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Fábio Augusto Lise
CONTADORES DE HISTÓRIAS OFICINAS SOBRE SEXUALIDADE COM
ADOLESCENTES
Dissertação apresentada à Universidade
do Vale do Rio dos Sinos como requisito
parcial para a obtenção do título de
Mestre em Saúde Coletiva.
ORIENTADOR: PROFª. D. STELA NAZARETH MENEGHEL
São Leopoldo
2008
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Espaço destinado à folha de aprovação.
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Agradeço primeiramente aos jovens que me confiaram
suas histórias, pela sua força, perspicácia e coragem.
Agradeço também a todos, que mesmo sem perceber,
contribuíram para a construção deste trabalho
meus familiares, amigos e professores com seu
conhecimento, amor, carinho e paciência.
Está conquista é nossa!
Muito obrigado!
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RESUMO:
Este trabalho analisa uma intervenção em educação em saúde realizada por meio de oficinas
de contadores de histórias com um grupo de adolescentes atendidos em um programa sócio-
educativo, em Porto Alegre. O objetivo foi problematizar a sexualidade, a partir da leitura e
elaboração de histórias pelos jovens. A análise dos dados pautou-se nos estudos de Michel
Foucault. Os jovens manifestaram dificuldade em se comprometer com a proposta, referindo-
se a si mesmos como aqueles que não são capazes de apreender. Nas conversas e nas histórias
construídas, eles falaram das violências presentes no cotidiano: a pobreza, a fome, a droga, a
vida na rua, o tratamento desigual que recebem na instituição. Nos repertórios se mesclaram
padrões tradicionais sobre sexo/gênero, traduzidos no desejo de namorar, casar, ter filhos, ao
mesmo tempo em que usaram gírias e ironias em relação aos aspectos proibidos da
sexualidade. Oficinas de histórias podem ser de valia nas práticas de educação em saúde como
ferramentas para trabalhar com pessoas vulneráveis, inclusive adolescentes.
Palavras Chave: Oficinas de Histórias; Sexualidade; Adolescentes.
ABSTRACT:
This work analyses a public health intervention based on storytellers workshops with
adolescents attended by a social and educative program in Porto Alegre city. The objective
was to problematize sexuality, starting from story reading and elaboration by the teenagers.
The data analysis was based on Michel Foucault studies. The teenagers expressed difficulties
to establish a commitment with the proposal, referring themselves as the ones who are not
capable of learning. Throughout the conversations and the stories constructions, they talked
about the violent situations on daily life: the poverty, the hunger, the drugs, the street life, and
the unequal treatment they receive at institution. The repertoires mixed traditional patterns
related to sex/gender, translated in the desire for dating, getting married, having children and,
at the same time, they used slang and ironies related to forbidden aspects of sexuality. Story
workshops can be helpful as tools in educational health practices, in order to work with
people who present vulnerability issues, including adolescents.
Key Words: Story workshops; Sexuality; Adolescents.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES:
Figura 1: História em quadrinhos produzida no quarto encontro. ............................................68
Figura 2: História “As crianças nas ruas”. ................................................................................69
Figura 3: História “Meu Sonho”. ..............................................................................................69
Figura 4: História “O Menino Bilu:” ........................................................................................70
Figura 5: Trabalho “Nunca vi um Play 2?”. .............................................................................71
Figura 6: História “O menino que era magro e ficou gordo”. ..................................................72
Figura 7: Trabalho produzido no quarto encontro....................................................................72
Figura 8: História “O Rap do Bom”. ........................................................................................73
Figura 9: Trabalho produzido no quarto encontro....................................................................74
Figura 10: Trabalho “A Cidade Fantasma”. .............................................................................74
Figura 11: História “A casa Imobiliada”. .................................................................................75
Figura 12: “O Pênis”.................................................................................................................85
Figura 13: “O Barco”. ...............................................................................................................85
Figura 14: “Arca de Noé”. ........................................................................................................86
Figura 15: “O Boneco”. ............................................................................................................86
Figura 16: “O Amor”. ...............................................................................................................87
Figura 17: “O Portal”................................................................................................................88
Figura 18: “A Pracinha”. ..........................................................................................................88
Figura 19: “A casa”. .................................................................................................................89
Figura 20: “O Dado”.................................................................................................................89
Figura 21: “Agente Jovem” ......................................................................................................90
6
SUMÁRIO:
1 PROJETO DE PESQUISA:.............................................................................................................8
1.1 Justificativa:......................................................................................................................8
1.2 Objetivos.........................................................................................................................14
1.2.1 Objetivo Geral: ........................................................................................................14
1.2.2 Objetivos Específicos:.............................................................................................14
1.3 Fundamentação teórica ...................................................................................................15
1.3.1 A Sexualidade:........................................................................................................15
1.3.2 Corpo/Corporeidade:...............................................................................................20
1.3.3 Sexualidade na adolescência: ..................................................................................23
1.3.4 Vulnerabilidade: ......................................................................................................26
1.4 Metodologia:...................................................................................................................29
1.4.1 Aspectos Éticos:.......................................................................................................32
1.5 Referências Bibliográficas:.............................................................................................33
1.6 Anexos:...........................................................................................................................36
1.6.1 Anexo 01: Termo Livre e Esclarecido e Autorização para o Uso de Imagem: .......36
2 RELATÓRIO DE TRABALHO DE CAMPO:...................................................................................38
2.1 Minha Experiência com Oficinas:..................................................................................38
2.2 O Programa Agente Jovem:............................................................................................40
2.3 Questões Éticas:..............................................................................................................40
2.4 Negociando a Entrada e Entrando em Campo:...............................................................41
2.4.1 O Modulo Centro:....................................................................................................42
2.5 Oficinas de Sexualidade:................................................................................................43
2.5.1 Primeiro Encontro – 19-07-2007.............................................................................43
2.5.1.1 Transcrição dos Trabalhos Gráficos:................................................................52
2.5.2 Segundo Encontro – 24-07-2007.............................................................................54
2.5.3 Terceiro Encontro – 25-07-2007 .............................................................................55
2.5.4 Quarto Encontro 26/07/2007 ................................................................................64
2.5.4.1 Trabalhos Gráficos Produzidos: .......................................................................67
2.5.5 Quinto Encontro 31/07/2007 ................................................................................75
2.5.6 Sexto Encontro 02/08/2007 ..................................................................................83
2.6 Analise do Processo:.......................................................................................................91
2.7 Análise das Oficinas:......................................................................................................92
2.7.1 Contar Histórias:......................................................................................................92
2.7.2 A realidade nas Histórias:........................................................................................93
2.7.3 Sexualidade:.............................................................................................................97
7
2.7.4 Como os adolescentes se percebem? .....................................................................100
2.7.5 O meio:..................................................................................................................103
2.7.6 Avaliação:..............................................................................................................104
3 ARTIGO:....................................................................................Erro! Indicador não definido.
8
1 PROJETO DE PESQUISA:
1.1 Justificativa:
Um terço da população Mundial é constituído por jovens, na faixa etária da
adolescência, ou o grupo entre 10 e 24 anos de idade (UNESCO, 2003). Estes dados
demonstram que a magnitude deste contingente populacional por si só já justificaria a
realização de estudos e pesquisas com adolescentes.
A Organização Mundial da Saúde (UNESCO, 2003) define a adolescência como um
período de vida compreendido entre os 10 aos 20 anos, embora as várias teorias acerca da
adolescência apontem que este período da vida tem se prolongando cada vez mais. Os
estudiosos justificam essa postergação da idade adulta afirmando que esta fase é diferenciada
para cada indivíduo e que ela envolve particularidades da construção do psiquismo tão
complexas que é impossível limitá-la em uma faixa etária estreita. O Estatuto da Infância e
Adolescência (AMARAL e FONSECA, 2006) de 1990, artigo 2º, considera adolescente para
efeitos dessa Lei, as pessoas de doze a dezoito anos de idade. Para a área da saúde do
adolescente do Ministério da Saúde consideram-se adolescentes, as pessoas de 10 a 14 anos
de idade, adolescentes jovens os de 15 a 19 anos e adultos jovens dos 20 aos 24 anos de idade.
Essas divergências na conceituação e limites etários sobre a adolescência têm sido
9
influenciadas pelas inúmeras mudanças sociais ocorridas na atualidade. Segundo Traverso-
Yépez e Souza Pinheiro (2002) o termo juventude foi utilizado nas últimas décadas em
referência a um prolongamento da adolescência, que em alguns países tem se estendido até os
29 anos, com os filhos permanecendo nas casas e a expensas dos pais (DUARTE-KUAPPER,
2001). Em paises da América Latina estes limites etários começaram a ser questionados
(FREITAS, ABRAMO e LEÓN, 2005). Para alguns, a adolescência iniciaria antes dos 10
anos em virtude do acesso das crianças a um mundo de informações disponibilizado pelos
meios de comunicação e terminaria após os vinte anos, em decorrência das dificuldades dos
jovens frente às responsabilidades financeiras, laborais e afetivas da vida adulta (BURAK,
2001). O Conselho Federal de Psicologia questiona se é possível considerar a adolescência
como uma faixa etária específica, recomendando que a maturidade psíquica e autonomia
orientem o ingresso dos sujeitos na vida adulta.
A adolescência fornece ao indivíduo elementos para lidar com as mudanças corporais,
repensar a posição na sociedade, objetivos de vida e principalmente sua importância no
mundo. É um período de transição engloba fatos, ações e mudanças diretamente ligadas à
construção do sujeito.
A adolescência é um fenômeno originado na sociedade ocidental (CARVALHO,
RODRIGUES e MEDRADO, 2005). Um conceito construído na virada do século XIX
resultante do prolongamento da vida dos indivíduos propiciados pela chamada Revolução
Vital, que estendeu a grande parte da população facilidades como saneamento, água potável,
melhores salários, alimentação e habitação adequadas. As mudanças sociais consideradas para
admitir indivíduos como adultos na sociedade forjaram a definição de “adolescência” como a
conhecemos hoje, “la juventud y la vejez no están dadas, sino que se construyen socialmente
en la lucha entre jóvenes y viejos” (BOURDIEU, 2000, p.164)
10
O adolescer vem acompanhado por mudanças físicas, emocionais e sociais. As
mudanças físicas decorrem do crescimento do corpo que na puberdade começa a liberar
hormônios sexuais responsáveis por mudanças corporais. O adolescente precisa conviver com
impulsos que o invadem e que o levam a ter pensamentos que ele ainda não sabe lidar. Há o
confronto com um corpo que parece não ser mais seu, um corpo que precisa ser descoberto e
testado, o que instiga esse indivíduo a se colocar em situações nem sempre compreendidas
pela sociedade. Esta mudança de condição social de criança para uma condição onde começa
a vivenciar aspectos da vida adulta é intensa e, por vezes ansiogênica e dolorosa, envolve
profundas modificações de conceitos, de visões e de formas de encarar o mundo.
Além disso, o adolescente precisa lidar com a sexualidade como forma de se
relacionar com o mundo. A sexualidade é um dos mais complexos aspectos do ser humano,
apesar disto continua sendo um tema de certo modo tabu, na medida em que quando tratado
na sociedade possui zonas de silêncio e interdição (FOUCAULT, 1993, 1994). A educação
sexual que deveria propiciar um espaço de reflexão sobre a sexualidade, um dos assuntos que
mais mobilizam adolescentes (CZERESNIA, 1995; PARKER, 1997; SZWARCWALD, 2000;
VERMELHO, BARBOSA e NOGUEIRA 1999) é um assunto que muitas vezes as famílias
delegam à escola, e as escolas se omitem de abordá-lo. Assim essa discussão é quase
inexistente nas escolas e nos locais que se atrevem a fazer alguma orientação sexual, os temas
são tratados de modo temeroso, utilizando-se de discursos prontos e medicalizados (GIAMI,
2005). Ou seja, a sexualidade é reduzida à relação sexual, ao processo biológico,
desconsideram-se os sentimentos envolvidos, a afetividade e os aspectos sociais. Os
adolescentes, na maioria das situações, são somente instruídos de como devem se proteger
contra a gravidez indesejada e a contaminação por Doenças Sexualmente Transmissíveis.
Os jovens precisam se apropriar de seu corpo e de sua sexualidade, ou seja, construir
suas identidades e subjetividades, onde a sexualidade é fundamental e constituinte da
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integralidade do ser humano. A discussão da sexualidade não precisa ficar pautada apenas no
biológico, na relação sexual, na reprodução humana e nas doenças sexualmente transmissíveis
(CARVALHO, RODRIGUES, e MEDRADO 2005).
Devido ao fato de perceber a sociedade de modo crítico e contestador, os adolescentes,
muitas vezes não são bem vistos ou acolhidos pelos adultos. Esta falta de compreensão leva o
jovem a procurar novas referências sociais e pessoas que possam perceber suas dores, dúvidas
e questionamentos. Esta referência geralmente está em outros adolescentes que por se
encontrarem na mesma condição proporcionam empatia e acolhimento no “grupo de iguais”.
A procura por estes grupos de iguais é importante e indispensável e fornece os elementos
necessários para enfrentar o que alguns autores chamam de “crise” da adolescência. Porém,
estes grupos não possuem a maturidade e vivência para compreender a crise e agir de modo
continente, podendo muitas vezes se colocar em situações de risco e de vulnerabilidade.
A sexualidade para os adolescentes pode tornar-se mais um fator de vulnerabilidade,
expondo-os a eventos indesejados como as DSTs, gravidez e sofrimento psíquico
(CARVALHO, RODRIGUES, e MEDRADO 2005). Este fato decorre da dificuldade que os
grupos sociais apresentam para lidar com a sexualidade, com o corpo e as diferenças de
gênero. Em decorrência, os repertórios que os adolescentes usam para falar sobre estes temas
estão eivados de crenças, estereótipos e tabus. Desta forma, o adolescente, um sujeito
passando por uma fase de transição de extrema complexidade, sofrendo mudanças corporais
que lhe produzem impulsos que ele não sabe administrar, não recebe os esclarecimentos e a
continência para lidar com estes fatos. Não é por acaso que recentes dados, mostram que
metade da incidência da infecção pelo vírus HIV se encontra em adolescentes (JEOLÁS et al.,
2005).
Ser vulnerável, no contexto da infecção pelo HIV ou outras DST, significa ter pouco
ou nenhum controle sobre o risco de se infectar; e para aqueles já infectados ou
afetados, ter pouco ou nenhum acesso à assistência e ao tratamento adequado. A
12
vulnerabilidade pode ser influenciada por diversos fatores pessoais, sociais e
programáticos (UNESCO 2003, p. 79)
Os adolescentes não recebem educação sobre a sexualidade nas famílias, que
terceirizam esta função para a escola. A escola por sua vez sente-se despreparada e temerosa
para abordar este tema. Eles também apresentam dificuldade de acessar os serviços de saúde
que poderiam fornecer informações referentes ao seu autocuidado (UNESCO, 2003). Essa
lacuna faz com que os jovens constituam um grupo relevante para intervenções com base
educativa, importantes do ponto de vista da saúde individual e coletiva.
A epidemia de HIV/AIDS trouxe à tona uma um problema de saúde coletiva e de
educação: como trabalhar um tema tão carregado de conotações de caráter antagônico (sexo
pode ser algo bom e, ao mesmo tempo ruim) e enraizado nos aspectos socioculturais “tabus”,
como a sexualidade? Segundo informações da (UNESCO, 2003), eleger como prioritária a
população de jovens e compreender como estes se relacionam e constroem conhecimentos
sobre a sexualidade visando prevenir a contaminação pelo vírus HIV é uma das estratégias
brasileiras a ser elencada para enfrentamento desta epidemia.
Acreditamos que a adolescência é principalmente um momento em que o jovem
encontra-se em uma “situação de aprendizagem”, estando extremamente mobilizado a
construir novos conceitos a estruturar novas formas de ver o mundo e a si mesmo
(CAMARGO e BOTELHO, 2007). O adolescente confronta valores sociais, questiona
instituições sociais e desconstrói preconceitos e estigmas. Desta maneira, entende-se que os
jovens são considerados pelas agências mundiais de saúde como um público prioritário em
educação em saúde.
Entendemos atividades educativas de modo participativo, pautado nas pressuposições
de Paulo Freire (1996). Assim, podemos partir da curiosidade natural do adolescente e junto
13
com os jovens problematizar o mundo, construindo referências coletivas sobre o corpo, a
sexualidade e a vida afetiva.
Ao pensar o processo de construção de conhecimento na adolescência é necessário
saber como os jovens percebem e vivenciam sua realidade e sua sexualidade. É preciso
compreender a riqueza das diferenças individuais, a diversidade cultural e as maneiras como a
sexualidade é encarada, entendida e vivenciada pelos jovens.
Como trabalhador da saúde mental coletiva não posso deixar de acreditar que
educação em saúde seja um das ações de Saúde Coletiva que deve ser mais incentivada pelas
Políticas Públicas. Porém, para que as ações de educação em saúde sejam efetivas, para que
realmente atinjam seus objetivos, o sujeito da aprendizagem não pode ser considerado como
um objeto que vai receber conhecimento passivamente. A educação em saúde é um processo
coletivo, em que educadores e educandos se apropriam, constroem e produzem conhecimento
em relações horizontais.
Ao longo de minha vida profissional, trabalhando com adolescentes de baixa renda,
pude observar o quando as formas usuais de educação em saúde não atingem este público. E
principalmente, o quanto às concepções e formas de ver o mundo dos trabalhadores de saúde,
que pertencem a outro estrato social, representam muito pouco para estes jovens. Impor uma
forma de ver o mundo e de se relacionar com ele significa manter a incomunicabilidade entre
profissionais de saúde e usuários de serviços e continuar a realizar ações de educação em
saúde em moldes compartimentalizados, autoritários e pautados na transmissão de
conhecimentos.
Tenho percebido o quanto falta a nós, profissionais de saúde, ferramentas que
contribuam para a mobilização dos adolescentes e a mudança de práticas de saúde. O
educador de saúde é um agente de transformação social e não pode desconsiderar as múltiplas
formas de aprender, os valores e a importância dos saberes que estes adolescentes já possuem.
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O educador em saúde não deve se frustrar com as desistências, com as palavras duras, com a
apatia, entendendo que estes sentimentos precisam ser manifestos. Precisa saber que, muitas
vezes, precisará mudar de caminhos e deixar-se guiar pelo grupo, estar disponível para
orientar quando necessário e não orientar algumas vezes. Antes de ensinar, aprender e
compreender como o grupo aprende.
Esta pesquisa utilizará a ferramenta contar histórias em oficinas sobre sexualidade,
gênero e vulnerabilidades, acreditando que o contar histórias possibilita construir identidades
e agenciar subjetividades (BENJAMIM, 1980; GARAY e IÑIGUEZ, 2005; IÑIGUEZ, 2004;
MENEGHEL e IÑIGUEZ, 2006; SAWAIA, 2000). Além disso, acreditamos que contar
histórias pode se constituir em um dispositivo de resistência para enfrentar as
vulnerabilidades, incluindo as relacionadas com a sexualidade humana.
1.2 Objetivos
1.2.1 Objetivo Geral:
Organizar oficinas de contadores de histórias para trabalhar sexualidade com
adolescentes.
1.2.2 Objetivos Específicos:
Identificar os sentidos que os adolescentes dão para a sexualidade;
Estimular o uso das histórias como ferramenta de empoderamento de adolescentes.
15
1.3 Fundamentação teórica
1.3.1 A Sexualidade:
A sexualidade compreende as dimensões biológica, psicológica e social, é construída
histórica e culturalmente e plurideterminada (CARVALHO, RODRIGUES, e MEDRADO,
2005). Na sociedade ocidental, a sexualidade fez parte da disciplinarização dos corpos,
realizada por meio do projeto médico higienista. Michel Foucault foi um dos autores que se
preocupou em entender os mecanismos e relações que constituíram a sexualidade na
sociedade. Em seus estudos, utilizou dois métodos de investigação e pesquisa - o método
arqueológico e o genealógico. O primeiro deles procurou compreender as regras discursivas
da constituição do saber, ou seja, analisa a posição e os enunciados do sujeito do
conhecimento. Ao usar este método, procurou saber quem somos nós hoje, porque
enunciamos um determinado discurso e realizamos/idealizamos determinadas práticas em
relação à sexualidade.
