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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
A LITURGIA NO CONTEXTO URBANO:
APONTAMENTOS PARA A PRÁXIS PASTORAL NA
COMUNIDADE DE HELIÓPOLIS
Por
Oswaldo de Oliveira Santos Junior
São Bernardo do Campo dezembro de 2006
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1
UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
A LITURGIA NO CONTEXTO URBANO:
APONTAMENTOS PARA A PRÁXIS PASTORAL NA
COMUNIDADE DE HELIÓPOLIS
Por
Oswaldo de Oliveira Santos Junior
Dissertação apresentada em cumprimento
parcial às exigências do Programa de
Pós-Graduação em Ciências da Religião
da Universidade Metodista de São Paulo,
para obtenção do grau de Mestre, sob a
orientação do Prof. Dr. Geoval Jacinto da
Silva.
São Bernardo do Campo dezembro de 2006
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Banca Examinadora
Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva
Universidade Metodista de São Paulo U
MESP
Prof. Dr. Clóvis Pinto de Castro
Universidade Metodista de São Paulo
U
MESP
Prof. Dr. José Rubens Lima Jardilino
Centro Universitário Nove de Julho U
NINOVE
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Para o André Felipe,
expressão da alegria e da esperança.
In memorian:
Zoraide de Lima Santos e
Oswaldo de Oliveira Santos,
Saudade e inspiração para as lutas do cotidiano.
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... toda ação principia mesmo é por
uma palavra pensada.
(João Guimarães Rosa)
Que o direito corra como as águas e a
justiça como um rio caudaloso!
(Livro do profeta Amós 5.24)
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AGRADECIMENTOS
Aqui eu me detenho para agradecer, e repetir Violeta Parra: Gracias a la
vida que me ha dado tanto.... Me dado amigos e amigas, porque a vida se faz em
comunhão. Agradeço pelo companheirismo e pelos gestos solidários que me
sustentaram e incentivaram nesta jornada tornando-a leve e possível. A todos e
todas o meu sincero agradecimento.
Ao Professor Dr. Geoval Jacinto da Silva, pastor que é a expressão do
cuidado, amigo sempre presente, orientador firme e dedicado, para quem todo
tempo é tempo de ensinar e incentivar a seguir pesquisando.
Aos Professores: Dr. Antonio Carlos de Melo Magalhães, Dr. James
Reaves Farris, Dr. Ronaldo Sathler Rosa, e Dr. Clóvis Pinto de Castro, pelas
aulas e motivação para a pesquisa.
Aos amigos e amigas, irmãos da Igreja Metodista no Ipiranga e Heliópolis,
pela acolhida fraterna e companheira.
Ao André Felipe e Denise Martins pela paciência na minha ausência e
carinho sempre presente.
Aos amigos Márcio Bérgamo e Marciano Kappaun pelas conversas e pelos
livros emprestados.
Ao IEPG Instituto Ecumênico de Pesquisa em Pós-graduação pela
bolsa de estudos parcial que contribuiu para a realização desta pesquisa.
Aos funcionários da UNAS na Comunidade de Heliópolis, pela atenção e
paciência no atendimento durante a pesquisa.
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SANTOS JR., Oswaldo de Oliveira. A liturgia no contexto urbano: apontamentos
para a práxis pastoral litúrgica na comunidade de Heliópolis. São Bernardo do
Campo, 2006. 161 f. Dissertação em Ciências da Religião Práxis religiosa e
sociedade. Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2006.
RESUMO
Esta pesquisa propõe-se a analisar a liturgia no contexto urbano, e a forma como
a práxis pode influir e se articular com a liturgia cristã construída na cidade,
especialmente em áreas empobrecidas e que experimentam as contradições
resultantes de um modelo econômico excludente e concentrador de renda. Assim,
a pesquisa busca apontar para o desenvolvimento da práxis pastoral litúrgica,
tendo como espaço de referência a área da Comunidade de Heliópolis, São
Paulo, a segunda maior favela do Brasil. A práxis é a atividade reflexiva e material
do ser humano, isto é, ação transformadora que deve insistir na opção
preferencial pelos pobres e excluídos. A pastoral litúrgica que tenha o seu
referencial na práxis irá, portanto, criar ações que animem as esperanças do povo
que celebra, favorecendo a organização e a sensibilização para as lutas sociais
necessárias para a superação da exclusão, devolvendo a dignidade aos seres
humanos. A pesquisa se desenvolve em três etapas: primeiramente, buscam-se
as conceituações teóricas de práxis e urbanizações; em segundo lugar, se analisa
o caminho da ocupação da área de Heliópolis; e por último os apontamentos para
a práxis pastoral litúrgica no contexto urbano. O resultado será um conjunto de
referenciais gerais históricos e teóricos capazes de sustentar uma pastoral
litúrgica que contribua para as esperanças humanas e a criação de um novo
paradigma de sociedade fundamentado na justiça e na igualdade.
Palavras-chave: liturgia fé esperança práxis urbanização Heliópolis
cidadania globalização.
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SANTOS JR., Oswaldo de Oliveira. Liturgy in an urban context: directions
for pastoral liturgical praxis in the community of Heliópolis. São Bernardo do
Campo, 2006. 161 f. Masters dissertation in Religious Sciences Praxis and
Society. Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2006.
ABSTRACT
This research proposes to analyze liturgy in an urban context, and the form
in which praxis can influence and articulate itself in terms of Christian liturgy
constructed in urban contexts, especially in poor areas that experience the
contradictions that result from an economic model that excludes and concentrates
wealth. As such, the research seeks to point out the development of pastoral
liturgical praxis, specifically in the context of the Community of Heliópolis, São
Paulo, which is the second largest slum in Brazil. Praxis is human reflexive and
material activity, which means that it is transformative action that should insist on a
preference for the poor and excluded. Liturgical pastoral action that has praxis as
its point of reference will, as such, act in ways that animate the hopes of people
that celebrate, favor organization and sensibility for social awareness that are
necessary for overcoming exclusion, and develop the dignity of human beings.
The research presents itself in three moments: first, theoretical conceptions of
praxis and urbanization; second, an analysis of the area of Heliópolis, and; third,
indications for liturgical pastoral praxis in an urban context. The result is a
combining of general historical and theoretical references that support liturgical
pastoral practice that contribute to human hopes and the creation of a new
paradigm of society based on justice and equality.
Key Words: Liturgy, faith, hope, praxis, urbanization, Heliópolis, citizenship,
globalization.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................12
CAPÍTULO I
Concepções teóricas que norteiam a práxis pastoral e a urbanização .....................20
1.1. A questão urbana em Milton Santos e Manuel Castells: delimitações e a
complexidade do conceito.........................................................................................21
1.1.1. Milton Santos e a questão urbana...................................................................21
1.1.2. O processo de urbanização: as bases da urbanização brasileira ...................27
1.1.3. A urbanização coorporativa.............................................................................28
1.1.4. Urbanização: emergência de uma cultura urbana ........................................29
1.2. A cidadania (privada) nas cidades brasileiras....................................................32
1.3. Concepções de práxis........................................................................................38
1.3.1. Gramsci e a filosofia da práxis ........................................................................41
1.3.2. Feuerbach: a práxis abstrata...........................................................................44
1.3.3. A concepção marxista de práxis......................................................................46
1.3.4. A práxis em Casiano Floristán.........................................................................49
CAPÍTULO II
Heliópolis: caminhos da ocupação ............................................................................54
2.1. São Paulo: produção do espaço urbano ............................................................55
2.1.1. Alterações do paradigma econômico ..............................................................55
2.1.2. Esgotamento do padrão periférico ..................................................................59
2.1.3. As lutas populares por moradia.......................................................................61
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2.2. A Comunidade de Heliópolis: características físicas e humanas .......................69
2.2.1. A comunidade de Heliópolis: luta por moradia e regularização fundiária ........74
2.2.2. Heliópolis e o poder público municipal ............................................................76
2.2.3. Heliópolis na gestão Reynaldo de Barros (1979 1983) .................................78
2.2.4. Heliópolis na gestão Mario Covas (1983-1986):..............................................81
2.2.5. Heliópolis na gestão Jânio Quadros (1986- 1988): a luta pelo mutirão ...........86
2.2.6. UNAS: um marco na história da organização popular em Heliópolis ..............88
CAPÍTULO III
Apontamentos para uma práxis pastoral litúrgica no contexto urbano ......................97
3.1. Considerações para a reflexão sobre a práxis pastoral litúrgica ........................98
3.1.1. Linguagem e religião: a religião e o trabalho de organização popular ............98
3.1.2 Um Mundo sinalizado pela esperança .............................................................103
3.1.3 A práxis pastoral para o contexto Urbano ........................................................106
3.1.4 A fé: preocupação última que move o povo .....................................................109
3.1.5 A perda dos centros referenciais na cidade: a privatização da fé ....................113
3.1.6 A questão da secularização ............................................................................115
3.2 A igreja no contexto urbano.................................................................................117
3.2.1 Desafios para a práxis pastoral: A cidade de São Paulo..................................121
3.2.2 Pastoral litúrgica para o contexto urbano.........................................................127
3.3 Liturgia: serviço feito para o povo........................................................................127
3.3.1 Famílias litúrgicas clássicas .............................................................................130
3.3.2 A inculturação litúrgica .....................................................................................133
3.3.3 Práxis litúrgica ..................................................................................................136
3.4 Desafios para a práxis pastoral litúrgica em Heliópolis .......................................138
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3.4.1 Elementos para uma práxis pastoral litúrgica...................................................141
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................146
REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA...............................................................................151
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INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas do século XX, a sociedade urbana ocidental
experimentou simultaneamente o enfraquecimento da religiosidade
institucionalizada e o retorno ao sagrado com práticas bastante diferenciadas. O
tema Liturgia cristã tem sido abordado por diversos pesquisadores, em áreas
distintas do conhecimento e com objetivos variados na teologia, na sociologia, na
história, na filosofia, ciências da religião e outras ciências.
Toda liturgia cristã surge num determinado contexto histórico e espacial, e
é influenciada pela cultura ao mesmo tempo em que influi também sobre ela com
sua ética e visão de mundo. Não existe neutralidade por parte das práticas
litúrgicas sobre as questões do cotidiano humano, como economia, política e as
relações humanas, através das práticas litúrgicas estão expressos os desejos
humanos para este mundo, ainda que o referencial seja uma realidade para além
desta.
A celebração litúrgica é a expressão da vida de uma comunidade, nela o
ser humano busca fortalecer a esperança e refletir sobre o sentido da vida e as
motivações para as suas lutas históricas. Na América Latina, dada a forte
religiosidade dos povos, as manifestações litúrgicas (festas, ritos, etc.) possuem
importância vital para o povo, isto porque povos que são profundamente religiosos
pensam religiosamente, especialmente quando enfrentam situações de crise
pessoal ou coletiva, em relação ao seu futuro.
1
A liturgia pode em certa medida ser considerada como o coração da vida
das comunidades cristãs, contudo uma liturgia que ignore as causas mais
1
SANTA ANA, Júlio. Pelas trilhas do mundo, a caminho do reino. São Bernardo do Campo:
Imprensa Metodista, 1984, p. 11.
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profundas dos dilemas humanos torna-se deficiente e incapaz de contribuir para a
superação das crises que afetam a comunidade.
2
As práticas litúrgicas
decorrentes desta deficiência em ler a realidade, tornam-se repetitivas e
alienantes e tendem a uma elaboração que repete as práticas da sociedade, em
consonância com os desejos hedonistas do ser humano.
Decorre destas práticas litúrgicas deficientes e adoecidas, a falta de
compromisso social e político de muitas comunidades cristãs, e por sua vez a
acusação de que as igrejas cristãs têm sido omissas frente aos grandes eventos
que decidem o destino da humanidade, como as guerras, a globalização
neoliberal, as questões da terra e da moradia.
3
Visto desta forma, as liturgias cristãs, quando desprovidas de teoria social,
e de uma teologia que faz da experiência com o Deus encarnado o seu norte,
tendem a repetir as práticas que prevalecem na sociedade atual: o fatalismo
sedutor que elimina a esperança humana e sepulta as práticas comunitárias de
solidariedade e fraternidade, assumindo uma lógica destrutiva e individualista,
impossibilitada de dar um salto das práticas comuns e repetitivas para a práxis
transformadora e criativa. Neste contexto, as comunidades cristãs vivem as
tensões de acreditar numa sociedade em que o ideal de vida é que cada qual
persiga seu interesse particular no mercado capitalista, e jamais contra ele
4
ou
insistir nas ações concretas de solidariedade e ajuda mútua, em contraposição à
lógica da competição que vem promovendo a destruição dos laços comunitários.
A liturgia cristã necessita, portanto, de um permanente aprofundamento
teológico e de leitura da realidade com o objetivo de renovar as celebrações,
permitindo que elas permaneçam com seu conteúdo profético, isto é,
fundamentada na esperança cristã e no ideal de libertação dos oprimidos,
portadora de uma força mobilizadora e transformadora da sociedade urbana.
2
BUYST, Ione. O mistério celebrado: memória e compromisso. Vol. I. São Paulo: LBT / Siquem
Ediciones, 2002, p. 11.
3
VELASQUES FILHO. Prócoro. A construção de uma sociedade justa e fraterna. São Bernardo do
Campo: IMS Cadernos de Pós-Graduação, Ciências da religião nº. 2, 1983, p. 7.
4
HINKELAMMERT, Franz J. Pensar em alternativas: capitalismo, socialismo e a possibilidade de
outro mundo. In: DUSSEL, Enrique (et al). Por um mundo diferente: alternativas para o mercado
global. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 11.
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Ao buscar sua fundamentação na filosofia da práxis, a pastoral litúrgica
encontra meios para a elaboração de celebrações capazes de favorecer uma
visão de mundo diferente, alternativa e profética, em oposição às lógicas
excludentes que exploram os seres humanos, especialmente os moradores das
periferias das grandes cidades.
As cidades constituem-se nos agrupamentos mais dinâmicos e complexos
que a humanidade produziu. Todo tipo de contradição e conflito se estabelece nas
cidades. A complexidade do contexto urbano faz muitas vezes afirmar que
existem muitas cidades se inter-relacionando num mesmo espaço. A vida na
cidade possibilita o surgimento de uma cultura urbana caracterizada pela
desorganização e complexidade social e cultural. Neste ambiente surgem as
iniciativas individualistas e a forte competição entre os indivíduos é quase
inevitável. Os laços familiares e comunitários tornam-se frágeis. Em uma análise
inicial, se observa que na liturgia presente no contexto urbano, há a presença dos
valores desta sociedade urbana: a fragmentação e o individualismo, assim como
a busca de satisfação material.
A globalização neoliberal, trouxe implicações e desafios para as práticas
litúrgicas no contexto urbano. O indivíduo urbano, através das diferentes
expressões litúrgicas, manifesta a sua relação com o sagrado de forma
heterogênea. Frente a estas questões, a proposta desta pesquisa é analisar a
práxis litúrgica no contexto urbano, e apontar ações para uma práxis pastoral
neste espaço, observando particularmente a maior favela da Cidade de São
Paulo, a Comunidade de Heliópolis.
A hipótese que orienta esta pesquisa é que a práxis pastoral litúrgica, no
contexto urbano (tendo como campo de pesquisa a Comunidade de Heliópolis),
favorece a organização e a sensibilização do seres humanos para as questões
sociais presentes em seu contexto histórico, e motiva para o exercício da
cidadania, possibilitando assim a superação das práticas esvaziadas de reflexão
política e social.
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A pesquisa está estruturada em três capítulos. O primeiro trata das
concepções teóricas sobre a urbanização e a filosofia práxis. Aborda a questão da
urbanização a partir das concepções de Milton Santos e Manuel Castells, dado
que os dois pesquisadores oferecem uma contribuição importante para a
compreensão do fenômeno urbano. Ainda no primeiro capítulo se desenvolve
uma pesquisa sobre o desenvolvimento histórico do conceito de práxis e as
concepções de práxis que irão nortear a pastoral litúrgica. Para tanto, são
abordadas as elaborações propostas por Antonio Gramsci, Feuerbach, Karl Marx
e Casiano Floristán.
Em sua de práxis filosófico-político, Gramsci, amplia a noção de cidadania,
dando a todos os seres humanos a possibilidade concreta de se tornarem sujeitos
políticos capazes de conduzir em comunhão a democracia, de serem
organizadores de todas as atividades e funções ao desenvolvimento orgânico de
uma sociedade integral, civil e política.
5
Esta concepção de práxis possibilita a
reflexão e construção de um projeto de democracia popular e ações de
solidariedade.
Na elaboração de Feuerbach, existe uma oposição entre religião e práxis,
visto que a religião para ele é somente prática, sua principal contribuição é a de
colocar o ser humano como sujeito que transforma e não o espírito.
Marx, por sua vez compreende a práxis como atividade revolucionária,
questionadora e inovadora, ou seja, numa atividade crítico-prática, sendo a
atividade concreta pelas quais os seres humanos se afirmam no mundo,
transformando a realidade objetiva, modificando-se a si mesmos. É uma atividade
que necessita, portanto, de reflexão, do conhecimento de si, da teoria que remete
à ação e a avalia permanentemente.
Por fim em Floristán se identifica que os traços característicos da práxis
estão presentes, quando afirma que práxis é atividade humana que se desenvolve
como ação criadora, reflexiva, transformadora e radical (revolucionária).
5
SEMERARO, Giovanni. Gramsci e os novos embates da filosofia da práxis. São Paulo: Idéias &
Letras, 2006, p. 192.
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O segundo capítulo aborda o campo de pesquisa: o processo histórico que
levou à ocupação, à resistência e organização da área onde se localiza a
Comunidade de Heliópolis. Para tanto se desenvolve uma pesquisa histórica
sobre a produção do espaço urbano na cidade de São Paulo entre os anos de
1970 até 1990, analisando as relações da comunidade com o poder público, as
lutas por habitação. Desta forma o capítulo aborda a constituição da Comunidade
de Heliópolis tendo como referencias os impasses e conflitos estabelecidos nas
relações com as gestões municipais em momentos históricos distintos, que foram
as gestões municipais dos prefeitos Reynaldo de Barros, Mário Covas e Jânio
Quadros, considerando que estes três momentos tiveram uma grande importância
no processo de ocupação, resistência e organização dos moradores. A pesquisa
se limita a estes três momentos por compreender que são fundamentais da
estruturação da comunidade.
O terceiro aborda a questão da práxis pastoral litúrgica no contexto urbano,
compreendendo que a religião, por meio das suas ações, pode contribuir para
motivar as pessoas nas lutas sociais. Esta etapa da pesquisa busca elementos
para uma liturgia que favoreça as ações transformadoras, não-reformistas,
radicais e libertadoras, ou seja, busca apontar para as práxis pastorais litúrgicas
no contexto urbano, a partir dos elementos estudados nos capítulos anteriores
sobre a urbanização, a práxis e a constituição da Comunidade de Heliópolis.
Para o desenvolvimento deste capítulo são elaboradas considerações que
favoreçam a reflexão e apontem para uma práxis litúrgica no contexto urbano.
Para tanto, é proposto um resgate da teologia da esperança elaborada por Jürgen
Moltmann, como um dos eixos norteadores da práxis litúrgica, considerando que
para ele, a esperança cristã se cumpre não pela especulação mas na práxis, em
meio à ação política e a revolução, sendo uma atividade criativa do ser humano.
Outro aspecto relevante discutido no terceiro capítulo é a liturgia, a partir
das questões das famílias litúrgicas, da inculturação e da práxis litúrgica,
encerrando com uma reflexão sobre os desafios para a práxis litúrgica na
Comunidade de Heliópolis.
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Os três capítulos desenvolvidos se articulam com o objetivo de analisar a
práxis pastoral litúrgica no contexto urbano, e se orientam pelo método histórico-
crítico.
Conforme comenta Eva Maria Lakatos, o método histórico:
(...) consiste em investigar acontecimentos, processos e
instituições do passado para verificar a sua influência na
sociedade de hoje, pois as instituições alcançaram sua forma atual
através de alterações de suas partes componentes, o longo do
tempo, influenciadas pelo contexto cultural particular de cada
época
6
.
Podemos observar, ainda, que o método histórico-crítico, trata da pesquisa
histórica e investigação do passado a partir da análise crítica da construção da
sociedade.
Contribui também para a compreensão do método histórico, o historiador
Michel De Certeau, que afirma que:
(...) a produção do historiador, portanto, deveria ser considerada
(...) como a relação entre um lugar (um recrutamente, um meio,
um ofício, etc.), procedimentos de análise (uma disciplina) e a
construção de um texto (uma literatura). É admitir que ela faz parte
da realidade de que trata, e essa realidade pode ser
compreendida como atividade humana, como prática. Nessa
perspectiva, (...) a operação histórica se refere à combinação de
um lugar social, de práticas científicas e de uma escrita.
7
Contudo para Certeau, o pesquisador não se contenta em simplesmente
traduzir uma linguagem cultural para outra. Ele afirma também que todo fato
histórico resulta de uma práxis, porque ela é signo de um ato e, portanto, a
afirmação de um sentido.
8
Certeau enfatiza que o pesquisador produz seu trabalho a partir do
presente, das inquietações e preocupações de sua realidade, fazendo de sua
produção algo muito particular, que tem um emissor, o próprio pesquisador, e um
6
LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Maria de Andrade. Metodologia Científica. São Paulo: Atlas,
1983. p. 79.
7
DE CERTEAU, Michael. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense universitária, 1982, p. 65-
80.
8
Idem, p. 41.
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destinatário, que pode ser a academia, a sociedade de forma geral ou um grupo
específico. Essa discussão implicou numa constatação vital para ele, não se pode
falar de uma verdade, mas de verdades (no plural).
9
É importante ressaltar, ainda, que na Comunidade de Heliópolis conta com
a presença da Igreja Metodista, que iniciou suas atividades na Comunidade na
década de 1980, com o apoio da família Meca
10
, moradores do Heliópolis e
membros da Igreja Metodista no Ipiranga, as atividades desde o início foram
dirigidas às crianças do bairro, sendo a principal ação na área da educação. Irany
Tenório de Albuquerque relata assim o início das atividades em Heliópolis:
O trabalho no Heliópolis começou na década de 80, com a família
Luiz Carlos Meca e Djalma Meca. Eles moravam na favela do
Heliópolis treze anos e desde então frequentavam a Igreja no
Ipiranga. Três anos depois que para mudaram perceberam que
as crianças precisavam de uma boa formação cristã para que não
crescessem influenciadas por aquele meio (sic.). com isso eles
passaram a levar as crianças com a autorização dos pais, à igreja
no Ipiranga. Levavam em média 18 crianças. (...). Somente após
cinco anos (...) percebe-se a necessidade de um veículo para
buscar as crianças na favela, e aluga-se uma perua para fazer o
trajeto
11
.
A organização do Ponto Missionário ocorreu no início de 1991 na Rua
Salvador Pinto, e mais tarde transferido para a Rua Edivaldo Amaral 42-a, e
atualmente no número 56 da mesma rua, em um local alugado, distante
aproximadamente 7 km da Igreja no Ipiranga.
9
MASSARÃO, Leila Maria. Michel de Certeau e a Pós-Modernidade: ensaio sobre pós-
modernidade, História e impacto acadêmico. UNICAMP / História - e-história,
http://www.historiaehistoria.com.br. Acesso em 20/11/2006.
10
A família é composta por quatro pessoas Sra. Djalma, Sr. José Meca, Fabiana e Fernando.
Atualmente participam das atividades neste espaço mais de 30 famílias, com uma participação
superior a 100 pessoas atendidas pelas diferentes atividades desenvolvidas, por pastores,
seminaristas e profissionais da educação e outras áreas.
11
ALBUQUERQUE, Irany Tenório. Perspectivas para uma pastoral urbana: estudo de caso da
experiência pastoral na favela Heliópolis. São Bernardo do Campo. Universidade Metodista
(UMESP), 2000, trabalho monográfico de conclusão do curso de bacharel em teologia, p. 42.
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19
Neste espaço são realizadas as celebrações e atividades pedagógicas com
as crianças e os adultos, tais como reforço escolar e recreação. O espaço, por ser
uma iniciativa de uma Igreja de missão
12
, leva em suas práticas alguns desafios
frente aos movimentos religiosos emergentes, que se movimentam
administrativamente e teologicamente de forma diversa das denominadas Igrejas
de missão. O desafio é o de uma práxis litúrgica e pastoral que supere o discurso
religioso em voga, com fortes tendências individualistas e proponha ações
comunitárias, libertadoras e uma socialmente responsável, atendendo e
observando as questões sociais presentes no contexto da comunidade. No
entanto este trabalho de pesquisa não aborda especificamente questões
relacionas a esta comunidade no que diz respeito à liturgia, não obstante se
encontre também como referencia para as reflexões que se fazem no decorrer do
trabalho de pesquisa.
12
Protestantismo de missão: O missionário vindo do exterior realizava no Brasil a atividade
missionária, buscando promover a experiência religiosa a partir da sua denominação, sendo
apoiado normalmente pelas Sociedades Bíblicas. Dentro dessa perspectiva, podemos citar, a
Igreja Metodista, a Igreja Presbiteriana, a Igreja Batista, e a Igreja Congregacional. O atual
protestantismo brasileiro de origem missionária ainda é conversionista. MENDONÇA, Antonio G.
Introdução ao protestantismo no Brasil. São Paulo, Loyola, 1990, pp. 33.
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20
CATULO I
CONCEPÇÕES TEÓRICAS QUE NORTEIAM A PRÁXIS
PASTORAL E A URBANIZAÇÃO
O propósito desta primeira etapa da pesquisa sobre a práxis no contexto
urbano, é o de analisar as concepções teóricas que orientam esta pesquisa no
que diz respeito à práxis, e as questões urbanas. Estes pressupostos teóricos
devem favorecer e fundamentar as hipóteses que levantamos nesta pesquisa, ou
seja, que a urbanização trouxe implicações e elementos novos para os diversos
grupos que compõem a sociedade e; que as celebrações (as liturgias)
possibilitam o desenvolvimento da práxis neste contexto urbano.
A sociedade atual é, dentre outras questões, marcada pela ruptura com a
forma de ler e explicar o mundo. As características fundamentais são a
fragmentação e o subjetivismo que se desenrolam na vida social urbana. Os
padrões culturais e religiosos desaparecem surgindo múltiplas expressões e
manifestações que m impacto direto sobre o sujeito religioso e suas práticas.
Conforme comenta Ronaldo Sathler-Rosa, vivemos um tempo de
impermanências. Relações afetivas são rompidas como se os seres humanos não
tivessem capacidade de cuidar das dificuldades próprias de qualquer
relacionamento próximo.
13
A pesquisa objetiva compreender a práxis e as práticas celebrativas, e
pretende contribuir para favorecer a reflexão sobre novas práxis litúrgicas em uma
sociedade marcada por manifestações culturais e artísticas diversificadas como a
brasileira. Desta forma, fica assinalado o objetivo de, neste primeiro capítulo,
desenvolver estes apontamentos teóricos sobre a questão urbana e a práxis.
13
SATHLER-ROSA, Ronaldo. Cuidado pastoral em tempos de insegurança: uma hermenêutica
teológico-pastoral. São Paulo: Aste, 2004, p. 19.
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21
1.1. A questão urbana em Milton Santos e Manuel Castells:
delimitações e a complexidade do conceito
Ao analisar a questão urbana, imediatamente o que se observa é a
complexidade do conceito e a sua extensão. Disto resulta a necessidade de
delimitar, quanto aos teóricos, à abrangência dos estudos realizados e apontar a
partir de quais conceitos, a pesquisa inicia sua trajetória.
Assim, a pesquisa busca caminhar a partir dos conceitos de urbanização
propostos por Milton Santos e Manuel Castells, por compreender que existem
nestes dois pesquisadores elementos suficientes que permitem sustentar um
estudo e pesquisa sobre a questão urbana. Milton Santos desenvolve uma teoria
de grande importância sobre o desenvolvimento urbano nos países pobres, em
sua obra O espaço dividido de 1975, e em Manuel Castells é possível destacar
seu importante papel no desenvolvimento da sociologia urbana, onde descreve
uma significativa importância para a participação dos movimentos sociais na
construção, por vezes conflitiva, da paisagem urbana e da sociedade.
1.1.1. Milton Santos e a questão urbana
A partir de Milton Santos observa-se que a abordagem teórica da
urbanização, experimentou ao longo do tempo sérios problemas em seu
desenvolvimento, dentre eles: o fato de que os trabalhos realizados nos países
subdesenvolvidos foram feitos por estrategistas pouco preocupados em pesquisar
profundamente a dinâmica espacial urbana destes países e também porque estes
estudos não consideraram, por desconhecimento, as conseqüências profundas do
período tecnológico sobre a organização do espaço, em especial a partir de
1960
14
.
14
SANTOS, Milton. Espaço dividido. São Paulo: EDUSP, 2002, p. 20.
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22
Santos aponta para a realidade na qual a urbanização nos países
denominados subdesenvolvidos possui uma particularidade na sua evolução em
relação aos paises desenvolvidos. Ele afirma que:
Essa especificidade aparece claramente na organização da
economia, da sociedade e do espaço e, por conseguinte, na
urbanização, que se apresenta como um elemento numa
variedade de processos combinados
15
.
Parte desta complexidade na organização espacial dos países pobres tem
sua origem no fato de que suas economias se organizam para atender interesses
externos e distantes, desta forma Santos afirma que:
Enfim, o espaço dos países subdesenvolvidos é marcado pelas
enormes diferenças de renda na sociedade, que se exprimem, no
nível regional, por tendência à hierarquização das atividades e, na
escala do lugar, pela coexistência de atividades de mesma
natureza, mas de níveis diferentes.
[...]
O comportamento do espa
ço acha-se assim afetado por essas
enormes disparidades de situação geográfica e individual
16
.
A maioria dos estudos sobre a urbanização se preocupa mais com os
efeitos do que com as suas causas históricas, sociológicas e econômicas.
Fazendo inclusive que, boa parte destes estudos, fique reduzido às estatísticas
matemáticas, como é o caso do IBGE
17
no Brasil, que concentra o estudo da
geografia às estatísticas matemáticas e tabulações de dados, que são
importantes fontes para o mercado e para a pesquisa em geral. Por isso Santos
afirma que:
O estudo da história dos países subdesenvolvidos permite revelar
uma especificidade de sua evolução em relação às dos países
desenvolvidos. Essa especificidade aparece claramente na
organização da economia, da sociedade e do espaço e, por
conseguinte, na urbanização, que se apresenta como um
15
Idem, p. 19.
16
Idem, p. 21.
17
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Responsável por recolher dados estatísticos sobre
a população e a dinâmica econômica brasileira.
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23
elemento numa variedade de processos combinados.
18
A partir do estudo da história, constata-se que não existem países em
desenvolvimento, mas sim países subdesenvolvidos, que participam do sistema
capitalista a partir da periferia, servindo aos interesses dos países do centro
(desenvolvidos). Esta característica possui sérias implicações na construção do
espaço geográfico dos países subdesenvolvidos, que é marcado por grandes
diferenças de renda na sociedade.
19
Visando uma maior compreensão da organização do espaço, Santos
propõe a divisão do espaço geográfico em dois circuitos econômicos: o circuito
superior e o circuito inferior.
20
Estes dois circuitos estão interligados, sendo que o
circuito superior faz uso de tecnologia de ponta e capital intensivo enquanto o
circuito inferior faz uso do trabalho intensivo e baixo desenvolvimento
tecnológico
21
. Por isso Santos adverte que a cidade não pode ser compreendida
como uma máquina única, mas como uma relação entre estes dois circuitos
22
.
Em A urbanização brasileira
23
, Santos, descreve de forma mais específica
a questão da urbanização no Brasil. Como ele mesmo descreve, o livro é uma
síntese da urbanização brasileira a partir da visão de um geógrafo,
compreendendo, portanto a urbanização como um processo, forma e conteúdo
muito específicos. Assim, o Brasil alcança a urbanização da sociedade e do
espaço somente em meados do século XX, tendo sido primeiramente uma
18
SANTOS, Milton, op.cit., p. 19.
19
Idem, p. 21.
20
O circuito inferior é formado de atividade de pequena escala, servindo, principalmente, à
população pobre; ao contrário do que ocorre no circuito superior, essas atividades estão
profundamente implantadas dentro da cidade, usufruindo de um relacionamento privilegiado com a
sua região. O circuito superior inclui bancos, comércios de exportação e importação, indústria
urbana moderna, comércio e serviços modernos, bem como comércio atacadista e transportes.
Esses dois últimos elementos formam os elos que existem que ligam os dois circuitos, o atacadista
operando também no topo do circuito inferior. O circuito inferior é formado essencialmente de
deferentes tipos de pequeno comércio, e da produção de bens manufaturados de capital não
intensivo, constituída em grande parte de artesanato e também de toda uma gama de serviços
não modernos (SANTOS, Milton. Pobreza Urbana. São Paulo: Hucitec,1998, p.39).
21
SANTOS, Milton, op.cit., p. 43.
22
Idem, p. 55.
23
SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. 5ª ed. São Paulo: EDUSP, 2005.
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24
urbanização litorânea e somente mais tarde se expandindo para o restante do
território brasileiro
24
.
Logo nos seus primórdios a cidade torna-se um pólo de pobreza, ou seja:
o lugar com mais força e capacidade de atrair e manter gente pobre, ainda que
muitas vezes em condições subumanas
25
. Isto deriva do fato de que
paralelamente ao processo de industrialização
26
, houve uma saída forçada da
população das regiões agrícolas em direção à cidade, e esta indústria se
desenvolveu com um número reduzido de empregos em comparação ao grande
contingente populacional que migrava do campo, o que tornou as cidades
brasileiras um grande teatro de conflitos crescentes
27
e complexos, exigindo
que a busca de soluções seja também bastante abrangente.
Na produção de Santos existe a clara intenção de propor uma teoria da
urbanização brasileira, e nisto reside a importância de sua considerável produção
acadêmica. Ele propõe essa teoria a partir da periodização e da análise histórica
e sociológica da sociedade brasileira.
O processo de urbanização
28
no Brasil torna-se mais visível a partir do
século XVIII, com a transferência da moradia dos grandes fazendeiros para as
cidades, entretanto esse processo é bastante tímido, sendo que a expansão da
agricultura comercial e a exploração mineral foram a base de um povoamento
29
.
