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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE CARATINGA
Programa de Pós-Graduação Meio Ambiente e Sustentabilidade
Mestrado Profissional
DESAFIOS À CONSTRUÇÃO DE UM PROCESSO DE
AUTO-GESTÃO DA ASSOCIAÇÃO DOS CATADORES DE
MATERIAIS RECICLÁVEIS NOVA VIDA DE TEÓFILO
OTONI - MG
SIMONE GOMES DA SILVA
CARATINGA
Minas Gerais – Brasil
Outubro de 2007
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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE CARATINGA
Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Sustentabilidade
Mestrado Profissional
DESAFIOS À CONSTRUÇÃO DE UM PROCESSO DE
AUTO-GESTÃO DA ASSOCIAÇÃO DOS CATADORES DE
MATERIAIS RECICLÁVEIS NOVA VIDA DE TEÓFILO
OTONI - MG
SIMONE GOMES DA SILVA
Dissertação apresentada ao Centro Universitário de
Caratinga, como parte das exigências do Programa
de Pós-Graduação em Meio Ambiente e
Sustentabilidade, para obtenção do título de
Magister Scientiae.
CARATINGA
Minas Gerais – Brasil
Outubro de 2007
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ii
SIMONE GOMES DA SILVA
DESAFIOS À CONSTRUÇÃO DE UM PROCESSO DE AUTO-
GESTÃO DA ASSOCIAÇÃO DOS CATADORES DE
MATERIAIS RECICLÁVEIS NOVA VIDA DE TEÓFILO
OTONI - MG
Dissertação apresentada ao Centro
Universitário de Caratinga, como parte das
exigências do Programa de Pós-Graduação
em Meio Ambiente e Sustentabilidade, para
obtenção do título de Magister Scientiae.
APROVADA: 25 de outubro de 2007.
_____________________________ __________________________________
Meubles Borges Junior José Ambrósio Ferreira Neto
_______________________________ _________________________________
Pierina German Castelli Marcos Alves de Magalhães
(Orientadora) (Co-orientador)
iii
Aos meus pais,
Vicente Fernandes Gomes e
Maria Helena da Silva Gomes
iv
AGRADECIMENTOS
Ao terminar esta importante etapa da minha vida, gostaria de primeiramente agradecer a
Deus, que sempre iluminou e determinou os caminhos da minha existência.
Não seria possível concluir o sonho de ser “mestre”, sem os ensinamentos dos meus
pais, além da torcida do meu irmão Gilmar. o fato de estar distante de casa é um
grande desafio, onde a paciência e compreensão deles foram imprescindíveis.
Lembrar de todos os amigos que direta e indiretamente contribuíram nesta labuta pela
busca do conhecimento é uma tarefa árdua, pois foram muitos que torceram e desejaram
esta conquista. Agradeço a todos os professores (amigos), funcionários e alunos das
Faculdades Doctum e FIC e demais amigos. Em especial ao Chiquinho que sozinho
representava toda uma torcida organizada... Saiba que você foi muito importante neste
processo! E aos amigos professores Vanderlei, Sávio e Angelina que deram aquela
“espiadinha” no meu trabalho, dando as suas contribuições.
Nesta trajetória acadêmica deixo o meu muito obrigado àqueles que me deram a
oportunidade de me inserir nesta desafiadora área de trabalho (educação) e que
confiaram no meu potencial: Çãozinha, Sônia Gomes, Liliane Guerra e Marcíria.
Tudo que tem um final, obviamente teve um início que para acontecer, primeiramente
passou por um processo de grandes incentivos de pessoas amigas que acreditavam
v
nos resultados positivos. Estas pessoas eu jamais poderia deixar de destacar aqui:
Elenice, a pedra angular desta trajetória, você não foi simplesmente amiga, agiu o tempo
todo como uma irmã que se alegrava e também sofria comigo em cada etapa deste
processo; aos demais amigos que também representaram verdadeiramente a minha
família, Gilseia e familiares e o Sr. Sérgio, valeeeeu!!!
A todos os professores e funcionários do Mestrado em Meio Ambiente e
Sustentabilidade da UNEC – Caratinga. Em especial agradeço a orientadora DSc Pierina
German, por ter aceito o desafio de participar da construção deste trabalho, ao amigo
professor DSc Marcos Magalhães, pelas sábias palavras em momentos desafiadores, ao
professor DSc Meubles Borges e ao Coordenador do Mestrado, DSc Jorge Luiz de Góes
pela competência e profissionalismo.
Aos amigos do mestrado (alunos), Rose, Romerito, Maria Tereza, Jane e Kátia.
Ao Prof. DSc José Ambrósio pela disponibilidade para participar de minha Banca de
Defesa e pelas pertinentes considerações apresentadas sobre o trabalho.
E em relação à ASCANOVI, não espaço nem palavras para agradecer a todos, pela
participação direta na realização desta pesquisa, apoiadores, estagiários, professores e é
claro... todos os catadores. Foram muitas as experiências adquiridas neste período que
convivi com os catadores associados da ASCANOVI e que carregarei sempre comigo.
Aprendi que realmente vale a pena resistir contra todas as formas de dominação que nos
são impostas nas relações entre capital e trabalho... resistir sempre, desistir jamais!!!
Enfim, hoje me sinto mais feliz e aliviada por ter enfrentado tais desafios... Ser
estudante em Caratinga, trabalhar em Teófilo Otoni e fazer ponte com a família em
Betim não foi fácil... Mas, graças a Deus valeu a pena... Venci! Obrigada Deus por mais
esta conquista!
vi
BIOGRAFIA
SIMONE GOMES DA SILVA é Assistente Social, formada pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais em 2002.
Iniciou a carreira profissional em 2003 como Assistente Social e Gestora da
Secretaria Municipal de Assistência Social no município de Imbé de Minas MG, onde
atuou até dezembro de 2004.
Concluiu o curso de especialização em “Organização do Trabalho e Serviços no
Âmbito das Políticas Públicas Municipais” pelas Faculdades Integradas de Caratinga-
FIC em 2004.
Atua desde 2005 nas Faculdades Doctum de Teófilo Otoni/MG e Caratinga/MG,
no curso de Serviço Social, como professora das disciplinas de Política Social e Cultura
e Movimentos Sociais; coordenadora de Estágio em Serviço Social; e coordenadora do
projeto de extensão Núcleo de Apoio e Pesquisa NAPE, que assessora a Associação
dos Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida – ASCANOVI.
No ano de 2006 concluiu o curso de “Criminologia” pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais.
vii
SUMÁRIO
LISTA DE SIGLAS...........................................................................................
x
LISTA DE FIGURAS........................................................................................
xii
RESUMO...........................................................................................................
xiv
ABSTRACT.......................................................................................................
xv
INTRODUÇÃO.................................................................................................
1
CAPÍTULO 1 - AS TRANSFORMAÇÕES OCORRIDAS NO MUNDO DO
TRABALHO E SEUS IMPACTOS NA SOCIEDADE
BRASILEIRA.........................................................................
4
1.1. Trabalho para quem?..................................................................................
4
1.2. As idéias neoliberais no Brasil: economia e exclusão social .....................
8
1.2.1. As novas facetas da exclusão social a partir de uma velha questão
social.......................................................................................................
12
1.3. Políticas públicas de inclusão social no início do século XXI:
oportunidades ou manutenção do status quo? .........................................
16
viii
CAPÍTULO 2 -
DO LIXO AO NICHO: A RECICLAGEM E SUA
FUNCIONALIDADE AO CAPITAL EM TEMPOS DE
RACIONALIZAÇÃO DO USO DOS RECURSOS
NATURAIS.......................................................................
22
2.1. Lixo ou um novo conceito de matéria prima? As conveniências do
mercado capitalista contemporâneo sob a égide do “desenvolvimento
sustentável” ..............................................................................................
22
2.2. Repassando responsabilidades via “terceiro setor”–
as novas relações de
trabalho a partir da estratégia neoliberal .....................................................
35
2.2.1. A economia solidária no atual contexto de reestruturação
capitalista..................................................................................................
39
2.2.1.1 Cooperativismo / Associativismo ................................................
44
2.3. Os catadores de materiais recicláveis e sua inserção subalterna na divisão
social e técnica do trabalho ..................................................
48
CAPÍTULO 3 - ANÁLISE DAS POSSIBILIDADES DE AUTO-GESTÃO
DE UMA ASSOCIAÇÃO DE CATADORES DE
MATERIAIS RECICLÁVEIS - UMA REFLEXÃO A
PARTIR DA EXPERIÊNCIA DA ASCANOVI ...................
56
3.1 Resgate Histórico da ASCANOVI .............................................................
56
3.2 Estrutura funcional da ASCANOVI............................................................
58
3.3 Controle da produção...................................................................................
60
3.4 Infra-estrutura da ASCANOVI e organização laboral.................................
63
3.5 Grupo de Apoio................................ ..........................................................
66
3.6 Rede Solidária Central Leste.......................................................................
75
3.7 Análise dos desafios à construção de um processo de auto-gestão
organizacional ..........................................................................................
77
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................
93
ix
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................
97
ANEXOS
ANEXO 1: Questionário semi-estruturado aplicado aos associados da ASCANOVI
ANEXO 2: Roteiro para entrevista do representante da Secretaria Municipal de
Meio Ambiente de Teófilo Otoni
ANEXO 3: Roteiro para entrevista de membros do grupo de apoio da ASCANOVI
ANEXO 4: Estatuto da ASCANOVI
ANEXO 5: Termo de Consentimento da ASCANOVI
ANEXO 6: Termo de Consentimento Livre e esclarecido do membro ASCANOVI
para conceder entrevista
x
LISTA DE SIGLAS
APJ Aprender e Produzir Juntos
ASCANOVI Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida de
Teófilo Otoni/MG
ASMARE
Associação dos Catadores de Papelão e Material Reaproveitável
CBO Classificação Brasileira de Ocupações
CDDH Centro de Defesa dos Direitos Humanos
CMMAD Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
CNUMAD Conferência das Nações
COPASA Companhia de Saneamento de Minas Gerais
DNIT Departamento Nacional de Transporte e Infra-Estrutura
FHC Fernando Henrique Cardoso
FMI Fundo Monetário Internacional
GIFE Grupo de Institutos, Fundações e Empresas
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível no site
IEF Instituto Estadual de Florestas
IMA Instituto Mineiro de Agropecuária
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MNCR Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis
NAPE Núcleo de Apoio, Pesquisa e Extensão
xi
OIT Organização Internacional do Trabalho
ONG Organização Não Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
PNDU Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PNSB Pesquisa Nacional de Saneamento Básico
xii
LISTA DE FIGURAS
FIGURA
1 Composição do lixo domiciliar formado por uma massa
heterogênea resíduos ..................................................................
23
FIGURA
2 Resíduos orgânicos que compõe o lixo orgânico ....................... 23
FIGURA
3 Esquema do circuito de reciclagem ............................................ 51
FIGURA
4 Organograma da ASCANOVI ................................................... 58
FIGURA
5 Catadora responsável pela balança pesando material. A direita
percebe-se a presença de criança nas dependências da
ASCANOVI ............................................................................... 64
FIGURA
6 Associados da ASCANOVI em curso de alfabetização ............. 68
FIGURA
7 Reunião do Grupo de Apoio da ASCANOVI ............................ 69
FIGURA
8 Alunos do Curso de Enfermagem (a) apresentando alguns
temas de saúde para os associados da ASCANOVI no próprio
local do trabalho (b) – ano de 2005 ............................................ 69
FIGURA
9 Diretoria, conselho fiscal da ASCANOVI e equipe de ciências
contábeis durante o estudo sobre associativismo e Estatuto da
ASCANOVI, em 2006 ............................................................... 70
FIGURA
10 Seminário realizado em Teófilo Otoni no dia do Meio
Ambiente 2006, vendo-se no primeiro plano o
pronunciamento de um associado manifestando-se em nome da
ASCANOVI durante o evento (a) e participação de membros
da associação (b) ………………................................................
71
xiii
FIGURA
11 Distribuição quantitativa dos associados quanto ao nível de
escolaridade ................................................................................ 81
xiv
RESUMO
SILVA, Simone Gomes. Centro Universitário de Caratinga (UNEC). Outubro de 2007.
Os desafios à construção de um processo de auto-gestão da Associação dos
Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida de Teófilo Otoni - MG. Orientadora:
DSc. Pierina German Castelli, Co-orientador: DSc. Marcos Alves de Magalhães.
A crise ambiental contemporânea, resultante do modelo de desenvolvimento capitalista,
colocou a reciclagem do lixo como uma necessidade urgente e paliativa ao processo de
entropia a que a humanidade está se conduzindo. Entretanto, muitos dos encarregados
desta reciclagem são indivíduos excluídos do mercado trabalhista capitalista, não
ficando outra opção que se reunirem em organizações de auto-gestão na tentativa de
garantir sua sobrevivência. Porém, a estas organizações trabalhistas de auto-gestão
urbanas o próprio sistema capitalista lhes coloca diversos desafios para sua
consolidação. Neste trabalho, a partir do estudo de caso da Associação dos Catadores de
Materiais Recicláveis Nova Vida ASCANOVI do município de Teófilo Otoni, Estado
de Minas Gerais, buscou-se identificar quais são estes desafios existentes. Verificou-se
que na ASCANOVI, o catador vivencia diferentes condições de precarização do
trabalho, bem como a mesma lógica de exploração do trabalho existente no modelo
capitalista. Deste modo, qualquer tentativa de construção de um novo modelo de
produção econômico baseado nos princípios da auto-gestão participação, democracia
e autonomia – fica altamente comprometido ou inviável.
Palavras-Chave: capitalismo, exclusão social, catadores, auto-gestão, ASCANOVI.
xv
ABSTRACT
SILVA, Simone Gomes. Centro Universitário de Caratinga (UNEC). October, 2007.
Challenges for the construction of self-managed process the Nova Vida Association
of Recyclable Materials Collectors ASCANOVI. Adviser: Dr
a
. Pierina German
Castelli, Commitee member: Dr. Marcos Alves de Magalhães.
The contemporary environmental crisis, as a result of the capitalist development system,
puts garbage recycling as an urgent need and palliative entropy process to which
humanity in heading. However, most of the people responsible for this recycling are
excluded from the capitalist work market. The have no other option but to form self-
managed organizations in order to struggle for their survival. However, the capitalist
system puts several challenges for the consolidation of self-managed urban work
associations. The objective of the present work was to identify, through a case study
with the Nova Vida Association of Recyclable Materials Collectors ASCANOVI,
from the city of Teófilo Otoni, the main existing challenges. It was verified that within
the ASCANOVI, the garbage collectors experience several precarious work conditions,
and face the same exploration logics existent in the capitalist model. This way, any
initiative of construction of a new economic production model based in the principles of
self-management participation, democracy and autonomy– remains difficult or
impossible.
key-words: capitalism, social exclusio, garbage collectors, self-management,
ASCANOVI
1
1. INTRODUÇÃO
A partir de um estudo de caso realizado na Associação dos Catadores de
Materiais Recicláveis Nova Vida ASCANOVI, localizada no município de Teófilo
Otoni, Estado de Minas Gerais, buscou-se neste trabalho analisar os principais desafios
existentes nesta organização associativista, tendo como parâmetro o seu caráter de auto-
gestão, baseado nos princípios de participação, democracia e autonomia.
Procurou-se verificar o significado da associação para o catador, recuperando
algumas situações específicas, e os desafios identificados na formação de uma cultura
autogestionária entre os catadores associados, tendo em vista que o trabalho nessas
instituições, mais que uma “alternativa” solidária, representa um quadro de desemprego
estrutural. Ao mesmo tempo, indagamos em que medida é possível construir uma
alternativa de produção e gestão do trabalho predominante no capitalismo.
Para que haja um melhor entendimento dos principais entraves e limitações do
processo de formação e funcionamento autogestionário das associações de cooperação,
faz-se necessário entender o significado do modelo de produção econômico
predominante na atualidade e sua funcionalidade, que falar em auto-gestão, implica
segundo Singer (2003), na existência de um outro modelo que venha se contrapor ao
atual, capitalista. Esta discussão se torna fundamental para analisarmos a existência da
autonomia dos catadores da ASCANOVI na cadeia produtiva.
Nossa hipótese central e que servirá de eixo central para o desenvolvimento
desta dissertação é que uma impossibilidade de garantir um projeto econômico de
auto-gestão fazendo parte de um sistema econômico capitalista, pois as cooperativas e
2
associações de auto-gestão acabam sendo “usadas” para garantir o processo de
acumulação deste, provocando diferentes reflexos no âmbito interno da associação que
inviabiliza a auto-gestão.
Para o desenvolvimento deste trabalho optou-se por realizar um estudo de caso
com a ASCANOVI do município Teófilo Otoni MG. Para o desenvolvimento deste
estudo de caso se realizaram entrevistas por meio da aplicação de questionários semi-
estruturados aos 23 (vinte e três) catadores associados (Anexo 1); ao representante da
Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Teófilo Otoni (Anexo 2) e a 3 (três)
representantes do grupo de apoio da ASCANOVI que estão participando nesta desde
sua formação.
Para a realização deste trabalho, também procedeu-se à observação, participação
em reuniões, contatos informais, pesquisa de literatura, relatórios e documentos. Cabe
destacar que também conto com uma experiência empírica nesta associação de
catadores de lixo, enquanto coordenadora do projeto do Núcleo de Apoio, Pesquisa e
Extensão NAPE, desenvolvido na ASCANOVI desde o ano de 2005 (Vide Capítulo
III).
O trabalho se estrutura em três capítulos.
O primeiro capítulo procede-se a realizar um resgate histórico crítico sobre o
mundo do trabalho, objetivando dar visibilidade às transformações do mundo do
trabalho, e como estas rebateram na classe trabalhadora. Este capítulo leva-nos a
compreender o perfil do trabalhador exigido hoje no mercado de trabalho formal e o
perfil daqueles que estão fora deste processo.
No segundo capítulo são analisados os desafios colocados para o
desenvolvimento sustentável determinados pelo sistema econômico dominante,
destacando a importância da consideração da inclusão social e sustentabilidade
ambiental para sua implementação, assim como a necessidade que a tomada de decisões
seja baseada sobre uma ética sincrônica para com a geração presente e diacrônica para
com as gerações futuras. Posteriormente, se analisa quais são os elementos da auto-
gestão dentro da perspectiva da economia solidária, assim como a estruturação e
princípios das associações e cooperativas de auto-gestão. Finalizamos com uma análise
dos catadores de materiais recicláveis como trabalhadores autônomos, que buscam nas
associações e/ou cooperativas de auto-gestão uma oportunidade de exercer uma
atividade laborativa.
3
No terceiro capítulo a partir do estudo de caso na ASCANOVI se analisaram os
desafios à construção de um processo de auto-gestão organizacional no contexto
político-econômico contemporâneo. Para tal destacaram-se seu contexto histórico e
particularidades, sem perder de vista os fatores externos nos campos sociais, políticos e
econômicos que determinarão o seu funcionamento em caráter de auto-gestão.
4
CAPITULO 1: TRANSFORMAÇÕES OCORRIDAS NO MUNDO DO
TRABALHO NO FINAL DO SÉCULO XX E SEUS IMPACTOS NA
SOCIEDADE BRASILEIRA
“O primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer: ‘isto é
meu’, e encontrou pessoas bastante simples para acreditar, foi o verdadeiro
criador da sociedade civil (burguesa). Quantos crimes, guerras, mortes,
quantas misérias e horrores não teria poupado ao gênero humano aquele que,
arrancando as estacas (...), tivesse gritado: ‘guardai-vos de escutar este
impostor...” (ROUSSEAU, 1983, p.259).
1.1. Trabalho para quem?
O cenário mundial no século XX é marcado por uma reorganização capitalista,
onde ocorre a formação de uma nova cultura econômica nas diferentes sociedades,
sendo introduzido novos problemas e desafios para o mundo do trabalho. Nesta nova
fase do capital os homens são levados a se separarem e se distanciarem até se completar
a divisão social do trabalho com a separação do trabalho material e intelectual (CHAUÍ,
2001).
A cisão entre trabalho intelectual e operacional é introduzida a partir do
surgimento de novos modelos de produção, Taylorismo
1
e Fordismo
2
, que segundo
1
O taylorismo ou administração científica do trabalho foi desenvolvido pelo engenheiro estadunidense
Frederick Winslow Taylor (1856-1915) como uma nova cultura do trabalho na passagem do século XIX
para o século XX. Sua teoria seguiu um caminho de baixo para cima, e das partes para o todo, dando
ênfase na tarefa. Segundo Taylor a administração tinha que ser tratada como ciência, com a finalidade de
ter uma maior rendimento do serviço do operariado da época, o qual era desqualificado e tratado com
desleixo pela empresa. Na época não havia interesse em qualificar o trabalhador, pois se contava com um
enorme e supostamente inesgotável “exército industrial de reserva”. O estudo de “tempos e movimento”
mostrou que um exército industrial desqualificado significava baixa produtividade e lucros decrescentes,
forçando às empresas a contratarem mais operários. Taylor pretendeu definir princípios científicos para a
administração de empresas, sendo os quatro princípios fundamentais da administração científica: 1)
5
Antunes (1999), fragmenta e parcela a ação operária, dividindo os trabalhadores entre os
pensantes (intelectuais) e os executares de tarefas repetitivas.
De acordo com Behring e Boschetti (2006), o final dos anos de 1960 e início dos
anos de 1970 são marcados pela crise do capital, rompendo com os modelos de
produção Fordista e Taylorista, bem como com o pleno emprego fordista-Keynesiano
3
introduzido na primeira metade do século XX, como estratégia de superação da primeira
crise do capital de 1929. Ainda segundo as autoras:
O que ocorreu na verdade, foi uma crise clássica de superprodução, se
observadas as tendências de longo prazo fundadas na lei do valor. O
presente agravamento do problema do desemprego (não nas proporções
atuais) pela introdução de técnicas capital-intensivas e poupadoras de mão
de obra, a alta dos preços de matérias-primas importantes, a queda do
volume do comércio mundial, e um poder de barganha de pleno emprego no
capitalismo central (BEHRING
e
BOSCHETTI, 2006, p. 116).
Princípio de planejamento, que consiste em substituir o critério individual do operário, a improvisação e o
empirismo por métodos planejados e testados; 2) Princípio de preparação dos trabalhadores, que consiste
em selecionar cientificamente os trabalhadores de acordo com suas aptidões, prepará-los e treiná-los para
produzirem mais e melhor, de acordo com o método planejado, e em preparar as máquinas e
equipamentos em um arranjo físico e disposição racional, o que pressupõe o estudo das tarefas ou dos
tempos e movimentos e da Lei da fadiga; 3) Princípio do controle, que consiste em controlar o trabalho
para se certificar de que o mesmo está sendo executado de acordo com o método estabelecido segundo o
plano de produção; 4) Princípio da execução, que consiste em distribuir distintamente as atribuições e
responsabilidades para que a execução do trabalho seja o mais disciplinado possível. Nas palavras de
Harvey (1992) o método de administração científica de Taylor permitiu ao capital enfrentar a relação de
dependência da habilidade manual da força de trabalho, mediante a dissociação dos processos produtivos
das especialidades dos trabalhadores; separação do trabalho de concepção e de execução; utilização do
conhecimento para controlar cada fase da produção e seu modo de execução.
2
O modelo Fordista pode ser entendido por uma série de características: “meticulosa separação entre
projeto e execução, iniciativa e atendimento de comandos, liberdade e obediência, invenção e
determinação, com o estreito entrelaçamento dos opostos dentro de cada uma das posições binárias e a
suave transmissão de comando do primeiro elemento de cada par ao segundo” (Bauman, 2001, p. 68 apud
Fraga, 2005, p. 36); baixa mobilidade dos trabalhadores; homogeneização da mão-de-obra; mão-de-obra
numerosa e predominantemente masculina” (Beynon, 1995: 6 apud Fraga, 2005, p. 37); produção em
massa, consumo em massa; rotinas de trabalho; controle do tempo, adaptação ao ritmo da máquina; e
homogeneidade dos produtos. O Fordismo, método de racionalização da produção em massa, integrou-se
ao Taylorismo, tendo seu inicio na indústria automobilística Ford Motor Company, trasladando-se
posteriormente a todos os setores industriais e inclusive o de serviços. O conjunto de práticas produtivas,
cunhado de fordismo, é característico da modernidade sólida ou do capitalismo pesado, nas palavras de
Bauman, sendo importante para a organização da produção até meados da década de 1970. “Entre os
principais ícones dessa modernidade estavam a fábrica fordista, que reduzia as atividades humanas a
movimentos simples, rotineiros e predeterminados, destinados a serem obedientes e mecanicamente
seguidos, sem envolver as faculdades mentais e excluindo toda espontaneidade e iniciativas mental
(Bauman, 2001, p. 33/34 apud Fraga, 2005).
3
Esse padrão de desenvolvimento, fordista/Keynesiano - que se caracterizava pelo investimento,
tanto na esfera da produção, como da reprodução, tendo como uma de suas características centrais, a
elaboração de Políticas Sociais, principalmente de pleno emprego - possibilitou o avanço de certas
conquistas no campo do bem-estar, especialmente nos países desenvolvidos, por meio do conhecido
Estado de Bem Estar Social (BEHRING, 2002).
6
Neste período as formas utilizadas pelo modelo econômico vigente de
administrar tal crise ocorreram a partir do fortalecimento das idéias liberais. A partir dos
anos de 1970 com o enfraquecimento do Estado de Bem estar, tal ideologia consegue
novamente se fortalecer a partir da década de 1980 com o impulso do neoliberalismo.
As idéias neoliberais se afirmam como uma reação ao Estado de Bem-estar, sob o
argumento de que a crise devia-se fundamentalmente à regulação econômica e social do
Estado, defendida pelo pensamento Keynesiano, a partir da pós-depressão de 1929
(ANTUNES,1999).
Assim, a solução encontrada para a crise da década de 1970 veio com a proposta
neoliberal fundada na reestruturação produtiva. Para Behring e Boschetti (ibid), a saída
seria desenvolver medidas estratégicas de legitimação da ordem e da gica capitalista
para enfrentamento da crise de superprodução e superacumulação, centradas na órbita
da sociedade civil e do mercado, em prol do Estado “minimizado”
4
.
Assistimos então, a transição dos referidos modelos de produção, Taylorista e
Fordista, pelas formas produtivas flexibilizadas e desregulamentadas denominada
Toyotismo. Segundo Antunes (1999), este novo modelo é caracterizado por novas
formas de produção, pela revolução microeletrônica, pelo surgimento de novos tipos de
automação, robótica e mecanização, pela flexibilização dos processos de trabalho, pela
criação de novos setores produtivos, pelo desenvolvimento do setor terciário (setor de
serviços), pelos novos mercados e padrões de consumo e, sobretudo, pelas taxas
intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional.
Nessa revolução administrativa, o homem deve exercer na automação, funções
mais abstratas e intelectuais, fazendo com que o mercado requisite constantemente um
profissional mais qualificado e polivalente, que, segundo Iamamoto (2001, p.32), “é
4
Segundo Bobbio (1998, apud Behring e Boschetti, 2006, p.60)
, o
Estado Mínimo é aquele que assume
apenas três funções numa sociedade: a defesa contra os inimigos externos; a proteção de todo indivíduo
de ofensas dirigidas por outros indivíduos; e o provimento de obras pública, que não possam ser
executadas pela iniciativa privada.
No Estado Mínimo deve ocorrer a menor interferência possível na liberdade individual e nas atividades
econômicas da iniciativa privada. Os neoliberais pregam que a crise econômica e financeira em vários
países e entre eles o Brasil, foi decorrente do intervencionismo estatal. E que este intervencionismo é
antieconômico e antiprodutivo e que a crise fiscal no Estado aconteceu porque este estimula o capital a
investir e os trabalhadores a trabalhar. Os neoliberais defendem que o único meio de sair dessa crise seria
reduzir a intervenção do Estado, privatizar as instituições públicas, desregulamentar as atividades
econômicas, reduzir os gastos públicos com o social. Enfim, o Estado deve intervir para aliviar a
pobreza e produzir serviços que não sejam rentáveis para o setor privado, já que a política neoliberal tem
como objetivo o acúmulo dos lucros das empresas privadas (Iamamoto, 2001).
7
aquele chamado a exercer várias funções, no mesmo tempo de trabalho e com o mesmo
salário, como conseqüência do enxugamento do quadro de pessoal das empresas”.
De acordo com Antunes (1999), esse novo padrão de acumulação, toyotismo,
após sua consolidação, traz como conseqüência o desemprego estrutural, a terceirização,
o subemprego, o trabalho precário e a desregulamentação dos direitos trabalhistas
conquistados a várias décadas. As lutas operárias que no início do processo de
reestruturação produtiva entravam em cena com toda força contestando esta nova forma
de organização do trabalho, como também a nova postura do Estado frente tais
mudanças ocorridas, chegam ao fim da década de 1980 apresentando, portanto, enormes
desafios para o movimento sindical que se depara com a diminuição das taxas de
sindicalização e do número de greves. Tais mudanças afetarão profundamente a classe
trabalhadora que se encontra cada vez mais alienada
5
.
No final da década de 1980 e início da cada de 1990, sob imposição do Fundo
Monetário Internacional FMI e do Banco Mundial, os países da América Latina,
incluindo o Brasil, passam a seguir as propostas neoliberais que entre outras coisas
prevê o corte dos gastos sociais e privatização do patrimônio público, o que traz pesadas
conseqüências, sobretudo, para a classe trabalhadora à medida que estes cortes ocorrem
mediante o sucateamento das políticas públicas. nos países de capitalismo avançado,
como a Inglaterra, eram aplicadas desde o final de década de 1970 (BEHRING, 2002).
Segundo as idéias neoliberais, o intervencionismo estatal no terreno do bem-
estar é um dos principais responsáveis pela crise fiscal do Estado
6
sendo necessário,
portanto, para a superação desta crise, por conta de uma opção política, a adoção de
medidas que reduzem os gastos sociais e a reconstituição do mercado como principal
instancia de regulação das relações sociais. Sendo desta forma, imprescindível a
supressão da intervenção do Estado na economia como forma de estimular a competição
e o individualismo, otimizando os resultados no mercado (Id).