Foucault evidenciou estruturas conceituais que determinam as articulações entre o
poder e o saber visando exercer controle (MENDONÇA, 2005). Desta maneira, somos
controlados e normalizados por múltiplos processos de poder, que constituem verdadeiros
esquemas de dominação. Nesta concepção a sexualidade é um dos “dispositivos históricos
onde uma variedade significativa de discursos e relações sociais está entrelaçada
(MEDEIROS, 2000). Para Foucault, os dispositivos são de natureza estratégica, sendo desta
maneira uma manipulação das relações de força com a finalidade de definir uma direção
concreta de pensamento e bloquear outras. O dispositivo se constitui de redes estabelecidas
entre: discursos, instituições, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas,
enunciados científicos, proposições filosóficas, morais e filantrópicas e ainda entre o dito e o
não dito gerando um conjunto de resultados heterogêneos de uso social.
16
Para Foucault a partir dos séculos XVI e XVII aconteceu na sociedade ocidental uma
multiplicação de discursos sobre o sexo, com o objetivo de ocultar a sexualidade, ou melhor,
traçar os limites do que poderia e não poderia ser dito e para quem. Existiu um projeto de
iluminação (em tese a sexualidade foi trazida à luz, ou seja, começou a tornar-se objeto de
estudo das ciências) de todos os aspectos relacionados ao sexo. Foi definido o vocabulário
permitido para se referir ao sexo, assim como onde e quando se poderia falar dele. Foram
criadas regiões de silêncio ou de discrição entre pais e filhos, educadores e alunos, patrões e
serviçais. Instaura-se, assim, um mecanismo que, ao propagar os discursos sobre o sexo, tem
por objetivo construir verdades sobre ele.
Muitos foram os motivos para se regular o sexo. Entre eles se encontra o aumento da
população mundial resultando em problemas econômicos e políticos. Dessa maneira, foi
necessário exercer um controle sobre as taxas de natalidade, retardar a idade do casamento,
diminuir a precocidade e a freqüência das relações sexuais. Estabeleceu-se uma relação entre
economia e forma como as pessoas usavam o sexo e a sexualidade, e uma verdade sobre ele
foi gerada objetivando produzir uma sexualidade com utilidade econômica. A família
burguesa respeita os mecanismos de poder, contribuindo para as manobras de controle de
natalidade, para as incitações problemáticas, para a medicalização do sexo e a
psiquiatrização das formas genitais” (FOUCAULT, 1993).
As ciências médicas do sexo se associam com a biologia (evolucionista) da
reprodução. Essa associação do discurso sobre o sexo com o discurso científico deu a ele
maior legitimidade. O discurso médico, sob uma aura de neutralidade científica, produz
crescentemente verdades sobre o sexo. Porém estes discursos estavam ligados a uma moral do
controle da sexualidade e da conexão entre o “patológico” e o “pecaminoso”.
Foucault distingue quatro conjuntos estratégicos de dispositivos específicos de saber e
poder, reforçados pelo discurso científico sobre o sexo; esses discursos foram sendo
17
arranjados paulatinamente, mas foram adquirindo características de esquemas de dominação
no decorrer da história da sexualidade.
O primeiro destes dispositivos expressos por Foucault (1993) é a “Histerização do
Corpo da Mulher”. Reduz a sexualidade feminina a uma sexualidade frágil e patológica a
histerização- tornando o corpo feminino um objeto do saber e da atuação da medicina. Além
disto, a mulher adquire um novo papel social, o de transmissão das relações de poder
veiculando a disciplina e os preceitos médicos dentro dos lares e fortalecendo a verdade
criada. Ou seja, as mulheres passaram a educar os filhos e filhas segundo o discurso médico-
científico, tornando-se agentes de propagação das verdades médicas e da higienização dos
lares.
Outro dispositivo foi a “Pedagogização do Sexo das Crianças” (FOUCAULT, 1993).
Neste caso a sexualidade foi transformada em sexualização. O medo da masturbação,
associada a patologias, induz a uma extrema vigilância familiar e escolar, constituindo uma
nova rede de relações interfamiliares pautada na disciplinarização da vida escolar e doméstica.
Foucault ao se referir aos colégios do século XVIII diz que embora se tenha a impressão que
neles não se falasse em sexo ou que o sexo era reprimido, a organização dos espaços e os
temas tratados em sala de aula, estavam marcados pelo medo de uma “danosa sexualidade
infantil”. O receio era a liberação da sexualidade que teoricamente poderia ser prejudicial à
sociedade, significando a liberação de energias a serem canalizadas para o trabalho.
O terceiro deles foi a Socialização das Condutas Procriadoras” (FOUCAULT,
1993). Nesse caso, as manifestações da sexualidade ficaram reduzidas às relações sexuais
monogâmicas, objetivando a procriação. O discurso afirma que todo o sexo deve ter função
reprodutora, permitindo espaço apenas para uma sexualidade heterossexual, adulta, entre
pessoas com vínculos formalmente conjugais, desconsiderando totalmente qualquer outra
forma de sexualidade. O século XIX construiu um discurso científico sobre a sexualidade e
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silenciou quaisquer formas de expressão da sexualidade que não as aceitas pelas instâncias de
controle.
O último destes dispositivos expressados por (FOUCAULT, 1993) foi a
Psiquiatrização do Prazer Perverso”. As verdades sobre a sexualidade impunham que as
expressões de sexualidade não usuais fossem patologizadas e transformadas em desviantes, a
serem evitadas e os praticantes trancafiados em instituições totais. Dessa forma, começou a se
estruturar uma tipologização dos atos passíveis de diagnósticos catalogados como distúrbios,
cujo destino era o isolamento em manicômios. Essa sexualidade foi assumida como ilegítima
podendo ser exercida somente em lugares como casas de prostituição, onde além de lucro
poderiam dar vazão aos prazeres de uma crescente força de trabalho que precisava ser
controlada.
A preocupação sobre o sexo materializa quatro figuras ou objetos privilegiados do
saber: a mulher histérica, a criança masturbadora, o casal e adulto perverso (FOUCAULT,
1993). São figuras que apontam verdades sobre a sexualidade das pessoas, concebidas pelo
saber cientifico e resultantes dos quatro dispositivos descritos acima. Dispositivos que ainda
atuam na sociedade atual.
Os saberes sobre sexo foram formulados de modo conjunto entre o aparelho médico e
o jurídico e tiveram expressão na forma de pares de opostos, em uma articulação binária: “o
licito e o ilícito, o permitido e o proibido” (FOUCAULT, 1993), podendo-se acrescentar “o
perverso e o saudável” e assim por diante. A expressão do poder manifesta-se na “função do
legislador”, aquele que faz a lei, que decide o que é permitido, tornando o modo de ação do
sexo um processo com forma “jurídico-discursiva” (FOUCAULT, 1993). O poder constitui as
relações sexuais como uma ordem” que se articula na relação com a lei e gera a regra,
apresenta o sexo usando a linguagem através do discurso, certifica o correto e determina a
verdade.
19
A sexualidade então é construída através de um sistema de verdades polarizadas entre
as condutas socialmente aceitas e as excluídas, entre o discurso do dominante e do
dominado” (FOUCAULT, 1993), sendo formada por uma grande variedade de elementos
discursivos que atua nas diferentes estratégias de construção de verdades. Ou ainda, o mesmo
dispositivo do discurso que gera o lícito define o que é ilícito, define o que pode ser pensado e
falado sobre a sexualidade e o que não se deve mencionar por não ser correto. Foucault fala
de uma carga ocasionada pelas coisas ditas” e pelas coisas não ditas e ocultas”, os
enunciados que possuem efeitos diferentes, liberando e proibindo, e constituindo normas que
catalogam os fazeres em relação à sexualidade. Desta maneira, a ordem da sexualidade é
construída através do poder que impõem aquele que fala, o que tem o direto de saber e quem
será mantido na ignorância e no silêncio.
Um dos dispositivos que colaboram, e talvez ainda colabore, para estabelecer uma
norma sobre o assunto é a repressão da sexualidade. Essa elaboração teve início com o
advento do capitalismo, a instauração do biopoder, o controle dos corpos e a economia do
desejo. Na verdade, a sexualidade não foi reprimida ou pelos menos não de uma forma tão
destrutiva quanto descrita. A sexualidade foi normalizada e manipulada para que se tornasse
mais um dispositivo de controle, e este discurso contribui para isto. Foucault denomina este
discurso sobre a repressão da sexualidade de Hipótese Repressiva”, que é a gênese de
posturas frente à sexualidade no século XVII.
No século XIX esse projeto até então da alçada da medicina, passa a fazer parte do
projeto científico, comprometido com o evolucionismo e com os racismos oficiais tornando-
se o que Foucault chamou de Scientia Sexualis. Um poder expresso pelas instituições
normalizadoras (Igreja, Estado, Escola, Família) na forma de paradigma de uma verdade e
centrado no modelo jurídico. Objetivava o controle, tinha como raiz o rito da confissão,
transportada da igreja para uma pedagogia médica que influenciou as relações familiares.
20
Segundo (FOUCAULT, 1993), a sociedade se inclinou a solicitar e a ouvir a própria
confidência dos prazeres individuais. Desta forma, um novo prazer surgiu baseado no prazer
de contar e ouvir e na crença que a sexualidade inevitavelmente resultaria em algo ruim. O
sexo seria causador de patologias, mas a cura poderia ser alcançada quando tudo fosse dito a
tempo e a quem é devido.
Opõem-se a este conceito o de “ars erótica” definido por Foucault como a curiosidade
natural, uma vontade de saber sobre as formas de ampliar o prazer (FOUCAULT, 1993).
Refere-se a uma sexualidade não danosa, mas integrante e necessária à constituição humana.
Um produto do encadeamento da estimulação dos corpos, da intensificação dos prazeres, da
incitação ao discurso, da formação dos conhecimentos, do reforço dos controles e das
resistências.
Em resumo, falar de sexualidade para Foucault é seguir três eixos que a constituem: a
formação dos saberes que a ela se referem; os sistemas de poder que regulam sua prática e as
formas pelas quais os indivíduos podem e devem se reconhecer como sujeitos dessa
sexualidade.
1.3.2 Corpo/Corporeidade:
Para operar com o conceito de sexualidade precisamos abordar sua base material, o
corpo. O corpo recebe influência das elaborações construídas no tempo e na cultura, portanto
tem uma historicidade (MACHADO, 1979). Assim, é preciso compreender a influência dos
discursos sobre os corpos dos indivíduos, pois eles acabam se tornando mecanismos de
controle, de dominação/submissão; corpos dóceis úteis para a normalização de condutas.
21
O corpo torna-se o elemento onde várias correlações de força atuam e se dispõem,
atravessando-o e exercendo sobre ele uma série de conformações, parte de relações de
dominação que perpassam a sociedade. Isso transfere a problemática da relação para a
problemática da carne, ou seja, do corpo, da sensação, da natureza, do prazer, dos
movimentos mais secretos, através de normas de exame de si mesmo (SILVEIRA e
FURLAN, 2003).
A corporeidade passa então a ser o elemento de visibilidade de tais confrontos no seu
efeito acumulativo histórico ou nas suas conformações presentes, onde a doença do momento
presente imediatamente materializa estes conflitos; ou sua antevisão prospectiva - em termos
de antecipação de novas movimentações futuras, propiciadoras de novas colocações
estratégicas dos corpos e das almas, efetuada pelo efeito de conjunto de tais embates, em toda
a rede social, seja no sentido de afirmação da submissão a certo tipo de dominação, seja no
sentido de resistência a tais forças (FOUCAULT, 1995).
Do ponto de vista estratégico das forças de saber e de poder, corpo e alma são
diferenciados para Foucault, embora a alma se mostre um mecanismo de acesso ao corpo
(SILVEIRA e FURLAN, 2003).
O corpo é formado/reformado pela história e articulado pelos muitos contextos
discursivos - os elementos integrantes de múltiplas fontes de subjetivação - é preciso associá-
los ao processo de constituição da identidade histórica do indivíduo (FOUCAULT, 1995). No
corpo está presente a marca dos acontecimentos do passado, da mesma maneira que dele
criam-se os desejos, os desfalecimentos e os erros; sendo este o local onde eles se atam e de
repente se exprimem, mas nele também eles se desprendem e lutam, se desgastam uns aos
outros e continuam seu insuperável conflito (MACHADO, 1979).
Foucault compreendeu o corpo normalizado pelos poderes e pelos saberes, constituído
e constituinte do processo de subjetivação do homem moderno (SILVEIRA e FURLAN,
22
2003). Nessa medida, o poder disciplina o sujeito até mesmo através de seu corpo, sendo que
este fica marcado em razão dos processos históricos, mas por outro lado, ele também é agente
dos processos de subjetivação.
A corporeidade dos sujeitos tornou-se o principal ponto onde um sistema complexo de
lutas e de confrontos atua no processo de produção de poder (SILVEIRA e FURLAN, 2003).
A corporeidade amplia o olhar para outros elementos além do corpo e da sexualidade
incluindo dispositivos de controle, de poder e de violência.
Foucault (1993) questionou o quanto à sexualidade e o corpo são contidos, velados e
interditados, concepções que se mantém atuais. Para trabalhar com o tema do corpo e da
sexualidade precisamos entender como esse tema e as interdições que o penetram foram
socialmente construídas atendendo objetivos socioeconômicos.
Temos que considerar que a construção da sexualidade integrou e ainda constitui um
dispositivo de poder. Um dos discursos que mantém a generificação dos seres humanos em
sociedade é a concepção essencialista de sexualidade, que atribui a homens e mulheres um rol
do que são as características esperadas do que é ser homem e ser mulher. Segundo (JEOLÁS
et al., 2005) entre as dificuldades encontradas no trabalho com sexualidade com adolescentes,
a questão de gênero ou a relação hierárquica existente nas relações sociais entre homens e
mulheres tem grande importância. Neles está presente o discurso da passividade da mulher
nos assuntos relacionados a sexo. Trabalhar com gênero pressupõe a desnaturalização das
relações entre homens e mulheres e o entendimento de que a identidade sexual é construída
histórica e socialmente. Gênero é um modo primordial de significar relações de poder,
representa uma recusa ao essencialismo biológico e à hierarquia sexista. Além disso, coloca
em pauta o aspecto relacional entre homens e mulheres e rompe com a postura de vitimização
considerando que as violências praticadas contra a mulher estão baseadas nas desigualdades
sociais (MENEGHEL e IÑIGUEZ, 2007).
A violência simbólica naturaliza as relações
23
desiguais de poder e é exercida pelos que se apossam do direito de intimidar e controlar
(BOURDIEU, 2002). Dentro da família as desigualdades produzidas por gênero e idade são
as principais determinantes das relações violentas que aí se constituem, mostrando a face
adultocêntrica e misógina do poder (SCOTT, 1990; SAFFIOTTI, 1999).
1.3.3 Sexualidade na adolescência:
Mudanças sociais significativas influenciaram a concepção de adolescência nos
últimos tempos, geradas por fatores como alteração no modelo de família e avanços nas
concepções de gênero obtidos pelo movimento das mulheres, incluindo direitos reprodutivos.
Além disso, a precarização do trabalho provocou uma elevação na exigência de capacitação
profissional e aumentou o período de dependência dos filhos em relação aos pais, embora este
alargamento do período de adolescência não seja empecilho para o exercício da sexualidade e
da autonomia do adolescente. Hoje cada vez mais a autonomia constitui o percurso
biográfico do adolescente” e essas características sociais da adolescência configuram as atuais
relações intergeracionais familiares (BRANDÃO e HEILBORN, 2006).
A sexualidade neste contexto é um dos aspectos que auxilia o alcance da autonomia
pelo jovem. E funciona como mediadora de todo o relacionamento em sociedade, já que ela
une formas de exercitar a autonomia pessoal e os contatos afetivo-sexuais sem vinculações ao
casamento, ou seja, mais direcionado ao crescimento pessoal.
O aprendizado da sexualidade auxilia na constituição de um domínio próprio do
adolescente que lhe permite consolidar uma identidade de gênero. E esta aquisição de
conhecimento relacional, orientado pela lógica de gênero, requer habilidade de negociação com
24
o parceiro. Ou seja, uma das mais importantes formas individualização é conseguida com o
estabelecimento de vínculos afetivo-sexuais.
Na atualidade, é possível perceber mudanças no comportamento sexual dos
adolescentes, cuja iniciação sexual está se fazendo em etapas mais precoces. Mesmo assim, a
sexualidade ainda está repleta de discursos normatizadores. No que tange à adolescência,
geralmente a sexualidade é abordada somente sob o aspecto biológico e reprodutivo sendo
totalmente medicalizada (AMARAL e FONSECA, 2006). A sexualidade é um produto das
relações humanas e segundo autores como (JEOLÁS et al., 2005), a abordagem construtivista
em que a sexualidade é contextualizada culturalmente pode trazer aportes à discussão com
jovens.
Na adolescência, a sexualidade tem algo de inovador, experimental, transgressor, que
implica no rompimento de imposições hierárquicas, religiosas, de preconceitos de gênero,
entre outras. Talvez seja por isso que automaticamente incita nas instituições (escola, igreja,
família) e em alguns de seus representantes, os adultos, uma ação de controle e normalização.
Outra questão importante diz respeito aos padrões culturais de masculinidade e
feminilidade. Os processos por meio dos quais a criança pensa em si mesma como
pertencente ao gênero masculino ou feminino são culturais, e muitas vezes certos padrões são
naturalizados. As diferenças orgânicas que indicam o gênero são modeladas pela cultura
englobando-se aí um conjunto de símbolos, valores e práticas que definem o que é ser homem
ou mulher em uma dada sociedade. Bourdieu (2000) ressalta a extraordinária autonomia das
estruturas sexuais em relação às estruturas econômicas, o mesmo esquema classificatório que
ultrapassa os séculos e as diferenças econômicas e sociais que faz com que os
comportamentos sejam iguais nos dois extremos: entre camponeses iletrados e a alta
burguesia européia. Como explicar a permanência da visão androcêntrica do mundo ao longo
do tempo e em situações tão diversas pergunta-se o sociólogo, levando quase a pensar em
25
uma essência natural, se não se soubesse que o eterno em história é sempre o produto de um
trabalho de (re)criação continuada das estruturas objetivas e subjetivas da dominação
masculina.
Brandão e Heilborn (2006) verificaram que a iniciação sexual dos jovens não ocorre
somente na primeira relação sexual, ela percorre um caminho que inclui “carícias íntimas,
desvelamento gradativo do próprio corpo e do corpo do parceiro, descoberta de sensações e
sentimentos novos”. Ou seja, o aprendizado da sexualidade, pelo menos nos entrevistados, se
faz de forma gradual orientado pelo prazer, pela “dimensão lúdica e erótica da sexualidade e
pela interiorização dos constrangimentos parentais e sociais” principalmente relacionados ao
gênero. Na mesma pesquisa Brandão e Heilborn (2006) constataram que os pais da maioria dos
entrevistados sabiam da atividade sexual dos filhos. Uma minoria não revelará aos pais para
evitar o controle parental. Outra constatação foi que maioria dos entrevistados teve a primeira
relação sexual com parceiro fixo. Todos os entrevistados relataram conhecer os métodos
contraceptivos, porém assim mesmo a concepção aconteceu. Acredita-se que o controle da
contracepção na adolescência é gradativo, similar a iniciação sexual. Os pesquisadores
concluíram que conhecer os métodos contraceptivos não significa ter domínio sobre eles. Ou
seja, o conhecimento das regras sociais orientam os relacionamentos sociais incluindo os
afetivo-sexuais, apontam para uma necessidade de trabalhar a sexualidade de forma mais
ampla, de forma a ajudar o jovem a construir sua autonomia (BRANDÃO e HEILBORN,
2006).
