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Karina Maria Dezotti
Dissertação de Mestrado
OS GÊNEROS JORNALÍSTICOS NO LIVRO DIDÁTICO DE
ENSINO MÉDIO E O DESENVOLVIMENTO DE CAPACIDADES
DE LINGUAGEM
Dissertação apresentada como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em Educação,
da Universidade São Francisco, sob orientação
da Profª. Drª. Luzia Bueno.
Itatiba
2008
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1
Ficha catalográfica elaborada pelas Bibliotecárias do Setor de
Processamento Técnico da Universidade São F
,1,
Ficha catalográfica elaborada pelas Bibliotecárias do Setor de
Processamento Técnico da Universidade São Francisco.
806.90:37 Dezotti, Karina Maria.
D519g Os gêneros jornalísticos no livro didático de
ensino médio e o desenvolvimento de capacidade
de linguagem / Karina Maria Dezotti. -- Itatiba, 2008.
260 p.
Dissertação (mestrado) Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu em Educação da Universidade São
Francisco.
Orientação de: Luzia Bueno.
1. Livro didático. 2. Gêneros. 3. Ensino médio.
4. Capacidade de linguagem. I. Bueno, Luzia.
II. Título.
Oliveira. I I. Título.
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2
3
Agradeço especialmente as professoras:
Luzia Bueno, pela orientação oportuna, dedicação e profissionalismo com
que me conduziu;
Maria Inês Ghilardi-Lucena, grande inspiradora e incentivadora, por ter
enriquecido imensamente minha formação acadêmica;
Lilia Santos Abreu-Tardelli, Marcia Aparecida Mamador Mascia e Eliane
Gouveia Lousada pelas importantes sugestões.
Agradeço, também, a todos que me apoiaram no decorrer da realização desta dissertação
e à CAPES, pela concessão da bolsa de pesquisa.
4
Toda introdução de um gênero na escola é o resultado de uma decisão
didática que visa a objetivos precisos de aprendizagem, que são sempre
de dois tipos: trata-se de aprender a dominar o gênero, primeiramente,
para melhor conhecê-lo ou apreciá-lo, para melhor saber compreendê-lo,
para melhor produzi-lo na escola ou fora dela; e, em segundo lugar, de
desenvolver capacidades que ultrapassem o gênero e que são
transferíveis para outros gêneros próximos ou distantes. (SCHNEUWLY
e DOLZ, 2004, p. 80)
5
RESUMO
Este trabalho busca analisar as propostas de ensino de gêneros textuais em livros didáticos de
Língua Portuguesa de Ensino Médio indicados pelo PNLEM/2009. Especificamente,
analisaremos as atividades didáticas propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem e as
respectivas capacidades de linguagem do aluno que poderão ser desenvolvidas por meio delas.
Para tanto, recorreremos ao suporte teórico-metodológico do Interacionismo Sócio-discursivo
(ISD) de J-P Bronckart e as propostas didáticas de Schneuwly e Dolz voltadas ao ensino de
gêneros na escola. Por meio dos modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem a que
chegamos, pudemos sinalizar quais capacidades de linguagem vêm sendo mobilizadas nas
propostas dos livros e suas implicações para o domínio desses gêneros textuais. Assim,
constatamos na análise que pouco se possibilita o desenvolvimento de capacidades de linguagem
do aluno, conseqüentemente as atividades propostas ao ensino de tais gêneros que circulam
socialmente não permitem seu domínio. Com este trabalho pensamos contribuir com reflexões
em torno do ensino de Língua Portuguesa, por meio dos gêneros jornalísticos, tendo como base
os livros didáticos dessa etapa da educação, além de contribuir, de algum modo, para a melhora
da qualidade desses instrumentos de ensino que permeiam o cenário educacional.
PALAVRAS-CHAVE: gêneros; livro didático; Ensino Médio; capacidades de linguagem.
6
ABSTRACT
This thesis attempts to analyze the teaching purposes of textual genres in Portuguese Language
textbooks for secondary levels, indicated by PNLEM/2009 (National Textbook Program). We
will specifically analyze the learning activities that involve the genres news and articles and the
learner‟s respective capacities for language that could be developed through them. In order to
reach this goal, we will count on the theoretical and methodological support of Socio-discursive
Interactionism (SDI) by J-P Bronckart and on Schneuwly and Dolz‟s teaching purposes, which
are related to genre teaching at school. Through the teaching models of the genres news and
articles, we could point out which capacities for language have been mobilized by the textbooks
purposes and their implications for knowing as fully as possible those textual genres. Thus, we
noticed on the analysis that the development of student‟s capacities for languages is not well
explored. Consequently, the established activities used when teaching such genres do not give
students the chance to know them well. This work aims to contribute to teaching Portuguese
language through journalistic genres, basing it on the textbooks of the previous mentioned level
on education, and somehow contributing to the improvement in the quality of those teaching
instruments that are part of the educational scene.
KEY WORDS: genres; textbooks; Secondary Level; capacities for language.
7
SUMÁRIO
Introdução
11
Capítulo 1. Contextualização da pesquisa
18
1.1 O Ensino Médio atual
18
1.2 O Ensino de Língua Portuguesa
21
1.3 Os documentos oficiais e o ensino de Língua Portuguesa
26
1.4 O livro didático: um objeto multifacetado
27
1.5 O livro didático brasileiro e o PNLEM
30
1.6 O livro didático de Língua Portuguesa
34
Capítulo 2. Gêneros textuais
39
2.1 A questão dos gêneros
39
2.2 Bakhtin e a teoria dos gêneros
41
2.3 Gêneros textuais na abordagem do Interacionismo Sócio-discursivo
44
2.4 Gêneros e aplicações didáticas
50
2.5 Gêneros jornalísticos: a notícia e a reportagem
58
2.6 Modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem
72
Capítulo 3. Procedimentos metodológicos
76
3.1 A seleção do corpus
76
3.2 Critérios de análise
78
3.3 Etapas de análise
79
Capítulo 4. Resultados da análise
80
4.1 Apresentação do livro didático de Ensino Médio
80
4.2 Os gêneros textuais no livro didático de Ensino Médio
91
4.3 O jornal no livro didático de Língua Portuguesa
99
4.4 O gênero notícia
102
8
4.4.1 A forma de apresentação do gênero notícia
106
4.4.2 O conteúdo temático do gênero notícia
111
4.4.3 Atividades propostas ao ensino do gênero notícia
112
4.4.4 O gênero notícia e as capacidades de ação
119
4.4.5 O gênero notícia e as capacidades discursivas
124
4.4.6 O gênero notícia e as capacidades lingüístico-discursivas
133
4.4.7 Capacidades de linguagem e o ensino da notícia
139
4.5 O gênero reportagem
142
4.5.1 A forma de apresentação do gênero reportagem
144
4.5.2 O conteúdo temático do gênero reportagem
156
4.5.3 Atividades propostas ao ensino do gênero reportagem
158
4.5.4 O gênero reportagem e as capacidades de ação
165
4.5.5 O gênero reportagem e as capacidades discursivas
173
4.5.6 O gênero reportagem e as capacidades lingüístico-discursivas
182
4.5.7 Capacidades de linguagem e o ensino da reportagem
189
Capítulo 5. Considerações finais
195
5.1 Respostas as perguntas da pesquisa
195
5.2 Reflexões em torno do ensino de gêneros textuais e o
desenvolvimento de capacidades de linguagem em livros didáticos de
Ensino Médio
203
Referências bibliográficas
206
Anexos
212
Anexo I: Livro 1(PL) Português: linguagens
212
Anexo II: Livro 2 (PLC) Português: língua e cultura
226
Anexo III: Livro 3 (LP) Língua Portuguesa
252
Anexo IV: Livro 4 (PEC) Língua Portuguesa: projeto escola e
cidadania para todos
259
9
Lista de quadros
QUADRO 1. Dados do PNLEM
32
QUADRO 2. Tipos de seqüências textuais
48
QUADRO 3. Capacidades e operações de linguagem
54
QUADRO 4. Agrupamentos de gêneros de Schneuwly e Dolz
55
QUADRO 5. Definições de notícia e reportagem
65
QUADRO 6. Descrição e análise do gênero notícia impressa
67
QUADRO 7. Modelo didático do gênero notícia
73
QUADRO 8. Modelo didático do gênero reportagem
74
QUADRO 9. Corpus de análise
77
QUADRO 10. Livro 1: estruturação da obra
83
QUADRO 11. Livro 2: estruturação da obra
86
QUADRO 12. Livro 3: estruturação da obra
88
QUADRO 13. Livro 4: estruturação da obra
90
QUADRO 14. Porcentagem dos capítulos dedicados ao ensino de gêneros
91
QUADRO 15. Livro 1: gêneros ensinados e seus agrupamentos
93
QUADRO 16. Livro 2: gêneros ensinados e seus agrupamentos
94
QUADRO 17. Livro 3: gêneros ensinados e seus agrupamentos
96
QUADRO 18. Livro 4: gêneros ensindados e seus agrupamentos
96
QUADRO 19. Gêneros textuais ensinados nos livros didáticos analisados
97
QUADRO 20. Gêneros textuais ensinados e suas esferas sociais de comunicação
98
QUADRO 21. Organização dos capítulos dedicados ao ensino do gênero notícia
103
QUADRO 22. Tipologias de perguntas de Marcuschi
114
QUADRO 23. Perguntas empregadas no ensino da notícia
115
QUADRO 24. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino
da notícia
124
QUADRO 25. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas no
ensino da notícia
134
QUADRO 26. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem
138
10
abordadas no ensino da notícia
QUADRO 27. Gênero notícia: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros
didáticos de Português de Ensino Médio analisados
140
QUADRO 28. Porcentagem de cada capacidade de linguagem trabalhada no ensino do
gênero notícia
141
QUADRO 29. Organização dos capítulos dedicados ao ensino da reportagem
143
QUADRO 30. Perguntas empregadas no ensino da reportagem
159
QUADRO 31. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino
da reportagem
172
QUADRO 32. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas no
ensino da reportagem
181
QUADRO 33. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem
abordadas no ensino da reportagem
188
QUADRO 34. Gênero reportagem: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros
didáticos de Português de Ensino médio analisados
190
QUADRO 35. Porcentagem da cada capacidade de linguagem trabalhada no ensino do
gênero reportagem
192
11
INTRODUÇÃO
Esta dissertação de mestrado busca analisar as atividades didáticas propostas ao ensino de
dois dos gêneros midiáticos de grande circulação nos livros de Língua Portuguesa de Ensino
Médio a notícia e a reportagem e as capacidades de linguagem do aluno que, possivelmente,
poderão ser desenvolvidas por meio delas.
Esse tema de análise partiu tanto de minha formação acadêmica quanto da prática da
docência. Durante minha graduação no curso de Letras, desenvolvi um projeto de pesquisa de
Iniciação Científica voltado à análise do discurso publicitário, especificamente à análise da
representação da figura masculina em anúncios publicitários (DEZOTTI; GHILARDI-LUCENA,
2005). Tal trabalho aproximou-me de questões relacionadas ao poder da mídia na formação da
opinião pública e, conseqüentemente, a partir de minha atuação profissional como docente em
escola pública, passei a conviver com a notável influência dela no universo estudantil.
Os alunos demonstram constantemente a apropriação que fazem das expressões e gírias
dos personagens de sucesso da televisão, seus materiais escolares trazem a imagem do artista ou
banda do momento, os novos modelos de vestuário das revistas de moda desfilam pela escola,
bem como comentários a respeito das manchetes jornalísticas do dia anterior, além de muitas
vezes se ouvir o slogan de novos produtos circulando na sala de aula. É obvio que essas
situações, como outras de caráter semelhante, não estão somente na escola, mas também fora
dela, enfim nas sociedades modernas, os meios de comunicação interferem na formação e
educação das pessoas, sejam elas crianças, jovens ou adultos, pois ensinam, por meio de modelos
de comportamento, como agir, pensar, consumir, vestir-se (CHARAUDEAU, 1996).
Dessa forma, como atuo no ensino de Língua Portuguesa, um questionamento se fez
presente: a escola tem preparado o aluno para ler (no sentido amplo da palavra) os gêneros da
mídia? Ou seja, a escola tem formado um leitor capaz de interpretar, julgar, confrontar, defender
suas idéias diante daquilo que lhe é exposto em jornais, revistas, internet, televisão?
Portanto, tendo como ponto de partida essa ampla questão dediquei-me à realização de
uma pesquisa que a respondesse, que permitisse investigar em que medida estes gêneros estão
12
presentes na aula de Português, como são trabalhados e apresentados aos alunos, isto é, o que é
„feito‟ com estes gêneros na escola, uma vez que as propostas contemporâneas para a educação
brasileira colocam o estudo do texto e da pluralidade de gêneros em papel central no ensino de
Língua Portuguesa.
Segundo a professora e pesquisadora Maria Aparecida Baccega (2003, p. 81):
A formação de cidadãos, atributo da escola, passa obrigatoriamente pela
habilitação do cidadão para ler os meios de comunicação, sabendo desvelar os
implícitos que a edição esconde; [...] para isso, a escola não pode esquecer-se do
ecossistema comunicativo na qual vivem os alunos. Ou seja, ou a escola
colabora para democratizar o acesso permanente a esse ecossistema
comunicativo ou continuará a operar no sentido da exclusão, tornando maiores
os abismos existentes.
Para a autora, os textos oriundos da esfera midiática, que compõem o „ecossistema
comunicativo‟, como ela pontua, no qual se vive na atualidade, precisam ser incorporados à
prática escolar de modo a formar leitores críticos. Caso contrário, a escola não agirá em função
de um acesso efetivo aos meios de comunicação e reproduzirá uma forma de exclusão, ao passo
que formará, muitas vezes, indivíduos incapazes de transcender ao que é dito nestes tipos de
textos para construir o significado, sendo que o não-dito elemento implícito em alguns casos,
é mais significativo para a construção de sentidos do que os fatos explicitados (DUCROT, 1987).
Partindo do pressuposto de que, no mundo contemporâneo, conhecer o funcionamento do
discurso midiático se faz necessário para as práticas sociais, pois ler um romance não é o mesmo
que ler uma reportagem, ou assistir a um programa de entretenimento não é o mesmo que assistir
a um noticiário, ou seja, cada gênero exige capacidades de linguagem de seus leitores
(telespectadores no caso dos televisivos). Essas capacidades de linguagem
4
são de três ordens:
capacidade de ação, relaciona-se à capacidade do aluno de conseguir contextualizar o gênero;
capacidade discursiva, refere-se à capacidade de saber estruturar o gênero de texto; capacidade
lingüístico-discursiva, compreende a capacidade de empregar adequadamente os mecanismos de
textualização e enunciação e compreender seus efeitos de sentido.
Somente por meio de um trabalho escolar que enfatize o ensino de operações de
linguagem, isto é, tarefas a serem apreendidas, que contribuam para o desenvolvimento de tais
capacidades, poderá ocorrer o domínio de quaisquer gêneros textuais.
4
O conceito de capacidade de linguagem empregado nesse trabalho será retomado e aprofundado no capítulo 2.
13
Assim, é impossível preparar indivíduos habilitados à leitura de novelas, anúncios
publicitários, quadrinhos, notícias, reportagens, crônicas, editoriais, artigos, entre muitos outros
que circulam socialmente, sem sua incorporação na sala de aula por intermédio do professor e/ou
sem sua veiculação no material didático.
Pensando em desenvolver uma proposta de trabalho viável e que contribuísse com
reflexões sobre o ensino de Língua Portuguesa, tomei como objeto de análise o livro didático.
Embora sofra críticas quanto à sua eficácia no ensino, o livro didático ocupa grande espaço na
sala de aula, consolidando-se como principal fonte de leitura e letramento da educação brasileira,
ao menos no que diz respeito às instituições públicas, conforme afirmam Rojo e Jurado em seu
estudo com materiais pedagógicos (2006).
Devido ao fato de serem, em alguns casos, a única fonte de leitura de muitos alunos, os
livros didáticos de Língua Portuguesa devem incorporar os mais variados gêneros textuais para
contribuir com o ensino da leitura na escola e ampliar o repertório textual dos alunos. Porém
concepções divergentes da minha, que argumentam que, a partir do momento que uma notícia é
submetida a atividades escolares, ou qualquer outro gênero, ele é escolarizado e perde sua função
comunicativa social. Entretanto, assim como Rojo e Jurado (2006) e Soares (1999; 2003),
acredito que ao se inserir quaisquer gêneros no ambiente e nas práticas escolares burocráticos,
jornalísticos, literários estes serão escolarizados, mas penso que o problema não está na
escolarização, pois dela não há como se fugir uma vez que a escola é um lugar social privilegiado
de ensino-aprendizagem, mas a questão é a qualidade dessa escolarização, isto é, como esses
gêneros são apresentados ao aluno, quais são as propostas didáticas em que eles são trabalhados.
Assim como as autoras citadas, acredito que as práticas de leitura e de escrita que se
realizam socialmente são práticas a se ensinar na escola, que, por sua vez, resultam em práticas
ensinadas e, depois de adquiridas, refletem-se no ambiente social. O conhecimento e estudo das
práticas de leitura e de escrita utilizadas em situações sociais de difícil domínio dos alunos na
escola permitem o reconhecimento delas fora desse ambiente, daí sua necessidade e importância
(SOARES, 2003).
A relação do livro didático com gêneros midiáticos é recente, praticamente iniciou-se a
partir dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Fundamental (PCN), estabelecidos em
14
1998, que realçam a importância do estudo dos variados gêneros textuais em sala de aula,
enfatizando os da mídia. Nos PCN (BRASIL,1998, p. 120) é afirmado que:
A mídia pode ser uma grande aliada no processo educacional: é importante
aproveitar o conhecimento que ela propicia e propor trabalhos de reflexão sobre
as programações, incentivando um olhar crítico. Do ponto de vista educativo, o
problema não está no consumo, mas no consumo passivo de tudo que é
veiculado.
Quanto ao Ensino Médio, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNEM) e sua
complementação PCN+ (BRASIL/SEMTEC, 1999; 2002, p. 55), no que diz respeito ao ensino do
Português, enfatizam os usos sociais da língua, buscando “desenvolver no aluno seu potencial
crítico, [...] sua capacidade como leitor efetivo dos mais diversos textos representativos de nossa
cultura”, além de buscar incorporar na prática escolar os gêneros pertencentes à esfera: literária,
jornalística, publicitária, científica e legal.
Embora os documentos oficiais da educação brasileira, tanto de Ensino Fundamental
quanto de Médio, proponham um trabalho crítico com os gêneros da mídia, estudos realizados
por Bueno (2002), Garé (2004), Zanchetta Jr. (2005), constataram que os livros didáticos para o
terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental atuais estão repletos de gêneros midiáticos,
principalmente os jornalísticos, porém a qualidade com que são apresentados e abordados é
discutível.
Segundo os autores, o uso de textos literários para se ensinar gramática no livro didático
de Português sempre foi motivo para discussão e debate por fazer com que se perdesse a essência
da obra em si, despertando o desinteresse dos alunos pela leitura ao utilizá-los apenas como
suporte textual em atividades de fixação gramatical. Entretanto, este posto foi ocupado ou, em
alguns casos, compartilhado com os gêneros midiáticos que acabam por receber tratamento
acrítico nos materiais didáticos.
Quanto à sua forma, os textos da mídia são apresentados em versões reeditadas e
adaptadas em que suas características principais não são respeitadas: as notícias não são
apresentadas em colunas como nas versões originais, mas em texto corrido; fotos são substituídas
por ilustrações infantis; adaptações são realizadas sem as devidas marcações textuais.
15
Quando se trata do estudo do gênero em si a situação ainda é pior, pois são raras as obras
que o fazem e mais raras ainda são as que não apresentam erros conceituais. Portanto, nota-se que
gêneros textuais vêm sendo tratados de modo inadequado e superficial nos livros didáticos de
Ensino Fundamental (BUENO, 2002; GARÉ, 2004).
Zanchetta Jr. (2005, p. 1508), diante dos resultados constatados em sua pesquisa com
esses livros, enfatiza que, para que haja uma abordagem adequada da mídia na escola,
principalmente quanto aos textos jornalísticos, deve-se trabalhar:
...as características dos gêneros e práticas jornalistas, além do funcionamento
dos meios de comunicação na sociedade contemporânea. [...] estimular o aluno a
perceber-se como agente midiático e não como receptor passivo de conteúdos ou
cliente dos meios de comunicação contribui para que ele possa se situar como
indivíduo e como parte de uma coletividade.
Ao invés de apenas veicular os gêneros da dia com o efeito de somente cumprir os
requisitos dos documentos oficiais de educação, os materiais didáticos devem apresentar
propostas de estudo para esses textos que se dediquem às suas características próprias, argumenta
o autor, como forma de ampliar o repertório e o olhar do aluno em relação ao “ecossistema
comunicativo” da modernidade que é permeado por estes textos nos ambientes sociais
(BACCEGA, 2003, p. 81).
A partir dos resultados apontados nos estudos realizados com materiais didáticos
destinados ao Ensino Fundamental (BUENO, 2002; GARÉ, 2004; ZANCHETTA, 2005),
buscarei me debruçar sobre os de Ensino Médio devido à carência de estudos referentes a esta
etapa da educação, pois muitas pesquisas se dedicaram à realidade do Ensino Fundamental I e
II, fato que não ocorre com a escolarização posterior.
Segundo trabalho realizado por Mendonça e Bunzen (2006), uma demanda por
pesquisas aplicadas ao Ensino Médio brasileiro. Assim, dedicar-me-ei à análise, especificamente,
dos livros didáticos de Língua Portuguesa aprovados pelo PNLEM/2009 que são enviados
gratuitamente às escolas públicas após prévia escolha realizada pelos professores para serem
utilizados nos anos 2009, 2010 e 2011. Ressaltamos que os livros que analisarei, possivelmente,
estão em muitas das salas de aulas brasileiras por terem sido indicados também pelo
PNLEM/2005, primeira versão do programa voltado ao Ensino Médio.
16
Devido à inviabilidade de análise de todos os gêneros da mídia presentes nas obras
didáticas, optei por delimitar o campo de análise aos gêneros notícia e reportagem por
proporcionarem a formação de leitores críticos diante de fatos sociais e políticos, e também por
serem, dentre os gêneros dessa esfera de comunicação, os que mais recebem destaque nos
manuais de Língua Portuguesa, conforme pesquisa realizada por Bueno (2002).
Foram selecionados para compor o corpus de análise dessa pesquisa, cujo cunho é
qualitativo, livros didáticos de Português de Ensino Médio, recomendados pelo PNLEM/2009,
que dedicassem unidades ou capítulos ao ensino dos gêneros notícia e/ou reportagem; ou que
dedicassem capítulos ou unidades ao estudo do jornal ou da imprensa e ao ensino desses gêneros,
correspondendo a esse critério 4 obras (36%) das 11 aprovadas e recomendadas pelo
PNLEM/2009. Assim, por meio da análise desses 4 livros didáticos, busquei responder às
seguintes questões:
Quais atividades didáticas são propostas para o ensino dos gêneros notícia e
reportagem no livro didático de Língua Portuguesa de Ensino Médio?
Que implicações tais atividades podem trazer para o desenvolvimento de capacidades
de linguagem dos alunos?
Para respondê-las, procurei analisar os livros didáticos buscando verificar:
Como se organizam os livros de Ensino Médio atuais?
Quais são os gêneros textuais selecionados para ensino nesses livros?
Quais são os tipos de perguntas aplicadas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem
nos livros analisados?
Quais são as operações de linguagem que devem ser mobilizadas para o domínio dos
gêneros notícia e reportagem?
Tais operações de linguagem implicam no desenvolvimento de quais capacidades de
linguagem dos alunos?
Quais capacidades de linguagem do aluno poderão ser desenvolvidas por meio das
atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem nos livros didáticos de
Língua Portuguesa analisados?
17
Ao respondê-las, acredito contribuir para uma reflexão em torno do trabalho escolar com
gêneros textuais como forma de ensino de Língua Portuguesa.
Para tanto, recorro ao suporte teórico-metodológico do Interacionismo Sócio-discursivo
postulado por J-P Bronckart (2003), que apresenta subsídios à análise dos gêneros textuais, e aos
estudos de Schneuwly e Dolz (2004) sobre o trabalho didático-pedagógico com gêneros na escola
e suas implicações no desenvolvimento de capacidades de linguagem. Tais pesquisadores são
membros do departamento de Didática do Ensino de Línguas da Universidade de Genebra (Suiça)
e configuram-se como autores de grande representatividade no campo das teorias de gêneros.
Esta dissertação tem como objetivo apresentar os resultados desta pesquisa. Assim, no
capítulo 1, busquei contextualizar os elementos fundamentais da análise: o Ensino Médio, o
ensino de língua materna, o trabalho do professor, o livro didático de Português e o PNLEM no
presente cenário educacional.
No capítulo 2, apresento as teorias de gêneros com as quais dialogo no decorrer deste
trabalho e o modelo didático a que cheguei para o domínio dos gêneros notícia e reportagem.
Primeiramente, busquei contextualizar a questão dos gêneros da teoria clássica até os estudos
modernos. Em seguida, tratei da perspectiva de gênero presente na obra de J-P Bronckart (2003)
e de seu suporte teórico-metodológico. Realizei ainda a exposição das propostas didático-
pedagógicas de Schneuwly e Dolz (2004) voltadas ao ensino da língua materna por meio da
modelização didática dos gêneros e, por fim, apresento os modelos didáticos dos gêneros notícia
e reportagem aos quais cheguei a fim de orientar as análises dos livros didáticos do corpus.
No capítulo 3, traço os procedimentos metodológicos da pesquisa. Iniciarei pela
apresentação dos critérios para seleção do corpus de análise, em seguida apresento os critérios e
as etapas de análise.
Passo então a apresentação dos resultados das análises e suas implicações. O capítulo 4
trará a descrição dos livros didáticos que compõem o corpus da pesquisa, apresentará a
organização dos capítulos que se dedicam ao ensino dos gêneros notícia e reportagem e delineará
a análise das atividades didáticas propostas, seguindo com a discussão em torno das capacidades
de linguagem que poderão ser desenvolvidas em tais atividades.
O capítulo 5 apresenta as conclusões da análise e reflexões em torno das propostas de
ensino de Língua Portuguesa por meio de gêneros textuais presentes em livros didáticos de
Ensino Médio.
18
Capítulo 1
CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA
Esta pesquisa tem por objetivo analisar as propostas de trabalho com os gêneros notícia e
reportagem em livros didáticos de Ensino Médio de Língua Portuguesa, recomendados pelo
PNLEM/2009. Assim, neste capítulo, buscaremos contextualizar os elementos fundamentais de
nossa análise: o Ensino Médio, o ensino de língua materna e o livro didático no presente cenário
educacional.
Iniciaremos a exposição situando o Ensino Médio na contemporaneidade e a concepção de
linguagem subjacente à prática de ensino de Português nessa etapa da educação brasileira, além de
tratar das orientações e diretrizes oficiais voltadas ao ensino de línguas. Para compreendermos o
livro didático atual, apresentaremos seu percurso histórico e sua constituição. Descreveremos,
ainda, o PNLEM e seus critérios para avaliação dos livros didáticos de Língua Portuguesa.
1.1 O Ensino Médio atual
O Ensino Médio, a partir de 1996, com promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB), passou a integrar o quadro da educação básica do país, configurando-
se como a etapa da educação em que se busca o aprofundamento nos conhecimentos adquiridos
no Ensino Fundamental com vistas a uma formação crítica, intelectual e profissionalizante,
contemplando os eixos da ciência, da cultura e do trabalho. Ao mesmo tempo em que o Ensino
Médio tem o intuito de preparar o alunado para o ingresso ao ensino superior, não perde de vista
a educação de caráter profissionalizante para oferecer oportunidades àqueles que não
prosseguirão nos estudos.
Somente após a inclusão do Ensino Médio como etapa da educação básica brasileira que
começou a reflexão e a discussão de modo mais aprofundado sobre suas questões, havendo, a
partir de então, intervenções do Estado nessa etapa da educação por meio de publicações de
documentos orientadores da ação docente: Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
19
(DCNEM), em 1998; Parâmetros Curriculares nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), em
1999; Orientações Complementares aos PCNEM (PCN+), em 2002; além de publicações de
pesquisadores que se dedicaram a pensar sobre esses documentos oficiais de Ensino Médio (Rojo
e Moita Lopes, 2005; entre outros).
O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), criado em 1995 para a distribuição
gratuita de livros aos alunos do Ensino Fundamental, foi ampliado em 2003 para a distribuição
aos alunos do Ensino Médio também, configurando-se como Programa Nacional do Livro
Didático de Ensino Médio (PNLEM).
Outra intervenção do Estado no Ensino Médio diz respeito à implantação de sistemas de
avaliações sistemáticas do ensino, que constantemente recebem grande destaque na mídia,
principalmente quanto à divulgação do desempenho dos alunos. Tais sistemas de avaliação de
grande escala são: Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), ampliado ao Ensino
Médio em 1995, e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), criado em 1997.
Tanto o SAEB quanto o ENEM avaliam competências e habilidades com enfoque à
pluralidade de gêneros textuais, priorizando àqueles de esferas sociais de comunicação como
jornalísticos, literários e de lazer, conforme as instruções das diretrizes oficiais de ensino:
No currículo pressuposto pelo SAEB para língua portuguesa, ao término do EM
o aluno deve ser capaz de ler textos argumentativos mais complexos, paródias,
textos mais longos e complexos, poemas mais complexos e cartuns, além de
dominar recursos lingüístico-discursivos utilizados na construção de gêneros. No
currículo pressuposto pelo ENEM, ao término do EM o aluno deve dominar a
norma culta da língua portuguesa e ter uma leitura compreensiva dos textos, o
que implica, entre outras capacidades, saber analisar as funções da linguagem e
conseguir estabelecer relações entre os diferentes textos e o seu contexto sócio-
histórico e cultural. (MARCUSCHI, 2007, p. 81)
Segundo Marcuschi (Ibid.), o que esses exames avaliam deve ser pensado e analisado,
pois eles influenciam no ensino e no currículo de Língua Portuguesa. Entretanto o que dizem as
pesquisas sobre o ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio?
Mendonça e Bunzen em Português no Ensino Médio e formação do professor (2007, p.
13) afirmam que “a tradição da formação para os conteúdos em si mesmos (saber por saber),
geralmente por métodos transmissivos e de memorização, se reflete fortemente no ensino
convencional de gramática” no Ensino Médio, subjacente a uma concepção de aprendizagem
passiva que visa à aprovação em concursos ou vestibulares em que “deixa-se de lado o que é
20
central a formação de leitores-produtores que saibam avaliar e analisar seus próprios textos e o
de outros autores” desviando “o foco da formação: dos usos da língua para o saber sobre a
língua,” distanciando-se das orientações oficiais (MENDONÇA; BUNZEN, 2007, p. 16-17).
Também Rojo e Jurado (2007), após análise de um livro didático de Ensino Médio de
Português, argumentam que a obra nada atendia às propostas das diretrizes ou referenciais
nacionais testados nos exames e avaliações. Enquanto os documentos oficiais centram-se nos
usos sociais da língua, fato que implica no trabalho escolar com uma diversidade de gêneros
textuais de variadas esferas sociais, o livro investigado centrava-se no ensino de conteúdos
gramaticais e literários.
No Ensino Médio, diferente do Ensino Fundamental, ocorre uma tendência à
fragmentação da disciplina Língua Portuguesa em: Gramática, Literatura e Redação, em que,
muitas vezes, cada um dos segmentos corresponde a professores diferentes, ou mesmo quando
um único professor, o caderno dos alunos é dividido em três matérias independentes. Enquanto as
teorias contemporâneas sobre ensino buscam a interdisciplinaridade e a desfragmentação das
disciplinas, o ensino da Língua Portuguesa no Ensino Médio está totalmente na contramão, pois
tanto a gramática (análise lingüística do texto), quanto a redação (produção do texto) e a literatura
(leitura, compreensão e análise do texto) são elementos que se relacionam e se complementam
para o ensino de uma língua. Entretanto, na prática da sala de aula, estudos relatam tal
contradição (MENDONÇA; BUNZEN, 2007).
Apesar das divergências entre o que dizem as diretrizes oficiais de ensino do Ensino
Médio e o que ocorre na sala de aula, Mendonça e Bunzen afirmam que são encontradas
práticas de ensino de língua materna embasadas em novas teorias de ensino, que se desvinculam
do ensino gramatical tradicional, voltadas para o ensino dos gêneros textuais. Porém há a
carência de estudos centrados no ensino de Português no Ensino Médio, enquanto muitos autores
se debruçaram sobre questões das etapas anteriores da educação, o mesmo não ocorre com a
etapa final da educação básica. Conforme esses autores: “há de fato uma demanda por pesquisas
que ajudem a compreender por que razões, no Ensino Médio, as competências relativas ao campo
da linguagem ainda estão longe do patamar desejado” (Ibid., p. 13) como indicam o SAEB e o
ENEM.
21
1.2 O ensino de Língua Portuguesa
Neste momento, buscaremos contextualizar o ensino de Língua Portuguesa na
contemporaneidade, para tanto, se faz necessário tratarmos da concepção de linguagem
subjacente à prática de didática de nguas vigente na atualidade para que compreendamos o
ensino atual de Português.
Os estudos sobre a linguagem humana, ao longo dos anos, têm apontado três concepções
a respeito do fenômeno da linguagem, classificando-a, em princípio, como “expressão do
pensamento”. Para esta concepção a dificuldade demonstrada pelo indivíduo ao se expressar de
modo claro corresponderia à dificuldade encontrada, também, ao pensar, presumindo a existência
de regras a serem seguidas para a organização lógica do pensamento humano e,
conseqüentemente, da linguagem; depois, como “instrumento de comunicação”, em que a língua
é vista como um conjunto de signos que se combinam segundo regras capazes de transmitir
mensagens de um emissor a um receptor. Essa concepção é representada pelos estudos
lingüísticos realizados por Saussure e Chomsky; e, finalmente, como processo ou “forma de
inter-ação”(GERALDI, 1999, p.43).
Esta última concepção de linguagem é baseada nos escritos de Mikhail Bakhtin e seu
Círculo que se dedicaram aos estudos da linguagem, destacando seu caráter interativo, social e
dialógico, desenvolvendo um suporte teórico-metodológico vasto e complexo neste campo do
conhecimento. Os estudos realizados por Bakhtin são extremamente reconhecidos e é a partir de
seus postulados que muitos autores desenvolveram suas teorias.
Para que se compreendam as dimensões da arquitetônica bakhtiniana sem simplificações,
distorções ou banalizações de seus conceitos, de se entender que Bakhtin não era lingüista,
mas filósofo e pensava o homem como ser naturalmente social que se constitui na e pela
interação com o outro. Conseqüentemente, por ter tal concepção, dedicou-se a refletir sobre a
filosofia da linguagem, postulando sobre a natureza dialógica dela, e partindo de uma crítica a
duas orientações do pensamento lingüístico representadas por Humboldt e Saussure.
A tendência lingüística de Wilhelm Humboldt é chamada por Bakhtin de subjetivismo
idealista e “interessa-se pelo ato de fala, de criação individual como fundamento da língua”, na
22
qual o lingüista “limita-se simplesmente a preparar a explicação exaustiva do fato lingüístico
como proveniente de criação individual” (BAKHTIN, 1999, p. 72).
na tendência estruturalista de Saussure, chamada de objetivismo abstrato, a
dicotomia entre língua e fala em que aquela é entendida como um sistema social e esta como
individual. Para Saussure, o objeto da lingüística é somente a língua enquanto sistema passível de
classificação e normatização, considerando o estudo da fala fora de seu alcance.
Embora realize uma crítica rigorosa a essas abordagens lingüísticas, Bakhtin reconhece a
importância delas, mas as considera insuficientes por enfocarem apenas o enunciado/enunciação
como fenômeno da língua, desvinculando-o do contexto de sua materialização, isto é, enquanto a
lingüística preocupava-se com a frase ou oração como unidades da língua (sistema), a teoria
dialógica bakhtiniana preocupa-se com o enunciado, concebendo-o como unidade de
comunicação verbal.
Para Bakhtin, nunca enunciamos do nada e para o nada. Sempre um contexto concreto
e determinado histórico e socialmente que marca a enunciação. Toda a enunciação é permeada
pela relação entre o “eu” e o “outro”, e é essa relação de interação e de diálogo que constitui a
linguagem. Daí a natureza dialógica da linguagem, em que toda enunciação a presença de
outras enunciações. Toda enunciação é uma resposta a outras enunciações, constituindo um
complexo diálogo que se materializa por meio da linguagem.
Portanto, os outros constituem o “eu” que se transforma, dialogicamente, em um outro de
novos “eus” (FARACO, 2003). Assim, o dialogismo diz respeito às relações entre o eu e o outro,
correspondendo a um diálogo nem sempre harmônico.
Para Bakhtin, toda palavra é uma resposta à outra, todo enunciado é produzido levando-se
em consideração os outros produzidos, e manifestando-se aspectos valorativos sobre os outros
enunciados criando-se, então, um novo enunciado.
Diferente das outras concepções de linguagem, nesta o indivíduo não faz uso da língua
somente para expressar o pensamento ou se comunicar com o outro, mas sim “encara a
linguagem como atividade, como forma de ação, ação finalisticamente orientada; como lugar de
interação” (KOCH, 1992, p.9) entre os sujeitos do discurso.
Daí decorre a concepção de discurso como forma de ação, como o lugar onde o sujeito
age no mundo, de acordo com o meio em que está inserido e com sua história (ORLANDI, 2001),
23
movido por um “querer dizer” que, em princípio, não é movido pelo sujeito do próprio discurso,
mas se constitui no jogo das relações sociais.
Como é fundamental em muitos discursos, se não for a todos, para influir na vontade de
seu interlocutor, mostrando que o que explana é verdadeiro, recorre-se ao ato de argumentar e de
persuadir, ou seja, a ação de um indivíduo sobre o outro, buscando convencê-lo de algo através
de seu próprio discurso em união a outros discursos, pois “a interação social por intermédio da
língua caracteriza-se, fundamentalmente, pela argumentatividade” (KOCH, 1996, p. 19).
É essa abordagem dialógica e discursiva de linguagem que a como ação e interação,
com enfoque nas variedades lingüísticas e textuais, a qual permeia as propostas contemporâneas
de ensino de língua materna e os documentos oficiais da educação brasileira hoje.
Partindo da concepção de linguagem bakhtiniana apresentada, debruçaremos sobre o
ensino de Língua Portuguesa, dialogando, principalmente, com Geraldi (1997; 2002), Possenti
(1996), Soares (2001) e Bagno (2001; 2003), autores que produziram um vasto trabalho na área
de ensino e linguagem e que, por sua vez, também dialogam entre si.
Ao pensar a questão da linguagem e ensino, Geraldi parte da abordagem discursiva que
entende que “a unidade lingüística básica para os processos de ensino/aprendizagem da escrita
não é a palavra, mas o discurso em sua materialidade social e em sua materialidade textual”
(2002, p. 49-50), concebendo que a língua não está de antemão pronta, mas constrói-se a cada
situação comunicativa. Tendo essa concepção dialógica de linguagem, Geraldi discute o ensino
de Língua Portuguesa.
O autor crítica rigorosamente o ensino tradicional da gramática na escola, apontando que
sistematizações a respeito da descrição e estrutura da língua cabem aos lingüistas e aos
professores que devem conhecer seu objeto de estudo e ensino, aos alunos basta “aprender a ler
criticamente e a escrever exitosamente” (2002, p. 72).
Tanto Geraldi, quanto Possenti e Bagno, nas obras citadas, buscam eliminar o falso
sinônimo de que ensino de Língua Portuguesa é o mesmo que ensino de gramática. No processo
de ensino-aprendizagem, o professor deve ter o objetivo de formar cidadãos conscientes sobre o
uso da língua em suas diversas modalidades para dominá-la e manuseá-la de acordo com a
finalidade específica de cada contexto.
Bagno, na obra Preconceito Lingüístico (2003), compara a atuação do professor ao de um
instrutor de auto-escola. O instrutor busca formar bons motoristas e não mecânicos profissionais,
24
conhecedores tanto dos nomes quanto do funcionamento das peças do motor do veículo, pois para
se dirigir bem não necessidade de conhecimentos sobre peças e motor. O mesmo acontece na
escola, o aluno não tem necessidade de saber toda a metalinguagem e as regras de exceção
gramaticais, isso cabe ao professor e só a ele faz sentido, não ao aluno, segundo esses autores.
Geraldi propõe uma forma possível de tornar o ensino de Língua Portuguesa um ensino
efetivo de língua por meio do trabalho a partir de textos em sala de aula, isto é, a partir de
atividades de reflexão sobre a linguagem (atividades epilingüísticas), pois “aquele que aprendeu a
refletir sobre a linguagem é capaz de compreender uma gramática”. E, entretanto, aquele que a
decorou “jamais compreenderá seu sentido” (2002, p. 64). Assim como Bakhtin, o autor pontua
que a comunicação se a partir de textos e não de palavras, entendendo o texto como unidade
comunicacional.
