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CATEGORIZAÇÃO FONOLÓGICA E
REPRESENTAÇÃO MENTAL:
uma análise da alternância entre [ks] e [s]
à luz de modelos de uso
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Maria Mendes Cantoni
CATEGORIZAÇÃO FONOLÓGICA E
REPRESENTAÇÃO MENTAL:
uma análise da alternância entre [ks] e [s]
à luz de modelos de uso
Dissertação apresentada ao Programa de s-
Graduação em Estudos Lingüísticos da
Faculdade de Letras da Universidade Federal
de Minas Gerais, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Lingüística
Teórica e Descritiva.
Área de concentração: Lingüística Teórica e
Descritiva
Linha de Pesquisa: Estudo da Inter-relação
entre Linguagem, Cognição e Cultura
Orientadora: Profª. Drª. Thaïs Cristófaro Silva
Belo Horizonte
Faculdade de Letras da UFMG
2009
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Agradecimentos
Agradeço a todos aqueles que de alguma forma contribuíram para que este trabalho
pudesse se realizar. Em especial, expresso imensa gratidão à Profª Thaïs Cristófaro, por todos
os anos de apoio, disponibilidade, ensino e orientação a qualquer tempo. Sou grata tamm
aos colegas do laboratório do Elabore, com destaque para Leonardo Almeida e Rosana
Passos, pelo apoio técnico e companheirismo. Aos professores da Faculdade de Letras, dentre
os quais, Profª Heliana Mello, Prof. Tommaso Raso, Prof. Seung Hwa Lee, Prof. José
Olímpio de Magalhães, pelos tão preciosos conhecimentos compartilhados. Ao Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq/Brasil, pelo suporte
financeiro.
Agradeço também a Janes e Rodrigo, mãe e esposo queridos, pelo suporte técnico e
familiar, incondicionais.
Obrigada!
Resumo
Este estudo tem como objetivo avaliar a variação de seqüências sonoras no português
brasileiro atual. Enfoca-se a alterncia observada entre a seqüência [ks] e o som [s], em
palavras como sintaxe [si⎆taksگ] ~ [si⎆tasگ]. Foram identificados três grupos de palavras: (1)
aquelas em que [ks] e [s] alternam e (2) aquelas em que ocorre apenas [ks] ou (3) apenas [s],
sem alterncia. Buscou-se avaliar as relações estabelecidas entre as palavras de cada grupo
no léxico, tendo como pano de fundo uma discussão mais ampla sobre a representação mental
e a dinâmica de armazenagem e processamento dos sons das línguas. Outra questão abordada
neste estudo é se [ks] pode ser mais bem caracterizado como uma seqüência de sons ou como
um único som. Os estudos sobre o sistema sonoro do português brasileiro, de base formalista,
assumem que [ks] seria um encontro consonantal, mas nenhum deles considera a existência
de alternância entre [ks] e [s] em algumas palavras. Demonstra-se que os modelos formalistas,
unirrepresentacionais, não oferecem uma análise satisfatória do fenômeno em estudo, por não
conseguirem lidar com o condicionamento lexical que opera na alternância [ks]~[s], com as
interações funcionais que se dão entre [ks] e os outros sons da ngua e com as motivações da
alternância. Defende-se que os modelos representacionais desenvolvidos pela Gramática
Cognitiva (LANGACKER, 1987), pela Fonologia de Uso (BYBEE, 2001) e pelo Modelo de
Exemplares de Pierrehumbert (2000) podem oferecer uma análise mais completa da
alternância [ks]~[s]. Promove-se uma comparação de [ks] com os encontros consonantais
heterossilábicos do português brasileiro o desfeitos por epêntese, de um lado, e, de outro,
com as consoantes complexas da língua. Verificou-se que [ks], ao contrário dos encontros
consonantais heterossilábicos, (1) pode ocorrer em coda final, posição em que tem, inclusive,
se tornado muito produtivo nos últimos anos; (2) não é suscetível a epêntese, que não foi
atestada no experimento. Verificou-se a assimilação de vozeamento de [s] em palavras com
[ks] referente a estrutura CVC, mas não em palavras com [ks] referente a estrutura CC. Das
palavras contendo [ks], apenas algumas apresentaram possibilidade de alternância com [s],
apontando para um quadro de difusão lexical. São apresentadas, com base nos resultados dos
experimentos realizados, análises multirrepresentacionais da alternância [ks]~[s]. Defende-se
que a alternância [ks]~[s] seria um caso em que estruturas análogas apresentam
representações mentais diferentes. Os resultados dos experimentos comprovaram alguns
pressupostos dos modelos de uso, como (1) a freqüência de ocorrência exerce impacto sobre a
mudança sonora (palavras mais freqüentes são afetadas primeiro por mudanças redutivas); (2)
o detalhe fonético é relevante para as representações mentais; (3) o uso lingüístico promove a
alteração imediata das representações, que são dinâmicas; (4) o gerenciamento das gramáticas
é específico e individual.
Palavras-chave: Fonologia do português brasileiro, Fonologia de Uso, Modelo de Exemplares,
modelos de uso, [ks].
Abstract
This work has the aim of evaluating patterns of variation in sound sequences of Brazilian
Portuguese. Focus is given to the observed alternance of [ks] and [s], as in sintaxe
[si⎆taksگ]~[si⎆tasگ]. Regarding this variation, three groups of words were identified: (1) words
in which [ks] and [s] alternate; (2) words in which only [ks] is realized or (3) only [s] is
realized, with no alternance. The relations between words in each group were evaluated
considering a broader discussion on mental representations and storage dynamics of sounds in
the world’s languages. This work also evaluated the issue of whether [ks] can be best
accounted for as a sequence of sounds or as a single sound. Studies on Brazilian Portuguese
sound system, all based on a formalistic point of view, claim that [ks] is a consonantal cluster,
but none of them recognizes the alternance of [ks] and [s] that can be attested in specific
words. In this work, it is claimed that unirepresentational models cannot offer a
straightforward analysis of the phenomenon studied here, for they cannot explain lexical
conditioning that operates in the alternance of [ks] with [s], neither the functional interactions
established between [ks] and other sounds of the language, nor the motivations for the
alternance. This work claims that the representational models presented by Cognitive
Grammar (LANGACKER, 1987), Usage-Based Phonology (BYBEE, 2001) and
Pierrehumbert’s Exemplar Model (2000) can provide a more complete account of the
alternance of [ks] with [s]. A comparison is developed on the one side between [ks] and
Brazilian Portuguese heterosyllabic consonantal clusters which are not broken by epenthesis,
and on the other side between [ks] and Brazilian Portuguese complex consonants. It was
attested that [ks], but not heterosyllabic consonantal clusters: (1) can occur in final coda, a
position in which [ks] has turned out very productive in the past years; (2) doesn’t undergo
epenthesis, which was not attested in the experiment. Voicing assimilation of [s] in words
with [ks] reduced from a CVC structure was detected, but not in words with [ks] in a plain
CC structure. Among the words containing [ks], only a few presented the possibility of
alternance with [s], suggesting a case of lexical diffusion. Based on experimental results,
multirepresentational analyses of the alternance between [ks] and [s] are presented. It is
suggested that this pattern of alternance consists of a case where similar structures display
different mental representations. Results of the experiments add proof to some assumptions of
usage-based models, such as (1) token frequency has an impact over sound changes (more
frequent words are affected by reductive changes first); (2) fine phonetic details are present in
mental representations; (3) linguistic use promotes online restructuring of representations; (4)
grammar management is specific and individual.
Key-words: Brazilian Portuguese Phonology, Usage-Based Phonology, Exemplar Model,
usage-based models, [ks].
Lista de Ilustrações
FIGURA 1 - Espectrograma obtido no estudo piloto: Informante 1, item lexical
([leksگ⎆kaw])................................................................................................ 28
FIGURA 2 - Representação autossegmental do cancelamento de [k] na seqüência [ks]........ 37
FIGURA 3 - Representação autossegmental de [ks] como um segmento de contorno.......... 38
FIGURA 4 - Representação autossegmental de [ks] como consoante complexa................... 38
FIGURA 5 - Palavras testadas no Experimento 2................................................................. 51
FIGURA 6 - Etiquetagem do item boxe, informante C1i1 .................................................... 59
FIGURA 7 - a) Oscilograma e espectrograma de boxe; b) oscilograma e espectrograma
de boxinformante C1i1 ............................................................................. 75
FIGURA 8 - Oscilograma e espectrograma de próximo – informante C2i1........................... 76
FIGURA 9 - Oscilograma e espectrograma da palavra destaquesinformante C1i3 ............ 78
FIGURA 10 - Representação das relações que emergem a partir de sons de palavras do
(a) Grupo 1, (b) Grupo 2 e (c) Grupo 3, conforme a Gramática Cognitiva.... 83
FIGURA 11 - Representação das relações que emergem a partir de sons de palavras do
Grupo 4, conforme a Gramática Cognitiva.................................................... 83
FIGURA 12 - Representação das relações que emergem a partir de sons de palavras do
(a) Grupo 1, (b) Grupo 2 e (c) Grupo 3, conforme o Modelo de
Exemplares .................................................................................................. 84
FIGURA 13 - Representação das relações que emergem a partir de sons de palavras do
Grupo 4, conforme o Modelo de Exemplares................................................ 85
FIGURA 14 - Representação da organização dos exemplares em cada Grupo (1 a 3),
conforme o Modelo de Exemplares .............................................................. 86
FIGURA 15 - Representação da organização dos exemplares do Grupo 4, conforme o
Modelo de Exemplares................................................................................. 86
QUADRO 1 - Grupos de palavras conforme o comportamento de [ks] e [s] ....................... 11
QUADRO 2 - Encontros consonantais heterossilábicos desfeitos por epêntese no PB ......... 24
QUADRO 3 - Freqüência de tipo dos encontros consonantais heterossilábicos desfeitos
por epêntese no PB ...................................................................................... 25
QUADRO 4 - Palavras obtidas em consulta ao banco de dados do Aspa, excluídas da
lista de teste do Experimento 1..................................................................... 45
QUADRO 5 - Critérios para classificação das palavras no Experimento 1 ........................... 46
QUADRO 6 - Respostas obtidas no Experimento 1 ............................................................ 47
QUADRO 7 - Respostas obtidas no Experimento 1 com concordância de quatro ou três
informantes a respeito de uma mesma palavra............................................... 47
QUADRO 8 - Lista de palavras obtidas no Experimento 1 em que pode haver variação
[ks]~[s], segundo quatro ou três informantes................................................ 48
QUADRO 9 - Grupos de palavras conforme o comportamento de [ks] e [s] ....................... 51
QUADRO 10 - Variáveis utilizadas para seleção das palavras no Experimento 2................. 52
QUADRO 11 - Freqüência de ocorrência das palavras do Experimento 2............................ 56
QUADRO 12 - Distribuição de informantes por células, segundo as variáveis
sociolingüísticas adotadas........................................................................... 57
Lista de Tabelas
1 - Contraposição dos resultados dos Experimentos 1 e 2.............................................. 61
2 - Freqüência de ocorrência de [ks], [s], [Ѐ] e [kis] por palavra do Experimento 2........ 63
3 - Freqüência de ocorrência de [s] e [Ѐ] por palavra do Grupo 1 do Experimento 2 ...... 64
4 - Médias de duração de [ks], [s], [Ѐ] e [kis] por palavra do Experimento 2 ................. 67
5 - Médias de duração da vogal precedente a [ks], [s], [Ѐ], [kis] por palavra do
Experimento 2 ......................................................................................................... 69
6 - Ocorrência de queda de intensidade em palavras do Grupo 1, Experimento 2 que
apresentaram variação [ks]~[s]~[Ѐ] .......................................................................... 70
7 - Freqüência de ocorrência de epêntese por palavra do Experimento 2........................ 72
8 - Freqüência de ocorrência de realização de vogal alta regular e realização de [i]
depois de [ks] por palavra do Experimento 2 ........................................................... 73
9 - Freqüência de ocorrência de variação entre [ks], [s] e [Ѐ] e ponto de articulação
da consoante fricativa por palavra do Experimento 2................................................ 77
Sumário
1 Introdução....................................................................................................................... 11
1.1 Delimitação do problema............................................................................................ 11
1.2 Justificativa ................................................................................................................ 13
1.3 Objetivos.................................................................................................................... 13
1.3.1 Objetivos gerais................................................................................................... 13
1.3.2 Objetivos específicos........................................................................................... 14
1.4 Breve resumo dos capítulos ........................................................................................ 14
2 Revisão da Literatura ..................................................................................................... 16
2.1 Modelos representacionais.......................................................................................... 16
2.2.1 Modelos formalistas ............................................................................................ 16
2.1.2 Modelos de uso.................................................................................................... 18
2.2 Alternância entre [ks] e [s] ......................................................................................... 22
2.3 Propriedades acústicas de [ks] .................................................................................... 27
2.4 Detalhe fonético ......................................................................................................... 29
2.5 Gradiência lexical e gradiência fonética...................................................................... 31
2.6 Modelo de Exemplares e Fonologia de Uso ................................................................ 32
2.7 A natureza da representação mental de [ks] ................................................................ 35
3 Metodologia..................................................................................................................... 43
3.1 Coleta de dados em corpus ......................................................................................... 44
3.2 Coleta de dados experimental..................................................................................... 45
3.2.1 Experimento 1 ..................................................................................................... 45
2.2 Experimento 2............................................................................................................ 49
4 Discussão dos resultados................................................................................................. 61
5 Conclusão ........................................................................................................................ 87
Referências Bibliográficas ................................................................................................. 89
ANEXO A - Palavras com [ks] obtidas em busca no banco de dados do Aspa, seguidas
de suas respectivas freqüências de ocorrência no corpus ................................................. 96
ANEXO B - Ficha utilizada no Experimento 1 (folha inicial) ........................................ 103
ANEXO C - Ficha utilizada no Experimento 2............................................................... 104
11
1 Introdução
1.1 Delimitação do problema
Este estudo tem como objetivo avaliar a variação de seqüências sonoras no português
brasileiro atual (doravante, PB). Especificamente, enfoca-se a alternância observada entre a
seqüência [ks] e o som [s], em palavras como sintaxe [si⎆taksگ] ~ [si⎆tasگ]. Ressalta-se que tal
variação não foi detectada em um grande número de palavras, que ocorrem, ou apenas com a
seqüência [ks] como sexo [⎆sϯksѨ] –, ou apenas com [s] como missa [⎆misђ]. Abaixo, no
Quadro 1, algumas palavras foram distribuídas em três grupos, de acordo com seu
comportamento em relação ao fenômeno de alternância [ks]~[s]. Apenas os sons relevantes
foram transcritos em caracteres fonéticos, por economia, o que se repetirá ao longo deste
estudo, quando conveniente.
QUADRO 1
Grupos de palavras conforme o comportamento de
[ks] e [s]
Grupo Exemplos de palavras Variantes
1
sinta[ks]e ~ sinta[s]e
lé[ks]ico ~ lé[s]ico
tó[ks]ico ~ tó[s]ico
1
[ks] ou [s]
2
se[ks]o
to[ks]ina
tá[ks]i
apenas [ks]
3
mi[s]a
pi[s]ina
fa[s]e
apenas [s]
Pretende-se, neste trabalho, caracterizar os três grupos, dando ênfase especial ao
primeiro: palavras em que se verifica a alternância entre [ks] e [s]. Pretende-se avaliar este
1
Para essa palavra específica, tóxico, verificou-se a possibilidade de alternância de [ks] não apenas com [s], mas
também com [Ѐ] ([⎆tѐЀikѨ]). Contudo, esse parece ser um caso isolado, visto que tóxico é o único item em que
essa variante foi detectada ao momento. A alternância [ks]~[s]~[Ѐ] será abordada novamente em capítulos
posteriores. Por economia, a variação enfocada neste estudo será referida como variação [ks]~[s], uma vez que a
variante [Ѐ] parece ser marginal.
12
fenômeno tendo como pano de fundo uma discussão mais ampla sobre a representação mental
e a dinâmica de armazenagem e processamento dos sons das línguas. Observando a
distribuição das variantes [ks] e [s] e tendo em vista uma discussão dessa natureza, foram
formuladas algumas perguntas, apresentadas imediatamente a seguir, que serão abordadas ao
longo de todo o estudo.
a) Da representação mental de [ks]
Como caracterizar cada grupo em especial, o Grupo 1 em termos de
representações mentais? Isto é, dada a variação entre [ks] e [s], pretende-se
investigar como se realiza o armazenamento e o processamento cognitivo das
palavras que contêm esses sons e suas formas variantes.
Com relação à seqüência [ks], trata-se da realização de um único som ou, antes, de
dois sons distintos? É possível determinar se [ks] seria ou não uma seqüência de
sons com base em argumentos funcionais: se sua ocorrência e seu comportamento
no PB forem semelhantes ao de outros encontros consonantais da língua, [ks] será
caracterizado como a realização de dois sons em seqüência. Se, pelo contrário, [ks]
diferir dos outros encontros consonantais, seria plausível interpretá-lo como um
único som. Essa questão se [ks] seria uma seqüência de sons ou um único som
tem implicações determinantes e diretas na representação mental de [ks].
Provisoriamente, neste e nos próximos capítulos, [ks] será referido como uma
seqüência de sons, mas sempre considerando que existem dúvidas a esse respeito.
b) Das propriedades acústicas de [ks] e [s]
Em termos acústicos, o [s] que alterna com [ks] (Grupo 1) teria as mesmas
características do [s] que não apresenta tal alterncia (Grupo 3)? Do mesmo modo,
o [ks] do Grupo 1, que alterna com [s], seria idêntico ao [ks] do Grupo 2, que não
alterna? O que se deseja saber é se haveria pistas acústicas que distingam os
segmentos sonoros em alternância (Grupo 1) dos que o alternam (Grupos 2 e 3).
Esta questão tem fundamental importância para verificar qual o impacto do detalhe
fonético na armazenagem e processamento sonoros.
13
c) Da natureza variável da alternância [ks]~[s]
A alterncia [ks]~[s], que afeta apenas as palavras do Grupo 1, pode ser
caracterizada como variação semelhante aos casos de mudança sonora por difusão
lexical, em que o fenômeno afeta palavras individualmente e o o sistema sonoro
como um todo? Para determinar qual a natureza da variação [ks]~[s], deve-se
avaliar se o fenômeno apresenta gradiência lexical e gradiência fonética. Am
disso, é relevante para esta questão se a delimitação dos Grupos 1, 2 e 3 é de
natureza discreta ou contínua. Ou seja, se as palavras podem ser enquadradas em
um ou outro grupo categoricamente ou se é possível que se situem entre os grupos,
em um contínuo.
1.2 Justificativa
De modo geral, o presente projeto de pesquisa mostra-se relevante por colaborar para
a compreensão dos processos e mecanismos de funcionamento envolvidos na linguagem
humana, mais especificamente para o desenvolvimento de teorias que estudam a dimensão
sonora da fala. Em uma perspectiva mais específica, este projeto justifica-se por contribuir
com a descrição do português atualmente falado no Brasil e em Belo Horizonte e, em
especial, por tratar de um fenômeno até então inexplorado, a alternância entre [ks] e [s]. Além
disso, contribui para o conhecimento acerca das representações mentais, com foco na
gradualidade lexical e fonética, oferecendo novos dados para aplicação e corroboração de
conceitos vinculados à Fonologia Cognitiva.
1.3 Objetivos
1.3.1 Objetivos gerais
14
Este trabalho tem como objetivo geral avaliar a representação fonológica de [ks] e [s]
no português brasileiro atual e, dessa forma, contribuir para a construção de conhecimento
científico acerca da dinâmica de processamento e armazenamento dos componentes sonoros.
Pretende-se aplicar e avaliar princípios da Fonologia de Uso (BYBEE, 2003) e da
Teoria de Exemplares (PIERREHUMBERT, 2000), modelos fonológicos
multirrepresentacionais que têm contribuído para o fortalecimento da Fonologia Cognitiva.
Esta área de estudos teve um desenvolvimento relativamente recente, se comparada às demais
áreas que integram o quadro maior da Lingüística Cognitiva. Têm sido necessários esforços
crescentes de inúmeros pesquisadores para a construção de uma teoria fonológica geral sob
uma perspectiva cognitiva, um fim com que se compromete a presente pesquisa.
1.3.2 Objetivos específicos
Quanto aos objetivos específicos, pretende-se avaliar:
a) a gradualidade lexical e fonética;
b) a relevância do detalhe fonético no processamento lexical;
c) a relevância das freqüências de tipo e de ocorrência na construção das
representações mentais;
d) a natureza representacional da seqüência [ks] (seqüência de sons ou um único som).
1.4 Breve resumo dos capítulos
Este estudo encontra-se estruturado como segue. Dando prosseguimento às
considerações introdutórias desenvolvidas no presente capítulo, será realizada, no segundo
capítulo, uma revisão dos principais modelos representacionais em fonologia, da literatura que
trata da seqüência [ks] no PB e das propriedades acústicas de [ks]. No mesmo capítulo, são
ainda abordados o detalhe fonético, a gradiência lexical e a gradiência fonética, passando, por
fim, a apresentar os aspectos fundamentais do Modelo de Exemplares e da Fonologia de Uso
e a iniciar uma discussão sobre a natureza da representação mental de [ks]. O terceiro capítulo
15
contempla a metodologia de trabalho utilizada, com aprofundamento das referências tricas
adotadas e descrição detalhada dos dois experimentos realizados. No quarto capítulo, propõe-
se uma discussão dos resultados obtidos nos experimentos, com base na análise acústica e
quantitativa dos dados. Por fim, no quinto e último capítulo, são apresentadas algumas
conclusões e aspectos a serem abordados em pesquisas futuras.
16
2 Revisão da Literatura
2.1 Modelos representacionais
2.2.1 Modelos formalistas
O surgimento da Lingüística moderna coincide e se confunde com o surgimento e
desenvolvimento da tradição estruturalista de análise dos sons da linguagem. O estruturalismo
representou um avanço com relação aos métodos de análise lingüística anteriores: os estudos
histórico-comparativos e neogramáticos, sob uma perspectiva diacrônica, buscavam
estabelecer generalizações possíveis entre as nguas do mundo e regras que explicassem as
mudanças sonoras. No estruturalismo, por outro lado, uma preferência pela análise
sincrônica, voltada para observações de natureza descritiva e tipológica. Deve-se aos
estruturalistas a separação da fonética e da fonologia em áreas independentes, com objetos de
estudo distintos. Outra grande contribuição estruturalista é o conceito de fonema, inicialmente
formulado como sendo uma unidade mínima do sistema fonológico de uma língua,
estabelecido funcionalmente por estar em relação opositiva com outras unidades do sistema
(TRUBETZKOY, 1973). Jakobson (1972) posteriormente proe que as unidades fonológicas
mínimas seriam ainda menores que o fonema: este poderia ser decomposto em traços
distintivos, características acústicas universais dispostas em um sistema de combinações
binárias (e.g. +vozeado vs. –vozeado). Sob essa nova ótica, o conceito de fonema é
reformulado, passando a corresponder a um feixe de traços distintivos. Na vertente norte-
americana, Sapir (1981), adotando uma visão mentalista da linguagem, esforça-se por
demonstrar a realidade psicológica dos fonemas: defende que os falantes de uma língua, ainda
que lidem diretamente com elementos fonéticos, percebem e produzem fonemas, como
resultado de um condicionamento à ordenação dos elementos fundamentais da experiência
lingüística em formas determinadas funcionalmente. Para ele, portanto, a mudança sonora se
dá no plano abstrato fonológico.
