Download PDF
ads:
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
1
EDUARDO MODENESE FILHO
ENTRE LINHAS E CURVAS:
A TEORIA E A PRÁTICA NA OBRA DE ZENON LOTUFO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA À
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DA
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, PARA OBTENÇÃO
DO TÍTULO DE MESTRE EM ARQUITETURA E URBANISMO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: PROJETO DE ARQUITETURA
ORIENTADOR: LÚCIO GOMES MACHADO
SÃO PAULO, 2008
ads:
2
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE
ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
E-MAIL: modenesefilho@uol.com.br
Modenese Filho, Eduardo
M689e Entre linhas e curvas: a teoria e a prática na obra de Zenon
Lotufo / Eduardo Modenese Filho. –São Paulo, 2008.
199 p : il.
Dissertação (Mestrado – Área de Concentração: Projeto de
Arquitetura) - FAUUSP.
Orientador: Lúcio Gomes Machado
1. Arquitetura moderna - Brasil 2. Arquitetura - Teoria 3. Lotufo,
Zenon I.Título
CDU 72.036(81)
1
À meus pais, que me ensinaram
a traçar retas e curvas.
2
Agradeço ao meu orientador Lúcio Gomes Machado,
por indicar alguns caminhos.
Aos professores que participaram da minha banca de qualificação:
Fernanda Fernandes e Miguel A. Buzzar, pelos comentários construtivos.
E também, aos professores Luis Antonio Jorge, Hugo Segawa, Carlos
Lemos, Jon Maitejean, Walter Maffei, Eugênio H. Monteferrante pelas
entrevistas e palavras de apoio.
À família de Zenon Lotufo, em especial Dona Coraly, Vitor, Cristina e
Tomaz, pela credibilidade depositada.
Aos meus familiares e amigos, pela confiança e incentivo.
À Prefeitura Municipal de Botucatu, pela documentação fornecida.
Às funcionárias da Biblioteca da FAUUSP e EPUSP, pela atenção
dispensada.
À Flávia Carmoni, pelo carinho e presença.
3
Resumo:
O foco deste trabalho é a relação entre teoria e prática na trajetória
profissional do arquiteto paulista Zenon Lotufo (1911-1985) destacando
fatos marcantes que pontuaram um quadro evolutivo pessoal inserido em
determinado contexto histórico. Período este onde a arquitetura
moderna brasileira despontou e se consolidou. Fatos como sua formação
acadêmica no curso de Engenheiro-Arquiteto na Escola Politécnica de São
Paulo (33-36) e a influência didática de Luis Anhaia Mello dão origem a
esse itinerário. Os contatos com a chamada “escola carioca” através de
trabalhos realizados com Abelardo de Souza e Hélio Duarte (46-48) e com
Oscar Niemeyer no projeto para o Parque do Ibirapuera (51-54)
complementam seu repertório moderno. Por sua vez, sua experiência
como professor da então recém fundada Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo (48) culmina com o polêmico Concurso de Cátedra (57). E
finalmente, este percurso se encerra numa fase de produção madura (58-
77), apoiada nas características do chamado “brutalismo paulista”.
4
Abstract:
The focus of this work is the relationship between theory and practice in
the professional career of the architect Zenon Lotufo (1911-1985)
pointing out remarkable facts that determined a personal evolving picture
in a certain historical context. A period when the Brazilian modern
architecture began to appear and consolidated . Facts as his academic
formation in the Engineer-Architect course at the Escola Politécnica de
São Paulo (33-36) and the influence of Professor Luis Anhaia Mello give
origin to this itinerary. The contacts with Abelardo de Souza and Hélio
Duarte (46-48) and with Oscar Niemeyer in the project of the Ibirapuera
Park (51-54) complement his modern repertory. His experience as a
professor at the new founded Faculty of Archictecture and Urbanism (48)
culminates with the polemic Chair Exam (57). And finally this route closes
down in a mature production phase (58-77), based on the characteristics
of the so called “paulista brutalism".
5
Sumário
Introdução........................................................................................... 6
Capítulo 1 – Anos de formação (31-46) ................................................19
Capítulo 2 – Afirmação moderna e escola carioca (46-58) .................... 61
Capítulo 3 – Brutalismo e maturidade (58-85) ................................... 126
Conclusão ......................................................................................... 161
Apêndices ......................................................................................... 165
Bibliografia ....................................................................................... 193
6
Introdução
“Caminante no hay camino,
se hace camino al andar...”.
1
Esta dissertação de mestrado trata da revisão crítica da obra do
engenheiro-arquiteto paulista Zenon Lotufo (1911-1985) sob o ponto de
vista da interlocução entre teoria e prática em sua atividade profissional,
dentro de um quadro de questões pertinentes à sua época e à disciplina
arquitetônica.
Isto é, versa e refletem sobre os aspectos da relação entre sua formação
acadêmica, bem como sua experiência didática como professor, e o
exercício do projeto arquitetônico dentro de um contexto histórico e
cultural.
Assim, o objetivo principal deste trabalho não foi analisar os projetos
encontrados do arquiteto Zenon Lotufo, mas sim introduzí-los dentro de
um panorama (contexto espaço-temporal) em que ocorreram. E também
no que diz respeito às questões específicas do conjunto de idéias e
1
Trecho extraído do poema Cantares de Antonio Machado (1875-1939), poeta
espanhol.
7
conceitos defendidos pelo arquiteto e suas aplicações, entendendo-os
como se apresentaram nas diferentes fases de sua atuação.
Para isto, adotamos alguns períodos temáticos capazes de identificar
algumas relações dentro da sua trajetória (que serão justificados a partir
do capítulo 1) que basicamente foram subdivididos em: Anos de formação
(31-46), Escola carioca e afirmação moderna (46-58) e Brutalismo e
maturidade (58-85).
Buscamos ainda em primeiro plano, trazer à tona o reconhecimento
acadêmico da produção de um importante nome da arquitetura moderna
brasileira que juntamente com Osvaldo Bratke, Vilanova Artigas, Rino Levi
e Oscar Niemeyer, entre outros, difundiram os novos padrões estéticos
em meados dos anos 30 e 40. E que, no entanto, apesar de ter realizado
inúmeros trabalhos e ter tido uma dedicação didática intensa, a
comunidade e a historiografia arquitetônica brasileira deram pouco valor
à sua contribuição profissional.
Em resumo, buscamos resgatar o legado de idéias e projetos deixados por
Zenon, entendidos também como sentido de uma trajetória pessoal, fruto
de escolhas e acasos que ora marcam seqüências, a “linha reta” do
engenheiro (construtor), e também as mudanças, a “linha curva” do
arquiteto (artista) na vida do paulista, visando reconstituir suas origens e
permanência nos dias atuais.
Suas principais reflexões sobre a disciplina arquitetônica, bem como sua
produção, são o resultado dessa trajetória particular marcada por
personalidades e contatos, encontros e obstáculos, desvios e
concordâncias, mas em que sempre preponderaram simplicidade,
equilíbrio e caráter profissional, como veremos.
Entre linhas e curvas
A escolha do tulo deste trabalho deriva das influências que cercaram a
carreira profissional de Zenon Lotufo, onde procuramos imaginar que as
linhas retas seriam a racionalidade técnica e construtiva, herdadas da
Escola Politécnica de São Paulo, que teriam originado o termo “escola
paulista”, e as linhas curvas simbolizariam a plástica formal e livre da
“escola carioca”, herdadas principalmente pelo contato com Oscar
Niemeyer e Abelardo de Souza, entre outros, com quem Zenon trabalhou.
Zenon Lotufo também foi grande admirador das idéias e do trabalho de Le
Corbusier, fato comprovado em seus textos, e também, pela influência de
Oscar Niemeyer, na rica experiência do projeto para o parque Ibirapuera.
De tal modo que podemos observar em algumas obras que Zenon Lotufo
procurou conciliar o uso de linhas retas (marca da racionalidade
corbusiana) com linhas curvas (herança do contato com a escola carioca)
em suas composições volumétricas.
8
Le Corbusier dizia que a linha reta é a linha da vida na cidade moderna,
uma resposta precisa a uma demanda, um ato voluntário e consciente, é a
linha do homem; em contraposição, o caminho em curvas seria arbitrário,
fruto do acaso e do descuido instintivo, para ele, a linha do asno. Em
função da economia, uma obra moderna exigiria o emprego da reta; para
Corbusier, a reta era a grande aquisição da arquitetura moderna.
Por sua vez, Oscar Niemeyer diz que: ”Não é o ângulo reto que me atrai,
nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a
curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país,
no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher
preferida. De curvas é feito todo o universo, o universo curvo de Einstein.”
2
A questão da crítica
A noção de revisão crítica refere-se à capacidade de se perceber e julgar
determinado assunto ou tema, de posse dos conhecimentos necessários.
Trata-se de certa maneira de pensar e agir na relação com o que existe, o
que se sabe e o que se faz numa determinada cultura e sociedade,
constituindo-se, portanto, um instrumento para se alcançar uma verdade
ou uma virtude.
2
Underwood, David. “Oscar Niemeyer e o modernismo de formas livres no
Brasil”. Cosac & Naify, São Paulo, 2002, p. 142.
Assim, criticar é fazer juízo através do ato psicológico de se contrapor,
baseando-se num conhecimento prévio, tornando-se trabalho intelectual
que visa explicitar um pensamento e encontrar novos consentimentos.
“Para se criticar algo, é necessário conhecer a matéria em análise,
fazendo-se juízo acerca de seu valor enquanto objeto intelectual,
sem pré-conceitos ou pré-juízos, questionando o que são as coisas,
os fatos e as idéias. Trata-se de uma atitude fundamental no
processo de constituição do pensamento humano, pois nos
permite distinguir o verdadeiro do falso, o real do imaginário e o
certo do verossímil.”
3
No entanto, procuramos ao longo deste trabalho justapor as principais
realizações do arquiteto Zenon Lotufo seja teórico ou práticas, de modo a
construir um quadro comparativo-cronológico que possibilite um
aprofundamento crítico de sua obra.
3
FOUCALT, Michel. O que é a crítica? (Qu'est-ce que la critique?)Bulletin de la
Société française de philosophie, Vol. 82, nº 2, pp. 35 - 63, avr/juin 1990
(Conferência proferida em 27 de maio de 1978). Tradução de Gabriela Lafetá
Borges e revisão de Wanderson Flor do Nascimento.
<http://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault/critique.html>
9
Sobre as noções de teoria e prática
Investigar a correspondência e coerência entre as idéias (valores) e
realizações (ações) do arquiteto Zenon Lotufo remete-nos também a uma
pequena especulação sobre as noções de teoria e prática.
Entendemos neste trabalho, teoria como sistema organizado de idéias e
conceitos que procuram explicar fenômenos podendo ser provados por
meio de experiências reprodutíveis, ou seja, práticas. A teoria justifica o
fato, mas não é o fato em si, é sim construída a partir da ocorrência deste
fato.
Quanto à prática, como dissemos, é a justificativa real e concreta para a
teoria. Assim, a teoria só é considerada como tal se foi comprovada pela
prática. Ou seja, não existe teoria sem prática.
Em outras palavras, podemos também dizer que a teoria trata da reflexão
(pensar) a partir da ação (agir). Conseqüentemente, a prática corresponde
ao agir, a partir do pensar.
Em se tratando da disciplina arquitetônica podemos imaginar a partir
disso algumas questões no sentido de explorar a relação entre teoria e
prática na trajetória profissional de Zenon Lotufo. Por exemplo, qual a
proximidade entre os valores teóricos da arquitetura e os procedimentos
reais que produzem sua obra? Sua prática arquitetônica é determinada
pelos valores teóricos ou acadêmicos, ou pelas regras do cliente e do
mercado? Qual o espaço para experimentação original e legítima do
arquiteto? E da cópia e imitação?
Talvez estes domínios estejam todos interligados em um emaranhado
difuso e seja difícil de medir com precisão o quanto um acaba
determinando e interferindo no outro. No entanto, procuramos abordá-
los de modo integrado como partes constituintes de um todo maior: o
percurso profissional de Zenon Lotufo.
O intuito de polarizar os conceitos “teoria” e “prática” dentro de uma
visão crítica da trajetória do arquiteto visa relacionar ambos, de modo
que a teoria torna-se a reflexão que se faz sobre a ação (prática) do
projeto de arquitetura, e vice-versa, num processo que se retroalimenta
continuamente.
Revisão permanente
Sabemos que os protagonistas do movimento moderno na arquitetura
brasileira costumam concentrar-se usualmente em torno de nomes como
Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Vilanova Artigas, Lina Bo Bardi e mais alguns
outros poucos.
No entanto, é fundamental revermos o peso e a contribuição de cada um
deles para a historiografia periodicamente, de modo a trazer à tona certos
vazios deixados para trás, ou ainda se preferirmos, personagens
esquecidos ao longo destes percursos.
10
Sem dúvida, o engenheiro-arquiteto Zenon Lotufo se encaixaria num
desses casos, onde os registros historiográficos acabaram passando sem
reconhecer seu devido valor e relevância para a cultura arquitetônica
paulista ou se preferirmos até, nacional.
Proximidade do objeto
A escolha do tema se deu num inesperado (e feliz) encontro com o nome
de Zenon Lotufo no livro Arquitetos da Poli, de Silvia Ficher, onde a autora
registrou (em forma de fichários) os formados pelo curso de Engenheiro-
Arquiteto da Escola Politécnica de São Paulo.
Uma vez também que este pesquisador é da mesma cidade de Zenon
Lotufo, o município paulista Botucatu, que aparecia como local de
nascimento e também falecimento na ficha do livro. Meu espanto e
orgulho foram confirmar que um importante arquiteto moderno
pertenceu a minha terra natal e que havia participado decisivamente em
alguns dos principais episódios da arquitetura paulista do século XX.
A facilidade e proximidade de contato com a família Lotufo (que mantêm
ainda hoje propriedade nos limites da área rural e urbana e onde vivem
ainda hoje Dona Coraly, esposa de Zenon, aos 88 anos de idade)
possibilitou o acesso às informações e documentos, como fotos, escritos,
publicações de época, além de uma série de depoimentos, que foram
determinantes para o desenvolvimento deste trabalho.
Apesar desta proximidade, houve grande dificuldade em encontrar os
arquivos originais do arquiteto como desenhos, plantas, mapas, croquis,
uma vez que, segundo Coraly, Zenon não tinha o hábito de preservá-los.
Ele jogava tudo fora, como quem diz: isto daqui é passado, não
tem importância, vamos em frente”.
4
Mesmo assim, localizamos uma quantidade considerável de projetos
(mais de sessenta) publicados principalmente nas revistas Acrópole,
Módulo e Habitat. Outro fato que chamou nossa atenção foi a diversidade
de programas enfrentados pelo arquiteto, indo desde residências a plano
diretores, passando por igrejas, edifícios escolares, administrativos,
institucionais, clubes recreativos, entre outros.
E também destacamos que a maior parte dos projetos foi realizada para o
cliente público como prefeituras municipais, órgãos federais e estaduais,
além de vários concursos nacionais que Zenon venceu fato que também
traduz o significado e a relevância de sua obra.
A trajetória de um arquiteto e a construção de sua história
Importante lembrar que a história não se faz sem historiador, e
conseqüentemente, é ele quem preenche as lacunas e os vazios entre os
documentos. Portanto, as interpretações encontradas ao longo deste
4
Depoimento de Coraly Lotufo em Botucatu, 25 de setembro de 2006.
11
trabalho (falhas ou incompletas, e mesmo superficiais) fazem parte de
uma visão pessoal de conjunto cuja responsabilidade pertence a nós.
Sigfried Giedion em Espaço, Tempo e Arquitetura afirma que o historiador
deve manter uma proximidade íntima com as questões de sua época,
somente assim, seria capaz de encontrar heranças esquecidas do passado.
A história não é um simples repositório de fatos imutáveis, mas
um processo, um conjunto de posturas e interpretações vivas e mutáveis.
Voltar-se para uma época passada não significa apenas examiná-la e
encontrar um padrão para todos que a visitam. O olhar retrospectivo
transforma seu objeto. Referências absolutas não existem para o
historiador. A história não pode ser tocada sem que seja modificada”.
5
No conhecido texto Sobre o conceito de história
6
de Walter Benjamin, o
autor afirmou que “articular historicamente o passado, não significa
conhecê-lo como ele foi. Significa apropriar-se de uma reminiscência tal
como ela relampeja no momento de perigo. Este perigo ameaça tanto a
tradição como os que a recebem”.
Segundo Benjamin, em cada época, é preciso arrancar a tradição do
conformismo que quer apoderar-se dela. Apenas quem tem o dom para
5
Giedion, S. Espaço, tempo e arquitetura.(original - 1941) Martins Fontes, São
Paulo, 2004, pgs. 32-33.
6
Walter Benjamin -– Obras escolhidas. Vol. 1. Magia e técnica,
arte e política. Ensaios sobre literatura e história da cultura. Prefácio de Jeanne
Marie Gagnebin. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 222-232.
despertar os lampejos de esperança do passado é a figura do historiador,
convencido de que também os mortos não estarão em segurança se o
conformismo vencer.
Porém, repetidamente, o historiador acaba estabelecendo uma relação
de empatia com os vencedores. E por sua vez, a empatia com os
vencedores beneficia sempre os dominadores, que são herdeiros dos que
venceram antes.
Portanto, para Benjamin, a tarefa do historiador deve traduzir-se em luta
contra as convenções, na busca de outra leitura do passado que
contemple a procura pelos não-ditos e excluídos. Trata-se de um ataque
frontal às concepções lineares e conformistas da história, dessa noção
positivista do progresso e da historiografia dos acontecimentos.
Benjamin acreditava que o historiador é capaz de identificar no passado
os germes de outra história, capaz de levar em consideração os
sofrimentos acumulados e dar nova face às esperanças frustradas.
Assim, deve-se construir uma experiência com o passado e não fixá-lo
como um conhecimento objetivo. Eis a arte da narração.
Para o filosófo, a história não seria algo estático, mas sim dinâmico, onde
era preciso revê-la e reavaliá-la para não deixá-la nas mãos do
conformismo. Desta forma, nos parece mais uma vez justificado aqui a
pesquisa em torno da trajetória profissional de Zenon Lotufo.
12
Arquitetura moderna
Outra questão importante é a construção de uma nova história que
permita identificar a riqueza, complexidade, limites e contradições da
arquitetura moderna, uma vez que esta tornou-se (segundo alguns
autores e teóricos) uma das principais vilãs, responsável pela decadência
da cidade contemporânea.
Se há algum sentido em pensar atualmente na permanência do
movimento moderno hoje, este estaria numa visão e atitude frente ao
mundo (como por exemplo, Le Corbusier que buscava desenvolver uma
arquitetura do seu tempo, capaz de possibilitar um retorno à natureza e
ao mesmo tempo, emocionar as futuras gerações), e não apenas à
reprodução de um repertório formal.
Por sua vez, Hélio Piñon discute em seu livro Teoria do Projeto
7
que o
modo de conceber (projetar) dos modernos era distinto do classicismo
acadêmico no sentido do enfoque aos problemas construtivos, ou seja,
muito mais apoiado no aspecto científico do que no mimético ou
tipológico. Assim, o arquiteto registrava o progresso e a arquitetura era
testemunho sico da história.
Para Piñon, não se pode apenas reduzir o modernismo em arquitetura a
um conjunto de características formais e plásticas ou preceitos morais e
ideológicos. Deve-se reconhecê-lo principalmente como modo de
7
Piñon, Hélio. Teoria do projeto. Livraria do Arquiteto, Porto Alegre, 2006.
enfrentar e resolver o problema de sua construção enquanto síntese
entre função, ordem, clareza e economia. Isto parece-nos a grande
herança moderna, corretamente aplicada e deixada por arquitetos como
Zenon Lotufo, e talvez ainda hoje, o modo mais eficaz de se enfrentar o
projeto arquitetônico.
Estrutura e conteúdo dos capítulos
O trabalho teve como propósito organizar os principais projetos
realizados pelo engenheiro-arquiteto Zenon Lotufo, de modo a
sistematizá-los em três fases de características distintas: Fase 1 – Anos de
formação (31-46), Fase 2 – Escola carioca e afirmação moderna (46-57) e
Fase 3 – Maturidade e brutalismo (58-85).
A primeira fase que convencionamos de “Anos de formação” de 1931 a
1946, esteve marcada principalmente por: sua formação universitária no
curso de engenheiro-arquiteto na Escola Politécnica da Universidade de
São Paulo (33-36) envolvendo o contato com excelentes professores
como Luis Ignácio de Anhaia Mello, sendo seu assistente por duas
ocasiões (38 e 47); os primeiros trabalhos com o colega Afonso Iervolino
como o Paço Municipal de Taquaritinga (37) e o Mercado Municipal de
Sorocaba (37-38); a experiência na administração pública de Santos como
Diretor da secretaria de Obras (39-45) e finalmente, prefeito da Estância
de Campos do Jordão em 46.
13
Quanto às características formais e técnicas arquitetônicas,
predominaram neste período o início das composições mais limpas, com
controle dos ornamentos nas fachadas, volumes mais puros e uso ainda
tímido do concreto armado nas estruturas.
A segunda fase, “Escola carioca e afirmação moderna” de 1946 a 1957,
ficou definida basicamente pela parceria com Abelardo de Souza e Hélio
Duarte (46-49), representantes diretos da Escola Nacional de Belas Artes
do Rio de Janeiro, ambos formados na época da reforma curricular de
Lúcio Costa; experiência com Oscar Niemeyer na realização dos pavilhões
de exposição do Parque do Ibirapuera por ocasião do IV Centenário da
cidade de São Paulo (51-55); e pelo ensino didático como professor
catedrático do curso Composição de Arquitetura, na Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo (FAUUSP), recém inaugurada, passagem
conturbada (49-57) que terminou de modo desastroso com a reprovação
no polêmico Concurso de Cátedra.
Nesta ocasião, escreveu o ensaio “O espaço psicológico na Arquitetura”,
premiado pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura, onde
descreve a importância dos aspectos psicológicos na organização do
espaço arquitetônico.
A arquitetura praticada nesta fase apropriou-se da linguagem mais livre e
sensual da escola carioca, com o predomínio de linhas mais curvas,
abóbadas e marquises de concreto armado, uso dos pilotis, continuidade
espacial garantida pela transparência dos grandes panos de vidro,
modulação racional das estruturas e dos vãos, entre outros elementos
que fortaleceram a afirmação da arquitetura moderna brasileira.
É a fase de maior volume de trabalho para Zenon Lotufo, com mais de 40
projetos publicados em periódicos incluindo internacionais como a revista
americana Archicteture Review.
Sua última fase, “Maturidade e brutalismo” de 1958 a 1985, marcou-se
pela parceria com Ubirajara Ribeiro (58-65), e em seguida com seu filho
Vitor Amaral Lotufo (67-73), tendo vencido vários concursos nacionais
importantes e realizado grandes projetos institucionais e públicos, como
mostraremos a diante.
Entre as características que definiam as concepções formais e
arquitetônicas estavam: o uso do concerto armado aparente, soluções
volumétricas mais simples, esquema estrutural legível nas elevações,
ausência de acabamentos e revestimentos mostrando o aspecto autêntico
dos materiais de construção.
Em termos didáticos, Zenon ausentou-se da academia por quase 10 anos
em virtude da frustração com a FAUUSP, pela anulação do Concurso de
Cátedra em 1957, retornando à Escola Politécnica apenas em 66.
Nesta ocasião, apresentou o ensaio “Arte ou artifício” onde descreve
sucintamente a relação entre forma e estrutura ao longo da história da
arquitetura ocidental, desde a Grécia Antiga até o movimento moderno.
14
Em 80, aposentou-se como auxiliar de ensino na FAUUSP, retornando à
sua cidade natal Botucatu, onde comprou um sítio para passar os últimos
anos ao lado de sua família.
Breve biografia
Zenon Lotufo nasceu na cidade de Botucatu, interior do Estado de São
Paulo, em 27 de dezembro de 1911. Filho de imigrantes italianos, sua
educação foi marcada pela religião presbiteriana, mas sempre esteve
vinculada a ensinamentos artísticos e culturais (música, línguas,
literatura).
Seu pai, Reverendo Francisco Lotufo (1865-1946), era pastor protestante
que havia realizado seus estudos preparatórios no instituto Mackenzie na
cidade de São Paulo, tendo sido ordenado em 1896. Veio trabalhar no
município de Botucatu, onde foi licenciado e exerceu todo seu ministério.
Dessa maneira, a religião foi fator determinante na educação de Zenon
tanto que definiu importantes aspectos de sua personalidade como
introspecção, humildade, caráter e honestidade.
Fig. 1: Francisco Lotufo (Fonte: www.mackenzie.br)
No início dos anos 30, Zenon foi admitido na Escola Politécnica do Rio de
Janeiro (1931), mas transferiu-se para o curso de Engenheiro Civil da
Politécnica de São Paulo em 1933, passando no ano seguinte para o curso
de Engenheiro-Arquiteto, o qual conclui em 1936.
8
Sua formação acadêmica foi um tanto peculiar, considerando que foi o
único aluno da sua turma. Naquela época, o curso de Engenheiro-
Arquiteto na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo era bastante
exíguo (com poucos alunos) e distinguia-se basicamente pelas aulas de
Composição de Arquitetura, ministradas por Luis Ignácio de Anhaia Mello.
Anhaia Mello nasceu em São Paulo em 1891. Entrou para o primeiro ano
do curso geral da Politécnica em 1909 e diplomou-se como Engenheiro-
8
FICHER, Sylvia. Os arquitetos da Poli: Ensino e Profissão em São Paulo. São
Paulo, EDUSP, 2005.
15
Arquiteto em 1913. Recém-formado, entrou para o escritório de Ramos
de Azevedo, mas dedicou-se pouco à arquitetura.
Sua principal atuação foi à docência. Efetivado em 1926, como catedrático
da nova cadeira ‘Estética. Composição Geral e Urbanismo I e II’, Anhaia
Mello deu início ao ensino da disciplina que se tornaria sua especialidade:
o Urbanismo.
Criticava a formação excessivamente racional dos engenheiros, por não
acreditar que o progresso técnico fosse incompatível com a beleza.
Segundo depoimento de seus alunos e discípulos, entre eles, Vilanova
Artigas e Osvaldo Correa Gonçalves, Anhaia Mello foi o professor de
maior influência do curso de Engenheiro-Arquiteto nas décadas de 30 e
40. Era um homem de grande cultura e um grande teórico, não se
preocupando muito com a prática de projetos. Suas aulas eram
verdadeiras conferências sobre arte e vida que entusiasmavam os
estudantes. Com Zenon, não foi diferente.
Seu trabalho de conclusão de curso já denunciava uma influência dos
preceitos modernos (geometria regular e limpa, livre de ornamentos),
mostrando o momento de transição pelo qual a arquitetura brasileira
passava, e sua sintonia com estes acontecimentos (como veremos
adiante).
Muito importante lembrar que a formação acadêmica de Zenon Lotufo
orientou-se pelos ensinamentos tradicionais e clássicos da École de
Beaux-arts francesa, a qual influenciou praticamente todas as primeiras
escolas de arquitetura do Brasil, em conformidade com o que ocorria em
todos os países marcados pela cultura européia.
A primeira parceria profissional foi realizada com o também colega
engenheiro-arquiteto Afonso Iervolino, vencendo alguns concursos
públicos: o Paço Municipal de Taquaritinga e o Mercado Municipal de
Sorocaba (apenas este último construído) ambos projetados em 36.
Paralelamente, iniciou sua carreira pública na Diretoria de Obras da
Secretaria de Viação e Obras da Prefeitura de São Paulo (1937-1938).
Transferiu-se para a Secretaria de Obras de Santos, na qual atuou como
Chefe da Divisão (1939-1945) e, finalmente, entre 46 e 47, exercendo o
cargo de Prefeito da Estância de Campos do Jordão, por nomeação e para
a qual elaborou o Plano Diretor.
Em Santos, desenvolveu importantes trabalhos como o Código de Obras e
os projetos para a Orla Marítima e seus Postos de Salvamento (43-44), o
Aquário e Orquidário Municipal (43-46), além de algumas residências e
edifícios de apartamentos.
Em meados de 46, Zenon Lotufo retornava a São Paulo onde desenvolveu
parceria com os arquitetos cariocas: Hélio Queiroz Duarte e Abelardo
Riedy de Souza.
Abelardo Riedy de Souza, nascido em 1908, formou-se arquiteto pela
Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro em 1932, pertencente,
16
portanto à geração de arquitetos que mudou os rumos da arquitetura
brasileira.
Os anos de sua formação foram turbulentos, pois nessa época a ENBA
passou por processo intenso de reforma introduzido por Lúcio Costa.
“Víamos através das poucas revistas que nossos colegas Carlos
Leão, Luiz Nunes e Affonso Reidy traziam que existia um franco-suíço
chamado Charles Edouard Jeanneret, mais conhecido como Le Corbusier,
que abria os olhos do mundo para uma nova maneira de viver”.
9
A influência da escola carioca começava a aparecer na presença de linhas
sinuosas e maior leveza plástica que se somam ao racionalismo estrutural
do engenheiro politécnico.
O grupo realiza inúmeros projetos importantes, como o projeto para o
concurso para a nova sede do Instituto de Arquitetos do Brasil,
Departamento de São Paulo, o qual vencem juntamente com mais duas
equipes formadas por Rino Levi e Roberto Cerqueira Cezar, e Miguel
Forte, Jacob Ruchti e Galiano Cimpaglia. Este concurso foi julgado por um
júri composto por Oscar Niemeyer, Gregori Warchavchik, Hélio Uchoa,
Firmino Saldanha e Fernando Britto que concluiu pelo empate entre as
três equipes paulistas.
9
SOUZA, A. R. de. Arquitetura no Brasil: Depoimentos. Diadorim/EDUSP, São
Paulo, 1978.
Outras parcerias com arquitetos paulistas ainda marcaram sua obra no
final da década de 1940: com Gregori Warchavichk, a sede do Clube
Atlético Paulistano em São Paulo (1949); e com Plínio Croce, a sede da
Faculdade de Engenharia Industrial da PUC-SP em São Bernardo do
Campo (1949).
Nos anos 50, a arquitetura moderna brasileira já havia assumido uma
posição de reconhecimento tanto no exterior como aqui mesmo. Oscar
Niemeyer assumia o posto de maior arquiteto brasileiro tendo realizado
importantes obras, a partir do projeto do Ministério da Educação e Saúde,
em equipe com Lúcio Costa.
A grande admiração por Le Corbusier ficou registrada em um artigo
publicado na revista Acrópole em abril de 1949, chamado “A influência
dos mestres” onde Zenon afirma que o arquiteto francês “provocou uma
verdadeira revolução em nosso meio arquitetônico”.
Em 51, Zenon integrou a equipe de Oscar Niemeyer no projeto dos
pavilhões de exposição do IV Centenário de São Paulo no Parque
Ibirapuera.
De 49 a 57, foi professor contratado como catedrático na cadeira n. 16
“Composição de Arquitetura” do primeiro ano do curso da Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, fato que
terminou de forma polêmica em virtude da conclusão negativa do
17
Concurso de Cátedra que afastou Zenon das atividades acadêmicas por
quase 10 anos.
Neste Concurso, defendeu a tese “O espaço psicológico na Arquitetura”,
texto posteriormente premiado pelo Conselho Regional de Engenharia,
onde discute a importância da sensação psicológica que o espaço
arquitetônico tem de oferecer.
De 58 a 65, venceu vários concursos nacionais de arquitetura com a
parceria de Ubirajara Motta Ribeiro. E em seguida de 67 a 73, com seu
filho Vitor Amaral Lotufo, realizou novos projetos e planos urbanísticos
relevantes entre eles: Plano Diretor de Limeira, Cordeirópolis e
Iracemápolis. Em 67, voltou às atividades acadêmicas e ao ensino.
Inicialmente, ao curso de Engenharia Civil da Escola Politécnica
apresentando um ensaio “Arte ou artifício” (breve estudo da evolução
forma-estrutura ao longo da história da arquitetura) e depois a FAUUSP,
como auxiliar de ensino, aposentando-se em 1980, e vindo a falecer em
85, em sua cidade natal: Botucatu.
Na página seguinte, resumimos em um quadro, alguns dos fatos mais
relevantes na trajetória de Zenon:
18
Século XX 1911-20 1921-30 1931-40 1941-50 1951-60 1961-70 1971-80 1981-90
Vida/obra 1911
Nascimento
em
Botucatu/SP
(filho de
imigrantes
italianos)
Termina
seus
estudos Rio
de Janeiro
1936
Forma-se engenheiro-
arquiteto Escola
Politécnica
Universidade de São
Paulo
1937-38
Obras Publicas
Prefeitura de São
Paulo
1939-45
Chefe da
Divisão de
Obras na
Prefeitura de
Santos
1946
Prefeito de
Campos do
Jordão
1949-57
FAU-USP e
Concurso :
“O Espaço
Psicológico da
Arquitetura
1951-54
Niemeyer e
Projeto do
Ibirapuera
1967
Seu filho, Vitor
passa a
integrar o
escritório
1969
Diretor da
Serpla
(Serviços de
Planejamento)
1973
Projeto da
Rodoviária de
Limeira
1981
Aposenta-se
como auxiliar
de ensino
FAUUSP
1985
Falece
em Botucatu
Brasil República
Café com
Leite
1922
Semana de
Arte
Moderna
1930
Estado
Novo
Getulio
Vargas
1937
Ministério da
Educação e Saúde
(Lúcio Costa, Oscar
Niemeyer e equipe)
1942
Conjunto de
Pampulha
(Oscar
Niemeyer)
1956-61
Governo
Juscelino
Kubistchek
1961
Inauguração
de Brasília
1964
Golpe militar
1970
Pavilhão do
Brasil, Osaka
(Paulo
Mendes da
Rocha)
1984
Movimento
Diretas-Já
1988
Constituição
Mundo 1914-18
1ª. Guerra
Mundial
1929
Quebra da
Bolsa de NY
1933
Carta de Atenas
(CIAM IV)
1939-45
2ª. Guerra
Mundial
1956
“Team X”
1973
Crise do
petróleo
19
Capítulo 1. Anos de formação (31-
46)
“Embora o Brasil nunca tenha estado no centro da cultura
clássica, e esteja bastante distante dos grandes monumentos
dessa tradição, o país foi alvo da difusão sistemática do
conhecimento
tradicional erudito no século XIX, com a vinda
da Missão Artística Francesa e com a criação da Academia
Imperial de Belas Artes, que impulsionaram a cultura plástica
local em direção ao Neoclassicismo. A primeira geração
de arquitetos modernos brasileiros foi formada de acordo
com esse sistema acadêmico, e moldou sua linguagem moderna
sob a forte influência de Le Corbusier, dois fatos que
justificam a transposição da discussão sobre modernidade e
tradição clássica para o Brasil”.
10
1.1 - Introdução
O intuito deste primeiro capítulo é rever os aspectos da formação
acadêmica do engenheiro-arquiteto Zenon Lotufo, a partir de certa
tradição clássica apoiada nos conhecimentos tratadísticos da École des
10
PONTES, A.P.G. Diálogos silenciosos: arquitetura moderna brasileira e tradição
clássica. Dissertação de mestrado, PUC-RJ, 2004, pg. 13.
20
Beaux-Arts, presente no ensino do curso de Engenheiro-Arquiteto da
Escola Politécnica de São Paulo, e o rebatimento em sua produção
profissional, procurando compreender e relacionar os vínculos entre a
teoria e a prática na obra do arquiteto.
Antes disso, parece-nos importante investigar um pouco do contexto de
idéias e acontecimentos presentes nas cidades de Rio de Janeiro e São
Paulo nas décadas de 20 e 30, onde Zenon permaneceu períodos
importantes e decisivos, numa época de agitação política dentro do
quadro nacional.
Atentamos também para a origem e aplicação do chamado método
Beaux-arts (Belas-Artes) procurando relacioná-lo com a estrutura do
curso e a influência dos ensinamentos de Luis Ignácio de Anhaia Mello
(1891-1974), professor catedrático do curso de Composição Geral,
Estética e Urbanismo e principal referência para os alunos na época.
E finalmente, apresentar seus primeiros trabalhos realizados, inicialmente
em parceria com o colega de Politécnica, Affonso Iervolino, seguidos por
sua atuação na administração pública de Santos (39-45), como diretor
comissionado da Secretaria de Obras Públicas e posteriormente sua
nomeação como prefeito da Estância Sanitária de Campos do Jordão (46),
onde coordenou o Plano Diretor.
1. 2. Contextos
Rio de Janeiro e São Paulo entre as décadas de 20 e 30
Os principais acontecimentos políticos que marcaram o final da década de
20 e início da década de 30 nas cidades do Rio de Janeiro (então capital
federal) e São Paulo determinaram importantes transformações culturais
e o processo de introdução do movimento moderno, influenciando
também o ensino e a prática da arquitetura da época.
A efervescência dos anos 20, principalmente na Europa, soprou seus ares
pelo mundo afora tendo encontrado também repercussão em terras
brasileiras, mais especificamente, através dos jovens que iam para lá
estudar e traziam uma nova visão em relação a costumes, cultura e arte.
Invenções tecnológicas como o cinema falado, o gramofone e a difusão
do automóvel começaram a despontar e alterar comportamentos e
modos nos centros urbanos, principalmente em São Paulo e Rio de
Janeiro.
Em São Paulo, aconteceria a Semana de Arte Moderna de 22 que pontuou
o cenário cultural paulista com a participação de nomes como Mário de
Andrade, Oswald de Andrade e companhia. Este movimento significou
uma espécie de renascimento artístico, pois buscava seus temas e
expressões nas fontes do nosso passado colonial, ao olhar o homem da
terra, do índio, do mulato e do negro, porém com uma visão libertadora
capaz de imprimir novos valores de identidade nacional.
21
No livro Arquitetura Brasileira, Carlos Lemos afirmou que os arquitetos
que participaram da Semana de 22, Álvaro Moya e Georg Przirembel, não
tinham a menor noção do racionalismo estrutural e muito menos do
modernismo que vinha sendo praticado na Europa. O estilo desenvolvido
por eles tinha caráter eclético e neocolonial, ou seja, muito mais
comprometido com o passado do que alinhado com a produção de
vanguarda.
O grosso dos nossos arquitetos seguia as regras clássicas de
composição, a mercê dos ensinamentos de seus mestres antiquados, nos
cursos de formação arquitetônica ministrados nas escolas de engenharia,
a Politécnica e a Mackenzie”.
11
Em novembro de 1925, o arquiteto russo Gregori Warchavchik publicava
o famoso artigo-manifesto Acerca da arquitetura moderna no Correio da
Manhã do Rio de Janeiro, onde defendia a necessidade de se superar os
preconceitos estilísticos e afirmava que a economia e a funcionalidade
deveriam prevalecer no projeto arquitetônico.
Quinze dias antes, o paulista Rino Levi (ainda estudante de arquitetura em
Roma) debatia no jornal O Estado de São Paulo sobre a falta de
planejamento das cidades brasileiras a mercê das vontades e padrões do
capital imobiliário.
11
Lemos, C. Arquitetura Brasileira. Melhoramentos, São Paulo, 1979, pg. 133.
Sente-se ainda a influência do classicismo que, aliás, hoje, se
estuda melhor procurando-se sentir e interpretar seu espírito, evitando-se
a imitação, já bastante desfrutada de seus elementos”.
12
Ou seja, apesar dos primeiros sinais e manifestações a favor de uma nova
linguagem arquitetônica capaz de expressar as mudanças que vinham
ocorrendo, havia ainda muita resistência por parte da sociedade em geral
em aceitar os novos padrões estéticos.
O início da década de 30 foi um momento bastante intenso na história
política e cultural do país, e conseqüentemente para a arquitetura.
Segundo Abelardo de Souza: “Podemos dividir a história da nossa
arquitetura em duas partes ou épocas distintas: antes de 1930 e depois de
1930”.
13
A revolução de 30 tendo a frente o gaúcho Getúlio Vargas como figura
central do movimento armado simbolizou a derrubada da República Velha
ou, se preferirmos, a alternância da oligarquia cafeeira paulista e mineira
no controle político nacional.
Fatores como a quebra da Bolsa de Nova York em 29, aliada à emergência
de uma classe média, uma incipiente burguesia e o crescimento do
12
Levi, R. A arquitetura e a estética das cidades (1925). Xavier, A. (org.)
Depoimento de uma geração. Cosac & Naify, São Paulo, 2003, pg. 38.
13
Souza, A. A ENBA, antes e depois de 1930. em Depoimento de uma geração,
org. Alberto Xavier. Cosac Naify, São Paulo, 2003, pg. 63.
22
movimento operário também contribuíram para a mudança de paradigma
econômico com o início da consolidação da produção industrial.
Paralelamente, a nomeação do jovem Lúcio Costa em 1930 para assumir a
direção da Escola Nacional de Belas Artes, então principal escola de artes
da capital federal, pode ser considerada também um marco transitório na
história da arquitetura brasileira. Suas ações quanto à reforma do
currículo aliada à nomeação de novos professores como Gregori
Warchavchik, Affonso Eduardo Reidy, Alexander Buddeus, Emilio
Baumgart entre outros significaram uma nova orientação no modo de
ensinar arquitetura.
“Passamos de uma longa fase de cópias de modelos e fórmulas
arquitetônicas para a criação. O Vignola foi solenemente queimado e suas
cinzas espalhadas pelas praias do Rio. Passamos a estudar temas mais
práticos como a “casa mínima”, postos de gasolina, grupos escolares,
equipamentos de cozinha e banheiro. Esta era uma coisa que
desconhecíamos até então: a função das coisas que éramos chamados a
projetar”.
14
Os mestres de formação européia como Warchavchik, Baumgart e
Buddeus mostravam as soluções da arquitetura moderna na Europa com
o uso de fachadas lisas e ausência de ornamentos, telhados planos e os
jardins suspensos, mas ainda via-se nas plantas e estruturas resquícios da
14
Souza, A., opt. Cit., pg. 67.
arquitetura clássica. Neste ambiente, floresciam os primeiros arquitetos
modernos do Brasil: Oscar Niemeyer, Carlos Leão, Jorge Moreira, Luiz
Nunes entre outros que impulsionaram a nova arquitetura que
resplandecia.
Não por acaso, em dezembro de 1930, Lúcio Costa publicou no jornal “O
Globo” um texto bastante elucidativo onde alertava sobre as condições de
ensino, apontando sua preocupação com o disparate exagerado entre a
arquitetura e a estrutura, modelo este que persistia no curso de
arquitetura na Escola de Belas Artes.
Em todas as grandes épocas, as formas estéticas e estruturais
identificam-se. Nos verdadeiros estilos, arquitetura e construção
coincidem. E quanto mais perfeita a coincidência, mais puro o estilo.
Partenon, Reims, Santa Sofia, tudo construção, tudo honesto, as colunas
suportam, os arcos trabalham. Nada mente”.
15
O anacronismo entre as realizações européias e as de solo brasileiro
perpetuava-se por anos a fio e precisava ser transformada a partir de uma
reforma séria na estrutura do curso, denunciava Costa. Ele (que havia
estudado em países como Inglaterra, França e Suíça) criticava não só a
formação acadêmica oferecida, mas seu reflexo nas práticas exageradas
15
COSTA, L. A situação do ensino das Belas-Artes. Em XAVIER, A. org. Depoimento
de uma geração. Edição original,1987. Cosac Naify, São Paulo, 2003, pg. 57.
23
da construção rotulando-as de mera simulação e cenografia
arquitetônica.
Segundo Costa, os tratados clássicos e os estilos históricos deveriam ser
estudados apenas como referência crítica, enquanto que as lições
construtivas advindas de nosso passado colonial guiariam o futuro da
arquitetura tendo em vista seus principais aspectos de “simplicidade,
perfeita adaptação ao meio e à função, e conseqüente beleza”.
