecimentos e, principalmente, valores em determinado tempo (Forquin, 1993; Faria Filho, 1996; Julia, 2001;
Viñao-Frago & Escolano, 1998; Viñao-Frago, 2000; Silva, 2003).
53
“A message arising from the research in this chapter is that those in schools must learn how to lose time in order
to gain time. Awareness of, and skill development in group and organizational processes is a first step in any
effective change. Instead of others trying to insert something into a school’s ( or community’s) culture, the school ,
and especially its leadership, should first be trying to help that culture develop an awareness of and responsiveness
to itself”.
149
A fim de se desenvolver um ambiente capaz de fomentar e legitimar experiências como
as das “Comunidades de Professores”, muitos quesitos são necessários.
Figura 1: Um modelo integrado de capital social e comunidades de aprendizagem profissionais (MULFORD,2006, p.176).
Mulford (2006, p.176) apresenta um modelo de capital social e comunidades de
aprendizagem profissionais que ajuda a ilustrar, em termos, as questões aqui refletidas. No
esquema apresentado por Mulford (FIGURA 1), há cinco níveis, digamos assim, para um
150
ambiente que fomenta atividades de comunidades. Como Mulford trabalha com a questão do
capital social voltado para as “Comunidades de Aprendizagem Profissionais” que engloba todos
os membros efetivos de uma escola, não há razão para seguirmos o mesmo modelo já que esse
trabalho busca identificar o ambiente onde as “Comunidades de Professores”, enquanto proposta
de formação continuada, possam ser legitimadas. Mas há razões para desenvolvermos uma
reflexão e propormos uma adaptação (FIGURA 2).
Figure 2: Modelo de interação e “Comunidades de Professores.
Nesse caso, ficaríamos com apenas três níveis: o nível da liderança, dos participantes e da
instituição escolar que continuariam integrando os desafios contextuais, organizacionais e
individuais.
Nesse momento, concentramos nossa atenção no nível da instituição escolar que aparece
como promotora de um clima de confiança e colaboração, incentivando missões monitoradas e
de interesse comum e tomando para si iniciativas e assumindo riscos. Contrabalanceando com
essas tarefas, a instituição deve cuidar dos desafios que se apresentam como a estrutura fixa do
sistema promovendo mudanças de circunstâncias, prioridades e liderança; com a necessidade da
obtenção de resultados frente à apresentação de mais atividades de cunho qualitativo ao invés de
INST.
ESCOLAR
LIDERANÇA
PARTICIPANTES
Com.
Social
Com.
Profissional
Com.
Aprendizagem
151
quantitativos; com as micropolíticas, evitando conflitos e problemas de implementação de
regulamentações; e com a necessidade de se consolidar um ambiente de planejamento consciente
de massa crítica.
Ao serem questionadas sobre os critérios priorizados para a escolha da instituição escolar
que estaria envolvida no projeto, as orientadora/mediadoras corroboraram com os indicativos
apresentados. Ou seja, todas elas evidenciaram que escolheram escolas com perfil de ambiente
colaborativo, que já haviam participado de programas de formação e atividades de reflexão.
Faz-se importante notificar que todos os casos estudados nessa pesquisa implementaram
seus projetos de comunidades a partir de uma cultura escolar vigente. Ao iniciaram as atividades
de comunidade, as orientadoras/mediadoras tiveram, apenas, que acertar as questões de melhor
dia e horário de encontro e de substituição dos professores participantes no caso de encontros
durante o horário escolar.
A orientadora/mediadora Sandra Crespo assinalou em sua entrevista que escolheu
implementar o projeto Lucent numa escola que ela já havia trabalhado anteriormente com os
professores e não era uma completa estranha.
“Eu conhecia estes professores, eu não apareci lá de surpresa. Eu já havia trabalhado com
essa escola por três anos e esses professores me viam de vez em quando. Eu me fiz
conhecer. Eu levava meus filhos, eu levava meus alunos seniores, um dos professores
que decidiu fazer parte do projeto foi meu aluno na universidade. Então eu tinha um
pouco de história com essa escola antes de eu sugeri-la e convidá-la para participar do
projeto. Os professores que sempre voluntariavam-se para ter alunos seniores em suas
salas, aceitaram participar do projeto. Eles tinham muitas razões para participar e foi
bom que eles já me conheciam
54
”.
Helen Featherstone confirmou a escolha das escolas.
54
“So I knew these teachers, it is not like I’ve just showed up. So I had three years of having working in that
school, they have seen me once in a while for the three years. I made myself known by them. You know, I take
children, I took seniors, one of the study group teachers actually one of my very first students here who ended up
being a teacher there so I had a little bit of history with that school before I suggested and made the invitation about
who wants to participate. For the teachers, very quickly, they had worked very closely with me, volunteered. The
people who always volunteer to have seniors in their classroom, said yes , we want to be part of this project. So they
have been mentor teachers to the senior year, and they had been wanting to have interns in the school. Many of
them would say that it was the way to get themselves trained, or whatever reason, they had many reasons why they
want to participate, that’s good that they know me”.
152
“Nós procuramos por escolas urbanas onde nós já tínhamos certo relacionamento. Eu já
havia trabalhado na April(nome da escola) com outra professora intensivamente. Eu
passei muito tempo na escola antes do projeto começar. Eu tinha alunos seniores na
escola por vários anos. Eu não tinha certeza que o que eles sabiam sobre mim faria com
que eles quisessem trabalhar comigo. O que realmente foi fantástico foi que eu consegui
uns 5, 6 ou 7 professores e esses eram suficientes para enquadrar todos os meus alunos na
minha seção com os professores do grupo de estudo. Isso foi muito, muito bom
55
”.
Grossman também apontou que a escolha da instituição proporcionou a participação de
professores bem preparados. “Além da cultura de ensino, nós tínhamos uma perspectiva de
formação de professores que podíamos ver claramente. Nós tínhamos professores abertos para o
fato do quê as pessoas poderiam aprender com o projeto
56
”.
Mas por que grupos de estudo não expressam a necessidade de serem fomentados e
legitimados em ambientes onde os processos de atividade, reflexão e colaboração são
assegurados?
A resposta dessa questão pode estar justamente no termo colaboração em contraposição
ao termo cooperação.
Atualmente, evidencia-se a necessidade de se distinguir cooperação e colaboração. A
cooperação envolve diversas pessoas que ao trabalharem em conjunto para o mesmo fim,
despontam participações desiguais devido à presença de objetivos individuais distintos. Em
contrapartida, na colaboração, os diversos participantes trabalham em conjunto com relativa
igualdade e numa relação de ajuda mútua, procurando atingir objetivos comuns, através de
negociação cuidadosa, tomada coletiva de decisões, comunicação, diálogo e aprendizagem por
parte de todos os participantes.
A colaboração é uma estratégia fundamental para lidar com problemas ou dificuldades
que não podem ser resolvidas a um nível puramente individual. E é a colaboração que constitui
55
So we looked for urban schools where we had relationships. I actually have worked at April with another
teacher quite intensively. I spent a lot of time at school before the project got on. I had senior at April for several
years. I wasn’t sure that what they knew about me would make them want to work with me. What was really
terrific was I got maybe 5,6 or 7 teachers and that was enough that I could embrace all the students in my section
with teachers in study group. It was really, really nice”.
56
“Along the culture of teaching we had a developmental perspective on teacher learning that we could see, we had
teachers pretty wide continue and opened to the fact of what people would learn from this project”.
153
elemento essencial de vários projetos envolvendo professores (ANDRÉ, 2001; COCHRAN-
SMITH & LYTLE, 1999), como é o caso dos projetos de comunidades.
Num trabalho de colaboração, os objetivos individuais, decorrentes de personalidade,
projetos pessoais e aspirações, servem de alicerce na construção do objetivo principal que é o
coletivo. Ou seja, num trabalho de colaboração não há lugar para objetivos individuais fortes.
Uma atividade que envolva colaboração pressupõe um nível de organização e exige,
igualmente, um tipo de ambiente relacional, sendo que ambos vão tornando-se mais intensos à
medida que o processo avança e os participantes se conhecem melhor e ganham confiança uns
nos outros. O ambiente relacional pressupõe uma relação de confiança entre os participantes de
modo a criar uma relação de mutualidade entre os participantes ( PONTE,2002 ).
Evidencia-se assim que o trabalho de colaboração acaba sendo muito mais complexo que
um trabalho de cooperação. Pois numa atividade de colaboração, torna-se necessário estabelecer
uma relação de diálogo franco e aberto entre os participantes. Isso implica na exposição,
vulnerabilidade, abertura às críticas, aspectos eminentemente relacionais, boa liderança, entre
outros.
Seguindo essa linha, podemos concluir que um grupo de estudo está fundamentado em
atividades de cooperação e por isso demandam menos exigências. Além disso, acreditamos que
modelos de grupo de estudo, como os ciclos de aprendizagem propostos por Simon, podem
embasar metodologicamente projetos de “Comunidades de Professores”. Porém nenhum projeto
que busque a constituição de um grupo de estudo deve ser entendido como um projeto de
comunidade.
Como salientamos inicialmente, a questão dos grupos de estudos versus as comunidades
surgiu justamente do estudo dos casos 1 e 2 que constituem essa pesquisa. Interessados em
explicitar a visão das orientadoras/mediadoras dos casos sobre essa questão, aproveitamos as
entrevistas. Observemos, agora, as considerações apontadas.
Entevistadora:“O título do seu projeto era “Comunidades de Práticas” mas todos
os relatórios falavam apenas sobre grupos de estudo. Como você entende essa
relação: grupo de estudo versus comunidades?
Sandra Crespo: OK. Grupo de estudo é diferente de uma comunidade de prática porque o
objetivo de um grupo de estudo é tornar-se uma comunidade de prática, mas quando você
tem um grupo de estudo de professores, é um começo, não é... é alguma coisa que tem
que ser...este é o propósito tornar-se uma comunidade de professores. Não é algo que é
154
naturalmente importante. É um lugar onde você fica sozinho, onde você pode encontrar
outros professores, eu quero dizer que isto se torna um modo de operar. É legal quando
você tem um grupo de estudo que (...). Você pode ter um grupo de professores que se
reúnem, mas para chamar isso uma comunidade de prática, seria algo mais! E eu não
acho que é uma coisa que acontece a partir do primeiro dia, é algo que acontece
eventualmente. Eu nem mesmo diria que meu grupo de estudo sequer chegou a ser uma
comunidade de prática porque a única razão que faria eu concordar com isso seria se eles
tivessem continuado a se encontrar após eu ter partido.
Entrevistadora: Eles não continuaram?
Sandra Crespo: Não que eu saiba.
Entrevistadora: Agora que você terminou o projeto, você mudaria o título?