A modernidade e as mudanças que aconteceram em relação ao trabalho, família e
gênero resultaram em mudanças nas regras de relacionamento afetivo-sexual dos
adolescentes. Os jovens hoje possuem vida sexual, com o conhecimento e aprovação da
família (BRANDÃO e HEILBORN, 2006).
26
Calazans (2006) percebeu entre jovens um discurso de que a sexualidade só poderia
ser exercida pelos adultos e concluiu que as adolescentes do sexo feminino utilizam-se da
gravidez como uma forma de se incluírem na vida adulta.
Outros pesquisadores constataram dificuldade tanto dos pais como dos adolescentes de
falar sobre a sexualidade. Além disto, para os adolescentes mais jovens não falar sobre
sexualidade com seus pais é até confortável. As explicações para este fato provem do medo de
que os pais possam reprimi-los ou ainda que as informações sobre suas práticas sexuais
fiquem expostas. Muitos adolescentes acreditam que seus pais não estão preparados para falar
sobre estes assuntos (AMARAL e FONSECA, 2006).
A família e a escola são instituições socializadoras e veiculadoras de ideologias. Em
ambas as instituições, ocorre à transmissão de discursos sobre as diferenças sexuais que vão
sendo estabelecidos, reforçados e reproduzidos de modo estereotipado. Os padrões
estabelecidos pela cultura como atributos próprios de homens e mulheres constituem de certa
forma um mecanismo que reforça a repressão sexual. É preciso reconhecer que a repressão
encontra-se associada a regras social e culturalmente impostas em um determinado momento
histórico e significam uma normalização que atende às expectativas da sociedade (MAIA,
MAIA, e FACHINI, 2004).
1.3.4 Vulnerabilidade:
Ao trabalhar com sexualidade e DST/AIDS não podemos deixar de lado a categoria
vulnerabilidade, que foi incorporada ao campo da saúde a partir da experiência com a
epidemia de AIDS, ou seja, a noção de vulnerabilidade em saúde teve como marco inicial o
debate centrado em torno da AIDS. Podemos dizer que no trajeto da epidemia apareceram
vários conceitos ferramenta. O primeiro deles foi à noção de risco, amplamente utilizada pela
27
epidemiologia, seguida da categoria grupos de risco. A utilização do conceito de grupo e
comportamento de risco acarretou preconceitos, discriminações e exclusão. A mudança do
perfil epidemiológico da AIDS na população, com a inclusão crescente do sexo feminino e a
pauperização da doença, exigiu um debate com novo dimensionamento e remeteu a um novo
conceito: o de vulnerabilidade. O termo provém da área dos Direitos Humanos e começou a
ser difundido mais fortemente no campo da saúde a partir da compreensão de que os
conceitos epidemiológicos de grupo de risco e comportamento de risco não conseguiram
alcançar respostas para a evolução da epidemia (AYRES, CALAZANS e SALETTI FILHO,
1999; FEIJÓ e ASSIS, 2004; KOWARICK, 2003).
Termo polissêmico e ainda sujeito a controvérsias, a vulnerabilidade possibilitou uma
ampliação de horizontes, extrapolando as tradicionais abordagens comportamentalistas das
estratégias individuais de redução de risco. No texto inicial de Mann e colaboradores, sobre a
AIDS no mundo, foram definidos três planos interdependentes para identificar a
vulnerabilidade individual e coletiva ao adoecimento: as vulnerabilidades individual, social e
programática. A vulnerabilidade foi considerada o contrário de empoderamento, conceito
advindo de empowerment, que significa outorga de poder, aquisição de poder ou conquista de
poder, resultante do jogo e forças que se estabelecem entre recursos culturais, políticos,
econômicos e jurídicos.
Em relação à vulnerabilidade social, os índices adotados pelo Programa de
Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) fornecem uma série de indicadores que
permitem classificar os países segundo grau de fragilidade social. O caminho seguido pelos
estudiosos da AIDS é a ênfase nos direitos humanos como fonte de critérios para avaliar as
diversas situações. Este aporte tem a vantagem de vincular o problema da AIDS, ou qualquer
outro que viermos a tratar no campo da saúde, as suas raízes sociais mais profundas, estimular
28
as pessoas para a transformação da realidade, favorecer a transdisciplinaridade e a
intersetorialidade.
Embora o conceito de vulnerabilidade ainda seja pouco usado, ele aponta para
múltiplas direções teóricas e práticas. Dentre suas vantagens, Ayres (1999) identifica:
a operacionalização do conceito de vulnerabilidade implica em privilegiar como
unidade analítica o nível coletivo, por meio da preocupação com um social
perspectivado nos direitos universais;
vulnerabilidade é uma categoria ético-filosófica um valor de fundo que orienta a
produção e interpretação de dados empíricos, fugindo do enfoque pragmático de
risco;
os horizontes práticos destes estudos possuem natureza político-cultural, na forma
de crítica das práticas, ao invés da defesa de prerrogativas que norteia outros tipos
de investigação.
Uma das maiores riquezas do uso do conceito de vulnerabilidade significa a mudança
do enfoque do individual para o coletivo. Além disso, vulnerabilidade está articulada às
noções de empoderamento, justiça social, e equidade. Além destes, dois novos conceitos
oriundos do campo dos Direitos Humanos foram introduzidos: o de connectedness (agir
localmente, pensar globalmente) e entitlement (que significa a preservação dos direitos
individuais por meio da autonomia e competência pessoal).
Em síntese, a discussão sobre vulnerabilidade retira o foco da doença e o redireciona
ao adoecimento; propõe avaliações mais sensíveis ao modo de viver das pessoas do que em
padrões técnicos; inventa estratégias e ações mais abertas à dinamicidade e complexidade das
experiências locais e busca novos parceiros, mesmo sem prescindir do aparato institucional.
29
1.4 Metodologia:
A Pesquisa Qualitativa é um tipo de investigação que percebe a realidade como algo
dinâmico; valoriza as interações sociais, os sentimentos e as emoções dos sujeitos da
pesquisa. Esta metodologia procura compreender os indivíduos como seres significados pela
cultura e interagindo socialmente. Entende o social como um sistema interligado com outros
inúmeros sistemas que se influenciam mutuamente, construindo a cada momento um novo
social ou uma nova forma de conviver com ele.
Na perspectiva qualitativa não é possível transformar observações, conceitos e
interações em valores e nem classificá-los em categorias. É preciso compreender a realidade
levando em consideração as relações e interações.
Os estudos qualitativos (TAYLOR e BOGDAN, 1996), são tipos criteriosos de
investigação de extrema importância. Eles surgiram procurando atender a necessidade de
aprofundar a compreensão de determinados fenômenos, que os outros métodos não são
capazes de fornecer.
Este projeto procura, através de oficinas de contadores de histórias, desafiar os
adolescentes para que estes venham a discutir questões referentes à sexualidade e com isto
possam achar/chegar as suas próprias conclusões sobre o assunto. Acredita-se que a técnica de
oficinas de histórias, já experimentada em outros grupos, permitirá a construção coletiva de
conhecimentos sobre sexualidade e saúde.
Entendemos oficinas como um espaço de construção que pode reunir aspectos
pedagógicos e terapêuticos (CARVALHO, RODRIGUES e MEDRADO, 2005). Além disto,
visa à construção de conhecimentos, é um lugar privilegiado onde pode se realizar análises
psicossociais, onde pode ocorrer a elaboração coletiva de conhecimentos utilizando e
reunindo vivências e afetos. As oficinas podem ser organizadas a partir das demandas vindas
30
do grupo; essas necessidades são percebidas de várias formas, através de resistências e de
fatos, a incidência de AIDS em adolescentes pode ser pensada como uma destas
demonstrações.
O procedimento inicial das oficinas consiste em lançar um desafio ao grupo através de
uma narração ou conto que trate direta ou indiretamente do tema sexualidade. E deixar que o
grupo direcione a discussão e construa seu próprio conhecimento sobre o assunto. O
pesquisador será ativo na conversa quando sua participação for solicitada. Se o grupo julgar
apropriado, poder-se-á construir uma história ou narração estruturando as conclusões e
apropriações do grupo. Para envolver os adolescentes na atividade de confecção de uma
história, esta poderá ser em quadrinhos ou utilizar personagens de seu universo.
Entendemos as narrativas como uma forma de expressar os sentidos atribuídos pelos
adolescentes a suas experiências do dia-a-dia e também de entender os esquemas
interpretativos sobre sexualidade. Além disso, o ato de narrar promove o repensar de
vivências e sentimentos, ordena o passado, o presente e o futuro, e confronta conceitos
veiculados como naturais ou essenciais. Acredita-se que através das histórias os adolescentes
poderão elaborar seus conceitos, compreendem melhor “os porquês” não questionados, pois
eles são necessários na organização da narrativa. Construir narrativas, então, já se constitui
em um ato de aprendizado e um questionamento de conceitos (LIRA, CATRIB e NATIONS,
2003).
Nas narrativas os significados não estão nem no texto, nem no autor, mas na relação
que se estabelece entre eles. Diversas formas de comunicação constituem a narrativa e é
necessário compreender as relações dialógicas entre a verbalização, os gestos, às expressões e
principalmente entre o dito e o não dito. As histórias precisarão ser analisadas em seu
contexto percebidas de modo integral, sem segmentações entre perguntas e respostas
(CAPRARA, CASTRO e VERAS, 2005).
31
Nas narrativas o enredo tem um papel crucial é nele que os fatos devem ser
organizados, objetivando a conclusão da história, o espaço de tempo que marca o início o
meio e o fim da história tem extrema importância e não pode ser desconsiderado (LIRA,
CATRIB e NATIONS, 2003).
As oficinas de narrativas serão integradas por aproximadamente quinze adolescentes
participantes de um programa de promoção social “Agente Jovem” executado pela Prefeitura
Municipal de Porto Alegre, Rio Grande do Sul/Brasil. Este programa é financiado em sua
maior parte pelo Governo Federal Brasileiro e tem a finalidade de trabalhar conceitos
relativos à cidadania, saúde e inclusão digital para que os adolescentes participantes possam
vir a ser agentes de mudança em sua comunidade. Os participantes têm idades entre 12 e 18 e
o principal critério de inclusão no programa é o fato de provir de uma família com poucas
condições financeiras e não se encontrar em conflito com a lei.
Para analisar os dados posteriormente, os encontros serão gravados e transcritos
respeitando todos os detalhes, as oficinas serão descritas minuciosamente assim como as
observações lá feitas (LIRA, CATRIB e NATIONS, 2003).
A análise das oficinas buscará entender as práticas discursivas, ou seja, as maneiras
pelas quais os adolescentes, por meio da linguagem produzem sentidos e posicionam-se em
relações sociais cotidianas. As práticas discursivas constituem momentos ativos do uso da
linguagem, capazes de produzir ressignificações, rupturas e produção de sentidos. É
linguagem em ação e compreende enunciados, gêneros da fala e conteúdos. Os enunciados e
as vozes descrevem o processo de interanimação dialógica de uma comunicação (IÑIGUEZ,
2004; SPINK, 2004a, b).
Usando as práticas discursivas, procurar-se-á identificar os repertórios usados pelos
participantes, principalmente em relação à sexualidade e gênero. Queremos saber como os
repertórios o dos dominantes e os dos dominados - se imbricam, se cruzam, permeiam e
32
refazem, assim como, como as estratégias de resistência se constituem a partir da doença, da
vulnerabilidade e da exclusão.
As oficinas serão analisadas considerando os depoimentos dos participantes e a
produção de materiais gráficos e artísticos. Ainda, será avaliado o dispositivo contar histórias
como ferramenta para a educação em saúde (FREIRE, 1988; VASCONCELOS, 2001). Além
disso, esperamos que os adolescentes passem a atuar como multiplicadores de ações de
promoção à saúde e à vida.
1.4.1 Aspectos Éticos:
Esta pesquisa foi apresentada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
UNISINOS (Termo de Aprovação 020/2005). Os participantes e seus responsáveis assinarão
um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e um Termo de Cessão do Uso de Imagens
(Anexo 01).
33
1.5 Referências Bibliográficas:
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36
1.6 Anexos:
1.6.1 Anexo 01: Termo Livre e Esclarecido e Autorização para o Uso de Imagem:
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2 RELATÓRIO DE TRABALHO DE CAMPO:
2.1 Minha Experiência com Oficinas:
Minha experiência profissional sempre foi voltada para pesquisas com populações em
condição de vulnerabilidade social. Ainda na academia tive a oportunidade de participar de
pesquisas financiadas que tinham como problematização de estudo crianças e adolescentes em
situação de rua e de risco social. Nestas pesquisas, além da experiência de trabalho com
pessoas em situação de vulnerabilidade, tive uma vivência bastante rica em pesquisa
qualitativa, incluindo coleta de informações, coordenação de grupos e elaboração de relatórios
técnicos.
Sempre considerei grupos uma ferramenta muito útil a ser utilizada pelas ciências da
saúde, porém pouco explorada. Desta forma, procurei me aprofundar no conhecimento e
utilização dos grupos. Em minha graduação ao desenvolver a vertente de estágio que
contemplava a Psicologia Social tive a oportunidade de desenvolver meu trabalho em uma
ONG-AIDS na cidade de Santo Ângelo/RS. Nesta instituição, que estava estruturando novas
formas de auxiliar na promoção de saúde e na prevenção da contaminação pelo vírus HIV,
desenvolvi vários grupos com familiares e usuários. E, em seguida direcionei meu trabalho
para intervenções de prevenção tentando suprir uma necessidade da própria comunidade que
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solicitara da ONG auxilio para desenvolver uma intervenção com objetivo de informar alunos
das escolas públicas sobre AIDS e DST. Seguindo as orientações dos programas nacionais de
prevenção a DST-AIDS e utilizando diversos materiais desenvolvidos por ONGs de todo pais,
comecei a realizar oficinas que tinham a função específica de trabalhar diversos aspectos
sobre a contaminação e prevenção das DST´s.
Continuei com este trabalho por mais dois anos. Esta vivência me proporcionou um
grande enriquecimento pessoal e profissional, pois, participei de capacitações onde diversas
formas de abordagens do tema sexualidade foram criadas e estudadas; e principalmente
adquiri experiência e facilidade para coordenar grupos e oficinas de adolescentes.
Em outro momento, fui convidado para planejar e executar as oficinas que deveriam
integrar as intervenções que seriam realizadas no Programa Agente Jovem que era
desenvolvido na cidade de Erechim no Rio Grande do Sul. Trabalhei duas vezes nesta cidade
com os adolescentes deste programa. Fiquei fascinado com as práticas de grupo que tive com
estes jovens apesar das dificuldades enfrentadas, e com a coragem que eles mostram para
enfrentar as adversidades do mundo.
Posteriormente, desenvolvi trabalhos em ONG’s de promoção social para deficientes
auditivos; população de baixa renda; e crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade.
Estas últimas experiências serviram entre outras coisas para constatar a falta de estudos e
pesquisas que objetivem o empoderamento destas pessoas, para que elas consigam romper
com as situações que as levam ao adoecimento.
Passei então a compreender que o campo da Psicologia Social é o que melhor me
instrumentará para desenvolver estudos com este objetivo. A crença de que a investigação
social crítica e participativa é uma das formas de diminuir as desigualdades e iniqüidades
sociais está cada vez mais forte em mim.
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2.2 O Programa Agente Jovem:
A pesquisa foi realizada no “Programa Agente Jovem de Desenvolvimento Social e
Humano” da cidade e Porto Alegre. Este é um programa federal orientado pelo Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate a Fome. É uma ação de assistência social desenvolvida
para a população jovem, objetivando o desenvolvimento pessoal, social e comunitário.
Utiliza-se de capacitação teórica e prática por meio de atividades educativas que visam a
permanência do jovem no sistema de ensino, preparando-o para futuras inserções no mercado
de trabalho. O Ministério do Desenvolvimento Social concede, também, diretamente ao
jovem, uma bolsa mensal durante os 12 meses em que ele estiver inserido no programa e
atuando em sua comunidade (Informações do Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate a Fome).
Em Porto Alegre, o Programa Agente Jovem é desenvolvido pela Fundação de
Assistência Social e Cidadania (FASC) (organização pública criada e fundamentada na Lei
Orgânica de Assistência Social (LOAS) e na a Lei Complementar Municipal 352) que
descentraliza seus trabalhos através de módulos espalhados por vários bairros da cidade. Por
uma questão de facilidade de acesso, a coleta de dados aconteceu com os adolescentes
usuários do Módulo Centro (Informações da Prefeitura Municipal de Porto Alegre).
2.3 Questões Éticas:
Os participantes e seus responsáveis assinaram um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido e um Termo de Cessão do Uso de Imagens (Anexo 01). Para preservar as
identidades dos adolescentes participantes da pesquisa seus nomes serão substituídos por
nomes de heróis de desenhos infantis. Às meninas foram dados nomes de personagens
41
femininos: Dhiana, Shaiéra, Welma, Lisa, Mary e Margery; e aos meninos foram dados
nomes de personagens masculinos: Clark, Bruce, John, Peter, Barth, Timoty, Bob, Benjamim,
Fred, Roni, Homer, Dimi e Antony.
2.4 Negociando a Entrada e Entrando em Campo:
Inicialmente realizei um contato telefônico com a Fundação de Assistência Social e
Cidadania (FASC), do Município de Porto Alegre, para verificar a possibilidade de realizar a
pesquisa intervenção com os adolescentes do Programa Agente Jovem. A ligação foi
transferida por diversas vezes e precisei explicar meus objetivos repetidamente, até que fui
instruído que deveria escrever um ofício dirigido para a coordenação da rede básica onde
explicasse os objetivos e interesses da pesquisa e como pretendia realizar a intervenção com
os adolescentes do programa. Compareci pessoalmente na esperança de poder esclarecer
prontamente alguma dúvida que a equipe pudesse vir a ter. Ao chegar lá expliquei o que
pretendia, relembrei-os do meu pedido e entreguei o ofício. Uma das coordenadoras
comunicou que este passaria pela comissão de ética da prefeitura e que eles iriam me
comunicar a resposta.
Passaram-se dois dias e como não recebi a ligação retomei os contatos com a FASC,
na tentativa de obter uma resposta. O tempo era curto, e caso não fosse possível realizar a
coleta no Programa Agente Jovem, teria que encontrar outra alternativa. Finalmente
solicitaram que comparecesse a uma reunião com uma das coordenadoras. Comunicaram-me
sobre a aprovação do projeto e também foi enviada uma apresentação direcionada à
Coordenadora do Módulo Centro da FASC. Imediatamente me dirigi à sede do Modulo
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Centro da FASC, onde se encontravam os adolescentes participantes do Programa Agente
Jovem com os quais estava autorizado a trabalhar.
2.4.1 O Modulo Centro:
Ao chegar ao local fui informado que a coordenadora do modulo, não se encontrava
naquele momento, então esclareci a situação com a servidora que ali estava. Esta pessoa não
se demonstrou muito receptiva à proposta. Porém, me orientou a conversar com a
coordenadora substituta, pessoalmente, no dia seguinte. Nesta reunião apresentei à
coordenadora o ofício encaminhado a FASC com o respectivo aceite e apresentação.
Apos ler o ofício, sua primeira manifestação foi que outra pessoa deveria ter assinado
a apresentação. E, em seguida, perguntou quais eram os objetivos da pesquisa (informação
que constava no documento que ela tinha em mãos) e, antes que eu pudesse responder, falou
que os adolescentes do programa já haviam passado por muita coisa e que ela não concordava
que seus sofrimentos fossem explorados. Expliquei-lhe que não pretendia coletar informações
sobre a vida dos adolescentes, mas realizaria uma intervenção de educação em saúde que lhes
faria pensar ou repensar aspectos sobre sua sexualidade e, que acreditava que estas reflexões
me forneceriam dados que me possibilitariam realizar uma análise de suas percepções e
entendimentos sobre o assunto. Esclareci-lhe também que se ela considerasse que a coleta não
poderia ser realizada naquele local, era necessário que eu fosse informado naquele momento,
pois necessitava respeitar uma necessidade temporal e explorar outras alternativas. Ela
realizou mais alguns questionamentos, e acabou por concordar com o trabalho salientando a
importância de trabalhar sexualidade com os adolescentes do programa. Esclareceu também
43
que os participantes do Agente Jovem residiam em bairros próximos ao centro e que alguns
eram abrigados.