Reclamando também da falta de conhecimento e sintonia dos artistas e
arquitetos com os acontecimentos e questões que se faziam presente no
resto do mundo, Lúcio professou a abertura do Salão de Belas Artes de
1931, evento de importante significado histórico que abriria caminho às
novas manifestações artísticas de Cândido Portinari, Di Cavalcanti, Ismael
Nery, Alberto Guignard e Cícero Dias, entre outros.
Formado pela Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro em 1924, o
arquiteto teve seu ensino pautado pelo gosto neoclássico e eclético e
suas primeiras experiências profissionais situaram-se no estilo
neocolonial. Suas reflexões sobre arquitetura brasileira marcaram a
excelência do pensamento crítico nacional onde procurava sempre aliar
tradição e modernidade.
Portanto, este quadro de acontecimentos culturais marcava o ambiente
carioca do início da década de 30, onde o arquiteto Zenon Lotufo esteve
presente por ocasião do ingresso no curso de Engenheiro-Civil da
Politécnica do Rio de Janeiro em 31.
Revolução constitucionalista de 32
Em 1930, uma revolução derrubou do governo os grandes latifundiários
de Minas Gerais e São Paulo. O gaúcho Getúlio Vargas assumia a
presidência do Brasil em caráter provisório, mas com amplos poderes.
Todas as instituições legislativas foram abolidas, desde o Congresso
Nacional até as Câmaras Municipais, sendo os governadores dos Estados
depostos.
A política centralizadora iniciada por Vargas desagradava às oligarquias
cafeeiras, especialmente as de São Paulo, e as elites políticas do Estado
economicamente mais importante sentiam-se prejudicadas, reivindicando
a realização de eleições e o fim do governo provisório.
O governo Vargas reconheceu oficialmente os sindicatos dos operários e
legalizou o Partido Comunista, apoiando um aumento no salário dos
trabalhadores, o que irritou ainda mais as elites paulistas.
Assim, em 1932, uma greve mobilizou 200 mil trabalhadores no Estado,
onde empresários e latifundiários de São Paulo se uniram contra o
governo de Vargas.
No dia 23 de maio, um comício reivindicou uma nova constituição para o
Brasil, porém o evento terminou de modo trágico com a morte de quatro
24
estudantes: Martins, Miragaia, Dráuzio e Camargo. As iniciais MMDC se
transformariam no grande símbolo da revolução.
Em julho, explodiu a revolta. As tropas rebeldes se espalharam pela
cidade de São Paulo e ocuparam as ruas.
Enquanto a imprensa paulista defendia a causa dos revoltosos, a
população aderiu à rebelião com um grande número de pessoas se
alistando para a luta. Tropas paulistas foram enviadas para as frentes de
batalha, mas as tropas federais eram mais numerosas e bem equipadas.
Cerca de 40 mil homens de São Paulo enfrentaram um contingente de
100 mil soldados, enquanto os revoltosos esperavam a adesão de outros
Estados, o que não aconteceu.
Em outubro de 32, após três meses de luta, os paulistas se renderam.
Prisões, cassações e deportações se seguiram às estatísticas oficiais de
830 mortos. Estima-se que centenas a mais de pessoas morreram sem
constar dos registros oficiais.
A Revolução Constitucionalista de 1932 foi o maior confronto militar do
século XX no Brasil e apesar da derrota paulista em sua luta por uma
constituição, dois anos depois da revolução, em 1934, uma assembléia
eleita pelo povo promulgaria a nova Carta Magna. Os reflexos desses
acontecimentos influenciaram a vinda de Zenon Lotufo para a cidade de
São Paulo, uma vez que dois irmãos seus lutaram como voluntários na
Revolução, aliado também ao fato de ter conhecido sua futura esposa
Coraly (nesta época com 12 anos)
16
o que determinou, entre outros
fatores, seu pedido de transferência para a Escola Politécnica de São
Paulo em 33.
Zenon, a Politécnica e a vinda para São Paulo
Zenon havia sido admitido na Escola Politécnica do Rio de Janeiro em
1931, mas transferiu-se mais tarde para o curso de Engenheiro-Arquiteto
da Escola Politécnica de São Paulo em 1933, como contamos acima.
Fig. 2: Zenon Lotufo aos 21 anos
(Fonte: Pasta de aluno - Arquivo Técnico EPUSP)
Em março, Zenon Lotufo apresentou guia de transferência do curso de
Engenheiro-Civil da Escola Polytechnica (segundo grafia da época) da
Universidade do Rio de Janeiro. Nele constavam as médias de seus
exames preparatórios, realizados no Lyceu de Botucatu entre os anos de
27 e 29, que mencionamos a seguir: Português (8,0), Francês (4,5), Inglês
16
Entrevista com Coraly Lotufo (1919- ), concedida em Botucatu, em 04 de
outubro de 2007.
25
(9,0), Latim (5,0), Aritmética (8,5), Álgebra (8,0), Geometria e
Trigonometria (7,5), Geografia (7,0), História do Brasil (8,5), História
Universal (6,5), Física e química (8,0) e História Natural (8,0).
17
Em 7 de abril de 1931, prestou o vestibular sendo aprovado com nota 5,0
(cinco) ingressando no primeiro ano de engenharia civil na Polytechnica
do Rio de Janeiro onde cursou: Cálculo (7,0), Geometria Analítica (9,0),
Geometria Descritiva e Projetiva (6,0), Geologia econômica e Metalurgia
(5,37) e Desenhos de Ornatos à mão livre (7,83). No segundo ano (32),
cursou apenas duas disciplinas: Mecânica, Cálculo Vetorial e Resistência
dos Materiais (6,0) e Química Inorgânica (5,37).
Já em São Paulo, em 1933, Zenon freqüentou disciplinas referentes ao
primeiro e segundo ano do curso de Engenheiro-Civil (Física I e II (13,0),
Desenho Topográfico (12,5) e Desenho de Perspectiva (15,0)), mas já
havia solicitado em carta a secretaria da Escola Politécnica (datada de 28
de março de 1933) sua transferência para o curso de Engenheiro-
Architecto.
A partir de 34, Lotufo freqüentou as disciplinas do 3º. Ano do curso onde
teve: Composição Geral (pontuação final – 18), Desenho de Perspectiva
(16), Tecnologia Civil (13,8) e Oficinas (18). Durante o 4º. Ano (35),
realizou os seguintes cursos obtendo os respectivos graus: Composição
Geral (9,0), Resistência e Estabilidade (6,6), História da Arquitetura (5,5),
17
Pasta de aluno da EPUSP.
Construção Civil (6,8), Hidraulica (6,7), Oficinas (6,0) e Laboratórios (7,0).
Seu último ano como aluno da Escola Politécnica no ano de 1936, Zenon
finalizou as cadeiras de: Composição Geral e Urbanismo (8,9), Economia
política (8,0), Hidráulica Urbana e Saneamento (8,0) e Contabilidade (6,5),
obtendo o diploma de Engenheiro-Arquiteto em 18 de dezembro de 1936.
Fig. 3: Boletim de Zenon Lotufo de 1936 (. Ano do curso de Engenheiro-Arquiteto)
(Fonte: Pasta de aluno Arquivo Técnico EPUSP).
O ensino na Politécnica de 1932 a 1954
“O ensino de Arquitetura na década de 30 pressupunha a
existência de modelos e de um elenco de elementos a serem compostos.
Para isso, o desenho e a história deveriam fornecer esta bagagem.
26
Estudavam-se os estilos como sistemas fixos e padronizados onde as
simplificações gráficas levavam a uma leitura deturpada e estereotipada
da História. Ou seja, a renovação do ensino foi conseqüência de uma nova
prática profissional”.
18
O curso de Engenheiro-Arquiteto no período de
1932 a 1954 (data em que se encerra o oferecimento desta formação
específica na Escola Politécnica de São Paulo) continuou sendo uma opção
de poucos alunos. As turmas eram exíguas, fato que colaborou para a
extinção do mesmo na década de 50, aliado também à fundação da
FAUUSP.
19
No entanto, a evolução do número de engenheiros-arquitetos
formados, década a década, a partir de sua inauguração é notória. Porém,
seu crescimento se deu mais rapidamente na década de 30, como vemos
na tabela a seguir
20
:
Período (1899-1954) n. engenheiros arquitetos formados
1899 – 1910 - 17
1911- 1920 - 03
1921-1930 - 13
18
Santos, L. C. Arquitetura Paulista em torno de 1930-40. Mestrado. FAUUSP, São
Paulo, 1985.
19
Ficher, Silvia. Os arquitetos da Poli: Ensino e Profissão em São Paulo. EDUSP,
São Paulo, 2005, p. 256.
20
Santos, M. C. L. Escola Politécnica (1894-1984). Edusp, São Paulo, 1985, p. 256.
1931-1940 - 40
1941-1954- 47
Total - 120 engenheiros arquitetos
O curso de Engenheiro-Arquiteto da Escola Politécnica foi a primeira
formação do gênero em São Paulo e representava um novo modelo
pedagógico, em comparação com a Escola de Belas Artes, em virtude de
ser um curso voltado para engenheiros e construtores, apresentando
assim um caráter mais racional da obra.
É preciso frisar que apesar do cunho racionalista do ensino de
arquitetura da Politécnica, nas questões de estilo e estética ainda
predominava a mentalidade do classicismo”.
21
Basicamente, o curso se diferenciava da Engenharia Civil pelos últimos
anos (3
o
, 4º e 5º) onde se ensinava desenho de representação
arquitetônica, composição geral, perspectiva e técnicas de representação,
história da arquitetura e urbanismo.
O curso de engenheiros-arquitetos aliou ao rigor intrínseco das
ciências exatas e das outras cadeiras integrantes da formação de
engenheiros, disciplinas humanísticas, arte e desenho do projeto”.
22
21
Santos, M. C. L. Opt. Cit., p. 256.
22
Santos, M. C. L. Opt. Cit., p. 239.
27
O 1
o
. Ano do Curso geral tinha como disciplinas: Cálculo Vetorial,
Complementos de Geometria Analítica, Física I, Topografia, Perspectiva e
Desenho Arquitetônico. Esta última era dada por Prestes Maia até 1937 e
baseava-se em esboços do natural e desenhos de aquarela, feitos a partir
de modelos.
O 2
o
. Ano compunha-se de Mecânica Racional, Física II, Química Geral,
Aplicações Técnicas de Geometria Descritiva, Cálculo Diferencial e Integral
e Desenho de Perspectiva, tendo Prestes Maia também à frente que
naquela oportunidade ensinava: desenhos de fachadas, em aquarelas
monocrômicas e policrômicas, exercícios e croquis de construção de
perspectivas.
O 3
o
. Ano estruturava-se por: Resistência e Estabilidade I, Tecnologia Civil,
Materiais de Construção, Fundações e Composição Geral I, sendo esta
última ministrada por Anhaia Mello, que cuidava da composição
arquitetônica e seus componentes elementares, de apoio, pórticos,
estudo das ordens e detalhes da arquitetura clássica.
Além dessas, ainda havia uma cadeira de Hidráulica Urbana e
Saneamento, e outra de Desenho de Composição Geral onde os alunos
realizavam desenhos de ornamentação em diversos estilos, as cinco
ordens de Vignola e suas aplicações em pórticos, arcadas e intercolúnios.
O 4
o
ano do curso tinha Resistência e Estabilidade II, Composição Geral II,
Noções de Arquitetura e Construções Civis e História da Arquitetura,
Tecnologia Mecânica e também Desenho de Composição Geral.
Para a segunda parte de Composição, Anhaia Mello orientou o estudo da
Estética e dos tipos de edifícios agrupando ainda temas do movimento
moderno como: Le Corbusier, concreto armado, funcionalismo, etc. Sob
responsabilidade do assistente era dado um exercício-tema de
composição como, por exemplo, em 1935: projeto de uma residência
nobre em estilo renascentista, uma igreja gótica e um edifício de
apartamentos.
23
Finalmente, o 5
o
. Ano encerrava o curso de Engenheiro-Arquiteto com
Composição Geral III e Urbanismo, História da Arquitetura, Hidráulica
Urbana e Saneamento II, Economia Política e Contabilidade. Desenho de
Composição Geral incluía a representação de plantas, cortes e fachadas
de grandes edifícios como hospitais, teatros, cinemas, aquarelas e
perspectivas.
A cadeira de Composição Geral foi introduzida ao currículo do curso no
Decreto Estadual n. 1.539 (1907) entrando em vigor apenas em 1911. Esta
nova organização priorizou aulas para elaboração de projetos e estudos
de composição de edifícios e da estética das artes e do desenho.
23
Ficher, opt. cit., pg. 262.
28
Enquanto nas aulas de história de arquitetura, os alunos conheciam os
diversos estilos, nas aulas de projeto, eles praticavam este conhecimento.
Na cadeira de composição, tratava-se da aplicação dos vários
estilos, à elevação das fachadas ou do interior, pois o seu objeto era o
estudo das plantas dos diferentes edifícios públicos e monumentos, com a
lógica distribuição de suas diversas partes. O valor prático da obra
dependia ainda de uma boa planta lógica e organicamente projetada.
Para a completa instrução ao aluno, os projetos de edifícios neste curso,
precisavam ser estabelecidos segundo as regras de composição, fazendo-
se na sua elevação, a aplicação dos diversos estilos”.
24
Os três principais nomes na evolução do curso de engenheiro-arquiteto
da EPUSP foram: Ramos de Azevedo (1851-1928); Alexandre Albuquerque
(1880-1940) e Luiz Ignácio Romeiro de Anhaia Mello (1891-1974).
Ramos de Azevedo regeu a cadeira de Arquitetura Civil e Higiene das
Habitações de 1894 a 1928, sendo vice-diretor (1900-1917) e diretor
(1917-1928).
Alexandre Albuquerque criou o Grêmio Politécnico em 1903, enquanto
aluno, e depois, tornou-se catedrático da cadeira de História da
Arquitetura. Mas talvez sua maior contribuição tenha sido a luta pela
24
Santos, M. C. L. Opt. Cit., p. 243.
regulamentação da profissão do arquiteto promulgada no Decreto
Federal n. 23.569, em 11 de dezembro de 1933.
Por sua vez, Anhaia Mello poderia ser considerado a alma do curso de
engenheiro arquiteto. Era totalmente devoto ao ensino e à cadeira de
Composição Geral e Urbanismo, trazendo sempre as aulas, discussões
atuais onde observava o conteúdo humano e os aspectos psicológicos dos
fatos. E talvez, sua maior contribuição tenha sido o projeto de criação da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo em
1948.
Nas palavras de seu filho José Luiz Anhaia Mello, em depoimento em
outubro de 1983, prestado a Maria Cecília Loschiavo dos Santos:
Era um homem que o pactuava, por assim dizer as formas
simples da engenharia, quer dizer, ele não suportava apenas tijolo e
cimento, ele queria dar cor a eles”.
25
1.3. A influência de Anhaia Mello
Zenon Lotufo foi o único aluno matriculado para o ano letivo de 1933 para
o curso de Engenheiro-Arquiteto, de modo que o professor catedrático
Anhaia Mello (responsável pela principal cadeira do curso Composição
Geral, Estética e Urbanismo) tornou-se seu grande mestre inspirador e
amigo próximo.
25
Santos, M. C. L. Op. Cit. p. 255.
29
A relação entre eles foi muito próxima nos anos de 33 a 36. Como
exemplo dessa relação, sabe-se que quando Anhaia previa que ia faltar a
aula, avisava a Zenon para não perder a viagem e vice-versa.
26
Luis Ignácio Romeiro de Anhaia Mello (1891-1974) foi o professor de
maior influência do curso de Engenheiro-Arquiteto nas décadas de 30 e
40. Era um homem de grande cultura e um grande teórico, não se
preocupando muito com a prática de projeto. Suas aulas eram
verdadeiras conferências sobre vida e arte que entusiasmavam os
estudantes. Criticava a formação excessivamente racional do engenheiro
e não acreditava que o progresso técnico fosse incompatível com a
beleza.
No Anuário de 1946 da Escola Politécnica, Anhaia Mello publicou um
interessante artigo denominado “A Evolução do Curso de Engenheiros
Arquitetos na Escola Politécnica de São Paulo” onde fez um balanço do
curso, sua estrutura, as cadeiras oferecidas e os professores entre outros
aspectos.
No texto, remontou a origem da escola inaugurada em fevereiro de 1894,
relembrando o fato de que a Arquitetura do final do século XIX não
dialogava mais com construção, ou seja, valorizavam-se
predominantemente aspectos estéticos de massa e volume, enquanto
que função e estrutura ficavam em segundo plano. Só este dado em si já
26
Depoimento de Coraly Lotufo em 25 de novembro de 2006.
parecia justificar o oferecimento de uma especialidade como a
Arquitetura, no quadro de formação da escola, segundo Anhaia.
O conteúdo do curso de Engenheiro-Arquiteto compunha-se
originalmente por cadeiras especiais, de acordo com Decreto 270-A de 20
de novembro de 1894, sendo o 1º. Ano - 3ª. Cadeira – Elementos de
Arquitetura. Estudo de detalhes, o 3º. Ano – 2ª. Cadeira Estética das
Artes do Desenho e 3ª. Cadeira – História da arquitetura. Estilos diversos.
O decreto 1.992, de 27 de janeiro de 1911, desenvolveu melhor a
disciplina de Composição Arquitetônica e as cadeiras passaram a ser: 2º.
Ano – 3ª. Cadeira – Elementos dos edifícios. Composição geral. 1ª. Parte:
Habitações, 3º. Ano – 2ª. Cadeira – Composição Geral. 2ª. Parte: Edifícios
públicos. Estética das artes do desenho e 3ª. Cadeira História de
arquitetura. Estudo de estilos diversos.
O decreto 2.931, de 12 de junho de 1918, alteraria novamente a
distribuição das cadeiras: 2º. Ano – 2ª. Cadeira – Composição Geral. 1ª.
Parte: Habitações; 3ª. Cadeira – História da arquitetura. 1ª. Parte:
Estética; 3º. Ano – 1ª. Cadeira – Composição Geral. 2ª parte: Edifícios
públicos e 2ª. Cadeira – História da arquitetura. 2ª. Parte: Estética.
Em 31 de dezembro de 1925, criou-se a lei n. 2.128 que incluía a cadeira
de Urbanismo entre as cadeiras especiais do 3º. Ano do curso. E
finalmente, o decreto 5.064, de 13 de junho de 1931, estabeleceu que o
estudo da Composição Arquitetônica se estendesse pelos três anos do
30
curso de Engenheiro-Arquiteto. Anhaia afirmou ainda, no mesmo artigo:
“A primeira idéia fundamental é que a arquitetura de hoje deve
tornar belos e eficientes todos os novos edifícios que os novos problemas
do século estão exigindo. A segunda é que devemos desenvolver uma
arquitetura livre de preconceitos de estilos históricos que faça uso criativo
de todos os novos materiais que a indústria e a ciência estão fornecendo.
E a terceira idéia fundamental do pensamento arquitetônico
contemporâneo é que para realizar as duas primeiras idéias – novas
formas adaptadas a novos problemas e novos materiais – é necessária
uma nova criação estética, lógica, serena e simples. Ser belo é função tão
real e necessária de qualquer edifício, como ser conveniente e
resistente”.
27
A seguir, comentamos alguns outros textos de Anhaia Mello, de modo a
contribuir para a construção de seu ideário e a influência destes valores
na formação de Zenon Lotufo.
Centenário de Ramos de Azevedo
Em discurso proferido em 1951 por razão do 1º. Centenário de
Nascimento de Francisco Paula Ramos de Azevedo (1851-1928), Anhaia
27
Trecho extraído do texto “A Evolução do Curso de Engenheiros Arquitetos na
Escola Politécnica de São Paulo de Luiz de Anhaia Mello, parte integrante do
Anuário da Escola Politécnica de 1946, p. 155.
Mello resgatou o prestigioso percurso traçado pelo célebre professor da
Politécnica e reconhecido arquiteto paulista.
28
Chamava à atenção a eloqüência e poética humanista do orador onde
destacava que em primeiro lugar deveria vir sempre o progresso
espiritual-moral e depois a serviço deste, a civilização ou progresso
técnico-material.
Assim, o autor recorda-nos da imortalidade do artista e da importância da
obra de arte:
O artista não morre. A arte dá o que a realidade nega ao homem:
a eternidade; e o artista se subtrai à fatalidade do destino e sobrevive na
Beleza das obras que plasmou. Mas há algo de imperecível, algo de mais
perene que o bronze e o granito – o conjunto da obra social, a vida de um
grande cidadão. E a vida pode e deve ser uma grande Forma, forma
estética, de profundo sentido espiritual, verdadeira obra de arte, portanto.
Por que arte é justamente isso, o processo de dar conteúdo espiritual
àquilo que se faz. Linguagem da sensibilidade, revelação das almas, a Arte
é a pedra de toque das nações. O espírito de uma época sobrevive nas
obras de Beleza que criou – e estas são o melhor e às vezes o único
intérprete de uma civilização. A elas pediremos o comentário fiel da
28
Discurso escrito à mão pelo próprio Luiz de Anhaia Mello por ocasião da
comemoração do Centenário de nascimento de Ramos de Azevedo em dezembro
de 1951, documento original existente no Arquivo Técnico da Escola Politécnica,
da Universidade de São Paulo.
31
História; a tradução sem deformação e sem lacunas, da alma dos
povos”.
29
Toda arte é reação
Segundo Anhaia, toda arte deveria ser reação e expressão. Reação do
artista diante do mundo e expressão da personalidade do artista. Artista e
coletividade seriam conceitos polares, não se pode conceber um sem o
outro. Dando seqüência a seu discurso, Anhaia exaltou a disciplina
arquitetônica apoiando-se na tríade vitruviana:
Arquitetura, arte social por excelência, a mais rica de todas:
berço, vida, túmulo e recordação do Homem. Símbolo sugestivo da
humanidade civilizada, a arquitetura une a poesia da vida a toda a
riqueza do mundo sensível. É obra comum de um povo, de um céu, de uma
terra, testemunho de suas crenças, de seus sonhos, de sua vida – forma
concreta de seu gênio. É pela construção e pela técnica que o arquiteto
organiza espaços e se exprime. A realização arquitetônica é sempre uma
pesquisa de equilíbrio entre as três condições da forma construída:
Utilidade – resposta da Forma à Função; Solidez- resposta da Estrutura à
Matéria, e Beleza – resposta às leis da Ordem visível da matéria no
Espaço, satisfeitas pelo Deleite espiritual.”
30
29
Idem, pg. 9.
30
Ibidem, pg. 13.
A seguir, Anhaia fez uma critica ao momento por que passava a cultura
ocidental do culo XX. Crise que para ele não possibilitava um olhar
atento e sereno devido à dinâmica das transformações de todas as ordens
do mundo capitalista e a competição que estimulava a agressão e não, a
pacificação (interessante observar a atualidade do texto).
“Vivemos sob ação e pressão de complexos. Complexo de
atividade, de expediente, de força, de ansiedade e preocupação com o
futuro. Sacrificamos as belezas do presente pelas ânsias do porvir.
Vivemos numa época em que muitos desconhecem que o homem vale
pelo seu caráter e não pelo seu sucesso. Muitos atribuem à ciência, um
papel moral que ela não possui. O fim da ciência é apenas compreender e
prever. Seu fundamento é essencialmente essa estranha necessidade de
unificar que caracteriza o espírito humano; sua base, a fé na continuidade
dos fenômenos e na harmonia do seu encadeamento. No entanto, nós,
homens, vivemos na esfera das ilusões, dos sentimentos, das paixões, dos
desejos, da Beleza e da Moral, esferas que a ciência não atinge”.
31
Após o pessimismo oriundo de duas Guerras Mundiais, aquele era um
momento de vestígios pessimistas e negativistas, no entanto Anhaia
reafirmava a importância de se olhar e valorizar o passado e seu otimismo
em relação ao futuro.
31
Ibidem, pg. 19-20.
32
E concluindo, Anhaia reafirmava que o problema do presente seria uma
questão de caráter.
Uma falta de visão sadia, consciente do passado, do feito de
nossos antecessores, homens corajosos que trilharam com grandeza e
vitalidade, a fim de encontrar a harmonia e a beleza em seus ideais de
futuro”.
Anhaia Mello envolveu-se timidamente com arquitetura tendo realizado
apenas algumas casas, o Colégio e Igreja São Luiz na Avenida Paulista
(fig.4), a Igreja do Espírito Santo à Rua Frei Caneca e a Matriz da Mooca.
Sua preferência de estilo sempre foi o classicismo, a busca da unidade,
simetria, equilíbrio e da proporção na composição.
Fig. 4: Igreja São Luiz (Fonte: Os arquitetos da Poli).
Aposentadoria
Neste outro importante discurso por ocasião de sua aposentadoria
compulsória (1961), Anhaia Mello novamente esbanjou seu
conhecimento como homem de cultura sempre convicto do verdadeiro
papel da Universidade, dizendo:
“Procurei sempre completar a educação e a formação espiritual
de meus alunos com humanas verdades. Sei que não basta exercitar a
inteligência e a memória. Sonhar, sentir e amar são elementos estruturais
do espírito que devem ser cultivados e desenvolvidos com carinho. A
tecnologia é um instrumento e não uma filosofia de vida. A técnica dá ao
homem apenas o valor instrumental, mas só a cultura lhe dá o valor
humano. E esta é a missão primordial da Universidade – formar homens
cultos e socialmente úteis que contribuam para solucionar os problemas
regionais e nacionais, elevando o nível material e espiritual do povo, para
que todos participem das alegrias e belezas essenciais da vida. Humanas
verdades e não apenas mecanismos matemáticos e abstrações. Não há
técnica sem ética. A ciência afirma, mas não escolhe. A máquina resolve,
mas não pergunta. E é este suplemento de alma que a Humanidade esta
precisando. No exercício de minha cátedra, insisti na formação global da
personalidade do Engenheiro e do Arquiteto, interessando-os pelos
problemas humanos, habilitando-os para o julgamento seguro dos
problemas culturais, sociais e políticos, para que tivessem personalidade
33
forte, espírito critico, sentido de solidariedade, abundância de ideais,
coragem de afirmar seu amor à Terra e sua fé no Futuro. Todos devemos
sentir o tormento da autenticidade. O homem não é apenas criador de
formas, mas também criador de si mesmo. É autenticamente, um ser de
desejo, de tensão, sempre insatisfeito. O homem satisfeito, sem
inquietudes, sem sonhos, não é aquele que se encontrou, mas sim aquele
que se perdeu”.
32
Assim, acreditamos ter destacado alguns dos pontos principais do
pensamento de Anhaia Mello, personagem decisivo na formação
profissional de Zenon Lotufo.
1.4. Composição em arquitetura
Neste ponto, faz-se oportuno conceituar melhor a relação entre
composição na arquitetura clássica e seu ensinamento nos cursos
tradicionais das Escolas de Belas-Artes, seu desenvolvimento e aplicação,
uma vez que a disciplina da Composição Arquitetônica sempre fez parte
da trajetória profissional e didática de Zenon Lotufo.
A idéia é investigar também o quanto seria verdadeira ou falsa a noção de
rompimento com os valores tradicionais acadêmicos do passado,
proposta e divulgada no discurso dos arquitetos modernos. Para isso,
32
Discurso proferido na Escola Politécnica da USP em 23 de agosto de 1961 in
“Documentos sobre o urbanista Luiz Ignácio Romeiro de Anhaia Mello”. FAUUSP,
São Paulo, 1986.
escolhemos as reflexões dos teóricos e críticos Reyner Banham e Edson
Mahfuz que se aprofundaram com bastante atenção nestas questões,
argumentando e discutindo com profundidade o tema.
Reyner Banham
O influente crítico britânico Reyner Banham (1922-1988) em seu
conhecido livro Teoria e projeto na primeira era da máquina, de 1960,
traçou um panorama geral do movimento moderno e suas origens.
Já no primeiro capítulo do livro, Banham discutiu a relação entre a
tradição clássica francesa e a noção de composição elementar, através
dos trabalhos de Julien Guadet (1834-1908), professor de grande respeito
e, para Banham, o maior representante da tradição acadêmica da École
des Beaux-Arts no final do século XIX.
Sua obra fundamental de cinco volumes Elements et Theories de
l´Architecture (1902) procurou tornar a disciplina da composição
arquitetônica tão racional, funcional e a-estilística quanto nenhum outro
já havia feito.
33
A valorização da composição, ou seja, a montagem do edifício a partir de
suas partes e volumes mostrava que um edifício completo qualquer não
33
Banham, Reyner. Teoria e projeto na primeira era da maquina. Editora
Perspectiva. São Paulo, 2003, pg. 26.
34
pode ser outra coisa senão o resultado da reunião de um número maior
ou menor de partes.
O problema era que o modo específico de reunir as partes é algo que
Guadet, segundo Banham, discutia muito pouco, e por tanto, não era
muito esclarecedor. O fato era que a disposição simétrica das partes de
um edifício em relação a um ou mais eixos era o princípio diretor da
arquitetura acadêmica de modo tão evidente que, segundo Guadet, não
havia necessidade de discutí-lo.
Deixando de lado, por enquanto, o sentimento libertário de Guadet, em
suas palavras vê-se uma atitude ambivalente e abstrata em relação à
história, no sentido de compreendê-la e não imitá-la.
“Compor é usar aquilo que se conhece. A composição tem
materiais, assim como os tem a construção, e estes materiais são
justamente: os Elementos da Arquitetura. Na verdade, nada é mais
atraente e sedutor do que a composição. É este o verdadeiro campo do
artista. Compor, afinal o que é isso? É por juntas, unir, combinar as partes
de um todo. Estas partes são os Elementos da Composição e assim como
irão realizar suas concepções com paredes, aberturas, abóbadas e
telhados – todos Elementos de Arquitetura – estabelecerão sua
composição com quartos, vestíbulos, saídas e escadas – estes sim então os
Elementos da Composição”.
34
34
Idem, pg. 36.
Portanto, para Banham, a composição era o modo de reuní-los, onde os
dois conceitos (composição/ reunião) formariam uma filosofia de projeto
que seria comum tanto aos acadêmicos quanto aos ditos modernos,
formados por esta mesma tradição.
A abordagem do assunto é particular, pequenos membros funcionais ou
estruturais (Elementos de Arquitetura) seriam reunidos a fim de se obter
volumes funcionais e estes por sua vez (Elementos de Composição)
seriam reunidos de modo a gerar o edifício como um todo.
Fazer isto era compor no sentido literal e derivado da palavra, pôr junto.
Assim, para Banham, podemos considerar como característica geral da
arquitetura do começo do século XX, o fato dela ser concebida em termos
de volumes separados para cada função, composta de tal modo que esta
separação ficava claramente identificável.
Julien Guadet
O conjunto dos elementos de arquitetura e sua composição, presentes na
obra de Julien Guadet (Éléments et Théories de L'Architecture) dividia-se
em 16 livros, organizados em 2 partes, onde o objetivo principal era o
estudo da composição arquitetônica, a partir destes elementos, e sua
adaptação aos programas definidos e respectivas necessidades materiais.
35
Fig. 5: Foto de Guadet (Fonte: Élemente e Teorie d´Architecture)
A primeira parte dedicava-se aos Elementos de Arquitetura propriamente
ditos como: muros, ordens, arcadas, portas, janelas, seguidos por
elementos mais complexos como salas, vestíbulos, varandas e escadas,
entre outros. A segunda parte apresentava os princípios gerais de
composição a partir do estudo dos principais gêneros de edifícios como,
por exemplo, religiosos, civis, militares, públicos, habitacionais.
O primeiro Livro mencionava no seu primeiro capitulo, os estudos
preparatórios do curso como matemática, geometria descritiva, traçado
de sombras, noções de perspectiva, desenho e modelagem. A descrição
dos instrumentos de desenho (réguas, compassos, esquadros, etc) ficou
para o segundo capítulo, enquanto que os desenhos de Arquitetura (as
escalas, a planta, o corte, a elevação, a necessidade de várias projeções
para uma representação completa, os eixos, croquis à mão livre no papel
quadriculado, etc) estavam no terceiro capítulo. Os capítulos 4 e 5
cuidaram dos modelos e sombras, e dos desenhos de imitação, forma e
proporção, respectivamente.
Para o segundo Livro, Guadet aprofundou-se nos princípios gerais da
composição reservando a discutir: lições introdutórias e programa geral
(1º. Capítulo), a Beleza na Arquitetura, o programa, local, terreno,
situação e clima, verdade na construção e estabilidade dos materiais (2º.
Capítulo), as grandes regras da composição (3º. Capítulo) – (este capítulo
será mais bem analisado posteriormente), as proporções gerais,
definições, proporção racional e tradicional, responsabilidade do
arquiteto, da proporção à composição (4º. Capítulo), proporções
específicas, arcadas, janelas, portas (5º. Capítulo), proporção das salas,
exigências higiênicas, entrada de luz natural (6º. Capitulo), corolário de
estudo das proporções em plantas, cortes e elevações e a dependência
recíproca entre elas (7º capitulo); a arte e a ciência da construção –
Arquitetura é construção; e construção é uma arte e uma ciência.
Arte pela invenção, combinação e previsão; e Ciência pelo controle, rigor e
verificação”.
35
Nos terceiro, quarto e quinto livros, o foco passa a ser os Elementos da
Arquitetura e, portanto seguem a ordem referida: muros, aberturas,
35
Guadet, J. Elements et Theorie de lÁrchitecture (cours professé á l´École
Nationale et Spéciale des Beaux-Arts). Librarie de la construction moderne, Paris,
1909 (3ª. edição original da Biblioteca da Escola Politécnica), pg 194.
36
portas, janelas, decoração (Livro 3); pórticos e ordens (Livro 4) e telhados,
coberturas, tetos e escadas (Livro 5), encerrando o primeiro volume da
obra de Guadet.
O segundo volume (correspondente aos livros de 6 a 9) apresentava os
Elementos de Composição (principiais tipologias de uso) como:
habitações (Livro 6), escolas primárias, liceus, colégios, ensino superior,
científicos, museus e bibliotecas (Livro 7), edifícios públicos
administrativos, judiciais e penitenciárias (Livro 8) e hospitais (Livro 9).
O terceiro volume abrangia os livros 10 a 12 onde estavam os edifícios
públicos comerciais, mercados, alimentação, termas e teatros (Livro 10),
edifícios religiosos, igrejas e respectiva ornamentação (Livro 11), e
edifícios funerários, comemorativos e decorativos (Livro 12).
O último (e quarto) volume da obra fundamental de Julien Guadet
compunha-se pelos livros de 13 a 16 onde se situava: monumentos,
fontanas, praças, pontes e aquedutos (Livro 13); arquitetura rural, militar
e jardins (Livro 14); considerações gerais da composição (Livro 15); e
profissão do arquiteto, designações, projeto executivo, direção de obra,
honorários e responsabilidades (Livro 16).
Concentramos nossa atenção principalmente na análise do capítulo III do
segundo livro, intitulado “Lês grandes regles de la composition” (As
grandes regras da composição)
36
, uma vez que nele encontram-se as
principais diretrizes e conceitos a serem aplicados na Arte de se compor a
Arquitetura.
Neste capitulo, Guadet destacava em linhas gerais os aspectos a serem
observados e estudados com atenção, como comentamos a seguir:
Superficies úteis
Em primeiro lugar, o destaque era para Les surfaces utiles et les
circulations (Superfícies úteis e circulação) onde dado qualquer programa,
este se dividiria em duas partes distintas: as partes habitáveis, ou seja, as
células, quartos, salas e salões (superfícies úteis) e as comunicações
necessárias para acessá-las, ou seja, os corredores, galerias, ante-salas e
escadas (circulações horizontais e verticais). Em outras palavras, Guadet
reforçava a importância de se pensar a circulação entre os ambientes da
maneira mais eficiente e útil possível, sem desperdícios (esta era uma das
principais preocupações de Zenon Lotufo na hora de projetar, segundo
seu filho Vitor).
“Em geral, a principal dificuldade da composição é permitir que se
circule facilmente por todas as peças, que todas as partes estejam
comodamente ligadas; se os meios encontrados forem simples, a planta
será clara e facilmente compreendida e seguida. Garantam, portanto, as
36
Traduzido para português pela prof. Maria Amália Ramos.
37
comunicações, mas sem abusar de pórticos, galerias, etc. E é nisso,
principalmente, que vocês reconhecerão a simplicidade como uma
qualidade preciosa da composição. Simplicidade, simplicidade sempre!”.
37
Guadet também afirmava que uma boa composição ofereceria as
condições para uma planta racional de telhado onde as águas deveriam
ser facilmente escoadas, e a planta do pavimento térreopressupunha
isto. E procurava resumir o processo compositivo como uma seqüência de
escolhas e sacrifícios em que não se deveria simplesmente seguir regras,
mas sim o bom senso a partir do profundo conhecimento das
necessidades dos usuários.
Beleza
“Mas não é tudo. Não visamos apenas o útil. Um povo que só visse
dentro da arquitetura o útil, sem buscar também o belo, renunciaria a
toda civilização”.
38
Desta forma, Guadet instruía que uma bela composição deveria ser antes
de tudo: boa. Assim, cada sala seria completada pelo efeito das demais,
se planejadas em belas seqüências; e se os pátios forem prolongados por
perspectivas bem planificadas; e se em suas fachadas, se colocar belas
sacadas ou recuos ou pavilhões acentuados, enfim se tudo isso for
variado, e se colocar oposições, até mesmo contrastes.
37
Guadet, Opt. Cit., pg. 117.
38
Guadet, Opt. Cit., pg. 124.
A simetria, a boa planta e o pitoresco
Guadet revelava que a simetria - junto com a variedade - deveria em geral
ser sempre buscada, pois a simetria seria a regularidade daquilo que deve
ser visto num só lance de olhar, a regularidade inteligente. A simetria
seria incontestavelmente uma beleza e raras vezes a composição poderia
renunciar a ela sem perdas. Seria, portanto um componente muito
importante da composição.
Outra questão discutida foi a expressão “uma bela planta” seria uma
expressão concisa, que é preciso entender como uma planta que permite
e promete belas coisas, belos interiores e belas fachadas.
Guadet abordou também o pitoresco; que segundo ele se compõe
sozinho pela ação do maior dos artistas: o tempo. Não deveria ser
procurado, só assim, talvez, se conseguiria alcançá-lo.
Mas, em suma, o que é o pitoresco? A variedade. Mas não existe uma
variedade que depende de nós, arquitetos, que nós podemos e, portanto
devemos garantir?
Essa variedade legítima nada mais seria do que o caráter, uma identidade
entre a impressão arquitetural e a impressão moral do projeto.
“Existe, sem dúvida, uma beleza intrínseca da arquitetura; e
admiramos vestígios soberbos de monumentos cuja destinação nós
ignoramos. Mas a beleza não é uma qualidade banal, e sua busca não tem
o direito de ignorar o caráter da edificação. As formas magníficas de um
38
palácio aplicadas a uma prisão seriam ridículas; aplicadas a uma escola, a
uma construção industrial, também estariam deslocadas”.
39
O caráter dos edifícios é a condição de sua diversidade, e preserva uma
cidade ou uma época da monotonia das demais edificações. O arquiteto
deve se necessário, agir com abnegação e resistir também à tentação. E
isso não deve surpreender, é a confirmação de uma lei histórica. Desde o
Cristianismo, o homem tornou-se mais diverso, mais complicado também:
não vamos lamentar, pois a variedade do caráter em nossos edifícios é
uma atração e uma riqueza a mais dentro da linguagem arquitetônica.
Tradição
Enfim, Guadet afirmou que para sustentar e guiar seus alunos haveria
também a tradição. Ora, essa atitude significa considerar dignos os longos
esforços, continuados através dos séculos pelas gerações que nos
precederam.
“Em geral, demonstra ignorância aquele que finge desdenhar o
que não conhece, para não precisar fazer o esforço necessário para
conhecê-lo. Não tenham essa presunção. O progresso é coisa lenta e deve
ser coisa segura. Chi va piano va sano, chi va sano va lontano.Vocês
39
Guadet, Opt. Cit., pg. 133.
sabem o que é muito forte, e muito original? É fazer muito bem aquilo que
outros fizeram simplesmente bem”.
40
Concluindo, Guadet relatava que as mais belas épocas da arte foram
aquelas em que a tradição era mais respeitada, onde o progresso era um
aperfeiçoamento contínuo, uma evolução, e não uma revolução. Nunca
houve geração espontânea em arte: entre o Partenon e os templos que o
precederam, só haveria nuances. A tradição seria um patrimônio
paterno: se abandonado sem prudência, arriscava-se a ficar entregue ao
acaso.
Assim, verificamos algumas das lições deixadas por Guadet sobre as
principais regras na composição arquitetônica que influenciaram gerações
de estudantes do curso da Ecole de Beaux-arts de Paris, tornando-se
referência também em outros países, no começo do século XX, refletindo
também sobre o curso de Engenheiro-Arquiteto da Politécnica de São
Paulo.
Edson Mahfuz e a razão compositiva
O livro Ensaio sobre a razão compositiva
41
do arquiteto e professor Edson
da Cunha Mahfuz também investigou o processo de projeto como uma
combinação de relações possíveis entre as partes e o todo arquitetônico.
40
Guadet, Opt. Cit., pg. 134.
41
Mahfuz, E. Ensaio sobre a razão compositiva. Editora UFV/AP Cultural, Belo
horizonte, 1995.
39
Durante a maior parte do século passado, segundo Mahfuz, o termo
composição teve uma conotação negativa, pois estava associado à
tradição acadêmica de imitação estilística, que o Movimento Moderno se
opunha ou tentava superar. Composição seria, portanto na acepção
acadêmica, o arranjo das partes da arquitetura como elementos de uma
sintaxe, de acordo com certas regras a priori, de modo a formar um todo.
Assim, o método Beaux-Arts baseava-se na idéia tradicional das teorias
arquitetônicas do Renascimento: o processo de composição arquitetônica
evolui do todo para as partes, ou seja, o todo viria antes das partes.
Portanto, gerava-se primeiro o todo e depois, projetava-se as partes de
acordo com aquele pré-conceito. Assim, as partes de um edifício
deveriam estar subordinadas a um aspecto principal (príncipe), devendo
adaptar-se a ele.
O primeiro passo no método Beaux-Arts era o desenvolvimento de um
príncipe; que vem a ser a concepção mais básica de um edifício, ou seja,
um esquema diagramático, uma idéia conceitual genérica. Depois desta
definição, segue-se o desenvolvimento do estudo onde ficam definidas as
características principais do projeto.
Segundo Mahfuz, a passagem para o plano material dar-se-ia em um
plano intermediário que corresponde ao desenvolvimento do todo
conceitual também chamado de partido. O partido fixaria a concepção
básica (essência) do projeto em termos de organização plani-altimétrica e
volumétrica, assim como suas possibilidades estruturais e de relação com
o contexto.
Tratados modernos
Os tratados modernos de arquitetura a partir do Renascimento surgiram
com Leone Battista Alberti (1404-1472) e sua obra De Re Aedificatoria
(1452) do século XV. Segundo Alberti, existiria um problema na definição
da parte arquitetônica que seria primeiro uma questão da escala e
segundo uma questão dos limites.
Assim, Alberti definiu a parte como algo com conteúdo espacial definido
(recinto) onde as partes principais seriam os espaços interiores e
exteriores de um edifício, com demarcação específica e separação das
áreas (pórtico, vestíbulo, pátio, salão) e as partes secundárias por sua vez
dariam o caráter às partes principais, ou seja, os detalhes arquitetônicos
(portas, janelas, as Ordens, etc).
Por sua vez, entre os séculos XVIII e XIX, o francês Jean-Nicholas-Louis
Durand (1760-1834) foi o professor da Escola Politécnica de Paris (criada
em 1795) que propôs mudanças revolucionárias na maneira de ensinar
arquitetura, focalizando sua prática nos valores utilitários e econômicos,
de modo a assegurar os princípios racionais clássicos: beleza, proporção e
simbolismo. Sua sistematização de planos/ elevações/ seções
transformou efetivamente o projeto de arquitetura em uma seleção de
40
tipologias onde a simetria e a simplicidade das formas geométricas
prevaleciam, definindo-o como um sistema racional e formal, de caráter
subjetivo, lógico e fechado, ao mesmo tempo.