Ainda percorrendo as idéias da autora, veremos que a fórmula neoliberal
utilizadas pelos países da Europa e dos Estados Unidos para sair da crise se resumia
5
Segundo Aranha (1998, p.12) o sentido etimológico da palavra alienação vem do latim alienare, alienus,
que significa “que pertence a um outro”, ou seja, alienar é tornar alheio, transferir para outrem o que é
seu.
6
É importante destacar que não é o Estado que entra em crise, mas a estrutura social e econômica do
capital baseado no padrão fordista de acumulação capitalista que começa a se exaurir na década de 1970,
conforme já apresentado, exigindo por uma opção política, que o Estado seja reformulado para atender às
necessidades do novo modelo de produção que se ergue, chamado de acumulação flexível (BEHRING,
2002).
8
basicamente a um Estado forte para romper o poder dos sindicatos e controlar a moeda e
um Estado parco para os gastos socais e regulamentações econômicas; a busca da
estabilidade monetária como meta suprema, e uma forte disciplina orçamentária, uma
reforma fiscal, diminuindo os impostos sobre os rendimentos mais altos. O desmonte
dos direitos sociais, implicando a quebra da vinculação entre política social e esses
direitos, que compunha o pacto político do período anterior.
1.2 As idéias neoliberais no Brasil: economia e exclusão social
Na década de 1980, no Brasil, momento em que as idéias neoliberais ganham
força nos diferentes países do capitalismo avançado, a força organizativa dos
movimentos sociais consegue garantir alguma resistência ao avanço de tais idéias.
A referida década, que marca a abertura democrática em nosso país, foi
delineada por uma intensa movimentação popular que culminou na Constituição Federal
de 1988 que garante no plano legal, um amplo sistema de seguridade social resultante
do protagonismo e da luta dos grupos sociais organizado.
A Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de
iniciativas dos poderes públicos e da sociedade, destinados a assegurar os
direitos relativos à saúde, previdência e assistência social, reformulando a
concepção da proteção social como um seguro social (CONSTITUIÇÃO
FEDERAL de 1988, art.194, cap. II, Tit.VIII).
Para Mota (1995, p.48):
A seguridade Social é um dos avanços para as classes que vivem do trabalho
no processo constituinte da década de 80 com o significado de proteção
social, embora desde a sua inscrição na Constituição de 1988 venha sendo
demolida antes de consolidar-se.
Os movimentos sociais não conseguiram impedir que o ideário neoliberal se
tornasse vitorioso no país a partir da década de 1990, quando os ex-presidentes
Fernando Collor de Melo (1989) e principalmente Fernando Henrique Cardoso FHC -
nos seus dois governos (1994 a 2002), abrem as portas do Brasil para a introdução do
projeto neoliberal, apesar de toda resistência dos partidos de oposição, das ONG’s e da
Igreja Católica.
Observa-se que para o projeto político neoliberal, a política social deve ser
intrínseca às funções do mercado, demandando que o Estado coloque limites
9
democráticos à gica do capital sem restringir a sua voracidade. A política social deve
ser totalmente subordinada à orientação macroeconômica estabelecida pelo grande
capital. Dessa forma, ela se torna uma função da participação contributiva de seus
usuários e não uma política universal. Assim, quem contribui mais, prestações
qualificadas e, quem contribui menos, prestações desqualificadas, conclusão: para o
pobre, uma política social pobre (Netto, 1999, p.86-87), perdendo então essa política o
seu caráter universal. Conforme destaca Soares (2000), a orientação das políticas sociais
estatais é alterada de forma significativa prevalecendo desta forma o trinômio
7
:
privatização, focalização e descentralização destrutiva.
A privatização das empresas públicas empregada pelo presidente Fernando
Henrique Cardoso nos seus dois mandatos, foi um dos pontos mais discutidos e
criticados pela oposição ao seu governo.
Tendo por base o trinômio supracitado frente o tripé da Seguridade Social
formado pelas políticas de Saúde (universal), Assistência Social (para todos que dela
necessitar) e Previdência Social (para quem contribui), Netto (1999, p.88), refere-se à
privatização destacando a política de assistência social. Esta foi transferida para a
sociedade civil, a qual ficou com a responsabilidade da construção de redes de proteção
social onde o Estado poderia ajustar parcerias
8
. Assim, a política de assistência social
tomou um caráter de não política, ficando sem o estatuto de direito social e sendo
conduzida a refilantropização. No primeiro ano do governo de FHC foi constituído o
Grupo de Institutos, Fundações e Empresas- GIFE, que reunia grandes grupos
capitalistas como: Banco Itaú, Unibanco, IBM, Iochpe, Maxion, etc. que desenvolvem
atividades comunitário-assistenciais através daquilo que chamam de cidadania
empresarial. O que resta de público-estatal, o governo de FHC reduz o Estado ao que
chamamos de pronto-socorro social, a questão social é caracterizada pela focalização
das ações e seu caráter intermitente, sendo sua intervenção basicamente emergencial
(Id).
7
Segundo Soares (2000), a descentralização assumida pelos governos a partir da década de 1990, trata-se
apenas de uma mera transferência da responsabilidade sobre os serviços completamente deteriorados e
sem financiamento para os níveis locais de governos. Quanto a privatização total ou parcial dos serviços
públicos, vem acompanhada pelo processo de descentralização destrutiva, já que os serviços são
precários, paga pelo particular quem pode. E a focalização acompanha tanto a descentralização quanto a
privatização pois, somente aqueles comprovadamente pobres, via “testes de pobreza” têm acesso aos
serviços públicos.
8
Esta estratégia neoliberal será debatida no tópico 2.2 do Capítulo II deste trabalho.
10
Quanto as políticas de saúde e previdência social, estas são marcadas pela
mercantilização, que segundo Netto:
(...) trata-se de, reservando ao Estado um papel residual (...), entregar ao
mercado – vale dizer: ao grande capital – a organização e a gestão dos
seguros sociais e dos serviços de saúde. (...) especialmente nos anos noventa
a seguridade social privada, conectada às grandes empresas, foi a que mais
cresceu, particularmente no que tange aos benefícios previdenciários e aos
serviços de saúde (NETTO, ibid, p.88).
É importante destacar que o neoliberalismo assume características singulares no
Brasil, pois prevê a redução em uma estrutura de proteção social (baseada na noção de
direitos) que basicamente nunca chegou a se desenvolver de fato. Pelo contrário, a
tendência predominante no trato da questão social foi fortemente marcada pelo
assistencialismo e pela privatização, a partir de uma lógica onde o clientelismo, o
paternalismo, o autoritarismo e a exclusão sempre foram traços marcantes no trato aos
segmentos sociais subalternizados se constituindo em instrumento de reprodução de
uma ordem conservadora através de relações tuteladas transformando direitos em
privilégios.
A herança cultural conservadora e autoritária que fazem parte da constituição da
sociedade brasileira, marcadamente assistencialista fundamentada na cultura do
favoritismo somada às perspectivas neoliberais de esvaziamento da concepção de
direitos, provoca uma total precarização do sistema de proteção social brasileiro e o
desmonte das Políticas Sociais na década de 1990, em contraposição a todas as
conquistas sociais processadas na década anterior que basicamente não havia se
desenvolvido.
Desta forma, os serviços no âmbito das políticas sociais que até então seriam de
responsabilidade do governo, de acordo com a carta constitucional, seguem uma lógica
de repasse de responsabilidades para a sociedade civil. Concomitante a isto, as relações
de trabalho vão sendo redefinidas de acordo com a necessidade de acumulação do
capital através do chamado terceiro setor, conforme veremos no próximo capítulo.
Dentro desse contexto percebe-se que para aumentar a acumulação de riquezas
acentuam-se os elementos destrutivos que presidem a lógica do capital. Tais elementos
se manifestam, de acordo com Antunes (1999), de forma grave através da destruição
e/ou precarização, sem limites no decorrer da era moderna, dos serviços estatais, bem
como da força humana que trabalha e a degradação crescente, na relação “metabólica
11
entre homem e natureza”
9
, conduzida pela lógica societal voltada prioritariamente para a
produção de mercadorias que destroem o meio ambiente. Para o autor:
Trata-se, portanto, de uma aguda destrutividade, que no fundo é a expressão
mais profunda da crise estrutural que assola a (des)socialização
contemporânea: destrói-se força humana que trabalha; destroçam-se os
direitos sociais; brutalizam-se enormes contingentes de homens e mulheres
que vivem do trabalho; torna-se predatória a relação produção/natureza,
criando-se uma monumental sociedade do descartável, que joga fora tudo
que serviu como embalagem para as mercadorias e o seu sistema, mantendo-
se, entretanto, o circuito reprodutivo do capital (ANTUNES, 1999, p.19).
Percebe-se também, que no processo de desenvolvimento do capitalismo, foi
negada de forma natural, a um exército de homens a oportunidade de exercer atividades
de trabalho, causando assim um aprofundamento da injustiça e exclusão social, muito
criticado por pensadores materialistas, destacando-se Marx e Engels (1977). Este
cenário foi se agravando na medida em que as expressões da chamada questão social
10
,
foram se alastrando pelo país.
9
Categoria marxista. De acordo com Foster (2005), no Capital a concepção materialista de natureza de
Marx alcançou plena integração com sua concepção materialista de historia. Na economia política
desenvolvida por Marx, tal como apresentada no Capital o conceito “metabolismo” (Stoffwechsel) foi
empregado para definir o processo de trabalho como “um processo entre o homem e a natureza, um
processo pelo qual o homem, através de suas próprias ações, medeia, regula e controla o metabolismo
entre ele mesmo e a natureza”. (...) A palavra alemã Stollwechsel”implica diretamente, nos seus
elementos, uma noção de “troca de material”subjacente à noção dos processos estruturados de
crescimento e decadência biológicos englobados pelo termo “metabolismo”, No processo de trabalho
Marx tornou o conceito de metabolismo central a todo o seu sistema de análise, enraizando nele a sua
compreensão do processo de trabalho. Assim, na sua definição do processo de trabalho em geral
(contraposta às suas manifestações historicamente especificas) Marx utilizou o conceito de metabolismo
para descrever a relação do homem com a natureza através do trabalho: “o trabalho é, antes de qualquer
coisa, um processo entre o homem e a natureza, um processo pelo qual o homem, através de suas próprias
ações, medeia, regula e controla o metabolismo entre ele e a natureza”. Ele e em movimento as forças
naturais que pertencem a seu próprio corpo, aos braços, pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar os
materiais da natureza de uma forma adaptada às suas próprias necessidades. Através deste movimento, ele
atua sobre a natureza externa e a modifica, a assim simultaneamente altera sua própria natureza... Ele [o
processo de trabalho] é a condição universal da interação metabólica [Stoowechssel] entre o homem e a
natureza, a perpétua condição da existência humana imposta pela natureza (MARX, 1976, v. 1, p. 283-
290 apud FOSTER, 2005, p. 219).
10
A questão social pode ser compreendida como uma categoria que se expressa de forma particular na
sociedade capitalista, no processo de intensificação das contradições em capital e trabalho, em torno das
grandes transformações econômicas sociais políticas, ocorridas na Europa do século XIX e desencadeadas
pelo processo de Industrialização. Essa questão assentou-se basicamente na tomada de consciência, por
parte de crescentes parcelas da sociedade, de um conjunto de novos problemas vinculadas às modernas
condições de trabalho urbano e pauperismo com um fenômeno socialmente produzido (Castel, 1999).
12
1.2.1 As novas facetas da exclusão social a partir de uma velha questão
social
Vários autores dentre eles Iamamoto (2001), Pereira (1999), Castel (1999),
analisaram os efeitos das políticas neoliberais sobre diferentes sociedades no decorrer
do final dos anos 90 e início do século XXI. As críticas desses autores estão diretamente
relacionadas as transformações do mundo do trabalho que, em vários casos, como no
Brasil, representam a exclusão social de uma parte significativa da sociedade. Esses
autores são fortemente influenciados pelo pensamento marxista, mas que são
fundamentais para se pensar tais transformações. A questão social surge como uma
questão significativa para se discutir o desenvolvimento econômico dos países do
Terceiro Mundo, como o Brasil.
De acordo com Iamamoto (2001), a questão social está integrada à estrutura do
sistema capitalista, sendo indissociável da sua forma de organização. A questão social é
o conjunto de expressões das desigualdades sociais engendradas na sociedade
capitalista, no século XIX, a partir da compra da força de trabalho do “trabalhador
livre”. Trabalho livre que se generaliza em circunstancias históricas nas quais, a
separação entre homens e meios de produção se dá em grande medida, marcando
profundamente seus desdobramentos.
Com o surgimento da classe operária, no referido século, que depende da venda
de sua força de trabalho como meio de atender suas necessidades vitais, emerge o
conflito entre capital e trabalho, resultando, portanto, numa questao social, que expressa
desigualdades econômicas, políticas e culturais das classes sociais, conforme expõe
Cerqueira Filho:
Por ‘questão social’, no sentido universal do termo, queremos significar o
conjunto de problemas políticos, sociais e econômicos que o surgimento da
classe operária impôs no curso da constituição da sociedade capitalista.
Assim, a questão está fundamentalmente vinculada ao conflito entre capital
e o trabalho (
CERQUEIRA FILHO, 1982, p. 21 apud NETTO,
1996, p. 47)
.
Nas palavras de Iamamoto e Carvalho (1996, p. 77):
A questão social não é senão as expressões do processo de formação e
desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da
sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do
13
empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da
contradição entre o proletariado e a burguesia.
Como demonstra Pereira (2001), o termo “questão” acrescido do adjetivo
“social” ganha outro significado. Indica a existência de conflitos entre portadores de
interesses opostos ou antagônicos, ou seja, contradição entre capital e trabalho. Neste
processo de co-relação de forças, os dominados conseguem impor-se como forças
políticas estratégicas, problematizando suas demandas sociais e alcançando ganhos
relativos.
De acordo com Pereira (1999), a partir de 1970 através do processo de
reestruturação produtiva impulsionado pela ideologia neoliberal foram desencadeadas
novas formas de expressão da questão social, que para Demo (2003) não se trata de uma
“nova questão social”, conforme muitos autores tentam defender, mas de uma
“exacerbação sem precedentes”.
Quanto ao adjetivo ‘nova’, faço coro com aqueles que discordam dessa
qualificação, pelo fato de ela basicamente referir-se às manifestações
contemporâneas de problemas que são engendrados pelas contradições
fundamentais (capital x trabalho) e de propugnar métodos de gestão social
cuja principal novidade é a de serem diferentes dos adotados pelo Welfare
State Keynesiano. O que não se pode negar, é o fato de que o quadro do
ponto de vista conjuntural mudou, é novo
(PEREIRA, 2001, p.54).
A conjuntura que se apresenta neste momento de intensificação das expressões
da questão social, consiste na decadência dos anos dourados (período de crescimento
econômico), devido à distribuição de forma desigual dos benefícios e impactos sobre o
meio ambiente, tanto entre as nações como no âmbito interno delas. Nesse período, os
efeitos sociais da recessão vão acumulando-se com intensidade (Id).
De acordo com Pereira (ibid, p. 49):
A formas de expressão da questão social apesar de se apresentarem variadas,
assumem amplitude global, produzindo efeitos comuns, como: desemprego
estrutural, aumento da pobreza e da exclusão social, trabalho sem
estabilidade e proteção social, sem vínculos empregatícios e desmonte de
direitos sociais edificados há mais de um século.
De acordo com Castel (1999, p. 496), o cenário de precarização, bem como de
negação de postos de trabalho, traz uma nova configuração destes “trabalhadores sem
14
trabalho”, que passam a ocupar na sociedade um lugar de “supranumerários, de inúteis
para o mundo” vivenciando portanto, uma exclusão social
11
.
Estamos assistindo no decorrer dos anos um modelo de desenvolvimento
econômico social, em que alguns são incluídos, outros pouco incluídos e, os demais,
para o funcionamento desse modelo, deverão ser excluídos econômica e socialmente.
Segundo Demo (2003, p.286),
no capitalismo nunca couberam todos os trabalhadores, sem falar em sua
inclusão marginalizada. Hoje, esta dinâmica está agravada em níveis
dramáticos, sobretudo em sociedades, como a brasileira, onde a oferta
informal de trabalho supera a formal.
Para Wanderley (1999), no Brasil a exclusão não é apenas econômica e política,
trata-se também de uma questão cultural e ética:
Este processo deve ser entendido como exclusão, isto é, uma
impossibilidade de poder partilhar o que leva à vivência da privação, da
recusa, do abandono e da expulsão inclusive, com violência, de um conjunto
significativo da população, por isso, uma exclusão social e não pessoal. Não
se trata de um processo individual, embora atinja pessoas, mas de uma
lógica que está presente nas várias formas de relações econômicas, sociais,
culturais e políticas da sociedade brasileira. Esta situação de privação
coletiva é que se está entendendo por exclusão social. Ela inclui pobreza,
discriminação, subalternidade, não eqüidade, não acessibilidade, não
representação pública (SPOSATTI, p. 53 apud WANDERLEY, ibid, p.20).
Segundo Gonçalves (2005, p.99), “no Brasil, os diversos termos estruturantes do
tema das iniqüidades sociais - desigualdade, pobreza e exclusão social têm sido
confundidos e/ou utilizados como sinônimos pelo senso comum”. Tais termos não se
apresentam enquanto sinônimos, mas como expõe Wanderley (ibid), são faces da
mesma moeda, pois a alta concentração de renda e desigualdade social que assola o
país, convive com efeitos perversos do fenômeno do desemprego estrutural. Assim,
torna-se perceptível que o fator distributivo é decisivo no que tange à redução da
pobreza de um país, mesmo sem qualquer crescimento econômico.
Castel (1999) nos permite refletir sobre as novas facetas da exclusão presentes
em nossa sociedade no final da década de 1990 - ainda que o foco das suas discussões
11
O conceito de exclusão social tem se prestado a uma amplitude de definições tanto na literatura quanto
no discurso de diferentes atores sociais. Apesar desta variação conceitual e não querendo polemizar o
tema, será utilizado neste trabalho o pressuposto de Castel (1999) de que embora a exclusão social
expresse um conjunto de carecimentos materiais, culturais e morais, seus elementos constitutivos são
remetidos a análise tendo em vista o cerne dos processos de produção e da repartição das riquezas sociais.
15
seja o cenário francês, muitos elementos são condizentes com a realidade brasileira
quando sugere uma diferenciação entre marginalização e a situação contemporânea, que
intitula desfiliação social. Esta desfiliação social é expressada pelo autor, como a
situação de indivíduos que flutuam na estrutura social e que povoam seus interstícios
sem encontrar um lugar designado.
A desfiliação não seria uma ruptura, como a exclusão, mas uma desqualificação
ou invalidação social de indivíduos (Castel, ibid). Para o autor ao invés da exclusão, o
processo que estaríamos vivenciando seria de invalidação social.
(...) pelo enfraquecimento das formas de política social, ou pelo seu
encolhimento, pelo crescimento do desemprego e da precarização, pela
impossibilidade de acesso livre aos postos assalariados de trabalho, sua
personificação se faz não pelo vagabundo, mas pelo desemprego e pelos
desempregados, os novos ‘desfiliados’ sem lugar (...) (CASTEL, ibid,
p.523).
Continuando com o autor, os problemas advindos das transformações do mundo
do trabalho, frente à revolução tecnológica e das novas filosofias políticas e
econômicas, é inevitável que a sociedade assalariada acabe sendo devastada. A atual
conjuntura econômica é marcada pela desestabilização dos “estáveis”, instalação de
alternativas precárias de trabalho, como os chamados “bicos”, pelos salários reduzidos e
pela descoberta de uma nova categoria de pessoas sub-remuneradas. Logo, se o mercado
não passar por restrições, voltaremos ao início do capitalismo, sem garantia alguma de
segurança trabalhista.
Portanto por falta de forças com efetivo poder de pressão para fazer
incorporar na agenda pública problemas sociais vigentes, com vista ao seu
decisivo enfrentamento, entendo que temos pela frente não propriamente
uma ‘questão social’ explícita, mas uma incomoda e complicada ‘questão
social’ latente, cuja explicitação acaba por tornar-se o principal desafio das
forças sociais progressistas
(PEREIRA, 2001, p.52).
Tal situação pode ser ilustrada com uma das principais expressões da questão
social na atualidade, que é o desemprego estrutural, cuja instauração está centrada numa
nova civilização onde o desemprego não é mais acidental ou expressão de uma crise
conjuntural, mas expressão de um regime que não mais a incorporação de toda
sociedade no mercado de trabalho. Como conseqüência, há um esvaziamento da
sociedade salarial, bem como perda de poder de pressão dos sindicatos,
desmoronamento dos direitos sociais e aumento da pobreza. O perfil histórico de
16
proteção social (pleno emprego, políticas sociais universais, extensão dos direitos
sociais), foi trocado por outro caracterizado pela crescente ocupação com desemprego e
insegurança social (PEREIRA, ibid, p.53).
Todavia, tais fatores como desigualdade social, desemprego, baixa renda e baixa
escolaridade, farão com que enormes contingentes de excluídos busquem suas próprias
oportunidades de trabalho e sobrevivência, principalmente quando são incentivados pelo
Estado a “criar seu próprio negócio”. Nesse sentido, políticas públicas de inclusão social
surgem como uma esperança para aqueles que são excluídos pelo chamado
“desemprego estrutural”, mesmo que essas iniciativas ainda respondam ou façam parte
de uma lógica de inclusão pelas “margens”. Esse é o caso dos catadores de materiais
recicláveis da sociedade brasileira, que apesar de serem trabalhadores fundamentais na
preservação do meio ambiente, através da reciclagem, como também na cadeia
produtiva do país, continuam vivendo em situações precárias de trabalho.
1.3. Políticas blicas de inclusão social no início do século XXI:
oportunidades ou manutenção do status quo?
Tendo analisado as novas facetas da exclusão social brasileira no final do século
XX, a partir do esvaziamento da sociedade salarial, daremos destaque neste momento a
política de geração e transferência de renda construída no século XXI no Brasil a partir
do governo Lula, com o intuito de verificar de forma breve um rompimento ou
continuidade da política de FHC, no que se refere ao processo de inclusão social.
O Governo Lula, sobretudo no período de 2003/2007 (equivalente ao primeiro
mandato), investiu no combate à fome e à pobreza, ampliando os recursos dos
programas de transferência de renda, em que se destacam os Programas Fome Zero e
Bolsa-família.
O Programa Fome Zero foi instituído logo no início do mandato do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, a partir da Proposta de Política de Segurança Alimentar
elaborada pelo Instituto de Cidadania, em 2001, sob a coordenação de José Graziano da
Silva, que contou com a participação de organizações não governamentais, institutos de
pesquisa e movimentos sociais. O programa parte da concepção de que o direito à
alimentação é um direito humano básico e deve ser assegurado pelo Estado. O projeto
norteia-se pelo conceito de segurança alimentar, definido como “a garantia do direito
17
de todos ao acesso a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente e de modo
permanente...” (INSTITUTO DE CIDADANIA, 2001, p.14 apud SILVA et al., 2007,
p. 120).
A proposta do Programa Fome Zero aponta a necessidade de se articular às
políticas emergenciais três outros tipos de políticas: políticas estruturais de geração de
emprego e renda, de redução da desigualdade e de Previdência Universal; políticas
específicas aquelas destinadas a promover a segurança alimentar e a combater a fome
e a desnutrição da população carente; e políticas locais já existentes em âmbito estadual
municipal e parceria com a sociedade civil (SILVA et al., ibid, p. 123-124).
O Programa Bolsa-Família resultou da articulação de programas existentes no
governo de Fernando Henrique Cardoso, a partir de um diagnóstico elaborado pela
equipe de transição do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, eleito em 2002.
Sob a designação de Bolsa-Família, foram inicialmente unificados quatro programas
federais de Transferência de Renda: Bolsa-Escola, Bolsa Alimentação, Vale-Gás e
Cartão-Alimentação. O Programa foi instituído por meio da Medida Provisória 132,
de 20 de outubro de 2003 (SILVA et al., ibid, p. 135-136).
Outro instrumento importante nesta ótica de enfrentamento das desigualdades
sociais é o BPC Benefício de Prestação Continuada, que sofreu algumas alterações
legais, visando assistir aos idosos e portadores de necessidades especiais de baixa renda.
A partir de 2003, os idosos tiveram a idade limite para recebimento do benefício
reduzida de 67 para 65 anos, e posteriormente, os idosos casados também foram
beneficiados, podendo receber dois salários mínimos por grupo familiar, fator que era
proibido na legislação anterior.
De acordo com as recentes pesquisas divulgadas pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada IPEA, a desigualdade de renda vem diminuindo entre os
brasileiros. Neste sentido, merece destaque inicialmente o estudo realizado sobre a
redução da desigualdade entre 2001 e 2004.
Medido pelo coeficiente de Gini, que é a medida de desigualdade de renda
mais comumente utilizada, o grau de concentração de renda no país caiu 4%
entre 2001 e 2004, passando de 0,593 para 0,569. Embora à primeira vista
essa taxa possa parecer modesta, em se tratando de uma medida de
desigualdade representa uma queda substancial: entre os 75 países para os
quais informações relativas à evolução da desigualdade de renda ao longo
da década de 1990, menos de ¼ apresentou taxas de redução da desigualdade
superiores à brasileira (IPEA, 2007).
18
No país, os níveis de desigualdade começaram a cair desde 1995, durante o
governo de Fernando Henrique Cardoso, no entanto, a queda mais acentuada vem
ocorrendo desde 2001.
Outro estudo do IPEA (2007) analisa os dados sistematizados a partir da PNAD
Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística IBGE, para o período de 2001 a 2005. De acordo com este
último estudo, em 2005 o índice de Gini do rendimento domiciliar per capita (RDPC)
caiu de 0,594 para 0,566 em 2005. Para os pesquisadores o valor absoluto de
intensidade da redução é semelhante ao do crescimento de 8 pontos percentuais do
índice de Gini do rendimento da PEA no Brasil, na década de 1960, que mereceu grande
destaque na literatura sobre distribuição de renda no debate político (HOFFMANN,
2007).
Outros indicadores confirmam a tendência de queda na desigualdade de renda no
país, demonstrando que uma desconcentração da riqueza apropriada, em que a
percentagem apropriada pelos mais ricos caiu enquanto aumentou a parte da renda
apropriada pelos mais pobres.
A percentagem da renda apropriada pelos 10% mais ricos cai de 47,2% em
2001 para 45,0% em 2005, ao mesmo tempo em que a percentagem da renda
total recebida pelos 5% mais ricos cai de 33,8% para 32,0%. Em 2001 a
percentagem da renda total apropriada pelo 1% mais rico (13,8%) ainda era
maior do que a percentagem da renda apropriada pelos 50% mais pobres
(12,7%). A situação inverte-se em 2005, ficando 12,9% para o centésimo
mais rico e 14,2% para a metade mais pobre (HOFFMANN, ibid).
Um outro índice que também apontou a melhora na distribuição de renda no país
nos anos de 2003 e 2004 é o Índice de Desenvolvimento Humano IDH, medido pelo
Programa as Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD. O IDH é a síntese de
três indicadores: PIB (Produto Interno Bruto) per capita depois de corrigido pelo poder
de compra da moeda de cada país, para isto é medido em dólar PCC (paridade de poder
de compra, a fim de eliminar as diferenças de custo de vida entre os países);
longevidade aferida através do indicador de expectativa de vida ao nascer e; educação
aferida através do índice de analfabetismo e a taxa de matrícula em todos os veis de
ensino, isto é níveis de ensino primário, secundário e terciário. As três dimensões têm a
mesma importância no IDH, que varia de zero a um (www.pnud.org.br/idh).
19
Os últimos dados disponibilizados pelo PNUD (2006) indicam que o IDH
brasileiro cresceu: passou de 0,788 em 2003 para 0,792 em 2004. O resultado mantém o
país na 69ª posição no mundo, entre as 83 nações de médio desenvolvimento humano
(IDH entre 0,500 e 0,799), fora, portanto, do grupo de 63 nações de alto
desenvolvimento humano. Estes dados deixam em evidência que ainda é necessário
encontrarem-se caminhos que conduzam a uma maior distribuição de riquezas com a
finalidade de combater a pobreza.
Segundo Sachs (2004), nas condições brasileiras, o ataque à pobreza deve
comportar necessariamente três frentes:
(a) as indispensáveis políticas compensatórias para atender os mais necessitados, as
quais, por mais importantes que sejam, não resolvem as causas da pobreza e,
ademais, demandam despesas extras;
(b) a ampliação e universalização das redes de serviços sociais de base e o
fortalecimento das instituições democráticas necessárias ao exercício da
cidadania; e
(c) a geração de números suficientes de novas oportunidades de trabalho decente
12
empregos e auto-empregos e a transformação em trabalho decente das
ocupações precárias e das ocupações informais, ou seja, a construção da ponte
sobre o social e o econômico.
Nesta evolução ocorrida, pode se considerar que os programas de transferência
de renda, embora não sejam o único fator, tiveram seguramente um impacto na redução
dos índices de desigualdade de renda no Brasil no período descrito, bem como na
melhora do IDH. De acordo com os pesquisadores do IPEA, a partir das informações
disponíveis na PNAD é possível distinguir três tipos de transferências públicas: (a) as
pensões e aposentadorias públicas; (b) o Beneficio de Prestação Continuada (BPC); e
(c) os benefícios do Bolsa Família e outros programas similares, tais como o Programa
de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e o Bolsa Escola. Em conjunto, as
12
O Diretor Geral da Organização Internacional de Trabalho OIT, Juan Somavia
,
propõe na XVI
Reunião Regional Americana no ano de 2006 um conceito de trabalho decente enquanto “um trabalho
produtivo com remuneração justa, segurança no local de trabalho e proteção social para o trabalhador e
sua família, melhores perspectivas para o desenvolvimento pessoal e social, liberdade para que
manifestem suas preocupações, organizem–se e participem na tomada de decisões que afetam suas vidas,
assim como a igualdade de oportunidades e de tratamento para mulheres e homens” (OIT, 2006).
.
.
20
transferências governamentais contribuíram com cerca de 1/3 da redução na
concentração de renda, o que aponta para uma elevada importância desse fator (IPEA,
ibid, 2007).
