RESUMO
Introdução: A mielomeningocele (MMC) é a causa mais comum de disfunção
vesicoesfincteriana neurogênica em crianças. O comprometimento da inervação
vesical e esfincteriana leva a alterações de risco para a função renal, como elevação
da pressão intravesical, refluxo vesicoureteral, obstrução e infecções. A identificação
dos problemas e tratamento precoce previne os danos renais, alterações
neurológicas, deformidades ortopédicas e problemas intestinais, frequentes nestes
pacientes. A atuação multidisciplinar é fundamental para otimização do tratamento.
Objetivos: O objetivo deste estudo foi descrever o perfil das alterações neurológicas
e nefro-urológicas de uma população de pacientes portadores de bexiga
neurogênica associada à MMC. Pacientes e Métodos: Estudo retrospectivo,
descritivo e analítico, envolvendo 94 pacientes com MMC e bexiga neurogênica
acompanhados de 1998 a 2008, em um centro de referência para atendimento de
espina bífida no Hospital Municipal Jesus - Rio de Janeiro - Brasil. Foram coletados
dados sobre a MMC, aspectos neurológicos e ortopédicos, avaliações urodinâmicas,
ultra-sonografias, uretrocistografias (UCM), cintilografia com DMSA e infecções do
trato urinário. Com base na avaliação urodinâmica, foram definidos dois grupos de
pacientes: aqueles com baixa complacência, pressão de perda > 40 cm H2O ou
dissinergia constituíram o grupo de risco, e os demais formaram o grupo controle,
que apresentavam complacência normal com hipo ou hiperatividade. Os dois grupos
foram comparados quanto à evolução, tratamento e complicações. A análise
estatística foi feita pelo teste do qui-quadrado de Pearson com significância
estatística para p < 0,05 e odds-ratio com IC de 95%. Resultados: Foram estudadas
94 crianças, 49 (52,1%) de meninas e 45 (47,9%) de meninos. A média de idade foi
de 8,8 anos (faixa, 1-14 anos). A localização da MMC foi: lombossacral em 57
(60,6%), lombar em 18 (19,1%), tóraco-lombar em 14 (14,9%) e torácica (5,3%).
Derivação ventrículo-peritoneal foi realizada em 90,5% dos casos. Os achados
urodinâmicos foram: complacência normal associada a hiperatividade do detrusor
em 23 (28,8%) e associada a hipoatividade em 4 (5%), baixa complacência em 18
(22,5%) e pressão de perda > 40 cm H
2O em 35 (43,8%). O grupo de risco compôs-
se de 53 pacientes, enquanto o grupo controle incluiu 27 pacientes. Os aspectos
clínicos relevantes foram: 58,5% dos pacientes tiveram a primeira consulta na
nefrologia após 1 ano de idade; o cateterismo intermitente limpo foi iniciado após o
primeiro ano de idade em 76,6% das crianças; e infecções urinárias ocorreram em
70,2%. Tratamento cirúrgico foi indicado em 9/53 (17,0%) pacientes do grupo de
risco e em 3/27 (11,1%) do grupo controle (p = 0,487). Lesões graves foram
detectadas pelo DMSA em 11/25 (44%) avaliações do grupo de risco e 4/13 (30,8%)
avaliações do grupo controle. As crianças do grupo de risco apresentaram maior
taxa de ITU (79,3% versus 59,3% no grupo controle), dado que revelou significância
estatística (p=0,04) com odds-ratio de 2,8 (IC 95%, 1,029 a 8,104). Conclusões: As
crianças do grupo de risco tiveram probabilidade 2,8 vezes mais alta de sofrer ITU
recorrente.
Palavras-chave: Meningomielocele, Bexiga urinária neurogênica, Crianças,
Urodinâmica