42
Seu livro Précis des Leçons d’ Architecture (1802-05) consistia na
combinação de elementos (partes) precisamente definidos onde havia
uma distinção entre elementos construtivos – fundação, paredes, tetos
e as partes dos edifícios divididas entre principais: pórticos, vestíbulos,
pátios e demais recintos – e acessórias: escadas, pérgolas, etc. Sua
principal preocupação era oferecer uma espécie de catálogo onde
qualquer projetista poderia escolher as partes e agrupá-las seguindo as
instruções de como reuní-las.
A estrutura do texto se organizava em dois volumes onde o primeiro
tratava dos Elementos do Edifício (qualidades e usos dos materiais,
formas e proporções) e da Composição em Geral (combinação de
elementos, partes do edifício e seu todo).
O segundo volume encarregava-se de examinar os principais tipos de
edifícios, agrupando-os em: urbanísticos (portais, arcos, ruas, pontes e
praças), edifícios públicos (templos, palácios, tribunais, escolas,
bibliotecas, museus, mercados, matadouros, teatros, balneários, hospitais
42
Durand, J-N-P. Precis of the Lectures on Architecture (1802-05). Traduzido em
inglês por David Britt. The Getty Research Institute. Los Angeles, 2000.
e penitenciárias) e edifícios privados (casas, apartamentos, dependências,
hospedarias, etc).
Para Antoine Picon, que abre a introdução do livro (traduzido para o
inglês em 2000), a metodologia de Durand sobreviveu por gerações de
estudantes ao longo do século XIX, pois teria sido o primeiro tratado
subjetivo de arquitetura. Ele teria sido pioneiro em definir o processo
arquitetônico com foco na metodologia de projeto, onde aplicava um
princípio comparativo, em uma escala constante, entre os diferentes tipos
de edifícios, ao longo da história da arquitetura, justapondo: templos,
fóruns, basílicas, teatros, bibliotecas, etc.
Para Picon, o grande desafio de Durand foi confrontar a possibilidade de
manter a arquitetura como disciplina autônoma com a racionalidade
científica que predominava naquela época, numa Escola que educava
engenheiros e cientistas, cujo objetivo era basicamente transmitir-lhes
conhecimento tecnológico.
No final da segunda parte do livro, Durand conclui com o texto The
Procedure to be followed in the composition of any Project
(Procedimentos a serem seguidos na composição de qualquer projeto)
onde relata (dirigindo-se aos estudantes) uma seqüência lógica para se
combinar os diferentes elementos e partes do edifício.
Antes de tudo, certifique-se que você compreendeu o uso e as
necessidades do edifício a ser projetado; atente-se para o espírito daquilo
41
que será concebido e certifique-se que qualidades como solidez,
salubridade, conforto, segurança e tranqüilidade transparecerão. Depois
disso, considere a hierarquia entre as partes, ou seja, quais salas são
principais, quais são secundárias; estabelecendo suas posições e
tamanhos. Uma vez feita estas observações (em croquis), determine o
número de eixos em cada sala, descobrindo o total deles em relação a
superfície do terreno (fundação) e a estrutura possível (vãos técnicos). Um
estudo feito desta maneira, se ajustará facilmente aos ornamentos
artísticos que serão empregados posteriormente. Assim, é fácil de
observar com que facilidade e sucesso, qualquer edifício pode ser
composto, se o arquiteto, seguir o curso indicado pela razão e pelos
princípios derivados da natureza, ambos presente no estudo da arte e da
composição, onde se trata de (nada mais e nada menos) uma sucessão
continua de observações e raciocínios”.
43
A noção tipológica de Durand não seria um catálogo de soluções
aplicáveis, mas um sistema classificatório que familiarizasse qualquer
pessoa com os vários problemas que viessem a ocorrer na prática
projetual. O tipo seria definido, portanto, segundo Durand, como uma
espécie de subsistema baseado na associação entre função, uso e
arranjos espaciais entre eixos. Sua coerência e estabilidade derivam de
43
Durand, J-N-P. Opt. Cit., p. 180-181.
uma economia interna, o que permite a formação de uma matriz que
orienta a concepção do edifício, sem confiná-lo na imitação de um
modelo.
44
Na recapitulação do prefácio, Durand definiu:
“Arquitetura é uma arte única em que seu objeto é a composição
e execução de edifícios, tanto público com privado, e seu propósito é
satisfazer a maior parte de nossas necessidades, e de colocar-nos numa
posição capaz de preencher todas as outras”.
45
Segundo Durand, os meios para se alcançar este fim seriam ajuste
(fitness) e economia. Ajuste indicaria solidez, salubridade e conforto. E
por sua vez, economia compreenderia simetria, regularidade e
simplicidade. Solidez dependeria da seleção e do uso dos materiais e do
número e disposição dos suportes, e salubridade dependeria da situação,
da exposição, da elevação do solo, das paredes e suas aberturas e da
cobertura. Conforto viria da relação entre a forma do edifício e o número
de partes, de um lado, e seus propósitos, de outro.
Quanto à economia, as mais simétricas, regulares e simples formas como
o círculo, o quadrado, seriam as mais econômicas pois seus perímetros
definiriam áreas mais precisas.
44
Durand, J-N-P. Opt. Cit., p. 47.
45
Durand, J-N-P. Opt. Cit., p. 87.
42
E na sua conclusão, disposição deveria ser a única preocupação do
arquiteto, e sua finalidade seria oferecer deleite. Caráter, efeito,
variedade – ou seja, os aspectos estéticos que se pretende dar a um
edifício através da decoração – naturalmente apareceriam em qualquer
disposição que abrangesse ajuste (fitness) e economia. Portanto, antes de
se dispor um edifício, combinando e reunindo suas partes, estas etapas
precisariam ser conhecidas.
A seguir, investigamos também a origem do chamado método Beaux-
arts
46
, de modo a caracterizá-lo com mais profundidade, na tentativa de
46
O método Beaux-arts baseava-se na solução de problemas de composição, ou
seja, na organização dos elementos arquitetônicos de acordo com princípios
compositivos (unidade, proporção, escala, harmonia) para daí extrair uma
formulação sobre o caráter do edifício. Baseava-se principalmente na relação
mestre-aprendiz que se efetivava no âmbito do atelier, onde o aluno dependia da
competência de projetar do professor para o seu desenvolvimento e
amadurecimento no processo de projeto. A noção de composição remonta à
tradição renascentista quando os tratadistas (leia-se principalmente, Alberti e
Palladio) estabeleceram normas e princípios que seriam capazes de traduzir a
idéia de Beleza. Mais precisamente, nos séculos XVIII e XIX, teóricos das escolas
de arquitetura francesa, as École dês Beaux-arts, influenciaram a noção de
composição arquitetônica, formulando as bases para a realização da boa
estabelecer as relações com os trabalhos de Guadet e Durand e
conseqüentemente com o curso de Composição da Escola Politécnica de
São Paulo.
Origem e aplicação do método Beaux-arts
A implantação da política cultural iluminista do Estado Francês, na forma
de academias, desvirtuou o ideal humanista da Renascença. Nela houve
lugar tanto para a imposição de uma nova síntese de arquitetura,
escultura e pintura – as Beaux-Arts -, quanto para uma completa
instrumentação do conhecimento. Essas duas tendências terão expressão,
respectivamente, na École de Beaux-Arts e na École Polytechnique de
arquitetura.A composição como técnica ou método de ensino Beaux-arts
fundamentava-se na interpretação das teorias renascentistas e clássicas, segundo
as quais, os elementos de uma edificação estariam subordinados a um aspecto
principal (“príncipe”), tendo como objetivo chegar a unidade e harmonia da obra.
O método era bastante claro e estabelecia as ações necessárias para se chegar ao
projeto final: 1) Desenvolvimento do partido (“parti pris”) – esquema conceitual
básico definido a partir de esquemas tipológicos tradicionais, previamente
assimilados na mente do projetista; 2) Estudo aprofundado (“esquise”)
definição das características gerais do edifício, com maior precisão; 3) Desenhos
finais (“rendu”) – tratamento requintado e fiel ao “esquise” original.
43
Paris, tanto que se tornaram modelos para o ensino de arquitetura de um
modo geral no ocidente.
47
No Brasil, assim como nos Estados Unidos, a influência da École des
Beaux-Arts foi definitiva. Entretanto há diferenças fundamentais a serem
consideradas no modo como essa influência modificou o ensino e a
prática da arquitetura nos dois países. Nos Estados Unidos, a tradição
Beaux-Arts se deu também via ensino de engenharia. Dessa forma, o
ensino americano, bem como na Alemanha e Espanha, herdaram a
tradição “politecnista” que considerava a arquitetura uma especialidade
da engenharia.
Já no Brasil, a tradição Beaux-Arts chegaria de duas formas: diretamente,
via missão francesa e, indiretamente, via escolas de engenharia. A
tradição Beaux-Arts "pura" se desenvolve numa seqüência de instituições.
Inaugurada no Rio de Janeiro em 1816, como "Escola Real de Ciências,
Artes e Ofícios", ela passa por várias fases, desde "Real Academia de
Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil", "Imperial Academia de
Belas-Artes", "Escola Nacional de Belas-Artes", até se transformar em
"Faculdade Nacional de Arquitetura", em 1945. Por sua vez, os cursos de
47
Trecho extraído do artigo eletrônico Disciplina e Legitimação do Conhecimento
de Roberto Eustáquio dos Santos em:
<http://www.arquitetura.ufmg.br/ia/disciplinalegitimidade.html>
Engenheiro-Arquiteto, fundados em São Paulo e no Rio Grande do Sul,
seguiram um modelo similar ao americano.
Segundo Santos, embora o prestígio "acadêmico" estivesse mais ligado à
tradição Beaux-Arts (que até 1945 tinha o curso de arquitetura ligado
estreitamente aos cursos de pintura e de escultura, ou seja, à noção
francesa de Belas-Artes) é o modelo inspirado na transformação ocorrida
dentro da tradição politécnica (que passa a considerar a arquitetura como
um ramo da engenharia) que prevaleceu no ensino brasileiro.
Sigfried Giedion em seu livro Espaço, Tempo e Arquitetura discorreu sobre
outro fator importante: a cisão entre a arquitetura e a tecnologia no
decorrer do século XIX. Segundo ele, este fato decorrera da existência e
também da controvérsia entre as linhas de atuação da Ecole de Beaux-
Arts e da Ecole Polytechnique de Paris.
48
Em 1806, Napoleão fundara a Ecole de Beaux-Arts cujo programa
mantinha a unidade entre a arquitetura e as demais artes. A Ecole
Polytechnique por sua vez havia sido fundada em 1794, oferecendo uma
formação científica em relação as escolas técnicas avançadas. Grandes
teóricos, físicos e matemáticos da França que atuavam na Ecole
influenciaram diretamente e decisivamente a indústria, combinando
ciência teórica e prática.
48
Giedion, S. Espaço, tempo e arquitetura. Editora Martins Fontes, São Paulo,
2004, pg. 237.
44
Assim, a tentativa da escola politécnica era estabelecer a articulação
entre ciência e vida, com o intuito de trazer aplicações práticas de
descobertas científicas e matemáticas para o desenvolvimento da
indústria.
A pergunta que se seguia era: que tipo de formação deveria seguir um
arquiteto? E afinal, qual a relação e a diferença entre um engenheiro e
um arquiteto?
Os sistemas construtivos deveriam influenciar o caráter do projeto de um
edifício e assim cada vez mais o engenheiro passava a interferir no campo
de atuação do arquiteto.
As novas invenções técnicas impunham ao arquiteto o dever de explorar
novos caminhos e alternativas. Assim, uma das principais funções da
técnica construtiva era também fornecer à arquitetura, o estímulo e o
incentivo para os novos avanços.
A menção dos fatos anteriores interessa no sentido de construir um
quadro histórico mais amplo e estabelecer pontes entre o ensino no curso
de Engenheiro-Arquiteto da Politécnica de São Paulo e a formação
acadêmica de Zenon Lotufo. Deste modo, passamos a registrar alguns dos
trabalhos realizados por Zenon, e também de alguns colegas de curso, de
forma a ilustrar o repertório estético e arquitetônico clássico da Escola.
1.5. - Trabalhos de Composição
Os melhores trabalhos eram periodicamente publicados pela Revista do
Grêmio Politécnico, veículo de circulação acadêmica que incentivava o
esforço e a dedicação dos alunos de modo que todos desejavam
participar com seus desenhos das páginas do periódico.
Zenon Lotufo teve a oportunidade de publicar cinco trabalhos sendo
importante destacar nos exemplos a seguir a riqueza dos temas (fig. 6 –
Lanterna de Demóstenes; fig. 7 – Igreja em estilo gótico e fig. 8 – edifício
Residencial), todos datados de 1935, durante o 4º. ano de curso para a
disciplina Composição Geral.
No quinto ano de curso de Zenon, o periódico acadêmico publicou o
projeto para uma estação ferroviária (fig. 9), além de seu trabalho de
conclusão.
(fig. 6) Fonte: RGP n.119
45
(fig. 7) Fonte: RGP n.120.
(fig. 8) Fonte: Revista Grêmio Politécnico n. 121 (RGP).
(fig. 9) Fonte: Revista Grêmio Politécnico 125 (RGP).
Em 1936, Zenon Lotufo forma-se Engenheiro-Arquiteto pela Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo. Seu trabalho de conclusão de
curso, um edifício de apartamentos (fig. 10) já apresentava certa transição
moderna ao preferir linhas mais ortogonais e limpeza nos volumes da
composição. Tal fato comprovaria uma sintonia do jovem arquiteto com
os processos de mudança na disciplina arquitetônica da década de 30.
Certa ruptura com os estilos tradicionais (ornamentação controlada), mas
ao mesmo tempo uma aceitação de valores clássicos como simetria,
equilíbrio e proporção. Interessante também é comparar a semelhança da
torre de apartamento com o Edifício Columbus (projeto de Rino Levi -
46
projeto de 1930 e construção terminou em 34), obra inovadora na época
que situava-se à Rua Brigadeiro Luis Antonio (já demolido), como
mostramos abaixo.
(Figs. 10 e 11): Trabalho de conclusão de curso de Zenon Lotufo, ao lado, foto de época do
edifício Columbus, autoria de Rino Levi. Fontes: RGP 122 e Rino Levi – Arquitetura e
Cidade.
Trabalhos de colegas
Zenon Lotufo se formou como único engenheiro-arquiteto no ano de
1936, ou seja, na metade da década de 30. Isto quer dizer que seus
colegas de outros anos (do primeiro ao quinto) com quem tivesse
convivido ou acompanhado, teriam freqüentado as aulas do curso de
engenheiro-arquiteto nesta faixa de tempo (cinco anos antes do ingresso
de Zenon (30) e cinco anos depois de sua formatura (40).
Assim, podemos comparar os trabalhos de Composição dos colegas que
conviveram no mesmo período que Zenon esteve na faculdade, fato que
poderia comprovar o repertório plástico dos alunos, estilos, linguagem e
técnica gráfica, entre outros, e também ilustrar certo padrão estético no
ensino da Politécnica.
A lista de formados de 30-41 totaliza um número de 41 engenheiros
arquitetos. Entre os nomes mais conhecidos podemos mencionar: Carlos
da Silva Prado (32), Carlos Brasil Lodi (33), Affonso Iervolino e Mário
Edgard Henrique Pucci (34), Icaro de Castro Mello (35), João Batista
Vilanova Artigas (37), Rubens Gouvêa Carneiro Vianna (38), Leo Ribeiro de
Moraes (39), Roberto Cerqueira César e Ariosto Mila (40) e Oswaldo
Correa Gonçalves (41)
49
. Alguns destes trabalhos reproduzimos a seguir.
49
Catálogo de exposição - 100 anos de Ensino de Arquitetura e Urbanismo em
São Paulo, setembro de 1996, coord. Nestor Goulart Reis, p. 93.
47
Fig. 12: Trabalho de Alfredo Giglio (5º. Ano – 1935) Fonte: RGP.
Interessante observar nos desenhos, os temas programáticos de
composição, a semelhança na linguagem e técnica gráfica de
representação (céu esfumaçado e escuro, massas de vegetação, sombras,
reflexos nos vidros), além do predomínio da temática clássica: simetria,
proporção, harmonia e ritmo do conjunto.
Fig. 13: Estudo de Ginásio de Ìcaro de Castro Mello (5º. Ano – 1935). Fonte: RGP.
Figs. 14 a 16: Trabalhos de Afonso Iervolino (5º. Ano - 1934), Roberto Cerqueira Cezar (3º.
Ano - 1938) e Rubens Carneiro Vianna (5º ano – 1938). Fonte: RGP.
48
João Batista Vilanova Artigas também fora aluno do curso de Engenheiro-
Arquiteto da Escola Politécnica, no período de 32 a 37. No livro editado
pela sua fundação em 1997, consta um relato de sua vida na introdução
onde o arquiteto abordou sobre sua estrutura de funcionamento:
O curso de Arquitetura, na Escola Politécnica, era, no fundo, um
curso de Engenharia Civil que incluía um programa de Pequenas e
Grandes Composições, como se fizera nas Belas Artes. Depois tínhamos
aulas de história da Arquitetura e uma cadeira de Estética e Urbanismo,
que era o Anhaia Mello quem dava, para o 4º. e 5º. Anos. As Pequenas e
Grandes Composições tratavam da parte compositiva, por assim dizer, de
criação artística ou estética.
50
Fig. 17: Trabalho de Composição de Vilanova Artigas Fonte: Vilanova Artigas: arquitetos
brasileiros.
50
Instituto Lina Bo e P.M. Bardi e Fundação Vilanova Artigas. Vilanova Artigas:
arquitetos brasileiros. São Paulo, 1997, pg. 17.
Contexto profissional em São Paulo
Na década de 30, os nomes da arquitetura paulista que despontavam
eram Rino Levi, Flávio de Carvalho e Gregori Warchavick, todos com
formação européia travando sozinhos, uma batalha pela aplicação da
nova linguagem moderna em São Paulo.
O ensino universitário limitava-se naquela época apenas ao curso de
Engenheiro-Arquiteto dado pela Escola Politécnica, cuja especialidade era
atribuída apenas aos alunos que assim a optassem, a partir do terceiro
ano, como vimos anteriormente.
No entanto, o negócio da construção em São Paulo (até a década de 40)
limitava-se basicamente às firmas particulares, conhecidas como
escritórios técnicos, que cuidavam de todas as etapas necessárias à obra:
projeto, orçamento e execução.
Arquitetura e engenharia não se distinguiam muito neste período,
existindo apenas algum tipo de subdivisão no interior dos escritórios
técnicos, de modo que não existiam firmas especializadas apenas na
realização dos projetos, uma vez que no valor da construção, este já
estava incluído.
Outro setor que absorvia os profissionais da construção civil era o serviço
público graças à quantidade de obras de infra-estrutura urbana como
pontes, estradas, escolas, etc. Como exemplo, poderíamos citar a
Secretaria de Obras Públicas e Viação da Prefeitura de São Paulo (onde
49
Zenon Lotufo chegou a trabalhar primeiro como desenhista e depois
como engenheiro-arquiteto contratado)
Nesta época, o diretor da escola de engenharia Mackenzie, Arquiteto
Christiano Stockler das Neves defendia duramente que o arquiteto
deveria ocupar-se exclusivamente da atividade projetual enquanto que o
engenheiro se encarregava da construção. Para ele, a função do arquiteto
estava ligada a uma atividade nobre e artística e, portanto, estaria acima
da construção, que seria uma mera atividade técnica.
Esta situação começaria a mudar lenta, porém efetivamente com a
atuação do arquiteto paulista Rino Levi. Em seu projeto para o Cine Ufa-
Palace em 1936, ele assumiria apenas a parte da elaboração dos desenhos
e da fiscalização da obra, abandonando a execução da construção
propriamente dita.
51
Assim, o arquiteto de formação italiana marcava o
início de uma nova atuação profissional vista agora como atividade liberal
autônoma.
Assim, este é o quadro em que se encontrava Zenon Lotufo, ao concluir o
curso de Engenheiro-Arquiteto na Politécnica de São Paulo. Seus
primeiros trabalhos como profissional recém-formado apresentavam as
linhas da arquitetura produzida e, de modo geral, ainda bastante aceita
naquela época.
51
Ficher, Silvia. Os arquitetos da Poli: ensino e profissão em São Paulo. Edusp, São
Paulo, 2005, pg. 244.
1.6. - Primeiros trabalhos profissionais
“O Art Déco foi o suporte formal para inúmeras tipologias
arquitetônicas que se afirmavam a partir dos anos de 1930”.
52
Hugo Segawa nos mostra em Arquiteturas no Brasil 1900-1990, que
embora as discussões acadêmicas estivessem já um pouco atualizadas
com a arquitetura praticada pelas vanguardas na Europa, muitos
arquitetos brasileiros, entre eles Lotufo, ainda eram “obrigados” a repetir
as fórmulas conhecidas do gosto eclético ou até Art-decó.
Portanto, as primeiras realizações de Zenon Lotufo estavam adequadas a
certa “arquitetura nacional corrente”, em que experiências formais se
disseminavam pelo Brasil, mostrando uma fase de transição estética e
técnica que valorizaria o uso do cimento armado, como veremos a seguir.
52
Segawa, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. Edusp, São Paulo, 1999, pg.
61.
50
Paço Municipal de Taquaritinga (Taquaritinga/SP, 1936 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Afonso Iervolino (Concurso público – 1
o
. lugar)
Fonte: Revista Grêmio Politécnico.
(fig. 18)
Zenon Lotufo acabara de se formar como engenheiro-arquiteto, e contou
com a parceria de seu ex-colega de Escola Politécnica, Affonso Iervolino,
para vencer este concurso público.
De certa forma, o estilo racionalista do edifício denunciava o processo de
transição da arquitetura paulista para linhas mais ortogonais e modernas,
com simplificação dos ornamentos e busca de uma composição mais
limpa e pura.
Observando a perspectiva do projeto (aliás, a única imagem conseguida),
notamos que a composição destacava um volume verticalmente
estendido com altas e compridas janelas, enfatizando a caixa de escada
para o segundo nível, entrecortando a caixa horizontal deitada próximo
ao acesso do edifício.
Um volume lateral também se prolongava em relação ao alinhamento da
rua, marcando um ingresso para a parte interna do prédio. O tratamento
sóbrio das molduras nas janelas, balcões e platibanda ilustrava o
abandono gradual de ornamentação excessiva nas fachadas, fato
bastante característico deste período.
O aspecto geral da composição no desenho assemelha-se muito a um
padrão de arquitetura produzida, principalmente na década de 30, de
modo geral no Brasil, aplicada a alguns edifícios públicos como paços
municipais e agências de correios. Como afirma Segawa:
“Nos anos de 1930, conceitos como funcionalidade, eficiência e
economia na arquitetura – termos próprios de soluções racionalistas –
tiveram firme aplicação em obras públicas”.
53
53
Segawa, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. Edusp, São Paulo, 1999, pg.
66.
51
Mercado Municipal de Sorocaba (Sorocaba/ SP, 1937-38)
Fontes: Acrópole n.03, julho 38, p-36-37.
(fig. 19)
No início do ano de 1937, a Prefeitura Municipal de Sorocaba abriu um
concurso público para a construção de um novo prédio para o Mercado
Municipal (área construída de 2.080 m2) que pudesse eventualmente
receber exposições de produtores industriais. Neste concurso, novamente
vencido por Zenon Lotufo e Afonso Iervolino, os arquitetos procuraram
dar ao edifício todas as comodidades desejadas, além de atender as
recomendações de higiene necessárias ao bom funcionamento do
Mercado: entradas amplas, perfeito escoamento das águas e instalações
sanitárias. Internamente, foram localizados os “boxes” para laticínios,
secos e molhados, açougues para carnes e peixes, acompanhando as
paredes perimetrais e na área central as bancas para verduras, frutas e
aves com passagens amplas entre si.
A clareza na distribuição das funções do edifício, bem como na circulação
(entradas e saídas, corredores, fluxo de mercadorias e usuários)
começaria a despontar como característica marcante do trabalho de
Zenon.
Planta baixa (fig. 20)
Outro fator que destacamos é a simetria dos eixos e da fachada na
composição do edifício, influência da formação clássica dos arquitetos,
ambos formados pela Politécnica de São Paulo.
Figs. 21-22: Mercado de Sorocaba. Fonte: AU 76 e www.sorocaba.sp.gov.br.
52
1.7.- Início das atividades didáticas
Zenon Lotufo foi assistente do professor Anhaia Mello na cadeira n.18
(Estética. Composição Geral e Urbanismo I e II) em 1938 (e depois,
novamente em 1947), fato que daria início à suas atividades como
professor acadêmico.
Interessante comparar a semelhança do programa da disciplina
ministrada por Anhaia Mello, com o método Beaux-arts e a estrutura dos
cursos de Guadet e Durand, onde primeiro se analisava as partes e os
elementos do edifício, e depois as tipologias principais de edifícios.
Assim, destacamos do programa de curso naquela oportunidade (38) que
se estruturava da seguinte forma:
Elementos de composição (3º. Ano)
Elementos de apoio (colunas, pilares, ordens, aberturas, portas,
janelas, arcadas, frontões, galerias, colunatas, etc).
Elementos apoiados (coberturas, tetos, abobadas, pavimentos,
etc).
Seções dos edifícios (ingressos, pórticos, escadas, claustros,
gradis, etc)
Edifícios (4º. e 5º. Anos)
Associação lógica das diferentes seções de acordo com o
programa.
Dados relativos à situação, orientação, clima e materiais.
Distribuição e equilíbrio das massas.
Edifícios particulares (casas operárias e burguesas, apartamentos)
Edifícios públicos (hotéis, escolas, bibliotecas, penitenciárias,
hospitais, bancos, lojas, mercados, restaurantes, fábricas,
estações, teatros, etc).
Estética (4º. Ano)
Estética Geral: Definições. Beleza natural e artística. A filosofia da
arte.
Teoria estética. Hedonismo, sentimentalismo, intelectualismo,
misticismo.
As Belas-Artes. Artes plásticas e acústicas. O lugar do belo e da
arte na cultura humana.
Estética da Arquitetura. O útil e o belo. Os estilos. Sistemas
fundamentais. Caráter profissional do arquiteto.
As formas arquitetônicas. Formas de conveniência, estrutura e
expressão.
Vocabulário ornamental. Leis gerais do ornato.
Teoria da arquitetura. Histórico da arquitetura na Antiguidade,
Idade Média, Renascimento, Época moderna e contemporânea.
Exame e crítica das principais teorias.
53
Urbanismo (5º. Ano)
Sociologia: ciência, arte e organização social.
Origem da vida urbana. Psicologia e sociologia.Tipos e estruturas
de cidades: morfologia e ecologia.Crescimento e expansão
urbana, mobilidade e metabolismo. Cidade e campo.
Desenvolvimento rural planejado. História das cidades – da pré-
história a época moderna e contemporânea.
A cidade, fenômeno geográfico e social; o município, unidade
funcional. Administração pública municipal, opinião pública,
finanças e orçamentos, contabilidade municipal.
Avaliação de imóveis urbanos, economia urbana, propriedade.
Legislação do urbanismo moderno. Zoneamento. Métodos
europeus e americanos de planejamento.
Organização de um Plano de Desenvolvimento. Elementos básicos
de MasterPlan. Inquérito preliminar ou reconhecimento.
Requisitos e finalidades.
Planos Regionais. Estudo das relações de massa. Distribuição das
populações: a habitação e a indústria. Salubridade das cidades.
Elementos físicos de um Plano. Sistema viário. Espaços abertos.
Zoneamento. Desenvolvimento local. Arquitetura e estética
urbana
A cidade-jardim. Exemplos atuais. Dinâmica do Plano. Circulação e
trânsito. Serviços públicos e infra-estrutura urbana.
54
Segundo depoimento de ex-alunos, como vimos anteriormente, Anhaia
Mello era considerado um extraordinário professor graças à sua extrema
capacidade didática e conhecimento teórico vasto. Suas aulas cativavam
os alunos, pela visão técnica que tinha do planejamento aliada à
perspectiva humanística que impregnava aos assuntos.
Organizava suas aulas sempre em fichas de papel-cartão separadas por
temas onde agrupava: resumos feitos a mão, croquis e reproduções de
interesse da matéria. Possuía uma excepcional capacidade de memória
utilizando-a com desenvoltura à medida que organizava seu quadro
negro.
Numa dessas reproduções (fig. 6) referiu-se à Teoria da Arquitetura como
conjunto de conhecimentos técnicos e artísticos necessários à
exteriorização da visão estética. Agrupando os Elementos de Ordem em:
1. Material (estáveis e impostos de fora) como solo, materiais e clima; 2.
Sócio-Econômica (instáveis e impostos de fora) como programa, custos e
legislações; e 3. Artístico (estáveis e pessoais) como partido, composição,
proporção, escala, correções óticas, realce e possibilidades técnicas de
54
Trecho extraído do Programa da Cadeira no. 18 “Composição Arquitetônica e
Urbanismo de 1938, do curso de Engenheiro-Arquiteto da Escola Politécnica da
Universidade de São Paulo.
54
execução. Por fim, destaca-se uma frase que diz: “só do justo equilíbrio
dos fatores técnicos e artísticos nasce a obra de arte verdadeira”.
55
Zenon
compartilhava esta mesma visão sobre a disciplina arquitetônica.
Fig. 23: Anotação de aula de Anhaia Mello. Fonte:(idem nota abaixo).
55
Documentos sobre o urbanista L.I.R. Anhaia Mello, FAUUSP, São Paulo, 1986,
pg. 18.
1.8-Experiência na administração pública de Santos (39-45)
O curso de engenheiro-arquiteto na Politécnica oferecia uma ampla
formação em diversas áreas e assuntos como as disciplinas de Urbanismo,
Contabilidade, Economia e Saneamento Urbano.
Constatamos pela abrangência urbanística e pelo conteúdo do programa
curricular aliada à rigorosa formação técnica dos alunos na Politécnica, a
possibilidade dos mesmos em atuarem em diversas áreas de trabalho e
cargos públicos, como o cargo de Chefe da Divisão de Obras Particulares
da Prefeitura de Santos que Zenon Lotufo exerceu de 1939 até meados de
1945 (período que curiosamente coincide com a 2 a. Guerra Mundial).
Além disso, Zenon Lotufo já tinha experiência em cargos públicos, pois
havia trabalhado antes como desenhista (35-36) e depois de formado
como arquiteto contratado na Secretaria de Viação e Obras Públicas da
Prefeitura de São Paulo (37-38).
Assim, aceitou o convite de Roberto Simonsen (que havia conhecido
Zenon no jornal Estado de São Paulo, onde trabalhou na época de
estudante da Politécnica) para atuar na diretoria de Obras Públicas de
Santos, vindo a realizar importantes obras como o Código de Obras de
Santos e São Vicente, os Postos de Salvamento da Orla Marítima e o
Orquidário Municipal, entre outros.
55
Aquário Municipal de Santos (Santos/ SP, 1943-45)
Construção: Soc. Const. e de Imóveis Silvio Passarelli.
Fonte: Acrópole, jan 46.
Fig:24
Este edifício seguia o chamado estilo neocolonial caracterizado por alguns
elementos de certa herança construtiva portuguesa, como neste caso, o
telhado cerâmico.
Situado nos jardins da praia bem próximo da entrada do porto na Avenida
Bartolomeu de Gusmão (Ponta da Praia) apresenta uma separação
funcional de espaço público e serviços bastante claros e distintos
internamente. Os espaços reservados ao uso público estavam definidos
por um amplo corredor de 3 metros de largura, ladeados por janelas. Um
grande tanque de 13 metros de diâmetro rodeado por uma circulação
avarandada com peitoril de 1,5 metros situa-se na extremidade esquerda
do prédio (como se vê na planta).
Inaugurado em 1945, com a presença do presidente Getúlio Vargas, o
Aquário é um importante marco arquitetônico e turístico para a baixada
santista. Recentemente em 2004, sofreu uma reforma e ampliação em
sua estrutura, fato que descaracterizou intensamente sua fachada frontal
e volumetria.
Planta baixa (fig. 25)
Novamente, ao analisar rapidamente a planta, observamos a clareza na
distribuição das funções do edifício, fato que caracteriza uma
preocupação constante na obra de Zenon Lotufo.
56
1.9. Prefeito nomeado de Campos do Jordão (46)
Encontramos pouco material sobre este período de atividades na carreira
de Zenon Lotufo quando foi prefeito nomeado em 46.
No entanto, uma publicação da década de 60 relatou um importante
trabalho realizado nesta época, mas que fora fruto de serviço anterior
prestado pelo arquiteto, ou melhor, prefeito, e que reproduzimos alguns
trechos.
Em 1960, o então Centro de Pesquisas e Estudos Urbanísticos (CPEU) da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo publicaram o Relatório e Pranchas
do Planejamento Territorial referente ao Plano Diretor da Estância de
Campos do Jordão
56
. Naquela ocasião, eram autoridades públicas, os
seguintes senhores: Prof. Dr. Carlos Alberto de Carvalho Pinto
(Governador do Estado), Brig. J. V. de Faria Lima (Secretário da Viação e
Obras Públicas), Prof. Dr. Antônio de Barros Ulhôa Cintra (Reitor da
Universidade de São Paulo), Prof. Dr. Luiz Ignácio Romeiro de Anhaia
Mello (Diretor FAUUSP), Dr. José Antonio Padovan (Prefeito da Estância) e
o Arquiteto Zenon Lotufo (Diretor Geral do Planejamento da Estância).
Na Introdução, apontavam-se as características peculiares da situação
geográfica do município, acoplado à Serra da Mantiqueira, contendo
paisagens pitorescas onde se destacava a presença de araucárias.
56
Centro de Pesquisa e Estudos Urbanísticos (CEPEU). Plano Diretor de Campos
do Jordão: relatório e pranchas de planejamento territorial. FAUUSP, 1960.
As médias de temperatura anual em Campos do Jordão (altitude 1630m)
chegavam aos 13
o
C o que lhe valeu na época o apelido de “paraíso de
clima tropical”, recebendo por isso clinica de recuperação de problemas
pulmonares e outras sanatoriais, além de sua altitude de 1630 m.
No histórico consta que desde sua fundação, a cidade sanatorial voltara-
se para o turismo nacional e internacional, merecendo atenção dos
governos estaduais. Em 35, o governador Salles de Oliveira nomeou uma
comissão presidida por Prestes Maia para elaborar estudos de
urbanização.
A partir de 39, houve um surto turístico na estância com obras de grande
porte como hotéis, estradas e melhorias urbanas, mas de uma maneira
isolada e sem visão de conjunto.
Em 46, o arquiteto Zenon Lotufo foi nomeado Prefeito da Estância, num
período de transição de ditadura militar para reconstitucionalização do
país, ou seja, época de grande atividade política, conseguindo mesmo em
poucos meses, encaminhar medidas para o planejamento municipal. E
mais tarde, em 52, colaborou novamente nos estudos preliminares para o
Plano Diretor da Estância que acabaram não se realizando por falta de
financiamento. Em 58, o governador Jânio Quadros assinou convênios
para o planejamento das estâncias paulistas. Zenon Lotufo coordenou o
trabalho como diretor geral de planejamento na Estância de Campos do
Jordão.
57
A Comissão Técnica iniciou seus trabalhos com uma série de reuniões
públicas para exposição e debates de assuntos referentes ao Plano. A
primeira fase dos trabalhos, junto com os dados dos arquitetos e o
conhecimento da região através de levantamento aerofotogramétrico
resultou no Plano Piloto, aprovado pela Câmara em 59.
A análise geral (diagnóstico) revelou a precariedade de infra-estrutura
básica como pavimentação, rede de esgoto, galeria de águas pluviais,
coleta de lixo. No entanto, o abastecimento de água, luz, telefone, e
iluminação pública apresentaram-se como eficientes em 80% dos casos.
Um levantamento geral dos equipamentos escolares da época apontou 35
salas de aula, sendo 31 estaduais e 4 particulares, e um total de 1850
alunos sendo 50 professores para o ensino primário de 7 a 14 anos, além
de mais 6 escolas rurais. Um número de alunos baixo pela capacidade
disponível segundo análise do plano. Os equipamentos de saúde
resumiam-se 13 sanatórios para tuberculose e 5 abrigos ou instituições
assistenciais, e nenhum hospital geral.
Quanto aos equipamentos esportivos, contavam-se 7 clubes recreativos e
culturais, 3 bibliotecas e um único cinema.Edifícios para cultos religiosos:
8 igrejas católicas (8,5 mil fiéis) , 3 protestantes, 3 espíritas. Em relação à
estrutura turística: 8 hotéis (800 leitos) e 4 colônias de férias. Os
principais atrativos geográficos eram: Pico de Itapeva, Pico do Imbiri,
Morro do Elefante, Palácio do governo, Parque da Ferradura, Pedra do
Baú, Horto Florestal, e as fontes de água mineral.
Destacava-se também a grande presença de loteamentos clandestinos
sendo 56 no total, onde os tipos de habitação: precárias (56%), popular
(20%), média (10%), luxo (2,6%) e turismo (10%)
E as áreas verdes correspondiam a 21% da área urbana, sendo a maioria
de matas naturais existentes, porém não possuindo espaços de lazer
específicos para a população como praças e parques.
Fundamentos e composição do Plano
Segundo o diagnóstico do Plano, a principal função do município era de
estação de tratamento de moléstias pulmonares e estância de repouso.
Mas, deveria se caracterizar efetivamente como centro turístico nacional
e internacional polarizado por Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte.
Assim, o Plano Diretor determinou a valorização por zoneamento de
extensa faixa territorial ao longo do Rio Capivari, permitindo nela apenas
a construção de edifícios multifamiliares (sem restrição de número de
pavimentos) respeitados apenas coeficientes de uso e ocupação do solo.
Seguindo esta mesma faixa, previa-se a instalação de zona comercial
linear, compatível com a população flutuante, com incentivos para o
artesanato local e a fruticultura.
58
Além disso, o Plano Diretor visava a proteção da zona rural tanto para a
produção agrícola quanto para o turismo, ou seja, preservação das
belezas naturais e meio ambiente, proibindo queima e derrubada de
matas ciliares, ou seja, faixa de 15 metros de largura das margens dos rios
e cursos d´agua, além de obras que alterassem os acidentes naturais. Este
fato mostra certa visão profética e preocupação antecipada de Zenon
Lotufo frente à proteção dos recursos naturais como bosques, matas e
reservas florestais.
Outras iniciativas seriam o incentivo à criação de clubes agrícolas
(conscientizar os jovens dos problemas do campo); à piscicultura
(construção de viveiros de peixes abertos à visitação e comercialização), à
fruticultura (estação experimental e de fomento de frutas para a região),
à floricultura (programa de incremento ao cultivo e comercio de flores da
região), aos acampamentos (abrigos pra escotismo e atividades similares
com crianças e jovens) e às unidades turísticas (loteamentos com lotes
mínimos de mil m2 constituídos por um hotel ou atração turística que
justificaria esta condição, e a gleba não poderia ser inferior a 12 mil m2).
O objetivo principal para a zona urbana era consolidação de um sistema
viário eficaz, aliado à setorização do uso da terra urbana e à criação de
espaços verdes.
Assim, o sistema viário se daria segundo uma hierarquia das vias
projetadas no esquema dos seguintes cortes transversais: vias-parque,
vias-principais e vias-marginais dos rios e ribeirões (ver figura abaixo).
Fig. 26:Tipos de sistema viário propostos. Fonte: CEPEU
Em relação ao uso da terra, estes se dividiram em: áreas residências
(subdividas segundo a densidade, 50, 140, 200 ou 1000 pessoas por
hectare); áreas comerciais (3 tipos: centro comercial de vizinhança, linear
ao longo do rio Capivari, ou seja, térreo dos edifícios, e centros de
bairros); áreas industriais (pequenas industrias tipo manufatura em
pequena área) e área sanatorial (ou parque sanatorial onde estariam os
sanatórios, podendo ser referência no tratamento e pesquisa das
moléstias).
59
O espaços verdes seriam basicamente de 3 tipos: reservas florestais (20%
da zona urbana, remanescentes de floresta tropical que predominavam
na região), recreio ativo (praças de esportes projetadas no vale do
Capivari) e recreio contemplativo (projetos e tratamento paisagístico,
arborização, represas de rios para formação de lagos nos vales do Capivari
e Abernéssia).
Fig. 27: Zoneamento proposto. Fonte: CEPEU.
E finalmente, quanto à setorização da estância, previa-se a subdivisão da
cidade em 20 setores ou unidades de vizinhança sendo prevista a
população e área de cada setor, bem como o dimensionamento futuro
dos equipamentos (escolas, praças, creches, etc) e infra-estrutura (água,
luz, esgoto).
Fig. 28: Detalhe da integração sistema viário e áreas de lazer. Fonte: CEPEU.
Conclusão
Portanto, esta primeira fase (31-46) da atuação profissional de Zenon
Lotufo esteve pautada principalmente pela sua formação acadêmica no
curso de Engenheiro-Arquiteto na Escola Politécnica em São Paulo, sua
relação próxima com Anhaia Mello, sendo seu assistente por duas
ocasiões (38 e 47), a parceria e os primeiros trabalhos como recém-
formados com Afonso Iervolino, e por fim, as experiências na
60
administração pública em duas oportunidades, na diretoria de obras de
Santos e a prefeitura de Campos do Jordão.
Este itinerário contribuiu de maneira decisiva para consolidar a formação
inicial do conjunto de valores do jovem arquiteto em relação à sua
postura profissional e acadêmica, passando a partir de então a realizar
com mais ênfase os preceitos da arquitetura moderna, porém
perpetuando os valores clássicos adquiridos na sua formação.
Em 1943, Zenon Lotufo era um dos sócio-fundadores do departamento
paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB-SP) juntamente com:
Eduardo Kneese de Mello (primeiro presidente), Ìcaro de Castro Mello,
Rino Levi, Oswaldo Bratke, Oswaldo Corrêa Gonçalves, Ribeiro de Moraes,
Miguel Forte, João Cacciola, Hélio Duarte, Abelardo de Souza, Francisco
Beck, Hélio Uchoa, Gregori Warchavchik, Francisco Kosuta, Roberto
Cerqueira César, entre outros.
57
Tal fato possibilitou uma maior aproximação com o grupo carioca e a
introdução definitiva aos princípios da arquitetura moderna,
principalmente com Abelardo de Souza e Hélio Duarte, com quem Zenon
Lotufo realizou parceria a partir de 46, montando escritório em São Paulo
à Rua Barão de Itapetininga, como mostraremos no capítulo seguinte.
57
Como mostra a placa de Fundação, localizada no térreo na Sede do Instituto.
61
Capítulo 2 – Escola carioca e afirmação moderna (46-58)
2.1 - Contextos
A cidade de São Paulo no pós-2ª Guerra Mundial (a partir de 45)
apresentou crescente e veloz processo de industrialização resultando em
alta taxa de urbanização.
Aliado a este fato, uma maior aceitação e difusão da linguagem moderna
arquitetônica passou a transformar a paisagem urbana das principais
capitais nacionais. O edifício do Ministério de Educação e Saúde Pública
(MESP) no Rio de Janeiro é considerado por vários autores como divisor
de águas do modernismo brasileiro.
Este projeto emblemático realizado em 1936 teve a participação direta de
Le Corbusier, que a convite de Gustavo Capanema, então ministro da
Educação, e Lúcio Costa, chefe da equipe de arquitetos, contando
também com a presença do então jovem arquiteto Oscar Niemeyer.
Neste edifício são experimentados pela primeira vez os 5 pontos da nova
arquitetura propostos por Corbusier: pilotis, teto-jardim, planta-livre,
janelas em tira horizontal e estrutura independente. Porém, o grupo de
arquitetos brasileiros deu “personalidade própria à sintaxe
62
corbusiana”
58
esboçando alguns elementos plásticos que se tornariam
característicos da nova linguagem.
Após o episódio do MESP, Lúcio Costa convidou Oscar Niemeyer para
projetar o Pavilhão da Feira Mundial de Nova York em 39, fato que
consagraria não apenas o arquiteto, mas a nova plasticidade da
arquitetura brasileira no âmbito internacional.