Partindo das idéias estruturalistas, Chomsky e Halle (1968) lançam a Gramática
Gerativa. Valem-se da noção de traços distintivos de Jakobson, mas adotam novos traços, de
natureza articulatória, e não acústica. Defendem a existência de uma gramática universal
17
interna, inata, desvinculada do uso efetivo da linguagem. A faculdade da linguagem verbal,
uma predeterminação genética, dotaria os seres humanos de um sistema universal de regras
que lhes permitiria praticar um número infinito de frases, independentemente de seu
conhecimento prévio, daí sua natureza gerativa, criativa, que se torna viável pela existência
desse conjunto de regras da língua, a sintaxe. Retomando a dicotomia saussuriana de língua
versus fala, o gerativismo propõe a existência de uma competência lingüística, capacidade do
falante de uma língua de produzir, interpretar e perceber, a partir de um sistema limitado de
regras, um ilimitado número de frases, e o desempenho lingüístico, que, em contrapartida,
representa a manifestação concreta de tal capacidade, o uso que o indiduo faz de sua
competência. A Gramática Gerativa é ancorada na sintaxe estrutura da linguagem,
autônoma e independente –, conferindo-lhe um papel central no processo gerativo e cognitivo.
Segundo essa perspectiva trica, as mudanças sonoras afetam a estrutura subjacente, a
competência, para depois se refletirem no plano superficial, o desempenho.
Diante de problemas enfrentados pela teoria gerativa, especialmente em lidar com
aspectos supra-segmentais, surgem as teorias fonológicas o-lineares, que defendem que a
cadeia sonora estaria estruturada hierarquicamente, e não de modo linear, como proposto no
gerativismo. Dentre as teorias não-lineares, pode-se citar a Fonologia Métrica, a Fonologia
Prosódica, a Fonologia Lexical. A Fonologia Métrica (LIBERMAN; PRINCE, 1977) destaca-
se no tratamento do acento e fenômenos relacionados. É introduzida a noção de sílaba,
elemento de vel superior ao do segmento, que apresentaria uma estrutura interna
responsável por determinar as seqüências segmentais possíveis (HOGG; MCCULLY, 1987, p.
35).
A Fonologia Prosódica (NESPOR; VOGEL, 1986) propõe que a dimensão prosódica
estaria organizada hierarquicamente, dovel mais básico, a sílaba, ao nível mais alto, o
enunciado.
A Fonologia Lexical (KIPARSKY, 1982), também uma teoria o-linear, promove
uma integração entre morfologia e fonologia, propondo a existência de dois veis de regras
fonológicas: as regras lexicais, que são aplicadas ainda no léxico e têm natureza clica, e as
regras pós-lexicais, aplicadas ao output da sintaxe, de natureza não-clica.
A Teoria da Otimalidade (MCCARTHY; PRINCE, 1993; PRINCE; SMOLENSKY,
1993) reformula a teoria gerativa, apresentando uma nova perspectiva de gramática e
representação subjacente. As regras são abandonadas, dando lugar ao ranqueamento de
restrições violáveis. Parte-se do output (que corresponderia à forma de superfície na gerativa)
18
e, através da interação de restrições, escolhe-se o candidato ótimo, que será o input (a forma
subjacente).
Como será demonstrado mais à frente, os modelos fonológicos tradicionais não
oferecem recursos que levem a uma explicação satisfatória e completa da alternância entre
[ks] e [s], aparentemente relacionada à trajetória de itens lexicais específicos. Uma das razões
para a dificuldade que as análises tradicionais encontram diante da alternância [ks]~[s] se
deve ao fato de que tais modelos são unirrepresentacionais, pressupondo que as
representações abstratas dos sons se apresentariam em um único vel e não se relacionariam
entre si. Além disso, as teorias tradicionais são essencialmente formalistas, reduzem o sistema
da língua a um conjunto organizado de regras/restrições, que transformam formas discretas e
estanques de input em formas previsíveis de output. Com isso, tratam as generalizações
(informações redundantes/previveis) em termos de aplicação de regras e geração de outputs,
o comportando fatos que envolvem variação ou efeitos de freqüência. O fenômeno em
enfoque, como tantos outros, rompe com a noção de fonema como uma unidade abstrata com
valor distintivo dentro do sistema sonoro. Esse conceito, proposto pelo estruturalismo e
adotado sucessivamente nas diversas correntes tricas posteriores, necessitaria minimamente
de ampliação e reformulação, para abarcar o tipo de variação identificado, que parece ser de
natureza gradiente e aponta para a relevância do detalhe fonético, como será abordado mais à
frente, na Discussão dos Resultados.
2.1.2 Modelos de uso
Os chamados modelos baseados no uso, ou simplesmente modelos de uso (usage-
based models) são modelos lingüísticos multirrepresentacionais, que assumem representações
múltiplas, multidimensionais e interconectadas. Compartilham a idéia de que os sistemas
lingüísticos são construídos a partir de eventos de uso, sendo que a relação entre estas duas
dimensões, sistema e uso, é relativamente direta (BARLOW; KEMMER, 2000). O termo
usage-basedremonta a Langacker (1987), ao referir-se a uma abordagem da linguagem que
se contrapõe à perspectiva formalista tradicional, por ser maximalista, não redutiva e bottom
up. As abordagens de uso assumem que, no armazenamento de informações, um grande
volume de dados estaria envolvido por isso seriam maximalistas, e não minimalistas. Nesse
19
armazenamento, haveria grande redundância de informações razão pela qual esses modelos
são chamados de o redutivos. Desse modo, na mente humana, a especificidade estaria
atrelada à generalidade, sendo que a última surge a partir da primeira daí dizer que modelos
de uso envolvem processamento bottom up, e não top down. Formulações muito próximas a
essas têm sido adotadas nas últimas décadas por estudos tanto independentes quanto
derivados da Gramática Cognitiva de Langacker, mas todos eles contribuindo para fortalecer
as bases gerais da abordagem de uso. Especialmente nas duas últimas décadas, vem-se
acumulando um corpo respeitável de evidências que indicam a primazia do uso em áreas
como psicologia, lingüística, cognição e neurofisiologia. Nessas áreas, destacam-se estudos
pioneiros sobre processos cognitivos e de categorização, que apresentam diferentes graus de
comprometimento com a linguagem humana, mas são em grande medida aplicáveis a seu
estudo e compatíveis entre si. Dentre eles, quatro serão aqui apresentados, a título de
contextualização. Rosch (1978) trata da construção e organização de categorias mentais, que
seriam articuladas ao redor de protótipos, membros que melhor representam a estrutura
redundante da categoria como um todo. Hopper (1987) apresenta o modelo da Gramática
Emergente, propondo que a estrutura lingüística molda e é moldada pelo discurso em um
processo contínuo. Hintzman (1986) relata os resultados obtidos com um simulador de
memória epidica compatível com o modelo de exemplares. Kuhl (1994) defende, com a
teoria do Native Language Magnet, que o espaço perceptual seria estruturado em protótipos,
referência perceptual para unidades sonoras e responsáveis por exercer um efeito atrativo
sobre representações próximas, que tenderiam a assimilar. O presente estudo baseia-se
principalmente em três abordagens de uso relativamente recentes, que se voltam para a
dimensão sonora da linguagem: a Fonologia de Uso (BYBEE, 2001), o modelo de exemplares
proposto em Pierrehumbert (2000) e a Fonologia Probabilística (PIERREHUMBERT, 2003).
Essas abordagens são amplamente comparáveis e complementares à proposta de Langacker,
que será outro ponto de referência trica neste estudo. Os pressupostos fundamentais destes
modelos serão brevemente descritos a seguir. Primeiramente, ressalte-se que todos eles
compartilham a idéia de que não uma separação tida entre léxico e gramática, essas duas
esferas sendo agrupamentos (assemblies) de estruturas simbólicas (LANGACKER, 2000).
As unidades lingüísticas de armazenagem e processamento, os exemplares, são
palavras e até mesmo grupos de palavras (chunks) e expressões fixas, organizados em
categorias cuja estrutura interna se assemelha à de protótipos são gradientes, centrados em
membros nucleares bem-definidos e difusos nas bordas.
20
[…] each category is represented in memory by a large cloud of
remembered tokens of that category. These memories are organized in a
cognitive map, so that memories of highly similar instances are close to each
other and memories of dissimilar instances are far apart.
2
(PIERREHUMBERT, 2000, p. 140).
[…] a token of linguistic experience that is identical to an existing exemplar
is mapped onto that exemplar, strengthening it. Tokens that are similar but
not identical (differing in slight ways in meaning, phonetic shape,
pragmatics) to existing exemplars are represented as exemplars themselves
and are stored near similar exemplars to constitute clusters or categories.
Thus the phonetic shape of a word might consist of a set of phonetic
exemplars that are very similar to one another.
3
(BYBEE, 2006, p. 717).
A partir da categorização de ocorrências reais de uso lingüístico, os exemplares, são
construídas categorias complexas, compostas de esquemas e categorias prototípicas.
A prototype is a typical instance of a category, and other elements are
assimilated to the category on the basis of their perceived resemblance to the
prototype; there are degrees of membership based on the degrees of
similarity. A schema, by contrast, is an abstract characterization that is fully
compatible with all the members of the category it defines (so membership
is not a matter of degree); it is an integrated structure that embodies the
commonality of its members, which are conceptions of greater specificity
and detail that elaborate the schema in contrasting ways.
4
(LANGACKER,
1987, p. 371).
Nas categorias prototípicas, o membro que dispõe de maior saliência cognitiva, o
protótipo, se articula com os demais membros da categoria com base na similaridade existente
entre eles, estabelecendo-se entre protótipo e os membros uma relação de extensão neste
tipo de relação, há um mapeamento parcial entre A/protótipo B/membro, em que algumas
características de A são modificadas ou suspendidas para equivalerem a B. Os esquemas são
estruturas abstratas gerais, que variam de veis mais baixos a veis mais altos em termos de
2
“[...] cada categoria é representada na memória por grandes nuvens de ocorrências recordadas daquela
categoria. Essas memórias são organizadas em um mapa cognitivo, de modo que memórias de instâncias
altamente similares estão próximas entre si e memórias de instâncias dissimilares estão afastadas.” (tradução
minha).
3
“[...] uma ocorrência de experiência lingüística que é idêntica a um exemplar existente é mapeada naquele
exemplar, fortalecendo-o. Ocorrências que são similares, mas não idênticas (diferindo em significado, forma
fonética, pragmática) a exemplares existentes são representadas elas mesmas como exemplares e são
armazenadas perto de exemplares similares para constituir conjuntos ou categorias. Portanto, a forma fonética de
uma palavra pode consistir de uma série de exemplares fonéticos que são consideravelmente similares uns aos
outros.” (tradução minha).
4
“Um protótipo é uma instância típica de uma categoria; outros elementos são assimilados à categoria com base
na semelhança percebida entre eles e o protótipo; há graus de pertencimento ao grupo baseados em graus de
similaridade. Um esquema, em contraste, é uma caracterização abstrata que é plenamente compatível com todos
os membros da categoria que ele define (então, o pertencimento ao grupo não é uma questão de graus); é uma
estrutura integrada que incorpora o que há de comum entre os membros, que são concepções de maior
especificidade e detalhe que elaboram o esquema de formas contrastivas.” (tradução minha).
21
abstração e complexidade, construídas a partir dos membros das categorias prototípicas,
estabelecendo-se entre esquema e membros uma relação de elaboração neste tipo de relação,
um mapeamento completo de A/esquema B/membro, em que as características de A são
totalmente compatíveis com B, sendo que B ocorre com maior grau de detalhamento.
Um dos pressupostos básicos dos modelos de uso é que “the phonetic properties of
lexical items, like their morphosyntactic and semantic properties, are affected by language
use”
5
(BYBEE, 2000, p. 81). Com isso, conseguem explicar sem dificuldades efeitos de
freqüência identificados em diversos fenômenos lingüísticos e.g. abundam na literatura
evidências de que palavras de alta freqüência tendem a ser afetadas mais rapidamente por
fenômenos fonéticos redutivos do que aquelas que contam com média ou baixa freqüência. A
freqüência de tipo e a freqüência de ocorrência
6
desempenham um papel importante nesses
modelos, exercendo impacto, respectivamente, sobre a produtividade de padrões e sobre a
força lexical.
Eventos de uso são armazenados nos exemplares por meio de processos cognitivos
gerais de categorização, resultando em grupos de memórias perceptuais ricas, que são
conectadas em redes relacionais baseadas em similaridade fonética e semântica. Tais redes, a
partir das quais emergem esquemas gerais (morfológicos, sintáticos, etc.), operam com base
em parâmetros probabisticos, apresentando distribuição estocástica.
Os prinpios descritos acima têm sido empregados com sucesso na análise de fatos
que representam problemas para as análises lingüísticas tradicionais, tais como o
conhecimento que os falantes possuem acerca de detalhes fonéticos finos, efeitos de
prototipicidade e efeitos de freqüência (BYBEE; HOPPER, 2001). Na seção 2.6, serão
retomados os principais aspectos da Fonologia de Uso e do Modelo de Exemplares.
5
“as propriedades fonéticas dos itens lexicais, bem como suas propriedades morfossinticas e semânticas, são
afetadas pelo uso lingüístico(tradução minha).
6
A freqüência de tipo (type frequency) corresponde ao número de vezes que uma unidade aparece representada
em um dado corpus. Já a freqüência de ocorrência (token frequency) corresponde a quantas vezes uma unidade é
efetivamente utilizada em um corpus. Por exemplo, no banco de dados do Aspa (o Projeto Aspa será brevemente
apresentado mais à frente, na p. 44), a freqüência de tipo do som [a] é 136.296 (ALMEIDA, 2005, p. 60), ou
seja, o som [a] aparece 136.296 vezes nas diferentes palavras contidas nesse banco de dados. Note-se que esse
valor se refere à representatividade do [a] no sistema da ngua, não ao uso efetivo que os falantes fazem desse
som, o que é dado pela freqüência de ocorrência. Por exemplo, a freqüência de ocorrência da palavra dia no
banco de dados do Aspa é 271.977, ou seja, nesse banco, a palavra dia ocorreu 271.977 vezes.
22
2.2 Alternância entre [ks] e [s]
Na literatura que trata sobre a estrutura sonora do PB, foram encontradas poucas
referências à seqüência [ks], e nenhuma sobre sua alternância com [s]. Em vista disto, este
projeto se proe a contribuir para a ampliação do conhecimento acerca da natureza e da
dimensão da alternância entre [ks] e [s] no PB.
A maioria dos estudos considera [ks] como mais um dos encontros consonantais
heterossilábicos admitidos pela língua, ao lado, por exemplo, de [pt], como em rapto (cf.
BISOL, 2001; CAGLIARI, 1981; CAMARA JÚNIOR, 1970 inter alia). Camara Júnior
(1970), baseando-se nos estudos estruturalistas, caracteriza /s/ como um fonema, em icio de
laba e entre vogais. Em final de laba, porém, ocorreria a neutralização, com perda do
contraste que distingue /s/ dos fonemas /z/, /Ѐ/ e /Ћ/, estabelecendo-se, pois, uma relação de
alofonia entre os quatro sons, que passam a ser representados por um arquifonema, /S/. Dentro
da estrutura sonora do PB proposta por Camara Júnior, [ks] é interpretado como uma
seqüência de dois fonemas, /k/ e /s/, à semelhança de outros encontros consonantais
heterossilábicos do tipo (oclusiva + sibilante). Entretanto, ao não se distinguir [ks] dos demais
encontros consonantais da língua, não como explicar porque essa seqüência, mas não as
demais, pode sofrer simplificação, com o cancelamento da primeira consoante.
No PB, há encontros consonantais tautossilábicos e heterossilábicos. Os
tautossilábicos são aqueles em que as consoantes pertencem à mesma laba, ocupando o
ataque
7
, em uma estrutura do tipo C1C2V(...), como em prato. Em encontros consonantais
tautossilábicos do PB, apenas as líquidas [ש,l] ocorrem na posição C2, enquanto a posição C1
pode ser ocupada por obstruintes (SILVA, 2002). Em um encontro consonantal
heterossilábico, que pode ser representado esquematicamente por (...)VC1.C2V(...)
8
, as
7
A sílaba apresenta uma estrutura hierárquica interna composta por ataque (onset), seguido de núcleo e coda,
sendo o núcleo um componente obrigatório. O ataque é ocupado pelas consoantes iniciais. O núcleo, centro da
sílaba, equivale ao pico de sonoridade que a caracteriza, sendo ocupado por vogais, longas ou breves, semi-
vogais e, em algumas línguas, certas consoantes contínuas. A coda é ocupada por consoantes pós-nucleares.
Núcleo e coda podem ser agrupados em um constituinte superior, a rima. Sílabas pesadas são aquelas em que a
rima é complexa (i.e., sílabas em que o núcleo é ocupado por ditongo ou vogal longa e/ou a coda é preenchida),
contrapondo-se às sílabas leves, que apresentam rima simples (cf. HOGG; MCCULLY, 1987, p. 36-38).
8
O ponto simboliza a divisão silábica e os elementos opcionais não-relevantes para o que se pretende demonstrar
estão subentendidos por “(...)”.
23
consoantes C1 e C2 pertencem a labas diferentes, sendo a primeira parte da coda da primeira
laba e a segunda, do ataque da segunda sílaba, como em pacto.
A interpretação de [ks] como um encontro consonantal tautossilábico pode ser
descartada considerando principalmente a ausência de [ks] em icio de palavra, ao contrário
das seqüências tautossibicas, como em prato. Além disso, no PB, os encontros
tautossilábicos são formados tipicamente por C+líquida (SILVA, 2002), diferentemente do
que se tem em [ks].
No PB, os encontros consonantais heterossilábicos também podem ser optativamente
desfeitos pela epêntese, que se realiza pela inserção de uma vogal alta breve [گ] (CAMARA
JÚNIOR, 1970; COLLISCHONN, 2002; CRISTÓFARO-SILVA; ALMEIDA, 2008b). Como
aponta Cristófaro-Silva (2000), dois tipos de encontros consonantais heterossilábicos no
PB: de um lado, aqueles em que C1 é ocupada por /N, R, S, l/, consoantes admitidas pelo PB
na posição de coda; de outro, aqueles em que C1 é ocupada por outra consoante que não /N,
R, S, l/. Apenas o segundo grupo, em que se enquadraria [ks], estaria sujeito a epêntese.
Abaixo, o Quadro 2, uma adaptação do quadro apresentado por Cagliari (1981),
mostra os encontros consonantais heterossibicos da língua desfeitos por epêntese, incluindo
[ks]. Ao quadro inicialmente apresentado pelo autor foram acrescentados os encontros [pn] e
[tn]. Foram excldos os encontros heterossilábicos que ocorrem exclusivamente entre a
consoante final de um prefixo e a consoante inicial da base que o segue ([b] + [p, k, m, n],
e.g. subproduto), opção que segue Collischonn (2002), pois há evidências de que fronteiras de
morfema, em algumas situações, podem se comportar de forma diferente das fronteiras
silábicas internas de morfema
9
.
Como se pode notar pelos dados do Quadro 2, restrições quanto às combinações de
consoantes que aparecem nos encontros consonantais heterossilábicos do PB opcionalmente
desfeitos por epêntese. Pode-se identificar uma forte tendência de que C1 apresente vel de
sonoridade menor que C2, considerando a seguinte escala de sonoridade: nasais > fricativas
vozeadas > oclusivas vozeadas > fricativas desvozeadas > oclusivas desvozeadas
(CLEMENTS, 1990; PARKER, 2002).
QUADRO 2
9
No PB, a decisão de excluir os grupos consonantais em fronteira de morfema dos encontros consonantais
heterossilábicos recebe suporte de casos em que a união de prefixo e base pode gerar a ressilabificação da
palavra (e.g. sub-região [sub.he.ցi.⎆aѨ] vs. *[su.bשe.ցi.⎆aѨ], subárea [sub.⎆a.שگ.a] vs. [su.⎆ba.שگ.a]).
24
Encontros consonantais heterossilábicos desfeitos por
epêntese no PB
Encontro consonantal Exemplo
[pt]
rapto
[ps]
oão
[pn]
apnéia
[bt]
obturação
[bd]
abdômen
[bv]
óbvio
[bs]
absinto
[]
objeto
[bn]
abnegação
[tm]
ritmo
[tn]
etnia
[dv]
advogado
[]
adjetivo
[dm]
administração
[kt]
pacto
[ks]
anexo
[kn]
cnica
[ցm]
pigmeu
[ցn]
diagnóstico
[ft]
afta
Fonte: Adaptação de Cagliari (1981).
O Quadro 3, a seguir, uma adaptação do quadro apresentado por Cristófaro-Silva e
Almeida (2008b), mostra a freqüência de tipo dos encontros consonantais heterossilábicos no
banco de dados do Aspa. Algumas alterações foram feitas
10
, para tornar o Quadro 3
comparável com o Quadro 2.
10
Dado o seu caráter marginal, foram excluídos do quadro os seguintes encontros consonantais, originalmente
presentes em Cristófaro-Silva e Almeida (2008): [dn] e [ցd], presentes somente em nomes próprios; [ts] e [ds],
presentes somente em nomes próprios e empréstimos (com exceção da palavra adstringentes e derivadas); [kz],
que conta com cinco palavras apenas no banco de dados (czar e derivadas, estrangeirismos, e eczema); [mn] que
conta com sete palavras apenas no banco de dados (amnésia e derivadas, mnemônico, amniótico). Além disso, o
encontro [tv], que no quadro original estaria presente em 94 palavras, na verdade não estava presente no banco
de dados e foi excluído. Por outro lado, [dv] e [] tiveram suas freqüências alteradas para respectivamente 92 e
40, pois os valores originais estavam equivocados.
25
QUADRO 3
Freqüência de tipo dos encontros consonantais heterossilábicos desfeitos por epêntese no PB
C2
[t] [d] [k] [v] [s]
[Ћ]
[m] [n]
[p]
404 319 41
[b]
89 75 42 225 84 20
[t]
50 46
[d]
35 92 40 148
[k]
530 652 101
[ց]
116 424
C1
[f]
23
Fonte: Adaptação de Cristófaro-Silva e Almeida (2008b).
Como se pode perceber, C1 é predominantemente ocupada por oclusivas, com
destaque para as vozeadas [b] e [d]. C2, por outro lado, é predominantemente ocupada por
alveolares, destacando-se nessa posição [t], [s] e [n]. Considerando um ponto de corte de 200
para dividir as seqüências de alta e de baixa freqüência, pode-se perceber que as de alta
freqüência envolvem justamente as consoantes alveolares [t, s, n]: [pt], [ps], [bs], [kt], [ks],
[gn]. Note-se, ademais, que a seqüência com maior freqüência de tipo é [ks], que ocorre em
652 palavras do banco de dados. Esse dado é de grande relevância, pois a alta freqüência de
tipo aponta para a consolidação de [ks] como um padrão forte no PB.
Cristófaro-Silva e Almeida (2008b) avaliaram a natureza fonética das vogais
epentéticas do PB, comparando-as com vogais altas regulares. Demonstraram que os dois
tipos de vogal alta podem ser ou não realizadas, havendo entre elas, contudo, uma diferença
na duração: a vogal epentética seria significativamente mais curta que a vogal alta regular.
Com base nesses resultados, concluem que a vogal epentética estaria presente na
representação mental, sendo diferenciada da vogal alta regular por detalhes fonéticos finos,
que teriam status representacional.
Resumindo os dados expostos nesta seção, os encontros consonantais do PB são
provenientes de duas fontes: de um lado, os encontros consonantais “de fato”, que
tradicionalmente são ditos presentes na representação subjacente (psicologia [psikolo⎆Ћiђ]);
de outro, os que resultam da não-realização de uma vogal alta regular (piscina [psinђ]). Além
disso, os encontros consonantais podem estar na mesma laba (tautossibicos, como prato
26
[a.tѨ]) ou em labas distintas (heterossilábicos, como pacto [⎆pak.tѨ]). Dentre os
heterossilábicos, alguns podem ser desfeitos por epêntese (como pacto [⎆pak.tѨ], em que C1
o é uma consoante permitida na posição de coda, /N, R, S, l/), enquanto outros não
apresentam epêntese (como parto [⎆pah.tѨ], em que C1 é uma consoante permitida na posição
de coda, /N, R, S, l/). Como anteriormente apresentado, a literatura sobre o sistema sonoro do
PB assume que [ks] é um encontro consonantal heterossilábico passível de epêntese, à
semelhança de [kt], em pacto, hitese que será retomada na seção 2.7.