Ficou acordado que eu poderia iniciar a coleta no dia seguinte, desde que se
realizassem as devidas combinações com a professora que era responsável pelo grupo.
Salientou que o programa não poderia disponibilizar materiais para as oficinas. Expliquei que
não havia a necessidade de iniciar a intervenção imediatamente e, que seria possível aguardar
mais um ou dois dias para não mexer muito no cronograma utilizado e também traria todos os
materiais necessários para a realização das atividades que proporia. No dia seguinte, contatei
com a responsável pelas atividades naquele grupo, ela demonstrou-se muito mais receptiva e
me informou que o grupo se encontrava nas terças, quartas e quintas feiras e que teria prejuízo
em deixar as atividades que ela havia programado para serem realizadas após minhas
intervenções. Combinamos então que eu iniciaria no dia seguinte, uma quinta feira, às 09h e
30 minutos.
2.5 Oficinas de Sexualidade:
2.5.1 Primeiro Encontro – 19-07-2007
No primeiro encontro fui recepcionado pela coordenadora substituta que se mostrou
mais simpática e prestativa. Mostrou me um armário metálico onde poderia deixar minha
pasta e informou-me que a professora do programa com quem eu havia conversado no dia
anterior ainda não havia chegado. Fiquei aguardando no corredor, onde me ofereceram café e,
a coordenadora me comunicou que os adolescentes que começaram a se reunir na sala em
frente eram os integrantes do Programa Agente Jovem. Eles estavam fazendo seu lanche
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naquele momento, como em todas as manhãs posteriores fizeram. Havia dentro da sala sobre
a mesa duas bandejas com pães, jarras com leite achocolatado e algumas canecas de plástico
em sua grande maioria azuis.
A sala onde se realizavam os encontros do Agente Jovem localizava-se no centro do
andar (terceiro) onde se estruturava o Módulo Centro. Ela era cercada de outras salas tendo
apenas uma fina divisória entre elas. Havia duas portas na sala, bem próximas uma da outra,
cadeiras com pernas de ferro e acentos de plástico laranja, uma grande mesa retangular
colocada a baixo de uma lousa branca, com uma TV cinza em cima, no canto oposto da porta
principal havia uma pequena janela, a única da sala, e, embaixo dela, uma escrivaninha com
um computador que aparentava ser antigo. Na parede lateral, da cômoda, perto de uma das
portas um armário de madeira com diversos tipos de materiais -papéis, lápis, canetas e outros.
Na outra parede lateral existia outra escrivaninha e no canto atrás da porta principal havia um
arquivo de aço com quatro gavetas.
Em seguida, a professora chegou e se apresentou. Na sala de aula os jovens
conversavam alto e faziam brincadeiras, gritavam muito, no chão encontravam-se farelos de
pão. A professora reuniu as canecas e as jarras em cima da bandeja e as levou para outro
local, usou um pano para limpar a mesa e começou a varrer o chão. Após isto, gritando
organizou os adolescentes, pedindo que estes se sentassem nas cadeiras que foram
posicionadas de forma a circularem a sala.
Os adolescentes reparam em minha presença e começam a questionar a professora
sobre a possibilidade da realização de suas atividades corriqueiras (grande parte dos
questionamentos eram feitos pela adolescente que chamarei de Dhiana). A professora solicita
silêncio e me apresenta aos jovens, e pede que eu explique o trabalho que pretendo realizar
com eles. Então, inicialmente me apresentando, explico que gostaria da colaboração deles
para realizar um trabalho. Eles participariam de atividades que eu acreditava que seriam
45
agradáveis e que, depois poderíamos discutir vários assuntos que eles julgassem necessários.
Enquanto eu falava, uma das meninas (Dhiana) se manifesta dizendo: “- ai que saco, chega
professora, que chato, vamos logo jogar bola”. A intervenção da adolescente aconteceu no
momento em que eu estava explicando a atividade, a fala dela era alta e impositiva. Continuei
a falar com o grupo, ignorando-a, já que ela não interagia comigo. Disse ao grupo que havia
preparado uma atividade para aquele dia e que após ela ser realizada, poderíamos conversar
sobre o que eles queriam fazer e se haviam ou não apreciado.
O grupo de início não se mostrou receptivo, porém a professora gritando organizou
todos em círculo e os obrigou a ouvirem o que teu tinha para falar. Expliquei-lhes que eu leria
uma história e que, depois poderíamos conversar sobre ela.
A transcrição deste encontro está realizada partir deste momento:
Pesquisador: Eu vou contar uma história para vocês. E vocês vão
poder me contar outras histórias. É possível?
Dhiana: Histórias da branca de neve!?
Pesquisador: Pode ser! As histórias que vocês quiserem. Só que
vocês poderiam ser um pouquinho mais criativos, né?
Clark: Harry Potter, Chapeuzinho Vermelho.
Bruce: Tu já vai passar a história?
Pesquisador: Sim eu vou entregar ela escrita para vocês e depois eu
vou ler, pode ser? Eu fiz algumas cópias, mas não sei quantos tem
hoje! Quantos têm?
Clark: Tem muitos que não chegaram ainda.
Professora: Hoje não vieram todos. Quantos você são hoje?..
Ihhhhh!!! Hoje ta faltando mais que a metade.
Várias pessoas falando junto.
Pesquisador: Alguém quer ler a história ou vocês preferem que eu a
leia? Eu acho que é a forma mais rápida de todos a conhecerem.
Alguém quer ler?
Dhiana: Eu acho que é melhor o senhor ler.
Pesquisador: Ok! Então eu posso ler.
Várias pessoas falando junto.
Professora: GENTE! PARA ALGUÉM LER AS OUTRAS TEM
QUE OUVIR!!! ENTÃO NÓS VAMOS OUVIR O FÁBIO, OU NÓS
VAMOS FAZER UMA LEITURA SELETIVA, CADA UM VAI
LER UM POUCO.
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Shaiéra: Não professora!
Clark: Tem gente aqui que nem sabe ler!
Pesquisador: Tudo bem eu leio! Está história é uma lenda, vamos
ouvi-la e depois nós poderemos fazer nossas histórias.
Foi lida a história transcrita abaixo:
“O Príncipe Encantado Das Águas
Esta lenda conta à história de um ser com a sorte dos peixes e a
sedução de um homem. O Boto Rosa o Príncipe Encantado das águas.
Nas noites de luar os lagos da Amazônia se iluminam com uma forte
luz mística, e dele surge um belo homem, alto, forte e sedutor,
vestindo um termo branco, camisa rosa e um chapéu. O Boto ou
Uauiara se transforma deixando de ser animal e sai das águas para
conquistar as moças. Ele se dirige a festa mais próxima. E quando
chega lá, embora desconhecido de todos, logo escolhe a moça mais
bonita e começa a observá-la. A moça envolvida por uma mágica
sedução se aproxima e se interessa pelo rapaz. Os dois dançam a
noite intereira. Antes do dia amanhecer o Boto na Forma de Homem
conduz a moça para margem do rio. Ao clarear do dia a moça acorda
sozinha e despida e mais tarde acaba descobrindo que está grávida.
Este lendário e conhecido ser anda sempre de chapéu para esconder
um buraco que há em sua cabeça, por onde o Boto respira. E dizem
que de sua cabeça exala um forte cheiro de peixe.
Conta-se ainda algumas histórias de maridos que armavam ciladas
para pegar um homem que tentava conquistar suas mulheres. A cilada
acontecia à noite, aonde o marido vai e luta com o seu rival, que
mesmo ferido consegue fugir e atira-se na água. No dia seguinte um
cadáver aparece na beira do rio ferido pela arma do marido, mas
para a surpresa de todos não é um homem, mas sim um Boto.
O Boto é considerado o protetor das mulheres, e quando ocorre um
naufrágio o Boto se manifesta e procura salvar a vida das mulheres,
procurando empurrá-las para as margens do rio.”
No início da história há muito barulho, mas em seguida todos ficam em silêncio e
prestam atenção na história.
Ao terminar a história:
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Pesquisador: Do que fala a história?
Welma: (Fala algo inaudível)
Pesquisador: Âh? (Como?)
Shaiéra: Nada.
Todos ficam em silêncio por alguns instantes!
Professora: Vocês já conheciam esta lenda aqui do Boto Rosa. É uma
lenda da Amazônia. Lendas são folclores de cada região. Uma lenda
como aquelas que temos aqui: Lenda do Negrinho do Pastoreio; da
Erva Mate. As lendas falam muito daquele povo. É o que o povo tem
para contar. Eles vêem contar nas lendas coisas que eles não sabem
explicar. E esta lenda aqui! Não sei se eu to certa Fábio? Me corrija se
eu estiver errada. Esta lenda fala dos povos que moram no rio
Amazonas ou por ali. E é uma lenda que também tem uma conotação
indígena. De um rapaz que seduzia as moças daquela região, mas só
que aquele rapaz não era um rapaz é sim um Boto que se transforma
em rapaz. Né? Estas lendas elas serviam também, por exemplo,
quando surgia uma moça grávida de uma aldeia ou povoados esta
lenda explicava porque que esta moça estava grávida. Muitas delas
colocavam a culpa no Boto. Daí eles criaram este folclore. Então até
hoje em dia existe esta lenda naquela região como existe a lenda da
Vitória Régia. Quais outras lendas existem Fábio?
Pesquisador: Bah! Olha o Boitatá acho que é de lá!?
Professora: Isso Currupira. Então são lendas; histórias. Como Dhiana
tinha falado Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho. Sei lá, tantas
histórias. Nestas histórias eles querem contar a vida das pessoas o que
elas fizeram. E tirar uma lição disto. Algumas coisas que sirvam para
vida deles. Não quer dizer que é real. Muitos acreditam, mas muitos
acham que é só uma história. Bom! Pode continuar... (E dirigiu-se a
mim!)
Pesquisador: Bom! Então se nós pensarmos... Formos pensar sobre a
história. Qual seria o personagem principal?
John: O Boto! (Vários ao mesmo tempo)
Pesquisador: Isto! E o que faz a história ficar interessante?
Lisa: O mistério!
Pesquisador: Isto! E o que mais?
Peter: Um homem que não é homem! Uma mulher...
Pesquisador: Isto! Fala de um homem que se transforma! Existe uma
mágica. Quem aqui já pensou em se transformar? Ou já se
transformou?..
Momento de silêncio!
Pesquisador: E o Boto! Vocês sabem o que ele é?
Peter: Um peixe.
Pesquisador: Isto! Bem parecido com um peixe, mas é um peixe
mesmo?
Professora: Um mamífero.
Barth: Tipo um golfinho.
Pesquisador: Isto! É uma espécie de golfinho, parecido com peixe,
mas um mamífero... Então! Eu pensei algo para fazermos agora! Nos
juntarmos em grupos, bem rapidinho. E vocês podem conversar sobre
a história e depois fazerem outra história.
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Acontecem vários tipos de protestos, referentes a terem que se levantar e,
principalmente, sobre terem de fazer uma história. Surgem exclamações que criar uma
história é difícil e que eles não saberão fazer.
Pesquisador: Calma pessoal! Eu vou ajudar vocês se precisarem. Mas
para ficar mais fácil, vocês podem pensar em como começar a
história. Ou criar um personagem. Comecem devagar que vocês vão
conseguir.
Clark: Tá mais e depois?
Pesquisador: Depois que as histórias estiverem prontas podemos
contá-las para o grupo. Podemos fazer isto?
Dhiana: Sim!!!
Pesquisador: Que tal grupos? Gostaram da idéia?
Professora: Grupos de três! Vamos.
A coordenadora incentiva a formação de grupos. E ajuda um dos grupos a fazer a
história. Segundo ela, os jovens deste grupo são mais quietos. Nenhum grupo fica com três
pessoas. Os adolescentes têm muitas dúvidas de como fazer a história. Perguntam se a história
tem que ser de um animal. Respondo sempre que pode ser como eles quiserem. Alguns
trocam várias vezes de grupo, brigam com os colegas e alguns escolhem fazer a história
sozinhos. Perguntam se podem escrever a história. Digo a eles que o importante é que contem
a história para todos, mas que se quiserem escrever podem sem problemas. Todos os grupos
escrevem suas histórias. Demoram aproximadamente 40 minutos para conseguir realizar a
atividade. Precisam de muitos incentivos e de muitas liberações.
Enquanto os grupos faziam as histórias um dos adolescentes estava usando o
computador da sala, faz um desenho de um pênis, utilizando um dos programas gráficos.
Quando a Professora vê, dirige-se a ele e pergunta:
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Professora: O que é isto Clark?
Em tom de brincadeira o adolescente justifica:
Clark: Estava tentando desenhar o Mickey, professora. Só que está de
cabeça para baixo.
Depois disto o adolescente fechou o programa e continua a digitar a
história no computador.
Clark: Quer gravar isso ai? Você vai gravar eu não vou ler... Eu não
vou ler, lê você!
Depois de passado algum tempo, solicito que contem suas histórias para o grupo.
Houveram muitos protestos, mas com algum incentivo o primeiro grupo concordou com a
tarefa.
Timoty: Professor! “Os meninos que Caminham” este é o título.
Pesquisador: Tudo bem.
Timoty: Todo dia de curso os (dizem os nomes dos próprios garotos
que compunham o grupo) vêm a pé lá da Santana e da Azenha (muitas
risadas dos colegas). E a professora diz que é pertinho. Pertinho pra ti
né professora! Tá loco, mais um pouco eu vou sumir. O cara vem de a
pé e não ganha passagem e quem mora bem pertinho ganha passage e
nós que moremos longe não ganhamo. A (nome de uma colega), que
mora longe, até vale ganhar passagem e a (outra colega) também que
mora longe, na Safira, e a (outra colega) também vale, porque ela
mora na Safira, também esses até vale ganhar passagem, mas o resto
não tem que ganhar nada tudo moram perto. É isto.
Margery: Ai para guri.
Pesquisador: Agora quem quer ser o próximo a contar.
Bob: Lê ai meu!
Benjamim: Hah! Eu não vou contar! Conta ai professora! (Grupo que
a professora ajudou a fazer a história).
Pesquisador: Vocês não precisam ler se não quiserem. Só contem a
história.
Clark: Era uma vez um gato xadrez, quer que eu conte outra vez!
Pesquisador: Bom já é uma história! Viram não é tão difícil!
Bob: Mas nós não terminamos professor.
Pesquisador: Faz assim começa lendo e depois inventa o final.
Bob: Os outros lêem antes professor!?
Fred: Nos podemos ler professor.
Pesquisador: Ok! Podem ler então! (Havia muito barulho na sala)
Então pessoal vamos ouvi-los!?
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Fred: “A história de um Menino Drogado”. A história começa com
um jovem estudante que morava com seus pais numa pobre vila
chamada Chocolatão. (Todos riem muito e fazem comentários, o
menino continua a ler e todos vão se acalmando) O garoto no outro
dia foi convidado para cheirar cola e fuma baseado. O menino pegou a
loló e o baseado foi cheirar e fumar escondido. Tal dia então pegou e
se viciou. Seus pais descobriram e mandaram internar, mas só que os
pais do menino não sabiam que o menino era judiado lá dentro da
clínica. Lá na escola ele era um menino inteligente e adorável pelos
professores. Os próprios amigos dele falavam que ele tem muita
determinação e vontade para vencer, mas só que ele não sabia que as
drogas iriam matar. Logo ele viu que começou a emagrecer e ficar
muito doente e parou no hospital. Logo depois que saiu do hospital ele
parou e pensou em parar com as drogas
Roni: Parar de usar né? (outro integrante do grupo)
Fred: É parar de usar. Então ele voltou a morar com seus pais e
conseguiu largar as drogas e voltou a escola. Acabou.
Pesquisador: Ótimo, obrigado! Quem mais quer ler?... E ai como está
a de vocês?
Bob: Ainda não ta pronta professor.
Pesquisador: Mas faz assim começa lendo e termina contando.
Peter: Eu posso ler professor só que ainda não ta pronta. (O
adolescente fez a história sozinho, não se juntou a um grupo).
Pesquisador: Ok! Você termina na hora.
Peter: Acordo de manhã, pego o meu ônibus e no ônibus observo
pessoas apressadas e atordoadas. O que será que elas procuram?
Procuram um futuro melhor. Esse futuro só é destinado para os que
acreditam nele, existem muitos obstáculos, existem pessoas que te
ajudam, existem também aquelas pessoas que não tão nem ai pra você.
Mas basta nós... basta nós... passar por cima deles e continuar
seguindo em frente.
Acontecem muitas discussões sobre a história.
Pesquisador: Pessoal não existe certo ou errado cada um tinha a
liberdade de fazer como queria.
Bob: Ainda não professor.
Homer: Bob, Bob! Começa a falar depois o grupo te ajuda a terminar.
Bob: “O Filho Drogado” (grupo que foi ajudado pela coordenadora, o
menino lê muito pausadamente e com dificuldade). Era uma vez um
menino chamado T. (nome de um dos colegas). Ele não queria fazer
nada ele só queria usa drogas. A mãe de T. não sabia o que fazer. Ela
resolveu procurar ajuda de um Psicologia.
Todos riem.
Dhiana: Ai é Psicóligo, oh burro!
Professora: Psicólogo.
Bob: Para falar com seu filho. E o psicólogo perguntou para o T. se
ele queria parar com essa coisa de usar drogas ou ele para ai... Mas
quem escreveu isto aqui, eu não vou mais ler.
Os integrantes do grupo discutem entre si. E após incentivos
resolveram continuar a história.
51
Bob: E T. disse que não ia parar com as drogas então o psi...
piscólogo...
Dhiana: Lê direito meu.
Bob: Hah! Táh louco meu... Psicólogo resolveu interná-lo num
hospício de drogados e T. achou bom para ele. (O colega que escreveu
o ajudava a ler) Lê alto meu, lê tu!
Dimi: Ah eu não. Lê tu!
Bob: Lê tu! Ah eu não vou terminar de ler ele não sabe escreve
direito. Eu não vou mais lê nada.
O grupo começou a reagir insistindo que o menino lesse.
Pesquisador: Ok! Não tem problema. A história estava bem legal
pena que vocês não a terminaram, mas obrigado... Pessoal! Vocês se
importam de me entregar estas folhas ou vocês querem ficar com elas.
Eles começaram a colocar os nomes nas folhas sem que eu solicitasse. E insistiram
com professora para irem jogar bola na praça.
Pesquisador: Olha pessoal! Eu tenho uma atividade que é bem mais
divertida. Mas se vocês não querem fazê-la agora, eu vou entender.
Mas daí combinamos, que na semana que vem, nós vamos fazê-la da
melhor maneira possível, ok?
Os adolescentes começaram a se agitar e guardar suas coisas. Concordaram com a
minha proposta com afirmações, sem muita convicção. Auxiliei no que pude a coordenadora,
na arrumação do material. Ela disse que eu poderia ir. Acalmou os adolescentes e permaneceu
com eles na sala em clima de reunião. Eu me despedi de todos em uma única saudação e me
retirei.
52
2.5.1.1 Transcrição dos Trabalhos Gráficos:
Será realizada a transcrição das histórias, que foram entregues em folhas pautadas.
Transcrição da história, escrita a lápis, “O Filho Drogrado”. O nome do personagem
principal foi omitido por ser o nome de um dos integrantes do grupo. E os sinais de pontuação
foram empregados pelo pesquisador já que no trabalho original eram inexistentes.
“Era uma vez um menino chamado (nome omitido). Ele não queria
fazer nada. Ele só queria usar drogas. A mãe de (nome omitido) não
sabia o que fazer. E, ela resolveu procurar ajuda de um psicólogo
para falar com seu filho. E o psicólogo perguntou para o (nome
omitido) se ele queria para (parar) com essa coisa de usar drogas ou
ele parace. E (omitido) disse que não ai parar com as drogas. Então o
psicólogo resolveu interna-lo num ospcio (hospício) de drogados. E,
(nome omitido) achou bom pra eles. E sua mãe foi cuidar dá vida
dela. (nome omitido) voltou para a escola e ele espera voltar para sua
família.”