Sandra Crespo: Não, eu não mudaria porque o objetivo era tornar-se uma comunidade de
prática. Eu não gostaria de perder a noção de que era esse nosso objetivo. Então, essa é a
visão, é que uma comunidade de prática dentro das escolas é uma forma de dar aos
professores oportunidades de teorizar sobre a prática, serem intelectuais, e serem colegas
uns dos outros.
Entrevistadora: Você acredita que eles poderiam ter continuado sem a sua
presença?
Sandra Crespo: Ah, sim. Eu tenho quase certeza de que eles poderiam. Eu acho que eles
poderiam ter feito isso. Eu acho que eles deveriam…Eu não tenho certeza…se eles
teriam atitude necessária para que confiassem uns nos outros tanto quanto confiaram sem
a presença de um pesquisador de fora...
57
Já a orientadora/mediadora Featherstone, do caso 2, pondera:
57
E: The title of your project was “Community of practices” but the whole reports talk all the time about study
groups. So how do you understand this relationship: study group versus communities?
SC: OK. Study group is different from a community of practice because the goal of a study group is to become a
community of practice but when you have a teacher study group, it is a beginning, it is not…it is something that has
to be…that is the goal to become a community of teachers. It is not something that is naturally important, that this is
a place where you leave yourself alone, where you can meet other teachers, I mean this become a way of operating.
It is cool when you have a study group that just like (…). You can have a group of teachers that gather together, but
to call it a community of practice, it would be a thing! And I don’t think that it is something that happens from the
first day, it is something happens eventually. I would not even say that my study group ever achieve a community
of practice, because the only reason I would agree that they would have, if they would have continue to meet after I
left.
E: They didn’t?
SC: Not at my knowledge.
E: Now that you have finished your project, would you change this title?
SC: No, I wouldn’t. Because the goal is to become a community of practice. I don’t want to loose sight of the fact
that what we were after. So that is the vision, it is that community of practice within schools is a way of giving
teachers opportunities to theorize about practice, to be intellectuals, to be colleagues to each other.
E: Do you think they could have continued without you?
SC:Oh, yeah. I am pretty sure they could have. I think they could have done it. I know that they might have…I am
not sure…I am not sure….if they have what it is needed in order to they trust each other as much without the
outsider in there to…
155
“O objetivo era o de se tornar uma comunidade, mas eu acho que os professores vieram
com o intuito de melhorar suas próprias práticas e melhorá-los como práticos e o projeto
foi um meio de fazer isso. Mas eu não me lembro de muitas evidências de investimento
na prática uns dos outros. Eles ajudavam-se mutuamente e eles eram .... Eu lembro de
uma das professoras que pediu que uma colega anotasse detalhes enquanto ela
apresentava o problema, a fim de ajudá-la a descrever o que aconteceu enquanto
explanava. Então houveram momentos de trabalho colaborativo. Mas, por exemplo, eu
não acho que tenha havia uma oportunidade em que os participantes(do projeto) disseram
‘vamos apresentar na próxima reunião de professores da escola, o quê nós estamos
tentando fazer, nós podemos persuadir outras pessoas a fazer mais o quê estamos
fazendo’. Ninguém sugeriu isso
58
”.
Novamente, o aspecto de se ter em mente um objetivo comum parece diferenciar uma
comunidade de um grupo de estudo. Além disso, as relações sociais que estão em andamento no
grupo também podem ser um demonstrativo de comunidade.
“ Eu realmente penso que muitas dessas diferentes tendências, desses métodos, grupo de
estudo, por exemplo, são todas formas de se construir comunidade profissional, são todas
maneiras de se criar oportunidades para os professores. O quê nós queríamos dizer com
pseudocomunidades faz parte do nosso modelo por que num certo ponto, o grupo
começará a agir compartilhando modelos e valores antes de iniciar as atividades. Mas eu
acho que é possível para mim generalizar num ponto: leva tempo para um grupo atingir
esse ponto
59
”.
Analisando as informações, podemos perceber que as orientadoras/mediadoras apontam
algumas linhas divisórias para distinguir grupos de professores de comunidades. Sandra Crespo
58
“The goal was to become a community but I think that the teachers went to improve their practice and themselves
as practitioners and this was a way of doing it. But I don’t recall a lot of evidence of investment in another people’s
practice. They were helpful to one another and they were some….hummm I remember one of the teachers asking
another teacher to take notes for her when she was addressing the problem so she was able to describe in details
what happened. And there were certainly some collaborative work. But, for example, I don’t think that there was
ever a time when they said ‘we want to present at a teacher meeting for the whole school, what we’ve been doing so
we can try, we can pursue other people to do more what we are doing’. Nobody suggested that”.
59
“I do think that many of these different approaches, study group, for example, those are all ways of building
professional community, they are all ways opportunities for the teachers. What we meant by pseudocommunity is
really quite part of our model because in a certain point the group will begin to act like a shares of models, values
before actually does. A study group could be a pseudocommunity or a community, it depends on , again , what is
going on. But I think it is possible to me made of a level of general agreement that covers up the bigger complex
group. It takes time for that group to hit the point”.
156
desenha essa linha na habilidade do grupo continuar as atividades sem a presença de uma
orientação/mediação externa. Helen Featherstone e Pamela Grossman apontam essa separação
na determinação de um objetivo comum superior aos objetivos individuais, ou melhor, o
empreendimento coletivo deve sobrepor os propósitos do participante, pois ele assumiria a
posição não mais de mero participante, mas de membro de uma comunidade.
Grossman ao ser questionada sobre quais seriam as características que diferenciariam um
grupo de estudo de uma comunidade, ela complementa:
“Eu acho que uma das marcas seria quando as pessoas passassem a assumir
responsabilidade pela aprendizagem e formação dos colegas. Não se trata mais de mim
mas também da preocupação com os meus colegas. Então, eu consigo ver alguma coisa
nesse, essa é uma das razões de um trabalho coletivo quando as pessoas começam a
deixar bilhetes para as outras, quando começam a cooperar na construção do pensamento
sobre o que você está fazendo, no quê você se interessa, como algo pode ajudá-lo. Esse
tipo de responsabilidade coletiva, e eles falam sobre responsabilidade coletiva pelo
aprendizado do aluno, mas eu acho que também posso ver responsabilidade coletiva pelo
modelo adotado no projeto de formação. Eu acho que outra marca seria a habilidade de
antecipar o que as outras pessoas pensariam disso. Eles passam a se conhecer tão bem
num certo ponto que você pode dar um OK antecipado, isto é o que tal participante pode
dizer a respeito disso, e daí você pode utilizar isso como um plano para o grupo. Há uma
certa consciência da diversidade do grupo e das distribuição de expertise, e como eles
usam isso. Eu acho que esses fatores constituem outra marca de comunidade
60
”.
Essas marcas propostas por Grossman evidenciam as características de uma atividade
colaborativa que pressupõe relações sociais que vão se tornando mais intensas à medida que o
processo avança e os participantes passam a se conhecerem melhor, resultando em confiança e
preocupação mútuas.
60
“I think one is people do take responsibility for each others’ learning and development. It is no longer
just about you but also I care about my colleagues. So if I see something this is one of the reasons of
collective work when people left notes on each others’ mail boxes, the point when they begin to cooperate
the thinking about what you are doing, what you are interested in, how something may help you, at a
particular point. A kind of collective responsibility, and they talked about a collective responsibility for
student learning, but I guess I can also see a collective responsibility to the adopted model. I think another
mark is the ability to anticipate what other people would think of this. They know each other well enough
at a certain point that you can give the anticipated OK this is what she might say about that and then you
can bring that as a plan for the group. There is a kind of awareness of the diversity of the group, right and
the distribute of expertise, and how they use that. I think that is another mark of it.
157
Em resumo, para existir uma comunidade precisa-se de modo decisivo de um ambiente
colaborativo onde as relações interpessoais, a dinâmica e a metodologia usadas assentem, numa
primeira fase, o bom andamento das atividades propostas de acordo com a metodologia
escolhida, e, numa segunda fase, a elaboração, discussão e aperfeiçoamento de pensamentos
sobre as suas experiências profissionais, sobre o conteúdo e sobre pedagogia. Para a criação
deste ambiente e desta dinâmica, muitos fatores são determinantes, entre eles o tipo de liderança,
o caráter emergente dos objetivos e processos de trabalho.
Retornando ao modelo proposto de interação e as “Comunidades de Professores”, vemos
no nível de participantes uma tendência que passa da formação com normatização para o
desenvolvimento e transformação. Ao ter controle e consciência de seu próprio aprendizado,
num processo de formação, o professor assume uma postura ativa que busca entender melhor
suas idéias, organizando conhecimento que facilitará a aplicação do mesmo assim como sua
transformação e ampliação. Ao ter ciência dos objetivos em relação a suas intenções, o professor
pode e deve vir a uma atividade de formação contínua, intelectualmente estimulado. Essa
característica pode vir a ser um diferencial entre a posição de participante para o de liderança,
assim como do desempenho e das expectativas.
O maior desafio de uma atividade de formação contínua baseada teoricamente nas
comunidades é fazer essa evolução, na nossa concepção, de um grupo de professores para uma
comunidade de professores. Nesse processo, várias dificuldades foram apontadas pelos
pesquisadores/mediadores/orientadores que participaram dos projetos típicos desse estudo.
Grossman chegou a denominar esse estágio que, no nosso entendimento está entre um
grupo de estudos e uma comunidade, como pseudo-comunidades.
2. PSEUDO-COMUNIDADES
De acordo com Grossman et al., assim que a comunidade começa a se formar, os
indivíduos têm uma tendência natural de desempenhar, interpretar como se eles já fizessem parte
de uma comunidade enquanto membros que dividem valores e crenças comuns. Essa
interpretação leva à criação de uma pseudo-comunidade. O imperativo da pseudo-comunidade é
158
“comportar-se como se todos nós concordássemos”. Fica superficial, se mantém a supressão de
conflitos. Parece ser contra as regras desafiar, pressionar uns aos outros. Estabelece-se, dessa
forma, uma ilusão de consenso a partir, muitas vezes, da compreensão ilusória de alguns sobre
um dado assunto. No âmago da questão fica a distinção entre o escondido e o revelado, entre o
que é sentido e o que é demonstrado.
Quando analisamos uma atividade cooperativa, vemos participação desigual entre os
participantes, pois há a compreensão de que todos estão ali com objetivos individuais distintos.
Num grupo de estudo, o participantes busca a ampliação de sua base de conhecimento, por
exemplo, sem preocupação constante ou nítida com o colega. Num trabalho colaborativo, esse
posicionamento deve ser diferenciado: há uma preocupação permanente com o crescimento de
todos os participantes, ou melhor, membros da comunidade, pois sem um aprendizado coletivo,
não há como se atingir os objetivos proposto. Já numa pseudo-comunidade, os participantes
iniciam suas atividades com metas comuns, coletivas e ao invés de trabalharem com relativa
igualdade e numa relação de ajuda mútua, negam a negociação cuidadosa, fingindo um consenso
que existe somente superficialmente. A comunicação, o diálogo e a aprendizagem não ocorrem
de forma a contemplar sinceramente todos os membros, mas cada participante individualmente,
não atingindo assim o contexto de uma comunidade.