Centrar o ensino no texto é ocupar-se com o uso da língua. Trata-se de pensar a
relação de ensino como o lugar de práticas de linguagem e a partir delas, com a
capacidade de compreendê-las, não para descrevê-las como faz o gramático, mas
para aumentar as possibilidades de uso exitoso da língua. (BAKHTIN, 2002,
p.71)
Dessa forma, o trabalho com o texto é o que de específico na aula de Língua
Portuguesa, porque é nele que a ngua se revela em sua totalidade. As aulas de Português devem
refletir, como propõem Mattos e Silva, citados em Bagno (2001, p. 157), “uma pedagogia voltada
para o todo da língua”, sendo os gêneros a materialização desse todo. Para Bagno (Ibid.), “a
escola tem de se abrir a todos os gêneros em que se pode concretizar o uso da língua”, isto é, não
somente aos gêneros literários, mas aos dos meios de comunicação, aos pertencentes a variedades
lingüísticas rurais, urbanas, orais e escritos.
Segundo Possenti (1996, p. 17), “o objetivo da escola é ensinar o Português padrão, ou,
talvez mais exatamente, o de criar condições para que ele seja aprendido”. Para tanto, Geraldi
(1999) apresenta três unidades básicas que devem ser articuladas para esse ensino: a prática de
leitura de textos; a prática de produção de textos; e a prática de análise lingüística.
Mas por que o Português padrão? Contra a hipótese de que o ensino do Português padrão
na escola é uma forma de preconceito lingüístico para com as outras variedades da língua, Magda
Soares argumenta que:
25
Um ensino de língua materna comprometido com a luta contra as desigualdades
sociais e econômicas reconhece, no quadro dessas relações entre a escola e a
sociedade, o direito que tem as camadas populares de apropriar-se do dialeto de
prestígio, e fixa-se como objetivo levar os alunos pertencentes a essas camadas a
dominá-lo, não para que se adaptem às exigências de uma sociedade que divide
e descrimina, mas para que adquiram um instrumento fundamental para a
participação política e a luta contra as desigualdades sociais. (2001, p. 78)
Dessa forma, com a aquisição da igualdade das condições de uso da linguagem por meio
do ensino do dialeto de prestígio, as camadas populares terão acesso ao capital lingüístico social
rentável e do capital social a que tal dialeto dá acesso.
Segundo os autores visitados, o ensino de Português na contemporaneidade deve
privilegiar o trabalho com o texto, especificamente, com os gêneros em detrimento a um ensino
descontextualizado e fragmentado em partículas fonéticas, fonológicas, morfológicas, sintáticas,
semânticas, repleto de metalinguagem, em que se primava pelo ensino tradicional da gramática
normativa por meio de exercícios de repetições com palavras e frase soltas, desconexas, que
negligenciava as variações lingüísticas do Português.
O que está por trás das diferenças entre o ensino pautado no texto e o ensino pautado na
gramática são as divergentes concepções de linguagem que os fundamenta. Enquanto no primeiro
concebe-se a língua como socialmente constituída, no segundo ela é vista como sistema pré-
estabelecido, como se para a criança ou mesmo um estrangeiro aprender a usar uma ngua
bastasse ler um dicionário ou uma gramática. Isso seria improvável, pois, como afirma Bakhtin
(2002), não nos comunicamos por palavras ou frases, mas por textos que se materializam sob a
forma de gêneros com as mais diversas funções e intenções.
Assim, o objetivo das aulas de Português deve ser o desenvolvimento do domínio dos
gêneros que circulam socialmente.
1.3 Os documentos oficiais e o ensino de Língua Portuguesa
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Ensino Fundamental e Médio de Língua
Portuguesa refletem as mudanças decorrentes do desenvolvimento de novas correntes teóricas
26
como a Análise do Discurso, a Lingüística Textual, a Pragmática entre outras em evidência no
contexto histórico-social ao qual foram produzidos.
Tanto nos PCN de Ensino Fundamental quanto nos de Ensino Médio de Língua
Portuguesa, a linguagem é entendida com atividade discursiva em que:
o objetivo de ensino [...]é o conhecimento lingüístico e discursivo com o qual o
sujeito opera ao participar das práticas sociais mediadas pela linguagem [...]
Nesta perspectiva, não é possível tomar como unidades básicas do processo de
ensino as que decorrem de uma análise de estratos letras/fonemas, sílabas,
palavras, sintagmas, frases que, descontextualizados, são normalmente
tomados como exemplos de estudo gramatical e pouco têm a ver com a
competência discursiva. Dentro desse marco, a unidade básica do ensino só pode
ser o texto. (BRASIL, 1998, p. 22-23)
Nesses documentos da educação brasileira, a ênfase do ensino do Português é dada ao
texto, portanto quando se pensa no trabalho com textos, outro conceito indissociável diz respeito
aos gêneros” (BRASIL/SEMTEC, 2002, p.77), por serem a materialização do todo da linguagem.
Segundo os PCN, de se priorizar o estudo aprofundado de uma diversidade de gêneros
que pertençam a usos públicos da linguagem, que são aqueles que correspondem às
características da modalidade escrita da linguagem, embora muitas vezes sejam orais como o
debate ou palestra, e que apareçam com mais freqüência na realidade social e no universo escolar.
Assim, os PCNEM e o PCN+, sua complementação, adotam a perspectiva de que as
instituições de ensino devem “abandonar o tradicional esquema das estruturas textuais (narração,
descrição, dissertação)” e incorporar em seus currículos a abordagem de gêneros que circulam
socialmente, como:
na literatura, o poema, o conto, o romance, o texto dramático, entre outros;
no jornalismo, a nota, a notícia, a reportagem, o artigo de opinião, o editorial,
a carta ao leitor;
nas ciências, o texto expositivo, o verbete, o ensaio;
na publicidade, a propaganda institucional, o anúncio;
no direito, as leis, os estatutos, as declarações de direitos, entre outros.
(BRASIL/SEMTEC, 2002, p.77)
As propostas contemporâneas para a educação brasileira colocam o estudo dos gêneros
em papel central no ensino de Língua Portuguesa, uma vez que estarão presentes em todas as
práticas de ensino da língua, tanto nas de leitura e escrita, quanto nas de reflexão lingüística
apontadas nesses documentos, sendo apresentado nos PCN um diálogo com a concepção de
27
ensino de língua defendida pelos autores visitados anteriormente (Geraldi (1997; 2002), Possenti
(1996), Soares (2001) e Bagno (2001; 2003)).
Dessa maneira, nosso objetivo de trabalho é analisar as propostas de ensino dos gêneros
notícia e reportagem em livros didáticos de Ensino Médio de Língua Portuguesa, aprovados pelo
PNLEM/2009, por ser o trabalho escolar centrado nos gêneros textuais eficaz no
desenvolvimento de capacidades de linguagem (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004), por ser
recomendado nas diretrizes de ensino, além de esses gêneros jornalísticos contribuírem à
formação crítica do aluno - um dos objetivos dessa etapa da educação.
A seguir, trataremos do livro didático, porque será nele que veremos as concepções de
linguagem sendo levadas até os alunos.
1.4 O livro didático: um objeto multifacetado
Como nossa pesquisa tem por objetivo analisar as propostas de trabalho voltadas aos
gêneros notícia e reportagem em livros didáticos de Língua Portuguesa, recomendados pelo
PNLEM/2009, apresentaremos a constituição atual do livro didático como forma de
contextualizá-lo no cenário educacional contemporâneo.
O livro didático constitui-se como um objeto familiar, facilmente reconhecível, entretanto
apresenta-se como uma fonte de pesquisa extremamente complexa por envolver em seu processo
de produção diversos fatores tais como econômicos, sociais, culturais e ideológicos que o
influenciam e não devem ser ignorados ao tomá-lo como objeto de estudo.
Configurando-se como um objeto multifacetado, tem despertado o interesse de
pesquisadores de variados campos do saber desde a cada de 1960, sendo investigado,
principalmente, enquanto:
...produto cultural; como mercadoria ligada ao mundo editorial e dentro da lógica
de mercado capitalista; como suporte de conhecimentos e de métodos de ensino
das diversas disciplinas e matérias escolares; e, ainda, como veículo de valores,
ideológicos ou culturais. (BITTENCOURT, 2004, p. 471)
O livro didático gera conflitos e debates tanto nas escolas, entre professores,
coordenadores, diretores e alunos, quanto nos meios acadêmico, político e editorial. O professor e
pesquisador Ezequiel Theodoro da Silva, em um de seus trabalhos, refere-se ao livro didático
28
como “insubstituível muleta”, defendendo que haverá uma melhora na qualidade do ensino
quando o professor abandonar tais muletas e “caminhar com as próprias pernas, com autonomia e
decisão” (1996, p. 8).
Geraldi, ao tratar do ensino, também critica os materiais didáticos, chamando-os de
“parafernália didática” (1997, p. 93). Segundo o autor, com a „democratização do ensino‟ houve a
necessidade do aumento do número de profissionais capacitados para atuarem nas salas de aula,
conseqüentemente foram criados programas de formação de professores de curta duração e de
baixa qualidade. Dessa forma, a solução foi o livro didático que servia tanto para formar os
alunos, quanto para auxiliar os professores mal formados. Antes do aumento da demanda por
docentes, estes eram os próprios produtores do conhecimento, ao passo que, com o livro didático,
tornaram-se controladores do processo ou transmissores de conhecimentos veiculados nestas
obras.
É evidente que autores que compartilham das idéias defendidas por Silva e Geraldi, ou
seja, que condenam o uso do livro didático, entretanto aqueles que defendem seu uso por ser
indiscutível o fato de o livro didático manter-se como fundamental no processo de escolarização e
letramento, sendo mesmo o único material impresso de leitura a que as classes menos
privilegiadas têm acesso (ROJO; JURADO, 2007). Isto é, graças às políticas públicas que
desenvolveram o PNLD, milhões de alunos têm acesso a um variado material de leitura.
Assim, este trabalho não pretende condenar ou defender o livro didático, mas sim analisar
as propostas de ensino de Língua Portuguesa neles apresentadas por ser ele um dos únicos
recursos didático-pedagógicos disponíveis a professores no cenário atual como instrumentos de
ensino sejam chamados de “parafernálias”, “muletas”, ou não eles permeiam as salas de aulas
brasileiras, e cabe aos estudiosos deste campo de conhecimento refletir sobre suas implicações
para o ensino de língua.
Como já afirmamos, facilmente reconhecemos um livro didático, mas o mesmo não ocorre
para defini-lo. O termo livro didático‟, usado muitas vezes como sinônimo de material didático
ou material pedagógico, vem apresentando variadas definições por dizer respeito a um grupo
heterogêneo de suportes textuais que circulam na escola como: livros, cartilhas, álbuns, cartazes,
apostilas, cadernos de atividades, cadernos de exercícios, folhetos, etc., dificultando a elaboração
de uma definição precisa.
29
O pesquisador Antônio Augusto Gomes Batista conceitua o livro didático como “livro ou
impresso empregado pela escola, para o desenvolvimento de um processo de ensino ou de
formação” (1999, p. 534). Contudo, em sua obra, apresenta distintas conceituações de vários
autores ou mesmo de instituições das quais caracteriza as concepções, em casos restritos, como a
conceituação do PNLD que somente adquiri materiais na forma de livro, e em outros
excessivamente amplos, como as que definem o livro didático como documentos pedagógicos.
A conceituação dos livros ou impressos empregados pela escola, segundo Batista, diz
respeito ao processo de produção dos mesmos. Assim, obras destinadas à escola e outras nela
utilizadas. Portanto, ele pensa em livro didático como sendo “textos que são tanto produzidos
quanto impressos tendo em vista o mercado escolar” (1999, p. 546). Porém, afirma que algumas
obras pertencentes a esse mercado escolar passaram por processo de autonomia e não são mais
percebidas como tais, que é o caso dos dicionários, das gramáticas e dos atlas que conquistaram
espaço fora da escola.
Ocorre, também, o processo inverso, ou seja, textos de diferentes esferas sociais são
incorporados no livro didático: notícias, reportagens, quadrinhos, anúncios publicitários, entre
outros. Fato que demonstra que estudar estas fontes permite analisar as relações da cultura escolar
com outras esferas de produção cultural.
Alain Choppin (1992), ao realizar uma pesquisa com a produção editorial francesa
destinada à escola, propõe quatro categorias, as quais, segundo Batista, podem ser aplicadas à
produção brasileira. São elas: manuais e seus satélites (livros e seus acompanhamentos tais como
cds de áudio, cd-roms, entre outros), edições clássicas (obras clássicas adaptadas ao nível dos
educandos com explicações), obras de referência (dicionários, gramáticas, atlas, entre outros) e
obras paraescolares (complementação ao ensino). Choppin não tinha por objetivo investigar os
problemas advindos da utilização desses materiais, nem os „contratos‟ entre leitores por eles
previstos, que propõem modos de abordagem e de leitura.
Batista (1999) apresenta dois modelos de contratos de leitura e utilização propostos pelo
livro didático. O primeiro dirigia-se ao professor, possibilitando-lhe alto grau de autonomia. O
segundo, que prevalece hoje, é dirigido diretamente ao aluno e passa a ter um caráter consumível.
Tal instabilidade na produção didática é fruto da “complexidade do conjunto de fatores que
condiciona sua elaboração, produção, comercialização e utilização”, ou seja, fruto das condições
30
de produção dos materiais didáticos como “fatores econômicos e tecnológicos, de ordem
educacional e pedagógica e de ordem social e política” (BATISTA, 1999, p. 554).
Destacamos a seguir um fragmento em que Batista (1999, p. 566) evidencia a
complexidade do livro didático, objeto sob o qual nos debruçamos em nossa análise:
Ele é uma mercadoria e, como tal, é dependente das condições materiais,
econômicas e técnicas de uma determinada época, no quadro de uma
determinada sociedade. Como mercadoria, é dependente também do mercado que
o acolhe e para o qual se destina [...] Mas essa mercadoria produzida para a
escola é também, por último, dependente do estado das relações de força entre
diferentes grupos sociais e políticos de uma determinada formação social e,
assim, do modo como o estado, por meio de sua ação, legitima a estrutura dessas
relações ou deseja modificá-las.
Assim, o livro didático constitui-se como um objeto multifacetado por ser construído por
dimensões subjacentes ao seu processo e contexto de produção, revelando ideologias e lutas
simbólicas por meio de suas escolhas e silenciamentos, comprometidos com a sociedade de sua
época (BATISTA, 1999). Portanto, pensamos que a presença ou ausência dos gêneros notícia e
reportagem, bem como a abordagem dada a eles nos livros didáticos de Ensino Médio,
recomendados por órgãos oficiais, revelará a concepção de ensino de Língua Portuguesa neles
legitimada.
Passemos à descrição da origem histórica dos livros didáticos como forma de
contextualizá-los no cenário educacional contemporâneo.
1.5 O livro didático brasileiro e o PNLEM
O livro didático perpassa um longo percurso de mais de 20 séculos na história da escola e
do ensino. Foi criado na Grécia antiga, mas circulou por todas as sociedades nas mais diversas
formas e com específicos objetivos educacionais. Contudo, com ele sempre se buscou contribuir
no ensino e aprendizagem.
Choppin, em sua obra História dos livros e das edições didáticas (2004), afirma que o
gênero escolar origina-se, inicialmente, da literatura religiosa. No Brasil, a ação pedagógica foi
conduzida pela Companhia de Jesus cerca de duzentos e dez anos, isto é, durante todo o período
colonial foram os jesuítas quase os únicos educadores da colônia. Desta forma, foi a literatura
31
religiosa, com algumas adaptações, que reinou nos ambientes de ensino e de aprendizagem
existentes na época, configurando-se como a primeira versão didática empregada no Brasil.
Segundo Fernando de Azevedo (1964), os jesuítas promoveram uma educação popular aos
índios, brancos e mestiços nas escolas elementares, base do ensino colonial, em que se ensinava a
catequese, a ler, a escrever, a contar e a falar Português, sendo eles os agentes de desintegração
dos valores nativos, embora ainda os protegessem da escravidão e até do extermínio.
A partir de sua chegada, os jesuítas adotaram a política de que onde houvesse uma igreja
haveria uma escola, fundando uma organização educacional que se ampliava à medida que o
domínio português crescia. José de Anchieta teve papel fundamental na instrução. Ele era
conhecido por suas virtudes evangélicas e intelectuais, recebeu o título de mestre-escola,
educador, protetor e apóstolo dos índios. Devido à falta de livros e materiais para o ensino da
“leitura, escrita e bons costumes”, era ele quem produzia canções, peças de teatro e organizava
cartilhas que, copiados e recopiados, constituíam o material didático usado em todos os colégios
existentes (AZEVEDO, 1964, p. 14).
Entretanto, em 1759, os jesuítas são expulsos das terras brasileiras e inicia-se um lento
processo de organização de uma política educacional. De acordo com Lajolo e Zilberman (1998),
por volta dos anos de 1800, nas poucas escolas estabelecidas, eram utilizados livros didáticos
importados, principalmente, da França e de Portugal, usados em seus idiomas originais, refletindo
a classe social e econômica privilegiada do alunado que possuía acesso à escola. Porém, esses
livros dividiam espaço com a Bíblia, o Código Criminal e cartas que serviam como manuais de
ensino e leitura devido à escassez de livros.
Somente em 1850, começaram a existir os primeiros livros didáticos nacionais, em virtude
da revolta dos escritores brasileiros em relação à inadequação das obras estrangeiras à realidade
educacional do país.
A partir de 1930, o governo toma várias medidas para controlar a produção e distribuição
de livros didáticos, estabelecendo programas e comissões. Segundo Bueno (2002), podemos
dividir a história do livro didático no Brasil em três momentos: o primeiro corresponderia de 1500
a 1930, em que se partiu do uso das cartilhas jesuíticas para os livros importados e, enfim, para a
produção editorial brasileira; o segundo, de 1930 a 1985, período em que o governo estabeleceu
políticas públicas para a compra e distribuição do livro didático; e o terceiro que se iniciou em
1985 com a criação do atual PNLD pelo Ministério da Educação (MEC), por meio de recursos do
32
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE. Entretanto, é a partir do terceiro
período que há uma preocupação com a qualidade didático-pedagógica do livro.
O PNLD que tinha o objetivo de adquirir e distribuir gratuitamente os livros didáticos aos
alunos do Ensino Fundamental da rede pública, em 1993, passou, também, a ser responsável pela
avaliação dessas obras. Para tanto, hoje existe uma comissão de professores especialistas
responsável pela avaliação da qualidade dos livros didáticos. Dessa forma, as editoras enviam
suas publicações para análise à comissão responsável, a qual elabora um catálogo, contendo a
síntese das obras aprovadas para o professor realizar a escolha daquele que adotará.
Somente em 2004, foi implantado o PNLEM, ampliação do PNLD à próxima etapa da
educação brasileira, o Ensino Médio público. O programa iniciou a distribuição com livros das
disciplinas Português e Matemática, conseguindo universalizar a distribuição em 2006, para então
iniciar a distribuição de livros das outras disciplinas do currículo.
O quadro a seguir traz alguns dados a respeito do PNLEM referentes à distribuição dos
livros de Português e Matemática:
QUADRO 1. Dados do PNLEM
5
Ano de
aquisição
Ano letivo do
PNLEM
Alunos
beneficiados
Escolas
beneficiadas
Livros
Financeiro
R$
2004
2005
1.304.477
5.392
2.705.048
47.273.737,00
2005
2006
7.012.619
13.253
12.581.620
143.834.244,00
2006
2007
6.896.659
15.570
9.175.439
124.275.397,18
Como é apontado no quadro, mais de 15 milhões de alunos do Ensino Médio em todo o
país têm acesso aos livros didáticos distribuídos pelo PNLEM, que se configura como o maior
programa de livro didático do mundo (BITTENCOURT, 2004).
Passaremos a refletir sobre o PNLEM e seus critérios de avaliação, tendo como base o
Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio de Língua Portuguesa, elaborado
pela equipe de especialistas do PNLEM e enviado às escolas para que os professores realizem a
escolha, sendo nele apresentado a síntese dos livros aprovados, orientações à escolha e os critérios
avaliados.
No catálogo do PNLEM/2005 (BRASIL/SEMTEC, 2004, p. 7-8) é afirmado que:
5
Quadro elaborado por meio de dados disponíveis no endereço eletrônico: http://www.fnde.gov.br, acessados em
janeiro de 2008.
33
Longe de ser a única possibilidade de trabalho, o livro didático é um instrumento
que, utilizado como complemento do projeto político-pedagógico da escola,
certamente contribuirá para promover a reflexão e a autonomia dos educandos,
assegurando-lhes aprendizagem efetiva e contribuindo para fazer deles cidadãos
participativos. [...] Em momento algum o livro será um substituto do professor ou
de suas experiências pedagógicas, mas poderá ser um bom referencial para
ampliar os trabalhos em sala de aula.
Portanto, o livro didático nas propostas do PNLEM/2005 e PNLEM/2009 é concebido
como um instrumento de ampliação e complementação às atividades de ensino e aprendizagem na
sala de aula, isto é, um dos únicos instrumentos didático-pedagógicos disponíveis a professores e
alunos são designados por órgãos oficiais como elementos complementares, eximindo, assim, o
livro didático de quaisquer falhas e incompletudes, centrando a responsabilidade do ensino na
figura do professor.
Embora ambos os catálogos apresentem os mesmos princípios pedagógicos, o catálogo do
PNLEM/2009 traz as análises das obras de modo mais detalhado: descreve passo a passo a
organização dos capítulos ou unidades das obras, apresenta os aspectos positivos e negativos,
realça quais conteúdos deverão ser complementados pelo professor, traz informações sobre o
referencial teórico utilizado pelo autor, mesmo os livros sendo um elemento complementar ao
ensino.
Fazem parte do processo de avaliação dos livros didáticos critérios classificatórios e
critérios eliminatórios. Sendo incorreções dos conceitos e das informações básicas, bem como
desrespeito aos princípios de construção da cidadania e a incoerência metodológica critérios
eliminatórios. Dessa forma, segundo o catálogo do PNLEM/2005 (BRASIL/SEMTEC, 2004,
p.10-11), é eliminada a obra que:
formular erroneamente os conceitos que veiculem;
fornecer informações básicas erradas e descontextualizadas;
mobilizar de forma inadequada esses conceitos e informações, levando o
aluno a construir de forma incorreta conceitos e procedimentos;
privilegiar um determinado grupo, camada social ou região do País;
veicular preconceitos de origem, cor, condição econômico-social, etnia,
gênero, orientação sexual, linguagem ou qualquer outra forma de
discriminação;
divulgar matéria contrária à legislação vigente para a criança e o adolescente,
no que diz respeito a fumo, a bebidas alcoólicas, a medicamentos, a drogas e a
armazenamentos, entre outros;
34
fazer publicidade de artigos, de serviços ou de organizações comerciais,
salvaguardada, entretanto, a exploração estritamente didático-pedagógica do
discurso publicitário;
fazer doutrinação religiosa.
São postulados três critérios principais para que os livros cumpram adequadamente sua
função didático-pedagógica:
correção das informações, conceitos e procedimentos que integram o
componente curricular;
adequação de sua proposta didático-pedagógica em relação de situação de
ensino-aprendizagem e aos objetivos visados;
sintonia com a legislação e os demais instrumentos oficiais que regulamentam
e orientam a Educação Nacional. (BRASIL/SEMTEC, 2004, p. 10)
Enfatiza-se, ainda, a importância da coerência e adequação metodológicas, exigindo-se
que as escolhas teórico-metodológicas sejam explicitadas e fundamentadas por meio do livro do
professor, cuja qualidade é também avaliada.
Segundo O Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino de 2009, onze livros
didáticos de Língua Portuguesa foram aprovados, sendo o corpus de análise desta pesquisa, que
será apresentado adiante, composto por alguns deles.
1.6 O livro didático de Língua Portuguesa
O livro didático de Língua Portuguesa tornou-se um interessante objeto de estudo em
especial pelas mudanças que vem sofrendo ao longo dos anos. São muitas as pesquisas que
investigam este objeto multifacetado com os mais variados enfoques teóricos e metodológicos,
porém há uma demanda por estudos que enfoquem o livro de Ensino Médio.
Basta folhearmos um livro didático de Português mais antigo, por volta da década de 1970
ou 1980, e o compararmos com os atuais que notamos diferenças, principalmente quanto às
abordagens teórico-metodológicas e ao aspecto visual, entretanto esta obra sempre manteve
relações com o texto.
Até a década de 1960, os livros de Português eram compostos exclusivamente por textos
literários. Seus módulos ou unidades eram organizados a partir de um texto principal, cujas
35
propostas de estudo eram voltadas às formas estéticas, estruturais e temáticas. Algumas obras
traziam também dois ou três textos complementares.
Conforme Bezerra (2003), com o desenvolvimento da lingüística estrutural e da teoria da
comunicação na década de 1970, os livros começam a apresentar textos não-literários como os
jornalísticos e histórias em quadrinhos, além dos literários. Contudo, somente na modalidade
escrita da língua, pois a oral não era considerada como texto. Aos textos não-literários, o enfoque
era dado aos seus aspectos estruturais e temáticos.
Os livros didáticos de Língua Portuguesa das décadas de 1960, 1970 e até os de 1980 são
semelhantes. Somente a partir de 1990, com a publicação dos PCN influenciado por novas teorias
do campo da linguagem e discurso, que se pode dizer que uma ruptura na tradição didática dos
livros de Português. Assim, devido aos novos postulados ao ensino da Língua Portuguesa
preconizados nos PCN, os livros renovaram-se, abordando “o tema com uma coletânea de textos
de variados gêneros, predominantemente, autênticos, ou seja, não escritos com finalidades
didáticas, mas com uso constante na nossa sociedade letrada”(Ibid., p. 40). Tal mudança é
conseqüência de questões políticas e econômicas do contexto social de produção dessas obras,
como Batista pontua (1999), pois o mercado editorial renovou-se com vistas a uma boa avaliação
nos programas do governo.
que nos PCN os gêneros são apresentados como a base de todo o ensino de língua
materna, é imprescindível sabermos como os livros de Ensino Médio incorporaram essa mudança,
isto é, qual é o tratamento didático neles proposto para o desenvolvimento de capacidades de
linguagem dos alunos.
Assim, passaremos a visitar a obra de autores que se dedicaram a investigar e discutir
algumas questões relativas a essas obras didáticas atuais. Marcuschi (2003), ao analisar os
exercícios de compreensão propostos em livros didáticos de Português de Ensino Fundamental e
Médio, concluiu que entre os livros mais antigos e os atuais acentuada diferença, entretanto
ambos apresentam problemas. Enquanto os mais antigos apresentam menos textos, mais
exercícios gramaticais e atividades de compreensão de texto equivocadas; os livros de 1990, mais
recentes, já apresentam uma nova concepção de texto, apresentam maior variedade textual, menos
exercícios gramaticais e mais discussão pessoal, embora ainda não abordem a variedade
lingüística e a oralidade. Para o autor, os livros melhoraram o aspecto visual, mas são menos
densos e mais dispersivos” (2003, p. 52).
36
Bezerra (2003), que também analisa livros didáticos de Português de Ensino Fundamental
e Médio contemporâneos, mas enfocando especificamente os textos neles veiculados, afirma que
a seleção textual é diversificada e atual, ou seja, esses livros são repletos dos mais variados
gêneros, propiciando aos alunos o contato com gêneros que circulam nas variadas esferas sociais
de comunicação. Contudo, a abordagem a eles dada é inadequada, não há propostas de reflexões
críticas sobre os usos da linguagem, havendo falta de aprofundamento nas abordagens.
Para a pesquisadora, apreende-se a ausência de embasamento teórico dos autores desses
livros. Fato que também se reflete nas palavras de Marcuschi (2003, p. 57) que, quanto aos
exercícios de compreensão de texto, afirma a “total falta de critérios para a organização dos
exercícios de compreensão”, além de “falta de clareza quanto ao que se deve entender por
compreensão de texto”. Para ele, compreensão é um processo criador, ativo e construtivo que
vai além da informação estritamente textual (Ibid, p. 58, grifos do autor). As atividades de
compreensão de texto, na maioria dos livros por ele analisados, são correspondentes a exercícios
de cópia de conteúdos do texto ou ainda questões pessoais, que não “levam a reflexões críticas
sobre o texto e não permite expansão ou construção de sentido, o que sugere que compreender é
apenas identificar conteúdos” (Ibid., p. 51).
Bueno (2002, p. 07), ao investigar a inclusão dos gêneros da mídia nos livros de Português
de Ensino Fundamental, conclui que, embora esses gêneros sejam bastante usados nos livros, “não
é o gênero que é explorado”, isto é, os gêneros da mídia veiculam nos livros didáticos como
pretexto para o ensino de gramática ou para a exploração do tema e, se tratando do gênero notícia,
um pouco do estudo da estrutura textual. Faz-se necessário sabermos se isso ocorre também
nos livros didáticos de Português voltados ao Ensino Médio.
Portanto, não como negar que “o livro didático de Língua Portuguesa passou a ser o
depositário de uma variedade de textos, dos quais, muitas vezes, o aluno só terá contato na escola,
isto porque grande parte da clientela da rede pública, em especial, não tem acesso a jornais,
revistas, obras literárias, etc.” (GARÉ, 2004, p. 73).
Contudo, não basta apenas incluir tais textos nos livros, de se trabalhá-los de forma
profunda em que haja a construção ativa do sentido, levando-se em conta as condições de
produção, a exploração das características dos gêneros, a análise lingüística, para proporcionar ao
aluno condições a realização de reflexões críticas sobre o texto e o desenvolvimento de
37
capacidades de linguagem dos alunos, fato que esta pesquisa busca analisar ao enfocar a
abordagem dada aos gêneros notícia e reportagem nos livros didáticos de Ensino Médio.
Os livros didáticos de Português contemporâneos apresentam pontos positivos como: o
contato com uma variedade de gêneros pertencentes às variadas esferas de circulação social, que
muitas vezes o aluno não teria acesso se não por meio dele; textos atuais e interessantes; aspectos
visuais atraentes. Entretanto, de se pensar, refletir e rever os modos de se abordar tais textos
para que se favoreça a aprendizagem efetiva da língua, que somente se concretizará por meio do
estudo sistemático dos gêneros na escola.
É imprescindível destacarmos que as questões problemáticas encontradas nos livros
didáticos de Português não invalidam sua utilização em sala de aula, até porque muitos deles
com contribuições inegáveis. Enfim, mesmo o mais perfeito e completo livro didático não
garantirá o sucesso da aprendizagem de uma língua. O livro didático constitui-se apenas como um
instrumento de apoio que pretende contribuir no processo de ensino-aprendizagem do Português,
cabendo ao professor complementá-lo, adaptá-lo e muitas vezes corrigi-lo.
Pensamos que analisar esse material que acompanha o professor, o aluno, e o ensino de
Língua Portuguesa no Ensino Médio é uma das formas de refletirmos sobre o ensino nessa etapa
da educação com vistas a sua melhora, porém não podemos centrar o processo de ensino-
aprendizagem estritamente na relação professor-aluno-material didático, desprezando outros
elementos constitutivos do trabalho do professor. Segundo Bueno (2007, p. 41), apoiando-se nas
discussões de Machado (2007), ele define o trabalho do professor como:
...uma atividade dirigida ao próprio professor, ao seu objeto, que é organizar um
meio de trabalho coletivo que propicie a aprendizagem de determinados
conteúdos disciplinares e o desenvolvimento de determinadas capacidades dos
alunos, e também dirigida aos outros (alunos, pais, colegas professores, chefes,
sociedade, a própria atividade, os outros dentro do próprio sujeito, etc.).
As relações sociais que interpelam o trabalho do professor influenciam em seu agir
docente. Assim subjacente à relação professor-aluno-material didático estão as prescrições oficiais
de ensino, as prescrições internas a cada instituição escolar, a interação entre pais, grupo docente,
direção e funcionários da instituição, a comunidade em que a escola está inserida, os instrumentos
de ensino disponíveis ao professor (giz, lousa, livro didático, laboratório de informática, etc.),
além de outros elementos. Desta forma, o trabalho realizado pelo professor em sala de aula é
direcionado e instrumentalizado por elementos interligados (MACHADO, 2007).
38
Neste momento, torna-se inviável aprofundarmos em tais questões devido à complexidade
que nelas se opera, buscamos apenas ressaltar alguns dos aspectos constitutivos do agir docente
como forma de contextualizá-lo no cenário educacional contemporâneo.
No capítulo seguinte, apresentaremos as bases teórico-metodológicas que permearão este
trabalho.
39
Capítulo 2
GÊNEROS TEXTUAIS
Este capítulo apresenta as teorias de gêneros com as quais dialogaremos no decorrer deste
trabalho e o modelo didático a que chegamos para o domínio dos gêneros notícia e reportagem.
A escolha de tais teorias se justifica devido à grande representatividade delas na
contemporaneidade, constituindo-se como referência básica da área, e por fundamentarem as
diretrizes nacionais de ensino de Língua Portuguesa. Buscamos contextualizar a questão dos
gêneros da teoria clássica até os estudos modernos, para então nos dedicar a apresentação da
teoria dos gêneros do discurso de Bakhtin por ser a precursora. Em seguida, tratamos da
perspectiva de gênero presente na obra de J-P Bronckart (2003) e de seu suporte teórico-
metodológico, enfocando seu modelo de análise de textos. Realizamos ainda a exposição das
propostas didático-pedagógicas de Schneuwly e Dolz (2004) voltadas ao ensino da língua
materna por meio da modelização didática dos gêneros e por fim apresentamos os modelos
didáticos dos gêneros notícia e reportagem aos quais chegamos a fim de orientar as análises dos
livros didáticos de nosso corpus. Assim, este trabalho fundamenta-se, principalmente, na obra
destes autores que dialogam entre si, visto que Schneuwly e Dolz partem da teoria de gêneros de
Bronckart e a aplicam ao ensino de línguas.
2.1 A questão dos gêneros
Decorrente do desenvolvimento dos estudos da linguagem e do surgimento de novas
vertentes teóricas como a Análise do Discurso, a Lingüística Textual, a Pragmática, entre outras,
os PCN colocam o texto e o gênero como centrais nas propostas de ensino de Língua Portuguesa,
desse modo, reconhecendo e privilegiando a dimensão discursiva do texto e postulando os
gêneros como unidades básicas de ensino de língua, uma vez que a linguagem materializa-se
socialmente por meio dos gêneros: instrumentos de comunicação.
Questões relacionadas aos gêneros como sua conceituação, classificação e aplicações
didáticas, têm despertado a atenção de pesquisadores. É notável o grande número de pesquisas e
40
publicações que abordam o tema à luz de variadas perspectivas teóricas. Os trabalhos em torno
dos gêneros de autores como Bakhtin (1991; 2000; 2002), Maingueneau (2001), Bronckart
(2003), Dolz e Schneuwly (2004), Marcuschi (2002), Rojo (2005), Machado (2005), entre outros,
configuram-se como referência fundamental desse campo de estudo.
Embora a noção de gêneros tenha recebido destaque com o desenvolvimento dos
modernos estudos e teorias da linguagem, eles já haviam sido pensados pela teoria clássica, tanto
pela poética quanto pela retórica desde os estudos de Platão e Aristóteles, pois a Lingüística
como ciência específica da linguagem é recente e inicialmente dedicava-se ao estudo de unidades
menores que o texto como o fonema, a palavra, a frase, etc. Quando começa a se preocupar com
o texto, o gênero torna-se uma de suas grandes questões.
Alguns exemplos clássicos de classificações de gêneros caracterizam a antiga
preocupação com o assunto como: a abrangente distinção entre a poesia e a prosa; a distinção
entre gêneros lírico, épico e dramático, desde Platão; a antiga distinção entre comédia e tragédia;
a classificação de três gêneros oratórios: judiciário, deliberativo e epidítico, realizada por
Aristóteles em sua obra Arte Retórica.
Como se constata, o estudo dos gêneros perpassa desde a antiguidade clássica até a
contemporaneidade como uma temática constante, mostrando-se não como objeto de
investigação da área da linguagem, mas de diversos campos do saber. Fato que caracteriza a
variedade de abordagens em torno da questão, resultando, em alguns casos, no uso de
metalinguagem sem definições claras. Brandão (2003, p.19) pontua que se tem usado às vezes
indistintamente os termos: gêneros, tipos, modos, modalidades de organização textual, espécie de
texto e de discursos,” sem as necessárias especificações e conceituações.
Bakhtin desenvolveu sua teoria dos gêneros do discurso e a partir dela foram realizadas
releituras que ora se aproximam de sua obra, ora se distanciam. Dessa forma, partiremos para a
apresentação da perspectiva defendida por alguns autores de grande representatividade no campo
dos gêneros, com os quais dialogaremos em nossa análise. Iniciaremos pela exposição da teoria
dos gêneros de Bakhtin por ser a precursora.
41
2.2 Bakhtin e a teoria dos gêneros
É fundamental que compreendamos a filosofia dialógica da linguagem que permeia a
obra de Bakhtin e de seu Círculo para que pensemos os gêneros do discurso como propõe o
autor: considerando o dialogismo do processo interativo.
A primeira vez que o conceito gêneros do discurso‟ veicula na obra bakhtiniana,
conforme Souza (2002), é em The Formal Method In Literacy Scholarship (1928), criticando os
formalistas por preocuparem-se com a língua enquanto sistema, isto é, com a fonética, o léxico, o
sintático, a gramática, em detrimento do todo, que para Bakhtin é o enunciado ou enunciação,
gerado por seu contexto social de comunicação. Para ele, comunicamo-nos por enunciados e
nunca por orações, sendo, pois, os neros do discurso formas desse enunciado que dependem
muito mais do contexto comunicativo e da cultura do que da própria palavra (BAKHTIN, 2000).
Embora o conceito houvesse aparecido, é no ensaio intitulado Gêneros do Discurso
(1952-1953) que um enfoque à problemática e a definição teórica dos neros. Tal trabalho
era parte de um projeto mais abrangente do autor que não pode ser concretizado.
Bakhtin desenvolveu sua teoria dos gêneros com um olhar voltado à literatura (prosa),
especificamente à estilística, o que não a impede de ser transferida ou aplicada a outros campos,
como fizeram autores como Maingueneau, Bronckart, Schneuwly e Dolz, entre outros, que
realizaram seus estudos sobre gêneros a partir de sua releitura dos postulados bakhtinianos.
O filósofo russo distancia-se das conceituações clássicas de gênero da Retórica e da
Poética por pensar nas diversas esferas de comunicação e nos diferentes usos da linguagem,
dando subsídios para se pensar e transferir suas colocações aos neros modernos como os dos
meios de comunicação de massa e mídias digitais, como o faz Maingueneau, apesar de Bakhtin
ter se dedicado às práticas prosaicas sem mencioná-los (MACHADO, 2005).
Um dos conceitos-chave para a compreensão da teoria dos gêneros do discurso de
Bakhtin é a compreensão do conceito de enunciado ou enunciação, como preferem alguns
tradutores. Para o teórico russo, a comunicação verbal se por meio de enunciados, entretanto,
esses enunciados não são simples orações ou frases com unidade de sentido, mas compreendem a
um todo, a uma totalidade comunicacional, que propicia ao outro a possibilidade de resposta.
Dessa forma, o todo do enunciado é determinado pelo “tratamento exaustivo” do assunto, “o
42
intuito” ou objetivo do locutor, “as formas típicas de estruturação do gênero” (BAKHTIN, 2000,
p. 299). Em outras palavras:
Em qualquer enunciado [...] captamos, compreendemos, sentimos o intuito
discursivo ou o querer-dizer do locutor que determina o todo do enunciado: sua
amplitude, suas fronteiras. Percebemos o que o locutor quer dizer e é em
comparação a esse intuito discursivo, a esse querer-dizer [...] que mediremos o
acabamento do enunciado. Esse intuito determina a escolha, enquanto tal, do
objeto, com suas fronteiras [...] e o tratamento exaustivo do objeto de sentido
que lhe é próprio. Tal intuito vai determinar também, claro, a escolha da forma
do gênero em que o enunciado será estruturado (Ibid., p. 300).
Portanto, de acordo como o intuito, objetivo ou intenção do locutor é que este seleciona o
gênero adequado para atingir os objetivos comunicacionais de seu enunciado. Sendo assim, os
enunciados concretizam-se na forma de gêneros do discurso.
Bakhtin propõe uma distinção entre os gêneros em primários e secundários.
Corresponderiam aos gêneros de discurso primário aqueles mais simples, espontâneos, de
linguagem cotidiana, familiar (orais, mas não exclusivamente). Enquanto os gêneros de discurso
secundário são gêneros mais complexos como o conto, o romance, o discurso científico, etc.
(escritos, mas não exclusivamente). Os gêneros secundários formam-se a partir dos gêneros
primários, que ao serem englobados nesta esfera transmutam-se e perdem seu contexto real e
imediato, tornando-se representações dos gêneros primários. Por exemplo, a apresentação de
uma conversa do tipo cotidiana em uma peça teatral é a representação desse gênero primário,
porque não espontaneidade, nem o contexto real, fato que faz com que a peça seja um gênero
secundário. Há, portanto, a inter-relação entre os gêneros primários e secundários, sendo os
últimos a complexificação dos primeiros.
Em Bakhtin, os gêneros são “tipos relativamente estáveis de enunciados”, que apresentam
uma inesgotável variedade conforme a esfera social a que se vinculam (BAKHTIN, 2000, p.
279). São assimilados, assim como a língua materna, por meio das experiências sociais de
comunicação verbal: ouvindo e reproduzindo, pois sempre falamos por meio de gêneros do
discurso e não os aprendemos em manuais, mas na e pela interação com o social, assim
“aprendemos a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do outro, sabemos de
imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir-lhe o gênero” (Ibid., p. 302).