Transcrição sem alteração da história escrita a lápis.
“Acordo de manhã, pego o meu ônibus, no ônibus observo pessoas
apresadas atordoadas. O que será que elas procuram? Procuram u
futuro melhor. Esse futuro só é destinado para os que acreditam nele,
existem muitos obstáculos, existem pessoas que te ajudam, existe
também aquelas pessoas que não tão nem ai pra você. Mas depende
de nós pensarmos e passar por cima desses obstáculos.”
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Transcrição da história, escrita a lápis, “Os meninos que caminham”. Os nomes dos
personagens foram omitidos por serem os nomes de alguns dos adolescentes. E os sinais de
pontuação foram empregados pelo pesquisador já que no trabalho original eram inexistentes.
“Todo dia de curso o (nomes omitidos) vem de a pé lá da Santana e
da Azenha. E a professora (nome omitido) diz que é pertinho.
Pertinho pra ti, né professora! Ta loko mais um pouco eu vou sumir.
O cara vem ainda não ganha passagem e quem mora bem pertinho
ganha passagem. E nós que moremos longe temos que ir a pé todo
dia.
A (nome omitido) que mora longe até vale ganhar passagem. E a
(nome omitido) também mora longe, na Safira. E a (nome omitido)
também vale porque ela mora na Safira também. Estes até vale
ganhar passagem mas o resto não tem que ganhar nada. Tudo moram
perto.”
Transcrição sem alteração da história, escrita a lápis: A história de um menino
drogado”.
“A história começa com um jovem estudante que morava com seus
pais numa pobre vila, chamada Chocolatão. E o garoto no outro dia
foi convidado para cherar cola e fumar baseado. O menino pegou o
lo-lô e o baseado e foi cheirar e fumar escondido. Tal dia então pegou
e se viciou.
Seus pais descobriram e mandaram internar, mas só que os pais do
menino não sabia que o menino era judiado lá dentro da clínica. Lá
escola ele era um menino inteligente e adorável pelos professores. Os
próprios amigos dele falavam que ele tem muita determinação e
vontade para vencer, mas só que ele não sabia que as drogas iriam
matar. Logo ele viu que começou a emagrecer e ficar muito doente.
Então ele parou no hospital.
Depois que saiu do hospital ele ficou e pensou em parar com as
drogas, pois ela estava destruindo. Então ele voltou a morar com seus
pais e conseguiu largar as drogas e voltou a escola.”
54
2.5.2 Segundo Encontro – 24-07-2007
Ao chegar no módulo centro fui recebido com protestos pelos adolescentes. Alguns
deles, principalmente as meninas (Dhiana e Shaiéra que funcionavam como lideres de um dos
subgrupos da turma) me abordaram questionando se eu iria trabalhar com eles naquele dia.
Disse-lhes que era minha intenção, e perguntei o porquê do interesse. Elas me disseram que
na terça feira era dia deles participarem de oficinas no Instituto Mário Quintana (prédio ao
lado do Módulo Centro) e que gostavam muito desta atividade. Permaneci ali, observando
eles tomarem seu lanche e aguardando a coordenadora do programa. Percebi que os
adolescentes começaram a se articular para protestar contra minha intervenção daquele dia, na
tentativa de que pudessem participar de sua atividade corriqueira. Algum tempo depois, a
coordenadora do programa chegou e iniciou seu ritual de recolher as bandejas com as canecas
azuis e os jarros, em seguida começou a varrer a sala e organizar as cadeiras em formato de
círculo.
Eu entrei e me sentei em uma das cadeiras enquanto a coordenadora exigia que os
adolescentes ficassem em silêncio e se sentassem. Por muitas vezes, desde que chegou, havia
sido questionada sobre a possibilidade de acontecerem as oficinas e na maioria das vezes ela
ignorou os questionamentos ou respondeu que conversariam sobre isto após eles se
organizarem.
Depois que todos estavam sentados e organizados, novamente os adolescentes
questionaram sobre as oficinas no Instituto Mário Quintana. A coordenadora por várias vezes
disse que naquele dia eles realizariam a atividade que eu havia trazido e que iriam às oficinas
somente na outra semana. Uma chuva de protestos aconteceu, e as reivindicações ficavam
cada vez mais altas. Por várias vezes pude ouvir a professora em tom de ameaça repetir a
frase: - Olha o que conversamos na semana passada. Após alguns minutos a situação não
55
havia mudado e o impasse continuava. Então me levantei e aproximei-me da professora
sugerindo-lhe que poderíamos deixar minha atividade para o dia seguinte, desde que
combinássemos que todos se empenhariam em sua realização. A coordenadora justificou a
reação dos jovens, dizendo que eles gostavam muito desta atividade e que por isso relutavam
tanto em abandoná-la. Enquanto conversávamos o barulho de vozes em torno de nós diminuiu
gradativamente.
A professora então concordou que eu realizasse a atividade no dia seguinte e
comunicou a eles. Em seguida, pedi a palavra, fiz a combinação e lhes apresentei o Termo
Livre e Esclarecido. Disse-lhes qual era sua função e porque ele era importante para mim.
Eles não questionaram nada. Então, solicitei que eles o levassem para os seus responsáveis,
sendo que, a professora se responsabilizou de entregá-lo no término das atividades daquele
dia. Despedi-me e me retirei enquanto a turma se preparava para sair.
2.5.3 Terceiro Encontro – 25-07-2007
Neste dia cheguei um pouco mais tarde e a professora já estava limpando a sala.
Cumprimentei a todos, e perguntei-lhes se haviam lembrado de trazer o Termo Livre e
Esclarecido que haviam levado para seus responsáveis assinarem. Uma das meninas gritou: -
eu não recebi isto. A professora imediatamente confirmou que havia entregue para eles no dia
anterior no final das atividades. Então a mesma menina perguntou para que o termo servia, e
por que os seus pais tinham que assinar. Expliquei a importância do termo para mim. E sobre
o que era pesquisa. Quando solicitei se alguém tinha alguma pergunta outra adolescente
perguntou por que eu havia escolhido o grupo deles para trabalhar. Respondi contando um
pouco da minha experiência com o “Programa Agente Jovem” e disse que achava que eles
56
poderiam me ensinar muito. Não houve mais perguntas, então passei para a realização da
atividade.
A transcrição deste encontro está realizada partir deste momento:
Pesquisador: Para atividade de hoje eu gostaria que vocês formassem
duplas.
John: duplas de dois, professor?
Pesquisador: Isto mesmo.
Dhiana: Não pode fazer uma dupla de quatro, anta!
Muitos Risos...
John: Cala boca guria!
Pesquisador: PESSOAL! Duas pessoas, vocês podem escolher. Daí
eu quero que vocês sentem de frente para a dupla.
Bruce: Ih professor! Como assim!
Professora: FORMEM A DUPLA, VAMOS!
Pesquisador: Oh pessoal! Nós vamos fazer duas colunas de cadeiras.
Assim! Aqui vai ser a coluna A e aqui a B. A pessoa que vocês
escolherem para dupla vai sentar na frente de vocês, ok!?
Shaiéra: Não entendi professor!
Pesquisador: Nós vamos formar duas filas de cadeiras. Sendo que as
pessoas sentadas na cadeira ficarão de frente para a outra pessoa que
está sentada na outra coluna, entenderam?
Professora: Vamos lá pessoal! Não é tão difícil! Vamos lá!!!
Passa algum tempo...
Pesquisador: Isto pessoal assim! Ótimo assim está certo!
Depois de todos organizados... Com exceção de três meninas que geralmente não
participavam da atividade e que ficaram em um canto.
Pesquisador: Pessoal, nós agora vamos fazer uma atividade que é um
jogo.
Dhiana: Qual o nome do jogo professor?
Pesquisador: ... Palavra!
Peter: PA-LA-VRA!
Pesquisador: Então! Eu vou explicar o jogo para vocês. A pessoa que
está sentada na frente de vocês é a sua dupla. Não é? Vocês dois estão
57
jogando juntos, conforme vocês acertarem eu marco um ponto para
vocês aqui na lousa e no final quem tiver mais pontos ganhou.
Clark: Mas acertar o que professor?
Pesquisador: Ok, vou explicar! Mas entenderam até agora, né? Bom
vai ser assim, eu vou escrever uma palavra no caderno. Você vai ter
que fazer a tua dupla adivinhar esta palavra, mas para isto você vai
dizer para ele somente uma palavra que seja diferente desta, mas que
faça a pessoa associar a palavra que esta aqui escrita, ok? Se a
primeira dupla não acertar pula para a segunda, que vai poder repetir
as palavras já ditas para tentar fazer seu parceiro acertar. Depois de
passar algumas duplas sem a pessoa acertar vai ficar fácil porque já
vai dar para formar uma frase completa.
Barth: Não entendi muito bem professor!
Dhiana: Eu também não entendi nada!
Pesquisador: Vamos fazer assim! Vamos começar a jogar daí vocês
vão entender!
Dhiana: Ih! Isto é muito complicado, nós não vamos conseguir fazer.
Pesquisador: Vão sim vocês são espertos.
Dhiana: Esperto? Aqui são tudo uns burros.
John: Cala boca guria que mais burra que você não tem!
Neste ponto começa uma discussão!
Professora: Pessoal, por favor!
Pesquisador: Vamos lá, começar! Se vocês prestarem atenção nestas
primeiras, todos vão conseguir fazer. Olha, estou escrevendo uma
palavra no caderno, agora você lê a palavra e diz para ela outra
palavra que você acha que ela vai associar, para adivinhar esta.
Lisa: Ai não sei professor!
Pesquisador: Lê o que está escrito e diz outra palavra para ela. Tenta!
Lisa: Ta! Abacaxi!
Pesquisador: Isto! Agora ela disse abacaxi! O que você acha que está
escrito aqui no caderno?
Welma: Não sei!
Pesquisador: Pensa assim, abacaxi o que ela está tentando te dizer
com isto?
Welma: Peru.
Todos começam a rir muito...
Pesquisador: Ok! Não é esta! Então vamos para o próximo vai ficar
mais fácil...
Lisa: Era maçã
Bob: Hahhh! É sempre fruta!?
Pesquisador: Lisa não pode falar, agora os outros que tinham que
adivinhar já sabem.
Clark: Huuu! È uma burra mesmo!
Dhiana: O que guri burro é você!!!
Pesquisador: Calma pessoal, vamos começar novamente, e agora
ninguém fala o que está escrito até alguém adivinhar, ok? No começo
eu vou usar palavras bem fáceis, tipo as frutas, depois que vocês
aprenderem vamos para as outras. Então aqui tem outra palavra.
Dhiana: Ai professor vamos parar com isto, que é muito difícil esta
brincadeira.
58
Pesquisador: Pessoal eu nem terminei de explicar a brincadeira
prestem a atenção um pouco que vocês vão conseguir.
Pesquisador: Olha está aqui é tua palavra! O que você pode dizer
para ele adivinhá-la?
Peter: Banana.
Bob: Maçã.
Pesquisador: Ok! Não acertou agora é assim. Já foram ditas duas
palavras. Ela pode usar estas duas palavras já ditas e mais uma para
fazer a colega acertar. Então você tem que pensar agora, estas palavras
ditas: banana e maçã; ajudam você a formar algo com outra palavra
que leve ela associar o que está escrito no papel? Então tenta!
Margery: Melancia.
Mary: Sei lá!.. Melão!
Pesquisador: Não é melão. Mas estão jogando bem certo! Vamos
continuar jogando!
Bruce: Abacate.
Roni: Pêra.
Pesquisador: Não é! Mas acho que vocês estão acertando.
Dhiana: É pepino professor!
Pesquisador: Você precisa deixar a tua colega te passar a dica antes
de tentar.
Shaiéra: É abacaxi sua anta, eu te fiz sinal.
Pesquisador: Pessoal não falem a palavra que está escrita... Mas
deixem eu dar um exemplo para vocês de como poderia ser feito.
Vamos supor que o colega aqui tivesse dito “fruta”, que não foi
falado, mas caso tivesse eu que seria o próximo poderia ter dito “fruta
coroa”, daí a próxima pessoa poderia ter entendido, uma fruta com
coroa, então deve ser o abacaxi.
Clark: Mas assim é fácil professor!
Pesquisador: Então! É isto que quero explicar, vocês podem usar as
palavras que os colegas disseram e acrescentar mais uma para fazer
sua dupla acertar.
Margery: Ah ta agora eu entendi!
Pesquisador: Pessoal vamos tentar uma vez para valer daí ver no que
dá. Eu vou escrever a palavra no caderno e deixá-lo com vocês.
Porque quero anotar no quadro as palavras que vocês disserem. Pode
ser assim?
Shaiéra: Hahaha.
Dhiana: Ai que chato professor!
Lisa: Beijo.
Welma: Boca.
...
Pesquisador: Pode continuar.
Peter: Mas como professor.
59
Enquanto eu explicava para este menino. No fundo da sala surge uma discussão sobre
outro assunto em tom agressivo. A professora interveio várias vezes, até que finalmente
voltamos a atividade.
Peter: Amor.
Bob: Namoro.
Pesquisador: Isto acertou! Oh pessoal ele acertou aqui! Vou marcar
um ponto para ele!
Dhiana: Acertou porque o Peter falou para ele!
Bob: Falou da onde guria!
Pesquisador: Bom pessoal, vamos continuar jogando!
Clark: Vamos trocar de lado professor!
Pesquisador: Sim! Agora vamos começar com o outro lado!Está é a
palavra.
A menina falou algo bem baixinho que não pude ouvir! Pedi para que ela repetisse.
Ela não quis. Mesmo eu lhe dizendo que não teria problema, ela não quis falar. Então, disse
para ela falar uma palavra para a colega associar.
Mary: Sexo.
Pesquisador: Lembra o que falei para vocês? Não é para falar o que
está escrito no caderno, mas uma palavra que lembre isto. Então, me
passa aqui o caderno que vou escrever outra palavra.
Dhiana: Eu disse professor que aqui eram tudo burro.
Clark: Cala a boca guria! Que a mais burra é você.
Pesquisador: Vamos começar pessoal?
Bruce: Paixão.
Bob: Amor.
Pesquisador: Isto acertou. Viram como não é difícil. Vou anotar um
ponto para vocês. Agora vamos começar por outro lado. Agora você
passa para ele.
Clark: Mudando.
Barth: Mudar.
Pesquisador: Não é! Podem continuar.
Timoty: Mudando.
60
Dhiana: Diz outra palavra burro.
Pesquisador: Pode ser a mesma se ele quiser. Vai tenta adivinhar!
Fred: Ombro.
Pesquisador: Não é! Pode continuar.
Antony: Transformação.
Pesquisador: Pessoal! Vamos lá! Vocês não entenderam o que eu
falei? Não é para ler o que está no caderno é para dizer outra palavra...
Neste ponto, expliquei toda a brincadeira novamente. E recomeçamos.
Homer: Criança.
Pesquisador: Isto ai!
John: Bebê.
Pesquisador: Não é! Mas estão brincando certo!
Clark: Tesouro.
Barth: Pessoa.
Pesquisador: Não é pessoa! Podem continuar!
Dhiana: Jovem. Isto professor?
Pesquisador: Ok! Está certo!
Shaiéra: Adulto.
Bruce: Muito difícil esta palavra professor.
Pesquisador: Será que é tão difícil? Olha só! Desde aqui (indico
palavras na lousa) você pode usar. Você pode usar todas estas palavras
mais uma e até formar uma frase se você quiser.
Bruce: Hum! Bebê, criança.
Roni: Emoção.
Pesquisador: Ok! Não é essa! Você pode usar as palavras já ditas,
estas aqui e uma nova.
Margery: Deixa eu ver! Jovem, pessoa e adolescente.
Bruce: Ihhh falou! Não pode professor! Ela errou!
Pesquisador: Mas qual o problema? Pode sim. É só uma nova.
Bruce: Mas não é adolescência?
Pesquisador: Ai amigo, agora você falou!
Bruce: Mas ela já tinha dito.
Pesquisador: Ele falou Adolescente! Não pode dizer a palavra, mas
outras parecidas sim. Ele não poderia ter dito adolescência, mas
adolescente não tem problema. Assim! Se a palavra fosse mudança,
você poderia dizer mudar, mas não mudança. Entendeu?.. Vamos
novamente!
Peter: Casado.
Bob: casamento.
Pesquisador: Acertou.
Bruce: Mas de novo ele falou, professor!
61
Pesquisador: Vamos continuar pessoal? Tá aqui a palavra!.. O que
foi? Não entendeu a letra?
Dhiana: Ela não sabe ler professor.
Lisa: Gravidez.
Bob: Gravidez na adolescência?
Welmar: Grávida.
Pesquisador: Acertou. Está aqui a outra palavra.
John: Prevenção.
Homer: Prevenir.
Pesquisador: Não é esta ainda!.. Pode continuar.
Antony: Prevenção, Cuidado!
Dimi: Camisinha.
Pesquisador: Agora eu vi que ele te soprou. Pessoal pelo jeito vocês
não querem mais jogar? Vocês querem jogar mais?
Várias Pessoas: Não!
Pesquisador: Então agora eu pensei em nós mudarmos nosso jogo.
Pode ser?.. Agora vamos fazer assim! Uma das pessoas da dupla tem
que iniciar uma história com as palavras daqui e outro da dupla tem
que continuar a história incluindo a próxima palavra! Entenderam?
Várias Pessoas: Sim!
Pesquisador: Legal! Se entenderam podem começar.
Dhiana: Era uma vez dois alunos que incomodavam a professora... é
assim professor?
Professora: Viu só Fábio, eles não prestam a atenção. E depois não
sabem fazer.
Pesquisador: Tudo bem, vou explicar novamente, ok?
Explico novamente a atividade, porém a turma fica muito dispersa e pouquíssimos
prestam a atenção. A partir deste ponto muitos dados são perdidos, pois existe muito barulho
e conversas paralelas, e a transcrição fica muito difícil de ser feita.
Pesquisador: Podemos começar então?
Clark: Era uma vez uma brincadeira bem chata... Vai você meu!
Barth: O que eu falo professor?
Pesquisador: Você tem que contar uma história com a palavra
“Beijo”.
Barth: Beijo na boca eu gosto, é coisa do passado.
Todos começam a rir muito.
Pesquisador: Então continua...
Clark: Agora a onda é namorar pelado.
E todos começam a rir muito... Depois de algum tempo...
62
Pesquisador: Pessoal conversem comigo um pouco! Vocês não
gostaram da brincadeira novamente é isto?.. Me digam então do que
vocês gostam?
Dhiana: Namorar!.
Clark: Vuco-vuco e dança da vassoura!
Pesquisador: Mas então vamos falar sobre isto...
Começa uma algazarra e várias pessoas falam ao mesmo tempo.
Dhiana: Eu nem sei nada sobre isto.
Pesquisador: É bom conversar sobre um assunto. Porque sempre
aprendemos algo sobre ele, não é?
Peter: Ai professor! Vamos fazer isto ai. Deixa quem não quer!
Professora: É Fábio, vamos fazer nós! E deixar eles ai. Os que não
querem.
Pesquisador: Ok! Então podemos fazer quem quiser...
Neste ponto alguns adolescentes, todos meninos formam um círculo em torno de mim
com as cadeiras a professora também entra no círculo.
Pesquisador: Quer começar?
Peter: Qual palavra professor?
Pesquisador: Amor.
Peter: Um guri e uma menina estavam sentados no banco da praça. E
ele disse que amava ela.
Pesquisador: Quer continuar? (Dirigi-me a professora que estava
sentada na cadeira subseqüente).
Professora: Sim... Eles começaram a namorar e o namoro deles foi
bem emocionante!
Pesquisador: Agora você? “Paixão”.
Fred: Era uma paixão de adolescentes.
Pesquisador: “Evolução”.
Homer: E eles evoluíram juntos.
Pesquisador: “Crescimento”.
Bob: E o crescimento de suas vidas.
Pesquisador: “Mudança/Mudar”.
Timoty: Agora não sei mais fazer professor. Ficou difícil.