Neste estágio, algumas atitudes são notadas e registradas pelo grupo, mas acabam não
sendo discutidas, apenas acabam tornando-se tópicos de fofoca. “Você viu como o fulano virou
os olhos quando a fulana falou?” Esse é um comentário feito entre indivíduos em sub-grupos.
Não são tópicos trazidos para o grande grupo. Essa situação recai exatamente no âmago da
questão de uma pseudo-comunidade: “Não há um senso autêntico de espaço comunal
compartilhado mas somente indivíduos interagindo com outros indivíduos
61
” (GROSSMAN et
al., 2001, p. 956).
Outra questão relacionada com a pseudo-comunidade é titulado por GOFFMAN (apud
GROSSMAN et al, 2001) de “impression management”, ou seja, gerenciamento de impressão. É
quando as pessoas agem da melhor maneira possível em busca da simpatia do grupo. A
execução do papel de cada um numa pseudo-comunidade acontece tranquilamente contanto que
todos ajam de maneira conveniente, sem desafiar ninguém. Não existem conflitos sócio-
61
There is no authentic sense of shared communal space but only individuals interacting with other individuals.”
159
cognitivos, pois não paira sobre o grupo a necessidade de manter as aparências em detrimento de
um processo de aprendizagem real que prevê desconstrução e construção de saberes e
conhecimento, e no caso de uma comunidade, prevê a existência saudável de conflitos sócio-
cognitivos.
Aí surge um problema: a diferença entre a atuação do professor num local público e em
outro privado – como a sala de aula, onde todas as informações são totalmente controladas.
Incorrem, também, problemas com conflitos pré-existentes, anteriores a formação da
comunidade, que em uma pseudo-comunidade acabam se consolidando ao invés de serem
diluídos.
Às vezes, por causa da falta de habilidade de orientadores/mediadores de comunidade
assim como de seus membros, desafios previsíveis de dinâmicas de grupo acabam sendo
ignorados. O aspecto emocional de convivência social e interação é sempre pertinente aos
trabalhos em grupos. Assim, acredita-se que no momento que se consegue trazer à tona
conflitos, angústias, medos e mágoas, o grupo estabelece um relevante avanço: passam de um
“simples encontro de professores” – uma pseudo-comunidade - para a formação de uma
“comunidade de professores”.
Analisando a literatura exposta a respeito dos conceitos que pairam entre cooperação e
colaboração, acreditamos que um divisor de águas pode ser delineado. Propomos então
definições de cada um dos conceitos. Tendo em mente o campo educacional, acreditamos que
um “Grupo de Estudo” possa ser definido como uma reunião de pessoas (alunos, professores,
profissionais de uma área específica) que, em busca de alcançar um objetivo próprio, pessoal,
aceitam participar de atividades cooperativas. Ou seja, diversas pessoas trabalham em conjunto,
mas pode-se perceber participações desiguais, sem uma responsabilidade coletiva, pois os
propósitos individuais são distintos.
As “Pseudo-Comunidades” aparecem no trabalho de Grossman como uma preliminar de
“Comunidades”. Ou seja, há uma reunião de pessoas (participantes de um projeto de
comunidades) que, em busca de um objetivo comum, aceitam participar de atividades
colaborativas. Porém, antes de atingir o ponto considerado característico de “Comunidades”
assumem atitudes individualistas, protegendo-se nas relações sociais, evitando confrontos e
exposição de pensamentos e falta de conhecimento. Quando uma pseudo-comunidade não
160
evolui para uma comunidade, temos apenas um grupo de professores sem qualquer tipo de
responsabilidade nem cooperativa nem colaborativa.
Enfim, por “Comunidades de Professores” entendemos um grupo de professores
comprometidos caracterizado pela união de forças em determinar melhor estratégias de acesso ao
conhecimento, da troca de materiais e opiniões, do comprometimento com o aprendizado do
outro e da preocupação em compartilhar um objetivo comum. Mostrando senso de coletividade,
expondo idéias de maneira a fazerem referências a si mesmos como membros de um grupo,
usando expressões como nós, nossa, nosso e nos.
Numa comunidade verdadeira, há desafios intensos, respeitáveis, em busca de definição e
elaboração: os membros passam a ter responsabilidades como participantes. Aqueles que
expõem idéias têm a obrigação de clarificar seus pontos, sua opinião. Assim, como os que
ouvem devem admitir suas possíveis confusões e pedir por esclarecimentos ao grupo. Assim,
enquanto coletivo, o grupo avança. E todos os indivíduos desse grupo, avançam
individualmente. Pois, ao assumir a falta de entendimento, esse participante beneficia o grupo
com o esforço que o detentor da idéia terá que imprimir para se fazer entender, criando um clima
convidativo para o debate.
O modelo de formação de “Comunidades de Professores” (FIGURA 5) apresentado por
Grossman et al.(2001, p.988) apresenta uma idéia de desenvolvimento destacados em três fases
distintas: início, evolução e maturidade considerando quatro aspectos: formação da identidade de
grupo e normas de interação, delineamento das linhas divisórias de procedimento, negociação da
tensão essencial, e responsabilidade comum para o crescimento individual.
No começo, o grupo apresenta-se dividido em sub-grupos, objetivos individuais que
superam os coletivos. Os participantes negam as diferenças a fim de evitar conflitos e
acreditam que o dever intelectual dos professores é com os alunos e nunca com os colegas. Essa
fase é marcada pela falta sobre os propósitos das comunidades e as diferenças de idéias são vistas
como intransponíveis
Durante a evolução das atividades, apresenta-se uma pseudo-comunidade que reconhece
as contribuições dos participantes e a necessidade de regulamentação do comportamento do
grupo, e, por isso, abre discussão de normas de relacionamento que estabelecem normas de
161
participação de todos os membros. Porém as idéias dominantes se sobrepõem às demais abrindo
caminho para possíveis erupções de conflitos.
Figure 3: Modelo de Formação de “Comunidades de Professores”(GROSMAN et al, 2001)
Finalmente, na maturidade, espera-se que os participantes identifiquem-se como
membros do grupo, reconhecendo que há enriquecimento devido a diversidade do grupo,
desenvolvam normas de interações e comunguem responsabilidade. Compreendem-se como
produtivas as diferenças e os conflitos, que são esperados e resolvidos de maneira aberta e
162
honesta. Há o reconhecimento de que o processo de aprendizagem dos professores é tão
importante quanto dos alunos e estão interligados. Enfim, há um comprometimento com o
crescimento profissional dos colegas e a aceitação de direitos e deveres por parte dos
participantes como membros de uma comunidade.
3. A DIVERSIDADE E AS COMUNIDADES DE PROFESSORES
Numa “Comunidade de Professores”, há divergências notáveis: conhecimento prévio dos
participantes, características básicas relativas a sua atividade profissional ( série, disciplina,
conteúdo, cultura escolar, população de alunos, etc. ). “Um modelo de comunidade
desenvolvido para um grupo de professores pode não funcionar para outros grupos. Em
comunidade, assim como em roupas, um tamanho não serve em outro
62
” (GROSSMAN et al,
2001, p.976)
Há uma diferença entre comunidade de professores primários e professores de ensino
médio, por exemplo. A primeira delas seria em relação ao conhecimento de conteúdo. Não se
espera que os professores primários sejam experts em todos os conteúdos que trabalham, muitas
vezes, eles têm preferência por esse ou outro conteúdo. Já os do ensino médio, são escolhidos
pelas disciplinas, por isso eles têm que ter domínio de seu conteúdo. A questão de conteúdo
também interfere na participação dos professores numa comunidade. Professores da área exata,
tendem a incidir num resultado único, enquanto os, da área de humanas, tendem a discutir e
discordar enquanto interagem sobre as questões de identidade: gênero, raça, religião, classe
social, regionalismo, e geração.
A tarefa das comunidades é aprender com a diversidade. Aprender a traduzir diferenças
em produtividade.
Voltando à questão do nível que os professores participantes atuam, Sandra Crespo fez
um comentário significativo.
62
A model of community developed for one population of teachers may not work for others. In community as
in clothing, one size does not fit all.
163
“(…)bom, foi isso que eu pensei que aconteceria. Eu pensei que eles iriam ficar
intimidades, eles não iriam começar a conversar sobre o que eles não sabiam. Quem quer
parecer tolo? Certo? Mas para mim foi totalmente surpreendente. Mas daí quando eu
pensei sobre o que estava acontecendo(os professores estavam conversando
honestamente a respeito de suas dificuldades), eu então entendi, ninguém espera que eles
sejam experts em matemática. Você sabe o quê quero dizer. Ninguém espera que
professores primários saibam matemática. Se nós estivéssemos falando de literatura (no
nosso caso seria equivalente ao ensino da língua portuguesa), eu posso dizer que seria
totalmente diferente. Eu acho que , pelo menos, aqui nos Estados Unidos o quê importa
na escola fundamental é aprender a ser, aprender a escrever. Quero dizer, eles não
admitiriam que não sabiam como escrever uma palavra, ou como lê-la. Não há como eles
admitirem que não sabiam algo de literatura
63
.
Ao insistir que a diferença poderia não estar no nível de ensino dos professores
participantes, Sandra Crespo reafirmou sua posição.
Entrevistadora: Eu estava tentando entender como que os professores, no seu
projeto, conseguiram falar tão livremente sobre o conhecimento de conteúdo. Uma
coisa que eu pensei foi que talvez a razão seja que eles, ao resolverem os problemas,
eram mais alunos que professores.
Sandra Crespo: Isso é verdade. Eu acho que poderia ser por todas as razões que
conversamos a respeito, mas não há como saber ao certo. Mas uma razão que eu acredito
era a de que ninguém esperava que esses professores fossem bons em matemática
64
.
Grossman que trabalhou com professores de ensino médio, confirma tal posição sob
diferente aspecto. “Eles acreditam serem os experts então a construção de comunidade nessa
63
“But that’s what I thought it would happen. I thought, oh, they are going to be intimidated, they won’t want to
talk about what they don’t know. Who wants to talk and look dumb? Right? But to me it was totally surprising.
But then when I thought about it, it was like, nobody expects them to know mathematics. You know what I mean.
Nobody expects that elementary school teachers to know math. If we are talking about literacy, I can tell you, it
would totally have a difference. I think that at least here in the States what happens in the elementary school is
about learning to be, learning to write. I mean they will not admit that they would know, not know how to spell
something, how to read something, you know what I mean. There is no way they would not admit that they don’t
know something related to literacy”.