Este período é denominado por Santos como processo pretérito de criação
urbana
30
, o que vai acompanhar todo o processo de urbanização no Brasil.
24
Idem, p. 44.
25
Idem, p. 10.
26
Compreende-se o processo de industrialização conforme exposto por Milton Santos, como um
processo social, político e econômico bastante complexo, o que inclui também a formação de um
mercado nacional e o consumo em diversos níveis, impulsionando o crescimento urbano e criando
pólos de atração populacional. Assim não é tão somente a criação de indústrias em determinados
lugares. (cf. SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. 5ª ed. São Paulo: EDUSP, 2005, p. 30).
27
SANTOS, Milton, op.cit., p. 11.
28
O Brasil experimentou três etapas de organização populacional em seu processo de
urbanização: aglomeração (com o aumento dos núcleos com mais de 20 mil habitantes), depois
concentração (com a multiplicação de cidades de tamanho intermediário) e por fim metropolização
(com o surgimento e aumento das cidades milionárias, como São Paulo e Rio de Janeiro).
SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. 5ª ed. São Paulo: EDUSP, 2005, p.77.
29
Idem, p. 22.
30
Idem, ibid.
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25
Mais tarde no século XIX, com a produção do café no Estado de São
Paulo, este propicia a acumulação de capitais necessários para a geração da
dinâmica industrial que veio logo a seguir, e que foi um novo fator no processo de
urbanização da região sudeste do Brasil, particularmente São Paulo.
Um segundo momento apontado por Santos ocorre entre 1940 e 1980, que
é quanto se dá efetivamente uma mudança do quadro populacional brasileiro, e
se consolida definitivamente a urbanização brasileira. Observando que a taxa de
urbanização em 1940 era de 26,35% e em 1980 já alcançava 77%, desta forma, a
população urbana brasileira se multiplica por sete vezes e meia
31
durante este
período.
O processo não foi linear e gradativo durante os anos 1940 a 1980, é
possível notar que entre 1960 e 1980 o crescimento da população urbana teve um
aumento de cerca de cinqüenta milhões de novos habitantes, algo parecido ao
total da população brasileira em 1950
32
.
Diante desta questão Santos afirma que:
Os anos 60 marcam um significativo ponto de inflexão. Tanto no
decênio entre 1940 e 1950, quanto entre 1950 e 1960, o aumento
anual da população urbana era, em números absolutos, menor
que o da população total do país
33
.
No entanto o crescimento urbano brasileiro não representou
necessariamente uma organização espacial em que a igualdade e a justiça
sociais fossem referencias marcantes, antes, a complexa organização territorial e
urbana do Brasil guarda profundas diferenças entre suas regiões
34
. A região
sudeste, por exemplo, experimentou um crescimento urbano e um
desenvolvimento das cidades muito mais acentuado que das regiões norte e
nordeste, é certo que este crescimento foi acompanhado, do que Santos
denominou macrocefalia urbana
35
, gerando nas grandes cidades da região
31
Idem, p. 31.
32
Idem, p. 32.
33
Idem, ibid.
34
Idem, p. 63.
35
Crescimento desordenado das cidades, sem que o mesmo seja acompanhado de políticas
públicas que possibilitem a inserção das populações aos sistemas de saúde, educação, habitação,
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26
sudeste espaços em que a população passou a conviver com a pobreza crônica e
a falta de equipamentos públicos suficientes para atender suas demandas
básicas, como creches, hospitais e escolas.
A forte concentração industrial no sudeste e de serviços na faixa litorânea
possibilitou a concentração populacional no Brasil, e os grandes vazios
demográficos no interior do país, como no Mapa abaixo, que demonstra a
concentração demográfica em toda a faixa litorânea do território brasileiro.
Fonte: Mapa da densidade demográfica brasileira (2000) IBGE
transporte e outros. Este fenômeno está intimamente relacionado ao processo de organização
econômica dos países pobres, que possuem sua economia orientada para atender aos interesses
externos.
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1.1.2. O processo de urbanização: as bases da urbanização brasileira
A urbanização ocorrida em território brasileiro passou por três momentos
históricos distintos em sua organização, o primeiro ocorreu entre 1530 e 1570,
período em que o maior interesse dos colonizadores foi a exploração do pau-
brasil; o segundo período compreende 1580 a 1640, que são os anos de
dominação espanhola, neste período ocorre uma maior urbanização do litoral
norte em direção à Amazônia; e a terceira fase ocorre entre 1650 e 1720, neste
período cidades como São Paulo e Olinda se consolidam e é constituído ao final
uma rede considerável de cidades e vilas
36
.
Estes três períodos constituíram o inicio do processo de urbanização no
Brasil. Durante muitos séculos o Brasil foi um grande arquipélago de cidades, em
que cada uma se desenvolvia segundo uma lógica muito particular. As cidades
durante muito tempo não desempenharam um papel preponderante na vida
cotidiana e econômica do país
37
.
Somente a partir do século XIX, com a produção do café em São Paulo,
esse quadro é relativamente alterado, e São Paulo emerge como um centro
importante na polarização do país. A produção de café no sudeste brasileiro, mais
precisamente no eixo São Paulo Rio de Janeiro Minas Gerais, possibilitou um
incremento da industrialização na região
38
. A partir da década de 30, surgem
novas condições políticas e organizacionais que permitem que a industrialização
aconteça definitivamente em São Paulo.
Nas décadas de 1940 e 1950, o processo de industrialização se consolida,
este processo é acompanhado por profundas mudanças no paradigma de
sociedade e economia, com a formação de um mercado nacional, que ativa o
36
SANTOS, Milton, op.cit., p. 40.
37
Idem, p. 63.
38
ARBEX Jr. José e OLIC, Nelson B. O Brasil em regiões: sudeste. São Paulo: Moderna, 1999, p.
73.
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28
processo de urbanização
39
, e o crescimento demográfico. Entre as décadas de
1940 e 1980, ocorre a inversão entre população urbana e rural no Brasil.
População Total População urbana Índice de urbanização
1940
41.326.000 10.891.000 26,35
1950
51.944.000 18.783.000 36,16
1960
70.191.000 31.956.000 45,52
1970
93.139.000 52.905.000 56,80
1980
119.099.000 82.013.000 68,86
1991
150.400.000 115.700.000 77,13
Fonte: SANTOS. Urbanização brasileira, p. 29.
A partir da tabela, entre 1960 e 1980 a população urbana experimentou um
enorme crescimento no Brasil, gerando com isso diversos problemas urbanos. No
Brasil, entre 1940 e 1950, o crescimento da população aumentou em 24%, porém
o das cidades cresceu em 39%. Em 1950 e 1960, o crescimento da população
total foi de 30%, porém o da urbana chegou a 54%40.
1.1.3. A urbanização coorporativa
A organização das cidades no Brasil, apresenta características muito
semelhantes, e nesta direção sinaliza Santos quando afirma que:
Com diferenças de grau e de intensidade, todas as cidades
brasileiras exibem problemáticas parecidas. Seu tamanho, tipo de
atividade, região em que se inserem, etc. são elementos de
diferenciação, mas, em todas elas, problemas como os do
desemprego, da habitação, dos transportes, do lazer, da água, dos
esgotos, da educação e saúde são genéricos e revelam enormes
carências
41
.
Os fatores causadores do caos urbano que se instala nas cidades
brasileiras possuem elementos comuns que são geradores desta desordem.
39
SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, ed. 4, 1998, p. 27.
40
SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. 5ª ed. São Paulo: EDUSP, 5 ed., 2005, p. 100.
41
Idem, p. 105.
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29
Dentre um destes elementos situa-se a urbanização coorporativa, ou seja, um
processo de urbanização inteiramente orientado para atender aos interesses do
mercado e à expansão capitalista. Compreende-se que ao orientar as políticas
públicas
42
, para o atendimento destes interesses o resultado é um processo de
urbanização excludente e que precariza as relações entre o Estado e o cidadão,
em que o cidadão não tem participação e acesso ao que a cidade produz
43
.
A urbanização coorporativa contribui para a desordem urbana, favorecendo
a proliferação dos guetos, cortiços e moradias de autoconstrução, ou seja, a
ausência de planejamento urbano e uma política urbana voltada para os
interesses dos cidadãos. O planejamento urbano encontra-se voltado para
atender aos interesses dos grandes grupos econômicos, com a construção de
vias para o escoamento da produção e cessão de áreas públicas para a
construção de empreendimentos industriais.
1.1.4. Urbanização: emergência de uma cultura urbana
Ao abordar o conceito de urbanização, Manuel Castells faz referencia a
dois sentidos diferentes do termo urbanização: o primeiro faz referencia à
concentração espacial de uma população em relação aos limites espaciais e de
densidade (forma espacial, como no mapa anterior) e o segundo faz referencia à
difusão do sistema de valores, atitudes e comportamentos denominado cultura
urbana’” (conteúdo cultural), esta segunda também denominada tendência
culturalista da análise da urbanização
44
, ou seja, a cidade não se resume aos
seus aspectos físicos, mas também é marcada por um estilo de vida muito
42
Trata-se de um conjunto de diretrizes garantidas por lei, que possibilitam a promoção e a
garantia de direitos para o cidadão. A sociedade civil tem uma participação considerável na
elaboração das políticas públicas, tornando o acompanhamento e execução das mesmas muito
mais eficientes. No contexto internacional, a doutrina neoliberal passou a ser o fundamento de
políticas públicas, configurando-se como ideologia conservadora e hegemônica no Ocidente a
partir do final dos anos de 1970 e, sobretudo, durante a década de 1980, quando foi posta em
prática pelos governos Thatcher, na Grã-Bretanha, e Reagan, nos Estados Unidos. (GROS.
Denise B. Revista Brasileira de Ciências Sociais, Vol. 19, Nº 54, Fev. 2004. http://www.scielo.br).
43
SANTOS, Milton, op.cit., p. 105.
44
CASTELLS, Manuel. A questão urbana. São Paulo: Paz e Terra, 2000, p. 39.
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30
particular, a vida urbana, tornando este modelo um modo de vida que ultrapassa
os limites físicos da própria cidade
45
.
A partir das considerações de Castells, observa-se que urbanização e
industrialização são dois processos que caminham conjuntamente gerando uma
forma própria de organização espacial. Entretanto, Castells menciona que a
relação entre o que se denomina forma espacial e conteúdo cultural não pode se
constituir num elemento de definição da urbanização
46
.
Para fundamentar a necessidade de uma análise histórica, Castells, propõe
a observação das relações estabelecidas historicamente entre espaço e
sociedade, o que em sua visão permite a base dos estudos sobre a
urbanização
47
. Desta maneira ele procede a investigação sobre as primeiras
aglomerações sedentárias na Mesopotâmia, Egito, China e Índia na antiguidade;
as cidades imperiais, particularmente Roma, onde ele observa que as cidades
eram locais de gestão e domínio administrativo, e não de produção; a cidade da
Idade Média, que vai se caracterizar pela luta da burguesia comercial em se
libertar do feudalismo, o que da origem a uma organização espacial própria
48
.
Castells também analisa a urbanização ligada à primeira fase da revolução
industrial, que por sua vez está inserida no sistema de produção capitalista. Para
Castells, a organização do espaço a partir deste momento se alicerça sobre duas
características fundamentais:
1.A decomposição prévia das estruturas sociais agrárias e a
emigração da população para os centros urbanos (...), fornecendo
a força de trabalho essencial à industrialização.
2.A passagem de uma economia dom
éstica para uma economia
de manufatura, e depois para uma economia de fábrica (...),
concentração de mão-de-obra, criação de um mercado e
constituição de um meio industrial.
49
45
SANT'ANNA. Maria Josefina Gabriel. A cidade como objeto de estudo: diferentes olhares sobre
o urbano. http://www.comciencia.br/.
46
CASTELLS, Manuel, op.cit., p. 40.
47
Idem, p. 41.
48
Idem, p. 41-44.
49
Idem, p. 45.
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31
A indústria provoca a urbanização, organiza e domina a paisagem
50
urbana, constituindo novos elementos nas relações humanas.
Castells aponta que os problemas atuais da urbanização giram em torno de
quatro dados fundamentais, que são:
1. O acelerado ritmo de crescimento urbano;
2. O fato de este crescimento ocorrer especialmente nas regiões denominadas
subdesenvolvidas;
3. O surgimento de novas organizações urbanas, as grandes metrópoles;
4. A relação do fenômeno urbano com novas formas de articulação oriundas do
modo de produção capitalista
51
.
Desta forma Castells termina por conceituar urbanização como:
(...) a constituição de formas espaciais específicas das sociedades
humanas, caracterizadas pela concentração significativa das
atividades e das populações num espaço restrito, bem como à
existência e a difusão de um sistema cultural específico, a cultura
urbana
52
.
A cidade deixa de ser tão somente uma aglomeração de pessoas, numa
complexa relação econômica, e passa a ser caracterizada também pelo
surgimento de uma cultura urbana, dentro de um sistema cultural específico.
Urbanização, portanto, significa concentração de atividades e a criação de uma
cultura específica nesta sociedade, denominada cultura urbana. Refere-se,
portanto, ao processo de concentração populacional num espaço determinado,
50
O conceito de paisagem é essencial para a geografia, significando muito mais do que afirma o
senso comum como sendo o que a visão abarca. A paisagem é marcada pelos elementos
objetivos e concretos e os subjetivos, como a cultura e as relações humanas. A paisagem
geográfica é vista como um conjunto de formas naturais e culturais associadas em uma dada área,
é analisada morfologicamente, vendo-se a integração das formas entre si e o caráter orgânico ou
quase orgânico delas. O tempo é uma variável fundamental. A paisagem cultural ou geográfica
resulta da ação, ao longo do tempo, da cultura sobre a paisagem natural. (CORRÊA, Roberto
Lobato & ROZENDAHL, Zeny (orgs.). Paisagem, Tempo e Cultura. Rio de Janeiro: Eduerj, 1998.
p.92-123) Em Milton Santos paisagem é ao mesmo tempo objetos naturais, que não são obra dos
seres humanos e todos os objetos sociais (SANTOS. Milton. Pensando o espaço do homem. São
Paulo: Hucitec, 1994, p. 37-40.).
51
CASTELLS, Manuel. op.cit., p. 46.
52
Idem, p. 46.
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32
em que se constituem aglomerações internamente interdependentes e
hierarquizadas, denominada rede urbana
53
.
Assim, Castells afirma que:
Quando falamos de sociedade urbana, não se trata nunca da
simples constatação de uma forma espacial. A sociedade
urbana, no sentido antropológico do termo, quer dizer um certo
sistema de valores, normas e relações sociais possuindo uma
especificidade histórica e uma lógica própria de organização e de
transformação
54
.
A sociedade urbana possui um sistema de valores, normas e relações
sociais muito próprias, onde as formas associativas se opõem às formas
comunitárias (rurais). A segmentação dos papeis e os rompimentos dos laços de
solidariedade marcam as relações na sociedade urbana
55
.
Considerando os problemas da urbanização, apontados tanto em Milton
Santos como em Manuel Castells, nota-se a necessidade de aprofundar a
questão da cidadania, visando elementos que contribuam para a discussão sobre
o tema.
1.2. A cidadania (privada) nas cidades brasileiras
Por muitos séculos o Brasil foi um país agrário, mesmo depois de iniciado o
processo de urbanização, as relações existentes nas cidades nascentes ainda
eram marcadas por um caráter fortemente agrário na forma dos agrupamentos
familiares.
Viver na cidade e nela trabalhar possui suas peculiaridades, dado que a
urbanização brasileira é bastante recente e ocorreu de modo muito acelerado, até
as décadas de 50-60 o Brasil possuía a maior parte de sua população vivendo no
interior do país, que era onde se encontrava a principal fonte de trabalho, a
atividade agrícola.
53
Idem, p. 47.
54
Idem, p. 127.
55
Idem, p. 127-128.
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33
A concentração populacional no Brasil ocorre principalmente nas grandes
metrópoles, em especial nas duas Metrópoles Nacionais (São Paulo e Rio de
Janeiro), sendo que o interior do território brasileiro permanece com algumas
áreas com um grande vazio demográfico. Essa situação é resultado de uma
política que privilegiou algumas áreas do país em detrimento de outras, gerando
um desenvolvimento desigual entre as regiões brasileiras.
A urbanização se avolumou e a residência dos trabalhadores agrícolas é
cada vez mais urbana. Mais do que a separação tradicional entre um Brasil
urbano e um Brasil rural, há, hoje, no país, uma verdadeira distinção entre um
Brasil urbano (incluindo áreas agrícolas) e um Brasil agrícola (incluindo áreas
urbanas)
56
.
A grande cidade que para muitos surgiu como uma possibilidade de
prosperidade e qualidade de vida tornou-se rapidamente num pólo de pobreza e
graves problemas, quanto maior a força de polarização
57
de uma cidade maior
seus problemas e mais complicado a solução dos mesmos.
A pobreza na cidade mostra toda a sua dureza, pois a estrutura física e a
ocupação do espaço possibilitam ou exigem a concentração da miséria em alguns
pólos periféricos nos cortiços em áreas centrais. A pobreza possui um modelo
espacial. É periférico em alguns casos (maioria) e central no caso dos cortiços.
Uma outra situação bastante grave é o fato da cidade não ser utilizada por
todos da mesma maneira, atualmente a divisão não é mais rural e urbana, a
diferença não se estabelece nesta simplória dicotomia (rural e urbano), a questão
é muito mais complexa e possui raízes socioeconômicas, políticas e culturais as
mais variadas.
O morador de uma fazenda distante dos grandes centros urbanos pode
conhecer e usufruir os benefícios da cidade muito mais que um morador de um
cortiço no centro de São Paulo, isto se pelo fato de que o que realmente faz o
56
SANTOS, Milton. Urbanização brasileira. 4ª ed. São Paulo: Hucitec, 1998, p. 9.
57
A capacidade de polarização deve ser entendida como a capacidade que uma determinada
região ou cidade possui para atrair pessoas.
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34
uso dos equipamentos urbanos ser maior ou menor não é a proximidade física,
mas sim a quantidade de recursos que a pessoa possui. O domínio dos meios de
comunicação passa a ser determinante para a cidadania, este controle ocorre
fundamentalmente pela via econômica, o que exclui uma parcela significativa da
população.
Para muitas pessoas a rede urbana não é real, pois não usufruem os
serviços por ela prestados (lazer, saúde, educação). Que vale morar numa favela
no bairro do Morumbi em São Paulo (próximo da maior universidade da América
Latina a USP) e não ter acesso digno à educação, saúde e lazer?
Assim o habitante de uma cidade vive a angústia de saber o que é ter e
não poder ter de viver próximo do conforto, mas sem experimentá-los.
Outro fator de muita complexidade quando se analisa a questão urbana no
Brasil, é a questão da cidadania
58
. No Brasil, as elites políticas sempre foram
representantes dos interesses econômicos subordinados ao grande capital
internacional e a relação entre a sociedade civil e o Estado, foram marcadas por
períodos de regimes ditatoriais, em grande parte sob influência estrangeira. A
questão da cidadania terá uma feição particular porque nos períodos de transição
para a democracia o problema irá se concentrar também na regulamentação das
regras de civilidade e cidadania no interior de uma sociedade travestida de
poderes arbitrários, autoritários
59
.
Ao analisar a questão da cidadania no Brasil, Lúcio Kowarick, afirma que:
(...) em virtude da condição generalizada de subcidadania, a
autoconstrução de uma percepção de moralidade e dignidade
tende a se solidificar nos valores e símbolos edificados em torno
58
Evelina Dagnino confere à cidadania um caráter fundamental na construção democrática o qual
lhe é definido pela luta política. A perspectiva da formulação de uma nova cidadania dos anos
1990 se distingue da visão liberal que cunha este termo no século XVIII e, deste modo, a autora
precisa tais distinções como: 1) noção de direito a ter direitos que não contempla somente o direito
à igualdade, mas também o da diferença; 2) requer sujeitos ativos lutando pelo seu
reconhecimento. Uma estratégia dos não-cidadãos, dos excluídos. (DAGNINO, Evelina. Os
movimentos sociais e a emergência de uma nova noção de cidadania. In: DAGNINO, E. (org).
Anos 90: política e sociedade no Brasil. São Paulo: Ed. Brasiliense,1994).
59
DAGNINO, Evelina. Os movimentos sociais e a emergência de uma nova noção de cidadania.
In: DAGNINO, E. (org). Anos 90: política e sociedade no Brasil. São Paulo: Ed. Brasiliense, 994, p.
55.
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35
de projetos individuais: é o primado do cidadão privado
60
.
O conceito de cidadania privada, em que a pessoa constrói sua cidadania a
partir de ações individuais e com toda a precariedade, ou seja, aquele que com
seu próprio esforço e perseverança venceu
61
. Com uma organização espacial e
urbana que não privilegia a cidadania coletiva e não proporciona meios eficientes
para o acesso dos indivíduos aos bens blicos, é que se a vida na cidade e
as expressões precárias de cidadania.
As condições existentes nesta ou naquela região determinam essa
desigualdade no valor de cada pessoa, tais distorções
contribuindo para que o homem passe literalmente a valer em
função do lugar onde vive. Essas distorções devem ser corrigidas,
em nome da cidadania.
62
As cidades brasileiras são desiguais e violentas em suas relações, a
ocupação do espaço e os serviços oferecidos aos cidadãos são desiguais,
transformando os seres humanos em cidadãos de diversas categorias. Diante
destas questões a Igreja, que olha para o ser humano, não somente como
cidadão, mas também como homem e mulher que refletem a imagem do Deus
que os criou, possui o grande desafio de resgatar a dignidade deste homem e
desta mulher que se encontram excluído social e economicamente. Este desafio
impõe uma práxis pastoral capaz de superar as ações comuns e repetitivas,
buscando a transformação da sociedade e a organização popular. A partir da
lógica neoliberal, àqueles que estão abaixo da linha de pobreza
63
(aproximadamente 53 milhões de pessoas no Brasil) não o vistos, pois não
consomem, não ditam moda, não interferem na vida política, quando não estão
social e politicamente organizados. É para estas pessoas que a práxis pastoral
deve (preferencialmente) lançar seu olhar, na busca de promover a cidadania e a
humanidade destes homens e mulheres.
60
KOWARICK, Lúcio. Cidade e cidadania: cidadão e subcidadão blico. IN: Brasil em Artigos,
Coleção SEADE bolso, São Paulo: Fundação SEADE, p. 114.
61
Idem, p. 112.
62
SANTOS, Milton, O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, ed. 4, 1998, p.112.
63
Esta linha de pobreza baseia-se no consumo de bens e serviços. É sugerida para a América
Latina e Caribe uma linha de pobreza de 2 dólares norte-americanos por dia. Para a Europa do
Leste e repúblicas da antiga União Soviética, tem sido usada uma linha de pobreza de 4 lares
norte-americanos por dia. Para a comparação entre países industrializados, tem sido usada uma
linha de pobreza correspondente à dos Estados Unidos, que é de 14,4 dólares por pessoa por dia.
(RELATÓRIO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO - http://www.undp.org.br).
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A opção pelos empobrecidos não é por mero oportunismo, mas se por
que o cristão percebe que a lógica capitalista é extremamente excludente,
marginalizando a pessoa pelo lugar onde se vive. Compreende-se que esta opção
deva também se dar a partir do espaço que a pessoa ocupa no território.
O valor do ser humano depende de sua localização no território, assim:
(...) seu valor vai mudando, incessantemente, para melhor ou para
pior, em função das diferenças de acessibilidade (tempo,
freqüência, preço), independentes de sua própria condição.
Pessoas, com as mesmas virtualidades, a mesma formação, a
mesmo o mesmo salário têm valor diferente segundo o lugar em
que vivem: as oportunidades não são as mesmas. Por isso a
possibilidade de ser mais ou menos cidadão depende, em larga
proporção, do ponto do território onde se está
64
.
O que se percebe que cabe também a Igreja possibilitar e contribuir para
as melhorias dos equipamentos urbanos em seu entorno, possibilitando com isso
a inserção plena da pessoa na sociedade em que vive.
A opção pelo empobrecido permanece como objetivo primeiro, e esta
opção passa necessariamente por uma reforma urbana.
Compreende-se que as cidades, em especial as grandes cidades estão
numa situação caótica, com suas áreas centrais cada vez mais desprotegidas e
abandonadas pelo poder público.
As pessoas que possuem um maior poder aquisitivo abandonam estas
áreas centrais, e buscam zonas reservadas e protegidas, isoladas do mundo por
muros e cercas elétricas, formando o que Comblin denomina cidade-paraíso.
Entretanto como ele mesmo afirma, a cidade-paraíso é uma solução acessível
somente a uma pequena minoria, sendo que para uma grande maioria a vida
urbana é um problema crônico dentro do sistema econômico e da gica
capitalista
65
.
64
SANTOS, Milton, op.cit., p. 81.
65
COMBLIN, José. Os desafios da cidade no século XXI. São Paulo: Paulus, 2002, p. 29.
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37
Compreende-se que o ser humano vale por onde mora, que seu valor não
reside em sua humanidade tão somente, mas antes no espaço que este ocupa no
território.
Cabe, portanto, à Igreja, como voz profética, defender os interesses destes
excluídos pela lógica econômica dominante, a globalização neoliberal. É
necessária uma ordem econômica que atenda aos interesses urbanos, o que se
faz com a organização popular.
A questão da cidadania passa necessariamente pela análise dos
processos históricos de lutas populares que culminaram na ampliação dos direitos
das pessoas e na ampliação da consciência de que o indivíduo é portador do
direito à ter direito. Foi assim nas lutas que levaram à Declaração dos direitos
humanos nos Estados Unidos da América do Norte e mesmo na Revolução
Francesa
66
, onde o princípio da legitimidade não mais se fundamentou
exclusivamente, nos deveres e sim nos direitos do cidadão
67
.
Compreendendo a cidadania como resultado das lutas dos povos ao longo
da história, João Quartim de Moraes, afirma que:
A cidadania democrática só cria raízes num povo ao longo da
experiência coletiva, a aprendizagem do exercício da cidadania é
lenta e muitas vezes turbulenta. Mas insubstituível, tanto no que
se refere ao voto quanto formas superiores da participação
democrática, como o autogoverno local e as múltiplas formas de
auto-gestão social. Nisso parece-nos consistir sua força enquanto
valor ético-político: a democracia é uma forma que, embora
suscetível de ser preenchida de múltiplos conteúdos, é a mais
apropriada para exprimir o interesse coletivo, tal como o entende a
coletividade
68
.
O processo de ampliação da consciência cidadã, decorre das atividades
dos indivíduos em sociedade, sendo conseqüência do exercício cotidiano das
práticas democráticas.
66
MORAES, Maria Ligia Quartim. Dois estudos sobre cidadania. Primeira Versão, Campinas:
IFCH/UNICAMP, 2002, p.27.
67
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 30.
68
MORAES, João Quartim de. A democracia: história e destino de uma idéia. São Paulo: Revista
da OAB / Brasiliense, 1989, p. 35.
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Tomando em consideração que a conquista da cidadania se dá dentro de é
um processo de lutas, de avanços e refluxos históricos, é possível constatar a
ocorrência de diferentes níveis de cidadania nos diferentes grupos de países e
sociedades, desta maneira, a situação concreta de cada sociedade define os
patamares e os limites do exercício da cidadania
69
.
O exercício da cidadania implica em um indivíduo autônomo, capaz de
enfrentar as tensões e carências dos centros urbanos encontrando mecanismos
democraticamente estabelecidos, que possibilitem o atendimento das
necessidades básicas (trabalho, moradia, saúde, educação e transporte). A práxis
desempenha um papel de fundamental importância, para o a construção de uma
cidadania capaz de gerar uma cidade onde haja justiça, liberdade e igualdade.
1.3. Concepções de práxis
O conceito de práxis evolui e sofreu transformações, e ganhou contornos
ao longo da história. É necessário destacar que na Antiguidade grega, a filosofia
ignorou e até por vezes reprimiu o mundo prático, sendo a atividade prática tida
como indigna de um ser humano livre, visto que todo trabalho braçal era
destinado aos escravos. O ser humano, na Antigüidade, se faz a si mesmo se
isentando de toda atividade prática material, separando a teoria, a contemplação,
da prática
70
.
Em Aristóteles práxis pode ser compreendida como atividade imanente
71
,
assim práxis é trabalho humano distinto da técnica e da arte, que entranha uma
opção ética
72
. Foi ele que mais fez uso da palavra práxis entre os autores gregos
antigos, e nem sempre a palavra possuiu em seus textos um sentido claro e
69
MORAES, Maria L. Quartim. op.cit., p.28.
70
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia da Práxis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1968, p. 17.
71
Que está inseparavelmente contido ou implicado na natureza de um ser, ou de um conjunto de
seres, de uma experiência ou de um conceito.
72
FLORISTÁN, Casiano. Teologia de la Práxis: teoria y práxis de la acción pastoral. Salamanca /
Espanha: Ediciones Sígueme, 2002, p 174.
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39
unívoco. De forma ampla, a palavra práxis para ele designava uma atividade ética
e política, diferente da atividade produtiva, entendida como poiésis
73
.
Platão foi quem separou a prática da teoria, em que a teoria
74
equivale a
contemplação e se associa a contemplação das idéias, a teoria é privilégio de
uma minoria de homens livres, enquanto para a maioria basta a práxis ou a
participação na vida como cidadão, esta destinada aos homens livres. Ao escravo
esta reservada a poiésis
75
(poesia), ou seja, a produção
76
.
O aprimoramento humano se dá pela negação de qualquer atividade
prática material, separando a teoria, a contemplação e a prática, assim:
Com Platão a vida teórica, como contemplação das essências, isto
é, a vida contemplativa (bios theoretikós) adquire uma primazia e
um estatuto metafísico que até então não tivera. Viver,
propriamente é contemplar (...)
Os homens livres s
ó podem viver como filósofos ou políticos
no ócio; entregues à contemplação ou à ação política, isto é, em
contato com as idéias ou regulando conscientemente (grifo
nosso) os atos dos homens, ,como cidadãos da polis (...)
77
Esta regulamentação consciente implica na reflexão sobre a tomada de
ações, assim, Platão reconhece uma práxis política a partir dos princípios da
teoria. A idéia de praxis na sociedade grega escravista corresponde aos
interesses de uma oligarquia dominante, que não deseja propriamente a
transformação desta sociedade, mas sim a sua manutenção. Assim a práxis neste
período é vista como uma atividade relacionada à vida da polis, exercida por
homens livres, existe aqui a reflexão, elemento constante na práxis.
Existiam, portanto, no mundo antigo, três atividades humanas sicas: a
práxis, a poiésis e a theoria. Desde então o tema da atividade humana em suas
diferentes formas e em sua relação com a reflexão teórica tem ocupado os
filósofos e inúmeros debates têm sido travados em torno das diferenças entre
73
KONDER, Leandro. O futuro da filosofia da práxis: o pensamento de Marx no século XXI. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1992, p. 97.
74
Theoria: 'ação de observar, examinar; estudo ou conhecimento devido a raciocínio especulativo',
pelo lat. theorìa,ae 'investigação filosófica (oposição à prática).
75
Grego = poíésis, é criação; fabricação, confecção.
76
FLORISTÁN, Casiano, op.cit., p. 174.
77
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. S., op.cit., p. 17-18.
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40
teoria e prática / ação e contemplação. A divergência se principalmente sobre
a ênfase que deve ser dada a uma ou outra atividade
78
.
Em momentos de crise (econômica, política ou cultural) este debate fica
ainda mais acirrado e as mudanças práticas se aceleram desafiando os seres
humanos a intervir. A Itália renascentista é um exemplo de como isso ocorreu,
com a reanimação da atividade política e econômica urbana os habitantes da
cidade foram obrigados a refletir sobre o convívio que se intensificou no espaço
urbano, exigindo que os cidadãos refletissem sobre seus problemas urbanos
tendo que buscar caminhos e soluções
79
.
Leandro Konder analisa esta situação da Itália renascentista dizendo que:
O aumento do número de pessoas com as quais cada cidadão
estava em contato intimava-o, com maior freqüência a tomar
decisões, a optar por agir ou não agir. E os problemas se
agravavam quando outros não apareciam em grande número
como se apresentavam unidos em torno de uma mobilização
comum. As multidões, ao se porem em movimento, conferiam
ação a uma fisionomia capaz de assustar alguns espíritos.
Marsílio Ficino (...), sustentava no plano filosófico, a superioridade
da contemplação sobre a ação, convencido de que era na
contemplação que a inteligência humana podia se aproximar da
verdade, isto é de Deus
80
.
Como se observa, a contemplação era vista como forma de contenção das
ações transformadoras exigidas pelas massas. Essa posição coexistia e conflitava
com outras, como a de Erasmo de Rotterdam que via com desconfiança a
segurança teórica que a contemplação pode proporcionar, lembrando que o ser
humano precisa saber ousar agir. Por outro lado existia também a posição de
Giordano Bruno que valorizava a ação a partir da teoria e Leonardo da Vinci que
combinava teoria e ação, lançando mão de uma metáfora militar para explicar seu
pensamento: a ciência é o capitão, a prática são os soldados. Outra perspectiva
78
KONDER, Leandro. op.cit., p. 98.
79
Idem, p. 98-99.
80
Idem, ibid.
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41
era a de Montaigne que afirmava que o ser humano nasceu para agir, mas as
condições humanas limitam tanta a ação como a contemplação
81
.
O cristianismo continua vivendo a tensão entre a contemplação e o agir,
durante muitos séculos foi considerado tão somente ão contemplativa, o
trabalho era considerado como castigo
82
. Entretanto é possível verificar a força da
práxis presente desde sua gênese e que sofreu repressões ao longo de sua
história.
Os escolásticos traduzem a palavra práxis simplesmente como ação
(agir)
83
.
1.3.1. Gramsci e a filosofia da práxis
A práxis é sim uma ação transformadora, é a relação entre teoria e prática,
mas que não deve ser confundida com uma prática repetitiva e sem reflexão.
Trata-se de uma ação objetiva que supera a critica social teórica, apontando
caminhos na história da humanidade para as questões que envolvem a
sociedade. Pela práxis o ser humano constrói seu mundo de forma autônoma.
Toda práxis é atividade, mas nem toda atividade é práxis
84
, mais adiante
aprofundaremos esta idéia sobre a atividade que se expressa como práxis.