Pesquisador: Dá uma pensadinha que você consegue... Então começa
de novo.
Timoty: Qual é professor?
Pesquisador: “Mudar”.
Timoty: Ai professor eu não sei!!!
Peter: Eu continuo professor... E eles mudaram de casa.
Pesquisador: “Mudança”.
63
Professora: E está mudança provocou uma transformação no seu
relacionamento.
Pesquisador: “Casamento”.
Fred: E daí eles se casaram.
Pesquisador: “Ombro”.
Bob: E caiu com um ombro na árvore. Este é difícil professor?
Pesquisador: Tudo bem! Mas as palavras são de vocês... Agora é
“Bebê”.
Homer: E tiveram um bebê.
Pesquisador: “Pessoa”.
Timoty: E as pessoas gostaram muito das crianças.
Havia muito barulho na sala.
Professora: A PARTICIPAÇÃO VAI SER AVALIADA A PARTIR
DE HOJE.
Iniciam-se muitas discussões e protestos. O barulho é imenso.
Pesquisador: Vamos continuar pessoal?.. “Jovem”.
Peter: Os alunos dela eram jovens... Assim! Ela era professora e os
alunos dela eram jovem e adultos.
Pesquisador: “Ser Humano”.
Fred: Ela dava aula para jovens e adultos e fazia deles Seres
Humanos.
Pesquisador: “Adolescentes”.
Homer: Como estava a história?
Neste momento acontece uma briga lá atrás. A professora vai lá separá-los. E Peter
resume a história para Homer.
Homer: E os filhos da professora viram adolescentes.
Bob: Eles tinham casado?
...
Pesquisador: A próxima palavra é “Gravidez”.
Peter: Depois de um tempo a mulher dele decidiu ter uma gravidez.
Pesquisador: “Prevenção”.
Fred: E agora digo que ela não se preveniu?
Peter: Mas ela queria ter a gravidez.
64
Neste momento a mesma briga anterior é retomada e professora acha melhor encerrar
minha atividade, porque quer ter uma conversa com os adolescentes. Eu recolho minhas
coisas e me retiro da sala.
2.5.4 Quarto Encontro 26/07/2007
Neste dia ao chegar ao módulo centro, entrei na sala de aula e a professora já se
encontrava realizando a limpeza da sala como fazia sempre. Cumprimentei a todos sendo que
recebi a replica de forma calma e ordeira. Diferente dos encontros anteriores, um clima de
calma e serenidade pairava, não havia bagunça e barulhos exagerados. Os adolescentes
demonstravam-se atentos e dispostos a trabalhar. Talvez influenciado por esta tranqüilidade,
minha forma de falar na gravação estava muito mais lenta e baixa do que nas anteriores.
Iniciei o encontro combinando com os adolescentes e disse-lhes que gostaria de
trabalhar na próxima vez com música. Mediante uma chuva de questionamentos e sugestões
sobre o tipo de música, combinei com o grupo que, se concordassem em realizar a atividade
com o tipo de música que eu quisesse, reservaria um tempo final para ouvirmos as músicas
que eles escolhessem desde que as trouxessem. Todos concordaram e então iniciamos a
atividade do dia.
A transcrição da atividade foi realizada a partir deste ponto:
Pesquisador: Bom Pessoal! Eu pensei que hoje nós poderíamos
começar com uma história, que eu trouxe e depois podemos discuti-la.
O que acham?
Todos concordaram prontamente!
Pesquisador: Alguém quer ler a história? Ou preferem que eu a leia?
65
Shaiéra: Eu leio professor!
Pesquisador: Ok, pode ler!
Shaiéra: Onde começa professor?
Pesquisador: Aqui onde tem o título.
Shaiéra: Uma Casa com Cupins!” Uma certa casa foi bem
cons...truída. Uma madeira de exc... excelência qualidade... excelente
qualidade.
Clark: Lê direito guria!
Shaiéra: Ai professor tá muito difícil!
Pesquisador: Você pode ler com calma e não tem problema se errar
algo, volte e leia de novo!
Shaiéra: Ai professor! Não quero mais ler não!
Pesquisador: Mas pode ler com calma, não tem problema!.. Tem
certeza?.. Tá bom! Alguém quer ler?.. Ninguém! Ok! Eu vou ler então!
Realizei a leitura do texto na integra. Iniciando pelo título.
“Uma certa casa foi bem construída.
Uma madeira de excelente qualidade foi utilizada.
E, embora ela tenha vários anos, ela ainda aparentava ser uma boa
casa no seu aspecto externo.
Ela ainda parece forte.
Entretanto, muitos anos atrás, cupins entraram na madeira e agora o
problema é sério.
Impossível dizer quando eles chegaram.
Não existem evidências externas de que eles estão trabalhando.
Um dia veio uma tempestade.
Uma grande tempestade, mas não maior do que muitas tempestades
que já havia acontecido.
A casa com cupins permanece de pé.
Ela é sacudida por fortes ventos.
As casas vizinhas são atingidas também.
Quando a tempestade passou as outras casas estavam em pé, mas está
casa não.
Inicialmente houve surpresa por a tempestade ter destruído tal casa.
Então, na madeira da casa desmoronada, o trabalho dos cupins foi
descoberto.
As colunas estão cheias de buracos.
Agora é fácil ver o que não se suspeitava antes.
A casa tinha, na realidade, se tornado muito frágil.”
Texto Retirado: Manual do Multiplicador:
Adolescente/Coordenação Nacional de Doenças Sexualmente
Transmissíveis e Aids. Brasília: Ministério da Saúde, 1997, p.87-88.
66
Os adolescentes no início da leitura permanecem em silêncio, porém com o transcorrer
do tempo começam a se movimentar nas cadeiras provocando fortes ruídos e surgem
conversas paralelas. Continuo lendo o texto sem interrupções no mesmo tom anterior, e é
retomado o silêncio.
Pesquisador: Então pessoal conseguiram pegar todo o texto?.. Do que
fala o texto?
Shaiéra: Fala de uma casa muito velha que tinha a madeira muito
velha.
Clark: E a casa que tinha cupins.
Pesquisador: Isto mesmo a história fala sobre isto. Mas o que será que
está por trás da história?.. Às vezes quando as pessoas contam uma
história elas estão querendo passar uma mensagem com a história, será
que tem alguma mensagem neste texto?
Silêncio!
Pesquisador: E daí o que será que tem por trás deste texto?
Shaiéra: O autor!
Pesquisador: Com certeza! O autor foi quem escreveu! Mas o que
mais tem por trás?
Silêncio!
Pesquisador: Será que fala só de uma casa?.. Do que mais poderia
estar falando no lugar da casa?
Silêncio!
Pesquisador: O que a casa representa para vocês?
Shaiéra: Velha muito antiga!
Pesquisador: Ok pode ser também. Mas o que a casa de vocês
representa para vocês?
Shaiéra: Velha muito antiga.
Pesquisador: Ok! Vamos tentar pensar assim, uma outra coisa que
vocês tem que pode ser considerada uma casa?
Peter: A escola!
Sheira: Uma moradia.
Dhiana: Ai ta chato professor!
Pesquisador: Ok pode ser também! Mais alguma coisa?
Dhiana: Não professor!
Pesquisador: Ok! A outra atividade que pensei em fazermos hoje! É
histórias em Quadrinhos. Que tal?
67
Todos começaram a se organizar para criarem as histórias. Respondi as dúvidas
quanto aos tamanhos dos quadrinhos e os temas das histórias, com a resposta: - não tem regras
podem fazer como quiserem! Solicitei que fizessem as histórias individualmente, mas isto
gerou muitos protestos, mantive a minha indicação, porém a maioria dos trabalhos foram
feitos em grupos.
2.5.4.1 Trabalhos Gráficos Produzidos:
Abaixo consta a transcrição da primeira história em quadrinhos (ver figura 01). Na
Capa consta somente o nome da adolescente que confeccionou o trabalho. Em seguida na
primeira folha o personagem diz: - Aí essa é minha casa. Na segunda folha um dos
personagens diz: - O essa é minha vizinha! E o outro personagem diz: - Está sou eu! Já na
terceira folha existe uma casa e sobre ela está escrito: Esta é a casa dela. E sob o personagem:
Esta é irmã da Maria. Na quarta folha está escrita a palavra “mercado” e a fala: Esse é o
Mercado do ROKK. Esse é o mercado. Na quinta folha diz: Está é a pracinha de meu bairro.
Na sexta folha o personagem diz: - Essa é a Flor não mora no bairro. Na sétima folha está
escrita a palavra “fim”.
68
Figura 1: História em quadrinhos produzida no quarto encontro.
O segundo trabalho é intitulado “As crianças nas Ruas”. Em sua capa consta o nome
da autora, o ano, idade: 16 anos e o professor no caso o nome do pesquisador. As folhas
seguintes contêm o seguinte texto:
“Era uma vez duas crianças que viviam na rua por causa que não
tinham família, não tinham casa, não tintam como comer ou como
tomar banho. Tudo era difícil pra elas até que um dia uma mulher
convidou elas para almoçar na casa dela e as crianças com muita
fome foram, colocaram elas no carro e foram. A moça disse também
que ai dar roupa para elas. Elas estavão muito feliz. E então uma
outra moça sentiu falta das crianças. A moça que também morava na
rua. Foi procurar, perguntou para todo mundo se eles viram as
crianças que estavam desaparecidas à dois dias. Ela estava
apavorada e começava a procurar e mais e mais. E ai as crianças
estavão apavorada na casa da moça. Apavorada que elas iam ser
seqüestradas, chorando falando que queria voltar pras ruas. E a
moça perguntou porque. Mas as crianças não disseram nada com
nada, só queriam ir embora mas a moça disse que não. A moça disse
a verdade pra elas, que elas foram adotada pro a moça. E elas
ficaram felizes porque elas pensaram que elas iam ser vendidas por
gente mal. Elas disseram que a única coisa que elas queriam era
69
mesmo ter uma família. E foi realmente o que elas conseguiram. No
fim elas viveram muito feliz. A moça colocou elas no colégio e a moça
deu pra elas tudo o que elas não tiveram. Fim”
Figura 2: História “As crianças nas ruas”.
O terceiro trabalho é intitulado Meu Sonho”. Apresenta uma única cena onde o
personagem diz a seguinte frase: - É ser um jogador de futebol e ser um... e ajudar as pessoas
que não têm necessidade de comer.
Figura 3: História “Meu Sonho”.
70
A quarta história é intitulada “O Menino Bilu:”. A primeira cena apresenta as seguintes
falas:
Personagem 01: Oi, eu sou o Bilu e esse é meu amigo.
Personagem 02: Eu sou o Carlo.
Personagem 03: E eu sou o Paulo.
A segunda cena apresenta a seguinte fala:
Personagem 01: Nos sempre brincamos juntos. Este é minha casa.
A terceira cena apresenta a seguinte fala:
Personagem 01: Gosto de jogar bola.
A quarta cena apresenta a seguinte fala:
Personagem 01: Gosto também de soltar pipa.
A quinta cena apresenta a seguinte fala:
Personagem 01: Eu gosto de tudo... Sou muito feliz.
A sexta cena apresenta o seguinte pensamento:
Personagem 01: As vezes eu vou na festa.
A sétima cena apresenta a seguinte fala:
Personagem 01: Eu sou o Bilu e agora vocês sabem do que eu gosto.
A oitava cena apresenta as seguintes falas:
Personagem 01: Muito obrigado por ter me escutado.
Personagem 02: Tchau.
Figura 4: História “O Menino Bilu:”
O título do quinto trabalho é “Nunca vi um Play 2?”. Ela é composta somente de uma
capa que na parte superior contém a expressão: “Sony computer presente”. Em seguida o
71
título e logo a baixo está escrito: “Exclusivo: dicas de DEF I AM FIGHTER FOR NY e muito
mais”.
Figura 5: Trabalho “Nunca vi um Play 2?”
A sexta história em quadrinhos é chama-se “O menino que era magro e ficou gordo”.
Na parte superior da primeira cena há a seguinte fala: “- Bom este menino que estão vendo é
magro. Ele precisa de ajuda”. Na parte superior da segunda cena diz: “- Num belo dia ele e a
mãe dele foram ao médico para ver se resolvem o problema dele”. A terceira cena apresenta a
seguinte fala: “O médico disse: - Seu problema é que você precisa comer e fazer exercício
físico”. E na parte superior da última cena diz: “ Então ele começou a comer bastante e fez
exercício físico e ficou forte. Fim”.
72
Figura 6: História “O menino que era magro e ficou gordo”.
Na parte superior das quatro cenas da sétima história existe a seguinte narrativa em
seqüência: “Era uma vez um menino que gosta de sair com os amigos e as namoradas. As
meninas queriam muito passear com os meninos. Eles foram no cinema. E depois os meninos
foram jogar bola. O menino Tuta fez o primeiro gol na vitória de 2 em cima do Náutico. O
técnico Menezes terá o retorno do zagueiro Schiavi para o jogo de sábado contra o
AtléticoPR no olímpico as 18h 10 minuto. O menino Carlos Eduardo fechou a placa do jogo
em 02 a 0 contra o Náutico. E o time do Mano Menezes ficam na vice-liderança”.
Figura 7: Trabalho produzido no quarto encontro.
73
A oitava história é chamada de O Rap do Bom”. A primeira cena apresenta as
seguintes falas:
Personagem 01: Vou encontrar meu amigo... Eu vou cantar Rap, e
ninguém vai me impedir.
A segunda cena apresenta a seguinte fala:
Personagem 02: Cadê aquele cara? Rapa vou começar a cantar a
música.
A terceira cena apresenta as seguintes falas:
Personagem 01: Falo mano Alisson ai!
Personagem 02: Ei vamos cantar nossa rapa ta na hora.
Na quarta cena está escrito o nome do autor da história.
Figura 8: História “O Rap do Bom”.
No nono trabalho primeiramente contém o nome do autor em letras grandes e duas
tiras. Na primeira cena da primeira tira o pesonagem 01 diz: “- Pai, se a Amazônia é o pulmão
do Brasil... Aonde é o intestino?”. Na segunda cena o personagem 02 responde: “- Brasília!”.
A segunda tira não contém falas.
74
Figura 9: Trabalho produzido no quarto encontro.
O décimo trabalho é intitulado “A Cidade Fantasma” e não contém palavras a não ser
o nome da autora na parte inferior.
Figura 10: Trabalho “A Cidade Fantasma”.
O décimo primeiro trabalho se chama “A casa Imobilhada”. Na parte superior da
primeira cena há a palavra cozinha”. Na parte superior da segunda cena existe a palavra
quarto”. Na terceira cena no centro está a palavra “hospital” e a personagem diz: “- Meu
filho”. Na quarta cena não há falas somente o nome das duas autoras.
75
Figura 11: História “A casa Imobiliada”.
2.5.5 Quinto Encontro – 31/07/2007
Ao chegar neste dia os adolescentes estavam fazendo seu lanche como de costume, a
professora ainda não havia chegado. Quando me viram os adolescentes começaram a
questionar qual seria a atividade. Perguntei se não lembravam, já que havíamos conversado
sobre o tema na semana anterior. Eles responderam que não, então lembrei-os que seria um
trabalho com música. Em seguida chegou a professora e começou a recolher o lanche.
Lembrei-a que utilizaria o aparelho de som, sendo que na semana anterior havia ficado
acordado que não necessitava que eu trouxesse que poderia utilizar o do programa. A
professora recordou da combinação, porém ficou preocupada, pois não havia lembrado de
reservar o aparelho. Concluiu a organização da sala e foi providenciar o equipamento. Neste
momento fiquei sozinho com os adolescentes.
A transcrição do encontro é feita a partir deste ponto:
Dhiana: O que vamos fazer hoje professor?
Pesquisador: Lembra que te falei a pouco que vamos trabalhar com
músicas como havíamos combinado semana passada.
76
Bob: Mas pode ser Rap professor?
Clark: Ou Hip-hop ou Funk, Dança da Mótinho!
Pesquisador: Vocês não lembram o que combinamos na semana
passada?.. Ninguém lembra?
Shaiera: Que íamos trabalhar com música!
Pesquisador: Sim, e o que mais?.. Lembram que nós combinamos que
no início vocês realizariam a atividade com as músicas que eu
escolhesse e depois, mais no final vocês poderiam ouvir a música que
quisessem?
Clark: Mas professor que música o senhor quer que a gente escute,
porque se for sertaneja estou fora!
Dhiana: Pode ser sertaneja sim professor!
Pesquisador: Confiem em mim vão ser músicas bem legais!
Shaiera: Mas diz qual é professor!
Pesquisador: Vamos esperar um pouco que já vem o som daí vocês
vão saber, ok?
Dhiana: Ai que chato isto professor!
Pesquisador: Aproveitando que a Dhiana disse isto, já quero ver com
vocês. Como estão sendo os encontros, estão muito chatos mesmo?
Shaiéra: Ta bem legal professor!
Pesquisador: Pessoal vocês podem me dizer a verdade, não vou ficar
bravo. E vai me ajudar a pensar outras atividades mais divertidas.
Clark: Ta legal sim professor!
Pesquisador: Vamos lá pessoal, acho que não está tão legal assim! E
confesso que estou ficando sem opções. Trabalhamos histórias,
histórias em quadrinhos, jogamos, tudo bem que o jogo foi meio
complicado, hoje vamos trabalhar com música, todas estas coisas me
pareceram divertidas. Mas se não foram, tudo bem, mas gostaria de
saber para poder pensar em outras coisas. Gostaria até que vocês me
sugerissem atividades mais legais.
Dhiana: Não é isto professor é que aqui só todos burros mesmo!
Pesquisador: Olha nisso eu vou discordar! Pelos trabalhos que vocês
fizeram até agora eu percebi que vocês têm muita capacidade, e só
querer que sai muita coisa legal.
Clark: É isso ai professor! Cala boca guria! (referindo-se a Diana) Tá
bem legal sim!
Shaiéra: Eu gostei das atividades professor!
Peter: Olha eu achei as atividades bem legais sim. O problema está no
pessoal que não colabora.
Bruce: Puxa saco!
Pesquisador: É a opinião dele! Você pode dar a sua!
Bruce: Não quero não professor!
Pesquisador: Você que sabe! Mas então se vocês não participam, me
digam o porquê!
Dhiana: Eu já disse porque são tudo uns burros!
Clark: Cala boa guria! A mais burra aqui é você!
Pesquisador: Calma pessoal! Cada um tem sua opinião!
77
A discussão continua entre os dois e, em seguida, entra a professora com o aparelho de
som... Interrompo a nossa conversa e inicio a atividade.
Pesquisador: Pessoal eu pensei em nós fazermos assim! Vocês
peguem uma folha de papel e a dobrem ao meio. Vocês vão usar o lado
de dentro e o lado de fora. E fiquem com um lápis na mão.
Shaiéra: Pode ser caneta professor?
Pesquisador: Pode ser sim! Algo para vocês escreverem! Eu vou
pedir para vocês escreverem algo sobre cada uma das músicas.
Shaiéra: Escrever o que professor?
Pesquisador: Cada uma delas eu vou dizer o que vocês devem
escrever.
Clark: E se nós não gostarmos da música?
Pesquisador: Olha pessoal é impossível agradar todo mundo. Se
vocês não gostarem da música, façam a atividade igual, escrevam as
coisas que vocês sentirem da música que não gostam. É só agüentar
um pouquinho que eu logo vou trocá-la. E também não machuca ouvir
um pouco da música que não se gosta?
Clark: Machuca sim professor os ouvidos!
Pesquisador: Bom, então você já vai ter material para escrever na
folha... Assim pessoal, não há certo ou errado do que escrever, é o que
cada um sentir ok? Então, seria interessante vocês não olharam o que o
colega está escrevendo e nem falar alto o que vocês perceberem, só
escrever. Pode ser?
Silêncio!
Pesquisador: Todos prontos com a caneta e o papel. Podemos
começar?
Respostas positivas dispersas.
Pesquisador: Agora vocês vão usar a parte de fora do papel. Cada
música eu vou pedir para vocês escreverem algo sobre a ela. OK?
Todos prontos?