Logo em seguida, Juscelino Kubitschek (então prefeito de Belo Horizonte)
contrataria Niemeyer para seu grandioso conjunto da Pampulha, projeto
em que o arquiteto expressou sua capacidade criativa sobrepujando os
padrões racionalistas a generosas curvas. E que contribui de forma
decisiva para a ascensão de consolidação como gênio da nova arquitetura
nacional.
Outro fato importante que ocorreu nesta época (1943) foi a exposição e a
publicação do livro Brazil Builds no Museu de Arte Moderna de Nova York,
organizada por Philip Goodwin que percorreu o país registrando nossa
arquitetura antiga e confrontando-a com a moderna que estava sendo
produzida, principalmente pelo grupo carioca (dos 40 projetos modernos
mostrados, 30 eram de autoria de arquitetos formados pela Escola
Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro).
59
Isto caracterizou ainda mais
a então capital federal do país como centro difusor, não apenas do novo
58
Segawa, H. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. Edusp, São Paulo, 1999, pg. 91.
59
Lemos, C. Arquitetura brasileira. Melhoramentos, São Paulo, 1979, pg. 143.
estilo ou corrente, mas de um novo modo brasileiro de se construir
arquitetura.
A partir da década de 40, arquitetos do Rio de Janeiro são
chamados a trabalhar em São Paulo, e os arquitetos paulistas, assim
como em outros estados, deixaram transparecer em suas obras a
influência marcante da arquitetura carioca”.
60
2.2 - Parceria com os cariocas: Abelardo de Souza e Hélio Duarte (46-49)
Após a experiência na administração pública em Santos (39-45) e depois
em Campos do Jordão (46), Lotufo retornaria a cidade de São Paulo
fixando seu endereço comercial a Rua Barão de Itapetininga, juntamente
com Abelardo de Souza e Hélio Duarte.
A aproximação entre os arquitetos cariocas teve início principalmente
com a movimentação política em torno do Instituto dos Arquitetos do
Brasil (IAB) e a fundação do departamento em São Paulo no início da
década de 40.
No grupo de arquitetos cio-fundadores constavam, além deles, nomes
como: Eduardo Kneese de Mello (primeiro presidente), Rino Levi,
Oswaldo Bratke, Ícaro de Castro Mello, Oswaldo Corrêa Gonçalves,
Ribeiro de Moraes, Miguel Forte, João Cacciola, Francisco Beck, Hélio
60
Constantino, R. A. – A obra de Abelardo de Souza. Mestrado FAUUSP, 2004, pg.
53.
63
Uchoa, Gregori Warchavchik, Francisco Kosuta e Roberto Cerqueira César,
dentre outros.
61
Abelardo Riedy de Souza, carioca nascido em 1908, formou-se arquiteto
pela Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro em 1932. Pertence,
portanto, a geração de arquitetos que mudou os rumos da arquitetura
brasileira. Os anos de sua formação foram turbulentos, pois nessa época a
ENBA passou por processo intenso de reforma curricular encabeçado pelo
carioca Lúcio Costa.
“Víamos através das poucas revistas que nossos colegas Carlos
Leão, Luiz Nunes e Affonso Reidy traziam que existia um franco-suíço
chamado Charles E. Jeanneret, mais conhecido como Le Corbusier, que
abria os olhos do mundo para uma nova maneira de viver”.
62
Por sua vez, o baiano Hélio Duarte (1906-1989) realizou algumas
peregrinações, o que colaborou ainda mais para uma difusão da nova
linguagem arquitetônica em outros cantos do pais como, por exemplo,
Salvador onde foi professor até 1944.
63
Formado pela Escola Nacional de
Belas Artes do Rio de Janeiro em 1930 (antes da reforma de Lúcio Costa),
Duarte trabalhou no Rio e em Salvador, antes de se fixar definitivamente
em São Paulo na metade da década de 40, onde faria um importante
61
Ferraz, A.R.F., Marcas do Moderno na Arquitetura de Bauru. Mestrado EESC-
USP, 2003, pg. 65.
62
SOUZA, Abelardo Riedy de. Arquitetura no Brasil: Depoimentos. Diadorim/
EDUSP, São Paulo, 1978.
63
Segawa. H. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. Edusp, São Paulo, 1998, pg. 142.
trabalho junto à coordenação do Convênio Escolar, a partir de 48,
projetando com uma equipe de arquitetos, mais de cem escolas
estaduais. Tal fato foi determinante para que a parceria com Zenon e
Abelardo se encerrasse.
Assim, a influência da escola carioca começou a despontar na presença de
linhas sinuosas e maior leveza plástica que se somaria ao racionalismo
estrutural do engenheiro politécnico.
64
2.3 - Principais projetos realizados pela parceria
Sede do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) (São Paulo/SP, 1946-7
Projeto original não foi encontrado)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte
Figs. 29-30: Fotos maquete e recente. Fontes: Acrópole e EMF.
64
Em 46, um concurso interno promovido entre os arquitetos escolheu os
projetos de três equipes participantes para o edifício sede do
departamento paulista do IAB. O júri composto por Firmino Saldanha,
Oscar Niemeyer, Hélio Uchoa e Fernando Britto decidiu optar por um
empate entre os trabalhos de Abelardo de Souza, Hélio Duarte e Zenon
Lotufo; Jacob Ruchti, Miguel Forte e Galiano Cimpaglia, e Rino Levi e
Roberto Cerqueira César. Importante marco da arquitetura moderna
paulista, este edifício abrigou e ainda hoje mantêm os escritórios de
64
Eduardo Modenese Filho.
alguns dos mais renomados arquitetos do Brasil como Vilanova Artigas,
Paulo Mendes da Rocha, Fábio Penteado, Ciro Pirondi, entre outros.
Infelizmente, não conseguimos localizar o projeto original apresentado
pelos arquitetos: Zenon, Abelardo e Hélio. O projeto mostrado aqui foi
desenvolvido por Rino Levi, Roberto Cerqueira César e Jacob Ruchti,
Miguel Forte e Galiano Cimpaglia.
Programa: Subsolo: Auditório; Térreo: Hall Acesso / Exposições; 1
o
pavimento e mezanino: Sede social; 2
o
ao 7
o
. pavimento: Escritórios.
Figs. 31-34: Plantas – Subsolo (Restaurante)/ Térreo (Loja) / Terraço (Sede Social IAB) /
Mezzanino (Sede Social IAB).
65
Grêmio Recreativo de Ourinhos (Ourinhos/SP, 1946- Não construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte
Fonte: Acrópole, maio 46, p. 38-40.
Fig.35
Ocupando um lote de 18 m por 28 m e área aproximada de 1.500 m2,
este projeto para a Sede social do Grêmio Recreativo de Ourinhos,
município do interior do estado de São Paulo, marca o início da segunda
fase da produção de Zenon Lotufo e a primeira publicação do então
formado grupo com os arquitetos: Abelardo de Souza e Hélio Duarte.
A presença constante de linhas curvas nas plantas revela a influência da
escola carioca, uma vez que Abelardo e Hélio haviam se formado na
Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
Essa busca por fluidez espacial refletia-se nos contornos sensuais do
território brasileiro em suas praias e montanhas e rebatia-se na
arquitetura daquele momento, ávida por uma identidade própria e
nacional. A composição volumétrica ilustrada (página anterior) pela
perspectiva da fachada frontal mostra-nos a referência aos princípios
modernos de Le Corbusier como, por exemplo, o uso da janela em tira
horizontal que marcava o primeiro pavimento. A estrutura do edifício
pautava-se pelo ritmo dos pilares cilíndricos organizados em modulação
de 4,50m por 4,5m e 9m entre eixos.
A circulação vertical do prédio estava definida por uma grande escada
circular espiral com degraus de 2 m de largura situada nos fundos e um
elevador.
Além disso, nota-se a presença de brises quadriculados para a proteção
solar no térreo, outro elemento característico da linguagem moderna
brasileira. Muros laterais nas divisas terminam por organizar a estrutura e
o caráter do projeto além da marquise da entrada que sutilmente
marcava o ingresso do edifício.
Programa: Térreo: Chapelaria/ Salão de jogos e estar/ Bar com cozinha e
serviços/ Barbearia/ Manicure/ Sanitários; Mezanino: Balcão com estar e
descanso/ sanitários/ terraços/ depósito; 1
o
. Pavimento: Salão para baile
com palco para orquestra/ Bar/ Copa e serviços; 2
o
. Pavimento:
Biblioteca/ Diretoria/ Salas administração/ Terraço coberto/ Sanitários.
66
Figs. 36-37: Plantas do Térreo e Mezanino
Figs. 38-39: Plantas – 1º. Pavimento e 2
o
. Pavimento
Associação Bahiana de Imprensa (A.B.I.) (Salvador/ BA, 1946/48 –
Construído).
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte.
Fontes: Acrópoles, jun 46, P. 53-55 e n.117, jan 48, P-249-251.
fig. 40
Vencedor do concurso público nacional para a sede da Associação
Brasileira de Imprensa em Salvador a ser construído inicialmente em lote
na rua Visconde do rio Branco e Rui Barbosa. O projeto respeitava o
gabarito dos edifícios vizinhos comportando-se num volume cúbico e
compacto.
Programa: O térreo estava solto do solo por uma galeria sob pilotis, com
lojas comerciais em amplo passeio coberto para pedestres. Os quatro
primeiros pavimentos estavam definidos por andares-tipo com salas de
escritório e janelas corridas “em tira” na horizontal. Os quinto e sexto
andares destinavam-se à sede propriamente dita com salão para leituras,
67
auditório e administração. A cobertura era ocupada pelo restaurante com
desenho livre e amplo terraço-jardim. A circulação vertical do prédio
estava definida por uma caixa retangular na parte posterior do prédio
contando com 2 elevadores e caixa de escada.
(Figs. 41-45) Planta Térreo
Planta 1
o
. ao 4
o
. andar Planta 5
o
. andar
Planta 6
o
. andar Planta Cobertura
A revisão deste projeto vencido anteriormente (46) pela equipe de
arquitetos ocorreu em virtude da mudança da localização para terreno na
Praça da Sé, no centro de Salvador. O programa permaneceu basicamente
igual ao anterior apenas devendo se adequar ao Plano de urbanização
vigente na época.
(Figs. 46-53) Planta Térrea – Lojas Planta 1
o
. ao 3
o
. andar – Escritórios
Planta 4
o
. andar – Administração Planta 5
o
. andar – Auditório e exposições
68
Planta 6
o
. andar – Biblioteca Planta 7
o
. andar – Restaurante
Perspectiva Foto externa
Estância Hidromineral Hotel-Cassino (S. Bárbara do Rio Pardo/ SP, 1946)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte
Fonte: Acrópole, julho 46, pp. 80-81.
(fig. 54)Perspectiva do conjunto.
O projeto ocuparia uma ampla gleba às margens do Rio Pardo, sendo
previstas diversas instalações e atividades recreativas, sendo as principais:
um Hotel com 98 apartamentos e amplo restaurante avarandado e um
Casino para jogos e diversões em anexo. Os desenhos do projeto ilustram
a predominância da linha curva. O volume do Hotel alonga-se
horizontalmente numa sutil curvatura onde os quartos abrem-se em
varandas privativas e olham para a vista do rio. As formas utilizadas para
o Casino remetem ao projeto contemporâneo da época: o Hotel da
Pampulha (obra não executada de 1940), de Oscar Niemeyer.
69
Planta Térreo – Hotel
Elevação - Hotel
Plantas 1
o
e 2
o
Pavimentos - Hotel
Planta Térreo –
Cassino
Planta Superior – Cassino
(figs. 55-59)
70
Cruz Vermelha do Brasil (São Paulo/ SP,1946 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte
Fonte: Acrópole 103, nov. 46, pp. 200-202.
Projeto realizado pela equipe de arquitetos para o prédio da sede social e
filial de São Paulo da Cruz Vermelha do Brasil. Situado em terreno
irregular, o projeto previa uma caixa de circulação horizontal localizada na
parte central e grande hall de distribuição, com 3 elevadores e escada de
segurança.
Programa: Térreo: Galeria sob pilotis com lojas comerciais e passeio
coberto para pedestres; 1
o
. ao 13º Andar: Salas amplas de escritório com
janelas moduladas; 14º Andar: Atendimento e ambulatório; 15
o
. Andar:
Administração e salas de aula; 16º Andar: Auditório e bar-restaurante
com terraço-jardim; 17
o
. ao 19 Andar: Salas.
Planta Térreo – Lojas Planta 1
o
. ao 13
o
. Andar – Salas
Planta – 15
o
Andar Planta – 16
o
Andar
(figs. 60-63)
71
Edifício Pedra Azul (São Paulo/SP, 1947 Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte
Proprietário: Sociedade Imobiliária América Ltda.
Fonte: Acrópole 114, out 47, pp.165-167.
(figs. 64-65) Foto entrada e implantação.
Resultado de um concurso privado, este edifício de apartamentos com 9
andares situado em terreno de 1.200 m2, no Jardim América, entre as
ruas Alameda Jaú e Haddock Lobo apresenta uma ocupação na diagonal
do sentido do lote com o intuito de aproveitar as melhores condições de
insolação e ventilação. No térreo, uma ampla marquise com desenho
curvo orienta a entrada no hall de circulação do prédio. Com uma planta-
tipo de 4 apartamentos por andar, a circulação vertical distribui-se em 2
caixas localizadas na face leste do edifício, bem como os blocos de
hidráulica.
Programa: Térreo: Salão social e apartamentos; Andar tipo: 4
Apartamentos (2 Dormitórios / Sala de Jantar / Sanitário / Cozinha /
Dispensa / Terraço e W.C.); Cobertura: Terraço Coberto e Descoberto /
Casa de Máquinas / Apartamento do Zelador.
Planta Térreo Planta – Andar Tipo
(figs. 66-67)
72
Instituto de Puericultura (Rio de Janeiro/ RJ, 1947 - Não construído -
Concurso nacional – 1
o
lugar)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte
Fonte: Acrópole, jun 48, pp.66-67.
(fig. 68) Foto maquete
Vencedor de concurso público para sede do Instituto de Puericultura da
Universidade do Brasil (atual UFRJ) na então Capital Federal previa
instalações para o ensino e pesquisa (atividade acadêmica), bem como
cuidados à criança e ao adolescente (assistência médica-hospitalar e
ambulatorial). A composição arquitetônica do grupo explorava a relação
entre blocos de características distintas: um racional e horizontal (corpo
principal) e outros, em anexo, variando de altura e direção, tendo em
uma de suas extremidades um arremate em cobertura curva. Este tipo de
jogo com os volumes, ora alongado e puro, ora mais livre e solto, tornou-
se uma marca na arquitetura concebida pelos arquitetos. O projeto não
foi executado, sendo substituído por outro de autoria de Jorge Machado
Moreira, situado na ilha do Fundão, em 1949.
(fig. 69) Foto maquete
73
Orfanato Amando de Barros (Botucatu/SP, 1947 - Não construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte.
Fonte: Acrópole 106, fev 47, pp. 256-257.
(Figs. 70-72) Elevação Frontal
Com fachada frontal de aproximadamente 80 metros, este projeto situar-
se-ia à Rua Rafael Sampaio, no município de Botucatu, interior de São
Paulo. A disposição em “T” das plantas no terreno privilegiou a formação
de pátios para atividades recreativas externas, além de favorecer o
conforto térmico criando amplas áreas de ventilação e insolação.
Volumetricamente, o projeto chama a atenção para o uso de elementos
vazados situados em posições diferentes na fachada, o que contribui para
a riqueza e variedade da composição do edifício.
Programa: Térreo: Salas de aula e trabalho / Biblioteca / Capela (à direita)
/ Refeitório / Recreio Coberto / Pátios abertos. Superior: Dormitórios /
Vestiários / Sanitários / Enfermaria / Apartamentos (à direita) / Varanda.
Planta Térreo
Planta Superior
74
Cerâmica São Caetano S/A (São Caetano/SP, 1947 - Não construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte.
Construção e idealização: Roberto Simonsen.
Fonte: Acrópole, 48.
(fig. 73) Foto maquete
Projeto ambicioso e visionário do empresário Roberto Simonsen que
vislumbrou, um ano antes de sua morte (em 1947), este complexo de
atividades produtivas e fabris. Localizado em amplo terreno na periferia
do município de São Caetano, o plano previa a organização e eficiência
dos profissionais e operários que ali desempenhariam suas funções. Com
uma produção diversificada de materiais cerâmicos como pisos, paredes e
tijolos, o projeto abrangia as instalações sociais como escola do Senai,
ambulatório geral, refeitório para funcionários, salão de festas, escritório
e guarita de acesso. Foi prevista a utilização dos próprios materiais
produzidos pela fábrica na construção e execução do projeto a fim de
obter uma maior economia e um bom efeito arquitetônico na composição
dos volumes e no contraste de cores.
(fig. 74) Foto maquete
75
Edifício Hecilda (São Paulo/SP, 1948 – Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio Duarte
Fonte: Acrópole, abril 48, pp.321-323
(Figs. 75-76) Perspectiva e Foto externa. Fonte: EMF.
Com área total aproximada de 2.500 m2, este edifício de apartamentos
situa-se na esquina entre as ruas Major Sertório e Cesário Motta, na
região central paulistana. Com 8 andares, o prédio apresenta uma
ocupação do lote em “L” distribuindo-se em planta de 3 apartamentos
por andar salvo o último andar onde existem apenas 2. Assim, os
apartamentos tem tamanhos diferentes, variando o número de
dormitórios. Destaque para o uso de elementos vazados (tipo cobogós) na
área de serviços e o desenho curvo da casa de máquinas na cobertura.
Programa: Térreo: Hall de entrada / Lojas comerciais; Andar tipo:
Apartamentos (1, 2 ou 3 dormitórios / Banho / Cozinha / Área de serviço /
Sala de estar).
Planta – Piso Térreo (Lojas) Planta – 7
o
Andar
Planta – 1
o
ao 6
o
Andar Planta Cobertura (figs. 77-80)
76
Demais parcerias
O arquiteto Zenon Lotufo realizaria ainda outras parcerias profissionais
neste período (49-52): Gregori Warchavchik, Plínio Croce, Roberto
Cerqueira César, Ìcaro de Castro de Mello, entre outros, como mostramos
a seguir.
Clube Atlético Paulistano (São Paulo/SP, 1949 – Construído)
Projeto: Gregori Warchavchik / Zenon Lotufo / Abelardo de Souza / Hélio
Duarte / Henrique Verona Cristófani. Construção: Socied. Comercial e
Construtora S.A.
Fonte: Acrópole, jan 58, pp-95-101.
(fig. 81)
Sede de clube recreativo e esportivo no Jardim Europa, situado à Rua
Honduras com Av. Europa. O edifício principal é composto em 3 níveis
onde o térreo abrigava a marquise de acesso da rua, portaria, rampas, bar
e jardim social sob pilotis, barbearia, manicure e médico.
No 1
o
. Andar abre-se um grande salão social de 19 por 35 m com terraço
respectivo e salões de jogos e bilhares, estar, diretoria e sanitários. No 2
o
.
Andar encontra-se o salão de festas com espaço para orquestra e
camarins para artistas e finalmente o mezanino contando com um largo
balcão sinuoso.
77
Programa: Sede social: Restaurante / Cozinha / Bar / Sanitários / Salão de
baile / Foyer / Terraço / Chapelaria / Play-ground (crianças) / Piscinas /
Quadras de tênis / Ginásio / Salão de jogos / Jardins.
Planta Térreo
Planta 1
o
Andar
Planta 2
o
Andar (Figs.82-84)
Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) (São Bernardo do Campo/SP,
1949 – Não construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Plinio Croce (colaborador) / Idealização: Padre
Roberto Saboia de Medeiros (PUC/SP)
Fonte: Acrópole 137, set 49, pp-146-147.
(fig.85) Foto maquete.
Projeto vencedor de concurso privado entre arquitetos para construção
da Faculdade de Engenharia Industrial, agregada à Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP). Situado em ampla área disponível no km
18 da Via Anchieta, destacando-se pela ocupação racional e distribuição
funcional do conjunto no lote e pelas modernas e arrojadas edificações.
Programa: Administração e aulas teóricas / Química / Mecânica /
Alojamento de alunos / Clube recreativo / Restaurante / Ginásio /
Auditório / Capela / Praça de esportes.
78
Associação Cristã de Moços (ACM) (São Paulo/SP, 1952 – Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Roberto Cerqueira César / Ícaro de Castro Mello
Fonte: Acrópole 171, jul 52, pp-95.
(Figs. 86-87) Foto maquete e externa.
Situado à rua Nestor Pestana, n. 147, este complexo de atividades
esportivas consta também como um edifício de apartamentos em bloco
vertical recuado em relação à rua. A história da ACM em São Paulo se dá
início em 1902 e tinha como propósito ampliar os ideais fraternais
cristãos e oferecer um espaço de reunião e prática para o lazer e o
desenvolvimento humano.
Programa: Estacionamento / Lojas / Restaurante / Ginástica / Musculação
/ Natação / Quadra poliesportiva / Curso de idiomas.
2.4. A influência de Le Corbusier
Em abril de 1949, Zenon Lotufo publicou na Revista Acrópole um
importante artigo chamado A Influência dos Mestres”, onde exaltava a
repercussão das idéias e do trabalho de Le Corbusier nele e entre os
arquitetos brasileiros.
“A formação mental, espiritual, artística e profissional do
indivíduo é resultante de várias componentes, de características diversas,
contraditórias ou não, agindo em conjunto ou isoladamente, cada qual
procurando modelar sua personalidade. O artista age sempre como
verdadeiro receptor sensível captando as ondas emitidas pelo mundo
externo e revelando-as em seguida, através de suas obras. A palavra
influir pode ter a acepção de inspirar, incutir, entusiasmar, excitar.
Portanto, o deixar-se influir pelos princípios ou doutrinas de um mestre,
não significa ausência de valor próprio, ou que se é um simples imitador”.
65
O arquiteto afirmou a importância para a arquitetura e o urbanismo
moderno de nomes como Walter Gropius, Frank Lloyd Wright, Mies van
der Rohe e Richard Neutra entre outros que procuravam romper com as
sólidas raízes do academicismo do século XIX.
Segundo Zenon, o caminho estaria no seguinte método:
65
LOTUFO, Zenon. A Influência dos Mestres. Acrópole, São Paulo, n. 132, abr.
1949, p. 356-357.
79
“Dado um programa concreto, melhorá-lo tanto quanto seja
possível, assegurando-se de que preencha exatamente as necessidades
exigidas e depois perguntar ao artista (arquiteto), quando trouxer seus
planos, a razão de cada coisa. Pois as regras da arte em arquitetura
consistem, sobretudo, em: NADA FAZER SEM RAZÃO”.
66
E posteriormente, o arquiteto paulista elogiou a qualidade das realizações
de Le Corbusier, segundo ele, o verdadeiro mestre da arquitetura
contemporânea.
“Pode alguém não apreciar seus trabalhos, mas o poderá
jamais desprezar ou ignorar seus conceitos e sua doutrinação, pois suas
palavras são majestrais e sua compreensão do mundo é extraordinária”.
67
Para ele, o mestre franco-suíço conseguiu dar forma e expressão às suas
idéias de maneira tão nítida, adaptando-as as novas condições sociais
modernas, tornando-as dignas de serem observadas.
Zenon observou também neste artigo que o Brasil, ou mais
especificamente alguns arquitetos cariocas, como Lúcio Costa e Oscar
Niemeyer, haviam sofrido grande influência de suas idéias mediante suas
visitas em 1929 (veremos a seguir) e depois em 1936, por conta do
projeto do Ministério da Educação, como relatamos anteriormente.
66
Idem.
67
Ibidem.
Depois questionava se a curta permanência de Corbusier no país seria
capaz de mudar os rumos da arquitetura brasileira. E respondendo:
Pelo dedo se conhece o gigante. Mais vale a palavra de um
grande mestre do que a cantilena de um medíocre. Uma conferência de Le
Corbusier vale um tratado. E tanto vale que aí está o resultado de sua
influência: O Brasil se projetando no estrangeiro através de sua
arquitetura. O arquiteto brasileiro compreendeu e apreendeu Le
Corbusier. Devem, portanto, nossos arquitetos compreenderem bem suas
obras, não no intuito de repetir as formas e soluções ditadas, mas sim,
deixando-se influenciar pelo espírito que precede seus trabalhos”.
68
Le Corbusier e o Brasil
Talvez o fato mais importante para a afirmação e a confiança no
movimento moderno na arquitetura brasileira foi a passagem do mestre
suíço Le Corbusier pelo país. Sua primeira visita ao Brasil em 1929
coincidiu com a realização de palestras e conferências na América Latina,
visita esta que foi fundamental para a disseminação de suas idéias,
principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo.
O impacto da natureza e da geografia latinamericana sobre o arquiteto
franco-suíço também se fez notável. Seu estudo urbanístico para o Rio de
Janeiro (fig. 88) foi uma boa prova disso. Uma mudança considerável de
68
Ibidem.
80
seu traçado geométrico ortogonal rígido para uma linha fluída e orgânica
em forma de edifício que deslizava pela paisagem carioca.
Le Corbusier convencionava assim a Lei do Meandro onde a linha sinuosa
dos rios e vales que, vistos de cima, desenhava a beleza tropical do
continente sul-americano.
“Olhando o contorno das curvas do rio, entendi as dificuldades
inerentes aos assuntos e interesses humanos, os becos sem saída nos
quais eles se enredam e as respostas aparentemente miraculosas que
repentinamente solucionam situações aparentemente inextricáveis”.
69
(fig. 88)
69
CORBUSIER, L. Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do
urbanismo. Cosac e Naify, São Paulo, 2004, pg. 18.
O arquiteto e o engenheiro
Resultado direto dessas intervenções, o livro Precisions retratou algumas
das principais idéias do mestre frente à arquitetura e à sociedade
industrial. No prefácio da re-impressão do livro de 1960, Le Corbusier
colocava que sua busca era restabelecer a harmonia entre o homem e seu
meio. Com um belo desenho (fig. 89) finalizava a introdução do livro onde
colocava no mesmo plano as funções do arquiteto e do engenheiro,
dizendo: é uma nova etapa que de agora em diante põe em contato
permanente, fraternal, igual, as duas vocações cujo destino é equipar a
civilização maquinista, e conduzi-la a um esplendor inteiramente novo.
Estas duas vocações são a do engenheiro e do arquiteto. São como duas
mãos cujos dedos se entrelaçam, duas mãos colocadas na horizontal, duas
mãos no mesmo nível”.
70
(fig.89)
70
Idem, pp. 9-10.
81
Alan Colquhoun em seu livro Modernidade e Tradição Clássica aponta que
a primeira idéia fundamental do livro Vers une Architecture de Le
Corbusier era que o compromisso do arquiteto com os princípios gerais
da engenharia moderna, acabaria redescobrindo as origens de sua própria
disciplina.
Assim, inicialmente Le Corbusier estabelecia uma clara distinção entre
engenharia e arquitetura. O objetivo do engenheiro seria fornecer o que é
útil, enquanto o do arquiteto deveria despertar a emoção. Em um único
sentido, engenheiro e arquiteto partiam dos mesmos fundamentos, pois
ambos produziam formas que estão em harmonia com o universo, porém,
as diferenças estariam no grau de intencionalidade. Os engenheiros
fariam arquitetura, de modo não intencional, fazendo-nos sentir a
harmonia, mas é o manipular da harmonia que consistia o trabalho do
arquiteto.
“Dessa maneira, se em um sentido o engenheiro e o arquiteto
partem dos mesmos fundamentos, em um sentido a arquitetura possui
seus próprios alicerces, que consistem em sua capacidade de estimular
nossos sentidos por meio de formas simples e claras. O engenheiro,
prosseguindo pela rota do conhecimento, mostra-nos meramente o
caminho da verdade, enquanto que o arquiteto torna tal verdade
palpável”.
71
Por uma arquitetura nova
O famoso livro de Le Corbusier, e talvez o mais influente manifesto
arquitetônico do século XX, “Por uma arquitetura” (Vers une Architecture)
de 1923, reuniu ensaios da época da revista Espirit Nouveau, de modo a
ilustrar seu pensamento. Comparar o conteúdo do seu texto é avaliar seu
reflexo nas idéias de Zenon Lotufo.
Inicialmente, Le Corbusier abordou a relação entre o engenheiro e o
arquiteto, fato que se repetiria em Precisions, apontando as diferenças e
as proximidades entre as duas profissões:
“O engenheiro, inspirado pela lei da economia e conduzido pelo
cálculo, nos põe em acordo com as leis do universo. Atinge a harmonia. O
arquiteto, ordenando formas, realiza uma ordem que é pura criação de
seu espírito, afeta nossos sentidos; pelas relações que cria, nos dá a
medida da ordem do mundo; sentimos então a Beleza”.
72
Para Le Corbusier, a arquitetura estava ligada à emoção do espírito e
deveria começar com o emprego de elementos a fim de atingir nossos
71
Colquhoun, Alan. Modernidade e Tradição Clássica: Ensaios sobre Arquitetura.
Cosac e Naify, São Paulo, 2004, p 106.
72
Corbusier, Le. Por uma arquitetura. Editora Perspectiva, São Paulo, 1973, pg. 3.
82
sentidos e desejos. Estes elementos seriam elementos plásticos, formas
primárias (esfera, cubo, cilindro, horizontal, vertical, diagonal) que nossos
olhos e espíritos poderiam ver e medir claramente.
Suas conclusões eram que o mundo exterior havia se transformado
admiravelmente no seu aspecto e na sua utilização, em conseqüência da
máquina (indústria). Uma nova óptica fazia-se necessária e uma nova vida
social já se realizava a um certo tempo, porém o habitat humano ainda
não havia se adaptado a isto.
Sendo a arquitetura (a casa, o templo ou a fábrica) formada por suas
respectivas superfícies, ou na maioria dos casos, paredes perfuradas por
portas e janelas, Le Corbusier via esses buracos como reveladores de
formas. E por sua vez, a planta seria a grande matriz geradora, a única
capaz de evitar a desordem e o arbitrário.
Sem a planta, não poderia haver grandeza de intenção e de
expressão, nem ritmo, nem volume, nem coerência. Sem planta há essa
sensação insuportável ao homem, de informe, de indigência, de
desordem, de arbitrário”.
73
Zenon Lotufo compartilhava desta mesma opinião na hora de elaborar
uma planta. Seus primeiros estudos, segundo seu filho Vitor, buscavam
sempre articular todos os elementos do projeto em um organograma
73
Idem, pg. 27.
preliminar coerente e lógico, ponto de partida para a definição de seus
projetos.
74
Traçados reguladores
Talvez o fato que mais comprovaria a apropriação corbusiana dos
princípios clássicos na arquitetura seja o que ele chamou de “traçados
reguladores”.
Tratava-se de um princípio de ordem, segundo ele, onde a escolha do
traçado regulador (plano) e suas modalidades de expressão (módulos)
fariam parte integrante da criação, sendo operação fundamental para se
alcançar harmonia na arquitetura.
“Para se construir bem, há medidas para repartir os esforços, para
a solidez, para a utilidade da obra. As medidas condicionam o todo. O
construtor tomou como medida, o que lhe era mais fácil, mais constante,
o instrumento que podia perder menos: seu passo, seu pé, seu cotovelo,
seu dedo”.
75
Assim, o homem e sua capacidade de medir criaram módulos e unidades
de medida que regulavam suas obras, a partir da sua escala,
estabelecendo assim a noção geométrica de ordem. Para Le Corbusier, ao
decidir a forma do cercado ou da cabana, ou mesmo a posição de um
74
Entrevista concedida por Vitor Amaral Lotufo, em Botucatu em 26 de janeiro
de 2007.
75
Ibidem, pg. 44.
83
altar ou templo, o homem teria seguido seus instintos através de ângulos
e eixos, criando figuras como o quadrado e o círculo.
Desta maneira, a geometria seria a verdadeira linguagem espacial do
homem onde o módulo (pé ou passo) teria a função de medir, enquanto
que o traçado regulador (plano e eixos) construiria a agradável percepção
de ordem.
Para Le Corbusier, isto era necessário: estabelecer padrões de eficiência
para se alcançar a perfeição. E, portanto, a boa arquitetura se realizaria
sobre esses padrões.
“Padrões são coisa de lógica, de análise e estudo, estabelecidos a
partir de um problema bem colocado. É o estudo aprofundado das partes.
É progresso. Uma necessidade de ordem trazida para o trabalho humano.
Todos os homens têm o mesmo organismo, as mesmas funções e as
mesmas necessidades. Estabelecer um padrão é esgotar todas as
possibilidades práticas e razoáveis, deduzir um tipo reconhecido conforme
as funções, com rendimento máximo, e empregonimo de meios, mão
de obra, palavras, formas, cores e sons”.
76
O estabelecimento de um padrão procederia da organização de
elementos racionais conforme uma linha de conduta igualmente racional.
A massa envolvente não seria preconcebida, apenas resultaria desta
organização.
76
Idem, pg. 89.
Portanto, em arquitetura, a eficiência de uma obra só seria atingida pelo
agrupamento e a proporção correta das partes: tarefa do arquiteto. Onde
a Beleza seria algo incomensurável que surgiria somente pela presença
formal de bases primordiais: a satisfação racional do espírito (utilidade e
economia) e as formas puras e sensoriais, como o cubo e o cilindro.
Depois, as relações que criam o inesperado são o gênio inventivo (plástico
e matemático) do arquiteto, aliado à sua capacidade de relacionar ordem
e unidade, e de organizar segundo leis claras, coisas que satisfazem nosso
espírito.
Portanto, para Corbusier, a harmonia seria um estado de concordância
entre partes distintas, de acordo com as normas do Universo e a Beleza
seria uma criação puramente humana, fundamental àqueles de alma
elevada. Tais idéias já estavam presentes nos tratados clássicos de Guadet
e Durand, sendo fortemente apropriadas por Zenon Lotufo tanto em seus
textos e teses, como em seus projetos.
Estudo atento da história
Muito das idéias de Le Corbusier vieram também de sua atenta
observação da história das cidades, aliada a uma visão utópica do
momento presente. Constantemente acusado de revolucionário, o mestre
franco-suíço confessava que na realidade tivera apenas um único mestre
– o passado, e apenas uma disciplina – o seu estudo.
84
A grandeza das invenções do passado (tradição) deveria ser repetida não
por imitação, mas por re-interpretação de suas constantes e a busca pela
sua equivalência, em termos modernos.
Os objetos tenderiam a representar um tipo que seria determinado pela
evolução das formas entre o ideal do máximo de utilidade e as
necessidades de economia que conformam as leis da natureza. Seria
preciso invocar todos os valores tradicionais da arquitetura e envolvê-las
através da memória.
Para Le Corbusier, quando o homem fazia o uso da memória e do
raciocínio surgiriam certas relações que agitam sua consciência, deixando
em estado de regozijo. Portanto, intuição seria a soma do conhecimento
adquirido que ficava gravado na memória coletiva. E o sentimento seria a
expressão desse conhecimento gravado. Assim, intuição e sentimento não
seriam antagônicos à razão. Seriam, na verdade, a própria razão sob seus
aspectos instintivo, sensorial e emotivo.
O mestre suíço via que era peculiar à engenharia, produzir resultados
provisórios, enquanto que a obra de arte apresentava-se como valor
atemporal. Assim, a indústria seria resultado do raciocínio abstrato,
prático e funcional, e não, da emoção e do espírito.
A ilusão das plantas
“A planta procede de dentro pra fora, o exterior é o resultado de
um interior. Os elementos da arquitetura são a luz e a sombra, a parede e
o espaço. Suas pedras me dizem. Vocês me prendem a esse lugar e meus
olhos contemplam algo que anuncia um pensamento. Um pensamento
com prismas silenciosos que mantém relações entre si. São a criação
matemática do espírito. São a linguagem da arquitetura. Com materiais
utilitários, vocês estabeleceram relações que me comoveram”.
77
Para Le Corbusier, fazer uma planta era ordenar e fixar idéias para que se
tornassem inteligíveis e executáveis, manifestando uma intenção precisa.
A planta seria a geradora e a determinante de tudo e implicaria desde o
começo em procedimentos de construção. Sem uma boa planta, tudo
seria frágil e pobre.
Por sua vez, o eixo talvez fosse a primeira manifestação humana. O meio
de todo ato humano e o ordenador da arquitetura que indicaria caminho
e direção.
“A ordenação é a hierarquia dos eixos, logo a hierarquia dos fins,
das intenções. O arquiteto confere fins aos eixos. Esses fins são as paredes
(o cheio, a sensação sensorial) ou a luz, o espaço. Na realidade, os eixos
77
Ibidem, pg. 125.
85
não se percebem do alto como mostra a planta, porém no solo, o homem
de pé, diante deles”.
78
A questão da composição volta à tona dessa vez com o nome de
modenatura, para Le Corbusier, o grande trunfo do arquiteto, e esta
qualidade se revelaria através de sua capacidade plástica. Não se tratava
de usos, nem tradições ou procedimentos construtivos às necessidades
utilitárias, mas do modo como se combinava plasticamente cada parte
num todo arquitetônico.
“Um belo rosto se distingue pela qualidade dos traços e um valor
particular das relações que os unem. Diz-se que um rosto é belo quando a
precisão da modelagem e a disposição dos traços revelam proporções que
sentimos harmoniosas, pois provocam em nós uma ressonância que se
põe a vibrar. Essa harmonia que satisfaz nosso espírito deve ser o eixo
sobre o qual se organiza todo universo, nos leva a pensar uma unidade de
gestão e uma vontade única na origem do mesmo”.
79
Daí, portanto uma outra definição corbusiana para harmonia: momento
de concordância do eixo em que está o homem com as leis do universo e
assim um retorno à ordem geral.
78
Ibidem, pg. 133.
79
Ibidem, pg. 145.
Para ele, seria preciso uma unidade de intenção motriz (ordenação) e um
caráter fundamental (algo que excita nossos sentidos) para tornar um
“objeto” em obra de arte.
A modenatura do Partenon é infalível e implacável, seu rigor
supera nossos hábitos e as possibilidades normais do homem. Aqui se fixa
o mais puro testemunho da fisiologia das sensações e da especulação
matemática que se pode prender a elas. Não se trata de dogmas
religiosos, de descrição simbólica: são formas puras dentro de relações
precisas”.
80
No capítulo final, Le Corbusier constatava que o concreto e o ferro haviam
transformado as organizações e os modos de construir conhecidos até
então. As precisões com quais estes materiais se adaptaram à teoria e ao
cálculo haviam produzido resultados surpreendentes.
A arquitetura se encontraria, portanto, de frente a um novo código onde
as inovações seriam de tal ordem que os estilos não correspondiam mais
a elas. Para ele, haveria uma tal novidade nas formas, nos ritmos, nas
ordenações e nos novos programas que em seu entendimento, as leis
verdadeiras e profundas da arquitetura seriam agora o volume, o ritmo e
a proporção.
Colocando-se em relação ao passado, Corbusier constatava que a velha
codificação da arquitetura, sobrecarregada de artigos e regulamentos
80
Ibidem, pg. 157.
86
durante quarenta séculos, não mais interessava, tendo chegado a seu fim.
Assim, para ele, os estilos não faziam mais qualquer sentido.
O homem moderno (inquieto pelas mudanças que o cercavam) sentiria
naquele momento que um novo mundo se elaborava, com lógica e
regularidade, produzindo coisas puras e mecânicas. Entretanto, sua casa,
seu bairro e sua cidade não correspondiam a toda aquela transformação.
Para Corbusier, um grande conflito reinava entre o estado de espírito
moderno e o estoque de antiguidades das cidades. No entanto, isso seria
apenas um problema de adaptação que dependeria do esforço e atenção
que a sociedade daria àqueles sintomas. E proclamava por fim:
Arquitetura ou revolução. Ora, podemos evitar a revolução.
Cidade, lazer e espírito
Para Le Corbusier, as pequenas realizações (casas, villas e estúdios) foram
um precioso laboratório de ensaios onde ele expôs seu modo de ver o
mundo, e seus desejos para a nova cidade industrial.
A estrutura elevada do solo (pilotis) tornou-se para ele o principal
instrumento para a mudança social, gerando um novo modo de viver na
cidade. Seus espaços livres contínuos por sobre o térreo dos edifícios
possibilitaria o trânsito livre das pessoas com a existência de vastos
parques interconectados.
Em suas conferências ministradas no Rio de Janeiro em 36, por ocasião do
projeto do Ministério da Educação, Le Corbusier enfatizou também que o
ciclo de horas diárias (fig. 90) deveria satisfazer as necessidades
psicológicas e fisiológicas do homem.
Para ele, o dia poderia ser dividido da seguinte forma: oito horas de sono,
uma hora para se locomover para o trabalho, quatro horas de trabalho e
o resto do dia livre, para atividades de lazer (onze horas), a serem
preenchidas com a leitura de grandes obras literárias, ou freqüentando-se
laboratórios de criação e arte, dispostos nos cruzamentos das vias
urbanas. Os jovens poderiam reunir-se para participar de atividades
cênicas e desenvolver seus talentos para as artes.
81
(fig. 90)
81
Harris, Elizabeth. Le Corbusier:Riscos brasileiros. Editora Nobel, São Paulo,
1987, p. 108.
87
A seguir, aproveitamos também para citar alguns trechos do livro de
Anatole Kopp, Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa, que
destacou a importância da obra do mestre franco-suíço.
“O pensamento utópico de Le Corbusier se compara ao dos que
queriam reconstruir simultaneamente a sociedade e seu ambiente
construído, esta é a chave principal para compreendermos sua obra
arquitetônica e urbanística. Um homem para quem uma nova arquitetura
é inseparável de uma transformação radical da sociedade, segundo ele
imediatamente possível. Na verdade, ocorre que para Le Corbusier não se
trata do ambiente construído; através de seus projetos e de seus escritos
assistimos a toda uma reorganização da sociedade, é um verdadeiro
projeto social que ele traça”.
82
Le Corbusier tentou resolver conscientemente a contradição entre
tecnologia, arte e sociedade, através da união entre a engenharia e a
arquitetura. Seu projeto utópico para o Rio de Janeiro (fig.88), por
exemplo, tinha o gesto grandioso de um romântico que evoca uma
imagem fantasiosa de um mundo tecnológico, transformado em forma
pura. Assim, talvez a maior qualidade estética desse projeto estivesse no
fato de tentar articular arte e existência social, de um modo não mais
conflituoso. Isto era princípio fundamental entre os moderno, herança
das idéias propagadas por Corbusier, assimiladas por toda uma geração.
82
Idem, p. 124.
2.5. Niemeyer, Zenon e Ibirapuera (50-55)
Nos anos 50, a cidade de São Paulo passou por modificações de grande
ordem como a redefinição de algumas funções urbanas, a
desconcentração dos bairros tradicionais, a reestruturação do skyline com
a maciça verticalização do centro e incremento das instituições culturais
rumo a pré-configuração definitiva de metrópole.
Assim, São Paulo perdia de vez seus ares campestres e viam-se erguer as
numerosas chaminés de fábricas, a imagem e o som estrangeiro dos
imigrantes nas ruas e praças, alterando também o ritmo da cidade
antiga.
83
Babel cultural, cosmopolita, moderna, industrial, amplitude
vertical e horizontal, todos estes cenários se faziam úteis para definir o
processo de transformação da capital paulista.
Nesta ocasião, Oscar Niemeyer realizava suas primeiras grandes obras na
capital paulista e uma destas realizações também se tornaria importante
marco da arquitetura moderna em São Paulo: o edifício Copan (1951-66).
O projeto original encomendado pela Companhia Pan-Americana de
Hotéis e Turismo para ser um complexo hoteleiro com cinema,
restaurantes, lojas e jardins não foi levado a diante, sofrendo inúmeras
alterações até a sua inauguração na década de 60.
83
Arruda, M. A. N.Metrópole e cultura: São Paulo no meio do século XX. Bauru,
Edusc, 2001, pg. 56.