Antonio Gramsci, dedica particular atenção para a filosofia da práxis, em
seu pensamento fica bastante evidente que os oprimidos precisam tomar
consciência, em seguida libertar-se das forças que os oprimem, mas que para
isso ocorra é necessário organizar-se para tornar-se senhor das próprias histórias
e este processo não vem senão pela reflexão e ação permanente, assim Gramsci
apresenta a filosofia da práxis como expressão consciente das contradições
existentes na história e na sociedade
85
.
81
Idem, p. 100.
82
FLORISTÁN, Casiano, op.cit., p. 174.
83
Idem, ibid.
84
Idem, p. 185.
85
SEMERARO, Giovanni, op.cit., p. 9-10.
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Para Gramsci a filosofia da práxis se resume em três tarefas principais, que
são:
A de ter uma aproximação permanente com as classes populares,
buscando compreender suas reais necessidades e possibilitando a formação de
quadros no interior destas classes, por meio da educação;
Revelar as ideologias que se apresentam travestidas de modernidade;
E por último, a tarefa de buscar sempre o fortalecimento e a renovação
diante dos novos questionamentos da história
86
.
Nos cadernos do cárcere, Gramsci enfatiza a necessidade de manter-se
em contato com o povo, afirmando que a falta de contato direto com a classe
popular acarreta em sérias dificuldades para o conhecimento real dos seres
humanos
87
.
Para Gramsci, de fato, assim como para Marx, o pensamento é
parte integrante da realidade e existe uma ligação inseparável
entre o agir e o conhecer. A leitura dos fatos e a compreensão das
coisas não são abstrações aleatórias e assépticas, mas derivam
da trama sociopolítica na qual os indivíduos estão situados
88
.
Em Gramsci agir e conhecer são ões inseparáveis, e toda análise dos
fatos, deve necessariamente ser feita a partir dos dados concretos, para tanto é
necessário elaborar uma teoria do conhecimento como instrumento de libertação
das estruturas que oprimem os homens.
Neste sentido, Gramsci chama a atenção para a figura dos intelectuais
orgânicos
89
, destacando como categoria mais típica destes intelectuais a dos
86
Idem, p. 12.
87
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. Vol.1, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999, p.
221-222.
88
SEMERARO, Giovanni, op.cit., p. 17.
89
Gramsci fala sobre a função dos intelectuais na sociedade em diferentes classes sociais.
Entretanto o faz diferentemente da filosofia alemã, ele afirma que todas as classes sociais
possuem seus intelectuais, que apontam suas visões de mundo para as classes que representam.
Desta forma os intelectuais possuem uma função orgânica no processo da reprodução social, na
medida em que ocupam espaços sociais de decisão prática e teóricas, tornando-os objeto de
longa análise nos Cadernos do Cárcere. Mas a principal função destes se encontra na formação
de uma nova moral e uma nova cultura, que podem ser entendidas também como uma contra-
hegemonia, já que o objetivo final das lutas organizativas seria, no seu momento histórico, o
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43
eclesiásticos
90
. O principal papel destes intelectuais consiste na organização da
classe a que representa, ou seja, seu modo de ser não consiste no discurso, que
é motor exterior e passageiro das paixões, mas num engajamento concreto com a
sociedade, como construtor e motivador permanente das transformações
sociais
91
.
O nascimento da filosofia da práxis está intimamente ligado à atividade dos
intelectuais orgânicos, particularmente quando Karl Marx e Engels, em oposição
ao idealismo alemão, passam a participar ativamente nas lutas operárias, este
novo intelectual (orgânico) é ao mesmo tempo cientista, crítico e revolucionário
92
.
É com a filosofia da práxis que os:
Novos intelectuais politicamente compromissados com o próprio
grupo social para fazer e escrever a história e, por isso, capazes
de refletir sobre o entrelaçamento da produção material com
controvertidas práticas da reprodução simbólica
93
.
A exigência que se faz da participação dos intelectuais vai além dos
discursos e teorias, a partir da filosofia da práxis passou-se a ter a necessidade
de conhecer o funcionamento da sociedade, revelando os mecanismos de
dominação que eram até então encobertos pelas ideologias dominantes, deste
modo se dá a participação dos intelectuais orgânicos, pois estes fazem parte de
um organismo vivo e em expansão. Por isso, estão ao mesmo tempo conectados
ao mundo do trabalho, com organizações políticas e culturais
94
, e próximos ao
seu grupo social. Para Gramsci,
Todo grupo social, ao nascer do terreno originário de uma função
essencial no mundo da produção econômica, cria também,
organicamente, uma ou mais camadas de intelectuais que
conferem homogeneidade e consistência da própria função não
apenas do campo econômico, como também no social e político
socialismo. (MARI, Cezar Luiz, O papel educador dos intelectuais.
http://www.ccsa.ufrn.br/ccsa/docente/rodson/ftp/Gramsci.rtf)
90
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. Vol.2, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1999,
p.16-17.
91
Idem, p. 17-18.
92
SEMERARO, Giovanni, op.cit., p. 130.
93
Idem, p. 130.
94
Idem, p. 134-135.
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44
(...)
95
.
É importante salientar que para Gramsci todos os homens são intelectuais,
mas que nem todos desempenham esta função na sociedade, entretanto não se
pode falar na existência de não-intelectuais, não existindo para ele atividade
humana da qual se possa excluir toda intervenção intelectual, não se pode
separar o Homo sapiens do Homo faber
96
, desta maneira todo ser humano
exerce uma atividade intelectual em algum momento.
Gramsci atribui uma significativa importância à educação neste processo
de formação intelectual em seus diversos níveis, respeitando, contudo o saber
popular mesmo quando da sua falta de organização e fragmentação, sem, no
entanto abandonar a crítica e uma formação que supere o senso comum, as
crenças e preconceitos presentes no grupo
97
. Certamente essa é uma
contribuição na elaboração de uma pastoral litúrgica, que tenha na filosofia da
práxis sua fundamentação teórica.
1.3.2. Feuerbach: a práxis abstrata
Ao buscar os fundamentos da práxis, observa-se a necessidade de
compreender a concepção de práxis em Ludwig Feuerbach, ou seja, o seu
materialismo, que elaborou uma crítica da religião que quando se viu aplicada ao
idealismo alemão de Hegel representou um enorme impacto para a filosofia da
época. Ao observar a crítica à religião desenvolvida por Feuerbach em A
essência do cristianismo, é possível destacar que Deus não existe em si e por
si, isto é, como sujeito, mas sim como objeto que, sem dúvida é um predicado
humano
98
. Deus é produto do homem, tornando-se essência idealizada do ser
humano. A religião nada mais é do que uma projeção do homem, e a consciência
que o ser humano tem de Deus, na realidade é a que ele tem de si próprio.
95
GRAMSCI, Antonio, op.cit., p. 15.
96
Idem, p. 16-18.
97
SEMERARO, Giovanni, op.cit., p. 18.
98
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez, op.cit., p. 92.
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45
Em Feuerbach o materialismo tem seu fundamento no homem, é um
materialismo que gira em torno do humanismo.
99
Deus é o ideal que o ser
humano produziu, uma imagem perfeita do homem, em todos os aspectos.
Ao produzir Deus como um objeto religioso seu, o homem o faz de forma
alienada (estranhada), sem consciência que ele é resultado de algo produzido e
idealizado pelo próprio homem. Assim se concebe o que Feuerbach denomina
alienação religiosa. Desta forma, quando Feuerbach coloca Deus como uma
construção humana e o homem como sujeito real, ele expõe a raiz antropológica
da religião e do idealismo hegeliano, ou seja, que a religião transfere a essência
humana para Deus e a filosofia idealista transfere a essência do homem e a
natureza para a Idéia absoluta. Desta forma a práxis somente encontra lugar no
abstrato, pois Deus é o único ser criador e ativo, transformador efetivamente,
enquanto o homem só é por derivação, não se como sujeito ativo da práxis.
Aqui se evidencia o fato de que a práxis humana é vista pelo homem como
atividade divina, quando o é de fato humana, entretanto, como observa
Feuerbach O homem é Deus porque o homem é Deus para o homem
100
.
Para Feuerbach, a característica misteriosa da religião é a unidade da
essência divina com a humana. Sendo Deus a própria essência humana, mas a
consciência o representa como outro ser, diferente do homem, isto é: o homem
não se no objeto que é seu produto e no qual objetiva sua própria essência:
isto se mostra para ele como alienação
101
.
Para Feuerbach, existe uma oposição entre religião e práxis, pois a religião
não expressa um ponto de vista teórico, mas sim prático e utilitário, desta forma
ele não uma práxis humana propriamente, nem como atividade produtiva, que
transforma a natureza; nem como atividade revolucionária no processo das
transformações sociais; e nem como prática social, pois para ele a prática possui
99
MANIERI, Dagmar. A concepção de homem em Ludwig Feuerbach. Revista Ética & Filosofia
Política. Volume 6, Número 2, Novembro/2003. http://www.eticaefilosofia.ufjf.br/
100
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez., op.cit., p. 93-116.
101
Idem, p. 100.
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46
um sentido reduzido, não sendo possível por ela fundamentar um
conhecimento
102
.
Ao sintetizar a concepção de práxis em Feuerbach, Vasquez afirma que o
materialismo contemplativo de Feuerbach é incompatível com a verdadeira
filosofia da práxis e que sua práxis abstrata é a negação da verdadeira
práxis
103
.
1.3.3. A concepção marxista de práxis
Em suas idéias sobre práxis, os marxistas se inspiram quase sempre nas
famosas Teses sobre Feuerbach de Karl Marx.
104
A análise destas onze teses é
bastante significativa, pois nelas estão expressos alguns dos princípios que
norteiam o pensamento marxista. A décima primeira tese é uma síntese deste
pensamento: Os filósofos limitaram-se até agora a interpretar o mundo de
diferentes modos; do que se trata é de transformá-lo
105
. A segunda e a oitava
tese expressam com clareza o pensamento de Marx sobre a práxis.
II
A quest
ão de atribuir ao pensamento humano uma verdade
objetiva não é questão teórica, mas prática. É na práxis que o
homem deve demonstrar a verdade, isto é, a realidade e a força, o
caráter terreno de seu pensamento. A disputa a cerca da realidade
ou irrealidade do pensamento
102
Idem, p. 110-114.
103
Idem, p. 115.
104
Teses Ad Feuerbach Estas onze teses foram escritas por Marx na primavera de 1845 e
publicadas pela primeira vez por Engels, em 1888, como apêndice à edição em livro da sua obra
Ludwig Feuerbach e o Fim da Filosofia Alemã Clássica, Estugarda 1888. Feuerbach havia
demonstrado, em A Essência do Cristianismo, a tese escandalosa para a sociedade da época,
que a essência da religião é a essência do ânimo humano, e que a teologia pode ser explicada
pela antropologia. Explica o autor que as representações e segredos atribuídos a um Ser sobre-
humano não eram mais do que representações humanas naturais, e que aquilo que no imaginário
pairava no Céu, pode ser encontrado sem maiores dificuldades no solo da Terra.[...] Feuerbach
inicia A essência do Cristianismo dizendo que o homem difere do animal por ter uma consciência
no sentido estrito, ou seja, sua consciência tem por objeto o seu gênero, a sua essencialidade.
[...] A teoria feuerbachiana causou profunda influência na filosofia do século XIX. Os primeiros a se
entusiasmarem com ela foram os jovens hegelianos, dentre eles Marx [...] Nas teses sobre
Feuerbach, Marx afirma que o sentimento religioso é um produto social relacionado a uma forma
determinada de sociedade. Para ele, a fonte da deficiência religiosa deveria ser buscada na
deficiência do próprio Estado. Esta deficiência deveria ser suprimida com a tomada de consciência
do homem como um ser espécie, num coletivismo que mudava o homem individual, abstrato.
(DUCLÓS, Miguel.
A Maturação do pensamento de Marx.
http://www.consciencia.org/contemporanea/marx.html)
105
MARX, K. e ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo: Martin e Claret, 2004, p. 120.
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47
VIII
Qualquer vida social
é essencialmente prática. Todos os mistérios
que levam ao misticismo encontram sua solução racional na práxis
humana e na compreensão dessa práxis
106
.
O aporte filosófico moderno sobre a práxis, corresponde a K. Marx. As
idéias surgem da práxis material, ou seja, pela revolução econômica e social, pela
transformação na raiz. O marxismo afirma que o critério da verdade é a práxis da
pessoa humana. A práxis é fundamento e fim de toda a teoria. A partir de Marx,
práxis passa a ser compreendia como prática social, atividade humana
transformadora do mundo. Desta forma é atividade social conscientemente
dirigida a um fim
107
, ou seja, a transformação social, a criação do novo.
A práxis não é vista como mera atividade da consciência humana, mas
como atividade material do ser humano agindo na história. Para se chegar a uma
concepção de práxis é necessário superar o idealismo e a espontaneidade
ingênua dos movimentos, buscando uma teoria da práxis, neste sentido Lênin, por
exemplo, afirmou que sem teoria revolucionária não há movimento revolucionário
possível
108
, sem práxis não existe transformações efetivas.
Na atividade cotidiana, os homens comuns, buscando responder às
indagações que o cercam, e encontrando-se diante de desafios sociais, políticos e
econômicos, o faz de modo prático
109
, sem o distanciamento necessário para se
fazer a reflexão da práxis em si.
O homem comum não enfrenta as situações cotidianas de forma pura ou
isenta (teórica), ele não é capaz de abstrair, pois ele se encontra condicionado
historicamente e socialmente a uma dada realidade, o que faz com que suas
ações sejam tidas como práticas.
106
Idem, ibid.
107
Idem, p. 173-191.
108
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez, op.cit., p. 8.
109
Idem, p. 9.
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48
Por conseguinte, sua atitude diante da práxis implica numa consciência
do fato prático, ou seja, certa integração numa perspectiva na qual vigoram
determinados princípios ideológicos
110
.
É possível identificar a aproximação com a práxis que o homem comum e
as inúmeras instituições presentes na sociedade realizam, sem, no entanto, ser
uma atitude que possa ser considerada práxis, isso porque sem se desprender do
cotidiano e ascender a um plano reflexivo não é possível se ter uma atitude
práxis.
Vázquez sedimenta esta idéia afirmando que:
(...) enquanto a consciência comum [gf. nosso] não percorre a
distância que a separa da consciência reflexiva [gf. nosso], que
tem na filosofia da práxis sua mais alta expressão, não pode
desenvolver uma verdadeira práxis revolucionária
111
.
É possível constatar que as ações decorrentes da consciência comum não
podem ser consideradas uma atitude advinda da práxis. O ser humano prático é
um ser produtivo, que constrói de forma alienada
112
um mundo para os outros, o
ser humano prático é meramente um ser produtivo e não reflexivo e por sua vez
suas ações não são transformadoras da realidade nem criadoras do novo.
Assim é possível identificar duas atitudes do ser humano comum, a
primeira é o que Vázquez denomina politicismo prático, ou seja, uma
concepção pragmática
113
, esvaziando toda a reflexão política das ações que são
tomadas em nome da prática, com isso abre-se espaço para a manutenção das
forças que oprimem o ser humano e possibilita a perpetuação das relações que
impedem as ações transformadoras; a segunda atitude do ser humano prático é o
apoliticismo, isto é, o abandono total da reflexão política e o apego às iniciativas
individuais que de igual modo permite que as estruturas sociais que oprimem e
110
Idem, ibid.
111
Idem, p.11.
112
Processo em que o ser humano se afasta de sua real natureza torna-se estranho a si mesmo
na medida em que já não controla sua atividade essencial (o trabalho), pois os objetos que produz
as mercadorias passam a adquirir existência independente do seu poder e antagônica aos seus
interesses.
113
Ênfase do pensamento filosófico na aplicação das idéias e nas conseqüências práticas de
conceitos e conhecimentos; filosofia utilitária.
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49
escravizam o homem permaneçam na sociedade. Tanto o politicismo como o
apoliticismo, são destituídos da reflexão, elemento necessário na práxis que
transforma de maneira criativa e radical a sociedade.
Tanto a prática sem reflexão como a falta de uma atitude na sociedade
estão a serviço da legitimação e manutenção de forças que detém o controle das
sociedades capitalistas e de todos os seus aparatos sociais, políticos e
econômicos.
A práxis é, portanto, a revolução, ou crítica radical que correspondendo a
necessidades radicais, humanas, passa do plano teórico ao prático
114
.
Não existe a possibilidade de emancipação e supressão das desigualdades
entre as classes sociais, sem atitude práxis, isto porque, nem a teoria nem a
prática ou a existência social podem libertar o ser humano.
1.3.4. A práxis em Casiano Floristán
Em Teologia Practica, de Casiano Floristán, é possível identificar o quanto
sua formulação teórica sobre a filosofia da práxis, vem ao encontro do que foi
constatado até aqui a partir de Marx e Gramsci, ao mesmo tempo em que propõe
elementos próprios a partir da reflexão teológica e pastoral.
Floristán compreende que nem toda atividade ou ação humana é práxis,
assim, os traços característicos da práxis para ele são
115
:
AÇÃO CRIADORA e para isso é necessário certo grau de consciência
critica. A práxis criadora é inovadora frente às novas realidades.
AÇÃO REFLEXIVA a superação da espontaneidade exige um alto grau
de reflexão. Toda ação exige a reflexão permanente e crítica com o objetivo de
traçar objetivos claros.
114
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez, op.cit., p. 128.
115
FLORISTÁN, Casiano, op.cit., p.180.
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AÇÃO LIBERTADORA existe práxis na medida em que existe um projeto
de libertação. A transformação das estruturas sociais é o fim de toda práxis, bem
como a ação para promover a liberdade humana.
AÇÃO RADICAL E NÃO REFORMISTA a práxis tem como objetivo
transformar a organização em direção à sociedade, transformando as relações
econômicas, políticas e sociais. Numa sociedade que se divide em classes este
processo de transformação radical, resulta na luta de classes. Disto resulta a
atividade política que busca a transformação social na sua raiz (radicalidade). Na
construção de uma sociedade nova sinalizada pela liberdade e pela igualdade é
necessária uma mudança pela raiz e não uma simples reforma.
A práxis para Floristán é atitude que: CRIA, REFLETE, LIBERTA e
TRANSFORMA (NA RAÍZ). Não possui um caráter meramente reformista ou de
sustentação e legitimação da ordem vigente, no sentido teológico é possível
afirmar que a práxis possui um caráter profético muito evidente. Esta ntese feita
a partir de Floristán permite a avaliação da práxis presente na sociedade, seja ela
proveniente do campo religioso ou não.
Floristán afirma que: nem todas as práxis são legitimas
116
. Para verificar a
legitimidade de uma práxis é necessário avaliar e criticá-la a partir de uma
perspectiva ideológica, política e econômica.
Uma observação importante a fazer é se a práxis em questão valoriza o
povo e possibilita a elevação da consciência critica e transformadora, neste
sentido é verificar se a práxis possui uma dimensão reflexiva, se faz o caminho
que separa a consciência do homem comum em direção à consciência reflexiva.
Para Floristán não existe uma práxis específica do cristianismo, ou como
algo propriamente evangélico, para ele, todos os atos são cristãos na medida em
que são realmente humanos
117
. Para sustentar esta idéia ele aponta três razões:
As ações e práxis possuem valor por seu conteúdo concreto;
116
Idem, p. 182.
117
Idem, p. 194.
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51
As ações e práxis nunca são neutras, sempre desejam;
O sentido e o significado das ações só podem residir em quem as
executa
118
.
Existe, portanto, a possibilidade de existirem cristãos na ação e
fundamentados na filosofia da práxis, mas não há uma práxis cristã propriamente.
Na eucaristia, somente pela fé se pode dizer que é uma práxis cristã (por sinalizar
a necessidade da partilha e da igualdade). Nesta direção, Floristán afirma que:
Sem dúvida, em termos históricos, pode haver umas
características próprias da práxis dos cristãos. Alguns destacam a
fraternidade, o amor aos inimigos, o perdão, etc. Na realidade, não
há uma práxis essencialmente cristã pelo qual o evangelho tenha
qualquer outro traço distinto frente a qualquer outra práxis
humana. (Traduzido pelo autor).
119
.
Por outro lado o cristão não aceita uma práxis fora da sua fé, assim como o
não cristão não necessita de fé. O autor afirma que em termos históricos pode
haver algumas características próprias na práxis dos cristãos: a fraternidade; o
amor aos inimigos e o perdão. Não há, portanto, uma práxis cristã distinta de
qualquer outra práxis humana.
Para M. Lefevbre existem três níveis da prática: a repetitiva; a mimética,
que cria pela imitação; e a inovadora, sobretudo na ação revolucionária. O teólogo
Clodovis Boff define práxis como o conjunto de práticas que tendem a
transformação da sociedade ou a produção da história compreende-se que a
práxis possui, portanto, uma dimensão política. Para Floristán, o binômio teoria e
práxis se estabelecem mediante a uma relação entre um modo de pensar e um
exercício ou ação. Entre teoria e prática uma relação dialética e permanente
118
Idem, p. 194-195.
119
Idem, p. 194.
Sin embargo, en t
érminos históricos, puede haber unas características propias en la praxis de los
cristianos. Algunos señalan la fraternidad, el amor a los enemigos, el perdón, etc. En realidad, no
hay una praxis esencialmente cristiana por la que el evangelio tenga rasgos distintos frente a
cualquier otra praxis humana.
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52
dinâmica, por vezes conflitante que deve buscar a superação pela síntese. Sem
dúvida há uma supremacia da práxis sobre a teoria
120
.
O homem comum em geral se move com esquemas mentais teóricos,
coletivos e ambientais, que correspondem à cultura em vigor que em geral é a
dominante. Assim, este homem vive ideologizado e manipulado. A consciência
geral, em certos estágios e culturas é fatalista e mágica. O homem prático resiste
a qualquer teoria, sem se dar conta de que se move com algumas teorias alheias
a si mesmo e em geral ultrapassadas, não admitindo que o melhor remédio para
uma prática ruim é uma boa teoria
121
.
Desta forma, Floristán compreende a práxis, a partir das concepções
marxistas, ou seja, a mudança social e o compromisso aqui chamado de militante,
e em Gramsci como orgânico, com as transformações estruturais e uma atitude
critica. É renovação do sistema social e emancipação pessoal e social
122
.
Floristán analisa as relações entre e práxis, compreendendo que o
cristianismo é uma comunidade de narração, detentora de uma práxis profética,
sendo a memória cristã repleta de recordações perigosas, que são simbolizadas
nos sacramentos, particularmente na eucaristia, e que se expressam
historicamente. Essa memória da justiça e do direito em Jesus é em certo sentido
subversiva
123
e criadora de novos sinais na sociedade e do homem novo.
A práxis não é mera atividade da consciência humana, mas atividade
material do ser humano agindo na história. Para se chegar a uma concepção de
práxis é necessário superar o idealismo e a espontaneidade ingênua. Na
atividade cotidiana, os homens comuns, buscando responder às indagações que
o cercam, e encontrando-se diante de desafios sociais, políticos e econômicos, o
faz de modo prático
124
, sem o distanciamento necessário para se fazer a reflexão
120
Idem, p. 176-177.
121
Idem, p. 179-180.
122
Idem, p. 181.
123
Idem, p. 184.
124
GIRARDI, Giulio. Desenvolvimento Local sustentável, poder local alternativo refundação da
esperança. In: Por um mundo diferente: alternativas para o mercado global. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2003, p. 9.
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53
da práxis em si, tornando a possibilidade de transformações efetivas e superação
consciente.
Como observado anteriormente, o homem comum não enfrenta as
situações cotidianas de forma pura ou isenta, ele o é capaz de abstrair, pois
ele se encontra condicionado historicamente e socialmente a uma dada realidade,
o que faz com que suas ações sejam tidas como práticas.
Na construção de uma sociedade nova sinalizada pela emancipação de
todas as pessoas e pela igualdade é necessária uma mudança pela raiz e não
uma simples reforma que acomoda e encobre os sinais de morte e injustiça. O
anúncio do evangelho sinaliza esta nova sociedade e alimenta a esperança de
transformação social. Nesta direção a práxis pastoral litúrgica colabora para dar
uma interpretação às novas dinâmicas sociais e econômicas, possibilitando a
descrição e análise da complexidade imposta pela globalização neoliberal. Para
que haja maior êxito nesta tarefa, a pastoral litúrgica deve buscar fundamentação
na práxis, como método de observação, reflexão, e ação sobre a realidade.
Ao ter a práxis como referencia no fazer litúrgico, a interpretação dos sinais
oriundos da globalização neoliberal torna-se mais precisas e propositivas,
possibilitando a resistência e a denúncia dos aspectos perversos desta
globalização. Por isso é necessário conhecer em profundidade o espaço em que
a pastoral litúrgica i se desenvolver, pois sem uma leitura cuidadosa da
realidade, toda construção tende à abstração.
Assim, o segundo capítulo desta pesquisa busca compreender os dados da
realidade da Comunidade de Heliópolis.
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54
CATULO II
HELIÓPOLIS: CAMINHOS DA OCUPAÇÃO
O propósito deste capítulo é analisar o processo de formação da
Comunidade de Heliópolis, em São Paulo, tida como a maior favela da cidade e
segunda da América Latina. Para tanto é necessário considerar que os processos
que desencadearam o seu surgimento possuem raízes no próprio
desenvolvimento da cidade de São Paulo, estando assim inserida neste processo
histórico. Desta forma o capítulo aborda a constituição da Comunidade de
Heliópolis tendo como referencias os impasses e conflitos estabelecidos nas
relações com as gestões municipais em momentos históricos distintos, que foram
as gestões municipais de Reynaldo de Barros, Mário Covas e Jânio Quadros,
considerando que estes três momentos tiveram uma grande importância para a
ocupação, resistência e organização dos moradores.
Compreendemos que esta investigação se desenvolve a partir das
análises históricas e sociológicas. Todo tipo de contradição e conflito se
estabelece nas cidades. A complexidade do contexto urbano faz muitas vezes
afirmar que existem muitas cidades se inter-relacionando num mesmo espaço.
No Brasil, existe uma relação muito estreita entre as políticas urbanas
(planejamento e gestão urbana) e o desenvolvimento do capitalismo. Observa-se
que tais políticas derivam das determinações do capital em nível internacional,
que influencia decisivamente tanto no planejamento urbano como na gestão
urbana
125
.
125
Por planejamento urbano entende-se como uma atividade que remete ao futuro, como busca
de prever a evolução do fenômeno ou do processo urbano. Enquanto gestão urbana remete ao
presente, buscando administrar determinadas situações dentro de uma conjuntura específica,
tendo em vista os recursos e necessidades imediatas.
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55
A Igreja Metodista em Heliópolis se constitui no contexto histórico de
organização desta comunidade, por isso a relevância em elaborar
preliminarmente a sua análise, neste capítulo, na direção de uma ação pastoral
litúrgica que motive os movimentos populares para a transformação social e a
efetiva libertação do ser humano.
2.1. São Paulo: produção do espaço urbano
São inúmeras as possibilidades de análises e compreensão do espaço
metropolitano, como analisa Silvana Maria Pintaudi, realizar uma síntese sobre
qualquer assunto relacionado com o espaço urbano das dimensões de São Paulo
é uma temeridade
126
. A análise a ser feita aqui exige que se faça opções de
ordem metodológica e histórica, com o objetivo de compreender os caminhos que
levaram à ocupação da gleba de Heliópolis.
Não se pode perder de vista o fato de que as mudanças no modelo
econômico, com o desenvolvimento industrial trouxeram novas características
para a paisagem urbana em São Paulo, que o esgotamento do padrão periférico
na década de 1970 somados ao renascimento dos movimentos populares, que
lutavam pela moradia, deram os rumos para que ocorresse a ocupação, a
resistência e organização dos moradores de Heliópolis.
Desta forma a compreensão destes três aspectos torna-se necessária para
uma análise sobre as lutas pela moradia no Heliópolis.
2.1.1. Alterações do paradigma econômico
No processo de urbanização no Brasil destaca-se a mobilidade da
população pelo território, possuindo como fator gerador as desigualdades
econômicas e regionais presentes no país. A urbanização da cidade de São Paulo
126
PINTAUDI, Silvana Maria. São Paulo, do centro aos centros comerciais: uma leitura. In:
CARLOS, Ana Fani A.; OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino (orgs). São Paulo: Contexto, 2006, p. 213.
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56
se insere no contexto de transferência de recursos do setor agro-exportador para
o setor industrial, uma mudança no paradigma econômico, a cidade recebe uma
parcela destes capitais, incentivando a industrialização e tornando-se um pólo de
atração para grandes contingentes populacionais. Ao analisar este processo,
Lúcia Bógus observa que:
De fato, já a partir dos anos 30, o Estado iniciava uma política de
transferência de recursos do setor agro-exportador para o setor
industrial, passando também a regular a relação capital-trabalho
(...). o parque industrial nacional, localizado de forma concentrada
no eixo Rio-São Paulo, passou a receber contingentes cada vez
maiores de população oriunda do meio rural, onde a
desagregação das relações de trabalho, estabelecidas à época do
café, empurravam contingentes de trabalhadores para as áreas
urbanas
127
.
Neste contexto econômico, nota-se a solidificação da posição hegemônica
da cidade de São Paulo no âmbito nacional, transformando a cidade na mais
importante área de imigração de todo o Brasil, nos anos 1930
128
. Esta
capacidade de atração exercida pela cidade não foi acompanhada na mesma
proporção dos fatores necessários para receber este grande contingente que se
deslocava em busca de oportunidades de trabalho e moradia. Desde muito cedo,
houve uma separação espacial da população de trabalhadores migrantes de
baixa renda do restante da população. Bógus argumenta ainda que,
historicamente o que se observa é que:
Até os anos 30, São Paulo era uma cidade pouco segregada,
embora com padrões de segregação bastante demarcados. Nesse
sentido, havia uma discriminação das áreas habitadas por
operários em relação à localização dos serviços e da infra-
estrutura urbana. Eram áreas de várzea, próximas às fábricas,
onde havia as piores condições de serviço e transporte
129
.
Desenvolve-se na cidade de São Paulo a partir de 1930, com o impulso
da industrialização, um processo de ocupação do solo que nitidamente separa os
cidadãos a partir da renda e ocupação. É necessário, no entanto fazer uma
observação nesta análise, como adverte Milton Santos quando analisa as
127
BÓGUS, Lucia Maria M.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (orgs.). A luta pela cidade em São
Paulo, São Paulo: Cortez, 1992, p. 29-30.
128
Idem, p. 30.
129
Idem, p. 30-31.
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57
relações entre classe, renda e lugar. Ele faz uma primeira advertência, quando
nos chama a atenção para o fato de que primeiramente podem existir exceções
com o surgimento de algumas áreas empobrecidas no interior de bairros que
contam com boa infra-estrutura e equipamentos urbanos
130
.
Ainda a partir das observações de Santos, constata-se que o fenômeno da
segregação espacial é bastante antigo, e que ao passo que desenvolvimento
no processo de urbanização estas características parecem mais claras aos olhos
do observador. Este fenômeno é observado em todo o Brasil, mas é algo
essencialmente urbano
131
, a segregação espacial.
Duas outras advertências feitas por Santos, sobre as causas espaciais da
pobreza é que ela: primeiramente está ligada a uma certa organização do espaço
que conduz a uma concentração de riquezas em poucas mãos e a segunda se
liga a impossibilidade de mobilidade devido à extrema pobreza. No entanto adotar
unicamente a análise espacialista tende a nos levar a conclusões erradas sobre
as causas da pobreza e conseqüentemente os motivos de sua localização
espacial
132
.
Feitas estas observações, notamos que o Paulo, segregou os cidadãos
que buscavam oportunidades na cidade, principalmente pela concentração de
riqueza, gerando bolsões de pobreza ora nas periferias distantes ora nas
proximidades do centro urbano, mas sempre orientados para atender os
interesses do capital.
As décadas de 1930 e 1940 são consideradas chaves na compreensão da
organização do espaço urbano da cidade de São Paulo. A partir de 1930 a cidade
se orienta para a expansão das avenidas, baseando-se na política de expansão
rodoviária presente no país. Desta política decorrem os planos de expansão
rodoviária e a abertura de novas vias
133
. O estado passa a propor também uma
política habitacional, a partir das pressões dos trabalhadores de baixa renda, que
130
SANTOS, Milton. O espaço do cidadão, 4ª. ed.,São Paulo: Nobel, 1998, p.83.
131
Idem, p.84.
132
Idem, p.84-85.
133
BÓGUS, Lucia Maria M.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (orgs.), op.cit., p. 32-33.
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58
sentiam no orçamento o peso habitação e desejava obter a casa própria, um bem
considerado essencial para a elevação das condições de vida e estabilidade
social
134
.
O contexto político deste período é o do estado getulista (1930-1945), que
possuiu uma política trabalhista e social bastante singular, reprimindo as
organizações que se encontravam fora do controle do Estado, e atraindo outras
com propostas difusas
135
, inclusive no tocante às políticas habitacionais.
Movido pela pressão popular, em 1937 o Estado propõe a criação das
Carteiras Prediais dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), uma
tentativa bastante tímida de financiamento para a casa própria. Esta iniciativa não
ficou isenta do clientelismo e por vezes foi utilizada dentro da lógica populista em
vigor. Apesar de insuficiente esta iniciativa gerou um novo padrão de ocupação do
espaço na cidade de São Paulo, que aliado com a expansão viária orientou a
ocupação para as periferias da cidade, juntamente com a autoconstrução e a
urbanização espontânea
136
.
Conforme afirma J. A. Langenbuch,
A suburbanização residencial foi propiciada, em grande parte, pelo
modo como se desenvolvia a cidade. Especulação imobiliária
exagerada expulsando, por assim dizer, uma parcela da
população funcionalmente urbana para fora da cidade, e
industrialização junto às ferrovias tornando vantajosa a fixação
residencial de operários junto a estações externas à cidade. (...) a
suburbanização residencial abrange sobre tudo pessoas de
categoria socioeconômica modesta
137
.
Este processo de ocupação da periferia, a periferização de São Paulo,
torna-se ainda mais efetivo a partir dos anos 1940-50, e é acompanhado da
grande expansão viária e em parte ferroviária da cidade. Os loteamentos o se
estabelecendo ao longo do trajeto das linhas de ônibus e trens, formando o que
viriam ser mais tarde os bairros periféricos da cidade e parte da região
metropolitana. Este processo foi motivado principalmente pela população
134
Idem, p. 30-31.