Não há respostas. Mas a turma demora muito tempo para se acalmar
e se organizar.
Pesquisador: Olha pessoal esta é a primeira música não é em
português! Porque vocês não precisam entender o que está sendo
cantado. Eu quero que vocês escutem a voz de quem canta e tentem
descrever esta pessoa, ok?
Shaiéra: E se nós não conhecermos a pessoa professor?
Pesquisador: Assim! Não é para vocês conhecerem a pessoa, e
mesmo se vocês a conhecerem tentem imaginar outra pessoa.
Peter: Mas descrever como professor?
Pesquisador: Como vocês quiserem! O físico como a pessoa é! Como
eu falei não tem certo ou errado! Está entendido?
Demora muito tempo para a turma se organizar! E continua muito
barulho! Eu coloco a música e o barulho continua. Os adolescentes
78
começam a descrever as características que vêem na pessoa, e a
perguntar o que é para fazer um para o outro. A música continua
rodando e o barulho e os comentários sobre o cantor continuam.
Muitos não fazem a atividade. A música termina.
Pesquisador: E daí pessoal conseguiram fazer? Quantos fizeram?
Duas meninas levatam as mãos!
Pesquisador: Vocês conseguiram ouvir a música?.. Porque tinha
muito barulho ou não?
Enquanto eu perguntava os adolescentes estavam copiando as
informações das colegas que disseram ter feito.
Pesquisador: Pessoal é para dizer para os outros o que vocês
percebem da música? É para todas as respostas serem iguais?
Várias respostas negativas.
Pesquisador: Então não façam isto!.. Agora esta música não vai ter
ninguém tocando, e vocês vão escrever o que ela lembra para vocês:
uma situação, uma cena ou um lugar, ok?
Novamente não obtenho resposta, tem muito barulho. Coloco a música para tocar. Os
barulhos diminuem significativamente. Pode-se ouvir vozes isoladas falando o que percebem
da música.
Pesquisador: Tá pessoal! Não vou mais falar, o que não se deve
fazer, porque vocês sabem ou não!?.. Bom agora a música também é
tocada, portanto não tem cantor. Então quem me disse antes que não
ouvia o cantor, agora eu respondo, ainda bem que não ouviu, porque
era uma música só instrumental como esta... Agora eu gostaria que
vocês escrevessem os sentimentos que ela vai despertando em vocês.
O que vocês estão sentindo ao ouvi-la!
Clark: Dor, professor!
Pesquisador: Escuta a música se você sentir isto põem no papel.
Coloco a música. O barulho é bem menor e se escutam poucas conversar entre eles.
Somente Clark ficava dizendo alto o que sentia com a música.
79
Pesquisador: Isto mesmo Clark, não escreva fique falando o que
sente da música!.. Agora pessoal, esta música vai ter outro ritmo.
Descrevam o que sentem ao ouvi-la, ok?
Não há muito barulho com a música, somente o Clark que fica tentando adivinhar de
que filme é a música, mas não acerta.
Pesquisador: Pessoal agora colocarei uma música em que há um
cantor. Quero que vocês tentem descrever a família do cantor.
Os adolescentes gostam muito mais dessa música. Somente Clark com os mesmo
comentários anteriores. Os adolescentes por várias vezes pedem para ele parar de falar e para
aumentar o volume da música. Logo depois os barulhos diminuem.
Pesquisador: Pessoal a próxima música, também é só tocada. E eu
quero que vocês descrevam algo acontecendo.
Clark continua tentando adivinhar de que filme é a música. Mas
depois desiste. E todos continuam em silêncio. Em seguida, os
adolescentes começam uma discussão e a professora demora algum
tempo para amenizá-la.
Pesquisador: Pessoal agora vocês farão a mesma coisa que na
primeira música. Vão descrever quem a canta.
Clark novamente tenta adivinhar de que filme é a música. Após um
breve momento de silêncio, iniciam-se as discussões sobre como seria
a cantora da música.
Pesquisador: Pessoal agora vocês vão abrir a folha e no lado de
dentro vocês vão escrever uma história. Ai na frente vocês tem vários
elementos de uma história. Vocês têm um personagem, tem uma
situação, tem sentimentos, tem outro personagem. Estão vocês só
precisam organizar estes elementos em história.
80
Os adolescentes pediram muitas explicações sobre como realizar a atividade. E
somente com muito incentivo alguns a realizaram. Estes textos estão transcritos no item
abaixo.
Depois deles terem realizado a atividade o aparelho de som ficou a disposição para
que escutassem as músicas que escolhessem. Como não haviam trazido suas músicas ficaram
por um tempo ouvindo os CDs que continham as músicas da atividade.
2.5.5.1 Transcrição dos Trabalhos Gráficos Produzidos:
Texto 1 escrito à tinta:
“Era uma vez um homem da cor preta, tinha 35 anos. Algum ano
depois, ele conheceu uma moça e ficou com ela. Tiveram uma filha. E
eles estavam muito felizes.
Mais tinha alguma coisa na cabeça que fazia eles sofrerem mais não
atrapalhava a vida. De nem a família que era muito feliz, no dia da
independência da América eles foram comemorar no baile. Dias
depois o filho mais velho se casou com uma moça muito bonita.
Eles passaram na frente do cemitério e olharam um barulho de zumbi
e ficaram com muito medo. E começaram a correr para fugir do
zumbi. Depois de alguns anos eles ficaram felizes para sempre”.
Texto 2 escrito a lápis:
“Um ladrão correndo da polícia. Ele corria por medo. Ele queria
fazer uma aventura no deserto e a polícia e cavalaria correndo atrás
dele.
81
Uma família passeando num parque eles com bastante alegria e um
baile dante com música lenta e vausa e um show da Retinunsom ela e
uma das melhores cantoras do Brasil e todo o mundo ela é morena
ela tinha olhos castanhos ela é alta e mora nos Estados Unidos, ela é
uma cantora que agora caiu ela estava sem fazer show no Brasil.”
Texto 3 escrito a lápis:
“O menino estava correndo apavorado pela cidade porque ele foi
salva a princesa que tava em cima de um palco é lá estava fazendo um
show.
Eles estão sentindo uma emoção.”
Neste texto (texto 4) a primeira parte foi escrita a lápis e a segunda à tinta:
“Era uma vez um homem branco, de cor branca. É alto que gostava
de cantar até que um dia apareceu alguém que o ajudou a entrar no
palco então ele começou a cantar musica românticas.
Esta história começa com trafico mortes choros e velas. Tudo
começou com a morte de um garoto de 08 anos quando a polícia
invadiu e gentes corriam e gentes sentiam ódio e raiva.”
Texto 5 escrito à tinta:
“Era uma vez, um rapaz que se chamava Lori, ele era o cantor de
música românticas e sempre estava alegre, mas ele começou a
roubar, e em um dos seus roubos ele se deu mal, teve que correr até
não querer mais.”
82
Texto 6 escrito a lápis:
“Uma mulher que cantava músicas românticas ela é branca alta e
magra. Atrás dela tem uma pessoa que ela não conhece e com isso ela
esta sentindo medo e alegria, mas logo depois ela encontra uma
família unida e feliz e isso a encoraja e lhe traz paz.
Essa família ao ver que ela se sentiu melhor a convidou para uma
festa que eles iam cantar e tocar, eles dançam e riem mas no final da
festa essa mulher tinha que ir embora e isso a deixou triste e a família
também.”
Texto 7 escrito à tinta:
“Eram uma vez um homem romântico, sentimental, viajou num sonho
muito bonito. Um lugar lindo cheio de árvores. Um mundo aparte que
cada pessoa imagina um lugar que tudo pode acontecer.
Mas o sonho não é feito só de coisas boas há muita confusão e
adrenalina.
Nesse sonho ele encontra uma mulher linda alguém companheira e
eles partem para uma aventura.”
Texto 8 escrito a lápis:
“Era uma mulher branca alta na base de uns 30 anos e magra
perdida em uma floresta tentando achar o rumo de sua casa de
repente no meio caminho. De repente no meio do caminho.”
83
Texto 9 escrito à tinta:
“Um homem vai a um lugar onde é tudo escuro e a atenção total e o
suspense ainda mais ele acha uma luz no fim ele acha a família dele
curtindo relaxando só na paz. Ele direto parte para uma aventura e
nessa aventura todo mundo se divertindo e a família toda cantando e
se divertindo no embalo da música depois ele liga o carro e sai com a
família todo atenta e todos no mesmo ritmo o filho do homem resolve
colocar uma música diferente então a família um pouco lenta e todos
no ritmo lento então uma diva da música coloca uma música legal e
toda a família curtindo. Fim da história.”
Texto 10 escrito à tinta:
“Era uma vez a polícia ai correr atrás dos ladrão e tinha muito
suspense e ação. Derrepente um cara de terror derrepente ele virou
um super homem não demorou muito ele trouxe uma mulher nos
braços e ele olhava para ela com um olhar de apaixonado olhar de
que queria dizer para ela que ama ela muito.
Ele a convidou ela a ir a apresentação dele. Ele é delegado e ele
tinham um segredo ele era o super homem ficaram juntos para
sempre tiveram filhos.
Derrepente uma mulher loira chegou nele falando que ama ele e ele
disse você está louco eu sou casado tenho filhos e sou muito feliz ele
mandou ela ir embora e nunca mais procurar ele que isso é loucura.
Fim.”
2.5.6 Sexto Encontro 02/08/2007
Neste dia quando cheguei a professora já estava organizando a sala. Os adolescentes
estavam muito mais calmos e pacíficos. Havia trazido argila para que eles trabalhassem, mas
84
também havia massa de modelar. Cada adolescente recebeu uma folha grande e deveria
trabalhar com a argila em cima deste papel. Houveram algumas resistências quanto a se sujar,
porém depois de esclarecimentos de que removeriam a argila com água este receio foi
amenizado. Foi passada a seguinte instrução.
Pesquisador: Eu gostaria que vocês, com a massa de modelar ou com
a argila, fizessem algum objeto que contasse uma história para vocês.
Algum objeto que lembre uma história para vocês. Pode ser um objeto
de família que vocês tem em casa ou outra coisa. Ok?
Foi necessário esclarecer muitas vezes o que deveria ser feito durante a atividade.
Muitos deles ficaram discutindo o que deveriam fazer. Mas os adolescentes a realizaram
individualmente e sem maiores conflitos.
No decorrer da atividade a adolescente que eu chamo de Shaiéra junto com Dhiana
vieram mostrar a todos um pênis que haviam confeccionado com argila (Ver figura 29). Pelo
tamanho e formas do pênis ele dava a impressão de estar ereto. Esta atitude me pareceu que
tivesse a intenção de ser algo agressivo. E realmente a professora reagiu como se o fosse. Os
demais adolescentes reagiram com espanto, sarcasmo e risos. Questionei as adolescentes se
este seria o trabalho que haviam feito e se queriam me contar a história sobre ele. Porém elas
não quiseram e logo o desmancharam utilizando a argila para confeccionar seus trabalhos.
Incluindo Dhiana que até aquele dia não havia feito atividade alguma.
85
Figura 12: “O Pênis”
Depois dos trabalhos terminados pedi que cada um contasse a história de seu desenho.
Mas havia tanto barulho que não consegui transcrever a maior parte dos relatos. Aqueles que
foram possíveis estão abaixo.
Pesquisador: E então o que você fez?
Clark: Um barco!
Figura 13: “O Barco”.
Pesquisador: E por que você escolheu fazer um barco?
Clark: Porque me lembra uma vez quando andei de barco e gostei.
Pesquisador: Hum! Que legal! E com você andou de barco?
Clark: Sozinho, eu as piazadas!
Pesquisador: Onde foi?
Clark: Aqui no Guaíba, né professor?
Pesquisador: Legal! Obrigado!
86
Pesquisador: Shaiéra me explica o teu agora?
Shaiéra: É a arca de Noé professor!
Figura 14: “Arca de Noé”.
Pesquisador: Que interessante! Então me explica as partes do deu
trabalho!
Shaiéra: Aqui é as pessoas se afogadas que caíram na água!
Pesquisador: E porque você escolheu fazer isto?
Shaiéra: Porque é a arca de Noé!
Pesquisador: Sim! Mas por que você escolheu fazer a Arca de Noé!
Shaiéra: Porque eu gosto da Arca de Noé!
Pesquisador: E o que você mais gosta nela?
Shaiéra: O Barco.
Pesquisador: Então você gosta de barco?
Shaiéra: Sim! Eu quero trabalhar nos barcos quando eu crescer!
Como chama mesmo aqueles milicos de barco.
Pesquisador: Marinha.
Shaiéra: É! Eu quero trabalhar na Marinha quando eu crescer.
Pesquisador: É, e por quê?
Shaiéra: Porque sim professor... Não quero mais falar.
Pesquisador: Ok! Obrigado!
...
Pesquisador: O que você fez ai?
Antony: Um boneco professor!
Figura 15: “O Boneco”.
87
Pesquisador: Legal! E o que ele representa para você?
Antony: É um garoto brincando com seus irmãos!
Pesquisador: O que isto te faz lembrar?
Antony: Minha mãe ela faz este Bisquiz!
Pesquisador: Legal! Se você fosse me contar uma história com estes
personagens qual seria?
Antony: Tipo quando saio com a minha mãe... Só isto!
Pesquisador: Ok! Obrigado!
...
Pesquisador: E daí Bob quer apresentar isto que você fez?
Bob: Nada professor!
Figura 16: “O Amor”.
Pesquisador: Mas não é nada?
Bob: Nada professor! Mas porque você escolheu fazer isto?
Bob: Ah! Sei lá professor!
Pesquisador: Me conta o que é isto, vai?
Bob: Eu não quero falar professor!
Pesquisador: Ah! Eu só queria saber o que é que você fez?
Bob: Ai é uma casa, um sol, escrito amor e uma panelinha.
Pesquisador: Legal! Olha quanta coisa e por que você fez isto?
Bob: A comida professor! Para fazer comida, a panela!
Os demais meninos começam a tirar saro dele ter feito uma panela e
ele não quis mais falar.
Pesquisador: E você quer me contar o que você fez?
Lisa: Ai eu não quero falar professor!
88
Figura 17: “O Portal”
Pesquisador: E você o que fez?
Margery: Uma paisagem, uma pracinha professor!
Figura 18: “A Pracinha”.
Pesquisador: Que legal! E o que isto te lembra?
Margery: Uma coisa boa.
Pesquisador: Esta pracinha te lembra alguma história, algum lugar
onde você ai quando era criança?
Margery: Quando eu era criança não, eu fui conhecer está pracinha
agora, aquela ali que nos vamos com o Agente Jovem.
Pesquisador: O que você faz lá?
Margery: Nos brinquedos!
Pesquisador: E que brinquedo você mais gosta de brincar?
Margery: Gangorra.
Pesquisador: E você fez ela ai?
Margery: Não professor isto eu não sei desenhar.
Pesquisador: E isto aqui o que é?
Margery: O diabinho né! Hehehe!
Pesquisador: Hum, e o que ele representa?
89
Margery: É assim... Eu não desenhei as crianças, né! Mas o diabinho
fica ali atentando as crianças.
Pesquisador: Hum, legal!
Shaiéra: Diabinha é ela professor!
Pesquisador: Eu estou falando agora com ela! Quando falei com você
ninguém se meteu.
Outros jovens começaram tirar sarro e a menina não quis mais
falar...
Pesquisador: E você o que fez?
Bruce: É minha casa professor.
Figura 19: “A casa”.
Pesquisador: Que ótimo!
Bruce: E é uma casa bonita.
Pesquisador: Sua casa é bonita, que legal e você gosta de morar lá?
Bruce: Gosto sim.
Shaiéra: Você mora em uma casa de barro?
...
Pesquisador: E o que você fez?
Dhiana: Um dado professor.
Figura 20: “O Dado”.
90
Pesquisador: Legal! E por que você fez um dado?
Dhiana: Porque o professor mandou a gente fazer qualquer coisa, daí
eu fiz um dado!
Pesquisador: Eu mandei fazer qualquer coisa?
Dhiana: Não mandou professor.
Pesquisador: Eu falei que era para você fazer algo que falasse sobre
você que contasse algo sobre a vida de vocês.
Dhiana: Então fiz um dado professor.
Pesquisador: Ótimo! E o que você quer dizer com ele?
Dhiana: É importante na minha vida professor! Porque eu jogo dado
professor. Jogo a dinheiro.
Pesquisador: E com quem você joga?
Dhiana: Com meu irmão.
Pesquisador: E qual é a idade dele?
Dhiana: 14.
Pesquisador: Ele te ensinou a jogar?
Dhiana: Ai chega de falar professor.
Pesquisador: Ok! Obrigado!
Havia mais um trabalho, mas as adolescentes que o confeccionaram não quiseram
falar.
Figura 21: “Agente Jovem”
Depois os adolescentes solicitaram que eu tirasse várias fotos deles, o que fiz. Em
seguida havia pensado em fazer uma avaliação dos nossos encontros, mas foi impossível
acalmar o grupo que acabou se dispersando e não concordou com a proposta da avaliação.
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Desta forma, somente eu falei, agradeci e me despedi dos adolescentes e combinei de deixar-
lhes um CD com as filmagens e fotos.
2.6 Analise do Processo:
Esta a experiência foi extremamente rica e singular. Além da grande quantidade de
dados, pude reforçar meu interesse pela pesquisa e pelo trabalho com grupos e adolescentes.
Considerei que por já ter trabalhado com um grupo de um programa similar poderia entender
suas motivações e sentimentos e proporcionar-lhes um espaço de aprendizagem proveitoso,
participativo e, principalmente instrutivo.
Ao analisar o processo grupal percebo que minha intervenção promoveu significativas
mudanças nestes adolescentes. Mudanças diferentes daquelas que imaginava que
aconteceriam, porém em minha interpretação mudanças positivas. Ou seja, as propostas que
utilizei considerando que gerariam discussões e construção de conhecimentos sobre
determinados assuntos, possibilitaram o “re-pensar” de outros temas e outras situações.
Por muitas vezes, me senti confrontado e agredido, nestes momentos procurei
proceder de maneira natural, tentando compreender o que estava se passando. Algumas vezes
fui bem sucedido nestas tentativas, em outras nem tanto.
Por mais que alguns dos adolescentes tenham dificultado o trabalho, recusando-se a
participar ou não concluindo atividades, vejo a ação destes jovens como um pedido de
socorro, que produz o desejo de ouvi-los e ajudá-los.
92
2.7 Análise das Oficinas:
2.7.1 Contar Histórias:
Contar histórias mostrou-se uma ferramenta útil para a educação em saúde. As estórias
foram utilizadas como meio de expressão, elaboração e de aprendizagem e, além do mais,
funcionaram como espaço de denúncias. Como se observa na estória confeccionada no
primeiro encontro.
Timoty: Todo dia de curso os (dizem os nomes dos próprios garotos
que compunham o grupo) vêm a pé lá da Santana e da Azenha (muitas
risadas dos colegas). E a professora diz que é pertinho. Pertinho pra ti
né professora! Tá loco, mais um pouco eu vou sumir. O cara vem de a
pé e não ganha passagem e quem mora bem pertinho ganha passage e
nós que moremos longe não ganhamos. A (nome de uma colega), que
mora longe, até vale ganhar passagem e a (outra colega) também que
mora longe, na Safira, e a (outra colega) também vale, porque ela
mora na Safira, também esses até vale ganhar passagem, mas o resto
não tem que ganhar nada tudo moram perto.
Os adolescentes usaram o espaço coletivo de contação de estórias como uma forma de
manifestar sua insatisfação e seu protesto. Uma maneira de apresentar uma resistência a um
modelo disciplinarizador, e questionar as verdades instituídas. Ou seja, a história foi um
instrumento que estes jovens usaram para demonstrar seu senso crítico e denunciar as
violências estruturais a que estão expostos.
93
2.7.2 A realidade nas Histórias:
Nas histórias contadas pelos adolescentes, eles evidenciaram aspectos da realidade
social em que vivem .Ao ler a história O Filho Drogado” confeccionada no primeiro
encontro, percebe-se facilidade e a familiaridade que estes jovens têm com as drogas, e
também o quanto estão cientes das conseqüências de seu uso.