Tendo em vista um investimento alto por parte do governo federal em políticas
sociais através dos programas de transferência de renda, faz-se necessário identificar a
existência de uma integração destes programas aos de geração de renda, bem como ao
aspecto ambiental. Considerando os apontamentos de Sachs (2004), pode afirmar-se que
os programas de transferência de renda não constituem por si medidas que garantam
uma emancipação do indivíduo e consequentemente um desenvolvimento sustentável
com inclusão social. Ainda segundo o autor é necessário pensar-se em um conjunto de
políticas públicas que apontem a um crescimento econômico com criação de um número
suficiente de oportunidades de trabalho decente.
Segundo Silva (2006), estudos creditam a redução da desigualdade social à
estabilidade da moeda, à recente diminuição do desemprego e aos Programas de
Transferência de Renda, pela sua expansão e maior focalização na população pobre.
Todavia, tem sido capaz apenas de melhorar a situação de vida dessas famílias, sem,
contudo, retirá-las do nível de pobreza em que se encontram. Conforme esta autora:
Esses programas ‘de transferência de renda’, quando não são articulados a
uma política macroeconômica de crescimento sustentável e de redistribuição
de renda, podem significar melhorias imediatas de famílias que vivem em
extrema pobreza, mas não superam a pobreza, melhorando a situação
vivenciada pelas famílias pobres, sem ultrapassar a denominada linha de
pobreza. A mesma pesquisa demonstro que os Programas de
Transferência de Renda que transferem um salário mínimo para indivíduos,
o Benefício de Prestação Continuada e o Seguro Social Rural apresentaram
impacto significativo na redução da desigualdade e da pobreza no Brasil
(SILVA, 2006, p. 14).
Apesar do governo Lula estar investindo altos recursos em Políticas Sociais
ainda se percebe uma concentração da renda e da riqueza socialmente produzida,
dificultando assim uma redução mais significativa nos índices de desigualdade social.
Ainda que o governo de Fernando Henrique Cardoso tenha apresentado
investimentos em políticas sociais nos últimos anos de seu governo, vimos através dos
dados apresentados que foi no governo de Lula que houve uma melhora na distribuição
de renda no país. Uma das medidas que possibilitou este avanço foi o programa Fome
Zero que prevê uma série de ações para que os brasileiros em situação de
vulnerabilidade social consigam gerar sua própria renda, através de programas que
21
privilegiam a criação de cooperativas e associações, bem como o fortalecimento da
agricultura familiar. Para isto é dado um direcionamento de financiamento à produção e
qualificação dos trabalhadores (www.fomezero.gov.br).
22
CAPÍTULO 2 - DO LIXO AO NICHO: A RECICLAGEM E SUA
FUNCIONALIDADE AO CAPITAL EM TEMPOS DE RACIONALIZAÇÃO DO
USO DOS RECURSOS NATURAIS
O Bicho
Vi ontem um bicho na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa, não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão, não era um gato, não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
BANDEIRA (1986)
2.1. Lixo ou um novo conceito de matéria prima? As conveniências do
mercado capitalista contemporâneo sob a égide do “desenvolvimento
sustentável”
O ser humano estabeleceu que todo o material resultante de suas mais diversas
atividades não lhe sendo mais útil é considerado lixo. No entanto, este paradigma se
apresenta hoje, como um tanto ultrapassado, pois segundo Pereira Neto (1996),
atualmente propõe-se que o lixo seja definido como uma massa heterogênea de resíduos
sólidos, resultante das atividades humanas, os quais podem ser reciclados e
parcialmente utilizados, gerando, entre outros benefícios, proteção à saúde pública e,
economia de energia e de recursos naturais (Figura 1).
23
LIXO DOMICILIAR
Materiais potencialmente
recicláveis
Rejeitos
FIGURA 1: Composição do lixo domiciliar formado por uma massa
heterogênea resíduos
Fonte: Pereira Neto (1996)
Grande parcela dos resíduos produzidos pelo homem é de natureza orgânica,
resultante de atividades industriais, comerciais, agrícolas, domiciliares, entre outras. Em
geral, esses resíduos orgânicos se apresentam na forma de sobras de alimento, frutas e
legumes, folhas, gramas e sobras de cultivo (PEREIRA NETO, 1996) (Figura 2).
FIGURA 2: Resíduos orgânicos que compõe o lixo orgânico
Fonte: Pereira Neto (1996)
Plásticos
Vidros
Metais
Cerâmica
Papel
Papelão
Osso
Pedra
Terra
Trapos
Couro
Outros
LIXO ORGÂNICO
(Matéria Orgânica)
Sobras de Frutas
Sobras de Legumes
Restos de Alimentos
Resíduos Orgânicos
Agroindustriais
Resíduos Orgânicos
industriais
Lodos Orgânicos
Podas, Gramas, Palhas, sobras
de cultivo, serragem, etc.
24
“Historicamente, desde que os seres humanos começaram a se agrupar,
sempre existiu a produção de resíduos. Com o avanço dos processos de
industrialização, urbanização e crescimento demográfico houve um
aumento crescente da produção de resíduos, que passou a ter uma
composição cada vez mais diversificada e perigosa” (GONÇALVES,
2005, p. 87).
O volume de lixo gerado tem crescido rapidamente, sobretudo nos países em
desenvolvimento, tornando-se um grande problema se não existir uma visão abrangente
e comprometida com a proteção ambiental, tanto pelo controle da poluição quanto pela
economia de energia e de recursos naturais.
Do ponto de vista ecológico e da degradação ambiental, sabe-se que o lixo
representa poluição e conseqüentemente degradação ambiental. Ainda, significa grande
desperdício de recursos naturais e energéticos. Afinal, com a cultuação do consumismo
desenfreado, somos compelidos cada vez mais a consumir mais supérfluos, que através
de suas embalagens “descartáveis” rapidamente viram lixo, que aumenta em quantidade
e variedade, contendo materiais cada vez mais estranhos ao ambiente natural.
O resultado disso, segundo Vieira (1998), é um planeta com menos recursos
naturais e um povo doente, fadado ao próprio extermínio, face à visão predadora do
homem que ainda, irracionalmente, reluta em aceitar a sua inter-relação com o meio
ambiente.
O modelo de desenvolvimento econômico dominante entende a natureza como
se todos os recursos fossem inesgotáveis, e a explora sem equilíbrio ecológico,
conseqüentemente, se desequilibrando junto. Um paradoxo, pois em nenhum outro
momento da história do mundo houve tantos recursos tecnológicos envolvidos na
produção e no dia a dia dos homens. Em quase todas as atividades do mundo moderno
maquinas que, supostamente, facilitam as atividades humanas. Entretanto, também
nunca houve tantas desigualdades sociais, injustiças, misérias, fome e mais
recentemente a constatação da irreversível depredação do ambiente natural do planeta,
causado em sua maioria pela ação antropocêntrica. Dentre muitas destas depredações se
destaca as de nível global, que se não são as mais graves, são as de maior repercussão: o
aquecimento da terra, a perda da biodiversidade nas florestas, o aumento do buraco na
camada de ozônio, o lixo nuclear, a poluição dos mares e a escassez da água (Id).
Silva (2003) assinala que os recursos naturais, nos primórdios da formação da
ciência econômica, exerceram um papel de grande relevância nas análises dos
economistas. Entretanto, o que se percebe é que esta preocupação não estava interligada
25
efetivamente à questão ambiental em si, mas aos prejuízos que poderiam causar ao setor
econômico, no que tange a sua lucratividade. Esta afirmativa pode ser evidenciada nas
palavras de Silva (ibid) quando apresenta a tal preocupação da ciência econômica em
diferentes momentos:
(...) nas teses fisiocráticas, da segunda metade do século XVIII, sobre
origem agrária do excedente, no alerta da escola clássica quanto ao possível
comprometimento da expansão capitalista como decorrência da escassez de
recursos naturais, percebido pelo desequilíbrio entre o crescimento
populacional e a oferta de alimentos, segundo Thomas Malthus, e pela
redução da produtividade do trabalho agrícola – por escassez de terras férteis
– e consequentemente queda do lucro, de David Ricardo, no início do século
XIX (ORTIZ et al, 2001 apud SILVA, 2003, p. 33).
A partir da segunda metade do século XIX, fatores históricos o progresso
técnico e o alargamento das fronteiras geográficas e a própria evolução do
pensamento econômico, através das análises neoclássicas, se somaram para a diluição
da importância dos recursos ambientais da análise econômica. A argumentação adotada
foi que “a abundancia dos recursos naturais é tamanha que estes são economicamente
gratuitos, não se convertendo, portanto, em bens econômicos e tampouco em fatores de
produção” (OLIVEIRA, 1997 apud SILVA, Ibid).
Na perspectiva de Ramonet (1998), a Revolução Industrial é a fase que melhor
representa a falta de limites do homem frente ao uso e exploração dos recursos naturais.
Para o autor, mais que uma profunda revolução técnica, representou o coroamento do
processo civilizatório ocidental que buscou incessantemente o aumento da
produtividade baseado na intensificação da exploração dos recursos naturais e
conseqüentemente na sua destruição.
Conforme afirmam MacNell et al. (1992, p.15),
“(...) os progressos do passando foram acompanhados pelo enorme
recrudescimento na escala de impacto ambiental sobre a terra. Desde 1900, a
população mais que triplicou. Sua economia cresceu 20 vezes. O consumo de
combustíveis fósseis aumentou 30 vezes e a produção industrial 50 vezes. A
maior parte desse crescimento, cerca de quatro quintos dele, aconteceu a partir
de 1950.
Embora a devastação do meio natural tenha se processado em alta escala durante
muitas décadas, após a primeira crise do petróleo em 1973, são explicitados os
questionamentos sobre os problemas ambientais causados pelo setor econômico.
Segundo Leff (2001), a luta contra a devastação da natureza se intensifica e ganha mais
26
força quando defensores do meio ambiente e cientistas começaram a questionar a
construção social do mundo moderno ancorado em um saber que é conduzido por
estratégias de poder que refletem em uma grave crise ambiental. Tais estratégias
segundo o autor se dão a partir de um discurso que defende o progresso partindo de um
crescimento econômico sem limites que, por sua vez, resulta numa “capitalização da
natureza” e “homogeneização cultural”.
O modelo econômico atual põe em questão a noção moderna de
desenvolvimento sustentável estabelecido pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento que se apresenta como aquele que “satisfaz as necessidades das
gerações atuais sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas
próprias necessidades” (CMMAD, 1988).
As discussões sobre os impactos do modelo de desenvolvimento de produção
sobre o meio ambiente têm suas origens na Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972. Vale destacar que estas
discussões tiveram como pano de fundo, a idéia de crescimento zero. A publicação de
The Limits of Growth do Clube de Roma, e que marcou as discussões dessa
Conferência, introduziu “a idéia de finitude do modo de produção de mercadorias (que
funciona baseado numa falsa infinitude), concluindo que caso não houvesse mudanças
só chegaríamos a uma catástrofe” (NOBRE, 2002).
Nessa Conferência não se chegou a nenhum ponto de consenso por discrepâncias
de fundo entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento, bem como
entre ambientalistas e desenvolvimentistas.
Em 1983, foi criada a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (CMMAD) por determinação da ONU – com a função de avaliar os
impactos produzidos pelas sociedades de consumo em todo o mundo. Em 1987, a
CMMAD publica “Nosso Futuro Comumou Relatório Brundtland, onde é publicado
pela primeira vez o conceito de “Desenvolvimento Sustentável”.
A idéia força deste relatório reside primeiramente em ter pretendido mostrar que
finitude no interior do modo de produção capitalista não significa necessariamente
catástrofe. Segundo Lélé ( 1991, p.613 apud Nobre, ibid, p. 30):
“O impacto maior do movimento do DS é a rejeição de que conservação
ambiental seja necessariamente um constrangimento ao desenvolvimento ou
que o desenvolvimento signifique necessariamente poluição ambiental não
se trata certamente de um ganho desprezível”.
27
Diversos autores assinalam que o Relatório Brundtland foi sobre tudo um
documento político mais que, um tratado científico dos problemas do mundo. Nas
palavras de Brundtland “o objetivo do relatório era aumentar o nível de conscientização
dos governos, agências de auxílio e outras que se ocupam com o desenvolvimento,
quanto à necessidade de integrar considerações ambientais no planejamento e nas
tomadas de decisão econômicas em todos os níveis”. Pode concluir-se que, embora o
Relatório seja bastante imperfeito como relatório ambiental, foi uma importante
contribuição para a politização dos problemas ambientais e sua inter-relação com
problemas de desigualdade, pobreza e políticas de comércio internacionais
(BROOKFIELD, 1988 apud NOBRE, ibid).
Outrossim, corresponde ressaltar que, em contraste com as discussões da
Conferência de Estocolmo de 1972, e das teses de The Limits of Growth onde o
crescimento era o próprio problema, “o Relatório Brundtland advoga o crescimento. De
fato, ele vê o crescimento como uma necessidade urgente se se trata de reduzir a
pobreza e minimizar os impactos ambientais” (BURTON, 1987 apud NOBRE, ibid).
Entretanto, na governança internacional a legitimação do conceito de
Desenvolvimento Sustentável se na década de 1990, quando realizada a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD)
também conhecida como, Cúpula da Terra ou ECO 92 deixando em evidência os
laços inextricáveis que existem entre as questões ambientais e o desenvolvimento.
Desde a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1945
13
o
conceito de desenvolvimento caracterizou-se por passar por uma complexificação, bem
como, pela compreensão de que se trata de um conceito pluridimensional. Segundo
Sachs (2007), hoje estamos muito longe do ponto de partida, quando se acreditava que o
crescimento econômico resolvia tudo. Hoje, na seqüência dos trabalhos de Amartya
Sen, pode se dizer entre as mil definições de desenvolvimento, que o desenvolvimento é
a efetivação universal do conjunto dos direitos humanos, desde os direitos políticos e
cívicos, passando pelos direitos econômicos, sociais e culturais, e terminando nos
direitos coletivos, entre os quais está, por exemplo, o direito a um meio ambiente
saudável (Id).
13
A ONU e suas Agências tiveram um papel fundamental no período que se seguiu à Segunda Guerra
Mundial na evolução do conceito de desenvolvimento.
28
Sachs (ibid) assinala que com base nesses adjetivos acrescentados ao conceito de
desenvolvimento deve dar-se ênfase na priorização de alguns aspectos, assim defende
que, quando se fala de desenvolvimento, deve se pensar em que este deve ser
socialmente includente, ambientalmente sustentável e economicamente sustentado. Para
tornar isto possível devemos partir de dois postulados éticos de solidariedade, um
sincrônico com nossa geração, permitindo seu progresso, porém, respeitando as
condicionalidades ecológicas e ambientais, a partir do conceito de solidariedade
diacrônica com as gerações futuras. Mas, para que as coisas aconteçam, têm que ser
economicamente viáveis, isto é, o econômico não tem que ser um objetivo em si, mas o
instrumental com o qual avançar a caminho do desenvolvimento includente e
sustentável.
O autor destaca a questão de desenvolvimento includente, em função de que o
problema social mais importante de nossa época é o desemprego aberto, o subemprego e
a exclusão social que atingem grande parte da população em idade de trabalho. De
acordo com Sachs (ibid, p.24) quando se fala de “inclusão social, cabe dizer que há uma
diferença essencial entre ações assistenciais, necessárias tendo em vista a imensidão do
problema, mas que não modificam estruturalmente a situação, e as ações que consistem
em promover a inclusão social pelo “trabalho decente”. O adjetivo “decente”
14
implica
o lado qualitativo, ou seja, remuneração, condições trabalhistas e relações de trabalho
condizentes com a dignidade humana. Isto é, que significa que não é suficiente
promover o emprego ou o auto-emprego, é necessário ainda que ele inclua os preceitos
de decência”.
Tanto Sachs (2004) como Guimarães (2001; 2006) apontam que os pilares
fundamentais do desenvolvimento sustentável são: o social, o ambiental, territorial,
econômico e político.
De acordo com Guimarães (2006, p.30), o que esem jogo é a superação dos
paradigmas da modernidade, que está definindo a orientação dos processos de
desenvolvimento, e a sua substituição por um paradigma de desenvolvimento humano
sustentável que coloque os seres humanos no centro do processo de desenvolvimento,
que considere o crescimento econômico como um meio e não como um fim em si
mesmo, que proteja as oportunidades de vida para as gerações atuais e futuras e, em
última instância, que respeite a integridade dos sistemas de suporte à vida no planeta.
14
Atualmente utilizado pela Organização Internacional do Trabalho - OIT.
29
Trata-se em síntese, de um paradigma que responde a um novo padrão civilizatório, a
uma forma distinta de definir a articulação entre seres humanos e natureza. Um
paradigma que responde também a um novo padrão de relacionamento entre os próprios
seres humanos.
Refletindo a partir das idéias de Sachs (2004; 2007) e Guimarães (2001; 2006),
pode-se concluir que o modelo econômico vigente é incapaz de garantir um bem-estar a
toda humanidade e às gerações futuras sem comprometer a estabilidade dos
ecossistemas, se não repensar suas ações.
A história nos tem demonstrado que o crescimento econômico não implica
necessariamente desenvolvimento, portanto, o desenvolvimento não deve ser entendido
apenas a partir do econômico, senão que deve buscar-se também eqüidade e justiça
social, através do equilíbrio entre o ambiental e a tecnologia, que como bem assinala
Leff (2001) é diferente da sustentabilidade apresentada pelo discurso neoliberal:
“A retórica do desenvolvimento sustentável converteu o sentido crítico do
conceito de ambiente numa proclamação de políticas neoliberais que nos
levariam aos objetivos do equilíbrio ecológico e da justiça social por uma
via mais eficaz: o crescimento econômico orientado pelo livre mercado. Este
discurso promete alcançar seu propósito sem uma fundamentação sobre a
capacidade do mercado de dar o justo valor à natureza e à cultura; de
internalizar as externalidades ambientais e dissolver as desigualdades
sociais; de reverter as leis da entropia e atualizar as preferências das futuras
gerações” (LEFF, 2001, p.24).
É notório que o crescimento não conduz automaticamente à eqüidade nem a
justiça social, pois não leva em consideração nenhum outro aspecto da qualidade de
vida a não ser o acúmulo de riquezas proporcionado apenas a alguns indivíduos.
O sistema capitalista, com seu objetivo de otimização dos “lucros” extrai o
máximo da natureza agindo de forma perversa e predatória através de uma política
injusta e alienante. Processo, que de acordo com Leff (2001, p.16), converteu a
escassez, numa escassez global que não se resolve mediante o progresso técnico, isto
é, pela substituição de recursos escassos por outros mais abundantes.
Segundo Silva (2003, p.34), os recursos físicos são resultantes de ciclos naturais
do planeta Terra que duram milhões e milhões de anos. A capacidade de recomposição
de um recurso no horizonte do tempo humano tem sido o principal critério para a
30
classificação dos recursos naturais
15
que podem ser renováveis, ou reprodutíveis, e não-
renováveis, ou exauríveis, esgotáveis ou não-reprodutíveis.
De acordo com WBGU (1996 apud van Bellen 2006, p.20), os principais
motivos de degradação ambiental estão expressivamente ligados ao processo de
exploração e acumulação não possibilitando a renovação dos recursos renováveis e
esgotando aqueles não renováveis. Os principais elementos de degradação ambiental
são:
- Cultivo excessivo das terras marginais;
- Exploração excessiva dos ecossistemas naturais;
-Degradação ambiental decorrente do abandono de práticas de agricultura
tradicional;
- Utilização não sustentável, pelos sistemas agroindustriais, do solo e dos corpos de
água;
- Degradação ambiental decorrente da depleção de recursos não-renováveis;
- Degradação da natureza para fins recreacionais;
- Destruição ambiental em função do uso de armas e decorrente dos conflitos
militares;
- Dano ambiental da paisagem natural a partir da introdução de projetos de grande
escala;
- Degradação ambiental decorrente da introdução de métodos de agricultura
inadequados e/ou inapropriados;
- Indiferença aos padrões ambientais em função do rápido crescimento econômico;
- Contaminação local de propriedades onde se localizam plantas industriais;
- Degradação ambiental decorrente da disposição controlada e descontrolada e
resíduos.
Tendo em vista as leis de preservação ambiental que vão surgindo, apesar delas
favorecerem em certa medida a rede capitalista, as empresas terão que se adequar às
normatizações quanto à exploração e uso do meio natural. Porém, como no livre
15
Os solos, o ar, as águas, as florestas, a fauna e a flora são considerados recursos naturais renováveis,
pois seus ciclos de recomposição são compatíveis com o horizonte de vida do homem. Os minérios em
geral e os combustíveis fósseis (petróleo e gás natural) são tidos como não-renováveis, uma vez que são
necessárias eras geológicas para sua formação (SILVA, 2003).
31
mercado globalizado tudo passa a ter valor econômico, até mesmo as políticas de
preservação ambiental passam a ser vistas como um novo e lucrativo negócio que as
empresas “poderão” e “deverão” explorar para garantir a manutenção de sua
lucratividade.
Como assinalado, o fato da definição de DS dada pelo Relatório Brundtland
ser extremamente vaga, deu espaço a numerosas definições e interpretações, o qual se
prestou em certo modo para a banalização do termo.
É justamente esta banalização do termo “desenvolvimento sustentável” que
margem para que o próprio mercado mediante suas conveniências apresente definições
que irão beneficiar simplesmente o fator econômico, desconsiderando, portanto, os
aspectos sociais e ambientais.
Neder (2006) assinala que na verdade, para grande parte das empresas os bens e
serviços ambientais não passam de mercadorias. Quanto ao cumprimento de leis
ambientais específicas, deparamo-nos com o uso de seu poder político e jurídico para
neutralizar a regulamentação dos governos, recorrendo, em particular, aos argumentos
de proteção do emprego e da empresa nacional. Por questão de sobrevivência, quando
existe uma pressão maior dos órgãos de controle e/ou do movimento ambientalista tais
empresas assumem uma falsa responsabilidade social para mudar a imagem da
organização.
Continuando com o autor, para grande parte das indústrias o sentido de
preservação ambiental no decorrer da década de 1980 se resumiu à resposta às multas e
sanções, portanto, podendo se dizer que não havia consciência ambiental. O autor ainda
assinala que o surgimento deste marco legislativo não se reverteu em mudanças na
estratégia de exploração do meio ambiente.
Somente no final da referida cada tendo em vista o processo de globalização
que gera uma acirrada competitividade entre as grandes empresas e a racionalização de
recursos naturais é que as empresas buscam se garantir no mercado utilizando-se de
marketing através da difusão das chamadas tecnologias limpas e do conceito de
excelência ambiental que avalia a organização não somente pelo seu desempenho
produtivo e econômico, mas por seus valores éticos e pela performance ambiental
16
(Id).
16
“Tomando como ponto de partida princípios definidos pela Política Ambiental, foi estruturado, o
Sistema de Gestão Ambiental (SGA) da empresa que compreende as responsabilidades, práticas,
procedimentos e recursos para implementar e manter a Política Ambiental da empresa e seus objetivos. O
SGA constitui um primeiro passo obrigatório para a certificação da empresa nas normas da série ISO que
possibilitarão incorporar a Gestão Ambiental na gestão pela Qualidade Total” (VALLE, 1996).
32
A preocupação principal da política econômica contemporânea é manter viável o
atual sistema econômico, através da constituição de novas estratégias que garantam o
seu processo de acumulação. Por isso, entende-se aqui que não é possível adequar as
estratégias de livre mercado a uma exploração dos recursos naturais ambientalmente
sustentável, bem como também garantir a justiça social.
Vale ressaltar que não se pretende ao realizar tal crítica desenvolver uma análise
unilateral e empobrecida colocando as políticas voltadas para a questão ambiental
apenas como uma estratégia do Estado para favorecer o mercado, deve ser vista
também, como um resultado de pressão e luta dos movimentos sociais. Pois, dentre o
surgimento de vários movimentos sociais com diferentes demandas, surge também o
movimento ambiental que segundo Leff (2001), incorpora novas reivindicações às
demandas tradicionais pelos direitos humanos e pela justiça social, assim como para
satisfazer de forma efetiva as necessidades básicas e as aspirações de desenvolvimento
material e cultural da sociedade, contribuindo para gerar uma cultura política mais
plural e para dar sentido aos processos de governabilidade democrática.
Presencia-se, portanto, uma correlação de forças, onde, de um lado, um discurso
instituído defende que o mercado será capaz de se auto-regular em prol, tanto da
diminuição da injustiça social, da pobreza e da miséria, como da racionalização no uso
dos recursos naturais e, do outro lado, uma linha contra hegemônica vai nos mostrar que
tanto os problemas sociais, como os ambientais emergiram, em grande parte, do
paradigma dominante do sistema produtivo do capitalismo, este regido pelo livre
mercado (LEFF, ibid).
Neste cenário, a tensão entre meio ambiente e modernidade tem gerado uma
questão socioambiental, apresentando, portanto, novos paradigmas de desenvolvimento.
Estes consistem no paradigma da racionalidade ambiental em contraposição ao
paradigma da racionalidade do capitalismo expansionista (Id).
Segundo Leff (2002) a sociedade capitalista gerou um crescente processo de
racionalização formal e instrumental que moldou todos os âmbitos da organização
burocrática, os métodos científicos, os padrões tecnológicos, os diversos órgãos do
corpo social e os aparelhos jurídicos e ideológicos do Estado. Entretanto, a questão
ambiental contemporânea coloca a necessidade de introduzir reformas no Estado, de
incorporar normas ao comportamento econômico, de legitimar novos valores éticos e
procedimentos legais e de produzir técnicas para controlar os efeitos poluidores e
dissolver as externalidades sociais e ecológicas geradas pela racionalidade do capital; a
33
problemática ambiental questiona os benefícios e as possibilidades de manter uma
racionalidade social fundada no cálculo econômico, na formalização, controle e
uniformização dos comportamentos sociais, e na eficiência de seus meios tecnológicos,
que induziram um processo global de degradação socioambiental, socavando as bases
da sustentabilidade do processo econômico e minando os princípios de eqüidade social e
dignidade humana. Num sentido propositivo, a questão ambiental abre assim novas
perspectivas para o desenvolvimento, descobrindo novos potenciais ecológicos,
tecnológicos e sociais, e propondo a transformação dos sistemas de produção, de valores
e de conhecimento da sociedade, para construir uma racionalidade produtiva
alternativa.
A partir da perspectiva dos fins de um manejo integrado e sustentável dos
recursos naturais, as contradições entre a lógica do capital e os processos ecológicos não
se apresentam como simples oposição de duas lógicas abstratas contrapostas; razão pela
qual sua solução não consiste em subsumir o comportamento econômico na lógica dos
sistemas vivos ou em internalizar esta lógica como um sistema de normas e condições
ecológicas, na dinâmica do capital (PASSET, 1979 apud LEFF, 2002). As contradições
entre racionalidade ambiental e racionalidade capitalista é uma confrontação de
interesses opostos arraigados em estruturas institucionais, paradigmas de conhecimento
e processos de legitimação que enfrentam diferentes agentes, classes e grupos sociais
(LEFF, 2002).
Assim, de acordo como o autor, racionalidade ambiental não é a expressão de
uma lógica, mas o efeito de um conjunto de práticas sociais e culturais diversas e
heterogêneas, que dão sentido e organizam os processos sociais por intermédio de certas
regras, meios e fins socialmente construídos, que ultrapassam as leis derivadas da
estrutura de um modo de produção. Em outras palavras, a racionalidade ambiental não é
uma lógica (do mercado, da natureza) ou de uma lei (do valor, do equilíbrio ecológico);
é a resultante de um conjunto de normas, interesses, valores, significações e ações que
não se dão fora das leis da natureza e da sociedade, mas que o as imitam
simplesmente; trata-se de uma racionalidade conformada por processos sociais que
ultrapassam suas atuais estruturas (LEFF, ibid, p. 125-126).
Por sua parte Stahel (2003) analisa a dinâmica de funcionamento do capitalismo
a partir da noção da entropia, oriunda da termodinâmica, pois segundo o autor este
conceito lança uma nova luz sobre a questão política, que emerge como central a toda
busca de desenvolvimentos sustentáveis, uma vez que uma sociedade sustentável
34
depende antes de tudo de uma reconstrução política total da sociedade contemporânea.
Para o autor, o problema da sustentabilidade se insere na problemática geral da entropia
material e energética crescente de um lado, frente à capacidade dos organismos vivos
em manterem o seu nível de entropia baixo, do outro. Isto significa que o que gera a
insustentabilidade é o alto consumo de matéria prima (energia) e conseqüentemente um
grande descarte de lixo, caso este não seja reutilizado.
O processo de reciclagem constitui-se, portanto, numa alternativa de garantir
uma entropia positiva na medida em que esta for reduzida (baixa entropia). Esta medida
garante uma redução da exploração do meio ambiente na busca desenfreada por
recursos naturais. Assim, as discussões sobre a reciclagem
17
, passam a ser debatidas
com maior intensidade a partir da primeira crise do petróleo, quando ampliam-se os
debates sobre a racionalização do uso dos recursos naturais.
A reciclagem é um processo que contribui a delongar o processo de entropia do
sistema Terra e conseqüentemente da depleção do meio ambiente, razão pela qual sua
adoção tornou-se uma necessidade urgente. No entanto, na lógica do desenvolvimento
capitalista, a reciclagem tem se tornado um nicho de mercado na qual se inserem grupos
de baixa qualificação profissional e diversificada problemática social (desempregados,
dependentes químicos, moradores de rua) na procura de re-inserir-se no mercado de
trabalho, na busca de satisfazer suas necessidades básica de subsistência.
Mas, em uma sociedade capitalista de acordo com a teoria marxista, as relações
de trabalho se dão sempre no âmbito dos interesses e da exploração, onde os mais fortes
dominam os mais fracos, ou seja, entre os que detêm e os que não detém os meios de
produção.
Infelizmente, não se pode dizer aqui que tais incentivos ocorreram através de
uma valorização daqueles “velhos trabalhadores” da reciclagem, os chamados catadores
de papel, estigmatizados como mendigos, vagabundos, vira-latas e, tantas outras
condenações. De fato surgem diferentes discursos competentes melhorando a imagem
destes trabalhadores, os colocando na condição de agente primordial do meio ambiente
e da cadeia produtiva, portanto, mantendo tais indivíduos na marginalidade frente a sua
submissão ao processo de exploração e precarização do trabalho, como será discutido
no próximo capítulo.
