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imóvel vai revelando as diversas posições que passam em sua frente. Na arquitetura, é o espectador que se move por
meio de uma série de fenômenos dispostos cuidadosamente, os quais são observados com seu “senso visual”. Em 1923,
com o manifesto The Montage of Attractions, Eisenstein propõe uma nova gramática cinematográfica, posteriormente
aplicada em seu filme Strike (1924) e, de forma primorosa, em sua obra-prima Encouraçado Potemkin (1925) marcada
pela justaposição de tomadas conflituosas, que funcionariam como palavras e sentenças dotadas do máximo poder de
persuasão. Estudando os experimentos de montagem de Lev Kuleshov, Eisenstein se convenceu que no cinema pode-se
manipular tempo e espaço para a criação de novos significados, principalmente se não há ligação entre as imagens, mas
justaposição como seu colega russo havia sugerido. Kuleshov montou um grande plano expressivo composto pela
recorrente justaposição da mesma imagem do rosto de um ator e diferentes situações cênicas: rosto, prato de sopa,
rosto, caixão de criança, rosto, mulher semi-nua em pose sensual. Ao projetar o plano para uma audiência, constatou-se
que a platéia partilhava da opinião de que se tratava de um ótimo ator, capaz de expressar de modo intenso os
sentimentos de fome, dor e desejo. Para Kuleshov, estava provado que o significado de uma seqüência é dado por
relações subjetivas que cada espectador imprime às imagens e planos, os quais, individualmente não carregam qualquer
significação.
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Para além do contato com Vito Acconci, artista reconhecido pelas proposições de contundência política, de extrema
relevância não só para a reflexão sobre a arte, mas sobre relações entre cultura e espaço público (Acconci, 1981),
Tschumi teve grande proximidade com a cena artística na década de 1960. Nela uma tônica determinante era a
experiência do corpo e a redescoberta dos sentidos, pela redefinição nas obras de termos como espaço, tempo e sujeito.
No contexto novaiorquino, Tschumi teve contato seja com artistas (do experimentalismo dos happenings até a arte
conceitual - Victor Burgin, David Salle, Robert Long e Cindy Sherman), seja com críticos de arte (Douglas Crimp, Craig
Owens, Kate Linker) (Walker, Tschumi, 2006: 22).
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Em Six Concepts, (1991, republicado em 1994b: 227-260) Tschumi reporta a introdução do termo “evento” em sua
reflexão à influência do discurso situacionista e dos eventos de maio de 1968. A teoria, os mapas e as proposições
urbanas da Internacional Socialista indicavam que a arquitetura deveria tornar-se um instrumento para “situações
construídas” (“Situação construída: momento da vida, concreta e deliberadamente construído pela organização coletiva
de uma ambiência unitária e de um jogo de acontecimentos” - Jacques, 2003: 65). A construção de “espaços de
liberdade” e de questionamento, que os situacionistas propunham com a ativação de fragmentos da cidade pelo
deslocamento segundo afinidades eletivas e interesses comuns é também uma questão cara a Tschumi. Por fim, ao tomar
a arquitetura como ação estratégica e não tanto como fabricação de objetos, interessa a ele o dispositivo do
détournement (desvio) empregado pelos situacionistas como possibilidade de transformação do existente (Grossman,
Sperling, Tschumi, 2007).
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No mesmo período, chamava a atenção de Tschumi a atividade dos grupos coletivos de arquitetos italianos Archizoom e
Superstudio, que compuseram o Movimento Radical que germinava em torno da Faculdade de Arquitetura de Florença e
da revista Domus nos anos 1960 e, posteriormente nos anos 1970, também em torno da revista Casabella. Com projetos
de “situações extremas”, estes grupos tencionavam “verificar para onde o sistema estava indo” (Tschumi in Damiani,
2003: 19). No Stop City Residential Parkings Climatic Universal System, proposição de Archizoom, é realizado em 1969
como um projeto-manifesto crítico composto por uma instância textual e outra imagética que caminham em paralelo e
dialogam por justaposição. Este projeto expõe criticamente a dupla condição da arquitetura de meio privilegiado para o
seguro desenvolvimento do sistema (otimização funcional) e de signo para esse mesmo desenvolvimento (construção do
imaginário). Em última análise, apresenta uma cidade sem arquitetura em decorrência da perda de unidade do projeto e
dos conflitos latentes entre a cidade e a arquitetura e entre a arquitetura e o mundo dos objetos (Branzi in Schaik, Mácel,
2005: 182). Superstudio apresenta o Continuous Monument no mesmo ano de 1969, como um modelo de urbanização
total por meio de um monumento contínuo, uma arquitetura sem cidade. Uma arquitetura utilizada para auto-crítica dos
paradigmas sobre os quais se movia a disciplina, um modelo usado como um “catalisador intelectual em um processo de
liberação de todas as ‘arquimanias’” (Natalini in Schaik, Mácel, 2005: 186). O Monumento Contínuo foi concebido como
uma forma de arquitetura que emerge de um igualmente “único e contínuo meio-ambiente: o mundo provido
uniformemente pela tecnologia, pela cultura e por todas as outras formas inevitáveis de imperialismo” (Continuous
Monument, 1969; Superstudio in Schaik, Mácel, 2005: 186).
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Reconhecido pelas idéias e proposições experimentais, as quais construiu em pequeno número, o arquiteto inglês
Cedric Price é comumente referenciado – inclusive por Tschumi - por seu projeto do Fun Palace, para o East Side de
Londres, realizado nos primeiros anos da década de 1960. Seu trabalho apontava para Tschumi, ainda estudante, que era
possível realizar uma arquitetura mais “arquitetural” e menos “arquitetônica”, isto é, “projetar as condições para a
arquitetura mais que condicionar projetos” (Tschumi in Damiani, 2003: 19). Price foi um dos nomes de destaque na
arquitetura dos anos 1960 e 1970, período em que o tema do “espaço flexível” – a impermanência, a temporalidade, a
dinâmica do espaço - era, em muitos matizes, uma das tônicas da experimentação em arquitetura, no qual o grupo
Archigram e os Metabolistas Japoneses foram protagonistas. Price graduou-se na Architectural Association em 1955,