88
O arquiteto Carlos Lemos foi o principal responsável pelo projeto
executivo e a supervisão dos trabalhos, sendo o chefe do escritório
paulista de Niemeyer.
O diretor do Banco Nacional Imobiliário contratou Niemeyer para
fazer o projeto do Copan, porém o Oscar precisava de um escritório em
São Paulo para coordenar os trabalhos . O diretor disse: “Conheço um
rapaz novo, bastante talentoso (Carlos Lemos) e assim, pediu para Oscar
ligar, e conversar e tal, sei que ele disse precisamos de mais desenhistas,
só sei que fiquei varando noite pós noite para entregar o Copan, foi
maravilhoso.”
84
Na mesma época (51) começou uma agitação política e cultural em
função dos eventos comemorativos para o IV Centenário da Cidade de
São Paulo.“Cicillo” Matarazzo tomou a frente na iniciativa de prover a
capital com um grande projeto de parque de exposições que abrigasse as
festividades e que posteriormente, fosse apropriado para a população
com amplo espaço de lazer.
O terreno escolhido situava-se no Ybi-ra-ouêra, que em tupi significa
“pau-podre”, ou seja, o local era um pasto pantanoso definido por uma
comissão mista entre prefeitura, Estado e iniciativa privada como área
ideal para o empreendimento.
84
Depoimento de Carlos Lemos em 20 de setembro de 2007.
“Ciccilo Matarazzo começou a pensar na Comissão para o IV
Centenário e precisava de um arquiteto para projetar os edifícios para a
exposição. Inicialmente, convidou Rino Levi e pediu para ele fazer um
orçamento para o trabalho. O Rino apresentou uma proposta
detalhadíssima, com várias páginas, porém o orçamento assustou Ciccillo.
Daí, ele ligou pro Oscar: Topa fazer? Sim, e Oscar fechou por menos da
metade do valor de Rino. Oscar precisava de uma nova equipe de trabalho
em São Paulo. O primeiro nome foi o de Eduardo Kneese de Mello, e este
por sua vez teria chamado os demais, incluindo aí Zenon, que cedeu o
espaço do seu escritório na Major Sertório para desenvolvermos os
projetos.”
85
Assim, foi encomendado a Oscar Niemeyer, então principal arquiteto da
nova geração que despontava os projetos dos edifícios para abrigar
exposições e atividades correlatas no Parque do Ibirapuera. Desta vez, o
arquiteto carioca contou com uma equipe de profissionais formada por
Zenon Lotufo, Hélio Uchôa Cavalcanti, Eduardo Kneese de Mello, Gauss
Estelita e Carlos Lemos.
O projeto final após várias modificações compreenderia os pavilhões
dedicados à Agricultura, às Indústrias, às Nações, aos Estados e às Artes,
todos conectados por uma longa e sinuosa marquise de concreto.
85
Depoimento de Carlos Lemos em 20 de setembro de 2007.
89
São Paulo tornava-se a maior cidade brasileira abrigando o maior parque
industrial superando a capital federal, Rio de Janeiro, e simbolicamente
também o passado agrícola do período colonial. Era a locomotiva do
Brasil, rumo a um futuro próspero e veloz. Assim, a arquitetura de
Niemeyer e equipe respondiam a este fato.
Até então inspirado pelo passado colonial e pela geografia fluminense, o
carioca explorava a leveza das curvas, o uso dos azulejos como
revestimento tradicional da herança portuguesa e os volumes puros, bem
como a precisão do sistema estrutural e da escala humana preconizada
pelo mestre Le Corbusier.
No projeto do parque do Ibirapuera, Niemeyer buscou a ausência de
alegorias e a austeridade das formas no sentido de atribuir um caráter
novo e não mais um olhar para trás da história.
(fig.91) Fonte: vitruvius.
“A escolha de Niemeyer para projetar os edifícios, nome firmado
nas hostes modernistas após a construção do complexo de Pampulha,
praticamente inaugurou a nova linguagem arquitetônica em São Paulo,
no setor das construções públicas, aentão primazia do Rio de Janeiro
com a construção do Ministério da Educação por Le Corbusier”.
86
(fig.92) Fonte: vitruvius.
A linguagem arquitetônica procurava ser a voz da capital e as concepções
de Niemeyer eram compostas de volumetria pura, clareza estrutural e
escala grandiosa, fruto da busca por uma linguagem plástica de caráter
nacional, como propunham arquitetos modernos.
Ora, a comissão do IV Centenário tendo a frente a figura de Ciccillo
Matarazzo, criador do Museu de Arte Moderna e patrono dos grandes
eventos culturais e artísticos, procurava mesmo evocar e transmitir o grau
de progresso e desenvolvimento industrial e econômico do estado
paulista neste seus quatro culos de existência.
86
Arruda, Maria A. do Nascimento. Metrópole e Cultura. São Paulo no meio do
século do XX. Edusc, Bauru 2001, p.85.
90
O próprio símbolo do evento – uma espiral ascendente – foi criado como
uma forma helicoidal que alça vôo em direção a um futuro rápido e
próspero. O monumento não conseguiu ser realizado por dificuldades
técnicas de execução, uma vez que se tratava de uma estrutura de 17
metros em concreto armado, com uma inclinação de 60 graus, apoiada
em apenas um único ponto de apoio no solo. A obra chegou a ser
completada e inaugurada, mas não resistiu e caiu.
Figs. 93-94. Fonte: www.vitruvius.com.br
Mas sem dúvida, o elemento que deu maior significado ao projeto do
parque Ibirapuera foi a longa e sinuosa marquise de concreto. Pois além
de propor a interligação física entre os pavilhões, ela sugeria passeio em
meio a natureza e a cultura, assumindo o caráter de rua, ou seja, signo
fundamental da comunicação entre os lugares e a continuidade dos
espaços da cidade.
“Os edifícios do Ibirapuera projetados por Niemeyer tinham
centralidade no projeto de urbanização do Parque, uma vez que este se
subordinava ao conjunto das construções e não o contrário, tornando a
concepção do espaço e da paisagem dependente das obras
arquitetônicas”.
87
Portanto, podemos concluir que o projeto do parque Ibirapuera
pretendeu unir o desejo de se construir uma imagem de São Paulo
enquanto “locomotiva” da nação com a necessidade de se fortalecer a
linguagem da arquitetura brasileira, atribuindo-lhe dimensão simbólica do
momento utópico e entusiasta da política nacional: um Brasil grande e
moderno.
Tal experiência rica em novas referências plásticas e conceituais (por
exemplo, uso de abóbadas e cúpulas de concreto armado) contribuiu de
maneira marcante na produção arquitetônica de Zenon Lotufo que as
assimilou e procurou aplicá-las com uma interpretação pessoal e criativa,
nos projetos posteriores que elaboraria como mostramos a seguir.
87
Arruda, M. A. N. Opt. Cit., pg. 85.
91
2.6. Demais projetos de Zenon Lotufo na década de 50
Sede para Vias e Viaturas (São Paulo/SP, 1951 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Arquitetura e Engenharia 16, mar-abr 51, pp-38-39.
(Fig. 95)
Projeto para as novas instalações da Vias e Viaturas situado entre a
Avenida do Estado e a Rua Presidente Costa Pinto. Composição
volumétrica com combinações interessantes valorizando a
horizontalidade do edifício com uma empena cega e uma sinalização
discreta onde se localiza o galpão de montagem. Um amplo e largo
passeio ajardinado contorna a frente e onde o bloco superior se apóia
sobre pilotis fica anunciada a entrada resguardada do prédio.
Programa: Térreo: Galpão - Montagem Motores (50 funcionários) / Loja
Mostruário / Almoxarifado / Controle / Escritório / Expedição /
Carpintaria / Pintura / Pátio externo; Superior: Salão para Escriturários /
Salas dos diretores / Terraço-jardim / Restaurante / Cozinha / Sanitários.
Planta – Térreo
Corte Longitudinal
(Figs. 96-97)
92
Igreja Presbiteriana (Presidente Prudente/SP, 1951 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole, jun 51, pp- 70-73.
(fig. 98) Fonte: Revista AU 76.
Projeto que inaugura o uso mais recorrente das coberturas curvas de
concreto armado, inspirado nas experiências e o contato com Oscar
Niemeyer na elaboração do projeto para o Parque Ibirapuera.
Programa: Piso Inferior: Salão para Festas e Reuniões / Departamento
Masculino / Departamento Feminino / Sanitários / Jardim de Infância /
Pátio de Recreação; Piso Térreo: Hall de entrada / Rampa / Salão de culto
/ Púlpito / Altar / Gabinete do Pastor / Vestiário / WC; Piso Superior:
Galeria-balcão / Coro e órgão.
Planta – Térreo.
Planta - Piso Inferior.
(Figs. 99-100)
93
Restaurante na Via Anchieta (São Paulo/SP, 1952 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fontes: Acrópole 184, jan 54, p. 187; Arquitetura e Decoração 01(53)p.7-9.
(Fig. 101) Perspectiva
Projeto aproveitava a situação do terreno e oferecia um amplo terraço
para desfrute da paisagem pelos visitantes, preocupando-se também com
o acesso ao local de modo a não incomodar o tráfego da Via Anchieta a
partir de vias de contorno ascendentes e descendentes que cruzavam a
rodovia. O intuito principal do D.E.R. (Departamento de Estradas de
Rodagem) do Estado de São Paulo na construção do restaurante era
oferecer uma atração turística a mais na descida do paulistano para o
litoral.
Programa: Térreo: Marquise acesso / Salão de exposições / Bar /
Sanitários / Cozinha/ Serviços / Terraço descoberto; Mezanino:
Restaurante / Cozinha / Dispensa.
Planta – Térreo
Planta – Mezanino
Corte
(Figs. 102-104)
94
Igreja Presbiteriana de Bauru (Bauru/SP, 1953 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole 180, pp- 454-456.
(Fig.105) Foto maquete.
Projeto realizado pelo arquiteto para templo de igreja cristã presbiteriana
na cidade de Bauru que contaria com uma casca de concreto como
cobertura única e iluminada lateralmente por aberturas protegidas por
brises verticais. A planta assumia uma forma cônica em “V” que convergia
para o altar, tendo na parte superior o salão da assembléia e no piso
superior sanitários, depósito e acesso ao coro. O acesso da rua dava-se
por uma escada externa que alcançava uma galeria-corredor. E a platéia
descia progressivamente de modo a possibilitar a visão de todos em
direção ao púlpito.
Programa: Superior: Escada de acesso / Galeria / Assembléia / Púlpito /
Escritório; Inferior: Sanitários - masculino e feminino / Depósito / Coro.
Planta Superior
Planta Inferior
Corte (Figs.106-108)
95
Paço Municipal de Bauru (Bauru/SP, 1953 - Construído parcialmente)
Projeto: Zenon Lotufo
Fontes: Acrópole 186, mar 54, pp. 253-257; Arquitetura e Decoração n.06,
ago 54, pp-2-5.
(fig. 109) Fonte: EMF.
O projeto original compunha-se de três edifícios: o Paço, a Câmara e a
Sala de Sessões, todos integrados por uma grande marquise de desenho
orgânico. No entanto, apenas o prédio do Paço Municipal foi construído.
A ocupação do terreno levou em conta a melhor orientação, no sentido
norte-sul, em relação ao trajeto do sol e a topografia do local, sendo que
a face norte foi protegida com brises horizontais. Estrutura independente
de concreto armado distribuída em módulos por 11 pilotis distantes 6,50
m em fileiras de três.
Programa: Paço Municipal: Térreo – Estacionamento prefeito / Portaria /
Hall de entrada / Salão atendimento público / Sanitários Primeiro e
segundo pavimentos - Andar tipo (salas administrativas). Câmara: Acesso
vereadores / Copa / Sala comissões / Secretaria / Sanitários. Sala de
sessões: Acesso público / Acesso vereadores / Sessões.
(Figs. 110-111) Implantação e foto maquete.
96
Planta Térreo – Paço / Câmara / Sala de Sessões
Planta 1
o
. e 2
o
. Pavimentos – Paço Municipal
(Figs. 112-113).
Paço Municipal (S. Caetano do Sul /SP, 1953-57 - Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: revista Raízes, dez 2002, pp. 45- 51.
(figs.114-116)
Os governantes na época almejavam um edifício com expressões
modernas e imponentes a ser construído na parte central da cidade em
meio a uma praça cívica onde se realizariam desfiles e eventos. Zenon
Lotufo foi contratado para esta tarefa, no entanto, como aconteceu no
município de Bauru, apenas o prédio do Paço Municipal acabou sendo
realizado. Os elementos compositivos da fachada são marcantes como as
janelas moduladas e os brises solares horizontais.
97
Fábrica de Fertilizantes da Petrobrás (Cubatão/SP, 1954-57- Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Manoel Machado / Adolfo Morales / Slioma
Selter. (Construção: Escrit. de Construções e Eng. Ecel Ltda).
Fonte: Acrópole 195, ago 54; Acrópole 226, ago 57, pp- 384-386; Habitat
n.20, jan 55, pp. 8-10.
(Fig. 117) Foto externa dos edifícios.
Fábrica construída em área situada às margens do rio Cubatão destinada
ao aproveitamento dos resíduos do petróleo, transformando-os em
fertilizantes para produção agrícola. Todos os edifícios foram construídos
em concreto armado, pensados em blocos separados, de modo a não
comprometer a segurança no caso de eventuais problemas como
explosões, por exemplo. Obviamente, os critérios de segregação
programática foram levados em consideração de maneira a ficarem
próximos os blocos destinados à administração, almoxarifado, garagem e
restaurante, separados da parte industrial propriamente dita.
Programa: Entrada / Garagem / Fábrica de amônia / Almoxarifado /
Vestiários / Restaurante
Foto geral do conjunto
Implantação
Fotos Garagem e Prédio da Administração (figs. 118-121)
98
Botucatu Tênis Clube (Botucatu/SP, 1956 – Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Módulo 4, mar 56, pp- 54-55.
(fig. 122) Fonte externa. Fonte: EMF.
Sede social de clube esportivo situado no município de Botucatu, interior
de São Paulo. A volumetria racional e econômica ocupava toda a extensão
do lote tendo um dos acessos de público localizado na esquina e o outro
na lateral do prédio. As circulações do edifício bem como os blocos de
sanitários situavam-se na parte do fundo de maneira concentrada,
otimizando as descidas de hidráulica.
Programa: Térreo: Entrada / Portaria / Salão de jogos / Escritório / Bar /
Copa / Estar / Sanitários; 2
o
. Pavimento: 2
a
. Entrada / Portaria / Secretaria
/ Salas de jogos / Estar; 3
o
. Pavimento: Salão de Baile / Palco para
orquestra / Bar / Copa / Terraço / Sala dos músicos / Chapelaria /
Sanitários; 4
o
. Pavimento: Mezanino / Terraço.
Perspectiva interna
Planta Térreo Planta 2
o
. Pavimento
99
Planta 3
o
. Pavimento Planta 4
o
. Pavimento
Perspectiva externa (figs. 123-128)
Igreja Presbiteriana (Jandira/SP, 1957 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Revista Acrópole 223, maio 57, p. 252-253.
Perspectiva
Contando com uma área de construção de 270 m2 (sendo 22,50 m de
comprimento por 12,00 m de largura) este projeto de pequena igreja
situar-se-ia no município de Jandira, interior do Estado de São Paulo. As
referências plástico-formais parecem óbvias quando observamos o
desenho da fachada com suas pequenas e variadas aberturas lembrando
o projeto de Le Corbusier para a capela Ronchamp. Bem como o conjunto
formado pela marquise sinuosa e o campanário, fazendo menção a capela
de São Francisco de Assis na lagoa da Pampulha, de Oscar Niemeyer.
Programa: Jardim / Entrada / Público / Altar / Balcão.
100
Planta - Superior
Planta - Térreo
Corte
(Figs. 129-132)
Edifício Arco Íris (Santos/SP, 1957 – Construído)
Projeto: Zenon Lotufo (Fonte: Acrópole 228, out 57, pp- 54-55)
(Fig. 133) Foto maquete
Edifício de apartamentos que se utiliza de desenhos curvos e sinuosos nos
terraços para compor sua forma. A circulação vertical está definida por
uma caixa de escada circular e 2 elevadores que alcançam um amplo hall
aberto de distribuição para os apartamentos. Interessante notar a
diferença de tipologia dos apartamentos no andar-tipo, com 3 tamanhos
diferentes, sendo o da esquerda maior.
Programa: Térreo: Lojas comerciais / Garagem estacionamento; Andar
Tipo: Apartamento de 2 ou 3 dormitórios / Sala / Cozinha / Quarto de
empregada / WC / Terraço; Cobertura: Terraço / Salões de festa /
Biblioteca / Terraço-jardim
101
Plantas do Andar Tipo e Cobertura (Figs. 134-135)
Assim, destacamos os principais projetos realizados por Zenon Lotufo
nesta fase de afirmação moderna, caracterizada por uma maior liberdade
plástica nas formas e composições arquitetônicas, influenciada pelo
contato direto com os arquitetos cariocas (formados pela Escola de Belas
Artes) Oscar Niemeyer, Abelardo de Souza e Hélio Duarte,
principalmente.
2.7. Ensino na FAU-USP e o desastroso Concurso de Cátedra
“A Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São
Paulo foi fundada em 1948 e se originou do antigo curso de engenheiro-
arquiteto da Escola Politécnica da mesma Universidade. Seu fundador e
primeiro diretor foi o Professor Luiz Ignácio de Anhaia Mello, responsável
pela formação urbanística no antigo curso e principal organizador de
novos conteúdos específicos naquele que se formava. Em seus primeiros
anos, o curso da FAU combinava as disciplinas técnicas originais do antigo
modelo, praticamente inalteradas, com elementos do currículo padrão da
Escola Nacional de Belas Artes, organizados em disciplinas como plástica,
modelagem, arquitetura de interiores, grandes e pequenas composições.
Essa combinação envolvia uma grande assimetria programática e didática
entre conteúdos, uma vez que - como destacava o Arq. Carlos Milan - "as
cadeiras de formação técnica eram habitualmente regidas por
engenheiros, enquanto as chamadas cadeiras artísticas eram dadas por
artistas plásticos, (...) lecionadas de formas muito semelhantes, senão
idênticas, às adotadas para a formação de engenheiros e de artistas
plásticos".
88
88
Trecho extraído de documento eletrônico situado na página
http://www.usp.br/fau/fau/histórico.
102
Passamos a analisar a relação entre Zenon Lotufo e a Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo no âmbito de sua
atividade didática e acadêmica.
Único aluno do curso de engenheiro-arquiteto de 33 a 36, da Escola
Politécnica quando se formou Zenon Lotufo sempre admirara e se
influenciara pelos ensinamentos e a eloqüência do professor catedrático
Luiz Ignácio de Anhaia Mello (1891-1974). Tanto que iniciaria sua
experiência didática junto à Universidade de São Paulo, a partir de 1938,
como assistente adjunto de Anhaia.
Desde aquele momento, sua dedicação sempre fora de profunda atenção
e respeito no contato com os alunos. Sua primeira experiência didática
durou até o ano seguinte, quando se transferiu para a cidade de Santos
no cargo de diretor da Secretaria de Obras Públicas.
Voltando em 45, colaborou com o professor Bruno Simões Magro na
disciplina Noções de Arquitetura e, depois em 47, foi novamente
assistente de Anhaia Mello, substituindo Vilanova Artigas que havia
pedido licença para viagem de pesquisa aos Estados Unidos.
Curioso destacar que Artigas fora também aluno do curso de engenheiro-
arquiteto na Escola Politécnica tendo se formado um ano depois que
Zenon. Além disso, fora também assistente do professor Anhaia na
mesma cadeira. A proximidade física entre ambos (Artigas e Lotufo) era
inevitável, no entanto não se encontrou nenhum relato de trabalho que
tenham desenvolvido juntos, qualquer documento que comprovasse
algum tipo de afinidade entre os mesmos. O que nos faz concluir que a
relação entre eles não era lá muito amistosa.
A criação da FAUUSP
A necessidade de se criar, ou melhor, se diferenciar o ensino de
arquitetura do ensino de engenharia se manifestava de forma acentuada
em São Paulo na década de 40, por um grupo de arquitetos articulados.
Um dos defensores era Carlos Alberto Cardim Filho que em entrevista
datada de 1941 acreditava na criação de uma Escola Superior de
Arquitetura, sem vínculos com a Politécnica nem com a Belas Artes.
A primeira faculdade paulista de arquitetura acabou sendo o Instituto
Mackenzie que conseguiu em dezembro de 1946 através do Conselho
Nacional de Educação aprovar sua instalação, tendo seu reconhecimento
por Decreto Federal de julho de 47 que passou então a chamar-se
Faculdade de Arquitetura Mackenzie, tendo Cristiano Stockler das Neves
como seu primeiro diretor.
No caso da Universidade de São Paulo, o procedimento jurídico-legal
também já estava em andamento naquela época, tendo outro grupo
orientando a remodelação do curso de engenheiro-arquiteto “nos moldes
do padrão federal da Faculdade Superior de Arquitetura, ou seja, com
103
direção autônoma e adaptável às necessidades atuais de uma
organização universitária”.
89
Novamente, se destacaria nesta ocasião a personalidade forte de Anhaia
Mello como principal interventor em favor da criação da nova faculdade.
A família Álvares Penteado apressou o desenlance desta história quando
fez adoação da residência em estilo Art-nouveau situada no bairro de
Higienópolis à Universidade de São Paulo, objetivando o acolhimento da
nova escola de arquitetura.
Assim, em março de 1948, começaria a funcionar a Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo (o enfoque para o urbanismo do curso era dado
por Anhaia Mello) da Universidade de São Paulo em Decreto Federal de
21 de junho de 1948, tendo Anhaia Mello como primeiro diretor.
Portanto, naquela ocasião configuram-se os moldes das duas principais
escolas de arquitetura paulistana.
No entanto, havia concepções diferentes na orientação dos estudos: uma
era mais influenciada pela formação americana de Stockler das Neves,
representando paradoxalmente os ideais do ensino beaux-arts francês; e
outra mais humanista e culta, resultando da prática urbanística americana
e aderência aos valores estéticos modernos.
89
Ficher, Silvia. Os arquitetos da Poli. Ensino e profissão em São Paulo. Edusp, São
Paulo, 2005, pg. 254.
Ou seja, a FAUUSP voltava-se mais para a manutenção de certos ideais
politécnicos: o conhecimento técnico da construção, preocupação
urbanística e estética racional moderna.
Em 4 de maio de 1949, Zenon Lotufo foi contratado pelo prazo de 2 anos
como professor catedrático para reger a disciplina n. 16 “Composição de
Arquitetura” para o 1º. Ano do recém-criado Curso de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo (Lei n. 104, de 21 de junho de
1948), na vaga de João Batista Vilanova Artigas, que foi transferido para o
2
o
. Ano.
“Fui da secunda turma da FAUUSP, me formei em 53. Zenon foi
meu professor no 1º ano da escola. Ele e o Hélio (Duarte) davam aulas de
projeto. Era uma pessoa recatada, talvez pelo fato da religião
(protestante), mas não era um professor notório que criava seguidores ou
inspirava muito os alunos. Era à sua maneira, anônimo, apagado e sério.
Seu riso era contido, pelo que me lembro. Não era homem de vanguarda.
Artigas praticamente o desconsiderava. No entanto, prevalecia nas aulas,
a arquitetura funcionalista, voltada para as funções do espaço, circulação,
orientação, implantação etc.
90
Nascido em Botucatu em 1932, o arquiteto Eugênio H. Monteferrante
formou-se na FAUUSP, cursou de 52 a 57 e foi aluno de Zenon Lotufo, no
primeiro ano de curso. Em relato pessoal, confessou:
90
Depoimento de Jon Maitrejean em 30 de outubro de 2007.
104
“Aprendi com o professor Zenon, a verdadeira noção de
circulação na construção. Além desse aspecto, de suma importância no
projeto, Zenon destacava ainda: a autenticidade dos materiais, a planta
bem elaborada, o que já definia as fachadas do edifício,a implantação
correta segundo a melhor orientação, insolação, ventos dominantes e
topografia, a hierarquia dos ambientes, hall de distribuição, estrutura,
fluxograma e programa.”
91
Concurso de Cátedra
A situação de renovação contratual de Zenon Lotufo como professor da
FAUUSP perduraria até 1956, portanto 7 anos, quando se anunciou,
mediante publicação no Diário Oficial da União, o Concurso para
provimento de cargo de Professor Catedrático da Cadeira n.16, agora
então conhecida como “Composição de Arquitetura. Pequenas
Composições I. Desenho Arquitetônico e Plástica I”. Na publicação oficial
regia o seguinte texto:
De ordem do então Diretor Lysandro Meles Pereira da Silva e em
cumprimento à deliberação do Egrégio Conselho Universitário
funcionando como Congregação desta Universidade acha-se aberta na
Secretaria desta Faculdade a inscrição para o concurso de preenchimento
91
Depoimento de Eugênio Henrique Monteferrante em 16 de maio de 2007.
do cargo de Professor Catedrático da Cadeira n. 16. Para a inscrição, de
acordo com legislação em vigor, o candidato deve apresentar: diploma
profissional, prova que é naturalizado ou brasileiro nato, certificado
quitado militar, prova de sanidade física e mental e idoneidade moral,
documentação de atividade profissional exercida durante o prazo mínimo
de 06 anos e por fim, 100 (cem) exemplares de tese original sobre assunto
de livre escolha, pertinente a matéria em concurso e cuja defesa
constituirá prova obrigatória.”
92
Em 7 de julho de 1957, ou seja, um ano e meio depois da primeira
publicação, o então vice-diretor em exercício Pedro Bento José Gravina
divulgaria publicamente através do Diário Oficial da União, as datas das
provas do concurso que se daria em 9 de agosto daquele mesmo ano,
com início marcado para às 10 horas da manhã.
Bem como a Comissão Julgadora que seria constituída pelos seguintes
professores: Dr. Demétrio Ribeiro, da Faculdade de Arquitetura da
Universidade do Rio Grande do Sul; Dr. Sylvio de Vasconcelos, da
Faculdade de Arquitetura da Universidade de Minas Gerais; Dr. José
Benedicto de Camargo, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de
Queiroz” da Universidade de São Paulo; Dr. Lourival Gomes Machado, da
92
Extraído de reprodução do recorte original do jornal Diário Oficial da União em
31 de janeiro de 1956.
105
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e
Dr. Diógenes Rebouças, da Escola de Belas Artes da Universidade da
Bahia.
A seguir, relatamos um breve resumo das principais atividades realizadas
pelos membros da banca examinadora, a fim de conhecer melhor o
mérito e a qualidade dos mesmos.
Demétrio Ribeiro
Demétrio Ribeiro nasceu em Porto Alegre em 1916 e se formou na
Faculdade de Arquitetura de Montevidéu em 1943, posteriormente
ingressando na Secretaria de Obras do Estado do Rio Grande do Sul em
45. A influência de alguns professores no Uruguai durante sua formação
acadêmica foi decisiva. Como no caso de Júlio Vilanajó que professava os
princípios universais e permanentes da Composição.
Demétrio dizia que era necessário ter noção de composição arquitetônica
ao fazer o projeto.
“Composição é noção de ordem. Alberti já escrevera sobre isto no
Renascimento italiano. Como é que se projeta algo que é composto por
partes distintas, mas que deve ser uma coisa só? Deve ter em mente o
princípio da unidade, onde não se pode retirar nada sem se notar a falta”.
93
Foi um dos fundadores da Faculdade de Arquitetura da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, em 52, lecionando por vários anos no curso.
De 46 a 51, exerceu a cátedra no Instituto de Belas Artes na disciplina
Composições de Arquitetura. E posteriormente com a fundação do curso
de Arquitetura, permaneceu como titular em Composições de Arquitetura,
de 52 a 64.
Em 1954, por ocasião do IV Congresso Brasileiro de Arquitetos em São
Paulo, Demétrio Ribeiro, juntamente com Enilda Ribeiro e Nelson Souza,
apresentaram a tese intitulada Situação da arquitetura brasileira.
94
Naquela oportunidade, os autores defendiam uma visão mais autocrítica
da arquitetura moderna de modo a democratizar seus valores estéticos
tendo em vista a satisfação das necessidades materiais e espirituais do
povo brasileiro. Ou seja, arquitetura não deveria ser uma arte que
depende do talento e da originalidade individual, mas sim o resultado de
um exame atento às realidades sociais e culturais do nosso meio.
93
Relato publicado Udo S. Mohr por ocasião do falecimento de Demetrio Ribeiro,
em artigo eletrônico
http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq041/arq041_00.asp
94
XAVIER, Alberto (org.) Depoimento de uma geração. Cosac & Naify, São Paulo,
2003, pg. 203-207.
106
É necessário compreender o caráter social do processo de
elaboração e fixação das formas capazes de definirem a arquitetura de
uma nação e de uma época.”
95
Cassado pela ditadura militar em 64, Demétrio só retornaria à Faculdade
em 1980, quando foi condecorado com o título de Professor Emérito. Foi
autor de vários planos diretores sendo também premiado em alguns
concursos públicos. Acreditava na arquitetura moderna que priorizava o
bem-estar e o conforto estético obtidos com o mínimo de recursos.
Faleceu em outubro de 2003.
Sylvio de Vasconcellos
Nascido em Belo Horizonte em 1916, Sylvio de Vasconcellos formou-se na
Escola de Arquitetura da UFMG em 44, onde lecionou de 48 a 69 e foi
diretor em 63-64. Dedicou-se atentamente à pesquisa e catalogação da
arte e da arquitetura colonial e barroca mineira, especialmente a obra de
Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. Tal fato gerou inúmeras
publicações e artigos sobre preservação do patrimônio histórico e
arquitetônico dedicando-se a isso ao longo dos trinta anos (39-69) em que
esteve à frente do IPHAN-MG (Instituto do Patrimônio Artístico Nacional
de Minas Gerais).
95
Idem, pg. 205.
Foi professor na Universidade do Chile em 1966 e de Brasília (UnB) em 68.
Publicou livros de destacada importância como Arquitetura no Brasil –
sistemas construtivos (51), Vila Rica: formação e desenvolvimento (56),
Vocabulário arquitetônico (61) e Vida e obra de Antonio Francisco Lisboa,
o Aleijadinho (79), entre outros.
Em 29 de junho de 1957, Sylvio de Vasconcellos publicou no jornal O
Estado de São Paulo o artigo intitulado Crítica de arte e arquitetura
96
onde questionava o papel da crítica de arte especializada em arquitetura
apontando problemas e alternativas para melhorar sua eficácia.
Segundo ele, o Brasil despontava sua produção arquitetônica para os
olhos do mundo, mas não gozava de um corpo técnico capaz de contestar
e discutir o sucesso repentino da arquitetura moderna nacional, e muito
menos de um canal receptor (leia-se: o povo) preparado para as lições a
serem emitidas.
Fez crítica ao modo de ver de Mário Pedrosa, que em artigo anterior
97
defendera a arte arquitetônica como solução plástica ao lado da pintura,
escultura e gravura, onde o que interessaria era seu aspecto belo e
deleitoso.
96
XAVIER, Alberto (org.) Depoimento de uma geração. Cosac & Naify, São Paulo,
2003, pg. 287-289.
97
Mário Pedrosa, Jornal do Brasil, em 23 fev. 1957.
107
Do outro lado, Vasconcellos defendia a idéia de que a arquitetura deveria
estar integrada à vida, onde o interior importasse tanto quanto exterior; a
técnica e a finalidade (uso) deveriam ser adequadas ao bem-estar
material e espiritual do povo.
Procurar a correspondência ideal entre a organização de espaço
e o estilo de vida a que ele vai servir. Inclusive para que essa organização
não atenda só às tendências da vida moderna, mas que influa sobre o
status familiar e social. A arquitetura estará assim ocupando seu
verdadeiro lugar na civilização contemporânea, participando ativa e
efetivamente dela e não apenas ornamentando-a com monumentos
isolados, ainda que de incontestável beleza”.
98
Diógenes Rebouças
Integrante e principal responsável pelo então EPUS (Escritório de
Planejamento Urbano de Salvador), criado em 46, Diógenes Rebouças foi
um dos pioneiros na introdução da arquitetura moderna na Bahia.
Nasceu em 1914 e diplomado na Escola de Belas Artes da Universidade
Federal da Bahia em 52 onde passou a lecionar posteriormente, sendo
notável professor da futura escola de Arquitetura da UFBa. Diógenes
faleceu em 1994, com 80 anos. Divulgou e empreendeu uma visão
98
XAVIER, Alberto (org.) Depoimento de uma geração. Cosac & Naify, São Paulo,
2003, pg. 289.
interdisciplinar da arquitetura sempre vinculada à realidade urbana. Ou
seja, sua visão de urbanista prevalecia sobre a concepção arquitetônica.
Mostrava-se adepto da matriz corbusiana, privilegiando o uso racional
dos materiais, a economia de ornamentos e o diálogo com a tecnologia
industrial.
Dentre seus principais projetos, destaques para: Avenida Contorno,
Estação Marítima, Faculdade de Farmácia, Arquitetura e a Escola
Politécnica da UFBa, o estádio da Fonte Nova, a estação do FerryBoat,
entre outros. Em 1947, juntamente com Hélio Duarte, desenvolveu o
projeto para a Escola Parque com a concepção programática de Anísio
Teixeira.
Para Diógenes, sempre deveria existir um raciocínio maior que legitimasse
a arquitetura em face de seu contexto físico, histórico, social e econômico
urbano. Os valores formais e plásticos deveriam fluir espontaneamente
reforçando a relação entre o “partido arquitetônico” e a geomorfologia
do sítio, cuja base era a cidade, dentro de sua lógica e princípios.
Projeto é papel pintado, se rasga e se joga fora, fazendo-se
outros. Já obra, não. Se feita de modo errado, estará sempre lá,
confessando nossos equívocos”.
99
99
Extraído de artigo eletrônico da Revista Bahia Invest de junho de 2006, ver site:
http://www.seplan.ba.gov.br/bahiainvest/port/perfil.php?find=versao008
* Karl Mannheim (1893-1947) – sociólogo alemão, professor de Sociologia em
Frankfurt e Londres. Sua obra mais influente - Ideologia e Utopia (29) - afirmava
108
Lourival Gomes Machado
Nascido em Ribeirão Preto em 1917, Lourival Gomes Machado
bacharelou-se em Direito e Ciências Sociais em 1938. Como crítico de arte
publicou vários artigos em jornais e revistas sendo professor da Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas desde 1939 e da Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo no biênio 61-62. Organizou e
instalou a 1
a
. Bienal Internacional de São Paulo em 1951. Não havia
muitos críticos de arte naquele tempo e, portanto, Mário Pedrosa e
Lourival concorriam, um no Rio de Janeiro, outro em São Paulo.
Disputavam a primazia de construir uma crítica embasada não apenas em
fundamentos estéticos, mas também sócio-culturais. Era a época em que
Mannheim* perturbava as mentes com a Sociologia do Conhecimento e a
Gestalt e a Psicologia Social davam um ar novo e diferente à maneira de
ver as artes plásticas.
Lourival era um homem político que discordava dos rumos que trilhava a
política brasileira. No início da década de 60, assumiu o Departamento de
Assuntos Culturais da Unesco em Paris. Entre suas principais obras
publicadas estão: Retrato da arte moderna no Brasil (47); Teorias do
que todo conhecimento não resulta simplesmente de uma consciência teórica,
mas de outros elementos provenientes da vida social e das influências e vontade
que o indivíduo está sujeito. Em cada fase da humanidade apareceriam teorias
conflitantes, tendendo ou para a conservação, ou para a mudança. A primeira
tenderia a produzir as ideologias e a segunda, as utopias.
barroco (53); Reconquista de Congonhas (60) e Barroco mineiro (69).
Faleceu em Milão na Itália no ano de 67.
Em seu livro de 47, Lourival escreveu sobre A renovação da arquitetura
brasileira onde constatava que a vinda de Le Corbusier, convidado pelo
grupo de arquitetos cariocas encarregados pela construção do Ministério
da Educação e Saúde, teria sido o grande impulso que alavancou a
chamada arquitetura moderna brasileira.
A visita de Le Corbusier teve uma orientação marcadamente
didática. Sua atitude fora a de estudar junto, encaminhando o
esclarecimento das questões e a solução dos problemas. E a melhor prova
de sua eficiência como professor se patenteia por ter deixado aqui, ao se
retirar, não o risco de um prédio público, mas um grupo de jovens
arquitetos capacitados a resolver esse problema urgente, e mais, de
construir, como vieram posteriormente a construir, as melhores amostras
contemporâneas do país”.
100
Programa proposto
Um ofício assinado pelo então secretário geral Júlio Mário Stamato levou
ao conhecimento do diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Pedro Bento José Gravina que no Conselho Universitário reunido em 23
de janeiro de 1956 havia sido aprovado o novo programa para a cadeira n.
100
XAVIER, Alberto (org.) Depoimento de uma geração. Cosac & Naify, São Paulo,
2003, pg. 77.
109
16 Composição de Arquitetura – Pequenas Composições I – Desenho
Arquitetônico – Plástica (1
a
. e 2
a
. partes)’ .
O programa proposto para o 1º. Ano do curso em 1956 era:
Apresentação dos materiais de construção mais usuais; seu
emprego sob ponto de vista estrutural, de vedação e plástico.
Equipamento da habitação; material sanitário, eletrodomésticos,
armários, mesas e cadeiras.
Elementos que compõem a construção do ponto de vista funcional
e construtivo.
O homem como modulador do espaço; os elementos construtivos
e espaciais em relação às proporções humanas.
Organização dos espaços internos e externos da habitação.
Interdependência dos ambientes interno e externo na habitação
contemporânea
Análise do local: situação, orientação, vizinhança, interpretação
de levantamento.
Discussão de programas mínimos de habitação e organização de
projetos.
Seriam estabelecidos exercícios referentes a: detalhes diversos de
construção; organização dos espaços internos e externos de uma
habitação; projeto de residência para família pequena.
Para o 2º. Ano, o programa seria:
Detalhes construtivos de edifícios e pequenas estruturas:
Fundações, Paredes, Estruturas simples, Cobertura, Acabamentos,
Instalações elétricas, hidráulicas e águas pluviais.
Situação dos edifícios no terreno e aproveitamento de lotes
urbanos.
Noções de insolação. Interpretação das disposições legais
contidas nas codificações sobre instalações.
A vida interna do edifício: o programa. Circulação interna em
residências e outros casos. Distribuição em planta em função da
circulação.
Os exercícios seriam: projeto de pequena residência e discussão coletiva
dos trabalhos; estudo de um sobrado atentando para a ligação entre
andares: escadas, rampas, elevadores; estudo de habitação coletiva e sua
insolação; estudo de projeto com programa específico (pequenas
estações, restaurantes, posto de serviços).
A disciplina de Plástica I (a partir do 2º. Ano) discorreria sobre:
Noções elementares de geometria plana. A medida áurea. As
leis da forma (Gestalt). Noções sobre cores primárias e
neutras.
Noções elementares de geometria espacial. Sólidos regulares.
Noções de espaço plástico: estático e dinâmico; espaço-
110
tempo; cheios e vazios; articulação de volumes; a cor como
elemento espacial.
Já a disciplina de Desenho Arquitetônico (para o 1º. Ano) teria o seguinte
programa:
Uso dos instrumentos de desenho: tira-linhas, grafos,
normógrafos, esquadros, compassos, escalas, etc.
Exercícios de representação em escalas diferentes: plantas, cortes,
elevações e detalhes.
Convenções usuais nos desenhos de instalações elétricas, água,
gás, etc.
Levantamento de edifícios e seus elementos.
Representação dos diversos ambientes de uma edificação:
cozinhas, banheiros, lavanderias, salas, dormitórios, refeitórios,
etc.
Desenhos de apresentação de anteprojeto e estudos.
Desenhos técnicos de execução.
Desenhos de projetos nos termos da legislação em vigor.
Destacavam-se ainda os assuntos e conhecimentos correlatos ao
programa da disciplina que deveriam ser desenvolvidos pelo professor:
A arquitetura e conceitos. Expressão, correlação, integração.
Problemas sociológicos e grupos sociais.
Complexidade do fato arquitetônico. Função, estrutura econômica
e síntese estética.
Estética sociológica e psicológica. Arte, indústria e sociedade.
O espaço e sua integração. Concepções através da história.
Problemas de psicologia experimental. Sensações e imagens.
Salubridade, saúde física e espiritual. Clima e micro clima.
Sistemas construtivos. Esqueleto e membranas. Aço, concreto e
madeira.
Economia. Simplicidade e pureza da forma.
O plano como gerador. Flexibilidade e uso múltiplo do espaço.
O problema da habitação. Circulação. O edifício e a cidade.
Vida e aura das formas. Forma e tempo, função, teoria, cor,
tradição.
Arquitetura e seu ensino.
Os estilos, suas origens e tendências.
Os elementos da Arquitetura. Elementos estruturais, de proteção,
de circulação e decoração. História e filosofia.
Teoria da Arquitetura. Fatores de ordem material, social,
econômica e psicológica.
101
101
Extraído de documento original presente na pasta de Zenon Lotufo na Seção
Pessoal da FAU-USP.
111
Candidatos
Inscreveram-se para o Concurso, além de Zenon Lotufo, os seguintes
arquitetos: rio Russo, Paulo Camargo de Almeida e Ernest Robert de
Carvalho Mange.
Mário Russo era italiano formado pelos princípios da escola racionalista
na Itália. Em 49, transferiu-se para Recife, onde projetou o campus da
Universidade Federal, seguindo como chefe do Escritório Técnico da
Cidade Universitária, ficando na cidade até 55. Projetou os prédios para a
Faculdade de Medicina e o Hospital das Clínicas, o Instituto de
Antibióticos e o Instituto de Biologia Marítima.
Paulo Camargo de Almeida (1906-1973) foi o arquiteto carioca que
presidiu a direção nacional do Instituto dos Arquitetos do Brasil em 43.
Participou junto com a equipe de Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi, do
concurso para o Plano Piloto de Brasília em 57, obtendo o quinto lugar na
competição. Foi diretor executivo do FUNDUSP entre 60 e 65.
Ernest Robert de Carvalho Mange (1922-2005) nasceu em São Paulo. Filho
de engenheiro suíço e professor da Escola Politécnica, onde estudou de
40 a 45. Foi estagiário no escritório de Rino Levi e Le Corbusier. Participou
nos anos 70 com Hélio Duarte, do projeto e construção de várias escolas
do Convênio Escolar e Senai.
Foi presidente da Empresa Municipal de Urbanização (EMURB). Projetou
o Conjunto Indaiá (blocos de apartamento) em Santos, novamente com
Hélio Duarte; o Bloco E-1 na Escola de Engenharia de São Carlos, o Plano
Diretor de Ilha Solteira (68) e o Instituto Itaú Cultural (95), na Avenida
Paulista, entre outros tantos.
Este brevíssimo resumo de algumas das atividades desenvolvidas pelos
candidatos, antes e depois do Concurso, serve para ilustrar um pouco do
gabarito e a qualidade profissional que estavam sendo avaliados na
solenidade acadêmica em questão.
O espaço psicológico na Arquitetura
O ensaio apresentado por Zenon Lotufo para sua defesa de tese no
concurso tornou-se um trabalho de referência para estudantes e mesmo
professores. A simplicidade de suas palavras nunca afetou a qualidade do
conteúdo das mesmas. O fato foi que em O Espaço Psicológico na
Arquitetura”, Zenon Lotufo procurou discutir os aspectos psicológicos na
organização dos espaços e sua relação com o homem, como comentamos
a seguir.
112
(Fig. 136) Capa ilustrativa da tese para o Concurso de Cátedra. Fonte: Arquivo da família.
Existem pontos interessantes que o arquiteto abordou já na introdução
do ensaio como, por exemplo, a crítica que fez à excessiva classificação de
movimentos e escolas nas artes e na arquitetura.
“Sim, por que não se admite que o arquiteto, o pintor, o escultor
estejam simplesmente fazendo arquitetura, pintura ou escultura; para
merecerem atenção e referências, precisam fazer arquitetura orgânica,
cubismo, construtivismo, neo-plasticismo, surrealismo, abstracionismo,
etc”.