135
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2003, p. 335.
136
BÓGUS, Lucia Maria M.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (orgs.), op.cit., p. 33.
137
LANGENBUCH, J. A. A estrutura da Grande São Paulo. Rio de Janeiro, IBGE, 1971, p 136.
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59
migrante, que ocupou as periferias de São Paulo, encontrando nestas periferias o
final de uma longa trajetória na direção de melhores condições de vida, trabalho e
renda
138
.
Nota-se neste período o agravamento das condições de habitação nos
centros urbanos, obrigando os trabalhadores de baixa renda a buscar cada vez
mais o Estado para o atendimento de suas reivindicações de moradia, que não
eram atendidas satisfatoriamente, havendo desta maneira uma solução para o
déficit habitacional sem a intervenção e planejamento do Estado: a
autoconstrução da moradia.
2.1.2. Esgotamento do padrão periférico
A urbanização da cidade de São Paulo ocorre dentro de um processo
impulsionado pelas transformações econômicas dos anos 30 e 40, que orienta as
políticas urbanas e de ocupação do espaço dos anos 50 e 60, consolidando-se
como processo nos anos 70. Podemos afirmar que a expansão da periferia como
a vemos configurada hoje, isto é, por toda região metropolitana, ocorreu até a
década de 1970
139
.
A expansão populacional em direção às áreas periféricas da cidade,
denominado padrão periférico, inicia um processo de esgotamento no final da
década de 1970, e o que se passou a observar foi uma maior concentração
populacional nas áreas centrais da capital. Houve uma maior concentração da
população em cortiços dos bairros centrais e favelas
140
próximas do centro.
Quatro fatores dificultaram a expansão populacional em direção à periferia: 1. a
138
BÓGUS, Lucia Maria M.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (orgs.), op.cit., p. 35.
139
Idem, p. 35.
140
De acordo com o IBGE, favela é um: Aglomerado subnormal (favelas e similares) é um
conjunto constituído de no mínimo 51 unidades habitacionais, ocupando ou tendo ocupado até
período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular) disposta, em geral, de forma
desordenada e densa, bem como carentes, em sua maioria, de serviços públicos essenciais.
(INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA http://www.ibge.gov.br)
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60
promulgação da lei Lehman
141
, em 1979, que inibiu os loteamentos clandestinos;
2. a crise econômica e perda do poder aquisitivo do trabalhador na década de
1980; 3. a inflação que atingia os preços dos materiais de construção; e 4. a
dificuldade de crédito e ausência de políticas habitacionais
142
. Com o
esgotamento do padrão periférico, acelera-se a expansão das favelas. O
encarecimento dos lotes urbanos de um lado, dos transportes de outro, deve ter
pressionado no sentido da favelização
143
.
Ao mesmo tempo em que o padrão de expansão periférico, tende a
diminuir, existem elementos que colaboram para afirmar que ele permanece
ultrapassando inclusive os limites da cidade de São Paulo e incorporando
periferias de outras cidades vizinhas, formando grandes áreas de conurbação
144
.
Pode-se então falar de duas áreas distintas ocupadas pela população de
baixa renda dentro da estrutura urbana: as periferias, onde a segregação é mais
evidente e a ausência dos equipamentos públicos se faz notar nitidamente para
esta população; e as áreas nas proximidades do centro, onde esta população vive
aparentemente menos segregada ao menos fisicamente dos padrões mínimos de
cidadania, mas vivendo em permanente conflito com os interesses imobiliários
desta região
145
.
141
O Governo Federal, na tentativa de reverter o quadro de deterioração urbana criou a lei nº.
6.766/79, conhecida também como lei Lehman.. a lei estabelece os padrões urbanísticos
necessários para aprovar a implantação do loteamento urbano: drenagem de águas pluviais, redes
de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário, energia elétrica pública e domiciliar e
as vias de circulação, pavimentadas ou não. (INSTITUTO PÓLIS, Desenvolvimento urbano,
http://www.polis.org.br/). A Lei Lehman é a conseqüência negativa do Movimento dos loteamentos
clandestinos MLC em São Paulo, e levou ao quase total desaparecimento da modalidade
loteamento popular, por outro lado o movimento inibiu a especulação imobiliária e exploração
dos trabalhadores de baixa renda. (GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas
sociais, a construção da cidadania dos brasileiros. São Paulo: Loyola, 2003, p. 113).
142
BÓGUS, Lucia Maria M.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (orgs.), op.cit., p. 43.
143
SADER, Eder. Quando novos personagens entram em cena: experiências e lutas dos
trabalhadores da grande São Paulo (1970-1980). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p. 114.
144
São extensas áreas urbanas, que se formam no encontro das periferias das cidades.
145
BÓGUS, Lucia Maria M.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (orgs.), op.cit., p. 44-47.
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2.1.3. As lutas populares por moradia
As lutas por habitação em São Paulo, se inserem dentro do contexto de
demandas populares urbanas no Brasil. Na década de 1970 surgem inúmeros
movimentos populares que possuíam como pauta de reivindicação questões
relacionadas ao problema da habitação, uso do solo, serviços e equipamentos
urbanos. Como, por exemplo, o Movimento das pastorais de periferia urbana em
São Paulo, organizado pelo então arcebispo Dom Paulo Evaristo Arns. Estas
pastorais foram as primeiras manifestações de organização e mobilização popular
dos grandes centros urbanos, que trabalham com uma população carente em
plena ditadura militar no Brasil. Outro exemplo é o do Movimento dos
Loteamentos Clandestinos (MLC), na década de 1970, em São Paulo, que surge
como conseqüência direta da exploração imobiliária levada a cabo nos
loteamentos clandestinos, que vendiam áreas sem o título de posse, e após um
longo financiamento e pagamento dos tributos públicos, os proprietários
descobriam a impossibilidade de regularização dos imóveis
146
.
Ainda na década de 1970 surge o Movimento das Favelas, em São Paulo e
Belo Horizonte, com uma pauta de reivindicações que incluía inicialmente a
implantação de sistemas de saneamento sico, luz, instalação de equipamentos
urbanos, a reurbanização e finalmente a posse da terra. Deste movimento
participam muitos religiosos, que foram responsáveis pela criação de uma
pastoral das favelas e pela organização de rios congressos. A partir das
pressões do movimento o Estado passou a negociar com as lideranças das
favelas e surgem inúmeros projetos de urbanização, chegando até mesmo a
elaboração de leis e regulamentações para o uso do solo, dentre elas o
pagamento de tarifas diferenciadas e a lei de Direito Real de Uso
147
. Destacando
146
GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas sociais, a construção da cidadania dos
brasileiros. São Paulo: Loyola, 2003, p. 110 - 163.
147
Decreto Lei 271 Art. 7º - É instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou
particulares, remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real
resolúvel, para fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, ou
outra utilização de interesse social.
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62
que esta lei foi elaborada com a participação dos moradores das favelas e foi
resultado de um longo processo de lutas com os donos das áreas em litígio
148
.
Sobre esta questão Maria da Glória Gohn comenta que:
O novo movimento dos favelados surge na década de 70
estimulado pelos seguintes fatores: apoio da Igreja Católica, que
em 1976/1977 lançou programas de Pastorais às favelas em
algumas capitais brasileiras; o ressurgimento da vida associativa
no país, com emergência das lutas urbanas, sindicais e o esboço
da rearticulação partidária; e a formulação de novas políticas
estatais voltadas não mais para a desfavelização mas para a
reurbanização das favelas
149
.
As pressões populares da década de 1970 são responsáveis por inúmeras
conquistas na política habitacional para os trabalhadores de baixa renda, e
sinalizam uma mudança nas políticas públicas com a criação, em 1979, do CNDU
(Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano), que passa a ter a tarefa de
elaborar planejamentos urbanos mais participativos, para Luiz Eduardo
Wanderley, consolida-se assim uma dada filosofia de ão, esta filosofia de
ação é marcada pela descentralização do planejamento e uma maior participação
popular
150
.
Ao analisar este processo Wanderley afirma que:
Não obstante a natureza tecnicista e de exclusão social que
marcou os conteúdos e as práticas da política urbana desenhada
e executada a nível federal (sic),houve grupos e técnicos, dentro
dos aparelhos estatais, conscientes dos efeitos perversos
engendrados pelos padrões de urbanização e industrialização que
foram se configurando durante o regime militar
151
.
Estes técnicos foram juntamente com os grupos populares organizados os
responsáveis para que houvesse uma participação mais efetiva dos setores
sociais na gestão pública
152
, isso em um ambiente político que impedia por
diversos mecanismos a participação dos mesmos. Dentre os segmentos da
148
GOHN, Maria da Glória, op.cit., p. 122.
149
GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais e luta pela moradia. São Paulo: Loyola, 1991, p.
55.
150
BÓGUS, Lucia Maria M. e WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (orgs.). A luta pela cidade em São
Paulo. São Paulo: Cortez, 1992, p. 55.
151
Idem, p. 56
152
Idem, p. 55-56
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63
sociedade que deram apoio e assessoria aos movimentos por moradia,
contribuindo para a formação política e a práxis dos movimentos, destacam-se o
clero católico, algumas grupos protestantes, sindicalistas e profissionais
liberais
153
.
Observando a participação destes grupos, Gohn afirma que:
A consciência transformadora não se constrói espontaneamente, a
partir meramente da existência dos problemas. Ela se constrói no
próprio processo das lutas. E observamos que nos movimentos
sociais populares urbanos há sempre elementos mais politizados
que organizam as lutas e as mobilizam no cenário urbano
154
.
A práxis, por assim dizer, dos movimentos que lutam por moradia se deu
no campo de embates cotidianos com o poder público e privado e no diálogo com
outros setores da sociedade que possuíam como interesse comum a
transformação social, ou seja, justiça e o reconhecimento dos grupos oprimidos
por uma lógica econômica que expropriava as pessoas de viver em condições
dignas.
Como sugere Luiz Antonio Falcoski
155
, é possível afirmar que desde o
início da década de 1970, já existiam condições propícias para uma efetiva
transformação nas políticas públicas, em especial sobre processos de
urbanização e expansão das áreas periféricas urbanas. Tal condição decorre
principalmente do papel ativo e dinâmico desempenhado pelos movimentos
populares que exerciam importante pressão na pauta de reivindicações e na
formulação das políticas urbanas e dos Planos Diretores.
A década de 1970 apresenta ainda a absoluta falta de alternativas para a
questão da habitação, particularmente na cidade de São Paulo, com um déficit
habitacional insustentável, tornando a ocupação de terras urbanas, uma medida
necessária como forma de solucionar a questão. Ao analisar o processo de
ocupação urbana, neste período, Arlete Moysés Rodrigues, observa que:
153
GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais e luta pela moradia. São Paulo: Loyola, 1991, p.
57.
154
Idem, p. 57.
155
FALCOSKI, Luiz Antonio. Estatuto da cidade e do urbanismo: espaço e processo social. In:
BRAGA, Roberto (org.). Estatuto da Cidade: política urbana e cidadania. Rio Claro/SP: UNESP,
2000, p. 63.
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64
As ocupações ocorrem em bloco, ou seja, um certo número de
famílias procura juntamente uma área para instalar-se. Esta
ocupação da área ocorre no mesmo dia para todo o grupo. As
construções, embora de responsabilidade de cada família
ocupante, são realizadas em verdadeiros mutirões, em que as
famílias que não contam com homens, são auxiliadas por
outras
156
.
Estes movimentos organizados pela população, obtiveram a assessoria de
inúmeros agentes externos (Igrejas, Sindicatos, Partidos Políticos, etc.), que
contribuíram não somente para apropriação do espaço para a moradia, mas
também para organizar as pressões necessárias para a resistência, regularização
fundiária e as mudanças nas políticas urbanas, que se faziam também
necessárias.
Na observação de Falcoski, os movimentos sociais e populares urbanos
conduzem as políticas urbanas para a superação da noção tecnocrática,
incorporando uma nova forma de planejamento urbano, com uma visão técnico-
política, destacando três aspectos principais:
Que o os planos diretores fossem instrumentos de reforma urbana,
garantindo a função social da cidade e da propriedade;
Que os planos diretores tivessem um caráter redistributivo, com um
planejamento descentralizado; e.
Que os planos diretores fossem instrumento de gestão política da cidade
com um planejamento participativo
157
.
Em decorrência desta participação popular iniciada na década de 1970, é
elaborada uma Carta de Princípios no II Fórum Nacional do Movimento Nacional
de Reforma Urbana (MNRU), 1989, após a promulgação da constituição de 1988,
tida como a constituição cidadã, justamente por contemplar várias reivindicações
oriundas dos movimentos populares. Esta carta irá influenciar, em 1990, a
proposição do projeto de lei 5788, que favorece uma maior participação no
156
RODRÍGUEZ, Arlete Moisés. Moradia nas cidades brasileiras. São Paulo: Contexto, 2003, p.
43.
157
FALCOSKI, Luiz Antonio, op.cit.,p. 65.
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65
planejamento urbano, com uma gestão solidária e participativa, além de apontar
para elementos essenciais para uma efetiva reforma urbana
158
.
Neste contexto as lutas pela moradia se organizam de diferentes modos,
como se pode observar no quadro a seguir proposto por Maria da Glória Gohn. A
observação deste quadro nos permite notar que as lutas pela moradia em São
Paulo se dividiam em diferentes categorias de moradores, que possuíam lutas e
reivindicações também diferentes, mas que contavam com uma base de
assessoria relativamente comum. Estas assessorias contribuíram, em certa
medida, para a reflexão necessária e o elevado grau de conscientização dos
movimentos, entretanto devemos salientar que estes grupos de acessórias
vivenciavam as lutas mais do ponto de vista teórico, não assumindo,
necessariamente, os embates concretos que se davam no interior dos
movimentos populares, o que levou a um certo distanciamento e independência
destes grupos por diferentes motivos: da Igreja onde os padres ficaram no meio
do caminho entre a moderna teologia da libertação e a igreja tradicional; e dos
partidos interessados nos movimentos como massa de manobra
159
.
Assim, o quadro da luta pela moradia popular em São Paulo, entre 1976 a
1986, revela a parte da complexidade que envolve a questão na cidade de São
Paulo. Quando se observa, por exemplo, as diferentes categorias de moradores
na cidade, se nota que existem ao menos 7 categorias diferentes, que por sua vez
vivem situações também diversas, que levam a lutas, reivindicações, formas de
atuação e organização, muito particulares em cada grupo.
As assessorias se dividem basicamente em três grupos: 1. movimento de
defesa do favelado, centro acadêmico 22 de agosto e centro acadêmico 11 de
agosto, este grupo irá priorizar a questão legal envolvendo os loteamentos
clandestinos na cidade; 2. agentes pastorais e igrejas, funcionários da câmara
municipal, comissão de justiça e paz, movimento de defesa do favelado, partidos
políticos e sindicatos, a atenção destes agentes externos irá recair sobre os
moradores das favelas, conjuntos habitacionais e cortiços, e 3. agentes pastorais
158
Idem, ibid.
159
GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais e luta pela moradia. São Paulo: Loyola, 1991, p.
53-54.
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e igrejas, FASE (Federação de órgãos para assistência social e educacional),
arquitetos autônomos e INFORMAR.
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Luta Por moradia Popular Quadro p. 161
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As lutas por moradia popular na cidade de São Paulo, se articularam em
diversas frentes, e tiveram a contribuição da igreja, dos partidos políticos e alguns
agentes que atuavam no interior dos governos, como é possível notar no quadro
anterior. A organização da luta por moradia teve pelo menos cinco modos
diversos:
Lutas pelo acesso a terra e à habitação, que organizaram uma série de
ocupações, e que se inspiraram nos Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra;
Lutas pela posse da terra, que são as lutas mais antigas pela regularização
da posse da terra, dentre elas se destacaram o PROMORAR, com o apoio Igreja
e do Partido dos Trabalhadores e o Movimento em defesa dos favelados, com o
apoio da Igreja e da Frente Nacional do Trabalho;
Lutas no âmbito dos processos construtivos, que foram aquelas que
giraram em torno da necessidade de construção de habitações populares como
forma de sair do aluguel, estas lutas organizaram uma série de cooperativas de
construção de ajuda mútua e autogestão, organizaram-se muitos mutirões de
construção;
Lutas dos inquilinos, que foram as lutas travadas pelos moradores dos
cortiços, que gerou o Movimento dos sem casa;
Lutas dos proprietários pobres, que foi a luta daqueles que adquiriram
terrenos das mãos de grileiros e se viram na impossibilidade de legalizar a posse
ou ainda daqueles que adquiriram do poder público (COHAB e PROMORAR) e
também não obtiveram título de posse definitiva
160
.
A complexidade da organização espacial na cidade de São Paulo atende à
lógica da urbanização coorporativa, com uma cidade que vive a contradição de
ser espaço para humanos, mas que serve aos interesses econômicos e
financeiros e não a sociedade, é o que Santos denomina de espaços sem
160
Idem, p. 61-67.
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69
cidadãos
161
. A luta pela moradia e os inúmeros choques com os interesses
conflitantes da especulação imobiliária, está inserida na luta pela conquista da
cidadania.
Após estas considerações iniciais sobre a organização do espaço na
cidade de São Paulo e as lutas sociais por moradia, vamos analisar
especificamente a constituição da favela de Heliópolis, que se insere nas lutas por
moradia e cidadania na cidade. Trata-se da segunda maior favela do Brasil e uma
das maiores da América Latina.
2.2. A Comunidade de Heliópolis: características físicas e
humanas
Heliópolis esta situada na região Sudeste da cidade de São Paulo,
pertencente à subprefeitura do Ipiranga, que possui uma população residente
próxima de 300.000 pessoas
162
. A comunidade faz limites com as cidades de São
Bernardo do Campo e São Caetano do Sul
163
.
Atualmente a área pertence a COHAB (Companhia Metropolitana de
Habitação de São Paulo), e possui aproximadamente 950.000 metros quadrados
(do tamanho do Parque do Ibirapuera), que são divididos em duas áreas pela
Avenida Almirante Delamare (conforme mapa que segue do complexo Heliópolis
São João Clímaco, na próxima página). A maior possui cerca de 840.000 m
2
e a
menor 110.000 m
2
.
Os trabalhadores residentes em Heliópolis são em sua grande maioria
assalariados (73,25%), principalmente operários de metalúrgicas que se
161
SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. 4ª ed. São Paulo: Nobel, 1998, p. 43-44.
162
PMSP / Notícias. Prefeito visita Heliópolis e anuncia regularização de moradias em toda a
cidade. São Paulo, 05/01/2006. http://www.prefeitura.sp.gov.br/portal/a_cidade/noticias/
163
LIMA. Carlos Franco. A religião popular: uma pesquisa-ação sobre aspectos da religião dos
trabalhadores de Heliópolis. São Paulo, PUC-SP, 1994. Dissertação de Mestrado em Ciências
Sociais, p.18.
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70
encontram no entorno (São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e São
Paulo). Os trabalhadores autônomos (10,56%) o constituídos por pequenos
comerciantes do bairro e trabalhadores da construção civil
164
. Destaca-se
inclusive no núcleo da Mina um pequeno Shopping Center e o Mec Favela (Cf.:
foto a seguir), uma lanchonete, que de acordo com Laís Fonseca (assessora de
comunicação da UNAS), faz muito sucesso entre os moradores.
Lanchonete Mec favela
Quanto á origem da população residente em Heliópolis, constata-se que a
grande maioria é formada por migrantes, o que constata a observação feita por
Eder Sader que afirma que na década de 1970 aproximadamente 70% da
população economicamente ativa da cidade de São Paulo era formada por
pessoas que haviam passado por situação de migração, e que deste contingente
35% havia chegado em São Paulo a menos de 10 anos
165
.
Pela observação da tabela a seguir, é possível constatar que a Região
Nordeste é de onde se origina a grande maioria da população de Heliópolis.
164
LIMA. Carlos Franco. op.cit., p.18.
165
SADER, Eder. Quando novos personagens entram em cena: experiências e lutas dos
trabalhadores da grande São Paulo (1970-1980). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p. 88.
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71
Origem da População residente em Heliópolis
Origem Percentual
Região Nordeste 73%
São Paulo 21%
Minas Gerais 3%
Paraná 2,5%
Mato Grosso 0,5%
Fonte: LIMA. Carlos Franco 1994.
O nível de escolarização é baixo entre os moradores de Heliópolis, quando
comparados aos dados gerais fornecidos pelo INEP, que aponta, por exemplo,
uma taxa de 28% para a conclusão da 8ª série enquanto em Heliópolis esta taxa é
de 4,5%, como é possível observar na tabela abaixo.
Grau de Escolaridade em Heliópolis
Escolaridade Percentual
Não freqüentou escola 13%
1ª a 4ª série incompleta 35%
5ª a 8ª série incompleta 37%
Ensino fundamental completo 4,5%
Ensino médio completo 10 %
Fonte: LIMA. Carlos Franco.
A população residente na Comunidade de Heliópolis, se caracteriza como
sendo constituídos por migrantes (nordestinos em sua maioria), trabalhadores
assalariados e com um grau de escolaridade abaixo da média da cidade, o que os
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72
coloca numa situação de precariedade também em suas relações de trabalho e
renda.
No mapa que segue, do Complexo Heliópolis São João Clímaco, é
possível notar a falta de planejamento urbano na ocupação da área, devido à
irregularidade no traçado das vias públicas. Duas vias públicas são fundamentais
para a circulação no complexo Heliópolis: a Estrada das Lágrimas e a Avenida
Almirante Delamare, que faz a ligação entre as cidades de São Paulo e o
Caetano do Sul.
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73
Mapa do Complexo Heliópolis - São João Clímaco
166
.
166
Mapa adaptado pelo autor. SAMPAIO, Maria Ruth Amaral. Heliópolis, o percurso de uma
invasão. São Paulo, FAU/USP, Tese de Livre Docência, 1990, p.142.
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74
Ao se referir à localização da Comunidade de Heliópolis Evânio Branquinho
afirma que:
Heliópolis tem uma localização privilegiada, pois está a cerca de
dez quilômetros do centro da cidade, próximo às concentrações
industriais de São Caetano do Sul e do início da Via Anchieta,
contando com vários corredores de circulação e um entorno com
uma boa infra-estrutura e serviços blicos, sobretudo no
Ipiranga
167
.
Destaca-se o fato de que a infra-estrutura de que fala Branquinho se
encontra nos arredores da comunidade, não existindo no seu interior
equipamentos públicos como escolas e creches, devido à falta de regularização
da área o que de acordo com as associações de moradores é um entrave para a
cidadania efetiva de seus moradores.
Não existe hoje nenhuma contribuição por parte do poder público na
construção das casas. As construções são realizadas tão somente pela prática
dos moradores, neste aspecto adverte Laís Fonseca, assessora de comunicação
da UNAS, existem casas em condições precárias de construção
168
.
2.2.1. A comunidade de Heliópolis: luta por moradia e regularização
fundiária
A comunidade de Heliópolis se insere de forma muito particular nas lutas
pela moradia na cidade de São Paulo, ela surge no contexto das lutas mais gerais
dos trabalhadores de baixa renda e é resultado do descaso do poder público
aliado à lógica da urbanização coorporativa. Heliópolis não surge como uma
ocupação espontânea, mas é resultado de uma prática herdada dos governos
autoritários, que transferia grandes contingentes populacionais visando atender
167
BRANQUINHO, Evânio dos Santos. Do Higienópolis ao Heliópolis: fragmentos urbanos de uma
metrópole e a sua (crise de) identidade. Dissertação de Mestrado. São Paulo, FFLCH-USP, 2001,
p. 141.
168
Entrevista realizada no dia 03 de outubro de 2006, na sede da UNAS. Rua da Mina, 38.
Heliópolis SP
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75
aos interesses da especulação imobiliária. Assim, o percurso da ocupação da
área onde hoje se localiza a comunidade de Heliópolis deve ser feito
cuidadosamente para que seja possível compreender a comunidade, que ainda
não conquistou sua cidadania plena e ainda luta para se tornar um bairro, obter a
regularização fundiária
169
e a posse definitiva do solo.
A Comunidade de Heliópolis, como é denominada por seus moradores, é
resultado de diferentes fatores, o primeiro deles foi a ação direta da Prefeitura da
Cidade de São Paulo, que entre os anos de 1971/72 , realizou a transferência dos
moradores de outras duas favelas da cidade: a de Vila Prudente e a de Vergueiro.
Ambas para liberar as áreas para a construção de obras públicas. Os moradores
destas duas favelas formam o primeiro núcleo de moradores de Heliópolis, que
foram transferidos para alojamentos provisórios, eram aproximadamente 160
famílias
170
.
A área onde se localiza Heliópolis, pertencia na década de 1970 ao IAPAS
(Instituto de Administração e Previdência e Assistência Social), que construiu o
Hospital de Heliópolis, inaugurado em abril de 1969. Após sua inauguração os
arredores foram sendo ocupados por muitos operários que haviam trabalhado na
construção do Hospital, o que caracteriza um segundo movimento de ocupação
da área. Concomitantemente, iniciava um processo de grilagem da terra
171
, nas
proximidades da Estrada das Lágrimas, uma das principais via de acesso da
área
172
.
169
As favelas, por se localizarem em áreas públicas ou privadas sem uso, e por não observarem o
que prevê a legislação urbana (especialmente a Lei federal 6.766, de 1979, que aborda a questão
do parcelamento e do uso do solo urbano), necessitam de regularização fundiária, para se
adequar à lei. Esta regularização possui vários elementos: garantia formal de permanência
(desapropriação e distribuição de títulos), realização de melhorias na infra-estrutura urbana, etc.
(SOUZA, Marcelo L.; RODRIGUES, Glauco B. Planejamento urbano e ativismos sociais. São
Paulo: UNESP, 2004, p. 125)
170
SAMPAIO, Maria Ruth Amaral. Heliópolis, o percurso de uma invasão. São Paulo:FAU/USP,
Tese de Livre Docência, 1990, p. 29.
171
O Termo se refere originalmente à falsificação de escrituras de posse onde eram utilizados os
excrementos dos grilos para dar aos papeis a impressão de antigos. São aos mecanismos
utilizados por pessoas ou empresas para venderem terras alheias com a apresentação de
documentos de posse forjados. A ação dos grileiros está quase sempre associada à violência
como forma de garantia do domínio sobre a área por eles controlada.
172
SAMPAIO, Maria Ruth Amaral, op.cit., p. 30-32.
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76
Maria Ruth Amaral de Sampaio descreve este momento da seguinte
maneira:
Quando o IAPAS se deus conta, a ocupa
ção da gleba era uma
realidade, e a solução adotada foi impetrar uma série de
reintegrações de posse contra os grileiros e demais ocupantes da
gleba.
Data da
í a organização da população moradora, que nessa
ocasião já estava começando a reivindicar serviços de água e
luz
173
.
Já haviam se passado cinco anos, (1977), desde que as famílias
deslocadas das favelas de Vila Prudente e Vergueiro tinham chegado ao
Heliópolis, e os problemas se avolumavam: a violência dos grileiros, a falta de
saneamento básico e de infra-estrutura mínima para atender aos moradores dá
origem às organizações de diversos núcleos na comunidade
174
.
2.2.2. Heliópolis e o poder público municipal
Analisando a evolução histórica da cidade de São Paulo, nota-se que as
primeiras favelas surgiram na década de 1940, de modo muito esparso, nos
bairros da Mooca, Vila Prudente e Lapa. Em 1957 existiam aproximadamente 50
mil pessoas residentes em 141 favelas. Entretanto o fenômeno da favelização
irá se desenvolver de fato em São Paulo a partir da década de 1970, chegando
em 1973/74 a uma população de 72 mil pessoas residentes em 541 favelas, algo
em torno de 1,1% da população do município de São Paulo. Em 1980, com
dados obtidos junto à Eletropaulo, constata-se que a população residente em
favelas no município alcançara 439.721 pessoas, ou seja, 5,2% da população
municipal. Também em 1980, foi realizado pela primeira vez o levantamento de
173
Idem, p. 32.
174
Idem, p. 33.
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77
dados no Censo Demográfico que analisaram a população das favelas como
categoria específica
175
.
Os dados atuais indicam que 11,2% da população da cidade de São Paulo
vivem em favelas, são 1.200.000 pessoas residindo em aproximadamente 2020
favelas espalhadas pelo município. Um contingente populacional considerável,
ainda mais quando se considera que a taxa de crescimento desta população é
atualmente da ordem de 3% ao ano, tendo sido nos anos 1980-90 a ser de 7% ao
ano
176
.
População residentes em
favelas no município de São
Paulo (1957
2005)
1.7.3. Ano
População
1957 50.000
1973 72.000
1980 409.120
1987 812.764
1991 891.673
2000 1.160.590
2005 1.200.000
Fontes: IBGE, PMSP, PRODAM e
secretaria de habitação e
desenvolvimento humano
Ao abordar a história de Heliópolis é necessário observar mais
atentamente como o poder público se relacionou com a comunidade nos anos
que se seguiram a ocupação. O que se ressalva até aqui foi o fato de que seus
habitantes foram ali inseridos sem que houvesse qualquer preocupação com a
infra-estrutura e os que vieram posteriormente o fizeram sem nenhum plano de
ocupação e urbanização, desta forma em poucos anos se formava a maior favela
175
PASTERNAK. Suzana, Espaço e População nas Favelas de São Paulo. USP/FAU. Trabalho
apresentado no XIII Encontro da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, realizado em
Ouro Preto, Minas Gerais, Brasil de 4 a 8 de novembro de 2002.
http://www.abep.nepo.unicamp.br/
176
PMSP. Secretaria de habitação e desenvolvimento urbano / PMSP e PRODAM. Base de dados
digital do município de São Paulo. 2000.
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do Estado de São Paulo e segunda do Brasil, com a absoluta ausência de um
planejamento urbano.
2.2.3. Heliópolis na gestão Reynaldo de Barros (1979 1983)
Desde o início do governo o prefeito Reynaldo de Barros sinalizou, em seu
plano de governo que a política econômica conduzida pelos governos estatuais e
federais inviabilizava o desenvolvimento urbano de são Paulo, quando incentiva o
processo de descentralização industrial e a diminuição da oferta de empregos,
sem conter a migração para a cidade. O prefeito advertia da seguinte forma em
seu plano de governo: esse processo poderá produzir tensões sociais de difícil
controle
177
. Chama-nos atenção o fato de que ao caracterizar a infra-estrutura da
cidade de São Paulo no início dos anos 1980, o mesmo plano de governo
apontava para as carências significativas da cidade, com 50% da cidade sem
iluminação pública, uma rede de esgoto que atingia somente 40% dos habitantes
e graves deficiências nos serviços públicos essenciais como transportes, limpeza
urbana e comunicações
178
.
São Paulo, experimentava nos anos 1980 suas grandes contradições, a de
ao mesmo tempo ser uma cidade com um considerável grau de desenvolvimento
econômico
179
e abrigar sérios problemas sociais como a falta de moradia. Soma-
se a isso que os investimentos na melhoria urbana eram feitos principalmente nas
regiões centrais da cidade e bairros mais valorizados, justamente de onde a
população pobre era expulsa
180
. Este contexto reafirma a idéia de uma
urbanização coorporativa, em que, por exemplo, a construção das vias blicas
177
BARROS, Reynaldo E. Plano de governo. PMSP. 1980. In: SAMPAIO, Maria Ruth Amaral.
Heliópolis, o percurso de uma invasão. São Paulo: FAU/USP, Tese de Livre Docência, 1990, pp.
44-45.
178
SAMPAIO, Maria Ruth Amaral, op.cit., p. 45.
179
Entre os anos 1979 1980, o Brasil vivia sérios problemas econômicos, com taxas de juros e
inflação elevadíssimas. O país passa a contrair uma série de empréstimos agravando ainda mais
a crise e em 1980, tendo Delfin Neto à frente do ministério da fazenda o Brasil passa a viver um
momento de grave estagnação econômica, que levou à recessão de 1981 1983, com PIB
negativo e declínio da renda dos trabalhadores como não se via desde a crise de 1929.
(FAUSTO. Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2003, p. 502.)
180
SAMPAIO, Maria Ruth Amaral, op.cit., p. 45-46.
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atendia aos interesses imobiliários mesmo que para isso moradores tivessem que
ser deslocados ou expulsos da área.
O governo de Reynaldo de Barros, fiel à herança populista de direita de
Ademar de Barros (seu tio), iniciou definindo como prioridade a solução dos
problemas de moradia de São Paulo, num momento em que a cidade contava
com aproximadamente 400.000 pessoas morando em favelas. Com a finalidade
de executar suas intenções, o prefeito cria por decreto (decreto lei nº. 16.100/79)
os Conselhos Comunitários, no segundo semestre de 1979, com essa medida a
prefeitura pretendia se aproximar das lideranças comunitárias interlocutoras das
demandas da população, o que na realidade tratava-se de uma tentativa de
cooptação das lideranças travestida de participação popular. Também, a
intenção de atender as classes mais carentes, sem dúvida fazia parte da
estratégia do futuro candidato para chegar Palácio dos Bandeirantes
181
, sede do
governo do Estado de São Paulo, os Conselhos Comunitários atendiam
certamente estes interesses também.
Os movimentos sociais em todo o Brasil se fortaleciam, e passavam pela
tentativa de cooptação e controle por parte dos governos, houve um grande
aumento dos sindicatos e federações de trabalhadores, surgem várias lideranças
combativas influenciadas pelas pastorais criadas pela Igreja Católica, como a
CPT (Comissão Pastoral da Terra). Na região metropolitana de São Paulo, os
trabalhadores se organizam e há um fortalecimento da suas lutas, o que abriu o
caminho para as inúmeras greves que se realizaram, em 1979, cerca de 3,2
milhões de trabalhadores entrou em greve no país e ocorreram mais de vinte
paralisações de professores
182
.
Reynaldo de Barros, tendo diante do governo municipal as pressões
populares para atender as reivindicações dos moradores das favelas, implanta em
setembro 1979 um programa de urbanização de favelas, o Pró-Favela, que incluía
não a urbanização, com as melhorias de condições de habitação (luz, esgoto,
água e limpeza urbana), mas também o desenvolvimento do trabalho social na
181
Idem, p. 46
182
FAUSTO. Boris, op.cit., p. 499-500.