Para o autor, “a comunicação verbal seria quase impossível” sem a existência e domínio
dos gêneros, pois o caráter normativo deles facilita a eficiência da comunicação (BAKHTIN,
43
2000, p. 302). É justamente pelo aspecto normativo dos gêneros que Bakhtin critica a lingüística
de Saussure pela oposição: fala (enunciado) como individual e língua (sistema) como social. Tal
concepção peca por ignorar que a fala, ao invés de ser individual, é coletiva, social, por se
estruturar em gêneros que são normativos, embora alguns, como os literários permitam um
pouco mais o uso de criatividade. Entretanto, os gêneros são maleáveis e flexíveis até o ponto de
que não se infrinjam suas características essenciais constitutivas de sua função comunicacional
que consistem em três elementos fundamentais:
a) Conteúdo temático: corresponde ao conjunto de temas que são dizíveis em um gênero
determinado, isto é, cada gênero do discurso engloba conteúdos temáticos que se
relacionam com sua esfera de atividade humana. Não se trata de qualquer tema em
qualquer gênero. O locutor deve selecionar aquele que melhor cumprirá a finalidade de
provocar compreensão e reação no outro;
b) Estilo: consiste no estilo lingüístico empregado nas esferas de comunicação social as
quais o gênero pertence. O estilo verbal, que compreende os recursos disponibilizados
pela língua como lexicais, sintáticos e gramaticais, não devem ser dissociados de seu
gênero. Por exemplo, na esfera jornalística de comunicação, o estilo do gênero notícia
corresponde ao uso de linguagem padrão e objetiva, entretanto, se uma notícia veicular
em um jornal com linguagem coloquial, apresentando gírias e comentários pessoais,
causará certo estranhamento no leitor por não corresponder ao estilo esperado a tal
gênero. O estilo é constitutivo do gênero e se alterado, altera-se conseqüentemente o
gênero;
c) Construção composicional: diz respeito à organização do enunciado, a ordem de sua
apresentação, ao como dizer para atingir o objetivo ou finalidade do gênero. Como
exemplo, pensemos a organização do gênero notícia: manchete (título) e o corpo do texto
organizado na forma de pirâmide invertida (organização textual em que no primeiro
parágrafo (lide) apresentam-se todas as informações fundamentais) (PUBLIFOLHA,
2006). Se essa organização composicional não for cumprida, transmuta-se o gênero.
O conteúdo temático, o estilo e a construção composicional são indissociáveis e
essenciais à constituição dos gêneros do discurso, garantindo a eles a efetividade de suas
finalidades comunicacionais (BAKHTIN, 2000, p. 279).
44
Passaremos, a seguir, a dialogar com autores que desenvolveram suas teorias sobre o
ensino e estudo de gêneros a partir da obra bakhtiniana para fundamentar nossa análise que é
voltada ao trabalho com gêneros em ambiente escolar, visto que os objetivos de Bakhtin, quanto
à teoria dos gêneros, diziam respeito à linguagem como social, ao enunciado e ao estudo
literário.
Uma importante referência a nosso trabalho é o suporte teórico-metodológico do
Interacionismo Sócio-discursivo desenvolvido por J-P Bronckart (2003) e, em especial, a teoria
didática de Schneuwly e Dolz (2004) que aplicam o modelo de análise de textos de Bronckart ao
trabalho escolar com gêneros. Assim, apresentaremos sumariamente o quadro teórico-
metodológico do Interacionismo Sócio-discursivo e suas implicações didáticas por
fundamentarem as análises de nossa pesquisa.
2.3 Gêneros textuais na abordagem do Interacionismo Sócio-discursivo
O Interacionismo Sócio-discursivo (ISD) trata-se de uma corrente teórico-metodológica
desenvolvida pelo grupo de pesquisadores da Universidade de Genebra (Suiça), em especial por
J-P Bronckart. É nessa concepção que Bronckart (2003) propõe um modelo de análise
estabelecendo uma relação entre as condições de produção e a organização material de textos. Tal
modelo de análise não possuía fins didáticos, entretanto por contemplar dimensões relevantes ao
ensino, Schneuwly e Dolz (2004), pesquisadores do mesmo grupo, aplicaram-no ao ensino de
línguas. Apresentaremos as propostas de Bronckart, para então tratarmos da teoria didático-
pedagógica de Schneuwly e Dolz que fundamenta as orientações nacionais de ensino de Língua
Portuguesa.
Para Bronckart (2008, p. 87, ênfases do autor), o texto corresponde a toda unidade de
produção verbal que veicula uma mensagem organizada e que visa a produzir um efeito de
coerência sobre o destinatário” ou “à unidade comunicativa de nível superior”, sendo apreendido
como produto concreto das formas de agir por meio da linguagem que apresentam características
relativamente estáveis e que se configuram em gêneros de texto, contudo tais características, no
decorrer do tempo, podem sofrer alterações refletidas pelas mudanças sociais, uma vez que os
gêneros são concebidos como instrumentos sociais de comunicação responsáveis pela mediação
45
das interações. Cada uma das formas de agir por meio da linguagem, isto é, cada “agir
linguageiro”, como designa o autor (Ibid. p. 87), pode corresponder a um conjunto de gêneros
possíveis, cabendo ao enunciador/emissor selecionar aquele que melhor se adequar a suas
intenções.
Bronckart, em seu modelo de análise de texto de um dado gênero, traz dois elementos
como fundamentais à compreensão e ao domínio dos textos: as condições de produção e a
arquitetura interna textual. As condições ou contexto de produção dizem respeito a fatores físicos
ou materiais e sociossubjetivos, sendo àqueles referentes ao suporte material, modalidade da
língua, momento histórico, público-alvo, identificação do emissor/enunciador e do
receptor/destinatário da produção, as representações referentes aos aspectos sociossubjetivos
são: a postura ou papel social assumidos pelo emissor/enunciador e pelo receptor/destinatário na
interação, o objetivo ou intenção da produção. ainda possibilidades de representações
decorrentes da situação e dos conhecimentos temáticos e de modelos reconhecidos de gêneros
disponíveis ao produtor (BRONCKART, 2008).
Segundo Bronckart (2006; 2008), ao produzir um texto o emissor/enunciador terá que
selecionar o modelo de gênero que melhor atingirá seus objetivos e adaptá-lo às particularidades
de sua situação de interação, desenvolvendo um duplo processo. Dessa forma, o texto apresentará
características que garantam a eficiência do gênero à realização de seus objetivos
comunicacionais, mas também aspectos individuais refletidos pela seleção vocabular empregada,
pelas vozes sociais ou individuais apresentadas, entre outros de acordo com o contexto de
produção.
A arquitetura interna textual, proposta pelo ISD de Bronckart, é constituída por três níveis
estruturais superpostos: o da infra-estrutura, o dos mecanismos de textualização e o da
responsabilidade enunciativa.
O nível mais profundo do „folhado‟ textual proposto pelo autor corresponde à camada da
infra-estrutura constituída pelo plano geral do texto, que corresponde à configuração estrutural do
texto, pela mobilização de tipos de discurso e suas intercalações, pelas seqüências e outras
planificações como os scripts e as esquematizações de modo a organizar o conteúdo temático.
Os tipos de discurso são “segmentos de texto ou até mesmo um texto inteiro” que
apresentam formas lingüísticas identificáveis e passíveis de classificação devido às regularidades
46
de organização e de marcação lingüística que apresentam em diferentes níveis (MACHADO,
2005, p. 242, ênfases da autora):
No nível semântico-pragmático: mostram determinada relação com o
contexto físico de produção: de implicação desse contexto ou autonomia em
relação a eles e, [...] exibem determinada forma de apresentação dos
conteúdos em relação ao tempo-espaço da produção [conjunção ou
disjunção];
No nível morfossintático, cada um deles apresenta um conjunto de unidades
lingüísticas discriminativas, que marcam qual é a relação estabelecida com o
contexto e qual é a forma de apresentação dos conteúdos em relação ao
tempo-espaço da produção;
No nível psicológico, são o resultado de operações discursivas de
estabelecimento de relações entre o mundo discursivo e o mundo da
interação [...];
No nível da planificação, os conteúdos dos diferentes tipos de discurso
podem apresentar-se organizados em seqüências textuais, scripts [relatos] ou
planificações [...];
No nível do texto, os tipos de discurso podem ser definidos como segmentos
constitutivos dos textos, mas de forma variável [...].
Para Bronckart (2003; 2008), os textos são compostos por quatro tipos de discurso, a
saber: discurso interativo, discurso teórico, discurso relato interativo e discurso narração, os quais
podem ser combinados de acordo com as finalidades da interação.
O discurso interativo pertence ao mundo discursivo do expor, sendo sua compreensão
dependente do ato de produção. É lingüisticamente marcado pelos participantes da interação, e
2ª pessoa do discurso, e também pelo tempo verbal presente e pelo modo imperativo. Constitui-se
como predominante nos neros diálogo, conversa cotidiana, chat, entrevista, peça teatral, entre
outros.
O discurso teórico ocorre no mundo discursivo do expor, como o interativo, entretanto
apresenta autonomia quanto ao ato de produção. Nele não marcas dos participantes da
interação, nem ao tempo e lugar da produção. O texto é narrado no presente genérico, sendo
predominante nos gêneros artigo científico, relatório de pesquisa, verbetes, monografia, entre
outros.
O discurso relato interativo apresenta disjunção com o mundo discursivo real, sendo da
ordem do narrar, mas se remete aos participantes da interação mostrando-se dependente do
47
contexto de produção. Ocorre predominantemente nos gêneros depoimento, biografia, relato,
diário, entre outros.
O discurso narração apresenta autonomia quanto ao ato de produção. Não ocorrendo
marcas lingüísticas dos participantes da interação, do tempo ou lugar da produção. Porém há uma
forte referência temporal absoluta (em 2007, ontem, etc.), sendo constante a presença de
organizadores temporais (advérbios, sintagmas preposicionais, coordenativos, subordinativos,
etc.) que desloca o acontecimento a um tempo disjunto do momento de interação, empregando-se
o presente genérico ou o pretérito perfeito e apenas frases declarativas. Ocorre nos gêneros
sempre monologados como notícia, reportagem, conto, além de outros. Vejamos o seguinte
exemplo
6
em que os organizadores temporais e os verbos empregados estão em
destaque:
BUENOS AIRES três múmias incas em excelente estado de conservação
foram encontradas em um vulcão localizado na Província de Salta, na
Argentina. A descoberta, divulgada ontem pela National Geographic society,
revela que os restos são de duas meninas e um menino sacrificados em um ritual
há 500 anos... (FARACO, 2003, p. 197-198, grifos nossos)
Assim esses quatro tipos de discursos são mobilizados na produção de textos por meio de
combinações. Por exemplo, em uma reportagem a predominância do discurso narração,
contudo pode haver também a presença de um relato interativo na forma de um depoimento, além
do discurso teórico na forma de argumentos para a explicação ou justificação de algum fato.
A infra-estrutura é caracterizada ainda por uma dimensão seqüencial ou linear do
conteúdo temático. Essa dimensão se organiza em seqüências que, nas palavras de Bronckart
(2033, p. 251), são “formas de planificação convencional, também em número restrito [como os
tipos de discurso], que podem ser observadas no interior de um tipo de discurso”.
Foi Adam quem teorizou sobre a organização textual baseada na noção de seqüência,
assim Bronckart (2003) retoma sua teoria e realiza algumas reformulações, classificando-as em
seis tipos convencionais: narrativa, descritiva, argumentativa, explicativa, injuntiva e dialogal.
Cada tipo de seqüência possui seu efeito pretendido e suas fases de concretização. Machado
(2005, p. 246-247) elaborou um quadro, o qual reproduziremos a seguir, que sintetiza os efeitos e
6
Fragmento de uma notícia do jornal O Estado de S. Paulo, de 07/04/99, veiculada no livro didático Português:
língua e cultura (FARACO, 2003, p. 197-198).
48
as fases das planificações convencionais. Não aprofundaremos na exposição de todos os tipos de
planificações, mas somente naqueles mobilizados nos gêneros textuais notícia e reportagem.
QUADRO 2. Tipos de seqüências textuais
SEQÜÊNCIAS
REPRESENTAÇÕES DOS EFEITOS
PRETENDIDOS
FASES
Descritiva
Fazer o destinatário ver em pormenor elementos
de um objeto de discurso, conforme a orientação
dada a seu olhar pelo produtor
Ancoragem
Aspectualização
Relacionamento
Reformulação
Explicativa
Fazer o destinatário compreender um objeto de
discurso, visto pelo produtor como incontestável,
mas também como de difícil compreensão para o
destinatário
Constatação inicial
Problematização
Resolução
Conclusão/Avaliação
Argumentativa
Convencer o destinatário da validade de
posicionamento do produtor diante de um objeto
de discurso visto como contestável (pelo produtor
e/ou pelo destinatário)
Estabelecimento de:
- premissas
- suporte argumentativo
- contra-argumentação
- conclusão
Narrativa
Manter a atenção do destinatário, por meio da
construção de suspense, criado pelo
estabelecimento de uma tensão e subseqüente
resolução
Apresentação de:
- situação inicial
- complicação
- ações desencadeadas
- resolução
- situação final
Injuntiva
Fazer o destinatário agir de certo modo ou em
determinada direção
Enumeração de ações
temporalmente
subseqüentes
Dialogal
Fazer o destinatário manter-se na interação
proposta
Abertura
Operações Transacionais
Fechamento
Bronckart pontuou além das planificações convencionais apresentadas no quadro, a
existência de outras planificações, mais elementares, denominadas scripts e esquematizações.
Segundo o autor, o script, que em português corresponde a relato, ocorre em textos da ordem do
narrar em que a planificação apresenta grau zero, isto é, não ocorrem fases e tensões, sendo os
fatos ou acontecimentos dispostos em ordem cronológica. As esquematizações são próprias dos
textos de ordem do expor cuja planificação é zero, ou seja, o objeto do discurso não é contestável
ou problemático não havendo a necessidade da concretização das fases convencionais,
49
constituindo segmentos de texto puramente informativos ou expositivos que se organizam na
lógica natural.
Para Bronckart é o tipo de discurso que determina as possibilidades de uso e combinação
das seqüências ou outras planificações em seu interior. Aprofundaremos na descrição da
planificação que ocorre no tipo de discurso narração, uma vez que este trabalho trata de gêneros
constituídos por esse tipo de discurso.
A planificação do discurso narração pode ser efetuada em três modalidades, combinando-
se de múltiplas maneiras: o script, a seqüência narrativa e a seqüência descritiva. Como
dissemos, o script reflete a cronologia efetiva dos acontecimentos, as seqüências narrativa e
descritiva são constituídas de fases convencionais cujas funções são criar tensão e fazer ver,
respectivamente. Assim crê-se que os gêneros notícia e reportagem são elaborados por meio da
planificação script ou relato, uma vez que os outros tipos de seqüências possíveis à narração são
incoerentes com os objetivos jornalísticos dos gêneros em questão.
O segundo nível da arquitetura textual é constituído de mecanismos de textualização que
possibilitam a coerência temática e linear dos textos por meio de mecanismos de conexão
(organizadores textuais: conjunções coordenativas e subordinativas, advérbios, etc.) e de coesão
nominal (anáforas) e verbal (tempos verbais, advérbios e grupos preposicionais).
O último vel diz respeito a mecanismos de responsabilidade enunciativa e de
modalização. Esse nível possui menor relação com a progressão temática do texto devido a seu
caráter configuracional em que o emissor/enunciador distribui as vozes sociais ou individuais
(polifonia) em seu texto de acordo com seu intuito interativo e nele explicita julgamentos ou
avaliações por meio de modalizações. Dessa forma, o posicionamento enunciativo se em
função da organização e emprego das vozes e das modalizações, que guiarão a interpretação do
receptor/destinatário.
Em resumo, segundo o ISD de Bronckart (2003; 2006), os usuários da língua agem
socialmente por meio de textos que se materializam na forma de gêneros, sendo estes os
instrumentos que mediarão as interações, contudo para que haja o domínio de um gênero de texto
há de se mobilizar conhecimentos referentes:
a) ao contexto de produção;
b) à infra-estrutura;
c) aos mecanismos de textualização;
50
d) aos mecanismos de responsabilidade enunciativa.
Portanto na concepção do ISD, o ensino de línguas deve centrar-se no domínio dos
gêneros de texto, entretanto não os enfocando como objetos reais de ensino e aprendizagem, e
sim como atividades sociais que permitem o agir linguageiro. Para tanto, faz-se necessário o
estudo das operações de linguagem mobilizadas a concretização de cada gênero, que quando
dominadas constituem capacidades de linguagem do aluno (MACHADO, 2005). Compartilhando
dessa concepção, Schneuwly e Dolz realizam as aplicações didáticas ao trabalho escolar com
gêneros como forma de ensino de língua.
2.4 Gêneros e aplicações didáticas
Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz, professores e pesquisadores da Universidade de
Genebra, dedicaram-se, principalmente, ao estudo da didática do francês, bem como ao
desenvolvimento do ensino dos gêneros escritos e orais na escola, elaborando seqüências
didáticas e pensando aspectos curriculares dos gêneros. Embora os estudos realizados por ambos
digam respeito ao francês como língua materna, permitem reflexões sobre o ensino do Português,
pois seu foco de investigação é no ensino de língua.
Os estudos sobre gêneros textuais de Schneuwly e Dolz, principalmente quanto ao
trabalho com gêneros orais e escritos na escola, fundamentam os postulados dos Parâmetros
Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa. Portanto, suas idéias e concepções sobre gêneros
são de grande relevância ao ensino do Português no Brasil.
Esses autores partem da teoria do ISD para desenvolver seus estudos. Para Schneuwly, o
“gênero é um instrumento” (2004, p. 23) no sentido vygotskiano da palavra, ou seja, é por meio
do gênero que agimos socialmente, ele é o instrumento mediador entre o sujeito e o meio social,
sem o qual não comunicação. A partir da definição de Bakhtin sobre gêneros, Schneuwly
(2004, p. 26) expõe três elementos os quais julga centrais em tal definição:
51
1. a escolha de um gênero, em função de uma situação definida por certo
número de parâmetros: finalidade, destinatários, conteúdo [...]. Dito de outra
maneira: há a elaboração de uma base de orientação para a ação discursiva.
2. Essa base chega à escolha de um gênero num conjunto de possíveis [...].
3.Mesmo sendo “mutáveis, flexíveis”, os gêneros têm uma certa estabilidade:
eles definem o que é dizível [...]; eles têm uma composição [...] eles têm uma
certa estrutura definida por sua função; [...] Finalmente, eles são caracterizados
por um estilo, que deve ser considerado não como um efeito da individualidade
do locutor, mas como elemento de um gênero.
Para Schneuwly, os gêneros são “um meio de conhecimento” ao passo que para se agir
discursivamente é necessário saber empregar o instrumento adequado à situação comunicativa
em questão, isto é, de se conhecer os elementos constitutivos do gênero para usá-lo, para agir
linguisticamente. Por exemplo, para um aluno relatar um fato que ocorreu na escola no jornal da
instituição, é necessário que ele tenha conhecimentos sobre o gênero notícia para realizar essa
ação discursiva (2004, p. 28).
Ao tratar dos gêneros primários, correspondentes às trocas verbais espontâneas,
vinculadas às práticas de linguagem cotidianas, e dos gêneros secundários, sendo as trocas
verbais complexas, relacionadas ao escrito (BAKHTIN, 1953/1979), Schneuwly propõe que os
alunos, em geral, entrem na escola fundamental, no caso do Brasil, tendo conhecimento dos
gêneros primários e passam a conhecer de modo sistemático, por meio de seqüências didáticas,
os gêneros secundários, que constituem a forma complexa dos gêneros primários dominados
pelas crianças.
Schneuwly e Dolz afirmam que as práticas de linguagem são o “principal instrumento de
interação social” sendo mesmo “mediações comunicativas, que se cristalizam na forma dos
gêneros”. Portanto, para eles os gêneros “constituem o instrumento de mediação de toda
estratégia de ensino e o material de trabalho, necessário e inesgotável, para o ensino da
textualidade” (2004, p.51). Concebendo que “comunicar-se oralmente ou por escrito pode e deve
ser ensinado sistematicamente” na escola (Ibid., p.51), tais teóricos dedicaram-se à elaboração de
um modelo didático de gêneros e ao desenvolvimento de uma progressão voltada ao domínio de
capacidades de linguagem.
O modelo didático de gênero busca desempenhar o papel de exemplo do gênero a ser
trabalhado. Segundo Machado (2005), para se construir um modelo didático de se realizar um
52
levantamento das dimensões ensináveis de um dado gênero por meio de referências teóricas
oriundas de estudos da linguagem e discurso, e de trabalhos de „experts‟ desse gênero,
observação e análise das práticas sociais com o gênero, complementadas pela proposta de análise
de textos de Bronckart. Assim, um modelo didático de gênero deve reunir dados teóricos e
práticos que contribuam em sua constituição.
A partir da elaboração desse modelo, intervenções na forma de seqüências didáticas
podem ser realizadas para o domínio de conhecimentos mobilizados na produção e compreensão
de um dado gênero. Nas palavras de Schneuwly e Doz, as seqüências didáticas:
buscam confrontar os alunos com práticas de linguagem historicamente
construídas, os gêneros textuais, para lhes dar a possibilidade de reconstruí-las e
delas se apropriarem. Essa reconstrução realiza-se graças à interação de três
fatores: as especificidades das práticas de linguagem que são objeto de
aprendizagem, as capacidades de linguagem dos aprendizes e as estratégias de
ensino propostas pela seqüência didática. (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004,
p.51)
As seqüências didáticas constituem-se em atividades que buscam a construção de
conhecimentos relativos ao gênero em questão, com vistas ao desenvolvimento de capacidades
de linguagem, portanto há de se ter cuidado ao empregar o conceito de seqüência didática
proposto por esses autores, não a confundindo com o emprego corriqueiro no qual correspondem
a quaisquer atividades/exercícios didáticos. A sequência didática tal qual proposta por
Schneuwly e Dolz (2004, p. 98) organiza-se na forma do seguinte esquema:
ESQUEMA 1. Seqüência didática proposta por Schneuwly e Dolz
Apresenta-se a situação de produção do gênero ao aluno e pede-se que ele realize a tarefa,
constituindo-se assim a „produção inicial‟ como diagnóstica, por meio dela serão avaliados os
Módulo
n...
Módulo
2
Módulo
1
PRODUÇÃO
FINAL
PRODUÇÃO
INICIAL
53
conhecimentos sobre o gênero que o aluno dispõe e quais capacidades de linguagem precisam
ser desenvolvidas para a elaboração dos „módulos‟. Nos módulos serão trabalhados de maneira
sistemática e aprofundada exercícios para o domínio do gênero de acordo com a necessidade do
aluno. É na „produção final‟ que o aluno colocará em prática os conhecimentos adquiridos nos
módulos, sendo esta um meio de avaliação do processo que muitas vezes sinalizará o que ainda
não foi alcançado e direcionará a elaboração de novos módulos (Ibid.).
A noção de capacidades de linguagem empregada por Schneuwly e Doz diz respeito às
“aptidões requeridas do aprendiz para a produção de um gênero numa situação de interação
determinada” (2004, p. 52), sendo classificadas em três tipos: capacidade de ação, capacidade
discursiva e capacidade lingüístico-discursiva.
A capacidade de ação refere-se à capacidade de contextualizar o gênero à circunstância de
interação, adaptando-o ao receptor/destinatário, à esfera de comunicação, enfim ao objetivo da
ação de linguagem. A capacidade discursiva diz respeito à capacidade de mobilizar
conhecimentos referentes à escolha e à organização de tipos discursivos adequados à situação de
interação, isto é, saber organizar um texto e nele posicionar-se de acordo com o plano
comunicativo, corresponde aos conhecimentos necessários à produção e compreensão do nível
mais profundo da arquitetura interna dos textos no modelo de análise de Bronckart (infra-
estrutura). A capacidade lingüístico-discursiva refere-se ao domínio de unidades lingüísticas, ou
seja, saber empregar mecanismos de textualização (conexão e coesão), vozes sociais ou
individuais (polifonia) e modalização de acordo com a circunstância de comunicação, de acordo
com o modelo de Bronckart.
O quadro a seguir, elaborado por Machado (2005, p. 254), visa expor as capacidades de
linguagem exigidas na realização de operações de linguagem e a relação delas com os níveis de
análise de Bronckart.
54
QUADRO 3: Capacidades e operações de linguagem
Capacidades de
linguagem
Operações
Níveis de análise
Capacidades de ação
1) Mobilização de representações
sobre:
- o contexto físico da ação
- o contexto sócio subjetivo
- conhecimentos de mundo que
podem ser verbalizados.
2) Adoção do gênero
1) Levantamento de hipóteses sobre
as representações do produtor:
- o contexto físico da ação
-o contexto sócio subjetivo
-conhecimentos de mundo que podem
ser verbalizados.
2) Levantamento de conhecimentos já
construídos sobre o gênero em
questão
Capacidades
discursivas
3) Gerenciamento da infra estrutura
textual
3.1) escolha do(s) tipos de discurso
3.2) seleção e organização global
dos conteúdos
3) Análise da infra-estrutura textual
3.1) identificação dos tipos de
discurso e de sua articulação
3.2) identificação do plano global do
texto e dos tipos de seqüência
Capacidades
lingüístico-
discursivas
4. Textualização
4.1) estabelecimento de relação
entre os segmentos
4.2) estabelecimento em
posicionamento enunciativo:
- gerenciamento de vozes
- expressão de modalização
5) Construção de enunciados
6) Seleção de itens lexicais
4) Identificação dos mecanismos de
textualização
4.1) da coerência e da coesão nominal
e verbal
4.2) de mecanismos enunciativos:
- de inserção de vozes
- de modalização
Salientamos que operações de linguagem são tarefas aprendidas para a concretização de
ações de linguagem cujo produto é o texto. Assim para a produção e compreensão de qualquer
gênero textual, há de se propiciar o desenvolvimento de capacidades de linguagem que garantam
seu domínio, as quais uma vez adquiridas poderão ser transferidas a gêneros semelhantes.
Schneuwly e Dolz, pensando em uma progressão em torno do trabalho com gêneros,
desenvolveram um agrupamento de gêneros, em que os gêneros são organizados em „domínios
sociais de comunicação‟, „aspectos tipológicos‟ e „capacidades de linguagem dominantes‟.
55
Vejamos o quadro proposto pelos autores em que se inscrevem os gêneros notícia e reportagem
os quais analisaremos neste trabalho (2004, p. 60):
QUADRO 4. Agrupamentos de gêneros de Schneuwly e Dolz
56
Domínios sociais de comunicação
Aspectos tipológicos
Capacidades de linguagem dominantes
Exemplos de gêneros orais e escritos
Cultura literária ficcional
Narrar
Mimeses de ação através da criação da intriga no
domínio do verossímil
Conto maravilhoso
Conto de fadas
Fábula
Lenda
Narrativa de aventura e de ficção científica
Narrativa de enigma e mítica
Sketch ou história engraçada
Biografia romanceada
Romance
Romance histórico
Novela fantástica
Conto
Crônica literária
Adivinha
Piada
Documentação e memorização das ações humanas
Relatar
Representação pelo discurso de experiências
vividas, situadas no tempo
Relato de experiência vivida
Relato de viagem
Diário íntimo
Testemunho
Anedota ou caso
Autobiografia
Curriculum vitae
Notícia
Reportagem
Crônica social e esportiva
Histórico
Relato histórico
Ensaio ou perfil biográfico
Biografia
Discussão de problemas sociais controversos
Argumentar
Sustentação, refutação e negociação de tomadas de
posição
Textos de opinião
Diálogo argumentativo
Carta de leitor
Carta de reclamação e de solicitação
Deliberação informal
Debate regrado
Assembléia
Discurso de defesa e de acusação (advocacia)
Resenha crítica
Artigos de opinião ou assinados
Editorial
Ensaio
Transmissão e construção de saberes
Expor
Apresentação textual de diferentes formas dos
saberes
Texto expositivo (em livro didático)
Exposição oral
Seminário
Conferência
Comunicação oral
Palestra
Entrevista de especialista
Verbete
Artigo enciclopédico
Texto explicativo
Tomada de notas
Resumo de textos expositivos e explicativos
Resenha
Relatório científico
Relatório oral de experiência
Instruções e prescrições
Descrever ações
Regulação mútua de comportamentos
Instruções de montagem
Receita
Regulamento
Regras de jogo
Instruções de uso
Comandos diversos
Textos prescritivos
57
O quadro apresenta cinco domínios sociais de comunicação, correspondendo aos aspectos
tipológicos: relatar, narrar, argumentar, expor e descrever ações, e a capacidades de linguagem
globais. Do ponto de vista curricular, os teóricos propõem a progressão das aprendizagens em
„espiral‟ de modo que os cinco agrupamentos sejam trabalhos em cada nível de ensino de forma
gradativa por meio de gêneros diversos, do nível menos formal ao mais formal, retomando os
gêneros de cada agrupamento e estudando aspectos que se destacam em cada um deles.
Pensando no agrupamento da ordem do „relatar‟, por exemplo, no primeiro ciclo do
Ensino Fundamental (1ª e séries ou 1º, e anos) poderia se trabalhar o gênero relato, no
segundo ciclo (3ª e ries ou e anos) os neros testemunho e diário íntimo, no terceiro
ciclo (5ª e séries ou 6º e anos) o gênero notícia e reportagem, e no último ciclo do Ensino
Fundamental (7ª e séries ou e anos) se trabalharia com os gêneros biografia e crônica
esportiva, constituindo uma progressão curricular em espiral e gradativa para os gêneros
correspondentes a essa tipologia.
Ao defenderem os gêneros como objeto de ensino, Schneuwly e Dolz partem da hipótese
de que “é através dos gêneros que as práticas de linguagem materializam-se nas atividades do
aprendiz(2004, p. 74). Sendo as práticas de linguagem, para os autores, o funcionamento da
linguagem em relação às práticas sociais em geral, e as atividades de linguagem dizem respeito a
um sistema de ações em que “uma ação de linguagem consiste em produzir, compreender e
interpretar e/ou memorizar um conjunto organizado de enunciados orais ou escritos” (Dolz,
Pasquier e Bronckart apud. SCHNEWNLY; DOLZ, 2004, p. 74). Portanto, o ensino dos gêneros
na escola possibilita que práticas sociais de linguagem materializem-se nas atividades
lingüísticas dos alunos para Schneuwly e Dolz.
Na escola sempre se trabalhou com os gêneros, instrumentos de comunicação, para se
ensinar a ler, escrever, falar, porém, ocorre uma complexidade quando o tomamos como objeto
de ensino, pois “há um desdobramento que se opera em que o gênero não é mais instrumento de
comunicação somente, mas é, ao mesmo tempo, objeto de ensino-aprendizagem”
(SCHNEWNLY; DOLZ, 2004, p. 76).
A complexidade dos gêneros na escola consiste em que esses sofrem mudanças e
transformam-se, sendo sempre uma variação do gênero de referência, ao passo que a função de
comunicar é substituída pela de aprender, no universo do „como se‟ que tange as práticas de
ensino escolares. Entretanto, os teóricos afirmam que tal prática de ensino empregada na escola é
58
uma “eficiente maneira de aprender” (Ibid., p. 180), pois é por meio das seqüências didáticas
trabalhadas na escola que as dimensões ensináveis dos gêneros são sistematizadas para o
domínio do aluno, possibilitando-lhe acesso a práticas de linguagem novas presentes nas práticas
fora do ambiente escolar.
Enfim, para os teóricos:
toda introdução de um gênero na escola é o resultado de uma decisão didática
que visa a objetivos precisos de aprendizagem, que são sempre de dois tipos:
trata-se de aprender a dominar o gênero, primeiramente para melhor conhecê-lo
ou apreciá-lo, para melhor compreendê-lo, para melhor produzi-lo na escola ou
fora dela; e, em segundo lugar, de desenvolver capacidades que ultrapassam o
gênero e que são transferíveis para outros gêneros próximos ou distantes.
(SCHNEWNLY; DOLZ, 2004, p.80)
É importante destacarmos que os autores reconhecem que o trabalho com gêneros na
escola, veiculados em livros didáticos ou não, causa-lhes transformações tais como a excessiva
simplificação ou generalização, bem como a ênfase a certos aspectos em detrimento a outros.
Porém, para eles, essas são conseqüências inevitáveis para que os objetivos didáticos sejam
atingidos.
Assim, por meio da teoria didático-pedagógica de Schneuwly e Dolz buscamos refletir se
as atividades propostas ao estudo dos gêneros notícia e reportagem no livro didático de Língua
Portuguesa de Ensino Médio propiciam o desenvolvimento das capacidades de linguagem
necessárias ao domínio desses gêneros.
2.5 Gêneros jornalísticos: a notícia e a reportagem
Neste momento, contextualizaremos os gêneros notícia e reportagem na modernidade e,
recorrendo a diversas obras, apresentaremos as características genéricas desses textos com o
objetivo de traçar suas dimensões ensináveis.
Vivemos em uma época de excesso de informação, isto é, o homem moderno vive numa
sociedade de informação em que tudo ocorre com muita rapidez e o tempo lhe é escasso.
Contudo, este excesso de informação lhe chega por meio da mídia, principalmente, por
meio do discurso jornalístico que antes bombardeava os indivíduos diariamente com notícias,
59
hoje os bombardeia minuto-a-minuto via canais de televisão e sites de jornalismo na internet.
Segundo Larrosa (2002, p. 23), “a velocidade com que nos são dados os acontecimentos e a
obsessão pela novidade, pelo novo, que caracteriza o mundo moderno, impedem a conexão
significativa entre acontecimentos.”
O autor argumenta que o volume de informações, muitas vezes, desnecessárias causa a
falta de memória e, conseqüentemente, a falta de experiência, pois para ele, o saber da
experiência se no indivíduo por meio dos fatos que realmente, de alguma forma, tocam-no.
Porém, o homem moderno respira novidades e informações de um modo tão rápido que nada o
toca, fazendo com que ocorra a impossibilidade de acúmulo de vivências, a impossibilidade de
memória:
...já que cada acontecimento é imediatamente substituído por outro que
igualmente nos excita por um momento, mas sem deixar qualquer vestígio. O
sujeito moderno não está informado e opina, mas também é um consumidor
voraz e insaciável de notícias, de novidades, um curioso impenitente,
eternamente insatisfeito. (LARROSA, 2002, p. 23)
Portanto, podemos apreender que o excesso de informação, conseqüência da
modernidade, é impossível à memória humana, pois não como o indivíduo se lembrar de tudo,
faz-se necessário que se esqueça de determinados acontecimentos para se lembrar de outros, daí
ocorre então a invenção de novos recursos tecnológicos de armazenamento de memória que
permeiam a atmosfera contemporânea.
A globalização encurtou as distâncias e fez com que as informações chegassem à
população praticamente no momento imediato de sua ocorrência. O leitor ou telespectador
contemporâneo não obtém somente notícias regionais e nacionais, mas internacionais. Nos
diversos locais do planeta, fatos ocorrem simultaneamente. Guerras entre nações, assalto a um
banco, rebeliões na cadeia, descobertas científicas, nascimento de uma criança, lançamento de
um novo carro, são inúmeros os acontecimentos que chegam às agências jornalísticas. Entretanto,
quem seleciona o que é de interesse da população? Quem escolhe o que a sociedade deve ou não
saber? Quem delimita a versão divulgada? Quem escolhe como se produzirá ou abordará a
notícia? Enfim, quem decide o que deve ser lembrado ou esquecido? As empresas jornalísticas,
os editores e os jornalistas. Seria uma visão simplista se apontássemos apenas os jornalistas como
responsáveis por todas estas escolhas, pois sabemos que por trás das empresas de comunicação há
ideologias a serem seguidas, objetivos a serem atingidos, vozes a serem explicitadas e outras
60
silenciadas. Não podemos ser ingênuos a ponto de pensarmos que as notícias são divulgadas
aleatoriamente, por trás delas há evidentemente relações de poder.
Portanto, de se selecionar quais fatos noticiar e o como relatá-los à população. Para
tanto, as grandes agências de comunicação produzem seus manuais de redação e de estilo
jornalístico que definem os conceitos por eles utilizados. Ao tratarem do gênero notícia, é
apontado que o texto caracterizado como tal deve ser interessante, objetivo, imparcial, apresentar
a descrição exata dos fatos (MARTINS FILHO, 1997; PUBLIFOLHA, 2006).
Assim sendo, os manuais definem a notícia de modo um tanto subjetivo. Um tema pode
ser interessante a todos os leitores? Qual é o critério para se estabelecer o que é interessante ou
não? Podemos interpretar que os acontecimentos são selecionados e os textos elaborados de
acordo com interesses de determinadas camadas da população em detrimento de outras.
No que cabe a imparcialidade na imprensa, sabemos, por meio dos estudos da linguagem
e de discurso, que a imparcialidade e a objetividade são impossíveis. Todo texto é carregado de
marcas que correspondem ao contexto histórico-social em que o texto foi produzido e a ideologia
de seu autor, que se materializam em sua linguagem. Segundo Marcuschi (1991), a própria
escolha dos verbos no discurso jornalístico reflete a opinião do autor diante do fato enunciado.
Quanto à descrição exata dos acontecimentos, é um fato questionável, pois tais descrições
não são livres de subjetividades. Qual é o método de coleta de tais dados? São confiáveis?
Pensemos em um dos métodos, por exemplo, o testemunho. A testemunha, ao relatar os fatos,
recorre a sua memória, como aponta Maurice Halbwachs (1990), a memória é uma reconstrução
do passado com base no presente, um processo mutável, portanto a exatidão é impossível à
memória e, ao que parece, ao jornalismo.
Assim, apreendemos que as empresas jornalísticas, editores e jornalistas selecionam „o
que‟ e „como‟ a população será informada por meio de critérios a ela silenciados, subjacentes a
questões de poder que nos revelam mecanismos de manipulação da memória coletiva. Desta
forma, o discurso jornalístico preenche o imaginário social de crianças, jovens e adultos de
acordo com interesses específicos, ditando o que deve ser lembrado e esquecido, construindo a
memória da população.
Um dos exemplos da influência do discurso jornalístico na construção da memória, no
mundo ocidental, é a guerra no Iraque. Ao se pensar sobre ela, grande parte da população constrói
suas lembranças com base em notícias sobre o acontecimento, pois, na verdade, não o presenciou,
61
portanto o jornalismo age na transmissão de imagens, ao passo que é a partir delas que a
população faz a imagem de como foi à guerra e constrói sua memória sobre o fato. O jornalismo
age, então, na construção da memória coletiva da população com base em uma visão de mundo
oficializada por seu discurso.
Segundo Le Goff (1996, p. 476), a invenção da imprensa revolucionou a memória no
mundo ocidental, sobretudo por colocar a população diante de uma enorme memória coletiva. O
autor argumenta que a memória coletiva é “um instrumento e um objeto de poderque garante e
legitima a identidade de uma sociedade. Portanto a memória coletiva é um importante elemento
identitário que na sociedade da informação atual pode ser controlada e produzida pelo discurso
jornalístico e pelos meios de comunicação em geral de acordo com determinados pontos de vista.
Nosso objetivo, entretanto, não é apresentar a imprensa como grande vilã, até porque não
temos esta concepção, mas refletir sobre sua implicação na construção da sociedade
contemporânea com vistas a uma educação escolar que prepare os alunos para a sua leitura e
compreensão.
Os textos jornalísticos são documentos que trazem versões de acontecimentos, passíveis a
reconstruções e a questionamentos. Conforme Le Goff (apud. ALBERTI, 2005, p. 183-184)
O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento que
ele traz devem ser em primeiro lugar analisados desmistificando-lhe o seu
significado aparente. O documento é monumento. Resulta do esforço das
sociedades históricas para impor ao futuro voluntária ou involuntariamente
determinada imagem de si próprias. [...] Todo documento é mentira. Cabe ao
historiador não fazer o papel de ingênuo. [...] É preciso começar por desmontar,
demolir esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as condições de
produção dos documentos-monumentos.
Assim, enquanto o jornalista produz notícia, relata acontecimentos, o historiador estuda,
investiga processos históricos em que a notícia, por ser um documento, torna-se, em alguns casos,
um de seus objetos de investigação a ser desconstruído e analisado. Pensamos, então, que não
o historiador deve realizar a desconstrução do discurso jornalístico, mas a população em geral,
como forma de ler criticamente a realidade que a cerca, não sendo ingênua e passiva diante do
que lhe é apresentado.
Para tanto, faz-se necessário a atuação da educação formal na formação de cidadãos
conscientes, capazes de fazer a leitura da realidade através das lentes dos meios de comunicação,
fato que somente é possível se crianças, jovens e adultos compreenderem a linguagem, os
recursos argumentativos, a ideologia, as intenções e as condições de produção destes textos.
62
Assim pensamos que o trabalho didático com gêneros jornalísticos propiciará o desenvolvimento
de capacidades de linguagem necessárias à leitura, compreensão, interpretação e produção desses
textos que circulam socialmente para o efetivo exercício da cidadania.
Neste momento, apresentaremos as definições, os princípios jornalísticos e as
características genéricas referentes à notícia e à reportagem tendo como base diversas fontes, a
saber:
a) manuais de ensino de jornalismo (obras didáticas);
b) textos teóricos da área de comunicação (obras acadêmicas);
c) manuais de redação e estilo jornalísticos (obras de referência);
d) descrição e análise de textos do gênero notícia e reportagem.