O PB tem apresentado fenômenos, em certa medida, opostos em termos de
estruturação fonotática: de uma parte, encontros consonantais são desfeitos, seja pelo
cancelamento de sons, com a quebra de encontros consonantais tautossibicos (e.g. livro
[⎆livrѨ]~[⎆livѨ], cf. CRISTÓFARO-SILVA, 2001) e heterossilábicos (e.g. estadual
[گstadu⎆aw]~[گsadu⎆aw], cf. CRISTÓFARO-SILVA, 2000), seja pela inserção de sons, com a
epêntese, que desfaz encontros consonantais heterossilábicos em que C1 é diferente de /N, R,
S, l/ (e.g. rapto [⎆hap.tѨ]~[⎆ha.pگ.tѨ]). De outra parte, são criados novos encontros
consonantais, pela ncope de vogais átonas (e.g. novecentos [nѐvi⎆setѨs]~[nѐvi⎆sets]), como
relatam Bisol e Hora (1993), e pelo cancelamento de vogais altas regulares (e.g. piscina
[pگ⎆si.nђ]~[psi.nђ]), como apontam Cristófaro-Silva e Almeida (2008b) e Cagliari (2002).
Ressalte-se que os dois últimos fenômenos, que criam novos encontros consonantais,
representam um problema para as teorias que postulam uma tendência geral das línguas do
mundo à estrutura silábica CV, que seria universal (cf. CLEMENTS, 1990), e que propõem
que o molde silábico do PB aceitaria somente as consoantes /N, R, S, l/ na posição de coda
(cf. CAMARA JÚNIOR, 1970). Em vista dessas considerações, faz-se necessário reavaliar os
pressupostos assumidos e difundidos pelos estudos que se dedicam ao sistema sonoro do PB.
Destaca-se a necessidade de repensar as tendências gerais da língua, relativizando aspectos
tidos como categóricos e sem exceções; reavaliar a questão dos encontros consonantais, em
vista das restrições e tendências distribucionais que os afetam, bem como a natureza
representacional de sons particulares, como [ks], diante dos fenômenos que têm sofrido.
27
2.3 Propriedades acústicas de [ks]
Nas etapas iniciais da presente pesquisa, foi desenvolvido um experimento piloto com
o objetivo de explorar as propriedades acústicas de [ks] (CANTONI, 2007). Na ocasião,
foram gravados dois informantes do sexo masculino, naturais de Belo Horizonte, que
realizaram a leitura de quatro textos com cerca de 100 palavras cada um. Foram testadas 25
palavras, sendo 14 reais e 11 inventadas
11
. Os dados foram analisados acusticamente através
do software Praat (BOERSMA; WEENINK, 2007). Buscava-se, entre outras coisas, averiguar
se haveria de fato uma vogal epentética separando a seqüência de obstruintes [ks]. Na análise
espectrográfica, apenas duas das 50 realizações apresentaram, entre [k] e [s], um segmento
vocálico semelhante à vogal epentética. Salienta-se que a vogal epentética foi observada
unicamente em palavras inventadas e em que o falante promoveu um alongamento das labas
que continham [k] e [s], talvez em decorrência da falta de familiaridade com o item (e.g.
lopax). Essas duas ocorrências isoladas de epêntese, portanto, não se mostraram significativas.
A título de ilustração, a Figura 1, abaixo, mostra um espectrograma do item lexical, obtido no
experimento piloto
12
. As setas pontilhadas indicam (a) a lacuna correspondente a [k] e (b) a
região de rdo em alta freqüência, correspondente a [s].
Am da ausência de epêntese, outro fato que chamou a atenção desde o começo da
análise acústica foram ressonâncias
13
nas sibilantes [s] avaliadas, que estão demonstradas
pelas setas sólidas na Figura 1.
11
As palavras reais testadas foram sintaxe, lexical, lexicologia, léxico, intoxicações, intoxicação, tóxico, toxina,
máximo, maximização, complexo, maximizar, reboques, box; as inventadas, teques, coixando, ranóxios, lopax,
becalixe, eduvaixo, póxico, axidérios, xines, finlaxe, Dostex.
12
Oclusivas têm como correlato acústico uma queda brusca de intensidade e são representadas no espectrograma
por uma lacuna, um espaço em branco, seguida de explosão e transição. as fricativas, aparecem como um
padrão randômico de ruído, especialmente em freqüências mais altas; para uma sibilante alveolar, a grande
concentração de energia estaria acima dos 4 kHz (próxima à região de F4, nas vogais) (KENT; READ, 1992;
LADEFOGED, 1993).
13
Ressonância é um pico de energia em determinada freqüência, formado quando um vibrador é movido por
uma força que varia em freqüência próxima à freqüência natural do vibrador (ROSSING, 1995). No caso da fala,
o vibrador corresponde às cordas vocais e a freqüência natural, à freqüência fundamental, f0.
28
Time (s)
0 0.582132
0
8000
FIGURA 1 - Espectrograma obtido no estudo piloto: Informante 1, item lexical
([leksگ⎆kaw])
Essas ressonâncias assemelham-se a formantes
14
, pois estão situadas em regiões
típicas de F3 e principalmente F2 (em que são mais proeminentes, na maioria dos casos).
Am disso, apresentam um comportamento que é característico de F2 e F3, que tendem a
convergir entre si quando envolvidos na transição de consoantes velares e para consoantes
velares
15
. A presença de formantes em uma fricativa é relevante, em especial para uma
sibilante alveolar, em que a grande concentração de energia estaria acima dos 4 kHz, perto da
freqüência de F4 e bem distante da de F2 (KENT; READ, 1992). Pode-se pensar, com isso,
que tais formantes seriam alheios ao próprio [s], sendo-lhe conferidos por outro elemento.
Neste ponto, é significativo que as ressonâncias das sibilantes avaliadas se assemelhem a F2 e
F3 de uma vogal alta anterior em região e espaçamento. Assim, retoma-se a questão da vogal
14
De acordo com a Teoria Linear de Fonte e Filtro, os formantes o padrões de ressonância gerados pela
sobreposição de um filtro (configuração do trato vogal) a uma fonte (o vozeamento produzido pela vibração das
cordas vocais) (KENT; READ, 1992). São característicos das vogais, mas outros sons (líquidas, nasais,
semivogais) apresentam ressonâncias semelhantes. Nos segmentos vocálicos, pode-se tecer a seguinte
correspondência acústico-articulatória (KENT; READ, 1992; LADEFOGED, 1996): F1 é inversamente
proporcional à altura, enquanto F2 é diretamente proporcional ao avanço da ngua (anteriorização); F3, apesar
de menos evidentemente, tamm é importante na determinação da qualidade fonética das vogais, sendo
correlato da roticização e do arredondamento dos lábios. Os formantes F4 e F5 seriam relevantes para determinar
a qualidade do vozeamento.
15
Algumas caractesticas da transição consoante-vogal (CV) e vogal-consoante (VC) serviriam para distinguir
as oclusivas entre si. Essas consoantes transmitiriam suas qualidades para as vogais adjacentes. Na transição de
ou para oclusivas velares como é o caso da oclusiva em estudo, [k] –, há um estreitamento da distância entre
F2 e F3, que tendem a se encontrar; o comportamento de F3 é assimétrico, com crescimento na transição de uma
velar e abaixamento na transição para uma velar (LADEFOGED, 1993).
(a)
(b)
29
epentética
16
, [گ], que, sendo alta e anterior, ofereceria uma explicação coerente e razoável para
a existência de formantes nas sibilantes componentes de [ks].
Estaria relacionada a esse fenômeno também a freqüência central da oclusiva [k], que
se localizaria na região de F2 (KENT; READ, 1992). Uma possibilidade de interpretação para
os fatos discutidos em relação às particularidades acústicas da seqüência sonora [ks] seria
dada pela Fonologia Articulatória (BROWMAN; GOLDSTEIN, 1986), que aponta para a
sobreposição de gestos articulatórios, situação em que propriedades acústicas de um segmento
partilhariam um mesmo espaço acústico com outro segmento. Assim, em seqüências [ks]
poderíamos sugerir que uma vogal alta estaria embutida na sibilante, o que é coerente com a
proposta de Albano (2001). Na coleta de dados definitiva, o fenômeno da presença
ressonâncias na sibilante deverá ser testado experimentalmente, para determinar se afeta
igualmente [s] alternante com [ks] e [s] pleno.
2.4 Detalhe fonético
Neste estudo, pretende-se averiguar se detalhes fonéticos finos exercem algum papel
na distinção entre os sons em alternância (cf. Grupo 1 do Quadro 1, p. 11) e os que não
alternam (cf. Grupos 2 e 3 do mesmo quadro). Para tal, serão avaliadas experimentalmente
características acústicas do [s] e do [ks], como a duração e a intensidade. Será investigada
tamm a hitese de ocorrência de queda na intensidade durante a produção do [s] que
alterna com [ks], com base nos resultados obtidos por Guimarães (2004). A pesquisadora
identificou uma redução da intensidade no [Ѐ] que alterna com [ЀtЀ] em formas como vestido
[vi⎆ЀidѨ] ~ [viЀ⎆tЀidѨ], sendo tal queda de intensidade o observada para casos de [Ѐ] sem
alternâncias, como em mexido [mi⎆ЀidѨ]. No mesmo estudo de Guimarães, mostrou-se
relevante também o parâmetro duração e, a partir desse resultado, levanta-se a possibilidade
de haver, para [s] e [ks], uma diferenciação da sua duração relativa ou de segmentos
16
Para um homem adulto, os valores de F1, F2 e F3 para [گ] giram em torno de 390, 1990, 2550 Hz (ROSSING,
1995).
30
adjacentes. Essa diferenciação funcionaria como uma marca da distinção funcional e como
preservação da identidade dos sons.
Resultado semelhante ao de Guimarães foi encontrado por Fox e Terbeek (1977 apud
ALBANO, 2001, p. 20), ao verificar, no inglês americano, uma relação entre o flapping de
/t,d/ (ambos realizados como [ש] entre vogais) e o alongamento vocálico antes de consoante
sonora, de modo que seja mantido o contraste entre pares de palavras como writer [rש
ђ
Ѣ] e
rider [raگ⍧ש
ђ
Ѣ]. Embora aparentemente homófonas, as formas para writer e rider diferem
quanto ao alongamento do ditongo, no caso de rider.
17
Esses e outros estudos fornecem indícios de que o detalhe fonético é relevante para o
processamento da fala (BYBEE, 2001). Pierrehumbert (1999) descreve uma série de
pesquisas acerca da natureza do conhecimento implícito sobre a linguagem, que encontraram
evidências da existência de padrões fonéticos específicos a cada língua, em veis
extremamente finos de detalhe, bem como evidências da natureza estocástica (e não
puramente gramatical) do conhecimento implícito sobre fonotática e alternâncias
morfofonológicas. Esses estudos, em sua maioria, fazem uso da análise de dados em larga
escala, possibilitada pelo advento de novas tecnologias e métodos experimentais, e colocam
em xeque dois pontos consensuais para a Lingüística Gerativa: (1) o conhecimento implícito
da estrutura sonora seria uma gramática, composta de um pequeno número de categorias
(fonemas, traços) e uma lógica que as combine em estruturas bem-formadas; (2) não faz parte
do conhecimento fonológico implícito a relação que se estabelece entre os outputs da
gramática fonológica e as propriedades sicas do sinal da fala. Como aponta Pierrehumbert,
ao invés de categorias fonéticas universais, convém pensar em recursos fonéticos universais,
organizados e aproveitados pelo sistema cognitivo, utilizados de formas distintas em
diferentes culturas. Verifica-se empiricamente a diferenciação sistemática dos detalhes
fonéticos finos em cada língua, que devem ser aprendidos pelo falante. Para tanto, este deve
ser capaz de formar generalizações estatísticas a partir do léxico, generalizações que dão
origem às restrições fonotáticas e são gradientemente refletidas em julgamentos de boa-
formação e no conhecimento das alternâncias morfofonológicas. Pierrehumbert conclui que
uma teoria condizente com tais resultados deve ser capaz de prever e explicar como os
recursos fonéticos gradientes são organizados e aproveitados por cada língua em seu
17
Há evidência na literatura de que segmentos sonoros são mais longos quando seguidos por consoantes
vozeadas. Assim, o ditongo em rider tem maior duração do que em writer. Portanto, a forma rider [⎆raگ⍧ש
ђ
Ѣ]
preservaria o alongamento do ditongo existente em rider [⎆raگ⍧d
ђ
Ѣ] como uma maneira de preservar a distinção
funcional entre writer e rider.
31
inventário lexical, a partir do qual são feitas as generalizações que dão origem à gramática
fonológica.
O presente estudo, por se propor a avaliar as propriedades fonéticas finas de sons do
PB, pretende oferecer mais uma evidência de que o detalhe fonético exerce um papel
fundamental na armazenagem e processamento lexical.
2.5 Gradiência lexical e gradiência fonética
A questão da gradiência fonética bem como da gradiência lexical têm sido alvo de
muitos debates acerca dos processos de mudança, desde os primórdios da Lingüística
moderna. Ainda no século XIX, os neogramáticos defendiam que uma mudança sonora, ao ser
implementada, afetaria todas as palavras da língua que contivessem o som em mudança, em
iguais condições fonéticas ou seja, as mudanças eram foneticamente graduais e lexicalmente
abruptas. Para eles, as leis fonéticas operariam em regularidade absoluta, as exceções sendo
atribuídas à força poderosa da analogia (FARACO, 2005; OLIVEIRA, 1991).
no século XX, William Wang, entre outros lingüistas, apresentou fatos empíricos
que não poderiam ser explicados pelo princípio neogramático da regularidade absoluta. Com
isso, a questão da mudança lingüística passou a atrair a atenção dos pesquisadores em direção
a uma abordagem alternativa. Nessa época, surgiu o modelo que ficou conhecido como
hitese da difusão lexical. Essa corrente teórica sugere que as mudanças sonoras podem ser
foneticamente abruptas e lexicalmente graduais ou seja, de natureza discreta, como
cancelamento, inserção e metátese de segmentos, e ocorrem de palavra em palavra, resultando
em regularidade lexical ou afetando apenas parte do xico. Isso permitiu explicar porque,
dentre as palavras que contêm um som em mudança, nem todas são afetadas ao mesmo tempo
e da mesma forma (BYBEE, 2002b; OLIVEIRA, 1991). Acredita-se que essa perspectiva
teórica consiga explicar, no caso do presente estudo, uma possível gradiência lexical, em que
a alternância entre [ks] e [s] afetaria palavras individualmente, mantendo intactas outras, com
contexto igualmente procio à aplicação do fenômeno. Em consonância com a Difusão
Lexical, esta pesquisa adota o modelo da Fonologia de Uso (BYBEE, 2001), que será
explorado a seguir.
32
2.6 Modelo de Exemplares e Fonologia de Uso
Frente à divergência entre difusionistas e neogramáticos, e propondo uma terceira
perspectiva de análise da mudança, surge a Fonologia de Uso (BYBEE, 2001), que a
mudança sonora como fonética e lexicalmente gradual. Os principais pressupostos deste
modelo serão sintetizados a seguir. Nessa perspectiva trica, a mudança sonora se processa
pelo uso atual das palavras, que são sujeitas a efeitos de freqüência (seja freqüência de type ou
de token). Hopper (1976) apresenta o que seria um paradoxo para a difusão lexical: palavras
de alta freqüência tendem a ser afetadas por mudanças sonoras redutivas (motivação fonética),
enquanto as de baixa freqüência, pelo nivelamento analógico (sem motivação fonética). De
forma semelhante, Phillips (1984; 2001) propõe que as mudanças sonoras podem ser
foneticamente motivadas e não foneticamente motivadas. As do primeiro tipo por exemplo,
o apagamento de t/d no inglês americano (BYBEE, 2002b) atingiriam antes palavras de
maior freqüência, ao contrário das do segundo tipo mudanças de natureza analógica, como a
regularização de formas irregulares do passado em inglês (BYBEE, 2002b) –, que afetariam
palavras menos freqüentes primeiro. Mudanças do tipo redutivo se enquadrariam no primeiro
grupo e seriam um resultado da automatização (redução da magnitude ou da duração de
gestos articulatórios) decorrente da repetição de tarefas neuromotoras específicas, como
acontece com a realização de palavras de alta freqüência (BROWMAN; GOLDSTEIN, 1992).
A alta freqüência de uso desencadearia, por um lado, o efeito de encaixamento, que resulta em
representações mentais fortes, e, por outro, o efeito de automatização, em que ocorre a
redução da magnitude ou da duração de gestos articulatórios, ocasionando processos de
enfraquecimento e assimilação: a repetição tem efeito redutivo on-line, mas efeito
conservador no armazenamento (BYBEE, 2002b). Defende-se que a mudança sonora tem um
efeito imediato e permanente sobre as representações lexicais, que são reestruturadas
gradualmente com base na ocorrência de variantes de uma palavra. As representações
mentais, de natureza múltipla, estariam interconectadas em redes, em veis lingüísticos
variados. Como já abordado na seção 2.4, mostra-se extremamente relevante o detalhe
fonético e o conhecimento do falante em face do uso da língua.
Essa proposta guarda semelhanças com o modelo de protótipos desenvolvido por
Eleanor Rosch (1973, 1978), que se voltava para a investigação de classes naturais na
formação de conceitos, dentro da psicologia cognitiva. A abordagem de protótipos, assim
33
como outros modelos cognitivos posteriores, que nela se basearam (e.g. LAKOFF, 1987;
LANGACKER, 1987), assume a noção de categoria como estrutura gradativa. As categorias
seriam compostas por vários elementos com status diferentes e essa desigualdade teria
implicações na organização hierárquica que estabelecem entre si. As variações
intracategoriais são vistas como desvios do protótipo, que seria o membro mais central da
categoria. Do modo semelhante, a Fonologia de Uso defende que a forma fonológica das
palavras forneceria evidência de que a categorização não se baseia inteiramente em
exemplares, mas envolve antes certa abstração que se assemelha à dinâmica de construção de
categorias prototípicas. Além disso, sugere que as categorias se reestruturam de modo gradual
e talvez contínuo em torno dos membros mais freqüentes, que funcionariam como elementos
nucleares do protótipo.
A Fonologia de Uso toma como modelo representacional a Teoria de Exemplares
(PIERREHUMBERT, 2000), que parte igualmente do princípio de que o armazenamento
mental das unidades lingüísticas se por meio de ocorrências atuais de uso: as
representações são o resultado da categorização de ocorrências fonéticas e incorporam o
detalhe fonético. Nesse modelo, como aponta Bybee (2002a), todas as variantes foticas de
uma palavra são armazenadas na memória e organizadas em nuvens, sendo que a proximidade
dos exemplares será determinada pela semelhança que mantêm entre si e sua robustez
aumenta com a freqüência. As nuvens de exemplares estariam embutidas em uma rede de
palavras, que são associadas com base em relações de similaridade em todos os veis os
morfemas e as relações morfológicas emergem a partir das conexões paralelas baseadas na
similaridade fonética ou semântica. A autora argumenta que essas redes de palavras seriam
responsáveis por gerenciar relações em diversos veis, como segmental, silábico,
morfológico, sintático, pragmático, social, etc. Portanto, fazem parte da representação
informações de cunho lingüístico e social, tidas como redundantes por modelos
unirrepresentacionais, como o gerativismo.
A Fonologia Probabilística (PIERREHUMBERT, 2003), também uma abordagem
multirrepresentacional, não compartilha com as duas propostas anteriores alguns
pressupostos básicos, mas encontra nelas sua base de sustentação. Busca compreender os
mecanismos e processos de organização e armazenamento das informações lingüísticas
adquiridas através do uso da língua. Como apontam Bod, Hay e Jannedy (2003), vários
estudos têm sido desenvolvidos no sentido de desafiar a noção de que a competência é
discreta e categórica, avaliando fenômenos que apresentam propriedades características de um
continuum e comportamento gradiente. Outros, por sua vez, voltam-se para dimensões
34
intermediárias do contínuo lingüístico que foram deixadas relativamente inexploradas e
inexplicadas pelos estudos gerativos, uma vez que estes diferenciam apenas os pontos
extremos da competência e do desempenho, com grande ênfase sendo dada ao primeiro. Os
autores defendem que a abordagem probabilística tem muito a contribuir para o avanço das
fronteiras da teoria lingüística, agregando-lhe novos conhecimentos e uma perspectiva de
análise diferenciada, que permite uma ampliação da dimensão dos dados analisáveis.
Se há um forte consenso de que cognição humana se baseia no processamento
probabilístico, contudo, para determinar a adequação da probabilidade à modelagem da
linguagem, devem ser levantadas evidências equivalentes de sua influência sobre a faculdade
da linguagem. Essas evidências, que seriam de naturezas diversas, constituem os pilares
conceituais da Fonologia Probabilística, que se apóia fortemente na variação (correlação entre
o conhecimento da variação e o conhecimento de freqüências), na freqüência (efeitos de
freqüência em abundância permeiam a representação, o processamento e a mudança
lingüística) e na gradiência (evidência mais robusta que a freqüência, faz-se presente em
esferas como pertencimento de membros a uma categoria, julgamentos de boa-formação e
gramaticalidade, produtividade e decomposição morfológica, distinção entre argumento e
adjunto). A probabilidade opera na representação, na percepção, na produção, bem como na
aquisição da linguagem, podendo ser muito útil no tratamento destas, entre outras questões.
Am disso, ao contrário das abordagens tradicionais, a probabilística permite a consideração
das similaridades e diferenças das línguas em relação a tendências universais da linguagem.
Os três modelos acima descritos convergem com a linha trica funcionalista, que se
opõe à linha formalista por defender que a estrutura e o uso da língua não podem ser
dissociados na análise lingüística. Conforme relatam Bybee e Hopper (2001), foram
desenvolvidas, principalmente a partir da década de 1980, abordagens que se contrapuseram à
visão estruturalista da linguagem, questionando alguns de seus pontos fundamentais, além da
questão da independência entre estrutura e uso e da primazia da primeira sobre o segundo. As
críticas dizem respeito principalmente à visão da gramática como um sistema sincrônico fixo
e da estrutura lingüística como um sistema autônomo, uma matriz preexistente, e alertam
sobre os inúmeros problemas e conseqüências de se fazer uma análise da competência
individual, por meio da intuição do lingüista. As abordagens inovadoras voltavam-se para o
impacto da experiência com a linguagem sobre as representações cognitivas e a categorização,
experiência que é refletida na freqüência. Segundo os autores, essas teorias alternativas
destacaram-se por acreditar que a freqüência de exposição e uso é um fator determinante para
o estabelecimento e a manutenção da estrutura lingüística, que é vista como um sistema fluido
35
e em constante mudança, uma resposta contínua a pressões do discurso. Nesse contexto,
tornam-se centrais as noções de emergência, como um processo contínuo de estruturação, e de
probabilidade, sendo promovida, para análise lingüística, a adoção de corpora de fala real,
que tenham volume e estruturação estatisticamente relevantes.
2.7 A natureza da representação mental de [ks]
Retomando a distribuição do Quadro 1, nele foram estabelecidas três categorias, como
base no comportamento dos sons [ks] e [s]. O Grupo 1 contempla palavras em que [ks] e [s]
alternam. Nos Grupos 2 e 3, encontram-se palavras com [ks] e [s] plenos, respectivamente.
Uma hitese a ser verificada neste estudo diz respeito à organização dos membros em cada
grupo e à relação entre os grupos. Aparentemente, a distribuição das palavras aponta para uma
configuração semelhante à de um protótipo, com alguns membros centrais mais estáveis
(núcleo bem definido) e outros, periricos, mais instáveis (bordas difusas). Pode-se sugerir
tamm que as bordas das três categorias se sobrepõem em alguns momentos, de forma que
certos membros são compartilhados. Levanta-se a hitese de que palavras como sintaxe,
léxico, tóxico lideram a aplicação do fenômeno de alternância entre [ks] e [s] e ocupariam o
centro da categoria, sendo os exemplares mais típicos e lidos do Grupo 1, enquanto que
outras, como maximização ou saxofone, se colocariam às margens e, por isso, sua
susceptibilidade à alternância entre [ks] e [s] seria menos evidente. Essa hipótese será testada
verificando, em um corpus de freqüência, quais seriam as palavras centrais e periféricas em
cada grupo, se de fato estas últimas são mais suscetíveis ao fenômeno e em que grau.
Certos itens lexicais, como máximo [⎆masگmѨ] e próximo [⎆pשѐsگmѨ], se enquadrariam
a priori no Grupo 3, por apresentarem um [s] não-alternante. No entanto, verificou-se que
alguns falantes, especialmente de gerações mais antigas, poderiam realizar essas palavras com
[ks] ao invés de [s]: [⎆maksگmѨ] e [⎆pשѐksگmѨ]. Pretende-se demonstrar esse fato gravando
informantes de idade mais avançada. Comprovando-se a proposição inicial, pode-se
argumentar que, nestes itens, máximo e próximo, teria havido uma mudança lingüística
envolvendo a simplificação da seqüência [ks], semelhante à alternância atestada em itens do
36
Grupo 1. Nesse caso, a restrição da mudança a esses dois itens específicos se deveria a um
condicionamento lexical por efeito de freqüência de token.
Pode-se levantar a hitese de que a simplificação de [ks] para [s], uma mudança de
natureza redutiva, seria desengatilhada primeiro em palavras mais freqüentes. É interesse
desta pesquisa investigar o grau de relação e proximidade que pode ser estabelecido entre o
processo de mudança possivelmente sofrido por máximo e próximo e o fenômeno que afeta
itens do Grupo 1, como sintaxe, léxico e tóxico. Ademais, chama a atenção uma semelhança
existente entre quatro dessas palavras, máximo, próximo, léxico e tóxico: são adjetivos
formados pelo acréscimo de um sufixo de duas labas breves ([گmѨ] e [گkѨ],
respectivamente), originando proparoxítonas. Nesse caso, argumenta-se que a natureza do
sufixo pode alterar a organização de um grupo de palavras, o que ofereceria evidências para
modelos de rede. Com isso, faz-se necessário considerar posteriormente uma possível
influência de fatores morfológicos, tomando como base as idéias propostas por Bybee (1985).
Outra questão que será abordada neste estudo é se [ks] pode ser mais bem
caracterizado como uma seqüência de sons ou como um único som. Defende-se, aqui, que os
modelos formalistas não conseguem lidar satisfatoriamente com o fenômeno em estudo.
Como anteriormente apresentado, a literatura sobre o sistema sonoro do PB assume
que [ks] seria um encontro consonantal. Uma análise da alternância [ks]~[s] dentro da
tradição estruturalista e nisso segue-a de perto a Gramática Gerativa consistiria
basicamente em desenvolver uma regra que representasse o cancelamento do [k] seguido de
[s]. Contudo, definir o contexto de aplicação da regra mostra-se um problema, por ser ela
lexicalmente condicionada ou seja, a regra não se aplica sempre que houver o contexto
sonoro procio, mas depende diretamente do item lexical. Independentemente de [ks] ser
interpretado como uma seqüência de sons ou um único som, em comparação com os demais
sons da língua, a regra formulada sempre seria incompleta:
a) [ks] como uma seqüência de sons
Regra: [k] Ø / [V __ s] (exceções: táxi, sexo, etc.)
b) [ks] como um único som
Regra: [ks] [s] / [V __ ] (exceções: táxi, sexo, etc.)
37
Uma análise autossegmental apresenta maior poder representacional frente à fonologia
de base estruturalista e gerativista, mas, como estas, também encontra barreiras para expressar
o condicionamento lexical, o aspecto funcional e a motivação da alternância [ks]~[s]. A
Fonologia Autossegmental representaria o fenômeno de alternância [ks]~[s] da seguinte
forma. Considerando [ks] como uma seqüência de sons, [k] e [s] seriam dois segmentos
simples, ou seja, segmentos em que o nó de raiz apresenta apenas um traço de articulação oral
(CLEMENTS; HUME, 1995, p. 253). Haveria, então, o cancelamento do [k], representado
através do desligamento (delinking), seguido de apagamento automático (automatic deletion),
como se pode ver abaixo, na Figura 2:
FIGURA 2 - Representação autossegmental do cancelamento de [k] na
seqüência [ks]
A outra possibilidade seria considerar [ks] como consistindo em um único som.
Surgem, então, duas possibilidades: interpretar [ks] como um segmento de contorno ou como
uma consoante complexa. Segmentos de contorno contêm uma seqüência de traços opostos,
apresentando efeito de bordas (edge effect): diante dos segmentos de um de seus lados,
comporta-se em conformidade com um traço; diante dos segmentos do outro lado, em
conformidade com o traço oposto (CLEMENTS; HUME, 1995, p. 254). Clements e Hume
apontam que africadas e oclusivas pré-nasalizadas seriam os candidatos mais comuns à
classificação como segmentos de contorno. As africadas são sons em que uma oclusiva é
seguida de uma fricativa homorgânica ou seja, que apresenta mesmo ponto de articulação
(LADEFOGED, 1982, p. 60). Portanto, [ks] não é uma africada, visto que [k] e [s] não o
homorgânicos – [k] é articulado no véu palatino e [s], nos alvéolos. Am disso, o foi
38
atestado para [ks] nenhum fenômeno que indicasse a ocorrência de efeito de bordas e, com
isso, justificasse sua interpretação como consoante de contorno. Essa hitese será, portanto,
desconsiderada. Em caráter meramente ilustrativo, a representação formal de [ks] como
segmento de contorno é apresentada na Figura 3, a seguir.
FIGURA 3 - Representação autossegmental
de [ks] como um segmento de
contorno
Tendo sido descartada a interpretação de [ks] como segmento de contorno, resta a
necessidade de considerar sua interpretação como consoante complexa. Consoantes
complexas são segmentos compostos por duas ou mais articulações, com constrições
simultâneas; geralmente envolvem a imposição de articulação de natureza vocálica sobre um
segmento consonantal, como a labialização, a palatalização, a velarização, entre outros
processos (CLEMENTS; HUME, 1995; LADEFOGED; MADDIESON; 1996). A Figura 4,
abaixo, mostra a representação autossegmental de [ks] como uma consoante complexa, de
acordo com Clements e Hume (1995):
FIGURA 4 - Representação autossegmental
de [ks] como consoante
complexa
39
O modelo autossegmental sem dúvida oferece uma análise mais elegante tanto da
alternância [ks]~[s] quanto da representação fonológica de [ks], mas ainda assim mostra-se
insatisfatória, por não conseguir lidar com o condicionamento lexical que opera na alterncia
[ks]~[s], com as interações funcionais que se dão entre [ks] e os outros sons da língua e com
as motivações da alterncia.
Para considerar a possibilidade de caracterização de [ks] como consoante complexa,
deve-se necessariamente analisar o comportamento desses sons em comparação com o
comportamento de outras consoantes complexas da língua, [] e [ցܦ]. Silva (1992) proe
que, no PB, algumas seqüências de (oclusiva velar + glide), [kw] e [ցw], sejam interpretadas
como consoantes complexas. Seria o caso das seqüências presentes nos itens iníquo [i⎆nikwѨ]
e língua [⎆liցwђ]. Os argumentos que fundamentam sua proposta se resumem a:
1) restrição segmental quanto à consoante que ocupa a posição anterior ao glide;
2) ausência de restrição segmental quanto à vogal posterior ao glide;
3) restrição funcional: impossibilidade de alternância do glide [w] com a vogal alta
[u], em palavras derivadas ou no mesmo item lexical (como em coalho [⎆kwaѭѨ] e
aguado [a⎆ցwadѨ], em que [kw] e [ցw] corresponderiam a uma seqüência de posições
nucleares);
4) restrição funcional: ausência de alternância da seqüência [oclusiva+glide] com a
oclusiva velar, sozinha;
5) restrição acentual: ausência de seqüências [kw] no ataque final de palavras
proparotonas.
O critério (1) não se verifica da mesma forma para [ks], visto que são possíveis no PB
as seqüências [ps] (psicologia), [bs] (absurdo) (cf. Quadro 2, p. 24). Contudo, por si só, o fato
de [ks] não satisfazer este critério o determina que se esteja diante de duas consoantes e não
de uma consoante complexa.
40
No caso de [ks], os argumentos (2) e (3) listados anteriormente não se aplicam, pois
o há, no caso dessa seqüência, possibilidade alternativa de agrupar o segundo segmento
([s]) com a vogal seguinte no caso de [kw] e [ցw], o glide poderia ser interpretado como
parte de um ditongo crescente, descartando-se, assim, o argumento (2) para os casos em
análise nesta pesquisa.
O argumento (4), que serviria para descartar uma interpretação de onset ramificado,
parece, em si, problemático, tendo sido revisto por Silva (2002), quando aponta a
possibilidade de, em alguns itens, a consoante complexa alternar com uma consoante simples,
como em liquidificador [likwidЋifika⎆doh]~[likidЋifika⎆doh]. Isso não leva a autora a mudar
a interpretação anterior, pois continua a ver os segmentos como complexos, inclusive
representando-os como [] e [ցܦ]. Para [ks], também é observada alternância sonora, mas
que difere quanto ao som cancelado. Em [ks]~[s], como em sintaxe [si⎆taksگ]~[si⎆tasگ],
cancela-se o primeiro som, ao passo que em []~[k], cancela-se o segundo. Cristófaro-Silva
(2000) aponta para a possibilidade de simplificação semelhante à de []~[k] em encontros
consonantais heterossilábicos onde C1 é /N, R, S ou l/: estadual [گstadu⎆aw]~[گsadu⎆aw].
O argumento (5) está relacionado a restrições acentuais. O comportamento de [ks],
nesse aspecto, é semelhante ao de [] e [ցܦ], não tendo sido encontradas palavras com
acento na antepenúltima laba (proparotonas) em que a seqüência estivesse no onset da
laba final por exemplo, síntaxe *[⎆sitaksگ], parádoxo *[pa⎆שadѐksѨ] . Contudo, o mesmo
se verifica para os encontros consonantais heterossilábicos desfeitos por epêntese: não
ocorrem entre as labas postônica medial e final de proparoxítonas, apenas entre a tônica e a
postônica medial (e. g. helicóptero [e.li.⎆kѐp.te.שѨ], técnica [⎆tϯk.nگ.kђ]). O argumento (5),
portanto, não é capaz de diferenciar as consoantes complexas dos encontros consonantais
heterossilábicos e não poderá contribuir para a interpretação de [ks] como uma seqüência de
consoantes ou como uma consoante complexa.
Um último argumento será apresentado na comparação entre [ks], as consoantes
complexas e os encontros consonantais heterossilábicos. Verificou-se que [ks] pode ocorrer
em coda final (e.g. box [⎆bѐks]), posição em que tem, inclusive, se tornado muito produtivo
nos últimos anos. Cantoni (2008) constatou que um grande número de neologismos
recentes no PB terminados por [ks], especialmente seguindo a vogal [ϯ], na seqüência [ϯks].
41
Os exemplos são abundantes, entre eles marmitex, Chamex, durex, sedex, Vendex, Vaspex,
pirex, telex, kleenex, rolex, multiplex. Os encontros consonantais heterossilábicos, por outro
lado, não ocorrem em final de palavra (e.g. pact *[⎆pakt]), salvo em alguns casos isolados e
de baixa freqüência de ocorrência, como bíceps [⎆biseps]. Essa restrição distribucional pode
ser utilizada como argumento de que [ks] não é um encontro consonantal heterossibico
como os outros. Contudo, essa restrição não basta para que [ks] seja interpretado como uma
consoante complexa. Para tal, [ks] deve satisfazer uma condição sine qua non: se [ks]
representa um único elemento, em termos funcionais, espera-se que não haja epêntese entre
[k] e [s].
Nesta seção, foram apresentadas duas interpretações possíveis com relação à natureza
representacional de [ks]. A primeira considera [ks] como uma seqüência de sons, um encontro
consonantal heterossilábico; a segunda considera [ks] como um único elemento, uma
consoante complexa. Neste estudo, a opção por uma das duas interpretações será baseada em
critérios funcionais, avaliando o uso efetivo dos sons em questão, assumindo, como Silverman
(2006), que a linguagem se organiza em torno de restrições baseadas na experiência, e não em
restrições estruturais. Com isso, para que se considere [ks] um encontro consonantal, como
fazem os estudos sobre a fonologia do PB, [ks] deve apresentar um comportamento
semelhante aos demais encontros consonantais heterossibicos da língua. Portanto, espera-se
que [ks], como os demais encontros, possa opcionalmente ser desfeito por epêntese. Na outra
alternativa de análise, [ks] é interpretado como um único elemento, uma consoante complexa.
Nesse caso, espera-se que [ks] não apresente epêntese e se comporte como as outras
consoantes complexas do PB, [] e [ցܦ]. A ocorrência de vogal epentética entre [k] e [s] será
investigada experimentalmente, através de análise acústica.
Foram apresentadas tentativas de análise da alterncia [ks]~[s] baseadas nos
pressupostos estruturalistas, gerativistas e autossegmentais. Todas falham especialmente por
o conseguir lidar com o condicionamento lexical e com as relações funcionais estabelecidas
entre os sons da língua, demonstrando que os modelos unirrepresentacionais o conseguem
oferecer uma análise satisfatória do fenômeno. Defende-se aqui que os modelos
representacionais oferecidos pela Gramática Cognitiva (LANGACKER, 1987), pela
Fonologia de Uso (BYBEE, 2001) e pelo Modelo de Exemplares de Pierrehumbert (2000)
42
podem oferecer uma análise mais completa da alternância [ks]~[s]. Uma análise
multirrepresentacional da alternância [ks]~[s], baseada nos dados obtidos experimentalmente
neste estudo, será apresentada posteriormente, no capítulo Discussão dos Resultados.
43
3 Metodologia
Neste estudo, pretende-se analisar a variação entre [ks] e [s] à luz de uma abordagem
de uso. Os modelos de uso assumem que os sistemas lingüísticos são construídos a partir de
eventos de uso e que a relação entre sistema e uso é relativamente direta (BARLOW;
KEMMER, 2000). Este estudo baseia-se principalmente em três abordagens de uso
relativamente recentes, que se voltam para a dimensão sonora da linguagem: a Fonologia de
Uso (BYBEE, 2001), o modelo de exemplares proposto por Pierrehumbert (2000) e a
Fonologia Probabilística (PIERREHUMBERT, 2003). Essas três abordagens, que têm muito
em comum, são em grande medida complementares. Retomam-se, a seguir, alguns dos
princípios básicos dos modelos multirrepresentacionais adotados neste estudo:
a) Padrões sonoros são esquemas gerais que emergem de ocorrências reais de uso
lingüístico.
b) As unidades lingüísticas de armazenagem e processamento, os exemplares, são
palavras e sua estrutura interna se assemelha a um protótipo.
c) Eventos de uso são armazenados em exemplares por meio de processos cognitivos
gerais de categorização, resultando em grupos de memórias perceptuais ricas.
d) Os exemplares encontram-se conectados em redes relacionais baseadas em
similaridade fonética e semântica.
e) As redes de exemplares operam com base em parâmetros probabilísticos, com
distribuição estocástica.
f) O uso lingüístico promove alterações imediatas na representação mental.
g) As freqüências de tipo e de ocorrência têm um papel central e exercem impacto,
respectivamente, sobre a produtividade de padrões e a força lexical.
44
3.1 Coleta de dados em corpus
Para desenvolver uma análise que considere a influência do uso sobre a construção das
representações mentais e que avalie a influência da freqüência de tipo e de ocorrência, é
imprescindível recorrer a uma fonte de dados representativa de eventos de uso lingüístico real.
Por essa razão, optou-se, aqui, por recorrer a um banco de dados de uso do PB,
disponibilizado pelo projeto Aspa Avaliação Sonora do Português Atual
(www.projetoaspa.org). Este projeto desenvolveu um corpus anotado, com informações sobre
aspectos sonoros do português brasileiro contemporâneo, sendo adequado a análises
probabilísticas da linguagem. Foi realizado junto ao Aspa um levantamento de quantas e quais
palavras apresentam a seqüência sonora [ks] no PB e qual a freqüência de ocorrência de cada
uma. Foram obtidas ao todo 662 palavras contendo a seqüência [ks] essa seria a freqüência
de tipo de [ks], que se mostra, assim, uma seqüência de baixa freqüência no português
18
. a
freqüência de ocorrência das palavras contendo [ks] variou entre 17407 (sexo) e 6
(toxinologia), a freqüência mínima apresentada pelo Aspa
19
. As palavras obtidas junto ao
Aspa encontram-se listadas no Anexo A.
A Fonologia de Uso proe que as mudanças sonoras seriam lexicalmente graduais,
operando através de difusão lexical (BYBEE, 2000). Na difusão lexical, os processos sonoros
seriam aplicados palavra por palavra, de modo gradual, muitas vezes deixando de operar antes
de afetar todo o léxico da língua. Além disso e neste ponto se distancia do difusionismo –, a
Fonologia de Uso acredita que as mudanças sonoras seriam tamm foneticamente graduais,
ou seja, envolveriam pequenas alterações articulatórias e acústicas significativas para a
diferenciação dos sons em mudança. Por isso, esses detalhes fonéticos finos, considerados
pelas teorias fonológicas formalistas como características redundantes e desprovidas de
função distintiva no sistema sonoro, desempenham um papel central na Fonologia de Uso.
Tendo em vista essa discussão, a pesquisa desenvolvida nesta dissertação tem por objetivo
18
É uma prática comum dos estudos que lidam com freqüência usar como ponto de corte para separar palavras
de alta e baixa freqüência a marca de 35 por milhão (cf. BYBEE, 2000). No Aspa, que apresenta um total de
228.766.402 palavras (tipos), a marca de 35 por milhão corresponde a 8007 palavras. Portanto, a seqüência [ks],
tendo ocorrido em 662 palavras, muito abaixo do ponto de corte de 8007, pode ser considerada de baixa
freqüência.
19
O banco de dados do Aspa foi construído a partir do corpus do LAEL PUC, do qual optou por utilizar
apenas as 200 mil palavras mais freqüentes. Essa medida foi tomada para eliminar palavras com freqüência
muito baixa presentes no LAEL, que na maioria das vezes representam palavras estrangeiras ou erros de
ortografia. Com isso, as palavras de menor freqüência no Aspa têm freqüência 6.
45
testar se a variação observada entre [ks] e [s] tem implementação lexical e fonética de caráter
gradual.
3.2 Coleta de dados experimental
3.2.1 Experimento 1
Quanto à hitese de gradiência lexical, indícios de que algumas palavras
apresentam comportamento diferenciado em termos de serem mais freqüentemente afetadas
pela variação [ks]~[s] do que outras. Para avaliar a gradiência lexical, foi realizado o
Experimento 1, que tinha como objetivo verificar empiricamente se algumas palavras são
mais passíveis do que outras à alternância [ks]~[s]. Nesse experimento, pretendeu-se avaliar a
possibilidade de alterncia através do julgamento de profissionais que trabalham na área de
fonética e fonologia, partindo de dados provenientes de um corpus de uso do PB
20
. Avaliando
os itens levantados no corpus, identificou-se a necessidade de fazer pequenas intervenções na
lista de palavras a serem testadas no experimento. De um lado, optou-se por excluir da lista
sete palavras, ou porque eram variantes ortográficas de outras palavras já presentes na lista
(como praxis, variante de práxis), ou porque sua pronúncia foi cadastrada equivocadamente
no banco de dados (como mixórdia, que não apresenta [ks]). No Quadro 4, abaixo, estão
dispostas as palavras excldas da lista de itens testados no Experimento 1, de acordo com o
motivo de exclusão:
QUADRO 4
Palavras obtidas em consulta ao banco de dados do Aspa,
excluídas da lista de teste do Experimento 1
Variantes ortográficas Não apresentam [ks]
praxis exobiologia
taxis hiperexcitabilidade
onix mixórdia
homosexual
20
Optou-se por utilizar, no Experimento 1, os dados obtidos na consulta realizada anteriormente junto ao Aspa,
uma lista de 662 palavras, cadastradas no corpus como apresentando um [ks] referente a <x>.
46
Am disso, houve a inserção de uma palavra que não figurou nos resultados da busca
no Aspa: sintaxe. Tal palavra, que pode ser realizada com [ks] ou [s], apareceu nos resultados
da busca inicial apenas em sua forma plural, sintaxes. Constatou-se que a forma singular
sintaxe não ocorreu nos resultados da busca porque se encontrava cadastrada com a pronúncia
[s], fato que reflete diretamente a possibilidade de alternância a que está sujeita esta palavra,
motivo pelo qual foi inserida na lista de palavras do Experimento 1.
Com a exclusão de sete palavras e inserção de uma, chegou-se por fim a 656 palavras,
que passaram a compor a ficha utilizada no Experimento 1. Nesta ficha, presente no Anexo B,
as palavras testadas estão dispostas à esquerda, tendo cada uma à sua direita um quadrado
vazio, onde devia ser assinalada a possibilidade de alternância entre [ks] e [s]. Nas instruções
para realização do experimento e também oralmente, os informantes foram solicitados a
classificar as palavras apresentadas utilizando quatro símbolos, de acordo com o seguinte
critério:
QUADRO 5
Critérios para classificação das palavras no Experimento 1
Símbolo Critério
s
sim, pode haver alternância entre [ks] e [s]
n
o, não pode haver alterncia entre [ks] e [s]
t
talvez possa haver alternância entre [ks] e [s]
? o sei dizer/palavra desconhecida
Os sujeitos avaliados foram quatro pesquisadores da área de fonética e fonologia,
falantes nativos do PB, selecionados através de amostragem por conveniência
21
. Após
receberem o formulário do experimento em formato digital ou impresso, foram solicitados a
classificar cada palavra em termos de possibilidade de variação [ks]~[s], segundo os critérios
apresentados no Quadro 5. O julgamento profissional desses pesquisadores foi tomado como
21
A amostragem por conveniência é um método em que a amostra é selecionada da maneira mais fácil. Esse
método de amostragem apresenta restrições quanto ao uso de diversos testes estatísticos, pois a amostra gerada
o é representativa da população de tal forma que se possa a partir dela fazer inferências gerais sobre a
população (TRIOLA, 2004). Ainda assim, optou-se pela utilização desse método por ser o único viável em um
estudo com as dimensões e o enfoque aqui pretendidos. A amostragem aleatória simples – em que um
determinado grupo de indivíduos tem a mesma probabilidade de ser escolhido que qualquer outro grupo do
mesmo tamanho na população –, a mais recomendada e exigida para diversos testes estatísticos, demanda
demasiado tempo e esforços para a seleção dos informantes, razão pela qual não é tradicionalmente adotada em
estudos lingüísticos.
47
critério para seleção de palavras que estariam mais propensas a apresentarem a variação
[ks]~[s].
As respostas do Experimento 1 foram agrupadas de acordo com o número de
informantes que emitiram o mesmo julgamento a respeito de uma palavra. Como resultado,
foi traçado o seguinte quadro de julgamentos:
QUADRO 6
Respostas obtidas no Experimento 1
Nº de julgamentos
Resposta
4 3 2 1 0
s 10 23 29 50 544
n 423 141 34 40 18
t 0 1 10 134 511
? 0 0 2 23 631
Total 433 165 75 247 1704
No Quadro 6, acima, estão dispostos os números de palavras obtidos em cada tipo de
resposta “sim”, não”, “talveze não sei–, de acordo com o número de informantes que
emitiram o julgamento de todos, 4”, a nenhum, “0”. Por exemplo, na coluna “4”, estão as
respostas em que houve unanimidade entre os informantes, na coluna três, as respostas em
que concordaram três dos quatro informantes, e assim por diante. As respostas emitidas por
quatro ou três informantes, que juntas englobam a maior parte dos dados, 91%, representam
os julgamentos com maior grau de certeza quanto à possibilidade ou não de variação [ks]~[s].
No Quadro 7, abaixo, foram agrupadas as respostas em que concordaram quatro ou três dos
informantes no julgamento de uma mesma palavra.
QUADRO 7
Respostas obtidas no Experimento 1 com
concordância de quatro ou três informantes
a respeito de uma mesma palavra
Nº de julgamentos
Resposta
4 e 3
s 33
n 564
t 1
? 0
Total 598 91%
48
Como se pode perceber no Quadro 7, a maioria dos informantes concorda que são
poucas as palavras em que a variação [ks]~[s] é possível e muitas as palavras em que tal
variação não é possível. Esse resultado corrobora a divisão, proposta inicialmente no capítulo
introdutório, das palavras com [ks] em grupos de acordo com a possibilidade ou não de
variação. As 33 palavras que foram consideradas propensas à variação pela maioria dos
informantes encontram-se listadas na seqüência, no Quadro 8.
QUADRO 8
Lista de palavras obtidas no Experimento 1
em que pode haver variação [ks]~[s],
segundo quatro ou três informantes
Palavra Nº de julgamentos
tóxico 4
léxico 4
lexicais 4
lexical 4
maximização 4
intoxicou 4
intoxicando 4
toráxico 4
sintaxes 4
sintaxe 4
intoxicação 3
maximizar 3
agrotóxico 3
intoxicados 3
intoxicadas 3
intoxicações 3
toxicológico 3
intoxicado 3
toxicologia 3
desintoxicar 3
intoxicada 3
maximizando 3
intoxicam 3
toxicológicas 3
léxicos 3
intoxicante 3
maximizada 3
toráxica 3
lexicografia 3
disléxico 3
léxica 3
disléxica 3
maximiniano 3
49
O Experimento 1 confirmou a hitese inicial de que a variação [ks]~[s] envolveria
gradiência lexical, uma vez que nem todas as palavras com estrutura procia para aplicação
do fenômeno (i.e., seqüência [ks]) apresentam possibilidade de variação. Além disso,
verificou-se que as palavras sintaxe, léxico e tóxico estão entre as mais suscetíveis a
apresentar a variante [s] essas três palavras serão tomadas como base para a seleção das
palavras a serem testadas no Experimento 2, que será descrito na seqüência.
2.2 Experimento 2
Am da hitese de gradiência lexical, testada pelo Experimento 1, pretendeu-se
avaliar também, neste estudo, se gradiência fonética na alternância [ks]~[s]. Para tal, foi
realizado o Experimento 2, com o intuito de avaliar as propriedades acústicas dos sons aqui
enfocados: [ks], [s], [Ѐ]. As palavras a serem testadas experimentalmente foram selecionadas a
partir dos resultados do Experimento 1 e de modo a permitir seis tipos de comparação:
a) Comparação (1): entre [ks] e [s] alternantes; comparar a seqüência sonora [ks]
versus o som [s] em palavras que apresentam alternância do tipo [si⎆taksگ] ~
[si⎆tasگ].
b) Comparação (2): entre [ks] alternante e [ks] pleno; comparar a seqüência sonora
[ks] em palavras que apresentam alternância do tipo [si⎆taksگ] ~ [si⎆tasگ] versus a
seqüência sonora [ks] em palavras que tipicamente não apresentam alterncia,
como [⎆taksگ].
c) Comparação (3): entre [s] alternante e [s] pleno; comparar o som [s] em palavras
que apresentam alternância do tipo [si⎆taksگ] ~ [si⎆tasگ] versus o som [s] em palavras
que tipicamente não apresentam alternância, como [i⎆pasگ].
50
d) Comparação (4): entre [ks] e [kis], sendo o primeiro tomado a princípio como uma
seqüência de consoantes (CC) e o segundo, uma seqüência de consoante-vogal-
consoante (CVC); comparar a seqüência sonora [ks] em palavras como [⎆taksگ], em
que os sons teoricamente pertencem a labas diferentes, versus a seqüência sonora
[kis] em palavras como [dЋis⎆takگs], em que os sons pertencem à mesma sílaba.
e) Comparação (5) entre, de um lado, [s] que remonta historicamente a uma seqüência
[ks] e, de outro, [s] e [ks] o resultantes de mudança. Em etapas anteriores da
língua, máximo e próximo eram realizadas com [ks], mas, atualmente, o
realizadas com [s] pleno. Tais palavras foram comparadas acusticamente entre si,
além de comparadas com uma palavra que apresenta [s] pleno não resultante de
mudança e com palavras que apresentam [ks] não resultante de mudança.
f) Comparação (6) entre [ks] que remonta historicamente a uma seqüência [kti] e [ks]
o resultante de mudança. Os itens ficcional e ficção apresentam uma seqüência
sonora [ks] que remonta a uma seqüência [kti]. Observou-se nestes itens uma
mudança sonora particular, envolvendo a assibilação da consoante [t]
(COUTINHO, 1976, p. 129), mudança que não se operou nas demais palavras do
Experimento 2 que apresentam o encontro consonantal [ks]. Ficcional e ficção
foram inseridas no experimento para avaliar se sincronicamente apresentam
características acústicas distintas das demais palavras com [ks].
Com a seleção de palavras com estrutura CVC (e.g. leques) a serem testadas no
Experimento 2, será acrescentado um quarto grupo ao Quadro 1, apresentado anteriormente
(p. 11). O Quadro 9, abaixo, apresenta uma versão reformulada do Quadro 1, incluindo o
Grupo 4, de palavras com [kis] estrutura CVC, que podem ser realizados como [ks].
51
QUADRO 9
Grupos de palavras conforme o comportamento de
[ks] e [s]
Grupo Exemplos de palavras Variantes
1
sinta[ks]e ~ sinta[s]e
lé[ks]ico ~ lé[s]ico
tó[ks]ico ~ tó[s]ico
[ks] ou [s]
2
se[ks]o
to[ks]ina
tá[ks]i
apenas [ks]
3
mi[s]a
pi[s]ina
fa[s]e
apenas [s]
4
le[kis] ~ le[ks]
reto[kis] ~ reto[ks]
par[kis] ~ par[ks]
[kis] ou [ks]
Para o Experimento 2, foram selecionadas 22 palavras: lexicografia; maximização;
proximidade; impasse; máximo; próximo; clássico; ficcional; táxi; ficção; destaques; sintaxe;
léxico; tóxico; lexical; intoxicado; toxina; sax; Alex; box; leques; reboques. Para fins
ilustrativos, tais palavras estão dispostas na Figura 14, abaixo, que indica, além disso, quais os
sons serão comparados e qual o tipo de comparação envolvido.
FIGURA 5 - Palavras testadas no Experimento 2
52
Na Figura 5, as palavras do Experimento 2 encontram-se grafadas em caracteres
ortográficos, com exceção dos sons comparados, que, conectados por uma linha pontilhada,
foram transcritos com símbolos fonéticos e isolados entre colchetes. As três palavras que
ocupam o centro do diagrama e encontram-se inseridas em um rculo cinza são palavras que
apresentaram possibilidade de alternância [ks]~[s] para todos os informantes no teste de
julgamento realizado no Experimento 1. Tais palavras, sintaxe, léxico e tóxico, foram
adotadas como ponto de referência para seleção dos demais itens do Experimento 2 e para
análise acústica comparativa, que será abordada no capítulo Discussão dos Resultados. No
Diagrama 1, os seis tipos de comparação realizados estão indicados por numerais de 1 a 6
entre cada par de palavras, ligadas por linha pontilhada, da seguinte forma: (1) [ks] alternante
vs. [s] alternante; (2) [ks] alternante vs. [ks] pleno; (3) [s] alternante vs. [s] pleno; (4) [ks] vs.
[kis]; (5) [s] e [ks] vs. [s] < [ks]; (6) [ks] vs. [ks] < [kti].
Am de possibilitar esses seis tipos de comparação, os itens testados foram
selecionados de modo a avaliar a influência de alguns fatores relativos à estrutura sonora das
palavras. A seguir, o Quadro 10 traz as palavras testadas no Experimento 2 divididas de
acordo com os critérios ou variáveis utilizados para seleção dos itens.
QUADRO 10
Variáveis utilizadas para seleção das palavras no Experimento 2
53
A linha cinza na tabela destaca sintaxe, léxico e tóxico, palavras usadas como ponto
de partida para a seleção dos itens do Experimento 2, bem como as características comuns
relevantes entre essas três palavras (possibilidade de alterncia entre [ks] e [s]; [ks] em
posição postônica; [ks] pertencentes à mesma laba e adjacentes à tônica). As quatro
primeiras colunas do Quadro 10 trazem os critérios adotados para determinar as palavras do
experimento, indicados por letras de (a) a (d), sendo (a) a variável dependente e as demais,
variáveis independentes. Em cada coluna, setas partem de cada característica básica que foi
alterada de modo a resultar em uma nova palavra a ser testada. Desse modo, cada palavra do
Experimento 2 difere de outra, com que será comparada, em pelo menos uma das variáveis
apresentadas nas quatro primeiras colunas do Quadro 10:
a) Tipo de segmento: buscou-se comparar [ks] e [s] alternantes com [kis] estrutura
CVC, [s] pleno e [ks] pleno, em palavras com estrutura segmental e supra-
segmental semelhante.
b) Posição com relação à tônica: buscou-se verificar se a posição da tônica influencia
ou o a ocorrência de alternância [ks]~[s]. Foram testadas palavras semelhantes,
em que a seqüência [ks] está em posição postônica, como em tóxico, pretônica,
como em intoxicado, ou tônica, como em toxina.
c) Posição na sílaba: buscou-se verificar se a posição da seqüência [ks] dentro da
laba influencia ou não a ocorrência de alternância [ks]~[s]. Para tal, foram testadas
palavras que diferem pela posição de [ks] na laba, isto é, se [k] e [s] se encontram
na mesma sílaba, como em sax, ou emlabas diferentes, como em léxico.
d) Distância até a tônica: buscou-se verificar se a distância entre o som avaliado e a
laba tônica da palavra influencia a ocorrência de alternância [ks]~[s]. Foram
testadas palavras em que o som avaliado encontra-se duas ou três labas antes da
tônica, como em maximização, ou em laba adjacente à tônica, como em máximo.
54
Procurou-se que os itens do experimento apresentassem contextos sonoros
semelhantes, para que pudesse ser descartada a influência de sons adjacentes sobre eventuais
diferenças acústicas entre os sons avaliados. Ademais, optou-se por utilizar somente itens do
sistema nominal, para descartar influências de natureza gramatical sobre o comportamento
dos itens testados evidências de que a classe gramatical exerce impacto sobre a dinâmica
de construção da representação mental (BYBEE, 1985, 1995). Buscou-se, ainda, quando
possível, selecionar itens morfologicamente relacionados, gerando, assim, no total, cinco
redes de conexões lexicais:
a) rede léxico: léxico, lexicografia, lexical;
b) rede tóxico: tóxico, intoxicado, toxina;
c) rede ficção: ficção, ficcional;
d) rede máximo: maximização, máximo;
e) rede próximo: próximo, proximidade.
Os dez itens restantes ficaram isolados, não fazendo parte de uma rede lexical
específica.
Relações de natureza morfológica, que envolvem similaridade tanto semântica quanto
fonológica, consistem no tipo mais forte de conexão lexical: connections are stronger where
the number of shared features are greater”
22
(BYBEE, 1985, p. 123). Dentro das redes
lexicais, os exemplares apresentam representações mentais mais próximas, com menor grau
de autonomia, podendo inclusive integrar uma única representação (BYBEE, 1985, p. 117).
Partindo dessas considerações teóricas, utilizaram-se no Experimento 2 grupos de palavras
morfologicamente relacionadas para que se possa comparar o comportamento de itens dentro
de uma mesma rede morfológica (como léxico vs. lexical) e itens de diferentes redes
morfológicas (como léxico vs. intoxicado), incluindo os itens isolados, que não pertencem a
nenhuma das cinco redes (como box). Com isso, será possível considerar se haveria diferenças
na realização das variantes [ks] e [s] em decorrência das relações morfológicas entre os itens.
Quanto às palavras selecionadas, por fim, destaca-se que, tendo sido recebidas duas
sugestões de pesquisa pertinentes, uma delas de um dos informantes do Experimento 1, foram
22
“as conexões são mais fortes onde o número de traços compartilhados é maior” (tradução minha).
55
acrescentados dois itens à lista de palavras a serem testadas no Experimento 2. O primeiro
item foi boxe, à semelhança do presente táxi, para que se pudesse verificar se de fato
uma vogal ao fim da palavra, depois de [ks], comparando-o com box, ou se esse seria apenas
um elemento ortográfico. O segundo item acrescentado foi hexacampeão, para verificar se
seria realizado com [ks] ou [kz] e, em caso de simplificação da seqüência de consoantes, se se
teria um [s] ou um [z]. Portanto, foram testados ao todo 24 itens no Experimento 2.
Na análise acústica, serão enfocadas alterações em características dos sons [ks], [s],
[kis] e a vogal que os precede. Pretende-se avaliar se fatores de natureza acústico-articulatória
poderiam consistir em uma maneira de marcar uma diferença funcional existente entre os sons
e, ao mesmo tempo, preservar a identidade dos mesmos, como Guimarães (2004) de
concluir em seu estudo. A autora analisou dois tipos de [Ѐ]: um, resultado da redução de uma
seqüência [ЀtЀi], como em estilo [i⎆ЀilѨ]~[i⎆ЀtЀilѨ]; outro, não proveniente de redução, como em
mexido [mi⎆ЀidѨ]. Parte da hitese de que um alongamento compensatório da laba
acompanharia o cancelamento da africada, em realizações como estilo [i⎆ЀilѨ]. Avaliando seus
resultados, Guimarães sugere que haveria entre os dois [Ѐ] uma diferença na duração, tanto
dos próprios sons enfocados, quanto da vogal da laba anterior, o que poderia funcionar
como uma forma de preservar a identidade dos elementos cancelados. Em vista deste
resultado, o presente estudo irá analisar os sons [ks] e [s] tendo em vista uma possível
diferenciação na duração relativa (alongamento compensatório) em decorrência do
cancelamento da oclusiva. Am disso, levanta-se a hitese de haver alterações na
intensidade durante a realização do resultante de cancelamento [s], bem como de haver a
sobreposição de características dos sons adjacentes a [k] e [s]. Pretende-se também averiguar
se ocorre vogal epentética entre as obstruintes na seqüência [ks], ou seja, se alternância
entre seqüências sonoras como [ks] e [kis]. Esse fato irá constituir evidência que suporte ou
descarte a interpretação de [ks] como consoante complexa.
Todas as palavras selecionadas para o Experimento 2, com exceção dos itens boxe e
hexacampeão, estão presentes no banco de dados do Aspa, sendo possível, assim, comparar
sua freqüência de ocorrência com seu comportamento em termos da alternância [ks]~[s], para
avaliar se haveria alguma relação entre esses fatores. Abaixo, no Quadro 11, estão dispostas
56
as freqüências de ocorrência dos itens testados no Experimento 2. Observando as distribuições
de freqüência, proe-se que, inicialmente, se dividam os itens em três categorias:
a) alta freqüência: acima de 7500 ocorrências; contempla seis palavras do
Experimento 2, marcadas em cinza escuro;
b) média freqüência: entre 750 e 7500 ocorrências; contempla quatro palavras do
Experimento 2, marcadas em cinza claro e
c) baixa freqüência: abaixo de 750 ocorrências; contempla 12 palavras do
Experimento 2, o coloridas.
QUADRO 11
Freqüência de ocorrência das palavras do Experimento 2
Palavra Freqüência de ocorrência
próximo 95.565
máximo 20.549
clássico 13.057
Alex 10.406
ficção 8.274
destaques 7.711
impasse 4.768
táxi 3.832
proximidade 2.914
box 1.418
sax 652
ficcional 641
sintaxe 604
tóxico 579
toxina 424
léxico 423
lexical 269
maximização 124
intoxicado 75
leques 63
reboques 60
lexicografia 12
57
O Experimento 2 foi aplicado a um total de 18 informantes, selecionados através de
amostragem por conveniência e estratificada
23
: foram nove homens e nove mulheres,
distribuídos igualmente em três faixas etárias (20-30 anos, 40-50 anos e acima de 60 anos). Os
informantes foram identificados por um digo contendo o número da célula de que faziam
parte (C1 a C6), seguido do número do informante dentro daquela célula (i1 a i3) por
exemplo, C2i3 é o terceiro informante da célula C2, que contempla mulheres entre 20 e 30
anos. A seguir, o Quadro 12 mostra a distribuição de informantes em cada célula, de acordo
com as variáveis sociolingüísticas testadas no Experimento 2.
QUADRO 12
Distribuição de informantes por células, segundo as variáveis sociolingüísticas adotadas
Faixa etária
Total:
18 informantes
20-30 anos
6 informantes
40-50 anos
6 informantes
acima de 60 anos
6 informantes
Masculino
9 informantes
Célula 1
Homem
20-30 anos
3 informantes
Célula 2
Homem
40-50 anos
3 informantes
Célula 3
Homem
acima de 60 anos
3 informantes
S
e
x
o
Feminino
9 informantes
Célula 4
Mulher
20-30 anos
3 informantes
Célula 5
Mulher
40-50 anos
3 informantes
Célula 6
Mulher
acima de 60 anos
3 informantes
Foram adotadas duas variáveis extralingüísticas para verificar se haveria influência de
fatores sociais na escolha das variantes lingüísticas [ks] ou [s], nas palavras que admitem tal
alternância. Essas duas variáveis, sexo e idade, foram escolhidas por serem as que,
provavelmente, mais poderiam exercer influência sobre o fenômeno em estudo. Quanto à
variável idade, estaria relacionada com processos identitários de inserção e pertencimento a
grupos sociais, especialmente no caso dos mais jovens, que se estruturam em redes mais
coesas (CHAMBERS, 2002). Além disso, a faixa etária do indiduo relaciona-se diretamente
com o exercício de uma atividade produtiva e inserção no mundo do trabalho, o que influiria
na adoção de variantes lingüísticas (NARO, 2003). Foram selecionadas três faixas etárias
descontínuas, bem delimitadas, que correspondem a: indiduos jovens, iniciando sua inserção
no mercado de trabalho (20-30 anos); indiduos adultos, no ápice de sua força produtiva (40-
50 anos) e indiduos idosos, que se já retiraram ou estão se retirando do mercado de trabalho
23
Na amostragem estratificada, a população é subdividida em grupos (strata) que compartilham características
comuns e então é selecionada uma amostra dentro de cada grupo (TRIOLA, 2004).
58
(acima de 60 anos). Quanto à variável sexo, estudos sociolingüísticos apontam para a
liderança das mulheres na utilização de formas socialmente prestigiadas, ao passo que os
homens tomam a frente quando a variante lingüística está revestida de prestígio encoberto
(LABOV, 1966, 1972). A variável escolaridade não foi controlada, pois, ao que tudo indica, a
alternância [ks]~[s], sendo pouco percebida conscientemente, não é alvo da prescrição
gramatical nas instituições de ensino. A variável contexto não foi considerada, pois, para
garantir a realização dos itens a serem analisados acusticamente, todos os informantes
desempenharão a mesma tarefa lingüística, com o mesmo grau de formalidade. De fato, como
se pode perceber pelo Quadro 11, acima, a freqüência de ocorrência da maioria dos itens
avaliados é baixa, de modo que o uso de fala espontânea em procedimentos experimentais fica
comprometido. Torna-se inevitável recorrer a textos escritos para obter a produção dos itens
que se deseja analisar. Quanto aos informantes, adotou-se como pré-requisito fundamental
que fossem brasileiros, falantes nativos do PB. Os participantes foram informados sobre a
natureza da pesquisa de acordo com as normas do COEP/UFMG (Comitê de Ética em
Pesquisa). A gravação foi realizada em ambiente silencioso, utilizando o gravador digital M-
Audio MicroTrack 24/96 e um microfone de cabeça omnidirecional Sennheiserk HSP 2.
Os informantes foram convidados a participar de uma pesquisa que trataria de
possíveis relações entre velocidade de leitura e capacidade de memorização, de modo a tentar
desviar sua atenção da pronúncia das palavras. Foram solicitados a ler em voz alta cinco
textos pequenos, com 85 linhas cada um, em média, esforçando-se para memorizar
determinadas informações sublinhadas, que funcionaram como distratores. Os textos,
adaptações de reportagens de jornais e revistas, consistiram em cinco trechos de um jornal
fictício, simulando chamadas de capa. O Anexo C traz a ficha utilizada no Experimento 2.
Os resultados obtidos foram submetidos à análise acústica por meio do software Praat
(BOERSMA; WEENINK, 2007). Primeiramente, foram separadas as palavras testadas em um
arquivo, nomeado com o digo do informante (e.g., C2i1, como explicado anteriormente).
Em seguida, utilizando a ferramenta TextGrid do Praat, foi feita a etiquetagem dos arquivos
de cada informante. Na etiquetagem, foram segmentadas as palavras e os sons cujas durações
seriam posteriormente medidas. A Figura 6, abaixo, mostra um exemplo de como foi
realizada a etiquetagem das palavras do Experimento 2.
59
FIGURA 6 - Etiquetagem do item boxe, informante C1i1
Realizada a etiquetagem, procedeu-se à análise acústica. Avaliaram-se detalhes
fonéticos finos dos segmentos envolvidos ([ks], [s] e [Ѐ] em alternância, [ks] e [s] plenos,
[kis] com estrutura CVC), como duração, intensidade, presença de estruturas formânticas.
Foram realizadas as seguintes medições:
a) Duração
- Consoantes em enfoque: [s] variante de [ks]; [s] pleno; [ks] alternante com [s];
[ks] pleno; [kis] com estrutura CVC
- Vogal da sílaba imediatamente anterior à consoante enfocada
- Vogal epentética inserida entre [k] e [s]
b) Intensidade
- Amplitude da curva de intensidade na realização de [s] variante de [ks]
- Vogal epentética inserida entre [k] e [s]
60
As medidas de duração foram realizadas considerando o icio das vogais no vale
imediatamente antes do primeiro pico que integra o padrão de oscilação típico dos sons
vocálicos. Quanto às consoantes, considerou-se a extensão das oclusivas [k] como
correspondente ao intervalo em branco no espectrograma e a das fricativas [s], como
correspondente aos ruídos em alta freqüência. Caracterizou-se a queda de intensidade como
uma alteração na porção medial da consoante fricativa, pois quase todas as sibilantes
apresentavam queda na porção final.
Os valores de duração levantados no Experimento 2 foram tabulados através do
software Excel, para avaliar a distribuição do fenômeno com relação aos informantes e aos
itens lexicais testados. Tendo sido utilizada como método para seleção dos informantes a
amostragem estratificada e por conveniência, a aplicação de uma série de testes estatísticos
torna-se comprometida, visto que não é possível deduzir inferências gerais sobre a população
a partir dos resultados da amostra (TRIOLA, 2004). Contudo, optou-se por controlar algumas
variáveis (extralingüísticas, como sexo e idade, e estruturais, como vogal precedente,
tonicidade, duração, intensidade, rede morfológica, freqüências de tipo e de ocorrência), pois,
mesmo com esse tipo de amostragem, é possível identificar pistas sobre a influência dessas
variáveis na alternância entre [ks] e [s] que apontem para tendências da língua.
O tratamento estatístico dos dados, portanto, reduziu-se a:
a) medidas de centro: média da duração das consoantes [ks], [s], [Ѐ] e [kis] e da vogal
da sílaba anterior a elas.
b) distribuição das freqüências relativas de:
- ocorrência de [ks], [s], [Ѐ] e [kis];
- cancelamento de [ks], em palavras passíveis de alternância [ks]~[s];
- realização de vogal epentética entre [k] e [s], em palavras com [ks] estrutura CC;
- realização de vogal alta regular em palavras com [kis] estrutura CVC;
- realização de [i] depois de [ks], em palavras com [ks];
- ponto de articulação da consoante fricativa;
- queda de intensidade no [s].
61
4 Discussão dos resultados
Neste capítulo, será feita a apresentação dos resultados obtidos no Experimento 2,
promovendo uma discussão voltada para a representação mental das seqüências [ks] no PB
atual. Primeiramente, serão apresentadas as freqüências de ocorrência de [ks], [s], [Ѐ] e [kis]
obtidas no experimento. Em seguida, serão realizadas as seis comparações propostas no
capítulo de Metodologia (cf. p. 49-50), apresentando-se dados sobre ocorrência de epêntese,
realização de vogal alta regular, realização de [i] depois de [ks], variação entre [ks], [s] e [Ѐ],
ponto de articulação da consoante fricativa, queda de intensidade no [s] e dados
distribucionais referentes à duração da vogal que precede [ks], [s], [Ѐ] e [kis].
O Experimento 1 teve como objetivo fundamentar a seleção de palavras para o
Experimento 2. Consistiu em solicitar a pesquisadores da área de Fonética e Fonologia que
classificassem uma série de palavras quanto à possibilidade de ocorrência de variação entre
[ks] e [s]. Os resultados obtidos apontaram que sintaxe, tóxico e léxico estavam de fato dentre
as palavras mais propensas à variação, por unanimidade dos informantes. A Tabela 1, a
seguir, contrapõe os resultados dos Experimentos 1 e 2. Os resultados das ocorrências [ks]
foram omitidos, por economia.
TABELA 1
Contraposição dos resultados dos Experimentos 1 e 2
Experimento 2 Experimento 1
Esperado Palavra Total
Ocorrência de [s]
Ocorrência de [Ѐ]
sim
Grupo 1
sintaxe 12 2 17% 1 8% sintaxe 4
[ks]~[s]
léxico 18 2 11% 1 6% léxico 4
tóxico 18 2 11% 1 6% tóxico 4
intoxicado 17 1 6% 1 6% intoxicado 3
lexical 16 1 6% 0 0% lexical 4
lexicografia 18 2 11% 1 6% lexicografia 3
maximização 18 2 11% 0 0% maximização 4
ficcional 18 1 6% 0 0% não
Grupo 2
táxi 18 0 0% 0 0% táxi 4
somente [ks]
boxe 18 0 0% 0 0% boxe 4
Alex 18 0 0% 0 0% Alex 4
box 18 0 0% 0 0% box 4
sax 18 0 0% 0 0% sax 4
toxina 18 0 0% 0 0% toxina 3
ficção 16 0 0% 0 0%
hexacampeão
18 0 0% 0 0%
62
Comparando os resultados dos dois experimentos, verifica-se que um teste como o
proposto no Experimento 1 é capaz de expressar, ainda que de forma aproximativa, os fatos
da ngua. Na Tabela 1, pode-se perceber que as palavras que apresentaram maior taxa de
variação [ks]~[s] no Experimento 2 foram classificadas por todos os informantes do
Experimento 1 como propensas à variação, exceto intoxicado e lexicografia, que obtiveram
três classificações de sime uma de “talvez”. Note-se que a Tabela 1 não traz o resultado das
palavras ficcional, ficção e hexacampeão no Experimento 1, pois tais palavras não constaram
da lista de itens deste experimento.
No Experimento 2, alguns informantes apresentaram dificuldades na leitura de certas
palavras, especialmente os informantes mais velhos. Essa dificuldade resultou em pausas,
alongamento de sons, alteração da estrutura das palavras, incluindo neste último caso a
mudança na tonicidade da palavra ou sua substituição por outro item lexical existente na
língua. Considerando que cada palavra tem uma representação mental própria – havendo
diferenças nesse sentido inclusive entre formas de plural e singular, que estariam armazenadas
em exemplares distintos e que a representação se manifesta diretamente no uso da palavra,
foram excluídos do mputo geral do experimento os itens que apresentaram alteração na
estrutura da palavra. A seguir, como se pode ver na Tabela 2, para a palavra sintaxe, foram
computadas somente 12 realizações. As palavras intoxicado, lexical, toxina e destaques
tamm sofreram redução no número total de realizações. O item sintaxe foi o que mais
causou problemas de leitura, sendo lido por muitos como síntese, palavra semelhante
foneticamente e com maior freqüência de uso e, portanto, com maior força lexical (BYBEE,
1985) que a primeira, o que pode explicar a recorrência da substituição. Ou seja,
desconsiderados os casos em que a dificuldade de realização de palavras se deveu a
problemas do participante em executar a tarefa de leitura em si, é possível que a alteração na
realização das quatro palavras citadas acima decorra da baixa força lexical desses exemplares
em alguns participantes e de interferências exercidas pelas relações de similaridade fonética
com outros exemplares.
Na Tabela 2, as palavras do experimento foram dispostas em quatro grupos diferentes,
em decorrência de seu comportamento quanto à realização de [ks], [s], [Ѐ] e [kis], conforme já
havia sido proposto na Metodologia (cf. Quadro 9, p. 51).
63
TABELA 2
Freqüência de ocorrência de [ks], [s], [Ѐ] e [kis] por palavra do Experimento 2
Esperado
Palavra Ocorrência
Total de
dados
[ks] Apenas [s] Apenas [Ѐ]
[kis]
Grupo 1
sintaxe 12 9 75% 2 17% 1
8%
[ks]~[s]
léxico 18 15 83% 2 11% 1
6%
tóxico 18 15 83% 2 11% 1
6%
intoxicado 17 15 88% 1 6% 1
6%
lexical 16 15 94% 1 6% 0
0%
lexicografia 18 15 83% 2 11% 1
6%
maximização
18 16 89% 2 11% 0
0%
ficcional 18 17 94% 1 6% 0
0%
Grupo 2
táxi 18 18 100%
somente [ks]
boxe 18 18 100%
Alex 18 18 100%
box 18 18 100%
sax 18 18 100%
ficção 18 18 100%
toxina 16 16 100%
hexacampeão
18 18 100%
Grupo 3
próximo 18 18 100%
somente [s]
máximo 18 1 6% 17 94%
proximidade
18 18 100%
clássico 18 18 100%
impasse 18 18 100%
Grupo 4
reboques 18 16 89%
2
11%
[kis] CVC
destaques 17 16 94% 1
6%
leques 18 16 89%
2
11%
Todas as palavras (Grupos 1 a 4)
Total
[ks] Apenas [s] Apenas [Ѐ] [kis]
420
308
73% 102
24% 5 1% 5 1%
Apenas palavras com [ks] (Grupos 1 e 2)
Total
[ks] Apenas [s] Apenas [Ѐ]
276
259
93% 13
5% 5
2%
Apenas palavras com [kis] (Grupo 4)
Total
[kis]
53
5 9%
No Grupo 1, estão as palavras em que se esperava a realização variável entre [ks], [s]
e [Ѐ]. No Grupo 2, somente [ks] era esperado, no Grupo 3, somente [s], e no Grupo 4,
esperava-se [kis] ou [ks], sendo este último [ks] decorrente do cancelamento de vogal alta. As
áreas da tabela marcadas com hachuras indicam a não ocorrência. Os resultados obtidos no
64
Experimento 2 comprovaram a divisão em quatro grupos e o que se esperava inicialmente
para cada um deles, exceção feita à ocorrência de uma realização [ks] no Grupo 3, para a
palavra máximo esse fato será retomado mais à frente, na seção que trata da quinta
comparação a ser realizada entre as palavras do corpus.
A Tabela 3, abaixo, retoma valores da Tabela 2 para a ocorrência de [s] e [Ѐ] no Grupo
1, acrescentado os valores totais, para a ocorrência das duas variantes juntas. Os resultados
das ocorrências [ks] foram omitidos.
TABELA 3
Freqüência de ocorrência de [s] e [Ѐ] por palavra do Grupo 1 do Experimento 2
Ocorrência [s] e [Ѐ]
Palavra
Total de
dados
Apenas [s] Apenas [Ѐ]
[s] e [Ѐ] juntos
Grupo 1
sintaxe 12 2 17% 1
8% 3 25%
[ks]~[s]
léxico 18 2 11% 1
6% 3 17%
tóxico 18 2 11% 1
6% 3 17%
intoxicado 17 1 6% 1
6% 2 12%
lexical 16 1 6% 0
0% 1 6%
lexicografia 18 2 11% 1
6% 3 17%
maximização 18 2 11% 0
0% 2 11%
ficcional 18 1 6% 0
0% 1 6%
Geral 135 13 10% 5
4% 18 13%
Como se pode ver, todas as palavras do Grupo 1 apresentaram pelo menos uma
ocorrência de variação (coluna [s] e [Ѐ] juntos”). Por outro lado, as taxas de variação por
palavra foram baixas, sendo sintaxe a que obteve maior taxa, com 25% de variação.
Considerando somente os dados do Grupo 1, a taxa de variação geral total, para [s] e [Ѐ]
juntos, é de 13%.
As palavras do Grupo 2 apresentam seqüência [ks] semelhante à do Grupo 1 e, em
teoria, também poderiam apresentar as variantes [s] e [Ѐ]. Contudo, como esperado, as
palavras do Grupo 2 o apresentaram sequer uma ocorrência de variação. Pode-se concluir
que se trata realmente de um fenômeno lexicalmente condicionado, em vista de palavras com
estruturas análogas poderem ou não apresentar a alternância [ks], [s] e [Ѐ]. Além disso, houve
grande variação intra-individual na seleção das variantes [ks], [s] e [Ѐ], mesmo considerando
somente as palavras do Grupo 1, que efetivamente estão sujeitas ao fenômeno: nenhum
falante realizou a variação em todas as palavras do Grupo 1, ou seja, um mesmo falante
65
realizou a variante em certas palavras, mas não em outras. As palavras que ocorreram com [s]
variaram de informante para informante. Por exemplo, o informante C3i3 realizou [s] apenas
em maximização, ao passo que o informante C6i1, quem mais apresentou variação, realizou
[s] em todas as palavras do Grupo 1, exceto em ficcional. Esse resultado apóia a conclusão de
que as variantes [s] e [Ѐ] estariam restritas a alguns itens lexicais (palavras do Grupo 1),
configurando um quadro de difusão lexical. Analisando a Tabela 3, percebe-se ainda que a
ocorrência de [Ѐ] é bem inferior à de [s]. A concorrência entre [ks], [s] e [Ѐ] é restrita a meio
de palavra, sendo favorecidas as variantes [s] e [Ѐ] quando antecedendo vogal alta anterior, [i].
A variante [Ѐ] é marginal e sua ocorrência pode ser explicada como uma influência do [i]
seguinte, em um processo de palatalização, muito recorrente na história do português (cf.
SILVA, 1991, p. 79-80).
Para seleção das palavras a serem testadas no Experimento 2, foram utilizadas quatro
variáveis estruturais:
a) tipo de consoante: [ks], [s] e [Ѐ] alternantes vs. [kis], [s] pleno e [ks] pleno;
b) posição da(s) consoante(s) com relação à tônica: pretônica, postônica ou tônica;
c) posição da(s) consoante(s) na sílaba: [k] e [s] heterossilábicos ou tautossilábicos;
d) distância entre a(s) consoante(s) e a laba tônica: duas ou três labas antes ou
adjacente.
A primeira variável estrutural, tipo de consoante, mostrou-se relevante nos resultados
levantados, tendo sido possível estabelecer diferenças no comportamento de palavras de
acordo com o tipo de som envolvido. Essa variável será abordada ao longo de toda a análise
subseqüente. A segunda variável, posição com relação à tônica, exerceu impacto nos valores
médios de duração da vogal adjacente, que apresentou maior duração quando tônica, o que
era esperado, com base em Massini-Cagliari (1992). Já as variáveis terceira e quarta, que
concernem à posição das consoantes na laba e à distância entre as consoantes e a laba
tônica, não se mostraram significativas, pois não foi possível estabelecer relações entre elas e
a ocorrência de [ks], [s] e [Ѐ].
Foram adotadas duas variáveis sociolingüísticas, faixa etária e sexo, que dividiram os
informantes em seis células (três faixas etárias x dois sexos). A estratificação dos informantes
66
segundo essas variáveis, contudo, o se mostrou significativa, uma vez que a variação [ks],
[s] e [Ѐ] foi realizada por duas informantes de acima de 60 anos, um informante acima de 60
anos, uma informante entre 40 e 50 anos, um informante entre 20 e 30 anos, ou seja, com
distribuição quase homogênea entre as variáveis faixa etária e sexo. Este fato indica que o
fenômeno de variação [ks]~[s] apresenta uma trajetória característica de variação estável, e
o de mudança em curso, que seria o caso se houvesse sido detectada a tendência de um
grupo especifico, seja etário ou por sexo, a empregar a variante.
Um último comentário sobre os dados da Tabela 2 deve ser feito, antes de serem
iniciadas as comparações entre os sons testados no experimento. O item hexacampeão foi
inserido no Experimento 2 para verificar se seria realizado com [ks] ou [kz], e,
conseqüentemente, em havendo variação, se seria [s] ou [z] a variante, segundo sugestão de
um dos informantes do Experimento 1. Como se pode ver na Tabela 2, todas as ocorrências
do item hexacampeão foram realizadas com [ks], pelo que se pode concluir que esta palavra
o difere qualitativamente das outras palavras testadas e, portanto, não foi exclda do
Experimento 1.
Passa-se, então, às realizar as comparações propostas anteriormente, retomadas
esquematicamente abaixo:
a) [ks] alternante vs. [s] alternante – comparar palavras do Grupo 1;
b) [ks] alternante vs. [ks] pleno comparar palavras do Grupo 1 realizadas com [ks] e
palavras do Grupo 2;
c) [s] alternante vs. [s] pleno comparar palavras do Grupo 1 realizadas com [s] e
palavras do Grupo 3;
d) [ks] vs. [kis] comparar palavras do Grupo 1 realizadas com [ks] e palavras do
Grupo 4, realizadas com [ks] ou [kis];
e) [s] e [ks] vs. [s] < [ks] comparar palavras do Grupo 1 e os itens máximo e
próximo, do Grupo 3;
f) [ks] vs. [ks] < [kti] comparar palavras do Grupo 1 realizadas com [ks] e os itens
ficção e ficcional, dos Grupos 1 e 3, respectivamente.
67
A Tabela 4, abaixo, apresenta as médias das medidas de duração dos sons (1) [ks], (2)
[s] em seqüência [ks], (3) [s] ocorrido isoladamente (coluna “Apenas [s]”), (4) [Ѐ] ocorrido
isoladamente (coluna “ Apenas [Ѐ]”), para o Grupo 1.
TABELA 4
Médias de duração de [ks], [s], [Ѐ] e [kis] por palavra do Experimento 2
Média de duração (ms)
Palavra
[ks] [s] de [ks] Apenas [s] Apenas [Ѐ]
Grupo 1
sintaxe 217,17 143,23 103,65 251,69
[ks]~[s]
léxico 222,34 135,41 163,40 168,14
tóxico 207,34 118,59 176,23 127,01
intoxicado 165,33 101,68 127,27 138,02
lexical 181,25 110,11 195,13
lexicografia 164,39 98,42 145,02 161,45
maximização 177,71 114,92 227,34
ficcional 169,86 121,01 125,97
Geral 188,17 117,92 158,00 169,26
Média de duração (ms)
Palavra
[k] [s] [ks]
Grupo 2
táxi 69,46 117,78 187,24
somente [ks]
boxe 78,88 106,34 185,22
Alex 66,48 85,26 151,74
box 81,36 117,56 198,93
sax 109,15 169,69 278,83
ficção 67,83 132,01 199,84
toxina 69,28 144,24 213,53
hexacampeão 73,01 103,16 176,16
Geral 76,93 122,01 198,94
Grupo 3
próximo 95,91
somente [s]
máximo 134,47
proximidade 127,05
clássico 104,12
impasse 207,95
Geral 138,80
Grupo 4
reboques 77,15 101,32 178,46
[kis] CVC
destaques 72,32 80,34 152,65
leques 79,68 102,30 181,98
Geral 76,38 94,65 171,03
Média de duração (ms)
Palavra
[k] [s] [kis]
reboques 119,34 334,95 269,09
destaques 168,72 46,56 380,95
[kis] CVC
leques 107,23 65,22 474,23
Geral 131,76 148,91 374,76
68
Para o Grupo 2, uma vez que todos os dados ocorreram com a seqüência [ks], estão
presentes os valores de [k] e [s] em seqüência [ks] e de toda a seqüência [ks]. Para o Grupo 3,
valores apenas para [s] ocorrido isoladamente, tendo sido desconsiderada a realização de
[ks] para máximo, um hapax que o é significativo para o cômputo geral, ainda que o
número de dados seja reduzido. Finalmente, para o Grupo 4, são apresentadas os valores de
[k] e [s] em seqüência [ks] e de toda a seqüência [ks], bem como os valores de [k] e [s] em
seqüência [kis] e de toda a seqüência [kis].
Comparação (1)
Procedendo à comparação (1), [ks] alternante vs. [s] alternante, pode-se perceber, pela
Tabela 4, que, quando acontece apenas [s] e [Ѐ], a duração desses sons é maior do que quando
estão em seqüência [ks]. No capítulo Metodologia, havia sido levantada a hitese de
ocorrência de um prolongamento da fricativa, fenômeno amplamente documentado na
literatura como resultado residual do cancelamento de algum som adjacente (cf. ALBANO,
2001). Esse fato seria explicado na teoria Autossegmental como devido à permanência de
uma posição vazia no esqueleto da estrutura silábica, após o cancelamento do [k]. Tal teoria
o explica, contudo, o motivo da permanência da posição esqueletal. Por outro lado, em uma
análise baseada no uso, a diferença duracional entre o [s] que ocorre na seqüência [ks] e o [s]
que ocorre em isolamento seria explicada como decorrente da diferença funcional existente
entre esses sons: a consoante oclusiva [k] na seqüência [ks] é cancelada, mas mantém algum
indício de sua presença potencial nesse caso, um aumento da duração. Dentro da Fonologia
de Uso (BYBEE, 2001), que defende a presença do detalhe fonético na representação mental,
é adequado afirmar que a representação mental das palavras do Grupo 1 pode conter tanto as
realizações com [ks], quanto as realizações com [s] e [Ѐ], pois a representações são ricas em
detalhes e envolvem grande volume de redundância e gradiência fonética.
A Tabela 5, a seguir, apresenta os valores médios de duração da vogal precedente a
[ks], [s], [Ѐ] e [kis]. Tomando os valores médios da vogal que antecede [ks], [s] e [Ѐ], pode-se
perceber que a média de duração da vogal antes de [ks] é um pouco menor que a vogal antes
de [s] e [Ѐ]: 87,85 ms contra 129,60 ms e 130, 15 ms, respectivamente. entre [s] e [Ѐ], os
valores são bem próximos.
69
TABELA 5
Médias de duração da vogal precedente a [ks], [s], [Ѐ], [kis] por palavra do Experimento 2
Média de duração da vogal precedente (ms)
Palavra
[ks] [s] [Ѐ] [kis]
Grupo 1
sintaxe 154,74 172,84 214,50
[ks]~[s]
léxico 99,49 152,46 192,30
tóxico 108,02 132,48 75,13
intoxicado 62,71 107,22 85,16
lexical 63,93 96,59
lexicografia 72,78 113,12 83,68
maximização
89,48 132,47
ficcional 51,62
Geral 87,85 129,60 130,15
Grupo 2
táxi 131,81
somente [ks]
boxe 140,73
Alex 97,43
box 149,72
sax 139,37
ficção 49,29
toxina 56,71
hexacampeão 79,93
Geral 105,62
Grupo 3
próximo 116,06
somente [s]
máximo 159,54
proximidade
68,86
clássico 136,17
impasse 155,01
Geral 117,31
Grupo 4
reboques 140,42 176,86
[ks] CVC
destaques 128,30 136,16
leques 117,01 131,56
Geral 123,30 148,19
Finalizando a comparação (1), será considerada a hitese de que pudesse haver uma
queda de intensidade na realização de [s] quando ocorrendo isoladamente, como uma
simplificação de [ks].
A Tabela 6, abaixo, mostra a freqüência de queda de intensidade em palavras do
Grupo 1 que apresentaram variação entre [ks], [s] e [Ѐ].
70
TABELA 6
Ocorrência de queda de intensidade em palavras do Grupo 1, Experimento 2 que
apresentaram variação [ks]~[s]~[Ѐ]
Variação
[ks]~[s]~[Ѐ]
Queda de intensidade no [s]
Palavra
sim o
sim,
marcada
sim, leve
Grupo 1
sintaxe 3
25% 1 33%
1 33%
1 33%
[ks]~[s]
léxico 3
17% 3 100%
0 0% 0 0%
tóxico 3
17% 1 33%
0 0% 2 67%
intoxicado 2
12% 0 0% 1 50%
1 50%
lexical 1
6% 1 100%
0 0% 0 0%
lexicografia 3
17% 3 100%
0 0% 0 0%
maximização
2
11% 2 11%
0 0% 0 0%
ficcional 1
6% 0 0% 0 0% 1 100%
Grupo 2
táxi 0
0%
somente [ks]
boxe 0
0%
Alex 0
0%
box 0
0%
sax 0
0%
ficção 0
0%
toxina 0
0%
hexacampeão
0
0%
Grupo 3
próximo 0
0%
somente [s]
máximo 1
6% 1 100%
0 0% 0 0%
proximidade 0
0%
clássico 0
0%
impasse 0
0%
Grupo 4
reboques 0
0%
[kis] CVC
destaques 0
0%
leques 0
0%
Foi avaliada a presença de uma queda na curva de intensidade durante a realização de
variantes reduzidas de [ks] (Grupo 1). Durante a análise acústica, contudo, houve dificuldade
em determinar de forma biria se havia ou o queda de intensidade em vários sons, pelo
que se optou por utilizar dois graus de depressão: um padrão de queda mais abrupta e
pronunciada e outro padrão com queda mais leve. Conclui-se que, com relação aos padrões de
intensidade, está envolvida a gradiência fonética. Foi avaliada a queda de intensidade somente
nas ocorrências do Grupo 1 que efetivamente apresentaram as variantes [s] e [Ѐ]. Como o
número de realizações com [s] e [Ѐ] é reduzido, os valores percentuais indicados para a queda
de intensidade não são significativos, pois uma grande margem de erro. Com isso, não é
possível estabelecer relações entre os fenômenos queda de intensidade e variação entre [ks],
[s] e [Ѐ]. Contudo, os dados apurados indicam que houve queda de intensidade o que em si é
71
significativo, pois confirma parcialmente uma das hiteses levantadas no capítulo de
Metodologia – e podem ser utilizados como ponto de partida para pesquisas futuras que
tratem da relevância do detalhe fonético para a representação mental.
Comparação (2)
Passa-se, então, à comparação (2), entre [ks] alternante vs. [ks] pleno. Serão feitas
aqui duas considerações: uma diz respeito à duração das consoantes oclusivas e das vogais
precedentes; outra, à epêntese. Retomando a Tabela 4, que traz os valores médios de duração
das consoantes avaliadas neste estudo, um fato se destaca: o [ks] que ocorre em seqüências
[ks] passíveis de redução (Grupo 1) é bem mais longo que o [ks] que ocorre em seqüências
[ks] em que não se verificou redução (Grupo 2): 188,17 ms para [ks] de palavras do Grupo 1
contra 76,93 ms para [ks] de palavras do Grupo 2. Passa-se, então, a considerar a duração da
vogal precedente a [ks], [s], ] e [kis]. Tendo em vista que a tonicidade tem como principal
correlato acústico um aumento da duração da vogal nuclear (MASSINI-CAGLIARI, 1992),
ressalte-se que a comparação das médias gerais de duração das vogais precedentes deve ser
feita levando em conta a diferença entre os grupos com relação ao número de palavras em que
a vogal precedente é tônica, pretônica ou núcleo de monossílabo. No Grupo 1, três palavras
em que a vogal precedente é tônica e cinco em que é pretônica. No Grupo 2, cinco tônicas
(sendo três delas monossílabos) e três pretônicas. No Grupo 3, são quatro tônicas e uma
pretônica e no Grupo 4, todas tônicas. De qualquer modo, ao contrário da média de duração
das consoantes, a duração das vogais precedentes, como se pode ver na Tabela 5, acima, é
razoavelmente próxima para os dois tipos de [s]: 129,60 ms e 117,31 ms, respectivamente.
Por fim, trata-se dos dados da freqüência de ocorrência de epêntese nas palavras do
Experimento 2, que se encontram dispostos na Tabela 7, a seguir. Como se pode perceber, não
foi detectada a ocorrência de epêntese em nenhum dos dados do experimento. A coluna
Epêntese” mostra taxa de 0% de ocorrência para todas as palavras em que o fenômeno seria
possível ou seja, palavras realizadas com [ks] estrutura CC, o que abarca os Grupos 1 e 2,
somente. Esse seria um dos requisitos apontados anteriormente para que [ks] fosse
interpretado como uma consoante complexa. No entanto, a não ocorrência de epêntese
consiste principalmente em um comportamento que indica que a natureza da representação
mental de [ks] que difere da dos demais encontros consonantais da ngua. Essa afirmação
será retomada mais à frente, incorporando à discussão a análise de outros fatos sobre o PB.
72
TABELA 7
Freqüência de ocorrência de epêntese por palavra do
Experimento 2
Epêntese
Palavra
Total de
dados
sim
Grupo 1
sintaxe 12 0 0%
[ks]~[s]
léxico 18 0 0%
tóxico 18 0 0%
intoxicado 17 0 0%
lexical 16 0 0%
lexicografia 18 0 0%
maximização 18 0 0%
ficcional 18 0 0%
Grupo 2
táxi 18 0 0%
somente [ks]
boxe 18 0 0%
Alex 18 0 0%
box 18 0 0%
sax 18 0 0%
ficção 18 0 0%
toxina 16 0 0%
hexacampeão 18 0 0%
Grupo 3
próximo 18
somente [s]
máximo 18
proximidade 18
clássico 18
impasse 18
Grupo 4
reboques 18
[kis] CVC
destaques 17
leques 18
Comparação (3)
A comparação (3) é semelhante à comparação (2), no sentido de que também
contrapõe sons foneticamente idênticos, mas que diferem em termos de uso. Foi avaliada a
duração dos sons [s] alternante com o [s] pleno, bem como a duração das vogais precedentes,
valores dispostos nas Tabelas 4 e 5, respectivamente. Ao contrário do que se verificou na
comparação anterior, aqui a duração aparentemente não se mostra significativa: o [s] que
provém de seqüência [ks] reduzida (Grupo 1) tem duração semelhante ao [s] não passível de
alternância com [ks] (Grupo 3): 158 ms é a dia de duração do [s] em isolamento das
palavras do Grupo 1 e 138,80 ms, a média de duração do [s] não-alternante em palavras do
73
Grupo 3. Além disso, como se pode ver na Tabela 5, as durações das vogais precedentes
tamm são próximas para os dois tipos de [s]: 129,60 ms e 117,31 ms, respectivamente.
Comparação (4)
Na comparação (4), serão contrapostas palavras do Grupo 1 realizadas com [ks] e
palavras do Grupo 4, realizadas com [ks] ou [kis]. Serão considerados dados relativos à
duração das consoantes e da vogal precedente, à ocorrência de vogal alta regular entre [k] e
[s] em palavras com estrutura CVC (Grupo 4) e à ocorrência de vogal depois de [ks] nas
palavras sintaxe, táxi, boxe, box, Alex, sax.
A Tabela 8, a seguir, mostra a freqüência de ocorrência de realização de vogal alta
regular e realização de [i] depois de [ks].
TABELA 8
Freqüência de ocorrência de realização de vogal alta regular e realização
de [i] depois de [ks] por palavra do Experimento 2
Vogal alta
regular
[i
] depois de
[ks]
Palavra
Total de
dados
sim sim
Grupo 1
sintaxe 12 7 58%
[ks]~[s]
léxico 18
tóxico 18
intoxicado 17
lexical 16
lexicografia 18
maximização 18
ficcional 18
Grupo 2
táxi 18 3 17%
somente [ks]
boxe 18 4 22%
Alex 18 0 0%
box 18 0 0%
sax 18 0 0%
ficção 18 0 0%
toxina 16
hexacampeão 18
Grupo 3
próximo 18
somente [s]
máximo 18
proximidade 18
clássico 18
impasse 18
Grupo 4
reboques 18 2 11%
[kis] CVC
destaques 17 1 6%
leques 18 2 11%
74
Cristófaro-Silva e Almeida (2008b) tratam da possibilidade de não-ocorrência de
vogal alta regular ([i]) frente à também opcional ocorrência de vogal epentética, comparando
estruturas CVC e CC, que são foneticamente análogas, mas apresentam comportamentos
distintos e teriam representações mentais diferentes. Em vista disto, optou-se por abordar
tamm neste estudo a ocorrência de vogal alta regular entre [k] e [s] em estrutura CVC,
comparando-a com a seqüência [ks] com estrutura CVC. Esperava-se, seguindo os resultados
de Cristófaro-Silva e Almeida (2008b), que a vogal alta regular fosse realizada em algumas
ocorrências do corpus, mas não em todas. Como se pode perceber na Tabela 8, os resultados
obtidos no Experimento 2 indicam que a ocorrência de vogal alta regular entre [k] e [s] em
estrutura CVC é marginal (11%, 6% e 11% para reboques, destaques e leques,
respectivamente), o que vai de encontro a teorias que defendem a primazia geral da estrutura
CV como a laba universal, para a qual convergiriam a maioria dos fenômenos sonoros das
línguas naturais (cf. CLEMENTS, 1990). O que se tem, portanto, é o contrário: uma estrutura
CV é desfeita pelo apagamento da vogal alta regular, gerando um padrão fonotático mais
complexo, CC.
Finalizando a comparação das palavras do Grupo 1 e Grupo 4, falta ainda considerar a
realização de [i] depois de [ks] em palavras do Grupo 1 como sintaxe, táxi, boxe, box, Alex,
sax, em que o [ks] está na borda final de palavra. Retornando à Tabela 8, acima, verifica-se
que a taxa de ocorrência de [i] depois de [ks] é baixa para táxi e boxe (17% e 22%) e
intermediária para sintaxe (58%). Houve variação individual por exemplo, algumas pessoas
falaram sintaxe e táxi com [i] no final, mas não boxe e gradiência fonética em algumas
ocorrências, o [i] final não apareceu tipicamente sob a forma de vogal, mas de formantes
sobrepostos ao [s] precedente. Note-se que nas três palavras em que foi realizado o [i] final,
sintaxe, táxi e boxe, vogal também na ortografia: pode-se afirmar, portanto, que ocorre
vogal depois do [ks] final quando correlato ortográfico, tratando-se, portanto, de uma
influência da ortografia sobre a pronúncia, enquadrando-se no chamado efeito Buben
(CHEVROT; MALDEREZ, 1999). Contudo, a informação escrita não é determinante da
ocorrência de [i], pois muitas realizações em que boxe tem a mesma pronúncia de box, por
exemplo. A seguir, a Figura 7 mostra espectrogramas do informante C1i1 para boxe e box.
75
boxe
[
ks
]
[ѐ]
[
k
]
[
s
]
Time (s)
1.107
1.537
1.10689827
1.53679538
C1i1
box
[
ks
]
[ѐ]
[
k
]
[
s
]
Time (s)
9.497
9.881
9.49690938
9.88110928
C1i1
FIGURA 7 - a) Oscilograma e espectrograma de boxe; b) oscilograma e espectrograma de box
informante C1i1
Comparação (5)
Na comparação (5), busca-se avaliar semelhanças e diferenças entre palavras do
Grupo 1, que podem ocorrer com [ks], [s] ou [Ѐ], e os itens máximo e próximo, do Grupo 3,
para os quais incio de uma pronúncia pretérita com [ks], ao invés de [s], como
atualmente. Note-se que houve uma ocorrência de máximo realizada com [ks]. A realização
dos itens máximo e próximo com a variante [ks], que já havia sido apontada no capítulo de
Metodologia, era esperada em informantes da faixa etária mais avançada, como de fato
ocorreu. Os itens máximo e próximo contam com alta freqüência de ocorrência. Proe-se
que, nessas palavras, tenha ocorrido uma mudança de [ks] para [s], que envolve um processo
a)
Time (s)
1.107 1.537
0
8000
1.10689827 1.53679538
C1i1
Time (s)
9.497 9.881
0
8000
9.49690938 9.88110928
C1i1
b)
76
redutivo, de simplificação articulatória, que tipicamente atinge primeiro palavras de alta
freqüência (BYBEE, 2000; PHILIPS, 2001).
Foram identificados na análise acústica das gravações fenômenos de redução sonora
envolvendo principalmente o cancelamento ou redução da vogal alta regular e cancelamento
de laba postônica medial. Os itens ficcional e proximidade destacaram-se na redução de
vogal alta regular e clássico, léxico, na redução de sílaba postônica. Os itens máximo e
próximo, os mais freqüentes do corpus, foram os que apresentaram grau mais avançado de
redução, inclusive, muitas vezes, com cancelamento de praticamente toda a porção postônica
da palavra (cf. Quadro 11, p. 56, para freqüência de ocorrência das palavras testadas). Esse foi
o único caso em que se detectou influência da freqüência de ocorrência das palavras sobre seu
comportamento. A Figura 8, a seguir, mostra o oscilograma e o espectrograma da palavra
próximo realizada pelo informante C2i1, em que se pode notar o cancelamento das labas
postônicas.
próximo
[
s
]
[ѐ]
Time (s)
0
0.2622
0
0.262232965
C1i2
FIGURA 8 - Oscilograma e espectrograma de próximo – informante C2i1
Comparação (6)
A comparação (6) tem como objetivo avaliar semelhanças e diferenças entre a palavra
ficcional e os demais itens do Grupo 1, que podem ocorrer com [ks], [s] ou [Ѐ], e, por outro
lado, entre ficção e os outros itens do Grupo 2, em que ocorre somente [ks]. indício de
uma pronúncia pretérita de ficcional e ficção com [kt] ao invés de [ks], como atualmente.
As dias de duração, presentes na Tabela 4, o puderam indicar nenhuma diferença entre
ficcional e ficção e os outros itens do Grupo 1 e 2, respectivamente: os itens apresentam os
menores valores de seus grupos em vogal precedente (51,62 ms e 49,29 ms), o que pode ser
Time (s)
0
0.2622
0
0.262232965
C1i2
77
explicado pela qualidade da vogal precedente, um [i], que, como dito anteriormente,
apresentou muitas ocorrências de redução e cancelamento. Houve três ocorrências de
ficcional com cancelamento do [i], com ou sem cancelamento simultâneo do [k]: [fksگo⎆naw]
ou [fsگo⎆naw]. Esse fato e a redução de vogal alta regular podem ser mais bem explorados em
pesquisas futuras. Os itens ficcional e ficção obtiveram valores bem baixos para a duração
média de [k] (53,50 ms e 67,83 ms) e valores medianos para [s] (125,77 ms e 132,01 ms), mas
a diferença entre esses valores e o de outras palavras, por exemplo lexicografia e toxina, é
pequena.
Durante a análise acústica dos dados do Experimento 2, um fato, que não havia sido
cogitado anteriormente na Metodologia, mostrou-se de grande relevância. Verificou-se a
assimilação de vozeamento de [s] em palavras com [ks] referente a estrutura CVC (Grupo 4),
mas não em palavras com [ks] referente a estrutura CC (Grupos 1 e 2).
TABELA 9
Freqüência de ocorrência de variação entre [ks], [s] e [Ѐ] e ponto de
articulação da consoante fricativa por palavra do Experimento 2
Variação
[ks]~[s]~[Ѐ]
Ponto da fricativa
Palavra
sim
[z] [Ѐ] ou [Ћ]
Grupo 1
sintaxe 3
25% 0
0% 1
8%
[ks]~[s]
léxico 3
17% 0
0% 1
6%
xico 3
17% 0
0% 2
11%
intoxicado 2
12% 0
0% 1
6%
lexical 1
6% 0
0% 1
6%
lexicografia 3
17% 0
0% 1
6%
maximização 2
11% 0
0% 0
0%
ficcional 1
6% 0
0% 0
0%
Grupo 2
táxi 0
0% 0
0% 0
0%
somente [ks]
boxe 0
0% 0
0% 0
0%
Alex 0
0% 0
0% 0
0%
box 0
0% 0
0% 0
0%
sax 0
0% 0
0% 0
0%
ficção 0
0% 0
0% 0
0%
toxina 0
0% 0
0% 0
0%
hexacampeão 0
0% 0
0% 0
0%
Grupo 3
próximo 0
0% 0
0% 0
0%
somente [s]
máximo 1
6% 0
0% 0
0%
proximidade 0
0% 0
0% 0
0%
clássico 0
0% 0
0% 0
0%
impasse 0
0% 0
0% 0
0%
Grupo 4
reboques 0
0% 0
0% 0
0%
[kis] CVC
destaques 0
0% 3
18% 0
0%
leques 0
0% 5
28% 3
17%
78
Como se pode ver na coluna Ponto da Fricativa” da Tabela 9, as palavras destaques e
leques, que, no texto, estavam dispostas antes de palavras iniciadas por consoantes vozeadas
(da e de, respectivamente), apresentaram ocorrências de assimilação de vozeamento. O item
destaques foi realizado com [z] em 18% das ocorrências. O item leques foi realizado com [z]
em 28% das ocorrências e com [Ћ] em 17% a variante [Ћ] ocorreu para leques e não para
destaques, pois leques estava, no texto, antes de consoante africada [dЋ], havendo, neste caso,
a assimilação não do vozeamento, mas também do ponto de articulação (alveopalatal).
A seguir, na Figura 9, um oscilograma e um espectrograma com a realização de
destaques pelo informante C1i3, em que se pode verificar a realização de [z] no final da
palavra, em decorrência da proximidade com consoante vozeada da palavra imediatamente
seguinte, da. O item reboques, no texto, estava antes de uma palavra iniciada por consoante
desvozeada (para), o que explica a ocorrência apenas de [s], e o de [z]. É digno de nota que
a assimilação de vozeamento se restrinja apenas a itens do Grupo 4, ou seja, casos em que
estava envolvida estrutura CVC, não ocorrendo em palavras com [ks] estrutura CC. Esse
resultado aponta para mais uma característica peculiar do comportamento das seqüências [ks]
com estrutura CC e será utilizado como novo indício de que, no PB, [ks] tem uma
representação mental diferente das outras seqüências consonantais de estrutura análoga, como
[ks], de leques.
destaques
[kz]
[a] [k] [z]
Time (s)
8.95 9.431
8.94958263 9.43081979
C1i3
FIGURA 9 - Oscilograma e espectrograma da palavra destaques – informante C1i3
Time (s)
8.95 9.431
0
8000
8.94958263 9.43081979
C1i3
79
Em resumo, dentre os resultados apresentados ao longo deste capítulo, destacam-se os
seguintes pontos:
a) não foi verificada a ocorrência de epêntese nas seqüências [ks];
b) não houve assimilação de vozeamento em juntura de palavras com a seqüências
[ks], apenas com seqüências [kis] estrutura CVC;
c) houve alterncia lexical dos sons das seqüências [ks]~[s].
Retomando os principais aspectos apresentados nos capítulos anteriores, foi
demonstrado que, no PB, as seqüências [ks] se comportam de forma diferenciada em termos
de fenômenos sonoros. Dentre esses fenômenos, podem ser listados os seguintes:
1) Possibilidade de variação de [ks] com [s] ou com [Ѐ] em palavras específicas (cf.
resultados dos experimentos realizados no presente estudo).
2) Ausência de epêntese entre [k] e [s] (cf. CANTONI, 2007; CRISTÓFARO-SILVA;
ALMEIDA, 2008a; bem como os resultados do Experimento 2 deste estudo). A
ausência de epêntese suporte à interpretação de que a seqüência [ks] tem
representação diferente dos encontros consonantais heterossilábicos que podem
opcionalmente ser desfeitos por epêntese. Por outro lado, seqüências [kis] podem se
reduzir a [ks] (cf. CRISTÓFARO-SILVA; ALMEIDA, 2008b; resultados do
Experimento 2 deste estudo). Esses dois tipos de fenômeno envolvem seqüências
sonoras análogas com representações diferentes, que se fortalecem e são
gerenciadas por sua distribuição e pelo uso.
3) Fenômeno de deslocamento acentual em verbos (cf. CANTONI; CRISTÓFARO,
2008): a vogal epentética em verbos pode receber o acento lexical, em algumas
flexões específicas. Contudo, esse fenômeno não foi atestado em [ks] (e.g. eu opto
[o⎆pitѨ], mas eu fixo *[fi⎆kگsѨ]. Este se mostra mais um argumento que será aqui
80
utilizado para sugerir que [ks] tem representação diferente dos encontros
consonantais heterossilábicos.
4) A seqüência [ks] pode ocupar posição final de palavra (e.g. box), ao contrário dos
demais encontros consonantais heterossilábicos, em que essa posição é
extremamente rara (e.g. ceps). Ademais, um grande número de neologismos
recentes no PB terminados por [ks], especialmente seguindo a vogal [ϯ], na
seqüência [ϯks] (CANTONI, 2008). Os exemplos são abundantes, entre eles
marmitex, Chamex, durex, sedex, Vendex, Vaspex, pirex, telex, kleenex, rolex,
multiplex. Neologismos consolidam padrões já existentes, mas marginais. Como
visto anteriormente, a variação [ks]~[s]~[Ѐ] é restrita a meio de palavra e [Ѐ] é
marginal, de modo que o padrão [ks] encontra mais espaço para se fortalecer em
posição final de palavra, onde não concorrência. Assim, pode-se explicar a
emergência de um padrão recorrente de palavras terminadas por [ks] final.
Verificou-se também a existência de um grande número de dissílabos terminados
em [ks]: no banco de dados do Aspa, 63% das palavras terminadas em [ks] são
dissílabas. Defende-se, portanto, que dissílabos e bordas asseguram a estabilidade
de [ks] em final de palavra. Note-se, ainda, que as consoantes complexas do PB,
[, ցܦ], não podem ocorrer em fim de palavra. Este fato distribucional indica uma
diferença funcional entre [ks] e [, ցܦ] que pode ser decisiva para descartar a
interpretação de [ks] como consoante complexa.
Avaliando os resultados obtidos nos Experimentos 1 e 2 listados em (a-c) e
considerando ainda os fenômenos e fatos distribucionais listados em (1-4), acima, pode-se
concluir que a seqüência [ks], no PB, conta com um status que difere tanto dos encontros
consonantais heterossilábicos, quanto das consoantes complexas. Trata-se de um caso em que
seqüências sonoras análogas apresentam representação mental diferente, que pode ser inferida
a partir de seu comportamento fonológico e de seu uso efetivo.
Os modelos fonológicos tradicionais, em sua maioria mentalistas, assumem que, na
mente humana, haveria um módulo da linguagem específico, inato e pré-definido, igual,
portanto, para todos os falantes. Os modelos de uso, orientação teórica adotada neste trabalho,
81
por outro lado, defendem o gerenciamento específico e individual das gramáticas. Os
resultados obtidos neste estudo corroboram os pressupostos dos modelos de uso, ao
apontarem para a possibilidade de que falantes diferentes tenham gramáticas fonológicas
diferentes, tendo sido detectada variação interindividual na alterncia [ks]~[s].
Outro problema enfrentado pelos modelos unirrepresentacionais diz respeito à sua
concepção de fonema. Como anteriormente demonstrado, os modelos fonológicos
tradicionais, unidimensionais, mostram-se empiricamente problemáticos, por não
incorporarem o uso lingüístico e por considerarem que as unidades sonoras (fonemas, traços,
etc.) são discretas e têm existência concreta. Estudos experimentais apontam que fonema,
fone e segmento sonoro são entidades meramente tricas, categorias impostas pelas
limitações da escrita, e não unidades psicológicas emricas na produção e percepção da fala
(PORT, 2008; BOUCHER; GILBERT, 2008). Segundo a Fonologia de Uso (BYBEE, 2001),
as palavras seriam as unidades mínimas de armazenagem na representação mental. Os sons
o dispõem de representação única, autônoma e independente, como afirmam os modelos
unirrepresentacionais. Pelo contrário, as representações mentais dos sons, sob uma
perspectiva multirrepresentacional, são múltiplas, dependentes, interconectadas em redes
relacionais. São formadas por instâncias reais de uso e tamm por generalizações, de baixo e
alto vel, construídas a partir da categorização de eventos de uso lingüístico. Essas
generalizações têm a forma de esquemas, estruturas abstratas que reúnem os aspectos comuns
às instâncias reais de uso de uma categoria. Baseado em Langacker, Palmer (1996, p. 272)
sustenta que [...] individual phonemes and sequences of phonemes are governed by auditory
schemas (and articulatory routines); they are complex categories; and they are
multidimensional.”
24
Langacker (1987, p. 389) defende que as diferentes realizações de um
fonema os tradicionais alofones” seriam entidades abstratas, construídas a partir de
eventos articulatórios e auditivos reais, atuais:
One cannot articulate a phoneme or allophone per se, but only a specific
sound that has precise values for pertinent values for pertinent phonetic
parameters. Even a low-level (i.e. maximally specified) allophone represents
an abstraction from actual articulatory (and auditory) events, each of which
is phonetically unique in absolute terms.
25
24
“[...] fonemas individuais e seqüências de fonemas são governados por esquemas auditivos (e rotinas
articulatórias); eles são categorias complexas; e são multidimensionais.” (tradução minha).
25
“Não se pode articular um fonema ou alofone em si, mas apenas um som específico que tem valores precisos
para pametros fonéticos pertinentes. Mesmo um alofone de baixo nível (i.e., maximamente especificado),
representa uma abstração a partir de eventos atuais articulatórios (e auditivos), cada um dos quais é único em
termos absolutos.” (tradução minha).
82
Os alofones se agrupariam em categorias complexas, estruturadas com base em um
protótipo o “alofone” considerado básico, com maior saliência cognitiva. A partir da
categoria prototípica, seria então construído um esquema geral, que contempla de forma
abstrata todas as características comuns aos alofones. Esse esquema de alto vel seria
equivalente ao fonema. Nos modelos de uso, o conceito de “fonema” é desconstruído,
passando a indicar uma representação abstrata que não tem existência própria, autônoma, mas
que emerge principalmente a partir das relações de similaridade fonética estabelecidas entre
os exemplares armazenados na mente e constantemente reformulada pelo uso. Os esquemas
sonoros são agrupados em esquemas silábicos e ancorados nos exemplares, que são
gerenciados de forma probabilística no léxico.
Para finalizar esta seção, considerando os resultados obtidos experimentalmente e os
modelos tricos apresentados, serão apresentadas a seguir duas propostas de análise
multirrepresentacional da alternância [ks]~[s] e das categorias testadas nos experimentos
(Grupos 1 a 4). As análises, uma baseada essencialmente na Gramática Cognitiva
(LANGACKER, 1987), outra, no Modelo de Exemplares (PIERREHUMBERT, 2000), se
mostram compatíveis e complementares.
Primeiramente, retoma-se a divisão inicial das palavras em grupos, de acordo com o
comportamento que apresentam com relação à alternância [ks]~[s]: o Grupo 1 contempla
palavras com [ks] e [s] alternantes; os Grupos 2 e 3, palavras que apresentam [ks] pleno e [s]
pleno, respectivamente; o Grupo 4, palavras com [kis] estrutura CVC. A seguir, as Figuras 10
e 11 mostram representações gráficas de cada grupo de palavras (1 a 3 na Figura 10 e 4 na
Figura 11) segundo a Gramática Cognitiva. Os quadrados com linhas lidas representam
instâncias de uso, enquanto os quadrados com linha tracejada correspondem a esquemas
construídos a partir dessas instâncias de uso. Como resultado, obtém-se uma categoria
complexa correspondente ao fonema, em cada Grupo. As setas indicam as relações de
extensão, estabelecidas entre as instâncias de uso, e de elaboração, estabelecidas entre as
instâncias de uso e os esquemas gerais. O mbolo x é utilizado por Langacker nos esquemas
para indicar elementos não especificados, que serão elaborados de formas distintas pelas
instâncias de uso que deram origem ao esquema.
26
26
Por economia, os alofones decorrentes do contexto sonoro foram omitidos (por exemplo, [ksܦ] e []
ocorreriam antes de vogal arredondada, etc.). Foram omitidas também algumas relações estabelecidas entre os
elementos representados, que se encontram indicadas por “(...)”.
83
FIGURA 10 - Representação das relações que emergem a partir de sons de
palavras do (a) Grupo 1, (b) Grupo 2 e (c) Grupo 3, conforme a
Gramática Cognitiva
FIGURA 11 - Representação das relações que emergem a partir de sons de palavras do Grupo 4,
conforme a Gramática Cognitiva
84
Esse tipo de representação, baseada no uso, consegue capturar e demonstrar as
relações estabelecidas entre os sons em cada grupo de palavras, as diferenças entre eles e a
construção de categorias abstratas, a partir das ocorrências sonoras reais.
Nas Figuras 10 e 11, que seguem a notação de Langacker (1987), foram representadas
somente os sons e as labas. Ainda que a Gramática Cognitiva apresente recursos poderosos
para lidar com a relação estabelecida entre sons, labas, pés e palavras, deu-se preferência por
apresentar as relações estabelecidas entre os itens lexicais através do Modelo de Exemplares.
As Figuras 12 e 13, na seqüência, apresentam as relações estabelecidas entre os exemplares
em cada grupo de palavras (1 a 3 na Figura 12 e 4 na Figura 13) e a emergência de esquemas
abstratos a partir da categorização de ocorrências de uso.
27
FIGURA 12 - Representação das relações que emergem a partir de sons de palavras do (a) Grupo 1,
(b) Grupo 2 e (c) Grupo 3, conforme o Modelo de Exemplares
27
Apenas os itens relacionados à alternância [ks]~[s] foram representados, omitindo-se variantes de outra ordem
(como [saks⍧], [klaskѨ], etc.).
85
FIGURA 13 - Representação das relações que emergem a partir de sons de palavras do Grupo 4,
conforme o Modelo de Exemplares
Por fim, a seguir, as Figuras 14 e 15 mostram as redes formadas pela conexão
estabelecida entre alguns dos itens testados no Experimento 2. Os exemplares mais centrais
das categorias encontram-se inseridos em uma elipse cinza. Nos casos de alternância, os
exemplares menos centrais foram dispostos atrás dos exemplares mais centrais. Note-se que,
para os itens máximo e próximo, foram representadas as realizações com [ks], para
demonstrar que, no passado, tais palavras, ao que parece, faziam parte do Grupo 1 (acima).
Por já não serem produtivos, os exemplares [ks]imo e pró[ks]imo e a relação que
antigamente mantinham com os itens do Grupo 1 foram grafados em cinza.
86
FIGURA 14 - Representação da organização dos exemplares em cada Grupo (1 a 3), conforme o
Modelo de Exemplares
FIGURA 15 - Representação da organização dos exemplares do Grupo 4,
conforme o Modelo de Exemplares
87
5 Conclusão
Este trabalho pretendeu caracterizar o fenômeno de alternância entre [ks] e [s], tendo
como pano de fundo uma discussão mais ampla sobre a representação mental e a dinâmica de
armazenagem e processamento dos sons das línguas. Procurou-se demonstrar que os modelos
formalistas, unirrepresentacionais, o conseguem lidar satisfatoriamente com o fenômeno em
estudo. Foi apresentada como alternativa de análise os modelos representacionais oferecidos
pela Gramática Cognitiva (LANGACKER, 1987), pela Fonologia de Uso (BYBEE, 2001) e
pelo Modelo de Exemplares de Pierrehumbert (2000). Uma das questões abordadas é se [ks]
poderia ser mais bem caracterizado como uma seqüência de sons ou como um único som.
Avaliando os resultados obtidos experimentalmente, ao lado de outros fatos do PB
relacionados a [ks], promoveu-se uma comparação de [ks] com os encontros consonantais
heterossilábicos do PB o desfeitos por epêntese, de um lado, e com as consoantes
complexas da língua. Verificou-se que [ks], ao contrário dos encontros consonantais
heterossilábicos, (1) pode ocorrer em coda final, posição em que tem, inclusive, se tornado
muito produtivo nos últimos anos; (2) o é suscetível a epêntese, que o foi atestada no
experimento. Foi detectada a assimilação de vozeamento de [s] em palavras com [ks]
referente a estrutura CVC, mas o em palavras com [ks] referente a estrutura CC. Concluiu-
se que [ks] difere tanto dos encontros consonantais heterossilábicos, quanto das consoantes
complexas. Seqüências com baixa freqüência de tipo, como [ks], mostram-se padrões de
pouca produtividade na língua, que tendem a sofrer mudanças de nivelamento analógico
(BYBEE, 2006). Com isso, espera-se que [ks] tenda a dar lugar a padrões mais freqüentes,
como [s]. Esse deveria ser o caso no português arcaico, quando as seqüências [ks] eram ainda
mais escassas que hoje, até que diversas palavras com essa seqüência foram inseridas na
língua pela chamada via erudita. Acrescente-se a esse quadro a recente explosão de
neologismos terminados [ks]. A questão de determinar se [ks] seria uma seqüência de sons ou
um único som perde relevância, pois seu status representacional parece instável e fugidio.
Talvez [ks] consiga fortalecer-se como um padrão produtivo, talvez não, depende do uso e
dos falantes.
88
Defende-se que a alternância [ks]~[s] seria um caso em que estruturas análogas
apresentam representações mentais diferentes. Os resultados dos experimentos comprovaram
alguns pressupostos dos modelos de uso, como:
a) as freqüências de tipo e de ocorrência exercem impacto sobre a mudança sonora
(padrões menos freqüentes são afetados primeiro por mudanças de nivelamento
analógico, enquanto padrões mais freqüentes são afetados primeiro por mudanças
redutivas);
b) o detalhe fonético é relevante para as representações mentais;
c) o uso lingüístico promove a alteração imediata das representações, que são
dinâmicas;
d) o gerenciamento das gramáticas é específico e individual.
No Experimento 2, foram gravados 18 informantes que viveram em Belo Horizonte
desde pelo menos os dois anos de idade. Essa decisão foi tomada para garantir que as
diferentes realizações dos informantes o se devessem a diferenças regionais. Contudo, as
propostas de análise dos resultados foram tecidas considerando o PB em geral, e não apenas o
português falado em Belo Horizonte. Não parece que a alternância [ks]~[s] esteja sujeita a
variação diatópica. No entanto, esse seria um tópico a ser desenvolvido em pesquisas futuras.
Outras questões, que permanecem ainda inexploradas na literatura sobre o sistema
sonoro do PB, destacaram-se como bons temas para estudos posteriores: avaliar a influência
das freqüências de tipo e de ocorrência em mudanças sonoras no PB, especialmente da
freqüência de tipo, que conta com um número menor de pesquisas. Mostra-se também um
bom tema de estudo avaliar a relação entre fenômenos redutivos e queda de intensidade,
aumento de duração e alteração de outras características acústicas finas, apontando para da
relevância do detalhe fotico para a representação mental.
Estudos sobre o PB inspirados em modelos de uso o ainda pouco numerosos. Com
isso, algumas dimensões da linguagem, como prosódia, fonotática e sintaxe, apresentam
contribuições inexpressivas sob esta perspectiva teórica. Espera-se, contudo, que este quadro
tenda a mudar nos próximos anos e que o interesse dos lingüistas brasileiros possa cada vez
mais ser despertado em busca de uma visão multirrepresentacional da linguagem humana.
89
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ANEXO A - Palavras com [ks] obtidas em busca no banco de dados do Aspa, seguidas
de suas respectivas freqüências de ocorrência no corpus
Palavra Freqüência de
ocorrência
1 sexo 17407
2 sexual 13405
3 alex 10406
4 fixa 9999
5 fax 9138
6 complexo 8884
7 fluxo 6852
8 reflexão 5731
9 boxe 5313
10
max 4777
11
conexão 4539
12
homossexuais 4428
13
sexuais 4372
14
fixo 3872
15
táxi 3832
16
texas 3494
17
excel 3334
18
marx 3235
19
reflexo 3179
20
fixar 3130
21
fixado 3094
22
homossexual 3000
23
mix 2758
24
sexualidade 2683
25
alexander 2668
26
complexidade 2544
27
complexa 2520
28
fixação 2454
29
anexo 2227
30
reflexos 2217
31
flexibilização 2180
32
oxigênio 2168
33
fixados 2060
34
prefixados 1941
35
flexibilidade 1931
36
indexação 1898
37
sexualmente 1876
38
fixos 1830
39
boxes 1790
40
paradoxo 1762
41
flevel 1719
42
complexos 1689
43
fixada 1656
44
lix 1646
45
fluxos 1635
46
ajax 1602
47
indexador 1595
48
marxista 1560
49
reflexões 1552
50
taxista 1550
51
conexões 1537
52
desindexação 1445
53
box 1418
54
fixou 1395
55
marxismo 1372
56
complexas 1287
57
saxofonista 1264
58
táxis 1228
59
homossexualismo 1185
60
taxistas 1113
61
paradoxalmente 1078
62
ortodoxos 1057
63
intoxicação 1055
64
perplexidade 1021
65
sexos 994
66
agrotóxicos 989
67
fixas 972
68
fixadas 969
69
fleveis 911
70
ortodoxa 878
71
tórax 857
72
homossexualidade 813
73
paradoxal 805
74
rexona 792
75
boxeador 740
76
ortodoxo 732
77
indexados 693
78
prefixada 692
79
prefixo 679
80
flexibilizar 658
81
sax 652
82
marxistas 630
83
galáxias 626
84
alexis 582
85
tóxico 579
86
asfixia 561
87
perplexo 561
97
88
ortodoxia 553
89
heterossexuais 549
90
lennox 542
91
monóxido 536
92
fixando 528
93
galáxia 522
94
inexorável 517
95
látex 496
96
anexos 481
97
paradoxos 476
98
reflexiva 444
99
toxina 424
100
léxico 423
101
cinemax 421
102
prefixado 416
103
clímax 403
104
anexado 395
105
refluxo 373
106
nexo 360
107
heterossexual 354
108
saxofone 337
109
lexicais 334
110
maximizar 334
111
remixes 332
112
anexados 331
113
infleo 331
114
anexada 330
115
anexar 327
116
remix 322
117
anorexia 318
118
indexada 315
119
perplexos 310
120
texano 305
121
anexação 296
122
reindexação 295
123
tóxica 293
124
inflevel 290
125
óxido 279
126
oxigenação 279
127
amoxicilina 269
128
lexical 269
129
fixam 259
130
toxinas 258
131
transexual 258
132
tóxicas 251
133
nix 248
134
bissexual 241
135
agrotóxico 238
136
anexa 233
137
lux 228
138
toxicidade 226
139
ortodoxas 225
140
prefixadas 225
141
boxeadores 224
142
bissexuais 223
143
inox 220
144
maxi 218
145
desintoxicação 217
146
mixagem 217
147
indexado 216
148
afluxo 209
149
paroxismo 206
150
reflexivas 206
151
fixaram 204
152
inexoravelmente 202
153
anexou 200
154
sexóloga 198
155
amoxil 194
156
rtex 191
157
indexadores 191
158
fixe 190
159
maxilar 185
160
indexadas 184
161
saxão 183
162
arbex 182
163
heterodoxo 181
164
inoxidável 181
165
perplexa 176
166
texana 175
167
multiplex 173
168
influxo 171
169
dioxina 170
170
dúplex 167
171
intoxicados 166
172
oxidação 166
173
paroxetina 166
174
práxis 166
175
maxsandro 164
176
rolex 161
177
anexando 160
178
axioma 157
179
crucifixo 156
180
fixava 156
181
heterodoxa 156
182
anexadas 155
183
flexibiliza 155
184
transexuais 154
185
fixará 153
98
186
heterodoxos 151
187
prefixos 151
188
intoxicadas 150
189
saxões 149
190
desindexar 146
191
saxônia 142
192
axilas 137
193
indexar 135
194
afixada 134
195
intoxicações 133
196
lurex 128
197
nexos 127
198
complexidades 125
199
maximiliano 125
200
desoxirribonucléico 124
201
maximização 124
202
heterodoxas 122
203
dioxinas 121
204
sufixo 119
205
unissex 119
206
fixamente 118
207
afixado 117
208
anticlímax 115
209
antioxidantes 115
210
reflexivos 114
211
duplex 111
212
taxímetro 110
213
inflexões 109
214
perplexidades 108
215
profilaxia 108
216
saxofonistas 108
217
desconexas 107
218
intoxica 106
219
oxigenar 106
220
oxigenada 103
221
afixados 101
222
inflexibilidade 99
223
afixar 98
224
artex 98
225
saxofones 97
226
texanos 97
227
saxônica 96
228
asfixiado 91
229
digoxina 91
230
toxicológico 91
231
flexões 90
232
conexos 88
233
infleveis 87
234
mixado 84
235
fleo 83
236
alexia 82
237
sexista 82
238
circunflexo 81
239
fixarem 81
240
sexismo 81
241
toxoplasmose 81
242
flexibilizando 76
243
asfixiante 75
244
intoxicado 75
245
antioxidante 74
246
maxima 74
247
afixadas 73
248
heterodoxia 73
249
paradoxais 73
250
bissexualidade 72
251
toxicologia 72
252
durex 71
253
flexibilizou 71
254
mixar 71
255
fluxograma 70
256
óxidos 69
257
sufixos 68
258
alexi 65
259
assexuada 64
260
influxos 64
261
axila 63
262
convexo 63
263
fixem 63
264
intoxicou 63
265
sexagenário 63
266
fixei 62
267
crucifixos 61
268
desindexada 60
269
flexibilizado 60
270
heterossexualidade 60
271
maximiano 60
272
asfixiada 59
273
fixador 59
274
asfixiar 58
275
asfixiados 57
276
índex 57
277
indexa 57
278
toxicológica 56
279
tratex 56
280
mixórdia 55
281
transexualismo 54
282
dislexia 53
283
telessexo 53
99
284
anoréxica 52
285
toxicológicos 52
286
axiomas 51
287
desconexão 51
288
mixagens 51
289
prolixo 51
290
sexólogo 51
291
axial 50
292
desconexos 50
293
hidróxido 50
294
ônix 50
295
prefixação 49
296
remixada 49
297
sexologia 49
298
inexoráveis 48
299
roxanne 48
300
sexagenários 48
301
expolux 47
302
remixadas 47
303
botox 46
304
saxônico 46
305
toxóide 46
306
assexuado 45
307
desconexa 45
308
sexólogos 45
309
taxonomia 45
310
toxicologista 45
311
oxímoro 44
312
prolixa 44
313
superbox 44
314
anafilaxia 43
315
hexacampeonato 43
316
inexorabilidade 42
317
sexistas 42
318
mixando 41
319
marmitex 40
320
anexaram 39
321
anoréxicas 39
322
bissexualismo 38
323
desconexo 38
324
taximétrica 38
325
fixidez 37
326
vertex 37
327
ájax 36
328
astérix 36
329
axônios 36
330
fixamos 36
331
flexibilizada 36
332
praxis 36
333
toxicomania 36
334
fixasse 35
335
intoxicar 35
336
oxigenado 35
337
anexe 34
338
conexas 34
339
desintoxicar 34
340
fixações 34
341
fluxogramas 34
342
hexabanco 34
343
sexagenária 34
344
anexas 33
345
epóxi 33
346
latibex 33
347
mixadas 33
348
mototáxi 33
349
oxiteno 33
350
peróxido 33
351
perplexas 33
352
prolixidade 33
353
taxímetros 33
354
triplex 33
355
desindexou 32
356
remixado 32
357
alexsandro 31
358
apoplexia 31
359
fluxus 31
360
paroxítonas 31
361
reflexividade 31
362
remixou 31
363
sexuada 31
364
desindexados 30
365
flexibilizados 30
366
interconexões 30
367
intoxicada 30
368
mixada 30
369
mototaxistas 29
370
oxitocina 29
371
remixar 29
372
taxis 29
373
toxicômanos 29
374
xérox 29
375
contrafluxo 28
376
flexibilizadas 27
377
maximiza 27
378
ortodoxias 27
379
oxidado 27
380
oxigena 27
381
pólux 27
100
382
complexado 26
383
flexionar 26
384
maxilares 26
385
oxidase 26
386
oxidativo 26
387
pansexual 26
388
pirex 26
389
toxidade 26
390
zetax 26
391
afixação 25
392
mentex 25
393
minoxidil 25
394
ocratoxina 25
395
piridoxina 25
396
radiotáxi 25
397
asfixiantes 24
398
complexificação 24
399
maximizando 24
400
flexionadas 23
401
lexicógrafos 23
402
maximino 23
403
oxidantes 23
404
proparoxítonas 23
405
saxônicas 23
406
superindexação 23
407
assexuados 22
408
axônio 22
409
oxigenadas 22
410
oxítonas 22
411
sexualização 22
412
asfixiadas 21
413
intoxicam 21
414
onix 21
415
oxítona 21
416
paroxítona 21
417
refluxos 21
418
toxicológicas 21
419
anorexígenos 20
420
fixara 20
421
fixarão 20
422
flexionado 20
423
indexando 20
424
maxidesvalorizações
20
425
oxímoros 20
426
verax 20
427
afixou 19
428
anoréxico 19
429
anoréxicos 19
430
antitóxicos 19
431
desindexado 19
432
disléxicos 19
433
fixavam 19
434
flexibilizações 19
435
léxicos 19
436
parataxe 19
437
paroxismos 19
438
flexibilizam 18
439
heterossexualismo 18
440
oxidante 18
441
toxicômano 18
442
transexualidade 18
443
axiomática 17
444
complexada 17
445
flexionando 17
446
hexadecimal 17
447
hipóxia 17
448
intoxicaram 17
449
lexicógrafo 17
450
medroxiprogesterona
17
451
oxida 17
452
oxidar 17
453
proparoxítona 17
454
asfixiando 16
455
fixadores 16
456
flexione 16
457
hidroxicítrico 16
458
mixados 16
459
mixes 16
460
mototáxis 16
461
mototaxista 16
462
ortodoxamente 16
463
plexo 16
464
prolixas 16
465
prolixos 16
466
quiropraxia 16
467
remixando 16
468
saxônicos 16
469
sulfóxido 16
470
antimarxista 15
471
asfixiam 15
472
convexos 15
473
desindexa 15
474
indexou 15
475
inoxidáveis 15
476
intoxicante 15
477
maximize 15
478
oxidada 15
479
oxigenados 15
101
480
pansexualismo 15
481
sexagésima 15
482
sexualizada 15
483
sulfametoxazol 15
484
texanas 15
485
boxear 14
486
durepox 14
487
flexibilizaram 14
488
reconexão 14
489
sexador 14
490
toxoplasma 14
491
hepatotoxicidade 13
492
hexacampeã 13
493
intoxicando 13
494
maximizada 13
495
maximizam 13
496
máxis 13
497
norfloxacino 13
498
panex 13
499
pneumotórax 13
500
prefixar 13
501
reflexionante 13
502
reflexivamente 13
503
reflexologia 13
504
toráxica 13
505
afixa 12
506
assexuadas 12
507
axiológica 12
508
axiológico 12
509
boxeadora 12
510
bucomaxilofacial 12
511
fixadoras 12
512
flexionada 12
513
lexicografia 12
514
maximina 12
515
maximizado 12
516
meflox 12
517
prafrentex 12
518
remixados 12
519
remixagem 12
520
supergaláxia 12
521
taxonomias 12
522
toráxico 12
523
asfixiou 11
524
cineplex 11
525
complexados 11
526
conexo 11
527
fixarmos 11
528
flexiona 11
529
heterodoxias 11
530
inflexivelmente 11
531
irreflexão 11
532
maximalista 11
533
proxenetismo 11
534
sexagésimo 11
535
sexuado 11
536
sexualizadas 11
537
taxidermia 11
538
toxóides 11
539
afixando 10
540
anorexígeno 10
541
atóxico 10
542
axiomático 10
543
convexa 10
544
desintoxicado 10
545
disléxico 10
546
embriotóxicos 10
547
exobiologia 10
548
fetotóxicos 10
549
fixassem 10
550
hiperpirexia 10
551
oxidados 10
552
paralaxe 10
553
paroxística 10
554
perfex 10
555
remixa 10
556
trioxina 10
557
aflatoxinas 9
558
alexsandra 9
559
antrax 9
560
atóxica 9
561
axiomatização 9
562
carboximetilcelulose
9
563
genuflexão 9
564
hexagramas 9
565
neomarxista 9
566
oxidou 9
567
paroxístico 9
568
psicossexual 9
569
sexagenárias 9
570
sílex 9
571
taxidermista 9
572
taxonômica 9
573
afixarem 8
574
anexará 8
575
asfixiava 8
576
assexualidade 8
577
ataxia 8
102
578
circunflexa 8
579
conexa 8
580
desintoxica 8
581
fixariam 8
582
genuflexório 8
583
hex 8
584
hexaclorobenzeno 8
585
hexagrama 8
586
hiperexcitabilidade 8
587
maxilofacial 8
588
maximizados 8
589
oxidadas 8
590
oxide 8
591
oxigenando 8
592
saxes 8
593
selimax 8
594
sexualizado 8
595
sintaxes 8
596
supersexy 8
597
taxionomia 8
598
afixaram 7
599
afixos 7
600
anatoxina 7
601
anexam 7
602
anexaria 7
603
auxina 7
604
axilar 7
605
descarboxilação 7
606
desintoxicante 7
607
desoxirribonucleico 7
608
erix 7
609
fixidade 7
610
flexibilize 7
611
indexam 7
612
inexorabilidades 7
613
léxica 7
614
maxila 7
615
neomarxismo 7
616
oxidando 7
617
oxidologia 7
618
oxigenou 7
619
radiotáxis 7
620
reanexação 7
621
remixagens 7
622
sexologista 7
623
sexuadas 7
624
sexualiza 7
625
amplexo 6
626
anexei 6
627
anoxia 6
628
assexuadamente 6
629
assexual 6
630
axiais 6
631
clordiazepóxido 6
632
crucifixão 6
633
disléxica 6
634
endotoxinas 6
635
excitotoxicidade 6
636
flexibilizem 6
637
genuflexos 6
638
hexanóico 6
639
homosexual 6
640
lexicográfica 6
641
marxismos 6
642
maximiniano 6
643
maximizará 6
644
mixava 6
645
neomarxistas 6
646
neurotoxinas 6
647
neurotoxoplasmose 6
648
oxigenoterapia 6
649
pansexuais 6
650
prefixações 6
651
proxenetas 6
652
quimioprofilaxia 6
653
reflexivização 6
654
saxônio 6
655
semifixo 6
656
sexênio 6
657
sexualizar 6
658
taxonômicas 6
659
toxicologistas 6
660
toxicômana 6
661
toxicomanias 6
662
toxinologia 6
103
ANEXO B - Ficha utilizada no Experimento 1 (folha inicial)
104
ANEXO C - Ficha utilizada no Experimento 2
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