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80
área. No entanto este programa de urbanização não se destinava a todas as
favelas da cidade, ele somente se aplicava onde existissem condições jurídicas,
físicas e sociais permitissem o seu desenvolvimento operacional, o que restringia
um grande número de áreas ocupadas pelos trabalhadores de baixa renda. A
regularização da posse e uma definição jurídica tornavam-se uma necessidade
para que o programa fosse implantado maciçamente, o que o ocorreu, o Pró-
Favela atendeu somente 3,4% do total dos moradores de favelas. O Pró-Favela
visava muito mais fortalecer o nome de Reynaldo de Barros a candidato a
sucessão de Paulo Maluf no governo do Estado de São Paulo, do que
necessariamente solucionar o problema de moradia na cidade
183
.
A organização popular tendia a crescer na medida em que os problemas
não eram resolvidos e tratados com seriedade, aliada as insatisfações populares
e uma maior intensificação das ações das Igrejas, principalmente através das
Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e uma parcela de membros de Igrejas
Protestantes. Esta situação levou à organização do I Encontro Nacional Contra a
Carestia e direitos humanos, em 1979. Em agosto do mesmo ano tem inicio as
atividades do Movimento das favelas de São Paulo, que reunia 70 favelas da
Região Sul. Deste movimento saem muitas reivindicações que chegam até a
prefeitura através de inúmeros atos públicos em frente à prefeitura, a pressão
exercida pelo Movimento das Favelas, leva o Prefeito Reynaldo de Barros a
declarar novamente apoio ao povo mais sofrido, como estratégia de neutralizar a
organização popular, como salienta Sampaio:
Na gestão Reynaldo de Barros, falava-se muito em participação,
mas o termo tinha conotação particular. Não significava tomar
parte no projeto e nem significava opinar, escolher, discutir, poder
alterar, influir no projeto em seu todo ou nas partes
184
.
A real participação que a prefeitura propunha tinha o sentido de cooptação
das lideranças, e se preciso fosse com a troca de favores e ofertas de emprego.
Esta forma de participação acontecia em todos os programas da prefeitura.
183
SAMPAIO, Maria Ruth Amaral. op.cit., p. 46.
184
Idem, p. 52.
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A Comunidade de Heliópolis na gestão de Reynaldo de Barros, não
obstante já contar com certo grau de organização popular, por meio da Comissão
de Moradores, recebeu ainda menos atenção por parte da prefeitura, por estar
localizada em propriedade do Governo Federal, o IAPAS. A comunidade recebeu
algum auxilio dos programas municipais Pró-luz e Pró-água, que eram as
principais reivindicações da Comissão de Moradores naquele momento. A
instalação de redes de água e luz teve início em 1982. E Em 1983 o IAPAS
conseguiu a reintegração da área na justiça, causando uma enorme inquietação
entre os moradores, o que levou as lideranças a uma nova reivindicação: a
regularização da posse do solo
185
.
A solução proposta na época foi a doação da gleba para a Prefeitura do
Município de São Paulo, com a finalidade de promover a urbanização da favela e
regularização da propriedade, o que não acontece na gestão de Reynaldo de
Barros e só vem a ser retomada na gestão seguinte de Mario Covas.
2.2.4. Heliópolis na gestão Mario Covas (1983-1986):
A gestão Mario Covas inicia com uma política habitacional com base no
mutirão por ajuda mútua, o que levou à construção de 430, moradias neste
moldes, durante os quatro anos de mandato. O novo prefeito, manifestou no
documento conhecido como Carta de São Paulo, que ele compreendia que os
problemas habitacionais da cidade eram essencialmente uma questão de renda, o
que ocasionava um déficit de mais de 8 milhões habitações, somando-se a esse
fato a corrupção no Sistema Financeiro de Habitação (SFH), que levava o Estado
brasileiro a financiar habitação para as classes altas. Covas então defendia que
os recursos públicos deveriam ser empregados exclusivamente para programas
sociais sob responsabilidade da COHAB
186
.
185
Idem, p. 55.
186
Idem, p. 57-59.
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82
O Plano Habitacional na gestão Mário Covas definia como meta a
urbanização de 150 mil lotes, especialmente em áreas de propriedade pública
(quadro em que se encontrava Heliópolis), e previa investimentos públicos e
privados, além da criatividade dos moradores nos mutirões. O Plano mantinha
elementos da gestão anterior como a necessidade de condições jurídicas, físicas
e sociais para a realização de projetos de urbanização. Entretanto, avançava na
direção de uma participação popular mais eficiente, possibilitando um canal de
diálogo com a população organizada
187
.
Heliópolis durante a gestão de Mário Covas, ainda convivia com as ações
dos grileiros e a violência gerada por eles para garantir o domínio sobre a área,
que possuía aproximadamente 1917 moradias de madeira cadastradas e a
contínua chegada de novos moradores. A comunidade recebeu uma atenção, por
parte da prefeitura, que até então não havia recebido, com propostas concretas
de solução, ainda que parcial, para os problemas habitacionais. A proposta,
finalizada em novembro de 1983 possuía quatro etapas: 1. esclarecimento das
questões jurídicas; 2. doação da área pelo IAPAS para a Prefeitura de São Paulo;
3. ocupação da área com loteamentos de interesse social; e 4. elaboração de um
projeto habitacional em parceria com a população após discussões nas
assembléias de moradores. Em março de 1984 a área foi então oficialmente
transferida para o Banco Nacional de Habitação (BNH), dando condições para
que a COHAB desse início às medidas para a urbanização da área
188
. Sampaio
afirma que:
É importante ressaltar que as pressões que a PMSP efetuou junto
ao BNH para transferência da gleba decorreram das pressões que
ela própria vinha sofrendo, através da COHAB, da população
moradora de Heliópolis. As lideranças da favela também
pressionaram o IAPAS e o BNH, em suas sedes regionais em São
Paulo
189
.
Ao mesmo tempo em que esta situação significou uma vitória dos
moradores, após 14 anos de lutas em Heliópolis, ouve também um grande afluxo
de pessoas e ações dos grileiros, que passaram a ver em Heliópolis as condições
187
Idem, p. 60-61.
188
Idem, p. 63-66.
189
Idem, p. 63.
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83
para a obtenção da casa própria e a especulação imobiliária, o que levou a um
processo de novas ocupações e a ação da COHAB proibindo novas construções
e instalações de luz e água na área.
A ação da Comissão de Moradores e das Associações existentes nos
diversos núcleos foi fundamental antes desta conquista e no período
subseqüente. A Comissão de Moradores e as associações passaram a realizar
diversas reuniões com o objetivo de continuar pressionando a Prefeitura de São
Paulo a proceder então a compra da área e a posterior venda dos lotes para os
moradores. Neste aspecto o Centro Comunitário situado na Rua da Mina, 38
(onde hoje esta situada a UNAS União de Núcleos, Associações e Sociedades
dos Moradores de Heliópolis e São João Clímaco), teve um papel muito
importante, pois lá foram realizadas as primeiras reuniões entre os técnicos da
COHAB e os moradores com a finalidade de pensar o projeto de urbanização. Na
organização destas comissões estavam presentes diferentes grupos de fora da
comunidade como a Pastoral da Favela, partidos políticos (especialmente o
Partido dos trabalhadores PT, na figura da deputada Irmã Passoni) e o Centro
Acadêmico XXII de agosto, na figura do advogado José Mentor
190
, atualmente
também deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores.
As comissões de moradores reuniam mais de 100 pessoas dos seguintes
núcleos de Heliópolis: Mina, Flamengo, Lagoa, Viracopos, São Francisco,
Portuguesinha, Imperador, Heliópolis, Sacomã e Pam. As convocações para
estas reuniões eram feitas por meio de cartazes distribuídos pela comunidade, e
curiosamente possuíam um formato em que as imagens faziam mais referencia
ao campo do que a cidade. Certamente indicando o que empiricamente se nota
em Heliópolis, ou seja, uma grande maioria de migrantes originários do interior do
Brasil.
190
Idem, p. 64-71.
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84
Cartaz de convocação para reunião dos moradores de Heliópolis
191
.
191
UNAS - União de Núcleos, Associações e Sociedades dos Moradores de Heliópolis e São João
Climaco. Cartaz de convocação para Reunião das comissões de moradores do dia 03 de junho de
1984. In: SAMPAIO, Maria Ruth Amaral. op.cit., p.71.
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85
O papel das comissões foi de fundamental importância, na organização
dos moradores, pois o número de habitações vinha crescendo rapidamente e as
demandas da população não eram atendidas na mesma proporção pelo poder
público, entende-se a COHAB, além do fato, como se pode observar pelo cartaz
de convocação para a reunião, que a Comissão de Moradores falava na
linguagem do povo, curiosamente com características do imaginário rural. D
resultaram diversos embates entre a Comissão de Moradores e a COHAB que
tinham propostas divergentes quanto ao projeto de urbanização. A comissão de
moradores exigia que houvesse maior flexibilidade para que as próprias famílias
construíssem suas moradias e que a COHAB liberasse a ligação de água e luz.
Além disso permanecia a reivindicação principal dos moradores,a regularização
da área e a posse definitiva com escritura lavrada. Durante todo o ano de 1984 as
tensões foram muito grandes, chegando a ponto de a COHAB ameaçar com
ações judiciais e finalmente resolver construir uma cerca de arame farpado ao
redor da área (aproximadamente 6.900 metros), como forma de conter as
ocupações, trabalho executado por uma empresa de engenharia e logo em
seguida desfeito por obras da SABESP na região e pela ação dos moradores
192
.
A Prefeitura Municipal que vinha até então acompanhando os
acontecimentos com certo distanciamento, volta a se envolver diretamente,
quando o então prefeito Mário Covas, em discurso de inauguração de uma praça
no bairro do Ipiranga, após pressões dos moradores de Heliópolis, se pronuncia
dizendo que o projeto de urbanização irá de fato acontecer. Entretanto não se
realiza de acordo com as expectativas dos moradores, que desejavam a casa
própria e condições dignas de habitação. Não alcançando assim a condição de
moradores de um bairro, com plenos direitos, inclusive o de solicitar a ligação de
água e luz.
Aparentemente, ficou então para que o próximo prefeito, Jânio Quadros,
buscasse a solução dos problemas habitacionais de Heliópolis e as demandas
sociais de sua população residente. No entanto, após estes anos de intensa luta e
192
Idem, pp. 72-77.
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86
organização, a comunidade compreendeu que era necessário das um passo na
direção do fortalecimento e da reflexão, surge então a UNAS.
2.2.5. Heliópolis na gestão Jânio Quadros (1986- 1988): a luta pelo
mutirão
O ano de 1986 inicia com o anúncio ao país do Plano Cruzado, em
fevereiro, o então presidente José Sarney comunica em rede nacional que o
cruzeiro seria substituído por uma nova moeda, o cruzado, a taxa de cambio, e os
aluguéis congelados por um ano, convocando o povo a travar uma luta contra a
inflação e a tornar-se em fiscais do Sarney
193
.
No mesmo ano Jânio Quadros assume a Prefeitura do Município de São
Paulo, tendo como prioridades os transportes, grandes obras viárias, a limpeza
urbana e o desfavelamento. Esta última prioridade foi levada a cabo logo nos
primeiros meses com a retirada da Favela de Cidade Jardim, que foi substituída
por um parque, o que deixava evidente a tendência do novo prefeito em retirar as
favelas das regiões de grande circulação ou assentadas em áreas de alto valor
imobiliário. Também Heliópolis foi atingida pela gestão de Jânio Quadros, em seu
objetivo de desfavelamento, o prefeito tentou despejar os moradores, que
organizados em comissão geral resistiram chegando a ocupar o escritório da
COHAB, e a partir destes fatos se estabeleceu uma tensa e conflituosa relação
com a prefeitura
194
.
Outro aspecto que marcou a gestão Jânio Quadros foi a resistência do
prefeito em levar adiante os projetos de mutirão e ajuda mútua, antes o prefeito
optou pela aprovação da Lei do Desfavelamento (Lei nº. 10.209), que beneficiava
grandes empreiteiras que se comprometiam com a doação de casas em áreas
193
FAUSTO. Boris, op.cit., p. 522.
194
LIMA. Carlos Franco. A religião popular: uma pesquisa-ação sobre aspectos da religião dos
trabalhadores de Heliópolis. São Paulo, PUC-SP, 1994. Dissertação de Mestrado em Ciências
Sociais, p.17.
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87
de favela, pois estas recebiam a concessão de mudança nos índices de
construção
195
.
É importante destacar que na gestão Jânio Quadros, uma intensificação
da defesa intransigente e truculenta da propriedade privada sem uso, que por
vezes eram ocupadas por sem tetos. Inclusive, em um processo de desocupação
violento ocorrido na cidade, ocorre o assassinato de um sem teto, Adão Manoel
da Silva, morto pela Guarda Municipal de São Paulo, sob o comando de José
Ávila da Rocha. O que se observa, neste período é uma enorme repressão aos
movimentos que lutavam por moradia, com a utilização de forte aparato policial e
inúmeros enfrentamentos violentos
196
.
Jânio Quadros modifica a forma de atuação da COHAB, que passou a
atuar como uma grande empreiteira de obra, chegando a mudar inclusive as
metas de população que deveria ser atendida pelos projetos, passando a atender
pessoas com renda de até dez salários mínimos, quando na gestão anterior o teto
era de cinco salários mínimos. O que dava mostras de uma gestão ainda mais
orientada para atender uma parcela da população, ignorando os graves
problemas de moradia da cidade, especialmente para os trabalhadores de baixa
renda.
Movido pela repulsa pelos projetos de mutirão, Jânio Quadros início ao
Plano Preliminar de Ação para o desenvolvimento do Projeto Heliópolis. Onde os
moradores e lideranças temiam as ações do Prefeito, primeiramente por sua
iniciativa unilateral de remoção de favelas e segundo por sua resistência em
permitir os mutirões. Mesmo com a proposta do novo projeto habitacional sendo
discutida, a UNAS convocou os moradores para um ato na Praça da Sé, em
agosto de 1986, por entender que uma das metas deste plano era a remoção de
famílias do Heliópolis. Novamente as tensões entre moradores e prefeitura se
195
SAMPAIO, Maria Ruth Amaral, op.cit., p. 88.
196
RODRÍGUEZ, Arlete Moisés. Moradia nas cidades brasileiras. São Paulo: Contexto, 2003, p.
46.
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88
acirram, e na ocasião a assessoria do advogado da UNAS Dr. José Mentor foi
necessária na formulação de propostas para o Projeto
197
.
A UNAS em consonância com os princípios do Movimento Unificado dos
Favelados, continuava então a insistir no Direito Real de Uso, bandeira defendida
desde os anos 70 e que vinha sendo ignorada pelo poder público.
Em outubro de 1987, não obstante a recusa anterior em permitir a
construção por mutirões, Jânio assinou com a Secretaria Especial de Ação
Comunitária (SEAC), órgão do governo federal, um acordo para a construção de
10 mil casas em regime de mutirão. Numa ação que tinha evidentes fins políticos.
Parte da verba acabou sendo utilizada para realizar as reformas e melhorias em
mais de 2000 mil casas em Heliópolis, atendendo assim projetos anteriores de
urbanização da área. O SEAC, praticamente abandonou a coordenação dos
mutirões, deixando a população sem atendimento técnico suficiente para levar
adiante o projeto, assim, o acompanhamento das atividades de mutirão acabou
sendo coordenado por Cláudio Roberto Scheel, um estudante do 5º ano de da
Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAUUSP), que na
ocasião era assessor voluntário da UNAS e estava lá para desenvolver seu
projeto de graduação
198
.
2.2.6. UNAS: um marco na história da organização popular em
Heliópolis
A criação da UNAS União de Núcleos Associações e Sociedades dos
Moradores de Heliópolis e São João Clímaco é certamente um marco na
história da organização dos moradores da Comunidade de Heliópolis. A entidade
surgiu em 1986, com apoio da Pastoral da Igreja Católica e outras entidades da
sociedade civil, tendo como meta a conscientização e a mobilização dos
197
SAMPAIO, Maria Ruth Amaral, op.cit., p. 89-96.
198
Idem, p. 126.
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89
moradores
199
. Ela se forma a partir da união dos diversos núcleos, associações e
sociedades de moradores de Heliópolis e São João Clímaco, compreendendo que
a unidade na luta pela moradia é um instrumento de fortalecimento para avançar
nas conquistas.
Ao analisar o processo histórico da criação da UNAS, a assessora de
comunicação da associação, Laís Fonseca argumenta que:
A organização da UNAS veio como uma exigência das relações
com empresas e a sociedade civil, pois como movimento de
moradores tornava-se difícil a realização de parceiras e projetos
(...).
Quando iniciou a ocupa
ção era um movimento de pessoas sem
um entendimento maior dos seus direitos como cidadãos e
pessoas humanas, no movimento, as pessoas tiveram muitos
problemas com os grileiros, neste momento houve um encontro
entre os moradores e a pastoral, que trabalhava com a teologia da
libertação, a pastoral sempre esteve junto com o movimento,
filiando, (catequizando) orientando, para que pudessem ter um
entendimento de seus direitos. A pastoral contribui para o
entendimento e uma visão mais elevada de conscientização, o que
durou vários anos. O movimento nunca foi liderando pela
pastoral
200
.
A UNAS, atualmente mantém inúmeros projetos sociais: o Centro de
educação Infantil, que atende crianças de zero a seis anos, onde a socialização é
o principal objetivo e o projeto pedagógico trabalha com a oralidade infantil,
administra ainda outras quatro creches em convênio com a Prefeitura do
Município de São Paulo, atendendo cerca de 600 crianças em período integral.
Possui ainda os Núcleos Sócios Educativos, que atendem crianças de sete
a quatorze anos, com o objetivo de ser um espaço de reflexão crítica e de
promoção da cidadania; o Projeto de Inclusão Digital, com um tele centro
instalado na comunidade (cf.: foto a seguir), atendendo mais de 2.000 pessoas
por mês, em 17 computadores cedidos pela prefeitura; o movimento de
alfabetização de jovens e adultos (MOVA), atendendo 350 pessoas; o movimento
dos sem teto, com atividade que organizam a população em suas ações junto aos
199
REVISTA UNAS HELIÓPOLIS. UNAS, trajetória de lutas e conquistas. São Paulo, S/d, p. 5.
200
Entrevista realizada no dia 03 de outubro de 2006, na sede da UNAS. Rua da Mina, 38.
Heliópolis SP.
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órgãos públicos; a assistência jurídica em parceria com a Procuradoria Geral do
Estado; o projeto Liberdade Assistida, que visa atender jovens em conflito com a
lei entre 12 e 18 anos, com atividades educacionais, culturais e esportivas; a
lavanderia comunitária, instalada em parceria com a empresa privada UNILEVER
com o objetivo de diminuir os custos com água e luz dos moradores, espaço
também utilizado para a discussão política sobre a comunidade
201
.
Tele Centro de Heliópolis / Sede da UNAS Rua da Mina, 38
Estes projetos e programas não chegam a atender 1% dos moradores da
comunidade, pois A Comunidade de Heliópolis vive uma grande carência de
recursos e investimentos para atender a totalidade dos moradores, especialmente
as crianças e jovens
202
.
A UNAS atua de forma a canalizar os anseios da população de Heliópolis,
sendo por voz das reivindicações dos moradores. No dizer de uma moradora da
201
REVISTA UNAS HELIÓPOLIS. UNAS, trajetória de lutas e conquistas. São Paulo, S/d, pp. 6-
12.
202
UNAS O SITE DA COMUNIDADE DE HELIÓPOLIS. http://www.unas.gov.br . pesquisa
realizada em 27/09/2006.
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Comunidade: Na UNAS é onde o Heliópolis acontece, ou seja, a associação tem
hoje responsabilidade frente aos moradores de buscar soluções para os
problemas da comunidade.
A Comunidade de Heliópolis obteve ao longo das últimas três décadas
muitas vitórias, alcançando, por exemplo, a marca de ser a maior favela
urbanizada do país, faltando pouco mais de 2% para a sua urbanização total.
Entretanto, como observa Laís Fonseca (assessora de Comunicação da UNAS) a
comunidade mantém ao menos cinco bandeiras de lutas, fundamentais para a
comunidade, como vemos a seguir:
A luta pela moradia e posso da terra, com as regularizações fundiárias, que
permanece sendo a principal bandeira de luta, e que enquanto não for
definitivamente conquistada não será deixado de lado. a maior bandeira de luta é
a habitação;
A melhoria da qualidade das moradias na comunidade ainda não ocorreu,
pois ainda existem barracos de madeira nas margens dos córregos (cf.: fotos a
seguir); Instalação de creches e melhoria da qualidade na educação. E nesta
direção a UNAS já atua em parceria com a Escola Municipal Campos Salles,
trabalhando com três eixos pedagógicos: autonomia, responsabilidade e
solidariedade, sem desvincular a formação cidadã e humana.
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Barracos sendo removidos da Estrada das Lágrimas (outubro de 2006)
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93
Barracos de madeira Avenida Almirante (outubro de 2006)
Na área da saúde, atua junto ao Hospital de Heliópolis, com o objetivo de
agilizar o atendimento, para que as pessoas tenham seus exames feitos num
prazo digno. Existem parcerias com empresas privadas (AMIL), e universidades,
palestras (DST/AIDS), exames gratuitos para detecção de doenças sexualmente.
A UNAS possui ainda como objetivo a comunicação, que acontece para
trazer uma maior compreensão sobre o Heliópolis, eliminado os preconceitos.,
buscando assim novos projetos e ações para a comunidade, dando visibilidade
para a comunidade
203
.
Uma das grandes preocupações da UNAS é a de trazer projetos que não
sejam assistencialistas e a formação de novas lideranças. Nota-se que há uma
preocupação com a formação política, pois todos os projetos têm como objetivo o
debate sobre a cidadania, a ecologia e a cultura.
203
Entrevista realizada no dia 03 de outubro de 2006, na sede da UNAS. Rua da Mina, 38.
Heliópolis SP.
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Biblioteca mantida pela UNAS em Heliópolis Rua da Mina, 52-A (outubro 2006).
A UNAS é atualmente organizada da seguinte forma: Presidente João
Miranda Neto (metalúrgico), 1º vice-presidente Delmiro Monteiro Farias
(comerciante), 2º vice-presidente Genésia Ferreira da Silva (Educadora);
Secretário Geral José Geraldo de P. Pinto (Educador); Secretário Nazareno
Antonio da Silva (Educador Popular); Tesoureira Geral Antonia Cleide Alves
(Contadora); 1º Tesoureiro Manoel Otaviano da Silva (Educador Popular); Diretor
de educação, esporte e cultura Francisco Sabino Soares (Serralheiro); Diretor de
comunicação Geronino Barbosa de Souza (Cabeleireiro); Diretor de políticas e
mobilização social João Isaías (Motorista); Diretora de patrimônio Roseli Camargo
(Educadora Popular)
204
.
Atualmente a participação da Igreja e das pastorais para a organização dos
moradores em suas reivindicações e lutas sociais é praticamente inexistente, ao
abordar a questão da presença das Igrejas na Comunidade de Heliópolis, Laís
Fonseca comenta que:
Hoje a igreja tem o papel que ela tem que ter mesmo, é uma
aliada, mais no sentido de amizade. Fizeram parte da formação
política no início do movimento na comunidade. Hoje a pastoral da
204
REVISTA UNAS HELIÓPOLIS. UNAS, trajetória de lutas e conquistas. São Paulo, S/d, p. 14.
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igreja é uma amiga. Na década de 70 sim, houve uma atuação,
naquele momento a igreja dominante era a igreja católica. Hoje
mesmo a igreja católica também se modificou
205
.
É correto afirmar que a religião demonstrou ser um fator de grande
importância na caminhada de ocupação, resistência e organização da
Comunidade de Heliópolis, o que se insere na análise feita por Júlio de Santa
Ana, quando comenta que as grandes mobilizações populares das décadas de
1970 e 1980, permite mostrar como o religioso é um fator que dinamizou e
motivou os movimentos populares para que assumissem um papel de
protagonistas de suas histórias e lutas, visto que os povos que são
profundamente religiosos não podem deixar de pensar religiosamente,
teologicamente, quando enfrentam opções cruciais relacionadas com seus
respectivos destinos históricos
206
.
No entanto, neste momento histórico, com o avanço da globalização
neoliberal e todas as suas conseqüências sociais e políticas, que certamente
diminuem todas as formas de solidariedade e organização das lutas comunitárias,
como afirma Darcy Ribeiro:
O capitalismo quebra todas as formas de solidariedade porque vê
nelas resistências ao seu desenvolvimento. As formas de
solidariedade dão força aos trabalhadores. O capitalismo pretende
reduzir o mais possível a força dos cidadãos para que estejam
mais disponíveis para as necessidades das empresas. Por isso,
promove a dissolução da família, da vida social dos bairros, das
associações de todo o tipo
207
.
Considerando que a sociedade atual é, dentre outras questões, marcada
pela ruptura com a forma de ler e explicar o mundo. As características
fundamentais são a fragmentação e o subjetivismo que se desenrolam na vida
social, onde os padrões desaparecem surgindo múltiplas expressões e
manifestações que m impacto direto sobre o sujeito religioso e suas práticas,
como comenta Ronaldo Sathler-Rosa, vivemos um tempo de impermanências.
Relações afetivas o rompidas como se os seres humanos não tivessem
205
FONSECA, Laís. Entrevista realizada no dia 03 de outubro de 2006, na sede da UNAS. Rua da
Mina, 38. Heliópolis SP.
206
SANTA ANA, Júlio. Pelas trilhas do mundo, a caminho do reino. São Bernardo do Campo/SP:
Imprensa Metodista, 1984, p. 11.
207
RIBEIRO, Darcy. Povo Brasileiro. São Paulo: Companhia das letras, 1998, p. 6.
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96
capacidade de cuidar das dificuldades próprias de qualquer relacionamento
próximo
208
.
Diante destas questões a Pastoral Urbana é desafiada a superar estes
refluxos na organização popular e a buscar uma pastoral e uma liturgia que
motive e renove as esperanças dos indivíduos, sendo portadoras de sentido e de
sinais de transformações nas comunidades, como afirma Geoval Jacinto da Silva:
Vivemos um tempo na América Latina onde nossas liturgias necessitam ser
criadora de ações que fortaleçam as ações das comunidades, não são possíveis liturgias
voltadas para o centro da comunidade, o povo precisa sair com alegria e assumir
compromissos e atos de transformações. Desta forma os desafios para as Igrejas cristãs
como motivadoras de uma liturgia que possibilite o encontro com a graça e com a
esperança de um novo tempo que vai chegar. (...) Liturgia é, por tanto, um ponto de
encontro e um ponto de partida!
209
.
Compreende-se, portanto, que a religião, por meio das suas ações
litúrgicas e pastorais, pode contribuir para o motivar as pessoas em suas lutas
coletivas e individuais. Desta forma o próximo capítulo tem como objetivo
colaborar para a análise e apontamentos para a práxis pastoral litúrgica no
contexto urbano, observando a Comunidade de Heliópolis.
208
SATHLER-ROSA, Ronaldo,op.cit.,p. 19.
209
SILVA, Geoval Jacinto. Liturgia como expresión de alegria, esperanza, gracia y servicio. CLAI,
2004, p. 11. (Texto traduzido do espanhol)
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97
CAPÍTULO III
APONTAMENTOS PARA UMA PRÁXIS PASTORAL
LITÚRGICA NO CONTEXTO URBANO
Compreende-se que a religião, por meio das suas práticas, pode contribuir
para o motivar as pessoas nas lutas sociais. Assim, esta etapa da pesquisa busca
elementos para uma liturgia que favoreça as ações transformadoras, não-
reformistas, radicais e libertadoras, ou seja, busca analisar a práxis pastoral
litúrgica no contexto urbano, a partir da comunidade do Heliópolis/SP.
A vida na cidade possibilita o surgimento de uma cultura urbana
caracterizada pela desorganização e complexidade social e cultural. Neste
ambiente surgem as iniciativas individualistas e a forte competição entre os
indivíduos é quase inevitável. Os laços familiares e comunitários tornam-se
frágeis. Tal situação revela a necessidade de se buscar uma liturgia e pastoral,
que motive e renove as esperanças dos indivíduos, sendo portadoras de sentido e
de sinais de transformações nas comunidades, onde a pastoral litúrgica seja
motivadora e criadora de ações comunitárias210.
Diante disto é necessário compreender como a religião e as sociedades se
relacionam em diferentes dimensões, para que se possa pensar uma liturgia
fundamentada na filosofia da práxis.
210
Idem, p. 11.
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3.1. Considerações para a reflexão sobre a práxis pastoral
litúrgica
A reflexão e análise sobre a práxis pastoral litúrgica exigem que se
considerem os aspectos sociológicos, teológicos e pastorais, com o objetivo de
iniciar a compreensão sobre o tema.
3.1.1. Linguagem e religião: a religião e o trabalho de organização
popular
Ao analisar o processo de construção da sociedade, Peter L. Berger,
afirma que a sociedade é um fenômeno dialético produzido pelo homem
211
, e a
religião ocupa um espaço de destaque nesta construção
212
. A religião em todos
os seus aspectos é fornecedora de sentidos e esperanças, a linguagem religiosa
se expressa como um destes sentidos. A linguagem religiosa fornece sentido
tanto para a libertação como para a alienação do homem, tanto para a
organização popular e a resistência à exploração como para o conformismo e
acomodação. Neste aspecto Pierre Bourdieu, afirma que a religião cumpre uma
função de conservação da ordem social, e conseqüentemente política e
econômica, legitimando o poder e domesticando os dominados
213
, assim:
Em outras palavras, a religião contribui para a imposição
(dissimulada) dos princípios de estruturação da percepção e do
pensamento do mundo e, em particular, do mundo social, na
211
Para Peter Berger este fenômeno dialético, consiste em um processo que ocorre em três
momentos ou passos: exteriorização a produção da sociedade pelo homem; objetivação
atividade por meio da qual a sociedade se torna uma realidade.
212
BERGER, Peter L. O dossel sagrado: elementos para uma sociologia da religião. São Paulo:
Paulus, 1985, p, 15.
213
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo:Perspectiva, 2004, p. 32.
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99
medida em que impõe um sistema de práticas e de
representações cuja estrutura objetivamente fundada em um
princípio de divisão política apresenta-se como a estrutura natural-
sobrenatural do cosmos
214
.
As práticas exercidas pela religião possuem uma linguagem poderosa (as
liturgias são expressões destas práticas), já que expressam em si elementos que
transcendem o mundo do indivíduo. Estas pticas tendem a serem manipuladas,
por um grupo restrito de pessoas, que exercem um grande poder, o que Bourdieu
denomina corpo de sacerdotes
215
, este corpo interpreta o mito, elabora o rito e
os manipula conferindo sentidos a eles.
Bourdieu assinala, ainda, que o desenvolvimento das grandes religiões
universais está associado ao processo de urbanização, sendo que o mundo
urbano contribui para a racionalização e moralização da religião, que por vez a
religião, colabora através do corpo de sacerdotes e suas práticas, para o
desenvolvimento da sociedade urbana, consagrando e legitimando a ordem social
em favor de uma determinada classe social, ou seja, a burguesia, que se
beneficia com os processos de interiorização e racionalização dos fenômenos
religiosos, (...) a transfiguração de deuses em poderes éticos
216
.
Contudo a relação desta instância religiosa com o poder político e
econômico, não se exclusivamente na esfera da legitimação e consagração da
ordem estabelecida pelas classes dominantes, isso devido ao antagonismo
existente entre o corpo de sacerdotes (tradição sacerdotal) e os profetas (tradição
214
Idem, p. 32 e 33.
215
Idem, p. 38.
216
Idem, p. 35.
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100
profética
217
). A tradição profética possui uma aptidão para lidar com as crises que
os sacerdotes não possuem. O discurso profético tem maiores chances de surgir
nos períodos de crise acirrada
218
, pois os profetas não se prendem aos dogmas e
instituições e esta liberdade lhes permite um discurso, ainda que muitas vezes,
baseado na tradição sacerdotal, capaz de mobilizar os grupos e as classes
sociais que reconheçam sua linguagem. O profeta é quem opera a revolução
simbólica que a solução das crises exige, Bourdieu afirma que: enquanto a crise
não tiver encontrado seu profeta, os esquemas com os quais se pensa o mundo
invertido continuam sendo produto de um mundo derrubado. Ele continua
observando que: a revolução simbólica supõe sempre a revolução política, mas a
revolução política não basta por si mesma para produzir a revolução simbólica
que é necessária para dar-lhe uma linguagem adequada
219
.
Citando Karl Marx, em O dezoito Brumário
220
, Bourdieu, aponta para a
necessidade que as sociedades presentes busquem em seu passado os
elementos para fortalecer as suas lutas e existência:
A tradição de todas as gerações mortas pesa excessivamente
sobre o cérebro dos vivos. E mesmo quando parecem ocupados
em transformar-se, a si mesmos e às coisas, em criar algo
inteiramente novo, é justamente nestas épocas de crise
revolucionária que evocam com temor os espíritos do passado,
tomando-lhes de empréstimo seus nomes, suas palavras de
ordem, seus costumes, para que possam surgir sobre o novo
217
A exegese bíblica revela que a tradição profética no Antigo Testamento, surge em oposição ao
poder estabelecido em Israel e Judá. Os profetas, muitas vezes pessoas oriundas do povo, se
opunham aos discursos e práticas do poder despótico dos que reinavam sobre o povo. Os
profetas possuem uma clara consciência de que cumprem um papel de denúncia com as formas
de opressão, não aceitando as estruturas corrompidas e rejeitado as ações legitimadoras de uma
ordem religiosa, política e econômica que sinalizasse a morte.
218
BOURDIEU, Pierre, op.cit., p. 73-74.
219
Idem, p. 77.
220
O Dezoito Brumário alia uma lúcida análise de eventos históricos à conceituação científica de
conexões universais, determinando assim a natureza de um fato político sempre atual: o golpe de
Estado bonapartista. Marx analisa ainda a contraditória evolução da cultura burguesa, indicando a
perspectiva justa para a avaliação do humanismo clássico, fornecendo os critérios para uma
análise das ideologias do período da decadência.
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101
palco da história sob um disfarce respeitável e com esta
linguagem emprestada
221
.