Como nossa pesquisa centra-se na análise das atividades propostas ao trabalho didático
com os gêneros notícia e reportagem e suas implicações no desenvolvimento de capacidades de
linguagem exigidas na leitura, compreensão e produção desses gêneros, tal procedimento é
fundamental para levantarmos as dimensões ensináveis da notícia e da reportagem (o que um
determinado texto deve apresentar para ser reconhecido como tal) e relacioná-las às capacidades
de linguagem que devem ser trabalhadas para seu domínio, isto é, levantarmos quais dimensões
ensináveis de cada um desses gêneros correspondem à capacidade de ação, à capacidade
discursiva e à capacidade lingüístico-discursiva. Para então analisarmos quais capacidades de
linguagem estão sendo desenvolvidas nas atividades propostas nos livros didáticos de Português
de Ensino Médio.
Segundo Machado (2005), tais levantamentos são a base para a construção de um modelo
didático dos gêneros o qual não precisa ser perfeito nem teoricamente puro, podendo reunir
referências teóricas diversas, assim como referências oriundas da observação e da análise das
práticas sociais que envolvem o gênero em questão. Assim visitaremos diversos autores com
vistas à construção de modelos didáticos dos gêneros em questão para orientar nossa análise dos
livros didáticos.
Os gêneros notícia e reportagem constituem-se como principais gêneros jornalísticos cuja
função é a de informar, sendo a notícia a matéria-prima do jornal. Entretanto a definição desses
gêneros, bem como os de imprensa em geral, mostra-se como uma tarefa complexa por serem
dadas a eles distintas classificações e definições de acordo com a obra visitada.
63
A fim de caracterizá-los de modo coerente com as concepções teóricas deste trabalho,
organizaremos a exposição de acordo com os níveis de análise de Bronckart (2003),
correspondendo: ao contexto de produção, à infra-estrututa geral do texto, aos mecanismos de
textualização e aos mecanismos enunciativos, assim retomaremos tais noções tratadas
anteriormente neste capítulo.
Iniciaremos pela apresentação das características relativas ao contexto de produção dos
gêneros encontradas nas fontes visitadas.
a) Contexto de produção dos textos dos gêneros notícia e reportagem
O contexto de produção de um gênero, como tratamos, corresponde ao “conjunto dos
parâmetros que podem exercer uma influência sobre a forma como um texto é organizado”
(BRONCKART, 2003, p. 93). Assim ao se ler, compreender e produzir uma notícia ou uma
reportagem tem de se levar em conta certos parâmetros que permitem situar tal produção, como:
a) o suporte material: jornal impresso (em que jornal é/será veiculado o texto);
b) o público-alvo do jornal (qual é o leitor esperado; a que classe social ele pertence);
c) o momento e lugar de produção do jornal (onde se situam emissor/destinatário);
d) a intenção da produção (o que se pretende com a produção);
e) o conteúdo temático (que fatos/assunto são dizíveis por meio da produção) .
Esses elementos contextuais permearão todo o processo de produção desses gêneros.
Uma característica de muitas reportagens e mais ainda de notícias é a
obediência a normas próprias de seleção do léxico [...] Em ambos os casos,
procura-se o que é compreensível no registro coloquial (considerando-se o
público-alvo) e aceitável do ponto de vista formal. Na linguagem-padrão, nada
de adjetivos e advérbios que expressem juízo de valor, nenhuma mesóclise, raras
ênclises [...] pretende-se que essa linguagem seja precisa, porque a precisão é
relacionada ao uso e o jornalismo busca atingir público não especializado.
(LAGE, 2002, p. 66-67)
Como podemos apreender, a linguagem da notícia e da reportagem deve adequar-se a seu
público-alvo sem cair no coloquialismo desmedido nem no excesso de formalidade,
apresentando-se acessível à compreensão dos leitores.
Por meio das palavras de Lage, apreendemos o quanto o público-alvo é determinante da
concretização social desses gêneros, isto é, o leitor cujo jornal busca atingir determina o „como‟ o
64
fato será narrado dentro das possibilidades oferecidas pelo gênero. Assim pretende-se aproximar
a linguagem do texto a de seu destinatário desde que não se infrinja o padrão formal, caso
contrário transmuta-se o gênero.
O conteúdo temático é um elemento que permeia o contexto de produção e recepção dos
gêneros. Ele diz respeito aos conhecimentos que o receptor/destinatário ou emissor/enunciador
possuem sobre o gênero, refere-se às representações mentais adquiridas nas interações sociais que
o envolvem. Para que se dominem os gêneros notícia e reportagem é imprescindível que se
(re)conheça os conteúdos temáticos dizíveis por meio deles e também a intenção da interação.
Vejamos as definições de notícia e reportagem apresentadas em fontes diversas. Bahia
(1990, p. 36) afirma que a notícia deve “reunir interesse, importância, atualidade e veracidade”,
enquanto a reportagem é definida como uma notícia “que impõe ao jornalismo um avanço na
medida em que se realiza com a multiplicidade de versões, de ângulos, de indagações” (Ibid.
p. 50). Passemos a outro tipo de fonte.
No quadro a seguir destacamos definições extraídas de uma obra de referência oriunda do
próprio meio jornalístico o Manual da redação: Folha de S. Paulo produção de um dos
grandes jornais brasileiros a Folha de São Paulo criado em 1921 (PUBLIFOLHA, 2006):
65
QUADRO 5. Definições de notícia e reportagem
Definições:
NOTÍCIA
REPORTAGEM
Manual da redação:
Folha de S. Paulo
Relata a informação de
maneira mais objetiva
possível; raramente é
assinada (p. 72).
Puro registro dos fatos sem
opinião. A exatidão é o
elemento-chave da notícia,
mas vários fatos descritos
com exatidão podem ser
justapostos de maneira
tendenciosa. Suprimir ou
inserir uma informação no
texto pode alterar o
significado da notícia. Não
use desses expedientes (p.
88).
Tem por objetivo transmitir ao
leitor, de maneira ágil,
informações novas, objetivas
(que possam ser constatadas
por terceiros) e precisas sobre
fatos, personagens, idéias e
produtos relevantes. Para
tanto, elas se valem de
ganchos oriundos da realidade,
acrescidos de uma hipótese de
trabalho e de investigação
jornalística (p. 24).
Traz informações mais
detalhadas sobre as notícias,
interpretando os fatos; é
assinada quando tem
informação exclusiva ou se
destaca pelo estilo ou pela
análise (p. 72).
Contudo, com base nas informações apresentadas, a notícia é definida como um gênero
exclusivamente informativo, imparcial e objetivo. Quanto à reportagem, trata-se de uma
ampliação do gênero notícia, traz dados novos e detalhados sobre a notícia, apresenta uma
investigação crítica sobre o fato de forma mais objetiva possível (MARTINS FILHO, 1997;
PUBLIFOLHA, 2006).
De modo geral, “a notícia é o relato objetivo de um fato ou evento que, além de inédito,
deve despertar o interesse dos leitores” (LAGE, 2001, p. 50) e a reportagem constitui-se como
uma ampliação dela, fornecendo detalhes e contextualização àquilo que foi noticiado.
Enquanto uma refere-se ao momento presente, atual e imediato, a outra se refere ao
contemporâneo tendo um caráter mais atemporal.
Após passarmos por essas definições que buscam caracterizar tais gêneros jornalísticos,
chegamos aos elementos que indicam o conteúdo dizível a esses gêneros, embora muitas
definições aprofundem em aspectos que trataremos a seguir. Portanto, para dominar o gênero
notícia deve-se ter conhecimento que o conteúdo nele relatado diz respeito a fatos que sejam
atuais, verdadeiros, precisos e interessantes. Já no gênero reportagem, os fatos ou assuntos devem
66
ser contemporâneos de modo a ampliar informações sobre um fato conhecido, isto é, antes
noticiado.
No manual da Folha, são apresentados critérios para determinar a importância de textos
jornalísticos, sendo eles:
1) Ineditismo (a notícia inédita é mais importante do que a já publicada).
2) Improbabilidade (a notícia menos provável é mais importante do que a
esperada).
3) Interesse (quanto mais pessoas possam ter sua vida afetada pela notícia mais
importante ela é).
4) Apelo (quanto maior a curiosidade que a notícia possa despertar , mais
importante ela é).
5) Empatia (quanto mais pessoas puderem se identificar com o personagem e a
situação da notícia, mais importante ela é).
6) Proximidade (quanto maior a proximidade geográfica entre o fato gerador da
notícia e o leitor, mais importante ele é). (PUBLIFOLHA, 2006, p. 44)
Assim tais critérios refletem a influência do público-alvo esperado do jornal na produção
textual, ou seja, demonstram o quanto é imprescindível as condições de produção na
concretização e elaboração do gênero.
Barbosa (2001; 2002), enfocando os gêneros como objetos de ensino-aprendizagem,
realizou uma descrição e análise de um grande corpus constituído por exemplares do gênero
notícia de diferentes jornais (Folha de S. Paulo, Folha da Tarde, Notícias Populares, O Estado
de São Paulo, Jornal da Tarde, Diário Popular, O Globo e Jornal do Brasil) com fins de
elaboração e programações de materiais didáticos. Tal descrição e análise se deram no âmbito de
um curso de formação continuada de professores da rede pública de ensino por ela desenvolvido.
Aqui trataremos apenas de um dos segmentos do trabalho realizado pela autora.
A partir de leitura, estudo e discussão de obras didáticas, teóricas e de referência sobre a
notícia, foram realizadas descrições e análises do corpus com os objetivos: de apropriação do
gênero por parte dos professores do curso, e de sinalizar as principais características do gênero.
Assim, apresentaremos dois dos Quadros Sínteses elaborados pela autora que sintetizam as
características encontradas na análise dos textos (BARBOSA, 2001, p.185-186):
67
QUADROS 6. Descrição e análise do gênero notícia impressa
I. ESFERA DE ATIVIDADE/ESFERA DE COMUNICAÇÃO
A esfera imprensa é composta por uma série de empresas privadas que, como quaisquer outras, visam
o lucro. Grande parte dos ganhos de um jornal não advém diretamente de assinaturas ou da venda em
bancas, mas sim da publicidade. Dessa maneira, forma-se um circuito indireto: a notícia e demais
informações disponibilizadas pelos jornais buscam atrair os leitores pois, quanto maior for a tiragem
de um jornal, mais caro será seu espaço publicitário. Tal relação evidentemente estabelece uma
competição entre as empresas concorrentes. Além disso, a notícia pode ser vista como um capital, num
sentido mais ideológico e político da questão. O poder da informação estabelece relações complexas
com o poder econômico e com o poder político, que precisam ser consideradas, quando da leitura de
relatos dos fatos ocorridos nas notícias, por mais que as mesmas se pretendam, na grande maioria das
vezes, neutras. É preciso considerar que os jornais, além de serem um veículo de informação, são
também veículos formadores de opinião;
A instituição imprensa controla e manipula informações em escala industrial e mundial. Muito do
noticiário internacional é ditado para o mundo por algumas poucas agências de notícias localizadas em
países centrais.
A matéria jornalística, mesmo nos países que vivem sob o regime democrático, está sempre
sujeita a vários tipos de censuras internas e externas, determinadas por interesses econômicos e
políticos.
II. SITUAÇÃO DE PRODUÇÃO
a) Leitores múltiplos e desconhecidos (conhece-se apenas estatisticamente o perfil de leitor de um
determinado jornal) que, na sua grande maioria, procedem a uma leitura rápida, muitas vezes,
transversal do jornal;
b) Em alguns casos, o redator é desconhecido (algumas notícias não trazem seus signatários). Em
outros casos o redator aparece identificado. Ele obedece a uma diretriz geral editorial de um jornal. O
redator está subordinado ao editor que pode alterar a notícia, cortar partes, etc. Uma notícia é
freqüentemente reescrita, condensada, traduzida, enfim, submetida a critérios de edição;
c) Objeto acontecimentos ou fatos do mundo (implica num tipo de discurso mais referencial). Uma
notícia pretende-se afirmar como verdadeira;
d) O processo de escrita de uma notícia é, na grande maioria das vezes, extremamente rápido, dado que
os jornais têm uma periodicidade diária e buscam dar “notícias quentes” antes dos concorrentes ou de
forma mais completa do que esses.
e) Objetivo (declarado pelos jornais) informar os leitores, interessando-os pela matéria e fazendo-se
entender por eles, o mais neutramente possível e com a maior fidedignidade possível (compromisso
ético- jornalístico);
f) Suporte material da notícia jornal periódico diário perecível, de duração fugaz;
g) Sensacionalismo x imparcialidade: sensacionalismo coleta de informação a qualquer preço e de
qualquer maneira, muitas vezes, sem nenhum critério de apuração e organização dos fatos;
imparcialidade a busca do desenvolvimento de métodos de pesquisa para apuração e tratamento da
informação. Pode-se pensar que a distinção acima implica em dois tipos básicos de imprensa;
h) Imparcialidade: aspectos éticos e ideológicos envolvidos na seleção, coleta e divulgação de
informação. Por mais que se tenha uma intenção de se ser imparcial, uma imparcialidade total é
impossível, pois o redator tem que escolher como vai contar o fato, o que implica numa dada seleção
lexical, numa escolha do que se estabelece como tópico, etc.
i) Notícia - “matéria-prima” do jornal. Por mais que os jornais tenham diversificado suas sessões e
tenham incorporado e desenvolvido diferentes gêneros, a notícia ainda continua sendo a “matéria
prima” dos jornais. Grande parte dos leitores/consumidores de jornais compra esse periódico por causa
das notícias. Dessa forma, por essa óptica, a notícia pode ser considerada um bem de consumo;
j) A existência de diferentes tipos de jornal é determinada, dentre outros fatores, pelo público alvo que
se pretende atingir, o que implica em diferentes tratamentos à matéria jornalística. É muito comum
uma mesma empresa jornalística possuir mais de um tipo de jornal, buscando com isso atingir a
diferentes públicos.
III. CONTEÚDO TEMÁTICO DA NOTÍCIA
68
Do ponto de vista do conteúdo temático, a notícia pode ser vista como o relato de transformações,
deslocamentos ou enunciações observáveis no mundo e consideradas de interesse para o público.
Assim, as proposições essenciais da notícia dão conta de transformações (da ordem do fazer),
deslocamentos (da ordem do ir) ou enunciações (da ordem do dizer). O universo da notícia é as
aparências e não o conhecimento essencial ou teórico (objeto das ciências e afins), a não ser que se
necessite aplicar esses conhecimentos para explicar ou contextualizar fatos...
Os dados apresentados nos quadros revelam-nos que de fato o que é postulado nas obras
visitadas, em especial, nos manuais de referência elaborados pelos jornais, materializa-se nas
práticas sociais envolvendo o gênero notícia, sinalizando as dimensões ensináveis que devem
ser tematizadas nas atividades propostas nos livros didáticos a tal gênero de texto.
A seguir trataremos das características encontradas quanto à infra-estrutura geral da
notícia e da reportagem.
b) Infra-estrutura geral dos textos dos gêneros notícia e reportagem
A infra-estrutura é composta pelo plano geral, pelos tipos de discurso, pelas seqüências e
as outras formas de planificação mobilizadas em um texto. Como apresentamos cada um
desses elementos, realçaremos somente aqueles que compõem a infra-estrutura da notícia e da
reportagem.
O plano geral corresponde à organização configuracional do texto. Assim o plano geral da
notícia e da reportagem corresponde a: título, lide e corpo de texto, a saber:
a) Título: apresenta uma ntese do fato; busca atrair a atenção do leitor; deve conter
verbo, de preferência, na voz ativa e no presente, exceto quando o texto se referir a
fatos no futuro ou no passado; empregam-se siglas com comedimento;
b) Lide: corresponde ao primeiro parágrafo do texto, constitui-se das informações
principais, respondendo às questões: o que, quem, quando, onde, como e por quê;
c) Corpo: corresponde aos parágrafos seguintes ao lide, cujas informações podem ser
apresentadas: em ordem decrescente de importância, recurso chamado de pirâmide
invertida (predominante na notícia); ou em ordem de desenvolvimento cronológico,
constituindo pirâmide normal; ou ainda pode-se haver a combinação entre ambas as
pirâmides (normal e invertida) em que no primeiro parágrafo se apresenta o ângulo
mais atual e forte do acontecimento, seguido pela ordem cronológica dos fatos, sendo
69
as duas formas de organização mais comuns na reportagem (PUBLIFOLHA, 2006;
BAHIA, 1990).
No que diz respeito à extensão, a notícia configura-se como um texto sintético, menos
extenso, a reportagem, por buscar ampliar a visão do leitor sobre o fato noticiado, torna-se um
texto mais longo e denso.
Não dúvida que tanto a notícia quanto a reportagem constituem-se do tipo de discurso
narração. Esses gêneros textuais apresentam autonomia quanto ao ato de produção. Não
ocorrendo marcas lingüísticas dos participantes da interação, do tempo ou lugar da produção.
Porém uma forte referência temporal absoluta (em 2007, ontem, etc.), sendo constante a
presença de organizadores temporais (advérbios, sintagmas preposicionais, conjunções
coordenativas e subordinativas, etc.) que desloca o acontecimento a um tempo disjunto do
momento de interação, empregando-se o presente genérico ou o pretérito perfeito e apenas frases
declarativas.
Quanto a forma de planificação, ocorre a denominada script ou relato. O script ocorre em
textos da ordem do narrar em que a planificação apresenta grau zero, isto é, não ocorrem fases e
tensões, sendo os fatos ou acontecimentos dispostos em ordem cronológica como é o caso da
notícia e da reportagem.
Vejamos a seguir os mecanismos de textualização característicos desses dois gêneros
c) Mecanismos de textualização dos textos dos gêneros notícia e reportagem
Os mecanismos de textualização possibilitam a coerência temática e linear dos textos por
meio de mecanismos de conexão (organizadores textuais: conjunções coordenativas e
subordinativas, advérbios, etc.) e de coesão nominal (anáforas) e verbal (tempos verbais,
advérbios e grupos preposicionais).
Os gêneros notícia e reportagem são constituídos, como dissemos, pelo discurso
narração no qual um eixo de referência espaço-temporal interna por ser um tipo de discurso
autônomo e disjunto do ato de produção. Assim a coesão e conexão são marcadas nesses gêneros
por advérbios, locuções adverbiais, sintagmas preposicionais, conjunções coordenativas e
subordinativas, entre outros elementos, que atuam como organizadores temporais (em 2007,
ontem, etc.) e organizadores espaciais (na Argentina, no alto, etc.).
70
Passemos as características enunciativas apresentadas na notícia e na reportagem.
d) Mecanismos enunciativos dos textos dos gêneros notícia e reportagem
Os mecanismos enunciativos correspondem à distribuição das vozes e às marcas das
modalizações presentes nos textos, sendo o último nível de análise proposto por Bronckart (2003)
o qual já tratamos neste capítulo.
Nos gêneros notícia e reportagem busca-se alcançar a credibilidade, a objetividade e a
imparcialidade por meio de efeitos de sentidos propiciados pelo emprego de mecanismos
enunciativos.
O manual da Folha faz ressalvas a essas questões no verbete „objetividade‟ no qual é
reconhecido que “não existe objetividade em jornalismo,” pois “ao escolher um assunto, redigir
um texto e editá-lo, o jornalista toma decisões em larga escala subjetivas, influenciadas por suas
posições pessoais, hábitos e emoções.” Entretanto, isto não o exime de ser “o mais objetivo
possível” (PUBLIFOLHA, 2006, p. 46).
Portanto no jornalismo os termos objetividade e credibilidade se inter-relacionam, pois se
busca transmitir objetividade como forma de produzir o efeito da credibilidade e
conseqüentemente de veracidade por meio do uso de recursos lingüísticos como: a atribuição das
informações às fontes e o emprego de aspas para indicar a transcrição fidedigna das falas, que
agem como mecanismos enunciativos por dizerem respeito à distribuição e à forma de introdução
das vozes no texto; o uso da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se
(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva (sintética ou analítica) , agem como
mecanismos enunciativos para se apagar as marcas do narrador; e a ausência de adjetivos ou
expressões qualificativas, agem como mecanismos enunciativos para apagar as marcas modais
(avaliações, opiniões, julgamentos, etc.).
Em relação à imparcialidade jornalística, no manual da Folha é pontuado que a notícia
deve ser “puro registro dos fatos sem opinião,” contudo são realçadas as possibilidades de
manipulação tendenciosa do texto que devem ser evitadas como a seleção dos fatos que devem
ser apresentados ou silenciados, bem como a organização das informações de modo a direcionar a
interpretação do leitor (PUBLIFOLHA, 2006, p. 88).
71
Cavalcanti (2006) realizou uma pesquisa enfocando o discurso jornalístico e seus gêneros
na qual realiza análise de textos. A autora conclui, com base nos estudos da área da comunicação
e em sua análise de textos, que os gêneros notícia e reportagem apresentam grande proximidade
quanto às dimensões temática e composicional, mas é na dimensão referente ao estilo que
distinção.
Segundo Cavalcanti, a reportagem apresenta variação na forma composicional do texto,
ora iniciando pela síntese dos fatos, ora pela ordem cronológica, ora pela contextualização do
assunto, ora por interrogações. Tais variações correspondem à liberdade que o gênero propicia ao
autor, postuladas por Lage (2001) que caracteriza a notícia como um gênero mais sintético e de
forma rígida, a reportagem constitui-se em um gênero menos rígido que propicia um pouco de
liberdade ao repórter.
Porém, a possibilidade de maior liberdade não permite abrir mão dos recursos que
produzem o efeito de objetividade, do uso do tempo verbal presente e da terceira pessoa do
discurso. Entretanto, Cavalcanti concluiu que, quanto ao estilo, na reportagem a preocupação
com o apagamento das marcas do autor e das marcas modais é menor, emitindo-se
constantemente “indícios da subjetividade desse narrador, de suas avaliações, de seu ponto de
vista” (CAVALCANTI, 2006, p. 174).
A distinção entre notícia e reportagem é tarefa complexa até à comunidade jornalística
devido às tênues fronteiras que as diferenciam (Sodré e Ferrari Apud. BONINI, 2003). Tanto uma
quanto a outra, de forma geral, são consideradas como pertencentes à esfera informativa,
caracterizando-se como textos pautados na objetividade. Entretanto, para Lage (2001), a
reportagem se aproxima, mesmo que timidamente, da esfera opinativa por nela o jornalista ser
autorizado a dar um enfoque crítico aos fatos narrados, ou seja, o gênero possibilita transparecer
de modo moderado indícios de subjetividade por meio dos mecanismos enunciativos.
As obras didáticas, teóricas e de referência com as quais dialogamos nesta seção do
trabalho contribuíram imensamente para que chegássemos às características constitutivas dos
gêneros notícia e reportagem, principalmente o manual da Folha por oferecer um padrão preciso
à produção desses gêneros e ser um dos referenciais utilizados pelos autores de livros didáticos ao
tratar de gêneros jornalísticos, conforme as próprias citações dele apresentadas nos livros de
Português de Ensino Médio.
72
A seguir passaremos a tratar da construção de modelos didáticos para os gêneros em
questão.
2.6 Modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem
Tendo como base as obras visitadas e assumindo a perspectiva de algumas delas, traçamos
as características genéricas da notícia e da reportagem a fim de chegarmos às operações de
linguagem exigidas ao domínio (leitura, compreensão e produção) desses gêneros e às
capacidades de linguagem nelas mobilizadas. Construindo, dessa forma, um modelo didático para
o ensino de textos do gênero notícia e reportagem tal qual é proposto por Schneuwly e Dolz
(2004).
Em suma, foram levantadas as características referentes:
a) à situação de produção dos gêneros;
b) ao conteúdo esperado ou dizível aos gêneros;
c) à organização global dos gêneros;
d) aos mecanismos lingüísticos empregados nos gêneros e seus efeitos de sentido;
e) à manutenção de coesão e coerência dos gêneros;
f) às vozes implícitas e explícitas presentes nos gêneros e a forma de introduzi-las;
g) às marcas modais presentes nos gêneros.
A partir delas, levantamos as operações de linguagem implicadas e as respectivas
capacidades de ação, discursivas e lingüístico-discursivas mobilizadas ao domínio dos textos dos
gêneros notícia e reportagem.
O quadro teórico a seguir, inspirado no modelo didático de resumo elaborado por
Machado (Apud. FERREIRA, 2008, p. 26), apresenta a modelização do gênero notícia a que
chegamos:
73
QUADRO 7. Modelo didático do gênero notícia
O quadro teórico, a seguir, apresenta o modelo didático a que chegamos para o domínio
do gênero reportagem:
Capacidades de linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do gênero
notícia
Capacidades de ação
Situação de Produção (contextualização do gênero)
Levar em conta o suporte material em que veicula o
gênero e seu formato de circulação social;
Identificar e considerar o público-alvo esperado, o
lugar e o momento da produção;
Precisar a intenção da produção.
Conteúdo Temático
Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de
muitas pessoas, inéditos, improváveis de acontecer,
que possivelmente despertem a curiosidade ou que
haja identificação com o público-alvo;
Apresentar fatos atuais, verdadeiros e precisos.
Capacidades discursivas
Apresentação e organização global do gênero
Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero
(título, lide e corpo de texto);
Compreender a função de cada elemento estrutural;
Reconhecer e empregar o tipo de discurso
característico do gênero: discurso narração;
Selecionar e organizar previamente eventos;
Conhecer e empregar a planificação script ou
relato.
Capacidades lingüístico-discursivas
Mecanismos de textualização e mecanismos enunciativos e
seus efeitos de sentido
Empregar a modalidade da língua característica do
gênero: modalidade padrão;
Selecionar adequadamente o léxico;
Manter coerência e coesão;
Empregar organizadores temporais e espaciais
adequadamente;
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade (a atribuição das informações às fontes,
o emprego de aspas para indicar a transcrição
fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do
discurso, o emprego do pronome oblíquo -se
(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da
voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as
marcas do autor; e a ausência de adjetivos ou
expressões qualificativas para se apagar as marcas
modais (avaliações, julgamentos, etc.));
Identificar e empregar vozes implícitas.
74
QUADRO 8. Modelo didático do gênero reportagem
Capacidades de linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do gênero
reportagem
Capacidades de ação
Situação de Produção (contextualização do gênero)
Levar em conta o suporte material em que veicula o
gênero e seu formato de circulação social;
Identificar e considerar o público-alvo esperado, o
lugar e o momento da produção;
Precisar a intenção da produção.
Conteúdo Temático
Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de
muitas pessoas, improváveis de acontecer, que
possivelmente despertem a curiosidade ou que haja
identificação com o público-alvo;
Apresentar fatos contemporâneos, verdadeiros e
precisos;
Ampliar relato de fato já noticiado.
Capacidades discursivas
Apresentação e organização global do gênero
Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero
(título, lide e corpo de texto) ou suas
possibilidades de estruturação;
Compreender que a estruturação da reportagem é
menos rígida do que a da notícia;
Compreender a função de cada elemento estrutural;
Reconhecer os acompanhantes do gênero: gráficos,
quadros, fotos e legendas;
Reconhecer e empregar o tipo de discurso
característico do gênero: discurso narração;
Selecionar previamente eventos;
Conhecer e empregar planificação script ou relato.
Capacidades lingüístico-discursivas
Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos e seus
efeitos de sentido
Empregar a modalidade da língua característica do
gênero: modalidade padrão;
Selecionar adequadamente o léxico;
Manter coerência e coesão;
Empregar organizadores temporais e espaciais
adequadamente;
Identificar o papel argumentativo de certos
conectivos (já que, se, por outro lado, etc);
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade (a atribuição das informações às fontes,
o emprego de aspas para indicar a transcrição
fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do
discurso, o emprego do pronome oblíquo -se
(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da
voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as
marcas do autor; e a ausência de adjetivos ou
expressões qualificativas para se apagar as marcas
modais (avaliações, julgamentos, etc.));
Identificar e empregar vozes implícitas.
75
Assim, tais quadros teóricos guiarão nossa análise das atividades propostas ao ensino dos
gêneros notícia e reportagem e suas implicações no desenvolvimento de capacidades da
linguagem nos livros didáticos de Português de Ensino Médio, recomendados pelo PNLEM/2009.
76
Capítulo 3
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este capítulo apresenta os aspectos metodológicos de nossa pesquisa. Iniciaremos pela
apresentação dos critérios para seleção do corpus de análise que é constituído por 4 coleções
recomendadas pelo PNLEM/2009, em seguida apresentaremos os critérios e as etapas de nossa
análise.
3.1 A seleção do corpus
Este trabalho busca analisar as atividades didáticas propostas ao ensino dos gêneros
notícia e reportagem e suas implicações para o desenvolvimento de capacidades de linguagem
dos alunos em livros didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio, aprovados pelo
PNLEM/2009. Optamos por esta etapa da educação porque há uma demanda por pesquisas que a
enfoque. Como uma das finalidades do Ensino Médio, segundo os documentos oficiais da
educação brasileira, é a formação crítica do aluno, decidimos analisar as propostas de ensino de
língua centradas em gêneros da esfera jornalística por pensarmos que o trabalho com estes
gêneros permitem reflexões críticas diante de fatos sociais e políticos.
Entretanto, a esfera jornalística é constituída por uma grande variedade de gêneros:
notícia, reportagem, editorial, artigo de opinião, crônica jornalística, entrevista, entre outros.
Seria inviável, devido ao tempo, analisarmos todos esses gêneros, então optamos por centrar
nosso trabalho em dois dos gêneros jornalísticos que, segundo Bueno (2002), são os que mais
veiculam nos livros didáticos: a notícia e a reportagem.
A fim de selecionarmos as coleções didáticas que seriam nosso objeto de investigação
realizamos a leitura do Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio de
Língua Portuguesa (PNLEM) de 2005 e 2009. Ambos apresentam os mesmos princípios
pedagógicos e critérios para avaliação das obras. Após a leitura das resenhas dos livros e de
posse das 11 coleções indicadas pelo PNLEM/2009, selecionamos nosso corpus de análise por
meio dos seguintes critérios:
77
livros didáticos de Português que dedicassem capítulos, unidades ou módulos ao ensino
dos gêneros notícia e/ou reportagem, tendo-os como textos principais; ou
livros didáticos de Português que dedicassem capítulos, unidades ou módulos ao estudo
do jornal ou da imprensa e que neles enfocassem o ensino dos gêneros notícia e/ou
reportagem.
Dessa forma, excluímos os livros didáticos que tratavam desses gêneros de modo
desarticulado com o assunto dos capítulos, unidades ou módulos, portanto selecionamos as obras
que se dedicassem ao estudo da esfera de comunicação da notícia e da reportagem e ao ensino
desses gêneros. Assim, chegamos a 4 livros didáticos, que foram indicados pelo PNLEM de
2005 e 2009:
QUADRO 9. Corpus de análise
Nome da coleção
Designações
usadas na
análise
Autores
Capítulos que tratam dos
gêneros
Notícia e/ou Reportagem
Português: linguagens
Livro1
(PL)
Thereza Cochar Magalhães
William Roberto Cereja
(Ed. Atual)
Capítulo 27. A Notícia
Capítulo 33. A Reportagem
Português: língua e
cultura
Livro 2
(PLC)
Carlos Alberto Faraco
(Ed. Base)
Capítulo 14. Texto Informativo:
A Notícia
Capítulo 15. Texto Informativo:
A Reportagem
Língua Portuguesa
Livro 3
(LP)
Heloisa Harue Takazaki
(Ed. IBEP)
Capítulo 9. Imprensa
Língua Portuguesa:
Projeto Escola e
Cidadania para todos
Livro 4
(PEC)
Harry Vieira Lopes
Zuleia de Felice Murrie
Jeosafá Fernandez Gonçalves
Simone Gonçalves da Silva
(Ed. Brasil)
Capítulo 26. É da hora! É do dia!
A seguir apresentaremos os critérios de análise dessa pesquisa, cujo cunho é qualitativo,
na qual há a preocupação em analisar cada uma das obras selecionadas de modo amplo e
coerente com o referencial teórico adotado.
78
3.2 Critérios de análise
Tendo como base o referencial teórico do ISD, em especial aos estudos de gêneros e suas
aplicações didáticas realizados por Schneuwly e Dolz (2004), buscamos verificar se as atividades
propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem trabalham com:
a) a situação de produção (implicando no desenvolvimento de capacidades de ação do
aluno);
h) o conteúdo esperado ou dizível (implicando no desenvolvimento de capacidades de
ação do aluno);
b) a organização textual (implicando no desenvolvimento de capacidades discursivas do
aluno);
c) os mecanismos lingüísticos empregados e seus efeitos de sentido (implicando no
desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do aluno).
Para tanto, recorreremos aos quadros teóricos, apresentados no capítulo 2 deste trabalho,
que trazem as modelizações dos gêneros em questão, os quais foram elaborados a fim de orientar
nossa análise dos livros didáticos selecionados. Tais quadros trazem as operações de linguagem
exigidas ao domínio dos gêneros de texto notícia e reportagem e as respectivas capacidades de
linguagem nelas mobilizadas.
Dessa forma, crê-se possível a realização de uma análise ampla das atividades didáticas
propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem nos livros de Português, na qual serão
verificadas se é propiciado o desenvolvimento das capacidades de linguagem dos alunos
necessárias ao domínio de tais gêneros de texto.
A seguir apresentaremos como se organizará o processo de análise do corpus.
3.3 Etapas de análise
Realizaremos a análise das 4 coleções que compõem o corpus deste trabalho, tendo como
base os critérios descritos. Primeiramente, dedicar-nos-emos à descrição de cada uma das obras
79
como um todo, apresentando também como elas são descritas nas resenhas dos catálogos do
PNLEM/2005 e 2009, para então nos aprofundarmos na descrição dos capítulos que se dedicam
ao ensino dos gêneros notícia e reportagem.
Em cada um desses capítulos, descreveremos sua organização e analisaremos:
a) o texto principal apresentado (além de outros se houver);
b) as atividades didáticas propostas;
c) as orientações e perspectivas teóricas apresentadas no manual do professor em
relação aos gêneros.
Tais análises, orientadas pelos quadros teóricos de modelização da notícia e da
reportagem por nós construídos, com base nos postulados teórico-didáticos de Schneuwly e Dolz
(2004), objetivam verificar se: a situação de produção, o conteúdo dizível, a organização textual,
os mecanismos lingüísticos empregados e seus efeitos de sentido o, de algum modo,
trabalhados no ensino desses gêneros nos livros de Língua Portuguesa selecionados.
Por meio das análises, buscamos responder se as propostas de ensino encontradas nos
livros de nosso corpus podem levar o aluno a desenvolver capacidades de linguagem exigidas ao
domínio de textos dos gêneros notícia e reportagem. Assim, pensamos contribuir com uma
discussão sobre o ensino de língua materna centrado no estudo de gêneros textuais.
80
Capítulo 4
RESULTADOS DA ANÁLISE
Neste capítulo, faremos a exposição dos resultados da análise dos livros didáticos de
Língua Portuguesa de Ensino Médio, indicados pelo PNLDEM/2009, que compõem o corpus
desta pesquisa. Iniciaremos pela apresentação geral da estrutura dos livros e os gêneros textuais
neles trabalhados. Em seqüência, trataremos da maneira como o jornal vem sendo abordado no
livro didático atual para então aprofundarmos na análise das atividades propostas ao ensino dos
gêneros reportagem e notícia e as respectivas capacidades de linguagem nelas mobilizadas.
4.1. Apresentação do livro didático de Ensino Médio
Neste momento, apresentaremos a organização de cada uma das 4 obras que compõem o
corpus desta pesquisa a fim de contextualizarmos os capítulos os quais analisaremos e mostrar
como os livros didáticos de Português vêm sendo estruturados na contemporaneidade.
Designaremos os livros didáticos no decorrer da análise da seguinte maneira:
Livro 1 (PL): Português: Linguagens;
Livro 2 (PLC): Português: língua e cultura;
Livro 3 (LP): Língua Portuguesa;
Livro 4 (PEC): Língua Portuguesa Projeto Escola e Cidadania para todos.
O livro 1 (PL), Português: Linguagens, de William Roberto Cereja e Thereza Cochar
Magalhães da editora Atual/Saraiva (2005) é obra aprovada tanto no PNLEM de 2005 quanto no
de 2009, entretanto naquele é apresentada a versão em volume único e neste a versão organizada
em 3 volumes, sendo uma para cada série do Ensino Médio. Será nosso objeto de estudo o
volume 2 por serem nele abordados os gêneros notícia e reportagem, especificamente o exemplar
do professor que contêm respostas aos exercícios e orientações pedagógicas.
81
A obra, que apresenta projeto gráfico atraente e modernos, segundo o catálogo do
PNLEM/2009, é organizada em 4 unidades sendo o fio condutor destas unidades e da obra como
um todo a literatura que é abordada de modo tradicional: em ordem cronológica, apresentando o
contexto histórico e as características dos movimentos literários, os autores consagrados e alguns
textos para leitura e estudo. Cada uma das unidades são constituídas por em média 12 capítulos,
totalizando 48 capítulos que são sistematicamente organizados nos seguintes tópicos: Literatura,
Produção de texto e Língua: uso e reflexão.
No catálogo do PNLEM/2009 de Língua Portuguesa, o tratamento dado nesse livro à
literatura e à produção de texto é elogiado. Enfatiza-se a variada seleção textual que compõe a
obra como um todo e destaca-se o tratamento dado aos gêneros nos capítulos de Produção de
texto:
O trabalho sistemático com os gêneros textuais tem um saldo muito
positivo na obra. Em primeiro lugar, cria as condições ideais para a
produção, sugerindo inúmeras situações-problema que contribuem para a
formação do aluno como ator social. Em segundo lugar, por ter em vista
um leitor, o aluno se conscientiza da necessidade de adequar seu texto (a)
ao gênero envolvido, (b) à situação comunicativa e (c) à variedade
lingüística que melhor atenda suas necessidades de expressão. Além
disso, o trabalho com os gêneros tem a vantagem de colocar o aluno em
contato com textos que ele efetivamente terá de produzir em situações
concretas de interação. (BRASIL/SEMTEC, 2008, p. 27)
Nosso propósito é analisar profundamente se tais adequações pontuadas no catálogo do
PNLEM/2009 de fato ocorrem no tratamento didático proposto ao estudo dos gêneros notícia e
reportagem nesta obra.
Se os tópicos Literatura e Produção de texto são elogiados, o mesmo não ocorre em
Língua: uso e reflexão. Segundo o catálogo do PNLEM/2009, não reflexão sobre o uso da
língua, mas sim o ensino de gramática prescritiva sob esse título oriundo das recentes teorias
lingüísticas, assim a obra não cumpre a expectativa do título do tópico.
ainda outras seções que constituem o livro. No início de cada unidade é apresentada a
seção Fique ligado!Pesquise! em que são apresentados filmes, livros, músicas, sites, obras de
arte, relacionados ao assunto literário da unidade com o objetivo de ampliar o conhecimento do
aluno sobre os fatos estudados e relacioná-los a atualidade, propiciando a ampliação do universo
cultural do aluno. Entre uma unidade e outra uma seção chamada Intervalo na qual são
82
propostos projetos e trabalhos de pesquisa com temas variados e multidisciplinares. ainda a
seção Em dia com o Vestibular e que é apresentada ao término de algumas unidades, trazendo
uma bateria de exercícios aplicados nesses exames.
No manual do professor apresenta-se a descrição das seções do livro, sugerem-se leituras
extraclasse com roteiros de leitura e explicitam-se as escolhas teórico-metodológicas que
permeiam o livro 1 (PL).
Com o quadro a seguir, buscamos traçar o panorama geral desse livro, trazendo as 4
unidades que o compõem e todos os capítulos em suas respectivas seções.
83
QUADRO 10. Livro 1: estruturação da obra
LIVRO 1 (PL)
Seções/
Unidades
LITERATURA
PRODUÇÃO DE TEXTO
LÍNGUA: USO E
REFLEXÃO
Unidade 1
História social do
Romantismo A poesia
Capítulo 1. A linguagem do
Romantismo
Capítulo 2. Do texto ao contexto
do Romantismo
Capítulo 5. A literatura em
portugal
Capítulo 7. O Romantismo no
Brasil: primeira geração
Capítulo 10. O ultra-romantismo
Capítulo 12. O condoreirismo
Capítulo 13. Diálogos com a
poesia romântica
Capítulo 3. O cartaz
Capítulo 9. A mesa-redonda
Capítulo 4. O substantivo
Capítulo 6. O adjetivo
Capítulo 8. O artigo e o
numeral
Capítulo 11. O pronome
Em dia com o vestibular
Intervalo: Projeto O Romantismo em revista
Unidade 2
O romantismo A prosa
Capítulo 14. O romance
romântico e a identidade
nacional o romance
indianista
Capítulo 17. O romance
regional
Capítulo 20. O romance
urbano
Capítulo 22. A prosa gótica
Capítulo 23. Diálogos com a
poesia romântica
Capítulo 15. O conto (I)
Capítulo 18. O conto (II)
Capítulo 16. O verbo
Capítulo 19. O advérbio
Capítulo 21. Termos
relacionais: a preposição e a
conjunção
Capítulo 24. A interjeição
Em dia com o vestibular
Intervalo: Projeto Do sarau à taverna: o Romantismo e o Ultra-Romantismo
Unidade 3
História social do
Realismo, do Naturalismo
e do Parnasianismo
Capítulo 25. A linguagem do
realismo, do naturalismo e do
Parnasianismo
Capítulo 26. Do texto ao
contexto realista
Capítulo 29. O Realismo em
Portugal.