17
De acordo com Magalhães et al. (2004), a reciclagem significa retornar e incorporar novamente no
ciclo de produção o(s) produto(s) de origem industrial, artesanal e agrícola que foi (foram) usado(s) e
descartado(s).
35
A oportunidade de uma inserção social, através da reciclagem, na verdade, se
apresenta mais como uma das estratégias do mercado capitalista para sua auto-
reprodução, tendo por trás o discurso ambientalista (Mota, 2002). A exploração deste
trabalho se processa no âmbito do chamado terceiro setor que se configura através de
uma política estratégica denominada economia solidária.
2.2. Repassando responsabilidades via “terceiro setor”: as novas relações de
trabalho a partir da estratégia neoliberal
Tendo neste trabalho, como campo exploratório de estudo uma associação de
catadores de materiais recicláveis (vide Cap. III), onde prevalece o objetivo de
compreender sua forma de organização, de produção e funcionamento, com o intuito de
desvendar as possibilidades de uma auto-gestão, torna-se necessária a discussão sobre o
chamado Terceiro Setor por ser este o lócus de configurações dos modos de produções
econômicas “alternativos” ao modelo hegemônico.
O Terceiro Setor entendido enquanto um conjunto de iniciativas privadas, de
caráter público, sem fins econômicos como associações, fundações, Organizações Não-
Governamentais (ONG’s)
18
, organizações ligadas à filantropia empresarial, projetos de
caridade, etc, assumidamente solidárias e destinadas ao interesse blico, é uma
expressão que vem sendo usada de forma ampla, nas últimas décadas, para se
diferenciar do primeiro setor que seria o Estado, considerado espaço da vida pública,
com finalidade pública; e do segundo setor, o mercado, como o espaço privado com fins
privados (FERNANDES, 1994).
Conforme retrata Salamon e Anheier (1992 apud Fernandes, 1994), o Terceiro
Setor é composto por organizações com características específicas como: formais e
institucionalizadas, privadas e independentes do governo, não distribuem lucros, se
auto-gerenciam e, por último, possuem um grau significativo de participação voluntária.
Este setor, com as referidas características, segundo Landim (1999), trata-se de um
termo importado, originário dos Estados Unidos, local onde o voluntariado e o
18
As Organizações Não-Governamentais no cenário brasileiro aparecem na década de 90 buscando
parceria e financiamento do Estado, e não como canal de oposição a ele, como ocorreu no período da
ditadura militar. Estas instituições eram importantes fomentadoras de movimentos sociais (MONTANO,
2005).
36
associativismo são próprios da cultura política e cívica, embasada no individualismo
liberal, no qual a sociedade se sobrepõe ao Estado.
Apesar de haver um consenso sobre o conceito de Terceiro Setor apresentado
por Fernandes (1994) supracitado, será utilizada neste trabalho a mesma fundamentação
teórica, ainda que polêmica, construída por Montano
19
(2005), por tratar-se de uma
crítica que apresenta o Terceiro Setor como um fenômeno real escamoteado, ou seja,
por desvendar algumas problemáticas que o próprio termo apresenta e que não é
debatido em nossa sociedade conforme será feito a seguir.
Para Montano (ibid), o Terceiro Setor apresenta algumas debilidades que o torna
um termo vago e impreciso que explica tudo e não explica nada, pois contém muitas
contradições em si. Segundo o autor tais debilidades se resumem em: contradição sobre
a origem do termo, pois apesar de muitos autores defenderem o seu surgimento nos anos
de 1960 e 1970 com o apogeu dos chamados “novos movimentos sociais” e das ONG’s,
o seu formato conceitual nos leva a entender que a sua existência estava vinculada às
instituições filantrópicas de caridade, dos séculos XV a XIX (Ex. Santas Casas da
Misericórdia); dissenso entre autores sobre as entidades que compõem o Terceiro Setor;
confusão teórica que se resume em um conceito que confunde mais do que esclarece; e
por fim não têm a autonomia que pretendem nem prática, nem ideológica e muito
menos financeira – dos governos (Id).
Continuando com o autor, esta falta de autonomia dos governos faz com que nas
diferentes organizações ditas não-governamentais e de auto-gestão ainda prevaleça um
espaço de dependência governamental no que tange a sua própria garantia de
sobrevivência (MONTANO, 2005, p.58).
Mediante as análises de Montano (1999), pode-se inferir que o Terceiro Setor
como ideologia, transforma a sociedade civil em um meio para o projeto neoliberal
desenvolver sua estratégia de reestruturação do capital, desencadeando os impactos
causados pelo próprio neoliberalismo e propiciando maior aceitação da população
afetada, através da propagação da auto-ajuda, através das organizações sociais. Por isto,
o chamado Terceiro Setor está diretamente ligado ao contexto da reestruturação
capitalista, que oculta por trás desta denominação ideológica a sua funcionalidade para
com o projeto neoliberal, no enfrentamento das refrações da questão social.
19
Montano (2005) em seu livro “Terceiro Setor e Questão Social: Crítica ao Padrão Emergente de
Intervenção Social”, mantém uma postura crítica e cética a respeito do Terceiro Setor no Brasil.
37
Dando continuidade as discussões do autor, a difusão do Terceiro Setor nos
aponta uma contradição entre interesse privado e interesse público, onde o privado
sobressai ao público, uma vez que a lógica vigente é a do mercado, que está sendo
imposta ideologicamente à sociedade civil, a qual vem se organizando em estratégias de
combate à fome, ao analfabetismo, à violência, à desnutrição, pois se trata de
solidariedade ao vizinho.
As ONG’s, que são parte constitutiva do terceiro setor, destacaram-se, segundo
Fernandes (1994), com uma forma nova, institucionalizada e de reconhecimento
mundial. Na atualidade têm como um dos principais espaços de trabalho a execução de
projetos junto às camadas mais pobres dos países em desenvolvimento. Este espaço que
começa a ser demarcado, no Brasil, a partir da década de 1970 como um fortalecedor
dos movimentos sociais, ganha um novo perfil a partir da década de 1990. Tais
organizações assumem o papel de parceiras do Estado para tratarem da questão social,
permanecendo a ideologia dos mais ricos “ajudando” os mais pobres e não a cultura do
direito a ter direito.
As ONG’s antes de se apresentarem como parceiras do Estado, começaram a se
esboçar no Brasil, no bojo da resistência à ditadura militar, quando o regime autoritário
bloqueava a participação dos cidadãos na esfera pública, gestando-se como um novo
campo de liberdade e reivindicações. Conforme Gohn (1998, p.14),
No Brasil, nos anos 70-80, as ONG’s cidadãs estiveram por detrás da
maioria dos movimentos sociais populares urbanos que delinearam um
cenário de participação na sociedade civil, trazendo para a cena pública
novos personagens, contribuindo decisivamente para a queda do regime
militar e para a transição democrática no país.
Os movimentos sociais formaram redes de relacionamento onde a iniciativa local
era evidente, gerando linguagens e estilos comuns. Neste cenário, as associações se
multiplicam, formando nas bases os elementos primários de uma institucionalidade
democrática. Estas se tornam parceiras de movimentos e iniciativas não
governamentais.
Nas análises de Pontes et al. (1996), as associações valorizavam a noção de
autonomia, introduzindo um padrão inovador no enfrentamento dos problemas comuns.
Apresentaram o suporte civil para o aprendizado de uma pequena cultura de ão não-
governamental, a qual se engendrava pelas bases sem se importar com o autoritarismo.
38
Até a década de 1990, as ONG’s tinham um papel fundamental de apoio aos
movimentos sociais, seus objetivos estavam articulados. De acordo com Pontes et al.
(ibid), os recursos vindos do exterior para a manutenção destas organizações que
posteriormente injetava nos movimentos sociais eram exorbitantes. Porém, após a
queda do muro de Berlim os países asiáticos passavam a ser o alvo das ONG’s, pois
estes países estavam estruturando o sistema capitalista, e deixam de investir o mesmo
montante no Brasil, como também em outros países em desenvolvimento (MONTANO,
1999).
O contexto brasileiro da década de 1990, demarcado pela política neoliberal que
estrategicamente desmobilizou os movimentos sociais (incluindo os sindicatos) ou
cooptou os mesmos, levou as ONG’s a entrar em crise de legitimidade e romper com os
movimentos sociais. Este rompimento provocou na sociedade civil algumas confusões
quanto ao entendimento sobre a diferenciação entre movimento social e ONG,
culminando, portanto, numa inversão de conceitos, ou seja, os movimentos sociais são
ONG’s e vice e versa (MONTANO, 1999).
Nesta mesma década ocorre uma proliferação de organizações ditas não-
governamentais, que apresentam uma configuração diferente daquelas ONG’s das
décadas anteriores, pois agora como parceiras do Estado estas organizações passam a
receber incentivos governamentais, através de crédito fácil, isenção fiscal, recursos
financeiros para atuarem nos espaços onde o Estado paulatinamente se retrai (Id).
Conforme expõe Montano (2005, p.224),
A função das “parcerias” entre o Estado e as ONG’s não é a de
“compensar”, mas a de encobrir e a de gerar a aceitação da população a
um processo que tem clara participação na estratégia atual de
reestruturação do capital. É uma função ideológica.
Assim, tendo em vista a expressiva participação da sociedade civil no processo
de redemocratização do país, percebe-se que após várias conquistas registradas na
Constituição Federal de 1988, no momento em que deveria se iniciar a mudança na
cultura política do país, houve um retrocesso. Através de um forte discurso sobre
solidariedade, a sociedade civil, ou seja, o terceiro setor é chamado a se organizar e
trabalhar pela questão social.
39
Todavia, grande parte das conquistas adquiridas pela classe de trabalhadores
através dos movimentos sociais foi se diluindo e dando lugar às novas relações de
trabalho, marcadas pela informalidade que concomitantemente gera desproteção social.
A ênfase dada à cultura empreendedora e individualista tornou-se cada vez mais
difundida. Nos anos de 1990, as declarações oficiais do governo federal brasileiro
descartavam abertamente o sindicalismo, tachavam a negociação coletiva de
ultrapassada e inadequada à indústria contemporânea e, davam seu crivo às novas
estratégias de acumulação do capital através da flexibilização do trabalho e
informalidade, tendo esta última como uma de suas representatividades, de forma
mascarada, a chamada economia solidária.
2.2.1. A economia solidária no atual contexto de reestruturação capitalista
Conforme Singer et al. (2000), a economia solidária surge como uma alternativa
ao modo de produção capitalista, frente a sua nova fase de desenvolvimento
caracterizada pelo desemprego estrutural e pela precarização do trabalho, sob
hegemonia da globalização financeira. De acordo com Singer et al. (2000, p.13),
A economia solidária surge como modo de produção e distribuição
alternativo ao capitalismo, criado e recriado periodicamente pelos que se
encontram (ou temem ficar) marginalizados do mercado de trabalho. A
economia solidária casa o princípio da unidade entre posse e uso dos meios
de produção e distribuição (da produção simples de mercadorias) com o
princípio da socialização destes meios (do capitalismo) (...). A unidade típica
da economia solidária é a cooperativa de produção, cujos princípios
organizativos são: posse coletiva dos meios de produção pelas pessoas que
as utilizam para produzir; gestão democrática da empresa ou por
participação direta; repartição da receita líquida entre os cooperados por
critérios aprovados após discussões e negociações entre todos; destinação do
excedente anual também por critérios acertados entre todos os cooperadores.
Para Singer (2003), a economia solidária é considerada uma possível alternativa
à sociedade vigente, ao desemprego e a flexibilização das relações de trabalho que
busca inserir pessoas excluídas do mercado de trabalho formal. A economia solidária
emergiu com a crise social na chamada década perdida de 1980 e de 1990, em que o
Brasil se desindustrializou, em decorrência do qual muitos postos de trabalho foram
perdidos, acarretando desemprego em massa e acentuada exclusão social.
Segundo Singer et al. (2000), é a partir desta época que a economia solidária
reviveu no Brasil, constituindo-se em uma ação que possibilitou a geração de novas
oportunidades de inserção social pelo trabalho, propiciando: democratização da gestão
40
do trabalho; conhecimento sobre os segredos da produção; valorização das relações de
cooperação; distribuição de renda; e fortalecimento do desenvolvimento local
sustentável.
Para Gonçalves (2003), Veiga e Fonseca (2001), a organização da economia
solidária baseia-se na cooperação autogestionária, tendo os seguintes princípios e
valores apresentados no Quadro 1:
QUADRO 1: Princípios e valores norteadores da organização da economia solidária
PRINCÍPIOS VALORES
- Adesão Livre e Voluntária
- Gestão Democrática e Participativa
- Participação Econômica dos Sócios
- Autonomia e Independência
- Educação, Capacitação e Informação.
- Intercooperação
- Compromisso com a Comunidade
- Ajuda mútua
- Responsabilidade
- Democracia
- Igualdade
- Equidade/Solidariedade.
- Honestidade / Transparência
- Responsabilidade Social
Fonte: Elaboração própria com base em Veiga e Fonseca (2001) e Gonçalves (2003).
De acordo com Singer (2003), a base da economia solidária centra-se na
organização coletiva dos trabalhadores e é composta por cooperativas, associações,
empresas autogestionárias e grupos de famílias, sendo que esta é mediada por princípios
de cooperação, democracia e auto-gestão.
Continuando com o autor, a referida auto-gestão, na perspectiva de uma
economia solidária, deve contemplar todos os princípios e valores supracitados,
incluindo inclusive a cooperação e a democracia. Nas análises de Lima (1998), a auto-
gestão é quando um organismo é administrado pelos seus participantes em regime de
democracia direta. Em auto-gestão, não há a figura do patrão, senão que todos os
empregados participam das decisões administrativas em igualdade de condições. Em
geral, os trabalhadores são os proprietários da empresa de auto-gestão. Ainda segundo o
mesmo autor, a auto-gestão não pode ser confundida com controle operário, que
mantém a hierarquia e o controle externo da organização. Os conceitos de auto-gestão
costumam variar de acordo com a posição política ou social de determinado grupo, por
exemplo: o conceito anarquista de auto-gestão se caracteriza por eliminar a hierarquia e
41
os mecanismos capitalistas de organização envolvidos; os conceitos de auto-gestão
empresarial mantêm os mecanismos tradicionais de organização capitalistas.
Singer (ibid, p.20) reforça tal análise quanto afirma que,
A auto-gestão de empresa solidária é ou deveria ser totalmente diferente
da gestão capitalista, em primeiro lugar porque os conflitos entre interesses
seccionais devem ser muito menores e em segundo, porque todos tomam
parte. Numa empresa solidária todas as informações relevantes estão
disponíveis aos interessados. A contabilidade e os demais sistemas de
controle são desenhados para que a transparência impere, de modo que a
participação de todos nas decisões possa acontecer.
Conforme visto, a construção da auto-gestão e da economia solidária pressupõe,
no mínimo, coerência entre os princípios e práticas solidárias. Para Singer (1998), a
cooperação e a confiança devem prevalecer sobre a competição, porque concorrência,
individualismo e dependência não apenas inibem, mas, simplesmente, destroem a
possibilidade e a perspectiva da criação de uma sociedade livre e fraterna, onde o ser
humano seja o centro de nossas preocupações.
De acordo com Singer et al. (2000), na perspectiva de economia solidária
autogestionária, os sujeitos considerados meros trabalhadores tornam-se além de
executores, também planejadores. Passam a atuar na gestão dos empreendimentos,
pagamento, divulgação da sua empresa, controle de qualidade, vendas, assumem o
gerenciamento de todas as etapas do processo produtivo. Para o autor, a economia
solidária é uma criação em processo contínuo de trabalhadores em luta contra o
capitalismo industrial. Segundo Singer (1998, p.37), esse processo representa
(...) a idéia que os próprios trabalhadores podem lutar e reagir contra o
desemprego, contra a exclusão social, e eles próprios, organizados, são capazes
de tomar o seu destino em suas mãos, criar suas próprias empresas e resolver,
portanto, a questão, ao invés de esperar soluções vindas do alto, do governo ou
da classe dominante, e assim por diante.
Assim, a economia solidária constitui-se em um projeto de organização
socioeconômico formado por princípios opostos ao laissez-faire: em lugar da
concorrência, a cooperação, em lugar do individualismo, a solidariedade. Para Singer
(ibid), este “novo modelo de economia” é a mais importante alternativa ao desemprego
causado pelo capitalismo, no atual momento histórico, por oferecer uma solução prática
e factível à exclusão social, diferentemente do capitalismo em sua nova fase liberal
exacerbada. Para que os envolvidos incorporem a idéia é preciso envolver sujeitos que
42
compartilhem este processo e romper com a forma capitalista de pensar e viver a
sociedade.
De acordo com Montano (2005), seria possível, na formação de um outro setor
econômico, numa sociedade comandada pelo capital, atingir uma solução não-
capitalista? Nesta lógica, como criar para este novo setor de economia solidária um
mercado protegido da competição externa? Para o referido autor, isto seria possível
ocorrer mediante mecanismos extra-econômicos a partir da intervenção do Estado,
como de alguma maneira foi feito no keynesianismo,
(...) primeiramente, isto exigiria não apenas a iniciativa de uma suposta
“sociedade civil” solidária, mas ainda de uma forte intervenção estatal,
promovida pelas lutas de classes e garantida por leis. Em segundo lugar, a
hegemonia do capital permitirá a criação de um tal mercado protegido para
este “setor” apenas num segmento para ele desinteressante (de reduzido
lucro), constituindo este processo muito mais uma estratégia de
sobrevivência do que o desenvolvimento de uma experiência não-capitalista
(MONTANO, 2005, p.170).
Em nível federal, a medida da atenção que o tema passou a merecer pode ser
dada pela recente criação de uma Secretaria Nacional de Economia Solidária -
SENAES, no âmbito do Ministério do Trabalho, a partir do ano de 2004. Esta iniciativa
do atual governo federal tem como princípio, conforme esta Secretaria, estimular a
difusão de cooperativas autogestionárias. Diante disso, várias questões postas na
cena do Brasil contemporâneo, sendo a principal mediada pelo seguinte
questionamento: seria esta uma forma viável e eficaz de incorporar trabalhadores
excluídos do circuito econômico atualmente?
Vale ressaltar que não se pretende neste trabalho questionar os princípios da
economia solidária, aliás, esta seria realmente a infra-estrutura que idealizamos. Os
questionamentos aqui apresentados sobre este modelo de produção econômica nos
levam a refletir sobre as possibilidades de realmente este projeto se apresentar enquanto
uma alternativa ao modo de produção capitalista, como idealiza Singer et al (2000).
Seriamos ingênuos ao acreditarmos que qualquer projeto que não abale a estrutura
capitalista, principalmente quando este seja funcional ao mesmo, possa garantir a
concretização de uma sociedade equânime.
Segundo Laville (2002 apud Pinto, 2006), a conjuntura econômica na segunda
metade do século XX possibilita um retorno das associações, tendo estas como
referências a solidariedade. Entretanto,
43
“(...) a essas iniciativas faltará legitimidade, se não forem reatadas a um
questionamento político sobre a economia capaz de substituir à
representação dominante da sociedade de mercado, aquela de uma economia
plural com mercado. Elas não ganham sentido se não em relação a uma
economia plural, isto é, uma economia que não se reduz à sociedade de
capitais e ao mercado, na qual várias lógicas econômicas podem se
desenvolver” (LAVILLE, 2002 apud PINTO, 2006, p.45).
Para Mota (2002, p.17), o capital buscando assegurar a valorização do valor,
necessita revolucionar constantemente a divisão social e técnica do trabalho, o que
justifica, na história do capitalismo, a existência de diferentes formas de produção de
mercadorias que vão desde a cooperação simples, passando pela manufatura e a
grande indústria até as atuais formas de organização dos processos de trabalho, da
produção e dos mercados”.
Para que o capital mais uma vez não reduza as práticas da economia solidária
simplesmente a permuta, troca, barganha e lucro fazem-se necessário segundo Polanyi
(1980 apud Pinto, 2006, p.46), alguns fatores de organização da produção e distribuição
da riqueza:
“Além do de mercado, que permite o encontro entre oferta e demanda de
bens e serviços com fins de troca através da fixação de preço, estariam
presentes os princípios de redistribuição, reciprocidade e domesticidade. A
redistribuição diz respeito ao princípio conforme o qual a produção é
remetida a uma autoridade central que tem a responsabilidade de reparti-la.
A reciprocidade que corresponde à relação estabelecida entre grupos ou
pessoas a partir de doações ou préstimos mútuos, cujo sentido está na
vontade de manifestar um liame social entre as partes envolvidas. a
domesticidade consiste em produzir para o seu próprio uso, provendo as
necessidades dos membros do grupo (LAVILLE (1997) e POLANYI
(1980) apud PINTO, 2006, p.46).
Tais princípios predominaram nas sociedades ocidentais até o culo XVIII,
sendo no século seguinte com o início do processo de industrialização, que um único
princípio se torna dominante, o do mercado. Neste momento, “ao invés da economia
estar embutida nas relações sociais, são as relações sociais que estão embutidas no
sistema econômico” (POLANYI, 1980, p.72, apud PINTO, p.46).
O retorno das práticas econômicas solidárias que vem se contrapor a economia
de mercado tem como formas mais representativas o associativismo e o cooperativismo,
que têm como proposta a auto-gestão e participação plena.
44
2.2.1.1. Cooperativismo / Associativismo
Segundo Singer (1998), as cooperativas e associações de produção, constituem
unidades típicas da economia solidária, cujos princípios organizativos são: posse
coletiva dos meios de produção pelas pessoas que as utilizam para produzir; gestão
democrática da instituição e repartição da receita liquida entre os cooperadores ou
associados por critérios aprovados após discussões e negociações entre todos.
Sabe-se que existem vários questionamentos sobre as possíveis diferenças entre
associativismo e cooperativismo, no entanto, Albuquerque (2003) afirma que as
finalidades destas instituições - principalmente no que diz respeito ao seu
funcionamento de modo autogestionário - são basicamente as mesmas, assinalando que
dentre as poucas diferenças existentes se destaca a legislação sobre a sua formação,
sendo os critérios para a formação de uma cooperativa mais rigorosos em relação a uma
associação.
Apesar desta discussão sobre as diferenças no que tange à formação de
cooperativas e associações ser instigante, será feito uma reflexão sobre o funcionamento
autogestionário destas instituições, que são pontos em comum, para não perder de
vista o objeto em questão.
De acordo com Albuquerque (ibid), os pressupostos associativistas e
cooperativistas, se caracterizam por um conjunto de práticas sociais datadas e
localizadas historicamente, que propõem autonomia qualificando a cooperação entre as
pessoas, porque baseia essas práticas sociais na reciprocidade, na confiança, na
pluralidade e no respeito mútuo. O significado do termo cooperar, conforme nos mostra
Lima (1998, p. 07),
(...) deriva da palavra latina “cooperari”, formada por “cum” (com) e
“operari” (trabalhar). A cooperação constitui-se em um processo de
interação social, onde os objetivos são comuns, as ações são compartilhadas
e os benefícios são distribuídos para todos. Este termo surge em contraponto
à terminologia competição que significa um processo de interação social,
onde os objetivos são mutuamente exclusivos, as ações são isoladas ou em
oposição umas às outras, e os benefícios são concentrados somente para
alguns.
De acordo com Fernandes (1994), foi na ditadura que a expressão trabalho
comunitário de cooperação ganhou maior peso, não apenas no Brasil, mas em diferentes
países da América Latina, pois os mecanismos de comunicação civil foram
estrangulados, e as oposições e os sindicatos foram reprimidos violentamente. Em suma,
45
reduziu-se a participação cívica no Estado e nas empresas, portanto a única saída foram
as comunidades, já que agir sobre a sociedade como um todo já não era possível, restava
trabalhar pela base da sociedade. Assim, o trabalho comunitário escapou aos controles e
pôde se expandir nesse período de repressão.
A acumulação flexível a partir do processo de reestruturação produtiva
20
vem
justificar neste momento a onda de empreendimentos cooperativos. Para Lima (2003),
apesar das cooperativas de crédito, habitacional e agrícola ter um histórico na
sociedade brasileira, anterior à década de 1980, somente a partir desta cada é que as
cooperativas de trabalho e de produção começarão a organizar-se e a ganhar
visibilidade.
Ainda conforme Lima (2003, p. 20), embora as cooperativas apareçam
historicamente no movimento operário como possibilidade autogestionária e de
democracia no trabalho, sua implementação efetiva sempre foi problemática e
dependente de injunções políticas e econômicas, razão pela qual sua proliferação
sempre foi e é em momentos de crise econômica visando a atenuar situações de
desemprego.
Para Coraggio (2000 apud Pinto, 2006), a economia solidária tratada pelo
autor como economia popular se constitui enquanto uma condição organizadora da
vida social, principalmente nos períodos de agravamento da precarização e exclusão.
Entretanto uma discordância do autor sobre a possibilidade da economia popular
substituir a economia capitalista. Na verdade trata-se um subsistema da economia que
depende tanto da economia empresarial quanto da economia pública.
O autor destaca a economia popular como um campo privilegiado para as
políticas redistributivas. Para tanto se faz necessária a reorientação de ações públicas
que supõe esforços no sentido de mudanças culturais e simbólicas que requalifiquem o
sentido do bem viver, hoje centrado no consumismo e em laços de cunho caritativo”. E
para que a economia popular não se torne funcional à precarização e exclusão existe
uma necessidade de uma atuação integrada entre os dirigentes sociais e políticos
(ONG’s, associações, igrejas, sindicatos, universidades, movimentos sociais), em favor
da economia solidária (CORAGGIO, 1997 apud PINTO, 2006, p. 51).
20
Apresentada no item 1.1
46
De acordo com Lima (ibid, p.1) a polêmica sobre a possibilidade efetiva das
cooperativas se constituírem um avanço na direção da maior democratização do
trabalho, pela auto-gestão e posse coletiva dos meios de produção, superando assim a
subordinação ao capital continua.
Continuando com o autor, as associações e cooperativas como alternativa de
ocupação, manutenção de empregos ou de geração de renda se multiplicam frente a um
quadro de desemprego estrutural ocorrido no período de transição do modo de produção
fordista para o de acumulação flexível. A partir deste período o autor nos chama a
atenção para os diferentes tipos de cooperativas de trabalho e produção que vão
surgindo, incluindo as chamadas falsas cooperativas.
A primeira apresentada por Lima (ibid), a partir de uma adaptação de Cornforth
(1983), consiste nas cooperativas chamadas “Endowed Co-operatives”. Estas são
propostas advindas dos proprietários de empresas, que mantém a hierarquia empresarial,
comprometendo desta forma o processo democrático no trabalho. Os funcionários
apenas participam do controle acionário enquanto os proprietários mantêm o controle.
Em seguida são apresentadas as cooperativas “defensivas”, organizadas pelos
próprios operários de empresas e fábricas que decretam fechamento ou falência. Devido
a defasagem estrutural e comercial apresentada por estas empresas ou fábricas, a sua
constituição como cooperativas surge com diversos problemas. Este fator
impossibilita a formação de uma cultura autogestionária mais ágil, pois grande parte dos
operários e staff administrativo abandona a cooperativa.
Um outro tipo de cooperativa que apresenta certa particularidade por estar
voltada mais a necessidades subjetivas do que a lucros é conhecido como “alternativa”.
Estas são resultantes dos chamados movimentos contraculturais dos anos 1960 e 1970,
sendo representadas por pequenos negócios mais comuns nos paises de capitalismo
avançado (editoras, livrarias, produtos naturais e similares) com dificuldades de
sobrevivência.
Dentre as cooperativas citadas por Lima (ibid), encontram-se também as falsas
cooperativas que têm como objetivo de terceirizar as atividades de empresas que
culminará na redução de custos das mesmas, estas são as cooperativas “pragmáticas”.
Neste tipo de cooperativa não existe um respeito aos princípios cooperativistas como a
democracia no trabalho ou autonomia do trabalhador.
Nesta categoria de cooperativa observa-se a formulação de um conjunto de
medidas por parte da classe empresarial, dentro dos preceitos neoliberais, visando
47
implementar um amplo processo de reestruturação do capital, com vistas à recuperação
do seu ciclo reprodutivo. Em conseqüência destas novas estratégias de reestruturação
produtiva, uma série de direitos e mecanismos de proteção social está sendo esvaziada
no bojo do que se denomina atualmente de flexibilização dos direitos trabalhistas.
Para Bihr (1998), a tão debatida flexibilização produtiva e das relações de
trabalho está ocasionando uma maior fragmentação do proletariado, com conseqüente
enfraquecimento do seu poder político. Ainda, segundo o autor, esses proletariados na
atual conjuntura se subdividem em diferentes categorias sendo elas: proletários estáveis
e com garantias, os proletários excluídos do trabalho e a massa flutuante de
trabalhadores instáveis, ou seja, os trabalhadores flexíveis. Estes últimos, para Bihr
(ibid), são aqueles que trabalham em regime de subcontratação (terceirização), neste
caso incluímos aqui os trabalhadores das cooperativas de “Endowed Co-operatives” e
cooperativas pragmáticas.
Podemos dizer que tanto as “Endowed Co-operatives”, quanto as cooperativas
“pragmáticas” estão levando a sociedade a desacreditar nas possibilidades de construção
de um trabalho autogestionário a partir de cooperativas e associações, tornando-se alvo
de críticas. Acaba por existir uma desconfiança de que o funcionamento de todas as
cooperativas ou associações se constitui apenas em uma estratégia por parte do setor
empresarial e do setor público para adequar-se a uma gestão organizacional mais
enxuta, livre de altos custos com mão de obra, e principalmente dos encargos sociais.
Destacamos neste momento a última categoria de cooperativas apresentada por
Lima (2003) como aquelas que surgem visando criar empregos no cenário de
desemprego estrutural. Trata-se das cooperativas de “geração de renda”, geralmente
criadas através de políticas públicas de governos, sindicatos, Igreja Católica e outras
instituições, como é o caso da ASCANOVI, que será analisada no final deste trabalho.
Tais cooperativas nos remetem à discussão de Coraggio (1997 apud Pinto, 2006), que
aponta este como campo privilegiado para as políticas redistributivas.