A solução para a crise, (política, social, etc.) da sociedade necessita do
encontro de um profeta, como menciona Bourdieu, o profeta é quem pode
contribuir para realizar a coincidência da revolução consigo própria, operando a
revolução simbólica que a revolução política requer
222
. Um exemplo de como o
símbolo e o rito estão cheios de elementos que também impulsiona e motiva na
busca por transformações sociais esta na mística
223
, prática presente em diversos
movimentos sociais e populares, como observa Christine Chaves ao analisar o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), afirmando que:
Múltiplos elementos conjugam-se, desde os ideais modernos de
igualdade, direito e cidadania até os sentidos religiosos da terra,
da solidariedade e da defesa da vida, passando pela crença
política na importância da disciplina e da organização e pelos
valores morais de lealdade, firmeza e coragem. Sentimentos e
crenças são acionados pelo grupo reunido em torno de mbolos
comuns e na ação conjunta em busca dos mesmos fins. No MST
elabora-se conscientemente a construção da identidade de sem-
terra e a reafirmação dos ideais e desejos condensados na "luta".
Para além dos símbolos do MST - o timbre, a bandeira, o hino - as
próprias ações são revestidas daquelas idéias e crenças políticas,
morais e religiosas. Não é incidental que essa elaboração múltipla
e multifacetada receba no MST o nome de mística
224
.
221
MARX, K. O 18 Brumário e Cartas a Kugelman, 4ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
222
BOURDIEU, Pierre, op.cit., p. 78.
223
A mística no MST é quase sempre uma atividade que precede encontros e reuniões dos
grupos, e tem como finalidade acolher os participantes e dar início às atividades. A mística é
realizada através de dinâmicas, teatro, canto e dança, possuindo um forte caráter simbólico.
Segundo João Pedro Stédile, a mística no MST é uma prática social e nela uma influência da
Igreja no sentido de ser um fator de unidade, de vivenciar os ideais; porém, procura-se que a
mística não seja somente uma liturgia propriamente dita. Neste sentido, diz Stedile, a mística deve
fazer parte da vida cotidiana, não pode ser um momento à parte, é sentimento canalizado em
direção a um ideal alcançável. Assim, o MST procura "fazer a mística" quando, em cada atividade
do movimento, ressalta o projeto global, traz para o cotidiano o projeto de conquistar o lugar
prometido para todos. [http://www.imaginario.com.br/artigo/a0061_a0090/a0064.shtml]
224
CHAVES, Christine de Alencar Chaves. Símbolos de Luta e Identidade no MST. In:
http://www.comciencia.br/reportagens/agraria/agr18.shtml - Data da Pesquisa: 10 de abril de 2005.
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102
A religião, tanto expressa elementos de conservação como de
transformação social como na mística presente no Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O desafio para a práxis pastoral litúrgica é o de buscar constantemente
elementos que possibilitem a mobilização na direção de transformações que
acrescentem dignidade aos seres humanos no seu fazer cotidiano. Isso é possível
quando se compreende de forma pormenorizada a função que a linguagem
desempenha na sociedade.
Nota-se que a linguagem é sempre essencial, para a mobilização e o
encantamento dos grupos, ela informa a realidade e o imaginário, esclarece e
exorciza os pensamentos, pela linguagem os homens se estabelecem como
humanos. Certamente por isso, no decorrer da história, e em especial no mundo
moderno, a humanidade tem buscado compreender e estabelecer teorias sobre a
linguagem. É necessário destacar que por meio da linguagem o ser humano
constrói, desenvolve e sintetiza as mais diversas realizações materiais e
espirituais, sem as quais as sociedades não se formam
225
. Na expressão
marxista, a linguagem é tão velha como a consciência humana, sendo a
linguagem a consciência prática ou real, ou seja, que existe para as outras
pessoas
226
.
As atividades humanas sempre são expressas através dos signos, e das
diversas formas de narrativa. A língua é uma dessas explosões, sem a qual o
mundo se revela carente de nome, conceito, inteligência, explicação, fantasia e
mito
227
.
As línguas representam cada uma, um modelo e forma de ver o mundo, no
mundo moderno o que se observa é uma quantidade enorme de formas de
225
IANNI, Octavio. ngua e Sociedade. Caderno Primeira Versão nº.84,
Campinas/SP:IFCH/UNICAMP, 1999, p. 9.
226
MARX , Karl e ENGELS, Friedrich. A ideologia Alemã. São Paulo: Martin Claret, 2004, p. 30
227
IANNI, Octavio, op.cit., p. 9.
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103
descrever o mundo em todos os seus aspectos. Nesta pluralidade de descrições
do mundo, encontra-se uma riqueza própria da humanidade, e que a massificação
e a imposição, por meio das pressões econômicas e políticas, busca eliminar.
Diante desta questão o que se observa é a necessidade de uma práxis
pastoral litúrgica que se articule com as diferentes formas de linguagem, com o
objetivo de fazer da esperança cristã um elemento central das ações dos seres
humanos na busca por justiça e libertação.
3.1.2 Um Mundo sinalizado pela esperança
O teólogo rgen Moltmann, com sua capacidade de reflexão sobre os
problemas do presente e a sua convicção de que o cristianismo possui algo para
dizer ao mundo atual, contribui para a pastoral urbana, na medida em que sua
produção acadêmica, particularmente em seu livro Teologia da esperança,
destaca o tema da esperança como um eixo norteador da práxis pastoral. A
teologia da esperança de Moltmann é resultado de seu aprofundamento sobre a
escatologia e a redescoberta de seu caráter transformador e criativo.
Para Moltmann a esperança cristã se cumpre não pela especulação mas
na práxis, em meio à ação política e a revolução, sendo uma atividade criativa. A
sua inspiração encontra-se na Filosofia da Esperança de Ernest Bloch
228
.
Moltmann, aplicando à escatológica a categoria de futuro / esperança de Ernest
228
Ernest Bloch pretendia a renovação da tradição marxista do ponto de vista do humanismo real.
A filosofia de Bloch fundamenta-se na perscrutação da realidade (sujeito) para capturar tendências
de futuro (predicado). É, portanto, uma filosofia voltada para o futuro, e justamente por isso,
empenha-se em recuperar algo existente no passado. Ela conhece um futuro que vem a ser a
partir da matéria, por isso mesmo se torna conhecido por meio da extrapolação de tendências
intrínsecas na realidade. Bloch desconfia de uma compreensão exclusivamente científica do
marxismo, que vê nele apenas uma ciência das contradições econômicas: ele reinvindica o
marxismo como prática humanista e como ética renovadora. (MÜNSTER, Arno. Ernest Bloch:
filosofia da práxis e utopia concreta. São Paulo: UNESP, 1993.
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104
Bloch, desejava uma renovação na teologia cristã e, por sua vez, na práxis da
comunidade cristã
229
.
Moltmann irá considerar que a esperança cristã, que possibilita a práxis,
abandonou a Igreja à medida que o cristianismo se institucionalizou e perdeu seu
caráter de movimento reivindicando para si as funções do Estado romano, a
escatologia foi deixada junto com sua eficácia mobilizadora e revolucionária da
história
230
. Este abandono da esperança possui conseqüências nas práticas da
Igreja, como no aparecimento de uma liturgia voltada para a satisfação individual
e desprovida de força de mobilização coletiva, pois a esperança é o que move a
fé cristã, sendo a escatologia o princípio pelo qual se orienta o cristão
231
.
A esperança, como categoria, possui as condições de transformação e
criação do novo como afirma Moltmann:
As afirmações da esperança estão necessariamente em
contradição com a realidade presente e experimentável. Elas não
resultam de experiências, mas constituem uma condição para que
sejam possíveis novas experiências
232
.
A esperança cristã possibilita a mobilização e a práxis, pois o futuro é
antecipado por ela, que exige no presente os sinais de justiça e igualdade
prometidos para o reino (futuro). Desta forma o sujeito que espera não se
conforma com o presente dominado pela exploração e por sinais de morte, para
esta pessoa, portadora da esperança cristã, a ressurreição é um protesto contra o
sofrimento humano. A fé que se desenvolve a partir desta esperança carrega
229
SOUZA, Giovani Pereira de. Jürgen Moltmann: a teologia da esperança. http://www.bit-
on.com.br/ipbbf/teologiaesperanca.htm
230
MOLTMANN, Jürgen. Teologia da esperança: estudos sobre os fundamentos e as
conseqüências de uma escatologia cristã. São Paulo: Teológica / Loyola, 2005, pp. 29-30.
231
O abandono da escatologia se faz notar na ética do descompromisso social e na passividade
conformista. Conforme salienta José Rubens L. Jardilino, há uma visão da escatologia pautada por
uma tragédia apocalíptica que faz com que muitos cristãos passem a viver um fim iminente,
,levando-os a viver numa passividade conformada com a tragédia social, econômica e política,
portanto sem uma ação transformadora de sua realidade. (JARDILINO, José Rubens L. As
religiões do espírito: visão histórico-teológica do pentecostalismo na década de 30. Rio de Janeiro,
ISER / CEPE, 1994, p. 86).
232
MOLTMANN, Jürgen, op.cit., p. 32.
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105
consigo as sementes da práxis, não traz quietude, mas inquietude; não traz
paciência, mas impaciência
233
.
O sujeito que espera em Cristo não se silencia diante da realidade de
sofrimento, morte e exploração, não se contenta com a realidade como um dado
estabelecido e imutável, mas a contradiz, a partir da sua práxis. Esta calcada
na esperança incomoda até que se cumpra todas as promessas no presente, cria
portanto as condições para consciência reflexiva sobre a realidade e, portanto,
para a práxis em lugar das práticas repetitivas da consciência comum. Como
afirma Moltmann:
Essa esperança torna a igreja cristã perpetuamente inquieta em
meio às sociedades humanas, que querem se estabilizar como
cidade permanente. Ela faz da comunidade cristã uma fonte de
impulsos sempre novos para a realização do direito, da liberdade e
da humanidade, aqui mesmo (...)
234
.
A cidade é espaço que cria também ilusões e conseqüentemente o
desespero na pessoa que vê a cidade como o lugar onde tudo parece possível,
mas se depara com o desgaste das condições de vida no mundo urbano
235
. O
desespero do mundo urbano nem sempre apresenta uma face desesperada, ou
seja, a ausência de qualquer perspectiva, mas pode ter a forma silenciosa da
renúncia, indiferença e apatia. Ao analisar esta questão Moltmann assinala que:
Dificilmente existe um comportamento que seja tão freqüente entre
os frutos podres de um cristianismo não escatológico,
aburguesado, em um mundo que já não é cristão, como(...), o
cultivo e manipulação lúdica da esperança que feneceu
236
.
A ausência de conteúdo escatológico no cristianismo urbano, conduz à
indiferença e a apatia da sociedade e dos indivíduos que buscam viver uma
existência sem sofrimentos, alegrias sem dor e comunidades sem conflitos,
contudo, quem vive orientado pela esperança cristã não tem como permanecer
233
Idem, ibid.
234
Idem, p. 37.
235
LIBÂNIO. João Batista. As lógicas da cidade, o impacto sobre a e sob o impacto da fé. São
Paulo, Loyola, 2002, p. 38.
236
MOLTMANN, Jürgen, op.cit., p. 39.
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106
apático, pois se vê impulsionado a transformar e a realizar, a entregar-se para
alcançar o que foi prometido
237
.
A esperança cristã, como analisa Moltmann, antecipa a possibilidade do
real e move o processo histórico, somente a esperança pode ser chamada de
realista, porque somente ela toma a sério as possibilidades que impregnam tudo
o que é real
238
.
A maior ameaça à esperança cristã, portanto, não é a desesperança, mas
a religião da passiva aquiescência do presente, que não busca o presente
eterno, isto é, a antecipação e a realização da justiça do reino de Deus, que
move o presente, pois o crente espera conhecer o que crê
239
.
3.1.3 A práxis pastoral para o contexto Urbano
A práxis pastoral encontra-se diante do desafio de criar uma comunidade
que seja ao mesmo tempo humana e que sinalize concretamente o amor de
Deus
240
.
A práxis como atividade material do ser humano, é atividade
transformadora, que visa a eliminação das injustiças e desigualdades presentes
no contexto da urbanidade. Sem reflexão não existe práxis, mas a práxis não é
tão somente reflexão, antes ela se desdobra em uma atitude frente às questões
históricas e sociais que são apresentadas aos homens em sociedade.
Para se chegar a uma proposta de práxis pastoral para o contexto urbano é
necessário antes elaborar a análise profunda deste contexto. Assim o que se nota
no contexto urbano é que o ordenamento econômico mundial, dita regras para os
237
MOLTMANN, Jürgen. Paixão pela vida. São Paulo: Aste, 1978, p. 15-17.
238
MOLTMANN, Jürgen. Teologia da esperança: estudos sobre os fundamentos e as
conseqüências de uma escatologia cristã. São Paulo: Teológica / Loyola, 2005, p. 40.
239
Idem, p. 42-50.
240
SATHLER-ROSA, Ronaldo, op.cit., p. 45.
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107
espaços locais, determinando sua organização e limitando a atuação destes
espaços. Pierre Bourdieu, analisa essa questão da seguinte forma:
O que está em jogo hoje é a reconquista da democracia contra a
tecnocracia: é preciso acabar com a tirania dos especialistas,
estilo Banco Mundial ou FMI, que impõem sem discussão (gf.
nosso) os veredictos do novo Leviatã, os mercados financeiros, e
que não querem negociar, mas explicar; é preciso romper com a
nova fé na inevitabilidade histórica que professam os teóricos do
liberalismo; é preciso inventar as novas formas de um trabalho
político coletivo capaz de levar em conta necessidades,
principalmente econômicas
241
.
Uma questão é de fundamental importância que seja esclarecida: o
mercado, mencionado por Bourdieu, jamais fará tal discussão sobre suas
verdades estabelecidas. Posta esta questão é preciso encontrar meios para o
questionamento deste pensamento (único) que é imposto pelo capital às
comunidades locais, gerando, como mencionado, anteriormente uma urbanização
coorporativa.
Segundo István Mészáros, a globalização imposta ao mundo pelos países
do centro é estruturalmente incompatível com a universalidade
242
, ou seja, com a
possibilidade de um desenvolvimento humano e, de políticas públicas, voltadas
para os interesses do cidadão. O neoliberalismo e seus defensores continuam
afirmando que o caminho capitalista sempre levará ao desenvolvimento, desde
que sejam evitadas as más ações de revolucionários criadores de problemas que
têm a tendência a se opor àquela ordem
243
, aos interesses do grande capital, que
ignora o ser humano.
A práxis pastoral, no contexto urbano necessariamente implica em algum
tipo de choque com os interesses do grande capital, interesses expropriam os
homens de suas riquezas e de suas vidas e fazem a opção permanente por uma
urbanização coorporativa.
241
BOURDIEU, Pierre. Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Rio Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1998, p. 39.
242
MÉSZÁROS, István. O século XXI: socialismo ou barbárie? São Paulo: Boitempo, 2003, p. 16.
243
Idem, p. 24.
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A práxis desafia o ser humano a transformar sua realidade de forma
integral e radical. A práxis em momento algum poderá servir como legitimadora de
estruturas que desumanizem e oprimam o ser humano, ao contrário ela busca a
transformação das realidades que inferiorizam a vida. Pela práxis os indivíduos
são desfiados a dar um salto da consciência comum para a consciência reflexiva.
Este salto possibilita a superação das práticas assistencialistas, ou seja, das
práticas que não contribuem para a eliminação e superação da realidade que
exclui o ser humano do convívio pleno em sociedade e o aliena dos meios de
subsistência. Práticas que não geram uma cidadania plena e que alimentam as
estruturas de exploração da miséria urbana.
Diante disso, a pastoral urbana é desafiada em várias de suas dimensões,
a desenvolver uma prática essencialmente missionária, ou seja, não se pode
mais falar de igreja e missão, apenas da missão da Igreja, sempre considerando
que ela o faz em para Deus e não para si
244
, como liturgia serviço.
Deve-se entender que a missão de Deus é maior que a missão da Igreja,
ou as missões das igrejas. Enquanto as denominações religiosas fizerem
missões com o objetivo de implantarem igrejas e para salvar almas, as igrejas
não estarão participando efetivamente da missão de Deus, que é única, e tem
como finalidade a plenitude da promessa do Reino de Deus a vida, a justiça e
o amor.
Para que exista uma práxis pastoral para o contexto urbano, é importante,
que a visão eclesiocêntrica de missão ceda lugar para uma nova concepção, a de
que existe uma única missão e esta é de Deus tão somente e não das
denominações religiosas
245
, possibilitando uma noção de missão como busca da
justiça e da cidadania, sendo que esta noção fundamenta-se na interpretação
ética da salvação, ou seja, pelo banimento de todos os sinais de injustiça,
ignorância, fome e miséria, concentrando-se no Jesus histórico
246
, e nas suas
práticas de justiça e amor. Salvação agora significa libertação da superstição
244
BOSCH, David J. Missão transformadora: mudanças de paradigmas na Teologia da Missão.
São Leopoldo: EST / Sinodal, 2002, p.436.
245
Idem, p. 437-438.
246
Noção que parte da compreensão da vida terrena de Jesus até o Cristo da fé.
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109
religiosa, preocupação com o bem-estar humano e o melhoramento moral da
humanidade
247
. Pode-se dizer que este novo paradigma soteriológico
proporciona a possibilidade da práxis pastoral no interior do cristianismo, haja
vista que salvação passa a ser também material (histórica) e social. Promover a
justiça era o mesmo que promover a salvação.
Assim, afirma David Bosch:
(...) as alegrias e esperanças, as tristezas e as angústias das
pessoas de hoje, sobretudo das pobres e de todas as que sofrem,
são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as
angústias dos discípulos de Cristo
248
.
Esta noção de salvação como justiça se baseia no legado profético do
Antigo Testamento. Esta noção pressupõe a mudança das estruturas injustas, e
que a Igreja possui a responsabilidade de buscar meios de transformação destas
estruturas possuídas pelo mal. A práxis pastoral no contexto urbano, torna-se
uma finalidade da igreja que assume a missão de Deus (missio dei), como
objetivo único de sua existência.
3.1.4 A fé: preocupação última que move o povo
As práticas dos movimentos que lutam por moradia foram também
orientadas e motivadas pelas pastorais, que deles participaram, o que permite
também afirmar que a fé em suas múltiplas dimensões é um dos elementos
presentes na motivação, inspiração e organização dos trabalhadores em luta por
habitação. Cabe, no entanto, um questionamento sobre como a fé, torna-se um
elemento constituinte da práxis. Paul Tillich ao elaborar sua teologia sistemática
afirma que:
Certamente, fé como expressão da pessoa toda inclui elementos
emocionais, mas não consiste apenas nisso. Ela atrai cada
elemento da theoria bem como da práxis para dentro de si mesma
247
BOSCH, David J., op.cit., p. 473.
248
Idem, p. 479.
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110
e de sua abertura extática à Presença Espiritual
249
.
Tillich rejeita a noção popular de fé que a reduz a um tipo de sentimento,
afirmando que a fé inclui elementos que envolvem todas as dimensões da vida
humana, incluindo às práticas materiais do ser humano, compreendendo que uma
das características da fé, é justamente o seu caráter antecipatório, que pode ser
entendido como a esperança que movimenta o sujeito. Para ele a fé pode ser
definida tanto como formal como material. A fé formal é uma aspiração última, a
preocupação última, que une um sentido subjetivo a um sentido objetivo, assim
compreendido pode-se dizer que todo ser humano tem fé, pois todos possuem
uma preocupação última com algo de seu interesse, mesmo que estas
preocupações sejam totalmente indignas. Em sua dimensão formal, a se
encontra em todas as religiões e culturas, e, portanto, nas ações materiais do ser
humano, que se movimentam movidos pela preocupação última, que é o que irá
dar sentido e significado às ações que se expressam individualmente e
coletivamente. Ainda é importante salientar que a implica em assumir riscos
existenciais, pois ela pode afirmar símbolos equivocados de preocupação
última
250
.
Compreende-se aqui que a [religião] não só é a comunidade do Novo Ser;
ela é também um grupo sociológico, imerso nos conflitos da existência
251
".
Para Tillich, a preocupação última se apresenta tanto na esfera religiosa
como na secular, não existindo uma separação no cotidiano entre o que seja
secular e sagrado. Inclusive, o secular encontra-se aberto para o impacto do
sagrado, e isso mesmo sem a mediação de uma igreja, observamos ainda que
não existe movimento secular que não possua uma preocupação última
252
.
249
TILLICH, Paul. Teologia sistemática. 2ªed. São Leopoldo/ RS: Sinodal, 2000, p. 486.
250
Idem, p. 334-485.
251
Idem, p. 128.
252
Idem, p. 572-573.
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Com uma compreensão de Fé, que supera a noção de crença dogmática
ou mesmo confiança irracional, Tillich afirma que: é estar possuído por aquilo
que nos toca incondicionalmente
253
, isto é, pela preocupação última. Assim, a fé:
(...) não surge como uma função ou atitude distinta da pessoa,
mas como uma abertura extática para o incondicionado que
abrange e unifica todas as outras funções da pessoa. Assim a fé
não poderia ser identificada com o saber, ou o sentir, ou o querer,
por exemplo. Além disso, ela envolve um elemento de paixão e de
autotranscendência, e esse elemento é o que integra as funções
humanas
254
.
Entretanto, não se deve ocultar o fato de que cristãos, que movidos por
sua fé compreendem que uma exigência (ética) na direção de uma verdadeira
transformação da sociedade e um compromisso com o seu próximo (na história),
particularmente com o pobre. Ao encontro desta argumentação, encontramos
Jürgen Moltmann afirmando que:
Não quero negar que muitas pessoas encontram em diferentes
fontes coragem e força para viver num mundo de sofrimento. No
que me concerne, confesso que a imagem de Cristo é que me
anima. Sua paixão pela vida levou-o ao sofrimento na cruz. Nessa
paixão e dor vejo muito bem a paixão de Deus que nos força
para resistir a morte [...]
Quem vive em comunh
ão com este Deus apaixonado não pode
permanecer apático
255
.
A partir desta fé o povo encontra motivação para a libertação e é salvo da
autodestruição, descobrindo sinais de esperança em meio às lutas, para a
superação concreta dos próprios sofrimentos na sua história. Moltmann, ao
abordar ainda a temática da fé afirma que a religião, seja qual for, cria elementos
de comunhão além dos limites raciais e nacionais e que a verdadeira comunidade
de fé nasce da consciência de um espaço comum e da reunião em torno das lutas
253
Idem, p. 5.
254
CARVALHO, Guilherme V. R. Sobre a Definição de em Paul Tillich. Correlatio, Revista da
Sociedade Paul Tillich do Brasil e do Grupo de Pesquisa Paul Tillich da UMESP, Número 8, São
Bernardo do Campo, outubro de 2005. Em: http://www.metodista.br/correlatio/ .
255
MOLTMANN, Jurgen. Paixão pela vida. São Paulo: ASTE, 1978, p.14-15.
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comuns. Neste caso a religião nada tem de ópio, mas é poder de resistência em
face da miséria
256
.
Ao observar esta questão, Júlio de Santa Ana, afirma que os povos que
são profundamente religiosos o podem deixar de pensar religiosamente,
teologicamente, quando enfrentam opções cruciais relacionadas com seus
respectivos destinos históricos
257
. Em toda a América Latina é possível
identificar, nas grandes mobilizações populares, especialmente na década de
1970, que o elemento religioso é um fator motivador das lutas sociais,
incentivando as pessoas a assumirem o papel de criadores e transformadores na
história, e uma das ferramentas que este povo, com profundas raízes religiosas
certamente fizeram uso foi a teologia da libertação
258
.
Entendemos que a preocupação última e o profundo sentimento religioso,
movem o indivíduo tanto no campo secular como no religioso e o orienta em sua
práxis. A realidade motiva e sensibiliza o ser humano, que imbuído desta fé
realiza historicamente as transformações sociais. A práxis pastoral de que
falamos aqui, é inspirada por esta fé, muito embora como sugira Casiano
Floristán, não se pode assegurar a existência de uma práxis propriamente
cristã
259
, ao mesmo tempo em que todas as práticas são cristãs na medida em
que são realmente humanas. Isto porque a práxis é avaliada por seu conteúdo
concreto, e não pelos fins, intenções, motivações ou mesmo disposição de quem
as executa. Tanto o sujeito religioso como os não religiosos exercem a atividade
práxis, movidos por uma preocupação última: que pode ser, por exemplo, a
valorização absoluta da vida.
O que se pode dizer é que em certos momentos, no processo das lutas
sociais, existem atividades decorrentes da práxis que se relacionam com os
símbolos e tradições cristãs, como nas lutas por moradia, saúde e educação na
Comunidade de Heliópolis e nas expressões de fraternidade, liberdade e justiça.
256
Idem, p. 37.
257
SANTA ANA, Júlio de. Pelas trilhas do mundo, a caminho do reino. São Bernardo do
Campo/SP: Imprensa Metodista, 1984, p. 11.
258
Idem, p. 16-17.
259
FLORISTÁN, Casiano. Teología práctica, teoria e praxis de la acción pastoral. Salamanca,
Espanha: Ediciones Sígueme, 2002, p. 194.
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Certamente a fé é uma porta de entrada para a práxis, um modo de superação
das práticas repetitivas para uma consciência reflexiva, que alimenta a esperança
por transformações radicais na história do povo explorado.
3.1.5 A perda dos centros referenciais na cidade: a privatização da
O desafio para a pastoral urbana, não é a busca pelo desenvolvimento de
uma práxis religiosa particular, mas compreender o impacto da perda dos centros
referenciais que ocorre no espaço urbano e contribuir no desenvolvimento da
práxis neste contexto em articulação com o conjunto dos movimentos sociais e
populares presentes na cidade. É importante observar que, um destes
deslocamentos do centro, recai justamente sobre o distanciamento das práticas
religiosas comunitárias, que como observa João Batista Libânio, este fenômeno
decorre da desmaterialização do espaço, ou seja, uma fragmentação dos centros
de interesse, fazendo com que o mundo urbano se torne pluriespacial, orientado
pelos desejos e opções dos indivíduos
260
.
Com a fragmentação dos centros de referencia, o espaço urbano torna-se
também um espaço de aparente liberdade e de muitas ilusões e fantasias, lugar
das manifestações individualistas, do prazer como estilo de vida e de inúmeras
tensões sociais. Soma-se a isso o fato de que no espaço urbano, se exacerba a
tendência à exploração e à concorrência, desafiando a pastoral na elaboração de
ações de solidariedade e colaboração como forma de se contrapor à lógica da
exclusão e a cultura do isolamento, que marginaliza e violenta uma parcela da
população da cidade.
No espaço urbano, a lógica da solidariedade e da colaboração é
substituída por exploração e concorrência entre as pessoas. Neste mesmo
espaço, em face da perda dos centros referenciais, ou do aparecimento de muitos
260
LIBÂNIO. João Batista. As lógicas da cidade, o impacto sobre a e sob o impacto da . São
Paulo: Loyola, 2002, p. 32.
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114
outros, a religião, que no passado havia sido um centro significativo, modifica sua
função, passando a responder aos anseios e aspirações dos indivíduos,
cumprindo um papel compensatório para as inúmeras carências existenciais,
Libânio observa que: O indivíduo está no centro dessa decisão. Com isso, a
expressão religiosa também se individualiza ou se exprime em grupos de
escolha
261
.
Neste contexto urbano policêntrico e avesso ao centralismo religioso, a
religião perde parte de seu componente comunitário, e tende ao individualismo,
transformando cada pessoa como centros válidos de sua religiosa, perdem-se
os referenciais comunitários e ocorre o que Libânio denomina privatização da fé,
isto é, privatiza-se e individualiza-se a fé, fazendo com que a cristã perca sua
dimensão social, impondo-se o culto ao Eu, onde cada pessoa constrói sua
religião de acordo com seus interesses privados e que lhe satisfazem. A
conseqüência deste processo, de privatização da fé, é a perda da dimensão
social e comunitária da fé cristã
262
.
A privatização da fé cristã terá um impacto decisivo na práxis dos sujeitos
religiosos, que abandonam progressivamente as ações que visam a
transformação social e a libertação humana, voltando-se unicamente para seus
interesses particulares. Este fenômeno é reforçado pelo pensamento único
neoliberal, que tem um impacto considerável sobre a fé, que ao se privatizar,
corre o risco de perder sua força profética e transformadora, acomodando-se
diante do projeto neoliberal que expropria as riquezas humanas. Nesta direção
argumenta Libânio quando afirma que a transforma-se mais em religião e
menos em fé
263
, ou seja, acomoda-se diante dos desafios éticos impostos pela
cidade (a fome, a pobreza, a falta de moradia, o desemprego, etc.).
A privatização da não significa o desaparecimento da religião, mas sua
acomodação diante dos dramas sociais e ausência de uma atitude capaz de
romper com a ordem que legitima a opressão e exploração humana.
261
Idem, p. 54.
262
Idem, p. 56.
263
Idem, p. 61.
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3.1.6 A questão da secularização
Uma das contribuições de Max Weber para o estudo da religião se pelo
fato dele restituir a sua autonomia diante dos processos sociais, ao mesmo tempo
em que os fenômenos sociais também influenciam a religião. É importante
lembrar que Weber não pode ser visto como um sociólogo da religião, muito
embora parte considerável de sua pesquisa passe pela sociologia da religião
264
.
Ao abordar o tema da religião é possível observar que o modelo weberiano
busca analisar a influência mútua entre religião e sociedade. Neste percurso
metodológico se dá a formulação do conceito de desencantamento do mundo, isto
é, o fim da magia como forma de explicação do mundo
265
, ou da
desmagificação
266
. Antônio Pierucci observa que o conceito permite uma enorme
manipulação metafórica, como se fosse um verso, e afirma que o conceito de
desencantamento do mundo possui dois sentidos concomitantes na obra de
Weber: desencantamento do mundo pela religião e pela ciência, ou seja, em dois
aspectos fundamentais da vida
267
.
O desencantamento do mundo se dá pela racionalização da sociedade
moderna e ganha força com a ética puritana que no trabalho a forma de
realizar a santificação e a sinalização do reino de Deus. Este agir racional é
proposto com maior intensidade no círculo protestante com a difusão de uma
espiritualidade voltada para as questões do cotidiano, como a vida profissional
268
.
Weber irá concluir que existe uma afinidade entre o protestantismo
ascético e o espírito do capitalismo, que conduziu á formação de um tipo de
sociedade mais racional e o surgimento de uma classe de empreendedores, para
264
PIERUCCI, Antônio Flávio. O desencantamento do mundo. São Paulo: Editora 34, 2005, p.15-
16.
265
MARTELLI, Stefano. A religião na sociedade pós-moderna. São Paulo: Paulinas, 1995, p. 77.
266
PIERUCCI, Antônio Flávio, op.cit., p. 46.
267
Idem, p. 219.
268
MARTELLI, Stefano, op.cit., p. 78.
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116
quem o sucesso profissional e pessoal tornou-se legitimador da sua adoção, isso
sem a necessidade de uma religião. Contudo não se pode afirmar que Weber
tenha atribuído ao protestantismo a responsabilidade do desenvolvimento do
capitalismo, mas sim que este foi um efeito não intencional ou previsto pelos
reformadores, que hoje inclusive se volta contra aos princípios cristãos mais
fundamentais
269
. Estas questões são possíveis de serem observadas em Weber,
quando afirma que:
Desde que o ascetismo começou a remodelar o mundo e a nele se
desenvolver, os bens materiais foram assumindo uma crescente,
e, finalmente, uma inexorável força entre os homens, como nunca
antes na História. (...) O capitalismo vencedor, apoiado numa base
mecânica, não carece mais de seu abrigo
270
.
Desta maneira o que se observa é que o capitalismo rompe com qualquer
vinculação com a religião, que não intencionalmente lhe abrigou, pois esta pode
limitar sua área de atuação e influência. O capitalismo então se viu livre de seu
abrigo ético-religioso tomando a forma das paixões puramente mundanas.
Diante da racionalização, que se desdobra em secularização e até a
marginalização da religião, Weber a possibilidade de um renascimento
carismático da religiosa, sem, contudo muito otimismo quanto a este
ressurgimento
271
. Entretanto a partir de outros escritos de Weber, como no texto
Rejeições religiosas do mundo e suas direções, observa-se que o
reencantamento do mundo, não se dará pelo retorno do sagrado, mas por outra
dimensão cultural, não-religiosa e não-racional, que pode ser o erotismo, como
assinala Pierucci
272
.
O certo é que existe uma possibilidade de um reencantamento do mundo
em meio a uma sociedade cada vez mais desencantada, e que este se dará não
pela racionalidade, mas pelo sentimento, e a motivação das esperanças humanas
vinculadas às práticas cotidianas.
269
Idem, p. 76-80.
270
WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira, 2000, p.
131.
271
MARTELLI, Stefano, op.cit., p. 81.
272
PIERUCCI, Antônio Flávio, op.cit., p. 219.
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3.2 A igreja no contexto urbano
É importante notar aqui que a conseqüência inevitável da urbanização é o
fenômeno da secularização da vida, como apontado por Max Weber e a
eliminação das formas de solidariedade, como afirma Darcy Ribeiro a seguir:
O capitalismo quebra todas as formas de solidariedade porque vê
nelas resistências ao seu desenvolvimento. As formas de
solidariedade dão força aos trabalhadores. O capitalismo pretende
reduzir o mais possível a força dos cidadãos para que estejam
mais disponíveis para as necessidades das empresas. Por isso,
promove a dissolução da família, da vida social dos bairros, das
associações de todo o tipo
273
.
Como se observa, a relação entre os habitantes da cidade são permeadas
por toda sorte de adversidades que dificultam, quando não impendem uma
harmonia e convivência plena entre os cidadãos.
As cidades constituem-se nos agrupamentos mais dinâmicos e complexos
que a humanidade produziu. Todos os tipos de contradição e conflitos
estabelecem-se nas cidades, e tornam-se quase sempre as soluções muito
complexas. Estas complexidades do contexto urbano nos fazem muitas vezes
afirmar que existem muitas cidades se inter-relacionando num mesmo espaço.