64
E: I was trying to understand how you get the teachers at your study group to feel so free to talk about content
knowledge. One thing that was thinking as a reason for that was that maybe when because when they were solving
the problems, they were more students than teachers.
SC: That is very true. I think it could be all of those things we talked about, there is no way of knowing which one it
is. It is just fun to make reason for why. One reason that I thought was that no one expects them to be good at math.
164
realidade pode interferir na perspectiva da aprendizagem. Cientes dessa questão, pois estávamos
lidando com professores do ensino médio, nós pensamos em ter dois conteúdos no mesmo
projeto
65
”. De acordo com os relatórios do caso 3, esta idéia mostrou-se muito eficiente.
“Ao escolhermos duas disciplinas, nós pudemos proporcionar oportunidades genuínas de
aprendizagem, pois os professores de inglês estavam encontrando alguns itens históricos
pela primeira vez, assim como os professores de história em relação à língua. Além
disso, os participantes tiveram que tornar suas idéias mais explícitas para se fazerem
entender
66
”.
4. AS COMUNIDADES E O PAPEL DOS
ORIENTADORES/MEDIADORES
Num grupo que se propõe realizar atividades complexas, em condições freqüentemente
adversas, a liderança é fundamental (COCHRAN-SMITH & LYTLE, 1999). Sendo que tal
liderança pode ser centrada numa pessoa, ser partilhada por um grupo ou ser relativamente
distribuída por todos.
Um trabalho de colaboração envolve dificuldades em relação às quais é necessário estar
atento, como o saber gerir a diferença, lidar com a imprevisibilidade, saber avaliar os potenciais
custos e benefícios e evitar a auto-satisfação confortável e o conformismo (PONTE, 2002).
Normalmente, essas comunidades estão sendo desenhadas por pesquisadores em
desenvolvimento de projeto acadêmico.
Muito do trabalho necessário para ligar a pesquisa com a prática está enfocado na
educação e no desenvolvimento profissional dos professores, no currículo, nas ferramentas de
avaliação, nas metodologias de ensino, e nas políticas que definem o ambiente no qual o
65
“They believe they’re the experts so the construction of communities on the top of the experts can get in the way
of the perspective of learning. Aware of this issue as we were dealing with high school teachers, we thought of
having two subject-matters in the same project”.
66
“By having two subject-matters, we could have more genuine learning opportunities. People of English really
encounter some historical items for the first time, as the History teachers. This strategy forced people became more
explicated about assumptions they had”.
165
aprendizado irá acontecer. Estas são áreas que os práticos têm bom conhecimento e experiência.
Mas, destaca-se a importância de se ter educadores em parceria com os pesquisadores ao
executar projetos de pesquisa. Tais parcerias permitem que as perspectivas e o conhecimento
dos professores sejam analisados, trazendo consciência à pesquisa sobre as necessidades e da
dinâmica do ambiente da sala de aula. Desde que tais parcerias são novidades para muitos
pesquisadores, exemplos de casos e princípios guias precisam ser desenvolvidos a fim de
conseguir que os planos consigam mais sucesso e conduzam à parcerias de pesquisa. As ligações
entre pesquisa e prática deveriam, rotineiramente, fluir em ambas as direções. Pois os insights
dos pesquisadores ajudam a moldar o entendimento dos práticos e os insights dos práticos
ajudam a moldar a agenda de pesquisa e os insights dos pesquisadores. Assim, as pesquisas
hoje caminham para a direção que liga cada uma das áreas a uma base de conhecimento que se
esforça para alinhar materiais educacionais, formação de professores, administração, política
pública, e opinião pública, onde novas idéias, técnicas de ensino, formas de comunicação são em
si mesmos sujeitos de estudo. Essa agenda propõe pesquisa e desenvolvimento que podem
ajudar a consolidar a base de conhecimento dentro das áreas que influenciam a prática, com a
participação dos práticos. Além disso, essa base de conhecimento também é alimentada pela
pesquisa geral sobre o processo ensino-aprendizagem mais generalizada assim como a prática da
sala de aula.
Constatando tal necessidade de pesquisa, as “Comunidades de Professores” vêm
desempenhando um importante papel na Ciência da Educação. Porém, muitos dos pesquisadores
envolvidos ainda não têm determinado para si qual o seu papel nesse tipo de intervenção.
O ato de gerenciar interações de grupo não pode estar ausente do referencial teórico
delineado. A ambivalência quanto ao próprio papel do pesquisador pode trazer à tona diversas
questões, entre elas:
Tentando duramente não construir uma imagem de que os pesquisadores são os
professores sabe-tudo, eles podem acabar deixando de exercer a liderança que se
espera e se faz necessária.
Como um projeto de pesquisa acaba após certo período, os pesquisadores tentam
criar entre os membros da comunidade, uma liderança para que o grupo perpetue
após o término do projeto em si. Essa liderança deve partir do próprio grupo
166
durante a pesquisa, mas os orientadores/mediadores não devem deixar de exercer
sua liderança uma vez que os participantes contam com a intervenção dos líderes
para resolver situações de má-conduta, por exemplo.
Ao surgimento de problemas e conflitos, os pesquisadores, na tentativa de “curar”
o projeto, podem incorrer no erro de resolver questões de maneira individualista,
falando com os indivíduos particularmente, ao invés de resolvê-las em grupo.
Dessa forma, os próprios orientadores/mediadores acabam fortificando não a
comunidade, mas os aspectos da pseudo-comunidade.
Como os pesquisadores, geralmente, são sujeitos que vêm de fora do contexto,
eles são tidos como os que detêm o poder de decidir as questões com impasse.
Essa posição torna-se, muitas vezes, desconfortável, pois ou o pesquisador não
assume esse papel e acaba fortalecendo conversas paralelas, separadas do grupo
como um todo, na tentativa de abrandar conflitos, ou assume seu papel decisivo e
intimida o surgimento de lideranças de dentro do grupo. Nesse movimento de
articulação de liderança e decisão, os orientadores/pesquisadores podem causar
conseqüências definitivas para o sucesso ou não do projeto. (GROSSMAN et al.,
2001)
O papel do orientador/mediador é o de ajudar o grupo a se tornar uma comunidade e isso
é uma tarefa complexa que consome tempo e dedicação ( GROSSMAN et al , 2001). O
problema é que os participantes conhecem melhor a cultura da escola e do grupo, quem são os
professores que fazem parte da cultura escolar daquele grupo, pois compartilhar experiências
com colegas que não fazem parte do grupo pode ser perigoso. O orientador/mediador deve
entender que está menos vulnerável do que os professores participantes.
Exatamente esse sentimento de preocupação constante com a mediação dos grupos foi
demonstrado pelas orientadores/mediadoras pesquisadas.
Helen Featherston revelou claramente sua falta de preparo para as questões das relações
sociais.
167
“Uma vez, talvez no segundo ano de projeto, uma professora saiu no meio do encontro.
Eu pensei que ela tinha ido no banheiro, mas ele não voltou. Depois da reunião, ela
voltou para a sala e desculpou-se por ter saído daquela forma. ‘Eu não agüentei…tem
sido assim em todos os encontros, ela disse’. Eu fiquei totalmente...você sabe. Então
para mim, a pior parte de ser orientadora/mediadora foi os problemas com personalidade
e com a forma de fingir entendimento dos participantes porque eu comecei
completamente desavisada e progressivamente fui conhecendo mais e mais as pessoas e
eles começaram a confiar em mim e vinham dizer as coisas. Assim, eu comecei a prestar
mais atenção. Algumas pessoas são muito diretas e dizem as coisas, outras ficam na
dúvida entre dizer algo e ofender alguém ou ficar quieta. Então as pessoas não dizem
nada e quando dizem, eles até podem estar corretos mas a outra pessoa não pensa
assim”.
67
O papel do pesquisador/orientador caracteriza-se como um campo minado. Seja qual for
o lado que o pesquisador decida avançar, ele corre o risco de prejudicar ao invés de contribuir.
Quando paira no ar o entendimento de que todos os conflitos devem chegar a uma conclusão
final, esse papel do orientador/mediador fica ainda mais desgastado. Por isso é importante
desenvolver o senso de que existem posições diferentes acerca de um assunto. A falta dessa
compreensão torna-se um problema para o orientador resolver. É preciso entender que há
diferentes formas de compreender um mesmo fenômeno. Sendo que identificar os pontos de
divergência entre opiniões opostas torna-se essencial e fator gerador de crescimento profissional.
Mas perceber esses pontos e confrontá-los parece essencial.
Acompanhemos os testemunhos da orientadora/mediadora Sandra Crespo.
“Quando você deve ou não corrigir os participantes e por quê? Eu estava tentando fazê-
los pensar sobre a razão que nós não estávamos corrigindo naquele momento. Se vai
corrigi-los, quando deveria corrigi-los. Você sabe. Eu planejei iniciar duas discussões,
uma em particular, perguntando o que você lembra sobre isto? Porque eu lembro que na
maneira que você falou comigo pareceu que você ficou chateado com a correção que fiz
67
One time, maybe on the second year, a teacher left in the middle of a meeting. I thought she went to the
bathroom but she didn’t come back in. Then, after the meeting, she came back to the classroom and she said she
was really sorry she had to walk that way. I just couldn’t take anymore…it has been like that every meeting, she
said. I was totally…you know. So for me the worst part of being a facilitator was problems about personality and
playing understanding because I started out completely unaware and I progressively became more and more aware
because people trusted me and came to me to tell me about things. And I became to pay more attention. Some
people are very direct and they say things and other people that are controversies think if I say that it would mean
that their teaching was terrible. So people don’t say and when they do they can be correct but the other person
doesn’t see like that.
168
sobre o problema. Outra, em grupo. Mas eu acabei não começando nenhuma discussão a
respeito do assunto. Mas eu, agora, acho que deveria ter falado com ele
68
”.
Assim, os pesquisadores/orientadores vivem sob uma linha ambígua: como pesquisadores
- documentando o progresso do projeto, como orientadores – planejando e desenhando as ações
da comunidade, e como co-participantes – resolvendo problemas, lendo livros, discutindo
currículo e compartilhando idéias com o grupo.
Apesar da persistência de muitos questionamentos que evidenciam a falta de um
entendimento delineado acerca desta questão complexa, alguns pontos destacados nesse estudo
poderão ajudar na preparação de pesquisadores para o papel de orientador/mediador. Sandra
Crespo sugere que o comprometimento com o grupo é essencial, como também o entendimento
de que o orientador/mediador torna-se um aprendiz no grupo, não aceitando a posição de expert
da situação.
“(...) Eu quero dizer que você é convidado a participar, a fim de poder fazer parte do
grupo. Eles permitem que você participe das discussões como um igual. Eu até
compartilhei histórias da minha prática. Eu estava tentando entender junto com eles, o
quê eles estavam fazendo e como estavam fazendo. Mas eu sabia que eu estava tentando
levar essas pessoa a aprenderem como qualquer outro
69
”.