Capítulo 32. O Realismo e o
Naturalismo no Brasil
Capítulo 35. O Parnasianismo
no Brasil
Capítulo 36. Diálogos com o
Realismo e o Naturalismo
Capítulo 27. A notícia
Capítulo 30. A entrevista
Capítulo 33. A reportagem
Capítulo 28. O modelo
morfossintático o sujeito e
o predicado
Capítulo 31. Termos ligados
ao verbo: objeto direto,
objeto indireto, adjunto
adverbial
Capítulo 34. O predicado
tipos de predicado
Em dia com o vestibular
Intervalo: Projeto a época do Realismo-Naturalismo
Unidade 4
História social do
Simbolismo
Capítulo 37. A linguagem do
Simbolismo
Capítulo 38. Do texto ao
contexto do Simbolismo
Capítulo 39. O Simbolismo em
Portugal
Capítulo 42. O Simbolismo no
Brasil
Capítulo 45. O teatro brasileiro
no século XIX
Capítulo 48. Diálogo com o
Simbolismo
Capítulo 40. O anúncio
publicitário
Capítulo 43. A crítica
Capítulo 46. O editorial
Capítulo 41. Tipos de sujeito
Capítulo 44. Termos ligados
ao nome: adjunto adnominal
e complemento nominal
Capítulo 47. Termos ligados
ao nome: aposto e vocativo
Em dia com o vestibular
Intervalo: Projeto A arte, a ciência e a filosofia no século XIX
50%
21%
29%
84
Como o quadro anterior ilustra, 50% da obra (24 capítulos) é destinada ao estudo de
literatura, 21% (10 capítulos) volta-se à produção de texto e 29% (14 capítulos) enfoca-se o
estudo da língua, portanto há grande ênfase ao estudo literário. A divisão da obra nestes 3
tópicos, que também aparecerão em outras obras, reflete a tendência à fragmentação do ensino de
língua que se opera na atualidade nas práticas de sala de aula, como afirmam Mendonça e Bunzen
(2007).
Os gêneros notícia e reportagem são trabalhados na unidade 3, História social do Realismo,
do Naturalismo e do Parnasianismo, possivelmente por serem textos relacionados à realidade,
assim como o movimento Realista.
Passaremos a apresentação do livro 2 (PLC), Português: língua e cultura, de Carlos
Alberto Faraco da editora Base (2003), volume único, é obra aprovada e indicada no catálogo do
PNLEM de 2005 e 2009. É um livro voltado a formação de leitores críticos, apresentando uma
grande variedade textual, conforme o catálogo do PNLEM/2009.
Vejamos a apresentação da obra realizada pelo próprio autor, Carlos Alberto Faraco,
presente no site da editora
7
:
Prezado/a colega professor/a de Português:
...O livro reúne um grande número de textos ligados a diversos gêneros do
discurso. Penso que devemos oferecer a nossos alunos a oportunidade de
se familiarizarem com a diversidade de textos e gêneros que circulam em
nossa sociedade. É esse material que os fundamentos do trabalho de
leitura e escrita proposto no livro.
Ao mesmo tempo, não descuidei da gramática. Nossos alunos precisam
aprender a pensar como a ngua funciona. Desenvolvi, de forma bastante
inovadora, unidades para o estudo da morfologia e sintaxe do português.
Inclui também uma ampla reflexão sobre as variedades da nossa língua
com dois objetivos: (a) fornecer subsídios para sustentar nossa luta contra
o preconceito lingüístico; e (b) dar base sólida para organizar o ensino da
norma culta.
Por fim, dediquei especial atenção ao estudo da literatura [...] um aspecto
inovador deste livro é a apresentação da literatura africana de expressão
portuguesa. É a primeira obra a fazer isso no Brasil...
Na apresentação do autor, podemos notar a ênfase aos aspectos inovadores da obra, fato
que reflete a dimensão mercadológica do livro didático o qual precisa ser „consumido‟. Assim o
autor recorre à inovação de seu livro para conquistar o público-alvo, os professores de Português.
4
Informações disponíveis em: http://www.baseeditora.com.br. Acesso em agosto de 2008.
85
Entretanto, busca deixar claro que não se descuidou dos conteúdos tradicionais de Língua
Portuguesa. Ao analisarmos o livro, apreendemos que a apresentação do autor corresponde ao
que é proposto na obra. A abordagem transita entre elementos inovadores e tradicionais no ensino
de língua.
O livro é original na forma de organizar o conteúdo, dispondo os seus 35 capítulos em
blocos denominados de: Textos, Enciclopédia da linguagem, Almanaque gramatical, Guia
normativo e História da literatura.
No catálogo do PNLEM/2009, é afirmado que a obra permite que o professor organize seu
uso de acordo com seu planejamento do curso, entretanto os capítulos do livro buscam uma
relação entre si, um remetendo ao outro.
As seções dos capítulos são longas e organizam-se em torno de, em média, dois textos
principais, além de outros que se relacionam de algum modo com eles, seja pela forma ou pelo
conteúdo. Os tópicos que estruturam as seções são: Leitura, Prática escrita, De olho na língua,
Observando aspectos gramaticais, Leitura lúdica, Leitura complementar e Pausa poética, os
quais variam de um capítulo a outro de acordo com o conteúdo estudado.
Vejamos os capítulos que compõem cada uma das seções do livro:
86
QUADRO 11. Livro 2: estruturação da obra
LIVRO 2 (PLC)
TEXTOS
ENCICLOPÉDIA DA
LIGUAGEM
ALMANAQUE
GRAMATICAL
GUIA NORMATIVO
HISTÓRIA DA
LITERATURA
Capítulo 1. Histórias
que a vida conta 1.
Comentários sobre a
crônica
Capítulo 2. Histórias
que a vida conta 2
(crônicas em verso)
Capítulo 3. Histórias
que a nossa
imaginação cria 1
(narrativa)
Capítulo 4. Histórias
que a nossa
imaginação cria 2
(conto em versos)
Capítulo 5. Narrativas
curtas e longas
Capítulo 6. Trilhando
os caminhos do texto
poético 1
Capítulo 7. Trilhando
os caminhos do texto
poético 2
Capítulo 13.
Folheando um jornal:
textos em profusão
Capítulo 14. Texto
informativo: a
notícia
Capítulo 15. Texto
informativo:
reportagem
Capítulo 16.
Narrativas longas: um
plano de leitura
Capítulo 17.
Entrevistas: lidando
com a palavra do
outro
Capítulo 24. Um
tema: vários textos
Capítulo 25. Textos
de opinião: editoriais
Capítulo 26. Um
tema: muitas opiniões
Capítulo 27. Ainda o
texto de opinião
Capítulo 28. O texto
publicitário
Capítulo 8.
Linguagem e
linguagens
Capítulo 9. A origem
da linguagem
Capítulo 10. A
complexidade das
línguas
Capítulo 11. A
flexibilidade das
línguas
Capítulo 12. A
variação lingüística
Capítulo 18.
Palavras, palavras,
palavras: o léxico da
língua
Capítulo 19.
Classificando as
palavras
Capítulo 20.
Construindo
sentenças simples:
um pouco de sintaxe
Capítulo 21.
Construindo
sentenças complexas
Capítulo 22.
Tópicos da língua
padrão
(concordância
verbal/verbos
irregulares)
Capítulo 23.
Tópicos da língua
padrão /regência
verbal/ uso dos
pronomes)
Capítulo 29.
História da literatura
brasileira: período
colonial
Capítulo 30.
História da literatura
brasileira: século
XIX
Capítulo 31.
História da literatura
brasileira: século
XX
Capítulo 32. A
literatura em
Portugal: inícios
Capítulo 33. A
literatura em
Portugal: do
renascimento ao
romantismo
Capítulo 34. A
literatura em
Portugal: os séculos
XIX e XX
Capítulo 35.
Literatura africana
em língua
portuguesa
49%
14%
11%
6%
20%
87
Como o quadro anterior ilustra, o enfoque principal é dado ao estudo de Textos
correspondendo a 49% da obra (17 capítulos), nesses capítulos trabalha-se o estudo de gêneros
variados como: crônica, conto, poema, notícia, reportagem, entrevista, editorial, dissertação e
anúncio publicitário; 20% é destinado à História da literatura (7 capítulos), apresenta-se o
contexto histórico e os autores consagrados da literatura brasileira, portuguesa e africana
respectivamente; 14% à Enciclopédia da linguagem (5 capítulos), nos quais se enfoca a origem,
complexidade e flexibilidade da linguagem e a variação lingüística do Português; 11% ao
Almanaque gramatical (4 capítulos), em que se trata da formação e das classes de palavras, além
da construção de sentenças; e 6% ao Guia normativo (2 capítulos), trabalha-se a concordância e a
regência verbal e nominal da língua padrão.
A abordagem dada ao ensino de Língua Portuguesa ora se aproxima das teorias de texto e
discurso recentes (capítulos de Textos e Enciclopédia da linguagem) ora se aproxima do ensino
tradicional centrado na gramática normativa (capítulos de Almanaque gramatical e Guia
normativo).
Passaremos então ao livro 3 (LP), Língua Portuguesa, de Heloísa Harue Takazaki,
editora IBEP (2005), volume único. O ensino de língua nesse livro é centrado no texto, como
propõe os PCN. Tal obra constitui-se de 24 capítulos adicionados de duas sínteses finais:
Questões de estilo, em que se abordam os movimentos literários de forma breve e concisa, e
Lingüística e gramática, em que se trata de concepções de linguagem e de gramática, além de
quadros sinópticos de picos gramaticais. No livro do professor é afirmado que tais sínteses têm
o objetivo de servir como material de consulta ao aluno, entretanto são nesses dois únicos
capítulos em que os movimentos literários e os conhecimentos gramaticais são sistematizados.
O livro 3 (LP) se propõe ao estudo da linguagem verbal, dos textos e da inter-relação entre
as diversas linguagens que permeiam o meio social, sem compromisso com a cronologia histórica
da literatura e com sistematização gramatical, segundo as informações contidas em seu manual
do professor.
Os capítulos se organizam, de forma geral, em torno de dois ou três textos. No interior de
cada um dos capítulos, as seções variam de acordo com o conteúdo estudado, sendo elas: Ponto
de partida, em que é apresentado o texto principal do capítulo; Estudo do texto, Reflexões e
Troque idéias, seções dedicadas à análise e reflexão sobre os textos propostos; Para confrontar,
em que textos, geralmente, que se opõem às idéias do texto principal; Para pesquisar, em que
88
são apresentadas propostas de ampliação do conteúdo estudado; e Produção de texto, seção em
que se propõe a produção do gênero ensinado no capítulo.
O livro 3 (LP), no catálogo do PNLEM/2009, é elogiado pela variada seleção textual, em
especial, aos textos literários e jornalísticos, entretanto é apontado que o trabalho com
conhecimentos lingüísticos são generalizantes, induzindo a erros, sendo este o ponto mais frágil
da obra. No quadro a seguir, apresentaremos sua estruturação geral:
QUADRO 12. Livro 3: estruturação da obra
Como o quadro ilustra, o livro 3 não apresenta explicitamente os capítulos agrupados em
módulos ou unidade de acordo com a tradicional divisão: literatura, língua e texto, entretanto, de
acordo com os títulos e com a análise de cada capítulo, foi possível apreender que os conteúdos
são estruturados de forma fragmentada subjacente a tal divisão, sendo 10 dos capítulos, ou seja,
41% deles dedicados ao ensino de gêneros (capítulos 5, 9, 10, 11, 12, 16, 17, 19, 20 e 23), sendo
7 deles voltados à literatura, correspondendo a 29,5% (capítulos 2, 4, 11, 14, 15, 21 e 22) e os
outros 7 restantes voltados ao ensino da língua (29,5%).
LÍVRO 3 (LP)
Capítulo 1. Língua
Capítulo 2. Literatura
Capítulo 3. Diversidade textual
Capítulo 4. Poesia e Trovadorismo
Capítulo 5. Teatro
Capítulo 7. Explicando o mundo
Capítulo 8. Textos que “devoram” textos
Capítulo 9. Imprensa
Capítulo 10. Discurso político-religioso
Capítulo 11. Sátira e deboche
Capítulo 12. Fala e escrita
Capítulo 13. Variedade da Língua Portuguesa
Capítulo 14. Literatura e história
Capítulo 15. Os clássicos
Capítulo 16. Resenhas
Capítulo 17. Mito e ciência
Capítulo 18. Lingüística
Capítulo 19. Poesia
Capítulo 20. Burocracia e trabalho
Capítulo 21. Semana da Arte Moderna
Capítulo 22. Regionalismo
Capítulo 23. Contar histórias
Capítulo 24. Descrição
Questões de estilo
Lingüística e gramática
89
O livro 4 (PEC), Língua Portuguesa Projeto Escola e Cidadania para todos, de Harry
Vieira Lopes, Zuleia de Felice Murrie, Jeosafá Fernandez Gonçalves e Simone Gonçalves da
Silva, editora do Brasil (2004), constitui-se de uma obra volume único, recomendada no PNLEM
de 2005 e 2009, de caráter inovadora tanto na abordagem quanto no aspecto gráfico.
Tal livro é constituído de 30 módulos, subdivididos em áreas temáticas: reflexões sobre
aspectos lingüísticos (oito módulos), conhecimentos literários (sete módulos), narrativas literárias
(seis módulos), textos pragmáticos (nove módulos). Nele é apresentada uma abordagem voltada à
interdisciplinaridade.
Cada módulo é constituído de forma a desenvolver diferentes aspectos sobre um mesmo
tema, a partir de um texto principal, que se articula a textos de outros gêneros, estando presente
na obra uma grande variedade textual. Não seguindo uma ordem preestabelecida, a obra propicia
que a aplicação seja definida pelo professor, segundo o planejamento curricular traçado tanto por
ele quanto pelo projeto pedagógico da escola, no intento de formar um aluno crítico e
participante.
A distribuição interna das seções, em cada módulo, não segue a divisão: leitura, produção
de textos, conhecimentos lingüísticos e conhecimentos literários, tanto em termos da
apresentação do conteúdo quanto da proposição de atividades. Ao contrário, o livro 4 se organiza
dinamicamente de forma a propiciar ao aluno uma experiência ampla sobre o tema que lhe é
didaticamente proposto. Vejamos o quadro a seguir no qual buscamos traçar sua estrutura geral:
90
QUADRO 13. Livro 4: estruturação da obra
Como o quadro anterior ilustra, o livro 4 (PEC) enfatiza o trabalho em torno de gêneros
textuais, dedicando 50% da obra a seu estudo. Seus módulos se organizam no livro na ordem que
os apresentamos no quadro: primeiramente os voltados ao ensino de aspectos lingüísticos (27%),
seguidos pelos módulos literários (23%) e aqueles voltados aos textos literários e aos textos
pragmáticos (50%). Alguns módulos tratam do estudo de vários gêneros, por exemplo, o Kit de
sobrevivência na escola trabalha com variados gêneros textuais escolares como ficha de leitura, a
aula expositiva, o resumo, a palestra, o seminário, o quadro sinóptico, com vistas a que o aluno
organize seus estudos. O módulo Projeto de pesquisa escolar prepara o estudante ao domínio
desse gênero que o acompanhará na vida acadêmica. O Burocracia: você odeia, mas não vive sem
enfatiza o ensino de gêneros tais como: currículo, ficha catalográfica, formulário, cheque,
cadastro, lei, memorando, correspondências internas, protocolo. O módulo Dois dedos de prosa...
tecnocientífica trata dos diferentes tipos de linguagem por meio do estudo de gêneros
LIVRO 4 (PEC)
Aspectos lingüísticos
Conhecimentos literários
Textos literários e pragmáticos
Liberdade é poder se
expressar
Você sabe gramática?
Ortografia: maquiagem da
língua escrita.
Fala e escrita: a maravilha
da linguagem
Armadilhas gramaticais
Falando de textos:
coerência.
Falando de textos: coesão.
Nomenclatura gramatical
brasileira.
Classificar é conhecer.
Lutar com palavras é a
luta mais vã.
Literatura: estudo do
termo.
Por oceanos da literatura.
Entre a fantasia e a
realidade.
Um mundo sem
fronteiras.
me interessa o que não
é meu.
A poesia nossa de cada dia.
Os tempos sempre foram de
crônica.
Romance: sempre perto de
você.
Quem conta um conto
aumenta um ponto.
Enveredando-se pela trama da
novela.
Quebre a perna! O teatro em
cena.
Pombo-correio, voa depressa.
Kit de sobrevivência na
escola.
Burocracia: você odeia, mas
não vive sem.
Dois dedos de prosa...
tecnocientífica.
É da hora! É do dia!
A alma do negócio.
Projeto de pesquisa escolar.
Se estou sem referências,
estou perdido.
Linguagem e poder: o texto
legal.
27%
23%
50%
91
tecnocientíficos como rmulas científicas e tabela periódica. Realçamos o conteúdo desses 3
módulos por enfocarem gêneros pouco freqüentes em livros didáticos.
Em suma, o quadro a seguir mostrará a estruturação geral de cada um dos livros que
constituem nosso corpus de análise:
QUADRO 14. Porcentagem dos capítulos dedicados ao ensino de gêneros
Livros analisados
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
Capítulos/Módulos
48
35
24
30
Capítulos/Módulos dedicados ao
ensino de gêneros
10
(21%)
17
(49%)
10
(42%)
15
(50%)
O livro 4, como sinaliza o quadro, é a obra que mais dedica capítulos ao ensino de gêneros
textuais. A seguir, apresentaremos quais gêneros são selecionados como objetos de ensino nos
livros didáticos de Português analisados.
4.2 Os gêneros textuais no livro didático de Ensino Médio
Como nosso trabalho é voltado à análise de atividades propostas ao ensino de gêneros
textuais e de suas implicações no desenvolvimento de capacidade de linguagem em livros
didáticos de Português de Ensino Médio, apontaremos quais gêneros vêm sendo tratados nos
livros analisados.
Iniciaremos a exposição pelo tratamento dado aos gêneros textuais no livro 1 (PL). Devido
ao fato de o ensino de gêneros ocorrer nos capítulos de Produção de texto nesta obra,
apresentaremos sua constituição. Os capítulos de Produção de texto são estruturados em 3
segmentos: Trabalhando o gênero, Produzindo o gênero e Para falar/escrever com.... O trabalho
é iniciado pela leitura de um texto do gênero a ser enfocado, observando aspectos da linguagem,
do conteúdo e da estrutura do texto, seguidamente é proposto que o aluno coloque em prática o
que aprendeu, produzindo um texto com as características do gênero estudado.
92
Por meio da apresentação do trabalho didático voltado ao ensino de gêneros contida no
manual do professor do livro 1, é possível apreender que os autores dispõem de embasamento
teórico coerente com as propostas contemporâneas de ensino de língua presentes nos documentos
oficiais da educação.
No manual do professor, é afirmado que a “produção de texto no ensino fundamental e
médio tem por objetivo formar alunos-escritores capazes de produzir textos coerentes, coesos e
eficazes” (CEREJA; MAGALHÃES (MP), 2005, p. 10). Para tanto, o livro 1(PL) se propõe a
trabalhar a produção textual de modo sistematizado e em gradação espiral de gêneros textuais,
fundamentando-se nos estudos de linguagem e de gêneros de Bakhtin e nos postulados teóricos
de ensino de língua por meio de gêneros e progressão curricular de Schneuwly e Dolz, sendo os
dois últimos enfatizados no manual.
Esses teóricos dividiram as capacidades sociais de linguagem em 5 agrupamentos de
gêneros, os quais, segundo eles, devem ser trabalhados em todos os ciclos ou séries em espiral,
isto é, retomando capacidades de linguagem por meio do estudo sistemático de variados gêneros,
ampliando-os e aprofundando-os de acordo com as habilidades lingüísticas que se destacam em
cada um deles e de acordo com o nível dos alunos, conforme apresentamos no capítulo 2 deste
trabalho.
Ao analisarmos a organização do tópico Produção de texto na obra como um todo, sem
aprofundarmos na análise detalhada da abordagem dada a cada gênero nos capítulos, pudemos
apreender que ao menos em sua estruturação as aprendizagens são organizadas em espiral, dos
gêneros mais simples aos mais complexos, em gradação como é proposto por Schneuwly e Dolz
(2004), cumprindo com o que é afirmado no manual. Por exemplo, os gêneros correspondentes a
tipologia „relatar‟ são trabalhados em 2 momentos da obra: a notícia é abordada no capítulo 27, é
o primeiro gênero estudado do agrupamento; em seguida a reportagem é tratada no capítulo 33,
gênero que já apresenta um grau maior de complexidade do que o anterior. Assim, a obra
proporciona ao aluno a leitura e produção de gêneros de níveis de complexidade diferentes,
pertencentes a domínios comuns, no decorrer do Ensino Médio.
Entretanto, os capítulos de Produção de texto enfocam gêneros de apenas 4 das capacidades
de linguagem globais agrupadas por Schneuwly e Dolz (2004). Correspondendo ao aspecto
tipológico „narrar‟ o gênero conto; ao „relatar‟ os gêneros: notícia e reportagem ; ao „argumentar‟
os gêneros: crítica, editorial e anúncio publicitário; e ao „expor‟ os gêneros mesa-redonda,
93
entrevista e cartaz. Não trabalhando com gêneros da tipologia „descrever ações‟, isto é, durante a
série do Ensino Médio os alunos não terão contado, ao menos por meio do livro didático, com
gêneros como regulamento, regras, instruções, textos prescritivos, entre outros do domínio das
capacidades de linguagem relacionadas às instruções e prescrições.
QUADRO 15. Livro 1: gêneros ensinados e seus agrupamentos
LIVRO 1(PL)
NARRAR
RELATAR
ARGUMENTAR
EXPOR
DESCREVER
AÇÕES
Conto (I)
Conto (II)
Notícia
Reportagem
Crítica
Editorial
Anúncio publicitário
Cartaz
Mesa-redonda
Entrevista
_____
20%
20%
30%
30%
0%
O quadro anterior demonstra o enfoque dado na obra aos gêneros relacionados às tipologias
argumentar e expor correspondendo cada uma delas a 30% das propostas de produção de texto do
livro 1, os gêneros relacionados à tipologia de relatar fatos, situações, experiências vividas
correspondem a 20% das propostas, sendo os gêneros notícia e reportagem pertencentes a este
domínio, e aqueles relacionados às capacidades do domínio cultural literário correspondem a
20% das propostas do livro 1.
Passemos aos gêneros no livro 2 (PLC). Nessa obra o autor não trabalha com o termo
„gêneros‟, mas sim com „tipos de textos‟. O bloco Textos, constituído por 17 capítulos, é
dedicado ao ensino de gêneros. Segundo o autor, a finalidade desse bloco é “fornecer meios para
o estudante perceber as especificidades de cada tipo de texto e de analisar seu conteúdo e
estrutura” (FARACO (MP), 2003, p. 17). Assim a afirmação do autor sinaliza que
possivelmente o livro 2 enfocará o desenvolvimento de capacidades de ação (ao tratar do
conteúdo) e de capacidades discursivas (ao tratar da estrutura) dos alunos.
Os capítulos do bloco Textos organizam-se em torno de textos literários: crônicas, contos,
romances e poemas, textos informativos: notícia e reportagem, textos de opinião: entrevista,
editorial e dissertação, e texto publicitário: anúncio publicitário, como ele designa no decorrer do
livro.
A progressão da aprendizagem dos gêneros se da seguinte forma: crônica (capítulos 1 e
2), narrativa (capítulo 3), conto (capítulo 4), retomada da narrativa do tipo curta e longa (capítulo
5), poema (capítulo 6 e 7), o jornal e seus textos (capítulo 13), notícia (capítulo 14), reportagem
94
(capítulo 15), retomada da narrativa longa/romance (capítulo 16), entrevista (capítulo 17),
editorial (capítulo 25), texto de opinião (capítulo 26), dissertação (capítulo 27) e texto publicitário
(capítulo 28).
Como podemos notar, durante os três anos do Ensino Médio as aprendizagens não o
organizadas em espiral no livro 2, como propõem Schneuwly e Dolz (2004), mas sim de modo
mais tradicional, enfocando na designação do autor textos literários (crônica, narrativa, conto,
poema), que corresponderiam ao agrupamento de gêneros da esfera do „narrar‟ dos teóricos, com
a exceção da crônica; em seguida trabalha-se os textos informativos (notícia e reportagem), que
para Schneuwly e Dolz tratam-se de gêneros da esfera do „relatar‟; após aborda-se textos de
opinião (entrevista, editorial e dissertação) e o texto publicitário (anúncio publicitário), gêneros
da esfera do „argumentar‟ para os teóricos, com a exceção da entrevista que corresponde à
tipologia „expor‟. Assim, o trabalho com os gêneros se dá em progressão do mais simples ao mais
complexo, entretanto a organização é linear, isto é, os gêneros pertencentes a esferas de
comunicação distintas não são intercalados, deixando a forma de aprendizagem em espiral a
cargo do professor na utilização da obra.
QUADRO 16. Livro 2: gêneros ensinados e seus agrupamentos
LIVRO 2 (PLC)
NARRAR
RELATAR
ARGUMENTAR
EXPOR
DESCREVER
AÇÕES
Narrativa/
romance
Conto
Poema
Notícia
Reportagem
Crônica
Editorial
Dissertação
Anúncio publicitário
Entrevista
______
30%
30%
30%
10%
0%
O quadro anterior traz cada gênero trabalhado no livro 2 na respectiva tipologia de
Schneuwly e Dolz. Como podemos apreender, tanto no livro 1(PL) quando no 2 (PLC), a
ausência de gêneros da tipologia „descrever ações‟.
Vejamos em outra obra. O livro 3 (LP) traz uma variedade de gêneros textuais, como
apresentamos. No manual do professor, as informações dadas são de caráter gerais não
especificando a perspectiva de gênero adotada nem como se dará a progressão de seu ensino na
obra durante os três anos dessa etapa da educação. O único momento em que se expõe um pouco
95
da perspectiva presente no livro ocorre somente na apresentação dos objetivos do capítulo 3,
Diversidade textual, em que é afirmado:
...este capítulo toma como base duas orientações teóricas básicas para
categorização dos textos: dos gêneros discursivos e das seqüências
discursivas (ou tipos de textos). O que se pretende é que o aluno, em
primeiro lugar, leve em conta que os gêneros, como formas “relativas
estáveis de enunciados”, possuem especificidades, características cuja
apreensão pode facilitar a leitura. (TAKAZAKI, 2005, p. 20)
Observe que no fragmento transcrito do manual do livro 3, cita-se a fala de Bakhtin, mas
não se faz nenhum tipo de referência a ele no texto, sendo somente sinalizado com aspas. Quanto
ao que é dito sobre gêneros, era de se esperar maior embasamento teórico para se expor a questão
em um manual de Língua Portuguesa, em especial, esse que é organizado em torno de vários
gêneros.
Tendo como base as informações contidas no manual do professor, no sumário e a
realização da análise do livro 3, capítulo a capítulo, chegamos a variedade de gêneros textuais
presentes na obra cujo aluno terá contato, a qual apresentamos na seção anterior, porém não são
todos que são tomados como objetos de ensino.
O livro 3 (LP) dedica-se ao ensino de 14 gêneros, a saber: texto teatral (capítulo 5),
notícia e artigo de opinião (capítulo 9), discurso político eleitoral (capítulo 10), charge (capítulo
11), entrevista (capítulo 12), resenha (capítulo 16), divulgação científica (capítulo 17), poema
(capítulo 19), ficha, currículo, carta de apresentação, anúncio classificado (capítulo 20), e conto
(capítulo 23).
QUADRO 17. Livro 3: gêneros ensinados e seus agrupamentos
LIVRO 3 (LP)
NARRAR
RELATAR
ARGUMENTAR
EXPOR
DESCREVER
AÇÕES
Texto teatral
Poema
Conto
Notícia
Currículo
Carta de
apresentação
Artigo de opinião
Discurso político
eleitoral
Charge
Resenha
Entrevista
Divulgação
científica
Anúncio
classificado
Ficha
21,5%
21,5%
28,5%
21,5%
7%
96
O livro 3 (LP), como o quadro sinaliza, trabalha com gêneros dos 5 agrupamentos
tipológicos, sendo nele enfatizado o estudo de gêneros de texto pertencentes à ordem de
„argumentar‟(28,5%).
Passemos aos gêneros no livro 4 (PEC):
QUADRO 18. Livro 4: gêneros ensinados e seus agrupamentos
LIVRO 4 (PEC)
NARRAR
RELATAR
ARGUMENTAR
EXPOR
DESCREVER
AÇÕES
Texto teatral
Poema
Conto
Novela
Romance
Notícia
Crônica
Carta
Currículo
Anúncio publicitário
Resumo
Aula expositiva
Palestra
Seminário
Projeto de
pesquisa
Verbete
Referência
bibliográfica
Quadro sinóptico
Ficha de leitura
Fórmula científica
Tabela periódica
Instruções
Ficha catalográfica
Formulário
Cheque
Cadastro
Lei
Memorando
Correspondências
internas
Protocolo
17%
13%
3%
37%
30%
O livro 4 (PEC) traz uma grande variedade de gêneros, contemplando as 5 tipologias de
Schneuwly e Dolz. A ênfase é dada, diferente dos outros livros, aos gêneros pertencentes à ordem
do „expor‟, 37%, e à ordem do „descrever ações‟, 30% dos gêneros estudados como o quadro
anterior mostra.
Em suma, o quadro a seguir retoma os gêneros textuais tidos, de alguma forma, como
objetos de ensino em cada um dos livros analisados a partir do agrupamento de Schneuwly e
Dolz (2004).
97
QUADRO 19. Gêneros textuais ensinados nos livros didáticos analisados
Livros/
Agrupamentos
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
NARRAR
Conto
Poema
Conto
Narrativa/romance
Poema
Conto
Texto teatral
Poema
Conto
Texto teatral
Romance
Novela
RELATAR
Notícia
Reportagem
Notícia
Reportagem
Crônica
Notícia
Currículo
Carta de
apresentação
Notícia
Currículo
Crônica
Carta
ARGUMENTAR
Editorial
Anúncio
publicitário
Crítica
Editorial
Anúncio
publicitário
Dissertação
Resenha
Artigo de opinião
Discurso político
eleitoral
Charge
Anúncio
publicitário
EXPOR
Entrevista
Cartaz
Mesa-redonda
Entrevista
Entrevista
Divulgação
científica
Anúncio
classificado
Resumo
Aula expositiva
Palestra
Seminário
Projeto de pesquisa
Verbete
Referência
bibliográfica
Quadro sinóptico
Ficha de leitura
DESCREVER
AÇÕES
___
___
Ficha
Ficha
Formulário
Instruções Cheque
Cadastro
Lei
Memorando
Correspondências
internas
Protocolo
Construímos também outro quadro no qual organizamos os gêneros tratados nos livros de
acordo com a esfera de comunicação em que circulam socialmente, assim optamos por
categorizá-los em gêneros midiáticos, literários, publicitários, científicos/escolares e burocráticos,
contudo gêneros de texto que cabem a mais de uma categoria, assim buscamos encaixá-lo
naquela que mais condizia com o enfoque dado a ele no livro didático.
98
QUADRO 20. Gêneros textuais ensinados e suas esferas sociais de comunicação
Livros/
Gêneros
Livro1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
Midiáticos
Notícia
Reportagem
Entrevista
Editorial
Crítica
Notícia
Reportagem
Entrevista
Editorial
Crônica
Notícia
Entrevista
Resenha crítica
Discurso político
eleitoral
Artigo de opinião
Charge
Notícia
Crônica
Literários
Conto
Poema
Conto
Narrativa/romance
Poema
Conto
Texto teatral
Poema
Conto
Texto teatral
Romance
Novela
Publicitários
Anúncio
publicitário
Cartaz
Anúncio
publicitário
Anúncio classificado
Anúncio
publicitário
Científicos/
Escolares
Mesa-redonda
Dissertação
Divulgação científica
Resumo
Aula expositiva
Palestra
Seminário
Projeto de
pesquisa
Verbete
Referência
bibliográfica
Quadro
sinóptico
Ficha de leitura
Burocráticos
_____
_____
Currículo
Ficha
Carta de
apresentação
Currículo
Ficha
Formulário
Carta
Instruções
Cheque
Cadastro
Lei
Memorando
Correspondênci
as internas
Protocolo
No quadro, destacamos os gêneros presentes em mais de um dos livros analisados. Como
podemos observar, certa tendência ao ensino de alguns gêneros como notícia e conto, que
apareceram nos 4 livros (todos); também os gêneros poema e anúncio publicitário, que
apareceram em 3 dos livros analisados. O livro 4 é o único que enfatiza o trabalho com gêneros
burocráticos e científicos/escolares. Salientamos que o livro 1 não se organiza em volume único
99
como as outras obras, sendo descrito o volume voltado à 2ª série do Ensino Médio, daí a
diferença se compararmos o número de gêneros ensinados nele e nos outros livros.
Constatamos que os principais gêneros selecionados para ensino pelos autores de livros
didáticos de Português de Ensino Médio são os pertencentes à esfera midiática, a qual é
enfatizada nos PCN.
Até o momento concentramo-nos em apresentar cada um dos livros que compõem o corpus
de um modo amplo. Primeiramente, na seção anterior deste trabalho, como um todo, ou melhor,
como se a organização de cada livro. Em seguida, dedicamo-nos na exposição dos gêneros
tidos como objetos de ensino nesses livros. Tais procedimentos se fizeram necessários para que
pudéssemos apresentar como se constituem os livros didáticos de Língua Portuguesa que
analisaremos e quais gêneros textuais são trabalhados nessas obras. Salientamos que tais coleções
didáticas estão presentes em várias das salas de aulas brasileiras e continuarão por mais 3 anos,
que foram recomendadas pelo PNLEM de 2005 (anterior) e de 2009 (atual), que enviará livros às
escolas públicas para uso em 2009, 2010 e 2011.
As próximas seções serão dedicadas à exposição da análise das atividades didáticas
propostas ao ensino dos textos dos gêneros notícia e reportagem e suas implicações ao
desenvolvimento de capacidades de linguagem dos alunos. Entretanto, como observamos que
uma tendência entre os livros didáticos em apresentar o jornal e sua esfera de comunicação antes
de abordar os gêneros jornalísticos propriamente ditos, delinearemos o enfoque dado ao jornal
nos livros de Português na seção seguinte para nas próximas abordarmos o ensino da notícia e da
reportagem.
4.3 O jornal no livro didático de Língua Portuguesa
Neste momento trataremos dos aspectos gerais do jornal e de sua esfera de comunicação no
livro didático de Língua Portuguesa, portanto não aprofundaremos na análise por não ser este o
foco da pesquisa.
O livro1 (PL) é a única obra de nosso corpus de análise que não aborda de algum modo o
jornal antes de introduzir os gêneros jornalísticos. O livro 2 (PLC) apresenta o capítulo
Folheando um jornal: textos em profusão (capítulo 13) em seqüência traz os capítulos dedicados
100
ao ensino da notícia e da reportagem (capítulos 14 e 15), sem retomar tal esfera de comunicação
em que veiculam os gêneros em questão no seu ensino.
Esse capítulo do livro 2, destinado ao estudo do jornal, apresenta seu surgimento, sua
linguagem, seus textos, além de tratar da liberdade de imprensa. O enfoque didático proposto é
voltado à leitura crítica desse veículo de comunicação, sendo a seção Lendo a imprensa
criticamente elogiada no catálogo do PNLEM/2009 por colaborar “para o desenvolvimento do
leitor crítico” (BRASIL/SEMTEC, 2008, p. 100).
Tal seção é iniciada com texto expositivo que trata da credibilidade pública da imprensa,
apresentando eventos cabíveis e incabíveis a essa esfera de comunicação, alertando e preparando
o aluno para a leitura crítica desses gêneros:
Apesar disso tudo, não sejamos ingênuos: abusos e erros ocorrem,
acidental ou mesmo propositalmente, na imprensa. Em razão disso, nós,
leitores, temos de nos relacionar com ela sempre criticamente.
(FARACO, 2003, p. 182, ênfases do autor)
Como o fragmento anterior ilustra, há no livro 2 um enfoque voltado nesse capítulo à
formação de alunos capazes de ler criticamente a imprensa, não sendo ingênuos diante dela.
Na seção posterior desse mesmo livro, O jornal e o estudo de Português, estuda-se a
“variedade de tipos de textos” presentes em um jornal, além da “língua-padrão escrita” nele
veiculada por ser uma das fontes de referência do Português padrão (Ibid., p. 186). Neste
segmento trata-se das diferentes linguagens, da diagramação das páginas e a distribuição das
matérias, mas enfatizam-se os tipos de textos que, segundo o autor, podem ser agrupados nos
seguintes blocos: textos informativos (notícias, reportagens, notas, colunas especializadas, etc.);
textos de opinião (editoriais, artigos de fundo, resenhas, etc.); textos de publicidade (propagandas
e anúncios classificados); textos literários (crônicas, contos e poemas); e textos de entretenimento
(palavras cruzadas, piadas e histórias em quadrinhos).
Após tratar dos blocos de textos, o autor introduz que nos próximos capítulos abordará
textos informativos “tomando-os como ponto de apoio para ampliar [...] a experiência de leitores
e para aprimorar [...] as habilidades de escrita” (Ibid., p. 186). Nada é mencionado a respeito do
ensino de gêneros de texto.
De modo geral, o livro 2 expõe o aluno às especificidades da imprensa e o prepara para o
trabalho com os gêneros notícia, reportagem, entre outros, desta esfera de comunicação que serão
abordados no decorrer da obra. A contextualização do jornal e de seus textos na atualidade e o
101
trabalho com a liberdade de imprensa realizados nesse livro favorecem o desenvolvimento da
capacidade de linguagem do aluno referente à ação, pois contribui para que ele compreenda o
contexto em que veicula tal gênero de texto e assim agir adequadamente por meio dele.
O livro 3 (LP) apresenta o capítulo Imprensa em que introduz a imprensa e sua função para
então abordar o ensino dos gêneros notícia e artigo de opinião, além de apresentar de modo
sintético gêneros presentes no jornal e a configuração de sua primeira página.
No manual do professor desse livro, afirma-se que as atividades do capítulo Imprensa
“partem do pressuposto de que os alunos possuem certa familiaridade com os gêneros
jornalísticos”, para atingir o objetivo de que os estudantes “apreendam, gradativamente, os
discursos implícitos e subentendidos de todo texto jornalístico, e que, mais do que informar,
reflitam, discutam e posicionem-se criticamente a respeito do ponto de vista dos autores desses
textos” (TAKAZAKI (MP), 2005, p. 30).
O livro 4 (PEC) traz o módulo É da hora!É do dia! em que aborda o jornal, sua função,
organização e seus gêneros, enfocando principalmente o ensino da notícia. Em seu manual do
professor é afirmado que o principal objetivo do trabalho didático com o jornal é “incentivar nos
alunos a necessidade de ler e interpretar criticamente o jornal” (MURRIE et al. (MP), 2004, p.
134).
De forma geral, de acordo com o que é proposto nos manuais do professor e da análise da
exposição do conteúdo no livro do aluno, sem nos aprofundarmos nas atividades didáticas
apresentadas, concluímos que o jornal veicula os livros de Português com vistas à formação
crítica do alunado e como forma de contextualizar a esfera social de comunicação dos gêneros
notícia e reportagem, entre outros, que se dá em seqüência.
A seguir, aprofundaremos na análise do ensino de dois dos principais gêneros jornalísticos,
a notícia e a reportagem, e das capacidades de linguagem implicadas nesse processo nos livros
em questão. Iniciaremos pelo gênero notícia por seu ensino preceder o da reportagem nos livros
que trazem ambos os gêneros.
102
4.4 O gênero notícia
Nesta seção, analisaremos a forma de apresentação do gênero textual notícia, a abordagem
dada a ele e os tipos de atividades didáticas propostas a seu ensino, relacionando-as as
capacidades de linguagem dos alunos que poderão ser mobilizadas e desenvolvidas.
Esse gênero textual é objeto de ensino dos quatro livros do corpus. A fim de mostrarmos
como se organizam os capítulos
8
dedicados a esse gênero e as diferenças entre as abordagens de
cada livro, construímos o seguinte quadro:
5
As páginas analisadas são apresentadas na seção de Anexos deste trabalho.
103
QUADRO 21. Organização dos capítulos dedicados ao ensino do gênero notícia
Livro 1 (PL)
Livro 2 (PLC)
Livro 3 (LP)
Livro 4 (PEC)
Capítulos/
Módulos
Cap. 27 A notícia
(4 páginas)
Cap. 15 Texto informativo: a notícia
(9 páginas)
Cap. 9 Imprensa
(7 páginas)
Mód. 26 É da hora! É do dia!