Segundo Pinto (2006, p.52), para que haja um fortalecimento da chamada
economia popular representada por cooperativas e associações, geralmente ocupada por
trabalhadores excluídos do mercado de trabalho formal, será necessário que a referida
economia popular não se constitua em espaços fechados a partir das comunidades
locais. Esta economia deverá também “gerar renda monetária para se articular através
do mercado com o restante da economia, bem como para se sustentar e ampliar sobre
suas próprias bases”.
48
Desta forma faz-se necessário de acordo com Coraggio (2000, apud Pinto, 2006),
que uma nova regulação pública, que considere o “fundo de trabalho” da economia
popular como base de um “desenvolvimento humano”, possibilite a superação dos
componentes reativos e potencialização ativa da capacidade dos trabalhadores. Para o
autor:
A hipótese que queremos discutir é que, a partir deste mundo magnático da
economia dos setores populares, é possível que surjam estruturas mais
eficazes e eficientes para a reprodução da vida; que isso pode se dar com
muito mais rapidez e segurança se for exercida uma ação coletiva
suficientemente forte e orientada por um paradigma de desenvolvimento
humano (CORAGGIO, 2000, p.111 apud PINTO, 2006, p.51).
Para tanto, cabe ao Estado o encaminhamento de mais recursos, além daqueles
garantidos na manutenção das políticas sociais existentes, bem com uma reorientação no
sentido de mudanças culturais e simbólicas que requalifiquem o sentido do bem viver,
hoje centrado no consumismo e em laços de cunho caritativo (Id).
2.3. Os catadores de materiais recicláveis e sua inserção subalterna na divisão
social e técnica do trabalho
A doutrina neoliberal implantada a partir dos anos 80 que intensificou a
exploração do trabalho por meio da reestruturação produtiva, levou à precarização dos
direitos sociais e à flexibilização do contrato de trabalho, incrementando
conseqüentemente o mercado da informalidade. Neste contexto a figura do catador de
lixo ganha maior visibilidade e recebe incentivos da sociedade civil para se organizar de
forma autônoma através de cooperativas e associações.
A interação destes agentes se insere no espaço específico do terceiro setor, que
segundo Montano (2005) se constitui em um meio para o projeto neoliberal desenvolver
sua estratégia de reestruturação do capital, destoando os impactos causados pelo próprio
neoliberalismo e propiciando maior aceitação da população afetada, através da
propagação da auto-ajuda, através das organizações sociais. Por isto, este chamado
Terceiro Setor está diretamente ligado ao contexto da reestruturação capitalista,
conforme referido anteriormente.
49
A referida estratégia, mais uma vez torna-se notória quando se analisam as
condições na qual estão submetidos os catadores. Apesar de serem apresentados, na
contemporaneidade, enquanto trabalhadores fundamentais na cadeia produtiva do país
(Gonçalves, 2005), ainda se deparam com uma realidade de extrema exclusão, pois
conforme observa Mota (2002, p.19), os catadores estão interligados ao circuito
mercantil e produtivo, mas apartados das condições sociais que lhes assegurem os
meios de proteção legais e institucionais relacionados ao seu estatuto de trabalhador”.
A figura do catador de lixo não é uma atividade recente como muitos imaginam.
Segundo Zica (2002), o catador de papel, papelão e alumínio compõem o cenário das
cidades brasileiras mais de 50 anos. No entanto, é na última década que houve um
maior reconhecimento e investimento de alguns governantes locais e, principalmente de
entidades não governamentais, na sistematização deste processo de trabalho.
Caberia aqui se perguntar: Será que os catadores inseridos em associações ou
cooperativas, incentivados por ONGs, por exemplo, realmente têm noção da sua
condição de trabalhador detentor de direitos sociais? De que forma a sociedade civil e
alguns governos locais, tentando associar a questão do desemprego à preservação
ambiental está estimulando a formação de tais entidades?
Sabe-se que existe um grande contingente de catadores nos lixões convivendo
com o mau cheiro dos gases que exalam do lixo acumulado e disputando comida com os
urubus. E que a saída destas pessoas deste ambiente acontece muitas vezes de forma
forçada, pela prefeitura de cada localidade, pois, existe uma legislação por parte do
governo federal que proíbe o acesso de pessoas próximas aos lixões, podendo a
prefeitura receber multa, caso não cumpra com a mesma.
Apesar da proibição da permanência nos lixões, muitos catadores insistem e
retornam, mesmo sendo incentivados por grupos de apoio a participar de associações ou
cooperativas. Seria a convivência com normas e regras existentes dentro de uma
entidade, um fator dificultador para estes catadores? Afinal, estamos falando de pessoas
que supostamente sequer foram inseridas no sistema convencional de convivência
social, tendo lhes sido negado as condições nimas de sobrevivência. Qual seria o
significado de associação para estes trabalhadores?
Segundo Escorel (1999, p.18), a condição de exclusão é definida como “a
daquele que está sem lugar no mundo, totalmente desvinculado ou com vínculos tão
frágeis e efêmeros que não constituem uma unidade social de pertencimento”.
50
Para a autora, grande parte da sociedade tem suas “vidas ao léu” que na verdade
são:
“(...) trajetórias de pequenas e grandes desvinculações, de laços afetivos
frágeis e irregular suporte material, que se revelam nos dois significados que
ao léu detêm: aquele que está a descoberto, sem teto, a céu aberto, e aquele
que é sem eira nem beira, que anda ao sabor das circunstâncias e não controla
o desenrolar dos acontecimentos. (...) pessoas desvinculadas no sentido
material e afetivo e marginalizados no sentido simbólico” (ESCOREL, ibid,
18).
O trabalho de catação de materiais recicláveis geralmente congrega péssimas
condições de trabalho, preconceito e desprezo por parte da população e desarticulação
política e social, quando não recebem nenhum tipo de apoio. Entretanto, “a rigor o
catador não pode ser considerado um excluído (enquanto estado permanente), pois ele é
um elo incluído em uma cadeia produtiva, ainda que de forma marginalizada”
(GONÇALVES, 2005, p.103).
Segundo Mota (2002, p.20),
“ao viabilizar direta ou indiretamente o processo de transformações do lixo
em mercadoria, as empresas públicas se apropriam não da mercadoria
reciclável, mas do trabalho do catador de lixo que se torna partícipe do
processo de coleta de lixo urbano”.
Ainda segundo a autora, apesar do catador se apresentar como integrante
fundamental da cadeia produtiva de reciclagem, a sua categoria passa a ser reconhecida
como uma profissão inserida na divisão sócio-técnica do trabalho. Segundo Gonçalves
(2005), este reconhecimento ocorre a partir do ano 2002, sob o código 5192, na
Classificação Brasileira de Ocupações – CBO. De acordo com o referido código é
considerado catador de materiais recicláveis: Catador de ferro-velho, Catador de papel e
papelão, Catador de sucata, Catador de vasilhame, Enfardador de sucata (cooperativa),
Separador de sucata (cooperativa) e Triador de sucata (cooperativa).
Quanto à descrição da ocupação estes trabalhadores recolhem, selecionam e
vendem materiais recicláveis como papel, papelão, plástico, vidro, materiais ferrosos e
não ferrosos e outros materiais re-aproveitáveis. Em relação às condições gerais de
exercício da atividade de catação, ainda conforme código 5.192:
O trabalho é exercido por profissionais que se organizam de forma
autônoma ou em associações e cooperativas. Trabalham para venda de
materiais a empresas ou cooperativas de reciclagem. O trabalho é exercido a
51
céu aberto, em horários variados. O trabalhador é exposto a variações
climáticas, a riscos de acidente na manipulação do material, a acidentes de
trânsito e, muitas vezes, à violência urbana. Nas cooperativas surgem
especializações do trabalho que tendem a aumentar o número de postos,
como os de separador, triador e enfardador de sucatas
(www.movimentodoscatadores.org.br, consultado em julho de 2007).
Percebe-se que apesar do reconhecimento da profissão, as condições gerais do
catador preconizadas pela CBO, caracterizam um quadro de precarização do trabalho. O
catador, mesmo estando exposto a diferentes riscos no trabalho continua se deparando
com a ausência de direitos trabalhistas porque o seu reconhecimento é caracterizado
como autônomo, uma vez que o associativismo prevê um trabalho sem vínculos
empregatícios, assim, sem proteção social.
Segundo Juncá (2004, p.76),
Vidro, papel, plástico, alumínio e outros tantos materiais constituem a
matéria-prima de um trabalho que não se desenvolve sob o olhar direto do
capitalista, mas com certeza com ele para ele converge, na cadeia produtiva
que se forma em torno do lixo; cadeia esta, onde no topo está a valorizada
indústria da reciclagem e no extremo oposto, ou seja, na base, encontram-se
os catadores, profissionais desvalorizados porque são os que fazem o
trabalho considerado como “sujo”.
Esta reflexão de Juncá (ibid) pode ser melhor visualizada através do esquema do
circuito de reciclagem que segue abaixo (Figura 3):
FIGURA 3: esquema do circuito de reciclagem
Fonte: Adaptado de Bursztyn, 2000, apud, Gonçalves, 2005.
Apesar de algumas cooperativas de recicláveis, hoje, estarem conseguindo
romper com estes chamados atravessadores e vendendo os materiais recicláveis
diretamente para as indústrias, a dependência por parte da maioria permanece, conforme
Produto Consumo Descarte Lixo
Catadores de materiais recicláveis
Aterros Usinas
Lixo
Comércio Indústria Atravessadores
52
foi destacado em encontro da Rede Solidária Central Leste
21
após realização de
diagnóstico das associações de catadores no Estado de Minas.
Como destaca Azeredo (1999, p. 120), embora a categoria de catadores seja
fundamental na cadeia produtiva de reciclagem, os catadores não alcançam a dinâmica
do sistema produtivo na sua totalidade”, mesmo que tenham ligação direta com as
indústrias.
A condição na qual é colocado o catador continua sendo antagônica, pois
contribui com seu “trabalho invisível” (Tavares, 2004), fornecendo matéria-prima para
a indústria de reciclagem, porém, experimenta as mesmas contradições existentes entre
capital e trabalho de maneira informal.
É notório que no contexto atual, não se pode contar com aquele Estado de
proteção social, pois a problemática da precarização do trabalho agora é transferida para
os ditos trabalhadores autônomos, ou seja, depende das formas como cada um busca se
organizar para garantir sua sobrevivência. Esta transferência de responsabilidades pode
ser percebida quando o Ministério do Trabalho classifica o catador como um
trabalhador autônomo, sem amparo social em caso de doenças ou acidentes de trabalho.
É neste contexto de precarização do trabalho que são reservadas as dificuldades de auto-
gestão da associação. Os catadores deverão buscar estratégias de organização interna
para a superação de tais condições de precarização.
É importante frisar que não se pretende aqui manter uma visão unilateral quando
se analisa a conversão da categoria catador de ocupação para profissão, somente
enquanto uma estratégia de governo atrelada às estratégias de acumulação do capital.
No entanto, deve se reconhecer também a luta iniciada pelo Movimento Nacional dos
Catadores de Materiais Recicláveis MNCR
22
, a partir da década de 1999, e
consolidada em junho de 2001.
21
A apresentação da referida Rede encontra-se no capítulo III deste trabalho. O referido diagnóstico foi
apresentado no primeiro semestre de 2007 em encontro realizado no município de Governador Valadares-
MG, a fim de construir outras Redes em diferentes regiões como estratégia de ruptura com os
atravessadores.
22
No ano de 1999 ocorreu em Brasília o I Encontro Nacional de Catadores de papel que reuniu mais de
1700 catadores (www.movimentodoscatadores.org.br)
53
O MNCR surgiu com a intenção de fortalecer a iniciativa de criação de
cooperativas, com caráter de auto-gestão. A declaração de princípios e objetivos do
MNCR é apresentada a seguir:
ARTIGO 1
° -
O Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis - MNCR, trabalha pela
'auto-gestão e organização'
1
dos catadores através da constituição de Bases Orgânicas, em que a
'participação' de todos os(AS) catadores(AS) que querem ajudar a construir a luta de seus direitos, seja um
direito internamente garantido, mas também um dever do catador com o Base Orgânica, com um critério
de democracia direta
2
em que todos tem voz e voto nas decisões, conforme critérios constituídos nas
bases de acordo;
ARTIGO 2
°
- O MNCR tem na 'ação direta popular'
3
bem como em outras formas de organização um
princípio e método de trabalho, que rompe com a apatia, a indiferença e a acomodação de muitos
companheiros(as), que parta desde a construção inicial dos galpões e sua manutenção, não esperando que
caia tudo pronto do céu, e até as mobilizações nas grandes lutas contra a privatização do saneamento
básico e do lixo, contribuindo para a preservação da natureza, mas também lutando pelo devido
reconhecimento e valorização da profissão dos catadores ;
ARTIGO 3
°
- O MNCR busca garantir a 'independência de classe'
4
em relação aos partidos políticos,
governos e empresários, mas também lutando pela gestão integrada dos resíduos sólidos com
participação ativa dos catadores organizados, desde a execução da coleta seletiva com catadores de rua,
até a triagem e o beneficiamento final dos materiais, buscando tecnologias viáveis que garanta o controle
da cadeia produtiva, firmando com os poderes públicos contratos que nos garantam o repasse financeiro
pelo serviço prestado a sociedade, e cobrando das empresas privadas, produtora industrial dos resíduos o
devido pagamento pela nossa contribuição na reciclagem.
ARTIGO 4
°
- No MNCR, ao contrário do individualismo e da competição, buscamos o 'apoio mútuo'
5
entre os companheiros(as) catadores(as) , e praticando no dia a dia das lutas a 'Solidariedade de Classe'
6
com os outros movimentos sociais, sindicatos e entidades brasileiras e de outros países. E desta forma ir
conquistando "o direito à cidade", local para trabalho e moradia digna para todos, educação, saúde,
alimentação, transporte e lazer, o fim dos lixões e sua transformação em aterros sanitários, más com a
transferência dos catadores para galpões com estruturas dignas, com coleta seletiva que garanta a
sustentação de "todas as famílias", com creches e escolas para as crianças.
Significado dos nossos princípios:
1
"Auto-gestão" é a prática econômica em que os trabalhadores são os donos das ferramentas e
equipamentos de produção. Auto-gestão é o modo de organizar o trabalho sem patrões, tendo a decisão, o
planejamento e a execução sob controle dos próprios trabalhadores.
2
"Democracia direta" é a forma de decisão tomada pela participação coletiva e responsável da base. Uma
decisão pode ser feita por consenso ou por maioria de votos, mas sempre deve respeitar antes de tudo a
exposição das idéias e o debate.
3 "
Ação direta" é um princípio e método que carrega o sentido do protagonismo do povo auto-organizado,
ou seja é o povo que deve fazer diretamente as transformações, com o exercício de suas próprias forças,
união, organização e ação, sem viver esperando para que os outros façam por nós, que caia do céu como
um milagre ou um presente, sem que nos esforcemos para isso;
A ação direta pode ser da pessoa para o grupo, do grupo para a base, da base para o movimento, e do
movimento para a sociedade;
4
"A independência de Classe" é o principio histórico que orienta a luta do povo na busca pela nossa
verdadeira emancipação das estruturas que nos dominam; Significa que a união do povo, nossa luta e
organização, não pode ser dividida por diferenças partidárias, nem se deixar manipular ou corromper
pelas ofertas que vem das classes dominantes, governos e dos ricos;
54
Não significa ignorar as diferenças, sabemos que elas existem e são saldáveis porém estas, não podem
ficar acima do movimento a ponto de dividido-lo. O acordo com este princípio é o que pode contribuir
para que não sofreremos manipulações futuras;
5
O "Apoio Mútuo" ou Ajuda Mútua é o principio que orienta nossa atitude para a prática que contribui
para a construção da solidariedade e da cooperação, é contrario aos princípios da competição, do egoísmo,
do individualismo e da ganância;
6
A "Solidariedade de Classe" é o principio histórico da união de todos os pobres. Sabemos que a
sociedade que vivemos está dividida em classes: pobres e ricos, Opressores e oprimidos, os que mandam
e os que obedecem. Nosso povo faz parte das classes Oprimidas, somos um setor dentro delas, porem
existem vários outros setores de classes oprimidas pelo sistema capitalista, como: os sem terra, os sem
teto, os índios, os negros e quilombolas, os trabalhadores assalariados, etc.... É importante
compreendermos isso, pois em nossa luta sozinhos, não venceremos, a verdadeira vitória pode ocorrer
com uma profunda transformação da sociedade, ou seja, onde não existam mais ricos ou pobres,
opressores e oprimidos, mas sim liberdade e igualdade. Para construirmos essa nova sociedade temos que
construir na luta a "solidariedade com todos os setores das classes Oprimidas".
É interessante o caráter politizado demonstrado pelos catadores na apresentação
de propostas de organização enquanto movimento social. Entretanto, quando analisamos
a atuação destes trabalhadores no âmbito local
23
percebe-se um grande descaso do poder
público, bem como uma subordinação do catador ao processo de exploração na divisão
social e cnica do trabalho. Neste sentido, um dos principais descasos do poder local
apontado na pauta da luta dos catadores está em torno da pouca atenção dada a
efetivação da coleta seletiva.
Em 1998 foi criado o Fórum Nacional Lixo e Cidadania por instituições públicas
e privadas com atuação direta e indireta na questão de resíduos sólidos, as quais
passaram a integrar seus esforços com o intuito de erradicar a catação de lixo por
crianças e adolescentes, e mudar a situação dramática do destino final do lixo no Brasil.
O levantamento de dados foi realizado em um contexto extremamente favorável, pois
foram considerados, entre outros, dois aspectos fundamentais: a existência de uma
Pesquisa Nacional de Saneamento Básico - PNSB de 1989 e 2000, com cobertura em
todo o território nacional e, a existência de uma articulação nacional de instituições e
entidades que trabalham a questão relativa à gestão dos resíduos sólidos de forma
integrada.
De acordo com PNSB (2000), o número de municípios com programas de coleta
seletiva é muito pequeno, 8,2% dos municípios têm programa de coleta seletiva, e
menor ainda, é o índice dos programas que incorporam os catadores como parceiros. A
gestão participativa que garanta o controle social dos sistemas igualmente é muito
23
Análise apresentada no próximo capítulo tendo como campo exploratório a Associação dos Catadores
de Materiais Recicláveis Nova Vida de Teófilo Otoni/MG.
55
incipiente. Outrossim, a situação da maioria dos trabalhadores da área é bastante
precária, havendo um maior investimento na valorização e qualificação apenas nas
grandes cidades, principalmente nas capitais.
Contudo, apesar de não haver, ainda, um maior reconhecimento social do
trabalho desempenhado pelos catadores de materiais recicláveis, sabe-se que tal
atividade representa hoje uma necessidade no projeto global de desenvolvimento
sustentável das diferentes sociedades, pois além de contribuir para a conservação de
recursos naturais, reduz os impactos ambientais do lixo e garante uma redução da
condição de vulnerabilidade social, quando há uma participação efetiva do poder
público.
56
CAPÍTULO 3 - ANÁLISE DAS POSSIBILIDADES DE AUTO-GESTÃO
DE UMA ASSOCIAÇÃO DE CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS -
UMA REFLEXÃO A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO DE
CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS NOVA VIDA - ASCANOVI
3.1 Breve Histórico da ASCANOVI
No final da década de 1990, os catadores de materiais recicláveis do município
de Teófilo Otoni, estado de Minas Gerais, segregavam esses materiais nos lixões ou nas
ruas e vendiam para os donos dos depósitos que, ainda hoje, intermediam a venda dos
materiais recicláveis para as indústrias recicladoras. Esses catadores foram estimulados
a se organizar recebendo o apoio de alguns segmentos da sociedade civil para criar uma
associação que atendesse aos seus interesses.
Esse processo de organização ocorreu no início de 1999, quando o Ministério
Público encaminhou para a Prefeitura de Teófilo Otoni um Termo de Ajustamento de
Conduta - TAC, obrigando ao poder público municipal, gestor dos serviços de limpeza
pública, a retirar os catadores que viviam da cata de orgânicos e inorgânicos nos lixões.
O não cumprimento desta exigência implicaria no pagamento de multas, que resultaria
em despesas para o cofre público municipal.
Nesse momento é perceptível que o real interesse do governo em apoiar a
retirada dos catadores do lixão não se tratava de sensibilidade efetiva com a questão
social, mas uma preocupação com o pagamento de multa gerando despesas para a
administração. Tal posicionamento irá justificar, conforme será apresentada adiante, a
57
ausência do poder público no processo de organização dos catadores, ficando, portanto,
a cargo de representantes da sociedade civil.
O início da organização dos catadores deu-se em 2002, quando um grupo de
pessoas da sociedade civil organizada (a exemplo da instituição Aprender a Produzir
Juntos - APJ, cooperativa de trabalho que foi pioneira em projetos de economia
solidária no município; Igreja Católica) e representantes de instituições governamentais
(Instituto Estadual de Florestas IEF), entre outras, junto aos catadores, se reuniram e
construíram o Estatuto da Associação (Anexo 4), que recebeu o nome de Associação
dos Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida - ASCANOVI. Os catadores mesmo
antes de criar o Estatuto, desde o ano de 2000, já utilizavam o galpão cedido pelo
Departamento Nacional de Transporte e Infra-Estrutura – DNIT, para a seleção de
materiais coletados nas ruas. A localização do referido galpão que ainda está sobre a
posse da ASCANOVI é um aspecto positivo para os catadores, pois se situa na região
central da cidade.
Vale ressaltar que no momento que a ASCANOVI completava dois anos de
funcionamento, no inicio de 2002, prazo mínimo exigido pelo governo federal para a
legalização de instituições sem fins lucrativos, o referido estatuto não chegou a ser
registrado de imediato em cartório. Em decorrência da mudança da administração
Pública no ano de 2001, houve uma desarticulação entre os apoiadores e catadores. Esta
desarticulação segundo um apoiador ocorreu devido a ausência do poder público local
para garantir o fortalecimento da organização através de iniciativas básicas como:
manutenção do espaço físico (pagamento de luz e água), e outros recursos necessários
para o funcionamento da associação.
Somente no final do segundo semestre do mesmo ano, ainda sem o apoio da
Administração Pública, novos apoiadores e algumas instituições governamentais como:
Companhia de Saneamento de Minas Gerais - COPASA, Instituto Estadual de Florestas
- IEF, Instituto Mineiro de Agropecuária - IMA, escolas, Câmara de Vereadores, bem
como entidades não governamentais: Centro de Defesa de Direitos Humanos - CDDH,
Associação Aprender e Produzir Juntos - APJ, grupos católicos, destacando também a
presença de colaboradores da Associação dos Catadores de Papelão e Material
Reaproveitável de Belo Horizonte/MG - ASMARE/BH contribuíram para reacender
novamente a discussão entre os catadores da ASCANOVI.
58
Em novembro do mesmo ano, culminou com a legalização da ASCANOVI,
passando a existir de fato e de direito como entidade civil sem fins lucrativos e de
Assistência Social, fundada em 23 de novembro de 2002.
3.2 Estrutura funcional da ASCANOVI
De acordo com o Estatuto e Regimento interno da ASCANOVI, esta
organização é administrada por: Assembléia Geral; Diretoria e Conselho Fiscal,
conforme organograma apresentado na Figura 4.
FIGURA 4: Organograma da ASCANOVI
A diretoria da ASCANOVI, com mandato de três anos cujos membros são
eleitos por voto direto de seus associados, conforme seu Estatuto se compõe por um
Presidente, um Vice-Presidente, Primeiro e Segundo Secretários, Primeiro e Segundo
Tesoureiros e se reunirá uma vez por mês. De acordo com o artigo 18 deste estatuto
compete à diretoria:
ASCANOVI
Assembléia Geral
Conselho Fiscal
Diretoria
Comissão
de
Saúde
Comissão
de Infra-
estrutura
Comissão
de Meio
Ambient
e
Comissão
de
Educação/
Cultura./Lazer
Comissão
de
Apoio
Comissão
Imprensa
Divulgação
59
I- elaborar e executar o programa anual de atividades;
II- elaborar e apresentar à Assembléia Geral, o relatório anual;
III- estabelecer o valor da mensalidade para os sócios contribuintes;
IV- contratar e demitir funcionários;
V- entrosar-se com instituições públicas e privadas para mútua colaboração
em atividades de interesse comum;
VI- convocar a Assembléia Geral.
A referida Assembléia Geral que também compõe o organograma da
ASCANOVI é órgão soberano da organização, e é constituída por associados em pleno
gozo de seus direitos estatutários. Compete a esta Assembléia Geral (Art. 13):
I - eleger a Diretoria e o Conselho Fiscal;
II - decidir sobre reformas do estatuto;
III - decidir sobre a extinção da entidade nos termos do Art. 33;
IV - decidir sobre a conveniência de alienar, transigir, hipotecar ou permutar
bens patrimoniais;
V - aprovar o Regimento Interno;
VI - destituir os administradores;
VII - apreciar recursos contra decisão da diretoria;
VIII - conceder o título de associados benemérito e honorário por proposta da
diretoria;
IX - aprovar as contas.
De acordo com os artigos 26 e 27 do mesmo Estatuto, o Conselho Fiscal é
constituído por três membros e seus respectivos suplentes, ambos eleitos pela
Assembléia Geral e tem como competências:
I- examinar os livros de escrituração da entidade;
II- examinar o balancete semestral apresentado pelo Tesoureiro, opinando respeito;
III- apresentar relatórios de receitas e despesas sempre que forem solicitados;
IV- opinar sobre aquisição e alienação de bens.
60
A fim de cumprir as finalidades da ASCANOVI, o seu regimento interno prevê a
formação de comissões específicas, conforme apresentado no organograma, cuja
finalidade é realizar atividades que visem promover a integração social e o crescimento
econômico dos catadores-associados
24
e a defesa do meio ambiente.
Entretanto, essas comissões, ainda, não foram formadas pela dificuldade de
organização entre esses associados. Para os catadores-associados o fato de gerir seu
próprio negócio não é algo com que estão familiarizados, pois se trata de um grupo de
pessoas que permaneceram à margem não apenas da posse dos meios de produção, mas
da própria inserção social. Percebendo tais dificuldades o grupo de apoio inicialmente
se organizou para acompanhar estes trabalhadores no processo de cumprimento
estatutário, orientando-os para que alcançassem uma maior autonomia no processo de
auto-gestão da ASCANOVI.
Atualmente entre o apoio sistemático que este grupo de catadores-associados
vem recebendo, cita-se os projetos de extensão desenvolvidos por professores e alunos
dos cursos de Serviço Social através do Núcleo de Apoio, Pesquisa e Extensão NAPE
e Ciências Contábeis das Faculdades Doctum de Teófilo Otoni. Equipe que elaborou um
relatório que permitiu visualizar o sistema de controle interno e de movimentação de
recursos na ASCANOVI, e que detalhamos a seguir.
3.3 Controle da produção
O estoque de materiais recicláveis é o resultado da coleta desses materiais que os
catadores-associados fazem nas ruas da cidade e nas empresas parceiras (doadoras).
Cada associado ao chegar na ASCANOVI faz a classificação dos materiais, por tipo e
em seguida a pesagem. A associação dispõe de uma pessoa responsável
25
(catador) que
fica de plantão à espera dos associados para fazer a pesagem dos materiais coletados.
Cada associado recebe um comprovante do material pesado (Tabela 1) para controle da
24
Os catadores associados da ASCANOVI que participaram desta pesquisa serão referenciados neste
trabalho como catadores-associados.
25
O catador responsável pela balança foi eleito em Assembléia Geral organizada pelos associados da
ASCANOVI. Os catadores interessados em ocupar este cargo apresentaram seus nomes e em seguida é
realizada a eleição. Para a permanência do eleito no cargo de balanceiro foram estabelecidos critérios na
mesma assembléia como: cumprir corretamente com os horários de trabalho estabelecido, conduzir sua
função com honestidade e tratar todos os catadores com igualdade no momento da pesagem do material,
caso não cumprirem com estas condições são substituídos.
61
quantidade (kg) dos materiais entregues, com os respectivos preços unitários e o total da
produção diária a receber na quinzena. Vale ressaltar que a ASCANOVI não possui
capital de giro, depende primeiramente das vendas dos materiais recolhidos pelos
catadores, o que lugar, portanto, a um constante atraso nos pagamentos quinzenais
dos catadores.
TABELA 1 - Modelo do comprovante de entrega dos
materiais recicláveis recebido pelo
associado
ASCANOVI
_____/_____/_____
Associação dos Catadores de Data da Pesagem
Materiais Recicláveis Nova Vida
Tipos de
materiais
Quantidade
(Kg)
Preço
Unitário
(R$)
Total
(R$)
Papelão
Papel Branco
Papel Misto
Plástico Filme
Plástico Colorido
PEAD
Pet
Ferro
Latas Alumínio
Valor
______________
___________________________
Ass. Do Catador Ass. Do Responsável Pesagem
Cada associado tem uma planilha de controle individual da produção quinzenal
dos materiais recicláveis entregues no galpão da ASCANOVI. Esta planilha é
preenchida em duas vias pelo responsável pela pesagem (balanceiro), uma via é
entregue ao catador e a outra via é entregue pelo balanceiro à tesouraria. O tesoureiro da
organização faz os lançamentos diários. Estas informações permitem acompanhar a
produção de cada associado e coletivamente, totalizando a produção da ASCANOVI.
Na planilha individual de cada associado (Tabela 2) consta o nome do catador,
todos os tipos de materiais segregados, período da coleta (1º quinzena ou quinzena),
quantidade coletada (kg), preço individual de cada material, o total em R$ e valor a
62
receber na quinzena. Para cada quinzena um bloco para os registros dos materiais
coletados por cada catador. O bloco abaixo refere-se a primeira quinzena do mês:
TABELA 2 – Planilha de controle individual da produção quinzenal dos materiais
recicláveis entregues a ASCANOVI.
ASCANOVI - Associação dos Catadores de Material Reciclável Nova Vida
Coleta da Quinzena
Mês:
Nome Coletor:
Data
Papelão
Papel Papel Saco
PEAD PET Ferro
Plástico Latas
Branco Misto Filme Colorido Alumínio
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
Sub Total /
Kg
R$ Kg
Total (R$)
Total da 1ª Quinzena R$ _________
Nº Recibo ___________
O pagamento é efetuado por meio de recibo, emitido em três vias e numerados
seqüencialmente. A primeira via destina-se à contabilidade para ser lançada na planilha
de produção do catador, a segunda via fica com o associado e a terceira via é fixa no
bloco de recibos. O recibo é timbrado com os dados da entidade e preenchido com os
dados do associado recebedor.
Com o controle de cada associado, pode-se acompanhar a produção da
associação. A planilha, denominada “Mapa de movimentação de produto” (Tabela 3)
permite saber: estoque inicial, entrada diária dos materiais que são coletados pelos
catadores-associados, doações recebidas e compra de materiais recicláveis realizadas na
própria associação pelo tesoureiro da organização. Estes materiais recicláveis
comprados são levados para a ASCANOVI por alguns trabalhadores de comércio e
63
moradores do município que se rejeitam a doar tais materiais, pois têm estes recursos
como uma complementação de renda.
Estes são os tipos de entradas, informando a quantidade de materiais disponíveis
para comercializar, ou formando estoque. O total das entradas menos o total da saída
representa o saldo final de cada material reciclável. Esta planilha apresenta também o
preço unitário e total de venda (R$) de cada produto.
TABELA 3 – Mapa de Movimentação do produto comercializado
ESTOQUE
INICIAL
Produto: _____________________
ENTRADA (Kg) SAÍDA ( Kg)
Saldo
Mês:
Vendas (R$)
Data Coleta Compra
Doação
Total Venda
Preço (Kg) Total
1
Até 31
Total
Total
Com os dados gerados no mapa de movimentação quinzenal de cada material
reciclável, o setor contábil determina a movimentação mensal da quantidade
comercializada (kg) e remuneração de cada associado. Por meio de balancetes, diário e
demonstrações contábeis, são gerados relatórios mensais, apresentando a situação
patrimonial e financeira da ASCANOVI, compreendendo seus bens, direitos e
obrigações, evidenciando o resultado econômico e acumulativo do período.
As planilhas utilizadas para armazenamento dos dados da ASCANOVI
constituem-se em importantes ferramentas implantadas e utilizadas para auxiliar no
gerenciamento da entidade. O objetivo é subsidiar seus gestores e apoiadores, a
direcionar os planos de ações necessárias, em busca da estruturação da organização seja
ela física ou humana.
3.4 Infra-Estrutura Física da ASCANOVI e Organização Laboral
Em relação à estrutura física da ASCANOVI vale ressaltar que o galpão
utilizado pelos catadores-associados apresenta algumas deficiências que necessitam de
reformas para viabilizar o armazenamento, triagem e comercialização dos materiais
64
recicláveis segregados. Dentre as reformas necessárias para uma melhor organização da
ASCANOVI, faz-se necessário ainda a construção de espaços físicos específicos, tais
como: cozinha, banheiros e sala de reunião.
Na ótica da segurança do trabalho, foi diagnosticada a necessidade de maior
sensibilização junto aos catadores-associados no que tange à utilização correta e
cotidiana dos equipamentos de proteção individual e coletiva (EPI e EPC). Sabe-se que
por questões de cunho sócio-cultural, é natural a rejeição por parte dos catadores-
associados em usar equipamentos básicos de proteção como luvas, máscaras e botas.
Ressalta-se que parte dos equipamentos necessários foram adquiridos nos primeiros
anos de formação da Associação, entretanto, por falta de uso ficaram obsoletos e/ou
foram extraviados nas dependências. Isto é reflexo do despreparo e baixo índice de
capacitação dos catadores, bem como de problemas organizacionais endógenos à
associação.
Como fator gerador de insegurança no âmbito da Associação, defronta-se
também com a problemática causada pela permanência de crianças cotidianamente no
Galpão da ASCANOVI, sujeitas a acidentes e contaminação de doenças provocadas
pelo lixo recolhido (Figura 5). Tal situação vem sendo banalizada, uma vez que os pais
ou responsáveis se justificam alegando não ter com quem deixar os filhos e que o poder
público não oferece creches suficientes para atendimento da demanda da cidade.
FIGURA 5: Catadora responsável pela balança
pesando material. A direita percebe-se
a presença de criança nas dependências
da ASCANOVI.
65
No que tange a organização laboral, o catador-associado enfrenta uma rotina de
trabalho um tanto que exaustiva, exigindo do mesmo uma boa resistência física, por se
tratar principalmente de uma atividade braçal. Cada catador-associado é responsável por
todo o seu processo de trabalho desenvolvido, desde catar, selecionar, puxar carrinho e
encaminhar o material reciclável para pesagem.
Na ASCANOVI foi definido em Assembléia Geral que os catadores-associados
receberiam por produção, desta forma cada um seria responsável também, pela forma de
estruturar a sua rotina de trabalho. O que se discute nas reuniões sobre esta flexibilidade
é que o catador-associado cumpra com os horários definidos pelas empresas doadoras
de materiais recicláveis, na retirada dos mesmos e que não acumule material no galpão
da associação, por mais de uma semana. Para evitar tais situações foi definido também,
em Assembléia Geral, que caso o catador não cumpra com o acordo de retirada dos
materiais das empresas nos dias e horários estabelecidos pelas mesmas, o ponto seria
repassado para outro catador. Em relação ao acúmulo de material no galpão, caso isto
ocorra, o material será doado para a própria ASCANOVI, e o dinheiro irá para o seu
caixa.
A diferenciação da renda de cada catador-associado está atrelada ao número de
empresas que ele consegue fechar parceria. Entretanto, devido a ainda existência de
preconceitos em relação à figura do catador, algumas empresas se negam até mesmo a
recebê-lo para conversar sobre a parceria. Desta forma, a fim de trabalhar a percepção
da sociedade (que estigmatiza o catador como marginal, vagabundo, medindo, etc.), em
relação ao catador, bem como incentivar e sensibilizar a população a doar tais materiais,
algumas medidas foram adotadas.
Os catadores juntamente com o grupo de apoio vêm desenvolvendo campanhas
em rádio, rede de televisão local, jornais e visitas aos comércios, seminários, com o
objetivo de apresentar a ASCANOVI para a sociedade e firmar parcerias. Tais medidas
têm se demonstrado positivas, segundo os relatos dos catadores-associados,
principalmente em relação ao trato dado a estes trabalhadores quando transitam pelas
ruas da cidade.
66
3.5 Grupo de Apoio
Considerando
a situação de exclusão na qual estão submetidos os catadores-
associados, e reconhecendo-os como sujeitos de direitos,
desde o ano de 2004 o grupo de
apoio da ASCANOVI vem buscando novas estratégias para o fortalecimento dos
catadores-associados, bem como, a reflexão do papel social que exercem, num cenário
de precarização das políticas públicas de proteção social.
Tais estratégias serão destacadas nesta pesquisa por se tratar de um trabalho que
acompanha de forma sistemática as atividades desenvolvidas pelos catadores-
associados, bem como a tentativa de organização do próprio grupo de apoiadores que
estava desarticulado, onde as ações de cada apoiador acorriam de forma isolada e até
mesmo assistencialista e paternalista.
A região de Teófilo Otoni tem historicamente um perfil assistencialista no que
tange às propostas de mobilização social, onde representantes da sociedade civil,
majoritariamente aposentados, tentam minimizar suas carências afetivas dedicando
parte do tempo ocioso aos trabalhos sociais. Vale ressaltar que no interior do grupo de
apoio, este fato se reflete, pois podem se distinguir apoiadores com dois olhares de
ações diferentes. Estão aqueles que acreditam no desenvolvimento de atividades com os
catadores associados que conduzem à emancipação e promoção humana; e aqueles que
acreditam no desenvolvimento de atividades paternalistas com os associados.
Obviamente esta diferença de enfoques entre os apoiadores gera conflitos internos no
grupo de apoio, o que conseqüentemente se reflete no trabalho desenvolvido na
ASCANOVI.
O desenvolvimento de atividades paternalistas apresenta o problema de reforçar
a permanência da condição de “vítimas” que se colocam os catadores-associados (ainda
que sejam vitimizados por um processo de exclusão social), fator que induz em alguns a
tentativa natural de resistir às possibilidades protagônicas ora ofertada no processo de
auto-gestão idealizado e ainda tido como um sonho distante.
No biênio 2005/2006 realizou-se a sistematização das ações do grupo de apoio
da ASCANOVI com o objetivo de contribuir no processo organizacional desta
associação. Entre as ações desenvolvidas pelo grupo de apoio destacam-se aquelas
sugeridas pelos próprios catadores: curso de alfabetização, fortalecimento do grupo de
apoio, oficina de saúde, estudo do Estatuto e Regimento Interno da ASCANOVI,
67
encontros para discussões e reflexões sobre trabalho coletivo, visitas domiciliares e
realização de seminários.
Curso de Alfabetização: A partir das demandas apresentadas pelos catadores-
associados, foram realizadas atividades de alfabetização e sócio-educativas, toda
segunda e terça-feira no período da manhã pelos integrantes do grupo de apoio que
representavam uma instituição de ensino superior do município de Teófilo Otoni.
Salienta-se que os dias e horários foram estabelecidos pelos próprios catadores-
associados. Inicialmente estas atividades foram desenvolvidas a partir da formação de
dois grupos: o grupo dos catadores-associados que não teve oportunidade de se
alfabetizar optando por acompanhar todo o processo de alfabetização e o grupo de
associados que já se encontravam em um estágio de alfabetização mais “avançado”
(Figura 6). Cada participante, de acordo com o seu próprio interesse, decidia em qual
grupo iria participar. Esta iniciativa favoreceu a inclusão da associação no projeto
“Todas as Letras do Governo Federal. No primeiro semestre de 2006, os catadores-
associados contavam com um educador capacitado e material escolar gratuito. Este
projeto, conforme previsto pelo Ministério da Educação, teve a duração apenas de 01
ano, não havendo continuidade. O curto período de funcionamento do projeto “Todas as
Letras” demonstra a precarização das políticas publicas sociais que muitas vezes
apresentam-se de forma focalizada e insatisfatória.
No ano de 2007 o grupo de apoio encaminhou à Secretaria Municipal de
Educação de Teófilo Otoni uma solicitação de continuidade dos cursos de alfabetização.
Apesar de a referida Secretaria demonstrar interesse em firmar tal parceria ainda não
havia definido a possibilidade de contratação de um educador social.
Destaca-se aqui a importância da continuidade deste curso, pois este momento
além de oportuno para discutir temas que fazem parte do cotidiano dos catadores
possibilita que os mesmos tenham mais interesse de participar de todo o processo de
organização da ASCANOVI inclusive nas questões administrativas que tem se tornado
um espaço apenas daqueles associados que têm um grau de escolaridade mais avançado
(ver tópico 3.7).
68
Projeto Extensão NAPE T.O
FIGURA 6: Associados da ASCANOVI em curso de
alfabetização no ano de 2005.
- Fortalecimento do grupo de apoio: Durante o primeiro semestre de 2005, as
Faculdades Doctum de Teófilo Otoni através do Núcleo de Apoio, Pesquisa e
Extensão NAPE, sediou alguns encontros do grupo de apoio da ASCANOVI
(Figura 7). Os encontros objetivavam a organização e o planejamento das ações
desenvolvidas pelos diversos apoiadores. A partir desta iniciativa foi possível
estruturar um cronograma de atividades com uma maior articulação entre o grupo,
evitando assim ações isoladas. Neste cronograma de atividades constava a
disponibilidade de participação de cada apoiador nas demandas apresentadas pelos
catadores em assembléia, bem como pelo diagnóstico realizado pela equipe do
NAPE com os associados. Posteriormente às reuniões do Grupo de Apoio, era
convocada uma reunião com todos os associados da ASCANOVI com a finalidade
de apresentar o planejamento de atividades a ser executados – em função das
demandas realizadas por eles bem como dos técnicos responsáveis pelo
acompanhamento destes. Destaca-se aqui que a decisão final sobre a execução de
tais atividades sempre era dos catadores associados, garantindo assim sua
autonomia.
69
FIGURA 7: Reunião do grupo de apoio da
ASCANOVI em 2005
- Oficina de Saúde: A partir da parceria firmada com a Associação dos Amigos da
Saúde - AMAS, representada por alunos do Curso de Enfermagem das Faculdades
Doctum foi possível apresentar para os catadores-associados, alguns temas sobre
saúde, como também desenvolver ações diretas, tais como: prevenção de acidentes,
higienização e vacinação (Figura 8).
Projeto Extensão NAPE T.O
Projeto Extensão NAPE T.O
(a) (b)
FIGURA 8: Alunos do Curso de Enfermagem (a) apresentando alguns
temas de saúde para os associados (b) realizando atividades
práticas no galpão da ASCANOVI – ano de 2005.
70
- Estudo do Estatuto e Regimento Interno da ASCANOVI: Durante o curso de
alfabetização com a participação dos catadores-associados foram trabalhados o
estatuto e regimento interno da ASCANOVI, bem como a temática do
associativismo. Este estudo foi realizado também em um outro momento com a
participação do Curso de Ciências Contábeis das Faculdades Doctum, no primeiro
semestre de 2006 no curso de formação da diretoria da ASCANOVI e Conselho
Fiscal. Foi conferida a este grupo a responsabilidade de continuar formando os
novos membros da associação (Figura 9). Esse estudo foi realizado ao longo de
cinco encontros. Realizaram-se também dois encontros com os novos membros da
ASCANOVI (ex-catadores do lixão) com a finalidade de apresentar direitos e
deveres dos catadores-associados da ASCANOVI, bem como o regimento interno
da mesma.
NAPE
FIGURA 9: Diretoria, conselho fiscal da
ASCANOVI e equipe de ciências
contábeis durante o estudo sobre
associativismo e Estatuto da
ASCANOVI, em 2006.
71
- Seminário sobre Meio Ambiente: Realiza-se anualmente envolvendo os alunos das
diferentes Faculdades de Teófilo Otoni e envolvendo os catadores de materiais
recicláveis (figura 10).
(a) (b)
FIGURA 10: Seminário realizado em Teófilo Otoni no dia do Meio Ambiente 2006,
vendo-se no primeiro plano o pronunciamento de um associado
manifestando-se em nome da ASCANOVI durante o evento (a) e
participação de membros da associação (b).
Além das atividades desenvolvidas pelo grupo de apoio na ASCANOVI,
conforme descritas nos anos de 2005 e 2006, outras atividades foram priorizadas
como:
- Encontros para Discussões/Reflexões: Em virtude dos membros da ASCANOVI
estarem desarticulados e enfrentando dificuldades para se entrosarem no ambiente
de trabalho, foram realizados ao longo de 2005 e 2006 encontros, dinâmicas em
grupo e reflexões, com o objetivo de aproximá-los e criar um espaço de diálogo e
interação. Nos primeiros encontros alguns catadores se negavam a participar para
evitar um contato mais próximo com outros associados nos momentos das
dinâmicas. Entendendo que tais mudanças fazem parte de um processo que demanda
tempo, a interação entre os catadores ainda continua sendo trabalhada, levando
também em consideração a alta rotatividade existente dentro ASCANOVI.
72
- Visitas aos Domicílios dos Catadores-associados: Em 2005 e 2006 foram
realizadas visitas aos domicílios dos catadores-associados a fim de identificar o
perfil de cada associado e notificar os principais problemas vivenciados por estes no
âmbito familiar. Depois de identificadas as problemáticas a ser resolvidas eram
encaminhadas para os diferentes serviços públicos prestados no município como:
prefeitura, Sistema Único de Saúde SUS, defensoria pública, Instituto Nacional do
Seguro Social INSS, Conselho Tutelar e outros. Os encaminhamentos mais
comuns eram: retirada gratuita de documentos pessoais, divórcio, construção de
banheiro, cadastro em programas de transferência de renda, ligadura de trompas,
solicitação de remédios, violência doméstica, dentre outros. Infelizmente nem todos
os encaminhamentos foram atendidos, principalmente aqueles que dependiam da
prefeitura local.
Outras atividades promovidas pelo grupo de apoio junto aos catadores-
associados são:
- Reuniões semanais com a finalidade de trabalhar a organização dos serviços
internos no galpão.
- Promoção de atividades grupais direcionadas para a abordagem de temas que
fazem parte do cotidiano dos participantes;
- Trabalhos de sensibilização dos participantes da ASCANOVI para que
identifiquem seu papel na organização e a importância de sua participação como
associado;
- Encontros mensais com o grupo de apoio objetivando o seu fortalecimento;
- Elaboração de projetos para a captação de recursos, porém cabe salientar que não
foram disponibilizados recursos pelos órgãos do poder publico estadual e federal,
conforme solicitado.
- Parceria com o curso de Ciências Contábeis das Faculdades Doctum, com o intuito
da ASCANOVI garantir maior transparência na movimentação financeira da
organização, a parceria ainda permanece.
- Articulação com o governo municipal e os respectivos representantes das
Secretarias de meio ambiente, educação e assistência social para a efetiva
participação do poder público no processo de organização dos catadores-
associados e implantação da coleta seletiva;
73
No período 2005/2007 muitas foram as ações desenvolvidas com a participação
dos catadores-associados, entretanto, os resultados obtidos foram incipientes e de difícil
mensuração. Constata-se que antes do planejamento das atividades realizadas pelo
grupo de apoio, a dependência dos catadores-associados em relação a este grupo
permanecia desde a fundação da associação, devido ao paternalismo que tirava a
iniciativa dos associados.
Ressalta-se que um dos objetivos durante os encontros dos apoiadores consistia
na avaliação do papel deste grupo na associação para não interferir em questões que
poderiam comprometer qualquer iniciativa de autonomia dos seus associados. Foi
partindo deste princípio que o grupo de apoio elaborou o plano de ação, que diz respeito
às atividades destacadas anteriormente referentes ao biênio 2005/2006. Porém, a
continuidade do plano de ação vem sendo dificultada devido à dispersão do grupo de
apoio, fruto dos conflitos internos entre seus atores. Aqueles que defendem ações
paternalistas e/ou assistencialistas tiveram dificuldades para trabalhar com outras
propostas, desencadeando o desenvolvimento de atividades isoladas por parte de
alguns. Isto vem gerando confusão entre os catadores-associados, especialmente no que
diz respeito aos papéis do grupo de apoio e deles mesmos. Destaca-se que permanecem
as tentativas de organização e fortalecimento do grupo de apoio.
Uma outra questão que inviabiliza a continuidade das atividades propostas pelo
grupo de apoio (aqueles ainda organizados) corresponde à falta de perspectiva dos
catadores-associados de melhorias das condições de vida para o suprimento de suas
necessidades básicas. Estas necessidades, como comer, beber, vestir e morar, são
identificadas como respostas primárias como adquiridas através do resultado da
produção na ASCANOVI. Conforme apresentado abaixo (Tabela1) esta renda tem se
mostrado insuficiente.
74
TABELA 4 - Distribuição percentual dos membros da ASCANOVI quanto à renda
(média) mensal recebida
Renda média (mensal) Nº de Catadores-Associados
%
< 1 salário mínimo
15 65,2
1 salário mínimo
5 21,7
> 1 salário mínimo
3 13,1
A renda obtida por 65% dos catadores-associados é inferior a um salário
mínimo, quantia considerada como insatisfatória para garantir até mesmo os recursos
primários para sua sobrevivência e de seus familiares que dependem dessa renda. A
baixa renda dos catadores-associados gera um nível de insatisfação em relação ao
trabalho executado, razão pela qual se verifica um alto índice de rotatividade na
ASCANOVI, resultado das constantes evasões. Muitos destes trabalhadores optam
pelos chamados “biscates” fora da associação (apesar da esperança de conseguir um
trabalho de carteira assinada), ou até mesmo pela catação no lixão do município de
Teófilo Otoni (mesmo este sendo um local proibido para esta atividade), que segundo os
catadores-associados têm um retorno financeiro maior do que na ASCANOVI, devido
ao grande volume de material reciclável que chega ao local reservado para o destino
final do lixo gerado no município de Teófilo Otoni.
Vale ressaltar que apesar da insatisfação do catador-associado estar relacionada
a renda obtida, contudo reconhece que houve melhorias no que tange ao
reconhecimento por parte da sociedade local do seu trabalho desenvolvido
26
, referindo-
se inclusive à oportunidade de exercer uma atividade laborativa, já que antes da
ASCANOVI viviam ao léu.
Com base na realidade vivenciada pelos catadores-associados, o grupo de apoio
busca estratégias que favoreçam o aumento da produção da ASCANOVI e da qualidade
dos materiais recicláveis segregados, de modo a alcançar melhores preços no mercado
de recicláveis, visando a um aumento da renda dos catadores-associados e
conseqüentemente a sua permanência na associação. Estas estratégias passaram a
26
Ver no Tópico 3.7 deste trabalho tal reflexão no Excerto 2, p. 80.
75
compor os objetivos do grupo de apoio a partir do segundo semestre do ano de 2006,
momento em que a ASCANOVI passa a fazer parte da “Rede Solidária Central Leste”.
3.6 Rede Solidária Central Leste
Durante o “Encontro Estadual de Catadores, Técnicos, Educadores Sociais e
Agentes Sociais”, realizado em maio de 2004 em Belo Horizonte - MG teve origem a
organização da Rede Solidária Central Leste. A formação desta Rede tem como objetivo
contribuir no processo de inclusão social dos catadores de materiais recicláveis a partir
de uma maior valorização dos materiais coletados que serão vendidos diretamente para
as indústrias
Conforme visto, as associações de catadores, no contexto atual de pouca
participação dos governos das diferentes esferas, principalmente a municipal, no
processo de organização destas instituições, enfrentam dificuldades para garantir a
sustentabilidade no seu funcionamento, ocasionando assim uma situação de
precarização das condições de trabalho que culmina na permanência do estado de
miserabilidade dos catadores e suas famílias. Esta pouca participação dos governos aqui
referida trata-se de uma colaboração em subsídios estruturais da organização como:
incentivos para a compra de maquinário próprio; transporte para entrega de materiais
diretamente para as indústrias; cursos contínuos de alfabetização para os catadores;
disponibilização de um funcionário administrativo para capacitar e auxiliar os catadores
nas questões administrativas e principalmente implantar coleta seletiva nos municípios.
Caso não ocorram outras estratégias próprias de fortalecimento institucional a
última alternativa que resta aos catadores é se renderem à exploração dos chamados
atravessadores que emprestam maquinários para os catadores e os obriga vender os
materiais recicláveis para os próprios atravessadores a preços abaixo do mercado; e
atuam como intermediários no mercado de recicláveis, funcionando como elo entre os
catadores e direta ou indiretamente com a indústria de reciclagem.
Frente ao exposto, a “Rede Solidária Central Leste”, foi organizada por técnicos
(apoiadores representantes da sociedade civil, ONG’s e governo) e catadores de
materiais recicláveis de 11 associações do estado de Minas Gerais, localizadas nos
Vales do Aço, do Rio Doce e do Mucuri, como estratégia que visa uma melhoria das
condições de trabalho e vida destes trabalhadores. Com o crescimento e fortalecimento
76
do Movimento Nacional dos Catadores a partir de 2004, os idealizadores desta Rede
perceberam que havia mais possibilidades de garantir a participação do Estado no
processo de organização das associações mediante uma maior pressão por parte dos
catadores.
Assim se formou a Rede composta pelas seguintes associações: Associação dos
Trabalhadores de Limpeza e Materiais Recicláveis de João Monlevade MG -
ATLIMARJOM; Associação dos Catadores de Rio Piracicaba ASCARIPI;
Associação dos Catadores de Bela Vista de Minas Gerais ASCABEV; Associação dos
Catadores de Materiais Recicláveis de Timóteo – MG – ASCATI; Associação dos
Catadores de Recicláveis de Ipatinga MG ASCARI; Associação dos Catadores de
Materiais Recicláveis de Belo Oriente – ASCABEO; Associação dos Catadores de
Materiais Recicláveis Natureza Viva ASCANAVI (Governador Valadares);
Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida ASCANOVI (Teófilo
Otoni); Associação de Catadores Trabalhadores de Materiais Recicláveis de Carlos
Chagas ASCATA; Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida -
NOVA VIDA (Coronel Fabriciano) e Associação de Reciclagem de Nanuque
RECLIN.
A Rede, a partir de um diagnóstico realizado em cada uma das associações se
propôs elaborar um projeto visando a estabelecer parcerias com o governo federal a fim
de captar recursos para a organização e infra-estrutura destas organizações. Este projeto
foi aprovado pela Fundação Petrobrás, mediante uma parceria estabelecida com o
Ministério do Desenvolvimento e Combate a Fome MDS, liberando um milhão de
reais para o estabelecimento de uma logística de coleta, transporte e destinação final dos
materiais recicláveis recolhidos pelas supracitadas associações de catadores.
Desde o início da formação da Rede a cidade de Governador Valadares sedia as
reuniões mensais, com os representantes (catadores e técnicos) de cada associação
vinculada a esta. Nestes encontros são discutidas as metas a serem cumpridas por cada
associação, com base nos critérios estabelecidos pela Fundação Petrobrás.
Para ser contemplado com os recursos da Fundação Petrobrás, cada associação
integrante da Rede deverá cumprir as exigências, quanto à estrutura e organização das
associações, a ser estabelecidas pelas Equipes de trabalho da Rede Solidária Central
Leste (Quadro 2).
77
QUADRO 2: Equipes de trabalho da Rede Solidária Central Leste
EQUIPE DE PROCESSO EQUIPE SOCIAL EQUIPE DE PLANEJAMENTO
E ADMINISTRAÇÃO
Equipe para definição do
procedimento de trabalho no
processo de controles
Equipe para projeto de
desenvolvimento dos catadores
Equipe para planejar a gestão da
Rede.
Equipe para trabalhar a
Qualidade do produto.
Equipe para projeto de
desenvolvimento da família do
catador
Equipe para desenvolvimento dos
produtos e compradores.
Equipe para trabalhar as
coordenações (diretoria)
Equipe para trabalhar a logística
(o controle dos dados de
produção, coleta, transporte e
destino final).
Equipe para relações
institucionais e comunicação.
Dentre as equipes supracitadas o Projeto NAPE ficou responsável pelos
trabalhos sociais a serem desenvolvidos com os catadores da rede (equipe para o projeto
de desenvolvimento dos catadores).
A consolidação da Rede Solidária é de extrema importância, pois beneficiará
diretamente 251 catadores, 754 dependentes e, indiretamente, 950 mil pessoas,
moradores das regiões de atuação das associações a partir da redução da degradação
ambiental. Enfim, esta estratégia implica na prevenção do retorno dos catadores para o
lixão ou para o grupo de atravessadores (galpões privados de compra de materiais
recicláveis), que significa, conforme expões Castel (1999) à desfiliação e à perda de
identidade destes “não cidadãos”.
3.7 Análise dos principais entraves enfrentados pela ASCANOVI, que
limitam as possibilidades de construção de uma auto-gestão
organizacional
O cotidiano da ASCANOVI é marcado pela perspectiva de desenvolver uma
associação que seja auto-sustentável, baseado no modelo da auto-gestão. No entanto,
esse processo perpassa por grandes entraves e contradições, o que vem dificultando o
cumprimento dos princípios norteadores da auto-gestão organizacional da associação,
em que os eixos devem ser a participação, democracia e autonomia.
78
Conforme assinalado, a ASCANOVI desde a sua fundação conta com a
participação ativa do grupo de apoio em seu processo de organização. Desde o início o
grupo de apoio desenvolveu atividades voltadas para o resgate da autonomia dos
catadores-associados no processo de construção de uma auto-gestão, priorizando os
seguintes objetivos:
- Recuperar e manter trabalho e renda através da participação e controle coletivo dos
trabalhadores(as) sobre as atividades produtivas;
- Democratizar as tarefas que envolvem conhecimento, dando oportunidade para que
o "saber fazer" chegue ao conjunto dos trabalhadores;
- Superar os entraves ao acesso às informações e conhecimento;
- Promover regularmente atividades de desenvolvimento do trabalho em equipe e de
relacionamento e inteligência coletiva entre os (as) trabalhadores(as).
Para isto, faz-se necessário um acompanhamento sistemático destes
trabalhadores que empiricamente têm histórias de vida singulares, marcadas por um
processo de exclusão social, que envolve trajetórias de vulnerabilidades, fragilidade e
precariedade nas dimensões do trabalho, sócio-familiar, da cidadania, das
representações culturais e da vida humana. Estas são questões que exigem um trabalho
com grande sensibilidade e compreensão pelas dificuldades dessas pessoas que
representam, no contexto atual, um elo fundamental na cadeia de reciclagem de lixo no
país.
De acordo com Singer (1998), a presença de um grupo de apoio é aceitável e
importante para o fortalecimento dos projetos de auto-gestão, desde que essas ações não
interfiram na autonomia dos associados. Para este autor os trabalhadores devem ter a
capacidade e o poder de decisão sobre tudo o que acontece na associação: metas de
produção, política de investimentos, modernização, política de pessoal, etc (Id).
A partir da pesquisa realizada foi possível identificar uma desmotivação dos
catadores-associados
27
de participar da gestão da ASCANOVI e garantir uma
autonomia. Os motivos dessa desmotivação podem ser listados da seguinte forma:
27
Os vinte três catadores-associados foram entrevistados no período de maio a junho de 2007, suas
identidades foram preservadas e suas falas transcritas na integra. Daqui por diante serão apresentados os
trechos mais representativos como excertos de 1 a 9.
79
ausência de renda fixa e com proteção trabalhista; baixa escolaridade o que para o
catador-associado não viabiliza outras modalidades de fonte de renda que não seja a
coleta de lixo; inserção precária na ASCANOVI que na grande parte das vezes é
acompanhada de um processo de autoritarismo de catador-associado para com o outro,
manifestando-se pela via da exploração nas atividades da coleta; incentivo do governo
local na coleta seletiva do lixo; resistência no que tange ao cumprimento de deveres;
essas são apenas algumas das dificuldades que alicerçam os entraves para auto-gestão.
Como a maior parte das cooperativas e associações de catadores, a ASCANOVI
é formada por pessoas sem qualificação, o que se reflete em que muitas vezes não
compreendam os princípios de associativismo e auto-gestão, e acabem buscando neste
espaço um trabalho como qualquer outro, se esquecendo que nestas organizações eles
são patrões de si mesmos. É válido destacar que o perfil da grande maioria dos
catadores-associados é marcado pela trajetória do alcoolismo, da moradia de rua e da
ausência de laços familiares, o que interfere no cotidiano da sua organização.
A pesquisa identificou que para 83% dos catadores-associados, a ASCANOVI se
apresenta como uma das últimas alternativas encontradas para manter ainda que de
forma precária a sua sobrevivência, o que mostra que o segmento dos catadores de lixo
não dispõe da qualificação necessária que lhe oportunize garantir melhores condições de
vida e de trabalho.
Excerto 1
“Eu tinha vontade de trabalhar de carteira assinada, mas infelizmente a
catação foi a única oportunidade que encontrei. Sei fazer muita coisa... é...
pedreiro, jardineiro, cozinheiro... tem muita coisa que sei fazer, mas tá muito
difícil consegui alguma coisa assim né? Então tive que ficá na catação até
se a gente consegue uma coisa melhor né?”.
A participação na associação é vista como uma falta de opção de empregos em
sua região. Apesar de afirmarem que sua situação melhorou, pois antes trabalhavam em
condições ainda mais precárias no lixão, ou não estavam exercendo nenhuma atividade
trabalhista, percebem sua permanência na cooperativa como temporária, até "arrumarem
alguma coisa melhor", de preferência numa empresa de carteira assinada.
Nesse universo, cabe considerar que apesar das dificuldades enfrentadas - no que
tange a rotatividade e a evasão freqüente da ASCANOVI - e até mesmo das
reclamações e da falta de motivação dos catadores-associados, ainda assim, eles
80
apontam que sua inserção nela vem contribuindo de forma lenta e gradual para um certo
respeito e reconhecimento da sociedade local, em relação as atividades desenvolvidas
por eles no município.
Excerto 2
“Fui pra ASCANOVI porque o presidente que tava me chamou pra gente
trabalhar pra nós mesmo, sem ganhar desaforo. Nas ruas a gente é muito
humilhado... é melhor ficar na ASCANOVI mesmo porque a gente passa
raiva também por conta da fofocaiada mas pelo menos os outro respeita mais
a gente na rua. Tem gente na rua que pergunta da ASCANOVI, como que
funciona, e até as loja confia na gente quando a gente tem que entrar pra
pegar material. A gente vai de uniforme direitinho e crachá também”.
Apesar deste reconhecimento os que desejam permanecer exercendo a atividade
da catação é reduzido, preferindo a maior parte procurar outro trabalho, isto justifica
também, a freqüente rotatividade e evasão na organização. Entretanto este outro
trabalho (jardineiro, ajudante de pedreiro, e outros), encontrado por alguns associados
que se desligam da organização continua na margem da informalidade, porque lhes falta
uma maior qualificação para assumirem o mercado formal de trabalho. Aqueles que
possuem uma melhor escolaridade em relação aos outros, quando conseguem alguma
oportunidade no mercado formal de trabalho (lojas, serviços gerais, construtora e
outros), também acabam abandonando a ASCANOVI.
Os catadores-associados que permanecem na ASCANOVI, são justamente
aqueles que têm maiores dificuldades de entender a auto-gestão, e geralmente,
desconhecem questões relacionadas ao estatuto, normas, a importância da sua
participação nesse processo, daí decorre a sua desmobilização e desorganização.
Desse modo, viver da coleta e da venda do lixo, acaba se constituindo num
instrumento de um grupo de pessoas excluídas socialmente, marcados pela ausência de
um emprego com proteção social e estabilidade.
Processar uma maior viabilidade em um modelo baseado na auto-gestão requer
que seus membros sejam autônomos, participativos e que saibam gerir seu próprio
negócio tomando decisões, bem como, a sabedoria de aprender a conviver em grupo e a
desenvolver a mesma atividade aonde existe vários sujeitos que compõem esse mesmo
espaço e, portanto, desempenha as mesmas funções e atribuições.
81
Tomar isso por premissa é construir um catador-associado pró-ativo, com visão
de futuro; com poder interventivo na organização, com funções relevantes que são
elementares para a auto-gestão oraganizacional.
Logo, se observa que essa realidade é muito distante do cotidiano que compõe a
estrutura da ASCANOVI, pois seria necessário que os catadores-associados fossem
portadores desses tipos de habilidades no seu perfil, o que não se apresenta nesta
organização. Problemáticas como o não reconhecimento por parte do catador-associado
de que a associação é um negócio seu, a desqualificação educacional, como outros
problemas serão destacados a seguir como entraves para a construção do referido perfil.
O quadro abaixo apresenta o perfil escolar dos catadores-associados. O que
retrata a baixa escolaridade da maior parte desses sujeitos e o que interfere na
organização da ASCANOVI, no que diz respeito a participação e organização dessa
instituição.
FIGURA 11: Distribuição quantitativa dos associados da ASCANOVI quanto
ao nível de escolaridade em 2007
Dentre os entrevistados 68% declaram não participar de todas as decisões da
ASCANOVI, destes 68% catadores-associados, 93% são analfabetos ou não concluíram
o ensino básico, refletindo-se nas dificuldades que se tem de participar.
Embora o catador-associado conheça os materiais comprados pelas empresas
recicladoras, ainda assim, este não dispõe de conhecimentos no que diz respeito ao
13
2
3
1
4
1º a 4º Série
Imcompleto
1º a 4º Série
Completo
5º a 8º Série
Imcompleto
Ensino Médio
Incompleto
Analfabeto
82
funcionamento de uma associação que envolve questões administrativas,
organizacionais e contábeis, dificultando desta forma todo o processo autogestionário.
Desta forma, a condução ainda que precária da gestão da ASCANOVI, acaba
ficando com aqueles que apresentam maiores conhecimentos sobre o assunto, o que
também é insuficiente para promover a auto-gestão. Nesse processo, vícios vinculados a
relação típica de empresa com cargo de chefia, acabam sendo incorporados pela maioria
que possui melhores esclarecimentos sobre o assunto.
Excerto 3
“Uma associação é como uma firma, sem a ajuda de outras pessoa que
entende de trabalho que nós não entende não é ... não tem como funcionar,
então é... nós não tem que preocupar com a administração... e também tem
os pessoal da diretoria, dos apoiador... é... igual a Doctum que cuida dessa
parte lá. Nós cuida de catar papel e um outro colega toma conta de tudo é...
dos outro trabalho. Pra falar a verdade a gente num precisava nem de ficar
em reunião, se tem uma pessoa que cuida de tudo pra nois então a gente tem
que confiá nela, é igual empresa num é?”
Os trabalhos realizados pelo grupo de apoio citados pelo catador, na verdade
trata-se de um acompanhamento e treinamento dos catadores que compõem os cargos de
Presidente, tesoureiro e secretário. Conforme Estatuto a Diretoria tem atribuições a
cumprir, portanto, o grupo de apoio durante a sistematização de ações internas na
ASCANOVI, destinou um tempo para acompanhar a nova diretoria em sua fase inicial.
Devido as diferentes limitações de cada um destes associados para compreender o
processo administrativo da ASCANOVI, acaba existindo um desinteresse por parte dos
mesmos em permanecer em tais cargos.
Os catadores-associados continuam agindo como empregados e nem sempre
percebem a diferença de uma associação de auto-gestão e de uma empresa privada com
sua dinâmica institucional (com o patrão e chefia). Isso aponta para uma problemática
que precisa ser enfrentada pela ASCANOVI, no que diz respeito ao seu processo de
organização hierárquica, o que passa pela definição de estabelecimento de normas e
regras necessárias ao seu funcionamento. Quando esta hierarquia restringe a
participação aos poucos catadores-associados em função do qual são reproduzidas
situações anteriores à associação (separação do pessoal da administração e da
produção), indo contra os princípios democráticos de uma associação de auto-gestão.
83
Uma outra questão que merece ser destacada é que a baixa escolaridade não
pode ser uma condição para a não participação dos catadores-associados nos processos
decisórios e organizacionais da instituição.
A educação deve ser percebida numa dimensão mais universalizante, como
resultado da prática social, através das interações do homem com o mundo. Brandão
(1997, p.32) afirma que “existe a educação sem haver escola e existe a aprendizagem
sem haver o ensino especializado e formal, como um tipo de prática social separada
das outras”.
Ainda segundo Brandão (ibid), o ensino-aprendizagem é um processo global que
abarca a totalidade da vida, situado, portanto, nas instituições, nos movimentos sociais e
nas relações informais. É também que se revela ou se oculta o jogo de interesses
antagônicos presentes nas relações de produção e na sociedade como um todo.
Dessa forma, associada ao processo de ensino-aprendizagem está a questão da
dimensão política do ato pedagógico
28
, que para Abreu (1996) aparece como
instrumento de mobilização, organização e unidade dos projetos da classe trabalhadora,
na luta para a transformação da estrutura social.
O referido processo apresenta-se como sendo todas as relações e ações que os
indivíduos estabelecem entre si e com a natureza. É, pois, construção coletiva, troca
grupal que ocorre nos sindicatos, nas associações, nos locais de trabalho, nas relações
familiares, no resgate dos valores da “cultura negada” e nos movimentos dos
trabalhadores de forma geral. Caracteriza-se, fundamentalmente, pela tomada de
consciência, por parte dos trabalhadores, na medida em que se percebem como sujeitos
engajados na construção de propostas viáveis historicamente e na elaboração do
conhecimento (Id).
Tendo em vista que a participação e a democratização do trabalho, não se
constituem em prioridades para os catadores-associados, constata-se que não
engajamento ao projeto ideológico-político da ASCANOVI, representado por seu
Estatuto, e nem mesmo vê-se a existência de um projeto coletivo no sentido essencial do
termo. Assim, o coletivo torna-se instrumento para atingir objetivos de natureza
28
O processo político pedagógico pode ser entendido nesta análise como aquele que, de um lado, faz
emergir nos indivíduos concretos a consciência da materialidade do seu existir e das relações
estabelecidas com esta materialidade, e, de outro lado, como aquele processo que, através de concepções
ideologizadas, tenta encobrir, ocultar ou mesmo deturpar a realidade (ABREU, 1996).
84
individual marcados por estratégias de sobrevivência ou de proveito que não podem se
dissociar de outros processos de ordem pessoal.
O fato de se insistir até aqui na discussão sobre a importância da participação, se
por entender que esta acaba desvendando outras problemáticas diferentes que
justificam a invibialidade da concretização de outros princípios que conduzem à auto-
gestão efetiva. No capítulo II vimos que o modelo de auto-gestão deve ser entendido
como aquele capaz de promover a igualdade de poder decisório que reitera a associação
de iguais e fundamenta-se na propriedade coletiva, que é garantida através do
estabelecimento prévio em assembléia geral.
A estrutura de uma associação autogestionária organizada em torno do princípio
democrático de participação em todas as esferas de decisão remete a um
empreendimento coletivo de trabalhadores e, como tal, deve produzir e ser conduzida
pelo conjunto de todos os associados. Este princípio garante que haja a priori uma
tomada de consciência do próprio significado existencial do catador-associado, ou seja,
quais são os seus verdadeiros anseios, desejos e sonhos.
Conforme estudos e análises dos depoimentos coletados junto aos catadores-
associados percebe-se que grande parte destes não se sentindo proprietário de um
negócio próprio têm certa dificuldade em participar efetivamente das questões que
envolvem os interesses coletivos da ASCANOVI. Tais trabalhadores vão às reuniões e
assembléias com o intuito de reivindicar somente seus interesses individuais, deixando
os demais assuntos coletivos para segundo plano, a cargo do presidente, tesoureiro ou
algum representante do grupo de apoiadores..
Excerto 4
“Eu falei...não participo de nada naquela associação, cumpro com o
meu trabalho, não quero nem saber de mais nada... o meu papel? É... catá
material nas rua né?”
Dentre os entrevistados que apresentam uma baixa participação na gestão da
ASCANOVI, foi possível identificar também aqueles que participam das assembléias,
mas abstêm-se de votar, catadores-associados que querem trabalhar, sem se envolver
em qualquer decisão.
Excerto 5
85
“Eu não sei pra que esse povo arruma tanta reunião, nós tamo ali é pra
trabalhá, tem muito catador ali que fica recramando disso também é...
assim... és tem que arrué material pra nós, isso tava bom, e também
trabalho e trabalho pra que reunião né? Quando eu trabalhava fora pros
outro, em outro serviço a gente não tinha esse negocio, patrão falava o
que que a gente tinha pra fazer, e só isso”.
O comentário deste catador-associado evidencia claramente a incompreensão da
proposta da ASCANOVI, tendo inclusive dificuldades de visualizar as diferenças e
compreender as responsabilidades cabíveis como membros de uma associação de auto-
gestão. Durante a participação do NAPE em algumas assembléias era comum
presenciar a saída de catadores-associados para o trabalho no meio da reunião, assim
como uma grande dispersão e distanciamento do grupo. Em decorrência, pode dizer-se
que não ocorre um grau mínimo de comprometimento que é exigido do trabalhador em
uma estrutura coletiva como a associação.
É perceptível a condição de alienação
29
dos associados da ASCANOVI
evidenciado pelas dificuldades que apresentam os associados na superação da
subalternidade; da posição de meros executores; da simples obediência; resistindo a
passagem à posição de gestores, responsáveis tanto pelo planejamento quanto pela
execução das atividades; no enfrentamento de diferenças de idéias para a busca da
construção de consensos; e decidir coletivamente, sem hierarquias, sem patrão. Porém,
desconstruir a antiga posição de trabalhador e construir a de partícipe de uma gestão
colegiada, não são tarefas fáceis, exige tempo, acesso à qualificação, exercício da
comunicação, da escuta, da troca, da confiança, do respeito e da solidariedade.
Segundo Gramsci (1978) é na coletividade cotidiana que está a aprendizagem
mais significativa dos trabalhadores, pois é nestes espaços que, aprendem e ensinam a
organização e a consciência de classe. A grande verdade é que as maiores lideranças
sindicais, por exemplo, não aprenderam a ser combativas nos bancos escolares, mas nos
movimentos organizados dos quais foram participando. Esta concepção é concebida por
Gramsci (1978, p.37) quando afirma que,
(...) a relação pedagógica não pode ser limitada às relações especificamente
“escolásticas” através das quais as novas gerações entram em contato com as
antigas e absorvem as suas experiências e os seus valores historicamente
necessários, “amadurecendo” e desenvolvendo uma personalidade própria,
histórica e culturalmente superior
.
29
Ver nota 5 na página 6 deste trabalho.
86
O referido autor enfatiza ainda que toda relação de hegemonia é necessariamente
uma relação pedagógica, que se verifica não apenas no interior de uma nação, senão
também em todo campo internacional e mundial, bem como no conjunto de civilizações
nacionais e continentais. Para Gramsci (ibid), propor a hegemonia da classe
trabalhadora não é algo que passe por um simples discurso fragmentado ou “senso
comum”, pois é uma luta contra outra força organizada: econômica, profissional,
política e cultural. Esta força organizada segundo o autor consiste na superação dos
discursos ideológicos construídos pelos burgueses nas bases da superestrutura (campos
ideológicos) de uma sociedade, formando-se uma nova cultura política que favoreça
uma mudança em diferentes setores da sociedade.
Para que os diferentes grupos de trabalhadores se constituam em uma classe
hegemônica, na condição de classe para si, é necessário que em sua consciência
manifeste a compreensão das estruturas e das contradições sóciopolíticos e econômicas
de uma sociedade concreta (GRAMSCI, ibid). Contudo, esta se torna uma tarefa difícil,
pois para o autor são inúmeros os trabalhadores que não percebem o conflito de classes
existentes nas relações de produção, portanto:
(...) não têm uma clara consciência teórica desta ação, que não obstante é um
conhecimento do mundo na medida em que o transforma. Pode ocorrer,
inclusive, que a sua consciência teórica esteja historicamente em contradição
com seu agir. É quase possível que ele tem duas consciências teóricas (ou
uma consciência contraditória): uma implícita na sua ação, e que realmente o
une a todos os seus colaboradores na transformação prática da sociedade; e
outra, superficialmente explícita ou verbal, que ele herdou do passado e
acolheu sem crítica. Todavia esta concepção “verbal” não é inconseqüente:
ela liga a um grupo social determinado, influi sobre a conduta moral, sobre a
direção da vontade, de uma maneira mais ou menos intensa, que pode,
inclusive, atingir um ponto no qual a contraditoriedade da consciência não
permita nenhuma escolha e produza um estado total de passividade moral e
política (GRAMSCI, 1978, p.20-21).
A dialética evidencia-nos a relação entre os indivíduos e o coletivo e o processo
que o grupo impõe sobre a intimidade dos indivíduos. Exige, assim, que se supere a
concepção dicotômica sobre o mundo, substituindo-a por uma visão da totalidade
histórica.
No contexto brasileiro de reestruturação produtiva encontram-se marginalizados
um sem número de desempregados que buscam a sobrevivência das mais variadas
87
formas, como um lúpen-proletariado
30
moderno que expressa enormes dificuldades de
se associar às novas possibilidades de projetos coletivos de trabalho, permanecendo na
condição de excluídos.
No cenário da ASCANOVI a questão da conscientização deve ser levada para o
terreno da luta concreta dos catadores-associados, pois nenhuma ação dos associados
tem por protagonista um associado isolado. O protagonista da ação é um grupo, um
coletivo, mesmo se a estrutura da sociedade em que vivemos tende a encobrir essa
realidade e transformá-la em uma soma de individualidades distintas e sem relações. Na
ASCANOVI esse individualismo torna-se perceptível nas falas dos próprios catadores-
associados:
Excerto 6
“(...) os catador tinha que ser mais organizado e unido. Eles olha pro seu
umbigo e não escuta quando a gente fala que precisa melhorar alguma coisa,
acha que a gente querendo mandar neles... assim fica muito difícil, sem
falar nas fofoca que eles cria lá dentro”.
Dando continuidade à análise sobre o cumprimento da ASCAVOVI dos eixos da
auto-gestão, aponta-se aqui como um outro entrave, a falta de autonomia da associação,
no que se refere a posse de equipamentos básicos de triagem do material reciclável
segregado. A ASCANOVI mantém contrato informal (tácito) de venda dos materiais
recicláveis com um atravessador local, que por sua vez disponibiliza maquinários
31
(prensa e balança). A dependência desses maquinários faz com que os catadores
submetam-se às determinações deste atravessador, no que tange ao tipo de material
coletado e preço pago, situação que lhes tira autonomia.
A ASCANOVI não tendo condições de escolher os compradores dos seus
produtos para ter autonomia, limita suas negociações dos materiais segregados apenas
na empresa atravessadora com quem mantém vínculo comercial. Segundo Juncá (2004,
p. 78):
30
Numa abordagem bastante ácida Marx relaciona diferentes categorias de “fortuna duvidosa e de origem
duvidosa, lado a lado com arruinados e aventureiros... havia vagabundos, soldados desligados do exercito,
presidiários libertos, forçados foragidos das galés... trapeiros, amoladores de faca, soldadores, mendigos –
em suma, toda essa massa indefinida e desintegrada...” estes setores marginalizados da classe
trabalhadora e com baixa qualificação profissional eram os lúpen-proletariados (MARX, 2002, p. 79).
31
Segundo os coordenadores do Projeto Rede Solidária Central Leste, os maquinários serão comprados
para as 11 associações a partir do próximo ano. No momento, as diferentes equipes técnicas estarão
passando por uma capacitação.
88
(...) ao disporem dos meios de produção necessários à realização do
comércio do lixo, bem como de um capital de giro para agilizarem as
transações comerciais cotidianas com os catadores, os sucateiros retêm parte
dos lucros desta cadeia produtiva e mantêm o controle de uma relação onde
a liberdade é só aparente
.
Por mais que os catadores-associados acreditem que a sua remuneração
corresponde ao volume de material coletado, na verdade o atravessador comprador
dispõe do fruto do seu trabalho, por um baixo valor, quando agrega valores ínfimos
àqueles materiais que despertam grandes interesses no mercado.
Nas reuniões da Rede Solidária são apresentados os preços inferiores pagos
pelos atravessadores às associações quando comparados ao de mercado. O lucro do
atravessador poderia ser destinado aos associados proporcionando o aumento de sua
renda.
Vale ressaltar que com a inserção da ASCANOVI na Rede Solidária, a figura do
atravessador em breve será descartada do processo de compra e venda de materiais
recicláveis, pois a equipe da referida Rede está articulando a venda destes materiais
diretamente com as indústrias, bem como a compra de equipamentos próprios para as
associações filiadas. Conforme apresentado neste trabalho, o projeto de captação de
recursos encaminhado pela Rede a Petrobrás foi aprovado com a previsão de um recurso
de Um Milhão de reais, que tem por objetivo equipar as associações e comprar o
caminhão que encaminhará os materiais das associações para as indústrias que
oferecerem o melhor preço.
Destaca-se que por decisão em Assembléia, o ganho do catador-associado é por
produção. Desta forma, a renda do catador-associado está submetida à quantidade de
materiais recicláveis que cada um consegue segregar e acumular diariamente. Esta
situação se agrava quando se analisa a trajetória do catador-associado em busca do seu
“vale sobrevivência” que para a maior parte da população é caracterizado como lixo. O
referido agravamento ocorre quando se depara com as limitações que são postas aos
catadores-associados e estes têm que disputar com outros catadores, não associados, de
forma violenta (agressões físicas) o que conseguem encontrar pelas ruas.
Tal problemática segundo depoimentos dos próprios catadores-associados está
condicionada por dois fatores principais que são: negligência do governo local na
implementação da coleta seletiva e monopolização por parte de um catador-associado
de alguns pontos comerciais que mais geram materiais recicláveis.
89
Dentre os entrevistados, 83% declaram que a ação mais importante que o
governo municipal deveria estar promovendo em benefício da ASCANOVI, seria a
coleta seletiva.
Excerto 7
“Falta organizar a coleta seletiva, porque se tivesse a coleta seletiva podia
até gerar mais emprego dentro da ASCANOVI. Mais eu num entendo
porque até hoje a prefeitura não fez isso, eles fica falando que com a
gente, que ajudando, mais a ajuda de verdade que tinha que acontecer era
primeiro essa, porque não adianta nada ficá indo migalha pra nós e
depois ir pras rádio falá que tá apoiando nóis”.
Segundo relatos dos catadores-associados mais antigos na ASCANOVI, a
associação tem se tornado um “curral eleitoral”, sendo funcional à propaganda dos
partidos políticos. Assim, a relação com a instituição torna-se extremamente clientelista,
não existindo ações efetivas que colaborem com o processo organizacional da mesma.
O fato dos Catadores exercerem as suas atividades na zona urbana da cidade de
Teófilo Otoni contribui para manutenção da apatia e comodismo do Poder Público
Municipal em implantar a Coleta Seletiva, concomitante ao investimento necessário à
sustentabilidade da ASCANOVI. É notório que as atividades desenvolvidas pelos
catadores-associados mantêm a cidade aparentemente limpa, sem necessidade de a
prefeitura investir diretamente em funcionários concursados e/ou terceirizados para
atuar na manutenção da limpeza urbana local.
Quando a representante da Secretaria do Meio Ambiente de Teófilo Otoni é
interrogada sobre a implementação da coleta seletiva dos resíduos sólidos urbanos no
referido município, esta apresenta dificuldades de efetivar tal coleta, mas demonstra
interesse em realizá-la. De acordo com o representante da Secretaria Municipal do Meio
Ambiente:
Excerto 8
“O governo municipal tem encontrado certa dificuldade, inclusive eu me
coloquei a disposição, aceitei um cargo que a prefeitura municipal me
ofereceu, sobretudo para fazer uma ligação entre ASCANOVI e prefeitura.
Como s não temos assim o hábito... nós nunca tivemos a ASCANOVI, os
catadores de papel unidos em uma associação, a gente encontra realmente
alguma dificuldade de caminhar. A gente quer saber o que é necessário por
parte da prefeitura para fazer. Então isso nós temos feito e existem já
algumas ações por parte da prefeitura que nós estamos desenvolvendo em
90
prol da própria associação. Como por exemplo, por parte da prefeitura nós
temos feito alguns mutirões nos bairros para ajudar a associação, temos
alguns bairros como o bairro Filadélfia que já existe a mini coleta seletiva e
além do apoio de manutenção por parte da prefeitura, o apoio e manutenção
em relação à limpeza do local, está sendo feito como eu já disse o
levantamento para ver o que a prefeitura pode fazer e acompanhar na rede
física da ASCANOVI. E o que é mais importante que nós pretendemos junto
com a ASCANOVI e a comunidade implantar definitivamente uma coleta
seletiva no município de Teófilo Otoni, porque sabemos que não é tão fácil,
mas nós não podemos fugir mais dessa coleta seletiva. Eu costumo dizer até
que a coleta seletiva é a impressão digital de uma sociedade. Uma cidade
como Teófilo Otoni de porte médio era pra ter começado ou então está
no momento de se fazer um trabalho de conscientização com o povo dessa
cidade, para começar por ai a defender o meio ambiente, defender o catador,
ajudar o catador, a preservar a natureza iniciando um trabalho de coleta
seletiva. Nós podemos ver que os lixões estão cada vez mais crescendo e
isso não é em Teófilo Otoni, é no mundo inteiro. Quanto dinheiro é
jogado nos lixões, quanto material reciclável poderia ser transformado em
dinheiro para que este dinheiro se transformasse em alimento na mesa do
catador, em remédio, educação. Então a prefeitura está tentando descobrir
como ajudar. Nós temos então que buscar novas parcerias através de
articulação com o poder público e universidades e outras organizações não
governamentais para que a gente possa realmente montar em Teófilo Otoni
uma coleta seletiva definitiva”.
A não implementação da coleta seletiva é considerada também pelo grupo de
apoio como um dos principais entraves no processo de auto-gestão da ASCANOVI e
permanência dos catadores-associados na mesma. Isto pode ser verificado a partir do
depoimento de um apoiador apresentado a seguir:
Excerto 9
“Eu acredito no processo de auto-gestão da ASCANOVI, mas ela não
aconteceu como o grupo de apoio pensou inicialmente, que seria um
processo mais acelerado, e penso que não ocorreu porque a gente não tem
uma permanência dessas pessoas para dar continuidade, mas a partir do
momento que a ASCANOVI consiga viabilizar a permanência de seus
membros, ou seja, que a cidade também começa a assumir a questão da
coleta seletiva que é uma forma de um suporte a eles, porque a questão
financeira mesmo, porque ali dentro muitos acabam sendo prejudicados em
alguns momentos por causa da normatização em torno da coleta e o
tratamento desse material, e pra muitos que ficam ali soltos, catando no
lixão, esta é uma forma que a ASCANOVI já tem um posicionamento
definido em relação a salubridade, a saúde, então é mais interessante do que
está na associação seguindo uma série de normas. Mas a partir do momento
que a cidade se propõe a realizar a coleta seletiva, que o volume de material
conseqüentemente aumentar a renda, a permanência dos catadores se torna
uma realidade e com a permanência é possível se ter um bom trabalho e
conseqüentemente uma auto-gestão”.
Para um outro apoiador entrevistado a coleta seletiva também se constitui em um
fator fundamental para o processo de organização autogestivo da ASCANOVI:
91
Excerto 10
“O que pode assegurar a permanência do catador na associação é preciso que
ele perceba que é viável para a sustentação da família dele, e enquanto a
cidade não tiver uma política de coleta seletiva e de apoio à ASCANOVI e
outras associações que possam está vinculadas a essa coleta seletiva, eu acho
muito difícil, então a gente tem que conseguir algumas conquistas, para
depois chegar nesse ponto de dar condições do catador permanecer e está
realmente preparado e habilitado para gerenciar seu próprio negócio”.
O outro fator relatado por grande parte dos catadores-associados que dificulta a
garantia de uma maior arrecadação de materiais recicláveis que concomitantemente
limita uma elevação na renda deste trabalhador diz respeito à monopolização dos
principais pontos comerciais geradores de materiais recicláveis.
Em pesquisa desenvolvida pela equipe do NAPE, a partir de visitas realizadas
em 30 estabelecimentos que doam materiais recicláveis para associados da
ASCANOVI, foram identificados 18 pontos exclusivos de apenas um associado. Não
sendo possível circular por todos estes pontos diariamente, além de ter que separar todo
o material, este mesmo catador-associado recruta dentro da própria associação àqueles
trabalhadores associados que têm baixa produção, devido a dificuldade de garantir
material diariamente e paga valores irrisórios aos mesmos.
Excerto 11
“Tinha que pagar alguém pra cuidar da administração lá. Porque, por
exemplo, tiro 130 reais na quinzena porque não tenho ponto. Tem um
atravessador dentro que finge ser associado que tem os ponto quase tudo
da cidade e paga com cigarro e outras coisa pros outros catador buscar pra
ele e separar os material, depois ele paga eles. Eu não trabalho pra ele
porque senão vou contra o regimento da ASCANOVI. Ele explora os
catador”.
Uma das condições da permanecia das associações na Rede Solidária é a não
exploração interna de catadores, por isso tal situação foi apresentada pelos apoiadores
representantes da Rede aos catadores-associados, entretanto houve uma conivência de
grande parte dos associados a esta situação. Os poucos que se manifestaram dizendo ser
contra alegam sofrer perseguições e inclusive ameaças por parte destes exploradores até
mesmo dos que estão sendo explorados, mas que acham um bom negócio o acordo
interno firmado com alguns catadores.
92
Desconhecendo a organização da instituição em sua totalidade, no que tange aos
princípios do associativismo, o catador-associado fica submetido àqueles que se sentem
donos dos “outros” e utilizam o seu conhecimento para explorar os demais catadores,
ferindo os objetivos propostos no Estatuto da associação. Tal situação exploratória pode
ser comparada ao domínio de chefes de tráfico de drogas em comunidades pobres, onde
os mesmos cumprem indiretamente o papel do Estado ofertando alguns benefícios de
cunho social em troca da legitimação do seu poder e cumplicidade de suas ações ilícitas.
Constata-se que não há mais, para este indivíduo explorado um projeto coletivo,
lhe restando as chances de trabalho e inserção social, neste caso a ASCANOVI, que
se resume em seu lugar de trabalho e possibilidade de sobrevivência, sem muito
envolvimento com outras questões da instituição, se submetendo então aquilo que for
conveniente para cada um.
93
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Chegar ao final desta pesquisa não foi tarefa fácil, pelo contrário, este foi um
processo desafiador devido os muitos questionamentos levantados na fase inicial da
construção deste trabalho. Para não perder de vista o objeto de estudo em questão, ao
longo desta pesquisa manteve-se o seguinte questionamento: em que medida é possível
construir uma verdadeira organização de produção e auto-gestão do trabalho quando
está inserida no mercado capitalista?
A partir das experiências vivenciadas pelos catadores de materiais recicláveis da
ASCANOVI, é possível compreender os impactos das transformações ocorridas no
mundo do trabalho, na organização interna da associação, marcada pela emergência de
formas “autônomas” do trabalho.
Os associados da ASCANOVI inseridos em uma organização associativista
continuam vivenciando o processo de exploração do trabalho encobertado pelo discurso
de trabalho autônomo. No caso da referida organização a situação de exploração se
torna ainda mais grave quando se verifica este processo entre os próprios catadores-
associados e entre catadores e atravessadores, devido a inexistência de equipamentos
básicos (balança, prensa), no processo de produção da associação. Tal realidade torna os
catadores-associados dependentes dos atravessadores que negociam esses equipamentos
em troca da exclusividade na venda de materiais recicláveis segregados, que resulta na
falta de autonomia da associação nas decisões sobre o tipo de material coletado e preço
pago.
94
Percebe-se nos depoimentos dos associados da ASCANOVI que a discussão
sobre mudanças na direção de uma sociedade solidária nos marcos da sociedade
capitalista, pressupõe uma cultura associativa formada pela falta de opção dos
trabalhadores e não uma escolha efetiva pela autonomia e solidariedade. A
contraposição entre alternativa à espoliação do trabalho versus opção pela autonomia
solidária ganha ainda mais destaque ao considerarmos a funcionalidade da organização
de cooperativas em uma conjuntura de flexibilidade e crescente fragilidade dos direitos
sociais.
O catador-associado conduzido à condição de “desfiliação” busca alternativas de
sobrevivência próprias, pois já não tem mais alternativas positivas capazes de fazer
frente às suas próprias necessidades básicas. Percebe-se que este trabalhador mesmo
inserido em um projeto associativista terá maiores dificuldades de se constituir como
sujeito coletivo, pois perdeu substancialmente a referência de sua cidadania.
O retorno financeiro obtido pela maior parte dos associados da ASCANOVI,
dificilmente torna-se suficiente para suprir suas necessidades básicas de subsistência.
Desta forma, estes catadores-associados não visualizam alguma vantagem em fazer
parte desta organização, na verdade a sua permanência vai ocorrendo sem muito
comprometimento com a coletividade, onde cada um vai encontrando suas estratégias
próprias de sobrevivência, uns explorando, outros sendo explorados, até que surja uma
oportunidade melhor. Este contexto inviabiliza a construção de trabalho participativo e
coletivo.
Segundo depoimentos dos catadores-associados, bem como dos representantes
do grupo de apoio, verifica-se a necessidade de participação mais efetiva do governo
municipal de Teófilo Otoni na ASCANOVI, especificamente para a implantação da
coleta seletiva que viabiliza o aumento do volume de materiais recicláveis na
organização, que resultará no aumento da renda dos catadores-associados. Foi destacada
pelos catadores a necessidade de contratação pela prefeitura, de um funcionário para
cuidar das questões administrativas da ASCANOVI, até o momento em que esta possa
arcar com tais despesas. Conforme apresentado neste trabalho, esta contratação é
permissível no processo de auto-gestão, desde que não comprometa a autonomia dos
catadores-associados.
A cadeia produtiva da reciclagem nos traz a configuração de um sistema de
trabalho coletivo organizado a partir de uma ideologia de cooperação e associação para
o trabalho, mas que ao final se submete a um sistema originalmente capitalista que
95
absorve os resultados deste tipo de prática porque o resultado da catação, isto é, a
matéria prima para a reciclagem é oriunda da geração de produtos industrializados que
retornam ao mercado de consumo, uma vez reciclados, logo, constata-se a
funcionalidade ao capital. Por outro lado, o catador-associado tem a impressão que está
realizando um trabalho autônomo que o conduzirá à emancipação social.
No entanto, devido a que à ASCANOVI não possui o maquinário necessário
para o processamento dos produtos destinados à reciclagem os obriga a caírem nas mãos
dos atravessadores da cidade, portanto a riqueza do material reciclável é apropriada pelo
capital, ou seja, os atravessadores, sem que os catadores-associados percebam que o seu
trabalho produziu um valor de troca do qual ele possa se apropriar, configurando deste
modo a sua alienação.
A expressiva quantidade de interrogações e críticas que o assunto estabelece, não
deve desanimar o leitor e o formulador de políticas públicas. Ao contrário, torna-se
urgente começar a buscar, de imediato e com maior profundidade, as respectivas
respostas. Parece-nos que, tais questões, espelham a importância desses
empreendimentos no cenário econômico, político e social do Brasil contemporâneo.
Acreditamos que daí decorrerão elementos que poderão ajudar a construir um efetivo e
eficaz engajamento do Estado, mesmo sem criar maiores expectativas, de que possam
constituir um núcleo germinador de transformações estruturais.
Destaca-se que a luta não se esgota no imediato, em uma localidade, em uma
organização, mas faz parte de uma perspectiva de classe maior, que passa pela negação
da estrutura capitalista e pela estruturação de um poder daqueles que nessa estrutura são
espoliados. É notório que, não seja possível uma organização completamente diferente
no capitalismo, mas é possível diferenciar a organização mesmo no capitalismo.
Cabe aos catadores-associados se organizarem para constituírem grupos de
resistência, compostos de trabalhadores conscientes, bem como aos movimentos sociais,
como o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis MNCR, a tarefa
de propor mudanças no modelo organizacional vigente, a partir de uma pressão maior
sobre o poder público, no processo de fiscalização, a começar no âmbito local.
Conforme depoimentos apresentados pelos catadores da ASCANOVI um dos principais
entraves vivenciados pelos mesmos no processo de consolidação da organização trata-se
da não implementação da coleta seletiva no município.
Contrapondo este cenário adverso, todos os envolvidos na luta e organização dos
catadores-associados vêem a criação da Rede Solidária Central Leste como “porta-de-
96
saída” para o enfrentamento dos problemas inerentes aos atravessadores e demais
exploradores dentro da própria organização, que a junção das Associações Regionais
possibilita a criação de mecanismos justos na comercialização e organização da infra-
estrutura evitando as lacunas atualmente ocupadas por empresários exploradores de
catadores, uma vez que tais fatos se reproduzem em outras regiões do Estado e do país.
A efetivação desta rede se apresenta como um novo objeto de estudo de uma nova
pesquisa que apresente os impactos causados no âmbito organizacional das associações
parceiras da mesma.
Fazendo uma leitura realista da situação vivenciada pela ASCANOVI, somos
conduzidos pelos fatos ora comprovados a acreditar que apesar dos avanços e
retrocessos ocorridos nestes últimos sete anos de funcionamento da Associação, os
desafios são mutáveis conforme alterações sociopolíticas e econômicas. Porém,
constata-se que a hipótese desta pesquisa foi comprovada, pois não foi possível
identificar o cumprimento dos princípios da auto-gestão: participação, democracia e
autonomia.
Portanto, isso nos leva às seguintes deduções: é preciso trabalho de
conscientização política e trabalhos pedagógicos sistemáticos dentro da ASCANOVI.
Este deve ser assumido pelo poder público e pelo grupo de apoio. Além disso, o
governo local deve sensibilizar a sociedade de que a reciclagem é uma demanda social e
assumir a coleta seletiva. Somente isto pode enfrentar o estigma que está em torno da
catação, pois a auto-gestão está intrinsecamente ligada à coleta seletiva.
Esta pesquisa constitui-se numa contribuição para reflexão sobre o tema de
como deverão organizar os catadores de materiais recicláveis em relação à sociedade
civil e poder público para conduzir o processo de coleta seletiva considerando aspectos
relevantes sendo tais: Como a comunidade e se comporta em relação aos catadores e
o nível de disposição para doar o “lixo” com potencial para reciclar? Como as pessoas
irão doar o lixo? Em que nível se dará a transferência desse novo capital chamado lixo?
A economia solidária deve pensar em mecanismos para que os novos recursos sejam
distribuídos como bens coletivos e não como bens de exploração.
97
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104
ANEXOS
105
ANEXO 1: Questionário semi-estruturado aplicado aos associados da ASCANOVI
I – IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO:
1 – Nome: _____________________________________________________________
2 – Sexo:
2.1 ( ) Feminino 2.2 ( ) Masculino
3 – Idade: ___________ (em anos completos) 3.1 Data Nasc: _________________
4 – Nível de escolaridade:
4.1 ( ) analfabeto
4.2 ( ) ensino fundamental 1ª a 4ª série – incompleto
4.3 ( ) ensino fundamental 1ª a 4ª série - completo
4.4 ( ) ensino fundamental 5ª a 8ª série – incompleto
4.5 ( ) ensino fundamental 5ª a 8ª série – completo
4.6 ( ) ensino médio incompleto
4.7 ( ) ensino médio completo
4.8 ( ) 3º grau incompleto Curso: _______________________________________
4.9 ( ) 3º grau completo Curso: ________________________________________
Outro: ______________________________________________________________
5 – Você é natural de Teófilo Otoni?
5.1 ( ) sim 5.2 ( ) não
6 – Qual a sua cidade de origem? (se a resposta acima for negativa) ________________
7 – A quanto tempo você está em Teófilo Otoni? _______________________________
8 – Pretende continuar morando em Teófilo Otoni? _____________________________
8.1 ( ) sim 8.2 ( ) não por que? ___________________________
___________________________________________________________________
106
II CONDUÇÃO DE TRABALHO E FORMA DE EXPLORAÇÃO DA
ATIVIDADE:
9 – Há quanto tempo você trabalha com materiais recicláveis?
9.1 ( ) menos de 1 ano
9.2 ( ) entre 1 e 2 anos
9.3 ( ) entre 2 e 3 anos
9.4 ( ) entre 3 e 5 anos
9.5 ( ) entre 5 e 10 anos
9.6 ( ) mais de 10 anos
10 - Por que você se associou a ASCANOVI?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
11 – Quanto tempo você é associado da ASCANOVI? __________________________
12 – Além de você tem outro membro da família que trabalha com a catação de
materiais recicláveis?
12.1 ( ) nenhuma
12.2 ( ) 1
12.3 ( ) 2
12.4 ( ) 3
12.5 ( ) outros: _____________________________________________________
13 – Com qual freqüência você trabalha na catação?
13.1 ( ) diariamente
13.2 ( ) uma vez por semana
13.3 ( ) duas vezes por semana
13.4 ( ) três vezes por semana
13.5 ( ) esporadicamente
107
14 – Renda estimada/mês com a venda de materiais recicláveis:
14.1 ( ) menos de um salário mínimo
14.2 ( ) um salário mínimo
14.3 ( ) entre um e dois salários mínimos
14.4 ( ) dois salários mínimos
14.5 ( ) mais de dois salários mínimos
15 – Você dispõe de outra(as) fonte(s) de renda além da venda de materiais recicláveis?
15.1 ( ) sim 15.2 ( ) não
16 – Caso a resposta do item 23 seja verdadeira, quais são as fontes?
16.1 ( ) Biscates
16.2 ( ) Aposentadoria
16.3 ( ) Pensão
16.4 ( ) Benefícios do Governo Federal
16.5 ( ) Instituições Filantrópicas
17 – Qual o local onde você realiza a catação de lixo?
17.1 ( ) somente no centro
17.2 ( ) somente nos bairros
17.3 ( ) em toda a cidade
17.4 ( ) somente na associação
18 - Qual é o seu grau de satisfação no trabalho?
18.1 ( ) pequeno 18.2 ( ) médio 18.3 ( ) grande
19 – De que forma o seu trabalho poderia ser melhorado? (Caso o grau de satisfação
seja pequeno ou médio)
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
20 – Gostaria de exercer outra atividade? Se sim qual?
20.1 ( ) sim qual? _______________________________ 20.2 ( ) não
108
21 – Qual a sua opinião sobre a ASCANOVI?
______________________________________________________________________
________________________________________________________
22 - Onde são comercializados os produtos da ASCANOVI?
22.1 ( ) Atravessadores
22.2 ( ) Industrias
22.3 ( ) Não Sabe
23 - Quais as limitações que impedem a venda direta às fábricas que reciclam?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
24 - Que papel você cumpre dentro da ASCANOVI?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
25 - Você participa de todas as decisões dentro da ASCANOVI?
25.1 ( ) sim 25.2 ( ) não
26 - Como é o processo de tomada de decisões dentro da ASCANOVI?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
27 – A ASCANOVI promove reuniões periódicas com seus associados?
27.1 ( ) sim 27.2 ( ) não
28 – No caso afirmativo, qual a periodicidade?
28.1 ( ) semanal
28.2 ( ) quinzena
28.3 ( ) mensal
28.4 ( ) esporadicamente
28.5 ( ) anualmente
109
28.6 ( ) não promove
29 – Quem convoca os associados para as reuniões? ____________________________
______________________________________________________________________
30 – Existe uma confiança dentro da ASCANOVI em relação aos associados?
30.1 ( ) nenhuma confiança
30.2 ( ) regular confiança
30.3 ( ) boa confiança
30.4 ( ) ótima confiança
31 – Como você analisa hoje, a presença do grupo de apoio dentro da ASCANOVI? Por
que?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
32- Existe alguma ação importante que o governo deveria está promovendo, em
benefício à ASCANOVI, entretanto não está sendo efetivada? Qual (is)?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
33- Em sua opinião a ASCANOVI tem condições de funcionar de forma autônoma? Por
que?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
34 - Quem você considera como liderança dentro da ASCANOVI? Por que?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
35 – Em seu entender como poderia ser melhorado o processo de auto-gestão da
ASCANOVI?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
110
36- O que é associativismo para você?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
111
ANEXO 2: Roteiro para entrevista do representante da Secretaria Municipal de Meio
Ambiente de Teófilo Otoni
1- O Sr. conhece o processo de funcionamento da ASCANOVI?
2- Qual a importância da ASCANOVI hoje, para o município de Teófilo Otoni?
3- Quais ações são desenvolvidas hoje, por parte do governo municipal, direcionadas a
ASCANOVI?
4- Existe alguma ação importante que o governo deveria está promovendo, em
benefício à ASCANOVI, entretanto não está sendo efetivada? Em caso afirmativo,
quais os principais entraves?
5- Existe alguma demanda apresentada a prefeitura pelos associados? Qual (is)?
6- O Sr. é a favor da auto-gestão da ASCANOVI? Por que?
7- Acredita na possibilidade desta auto-gestão ?
112
ANEXO 3: Roteiro para entrevista de membros do grupo de apoio da ASCANOVI
1 - Qual é o papel do grupo de apoio junto a ASCANOVI?
2 - Você enquanto apoiador acredita na auto-gestão da ASCANOVI?
2.1 ( ) sim 2.2 ( ) não Por que?
3 Quais são os entraves internos e externos que você visualiza que atuam como
barreiras para uma boa gestão da ASCANOVI?
4 – Quais seriam as ações necessárias para viabilizar uma gestão eficiente e auto
consolidação da ASCANOVI?
5 – O que você entende por associativismo?
113
ANEXO 4: Estatuto da ASCANOVI
Capítulo I
DA DENOMINAÇÃO, SEDE, E FINS
Art. - A Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida, também
designada pela sigla ASCANOVI, fundada em 23 de Novembro de 2002, é uma
entidade civil sem fins lucrativos, que terá duração por tempo indeterminado, com sede
e foro no município de Teófilo Otoni-MG
Art. 2º - A ASCANOVI, tem por finalidades:
I Apoiar e defender os interesses dos catadores (as) de papel, papelão e materiais
reaproveitáveis, favorecendo a união e organização dos mesmos;
II - Proteção à saúde da família, da maternidade, da infância e da velhice;
III combate à fome e à pobreza através de campanhas de distribuição de alimentos e
agasalhos;
IV Integração de seus beneficiários no mercado de trabalho através da promoção de
cursos profissionalizantes ligado à todas as atividades e prestação de serviços à
comunidade;
V Proteção ao meio ambiente através da integração com entidades afins que atuem na
promoção de campanhas educativas e projetos de recuperação ambiental;
VI Elaborar projetos e firmar convênios com órgãos e entidades financiadoras para
atendimentos às necessidades da comunidade;
VII Promover e implementar ações de desenvolvimento sócio-econômico e cultural
dos associados através de grupos de produção, grupos de jovens, clubes de mães,
creches, pré-escolas e difusão de tecnologias e bem estar social;
I X – divulgação da cultura e do esporte;
X Desempenhar atividades de implementação e gerenciamento de infra-estruturas
comunitárias de saúde, saneamento básico, habilitação, comunicação e educação.
XI Trabalhar pelo desenvolvimento da comunidade através da integração com
entidades afins que visem a melhoria do bem estar social de todos os associados;
XII Manter serviços de assessoria jurídica, visando a defesa e os interesses e direitos
de seus associados;
XIII Lutar para que seus associados possam trabalhar com segurança e protegidos da
ação de atravessadores intermediários e outros tipos de exploradores;
XIV Lutar para que os catadores sejam respeitados na sua atividade e para que a
mesma seja legalmente reconhecida.
Art. 3º - No desenvolvimento das suas atividades, a entidade não fará qualquer
discriminação de raça, cor, sexo ou religião.
Art. - A Entidade poderá ter um regime interno, que aprovado pela assembléia geral,
disciplinará o seu funcionamento.
114
Art. 5º - A fim de cumprir suas finalidades a entidade se organizará em tantas unidades
de prestações de serviços, quanto se fizerem necessárias, as quais se regerão pelo
Regimento Interno.
Capítulo II
DOS ASSOCIADOS
Art. - A ASCANOVI, é constituída por número ilimitado de associados, que catam
papel, papelão e/ou materiais reaproveitáveis, necessários à sua sobrevivência, que
serão admitidos, a juízo da diretoria, dentre pessoas idôneas, maiores de idade, em pleno
gozo de seus direitos civis, e que manifestem interesse em contribuir para a execução
dos objetivos da instituição.
$ - A demissão dar-se-á a pedido do associado, mediante carta dirigida á Diretoria da
instituição, não podendo ser negada;
$ 2º - A exclusão será aplicada pela Diretoria com o aval da Assembléia Geral e
ocorrerá por morte física ou por infringir qualquer disposição legal ou estatutária, 30
(trinta) dias o associado ter sido notificado por escrito;
$ 3º - O associado poderá recorrer à Assembléia Geral dentro do prazo de 10 (dez) dias,
contados na data de recebimento da notificação.
$ 4º - O recurso terá efeito suspensivo até a realização da primeira Assembléia Geral.
$ 5º- A eliminação considerar-se-á definitiva se o associado não recorrer da penalidade,
no prazo previsto $ 3º deste artigo.
$ 6 - Perderá automaticamente o direito de pertencer aos quadros da ASCANOVI, o
associado que deixar de praticar suas atividades de catadores de papel, papelão e/ou
materiais reaproveitáveis.
Art. 7º - Haverá as seguintes categorias de associados:
1.Fundadores : São aqueles que participaram da assembléia de constituição da
entidade e assinaram a respectiva ata.
2. Contribuintes: São os que contribuem com uma importância mensal no valor e na
modalidade estabelecida pela diretoria.
3.Beneméritos: São aqueles que prestam à entidade relevantes serviços sendo os
mesmos indicados espontaneamente pela assembléia geral ou pela diretoria, não tendo
direito a voto e nem podendo ser votados;
4. Honorários : São aqueles que prestam serviços de notariedade e assim se fizeram
credores dessa homenagem apontados por proposta da diretoria a Assembléia Geral,
não tendo direito a voto e não podendo ser votados.
Art. 8º - São direitos dos associados quites com suas obrigações sociais:
I – votar e ser votado para os cargos eletivos;
II – tomar parte nas Assembléias Gerais;
Art. 9 º - São deveres dos associados:
I – cumprir as disposições estatutárias e regimentais
II – acatar as determinações da diretoria.
Art. 10º - Os associados não respondem nem mesmo subsidiariamente pelas
obrigações e encargos sociais da entidade.
115
Capítulo III
DA ADMINISTRAÇÃO
Art. 11º - A ASCANOVI , será administrada por:
I – Assembléia Geral;
II – Diretoria; e
III – Conselho Fiscal.
Art. 12º - A Assembléia Geral, órgão soberano da instituição, constituirse-á dos
associados em pleno gozo de seus direitos estatutários.
Art. 13º - Compete à Assembléia Geral
I – eleger a Diretoria e o Conselho Fiscal;
II – decidir sobre reformas de estatuto;
III – decidir sobre a extinção da entidade nos termos do Art. 33º;
IV – decidir sobre a conveniência de alienar, transigir, hipotecar ou permutar bens
patrimoniais;
V – aprovar o Regimento Interno;
VI – destituir os administradores;
VII – apreciar recursos contra decisão da diretoria;
VIII – conceder o título de associados benemérito e honorário por proposta da diretoria;
IX – aprovar as contas.
Art. 14º - A Assembléia Geral realizar-se-á ordinariamente uma vez por ano para:
I – apreciar o relatório anual da Diretoria;
II – discutir e homologar as constas e o balanço aprovados pelo Conselho Fiscal;
Art. 15º - A assembléia Geral realizar-se-á, extraordinariamente quando convocada:
I – pela presidente da Diretoria;
II – pelo Conselho Fiscal;
III – por requerimento de 1/5 dos associados quites com as obrigações sociais.
Art. 16º - A convocação da Assembléia Geral será feita por meio de edital afixado em
local público (sede da entidade e/ou igreja), publicado na imprensa local, por circulares
ou outros meios convenientes, se ordinária com antecedência mínima de 15 (quinze)
dias, e se extraordinária com antecedência mínima de 07 (sete) dias.
Parágrafo único - Qualquer Assembléia instalar-se-á em primeira convocação com
maioria dos associados e, em segunda convocação com qualquer número, não exigindo
a lei quorum especial.
Art. 17º - Α Diretoria será constituída por um Presidente, um Vice- Presidente, Primeiro
e Segundo Secretários, Primeiro e Segundo Tesoureiros.
Parágrafo único - O mandato da Diretoria será de 03 (três) anos, sendo vedada mais
de uma reeleição consecutiva.
Art. 18º - Compete á Diretoria:
I – elaborar e executar o programa anual de atividades;
116
II- elaborar e apresentar à Assembléia Geral, o relatório anual;
III – estabelecer o valor da mensalidade para os sócios contribuintes;
IV – contratar e demitir funcionários;
V entrosar-se com instituições públicas e privadas para mútua colaboração em
atividades de interesse comum;
VI – convocar a Assembléia Geral.
Art. 19º - A Diretoria reunir-se-á mínimo uma vez por mês.
Art. 20º - Compete ao Presidente:
I – representar a ASCANOVI, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente;
II – cumprir e fazer cumprir este Estatuto e o Regimento Interno;
III – convocar o presidir a Assembléia Geral;
IV – convocar e presidir as reuniões da Diretoria;
V – assinar, com o primeiro tesoureiro, todos os cheques, ordens de pagamento e títulos
que representem obrigações financeiras da entidade.
Art. 21º - Compete ao Vice-Presidente:
I – substituir o Presidente em suas faltas ou impedimentos;
II – assumir o mandato em caso de vacância até seu término;
III – prestar, de modo geral a sua colaboração ao Presidente.
Art. 22º - Compete ao Primeiro Secretário:
I – secretariar as reuniões da Diretoria e Assembléia Geral e redigir as atas;
II – publicar todas as notícias das atividades da entidade.
Art. 23º - Compete ao Segundo Secretário:
I – substituir o Primeiro Secretário em suas faltas ou impedimentos;
II – assumir o mandato em caso de vacância, até seu término;
III – prestar de modo geral a sua colaboração ao Primeiro Secretário.
Art. 24º - Compete ao Primeiro Tesoureiro:
I arrecadar e contabilizar as contribuições dos associados, rendas, auxílios e
donativos, mantendo em dia a escrituração;
II – pagar as contas autorizadas pelo Presidente;
III – apresentar relatório de receitas e despesas, sempre que forem solicitados;
IV – apresentar relatório financeiro para ser submetido à assembléia Geral;
V – apresentar semestralmente o balancete ao Conselho Fiscal;
VI – conservar sob sua guarda e responsabilidade os documentos relativos à Tesouraria;
VII – manter todo numerário em estabelecimento de crédito;
VIII assinar, com o Presidente, todos os cheques, ordens de pagamento e títulos que
representem obrigações financeiras da entidade.
Art. 25º - Compete ao Segundo Tesoureiro:
I – substituir o Primeiro Tesoureiro em suas faltas ou impedimentos;
II – assumir o mandato em caso de vacância até o seu término;
III – prestar de modo geral a sua colaboração ao Primeiro Tesoureiro.
Art. 26º - O Conselho Fiscal, será constituído por 03 (Três) , membros e seus
respectivos suplentes, eleitos pela Assembléia Geral:
$ 1º - O mandato do Conselho Fiscal será coincidente com o mandato da Diretoria;
117
$ - Em caso de vacância o mandato será assumido pelo respectivo suplente até o seu
término.
Art. 27º - Compete ao Conselho Fiscal:
I – examinar os livros de escrituração da entidade;
II – examinar o balancete semestral apresentado pelo Tesoureiro, opinando a respeito;
III – apresentar relatórios de receitas e despesas sempre que forem solicitados;
IV – opinar sobre aquisição e alienação de bens.
Parágrafo Único: O conselho reunir-se-á ordinariamente a cada 06 (seis) meses e
extraordinariamente, sempre que necessário.
Art. 28º - As atividades dos Diretores e Conselheiros, bem como as dos associados,
serão inteiramente gratuitas, sendo-lhes vedado o recebimento de qualquer lucro,
gratificação, bonificação ou vantagem.
Art. 29º - A instituição não distribuirá lucros, resultados, dividendos, bonificações ou
parcelas seu patrimônio, sob nenhuma forma ou pretexto.
Art. 30º - a receita da ASCANOVI, necessária à sua manutenção será constituída por:
I – doações de qualquer natureza recebidas;
II – produto líquido de promoções de beneficência;
III – rendas de emprego de capital ou patrimônio que possua ou venda a possuir;
IV – auxílio de subvenções que venha a receber do poder público;
V auxílio ou recursos provenientes de convênio que venha a receber de entidades
privadas.
$ - Essas rendas, recursos e eventual resultado operacional serão aplicados
integralmente na manutenção e desenvolvimento dos objetivos institucionais, no
território Nacional.
Capítulo IV
DO PATRIMÔNIO
Art. 31º - O patrimônio da ASCANOVI, se Constituída de bens móveis, imóveis,
veículos, semoventes, ações e apólices de divida pública.
Art. 32º - No caso de dissolução da entidade, os bens remanescentes serão destinados a
outra instituição congênere, com personalidade jurídica que esteja registrada no
Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS ou entidade pública.
Capítulo V
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
118
Art. 33º - A ASCANOVI , será dissolvida por decisão da Assembléia Geral
Extraordinária, especialmente convocada para esse fim, quando se tornar impossível de
suas atividades.
Art. 34º - O presente Estatuto poderá ser reformado em qualquer tempo por decisão de
2/3 (dois terços) dos presentes à Assembléia Geral especialmente convocada para esse
fim, não podendo ela deliberar, em primeira convocação, sem a maioria absoluta dos
associados, ou com menos de 1/3 (um terço) nas convocações seguintes, e entrará em
vigor na data de seu registro em cartório.
Art. 35º - revogam-se os estatutos anteriores e todas as alterações e disposições em
contrário a partir do registro deste em Cartório.
Art. 36º - Os casos omissos serão resolvidos pela Diretoria e referendas pela
Assembléia Geral.
O presente Estatuto foi aprovado pela Assembléia Geral realizada no dia 10 de Agosto
de 2006.
Teófilo Otoni / MG, 10 de Agosto de 2006.
____________________________________ _____________________________
João Antonio Evangelista da Costa Sebastião Cardoso Alves
Presidente Conselho Fiscal
____________________________________ _____________________________
Olimpio Gonçalves Pereira Eduardo dos Santos
Vice – Presidente Conselho Fiscal
____________________________________ _____________________________
Luciana Ernestina dos Jesus Elizabete Barbosa de Jesus
1º Secretario Conselho Fiscal
___________________________________ _____________________________
Luzinete Fernandes da Silva Crisolina Maria de Jesus
2º Secretario Conselho Fiscal-Suplente
____________________________________ _____________________________
Jailton Santos da Silva Arenilda Ribeiro dos Santos
1º Tesoureiro Conselho Fiscal-Suplente
___________________________________ _____________________________
Gilvan Pereira Ana Oliveira Santos
2º Tesoureiro Conselho Fiscal-Suplente
119
ANEXO 5: Termo de Consentimento da ASCANOVI
Declaro para os devidos fins que a Associação dos Catadores de Materiais
Recicláveis Nova Vida ASCANOVI, localizada na cidade de Teófilo Otoni, MG, após
análise do projeto de pesquisa de Simone Gomes da Silva, mestranda do Programa de
Meio Ambiente e Sustentabilidade do Centro Universitário de Caratinga (UNEC), sobre
“Os desafios à construção de um processo de auto-gestão associativista na reciclagem
de lixo frente as estratégias e conveniências do mercado capitalista e entendendo a
contribuição desse trabalho para a ASCANOVI, está de acordo com o estudo, permitindo
a pesquisadora livre acesso ao galpão de triagem dos materiais recicláveis, acesso a
dados e as informações que se fizerem necessárias, autorização para entrevistar os
trabalhadores em horário de trabalho e inclusive, ter o direito de registro fotográfico. O
trabalho terá início em Fevereiro de 2007 com término previsto em Outubro de 2007.
Atenciosamente,
__________________________________________
João Antonio Evangelista da Costa
Presidente da ASCANOVI
Teófilo Otoni, 13 de Fevereiro de 2007.
120
ANEXO 6: Termo de Consentimento Livre e esclarecido do membro ASCANOVI para
conceder entrevista
Eu, __________________________________________________ membro da
ASCANOVI concordo em participar voluntariamente da pesquisa sobre Os desafios à
construção de um processo de auto-gestão associativista na reciclagem de lixo frente
as estratégias e conveniências do mercado capitalista na qualidade de entrevistado,
estando informado e esclarecido de que os dados serão utilizados exclusivamente nesta
pesquisa, sendo minha identificação mantida em sigilo.
Teófilo Otoni (MG), de de 2007.
_________________________________
Assinatura do Entrevistado
_________________________________
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