Pamela Grossman aponta a necessidade de se compreender a cultura escolar do contexto
que o orientador/mediador estará trabalhando, e ter uma base de conhecimento sólida.
68
When do you correct and when don’t you correct and why? And so, I was pushing them to think about why
aren’t we correcting now, you know. If you are going to correct them, when would you correct them? You know.
I planned to eventually to bring two conversations, this one in particular, what do you remember about this?
Because I remember the way that sounded to me was that it was upset. And another one in group. If it would be
nice to bring it back. But …I didn’t do it , I probably should have”.
69
(…)I mean you have to be invited in, in order to see everyone you and yourself as a part of their group, they allow
you to be part of the conversation as an equal. I was able to bring in things from my own teaching. I was trying to
figure out with them, what they were doing and how they did things. But I knew something that I was trying to get
people to learn like anybody else.
169
“Eu acho que foi bom que nós éramos de fora. Algumas vezes você precisa ter muita
experiência em trabalhar com professores e entender a cultura escolar. Compreender essa
cultura, novamente, as pessoas vêm da universidade e não possui tal entendimento.
Quando nós recebemos o financiamento do projeto, nós lemos muito trabalho
psicológicos envolvendo o ambiente escolar. E mesmo assim, quatro meses após o início
do projeto, nós chegamos a conclusão que deveríamos ter lido muito mais sobre
psicologia social. Mesmo assim, eu acho que você deve ter um orientador externo
inicialmente. Nós decidimos o projeto, nós compartilhamos a liderança, nós tínhamos
bem definida a noção de nós não ficaríamos lá para sempre, então nós queríamos treinar a
capacidade dos participantes a liderar a si próprios de forma a continuarem com o
projeto. Além disso, ter um conhecimento profundo dos conteúdos pode também trazer
outros recursos
70
”.
Orientar as discussões, fazer parte do grupo enquanto membro, desenvolver atividades
que proporcionem oportunidades para o grupo evoluir e alcançar a maturidade, solidificar a base
de conhecimento, incentivar a participação de todos, encaminharem as ações em prol do objetivo
previamente traçado, etc. Esses são alguns dos aspectos que delineiam o papel do
orientador/mediador de um projeto de comunidade. Um papel difícil, que demanda tempo e
comprometimento, como testemunhou Crespo. Mas uma posição que carrega consigo ainda
muitas dúvidas mas uma certeza: sempre haverá espaço para o imprevisível numa atividade
como essa.
5. DIFICULDADES PARA “COMUNIDADES DE PROFESSORES”
No campo afetivo, a dificuldade maior pousa sobre a insegurança, falta de autoconfiança,
alguma inibição por parte dos participantes. Esse obstáculo é inclusive apontado por
orientadores/mediadores. Assim como os participantes temem tecer opiniões errôneas e
70
That was helpful that we were outsiders. Sometimes you need to have a lot of experience working with teachers
and kind of understanding the culture of teaching. Understanding the culture, again, people can come from
university and not be very understanding of the culture of teaching. When we got funded, we read a lot of
psychologist working at schools. And four months of this project and we realized we should have read a lot more of
social psychology. But I think you need an external facilitator initially. We decided our project, we shared
leadership, we’re pretty mindful that we wouldn’t be there forever, so we want to try their capacity to leadership
themselves so they could continue the work. Having a deep understanding of the subjects, could also bring some
other resources.
170
despertar um sentimento de incompetência, outros temem agredir seus colegas com seus
comentários. Sendo assim, o hábito de se trabalhar para a compreensão dos outros, respeitando
as diferenças, estendendo a compreensão dos fatos , trabalhando para a melhoria do
conhecimento do grupo devem ser procedimento indispensáveis numa “Comunidade de
Professores”. Pois toda construção de comunidade requer uma negociação social aberta e
disponível, e a regulamentação das interações sociais e normas de convivência em grupo.
Conhecer dinâmicas de grupo pode auxiliar orientadores/mediadores nessa árdua tarefa.
“Você sabe de uma coisa? A coisa mais difícil de um grupo de estudo é fazer com que os
participantes tenham uma conversa proveitosa. Nós não desempenhamos esse papel o
tempo suficiente para saber e não existe muita coisa escrita sobre como mediar conversas
sobre o ensino. É difícil. E as pessoas querem falar sobre suas práticas e tudo que lemos,
ao invés de conseguirmos algo assim, aqui estão maneiras de conversar sobre a prática no
campo profissional. É muito difícil e nós não sabemos como chegar lá
71
”.
De um modo muito forte, entende-se que a generalização de projetos assim não existem.
Há de se entender que as características especiais e particulares de cada grupo, determinadas pela
diversidade de seus participantes, compõem a natureza da experiência que realizada de modo
coletivo, delineia uma tônica de partilha num ambiente colaborativo.
Não há referencial teórico, atualmente, que dê conta desse processo que é concebido,
construído, partilhado, refletido por uma comunidade. Trata-se de um processo que vai
crescendo e transformando-se dependendo, principalmente, do comprometimento do
orientador/mediador e da expectativa, motivação e compromisso de todos os participantes.
Em resumo, para o sucesso de um projeto de “Comunidades de Professores”, contribuem
de modo decisivo o ambiente colaborativo, as relações interpessoais, a dinâmica e a metodologia
usada, assim como a liderança, objetivos e ações desenvolvidas.
71
You know what? This is probably the most difficult problem of a group study getting them to have a helpful
conversation. We haven’t done it long enough to know and there is no, you know there is a lot written facilitating
math discussion but there isn’t very much about facilitating a conversation about teaching, you know. It is hard.
And people want to talk about their teaching and that is all we read about, instead of here are some ways in which
you could have, just talk about their teaching on professional matters. It is really hard and we don’t know how to go.
171
Os casos 1 e 2 apresentaram um grande impasse causado pela implementação de nova
micro política no distrito educacional do qual as escolas do projeto estavam situadas. Segundo ,
Helen Featherston, orientadora/mediadora do caso 2, esse foi o maior desafio que ela encontrou
no desenvolvimento de seu grupo.
“Bem, a pior parte do projeto foi quando boas coisas já estavam acontecendo nas salas de
aula, e o distrito começou a interferir mais diretamente com as crianças e abrir espaço
para os problemas que resolvíamos nos encontros com os alunos tornou-se muito, muito
difícil. Os testes quinzenais vieram e dificultaram tudo. Então não foi um problema
interno do grupo mas foi realmente frustrante. Nós vimos o progresso e queríamos fazer
assim mas não podíamos mais. De uma certa forma, nós no sentimos pior que antes
porque agora tínhamos uma visão de como queríamos ensinar mas não podíamos mais.
Foi frustrante porque o distrito comprou livros de investigação. Esse material
apresentava uma tendência progressivista, muito bom. Eles são bons. Eles realmente
requerem que os professores pratiquem o conteúdo. Então eles compraram esse material
para o distrito e Deus sabe quanto gastaram. Deve ter custado uma fortuna. E os
professores tinham esse material, mas também tinham livros didáticos bem tradicionais.
E o distrito relacionou os testes quinzenais à tabela de conteúdos dos livros didáticos
72
”.
Sandra Crespo encontrou outro problema distrital com seu grupo. Apesar de serem casos
do mesmo projeto, a escola do caso 2 não se encontra no mesmo distrito do caso 1. Sendo assim,
os testes quinzenais não se transformaram num problema para seu grupo, mas em contrapartida,
os livros didáticos e a cobrança de segui-los tornaram um obstáculo para os participantes do
caso.
“O distrito determina que no dia tal você estará ensinando X, e no outros dia, você estará
ensinando Y, então ao invés de ajudas os professores, o distrito determina padrão
específico. Dessa forma, se houver um movimento de um aluno de uma escola para a
outra no mesmo distrito, ou aconteça de uma escola fechar, ou de professores demitirem-
se, você terá certeza de que todos estão na mesma página do livro didático. Sendo assim,
nós podemos unir classes sem ou com um mínimo de interrupções. O quê tornou difícil
72
“Well, the worst part of the project was that really after we got good things happening in the classrooms, the
district became much more deeply involved testing kids overtime and became really, really hard to teachers to make
space to practice the problems. Quarterly tests came in and it was really hard. So that was not internal to the group
and that was really frustrating. We saw the progress we want to make and it had to end. In some way, we felt like
things were worse than they were before because they had a vision how they want to teach but they couldn’t
anymore. It was frustrating because the district actually had bought the investigation books. The investigation
materials are kind progressive, very nice. They are good. They do require teachers to practice. So they bought all
these materials for the district and God knows how much they spent. It must have cost a lot. And the teachers had
that but they had these very traditional textbooks. And the district linked the quarterly tests to the table of contents
of the textbooks.”
172
para nós foi o fato de se tornar menos possível que o orientador/mediador conseguisse
encontrar diferentes tipos de problemas matemáticos que correspondessem ao que os
professores estavam ensinando, ao invés de um problema que fizesse os professores
refletirem Assim, o planejamento estava voltado para o quê estava acontecendo na escola,
não poderia ser uma escolha livre. Por causa disso, os professores tiveram mais
dificuldade de usar os problemas com seus alunos pois como dependiam de um
planejamento rigoroso, nunca sobrava tempo
73
”.
O caso 3 não reportou nenhum impasse ocasionado pelo distrito escolar ou implantação
de uma nova política educacional. Porém, apontou para questões ligadas às micro-políticas da
instituição escolar. Essas questões apontam para as características propostas pelos casos.
Os casos 1 e 2 apresentam quatro características básicas e apontadas como essenciais:
school-based, cross-grade, problem-based e focused on participant-generated artifacts.
Primeiramente, vamos discutir a característica na qual a proposta indica que o grupo de
estudo está centrado na escola a fim de promover a realização de comunidades entre colegas que
compartilham o mesmo ambiente de trabalho e por isso, na visão dos coordenadores do projeto,
têm mais chance de apoiar a melhoria da prática de cada um. Essa perspectiva também está
presente no caso 3, porém com um ajuste. No caso 3, essa característica é descrita como
department-based, ou seja, centrado em departamentos por envolver professores do ensino
médio que nas instituições americanas estão locados em departamentos de acordo com as
disciplinas.
Esse enfoque apresentado pelos coordenadores do projeto dos casos 1 e 2 acabou sendo
contestado pelas próprias orientadoras/mediadoras em questão, pois segundo elas, o fato dos
professores participantes já possuírem uma história de vida e conhecerem-se pessoalmente ou
73
The district determines that in this particular day you will be teaching X, in this particular day you will be
teaching Y, so instead of helping the teachers, determines a particular path. So if you have a movement from one,
you know, school closing, or teachers quitting, you have to make sure that everybody is in the same page because
we have all this movement of students moving from one school to the other, or teachers school merging. So we
have to make sure we can merge classes without or with minimum disruptions. The thing that made difficult to us, it
became less possible that the facilitator had to deal with different kinds of problems to match whatever it was that
the teachers had to be teaching, rather than , for example, something that would push the teachers toward thinking.
So the agenda had to be more into, always had to be towards what was going on in the schools, it cannot be a free
supply, thing that you bring in, always had to be with the context. And the teachers became less able to try these
problems in their classroom because if they are not teaching that they wouldn’t take the time to do this because
what’s the purpose of doing that? And if you know, if you have a timeframe you are never on time, you are always
behind. You know. You always have to catch up. There is never the case you work away ahead and you have lots
of time.
173
por meio de comentários dos alunos, o relacionamento dentro do grupo foi prejudicado. Outro
ponto importante foi que as orientadoras/mediadoras por terem vindo de outro contexto não
conheciam essas relações que algumas vezes passaram despercebidas como foi exemplificado
por Helen Featherstone no caso da professora que abandonou um encontro, pois não agüentava
mais atitude de outra participante. No caso, Helen assume ter ficado surpresa, pois até então não
havia percebido qualquer sinal de desajuste no grupo. Sandra Crespo também questiona tal
aspecto.
School-based, eu não tenho certeza de que precise ser school-based, mas é prático estar
em uma escola. Eu sei que num projeto anterior, Helen teve professores de várias escolas
diferentes e porque não precisavam se ver todo dia, só se viam uma vez ao mês, permitiu
que fossem mais honestos talvez. É difícil dizer alguma coisa sobre o colega que trabalha
no mesmo lugar que você, que você terá que encarar no dia seguinte, então ...eu não
tenho certeza sobre esse aspecto
74
”.
Helen Featherstone complementa:
“Eu realmente não acho que seja crucial ser school-based e cross-grade. Eu acredito que
o senso de segurança dos participantes seja mais importante. A capacidade deles
forçarem uns aos outros a serem honestos, todas essas coisas, ter bons problemas
matemáticos e as pessoas terem coragem de levar para sala de aula uma coisa diferente,
voltar e comentar, isso sim parece-me que importa mais
75
”.
Porém Grossman apresenta uma preocupação:
“A noção de “Comunidades de Professores” foi de que se você não trabalhar num
contexto, você acaba mudando a prática dos professores mas não afeta as escolas, porém
74
“The school-based, I am not sure if it needs to be school-based, but it is practical to be in one school. Because I
know Helen had teachers from different schools, and (…) because you don’t have to see these people every day.
They only see them every month, I think this allows you to be more honest maybe, rather than knowing that if the
colleague who is from the place where you are working, you have to say something, you have to see the next day,
so…I think… I don’t know about the school-based”.
75
“I really don’t think it’s crucial to be school-based and cross-grade. I think people sense of safety is more
important, their capacity to push one another to be honest, all those things and having the courage to take something
different that they usually do, and come back and talk about it.
174
se você está localizado dentro das escola você tem a possibilidade, e isso de fato ocorreu
no nosso projeto, de muda a cultura escolar também
76
”.
Considerando os dois aspectos apresentados pelas orientadoras/mediadoras, vemos que
trabalhar com professores de diferentes escolas, pode facilitar a formação dos laços de relações
sociais e abrir caminho para discussões mais francas a respeito da rotina, normas e
regulamentações de cada instituição, dos problemas enfrentados e, parece, facilitar a construção
de críticas quanto à prática dos colegas de grupo mas que não colegas do dia-a-dia. Essa
característica acaba por determinar um objetivo diferenciado de modelo, sendo que o school-
based irá focar na formação de professores, com melhoria da base de conhecimento. Esse
propósito traria conseqüências diretas na sala de aula, no aperfeiçoamento profissional do
professor, mas não estaria conectado, necessariamente, à intenção de promover uma mudança da
cultura escolar, por exemplo. Porém, como vimos anteriormente, toda pesquisa colaborativa
precisa de um ambiente que fomente e assegure essa perspectiva. Assim, ao centrar projetos de
comunidade em uma escola, procura-se suprir essa condição básica de um contexto que promova
discussões coletivas, propiciando ao professor um melhor entendimento das características da
cultura escolar, da preparação e produção adequada das ações pedagógicas à realidade escolar,
da apropriação da produção do saber científico e dos mecanismos de produção do saber escolar e
por fim, da compreensão do seu próprio processo de amadurecimento profissional.
Prevalecendo a percepção de modificação do contexto escolar, e cientes das dificuldades
de se conseguir discussões honestas e frutíferas num grupo com essa característica, resta aos
orientadores/mediadores um maior conhecimento de dinâmicas de grupo e psicologia social para
garantir que o grupo passe pelas fases de pseudo-comunidade e evolua para comunidade.
O segundo aspecto, cross-grade, está delineado nos três casos. Nos casos 1 e 2, essa
característica é descrita como básica. Já no caso 3, não há menção explícita quanto ao grupo
contar com professores de diversas séries. Porém, conhecendo a realidade das escolas
americanas de ensino médio, podemos interpretar que cada departamento conta com a presença
de professores daquela disciplina que trabalha nas várias séries que compõe essa etapa do ensino.
76
“The notion was that if you didn’t do in a context , you’d get changed teachers but unchanged schools, if you’re
located within the schools you have the possibility what in fact happened in our project of changing school culture
as well”.
175
Porém, quando consideramos as séries do ensino médio podemos destacar poucas diferenças
cruciais entre uma série e outra. Provavelmente a lista de conteúdos e o grau de exigência. Mas
as séries do ensino fundamental representam estágios bem diferenciados considerando o
processo ensino-aprendizagem. Portanto, essa condição torna-se mais significativa nos casos 1 e
2. Sandra Crespo acredita esse seja um aspecto importante porque os participantes acreditam ser
aconselhável conhecer a realidade das demais séries para seu próprio conhecimento. Entretanto,
Helen aponta outra faceta. “Do jeito que as escolas são em Lansing (capital do estado americano
de Michigan. As escolas são muito pequenas. Se você quer ter um grupo de estudo baseado na
escola, ele tem que ser entre séries. Mas eu não tenho muita certeza do quanto isso importa
77
”.
Acreditamos que para o ensino fundamental a percepção de como o pensamento do aluno
desenvolve-se pode ser um ganho extra de conhecimento pedagógico e conhecimento
pedagógico do conteúdo.
Já ao ser baseado em problema acaba sendo próprio dos casos 1 e 2 , ou seja, dos casos
de comunidades que envolvem o conhecimento matemático. No caso 3, cujo conhecimento
específico está relacionado com as ciências humanas, um projeto baseado em problema poderia
acontecer, por exemplo, com apresentação de casos de estudo que, com certeza, gerariam
discussões acerca da prática. Porém, deveriam estar inseridos em um conhecimento específico,
dificultando assim essa adequação.
Finalmente, na questão de ser focada nos artefatos gerados pelos participantes,
poderíamos inserir os três casos desse estudo. Os relatos das práticas nos casos 1 e 2 após a
aplicação dos problemas matemáticos com os alunos, e no caso 3, do entendimento da leitura
proposta são artefatos gerados a partir dos fatos vivenciados ou das concepções dos professores
que fazem parte do grupo e responsáveis por gerar discussão. Acreditamos que seja essa uma
característica essencial de todo e qualquer projeto de “Comunidades de Professores”. Mesmo
quando se integra um grupo, onde diversos participantes tenham tido experiências e concluído
pesquisas anteriormente, o mérito está no apoio a uma reflexão mais aprofundada.
Os projetos americanos contaram com o financiamento de fundações e puderam, assim,
bonificar os participantes, como no caso 3, como também contratar professores substitutos, a
77
“The way schools are in Lansing. The schools are too small. If you want to have a school-based study group, you
have to do it cross-grade. I am not sure how much it matters”.
176
exemplo dos casos 1 e 2. Advinda de um país capitalista como os Estados Unidos, não há de se
estranhar que é de senso comum entre os profissionais de que nenhum trabalho é feito
gratuitamente. Sem um financiamento, nenhum dos casos estudados nessa pesquisa teriam
acontecido pois os professores americanos não dispõe de nenhuma hora extra se não forem
recompensados financeiramente. Mesmo com bonificação monetária e professores substitutos
para os dias de encontro, as orientadoras/mediadoras apontaram dificuldades em recrutar
participantes. Nos casos 1 e 2, o recrutamento não ocorreu facilmente. Os diretores das escolas
afirmaram que os professores estariam participando, mas não os consultou antes. Essa situação
mostrou-se constrangedora no início, mas aos poucos, com a divulgação dos objetivos do
projeto, os professores começaram a se voluntariar. Nesse projeto, uma das outras duas escolas
contou com a participação maciça dos professores, pois o diretor da mesma exigiu a presença de
todos. Esse grupo acabou sendo o maior de todos e ultrapassando o número desejável de
participantes. A facilitadora desse grupo, infelizmente, não chegou a escrever nenhum artigo a
respeito, mas informações dão conta de que ela, costumeiramente, dividia o grupo em sub-grupos
a fim de facilitar a orientação dos trabalhos.
Alguns outros problemas começaram a acontecer após algum tempo de projeto, pois um
grupo tinha encontros no horário escolar e os participantes eram substituídos, enquanto outro
fazia seus encontros após o horário escolar. Aos poucos, o grupo com encontros após as aulas
estava reivindicando encontros no horário de expediente. Apesar dos contratempos no
recrutamento, as orientadoras/mediadoras participantes declararam que o número, na opinião
delas, estava bom. Um dos grupos contou com sete professores e outro grupo com dez
professores. Já no caso 3, a participação foi “sugerida” pelos chefes de departamentos. A
sugestão conseguiu recrutar vinte e quatro participantes. Questionadas sobre o número ideal de
professores num grupo de comunidade, nenhuma das orientadoras/mediadoras conseguiu
expressar uma opinião definitiva a respeito. Porém, menos que cinco ou seis professores, as
orientadoras/mediadores acreditam que não seja ideal pela falta de um maior número de pessoas
para as discussões, assim como um número muito excessivo acaba transformando comunidades
em workshops.
Com atividades embasadas no conteúdo específico, há de se questionar como abranger o
conhecimento pedagógico. Nos casos 1 e 2, da área de exatas, as orientadoras/mediadoras
177
apontaram para a dificuldade de se fomentar discussões consistente sobre prática, conhecimento
pedagógico.
“No terceiro ano eu estava começando a experimentar maneira diferente de tentar iniciar
discussões sobre conhecimento pedagógico. Algumas vezes eu tentei levar ao grupo
artigos especificamente de pedagogia. Às vezes, essa estratégia funcionava, outras vezes,
não. O que faria com que os professores falassem consistentemente sobre a sua prática?
Nós tentamos diferentes coisas que os orientadores/mediadores têm que se envolver.
Uma delas é que os professores possuem uma conta verbal sobre o quê e como aconteceu
na sala de aula. Alguns trazem trabalhos dos alunos, mas alguns até trazem vídeo de sua
prática, e cada uma dessas coisas requer um movimento diferenciado do
orientador/mediador e todas elas acontecem no mesmo encontro. Você sabe o quê quero
dizer pois quando você está mediando problemas matemáticos, tudo é a mesma coisa, e
eles somente estão lá
78
”.
Grossman indica a importância do conhecimento do conteúdo ser a força geradora das
discussões em uma comunidade, mas salienta que não se pode esquecer da base de conhecimento
e seus três pilares, digamos assim.
Finalmente, há considerações sobre as dificuldades dos professores participantes
desempenharem suas atividades rotineiras e ainda acrescentar momentos de formação. Mesmo
com tais dificuldades, poucos foram os participantes que desistiram do projeto antes de seu
término, deixando a sensação de que apesar das dificuldades, a participação tornou-se importante
e necessária. Sendo que cada vez que um dos membros abandonava o grupo, os demais
participantes sentiam falta e conseguiam formular as perdas do grupo com a saída de um
participante. Esses sinais demonstram conscientização e amadurecimento da comunidade.
78
I was beginning to experiment with different ways to try to get them to talk about way more and some of them
happen only once instead of happening and then I had to go back to the classroom what happen here and why keep
happening. Some other times I got some paper specific on pedagogical content. Sometimes it worked. Sometimes
it didn’t work. I have a few theories about what matters. What would make teacher talking consistently about their
teaching, some artifacts, a classroom video, or for what they matter teacher would sustain a verbal account about
happened in the classroom. We’ve tried different kinds of things that you have to deal with when you are
facilitating. One of them is that the teachers have a verbal account for what happened, how happened. Some of
them bring paper work from the kids, but some people would even bring a video of their teaching, so each of those
things require different facilitator move and they all happen in the same meeting. You know what I mean, when you
are facilitating a math problem, everything is the same, and they are just there.
178
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Poucos professores entram na profissão para trabalhar com outros adultos com o mesmo
nível ou um nível próximo quanto à base de conhecimento. Sendo assim, quando são colocados
em situações de negociação com outros adultos que não compartilham suas crenças, seu ponto de
vista, nem suas filosofias pedagógicas, o professor se vê frente a uma realidade adversa,
contrária ao que está acostumado.
“Ao contrário do que as visões idealísticas possam ter determinado na literatura a favor
das “Comunidades de Professores”, o fato de se colocar professores juntos para aprender
e vivenciar tal experiência pode tanto machucar, ferir, quanto ajudar, especialmente
quando as normas de interação numa esfera pública estão mal definidas
79
”(GROSSMAN
et al, 2001, p.991)
Diante da possibilidade de poder causar danos a seus participantes, os cuidados para a
formação de “Comunidades de Professores” passam a ser uma prerrogativa de qualquer ação
nesse sentido. Assim como uma jornada a ser percorrida por seus participantes, sempre se espera
alcançar o fim com o reconhecimento de mais experiências positivas que negativas.
Dispensa comentários o quanto seria mais fácil reunir professores que compartilham
pensamentos e atitudes para formarem uma comunidade. Mas aí, cria-se uma situação irreal,
pois hoje se verifica uma sociedade pluralista, marcada pelo indivíduo. Apesar de dificultar o
79
“In contrast to the idealistic visions sketched in the advocacy literature on teacher community, bringing teachers
together can hurt as well as help, especially when norms for interacting in a public sphere are ill defined.”
179
processo, o ato de unir professores com conhecimentos prévios diversificados, pensamentos e
idéias contrastantes, torna-se rico recurso de aprendizagem.
As diferenças existem de raça, religião, diferenças étnicas, políticas. Mas as diferenças
que importam e devem vir à tona são as diferenças que importam no contexto da escola:
diferenças na filosofia educacional, perspectivas sobre o conteúdo, tendências pedagógicas e
crenças relacionadas aos alunos e às teorias de aprendizagem. Apesar da natureza de qualquer
grupo que se reúne para discutir um assunto de que se deve chegar a um consenso suprindo
qualquer divergência, há de se exercer uma rígida vigilância dentro das comunidades para que a
diversidade sobreviva de maneira produtiva – há compreensão e respeito em relação às
diferenças de conceitos e opiniões.
Fica evidente a fragilidade entre um grupo de professores, um grupo de estudo e uma
“Comunidade de Professores”. Sem uma orientação, os participantes tendem a formar pequenos
grupos baseados nas similaridades percebidas ou reais. Mesmo com cuidados relativos à
estruturação, as pessoas não conseguem interagir diferentemente ao que estão acostumadas a não
ser que as comunidades consigam atingir um patamar diferenciado de um fórum entre
desconhecidos e que exerçam novas formas de participação social e intelectual.
Diante de tantas dificuldades, por que insistir nas comunidades?
Primeiramente, sem a oportunidade de vivenciar uma comunidade de aprendizes,
professores não podem “reproduzir” com os seus alunos. Pois, cultivando comunidades
profissionais dentro das escolas, dá-se mais chances para os professores dominarem situações
rotineiras de sua profissão.
As disciplinas, os assuntos, os conteúdos estão em constante modificação. Mas muitos
professores continuam com a matéria que aprenderam na universidade. Muitas das reciclagens
que envolvem professores focam as inovações pedagógicas e/ou como integrar a tecnologia na
prática existente. Grandes mudanças de como e o quê foi ensinado precisam ser confrontados,
discutidos, antes de ocorrerem. Assim, as comunidades aparecem como locais ideais para que
um maior número de professores consiga discutir, aprofundar e fortalecer sua base de
conhecimento no local de trabalho, evitando os encontros, fóruns, seminários esporádicos que
tratam de temas distantes da realidade desses profissionais. Além disso, ao se encontrarem na
posição de aprendizes novamente, os professores enfrentam pessoalmente as dificuldades de um
180
processo de aprendizagem. Essa vivência tende a gerar uma compreensão maior em relação ao
dia-a-dia em sala de aula.
Assim, as “Comunidades de Professores” se desenham como um modelo de formação
continuada que se preocupa, centralmente, com o quê os professores fazem, pensam, precisam.
As comunidades podem criar dentro da escola um espaço de discussão de idéias, pensamento
científico, crescimento profissional para os professores e crescimento acadêmico para os alunos.
“Há claramente outros benefícios para os alunos. Este modelo de “Comunidade de
Professores” enfatiza a relação entre as oportunidades que os professores recebem com a sua
própria habilidade de propiciar similar oportunidades para os seus alunos
80
”, (GROSSMAN et al,
2001, p.999)
Próximo ao final do terceiro ano de projeto, um dos líderes do caso 1 registrou que seu
grupo conversou sobre formas de incluir outros membros da escola no processo de
aprendizagem. Eles começaram usando um problema escolhido, cada professor iria enviar o
trabalho dos alunos para o quadro de avisos da escola. Eles tentaram achar tempo para discutir o
trabalho dos alunos uns com os outros, mas não foi possível devido à falta de tempo.
Nós planejamos continuar trabalhando dessa forma para expandir nosso aprendizado por
toda a escola. Os professores que estavam envolvidos com o Projeto Lucent estão se
sentindo muito bem com a experiência. Eles consideram que ganharam tempo para
pensar, aprender e discutir juntos. Eles ganharam tempo para colaborar! Nós
pretendemos continuar nos encontrando uma vez por mês depois do horário escolar para
continuar um a apoiar o outro.
Infelizmente, o grupo acabou não se encontrando mais. O projeto acabou. A
orientadora/mediadora retornou às suas funções diárias na Universidade, e os participantes
voltaram à prática. Mesmo não tendo continuado com os encontros, certamente, não podemos
dizer que esses professores regressaram à sua rotina com a mesma base de conhecimento e as
mesmas idéias que entraram. A própria declaração acima mostra um novo perfil: eles
80
There are clearly other potential benefits for students. This model of professional community highlights the
relationship between teachers’ opportunities to engage in rich discourse and their own ability to provide similar
opportunities for students.
181
demonstram sinais de responsabilidade coletiva para com toda a escola e, no nosso
entendimento, o mais importante foi que descobriram a colaboração. Apesar de não termos
estendido essa pesquisa ao nível dos professores participantes, podemos verificar, pelos
resultados apresentados nos relatórios, muitos depoimentos positivos que ressaltam tanto a
formação profissional dos professores, desenvolvimento intelectual, quanto à ampliação de visão
coletiva e de participação, desenvolvimento social.
Outro indicativo foi a persistência dos participantes. Apesar de toda frustração causada
pelos testes, pelo uso obrigatório do livro didático, pela falta de tempo e pelos conflitos que
acabaram fazendo parte das discussões nos grupos, há apenas o registro de duas desistências nos
três casos estudados.
E finalmente, podemos indicar a avaliação das orientadoras/mediadoras dos três casos
pesquisados sobre as suas respectivas participações nos projetos que objetivavam a construção de
“Comunidades de Professores”.
Sandra Crespo atesta que “embora eu tivesse que devotar muito tempo e
comprometimento, essa experiência ficou marcada na minha vida profissional e da dos
participantes, eu creio, pois numa próxima oportunidade acredito que tanto eles como eu iríamos
participar diferentemente, melhor
81
”.
Pamela Grossman avalia,
“comunidade está ligada ao fato da ‘manutenção’ dos professores. Professores
adoram projetos, então essa é uma maneira de transformar a carreira de professor
em uma atividade intelectualmente desafiadora, ajudando-os a chegar num
próximo nível. Eu tenho curiosidade sobre como as pessoas mudam, quando as
coisas ficam difíceis o quê as mantém é a curiosidade, então é importante manter
meus alunos e meus colegas sempre surpresos, intelectualmente desafiados. E
isso um projeto de “Comunidades de Professores pode fazer muito bem
82
”.
81
“Although I had to give a lot of my time and commitment, this professional experience was remarkable for me
and the teachers on my group, I believe, because next time we have the opportunity to take part in a project like this,
we would, for sure, participate differently, better”.
82
“Community is also about maintaining teachers. Teachers love projects, so you have to think in ways of making
the career itself more intellectual challenging. Help to get to the next level. I am very curious about how people
change, because when things get tuff what sustain them is their curiosity, get my students and my colleagues be
always surprised, intellectual challenging. A project of community of teachers can do pretty well”.
182
Helen Featherstone confessa que mesmo ao final do projeto, ela continuou se
encontrando com seu grupo por mais dois anos. Ela analisa que sua participação foi muito
interessante e o entusiasmo dos professores participantes acabam por contagiá-la a ponto de
definir o projeto como uma festa intelectual.