(12 páginas)
Descrição
das seções
internas aos
capítulos
Trabalhando o gênero
(traz o texto principal;
estudo do texto; exposição
didática)
Produzindo a notícia
(proposta de produção de
texto)
Escrevendo com
adequação (estudo de
títulos, subtítulos e
legendas)
Qualidades do texto informativo (abordam-
se algumas características)
Texto 1 (traz o texto principal e atividades
de estudos)
Práticas de escrita (proposta de produção de
uma notícia)
Atividades (propõem-se atividades que
abordam o conteúdo temático da notícia
trabalhada só que em enciclopédia)
Texto 2 (traz o texto e atividades de
estudo)
Prática de escrita (proposta de produção de
resumo do texto 2)
De olho na língua (ensino descritivo do
verbo haver, x a, voz passiva analítica,
sentenças substantivas e sentenças complexas
com base em frases dos textos estudados; traz
exposição e atividades)
Observando aspectos gráficos (traz
atividades que abordam o uso de siglas, de
maiúsculas, a grafia de países, pontuação e
acentuação, respectivamente)
Pausa poética (traz poema que narra um
acontecimento para tratar da relação entre texto
poético e jornalístico; leitura complementar)
Prática de escrita (apresenta um conto
inspirado em uma notícia e pede-se que o
aluno faça o mesmo)
Leitura complementar (traz uma crônica que
trata do excesso de informação que na
atualidade)
Ponto de partida (trata da função
da imprensa na atualidade)
Estudo do texto (apresentam-se
dois textos: notícia e artigo de
opinião e sobre eles são realizadas
indagações)
A notícia (estudo de algumas
características do gênero; pirâmide
invertida, tópico frasal (lide))
Estudo do texto (exposição
didática sobre a questão da
neutralidade do texto noticioso;
análise da notícia apresentada)
Produção de texto (proposta de
reescrita da notícia apresentada
segundo instruções dadas)
Artigo de opinião (estudo de
algumas das características do
gênero)
Gêneros do jornal
(caracterização sumária de alguns
dos gêneros jornalísticos)
A primeira página (estudo de
elementos da primeira gina:
seleção dos fatos, imagens e
manchetes)
A história viva (exposição didática sobre a
relação entre jornal e sociedade atual)
A primeira página do jornal (expõe a função e
a organização dos elementos da 1ª página do
jornal; e trata das manchetes e do lide)
A notícia (exposição sobre algumas
características do gênero; traz 2 poemas que
narram acontecimentos e propõe-se que o aluno
escolha 1 deles e o transforme em uma notícia;
proposta de produção de notícias para um jornal
da escola)
A organização gráfica (exposição didática que
trata da disposição e função dos elementos
gráficos que compõem o jornal)
Os gêneros jornalísticos (caracterização
sumária de alguns dos gêneros jornalísticos)
Os cadernos (apresentação)
A linguagem escrita do jornal (trata da
necessidade de se escrever bem no jornalismo)
O jornalista (apresenta as funções desse
profissional)
O poder da imprensa e o sensacionalismo
(exposição sobre esses elementos)
Sempre foi assim... (traz a história do jornal)
A praga da censura (aborda a liberdade de
imprensa)
Romance ou reportagem (trata da obra Os
Sertões de Euclides da Cunha)
104
Como o quadro anterior mostra, a abordagem dada ao gênero notícia é mais
extensa em algumas obras do que em outras. Os livros 1 (PL), 3 (LP) e 4 (PEC) não
trazem o tradicional ensino gramatical nos capítulos ou módulos dedicados à notícia,
sinalizando novas tendências no ensino de Português advindas das teorias recentes,
embora o livro 2 ainda apresente o tradicional ensino descritivo de gramática.
O capítulo A notícia do livro 1 (PL) aproveita a seção voltada ao ensino de
conhecimentos lingüísticos, Escrevendo com adequação, para o trabalho com elementos
que compõem o gênero em questão como a escrita de tulos, subtítulos e legendas. O
livro 2 (PLC) também trabalha elementos importantes à concretização desse gênero nas
seções De olho na língua e Observando aspectos gráficos, porém ao tratar da voz
passiva analítica, por exemplo, não relaciona seu uso a sua função de construir o efeito
de objetividade e imparcialidade no texto, mostrando-se estar centrado estritamente no
aspecto gramatical, usando as frases das notícias estudadas como pretexto.
O livro 2 (PLC), ao iniciar o capítulo sobre a notícia, realiza a seguinte
introdução:
105
Livro 2 (PLC), 2003, p. 196.
Como a introdução do autor sinaliza, essa obra abordará o gênero notícia,
assim como a reportagem, com vistas ao ensino sistemático da língua, isto é, focará nos
aspectos, principalmente, estruturais do texto.
Os livros 3 (LP) e 4 (PEC), além de trabalharem o gênero notícia, abordam a
imprensa como um todo e outros gêneros jornalísticos. Dessa forma, em nossa análise
nos centraremos nas propostas de ensino do texto do gênero notícia devido à
inviabilidade de tratarmos de todos os elementos presentes nesses capítulos.
A seguir, apresentaremos a análise da forma de apresentação do gênero notícia
nos livros de nosso corpus.
106
4.4.1 A forma de apresentação do gênero notícia
Segundo Schneuwly e Dolz (2004), ao entrarem no ambiente escolar os gêneros
de distintas esferas sociais sofrem transformações, entretanto isso não invalida seu
ensino. O trabalho com gêneros textuais na escola consiste em apresentá-los e tratá-los
da forma mais próxima possível das situações de comunicação reais em que eles
circulam para que o aluno possa dominá-los e identificá-los fora do contexto de
aprendizagem.
É de fundamental importância que os livros didáticos apresentem o gênero notícia
respeitando seu formato social de circulação para que o aluno o reconheça e assim
desenvolva a capacidade de linguagem referente à ação.
De modo geral, as modificações que ocorrem na didatização da notícia são
semelhantes as da reportagem, as quais apresentaremos adiante, nos livros de Português
analisados:
muda-se a posição da exibição de fotos;
não se traz o texto em colunas;
ausência de recursos gráficos presentes nos jornais e revistas.
O livro 2 (PLC) apresenta dois textos principais e ambos são retextualizados, isto
é, perdeu-se as características referentes a seu formato de circulação social, como ocorre
também com o gênero reportagem nessa obra. Vejamos o exemplo:
107
108
Livro 2 (PLC), 2003, p. 203-204.
Esse exemplo ilustra que, em tal obra, a capacidade de ação do aluno não é
enfatizada nesse capítulo, fato que discutiremos em outro momento.
Nos livros 1 (PL) e 3 (LP) as notícias apresentadas mantêm o formato de
circulação social do gênero: texto em colunas, reprodução de recursos gráficos do jornal
impresso, sendo claramente reconhecidas como tal. Porém no livro 1, as imagens
apresentadas junto à notícia, se pertenciam mesmo a ela, foram mudadas de posição e de
tamanho pois destoam das características da apresentação do gênero em jornais. o
109
livro 3, não traz imagens. Vejamos a reprodução das páginas em que aparece o gênero
nessas obras:
Livro 1 (PL), 2005, p. 240.
110
Livro 3 (LP), 2005, p. 101.
As páginas reproduzidas anteriormente mostram-nos que as transformações que
esse gênero jornalístico sofre para tornar-se um gênero a ser ensinado na escola, quanto
a seu aspecto visual, permitem seu reconhecimento por manterem características
importantes a sua concretização como a forma lingüística do título, frases em destaque e
texto em colunas.
Ressaltamos que no livro 4 (PEC) se reproduz a primeira página de um jornal,
mas não é apresentada nenhuma notícia para estudo, apenas propõe-se que o aluno leve
para a aula um jornal completo para leitura e análise. É apresentada ao estudante a
função e estrutura da notícia e pede-se que ele produza o gênero. A abordagem de tal
obra é compacta e interdisciplinar, nela poucas atividades, sendo constituída
111
basicamente por texto didático-expositivo, deixando a cargo do professor propostas de
atividades de acordo com as necessidades dos alunos e a proposta pedagógica da escola.
Quanto à apresentação do gênero notícia nos livros de Ensino Médio, dos quatro
livros que se dedicam a seu ensino, dois deles (50%) respeitam suas características
sociais em sua apresentação. Passaremos à análise do conteúdo temático da notícia
apresentado pelos livros.
4.4.2 O conteúdo temático do gênero notícia
O conteúdo temático constitui-se como um dos elementos que busca o sucesso do
gênero, isto é, elemento que faz com que o gênero atinja seu objetivo social. Cada
gênero apresenta certos temas esperados de acordo com o público-alvo a que se destina.
O tema deve estar estritamente relacionado aos interesses do leitor, assim para que
ocorra a aprendizagem da notícia, os livros devem apresentar ao aluno exemplares desse
gênero cujos conteúdos temáticos pertençam aos interesses dos jovens e as atividades de
produção de texto devem sugerir assuntos pertinentes ao público-alvo da proposta dada,
adequando o conteúdo ao leitor. Salientamos que as atividades de produção serão
analisadas na próxima seção.
Como os títulos das notícias sinalizam ou, ao menos, deveriam sinalizar seu tema
(PUBLIFOLHA, 2006), descreveremos o título de cada texto principal apresentado nos
capítulos dedicados ao seu ensino:
Livro 1 (PL): Arqueólogos encontram mais de 50 múmias em valas no
Egito (O Estado de S. Paulo, 27/4/2004);
Livro 2 (PLC): Achadas três múmias incas na Argentina (O Estado de S.
Paulo, 07/4/1999);
Para IBGE, envelhecimento tende a aumentar (O Estado
de S. Paulo, 11/3/1999);
Livro 3 (LP): EUA criam núcleo para mentira oficial (Jornal do Brasil,
20/2/2002);
Livro 4 (PEC): não são apresentados exemplares do gênero.
112
Os títulos ilustram a tendência por seleção de fatos genéricos, isto é, os livros
trazem notícias que relatam acontecimentos não tão pontuais e que possivelmente se
manterão atuais durante certo período de tempo. Tais assuntos não são estritamente
relacionados ao universo jovem, entretanto podem despertar a curiosidade dos
adolescentes, no caso das notícias relacionadas a múmias que ocorrem em dois dos
livros, ou propiciar ao aluno conhecimentos sobre questões sociais e políticas como a
notícia sobre o núcleo criado nos EUA para difundir fatos na mídia de países aliados ou
inimigos, a qual é sensacionalista e parcial, no decorrer das atividades propostas a ela,
no livro 3 (LP), são trabalhadas as capacidades de linguagem lingüístico-discursivas do
estudante. Na notícia sobre o aumento da taxa de envelhecimento no Brasil, que
também propicia conhecimentos sociais e políticos ao leitor, a ocorrência de uma
vírgula no título, prática que, segundo os manuais de jornalismo, deve ser evitada em
títulos e subtítulos. Contudo o autor do livro 2 (PLC) não faz nenhuma ressalva a tal
fato.
Concluímos, portanto, que o conteúdo temático dos textos apresentados aos
alunos relaciona-se de algum modo com as curiosidades do adolescente, mas pensamos
que se os livros veiculassem temas relacionados à faixa etária dos estudantes de Ensino
Médio como: vestibular, profissões, jovens no mercado de trabalho, sexualidade,
gravidez na adolescência, jovens e as drogas, entre outros, contribuir-se-ia mais com a
formação cidadã do estudante. Ressaltamos que o jornal trata-se de um suporte
heterogêneo de textos, isto é, nele veiculam-se diferentes temas da realidade, porém o
leitor é livre para ler aqueles que lhe interessam, assim ao trazer notícias relacionadas ao
universo jovem o livro didático não simplificaria o caráter de sua esfera de
comunicação.
Na próxima seção deste trabalho, analisaremos as atividades didáticas propostas
ao ensino da notícia.
4.4.3 Atividades propostas ao ensino do gênero notícia
As atividades didáticas propostas ao ensino da notícia, assim como as
apresentadas ao ensino da reportagem, constituem-se de dois tipos: atividades de leitura
e atividades de produção de texto. De modo geral, os capítulos organizam-se em:
113
apresentação do exemplar do gênero, atividades de leitura, atividade de produção escrita
e ensino gramatical, quando mais de um texto principal retoma-se a seqüência. As
sistematizações ou os textos didático-expositivos são intercalados entre essas atividades.
Para a análise das atividades de leitura, recorreremos a tipologização de questões
elaboradas por Marcuschi (2003). Esse autor, ao analisar livros didáticos, construiu uma
classificação dos tipos de perguntas voltadas ao estudo de textos, a qual empregaremos
em nossa análise. Assim reproduziremos o quadro por ele elaborado (MARCUSCHI,
2003, p. 54-53):
114
QUADRO 22. Tipologia de perguntas de Marcuschi
Tipos de perguntas
Explicitação
Exemplos
1. A cor do cavalo
branco de Napoleão
São P não muito freqüentes e de perspicácia
mínima, auto respondidas pela própria
formulação. Assemelham-se as indagações do
tipo: “Qual a cor do cavalo branco de
Napoleão?”
Ligue:
Lilian Não preciso falar sobre o que
aconteceu.
Mamãe Mamãe, desculpe, eu menti
para você.
2. pias
São as P que sugerem atividades mecânicas
de transcrição de frases e palavras. Verbos
freqüentes aqui são: Copie, retire, aponte,
indique, transcreva, complete, assinale,
identifique etc.
Copie a fala do trabalhador.
Retire do texto a frase que ...
Copie a frase corrigindo-a de acordo com
o texto.
Transcreva o trecho que fala sobre ...
Complete de acordo com o texto.
3. Objetivas
São as P que indagam sobre conteúdos
objetivamente inscritos no texto (O que,
quem, quando, como, onde...) numa atividade
de pura decodificação. A resposta acha-se
centrada exclusivamente no texto.
Quem comprou a meia azul?
O que ela faz todos os dias?
De que tipo de musica Bruno mais gosta?
Assinale co um X a resposta certa.
4. Inferenciais
Estas P são as mais complexas; exigem
conhecimentos textuais e outros, sejam
pessoais, contextuais, enciclopédicos, bem
como regras inferenciais e analises clítica
para busca de respostas.
Há uma contradição quanto ao uso da
carne de baleia no Japão. Como isso aparece
no texto?
5. Globais
São as P que levam em conta o texto como
um todo e aspectos extra-textuais,
envolvendo processos inferenciais
complexos.
Qual a moral desta historia?
Que outro titulo você daria?
Levando-se em conta o sentido global do
texto, pode concluir que...
6. Subjetivas
Estas P em geral têm a ver com o texto de
maneira apenas superficial, sendo que a R
fica por conta do aluno e não há como testá-la
em sua validade.
Qual a sua opinião sobre...?
O que você acha do...?
Do seu ponto de vista, a atitude do
menino diante da velha senhora foi correta?
7. Vale-tudo
São as P que indagam sobre questões que
admitem qualquer resposta não havendo
possibilidade de se equivocar. A ligação com
o texto é apenas um pretexto sem base
alguma para a resposta.
De que passagem do texto você mais
gostou?
Se você pudesse fazer uma cirurgia para
modificar o funcionamento do seu corpo,
que órgão você operaria? Justifique sua
resposta.
Você concorda com o autor?
8. Impossíveis
Estas P exigem conhecimentos externos ao
texto e pode ser respondidas com base em
conhecimentos enciclopédicos. São questões
antípodas às de copia e às objetivas.
um exemplo de pleonasmo vicioso
(Não havia pleonasmo no texto e isso não
fora explicado na lição)
Caxambú fica a onde? (o texto não falava
de Caxambú)
9. Meta-lingüísticas
São as P que indagam sobre questões formais,
geralmente da estrutura do texto ou do léxico,
bem como de partes textuais.
Quantos parágrafos tem o texto?
Qual o titulo do texto?
Quantos versos tem o poema?
Numere os parágrafos do texto.
115
No quadro, a seguir, apresentaremos a ocorrência dos tipos de indagações em cada
um dos livros de Ensino Médio analisados:
QUADRO 23. Perguntas empregadas no ensino da notícia
Tipos de perguntas
(Marcuschi)
Ocorrências
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
1. A cor do cavalo
branco de Napoleão
__
__
__
__
2. pias
1
(3%)
1
(4%)
__
__
3. Objetivas
6
(18%)
9
(35%)
__
__
4. Inferenciais
6
(18%)
12
(46%)
8
(89%)
__
5. Globais
8
(23%)
4
(15%)
1
(11%)
__
6. Subjetivas
__
__
__
__
7. Vale-tudo
__
__
__
__
8. Impossíveis
1
(3%)
__
__
__
9. Meta-lingüísticas
12
(35%)
__
__
__
Total
34
(100%)
26
(100%)
9
(100%)
0
(100%)
Como o quadro sinaliza, as perguntas mais complexas, inferenciais e globais, as
quais mobilizam processos cognitivos mais sofisticados, aparecem nos três livros que
apresentam indagações, destacando-se no livro 2, correspondendo a 46% das
ocorrências, e no livro 3, sendo 89% das indagações propostas ao estudo da notícia.
Vejamos exemplos da ocorrência desse tipo de pergunta no livro 3 (LP):
116
Livro 3 (LP), 2005, p. 102.
A atividade reproduzida traz quatro perguntas do tipo inferenciais, pois para
respondê-las o aluno deve mobilizar conhecimentos textuais, lingüísticos, contextuais,
extra-textuais na realização de uma analise crítica para a construção das respostas. Essa
atividade é voltada a identificação das marcas modais presentes no texto apresentado
para estudo, além de trabalhar com o efeito de sentido do emprego da citação (item „d‟).
Observe que nos enunciados das perguntas as partes estruturais da notícia (título, tópico
frasal, desenvolvimento, conclusão, como a autora designa) apresentadas ao estudante
na seção anterior do capítulo, são empregadas. Nessa atividades, é evidente que as
operações de linguagem voltam-se ao desenvolvimento das capacidades lingüístico-
discursivas do aluno, correspondendo aos níveis intermediário (mecanismos de
textualização) e superficial (mecanismos enunciativos) na proposta de Bronckart (2003;
2008).
No livro 1 (PL), destaca-se a quantidade de questões meta-língüísticas aplicadas
ao ensino da notícia, assim como ocorre com a reportagem nessa obra, sinalizando que
trabalha-se com elementos estruturais e lingüísticos no ensino desse nero textual,
podendo mobilizar então capacidades de linguagem discursivas e lingüístico-discursivas
do aluno. Nessa obra ocorre uma questão do tipo impossível tanto no ensino da notícia
quanto no da reportagem, a qual aborda o mesmo elemento (discurso direto e discurso
indireto) em ambos os capítulos, porém em nenhum deles trabalham-se os
conhecimentos exigidos do aluno. As atividades pedem que o estudante responda qual é
o tipo de discurso empregado em determinado momento do texto, mas não expõe o que
de fato é discurso direto e discurso indireto, não o instrumentando à realização dessa
tarefa.
117
As perguntas voltadas a identificação a conteúdos inscritos nos textos, as do tipo
objetivas, são enfatizadas tanto no ensino da notícia quanto no da reportagem. No livro
2, esse tipo de indagação corresponde a 35% das ocorrências, refletindo a confusão
teórica entre compreensão e decodificação que se opera nos livros como afirma
Marcuschi (2003).
O livro 4 traz apenas atividades de produção de texto relacionadas à notícia,
devido sua organização inovadora a qual o torna semelhante a uma revista quanto ao
aspecto visual e organizacional, deixando a cargo do professor a elaboração de
atividades de perguntas.
Passaremos a análise das atividades de produção do gênero presentes nos livros
analisados. De modo sumário, descreveremos as propostas de cada obra:
Livro 1 (PL): propõe-se que o aluno escolha entre produzir uma notícia
sobre um fato ocorrido recentemente no Brasil ou no mundo; ou sobre um
fato recente que ocorreu em seu bairro ou escola; tal produção veiculará
em um jornal mural escolar;
Livro 2 (PLC): primeira proposta a produção é abordada como um
exercício de escrita; há a ausência das condições de produção, apenas
apresenta-se o tema (arqueólogos descobrem tesouro...) e centra-se nas
instruções dos aspectos estruturais do texto; segunda proposta produção
de resumo sobre uma das notícias apresentadas;
Livro 3 (LP): o aluno deve reescrever a notícia principal, eliminando as
marcas de subjetividade por ele analisadas e defender um outro ponto de
vista sob o disfarce da neutralidade; não há instruções sobre o público-alvo
do jornal cujo aluno será um jornalista contratado;
Livro 4 (PEC): primeira proposta transformar poemas que narram
acontecimentos em notícias; segunda proposta produzir uma notícia para
um jornal da escola; o aluno deve escolher o tema que achar interessante a
estudantes e redigi-la de acordo com as características do gênero.
Como podemos apreender, os livros 1 e 4 apresentam propostas coerentes com o
ensino de gêneros na escola, conforme Schneuwly e Dolz (2004), pois pedem que o
aluno coloque em prática as características do gênero estudadas e oferecem-lhe as
condições de produção para tanto, sendo o tema, que deve interessar aos leitores,
inferido pelo próprio estudante.
118
no livro 3, proposta também coerente com os postulados dos teóricos, enfatiza-
se a questão da impossibilidade de haver neutralidade na linguagem e no jornalismo.
Segundo Schneuwly e Dolz (2004), a ênfase em alguns aspectos do gênero em
detrimento a outros, ocorre no processo de didatização para que haja seu ensino na
escola.
Na proposta do livro 2, apreendemos que o objetivo da primeira produção é que o
aluno coloque em prática a estruturação textual que lhe foi ensinada nas atividades e a
linguagem adequada. Segundo o autor da obra, redigir uma notícia “é um exercício
interessante para amadurecer a habilidade de passar informações sem misturá-las com
opiniões” (FARACO, 2003, p. 201). Enquanto o livro 3 esforça-se para tratar da
impossibilidade da neutralidade da linguagem, a obra de Faraco ainda prega tal mito. O
conteúdo temático apresentado ao estudante é genérico e semelhante ao da notícia
estudada nessa obra (arqueólogos descobrem tesouro...). A segunda proposta de
produção do livro 2 não se volta para o ensino do gênero, busca apenas testar a
compreensão do aluno sobre a notícia trabalhada por meio da elaboração de resumo.
Como podemos notar, essa obra é mais centrada no trabalho com a sistematização da
língua e com a textualidade do que com o ensino do gênero propriamente dito,
entretanto nela também se trabalham as características estruturais da notícia, assim o
ensino desse gênero foi simplificado a sua estrutura nesse livro.
Chegamos à conclusão de que, nas propostas de produção de texto, cada obra
aborda a seu modo as características do gênero notícia, enfatizando alguns elementos
em detrimento a outros, processo considerado necessário para que se dê o ensino escolar
dos gêneros sociais, segundo as orientações didáticas de Schneuwly Dolz (2004).
Quanto às atividades didáticas de leitura, o índice de indagações que mobilizam
processos cognitivos sofisticados como: relacionar informações e conhecimentos,
comparar, analisar criticamente o texto para a construção da resposta, é maior em
relação às atividades propostas a reportagem, as quais trataremos em outro momento.
Nas seções seguintes, passaremos a analisar as atividades didáticas propostas ao
ensino do gênero notícia as relacionando as possíveis capacidades de linguagem do
aluno que possivelmente serão mobilizadas.
119
4.4.4 O gênero notícia e as capacidades de ação
Segundo Schneuwly e Dolz (2004), as capacidades de linguagem constituem-se
em capacidade de ação, capacidade discursiva e capacidade lingüístico-discursiva. O
desenvolvimento de cada uma dessas capacidades se faz necessário para o domínio dos
gêneros na escola, assim os livros didáticos devem se empenhar no trabalho com
operações de linguagem que propiciem o desenvolvimento de cada uma delas para que
o aluno de fato aprenda a ler, interpretar e produzir os gêneros textuais que circulam
socialmente.
Iniciaremos pela análise das atividades propostas ao ensino da notícia que se
relacionam à capacidade de ação, isto é, as atividades que, de algum modo, trabalharão
com operações que busquem fazer com que o estudante contextualize o gênero e
compreenda a função dos elementos presentes na circunstância de produção como
constitutivos de seu sentido, para que então o aluno possa agir socialmente por meio
dele, se necessário.
De modo geral, as operações de linguagem mobilizadas nas atividades de ensino
da notícia, que se referem ao desenvolvimento de capacidades de ação do adolescente
de Ensino Médio, abordam:
o suporte material em que veicula o gênero;
a relação gênero-leitor-conteúdo;
a intenção do gênero.
As quatro obras de Português analisadas abordam o jornal, suporte material da
notícia, de modo a contextualizá-la em sua esfera de comunicação. Todas as obras
tratam também das intenções do gênero. A reprodução, a seguir, mostra como a relação
entre imprensa e o gênero notícia é tratada em um dos livros analisados:
120
Livro 3 (LP), 2005, p. 99.
Como podemos apreender, esse livro apresenta distintos pontos de vista sobre a
imprensa, contribuindo para a construção de uma postura crítica do aluno diante dessa
esfera de comunicação, além de atuar na contextualização do gênero a ser trabalhado no
capítulo a notícia mobilizando, assim, a capacidade de linguagem referente à ação.
A interdependência entre gênero-leitor-conteúdo consiste na relação entre esses
elementos de modo que o conteúdo temático do gênero deve ser de interesse do leitor
para que a função social da notícia, gênero em questão, seja concretizada. Tal relação é
121
brevemente abordada no livro 1 (PL) e 4 (PEC), sendo no livro 2 (PLC)
superficialmente mencionada a importância de se considerar o leitor para produção do
gênero.
Reproduziremos, a seguir, ginas dos livros analisados que sinalizam os
aspectos relacionados à capacidade de ação que citamos:
Livro 4 (PEC), 2004, p. 703.
O texto didático-expositivo apresentado sobre o gênero notícia realça algumas de
suas características como: a função do gênero, seus suportes materiais, a importância de
122
se considerar os leitores do suporte, de modo sumário sem se aprofundar em nenhum
dos elementos.
Vejamos a próxima reprodução:
Livro 1 (PL), 2005, p. 241.
A página reproduzida do livro 1 traz as atividades propostas ao estudo do texto
principal que abre o capítulo. As atividades de números 1 e 2, as quais classificamos
como globais por exigirem que o aluno relacione conhecimentos textuais e extra-
textuais na construção da resposta. O item „a‟ da atividade 1 pede que o estudante
aponte o objetivo da notícia e o item „b‟ indaga sobre os veículos de comunicação em
que ela é transmitida. A atividade 2 visa que o aluno infira qual é a função da notícia:
123
informar ou comentar. Assim, trabalha-se o objetivo do gênero, seus suportes materiais
e sua função social. O quadro Isto é notícia também contempla o desenvolvimento da
capacidade de ação do aluno por trazer definições do gênero. As outras atividades da
página abordam outras capacidades e serão tratadas em outro momento.
A forma de apresentação do gênero no livro didático contribui para o
reconhecimento da notícia, atuando no desenvolvimento da capacidade de ação do
aluno. Como tratamos desse tema detalhadamente agora somente retomaremos que
duas das obras (50%) respeitam as características sociais desse gênero.
Sabemos que aspectos mercadológicos influenciam a produção dos livros
didáticos. Subjacente a essa questão está a organização espacial do livro, isto é, o
espaço disponibilizado à apresentação de textos muitas vezes influencia no formato em
que o gênero é exibido. Contudo de se compreender que o formato em que quaisquer
gêneros circulam socialmente é constitutivo de seu sentido e buscar meios de resolver
tal impasse de modo que não prejudique o processo de ensino-aprendizagem.
O quadro, a seguir, mostra as operações de linguagem, referentes ao
desenvolvimento da capacidade de ação do aluno, trabalhadas em cada uma das obras
analisadas:
124
QUADRO 24. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino
da notícia
Como o quadro apresenta, os livros 1 e 4 são os que mais se empenham no
trabalho com operações relacionadas à capacidade de ação do estudante. Já o livro 2
pouco aborda tais tarefas. De modo geral, concluímos que a capacidade de linguagem
referente à ação é mobilizada no ensino de gênero notícia nos livros didáticos de Língua
Portuguesa recomendados pelo PNLEM/2009.
Passaremos a análise do desenvolvimento da capacidade discursiva.
4.4.5 O gênero notícia e as capacidades discursivas
A capacidade discursiva corresponde ao nível de análise de Bronckart (2008) mais
profundo da arquitetura interna dos textos. É por meio do desenvolvimento de tal
capacidade que o estudante organiza estruturalmente um gênero e nele posiciona-se com
adequação. O desenvolvimento da capacidade discursiva é fundamental para o domínio
de quaisquer gêneros.
Por meio da análise dos capítulos dedicados ao ensino da notícia, chegamos às
seguintes operações de linguagem que atuam no desenvolvimento de capacidades
discursivas nos livros analisados, isto é, nessas obras abordam-se as seguintes
características do gênero:
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do
gênero notícia
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
Capacidades de
ação
Situação de Produção (contextualização do gênero)
Levar em conta o suporte material em que veicula
o gênero;
X
X
X
X
Apresentar o gênero em seu formato de circulação
social;
X
X
Identificar e considerar o público-alvo esperado;
K
X
X
Identificar e considerar o lugar e o momento da
produção;
Precisar a intenção da produção.
Conteúdo Temático
Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de
muitas pessoas, improváveis de acontecer, que
possivelmente despertem a curiosidade ou que haja
identificação com o público-alvo;
X
X
Apresentar fatos atuais, verdadeiros e precisos;
X
X
X
X
X
X
X
X
X
125
a estruturação do gênero (título, lide, corpo de texto ou desenvolvimento);
a função dos elementos estruturais (em especial o título);
a organização e seleção de eventos;
os acompanhantes do gênero (fotos e legendas).
Uma das características fundamentais da notícia é o seu tipo de discurso e sua
planificação: narração e script (relato), respectivamente, os quais não são trabalhados.
As páginas reproduzidas, a seguir, exemplificam a forma como os livros abordam
as operações de linguagem referentes à capacidade discursiva. Recorreremos às
atividades dos livros 1 (PL) e 2 (PLC). Vejamos o primeiro exemplo extraído do livro 2:
126
Livro 2 (PLC), 2003, p. 199-200.
A atividade 4, na qual a exposição didática sobre o lide (do termo em inglês
lead), recorrendo-se ao manual do Estado de S. Paulo, é classificada como inferencial
na tipologia de Marcuschi (2003) por mobilizar conhecimentos textuais e contextuais.
Por meio dela apresenta-se ao aluno a função e estruturação do elemento lide. Em
seqüência, trabalha-se a organização dos parágrafos e a seleção dos fatos. Como
podemos notar, na exposição da estrutura textual da notícia em estudo, o autor desse
livro didático expõe sua análise do texto como legítima e única.
Vejamos exemplos retirados do livro 1 (PL):
127
Livro 1 (PL), 2005, p. 241.
Esses exercícios são propostos à notícia principal. As atividades 3 e 4 abordam a
estruturação do nero, enfocando o lide e o corpo do texto. Observe que é no
enunciado das atividades que as definições desses elementos são apresentadas ao aluno.
Enquanto a atividade 3 traz perguntas objetivas sobre o conteúdo do lide, a de número 4
traz a do tipo meta-lingüística sobre a identificação do corpo do texto.
128
Passemos a apresentar mais exemplos de como as operações de linguagem
relacionadas à capacidade discursiva são trabalhadas nos livros analisados. As páginas
que reproduziremos, a seguir, correspondem à seção Escrevendo com adequação, nelas
são abordadas a escrita de títulos, subtítulos e legendas jornalísticas. Essa seção do livro
1 (PL) é dedicada ao trabalho com conhecimentos lingüísticos, segundo as palavras dos
autores no manual do professor e conforme a resenha da obra presente no catálogo do
PNLEM/2009. Dos livros didáticos que trabalham com o ensino dos gêneros notícia
e/ou reportagem do PNLEM/2009, essas páginas que reproduziremos são os únicos
momentos em que o trabalho com elementos lingüísticos, isto é, seções voltadas a esse
fim, vinculam-se ao ensino do gênero em questão, pois:
Livro 2 (PLC): o trabalho com elementos lingüísticos não se relaciona com o
ensino do gênero, ocorre o ensino de gramática descritiva, usando-se frases dos
textos principais como exemplo sem se apresentar a função ou o efeito de
sentido de tais formas e escolhas lingüísticas no texto;
Livro 3 (LP): no capítulo de ensino da notícia, não seções voltadas ao ensino
de elementos lingüísticos;
Livro 4 (PEC): no capítulo de ensino da notícia, não há seções voltadas ao
ensino de elementos lingüísticos, como ocorre no livro anterior.
Assim, a ausência do trabalho com elementos lingüísticos empregados nos
gêneros em questão e seus efeitos de sentido ocorre em 75% das obras que visam o
ensino da notícia e da reportagem, sinalizando que pouco se mobiliza a capacidade
lingüístico-discursiva do estudante de Ensino Médio.Vejamos, então, a seção
Escrevendo com adequação do livro 1:
129
130
131
Livro 1 (PL), 2005, p. 243-245.
Tal seção reproduzida é basicamente dedicada ao desenvolvimento da capacidade
do aluno de redigir e compreender elementos estruturais título, subtítulo e legenda
implicando assim no desenvolvimento da capacidade discursiva dele. Ao tratar do título
(quadro presente na segunda página reproduzida (p. 244)), esse livro apresenta a relação
entre título e leitor, bem como a função daquele, atuando também no desenvolvimento
da capacidade da ação do aluno.
132
No quadro Como escrever um título jornalístico (presente na segunda página
reproduzida (p. 244)), recorre-se ao Manual de redação e estilo jornalístico do jornal O
Estado de S. Paulo para orientar as produções dos alunos. É nele que se apresentam os
elementos lingüísticos empregados nos títulos e seus efeitos de sentido.
Observe que esses exercícios expõem o adolescente de Ensino Médio à leitura de
outras notícias, contribuindo para a ampliação do repertório desse aluno na medida que
permite um pouco mais de contato com o gênero. Quanto à forma de apresentação nas
atividades, as notícias podem ser perfeitamente reconhecidas como tal, assim atua-se no
desenvolvimento da capacidade de ação mais uma vez.
Vejamos também como o livro 4 (PEC) mobiliza as capacidades discursivas dos
alunos:
133
Livro 4 (PEC), 2004, p. 701-702.
Nestas reproduções, o livro dedica-se ao trabalho com elementos estruturais da
notícia como: a elaboração e função do tulo e do lide, recorrendo ao manual do jornal
O Estado de S. Paulo e a exemplos que atuarão como modelos para a produção dos
alunos. Assim, pode-se propiciar o desenvolvimento das capacidades discursivas do
estudante, correspondendo ao nível da infra-estrutura textual, segundo o modelo de
Bronckart (2003; 2008).
134
Esperamos que, por meio da apresentação dessas páginas, conseguimos ilustrar o modo
como são abordados os elementos da infra-estrutura textual do gênero notícia nos livros
de Português de Ensino Médio.
O quadro seguinte traça o panorama geral das operações de linguagem, referentes
à capacidade discursiva, trabalhadas em cada uma das obras:
QUADRO 25. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas
no ensino da notícia
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do
gênero notícia
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
Capacidades
discursivas
Apresentação e organização global do gênero
Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero
(título, lide e corpo de texto);
X
X
X
X
Compreender a função de cada elemento
estrutural;
X
X
X
X
Reconhecer os acompanhantes do gênero como
fotos e legendas;
X
X
X
Reconhecer e empregar o tipo de discurso
característico do gênero: discurso narração;
Selecionar previamente eventos;
X
X
X
X
Conhecer e empregar planificação script ou relato.
Concluímos que os livros tendem a tratar de alguns aspectos em detrimento a
outros, decorrência do processo de didatização do gênero (SCHNEUWLY; DOLZ,
2004). Conforme o quadro sinaliza, nesses livros mobilizam-se de algum modo, ou seja,
mesmo que superficialmente, operações que poderão desenvolver capacidades
discursivas dos alunos de Ensino Médio.
Na próxima seção, analisaremos a ocorrência de operação de linguagem que
enfatizam o desenvolvimento da capacidade lingüístico-discursiva dos estudantes.
4.4.6 O gênero notícia e as capacidades lingüístico-discursivas
A capacidade lingüístico-discursiva corresponde ao nível intermediário e
superficial dos textos no modelo de Bronckart (2003; 2008). Refere-se, especificamente,
ao domínio dos mecanismos lingüísticos e enunciativos e seus efeitos de sentido.
Assim para o domínio do texto do gênero notícia, o aluno deve saber empregar:
mecanismos textuais que mantenham a coesão e a coerência do texto; a modalidade
135
adequada da língua; elementos lexicais adequados; organizadores temporais e espaciais;
vozes verbais; mecanismos de modalização; recursos lingüísticos que produzam o efeito
de objetividade, imparcialidade e credibilidade. Para que os livros didáticos propiciem o
desenvolvimento da capacidade lingüístico-discursiva do estudante devem ser
trabalhadas operações de linguagem que abordem tais elementos descritos.
De modo geral, as operações que se destacam nos livros analisados são as que se
relacionam com: mecanismos coesivos, o emprego das aspas para produzir o efeito de
credibilidade e veracidade aos fatos narrados, mecanismos de modalização e a
modalidade adequada da língua. Os mecanismos lingüísticos empregados para se apagar
as marcas do autor e garantir o efeito de imparcialidade e neutralidade não são
mencionados e nenhuma das obras, assim como os organizadores temporais e espaciais
característicos nesse gênero por marcarem de modo pontual os acontecimentos.
Vejamos a reprodução de atividades que abordam operações lingüístico-
discursivas presentes nos livros didáticos analisados como forma de exemplificarmos
nossa análise:
136
Livro 3 (LP), 2005, p. 102.
A página reproduzida nos mostra o empenho desse livro em formar leitores
competentes para a leitura e interpretação desse gênero textual. A atividade 1 é
constituída de questões inferenciais nas quais o aluno deve mobilizar conhecimentos de
diferentes ordens para a construção das respostas. Tanto a atividade quanto o texto
didático-expositivo que a acompanha abordam a impossibilidade de neutralidade e de
imparcialidade à linguagem e ao jornalismo, mobilizando operações de linguagem que
implicam no desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas. Em seqüência à
atividade anteriormente reproduzida, o livro 3 traz o seguinte exercício de produção:
137
Livro 3 (LP), 2005, p. 103.
A proposta de produção de texto é coerente com a atividade anterior, pois
permanece na mesma linha de raciocínio, isto é, mantém-se no trabalho centrado nas
marcas da subjetividade do autor, fazendo com que o estudante coloque em prática as
orientações expositivas dadas e os conhecimentos apreendidos por meio da análise da
notícia apresentada para estudo e produza sua notícia empregando recursos lingüísticos
que criam o efeito da neutralidade e imparcialidade no texto.
Embora tal obra enfoque poucas operações de linguagem referentes ao
desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do estudante no trabalho com o
gênero notícia, nela é realizado um trabalho profundo quanto as marcas modais e a
138
neutralidade da linguagem, fato que não ocorre nos outros livros de Ensino Médio
analisados que passam rapidamente por algumas operações sem se aprofundar em
nenhuma.
Por meio do quadro seguinte, pensamos sinalizar as operações lingüístico-
discursivas mobilizadas no ensino da notícia, as quais poderão implicar no
desenvolvimento da respectiva capacidade de linguagem:
QUADRO 26. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem
abordadas no ensino da notícia
Concluímos que, embora sejam pouco trabalhadas as operações de linguagem
referentes à capacidade lingüístico-discursiva exigidas para o domínio da notícia,
algumas delas são ensinadas nos livros, ficando a cargo do professor complementar a
abordagem dada nesses livros de Português de Ensino Médio de modo a ampliar o
desenvolvimento dessa capacidade de linguagem do estudante, de acordo com as
possibilidades de seu agir docente, isto é, de acordo com elementos que influenciam seu
trabalho como: comunidade em que a escola está inserida, prescrições internas e
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do
gênero notícia
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
Capacidades
lingüístico-discursivas
Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos
e seus efeitos de sentido
Empregar a modalidade da língua característica do
gênero: modalidade padrão;
X
X
Selecionar adequadamente o léxico;
X
Manter coerência e coesão;
X
X
X
Empregar organizadores temporais e espaciais
adequadamente;
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: a atribuição das informações
às fontes, o emprego de aspas para indicar a
transcrição fidedigna das falas;
X
X
X
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: o uso da terceira pessoa do
discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice
de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva
(sintética ou analítica) para apagar as marcas do
autor;
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: a ausência de adjetivos ou
expressões qualificativas para se apagar as marcas
modais (avaliações, julgamentos, etc.);
X
X
X
X
Identificar e empregar vozes implícitas.
139
externas à instituição, alunos, seus pais, grupo docente, direção escolar, entre outros,
que de alguma forma atuam em sua prática profissional.
4.4.7 Capacidades de linguagem e o ensino da notícia
Por meio da análise dos capítulos ou módulos dedicados ao ensino do gênero
textual notícia, concluímos que a tendência à abordagem de certas características em
detrimento a outras, processo necessário para que o gênero social torne-se um gênero a
ser ensinado e aprendido, ou seja, para que ocorra sua didatização o gênero passa por
um processo de simplificação em que algumas de suas características são silenciadas
(SCHNEUWLY; DOLZ, 2004). Chegamos, ainda, a conclusão de que as atividades
didáticas propostas à notícia podem implicar no desenvolvimento de capacidades de
linguagem do aluno, embora a capacidade lingüístico-discursiva seja pouco mobilizada,
enquanto as capacidades de ação e discursiva são enfatizadas.
O quadro, a seguir, sinaliza o panorama geral das operações de linguagem
mobilizadas nos livros de Língua Portuguesa analisados:
140
QUADRO 27. Gênero notícia: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros de
Português de Ensino Médio analisados
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do
gênero notícia
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
Capacidades de
ação
Situação de Produção (contextualização do gênero)
Levar em conta o suporte material em que veicula o
gênero;
X
X
X
X
Apresentar o gênero em seu formato de circulação
social;
X
X
Identificar e considerar o público-alvo esperado;
K
X
X
Identificar e considerar o lugar e o momento da
produção;
Precisar a intenção da produção.
Conteúdo Temático
Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de muitas
pessoas, improváveis de acontecer, que possivelmente
despertem a curiosidade ou que haja identificação com o
público-alvo;
X
X
Apresentar fatos atuais, verdadeiros e precisos;
X
Capacidades
discursivas
Apresentação e organização global do gênero
Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero
(título, lide e corpo de texto);
X
X
X
X
Compreender a função de cada elemento estrutural;
X
X
X
X
Reconhecer os acompanhantes do gênero como fotos e
legendas;
X
X
X
Reconhecer e empregar o tipo de discurso característico
do gênero: discurso narração;
Selecionar previamente eventos;
X
X
X
X
Conhecer e empregar planificação script ou relato.