102
102
LOTUFO, Zenon. O Espaço Psicológico na Arquitetura. Tese elaborada para o
Concurso Público para provimento do cargo de Professor Catedrático da Cadeira
n. 16 ‘Composição de Arquitetura. Pequenas Composições I. Desenho
Arquitetônico. Plástica I’ do Curso de Arquitetura da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo. São Paulo, 1956, pg. 9.
Mesmo assim, Zenon trazia à tona seu otimismo e entusiasmo pelas
questões contemporâneas da sociedade em constante evolução e a
arquitetura que se desenvolvia naquele período. E mais diante, afirmava
convicto:
“Há ainda hoje quem pense em arquitetura contemporânea,
exclusivamente em função da forma, sob os aspectos puramente
plásticos. Esquece-se completamente da função primordial do arquiteto
que é a de organizar o espaço. Muito mais útil e necessário é o estudo e
análise do espaço e sua organização nas obras históricas, do que a
memorização de estilos, detalhe de fachadas, molduras e colunas. A
composição espacial interna e externa dos edifícios reflete de certa
maneira a vida de um povo, suas tendências, suas preocupações sociais,
seus processos políticos”.
103
Seu texto se prontificava em apontar com simplicidade e clareza, a função
social da arquitetura e a importância do arquiteto em ter a liberdade para
exercer sua sensibilidade criativa, interpretando os problemas e
fenômenos sociais e expressando seu pensamento.
Lotufo afirmou que havia uma diferença muito grande entre o arquiteto
que atua de modo livre, expressando sua arte através da influência que
recebe do seu meio, da filosofia de sua época e da cultura do seu povo, e
103
Idem, pg. 10.
113
o profissional que cumpre apenas as determinações que seu cliente lhe
pede.
A primeira seria espontânea, característica fundamental da criação
artística, e a segunda impositiva, portanto, destituída de expressão
verdadeiramente artística, pois aniquilava algo extremamente valioso: a
personalidade humana. E encerrando o capítulo, Zenon recuperava as
quatro funções básicas da cidade moderna corbusiana, descrita na Carta
de Atenas em 1933: habitar, trabalhar, circular e a cultivar o corpo e o
espírito.
Entender os limites do tempo na sua divisão em acordo com as atividades
do homem, ou seja, períodos para uma de cada destas funções em
ambientes que satisfaçam seu conforto fisiológico e psicológico.
“O habitar não deve ser meramente o atendimento das
necessidades físicas elementares. Deve ser a integração de uma solução
espacial orgânica com o desejo humano por elementos visuais e plásticos.
Ao se estudar as organizações espaciais de cada povo e cultura verificam-
se diferentes modos de se valorizar aspectos espirituais. Quanto mais
culto e civilizado esses povos, maior a importância creditada aos valores
espirituais”.
104
104
Ibidem, pg. 15.
Continuidade espacial
Uma tendência natural do homem seria a conquista visual do exterior,
ultrapassando os limites materiais dos espaços internos. Esta correlação
entre ambiente interno e externo ficou enfatizado na tese por
continuidade espacial. Tratava-se, segundo Zenon, de uma das condições
psicológicas mais necessárias à vida humana.
“Mas a continuidade espacial deve ser tratada de tal maneira que
sua influência sobre o ambiente não altere as qualidades indispensáveis à
sua consideração como espaço psicológico”.
105
Para Zenon, deve-se estar muito atento ao emprego do princípio
da continuidade espacial, pois as condições para que determinados
ambientes desempenhem suas plenas funções devem estar em acordo
com as necessidades psicológicas de seus usuários.
Outro conceito desenvolvido em sua tese foi a questão da
proporcionalidade espacial.
Devendo existir proporcionalidade e relação com o meio
ambiente e as funções necessárias ao desempenho das atividades
humanas, em uma composição plástica que satisfaça simultaneamente
aos valores espirituais. O engenheiro calcula o espaço exato ou fisiológico;
o arquiteto organiza o espaço psicológico.
106
105
Ibidem, pg. 28.
106
Ibidem, pg. 29.
114
Para Zenon, esta seria a principal diferença entre a obra do engenheiro e
do arquiteto. É notável o parentesco dessas palavras com as de Le
Corbusier em Por uma arquitetura, como vimos anteriormente.
Evolução social
Outro fenômeno que Lotufo enfatizou em seu texto foi o da evolução
social. Para ele, os edifícios tenderiam a responder aos usos de um
determinado grupo social. No entanto, com o passar do tempo, este
grupo poderia mudar ou mesmo o próprio uso tenderia a uma mudança.
Neste caso, o edifício perde sua razão de existir, devendo encontrar nova
destinação de uso, caso pretenda-se que o mesmo sobreviva. Ou seja,
uma adaptação frente a uma nova exigência, ou um novo cenário que
atenda a uma nova demanda, se esta existir.
Para Zenon, bastaria imaginar nos castelos medievais ou mesmo nos
palácios renascentistas. Em determinado período da história cumpriam
importante função social na vida das comunidades, tornando-se com o
passar dos tempos, obsoletos e desnecessários frente aos usos que se
fizeram presentes.
Assim, o processo de evolução social e científica das civilizações humanas
é inevitável. Basta observar o exemplo, segundo Lotufo, dos meios de
locomoção. O cavalo, a máquina a vapor, o motor a combustão, o avião. O
fato é que este fenômeno reflete diretamente na organização dos
espaços utilizados pelo homem e, portanto no modo de conceber e
planejar nossas cidades, sendo necessária, uma intervenção constante
com o intuito de adaptar da melhor maneira: usos, técnicas e contextos.
“A excelência de tais criações não pode ser negada, como não o
poderá ser igualmente, a possibilidade de novas manifestações espaciais
que, psicologicamente, resolvam os problemas de cada época, no
conteúdo, na forma e na estrutura”.
107
Numa definição primorosa sobre arquitetura no livro Precisões, Le
Corbusier também comentou sobre a necessidade de sua arte se adaptar
às mudanças contínuas da sociedade:
“Arquitetura é um encadeamento de acontecimentos sucessivos,
que vão da análise à síntese. Acontecimentos que o esrito tenta tornar
sublime, através da criação de relações tão precisas e perturbadoras que
delas decorrem sensações fisiológicas profundas. Intervêm um verdadeiro
deleite espiritual ao lermos o problema resolvido e alcançarmos uma
percepção da harmonia, graças à qualidade matemática que une cada
elemento da obra aos demais, e o conjunto dela ao meio ambiente onde
está, o local. O próprio da criação é equacionar relações forçosamente
novas, pois um dos termos é fixo - a sensibilidade humana – e o outro está
sempre em movimento – as contingências, isto é, o meio formado pela
107
Ibidem, pg. 37.
115
qualidade técnica em todos os setores, de uma sociedade em perpétua
evolução”.
108
Oscar Niemeyer, do mesmo modo, em artigo recente também comentou
que:
Não foi apenas o progresso da técnica que marcou a evolução da
arquitetura, mas também as transformações das ciências e da
sociedade”.
109
Correlação dos espaços
Segundo Zenon, examinando, por exemplo, os templos gregos da
Antiguidade clássica verificavam-se também uma preocupação desses
povos em adequar suas construções às condições geográficas, ao clima, à
paisagem e à topografia.
A correlação dos espaços era uma das preocupações relacionadas por
Lotufo onde a forma arquitetônica seria determinada pelo modo como os
espaços internos estariam organizados.
“A perfeita harmonia entre invólucro e a organização interna do
espaço, permitirá sua natural expansão, além dos limites materiais a que
está circunscrito, sem perder suas qualidades intrínsecas. Essa harmonia
108
CORBUSIER, L. Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do
urbanismo. São Paulo, Cosac e Naify, 2004, p 160.
109
Niemeyer, Oscar. Conversa de arquiteto Artigo publicado no jornal Folha de
São Paulo em 16 de julho de 2006, caderno A, p. 3.
adiciona-lhe uma espécie de força espiritual, capaz de influenciar e
modificar o espaço externo. Este igualmente influenciará o ambiente
interno, havendo não propriamente uma compensação, mas sim, um
acréscimo mútuo de valores. Haverá uma interpenetração com vantagens
reais recíprocas”. (LOTUFO, 1956, pg. 49-50)
Zenon continua seu texto relatando a ineficácia das cidades e das
metrópoles atuais e os males que a desorganização política e a ausência
de planejamento e controle para direcionar o crescimento do território,
resultaram somente em espaços restritos e apertados.
Os processos de verticalização intensos coincidente com um mercado
imobiliário que se valeu do máximo aproveitamento de construção
produziram o enclausuramento do homem contemporâneo, fechado em
seu minúsculo apartamento, não consegue gozar de situações favoráveis
ao seu conforto físico nem psicológico.
Cabe salientar que o principal interessado e ao mesmo tempo
menosprezado é o próprio homem, cujas necessidades e aspirações
deveriam ser o ponto de partida para todas as soluções urbanísticas.
116
Toda cidade é uma casa. Toda casa é uma cidade
No capítulo seguinte, Zenon resgataria um importante ensinamento de
Alberti
110
quando diz que os espaços abertos e externos seriam a
continuidade da habitação. Pois o sentido de habitar não está apenas na
moradia particular, ela se estender no território urbano-rural como um
todo. Essa correlação de espaços é discutida por Zenon tendo como foco
o aspecto psicológico na relação homem e meio ambiente.
“Não se trata de grandes avenidas ou extensas praças. Procura-se
a correlação entre as organizações espaciais, a proporção, o equilíbrio,
estudando-se o comportamento do homem em relação ao ambiente, para
que não se sinta constrangido, atemorizado ou preocupado, mas sinta
emoções agradáveis, conforto físico e espiritual, segurança e bem-estar”
(LOTUFO, 1956, pg. 58).
Assim, Lotufo reforçou sua crença nos valores estéticos clássicos
necessários à obra arquitetônica: proporção, equilíbrio, harmonia e
unidade na variedade.
“A emoção estética não é produzida pelo acaso, pela distribuição
indiscriminada de volumes e cores, de cheios e vazios; mas sim
conseqüência lógica da organização inteligente, ordenada e plástica do
110
Leon Battista Alberti (1404-1472), arquiteto e teórico do Renascimento
italiano, escreveu o célebre tratado de arquitetura, baseado na harmonia dos
números e das proporções na arte da Antiguidade: De re aedificatoria (1452).
espaço. Cada edifício ou conjunto de edifícios, cada monumento, praça ou
logradouro, devem ter seu lugar e sua razão de ser no complexo urbano”
(LOTUFO, 1956, pg. 59).
Em seguida, Lotudo reproduz um conceito desenvolvido por Eliel Saarinen
(1873-1950) em seu livro “Busca pela Forma” (“Search for Form”)
chamado “embracing space”.
“Em qualquer circunstância, toda obra de arte deve estar disposta
de modo a fazer parte integral do espaço que a envolve, deve estar em
harmonia com os vários fatores de sua esfera de influência, deve ser
expressiva de significado e sentido em seu espaço envoltório (embracing
space) e deve atender as funções de sua razão de existir”.
111
Tradição criadora
O instinto criador dos gregos preocupava-se atentamente com o trato do
ambiente externo, ou seja, da correlação entre a obra de arte e o local
onde estará.
De modo que contribuísse para originar a noção de continuidade espacial,
unidade de composição e harmonia de conjunto.
Novamente trazem o exemplo da Acrópole grega salientando o valor
plástico de cada peça dentro do conjunto e a zona de influência de uns
com os outros, respeitando e apoiando intrinsecamente.
111
Saarinen, Eliel. Search for Form p. 131.
117
“Os princípios que os orientaram, as causas determinantes de
adoção de certos critérios construtivos e plásticos, conseqüência de
circunstâncias e fatores peculiares ao meio, ao clima, à organização
social, à técnica conhecida, enfim todo esse complexo que aliado à
intuição, modela uma obra de arte, por muito tempo” (LOTUFO, 1956, pg.
66).
Novos rumos
Comentando sobre o modo recente que a arquitetura moderna
despontou e os rótulos que lhe foi atribuída, entre eles, funcionalista ou
racionalista, Zenon qualificou estas características como sendo inerentes
à qualquer obra de arquitetura verdadeira. Do contrário, seria obra de
engenharia.
Criticou também a necessidade material imediata da sociedade
contemporânea que se preocupava muito mais com os aspectos formais e
os estilos de moda, valorizando o máximo aproveitamento dos espaços do
que os verdadeiros fundamentos da arquitetura: a satisfação das
necessidades psicológicas do homem.
O progresso tecnológico e científico, segundo Lotufo, estaria escravizando
o ser humano, pois à medida que colocava à disposição os meios técnicos
adequados à concretização de suas idéias, criava maior competição por
produtividade e lucros.
Outro autor citado no ensaio foi Herbert Read (1893-1968), crítico de arte
inglês que no seu livro “The Grass Roots of Art” destacava que a grandeza
da Arquitetura se encontraria numa determinada estrutura social,
animada por um espírito político ou religioso, mas que essencialmente
relacionasse eficiência, integridade, singeleza e intimidade.
No desfecho do ensaio, Zenon ressaltou a complexidade de organização
da cidade moderna. Suas mudanças como sendo muito rápidas e
constantes, de forma e caráter. Mas sua morte não poderia ser
comparada a de um organismo. Só morreria, quando parasse de evoluir.
E citando o filósofo Henri Bérgson
112
em A Evolução Criadora: “Duração
significa invenção, criação de formas, elaboração contínua do novo”.
Para Lotufo, o que determinaria a evolução das cidades, este fantástico
fenômeno fruto das organizações espaciais relacionadas entre si por
contigüidade, seria o próprio homem, fator único de sua existência. Sendo
o homem, uma criatura dotada de emoção e razão, espírito e matéria, sua
casa-cidade não poderia abdicar de nenhum desses aspectos para
satisfazer seus anseios e necessidades.
112
Henri Bérgson (1859-1941), influente filósofo francês, da primeira metade do
século XX. Ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em 1927. Buscou superar o
positivismo e o idealismo do século XIX. Suas obras mais importantes: Matéria e
memória (1896) e A evolução criadora (1907).
118
Resultado polêmico
O relatório final da banca examinadora do Concurso de Cátedra
113
contendo 35 páginas descreveu o conteúdo de atividades desenvolvidas
pelos candidatos, as provas, os critérios de avaliação, as notas, os pontos
sorteados e os temas escolhidos, e a seguir, reproduzimos seus aspectos
principais.
O Concurso teve seu início em 9 de agosto de 1957, às 10 horas da
manhã, quando o então diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo, Prof. Dr. Pedro Bento José Gravina
empossou os membros da Comissão Julgadora.
Assumindo então a presidência da banca examinadora o Prof. Dr. José
Benedito de Camargo tendo como secretário o também professor e
doutor, Lourival Gomes Machado, a primeira providência foi determinar a
seqüência e os horários das provas a serem aplicadas.
Sendo feita a seguinte programação e distribuição de horários:
dia 9 – 15 horas: Julgamento de títulos
17 horas: Organização dos pontos para a prova
escrita
dia 10 – 8 horas: Realização das provas escritas
dia 12 – 7:30 horas: Sorteio de ponto da prova prática
113
Extraído de reprodução de documento original datilografado do Arquivo
Histórico e Técnico da FAUUSP.
8 às 12 e 14 às 18 horas: Início da prova prática
dia 13 - 8 às 12 e 14 às 18 horas: Continuação da prova
prática
dia 14 - 8 às 12 e 14 às 16 horas: Continuação da prova
prática
16 às 18 horas: Redação de relatório das provas
práticas pelos candidatos / Julgamento e encerramento
da cédulas
dia 15 – 8 horas: Leitura da prova escrita
a seguir: Julgamento e encerramento das cédulas
dia 16 – 8 horas: Defesa de tese de Zenon Lotufo
A seguir: Julgamento e encerramento de cédula
15 horas: Defesa de tese de Mário Russo
A seguir: Julgamento e encerramento da cédula
Dia 17 – 8 horas: Defesa de tese de Paulo de Camargo e
Almeida.
A seguir: Julgamento e encerramento da cédula
15 horas: Defesa de tese de Ernest Robert de
Carvalho Mange.
A seguir: Julgamento e encerramento da cédula
Dia 18 – 9 horas: Sorteio de ponto de prova didática para
Zenon Lotufo e Mário Russo.
119
14 horas: Sorteio de ponto de prova didática para Paulo
de Camargo e Almeida e Ernest Robert de Carvalho
Mange.
Dia 19 – 9 horas: Realização da prova didática de Zenon
Lotufo e Mário Russo.
A seguir: Julgamento e encerramento das cédulas
14 horas: Realização da prova didática de Paulo de
Camargo e Almeida e Ernest Robert de Carvalho Mange
A seguir: Julgamento e encerramento das cédulas
16 horas: Sessão final pública de apuração dos resultados
do concurso e encerramento dos trabalhos.
Julgamento de títulos
A primeira avaliação levou em conta o julgamento dos títulos dos
candidatos e os critérios de avaliação levaram em conta as seguintes
prioridades:
- dignidade universitária do candidato
- trabalhos científicos e publicações
- atividade didática
- atividade profissional correlacionada à matéria da cadeira
Prova escrita
A prova escrita realizou-se no dia seguinte (10) sob fiscalização dos
membros da comissão julgadora sendo concedida aos candidatos duas
horas de consultas.
A lista de 10 pontos foi apresentada pela Comissão às 7:30 horas e
abrangiam, de certo modo, todo programa proposto para a cadeira:
1. Situação da arquitetura na estética contemporânea
2. Influência da habitação no comportamento individual e social
3. Técnica e materiais na arquitetura brasileira atual
4. Economia da arquitetura
5. Possibilidades do monumental na arquitetura atual
6. Discussão da validade e permanência dos princípios de
composição
7. Forma e tradição na arquitetura brasileira, o barroco e o racional
8. Educação artística na formação do arquiteto
9. Estilo em arquitetura
10. Realidades e meios de representação em arquitetura; correlação
e divergência.
A seguir, o primeiro candidato inscrito Zenon Lotufo foi convidado a
sortear o ponto a ser realizado na prova escrita, retirando da urna o tema
de número 5. Ficou estipulado um prazo de 6 horas para a realização da
prova.
120
E sua leitura e correção ocorreram no dia 15 pelos candidatos. O primeiro
a iniciar foi Zenon Lotufo, que leu sua prova contendo 9 páginas de folha
almaço. Seguido por Mário Russo que continha 5 folhas, depois Paulo de
Camargo e Almeida, com 6 páginas e finalmente, Ernest Mange contando
com 17 páginas.
Logo após, esta sessão de leitura, os membros da Comissão atribuíram
notas de mérito para cada candidato em cédula especial e após
assinarem, o conteúdo foi lacrado em envelope opaco e depositado em
urna inviolável que ficou em posse do Secretário da Faculdade.
Zenon Lotufo discorreu em sua prova escrita sobre o ponto sorteado pela
banca avaliadora: Possibilidades do Monumental na Arquitetura Atual.
Sua atenção inicial voltou-se para a definição da palavra monumento que
segundo ele não seria algo com dimensões enormes, mas sim o
significado que uma obra adquire diante da necessidade humana em criá-
la.
“A História da Arquitetura nada mais é que a catalogação dos
monumentos dos povos civilizados onde suas obras de arte têm raízes
profundas na cultura, religião, condições sociais, possibilidades técnicas,
materiais e econômicas de cada povo”.
114
114
Prova escrita a mão por Zenon Lotufo datado de 10 de agosto de 1957 em São
Paulo por ocasião do concurso publico para provimento de cargo de professor
catedrático na cadeira 16 da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo, trecho extraído do documento original, pg. 1-2.
Dando continuidade, Lotufo argumentou sobre as possibilidades
grandiosas que a técnica da sua época, apoiada na industrialização dos
componentes do edifício ou estandardização, ofereciam em comparação
à arquitetura clássica tradicional. Era um momento inédito na história da
humanidade.
Assim, a arquitetura, não abandonando o funcionalismo, tirando
as maiores vantagens da capacidade da máquina e da técnica, aliando-se
à pintura e à escultura, de quem tem estado divorciada, há muito tempo,
procurando humanizar cada vez mais sua conceituação plástica e espacial
(no sentido verdadeiro do homem-espírito) fatalmente há de chegar a
uma síntese estética da arquitetura: Função, Forma, Estrutura e
Economia, alicerces poderosos sobre o qual se levantará a arquitetura
monumental contemporânea”.
115
Ao término de sua elaboração, concluiu criticando as reais condições da
realização de trabalho para os arquitetos:
O arquiteto tem enormes possibilidades técnicas, materiais e
plásticas para realizar o monumental, mas desde que a sociedade se
reeduque e disponha de seu talento e capacidade”.
115
Idem, pg. 7.
121
Prova prática
A Comissão havia se reunido no dia 9 e elaborado uma lista prévia dos
seguintes programas a serem sorteados para a prova prática, que foram
anunciados após serem melhor elaborados, no dia 12, às 7 e 30 horas,
constando dos seguintes temas:
1. Residência rural: sede de fazenda
2. Edifício de apartamentos para aluguel
3. Estação rodoviária terminal
4. Restaurante tangente à estrada tronco
5. Prefeitura para cidade de 30 mil habitantes
6. Creche anexa à fábrica de tecidos
7. Mercado para bairro da capital com 15 mil habitantes
8. Hotel de cidade balneária de praia, para 100 hóspedes
9. Residência urbana para escultor e família
10. Sede social de clube esportivo para 1000 sócios
A seguir, o candidato inscrito em primeiro lugar foi convidado a sortear
um número que corresponderia ao programa a ser desenvolvido na prova
prática. Zenon Lotufo retirou o papel de número 3 e assim a Comissão
entregou aos candidatos por escrito, indicações visando maior precisão
no desenvolvimento do programa, da seguinte maneira:
1. Plataforma de acostagem (10 partidas/hora)
2. Venda de passagens (4 boxes)
3. Serviço de recepção e expedição de bagagens
4. Administração da rodoviária
5. Polícia
6. Serviço de encomendas
7. 4 salas para pessoal de tráfego, com instalações sanitárias
8. Pronto socorro
9. Serviços de conforto de passageiros (banheiros, bar-restaurante,
estar, banca de jornal e depósito de bagagens)
O projeto deveria compreender fundamentalmente: organogramas,
esquemas de distribuição e estrutura, plantas baixas (incluindo planta de
situação), cortes, fachadas, perspectivas e detalhes construtivos. Os
desenhos poderiam ser apresentados á mão livre, a nanquim ou lápis
preto sobre papel vegetal, sendo que a perspectiva deveria ser pelo
menos proporcionada pelo método geométrico exato.
Portanto nos dias 12, 13 e 14, em sessões de oito horas de trabalho com
intervalo para o almoço, realizaram-se as provas práticas sendo que no
fim da primeira sessão, os candidatos deveriam apresentar o estudo
inicial do projeto a ser desenvolvido nas duas sessões subseqüentes.
No julgamento da prova prática adotou-se os seguintes critérios: situação
urbana e circulação externa, partido em planta e da circulação interna,
elevações, estrutura e configuração plástica.
122
Defesa de tese
Nos dias 16 e 17, os candidatos foram submetidos às provas de defesa da
tese apresentada, sendo Zenon Lotufo e Mário Russo avaliados no
primeiro dia, enquanto Paulo de Camargo e Almeida e Ernest Robert
Carvalho Mange, ficaram com o segundo dia.
O primeiro candidato foi Zenon Lotufo que iniciou às 8 horas, a defesa de
sua tese O espaço psicológico na Arquitetura”. Logo após a
apresentação, o candidato foi argüido sucessivamente pelos membros da
Diógenes Rebouças, Demétrio Ribeiro, Sylvio de Vasconcelos, Lourival
Gomes Machado e José Benedicto de Camargo que respeitaram o prazo
de 30 minutos permitidos a cada um deles. A prova terminou às 13 horas
e 25 minutos, tendo cada professor da Comissão atribuído uma nota de
mérito com rubrica e encerrada em envelope opaco e depositado na
mesma urna.
No mesmo dia, procedeu-se a defesa do segundo candidato Mário Russo
a partir das 15 horas, com a tese “A tradução arquitetônica da célula
habitativa – sua evolução e previsão lógica”, terminando por volta das 19
horas a sua avaliação.
No dia seguinte, dia 17, aconteceram as defesas respectivas de Paulo de
Camargo e Almeida pela manhã com a tese “A função social do
arquiteto”. E por fim, no período vespertino, o último candidato Ernest
Robert de Carvalho Mange com o título “A função abrigo em Arquitetura”.
Todas as defesas ocorreram da mesma forma, com os professores
fazendo a argüição seguindo de atribuição de nota aos candidatos,
lacradas em envelope e colocadas em urna especial.
Prova didática
E finalmente nos dias 18 e 19 de agosto, os candidatos fizeram a última
prova que foi a prova didática em duas turmas distintas: Zenon Lotufo e
Mário Russo.
Foi lida pelo Presidente da Banca a lista de pontos escolhidos do
programa da cadeira, a ser sorteado:
1. Análise da orientação e situação dos edifícios no terreno
2. Esquemas funcionais: integração horizontal e vertical
3. Os elementos da arquitetura: circulação
4. O edifício e a saúde física e espiritual
5. Os elementos da Arquitetura: estruturais e de proteção
6. Complexidade do fato arquitetônico: função, estrutura
econômica, síntese estética.
7. O edifício e a cidade.
8. Os espaços e sua manipulação. O ambiente e a respectiva
integração.
9. Elementos da arquitetura: decoração.
10. Economia, simplicidade e pureza das formas.
123
Nenhum dos candidatos ofereceu qualquer tipo de objeção aos temas
propostos e a seguir, às 9 horas e 50 minutos, procedeu-se o sorteio pelo
candidato Zenon Lotufo que retirou o número 5 da urna: Os elementos de
arquitetura: estruturais e de proteção.
No período da tarde realizou-se o sorteio do ponto a ser desenvolvido
pelos outros candidatos: Paulo de Camargo e Almeida e Ernest Robert de
Carvalho Mange. Nesta ocasião, o tema sorteado por Paulo Almeida fora
“Interdependência dos ambientes interno e externo na habitação”.
No dia posterior pela manhã, dia 19, iniciou-se a realização da prova dos
candidatos Zenon Lotufo, às 9 horas e 50 minutos, seguido por Mário
Russo, ambos tendo à disposição o tempo corrido de 50 minutos. Ao final
de suas exposições, os membros da Banca atribuíram uma nota para cada
arquiteto em cédula especial que com assinatura foram encerradas em
envelope opaco e também rubricado e depositados na mesma urna.
Às 14 horas do mesmo dia, foram realizadas as provas dos outros
candidatos, que tiveram o mesmo tempo (50 minutos) para versarem
sobre o tema sorteado para eles: Interdependência dos ambientes interno
e externo na habitação.
A sessão encerrou-se às 16 horas e 20 minutos, e imediatamente foi
convocada reunião para se realizar a apuração final dos resultados e
notas dos candidatos, sendo solicitada a abertura da urna com os
envelopes, e a consecutiva abertura dos mesmos e lidas as notas obtidas.
Tendo em vista o resultado final da apuração, o senhor presidente da
Comissão José Benedicto de Camargo declarou não haver nenhum
candidato habilitado ao cargo pretendido.
Então, o vice-diretor em exercício da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo, Pedro Bento José Gravina agradeceu a estimada colaboração
prestada ao concurso pelos professores que integraram a Comissão
Julgadora e declarou encerrada a sessão. Assim, reproduzimos o quadro
de notas conferidas aos candidatos em cada uma das provas realizadas,
cuja apuração foi realizada ao fim das provas didáticas.
124
Fig. 137: Quadro de notas do Concurso de tedra. Fonte: Seção pessoal FAUUSP.
Portanto, naquela ocasião um fato inédito aconteceu. Pela primeira vez
na história da Universidade de São Paulo, a banca composta por José
Benedicto de Camargo, Sylvio de Vasconcellos, Diógenes Rebouças,
Lourival Gomes Machado e Demétrio Ribeiro considerou que o
desempenho dos candidatos não fora à altura do cargo e reprovou a
todos. Os candidatos protestaram juridicamente e o concurso acabou
sendo cancelado.
Repercussões
“Claro que a questão política contava muito naquela época. Os
grupos se dividiam nitidamente em direita, esquerda e centro. A postura
de Zenon nunca foi muito clara, não se posicionava claramente.
A posição de nós, alunos, sempre foi desfavorável à Cátedra e ao
concurso. Não era nada pessoal, contra o Zenon ou o Mange, por
exemplo. Por isso, nossas vaias e a comemoração no fim do concurso”.
116
Após este episódio, Zenon Lotufo afastou-se das atividades acadêmicas,
por quase dez anos, principalmente da FAU-USP. Ele se sentiu traído e
injustiçado pela maneira como foi tratado pela instituição a que tanto se
dedicara naqueles anos. Este fato marcou profundamente sua carreira
acadêmica se desinteressando também de questões políticas, reuniões de
classe, conselhos e mesmo da atividade didática.
Zenon voltaria às atividades didáticas acadêmicas apenas em 1966,
portanto quase 10 anos depois, na Escola Politécnica como instrutor
contratado, permanecendo até o início dos anos 70. E depois, retornaria
à FAU, mas desta vez como auxiliar de ensino, permanecendo obscuro
nos corredores da faculdade até se aposentar compulsoriamente em
setembro de 1980.
116
Depoimento de Jon Maitrejean, em 30 de outubro de 2007.
125
Em 14 de março de 1969, Zenon Lotufo encaminhou ao então reitor da
Universidade de São Paulo um requerimento solicitando sua estabilidade
funcional na instituição, “por julgar satisfeitas as condições exigidas pelo
Egrégio Conselho Universitário, não pela posse de um título, mas pelo
longo período de exercício no Magistério Superior”. Neste mesmo
documento, revelava que exercera desde 1935, diversos cargos públicos.
Inicialmente, como desenhista no Departamento de Obras Públicas da
Prefeitura Municipal de São Paulo, de 35 a 38, como engenheiro arquiteto
auxiliar. Depois assistente de Anhaia Mello na Politécnica, no mesmo ano
(38) na disciplina Composição de Arquitetura, e posteriormente também
em 47.
Zenon Lotufo relatou que em 1957, prestou concurso para o provimento
da Cadeira de Composição de Arquitetura na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo, juntamente com mais três
colegas”. Esse concurso, disse ele, “eivado de sérias irregularidades,
desde a insuficiência de formalidades legais, até a mais completa
irresponsabilidade de certos membros da banca examinadora (dois deles
cassados e com direitos políticos suspensos por 10 anos)”.
Este concurso referido foi anulado pelo Egrégio Conselho Universitário,
dando provimento ao recurso dos interessados, ou seja, os candidatos.
O julgamento deste concurso prolongou-se por sete anos, prejudicando
particularmente a Zenon Lotufo, que não se viu mais em condições de
continuar ocupando a Cátedra mesmo que interinamente, razão pela qual
solicitou sua dispensa. Este concurso, nunca mais foi reaberto para a
cadeira em questão, impossibilitando o arquiteto de prestá-lo
novamente.
O arquiteto visou simplesmente o reconhecimento de sua dedicação à
instituição pública, nos 35 anos em que trabalhou não conseguindo nem
ao menos que seu nome permanecesse distintamente no quadro de ex-
professores da faculdade. A obscuridade de sua passagem pela Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo nos anos 70
também levanta suspeitas sobre a possível articulação política montada
para apagar a figura de Zenon no referido concurso.
A Faculdade tinha sido recém-fundada em 1948, portanto era um curso
recente. Como o Concurso para provimento da Cátedra tinha sido o
primeiro realizado pela instituição, caso Zenon fosse aprovado, como
professor catedrático concursado, automaticamente se tornaria o Diretor
da Faculdade. O fato é que sua esposa Coraly (hoje, com 88 anos) revelou
que pouco tempo antes de falecer, Zenon reclamou do modo como foi
tratado pela USP e levava ainda consigo enorme mágoa da instituição.
117
117
Entrevista concedida por D. Coraly, em Botucatu, em 04 de outubro de 2007.
126
Capítulo 3 – Brutalismo e maturidade (1958-85)
3.1. Contextos
Outro termo conceitual que começou a ser difundido internacionalmente
foi o Brutalismo, que na verdade, se confundia com o uso do béton brut
(concreto bruto) por Le Corbusier, material que celebrou a última fase
criativa do arquiteto (45-65).
Este fato inicia-se com as obras do II pós-guerra, principalmente a
Unidade de Habitação de Marselha (fig. 138) que acabou tornando-se
referência para inúmeros arquitetos nas décadas de 50 a 70.
(fig. 138) Fonte: www.vitruvius.com.br.
Por sua vez, o Novo Brutalismo foi o nome adotado por uma nova
geração de arquitetos britânicos que procurou sintetizar a natureza
intrínseca dos materiais com as técnicas através das quais estes eram
127
elaborados, numa tentativa de re-estabelecer uma unidade entre forma
construída e modo de viver.
Na década de 50, esta nova direção da arquitetura revelou-se
principalmente nos textos e projetos dos Smithsons (Peter e Alison) e de
Reyner Banham para a revista Architecture Review . Na verdade, o
emprego do termo servia apenas como bandeira frente à acomodação
que o movimento moderno assumira, buscando acima de tudo, reavaliá-
lo.
O Novo Brutalismo enquanto corrente ganhou força no final da década de
50 quando várias experiências foram realizadas por arquitetos ao redor
do mundo, em São Paulo também, apresentando entre si as mesmas
aproximações formais, construtivas e plásticas, e sistematizando um
idioma arquitetônico comum nas décadas de 60 e 70.
No Brasil, talvez este movimento (Novo Brutalismo) não tenha tido o
mesmo sentido social que teve na Europa, mas com certeza o resultado
formal (desnudamento da estrutura e das instalações de serviços, prismas
puros e elevados sob pilotis, verdade dos materiais, etc) fez escola entre
os paulistas, tendo a frente principalmente, Vilanova Artigas e Lina Bo
Bardi.
118
Zenon Lotufo também compartilhou desta mesma linha nas
décadas de 60 e 70, como passamos a observar em seus trabalhos.
118
FUÃO, Fernando F. Brutalismo, a última trincheira do movimento moderno.
em http://www.romanoguerra.com.br/arquitextos/arq000/esp036.asp.
CIAM X (1956)
O próprio movimento moderno começou a passar por uma revisão
interna de seus princípios ortodoxos em um de seus últimos eventos
internacionais de divulgação: o CIAM X.
Os Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM) entraram
em fase de contradição no pós II Guerra onde o discurso de integrantes
como os Smithsons, Candilis , Bakema e Van Eyck mostravam uma
mudança de direção dos postulados originais do movimento. O fato é
que, para eles, o mundo havia mudado e o modernismo haveria de se
adequar a este novo cenário. Assim, outras disciplinas humanas como
Antropologia, Psicologia, Comunicação e Sociolgia começaram a ganhar
maior participação na Arquitetura passando a influenciar as novas
posturas. São deste período também (anos 50-70),por exemplo, as
experiências sensorias e multicoloridas da arte psicodélica, a Pop-art, a
cultura hippie e a flower generation. O estruturalismo também contribuiu
para uma redefinição da arquitetura desta época seja na volta às origens
(alguns arquitetos vão estudar sociedades primitivas), ou na questão da
verdade estrutural e pureza da forma.
Depoimento de Niemeyer (58)
Em artigo escrito para a revista Módulo no final dos anos 50, Niemeyer
relatou que as obras de Brasília (57-60) haviam marcado uma nova etapa
128
de seu trabalho, caracterizada agora por uma busca constante por pureza
e síntese na solução estrutural mais simples e geométrica possível.
“Neste sentido, passaram a me interessar as soluções compactas,
simples e geométricas; os problemas de hierarquia e de caráter
arquitetônico; as conveniências de unidade e harmonia entre os edifícios e
ainda, que estes não mais se exprimam por seus elementos secundários,
mas pela própria estrutura, devidamente integrada na concepção plástica
original”.
119
Niemeyer relatava em certo tom de culpa os exageros formais cometidos
em alguns projetos, o que estaria em contradição com o compromisso da
arquitetura brasileira diante do seu quadro social. Seu descuido ao
priorizar a originalidade e plasticidade das curvas havia prejudicado o
sentido lógico da construção que deveria visar sempre a economia de
meios e a simplicidade da forma.
Seu depoimento teve grande repercussão entre os paulistas que
entenderam aquilo como uma revisão autocrítica do arquiteto carioca e
começariam a desenvolver com maior intensidade uma nova linguagem
formal, tendo como protagonista principal da composição arquitetônica: a
estrutura.
119
Niemeyer, Oscar. Depoimento. (fevereiro de 58) Módulo n. 9 em Xavier,
Alberto (org.). Depoimento de uma geração: arquitetura moderna brasileira.
Cosac Naify, São Paulo, 2003, p. 239.
O manifesto de 1958 foi prontamente sentido pelos colegas: seu
conteúdo foi seminal para os arquitetos de esquerda e certamente tornou-
se um ponto de partida para uma nova “linha”: um tipo de arquitetura
feita em São Paulo, a “linha paulista”. ”
120
3.2. Parceria com Ubirajara Ribeiro (58-65)
Zenon Lotufo havia sofrido imensa decepção com a FAUUSP no ano de 57
em virtude do resultado “desastroso” do Concurso de Cátedra. Ele havia
se preparado um ano inteiro, estudando e escrevendo sua tese (O Espaço
psicológico na Arquitetura), mas não esperava de modo algum o ocorrido.
De tal maneira que o arquiteto se ausentou do ensino e da academia e
mesmo das representações políticas, voltando-se prioritariamente para o
ofício da prancheta e do projeto.
Este período (58-65) ficou marcado principalmente pela parceria
profissional com o arquiteto formado pelo Mackenzie, Ubirajara Ribeiro e
pelos concursos públicos e privados que ambos realizaram e venceram.
Ubirajara Motta Lima Ribeiro (1930-2002) foi arquiteto, desenhista,
gravurista, artista gráfico, pintor, aquarelista e professor. Formado pela
Faculdade de Arquitetura da Universidade Mackenzie em 1954, fez curso
de arte com Vicente Mecozzi, Pedro Corona, João Rossi e Waldemar da
120
Segawa, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. Edusp, São Paulo, 1999, pg.
144.
129
Costa. Em 1956 muda-se para Salvador e estuda gravura com Mario Cravo
Júnior na Escola de Belas Artes da Universidade da Bahia.
Na década de 60, participa dos movimentos de vanguarda, integra o
grupo dos cinco arquitetos-pintores com Maurício Nogueira Lima, Flávio
Império, Sérgio Ferro e Samuel Szpigel e inicia carreira como professor,
onde leciona na Faculdade de Arquitetura da Universidade Mackenzie e
na Faap, entre outras instituições. Até meados da década de 70
desenvolveu intensa atividade na área de arquitetura.
“Era um artista talentosíssimo, com muita visão da forma e do
espaço. Fazia desenhos de perspectiva lindíssimos. Certamente, exerceu
influência determinante sobre o trabalho de Zenon Lotufo.
Não sei como teria acontecido o contato entre ambos, mas sei que um
complementava o trabalho do outro. Zenon era mais metódico e
organizado enquanto Bira tinha um talento artístico para a forma. Era um
artista de atelier”.
121
Entre seus prêmios destacam-se: Prix de Voyage (1955 pela Maison de
France, tornando-se bolsista do Governo Frances em 1960), Medalha de
ouro no XIII SPAM em 1965, Primeiro Prêmio Pintura e Primeiro prêmio
Desenho nos Iº e IIº Salão de Arte de S. Caetano do Sul/SP, Melhor
Gravador em 77 e Prêmio Vencedor de vários Concursos Nacionais de
121
Depoimento de Walter Maffei em 30 de outubro de 2007. Maffei foi sócio de
Ubirajara Ribeiro de 64 a 74.
Arquitetura: Associação Atlética Banco do Brasil em Porto Alegre,
Mercado Municipal de Porto Alegre, Sindicato dos Trabalhadores nas
Indústrias de Energia Elétrica de SP, Catedral Presbiteriana de Brasília,
Praça Municipal de Esporte em S. Caetano do Sul/SP, Quartel do Exército
no Parque Ibirapuera, projetou o Teatro Castro Alves em Salvador com
equipe de arquitetos.
(Fig. 139) Foto de Zenon Lotufo e Ubirajara Ribeiro no escritório na Rua Major Sertório.
Fonte: Arquivo da família Lotufo.
130
3.3. Principais obras e projetos realizados pelos arquitetos
Associação Atlética do Banco do Brasil (Porto Alegre/ RS, 1958)
(Não Construído - Concurso público nacional – 1
o
. lugar)
Projeto: Zenon Lotufo / Ubirajara Motta Lima Ribeiro.
Fonte: Módulo 4, ago 60, pp- 40-45.
(Figs. 140-141) Perspectiva e Implantação.
Este anteprojeto vencedor de concurso nacional para sede social e
esportiva da Associação Atlética do Banco do Brasil em Porto Alegre inicia
uma nova fase na carreira de Zenon Lotufo, onde prevalece maturidade e
ao mesmo tempo uma maior simplicidade e clareza estrutural. Sua
parceria com o arquiteto e artista plástico Ubirajara Ribeiro seria fruto de
outros sucessos em demais concursos. Neste concurso, os arquitetos
agruparam as atividades segundo afinidades programáticas o que
permitiu a criação de ambientes variados com a preocupação de oferecer
maior contato social, onde o aproveitamento da topografia do terreno
também foi fator decisivo para o sucesso do projeto.
Programa: Sede social: Salão / Restaurante / Administração / Vestiários;
Alojamentos: Apartamentos / Dormitórios / Lavanderia; Ginásio: Quadra
poliesportiva coberta / Vestiários / Oficinas; Play-ground: Quadras de
tênis; Jardim; Boliche-bocha.
Esquema – circulação Esquema – zoneamento
Corte esquemático
131
Planta Térreo – Sede social
Planta 1
o
pavimento – Sede social
Planta 2
o
. pavimento –Sede social
Planta 3
o
. pavimento – Sede social
Corte Sede social e Alojamentos
Corte Ginásio
Planta Cobertura
Planta 2
o
. Pavimento
Planta 1
o
. Pavimento
Planta Térreo
Elevação - Alojamentos
(Figs. 142-155)
132
Anteprojeto para Praça de Esportes (São Caetano do Sul/ SP, 1960 - Não
Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Ubirajara Motta Lima Ribeiro (Concurso público
nacional – 1
o
. lugar) Fonte: Acrópole 264, out 60, pp-354-357.
(Fig. 156) Foto maquete.
Concurso realizado pela Prefeitura Municipal de São Caetano para uma
praça de atividades esportivas situado em quadra entre as ruas Tapajós,
Goiás, Capiberibe e Conselheiro Lafayete. O bom aproveitamento do
terreno levou a uma ocupação racional do mesmo, onde o ginásio situa-se
no sentido transversal. Uma larga esplanada faz a conexão entre as
demais atividades como vestiários, piscinas e playground. Duas paredes
laterais sustentam a cobertura em “shed” do ginásio permitindo a
iluminação natural. O desnível natural do terreno foi aproveitado de
modo a minimizar os trabalhos de terraplanagem e criar as arquibancadas
do ginásio e das piscinas.
Programa: Ginásio coberto / Vestiários / Bocha / Galpão / Play-ground /
Piscinas / Ginástica / Estacionamentos.
Implantação
Perspectiva – esplanada
133
Esquemas – Circulação e Zoneamento
Esquema cobertura – Ginásio
Planta Superior – Ginásio Planta Inferior – Ginásio
Corte Longitudinal
Corte - Ginásio
(Figs. 157-166)
134
Anteprojeto para Supermercado (São Paulo/SP, 1961 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Ubirajara Motta Lima Ribeiro
(Fonte: Acrópole 269, mar 61, pp-182-184).