Fred: “A história de um Menino Drogado”. A história começa com
um jovem estudante que morava com seus pais numa pobre vila
chamada Chocolatão. (Todos riem muito e fazem comentários, o
menino continua a ler e todos vão se acalmando) O garoto no outro
dia foi convidado para cheirar cola e fuma baseado. O menino pegou a
loló e o baseado foi cheirar e fumar escondido. Tal dia então pegou e
se viciou. Seus pais descobriram e mandaram internar, mas só que os
pais do menino não sabiam que o menino era judiado lá dentro da
clínica. Lá na escola ele era um menino inteligente e adorável pelos
professores. Os próprios amigos dele falavam que ele tem muita
determinação e vontade para vencer, mas só que ele não sabia que as
drogas iriam matar. Logo ele viu que começou a emagrecer e ficar
muito doente e parou no hospital. Logo depois que saiu do hospital ele
parou e pensou em parar com as drogas.
Roni: Parar de usar né? (outro integrante do grupo)
Fred: É parar de usar. Então ele voltou a morar com seus pais e
conseguiu largar as drogas e voltou a escola. Acabou.
Esta história é parecida com o filme “Bicho de Sete Cabeças”, os adolescentes a
adaptaram a sua realidade, demonstrando temor de que profissionais da saúde possam interná-
los e maltratá-los. Demoinstram medo das instituições que deveriam ajudá-los e o sentimento
de serem maltratados pela sociedade, quem sabe na própria escola e no programa social que
participam.
A história a seguir, também confeccionada no primeiro encontro, fala das dificuldades
da adolescência e do medo do futuro. Parece ser um apelo por ajuda, enunciado por alguém
94
que se encontra perdido, que se sente esmagado pelo mundo. O adolescente sabe que tem
pessoas que podem ajudá-lo e clama por elas. Também se percebe que o adolescente expressa
na história uma postura individualista, oriunda da sociedade competitiva na qual o vencedor
passa por cima de tudo e de todos para chegar lá (no futuro?).
Peter: Acordo de manhã, pego o meu ônibus e no ônibus observo
pessoas apressadas e atordoadas. O que será que elas procuram?
Procuram um futuro melhor. Esse futuro só é destinado para os que
acreditam nele, existem muitos obstáculos, existem pessoas que te
ajudam, existem também aquelas pessoas que não tão nem aí pra você.
Mas basta nós... basta nós... passar por cima deles e continuar
seguindo em frente.
No terceiro encontro é manifestada a crença de que a escola transforma pessoas em
seres humanos, de que quem não sabe ler ou não é inteligente ou é um ser de segunda
categoria. A história também demonstra que os adolescentes conhecem e confiam nos
métodos anticonceptivos para evitar a gravidez.
A história “O Menino Bilu” apresenta um cenário muito mais colorido e conta um
pouco dos interesses de seus autores. O ponto mais interessante é o agradecimento do autor no
final: - Muito obrigado por ter me escutado.” Este agradecimento demonstra como as
histórias são uma forma de expressão que pode fornecer alívio e um repensar de problemas
para os adolescentes. Talvez ele agradeça pelo espaço onde pode se expressar e mostrar suas
conquistas, mesmo vivendo em um mundo com tantas dificuldades ele busca força, diversão e
prazer em coisas simples.
A história “Nunca vi um Play 2?”, embora curta, apresenta um elemento contundente
de crítica social. Ou uma pergunta que pode ser traduzida da seguinte forma: Você nunca viu
95
um dos símbolos que representam a adolescência da classe média? Ou seja, mostra a dor em
não ter acesso a mercadorias divulgadas como necessidades absolutas para qualquer jovem.
Novamente na história “O menino que era magro e ficou gordo” é exposta a condição
social de vulnerabilidade destes adolescentes. O menino magro precisava de ajuda por ser
magro e uma das soluções era comer. Ou seja, para que ficasse saudável precisava comer.
Parece algo simples, mas fala das necessidades básicas não atendidas destes adolescentes. O
gordo e o magro representam a diferença social entre as pessoas de classe social mais humilde
e os mais abastados.
A história “A Casa Imobiliada” apresenta um material imagético que mostra a uma
adolescente lembrando-se do encontro como o namorado que resultou em um filho. O que
chama a atenção é o título da história a palavra imobiliada significando não mobiliada. Ou
seja, a menina tem o filho antes de mobiliar a casa, os filhos nascem sem planejamento, ou
ainda mesmo que planejado nem sempre a família pode proporcionar o conforto que
gostariam de proporcionar para estas crianças.
O sentimento de abandono de estar sozinho no mundo é mostrado na história “A
cidade Fantasma”. E na história “o RAP do bom” é uma tentativa de manter uma cultura
própria e resistir a uma cultura imposta socialmente.
Já a estória “Crianças nas Ruas” apresenta uma realidade dura de pessoas que estão ou
que se sentem desprovidas das condições básicas de subsistência, que tem dificuldade em
encontrar satisfação nos aspectos mais corriqueiros de suas vidas. Mas a história também
apresenta a esperança de mudança de vida, embora seja uma esperança que está no outro, que
vem de terceiros que, em atos de bondade, podem melhorar suas vidas. Ou seja, reproduz uma
concepção de assistência social pautadano assistencialismo. A menina apresenta desesperança
e descrença tanto nas instituições sociais quanto em si mesma. Novamente pode-se constatar o
medo de serem prejudicados por pessoas que teriam a função social de ajudar. E ainda quando
96
uma das personagens fica com medo pelo desaparecimento das crianças, isto representa os
perigos que o estar em situação de rua apresenta.
Questiona-se então que tipo de ajuda os órgãos de assistência social estão
promovendo, já que eles estão despertando tanto medo e receio nos usuários, que mesmo
sabendo que precisam ser ajudados - serem beneficiados pela ação de tais órgãos - o
sentimento de medo predomina. Existe o temor de serem enviados para lugares distantes e
maltratados. Sabemos da necessidade de considerar as diferenças sociais e o fato que por
vezes as pessoas não compreendem que algumas mudanças podem ser benéficas - que o
desconhecido que temem pode ser melhor para elas porém, ainda assim, podemos concluir
que este trabalho de mudança não pode ser baseado no medo e no assistencialismo.
No quinto encontro vários textos foram produzidos. No primeiro deles, novamente
aparece a constituição de uma família e o casamento formal. Como em outras histórias
aparecem elementos de filmes onde é explorada a cultura norte americana. A história
apresenta uma morte perseguidora da qual todos precisam fugir.
No segundo texto aparecem elementos já expressos, como um ladrão que corre da
polícia, não por temer ser preso, mas porque tem medo dela. Ou seja, novamente o medo das
instituições que deveriam proporcionar auxílio.
Outro menino escreveu uma história que inicia em: “Era uma vez um homem branco,
de cor branca”. Ele fala de uma categoria homem branco que pode abranger pessoas não
necessariamente com a cor da pele branca. Ou seja, pode falar de racismo ou de discriminação
que pode afetar pessoas que não descendem de etnias caucasianas, mas que se assumem como
brancos. Outro elemento que também aparece nesta estória é novamente uma demonstração
negativa com relação à polícia que, neste episódio, é responsável pela morte de uma criança,
gerando sentimentos como raiva e ódio.
97
Outro texto fala da facilidade de acesso que estes adolescentes tem para se envolver
em atos ilícitos e do entendimento que possuem de que estes atos podem ser responsáveis pela
destruição de suas vidas.
Um menino fala da importância da família e de sentimentos. Outro diz do sonho e
esperança; um terceiro conta de uma mulher perdida. Talvez nos dizendo dos sentimentos dos
adolescentes, que muitas vezes se sentem perdidos em um mundo que não conhecem, que tem
muitas coisas por acontecer, e eles não sabem quais são.
No trabalho a “Arca de Noé” do sexto encontro novamente apresentam o barco. A
figura do barco pode representar a transição, um metáfora do grupo que se constitui, um
abrigo, uma viagem que o adolescente está fazendo entre o ser criança e a vida de adulto. No
caso de Shaiéra o barco está cercado de pessoas mortas, cercado de perdas, de mortes
simbólicas. Um elemento que aparece na entrevista é que Shaiéra apresenta um sonho bem
estruturado.
2.7.3 Sexualidade:
A sexualidade não é expressa de forma clara em suas manifestações, mas sempre se
apresenta de forma velada. No momento em que Clark desenha um pênis no
microcomputador, manifesta a sexualidade como algo agressivo e confrontador que não pode
ser manifestada abertamente. De qualquer modo, Clark diz que o pênis não era um pênis
tratando o fato de tê-lo desenhado como um ato inadequado. Fato também reforçado pela
atitude da professora. (Repertórios do primeiro encontro)
98
Professora: O que é isto Clark?
Em tom de brincadeira o adolescente justifica:
Clark: Estava tentando desenhar o Mickey, professora. Só que está de
cabeça para baixo.
O interesse pelas relações sexuais é demonstrado novamente pelos jovens neste ponto.
Porém conversar abertamente sobre elas não é interessante, somente quando elas tem uma
conotação agressiva.
Barth: Beijo na boca eu gosto, é coisa do passado.
Todos começam a rir muito.
Pesquisador: Então continua...
Clark: Agora a onda é namorar pelado.
...
Pesquisador: Pessoal conversem comigo um pouco! Vocês não
gostaram da brincadeira novamente é isto?.. Me digam então do que
vocês gostam?
Dhiana: Namorar!.
Clark: Vuco-vuco e dança da vassoura!
Pesquisador: Mas então vamos falar sobre isto...
Começa uma algazarra e várias pessoas falam ao mesmo tempo.
Dhiana: Eu nem sei nada sobre isto.
Pesquisador: É bom conversar sobre um assunto! Porque sempre
aprendemos algo sobre ele, não é?
Peter: Ai professor! Vamos fazer isto ai. Deixa quem não quer!
...
Na história do terceiro encontro (transcrita abaixo) e construída coletivamente foi
possível perceber mais um dos dispositivos da sexualidade, ou seja, há um consenso entre os
jovens de que é necessário ser casado para ter filhos.
99
Peter: Um guri e uma menina estavam sentados no banco da praça. E
ele disse que amava ela.
Professora: Sim... Eles começaram a namorar e o namoro deles foi
bem emocionante!
Fred: Era uma paixão de adolescentes.
Homer: E eles evoluíram juntos.
Bob: E o crescimento de suas vidas.
Peter: Eu continuo professor... E eles mudaram de casa.
Professora: E está mudança provocou uma transformação no seu
relacionamento.
Fred: E daí eles se casaram.
Bob: E caiu com um ombro na árvore. Este é difícil professor?
Homer: E tiveram um bebê.
Timoty: E as pessoas gostaram muito das crianças.
Peter: Os alunos dela eram jovens... Assim! Ela era professora e os
alunos dela eram jovens e adultos.
Fred: Ela dava aula para jovens e adultos e fazia deles Seres
Humanos.
Homer: E os filhos da professora viram adolescentes.
Bob: Eles tinham casado?
...
Peter: Depois de um tempo a mulher dele decidiu ter uma gravidez.
Fred: E agora digo que ela não se preveniu?
Peter: Mas ela queria ter a gravidez.
...
Em uma das estórias em quadrinhos do quinto encontro, um novo elemento da
sexualidade aparece, o menino como um herói que precisa salvar a princesa indefesa,
reproduzindo elementos da cultura generificada onde a mulher, uma princesa, mas totalmente
passiva, necessita ser salva pelo homem, não possuindo controle de sua vida e necessitando
do homem para ser guiada e orientada.
Uma das histórias coloca a idéia da família como um caminho para salvação, uma luz
aparece no fim do túnel. No último texto, dois estereótipos sobre gênero são evidenciados, a
mulher que precisa ser conduzida e carregada nos braços de um homem e a mulher que tenta
destruir o casamento de sua rival.
No sexto encontro, entra em cena outra vez o pênis de argila indicando o tratamento
clandestino da sexualidade, na medida em que ele é confeccionado e imediatamente destruído.
100
Ele é apresentado como um pênis agressivo, um símbolo já utilizado no primeiro encontro
para mostrar que embora não se fale sobre a sexualidade, ela está ai, confrontando-os
freqüentemente.
O Barco confeccionado no sexto encontro, quando analisado de perto dá impressão de
serem duas pessoas uma em cima da outra sendo que a de cima encontra-se com o pênis ereto.
Neste mesmo encontro, no trabalho chamado “a pracinha” há a figura de um diabinho que
tenta as crianças, uma representação da sexualidade que fica assombrando as crianças
transformando elas em adultos, fazendo-as contrariar tudo que lhe foi ensinado.
2.7.4 Como os adolescentes se percebem?
Os jovens desqualificaram o autodesempenho em atividades que
envolviam.produções abstratas, categorizações e trabalho intelectual Esse fato pode dever-se
ao desprezo secular das elites brasileiras pelos trabalhos manuais atribuídos aos escravos e,
depois da abolição, as camadas populares. O trabalho intelectual sempre foi considerado mais
complexo e permaneceu restrito à classe dominante. Assim, pela ideologia que é transmitida
às camadas populares, elas não têm capacidade e competência para as atividades abstratas. O
êxito destas medidas fica evidente na resposta destes jovens, que se declaram burros e
incapazes.
Possivelmente a resistência a este tipo de trabalho se deve ao medo de não ter
sucesso, de não conseguirem atingir os objetivos esperados, de que realmente sua
autopercepção de si mesmo, manifestada várias vezes, pudesse ser confirmada. Seguindo este
raciocínio o “jogar bola e assistir oficinas” era mais atrativo por ser uma atividade conhecida,
onde o medo de errar ficava amenizado.
101
Os adolescentes modificavam intencionalmente o tom de voz ao responder a
determinadas situações. Expressavam posturas mais agressivas em momentos que suas
habilidades não eram solicitadas, mas quando respondiam às perguntas do pesquisador
falavam muito baixo, de modo quase inaudível.
Pesquisador: Do que fala a história?
Welma: (Fala algo inaudível)
Pesquisador: Âh? (Como?)
Shaiéra: Nada.
Mostravam medo de errar, mesmo quando lhe era esclarecido não haver uma resposta
certa ou uma errada. Inúmeras vezes pediam confirmação do modo que uma atividade deveria
ser realizada. Por outro lado, não prestavam atenção nas explicações das atividades, talvez
porque se não ouvissem a explicação teriam motivo para a solicitarem novamente e desta
forma não se sentirem menos inteligentes. Pode-se observar isto nos seguintes repertórios do
terceiro encontro:
Dhiana: Eu também não entendi nada!
...
Dhiana: Ihh! Isto é muito complicado, nós não vamos conseguir
fazer.
...
Dhiana: Ai professor vamos parar com isto, que é muito difícil esta
brincadeira.
...
Shaiéra: É abacaxi sua anta, eu te fiz sinal.
...
Dhiana: Ai que chato professor!
...
Dhiana: Eu disse professor que aqui eram tudo burro.
Clark: Cala a boca guria! Que a mais burra é você.
102
...
Dhiana: Diz outra palavra burro.
...
Dhiana: Ela não sabe ler professor.
...
Clark: Era uma vez uma brincadeira bem chata... Vai você meu!
...
Timoty: Ai professor eu não sei!!!
...
Timoty: Agora não sei mais fazer professor. Ficou difícil.
...
Dhiana: Não pode fazer uma dupla de quatro, anta!
...
John: Cala boca guria!
Dhiana: Esperto? Aqui são tudo uns burros.
John: Cala boca guria que mais burra que você não tem!
...
Clark: Huuu! È uma burra mesmo!
...
A adolescente Dhiana durante os encontros demonstrava uma atitude transgressora,
fazia comentários para atrair a atenção dos colegas, porém nos momentos em que era
solicitada, não aceitava o convite.
Pesquisador: Alguém quer ler a história ou vocês preferem que eu a
leia? Eu acho que é a forma mais rápida de todos a conhecerem.
Alguém quer ler?
Dhiana: Eu acho que é melhor o senhor ler.
Em vários encontros, e que eram burros. Eles também negaram a possibilidade de ler
em voz alta, articulada pela professora, em que todos teriam que ler (repertório do primeiro
encontro).
103
Professora: GENTE! PARA ALGUÉM LER AS OUTRAS TEM
QUE OUVIR!!! ENTÃO NOS VAMOS OUVIR O FÁBIO, OU NÓS
VAMOS FAZER UMA LEITURA SELETIVA, CADA UM VAI
LER UM POUCO.
Shaiéra: Não professora!
Clark: Tem gente aqui que nem sabe ler!
...
Dhiana: Ai é Psicóligo, oh burro!
...
Outra situação que acontece várias vezes foi desrespeitar os outros e amedrontá-los
para que não participassem, bem como desvalorizar suas respostas.
Eles diziam sentir dificuldades para realizar trabalhos individualmente. Uma das
histórias, por exemplo, foi iniciada pelo adolescente, porém ele copiou o final de um jornal.
Embora a história estivesse boa, o menino não pode continuá-la. Desta maneira evitou errar e
o julgamento dos demais que poderiam lhe dizer que ele ou a sua história não eram bons o
suficiente.
2.7.5 O meio:
Muitas vezes percebemos que as atitudes dos adolescentes poderiam ser uma resposta
ao meio e a forma com que são tratados. A professora do programa usava um tom agressivo e
uma modulação de voz alta para falar com os adolescentes, e eles reproduziam este
comportamento. Alem disso a professora não respeitava o tempo e a individualidade de cada
um. Mostrava mais interesse no resultado da tarefa do que no aprendizado alcançado com a
execução.
104
Outra compreensão que os adolescentes têm e que pode ser resultado das suas
interações na escola é o fato de acreditarem que as atividades para serem válidas devem ser
entregues, como se estivessem sendo avaliados e se não as entregassem não receberiam suas
notas.
Outro aspecto presente em outras histórias é a importância da escola, o fato que todos
devem estar lá. A escola como uma segunda casa, todas as crianças devem estar na história.
Porém em nenhum momento eles manifestam gostar desta escola, ou a importância de
freqüentá-la porque é importante aprender. Reproduzem verdades coletivas, embora não
parecem acreditar nestas verdades ou se sentirem sensibilizados por elas. Manifestam uma
atitude de que tem que fazer porque é preciso, mas quando puderem deixarão de fazer.
2.7.6 Avaliação:
No quinto encontro, embora não tivesse sido o último, foi possível realizar uma
avaliação das atividades com o grupo. Durante os outros encontros várias vezes os
adolescentes realizaram avaliações negativas das atividades. Esse fato foi contraditório, pois
no momento da avaliação formal, as opiniões foram diferentes. A maioria das avaliações
negativas foram emitidas pela adolescente Dhiana, sendo que imediatamente antes da
avaliação formal disse: “Dhiana: Ai que chato isto professor!
Porém após algumas avaliações positivas dos colegas. Dhiana emite outra opinião
responsabilizando o grupo pelo não sucesso, a seu ver, das atividades: “Dhiana: Não é isto
professor é que aqui só todos burros mesmo!”
Considero duas explicações para a contradição de Dhiana e do grupo. A primeira vem
do fato que avaliar negativamente a atividade serviria como justificativa para um esperado
105
insucesso por parte dos adolescentes. Ou seja, quando existe outro fator que justifique o não
realizar bem algo, a responsabilidade é deslocada do sujeito. Outra razão provém da possível
intimidação que uma avaliação formal pode causar. Pois para estes jovens parece muito mais
fácil emitir opiniões de forma descompromissada do que assumir seus pensamentos e
enfrentar as conseqüências deles. Ou seja, uma avaliação negativa pode ter gerado nos jovens
um medo de retaliação de tal atitude, talvez em consonância com outras experiências já
vividas pelos adolescentes.
O mais importante é que a resistência apresentada pelos adolescentes sempre se
apresenta de forma velada, através de avaliações curtas e descontextualizadas ou ainda através
de suas histórias e trabalhos. E isto não acontece somente por falta de espaços instituídos para
emitir opinião. Mas por outros fatores, dentre os quais podem estar o medo da punição e o
medo da retaliação.
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