Capacidades
lingüístico-discursivas
Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos e
seus efeitos de sentido
Empregar a modalidade da língua característica do
gênero: modalidade padrão;
X
X
Selecionar adequadamente o léxico;
X
Manter coerência e coesão;
X
X
X
Empregar organizadores temporais e espaciais
adequadamente;
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: a atribuição das informações às
fontes, o emprego de aspas para indicar a transcrição
fidedigna das falas;
X
X
X
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: o uso da terceira pessoa do
discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de
indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva
(sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor;
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: a ausência de adjetivos ou
expressões qualificativas para se apagar as marcas modais
(avaliações, julgamentos, etc.);
X
X
X
X
Identificar e empregar vozes implícitas.
X
X
X
X
X
X
X
141
Das 22 operações de linguagem a que chegamos para a construção do modelo
didático do gênero notícia, muitas delas foram de alguma forma tratadas nos livros
didáticos. O livro 1 (PL) abordou 67% das operações necessárias ao domínio do gênero
notícia, os livros 3(LP) e 4 (PEC) trabalharam com 52% das operações e o livro 2
(PLC) somente com 43% delas.
De forma geral, uma tendência a se trabalhar com algumas das características
do gênero em detrimento a outras. As operações de linguagem relacionadas: ao suporte
material da notícia, às intenções de produção, aos elementos estruturais (título, lide,
corpo de texto) e suas funções e à seleção de eventos a serem noticiados são trabalhadas
em todos os livros de Português analisados, correspondendo a 29% das operações
exigidas ao domínio da notícia. a porcentagem que equivale às operações que não
foram trabalhadas de nenhum modo nesses livros corresponde a 19%, sendo elas
vinculadas: aos tipos de discurso e planificação característicos do gênero, aos
organizadores espaciais e temporais, aos recursos lingüísticos utilizados para se apagar
as marcas de subjetividade e ao uso de vozes implícitas e explícitas e seus efeitos de
sentidos.
Tais operações que foram negligenciadas estão, em sua maioria, 60%, implicadas
no desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do aluno e 40% no
desenvolvimento de capacidades discursivas. Portanto a capacidade privilegiada nos
livros foi a capacidade de linguagem referente à ação. O quadro, a seguir, apresenta o
quanto foi trabalhado de cada capacidade nos livros analisados:
QUADRO 28. Porcentagem de cada capacidade de linguagem trabalhada
no ensino do gênero notícia
Livros/
Capacidades de linguagem
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Livro 3
(LP)
Livro 4
(PEC)
Capacidades de ação
86%
29%
57%
71%
Capacidades discursivas
67%
50%
67%
67%
Capacidades lingüístico-discursivas
50%
50%
37%
25%
Como o quadro sinaliza, quanto ao ensino da notícia os livros 1 (PL) e 4 (PEC)
enfatizam o trabalho com a capacidade de ação do aluno, o livro 3 (LP) enfoca mais
142
as capacidades discursivas e o livro 2 (PLC) prioriza tanto a capacidade discursiva
quanto a lingüístico-discursiva. Desta forma, o ensino está, principalmente, focado na
contextualização desse gênero e em sua organização textual (infra-estrutura), entretanto
ao não se ensinar os efeitos de sentido dos mecanismos de textualização e enunciativos
empregados nesse gênero, referentes à capacidade lingüístico-discursiva,
conseqüentemente não se prepara o aluno de Ensino Médio para dominar a notícia, pois
para tanto não basta contextualizá-la e conhecer sua organização textual se
compreender os efeitos de sentido nela implicados, caso contrário, o aluno não
dominará os conhecimentos necessários para agir e posicionar socialmente por meio
desse gênero textual.
Passemos à análise das atividades didáticas propostas ao ensino do gênero
reportagem.
4.5 O gênero reportagem
Nesta seção, analisaremos a forma de apresentação do gênero textual reportagem,
a abordagem dada a ele e os tipos de atividades didáticas propostas a seu ensino,
relacionando-as as capacidades de linguagem dos alunos que poderão ser mobilizadas e
desenvolvidas.
O gênero textual reportagem é objeto de ensino de dois dos livros do corpus, livro
1 (PL) e livro 2 (PLC). Vejamos como se organizam os capítulos
9
dedicados a esse
gênero nos livros analisados:
9
Os capítulos encontram-se na seção de anexos deste trabalho, correspondendo ao Anexo I, as páginas
analisadas do livro1, e ao Anexo II, as do livro 2.
143
QUADRO 29. Organização dos capítulos dedicados ao ensino da reportagem
Livro 1 (PL)
Livro 2 (PLC)
Capítulos
Cap. 24 A reportagem
(3 páginas)
Cap. 15 Texto informativo: a
reportagem (9 páginas)
Descrição das
seções internas aos
capítulos
Trabalhando o gênero (traz o
texto principal; estudo do texto;
exposição didática)
Produzindo a reportagem
(proposta de produção de texto)
Texto 1 (traz o texto principal e
atividades de estudos)
Praticas de escrita (proposta de
produção de resumo do texto principal)
Texto 2 (traz o e atividades de
estudo)
Pratica de escrita (proposta de
complementação do texto 2)
Texto 3 (traz reportagem com
infográfico e atividades de estudo)
Pratica de escrita (proposta de
produção de texto que traduza as
informações contidas no gráfico
apresentado)
De olho na língua (ensino descritivo
do verbo haver, crase, aposto e
sentenças complexas com base em
frases dos textos estudados; traz
exposição e atividades)
Observando aspectos gráficos (traz 2
atividades que abordam o uso de aspas
e a acentuação de algumas palavras,
respectivamente)
Pausa poética (traz poema com
relação temática com o texto 2; leitura
complementar)
Como é demonstrado no quadro anterior, o trabalho com o gênero reportagem é mais
extenso no livro 2. Enquanto o livro 1 organiza-se em torno de uma única reportagem principal, o
outro organiza-se em torno de três reportagens tidas como textos principais.
Quanto à estruturação dos capítulos, podemos observar que é organizada de modo
tradicional: texto, atividades de estudo do texto, produção de texto e ensino de tópicos
gramaticais. Assim mudam-se as teorias de ensino de língua e os autores de livros didáticos as
adaptam ao modelo cristalizado, sendo abordados os gêneros das mais distintas esferas sociais
da mesma maneira, não se aproveitando as especificidades de cada gênero para se inovar o modo
de ensino.
Ressaltamos que o ensino de tópicos gramaticais é desarticulado do ensino do gênero
textual. Ocorre no livro 2 o ensino de gramática descritiva abordando o verbo haver, a crase, o
144
aposto e alguns tipos de sentenças complexas, recorrendo às frases das reportagens em estudo
apenas para exemplificação, sem qualquer relação com o gênero.
Portanto perdeu-se a oportunidade de se trabalhar elementos lingüísticos característicos da
concretização dos textos de gênero reportagem como:
os organizadores espaciais e temporais (advérbios e locuções adverbiais) freqüentemente
empregados para localizar precisamente os fatos narrados;
o uso da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de
indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as
marcas do autor e exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade;
o emprego das aspas para introduzir vozes no texto usado para exprimir o efeito de
veracidade e propiciar credibilidade à reportagem.
O estudo de tais mecanismos oferecidos pela língua propiciariam o desenvolvimento de
capacidades lingüístico-discursivas do aluno, entretanto como há a ausência de um trabalho
voltado ao desenvolvimento de tais capacidades não aprofundaremos na análise das seções
dedicadas a tópicos gramaticais por não haver relação com o gênero e assim fugir de nossa
proposta de análise.
Nas próximas seções trataremos da forma de apresentação e do conteúdo temático do
gênero reportagem nos livros analisados. Salientamos que esses dois elementos permeiam o
desenvolvimento da capacidade de linguagem referente à ação, isto é, para que o livro contribua
com o desenvolvimento da capacidade de ação do aluno diante do gênero reportagem, seja lendo-
o ou produzindo-o, é preciso que propicie meios de (re)conhecer sua forma e seu conteúdo
esperado. Assim trataremos da forma de apresentação da reportagem no livro de Português de
Ensino Médio.
4.5.1 A forma de apresentação do gênero reportagem
Partindo do princípio de que é necessário expor o aluno a textos do gênero reportagem
que sejam apresentados como veiculam em jornais e revistas, isto é, com título, subtítulo, texto
em colunas, acompanhados de fotos com legendas, quadros e gráficos, se possível, para que o
145
aluno reconheça-o, como é proposto por Schneuwly e Dolz (2004), descreveremos a análise da
forma de apresentação da reportagem em livros de Ensino Médio.
De modo geral, ocorrem as seguintes modificações no gênero reportagem nos livros de
Português analisados:
excluem-se partes do texto, quadros, fotos e legendas;
muda-se a posição da exibição de fotos;
não se traz o texto em colunas;
ausência de recursos gráficos presentes nos jornais e revistas.
No livro 1 (PL), o texto principal que inicia o estudo apresenta título, subtítulo, quadros
estatísticos e foto acompanhada de sua legenda, propiciando fácil reconhecimento do gênero.
Trata-se de uma reportagem de capa extraída da revista Isto é cujo título é Quero ser grande.
Mantém-se o estilo textual jornalístico organizado em colunas e fazem-se as devidas indicações
de que a reportagem foi adaptada.
146
147
148
149
Livro 1 (PL), 2005, p. 291-294.
Como as reproduções mostram, a reportagem é extensa, ocupando quatro páginas do livro,
constituindo-se como uma excelente seleção textual dos autores, por apresentar tal elemento
característico da reportagem: maior extensão textual que a notícia, que é uma complementação
àquela. De modo a verificarmos se as características do gênero foram realmente respeitadas no
150
livro, chegamos à versão original da reportagem. A data de tal edição é 5/5/2004. Observamos
que foi excluída da reportagem original sete das fotos que acompanham o texto na revista.
Quanto ao texto, são eliminados parágrafos e subtítulos, mas a devida indicação textual de
adaptações.
No livro 2 (PLC), duas das reportagens são retextualizadas, isto é, a ausência de texto
em colunas, subtítulo, gráficos, quadros, foto e legenda, com a exceção de no texto 2 haver um
subtítulo. Vejamos como é apresentada a reportagem que inicia o capítulo de estudo do gênero no
livro 2:
151
152
153
Livro 2 (PLC),2003, p. 214-216.
Como podemos apreender, ocorre o desrespeito das características constitutivas do gênero,
quanto a seu formato de circulação social.
Na mesma obra, na apresentação do texto 3, Obesidade muda oferta de comida no mundo,
reportagem da Folha de S. Paulo de 6/07/2003, mantém-se fielmente as características do gênero,
chegando a reproduzir a cor da página do jornal, os tamanhos e os tipos de letras do título,
154
subtítulo e o texto em colunas com as devidas distinções, acompanhados pelo infográfico que
complementa a reportagem.
155
156
Livro 2 (PLC), 2003, p. 222-224.
Concluímos que a forma de apresentação dos textos do gênero reportagem nos livros
didáticos precisa ser repensada e melhorada, ora o livro traz o gênero com suas características
sociais de apresentação, como na reportagem apresentada anteriormente, revelando indícios de
que as teorias de ensino de ngua centradas no gênero estão aos poucos permeando o livro
157
didático; ora as ignora, transmutando o gênero, como ocorre na reportagem Charada no Cafundó,
do mesmo livro.
Assim crê-se que os livros trazem os gêneros como melhor os convier, em momentos
estando de acordo com as teorias recentes, em outros as ignorando, revelando um pouco do
processo de mudança que vem sofrendo os livros didáticos contemporâneos devido ao
desenvolvimento de novos estudos. Entretanto é preciso haver rigor quanto à forma de
apresentação desses gêneros e reconhecer que a forma de configuração deles é elemento
constitutivo de seus sentidos. Não se uma reportagem, por exemplo, da mesma maneira que a
um conto. Não se contribuirá para que o aluno desenvolva tal consciência, se alguns livros de
Português os apresentam da mesma maneira sem realizar qualquer tipo de sinalização.
de se manter as características que garantem o reconhecimento social do gênero
reportagem como o título, o subtítulo, o texto em colunas, e seus acompanhantes: fotos com
legendas, quadros e gráficos, se possível. Caso contrário, não sepropiciado o desenvolvimento
da capacidade de linguagem referente à ação, pois o aluno somente saberá agir ativamente, seja
lendo-o ou produzindo-o, se dominar a forma constitutiva desse gênero e reconhecê-la como tal.
Trataremos na próxima seção do conteúdo temático apresentado nas reportagens
selecionadas para compor os capítulos voltados a seu ensino.
4.5.2 O conteúdo temático do gênero reportagem
Ressaltamos que o conteúdo temático é constitutivo do gênero na medida em que um
conjunto de temas comunicáveis e aceitos a cada tipo de gênero. Em reportagens, por exemplo, é
esperado o relato de fatos atuais ou contemporâneos que, de alguma forma, possa despertar o
interesse de seu público-alvo. Causaria estranheza se uma revista voltada a adolescentes
apresentasse reportagens sobre a crise na bolsa de valores, assunto alheio ao universo jovem.
Assim buscaremos analisar se a seleção textual dos livros de Português relaciona-se com
possíveis interesses dos adolescentes de Ensino Médio e se o conteúdo temático do gênero é
relacionado, de alguma forma, a sua concretização social nas abordagens dos livros.
Quanto à análise do conteúdo temático, no livro 1 (PL) a seleção do tema do texto está
coerente com o universo dos adolescentes de Ensino Médio. A reportagem apresentada nesse
158
livro
9
trata da juventude brasileira, expondo resultado de pesquisa de grande representatividade
que buscou traçar o perfil do jovem.
Já no livro 2 (PLC) tal relação entre leitor-conteúdo temático não ocorre na primeira
reportagem apresentada na obra. Esse livro traz três textos principais, o primeiro, Charada no
Cafundó
10
, é uma reportagem que trata de uma comunidade brasileira que ainda usa palavras de
uma língua de origem africana, tema importante a ser tratado do ponto de vista de ensino de
língua, porém o texto veiculou na revista Veja de 26/04/1978, pensamos que seria mais produtivo
tratar de textos mais atuais já que o capítulo propõe-se a ensinar um gênero relacionado à
atualidade, visto que a reportagem foi publicada 30 anos e talvez tal comunidade possa até ter
deixado de existir. Assim, a presença de tal reportagem sinaliza a preocupação do autor com o
conteúdo em detrimento ao ensino do gênero reportagem como forma de um agir linguageiro, isto
é, o gênero é usado como suporte de conteúdo temático ao invés de ser abordado como um modo
de agir socialmente, que se desprezou o caráter temporal da reportagem e também a relação
entre conteúdo e leitor que se opera nos gêneros textuais.
A segunda reportagem do livro 2, A hora do lobo
11
, da revista Caminhos da Terra de junho
de 2002, trata da possibilidade do lobo-guará não ser mais considerado um animal em extinção,
tema que aproxima o jovem dos problemas ambientais atuais. A terceira reportagem apresentada
nesse livro trata de um assunto que faz parte do cotidiano de todos: a obesidade, tema que poderá
contribuir para os estudantes conscientizarem-se da importância de uma alimentação adequada.
De forma geral, os temas de algumas das reportagens se aproximam do universo dos
adolescentes e podem contribuir com sua formação cidadã ao abordar questões de saúde e meio
ambiente. Entretanto, quanto o tratamento da relação entre conteúdo e concretização social do
gênero reportagem, no livro 2 (PLC) nada se menciona e no livro 1 (PL) são realizadas ressalvas
nas instruções da atividade de produção de texto.
Assim sendo, no ensino do gênero reportagem não ocorre o estudo sistematizado da
relevância do conteúdo temático como elemento constitutivo do gênero, conhecimento necessário
ao domínio de qualquer gênero de texto. Desta forma, perde-se uma oportunidade nesses livros
de contribuir para o desenvolvimento da capacidade de linguagem do aluno referente à ação.
A seguir, trataremos das atividades didáticas propostas ao ensino do gênero reportagem.
9
Disponível no Anexo I.
10
Disponível no Anexo II.
11
Disponível no Anexo II.
159
4.5.3 Atividades propostas ao ensino do gênero reportagem
Os textos do gênero reportagem iniciam os capítulos e são seguidos por atividades didáticas
voltadas a seu ensino. Tais atividades são de dois tipos: leitura e produção de texto. As atividades
de leitura são predominantes nos livros e enfocam, principalmente, a compreensão do conteúdo
do gênero e seus elementos estruturais. As atividades de produção também testam a capacidade
de compreensão do aluno e permitem que ele exercite o que aprendeu no decorrer do capítulo
produzindo um texto do gênero reportagem. Geralmente, a produção escrita finaliza o estudo do
gênero e é seguida pelo ensino de tópicos gramaticais quaisquer.
Iniciaremos pela análise das atividades de leitura que se constituem em perguntas. Para
tanto, recorreremos à tipologização elaborada por Marcuschi (2003), a qual já descrevemos.
Apresentaremos os tipos de questões propostas aos textos de gênero reportagem nos livros
didáticos analisados no quadro a seguir:
QUADRO 30. Perguntas empregadas no ensino da reportagem
Tipos de perguntas
(Marcuschi)
Ocorrências
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
10. A cor do cavalo
branco de Napoleão
__
__
11. pias
1
(5,5%)
4
(8%)
12. Objetivas
4
(21%)
31
(65%)
13. Inferenciais
5
(26%)
5
(10%)
14. Globais
3
(16%)
1
(2%)
15. Subjetivas
__
1
(2%)
16. Vale-tudo
__
__
17. Impossíveis
1
(5,5%)
6
(13%)
18. Meta-lingüísticas
5
(26%)
__
Total
19
(100%)
48
(100%)
160
Como mencionamos, o livro 2 (PLC) apresenta um trabalho mais extenso ao ensino da
reportagem, centrando-se em torno de 3 textos principais, daí a diferença entre o número de
questões entre os livros, entretanto o livro 1(PL) é o volume destinado a apenas a série do
Ensino Médio e o livro 2 a essa etapa completa da educação. Como o quadro ilustra, de modo
geral, destacam-se as perguntas do tipo objetivas, ou seja, perguntas voltadas a identificação de
conteúdos estritamente inscritos no texto, tratando-se de atividades de decodificação que testam a
capacidade do aluno de localizar informações no texto. Portanto, grande parte das atividades de
perguntas propostas em capítulos que se propõem ao ensino do gênero reportagem não abordam
as características do gênero ou mesmo o gênero, mas a localização do conteúdo temático inscrito.
Vejamos um exemplo desse tipo de atividade:
Livro 2 (PLC), 2003, p. 216.
Observe que todos os itens da atividade anterior indagam aspectos bem pontuais do texto,
isto é, conteúdo temático estritamente inscrito, cabendo ao aluno identificá-lo e copiá-lo. Em
atividades como essa não se mobiliza conhecimentos mais sofisticados do aluno como refletir,
analisar, comparar na busca da construção da resposta.
Compartilhamos da afirmação de Marcuschi (2003) de que nos livros didáticos ocorre a
confusão terminológica entre decodificação e compreensão, possivelmente conseqüência dos
fatores mercadológicos que influenciam na produção de livros didáticos e/ou da falta de
embasamento teórico de seus autores. As atividades propostas não testam a capacidade de
161
compreensão do aluno, mas a capacidade de localizar ou decodificar informações, havendo a
ausência de mobilização da capacidade de análise crítica do aluno, além das capacidades de
realizar inferências, de relacionar conhecimentos lingüísticos, pessoais, enciclopédicos,
operações implicadas nas perguntas do tipo inferencial e global na classificação do autor, as quais
são pouco trabalhadas no livro 2, correspondendo à 10% das ocorrências e no livro 1 (PL) à 26%,
como o quadro mostra. A reprodução, a seguir, traz um exemplo de pergunta do tipo inferencial:
Livro 1 (PL), 2005, p. 296.
Para construir a resposta a essa indagação reproduzida, o aluno deverá mobilizar
conhecimentos de diferentes ordens: textuais, lingüísticos, extra-textuais, de modo a analisar
criticamente a reportagem estudada na busca de suas características, assim a classificamos como
do tipo inferencial. Por meio dela é possível avaliar os conhecimentos adquiridos nas atividades
proposta a esse gênero no decorrer do capítulo. Essa atividade será retomada em outro momento
da análise.
No livro 1 (PL), os tipos de perguntas que se destacam são as inferenciais (26%), já
descritas, e as meta-lingüísticas (26%), isto é, aquelas que indagam sobre a estruturação do texto,
utilizando-se geralmente de meta-linguagem, fato que sinaliza a ênfase ao desenvolvimento de
capacidades discursivas de linguagem nessa obra.
As perguntas impossíveis, a segunda tipologia de pergunta que se destaca no livro 2 (PLC),
dizem respeito a questões que indagam sobre elementos não estudados ou retomados no capítulo.
Salientamos que o livro 2 organiza-se, conforme as palavras do autor no livro do professor e a
resenha do catálogo do PNLEM/2009, em capítulos independentes. Entretanto isso não ocorre
quanto ao ensino de gêneros jornalísticos, pois se a seqüência dos capítulos 13,14 e 15 não for
seguida, muito se perderá sobre o conteúdo. Nessa obra, o capítulo 13 trata do jornal, sua função
e seus textos, como apresentamos. A seguir, o capítulo14, aborda a notícia sem retomar as
especificidades de sua esfera de comunicação de modo a pressupor que o aluno a conheceu no
estudo anterior. É nesse capítulo sobre a notícia que são sistematicamente trabalhadas as
principais características dos textos informativos, como designa o autor. Enfim, no capítulo 15,
162
dedicado ao ensino da reportagem, é pressuposto que o aluno já estudou a esfera de comunicação
e as características do gênero reportagem que na perspectiva do autor trata-se de um tipo de texto
informativo. Devido à relação de dependência entre os conteúdos do livro 2, são propostas 6
perguntas (sendo elas: 2. d/ e/ p. 217; 3.a/ b/c/d/ p. 221) as quais consideramos impossíveis, em
que o aluno deve avaliar as qualidades do texto informativo, sem tê-las estudado no capítulo em
questão. Vejamos a reprodução de uma dessas atividades:
Livro 2 (PLC), 2003, p. 221.
A atividade de mero 3 pede que o aluno avalie as qualidades do texto, porém os
conhecimentos necessários a tal tarefa não lhe são apresentados nem retomados. Assim,
possivelmente, as respostam a essas indagações ficarão no campo da opinião, que não se
instrumentaliza o estudante para respondê-las.
No livro 1 (PL), também há a ocorrência de uma questão do tipo impossível:
Livro 1 (PL), 2005, p. 295.
O item „c‟ da atividade reproduzida pede que o aluno indique se o discurso empregado em
um determinado trecho da reportagem é direto ou indireto, entretanto não se trabalhou nem
retomou no capítulo tais elementos. Como o aluno não é instrumentalizado a responder tal
indagação a classificamos como impossível.
163
As atividades de produção de texto são propostas em ambos os livros. O livro 1 (PL) traz
uma proposta coerente com o ensino de língua centrado nos gêneros, embora propicie pouca
exposição a ele (uma única reportagem), há a sistematização de algumas características da
reportagem com vistas a seu domínio, como é proposto por Schneuwly e Dolz (2004).
Conseqüentemente ocorre a simplificação desse gênero, pois são enfatizadas algumas de suas
características em detrimento a outras, processo normal, segundo esses autores, para que se a
didatização e o processo de ensino dos gêneros.
Pensamos que a atividade de produção textual do livro 1 (PL), a qual será abordada à
frente, simplificou o gênero reportagem como esperado. Entretanto, são apresentados dados da
condição de produção: adequação entre assunto, público-alvo e suporte material, uma vez que o
texto será fixado no mural da escola, o leitor esperado será o jovem estudante, assim os temas
sugeridos vinculam-se a esse universo e a atualidade; além da atenção dada às características
estruturais do gênero, há, portanto, preocupação com aspectos que garantem o sucesso do gênero
na elaboração da proposta de produção.
No decorrer do capítulo da reportagem do livro 1, apresentam-se como suas características:
citações de pesquisas, trechos de entrevistas, dados estatísticos, boxes informativos, tabelas e
gráficos, os quais estão presentes no texto principal. Porém, não se aborda a função nem o modo
de utilizar esses recursos no texto, mas na proposta de produção de texto o aluno deverá pesquisar
um dos assuntos dados, colher opiniões e realizar entrevistas sobre o tema para a redação de uma
reportagem. As atividades propostas ao estudo desse gênero não instrumentalizam o estudante
para a realização de tal tarefa. A partir da realização de entrevistas, gênero específico que
prescinde de certas normas e características que não foram trabalhadas ou de alguma forma
retomadas, e da coleta de opiniões, o aluno deverá produzir a reportagem. Assim a abordagem
dada a essa produção ignora os outros gêneros que a permeiam, simplificando-os.
Concluímos que, na proposta de produção do gênero do livro 1 (PL), enfatiza-se o
desenvolvimento das capacidades de ação, ao fornecer as condições de produção, e as
capacidades discursivas, ao pedir que o estudante empregue a estrutura do gênero, fazendo com
que exercite o que estudou no capítulo, em detrimento das capacidades lingüístico-discursivas.
Já no livro 2 (PLC), há três propostas de produção de texto, a saber:
164
na primeira, propõe-se que o aluno redija um resumo sobre a reportagem Charada no
Cafundó, portanto o objetivo é testar a compreensão do aluno a respeito do conteúdo da
reportagem;
na segunda proposta, o aluno deve complementar a reportagem A hora do lobo com um
parágrafo incluindo o posicionamento do Ibama sobre o assunto;
na terceira atividade de produção, o aluno deve escrever um texto traduzindo as
informações sobre o gráfico apresentado, objetivando testar a leitura do gráfico realizada
pelo aluno.
Portanto, nesse livro a atividade de produção não busca o domínio do gênero de texto
reportagem, mas somente avaliar a capacidade de compreensão do aluno quanto ao conteúdo dos
textos estudados.
Grande parte das atividades didáticas, tanto de leitura quanto de produção, presentes nos
capítulos de ensino de reportagem centram-se na localização de informações referentes ao
conteúdo temático do texto, não sendo o gênero em si enfocado e sim servindo como suporte para
o estudo de conteúdo temático. Assim o gênero reportagem é depositário de conteúdos sob os
quais se avalia a capacidade de decodificação e compreensão do aluno.
Porém não podemos ignorar que no livro 1 (PL) atividades que contribuem para o
desenvolvimento de capacidades de ação. Nesses livros didáticos de Português também se
buscam tratar da estrutura textual da reportagem, sinalizando possível ênfase no desenvolvimento
da capacidade discursiva do aluno. Os elementos característicos do gênero que nos parecem mais
comprometidos são os referentes às capacidades lingüístico-discursivas exigidas para o domínio
da reportagem, como os mecanismos lingüísticos empregados para produzir o efeito da
objetividade, impessoalidade e veracidade, que não são tratados. Vejamos como tais elementos
são trabalhados em uma das atividades do livro 1:
165
Livro 1 (PL), 2005, p. 296.
Por exemplo, na atividade „a‟ do exercício 8, é pedido que o aluno assinale a alternativa que
apresente as características da linguagem da reportagem, é considerada como correta, no manual
do professor, a alternativa que a traz como “clara, objetiva, direta...”, sem qualquer ressalva
quanto aos mecanismos lingüísticos que produzem esses efeitos. Assim perdeu-se a oportunidade
de trabalhar tais mecanismos e mobilizar as capacidades lingüístico-discursivas.
Como nossa proposta trata-se da análise das atividades voltadas ao ensino do gênero
reportagem e das capacidades de linguagem que poderão ser desenvolvidas por meio delas,
passaremos a expor as atividades que mobilizam tarefas exigidas ao desenvolvimento de
capacidades de linguagem dos alunos para o domínio de tal gênero jornalístico nos livros de
Português de Ensino Médio na seção seguinte.
4.5.4 O gênero reportagem e as capacidades de ação
Como postulam Schneuwly e Dolz (2004), as capacidades de linguagem são
conhecimentos exigidos para o domínio dos gêneros, assim para que haja a aprendizagem do
gênero reportagem os livros didáticos devem propor atividades que desenvolvam tais capacidades
dos alunos.
Neste momento, optamos por apresentar a análise das atividades propostas ao ensino do
gênero reportagem, incluindo atividades de leitura (perguntas), produção escrita e sistematização
didática, as relacionando às respectivas capacidades de linguagem ação, discursiva e
166
lingüístico-discursiva que poderão ser desenvolvidas do aluno. Iniciaremos a exposição pela
capacidade de ação.
A capacidade de ação refere-se à capacidade de contextualizar o gênero à circunstância de
interação, adaptando-o ao receptor/destinatário, à esfera de comunicação, enfim ao objetivo da
ação de linguagem. Segundo o modelo didático que elaboramos para a reportagem, as operações
de linguagem ou as tarefas a serem aprendidas pelo estudante que propiciam o desenvolvimento
de capacidades de ação correspondem a atividades didáticas que, de alguma forma, enfoquem as
condições de produção: público-alvo esperado, o suporte material em que veicula, o conteúdo
temático dizível, o lugar e o momento de produção, as intenções, além da exposição do aluno ao
formato do gênero que circula socialmente para que possa ocorrer seu reconhecimento fora do
ambiente escolar.
Quanto à apresentação do formato real do gênero e quanto ao conteúdo nele esperado
tratamos anteriormente. Na apresentação ocorrem as seguintes modificações no gênero
reportagem nos livros de Português analisados:
excluem-se partes do texto, quadros, fotos e legendas;
muda-se a posição da exibição de fotos;
não se traz o texto em colunas;
ausência de recursos gráficos presentes nos jornais e revistas.
Esses elementos são constitutivos do gênero o qual é facilmente reconhecido por meio
deles, pois não é necessário ler uma reportagem para perceber de que gênero trata-se basta avistá-
la. Entretanto das quatro reportagens que veiculam os capítulos que analisamos, duas delas
podem ser claramente reconhecidas como tal, isto é, o formato mantém-se como o característico
da reportagem mesmo com algumas modificações como mudança da posição da foto, ausência da
legenda, entre outras, as quais constatamos com a comparação com as versões originais. As duas
reportagens que restaram são retextualizadas, o formato da apresentação social não é respeitado,
havendo nesses casos o comprometimento da capacidade de ação do aluno, pois não se da
mesma maneira um fragmento de romance e uma reportagem, por exemplo, cada um pertence a
uma esfera social específica.
O conteúdo temático é constitutivo do sucesso do nero, o estudante deve apreender que
uma reportagem não relata quaisquer fatos, mas aqueles que despertarão, de algum modo, o
167
interesse do público a que esse texto se destina. Assim os livros didáticos que se propõem ao
ensino desse tipo de gênero de texto têm de tratar dessa questão.
Infelizmente, o tratamento da relação entre conteúdo e concretização social do nero não
ocorre no livro 2 (PLC), sendo nessa obra nada mencionado sobre o assunto. No livro 1 (PL), o
único momento em que é ressaltada a relação entre conteúdo e público-alvo ocorre na atividade
de produção textual.
A atividade de produção de texto proposta no livro 1 permite que o aluno exercite o que
foi aprendido por meio da leitura da reportagem, das perguntas e da exposição didática
apresentada ao ensino do gênero, contribuindo para o desenvolvimento da capacidade de ação do
estudante na medida que fornece o contexto de produção:
suporte material: mural da escola;
público-alvo: estudantes;
temática proposta: assuntos atuais que permeiam o universo jovem.
Vejamos a reprodução da atividade:
168
Livro 1 (PL), 2005, p. 296.
Como podemos apreender, os vocábulos recente, atualmente, lançamento, do momento
presentes nos assuntos sugeridos para a produção, demonstram que a atividade está coerente com
a temática atual que permeia o gênero reportagem. Como a produção será destinada a estudantes,
os assuntos propostos condizem com os interesses de tal faixa etária. ainda o enfoque voltado
à busca de informações reais, verdadeiras, coletadas por meio de entrevistas, depoimentos e
169
pesquisas, elementos que realçam o caráter investigativo e preciso do gênero. Nas últimas
instruções é pedido que o aprendiz planeje o aspecto visual e um título que atraia a atenção do
leitor e anuncie o tema, marcando a função dessa estrutura textual, anunciar de modo atrativo o
assunto, considerando o destinatário. A atividade aborda também elementos referentes à
capacidade discursiva os quais trataremos na seção seguinte.
A definição da reportagem é trazida ao aluno, no livro 1, por meio das palavras de Bahia
que a caracteriza diferenciando-a da notícia. A longa citação desse estudioso da área de
comunicação apresentada no livro didático realça que “a notícia se esgota no anúncio; a
reportagem, porém, se esgota no desdobramento, na pormenorização, no amplo relato dos
fatos” com ênfase de que a reportagem deve apurar fatos que sejam e pareçam verdadeiros
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005, p. 295). Portanto, as palavras de Bahia permitem que o aluno
conheça as especificidades da reportagem para que possa agir ativamente por meio dela ao -la,
compreendê-la e produzi-la.
A seguir, reproduziremos a página que traz o texto de Bahia e as atividades de leitura
propostas à reportagem:
170
Livro 1 (PL), 2005, p. 295.
As perguntas da atividade 1 foram classificadas como globais, segundo a tipologia de
Marcuschi, por enfocarem o texto como um todo e prescindirem de conhecimentos textuais e
extra-textuais dos alunos. Por indagarem a respeito da intenção comunicacional do gênero e sobre
171
seu suporte material, pensamos que poderão contribuir com o desenvolvimento de capacidades de
ação.
A atividade 2 retoma os ensinamentos do capítulo 27 dedicado à notícia, o qual
analisamos, e indaga se no gênero reportagem é priorizada a informação ou o comentário. Tal
atividade foi classificada como inferencial por exigir que o estudante mobilize conhecimentos,
tanto textuais quanto enciclopédicos, a fim de construir uma análise crítica para respondê-la,
atuando também como atividade motivadora do desenvolvimento da ação do aluno por meio
desse gênero de texto.
As atividades 3 e 4 enfocam a compreensão da reportagem apresentada para estudo.
Classificamos como objetivas as perguntas: 3.b, 4.a/b, por indagarem sobre conteúdos inscritos
no texto, cabendo ao aluno apenas identificá-los; as perguntas: 3.a, 4. c, como inferenciais por
exigirem análise crítica do aluno. Nessas atividades, o gênero é usado para testar a capacidade de
decodificação do estudante e também para o ensino da textualidade sem relacioná-la ao gênero
em si.
As atividades 5, 6 e 7 enfocam questões relacionadas às capacidades discursivas e
lingüístico-discursivas, assim trataremos de sua análise à frente.
No livro 2 (PLC), a única ressalva a elementos que se referem à capacidade de ação é
apresentada superficialmente no parágrafo introdutório ao capítulo de ensino do gênero
reportagem. Nele é afirmado que “a reportagem é um texto mais extenso e resulta de uma
investigação mais detalhada dos fatos”, fazendo uma apresentação mais panorâmica e em maior
profundidade das informações”. Sobre o suporte material é dito que “ocorre nos jornais e
também, com mais freqüência, em revistas”. Vejamos tal reprodução:
172
Livro 2 (PLC), 2003, p. 214.
Tal obra centra-se no ensino de capacidades discursivas, em detrimento dos outros tipos de
capacidades de linguagem.
As atividades didáticas que tratam de alguma forma de operações de linguagem exigidas
para o desenvolvimento de capacidades de ação dos aprendizes em relação ao gênero reportagem
presentes nos livros analisados foram descritas no decorrer desta seção. O quadro a seguir traça o
173
panorama geral das operações que são abordadas nos livros de Português referentes às
capacidades de ação:
QUADRO 31. Capacidades de ação e as operações de linguagem abordadas no ensino da
reportagem
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio
do gênero reportagem
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Capacidades de
ação
Situação de Produção (contextualização do
gênero)
Levar em conta o suporte material em que
veicula o gênero e sua forma de apresentação;
X
X
Identificar e considerar o público-alvo
esperado;
K
X
Identificar e considerar o lugar e o momento
da produção;
Precisar a intenção da produção.
Conteúdo Temático
Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida
de muitas pessoas, improváveis de acontecer,
que possivelmente despertem a curiosidade ou
que haja identificação com o público-alvo;
X
Apresentar fatos contemporâneos,
verdadeiros e precisos;
X
Ampliar relato de fato já noticiado.
O quadro ilustra as diferenças de abordagens dadas ao ensino de gêneros nos livros
didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio. Enquanto o livro 1 dedica-se ao ensino de
operações de linguagem que preparam o aluno para a contextualização do gênero, o livro 2 pouco
mobiliza tais conhecimentos.
Concluímos que a abordagem do livro 1 pode propiciar o desenvolvimento das capacidades
de linguagem referentes à ação, dos aprendizes, exigidas para o domínio da reportagem. Já o livro
2 prescinde de complementação do professor para que os alunos desenvolvam as capacidades
necessárias a contextualização da reportagem e possam assim dominá-la socialmente. Caso
contrário, o gênero em si não será ensinado tornando-se apenas suporte para o estudo de conteúdo
temático.
A próxima seção abordará a mobilização da capacidade discursiva nas atividades propostas
ao ensino da reportagem.
X
X
X
X
X
174
4.5.5 O gênero reportagem e as capacidades discursivas
A capacidade discursiva diz respeito à capacidade de mobilizar conhecimentos referentes
à escolha e à organização de tipos discursivos adequados à situação de interação, isto é, saber
organizar um texto e nele posicionar-se de acordo com o plano comunicativo, corresponde aos
conhecimentos necessários à produção e compreensão do nível mais profundo da arquitetura
interna dos textos no modelo de análise de Bronckart (infra-estrutura).
Buscamos, nesse momento, apresentar as atividades didáticas propostas que podem atuar
no desenvolvimento de capacidades discursivas dos alunos nos livros didáticos analisados. O
livro 1 (PL) traz poucas atividades que abordam tal capacidade, especificamente a atividade de
pergunta de número 8 (itens c/d) e algumas das instruções da atividade de produção de texto
(itens a/f). Vejamos a reprodução, a seguir, em que as atividades são destacadas:
175
Livro 1 (PL), 2005, p. 296
O item „cda atividade de número 8 indaga sobre o tempo verbal e pessoa do discurso
predominantes. Essa atividade foi classificada como do tipo meta-lingüística, segundo a tipologia
de Marcuschi (2003), por enfocar aspectos formais do texto. Já o item seguinte, „d‟, foi
classificado como inferencial por exigir que o estudante associe conhecimentos lingüísticos,
contextuais e de mundo em busca de uma análise crítica para a construção das hipóteses pedidas,
pois ele deveria relacionar o tempo presente, predominante na reportagem, ao suporte material
original desse gênero, à sua função social e às intenções do autor. Entretanto, no livro do
professor, a essa pergunta é dada a indicação de que a resposta é pessoal, consideramos que por
176
meio dela são mobilizados conhecimentos pessoais além dos lingüísticos e contextuais, sem a
relação entre esses diferentes tipos de conhecimentos o aluno não realizará a análise crítica a que
a pergunta o expõe.
Outro momento em que as capacidades discursivas são tratadas ocorre nas instruções da
atividade de produção de reportagem. Os itens „a‟ e „f‟ abordam a forma de estruturação do texto
desse gênero, enfocando os elementos que o compõem como pesquisa de informações, coleta de
entrevistas (gênero estudado em capítulo anterior da obra), título, fotos, dados estatísticos,
tabelas, e a organização desses elementos na apresentação visual da reportagem. Assim a obra
aproxima o aluno da estrutura reconhecida socialmente desse gênero, propiciando o
desenvolvimento de capacidades discursivas exigidas para seu domínio.
O livro 2 (PLC) apresenta três textos principais seguidos pela seção Estudo do texto na
qual são realizadas perguntas sobre as reportagens. Nessa seção as atividades constituem-se em
perguntas que avaliam a capacidade de decodificação do aluno e em perguntas voltadas ao ensino
da estruturação dos parágrafos do texto. Pouco se explora as capacidades lingüístico-discursivas.
Vejamos a reprodução das atividades propostas à primeira reportagem a qual inicia o
capítulo de ensino desse gênero:
177
178
Livro 2 (PLC), 2003, p. 216-217.
Como podemos apreender, a atividade 1 centra-se na decodificação de informações
inscritas na reportagem, sendo classificadas como objetivas, com a exceção do item „d‟ que é do
tipo cópia, conforme a tipologização elaborada por Marcuschi (2003). Assim nela a ausência
de um trabalho voltado ao desenvolvimento de capacidades de linguagem.
179
A atividade 2 pede que o aluno verifique se a reportagem apresentada “tem as
qualidades de um bom texto informativo”, entretanto tais qualidades não foram ensinadas no
capítulo. Os itens „c‟ e „d‟ enfocam capacidades lingüístico-discursivas, porém as discutiremos a
seguir.
A atividade 3 trata de elementos estruturais do texto remetendo-se ao desenvolvimento de
capacidades discursivas, contudo organiza-se de modo confuso, pois seus itens (a/b/c/d) não
trazem indagações como nos outros exercícios, mas sim a apresentação da análise que o autor faz
do planejamento do texto. Somente o item „f‟ é voltado ao aluno, sendo trabalhado nele a coesão
do texto, correspondendo à capacidade lingüístico-discursiva a qual trataremos na seção seguinte
deste trabalho.
Outro momento em que se trabalha um pouco das operações de linguagem implicadas no
desenvolvimento de capacidades discursivas, ocorre no Estudo do texto proposto à segunda
reportagem apresentada no livro 2, cuja reprodução consta a seguir:
180
Livro 2 (PLC), 2003, p. 220.