A vida na cidade possibilita o surgimento de uma cultura urbana
caracterizada pela desorganização e complexidade social e cultural, como
abordado por Manuel Castells. Neste ambiente surgem as iniciativas
individualistas e a forte competição entre os membros da cidade é quase
273
RIBEIRO, Darcy. Povo Brasileiro. São Paulo: Companhia das letras, 1998, p. 6
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118
inevitável. Os laços familiares se tornam frágeis e a secularização da vida urbana
torna-se uma constante
274
.
No que diz respeito à vida em cidades, observa-se que a secularização é
uma das tendências importantes das sociedades urbano-industriais, ela é na
verdade um processo complexo, pois o êxodo rural transformou a vida das
pessoas em sua passagem do campo para a cidade. As relações mudaram,
assim como as necessidades do indivíduo urbano. Desta forma identifica-se que:
Em relação ao Brasil, diversos autores sugeriram que a recente
intensificação do seu capitalismo estaria causando um declínio
gradual do catolicismo entre a população urbana. Mas se por um
lado se a adesão e freqüência ao catolicismo pode estar
diminuindo nas grandes cidades brasileiras, por outro esta
havendo um crescimento impressionante da Umbanda, e do
Pentecostalismo
275
.
Não somente a Umbanda, o Candomblé e as Igrejas Pentecostais têm
experimentado um forte crescimento no Brasil, mas também as religiões orientais
e os grupos de auto-ajuda
276
.
Não se observa uma diminuição da religiosidade na cidade, mas um
deslocamento, e o surgimento do sujeito religioso, aquele que constrói sua
religiosidade de acordo com as suas necessidades mais urgentes, ou seja, surge
um tipo de religiosidade com os elementos típicos da cidade: o individualismo, a
competição e a busca de prosperidade.
Diversas pesquisas e estudos revelam que entre os cristãos não existe
relação entre o cristianismo e as preocupações sociais e que muitos não
procuram expressar sua fé numa ação social.
A igreja no contexto urbano, tende a mobilizar todo o seu esforço para a
conservação e quando muito para a expansão da própria comunidade local. A
274
OLIVEN, Ruben George. Antropologia de grupos urbanos. 5ª ed.Petrópolis/RJ: Vozes, 2002, p.
32.
275
Idem, p. 42.
276
Neste capítulo não iremos discutir o crescimento das religiões e suas causas e conseqüências
para a sociedade brasileira. O principal objetivo é delinear o crescimento urbano, seus
desdobramentos e conseqüências para a ação pastoral na cidade.
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ação da igreja é por assim dizer de manutenção, uma ação tímida frente à
complexidade da vida urbana e moderna.
No dizer de Comblin a igreja,
Teme que o mergulho numa sociedade urbana tão diversa e
múltipla leve a uma dispersão dos cristãos. Teme perder o
controle sobre os cristãos que, no agir da cidade, usam uma
linguagem não eclesiástica, formulam objetivos não eclesiásticos,
formam solidariedades com pessoas de outras religiões. Por isso
prefere manter o agir dos fiéis dentro do recinto paroquial ou
diocesano
277
.
Não obstante o fato de Comblin estar se referindo com maior
especificidade à igreja Católica Romana, a afirmação serve também para as
demais igrejas, em especial as protestantes históricas, que agem de modo tímido
no que tange a sua inserção nas questões sociais e em suas relações com os
movimentos sociais e populares.
Na cidade tudo ganha um grande volume, o bem e o mal presentes nos
seres humanos tornam-se, no espaço urbano, muito mais visível. Uma questão
que ganha dimensões assustadoras nas grandes cidades é a grande massa de
trabalhadores desempregados, os excluídos do sistema habitacional, educacional,
de saúde e do mundo do trabalho.
Este contingente de excluídos é, sem dúvida, resultado de um sistema
econômico que privilegia o lucro em detrimento do ser humano. Estes indivíduos,
são aqueles que o são capazes de entrar e permanecer no mercado como
consumidores, para este grupo de seres humanos, o que existe é uma existência
à margem, excluída da sociedade e uma cidadania incompleta.
O mercado em sua ânsia pelo acúmulo do capital deixa à margem os
pobres, na lógica capitalista nada é feito para facilitar a vida dos seres humanos,
tudo contribui e deve contribuir para a acumulação do capital. O dinheiro torna-se
objeto de culto e veneração, a riqueza e o lucro, tornam-se os deuses na cidade,
mas, esta riqueza não esta ao alcance de todos e nem mesmo da maioria. Disto
277
COMBLIN, José. Viver na cidade: pistas para uma pastoral urbana. 2ª ed. São Paulo, Paulus,
1996, p. 26.
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resulta este enorme contingente de excluídos que surgem nas cidades. A cidade
torna-se espaço onde a exclusão se concentra de forma muito evidente.
Em meio a toda esta situação, em meio a toda esta complexidade que é a
cidade, o que faz a igreja? O que podem fazer os cristãos? Colocar a experiência
da fé que produz milagres, no sentido que Hannah Arendt descreve, ou seja,
como a capacidade humana de iniciar algo novo, por meio de uma ação que
interrompe os processos automatizados
278
. Clóvis Pinto Castro comenta ainda
que:
A fé, nesta perspectiva, torna-se um instrumento apropriado para
inserir os cristãos no espaço da pluralidade para ali, mediante a
palavra e a ação, promoverem os milagres que gestarão o mundo
novo
279
.
Certamente a cidade é um desafio para a Igreja, isto porque em todo o
tempo de existência a Igreja sempre deu o tom, o rumo das práticas, mas no
espaço urbano a Igreja não possui o monopólio da verdade, sozinha ela não é
capaz de dar todas as respostas e solucionar todas as questões.
José Comblin chama a atenção para alguns desafios para a igreja no
contexto urbano. O primeiro desafio, que se impõe à Igreja, é abrir-se para o
diálogo com a sociedade e se envolver com a realidade humana e urbana com
toda a sua complexidade. O segundo desafio é compreender os tempos de vida
comunitária, entender que as pessoas possuem pouco e valioso tempo, e que por
isso aquele tempo passado comunitariamente deve ser vivido de forma intensa e
prazerosa, ao mesmo tempo em que desafia a assumir compromissos. O terceiro
desafio, é inserir-se no contexto dos excluídos, possuindo um canal de
comunicação com este contingente da população, estando presente em todos os
dramas da vida humana, tornando-se ativa na vida política e na organização da
cidade, sendo sinal e não se deixando sinalizar e seduzir pelo mercado
280
.
278
CASTRO, Clóvis Pinto. Por uma cidadã: a dimensão pública da igreja fundamentos para
uma pastoral da cidadania. São Paulo: Loyola / UMESP, 2000, p, 110.
279
Idem, ibid.
280
COMBLIN, José. Os desafios da cidade no século XXI. São Paulo: Paulus, 2002, p. 9.
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A cidade deve ser resgatada como um espaço de convivência e de
relações, de exercício da cidadania plena, ela não pode ser reduzida a um palco
de enormes desigualdades e injustiças sociais. O que mais vale na cidade são as
relações entre os seus habitantes
281
. Mediante essa constatação, a Igreja não
pode abandonar a sua vocação pública, e perder com isso, sua relevância
política
282
, a práxis litúrgica, portanto, deve contribuir para o surgimento de ações
promotoras de justiça e igualdade.
Entretanto nas grandes cidades, como São Paulo, há cidadãos de diversas
classes, alguns usufruem todo o espaço urbano com todos os seus equipamentos
públicos e privados, para muitos seres humanos, o espaço territorial e os
benefícios da grande cidade são extremamente restritos
283
. Esta situação exige
por parte da igreja um planejamento e uma estratégia de atuação que envolve o
estudo e a compreensão do fenômeno urbano. É o que se discute a seguir tendo
a cidade de São Paulo como referencia.
3.2.1 Desafios para a práxis pastoral: A cidade de São Paulo
Como se nota até aqui, a pastoral litúrgica, no contexto urbano, encontra
uma série de desafios para serem superados. A cidade de São Paulo é sem
dúvida um exemplo destes desafios que carecem de superação por parte da
pastoral. Por se tratar de uma cidade que experimentou um acelerado
crescimento urbano
284
, a cidade experimenta uma série de situações que
transformam a vida de seus habitantes bastante difícil, em especial para aqueles
habitantes que carecem de recursos financeiros para usufruírem toda a cidade e
seus equipamentos públicos.
A alma do Brasil se encontra em São Paulo, a cidade é o coração
econômico do país
285
. É bastante importante salientar que o desenvolvimento
281
COMBLIN, José. Viver na cidade: pistas para uma pastoral urbana. 2ª ed. o Paulo, Paulus,
1996, p. 46.
282
CASTRO, Clóvis Pinto. Por uma cidadã: a dimensão pública da igreja fundamentos para
uma pastoral da cidadania. São Paulo: Loyola / UMESP, 2000, p. 110-111.
283
SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. 4ª ed. São Paulo: Nobel, 1998, p. 112.
284
São Paulo sofreu uma urbanização acelerada, em especial nos séculos XIX e XX.
285
ARBEX JR. José e OLIC. Nelson Bacic. O Brasil em regiões: sudeste. São Paulo: Moderna,
1999, p. 26.
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econômico da cidade de São Paulo teve como principal causa a atividade
cafeeira, que chegou pelo Vale do Paraíba, vinda do Rio de Janeiro num processo
extremamente rápido se espalhando por todo o estado.
O crescimento econômico teve origem no século XIX e se consolida na
primeira metade do século XX, atraiu um grande contingente populacional para a
cidade de São Paulo, causando diversos problemas urbanos, tais como: déficit
habitacional, violência e desemprego ou o subemprego. O processo de
favelização é resultado direto deste processo bem como o fenômeno da
macrocefalia urbana, o acelerado crescimento urbano sem contar com uma infra-
estrutura adequada.
Os problemas vividos em São Paulo são de diversas ordens e origens, o
que torna a solução destes problemas algo bastante complexo. A violência
urbana, por exemplo, demanda uma série de recursos público e privado com a
finalidade de atenuar a questão, no entanto o que se observa é um crescente
número na criminalidade e violência, o que nos leva a questionar se o
planejamento estratégico no combate à violência na cidade é o mais correto.
Atualmente a cidade de São Paulo, com os 37 municípios que compõem a
região metropolitana, possui uma população de aproximadamente 18 milhões de
habitantes
286
, distribuídos por uma área de mais 8.000 km
2
.
A cidade de São Paulo ingressa no século XXI, possuindo mais de 10
milhões de habitantes
287
. Isto faz com seja o quarto maior aglomerado urbano no
mundo, já que a sua região metropolitana possui uma população de cerca de 18
milhões de pessoas. Entretanto, as taxas de crescimento populacional têm
decrescido nos últimos anos. Entre 1991 e 2000, por exemplo, a população
cresceu apenas 1% ao ano, bem abaixo dos 5% verificados entre 1940 e 1970,
período de intensa industrialização e migração interna, ou que os 14% verificados
na última década do século XIX, quando da imigração européia, sucedida pela
imigração japonesa no início do século XX.
286
IBGE Instituto brasileiro de geografia e estatística http://www.ibge.gov.br
287
IBGE Instituto brasileiro de geografia e estatística http://www.ibge.gov.br
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A população da cidade de São Paulo vem crescendo num ritmo inferior ao
verificado na região Metropolitana, no Estado de São Paulo e no Brasil como um
todo. Porém, cabe lembrar que a população paulistana, no ano 2000, ainda
representava 6,1% da população brasileira, quase 30% da população do Estado
de São Paulo e cerca de 60% da população da Região Metropolitana de São
Paulo, composta de outros 38 municípios.
Conforme a tabela a seguir, que trás os dados demográficos da cidade de
São Paulo nas últimas décadas, a população cresceu num ritmo acelerado, com
altas taxas de crescimento, tendo sido o crescimento populacional entre as
décadas de 1960-80 bastante elevado, com aumento populacional absoluto
superior a 4.800.000 habitantes em 20 anos. Lembrando que em 1960 a
população na cidade era de 3.666.701habitantes, passando para 8.493.226 em
1980.
População nos Anos de Levantamento Censitário
Município de São Paulo - 1872 a 2000
Anos População Taxa de Crescimento(1)
1872 31.385 4,1
1890 64.934 14
1900 239.820 4,5
1920 579.033 4,2
1940 1.326.261 5,2
1950 2.198.096 5,3
1960 3.666.701 4,9
1970 5.924.615 3,7
1980 8.493.226 1,2
1991 9.646.185 0,4
1996 9.839.436 1,5
2000 10.434.252 -
Fontes: IBGE, Censos Demográficos e Prefeitura do Município de São Paulo
(1) Taxa de Crescimento Geométrico Anual
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124
Fonte: População nos Anos de Levantamento Censitário - Município de São Paulo - 1872 a
2000
288
A cidade de São Paulo, segundo dados de 1996, representava 13,7% do
PIB nacional e 36% do PIB paulista. Ainda que estes percentuais fossem de
18,9% e 48%, respectivamente, em 1970, o município de São Paulo continua
sendo o pólo fundamental de organização de uma imensa rede de serviços,
distribuição de mercadorias e produção industrial. Como prova disso, 28% do
produto industrial do país se encontra localizado no município.
Para Milton Santos, entre 1960 e 1980, o emprego industrial, em São
Paulo, cresceu mais que a população ativa, e mesmo que o emprego terciário
nesta cidade enorme e populosa (por ele qualificado de operosa e operaria),
embora o próprio autor observe a perda de participação relativa, desde 1970, do
valor da produção industrial, tanto do município de São Paulo, quanto da região
metropolitana, no conjunto do estado
289
.
Entre 1996 e 2000, cerca de 20% dos investimentos externos de
multinacionais no Brasil se dirigiram para a Grande São Paulo. Em 1997, o PIB
municipal em dólares chegava a 76,7 bilhões de dólares, sendo a renda per capita
municipal superior à brasileira.
TOLTAL US$ PER CAPITA US$
Região Metropolitana 147,1 bi 8.758
Município de São
Paulo
76,7 bi 7.786
(1) Fonte: Emplasa 1997 -
Interno Bruto -
Região Metropolitana e
Município de São Paulo 1997
288
Fonte: IBGE, Censos Demográficos Prefeitura do município de São Paulo.
289
SANTOS, Milton, Urbanização Brasileira. 4ª ed. São Paulo, Hucitec, 1998, p. 100.
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125
As lutas pelos recursos que estão sob controle da esfera municipal e
estadual são lutas desiguais, a distribuição dos recursos públicos não se orienta
pela necessidade ou pela justiça social, mas quase sempre pela capacidade dos
grupos econômicos mais poderosos em fazerem pressão para conseguirem
investimentos nas áreas nobres da cidade.
A melhoria de infra-estrutura urbana, segurança, arborização de praças e
ruas, saneamento básico e serviços de assistência aos excluídos do sistema de
saúde e educação, não ocorrem de forma planejada e articulada entre os poderes
estadual e municipal.
O município de São Paulo possuía, ao início de 2001, cerca de 800 mil
desempregados
290
. No ano 2000, a taxa de desemprego chegou a 16,2%, inferior
ao pico de 1999, de 17,9%, mas bem acima da taxa verificada logo após o Plano
Real, de 12,3%. Além disso, do total de desempregados na cidade de São Paulo,
cerca de 70% encontram-se nas áreas periféricas.
Ao mesmo tempo, percebe-se que a taxa de desemprego é
significativamente superior para os indivíduos de menor escolaridade, de 19,3%
291
para os analfabetos e indivíduos com grau incompleto e 22,4% para aqueles
que concluíram o grau completo, para uma média de 16,6% do município de
São Paulo entre os anos 1997 e 1999.
As razões que explicam este aumento do desemprego durante os anos
noventa são: a combinação de políticas de abertura e privatização
indiscriminadas, associadas aos juros altos, de um lado, com a inexistência de
políticas de desenvolvimento econômico e social locais nos últimos oito anos.
A PCV-98 identificou três tendências que definem o perfil demográfico da
Região Metropolitana de São Paulo, que são as mesmas que tinham sido
observadas para o interior do Estado: redução dos veis de fecundidade;
concentração da população nas faixas etárias jovens (onda jovem); e elevação da
participação dos idosos.
290
Fonte: fundação SEADE - http://www.seade.gov.br/.
291
Ministério do Trabalho e emprego - http://www.mte.gov.br/.
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126
Cerca de 35% da população residente na região nasceu fora do Estado de
São Paulo, notadamente em estados da Região Nordeste do país. Desse
contingente, 17,2% moravam há menos de três anos no mesmo município,
proporção menor que a registrada no interior do Estado.
Outra informação relevante diz respeito ao dimensionamento dos fluxos de
pessoas que trabalhavam em municípios diferentes daqueles em que residiam.
Entre os indivíduos residentes na RMSP que trabalhavam 17,8% o faziam em
município distinto daquele em que moravam, o que corresponde a um contingente
próximo a 1.300.000 pessoas
292
.
Como se pode constatar o perfil dos habitantes da cidade de São Paulo
vem se transformando ao longo das últimas décadas, o que exige uma adaptação
e planejamento pastoral visando uma intervenção mais eficiente da ação pastoral,
visando o exercício da cidadania, compreendendo que este exercício requer uma
práxis pastoral capaz de participar, preferencialmente, das lutas da classe
trabalhadora.
A cidade possui uma dinâmica que pode, ao mesmo tempo, que promover
o desenvolvimento, promover também elementos de destruição e definhamento
de seus espaços e instituições. Disto resulta a necessidade de uma intervenção
hábil por parte da igreja visando resgatar desenvolver a práxis litúrgica em meio
às angustias e dilemas em que vivem os habitantes da cidade, buscando as
transformações sociais, econômicas e políticas que proporcionem a cidadania.
Várias são as questões que demandam uma ação efetiva da Igreja. Ao
ocupar o espaço urbano a Igreja é desafiada a inserir-se em todas as camadas e
segmentos da sociedade, a expressar uma verdadeira fé cidadã
293
, ou seja, uma
292
Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) - http://www.seade.gov.br/.
293
Conforme conceito desenvolvido pelo Professor Dr. Clóvis Pinto de Castro, compreende-se que
as Igrejas podem participar na construção de cidades mais justas e inclusivas por meio do
exercício de uma cidadã. O exercício da cidadania vista como mediadora na relação entre a
vida pública e privada, é um espaço singular para a concretização da cidadã. A cidadania
requer a fé em ação, que transcende a dimensão privatizante (sem desprezá-la) e incorpora a
dimensão pública. A cidadã concretiza-se na esfera pública, no mundo da política. Para tornar-
se uma realidade na esfera pública, a cidadã pressupõe pastorais (ad intra e ad extra) que
incentivem e possibilitem a vivência de uma espiritualidade que considere a perspectiva política e
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127
fé que se envolve e penetra na dinâmica da cidade. Para tanto é necessário o
desenvolvimento de uma pastoral litúrgica para o contexto urbano, fundamentada
na práxis, como fundamentação para a reflexão, libertação e exercício da fé
cidadã.
3.2.2 Pastoral litúrgica para o contexto urbano
A sociedade urbana, com suas características plurais, vive os dilemas da
secularização, da apatia religiosa e sem projetos de transformações sociais e
esperanças para o ser humano. Diante disto, se observa a necessidade de refletir
sobre uma pastoral litúrgica que atenda às necessidades humanas sendo
instrumento pelo qual o ser humano celebre a vida e encontre motivações e
esperanças em suas lutas cotidianas, encontrando meios para a superação da
desesperança e forças para criar uma sociedade centrada nos valores de
igualdade e justiça.
3.3 Liturgia: serviço feito para o povo
O termo liturgia deriva do grego leitourgia (ëåéôïõñãßá), e significa serviço
público. O termo não possui origem religiosa, provém do meio secular e é
composto de duas palavras: trabalho (ergon) e povo (laós). Historicamente a
palavra liturgia se relaciona com o trabalho público, com as atividades em
benefício da cidade ou do Estado grego. James F. White, afirma que: seu sentido
equivalia a pagar imposto, embora a liturgia pudesse implicar tanto serviço doado
quanto tributos
294
. O apóstolo Paulo, no Livro de Romanos 13.6
295
, fala
articule a experiência da fé entre o privado e o público. (ESPAÇO CIDADANIA. Instituto Metodista
de Ensino Superior - Ano 2 - Número 15 - Dezembro de 2004.
(www.metodista.br/comunicacao/espcidadania/numero15/feecid.php).
294
WHITE, James F. Introdução ao culto cristão. São Leopoldo/RS: IEPG / Sinodal, 1997, p. 20.
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128
literalmente das autoridades romanas como sendo litúrgos de Deus
(e de si próprio como um litúrgo de Cristo Jesus para os
gentios (, em Romanos 15.16
296
. Assim, deve-se
compreender a liturgia como sendo o trabalho e o serviço executado na direção
de outras pessoas, é portanto ação solidária e comunitária.
James White, compreende a liturgia como ação fundamental do sacerdócio
universal, é a atitude que qualifica a atividade da Igreja, e expressa de forma
visível a função da igreja como serva, nesta direção ele afirma que:
Denominar litúrgico um ofício é indicar que ele foi concebido de
modo que todas as pessoas que participam do culto tomem parte
ativa na oferta conjunta do seu culto.
O conceito de servi
ço, então é fundamental para entender o
culto
297
.
O termo culto é outro que se emprega quando se faz referencia ao
serviço cristão. O termo provém da palavra latina colere, que é um termo
agrícola que significa cultivar. Este termo expressa com precisão um outro
sentido do serviço cristão: o caráter mútuo de responsabilidade, a ação de dar e
receber entre os que participam do ato cúltico, assim como o agricultor que cuida
da sua terra ou animais e recebe em troca os frutos da terra, aquele que participa
do culto o faz como ato relacional.
Contudo para uma compreensão do significado da expressão culto
cristão, é preciso observar como diferentes tradições religiosas lidaram com o
conceito.
Paul W. Honn, a partir da tradição metodista, observou que o culto cristão
está relacionado à história da salvação, para Hoon, a vida cristã é uma vida
litúrgica, ou seja de serviço em direção ao próximo. Para ele, revelação (de
Cristo) e resposta (do ser humano diante da revelação de Cristo) são as bases do
295
Por esta razão também pagais tributo; porque o ministros (litúrgos) de Deus, para
atenderem a isso mesmo. (Versão: João Ferreira de Almeira Revista e Atualizada)
296
para que eu seja ministro (litúrgo) de Cristo Jesus entre os gentios, no sagrado encargo de
anunciar o evangelho de Deus, de modo que a oferta deles seja aceitável, uma vez santificada
pelo Espírito Santo. (Versão: João Ferreira de Almeira Revista e Atualizada)
297
WHITE, James F., op.cit., p. 20.
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129
culto cristão, ele compreende o culto, portanto, como diálogo que usa uma
variedade de ritos, emoções, palavras e ações
298
.
A tradição luterana, por sua vez, descrita pelo teólogo Peter Brunner,
compreende o culto cristão (em alemão: Gottesdienst serviço de Deus e nosso
serviço para Deus), como serviço recíproco entre Deus e os seres humanos. O
culto é compreendido como serviço de Deus à comunidade e culto como serviço
da comunidade perante Deus
299
.
Na tradição reformada, descrita pelo professor Jean-Jaques Von Allmen, o
culto cristão é tido como a memória (recapitulação) daquilo que Deus já fez, e se
relaciona diretamente com a história bíblica dos eventos salvíficos de Deus. No
culto a comunidade se capacita a servir, renova a esperança e toma consciência
de si mesma. Para ele, o culto cristão contesta a justiça humana e aponta para o
dia em que todas as conquistas e fracassos serão julgados, oferecendo, porém,
esperança e promessa pela afirmação de que, em última análise, tudo está nas
mãos de Deus
300
.
A partir da tradição anglo-católica, Evelyn Underhill, destaca que a
característica do culto cristão é a sua expressão profundamente social e orgânica,
isto é, que não existe culto solitário e que o mesmo possui um caráter concreto na
sociedade, em especial quando se observa que Deus se movimenta
permanentemente em direção do ser humano, sendo a resposta do ser humano
também executar este movimento na direção do outro
301
.
A tradição ortodoxa, conforme Georg Florovsky, afirma que: o culto cristão
é a resposta dos seres humanos ao chamado divino, aos prodígios de Deus,
culminando no ato redentor de Cristo
302
. Florovsky enfatiza esta resposta ao
chamado de Deus, compreendendo que a essência do cristianismo é
fundamentalmente comunitária.
298
Idem, p. 15.
299
Idem, p. 15-19.
300
Idem, p. 16.
301
UNDERHILL, Evelyn apud WHITE, James F., op.cit., p. 17.
302
FLOROVSKI, Georg apud WHITE, James F., op.cit., p. 17.
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Por último na tradição católica romana, o culto cristão pode ser definido de
duas formas que se completam. Primeiro é tido como a glorificação de Deus e a
santificação da humanidade (...) e a glória de Deus e a santificação e edificação
dos fiéis
303
, como descrito no motu próprio de 1903, do Papa Pio X sobre a
música sacra no culto e que se repete nas encíclicas posteriores, que sofre uma
inversão significativa em 1963 no Concílio Vaticano II, passando a ser
santificação do ser humano e glorificação de Deus
304
, observando esta inversão
de ordem e o debate que se instalou White, afirma que: glorificação e
santificação formam uma unidade, pois o ser humano tornado santo glorifica a
Deus, entendendo que a glorificação e a santificação caracterizam o culto cristão.
Ainda de acordo com a tradição católica romana, o culto cristão é descrito como
mistério pascal, isto é, a comunidade que compartilha os atos redentores de
Cristo no culto, revive os atos de salvação e solidariedade
305
.
A partir destas definições do culto cristão nota-se que o traço comum que
perpassa é a dimensão do serviço e do diálogo entre o ser humano e Deus. Estas
definições apontam também para a possibilidade de novas experiências e práticas
litúrgicas como forma das comunidades cristãs sinalizar na história o amor de
Deus. A possibilidade de novas práticas litúrgicas cristãs, é reforçada quando se
analisa o desenvolvimento das famílias litúrgicas.
3.3.1 Famílias litúrgicas clássicas
A compreensão do desenvolvimento histórico da liturgia se dá também pelo
entendimento das famílias litúrgicas, que apresentam, a partir da cultura de
diferentes povos e lugares, formas próprias de expressar o culto cristão. Contudo,
é necessário afirmar que embora os ritos sejam diferentes, é possível notar os
fundamentos do cristianismo em meio à diversidade dos povos, línguas, ritos e
303
PAPA SÃO PIO X Tra le sollicitudine. sobre a Música Sacra. Roma, 1903.
<http://www.vatican.va/> pesquisa realizada em novembro de 2006.
304
CONSTITUIÇÃO CONCILIAR. SACROSANCTUM CONCILIUM. Sobre a sagrada liturgia.
Roma, 1963. http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council
305
WHITE, James F. op.cit. p. 18.
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lugares. White destaca, a partir do catolicismo romano e ortodoxo, sete famílias
litúrgicas clássicas: 1. família de Alexandria, 2. família Síria Ocidental, 3. família
Armênia, 4. Família Síria Oriental, Família Bizantina ou de são João Crisóstomo,
6. família Romana e 7. família Gálica
306
. Cada uma destas famílias litúrgicas
possui suas particularidades e características.
A família Alexandrina, também denominada egípcia, possui em seu rito
inicial uma longa enumeração das obras de criação e redenção de Deus. Busca
uma forte fundamentação no Antigo Testamento. Segue com uma oração de
intercessão, que inclui uma oração pela cheia do rio Nilo e por pessoas (vivas e
mortas), essas orações eram denominadas dípticos. O terceiro tempo era
preenchido pelo sanctus (hino que se dava pela repetição tripla da palavra
sanctus - ''Sanctus, sanctus, sanctus/dominus Deus sabaoh/benedictus qui venit
in nomine domini...'' Santo, santo, santo/ senhor Deus dos exércitos/ bendito o
que vem em nome do Senhor). Em seguida vem o pós-sanctus que inicia com:
cheios de verdade, estão os céus e a terra. Segue-se uma invocação ao Espírito
Santo (epiclese), a elevação dos elementos da eucaristia (oblação), uma oração
que celebra a paixão (anamnese), uma nova invocação ao Espírito Santo e uma
oração final que glorifica a grandeza de Deus (doxologia)
307
.
A família Sírio Ocidental ou antioquena se caracteriza principalmente pelo
prefácio que contém uma lista de chamada celestial, as orações de intercessão
iniciam sempre com a expressão lembra Senhor, e possui uma forma de
linguagem rebuscada, poética e complexa
308
.
A família Armênia, preserva boa parte dos ritos da família sírio ocidental,
preservando a língua Armênia clássica. O rito armênio irá receber posteriormente
influência bizantina
309
.
A família Sírio Oriental possui alguns aspectos controversos, tanto que
acabou se isolando por ser tida como herege. Há uma aparente falta de palavras
306
Idem, p. 26-28.
307
Idem, p. 184-185.
308
Idem, p. 185.
309
Arquidiócesis de Monterrey. Secretariado de Pastoral Catequetic. Distintos ritos de la Iglesia
Católica. In: http://www.rosario.org.mx/liturgia/ritos.htm
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132
de instituição, o que a tornaria única entre as liturgias cristãs, e a invocação ao
espírito Santo vem após as intercessões
310
.
A família Bizantina apresenta uma detalhada recitação da criação, queda e
redenção logo após o sanctus. O pós-sanctus e as intercessões são bastante
curtos. Este rito é o segundo mais usado pela igreja ainda hoje. E de acordo com
Mihail Sabatelli possui como diferenças marcantes a língua e a música.
O Rito Bizantino, do Patriarcado de Constantinopla, difundiu-se em todas
as províncias eclesiásticas dependentes na origem de tal patriarcado (Anatólia,
Balcãs, Ucrânia, Rússia) e, desde o século XI substituiu os ritos existentes nos
patriarcados ortodoxos de Antioquia, Alexandria e Jerusalém. Em todas estas
regiões há grande uniformidade litúrgica, embora com pequenas variantes. A
diferença mais sensível é a da ngua e, mais ainda, da música. Língua originária
do rito é o grego antigo, mas desde cedo começou a ser usada a língua georgiana
e, nos países eslavos, no século XI, a língua eslava antiga ou leo-eslavo. Mais
tarde foi introduzido o uso da língua romena, árabe e outras línguas modernas
311
.
A família gálica, esta entre aquelas que se diferenciam do rito romano, se
incluem portanto, entre os ritos ocidentais não-romanos. Esta família se divide em
quatro subgrupos: ambrosiano ou milanês, moçárabe (Espanha), céltico (Irlanda)
e galicano (França e Alemanha). A origem desta família é de difícil identificação,
mas parece haver uma fundamentação no rito romano, e muitos fatores
contribuíram para as diferenças, como as ações nacionalistas dos francos no
século V e a falta de contato direto com Roma. O rito galicano possui uma grande
variedade de fórmulas e expressões. Inicia com a saudação O Senhor esta
sempre convosco, segue-se com dois cânticos, a leitura do Antigo Testamento e
do Novo Testamento com uma explicação homilética dos textos, assim termina a
liturgia da palavra. A liturgia do sacrifício inicia com a entrada dos elementos da
eucaristia que são colocados sobre o altar, o feitas as intercessões e o rito
termina com um beijo da paz. Em seguida é feita a oração eucarística e o pós-
sanctus, o pão é partido e disposto em forma de cruz, o Pai-nosso é recitado pelo
310
WHITE, James F.,op.cit., p. 185.
311
SABATELLI, Mihail (org). A Divina Liturgia no Rito Bizantino-eslavo. In: A Divina Liturgia no Rito
Bizantino-Eslavo - Pequeno Missal Bizantino. http://www.ecclesia.com.br/biblioteca/
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celebrante e pela congregação, a comunhão se recebe no altar, os homens com
as mãos descobertas e a mulheres com a mãos cobertas por um tecido e tomam
do cálice. Segue-se com uma oração após a comunhão e o rito termina com a
expressão: Missa acta est. In pace
312
.
O rito da família Romana é dominante no catolicismo romano, chegando a
ser utilizado por cerca de 98% dos católicos. Em princípio O rito romano era
celebrado somente na cidade de Roma, somente depois do século VIII que se
dirigiu para outras partes do ocidente, influenciando outros ritos ocidentais e
sendo também influenciado (como o rito galicano). A liturgia eucarística se divide
em quatro partes: 1. O ofertório; 2. oração de ação de graças com a expressão:
"deu Graças" a Seu Pai antes de "abençoar", é feito O memorial da Ceia que
precede as palavras da instituição: "Tomai... isto é meu Corpo", é feita uma
invocação do Espírito Santo (epiclése); 3. vem então a fração do pão repetindo o
gesto de Jesus, um fragmento do pão é mergulhado no cálice; e 4. a
comunhão
313
.
A partir da análise das famílias litúrgicas clássicas, contata-se que a cultura
é um elemento fundamental no desenvolvimento da liturgia, que ela imprime suas
marcas nas expressões religiosas e que portanto deve ser compreendida em toda
elaboração litúrgica.
3.3.2 A inculturação litúrgica
A partir da análise das famílias litúrgicas se observa a variedade de
expressões religiosas existentes no mundo antigo, e como estas manifestações
estavam relacionadas com as características culturais dos povos que as
elaboraram, por detrás da rigidez das fórmulas e dos ritos existia a cultura local
modelando e imprimindo suas marcas próprias. O que pode ser considerado um
traço da inculturação litúrgica, ou seja, o processo pelo qual os elementos
pertencentes a uma cultura local são integrados na liturgia, como é descrito por
Anscar J. Chupungco:
312
VALLE. C. Garcia Del. Galicano, rito. Canal social. Ediciones Rialp. In:
<http://www.canalsocial.net/ >. pesquisa realizada em novembro de 2006
313
DULAC, Raymund. QUO PRIMUM TEMPORE: Estudo do padre Raymond Dulac sobre a bula
que promulgou o missal romano. In: http://www.capela.org.br/Missa/dulac1.htm
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A integração significa que a cultura influencia a maneira de
compor e proferir textos e orações, executar ações rituais e
expressar a mensagem em formas artísticas. Integração pode
significar também que ritos, símbolos e festas locais, depois de
passarem pela devida crítica e reinterpretação cristã, tornam-se
parte do culto litúrgico de uma igreja local.
Um resultado da incultura
ção é o de que os textos, símbolos,
gestos e festas litúrgicos evocam algo da história, das tradições,
dos padrões culturais e do espírito artístico do povo. Podemos
dizer que, se uma liturgia é capaz de evocar a cultura local, isso é
um sinal de que efetivamente ocorreu inculturação
314
.
