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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL
CLÁUDIA NOVELLI DE MACEDO
COMUNICAÇÃO E COMPLEXIDADE:
O DISCURSO ORGANIZACIONAL E O PODER DA CIA ZAFFARI
PORTO ALEGRE
2009
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CLÁUDIA NOVELLI DE MACEDO
COMUNICAÇÃO E COMPLEXIDADE:
O DISCURSO ORGANIZACIONAL E O PODER DA CIA ZAFFARI
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre
em Comunicação Social, pelo Programa
de Pós-Graduação em Comunicação
Social da Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul.
Orientador: Prof. Dr. Roberto Ramos
PORTO ALEGRE
2009
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CLÁUDIA NOVELLI DE MACEDO
COMUNICAÇÃO E COMPLEXIDADE:
O DISCURSO ORGANIZACIONAL E O PODER DA CIA ZAFFARI
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre
em Comunicação Social, pelo Programa
de Pós-Graduação em Comunicação
Social da Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul.
APROVADA PELA BANCA EXAMINADORA
Porto Alegre, 15 de janeiro de 2009.
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________
Orientador: Prof. Dr. Roberto Ramos
_____________________________________________
Profª. Drª. Mariângela Toaldo (ESPM)
_____________________________________________
Profª. Drª. Maria Beatriz Rahde (PUCRS)
Dedico este trabalho à Opus Assessoria e Promoções Ltda. por
ter me dado a oportunidade de conhecer, criar e produzir muitas das
ações organizacionais da Cia Zaffari.
O mercado de trabalho, na área de Comunicação Social, carece
de mais empresas que valorizem a Comunicação, assim como faz a
Cia Zaffari há mais de 20 anos.
Inúmeras vezes pude emocionar-me, mesmo na correria que é o
trabalho de Produção de Eventos, com os Concertos Comunitários
Zaffari, realizados na igreja de Passo Fundo ou de Caxias do Sul,
bem como no grande concerto de Natal realizado no Parcão, que
contou com a presença de Fafá de Belém ou Milton Nascimento.
Também foi emocionante assistir a catarse de um passante na
Feira do Livro de Porto Alegre, ao se deparar com as músicas
clássicas, instrumentadas por quartetos formados pela orquestra da
PUCRS. Igual sentimento ocorreu com a alegria das crianças ao
receber um abraço e um balão do ícone da Cia, o Esquilo.
Sem falar nas premiações aos ginetes ganhadores do Freio de
Ouro, competição o linda e valorizada pelo povo do Rio Grande do
Sul e de fora do Estado ou País. A marca Zaffari se faz presente na
Expointer há muitos anos.
Por fim, ajudei a inaugurar um teatro, o Teatro do Bourbon
Country, um lugar importante da cultura, que hoje recebe inúmeros
artistas e toca tão profundamente os porto-alegrenses.
Essas experiências marcam de forma complexa a minha Cultura,
modificando a minha capacidade de sentir e fazendo com que eu
consiga transformar em ciência uma “Partedo Discurso e do Poder
que o “Todo” da Cia Zaffari emana.
AGRADECIMENTOS
Palavras não o suficientes para agradecer ao Mestre, Professor Doutor
Roberto Ramos, que me fez acreditar que a construção do conhecimento tamm
deve ser prazerosa. Nas horas de angústia e de dúvidas sobre os meus próprios
limites, ele sempre teve uma palavra de carinho e incentivo, ensinando-me que
podemos dar aquilo que nos é possível em determinado momento, sem nunca
menosprezar o esforço ou desacreditar na vontade.
Obrigada, Professor Roberto!
Agradecer ao amor da minha vida, Andi, companheiro no significado mais
completo desta palavra. Meu incentivador, que me deu muitas caronas de idas e
vindas à biblioteca, às orientações, ao xérox. Assim como eu, acredita na Educação,
corre atrás do aperfeiçoamento e, quem sabe, daqui uns dias, será um belíssimo
mestre de Direito. Eu faço fé!
Obrigada! Amo você, meu amor!
Aos meus queridos pais, que sempre contribuíram financeiramente e
afetivamente para que eu pudesse me tornar uma pessoa melhor, uma profissional
mais competente. Eu sou uma parte do todo que vocês formaram com tanta
competência. Espero continuar tecendo este tapete com a mesma excelência.
Obrigada, Mama e Pai!
Aos meus avós, que sempre valorizaram o estudo, a formação e os títulos.
Também por vocês, findo a quarta etapa pela busca da aprendizagem intelectual.
Obrigada, vó Eva! Obrigada, vô José!
RESUMO
Nesta dissertação, estudaremos o Discurso Organizacional da Cia Zaffari nas
suas interfaces com a Comunicação e o Poder. Buscaremos, em especial, a análise
da forma como uma organização imprime seu Poder na comunidade onde está
inserida, através de seu discurso e ação comunicacionais. Consideradas como
elementos-chave na reconfiguração da ordem social, as organizações passam a ser
estudadas a partir de um olhar multidimensional que busca contemplar o
emaranhado de relações e a Complexidade na qual estão inseridas. Em decorrência
das abordagens contemporâneas dos estudos organizacionais e dos desafios
encontrados na vida organizacional, a comunicação assume papel de alta
relevância. Abraçando o Princípio Sistêmico ou Organizacional, o presente trabalho
organizar-se-á a partir da abordagem consolidada no Paradigma da Complexidade,
de Morin, destacando os pressupostos do todo e das partes onde, estas interagem
para a compreensão da Complexidade dos elementos. Inserimos a Cia Zaffari como
o todo e as suas cinco peças gráficas e veiculadas, de títulos: cartaz 20 anos dos
Concertos Comunitários Zaffari, anúncio Semana Farroupilha 2008, VT Anjos, VT
Natal 2007 e VT Dia das Mães 2007, como recortes ou partes deste todo. Já, a
Semiologia, de Barthes, foi escolhida como Técnica Metodológica, resultando numa
Pesquisa Semiológica. A fundamentação teórica, a priori, revela a Comunicação, de
Morin, juntamente com a subcategoria Cor, de Farina. Aparecem, tamm, as
categorias Sujeito e Organizações, de Morin, Poder, Cultura e Socioleto, de Barthes.
Além, da categoria aposteriori, “Fait Divers”, tamm de Barthes. Com base em tais
pressupostos, teóricos e metodológicos, a Dissertação busca compreender, via
Comunicação, como o Discurso Organizacional da Cia Zaffari está imbuído de
produção de sentido (verbal e não-verbal) e de aspectos complexos. Além disso, nos
permitimos transformar a análise do intangível, que são as falas das peças, em
análise científica, dando profundidade para categorias que se encontram e se
fundem.
Palavras-chave: Comunicação. Complexidade. Poder
ABSTRACT
In this dissertation, we will study the Organizacional Speech of the Cia Zaffari
in its interfaces with the Communication and the Power. We will search, in special,
the analysis of the way as an organization prints its Power in the community where
she is inserted, through its comunicational speech and action. Considered as key
elements in the reconfiguration of the social order, the organizations start to be
studied from a multidimensional view that it aims to contemplate the tangled relations
and the Complexity in which they are inserted. In result of the contemporaries
approach of the organizational studies and the challenges found in the
organizacional life the communication assumes role of high relevance. Embracing the
Sistêmic Principle or Organizacional, the present work will organize from the
approach consolidated in the Paradigm of the Complexity, of Morin, emphasising
the assumption of all and the parts where, these interact for the understanding of the
Complexity of the elements. We insert the Cia Zaffari as all and its five graphical and
propagated parts, of headings: poster 20 years of Communitarian Concerts Zaffari,
announcement Week Farroupilha 2008, Angels VT, Christmas VT 2007 and Mothers
day VT 2007, as clippings or parts of this whole thing. Already, the Semiology, of
Barthes, was chosen as a metodological Technique, resulting in a Semiologic
Research. The theoretical fundamentetion, a priori, reveals the Communication, of
Morin, together with the subcategoria Color, of Farina. They appear, also, the
categories Subject and Organizations, of Morin, Power, Cultura and Socioleto, of
Barthes. Besides, of the category aposteriori, “Fait Divers”, also of Barthes. Based on
those assumptions, theorical and metodologycal, the Dissertation aims to
understand, through Communication, as the Organizacional Speech of the Cia felt
Zaffari is impregnated of production of sense (verbal and not-verbal) and of complex
aspects. Besides that, we allow in them to transform the analysis of the intangible
one, that are the speeches from the plays, in scientific analysis, giving depth for
categories that meet themselves and getther.
Keywords: Communication. Complexity. Power.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................8
2 ORGANIZAÇÕES E A CIA....................................................................................12
2.1 TECIDOS DE UMA CIA: DIMENSÕES TEÓRICAS E METODOLÓGICAS........24
2.2 O CAMINHO DA COMPLEXIDADE: PERFIL DE EDGAR MORIN .....................41
2.3 O CAMINHO DA SEMIOLOGIA: PERFIL DE ROLAND BARTHES ....................53
3 UM OLHAR ORGANIZACIONAL SOBRE O DISCURSO DA CIA ZAFFARI .......59
3.1 CARTAZ 20 ANOS DOS CONCERTOS COMUNITÁRIOS ZAFFARI.................59
3.2 ANÚNCIO ALUSIVO À SEMANA FARROUPILHA .............................................70
3.3 VT “ANJOS” ........................................................................................................82
3.4 VT “NATAL”.........................................................................................................92
3.5 VT “DIA DAS MÃES”.........................................................................................102
4 EVIDÊNCIAS PROVISÓIRAS..............................................................................110
REFERÊNCIAS.......................................................................................................115
ANEXO A – CARTAZ 20 ANOS CONCERTOS COMUNITÁRIOS ZAFFARI........120
ANEXO B – ANÚNCIO ALUSIVO À SEMANA FARROUPILHA ...........................121
ANEXO C – VT ANJOS ..........................................................................................122
ANEXO D – VT NATAL ..........................................................................................123
ANEXO E – VT DIA DAS MÃES.............................................................................124
ANEXO F – ÍCONE CIA ZAFFARI..........................................................................125
8
1 INTRODUÇÃO
O Discurso Organizacional da Cia Zaffari, de alguma maneira, parece nos
inspirar, à medida que se mistura à nossa trajetória profissional. O processo de
Produção de Eventos nos fez refletir, por ocaso da experiência na Opus
Promoções Ltda. Por meio da Comunicação, agregamo-nos de outras bagagens, até
chegar a este ponto original.
Nesse caminho, considerando a complexidade que assinala nossa caminhada
como trajetória, partimos das vivências acadêmicas e profissionais proporcionadas.
Buscamos, em cada experiência, desenvolver olhares que nos permitam refletir
sobra a realidade que nos rodeia, ou aquilo que, de alguma forma, acompanha a
nossa mudança como elementos de uma determinada situação. Inspirados nas
andanças da nossa vida, optamos por desenvolver um olhar a partir de um ponto
que tem caráter próprio: o Discurso Organizacional da Cia Zaffari, como fenômeno
complexo que perpassa a peça publicitária e/ou ação organizacional e atinge o
estudo semiológico, transformando-se em ciência.
Dirigidos por este espírito que tende a resumir a soma do todo e das partes,
as Organizações tem apresentado, em diferentes momentos e das formas mais
diversas, um recorte possível de observação, sob enfoque da Comunicação
Organizacional. Porém, neste estudo, o nosso interesse está na compreensão, via
complexidade, do Discurso Organizacional de uma empresa e, em especial, na
tamanha força de que este está imbuído. O objetivo desta pesquisa é estudar a
discursividade da Cia Zaffari, por intermédio do sentido verbal e o-verbal, a fim de
compreender e explicar o Discurso Organizacional da Cia Zaffari, analisando peças
publicitárias gráficas e veiculadas.
As peças serão apresentadas na forma de uma descrição, rica em detalhes e,
posteriormente, analisadas de acordo com as cinco categorias: Organizações,
Comunicação e Sujeito, de Edgard Morin, e Poder, Cultura e Socioleto, de Roland
Barthes. A Organização somará para explanarmos a história da Cia Zaffari e de que
forma ela se vende por meio da produção de sentido; a Comunicação para justificar
9
o recorte das peças publicitárias e suas particularidades; o Sujeito para explicitar a
forma que a Cia aborda o consumidor; o Poder para justificar por que a produção de
sentido o instrumentaliza; a Cultura para entendermos a valorização do gaúcho pela
Cia Zaffari; e o Socioleto para entender de que forma se singulariza por intermédio
do discurso. Estas classificações eleitas levam em conta os caminhos que
desejamos percorrer, que são as teorias de dois autores-âncoras, Morin e Barthes.
Respaldamo-nos no método do Paradigma da Complexidade, de Morin, e na
técnica de Pesquisa Semiológica, de Barthes. A escolha do Paradigma da
Complexidade propõe abraçar a natureza Transdisciplinar dos temas relacionados
nesta dissertação, pois a estrutura do pensamento moraniano é pautada pela
epistemologia da Complexidade, que compreende os pressupostos do todo e das
partes, sendo que estas interagem para a compreensão dos elementos.
A Semiologia, de Barthes, será a técnica utilizada para a análise das peças ou
recorte. Este conjunto de processos, os quais acompanharão os conhecimentos
científicos e serão utilizados na investigação e na transformação da realidade,
advém de ciência geral, que tem como objeto todos os sistemas de signos. Barthes
(1996) afirma que a Semiologia “é a ciência geral dos signos, que estuda todos os
fenômenos de significação. Tem por objeto os sistemas de signos das imagens,
gestos, vestuários, ritos, etc”.
Para embarcarmos numa viagem até o objeto deste ensaio, a Cia Zaffari e
seu discurso, precisaremos fazer algumas paradas em importantes estudiosos da
Administração Científica. Isso tudo para que a história de como foram criadas as
primeiras organizações/empresas seja compreendida e, enfim, também, possam ser
entendidas que relações e quais intertextos e exemplos a família Zaffari tomou para
si na administração de seus negócios.
A dissertação estará organizada em duas partes: a primeira fará um resgate
bibliográfico por meio de dois capítulos. O primeiro capítulo, intitulado “Organizações
e a Cia”, resgatará a história das Organizações e da Cia Zaffari. O segundo capítulo,
com o título “Um olhar Organizacional sobre o Discurso da Cia Zaffari”, abordará o
Paradigma da Complexidade e a Pesquisa Semiológica. A segunda parte constará
10
de cinco subtítulos, um para cada tipo de peça escolhida, peças gráficas e
propagandas veiculadas em televisão, para descrição e análise.
Empregaremos, no decorrer do estudo, a Primeira Pessoa do Plural, para
manter coerência com o método eleito, o Paradigma da Complexidade, que
estabelece o diálogo entre o eu” e o “outro”. Fazendo, assim, com que esta
produção acadêmico-científica seja resultado da união de orientador, autor,
pensadores, organização, peças, banca e futuro leitor. O texto e análise não findam
em si mesmos, mas são processos de troca de compreensão mútua.
Conforme Buber e Heidegger (1997, p. 1405-1406),
O Diálogo como atitude própria do homem é a capacidade de se dirigir e de
responder ao outro como igual, para com ele estabelecer uma relação. [...]
Toda existência humana é, em certo sentido, dialógica ou dialogal, mesmo
previamente ao uso da palavra. [...] o diálogo supõe a superação do
individualismo-egoísmo e a superação da vontade do sistema. [...] O
Diálogo, mais do que a simples presença do outro, supõe interação; o outro
é mais do que a soma de todos os seus aspectos e mesmo mais do que
essa totalidade – ele é antes o infinito de uma proposta sempre renovada.
As nossas questões de pesquisa para a presente dissertação serão: De que
forma a Comunicação da Cia Zaffari se particulariza?; Por que a produção de
sentido instrumentaliza o Poder?; Como a Cia Zaffari valoriza a Cultura gaúcha?; De
que maneira o discurso organizacional aborda o Sujeito, enquanto consumidor?;
Como as Organizações Zaffari se vendem por meio da produção de sentido? e De
que forma o Socioleto se singulariza?
As respostas a estas questões m como objetivo: compreender e explicar a
discursividade da Cia Zaffari, por intermédio de algumas de suas peças publicitárias
(cartaz comemorativo aos 20 anos dos Concertos Comunitários Zaffari, cartaz
alusivo à Semana Farroupilha, VT Anjos”, VT Natal” e VT “Dia das Mães”).
Contemplando as categorias Comunicação e Sujeito, de Morin, Poder, Cultura e
Socioleto, de Barthes, costuram-se uma Pesquisa Semiológica e os pressupostos do
Paradigma da Complexidade, de Morin, e da Semiologia, de Barthes. A fim de
destacar as categorias citadas, as sua iniciais aparecem com a letra maiúscula,
facilitando leitura e compreensão, e, principalmente, dando vazão aos seus valores.
11
A nossa formação em Relações Públicas leva-nos a fazer escolhas de forma
natural, ou seja, primeiro acreditamos numa causa e, quando nos damos conta, ela
já faz parte de nós. O abraço à história da Cia Zaffari deu-se dessa forma. Com a
prática de produção de eventos, iniciamos o convívio com a cultura do grupo Zaffari,
deste “entremear”, surgiu a admiração e, após, a constatação de que a teoria vista
nas disciplinas da nossa formação se materializam no pensamento e nas ações
comunicacionais desta empresa gaúcha.
Para um profissional de Comunicação, não há alegria maior do que conseguir
tornar públicos e notórios valores que, muitas vezes, o intangíveis e para os quais
uma maioria de empresas e profissionais não a importância necessária e de
direito.
12
2 ORGANIZAÇÕES E A CIA
O presente trabalho organizou-se a partir da abordagem consolidada no
Paradigma da Complexidade, de Morin, destacando-se os pressupostos do todo e
das partes, sendo que estas interagem para a compreensão da Complexidade dos
elementos.
A dissertação está dividida em duas partes: a primeira fará um resgate
bibliográfico, por meio de dois capítulos. O primeiro capítulo, intitulado “As
Organizações e a Cia Zaffari”, resgata a história das Organizações e da Cia Zaffari.
O segundo capítulo, com o título Complexidade e Pesquisa”, aborda o Paradigma
da Complexidade e a Pesquisa Semiológica. A segunda parte consta de dois
capítulos, um para cada tipo de peça escolhida, peças gráficas e propagandas
veiculadas em televisão, para descrição e análise.
As peças são apresentadas na forma de uma descrição, rica em detalhes e,
posteriormente, analisadas de acordo com as cinco categorias: Organizações,
Comunicação e Sujeito, de Morin, e Poder, Cultura e Socioleto, de Barthes, eleitas
para este fim. Isso porque levam em conta os caminhos que desejamos percorrer,
que são as teorias de dois autores-âncoras, Morin e Barthes.
Logo, a pesquisa proposta estuda o Discurso Organizacional da Cia Zaffari,
perpassando pelo verbal e não-verbal, por meio de peças gráficas e televisivas,
respaldando-se no método do Paradigma da Complexidade, de Edgar Morin, e na
técnica de Pesquisa Semiológica, de Barthes.
As nossas questões de pesquisa, para a presente dissertação, o: De que
forma a Comunicação da Cia Zaffari se particulariza por meio da Cor?; Por que a
produção de sentido instrumentaliza o Poder?; Como a Cia Zaffari valoriza a Cultura
gaúcha?; De que maneira o discurso institucional aborda o Sujeito, enquanto
consumidor?; Como as Organizações Zaffari se vendem por meio da produção de
sentido? e De que forma o Socioleto se singulariza?
Os nossos objetivos se dividem em Geral e Específico, sendo o primeiro
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estudar a discursividade da Cia Zaffari, por meio de sentido verbal e o-verbal,
utilizando o Paradigma da Complexidade e a Semiologia e disponibilizando uma
pesquisa semiológica. o Específico é compreender e explicar o discurso
institucional da Cia Zaffari em duas peças gráficas dos anos de 2007 e 2008 e em
duas peças veiculadas nos anos de 2007 e 2008, por intermédio das categorias
Organizações, Comunicação e Sujeito, de Morin, e Poder, Cultura e Socioleto, de
Barthes.
O objeto de pesquisa é a Comunicação Organizacional da Cia Zaffari,
percebida pela análise de peças publicitárias (cartaz comemorativo dos 20 anos dos
Concertos Comunitários Zaffari, cartaz alusivo à Semana Farroupilha VT “Anjos” e
VT “Natal 2007”), utilizando-se as categorias Comunicação e Sujeito, de Morin,
Poder, Cultura e Socioleto, de Barthes, costurando assim uma Pesquisa
Semiológica.
Para embarcarmos numa viagem até o objeto deste ensaio, a Cia Zaffari e
seu discurso, precisaremos fazer algumas paradas em importantes estudiosos da
Administração Científica, para que a história de como foram criadas as primeiras
organizações/empresas seja compreendida e, enfim, também, compreender que
relações e quais intertextos e exemplos a família Zaffari tomou para si na
administração de seus negócios.
O primeiro autor, a ser citado, é Taylor (1990), que foi o iniciador da eficiência
industrial, sendo chamado o “Pai da Organização Científica do Trabalho”. Ele
contribuiu, de forma eficaz, para o desenvolvimento industrial do século XX.
Quando entrou na Bethlehem Steel Works, ims-se o dever de aperfeiçoar
os métodos dos diversos setores da fábrica. Lutou para aplicar as conclusões de
suas experiências, o que conseguiu após vencer incompreensões. Ampliou aquelas
experiências e, ajudado por um grupo de companheiros, fez a completa
reorganização da empresa, obtendo enorme êxito no terreno administrativo. Três
anos mais tarde, Taylor fazia somente com 140 homens o trabalho, que, antes,
necessitava de 400 a 600.
14
Com Taylor, da mesma forma que com a direção da fábrica na atualidade, o
custo do tempo era uma ferramenta usada para aumentar a eficiência global da
fábrica, tornando possível pagamento de maiores salários para a mão-de-obra e
preços mais baixos para o consumidor de produtos acabados. Em 1900, começou a
revelar ao país êxitos que conseguiria obter, dizendo que todos os administradores
podiam conseguir o mesmo, desde que adotassem os princípios científicos que ele
defendia.
em 1911, em virtude de um inquérito sobre as consequências dos
métodos de Taylor nos trabalhos do arsenal de Watertown e de diversas discussões
na Interstate Commerce Commission a respeito do sucesso de seus trabalhos em
oficinas ferroviárias, vieram os trabalhos de Taylor a interessar os membros da
Sociedade e o público em geral.
Nos três “mandamentos” da experiência de Taylor (1990): atribuir a cada
operário a tarefa mais elevada que lhe permitissem as aptidões, solicitar a cada
operário o máximo de produção que se pudesse esperar de um trabalhador hábil de
sua categoria e que cada operário, produzindo a maior soma de trabalho, tivesse
uma remuneração adequada, ou seja, 30 a 50 por cento superior à média dos
trabalhadores de sua classe, está contida a principal orientação dos trabalhos de
Taylor obtenção de mão-de-obra econômica, retribuída, entretanto, com salários
mais elevados.
A contribuição real de Taylor para a indústria foi seu método científico,
substituindo processos rotineiros por outros, deduzidos de análises prévias. Sua
atitude crítica e suas constantes investigações das causas proporcionaram-lhe um
lugar privilegiado, que o mantém como precursor da Ciência da direção. Foi, ao
mesmo tempo, um descobridor da aplicação da Ciência àquela fase da produção
que afeta intimamente o trabalhador. Compreendeu que se tratava de problemas
humanos, assim como materiais e mecânicos, e, em suas investigações, levou em
conta os aspectos psicológicos, quando estudava o elemento humano.
Mayo (1959) trabalhava com outras realidades, ainda que a sua sede
material fosse, também, o grande estabelecimento fabril. O esforço humano é, para
15
ele, a consequência de fatores que não se descobrem na peça individual clássica.
Mayo chega, por ali, à conclusão de que o conhecimento desses fatores permite
modificar a produtividade individual.
Até esse ponto, o que Mayo fez pôde interessar ao grande empresário de
1933, como os planos de racionalização de Taylor interessaram ao de 1890, e pelas
mesmas razões. Mas o professor de Harvard recorreu a outros caminhos, vedados
ao engenheiro de Germantown. Mayo remontou a história do pensamento político
liberal e acusou de estar divorciado de conteúdo social; saiu do recinto da fábrica e,
quase sem transição, investigou a capacidade do homem para se organizar, para
coexistir a desorganização social, que ele considerou característica da civilização
industrial, e a profunda ignorância em que a humanidade tinha vivido diante das leis
que governavam o esforço humano e as trocas sociais (MAYO, 1959).
Entre Taylor e Mayo, houve outras iniciativas que vão marcando etapas na
história da Sociologia Industrial. Entre elas, as principais são: o Health of Munition
Workers Commitee, em 1915; o Industrial Fatigue Research Board, em 1917; o
National Institute of Industrial Psychology, em 1921 todos eles na Grã-Bretanha.
Depois, o Laboratório da Fatiga, na Universidade de Harvard; o chamado
experimento de Hawthorne, hoje considerado um clássico, que inicia nos
estabelecimentos da Western Eletric Company, em Chicago, em 1926 ambos nos
Estados Unidos (MAYO, 1959).
A necessidade de incrementar a produção durante a Primeira Guerra Mundial
moveu o governo da Grã-Bretanha a investigar as condições da produtividade dos
obreiros industriais.
A Grande Depressão, tamm, chamada por vezes de Crise de 1929, foi uma
grande recessão econômica que teve início em 1929 e que persistiu ao longo da
década de 1930, terminando apenas com a Segunda Guerra Mundial. A Grande
Depressão é considerada o pior e o mais longo período de recessão econômica do
século XX. Este período causou altas taxas de desemprego, quedas drásticas do
produto interno bruto de diversos países, bem como quedas drásticas na produção
industrial, nos preços de ações e em praticamente todo medidor de atividade
16
econômica, em diversos países no mundo.
A onda de prosperidade, que precede a bancarrota de 1929, criou um clima
favorável, nos Estados Unidos, para investigações prolongadas, como o experimento
de Hawthorne, que persistiu durante vários anos. Abertas as comportas do
conhecimento, a grande crise paralisa estes estudos, porque se havia
compreendido que a indústria obtivera deles um benefício material.
O pensamento de Mayo (1959) excede, folgadamente, os limites técnico-
profissionais da Sociologia Industrial. A tese, sustentada pelo autor, de que os
problemas sócio-industriais se apresentam com iguais características nos países
com regimes políticos muito distintos, deve, pois, ser recebida e analisada, levando-
se em conta todos os antecedentes pessoais. O que Mayo descobre e o que
resulta muito significativo – é que a atitude do homem frente ao trabalho e as
relações entre o obreiro e o administrador têm certas características, que se repetem
no estabelecimento americano e soviético.
Fazendo a primeira parada da nossa viagem, após termos percorrido os
tempos e iias de Taylor e Mayo, seguimos o percurso, para compreender o
desenvolvimento tanto de conceitos coloquiais, como de práticas das organizações
enquanto empresas voltadas ao lucro.
Quando procuramos categorizar as Organizações, dois aspectos são,
amplamente, trabalhados pela maioria dos autores: o ato e efeito de “organizar”, que
é uma das funções da administração; e o uso do termo “Organização”, como
expressão de um agrupamento planejado de pessoas que desempenham funções e
trabalham, conjuntamente, para atingir objetivos comuns.
Outra preocupação dos estudiosos é destacar as possíveis diferenças entre
Organizações e Organizações Sociais, entre instituições e organizações formais ou
complexas e, ainda, entre instituições e organizações, como sistemas abertos,
dentro da teoria dos sistemas.
Chiavenato (2000, p. 143) tem duas concepções para o mesmo termo:
17
“Organização, como unidade ou entidade social, na qual as pessoas interagem entre
si, para alcançar objetivos específicos” e “[...] organização, como função
administrativa e parte do processo administrativo”.
Hoje, o termo organizações” já se tornou comum, para denotar as mais
diversas modalidades de agrupamentos de pessoas, que se associam,
intencionalmente, para trabalhar, desempenhar funções e atingir objetivos comuns,
com vistas de satisfazer alguma necessidade da sociedade.
Para Weber (1982, p. 291), a Organização
[...] é um sistema de atividade contínua e intencional de um tipo específico.
Uma organização, dotada de personalidade jurídica, é uma relação social
associativa, caracterizada por um quadro administrativo, que se dedica a essa
atividade contínua e intencional.
São inúmeras as organizações, cada uma perseguindo os seus próprios
objetivos, dotadas de características próprias, com uma estrutura interna, que lhes
possibilita alcançar os objetivos propostos, mas dependentes, como subsistema, de
inúmeras interferências do ambiente geral, numa perspectiva sistêmica.
As organizações sempre existiram, desde o início da humanidade. No mundo
contemporâneo, paralelamente aos paradoxos e à Complexidade vigente, um
aumento significativo de novas organizações, que surgem para atender às
crescentes demandas sociais e mercadológicas, desencadeadas, muitas vezes, pela
perspicácia dos agentes do mercado competitivo, os quais estão atentos às
oportunidades e às ameaças do ambiente global e organizacional.
Com o objetivo de conquistar novos espaços e até sobreviver, criam as mais
diversas e inovadoras organizações. O segmento de serviços é um bom exemplo
para constatação de tal realidade.
Esse conjunto diversificado de Organizações é que pode viabilizar todo o
18
funcionamento da sociedade e permite a satisfação de necessidades sicas, como
alimentação, saúde, vestuário, transporte, salário, lazer, segurança e habitação.
Também, as nossas necessidades sociais, culturais e de qualidade de vida são
atendidas por meio de e nas organizações. Enfim, valemo-nos delas, para
sobreviver, para nos realizar, para sermos felizes.
Mesmo virtualmente, no contexto da revolução tecnológica da informação, o
homem está dependendo das Organizações. São elas, por exemplo, que
possibilitam as operações “on-line”, por meio da rede mundial de computadores. Ou
seja, ainda que o homem moderno não precise mais passar a maior parte do seu
tempo dentro das organizações, continuará dependendo delas, para operacionalizar
as suas ações e se conectar com o mundo nas mais diferentes frentes.
As origens e a evolução das organizações se fundamentam na natureza
humana. O homem, como ser social, necessita do seu semelhante, para satisfazer
as suas necessidades e completar-se, o que é possível mediante uma interação
de pessoas que buscam alcançar resultados pela conjugação de esforços.
Littlejohn (1982) enfatiza a necessidade vital da cooperação humana para a
existência efetiva de uma Organização. Por meio dessa cooperação, as capacidades
individuais podem coligar-se, para realizar tarefas complexas e ordenadas. Ele
considera que, em primeiro lugar, as pessoas são vistas como seres ativos, dotados
de motivos e propósitos.
As pessoas estão, contudo, severamente, limitadas em suas capacidades de
realização. Existem limitações biológicas, situacionais e sociais, para o que uma
pessoa pode fazer sozinha. Somente pela interação pode ocorrer a necessária
cooperação.
Fazemos a segunda parada, após conhecermos o tema das
organizações/empresas, suas relações de trabalho e de que forma foram se
desenvolvendo, por meio dos tempos e dos desafios encontrados, para, finalmente,
chegarmos ao destino principal: a Cia Zaffari.
A história da Companhia Zaffari começou nos anos 30, como a de tantas
19
outras empresas brasileiras, graças à iniciativa de um pequeno núcleo familiar.
Em 1935, na região norte do Rio Grande do Sul, o fundador, Francisco José
Zaffari, e sua esposa, Santina de Carli Zaffari, montaram uma pequena casa de
comércio. Era um armazém de neros alimentícios, instalado na frente da
residência do casal, na Vila Sete de Setembro, interior do município de Erechim.
Desde o começo, Francisco demonstrou empenho para esse ramo de
atividade, obtendo progressos e passando a oferecer melhores produtos e serviços
a seus clientes. Anos mais tarde, em 1947, mudou-se com a família para Erval
Grande, cidade sede do distrito, onde abriu uma nova casa comercial, já mais
estruturada. Os filhos desempenharam papel fundamental nesse crescimento,
auxiliando o pai na administração do negócio.
Na década de 50, os negócios prosperaram, e a família pôde inaugurar as
primeiras filiais em localidades vizinhas à sede do distrito. Em 1960, a empresa
chegou a Porto Alegre, abrindo o seu primeiro estabelecimento de comércio na
capital, um atacado. Esse foi o ponto de partida para uma nova etapa de expansão,
que resultou na abertura da primeira loja de varejo de auto-serviço, em 1965.
Hoje, a Companhia Zaffari possui uma rede de supermercados e
hipermercados no Rio Grande do Sul, além de shopping centers, sendo um deles em
São Paulo.
Desde a década de 80, atua, também, na industrialização e comercialização
de alimentos, com a fábrica de café e biscoitos Haiti/Plic-Plac (CIA ZAFFARI, 2008).
Em termos de números, o grupo conta, hoje, na sua rede de supermercados
Zaffari, com 14 lojas, localizadas em Porto Alegre, Passo Fundo e Caxias do Sul,
somando 1.850 funcionários; na rede de hipermercados, com 13 de lojas,
localizados em Porto Alegre, Canoas, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Caxias do Sul
e Passo Fundo, totalizando 4.400 de funcionários; na rede shopping centers
Bourbon, com 8 lojas, situadas em Porto Alegre, Canoas, Passo Fundo, Novo
Hamburgo e São Leopoldo (CORÁ, 2007).
20
Na lista dos novos empreendimentos, conta, desde junho de 2007, com um
teatro, localizado dentro do Bourbon Country, em Porto Alegre, com capacidade de
1.100 lugares, tendo a parceria da Opus Promoções, responsável pela operação e
planejamento cultural; e, desde março deste ano, com o Shopping Bourbon
Pompéia, em São Paulo. Em 2009, inaugurará mais um teatro, este localizado
dentro do Bourbon Pompéia.
A arquitetura das lojas está voltada para o bem-estar do cliente.
corredores amplos e bem sinalizados, iluminação especial nas gôndolas, para que
os produtos possam ser bem visualizados, sistemas modernos de refrigeração e
ventilação, elementos decorativos, como madeira e plantas, para criar um ambiente
mais aconchegante, com a intenção de parecer com a casa de cada cliente. O
treinamento dos colaboradores está direcionado para a total satisfação do cliente. É
essa orientação que garante um padrão de atendimento diferenciado (CIA ZAFFARI,
2008).
Tal padrão de atendimento foi premiado, em 2007, pela Associação Brasileira
de Recursos Humanos, que deu o título de Personalidade Top Ser Humano ao
Diretor-Presidente da Cia Zaffari, Sr. Marcelo Zaffari, falecido no mês de outubro de
2008.
O Café Haiti e biscoitos Plic-Plac, tamm, fazem parte da história da Cia.
Duas tradicionais marcas gaúchas que, desde 1986, vêm sendo fabricadas pelo
Grupo Zaffari. Instalada em Porto Alegre, a indústria tem equipamentos e equipe
especializada na torrefação e moagem de café e na fabricação dos biscoitos tipo
grissini. A indústria Haiti/Plic-Plac comercializa os seus produtos em todo o Rio
Grande do Sul - Brasil.
Engajada com os projetos sociais, a Cia aniversaria 20 anos dos Concertos
Comunitários Zaffari, hoje, sua maior e mais antiga ação comunitária. Desde 1987, a
Companhia Zaffari oferece à população eventos que ajudem a difundir a música
erudita e popular. Os espetáculos são realizados em parques, igrejas, praças e
estacionamentos das lojas da rede (CIA ZAFFARI, 2008). Os espetáculos
apresentam obras de mestres da música clássica, popular e contemporânea, por
21
meio do coral e da orquestra do Instituto de Cultura Musical da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, sob a coordenação do maestro
Frederico Gerling Júnior. Entre músicos, maestros, arranjadores, coral, corpo de
baile e pessoal de montagem dos espetáculos, uma equipe de cerca de 300
pessoas é mobilizada na produção de cada evento (CIA ZAFFARI, 2008).
Participante de todos os Concertos Zaffari e das demais ações sociais que a
Cia promove durante todo o ano, o Esquilo é o ícone da Cia. Esse é o animalzinho
que a Zaffari escolheu como seu mbolo. Ele aparece ao lado do nome Zaffari,
traduzindo o espírito organizado e a preocupação com a qualidade, que
caracterizam a empresa. Devido à grande simpatia que o Esquilo criou com as
crianças, futuros clientes das redes Zaffari e Bourbon, a Cia criou o Clubinho do
Esquilo.
O Clubinho do Esquilo de Culinária Infantil é um lugar organizado,
especialmente, para as crianças. Com a orientação da professora Rosaura Fraga, a
turminha aprende a fazer comidas de verdade, sanduíches, doces, sucos e muitas
outras delícias.
A Cia Zaffari se muniu de muitos profissionais, para, hoje, conseguir
transformar o seu discurso e as suas ações em projetos coesos e reconhecidos.
Neste momento, citaremos, então, os principais braços” desta empresa tão grande:
Luiz Coronel o homem que introduziu a poesia na publicidade; Agência Matriz -
responsável por toda criação gráfica, de áudio e de vídeo e a Opus Assessoria e
Promoções Ltda. – produtora cultural responsável por todas as ações da Cia.
A Agência Matriz foi fundada em 2000, com a união de três sócios: Alberto
Freitas, Luiz Coronel e Roberto Philomena. A proposta de trabalho foi clara. Fazer
Comunicação com ética, envolvimento comunitário e respeito ao consumidor.
O alvo das campanhas é a satisfação das pessoas, as quais consomem os
produtos que o anunciados. Quando a agência e o cliente definem, claramente,
essa estratégia de ação, todas as ferramentas empregadas e as iniciativas adotadas
ganham uma nova origem e um único fim: cativar pessoas (AGÊNCIA MATRIZ,
22
2007).
A base dos planejamentos estratégicos da Agência Matriz é o respeito e a
informação. Respeito pelo consumidor, pelo mercado, pelos clientes e pela
comunidade. O dia-a-dia é a maior fonte de inspiração e informação. O
conhecimento formal e as pesquisas são fundamentais, mas não refletem a
realidade, sem a experiência direta (CORONEL, 2007).
O processo de construção e manutenção da imagem das marcas passa pela
busca de um diferencial sólido e real. Algo que o consumidor possa identificar como
“verdade” na sua experiência com a marca, produto ou serviço. Isso o
embasamento necessário que fortifica a Comunicação, gerando uma relação de total
confiança. E não há nada mais valioso para uma marca do que essa confiança.
A Opus Assessoria e Promoções Ltda. é a produtora cultural que realiza todos
os projetos da Cia Zaffari, desde inaugurações das lojas até lançamento de livro na
Academia Brasileira de Letras.
três décadas, atuando na área de produção cultural no Rio Grande do Sul,
a Opus Promoções é, hoje, considerada uma das maiores empresas realizadoras de
eventos no Estado, com ações culturais, sendo referência de qualidade junto a
artistas e produtores nacionais e internacionais. Com todo este “know-how”, uma
equipe formada por profissionais especializados e estruturada para atender a cada
tipo de evento, a OPUS propõe-se a atuar como extensão de seus parceiros,
criando, assessorando e produzindo toda uma série de ações e eventos em suas
diversas etapas: Criação, Planejamento, Assessoria, Produção, Cotação e
Intermediação junto a fornecedores e prestadores de serviço, Execução, Supervisão
e Relatórios Finais.
A empresa trabalha com diferentes segmentos, apresentando uma ampla
atuação no setor de eventos. Proporciona, assim, momentos de arte ao participar da
história da cena cultural brasileira.
18 anos, a Opus realiza o planejamento e a produção da rie Concertos
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Comunitários Zaffari – principal projeto desenvolvido na área cultural pela Cia Zaffari
Comércio e Indústria, em parceria com o Instituto de Cultura Musical da PUCRS. O
projeto, consolidado junto à comunidade do Rio Grande do Sul, ao levar a música
erudita e popular a milhares de pessoas, realiza, em média, 20 apresentações por
ano, em várias cidades gaúchas, como Porto Alegre, Canoas, Novo Hamburgo, São
Leopoldo, Caxias do Sul, Carlos Barbosa e Passo Fundo (OPUS PROMOÇÕES,
2008).
A Opus, também, realiza o planejamento, formatação e execução de projetos
de publicações, exposições, CDs. Entre outros projetos, podemos citar: Dicionário
Mário Quintana (incluindo CD com poemas de Quintana por Luiz Coronel), RBS
Publicações O Negrinho do Pastoreio, Eduardo Vieira da Cunha livro e
exposição, Ado Malagoli livro e exposição, Érico Veríssimo 100 anos dicionário
verbetes com CD O Tempo e O Vento, Laçador exposição itinerante,
acompanhada de catálogo sobre a obra de Caringi e Esquina Elis Regina.
A Opus Promoções é uma empreendedora de realizações culturais, artísticas
e eventos. O trabalho, desenvolvido durante a sua trajetória, que, em 2006,
completou 30 anos, e a relação com os seus parceiros conferem credibilidade ao
conceito formado nos mercados em que atua.
Portanto, a escolha do estudo a partir do discurso organizacional da Cia
Zaffari vislumbra aprofundar os conhecimentos da prática da fala e ação
institucionais da empresa. Isso porque, na atual conjuntura das organizações, a
principal preocupação não passa somente pelos resultados dos números, e sim pela
satisfação dos clientes, credibilidade da empresa, relacionamentos com os públicos-
alvos e outras questões.
Nossa formação em Relações Públicas, a íntima relação de trabalho já
realizada com a Cia Zaffari e a crença de que esta organização optou pelo caminho
acertado em termos de Comunicação Organizacional, fazem-nos acreditar que
outras podem realizar um grande percurso comunicacional.
Todas estas justificativas unidas nos levaram a estudar a discursividade da
24
Cia Zaffari, por meio de sentido verbal e o-verbal, utilizando-se do Paradigma da
Complexidade e da Semiologia e disponibilizando uma pesquisa semiológica.
Este estudo poderá nos levar a compreender o discurso institucional da Cia
Zaffari, analisando algumas peças gráficas e de audiovisual do ano de 2007 e 2008,
por intermédio das categorias previamente delimitadas.
2.1 TECIDOS DE UMA CIA: DIMENSÕES TEÓRICAS E METODOLÓGICAS
Como primeira categoria escolhida, destacamos a Comunicação, em Morin,
que aparece unida à reflexão sobre o conhecimento, quando este possibilita uma
visão de mundo diferenciada da tradicional. Para entender como tudo começou,
precisamos levar em conta os critérios científicos.
[...] Se houvesse esse tipo de reflexão nas emissões dos programas
científicos, acho que os cidadãos estariam mais aptos para considerar o
caráter complexo, surpreendente, misterioso, assustador e maravilhoso do
universo no qual vivemos. Porém, acho que primeiro devemos compreender
o seguinte: os humanos precisam de uma visão de mundo; é por isso que
existe uma avalanche científica, pericientífica, paracientífica na imprensa,
nos jornais etc. As pessoas precisam se alimentar de ciência. Antes, elas
buscavam esse alimento nas religiões e nos mitos, compreendem? [...]
(MORIN, 1996, p. 93).
É possível considerarmos que a maneira de ver a Comunicação baseia-se em
aspectos que envolvem comportamento de quem busca elementos culturais não
localizados em outros meios, antes facilmente localizáveis, para, a partir daquele
meio saciar a própria visão de mundo. Mesmo que pareça, aos olhos dos cientistas,
que essa maneira de ver o mundo é algo periférico, é preciso perceber que o mundo
das idéias o se restringe a eles e tampouco às categorizações por eles
estabelecidas. Seguramente “[...] as idéias podem ser partilhadas, comunicadas, na
língua natural.” (MORIN, 2006, p. 94).
A Comunicação o é um processo simplificador, mas carrega a tarefa de
aproximar culturas e pessoas, conforme aponta Morin (1996, p. 94): “Eles precisam
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de Comunicação entre uma cultura científica e uma cultura humanista (filosofia) e da
Comunicação com a cultura dos cidadãos, que passa pela Mídia. Tudo isso exige
esforços consideráveis das três culturas e também dos cidadãos.”
Morin (2001) defende que não uma única Globalização (ou
modernização?), mas duas que são ligadas e antagônicas. E que fenômenos
quase que ambivalentes, como o desenvolvimento das Comunicações. O autor
explica que o desenvolvimento destas Comunicações, sobretudo nos últimos anos,
com o fax, o celular, a internet e a comunicação instantânea em todos os pontos do
planeta, é um fenômeno notável no sentido de que pode ter efeitos muito positivos,
que permitam comunicar, entender e intercambiar informações.
Mas o autor alerta-nos para não confundir Comunicação e compreensão,
porque, para Morin (2001), a primeira categoria se refere à informação que chega
até as pessoas ou grupos, que podem entender o que significa tal informação. a
compreensão, detalha o autor, é um femeno que mobiliza os poderes subjetivos
de simpatia para entender uma pessoa que é tamm Sujeito.
A Comunicação, na concepção do autor, encontra-se relacionada ao seu
sentido etimológico, significando, consequentemente, compartilhar, tornar comuns os
signos compreendidos como sinônimo de informação. Esses signos apresentam,
devido ao seu caráter ambivalente, aspectos positivos, como “[...] facilidade de
comunicar, entender e intercambiar informações.” (MORIN, 2001, p. 42).
Podemos refletir, portanto, que vivemos, hoje, “num planeta de tantas
Comunicações e pouca compreensão [...]”, conforme Morin (2001, p. 43), ou seja, de
nada adianta tanta tecnologia de informação e Comunicação, se muito pouco é
compreendido. O autor nos ensina, então, que, para haver, verdadeiramente, o
fenômeno da Comunicação, precisa, necessariamente, haver compreensão entre as
partes ou Sujeitos.
Após, Morin (2001) nos explica que, tanto na Psicologia Social, como nos
Meios de Comunicação, existem princípios básicos, os quais poderiam ser
chamados de uma potica de Comunicação: procurar uma Comunicação profunda
com o outro; procurar a forma de um diálogo e procurar transformar a assimilação do
26
espectador em compreensão. Ele pode abandonar facilmente o seu egocentrismo e
etnocentrismo no imaginário: então ele se interessará, verdadeiramente, pelo outro.
Posteriormente à escolha da categoria Comunicação, surgiu a necessidade
de, tamm, incluirmos a categoria Cor, pois esta é uma constante nas peças de
comunicação institucional da Cia Zaffari. Para nos auxiliar no aprofundamento desta
categoria, optamos pelo autor Farina (2003, p. 101), que conceitua Cor como: “[...]
uma realidade sensorial à qual não podemos fugir. Além de atuarem sobre a
emotividade humana, as cores produzem uma sensação de movimento, uma
dinâmica envolvente e compulsiva [...]”
O autor nos ensina que é comum, entre os que utilizam esse tipo de
linguagem na comunicação humana, a classificação das Cores em frias e quentes.
Mas, mais do que isso, salienta que é necessário, primeiramente, sanar um
inconveniente: as reações que uma mesma Cor pode ocasionar e que derivam, às
vezes, da utilização que dela pretendemos fazer.
Farina (2003) continuidade, esclarecendo que, se o indivíduo pensa,
consciente ou inconscientemente, em uma Cor em relação a determinado uso que
irá fazer dela, é evidente que sua reação não é diante da Cor em si, mas em função
de algo. Isso porque os costumes sociais, por exemplo, são fatores que intervêm nas
escolhas das Cores.
Farina (2003) explicita que a preferência pela Cor, geralmente, denuncia
indivíduos com mais abertura a estímulos exteriores; é privilégio de pessoas
sensíveis, que se deixam influenciar, e que estão propensas à desorganização e a
oscilações emocionais. No entanto, as reações à forma indicam, ao contrário, o
temperamento frio, controlado, introspectivo.
No caso da Cia Zaffari, optamos pela categoria Cor, por ser, amplamente,
utilizada, fazendo companhia ao discurso institucional. A escolha foi, porém,
essencialmente, pensada em termos de logotipia, que é verde, branca e vermelha,
fazendo uma alusão às Cores da Itália, já que estamos tratando de uma organização
oriunda de uma família genuinamente italiana.
27
A segunda categoria escolhida foi Poder. Para Barthes (1996), o Poder é uma
Libido dominante, uma energia prazerosa. Ele não depende apenas da política, da
sociedade; o Poder existe onde o homem existe. Envolve o prazer, a capacidade de
realização. A dominação dialoga com a questão prazerosa.
O Poder está presente nos mais finos mecanismos do intercâmbio social: não
somente no Estado, nas classes, nos grupos, mas, ainda, nas modas, nas opiniões
correntes, nos espetáculos, nos jogos, nos esportes, nas informações, nas relações
familiares e privadas, e até mesmo nos impulsos liberadores que tentam contestá-lo:
“[...] chamo discurso de Poder todo discurso que engendra o erro e, por conseguinte,
a culpabilidade daquele que o recebe.” (BARTHES, 1996, p. 11).
O Poder é eterno, e a razão dessa resistência e dessa ubiquidade é que este
é o parasita de um organismo trans-social, ligado à história inteira do homem, e não
somente à sua história política, histórica. Esse objeto, em que se inscreve o Poder,
desde toda a eternidade humana, é a linguagem ou, para ser mais preciso, sua
expressão obrigatória: a língua (BARTHES, 1996).
A linguagem é uma legislação, e a língua é seu código. Falar, e com maior
razão, discorrer, não é comunicar, como se repete com demasiada frequência, é
sujeitar: toda ngua é uma reição generalizada (BARTHES, 1996).
A língua, como desempenho de toda linguagem, o é nem reacionária, nem
progressista; ela é simplesmente: fascista, pois o fascismo o é impedir de dizer, é
obrigar a dizer. Assim que ela é proferida, mesmo que na intimidade mais profunda
do sujeito, a língua fica a serviço de um Poder (BARTHES, 1996).
A categoria Poder foi escolhida por nós, a fim de tornar evidente a justificativa
de tamanho sucesso das campanhas publicitárias da Cia Zaffari, entre as quais
optamos por peças com discursos, exclusivamente, institucionais.
A Cia Zaffari nos apresenta em sua história discursiva sabedoria na utilização
dos sentimentos mais bonitos do ser humano, suas atividades do dia-a-dia, os seus
sonhos e necessidades, ou seja, de maneira sutil, esta organização se tornou
especialista no que tange o discurso institucional. O discurso da Cia Zaffari vem
28
impregnado do Poder de tocar os mais íntimos sentimentos de seu público, da
sensação de felicidade em volta da família, da amizade mais profunda e verdadeira,
do valor da figura materna, do carinho com os que queremos bem.
As peças publicitárias chegam aos consumidores de forma terna, singela e
inofensiva, trazendo ao público uma maneira diferente e prazerosa de vender
produtos variados, que é o seu objetivo final. Dessa forma, o discurso institucional da
Cia Zaffari se transformou num marco em fazer propaganda publicitária, em colocar
o discurso institucional antes do discurso da simples e pura compra de produtos.
Trouxe, então, um discurso carregado de identificação com os sujeitos que irão
consumir seus produtos e serviços, um discurso carregado de prazer, o prazer pelo
Poder.
A terceira categoria, que nos auxiliará no caminho de aprofundamento do
discurso organizacional da Cia Zaffari, é Cultura. Barthes (1971b) defende que a
Cultura se sincretiza na maresia do quotidiano, é o conjunto infinito das leituras, das
conversas ainda que sob a forma de fragmentos prematuros e mal compreendidos
em resumo, o Intertexto, que faz pressão sobre um trabalho e bate à porta para
entrar.
Decodificamos como Intertexto materializando os nós que unem o evento da
linguagem ao evento social. Barthes caracteriza o Intertexto como o banco de
influências, das fontes, das origens de uma obra e de um autor (BARTHES, 1971b).
A noção de Intertexto tem, primeiramente, um conteúdo polêmico: ele serve
para combater a Lei do contexto.
O contexto (em filosofia, em crítica, em linguística) é sempre um caminho
positivo redutor, legal, composto segundo as exigências do racionalismo: o contexto
é, em suma, um objeto assimlico. Deve-se pensar em quem quer que seja que é
invocado no contexto: se explorar um pouco encontrar-se-á sempre nele uma
resistência ao símbolo, uma assimbologia. O Intertexto, que não é, há que repeti-lo,
o banco das influências, das fontes, das origens a quem se faz comparecer uma
obra, um autor, é muito mais amplamente e a um outro nível, o campo em que se
29
cumpre aquilo a que Sollers chamou, soberbamente, e de uma forma indelével (no
seu artigo sobre Dante), de travessia da escrita: é o texto enquanto atravessa e é
atravessado (é reconhecida nesta equivalência do ativo e do passivo a palavra
própria do inconsciente) (BARTHES, 1971b, p. 93).
Barthes (1994 apud RAMOS, 2007, p. 9) caracteriza o discurso como a
reivindicação do zelo do resgate etimológico: Discursus é, originalmente, a ação de
correr para todo o lado, são idas e vindas, marches, intrigas.” Discurso é um
transitar obsessivo pelos signos, num sentido em que Mallarmé observa, também,
uma divagação, que revela e encobre.
A Cultura, portanto, na qual o discurso está inserido, é uma prática
linguageira, que não se esgota na dimensão linguística; abrange como intertexto
uma dimensão social, que parece se esmiuçar, igualmente, em uma abordagem
psicanalítica. A Cultura condensa, em seu silêncio, as noções de alteridade e de
identificação (BARTHES, 1999).
A categoria Cultura foi escolhida para fazer parte deste estudo, por razões
bem explícitas: o discurso da Cia Zaffari evidencia as influências de seu texto de
duas formas, o sentimento em torno da família e a valorização da Cultura gaúcha.
A família Zaffari, conforme nos referimos na justificativa deste trabalho,
iniciou seus trabalhos em um pequeno mercado no interior do Rio Grande do Sul.
Família de origem italiana, com muitos filhos, na qual o trabalho é supravalorizado,
todos trabalhavam juntos, cada qual auxiliando de alguma forma: no caixa, na
limpeza, na colocação de produtos nas caixas do armazém, entre outros. Os valores
religiosos, familiares e de trabalho são a essência de qualquer família de origem
italiana da década de 30.
No discurso organizacional da Cia Zaffari de hoje, muitos anos se passaram,
mas as origens, as influências, o intertexto desta época e dos valores arraigados
continuam lá. Mesmo que repaginados, em linguagem moderna, lindas imagens,
mas a essência continua lá.
30
A Cia Zaffari, em sua abordagem discursiva, traz à tona a importância da
família, dos bons sentimentos, do melhor que a vida tem a oferecer e da forma que
acredita ser a seguida: união e carinho entre as pessoas. Valorização ao ser
humano, às artes, à cultura, à popularização de ações de música a todos os
públicos, sendo seus consumidores ou não, no caso dos Concertos Comunitários
Zaffari, por exemplo.
No que se refere à Cultura gaúcha, a Cia Zaffari é uma das grandes
patrocinadoras do evento Freio de Ouro, maior evento de valorização das tradições
gaúchas, que acontece, anualmente, na Expointer – Esteio.
As propagandas em TV, rádio e jornal valorizam o sentimento do povo
gaúcho, desde sempre conhecido como bairrista, apaixonado e orgulhoso de sua
terra. O blico consumidor se identifica então com uma organização que, além de
vender produtos, vende sentimentos e valores, os quais a comunidade rio-
grandense sente prazer em explorar.
A quarta categoria é Sujeito. O Sujeito, em Morin (2001, p. 129-130), possui
uma configuração ditada pela singularidade: “[...] cada indivíduo é um sujeito único e
original, não por ser um indivíduo, mas por existir a partir de um intertexto, que é
próprio a sua vida [...]”
Assim, o Sujeito é a parte e o mundo, o todo. Ele tem as possibilidades de
“Auto-organização e de Reorganização”, adverte Morin (2001). É a capacidade de se
“transformar sempre, de manter a sua identidade”. O sujeito moriniano está
estruturado na perspectiva da complexidade. Isso ocorre devido à sua lógica de
formulação, comprometida, sobretudo, com os Princípios do Pensamento Complexo,
que estipulam o dialogismo entre as partes e o todo.
Ainda, Morin (2001) nos faz deduzir que a categoria, em sua singularidade,
não está descolada de uma antecedência, subjacente e implícita. É concebida a
partir de Althusser, para o qual o sentido de Sujeito convive com a dialética da
liberdade e da submissão.
31
Morin (1999, p. 64-65) dimensiona a importância do Conhecimento. Ele
observa que o Conhecimento está no próprio ser, porquanto “nascer é conhecer”.
Também pormenoriza:
[...] Conhecimento é necessariamente: tradução de signos/símbolos e em
sistemas de signos/símbolos; construção, ou seja, tradução construtora a partir de
princípios/regras, que permitem construir sistemas cognitivos, articulando
informações/signos e símbolos; solução de problemas, a começar pelo problema
cognitivo de adequação da construção tradutora à realidade, que se trata de
conhecer [...].
A conjugação da ação de conhecer está relacionada à linguagem. Não é uma
tradução qualquer, mas uma “tradução construtora”, aparelhada de
“princípios/regras”. Precisa ter a capacidade de revelação e a autocapacidade do
seu relativismo, porque o real, em toda a sua extensão e profundidade, é indivisível.
Tal Antítese aparenta dispor de uma Síntese, por meio do Dialogismo, quando
os opostos encontram os seus vértices de diálogo. Também, a Reintrodução tem
importância, concebendo o Conhecimento como um processo, que envolve o objeto
e o sujeito. Assim, conhecer é viver, e vice-versa. A equivalência e a reciprocidade
de sinomínia instauram o conhecer-viver, como o todo, em interação com as partes.
São os vários lados, tecidos pela Complexidade.
A intenção de adicionarmos a categoria Sujeito na abordagem deste ensaio
foi de esclarecer se o Sujeito, enquanto consumidor da Cia Zaffari, é interpretado
como significado ou significante (verbal e o-verbal) do discurso institucional desta
organização. O Sujeito, enquanto consumidor, é único em si, pelas suas vivências,
sua sapiência e, ao mesmo tempo, por fazer parte de um grupo denominado
consumidores da Cia Zaffari.
Esta concepção de todo e parte faz do processo discursivo/comunicacional de
qualquer organização que tenha um processo difícil. Ao mesmo tempo em que a Cia
precisa atingir o maior número de pessoas possível com seu discurso, ela precisa
atingir, unicamente, cada um dos seus Sujeitos consumidores”, para o sentimento
32
desta parte se sentir parte de um todo.
O Sujeito, enquanto consumidor da Cia Zafffari, é abordado em dois
elementos da Semiologia, significado e significante. E a maneira com que a Cia
Zaffari faz este trabalho é simples: os seus discursos são sempre acompanhados de
imagens de pessoas de todos os tipos e cores: criança, mãe, velho, negro, ruivo,
interagindo em tarefas cotidianas e de prazer, por exemplo, passeando num parque,
namorando, comprando, sentados em volta da mesa em uma refeição, entre outros.
O Sujeito, enquanto consumidor e “significado”, é colocado de forma clara e
consciente em uma representação da vida, das coisas boas que se faz ou que se
gostaria de fazer. enquanto “significante”, o consumidor é trazido por intermédio
do consciente das imagens do significado, ao inconsciente e imaginário.
Ponderamos, então, que a soma de significado e significante do discurso da
Cia Zaffari pode levar o Sujeito enquanto consumidor a, primeiramente, se sentir
único, para somente assim se sentir uma parte deste todo de consumidores de
produtos e serviços Zaffari. Conforme defende Morin acima, o Sujeito se mune de
signos e símbolos que instrumentalizam uma tradução construtora de sentido.
A quinta categoria é Organização. Para Morin, um sistema constitui-se de
partes interdependentes entre si, que interagem e tranformam-se, mutuamente.
Desse modo o sistema o sedefinível pela soma de suas partes, mas por uma
propriedade que emerge deste seu funcionamento. O estudo, em separado, de cada
parte do sistema não levará ao entendimento do todo. Tal lógica se contrapõe ao
método cartesiano analítico, que postulava, justamente, o contrário.
Nessa perspectiva, o todo é mais do que a soma das partes. Da Organização
de um sistema, nascem propriedades emergentes que podem retroagir sobre as
partes. Por outro lado, o todo é, tamm, menos que a soma das partes, uma vez
que tais propriedades emergentes possam, também, inibir determinadas qualidades
das partes.
Imaginamos uma tapeçaria contemporânea. Ela comporta fios de linho, seda,
33
algodão, lã de cores variadas. Para conhecê-la, seria interessante conhecer as leis e
os princípios, relativos a cada uma dessas espécies de fio. Contudo, a soma dos
conhecimentos sobre cada tipo de fio, que compõe a tapeçaria, é insuficiente, para
conhecer essa nova realidade que é o tecido (ou seja, as qualidades e propriedades
dessa tessitura). É, também, incapaz de nos auxiliar no conhecimento de sua forma
e configuração.
Na tapeçaria, como nas Organizações, os fios não estão dispostos ao acaso.
Estão organizados em função da talagarça, isto é, de uma unidade sintética na qual
cada parte contribui para o conjunto. A tapeçaria é um fenômeno que pode ser
percebido e conhecido, mas não pode ser explicado por nenhuma lei simples.
Uma Organização, como a empresa, está situada num mercado. Produz
objetos ou serviços coisas que saem dela e entram no universo do consumo. Mas
se limitar a uma visão heteroprodutiva da empresa seria insuficiente, pois, ao
produzir coisas e serviços, ela, ao mesmo tempo, se autoproduz. Isso significa que
produz todos os elementos necessários à sua sobrevivência e à Organização. Ao
organizar a produção de objetos e serviços, a empresa se auto-organiza,
automantém-se, autorrepara-se se necessário, e, se as coisas não vão bem,
autodesenvolve-se, enquanto desenvolve sua produção.
Desse modo, ao produzir produtos independentes do produtor, a empresa
desenvolve um processo no qual o produtor produz a si mesmo. De um lado, sua
autoprodução é necessária à produção de objetos; de outra parte, a produção de
objetos é necessária a sua própria produção (MORIN, 2006).
Conforme Morin (2006), a Complexidade surge neste enunciado: aquele que
produz coisas produz, ao mesmo tempo, a si próprio; o produtor é o seu próprio
produto. Tal enunciado suscita um problema de causalidade.
Primeiro ângulo: causalidade linear. Se com tal matéria-prima, aplicando tal
processo de transformação, é produzido tal objeto de consumo, a causalidade é
linear: tal causa gera tais efeitos.
34
Segundo ângulo: causalidade circular ou retroativa. Uma empresa precisa ser
regulada. Deve produzir em função das necessidades externas, de sua força de
trabalho e de capacidades internas de energia. mais ou menos 40 anos que
sabemos, graças à Cibernética, que o efeito (boas ou más vendas) pode retroagir,
para estimular ou desestimular a produção de objetos e serviços por uma empresa.
Terceiro ângulo: causalidade recursiva. No processo recursivo, os efeitos e os
produtos são necessários ao processo que os produz. O produto é o produto daquilo
que o produz.
Essas três causalidades são encontradas em todos os níveis das
Organizações complexas. A sociedade, por exemplo, é produzida pelas interações
dos indivíduos que a constituem. Na condição de um todo organizado e
organizador, a própria sociedade retroage, para produzir os indivíduos por meio da
educação, linguagem e escola. Assim, em suas interações, os indivíduos produzem
a sociedade, e esta produz os indivíduos que a produzem. Tudo isso acontece num
circuito em espiral, por meio da evolução histórica.
Para compreender a sociedade dessa maneira, necessitamos de uma
mudança bastante profunda em nossas estruturas mentais. Se tal mudança não
ocorrer, existe o risco de caminharmos para a confusão ou para a recusa dos
problemas. o existe de um lado o indivíduo, do outro a sociedade; de uma parte a
espécie, de outra os indivíduos; de um lado a empresa, com seu organograma,
programa de produção, avaliações de mercado, e de outra parte os seus problemas
de relações humanas, de pessoal, de relações públicas. Os dois processos são
inseparáveis e interdependentes. Na condição de organismo vivo, a empresa se
auto-organiza e se autoproduz. Ao mesmo tempo, ela faz auto-eco-organização e
auto-eco-produção (MORIN, 2006).
A empresa situa-se num meio exterior, o qual, por sua vez, faz parte de um
sistema eco-organizado ou ecossistema. Consideramos o exemplo das plantas e
animais: seus processos cronobiológicos conhecem a alternância do dia e da noite e
das estações do ano. A ordem cósmica está no interior da Organização das
espécies vivas.
35
Nós, humanos, conhecemos o mundo por meio das imagens que nossos
sentidos transmitem ao cérebro. O mundo está presente em nossa mente, a qual,
por sua vez, está presente no mundo.
A visão simplificada diria que a parte está contida no todo. A visão complexa
diz que não a parte está no todo, como este está no interior das partes, que, por
sua vez, estão dentro do todo. Trata-se de algo diferente da concepção confusa de
que tudo está em tudo e vice-versa.
Isso é verdadeiro para cada lula do nosso organismo, que contém a
totalidade do código genético do nosso corpo. É, tamm, verdadeiro para a
sociedade: desde a infância ela se imprime como totalidade em nossa mente, por
meio da educação familiar, escolar e universitária.
Estamos diante de sistemas, extremamente, complexos, nos quais a parte
está no todo e este está nela. Isso é válido para a empresa que tem as suas normas
de funcionamento, sendo que dentro dela atuam as leis de toda a sociedade.
Uma empresa se auto-organiza no seu mercado. O mercado é um fenômeno,
ao mesmo tempo, ordenado, organizado e aleatório. É aleatório porque não existe
absoluta certeza sobre as hipóteses e possibilidades de venda de produtos e
serviços, mesmo que existam possibilidades, probabilidades, plausibilidades de que
isso aconteça. O mercado é uma mistura de ordem e desordem (MORIN, 2006).
As Organizações precisam de ordem e de desordem. Num Universo em que
os sistemas sofrem o aumento da desordem e tendem a se desintegrar, sua
Organização permite que eles captem, reprimam e utilizem a desordem. Qualquer
fenômeno físico, organizacional e vivo tende a degradar-se e a degenerar. A
decadência e a desintegração constituem fenômenos normais. Não seria normal, e
sim inquietante, se as coisas não se modificassem com o tempo. Não existe
nenhuma receita de equilíbrio (MORIN, 2006).
A única forma de lutar contra a degeneração é a regeneração constante, isto
é, a aptidão do conjunto da organização, para se regenerar e se reorganizar
36
enquanto enfrenta os processos de desintegração (MORIN, 2006).
A sexta e última categoria a priori é Socioleto, categoria esta que faz a
“amarração” de todo o percurso de categorias que fizemos até aqui. Para Barthes
(1999), o caráter principal do campo socioletal é que nenhuma linguagem lhe pode
ficar exterior; toda palavra é, fatalmente, incluída em determinado Socioleto. Essa
injunção tem uma consequência importante para o analista: ele próprio é envolvido
no jogo dos Socioletos.
Em outros casos, essa situação não impede, absolutamente, a observação
científica: é o caso do linguista que deve descrever um idioma nacional, isto é, um
campo de que nenhuma linguagem escapa (nem mesmo a sua). Mais precisamente:
o idioma é um campo unificado (só uma língua francesa), quem fala dele não é
obrigado a estar situado nele (MORIN, 1999).
Em contrapartida, o campo societal se explica pela divisão, pela secessão
inexpiável, e é nessa divisão que deve tomar lugar a alise. Disso resulta que a
pesquisa socioletal (que, ainda, não existe) não pode ser começada, sem um ato
inicial, fundador, de avaliação (quiséramos entender essa palavra no sentido crítico
que Nietzsche soube lhe dar) (MORIN, 1999).
Barthes (1999) explica que isso significa que não podemos despejar todos os
Socioletos (todos os falares sociais), quaisquer que sejam, qualquer que seja o seu
contexto político, num vago corpus indiferenciado, cuja indiferenciação, igualdade,
seria uma garantia de objetividade, cientificidade. Temos de recusar aqui a adiaforia
da ciência tradicional, temos de aceitar ordem paradoxal aos olhos de muitos
que sejam os tipos de Socioletos que comandem a análise, e não o inverso: a
tipologia é anterior à definição.
Precisamos, ainda, que a avaliação não se reduza à apreciação: cientistas
muito objetivos se atribuíram o direito (legítimo) de apreciar os fatos que descreviam
precisamente o que faz F. Brunot com a Revolução Francesa); avaliar é um ato
não subsequente, mas fundador; não é um procedimento “liberal”, mas, ao contrário,
violento: a avaliação socioletal, desde a origem, vive o conflito dos grupos e das
linguagens; ao colocar o conceito socioletal, o analista deve dar conta,
37
imediatamente, ao mesmo tempo da contradição social e da fratura do sujeito sábio
(remetemo-nos aqui à análise lacaniana do “sujeito suposto saber”) (BARTHES,
1999).
Logo, não é possível uma descrição científica das linguagens sociais (dos
Socioletos), sem uma avaliação potica fundadora. Assim como Aristóteles, na
Retórica, distinguia dois grupos de provas: as provas interiores techne e as provas
exteriores a techne, Barthes (1999) sugere distinguir-se desde a origem dois grupos
de Socioletos: o Discurso no Poder sombra do Poder) e o discurso fora do poder
(ou sem poder, ou, ainda, sob a luz do não-poder); recorrendo a neologismos
pedantes. Chamemos aos primeiros Discursos Encráticos e aos segundos,
Discursos Acráticos (BARTHES, 1999).
A relação de um Discurso no Poder (ou fora do poder) é muito raramente
direta, imediata.
A lei proíbe, por certo, mas o seu discurso já é mediatizado por toda uma
cultura jurídica, por uma ratio que quase todos admitem. E a fabulosa
figura do Tirano poderia produzir uma palavra que colaria de forma
instantânea ao seu poder (‘o Rei ordenou que...’). (BARTHES, 1999, p.
118).
De fato, a linguagem do Poder é sempre dotada de estruturas de mediação,
de conclusão, de transformação, de inversão (assim ocorre o discurso da Ideologia,
cujo caráter invertido com relação ao Poder burguês foi indicado por Max)
(BARTHES, 1999).
Assim, tamm, o Discurso Acrático nem sempre se faz, declarativamente,
contra o Poder.
Para tomar um exemplo particular e atual, o discurso psicanalítico não está
diretamente ligado (pelo menos na França) a uma crítica do Poder, no
entanto podemos alinhá-lo entre os Socioletos Acráticos. Isso se porque
a mediação que intervém entre o Poder e a linguagem não é de ordem
política, mas de ordem cultural: retomando uma velha noção aristotélica, a
de doxa (opinião corrente, geral, ‘provável’, mas o ‘verdadeira’,
‘científica’), diremos que a doxa, que é a mediação cultural (ou discursiva),
por meio da qual o Poder (ou o não-poder) fala: o Discurso Encrático é um
discurso, conforme a doxa, submisso aos seusdigos, que são, eles
próprios, as linhas estruturantes da sua Ideologia; e o Discurso Acrático
38
enuncia-se sempre em graus diversos, contra a doxa (qualquer que seja
será um discursos para-doxal) (BARTHES, 1999, p. 118).
Essa opinião não exclui os matizes no interior de cada tipo; mas,
estruturalmente, a sua simplicidade permanece válida enquanto o Poder e o o-
poder estão cada um no seu lugar; esta naturalidade não pode ser (provisoriamente)
perturbada, senão nos casos raros em que uma mutação de poder (dos lugares
do Poder). Assim acontece com a linguagem política em período revolucionário: a
linguagem revolucionária provém da linguagem Acrática precedente; ao passar para
o poder, conserva o caráter Acrático, enquanto houver luta ativa no seio da
Revolução. Mas, logo que essa se consolida, que o Estado se instala, a antiga
linguagem revolucionária torna-se por sua vez doxa, Discurso Encrático (BARTHES,
1999).
O Discurso Encrático que submetemos a sua conceituação à mediação
da doxa não é apenas o Discurso da classe no Poder. Classes fora do Poder ou
que tentam conquistá-lo, por vias reformistas ou promocionais, podem assumi-lo
ou, pelo menos, recebê-lo com consentimento (BARTHES, 1999).
Barthes (1999) discorre que a linguagem Encrática, sustentada pelo Estado,
está por toda parte: é um discurso difuso, disseminado e, por assim dizer, osmótico,
que impregna as trocas, os ritos sociais, os lazeres, o campo-simbólico (sobretudo,
evidentemente, nas sociedades de Comunicação de Massa). Não o Discurso, o
Discurso Encrático nunca se dá por sistemático, mas se constitui sempre como uma
oposição ao sistema: álibis de natureza, universalidade, clareza, bom senso, as
resistências anti-intelectuais tornam-se as tácitas do sistema Encrático.
Ainda, é um Discurso pleno: nele, não lugar para o outro (onde sensação
de sufocamento, de pegajosidade que pode provocar naqueles que não participam
dele). Enfim, se quisermos nos referir ao esquema de Marx (“A Ideologia é uma
imagem invertida do real”), o Discurso Encrático sendo plenamente ideológico
apresenta o real, como a inversão da ideologia (BARTHES, 1999).
É, em suma, uma linguagem não marcada, produtora de uma intimidação
39
amaciada, de maneira que é difícil designar-lhe traços morfológicos a menos que
se consiga reconstituir com rigor e precisão (o que é um pouco uma contradição nos
termos) as figuras do amaciamento. É a própria natureza da doxa (difusa, plena,
“natural”) que torna difícil uma tipologia interna dos Socioletos Encráticos; uma
atipia dos discursos do poder: esse gênero desconhece espécies (BARTHES, 1999).
Os Socioletos Acráticos são, indubitavelmente, mais fáceis e mais
interessantes de estudarmos: o todas as linguagens, que se elaboram fora da
doxa e, por isso, recusadas por ela (ordinariamente sob o nome de jargões)
(BARTHES, 1999).
Ao analisar o Discurso Encrático, sabemos mais ou menos, de antemão, o
que se vai encontrar (razão pela qual, hoje, a análise da Cultura de massa está,
visivelmente, marcando passo). O Discurso Acrático, porém, é, em linhas gerais, o
nosso (o do pesquisador, do intelectual, do escritor); analisá-lo é analisar a nós
mesmos, enquanto falamos: operação sempre arriscada e para a qual, por isso
mesmo, será preciso empreender: que pensam o Marxismo, ou o Freudismo, ou o
Estruturalismo, ou a Ciência (a das ciências ditas humanas) na medida em que
cada uma dessas linguagens de grupo constitui um Socioleto Acrático (para-doxal)
_, que pensam eles do seu próprio discurso? Essa interrogação, que jamais é
assumida pelo Discurso do Poder, é, evidentemente, o ato fundador de toda análise
que pretende não se exteriorizar ao seu objeto (BARTHES, 1999).
A rentabilidade de um Socioleto (afora as vantagens que a posse de uma
linguagem a todo Poder que se busca conservar ou conquistar) é, evidentemente,
a segurança que proporciona: como todo cerco, o da linguagem exalta, garante
todos os sujeitos que estão dentro, rejeita e ofende os que estão fora (BARTHES,
1999).
Mas Barthes (1999) indaga como age um Socioleto do lado de fora? Sabemos
que não existe mais hoje a arte da persuasão, não mais retórica (senão
envergonhada). Notamos a propósito que a retórica aristotélica, fundamentada na
opinião da maioria, era, de direito, e, por assim dizer, voluntariamente,
declaradamente, uma retórica endoxal, portanto Encrática (razão por que, por um
40
paradoxo que é apenas aparente, o aristotelismo ainda pode fornecer conceitos
muito bons para a Sociologia das Comunicações de massa). O que está mudado é
que, na democracia moderna, a “persuasãoe sua techné não são mais teorizadas,
porque o sistemático é censurado e porque, sob o efeito de um mito propriamente
moderno, a linguagem é reputada “natural”, “instrumental”.
Para Barthes (1999, p. 120), podemos dizer que [...] num único movimento a
nossa sociedade recusa a retórica e se ‘esquece’ de teorizar a Cultura de Massa
(esquecimento flagrante na teoria marxista posterior a Marx).”
Os Socioletos não se ligam a uma techné de persuasão, mas todos
comportam figuras de intimidação (ainda que o Discurso Acrático pareça mais
brutalmente terrorista): fruto da divisão social, testemunha da guerra dos sentidos,
todo Socioleto (Encrático e Acrático) visa a impedir o outro de falar (isso tamm se
dá com o Socioleto liberal).
Assim, a divisão em dois grandes tipos de Socioletos não faz mais do que
constranger o outro do que a opor tipos de intimidação, ou, se preferirem, modos de
pressão: o Socioleto Encrático age por opressão (do excesso endoxal, daquilo a que
Flaubert chama de Burrice [Bêtise]); o Socioleto Acrático (estando fora do Poder,
deve recorrer à violência) age, por sujeição e põe em bateria figuras ofensivas de
discurso, destinadas mais a constranger o outro do que a indicá-lo. O que opõe
essas duas intimidações é, ainda uma vez, o reconhecido papel ao sistema: o
recurso declarado a um sistema pensado define a violência acrática; a perturbação
do sistema, a inversão do passado em “vivido” (e não pensado) define a repressão
encrática: uma relação inversa entre os dois sistemas de discursividade:
patente/oculto.
Um Socioleto não tem caráter intimidativo apenas para aqueles que dele são
excluídos (em razão da situação cultural, social): coage, tamm, aqueles que o
compartilham (ou melhor, têm-no em partilha). Isso resulta, estruturalmente, do fato
de que
[...] o Socioleto, em nível do discurso, é uma verdadeira língua: na esteira de
41
Boas, Jakobson deixou bem claro que uma língua se define não pelo que
permite dizer, mas pelo que obriga a dizer. Da mesma forma, todo Socioleto
comporta ‘rubricas obrigatórias’, grandes formas estereotipadas fora das
quais a clientela do Socioleto não pode falar (não pode pensar). (BARTHES,
1999, p. 120-121).
Em outras palavras, como toda língua, o Socioleto implica o que Chomsky
(1998) chama de competência, em cujo seio as variações de performance tornam-
se, estruturalmente, insignificantes: o Socioleto Encrático não é afetado pelas
diferenças de vulgaridade, que se estabelecem entre os seus locutores. E, defronte,
todos sabemos que o Socioleto marxista pode ser falado por imbecis: a língua
socioletal não se altera ao sabor de acidentes individuais, mas o somente se
produzir na história uma mutação de discursividade, (Marx e Freud foram desses
mutantes, mas, a partir deles, a discursividade que fundaram nada mais faz que se
repetir) (BARTHES, 1999).
No caso do discurso organizacional da Cia Zaffari, encontramos o Discurso
Encrático, aquele que está ligado ao Poder. De forma natural, e quase que
imperceptível (leve), a Cia traz suas peças publicitárias, sejam gráficas ou de vídeo,
embebidas em Poder, este que envolve o prazer e a dominação, dialogando com a
questão prazerosa. Trabalhando valores, sensações, indivíduo como ser único e sua
forma de organização, a Cia Zaffari apresenta o seu Socioleto Encrático.
2.2 O CAMINHO DA COMPLEXIDADE: PERFIL DE EDGAR MORIN
Edgar Morin nasceu em 1921, em Paris, filho de Vidal Nahoum e Luna
Beressi, judeus que moravam na França. Com a perda da mãe, aos nove anos de
idade, a morte iria marcá-lo pelo resto da vida, e não apenas por se tornar o tema de
um de seus livros, mas tamm por representar para ele um despertar de
consciência semelhante àquele conhecido por nossa espécie em sua gênese. Morin
como que repete, em mescla pessoal, a grande tragédia do homo sapiens. Da
mesma forma, desde o nascimento, sua vida foi marcada pelas contradições. A
princípio, influenciado por Hegel e Marx, ele tentou superá-las em sínteses (MORIN,
42
2003,).
Sociólogo, antropólogo, historiador e filósofo, é considerado um dos maiores
intelectuais contemporâneos. Diretor do Centro Nacional de Pesquisa Científica,
fundador do Centro de Estudos Transdisciplinares da Escola de Altos Estudos em
Ciências Sociais de Paris. Sua trajetória de vida é marcada por um firme
posicionamento no que se refere às questões cruciais de seu tempo, o que se reflete
em grande parte da sua produção intelectual (MORIN, 2001).
Seu nome verdadeiro é Edgar Nahoum. Fez os estudos universitários de
História, Geografia e Direito na Sorbonne, onde se aproximou do Partido Comunista,
ao qual se filiou em 1941.
Teve papel ativo no movimento de resistência à ocupação nazista durante a
Segunda Guerra Mundial. Após o fim do conflito, participou da ocupação da
Alemanha. Em 1949, distanciou-se do PC, que o expulsou dois anos depois.
Ingressou no Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), onde realizou um dos
primeiros estudos etnológicos produzidos na França - sobre uma comunidade da
região da Bretanha. Criou o Centro de Estudos de Comunicações de Massa e as
revistas Arguments e Communications.
Interessou-se por Cinema e, em 1961, realizou o filme Crônica de um Verão,
em parceria com o documentarista Jean Rouch. Nos anos seguintes, fez uma série
de viagens à América Latina.
Em 1968, começou a lecionar na Universidade de Nanterre. Passou o ano de
1969 no Instituto Salk de Estudos Biológicos em La Jolla, na Califórnia, onde pôde
acompanhar de perto as descobertas da genética. Redigiu em 1994, com o artista e
semiólogo português Lima de Freitas e o físico romeno Basarab Nicolescu, um
manifesto em favor da transdisciplinaridade.
Em 1998, promoveu, com apoio do governo francês, jornadas temáticas que
originaram o livro A Religação dos Saberes. Em 2002, a Justiça o condenou por
"difamação racial" devido a um artigo no jornal Le Monde, no qual dizia que "os
43
judeus, que foram vítimas de uma ordem impiedosa, impõem sua ordem impiedosa
aos palestinos".
Morin, que é judeu, pagou um euro como pena simbólica. Ainda diretor de
pesquisas no CNRS, é doutor honoris causa de diversas universidades. É um
pensador de expressão internacional, um humanista, preocupado com a elaboração
de um método capaz de apreender a complexidade do real, tecendo severas críticas
à fragmentação do conhecimento.
Morin é um apaixonado pelas artes e ciências, extremamente polêmico. Ele
nos propõe uma reforma do pensamento por meio do ensino transdisciplinar, capaz
de formar cidadãos planetários, solidários e éticos, aptos a enfrentar os desafios dos
tempos atuais. Defende a formação do intelectual polivalente. Sua obra múltipla é
norteada pelo cuidado com um conhecimento não mutilado nem compartimentado,
respeitando o singular ao mesmo tempo em que o insere em seu todo (EDGAR...,
2008).
Cabe-nos apresentar as distinções feitas por Morin (1999) entre metodologia
e método, ao elegermos o Paradigma da Complexidade como norteador deste
estudo. Enquanto a metodologia consiste no conjunto de guias que se usa para
programar as formas de se realizar a pesquisa, o método representa o caminho pelo
qual o pesquisador consegue “pensar por si mesmo para responder a um desafio da
complexidade dos problemas.” E completa: Muito embora o método utilize
metodologias (segmentos programados), ele comporta uma proposta mais ampla, na
qual se inscrevem a ‘descoberta’ e a ‘inovação’.” (MORIN, 1999, p. 36).
Seguindo esse raciocínio, é importante ressaltar a concepção do autor sobre
a amplitude e a importância do Paradigma em uma pesquisa. Morin (2005) discorre
sobre o significado da palavra Paradigma que se divide em modelo ou regra por
parte de Platão e argumento baseado em exemplo, que se destina a ser
“generalizado”, por parte de Aristóteles. Depois de sua concepção inicial, a noção de
Paradigma evoluiu por diversas áreas do saber, até se designar como “[...] o
conjunto das representações, crenças, iias que se ilustram de maneira exemplar
ou que ilustram casos exemplares.” (MORIN, 2005, p. 259).
44
O discurso organizacional da Cia Zaffari, objeto deste estudo, por intermédio
de peças gráficas e veiculadas, mostra-se afinado com a Complexidade, pois é fruto
de uma realidade sociocultural em que todos os elementos se ligam e estabelecem
relação com o todo, de modo a formar uma parceria única e inseparável, um tecido
complexus, no sentido daquilo que é tecido junto e que constitui o mundo.
Segundo Morin (2006, p. 17), "[...] à primeira vista, a Complexidade é um
tecido (complexus: o que é tecido em conjunto) de constituintes heterogêneos”,
inseparavelmente, associados: coloca o paradoxo do uno e do múltiplo. Na segunda
abordagem, a Complexidade é, efetivamente, o tecido de acontecimentos, ações,
interações, retroações, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo
fenomenal.
Então, a Complexidade apresenta-se com os traços inquietantes da confusão,
do inextricável, da desordem, da ambiguidade, da incerteza. Daí a necessidade,
para o conhecimento, de ordenar os fenômenos, ao rejeitar a desordem, de afastar o
incerto, isto é, de selecionar os elementos de ordem e de certeza, de retirar a
ambiguidade, de clarificar, de distinguir, de hierarquizar. Mas tais operações,
necessárias à inteligibilidade, correm o risco de a tornar cega se eliminarem os
outros caracteres do complexus; e efetivamente, como o indiquei, elas tornam-nos
cegos." (MORIN, 2006, p. 13).
“A proposta da Complexidade é a abordagem transdisciplinar dos fenômenos
e a mudança de paradigma, abandonando o reducionismo que tem pauta na
insvestigação científica em todos os campos. Assim, é dado lugar à criatividade e ao
caos.” (MORIN, 2006, p. 14 ).
Sendo transdisciplinar, não é possível um significado sucinto do termo e suas
aplicações. Alguns dos conceitos que compõem o tecido da Complexidade são:
auto-organização, amplificação por flutuações, artificialeza, autoconsistência,
autopoiese: capacidade de um sistema de organizar de tal forma que o único
produto seja ele mesmo, autossemelhança, imprecisão, conectividade,
construtivismo, correlação, criticabilidade, dialógica, diversidade, emergência, fluxo,
imprevisibilidade, inclusão, metadimensionalidade, onijetividade, paradoxo,
45
aderência, potencialidade, retorno, ressonância, rizomas, virtualidade.
O Paradigma da Complexidade possui um significado básico: fazer com que
haja diálogo entre as partes e seu todo, desfazendo limites entre diferentes áreas do
saber, com sua interpelação transdisciplinar.
O papel do nome é primordial, pois materializa a condição de real. Garante as
trocas simbólicas existentes em todos os âmbitos da vida. E, quando o complexo”
não é encarado como “difícil”, mas como completo, cheio, variado, conseguimos
aceitar as ambivalências. O conhecimento pode ser isso” e aquilo”. Faz com que
consigamos abraçar as possibilidades, inúmeras correlações, assim deixamos de ser
reducionistas.
Os sujeitos, as organizações, os paradigmas, ou seja, tudo que ambiciona ter
vida possui um pré-requisito. Precisa de uma nomeação, como um estatuto
simbólico, que singulariza as impressões digitais de uma identidade.
O termo Paradigma parece ser um dos pontos de partida para a sua
compreensão. Kunsch (2000) o observa com um sentido específico. É o “modelo”, o
que Buber e Heidegger (1997, p. 1331) denominou como “Arquétipo”.
Nesse sentido, temos o Paradigma como “modelo”. As suas relações e as
suas inter-relações se mobilizam pela perspectiva da alteridade, conforme Barthes.
A perspectiva da alteridade sustenta uma categoria dialética. É a Relação, uma
realidade só existe, à medida que outra realidade tenha existência. Nada está,
absolutamente, separado. Nada é, absolutamente, igual.
Morin (1999, p. 31-32) faz um resgate etimológico. Recorre ao latim “[...]
complexus é o que se tece junto [...]” Especifica, assim, a tarefa da Complexidade
de, ao mesmo tempo, unir (contextualizar e globalizar), e aceitar o desafio da
incerteza. O autor (MORIN, 2001, p. 45) complementa: “[...] A Complexidade é, cada
vez mais, uma cumplicidade de desconstrução e de criação, de transformação do
todo sobre as partes e das partes sobre o todo [...]”
46
Também, Morin (2006, p. 7) caracteriza as práticas do pensamento
simplificador, para melhor diferenciá-lo do pensamento complexo:
[...] Idealizar (crer que a realidade pode reabsorver-se na idéia), que o
inteligível é real; racionalizar (querer encerrar a realidade na ordem e na
coerência de um sistema), proibi-la de transbordar para fora do sistema,
(precisar de justificar a existência do mundo, conferindo-lhe um certificado
de racionalidade); normalizar (isto é, eliminar o estranho, o irredutível, o
mistério [...]
Ao perfilar a singularidade das práticas de Idealização, de Racionalização e
de Normatização, Morin (1999) estipula o seu conceito sobre o pensamento
simplificador, tecendo os seus limites. Assim, por oposição, tece, também, os fios de
sua Complexidade.
O Paradigma da Complexidade estabelece o conceito sobre as práticas da
produção de Conhecimento. É instituído e constituído por sete Princípios da
Complexidade, inscritos na Transdisciplinaridade.
Morin (1999, p. 32-34) os singulariza, sem valoração de hierarquia: “O
Primeiro é o Sistêmico ou organizacional, o Segundo, o Hologramático, o Terceiro, o
Anel Retroativo, o Quarto, o Anel Recursivo, o Quinto, o Auto-eco-organização, o
Sexto, o Dialógico, e o sétimo, o da Reintrodução.”
O Sistêmico ou Organizacional liga o conhecimento das partes ao
conhecimento do todo. O Hologramático observa que as partes estão no todo, e
vice-versa. O Anel Retroativo estipula que a causa age no efeito, e vice-versa. O
Anel Recursivo estabelece o que o produtor faz o produto, e vice-versa. O Dialógico
sustenta que os opostos, os diferentes dialogam na Complexidade. Por fim, a
Reintrodução o conhecimento como um processo, que envolve o sujeito e o
objeto (MORIN, 1999).
O Princípio Sistêmico ou Organizacional estabelece as ligações entre as
partes e o todo. Ambos se encontram indissociáveis. Estão envoltos em um
processo de interações, em que as partes revelam o todo, e vice-versa.
47
No âmbito do presente trabalho, podemos observar o Princípio Sistêmico ou
Organizacional, quando vemos que o Discurso Organizacional da Cia Zaffari está
intimamente ligado à Cultura e aos Sujeitos que fazem parte desta Organização, ao
mesmo tempo em que a Cia está intimamente ligada ao interesse do seu blico-
alvo e finalmente ao mundo exterior.
O Hologramático observa que as partes se localizam no todo. A recíproca,
tamm, é verdadeira. Apresenta, como âncora referencial, o Holograma uma
chapa, capaz de reproduzir, imageticamente, o binômio simbiótico entre as partes e
o todo.
No Hologramático podemos observar o Discurso Organizacional como parte
de um todo Organizacional, que é a Cia Zaffari enquanto empresa, e vice-versa,
sendo a Cia tamm parte da totalidade de seu Discurso.
Também fica claro, no Discurso Organizacional da Cia, quando analisamos o
Sujeito, enquanto consumidor, sendo atingido como todo, ser único, e ao mesmo
tempo sabemos a quantidade de Sujeitos envolvidos na grande gama de clientes
existentes.
Os dois primeiros princípios mobilizam e são mobilizados por uma Figura de
Linguagem de Palavras. É a Metonímia, que pronuncia os diálogos entre as partes,
como representantes e representativas, de forma verossímil, do todo.
Chevalier e Gheerbrant (1991) caracterizam que o anel serve para indicar um
elo, mas, também, chama-nos a atenção para a ambivalência desse símbolo, pois
coloca que o anel une e isola ao mesmo tempo, fazendo lembrar por isso a relação
dialética amo-escravo. Quando os noivos, por exemplo, utilizam o anel como
simbologia de sua união, cada um dos cônjuges se torna amo e escravo do outro.
O Anel Retroativo pressupõe os sentidos de movimentos no jogo entre as
causas e os efeitos. Não são fixos, estáticos. Podem trocar de posições. Assim
sendo, um evento não é filho único de uma causa, porém de uma pluralidade causal.
48
O Anel Retroativo pode ser observado no Discurso Institucional utilizado nas
peças analisadas neste trabalho, no qual o tema do Discurso não é objetivo e
simplesmente voltado para venda direta de produtos da Cia Zaffari, e sim subjetivo,
trazendo à tona os bons sentimentos, os valores arraigados, o bem viver.
O Anel Recursivo agencia a dinâmica entre sujeitos e objetos. O ser humano
faz os objetos, que, ao serem feitos, também o fazem. Representa o ritual que
abraça os liames entre criador e criatura em suas verossimilhanças respectivas.
No Recursivo, mostra-nos que os Sujeitos a serem atingidos pelas
mensagens institucionais da Cia Zaffari são, ao mesmo tempo, atores e figurantes,
em momentos fazem o Discurso e, em outros, são espectadores deles. Esses
exemplos encontramos nas peças que pontuam a Cultura Gaúcha e na propaganda
dos anjos, respectivamente. Na primeira, o Discurso se utiliza de um Sujeito que
existe, que fala por si, que ama a sua Terra e cultiva suas tradições. No segundo, o
Sujeito é convidado a voar, mas entende que anjo de apenas uma asa o
consegue voar, fazendo alusão ao poema de Augusto dos Anjos. O Sujeito é
coadjuvante, simplesmente é participante e não mais ator.
Os Anéis Retroativo e Recursivo comungam de uma mesma matriz simbólica.
É o Anel que une e isola em sua ambivalência, como referem Chevalier e
Gheerbrant (1991). Emblematiza as feições às afeições recíprocas entre as partes e
o todo.
O Anel Auto-eco-organização estipula as possibilidades dialógicas que
envolvem a autonomia e a dependência. O sujeito possui autonomia para traçar seu
caminho. Depende, todavia, da sociedade em que vive, a qual, ao mesmo tempo,
tem dependências do meio ambiente do planeta.
Tal princípio, em sua essência, parece conjugar uma Figura de Linguagem de
Pensamento. É a Antítese, como possibilidade de unificação dos opostos, dos
antagônicos. Entroniza, simbolicamente, as noções dos conflitos emocionais, que
ligam o ser humano ao social.
49
A Cia Zaffari, apesar de já ser uma grande empresa, em tamanho e
reconhecimento de mercado, estará fadada na dependência com os Sujeitos, sejam
eles funcionários, fornecedores, clientes e até concorrentes. Mesmo possuindo um
alto grau de autonomia, visto que não depende de capital público, o depende de
votação do povo para se instalar em qualquer lugar, e, além disso, apresentando
diretoria familiar, ou seja, não depende de grandes gestores do mercado (nacional
ou internacional) para ser gerida ou continuar sendo, sempre estaà mercê de um
Estado, de políticas públicas, da situação econômica mundial e, principalmente, de
seus consumidores.
O Dialógico viabiliza a aproximação e a associação dos contrários, que
articulam, mesmo em suas divergências e oposições, vértices convergentes.
Apresentam interações. São protagonistas de processos marcados e demarcados
pelo diálogo.
De acordo com a enciclopédia luso-brasileira de filosofia, o diálogo, como
atitude própria do homem, é a capacidade de se dirigir e de responder ao outro
como igual, para ele estabelecer uma relação. O homem, nesse sentido, apenas
dialoga com o homem, porque este lhe pode responder em condições de
igualdade. A reciprocidade existencial pressupõe a semelhança e a diferença, dado
que o que é em parte igual e em parte diferente pode enriquecer-se com a mútua
relacionação. Assim, a propriedade e a alteridade são dois momentos ou dois
pressupostos desta condição relacional do homem.
A espontaneidade e a criatividade o duas condições necessárias, embora
não suficientes, para a existência de um autêntico diálogo. Quando estas condições,
além de outras, não se verificam, teremos apenas um simulacro de diálogo.
O diálogo não se entre pessoas individuais, mas tamm entre grupos
ou entre comunidades mais largas. Mas o autêntico é o que se realiza entre pessoas
individuais (ou entre indivíduos). A fala entre duas pessoas, antes de ter valor, deve
ser vista como uma experiência humana fundamental. Toda existência humana é,
em certo sentido, dialógica ou dialogal, mesmo previamente ao uso da palavra. Todo
crescimento espiritual é um esforço por atingir níveis cada vez mais profundos e
50
cada vez mais perfeitos de diálogo. Mesmo quando o colóquio pretenda ir para além
da relação e da atenção do outro, o outro e consequentemente o primeiro nunca
pode ser entendido como um simples meio. A mediação, neste caso, não será nem,
sobretudo, funcional, mas constituinte. Por isso, certas formas dialogais são mais
perfeitas, na sua essência, do que outras. Os tipos de diálogos (político-social e
místico-religioso, por exemplo) surgem como diversos nos seu nível de profundidade
e consequentemente no compromisso existencial que postulam dos seus
intervenientes. A relação como o outro aparece assim tipificada também segundo os
objetivos a atingir. Tais objetivos condicionam logo à partida a imagem e as
expectativas dos participantes na relação dialogal.
Evidentemente, o diálogo o se esgota em si mesmo. Mas tamm é certo
que, como meio, altera tudo aquilo que simultaneamente o vai constituindo e
ultrapassando. A qualidade e as conotações do diálogo dependem, em boa parte, da
visão que se tiver do outro. Por isso, o autêntico supõe uma relação de amizade
positiva, o que a enciclopédia nos traz como a superioridade do outro, um certo
desejo de superar o outro na vontade de o amar.
Por isso o diálogo supõe a superação do individualismo-egoísmo e a
superação da vontade de sistema. Como atitude existencial supõe a vontade de
compreender o outro tal como a de, pelo outro, compreendermos a nós próprios, no
sentido que Buber e Heidegger (1997) atribuem a esta compreensão. O diálogo,
mais do que simples presença ao outro ou do outro, pressupõe interação ou inter-
reação; o outro é sempre mais do que a soma de todos os seus aspectos e mesmo
mais do que essa totalidade – ele é antes o infinito de uma proposta sempre
renovada.
Para Buber e Heidegger (1997), é uma forma superior de encontro. O autor
define-o como mutualidade da ação interior. Por isso, o movimento dialógico
fundamental consiste em voltar-se para outrem.
No dicionário da língua portuguesa, significa a conversa entre duas pessoas,
que respondem e por vezes se reúnem, ou seja, assim como as pessoas são
diferentes e nem por isso deixam de conversar ou não conseguem manter um
51
diálogo, as idéias ou conhecimento podem e devem dialogar, tirando proveito
daquilo que pode ser somado das partes. Assim como no termo diálogo, os sujeitos
funcionários e clientes da Cia dialogam entre si e fazem desta Organização uma
única possível.
Também, podemos analisar, diante deste Princípio, que uma rede de
supermercados pode se comunicar de uma forma estreita e até mesmo íntima com
os diversos tipos de pessoas e, mesmo assim. consegue diálogo, troca e, na maioria
das vezes, até mesmo consenso.
Tal qual o Auto-eco-organização, o Dialógico, também, se instrumentaliza e é
instrumentalizado pela Antítese, como Figura de Linguagem. Além disso, agencia e
é agenciado pela Conjunção Coordenativa Aditiva “e”, como a materialidade de
associação.
O Princípio Dialógico se enquadra no Discurso Institucional da Cia Zaffari,
seja ele verbal, não-verbal ou prático, pois associa dois mundos distintos, que é o
mundo empresarial do varejo e o mundo cultural (literário e musical). A Cia, apoiada
pelos seus principais “braços” (Opus Promoções e Agência Matriz), para tornar uma
rede supermercadista em case nas áreas de Responsabilidade Social, de apoio à
Cultura local e de expressão de valores familiares.
Por fim, o Princípio da Reintrodução afirma que o Conhecimento não é um
puro ato de simplificação, restrito à linearidade. Significa o contrário disso. É plural e
pluralizante. Abriga os dialogismos que contemplam os sujeitos e os objetos.
Podemos observar, neste último Princípio, que o Objeto é a Cia Zaffari e sua
Comunicação e o Sujeito é o seu público consumidor, que, ao mesmo tempo analisa
esta Comunicação e “responde” a ela, sendo adepto desta Organização atacadista.
Sendo assim, é o ator principal de sua Comunicação e ações.
A troca nítida entre a Cia e seus públicos dá-se no Princípio da Reintrodução,
quando o consumidor, automaticamente, se torna alvo da Comunicação
Organizacional e quando este mesmo consumidor é quem dita a forma como esta
52
Comunicação deve ser feita.
Então, ao mesmo tempo em que o cliente é a “introdução” para a Cia Zaffari,
ou seja, o começo de tudo, pois é a finalidade da existência de tal organização, ele
mesmo é o ponto de partida para sua Comunicação, reintrodução, um novo começo.
Tal princípio fica claro, quando refletimos sobre este trabalho, pois, a partir da
análise de objetos (peças publicitárias de cunho institucional) e da relação com os
Sujeitos-alvos da mensagem contida nestes objetos, aprofundamos e tornamos
pesquisa científica, o que, para muitos, seria meramente uma prática “marketeira”.
Fazendo uma leitura do não-verbal e de todas as nuances que permeiam o
Discurso Oranizacional da Cia Zaffari, somos agraciados com um novo olhar, não
mais reducionista e linear, e sim com o que podemos chamar de lente de grande
ocular para podermos usufruir do verdadeiro sentido da Complexidade.
Os sete princípios são agenciadores e agenciados por um essencial. É a
Transdisciplinaridade, que elimina distâncias, barreiras e separações entre teóricos,
disciplinas e conceitos. Formata e configura uma outra concepção de conhecimento.
Morin (1999, p. 64-65) dimensiona o Conhecimento Complexo, observando-o
no próprio ser, porquanto “nascer é conhecer”. Ele pormenoriza:
O conhecimento é, necessariamente, uma tradução de signos/símbolos e
em sistemas de signos/símbolos; construção, ou seja, tradução construtora
a partir de princípios/regras, que permitem construir sistemas cognitivos,
articulando informações/signos e símbolos; solução de problemas, a
começar pelo problema cognitivo da construção tradutora à realidade, que
se trata de conhecer [...]
Para o autor,
[...] o conhecimento se higieniza a partir de qualquer postura e tom
absolutizante. Perde a sua pose de certeza inequívoca, de ordem metafísica. Ganha
uma amplitude, na qual transitam as certezas, em parcerias com as incertezas, sem
a hierarquização, com um cenário histórico. É provisório bem ao gosto e dentro da
53
gica e da ilógica da vida (MORIN, 1999, p. 66).
Transdisciplinaridade se quando algumas disciplinas encontram um ponto
de intersecção e trabalham de forma integrada.
A transdisciplinaridade trata frequentemente de esquemas cognitivos que
podem atravessar as disciplinas, às vezes com tal virulência, que as deixam em
transe. De fato, “[...] os complexos de transdisciplinaridade realizaram e
desempenharam um fecundo papel na história das ciências. É preciso conservar as
noções-chave que estão envolvidas nisso, ou seja, cooperação, objeto comum e/ou
projeto comum.” (MORIN, 2000, p. 115).
Portanto, o Paradigma da Complexidade tem um objeto de estudo próprio,
bem como uma concepção e uma prática do conhecimento complexo. É um recurso
metodológico importante, pela pulsão de um conhecimento pleno, em sua
provisoriedade (MORIN, 1999).
2.3 O CAMINHO DA SEMIOLOGIA: PERFIL DE ROLAND BARTHES
Após explanarmos sobre o método que rege o presente ensaio, vamos a um
breve perfil do personagem que dita nossa Técnica Metodológica, Roland Barthes e
a Semiologia. Roland Barthes (Cherbourg, 12 de Novembro de 1915 Paris, 26 de
Março de 1980) foi um escritor, sociólogo, crítico literário, semiólogo e filósofo
francês (RAMOS, 2007).
Formado em Letras Clássicas, em 1939, e Gramática e Filosofia, em 1943, na
Universidade de Paris, fez parte da escola estruturalista, influenciado pelo linguista
Ferdinand de Saussure. Crítico dos conceitos teóricos complexos que circularam
dentro dos centros educativos franceses nos anos 50. Entre 1952 e 1959, trabalhou
no Centre National de la Recherche Scientifique – CNRS (RAMOS, 2007).
Barthes usou a análise semiológica em revistas e propagandas, destacando o
54
seu conteúdo político. Dividia o processo de significação em dois momentos:
denotativo e conotativo. Resumida e, essencialmente, o primeiro tratava da
percepção simples, superficial; e o segundo continha as mitologias, como chamava
os sistemas de códigos que nos são transmitidos e são adotados como padrões.
Segundo o autor, esses conjuntos ideológicos eram, às vezes, absorvidos
despercebidamente, o que possibilitava e tornava viável o uso de veículos de
comunicação para a persuasão.
Barthes concedeu um estatuto à Semiologia, sintonizou-a com a inflncia
crescente da mídia, ocorrida, sobretudo, na segunda metade do século XX. A
Semiologia do autor persegue o translinguístico, portanto a Mídia doa-se como
objeto para suas pesquisas semiológicas.
O autor discorre que não representa a Semiologia, pois nenhum homem no
mundo pode representar uma idéia, uma crença, um método, e muito menos alguém
que escreve, cuja prática eletiva não é nem a fala, nem a escrevência, mas a escrita
(BARTHES, 1984, p. 12).
Conforme o autor, Semiologia é uma aventura, isto é, “aquilo que me
acontece”. Em sua versão francesa, é filha do século XX, e Barthes situa seu
nascimento por volta de 1956, embalada pela influência de Saussure.
Essa aventura se divide em três momentos. O primeiro foi o de admiração, no
qual o discurso dá-se como objeto constante do trabalho do autor. O segundo
momento foi o da ciência, em que se esforçava para conseguir a análise semiológica
de um objeto significante, já que, naquela época, seria a Moda. Este período,
conforme Barthes, foi menos de um projeto de fundar a Semiologia como ciência,
que o prazer de exercer uma Sistemática, no caso, de análise e classificação. O
terceiro momento foi, com efeito, o do Texto, no qual o questionamento era feito no
“que é, então, o Texto?”. O sentido moderno, atual, que tentamos dar a esta palavra,
distingue-se fundamentalmente da obra literária (BARTHES, 1984).
A Semiologia Barthesiana é tecida por intermédio de duas teses significantes:
são a semiologia negativa e ativa, saindo delas uma concepção a respeito do signo,
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marcada e demaracda por uma abordagem dialética.
Na Semiologia Negativa, existe a sustenção de um caráter apofático. Nega os
caracateres positivos, fixos, a-históricos do signo, desfazendo-os, como dimensão
de metalinguagem e tautologia (o mesmo pelo mesmo). uma quebra de seu
sentido onipotente, pregando, assim, a perspectiva interdisciplinar.
Barthes (1996), na Semiologia Ativa, sustenta que ela não é uma semiofísis,
nem uma semioclastia. É, antes de tudo, uma semiotropia, porquanto trata do signo
e o imita, procurando compreendê-lo. O seu objeto são os textos do imaginário,
como significantes, que, com diferentes gêneros, percorrem a territorialidade do
cotidiano.
A concepção de Barthes (1996, p. 41) da Semiologia é:
[...] o curso de operações ao longo do qual é possível quiçá almejado
usar o signo, como um véu pintado, ou, ainda, uma ficcção. Ela possui a
hegemonia do significante, em relação ao significado. A Conotação é mais
importante do que a denotação [...]
Segundo Barthes (1999, p. 103), “[...] o objetivo da Pesquisa Semiológica é
reconstituir o funcionamento dos sistemas de significação diversos da língua,
segundo o próprio projeto de qualquer atividade estruturalista, que é construir um
simulacro dos objetos observados.”
Para empreender este tipo de pesquisa, é necessário aceitarmos um princípio
limitativo, oriundo este da Linguística, que é o princípio de pertinência. A partir deste
princípio, o pesquisador decide-se a descrever fatos reunidos a partir de um
ponto de vista e, por consequência, a reter, na massa heterogênea desses fatos,
os traços que interessam a esse ponto de vista, com a exclusão de todos os outros.
Conforme Barthes (1999, p. 104), o
Princípio de Pertinência acarreta evidentemente para o analista uma
situação de imanência, pois se observa um dado sistema do interior.
Todavia, como o sistema pesquisado não é conhecido de antemão em seus
56
em seus limites, a imanência pode ter por objeto, inicialmente, um
conjunto de fatos que cumprirá ‘tratar’ para conhecer-lhe a estrutura. Esse
conjunto deve ser definido pelo pesquisador anteriormente à pesquisa: o
corpus.
Barthes (1999, p. 104) conceitua Corpus como “[...]uma coleção finita de
materiais, determinada de antemão pelo analista, conforme certa arbitrariedade
(inevivel) em torno da qual vai trabalhar [...]”
Estudando o corpus, deveremos a ele ater-nos rigorosamente: de um lado,
nada lhe acrescentar no decurso da pesquisa, mas também esgotar-lhe
completamente a análise, sendo que qualquer fato incluído no corpus deve
reencontrar-se no sistema (BARTHES,1999).
O Corpus deve ser bastante amplo, para que possamos, razoavelmente,
esperar que seus elementos saturem um sistema completo de semelhanças e
diferenças: é certo que, quando dissecamos uma sequência de materias, ao cabo de
certo tempo, encontramos fatos e relações referenciados (ao passo que a priori já
sabemos que a identidade dos signos constitui um fato de língua). Esses “retornos”
são cada vez mais frequentes, aque não se descubra nenhum material novo: o
corpus está então saturado (BARTHES, 1999).
O autor chama a atenção de que é aceitável termos um corpus heterogêneo,
mas precisamos ter cuidado, então, de estudar meticulosamente a articulação
sistemática das substâncias envolvidas (sobretudo, de separar bem o real da
linguagem que dele se incumbe), isto é, dar à sua própria heterogeneidade uma
interpretação estrutural; em seguida, homogeneidade temporal. Em princípio, o
Corpus deve coincidir com um estado do sistema, um “corte” da história.
Barthes (1999, p. 106) finaliza defendendo que o “[...] objetivo talvez essencial
da Pesquisa Semiológica, isto é, aquilo que será encontrado em último lugar, é
precisamente descobrir o tempo próprio dos sistemas, a história das formas.”
Para Gaskell e Bauer (2004, p. 22-23), a expressão “Pesquisa Qualitativa”
assume diferentes significados no campo das ciências sociais. Compreende um
57
conjunto de diferentes cnicas interpretativas que visam a descrever e a decodificar
os componentes de um sistema complexo de significados.”
Tem por objetivo traduzir e expressar o sentido dos fenômenos do mundo
social; trata-se de reduzir a distância entre teoria e dados. Em sua maioria, os
estudos qualitativos são feitos no local de origem dos dados: o impedem o
pesquisador de empregar a lógica do empirismo científico, mas partem da suposição
de que seja mais apropriado empregar a perspectiva de análise fenomenológica,
quando se trata de fenômenos singulares e dotados de certo grau de ambiguidade.
O desenvolvimento de um estudo de pesquisa qualitativa supõe um corte
temporal-espacial de determinado fenômeno por parte do pesquisador. Esse corte
define o campo e a dimensão em que o trabalho se desenvolverá, ou seja, o
território a ser mapeado.
O trabalho de descrição tem caráter fundamental em um estudo qualitativo,
pois é por meio dele que os dados são coletados. De certa forma, os métodos
qualitativos se assemelham a procedimentos de interpretação dos fenômenos que
empregamos no nosso dia-a-dia, que têm a mesma natureza dos dados que o
pesquisador qualitativo emprega em sua pesquisa. Trata-se, portanto, de dados
simbólicos, situados em determinado contexto; dados esses que revelam parte da
realidade ao mesmo tempo em que escondem outra parte.
O vínculo entre signo e significado, conhecimento e fenômeno, sempre
depende do arcabouço de interpretação empregado pelo pesquisador, que lhe serve
de visão de mundo e de referencial. Esse arcabouço pode servir como base para
estabelecer caminhos de pesquisa e delimitação do tema.
Para empreendermos uma Pesquisa Semiológica, tamm devemos levar em
consideração o Princípio de Pertinência, como ressalta Barthes (1999, p. 103):
Para compreender ess Pesquisa, é necessário aceitar, francamente, desde
o início (e, principalmente, no início) um fim limitativo. Este princípio, mais
uma vez, oriundo da lingüística, é o Princípio de Pertinência: decida-se o
pesquisador a descrever fatos, reunidos a partir de um ponto de vista e,
por conseguinte, a reter, na massa heterogênea desses fatos, os traços
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que lhe interessam a esse ponto de vista, com a exclusão de todos os
outros (esses traços são chamados de pertinentes) [...].
A concepção do corpus neste estudo segue a proposta de Corpus de Barthes,
já elencada anteriormente. No caso desta pesquisa, buscaremos resgatar elementos
que caracterizam o discurso da Cia Zaffari, em especial os das peças gráficas e
veiculadas.
Destacamos, ainda, que esta pesquisa promove uma reflexão a partir dos
objetivos (gerais e específicos) associados às questões de pesquisa que buscamos
“responder” segundo o Paradigma da Complexidade e a Pesquisa Semiogica.
Neste sentido, propomo-nos a estudar o Discurso da Cia Zaffari, enfocando seu
caráter organizacional por intermédio de seus elementos identitários. Mais
especificamente, buscamos compreender o caráter organizacional do discurso da
Cia Zaffari, a partir das categorias: Organizações, Comunicação e Sujeito, de Morin,
e Poder, Cultura e Socioleto, de Barthes.
Também buscamos compreender de que forma a Comunicação da Cia Zaffari
se particulariza por meio da Cor. Por que a produção de sentido instrumentaliza o
Poder? Como a Cia Zaffari valoriza a Cultura gaúcha? De que maneira o discurso
institucional aborda o Sujeito, enquanto consumidor? Como as Organizações Zaffari
se vendem através da produção de sentido? De que forma o Socioleto se
singulariza?
59
3 UM OLHAR ORGANIZACIONAL SOBRE O DISCURSO DA CIA ZAFFARI
A nossa análise contemplará alguns elementos que fazem parte do
discurso organizacional da Cia Zaffari. Para facilitar nossa reflexão, reforçamos os
ingredientes que compõem o corpus deste estudo, e destacamos a inserção, em
anexo, de cópias das peças gráficas imagens que inspiraram a análise. Os
elementos selecionados serão analisados a partir dos critérios: “peças gráficas” e
“peças veiculadas”.
Abordaremos, primeiramente, o cartaz comemorativo aos 20 anos dos
Concertos Comunitários Zaffari. Posteriormente, seguimos a análise pelo anúncio de
jornal alusivo à Semana Farroupilha. Logo após, partimos para as peças veiculadas
em televisão, denominadas VT “Anjos”, VT “Dia das Mães 2007” e VT “Natal 2007”.
3.1 CARTAZ 20 ANOS DOS CONCERTOS COMUNITÁRIOS ZAFFARI
Os Concertos Comunitários Zaffari são a principal ação organizacional,
produzida pela Cia. Desde 1987, a Companhia Zaffari oferece à população eventos
que ajudam a difundir a música erudita e popular de forma democrática e alegre. Os
espetáculos são realizados em parques, igrejas, praças e estacionamentos das lojas
da rede.
Essa iniciativa obteve muito reconhecimento, traduzido na forma de duas
premiações: em 1995, a Federasul conferiu à Companhia Zaffari o prêmio Líderes e
Vencedores, na categoria Destaque Comunitário. No final de 1999, a Rede Globo e
a RBS homenagearam a empresa com o troféu Construir, na categoria Destaque
Cultural.
Os espetáculos apresentam obras de grandes mestres da música clássica,
popular e contemporânea, apresentadas pelo coral e pela orquestra do Instituto de
Cultura Musical da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, sob a
60
coordenação do maestro Frederico Gerling nior. Entre músicos, maestros,
arranjadores, coral, corpo de baile e pessoal de montagem dos espetáculos, uma
equipe de cerca de 300 pessoas é mobilizada na produção de cada evento.
A primeira peça analisada é institucional e comemorativa aos 20 anos dos
Concertos Comunitários Zaffari. Cartaz horizontal, dividido em duas grandes caixas.
Na caixa da esquerda, uma foto de paisagem, lago com cisnes nadando, e os
dizeres acima do desenho: “Os grandes mestres precisaram de muita inspiração
para criar suas obras”. Na caixa da direita, existe uma foto de público aplaudindo,
com um homem em primeiro plano e o restante em segundo, sem foco, e os dizeres:
“Nós só precisamos de uma: você”. Assinam Concertos Comunitários Zaffari 20 anos
e os logotipos de financiadores, planejadores, realizadores, apoiadores e
patrocinadores do projeto.
A categoria Comunicação pode ser analisada na peça, por se tratar de projeto
de uma empresa, e a Cor se exalta na grande faixa preta acima da peça, em que
constam as duas principais frases já citadas na descrição acima, escritas em branco.
A cor preta e as letras brancas foram utilizadas para destacar a frase e sobrepor a
mensagem acima das fotos. O preto é sóbrio, transborda a sensação de colocação
clássica, assim como os Concertos Comunitários Zaffari.
Conforme Farina (2003, p. 90),
O contraste entre os acromáticos branco e preto e os seus tons, que variam
entre eles, é bastante aproveitado na criatividade publicitária. A Cor, além
de produzir uma sensação de movimento, de expansão e de reflexão, pode
também nos oferecer uma impressão estática. Mas, ao relacionar uma Cor a
outra, ou outras, dentro de um espaço bidimensional, um outro fenômeno
pode, e acontece: os valores apresentados por uma determinada Cor se
alteram quando ela passa a sofrer a influência de uma ou mais Cores
colocadas dentro de um mesmo espaço.
É isso o que acontece, quando a peça une o branco e o preto, pois, conforme
Farina (2003, p. 112-113),
As cores possuem associações afetivas. O branco significa ordem,
simplicidade, limpeza, bem, pensamento, juventude, otimismo, piedade,
paz, pureza, inocência, dignidade, afirmação, modéstia, deleite, despertar,
61
infância, alma, harmonia, estabilidade e divindade. o preto tem
associação afetiva com mal, miséria, pessimismo, sordidez, tristeza,
frigidez, desgraça, dor, temor, negação, melancolia, opressão, angústia,
renúncia, intriga. O autor defende que o preto, quando combinado com
certas cores, às vezes, tem conotação de nobreza e seriedade. E essa
questão é justamente a constatada acima, quando dizemos que o cartaz
traz a ‘sobriedade e o clássico’ dos Concertos Comunitários Zaffari.
Mas, dando continuidade à descrição do “casamentoentre as cores branco e
preto, encontramos mais uma categoria, desta vez a posteriori, que é a Antítese. O
preto e o branco fazem uma interpelação, um “chamar a atenção”, para o que está
sendo dito na peça.
A Antítese, conforme Barthes (2000, p. 95), é, evidentemente, a figura
preferida da ponta”: ela capta todas as categorias gramaticais, os substantivos (por
exemplo, razão/natureza), os adjetivos (grande/pequeno) e os pronomes mais
humildes de aparência (um/outro), desde que sejam colocados em oposição
significativa. E, para além da gramática, pode captar, é claro, movimentos, temas,
opor, por exemplo, todas expressões do acima (elevar-se) a todas as do abaixo
(abaixar).
O autor observa que, no mundo da máxima, a Antítese é uma força universal
de significação, a ponto de poder tornar espetacular (pertinente, diriam os linguistas)
um simples contraste de números; este, por exemplo: “Só uma espécie de amor,
mas mil diferentes cópias”, sendo que a oposição um/mil constitui a ponta”.
Vemos, assim, que a Antítese não é apenas uma figura enfática, isto é, um simples
cenário do pensamento. É provavelmente outra coisa e mais um jeito de fazer surgir
o sentido de uma oposição de termos.
Como sabemos pelas explorações recentes da linguística que é esse o
procedimento fundamental da significação (e certos fisiologistas dizem mesmo da
percepção), compreendemos melhor que a antítese combine tão bem com essas
linguagens arcaicas, que são provavelmente o verso e o aforismo. A Antítese não é
basicamente senão o mecanismo totalmente nu do sentido, e como, em toda
sociedade evoluída, a volta às fontes funciona afinal como um espetáculo
62
surpreendente, assim a Antítese se tornou uma “ponta”, isto é, o espetáculo mesmo
do sentido.
Portanto, a Antítese é um recurso estilístico literário que consiste na
exposição de iias opostas. Ocorre quando uma aproximação de palavras ou
expressões de sentidos opostos e, no nosso caso, de cores opostas. O contraste
que se estabelece serve, essencialmente, para dar uma ênfase aos conceitos
envolvidos que não conseguiríamos com a exposição isolada dos mesmos. É uma
figura relacionada e muitas vezes confundida com o paradoxo. Várias antíteses
podem ser feitas por intermédio de Amor e Ódio, Sol e Chuva, Paraíso e Inferno,
Deus e Diabo.
A categoria Poder nos traz a idéia dos prazeres vendidos, mostra-nos a
catarse do público (expressão de emoção por parte do homem em primeiro plano e
da alegria por parte do restante da plateia, com os sorrisos) e as mãos pra cima,
fechadas em palmas, como símbolos de Poder.
Para Chevalier e Gheerbant (1991, p. 589), “A mão exprime as ideias de
atividade, ao mesmo tempo em que as de Poder e de dominação.Lembra, ainda,
que
A palavra manifestação tem a mesma raiz que mão, manifestando aquilo
que pode ser seguro ou alcançado pela mão. É um emblema real,
instrumento de maestria e signo de dominação, a mesma palavra em
hebreu significa concomitantemente mão e Poder. (CHEVALIER;
GHEERBANT, 1991, p. 589).
Nas religiões budista e hinduísta, o simbolismo essencial é o dos mudras,
gestos da mão, para os quais o “anjali-mudra”, mãos juntas na posição, o que nos é
familiar tanto na reza quanto nas palmas, significa reza e adoração. Chevalier e
Gheerbant (1991, p. 592) observa que “A mão é, às vezes, comparada com o olho:
ela vê. É uma interpretação que a Psicanálise reteve, considerando que a mão que
aparece nos sonhos é equivalente ao olho.”
63
Segundo Chevalier e Gheerbrant (1991, p. 594) as mãos do homem estão do
mesmo modo ligadas ao conhecimento, à visão, pois elas têm como fim a
linguagem. Em seu tratado sobre a criação do homem, ele escreve:
[...] as mãos são para ele, em função das necessidades de linguagem, de
grande ajuda. Quem vê no uso das mãos o que é próprio de uma natureza
racional não esenganado, pela razão corrente é fácil de compreender de
que elas nos permitem representar nossas palavras através de letras; com
efeito, é bem uma das marcas da presença da razão a expressão através
das letras e de uma certa maneira de conversar com as mãos, dando os
caracteres escritos pertinência aos sons e aos gestos [...]
Chevalier e Gheerbant (1991, p. 592) concluem que
[...] a mão é, enfim, um mbolo da ação diferenciadora. Sua significação se
aproxima da flecha e lembra que o nome de Quirão, Sagitário, cujo
ideograma é uma flecha, vem da palavra mão. É como uma síntese,
exclusivamente humana, do masculino e do feminino. Ela é passiva naquilo
que contém; ativa no que segura. Serve de arma e de utensílio; ela se
prolonga através de seus instrumentos. Mas ela diferencia o homem de
todos os animais e serve, tamm, para diferenciar os objetos que toca e
modela.
Mesmo quando indica uma tomada de posse ou uma afirmação de Poder a
mão da justiça, a mão posta sobre um objeto ou um território, a mão dada em
casamento -, ela distingue aquele que ela representa, seja no exercício de suas
funções, seja em uma situação nova.
A Cultura é demonstrada a partir da foto da natureza, da foto da multidão
reunida prestigiando a música, a Cultura do povo gaúcho e Deus, com a frase “dos
grandes mestres” e a criação da natureza por um Deus.
Uma categoria básica do halo teórico barthesiano é a Cultura. Ela se
sincretiza na maresia no cotidiano, como as nossas conversas, as nossas leituras,
as nossas músicas. Decodificamos a Cultura, como intertexto, materializando os nós
que unem o vento da linguagem ao evento social. Barthes (1971b, p. 84) a
pormenoriza: É a cultura, o infinito das leituras, das conversas ainda que sob a
forma de fragmentos prematuros e mal compreendidos - em resumo, o inter-texto
que faz pressão sobre um trabalho e bate à porta, para entrar [...]”
64
O Intertexto, talvez, seja a metalinguagem de Barthes mais consequente, para
metaforizar a sua compreensão cultural. Ele o caracteriza como “[...] banco de
‘influências’, das ‘fontes’, das ‘origens’.” (BARTHES, 1971b, p. 94) de uma obra e de
um autor. A Cultura, nessa perspectiva, é inseparável dos empreendimentos
linguageiros, em geral, e da produção discursiva, em particular. A questão do
Discurso pode tornar-se essencial, como um dos significantes da dialética cultural.
Barthes (1994 apud RAMOS, 2007, p. 9) categoriza o Discurso com a
reivindicação do zelo do resgate etimológico. Anota que “[...] discursus é,
originalmente, a ação de correr para todo o lado, são idas e vindas, ‘demarches’,
intrigas”. É um transitar obsessivo pelos signos. Tamm observa, num sentido de
Mallarmé, que é uma divagação, que revela e encobre.
O semiólogo (BARTHES, 1999, p. 101) propõe dois tipos básicos de Discurso
por intermédio de suas relações com o Poder:
[...] Nas sociedades atuais, a mais simples divisão de linguagens incidem
sobre a relação com o Poder. linguagens, que se anunciam, se
desenvolvem, se marcam na luz (ou na sombra do Poder), dos seus
múltiplos aparelhos estatais, institucionais, ideológicos, chamar-lhes-ei de
linguagens ou discursos Encráticos. E, de outro lado, há linguagens, que se
elaboram, se procuram, se armam fora do Poder e/ou contra ele, chamar-
lhes-ei de linguagens ou discursos Acráticos [...]
O Socioleto, para Barthes (1999), é uma característica discursiva grupal e,
quando partimos para a análise desta peça, o cartaz comemorativo aos 20 anos dos
Concertos Comunitários Zaffari, caracteriza-se pelo Poder Encrático. A linguagem do
Poder, pois o texto se autoequipara a Deus e a belas criações deste, fazendo a
Antítese e dizendo que precisa “de você”, seu público consumidor e participante
dos concertos.
O Poder ganha explicitude como diferencial nas tipologias discursivas.
Barthes (1996) o caracteriza como Libido dominandi”. Está relacionado com a
história inteira do homem e não somente com a história política. É uma invariância
na existência humana, por meio da simbiose entre dominação e poder.
65
O semiólogo propõe, sem um apuro filosófico, um elo interdisciplinar com a
Psicanálise, criada por Freud, sem a devida explicitude. Metaforiza o Poder,
tornando-o análogo à categoria Libido, que, em seu desenho biológico e cultural, é
constituinte dos processos do inconsciente.
Ainda que invariante, a Libido se particulariza como energia prazerosa em
diferentes fases. Passa pela oral, anal e fálica na primeira infância. Possui
constância, supratemporalidade e supraespacialidade. Tal qual acontece com o
Poder, que é imutável no curso da história, porém se singulariza em cada
conjuntura.
O Sujeito é exposto pela plateia e, principalmente, pelo homem em primeiro
plano, demonstrando que a emoção daquele indivíduo é tratada de forma individual,
apesar de fazer parte de uma plateia, de um grande público.
Morin categoriza o Sujeito como Significado e Significante, os quais são
indissociáveis como elementos constituintes da ntese semiológica. Sendo o
Significado a aparência, o Imaginário em seu desenho ilusório. É da ordem da
consciência. Tal qual a Conotação, o Significante pode representar a essência. Tem
relação com o simbólico. É da ordem do Inconsciente.
No caso da peça analisada, temos a imagem do rapaz sendo o Significado,
imagem e resultado concreto, consciente. Ao mesmo tempo em que aquela mesma
imagem pode significar o consumidor, sentindo-se representado por aquela pessoa
que faz parte do público dos Concertos Comunitários Zaffari. Parte de um todo que
se emociona com um espetáculo de arte.
A categoria Organização nos remete à parte pelo todo, com homem em
primeiro plano; à metomínia, uma representação de uma ação verossímel do que,
realmente, acontece com a plateia que assiste aos Concertos Comunitários Zaffari e
a como a Cia Zaffari se “vende”, utilizando a Cultura e a entrega de cultura à
comunidade, sendo esta organização uma rede de supermercados.
66
Os novos paradigmas, que ganham espaço nos estudos organizacionais
contemporâneos, apontam para a necessidade das organizações de desenvolver
modelos de gestão que passem, efetivamente, a considerar uma visão sistêmica e
relacional dos processos. Sob esse contexto, contemplam-se estudos teóricos que
abordam reflexões sobre as concepções e estruturas organizacionais, considerando
o ambiente contemporâneo.
No contexto apresentado, Rodrigues e Cunha (2000, p. 67) nos fazem-nos
perceber que “Os modelos de gestão vigentes estão se esgotando, fazendo com que
uma nova perspectiva de compreensão organizacional venha a emergir.” Sendo
assim,
[...] considerar que as organizações são espaços de diversidade e
pluralidade significa dizer que antigas referências e quadros interpretativos
podem ser aceitos ou contestados e refutados diante da emergência de
uma nova corrente intelectual dominante, de um novo paradigma, que
possa contemplar toda a complexidade organizacional.
Chanlat (2000) destaca que, nos últimos anos, houve movimentos de retorno
do ator e do sujeito no âmbito das Ciências Sociais contemporâneas. Toda pessoa é
um ator, e a realidade das organizações se produz, reproduz e se transforma por
meio da interação dos diferentes grupos e indivíduos que as compõem.
Nesta mesma linha de pensar, Rodrigues e Cunha (2000, p. 68) ressaltam
que “[...] o conhecimento científico é intrinsecamente um processo de grupo e nem a
sua peculiar eficácia nem a maneira como se desenvolve se compreenderão sem
referência especial dos grupos que o produzem”, enfatizando a pluralidade e a
diversidade. Chanlat (1993) corrobora esses argumentos, quando manifesta que os
estudos das organizações enfatizam os processos sociais e relações coletivas
porque são coletividades que estão agindo e interagindo.
Sob outra categorização, Chanlat (1993, p. 41) defende que a Organização é
um quadro social de referência no qual se apresentam fenômenos humanos. As
Organizações contemporâneas passam a exercer enorme influência “[...] sobre as
condutas individuais, sobre a natureza, as estruturas socioeconômicas e a cultura, o
67
que as leva a se transformar em elementos-chave das sociedades, contribuindo,
dessa forma, a edificar uma ordem social mundial.”
Considerando esta linha de abordagem, destacamos que as representações
imaginárias que uma Organização cultiva mostram quem é quem, descobrem e
mapeiam praxes nem sempre explícitas, ratificam precedências e formalidades
compulsórias, regulam expectativas e pautas de comportamentos, e exigem cautela
e aprendizagem por parte de todos os membros (CHANLAT, 1993).
Enquanto a dimensão política traça o espaço da arena em que se articulam
as relações de Poder e a dimensão econômica demarca o espaço da praça, em que
se articulam as relações de haver, a dimensão simlica representa o espaço do
palco em que se articulam as relações de saber (CHANLAT, 1993).
Desta forma, segundo Chanlat (1993, p. 44), “[...] a ordem de interação é
influenciada pelos indivíduos presentes.” A ordem organizacional é, ao mesmo
tempo, o produto e o produtor da ordem societal e da mundial, quando,
inversamente, a ordem mundial irepercutir sobre os outros níveis. O autor afirma
que reunir o que estava separado, colocar em evidência as dimensões esquecidas,
reafirmar o papel do indivíduo, da experiência, do simbólico nas organizações e, ao
mesmo tempo, restituí-los ao seu quadro sócio-histórico, é a ambição da
antropologia das organizações, que propõe a consideração de todas as ciências que
entendem o homem como ser vivo, consciente e capaz de integrar-se socialmente.
Deste modo, todo fenômeno estudado tem sempre rias explicações, num contexto
que envolva a multidisciplinaridade e interdisciplinaridade (MORIN, 2005).
Concebem-se, desta forma, as consequências apontadas pelos teóricos que
discutem e apresentam os problemas, enfrentados pelas Organizações mediante o
desgaste do paradigma da simplificação, enfatizando a influência das mesmas
enquanto produto e produtoras da ordem social contemporânea. Assim, destacam-
se aqueles que apontam a necessidade de (re) olhar a organização considerando
sua complexidade.
68
É no cenário complexo da contemporaneidade que a Comunicação
Organizacional passa a acontecer. Para Giddens (2003, p. 22),
O que separa a era moderna de qualquer período anterior é seu dinamismo.
O mundo moderno é um “mundo em disparada”: não só o ritmo de mudança
social é muito mais rápido que em qualquer sistema anterior; tamm, a
amplitude e a profundidade com que a era moderna afeta práticas sociais e
modos de comportamento preexistentes são maiores. A consequência de as
organizações passarem a ser elementos-chave para a ordem social fez com
que a comunicação assumisse novas formas de atuação, deixando de ser
apenas técnica e instrumental, para ser, tamm, estratégica e planejada.
Kunsch (2000, p. 175) considera “[...] três dimensões da Comunicação
Organizacional: a humana, a instrumental e a estratégica. Na humana, a
Comunicação é entendida como parte, inerente à natureza das Organizações, pois
são estruturas formadas por pessoas que se comunicam entre si e que, por meio da
interação, viabilizam o sistema funcional, para a sobrevivência e consecução dos
objetivos organizacionais num contexto de diversidade e transações complexas.
Conforme Taylor (1990, p. 215), “As Organizações se auto-organizam e o fazem
como resultado da dinâmica de interação local. A auto-organização é um fenômeno
comunicacional.”
A percepção congruente tem Morin (2006), quando o autor elucida que uma
Organização, como a empresa, está situada num mercado. Produz objetos ou
serviços – coisas, que saem dela e entram no universo do consumo. Mas se limitar a
uma visão heteroprodutiva da empresa seria insuficiente, pois, ao produzir coisas e
serviços, ela, ao mesmo tempo, se autoproduz. O autor defende que, ao organizar a
produção de objetos e serviços, a empresa se auto-organiza, automanm-se,
autorrepara-se, caso necessário, e autodesenvolve-se, enquanto desenvolve sua
produção. Desse modo, continua o autor, ao produzir produtos independentes do
produtor, a empresa desenvolve um processo no qual o produtor produz a si mesmo.
De um lado, sua autoprodução é necessária à produção de objetos; de outra parte, a
produção de objetos é necessária à sua própria produção (MORIN, 2006).
a segunda dimensão da Comunicação Organizacional, denominada
instrumental, ainda é a mais presente e predominante nas Organizações, ou seja, a
simples transmissão de informação. Chanlat (1993), para explicar essa maneira de
69
entender a Comunicação, utiliza a “metáfora do conduíte”: é considerada um canal
ou via de envio de informações. O foco está nas Mídias internas e externas e, nesse
modelo, o setor ou departamento de Comunicação atua na divulgação de notícias
numa esfera tática e técnica.
A terceira e última dimensão da Comunicação Organizacional seria a
estratégica, na qual a Comunicação é considerada como fator estratégico de
resultados que agregam valor à organização e aos negócios e como parte integrante
da gestão das empresas. Kunsch (2000) entende que a dimensão estratégica é o
caminho para a Comunicação Organizacional do futuro. A autora defende que a
Comunicação auxilia a Organização a fazer a leitura das ameaças e das
oportunidades presentes na dinâmica do ambiente global, avaliando a cultura
organizacional e pensando estrategicamente as ações comunicativas.
Após analisarmos esta única peça, neste primeiro momento, na recente
iniciação de um processo que findará daqui a muitas páginas, ficamos
impressionados com tamanho mundo a ser descoberto a partir da teoria escolhida
em Barthes e Morin.
Portanto, o cartaz comemorativo aos 20 anos dos Concertos Comunitários
Zaffari perpassa pela categoria Comunicação, em que se apresenta o projeto de
comunicação organizacional da Cia, que são os Concertos Comunitários Zaffari. A
Cor representa a Antítese do preto e do branco. O Poder, pudemos observá-lo por
meio dos prazeres vendidos e da catarse do público. A categoria Cultura nos traz a
ideia de natureza divina e do projeto dos concertos, o qual já faz parte da Cultura do
povo gaúcho, com 20 anos de história. O Sujeito é tratado de forma particular na
imagem de uma pessoa, que, ao mesmo tempo, representa a emoção do todo que é
a plateia dos concertos. Na categoria Organização, encontramos a Cia Zaffari, sua
forma de se “vender” ao blico, um tanto diferente das demais do mercado, que se
reproduz por intermédio da interação do seu público do referido evento. E,
finalmente, o Socioleto, com o Discurso Encrático bem delimitado, com o texto
fazendo alusão a Deus e a suas criações, utilizando-se da frase: “Os grandes
mestres precisaram de muita inspiração para criar suas obras. Nós precisamos
de uma: você”. Algumas categorias com maior ênfase, outras com menor
70
constância, mas todas juntas, montando o “quebra-cabeças” que é a análise
científica, teórica e simbólica, do que a princípio nos parecia ser uma simples peça
publicitária.
3.2 ANÚNCIO ALUSIVO À SEMANA FARROUPILHA
A segunda peça é alusiva à Semana Farroupilha e à 31ª Expointer, maior
feira agropecuária da América Latina, realizada no Parque de Exposições de Esteio
RS, na qual a Cia Zaffari se faz presente como patrocinadora oficial do Freio de
Ouro, principal campeonato de cavalos crioulos.
O Freio de Ouro, denominado prova Flavio e Roberto Bastos Tellechea, é a
maior e mais popular promoção da raça Crioula e, talvez, a maior competição de
animais puros de uma só raça no Brasil.
Descendente direto dos primeiros cavalos trazidos para a América Latina
pelos espanhóis, o cavalo crioulo está presente em praticamente todos os estados
da União, segundo mostram dados da Associação Brasileira de Criadores de
Cavalos Crioulos (ABCCC), com sede em Pelotas (RS). Segundo o Relatório
populacional da raça, emitido pela entidade, estão registrados 84.741 animais, entre
machos e meas, espalhados por 22 estados brasileiros (ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DE CRIADORES DE CAVALOS CRIOULOS, 2008).
A expansão do crioulo a partir do Rio Grande do Sul e o conceito que adquiriu
entre criadores e aficcionados foram conquistas devido a suas características de
rusticidade e habilidade nas lides de campo. Forjada por uma rigorosa seleção
natural ao longo de 500 anos no sul do continente americano, que apresenta
temperaturas elevadas no verão e, extremamente, baixas no inverno, a raça Crioula
é hoje uma das mais conceituadas e valorizadas criações equinas não no Brasil,
mas também no Uruguai, Argentina e Chile.
71
Neste contexto, o Rio Grande do Sul se destaca não apenas com estado
matriz, mas tamm pelo maior plantel crioulo, com 48.544 fêmeas e 24.359 machos
registrados. A expansão dessa raça a partir do Rio Grande do Sul e o alto conceito
que granjeou entre criadores de todas as partes do país e tamm exterior foram
conquistados mais recentemente, também, nos esportes equestres, nos quais vem
ganhando espaço.
A eficiência funcional do crioulo, sua rusticidade, longevidade e baixo custo
atraíram muita gente para a raça. Hoje o mero de criadores já ultrapassa os cinco
mil, metade deles associados à ABCCC. Desse total, grande parte não é do meio
rural, tendo aderido à criação em busca do lazer ou das provas funcionais,
organizadas pela Associação Brasileira de Criadores.
As provas funcionais deram origem ao Freio de Ouro, uma competição
realizada, unicamente, por esta raça. É o Freio que testa na prática toda a
potencialidade e a habilidade do cavalo Crioulo, envolvendo cerca de 800 animais
em mais de 30 provas Credenciadoras (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
CRIADORES DE CAVALOS CRIOULOS, 2008).
Cada uma dessas credenciadoras seleciona no máximo quatro machos e
quatro meas para a etapa seguinte, as Finais Classificatórias Regionais. Estas
tamm selecionam no máximo 4 machos e 4 fêmeas, sem reservas, e desde que
os animais atinjam 18 pontos pelos critérios de pontuação da ABCCC. Uma exceção
é feita em relação à Classificatória de Montevidéu, no Uruguai, que seleciona
somente dois machos e duas fêmeas, fechando o número de animais que
participaram da final em Esteio, com 30 machos e 30 fêmeas. A grande final do Freio
de Ouro é realizada em Esteio durante a Expointer, em que, após dois dias de
competições entre os melhores expoentes da raça, são conhecidos os campeões,
macho e mea, que recebem a mais alta congratulação do meio crioulístico.
(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CRIADORES DE CAVALOS CRIOULOS, 2008).
Ao longo de todo esse processo, praticamente um ano de competições
selecionando os mais destacados exemplares para a final, centenas de criadores e
ginetes estão mobilizados, não no Rio Grande do Sul, mas também no Paraná e
72
São Paulo, onde são realizadas Finais Classificatórias e em Montevidéu, onde
ocorre outra. Este panorama dá uma idéia da dimensão que a raça alcançou, bem
como sua organização e desenvolvimento.
O Diretor-Presidente da Cia Zaffari, falecido neste ano, era um admirador e
criador da raça crioula. Por isso, também, este grande vínculo da Cia Zaffari com o
Freio de Ouro.
A segunda análise é de um anúncio horizontal, dividido em duas grandes
caixas. Na caixa da esquerda, uma ilustração em homenagem ao pintor Nelson
Junglubuth, na qual podemos distinguir dois gaúchos comandando uma tropa de
cavalos em movimento.
Jungbluth começou a carreira criando quadrinhos, enveredou pela
publicidade, ganhou fama como ilustrador e se popularizou como pintor com
imagens de cavalos. Gaúcho de Taquara, era considerado um artista de cores
generosas e figuras faceiras. Foi determinante, para sua formação, a longa
passagem pela ilustração publicitária.
Em 1939, seguiu para o Rio de Janeiro e começou a desenhar,
profissionalmente, quadrinhos nas revistas Suplemento Juvenil e O Guri. Na capital
fluminense, iniciou-se no desenho de propaganda. Durante 35 anos, Jungbluth fez
os famosos cartazes e calendários da companhia aérea Varig. Desenhava cenários
do Brasil e do mundo, apostando nas cores explosivas e festivas. "Eu era o
publicitário melhor pago no Rio Grande do Sul. Tinha o maior salário do Estado na
área da publicidade. E larguei tudo, para ser artista. A publicidade é maravilhosa,
mas eu queria seguir outro caminho. Minha mulher ficou doida", contou o artista em
entrevista a Zero Hora em 2001 (GRUPO RBS, 2008).
Como artista, os cavalos foram seu tema de maior sucesso. "Já reparou que
os meus cavalos não têm freio? Para mim, o cavalo tem que estar livre. Nunca está
preso num brete, num cercado", costumava dizer. Críticos observavam que
Jungbluth pintava os mais elegantes cavalos das artes plásticas brasileiras (GRUPO
RBS, 2008).
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Na parte direita do anúncio, consta a frase “31ª Expointer. Uma feira, para
servir de modelo a toda Terra.”, com assinatura do Zaffari e Bourbon, empresa cem
por cento brasileira.
As cores, novamente, são elementos que nos chamam a atenção nesta peça,
sendo que o fundo é, predominantemente, marrom, cor de “terra”, desta terra, o Rio
Grande do Sul.
Farina (2003) analisa que as Cores fazem parte da vida do homem porque
são vibrações do cosmo que penetram em seu cérebro, para continuar vibrando e
impressionando sua psique, para dar um som e um colorido ao pensamento e às
coisas que o rodeiam, enfim, para dar sabor à vida, ao ambiente. No caso
específico da cor marrom, os cientistas estabelecem dois tipos de associações: na
material, seria a terra, e, na afetiva, seriam a resistência e o vigor.
Para Chevalier e Gheerbant (1991, p. 879-880),
A terra simboliza a função maternal: e rouba a vida. A terra fértil e a
mulher são, frequentemente, comparadas na literatura: sulcos semeados, o
lavrar e a penetração sexual, parto e colheita, trabalho agrícola e ato
gerador, colheita dos frutos e aleitamento, o ferro do arado e o falo do
homem. Com esse caráter sagrado, esse papel maternal, a terra intervém
na sociedade como garantia dos juramentos. Se o juramento é o elo vital do
grupo, a terra é a mãe e o sustento de toda a sociedade.
A frase em vermelho faz alusão ao Zaffari, ao sangue gaúcho, que, tantas
vezes, foi derramado em luta pela terra, principalmente, na Guerra Farroupilha, uma
guerra perdida, mas, até hoje, ovacionada e festejada pelos gaúchos, pelo simples
fato de o povo lutar pelo que é seu e ter orgulho de seu Estado.
De acordo com as de sensações cromáticas, citadas por Farina (2003),
podemos nos deter nos dois tipos, materiais e afetivas.
Nas sensações de cunho material, podemos citar a guerra, o sangue, o
combate, as feridas, a conquista e a masculinidade. Nas sensações
afetivas, salientamos o dinamismo, a força, a baixeza, a energia, a revolta, o
movimento, o barbarismo, a coragem, o furor, o esplendor, a intensidade, a
paixão, o poderio, o vigor, a glória, a violência, a emoção, a ação e a
agressividade. (FARINA, 2003, p. 113-114).
74
Portanto, as sensações cromáticas da cor vermelha estão, totalmente,
inseridas no significados e significantes da Revolução Farroupilha para os gaúchos.
Conforme Franco (2005), a Revolução Farroupilha teve dois grupos
conflitantes, os Chimangos e os Margatos. Este último nome foi dado aos sulistas
que iniciaram a Revolução Federalista no Rio Grande do Sul, em 1893, em protesto
à política exercida pelo governo federal, representada na província por Julio de
Castilhos. Os Maragatos eram identificados pelo uso de um lenço vermelho no
pescoço.
O termo tinha uma conotação pejorativa, atribuída pelos legalistas aos
revoltosos, liderados por Gaspar da Silveira Martins, eminente tribuno, e o caudilho
estrategista Gumercindo Saraiva, os quais deixaram o exílio, no Uruguai, e entraram
no Rio Grande do Sul à frente de um exército.
Como o exílio havia ocorrido em rego do Uruguai, colonizada por pessoas
originárias da Maragateria (na Espanha), os republicanos, então chamados Pica-
paus, os apelidaram de Maragatos, buscando caracterizar uma identidade
"estrangeira" aos federalistas. Com o tempo, o termo perdeu a conotação pejorativa
e assumiu significado positivo, aceito e defendido pelos federalistas e seus
sucessores políticos.
Na Revolução de 1923, desencadeada contra a permanência de Borges de
Medeiros no governo do Estado, novamente, a corrente maragata rebelou-se,
liderada pelo diplomata e pecuarista Assis Brasil. Seus antagonistas, que detinham o
governo, eram chamados, no Rio Grande do Sul, de Chimangos, comparando-os à
ave de rapina. O lenço vermelho identificava o Maragato. O lenço branco identificava
o Pica-Pau e o Chimango. O movimento originou, no Rio Grande do Sul, o Partido
Libertador, de grande influência regional.
Ainda podemos salientar que, no Ocidente, a cor vermelha chama muito mais
a atenção do que no Oriente porque, , os indivíduos tinham fontes naturais para
extrair pigmentos vermelhos muito mais tempo. Lembramos que os portugueses
75
deram o nome de Brasil para nosso país, porque aqui cresciam naturalmente
árvores de Pau-Brasil, das quais se extraía um líquido vermelho, para tingir tecidos.
Nessa época do Descobrimento do Brasil, os nobres podiam vestir
vermelho. O significado da cor representava riqueza, ostentação. Hoje em dia, o
significado do vermelho não é mais o mesmo, pois surgiram outras fontes de
pigmentos muito mais baratas, permitindo que todos vistam vermelho, se quiserem.
a categoria Poder ilustra-se nos gaúchos em seus cavalos, na alegria que
envolve o gaúcho e que exerce sobre o seu instrumento de trabalho, o cavalo.
A frase do anúncio, também, demonstra o Poder do gaúcho de mostrar ao
restante do mundo suas façanhas e as riquezas de suas terras, fazendo alusão aos
dizeres do hino rio-grandense:
Como aurora precursora
Do farol da divindade
Foi o vinte de setembro
O precursor da liberdade
Mostremos valor constância
Nesta ímpia injusta guerra
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra
De modelo a toda terra
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra
Mas não basta pra ser livre
Ser forte, aguerrido e bravo
Povo que não tem virtude
Acaba por ser escravo
A categoria Cultura é a ênfase da peça, que traz a figura do gaúcho e do
cavalo, a exaltação do amor pela sua terra e o exemplo que o povo gaúcho acredita
que repassa ao restante do país.
O gaúcho é uma denominação das pessoas ligadas à atividade pecuária em
regiões de ocorrência de campos naturais do vale do Rio da Prata, entre os quais o
bioma denominado pampa, supostamente descendente, mestiço de espanhóis,
portugueses, indígenas e negros. As peculiares características de seu modo de vida
pastoril teriam forjado uma cultura própria, derivada do amálgama da cultura ibérica,
76
indígena e africana, adaptada ao trabalho pecuário em propriedades denominadas
estâncias. É assim conhecido no Brasil, enquanto que em países de língua
espanhola, como Argentina e Uruguai, é chamado de gaúcho.
O termo tamm é, correntemente, usado como gentílico, para denominação
de habitantes do estado brasileiro do Rio Grande do Sul. Em alguns casos, o termo
é utilizado por habitantes do norte do Brasil para denominar os oriundos de qualquer
região do sul do país.
O termo é, ainda, utilizado para denominar um tipo folclórico e um conjunto de
tradições codificado e difundido por um movimento cultural agrupado em
agremiações que cultivam ou mantêm tais tradições, denominadas CTGs. Seria,
conforme seus defensores, a denominação de uma nacionalidade.
Existem rias teorias conflitantes sobre a origem do termo "gaúcho". Pode
ser que o vocábulo tenha derivado do quechua (idioma ameríndio andino) ou do
árabe "chaucho" (um tipo de chicote para controlar manadas de animais). Am
disso, abundam outras hipóteses sobre o assunto. A primeira vez que foi
documentado o seu uso foi em torno de 1816, durante a independência da
Argentina, quando se denominava uma ou rias tribos de índios Nômades, os
gaúchos ou os tamm chamados chá-rruas (daí o chá - chimarrão, bebida típica,
extraída do chá verde seco), índios cavaleiros de cor mais escura (moura), que
domavam e cavalgavam "em pelo" os cavalos que se desgarraram das estâncias
espanholas e se procriavam nos pampas de forma selvagem (CULTURA..., 2008).
Segundo Lessa (1995), o primeiro registro da palavra se deu em 1787,
quando o matemático português Dr. José de Saldanha participava como integrante
da comissão demarcadora de limites na fronteira do Brasil com o Uruguai. O registro
se deu em uma nota de rodapé, em seu relatório de trabalho, com relação aos índios
cavaleiros.
O termo originou-se na língua indígena, na descrição de pessoas, de hábitos
nômades, ciganos, moradores em barracas ou tendas, brancos pobres, de
miscigenação moura, vinda da Espanha fugidos, que viraram índios ou índios
77
aculturados pelas missões que não possuíam terras e vendiam sua força de trabalho
a criadores de gado nas regiões de ocorrência de campos naturais do vale do Rio da
Prata, entre os quais o pampa, planície do vale do Rio da Prata e com pequena
ocorrência no oeste do estado do Rio Grande do Sul, limitada, a oeste, pela
cordilheira dos Andes.
O gentílico "gaúcho" foi aplicado aos habitantes da Província do Rio Grande
do Sul na época do Império Brasileiro por motivos políticos, para identificá-los como
beligerantes até o final da Guerra Farroupilha, sendo adotado posteriormente pelos
próprios habitantes por ocasião da pacificação de Caxias, quando incorporou muitos
soldados gaúchos ao Exército ao final do Confronto, sendo Osório um gaúcho que
participou da Guerra do Paraguai e é patrono da arma de Cavalaria do Exército
Brasileiro. Nessa época, valores culturais tomaram outro significado patriótico, os
cavaleiros mouros se notabilizaram na Guerra ou Confronto com o Paraguai.
Também importante, para a adoção dessa imagem mítica para representação do
Estado do Rio Grande do Sul, é a influência do nativismo argentino que, no final do
século XIX, expressa a construção de um mito fundador da cultura da região.
Na Argentina, o poema épico Martín Fierro, de José Hernández, exemplifica a
utilização do elemento gaúcho como o símbolo da tradição nacional da Argentina,
em contradição com a opressão simbolizada pela europeização. Martín Fierro, o
herói do poema, é um "gaúcho" recrutado à força pelo exército argentino, que
abandona seu posto e se torna um fugitivo caçado. Esta imagem idealizada do
gaúcho livre e altivo é frequentemente contrastada com aquela dos trabalhadores
mestiços das outras regiões do Brasil.
Os gaúchos apreciam mostrar-se como grandes cavaleiros, e o cavalo do
gaúcho, especialmente o cavalo crioulo, "era tudo o que ele possuía neste mundo".
Durante as guerras do século XIX, que ocorreram na rego, atualmente conhecida
como Cone Sul, as cavalarias de todos os países eram compostas quase que
inteiramente por gaúchos.
Existemrios ritmos que fazem parte da cultura gaúcha, mas a maioria deles
são variações de danças de salão centro-européias populares no século XIX. Esses
78
ritmos, derivados da valsa, do xote, da polca e da mazurca, foram adaptados como
vaneira, vaneirão, chamamé, milonga, rancheira, xote, polonaise e chimarrita, entre
outros.
O único ritmo que, realmente, é gaúcho, é o Bugio, criado pelo gaiteiro
Wenceslau da Silva Gomes, conhecido como Neneca Gomes, em 1928, na então
província de São Francisco de Assis. Inspirado no ronco dos bugios, macacos que
habitam as matas do Rio Grande do Sul, o ritmo foi banido de lá por ser considerado
obsceno, mas foi cultivado em São Francisco de Paula, onde ahoje é realizado o
festival nativista "O Ronco do Bugio" (CULTURA..., 2008).
A partir de 1970, com a criação da Califórnia da Canção Nativa em
Uruguaiana, começaram a surgir festivais de música nativa, que incentivaram o
surgimento de novos estilos, de músicos e compositores, naquilo que passou a ser
chamado de "música nativista". A música nativista é formada por ritmos que já
existiam, com destaque para a milonga e o chamamé, porém com canções mais
elaboradas e com letras quase sempre dedicadas ao Rio Grande do Sul.
A pilcha é a indumentária do gaúcho. O traje típico do gaúcho inclui o seu
pala (ou poncho), um sobretudo que pode servir de cobertor para dormir (com um
corte central para enfiar a cabeça, o chamado "poncho"), um facão ou adaga (ou
facón, em castelhano), um relho (ou rebenque) e as calças largas chamadas
bombachas, para facilitar a montaria, presas às suas cinturas por um tipo de cinto
com diversos bolsos de couro, denominado guaiaca (ou tirador, em castelhano). São
complementos as botas, o chapéu de barbicacho e o lenço no pescoço. Pode
carregar boleadeiras (bolas ou boleadoras, em castelhano), uma soga (corda) de
couro torcido ou trançado com duas pedras redondas, amarradas em cada uma de
suas extremidades e outra soga (corda) de couro atada no meio dela com uma
pedra menor na extremidade, chamada de Pedra Chica, formando uma ferramenta,
para caça ou captura de animais, com três pedras muito utilizadas no pampa
gaúcho, em comparação com o lariat ou riata do cowboy , vaqueiro norte-americano.
O dialeto gaúcho, a exemplo do falar de outros locais do Brasil, possui
expressões próprias em relação à língua padrão do País, alguns próprios da cultura
79
urbana do Rio Grande do Sul, que não necessariamente fazem parte da cultura
original dos camponeses denominados "gaúchos". Tudo o que temos sobre os
gaúchos são registro históricos que demarcam apenas uma idéia de tempo, e não
exatamente de onde surgiu este "afamado" povo.
O Sujeito é trazido na forma do sentimento de “ser gaúcho” e no orgulho de
suas façanhas. A Cia Zaffari, em diversas oportunidades, traz à tona o sentimento do
povo gaúcho, que sabe ser forte e latente, e tem um resultado positivo nestes
discursos, já que se destaca no meio de grupos supermercadistas mundiais. O
sentimento bairrista do gaúcho abraça esta Cia, tamm gaúcha, preterindo as
demais.
A categoria Organização, novamente, nos traz a parte e o todo, sendo o RS e
o sentimento dos gaúchos uma parte, e o resto da “terra”, o todo. Ou, ainda, o
Estado do RS sendo o todo e cada gaúch0 uma fatia deste orgulho.
Valorizando as coisas da terra gaúcha, a Cia se faz presente na vida do
agricultor, do pecuarista, do público visitante da Expointer, do criador ou admirador
do cavalo crioulo e até daquele “forasteiro”, que porventura tenha vindo morar no
RS.
Uma Organização que vende produtos variados, mas que, neste anúncio e
nas demais ações e discursos, consegue, simplesmente, se mostrar gaúcha e parte
de um sentimento que para muitos é intangível. Varejo ou retalho é a venda de
produtos ou a comercialização de serviços em pequenas quantidades, em oposição
ao que ocorre no atacado. É a venda por retalho, como por partes de um todo, direto
ao comprador final, o consumidor do produto ou serviço, sem intermediários.
Segundo Kotler (2000, p. 540),
Todas as atividades de venda de bens ou serviços, diretamente, aos
consumidores finais, o definidas como varejo. O local onde os produtos
ou serviços são vendidos (lojas, rua ou residência do consumidor) não é
importante. Da mesma forma, todas as maneiras pela qual estes bens ou
serviços o vendidos estão incluídas no conceito de varejo, através de
venda pessoal, correio, telefone ou máquina automática.
80
No Marketing de varejo, existem duas características específicas de grande
importância: o atendimento e a exposição. Estes dois fatores são tão importantes,
que, além dos tradicionais produto, preço, promoção e praça (distribuição), Parente
(2003) defende a teoria dos seis P’s, sendo que duas novas variáveis se destacam:
o P de Pessoal (atendimento e serviços) e o P de apresentação. Alguns colocam o
6ºP como Paixão, porque o entusiasmo do varejista e seus colaboradores é
fundamental para o sucesso de sua operação (INSTITUTO DE PESQUISA E
DESENVOLVIMENTO DE MERCADO, 2008).
O sucesso de um varejista, seja ele pequeno ou grande, depende,
principalmente, do quanto ele incorpora o conceito de Varejo. Este conceito é uma
orientação de gerenciamento, que faz o varejista focar a determinação das
necessidades de seus mercados-alvo e a satisfação das mesmas mais eficaz e
eficiente que seus concorrentes. Segundo Ruotolo e De Menezes (INSTITUTO DE
PESQUISA E DESENVOLVIMENTO DE MERCADO, 2008), ao idealizar um
conceito de loja, o varejista toma decisões sobre: nível de serviço oferecido; linha de
produtos comercializados; política de preços; cobertura geográfica; acesso ao
cliente; tamanho e localização da loja.
O Marketing do varejo é uma ciência, totalmente, distinta do marketing
tradicional, que teve sua formulação baseada na indústria de bens de consumo.
Suas principais características de diferenciação são os tempos utilizados em seus
planos e ações, as formas de pesquisa junto ao consumidor e a comunicação.
A raiz da palavra varejo, que é utilizada no Brasil, está no português antigo,
dos tempos em que a “vara” era a medida para se fracionar peças de tecidos,
cordas, linhas, madeiras, etc. Ainda hoje, em algumas lojas de tecidos, usa-se uma
régua de madeira com um metro de comprimento para fracionar os produtos. O
termo utilizado, hoje, para varejo, em Portugal, é retalho, que também denota
claramente o fracionamento de produtos para venda em pequenas porções ou
quantidades (MARKETING..., 2008).
E, por fim, o Socioleto, que, nesta peça, também se caracteriza pelo Poder
Encrático, a linguagem do Poder, pois servir de exemplo a toda terra e não repassar
81
um tom soberbo, somente falando aos seus semelhantes, de algo que lhes é por
demais íntimo.
O Poder parece se revelar, portanto, como um elemento estruturador e
consolidativo da ordem social, determinando o estatuto hegemônico deste ou
daquele grupo, ou, definindo o grau de dominação, de repressão e de influência
exercidas, ainda que inconscientemente, sobre os restantes grupos. No seio desse
grupo circula uma linguagem própria a que Barthes deu o nome de encrática
emanada do Poder, incrustada de dogmas e, por vezes, doxomaníaca, que não
admite contradição nem coexistência com outras linguagens, suas contestatórias.
Assim, as relações assimétricas que, no interior do tecido social, constroem-
se de acordo com os ditames do poder, são justificadas e naturalizadas dentro de
um vocabulário, que vai buscar os seus significantes à Ideologia dominante.
É nesse sentido que Eagleton (1997) argumenta que toda a Ideologia marca o
ponto em que o Poder penetra e se instala no cerne dos discursos, intervindo
ativamente nos processos de construção de sentidos. Todavia, nem todos os
discursos partilham do Poder. Barthes (1973), embora admitindo o haver texto
sem ideologia, reconhece que no interior da logosfera (o mundo da linguagem) é
impossível aspirar a uma harmonização ideológica dos diferentes socioletos
linguagens alimentadas por certas ficções, ou, como ousará, ainda, qualificar, por
certas “paranóias”— que entre si competem pela hegemonia (BARTHES, 1973).
Logo, o anúncio alusivo à Semana Farroupilha perpassa pela categoria
Comunicação, para a qual apresenta o engajamento anual na Exposição
Internacional de Animais - Expointer. Na Cor, destacam-se a “terra” e a “vermelha”,
com significados de amor à localidade e o orgulho pelas lutas. O Poder, que
pudemos observar no instrumento de trabalho do gaúcho, é o cavalo. A categoria
Cultura nos remete às tradições gaúchas, à identificação do povo. O Sujeito é
tratado de forma simbólica no bairrismo do povo, sendo que a Cia Zaffari, que
tamm tem suas origens no Rio Grande do Sul, consegue captar de forma natural
nos seus discursos e, em particular, nesta peça. Na categoria Organização,
encontramos o Estado sendo colocado como parte do todo que é o resto do mundo.
82
E, finalmente, o Socioleto, com o Discurso Encrático bem delimitado, com o texto
referenciando os gaúchos para servirem de modelo para o resto. Podemos
examinar, no Socioleto desta peça, que a comunidade gaúcha é um grupo e os
dizeres do anúncio dizem respeito a uma linguagem íntima a somente aqueles
nascidos no Rio Grande do Sul e/ou que conhecem o hino rio-grandense.
3.3 VT “ANJOS”
O primeiro dos filmes a ser analisado tem duração de 90 segundos e foi
inspirado no poema de Fernando Pessoa, denominado Anjos”. Por se tratar de uma
propaganda de cenas corridas, sem a continuidade de histórias, dividimos a
descrição em vinte cenas, para que haja maior verossimilhança e para que a análise
posterior não deixe nenhum detalhe sem abordagem.
1) Mulher triste e pensativa;
2) Outra mulher pensativa;
3) Homem jovem a esperar alguém, ele sorri;
4) Mulher jovem, com vestido fluido, a descer escadas envoltas em folhagens;
5) Mulher da cena 1 a olhar nos olhos de uma senhora, que sorri;
6) Jovem a entrar em uma porteira de madeira;
7) Senhora a espiar por uma cortina na janela;
8) Um casal de crianças, num lindo jardim, sorrindo e de testas encostadas;
9) Homem de meia idade sentado ao lado de um senhor idoso, na beira da
praia, mar ao fundo;
10) Mulher, da cena 4, continua a descer escadas, correndo, sorrindo;
11) Mulher, da cena 2, encontra o filho no quarto escuro a brincar com uma
lamparina a vela. A luminária tem desenhos de pássaros, que transmitem figuras de
luz nas paredes do aposento. A mulher se abaixa, dá um beijo no filho e, neste exato
momento, a figura da parede forma asas de anjos em volta dos dois;
12) Pai e filho, da cena 9, se abraçam, e as nuvens que passam atrás deles
formam asas de anjo no entorno dos dois;
83
13) Um casal de crianças de uniforme de colégio aparece deitado lado a lado, no
chão de parquete de uma sala de aula. Do céu caem trabalhinhos feitos em folhas
de ofício brancas, as quais formam duas grandes asas de anjos ao lado;
14) O homem da cena 3 aparece abraçado na mulher da cena 4 (a que descia as
escadas, para encontrar o amado), e a luz que adentra na escadaria onde se
encontram forma duas asas de anjo no casal;
15) Jovem da cena 6 começa a correr porteira adentro, e a senhora da janela da
cena 7 sorri. Os dois se abraçam entusiasmadamente, e os lençóis do varal da
senhora formam duas asas de anjos em volta de mãe filho;
16) O casal de crianças, da cena 8, continua com as testas coladas, mas agora
abraçados, e o pólen das plantas forma duas asas de anjos ao redor deles;
17) A mulher e a senhora, da cena 5, se abraçam, e a guirlanda de luzes de Natal
que se encontra atrás delas forma duas asas de anjos;
18) Entra a locução em off” da frase: “Somos anjos de uma asa, somente
abraçados podemos voar”;
19) Cena de uma linda praia onde um menininho corre para os braços do pai, que
o espera ao lado de uma jangada de madeira com vela de pano. Esta forma duas
asas de anjo atrás deles;
20) Casal se abraça em frente a um chafariz, num lindo parque. A água forma
duas asas de anjo.
Assina em locução: Natal Zaffari e em lettering: Zaffari.
O comercial “Anjos” só tem música instrumental de fundo. O recurso da
música, com seus timbres, suas tonalidades, seus ritmos, seus instrumentos
diversos. Neste filme podemos examinar a presença da categoria Poder, ainda
Encrático, pois passa a mensagem do Poder de Deus sobre as pessoas e de que
forma a época de Natal faz com que as pessoas se sensibilizem e deixem com que
as emoções aflorem. Este Poder de sensibilização e de emoção se dá pelo figurativo
das asas e/ou anjos.
Os anjos são seres intermediários entre Deus e o mundo, mencionados sob
formas diversas nos textos acádios, ugaritas, blicos e outros. “Seriam seres
puramente espirituais, ou espíritos dotados de um corpo etéreo, aéreo; mas não
84
poderiam revestir dos homens senão as aparências.” Ocupariam para Deus as
funções de ministros: mensageiros, guardiães, condutores de astros, executores de
leis, protetores dos eleitos, etc., e estariam organizados em hierarquias de sete
ordens, de nove coros ou de tríades (CHEVALIER; GHEERBANT, 1991, p. 60).
Para muitos autores, os atributos conferidos aos anjos são considerados
como mbolos de ordem espiritual, outros, ainda, veem nos anjos mbolos das
funções divinas, ou, ainda de modo mais amplo, o anjo simboliza a criatura na qual
surge já realizada a transformação do visível em invisível por nós executada.
Ainda os anjos podem ser considerados o exército de Deus, sua corte, sua
morada, transmitem suas ordens e velam sobre o mundo. “Na função mensageira,
os anjos o sempre portadores de boas notícias para as almas.” (CHEVALIER;
GHEERBANT, 1991, p. 61).
As asas são, antes de qualquer coisa, símbolo de alçar voo, do alívio de um
peso (leveza espiritual), de desmaterialização, de liberação seja de alma ou de
espírito -, de passagem ao corpo sutil. O alçar voo aplica-se, universalmente, à alma
em sua aspiração ao estado supraindividual. As asas indicam, ainda, a faculdade
cognitiva: aquele que compreende tem asas.
Na tradição cristã, as asas significam o movimento aéreo, leve, e simbolizam
o pneuma, o espírito. Na Bíblia, são símbolos constantes da espiritualidade, ou da
espiritualização dos seres que as possuem, que sejam representados por figuras
humanas. Dizem respeito à divindade e a tudo o que dela pode se aproximar, após
uma transfiguração, por exemplo, os anjos e a alma humana.
Quando se fala de asas a propósito de um pássaro, trata-se, na maior parte
das vezes, do símbolo da pomba, que significa o Espírito Santo. A alma
propriamente dita, pelo fato de sua espiritualização, possui asas de pomba,
e voaria e procuraria um pouso. Possuir asas, portanto, é abandonar o
mundo terreno para ter acesso ao mundo celeste. (CHEVALIER;
GHEERBANT, 1991, p. 91).
Ao analisarmos esta peça, deparamo-nos com uma categoria a posteriori, que
é o “Fait Divers”. A expressão francesa designa, em sua generalidade, informação
85
sensacionalista. Ela é bem anterior ao advento da Imprensa. Já existia em diferentes
produções culturais na Idade Média, habitando os cantos dos menestréis.
O “Fait Divers” é a informação sensacionalista. Expressa conflitos por meio da
Causalidade e da Coincidência. Interpela a emoção do receptor, independente de
seu estilo jornalístico.
Angrimani (1994, p. 27) observa que, em 1631, a Gazette de France lançou
“[...] edições extraordinárias de grandes tiragens, consagradas aos ‘fait divers’
sensacionais.Depois desse jornal, os editores dos outros passaram a publicá-los,
com mais intensidade, para aumentar seus rendimentos.
Na literatura, o “Fait Divers” inspirou os heróis de Balzac, as novelas de
Flaubert, tal como Madame Bovary”; e o romance de Stendhal, O Vermelho e o
Negro”. Proporcionou a Beauvoir e Sartre material para seus textos; e Breton usou
essa estrutura na poesia. Muitos outros escritores, tamm, sofreram sua influência,
assim como artistas que pintaram suas obras, baseadas em “Fait Divers”, salienta
Walker (1995).
Barthes (1971a) transgrediu o perímetro conceitual. Arrumou-lhe uma
tipologia básica, organizada por duas categorias: Causalidade e Coincidência.
Ambas se subdividem em subtipos, direcionados à compreensão da
excepcionalidade, introdutora da noção de conflito.
No caso deste vídeo, podemos observar o “Fait Divers” de Causalidade
Esperada, pois a causa é normal e a ênfase recai nos personagens dramáticos
criança, mãe e idoso (BARTHES, 1971a).
A excepcionalidade fica deslocada para os protagonistas, que são
responsáveis pela instauração do conflito. A dramaticidade apanha três tipos de
sujeitos básicos: criança, mãe e idoso. Eles representam os diversos ciclos do
processo do existir humano.
86
A criança, a mãe e o idoso simbolizam a fragilidade e a pureza humanas,
decodificadas na dimensão do bem. Por suas próprias características, eles estão
revestidos de circunstâncias, pronunciadas pela dramaticidade.
Podemos observamos que, no “Fait Divers” de Causalidade, existe a
estruturação de um conflito, não-classificado pelo conhecimento humano. Torna-se
inexplicável aos recursos da racionalidade e dos pressupostos da intelectualidade,
ficando ininteligível na dimensão histórica.
Os Sujeitos relativos não conseguem ter respostas para a situação conflituosa
estabelecida. Ficam impotentes, sem recursos de compreensão. Recorrem a um
Sujeito Absoluto, tal qual na Tragédia Grega, quando um “Deus-ex-Machina” entrava
em cena, para contornar os impasses incontornáveis historicamente. Prevalece a
gica da Fatalidade.
A Fatalidade é o Sujeito Absoluto, o grande pai transcendental, que possui a
explicação para o inexplicável. Representa a iluminação do oculto, o conhecimento
do desconhecido pela onisciência e onipresença. Assume a responsabilidade sobre
todas as coisas e a plenitude do todo. É o fiador perfeito, para todas as
imperfeições, inscritas na relatividade histórica da sujeição.
Tudo está pronto e harmonizado na Fatalidade. É o espelho, por excelência.
Interpela os sujeitos relativos, que se reconhecem, com liberdade, no seu Poder --
Libido dominante, conforme Barthes (1996) -- os Sujeitos se tornam submissos
diante do seu pleno e indizível saber, causa de todas as causas e suprema
revelação de quaisquer enigmas de subjetividade.
Na “Fait Divers” de Causalidade, existe a estruturação de conflitos que
interpelam. São reconhecidos, porque reproduzem a dialética da subjetividade.
Ensejam, por conseguinte, a Identificação Projetiva, que possui um final feliz, uma
saída catártica: a Fatalidade, o Sujeito Absoluto, garantia de harmonização e
suprema desculpa para todas as culpas, desde que, com liberdade, seja pago o
dízimo da submissão.
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Os dominantes e os dominados, ricos e pobres, belos e feios comem um
rebanho harmônico, apesar de suas divergências. Possuem o mesmo ancoradouro.
Compartilham, pelos atalhos da Causalidade e da Coincidência, do mesmo caminho:
a Fatalidade, uma categoria de fácil disponibilidade e de elástico uso no Senso
Comum.
Na teorização de Barthes (1971a) sobre o “Fait Divers”, o conceito de
estrutura é essencial. Ele o explica da seguinte modo:
A estrutura é, pois, na verdade um simulacro do objeto, mas um simulacro
dirigido, interessado, uma vez que o objeto imitado faz algo que permanecia
invisível, o se preferirmos, ininteligível no objeto natural.
Barthes realiza um simulacro dirigido do “Fait Divers”. Dá-lhe um conceito.
Oferece-lhe estrutura com duas categorias: a Causalidade e a Coincidência. Ambas
estão direcionadas para a classificação da excepcionalidade, fixada na dimensão do
conflito, respectivamente, por meio da Causa Perturbada e Causa Esperada. Na
abordagem estruturalista, o mais importante não é o dito. As histórias, os
protagonistas e as circunstâncias são variáveis no tempo e no espaço. São
perecíveis. O que importa é a estrutura, a forma de dizer, o significante invariante,
que tem permanência perante quaisquer possibilidades de mutação.
Barthes (1971a) enfatiza que o “Fait Divers” possui um consumo imediato.
Notabiliza-se pela sua imanência. É fechado no seu próprio contexto, que é a única
dimensão do seu saber. Não reivindica nada que possa transcender o seu próprio
território. Está preso no presente, cristalizado no aqui e no agora. É, por excelência,
narcísico.
O Fait Divers”, em suas diferentes manifestações, é utilizado na Mídia com
diversas abordagens. Aparece no tratamento da realidade e da ficção, seja nas
telenovelas, nos telejornais, nos “talk-shows”, nos programas de humor, no noticiário
da Imprensa e na Publicidade.
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O Fait Divers” é, por natureza, sensacionalista, quanto pela Causalidade
Causa Perturbada e Causa Esperada. As suas estruturas são constituídas pelas
anomalias e pelas excepcionalidades, marcadas, em essência, pela valorização do
espetacular. As duas causalidades conotam a Fatalidade como explicação do real.
Em maior ou menor grau, a Mídia é sensacionalista por natureza. É o agente
da interpelação, que busca o reconhecimento do interpelado e a sua consequente
submissão. Está, tamm, submetida à audiência, aos patrocínios e ao lucro. À
medida que a mensagem se encontra dominada pelo Valor de Troca, transforma-se
em mercadoria. Não como ela abdicar do Sensacionalismo, explícito ou implícito,
mas presente.
O “Fait Divers” se compatibiliza com a linguagem televisiva. Nessa, a imagem
concisa, com a supremacia da exterioridade, onde reina a factualidade, expressa,
pelo presente, a interpelação narcísica. A Televisão e o “Fait Divers” estão voltados
para mostrar e não demonstrar. Não solicitam nenhuma reflexão aprofundada, pois
se notabilizam pela superficialidade, marcada pela emocionalidade.
O Fait Divers”, em suas rias pronúncias, tem um Sistema de Significação
que denota a factualidade presente, embebida pelo conflito. Possui uma interpelação
narcísica com o receptor, que identifica, projetivamente, os seus conflitos
inconscientes no formato conflitante da informação.
O Poder, no “Fait Divers”, é a expressão do domínio do individualismo,
manifestado pela emocionalidade. o importa o uso da razão. O que conta e
saldo é a exploração das emoções, reprimidas no Inconsciente, que emergem por
intermédio da Identificação Projetiva, responsável pela Catarse.
A Cultura nós podemos contemplar fazendo uso do mbolo do abraço. Os
personagens se encontram, cena após cena, e se abraçam. Demonstram amor,
carinho, afeto, amizade, perdão, por meio de um ato simples para nós, ocidentais
brasileiros, os quais sabemos que, em muitos lugares do mundo, as pessoas não
têm o costume do toque.
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As nossas “leituras”, “criação”, “orientação”, são demonstradas neste
comercial, mediante o abraço, que acontece quando duas ou mais pessoas –
geralmente duas ficam parcial ou completamente entre os braços da outra. É
usado, dependendo da cultura local, como forma de demonstração de afeto de uma
pessoa para outra. Por meio do abraço, podemos cumprimentar ou expressar
sentimentos como carinho, amor, compaixão, saudade, congratulação etc. Um
abraço em alguém pode demonstrar também proteção instintiva.
O abraço consiste, basicamente, no envolvimento de uma pessoa nos braços
da outra. É possível um abraço "completo", quando as duas pessoas se abraçam
entre si, ou um abraço unilateral, quando alguém permanece imóvel e a outra
pessoa a abraça. Geralmente um abraço é dado pela frente de ambos, mas tamm
pode ser dado de lado ou por trás. Entretanto, a expressão "abraço por trás" pode
ter um sentido sexual mais forte. Um abraço pode ser coletivo e dado entre mais de
uma pessoa ao mesmo tempo.
É possível, também, abraçar objetos ou animais, como uma árvore ou um
pequeno cão. Algumas vezes, abraços entre amigos podem ser finalizados com uns
tapinhas nas costas.
Dependendo da intensidade e forma como é expresso, um abraço pode fazer
parte do relacionamento sexual dos seres humanos, despertando tanto no homem
quanto na mulher sinais de libido. Esse tipo de abraço pode acompanhar um beijo
apaixonado.
Apesar de incomum, podemos dizer também que alguns animais podem
abraçar. Uma gorila, por exemplo, pode abraçar seu filhote de forma muito parecida
com o ser humano; uma gata pode cobrir seus filhotes com a pata, para proteger, e
pode ser interpretado por nós como um abraço.
O Sujeito fica explicitado nos personagens das cenas, as quais apresentam
ações corriqueiras, que podem acontecer na vida de qualquer pessoa, cliente ou não
da Cia Zaffari. O encontro com a pessoa amada, com o pai idoso, com o colega de
90
aula, com a mãe saudosa, com o filho pequeno, ou seja, todas as personagens que
nós, pessoas da vida real, tamm assumimos nas nossas relações diárias.
O público pode se ver em algum ou alguns daqueles Sujeitos ali
representados. Então, novamente se sente parte do todo que é a humanidade,
sofrendo, sorrindo, emocionando e se fazendo emocionar com os mais puros
sentimentos terrenos.
A frase final do filme, “Somos anjos de uma asa, somente juntos podemos
voar”, arremata de forma sutil e, ao mesmo tempo, intensa, o sentimento do Sujeito,
entendendo que, somando as partes, formamos um todo extramente poderoso,
capaz de enfrentar a vida, ser e fazer o próximo feliz.
Na categoria Organização, a nossa análise se faz não pela simples
observação da peça, mas pela Cultura adquirida no convívio com membros e
colaboradores da Cia Zaffari. Nesta etapa, a categoria transparece mediante a
influência da fé e devoção desta família.
A família Zaffari, assim como a grande maioria das famílias ítalo-brasileiras, é
uma família de religião católica. Todas as inaugurações de lojas contam com a
presença de um padre, da paróquia inserida na comunidade em que a obra é
entregue, para que este abençoe mais um casa de trabalho.
Outra ação comum desta família é que os novos estabelecimentos recebem
uma imagem de Nossa Senhora das Graças, com a seguinte oração:
[..] Ó Imaculada Virgem Mãe de Deus e nossa Mãe, ao contemplar-vos de
braços abertos derramando graças sobre os que vo-las pedem, cheios de
confiança na vossa poderosa intercessão, inúmeras vezes manifestada pela
Medalha Milagrosa, embora reconhecendo a nossa indignidade por causa
de nossas inúmeras culpas, acercamo-nos de vossos s para vos expor,
durante esta oração, as nossas mais prementes necessidades (momento de
silêncio e de pedir a graça desejada).
Concedei, pois, ó Virgem da Medalha Milagrosa, este favor que confiantes
vos solicitamos, para maior Glória de Deus, engrandecimento do vosso
nome, e o bem de nossas almas. E para melhor servirmos ao vosso Divino
Filho, inspirai-nos profundo ódio ao pecado e dai-nos coragem de nos
afirmar sempre como verdadeiros cristãos. Amém.
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Rezar 3 Ave Marias. Depois: Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós
que recorremos a vós [...]
O Socioleto é observado em duas questões. A primeira seria a dos
telespectadores, clientes ou não, que se identificam com a mensagem de cunho
religiosa, por se tratar do Natal e das crenças da Cia Zaffari. E a segunda é o
conhecimento do poema “Abraço de Anjo”, de Domênico Crescêncio, poeta italiano
do século XVI, por parte do público espectador.
O Socioleto, com sua multiplicidade de recursos, acaba por intimidar os
crentes, mas também os não-crentes em alguma religião, ou religiosidade, que
age com o Poder de fazer o Sujeito sentir algo, seja compreensão ou culpa por não
entender o cunho do vídeo ou não se emocionar com ele.
Na questão da noção sobre tema, autor e obra, o Socioleto intimida pela
mensagem forte, estruturada e emocional. Poucos devem ser conhecedores de um
autor do século XVI, quantidade da massa telespectadora, mas esta informação não
diminui o tamanho do impacto produzido pelo tema de companheirismo exacerbado
em época de Natal.
Portanto, o filme “Anjos” nos traz a primeira categoria a posteriori, que é o
“Fait Divers” de Causalidade Esperada, quando faz uso de personagens dramáticos
como a criança, a mãe e o idoso para nos repassar a emoção das cenas e histórias
contadas. Perpassa, tamm, pela categoria Poder, para a qual pudemos observar a
força de Deus agindo sobre as pessoas na época do Natal, mediante a simbologia
das asas no comercial. A categoria Cultura nos traz a idéia do abraço e do que o
gesto representa na leitura ocidental. O Sujeito é apresentado na forma de
personagens encenadas por s, público-consumidor da Cia, em nosso dia-a-dia.
Na categoria Organização, particularmente podemos trazer a bagagem profissional
adquirida até o momento e fazer a leitura de família cristã, religiosa na prática. O
Socioleto, com o Discurso Encrático tamm delimitado no texto, faz alusão à força
que somamos ao nos unirmos uns aos outros, visto que somos Sujeitos, parte de um
todo.
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3.4 VT “NATAL”
A quarta peça a ser analisada por nós é um comercial de noventa segundos
criado pela Agência Matriz para o Natal de 2006 da Cia Zaffari. Foi repassado no
Natal de 2007, tamanho sucesso e apelo atingidos junto ao público.
O filme trata de uma pequena novela, sendo que a próxima peça analisada é
uma continuação desta. Os personagens são uma menina de uns três anos de
idade, como protagonista, uma mãe jovem, beirando os seus 34 anos, que está
grávida, um pai, também jovem, e uma avó, que não distinguimos se materna ou
paterna.
O vídeo começa somente com música instrumental. A menina abre uma
portinha branca de madeira, que se parece a uma casinha de bonecas. A mera
filma a casinha de frente, e a menina aparece atrás, quando abre a portinha,
brincando com biscuís em forma de ursinhos, que formam uma família, papai,
mamãe e filhinha.
A seguir, aparece a barriga de grávida da mãe em primeiro plano. A câmera
abre e a menina vem correndo para uma sala de estar, onde se encontra uma bela
árvore de Natal sendo enfeitada pela mãe grávida, que parece sentir as primeiras
dores do parto, e pelo pai, que a atende. Mais adiante está a avó, que observa a
cena. A menina também observa, “cabreira”.
A mãe e o pai descem as escadas da casa e se direcionam ao carro (pai,
auxiliando a mãe que “segura” as costas). A menina espia, posicionada ao lado da
avó, pertinho de sua perna, abanando cabisbaixa. O pai também acena.
Entra a música tema do comercial, intitulada “Fico assim sem você”, de
autoria de Abdullah e Cacá Moraes e interpretada por Adriana Calcanhoto.
Seguindo o Paradigma da Complexidade, de Morin, não podemos deixar de
contemplar, neste estudo, um perfil da intérprete Adriana Calcanhoto, valendo-nos
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do sétimo princípio, o da Reintrodução. Ou seja, para abordar um objeto,
precisamos, também, abordar o sujeito deste objeto, contemplando a parte e o todo.
Adriana da Cunha Calcanhotto, mais conhecida por Adriana Calcanhotto ou
Adriana Partimpim, (Porto Alegre, 3 de outubro de 1965), é uma cantora e
compositora brasileira. Filha de um baterista de uma banda de jazz, Carlos
Calcanhoto, e de uma bailarina. Aos seis anos, ganhou do a o primeiro
instrumento: um violão. Aprendeu a tocar o instrumento e tamm, mais tarde, a
cantar. Logo imergiu nas influências musicais (MPB) e literárias (Modernismo
Brasileiro). Ficou fascinada pela Antropofagia de Oswald de Andrade, Tarsila do
Amaral e outros nomes daquele movimento cultural (ADRIANA CALCANHOTTO,
2008).
As composições abordam estilos variados: samba, bossa nova, funk, rock,
pop, baladas. Dentre as características de repertório, observa-se a regravação de
antigos sucessos da MPB e arranjos diferenciados (ADRIANA CALCANHOTTO,
2008).
A vida artística iniciou-se em bares, como o Fazendo Artes, situado próximo à
I Cia. de Guardas do Exército, próximo ao Parque Farroupilha, e o Porto de Elis, na
Av. Protásio Alves. Tamm, trabalhou em peças teatrais e depois se lançou em
concertos e festivais por todo o país no estilo voz e violão. O primeiro disco,
Enguiço, lançado, em 1990, pela gravadora CBS, foi muito elogiado, e o primeiro
sucesso foi Naquela Estação, no repertório deste, que também trouxe músicas de
autoria (a faixa-título e Mortais) e regravações de clássicos da MPB (Sonífera ilha,
do grupo Titãs, Caminhoneiro de Roberto e Erasmo Carlos, Disseram que eu voltei
americanizada, que fez sucesso na voz de Carmem Miranda, e Nunca, do
conterrâneo Lupicínio Rodrigues). Nessa época, chegou a ser comparada a Elis
Regina. (ADRIANA CALCANHOTTO, 2008).
Naquela estação, por sua vez, integrou a trilha sonora da telenovela global
Rainha da Sucata, de Sílvio de Abreu (1990). No ano seguinte, recebeu o Prêmio
Sharp de revelação feminina. No segundo trabalho, Senhas, de 1992, o repertório
estava focado nas canções de autoria, com destaque para Esquadros e Mentiras;
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esta última foi incluída na trilha da novela Renascer, de Benedito Ruy Barbosa.
(ADRIANA CALCANHOTTO, 2008)
Em 1994, a rmula dá sinais de cansaço e desgaste devido à exposição
excessiva na mídia. Por isso, nesse mesmo ano, lançou o LP A fábrica do poema,
com algumas doses de experimentalismo (poemas de Augusto de Campos, Gertrude
Stein, textos do cineasta Joaquim Pedro de Andrade e parcerias com Waly Salomão,
Arnaldo Antunes, Antônio Cícero e Jorge Salomão). No terceiro disco, que, tamm,
foi o último a ter versão em vinil, os destaques foram Metade e Inverno. Prosseguiu
com o álbum Maritmo, que simulou uma incursão pela dance music (Pista de dança,
Parangolé Pamplona), samples (Vamos comer Caetano), e a regravação de Quem
vem pra beira do mar, de Dorival Caymmi. O maior sucesso do disco foi Vambora,
que, incluída na trilha de Torre de Babel, de Sílvio de Abreu, obteve enorme
repercussão (ADRIANA CALCANHOTTO, 2008).
Uma das participações foi uma performance na livraria Argumento, no Rio de
Janeiro, musicando poemas do poeta português Mário de Sá Carneiro em 1996. Um
deles, O outro, acabou por entrar no CD Público (2000), que trazia regravações dos
antigos sucessos entre outras canções consagradas e também rendeu um DVD,
lançado no ano seguinte pela gravadora BMG (ADRIANA CALCANHOTTO, 2008).
Em 2004, foi o CD Adriana Partimpim, uma seleção de canções para
crianças, o álbum Adriana Partimpim (2004), com o qual obteve grande sucesso em
espetáculos e pelo qual foi escolhida para concorrer ao prêmio Grammy Latino de
melhor álbum infantil na casa de espetáculos nova-iorquina Madison Square
Garden, em 2 de novembro de 2006. A canção do comercial, interpretada por
Adriana, apresenta a ausência de um amor, conforme a letra:
Avião sem asa,
Fogueira sem brasa,
Sou eu assim, sem você
Futebol sem bola,
Piu-piu sem Frajola,
Sou eu assim, sem você...
Porque é que tem que ser assim?
Se o meu desejo não tem fim
Eu te quero a todo instante
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Nem mil auto-falantes
Vão poder falar por mim...
[...]
Tô louco prá te ver chegar
Tô louco prá te ter nas mãos
Deitar no teu abraço
Retomar o pedaço
Que falta no meu coração...
[...]
Eu não existo longe de você
E a solidão é o meu pior castigo
Eu conto as horas pra poder te ver,
Mas o relógio tá de mal comigo
Por quê? Por quê?
Neném sem chupeta,
Romeu sem Julieta,
Sou eu assim, sem você
Carro sem estrada,
Queijo sem goiabada,
Sou eu assim, sem você...
[...]
Na próxima cena, a avó coloca a menina para dormir. A pequena sonha com
a mãe, as duas se encontram num jardim, brincando com bolhas de sabão. A
criança acorda, pega seu bichinho de pelúcia e se dirige ao quarto dos pais, espia a
ausência escorada no marco da porta com ar de tristeza. Segue pelo corredor,
arrastando o seu brinquedo.
A próxima cena é o céu e as árvores de um ângulo diferente, a garotinha está
“andando” de balanço com a cabeça para baixo.
Nova cena, ela se encontra sentada na escada interna da casa,
contemplando uma janela. Escuta movimento de carro e sai correndo a outra
janela; quando um carro vermelho de onde dois homens descarregam um
bercinho de madeira com detalhes em verde. A criança vai até o quarto do futuro
irmãozinho, para olhar o bercinho recém-chegado e, depois, volta à janela da
escada e fica a observar a chuva.
Próxima tomada, a avó está sentada no sofá da sala, com a menina ao seu
lado. A a lê uma história e a menina parece não prestar muita atenção. Então,
levanta-se do sofá, vai até a árvore de Natal e avista um pequeno sino, pendurado
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como enfeite. Ela retira o sino da árvore e coloca-o no trinco da porta de entrada da
casa. A avó e a menina adormecem no sofá com as cabeças recostadas.
O sino do trinco se mexe e toca; quando a porta se abre, a menina acorda e
olha para a porta. De vem sua mãe, com o bebezinho no colo e, logo atrás, seu
pai. A mãe vem sorridente, e a garotinha tamm sorri, ainda contida. Na próxima
cena a menina observa o irmão no berço, agora sorrindo aliviada.
O filme acaba com a garotinha abrindo, novamente, a portinha de sua casa de
bonecas para incluir um novo biscuí, agora, em formato de bercinho com um bebê
dentro. Assina “Feliz Natal”, em letras brancas, em cima da tela, e Zaffari e Bourbon,
na parte debaixo do enquadramento.
Neste filme, novamente podemos observar a categoria a posteriori “Fait
Divers” de Causalidade Esperada, contando com os personagens da criança, da
mãe e do idoso.
Já o Poder, neste VT, está inserido na forma do prazer, pelas emoções
afloradas nas cenas de expectativa de chegada do mais novo membro da família, da
paz familiar quando o conflito se torna tranquilidade, pois os pais da criança
retornam ao lar e principalmente, ao final feliz, quando todos retomam os seus
papéis de mãe, pai, filhos.
A Cultura discorre em torno do Natal. De acordo com Sartori e Triacca (1992),
o Natal é uma das festas mais importantes do cristianismo, junto com a Páscoa e o
Pentecostes. Ele celebra o nascimento de Jesus Cristo. A festa é celebrada no dia
25 de Dezembro pela Igreja Católica Romana, pela Igreja Anglicana e por alguns
grupos protestantes e no dia 7 de Janeiro pela Igreja Ortodoxa.
Do latim natális”, derivada do verbo “nascor, nascéris, natus sum, nasci”,
significa nascer, ser posto no mundo. Como adjetivo, significa também o local onde
ocorreu o nascimento de alguém ou de alguma coisa. Como festa religiosa, o Natal,
comemorado no dia 25 de dezembro desde o Século IV pela Igreja ocidental e
desde o século V pela Igreja oriental, celebra o nascimento de Jesus e assim é o seu
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significado nas línguas românicas italiano, “natale”; francês, “noël”; catalão,
“nadal”; espanhol, “natal”( navidad de J.C); português, “natal”.
Em inglês, a palavra que designa o Natal - Christmas - provém das palavras
latinas “Cristes maesse”, significando em inglês “Christ's Mass", missa de Cristo.
Muitos historiadores localizam a primeira celebração em Roma, no ano 336 D.C. De
“natális” deriva também “natureza”, o somatório das forças ativas em todo o
universo.
O autor discorre que, No ano 245 d.C., o teólogo Orígenes repudiava a ideia
de se festejar o nascimento de Jesus ‘como se fosse um Faraó’.
inúmeros testemunhos de como os primeiros cristãos valorizavam cada
momento da vida de Jesus Cristo, especialmente sua Paixão e Morte na
Cruz. No entanto, não era costume na época comemorar o aniversário e
portanto não sabiam que dia havia nascido o seu Senhor. Os primeiros
testemunhos indicam datas muito variadas, e o primeiro testemunho direto
que afirma que Jesus Cristo nasceu no dia 25 de dezembro é de Sexto Júlio
Africano, no ano 221 d.C. (SARTORI; TRIACCA, 1992, p. 812).
A festa era celebrada em Roma no ano 336 d.C. Na parte Oriental do
Imrio Romano, comemorava-se em 7 de janeiro o seu nascimento, ocasião do seu
batismo, em virtude da não-aceitação do Calendário Gregoriano. No século IV, as
igrejas ocidentais passaram a adotar o dia 25 de dezembro para o Natal e o dia 6 de
janeiro para Epifania (que significa "manifestação"). Nesse dia, comemora-se a visita
dos Magos. A celebração do Natal de Jesus foi instituída oficialmente pelo Papa
Libério, no ano 354 d.C. (SARTORI; TRIACCA, 1992).
A data de 25 de dezembro não é a data real do nascimento de Jesus. A Igreja
entendeu que devia cristianizar as festividades pagãs que os vários povos
celebravam por altura do solstício de Inverno (SARTORI; TRIACCA, 1992).
Portanto, o dia 25 de dezembro foi adotado para que a data coincidisse com a
festividade romana dedicada ao "nascimento do deus sol invencível", que
comemorava o solstício do Inverno. No mundo romano, a Saturnália, festividade em
honra ao deus Saturno, era comemorada de 17 a 22 de dezembro; era um período
de alegria e troca de presentes. O dia 25 de dezembro era tido tamm como o do
nascimento do misterioso deus persa Mitra, o Sol da Virtude.
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Assim, em vez de proibir as festividades pagãs, forneceu-lhes um novo
significado e uma linguagem cristã. As alusões dos padres da igreja ao simbolismo
de Cristo como "o sol de justiça" (Malaquias 4:2) e a "luz do mundo" (João 8:12)
revelam a fé da Igreja n'Aquele que é Deus feito homem para nossa salvação
(SARTORI; TRIACCA, 1992).
As evidências confirmam que, num esforço de converter pagãos, os líderes
religiosos adotaram a festa que era celebrada pelos romanos, o "nascimento do
deus sol invencível" (Natalis Invistis Solis), e tentaram fazê-la parecer “cristã”. Para
certas correntes místicas como o Gnosticismo, a data é perfeitamente adequada
para simbolizar o Natal, por considerarem que o sol é a morada do Cristo Cósmico.
Segundo esse princípio, em tese, o Natal do hemisfério sul deveria ser celebrado em
junho.
muito tempo se sabe que o Natal tem raízes pagãs. Por causa de sua
origem não-bíblica, no século 17, essa festividade foi proibida na Inglaterra e em
algumas colônias americanas. Quem ficasse em casa e não fosse trabalhar no dia
de Natal era multado. Mas os velhos costumes logo voltaram, e alguns novos foram
acrescentados. O Natal voltou a ser um grande feriado religioso, e ainda é em
muitos países.
O Sujeito é retratado por intermédio da menina, da criança e dos seus
sentimentos destacados, como a saudade, a lembrança, o convívio em família, a
surpresa e/ou a novidade em receber um irmão em casa.
A infância é símbolo de inocência: é o estado anterior ao pecado e, portanto,
o estado edênico, simbolizado em diversas tradições pelo retorno ao estado
embrionário, em cuja proximidade está a infância. É símbolo de simplicidade natural
de espontaneidade. A criança é espontânea, tranquila, concentrada, sem intenção
ou pensamentos dissimulados.
Na tradição cristã, os anjos são muitas vezes representados como crianças,
em sinal de inocência e de pureza. Na evolução psicológica do homem, atitudes
pueris ou infantis em nada se confundem com as do mbolo criança assinalam
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períodos de regressão; ao inverso, a imagem da criança pode indicar uma vitória
sobre a complexidade e a ansiedade, e a conquista da paz interior e da
autoconfiança.
A Organização é retratada mediante um recurso por demais recorrente em
muitos dos materiais produzidos pela Cia Zaffari, a família.
A família representa um grupo social primário que influencia e é influenciado
por outras pessoas e instituições. É um grupo de pessoas, ou um número de grupos
domésticos ligados por descendência (demonstrada ou estipulada) a partir de um
ancestral comum, matrimônio ou adoção. Nesse sentido, o termo confunde-se com
clã. Dentro de uma família existe sempre algum grau de parentesco. Membros de
uma família costumam compartilhar do mesmo sobrenome, herdado dos
ascendentes diretos. A família é unida por múltiplos laços capazes de manter os
membros moralmente, materialmente e reciprocamente durante uma vida e durante
as gerações.
Podemos, então, de acordo com Minuchin (1990), categorizar família como
um conjunto invisível de exigências funcionais que organiza a interação dos seus
membros, considerando-a, igualmente, como um sistema, que opera por meio de
padrões transacionais. Assim, no interior da família, os indivíduos podem constituir
subsistemas, podendo estes ser formados por geração, sexo, interesse e/ ou função,
havendo diferentes níveis de poder, sendo que os comportamentos de um membro
afetam e influenciam os outros membros. A família, como unidade social, enfrenta
uma série de tarefas de desenvolvimento, diferindo em nível dos parâmetros
culturais, mas possuindo as mesmas raízes universais.
Segundo Atkinson e Murray (1989), a família é um sistema social uno,
composto por um grupo de indivíduos, cada um com um papel atribuído e, embora
diferenciados, consubstanciam o funcionamento do sistema como um todo. O
conceito de família, ao ser abordado, evoca obrigatoriamente os conceitos de papéis
e funções, como se verifica.
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O Socioleto fica descrito nas funções exercidas por cada membro da família,
pois, em todas as famílias, independentemente da sociedade, cada membro ocupa
determinada posição ou tem determinado estatuto, por exemplo, marido, mulher,
filho ou irmão, sendo orientados por papéis. Papéis estes que não são mais do que
“[...] as expectativas de comportamento, de obrigações e de direitos que estão
associados a uma dada posição na família ou no grupo social.” (STANHOPE, 1999,
p. 502).
Assim sendo, a começar pelos adultos na família, os seus papéis variam
muito, tendo Nye (2002) considerado como característicos os seguintes: a
“socialização da criança”, relacionado com as atividades contribuintes para o
desenvolvimento das capacidades mentais e sociais da criança; os “cuidados às
crianças”, tanto sicos como emocionais, perspectivando o seu desenvolvimento
saudável; o “papel de suporte familiar”, que inclui produção e/ ou obtenção de bens
e serviços necessários à família; o “papel de encarregados dos assuntos
domésticos”, nos quais estão incluídos os serviços domésticos, que visam ao prazer
e ao conforto dos membros da família; o “papel de manutenção das relações
familiares”, relacionado com a manutenção do contato com parentes e implicando a
ajuda em situações de crise; os “papéis sexuais”, relacionados com as relações
sexuais entre ambos os parceiros; o papel terapêutico”, que implica ajuda e apoio
emocional quando dos problemas familiares; o “papel recreativo”, relacionado com o
proporcionar divertimentos à família, visando ao relaxamento e ao desenvolvimento
pessoal.
Relativamente aos papéis dos irmãos, estes são promotores e receptores, em
simultâneo, do processo de socialização na família, ajudando a estabelecer e manter
as normas, promovendo o desenvolvimento da cultura familiar. Contribuem para a
formação da identidade uns dos outros servindo de defensores e protectores,
interpretando o mundo exterior, ensinando os outros sobre equidade, formando
alianças, discutindo, negociando e ajustando mutuamente os comportamentos uns
dos outros.” (NYE, 2002, p. 502). Há a salientar, relativamente aos papéis atribuídos,
que o ideal é que exista alguma flexibilidade, assim como a possibilidade de troca
ocasional desses mesmos papéis, aquando, por exemplo, um dos membros não
possa desempenhar o seu (MINUCHIN, 1990).
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Para Minuchin (1990), a família tem como função primordial a de proteção,
tendo, sobretudo, potencialidades para dar apoio emocional para a resolução de
problemas e conflitos, podendo formar uma barreira defensiva contra agressões
externas. Reforça ainda que a família ajuda a manter a saúde sica e mental do
indivíduo, por constituir o maior recurso natural para lidar com situações
potenciadoras de estresse associadas à vida na comunidade.
Relativamente à criança, a necessidade mais básica da mesma remete-se
para a figura materna, que a alimenta, protege e ensina, assim como cria um apego
individual seguro, contribuindo para um bom desenvolvimento da família e
consequentemente para um bom desenvolvimento da criança. A família é, então,
para a criança, um grupo significativo de pessoas, de apoio, como os pais, os pais
adotivos , os tutores, os irmãos, entre outros. Assim, a criança assume um lugar
relevante na unidade familiar, na qual se sente segura. Em nível do processo de
socialização, a família assume, igualmente, um papel muito importante, já que é ela
que modela e programa o comportamento e o sentido de identidade da criança. Ao
crescerem juntas, família e criança promovem a acomodação da família às
necessidades da criança, delimitando áreas de autonomia, que a criança experiencia
como separação.
A família tem, também, um papel essencial para com a criança, que é o da
afetividade, tal como já foi referido. Para Minuchin (1990), a família é de importância
primordial, pois considera o alimento afetivo o imprescindível, como os nutrientes
orgânicos: “Sem o afecto de um adulto, o ser humano enquanto criança o
desenvolve a sua capacidade de confiar e de se relacionar com o outro”
(MINUCHIN, 1990, p. 30).
Constitui o primeiro o mais fundante e o mais importante grupo social de toda
a pessoa, bem como o seu quadro de referência, estabelecido por intermédio das
relações e identificações que a criança criou durante o desenvolvimento, tornando-a
a matriz da identidade.
Logo, o filme “Nataltambém apresenta a categoria a posteriori “Fait Divers”,
demonstrando, assim, o uso na prática rotineira deste fundamento em seus
102
comerciais de televisão. A justificativa nos parece estar no intuito desta Organização
de trazer à tona os valores da família. O Poder, que pudemos observar por meio das
emoções da peça, da paz familiar e no final feliz, sendo libido dominandi. A categoria
Cultura está calcada no significado do Natal e nas simbologias. O Sujeito, tratado
por intermédio da inocência da personagem criança, está representado na figura do
anjo, mais uma recorrência ao Natal. Na categoria Organização, encontramos a Cia
Zaffari retratada na família, família Zaffari, família de cada consumidor, família de
cada telespectador. E o Socioleto, com a subjetividade humana, está demonstrado
nos papéis exercidos pelos membros da família retratada no comercial.
3.5 VT “DIA DAS MÃES”
Este VT é uma continuação do comercial do Natal e tem duração de sessenta
segundos. Agora o bebezinho já cresceu, e a mãe sente falta da filha.
A mãe está na porta de entrada da casa, e a menina está descendo as
escadas, de uniforme, em direção ao transporte escolar estacionado e com a
porta aberta. A menina vira para trás e abana para a mãe, que lhe retribui o aceno.
O veículo arranca e a menina fica na janela, com a mão no queixo, sorrindo
para a mãe, que fica na porta de casa, com um semblante de saudade. Neste
momento começa a tocar a melodia da música “Fico assim sem você”.
A mãe fecha a porta e se direciona à escada interna da casa, onde encontra o
brinquedo da filha caído em um dos degraus. A mãe coloca o bicho de pelúcia sobre
a cama da menina.
Na nova tomada, a mãe está trabalhando em uma mesa de arquitetura,
parece desenhar. Mexe nos papéis e, embaixo de um deles, o comercial vida a
um desenho “palito”, visivelmente infantil, de uma mãe com seus dois filhos de mãos
de dadas. Este desenho se transforma na imagem real da mãe com seus filhos num
lindo jardim. O pequeno agora já caminha. Há risadas de criança ao fundo.
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Volta a cena da mãe na mesa trabalhando pensativa, e, mais uma vez, a cena
com as crianças, brincando com a mãe e sorrindo. Há as lembranças da mãe
materializadas e a melodia: “[...] louca para te ver chegar, louca pra te ter nas
mãos [...]”
A mãe espia na janela o balanço da filha, vazio, movimentado apenas pelo
vento que sopra fora. O quarto da menina se vazio, e a mãe, recostada no
marco da porta a observar o regio; as horas parecem demorar a passar.
Nova cena: a mãe está na sala da casa, o filho pequeno a brincar e ela a
tentar ler um livro, sem conseguir se concentrar. A mãe escuta a buzina do
transporte escolar, a menina sai correndo do veículo, a sorrir. A mãe abre a porta de
casa tamm sorrindo e, surpresas, as duas se abraçam felizes, e surge a música:
“[...] eu não existo longe de você [...]”
A menina entrega um bilhetinho, feito na escola, à mãe. Neste consta um
coração vermelho pintado na capa. A menina beija a mãe. A mãe fixa o bilhetinho
num mural, cheio de outros papeizinhos, e abre. Leem-se os dizeres: “eu não existo
longe de você”. Um coração vermelho, com a palavra mãe em branco, feito de
bolinhas de coloridas, feitas de papel amassado, resultado de um trabalhinho
escolar.
O filme assina Zaffari e Bourbon na parte debaixo do enquadramento.
Conforme chamamos a atenção anteriormente, o comercial é uma
continuação do vídeo intitulado “Natal”. Encontramos nesta peça, portanto, a
conceituação de folhetim e/ou novela.
Esta significação nos remete à categoria Poder, sendo o público convidado a
continuar acompanhando o desenvolvimento desta família e de suas ações diárias,
acompanhando crescimento físico e espiritual, é claro, simbolicamente.
O folhetim televisivo é um gênero televisual do campo da ficção, próximo da
série televisiva. Com esta diferença que o folhetim é uma história parcelada, cujos
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segmentos o chamados capítulos, sendo que cada um é continuação do
precedente, contrariamente à série televisiva, que é uma sucessão de histórias
independentes (chamadas episódios), com um único laço à presença de um ou
vários personagens recorrentes. Os folhetins de longa duração, com muitos
capítulos, são chamados de telenovelas, e os de duração curta, com pouco
capítulos, são chamados de minisséries.
O folhetim surgiu na França em 1836, junto ao nascimento da imprensa
escrita. Foi importado para o Brasil logo depois, fazendo enorme sucesso na
segunda metade do século XIX. Eram publicados diariamente em jornais da capital
do Imrio (Rio de Janeiro) e jornais do interior, em espaços destinados a
entretenimento.
Com relação à Teoria Narrativa, o formato do folhetim afetou o gênero
Romance, tanto no Brasil quanto no mundo. A trama passou a ser o centro das
atenções, mais que a caracterização dos personagens ou descrições de ambientes.
Os acontecimentos passaram a ser elos de uma vertiginosa cadeia de eventos e
foco principal do interesse dos leitores.
Telenovela é uma obra audiovisual pertencente ao gênero folhetinesco,
apresentada em seis capítulos semanais e cuja duração média de exibição é de oito
meses.
Os países produtores de telenovela são, essencialmente, países de formação
cultural Ibérica e Espanhola. Países de origem cultural anglo-saxã preferem outras
formas de narrativa seriada, tangentes ao gênero folhetinesco.
Destacam-se na produção de telenovelas, em termos quantitativos, o México
e a Venezuela, e em termos qualitativos, o Brasil. As novelas brasileiras são,
inclusive, mundialmente conhecidas por apresentar nível de texto, produção e
direção próximos ao cinematográfico.
A palavra telenovela é uma palavra de origem castelhana, particularmente do
espanhol falado em Cuba, país precursor desse gênero audiovisual que foi inspirado
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nas radionovelas. O vocábulo é fruto da fusão das palavras: tele (de televisão) e
novela, que em espanhol é o mesmo que romance em português.
Devido a sua longa duração, quem aponte uma pretensa contradição em
sua denominação, ao dizer que as telenovelas deveriam se chamar "telerromances".
Porém, para a língua portuguesa, o nero literário novela distingue-se do romance
não pelo seu tamanho, mas pela forma como os eventos se sucedem na narrativa e
pela abordagem folhetinesca de sua escrita.
A matriz original do termo mostrou ser forte a ponto de conseguir legitimidade
em outros idiomas, como o russo, que preferia a palavra serial” para designar os
folhetins audiovisuais.
A fala cotidiana, em países como o Brasil e até a própria Cuba, aceita a forma
abreviada de “novela” para chamar a obra audiovisual. Em Portugal e outros países
da Europa, prefere-se o termo "telenovela", a fim de distinguir a obra audiovisual da
literária. Nos EUA, as "telenovelas" recebem o nome de "soap operas", que não se
confundem com os "seriados", tamm em razão de sua linguagem folhetinesca.
O Sujeito, neste comercial, se caracteriza pela mãe, símbolo universal do
fundamento originário e da segurança, pois é, em todos os âmbitos, a imagem da
transmissão da vida à personalidade individual, independentemente da ordem social.
A experiência da mãe é grandiosa e duradoura no começo de nossa vida e
preenche nossa infância. “A figura desta mullher, a quem pertencemos mais do que
a qualquer outra, nos acompannha todos os dias de nossa vida. Separado
corporalmente dela, o homem se nutre por muitos anos de sua fadiga e sua
abnegação.” (AEPPLI, 1953, p. 235).
Jung (2000, p. 247) concebe o “arquétipo materno” de modo bastante
abrangente e o na figura da mãe ou da avó, assim como na da ama ou da babá.
“Em sentido superior, metafórico”, essa é a “[...] deusa, especialmente a mãe de
Deus, a virgem”. Em primeiro plano, estão “[...] a sabedoria de além do intelecto, o
elemento benévolo, protetor, acolhedor; a dádiva do crescimento, da fecundidade,
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da nutrição; o lugar da metamorfose mágica, do renascimento; aquilo que é oculto,
secreto.”
A mãe, da propaganda pode servir de espelho, de reflexão, para todas as
outras mães que assistem ao filme e se identificam com a situação desenhada.
Apesar de o Sujeito ser “uno”, com seus intertextos arraigados, a figura do Sujeito-
Mãe tamm é universal, fazendo com que o amor, o zelo, a preocupação e a
saudade sejam divididos pelo todo. O todo, neste contexto, engloba todas as mães.
Não poderíamos deixar de citar o poema de Coelho Neto, de 1901, cuja frase
“Ser mãe é padecer no paraíso” faz parte do dito popular até hoje:
Ser Mãe
Ser mãe é desdobrar fibra por fibra
O coração! Ser, é ter no alheio
Lábio que suga, o pedestal do seio,
Onde a vida, onde o amor cantando a vibra.
Ser mãe é ser um anjo que se libra,
Sobre um berço dormindo! É ser anceio,
é ter temeridade, é ser receio
é ser força que os males equilibra!
Todo bem que não gosa é bem do filho,
Espelho em que se mira afortunado
Luz que lhe põe nos olhos novo brilho
Ser mãe é andar chorando num sorriso!
Ser mãe é ter um mundo e não ter nada!
Ser mãe é padecer no paraíso.
(Coelho Neto, 1901)
Na categoria Organização, situamos a organização da Família, de que forma
acontecem as relações entre este Sujeito-Mãe com os demais Sujeitos-Filhos.
Szymanski (2003) reflete que, desde Freud, a família e, em especial, a relação mãe-
filho, tem aparecido como referencial explicativo para o desenvolvimento emocional
da criança. A descoberta de que os anos iniciais de vida são cruciais para o
desenvolvimento emocional posterior focalizou a Organização família como o locus
potencialmente produtor de pessoas saudáveis, emocionalmente estáveis, felizes e
equilibradas, ou como o núcleo gerador de inseguranças, desequilíbrios e toda sorte
de desvios de comportamento.
107
Cada família circula num modo particular de emocionar-se, criando uma
Cultura familiar própria, com seus códigos, com uma sintaxe própria para comunicar-
se e interpretar comunicações, com suas regras, ritos e jogos. Além disso, o
emocionar pessoal e o universo pessoal de significados.
A autora reflete que tais significados, no cotidiano, o são expressos. O que
se tem são ações que o interpretadas num contexto de emoções entrelaçadas
com o crivo dos códigos pessoais, familiares e culturais mais amplos. Tais emoções
e interpretações geram ações que vão formando um enredo cuja trama come o
universo do mundo familiar.
A família, enquanto Organização, tem sido vista como um sistema linguístico,
construído “[...] onde significado e compreensão são social e intersubjetivamente
construídos” e onde “[...] mudança é a evolução de novos significados através do
diálogo.” (ANDERSON; GOOLISHIAN, 1988, p. 372).
Analisando o percurso histórico da evolução do trabalho, Lamas (1994)
observa que é por meio do trabalho que o homem e a mulher dominam e
transformam a natureza, tirando dela a satisfação de suas necessidades, ao mesmo
tempo em que criam objetos de Cultura.
Isso nos leva a fazer uma reflexão sobre como aconteceu a divisão social e
sexual do trabalho. De acordo com Silva (1997), a argumentação de ordem biológica
legitimou a divisão sexual do trabalho como algo natural. Para este autor, com a
separação do espaço de trabalho do espaço de trabalho doméstico, permaneceu a
concepção de que a casa seria o lugar natural da mulher, e sua função primordial de
gerar e cuidar dos filhos.
No comercial analisado, podemos vislumbrar a categoria Cultura arraigada à
cultura desta vida doméstica, da mãe que cuida dos filhos, alimenta, veste, apronta-
os para ir ao colégio e depois aguarda ansiosa pela sua volta.
108
Novamente nos deparamos, neste filme, e já pudemos notar que é de praxe,
com a categoria Fait Divers” de Causalidade Esperada, sendo que aqui o Socioleto
se embasa na mãe como personagem dramática e seu Poder Encrático.
O vídeo se passa numa narrativa, neste contexto, alinhada à música “Fico
assim sem você”, de Adriana Calcanhoto, dando continuidade ao comercial “Natal”.
Ou seja, no primeiro, a criança era a personagem dramática principal e sentia falta
da mãe, ausente para ter um novo bebê. Neste segundo comercial, a mãe se torna a
personagem dramática principal, é ela agora quem sofre com a ausência da filha.
Estas espécies de essências emocionais naturalmente se encarregam de vivificar o
esteriótipo.
O Poder Encrático citado nesta peça se materializa no apelo sensacionalista a
que o caso do dia se propõe. Assim como as novelas, este tipo de propaganda, que
se apega aos personagens dramáticos, acaba por dominar o público por meio da
tomada de compensação prazerosa, já que envolve um sentimento grupal, o amor
da mãe pelos filhos, que está arraigado na subjetividade humana.
Portanto, no filme Dia das Mães”, a categoria Sujeito evidencia a mãe como
personagem principal da história. Depois, na categoria Organização, vislumbra-se a
família, seu papel na sociedade e o papel de cada personagem desta organização.
A categoria Cultura nos traz a iia de mãe dona-de-casa, trabalho doméstico e
seus significados. O Fait Divers” de Causalidade Esperada, categoria a posteriori,
que se repetiu em todos os comerciais, neste, focou-se na personagem dramática da
mãe. E, por fim, a categoria Poder, tamm lincada ao Fait Divers” e à força de
identificação que causa no público consumidor.
Perpassando por todas as categorias, Comunicação _ Cor e Antítese, Poder _
Mãos, Cultura, Sujeito, Organização e Socioleto, podemos notar quanta
discursividade, quantos significantes, quanta conotação existe sob poucas frases,
cores e imagens.
A Cia Zaffari se mostra rica de sentido, no que tange seu discurso
institucional, mesmo que alguns clientes compreendam algumas partes e, outros,
109
nem tanto. Neste quesito, de novo ressurge a Complexidade, trazendo-nos a parte e
o todo: mesmo que parte das pessoas entendam o que a Cia quer lhes passar, ou
todas as pessoas entendam parte do que a Cia quer lhes passar. Assim esta
organização continuidade ao seu trabalho discursivo, o que resulta num todo de
imagem que hoje é a Cia Zaffari.
110
4 EVIDÊNCIAS PROVISÓIRAS
Nosso ponto de partida deu-se a partir da observação durante a prática
profissional. Ao procurarmos compreender assuntos que rodeavam nosso dia-a-dia,
nem sempre o fazemos de forma profunda, principalmente por tratar-se de profissão,
de produtor de eventos, tão atribulada. O que pudemos observar é que o trabalho
diário havia algo a mais a dizer, a inteirar, a descobrir.
Desta maneira, mergulhamos na Comunicação Organizacional da Cia Zaffari,
buscando compreender os fenômenos como manifestações das trocas entre os
Sujeitos de uma sociedade, pedacinhos do nosso caminhar, como Sujeitos que
produzem Cultura e são produzidos por ela, por meio de um diálogo sem finitude.
Elegemos tratar, neste estudo, da Comunicação pensada e exercida pela Cia
Zaffari. Mais precisamente, seu Discurso Organizacional, num recorte de análises de
peças publicitárias. A justificativa encontramos no significado das mensagens
extraídas de tais peças e não, simplesmente, em recortes que, à primeira vista,
seriam tema para um profissional de publicidade e propaganda.
Nossa formação está nas Relações Públicas. A escolha, portanto, se deu na
Comunicação Organizacional, num abraço à fala e à ação, direcionadas ao Sujeito-
consumidor/cliente.
Somando a inspiração de forma complexa, ou seja, unindo as partes de
formação, profissão, organização e discurso, o nosso objetivo nesta pesquisa era
estudar a discursividade da organização por intermédio do sentido verbal e não-
verbal, a fim de compreender e explicar o Discurso Organizacional da Cia Zaffari,
analisando-se peças publicitárias gráficas e veiculadas.
O Paradigma da Complexidade e seu pensador, Morin, foram-nos
apresentados no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e, de forma natural,
encaixaram-se na nossa proposta de busca e produção do conhecimento. A
transdisciplinaridade da comunicação da Cia Zaffari, assim como a
111
transdisciplinaridade da bagagem da autora na Comunicação, Relações Públicas,
Produção de Eventos e Organização, facilitaram a integração de abordagens.
Produzirmos, livres para somarmos as partes de prática e teoria, deu-nos a
possibilidade de fazermos com prazer. A curiosidade e a ânsia de vislumbrar a vida
profissional dentro da ciência permitiram-nos reconhecer a multiplicidade de
recortes, mas, ao mesmo tempo, o poder de escolha da unicidade que é a
comunicação organizacional da Cia Zaffari.
Com a complexidade, assumimos escolha de forma singular, particular e, ao
mesmo tempo, dialogamos com as incertezas, entramos e saímos do todo e das
partes. Construímos conhecimento a partir do nosso a priori. Abrimos a guarda e
vimos quão rico se faz o diálogo.
Além da Complexidade, tivemos apoio da Semiologia, de Barthes, que
cunhou a cnica por onde nosso olhar pôde apoiar-se em categorias, que, abertas,
deram-nos um leque de possibilidades. Com a Semiologia, tornamo-nos capazes de
jogar com os signos, ao mesmo com suas verdades e incertezas, resultando na
decodificação dos signos como uma produção social e histórica.
A partir desse apoio teórico, nossas principais evidências foram as categorias
que elegemos como a priori: Organizações, Comunicação e Sujeito, de Morin, e
Poder, Cultura e Socioleto, de Barthes, que representavam significado, antes mesmo
da análise.
Compreendemos a Comunicação como elo da Cia Zaffari e seu Discurso,
que esta contém força epistemológica ou potencialidade em articular proposições,
conhecimentos e informações, promovendo as interações. Este entendimento tende
a nos conduzir mais profundamente à Comunicação Organizacional e engloba
políticas de Comunicação, elaboradas a partir dos valores e objetivos da Cia Zaffari,
planejando os processos comunicacionais, propiciando espaços de interação e
contribuição para a produção de sentido. Vimos que as Relações Públicas, dentro
deste contexto, m uma perspectiva teórica, que se articula com a Comunicação
112
Organizacional e outra de intervenção, que cuida de ações de comunicação,
objetivando a construção dos fluxos relacionais entre organização e seus Sujeitos.
A Organização, por sua vez, dada a idéia de todo e parte, de Morin, tende a
manifestar a história da Cia Zaffari, ponto de partida de nossa caminhada. O todo,
que é a Organização, e as partes, que se interdependem, e a partir da interação,
transformam-se.
A Cia Zaffari, com mais de quatro décadas, servindo o povo gaúcho, é uma
instituição reconhecida pelo bom atendimento e pela qualidade de seus produtos.
Respeitando as diferenças, sabemos que esta Organização é singular em sua
essência, e a justificativa encontramos no cunho familiar de sua administração,
abraçando os clientes como “uma grande família”, como são as “italianas”.
O Poder é o componente que tangencia o estudo em sua parte prática, de
análise, pois se singularizou por meio da linguagem do Discurso. O sucesso das
campanhas da Cia Zaffari esteve imbuído do Poder por intermédio do prazer, na
medida em que são retratados os bons momentos vividos em família ou no âmago
do interior de cada Sujeito.
Neste caminho, o Sujeito veio para revelar o sentido singular do tratamento
evocado aos clientes da Cia Zaffari. Os Sujeito “leram” as peças, interagiram com
elas, puderam enxergar-se dentro delas, de maneira a emergirem os seus próprios
intertextos, as suas próprias bagagens.
No que tange à Cultura, sublinhada por Barthes, identificamos que seguiu os
valores familiares e a valorização da cultura gaúcha. As influências de família cristã,
unida, e o bairrismo gaúcho perpassaram todas as cinco peças analisadas.
Vislumbramos a valorização do ser humano como uma constante.
Costuramos as análises por meio do Socioleto, que é a característica
discursiva grupal, em que encontramos a própria Cia Zaffari e seus clientes.
Compreendemos que o Socioleto se caracterizou em todas as peças e categorias,
por tamanha intimidação que nos lançou, mesmo que mascaradamente.
113
O estudo revelou que a Cia Zaffari se vende por intermédio da produção de
sentido de valores como família, conforto, qualidade, atendimento, religiosidade e
bem-estar. A Comunicação nos revelou as particularidades das peças publicitárias,
de forma profunda de significados. O Sujeito ficou explícito como tratamento
personalizado que a Cia entrega a seus clientes. O Poder instrumentalizado na
produção de sentido, ou seja, a persuasão através do prazer entregue pela Cia
Zaffari aos seus clientes, por meio de ações como os Concertos Zaffari, a
participação no Freio de Ouro ou a personificação de personagens que todos somos
no dia-a-dia. Para a Cultura, entendemos a valorização do gaúcho, o significado de
suas Cores e instrumentos e o porquê do “bairrismo”. o Socioleto nos fez
compreender como é singularizado pelo Discurso.
Após identificarmos a Comunicação, a Cor, o Sujeito, o Poder, a Cultura e o
Socioleto, fomos instigados a mais um degrau de observação e compreensão.
Seguindo a análise, chegamos, posteriormente, ao Fait Divers” de Causalidade
Esperada, de Barthes, que, no decorrer do estudo, vislumbramos como mote” de
todo e qualquer discurso da Cia Zaffari aos seus Sujeitos.
Os personagens mãe, criança e idoso estão presentes em praticamente todas
as peças da Cia Zaffari, fazendo com os clientes se sintam parte da Cia Zaffari, na
medida em que estão retratados nas histórias. A partir do momento em que um dos
valores arraigados pela Cia é a família, o Fait Divers” nos brindou na maioria das
análises, principalmente, nas narrativas televisas.
Sob esse enfoque, entendemos que o êxito que retrata a caminhada de
existência da Cia Zaffari parece ter várias causas. Podemos refletir sobre algumas,
que fazem parte da história da Cia: a família é uma delas, pois a Organização
familiar é entendida como mais próxima, mais real, mais humana, aos olhos de seus
clientes. O atendimento individualizado ao Sujeito, com suas expectativas diversas,
permeia o sentimento de parte de um todo. A participação social e religiosa,
permeando a Cultura local e se apropriando desta. E, por fim, falando de igual para
igual, quando ilustra personagens da vida real.
114
Para chegarmos à nossa dissertação, precisamos nos munir e ao mesmo nos
despir de nosso conhecimento a priori. Ao mesmo tempo em que precisamos
usufruir de nossa bagagem da prática vivenciada junto ao objeto, a Cia Zaffari, e nos
distanciarmos para que o estudo não receba somente o olhar da autora. Sabemos,
portanto, que o trabalho foi desenvolvido sob um olhar, o nosso olhar possível neste
determinado espaço de tempo. Mas olhares diversos podem fazer outros recortes e
costuras, por isso nosso título de “Evidências Provisórias”.
Orientados pelo Paradigma da Complexidade, aventuramo-nos a seguir a
caminhada do conhecimento, em busca de um novo desafio, num novo momento,
com novo olhar, sobre novos objetos. Estamos receptivos a uma nova etapa de
produção acadêmico-científica para dar continuidade ao processo de crescimento
pessoal e profissional. Sugerindo um novo estudo, por meio desta parte que é a
dissertação, do todo que é a Comunicação Organizacional, vislumbrando a
possibilidade de um Doutorado, A Cia Zaffari na Dimensão Cultural.
115
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ANEXO A – CARTAZ 20 ANOS CONCERTOS COMUNITÁRIOS ZAFFARI
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ANEXO B – ANÚNCIO ALUSIVO À SEMANA FARROUPILHA
122
ANEXO C – VT ANJOS
123
ANEXO D – VT NATAL
124
ANEXO E – VT DIA DAS MÃES
125
ANEXO F – ÍCONE CIA ZAFFARI