mulher deverá morar em um outro onganda, sob os cuidados de outros ancestrais, mas
pertencer ao mesmo eanda do marido). Caso tais regras sejam observadas, os filhos deste
casal estarão vinculados tanto ao oruzo quanto ao eanda do pai.
Além disso, não só os homens, mas o gado também está divido entre aqueles do
eanda e aqueles do oruzo.
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Os primeiros fazem parte da propriedade comum de um
onganda, estão a disposição de qualquer um, mas não como propriedade individual. Eles
são dados em empréstimo. O administrador dos mesmos deverá ser o descendente mais
velho da esposa mais velha do omuhona. Já o gado do oruzo é separado e inalienável,
possuí função ritual na manutenção do Okuruwo, lugar de contato entre mortos e vivos, pais
e filhos
19
. Um homem não pode possuir um Okuruwo sem esses animais separados
(Ozondere, Ozomwaha, ou Ozongombe
20
) que devem ser guardados no curral situado à
oeste
21
, em frente à casa do homem responsável pelos rituais diários (omuini wOkuruwo),
sendo que, entre os dois, se encontra a estrutura física do Okuruwo. Além disso, vale
ressaltar que o responsável pelo Okuruwo, caso seja considerado um omuhona será também
o líder do assentamento. Com sua morte deverá assumir o posto um dos seus herdeiros que
conheça os esquemas rituais.
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18
Os herero são um povo pastoril e, por isso, o gado está fortemente presente em todas as áreas de sua vida.
Ao nascer, a primeira coisa que a criança recebe é um bezerro que será seu e ficará aos seus cuidados; nas
demais fases da vida de um indivíduo (início da puberdade, casamento, nascimento dos filhos e morte) o gado
estará sempre presente. Porém, ao contrário do que se poderia imaginar, o gado não é, por isso, divinizado,
eles são vistos, isto sim, como símbolos importantes na cosmologia social herero, são parte central na
‘tradição’, possuindo certos atributos sagrados, mas nem por isso sendo idolatrados tal como em certas
religiões orientais.
19
Local separado (mais do que sagrado) que fica sob o cuidado de um homem e de seu núcleo familiar
(homem, mulher e seus filhos), deve encontrar-se entre a casa do ‘velho’ – como também são chamados os
homens especialistas rituais – e seu curral – onde fica o seu gado separado. Ali, são colocados alguns galhos
no chão, e estes são cercados por três troncos pequenos de árvores, onde o filho se sentará para falar com seus
pais. O filho deve visitar o Okuruwo diariamente, ao nascer do sol e ao pôr do sol, quando então, os “espíritos
dos mortos sopram as brasas” trazidas de dentro de sua casa e colocadas sob os galhos, levantando assim uma
pequena fumaça que pode ser vista por todos no terreno, lembrando-os sempre de seus pais, já falecidos, e que
hoje são os responsáveis pelo cuidado dos que ainda vivem. Diante dos galhos, queimando vagarosamente, o
homem conversa com seus ancestrais, presta-lhes reverência e garante, assim, o bem estar de sua família.
20
É difícil saber exatamente que termo usar. Apenas um trabalho de campo mais demorado poderá responder.
O primeiro termo é usado por Gibson (1956), o segundo por Abati (1992) e o terceiro foi usado por um
interlocutor com o qual trabalhei durante meu próprio trabalho de campo.
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Os animais guardados junto ao curral, como já disse são diferentes dos outros. Um homem não pode perdê-
los ou tê-los saqueado, isto interromperia as relações entre vivos e mortos. Esta é apenas uma porção do gado,
os demais, que fazem parte da herança do eanda ficam divididos pelos cattle-posts criados pela região e sob o
cuidado dos jovens membros do onganda.
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Para um aprofundamento maior ver Luttig (1933), Gibson (1956), Crandall (1996), van Rooyen (1984),
Castro (2006; 2008), Abati (1992).
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