“Bom, sabe, é quase uma festa. É disso que tudo isso se trata, dar uma festa...uma festa
intelectual. Você tem um plano, certifica-se que as coisas estão nos lugares e inclui,
talvez, outras coisas, como, por exemplo, visitar um dos professores participantes em sua
sala de aula no dia anterior ao encontro de modo a poder reportar o que viu para todo o
grupo. Então caracterizo-me como a organizadora da festa. E que não gosta de uma
festa? Não é mesmo? É muito mas divertido e gratificante do que eu pensei. Eu não
queria fazer parte do projeto inicialmente, mas me convenceram e eu acabei ficando mais
tempo com o meu grupo que qualquer um dos outros orientadores/mediadores
83
”!
Concluímos com essa pesquisa que “Comunidade de Professores” é uma opção de
formação contínua de professores com grande potencial e excelente perspectivas de resultados
positivos, duradouros e condizentes com as mais atuais exigências explicitadas no campo
educacional. Porém, devemos salientar a necessidade de se ter em mãos projetos bem
elaborados; orientadores/mediadores dispostos, comprometidos e bem preparados para a tarefa;
um esclarecimento teórico exemplar a respeito do conceito e das prerrogativas que envolvem
uma atividade como essa; conhecimento profundo do(s) conteúdo(s) específico(s) que nortearão
tal projeto; voluntários disponíveis e interessados; uma instituição escolar aberta para esse tipo
de projeto; e financiamento para facilitar todo o processo em si.
Ao término do mestrado, sentíamos a necessidade de pesquisar comunidades a fim de
tentar responder a seguinte questão:
Seriam as “Comunidades de Professores” o grande desafio do processo de formação
contínua de professores na realidade atual?
Ainda não conseguimos responder tal questão em toda sua amplitude, mas conseguimos
explicitar uma série de pontos importantes para o desenvolvimento de autonomia e atitudes
investigativas de seus participantes, incluindo a importância do desempenho dos
orientadores/mediadores, a necessidade de se evoluir de uma pseudo-comunidade para uma
83
“But, you know, it is almost a party. You are giving a party…an intellectual party. You have a plan, make sure
the stuff is there and that includes, maybe, some other things, it maybe includes going to visit one of the
teachers’classroom in the previous day so you can report what you saw to the whole group, for example. I would
call myself a party giver. I didn’t want to be part of the project but they talked to it. At the end I was with my group
for longer than the others”!
183
comunidade, a determinação de objetivos coletivos e atividades colaborativas, e a perspectiva de
uma ampliação da base de conhecimento de cada professor participante.
Não temos aqui uma atividade fácil de ser realizada, mas possível e gratificante como
mostram os casos apresentados nesse trabalho.
184
185
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194
APÊNDICES
195
APÊNDICE A – Roteiro de Entrevista Caso 1
1. De onde surgiu a idéia do Projeto? Qual a razão de se propor tal projeto?
2. Você e a Professora Featherstone trabalhavam juntas antes desse projeto?
3. Como foi a escolha dos orientadores?
4. Como você se sentiu no primeiro ano com as dificuldades para encontrar professores que
quisessem participar do projeto?
5. Já a partir do primeiro ano do projeto, vocês descreveram problemas com as
determinações do Superintendente face ao Parâmetros. Como você analisa essa questão?
Se formos analisar pelo contexto político, como você descreve a relação entre os
Parâmetros curriculares nacionais, os Parâmetros da Sociedade de matemática e o poder
do Distrito?
6. Em que contexto político você localiza esse projeto?
7. Quando a Fundação Lucent aprova um projeto, quais são as prerrogativas?
8. Quando vocês selecionaram as escolas, havia um contexto de notas baixas, problemas
com o ensino da matemática, ou as escolas foram escolhidas à revelia?
9. Quanto ao papel do orientador? Como vocês escolheram os orientadores? Teve alguma
preparação especial para vocês?
10. Em relação à participação dos professores, você aponta que a escola que já tinha história
de participação junto com a universidade acolheu melhor o projeto que as outras. Você
realmente acredita nisso? Ou seja, esse envolvimento faz diferença? Por quê?
196
11. Em suas análises, você mostra claramente que 4 características são básicas num projeto
como esse: School-based, cross-grade, problem-based and focuses on participant-
generated artifacts. Sob qual justificativa.
12. As barreiras encontradas foram previstas?
13. Como você se sentiu ao final do segundo ano de projeto?
14. Como se sentiu ao final do terceiro ano de projeto?
15. Os grupos continuam se encontrando? Se sim, como, onde, por quê? Se não, quais as
complicações de uma comunidade subsistir por si própria?
16. Você chamou seu projeto de “Comunidades de Prática”. Por quê?
17. Ao ler seus relatórios, a gente só encontra a expressão grupo de estudo. Somente o título
traz a expressão “Comunidades”. Por quê?
18. Como você explicaria essa relação entre comunidades e grupo de estudos?
19. Você comenta sobre hierarquias invisíveis dentro do grupo. Comente, por favor.
20. Num dos artigos, vocês sinalizam que no projeto, vocês acharam que as conversas dos
professores sobre suas próprias exploração da matemática foram, na verdade, mais
colaborativas e exploratórias que as conversas que surgiram após o uso do problema em
sala de aula.
21. Você afirma que em seu grupo os professores participavam mais no momento de resolver
os problemas que no momento de conversarem sobre suas práticas. Você acha que os
participantes se sentiam mais à vontade resolvendo os problemas do que ao conversarem
sobre suas práticas?
22. Mesmo com o conhecimento que os professores tinham da sua pessoa, você era vista
como uma estranha, vinda de fora. O que mais fazia a diferença na sua opinião: saber
mais das questões ligadas à educação ou à matemática?
23. Por favor, explique-me esse conceito de escolas suburbanas e rurais versus escolas
urbanas.
24. Como você se sentiu a respeito do projeto?
25. Você notou diferença na participação entre os professores novatos e os mais experientes?
26. Na sua opinião, você teve um grupo de estudo ou uma comunidade? Explique.
197
APÊNDICE B – Roteiro de Entrevista Caso 2
1. Por que você se envolveu no Projeto Lucent?
2. Qual grupo você estava orientando?
3. Qual foi seu papel no projeto?
4. Você escolheu a escola na qual trabalharia com o projeto? Por quê?
5. Quantos professores faziam parte do seu grupo?
6. Em suas análises, você mostra claramente que 4 características são básicas num projeto
como esse: school-based, cross-grade, problem-based and focuses on participant-
generated artifacts.Fale- me sobre elas.
7. As barreiras encontradas foram previstas?
8. Como você se sentiu ao final do segundo ano de projeto?
9. Como se sentiu ao final do terceiro ano de projeto?
10. Os grupos continuam se encontrando? Se sim, como, onde, por quê? Se não, quais as
complicações de uma comunidade subsistir por si própria?
11. Você afirma que a estrutura dos encontros do seu grupo estavam efetivamente ligadas a
promover o desenvolvimento profissional dos professores. Por quê?
12. Você chamou seu projeto de “Comunidades de Prática”. Por quê?
13. Ao ler seus relatórios, a gente só encontra a expressão grupo de estudo. Somente o título
traz a expressão “Comunidades”. Por quê?
14. Como você explicaria essa relação entre comunidades e grupo de estudos?
198
15. Você comenta sobre hierarquias invisíveis dentro do grupo. Comente, por favor.
16. Num dos artigos, vocês sinalizam que no projeto, vocês acharam que as conversas dos
professores sobre suas próprias exploração da matemática foram, na verdade, mais
colaborativas e exploratórias que as conversas que surgiram após o uso do problema em
sala de aula.
17. Você afirma que em seu grupo os professores participavam mais no momento de resolver
os problemas que no momento de conversarem sobre suas práticas. Você acha que os
participantes se sentiam mais à vontade resolvendo os problemas do que ao conversarem
sobre suas práticas?
18. Mesmo com o conhecimento que os professores tinham da sua pessoa, você era vista
como uma estranha, vinda de fora. O que mais fazia a diferença na sua opinião: saber
mais das questões ligadas à educação ou à matemática?
19. Por favor, explique-me esse conceito de escolas suburbanas e rurais versus escolas
urbanas.
20. Como você se sentiu a respeito do projeto?
21. Você notou diferença na participação entre os professores novatos e os mais experientes?
22. Na sua opinião, você teve um grupo de estudo ou uma comunidade? Explique.
199
APÊNDICE C – Roteiro de Entrevista Caso 3
1. Você apresenta seu projeto como “Comunidade de Professores Aprendizes”, o que você
pretende expressar com essa denominação?
2. No que ela difere do conceito de “Comunidades de Professores”?
3. Quando você apresenta comunidade profissional, você quer dizer especificamente o quê ?
4. A literatura utilizada em seu projeto está embasada em Brown e Campione. Por que
poucas referências a Shulman ? Na sua opinião, existe discrepância teórica entre esses
teóricos ?
5. Shulman define que o conteúdo disciplinar é a força motriz de uma “Comunidade de
Professores”. Mas em seu projeto, você tem professores de dois departamentos: inglês e
história, ou seja, duas disciplinas. Você acredita que unir professores de duas disciplinas
distintas beneficiou ou atrapalhou sua comunidade? Acredita que poderia ter mais
colaboração se todos os professores fossem de uma única disciplina?
6. E por que a opção de serem professores de história e inglês? O que a levou decidir por
essas duas disciplinas?
7. Em seus comentários, você assinala que passou muito tempo tentando equilibrar as
diferentes expectativas e interesses. Na sua opinião, o fato de ter professores de duas
disciplinas não ocasionou esse problema?
8. Você afirma que manter a tensão essencial numa “Comunidade de Professores” é a
importância de destacar o desenvolvimento intelectual do conteúdo do professor, o
currículo escolar e a melhoria do conhecimento do aluno. Considerando essa posição,
você acredita que seu projeto esteve focado no aprendizado do aluno, dos professores ou
nas escolas ?
9. Você descreveria o modelo de clube de livro como uma metodologia?
200
10. Você poderia tentar explicar se você percebeu alguma mudança efetiva no ambiente de
trabalho desses professores? Se sim, como isso aconteceu?
11. Os professores se encontravam quinzenalmente. Você acredita que essa escala de
encontros desenvolvida em seu projeto é o suficiente para desenvolver uma comunidade?
12. Você usa muito a expressão “Comunidade intelectual”. O que quer dizer com isso?
13. Você coloca várias observações do quão difícil é o papel de orientador em projetos de
comunidade. Após seu projeto, você saberia dizer o que um pesquisador ou professor
precisa para ser um orientador de comunidade?
14. Bem sinceramente, você acredita ser possível ter uma comunidade sem um orientador
externo?
15. Na sua opinião, uma pseudocomunidade seria um grupo de estudo? Explique.
16. Você acredita que trabalhar com professores primários seja diferente de trabalhar com
professores do ensino médio. Por quê?
17. Quais são as vantagens de se trabalhar em projetos de “Comunidades de Professores”
levando em consideração todas as dificuldades e barreiras apontadas na análise do seu
projeto?
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