(Fig. 167)
Projeto de mercado que atenta para a questão das circulações das
mercadorias e dos serviços. Pensado de forma a garantir uma
independência entre o acesso do público que trafega em amplo hall e
rampa circular central que liga o nível superior. Solução estrutural em
concreto armado sendo as lajes nervuradas em caixão perdido. Um
grande e redondo “domus” transparente permitiria a iluminação natural
na parte central do edifício sendo que todas as faces laterais do piso
superior apresentariam brises solares, o que eliminava a necessidade de
esquadrias e vidros.
Programa: Térreo: Estacionamento / Acesso ao público / Hall / Rampa
Circular / Boxes e bancas / Banheiros / Depósitos; Piso intermediário
(mezzanino): Bar / Charutaria / Banca de jornais e revistas / Correio /
Bomboniere / Acesso de mercadorias; Superior: Bancas / Banheiros /
Depósitos.
Corte longitudinal
Planta – Térreo
135
Planta – Mezzanino
Planta – Superior
Corte transversal (figs. 168-172).
Departamento de Eletricidade da Politécnica (São Paulo/SP, 1961-66 -
Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Ubirajara Motta Lima Ribeiro.
Construção: Escritório Técnico da C.U.A.S.O.
Fonte: Revista Acrópole 327, abr 66, pp-40-43.
(Fig. 173) Perspectiva externa.
Situado na Cidade Universitária, este projeto consta de blocos de salas de
aulas e laboratórios destinados à pesquisa da energia elétrica ligada a
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. A solução explora a
horizontalidade do edifício com amplos espaços abertos (pátios) para
iluminação e ventilação natural além de serem espaços bastante
significativos para a troca de informações entre os colegas e professores.
Programa: Térreo: Estacionamento / Hall de acesso / Auditório /
Administração / Biblioteca / Laboratórios / Oficinas / Sala de máquinas /
Sanitários. Superior: Terraço-café / Salas de aula Laboratórios / Sala
professores / Sanitários.
136
Planta Térreo
Corte transversal
Planta Superior
(figs. 174-177)
137
Sede do Sindicato dos Trabalhadores de Energia Elétrica (São Paulo/SP,
1963 - Construído - Concurso público nacional – 1
o
. lugar)
Projeto: Zenon Lotufo / Ubirajara Motta Lima Ribeiro.
Engenheiro: Roberto Zuccolo
Fonte: Acrópole 298, ago 63, pp- 295-297.
(Figs. 178-179) Ilustração e foto recente. Fonte: EMF.
Concurso público nacional cujo assessor foi o arquiteto Eduardo Kneese
de Mello e a comissão julgadora formada por: Rino Levi, Leo Ribeiro de
Moraes, Octavio Lotufo, Décio G. Pereira e Mário Savelli. Foi atribuído o
primeiro prêmio aos arquitetos Zenon Lotufo e Ubirajara Ribeiro sendo
que a comissão destacou: “ótima disposição do salão de festas e do
auditório em relação ao acesso da rua, possibilitando o uso independente
entre si e os demais ambientes do edifício. Dois sistemas de circulação
verticais autônomos – uma para serviços e outra social. Boa distribuição e
agrupamento funcional das dependências, todos dotados de ótima
iluminação e ventilação. Estrutura em harmonia com o partido
arquitetônico.”
Um dos primeiros prédios paulistanos a utilizar a tecnologia do concreto
protendido. A estrutura do edifício reduzia-se às vigas e às lajes gerando
economia na construção e dois grandes blocos laterais de circulação
vertical faziam toda a sustentação do prédio. Programa: 2
o
.subsolo:
Garagem estacionamento; 1
o
. Subsolo: Auditório; Mezzanino: Bar /
Restaurante; Térreo: Entrada / Hall nobre / Exposições; 1
o
Pavimento:
Salão de festas; 4
o
. ao 12
o
. Pavimento: Escritórios.
Corte Fachada
138
Planta - Estacionamento Planta – Hall Entrada Planta- Mezanino
Planta – Salão Festas Planta – Restaurante Planta - Escritórios
(Figs. 180-187)
Estádio Municipal “Annacleto Campanella” (São Caetano do Sul/SP, 1965
- Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Ubirajara Motta Lima Ribeiro.
Construção: Heleno e Fonseca S.A.
(Fonte: Acrópole 316, abr 65, pp-26-29).
(Fig. 188) Foto aérea.
Os arquitetos haviam vencido anteriormente o concurso para a praça de
esportes, mas a Prefeitura Municipal mudou a decisão e optou pela
remodelação da antiga praça de esportes do São Caetano Futebol Clube,
que na época contava apenas com o campo de futebol. No projeto para o
ginásio foi aproveitado a mesma solução estrutural do projeto anterior:
duas paredes estruturais de apoio para a cobertura metálica em “sheds”.
Programa: Ginásio poli-esportivo / Piscina olímpica / Piscina de saltos /
Arquibancadas / Bilheteria.
139
Implantação
Planta Inferior – Piscinas e Ginásio (Vestiários)
Planta Superior (Arquibancadas)
Corte – Ginásio
Foto externa - ginásio
Foto - piscinas (Figs. 189-195)
140
3.4. Arte ou artifício e a volta ao ensino (66)
Permanecendo quase dez anos praticamente afastado do meio
acadêmico, Zenon Lotufo (com 55 anos) voltaria a escrever a tese de
titulo “Arte ou Artifício” apresentada no concurso de cátedra da cadeira
n. 12 “Construções de Edifícios; Noções de Arquitetura, Engenharia
Urbana e Urbanismo”, no curso de Engenharia Civil da Escola Politécnica
da Universidade de São Paulo em dezembro de 1966 (portanto 30 anos
depois de sua formatura na mesma Escola).
Seu texto contendo sempre uma linguagem simples e didática mostrava
um panorama histórico da relação forma-estrutura na evolução da
arquitetura iniciando com uma discussão sobre o significado de palavras
como estrutura, forma e ordem.
Estrutura sugere a idéia de organização, composição de coisas,
relação entre partes de um todo, constituindo uma forma. Produzir uma
boa forma estará sempre próximo da criação estética, quanto mais se
aproximar da verdade e das leis da boa forma, isto é, quanto melhor
organizar os elementos de sua estrutura”.
122
122
Lotufo, Zenon. Arte ou artifício. Tese apresentada a Congregação da Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo, 1966, p-2.
A parte e o todo
Nesta primeira parte, Lotufo citou os trabalhos de Von Ehrenfels sobre a
teoria da Gestalt (Gestalttheorie) e o livro Psychologie de la Forme de Paul
Guillaume onde descreveu que a noção de unidade percebida pela visão
humana dava-se pela maneira como as partes deste sistema (todo) se
relacionavam.
Se entendermos o exemplo de uma melodia musical que é composta por
diferentes sons e timbres relacionados entre si conformando a estrutura
de uma canção. Ou o mesmo poderia se dizer de um quadro composto de
figuras que são pontos e linhas organizados.
Se alguma mudança ocorre nas condições de um elemento, o todo já não
mais se comportará da mesma forma. Tornar-se-á, portanto uma nova
relação, uma nova forma. Segundo Lotufo, não existiria em uma obra de
arte, menos ou mais importante, apenas a idéia de todo, de sistema.
Portanto, podemos entender que a relação entre as partes é
determinante na configuração do todo, e assim, discutir se uma parte é
ou não apropriada ou conveniente, mas o sentido de totalidade sempre
será alterado se algo for remanejado, seja numa melodia, numa figura ou
em um edifício. Zenon posteriormente esclareceria que o principal
objetivo da engenharia era a realização da estrutura mais elementar e
eficiente possível, com o mínimo gasto de energia e de material.
141
Percepção do todo
A noção de profundidade e proximidade de um objeto ou edifício estaria
determinada por fenômenos óticos captados por nossos olhos e
transformada em imagens. Assim nosso aparelho ótico tenderia a corrigir
deformações procurando ajustar em nossa mente uma imagem que lhe
pareça satisfatório.
As experiências realizadas pela psicologia da Gestalt no princípio do
século XX foram a fundo nestas questões, e o que se concluiu é que
tendemos sempre a buscar uma relação de unidade e de conjunto nos
objetos que nos cercam.
A tese fundamental da teoria da Gestalt evidenciava a percepção como
dado original. O estudo da percepção então passa a ser a tônica dos
trabalhos de Wertheimer que em 1912 afirmou que há contextos em que
o que acontece no todo não pode ser deduzido das características das
partes separadas, mas inversamente, o que acontece a uma parte do
todo, é determinado, em casos bem nítidos, pelas leis da estrutura
intrínseca do seu todo.
Assim, todas as funções psicológicas como memória, percepção,
inteligência e emoção foram compreendidas através dos princípios
fundamentais da psicologia da forma que foram expressos da seguinte
maneira:
- Lei da boa forma ou princípio da pregnância: é a tendência que cada
estrutura possui de se organizar psicologicamente da melhor forma
possível, de acordo com as condições do momento. Abrangendo assim
algumas variações como continuidade, simetria, fechamento, direção,
proximidade e semelhança.
“Em um conjunto estruturado, a lei do todo determina as partes;
estas tendem a se completarem de certo modo a constituir a melhor
forma possível”.
123
A estrutura – forma, números e proporções
Zenon também compartilhou sua opinião sobre a estreita relação entre
arte e a matemática, e entre arquitetura e proporção, citando Matila C.
Ghika, autor do livro Estética das proporções na Natureza e nas Artes
124
,
declarando que toda a harmonia dependia de uma relação geométrica.
A seguir, começou a descrever a evolução das estruturas arquitetônicas a
partir da relação entre a matemática e as proporções. Um percurso
simplificado permeado por ilustrações à mão feitas pelo próprio
arquiteto, que iria das pirâmides egípcias, passando pelos templos gregos,
aos monumentos romanos, as catedrais góticas, o Renascimento italiano,
123
Idem, p-13.
124
Ghyka, M. Estética de las Proporciones em la Naturaleza y em las Artes. Ed.
Poseidon, Buenos Aires, 1953.
142
as igrejas Barrocas e concluía nas estruturas industriais da Engenharia
moderna.
“A arquitetura egípcia constitui um tratado mudo da geometria. A
Grande Pirâmide ofereceu-nos a austeridade do volume com proporções e
progressões que se derivam dela. Condensadas sobre si mesmas, algumas
construções mais características da morfologia dos cinco corpos
planicos. Sua forma equilibrada, derivada da combinação de forças
horizontais com forças verticais é exemplo supremo de uma ordem
eterna”.
125
Fig. 196. Desenhos produzidos por Zenon Lotufo. Fonte: Arte ou artificio, pg.37-38.
125
Ibidem, pg. 36.
Por sua vez, os templos gregos projetavam exteriormente a claridade das
grandes linhas e a sutileza da geometria euclidiana, expressando todo um
sistema filosófico onde a harmonia perfeita estava representada na
unidade cósmica do Universo.
Arquitetura romana, bizantina e românica
A arquitetura dos engenheiros romanos produziu formas sinceras e
correspondentes às funções específicas dos edifícios. Sua beleza estava
no caráter humano e sereno de seus volumes e não mais numa invocação
mística.
Em Bizâncio, mais tarde, citava Zenon, a clareza dos volumes geométricos,
como o cubo, apareceriam de maneira elementar na composição
arquitetônica como na estrutura da Santa Sofia.
“A época românica é um prolongamento da sinceridade Bizantina
na expressão dos volumes. O prolongamento das naves substitui a
simetria demasiada e cristalina do cubo, introduzindo como elemento
novo, uma modulação dirigida do espaço e uma sugestão paralela de
energia acumulada e retida, porém nela voltamos a encontrar os cilindros,
semicilindros, prismas octogonais, calotas esféricas pendentes em límpida
geometria de volumes honestos”.
126
126
Ibidem, pg. 40.
143
O esplendor gótico
Citando Le Corbusier, Zenon reproduziu a condição da catedral gótica
para o mestre franco-suíço.
O Gótico, como outros estilos, estão para Arquitetura como a
pena no cabelo de uma mulher; são muitas vezes bonitas, e nada
mais. Uma catedral nos interessa como engenhosa solução de um
problema difícil, mas cujos dados foram mal colocados porque
não procedem das grandes formas primárias. A Catedral não é
obra plástica; é um drama: uma luta contra a gravidade. A
sinceridade, a verdade nos volumes, é substituída pela sinceridade
no equilíbrio das forças e dos empuxos. É por essa razão que uma
catedral não é muito bela”.
127
Portanto, Zenon compartilhava da mesma opinião de Le Corbusier, pois
considerava a arquitetura gótica incomodamente dinâmica e instável. Os
volumes ocupavam valor secundário e o que contava era o traçado das
linhas de força vetoriais, os empuxos e os esforços distribuídos nos
arcobotantes. Para ambos, era a arquitetura da tensão, e não do
equilíbrio.
127
Ibdem, pg. 42.
A época do humanismo na arquitetura
O Renascimento, segundo Zenon, traria de volta a clareza matemática dos
volumes e das proporções para a arte e a arquitetura.
“Guiados por Platão, neoplatônicos e o amparo de uma grande
cadeia de teólogos, a partir de Santo Agostinho, alentaram para
convicção de que o Universo correspondia a uma estrutura matemática e
harmônica. Se as leis dos números harmônicos o regiam, desde as esferas
celestiais até as mais humildes da vida terrena; então nossas almas
deveriam conformar-se a essa harmonia”.
128
Prosseguindo, Zenon citou o pensamento de Alberti sobre a definição de
beleza:
“A beleza consiste em uma integração racional das proporções de
todas as partes do edifício, de tal maneira que cada parte tenha um
tamanho e uma forma absolutamente fixos, sem que nada se possa
acrescentar ou retirar sem destruir a harmonia do todo”.
129
E também, Palladio:
“A beleza resulta da forma bela e da correspondência do todo com
as partes, das partes entre si e destas com o todo, de modo tal que as
construções pareçam constituir um corpo inteiro e completo, em que cada
128
Ibidem, pg. 46.
129
Ibidem, pg. 47.
144
membro concorda com o outro e todos resultam necessários para a
perfeição do edifício”.
130
Zenon relembrava que a fonte dos renascentistas voltava a ser os valores
estéticos clássicos (matemática e geometria) da arquitetura grega e
romana. E que a geometria do espaço afinal havia sido reformulada
recentemente no trabalho de Le Corbusier. Le Modulor seria uma
releitura moderna da divina proporção onde o mestre franco-suíço
buscou desenvolver uma teoria matemática que respondesse à aplicação
prática da geometria clássica nas construções arquitetônicas.
Modulação
A estética da construção na arquitetura greco-romana ou renascentista
decorria principalmente da preocupação com as proporções dos volumes
entre si e destes com o conjunto, o todo.
“A Acrópole de Atenas não é o fruto ou o resultado de uma
pesquisa plástica de uma geração; é o resultado do trabalho de séculos de
uma civilização. Do mesmo modo que a forma das edificações evolui
através dos séculos, aprimorando-se as proporções, definindo-se um
padrão estético, assim o módulo variou à medida que as colunas foram se
adelgando. Mas se a coluna variou de seção e altura foi para atender
sempre as possibilidades de resistência do material empregado –
130
Ibidem, pg. 48.
mármore ou pedra. Assim, a relação entre diâmetro, altura e entrecolúnio
tornou-se necessariamente um fator constante nas edificações antigas,
deduzindo daí o modulo da construção. Diferentemente se opera hoje com
a coordenação modular, pois além de atender a composição
arquitetônica, ela tornou-se um dos mais valiosos auxiliares do construtor,
tendo em vista a economia, pela adoção de padrões industrializados ou
pré-fabricados que permitem rápida aplicação com menor dispêndio de
mão-de-obra, além de apresentar notável flexibilidade no uso do
edifício”.
131
Citando Sigfried Giedion, em seu livro Space, Time and Architecture,
Zenon também destacou as transformações científicas que marcaram o
início do século XX, principalmente no diz respeito à noção de tempo. Isto
estaria evidenciado pelas correntes artísticas como o cubismo e o
futurismo, através da introdução do espaço-tempo na linguagem da arte
e depois pelas obras dos mestres da arquitetura moderna: Gropius, Le
Corbusier, Wright e Neutra.
O funcionalismo
Para Zenon, a indústria moderna oferecia agora ao engenheiro um campo
ilimitado de aplicação matemática para os cálculos das espessuras das
131
Ibidem, pg. 53
145
vértebras de aço, as quais despojadas de todo revestimento se
respondiam apenas às reais necessidades estruturais.
Assim, a arquitetura que procurava no século XIX esconder a ossatura do
edifício em maciços de alvenaria, começou a redescobrir que o princípio
fundamental da organização e da forma era exatamente a estrutura
(interessante comparar a sintonia deste discurso com o texto de Por uma
Arquitetura, de Le Corbusier).
“Sem perseguir a idéia arquitetural, porém simplesmente guiados
pelas necessidades de um programa imperativo, os engenheiros de hoje
mostram o novo caminho e criam fatos plásticos, claros e límpidos, dando
aos olhos a calma e ao espírito as alegrias da geometria. Escutemos os
conselhos dos engenheiros americanos. Porém temamos os arquitetos
americanos.”
132
Fig. 197 (desenhos extraídos do ensaio Arte ou artifício, p. 65)
132
Ibidem, pg. 63.
Panorama atual
O desenvolvimento tecnológico das estruturas no campo da construção
estava avançando de maneira muito veloz, segundo Lotufo, mediante
muitas pesquisas e realizações. Mas o arquiteto fez um alerta destacando
que para se tornarem realmente úteis para o homem, as estruturas
deveriam obedecer ao menor emprego de material, com mínimo gasto de
energia e com máximo de eficiência.
“A evolução da arquitetura ocidental é um encadeamento de
transformações e aprimoramentos construtivos determinados por cada
época histórica e suas especificas condições sociais, no tempo e no
espaço. Foi um processo lento em comparação aos fatos atuais. Antes ao
arquiteto era atribuída uma formação artística que era parte integrante
de seu desenvolvimento frente à matemática e às técnicas construtivas.
Era difícil afirmar se era arquiteto com conhecimento de engenharia ou
engenheiro com capacidade artística. Num dado momento, houve um
divórcio entre essas disciplinas fundamentais e o bom profissional,
passando o arquiteto a exercer funções mais ligadas à decoração de
edifícios ou desenhista de fachada. Esta situação se alterou com o
movimento renovador da arquitetura contemporânea encabeçado por
nomes como Lloyd Wright, Gropius e Le Corbusier. E o arquiteto passou a
compreender e a empregar os novos processos estruturais rompendo com
a tradição acadêmica. Hoje, vivemos um período de velocidade
146
espantosa, onde as coisas são rapidamente superadas, impondo às
atividades criadoras além de capacidade artística, outras necessidades e
com elas, novos valores. Novos usos pedem novas soluções e
subjetivamente o fator “gosto” não segue o mesmo ritmo, mas salta
bruscamente desafiando os artistas e arquitetos”.
133
Na conclusão deste importante ensaio, Zenon emprestou a conhecida
definição de Lúcio Costa sobre arquitetura, como construção com
intenção plástica, fazendo uma sutil distinção entre os trabalhos do
engenheiro e do arquiteto.
“O engenheiro, no ato de projetar uma estrutura, embora não seja
essa sua preocupação, estará também criando uma forma plástica,
quando procurar boas relações entre as partes e destas com o todo. Os
conhecimentos adquiridos, a experiência e a intuição atuam
conjuntamente na fase de pesquisa da estrutura que proporcione a
máxima capacidade com o mínimo de material e menor dispêndio de
energia. Por sua vez, o arquiteto, no estudo do projeto, parte da planta,
base sobre a qual se levanta a estrutura, os volumes, a forma. Se é bem
desenvolvida produzirá formas nobres, variedades de formas e unidade de
princípios geométricos. Sem plano não pode haver grandeza de objetivo e
expressão, nem ritmo, nem massa, nem coerência. Sem plano temos a
133
Ibidem, pg. 67-68.
sensação, tão insuportável para o homem, de desordem, de coisa amorfa.
Forma e estrutura não são independentes. Não há forma em tudo, mas
onde há forma, há estrutura”.
134
E finalmente, conferiu nova importância à matemática e à geometria na
evolução das estruturas:
“A matemática sempre esteve presente na organização dos
planos, geratriz dos volumes geométricos, do grego ao barroco. A lei dos
números, os princípios da forma privilegiada e da melhor estrutura
prevaleceram. A industrialização dos elementos de construção que atende
a coordenação modular está indicando claramente o caminho ao
arquiteto e deve orientá-lo na elaboração dos seus trabalhos. Mais uma
vez a engenharia e a indústria vão liderar um movimento plástico
renovador, que deveria pertencer ao arquiteto, mas que por sua formação
distorcida, só mais tarde aceitará o fato de que é possível compor com
elementos simples e criar as mais belas formas. A matemática é pura,
correta, exata, por isso mesmo a história da arquitetura nos apresenta um
repertório de formas belas, simples e corretas pois tiveram estruturas
certas, puras e simples. Assim concluímos afirmando que a arquitetura
contemporânea, resultado de condições geradas pelas necessidades
concretas e subjetivas, determinadas pela evolução social e pela
134
Ibidem, pg. 72-73.
147
imperativa aplicação de conhecimentos matemáticos da engenharia
moderna é válida enquanto seguir a lei da boa forma e da melhor
estrutura”.
135
A atenção dada à temática da estrutura revela a sintonia de Zenon com os
principais debates teóricos que ocorriam naquele momento, como por
exemplo, o Depoimento (58) de Niemeyer.
135
Ibidem, pg. 74-75
3.5. Parceria com o filho: Vitor A. Lotufo (67-72)
A partir de 67, Zenon passou a contar mais intensamente com a
colaboração de seu filho Vitor Amaral Lotufo, recém-formado arquiteto
pelo Mackenzie (que já freqüentava o escritório, desde estudante), que
havia recebido uma bolsa de estudos na Universidade de Harvard (E.U.A.)
, no ano anterior
136
. A parceria rendeu vários e bons trabalhos aos Lotufo,
apesar do incômodo quadro político em vigor daqueles anos (ditadura
militar, a partir de 64), caracterizados fortemente pela expressão estética
marcante da estrutura de concreto aparente, como passamos a mostrar a
seguir.
Fig. 198 Zenon e Vitor Lotufo trabalhando. Fonte: Revista AB
136
Revista AB Arquitetura Brasileira n. 8, 1973, pg. 14.
148
Edifício para Perícias Médicas do I.N.P.S. (São Paulo/SP, 1967 -
Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Vitor Amaral Lotufo / Victor Pini
Fonte: Arquitetura Brasileira 8 (1974), pp-40-49.
(figs. 199-200) Foto externa e implantação.
Um dos mais importantes serviços do INPS (Instituto Nacional de
Previdência Social), a Perícia Médica, acabou sendo alojado em dois
grandes blocos de edifício que abrigam consultórios médicos
(aproximadamente uns noventa) e no outro ficaram os serviços
burocráticos correspondentes. Grandes e largas áreas de circulação
oferecem tanto aos usuários quanto aos funcionários um uso confortável
dos espaços, em relação às atividades que praticam.
Além disso, as divisórias dos ambientes do grande salão foram pensadas
de modo a serem removíveis, garantindo grande flexibilidade no layout
dos edifícios. A estrutura foi concebida de maneira simples com
elementos de apoio em concreto aparente.
Programa: Perícias médicas – Embasamento: Estacionamento / Depósito
/ Vestiários / Auditório; Pavimento principal: Atendimento ao público /
Consultórios / Espera / Sanitários. Prédio de Concessões – Embasamento:
Estacionamento / Depósito / Vestiários; Pavimento principal:
Atendimento ao público / Cozinha / Balcão funcionários.
(Figs. 201-202) Elevações - Prédio Perícias (acima) e Prédio Concessões (em baixo)
149
(Figs. 203-204) Plantas Pavimento Principal – Prédio Concessões e Prédio Perícias.
Associação Cristã de Moços da Lapa (São Paulo/SP, 1969 - Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Vitor Amaral Lotufo
(Fonte: Revista AB n. 8, pp-18-25).
(Fig. 205) Perspectiva ilustrativa
Um terreno de aproximadamente 12 mil m2 situado no bairro da Lapa foi
obtido através da prefeitura e da anuência da Companhia City de
Melhoramentos, para a construção de mais uma unidade da Associação
Cristã de Moços (ACM). No entanto, ficaram estabelecidas limitações
quanto à ocupação do lote, que não poderia ultrapassar 1/5 da área total,
e também o gabarito de altura máxima de 8 m.
Programa: Piscinas / Ginásio poliesportivo / Salas para ginástica / Quadras
ao ar livre / Parque infantil / Sala para jogos / Auditório / Administração /
Serviço médico / Apartamentos / Cantina
150
Implantação
Fachada acesso principal
Elevação lateral – piscinas
Corte transversal
Planta Térreo
Planta 1
o
. Pavimento
Planta 2
o
. Pavimento
(Figs. 206-212)
151
Escola Técnica Federal de São Paulo (São Paulo/SP, 1969 – Construído -
Concurso privado – projeto vencedor)
Projeto: Zenon Lotufo / Vitor A. Lotufo / Victor Pini / Cláudio Sganzerla.
Fonte: Acrópole 363, jul 69, pp-36-39.
(Figs. 213-214) Perspectiva e implantação
Preocupado com a difusão do ensino técnico em todo o território
nacional, o Ministério da Educação e Cultura construiu na cidade de São
Paulo, uma das maiores escolas técnicas da América Latina à Av. Cruzeiro
do Sul. Com área próxima de 30 mil metros quadrados, este projeto foi o
vencedor de um concurso privado onde participaram apenas arquitetos
selecionados por seus currículos e experiência na área de projetos
educacionais. O projeto caracteriza-se pela sua organização horizontal
dentro de uma clara funcionalidade das circulações. Estruturalmente
foram empregados elementos pré-moldados a serem fabricados no
próprio local.
Programa: Térreo: Auditório / Oficinas / Secretarias / Administração /
Vestiários / Rampas; Superior: Salas de aula / Laboratórios / Anfiteatros /
Cantina / Biblioteca / Sanitários.
(Fig. 215). Corte esquemático – Circulação.
152
(figs. 216-217) Plantas Superior (acima) e Térreo
Velório do Cemitério Araçá (São Paulo/SP, 1972 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo / Vitor Amaral Lotufo
(Fonte: Revista AB n. 8 (1974), pp-26-31)
(Fig.218) Perspectiva ilustrativa.
O Serviço Funerário do Município de São Paulo resolveu construir vários
edifícios com o mesmo programa a fim de prestar um bom serviço a
população. Este projeto seria construído na rua Itatinga limitando-se aos
fundos com o cemitério do Araçá.
A topografia do terreno foi respeitada tendo a circulação orientada no
lado interno através de uma larga galeria próxima ao estacionamento. A
forma e a estrutura do edifício acabam sendo conseqüência desta
disposição.
Programa: Inferior: Estacionamento / Galeria / Estar / Câmaras /
Escritório / Banca de flores Superior: Estacionamento / Galeria / Estar /
Câmaras / Bar / Cozinha.
153
(fig. 219-220) Elevação frontal e fundos
(fig. 221-222) Planta inferior (acima) e superior
3.6. Anos 70
Le Corbusier havia falecido em 1965 e alguns dos demais mestres
modernos como Walter Gropius e Frank Lloyd Wright também. Foi um
momento de revisão dos ensinamentos e lições modernas frente às
mudanças culturais de grande ordem como o movimento pop e a cultura
de massa.
O golpe militar de 64 abalou de forma fulminante as estruturas
democráticas brasileiras e mergulhou o país numa certa cegueira cultural
graças à censura aos meios de informação (imprensa, rádio) e às
manifestações artísticas e acadêmicas.
Mesmo assim, a arquitetura nacional procurou renovar o olhar de sua
produção anterior, apostando nos processos de racionalização da
construção civil e na pré-fabricação de elementos construtivos, ligados
principalmente ao concreto armado.
“Foi um período (65-78) onde predominou o uso de materiais sem
revestimento como o concreto aparente nas estruturas e também
em alguns casos, o uso de materiais tradicionais como o tijolo e a
madeira”.
137
Além disso, o Brasil passou de país rural para urbano (em 1970, 56% da
população brasileira viviam em cidades) onde uma cultura de massa e
137
Bastos, Maria Alice Junqueira. Dos anos 50 aos anos 70: Como se completou o
projeto moderno na arquitetura brasileira. Tese de Doutorado, FAUUSP, São
Paulo, 2004.
154
consumo crescia rapidamente e também já despontando um novo
aspecto na paisagem das metrópoles: maciços investimentos em infra-
estrutura como transporte e comunicação, grandes obras civis como
indústrias e terminais rodoviários, e o aparecimento de assentamentos
irregulares e precários (as favelas).
Neste contexto, vemos se consolidar na arquitetura brasileira a
institucionalização da exploração plástica do concreto e liberdade formal,
perdendo, porém muito da sua força conceitual inaugural.
Era como se os arquitetos tivessem adquirido auto-suficiência perante o
que acontecia ao redor do mundo. Claro que este isolamento era produto
da ditadura militar, o que contribuiu decisivamente para um
congelamento autocrítico de opiniões e posturas teóricas, externa e
internamente.
Curioso foi que nunca se projetou e construiu tanto como naqueles anos,
porém a quantidade não equivalia necessariamente à qualidade, o que
acabou produzindo uma arquitetura destituída de crítica.
Formalmente, portanto, buscou-se uma reconciliação entre experiências
cariocas e paulistas onde algumas das principais preocupações nas
abordagens arquitetônicas desta fase foram: racionalidade construtiva
com o uso do concreto aparente (ausência de revestimentos), grandes
vãos estruturais, valorização dos espaços coletivos, inserção urbana
criteriosa, continuidade espacial e flexibilidade de arranjos.
Revista AB
Em 1973, a revista AB Arquitetura Brasileira (n. 8) dedicou número
especial a obra de Zenon Lotufo. No artigo introdutório, Ulisses
Burlamaqui
138
comentou as características humanistas na produção do
arquiteto paulista, aproveitando para fazer uma análise do cenário
arquitetônico da ocasião (curiosamente apresentando notáveis
semelhanças com nosso momento contemporâneo).
“Uma nova consciência ambiental, sem programas monolíticos e
rígidos, refletindo as complexas contradições da vida, confirmam existir
importantes transformações no significado da arquitetura
contemporânea. A morte dos grandes mestres privou a classe de suas
lideranças. No momento incerto da civilização devemos assumir as
responsabilidades humanas inerentes à arquitetura. Alerta ambiental: os
recursos naturais começam a escassear. A demanda só faz aumentar em
ritmo acelerado. É preciso produzir e consumir menos, minimizando a
quantidade de meios empregados na construção, melhorando o
desempenho dos edifícios hoje desenhados. Reduzir a poluição e a
natalidade parece o caminho certo para evitar danos futuros”.
139
138
Arquiteto carioca nascido no Rio de Janeiro em 1925, que realizou projetos de
postos de gasolina nas décadas de 50 e 60, além de vencer o concurso privado
fechado para a construção do Shopping Center Rio Sul em 1975.
139
Revista AB Arquitetura Brasileira n. 8 (1973), pg. 9-10.
155
Segundo o autor, Frank Lloyd Wright já havia postulado sua arquitetura
orgânica imaginando uma harmonia espiritual entre homem, arquitetura
e natureza, opondo-se ao racional-mecanicista dos anos 20.
Caberia, portanto àquela altura uma terceira postura capaz de conciliar as
duas formulações opostas de modo a aceitar a máquina como ferramenta
legítima de produção (racionalismo), porém valorizando a sinergia do
homem com a natureza (organicismo). E afirmava, portanto:
“O CIAM X de 1956 trouxe à tona a crise do modernismo ortodoxo
e o surgimento de uma nova geração descontente. Os Smithsons, Aldo van
Eyck e companhia dirigiram ataques contundentes aos postulados dos
mestres (recém falecidos), afirmando que a arquitetura moderna sem
integrar-se a vida do seu tempo, afastava-se da realidade. Destaque para
o fracasso do funcionalismo e da Cidade Jardim. Assim, dá-se início ao
processo de revisão da arquitetura moderna. O que parecia já estar
acontecendo na obra da Capela de Ronchamp em 1952 por Le Corbusier,
onde parece nítida a demolição dos 5 pontos e uma exaltação das formas
livres e volumes escultóricos. Naquele momento portanto parecia que o
humanismo havia retornado como ponto de fuga no debate arquitetônico:
aceitação do irracional, volta ao direito de expressão, redescobrimento
das manifestações populares e regionalistas e fortalecimento da forma
orgânica e dos valores humanos”.
140
140
Idem, pg.10.
Segundo Burlamaqui, o arquiteto Zenon Lotufo substituía uma
expressividade subjetiva por uma manifestação coletiva integrada ao
entorno. E o resultado seria uma arquitetura despojada, singela, ascética
e asséptica.
No entender de Lotufo, para o autor, o estudo do projeto partia sempre
da planta, base sobre a qual se levantaria a estrutura e o volume,
produzindo formas nobres, variadas e harmônicas. Por sua vez, a indústria
e a modulação davam ao arquiteto as possibilidades de compor com
elementos simples criando formas resultantes da melhor estrutura.
Assim, a identificação com a obra de Le Corbusier seria notória em seus
trabalhos, pois procuravam o justo equilíbrio entre razão e sentimento.
Portanto, uma arquitetura produzida como função vinculada à forma
tendo em vista o melhor atendimento ao homem e o integral respeito à
natureza.
Para Burlamaqui, a intimidade com a disciplina da composição de Zenon
confirmava sua maestria no manejo das formas arquitetônicas onde
aperfeiçoava as áreas de circulação oferecendo momentos de trocas
sociais de caráter informal, valorizando os pátios internos, significativos
pontos de encontro, da troca de idéias e da formação de amizades
duradouras. A seguir, reproduzimos também alguns trechos do texto
“Tendências da Arquitetura” de Zenon Lotufo, escrito especialmente
para a mesma revista.
156
Deve-se entender preliminarmente que uma nítida distinção
entre a Arquitetura, testemunha visível das tendências da situação
econômico-financeiro ou política de uma determinada sociedade e a
atividade criadora do arquiteto, impedido de atuar com liberdade. A
imaginação criativa do arquiteto vem sendo esmagada pela obsessão ao
monumental, ao “modernoso” e ao aparatoso. No entanto, verificamos
que só foi possível o surgimento de uma nova mentalidade, novos
conceitos, onde existia ou existiu liberdade para a criação. Gropius e a
Bauhaus são provas desses fatos. O que tem ocorrido é que se exige do
profissional apenas sua capacidade técnica, esquecendo-se as
potencialidades do seu talento. Assim, a arquitetura deixa de ser um
poderoso instrumento de renovação ou mesmo componente adequado à
evolução da sociedade para, simplesmente comportar-se como um
termômetro que registra a temperatura ambiente, mas não contribui para
alterá-la. O crescimento material e o desenvolvimento tecnológico estão
sufocando o pensamento e impedindo que as soluções técnicas se alinhem
no mesmo plano que as idealizações artísticas. Assim, a arte passa a ser
mero elemento decorativo na sociedade, usada para enfeitar e adornar. E
o arquiteto passa a ser o homem das “bossas”, dos “macetes” ou
torturador de formas”.
141
141
Ibidem, pg.16-17.
Naquele momento, para Zenon, a pesquisa da forma havia chegado a um
ponto estranho onde de um lado evidenciava-se a ausência de arte nas
soluções arquitetônicas e de outro, percebia-se uma preocupação do
artista em agredir uma sociedade que ele não mais aceitava. E
concluindo, questionava-se:
“Para onde caminha a arquitetura? Acredito que teremos
tendências bem definidas quando a Humanidade parar um pouco para
pensar, e assim dar margem para que a Cultura ocupe seu verdadeiro
lugar, pois à medida que se educa, o homem exige mais. Mais qualidade e
não quantidade.”
142
3.7. Limeira – Planejamento e ensino (73-77)
Neste mesmo período, Zenon participaria de importantes trabalhos
urbanísticos como o Plano de Desenvolvimento Integrado de Limeira,
Iracemápolis e Cordeirópolis, além de ensinar na Faculdade de Engenharia
da Unicamp (aquele tempo situada ainda em Limeira), chegando até a ter
escritório nesta cidade, onde desenvolvia os projetos. Mesmo assim,
ainda retornou ao quadro de professores da FAUUSP, desta vez como
auxiliar de ensino, e lecionando também no Instituto de Tecnologia de
Mauá. No caderno de Estudos para Obras Viárias (1974), Zenon Lotufo
142
Ibidem, pg.16-17.
157
relacionou uma seqüência de empreendimentos a serem executados, de
modo a preparar a infra-estrutura viária do município de Limeira, interior
de São Paulo, para sua expansão futura, tendo em vista a análise do
processo histórico de crescimento urbano.
A estruturação viária proposta levava em conta os marcos geográficos
importantes como o Ribeirão Tatu, origem da ocupação, posteriormente a
construção da linha férrea junto ao vale do mesmo córrego, o que dividia
a cidade em duas partes distintas: o centro e a área residencial de melhor
nível, e do outro lado, os bairros industriais. O crescimento se deu de
forma desordenada e espontânea, a partir da primeira ordenação em
meados do século XIX pelo senador Vergueiro. Com os loteamentos ao
redor do centro e em direção à Campinas, Piracicaba e Rio Claro, a cidade
consolidou sua configuração tendo como novo marco divisório a rodovia
Anhanguera. O transporte de cargas e mercadorias viria a acentuar o
problema do tráfego doméstico.
O Plano de Desenvolvimento Integrado de 69 (também realizado pelo
escritório de Zenon Lotufo) já previa uma reorientação da rede através de
um grande anel viário em torno do município, através da construção de
avenidas, viadutos e praças rotatórias, o que possibilitaria uma melhor
interligação das funções viárias presentes então no território.
143
143
Caderno de Estudos de Obras Viárias da Prefeitura Municipal de Limeira de
1974, elaboração de EMDEL (Empresa de Desenvolvimento de Limeira) e projeto
de Zenon Lotufo.
Estação Rodoviária de Limeira (Limeira/SP, 1973 – Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fontes: Boletim Informativo IAB/SP n. 53, 2006 e Revista AU n. 76,
fev/mar 98, pg.102.
(Figs. 223-224) Fotos externa e interna – Rodoviária de Limeira. Fonte: EMF.
158
Situada ao lado da antiga estação ferroviária da cidade, a Rodoviária de
Limeira, interior do estado de São Paulo, um dos últimos projetos de
grande porte de Zenon Lotufo, privilegia a circulação dos usuários com
uso de rampas e passarelas. A planta livre do edifício e a solução
estrutural em concreto armado aparente são as características fortes
deste exemplar típico da arquitetura “brutalista” praticada nos anos 70
por uma boa parte dos arquitetos paulistas e demonstrava a clareza da
solução que define a forma plástica do edifício. A relação entre exterior e
interior garantia-se pela continuidade espacial através das grandes
aberturas no térreo juntamente com as largas rampas utilizadas para
circulação vertical.
Programa: Plataformas de embarque e desembarque / Bilheteria /
Rampas de acesso / Sanitários / Almoxarifado / Estacionamento.
(Fig. 225) Fonte: Info IAB 53.
3.8. Aposentadoria e os últimos anos (78-85)
Aposentando-se pela FAUUSP como auxiliar de ensino em 1980, Zenon
Lotufo retornou à sua cidade natal (Botucatu) onde comprou um pequeno
sítio e ali decidiu passar, ao lado de sua família, o resto de sua humilde
trajetória. Ainda assim, o arquiteto produziu trabalhos significativos.
Artigos para o Jornal de Botucatu (81-82)
Encontramos ainda alguns artigos (talvez os últimos) publicados por
Zenon Lotufo, para o Jornal de Botucatu, nos anos de 1981 e 82, nas
encadernações do arquivo técnico do mesmo veículo de comunicação.
Dos cadernos localizados, contabilizamos 15 textos escritos neste período
(81-82) para o periódico, como relatamos a seguir, com seus títulos,
assunto e datas correspondentes:
- “Óleo e gasolina” – transporte/ petróleo - (21/01/81)
- “Planejamento” – urbanismo – (04/02/81)
- “Planejamento - Lazer” – urbanismo - (14/02/81)
- “Planejamento – Uso e ocupação do solo” – urbanismo
- (07/03/81)
- “Planejamento Urbano” – urbanismo - (25/03/81)
- “Planejamento – Abastecimento” – urbanismo -
(14/04/81)
159
- “Planejamento – Traçados de Cidades” – urbanismo -
(06/05/81)
- “Experiências na vida profissional” - memórias –
(23/05/81)
- “Arquitetura – A Casa” – arquitetura – (13/06/81)
- “Estranha conversa” - memórias – (24/06/81)
- “Porque perdemos” – futebol/ Copa de 82 – (14/07/82)
- “Promessas” – política/ eleições – (24/07/82)
- “Um Grande Clube para Botucatu” – projeto para hípica
– (07/08/82)
- “Municípios Pobres” – política – (22/09/82)
Notamos também que entre os títulos e assuntos abordados, destaca-se
principalmente o tema referente ao planejamento e urbanismo,
aparecendo numa série seguida de seis textos. Destacamos alguns dos
principais trechos destes artigos.
Planejamento - Lazer
No artigo Planejamento - Lazer, Lotufo fez nova referência às idéias de Le
Corbusier citando as principais funções da cidade que eram: Habitar,
Circular, Trabalhar e Cultivar o Corpo e o Espírito.
Mas se ateve especificamente à última, criticando as posturas político-
administrativas de certos governos que se preocupavam demais em
realizar obras eleitoreiras como viadutos e prédios administrativos, em
vez de oferecer mais espaços de lazer para população.
“O lazer abrange uma faixa grande de atividades humanas sendo
difícil enquadrá-lo num esquema rígido de significação, por isso
apreciamos a expressão - cultivar o corpo e o espírito – pois englobam as
atividades fora da rotina diária, oferecendo um campo inesgotável de
atividades para o homem desenvolver seu corpo (atividades esportivas e
recreativas), mente e espírito (teatro, cinema, biblioteca, cultos
religiosos)”.
144
Arquitetura- A Casa
Em Arquitetura – A Casa, Zenon Lotufo relatou uma interessante lista de
condicionantes essenciais na determinação de um projeto e construção
de uma residência. Para ele, inicialmente haveria alguns fatores limitantes
que deveriam ser conhecidos antes de se construir uma casa: códigos de
obra, terreno/ topografia e orçamento. Zenon propunha imaginar a casa
sempre como lar, local privilegiado onde se viverá com filhos, parentes e
amigos, devendo ser satisfatoriamente confortável.
Assim, sua implantação deve ser correta no terreno,
demonstrando clara identificação com o local. Deverá também ser
144
Trecho extraído do artigo Planejamento e Lazer publicado por Zenon Lotufo
no Jornal de Botucatu em 14/02/1981.
160
funcional, sem que isso signifique prejuízo para sua forma. Le Corbusier, o
maior gênio da arquitetura contemporânea, afirmava que a planta de
uma construção é a geratriz de seus volumes, e bem estudada, propiciará
certamente boa forma”.
145
Zenon reafirmava também a relação entre interior e exterior numa
habitação, fato que possibilitava a integração de ambientes,
influenciando-se e ampliando-se mutuamente, fazendo fortalecer o
caráter de espaço público de áreas como jardins e varandas, por exemplo.
Ao concluir, Lotufo expressou que um dos erros dos arquitetos modernos
foi imaginar uma libertação total da forma e do conteúdo, o que despiria
a casa de ornatos e decorações dando lugar às paredes lisas e a grandes
superfícies envidraçadas, tal como uma vitrina de exposição. Assim, para
ele, este abuso gerou ambientes frios e incômodos.
Entretanto, os grandes talentos da arquitetura contemporânea
jamais partiram para esse tipo de coisa, basta examinar as obras de Le
Corbusier, Lloyd Wright, Niemeyer, Neutra e outros. O que eles
procuraram foi adaptar a forma da arquitetura contemporânea a um
novo viver, a novos materiais de construção, a novas tecnologias e a uma
mão de obra que não permitia mais, o artesanato na construção”.
146
145
Trecho extraído do artigo Arquitetura – A Casa, no Jornal de Botucatu, em
13/06/1981.
146
Idem.