314
CHUPUNGCO, Anscar apud KIRST, Nelson. Liturgia. IN: SCHNEIDER-HARPPRECHT (org.),
Teologia prática no contexto da América Latina. São Leopoldo, Sinodal / ASTE, 1998, p.136.
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O objetivo da inculturação da liturgia é o de criar uma maneira de
comunicação que seja adequada à comunidade local e facilmente assimilada pelo
povo, o que possibilita uma participação ativa e consciente no culto, que brota da
convicção de fé de cada indivíduo. Compreende ainda que se for executada de
forma correta, levará a comunidade a uma compreensão maior do mistério de
Cristo. A inculturação objetiva, portanto, aprofundar a espiritualidade e a
participação da comunidade, evitando práticas descontextualizadas e alienantes.
Se a inculturação não levar a tanto, não passa de um exercício fútil
315
.
O processo de inculturação litúrgica se dá a partir de dois métodos: as
assimilações criativas, que foi praticada pelos cristãos gregos e entre os séculos I
e IV e o método de equivalência dinâmica.
O primeiro método de assimilação criativa consistiu na incorporação
daquilo que existia na cultura (símbolos, língua, ritos religiosos ou não). Este
método retira o potencial austero da liturgia possibilitando uma interação muito
maior entre as pessoas e o ato celebrado
316
.
O segundo método é o de equivalência dinâmica. Ele parte daquilo que já
existe na liturgia cristã, e observa como a cultura pode contribuir no
desenvolvimento de sua estrutura e forma, Nelson Kirst afirma que este método
se assemelha a um tipo de tradução, substituindo elementos da estrutura
litúrgica por algo que tenha maior sentido na cultura do povo, que seja mais
contextualizado e adequado para os objetivos da liturgia. O que se nota é que
este método, substitui elementos da estrutura litúrgica por algo que tenha um
significado ou valor igual na cultura do povo
317
.
A expressão inculturação litúrgica, pode então ser compreendida, como um
neologismo litúrgico, o a idéia por detrás do conceito não é nova como prática
litúrgica, Chupungco, reconhece que o partir do o, o batismo, a imposição de
mãos e a unção dos enfermos no Novo Testamento podem ser considerados
315
Idem, 137.
316
Idem, ibid.
317
CHUPUNGCO. Anscar J. Liturgias do Futuro: processos e métodos de inculturação. São Paulo:
Paulinas, 1991, p. 46.
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como inculturação litúrgica, pois eram práticas da cultura neo-testamentária.
Desta forma, se descreve inculturação litúrgica como um processo que ocorre de
inserção da estrutura cultural nos ritos e textos do culto, que absorvem a
linguagem, o pensamento e modelos
318
.
Nesta direção Chupungco, afirma que:
No decorrer dos séculos, a liturgia aproveitou elementos materiais
e gestos corporais em uso entre diferentes povos: pão, vinho,
água, óleo, incenso, velas, imersão, imposição das mãos,
aspersão com água, genuflexão, prostração etc. Na liturgia, tais
elementos assumiram o papel de expressar e simbolizar com
conaturalidade as realidades cristãs. Por isso, os elementos da
cultura e na verdade a própria cultura, enriquecidos pela e pelo
culto cristãos, evoluíram em um processo transcultural, sem forçar
a sua natureza
319
.
Nem todos os aspectos da cultura, podem ser assimilados diretamente
pela liturgia cristã, há elementos que ficam de fora da inculturação litúrgica, neste
processo de inculturação, é necessário considerar a natureza e os objetivos da
liturgia cristã, que tem na práxis um de seus fundamentos: comunicar o
evangelho, possibilitar a reflexão, criar condições para as transformações sociais
e desenvolver as práticas comunitárias e de serviço ao povo. Assim, a avaliação
da inculturação litúrgica passa pelo crivo histórico, bíblico e teológico.
3.3.3 Práxis litúrgica
Como foi visto anteriormente, liturgia é uma expressão de origem grega
(leitourgia; verbo: leittourgein; substantivo pessoal: leitourgós), assim provém da
composição de duas palavras láós, que quer dizer povo e érgon, que significa
obra / serviço / ação. Traduzindo literalmente a palavra liturgia, ela terá o
significado de serviço feito para o povo, ou serviço diretamente prestado para o
bem comum. Como quando um grupo de vizinhos e amigos que se reúnem para
encher uma laje ou construir um cômodo em mutirão em um final de semana, eles
estão fazendo liturgia, da mesma forma que o sacerdote ao celebrar um serviço
318
Idem, p. 37-38.
319
Idem, p. 42.
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na Igreja, também faz liturgia. Portanto, a práxis como é atividade intrínseca a
liturgia cristã.
A partir da eclesiologia contemporânea, a igreja é vista como sacramento,
sinal e instrumento
320
, portanto, como espaço do serviço e da ação profética,
capaz de operar a revolução simbólica que as transformações sociais exigem.
Este modelo de igreja encontra-se em contradição com uma eclesiologia centrada
na instituição e no clericalismo, que uma igreja clerical irá corresponder a uma
liturgia clerical, construída sem a participação do povo, enquanto a igreja como
sacramento aponta para uma liturgia comunitária e participativa. Como se observa
na afirmação de Ione Buyst:
É esta Igreja povo de Deus, povo sacerdotal, profético e régio,
Corpo de Cristo no espírito Santo que é chamada a celebrar a
liturgia, a ser seu sujeito, ator, agente; a ser liturgo
321
.
A eclesiologia emergente, afirma que a igreja é vista como essencialmente
missionária, enviada a servir, dentro de um envolvimento direto com a sociedade,
desta forma, ela é chamada a transpor os muros e a se engajar no trabalho em
prol da justiça, da libertação e da paz.
O desafio para a práxis litúrgica é o de possibilitar a criação de uma igreja
que é verdadeiramente uma comunidade a serviço do povo, ou seja, capaz de
acolher pessoas de fora e sinalizar o amor e a justiça em suas práticas cotidianas.
Uma igreja capaz de formar as pessoas para exercer sua vocação de serva, que
se transforma em sacramento, sinal e instrumento de Deus na sociedade.
A igreja é o povo de Deus, que se reúne para o exercício visível de sua fé,
da práxis transformadora e libertadora que sinaliza o reino de Deus na sociedade,
todos os cristãos são chamados a assumir sua cidadania e a participar da missão
de Deus no mundo. Nesta direção, observa Buyst que:
320
BOSCH, David J. Missão transformadora: mudanças de paradigmas na Teologia da Missão.
São Leopoldo, EST / Sinodal, 2002, p.449.
321
BUYST, Ione. O mistério celebrado: memória e compromisso I. São Paulo: LBT/Siquem
Ediciones, 2002, p. 93.
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Como povo sacerdotal, somos chamados a viver conscientemente
e a expressar publicamente, na liturgia, os laços de intimidade, de
fidelidade, que, muitas vezes de forma inconsciente ou difusa,
unem todos os seres humanos e até mesmo toda a realidade
criada, com o sagrado (...)
322
.
Uma práxis litúrgica resultante da igreja como sacramento, sinal e
instrumento, certamente levará à reflexão sobre o papel do cristão na sociedade,
já que tal liturgia não é elaborada para servir o indivíduo, em seus interesses
hedonistas, mas a comunidade, e busca ser apoio na jornada do povo de Deus
na busca por sinalizar o mundo com os valores do reino de Deus justiça,
igualdade e liberdade.
3.4 Desafios para a práxis pastoral litúrgica em Heliópolis
A comunidade de Heliópolis, como foi analisado no primeiro capítulo,
surgiu a partir de uma ação não planejada do poder público municipal da cidade
de São Paulo. Na década de 1970 a comunidade é transferida para uma área
pública, sem condições apropriadas para a habitação. A organização dos
moradores contou nos anos 70-80, com diversos agentes externos, inclusive as
pastorais sociais, que se engajaram na lutas dos moradores de Heliópolis por
habitação. Neste período, no Brasil, estavam ocorrendo as lutas pela
redemocratização do país e por uma ordem social marcada pela justiça social. No
contexto religioso, a Teologia da Libertação, vive seu período de maturação
323
, e
contribui para fortalecer os sonhos e as práticas de muitos cristãos que
participaram das pastorais sociais, tanto no meio católico como protestante.
A partir 1989, com a queda do muro de Berlim e a imposição hegemônica
da economia de mercado e de uma globalização de cunho neoliberal
324
, há um
refluxo das lutas sociais e pastorais, que reivindicavam por justiça social. Este
322
Idem, p. 93.
323
RICHARD. Pablo. Força ética e espiritual da teologia da libertação: no contexto atual da
globalização. São Paulo, Paulinas, 2006, p. 21.
324
Idem, p. 21.
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139
processo atinge também a igreja e, particularmente, a Teologia da Libertação.
Clóvis Pinto de Castro comenta este fato afirmando que:
A utopia socialista, que alimentava a práxis de muitos cristãos,
perdeu seu poder de encanto e sedução. A própria Teologia da
Libertação ainda passa por um processo de reformulação na
busca de uma reflexão teológica que apreenda a complexidade da
modernidade neste final de milênio, e que apresente novas
alternativas para a espiritualidade e ação pastoral dos cristãos nas
diferentes realidades da sociedade brasileira
325
.
As transformações sociais e políticas dos anos 1990 atingiram as
esperanças e conseqüentemente a práxis da parcela da igreja envolvida com as
questões sociais, e a presença das pastorais sociais sofreu uma diminuição. Em
certa medida se notou a perda da esperança cristã, e por sua vez da eficácia
mobilizadora e revolucionária das pastorais sociais.
A partir dos anos 1990, movimentos de inspiração conservadora e
fundamentalista ganham espaço dentro das igrejas (católicas e protestantes), e
anunciam a superação da Teologia da Libertação, juntamente com as
transformações no chamado socialismo real. Com a demolição da Teologia da
Libertação, comenta Pablo Richard, estes movimentos sepultam a própria
capacidade dos cristãos, especialmente do pobre, de ser sujeito criativo de uma
nova teologia, de um novo modelo de Igreja e sociedade
326
, e de práxis pastoral
litúrgica.
Atualmente, na comunidade de Heliópolis, apesar da presença de
inúmeras igrejas cristãs, não se constata uma participação política e com força de
mobilização por parte das igrejas nas ões dos moradores e organizações como
a UNAS, que, por sua vez, permanecem em luta pela urbanização, por educação
e saúde.
A partir destas considerações: o refluxo das pastorais sociais e a ausência
de ações por parte das igrejas que atuam em Heliópolis, nota-se a necessidade
de retomar a pastoral litúrgica, fundamentada na práxis, como forma de contribuir
325
CASTRO, Clóvis Pinto. Por uma cidadã: a dimensão pública da igreja fundamentos para
uma pastoral da cidadania. São Paulo:Loyola / UMESP, 2000, p, 106.
326
RICHARD. Pablo, op.cit., p. 34.
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140
nas lutas dos moradores de Heliópolis, sustentando suas esperanças e
fortalecendo suas resistências. Neste contexto a práxis litúrgica, torna-se um
obstáculo para o avanço das práticas de exclusão.
São muitos os desafios para uma práxis litúrgica para a Comunidade de
Heliópolis, a começar por recuperar a dimensão comunitária e festiva da liturgia
cristã e buscar na inculturação litúrgica na assimilação criativa dos elementos
da cultura nordestina meios mais eficientes de comunicar o evangelho. A práxis
litúrgica neste contexto deve buscar a revolução simbólica, elemento necessário
para motivar as lutas por transformações sociais e justiça.
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141
3.4.1 Elementos para uma práxis pastoral litúrgica
A práxis pastoral litúrgica para o contexto da Comunidade do Heliópolis se
faz necessária a partir da opção pelos pobres
327
, que ali vivem e constroem seus
sonhos e esperanças. A necessidade de uma práxis litúrgica se faz presente na
comunidade, por que lá residem seres humanos ainda mais silenciados pela
opressão do capital, excluídos do mercado de trabalho e com dificuldades de
tornarem-se sujeitos efetivos da própria história
328
. Essa posição ao lado do ser
humano excluído também é uma opção contra a racionalidade do mercado que
expropria as riquezas e impede a criatividade humana. Nesta atividade não se
separa o homo sapiens do homo faber, já que não existe atividade humana que
prescinda o conhecimento intelectual.
A partir da análise do texto Força ética e espiritual da Teologia da
Libertação de Pablo Richard, é possível apontar para o fato de que práxis
pastoral litúrgica deve priorizar três aspectos fundamentais para o seu
desenvolvimento na comunidade de Heliópolis: a construção da esperança, a
criação de fundamentos sólidos e a formação de pessoas
329
. Outros elementos
que devem constituir esta práxis litúrgica são: a espiritualidade e o profetismo.
Para o desenvolvimento da práxis pastoral litúrgica, cinco objetivos gerais
podem ser apontados, até aqui, são eles: 1. construção da esperança, como
categoria capaz de mobilizar o ser humano a se afirmar nos laços de cooperação
e solidariedade; 2. o incentivo à criação de alternativas (políticas, econômicas,
éticas, espirituais e sociais); 3. a formação de quadros de liderança para a
327
No sistema de globalização do mercado, inspirado na ideologia neoliberal, não existe
realidade do empobrecimento, mas também a da exclusão. No modelo capitalista, anterior ao
capitalismo selvagem, os pobres contavam como mão-de-obra ou como consumidores. Além
disso, a pobreza estava ligada normalmente ao salário miserável, em um contexto de lutas de
classes entre proprietários e meios de produção e assalariados. No capitalismo tradicional de
bem-estar social procurava-se um desenvolvimento nacional que incluíssem todos e todas. Nunca
se realizava, mas ninguém ficava excluído da planificação social de trabalho, terra, saúde e
educação para todos. Hoje, os pobres são majoritariamente excluídos: como o-de-obra, como
consumidores, como assalariados; são excluídos até da própria planificação capitalista global. Os
pobres simplesmente não existem. (RICHARD. Pablo, op.cit., p. 87).
328
RICHARD. Pablo, op.cit., p. 35.
329
Idem, p. 38.
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142
comunidade; 4. a criação de condições para o diálogo inter-religioso e com os
movimentos sociais e ecumênicos; e 5. o desenvolvimento de uma
espiritualidade da vida como valor absoluto, contra os valores de pura
produtividade
330
, uma espiritualidade que considere todas as dimensões do ser
humano e capaz de compartilhar no lugar de somente acumular e consumir .
Estes objetivos devem possibilitar o desenvolvimento, ainda que lento, de ações
de solidariedade, cidadania e resistência às forças que oprimem e escravizam os
seres humanos.
Como se faz uma liturgia capaz de atingir estes objetivos? Que se
transforme, por exemplo, em ações concretas no Ponto Missionário do Heliópolis?
Primeiramente é necessário buscar uma abordagem interdisciplinar da
subjetividade, já que a subjetividade se configura como característica cultural,
cognitiva e emocional do ser humano, e pode ser analisada sob variados
aspectos: sociológicos, filosóficos, históricos e teológicos, todos fundamentais
para o liturgista
331
. Sobre a subjetividade, Luiz Viera afirma que:
A discussão sobre a relação entre liturgia e subjetividade é
necessária e urgente, se concordarmos que a subjetividade é
característica das mais evidentes na cultura moderna, devemos
partindo da liturgia, levar a cabo essa discussão. A celebração
litúrgica não se sem o encontro entre a realidade humana e a
divina. (...) Por isso mesmo a subjetividade humana deve ser
valorizada e considerada
332
.
Valorizar e considerar o processo de subjetivação é também proteger o
indivíduo das pressões massificantes da sociedade urbana, desta forma a liturgia
deve acolher o indivíduo tal como ele é e a partir daí buscar atingir os objetivos
propostos anteriormente.
Visando atingir os objetivos gerais para o desenvolvimento da práxis
litúrgica, nota-se a necessidade de observar algumas ações, tais como: 1. a
330
Idem, p. 48.
331
VIEIRA, Luiz. Liturgia e subjetividade: relação e conseqüência. In: Liturgia e subjetividade.
Cadernos de Liturgia. São Paulo: Paulus,1998, p. 6.
332
Idem, p. 10.
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leitura popular da Bíblia, 2. as orações de ação de graças e intercessão, 3. a
celebração da eucaristia, 4. o uso da música e 5. a prática dos gestos corporais.
No exercício cotidiano da leitura popular da bíblia, o ser humano descobre
o sentido da palavra de Deus e reflete sobre a sua própria realidade
333
. Esta ação
deve proporcionar a reflexão e a troca de experiências entre o povo. A Bíblia
aparece como um reflexo, um símbolo daquilo que as pessoas vivem na
sociedade urbana. A partir desta leitura é possível fazer o exercício de
interpretação e análise dos fatos da vida cotidiana e buscar a partir destas
interpretações o engajamento social e cidadão. Essa atitude proporciona a
vivência comunitária e o despertar de uma consciência crítica e cidadã.
A oração de ação de graças e louvor, reanima a esperança cristã e a
alegria do povo que se reúne. As expressões de gratidão, motivam o povo em
suas lutas cotidianas, pessoais e comunitárias e sentido à vida. A oração de
súplica e intercessão, também deve ser praticada, pois ela lembra o povo que
ainda há pelo que lutar para que o reino se realize em plenitude, que
poderemos sossegar quando não houver mais nenhuma pessoa no mundo
vivendo na miséria, nas trevas, na solidão, na injustiça
334
.
A celebração da eucaristia, como prática da comensalidade, deve estar
presente na liturgia que se orienta pela filosofia da práxis. O ato comunitário da
eucaristia reafirma que a vida vence a morte e possibilita a renovação da
esperança e do engajamento social e político de todo o povo que a celebra
335
. A
celebração da ceia ensina e move a igreja a colocar em prática o amor e a
solidariedade, ninguém come sozinho, compartilhar é o ato central, assim, as
dimensões da fraternidade e da igualdade estão sempre presentes na
eucaristia
336
. Há também a renovação do sentido profético, da igreja, que insiste
em uma visão de mundo alternativa ao modelo hegemônico na sociedade urbana,
excludente e não solidário.
333
RICHARD. Pablo, op.cit., p. 51-53.
334
BUYST, Ione, op.cit. p. 135.
335
MARASCHIN, Jaci. A beleza da santidade: ensaios de liturgia. São Paulo: Aste, 1996, p. 70.
336
FLORISTÁN, Casiano, op.cit., p. 48-49.
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144
O uso da música e do canto, como elementos integrantes da liturgia, pois
a música pode e muitas vezes efetivamente transmite uma intensidade de
sentimento maior do que se expressaria sem ela
337
. Não se pode limitar a música
á uma função decorativa e de preenchimento de espaços vazios na liturgia, pois a
música transcende a racionalidade sendo capaz de atingir o povo em sua
totalidade, a partir dos sentimentos. Ela ainda proporciona um clima de festa e
alegria
338
. Ione Buyst comenta ainda que:
O canto meditado se aloja no coração e de irradia luz e paz ao
longo do dia, no meio de nossas ocupações diárias e, assim, ajuda
a manter a oração permanente
339
.
A prática do gesto corporal, que é ao mesmo tempo envolve razão e
afeto, sendo uma realidade psíquica e espiritual. Não ação humana que não
envolva a corporeidade, (...) não outro lugar ou outro meio para fazer
experiência com Deus e nos encontrar com ele, a não ser em nossas
experiências corporais
340
. Assim, dançar a liturgia, formar círculos, dar-se às
mãos, contribui para criar um corpo celebrante e comunitário que é sujeito da
liturgia e experimenta a libertação. Como afirma Jaci Maraschin:
No Brasil, tudo é dança, jogo e brinquedo: festa do corpo. Tudo é
celebração dionisíaca de alegria e entusiasmo. Tudo termina em
contemplação (...) perante o mistério
341
.
Em todas estas ações, a reflexão e a participação ativa da comunidade
devem estar presentes, ao mesmo tempo em que o saber popular é valorizado e
avaliado criticamente. O agir e o conhecer, a leitura dos fatos e a compreensão
das coisas, comentada por Gramsci
342
, são partes integrantes da práxis litúrgica,
que objetiva uma formação que supere o senso comum, as crenças e
preconceitos presentes no grupo.
337
WHITE, James F. op.cit., p. 85.
338
BUYST, Ione, op.cit., 147-148.
339
Idem, p. 148.
340
Idem, p. 116-117.
341
MARASCHIN, Jaci. A (im)possibilidade da expressão do sagrado. São Paulo, Emblema, 2004,
p. 9.
342
SEMERARO, Giovanni, op.cit., p. 17.
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145
As ações que se relacionam à práxis litúrgica devem favorecer a reflexão
necessária para a superação das práticas repetitivas e a consciência comum,
possibilitando ações transformadoras e criadoras de um novo modelo de
sociedade, no interior da comunidade de Heliópolis. Como afirma Richard:
Hoje necessitamos, mais do que nunca, reconstruir a vida e a
esperança, especialmente entre os pobres. A esperança é não
somente uma virtude teologal mas também uma orientação
estratégica, uma metodologia, um espaço onde haja vida para
todos e todas
343
.
A liturgia que se fundamenta na práxis é uma alternativa aos modelos
religiosos e litúrgicos que buscam a solução na fuga para um mundo ilusório e de
submissão à uma ordem opressora. Assim, ao desenvolver suas ações e
objetivos, esta práxis pastoral litúrgica, certamente terá condições de colaborar
com a comunidade de Heliópolis em suas lutas, e resistência às forças que geram
a morte, podendo assim trilhar caminhos de vida, justiça e esperança.
343
RICHARD. Pablo, op.cit., 169.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
De que me adianta viver na cidade se
a felicidade não me acompanhar.
(Saudade da minha terra -Goia e Belmonte)
A proposta da pesquisa foi analisar a práxis da pastoral litúrgica apontando
caminhos para esta atividade no contexto urbano, e como toda análise, ela é uma
leitura da realidade, neste caso da realidade da cidade de São Paulo, mais
especificamente da Comunidade de Heliópolis, A cidade do Sol.
Contudo é necessário salientar que tanto a Comunidade de Heliópolis
como a cidade de São Paulo, são partes que integram um sistema econômico,
cultural e político complexo e diversificado, um sistema global, que vem gerando
espaços de concentração de riqueza e exclusão social, de plena mobilidade
alguns e limitações no exercício da cidadania para muitos. Neste sistema, o
mercado e a globalização neoliberal despontam como deuses portadores dos
bens de salvação para a humanidade, criando uma sociedade que se apropria da
tecnologia para o bem de poucos indivíduos e na qual a atividade solidária se
revela como um obstáculo dentro do modelo de desenvolvimento imposto pelo
sistema.
A práxis como atividade material do ser humano, é ação transformadora,
que objetiva a supressão das injustiças e desigualdades presentes na sociedade.
Sem reflexão e leitura cuidadosa da realidade não existe atividade práxis, mas
não basta a reflexão e análise para a práxis, antes ela se desdobra em uma
atitude concreta frente às desafios históricos que são apresentadas aos seres
humanos.
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147
A globalização neoliberal em todos os seus contornos, seja: econômico,
político, cultural, ou religioso, é um desafio para o ser humano moderno, ela
modelou nas últimas décadas, uma sociedade nova, centrada em valores que
desafiam a igreja e a humanidade. Ela cresce sem limitações, forçando os países
da periferia do capitalismo a abrirem seus mercados aos países centrais,
privatizando suas economias, flexibilizando os direitos trabalhistas e impondo
ajustes econômicos por meio de organismos internacionais como o FMI (Fundo
Monetário Internacional) e o Banco Mundial, que não somente impede o
desenvolvimento destas economias como também contribui para perpetuar a
exclusão social, impedindo o investimento em áreas sociais vitais para a
sobrevivência dos pobres e excluídos.
A igreja, não pode ignorar a globalização neoliberal imposta à sociedade,
como um elemento que norteia as ações dos indivíduos, e as mudanças culturais
dos diferentes grupos de países. Diante das pressões para impor o pensamento
único, fica o desafio constante de buscar na diversidade de pensamentos e
alternativas criativas para a superação dos problemas que tocam a humanidade
que vive sob os efeitos deste modelo econômico perverso e excludente.
As reflexões feitas alheias aos processos de decisão global, talvez
considerem como única possibilidade a intervenção tão somente no nível local e
pontual. É importante notar que não se pode ignorar a importância das ações
locais bem intencionadas, que visam às transformações políticas e econômicas e
a inserção dos pobres. Entretanto, uma reflexão isenta de crítica, e que
desconsidere os efeitos da globalização neoliberal nas localidades, e se conforma
com a inevitabilidade da imposição da exploração imposta pelo mercado global,
não dará conta de responder à todas indagações e problemas oriundos da
localidade.
Não resta duvida que as ações são exercidas também no local, num
determinado contexto cultural, político e econômico, e que necessitam de um
exame dentro do contexto, entretanto tais análises precisam dar o salto de uma
consciência comum para uma consciência reflexiva, ou seja, para a práxis, que
supera a miopia da análise local considerando a relevância das questões globais,
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148
que em última instância é onde as forças econômicas agem e as decisões são
efetivamente tomadas afetando a vida de todas os indivíduos.
Uma pastoral litúrgica que busca seus fundamentos na filosofia da práxis,
certamente possui ações que são locais, dentro de um contexto social específico
e facilmente reconhecido, como a Comunidade de Heliópolis. Entretanto tais
ações não podem se desvincular de uma reflexão conjuntural que considere
criteriosamente o sistema de globalização neoliberal, que segue vitimando
homens e mulheres em todo o mundo. Esta ação tem uma potencialidade de
criar condições que operem transformações nas relações sociais existentes na
Comunidade de Heliópolis, que podem vir a contrapor os interesses do sistema
capitalista e do Estado que o avaliza, que passa a ter a função quase que
exclusiva de deter e limitar quaisquer intenções que venham frustrar os interesses
dos capitais, e o papel de legitimar as formas de dominação impostas pelas
grandes corporações, ou seja, um Estado operando em favor do capital em
detrimento do cidadão.
A organização das cidades no Brasil, também se orienta para atender aos
interesses do capital, o que tem causado o caos e o descaso com as questões
urbanas mais urgentes como moradia, saúde e educação. Os fatores causadores
do caos urbano que se instala nas cidades brasileiras possuem elementos
comuns que são geradores desta desordem, dentre estes elementos situa-se a
urbanização coorporativa, um processo de urbanização orientado para atender
aos interesses do mercado e à expansão capitalista. Ao orientar as políticas
públicas, para o atendimento destes empreendimentos o resultado é um processo
de urbanização excludente e que precariza as relações entre o Estado e o
cidadão, em que o cidadão não tem participação e acesso ao que a cidade
produz.
O que se nota é que uma deterioração deliberada do Estado, com o
objetivo de atender à lógica neoliberal de um Estado mínimo que por sua vez
leva a uma degradação também dos projetos políticos que tenham as
transformações sociais como eixo norteador. A conseqüência é a falta de
interesse popular em debater as questões políticas e sociais que afetam o
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149
cotidiano. Diante desta questão, os diversos movimentos sociais possuem
enorme relevância, como espaço de reflexão e ações de transformação social,
resistência e denúncia das práticas de exploração do ser humano.
A práxis pastoral litúrgica deve participar da reflexão e das atividades em
parceria com os movimentos sociais organizados na cidade, que possuem como
objetivos a transformação da realidade social e a emancipação humana. Em
todos os movimentos sociais, se formam novos sujeitos históricos, distintos entre
si, como movimentos urbanos, campesinos, de migração, moradia, educação,
economia solidária, etc. Muitos movimentos sociais surgiram motivados por
diferentes Igrejas e pastorais sociais, e hoje são um importante espaço de diálogo
e fortalecimento mútuo entre a sociedade e a igreja
344
.
Entretanto diante do avanço das políticas neoliberais, da privatização da fé
e da gradativa eliminação do caráter antecipatório da preocupação última, os
movimentos sociais têm experimentado perdas e refluxos constantes, o que
acaba gerando a falta de esperança, pela vitória que não chega, e o desanimo.
Este quadro tem levado inúmeros movimentos sociais a serem cooptados e
seduzidos pelas soluções paliativas oferecidas pelo sistema que não são capazes
de propor ações efetivas de transformação e que colaboram para a manutenção
da pobreza, da falta de moradia e da fome.
Neste contexto, a práxis pastoral litúrgica deve insistir na opção
preferencial pelos pobres e excluídos priorizando a práxis de libertação, a
espiritualidade integral e à atividade profética, estas ações possuem um
importante sentido revolucionário, que coloca o ser humano e a natureza no
centro das decisões, devolvendo-lhes a dignidade e as esperanças perdidas.
Compreende-se que a esperança cristã é uma categoria que deve estar
presente na práxis pastoral litúrgica, pois ela possibilita a mobilização para as
mudanças desejadas, já que o futuro é antecipado por ela, exigindo no presente
os sinais de justiça e igualdade prometidos para o reino (futuro). Como foi
344
Cf. RICHARD, Pablo. Força ética da teologia da libertação no contexto atual da globalização.
São Paulo: Paulinas, 2006, p. 44-46.
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observado, o ser humano portador desta esperança não se contenta com o
presente dominado pela exploração e por sinais de morte. A fé que se desenvolve
a partir desta esperança carrega consigo as sementes da práxis, trazendo a
impaciência e a inquietude capazes de transformar o presente.
A práxis pastoral litúrgica, o obstante, se movimente pelo terreno, por
vezes austero, das análises conjunturais e da crítica às estruturas (apolíneo), não
deve perder a perspectiva de que todo o seu fazer é para o ser humano, é serviço
para o povo, em que a arte, a beleza, o companheirismo, a paixão pela vida
(dionisíaco), e o anúncio da ressurreição de Cristo protesto contra o sofrimento
humano são elementos fundamentais na constituição da práxis litúrgica.
Desta maneira a práxis litúrgica alimenta o sonho de materialização
objetiva daquilo que se espera e a renovação da esperança cristã torna-se um
dos eixos norteadores da pastoral litúrgica, em sua busca para reanimar o povo
para as suas lutas concretas, favorecendo assim, a organização e a
sensibilização do ser humano para as questões sociais presentes em seu
contexto.
A celebração litúrgica é o encontro do povo de Deus, que espera a
plenitude do reino, mas provoca sua irrupção no cotidiano. A cidade com seus
encontros e desencontros por vezes impede o brilho desta esperança na vida de
seus habitantes, não é diferente na Cidade do Sol, contudo tudo isso se torna
ainda mais perverso pois há muito pelo que lutar e conquistar, por isso toda a
ação que vai ao encontro de animar o sonho de emancipação destes homens e
mulheres cumpre uma missão profética, de anúncio da esperança e denúncia dos
males. Um povo alegre, inspirado pelo sopro do Espírito de Deus, realiza a práxis
histórica.
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151
REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA
ALBUQUERQUE, Irany Tenório. Perspectivas para uma pastoral urbana: estudo
de caso da experiência pastoral na favela Heliópolis. São Bernardo do
Campo. Universidade Metodista (UMESP), 2000, Monografia de conclusão
do curso de Bacharel em Teologia.
ARBEX JR. José e OLIC. Nelson Bacic. O Brasil em regiões: sudeste. São Paulo:
Moderna, 1999.
BARROS, Reynaldo E. Plano de governo. PMSP. 1980. In: SAMPAIO, Maria
Ruth Amaral. Heliópolis, o percurso de uma invasão. São Paulo: FAU/USP,
Tese de Livre Docência, 1990.
BERGER, Peter L. O dossel sagrado: elementos para uma sociologia da religião.
São Paulo: Paulus, 1985.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
BÓGUS, Lucia Maria M. e WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (Org.). A luta pela
cidade em São Paulo, São Paulo, Cortez, 1992.
BOSCH, David J. Missão transformadora: mudanças de paradigmas na Teologia
da Missão. São Leopoldo, EST / Sinodal, 2002.
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo, Perspectiva,
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__________. Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Rio
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152
BRANQUINHO, Evânio dos Santos. Do Higienópolis ao Heliópolis: fragmentos
urbanos de uma metrópole e a sua (crise de) identidade. Dissertação de
Mestrado em Ciências Sociais. São Paulo, FFLCH-USP, 2001.
BUYST, Ione. O mistério celebrado: memória e compromisso. Vol.I. São Paulo:
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GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais e luta pela moradia, São Paulo, Loyola, 1991, p.68.
(a)
Luta Pela Moradia Popular 1976-1986
Quadro Geral
Categoria de moradores
Moradores de
loteamentos
clandestinos
Moradores de
pra
ças, ruas,
pontes e
viadutos
Moradores
de corti
ços
Moradores de
conjuntos
habitacionais
Moradores
de favelas
Moradores
de casa de
aluguel
Moradores
de
áreas
invadidas e
área precária
(2) Lutas
Luta pela
regulariza
ção
Lutas contra a
repress
ão do
abrigo
Lutas pela
fiscaliza
ção
e locação
Lutas pela melhoria
de qualidade
Luta pela
posse e
urbanização
Lutas pelo
controle dos
pre
ços
Luta pelo
acesso
à
moradia
(4)
Movimentos e organizações
Movimentos de
moradores de
lotes
clandestinos
Associação dos
sofredores de
rua
Movimento unificado de
favelas, corti
ços
e PROMORAR
Movimento de luta das
Associações Comunitárias e
Cooperativas
Reivindicações básicas
Registro do im
óvel
Posse coletiva da terra
Autocontrole do processo
produtivo dos Conjuntos
habitacionais
(6) Forma de
atuação
Através de associação de Defesa da
Moradia Movimentos de
Loteamentos Clandestinos
assessoria jur
ídica da Faculdade de
Direito
Coordena
ção das Favelas
Coordena
ção das associações
comunitárias
(8) Projeto
principal
Legislação sobre loteamentos
populares
Direito real de uso por 90
anos
Cooperativa de ajuda m
útua e
autogestão
(10) Assessorias
Movimento de defesa do favelado
Centro Acad
êmico 22 de agosto
Centro Acad
êmico 11 de agosto
Agentes pastorais e
Igrejas
Func. Da
C
âmara Municipal
Comiss
ão de justiça e paz
Movimento de Defesa
do Favelado
Partidos
Sindicatos
Agentes Pastorais e Igrejas
FASE
Arquitetos autônomos
e INFORMAR
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