181
Como a reprodução nos mostra, a atividade 1, constituída de indagações objetivas, centra-
se na decodificação de informações sobre o conteúdo temático da reportagem apresentada. Já a
atividade 2 enfoca a organização textual do gênero, com exceção do item „a‟ que trata ainda do
conteúdo.
O terceiro texto apresentado no livro 2 trata-se de uma reportagem acompanhada por um
infográfico. No parágrafo introdutório à seção do livro, explica-se a função do infográfico e sua
relação com o gênero. Vejamos a reprodução:
182
Livro 2 (PLC), 2003, p. 222.
Podemos constatar que ao tratar da relação entre a reportagem e seu complemento, bem
como a função do infográfico, o livro propicia o desenvolvimento da capacidade discursiva do
estudante uma vez que permite a ele o contato com o gênero na forma de sua circulação social,
preparando-o para ler e produzir esse gênero.
O quadro, a seguir, sinaliza as operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de
capacidades discursivas trabalhadas, de algum modo, nos livros analisados.
QUADRO 32. Capacidades discursivas e as operações de linguagem abordadas no ensino da
reportagem
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do
gênero reportagem
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Capacidades
discursivas
Apresentação e organização global do gênero
Conhecer e empregar a estrutura geral do nero
(título, lide e corpo de texto) ou suas possibilidades
de estruturação;
Compreender que a estruturação da reportagem é
menos rígida do que a da notícia;
Compreender a função de cada elemento
estrutural;
X
X
Reconhecer os acompanhantes do gênero: gráficos,
quadros, fotos e legendas;
X
X
Reconhecer e empregar o tipo de discurso
característico do gênero: discurso narração;
Selecionar previamente eventos;
X
X
Conhecer e empregar planificação script ou relato.
O quadro nos mostra que ambos os livros trabalharam as mesmas operações de
linguagem, tais como:
a função de elementos estruturais como o título;
a organização dos parágrafos e dos fatos narrados;
a função dos elementos que acompanham o gênero.
183
Entretanto um dos elementos essenciais da infra-estrutura da reportagem é o tipo de
discurso narração, o qual não é mencionado em nenhum dos livros. Não há como o aluno
dominar um gênero sem saber reconhecer e empregar seu tipo de discurso característico. Os
elementos estruturais da reportagem como título, lide e corpo de texto, bem como suas
possibilidades de modificações e diferenciação da notícia, não são trabalhados nem retomados,
uma vez que tal estudo (do título, lide e copo de texto) ocorre nos capítulos dedicados à notícia
nos livros analisados, mas como essas obras, segundo seus manuais do professor e na resenha
presente no catálogo do PNLEM/2009, constituem-se de capítulos independentes seria
fundamental ocorrer a retomada dos elementos que constituem o gênero, porém não ocorre.
Concluímos que as propostas apresentadas à reportagem pouco trabalham as tarefas de
linguagem ou operações exigidas ao domínio desse gênero, conseqüentemente, propiciando
pouco desenvolvimento da capacidade discursiva do aluno de Ensino Médio. As atividades
didáticas que analisamos demonstram uma abordagem superficial quanto à organização do texto
desse gênero, fato que pode dificultar ao estudante o modo de posicionar-se nas interações sociais
por meio desse gênero e mesmo organizá-lo em circunstâncias de produção.
A seguir, discutiremos as atividades didáticas voltadas ao desenvolvimento de
capacidades lingüístico-discursivas.
4.5.6 O gênero reportagem e as capacidades lingüístico-discursivas
A capacidade lingüístico-discursiva refere-se ao domínio de unidades lingüísticas, ou seja,
saber empregar mecanismos de textualização (conexão e coesão), vozes sociais ou individuais
(polifonia) e modalização de acordo com a circunstância de comunicação, correspondendo aos
conhecimentos mobilizados à elaboração dos níveis intermediário e superficial dos textos no
modelo de Bronckart (2008).
Tais níveis de texto elaborados por Bronckart são pouco trabalhados no ensino da
reportagem proposto nos livros didáticos de Português de Ensino Médio indicados pelo
PNLEM/2009. As obras por vezes chegam a tratar de citações e do emprego das aspas nos textos
em questão, mas sem relacionar seu uso aos efeitos de sentido que propiciam no gênero como
veracidade, credibilidade ao indicar a transcrição fidedigna das falas.
184
O livro1 (PL) aborda as marcas modais presentes na reportagem em uma de suas
atividades:
Livro 1 (PL), 2005, p. 295.
Nela é pedido que os alunos identifiquem momentos da reportagem em que se apreende a
opinião, julgamento ou avaliação do autor, constituindo-se como atividades do tipo cópia, pois o
estudante deve copiar tais passagens do texto.
atividades que enfocam as características da linguagem da reportagem e os elementos
coesivos empregados nesses textos. Ressaltamos que o estudo desses elementos se dão por meio
das atividades propostas, não havendo sistematizações sobre tais assuntos. Vejamos a reprodução
a seguir:
Livro 2 (PLC), 2003, p. 221.
185
Essa atividade extraída do livro 2, classificada como do tipo meta-linguística, demonstra
como ocorre o trabalho com operações de linguagem com elementos coesivos, implicando no
desenvolvimento das capacidades lingüístico-discursivas do aluno.
Vejamos a reprodução das atividades do livro 1 (PL) as quais poderão implicar também no
desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas:
Livro 1 (PL), 2005, p. 295.
Como podemos notar, a atividade 5 aborda a forma das citações no gênero reportagem. Seu
item „a‟ configura-se como uma indagação objetiva, o „bcomo do tipo meta-lingüística, o „c‟
como impossível, o qual foi discutido anteriormente, e „d‟ do tipo global. O emprego de
citações é somente tratado por meio dessa atividade e da seguinte nessa obra:
Livro 1 (PL), 2005, p. 295.
A atividade reproduzida aborda os “vários textos” constitutivos da reportagem e a forma de
apresentação das citações. Essa atividade foi classificada como do tipo meta-lingüísticas,
conforme a classificação de Marcuschi (2003). Tanto a atividade de número 5, quanto a de 7 não
aprofundam na construção do conhecimento sobre a função da citação, sua forma de apresentação
e seu efeito de sentido. Assim, pensamos que o trabalho realizado com tal operação de linguagem
é insuficiente para domínio do emprego de tal recurso lingüístico.
A seguir, reproduziremos a continuidade dessas atividades:
186
Livro 1 (PL), 2005, p. 296.
A atividade 8 do livro 1, apresentada anteriormente, trata da linguagem da reportagem, com
a exceção dos itens „c‟ e „d‟ que foram discutidos em outro momento, bem como parte do
quadro Avalie sua reportagem e o item „d‟ da atividade de produção de texto. o item „c‟ da
produção de reportagem menciona as conexões que ocorrem entre os elementos do gênero. Tais
187
atividades enfocaram operações de linguagem relacionadas ao desenvolvimento de capacidades
lingüístico-discursivas do estudante.
A atividade 9, do mesmo livro, é caracterizada como inferencial por mobilizar
conhecimentos textuais, lingüísticos, contextuais e pessoais na análise crítica do gênero para a
construção da resposta, isto é, para a construção das características da reportagem pelo aluno. Por
meio dela, avalia-se o que o estudante aprendeu sobre o gênero reportagem no decorrer das
atividades propostas. Assim essa tarefa contribui para o desenvolvimento das três modalidades de
capacidades de linguagem ão, discursiva, lingüístico-discursiva de modo a preparar o
aprendiz para ler, interpretar e produzir o gênero em questão.
Passaremos as atividades do livro 2 (PLC). Vejamos a reprodução da página que traz
atividades relacionadas a capacidades lingüístico-discursivas:
188
Livro 2 (PLC), 2003, p. 217.
A atividade de número 2 aborda as qualidades do texto informativo sem tê-las ensinado
no capítulo, sendo algumas das tarefas propostas impossíveis devido a falta do embasamento
teórico-didático fornecido ao aluno, assim as respostas dadas as indagações „b‟, „d‟ e e‟ poderão
ficar no campo da opinião. Os itens „c‟ e „d‟ tratam das marcas modais e do efeito de
credibilidade do texto respectivamente. Enquanto o „e‟ pede que o aluno avalie se a reportagem
proposta ao estudo constitui-se como um bom texto informativo, sem ter explicitado as
características de tal texto no capítulo, assim como não explicita de que se trata a credibilidade e
189
sua função. Portanto classificamos as indagações „d‟ e „e‟ desse exercício como impossíveis
também.
A atividade 3, a qual tratamos de elementos relacionados a capacidade discursiva em
outro momento, traz no item „d‟ o enfoque à coesão textual do gênero reportagem, elemento
retomado também nas outras reportagens presentes no capítulo.
O próximo quadro destaca as operações de linguagem relativas à capacidade lingüístico-
discursiva trabalhadas nos livros de Ensino Médio analisados.
QUADRO 33. Capacidades lingüístico-discursivas e as operações de linguagem abordadas no
ensino da reportagem
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do
gênero reportagem
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Capacidades
lingüístico-discursivas
Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos
e seus efeitos de sentido
Empregar a modalidade da língua característica do
gênero: modalidade padrão;
X
X
Selecionar adequadamente o léxico;
Manter coerência e coesão;
X
X
Empregar organizadores temporais e espaciais
adequadamente;
Identificar o papel argumentativo de certos
conectivos (já que, se, por outro lado, etc);
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: a atribuição das informações
às fontes, o emprego de aspas para indicar a
transcrição fidedigna das falas;
X
X
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: o uso da terceira pessoa do
discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice
de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva
(sintética ou analítica) para apagar as marcas do
autor;
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para
exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e
veracidade, tais como: a ausência de adjetivos ou
expressões qualificativas para se apagar as marcas
modais (avaliações, julgamentos, etc.);
X
X
Identificar e empregar vozes implícitas.
Concluímos que algumas das operações de linguagem relacionadas ao desenvolvimento
de capacidades lingüístico-discursivas do aluno são abordadas superficialmente nos livros
didáticos de Português analisados. Por exemplo, em um dos livros dedica-se uma única indagação
190
ao uso das aspas no gênero reportagem sem aprofundar nos efeitos de sentido e em sua função.
Pensamos que a ausência de explicitação e sistematização dos mecanismos lingüísticos e
enunciativos socialmente empregados no gênero e de seus efeitos de sentidos compromete o
desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas e assim o ensino do gênero reportagem.
4.5.7 Capacidades de linguagem e o ensino da reportagem
De acordo com a análise das atividades didáticas propostas ao ensino do texto do gênero
reportagem apresentadas nos livros de Português de Ensino Médio, concluímos que os livros
passam por alguns dos elementos característicos desse gênero sem se aprofundar em nenhum
deles. Portanto das capacidades de linguagem implicadas no domínio de gêneros na escola, as
quais são capacidade de ação, discursiva e lingüístico-discursiva, a que é, de modo geral,
enfatizada é a capacidade de ação, isto é, os livros enfatizam o trabalho com operações de
linguagem que contribuirão para que o aluno compreenda a função social desse gênero de texto e
apreenda que seu contexto de produção atua na construção de seus sentidos, pouco se
empenhando no trabalho com operações relativas às outras capacidades de linguagem.
O quadro, a seguir, traça o panorama geral das operações de linguagem trabalhadas nos
livros analisados e as respectivas capacidades de linguagem que poderão ser desenvolvidas do
aluno.
191
QUADRO 34. Gênero reportagem: capacidades de linguagem mobilizadas nos livros didáticos de
Português de Ensino Médio analisados
Capacidades de
linguagem
Operações de linguagem exigidas ao domínio do
gênero reportagem
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Capacidades de
ação
Situação de Produção (contextualização do gênero)
Levar em conta o suporte material em que veicula o gênero e seu
formato de apresentação;
X
X
Identificar e considerar o público-alvo esperado;
K
X
Identificar e considerar o lugar e o momento da produção;
Precisar a intenção da produção.
Conteúdo Temático
Selecionar e relatar fatos que afetarão a vida de muitas pessoas,
improváveis de acontecer, que possivelmente despertem a
curiosidade ou que haja identificação com o público-alvo;
X
Apresentar fatos contemporâneos, verdadeiros e precisos;
X
Ampliar relato de fato já noticiado.
Capacidades
discursivas
Apresentação e organização global do gênero
Conhecer e empregar a estrutura geral do gênero (título, lide e
corpo de texto) ou suas possibilidades de estruturação;
Compreender que a estruturação da reportagem é menos rígida do
que a da notícia;
Compreender a função de cada elemento estrutural;
X
X
Reconhecer os acompanhantes do gênero: gráficos, quadros, fotos
e legendas;
X
X
Reconhecer e empregar o tipo de discurso característico do
gênero: discurso narração;
Selecionar previamente eventos;
X
X
Conhecer e empregar planificação script ou relato.
Capacidades
lingüístico-
discursivas
Mecanismos lingüísticos e mecanismos enunciativos e seus efeitos de
sentido
Empregar a modalidade da língua característica do gênero:
modalidade padrão;
X
X
Selecionar adequadamente o léxico;
Manter coerência e coesão;
X
X
Empregar organizadores temporais e espaciais adequadamente;
Identificar o papel argumentativo de certos conectivos (já que, se,
por outro lado, etc);
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o
efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: a
atribuição das informações às fontes, o emprego de aspas para
indicar a transcrição fidedigna das falas;
X
X
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o
efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: o uso
da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se
(índice de indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva
(sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor;
Reconhecer e empregar recursos lingüísticos para exprimir o
efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade, tais como: a
ausência de adjetivos ou expressões qualificativas para se apagar as
marcas modais (avaliações, julgamentos, etc.);
X
X
Identificar e empregar vozes implícitas.
X
X
X
X
X
192
Das 23 operações de linguagem a que chegamos com a elaboração de nosso modelo
didático do gênero reportagem, 57% delas são, de alguma forma, trabalhadas no livro 1 (PL) e
43% das operações no livro 2 (PLC). Constatamos que uma tendência entre esses dois livros
em abordar as mesmas características do gênero como: o suporte material em que a reportagem
veicula, as intenções de produção, apresentá-la como uma ampliação da notícia, a função do
título e dos acompanhantes da reportagem (gráficos, quadros, fotos com legendas), a seleção dos
eventos a serem relatados, a modalidade adequada da linguagem, os mecanismos de manutenção
da coerência e coesão do texto, o emprego e função das citações e a identificação das marcas
modais e seus efeitos de sentido.
As operações de linguagem que não foram tratadas em nenhuma das obras referem-se:
à identificação do lugar e momento de produção do gênero (abordado em apenas uma das
obras no ensino do gênero notícia);
ao emprego da estruturação geral da reportagem (elemento estudado na notícia);
à compreensão de que a reportagem trata-se de um gênero de estruturação menos rígida
do que a notícia (característica apenas da reportagem);
ao emprego do discurso narração e da planificação script (elementos sob os quais
também se silenciou no ensino da notícia);
à seleção do léxico (abordada no trabalho com a notícia);
ao emprego de organizadores temporais e espaciais (como na notícia);
à função argumentativa se alguns conectivos que podem ser usados nesse gênero
(característica mais característica da reportagem);
aos recursos lingüísticos usados para se apagar as marcas de subjetividade como o
emprego de voz passiva ou pessoa do discurso entre outros (recurso também silenciado
no ensino da notícia);
à ausência de qualificações para se apagar as marcas modais (elemento estudado no
ensino da notícia);
à identificação das vozes implícitas presentes no texto (elemento que não foi abordado na
notícia).
Tais operações de linguagem que não foram trabalhadas correspondem a 46% do total,
sendo 56% (5 operações) relacionadas à capacidades lingüístico-discursiva, 36% (4 operações) à
capacidade discursiva e 9% (1 operação) à capacidade de ação. Assim, como no gênero notícia, a
193
capacidade privilegiada nos livros analisados é a referente à ação, enquanto a que é pouco
mobilizada é a capacidade lingüístico-discursiva, relacionada aos mecanismos lingüísticos e
enunciativos e seus efeitos de sentido.
O quadro, a seguir, traz a porcentagem de cada uma das capacidades de linguagem
enfocadas nos livros de Língua Portuguesa de Ensino Médio analisados:
QUADRO 35. Porcentagem de cada capacidade de linguagem trabalhada
no ensino do gênero reportagem
Livros/
Capacidades de linguagem
Livro 1
(PL)
Livro 2
(PLC)
Capacidades de ação
86%
43%
Capacidades discursivas
43%
43%
Capacidades lingüístico-discursivas
44%
44%
Como o quadro sinaliza, o livro 1 enfatiza o estudo de elementos relacionados à condição
de produção do gênero, como no ensino da notícia, em detrimento dos aspectos vinculados à
organização da reportagem e a seus mecanismos lingüísticos e enunciativos, correspondendo
respectivamente às capacidades discursivas e lingüístico-discursivas. Já o livro 2 trabalha por
volta de 43% de cada capacidade, pouco mobilizando-as.
As operações de linguagem trabalhadas no ensino do gênero notícia e reportagem são
praticamente as mesmas, com a exceção dos elementos estruturais (título, lide, corpo de texto)
que não são retomadas na segunda. Por tratar-se de gêneros semelhantes, os livros poderiam
aprofundar em alguns aspectos no ensino da reportagem, que esse gênero é uma ampliação do
outro, entretanto não ocorre um aprofundamento, mas sim uma sumária retomada de elementos
antes trabalhados.
Na comparação entre as atividades propostas ao ensino da notícia e da reportagem nos
livros didáticos analisados, constatamos que a abordagem direcionada ao gênero notícia atua de
modo mais profundo no ensino das operações de linguagem relacionadas ao domínio desse
gênero. Contudo ambas as abordagens dadas por esses livros são insuficientes ao domínio tanto
da notícia quanto da reportagem, pois pouco se mobilizam as capacidades de linguagem
194
necessárias para a leitura, interpretação e produção, se necessário, desses gêneros com os quais o
aluno se depara socialmente.
Ao que parece, a concepção de linguagem que permeia as propostas de ensino de gêneros
textuais dos livros analisados distanciam-se da concepção que a vê como processo de construção
de sentidos que se por meio da interação, uma vez que os livros se limitam a dar informações
sobre os gêneros, cabendo ao aluno recebê-las passivamente, isto é, as propostas não propiciam
ao aluno a construção dos sentidos, conseqüentemente, não o levam a agir por meio deles.
Os quatro livros de Ensino Médio de Língua Portuguesa analisados constituem-se nas
únicas obras indicadas pelo PNLEM/2009 que trabalham com o ensino da notícia e/ou
reportagem, no entanto as atividades propostas pouco mobilizam as operações de linguagem
implicadas no desenvolvimento de capacidades de linguagem do estudante, não o levando a
dominá-los.
195
Capítulo 5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho dedicou-se à análise das atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e
reportagem e suas implicações para o desenvolvimento de capacidades de linguagem do aluno em
livros didáticos de Língua Portuguesa voltados à última etapa da educação básica brasileira o
Ensino Médio indicados pelo PNLEM/2009. Neste capítulo apresentaremos as conclusões a
que chegamos com a realização da pesquisa. Para tanto, retomaremos as perguntas que buscamos
responder e apresentaremos as constatações decorrentes da análise, para então refletirmos em
torno das possíveis contribuições deste trabalho.
5.1 Respostas às perguntas da pesquisa
Este trabalho analisou quatro livros didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio
indicados pelo PNLEM de 2005 e de 2009. Portanto esses livros, possivelmente, estão
presentes nas salas de aulas brasileiras e, assim, permanecerão durante os anos de 2009, 2010 e
2011, período de duração do PNLEM/2009. Tais obras foram selecionadas por serem as únicas a
dedicarem-se ao ensino dos gêneros notícia e/ ou reportagem, objetos de análise desse trabalho.
Ao analisarmos como se organizam os livros de Ensino Médio atuais, como forma de
contextualizar os capítulos a quais analisaríamos a fundo, constatamos que nessas obras o ensino
é estruturado de modo fragmentado, isto é, os capítulos dividem-se em três eixos principais: o
trabalho com a literatura, com elementos lingüísticos e com textos, seja enfatizando a leitura e/ou
a produção. Embora as teorias de ensino de língua materna, que fundamentam os PCN, sejam
voltadas a um ensino articulado entre literatura, reflexão lingüística, leitura e produção, isso ainda
não ocorre nesses livros didáticos atuais.
Quanto à estruturação interna dos capítulos, observamos que é organizada de modo
tradicional: texto, atividades de estudo e de produção de texto e ensino de tópicos gramaticais.
Desse modo, mudam-se as teorias de ensino de língua e os autores de livros didáticos as adaptam
196
ao modelo já cristalizado, sendo abordados os gêneros das mais distintas esferas sociais da
mesma maneira, não se aproveitando as especificidades de cada gênero para se inovar o modo de
ensino.
Ao verificarmos quais são os gêneros textuais selecionados como objetos de ensino nessa
etapa da educação, constatamos que uma tendência a se trabalhar com certos gêneros como:
conto, poema, texto teatral, romance, notícia, entrevista e anúncio publicitário, os quais são
enfatizados nas obras analisadas. Os gêneros midiáticos foram os que mais veicularam os
capítulos destinados ao ensino de gêneros nos livros, seguidos pelos gêneros cristalizados no
ensino de língua, correspondentes à esfera literária.
Esta inclusão dos gêneros da mídia nos livros didáticos que se opera na atualidade é
conseqüência das prescrições oficiais da educação brasileira que permeiam o PNLEM, uma vez
que os livros buscam ser bem avaliados nesse programa para que sejam selecionados pelos
professores e adquiridos pelo governo. Assim, na produção desses recursos usados na sala de aula
imperam aspectos mercadológicos que também contribuem em sua constituição, os quais não
devem ser ignorados.
Um dos livros analisados, livro 4 (PEC), destacou-se na análise por tratar do ensino de
gêneros pouco comuns em livros didáticos como: projeto de pesquisa, referência bibliográfica,
memorando, entre outros. Tal obra apresenta recursos gráficos atraentes, várias imagens,
variedade de gêneros textuais, distanciando-se da forma tradicional de organização de livros
didáticos em que se trabalha o texto, as atividades de leitura e de produção, e elementos
lingüísticos. Nela os dulos não apresentam uma estruturação pré-estabelecida, variando na
abordagem conforme o conteúdo estudado, sempre buscando apontar a relação com outras áreas
do conhecimento, tendo, assim, uma proposta pedagógica voltada à interdisciplinaridade. Um
livro didático como esse demonstra que as mudanças teórico-metodológicas no campo da
Lingüística aos poucos vão sendo assimiladas e refletidas nesses instrumentos de ensino.
Na análise de quais são as atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e
reportagem e quais são suas implicações, concluímos que as atividades propostas para o ensino
desses gêneros são de dois tipos: atividades de leitura e atividades de produção de texto.
Constatamos que grande parte das atividades didáticas, tanto de leitura quanto de produção,
presentes nos capítulos de ensino de reportagem, centram-se na localização de informações
referentes ao conteúdo temático do texto, não focando o gênero em si, mas servindo como
197
suporte para o estudo de conteúdo temático. Dessa maneira, o gênero reportagem é depositário de
conteúdos sob os quais se avalia a capacidade de decodificação e compreensão do aluno.
Quanto ao gênero notícia, destaca-se a ocorrência de questões que mobilizam
conhecimentos mais sofisticados relacionadas à produção de inferências como: analisar,
comparar, refletir sobre determinados aspectos na busca da construção de respostas, mobilizando
conhecimentos textuais, lingüísticos, contextuais, extra-textuais. Embora as perguntas voltadas à
identificação de conteúdos inscritos nos textos também apareçam, configuram-se como minoria.
Os tipos de atividades propostas ao ensino dos gêneros notícia e reportagem sinaliza o
enfoque que é dado nos livros, uma vez que o trabalho com atividades didáticas inferenciais, as
quais predominam no ensino da notícia, poderão contribuir para o desenvolvimento de
capacidades de linguagem do aluno para o domínio dos gêneros em questão. Entretanto as
atividades predominantes no ensino da reportagem não enfocam o gênero, pelo contrário, ele é
usado como pretexto para o ensino de outros elementos.
A fim de traçarmos quais são as operações de linguagem que devem ser mobilizadas para
o domínio dos gêneros notícia e reportagem e as respectivas capacidades de linguagem nelas
mobilizadas, as quais foram apresentadas e discutidas no capítulo 2, fez-se necessário
levantarmos suas dimensões ensináveis (o que um determinado texto deve apresentar para ser
reconhecido como tal) e relacioná-las às capacidades de linguagem que devem ser trabalhadas
para seu domínio, isto é, levantarmos quais dimensões ensináveis de cada um desses gêneros
correspondem à capacidade de ação, à capacidade discursiva e à capacidade lingüístico-
discursiva, para então analisarmos quais capacidades de linguagem estão sendo desenvolvidas
nas atividades propostas nos livros didáticos de Português de Ensino Médio.
Tendo como base diversas obras visitadas e assumindo a perspectiva de algumas delas,
construímos um modelo didático para o ensino de textos do gênero notícia e reportagem tal qual é
proposto por Schneuwly e Dolz (2004).
Em suma, foram levantadas as características referentes:
a) à situação de produção dos gêneros;
b) ao conteúdo esperado ou dizível aos gêneros;
c) à organização global dos gêneros;
d) aos mecanismos lingüísticos empregados nos gêneros e seus efeitos de sentido;
e) à manutenção de coesão e coerência dos gêneros;
198
f) às vozes implícitas e explícitas presentes nos gêneros e a forma de introduzi-las;
g) às marcas modais presentes nos gêneros.
A partir delas, traçamos as operações de linguagem, que se constituem em tarefas a serem
aprendidas, implicadas no desenvolvimento de capacidades de linguagem do aluno para o
domínio desses gêneros.
a) Capacidades e operações de linguagem implicadas no ensino do gênero notícia
As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades de ação do
aluno são as relacionadas:
ao suporte material em que veicula o gênero e seu formato de circulação social;
à identificação e consideração com o público-alvo esperado, o lugar e o momento da
produção;
à intenção da produção;
à seleção de fatos que afetarão a vida de muitas pessoas, inéditos, improváveis de
acontecer, que possivelmente despertem a curiosidade ou que haja identificação com o
público-alvo;
à apresentação de fatos atuais, verdadeiros e precisos.
As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades discursivas do
aluno são as relacionadas:
ao emprego da estrutura geral do gênero (título, lide e corpo de texto);
à função de cada elemento estrutural;
ao tipo de discurso característico do gênero: discurso narração;
à seleção prévia de eventos;
ao emprego da planificação script ou relato.
as operações implicadas no desenvolvimento de capacidades lingüístico-discursivas do
aluno são as relacionadas:
à modalidade da língua característica do gênero: modalidade padrão;
199
à seleção adequada do léxico;
à manutenção da coerência e da coesão;
ao emprego de organizadores temporais e espaciais adequadamente;
ao reconhecimento e emprego de recursos lingüísticos para exprimir o efeito de
objetividade, imparcialidade e veracidade (a atribuição das informações às fontes, o
emprego de aspas para indicar a transcrição fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do
discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de indeterminação do sujeito) ou o uso
da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor; e a ausência de
adjetivos ou expressões qualificativas para se apagar as marcas modais (avaliações,
julgamentos, etc.));
ao emprego de vozes implícitas.
b) Capacidades e operações de linguagem implicadas no ensino do gênero reportagem
As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades de ação do
aluno são as relacionadas:
ao suporte material em que veicula o gênero e seu formato de circulação social;
à identificação e à consideração com o público-alvo esperado, o lugar e o momento da
produção;
à intenção da produção;
à seleção de fatos que afetarão a vida de muitas pessoas, inéditos, improváveis de
acontecer, que possivelmente despertem a curiosidade ou que haja identificação com o
público-alvo;
à apresentação de fatos contemporâneos, verdadeiros e precisos;
à ampliação de fato já noticiado.
As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades discursivas do
aluno são as relacionadas:
ao emprego da estrutura geral do gênero (título, lide e corpo de texto) ou suas
possibilidades de estruturação;
200
à compreensão que a estrutura da reportagem é menos rígida do que a da notícia;
ao reconhecimento de acompanhantes do gênero: gráficos, quadros, fotos e legendas;
à função de cada elemento estrutural;
ao tipo de discurso característico do gênero: discurso narração;
à seleção prévia de eventos;
ao emprego da planificação script ou relato.
As operações de linguagem implicadas no desenvolvimento de capacidades lingüístico-
discursivas do aluno são as relacionadas:
à modalidade da língua característica do gênero: modalidade padrão;
à seleção adequada do léxico;
à manutenção da coerência e da coesão;
à identificação do papel argumentativo de certos conectivos (já que, se, por outro lado,
etc);
ao emprego de organizadores temporais e espaciais adequadamente;
ao reconhecimento e emprego de recursos lingüísticos para exprimir o efeito de
objetividade, imparcialidade e veracidade (a atribuição das informações às fontes, o
emprego de aspas para indicar a transcrição fidedigna das falas; o uso da terceira pessoa do
discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de indeterminação do sujeito) ou o uso
da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as marcas do autor; e a ausência de
adjetivos ou expressões qualificativas para se apagar as marcas modais (avaliações,
julgamentos, etc.));
à identificação de marcas modais (avaliações, julgamentos, etc.);
ao emprego de vozes implícitas.
O levantamento de tais operações de linguagem e as respectivas capacidades de linguagem
mobilizadas por meio delas, ou seja, a elaboração de modelos didáticos para cada um dos gêneros
foi de fundamental importância para a análise das atividades propostas nos livros analisados.
Com base nos modelos didáticos descritos, constatamos, por meio da análise dos capítulos
ou módulos dedicados ao ensino dos gêneros notícia e reportagem, que a tendência à
201
abordagem de certas características em detrimento a outras, processo necessário para que o
gênero social torne-se um gênero a ser ensinado e aprendido, ou seja, para que ocorra sua
didatização o gênero passa por um processo de simplificação em que algumas de suas
características são silenciadas (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004).
As seguintes operações de linguagem não foram trabalhadas em nenhum dos livros, elas
referem-se:
à compreensão de que a reportagem trata-se de um gênero de estruturação menos rígida
do que a notícia (capacidade discursiva);
ao emprego do discurso narração e da planificação script (capacidade discursiva);
ao emprego de organizadores temporais e espaciais (capacidade lingüístico- discursiva);
à função argumentativa se alguns conectivos que podem ser usados no gênero reportagem
(capacidade lingüístico- discursiva);
aos recursos lingüísticos usados para se apagar as marcas de subjetividade como o
emprego de voz passiva ou pessoa do discurso, entre outros (capacidade lingüístico-
discursiva);
à identificação das vozes implícitas presentes no texto (capacidade lingüístico-
discursiva).
Tais operações de linguagem que não foram trabalhadas relacionam-se à capacidade
lingüístico-discursiva e à capacidade discursiva. Assim, a capacidade privilegiada nos livros
analisados é a referente à ação, enquanto a que é pouco mobilizada é a capacidade discursiva e
lingüístico-discursiva, relacionadas à organização textual e aos mecanismos de textualização e
enunciativos e seus efeitos de sentido, correspondendo aos níveis de análise do modelo de
Bronckart (2003; 2008).
Ressaltamos que o ensino de elementos lingüísticos, quando ocorre, é desarticulado do
ensino do gênero textual, perdendo-se a oportunidade de se trabalhar as capacidades lingüístico-
discursivas do estudante nos livros analisados. Por exemplo, no livro 2, ocorre o ensino de
gramática descritiva, em que é abordado o verbo haver, a crase, o aposto e alguns tipos de
sentenças complexas, recorrendo às frases das reportagens em estudo apenas para
exemplificação, sem qualquer relação com o gênero. Portanto perdeu-se a oportunidade de se
trabalhar mecanismos lingüísticos e seus efeitos de sentidos oferecidos pela língua característicos
da concretização dos textos de gênero reportagem como:
202
os organizadores espaciais e temporais (advérbios e locuções adverbiais) freqüentemente
empregados para localizar precisamente os fatos narrados;
o uso da terceira pessoa do discurso, o emprego do pronome oblíquo -se (índice de
indeterminação do sujeito) ou o uso da voz passiva (sintética ou analítica) para apagar as
marcas do autor e exprimir o efeito de objetividade, imparcialidade e veracidade;
o emprego das aspas para introduzir vozes no texto usado para exprimir o efeito de
veracidade e propiciar credibilidade à reportagem.
De forma geral, o ensino proposto à notícia nos livros 1 (PL) e 4 (PEC) enfatiza o trabalho
com a capacidade de ação do aluno, nos livros 2 (PLC) e 3 (LP) enfoca mais as capacidades
discursivas. Desta forma, o ensino está voltado à contextualização desse gênero em relação à sua
organização textual.
Entretanto, ao não se ensinar os efeitos de sentido dos mecanismos lingüístico e
enunciativos empregados nesse gênero referentes à capacidade lingüístico-discursiva,
conseqüentemente, não se prepara o aluno de Ensino Médio para dominar a notícia, pois, para
tanto, não basta contextualizá-la e conhecer sua organização textual, mas de se compreender
os efeitos de sentido nela implicados. Caso contrário, o aluno não dominará os conhecimentos
necessários para agir e se posicionar por meio desse gênero textual.
Em suma, com a análise das atividades didáticas propostas ao ensino do texto do gênero
reportagem apresentadas nos livros de Português de Ensino Médio, concluímos que os livros
passam por alguns dos elementos característicos desse gênero sem se aprofundar em nenhum
deles. Portanto das capacidades de linguagem implicadas no domínio de gêneros na escola, as
quais são capacidade de ação, discursiva e lingüístico-discursiva, a que é, de modo geral,
enfatizada é a capacidade de ação, isto é, os livros enfatizam o trabalho com operações de
linguagem que contribuirão para que o aluno compreenda a função social desse gênero de texto e
apreenda que seu contexto de produção atua na construção de seus sentidos. Porém, para se
dominar a reportagem, é necessário mais do que contextualizá-la, é preciso saber empregar e
identificar as formas de sua estruturação e a respectiva função de cada um de seus elementos,
além dos mecanismos lingüísticos e enunciativos nela usados. Se assim não for feito, não será
possível a construção de uma leitura crítica desse texto com o qual o aluno depara-se
socialmente.
203
As operações de linguagem trabalhadas no ensino do gênero notícia e reportagem são
praticamente as mesmas, com a exceção dos elementos estruturais (título, lide, corpo de texto)
que não são retomadas na segunda. Por tratar-se de gêneros semelhantes, os livros poderiam
aprofundar em alguns aspectos no ensino da reportagem, que esse gênero é uma ampliação do
outro. Portanto não ocorre um aprofundamento, mas sim uma sumária retomada de elementos
antes trabalhados.
Na comparação entre as atividades propostas ao ensino da notícia e da reportagem nos
livros didáticos analisados, constatamos que a abordagem direcionada ao gênero notícia atua de
modo mais profundo no ensino das operações de linguagem relacionadas ao domínio desse
gênero. Contudo, ambas as abordagens dadas por esses livros são insuficientes ao domínio tanto
da notícia quanto da reportagem, pois pouco se mobilizam as capacidades de linguagem
necessárias para a leitura, interpretação e produção, se necessário.
5.2 Reflexões em torno do ensino de gêneros textuais e o desenvolvimento de
capacidades de linguagem em livros didáticos de Ensino Médio
Com a análise de alguns dos livros didáticos de Língua Portuguesa de Ensino Médio que
realizamos neste trabalho, constatamos que os livros estão pouco a pouco incorporando as
propostas atuais de ensino de ngua materna a seu modelo cristalizado, ora se aproximando
das teorias acadêmicas, ora delas se distanciando, especificamente, quanto ao ensino de gêneros
textuais.
Pensamos que há de se rever as formas de apresentação e abordagem desses gêneros sociais
no cenário escolar, de modo que se ensinem as operações de linguagem que contribuirão para o
desenvolvimento de capacidades de linguagem do aluno, as quais possivelmente poderão ser
transferidas para gêneros semelhantes dentro e fora da escola, ao invés de apenas veicular tais
gêneros, devido às prescrições oficiais (LDB, PCN, PCN+, PNLEM), e abordá-los como melhor
convier, trazendo-os com a finalidade de cumprir requisitos valorizados no âmbito educacional,
mas sem de fato aplicar as formas efetivas de seu ensino.
Assim, este trabalho pode atuar para uma compreensão mais ampla de fatores complexos
que permeiam os livros didáticos atuais, pois se destacou na análise que tais obras são
204
comprometidas com os documentos oficiais da educação e com as avaliações que o governo, via
PNLD e PNLEM, delas fizer.
Os livros didáticos são comprometidos também com a apropriação de novas teorias de
ensino que seus autores realizam ou não, além do compromisso com o modelo cristalizado de
livro didático, possivelmente para aproximar-se de um público (professores, coordenadores
pedagógicos, diretores, alunos, pais, entre outros) que valoriza aspectos mais tradicionais, ao
mesmo tempo, buscando manter o compromisso com a inovação elemento valorizado na
sociedade contemporânea para aproximar-se de um público adepto a inovações no ensino. o
comprometidos, ainda, com fatores mercadológicos, que são mercadorias que precisam ser
consumidas, isto é, adotadas por professores, devendo atender às necessidades por eles julgadas.
Desta maneira, os livros didáticos são comprometidos com fatores de diferentes ordens, os
quais atuam em sua constituição. Ao que parece, o livro didático atual tenta ajustar-se para
atender aos interesses: do governo, das editoras, do mercado, dos professores, dos diretores, dos
coordenadores pedagógicos, dos alunos e seus pais, a fim de constituir-se como um instrumento
de ensino usado no trabalho do professor, sendo embutido nesse agir docente vários outros
fatores também de natureza complexa como: as prescrições oficiais de ensino, as prescrições
internas a cada instituição escolar, a interação entre pais, grupo docente, direção e funcionários da
instituição, a comunidade em que a escola está inserida, os instrumentos de ensino disponíveis ao
professor (giz, lousa, livro didático, laboratório de informática, etc.), além de outros elementos.
Portanto, subjacente à produção, adoção e utilização do livro didático estão escolhas e
silenciamentos que se refletem no processo de ensino-aprendizagem, cabendo aos pesquisadores
do campo da educação atuar de alguma forma para que melhoras ocorram e transcendam da
academia à sala de aula, via formação e capacitação de professores e produção de materiais
didáticos qualificados.
O PNLEM é responsável pela avaliação e distribuição dos livros didáticos de Ensino
Médio, entretanto, no que cabe a avaliação, não cumpre sua função. Com a análise, pudemos
constatar que é preciso olhar de modo mais crítico as avaliações de livros didáticos feitas pelo
governo, já que informações dadas pela equipe de avaliadores sobre alguns dos livros no catálogo
do PNLEM/2009 puderam ser contestadas, refletindo a complexidade que se opera no trabalho do
professor, uma vez que a adoção de um instrumento bem-avaliado pelos órgãos oficiais da
educação brasileira nem sempre irá ajudá-lo a melhorar a qualidade de seu trabalho.
205
Reconhecemos que os livros didáticos apresentam grandes contribuições ao ensino, embora
ainda haja muito a ser melhorado, sendo muitas vezes o único recurso didático disponível a
professores e alunos. Assim, com este trabalho, não visamos desqualificá-lo, ao contrário,
pretendemos contribuir para que esse instrumento que permeia grande parte das salas de aulas
brasileiras torne-se cada vez mais bem-qualificado.
Para tanto, ao analisar as propostas de ensino de dois dos gêneros jornalísticos de grande
representatividade social, com os quais os adolescentes cotidianamente se deparam, buscamos
apresentar como vêm sendo tratados esses gêneros textuais nos livros como forma de refletirmos
sobre a qualidade do ensino proposta nessas obras e propormos o ensino de gêneros por meio do
desenvolvimento de capacidades de linguagem exigidas a seu domínio, tal qual Schneuwly e
Dolz (2004) propõem, devido a esta teoria didático-pedagógica mostrar-se eficaz no ensino de
língua materna por meio de gêneros textuais.
Pensamos que os modelos didáticos dos gêneros notícia e reportagem que produzimos
nesse trabalho poderão contribuir tanto para que os professores planejem o ensino de tais gêneros,
enfocando as operações de linguagem pertinentes a eles, para que ocorra o desenvolvimento das
capacidades de linguagem dos alunos exigidas para o domínio desses gêneros, quanto aos autores
de materiais didáticos na elaboração de capítulos, unidades ou módulos voltados ao ensino da
notícia e da reportagem.
Esta dissertação, além de sinalizar como são as propostas de ensino de gêneros textuais nos
livros didáticos de Ensino Médio atuais e suas implicações ao desenvolvimento de capacidades
de linguagem do aluno, como forma de ensino de Língua Portuguesa, nesta última etapa da
educação básica, permite-nos refletir como as teorias acadêmicas têm chegado às salas de aulas
via livro didático e assim (re)pensarmos em formas de encurtarmos tal distância para a melhora
da qualidade do livro didático e do ensino.
206
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212
ANEXOS
Anexo I: Livro 1(PL) Português Linguagens
213
214
215
216
217
218
219
220
221
222
223
224
225
226
Anexo II: Livro 2 (PLC) Português: língua e cultura
227
228
229
230
231
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233
234
235
236
237
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240
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242
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244
245
246
247
248
249
250
251
252
Anexo III: Livro 3 (LP) Língua Portuguesa
253
254
255
256
257
258
259
Anexo III: Livro 3 (PEC) Língua Portuguesa: Projeto Escola e Cidadania para Todos
260
261
262
263
264
Livros Grátis
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