Municípios pobres
Num de seus últimos artigos intitulado Municípios Pobres, o arquiteto deu
uma visão do processo perverso que prejudicava os municípios pequenos,
devido ao repasse irrisório de verbas federais.
Este fato, segundo Zenon, prejudicava a nação de modo geral, pois
concentrava as atividades econômicas nos grandes centros, o que
contribuía para o crescimento da violência e desemprego.
Um país não pode ser forte com municípios fracos. O município é
a menor fração territorial de um país. É como a célula de um corpo
orgânico, se a célula enfraquece o corpo todo sofre. O enfraquecimento
do município tem como conseqüência a falta de empregos e com isso a
migração para grandes centros onde o trabalhador encontrará o
subemprego. Assim, crescem as favelas, aumentam os crimes, os assaltos,
a insegurança, as dificuldades de transporte, etc.”
147
Vindo a falecer aos 74 anos em sua cidade natal, Botucatu, em dezembro
de 85, Zenon Lotufo completou um caminho virtuoso deixando preciosas
realizações e lições que permaneceram obscuras à comunidade
acadêmica e arquitetônica, ou se preferirmos, à sociedade brasileira, para
a qual tanto contribuiu e se dedicou profissionalmente.
147
Trecho extraído do artigo Municípios Pobres, publicado por Zenon Lotufo, no
Jornal de Botucatu, em 22/09/1982.
161
4. Conclusão
“Hoje examinamos conscientemente o passado a partir do ponto
de vista atual, a fim de situar o presente em uma dimensão mais ampla do
tempo, de modo que esse possa ser enriquecido pelos aspectos do
passado que ainda são vitais. Essa é uma questão que diz respeito à
continuidade, não à imitação”.
148
A idéia desta dissertação foi apresentar um panorama das principais
atividades desenvolvidas no percurso profissional do arquiteto paulista
Zenon Lotufo.
Neste sentido, procuramos revelar um conjunto de trabalhos realizados,
reproduzindo-os cronologicamente, de modo a concatená-los ao contexto
de idéias e valores pertinentes ao universo do arquiteto.
Enfocamos inicialmente sua formação acadêmica, os contatos e primeiros
trabalhos, posteriormente as influências advindas pelo grupo carioca
quando se afirmou sua atuação moderna, e finalmente, um último
período de realizações que confirmam sua maturidade profissional.
148
Giedion, Sigfried. Espaço, tempo e arquitetura: o desenvolvimento de uma
nova tradição. Martins Fontes, São Paulo, 2004, p. 34.
162
Como no título deste trabalho, por vezes arriscamos uma alusão
imaginária e abstrata da intersecção entre linhas retas e curvas para
traduzir um pouco da complexidade deste percurso único.
As retas serviram para ilustrar os caminhos certos, diretos e precisos do
racionalismo estrutural, do funcionalismo moderno, a razão e verdade de
ser das coisas, tão própria da chamada “escola paulista” de origem
politécnica, que Zenon cursou.
Por sua vez, as curvas indicaram os desvios, contornos, leveza, plástica e
sensualidade das escolhas e das formas, por sua vez herdada com o
contato direto com os arquitetos da “escola carioca” de origem Beaux-
arts, entre eles, Niemeyer, Abelardo de Souza e Hélio Duarte.
E nesta mistura de retas e curvas, hora uma prevalece sobre a outra, hora
os papéis se invertem, criando um rico emaranhado de interferências
mútuas onde história, personagens e lugares se sobrepõem, destacando-
se assim nos trabalhos de Zenon Lotufo.
Tentamos também destacar uma noção de continuidade histórica que
marca o destino e a trajetória de vida dos homens, em particular, do
arquiteto paulista.
Não que estejamos presos à tradição, mas somos uma herança dela.
Assim, essa idéia de rompimento com o passado é relativa e não se
efetiva completamente na prática.
Somos a continuidade dos processos históricos, influenciados pelas
pessoas que cruzam nossos caminhos. Conjunto de sabedorias e crenças,
hábitos e culturas diferentes, nós escolhemos nossas trajetórias apoiados
nessa bagagem.
Com Zenon Lotufo não foi diferente; sua formação na Escola Politécnica, a
convivência com professores como Anhaia Mello, o contato com as idéias
de Le Corbusier, a experiência com os cariocas da Escola de Belas Artes e
principalmente Oscar Niemeyer, todo esse caldo de influências e
acontecimentos permitiram a ele fazer suas escolhas teóricas e práticas.
Assim podemos também imaginar como Le Corbusier teria influenciado os
arquitetos brasileiros com suas lições sobre as transformações da
sociedade industrial; assim como, a sua passagem pelo Brasil (e em outros
países e culturas) também teria modificado seu modo de perceber o
mundo, o que acabou refletindo em sua arte.
A arquitetura moderna brasileira não procurou, de modo geral, romper
bruscamente com a tradição e a herança colonial, o modo de construir e o
uso de seus elementos mais característicos. Mesmo assim, buscou
desfazer com cuidado os nós e se libertar com habilidade, procurando
manter um vínculo permanente.
Nascida oficialmente no Rio de Janeiro na década de 30, esta arquitetura
soube colher os ensinamentos do mestre franco-suíço através de nomes
163
como Oscar Niemeyer, Lúcio Costa e companhia, e difundí-la com
autonomia através de seus trabalhos.
Em São Paulo, apesar de ter ocorrido a primeira experiência com o
concreto armado, a casa de Gregori Warchavchik em1928, considerada
por muitos como o introdutor da arquitetura moderna no Brasil, este fato
não adquiriu tamanho significado quanto o projeto do Ministério da
Educação e Saúde, de 37, no Rio de Janeiro.
No entanto, a chamada “escola paulista” floresceu com nomes de peso
como Rino Levi, Osvaldo Bratke e Vilanova Artigas, que adotaram linhas
mais austeras e soluções estruturais simples de concreto armado.
Enquanto isso, a “escola carioca” explorou a fluidez e a liberdade de
linhas mais curvas e sensuais, permitidas pelo uso e a flexibilidade do
mesmo material, principalmente com os trabalhos de Oscar Niemeyer e
Affonso Eduardo Reidy.
“O curso de arquitetura em São Paulo diferentemente das demais
regiões, tinha suas origens não nas belas artes, mas na engenharia, o que
lhes configurava uma maior familiaridade com a arquitetura enquanto
questão tecnológica. Mas o fator mais palpável para a materialização de
uma arquitetura formalmente identificável como “paulista” deveu-se a
seu caráter de continuidade à linha carioca. ”
149
149
Segawa, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. Edusp, São Paulo, 1999, p.
147.
De qualquer modo, houve intercâmbios bastante salutares (idas e vindas
de Le Corbusier, experiência didática de Warchavchik no Rio, Niemeyer
elaborando projetos paulistas como o edifício Copan e os pavilhões do
Parque Ibirapuera) para o desenvolvimento de uma arquitetura de
expressão nacional de tal modo que talvez o ponto mais interessante a
ser salientado seja que ambas influenciaram-se mutuamente. E que
continuam influenciando, as gerações atuais com seus postulados
teóricos e práticos.
Por sua vez, a trajetória de Zenon Lotufo confunde-se com a evolução de
seu pensamento e formação profissional de tal modo que é possível
identificar por fim certa homogeneidade na elaboração de suas idéias e
valores. Elementos comuns que acabaram por sintetizar uma linha de
raciocínio atenta à simplicidade e à clareza da técnica, da função e da
forma, ou seja, aos princípios vitruvianos (Firmitas, Utilitas e Venustas),
aliados à economia e racionalidade de meios.
Assim, baseando-se na busca do equilíbrio justo entre razão e sentimento,
Zenon Lotufo foi um daqueles raros homens dignos e corretos que trilhou
um caminho cheio de “retas e curvas”, mas que no final, apesar dos
obstáculos, pode olhar para trás com satisfação e orgulho da contribuição
deixada tanto para os arquitetos como para a sociedade.
Mas se precisássemos destacar uma única característica que resumisse a
obra de Zenon Lotufo, e talvez de toda uma geração de engenheiros-
164
arquitetos, esta teria origem na sua formação na Politécnica onde: “Saber
construir bem era uma obrigação”.
150
Ou seja, o aspecto principal a se dominar era a construção e os
conhecimentos técnicos da engenharia civil, de maneira a transportá-los
para a arquitetura. Esta tradição do bem construir era herança deixada
também pelos polivalentes engenheiros dos fins do século XIX, nomes
como Ramos de Azevedo e Anhaia Mello que se esforçavam para conciliar
as teorias clássicas (Vitruvio, Alberti, Palladio, Durand, Guadet) aos ideais
práticos e funcionais da era moderna, e propagá-los aos seus alunos.
Contraponto: Por uma arquitetura não-global
Em tempos atuais de globalização e sociedade de consumo, impera a
cultura de imagens e as formas exuberantes da chamada “arquitetura do
espetáculo”, despontando nos trabalhos de arquitetos internacionais
como Frank Gehry ou Santiago Calatrava, por exemplo. Seus mega
projetos para corporações multinacionais refletem o poderio do capital
global e traduzem os interesses imediatos de seus clientes: uma
arquitetura de se encher os olhos.
No entanto, há que se questionar a qualidade destes empreendimentos e
até que ponto atende as reais necessidades humanas de abrigo e bem-
150
Reis. N. G. (coorden.). Catálogo de exposição “100 anos de Ensino de
Arquitetura e Urbanismo em São Paulo”, LAP-FAUUSP, 1996. , pg. 9.
estar. Há que se rever crítica e atentamente estas questões
permanentemente, pois muitas vezes a verdade pode se esconder por
trás de formas sedutoras
Questões como relação com a vida (programa), a natureza (geografia e
clima) e a técnica (construção), bem como a economia e racionalidade de
meios foram fatores determinantes para os autênticos modernos, e aqui
encaixamos seguramente a figura de Zenon Lotufo. E ainda hoje,
acreditamos que se fazem fundamentais para qualquer tipo de ambiente
a ser planejado e construído corretamente.
Assim, reavaliar os principais valores e princípios divulgados por uma
geração de arquitetos formados nas décadas de 30 e 40 em São Paulo, ou
seja, sobre o cunho de uma modernidade latente que florescia é também,
rever a permanência e força das lições deixadas por eles.
Último lembrete
A finalidade última desta pesquisa nunca foi esgotar os pormenores na
vida ou obra do arquiteto Zenon Lotufo, mas sim possibilitar a abertura de
novas frentes de pesquisa sobre a arquitetura paulista do século XX.
É justo, portanto que se reconheça, ainda que tardiamente, os valores e
lições deixados por sua personalidade humilde e íntegra, pois as próximas
gerações devem refletir e julgar sobre estes acontecimentos, de modo a
definir a atualidade e relevância dos mesmos.
165
Apêndice 1 - Residências
Residência Francisco Lotufo Filho (São Paulo/ SP, 1946-Construída)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole n. 100, ago 46, p.121.
Residência unifamiliar construída para seu irmão, Francisco Lotufo Filho.
Situado em terreno em aclive, o projeto tira partido da situação
topográfica minimizando a terraplanagem. Volumetria sóbria com telhado
em uma água, varanda alpendrada na frente e janela em tira no
pavimento superior. As áreas hidráulicas da casa (cozinha e banho)
concentram-se no lado direito, sobrepondo-se uma a outra, de modo a
racionalizar os encanamentos e instalações. Um jardim pergolado abre-se
para a janela do escritório.
Programa:
Subsolo: Garagem para autos.
Térreo: Terraço e varanda de acesso / Hall de entrada / Sala de estar /
Sala de jantar / Cozinha / Dispensa / Lavabo / Biblioteca.
Quintal: Quarto de criada / Serviços / Galinheiro.
Superior: Dormitórios / Rouparia / Banho / Terraço.
Planta Térreo Planta Superior
166
Residência Vicente Huet Bacellar Júnior (São Paulo, 1946)
Projeto: Zenon Lotufo / Abelardo de Souza/ Hélio Duarte
Fonte: Acrópole 104, dez 1946, p. 226.
Residência unifamiliar com 320 m2, situada em terreno em aclive, o
projeto tira partido da situação topográfica minimizando a
terraplanagem. Volumetria sóbria com telhado em uma água, varanda
alpendrada na frente e janela em tira no pavimento superior. O bloco
residencial fica solto do solo mediante o uso de pilotis criando uma ampla
área de terraço coberto.
Programa: Térreo: Terraço coberto / Quarto de criada / Serviços.
Superior: Dormitórios / Banho / Sala de Viver / Lavabo / Copa / Cozinha.
Planta – Térreo
Planta – Superior
167
Estudo de Residência (São Paulo, 1947)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole n. 108, abril 47, pp. 315.
Estudo para residência unifamiliar com volumetria singular com telhado
em uma água no bloco superior, varanda alpendrada na frente e janela
em tira no pavimento superior. Composição volumétrica prioriza blocos
puros e identificáveis como o prisma que marca a garagem e o acesso da
rua. A janela em tira horizontal permanece como referência à matriz
corbusiana. Destaque para a atenção dada aos elementos paisagísticos e
a relação dos jardins com a casa.
Programa: Térreo: Terraço e varanda de acesso / Hall de entrada / Sala de
estar / Sala de jantar / Cozinha / Dispensa / Lavabo / Biblioteca.
Quintal: Quarto de criada / Serviços / Galinheiro.
Superior: Dormitórios / Rouparia / Banho / Terraço.
Planta Térreo
Planta Superior
168
Residência Antônio Lotufo (São Paulo/ SP, 1948)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Revista Acrópole, jul 48, pp. 106-107
Residência unifamiliar para seu irmão, Antônio Lotufo de volumetria
sóbria com telhado em uma água, varanda alpendrada na frente e janela
em tira no pavimento superior. A composição privilegia os espaços de
jardim e varandas otimizando os elementos paisagísticos e a relação com
as áreas sociais no térreo da casa. Destaque para o aproveitamento do
recuo lateral e o uso de pérgula criando um corredor-jardim que contribui
para a iluminação e ventilação.
Programa: Térreo: Garagem para autos / Terraço coberto de acesso / Sala
de estar / Sala de jantar / Cozinha / Dispensa / Lavabo / Biblioteca /
Quarto de criada / Serviços.
Superior: 3 Dormitórios / Banho / Terraço.
Planta Térreo
Planta Superior
169
Estudo de Residência e Consultório (São Paulo/SP, 1950)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole 97, mar 50, pp. 32.
Estudo para residência unifamiliar e consultório médico com volumetria
variada com telhados tipo borboleta em sentidos diferentes e bloco
superior com janela em tira na horizontal. Uma grande varanda
alpendrada na frente para acesso faz a distinção das funções e usos (bloco
da esquerda – consultório).
Programa: Consultório (planta - lado esquerdo): Sala de Exames / Banho /
Sala de Curativos / Fisioterapia / Sala de espera / Terraço.
Residência: Garagem para auto (semi-enterrado) / Hall de entrada / Sala
de estar / Sala de jantar / Copa / Cozinha / Pátio / Dormitórios / Banho.
Planta Baixa
170
Residência Honório Sylos (São Paulo/SP, 1951– Construída)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole, mar 51, pp. 284-28
Residência unifamiliar para Dr. Honório de Sylos situada na Rua Fernandes
Borges com Oliveira Pimentel, Vila Paulista, onde a ocupação do terreno
gerou um pátio no fundo, além do recuo frontal de cinco metros
determinado pela legislação vigente na época.
Programa: Térreo: Garagem para auto / Lavabo / Cozinha / Sala de
Estar / Sala de Jantar / Escritório / Área de serviços / Quarto
empregada; Superior: Suíte / Dormitórios / Banho.
Planta Térreo
Planta Superior
171
Estudo para Residência (São Paulo/SP, 1951)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Revista Acrópole 1951
Estudo para residência unifamiliar em terreno na Rua Diogo Jácomo, de
660 m2, onde o programa principal ocupa o térreo em forma de “U”
conformando um grande pátio social.
A parte superior foi destinada para sala de jogos, escritório, estúdio,
lavanderia e aposentos para empregada, o que foge de uma disposição
mais convencional com os dormitórios situados na parte de cima.
Programa: Térreo: Garagem para autos / Sala de Estar / Sala de Jantar /
Copa / Cozinha / Serviços / Dormitórios / Banho / Sala de espera
Superior: Terraço / Sala de jogos / Escritório / Dormitório empregada /
Lavanderia / Estúdio
Planta Térreo
Planta Piso Superior
172
Residência Menezes (São Paulo/ SP, 1951)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Casa e Jardim, pp. 4-8.
Residência unifamiliar térrea para M. T. Menezes situada à Rua Zapará no
bairro de Pinheiros de volumetria elegante e discreta com telhado tipo
borboleta na fachada. Esta solução foi bastante utilizada por arquitetos
brasileiros nas décadas de 50 e 60, uma referência ao projeto de Lê
Corbusier para a casa Errazuris em 1930 no Chile. A área hidráulica da
casa (Cozinha e banho) concentra-se no lado esquerdo de modo a
racionalizar estas instalações.
Programa: Térreo: Garagem para auto / Hall de entrada / Sala de estar /
Sala de jantar / Copa / Cozinha / Dispensa / Dormitórios / Banho
Edícula: Lavanderia / Dormitório / Banho / Depósito
Planta baixa
173
Residência Nilo Andrade Amaral (São Paulo/SP, 1954 – Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Arquitetura e Decoração n.14, dez 55.
Residência unifamiliar construída no bairro do Morumbi, zona sul de São
Paulo, nas proximidades da atual Fundação Oscar Americano. Consta de
um bloco longitudinal onde se localizam os dormitórios, definido por uma
cobertura plana inclinada, que contrasta perpendicularmente com uma
grande laje plana de concreto, de traçado irregular, que desenha as
dependências sociais e os jardins do andar térreo.
Programa: Térreo: Garagem autos / Escritório / Galeria de entrada / Salão
social / Varanda / Piscina / Sala de jantar / Sala de estar / Cozinha /
Dispensa / Bloco de serviços com Pátio
Superior : Dormitórios e banhos.
Planta Térreo
Planta Superior
174
Fazenda Boa Esperança (Botucatu/ SP, 1956 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole 209, mar 56, pp- 180-183.
Plano de ocupação de fazenda de propriedade de Joaquim Amaral
Amando de Barros encomendado à Zenon Lotufo.
Com a preocupação de atender às várias atividades tanto da família como
de seus empregados, o programa previa instalações como a casa-sede,
casa do caseiro, casa do administrador, oficinas, capela, casa dos colonos.
Programa: Casa-sede: (térreo) Sala de estar / Sala de jantar / Sala de
jogos / Cozinha / Copa / Lavanderia; Superior: Dormitórios (6) / Banhos /
Sala intima; Casa do Administrador: Sala de convivência / Terraço /
Dormitórios (4) / Cozinha / Copa / Área de serviço; Capela: Salão / Altar /
Sacristia / WC.
Planta Térreo - Sede
Planta Superior - Sede
175
Casa do administrador
Planta e Elevação – Casa administrador
Implantação Geral, Planta, Corte e Elevação - Capela
176
Anteprojeto para Residência (São Paulo/SP, 1956)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole 216, out 56, pp- 466.
Situado no Jardim Guedala, este anteprojeto de residência procurou se
acomodar à topografia do terreno de modo a minimizar os serviços de
terraplanagem e aproveita para descortinar a vista da sala de estar e
terraço. A funcionalidade das circulações se qualifica com a separação dos
acessos aos serviços e demais atividades da casa.
Programa: Térreo: Garagem autos / Lavanderia / Quarto de empregada /
Banho / Jardim; Superior: Sala de Estar / Sala de Jantar / Terraço / Copa /
Cozinha / Lavabo / Dormitórios (3) / Escritório / Hall
Planta Térreo e Superior
177
Estudo para Residência (São Paulo/SP, 1957)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Revista Acrópole 225, jul 57, pp- 327.
Projeto de residência unifamiliar térrea com volumetria simples e
organização programática clara com separação das áreas íntimas
(dormitórios) e área social (estar).
Uma marquise horizontal protege e orienta a entrada da casa,
desdobrando em um braço que abriga a garagem.
Toda parte hidráulica da casa ficou distribuída ao longo do eixo central
(banheiros, cozinha e serviços).
Programa: Residência: Garagem para auto / Hall de entrada / Sala de
estar / Sala de jantar / Copa / Cozinha / Pátio / Dormitórios / Banho.
Planta baixa
178
Residência Charlotte Brandão (São Paulo/SP, 1958)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Acrópole 236, jun 58, pp-399.
Projeto de residência unifamiliar situada em grande terreno na rua São
Sebastião com solução estrutural configurada a partir de pórticos de
concreto armado que definem a cobertura.
A garagem para autos ficou localizada no fundo do lote assim como as
dependências de empregada.
Contando com uma área de aproximadamente 440 m2, o projeto abre
toda a parte social da casa (salão com lareira, estar e jantar) para a vista
do jardim.
Uma escada circular faz a transição para o piso superior.
Programa: Térreo: Terraço entrada / Salão / Sala de Estar / Sala de Jantar
/ Terraço / Copa / Cozinha / Área de Serviços
Superior: Dormitórios / Banhos / Escritório / Terraço.
179
Residência no Sítio Beira Serra (Botucatu/SP, 1976 - Não Construído)
Projeto: Zenon Lotufo
Fonte: Reprodução do desenho original em A4, pertencente ao arquivo da
família.
Perspectiva
Talvez o último projeto realizado pelo arquiteto para uma residência em
sítio localizado em sua cidade natal, Botucatu. O caráter experimental das
soluções espaciais chama a atenção pela organização dos ambientes a
partir de um conjunto de círculos de tamanhos variados.
A solução estrutural é extremamente simples e modulada com pilares e
vigas em madeira e cobertura de telha trapezoidal de fibro-cimento. A
modulação regular da estrutura de madeira contrasta com as formas
cilíndricas que definem os ambientes da casa e dos muros, o que poderia
indicar uma possível mudança no modo de conceber sua arquitetura,
apontando para uma nova direção.
Programa: Terraço / Estacionamento para autos / Hall de entrada / Sala
de estar / Recanto / Escritório / Lavabo / Sala de refeições / Copa /
Cozinha / Pátio de serviços / Dormitórios / Banhos.
Planta baixa
180
Apêndice 2 – Projetos localizados na Prefeitura Municipal de Botucatu
Reforma do Clube 24 de Maio (atual Brasil-Itália)
181
Fábrica de Biscoitos Catu
182
Botucatu Tênis Clube
183
Residência Dr. Jorge Saad
184
Edifício comercial José Luiz Amat
185
Apêndice 3 – Cronologia das principais obras e projetos
Fase 1 – Anos de formação (31-46)
1936
Paço Municipal de Taquaritinga (concurso público, c/ Afonso Iervolino) NC
1937
Mercado Municipal de Sorocaba (concurso público, c/ Afonso Iervolino) C
1943
Aquário Municipal de Santos C
(Chefe da Divisão e Diretor de Obras da Prefeitura Municipal de Santos,
de 1939 a 45, onde elaborou os Códigos de Obras de Santos e São
Vicente).
1946
Plano Diretor da Estância de Campos do Jordão
(Prefeito nomeado da Estância de Campos do Jordão)
Fase 2- “Escola Carioca” (46-58) - Afirmação moderna
1946
Sede do IAB em São Paulo (c/ Abelardo de Souza e Hélio Duarte) C
Estância Hidromineral de Santa Bárbara do Rio Pardo (c/ Abelardo de
Souza e Hélio Duarte) C
186
Instituto de Puericultura da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro (c/
Abelardo de Souza e Hélio Duarte) NC
Grêmio Recreativo de Ourinhos (c/ Abelardo de Souza e Hélio Duarte) NC
Associação Bahiana de Imprensa (ABI), Salvador (c/ Abelardo de
Souza/Hélio Duarte) C
Residência Francisco Lotufo Filho, São Paulo C
1947
Cruz Vermelha do Brasil (c/ Abelardo de Souza e Hélio Duarte) NC
Orfanato Amando de Barros, em Botucatu (c/ Abelardo de Souza e Hélio
Duarte) NC
1948
Edifício D. Hecilda (Rua Major Sertório c/ Cesário Motta) São Paulo (com
Abelardo de Souza e Hélio Duarte) C
Edifício Pedra Azul (Alameda Jaú) São Paulo (com Abelardo de Souza e
Hélio Duarte) C
Cerâmica São Caetano (com Abelardo de Souza e Hélio Duarte) NC
1949
Escola de Enfermagem, Alameda dos Aimorés ?
Clube Atlético Paulistano (com G. Warchavchik) PC
Sede da Faculdade de Engenharia Industrial da PUC-SP (São Bernardo do
Campo, primeiro lugar concurso, com Plínio Croce) NC
1951
Parque do Ibirapuera em São Paulo (equipe: O. Niemeyer, Hélio Uchoa,
Eduardo Kneese de Mello e Carlos Lemos) C
Igreja Presbiteriana (Presidente Prudente) NC
Edificio residencial Arco Íris em Santos ?
Residência Honório de Sylos C
1952
Associação Cristã de Moços (rua Nestor Pestana, São Paulo, com Ícaro de
C. Mello e Roberto Cerqueira César) C
1953
Igreja Presbiteriana de Bauru NC
Paço e Câmara Municipal de Bauru PC
Fábrica de Fertilizantes da Petrobrás em Cubatão (com Manoel Machado,
Adolfo Morales e Slioma Selter) C
Residência do Arquiteto, Morumbi, São Paulo C
1954
Residência Nilo Andrade Amaral, São Paulo C
Restaurante na Via Anchieta NC
1956
Igreja Presbiteriana, Jandira NC
1957
Paço Municipal de São Caetano do Sul C
Botucatu Tênis Clube C
187
Museu da Aeronáutica (com Aldo Calvo e Giancarlo Palanti) NC
Fase 3- “Brutalismo e maturidade” (58-85)
Associação Atlética Banco do Brasil, Porto Alegre (com Ubirajara Ribeiro,
vencedor concurso nacional) NC
Departamento de Eletricidade da Escola Politécnica da USP (com
Ubirajara Ribeiro) C
1961
Supermercado no Pacaembu, São Paulo (com Ubirajara Ribeiro) NC
1963
Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Energia Elétrica, São Paulo
(com Ubirajara Ribeiro, primeiro lugar concurso nacional) C
1965
Praça de esportes e Estádio Municipal em São Caetano do Sul (com
Ubirajara Ribeiro) C
Clube de Campo Lagoa de Cumbica, Guarulhos ?
1967
Edifício para Perícias Médicas – INPS (c/ Vitor Lotufo e Vitor Pini)
Solução arquitetônica e urbanística para o novo viaduto da Avenida
Rangel Pestana (sobre as linhas da Estrada de ferro Santos-Jundiaí –
antigas porteiras do Brás) ?
1968
Grupos escolares em Mauá, Santa Fé do Sul, Mirante do Paranapanema,
Cardoso (todos para o governo do Estado de São Paulo – FECE). C
1969
Colégio Técnico de Mococa (CESP) C
Escola Técnica Federal de São Paulo (com Vitor Lotufo, Vitor Pini e Cláudio
Sganzerla) C
Associação Cristã de Moços na Lapa em São Paulo (com Vitor Lotufo) C
Planos de Desenvolvimento Integrado de Limeira, Iracemapolis e
Cordeirópolis (Serpla- Serviços de Planejamento) ?
1971
Laboratórios de Engenharia Química do Instituto de Energia Atômica, USP
C
Edifício-sede da ORGASTEC – Centro Eletrônico de Processamento de
Dados (700 m2) C
1972
Velório do Cemitério do Araçá, São Paulo (com Vitor Lotufo) NC
Mercado Distrital do Ipiranga (Prefeitura de São Paulo) C
1973
Estação Rodoviária de Limeira C
188
Plano do Conjunto Residencial para a empresa Aracruz-Florestal S.A.,
município de Aracruz, Espírito Santo ?
Outros projetos sem data
Ginásio e Colégio - Itajaí, Goiás (C).
Escola de Enfermagem e Hospital em Rio Verde, Goiás (C).
Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana Independente – Estrada de
Cotia ( km 2) – conjunto de edifícios destinados a ensino, moradia, culto,
esportes e recreação (PC).
NC – Não construído; C – Construído; PC – Parcialmente construído;
? – Não sabe
189
Apêndice 4 – Anotações de Zenon Lotufo
Reprodução dos trechos mais significativos da revisão em fichas de papel-
cartão escritas à mão, da tese “O Espaço psicológico na Arquitetura”, feita
pelo próprio autor Zenon Lotufo, encontrados no interior de um exemplar
pertencente à familia do arquiteto, onde o mesmo cita autores e
respectivas obras, traduzidas por ele mesmo:
Las teorias de la Arquitetura
-“A psicologia da Arquitetura tem por fim descrever e explicar os efeitos
psíquicos que a Arquitetura é capaz de evocar por seus meios. E o fim da
Arquitetura é a representação de nossos sentimentos e disposições de
nossas almas. Os homens não são diferentes, mas semelhantes....
O belo tem caráter de ilusão que é válido para o espaço e para todas as
outras representações e sentimentos. “O dever da Estética é buscar e
demonstrar a lei psicológica, através da qual se realiza o sentimento do
belo”.
História crítica da Arte (1ª. Ed. 1936) - Lionello Venturi (1885-1961)
-“Alberti demonstra claramente que a origem da arte é psicológica e não
histórica e renovam-se cada vez que se cria uma obra de arte”.
190
-“A imaginação criadora é considerada hoje como atividade espiritual que
produz as obras de arte”.
-“Por isso, é natural que os críticos tenham se ocupado em estudar os
fenômenos psicológicos e da visão, para isso existia a psicologia”.
Curso de Estética - Hegel (1770-1831)
- “O objeto de arte nada é em si, só poderá o ser realmente se atingir
nosso ESPÍRITO”.
Benedetto Croce (1866-1952)
- “O belo não tem existência física. O caráter estético de um objeto não é
uma qualidade sua, mas uma atitude que assumimos diante deste
objeto”.
Psicologia da Forma (1937) - Paul Guillaume (1878-1962)
-“A psicologia não tem que criar entidades para explicar os fatos, mas sim
descrevê-los e determinar as condições que permitem prevê-los.
O todo articulado composto por partes secundárias alcança uma
percepção global e assim uma existência psicológica real.
“Entendemos por percepção do espaço os aspectos geométricos das
coisas: tamanho, direção, distância e localização”.
Art et Technique (1956) – Pierre Francastel (1900-1970)
-“Uma casa será uma espécie de materialização da tensão psíquica do seu
ocupante. As condicioantes sociais que orientam o desenvolvimento da
técnica”.
- “A máquina deshumanizou a vida humana, ela gerou disformidade e
horror às cidades, e a vida moderna desenvolveu-se contra a cultura, não
é do trabalho que nasce a civilização”.
-“O homem não cria as formas, ele as descobre seguindo os principios que
o recoloca no plano da criação”.
Space, time and Architecture (1941) – Sigfried Giedion (1888-1968)
-“As influências sociais, econômicas e funcionais desempenham papel vital
em todas as atividades humanas, das ciências as artes. No entanto,
existem outros fatores importantes – nossos sentimentos e emoções.
Comumente descartados como triviais, seus efeitos sobre as ações
humanas são enormes”.
-“O caráter funcional da indústria e da técnica relegaram as artes (leia-se
conteúdo emocional) a um lugar isolado e autônomo, completamente
alienada da realidade cotidiana. Como resultado, a vida perdeu unidade e
equilíbrio”.
191
-“Em particular, não se tornou pacifico que as qualidades estéticas do
espaço não sejam limitadas à sua ilimitada vista. A essência do espaço é
sua amplitude, que depede de uma infinidade de relações possíveis para
com ele, mudando a cada ponto de vista; mas para se compreender a
verdade do espaço, o observador deve projetar-se nele e assimilá-lo” .
-“As casa de Wright devem ser consideradas como pura expressão
artística que profundamente conectadas com aspirações anônimas de sua
época.
-“Hoje, o mais urgente problema surge no campo do urbanismo”.
Notions d´Esthetique (1925) - Charles Lalo
“A verdadeira ciência Estética se esforça por fazer a síntese das tendências
sociais, políticas e históricas, retendo o que cada escola tem de positivo,
desprezando o negativo”.
-“Dizemos q uma obra de arte é bela, quando se adapta às funções
psíquicas e sociais, ou é capaz de realizar a harmonia ou ainda se purifica
ou idealiza a vida coletiva ou individual, enfim quando é capaz de
continuar a fase de evolução histórica ou mesmo de reagir contra ela. Ou
seja, a estética é um dado essencialmente psicológico”.
-“No objeto estético, o sensível é sempre símbolo de um conteúdo
espiritual”.
-“Grandes revoluções não são individuais, mas sim sociais. Ninguém cria
um movimento sozinho, apenas acrescenta sua marca sobre um produto
de origem social”.
-“A estética é indissoluvelmente objetiva e subjetiva, isto é, as leis da
beleza consistem nas relações entre o sujeito e o objeto”.
El significado da Arte (1932) – Herbert Read (1893-1968)
-“O arquiteto grego buscava conseguir a impressão do vazio no espaço,
enquanto que o gótico buscava o espaço imaterial da leveza”.
Art and Society (1937) – Herbert Read
-“A elite acumula poder, riqueza e lazer, isto exige símbolos visíveis de seu
status, que reflitam sua glória. A arquitetura aparece então em evidência
e muitas outras artes seguem seu rastro”.
Verso une Architecture Organiche (1945) - Bruno Zevi (1918-2000)
-“Invés de se aspirar a viver em obras de arte, desejamos viver em casas
(material e psicologicamente) confortáveis”.
-“Não que Aalto seja um romântico, ao contrário, seu espírito racional
dirigia-se aos problemas da estrutura e da distribuição dos ambientes,
intimamente vinculados aos aspectos psicológicos da vida”.
192
-“Cerca de trinta anos depois da Revolução Soviética, conclui-se que este
tempo é insuficiente para se construir uma nova cultura. Por outro lado, se
neste processo, se houvesse permitido à arte, evoluir organicamente,
numa síntese dialética entre imaginação e realidade, tudo poderia estar
melhor, porém a realidade foi outra: a imposição de uma concepção
intelectual predeterminada do que deveria ser a arte numa comunidade
soviética, isto sim foi um erro fatal”.
Vision in Motion (1947) – Lazlo Moholy-Nagy (1845-1946)
-“As condições sociais, as artes, as ciências, o desenvolvimento de uma
tecnologia industrial com a pré-fabricação, novos materiais e processos
são os fatores determinantes para a realização de um novo
desenvolvimento arquitetônico”.
Forms, composition et loci d´harmonie (1953) - Andre Lurçat (1894-1970)
“As necessidades de nossa análise tem nos levado a falar corretamente do
espaço seja como elemento constitutivo das formas, seja como base das
formulações arquitetônicas onde o vazio é o elemento fundamental”.
193
Bibliografia
ARRUDA, M. A. do N. Metrópole e Cultura. São Paulo no meio do
século do XX. Edusc, Bauru, 2001.
ARTIGAS, Vilanova. Caminhos da Arquitetura. Cosac Naify, São
Paulo, 2004.
BAHNHAM, Reyner. Teoria e projeto na primeira era da máquina.
Editora Perspectiva, São Paulo, 2003 (1
a
. edição, 1960).
BASTOS, M. A. Junqueira. Dos anos 50 aos anos 70: como se
completou o projeto moderno na arquitetura brasileira.
Doutorado FAUUSP, 2004.
BERGSON, Henri. Cartas, conferências e outros escritos. Coleção
Os Pensadores, Edit. Abril, São Paulo, 1984.
CAVALCANTI, Lauro. Quando o Brasil era moderno: Guia de
Arquitetura 1928-1960. Aeroplano, Rio de Janeiro, 2001.
Centro de Pesquisa e Estudos Urbanísticos (CEPEU). Plano Diretor
de Campos do Jordão: relatório e pranchas de planejamento
territorial. FAUUSP, 1960.
COLQUHOUN, Alan. Modernidade e Tradição Clássica: Ensaios
sobre Arquitetura 1980-87. Cosac e Naify, São Paulo, 2004.
CURTIS, William. Le Corbusier, Ideas and Forms. Phaidon Press,
London, 1986.
194
DURAND, J-N-P. Precis of the Lectures on Architecture (1802-05).
Traduzido em inglês por David Britt. The Getty Research Institute.
Los Angeles, 2000.
FICHER, Silvia. Os arquitetos da Poli. Ensino e profissão em São
Paulo. Edusp, São Paulo, 2005.
GHYKA, Matila. Estética de las Proporciones em la Naturaleza y
em las Artes. Ed. Poseidon, Buenos Aires, 1953.
GIEDION, Sigfried. Espaço, tempo e arquitetura: o
desenvolvimento de uma nova tradição. Martins Fontes, São
Paulo, 2004.
GUADET, Julien. Elements et Theorie de lÁrchitecture (cours
professé á l´École Nationale et Spéciale des Beaux-Arts). Librarie
de la construction moderne, Paris, 1909 (3ª. edição original da
Biblioteca da Escola Politécnica).
GUILLAUME, Paul. Psicologia da forma. Companhia Editora
Nacional, São Paulo, 1966 (1ª. Ed. 1937).
HARRIS, Elizabeth. Le Corbusier: Riscos brasileiros. Editora Nobel,
São Paulo, 1987.
INSTITUTO LINA BO e P.M. BARDI/FUNDAÇÃO VILANOVA
ARTIGAS. Vilanova Artigas: arquitetos brasileiros. São Paulo, 1997.
KOPP, Anatole. Quando o moderno não era um estilo e sim uma
causa. Edusp, São Paulo, 1990.
LE CORBUSIER. Precisões: sobre um estado presente da
arquitetura e do urbanismo. Cosac e Naify, São Paulo, 2004.
LE CORBUSIER. Por uma arquitetura (Vers une Architecture).
Editora Perspectiva, São Paulo, 1973. (1ª. Edição, 1923).
LEMOS, C. A.C. Arquitetura Brasileira. Melhoramentos, São Paulo,
1979.
LOTUFO, Zenon. O Espaço Psicológico na Arquitetura. Tese
elaborada para o Concurso de Cátedra, FAUUSP, 1956.
LOTUFO, Zenon. Arte ou Artifício. Tese apresentada para concurso
de cátedra na Escola Politécnica de São Paulo, 1966.
MAHFUZ, E. C. Ensaio sobre a razão compositiva – uma
investigação sobre a natureza das relações entre as partes e o
todo na composição arquitetônica. Editora U.F.V./ AP Cultural,
Belo Horizonte, 1995.
MINDLIN, Henrique. Arquitetura moderna no Brasil. Editora
Aeroplano, Rio de Janeiro, 1999.
READ, Herbert. As Origens da Forma na Arte. Zahar Editores, Rio
de Janeiro, 1967.
REIS, N. G. (coorden.). Catálogo de exposição “100 anos de Ensino
de Arquitetura e Urbanismo em São Paulo”, LAP-FAUUSP, 1996.
ROBERTSON, Howard. Los principios de la Composition
Arquitectonica. Editorial Victor Leru, Buenos Aires, 1955.
195
SAARINEN, Eliel. Search for Form: a fundamental approach to art.
Reinhold Pub., New York, 1948.
SANTOS, M. C. L. Escola Politécnica (1894-1984). Edusp, São
Paulo, 1985.
SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil 1900-1990. Edusp, São
Paulo, 2002.
SCOTT, Geoffrey. The Architecture of Humanism. London
Company LTD, 1935 (1ª. Ed. 1914).
SOUZA, Abelardo Riedy de. Arquitetura no Brasil: Depoimentos.
Diadorim/EDUSP, São Paulo,1978.
SUMMERSON, John. El lenguaje clasico de la arquitectura – De
Alberti a Le Corbusier. Edit. Gustavo Gili, Barcelona, 1984.
UNDERWOOD, David. Oscar Niemeyer e o modernismo de formas
livres no Brasil. Cosac & Naify, São Paulo, 2002.
XAVIER, Alberto (org.). Depoimento de uma geração: arquitetura
moderna brasileira. Cosac Naify, São Paulo, 2003.
WITTKOWER, Rudolf. La arquitectura em la edad del Humanismo.
Editorial Nueva Vision, Buenos Aires, 1958 (1ª. Ed. 1949).
Teses e dissertações
CONSTANTINO, R. A. A obra de Abelardo de Souza. Dissertação de
Mestrado, FAUUSP, 2004.
ALBUQUERQUE, R. A. Uma Escola de Arquitetura – FAUUSP: edifícios e
ensino. Dissertação de Mestrado, FAUUSP, São Paulo, 2004.
BASTOS, M. A. J. Dos anos 50 aos anos 70: Como se completou o
projeto moderno na arquitetura brasileira. Tese de Doutorado,
FAUUSP, São Paulo, 2004.
CORONA, Eduardo. Princípios fundamentais de composição na
Arquitetura brasileira. Tese para Catedra em “Teoria da Arquitetura”,
FAUUSP, 1957.
FERRAZ, Á. R. F. Marcas do Moderno na Arquitetura de Bauru.
Dissertação de Mestrado, EESC-USP, São Carlos, 2003.
PONTES, A.P.G.Diálogos silenciosos: arquitetura moderna brasileira e
tradição clássica. Dissertação de mestrado, PUC-RJ, 2004.
SANTOS, L. C. Arquitetura Paulista em torno de 1930-40. Mestrado.
FAUUSP, São Paulo, 1985.
Revistas e periódicos
Acrópole: n. 03, 97, 99, 100, 103, 104, 106, 108, 114, 117, 131, 132, 137,
155, 171, 180, 184, 186, 195, 209, 216, 223, 225, 226, 228, 236, 264, 269,
298, 316, 327, 363.
AB Arquitetura Brasileira: n. 8.
AD Arquitetura e Decoração: n. 2, 6, 14.
Arquitetura e Engenharia: n. 16.
196
AU Arquitetura e Urbanismo n. 76.
Habitat: n. 20, 39.
Módulo: n. 4, 19.
Revista Politécnica n. 119, 120, 121, 122 e 125.
Artigos e Mídias eletrônicas
LOTUFO, Zenon. Planejamento e Lazer. Publicado no Jornal de
Botucatu, em 14 de fevereiro de 1981.
LOTUFO, Zenon. Arquitetura – A Casa. Publicado no Jornal de
Botucatu,em 13 de junho de 1981.
LOTUFO, Zenon. Municípios Pobres. Publicado no Jornal de
Botucatu, em 22 de setembro de 1982.
NIEMEYER, Oscar. Conversa de arquiteto. Publicado no jornal
Folha de São Paulo, em 16 de julho de 2006, caderno A, p. 3.
MARTINS, C. A.F. “Construir uma arquitetura, construir um país”
em Da Antropofagia à Brasília 1920-1950. Catálogo de exposição
MAB/FAAP, Cosac Naify, São Paulo, 2002, p. 373-383.
FOUCALT, Michel. O que é a crítica? (Qu'est-ce que la
critique?)Bulletin de la Société française de philosophie, Vol. 82,
nº 2, pp. 35 - 63, avr/juin 1990 (Conferência proferida em 27 de
maio de 1978). Tradução de Gabriela Lafetá Borges e revisão de
Wanderson Flor do Nascimento. Em
<http://www.unb.br/fe/tef/filoesco/foucault/critique.html>
SANTOS, Roberto E. . Disciplina e Legitimação do Conhecimento
de artigo eletrônico em
<http://www.arquitetura.ufmg.br/ia/disciplinalegitimidade.html>
FUÃO, Fernando F. Brutalismo, a última trincheira do movimento
moderno. em
<http://www.romanoguerra.com.br/arquitextos/arq000/esp036.a
sp>
<http://www.vitruvius.com.br >
http://www.usp.br/fau/fau/histórico
Índices
Índice de arquitetura brasileira, 1950/70. Pesquisa e coordenação:
Eunice R. Ribeiro Costa e Maria Stella de Castilho, Universidade de
São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, 1974.
Lista de figuras
As respectivas informações das reproduções iconográficas estão
relacionadas nas páginas onde as mesmas aparecem, contendo número
da imagem e fontes, situando-se ou imediatamente abaixo da figura, ou
abaixo do título do projeto mencionado.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo